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PERIGOSAS NACIONAIS

PERIGOSAS ACHERON
PERIGOSAS NACIONAIS

Copyright © 2018 A G Moore

Texto: Andressa G. Moreira


Revisão: Fabiano Jucá e Hellen Caroline
Capa: Murillo Magalhães
Diagramação: Denilia Carneiro

Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens, lugares e


acontecimentos descritos são produtos da imaginação da
autora. Qualquer semelhança com nomes, datas e
acontecimentos reais é mera coincidência.
________________________________________________
INESQUECÍVEL

A G MOORE

1ª Edição — 2018
________________________________________________
Todos os direitos reservados.
São proibidos o armazenamento e / ou a reprodução de
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qualquer parte dessa obra, através de quaisquer meios —


tangível ou intangível — sem o consentimento escrito da
autora.
A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na lei nº.
9.610/98 e punido pelo artigo 184 do Código Penal.

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SUMÁRIO

SUMÁRIO
Nota da Autora
Dedicatória
Epígrafe
Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
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Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Epílogo
Nota sobre a doença de Henri
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Agradecimentos
Sobre a autora
Redes Sociais
Trecho do próximo livro: Imensurável.
Conheça as outras obras da autora:

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Nota da Autora

Este livro faz parte de uma série com 4. Cada


livro tem um casal como protagonista, e você pode
compreender mais sobre o passado dos mocinhos
da série lendo o conto “4 amigos — como tudo
começou” aqui mesmo, na Amazon.
Estou grata por você já ter chego até aqui, e
dado uma chance ao meu primogênito. Que sua
leitura seja repleta de emoções e que sua mente se
abra para compreender a evolução desse romance
do começo ao fim.
O livro foi escrito inicialmente por mim em
2015, e teve uma versão anterior a essa com outro
nome e outro pseudônimo. Caso reconheça o
enredo, continue a ler, pois o livro sofreu alterações
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e reformulações.
Nesses três anos com essa história sendo
trabalhada, me empenhei a chegar em um ponto
onde enfim fiquei satisfeita.
Espero que te faça feliz também.
Boa leitura!

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Dedicatória

A Deus, pelo amor infinito.


A Antônio Carlos, meu avô. Um
dia você me devolveu um quadro com
nossa foto nos meus 15 anos, dizendo
que quem deveria guardá-la é a pessoa
que ficaria na Terra após a outra
partir. Eis aqui mais um modo de
deixá-lo inesquecível nas minhas
lembranças, mesmo o tendo ainda em
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vida. Te amo.

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Epígrafe

INESQUECÍVEL
adjetivo de dois gêneros
Que não pode ser esquecido;
inolvidável, memorável.

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Prólogo

Era começo da madrugada quando percebi


que, como fazia nas minhas lembranças, Henri
estava demorando a chegar em casa. Vesti um robe
por cima da camisola e saí do nosso quarto com
uma sensação ruim pairando em meus
pensamentos. Clara já dormia serenamente em seu
dormitório e eu não conseguia me concentrar em
fazer o mesmo. Me preocupava com meu marido.
Depois de tanto andar em círculos pela sala,
com os braços cruzados na altura do peito e a
mente trabalhando a todo vapor, olhei as horas,
vendo que já eram 2 da manhã. Fui para o sofá da
sala e comecei a fazer o que fazia há anos, quando
essa era minha rotina: jogar Xbox aguardando a
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chegada de Henri.
Ele chegou 40 minutos depois. Desliguei a
tevê com pressa e andei até a porta da frente,
ouvindo a chave na tranca.
— Henri? — indaguei ao vê-lo entrar.
Ele não respondeu, mas entrou apoiando-se
aos móveis, cambaleando. Fechei a porta e o segui.
— Henri, você está bêbado? — Me
aproximei e tentei estabilizá-lo.
Porém, quando o toquei, tive uma reação sua
que não esperava.
— Sai! Eu estou bem! Está tudo bem! —
Escapou do meu toque.
— Vem, senta aqui. Vou fazer algo para
você. — O puxei para o sofá.
Meu coração começou a palpitar. Nunca o
tinha visto naquele estado e algo me dizia que havia
coisas por trás de toda aquela cena.
— Não quero nada! Eu não quero nada de
você. Você arruinou minha vida! — Henri gritou e
me empurrou para o sofá.
Meu corpo caiu em choque no móvel macio e
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eu abanei a cabeça para clarear meus pensamentos.


