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DADOS DE ODINRIGHT

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1ª Edição

2022

Copyright © 2022 Harin Adna

Revisão: Paula Domingues

Diagramação Digital: Paula Domingues

Capa: Thatyane Tenório

Esta é uma obra ficcional.


Qualquer semelhança entre nomes, locais ou fatos da
vida real é mera coincidência.

Todos os direitos são reservados. Nenhuma parte


deste livro pode ser utilizada ou reproduzida em
quaisquer meios existentes sem a autorização por
escrito da autora.

A violação dos direitos autorais é crime estabelecido


na Lei nº

9.610/98 e punido pelo artigo 184 do Código Penal.

Não há nada mais perigoso, do que um homem


completamente obcecado por uma mulher.

Esse sou eu.

Acompanhando cada passo, cada detalhe, de longe, sem


que ela soubesse.

Cada pedacinho da sua vida glamourosa, cada respiração,


velando cada sono.

Eu tinha feito as pazes sobre ficar longe, jamais seria bom


para ela e toda sua vivacidade.
Até que ela apareceu em minha casa por um feito do
destino. Entrou no antro do demônio por sua própria
escolha.

E eu?... eu estou, mais do que disposto a tirar todas as


escolhas dela.

Não se pode tentar um homem com o que ele mais deseja.

Melissa Tunner será minha.

SINOPSE

SUMÁRIO

PRÓLOGO

CAPÍTULO 01

CAPÍTULO 02

CAPÍTULO 03

CAPÍTULO 04

CAPÍTULO 05

CAPÍTULO 06
CAPÍTULO 07

CAPÍTULO 08

CAPÍTULO 09

CAPÍTULO 10

CAPÍTULO 11

CAPÍTULO 12

CAPÍTULO 13

CAPÍTULO 14

CAPÍTULO 15

CAPÍTULO 16

CAPÍTULO 17

CAPÍTULO 18

CAPÍTULO 19

CAPÍTULO 20

CAPÍTULO 21

CAPÍTULO 22

CAPÍTULO 23

CAPÍTULO 24

CAPÍTULO 25

CAPÍTULO 26
CAPÍTULO 27

CAPÍTULO 28

EPÍLOGO

Sigam a Autora

Melissa Turner, 17 anos

Passado.

— Tome o remédio.

— Não sei se posso.

— E o que você quer, Melissa? Ter um filho aos dezessete?

Desistir de sua carreira?

Olhei para Melinda, a dona da agência que eu tinha acabado


de entrar. Estava morando em Nova Iorque há seis meses e
tinha acabado de alugar um apartamento. Diziam que eu
era a promessa da Estillus e estavam investindo em minha
carreira internacional.

Até ele! Darius Konstantinus, um cliente vip da Estillus.

— Eu não tive culpa. — Falo baixo.


Melinda suspira com quase pesar.

— Não importa mais, Melissa. Fizemos um investimento


milionário em você. Em dois meses você vai para Milão e de
lá para o mundo inteiro — diz freneticamente. — Não vou
permitir que estrague isso.

— Ele me forçou — Tentei novamente entre lágrimas.

— Não importa! — Melinda segurou meu braço com força —


É

graças a ele que você vai conseguir o que tanto deseja. Se


ele descobrir que não foram tomadas as medidas
necessárias, você estará perdida. Eu estarei perdida.

Não era justo. Eu sabia, mesmo sendo nova, eu sabia que


estava errado. Eu sabia que deveria denunciar, mas eram
pessoas poderosas. Minha família era de um pequeno
rancho no interior de Montana. Meu irmão tinha acabado de
se formar em Direito e estava

indo morar em Chicago. Eles poderiam destruir minha


família, mesmo que as ameaças tenham sido veladas.

— Tome esse remédio, Melissa. No futuro, quando estiver


com seu rosto estampado no mundo todo, representando as
melhores marcas, irá me agradecer. Não quer destruir tudo
por um bastardo fruto de um abuso.

Doeu a forma, como a Melinda colocou, mas eu sabia que


ela não estava pensando em mim. Ela estava pensando
nela, no escândalo que poderia vir sobre ela, sobre a
agência e até mesmo sobre as outras modelos.

— Está pensando em você, apenas em você! — Eu gritei em


meio ao desespero. Os olhos de Melinda gelaram e eu dei
um passo para trás, no escritório da agência, onde
estávamos.

— Aprenda uma coisa de uma vez por todas, Melissa. Algo


que ninguém mais vai ter coragem de dizer: — Você não
tem voz aqui, não tem vontade, Darius vai passar por cima
de você com um rolo compressor. — Fala decidida. — Você
não é ninguém. É uma iniciante. Sem influência, sem
dinheiro e com apenas alguns sonhos bobos adolescentes —
respira fundo — Foi uma fatalidade, e eu sinto muito que
tenha acontecido com você. Agora tome o maldito remédio
e interrompa essa gravidez de forma segura de uma vez por
todas, se torne alguém que possa fazer algo por outras que
virão após você, ou o que você quiser. A escolha é sua.

Engoli em seco. Escolha? Era realmente uma escolha para


mim? Eu não sentia assim. Futuramente, eu entenderia
melhor sobre situações em que nos fariam acreditar que
temos uma escolha, quando, na verdade, não temos. Eu
sentia medo, medo dos pés à cabeça. Era desesperador,
muito desesperador.

Limpei as lágrimas e respirei fundo. Mesmo aos dezessete,


eu sabia que era a decisão da minha vida. Era uma merda,
mas ela estava certa. O que eu faria voltando para Montana
com um filho na

barriga? Um filho fruto de um abuso. Fechei os olhos com


força e algumas lágrimas desceram. Aceitei o copo de água,
que, agora, repousava em cima da extensa mesa de vidro.
Olhei para a mulher ruiva, de terno e rosto severo e peguei
o comprimido.

Em um só gole, sem pensar demais, eu tomei. Muitos


poderiam considerar que ali foi o início de toda a glória que
eu conquistei, mas não. Ali, foi quando eu deixei todos os
sonhos tolos de uma adolescente de dezessete anos, e
passei a ver o mundo de forma cinza.

Mas algo, todos poderiam concordar. Foi ali que tudo


mudou.

Vicenzo Capello

— Olhe para mim, Vicenzo.

— Pai, por favor.

— Não chore. Você tem vinte e um, agora, Mario e Vito


precisam de você forte.

— Pai...

— Perdão! Você sempre foi o mais forte, se torne temido e


nos vingue Vicenzo. Seja forte, porque eu... — O homem
mais forte do mundo, que para mim era invencível, chorou.
— Eu avancei, tentando evitar o pior, mas foi muito tarde.
Com o cano da arma na cabeça, suas últimas palavras
foram — Me perdoe.

A neve caia como sempre acontecia em janeiro. Ela cobria


os jardins e caminhos do palacete antigo onde moravam eu
e Mário, meu irmão do meio, e segundo no comando. Hoje,
especialmente hoje, era um dia que todas as lembranças de
um passado sombrio revisitavam. Se eu fechasse os olhos,
com força, poderia sentir o cheiro de pólvora e sangue, meu
pai caído no chão com uma carta estúpida ao seu lado.

O homem não se levantou desde que a Bratva nos destruiu,


matando e torturando minha irmã. O que foi seu último
prego no caixão, visto que o homem era louco pela minha
mãe, que morreu ao dar à luz a Bianca.

— É hoje.

Não fiz menção alguma de olhar para Vito. Meu irmão mais


novo, estudava e morava atualmente em Cambrigde, era
aluno do Instituto de Tecnologia de Massachussets e não era
segredo que ele pouco sabia do negócio da família. Mas
hoje era sombriamente especial. Era o aniversário de Bianca
e religiosamente, todos os anos, nos reuníamos, o que
sobrou da família Capello, em memória da minha irmã
caçula.

Bianca foi brutalmente assassinada pela Bratva, a Máfia


Russa, quando esta era liderada pela família Nikolai. Minha
irmã era uma criança, entrando para a adolescência, e, sem
sombras de dúvida, o motivo dos

sorrisos de nossa família. Mas seria impossível não olhar


para trás e enxergar que a morte de Bianca foi o ápice do
nosso período mais brutal e sombrio, e com toda a certeza,
nunca, nada voltou a ser o que era.

Bianca era uma extensão de nossa mãe, e perdê-la foi


desolador.

Mas, ainda pior do que perder a minha irmã, foi ter que
herdar uma organização criminosa, tendo um sucessor,
sangue do seu sangue, julgado como um fraco.
Eu me tornei o que eu sou, desde então. Fiz do meu ódio
combustível para reconstruir o império destroçado que meu
pai me deixou.

Tive que ser mais cruel, mais temido, mais voraz, provar ser
digno de continuar a liderar a Chicago Darkness, mesmo
depois de meu pai ter se mostrado incapaz. Hoje eu havia
conquistado o respeito e o temor, e nada acontecia em meu
território sem que eu soubesse, ou permitisse.

Caso acontecesse, sempre havia um preço.

— Mário nos aguarda no saguão.

Olhei finalmente para meu irmão mais novo, e estudei sua


figura.

Alto, atlético, cabelos escuros e olhos azuis, como eram os


de Bianca.

Mário tinha olhos e cabelos castanhos, mas eu sempre fui


acusado de ter olhos peculiares. Todos sabiam quem
éramos aqui em Chicago, a própria mídia nos
sensacionalizavam, contudo, todos também temiam sobre o
que publicar a nosso respeito. Falavam do sucesso de
nossos empreendimentos, da beleza, principalmente de Vito
e Mário, enfim, e me chamavam de recluso e sisudo. Eu não
me importava.

Prefeitos, e o próprio governador, estavam em minhas


mãos, e sabiam exatamente com quem estavam lidando.
Não foi fácil chegar no patamar de poder quase absoluto
que eu exercia em meu território, não depois de meu pai ter
se suicidado, mas aqui estávamos. Quase a realeza de
Chicago.
Vito continuou me olhando, embora calado. Eu não era o
exemplo de irmão amoroso, mas cuidava dos meus irmãos.
Enquanto Vito estudava, mesmo que os filhos da puta que
mataram minha irmã já houvessem pagado com a vida por
tudo o que causaram, ainda havia perigos na vida que eu
levava.

Dimitri Nikolai, o assassino de minha irmã, estava morto, e


sua morte só foi possível graças a união das principais
facções criminosas do país.

Os Devils Dragons MC, a Cosa Nostra e a Máfia Irlandesa em


Boston.

Juntos, derrotamos Dimitri e entregamos a Bratva ao seu


herdeiro por direito, Yuri Ivanov, que agora também era um
aliado.

Mas o perigo ainda existia.

O Cartel de Guadalajara, aliado de Dimitri Nikolai e alguns


políticos influentes trabalhavam com o tráfico de mulheres e
crianças. A Aliança, como foi chamada, impediu o tráfico
praticamente em todo o país, alimentando assim a ira do
Cartel.

O seu líder, Juan Suarez, então conhecido como um


fantasma por nunca ter sido visto, passou a perseguir os
Devils, principalmente, sequestrando Hanna Walker, irmã de
Shield, vice-presidente do moto clube. Hanna foi resgatada
com vida e após três anos, a agora, Old lady do Prez, Storm,
teve sua vingança.

Juan Suarez estava morto.

Era mais uma batalha vencida pela união da Aliança, mas a


guerra, essa estava longe de ser vencida. Porque ainda
havia o irmão de Suarez, que, agora, comandava o Cartel,
os políticos influentes que tiveram sua renda comprometida
com o fim do tráfico internacional de pessoas, e a ameaça
sussurrada do próprio FBI em cima do crime organizado.

Tudo isso não me colocava no patamar de irmão mais


amoroso, mas eu cuidaria de cada Capello que sobrou.

Eu daria a vida por meus irmãos.

— Vamos. — Foram, minhas únicas palavras, antes de


reviver um dos maiores horrores vivenciados pela minha
família. A imprensa teria algo para falar durante a semana,
os homens mais antigos da Darkness ficariam incomodados
e ressuscitariam suas falácias sobre como meu pai foi fraco,
talvez eu matasse algum deles para dar como exemplo
sobre o cuidado com as palavras, mas era o que acontecia
todos os anos. Eu lidaria com tudo no tempo certo.

Hoje, eu olharia para a foto da minha irmã, com onze anos,


e me lembraria o motivo pelo qual eu me tornei quem sou.
Eu me confortaria sabendo que ela era inocente demais
para viver em um mundo como esse, boa demais para ficar,
e isso explica a falta de qualquer sentimento que não fosse
ódio e vazio dentro de mim. Foi o preço para me tornar
quem sou. Oco, sem nada. Porque Bianca morreu tão
cruelmente, e sua morte me tirou tudo.

E nada poderia suprir o vazio! Palavras bonitas, mas ainda


assim, insignificantes, lamentação, choro de algumas das
mulheres dos meus homens que conheceram minha família.
Ninguém me abraçava, mas abraçavam Vito, que foi sempre
mais aberto. Em Mário, ao meu lado, um aperto de mão,
principalmente dos homens que trabalhavam com ele na
rua, pois Mário gostava de sentir o perigo e isso o colocava
em contato diário com os homens. Ele era meus olhos no
negócio.

Poucos ousavam me dirigir mais do que um sussurrado


“meus sentimentos”. As mulheres mais corajosas o faziam
de longe, por pura obrigação.

— Dead Eyes.

Olhei para Carl, meu executor principal. Ele era um dos


poucos homens que falavam comigo diretamente, e me
chamava pelo infame apelido dado a mim, desde que
assumi a Chicago Darkness. Os outros me chamavam
assim, mas nunca em minha presença. Eu apenas olhei o
homem que mais confiava, depois dos meus irmãos, e
esperei que ele dissesse o que precisava ser dito.

— Alguns homens... bem, os de sempre — começa falar,


mas pausa.

Alguns homens estavam falando sobre o meu pai. Sobre a


fraqueza de meu pai, e provavelmente, colocaria minha
própria conduta diante da organização a prova.

Eu não movi um músculo até finalmente perguntar:

— Quem?

— Júlio. E alguns outros. Mas Júlio principalmente.

Júlio Santino, era um dos chefes de rua. Eu tinha executado


seu pai, no ano anterior. E os Santinos, queriam a todo
custo me tomar o poder, desde a morte de seu pai.

No ano anterior, exatamente um ano atrás, o pai de Júlio fez


uma declaração pública, afirmando que em breve eu
sucumbiria como meu pai.
Ele pagou com sua vida.

— Então você já sabe o que deve fazer.

— Chefe? — Carl me perguntou tentando disfarçar a


surpresa. Eu não tinha mais paciência para desconfiar dos
membros da Chicago Darkness. Ou os homens estavam
comigo, ou contra mim.

— O de sempre, Carl. — Eu disse e me afastei.

Passei pela mídia do lado de fora da igreja, e não os


cumprimentei.

Apenas passei direto, usando meus óculos escuros. Vito e


Mário vieram logo atrás, Vito acenando e agradecendo
alguns dos repórteres. Bando de inúteis, era o que esses
repórteres eram. Mas era graças a inutilidade dessa
categoria aqui em Chicago, que eu conseguia anistia para
os meus negócios.

Eles estavam mais interessados em alguma fofoca do que


em como eu construía meu império, ou por quais vias.

— Não custa ser educado, Vicenzo. — Vito resmungou,


assim que entrou no carro, e como sempre acontecia, eu lhe
dei o meu silêncio. Ele era mais significativo do que
qualquer palavra. Mário suspirou e acendeu um cigarro
eletrônico.

— Hoje mais cedo, os homens estavam dizendo que você


deveria aceitar a oferta de um casamento pela Aliança.
Romero inclusive, chegou a citar um nome, Anita Santorelli,
a irmã de Eduardo.

Eu segurei na risada sarcástica que quis explodir em minha


garganta. Anita Santorelli era uma criança, uma menina, e
eu não queria me unir em casamento com mulher alguma.
Eu simplesmente não precisava de uma mulher e nem de
um casamento para me tornar mais forte. Eu jamais
colocaria uma mulher de forma definitiva em minha vida,
não por essa via.

— Mas ela é uma criança. Ela tem o quê? Dezesseis,


dezessete? —

Vito enojou-se, dizendo o que eu pensava.

— Hei, sou apenas o mensageiro. — Mário levantou as mãos


rindo.

— Romero deve cuidar mais de seus negócios, do que se


preocupar com quem eu me caso. — Eu disse
simplesmente.

Romero era um homem antiquado, velho, do tempo em que


a Darkness ainda estava intimamente ligada com a Cosa
Nostra. Meu pai mudou isso, quando chegou ao poder e se
casou com minha mãe, uma estranha, alguém de fora da
Máfia. E isso mudou a Chicago Darkness de forma
estrutural. A vida pessoal de cada homem não importava,
ou se sua origem era meia ou nada italiana.

Um homem feito da Darkness só tinha que ser leal ou


pagaria com a vida. Romero idealizava resgatar os valores
iniciais da organização, mas só sobre a porra do meu
cadáver que eu me casaria com uma menina que mal
conhecia para satisfazer a vontade do amigo mais antigo de
meu pai.

— Agora, você, Vito, seria uma boa escolha para se casar


com a italiana. Se idade for um problema.
Vito olhou horrorizado para Mário, que caiu, em uma sonora
gargalhada. Eu assisti a tudo do meu silêncio habitual, mas
as provocações entre meus irmãos era algo familiar e
confortável. E tal leveza era raro na vida que eu vivia.

— Eu conversei com ela em duas ocasiões, ela é menor de


idade. E

eu tenho Kessi, minha namorada em Cambridge.

— Você precisava ver a sua cara — Mário disse entre


risadas, até limpar dos olhos de tanto rir, então se virou
para mim — Eu poderia ser um candidato. Tenho vinte e
quatro, não muito mais velho do que ela. E ela, as poucas
vezes em que a vi, deu indícios de que se tornaria uma
mulher linda e gostosa. Eu não me importaria com esse
sacrifício.

— Ninguém vai se casar com Anita Santorelli, pelo menos


não por política.

O time foi perfeito, e nesse momento chegamos em casa.


Eu sabia que toda a conversa leve era uma forma de tornar
o momento um pouco mais tragável. Porque a lembrança de
tudo era um verdadeiro pesadelo anual. Era onde os
homens se sentiam no direito de levantar palavras de duplo
sentido sobre meu pai, e às vezes, até mesmo sobre mim.
Era quando revivíamos um período tenebroso de tragédias
na família Capello.

Assim que cheguei em meu quarto, meu telefone tocou.

— Rebecca. — Eu suspirei, mas atendi da mesma forma. Se


eu não atendesse a filha do governador de Illinois, e única
mulher com qual me relacionei publicamente, ela arrumaria
uma forma de chegar até mim.
— Rebecca.

— Como você está, Vi.

— Eu estou bem.

— Sempre tão acolhedor — Meu silêncio a fez suspirar mais


de uma vez — Sei que hoje é um dia... difícil! — Embora
você não demonstre e nem fale. Ficamos juntos por um ano,
eu te conheço bem. Achei que poderíamos, não sei, nos
encontrar. E conversar.

— Eu agradeço a sua ligação, Rebecca. Mas irei dispensar o


convite. Tenho muito trabalho e viajo amanhã.

Ela respirou mais uma vez.

Eu fechei os olhos e praguejei mentalmente.

— Eu só queria entender o que aconteceu, que nos afastou


tanto, éramos bons juntos.

— Eu preciso desligar. — Disse direto, e desliguei.

Sabia que estava sendo um filho da puta, mas já fazia três


anos que não tínhamos nada. Mudou porque era isso que
acontecia toda vez que eu conseguia o que queria. Eu
perdia o encanto, eu perdia o interesse. O que me chamava
a atenção, de repente, passava a me irritar. Tudo se tornava
frio, como o eterno vazio dentro de mim. Com Rebecca
London não foi

diferente. Foi obsessão à primeira vista, como sempre


acontecia, eu ficava obcecado até possuir o que desejava.

Eu já tinha feito esse caminho algumas vezes, e os poucos


próximos a mim, sabiam como terminava. Com um coração
partido do outro lado, com a minha total falta de empatia ou
consideração, com meu comportamento frio, com uma
rejeição ou mais, dependendo da insistência da outra parte.

Eu tentei ser mais tolerante com a insistência de Rebecca


por uma questão política. Quando a vi pela primeira vez, foi
como uma compulsão, eu sabia que deveria tê-la, que não
resistiria a minha obsessão, mas por ela ser quem é, tive
que cortejá-la. Minha obsessão sempre me levava a estudar,
investigar, seguir, controlar tudo sobre o meu objeto de
desejo de forma doentia.

Isso me tornava atento a qualquer detalhe, isso me levava a


ser o amante perfeito, até que o desejo fosse saciado,
minha obsessão acabasse, e as mulheres, em sua maioria,
ficavam quase dependentes.

Eu gostaria que tudo fosse simples, como era comigo, mas


nunca era assim. Elas não entendiam quando o encanto
acabava, e eu não tinha consideração suficiente para
explicar mais de uma vez. Talvez eu fosse um psicopata
doente como me chamaram várias vezes.

Eu não me importava, nem mesmo com isso.

Olhei o telefone e entrei na antessala que tinha em meu


quarto. “Meu lugar”. Entrei e lá estava, por toda a parte,
revistas de moda, um computador em minha mesinha com
algumas imagens. Imagens da Time Square, do edifício
Muller, da sua fachada e entrada. De outro Apartamento em
Paris, um cronograma de voos e escalas. “Detalhes.”

Melissa Turner.

Melissa, a supermodelo, famosa internacionalmente, irmã


de Daniel Turner, meu advogado, o homem que limpava
minha bunda aqui em Chicago. O homem que me deu a
ordem clara de ficar longe de sua irmã.

Ri com o lembrete inútil. Ninguém, absolutamente ninguém,


me dava ordem. Eu a quis desde o primeiro momento que a
vi. Eu a segui, a farejei

como um cão pelo mundo, e tem sido assim no último ano.


Contudo, algo me segurava. Talvez porque eu sei como a
história acaba, talvez porque eu tenha visto tanta
vivacidade em seus olhos azuis e seu rosto de boneca, e
ainda assim, lá, no fundo, eu vi a melancolia.

Eu vi a tristeza encapando seu olhar de céu. E talvez por


isso, por tudo isso, eu tenha me segurado. Eu não tenha me
aproximado. Mas o controle, antes, nunca exercido, tem
deixado tudo muito maior, mais difícil.

Eu tento alimentar a compulsão de longe, sem chegar muito


perto para não a quebrar.

Porque se eu me aproximasse, seria esse o fim.

Mas aqui, nessa sala silenciosa, eu poderia olhar por ela.


Cuidar dela, mesmo que o perigo que envolveu Daniel
Turner a um ano atrás, quando sua esposa e filha estavam
na mira de um psicopata, não respingasse nela.

Mesmo que não houvesse perigo real à espreita, mesmo


que o perigo real fosse eu mesmo, eu a vigiava
incansavelmente. E eu torcia, pelo bem de Melissa Turner,
que a obsessão fosse embora.

Porque eu era incapaz de dar mais a qualquer pessoa. Eu


era caos e vazio e nunca tive nada de bom para oferecer a
ninguém. E eu não quebraria Melissa, mesmo que esse
fosse o desejo mais intenso, obscuro e sombrio que eu já
tivesse sentido.

Eu a salvaria de mim.

Melissa Turner

Eu gostava de Montana.

Estar em meio a minha família era uma das coisas, se não,


a coisa mais prazerosa que eu tinha em minha vida. Olhei
para Victoria, minha sobrinha de seis anos em meu colo,
quase adormecida, enquanto assistíamos Frozen, pela
vigésima vez. Todos já haviam adormecido, inclusive seus
pais foram para a cama cedo. Mas eu tinha a leve
desconfiança de que Daniel e Ashley não foram dormir,
exatamente.

Milla, minha irmã gêmea se aproximou e deu um beijo em


nossa sobrinha. Ela tinha sido um presente em nossas vidas.
Meu irmão, Daniel, tinha descoberto sua existência quando
ela tinha cinco anos. Foi fruto de um dos inúmeros casos
que meu irmão teve ao longo da vida, e quando a mãe e os
avós de Victoria morreram, uma governanta a trouxe para
Daniel.

No início foi assustador para o meu irmão, mesmo que hoje


ele negue. Mas ele mudou a vida, se casou com sua rival e
maior desafeto, para que não arriscasse perder Vic. O
casamento de conveniência virou real, Ashley adotou
Victoria, e hoje eles são uma família feliz.

Assim como minha irmã gêmea, Milla, também casada e


muito feliz com a estrela de Hóquei do Chicago Winters. Eu
era a tia legal e solteira, e estava tudo bem.

— Ela está crescendo — Milla sussurrou para não acordar


Vic.

— E cada vez mais linda — Eu completei, totalmente


apaixonada na pequena.

Ficamos olhando a preciosidade que tínhamos ganhado em


uma jogada da vida em nossa frente, nos perdendo na
beleza e meiguice pura que era Victoria. Cabelo negro,
longo, olhos extremamente azuis acinzentados como do
meu irmão, e rosto de anjo.

Deixamos Vic deitada no sofá do Rancho dos nossos pais, o


Rancho que fomos criadas, e fomos em direção a varanda,
imensa que contornava

toda a casa. Assim que chegamos, Milla, de pantufas de


elefante, mais velhas que nós duas, se virou com a mão na
cintura.

— Estou muito intrigada. Faz tempo que quero ter essa


conversa com você, e sei que amanhã voltará para Nova
Iorque.

— O que foi? — Perguntei sorrindo, enquanto estremecia


olhando a noite.

— Espera, essa conversa eu também quero ter.


Olhamos juntas para a entrada da casa, e nos
surpreendemos com Ashley, de pijama, meias e chinelos. Os
longos cabelos negros que lembravam em muito Victoria
estavam por toda a parte, a tornando menor do que
realmente era. Meu irmão era louco por essa mulher. A
aparência com Victoria hoje já não era mais um mistério.
Ashley, que até então achava que era sozinha, descobriu
em uma longa história que é prima de segundo grau de Vic.

Como eu disse, longa história.

— Isso está parecendo uma intervenção. — Eu disse com


uma risada.

— Eu vou ser direta: — Tem um ano que você disse algo


sobre ir morar em Chicago, por querer participar mais da
vida de Victoria e ver seus pais com mais frequência.
Sabemos que tem dinheiro para viver em uma
aposentadoria eterna. Mas toda vez você procrastina. O que
está acontecendo?

— Estou procurando o melhor momento, Ash. — Respondi,


olhando minha cunhada.

— Você sempre responde isso — Disse Milla — Eu não


queria ser a irmã chata que entrega os outros, e se mete
em sua vida, mas estou preocupada.

Gelei.

— Com meu trabalho?

Ela fechou os olhos, então os abriu, determinada.

— Judith me ligou. Disse que você anda estranha. Está


evitando-a, e ela te ouviu ao telefone, você parecia estar
sendo ameaçada. Não falei nada com ninguém, apenas com
Ashley.

Meu coração bateu disparado no peito, mas meu rosto


continuou impassível. Com certeza mataria Judith, minha
amiga de longa data, assim que a visse. Eu já tinha dito que
não era nada demais e que meus problemas eram meus
problemas. Jamais eu diria o que estava acontecendo, não
por não confiar em Ash e Milla, mas simplesmente, conhecia
minha família e sabia que eles iriam querer resolver se
soubessem de tudo.

— Eu não contei a Daniel, ou ele iria querer meter o amigo


esquisito dele no meio para investigar.

Milla bufou em uma risada com o comentário de Ahsley, e


eu me lembrei do tal amigo. Eu jamais o descreveria como
esquisito, e sim como misteriosamente sexy e gostoso.
Contudo, desde que Daniel me fez prometer que não me
envolveria com ele, eu não o fiz. Não que eu tivesse voltado
a vê-lo ou recebido alguma proposta. E eu estava envolvida
demais na merda da minha vida, para procurar por algum
homem.

O que eu sabia, era que os Capellos eram perigosos de


alguma forma.

Especulavam que eles tinham alguma ligação com o


submundo de Chicago, e além, mas nunca nada foi provado.
Olhei para ambas.

— O que sabem sobre ele? — Perguntei para ambas que se


olharam e congelaram.

— Moramos em Chicago Mel. O que sabemos é o que todo


mundo sabe, e ninguém diz. — Milla disse, mas era péssima
em esconder as coisas. Eu a conhecia desde o útero da
mamãe.

— Existe algum fundamento sobre essas especulações, ou é


só porque são absurdamente ricos?

Elas se olharam novamente, e eu me dei conta de que


ambas sabiam mais do que estavam dizendo. Era assim,
amava minha família, mas cada um com seus segredos.

Eu também não diria os meus, de forma alguma.

— Só sabemos os sussurros. De que, ele tem negócios sujos.


Só. —

Ashley disse e desviou o olhar. Ela mentia melhor que Milla


que comprimia os lábios.

— Não fuja da questão. Mel. Você sabe que pode contar


conosco para qualquer problema. — Milla disse e segurou
minha mão.

— Eu agradeço a preocupação, mas não é necessária. Eu


aceitei um contrato em Nova Iorque mesmo, e acredito que
seja o último, e então irei abrir um negócio para mim em
Chicago, porque não suporto ficar parada.

— Você pode falar? — Ashley perguntou, e eu fiquei aliviada


pela mudança de assunto. Iluminei-me falando.

— Serei o novo rosto da coleção de inverno da Castelle.

Ambas abriram os olhos como pratos.

— Eu já ouvi falar dessa marca. Parabéns, Mel.

— É uma marca que está em ascensão, a designer é Milena


Castelle. Ela marcou uma reunião para semana que vem.
Estou animada, principalmente porque meu assessor me
garantiu que ela está procurando uma sociedade, com
alguém sólido no meio da moda. E eu estou procurando
mudar um pouco a rota. Acho que tem grandes chances de
dar certo.

— Mas você desenha? — Ashley questionou genuinamente


interessada.

— Eu seria mais a parte comercial. Frank me disse, que eu


representar a marca, será um experimento, para ver como
trabalhamos juntos. Ela quer ter mais tempo para a família,
é mãe de gêmeos, e quer dividir o trabalho. Enfim, estou
ansiosa.

Ambas me abraçaram. E eu aceitei o abraço com gosto de


lar. Nesse momento, minha mãe se aproximou e nos
abraçou também.

— Não sei o motivo do abraço, mas senti vontade de me


juntar a ele.

Todas rimos e a incluímos no momento.


— Eu amo quando estamos todas juntas — Milla soltou,
sendo sempre a mais amável de todas nós.

— E eu amo minhas três filhas.

Ashley bem que tentou esconder as lágrimas. Ela não tinha


ninguém, nem pai, nem mãe, nem irmão e nem avós. Mas
agora, ela tinha a todos nós, e eu sabia que era para
sempre, pois meu irmão renunciaria a um órgão antes de
perder Ashley.

Assim como Nate, seria capaz, de buscar a lua, caso Milla


quisesse.

E não diria nada sobre meus pais, que eram apaixonados a


mais de trinta anos. Eu tinha muitas referências sobre amor,
e talvez por isso, nunca tenha tido relacionamentos que
ultrapassassem seis meses. Não era de encher o coração,
não eram amores intensos, não como a referência que eu
tinha em minha família.

E eu jamais aceitaria menos do que eu merecia.

— Mas você é de Chicago, Melissa.

Olhei para minha melhor amiga, que repousava em meu


grande sofá. Judith, apesar de ter iniciado a carreira de
modelo junto comigo, conseguiu ir para a Universidade.
Como ela conseguiu conciliar a vida de modelo com os
estudos, era um grande mistério para mim, embora eu
tenha acompanhado todo o processo de perto.

— Não sou de Chicago, Ju. Sou de Livingston, Montana.

— Tanto faz — Ela disse, e se aproximou de mim, já alegre


demais pelo vinho — Você está em Chicago sempre. Eu
preciso de uma entrevista com a família Capello.
Eu sabia muito pouco sobre essa família, além do fato de
que ela era poderosa em Chicago, e que tinha alguma
ligação com Daniel. Lembro de quando o vi Vicenzo Capello
no escritório de Daniel, a muitos meses atrás e de achá-lo
atraente. E da forma como Daniel me pediu para ficar longe
dele.

— Eu conheci um deles. — Disse pensando alto e me


arrependi na mesma hora com o olhar enlouquecido de
Judith em mim — Está bem, para de me olhar assim,
conhecer é uma palavra muito forte. Eu o vi no escritório do
meu irmão, e...

— Isso, meu Deus, eu sabia. Eu li que ele mantém negócios


com a Jhonson & Turner, e eu sabia que Daniel poderia me
ajudar a fazer uma ponte. Agora me diga tudo o que
percebeu sobre eles.

Olhei para minha amiga que pulava ensandecida ao meu


lado, agora próxima demais de mim.

— Eu não disse que foram eles. Eu sei pouco sobre os


Capellos, tanto que no dia em que ele me foi apresentado,
eu nem me liguei ao nome. Foi uma apresentação formal e
pronto. Pare de pirar!

Ela colocou as mãos juntas e passou a implorar, como Vic


fazia quando queria algo negado.

— Por favor, por favor, prometa que vai pelo menos falar
com seu irmão sisudo para que ele faça uma apresentação.
Se eu pudesse conversar com Vicenzo, o mais velho, seria o
mais ideal ainda. Ele nunca dá entrevistas, nunca faz
questão de ser educado, enfim, o homem é liso.

— Mas o que tanto você quer com essa família? —


Perguntei, já impaciente.
— Isso é algo que eu não posso dizer, não agora pelo
menos.

Olhei desconfiada para minha amiga meio louca, me


endireitei no sofá, e Meg, minha, poodle toy, presente da
minha irmã gêmea, Milla, pulou em meu colo pedindo
conforto. Eu a acariciei, mas ainda olhei para a ruiva louca
em minha frente.

— Controle seus impulsos, Judith. Lembro do meu irmão ter


deixado bem claro, nas entrelinhas, que não era uma família
para se meter.

Judith vibrou visivelmente em um sorriso gigante, quase


como se eu tivesse acabado de dizer o que ela queria. Judith
queria ser uma repórter investigativa, e um mau presságio
me veio sobre isso.

— Eu sabiaaaaa. Ai, Deus. Uma entrevista, é tudo o que eu


quero.

— Judith, vou dizer uma única vez, não vou fazer essa
ponte, e você deveria procurar outra coisa para investigar.

Ela me olhou desanimada, mas antes que protestasse, eu


continuei.

— E não pense que eu me esqueci, viu. Você foi levar


conversa para Milla, de todas as pessoas. Não conhece
minha família, são um bando de intrometidos, que eu amo,
mas tendem a querer resolver tudo.

Ela me olhou com uma ponta de culpa.

— Eu fiquei preocupada. Mel. Escutei muito bem Melinda te


ameaçando, mesmo que você queira esconder. Não sou
boba, ela não quer que você cancele o contrato com a
agência, e sei que há muito tempo você quer sair. Quer ir
para Chicago viver perto dos seus. Algo te segura.

Olhei para a sagacidade de Judith e suspirei.

— Ela quer me segurar.

— Porque você é boa. A melhor da agência. É a galinha de


ovos de ouro da Estillus — Ela segurou minha mão — Mas
também sei que ela tem algo contra você. Já a ouvi falar
com você em mais de uma ocasião como se te possuísse.

— Você está criando coisas, Ju. Acho que a investigadora em


você está começando a criar paranoias. — Disse em tom de
brincadeira, rindo, mas ela continuou séria.

— Desculpe me meter assim, não vai voltar a acontecer. Só


fiquei preocupada — olhei e sorri. — Agora, vamos voltar a
falar sobre a ponte que você poderia fazer.

Levantei-me, e coloquei Meg no chão, clamando alto por


paciência.

Eu não faria isso, e uma hora ela cansaria de insistir.

Vicenzo Capello

— Carl. O que tem de novo hoje?


— O de sempre, senhor. Nenhuma novidade, a não ser uma
universitária de Nova Iorque solicitando uma entrevista.

— Negue.

— Já foi negado, senhor.

— E o carregamento norte?

— Entregue com sucesso. Já tem um tempo que não temos


infortúnios.

— Mais alguma coisa?

— A reunião da Aliança será em Nova Iorque, esse fim de


semana.

Suspirei, odiava quando as reuniões não eram em Chicago,


mas eu sabia o motivo de tudo estar acontecendo em Nova
Iorque. Thomas Madison, o senador de Washington,
desafeto número um dos Devils Dragons, agora que Juan
Suarez não representava um perigo, tinha voltado a achar
suas bolas e ameaçado a Aliança abertamente.

E claro, ainda tinha o FBI, investigando cada passo de


Eduardo Santorelli. O ideal era que ele não viajasse muito
para não levantar suspeitas.

— Sobre o alvo.