Aquele não era meu marido.
Ao menos não o que eu recordava ser.
— Não sei do que está falando. Me deixa
cuidar de você! — insisti, levantando e andando na
direção dele, que já estava seguindo rumo ao
corredor dos quartos.
Puxei-o pelo braço, trazendo seu corpo de
encontro ao meu. Chocamo-nos um com o outro e
notei seus olhos, banhados de lágrimas e
vermelhos, darem lugar a uma ira que jamais havia
visto em toda minha vida.
Ele me empurrou, fazendo com que eu
cambaleasse para trás.
— Ela não me quer mais por sua causa!
Vadia! Louca! Fique com suas lembranças idiotas!
Volta pro galãzinho e me deixa! — E proferindo
essas palavras, estapeou-me, gerando uma dor
desconhecida para mim.
A ardência do tapa me fez recuar e acariciar
meu próprio rosto. Eu não entendia; não sabia de
quem ele estava falando, mas meus olhos estavam
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em prantos e meu semblante, em choque. O tapa


doeu, mas minha cabeça latejava mais do que
nunca pela agressão. Não podia acreditar que
aquele homem era meu marido, o homem que me
fazia juras de amor.
— Eu... te odeio, Henri... Você não devia ter
feito isso comigo!
Ainda tive a coragem de encará-lo, mesmo
com o rosto dolorido e lágrimas desenfreadas
banhando minha face. Nunca fiz nada para merecer
a forma como me tratou naquele dia, e mesmo que
fizesse, nada justifica a violência que ele estava me
fazendo passar em uma simples noite por motivos
que nem ao certo eu sabia.
— Se chegar perto, farei mais! Eu perdi! Que
se dane! Perdi de novo. A perdi e perdi minha vida!
— Henri falou chorando, erguendo os braços
enquanto gesticulava sem parar.
Após ter dito isto, entrou no nosso quarto e
meus batimentos puderam, enfim, ir voltando ao
normal. Eu estava tremendo, doendo, chorando.
Corri desesperadamente para o quarto de
Clara e me tranquei lá. Levei meu celular e fiquei
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ali, tremendo de medo e chorando a noite inteira,


sentada com as costas na porta, sem conseguir
dormir até o amanhecer.
Meu rosto estava pálido, exceto na área em
que Henri bateu, onde permanecia inchado e muito
vermelho.
Encarei-me no espelho do banheiro às 8h da
manhã. Clara ainda dormia. Saí do quarto e Henri
já não estava mais em casa, mas não sabia se
comemorava ou me preocupava. Para onde ele teria
ido, eu não fazia ideia. No entanto, aquele dia com
certeza me deu respostas que nem precisei
procurar.

Fique à vontade.
Logo conhecerá uma história.
Te contarei a minha história de amor.
Não é tão comum quanto pensa, posso
garantir. Não, não me apaixonei perdidamente por

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um poderoso homem sem sentimentos, nem fui a


mocinha inocente que mal sabia do amor.
Eu já amei. Amei com toda minha alma.
Mas fui destruída.
Perdi tudo e precisei recomeçar.
E essa é a história de como tudo foi
reconstruído e, enfim, fui amada da forma que
mereço.

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Capítulo 1

AMANDA
Meses antes.

Sabe aquele dia em que você para tudo e


pensa no que passou?
Eu estava tendo um desses momentos.
Ali, no quarto emprestado no apartamento do
meu irmão, foi inevitável fazer uma retrospectiva
da minha vida desastrosa. Como começar a te
contar minha história? Confesso que não sei ao
certo como relatar... Mas se for para contar a raiz
de tudo, que seja desde o meu primeiro coração
partido.
Nunca fui o tipo de garota que chama a
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atenção por onde passa, mas sempre acreditei que


um dia poderia ser feliz e ter alguém ao meu lado
para compartilhar minha felicidade. Mas a vida vai
mostrando que nem tudo é como sonhamos.
Com quinze anos meu primeiro namorado de
escola me traiu debaixo do meu nariz. Toda a
escola cochichava entre os corredores quando eu
passava. Foi humilhante, mas a adolescência é
assim, cheia de decepções e aprendizados.
Aos dezoito eu finalmente encontrei um
namorado perfeito. Ele era o cara dos meus sonhos
– literalmente –, até conseguir me convencer a
perder a virgindade em uma noite, falando no dia
seguinte que tudo estava acabado entre nós, pois ele
iria para outra cidade estudar.
Okay, decepções fazem parte da nossa vida!
Mas depois dessa eu me fechei.
Decidi que relacionamentos não eram algo
primordial na vida de qualquer ser humano, muito
menos na minha.
Meus pais se separaram na mesma época,
fazendo com que meu irmão e eu fôssemos