Olhei para o meu homem de confiança. Sim, o alvo, era


como chamava minha obsessão. Tinha uma semana que eu
não entrava no quarto, na esperança de uma hora a fixação
passar. Porque olhar para ela, alimentava minha loucura. Eu
não saberia dizer se conseguiria segurar por muito tempo,
embora estivesse lutando como um filho da puta.
Algo me travava, talvez fosse o fato, de que eu nunca
permanecia.

— Está segura.

Não havia perigos, não perigos reais, mas a minha


compulsão me induzia a protegê-la. Por último, só pedi para
que Carl me dissesse se ela estava segura, porque, pelo
menos isso, eu teria que ter.

Era uma fraqueza, eu sabia. Não poderia ser fraco, nunca.


Só Carl sabia que deveria protegê-la, embora não soubesse
o real motivo. E tinha uma semana que eu não sabia onde
ela estava, e mesmo que fosse um sacrifício não saber, era
minha esperança de que acabasse a necessidade que me
consumia.

Ela estava segura.

— Ok.

Ele fez uma mesura e saiu. Eu me levantei, antes que


enlouquecesse dentro de casa, e fui em direção ao meu
carro. Saí da mansão mais guardada de Chicago, tendo pelo
menos um carro me acompanhando e fui para o clube. Era
noite. Entrei e encontrei Mário se divertindo com uma
mulher. Ele me viu e sorriu, vindo em minha direção.

Fui direto para o escritório escutando seus passos me


seguindo.

— Era para você estar trabalhando — Eu disse enquanto


abria o notebook.

— Já se passa das 22h.

Levantei-me com olhos inflamados para meu irmão.


— Você está achando que cumpre horário, Mário? Acha que
esse é um emprego das nove às cinco?

Mário arregalou os olhos e saiu com a atitude que tanto me


incomodava.

— Você precisa transar.

Eu suspirei e encostei as costas na cadeira. Não era dado a


gritos.

Eu não gritava, nunca. Nunca foi necessário, mas a cada


dia, nos últimos meses, era quase como seu precisasse
gritar. Talvez, Mário estivesse certo, talvez eu precisasse
transar. Assim que Mário saiu, liguei para Carl e pedi para
ele mandar uma das meninas para minha sala.

Não foi três minutos e uma garota entrou. Loira, olhos azuis.
Filho da puta. Ela entrou e fechou a porta atrás de si. Estava
um pouco insegura e não encontrava meus olhos.
Aproximei-me e ela teve que lutar para não se encolher.
Levantei seu rosto para mim e ela forçou um sorriso.

— Seu nome.
— Liza — Ela respondeu em um sussurro.

— Você quer estar aqui. Liza? — Perguntei e ela respondeu


que sim, embora desviasse o olhar — Não minta para mim.
Você quer estar aqui?

— O senhor me, intimida. Mas sim, estou aqui por minha


vontade. —

Ela pareceu sincera, e sua resposta me encorajou.

— Bom. Você pode me pedir para parar a qualquer


momento.

Eu disse e ela relaxou, me olhando mais tranquilamente.


Então a aproximei de mim. Ela veio com a intenção de me
beijar, mas eu a virei, com cuidado. A inclinei sobre a mesa
e fiz, mais uma vez, o que fazia sempre que precisava tirar
a frustração do meu sistema.

Após cuidar do prazer dela, me perdi em minha imaginação.

Funcionava, por algum tempo. Mas no fim, só alimentava


mais e mais a minha necessidade de quem eu realmente
queria.

No dia seguinte, na mesa de café da manhã, eu escutava


Mário falando sobre alguma briga entre dois herdeiros de
Chicago, que teve de ser contida no clube. Carl então
entrou e se sentou à mesa. Era um dos únicos homens que
poderiam fazer isso.

— Senhor, houve uma invasão em nosso sistema.

— Grave? — Perguntei sem levantar o olhar.


— Não, nada foi comprometido, mas algumas informações
foram copiadas.

Levantei os olhos como águia para o meu homem.

— E isso não é grave, Carl?

O homem encolheu.

— Nada comprometedor, pois nosso hacker conseguiu


conter.

Eu apertei a colher.

— Você sabe quem foi? O Cartel, o FBI? Madison?

Mário apenas acompanhava o diálogo, sem uma palavra,


mas um olhar me fez ver que ele também havia ficado
preocupado. Ele, diferente de Vito, sabia dos riscos. Não
inventava um mundo imaginário para fugir da realidade de
nosso universo. Limpou a testa e praguejou:

— Descubra quem é. — Mário disse.

— O que eu faço quando descobrir quem é? — Carl


perguntou olhando diretamente para mim.

— Você sabe, Carl.

Eu disse e me levantei, indo para o quarto. Tinha que


separar o que levaria para Nova Iorque, nenhum empregado
tinha permissão para mexer em minhas coisas, ou entrar
em meu quarto sem um convite. Nem mesmo meus irmãos.
Sentei-me na cama e respirei. Às vezes, era ferrado demais
ter o tamanho da responsabilidade que tinha. Minha cabeça
doía, e eu me levantei, ficando em frente ao espelho, no
caminho para o banheiro.
Inclinei-me e olhei os meus olhos.

Negros, totalmente negros. Sem a circunferência da íris,


pelo menos não de forma visível. Os olhos da morte. Dead
Eyes, bilionário, antagônico, antissocial. Um psicopata
sombrio, era o que eu era, era o que via refletido ali, caos e
vazio. Nunca, nunca bom.

E era só por isso que mais um dia, ela estaria salva de mim.

Melissa Turner

Cheguei na fachada da Castelle, na Time Square e respirei


fundo.

Um contrato meu, unicamente meu, era minha carta de


alforria, e a chave para trancar definitivamente o meu
passado. Arrumei o meu gorro caramelo e entrei. Fui
recebida por uma recepcionista muito simpática e ela me
encaminhou direto para uma sala. Tudo dentro da Castelle
era de bom gosto. Nada exagerado, porém muito
sofisticado. Portas de vidro, cores pastéis, eu sentia amor
em cada detalhe.

Assim que entrei no que parecia uma sala de reunião, me


deparei com uma morena de olhos escuros, cabelo liso, na
cintura, vestida com um vestido vinho, que se agarrava ao
seu corpo como uma segunda pele.
Saltos afiadíssimos, scarpin, e exalando um poder invejável.
Ela sorriu e eu consegui soltar um pouco a respiração.

— Você é muito mais linda pessoalmente, Melissa.


Realmente a preciosidade que me disseram. Tenho certeza
de que faremos um ótimo trabalho juntas.

Eu sorri de volta e aceitei o seu abraço. Frank, que sorria


para mim de seu lugar, tendo chegado mais cedo que eu,
me deu um aceno positivo.

Ele sabia que já estava ganho, e isso só me deixou ainda


mais ansiosa.

— Obrigada, Milena. Você também é linda. Não sei por que


não está nas passarelas do mundo. — Retribuí o elogio e me
sentei.

— Oh, não, minha querida, esse definitivamente não é o


meu negócio, nem mesmo da minha família.

Eu sorri, e então ela tomou uma atitude extremamente


profissional.

— Vamos lá, vou ser sincera com o que procuro. Quero que
seja a modelo principal da nova coleção. Sei de rumores de
que vai deixar a carreira e espero que aceite o meu projeto
como o último como modelo, mas também, quero te propor
um novo início. Uma sociedade.

Prendi a respiração, visualizando meu sonho se


concretizando.

— Você tem a influência, contatos, experiências com esse


núcleo, e eu tenho uma carteira de clientes poderosa em
Nova Iorque, e mesmo em
outros estados. Podemos fazer isso muito maior.

— Eu fico muito feliz que tenha pensado em mim, de todas


as pessoas. Mas preciso perguntar, porque está procurando
uma sociedade, se o negócio está indo bem.

Ela sorriu e então pegou o celular. Na tela, brilhou dois


rostinhos sorridentes. Um garotinho loiro de olhos azuis e
uma menina morena como Milena. E ao lado um homem
loiro, muito parecido com o garotinho, que eu deduzi ser o
marido dela.

— A resposta é somente uma. Família. Não quero renunciar


ao meu negócio e eu consegui conduzir às duas partes da
minha vida até agora.

Contudo, a demanda com as crianças tem aumentado. E


Frank fez um ótimo trabalho me indicando você. Acredito
que seja perfeita.

— Entendo a sua motivação. Quero parar um pouco de


viajar pelo mesmo motivo. Ter parada em um lugar apenas.

— O fato de eu querer abrir uma subsede em Chicago só


torna tudo ainda mais fácil para nós duas. Frank disse que
você pretende morar lá, e eu acho perfeito, pois pode
gerenciar as coisas de lá. Claro que precisarei de você em
eventos pontuais aqui, mas não teria necessidade de se
estabelecer aqui.

Eu quase não consegui conter o sorriso com o tamanho da


minha sorte. Milena Castelle estava me dando o que eu
mais queria no mundo inteiro, continuar no mundo da Moda
e ter mais tempo com minha família, especialmente
Victoria.

— Estou muito animada com a possibilidade, confesso.


Ambas sorrimos e então ela abriu o contrato. Primeiro eu
faria o trabalho com a coleção, enquanto isso, daríamos
início a nossa sociedade. Seria o fechamento do meu
trabalho como modelo e o início de um novo ciclo. Eu só
teria que arrumar uma forma de me livrar, definitivamente,
do poder que Melinda tinha sobre mim.

Eu tinha que me livrar da Estillus.

— Cheguei!

— Conseguiu?

Olhei para Judith, e mostrei o champagne que tinha


comprado.

Gritei, e ela gritou também, pulando como uma louca em


cima do sofá. Eu me juntei a ela, e começamos a gritar
ainda mais.

— Seus vizinhos irão nos expulsar. Ju. — Eu disse, embora


não parasse de pular e vibrar com a nossa sorte. Era ótimo,
e eu confiava inteiramente em Judith, sabia que sua
felicidade por mim era sincera. Eu queria ligar para Milla e
Daniel, minha mãe, contar tudo o que estava acontecendo.
— Eu vou ser uma repórter investigativa famosa, e você
uma empresária de sucessoooo!!

Judith sempre teve essa vibração louca que só vinha dela.


Começou a carreira de modelo aos quinze anos, então ela
era alguns anos mais nova do que eu. Com vinte e quatro,
ela finalmente estava se livrando de modelar, que foi mais
uma imposição da mãe, e fazendo o que mais queria, ser
repórter.

Ninguém deu muita atenção quando ela começou, porque


ninguém entendia o motivo dela largar uma carreira que
estava se solidificando como modelo, para ser repórter. Mas
era o que ela queria, seu sonho.

Estava feliz por ela.

— Não venda seu apartamento em Paris! Em dez anos


comemoraremos nosso sucesso lá!

Ela gritou enquanto seu cabelo ruivo caia por toda parte.
Nesse momento houve uma batida na porta.

— Está esperando alguém? — Eu perguntei rindo baixo

— Não — Ela respondeu, ainda rindo, indo em direção a


porta —

Deve ser alguém querendo reclamar do nosso barulho.

Eu ri e me sentei no sofá, e então me levantei de imediato.

— Vou pegar duas taças enquanto você se desculpa — Gritei


e fui em direção a cozinha. Escutei algumas vozes alteradas
e escondi a cara de culpa. Alguém estava bravo. Então, a
porta foi fechada com muita força, e eu fui verificar. Peguei
as taças em uma mão e a champagne em outra e estaquei
quando voltei para a sala, na entrada, onde não dava para
ser vista, não se a pessoa não virasse totalmente naquela
direção.

Dois homens vestidos de segurança entraram, um deles


tinha, meu Deus, um deles tinha uma arma, e segurava o
rosto de Judith. Outros dois imobilizavam minha amiga. Eu
voltei dois passos e tentei acalmar as batidas do meu
coração, me escondendo atrás de um pilar.

— Eu quero o que você roubou! — O homem falou.

— Por favor, me solte.

— Oh, criança, você sabe o que fez. — Outro homem disse.


Olhei por trás do pilar e percebei o quanto ele era grande e
intimidador. Tinha um rosto mortal, e sua linguagem
corporal, entregava que ele mataria Judith sim, que não
seria a primeira vez — Me devolva, e eu prometo te dar uma
morte rápida.

Oh meu Deus.

Ouvi-lo me fez soltar a taça no balcão, e pegar meu celular.


Minhas mãos tremiam, mas eu consegui pegar o celular. Eu
tinha que chamar a polícia, tinha que fazer algo, pois na
minha mente reverberava sua ameaça contra a vida de
Judith.

Acredito que não fui tão silenciosa, pois senti o celular ser
puxado da minha mão, e meu corpo ser jogado para trás,
batendo contra o pilar. O

homem sorriu lascivamente.

— Tem outra aqui! — Ele gritou, olhando para mim


— Vocês olharam toda a casa? — A voz que falou, foi
diferente, mais forte, mais como de um comandante. Eu só
sabia tremer enquanto lágrimas corriam por meu rosto. —
São um bando de idiotas amadores.

Como não olharam tudo?

A voz diferia das outras. Mais imponente, embora eu não


pudesse ver da cozinha. O homem segurou meu braço e eu
ouvi passos pelo apartamento de Judith. Provavelmente
estavam vendo todos os cômodos.

O homem me chacoalhou e eu pareci acordar da inércia.


Soltei-me em um solavanco e gritei, entrando mais na
cozinha.

— SOCORRO! SOC...

— Cale a boca! — O homem disse e me segurou novamente.


Ele tampou minha boca e eu mordi sua mão. Isso fez com
que ele me jogasse no chão e eu batesse a cabeça. Vi
pontos negros nublarem minha visão.

— A vadia me mordeu, vou matá-la!

Senti meu corpo ser levantado sem muita gentileza, e então


eu fui jogada no sofá. Foi então que algo no ar mudou,
mudou totalmente. Eu vi dois pares de olhos escuros
olhando para mim e um homem que eu ainda não tinha
visto, me olhava como se me conhecesse. Ele se vestia
como alguém que comandava, e eu o liguei a vós que
chamou os outros de amadores.

— Vou matá-la! — Uma arma com silenciador estava


apontada para minha cabeça pelo homem cuja mão eu
mordi.
O homem falou, me dando a certeza de que era o que ouvi
da cozinha, e de que era o comandante realmente. Ele falou
olhando para mim de forma estranha.

— Faça isso e eu matarei você.

Eu olhei para o homem, e apesar da confusão, minha visão


começou a limpar.

— Tocou nela? — Ele voltou a falar.

— Qual o seu problema, Carl?

O tal Carl, acertou o homem que me agrediu, no rosto. Foi


um golpe que eu pude sentir, mesmo que não fosse em
mim. Fechei os olhos e estremeci.

— Só não a toque se quiser viver mais tempo.

Ele disse e então suspirou, como se tivesse um grande


problema que não entendesse nas mãos. Eu me levantei,
sentando-me devagar e vi que Judith tinha o notebook nas
mãos. Os homens usavam capuz e somente o tal Carl tinha
o rosto descoberto, como se não temesse nada.

— Você tem mais alguma cópia? Diga a verdade! — Ele


perguntou a Judith de forma firme, embora não gritasse.

— Na-não. — Ela respondeu, entre soluços.

— Olhe para mim. Está falando a verdade? — Carl


perguntou e segurou os ombros de Judith, enquanto ela
tremia sob seu toque.

— Sim. Estou.

— Certo. Se você estiver mentindo, esses homens irão


voltar, e eu não poderei impedi-los de te machucar. Você me
entende?

— Entendo — Ela disse em um sussurro de pânico, sem


levantar os olhos para o homem.

— Mas, chefe, a ordem é exec... — Um dos homens tentou


argumentar.

— Estou dando uma nova ordem agora. Vamos embora!

Os homens pareceram confusos. O Carl me deu uma última


olhada, e fez uma mesura de respeito antes de sair. Então
voltou e disse olhando para mim.

— Nada de polícia. Seria perda de tempo, de qualquer


forma.

Entenderam?

Eu não desviei os olhos, mas corri para Judith, que estava


chorando e tremula no chão. O homem que me empurrou
deu uma última olhada

para mim e fez um sinal ameaçador, de que cortaria meu


pescoço, e eu não escondi minha carranca, mesmo que
estivesse morta de medo.

Antes de sair definitivamente, ele se aproximou, enquanto


eu e Judith nos afastávamos no chão, e pisou no notebook
de Judith, o quebrando. Ela soltou um grito de pavor, e eu a
abracei mais forte.

Foram necessários vários minutos até que ela conseguisse


parar de tremer, mesmo após a porta ser fechada, e os
homens terem saído. Eu me levantei e fui até a cozinha,
peguei um copo de água, sem conseguir entender o que
diabos tinha acontecido, quem eram aquelas pessoas.
Judith sabia. Ela estava entendendo, e tinha que me falar.

Minha cabeça tinha um leve corte, provavelmente da


queda, mas eu não me importei. Aproximei-me novamente
da minha amiga desmiolada, e a levantei do chão. Sentamo-
nos no sofá, e ela passou a tomar o copo de água.

— O que aconteceu? Quem eram essas pessoas? —


Perguntei de uma vez.

— Eu não tenho certeza.

— Judith! Você sabe, porque apagou algo do computador.


Eles queriam algo que você tinha. O que você andou
fazendo? — Perguntei preocupada.

— Ai, Mel, eu só acho que dei um passo maior do que


deveria, quando você se recusou a me apresentar os
Capellos, e eu tive minha entrevista negada novamente,
resolvi contratar um hacker, e ir atrás de informações.

Fechei os olhos com força.

— O que você conseguiu?

— Isso que eu não entendo, pois não consegui nada demais!


Não entendo por que vieram aqui, me ameaçaram, porque
não tinha nada nos arquivos que consegui!

— Foi um aviso, Judith. Espero que agora você desista de


uma vez dessa loucura! Está se colocando em risco! Você
devolveu tudo?

O silêncio de Judith me respondeu. Ela ainda tinha cópias.


Eu respirei em pânico e me levantei.
— Pelo amor de Deus, Judith, qual o seu problema? Se não
tinha nada de mais, por que não apagou tudo? Eles iam te
matar, você não entendeu?

— Porque o fato de me ameaçarem só me prova que estão


de fato escondendo algo! Vou descobrir e...

— E vai morrer no processo, sua tola! — Eu gritei — Cadê?


Cadê as cópias?

— Melissa!

— Eu sei que você quer provar para os seus pais que você é
inteligente, e pode ter sucesso na profissão que escolheu
para si, mas está se arriscando por nada! Esse foi um aviso,
essa é a realidade, Ju!

Você é boa, não precisa se colocar em risco desnecessário


para fazer isso! Cadê! Me dê essas cópias!

— O que vai fazer?

— Não interessa!

— Melissa, não me trate como uma criança!

— Está se comportando como uma adolescente


inconsequente. Se for verdade o que dizem, ele é dono do
submundo de Chicago.

— Será que agora vou ficar na mira deles? Vão ameaçar


minha família, vão me machucar? — Judith disse se
sentando, se dando conta do tamanho da encrenca que se
meteu.

— Me dê tudo o que tem — Eu me sentei ao lado dela, e


segurei sua mão — Vou te ajudar de algum jeito. Estou indo
para Chicago e vou dar um jeito de te ajudar. Eu prometo.

Ela olhou para mim e concordou, chorando. Eu segurei as


lágrimas e respirei fundo, a abraçando. Algo no olhar do tal
Carl me deu alguma confiança. Foi um diálogo confuso e
assustador do caralho, mas era quase como se ele não
quisesse nenhuma violência em minha frente. O que não
fazia o menor sentido. Era como se ele me conhecesse.

Era como se ele soubesse muito sobre mim. Ou eu estava


louca por bater a cabeça forte demais. De qualquer forma,
eu falaria com Daniel, assim que chegasse em Chicago no
dia seguinte e tentaria ajudar Judith de alguma forma.

Ela era uma amiga querida, que tinha todo o meu afeto, e
eu estava assustada demais com tudo. Nem que fosse
preciso falar com Vicenzo Capello em pessoa, eu tentaria.

Vicenzo Capello

— A reunião com Pablo Suarez ficou para o fim do mês —


Talia, esposa de Aleksander, ambos líderes da Máfia
Irlandesa, disse e nos olhou.

— Eu ainda não vejo sentido nessa reunião. Por mim,


apenas excluiríamos qualquer contato com os mexicanos. —
Storm, Presidente dos Devils Dragons soltou em um bufo
irritado.
Eu entendia a raiva e o desinteresse de Storm com qualquer
menção ao Cartel, Juan Suarez havia raptado Hanna, sua old
lady, e a manteu cativa por seis meses, em Guadalajara. O
fato de Hanna ser irmã de Shield, seu VP, só deixava toda a
raiva dos Devils ainda mais visível.

— Eu concordo com Storm — Shield soltou. Ele estava


casado com Tara, filha do senador Thomas Madison. Tara
também foi vítima de Juan Suarez, quase sendo leiloada,
salva na operação em que salvamos Hanna.

— Vamos apenas ouvir o que ele tem a dizer. — Talía, sendo


a única mulher na cúpula da Aliança, sempre era a mais
razoável.

Talía foi de uma principessa italiana, para uma líder de


respeito, e eu tive participação em seu processo. Quando
seu marido, Aleksander, foi dado como morto, a mulher
enfrentou a Aliança ao se negar a voltar para Nova Iorque.

Continuou em Boston e liderou a organização, se tornando


indispensável, mesmo após Aleksander ser resgatado. Eu fui
o seu mentor. Isso fez com que estabelecêssemos uma
relação, que eu poderia chamar de amizade. Ela tinha
alguma liberdade comigo e a tinha em grande estima. Se
um dia a Aliança fosse desfeita, eu sentiria muito por Talía.

Ela me lembrava o que poderia ter sido, a relação que eu


poderia ter construído com Bianca.

— E Anthony Howard?

Perguntei, por fim. Eduardo se retorceu quando o nome foi


dito.

Giovanni, consigliere da Cosa Nostra, respondeu.


— Ele sossegou, mas estamos de olho.

— Bom. Menos um problema, por enquanto — Yuri, líder da


Bratva, respondeu.

— Bom, então é isso. — Eu disse, querendo finalizar de vez


a reunião. Sempre era muito ego em uma sala pequena.
Talía era quem lutava para conseguir controlar as situações.

— Nos falamos no final do mês, então.

Com isso, nos despedimos, e começamos a nos dispersar.


Giovanni se aproximou.

— Dead Eyes. — Sempre engraçadinho, eu apenas o olhei,


não compartilhando o sarcasmo — Vai ficar em Nova
Iorque?

— Não, dessa vez volto hoje mesmo para Chicago.

— Entendi. Talía ficará, e eu iria te chamar para jantar


conosco.

Talía era prima de Giovanni. Eu fiz um aceno de


agradecimento.

Giovanni e sua esposa eram agradáveis e os gêmeos, filhos


de ambos, era um charme a parte, mas hoje eu tinha
urgência para voltar para Chicago.

Nova Iorque, essa época do ano, era quase um gatilho para


mim.

Era a época que Melissa estava na cidade. E quanto mais eu


ficasse, maior era a probabilidade de que eu voltasse a
farejá-la como um cão.

— Eu realmente preciso voltar, mas agradeço o convite.


— Uma pena, Vicenzo. — Talía se aproximou e beijou meu
rosto —

Precisava tirar algumas dúvidas com você sobre alguns


esquemas em Boston.

Aleksander olhou de mim para a esposa, e então se


aproximou a enlaçando pela cintura. Ele nunca disse
abertamente, nada sobre a familiaridade de Talía comigo,
mas sabia que ele jamais desconfiaria de

algo entre mim e ela. O que não o impedia de se comportar


como um homem das cavernas e marcasse seu território.

Eu sorri, e ele acabou por sorrir de volta. Ele sabia que eu


não seria um perigo para a relação de ambos. Talía era mais
como uma irmã, alguém que confiava em mim por eu tê-la
conduzido em meio ao seu caos.

E eles eram bobamente apaixonados, era visível para


qualquer idiota.

— Alainn, você não procura me consultar para seus


esquemas —

Ele disse e beijou seu pescoço. Ela sorriu.

— É porque eu sei qual o seu método, amore mio. Tirar uma


faca e cortar o pescoço do infeliz. Ou simplesmente
implantar uma bomba — Ela me olhou — Vicenzo é mais
político. Um pouco.

Eu dei um sorriso de boca fechada.

— Vou deixá-los discutindo seus problemas matrimoniais em


paz.
Aguardo sua ligação, Talía.

E com isso saí. Carl já me esperava no carro e ele parecia


um pouco tenso. Não pensei em perguntar, mas assim que
saímos na rua, a loucura se apossou de mim.

— Carl...

— Sim, senhor.

Não precisei dizer mais nada. Era só passar na porra da


frente do apartamento dela. Era só passar na frente, e
torcer para que o destino sorrisse para mim. Que ela
estivesse na frente, entrando ou saindo.

Poderia ser com outro homem, eu não me importaria, desde


que tivesse um vislumbre dela. Como sempre, o destino não
sorriu para mim. A entrada estava tão deserta quanto todas
às vezes em que passei aqui, quando vinha para Nova
Iorque.

Eu poderia localizá-la com facilidade, mas aquele algo sem


nome me segurava.

— Senhor?

Assim que o condomínio desapareceu eu respondi.


— Para o aeroporto.

Assim que chegamos em Chicago, notei que Carl estava


mais e mais tenso. Aguardei por toda a viagem que ele me
dissesse de uma vez o que estava acontecendo, se era algo
com os negócios, mas ele não disse.

Pensei que pudesse ser algo pessoal, então o pensamento


me calou.

Cada um com suas merdas, era isso.

Cheguei em casa e fui direto para o escritório. Ele me


seguiu. Eu abri o notebook e comecei a olhar alguns e-mails
enquanto ele estava inquieto em minha frente. Finalmente,
olhei para ele e aguardei.

— Tem algo para me dizer.

— Sim, senhor.

— Diga de uma vez.

— Fomos atrás da pessoa que entrou em nosso sistema.


— E?

— Era uma estudante universitária.

Eu esperei alguns segundos, então disse.

— Resolveu o problema? Descobriu a motivação dela?

— Não a executamos, senhor. Era uma menina, não tinha


ligação com o FBI ou com o Cartel. Nem com nenhuma
organização internacional.

Pareceu-me mais curiosidade acadêmica.

Eu confiava em Carl para julgar os negócios menores, e nem


era a nossa forma de trabalho machucar civis. Não, a menos
que fosse estritamente necessário. Então dei de ombros e
voltei para o notebook.

— O alvo estava lá.

Eu congelei. Meus olhos foram para Carl de forma


matadora.

Melissa estava lá? Minha Melissa? Como era possível que ela
estivesse lá e Carl não soubesse? Era para isso que ele era
pago.

— Não sabíamos da ligação, senhor. — Ele começou a se


justificar

— A única ligação, era que começaram na mesma agência,


mas tem muitas garotas na mesma agência. Ela estava na
casa e presenciou o questionamento.

Questionamento.
Eu quase ri. O questionamento significava a violência para
conseguir o conteúdo roubado. Eu continuei olhando para
Carl, indeciso sobre matá-lo ou questionar até a última gota
como foi possível que isso acontecesse.

— Machucaram ela?

— Não, senhor. Mas eu tenho que admitir que foi por pouco.
Os homens não a conhecem, e ela iria chamar a polícia. No
fim, decidi que nem a amiga e nem ela era uma ameaça
real, embora eu esteja com um pessoal de olho na Judith
Larry, a amiga, só por precaução. Já tinha decidido que não
era uma ameaça, mas foi uma surpresa encontrar o alvo lá.

Eu me levantei, sem desviar os olhos de Carl.

— Você tem noção de que é pago para nunca, nunca ser


surpreendido?

— Foi um erro, senhor. Não vai se repetir, não houve dano


algum, a ela, isso eu posso garantir.

Isso não era suficiente, não poderia ser.

— Por que não me contou quando ainda estávamos em


Nova Iorque?

— Temi sua reação, senhor. Se me permite ser sincero, fica


instável toda vez que vamos para Nova Iorque. Minha
principal missão é te

proteger e proteger seus interesses, nem que seja de si


mesmo. Não se aproxima dessa moça por alguma razão, e
jamais o questionarei. E se um dia o fizer, sei que não
quererá que seja dessa forma.
Eu olhei para o meu homem de confiança, e então me
sentei. A tempestade não tinha sido aplacada, de forma
alguma, mas eu entendia.

Contudo, não justificava. Eu era o Chefe, eu era quem


decidia e me responsabilizava por qualquer escolha minha.

— Que seja a última vez que você tenha tomado decisões


por mim, Carl.

Ele fez uma mensura e saiu. Eu fiquei ali, perdido em meus


pensamentos, cada vez mais envolvido na merda da minha
obsessão por essa garota.

Abri o Google e digitei o nome dela, fotos e fotos, imagens


dela sorrindo, trabalhando, em eventos. Fechei os olhos. Eu
era um fodido doente.

Um fodido doente. Se eu não fosse tão louco, se eu fosse


um cara comum, ligaria para ela e perguntaria como ela
estava. Deveria estar assustada pra caralho, porque ela não
foi feita para essa vida. Era uma merda, mas mais uma vez
era a prova de que eu deveria me manter a margem.

Porque eu nunca teria nada de bom para oferecer a ela.

Melissa Turner
Acordei com meu telefone tocando. Era Melinda. Droga, mil
vezes droga. Eu não poderia correr dela por muito mais
tempo, ela tinha o poder, de me destruir. Ela sabia de tudo,
todos os segredos.

— Oi, Melinda — Tentei não soar muito desanimada.

— Darius insisti na não renovação do contrato. Melissa, por


que não está em Nova Iorque resolvendo isso?

— Não vou renovar o contrato, Melinda, estou cansada,


quero outras coisas.

O silêncio foi minha resposta por um tempo.

— Você só chegou aonde chegou, por minha causa, pela


Estillus.

Não vou jogar anos de trabalho e preparo porque você


resolveu que está cansada, Melissa.

— Não se trata de você, Melinda. É sobre mim, minha vida.

Ela sorriu.

— Ainda não aprendeu. Mel. Ai, tantos anos nessa vida e


ainda não percebeu que somos marionetes de quem manda
de verdade. Darius ainda não te quer fora ele, quer ter na
nova coleção, e você sabe que eu não posso fazer nada
sobre isso.

Toda vez que esse nome era mencionado eu queria chorar


feito criança. Esse era o homem que tinha destruído minha
vida, me feito desacreditar em tantas coisas, e ainda me
mantinha na rédea curta. Mas ele era perigoso e poderoso.
Uma junção periculosa. Todavia, eu estava cansada de suas
ordens, estava disposta a pagar para ver.
— Pois que ele faça o que quiser. Eu estou com uma
oportunidade ótima, algo que eu procuro. E não vou abrir
mão, de jeito nenhum.

Disse e desliguei. Lágrimas teimosas caíram de meus olhos


e eu tentei contar minha respiração. Não, eu não seria mais
refém do meu

passado. Chega. Eu pagaria para ver, contaria minha versão


da história e contaria com a influência que tinha hoje para
que acreditassem em mim.

Decidida, me levantei e me arrumei. A cobertura de Milla e


Nate era um verdadeiro sonho e tinha a cara dos dois. Eu
tomei café sozinha, pois ambos já tinham saído, e fui fazer o
que tinha ido fazer em Chicago.

Entrei no escritório de Daniel tentando soar o mais casual


possível.

Meu irmão era um homem lindo de morrer, eu tinha que dar


isso a ele.

Compartilhávamos os mesmos olhos, porém ele tinha o


cabelo negro como de um corvo. Era a versão masculina de
Vic. Ele olhou meu macacão jeans e meu croped branco por
baixo de manga longa, com um tênis prateado e brilhoso.
Olhou e aprovou com palmas.

— Minha irmã famosa, e agora praticamente empresária. A


que devo a honra? — Ele se levantou e beijou minha testa.

— Estava passando por perto e resolvi passar aqui.

— Chegou hoje?

— Madrugada. E já digo que amanhã Vic passará o dia


comigo. Ela vai me ajudar a escolher um apartamento aqui.

— Estou feliz por ter você perto de nós maninha. Victoria


então, não se cabe de felicidade.

Eu sorri muito abertamente. Eu também estava para lá de


feliz com a novidade. Minha família era o que eu tinha de
mais precioso. Daniel então me olhou e passou a mão em
minha testa. Escondi o tremor de dor.

— O que foi isso? — Ele disse, já com olhos assassinos.


Daniel, por ser oito anos mais velho que eu e Milla sempre
foi extremamente protetor

conosco. Eu fugi de suas rédeas mais cedo, quem sofreu


mais foi Milla por vários motivos.

— Um acidente. Não é só Milla que é desastrada, Dan.

Ele sorriu, embora não muito convencido.

— Dan, eu preciso de sua ajuda. Sei que você tem contato


com a família Capello.

Daniel ficou sério. Muito sério.


— De jeito nenhum, Melissa.

— Eu só preciso de uma entrevista.

— Desde quando?

— É para uma amiga. Judith.

Olhou-me desconfiado.

— Não posso passar o contato de alguém sem autorização.


A família são clientes do escritório, seria antiético.

Olhei para o meu irmão sabendo muito bem que ele não era
o modelo de cidadão que tentava passar. Hoje eu tinha
certeza de que a família Capello eram pessoas perigosas, e
se tinha relação com Daniel, ele não era tão santo assim.

— Tudo bem, então. — Respondi me levantando, e ele me


olhou surpreso — Vou pedir para que ela entre em contato
com você, pois eu só queria fazer uma ponte mesmo. Vou à
sala da Milla dar um beijo nela, e vou para sua casa. Ashley
está fazendo cupcakes.

Daniel suavizou ao escutar o nome da esposa. Eu dei um


tchau, soprei um beijo e fui para a sala da minha irmã. Ela
trabalhava com Daniel, fazendo a contabilidade do
escritório. Dei uma batida e ela me olhou de lá.

Imersa em uma quantidade exorbitante de papéis, de


óculos, caneta no cabelo escuro e um semblante de pura
angústia.

— Estou enlouquecendo — Ela disse, enquanto recebia meu


beijo no rosto. — Sente-se de uma vez. Estou procurando
alguém para me ajudar, mas está difícil. Daniel está cada
dia mais intragável me dando mais e mais demandas.
Jhonson é mais velho e tem muito mais paciência.

Eu ri das reclamações de Milla. Ela trabalhava porque


gostava, e era isso. Nate, seu esposo, a tratava como uma
princesa e era um dos homens mais ricos de Chicago. Mas
ela preferia assim. E Nate respeitava.

— Não precisa se preocupar comigo, só vim te dar um beijo.

Olhei ao redor e vi um arquivo escrito Capello. Na mesa de


Milla.

— Que pastas são essas?

— Para faturamento — Ela respondeu com os olhos no


notebook em sua frente.

Eu abri casualmente o arquivo e lá estava. Nome e


endereço. Passei os olhos e memorizei o endereço,
mentalizei incansavelmente antes que ela percebesse o que
eu estava fazendo. Queria ser capaz de me parar, mas eu
faria isso. Uma força maior estava me movendo. Judith
havia percebido homens a seguindo, eu precisava ao menos
tentar ajudá-la.

— Maninha, eu já vou.

— Vai ficar em casa, né? — Ela olhou do computador para


mim —

Me desculpe, hoje eu estou um pouco louca aqui. Mas a


noite vamos ficar juntas, comer uma massa e tomar um
vinho.

Eu sorri e concordei. Soprei um beijo e um até logo, e sai.


Coloquei o endereço no Uber e solicitei a corrida. Meu
coração saltava no peito e eu ainda não conseguia acreditar
no que estava prestes a fazer. Era loucura, mas eu não
conseguia me parar. Entrei no carro e o pânico começou a
me tomar. Balancei a cabeça e tentei me tranquilizar. Eram
apenas pessoas, pessoas.

Foi um tempo até que chegássemos no endereço. De longe,


vi uma casa no subúrbio de Chicago. Era um casarão,
grande, uma mansão de cair o queixo, antiga, murada, com
guardas por todo o lado. Meu Deus, a noção de onde eu
estava indo me caiu como uma bomba. Eles poderiam

me matar ali e consumir meu corpo que ninguém jamais


ficaria sabendo.

Era um local isolado, mesmo que sofisticado.

— Tem certeza de que seu destino é aqui, moça?

A voz do motorista entrou em mim e foi por muito pouco


que eu não pedi para ele voltar. Mas respirei, ainda movida
por algo que eu não entendia, e sai do carro. Ele pareceu
incerto sobre me deixar ali.

— Quer que a espere aqui?

Eu neguei e agradeci. Não deixaria um homem inocente ali,


não quando eu não fazia ideia do que aconteceria comigo.
Não, de jeito nenhum. Respirei e me aproximei da portaria.
Por incrível que pareça, um homem sorrindo me deu um olá.

— Está perdida, moça?

O sorriso dele me deixou um pouco mais tranquila. Pessoas,


eram pessoas.

— Aqui é a residência da família Capello?


O sorriso do homem escorregou e foi como uma máscara.

— A família não dá entrevistas, a senhorita pode voltar.

— Não, não! Não quero uma entrevista. Eu, eu apenas...


tenho algo que Vicenzo Capello quer.

O homem me olhou de cima embaixo. Senti-me um objeto.

— Não estou falando de mim. — Não vi a hora que falei. O


homem sorriu.

— Só diga a ele por favor que Melissa, Melissa Turner, não


se esqueça do Turner, está aqui, e precisa falar com ele.
Urgentemente.

O homem ainda me olhou desconfiado. Por Deus, tanto ele


quanto o outro estava armado. Ele fechou a portinha e eu
achei que ele estava me dispensando. Eu olhei o muro, e
muito acima, tinha alguns homens de

sentinela. Por que tanta segurança? Tantos homens


armados? Eu senti estar entrando na cova do demônio, e
pior, por vontade própria.

Quando eu tinha desistido e já ia solicitar o carro para


voltar, pois eu não seria louca o suficiente para me arriscar
pular os muros. Seria certamente atingida por um tiro, ou
dois, talvez mais.

— Moça, você será revistada e então poderá entrar.

Meu coração disparou tanto e eu travei sem conseguir dar


um passo.

Olhei par a câmera acima de mim, me dando conta de que


era assistida.
Encarei a câmera por alguns segundos, um pouco incerta.

— Vamos moça, não tenho o dia inteiro! — O homem gritou


impaciente e eu me obriguei a desviar os olhos da câmera.

Entrei e quase tive que limpar a baba com a vista da


imponência da casa, que estava em minha frente, muito
segura atrás dos muros, e os sentinelas. Respirei fundo, me
deixei ser revistada por uma mulher, o que me aliviou e
surpreendeu, e então entrei.

A mulher me acompanhou por todo o caminho até uma sala


ampla, linda. Ela me ofereceu o sofá sem uma palavra e se
afastou. Tudo era meio rústico e antigo, eu observei
enquanto esperava, mas era de muito bom gosto. Eu me
lembro de ver alguns blogs, chamando de Dinastia Capello,
que eles eram meio que da realeza italiana. Lembro de que
eles estavam sempre sendo mencionados, embora eu nunca
tenha prestado muita atenção. Agora, meio que eu tentava
puxar em minha mente de onde vinha tanto dinheiro.
Porque tudo ao meu redor gotejava dinheiro.

Levantei-me, olhando ao redor, de cima embaixo, tudo que


eu podia absorver ao meu redor, e, ao me virar, me deparei
com duas fendas escuras sinistras, em uma figura alta e
imponente, como a casa que eu estava admirando. Ele era
alto, como eu me lembrava, tinha os olhos mais intrigantes
que já vi em toda minha vida, o cabelo escuro como corvo.
Não sorria, mas me olhava de forma predadora. Como se
me conhecesse.

Como se soubesse de cada detalhe sobre mim.

O homem na minha frente não era bom, não, não mesmo.


Era ruim.
Era um homem perfeitamente capaz de matar a mim, Judith
ou qualquer outro. Mas, como aconteceu na primeira vez
em que o vi, eu não me senti

repelida. Eu senti um calor em meu baixo ventre, quase


como se fosse atraída por toda sua obscuridade.

— Olá! Eu sou Melissa Turner.

— Eu sei — Sua resposta me enviou um arrepio em minhas


costas.

Era rouca, baixa, mas ainda assim, forte. E eu me senti uma


idiota. Era claro que ele sabia quem eu era, ou nem em sua
sala eu estaria.

— Nos vimos uma vez, a alguns meses.

— Um ano e quinze dias. — Ele me interrompeu


surpreendendo a merda em mim.

— Me desculpe? — Eu perguntei um pouco atônita.

— Continue — Ele disse e eu não senti coragem de pedir


para que ele esclarecesse a resposta anterior.

— Bom, eu, eu vim te entregar isso — Estendi minha mão


para ele, que em nenhum momento desviou os olhos de
mim. Era meio assustador, mas, ao mesmo tempo, mesmo
com toda minha experiência em passarelas, me senti vista,
realmente vista. Ele não se moveu.

— Vou deixar aqui. — Eu disse, e deixei o objeto, um


pendrive, sob a mesa — Eu gostaria de me desculpar pelo
comportamento de Judith. Ela é meio intrometida, mas é
inofensiva. Estava curiosa sobre vocês, como toda –
Chicago, está se formando em jornalismo e queria saber
mais sobre vocês. Enfim, ela foi uma idiota, o ocorrido está
totalmente esquecido, sem policiais, juro, e ela está
totalmente convencida a esquecer vocês.

As palavras apenas jorravam de mim nervosamente. A


presença do homem a minha frente me deixava intimidada.
Eu queria apenas sair correndo nesse exato momento.

— E o que é isso? — Ele perguntou finalmente.

— Ah! É um material que ela copiou e esqueceu de


entregar. E como eu vinha para Chicago, decidi, como
forma, de mostrar a nossa boa-fé, entregar pessoalmente.

Estranhamente, ele se aproximou, negando com a cabeça.


Seus olhos pararam em meu machucado. Sua mão se
levantou para lá e o toque levou um formigamento por todo
o meu corpo. Nossos olhos se chocaram. Seu cheiro, a
suavidade do toque que deveria me mandar correndo para
as colinas, acalmou algo dentro de mim. Ele me olhou
com... cuidado? Eu estava confusa.

— Porque se meteu nisso, Melissa? — Ele perguntou com


pesar. Foi quando me dei conta do meu engano. Senti-me
estúpida, tão estúpida quanto Judith, e senti que me
arrependeria amargamente de ter vindo ali.

— Por favor, deixe minha amiga em paz. Por favor. —


Implorei de imediato.

Ele sorriu falsamente.

— Não é tão simples assim.

Fiquei apavorada. Bati em sua mão movida por uma


coragem, a ferocidade que sempre fui acusada de ter. Ele
olhou surpreso para minha mão, mas não se moveu.
— É simples, sim. É só pedir para seus homens pararem de
seguir Judith. Ela é inofensiva, eu já falei.

— E por que eu acreditaria em você?

Fiquei apavorada, tentando argumentar.

— Você conhece Daniel. Ele pode afirmar, ele a conhece.

Ele se afastou, se sentou casualmente, e mesmo que


estivesse sentado, era como se reinasse na sala. Eu ainda
me sentia pequena diante dele.

— Deixe que eu te diga a gravidade da situação, Melissa:


Sua amiga mentiu que tinha entregado tudo. Você provou
isso vindo aqui. Se ela mentiu sobre isso, pode ter mentido
sobre mais. Quem me garante que vocês duas não tem
ligação com meus inimigos? Existem muitas pessoas que
querem a minha destruição.

— Porque será, não é? Você parece um anjo! — Eu disse e


me arrependi no mesmo instante. Meu comentário
venenoso não abalou Vicenzo. Ele continuou me olhando. —
Então o que, você vai machucá-la como seu homem
prometeu? Vai me machucar também?

Ele se levantou e então parou em minha frente. Eu vi uma


espécie de fascínio em seus olhos, enquanto admirava cada
pedacinho do meu rosto. Sua mão foi para minha bochecha
e sua respiração ficou levemente ofegante quando me
tocou. Então ele sorriu de lado e eu odiei achá-lo charmoso.
Ele estava ameaçando minha amiga e eu estava encantada
com ele, estava louca, completamente louca.

— Seria um desperdício machucá-la.


O medo me tomou. Dei um passo para trás, esquecendo
qualquer encanto no homem a minha frente. Comecei a
tremer. De repente me dei conta de que, tentando ajudar,
eu acabei atrapalhando ainda mais Judith.

Respirei fundo, pronta para implorar. Ele finalmente abaixou


a mão, mas ficou onde estava.

— Por favor, não nos machuque. — Eu sussurrei sentindo


minha garganta apertar.

— A escolha foi dela. E sua de ter vindo aqui.

— Por favor... — Implorei, novamente me dando conta do


tamanho da minha ingenuidade.

— Eu sinto muito, Melissa — Ele disse e o pânico me tomou.


Duas lágrimas desceram do meu rosto.

— O que você vai fazer?

Ele pareceu pensar, mas sua postura mostrava que ele já


sabia exatamente o que faria. Se levantou e serviu dois
copos com bebida. Eu não deveria, mas muito
provavelmente aceitaria, porque parecia ser a conversa da
minha vida. Ele me serviria uma bebida e então me mataria,
se desculpando por isso? Filho da puta frio. Psicopata louco.
Eu precisava daquela bebida. Aproximei-me e tomei da mão
dele. Se eu fosse morrer, manter qualquer postura educada
já não fazia sentido. Ele riu.

— Você é doente.

— Eu sei — Ele disse com um meio sorriso. Ele era quase


divertido, se não estivesse me ameaçando. Eu me sentei,
como quem já desistiu da vida.
— Então o que, agora é a hora que eu morro?

Ele pareceu tão surpreso quanto eu, e soltou uma risada


baixa.

Fiquei olhando para ele muito séria, porque não achava o


mínimo de graça.

— Não, eu tenho outros planos para você.

O pânico que tinha me deixado por alguns segundos, depois


que ingeri um pouco do álcool, voltou com tudo. Meu Deus,
existiam destinos muito piores que a morte. Eu voltei a me
retrair e olhei para a porta. Eu conseguiria sair daqui? Viva?
Preferia morrer a qualquer horror. De novo, não, eu não
aceitaria. Olhei para ele, desconfiada.

— Não tem como você sair daqui a menos que eu permita.


Mas para fim de esclarecimento, não vou forçá-la a nada.
Será uma escolha. Não sou um selvagem, Melissa, não
totalmente. — Era uma frase ambígua.

Tem situações que, mesmo que pareça que você tenha


escolhas, você realmente não tem, eu sabia disso em minha
medula.

— Diga de uma vez o que quer de mim.

Ele sorriu, aquele sorriso que não era um sorriso de


verdade.

— Quero que se case comigo.

Engasguei-me com porra nenhuma.

Puta. Que. Pariu.


Melissa Turner

Vicenzo, apenas focou os olhos em mim enquanto eu quase


morria engasgada com o uísque. Eu deveria ter entendido
errado. Contudo, a forma, como ele me olhava, e até
mesmo se divertia com meu ataque de tosse, me dizia que
eu tinha escutado certo. Ou será que era algum senso
mórbido de humor? Porque não tinha a menor graça.

— Casar? — Perguntei quando consegui controlar a tosse.

— Sim.

— Você é louco! Por que eu me casaria com você?

— Claro que você pode não se casar comigo. Meus motivos


são simples, vocês me roubaram, invadiram meu sistema na
tentativa de conseguir algo para me incriminar.

— Eu não fiz isso! — Eu disse quase chorando.

— E mesmo assim, você está aqui. Como não me dizem a


troco de que, eu nunca terei certeza se estão sendo
sinceras. Estão trabalhando para alguma organização? Qual
o propósito de me investigar? Isso é controle.

— Eu já expliquei.
— Sim, eu escutei, Melissa. Acontece, que eu não acredito
em você.

Meu coração parou no peito.

— Não vou me casar com você. Pede todo mundo que te


irrita em casamento? E o que, mata suas esposas na noite
de núpcias?

Ele não sorriu, mas vi um brilho de divertimento naqueles


olhos escuros.

— Só se forem tão tentadoras quanto você. E não, como eu


disse, seria um grande desperdício matá-la.

O calor no baixo ventre estava lá novamente. Droga. Eu só


poderia ser louca e doente.

— Não posso fazer isso. Não te conheço, e o pouco que sei,


não é nem um pouco encorajador.

— Tudo bem, você pode não se casar. Já te disse que não é


obrigada. — Semicerrei os olhos, desconfiada — Mas não se
esqueça de que irei cobrar o preço da ousadia da linda
Judith.

Meu coração voltou a disparar. Ele estava ameaçando


minha amiga como se falasse do tempo. Eu me levantei
com raiva.

— Eu vou chamar a polícia, o FBI, a CIA, o que for


necessário para acabar com você.

Ele riu.

— Faça o seu melhor — Então se levantou perigosamente, e


quando voltou a falar, cada poro meu se elevou, por puro
medo — Mas eu posso acabar com a carreira do seu irmão.
Sabe os jogadores de hóquei?

Sempre estão propícios a acidentes horríveis. Ah! E sabe o


que dizem sobre os ranchos de Montana né? Sempre pode
haver um incêndio, às vezes fatal para quem mora tão
longe da cidad...

Eu joguei o resto da bebida no rosto dele em puro


desespero. Meu coração em frangalhos. Doendo e tomado
por um espanto descomunal.

Esse com certeza era um destino pior que a morte.

— Desgraçado!

Ele apenas retirou um lenço do bolso com toda a classe e se


limpou.

Sorriu, um sorriso falso. Ele ameaçou toda minha família e


minha amiga.

Qual era o propósito de tudo isso? Qual?

— Escolhas, Melissa. Escolhas. Faça a sua, e lide com a


realidade que dá conta.

— Você não pode querer se casar comigo, isso é um


absurdo, não nos conhecemos.

— Depois do que fizeram, não tenho que dar satisfação de


nenhuma decisão minha.

— Eu não fiz nada! — Gritei, alucinada. Confusa, sem


entender como consegui chegar em uma situação tão
desesperadora em uma hora.

— Você escolheu estar aqui agora.


— Estou profundamente arrependida, confesso! E aí? O que,
vai ser? Casar comigo e me manter como prisioneira?

Ele sorriu, enigmaticamente. De forma que me atingiu como


um caminhão.

— Faça sua escolha, até amanhã, meio-dia, Melissa. Te darei


esse tempo. Vou pedir para Lexa te levar em casa.

Ele disse, e a mulher apareceu, como se estivesse o tempo


todo atrás das portas. Ele disse algo para ela em italiano,
então saiu, sem olhar para trás. Enquanto eu era conduzida
para fora da casa, tudo já não era mais tão lindo como
quando cheguei. Tudo estava nublado. Ele seria capaz de
cumprir suas promessas? Ele era amigo de Daniel! Se bem
que, não poderia dizer que um homem como Vicenzo
Capello era amigo de alguém.

Entrei no carro, e enquanto as luzes do centro de Chicago se


aproximavam, minha angústia aumentou. Em que confusão
eu fui me meter, meu Deus. Joguei o nome Capello no
Google e vi que os Capellos eram donos de metade de
Chicago. Nada sobre submundo do crime.

Eram donos de corporações, indústrias, boates e tantos


outros empreendimentos. Vi uma foto com três homens.
Três irmãos. Vicenzo, Mario e Vito. Vito dava mais
entrevistas, e parecia estudar em Michigan.

Mário era descrito como baladeiro. E Vicenzo... quase nada


sobre ele.

Ele conseguiria cumprir todas as ameaças que fez? Fechei


os olhos e me lembrei, de quando os homens quase
mataram Judith. A forma violenta com que fizeram ela
apagar tudo a respeito deles. Eu chorei. Sim, ele seria
capaz. No fim, essa era uma daquelas situações desastrosas
em que eu não tinha de fato uma escolha.

A mulher me deixou na frente da casa de Milla, e só então


eu me dei conta de que eu não tinha dado o endereço a ela.
De repente senti a sensação de estar sendo seguida e
vigiada, mesmo que não fizesse

sentido. Ele sabia sobre mim. Talvez desde o incidente.


Deus, Daniel estava certo.

Eu deveria ter deixado ir.

— Tia Mel, você está tristinha? — Victoria perguntou, e eu


sorri, saindo da miríade de pensamentos que me tomava. O
momento meu e de Milla acabou se tornando o momento de
todo mundo. Milla e Ahsley dançavam enquanto tomavam
vinho, Nate olhava embevecido para Milla e Daniel estava
no celular, no terraço. De lá, ele olhou para Ashley e soprou
um beijo. Ela dançou de forma provocante e ambos riram.

Era esse o tipo de amor que eu esperava. O tipo de amor


que eu queria, e agora, eu tinha me metido em uma
confusão onde provavelmente teria uma vida infernal. Fiquei
pensando de ir à polícia, mas algo me disse que não
adiantaria muito. Também pensei em fugir do país, mas não
teria como fugir, com toda minha família. Eles tinham sua
vida.

Meu celular tocou e vi o nome de Melina, outro fator


desanimador.

Minha vida estava uma merda sem tamanho, e o vinho


estava me deixando ainda mais chorosa.

— A tia só está cansada, meu amor.

— Vamos dançar com a mamãe e tia Milla? — Ela perguntou


e se levantou.

— Vai lá — Eu olhei para Daniel que desligava o celular —


Eu vou falar com seu papai e já me junto a vocês.

— Ta-bom. — Eu beijei a ponta do nariz de Vic e me


levantei.

Devagar, me aproximei de Daniel. Ele me olhou e então


colocou o celular no bolso. Eu me sentei em uma das
cadeiras, e fiz sinal para que

ele se sentasse também. Encorajada pela bebida e de forma


descuidada, perguntei.

— Quanto Vicenzo Capello é poderoso?

— De novo isso?

— Daniel, é importante.

Daniel semicerrou os olhos.

— Espero que não tenha se metido com Capello, Melissa.


Eu o olhei desanimada, acredito que meu semblante
entregou.

— Porra! O que você fez?

— Nada, não surta. Só me responda porque eu deveria ficar


longe dele!

Ele parou e se agachou em minha frente, segurando meus


ombros, como aquela vez em seu escritório. O dejavú foi
intenso, embora hoje fosse tarde demais.

— Ele é muito poderoso. Igualmente perigoso. Intocável.


Fique longe dele.

— Ele tem laços com o submundo de Chicago? É verdade?

Achei que Daniel não responderia, mas ele abriu a boca com
determinação.

— Ele é, o submundo de Chicago, Melissa. Ele, junto de sua


cúpula, manda em praticamente todo o país. Controla tudo.
Intocável, Melissa, intocável.

Senti o desespero em todo o meu corpo. Tomei mais um


gole de vinho, tentando dissipar o meu terror. Deus, eu
estava perdida. Muito perdida. Minha vida estava acabada,
definitivamente. Eu só tinha sido

“pedida” em casamento por um homem que jamais


aceitaria um não de bom grado, que ameaçou minha família
e possivelmente teria mais poder que o próprio presidente.

— Por que não prendem ele? Porque trabalha para um


homem desses, Dan?

Daniel enrijeceu.
— Tenho os meus motivos. Isso não é da sua conta de
qualquer forma. Só me escute, e deixe essa fixação com
Capello de lado. Ele não é homem para você. Qualquer
mulher, com um mínimo de autopreservação, fugiria no
sentido contrário a Capello.

Naquele momento, eu gostaria de ter essa possibilidade.


Naquele momento, eu gostaria de não ter tido a ideia
absurda de ir à casa de Vicenzo, mas agora, agora era
tarde. Eu não tinha uma escolha real. Mas talvez, eu
pudesse barganhar, e não perder toda a minha vida.

Vicenzo Capello

— Tenho que perguntar, senhor. Não acha um pouco


drástico? Digo, se casar. Os chefes vão questionar sua
escolha.

— A Darkness não questiona a escolha de esposa de


ninguém. Eu pouco me importo se meus homens vão foder
homens, mulheres ou o local onde nasceram. Já nos
desprendemos desses dogmas.

— Mas os antigos vão questionar. Eles querem alguém que


fortaleça a Darkness.

Eu olhei para Carl.


— A Darkness já é forte o suficiente, Carl.

Ele concordou e então voltou a dizer.

— A mídia vai enlouquecer. Porque a escolheu, senhor?

Eu poderia dizer ao meu homem de confiança, que era


porque eu queria, e isso era parte da verdade. Mas saber
que eu mesmo a coloquei em perigo, em Nova Iorque, fez
com que eu voltasse a farejá-la. E eu escutei parte de sua
conversa com a dona da Estillus. Melinda Gray a ameaçou e
isso me intrigou. Claramente, eu perdi algo desse quebra-
cabeça.

Mandei alguns homens no mesmo dia fazer uma visita a


Melinda para descobrir o que ela tinha contra Melissa, e foi
então que o nome Darius Konstatinus apareceu: bilionário
grego, meia-idade, filho da puta, abusador de modelos no
início da carreira, com uma informação que pode prejudicar
Melissa. E eu tenho compulsão em protegê-la. Meu nome
poderá protegê-la de Darius, assim como a minha influência
também.

A minha loucura estava querendo ser justificada por esses


fatores, mas a verdade era que eu queria aquela mulher.
Até que eu encontrasse Darius, visto que essa estava sendo
uma missão difícil, e acabasse com sua existência. Era uma
loucura, mas se um dia a obsessão esfriasse, eu daria a
liberdade a ela.
Embora, estar tão perto de Melissa, respirar o mesmo ar
que ela, tocá-la, mesmo que estivesse sendo alvo de seu
ódio, fosse a sensação mais prazerosa que experimentei em
tanto tempo.

Ela era engraçada, mesmo com medo e raiva. Era ainda


mais encantadora do que me lembrava, seria a luz dos
meus dias sombrios.

— Porque eu decidi assim, Carl.

Ele se calou. Eu estava disposto a deixá-la em paz. A nunca


a procurar, então, ela apareceu em minha casa,
perguntando por mim, me esperando. Foi uma tentação
difícil demais de ser contida. Eu a quis.

Naquele momento, ao olhá-la, eu soube: ela seria minha.

E mais uma vez, a compulsão venceu.

Eu estava sentado no Grant, um dos nossos restaurantes,


aguardando Melissa. Eu não poderia esconder de mim,
interiormente, o quanto estava animado por vê-la, nem se
quisesse.
Foi um ano de repressão, e como uma represa, tudo estava
jorrando dentro de mim. Cinco minutos após o horário
combinado, ela apareceu.

Seu rosto não era nem um pouco feliz. Ela tinha uma
carranca, moldada por seus cabelos claros, soltos, um
casaco marrom, calça jeans e botas.

Se aproximou, me surpreendendo ao aceitar que um dos


meus homens afastasse a cadeira para que ela se sentasse.
Ela então olhou para mim, e seus olhos azuis estavam
vermelhos, quase como se ela tivesse chorado. Ela desviou
os olhos para as janelas a direita, olhando para Chicago.

— Tudo bem, Vicenzo. Você venceu. — Ela me olhou então


—É

monstruoso o que está me obrigando a fazer, ameaçando


minha família,

meus amigos, não entendo o propósito. Quem sou eu? Não


tenho nada para te dar.

Eu continuei em silêncio, aguardando-a terminar.

Eu poderia sentir remorso, mas eu só conseguia pensar que


teria a visão dela sempre que quisesse, sem parecer um
perseguidor louco.

Poderia até mesmo construir alguma relação com ela, se ela


me permitisse. Até que tudo acabasse, que minha loucura
se aplacasse, e então ela poderia voltar para sua vida.

Era egoísta, eu sabia disso, egoísta demais. Mas eu nunca


disse ser bom.
— Eu preciso perguntar: serei sua prisioneira? — Melissa me
olhava nos olhos. Ela não temia, nunca temia meus olhos.
Eu tomei mais um gole da minha bebida sem quebrar nosso
contato visual.

— Você será minha esposa, Melissa.

Ela continuou me olhando em expectativa, esperando por


algo mais, alguma informação a mais, mas eu continuei
apenas a olhando. Então ela revirou os olhos, tomando um
pouco de vinho, como se pensasse que aquela conversa, se
tornaria, impossível sem álcool.

— Olha, eu nem sei o que isso significa para você.

— Você fará o que uma esposa faz.

Seus olhos seguraram os meus com ferocidade.

— Eu nunca vou dormir com você.

Eu me aproximei por cima da mesa, ainda com meus olhos


nos dela.

— Você vai implorar por isso. — Ela se afastou, e eu poderia


ver a sua pulsação no pescoço. Eu resolvi facilitar um pouco
para ela — Mas se serve para te tranquilizar, eu jamais
precisei forçar uma mulher a ficar comigo.

— Não — Ela riu sem vontade — Só a se casar com você.

Eu não tive reação. Era bom que ela tivesse alguma


coragem para me responder, mesmo em sua situação. Eu
não gostaria que ela se tornasse medrosa e submissa,
gostava de ver o fogo sob sua pele.
— Eu sou uma mulher que trabalha, Vicenzo. Eu viajo, tenho
meus negócios. Meus planos e objetivos. Não vou ficar
presa naquela casa.

— Você pode fazer o que bem-quiser, Melissa. Desde que


me acompanhe em alguns eventos e nunca tente fugir de
mim. Porque eu vou caçá-la e não será doce.

Ela bem que tentou esconder o estremecimento de medo,


mas eu o vi. Ela desviou os olhos e ficou focada em algo na
rua. Nosso almoço chegou, e almoçamos em silêncio. Eu
não poderia me parar de olhá-la, e nem de pensar no
tamanho da loucura que estava cometendo.

Ela muito provavelmente me odiaria para o resto da vida.


Ela não sabia, e eu não diria, não por enquanto, mas em um
ano ela poderia ir, se quisesse. Era tempo mais do que
suficiente para que eu encontrasse o filho da puta que
abusou dela, na adolescência, e calasse de uma vez por
todas a Estillus. E então ela seria livre para viver o que
quisesse e com sorte, eu também estaria livre do meu
fascínio por ela.

— Como vai querer fazer isso?

Eu a olhei, meio confuso com o que dizia, até me dar conta


de que ela estava perguntando sobre o casamento. Isso era,
o casamento.

— Já está tudo preparado. Teremos um casamento civil e


religioso, pois minha família é religiosa. Será em um mês.

Ela engasgou como quando a pedi em casamento.

— Um mês?

— Sim.
— Mas isso é impossível! Não posso me casar em um mês.

— Pode e vai. — Respondi simplesmente, enquanto dava


minha última garfada no filé migon.

— Minha família... oh meu Deus...

— Reservei o próximo fim de semana para darmos a notícia


aos seus pais. Seus irmãos e companheiros podem ir em
nosso jatinho.

“Nosso jatinho”. Ela me olhou um pouco desconfortável e


até mesmo eu, fiquei um pouco surpreso com minhas
palavras. Mas dei de ombros.

Eu contaria aos meus irmãos que iria me casar, e teria, por


obrigação, que fazer uma festa digna de um Chefe.
Convidar meus aliados e demonstrar força e segurança. Por
mim, poderíamos fazer apenas um casamento civil, mas não
era o esperado para mim. Infelizmente, até mesmo para
mim havia regras e protocolos que não deveriam ser
quebrados. Política, simples.

— Imagino que eu não tenha nada para dizer a respeito.

Ela disse de forma derrotada. Talvez não hoje, nem agora,


mas eu não queria uma Melissa subalterna. Agora, talvez
fosse melhor que ela olhasse para mim como um monstro,
só para que eu garantisse que ela não fugisse.

— Não — Eu me levantei e coloquei um estojo em cima da


mesa, sem me dar o trabalho de abrir. — Esteja pronta no
fim de semana. E boa sorte com sua família.

Saí sem olhar para trás, a deixando estarrecida. No íntimo,


ela também preferia ficar sozinha, a minha companhia.
Assim que entrei no carro, Carl me aguardava lá dentro. Ele
não conseguiria não perguntar.

— Ela aceitou, chefe?

— Não é como se ela tivesse a opção de não aceitar.

Carl quase riu. Então olhou para mim.

— Parabéns?

Eu não sorri, apenas olhei para frente, mas internamente,


eu não conseguia conter as sensações que afloravam.
Melissa seria minha, por contrato, mesmo que não fosse de
verdade. Ela estaria ao alcance do meu braço, perto de
mim. Eu escutaria sua voz e se chegasse muito perto,

poderia sentir seu perfume floral. A intenção era aplacar a


loucura, mas cada dia perto dela, parecia que tudo só
aumentava de tamanho. Respirei.

Era só agora. Só devido à novidade. Era o preço de um ano


de repressão. Logo iria acabar, passar, ela seria livre e eu
também. E tudo voltaria a ser como antes dela.

Melissa Turner
Eu estava apavorada enquanto olhava para meus irmãos na
mesa de jantar, na casa de Daniel. Em dois dias eu teria que
ir para Montana, embora ninguém, nem meus pais, nem
meus irmãos soubessem que teriam que ir também.

E eles iriam, eu seria incapaz de enfrentar tudo sozinha.

Dois dias. Tinham se passado dois dias de pura covardia


sem ter coragem de dizer que eu deveria me casar.

Os dois dias passados eu passei mais reclusa, evitando falar


muito com todos por medo de não passar a segurança
necessária nesse momento. O momento que eu mentiria,
sobretudo para proteger todos.

Coloquei um sorriso no rosto esperando ser o mais


convincente possível, e retirei o infame anel da minha bolsa.

Caro e elegante, e mesmo assim, eu gostaria de jogá-lo pela


janela.

Olhei para todos, e resolvi dizer de uma vez, já que perdi


um tempo, seria impossível, todos falavam de uma vez.

— Eu vou me casar!

O silêncio foi gritante. Milla e Ashley estavam atônitas: Boca


aberta, olho arregalado e tudo. Daniel ficou confuso e então,
vermelho. Victória gritou.

— Quem é o seu príncipe, tia Melissa?

Olhei para a inocência de Victoria e segurei a onda de


desespero.

Deus, como seria tudo isso? Como seria trazer um homem


perigoso e ameaçador para dentro do seio de nossa família,
conviver com minha sobrinha preciosa, o que eu estava
fazendo? No que eu tinha me metido?

Contudo, dos males, o menor, Era tarde. Sorri, com uma


confiança que eu não tinha.

— Que maluquice é essa Melissa? — Daniel soltou, quando


ninguém conseguia dizer nada.

— Maluquice nenhuma.

— Certo, Daniel se acalme. Melissa, nem sabíamos que


estava namorando, como assim você vai se casar?

— Eu estava. — Droga, eu não tinha pensado nisso, nessa


parte da história — Em segredo. Não queria que ninguém
soubesse. Mas estou loucamente apaixonada, e ele me
pediu em casamento. E eu aceitei.

— Quem é? — O olhar de Daniel era assassino. Era quase


como se ele soubesse quem era, e temesse a resposta. Se
meus olhos pudessem dizer algo, seria, sinto muito Dan. Eu
sinto tanto. — Diga de uma vez, Melissa.

— Vicenzo Capello — Eu falei em uma respiração, deixando


todos ainda mais chocados.

— Você não pode! — Milla gritou — Melissa, ele é... ele...

— Milla! — Ashley repreendeu. Então olhou para mim. —


Nem sabíamos que se conheciam. Não queremos parecer
um bando de loucos, mas isso é muito para absorver assim.

Eu congelei o sorriso, e tentei dizer naturalmente.

— Nos conhecemos a um ano e alguns dias. E mantemos


contato —
Olhei para Daniel que parecia infartar em algum momento
— E então, nos envolvemos, e agora, decidimos nos casar.

— Mas então, por que estava perguntando sobre ele aquele


dia?

Melissa, não faz sentido — Milla disse, angustiada.

— Queria medir a reação de vocês. Sei que não gostam


muito dele, então queria saber como reagiriam — Minha voz
estava tremula, então respirei fundo, e pareci ofendida — Eu
não falei nada do romance entre vocês, e estou contando,
porque quero o mesmo apoio. Esse fim de semana quero
todos vocês em Montana, para falarmos com o papai e a
mamãe.

— Melissa! — Ashley começou, com cuidado.

— Quando foram todos vocês, eu estendi a mão.

— É diferente, e você sabe. — Milla soltou em um bufo.

— Não, não é. Vocês nem conhecem o Vicenzo — Nem eu,


minha mente gritou — Se permitam conhecê-lo, antes de
julgá-lo. Dá para me apoiar? Quando você fingiu um namoro
com Nate, eu estava lá ao teu lado. E quando você, Daniel,
precisou se casar, eu te dei apoio, força, tudo para não
perder Vic. Não estou pedindo para aceitarem, só respeitem
e apoiem.

Eu sabia que estava sendo injusta, em partes. Todos


estavam brancos, Vic tomava seu suco e pelo rosto de
confusão, não entendia o que estava acontecendo. Nate,
que até então tinha permanecido calado, se aproximou e
me deu um abraço. O gigante então falou.

— Felicidades pelo noivado. Mel. Somos família.


Eu queria chorar pelo voto de confiança, embora eu
soubesse que estava mentindo para todos. Eu não estava
feliz, não queria nada daquilo, mas precisaria fingir querer
para salvar a todos. Milla meio a contragosto, se aproximou
e me abraçou. Ashley também se rendeu, contudo, Daniel
continuou sentado, me olhando friamente.

— Acho que o jantar acabou. Me deêm licença.

Seus olhos perfuraram meu crânio, e era quase como se ele


lesse o meu pânico em minha mente. Ele desconfiava muito
que tudo era um ato, não estava longe da verdade. Ele
subiu as escadas em direção ao quarto e eu temi o seu
silêncio. Eu preferia que ele brigasse, discutisse como o
irmão chato que era, mas o silêncio de Daniel era perigoso.

— Ele vai entender. — Ahsley disse.

— Não é como se fosse fazer alguma diferença em minha


decisão.

Sou uma mulher adulta, e tenho o direito de escolher com


quem vou me casar.

Exceto que não era minha escolha. Olhei para ambas e elas
estavam tentando, mas estavam preocupadas, para além
de preocupadas.

Nate também não estava cem por cento certo de que eu


estava fazendo uma boa escolha. Milla foi a primeira a
perguntar.

— Está apaixonada por ele?

Forcei-me a responder.

— Por que acha que me casaria?


Milla me encarou mais tempo e então sorriu.

— Então é o que importa. Mel. Estou feliz se você estiver


feliz.

Ashley também forçou o sorriso e pegou minha mão. Eles


estavam tentando, eu daria isso a elas.

— É um lindo anel.

Lembrei-me da forma fria que Vicenzo me deu o anel. Era


uma amostra de como seria esse casamento. De repente,
me ocorreu que moraríamos juntos, e que ele poderia fazer
da minha vida um inferno. Era desproporcional o preço que
eu estava pagando. Algo que, para mim, não fazia sentido.

— É lindo, sim.

A tensão ainda pairava entre nós. Então, Nate de forma


divertida bagunçou meu cabelo e me levantou no colo
comemorando meu desencalhamento. Eu ri de susto e Vic
começou a gritar que iria salvar a princesa do dragão. Todas
começamos a rir e eu pude relaxar um pouco.

O futuro era um enorme ponto de interrogação, mas eu


sabia que tinha feito a melhor escolha.

Foi pela minha família.

Eu não conseguia entender, mas internamente fiquei grata.


Não recebi nenhuma ligação de Melinda Gray. Estava quase
tentada a ligar para ela para saber se desistiu, mas não iria
fazer isso. Se ela tivesse desistido, o tempo diria.

Olhei meus e-mails, respondi Milena Castelle, que precisaria


de mim em Nova Iorque na semana seguinte a minha ida
em Livingston, o que só me deixaria com o tempo mais
apertado para fazer um casamento.

Não que eu estivesse muito preocupada. Vicenzo parecia ter


tudo sob controle, e por mim, a festa poderia ser em um
cemitério. Respondi mais algumas mensagens pessoais, e
reunindo minha coragem, resolvi falar no grupo da família,
que estaríamos indo para lá no fim de semana.

Apesar da confusão inicial, meus pais ficaram felizes.

Contudo, como eu imaginava, meu pai resolveu me ligar.

Antes de atender, imaginei se Daniel havia falado algo.


Desde a noite anterior eu não havia visto, considerando que
eu nem do quarto que dormia na casa do meu irmão, tinha
saído. Respirei e atendi.

— Mel.

— Oi Papai.

— Filha, está tudo bem? Aconteceu algo?

— Claro. Está tudo bem, sim.

Silêncio.

— Quem você vai trazer?

— Ah...— Suspirei — Pai, eu conheci alguém, e gostaria que


vocês o conhecessem.

— Mas isso é uma novidade boa. Eu achei que algo poderia


ter acontecido com vocês, mas se esse é o motivo, traga o
homem para podermos conhecê-lo. Tenho certeza de que é
alguém bom, pois você não merece menos, minha filha.
Fechei os olhos sentindo a ponta da culpa como uma faca
em meu coração. Era detestável mentir para meus pais.
Mas o que eu poderia dizer? “Oi, papai, estou sendo
obrigada a me casar com o chefe do crime em Chicago”.
Sem chance. Sem chance alguma.

— Levarei, papai. Te amo.

Desliguei e respirei fundo. Era melhor eu me acostumar com


essa realidade, pois esta, “era a realidade”.

Eu iria me casar em um mês. O anel caríssimo em meu


dedo era um indicativo forte do fato. Era o que aconteceria,
exceto se eu arrumasse alguma forma de fazê-lo desistir. O
que se tornava praticamente impossível, visto que eu nem
sabia o real motivo que o fez tomar tal atitude.