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chutados para fora de casa como se não


passássemos de um fardo.
Foi aí que Henri entrou.
Eu estava recomeçando.
Eu estava bem.
Estava trabalhando, em breve entraria na
faculdade, mas ele apareceu. Ele me quis, ele
perturbou dia após dia até que eu aceitasse sair com
ele.
Enfim... Me apaixonei.
Henri era o sonho de consumo da minha
mente imatura. Moreno bronzeado, com um porte
autoritário e imponente. Seus olhos cor de mel me
faziam derreter enquanto falava coisas doces. Eu
cedi, eu me envolvi, eu casei com ele.
Aos vinte anos comecei a namorar com ele;
aos vinte e dois éramos recém-casados, felizes,
apaixonados. Tudo com Henri era maravilhoso, até
eu engravidar e dar à luz a uma menina linda com
os olhos cor de mel como os do pai, aos vinte e
quatro anos.
Foi aí que tudo mudou.
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Sabe quando você começa a notar que não é


mais tão especial, ou não tem mais o olhar de amor
e devoção do seu marido? Sabe quando você nota
que ele começa a te evitar e inventar desculpas para
não dar toda a doçura que dava antes?
Não sei qual foi meu erro, mas foi aos vinte e
oito anos – que eu havia acabado de completar –
numa noite quente de sábado, que eu soube
claramente:
Henri me traía há anos.
— Alô? Quem quer que seja, é engano. Estou
muito ocupada agora. — Uma voz feminina
notoriamente bêbada falou ao telefone.
Eu tinha ligado para ele pela milésima vez
naquela madrugada, pois o maldito ainda não tinha
chegado em casa. Aquela postura já tinha se
tornado uma rotina torturante em nosso lar.
— Henri! Passa pro Henri agora! — gritei.
Nossa filha já dormia e eu havia me trancado em
meu quarto desde então.
— Hummm, ele está ocupado agora. Não
pode falar, né, meu amor? Aiii! Não faz assim que

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eu piro! — A mulher respondeu e depois


direcionou a fala a alguém que estava com ela.
Claramente era Henri.
Desliguei o telefone e, sem pensar duas
vezes, fiz as malas com tudo que possuía: roupas,
acessórios, itens de higiene e sapatos. Estava
decidida a ir embora assim que meu marido traidor
colocasse os pés dentro de casa.
E foi o que aconteceu. O surpreendi na porta
da frente, dando um soco em cheio no seu rosto,
comunicando que iria embora. Ele não negou ter
me traído. Eu soube que meu esposo jamais
deixaria Clara ir comigo, pois nem sabia onde
poderia morar. Então, decidi ir sem mais
discussões, no instante em que ele vetou a saída da
criança e, assim que pudesse, voltaria para buscar
minha filha.
Afinal, ele tinha me traído, mas ainda era pai.

É esse o momento em que chego ao ponto


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crucial da minha história. Eu, ainda deitada sobre a


cama no apartamento de meu irmão após dois
meses da separação, decidi que aquele dia seria um
divisor de águas em minha vida. Até ali, ainda não
tinha conquistado nada no âmbito profissional e a
frustração me dilacerava. Determinei que voltaria
para a faculdade, conseguiria um emprego melhor e
faria tudo para me realizar pessoal e
profissionalmente, e logo poderia buscar minha
filha, Clara. Relacionamentos? Não, obrigada. Eu
me sentia forte o suficiente para ser feliz sozinha.
E, bem, tinha razão, pois sempre fui determinada
em tudo o que fazia e sempre conseguia o que
almejava, mesmo com muito custo.
Era uma sexta-feira, quando, após muito
meditar e refletir sobre tudo que tinha vivido, meu
irmão Pedro entrou no quarto de repente.
— Mandi, cheguei agora. Vou tomar um
banho e sair para encontrar com meus amigos.
Devemos ir a algum bar ou boate aqui por perto.
Precisa de alguma coisa?
Ele jazia de pé, encostado no batente da
porta, já arrumado. Confesso que nunca fui de sair
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para baladas, sempre fui estudiosa e centrada, não