Desci as escadas, e encontrei Victoria e Ashley no sofá da


sala.

Ashley é fisioterapeuta esportiva, do time Chicago Winters e


estranhei ela em casa. Quando me viu, ela sorriu, embora
uma fenda de preocupação estivesse ali, enrugada em sua
testa.

— Achei que iria para a Arena.

— Baixa temporada. Hoje eu quis ficar com minha filhota —


Ela disse e beijou a testinha de Vic. Então olhou para mim —
Daniel saiu muito cedo.

Um arrepio ultrapassou todo o meu corpo. Algo me avisou,


como uma voz sobrenatural, algo que eu já imaginava que
ele faria. Ele foi confrontar Vicenzo. Eu me levantei de
imediato e falei baixo.

— Você acha que ele foi ver Vicenzo?


Ashley me olhou insegura.

— Ele gritou muito ao telefone antes de sair.

Minhas pernas criaram vida própria saindo da cobertura.

— Me empresta seu carro, Ash?

— Mel...

Eu não esperei resposta. Peguei a chave e saí, escutando


Ashley me pedindo para esperar.

Eu só saí, entrei no carro e comecei a dirigir. Daniel era


cabeça quente, Vicenzo mataria meu irmão. Era o único
pensamento que me tomava enquanto eu dirigia em direção
a casa de Vicenzo.

Vicenzo Capello

— O que foi Carl?

Levantei meus olhos para Carl, que me encarava com olhos


nada amigáveis. Ele engolia com dificuldade, o que só
demonstrava que ele não estava feliz. Algo tinha
acontecido. Eu me levantei refazendo minha pergunta com
o olhar.
— Turner está na sala te aguardando. O idiota está furioso.

Eu já sabia que isso iria acontecer em algum momento.


Daniel tinha expressado seu descontentamento sobre
qualquer possibilidade de eu me aproximar de sua irmã,
tinha provavelmente vindo pronto para uma briga.

E explicava o mau-humor de Carl, que detestava Daniel.

— Peça para entrar.

Carl me olhou com cautela e então se afastou. Daniel


poderia ser esquentado, mas sabia melhor que ninguém
que não poderia extrapolar os limites comigo. Ele sabia,
melhor do que qualquer pessoa em Chicago, do que eu era
capaz.

Não demorou muito, e um desalinhado Daniel, muito


parecido com um touro bufante, entrou em meu escritório.
Carl entrou também, já com sua mão em sua arma. Eu
levantei e mão e com um sinal pedi para que ele se
afastasse.

— Tem certeza, chefe?

— Sim, Carl. É assunto de família. — Eu disse com os olhos


nos de Daniel, que ficaram ainda mais inflamados. Carl se
afastou, e Daniel se aproximou da borda da mesa. E eu me
sentei, demonstrando meu domínio. Ele levantou o dedo em
riste com a respiração suspensa.

— Você!

Eu o olhei e esperei por seu desfecho. Ele abaixou as mãos


e respirou profundamente procurando por algum controle.
Parecia estar impossível.
— O que tem contra minha irmã? O que... o que você quer,
Vicenzo, qualquer coisa, só deixe Melissa em paz.

— Eu não tenho ideia do que está sugerindo.

— Pare de teatro! Por que quer se casar com Melissa? O que


ela fez? Olha podemos consertar!

Se ele soubesse.

Se ele soubesse que não havia o que ser feito, que Melissa
era a única que eu queria, que não havia como me parar.
Estava disposto a ir até às últimas consequências para que
ela me permitisse provar o gosto dela, e então, ambos
poderíamos seguir em frente.

Eu não queria nada de Daniel. O que eu necessitava,


somente Melissa poderia me dar.

— Me diga de uma vez!

Eu fiquei em silêncio enquanto olhava para ele, e antes que


eu dissesse qualquer palavra, vendo que sua veia quase
saltava em sua testa, um barulho vindo do corredor, uma
voz alterada feminina, e Carl.

Então, Melissa entrou em meu escritório. Seus olhos foram


de mim para seu irmão, e eu vi o pânico a tomar, pânico
que ela logo mascarou com uma carranca para o irmão.

— O que faz aqui, Daniel?

Daniel olhou a irmã e passou as mãos por seus cabelos.


Então olhou para mim e para ela. Ele parecia uma panela de
pressão pronta para explodir, eu cruzei minhas pernas, sem
mostrar qualquer tipo de alteração.
Melissa, surpreendendo tudo em mim, veio para o meu lado
e então se voltou para o irmão.

— Daniel, espero que não tenha vindo confrontar o meu


noivo! Já disse que não sou Milla!

A voz firme de Melissa quase me convenceu de que ela


realmente estava ao meu favor nesse embate. Mas eu sabia
o que a movia, era

medo, medo de que eu fizesse algo contra Daniel, ou


qualquer familiar dela.

— Eu não tenho ideia de qual jogo vocês estão jogando,


mas vou te dizer Vicenzo, se algo acontecer a minha irmã,
se você a estiver obrigando de alguma forma, como eu
imagino que esteja, eu vou te matar. Eu juro que te mato.
Você atravessou uma linha que não deveria.

Transtornado, ele olhou para a irmã e saiu. Melissa respirou


fundo, quando viu que o irmão saía do escritório e se sentou
em uma cadeira lateral, como se finalmente pudesse
relaxar um pouco. Mas seu pequeno corpo tremia, sua boca
também. Ela então levantou os olhos para Carl com ódio.
Tanta raiva.

— Eu vou me casar com você, Vicenzo, mas saiba que eu


sei muito bem que há muito mais por trás dessa decisão do
que uma possível punição pelo que Judith fez. — Ela olhou
para mim — Eu vou descobrir o que quer de mim. Porque
eu... Isso... — Sua voz falhou — Isso é pessoal de uma forma
que eu não entendo. Vou descobrir o motivo do seu ódio por
mim.

Suas palavras deixaram uma marca de uma forma que eu


não entendi. Eu quase me importei, mas a obsessão sempre
vencia. Eu apenas assenti como se ela tivesse falado do
tempo. Ela então se levantou e foi em direção a porta.

— Tudo certo para o fim de semana em Montana. Já avisei


meus pais e minha família. Na próxima semana, terei que ir
em Nova Iorque a trabalho. Espero que mantenha sua
palavra sobre não me fazer prisioneira.

E então ela saiu, esbarrando em Carl, de propósito.


Enquanto seus passos sumiam pelo corredor, Carl se
aproximou de mim. Como esperado, ele fez o seu
comentário.

— Eu ainda não entendo por que escolheu uma mulher que


te odeia para dar seguimento a Dinastia Capello. Ela é linda,
mas claramente não gosta do Chefe.

Eu sabia que era verdade. Mas eu poderia despertar o seu


desejo, isso eu sabia fazer. E depois que saciasse a ambos,
tudo poderia voltar a

ser como antes. Eu tentei suportar, tentei salvá-la de mim,


mas agora era tarde demais. Ela seria minha. Ela já era
minha.

— Não importa.

— Ela me reconheceu. Chefe, eu tenho que dizer, ela vai


odiar tudo isso aqui.

— Ela vai superar.

Carl me olhou, acreditando tanto quanto eu em minha


sentença.

Levantei-me, indo em direção ao meu quarto. Entrei na


antessala antes que pudesse pensar sobre tudo. Melissa
reinava naquela sala pequena e fechada. Ela brilhava,
mesmo quando usava óculos escuro na rua, apenas indo a
um supermercado. Eu não saberia dizer o que mais me
atraia em Melissa. Sua beleza era inegável. Seu sorriso
brilhante, a vivacidade natural que emanava dela. Ela
irradiava luz e eu queria um pouco daquela luz em meio a
minha escuridão.

Busquei dentro de mim algum sentimento de culpa por


obrigá-la a compartilhar sua luz comigo, mas não havia.

Eu de fato era o monstro que ela me acusava, e nada me


faria voltar atrás, da minha decisão, decisão que foi possível
graças a uma jogada do destino, uma sombria jogada do
destino, que a jogou diretamente para mim.

Seu sorriso sincero de olhos fechados me segurou e um lado


da minha boca se curvou, enquanto a admirava na parede
da antessala.

Eu a teria.

Melissa Turner

Uma bola nervosa estava alojada em meu estômago.

Deus, eu era modelo, não atriz.


Mas eu deveria fingir, para toda a minha família, que estava
apaixonada, e iria me casar por amor, e não por pura
ameaça. Será que essa era a maldição dos Turners?
Considerando o quanto Milla e Daniel estavam felizes em
seu casamento, eu poderia chorar por minha sorte.

Meu futuro não seria de amor ou algo nesse sentido. Eu mal


conhecia Vicenzo, nem sequer tinha certeza de seus
motivos, ele bem poderia me matar na noite de núpcias.
Jamais duvidaria de sua capacidade.

Daniel não estava falando comigo. Desde o dia em que o


enfrentei no escritório de Vicenzo, ele não falou comigo. Ele
sabia que tinha alguma história por trás desse casamento.
Mas pelo menos, ele me surpreendeu estando pronto de
manhã e entrando no carro conosco para o aeroporto.

Se eu pudesse dizer algo a respeito, diria que ele preferia


acompanhar essa tragédia de perto, mesmo que não
concordasse com ela.

Todas às vezes em que fomos juntos para Montana, o clima


foi de puro deleite e felicidade. Sempre fomos uma família
extremamente unida, até mesmo intrometida na vida de
cada um. Milla, ao meu lado, segurou minha mão forte,
como se sentisse que eu precisasse de apoio. Eu respirei
fundo e dei o meu sorriso mais brilhante. Chegamos no
aeroporto e o clima não era o melhor do mundo.
Principalmente quando fomos direcionados por dois homens
de preto a ir direto para o hangar, embarcar.

— Mãe, nós vamos nesse aviãozinho pequenininho? —


Victoria perguntou assim que entramos no avião. Contudo,
enquanto Ashley explicava para minha sobrinha sobre as
diferenças entre avião comercial e jato particular, meus
olhos pararam nas duas esferas escuras que estavam
exclusivamente em mim.

Não sabia o que fazer, então parei. Um pânico me tomou e


eu quase sucumbi a vontade de virar as costas e correr para
muito longe. Esse homem cheirava a perigo, e seus olhos
escuros pareciam não se forçar em esconder as maiores
crueldades do mundo.

E ele seria meu marido. Como se lesse meus pensamentos e


não se importasse um mínimo em aplacar meus medos, ele
se aproximou e beijou minha testa. Congelei um pouco com
o contato dos seus lábios em mim, mas logo entendi
estarmos em meio a toda minha família.

— Bom dia, querida.

Olhei para ele, e então dei um sorriso brilhante, que eu


supunha daria a um noivo verdadeiro.

— Boa noite, baby — Me virei para minha família que


assistia atentamente, principalmente Daniel, que parecia
infartar em algum momento — Bom, gente, sei que se
conhecem informalmente, mas ainda assim vou apresentar:
Vicenzo, meu noivo. — Olhei para ele — Daniel, Milla,
Ashley, Nate e minha sobrinha Victoria.

Todos deram um aceno desconfortável, e eu só consegui


pensar no que seria desse final de semana. Para minha
surpresa, Victória se aproximou e se jogou no colo de
Vicenzo, que pareceu tão surpreso quanto eu.

— Você vai ser o meu tio agora?

A cena pareceu correr em câmera lenta. Ashley se


aproximou e tentou tirar Vic de Vicenzo, que a tinha no colo
com um rosto de puro espanto, enquanto minha sobrinha
sorria abertamente.

Ashley resmungou uma desculpa, e tanto Milla e Nate,


tinham os olhos que pareciam pular do rosto em algum
momento. Ele não maltrataria uma criança de seis anos,
maltrataria? Por incrível que pudesse parecer, eu me vi
ansiando pelo que viria a seguir.

Daniel olhou com curiosidade e até um pouco de receio,


mas se manteve quase neutro. Quase.

— Suponho que sim.

Vicenzo respondeu olhando para Vic, e ignorando o apelo


silencioso de Ashley. Victoria então deu um beijo no rosto de
Vicenzo como se ele fosse sua nova pessoa favorita no
mundo. E então o abraçou mais um pouco, e ele, parecendo
incerto, apoiou a mão em suas costas. Seus

olhos focaram em algo em um dos assentos, mas não


subiram para nenhum dos nossos rostos.

— Bem-vindo a família tio Vince.


O apelido de Vic me fez soltar um bufo, seguido por outro
de Milla.

Olhei para minha irmã gêmea, e ambas estávamos com a


mão sobre a boca. Tio Vince, vulgo Vicenzo, finalmente
olhou para mim e arqueou uma sobrancelha, que eu arqueei
de volta.

Victoria poderia ser o sopro de ar fresco do fim de semana,


e mesmo um homem estranho e duro como Vicenzo, não
conseguiria manter a sua inocência a distância. Vic acabara
de escolher Vicenzo e ele estava tão ferrado.

Toda a viagem ocorreu tranquilamente. Milla e Ashley


embalaram uma conversa leve que eu participava
esporadicamente, Vicenzo pediu licença e foi para um lado
mais reservado, onde mexia em seu notebook, e Daniel
estava calado, com Vic em seus braços.

Na hora que fomos descer, tentei manter o sorriso mais


doce em meus lábios, e esperei por Vicenzo, que guardava
suas coisas. Ele terminou e me olhou com um ponto de
interrogação em seu rosto. Eu me aproximei e segurei sua
mão, estranhamente gelada. Olhei rapidamente assustada
para ele, mas continuei segurando sua mão e disse o que
tinha que ser dito.

— Você vai conhecer meus pais agora. Tente ser simpático,


tente sorrir um pouco, me trate como uma rainha,
principalmente na frente dos meus pais, e não teremos
problemas algum.

Vicenzo apenas me olhou por um tempo, a ponto de eu me


sentir desconfortável. Quando fiz menção de começar a
andar, ele puxou minha mão levemente. Eu mirei seus olhos
novamente.
— Você não merece menos, Melissa.

A voz era estranhamente profunda. Eu franzi o cenho


sentindo meu coração galopar no peito. Talvez eu tenha
ficado sem palavras. Ele disse as palavras como se
realmente quisesse dizê-las, e eu as entendi. Mas isso era
tão, tão diferente de suas ações comigo.

Ele estava me obrigando a casar com ele, ameaçou


abertamente toda minha família, eu estava perdendo algo
aqui. Me lembrar de suas ameaças fez algum juízo voltar
para a minha mente. Comprimi os lábios e apertei os olhos.

— Engraçado você dizer isso quando me coloca em uma


situação de prisioneira.

Ele levantou os olhos acima da minha cabeça e deu um


sinal para que eu andasse desviando o assunto.

Vicenzo era um mistério e eu me sentia a cada passo do


caminho, mais e mais perdida. Algo não fazia o menor
sentido em tudo isso. Eu deveria ter escutado meu irmão e
ficado quilômetros de distância de Vicenzo, mas agora era
muito, muito tarde. Eu estava pagando o preço da minha
loucura.

Todo o caminho até o rancho foi feito em um silêncio


desconfortável, já que Vic dormia. Todos no mesmo carro,
sendo seguidos por outro carro mais a distância, os
seguranças de Vicenzo, só deixava mais e mais claro que
ele nunca seria um de nós.

Olhei de relance para o homem que eu me casaria. Polido e


sério.

Apenas algumas tatuagens que dava um leve ar selvagem.


Mas havia uma sofisticação inigualável. Algo sobre como ele
andava, agia, olhava, emanava poder, mesmo que eu ainda
não o tivesse visto levantar a vós para qualquer um que
fosse.

De longe, o Hope Ranch deu o ar da graça. Uma linda casa,


enorme, rústica, toda adornada por uma varanda,
acompanhada por montanhas e montanhas ao fundo. Fui
criada nessa casa, todas as minhas memórias, as melhores
da infância e adolescência estavam ali.

De longe, vi Mary, que foi nossa baba desde sempre, e


meus pais.

Eu sorri, abri a janela e deixei o vento tocar meu rosto em


um suspiro.

Quando os abri, já estávamos bem próximos e, por mais que


a situação não fosse a melhor, eu estava feliz. Eu adorava
vir aqui. Olhei para Vicenzo ao meu lado e ele tinha suas
esferas negras fixadas em meu rosto, mais uma vez me
surpreendendo com o fascínio alojado ali.

Ele sentia algo por mim, embora, nunca eu imaginaria que


fosse suficiente para que ele se casasse comigo. Por Deus,
casamento para mim sempre foi algo sério e que você só o
fazia se houvesse muito amor.

Como meus pais, meus irmãos. Não assim, por algo que eu
ainda não sabia definir.

Ele novamente segurou minha mão e, por mais que eu


odiasse admitir, estava se tornando algo comum entre nós.
E deveria realmente se tornar, pois iríamos nos casar.

Se eu pudesse classificar o que aconteceu a seguir seria:


minha mãe olhou para Vicenzo, e simplesmente o adotou.
Ele foi extremamente educado com ela e ela o abraçou.
Olhou para o homem que estava me coagindo a se casar
com ele e o acolheu, como se ele fosse um homem que
precisasse de colo.

Tanto Daniel, quanto meu pai, olhavam desconfiados. Nate


tentava naturalizar tudo, e Vicenzo... ele dançou conforme a
música. E eu tenho que dar isso a ele, soube lidar com tudo
de forma surpreendente.

Em um dado momento, eu, que tinha me preparado para


explicar qualquer comportamento estranho do meu noivo
para minha família, fiquei exasperada. Até um pouco
chateada. Porque ele era um mestre em fingir se importar,
em ser simpático. Esse homem, que embora não sorrisse
muito, tinha um semblante aprazível para minha mãe e
Mary, nossa governanta, e estava encantando a ambas.

Eu apertava minha caneca de café quente na mão enquanto


olhava para Vicenzo. Ao meu lado, Milla e Ashley, embora
essa um pouco mais disfarçadamente, também olhavam
meio perplexas para a cena se desenrolando.

— Eu preciso dizer. Mel, Seu noivo é um verdadeiro


gentleman. Tudo bem, ficamos muito preocupados com essa
pressa toda em se casar, mas vendo ele agora, minha filha,
eu entendo.

Eu devo ter ficado vermelha. Droga. Minha mãe só soltou


isso no meio de todos como se fosse uma conversa privada
de garotas. Olhei para Vicenzo que manteve o sorriso, mas
não adiantava ele sorrir e ser cordial, eu ainda me lembrava
de suas palavras ameaçando minha família, inclusive a
pessoa em sua frente, que praticamente o adotou após ter
ficado apenas uma hora em sua frente.

— Eu tenho muita sorte.


Disse as palavras olhando diretamente nos olhos estranhos
e enigmáticos de Vicenzo. Aqueles olhos que, em quase
todo o momento, eram opacos e pareciam sem vida,
brilhou. Muito pouco, quase nada, mas eu vi, e um arrepio
de perigo passou por mim. Por algum motivo eu me senti
uma presa pronta para cair em uma armadilha.

E talvez fosse exatamente isso que estivesse acontecendo.

Vicenzo Capello

Tinha apenas dois tipos de pessoas que me faziam sentir


algo muito parecido com compaixão: pessoas genuínas, e
crianças.

Em meu mundo, quando alguém se aproximava de você,


sempre era por algum motivo oculto. Poder, sexo, dinheiro,
influência, era assim que funcionava. Mas aqui, no meio
desse nada, em um rancho qualquer, eu tinha encontrado,
em um mesmo espaço, dois tipos de pessoas que poderiam
fazer o meu morto coração bater alguma vida.

Melissa era surpreendente. Não parecia um esforço para ela


estar perto de mim, ela parecia realmente estar nesse
compromisso por vontade própria. Ria, me envolvia em suas
conversas, como se o que tínhamos, de fato, fosse real.
Olhando o quanto sua família era unida, eu sabia o porquê
ela estava tão empenhada em parecer feliz, estava
protegendo a todos que amava. Protegendo-os de mim.

Eu estava na extensa varanda, olhando as montanhas


salpicadas de neve, o que era um charme a parte, quando
escutei passos. Passinhos.

Eu não precisei me virar para saber que era a sobrinha de


Melissa. Virei e olhei os grandes olhos azuis de Victoria, a
franja já alcançando os olhos e um cabelo que ia até à
cintura, liso e escuro. Como de sua mãe. Como o de seu pai.
Ela sorriu timidamente, se aproximou e, abraçou a minha
perna.

Poucas coisas me deixavam desconcertados nesse ponto da


minha vida. Eu não era avesso a carinho, mas não era parte
do meu dia a dia.

— Tio Vince, você vai mesmo se casar com a tia Mel?

Tio Vince. “Vince”.

As palavras novamente me paralisaram, pois se eu fechasse


os olhos, eu escutaria Bianca me chamando exatamente
assim. Se não fosse uma criança de seis anos que nunca
tinha me visto na vida, me chamando dessa forma, eu
poderia achar que era algum tipo de armação para me
desestabilizar.

Nesse caso, era impossível. Eu me abaixei, tentando


disfarçar a inflamação em meus olhos, e a emoção que
tomava meu interior ao me sentir levado novamente diante
de uma das raras situações que mexiam com meu interior.

— Por que me chama de Vince? — Perguntei de forma


calma, tentando achar qualquer coisa no semblante de uma
criança. Qualquer coisa que me fizesse sentir a comodidade
de saber que estou diante de pessoas que sempre tentam
extrair o pior de mim. Tudo o que vi foi inocência. Inocência
e pureza.

Ela soltou uma risadinha que acelerou meu coração.

— Eu gosto de tio Vince.

Ela disse e me enlaçou pelo pescoço. Tão puro, tão inocente


que eu tive que segurar o impulso de me afastar, me
sentindo indigno daquela demonstração de afeto.

Ela pairou ao meu redor o dia todo, eu sabia que era


genuíno. E em respeito à sua ingenuidade, eu me levantei
com ela nos braços e me sentei em uma cadeira de balanço.
Tentei não focar no quanto tudo era estranho, eu, sentado
em uma cadeira de balanço, com uma criança de seis anos,
mas apenas fiquei ali. Sem pensar muito.

Em um dado momento, o mais irreal aconteceu, senti uma


mão tímida em meu braço. Era Ashley. Ela parecia um pouco
assustada, mas forçou um sorriso. Então eu me dei conta de
que cochilei na cadeira e que Victoria dormia em meu colo.
Mascarei o espanto e apenas olhei para ela.

— Me desculpe por ela. Está animada com o noivo da tia. —


Ela disse e sorriu, nervosa.

— Tudo bem.

Ashley se aproximou para pegar Victoria, mas eu me


levantei antes.

— Pode deixar que eu a levo para o quarto. Me mostre o


caminho.

— Oh — Ela me olhou espantada — Tudo bem.


Saindo um pouco do choque, ela andou na frente e nos
encaminhou pelas escadas até o quarto da pequena. Era
realmente o quarto dela na casa dos avós. Eu a deitei com
cuidado e deixei que Ashley a arrumasse para dormir.
Quando fiz menção de sair, Ashley me parou.

— Vicenzo — Eu me virei e aguardei — Eu nunca te agradeci


por salvar a minha vida. Por duas vezes.

Ashley sofreu duas tentativas de assassinato há um ano,


logo que se casou com Daniel. O mesmo aconteceu com
Milla, irmã de Melissa, uns quatro anos antes. Ambas
conheciam uma parte do meu lado sombrio e eu entendia
suas ressalvas em relação a mim.

— Foi um trabalho. Você não tem que me agradecer.

Eu disse e me virei, mas antes que saísse, ela ainda disse.

— Mesmo assim. Foi um trabalho que salvou minha vida.


Obrigada.

Eu não me virei, embora tivesse parado. Assenti e continuei


o caminho. Como se estivesse precisando de ar, desci as
escadas e quis voltar para a varanda, mas encontrei Patrick
Turner, meu futuro sogro, na cadeira que eu ocupava. Ele se
virou e sorriu, embora o sorriso não chegasse nos olhos. Aí
algo que eu tinha que ressaltar, a mesma medida que a
mãe de Melissa tinha me acolhido, o pai de Melissa ainda
me olhava desconfiado.

— Se achegue, filho. Acho que agora posso te chamar assim


também.

Eu não sorri, mas me aproximei. Seria o meu sogro, afinal.


Ele mirou a noite e então suspirou, antes de começar a falar.
— Chega uma época da nossa vida, que tudo o que
queremos é sombra e água fresca. Após ter que cuidar de
uma família, criar os filhos e eles voarem sozinhos, tudo o
que nos dá prazer, são esses momentos em família, e curtir
os netos. No meu caso, Victoria.

Eu assenti, aguardando a continuação. Nesse momento,


Patrick se virou inteiramente para mim com um olhar firme,
embora seu tom ainda fosse calmo.

— Eu não te conheço, filho. Não como pessoa, pelo menos.


Sei do seu sobrenome, sei que tem poder lá fora. Sei que
tem negócios com meu filho, negócios que não concordo
muito, se me permite dizer. Eu sou pai, afinal. Um dia,
talvez, você saiba que estou falando.

Agora, Patrick Turner tinha toda a minha atenção. Seria uma


ameaça a seguir?

— Melissa sempre foi independente. Algo que foi uma


benção e uma maldição. E apesar de não conseguir definir
ao certo o que sinto diante de um casamento tão repentino,
eu confio na decisão dela. — Então o homem me olhou de
forma ameaçadora. Era um pai, eu tinha que respeitar —
Não a machuque. Nunca. Eu colocarei um fim em sua vida,
ou morrerei tentando. Saiba disso.

Eu apenas encarei o homem em minha frente. Poucos


homens me ameaçaram e saíram ilesos, mas algo sobre um
pai proteger uma filha de um homem que ele sabiamente
julgava ruim, me segurou ali.

Eu poderia destruí-lo em vida com apenas uma respiração,


mas o homem estava protegendo sua filha. Foi impossível
não o respeitar. Então eu apenas olhei para o homem, que
como em um piscar de olhos, deixou a postura ameaçadora
e passou a sorrir novamente.

— Você fuma, filho? Nada melhor em uma noite fria.

E assim, de repente, eu estava aceito na família Turner.

Era tarde quando resolvi voltar para o quarto que dividiria


com Melissa. A conversa com Patrick, depois da ameaça
aberta, foi tranquila.

Falamos sobre o Rancho, sobre negócios, sobre família. E


então eu resolvi ser hora de me recolher. Não saberia dizer
com certeza se o homem me aprovava para sua filha, muito
provavelmente não, mas ele respeitava.

E estava tentando, de sua forma, fazer funcionar.

Os Turnners eram uma família unida e feliz, talvez ele


tivesse receio de que a chegada de um novo integrante, eu
especificamente, pudesse fazer com que essa dinâmica se
perdesse.

Assim que entrei no quarto, Melissa estava deitada, coberta,


virada para o outro lado da cama, o lado da janela, e só sua
cabeça pontava para fora. Um morro de travesseiros foi
formado no meio da cama, como se fosse uma muralha.
Como se eu quisesse me aproveitar dela e esse morro fosse
me impedir. Eu controlei o riso que quis escapar de meus
lábios. Aproximei-me calmamente de seu lado e me abaixei.

Ela ressonava tranquilamente, quase como uma criança. Se


eu não soubesse da parte sombria de sua história, poderia
até mesmo acreditar que ela não tivesse problemas ou
dores. Porque ela aspirava calmaria e felicidade. Talvez essa
fosse ela, esse sorriso solto, essa energia boa, talvez ela
tenha sabido lidar com seus traumas e não deixou com que
eles destruíssem sua perspectiva boa da vida.

Hoje, a minha única perspectiva boa da vida estava em


minha frente.

Ela. Minha obsessão mais louca e perversa. Eu tentei não


sugar a alegria dela, talvez no final, ela terminasse
destruída e eu saciado, mas era impossível de voltar atrás
agora. Meu peito disparava só de imaginar ela longe de
mim, longe dos meus olhos, não depois de um ano de
latência, um ano de repressão.

Não, eu não abriria mão. Nós lidaríamos com o resto quando


fosse possível. Agora, tudo o que me importava era ela.

Melissa Turner
— Melissa.

Eu estava viajando em minha mente. De novo, desde que


voltei de Montana a dois dias. Desde que acordei no
domingo com braços e pernas entrelaçadas com um
monumento de cabelos escuros e olhos penetrantes. Me
encarando como se eu fosse uma das maravilhas da terra.
Não era a primeira vez que eu tinha essa impressão. A de
que Vicenzo me olhava como se eu fosse algo sobrenatural.
E eu nem sabia dizer como me sentia sobre isso.

“— Você me olha diferente. — Eu disse, ainda sonolenta,


com todas as minhas guardas baixas.

— Te olho como você merece ser olhada — Ele respondeu


com a voz rouca.

Estava sem camisa. Tatuagens e cicatrizes cobriam seu


dorso, peito, braços. Tatuagens que ficavam geralmente
escondidas por trás do terno de homem sério de negócios,
que ele representava para o mundo. E foi a onda de calor
que começou a subir por meu corpo, diante da dualidade da
personalidade intrigante de Vicenzo, que me fez levantar
em um salto.

Lembrei-me das ameaças dele contra minha família, contra


todo mundo e me enfureci contra ele e contra mim.
Estúpida, estúpida. Não há nada de fascinante sobre esse
homem.”

— MELISSA!

Olhei assustada para Frank. Mais baixo que eu, ruivo e um


pouco acima do peso, embora com uma pose de rainha,
esse era o meu empresário. Eu respirei e apertei minha
bolsa no colo. Estava em Nova Iorque e ia me encontrar
com Milena, minha futura sócia. Contudo, em uma mudança
de planos, eu iria para um café na casa dela, algo
relacionado aos filhos.

— Eu não tenho ideia do que está acontecendo com você


hoje, mas coloque a cabeça no lugar. É o seu futuro, mulher!

— Eu sei, só estou um pouco distraída.

Frank respirou e ficou em silêncio. Não muito tempo depois,


uma casa sinuosa, espetacular, pontou, e como previsto, o
carro entrou. Era uma senhora de uma casa, antiga e
gotejava dinheiro.

Com o que será que o marido de Milena trabalhava? Deveria


ser algum herdeiro. Só poderia ser algum herdeiro.

Olhei para Frank pronta para perguntar, contudo, seu


semblante embasbacado só provava que ele também
estava surpreso e sabia tanto quanto eu.

Descemos e entramos em um saguão todo iluminado. Antes


que batêssemos na porta, um homem loiro de olhos azuis a
abriu. Tinha um sorriso fácil no rosto, e uma bebezinha linda
no colo, que eu daria uns dois anos. A bebezinha chorava,
mas me encarou por um período com os olhos negros
imenso, e uma boquinha de coração. Os cabelos negros e
lisos, uma franjinha fofa muito parecida com a de Victoria.
Era a cara de Milena, agora eu via.

— Boa noite, você deve ser a Melissa. E você o Frank,


entrem, por favor.

O homem, muito lindo por sinal, nos deu passagem e


respondemos o boa noite dele. A casa por dentro era ainda
mais excepcional. De forma que segurei o riso nervoso que
quase explodiu de mim. Principalmente porque o homem
que atendeu a porta, que muito provavelmente era o
esposo de Milena, não parecia nenhum pouco um homem
tenebrosamente rico e esnobe. Ele estava descalço e
parecia bem normal.

— Sentem-se, por favor, Milena já está descendo. Hoje as


duas babas faltaram e como podem ver — Ele apontou para
o sofá e a sala com brinquedos espalhados, e um notebook
aberto em uma poltrona —

Tivemos que trabalhar em casa.

Eu e Frank sorrimos junto, com o homem. Sentei-me e olhei


para a menininha que começava a chorar novamente.

— Valentina, principessa, não chore filha.

— Italianos? — Frank perguntou e o homem sorriu, olhando


brevemente para Frank e então para a filha.

— Sim, somos descendentes.

Ele respondeu sorrindo e continuou acariciando a pequena


que fazia um biquinho adorável para chorar. Ela era uma
fofura de criança e eu poderia entender o motivo de Milena
querer passar mais tempo com os filhos. Se bem que, pelo
que eu poderia notar, Milena trabalhava por puro prazer,
não por necessidade.

Nesse momento Milena desceu, exuberantemente linda, e o


olhar que seu esposo lhe deu, me fez enxergar ali, no
primeiro impacto, que ele tinha verdadeira adoração por
ela. Quando ela nos viu, abriu um sorriso brilhante e me
cumprimentou com um caloroso, abraço.

— Me desculpe o infortúnio de trazê-la até aqui, mas hoje


foi um dia daqueles.
Eu sorri de volta, enquanto ela cumprimentava Frank.

— Imagina, trabalho algum.

Ela se virou para seu esposo e sorriu.

— Amore mio, Luigi ainda dorme, mas sua mãe vai ficar de
olho nos pequenos para que você receba seus amigos.

— Okay, querida. — Ele deu um rápido beijo em Milena e


subiu as escadas com a pequena Valentina.

— Sua família é linda. — Eu disse de forma espontânea.

— Obrigada — Ela sorriu sinceramente maravilhada. — Bom,


vamos para o escritório, temos muito o que colocar em dia
hoje.

E assim, fomos para a nossa reunião

Eu estava fascinada com o rumo que as coisas estavam


tomando em minha vida, tão fascinada que foi impossível
não me esquecer de Melinda e Vicenzo, mesmo que por um
tempo curto. Milena era maravilhosa, muito profissional e já
sentia que nossa parceria seria ótima.

Com um sorriso maior do que eu imaginaria que poderia


dar, saímos do escritório, mas eu estaquei na porta, e o
sorriso sumiu

instantaneamente. Na sala, o esposo de Milena estava


agora formalmente vestido, e tinha... convidados. Um
desses convidados, de costa, me fez congelar.

Não, não, não. Não poderia ser, não, nem mesmo no inferno
isso seria possível.
— Tudo bem, Mel? — Frank falou em meu ouvido quando
parei no meio do caminho.

Eu sabia que outras pessoas estavam na casa, mas meu


olhar estava somente no homem de costas que eu poderia
jurar ser.

— Vicenzo, que surpresa! — Milena disse e cumprimentou o


meu noivo.

Ele se virou para cumprimentá-la, e seus olhos pararam em


mim.

Eles não diziam nada, como sempre, mas um leve arquear


de sobrancelha poderia revelar surpresa.

Ah, mas eu não era idiota, ele sabia que eu estava em Nova
Iorque, estaria controlando meus passos? Minha vida seria
isso agora? Tentei segurar uma onda de lágrimas de
frustração. Não, eu não permitiria isso, nada tinha feito para
que isso acontecesse.

— Gente, quero que conheçam a Melissa, ela será minha


sócia.

Permiti que meus olhos passeassem pela sala por um


momento, mas minha mente estava ligada apenas em
Vicenzo. Frank deu um suspiro ao meu lado, pois eu deveria
reconhecer que os homens eram lindos, e entre eles estava
uma mulher muito linda ao lado de um homem igualmente
exuberante. Contudo, parecia algo mais social.

— Boa noite. — Eu me obriguei a resmungar, minha voz


saindo fraca e trêmula.
Vicenzo deu passos predadores em minha direção e todos
passaram a assistir à cena. Eu dei um passo instantâneo
para trás e trompei em Frank que me segurou. Vicenzo
parou em minha frente e sorriu friamente.

— Melissa Turner.

— Vocês se conhecem? — Frank perguntou.

Vicenzo ainda perfurou meus olhos por alguns minutos e


então se virou para todos. Deu um sorriso que não era um
sorriso de verdade e disse:

— Melissa e eu nos casaremos em menos de um mês.

O silêncio foi mortal. Milena parecia chocadíssima e eu


apenas fiquei em silêncio. Frank pareceu que iria explodir
em algum momento, de puro, eu nem saberia dizer o que.

Espanto? Choque? Talvez ele estivesse esperando eu dizer


ser uma brincadeira. Não, eu não tinha dito ainda para
meus amigos que me casaria, porque se fosse ser bem
sincera, nem mesmo eu estava convencida ainda.

— Nossa, isso é uma surpresa. — Milena resolveu dizer


quando ninguém disse nada.

A garota, que estava acompanhada pelo homem de olhos


verdes intensos como os dela, se aproximou e deu um beijo
estalado no rosto de Vicenzo. Seu olhar era enigmático,
quase como se ela tivesse descoberto algo que ela já
desconfiava.

— Parabéns, Vicenzo.

Ele fez algo que eu jamais imaginaria. Ele revirou os olhos


para ela, mas sorriu, sinceramente sorriu. Ele gostava dela e
isso foi estranho para mim de uma forma que eu não soube
explicar. Ela então voltou seus olhos para mim. Cabelos
castanhos escuros, olhos verdes, lábios cheios e uma
elegância sem igual, suas mãos foram para as minhas e ela
sorriu brilhantemente.

— Melissa Turner, eu te sigo no Instagram. Você é ainda


mais linda e estilosa pessoalmente. Nem imaginava que
conhecia Vicenzo, mas agora muita coisa faz sentido.