gostava de bebidas alcoólicas nem de farras nos
fins de semana. Por um momento me senti tentada
a saber como deveria ser essa vida boêmia, já que,
agora que morava em um bairro mais nobre...
Deveria ao menos curtir o local. Afinal, estava
solteira e sem absolutamente nada para fazer numa
sexta à noite.
— Preciso sair, posso ir com você?
— Absolutamente... Não — Pedro respondeu
imediatamente. — Você não vai gostar, fora que eu
não estou a fim de ser babá hoje. Então fica aí
vendo seus filmes melodramáticos. Se quiser trago
um lanche pra você mais tarde, quando eu voltar.
Fiquei com um pouco de raiva e fitei
fixamente os olhos do meu irmão, tentando criar
uma justificativa boa para que ele me levasse.
Definitivamente estava decidida a ir a qualquer
custo. Pensei em minha filha e no compromisso de
buscá-la no dia seguinte. Imediatamente, antes de
falar qualquer coisa, reforcei o alarme no celular,
mas não desisti da ideia de sair. Era um direito
meu, que sempre vivi trancada em casa, vivendo
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para filha e marido, me divertir nem que fosse um


pouco. Afinal, Henri fez muito pior quando
também saía à vontade e me traía mesmo quando
estávamos casados.
— Ok, você vai e eu sairei sozinha pelas ruas
procurando uma boate, então. — Dei de ombros. —
Vou colocar aquele vestido de paetê rosa e passar
um batom vermelho que vai chamar atenção de
muitos caras na rua...
Enquanto eu falava, Pedro, ainda de pé na
entrada do quarto, balançava negativamente a
cabeça, provavelmente imaginando a cena, e como
um irmão protetor e ciumento que era,
interrompeu-me em seguida.
— Tudo bem! Você pode ir, mas eu te aviso
logo que não costumo voltar cedo e, se eu for pra
outro lugar, você terá que voltar de táxi, ouviu?
— Sua voz era mais em tom de advertência do que
de raiva.
— Obrigada, irmãozinho! — Fiquei eufórica
e pulei da cama. Corri e fui abraçá-lo. — Não irei
te decepcionar.
Ele sorriu, pois em meio a toda a seriedade
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que demonstrava, me amava e estava disposto a


cuidar da única irmã mais nova. Pedro não hesitou
em me oferecer um quarto do seu recém-adquirido
apartamento no bairro nobre da cidade — que
ficava a uma curta viagem do meu antigo lar —,
assim que liguei chorando e contando o que o
canalha do Henri tinha feito. Ele prometeu que
cuidaria de mim e me ajudaria a superar essa fase
ruim. Pedro era bem-sucedido e tinha um emprego
federal, ganhava bem e conhecia muitos donos de
empresas e multinacionais. Desde que eu fui morar
com ele há dois meses, tentava encontrar um
emprego com seus contatos pessoais, mas ainda
não tinha conseguido nada.
Algumas horas depois, meu irmão e eu
saímos de casa. Pedro tinha um Corolla do ano, de
cor chumbo. Fomos nele em direção à boate Drink,
que ficava a alguns quarteirões do apartamento, no
mesmo bairro em que morávamos. Ao chegarmos,
ele passou algumas advertências a mim.
— Mandi — me chamou pelo apelido de
infância. — Vou me encontrar com alguns amigos.
Você entra comigo, mas pode ficar à vontade lá
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dentro. Não me chama a não ser que seja


emergência — ponderou antes de prosseguir. — Se
eu estiver com alguma mulher, não me chama nem
que seja emergência. Acredito que você saiba se
virar, não sabe?
Ainda não tínhamos saído do carro. Eu
apenas desejava que ele aproveitasse sua noite
normalmente, sem se incomodar com a minha
presença.
— Tudo bem, irmãozinho, não vou estragar
sua noite, relaxa. Aqui estão as chaves de casa,
qualquer coisa eu pego um táxi. Prometo não beber
muito, isso se eu beber. — Sorri ao fim da frase,
mas na verdade eu pensava em provar de tudo um
pouco. Não estava nem me importando se meu
irmão me levaria para casa ou não, eu queria
independência e pela primeira vez ansiava
aproveitar uma boate, já que não conhecera
nenhuma na vida.
— Ok. Vamos lá, entre comigo. — Ele saiu
do carro e me levou até o interior do local.
Ao entrarmos, Pedro se dirigiu ao grupo de
amigos sentados no bar, que o aguardavam. Sem
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saber muito o que fazer, o segui enquanto admirava