Eu estava pronta para perguntar o que, quando o homem,


provavelmente companheiro dela, se aproximou e pôs a
mão em seu ombro.

— Alaiin! — Ele disse carinhosamente como reprimenda.

— Eu sou Talía Dardan, afinal. Sou prima de Giovanni.

Eu já não entendia mais nada. Olhei para Vicenzo e ele


segurou minha mão. De alguma forma, foi reconfortante,
mesmo que ele fosse a causa de tudo o que estava
acontecendo ali. Frank então me virou para ele.

— Como assim você vai se casar? E você não me disse


nada, Mel!

— Ele soava acusador e eu me senti culpada.

— Foi... foi meio que sem planejar. Nesse fim de semana —


Olhei para Vicenzo — Eu não queria contar para ninguém
antes de contar para minha família, iria contar essa semana
para vocês. — Olhei para Frank —

Me desculpe.

— Bom, já que estamos em família, então podemos jantar


todos juntos, o que acham? — Milena nos disse e puxou a
todos para a sala de jantar.

O jantar serviu para que eu acalmasse um pouco os ânimos,


embora ainda estivesse frustrada sobre como me sentia
controlada. Não, não poderia ser apenas uma coincidência.
Não poderia.

Pela primeira vez em minha vida, comecei a questionar


minha capacidade de trabalho, se não fosse o olhar chocado
de Milena eu poderia jurar estarem todos mentindo para
mim. Quando eu olhava a dinâmica de todos, percebia que
eles se conheciam bem. Giovanni era engraçado, o que eu
soube então ser esposo de Talía e meu “noivo”

reviravam os olhos esporadicamente para as palhaçadas


dele. Vicenzo era sério. Mesmo ali, ele não relaxava muito,
embora tenha sido um dos lugares que o vi talvez mais à
vontade, mesmo não tão à vontade assim.

Perguntei-me que tipo de negócios Vicenzo teria com


Giovanni, embora ali olhando, todos pareciam ter o mesmo
estilo de vida. O estilo que goteja dinheiro. Certamente, se
eram amigos de Vicenzo, não era um dinheiro muito limpo.
Deus, eles poderiam ser todos da Máfia. Tentei de
desprender dos meus próprios preconceitos e focar no
quanto estavam sendo gentis comigo.

— Estou curioso, como se conheceram? — Giovanni


perguntou.

Eu não soube o que dizer. Contudo, Vicenzo segurou minha


mão por cima da mesa e foi reconfortante, uma droga
reconfortante, respondendo com uma segurança que eu não
teria.

— Melissa é irmã de um amigo. Nos conhecemos,


mantemos contato por um tempo, até que eu resolvi pedi-la
em casamento.

Olhei para ele, que então, olhou para mim. Algo me dizia
que ele jamais responderia essa pergunta, que mandaria
um olhar indiferente para a mesa e não diria, porque ele
parecia esse tipo de pessoa. Não, ele era esse tipo de
pessoa. Mas seria humilhante para mim, e como se ele
soubesse que era importante para mim a visão
principalmente de Milena a meu respeito, ele respondeu.
Quase como se fosse realmente isso.

Eu sorri. De alguma forma, fingir para minha família era


mais fácil do que para essas pessoas estranhas. Eles eram
muito gentis, mas tinha algo que me lembrava perigo, um
pouco mais escondido, abaixo da superfície.

Eles eram como Vicenzo.

— Sim, foi isso. Eu só não fazia ideia de que vocês se


conheciam.

Acho que estou em choque.

Todos riram do meu humor e eu relaxei um pouco. Frank


estava estranhamente em silêncio, eu deveria conversar
com ele depois. E ainda tinha Judith.

— Acho que entendo agora por que quer dar uma pausa na
carreira de modelo e parar em Chicago — Milena disse
sorrindo.

— Meu irmão e minha irmã gêmea moram em Chicago. E


tenho uma sobrinha linda de seis anos que quero ver
crescer. E claro — Eu sorri e olhei para Vicenzo — Teve outro
motivo agora não tão secreto assim.

Todos sorriram. Ótimo, eles estavam comprando a história.


No momento, era o suficiente.

Melissa Turner

Eu estava fazendo de tudo para não parecer tão ansiosa


sobre estar no carro de Vicenzo indo sabe-se Deus para
onde. Contudo, outro sentimento crescia muito mais que a
ansiedade ou o medo de saber o que faríamos, assim que
saíssemos da casa de Milena.

A raiva. Vicenzo estaria me controlando? Me seguindo? Até


mesmo o meu contrato agora era algo que eu estava
duvidando. Milena e Vicenzo pareciam se conhecer de longa
data.

Será que... Não, eu não iria por esse caminho.

Sou uma modelo influente e competente. Tinha que


valorizar o meu trabalho. Mas eu ainda iria tirar toda essa
história a limpo, mesmo que Vicenzo fosse assustador e eu
não tivesse muito o que fazer a respeito.

Ele não olhou para mim, apenas dirigiu. Eu estava com o


coração os pulos de raiva e medo. Frank foi embora
despreocupado achando que tinha me deixado nas mãos de
meu noivo, embora seu olhar no final me dizia que iriamos
conversar sobre tudo.
Paramos em frente a um condomínio na Time Square. Claro,
não teria como ser diferente. Revirei os olhos mentalmente
enquanto descia sem esperar que um de seus brutamontes
me abrisse a porta. Eu estava muito nervosa. Vicenzo, se
percebeu, não se importou. Contudo, na mesma medida em
que estava brava, eu sentia medo. Estaria sozinha com
Vicenzo. Quase ri com o pensamento, o homem assustador
que agora me acompanhava passo a passo para dentro do
condomínio, seria meu marido e passaríamos um longo
tempo juntos.

Quando entramos no elevador, Vicenzo sinalizou a


cobertura. Um dos homens que invadiram a casa de Judith
estava junto e o pouco do tempo que passei na companhia
dos dois me fez perceber que eles tinham uma relação mais
próxima. Contudo, eu não conseguia ser simpática ou
cordial com o homem que, por muito pouco, não tirou a vida
da minha amiga.

Judith! Eu ainda tinha que falar com ela, seriamente. E


talvez, para ela, eu tivesse que dizer a verdade, pois ela
jamais acreditaria nesse blábláblá de amor.

Suspirei em desânimo, entendendo o espiral de confusão


que eu tinha me metido. Eu, com minhas próprias pernas.

— Algum problema?

O barítono sombrio de Vicenzo me fez dar um pulo de susto,


contudo, um arrepio inoportuno também subiu por meu
corpo. Uma atração idiota e sem sentido, principalmente
depois de tudo o que ele estava fazendo comigo. Eu apenas
fiquei em silêncio. Assim que entramos na cobertura que eu
pararia para admirar em outro momento, eu me virei em
direção a ele.

— Quero falar com você — Olhei para Carl — A sós.


Vicenzo apenas olhou para Carl, que tentou encobrir um
meio sorriso, mas assentiu e se afastou. Por algum motivo,
o gesto fez com que a minha raiva sobressaísse ao medo.
Encarei o meu futuro marido e respirei fundo antes de
começar.

— Como é possível? Não me falou que viria para nova


Iorque, embora soubesse que eu estaria aqui. Está me
seguindo? Vai controlar cada passo meu?

Vicenzo ficou me encarando por alguns segundos. Então,


começou a tirar o seu casaco, revelando uma camisa branca
por baixo. Seus olhos não deixavam os meus e
instintivamente, eu dei um passo para trás. Ele tinha um
corpo poderoso, muito maior que eu.

Poderia me matar, ou mesmo me foder com... Desviei os


pensamentos. Que merda eu tinha na cabeça? Olhei para
ele, ainda mais determinada, fazendo com a intimidação
que ele provavelmente estava tentando jogar para cima de
mim, perdesse um pouco da força.

— Eu não tenho ideia do que você está dizendo, Mel. — Ele


disse meu nome de forma doce, embora não sorrisse, nem
mesmo com os olhos. Mel era meu apelido, mas na boca
dele, era perigosamente excitante.

— Não faça joguinhos, Vicenzo. Está querendo me controlar?


Como é possível que você seja tão próximo da minha futura
sócia?

Vicenzo se sentou em uma poltrona e seus olhos brilharam


daquela forma que eu só tinha visto em pouquíssimas
ocasiões.

— Acredite, estou tão surpreso quanto você.


Eu ri ironicamente, ri com sarcasmo. Ele achava mesmo que
eu acreditaria nisso?

— De onde conhece Milena? E o marido dela? Por Deus,


você conhece até mesmo a família dela!

— Temos negócios. — Ele disse, não perdendo nem mesmo


um pouco da sua aura de poder ao se sentar. Olhos
levemente divertidos. Que serviram apenas para inflamar a
minha raiva.

— Desde quando? Não minta para mim!

— Alguns anos.

Eu me aproximei, ficando acima dele, que estava sentado


na poltrona. Meu dedo subiu em riste, a autopreservação
toda jogada no lixo a essa altura.

— Você por acaso tem alguma relação com a minha


sociedade com Milena? — Meus olhos encheram de
lágrimas, porque de repente eu comecei a achar estranho
que, de tantas modelos, Milena quisesse uma sociedade
comigo, justamente comigo.

Não percebi que Vicenzo tinha se levantado, apenas quando


choquei com sua camisa branca emoldurando seu peito
másculo. Dei um passo para trás, porém suas mãos,
suavemente, subiram por meus braços desnudos. Era quase
a promessa de um toque, lento, que fez os meus poros se
arrepiarem. Minha vontade era fechar os olhos para sentir a
sensação com mais potência, mas eu ainda estava com
raiva de estar em uma situação que não tinha escolhido,
que foi imposta.

Quando as mãos de Vicenzo seguraram meus ombros, eu


olhei para cima, determinada a odiar o homem em minha
frente para o resto da minha vida. O homem que havia me
colocado na situação mais perturbadora da minha
existência. Seus olhos não eram mortos, não

nesse momento. Seus olhos pareciam um infinito negro de


mistérios, que eu nunca saberia, nunca teria acesso.

— Eu só vou dizer uma única vez, Mel. Eu não fazia ideia de


que sua sociedade era com a Castelle’s. O que você
conseguiu, foi mérito seu, não duvide de si mesma.

Percebi então que prendia a respiração, e a soltei de uma só


vez quando ele soltou meus braços. Sua voz, foi a mais
suave que eu já tinha escutado. Seu hálito mentolado em
meu rosto quase me fez cair na fraqueza de fechar os olhos.
Dei um passo para trás. A ideia de que eu estivesse vivendo
uma versão estranha de Síndrome de Estocolmo, me fez dar
mais dois passos e quase cair em cima da mesinha de
centro na sala de Vicenzo.

Quase. Porque um braço potente me enlaçou pela cintura e


me manteve com os dois pés no chão. O choque de nossos
corpos foi de uma intensidade que me fez agarrar seus
ombros procurando por mais que equilíbrio. Procurando
intensificar aquele choque.

Nossos olhos se encontraram. Sua mão foi suavemente das


minhas costas para o meu cabelo, lentamente, e
suavemente, segurando-o pela raiz. E então, um puxão
firme, embora não doloroso. Uma promessa de que, se eu
deixasse acontecer, seria duro e doce ao mesmo tempo.

Ele tinha uma aura de poder e domínio que me deixava sem


ação, e eu sabia que se me permitisse qualquer
proximidade que fosse, talvez eu estivesse perdida. Agarrei-
me a raiva, ao motivo pelo qual estávamos ali, em primeiro
lugar. Ele estava me manipulando, e eu não o deixaria
ganhar, não nesse jogo. Eu já tinha perdido quase tudo, mas
a minha dignidade, essa eu manteria, ou morreria tentando.
Empurrei o seu peito com força e olhei determinada em
seus olhos.

— Você pode me obrigar a casar com você, manipular meu


trabalho e até mesmo minha família. Mas eu nunca, ouviu
bem, NUNCA vou te dar esse prazer: O de me ter por livre e
espontânea vontade em sua cama.

Vicenzo não teve uma única expressão diante das minhas


palavras, inflamadas pela raiva. Eu estava respirando com
dificuldade. Raiva pela situação que ele estava impondo a
mim, mas raiva mesmo de mim, por

apesar de tudo, sequer cogitar beijá-lo. Coloquei ambas as


mãos em meu rosto.

— Dá para pedir para um dos seus trogloditas me levar para


minha casa? Ou melhor, vou de táxi.

— Você dorme aqui essa noite.

— Nem em seu sonho! — Esbravejei olhando para o seu


rosto.

— Você dorme. Nova Iorque não é o meu território, você


pode estar em perigo, agora que oficialmente é minha
noiva. Saiu uma nota no jornal de Chicago.

— O que significa aqui não ser o seu território? — Perguntei


alarmada.

— Significa que aqui não é seguro para nós dois.

Um arrepio passou por meu corpo enquanto eu tentava


assimilar.
Sim, Judith poderia estar mais que certa. Crime organizado,
poder, máfia.

Meu Deus, onde eu estava me metendo? Coloquei ambas as


mãos no rosto novamente tentando conter a onda de
pânico.

— Eu não estou pronta para saber sobre os seus negócios.


Me coloque no quarto mais longe possível do seu.

Escutei uma risada contida, mas não abri o olho para ver o
feito inédito. Estava esgotada. Era muito em pouco tempo.
Era demais para assimilar de uma vez só.

Eu pensaria em tudo isso com calma, mas agora, tudo o que


eu queria era descansar um pouco. Isso, eu descansaria,
amanhã, talvez, se me desse coragem, eu perguntaria
sobretudo, não que fizesse alguma diferença no fim das
contas.

Vicenzo me deu sinal para o seguir, e eu o segui. A única


certeza que eu tinha, eu pensava, enquanto olhava as
costas do homem a minha frente, era que se tudo o que eu
imaginava fosse, de fato, verdade, seria praticamente
impossível sair desse mundo, uma vez que eu entrasse.

Talvez fosse a minha sentença.


Melissa Turner

— É tudo minha culpa! — Judith chorava.

E eu já não sabia o que dizer para que ela parasse de


chorar. Após acordar muito cedo e ser trazida pelo tal Carl
para o meu apartamento, eu liguei para Judith e pedi para
que ela viesse almoçar comigo. Não queria falar sobre tudo
em um local público, não queria que ela se sentisse mal e
eu conhecia a natureza passional de Judith, que, como sua
mente curiosa, era explosiva.

— Já disse que não é sua culpa. Já disse para parar de falar


isso. Eu decidi ir lá, eu aceitei a situação, não carregue
culpas que não é sua.

— Eu vou falar com ele — Judith se levantou e eu a segurei.

— Pare! Preste atenção, Judith: Você é a única pessoa, além


de mim e Vicenzo, que sabe a real natureza do nosso
envolvimento. Isso não pode estourar, primeiro, porque
tanto eu quanto ele somos pessoas públicas, e segundo,
porque isso iria ferir a minha família. Daniel já não acredita,
você não pode alimentar as desconfianças dele — Segurei
firme seus braços — Eu estou confiando em você, me
prometa que vai ficar calada.

Judith tinhas os olhos vermelhos de chorar, mas acabou


concordando comigo. Eu entendia a culpa que ela sentia,
contudo, já não havia espaço para lamentos. Essa era a
realidade, eu só teria que descobrir a melhor forma de lidar
com tudo.

— Eu preciso de você controlada, Ju. Lembra da ameaça que


fizeram? — Ela afirmou que sim, comprimindo os lábios, e
lágrimas caindo de seu rosto — Então, preciso que você me
dê força, e não, que eu fiquei preocupada com você.
— Eu vou me controlar.

— Prometa!

— Prometo!

Um pouco mais tranquila, soltei seus braços e a abracei.


Não tinha como esconder a verdade de Judith, primeiro
porque ela jamais acreditaria que esse casamento seria por
amor, e segundo, porque ela merecia saber.

E era melhor que fosse por mim.

— Eu só não consigo entender, porque ele quer se casar


com você.

Não acha um exagero? Porque, ele poderia pedir sexo, uma


noite, uma temporada, que fosse. Mas casamento? Com
uma pessoa que ele viu uma vez na vida?

Respirei fundo. Porque, sim, eu achava muito estranho, mas


não mudaria os fatos.

— Acho estranho. Mas o que eu posso fazer?

— Talvez, se soubéssemos a real motivação, poderíamos


virar esse jogo, e...

— Judith, Judith! Você prometeu!

— Tá, desculpe. É que não é justo.

Olhei para minha amiga. Escolhi bem as palavras para


acalmar não somente ela, mas a mim também.

— Não vou mentir que não estou insegura. Mas dormi duas
noites no mesmo lugar que ele, uma vez na mesma cama, e
ele não ultrapassou um limite. Eu não sei a verdadeira
motivação de Vicenzo, mas até agora ele tem se mostrado...
não sei... Acho que ele tem se mostrado quase confiável.
Nesse aspecto.

— Não quero te apavorar, mas não dá para colocar Vicenzo


Capello e confiável na mesma frase. Ele está te obrigando a
se casar com ele, pelo amor de Deus.

— Eu sei disso, mas não muda o fato, de que, se fosse sexo


a motivação principal, ele já poderia ter conseguido. Às
vezes eu tenho a impressão de que ele quer me seduzir
para só então transar comigo.

— Nojento, nunca transe com ele.

— Eu não vou — Respondi imediatamente.

Ficamos em silêncio por algum tempo, até Judith se


aproximar novamente e me abraçar. Eu queria sucumbir ao
choro, mas segurei.

Judith já tinha chorado por nós duas.

— Eu o mato caso ele te machuque. Nem que eu morra


depois, mas eu o mato.

Eu ri em seu cabelo.

Por algum motivo, não achava que Vicenzo queria me


machucar, não fisicamente. Mesmo que eu soubesse que
não estava a par de todo o contexto por trás desse
casamento, algo me dizia que me machucar não era o
intuito de Vicenzo.

Não literalmente.
Três dias. Apenas três dias e eu estaria casada, oficialmente
casada.

Deus, que loucura. Eu tinha procurado Melinda para


conversar com ela e resolver a nossa questão, mas ela não
estava respondendo os meus recados e telefonemas. Nem
minhas mensagens. Eu não fazia ideia do que havia
acontecido, principalmente por ela chegar ao ponto de me
ameaçar, mas era isso, Melinda estava me evitando. E eu
não iria atrás, talvez ela tivesse finalmente entendido que
eu tinha outros propósitos em minha vida.

Eu e Ashley estávamos indo para a minha futura casa e eu


estava fazendo de tudo para parecer uma noiva feliz. Ashley
me olhava um pouco aflita, quase como se quisesse me
dizer algo, mas estivesse incerta.

Todo o caminho até a nova casa estava sendo feito em um


silêncio constrangedor. Assim que chegamos na entrada,
Ashley estremeceu e resmungou algo que eu não entendi.

— Aconteceu alguma coisa, Ash?

Ela negou, mas estava mais branca do que o costume.


Entramos na casa e ela olhou ao redor, mais assustada do
que deslumbrada, principalmente pela casa estar rodeada
de sentinelas. Será que em algum momento eu me sentiria
em casa aqui?

— Bom dia, meninas.

Olhei e dei de cara com dois rapazes. Um era alto, cabelo


escuro e olhos azuis, mas tinha muita semelhança com
Vicenzo. O outro era mais alto e mais... largo. Enquanto um
tinha uma aura de divertimento, o outro era mais sério,
mais perigoso. Cabelo e olhos escuros, embora os de
Vicenzo ainda fossem mais misteriosos.
— Vitto, seu cunhado. — Vitto tinha um grande sorriso
sincero nos lábios, e isso me deixou um pouco à vontade. —
Esse é Mário, o irmão do meio. Eu serei o cunhado favorito,
já adianto.

— Sou Melissa.

— Sabemos. Aliás, tenho que parabenizar meu irmão pelo


bom gosto. E você é muito mais linda pessoalmente, com
todo respeito.

Ashley estava muda, e eu acabei sorrindo junto com o Vitto,


aceitando sua mão. Era bom saber que nem todos ali eram
assustadores.

Mário me estendeu a mão, revirou os olhos com a


provocação do irmão, mas não disse uma única palavra.
Imaginei que um silêncio constrangedor viria em seguida,
mas Vitto passou os braços em meu ombro e de Ashley.

— Vou levar você para o seu novo quarto, onde suas coisas
foram levadas. E seja muito bem-vinda, Mel.

A acolhida de Vitto foi reconfortante, tanto que até mesmo


Ashley relaxou, principalmente quando percebeu que Mário
não nos seguiu.

— Obrigada, Vitto.

Ele sorriu e nos deixou em um... uau... um quarto que mais


parecia um pequeno apartamento a parte. Eu fechei a boca
diante da grandeza que se abriu a minha frente.

— Muito melhor.

Olhei para Ahsley.


— Melhor? — Ashley fechou os olhos. Depois o abriu e me
puxou para um espaço na cama, sentando-se ao meu lado.

— Seu irmão vai me matar, mas você deve saber. Isso se


não já sabe, porque se vai se casar com Vicenzo, deve saber
quem ele é.

Gelei o corpo inteiro.

— Me conte.

Ashley apertou minha mão.

— Ele não é bom, Mel. Se lembra de Steven?

Nojo e repulsa me tomou quando escutei o nome do algoz


de minha irmã. O homem que a sequestrou por duas vezes,
e quase tirou a sua vida. Um homem que a queria presa a
sua mercê. Que quase destruiu Milla.

— Daniel chamou Vicenzo, e ele o matou. Se lembra do tio


de Victoria, meu primo, que tentou me matar também?
Daniel voltou a chamá-lo. Vicenzo é a Máfia de Chicago, ele
domina o submundo. Os negócios dele com Daniel são
negócios sujos. Mais que trafico, crime organizado, Vicenzo
é um assassino. Eu sou grata por ele salvar a mim e a
Victoria, por ele salvar Milla também. Mas você merece
saber.

Eu me levantei com a mão sobre a boca. Que ele tinha


acesso a esse mundo do crime eu já fazia uma ideia. Até
cogitei assassinato, mas agora, ser um chefe do crime? Ao
mesmo tempo... ele salvou minha irmã, salvou Ashley
também que não era diferente de uma irmã para mim. Olhei
para Ashley.
— E me diga, qual a diferença de Daniel para Vicenzo? —
Não sei de onde veio essa necessidade de defender Vicenzo.
Mas algo me induziu, talvez, fosse por ser o que uma noiva
apaixonada faria, mas também, eu tinha total ciência de
que não havia muitas diferenças. Amava meu irmão, mas
ele não era melhor que Vicenzo, ele também se beneficiava
do negócio sujo.

— Mel...

— Eu agradeço a informação, Ash. Mas isso não muda nada


— Ela fechou os olhos e assentiu — Agora, vamos começar?
— Eu disse em falsa alegria. Porque não mudava mesmo.

Não era como se eu tivesse alguma escolha.

Vicenzo Capello

A chuva gelada batia contra o vidro do meu escritório. A


noite deixava uma aura de melancolia sobre os fatos e
sobretudo. Eu me casaria no dia seguinte com a mulher que
tinha roubado cada pensamento meu no último ano, cada
segundo do meu dia, mesmo em meio ao trabalho. Minha
obsessão. E ela nem sonhava com o meu tormento.

Eu não estava me permitindo pensar muito sobre as


decisões que eu estava tomando. Não eu não pensaria
sobre, pois sabia que chegar ao extremo de me casar, era
uma loucura, até mesmo para mim. Mas era a única forma
que eu tinha encontrado, de acabar com a minha ânsia por
Melissa. Ela seria minha, totalmente minha, e de quebra, eu
a protegeria daqueles que queriam prejudicá-la.

Melissa estava me surpreendendo com sua resiliência. Mais


cedo, no jantar, com sua família, ela quase convenceu até
mesmo a mim de que estava feliz com esse casamento.
Contudo, eu sabia bem quando ela dava um sorriso sincero.
Seus olhos brilhavam e ficavam enrugados nos cantos.

Era o sorriso que ela dava a Victoria. E para minha surpresa,


foi o sorriso que ela deu para Vitto, meu irmão. Em dado
momento, chegaram a fazer algumas brincadeiras como
velhos conhecidos.

— Eu tenho que reconhecer, Vi. Nossa cunhada é gata.

Meu olhar foi único aviso para Mário, que se sentava na


cadeira de frente a minha mesa, acompanhado por Vitto,
que pegava um pouco de uísque na mesa lateral.

— Mais que gata, o que todo o mundo, literalmente, pode


constatar, Melissa parece ser uma ótima pessoa. — Vitto
acrescentou — Vai ser bom ter uma presença feminina na
casa. Você fez uma excelente escolha, irmão.

— Quem não concorda é o conselho. Ainda acham que você


deveria...

— A Darkness deixou de dar explicações sobre a vida


pessoal dos seus membros a uma geração.

Mário revirou os olhos.

— Eu pouco me importo com quem você se casa, mas deve


reconhecer que isso deixa tudo instável. Você é um filho da
puta fechado pra caralho, e eu nunca me importei, mas às
vezes me pego questionando, de que porra esse
relacionamento saiu?

Vitto me olhou tendo o mesmo questionamento nos olhos.


Eu, o Chefe de uma organização criminosa, estava me
sentindo encurralado por dois fedelhos.

— Não tenho que dar satisfação de nada para vocês.

Ambos se entreolharam e sabiamente permaneceram em


silêncio.

Eu não daria nenhuma explicação, primeiro porque não


tinha, segundo porque eu não queria. Melissa conseguia ser
melhor que eu nesse sentido, o de dar explicações contando
alguma história que até mesmo eu quase acreditava.

— De qualquer forma, estou feliz por vocês. — Vitto se


aproximou, e apertou meu ombro.

Antes que ele saísse, eu me vi falando:

— Vitto! Quero que passe mais finais de semana com a


família.

Ele franziu o cenho.

— Por quê?

— Porque eu estou mandando, Vitto.

Ele revirou os olhos e saiu. Mário manteve o cenho franzido,


mas eu o ignorei. Vitto daria um jeito de passar mais tempo
com a nossa família, eu não renunciaria a isso, por um
motivo muito simples: Vitto fazia Melissa sorrir de verdade.
— Confesso que é uma surpresa e tanto esse casamento
repentino.

Olhei para o Don da Cosa Nostra em Nova Iorque, Eduardo


Santorelli, que muito certamente estaria esperando uma
proposta minha para sua irmã, ou mesmo para um de meus
irmãos. A Cosa Nostra ainda

carregava muita tradição antiga, tradições essas que meu


pai, e eu após ele, extinguimos da Darkness, mesmo ela
sendo italiana também.

— Acredite, foi inesperado para nós também.

Eduardo era um filho da puta desconfiado. Mas eu não


abriria nenhuma brecha para que ele dissesse qualquer
coisa sobre o assunto, tínhamos negócios juntos, mas nunca
nos metemos na vida pessoal dos membros.

— Ela é confiável?

— Ela é o que precisa ser.

— Eu não tenho nada com o teu negócio, Capello. A mim


pouco importa onde você enfia o seu pau, mas temos muito
a perder, todos nós, quando você coloca uma estranha no
nosso meio.

— Meça suas palavras — Respondi friamente — Está na


minha casa, no meu território e em minutos assistirá ao
meu casamento. Melissa Turner será uma Capello.

Eduardo comprimiu o queixo.

— Alguns dos seus homens não está satisfeito com esse


desfecho.
— Meu negócio, minha preocupação.

Eduardo respirou, e virou-se para a janela de meu escritório,


também conhecido como meu refúgio.

Ele e os outros membros da Aliança estavam em Chicago, e


sempre era uma explosão de duelo de ego. Eduardo não,
tinha qualquer domínio fora de seu território, e mesmo que
eu entendesse que ele esperaria estreitar os laços com a
Darkness, por esse ser o seu costume, eu ainda era o rei da
porra de Chicago. E ele deveria saber o lugar dele.

— Só estou preocupado. O FBI continua na minha cola,


esperando qualquer deslize. E você sabe que se qualquer
um de nós cair, será efeito dominó.

— Ainda acho pouco provável que aquele fedelho do


Anthony Howard consiga algo contra você ou qualquer um
de nós.

Anthony Howard era o garoto prodígio do FBI, que tinha


sede de vingança, contra Eduardo. Segundo ele, Eduardo
seria o responsável pela morte de seu pai, e ele jurou
vingança contra o crime organizado. Estava dando algumas
dores de cabeça para a Aliança, mas nada que nos
preocupasse tanto.

— Ele acha que tem uma motivação.

— Estamos de olho nele.

Eduardo voltou e me encarou.

— Espero que saiba o que está fazendo. Parabéns.

O casamento aconteceu na tarde de sábado na St Peter’s


Church, banhado por um clima ameno e triste, como era a
promessa estampada no olhar azul de céu da minha agora
esposa. Mesmo que no fundo, de seus olhos azuis-celestes
eu soubesse seus verdadeiros sentimentos, Melissa sorriu e
foi amável todo o tempo, mesmo que não estivesse ali por
sua vontade.

Ela chorou quando abraçou Milla e sua mãe. Ela chorou mais
ainda ao abraçar Victoria, que levou as alianças. Ela sorriu
como uma verdadeira noiva faria, eu não conseguiria
imaginar nada mais real, ela conseguia ser perfeita, mesmo
que a situação não estivesse a seu favor. A amiga ruiva não
disfarçou sua reprovação ao nosso casamento, e eu quase
achei divertido. No fim, eu deveria agradecê-la, pois se não
fosse a curiosidade aguçada e tola dela, eu não teria
Melissa para mim.

A festa aconteceu no Queen Palace e foi uma recepção


cheia de pompa. Com repórteres ao lado de fora,
descrevendo como o evento do

ano em Chicago. Como muitas pessoas importantes tanto


de Chicago, quanto do país estavam participando do
evento, acabou chamando mais a atenção do que o
esperado. A vigilância estava ferrenha e era a junção do
mundo pop de Melissa, e o dos negócios e cenário político
do meu mundo.

— Assustador.

Foi a primeira palavra que Melissa disse diretamente a mim,


sendo minha esposa. As palavras trouxeram meu olhar para
seu rosto lindo. As faces ruborizadas, os olhos iluminados
pelas luzes, um pouco abertos demais. Instintivamente
minha mão foi para a dela, que a apertou como se sua vida
dependesse disso.

— É a nossa mescla, Melissa. Agora, somos um só.

Ela baixou os olhos e tentou soltar a mão da minha, porém


não permiti. A segurei ali, até que os olhos dela
encontrassem os meus. Eu vi todos os sentimentos ali.
Desde incerteza, medo, mágoa, e talvez, só talvez, um
pouco de curiosidade sobre minhas motivações.

Melissa era boa, jogava o jogo. Sorria, encantava, contudo,


não entregava tudo. A festa prometia abaixo de nós, mas
seus olhos estavam presos nos meus.

Negros mortos, com azuis vividos. Era a nossa mescla.

Melissa Capello
“Sra. Capello.”

A aliança brilhando em meu dedo não deixava margens


para dúvidas. Era isso, agora eu estava casada com o
homem do qual, eu não sabia quase nada, e o que eu sabia,
era simplesmente aterrorizante.

Olhei a porta fechada atrás de mim e comecei a sentir meu


corpo tremer. Estávamos em um hotel, talvez o mais
luxuoso de Chicago, com uma sala grande, e dois quartos
conjugados, e para minha total surpresa e alívio, eram dois
quartos... “Um que Vicenzo simplesmente entrou e não saiu
mais.”

E eu?... Eu estava parada na porta, por uns bons dez


minutos, desde que chegamos neste hotel. Um tremor
passou por meu corpo quando comecei a pensar sobre
como seria o meu futuro. Vicenzo poderia até mesmo
exercer algum tipo de poder sobre mim, mas eu lutaria por
uma parcela de liberdade com todas as minhas forças.
Nunca fui uma pessoa ansiosa, mas agora, nesse momento,
estava à beira de uma crise de ansiedade, por não ter ideia
do que esperar desse casamento.

O tremor passou a ficar mais potente, e com muito esforço,


me sentei no pequeno sofá. Uma sensação de falta de ar
começou a me tomar, e eu me senti fraca. Minha boca
secou e eu só queria conseguir respirar sem que fosse um
verdadeiro sacrifício. Coloquei meu rosto entre minhas
pernas e tentei contar minhas respirações, até sentir uma
mão quente e suave em meu pescoço, embora não
conseguisse fazer nada a respeito.

— Conte as respirações comigo, Melissa.

A voz serena de Vicenzo compenetrou em meu interior e eu


me vi seguindo suas instruções, até sentir meu coração
desacelerar. Quando meu interior se acalmou um pouco,
lentamente, levantei a cabeça, ainda tenho a vista
embaçada. Lágrimas teimosas desceram por meu rosto e eu
me odiei por sentir fraca diante de tudo. Principalmente,
fraca diante dele.

— Tome um pouco de água.

Meus lábios estavam trêmulos e eu não consegui pegar.


Apenas fixei meus olhos nos olhos de Vicenzo, articulando
as palavras de forma puramente emocional.

— O que você quer de mim? — Perguntei, e um soluço


escapou, com mais lágrimas.

Vicenzo, que estava inclinado em minha direção, se


endireitou, e só então eu me dei conta de que ele só usava
uma calça. Tinha o peito desnudo, e tomava toda a minha
visão, à medida que ela ia ficando clara. Minha boca voltou
a ficar seca, mas agora, por um motivo diferente: O homem
em minha frente era lindo. Não que eu já não soubesse
desse fato, só não me permitia pensar muito sobre.
Contudo, quando eu tinha um peito másculo, cheio de
tatuagens e cicatrizes, por baixo do terno caro que ele
usava, diante de mim, era meio difícil não ter pensamentos
sobre o fato.

Me afastei em um impulso, encostando minhas costas no


sofá inteiramente e fechando os olhos com força. EU não
iria por esse caminho.

— Me responda. — Falei novamente com mais firmeza.

O silêncio foi minha resposta nos primeiros cinco segundos,


o que me obrigou a abrir os olhos e lidar com Vicenzo diante
de mim, sentado na mesinha de centro. Embora, para meu
total alívio, estávamos distantes.
— Eu não quero nada que já não tenha.

Suas palavras me irritaram ainda mais. Eu me levantei de


uma vez e senti uma tontura, mas antes que pudesse fazer
qualquer coisa, Vicenzo me sentou em seu colo. Meu
primeiro impulso foi colocar ambas as mãos em seu peito e
me afastar, mas só fiquei ali. Paralisada, em seu colo, com
as mãos em seu peito até meus olhos encontrar os seus.

— Você não me tem. Não de verdade. — Sussurrei e me


surpreendi com a firmeza das minhas palavras, pois eu
mesmo não

sentia aquela firmeza. Os olhos de Vicenzo, dizia que ele


não comprava minhas palavras, mas suas palavras, elas
foram quase paternais quando disse.

— Vá para o seu quarto, tome um banho e descanse. Caso


precise de alguma coisa, não hesite em me chamar.

Ele então se levantou de uma vez, me elevando em seus


braços.

Então me sentou no sofá, me deixando perplexa pelo


movimento poderoso e viril, deu um beijo em minha testa
como fez em nosso casamento, e foi para o seu quarto.

Eu estava um pouco transtornada com tudo. Se não era


sexo, qual outra motivação Vicenzo teria para tomar uma
atitude tão drástica ao se casar comigo? Ele estava
tentando me seduzir aos poucos? O mais importante, eu
seria capaz de resistir? Eu seria. Sacudi a cabeça e fui para
o meu quarto, seguir as recomendações do meu então
marido.

Nisso, ele estava certo.

Eu precisava descansar.

A casa da família Capello gotejava poder e dinheiro.


Dinheiro antigo. Dinheiro sujo. Para ser bem sincera, eu me
sentia aprisionada, tendo tantos guardas e sentinelas
espalhados por todos os lados. Pelo menos eu tinha um
quarto, uma ala da casa que pertencia somente a mim.
Claro, e a Vicenzo em algum lugar da ala, que eu não estava
nem um pouco interessada em descobrir qual era.

Tentei olhar ao redor e começar a me sentir em casa,


mesmo que tudo fosse estranho demais. Me sentei na cama
gigante e abri meus arquivos de trabalho. Isso com certeza
me ajudaria a distrair sobre o quanto minha vida havia
mudado. Meu celular tinha chamadas de Milla e minha mãe,
ligações que eu retornaria mais tarde, não poderia parecer

uma noiva entediada com o casamento. Deveria dar a


impressão de que estava aproveitando muito. Nesse
momento, uma batida na porta que me fez pular em minha
cama. Respirei fundo uma vez e pedi que quem quer que
fosse, entrasse.

Quando Vicenzo entrou no quarto que agora me pertencia,


vestindo uma calça de flanela preta e uma camisa do
mesmo tecido, o cabelo preto molhado parecendo um ser
humano normal, meu coração deu um salto. Eu não deveria
sentir nenhum tipo de sentimento em relação ao meu
marido que não fosse repulsa. Essa estranha atração, ela
tinha que ir embora.

— Bom dia, Melissa.

Tão formal... Quando senti ser seguro falar, respondi:

— Bom dia.

Me levantei, usando um pijama extremamente composto, e


ainda assim, passei os braços em meu corpo. Uma
saudação indiferente da parte de Vicenzo foi minha única
resposta comportamental. Vicenzo era uma incógnita, eu
nunca sabia o que esperar, e ainda assim, mesmo após
tudo, eu não conseguia sentir medo.

— Como você pode ver, essa é a nossa ala. Meu quarto está
no final do corredor, caso precise de algo. Sempre que
precisar sair, Lexa te fará companhia.

— Como é? — Interrompi em um rompante — E ela vai me


acompanhar por qual motivo? Sou uma prisioneira?

Vicenzo respirou como se estivesse falando com uma


criança.

— Todos os membros da família Capello precisam de


segurança.

Agora, você é Melissa Capello, sua segurança é minha


responsabilidade.

Franzi o cenho fazendo a pergunta que eu não sabia de


verdade se queria a resposta.
— E por que tudo isso? Devido ao negócio de vocês?

Vicenzo levantou uma das sobrancelhas e deu um meio


sorriso.

— Está pronta para essas respostas, Mel? — Eu dei um


passo para trás e ele sorriu abertamente, mostrando que
quando sorria, ele sabia sorrir lindamente — Como eu
esperava, você não está. Contudo, agora você terá que
viver sob minhas regras. Você não é prisioneira de Lexa, ela
trabalha para você.

Respirei fundo.

Tudo bem, tudo bem, eu poderia lidar com isso, autoafirmei.


Eu tinha que conseguir lidar com isso. Na próxima semana
que teria que passar três dias em Nova Iorque, e quando
passei minha programação para Vicenzo, ele não disse
nada. Então eu deveria acreditar que não seria uma
prisioneira. O que, além de aliviada, me deixava mais
intrigada.

— Acho que você já tem uma ideia das pessoas que


trabalham para mim, dos empregados, mas qualquer dúvida
você pode me procurar. Ou Lexa. — Ele então sorriu um
pouco — Seja bem-vinda, Melissa.

Tão, tão formal. Tão normal, como se ele não tivesse me


obrigado a estar ali. Como se eu estivesse ali por escolha. A
situação era enlouquecedora se eu parasse para pensar
com clareza. O que ele queria de mim? O que era tudo isso?
Ele começou a se afastar em direção a porta com o meu
silêncio, quando me vi dizendo.

— Um dia você vai me dizer o motivo de tudo isso? — Minha


voz saiu mais magoada do que eu gostaria — Porque nem
em um milhão de vidas eu acredito ser só devido à loucura
de Judith.

Vicenzo olhou enigmaticamente antes de dizer.

— Você tem alguma teoria?

Eu apertei os olhos e comprimi os lábios antes de dar voz


aos meus pensamentos.

— Eu acho que isso está além de Judith. Algo me diz que


tem muito mais relação comigo e que, de alguma forma, em
algum momento eu estaria aqui — dei um passo para frente
— É pessoal... E é sobre mim.

Nossos olhos se trancaram em um momento. Era quase


uma troca de energia toda a emoção que nos tomava,
mesmo que não nos tocássemos. Ele deu um passo para
frente, tomou uma mecha do meu cabelo solto, e o colocou
atrás da minha orelha, quase como a promessa de um
toque. Seu olhar era puro fascínio, o que me deixava ainda
mais confusa.

— Tenha um bom dia, Mel.

Sua voz suave e forte ao mesmo tempo, fez os meus poros


se arrepiarem. Ele se afastou, lentamente, se virou e fechou
a porta. E

então eu me dei conta de um fato, um fato que me passou


batido diante de tudo o que tinha acontecido. Vicenzo sabia
exatamente quem eu era.

Sabia onde apertar os meus botões para me fazer ceder a


esse casamento e eu... eu não fazia ideia de quem era o
homem que havia me casado.
Era hora de fazer o dever de casa.

Melissa Capello

Eu tinha que admitir, minha vida não era uma prisão.


Mesmo a contragosto, eu quase, quase estava gostando
dela. Lexa era ótima, e mesmo que a nossa situação não
fosse a mais habitual, ela era a minha companhia mais
constante, e tínhamos desenvolvido uma espécie de
amizade. Todos os dias, nas três semanas que se passaram
desde o casamento, Judith me ligava procurando sinais de
que eu era uma esposa violentada de alguma forma.

E a verdade era que... não. Vicenzo em momento algum,


nas semanas que se passaram, foi menos ou mais que
cordial e educado. Eu já estava começando a desconfiar de
que era um mero ornamento em sua vida perfeitamente
imperfeita. Fomos em alguns eventos, onde passávamos
algum tempo juntos, éramos o casal do momento de
Chicago, mas no final ele se despedia educadamente e se
retirava para seu quarto. Eu não sabia por que, mas me
sentia frustrada.

Eu e Milena estávamos nos debruçando nas fotos que eu


tinha feito da coleção. A divulgação começaria na próxima
semana e estávamos em êxtase. Nas redes sociais, tudo
estava tomando uma proporção gigante, fazendo com que
acreditássemos que tudo seria um sucesso. Milena parecia
confiável, mesmo que eu achasse conveniente demais que
o marido dela fosse tão próximo de Vicenzo. Tão próximo,
que dessa vez, Vicenzo tinha alguma reunião em Nova
Iorque e nos acompanhou.

Eu, desconfiada, cheguei a pensar que ele estava


começando a mudar o comportamento, que iria começar a
me aprisionar, mas não, ele realmente saia cedo para suas
reuniões e eu quase não o via.

Me deparei com Milena me encarando.

— Tenho que admitir, Melissa. Fiquei muito surpresa com o


casamento de Vicenzo. Ele sempre foi... misterioso e
fechado em relação à vida pessoal e... bem... nos
surpreendeu.

— Vocês não conheceram nenhuma namorada dele?

— De Vicenzo? Nunca! — Milena disse, e riu como se a ideia


fosse um absurdo. Então parou e me olhou — Você deve
conhecer o homem

que se casou e, consequentemente, o mundo que agora faz


parte.

Vicenzo quebrou todos os protocolos se casando com


alguém de fora do nosso mundo.

Milena estava me dando informações que eu não tinha.


Talvez ela achasse que eu sabia de tudo e por algum
motivo, movida por orgulho, eu não queria transparecer que
não, eu não sabia que “mundo” era esse, apesar de fazer
uma vaga ideia. Então eu sorri, apenas sorri.
— Oh, mas por favor, não me leve a mal, não estou
desmerecendo você, é ótima, e entendo perfeitamente toda
a paixão de Vicenzo por você.

É incrível Melissa.

Toda a paixão de Vicenzo. Toda a paixão. Cada dia que se


passava eu menos entendia as motivações de Vicenzo,
contudo, paixão não era uma explicação que eu
considerava. Não tinha como ser. A conversa fluiu por outro
caminho, o profissional e sucesso iminente da nossa
campanha, até que já havia escurecido. Me despedi de
Milena e encontrei Lexa me aguardando no carro ao lado de
fora da Castelle’s.

Antes que entrasse no carro, fui abordada por um homem.


Ele era jovem e bonito e de cara, quando Lexa se pôs em
minha frente, ele mostrou um distintivo.

FBI.

— Melissa Capello?

O nome ainda me soava estranho, e depois de um segundo


eu confirmei, levemente alarmada. Que diabos o FBI queria
comigo?

— Meu nome é Anthony Howard e gostaria de ter uma


conversa com a senhora. Prometo que será rápido e
informal.

Eu estava confusa e um pouco assustada. O homem em


minha frente era moreno e tinha os olhos claros. Era bonito,
mas parecia muito jovem para ser um agente do FBI. Eu me
lembrei do que Vicenzo havia dito, sobre ter inimigos e por
um segundo, temi por ele.
— Estou sendo intimada? Tenho opção?

— Como eu disse, é uma conversa informal. Poderíamos


tomar um café no fim da rua.

Lexa estava me mandando olhares muito alarmados e então


eu percebi que o tal Anthony ficou ainda mais alerta. Eu
tinha que ser inteligente. Não deveria demonstrar qualquer
fraqueza ou medo, ou então seja lá qual fosse o motivo
desse convite, poderia prejudicar Vicenzo de alguma forma.
Era horrível estar no escuro, mas nesse momento, tentei
usar a ignorância a meu favor. No fim das contas, eu não
sabia de nada, realmente.

— Não posso demorar.

— Senhora...

— Eu sei o que estou fazendo, Lexa — disse com firmeza.


Me lembrei de que não era prisioneira, agora eu saberia de
verdade se era uma afirmação verdadeira.

Para minha surpresa, Lexa me acompanhou até o carro sem


tentar me impedir. Estacionamos perto de um café, e ela,
apesar da cara de reprovação, não disse uma única palavra.
Entramos no café, e ela se sentou em uma mesa próxima,
enquanto Anthony puxava uma cadeira em minha frente.

— Muito obrigada pelo seu tempo, senhora. Capello.

— Confesso que o que mais me motivou foi a curiosidade,


senhor Howard, estou eu aqui pensando o que o FBI teria
para falar comigo.

Howard não se intimidou com o meu sarcasmo. Ele


semicerrou os olhos, e então sorriu enigmaticamente, puxou
um envelope e começou a tirar algumas fotos. Colocando-as
em minha frente.

Eu conhecia, mesmo de vista, a maioria daqueles homens.


Inclusive, muitos deles estavam em meu casamento a
algumas semanas. No centro, a foto de Vicenzo, também, a
foto de Giovanni, o marido de Milena.

— Eu acredito que conheça essas pessoas.

— Inclusive sou casada com um deles.

Respondi e beberiquei o meu café, contudo, meu coração


começou a pular em meu peito. Com desespero. Algo me
dizia que as próximas palavras do homem a minha frente
seriam divisoras de águas.

— Será que você está a par do tipo de trabalho que essas


pessoas fazem? Me disseram que você, Melissa Turner, é
uma boa pessoa.

Interior, boa família, bem-criada, cresceu em seu mundo


com dignidade.

Deve ser fácil se deslumbrar com o tipo de vida que essa


gente pode dar, mas algo me diz que você não conhece de
verdade o homem com quem se casou.

Minha face era serena, mas meu coração, esse, parecia ter
vida própria. Anos em passarelas me fez saber disfarçar
bem os meus incômodos. Eu mantive o olhar no homem a
minha frente.

— São bandidos, assassinos. Esses cinco aqui,


principalmente, comandam um negócio internacional de
tráfico de armas, drogas e pessoas. O dinheiro que você
usufrui está sujo do sangue de pessoas inocentes.
— Se isso tudo é verdade — eu respondi, quando consegui
sair de meu transe — Por que essas pessoas não estão na
cadeia?

Howard sorriu tristemente. E eu pensei em Daniel, de todas


as pessoas, que com certeza estava envolvido em todo esse
esquema.

Pensei em Milena e seus filhos. Um conflito me abateu, mas


não era hora de demonstrar. Eu teria que descobrir,
principalmente se o lance do tráfico de pessoas era
verdade. Se fosse, seria demais para mim como ser humano
compactuar com isso. Drogas, armas, era uma merda, uma
grande merda, mas eu poderia lidar. Vidas? Mulheres,
crianças? Eu preferia pagar para ver.

— Não parece ter uma resposta. O que eu penso, senhor


Howard, é que você me parece desesperado. Tão
desesperado que resolveu conversar com a esposa de um
‘bandido” para ver se consegue algo, porque, na verdade,
você não tem nada. — Eu me levantei — Boa sorte com a
sua perseguição e só me procure novamente se tiver uma
intimação.

Lexa não conseguiu disfarçar o sorriso quando me levantei e


ela me seguiu. Todo o caminho até a porta eu tremi da
cabeça aos pés, e pedi para todos os seres divinos que não
fosse possível perceber. Eu estava nervosa, muito nervosa,
minha cabeça era um espiral de pensamentos.

Quem era Vicenzo, quem eram aquelas pessoas? Quem era


Daniel? E se tudo fosse verdade, quem era eu mesma nessa
história toda?

Antes que eu saísse, Vicenzo, Mário e Carl entraram pela


porta da cafeteria como se fossem os donos de tudo.
Vicenzo, como sempre, estava de preto e seu olhar era
assustador em algum ponto atrás de mim.

Eu me virei e o vi passar por mim como se não me visse. Ele


foi direto a Howard, que sorria abertamente. De onde eu
estava, congelada e inerte, não conseguia escutar o que
diziam. O que eu sabia era que Vicenzo dizia algo que fez o
sorriso de Howard se transformar em uma máscara de raiva.
Máscara que logo, ele substituiu pelo sorriso sarcástico. Ele
não disse uma palavra. Só Vicenzo falava.

Quando Vicenzo se virou, Howard demonstrou sua


frustração passando a mão em seu cabelo. Seus olhos
seguraram os meus e vi uma espécie de aviso, era quase
como se ele, no fundo, se preocupasse comigo de alguma
forma, como se eu não fizesse ideia do que estava
acontecendo de verdade. Vicenzo parou em minha frente,
segurou meu braço com suavidade e me levou para um dos
carros.

Confusão me tomava, principalmente porque Vicenzo não


demonstrava nada. De repente, além da confusão, eu
passei a sentir medo. pois, de alguma forma,
independentemente de qualquer coisa, eu tinha conversado
com um agente do FBI. Era grave? Me preocupei.

Olhei para Vicenzo, mas ele não devolveu o meu olhar ao


meu lado.

Chegamos e subimos para a sua cobertura em silêncio.


Sentia medo, mas também sentia raiva e tinha perguntas.
Perguntas das quais eu não poderia mais fugir. Contra a
minha vontade ou não, eu estava nisso, tinha visto a prova
hoje. Vicenzo se sentou em sua poltrona com um copo de
uísque nas mãos. Eu não me sentei, me sentiria ainda mais
vulnerável sentada. O silêncio dele me olhando me fez dizer
o que tinha para dizer em um surto.

— Você trafica pessoas? Crianças, mulheres, você faz esse


tipo de monstruosidade? — Lágrimas teimosas começaram
a rolar por meus

olhos. Desde que tudo me sobreveio, eu ainda não tinha me


permitido chorar, mas hoje, tudo, absolutamente tudo
estava demais — Daniel... —

Minha voz falhou — Meu irmão faz esse tipo de trabalho?

Se a resposta da minha primeira pergunta fosse sim, o


restante também era. Minhas mãos foram para meu cabelo
e eu tentei controlar a onda de choro.

Porque eu queria gritar. O que eu tinha feito da minha vida?

Se fosse verdade, eu daria um jeito de sumir no mundo. Não


compactuaria com isso, nunca. Eu já tinha passado por uma
violência, não faria parte desse circo de horrores. Vicenzo,
que sempre, principalmente desde o casamento, tinha sido
apenas indiferente a meu respeito, tinha uma expressão de
incômodo diante das minhas lágrimas.

— Me respondo porque diabos você me trouxe para essa


vida! O

que foi que eu te fiz, porque todo esse ódio, por que tudo
isso por uma pessoa que você nem conhece?

Explodi em lágrimas e cedi. Uma onda de choro me tomou e


minhas pernas foram ao encontro do chão. Com ambas as
mãos no rosto, eu me entreguei ao choro que eu segurava
desde que entrei na casa de Vicenzo para interceder por
Judith.
Não sei por quanto tempo fiquei ali, já pouco me importava
a dignidade. Eu me permiti sentir.

Uma mão embaixo da minha perna e outra em minhas


costas me levantou do chão e eu não tive forças para lutar.
Era odioso, mas o peito de Vicenzo era quente, e o seu
cheiro... era acolhedor. Eu tentei buscar dentro da minha
mente que esse homem era perigoso e estava me
manipulando, mas não tive forças. Ele hesitou um segundo
e me colocou no sofá, tirando o meu cabelo do rosto,
colocando as mechas atrás da minha orelha, e me
encarando com seus olhos. Uma espécie de aflição estava
ali.

— Eu tinha uma irmã. Bianca, o nome dela. — Eu dei toda a


minha atenção a ele — Ela foi tomada da nossa família aos
doze anos. Eu estava na faculdade, onde conheci o seu
irmão. Ela foi sequestrada por inimigos e sofreu todos os
tipos de violência antes de morrer — a voz de Vicenzo

tremeu, e pela primeira vez, vi alguma emoção no homem


que agora era meu marido.

— Eu sinto muito, Vicenzo.

— Nem todos os meus negócios são limpos, mas algo eu


posso te garantir, Melissa: Não machuco crianças e
mulheres. Sou o chefe de uma organização criminosa, e
agora você faz parte disso, mesmo que não queira. Por isso
os seguranças, por isso o cuidado. Eu nunca me perdoaria
se algo te acontecesse.

A pergunta apenas escapou de meus lábios:

— Por quê? Por que se importa?


Vicenzo sorriu. Um sorriso que não chegou nos olhos, um
sorriso triste, e nada falou. Ele se levantou, voltando a vestir
sua máscara indiferente.

— Se você falasse comigo, talvez eu estivesse mais


preparada para lidar com essas situações, como, por
exemplo, ser abordada pelo FBI —

me levantei — por um segundo, eu considerei dizer ao


agente que eu fui obrigada a estar aqui, que fui coagida e
ameaçada, mas eu pensei em meu irmão. Eu escolhi não
saber de muita coisa, mas tudo está demais.

Eu preciso saber no que estou envolvida, mesmo contra a


minha vontade.

— Segundo Lexa, você se saiu muito bem.

— Ah, claro — eu sorri. — Claro. Quem vai me abordar


agora?

Algum inimigo seu?

Vicenzo se voltou para mim, colocando ambas as mãos em


meu rosto. Por um segundo, achei que ele me beijaria e, por
um segundo, achei que nada faria se ele realmente me
beijasse. Seu hálito estava em meu rosto.

— Eu nunca vou deixar nada acontecer com você! — A


forma que ele disse as palavras fez um arrepio subir por
meu corpo. Era quase como se ele se importasse demais.

— Um dia você vai me dizer por que me trouxe para sua


vida? —

Falei na mesma voracidade.


Olhos trancados, respirações simultâneas. Meu coração
galopava no peito em um misto de sentimentos, que ali,
naquele momento, eu jamais saberia definir. As mãos de
Vicenzo eram quentes, mas me davam calafrios. Eu
coloquei as minhas em cima da dele na intenção de afastá-
lo, mas a intensidade dos olhares cravados me travou.

Ficamos ali, minha pergunta solta no ar. Uma lágrima


decorrente da confusão que me tomava rolou por meu rosto
e lentamente, Vicenzo a limpou. Uma carícia suave que me
fez fechar os olhos. O pensamento, que era para ser
somente um pensamento, saiu dos meus lábios, quase
como um lamento.

— O que você está fazendo com a minha cabeça?...

Quando abri os olhos, Vicenzo estava ainda mais próximo.


Nossos corpos quase se tocando, seu corpo quente,
aquecendo o frio de desespero que me envolvia. Seria tão
fácil me perder ali, no momento. No conforto que ele
prometia, mesmo sem palavras. Mas não, eu não poderia.

Nunca poderia. Com todo o esforço dentro de mim, eu me


afastei, retirando a sua mão do meu rosto. Vicenzo fechou
os olhos com força, sua própria forma de lamentar o
afastamento. Um, dois segundos, e ele os abriu, voltando a
ser o Vicenzo indiferente e sem emoções que sempre
demonstrou.

— Você está segura, Melissa. Howard não se aproximará


mais de você.

E com essas palavras, ele foi para o quarto que era dele, me
deixando um amontoado de confusão. Deus, o que havia
acontecido com a minha vida no último mês? Eu era uma
esposa do crime. Uma mafiosa, mesmo que por
consequência. Trabalhava com uma mulher em um negócio
limpo, contudo, o dinheiro também tinha vindo do crime.
Um agente tinha me interceptado.

Caos? Era o que minha vida havia se tornado.

Vicenzo Capello

— Ele está ficando mais audacioso. — Eduardo disse com


um soco na mesa.

Anthony Howard tinha passado de todos os limites ao


abordar Melissa. O sentimento que me tomou foi de pura
possessão, quando Lexa me mandou mensagem dizendo o
que ele tinha feito. Tamanho foi a minha surpresa também
diante da postura de Melissa. Independente das suas
motivações, ela se saiu brilhante, e não se intimidou, o que
só me fez admirá-la mais.

— Por todos os santos, eu espero que sua esposa seja


confiável...

— Chega! Vicenzo já disse que Melissa se saiu muito bem


com o agente, ela é confiável! — Talía saiu em minha
defesa. EU a olhei com gratidão.

— Devemos ficar de olho nele. Todo esse silêncio até agora,


ele só está esperando uma brecha para atacar.
— Não fui eu quem matou o pai de Howard, mas com toda a
certeza, estou com muita vontade de pôr um fim em sua
vida — Eduardo voltou a dizer. Era muito difícil ver Eduardo,
o grande Don da Cosa Nostra, desestabilizado.

— Não é o momento, Eduardo. Howard fez acusações


gravíssimas contra você publicamente. Vicenzo ontem já
quase perdeu a cabeça por conta da abordagem dele a
Melissa. O melhor agora é nos preservar. —

Talía voltou a ponderar.

— Ele é só um moleque! Um merdinha de nada, a sujeira do


meu sapato! — Eduardo voltou a dizer.

Eu tinha que reconhecer, estava com muita raiva pela


audácia de Anthony se aproximar de Melissa, mas a raiva de
Eduardo era visceral.

Era ódio puro. Por um lado, era compreensível, o garoto


vinha dando muita dor de cabeça a Eduardo. Eu me levantei
finalmente, já cansado das discussões que nunca saiam do
mesmo lugar.

— Se Howard voltar a se aproximar de Melissa, eu mesmo


resolverei o problema, e ele está ciente disso. Ele sabe que
foi longe demais, e provavelmente sumirá por um tempo.
Mas se algo me diz dessa atitude, é que ele não desistiu e
em algum momento tentara novamente. Então, fiquem
espertos.

Sem me despedir, saí da sala do D’Itália, um dos


restaurantes de Eduardo, e fui em direção ao apartamento.
Esperaria até o dia seguinte para voltar a Chicago, uma vez
que Melissa ainda tinha algo para resolver com Milena. No
meio do caminho, pedi para que Carl fosse até a Castelle’s,
a loja de Milena, por algum motivo que eu não saberia dizer.
Eu apenas queria ver Melissa.

Não precisei ser anunciado, nem tentaram me impedir.


Luzes e flashes em uma sala a parte me chamou a atenção,
e eu fui direto para lá.

Milena estava ao lado de Frank, e ambos conversavam algo


enquanto um fotógrafo estava próximo demais de Melissa,
fotografando seu lindo rosto.

E ela estava esplendida. Não que ela precisasse de verdade


de qualquer roupa de grife como o vestido vermelho de gala
que usava, ou mesmo de todos os apetrechos que a
adornava. Melissa brilhava por ela mesma. Seu sorriso doce,
até mesmo sua seriedade e aquele levantar de queixo,
como se desafiasse a câmera a capturar sua beleza com
fidelidade.

Era a mulher mais linda que eu já tinha posto os olhos.

Quando seus olhos encontraram os meus, ela os abriu


levemente e saiu da postura que estava. Não vi nervosismo,
nem a tristeza da noite anterior. Vi apenas surpresa e algo
mais.

— Que surpresa, Vicenzo! — Milena disse, mas nem eu e


nem Melissa dissemos uma palavra ou tiramos os olhos um
do outro. — Bom, acho que dá para darmos uma pausa né,
pessoal?

Com isso, apenas ouvi passos das pessoas saindo do


recinto. Eu esperava não parecer que eu e minha esposa
estivéssemos dando sinais de que tínhamos problemas.
Lentamente, Melissa se aproximou de mim.
— Me perseguindo agora? — Seu tom não foi nem mesmo
um pouco defensivo como eu acreditava que ela quisesse
soar. Era quase...

provocador.

— Você não tem ideia.

Era uma verdade. Ela abriu a boca levemente e inclinou a


cabeça para o lado. Então franziu os olhos de um jeito lindo
antes de dizer:

— Você é uma incógnita.

— E você é a mulher mais linda que vi em toda minha vida.

Minhas palavras a emudeceram. Eu vi suas defesas caírem


por um segundo, e dessa vez... dessa vez eu não deixaria
passar.

Eu me aproximei e a enlacei pela cintura. Não dei tempo


para que protestasse, apenas colei meus lábios nos dela.
Esperei um segundo, esperei sua repulsa, sua recusa,
ficando apenas com meus lábios nos dela. Senti sua mão
subindo por meu peito de forma incerta, quase tímida, e não
precisei de mais sinais.

Eu beijei o objeto de todos os meus desejos.

Minha língua alcançou a sua e começamos uma dança


erótica e prazerosa ali. E foi melhor do que eu imaginei em
todos os meus sonhos.

Sua boca era doce, seus lábios macios e tentadores.

Melissa puxou uma respiração, e eu aprofundei o beijo.


Apertei seu corpo esbelto junto ao meu, e ela me enlaçou
pelo pescoço. Uma ânsia cresceu e eu estava prestes a virar
um animal que finalmente tinha sua presa ao seu alcance.
Eu queria consumir a mulher em meus braços.

Nossas respirações ficaram suspensas, e eu me peguei na


realidade de que o desejo dela por mim estava sendo
desperto e eu deveria ter cautela.

Não deixar a minha ânsia de mais de um ano falar mais alto.


Então me afastei de súbito, ou a despiria ali mesmo no chão
e clamaria seu corpo como meu desejo primitivo queria.

Quando me afastei, Melissa colocou uma mão sob a boca e


fixou os olhos em meu peito, evitando meus olhos. Vi o
arrependimento a tomar, e não quis ficar para ouvir seu
lamento. Não deixaria que a crise de consciência dela
estragasse o momento pelo qual ansiei por tanto tempo.

Ela me acharia um filho da puta insensível, mas talvez um


dia, um dia ela entendesse.

— Isso não...

— Vou te esperar na recepção.


Seus olhos eram labaredas de fogo, um rico contraste com o
azul do céu com o qual eu estava me acostumando, mas eu
não fiquei tempo o suficiente para saber o que ela faria a
seguir. Eu apenas a deixei ali, mesmo convicto de que era o
correto no momento, com uma ponta de um sentimento que
talvez eu nunca tivesse sentido na vida... Remorso.

Melissa não falou comigo durante todo o trajeto até


Chicago.

Passamos na Jhonson&Turnner, pois eu precisava alinhar


algumas coisas com Daniel, e sua única palavra foi que
gostaria de me acompanhar para ver os irmãos. Eu poderia
entender o seu silêncio após deixá-la como deixei. Também
não poderia dizer que me arrependia.

— Não poderei demorar muito. Caso queira ficar mais tempo


ou mesmo ir para outro lugar, eu peço para Lexa vir e te
acompanhar.

Ela me olhou indiferente antes de descer do carro.

— Eu posso voltar de Uber.

Eu ri de forma sarcástica pelo absurdo da situação.

— Totalmente fora de cogitação.

Ela suspirou.

— Claro. Seus inimigos. Eu me esqueci completamente.

— Agora seus também, Melissa.

Ela me olhou com raiva.

— Não por minha vontade. Não por escolha.


Eu coloquei meus óculos como se estivesse ignorando uma
criança fazendo birra. Não me arrependia de ter arrastado
Melissa para meu mundo, e se a forma como correspondeu
meu beijo era um indicativo, logo eu a arrastaria para minha
cama também.

— Sempre há uma escolha.

Eu disse e sai do carro. Carl abriu a porta para Melissa, que


deu um agradecimento frio. Ela ainda não o havia perdoado
por ameaçar sua amiga e ela mesma, mas ainda assim,
mesmo de forma fria, era educada.

Entramos no escritório, e eu fui direto para a sala de Daniel,


vendo Melissa sumir para a sala da irmã. Daniel não fez
mais do que me dar uma olhada fria e voltar seus olhos
para algum papel que estava estudando.

— Olá, Daniel.

Ele me deu um aceno indiferente.

— Os dois homens da Darkness pegos na disputa de rua


com traficantes locais ontem à noite já foram liberados.
Nem chegaram a ser interrogados.

— Tem certeza? Alguma chance de um deles...

— Nenhuma chance, Vicenzo. — Ele me olhou com dureza


— Eu faço bem o meu trabalho.

— Okay.

Eu me levantei pronto para sair, quando Daniel me parou.

— Só uma pergunta.
Eu sabia o que vinha. Daniel era um protetor das irmãs, ele
nunca aprovaria nosso casamento, mesmo que eu pouco
me importasse com o que ele achava. Ele sabia do que eu
era capaz, certamente, se Bianca estivesse viva também
não gostaria que ela tivesse ligação com alguém como eu.

— Por que Melissa?

Eu pensei em sua pergunta. Me fiz a mesma pergunta


milhares de vezes. Eu tive obsessões na vida, mas nenhuma
que me fizesse ir tão além, a ponto de me casar. A verdade
é que nem mesmo eu saberia dizer o real motivo de ir além.
Eu poderia ter resolvido tudo de outras formas, mas a
oportunidade era boa demais para que eu a perdesse. Eu
tinha Melissa. Posse, obsessão.

Melissa era minha. Em breve, totalmente minha.

— Porque eu quis assim.

— Eu não entendo. Você poderia...

— Não te devo nenhuma explicação, Daniel. Você trabalha


para mim...

— Eu estou pouco me fodendo para isso, se você machucar


a minha irmã eu acabo com você...

Antes que ele terminasse, Melissa apareceu na porta.

— Tudo bem aqui?

Ela passou por mim com os olhos muito abertos e foi em


direção ao irmão, que virava em direção a janela com
ambas as mãos no cabelo.
Quando se virou, recebeu o beijo no rosto da irmã, e a olhou
dos pés à cabeça.

— Eu que pergunto, Mel... Está tudo bem?

Melissa deu um sorriso doce.

— Eu estou ótima. Precisamos marcar de conversar para


que eu te conte todos os meus projetos. Essa semana vou
ver vocês.

Ele sorriu vacilante, sorriso que sumiu quando seus olhos


viraram para mim. Eu apenas arqueei uma sobrancelha, até
que Melissa viesse para o meu lado e segurasse a minha
mão. Eu não prestei atenção na conversa que se seguiu
entre ela e o irmão, apenas na despedida e na descida até o
carro. A mão dela estava na minha, e mesmo que eu

soubesse o quanto isso era uma migalha, uma migalha de


Melissa para mim era um banquete.

— Não leve as ameaças de Daniel a sério, por favor.

Ela disse assim que entramos no carro e soltou minha mão.


Percebi pelo seu tom que ela estava com medo de que eu
fizesse algo contra o irmão. Eu estava dirigindo, e sem tirar
os olhos da estrada, disse:

— Não vou machucar o seu irmão, Melissa. Ele é meu


advogado, o trabalho dele é valioso para mim. — Fiz uma
pausa antes de finalizar —

Ele também importa para você.

Senti os olhos surpresos em mim, embora não a olhasse.


E percebi então que era verdade. Eu não machucaria
Melissa deliberadamente

Melissa Capello

— A titia também estava morrendo de saudade, meu amor.

— Por que você não vem mais dormir aqui?

Coloquei Vic no chão, pois ela já estava bem grandinha para


que eu ficasse muito tempo com ela no colo, e me sentei no
sofá dando um beijo em Ashley. Olhei de volta para Vic com
uma pontada de culpa.

— Agora sua tia é casada, meu bem. Ela tem que dormir
com o marido dela.

— Então eu vou para a casa dela dormir com ela e já vejo o


tio Vince, que também não vem me ver.

Ashley abriu os olhos e eu tive que disfarçar o espanto


também.

Mesmo que eu ainda tivesse minhas reservas quanto a ver a


mansão Capello como minha casa, eu não deveria deixar
transparecer. Vicenzo era uma pessoa ruim, contudo, não
tinha visto nenhum sinal de crueldade dele em relação a
mim, que não fosse toda a chantagem.
Sorri.

— Então vamos dormir em casa essa noite comigo.

Ashley me olhou cautelosa.

— Não sei se é uma boa ideia...

— Por favor, mamãe, por favor. Eu prometo me comportar,


por favor!

— Ela estará segura, Ash. Você sabe que eu, jamais,


permitiria qualquer coisa contra ela.

Ashley pareceu pensar um pouco e então concordou.


Chamou a baba e pediu para que ela arrumasse as coisas
de Victoria e a própria para que voltasse comigo. Enquanto
Vic subia gritando sua felicidade para o seu quarto, Ash me
olhava de forma curiosa.

— Como tem sido?

Eu sorri.

— Um pouco estranho, confesso. Mas estamos nos


alinhando bem.

— Ele gosta de Victoria.

Eu também já havia percebido isso desde que passamos o


dia no rancho, e mesmo depois, no casamento, toda às
vezes que Vic abordava Vicenzo ou o procurava com sua
doçura, ele a recebia com um sorriso.

Um sorriso que eu só o vi dar a ela até então.

— Ele gosta.
— E eu confio em você, embora não confie nele.

Eu fechei o rosto.

— Não se esqueça que Daniel é comparsa de Vicenzo,


Ashley. Ele é meu irmão, mas agora você está falando do
meu marido.

Ashley me olhou surpresa antes de dizer.

— Nossa... Eu juro... preciso confessar. Por um momento eu


achei que esse casamento era uma espécie de fachada,
embora eu não soubesse explicar, mas é a segunda vez que
você defende Vicenzo. Pode parecer hipocrisia, mas eu vi
esse homem matar outro em minha frente, também vi o que
os outros homens, “homens dele,” fizeram. Não me culpe
por ser cautelosa, eu amo você e me preocupo.

— Para salvar sua vida, Ashley. Nunca se esqueça que foi


para salvar a sua vida.

Ashley suspirou.

— Desculpa, não vamos brigar. Ele é seu marido agora, e


mesmo que eu não entenda direito o que realmente está
acontecendo, vou respeitar sua decisão. — Ela se aproximou
e me abraçou — Só toma cuidado.

Eu fechei os olhos com força, me sentindo confusa. Mas não


poderia deixar essa confusão transparecer, de forma
alguma. Eu precisava manter a fachada, embora uma
dúvida maior agora me corroesse: O verdadeiro
motivo pelo qual eu vinha defendendo Vicenzo. Se era pelo
acordo ou por eu realmente acreditar que talvez, lá, no
fundo, houvesse alguma bondade no meu marido.

— Frozen de novo, Vic?

— Esse é o segundo, tia Mel.

Olhei para minha sobrinha deitada no sofá.

Pipoca, pijamas e meias nos pés, pois a noite era sempre


fria. E

Frozen. Novamente.

Suspirei e peguei um pouco de pipoca, olhei para minha


sobrinha vendo seus olhinhos brilhando com o desenho que
começava. Tínhamos passado uma tarde maravilhosa, ela
quis conhecer toda a mansão, algo que nem mesmo eu
tinha feito ainda, fez amizade com todos os sentinelas, e
todos pareceram encantados com Victoria. Esse era o efeito
que ela sempre tinha nas pessoas.

Até mesmo Mário, que sempre foi mais sarcástico e


fechado, se encantou com minha sobrinha antes de sair.
Ainda tínhamos uma relação um pouco estranha, mas eu
não tinha o que falar sobre ele.

— Boa noite.

Me sentei de sobressalto com a voz barítono de Vicenzo na


porta da sala de TV. Eu estava estranhando meu
comportamento: Ele disse que a casa era minha, então não
deveria ser um problema eu trazer minha sobrinha, embora,
no fundo, comecei a imaginar se não deveria tê-lo avisado.
Ele me deu o número de um telefone onde eu falaria
diretamente com ele, algo que eu não tinha feito ainda.
Sempre pedia para que Lexa fizesse essa ponte.

— Eu...

— Tio Vince! — Victoria gritou e pulou do sofá, correndo, e


novamente pulando no colo de Vicenzo, deixando ambos
surpresos —

Achei que não iria te ver, você trabalha demais, parece o


papai!

Eu tive que rir, assim como Vicenzo. Ele olhou para Victoria
e veio em direção ao sofá com ela no colo, a deixando em
pé ali, ao meu lado.

— Sim, pequena. Eu trabalho bastante mesmo.

Por algum motivo absurdo, a forma carinhosa como Vicenzo


falou com minha sobrinha quase me emocionou. Eu só
poderia estar perto do meu ciclo, por Deus.

— Assista com a gente, tio. É Frozen. O melhor filme do


mundo.

— Não quero atrapalhar a noite de vocês, só vim...


— Por favor, tio, por favor. Venha, senta-se aqui no meio,
assim você mata a saudade da sua esposa e da sua
sobrinha — Victoria disse e deu uma gargalhada.