o interior daquele local pouco iluminado com
feixes de luz e várias áreas vip ao redor de uma
pista no centro, onde muitas pessoas dançavam. Ao
se aproximar dos amigos, Pedro os apresentou a
mim.
— Gente, essa é minha irmã, Amanda. —
Apontou para mim diante dos três homens.
Virou-se para o primeiro — um homem de
aparentes 30 anos como ele, com uma barba rala e
cabelo bagunçado curto, olhos dourados
esverdeados, um belo sorriso, pele branca e porte
robusto.
— Esse é Nick. — Nick acenou e Pedro logo
apontou para o segundo homem ao seu lado, um
negro bem afeiçoado que aparentava ser um pouco
mais velho, não tão alto quanto Nick, mas com um
corpo bastante atlético, cabelo raspado sem barba
nem bigodes, olhos escuros, quase imperceptíveis
na escuridão da boate.
— Esse é o Lucas. — Lucas sorriu e acenou
com a cabeça.
Por fim, Pedro apresentou o último amigo:
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um homem bem mais alto que os três, beleza jovial,


corpo atlético e largo, pele branca bronzeada,
cabelos claros longos e rebeldes, olhos azuis quase
cinza, braços fortes e um sorriso que faria qualquer
garota deitar e rolar só de olhar.
— Esse é Tony. — Quando Tony se virou
para falar comigo, seu rosto ficou sério. Ele me
observou de baixo para cima e soltou um "oi",
voltando a beber o que estava ingerindo
anteriormente.
Me senti um tanto constrangida por estar ali e
logo me recolhi em minha insignificância.
— Oi. Não vou atrapalhar vocês. Prazer em
conhecê-los — proferi rapidamente e saí de perto
deles quase que imediatamente, desejando não
precisar voltar para aquele "altar de deuses" onde
meu irmão acidentalmente estava incluso.
Não que meu irmãozinho não fosse lindo, ele
era. Mas eu quase poderia crer que ele fez seleção
das amizades em uma agência de modelos. Todos
eram bastante... Como posso falar? Atraentes.
Não que eu perdesse tempo em analisar essas
bobagens.
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Caminhei até o bar e pedi uma bebida,


afirmei para o barman que queria a mais forte e
quente do local. Rapidamente ingeri e senti minha
cabeça arder, mas jurei para mim mesma em meus
pensamentos, que aquele dia eu aguentaria tudo que
fosse preciso.
Após beber algumas doses, fui dançar. Sabia
que era fraca para bebidas e já nem sentia muito
bem a aflição e nervosismo inicial. Não conseguia
ver claramente as pessoas que dançavam comigo
devido à luz fraca, mas aceitava todos que se
ofereciam e dançava até não aguentar mais. Foi
quando em um momento, corri os olhos pelo local e
notei um dos amigos de meu irmão ao lado dele em
algum canto do bar me encarando. Pedro
conversava com uma garota mais nova que ele,
enquanto seu amigo – o maior de todos – me
encarava com olhos cautelosos e curiosos. Talvez
eu chamasse sua atenção. Disfarcei para que ele
não visse que reparei suas olhadas, mas quando
decidi virar o corpo para o lado oposto ao dele,
notei esse tal amigo cochichar algo no ouvido do
meu irmão.

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Senti um arrepio e minha orelha queimar.


Mas querem saber o que eu fiz?
Nem me incomodei. Estava bêbada e já tinha
dançado tanto que não quis raciocinar nem
imaginar o que aquele homem enorme poderia ter
dito a Pedro.
Alguns se aproximavam e dançavam comigo.
É claro que eu aceitava e ria, entretida com eles,
deixando meu humor maravilhoso devido à
embriaguez ser o condutor daquela noite.
Até que...
— O que você está fazendo aqui? Virou
baladeira?
Quando ouvi isso, paralisei.
Não, não era ele.
Virei e foquei meus olhos embaçados no
homem da voz familiar. Era Henri, meu ex-esposo,
bem no meio daquela boate que ficava a uma curta
viagem de onde ele morava. Aquele maldito não
tinha aprendido nada, na mesma hora me lembrei
de Clara e não hesitei em avançar e socar o peitoral
do meu ex.
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— Cadê minha filha? Com quem ela está?