Vicenzo me olhou pedindo uma autorização silenciosa e eu


acenei que sim, embora eu não fizesse ideia do motivo.
Tudo bem, Victoria poderia ser insistente e um pouco
mimada, mas se eu pensasse bem, poderia não gostar dos
motivos que poderia encontrar.

— Tudo bem, vou assistir um pouco do melhor filme do


mundo com você.

— Obaaaaaa! — Vic comemorou.

Vicenzo tirou os sapatos e se sentou no meio, como Victoria


havia praticamente ordenado. Eu tentei ficar na outra
extremidade, mas depois que Vicenzo nos cobriu, os três
com a mesma coberta, eu pude sentir o calor do seu corpo.
Victoria se aconchegou a ele e eu quase me chutei.

Senti inveja da minha sobrinha. A verdade era que Vicenzo


ser tão humano com uma das pessoas que eu mais amava
na minha vida, mexia comigo de uma forma que eu nunca
poderia explicar.

O tempo passou e eu consegui relaxar um pouco, até


adormecer, por já saber quase decorada a maioria das falas.
Acordei e me deparei com uma cena que me deu um misto
de sentimentos. Vicenzo dormia, e ao lado dele, Victoria,
ambos deitados e aninhados no sofá. O filme havia
terminado e eu peguei o meu celular, vendo que já se
passava da meia-noite.

Me sentei lentamente e olhei o semblante de Vicenzo.


Enquanto dormia, ele não tinha aquele ar indiferente ou
severo que nunca sorria, ou mesmo enigmático. Ele parecia
em paz. Quase um humano normal. O

cabelo estava um pouco jogado na testa e ele ressonava,


assim como Vic.

Era quase doloroso ter que acordá-los, mas era isso, ou


acordar com dores nas costas no dia seguinte.

Eu levei a minha mão para o seu braço bem levemente, no


intuito de sacudi-lo levemente, mas foi minha mão encostar
no homem, ele segurou o meu pulso em uma velocidade
impressionante. A forma como ele me segurou me fez
desequilibrar e quase cair em cima dele. Minha mão foi para
o encosto do sofá a procura de equilíbrio enquanto seus
olhos seguraram os meus. Minha respiração ficou suspensa,
tendo o seu rosto quase rente ao meu.

Eu me lembrava demais do que essa boca era capaz de


fazer, embora todos os meus esforços para esquecer. O
calor do corpo dele aquecia o meu, mesmo que não
estivéssemos nos tocando. Se não fosse Vic adormecida ao
seu lado, eu poderia cair na tentação de sentir, mesmo
sobre a coberta, o seu corpo que parecia quente e
convidativo.

— Me desculpe...

Ele frouxou o aperto em meu pulso, embora não soltasse.


Seus olhos foram para minha mão e ele começou a acariciar
ali. Oh Deus, isso seria o meu fim. Me soltei com muito
esforço, e me pus de pé.

— Eu vou levá-la para a cama.

— Deixe que eu mesmo faço isso.


Ele disse, e de uma forma impressionante, se levantou e
aninhou Victoria em seu colo, como se estivesse
acostumado a pegar uma criança de seis anos no colo. Eu
segui na frente escutando seus passos atrás de

mim. Subimos as escadas e eu fui em direção ao quarto que


fora designado a mim.

Com muito cuidado, Vicenzo colocou-a na cama e a


aconchegou nos cobertores. Eu fiquei na porta até ele parar
bem em minha frente. Forcei minha voz a sair, pois ele
havia sido muito gentil com minha sobrinha.

— Muito obrigada, Vicenzo. Você não precisava fazer isso.

Ele continuou segurando meus olhos na meia luz. Me dei


conta de que estávamos muito, muito próximos. Se eu me
aproximasse e ficasse na ponta dos pés, poderia sentir sua
respiração em meus lábios. Por um momento, eu achei que
o mesmo pensamento passou pela mente dele, pois fez
menção de se aproximar. Deus sabia que eu não teria forças
para rechaçá-lo.

Não depois de ele ter sido tão gentil com minha sobrinha.

Mas ele se afastou, levando junto o calor do seu corpo


próximo ao meu.

— Não precisa agradecer.

Sua voz foi suave. Ele então beijou minha testa de forma
suave, quase comedida, sussurrou um boa noite e se foi. Eu
fiquei ali, paralisada por um tempo que não soube definir,
tentando entender o que diabos estava acontecendo
comigo.
Melissa Capello

— Mas eu quero o chocolate, tia Mel.

— Coma os cereais primeiro.

Victoria fez um bico maravilhoso que quase me fez desistir


de fazê-la comer os cereais. Lexa escondeu um sorriso
também, assim como Vitto, que agora estava todo fim de
semana em Chicago.

Na última vez ele tinha trazido a namorada, hoje, porém,


veio só. Eu bem que tentei não gostar muito de nenhum dos
familiares de Vicenzo, mas a cada dia eu via mais cada um
deles como pessoas e não como...

foras da lei.

— Tio Viiiiiiinceeee!!!

O grito de Victoria me tirou do limbo de pensamentos e eu


arrumei minha postura lidando com dois olhos negros em
mim, como águia. E

então, eles foram para minha sobrinha, que pulou em


Vicenzo.

— Eu queria chocolate.
— Olá, princesa. Então coma o chocolate — Eu revirei os
olhos.

— Ela precisa comer os cereais primeiro.

Eu respondi, arrancando risadinhas de Vitto e Lexa.

— Então você deve comer os cereais primeiro.

Victoria murchou visivelmente e Vitto se levantou com uma


gargalhada leve.

— Não foi dessa vez, princesa — Ele disse e então saiu, me


dando uma piscadinha charmosa. Se ele estranhava a
estranha dinâmica entre mim e Vicenzo, nunca disse uma
única palavra. Guardava para si.

— Tia Mel disse que vocês têm uma pista de patinação aqui.
É

verdade?

O rosto de Vicenzo, por um segundo, um único segundo,


ficou petrificado. Ele se reestruturou tão rapidamente e
sorriu para Vic. Eu sabia dessa pista, até a vi quando fiz um
tour com Lexa, mas não dei muita importância.

— Sim, nós temos.

— Eu posso patinar lá?

Hesitação. Que logo foi substituída por outro sorriso. Sorriso


que vinha fácil com Victoria, somente com ela.

— Claro que sim. — Ele respondeu e a colocou de volta na


cadeira
— Depois que comer os cereais eu mesmo vou levar as duas
para a pista de patinação.

A informação arrancou um grito exasperado de Vic e uma


expressão de pura surpresa de mim. Meu coração começou
a pulsar tão forte, talvez por ele estar me surpreendendo
tanto e talvez, talvez por saber que passaria ainda mais
tempo com Vicenzo.

— Você não precisa...

— Eu sei. Mas eu quero.

A forma como ele disse calou qualquer argumento que eu


tinha a respeito do que ele poderia fazer com o tempo dele.
No fim das contas, ele era uma espécie de chefe. Eu já tinha
percebido como as pessoas de seu mundo o olhavam, o
respeito e até mesmo um certo medo. Ele exercia domínio e
poder por onde andava, embora, apesar de ter me obrigado
a esse casamento, eu não havia me sentido oprimida ou
mesmo dominada por Vicenzo. Ele me deixava... a vontade.
Exceto agora.

Contudo, Vic devorou os cereais e até mesmo esqueceu os


chocolates, recebendo os patins de Lexa e correndo,
tagarelando, monopolizando a atenção de Vicenzo. Eu fiquei
um pouco atrás com Lexa, que também estava cada vez
mais à vontade em minha presença.

— Victoria conquistou o chefe.

— Ela tem esse efeito sobre as pessoas — Eu disse e sorri


ao vê-la falando, e Vicenzo dando toda a atenção.

— Eu nunca vi o chefe tão relaxado com alguém. Outra


pessoa que ele muda também ao redor, é a senhora.
A informação me surpreendeu. Eu olhei para Lexa e ia
perguntar mais, contudo, Vic gritou meu nome e eu tive que
ir atendê-la. Eu nunca li Vicenzo dessa forma, mas Lexa, que
trabalhava com ele, o conhecia a mais tempo e mais
profundamente que eu.

— Coloque os seus patins.

— Titia vai passar vexame, meu bem. Tem anos que não
patino.

Vicenzo apenas olhou a troca, enquanto eu tirava meu tênis


e colocava os patins, um pouco a contragosto. Victoria e eu
patinamos por um tempo ao som de Frozen, até eu me
cansar e me sentir estranhamente tímida, tendo certeza dos
olhos de Vicenzo em nós, em mim, principalmente.

Era como se eu estivesse me esquecido que já tinha


desfilado para dezenas de pessoas pelo mundo. Em um
momento eu fui para a borda da pista.

— Lexa, você fica de olho em Vic? Já não tenho quinze anos.


Disse e me sentei no banco para tirar os patins.

Um bufo me fez olhar para cima e ter a visão de Vicenzo


sorrindo.

Dessa vez para mim. Eu disfarcei a surpresa, mas acabei


dando um sorriso de boca fechada. Guarda baixa.

— Ela está patinando bem. — Ele disse e encostou na borda,


olhando para Vic com Lexa.

— Além da influência de Nate, ela faz aulas. Ama patinar.


Eu me levantei e fui para o lado dele, embora não muito
distante, não estávamos nos tocando. Eu abri a boca e
fechei. Abri novamente, mas a voz não saiu. Novamente, eu
precisava agradecer a atenção de Vicenzo a Vic. As atitudes
dele me deixavam confusa sobre a nossa situação.

— Essa pista foi construída para Bianca. — Eu olhei para


Vicenzo, surpresa — Eu a trazia aqui nas férias da faculdade
para patinar.

Meu coração se contorceu. Não havia fotos dos pais, ou


mesmo da irmã de Vicenzo pela casa. Era quase como se
não existissem. Mas naquele momento eu soube que Bianca
era uma lembrança diária da família Capello.

— Como ela era? — Me vi perguntando.

Vicenzo me olhou surpreso e por um momento achei que


não responderia.

— Alegre e cheia de vida, como uma criança deve ser. Como


Victoria.

De repente eu entendi. Entendi tudo. Vicenzo se lembrava


de Bianca quando olhava para Victoria. Uma estranha
emoção me tomou, e de forma espontânea, peguei a mão
de Vicenzo, fria, na minha, dando um leve aperto.

— Eu sinto muito, Vicenzo.

Falei de todo o meu coração. Ele olhou para a minha mão, e


então, no fundo dos meus olhos. Eu vi uma estranha
emoção ali. Nossos olhos se trancaram e eu não tive forças
para desviar o olhar. Tinha tanto naquelas profundezas
negras e eu me vi corajosa, curiosa e ansiosa para
desvendar todos os mistérios que aqueles olhos traziam.
Como se tivesse vida própria, minha mão subiu pelo braço
de Vicenzo, surpreendendo a mim e a ele. Minha mão parou
no pescoço, devagar e subiu até o rosto, deixando ali uma
carícia.

O maxilar de Vicenzo trincou, e meu coração acelerou três


vezes mais. Devagar, ele me puxou para perto, muito perto.
Sua mão subiu para o meu cabelo e eu fiquei entre o apoio
e seu corpo. Ele subiu meu rosto e devagar, encostou os
lábios nos meus. Foi... erótico, mesmo que estivéssemos
vestidos. Por dentro, eu sentia a muralha que havia
construído entre nós sendo destruída. Subi ambas as mãos
para sua nuca, enlaçando seu pescoço, e apenas deixei que
o beijo acontecesse.

O calor do seu corpo, seus lábios, tudo me fez girar em um


espiral mental, onde eu me esqueci de todos os motivos
que me levaram ali. Eu queria Vicenzo, eu queria aquele
beijo, eu queria saber mais daquele homem misterioso que
estava cada dia se apossando mais e mais dos meus
pensamentos. Com isso em mente, eu aprofundei o beijo,
dominei, enquanto ele permitiu e me acompanhou.

Até que, não mais. Até que, ele me beijou com vontade.
Seus braços pareceram correntes em volta de mim,
correntes que eu não queria me desprender, não ali. O beijo
foi ficando faminto, intenso, e de repente eu já não sabia
mais o que estava fazendo. Eu o queria.

Mais que seus lábios, sua boca em mim, eu queria seus


mistérios.

Todos eles.

Sua língua se enroscou na minha e minha mão, com vida


própria, fez o que eu vinha até mesmo sonhando em fazer
nos últimos dias. Passou por baixo de sua camisa preta e
explorou o corpo. Eu estava ensandecida.

De repente, me lembrei do lugar que eu estava e


principalmente, as pessoas. Me afastei e olhei em volta,
mas Vicenzo virou meu rosto em sua direção.

— Estamos sós.

— Vic...

Ele me beijou, agora duramente.

— Está com Lexa.

E então me levantou e me sentou no suporte. Eu estava


com um vestido longo, vestido esse, que foi parar na minha
cintura, quando senti o metal gelado em minha bunda,
suspirei.

Deveria aproveitar esse pequeno momento para parar o


homem em minha frente, mas não consegui. Suas mãos
estavam poderosas em minhas pernas, sua boca em meu
pescoço, e seja lá o que eu tentei dizer foi inteligível até
mesmo para mim.

Segurei seu rosto e voltei a beijar sua boca. Sua mão foi
subindo com destino muito definido a minha virilha, quando
pânico e ansiedade me

tomou. Talvez, ele tenha sentido o pânico. Talvez, ele tenha


sentido a minha confusão interna.

Porque ele parou.

Eu estava entre aliviada e muito brava, porque meu corpo


duelava com a minha mente. Sua boca se afastou alguns
centímetros da minha, sua mão desceu o meu vestido,
lentamente e ficamos ali, respirando juntos.

Um pouco de consciência foi me tomando a cada segundo e


a recriminação estava crescendo. Não por ele, por mim, por
meu comportamento, com os sentimentos que alguém
como ele estava me causando. Fiquei de olhos fechados,
principalmente por estar com vergonha. Vergonha de mim.

Senti um beijo em minha testa e me senti ser colocada sob


meus pés.

E então, passos cada vez mais distante.

Vicenzo Capello

— Vou começar a anotar cada vez que você liga para minha
esposa para aprender a lidar com a sua.

Revirei os olhos com os ciúmes de Dardan.

— Entregue o telefone de Talía para ela, e pare com esse


ciúme de merda.

— Ela estava lidando com Sean, para sua informação.

Ele disse com uma risada, e escutei seus passos. Não


demorou muito para que a voz de Talía aparecesse do outro
lado.

— Vi?

— Vai estar na próxima reunião da Aliança?

— Você sabe que sim. Eu sou a voz da razão naquela


cúpula.

Mesmo que ela estivesse com muita pretensão, essa era


uma verdade indiscutível. Tália era o equilíbrio das facções.
Embora, se necessário, ela poderia ser tão letal quanto
qualquer um ali, já tinha provado isso.

— A maioria está votando para silenciar Howard. Após ter


abordado minha esposa em Nova Iorque, não sei se vou
continuar te apoiando na decisão de deixá-lo em paz.

— Eu sinto muito por Melissa, Vicenzo. Milena a adora, mas


ela sabia que esse eram os riscos do seu mundo.

Fiquei em silêncio, pois algo parecido com consciência me


incomodou um pouco. Meu silêncio deu munição a Talía.

— Ela sabia... não sabia?

— Isso não importa agora.

— Você precisa pensar além dos seus sentimentos, Vicenzo.


Eu sei como é isso, você acompanhou a minha jornada. Tudo
tem o seu tempo,

Howard terá o dele. Paciência.

Eu queria mesmo era simplesmente acabar com a vida


daquele fedelho que se achava alguma espécie de
justiceiro, mas Talía estava certa. Eu poderia começar algo
muito maior se simplesmente matasse o filho da puta.
— Como está o casamento? Vocês não têm nem mesmo
dois meses de casados, era para estar mais relaxado.

Relaxado.

Eu estava cada dia mais fodido da cabeça com a


proximidade de Melissa. Com seu desejo e hesitação. Mas
não, quando eu tivesse Melissa, seria por inteira, entregue,
por vontade dela. Sem espaços para quaisquer dúvidas.

Não que não tenha sido um incômodo, quase demais, muito


mais do que eu esperava, sua hesitação. Quero Melissa por
inteiro, suas reservas mais que me incomodam.

— Já está com problemas no paraíso?

Suspirei.

Talía poderia ser uma fedelha quando queria.

— Tchau, Talía.

Não esperei resposta, apenas desliguei. Hoje a amiga ruiva


enraivecida de Melissa havia chegado, e ambas estavam no
quarto.

Tanto eu quanto Melissa estávamos nos evitando, embora


uma conversa cordial, principalmente da parte dela e até
mesmo sorrisos,

“tímidos”, mas ainda assim sorrisos, estavam sendo


lançados em minha direção. Outro dia a encontrei na
cozinha bebendo água e seus olhos se abriram como pratos
quando me viu.

Sim, havia uma tensão sexual de ambas as partes, mas


tudo o que ela fez foi me mostrar um vídeo de Victoria
fazendo alguma graça. Vic era especial, contudo, minha
atenção estava no perfume suave de Melissa. Na

doçura de sua risada. E ela, parecia esperar que eu fizesse


algo em relação à tensão quase palpável ao nosso redor.

O que eu não fiz. Eu apenas sorri do vídeo, me despedi e fui


para o meu quarto. Me masturbar em minha miséria com a
lembrança do perfume de Melissa.

— Chefe.

Carl entrou em meu escritório, com cara de poucos amigos.


Esperei que continuasse, estava claro que tinha algo a dizer.
Não muito atrás, antes que ele começasse a falar, Mário
entrou a gargalhadas.

— Vicenzo... quem é aquela figura que está aqui visitando


sua bela esposa?

Carl não sorriu, pelo contrário, fechou ainda mais a cara.

— Ela tratou Carl do aeroporto aqui como se ele fosse seu


empregado pessoal, sua esposa pareceu discretamente se
divertir muito, e embora eu ache que perdi algo dessa
história, a ruiva, que é linda por sinal, parecia saber
exatamente o que estava fazendo. O que diabos você fez
para ela, Carl?

Mário não conseguia conter a risada e minha vontade de me


juntar a ele era grande. Eu já tinha sido alvo da megerinha
ruiva em meu próprio casamento.

— Se veio reclamar sobre a amiga de Melissa, Carl, já sabe:


essa casa também é dela e quem ela chama para cá deve
ser muito bem tratado.
— Senhor...

— Você não machucará Judith. — Eu ordenei.

— Não pediria para machucá-la, apenas permissão para dar


um susto na fedelha.

— Nem isso. — Eu respondi, e Mário recomeçou seus


acessos de riso — Se quer um conselho, a evite.

— E se me permite uma opinião, eu apoio a decisão de


Melissa trazer suas amigas para essa casa com mais
frequência, ainda mais se forem tão...

— Você também não tocará em Judith.

— A menos que ela queira? — Mário perguntou e eu revirei


os olhos.

— A menos que ela queira, Mário.

Ele saiu convencido de que se encarregaria desse fato. E se


eu conhecia meu irmão, as chances de que ele conseguisse
eram grandes, o grande desafio seria ele conseguir desfazer
a má impressão que ela já deveria ter sobre os Capellos. O
que não, era algo da minha preocupação.

— Mais alguma coisa, Carl? Se ajudar, evite a amiga de


Melissa. Ela é nossa hóspede.

— Sim, senhor — Carl concordou a contragosto, trancando o


maxilar.

Eu foquei em meu trabalho por algumas horas, embora


volta e meia meu pensamento ia para Melissa e para as
nossas interações. Era irônico que a mulher que eu mais
estava tendo dificuldade para me conectar fisicamente, era
minha própria esposa. Mas cada muro que eu derrubava de
Melissa, me mostrava que ela valeria qualquer espera.

Ouvi passos e então uma batida na porta. Antes que eu


dissesse para entrar, a porta abriu, e Melissa passou por
ela. Pés descalços, cabelos soltos e um pijama de seda
branco. Seus olhos demoraram um pouco, mas focaram nos
meus, visto que apenas o abajur sob os papéis estava
ligado e uma meia luz na estante. Ela fechou a porta
determinada e se aproximou, me dando a bela visão de
seus mamilos sob o pijama.

Minha respiração ficou suspensa quando ela se sentou em


meu colo, me invadindo com seu perfume. Seu cabelo me
envolveu, assim como seus braços e então, sua boca
encontrou a minha. Um beijo doce, porém, determinado,
partiu dela, e eu instintivamente passei meus braços em
volta do seu corpo.

Internamente, eu queimava. Um desejo insano por essa


garota, acumulado a tanto tempo que eu já nem me
lembrava mais, tinha parado de contar no dia em que ela
escolheu ser minha.

Agora ela estava aqui, de inteira boa vontade, em meus


braços. E foi quando senti o gosto do vinho em seus lábios.

Ela estava embriagada, talvez levemente embriagada. Mas


ainda assim, se eu conhecia a mulher em meus braços, que
me beijava cada vez mais intensamente, provocando meus
lábios com a língua, no dia seguinte, ela usaria o fato contra
mim.

Reunindo todas as forças necessárias, eu afastei Melissa dos


meus braços e segurei seu rosto em minhas mãos.

— Você está bêbada.


Ela riu e tentou tirar minha mão de seu rosto.

— Eu sei o que estou fazendo. E sei o que eu quero.

Semicerrei os olhos.

— E o que você quer Melissa?

— Que você me foda.

Arrepios passaram por minha pele. Emoção que eu


raramente sentia, principalmente no que se referia a
mulheres.

— Eu vou te foder, Mel. Te foder como nenhum te fodeu. —


Eu disse, e senti quando ela soltou a respiração, fechando
os olhos lentamente. Meu pau latejava duro embaixo da sua
bunda macia. — Mas não será hoje.

Ela se afastou um momento e então se levantou depressa.


Se virou em minha direção e começou a tirar a parte de
cima do pijama. E a visão foi... espetacular. Melissa era
espetacular como eu sempre soube que seria. Ela estava
em pé, aproximou a boca do meu ouvido, trazendo os seios
desnudos direto para o meu rosto.

— Não vai ser quando você quer. Tudo tem sido do jeito que
você quer, desde o início. Eu estou com tesão, e você
deveria fazer o seu papel

de marido — Ela se afastou e olhou em meus olhos sem


medo. Ela nunca teve medo deles — Me satisfazer.

As últimas palavras saíram sussurradas e fez com que eu


perdesse todo o controle. Eu me levantei quase a
levantando junto, varri a mesa atrás dela, a peguei no colo
e a deitei ali. Me inclinei sobre ela e peguei um mamilo na
boca enquanto minhas mãos passeavam por todo o seu
corpo.

Eu queria aquela mulher, a tanto, tanto tempo, ela não


tinha ideia da fome reprimida que eu tinha dela. Eu passei a
boca para o outro mamilo e o suguei como se fosse água no
deserto. Como se a minha vida dependesse dela. Minha
mão foi para o short de pijama e o desceu. A filha da puta
estava sem calcinha. Ela veio com a missão de me tirar o
juízo essa noite.

Eu olhei para ela de forma predatória, enquanto ela ria da


minha desgraça. Meu sonho era enterrar o meu pau, já
molhado em minha cueca, naquela boceta suculenta, mas
eu me seguraria. Por hoje.

Passei minha mão lentamente pelas suas cochas, as


deixando abertas. Minha boca salivava, e Melissa fechou os
olhos em antecipação.

Passei a ponta da língua em seu clitóris saliente, e ela quase


pulou da mesa. E então, fiz de Melissa meu banquete.

A quis por tanto tempo. Mas, tanto tempo, que agora


parecia uma mentira. Um dos sonhos que eu tinha,
enquanto me imaginava fazendo exatamente isso.
Exatamente aqui.

Ela nem sabia o poder que tinha sobre mim, sobretudo. Eu


demonstrei a minha vontade dela atacando sua boceta com
minha língua, dedos, e me deliciando com seus gemidos.
Suas mãos foram para meu cabelo e o apertou ali, fodendo
meu rosto, que já tinha, ela por toda a parte. Suas pernas
contraíram. Seu rosto se contorceu. E então, ela teve um
orgasmo ali, nua, sob a mesa do meu escritório.
Seu corpo convulsionou e ela tentou segurar a onda de
grito. A visão de Melissa atingindo o clímax quase me fez
gozar em minhas calças, como um adolescente, pois era
uma das visões mais lindas que eu já tinha visto.

Era muito mais linda do que qualquer foto que eu tivesse


naquela antessala.

E eu decidi que eu teria aquela visão por muito, muito


tempo.

Não abriria mão.

Melissa Capello

Eu sentia uma dor de cabeça do caralho. Droga. Minha noite


de garotas com Judith simplesmente não era o que eu tinha
esperado. Abri os olhos lentamente e a primeira coisa que
me ocorreu foi que eu não estava em meu quarto. E eu
estava nua. NUA. Me sentei rapidamente e minha cabeça
voltou a latejar.

— Cuidado.

A voz quase me fez saltar da cama mesmo nua, uma voz


que eu sabia muito bem a quem pertencia. Vicenzo. Meu
marido.
Eu olhei em minha lateral, onde ele se levantava de sua
poltrona e me entregava um analgésico e um copo de água.
Enrolei o lençol com ao meu redor, de repente me
lembrando do que tinha acontecido na noite anterior. Eu fui
ao escritório de Vicenzo disposta a acabar de vez com a
nossa tensão sexual. E só não tinha certeza de até que
ponto tínhamos chegado. Além de sua boca... oh Deus, a
sua boca. Meu núcleo se apertou com a memória.

— Eu...

— Tome o remédio, irá se sentir melhor.

Com o rosto queimando, eu, que jurei não me deitar na


cama de Vicenzo, estava ali, nua, e poderia ter feito muito
mais do que me lembrava.

— Nós... — Eu comecei a perguntar enquanto pegava o


remédio de sua mão, embora meus olhos não encontrasse
os dele.

— Você dormiu após o orgasmo que te tirei com minha


boca. Eu te trouxe para cá.

O copo quase caiu da minha mão com a forma direta que


Vicenzo falou comigo. Olhei para ele que não sorria de volta,
embora também não deixasse transparecer qualquer outra
emoção. Ele então esperou que eu devolvesse o copo e se
afastou de forma dominante, como sempre.

— Sobre ontem...

— Não se preocupe.

— Dá para me deixar falar?


Sua sobrancelha se levantou de forma surpresa. E então ele
me fez sinal, para eu falar.

— Sobre ontem à noite, eu bebi um pouco, sim, mas eu


sabia exatamente o que estava fazendo.

Dead Eyes colaram nos meus. Ele se aproximou lentamente


e meu coração saltou. Então se aproximou mais, e
perguntou de forma lenta, embora seu tom fosse quase
como uma ordem:

— E o que você queria, Mel?

Mel. A forma como ele dizia o nome fazia meus órgãos


internos quererem sair do lugar. Era irritantemente irritante.
Mas eu deveria ser uma mulher e assumir os meus riscos.

— Eu queria um orgasmo — Eu disse e me levantei


enrolando o lençol em volta de mim — Aliás, obrigada por
isso.

Eu dei um sorriso de boca fechada e sai do quarto. Embora


minhas mãos suassem e meu rosto estivesse em chamas,
me parabenizei pela coragem, e principalmente pelo meu
triunfo.

O triunfo de ter deixado Vicenzo inegavelmente surpreso e


até sem palavras. Ponto para mim, finalmente.

Eu terminava o meu banho e já estava pronta para


enfrentar toda a artilharia pesada da casa onde agora eu
morava, atrás da minha Judith, quando ela entrou pela porta
do meu quarto. Lábios inchados, cabelos desarrumados e
um olhar cansado de quem dormiu pouco. Ela simplesmente
se deixou cair na cama.
— Onde você estava? — Perguntei em uma mistura de alívio
e raiva.

— Não me faça perguntas das quais você não gostara das


respostas, Mel.

Minha paciência se esgotou.

— Estou falando sério, Judith — Fui até a cama e me sentei


ao lado dela — Essas pessoas poderiam ter lhe feito mal,
principalmente depois da forma como você tratou Carl no
caminho do aeroporto até aqui. E aí você some.

Olhei para seu corpo. Ela parecia ter tido uma noite
selvagem.

— Você transou com quem?

— Não me condene. Aceitei ir em uma boate com Mário


depois que você saiu do quarto e sumiu. Eu já vou embora
hoje, não queria passar minha única noite em Chicago no
seu quarto sozinha.

— E aquele ódio todo pelos Capellos? — Não resisti


perguntar.
— Você disse que Vicenzo tem sido decente. E mesmo que a
situação seja... inusitada, eu não odeio os Capellos. Como
eu poderia te odiar?

Revirei os olhos.

— Vá tomar um banho, você fede a fumaça e bebida. — Ela


colocou um travesseiro sobre o rosto e resmungou. Eu o tirei
e a olhei seriamente

— Cuidado, Judith. Só... cuidado.

Ela me olhou de volta com a mesma seriedade.

— Há algo que você não tem me contado?

Pensei nas últimas interações que andei tendo com meu


marido. Os beijos, os amassos...

— Não. Mas a casa e rodeada de segurança por algum


motivo.

Então, cuidado.

Após deixar Judith no aeroporto e mandar alguns e-mails


sobre o lançamento em três dias da coleção Castelle aqui
em Chicago, com a inauguração da nova estrutura física, eu
tive que me arrumar muito rapidamente para um evento
que Vicenzo precisava comparecer.

Coloquei um vestido preto, longo, sem mangas, liso, básico,


porém elegante. Ele se moldava ao meu corpo, e soltava um
pouco na cocha, onde se iniciava uma fenda lateral. Assim
que terminei a maquiagem, uma batida na porta me
apressou a pegar a bolsa de mão prateada.
Esses eventos eram chatos. As mulheres eram... um pouco
esnobes.

Mas eu fazia a minha parte sendo cordial.

Abri a porta e me deparei com Vicenzo... lindo. Não tinha


outra palavra para definir o homem. Ainda que fosse uma
beleza diferenciada, nada tradicional, ele era lindo, ainda
mais em um smoking.

— Você está linda, Melissa.

Percebi então que a minha respiração estava suspensa e a


soltei lentamente para não demonstrar que ele havia me
afetado. Eu não o tinha visto durante o dia depois que o
deixei essa manhã. Acenei, pois palavra alguma saiu da
minha boca, nem mesmo obrigada, e aceitei o braço dele.

Todo o caminho até o evento não trocamos uma palavra,


mas era um silêncio confortável. Às vezes eu me pegava
presa no pensamento dê o que eu estava perdendo em toda
essa história.

Vicenzo me desejava. Me dava toda a liberdade para ir a


Nova Iorque ou qualquer lugar, desde que tivesse alguma
segurança. Se ele queria apenas uma esposa, por que eu?
Talvez esse fosse o fio que me mantinha intacta na
sanidade. Eu desejava esse homem, era um fato. Ele era
misterioso e intenso. Magnético. E eu estava cada dia mais,
envolvida, mesmo que não quisesse.

Chegando no evento, em um momento nos separamos. Eu


sempre sentia alguma resistência por parte de algumas
mulheres. Sei bem quem eram a maioria daquelas pessoas,
eram do “meio” de Vicenzo. Talvez não aprovassem a
escolha de Vicenzo. Elas que entrassem na fila, muita gente
não aprovou, inclusive eu mesma.
— Querida, como você está linda. — Eu não me lembrava o
nome dela. Laura? Dora? Sei que era esposa de alguém
importante. E sorri e aceitei o seu beijo.

— Obrigada. Você também está linda.

A mulher me deu um sorriso que não chegou aos olhos.

— Venha, junte-se a nós.

Eu não estava animada, mas ainda assim, segui a mulher


para um grupo que só fazia fofocar e falar das roupas de
outras mulheres. Eu realmente não tinha muito o que
compartilhar com elas.

— Olá, Melissa, O casamento te fez bem.

— Obrigada — Eu respondi para a loira de meia-idade, que


tinha ao seu lado uma filha, em torno de uns vinte anos —
Preciso dizer que foi uma grande surpresa para todos o
casamento de Vicenzo com você.

Eu gostaria de dizer compartilhar do sentimento, mas


apenas sorri.

— Pois é, as coisas do coração é assim mesmo.

— Algumas más línguas chegaram a comentar que poderia


ser uma gravidez — Ela comentou olhando para o meu
abdome. Eu tive que conter uma crise de riso.

— Oh não. Eu estou muito envolvida com meu trabalho,


meus projetos.

— Outra coisa que me deixou surpresa — A morena também


de meia-idade começou a falar — Não deve ser fácil a
responsabilidade de carregar um sobrenome como Capello.
Há muitas responsabilidades.

Admiro que esteja dando conta de tudo e ainda


trabalhando.

Eu quase paralisei diante do comentário arcaico.


Definitivamente, esse não era o meu meio. Eu jamais
pararia a minha vida por algo que nem pedi, e ainda bem
que Vicenzo parecia saber disso. Eu sorri forçadamente.

— Vou ao toalete.

— Claro.

Uma leva de sorrisos falsos me acompanharam e eu poderia


sentir os olhares em minhas costas. Eu suspirei e transitei
por entre os convidados por alguns minutos. Estava na
terceira taça, quando senti um leve puxão em meu ombro.

— Você está bem? — Era Vicenzo. Como ele poderia estar


ao meu lado? Menos de um segundo ele estava em uma
conversa com o prefeito e mais dois homens.

— Isso está muito chato.

Eu queria morder a minha língua, mas era a verdade. Ele


olhou por cima da minha cabeça e deu um sinal. Eu fechei
os olhos com força e ia começar a pedir desculpas, quando
ele começou a me puxar em direção a porta dos fundos. Um
pouco surpresa, embora não com medo, eu olhei em volta.

— Aonde vamos?

— Para onde você quer ir?


Eu parei em frente ao carro que nos aguardava nos fundos,
pensando sobre suas palavras. Então o olhei de esguelha
enquanto ele abria a porta para eu entrar. Tão cavalheiro,
apesar de tudo.

— Você pode sair assim? — Perguntei quando ele deu a


volta e se sentou ao meu lado. Ele me deu um sorriso raro
de lado.

— Eu posso tudo, querida.

Revirei os olhos e ele deu um sorriso mais descontraído.


Era...

desconcertante. Mas esquentou meu peito por algum


motivo. E eu me peguei rindo de volta.

— Acho que eu só quero ir embora. — Disse por fim. Em


breve seria o e evento de lançamento aqui em Chicago e eu
estava um pouco ansiosa.

— Então vamos para nossa casa.

Pela primeira vez a expressão “nossa casa” não saiu


estranha. Eu o olhei novamente e ele segurou meu olhar.
Era magnético toda vez que ele me olhava, era difícil
desviar o olhar. Dead Eyes fazia algo dentro de mim... viver.

— Você estava odiando.

Eu baixei os olhos e acabei rindo, um pouco envergonhada.

— Estava tão na cara assim?

— Sim. E pela quantidade de champagne que estava


tomando, estava com medo de que viesse em minha
direção e me atacasse novamente.
Eu o olhei em espanto nada disfarçado.

— Você fez uma piada?

Ele me olhou com a um ar indiferente, o que só deixou tudo


ainda mais engraçado. E eu soltei uma gargalhada
espontânea que surpreendeu a ambos. Eu ri tanto que senti
meus olhos queimarem com algumas lágrimas.

Ele apenas ficou olhando para mim com... algo parecido


com devoção. E a ideia de que fosse devoção me fez rir
ainda mais. Em um momento eu parei, aos poucos, e me
recompus.

— Você é linda, Melissa.

Fiquei em silêncio, apenas sentindo a intensidade que


emanava de suas palavras. A beleza sempre fez parte da
minha vida. Não era prepotência, era um fato. Eu cresci
escutando minha beleza ser ovacionada, mas agora, nesse
exato momento, diante das palavras de Vicenzo, diante do
seu elogio, eu percebi ser a primeira vez que me sentia
assim: linda.

A percepção me fez afastar os olhos para as ruas de


Chicago. Eu tinha que tomar cuidado. Seria fácil, muito fácil
gostar de Vicenzo.
Vicenzo Capello

— Já tem mais de um mês, mas alguns ainda não


conseguem aceitar o fato de uma estranha seja a senhora
Capello.

— Eu já disse, Carl. Isso nunca deveria ao menos ser uma


questão.

Se continuarem com essa conversa, peça para virem falar


comigo.

— Senhor, os homens mesmo não falam, a não ser Santino.


São as mulheres...

Me sentei e então me lembrei da hostilidade mascarada de


gentileza que Melissa teve que lidar. Eu estava disposto a
dar tempo ao tempo para que todos se acostumassem com
a minha decisão, contudo, os tradicionalistas continuavam
com alguma resistência. Não gostei de ver Melissa
incomodada em um ambiente onde ela deveria reinar. Se
tivesse que dar algum recado para a Darkness a meu modo,
eu daria. O

bem-estar de Melissa era minha obrigação.