Seu monte de merda, você deixou nossa filha
sozinha?! — gritei desesperada enquanto socava o
peito dele.
Estava numa boate, tinha plena consciência
daquilo. Mas eu nunca fiz uma loucura daquelas.
Nunca deixei minha filha para me “divertir”. Senti
o ódio percorrer por minhas veias.
— Ela está com a babá. Relaxa. Eu só quero
saber por que você está aqui. Vai pra sua casa!
— Henri estava nervoso, dava para notar. Deve ser
por ver que eu estava seguindo em frente,
aproveitando tudo o que ele negara durante todos
os 8 anos em que estivemos juntos.
Mas eu não deixaria barato. Não mesmo. Ele
pode curtir tudo e eu não? Continuei com meus
gritos e socos o xingando de machista e, em
seguida, gritei em bom som tudo que ele fez a mim.
Depois disso ele me puxou pelo braço algumas
vezes, exigindo satisfações e explicações enquanto
eu, bêbada, cuspia em seu rosto e depois chorava
pedindo para que ele me soltasse. Seu aperto era
forte e sua voz estava me deixando tonta e com
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medo. Então, de repente, outro personagem entrou


na história complexa que se desenrolava no centro
daquela pista: o amigo do Pedro que eu não
lembrava o nome. Ele me puxou pelo braço,
tirando-me da frente de Henri, depois voltou ao
meu ex, dando um soco no meio do seu olho,
deixando-o sem reação. Logo após o golpe, ele
retornou e levou-me para fora da boate.
Seu toque no meu braço era firme, mas
gentil. Sem o aperto abusivo que Henri tinha.
A verdade era que algumas lágrimas já
ardiam em minha face e eu não entendia muito bem
nada do que tinha acontecido ali. Por que eu não
estava assimilando as coisas?
Abri bem os olhos e, mesmo sabendo que
aquele homem era amigo do meu irmão, não
entendi o motivo dele estar me carregando boate
afora.
— Ei, eu não quero ir pra casa! Quem é
você? Por que está me puxando? Estou sendo
expulsa? — Relutei, bêbada, contra o aperto firme
dele no meu braço. Ele continuou me arrastando e
me colocou no banco do carona em um carro preto.
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Assim que ele entrou do lado do motorista, foi


como se o mundo tivesse acionado o “mudo” e um
silêncio pacífico reinou, me fazendo dormir
imediatamente.
— Eu hein... Maluca. — Consegui ouvir
antes de ser embalada pelo sono.
Após isso, tudo foi um borrão louco e
alucinado. Senti alguém me segurando no colo e
forcei meus olhos a se abrirem. Estava num
quadrado de metal com um homem sendo
iluminado pela luz central do quadrado.
— Você é meu anjo da guarda? Eu estou no
céu? — falei num sussurro e meus olhos foram
direto em encontro aos do homem. Logo após
indagar, os fechei e voltei a relaxar em seus braços.
— Não sou um anjo, mas acho que essa boa
ação de hoje pode me dar uma passagem direto
para o céu. — A voz firme sussurrou em resposta
ao que eu havia perguntado. — Droga, tô falando
com uma bêbada inconsciente. Parabéns, Antônio.
Quem era Antônio?
Enfim, eu estava bastante atordoada ainda,

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então não fiquei me questionando mais nada sobre


o estranho.
Acontece que ele me levou para a casa de
meu irmão e me acomodou no sofá, porém assim
que senti meu corpo na horizontal, uma ânsia subiu
por meu estômago.
Abri os olhos um tanto embaçados e tentei
me conter para não sair vomitando pela sala da
casa.
— Calma, calma, ainda não. Vou pegar um
balde! — Notei o homem quando falou perto de
mim, de pé.
Segurei enquanto pude. Estava um pouco
mais consciente e esperei pelo balde. Assim que ele
o colocou em minha frente, vomitei imediatamente
tudo o que havia dentro de mim. Ele me ajudou,
segurando meus cabelos longos enquanto eu,
sentada no sofá, apoiada com a cabeça baixa para o
balde, vomitava.
Depois de ter passado aquele vexame,
levantei e corri para o banheiro, consciente da
minha vergonha. Tranquei a porta, lavei meu rosto
e a boca e me olhei no espelho. Vi a imagem de
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uma mulher destruída pela vida e me senti a pior