— Sobre o evento de hoje, a segurança está planejada?

— Sim, Giovanni Maceratta também trouxe alguns homens


de Nova Iorque para a segurança da esposa.

— Não gosto disso.

— É o protocolo. Se fosse ao contrário, faria o mesmo


senhor.

Achei razoável.
Giovanni tinha se mostrado decente, mas não confiava em
estranhos pelo meu território. Contudo, Carl tinha certa
razão. Giovanni era louco pela mulher e não desistiria de ter
homens de sua confiança fazendo a sua segurança.

— Não acredito que venhamos ter algum problema.

— Nem eu.

Contudo, era quando a guarda estava baixa que algo


sempre acontecia. E por isso que eu nunca, nunca baixava a
guarda.

O evento ocorreu como esperado. Tudo em ordem, e todos


os olhos para minha esposa. Melissa brilhou nos modelos da
Castelle, algo que não me incomodava. Ela era uma luz que
merecia ser admirada. E

agora, eu me preocuparia menos ainda, sabendo que ela


era minha.

Ovacionada e aplaudida, Melissa tomou toda a minha


atenção, assim como a dos outros no evento. Era raro algo
ter toda a minha atenção, mas era o que acontecia com
Melissa, ela tomava a atenção de todos ao seu redor.
Eu jamais lutaria contra essa luz. E foi admirando sua
performance, admirando seu discurso, junto da Milena,
afirmando a parceria de ambas na Castelle, que eu perdi
algo importante. Andar suspeito, olhar obscuro, eu conhecia
essa obscuridade, eu conhecia esse estilo de pessoa.

Porque eu era um deles.

Mas não foi um minuto. O barulho de uma explosão ao


fundo, fumaça, gritos e histeria. Melissa saiu da minha linha
de visão e meu primeiro ato foi ir em direção ao palco onde
ela discursava, contudo, fui parado por Carl, que se jogou
em cima de mim, me levando ao chão.

E então... tiros.

Pânico.

O que diabos estava acontecendo? Em minha cidade? E eu


só conseguia pensar em Melissa.

— Me deixe, Carl.

Empurrei Carl de cima de mim, até perceber que as balas


iam em direção ao palco. Meu coração pulsou de forma
inimaginável, como se eu

fosse ter um ataque cardíaco. Eu só consegui correr em


direção aonde as balas iam, ouvindo Carl atrás de mim,
gritando.

Eu consegui ver os irmãos e cunhados de Melissa saindo


pelas portas dos fundos, agradecendo internamente por
Victoria não ter vindo, mas meu foco estava unicamente em
Melissa.
Vi Milena atrás de um pilar, enquanto a fumaça diminuía,
revidando os tiros com sua própria arma. Às vezes eu me
esquecia que Milena era uma atiradora de elite, mas o que
me apavorou, e literalmente apavorou, foi ver, mais atrás,
Lexa sendo alvejada por um homem que tinha apenas um
alvo em mente: Melissa.

O homem atirou duas vezes em Lexa, que caiu


desacordada.

Melissa caiu sentada e sufocou um grito com a mão. Eu me


aproximei, enquanto o homem apontava a arma para a
cabeça de minha esposa.

Sem pensar, entrei na frente do homem, protegendo Melissa


com meu corpo, eu atirei em sua cabeça, fazendo seu
cérebro explodir diante de nós dois, que tinha o traje branco
agora todo salpicado de sangue. O

homem não esperava que eu aparecesse, e foi um segundo


para que estivesse no chão.

Melissa olhou para Lexa, para o homem, e então para mim


com a mão sobre a boca. Depois do que pareceu uma
eternidade, eu a alcancei e a levantei. Fiz uma inspeção
minuciosa em seu corpo procurando por algum machucado
enquanto alívio e raiva me inundavam.

— Está machucada? — Perguntei instável.

— O-oque...

— Olhe para mim — Melissa tinha os olhos em Lexa, que


estava no chão. Então, levantou-os em minha direção com
certa dificuldade.

— Lexa...
— Olhe para mim! Está machucada?

Melissa apenas me olhou, com os olhos azuis inundados de


lágrimas não derramadas. Nenhuma única resposta saiu de
seus lábios,

apenas lágrimas descendo. Carl chegou, sinalizando, e com


isso a ajudei a se levantar. Quando a segurei pelo ombro,
ouvindo, ela tremia levemente, e pude notar também que
os disparos haviam cessado. Carl nos levou para os fundos,
onde eu vi Milena e os homens de Giovanni entrando em
um carro. Eu entrei em nosso carro, me sentando na frente,
e deixando Melissa enrolada em seu próprio corpo no banco
de trás, totalmente silenciosa.

O caminho até em casa foi tenso, até termos certeza de que


não estávamos sendo seguidos. Tudo o que me preocupava
era a segurança de Melissa, e descobrir o que diabos tinha
acontecido. Isso nunca aconteceu, nunca em minha cidade,
enquanto eu chefiava a Darkness.

— Alguma ideia? — Perguntei assim que vi a entrada de


nossa casa.

— Infiltrados.

Esbravejei e soquei o porta-luvas. Eu tinha uma


desconfiança de que o alvo era Melissa. Mesmo que não
fizesse exato sentido, era a única explicação. Talvez o
descontentamento fosse grande, e tentaram tirar Melissa de
circulação.

Uma ponta de culpa me corroeu, quando pelo espelho, vi


Melissa com o olhar perdido na janela.

— Traidores?
— Ainda não tenho muitas informações, senhor. Mas
vamos...

questionar alguns.

— Farei isso pessoalmente.

— Senhor...

— Farei. — Cortei Carl enquanto descia do carro. Eu


descobriria essa merda — Peça para que me esperem.
Inclusive Maceratta.

— Ele está com raiva.

— Nada será feito sem a minha presença, Carl.

Dei a volta e abri a porta do carro para descer Melissa. Ela


parecia... perdida. Eu a conduzi com cuidado pela entrada,
escada acima, e a levei para seu próprio quarto. A sentei em
sua cama e pedi um calmante para uma das mulheres da
cozinha, pelo interfone.

— Está machucada?

Ela olhou finalmente em meus olhos.

— Ele atirou em Lexa... e então apontou a arma para mim. E

você... você entrou na frente da arma e o matou — Sua voz


saiu distante

— Você poderia ter morrido...

Eu me aproximei e agachei diante dela. Segurei seu rosto


entre minhas mãos e disse com todo o ódio e raiva que
sentia no momento, por vê-la em um estado tão deplorável
em sua festa de estreia, algo que eu já tinha notado ser de
extrema importância para ela.

— Eu vou matar cada filho da puta que pensar em te


machucar!

Ela me olhou, com os olhos muito abertos diante da minha


declaração. Eu selei nossos lábios em um beijo de boca
fechada, mas ainda assim, forte. Duro. Me levantei e sai do
quarto, a ouvindo me chamar.

Encontrei uma das mulheres da cozinha no caminho, ela


ajudaria Melissa. Minha mente estava em apenas um lugar:
descobrir que merda tinha acontecido na porra da minha
cidade, colocado a credibilidade da segurança da Darkness
em cheque, lidar com Giovanni e Milena e o principal.

Descobrir quem tinha tentado contra a vida de Melissa.

Melissa Capello

Meu Deus...

Eu estava em transe. Após dispensar Mariana e qualquer


remédio que ela quisesse me dar, eu me sentei na beira da
minha cama e fiquei ali. Lexa... meu Deus, o que poderia ter
acontecido com Lexa? Ela estava bem? E Vicenzo?
Ele entrou na frente de uma arma e matou o homem que
iria atirar em mim. Eu vi a determinação do homem no olhar
dele, ele sorriu. Ele queria me matar. Então Vicenzo
apareceu e o matou primeiro. Eu ainda tremia, mas medo
me tomou, quando comecei a elaborar a dimensão de tudo
o que tinha acontecido.

Estávamos fazendo o nosso discurso, eu e Milena, quando


simplesmente houve uma explosão e barulhos e fumaça.
Então Milena estava trocando tiros com alguns homens.
Gritos, histeria. Milla, Daniel...

desesperada me levantei e peguei o celular. Disquei o


número de Daniel que chamou três vezes antes que ele
atendesse.

— Você está bem?

— Estou em casa, Dan. Pelo amor de Deus, me diga que


você está bem.

— Estamos todos bem, aqui na casa do Nate e Milla.

— Daniel, pelo amor de Deus, o que aconteceu?

Daniel suspirou.

— Vicenzo ainda não sabe. Ele disse que vai se encarregar


de saber.

— Ele... ele entrou na frente de uma arma. Você acha que


ele pode... se machucar?

— Infelizmente, Mel, a vida que seu marido leva não é a


mais segura. Mas se eu bem conheço Vicenzo, ele vai
destruir Chicago antes
que algo assim volte a acontecer.

Respirei fundo duas vezes. Vicenzo parecia não temer nada,


eu pude ter a prova hoje, ali, na minha frente.

— Você sabe onde ele foi?

A resposta demorou alguns segundos que pareceram uma


eternidade.

— Não. Mas ele estava determinado no telefone, e parecia


saber aonde ir e o que fazer.

— Acha que é... perigoso? — Eu não consegui me parar.


Estava preocupada, ele poderia fazer uma loucura. Eu vi a
loucura nos olhos dele, loucura somente com a possibilidade
de eu ter me machucado.

— Não sei. Mas se cuida, fique aí, seu marido sabe se


cuidar.

Me despedi de Daniel, mas toda a situação ainda crescia


dentro de mim. Eu estava no escuro em absolutamente
tudo. Não fazia ideia do que de fato estava acontecendo lá
fora, de quem eram aquelas pessoas e suas motivações.

Eu me levantei da cama e fui para onde ainda não tinha ido


em momento algum: O quarto de Vicenzo. Estava
preocupada com ele, essa era a única verdade.

Ele saiu determinado a fazer uma loucura e eu temia por


ele.

Minha surpresa foi tremenda ao encontrar a porta apenas


encostada. Talvez ele tivesse saído com muita pressa, ou
talvez, simplesmente, ninguém era louco o bastante para
entrar ali sem um convite.
Mas eu era. Cada dia mais, eu tinha certeza de que nunca,
jamais, Vicenzo me trataria com violência, principalmente
depois dele entrar na frente de uma arma por mim. E matar
um homem que me ameaçava.

O quarto era o que se esperava de um homem como


Vicenzo. Tons escuros, uma cama enorme no centro, lenções
de seda marrons. O

perfume de Vicenzo exalando no ar. Nenhuma foto, nenhum


porta-retrato, tudo muito... limpo e organizado. O banheiro
estava logo a frente, então uma porta na lateral, pequena,
me chamou a atenção.

Por algum motivo louco e desconhecido, meu coração


disparou no peito, e movida por muita curiosidade me
aproximei da porta. Fiquei parada em frente alguns
segundos pensando sobre o quanto era inapropriado estar
no quarto de Vicenzo e mexer em suas coisas sem o seu
consentimento.

Consentimento.

Ri internamente.

E talvez foi por perceber o quanto era irônico eu ter essa


consideração por Vicenzo, que eu me encorajei e abri a
porta. O quarto não era muito grande, e estava totalmente
escuro. Por instinto, procurei o interruptor na parede e liguei
a luz.

A cena que se formou em minha frente fez o meu coração


parar por alguns segundos. Eu esqueci como era respirar.
Tinha fotos minhas.

Fotos dos meus ensaios, fotos de todos os formatos colados


em toda a parede. Tentei não surtar internamente. Fechei os
olhos, e me lembrei de que Vicenzo não era um homem
convencional. Ele poderia ser um admirador esquisito do
meu trabalho.

Contudo, foram as fotos em cima da mesa que me tiraram o


chão.

Eram fotos de viagens pessoais, com amigos, em jantares.


Eram fotos que eu não tinha visto serem tiradas. Minha mão
foi sobre a minha boca e eu tentei controlar as batidas do
meu coração. Câmeras em frente ao meu prédio em Nova
Iorque. Em Paris. Fotos de um jantar em Tóquio.

Stalker.

Vicenzo era um Stalker, e pelo que eu via, já a algum


tempo.

Eu estava prestes a chorar, virar as costas e surtar de vez


quando uma pasta me chamou a atenção.

“Estillus”. Ali, estava uma pasta com o nome da agência


que eu trabalhei por anos. Fui em direção a pasta e a abri
de forma quase frenética. Encontrei meus dados, trabalhos
e... Darius. Vi fotos de Darius.

Ver o homem que abusou de mim e me engravidou aos


dezessete anos foi um choque. As fotos eram de Darius em
algum lugar na Grécia, tiradas a menos de uma semana, se
a data na foto fosse correta.

Então tudo fez sentido.

Vicenzo estava rastreando Darius. Era por isso que Melinda


Gray não me ligou mais desde o meu casamento, e por isso
que Darius também havia sumido. Muito provavelmente
Vicenzo sabia o que havia acontecido comigo e estava... me
vingando.

A confusão me tomou pela enxurrada de informação em


uma noite só.

Vicenzo me obrigou a me casar com ele porque ele me


queria por algum motivo, que em nada tinha relação a
idiotice de Judith. Era por mim. Ele viu uma oportunidade e
a pegou.

Ele me chantageou e se casou comigo. Contudo... ele


sempre me tratou com gentileza. Tirou Melinda e Darius do
meu caminho. Me protegeu de uma bala se arriscando por
mim, matou um homem por mim, nesse exato momento,
estava tentando descobrir o motivo de atacarem o meu
evento e continuava me protegendo, procurando por Darius.

Não me perguntou sobre nada, apenas estava me vingando,


eu poderia apostar ser isso. A mistura de sentimentos que
esse homem me causava era algo que estava além da
explicação. Me sentei na cama, coloquei a cabeça no
travesseiro e me deitei ali, tomada pela exaustão.

Herói ou vilão? Os dois. Vicenzo era os dois.

Foi com muito custo que abri os olhos. O quarto já não


estava escuro, estava em uma semiescuridão devido à
porta aberta. E um homem estava ali, parado. Vicenzo. Eu
me sentei, olhando o horário na cabeceira, já se passavam
das quatro da manhã. Sentada, liguei o abajur e encarei
Vicenzo.

Deus.

Ele estava todo sujo de... sangue. Mãos, braços, roupas. Ele
parecia um animal. Ali eu vi o verdadeiro Dead Eyes. Ele
olhava para mim em confusão, e então, vi o entendimento
se desenrolar em seus olhos. A porta da antessala estava
aberta. Seus olhos voltaram para mim com uma mistura de
surpresa e... insegurança?

— Melissa...

Eu não pude controlar o instinto. Esse homem era um


monstro.

Tinha me obrigado a casar sob ameaças, mas ainda assim...


ainda assim... ele nunca havia maltratado a mim ou a
qualquer um da minha família.

Tinha carinho por Victoria que era meu mundo inteiro. Me


apoiava, me olhava com adoração. Deus, eu deveria estar
assustada. Outra mulher em meu lugar estaria desesperada
por ser perseguida por um homem como ele, mas... eu me
senti estranhamente protegida.

Ele tirou Melinda e Darius do meu caminho. Me protegeu


com seu próprio corpo de uma bala. Matou por mim.

Talvez eu fosse louca como ele. Estava cansada de resistir.


Me aproximei dele com a rapidez que reuni e beijei seus
lábios. Sua roupa estava úmida de sangue. Sua mão com
sangue seco me enlaçou e me tirou do chão. Minhas pernas
se enrolaram ao seu redor.

Não me importei com o cheiro metálico de sangue e


pólvora, nem mesmo com o fato, que poderíamos estar
parecendo dois animais, eu o queria. Queria como a
primeira vez que o vi no escritório do meu irmão.

— Eu quero você. Dentro de mim.


Os olhos predadores de Vicenzo me seguraram e ele me
jogou na cama, me deixando ainda mais em expectativa.
Ele tirou minha calcinha e eu o ajudei tirando a camisola.
Vicenzo pairou por cima de mim como se eu fosse perfeita.
Sua mão, suja de sangue, áspera, passou do meu pescoço,
lentamente, até os meus mamilos, provocando-os com uma
suavidade que me fez quase perder o ar. Sua boca passeou
por meu pescoço, até chegar ao meu mamilo, dando ali
uma leve mordida.

Eu me movimentei em direção a sua boca, até sentir suas


mãos em meus braços, me mantendo cativa ali. Sua boca
desceu até minha barriga em uma carícia torturante e eu fui
ficando mais e mais úmida.

Sua boca passou por minha virilha, explorando, como se ele


estivesse realizando um sonho.

Talvez estivesse.

Minha mente parou quando ele desceu até o meu clitóris e o


beijou, lentamente. Instintivamente eu abri mais as pernas
e soltei um gemido.

Meu gemido fez com que ele soltasse um rugido


animalesco, deixando a suavidade de lado e abocanhando
minha boceta. Como se ela fosse a sua refeição.

Eu gritei de puro deleite e prazer, enquanto sua língua


girava e me deixava mais e mais louca. Um prazer foi se
construindo, crescendo à medida que ele me penetrava com
um dedo. Eu gritei quando foi impossível conter o orgasmo
que fez todo o meu corpo tremer. Ele me acariciou enquanto
os espasmos me deixavam, até se pôr de pé.

E começar a se despir. Cada peça jogada no chão, eu lia sua


história em seu corpo, coberto de tatuagens e cicatrizes.
Quando sua cueca boxer foi tirada, um pênis imponente e
ereto surgiu em minha linha de visão. Eu me sentei, e sem
pedir permissão o coloquei em minha boca.

— Puta que pariu... — Vicenzo disse em um gemido.

Eu suguei a cabeça do seu pau e o estimulei com as mãos,


sua mão foi para o meu cabelo enquanto nossos olhos se
encontravam. Ele parecia perdido na miríade de prazer que
eu provocava nele com minha boca. Sua respiração foi
ficando suspensa à medida que eu intensificava a ação, e
ele segurou minha cabeça por meus cabelos, me olhando
com uma mistura de raiva e tesão. E fodeu a minha boca
até lágrimas surgirem em meus olhos.

Quando se deu por satisfeito, me deitou na cama e cobriu


seu corpo com o meu. Sentir seu corpo quente, ainda que
sujo da sua realidade, o seu peso, me fez sentir uma
completude que eu ainda não havia sentido.

Esse era ele, Vicenzo, em toda a sua verdadeira essência. A


cabeça do seu pau cutucou a minha entrada e lentamente,
ele me penetrou.

Vicenzo Capello

Não foi como eu imaginei que seria.


Foi muito, muito melhor do que qualquer fantasia. Sentir as
paredes internas de Melissa molharem meu pau e o sufocar
com sua pressão. Ela era apertada pra caralho. Comecei a
me movimentar dentro dela sem me preocupar do motivo
de ela estar em meu quarto, ou mesmo de sua entrega.

Ela era finalmente minha, e daqui não sairia até eu dizer


para sair.

Ela era doce em seus lábios, selvagem em suas unhas,


marcando minhas costas. Eu não aguentaria muito tempo.
Esperei demais por esse momento. Talvez uma das maiores
conquistas até o momento.

Meus movimentos foram se ritmando. Eu estava tão


insanamente obcecado pela mulher que penetrava, foi
impossível e inevitável não jorrar a porra do tempo de
espera dentro dela, marcando sua boceta como minha pelo
tempo necessário.

Eu a tinha em meus braços, convulsionando pelo próprio


prazer, enquanto eu mesmo tentava controlar o meu próprio
abalo interior. Tudo tremia. Sangue, suor, respirações
ofegantes, a prova do nosso prazer em nossos fluidos. Eu a
tinha. Melissa finalmente era minha.

— Desde quando? — Sua voz suave soou após um tempo,


enquanto seu corpo quente se enlaçava no meu e eu
acariciava suas costas.

— Desde que te vi no escritório do seu irmão.

Ela levantou a cabeça e me olhou nos olhos. Eu não fugi da


sua imensidão azul.

— Tirou Melinda do meu caminho. Eu sei que foi você.


Eu apenas a olhei em silêncio, não adiantaria negar.

— E está perseguindo Darius.

— Ele pagará com a vida pelo que fez a você.

Eu a senti se encolher diante das minhas palavras. Baixou a


cabeça, voltando a deitar em meu peito, e passou a brincar
com alguns cabelos ali. Ver Melissa, que sempre me
encantou com seu brilho, se diminuir diante da memória do
que tinham feito a ela, me deixou com mais raiva ainda.

— Nunca se envergonhe da sua história. Você não fez nada


de errado.

— Eu tomei o remédio porque quis. Eu escolhi.

Eu levantei seu queixo e olhei em seus olhos.

— Você era só uma menina lidando com uma situação que


não deveria lidar.

Seus olhos estavam cheios de lágrimas não derramadas. Ela


sussurrou um obrigado, e me deu um suave beijo, um roçar
de lábios que encheu o meu coração de ternura.

— Lexa está bem?

— Ela vai ficar bem.

Ela usava colete e o tiro no braço com o tempo iria se curar.

— Você sabe quem está por trás do ataque?

Eu respirei fundo... Sim, eu sabia, e embora não fosse do


meu feitio compartilhar negócios com as mulheres que me
relacionei, com Melissa foi natural. Talvez porque ela tinha o
direito de saber, afinal, tinha relação direta com ela.
— Alguns homens da Darkness tinham algumas
expectativas em relação a mim. Mesmo que a minha
organização não tenha o hábito de se meter nos assuntos
pessoais dos seus homens, eu sou o líder.

— Não queriam que se casasse com alguém de fora do seu


mundo. — Ela voltou a me encarar. Não precisava de uma
resposta, e eu

já estava cuidando de Santini e seus aliados — Por que eu?

Eu respirei fundo novamente.

— Porque desde o momento em que te vi pela primeira vez


algo dentro de mim, gritou que você deveria ser minha.

Seus olhos ficaram muito abertos e então ela se sentou na


cama, cobrindo os seios com o lençol.

— Não é convencional. Você me ameaçou, me coagiu, ao


mesmo tempo. Você, de uma forma distorcida, cuidou e
cuida de mim. Eu não sei muito bem como lidar com isso.

Eu me sentei e puxei o seu cabelo para atrás da orelha.

— Esse sou eu, baby. Espero que um dia consiga entender.

Seus olhos azuis seguraram os meus pelo que pareceu uma


eternidade e então ela cedeu a minha aproximação.

Eu me dei conta então de que, mais do que ter o corpo de


Melissa em minha cama, eu queria a confiança dela. Seu
afeto. E isso me surpreendeu.
Melissa Capello

Mesmo com o desastre da festa de inauguração da sede da


Castelle em Chicago, os dias que transcorreram foram de
intenso trabalho, mesmo que a sombra do atentado da
inauguração ainda pairava sobre os homens. Embora muitas
coisas tinham mudado desde então.

A poucos dias, Lexa voltou a fazer a minha segurança, o que


foi um extremo alívio, eu confiava nela. As mulheres que
frequentavam os eventos em que eu acompanhava Vicenzo,
da Darkness eu sabia agora, simplesmente passaram a ser
mais amáveis comigo.

E Vicenzo... bem, as coisas têm estado bem... quentes entre


nós.

Eu bem que tentei resistir, mas a cama dele já era nossa.


Ele me surpreendia mesmo quando estava longe. Era como
se soubesse ler cada pensamento meu, de forma que me
assustava em alguns momentos.

Eu fui criada com excesso de atenção. Meu trabalho exigia


que eu fosse o centro das atenções, mas ali, com Vicenzo,
era uma atenção que eu nunca havia sentido antes. Me
fazia sentir especial. Única.
Não que ele sorrisse com frequência, até mesmo o
relacionamento com seus irmãos era meio frio e distante.
Mas quando estava comigo, principalmente só comigo, ele
era envolto por uma ternura que eu nunca imaginei um
homem com a história de vida dele possuir.

Além do sexo avassalador, que me revirava por dentro, nós


conversávamos sobre tudo. Mesmo Mário estava mais
acessível e era nítido que eu me sentia confortável ali. Não
era o que eu esperava, na verdade, de todas as
possibilidades, aquela era a única que eu nunca considerei:
A de realmente gostar de Vicenzo.

Olhei para a tela do notebook e tirei os óculos. A parte


burocrática da Castelle era uma dorzinha de cabeça a parte,
mas era o que eu queria no fim das contas. Estava vestida
em um pijama de algodão, de short e regata, e me lembrei
de que já fazia pelo menos três horas que

eu estava lutando com aquelas planilhas. Começar uma


equipe não era fácil, mas eu estava muito empenhada com
o novo negócio.

Desci as escadas e, como eu vinha fazendo a algum tempo


nos últimos dois meses, vi a luz do escritório de Vicenzo
acesas. Era quase como uma mariposa sendo chamada para
a chama, e eu não ligava. Eu adorava me queimar.

Bati uma vez e abri a porta, Vicenzo estava ao telefone.


Como sempre ele não falava muito, apenas alguns
resmungos. Eu me aproximei e seus olhos iluminaram
quando passou por minhas pernas.

Eu me sentei na mesa, de frente a ele, começando a


provocá-lo com meu pé em seu peito. Ele se deitou para
trás, falava em italiano, eu não entendia uma merda, mas
seus olhos me davam toda a atenção.
Desci o pé do peito para a virilha, encontrando seu pênis
pronto.

Então retirei o pé e me agachei no chão, ouvindo-o sufocar


um gemido.

Ele semicerrou os olhos quando eu desabotoei seu cinto e


liberei o seu pau. Estava úmido. Lentamente, passei a língua
na ponta, sentindo o gosto salgado dele.

Antes que eu repetisse o ato, ele resmungou uma despedida


e desligou o telefone. Eu abocanhei o seu pau em minha
boca, e passei a chupá-lo com vontade. Ele deitou e revirou
os olhos, enquanto eu o levava com minha mão e boca.

Quando percebi que ele perderia o controle, Vicenzo me


levantou e me virou de costas, varrendo sua mesa e tirando
minha blusa. Meus seios fizeram contato com a mesa
gelada, e senti meus shorts deixando meu corpo com a
calcinha. Um tapa estralado foi dado antes que seu pênis
entrasse sem reservas.

Sufoquei o grito de surpresa, e então senti a mão de


Vicenzo em meu cabelo levantando minha cabeça
levemente.

— Está se saindo uma menina muito má, Mel.

— Eu sei que você adora...

Ele arremeteu contra mim duramente, colocando dois dedos


em meus lábios.

— Me dê tudo, Melissa. Tudo.

Senti um calafrio por todo o meu corpo.


— Sou tua.

As palavras simplesmente jorraram da minha boca. Seu


dedo passou a acariciar minha bunda, primeiro com um
dedo, depois dois. Ele provocava enquanto me penetrava
por trás e eu só conseguia ficar ali assimilando as
sensações. Era... muito bom.

Senti uma sensação gelada na minha entrada traseira e


então o pau de Vicenzo passou a brincar ali. Eu fechei os
olhos até senti-lo me penetrar devagar. Doeu um pouco,
mas logo eu me acostumei com a sensação. Até ele me
firmar pelos quadris e se apossar do meu corpo como se
realmente ele fosse o dono.

Meus seios nus sobre a mesa, a fricção na virilha e seus


urros animalescos me fez ter um orgasmo fora de série, que
quase me fez chorar, e eu senti Vicenzo chegar ao clímax no
mesmo momento. Foi louco e terno, uma sensação de
prazer e poder.

Ele deixou o corpo cair sobre o meu e entrelaçou nossos


dedos.

Nossos corações batiam em um compasso quase perfeito.


Da forma mais distorcida e nada convencional, eu havia me
afeiçoado ao meu algoz. E não, sentia qualquer culpa por
isso.

Ele saiu de mim, virou meu corpo e eu o encarei. O agarrei


com pernas e braços, e ele me levantou no colo, colocou
seu paletó em volta do meu corpo nu, e me levou para
cima.
Vicenzo Capello

Eu estava em uma conversa com Carl e o Prefeito de


Chicago, em uma angariação de fundos para crianças com
leucemia, e de onde eu estava, volta e meia meus olhos iam
para Melissa. Era incrível como ela socializava, mas a única
pessoa que ela conversava de fato era Lexa.

Ela dizia algo, e Lexa tentava segurar o sorriso.

— Deveria ao menos disfarçar essa sua devoção pela sua


esposa.

— Mário provocou. Eu revirei os olhos e não disse uma


palavra.

Continuei fingindo que ouvia o que o prefeito dizia. Em


seguida, vi Ashley e Daniel chegarem ao evento, e logo,
Melissa e a cunhada grudaram. Eu e Melissa a cada dia que
se passava, estávamos mais e mais próximos, tão próximos
como eu nunca fui de qualquer mulher.

Enquanto eu a via jogar a cabeça para trás e sorrir


abertamente de algo que Ashley dizia, senti uma mão em
meu ombro.

— Olá, Vi.
Olhei e me deparei com Rebecca London. Dei um sorriso de
boca fechada e acenei.

— Boa noite, Rebecca.

— Queria te parabenizar pelo casamento. Foi bem...


inesperado.

Rebecca e eu nos relacionamos por três anos, e eu sabia


que ela esperava um pedido em algum momento. A verdade
é que, até que tive a oportunidade de ter Melissa, eu nunca
tinha pensado na possibilidade de me casar com mulher
alguma.

— Obrigado, Rebecca.

Ela me olhou por alguns instantes e então abriu a boca para


falar.

— Por que ela? — Sua voz não tinha qualquer tom de


acusação.

Apenas uma dolorosa curiosidade.

Olhei para Melissa, que tinha os olhos em nós dois. Nossos


olhares se encontraram e eu ouvi um riso triste. Voltei para
a mulher em minha frente — Eu já entendi, Vi. Você se
apaixonou.

Olhei surpreso para Rebecca. Ela me deu um tapinha no


ombro, e saiu. Enquanto eu pensava sobre o que Rebecca
tinha dito, senti o perfume e a presença de Melissa ao meu
lado. Sua mão veio para a minha, e como esperado, senti o
conforto.

Eu a olhei, ainda pensativo sobre as palavras de Rebecca.


Sim, eu estava apaixonado.
— Bonita, ela.

Eu dei um sorriso de lado, foi impossível não notar a picada


em seu tom.

— Ela é.

Os olhos de Melissa foram para os meus e semicerraram.

— Pareciam íntimos.

Eu sorri amplamente antes de olhá-la novamente.

— Ciúmes?

Ela revirou os olhos.

— Apenas curiosa.

Sorrimos juntos e eu a aproximei de mim.

— Não há ninguém nessa sala que se compare a sua luz e


beleza, Mel.

Ela olhou para mim, e então sorriu, encostando o rosto em


meu peito. Porque era verdade. Não havia. Ela levantou o
rosto e beijou meus lábios de leve. Meu peito se apertou
com o carinho genuíno. Sim, eu estava apaixonado. Essa era
a sentença de Melissa: Ser minha para sempre.

Eu tinha entrado para uma reunião com o prefeito quando


meu telefone tocou. Era Carl. Eu nunca dispensava uma
ligação de Carl quando ele me ligava mesmo sabendo que
eu estava em uma reunião importante. Pedi um tempo e
atendi.

— Darius está em Chicago.


Meu peito saltou.

O verme do Darius estava na cidade e logo teria o que


merece. Eu o deixei solto, sabia que em algum momento ele
arrumaria uma forma de se aproximar de Melissa. E meu
faro estava certo, ele queria a minha Melissa.

Eu encerrei a reunião com o prefeito, mesmo percebendo


que ele não havia gostado muito, e fui em direção a Melissa
e Lexa. Melissa me olhou já estranhando o meu
comportamento e eu olhei para Lexa.

— Leve Melissa daqui para casa.

— O que está acontecendo? — Ela perguntou, me olhando


alarmada.

Eu beijei sua testa, lentamente.

— Depois eu te explico, Mel.

Ela não discutiu, embora quisesse. Eu me afastei e fui em


direção a Carl. Hoje Darius pagaria com a vida pelo mal que
tinha feito a Melissa.

Entramos no carro e eu nem me identifiquei para entrar em


um dos hotéis mais sofisticados de Chicago: Era um
associado da Darkness.

Subi para a cobertura, nem um pouco surpreso pela sutileza


de Darius. Ele, em minha cidade, eu sabia que era para
ameaçar Melissa de alguma forma. Eu esperei com
paciência e ali estava ele. Dois homens faziam a guarda do
seu quarto, e logo foram silenciados por Carl e mais dois
homens da Darkness.
Entramos e encontramos um homem de idade, muito acima
do peso. Me embrulhou o estomago ao imaginar o que esse
porco havia feito com a minha Melissa. Ele pagaria por cada
sofrimento. Seus olhos

se arregalaram quando me viu. Ele tentou pegar um


telefone, mas eu tirei minha arma e atirei em sua mão com
um silenciador. Ele deu um grito.

— Quem é você? — Questionou, enquanto levava a mão ao


peito, sujando seu roupão branco de sangue.

— Seu pesadelo.

O homem urrou quando outro tiro foi dado em sua perna.


Carl e os outros o seguraram e eu me aproximei, ficando em
frente ao seu rosto.

— Melissa Turner. Se lembra desse nome?

Seus olhos se arregalaram.

— Você não tem ideia de quem sou eu.

— Não, senhor — Eu disse a apontei a arma para sua


cabeça —

Você é que não tem ideia de quem sou eu.

Um tiro em sua cabeça. Outro para garantir.

Ele seria um exemplo para qualquer um que ousasse se


aproximar de Melissa.
Melissa Capello

— Porque você nunca nos contou, Mel? — Milla disse, se


levantando e vindo me abraçar.

— Por que não. Não queria ninguém preocupado comigo, já


bastava tudo o que acontecia com você.

— Meu Deus, você teve que passar por um abuso e um


aborto sozinha, sem o nosso apoio. Me sinto culpada.

— Não se sinta. Por favor, foi uma escolha minha. E eu


superei.

— Eu não estou acreditando que esse homem teve a


coragem de vir até aqui! — Ashley disse vindo me abraçar
do outro lado — Eu sinto tanto Melissa. Nem imagino como
deve ter sido.

— Vicenzo me protegeu. Ele vem me protegendo de tudo e


todos.

Milla respirou.

— Ele salvou todas nós, essa é a verdade. E é só olhar para


vocês, estão apaixonados. Ele te daria a lua se você
pedisse. Ou pelo menos tentaria.
Eu sorri. Realmente, Vicenzo me daria qualquer coisa. Faria
qualquer coisa por mim, e eu estava convencida de que
estávamos apaixonados. Agíamos como um casal
apaixonado.

— Vamos prometer não esconder mais segredos. — Ashley


disse.

Eu sorri.

— Não, eu passo, todos temos segredos.

Todas caímos na gargalhada. As meninas ficaram mais


alguns minutos e foram embora. Eu aproveitei para ir ao
encontro de Vicenzo no escritório, onde eu sabia que o
encontraria. Contudo, o encontrei no corredor, vindo em
minha direção. Quando se aproximou me elevou no colo,
deixando meu rosto rente ao seu.

— Já ia lá, tirar minha paz, não é? — Disse sorrindo


enquanto beijava minha boca.

— Claro que não, ia te puxar para a cama.

Fiz cara de inocente e ele sorriu amplamente. Eu amava


quando ele sorria assim. Ele pegou a minha mão e levou até
o seu coração, ficando sério.

— É teu. É cruel e impiedoso, mas você desperta o melhor


dele, mas é teu. Gostaria de me arrepender por ter te
obrigado a ficar comigo, porém não consigo. Eu faria
novamente, mil vezes, se fosse para você estar aqui agora.

Eu o encarei com intensidade. Quão distorcido poderia ser,


eu retribuir o sentimento dele? Porque em mim, hoje, só
cabia alegria.
— E o meu coração é teu, Vi. Eu te amo.

Ele suspendeu uma respiração e me beijou. Era isso, eu


havia encontrado amor onde jamais imaginei encontrar.

Distorcido ou não, correto ou não, era amor. E eu o sentiria


em toda sua complexidade. Pelo tempo que durasse.

FIM

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SINOPSE
SUMÁRIO
PRÓLOGO
CAPÍTULO 01
CAPÍTULO 02
CAPÍTULO 03
CAPÍTULO 04
CAPÍTULO 05
CAPÍTULO 06
CAPÍTULO 07
CAPÍTULO 08
CAPÍTULO 09
CAPÍTULO 10
CAPÍTULO 11
CAPÍTULO 12
CAPÍTULO 13
CAPÍTULO 14
CAPÍTULO 15
CAPÍTULO 16
CAPÍTULO 17
CAPÍTULO 18
CAPÍTULO 19
CAPÍTULO 20
CAPÍTULO 21
CAPÍTULO 22
CAPÍTULO 23
CAPÍTULO 24
CAPÍTULO 25
CAPÍTULO 26
CAPÍTULO 27
CAPÍTULO 28
EPÍLOGO
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