pessoa do mundo. Como alguém vai se importar
com isso? Eu pareço uma mendiga de vestido
chique, estou acabada, minha vida é um caos.
Diante desses pensamentos, comecei a chorar,
amargurada. Meu choro se interrompeu com uma
batida na porta do banheiro.
— Você está melhor? Já posso ir? — Era a
voz de um homem, que eu nem lembrava mais que
existia.
Virei e abri a porta. O verifiquei de cima a
baixo, tentando identificar de onde o conhecia, pois
obviamente não lembrava devido ao exagero no
álcool.
— Quem é você e o que faz no meu
apartamento? — perguntei, desconfiada.
— Tony, amigo do seu irmão. Já estou de
saída, queria apenas saber se estava bem
— respondeu enquanto se afastava de mim, creio
que por medo do meu olhar raivoso naquele
momento. — Tchau.
Enquanto ele se dirigia para a porta da saída,
minha mente afundava. Eu não queria saber o que
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podia ter acontecido entre nós, só me sentia a pior


das mulheres do mundo por estar naquela condição,
algo inimaginável até então. Finalmente saí do
banheiro, encostei na parede da sala e recomecei a
chorar. Não sabia mais o que fazer, estava no meu
limite. Escorreguei pela parede até sentar no chão
com os cotovelos apoiados nos joelhos e as mãos
na cabeça, em total desespero.
Tony estava na porta quando se virou e viu
essa cena. Ele pareceu pensar um pouco antes de
voltar até mim e oferecer um lenço que guardava
no bolso.
— Por que minha vida é assim? Eu nunca
poderei ser feliz na vida? Nem aproveitar uma noite
na boate sou capaz! Adolescência arruinada,
casamento destruído, e olha você, nem te conheço,
mas já estou aqui arruinando sua vida com meus
problemas.
Meu choro parecia não ter fim. Não queria
importunar aquele homem que, por mais que não
fosse ninguém conhecido, não parecia ser uma
pessoa ruim. Mas mesmo me vendo fazendo uma
cena ridícula, ele ficou perto de mim.
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— Fica calma, eu só quero ajudar. Não seria


melhor se você fosse dormir agora? Já é tarde e vai
ser melhor para sua cabeça, que deve estar doendo
por ter bebido tanto.
E minha cabeça doía.
— Qual o seu nome? Você é real? Isso tudo
está mesmo acontecendo? — Ainda um tanto
atordoada, engoli o choro. Meus olhos se fixaram
nos dele.
Um curto sorriso brotou em seu rosto antes
de me responder.
— Tony. Isso é real, sim... E... Eu já tinha me
apresentado antes.
— De Antônio? — perguntei enquanto
tentava afastar minha mente dos pensamentos
negativos.
— Sim. — Tony pareceu achar graça. — De
Antônio.
— O meu nome é Amanda — disse. Tony
apenas continuou sorrindo e percebi o que tinha
acabado de fazer. Olhei para baixo envergonhada.
— Você já sabia, não é? Meu nome.
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Ele assentiu e logo depois seus olhos rolaram


para seu relógio de pulso, puxando sua camisa
social branca para cima. Mesmo tonta, eu
acompanhava Tony com os olhos em cada
movimento que fazia, sinceramente não conseguia
lembrar de onde tinha visto alguém tão
estupidamente lindo em toda a minha vida. Mas
logo espantei esses pensamentos quando ele disse
que estava tarde, já eram 3h.
— Meu Deus! Desculpe, pode ir, vai pra sua
casa, não quero te alugar mais! — exclamei,
sentindo-me um incômodo para ele, enquanto
levantava e o puxava para fora do apartamento.
— Obrigada por sei lá o que você fez, e por estar
aqui agora também. Tchau.
E foi assim que a primeira noite que selou o
resto da minha vida, terminou.
Com Tony do outro lado da porta, e eu
sozinha com minha desgraça dentro do lugar que
agora eu chamava de casa.

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Capítulo 2

TONY

Talvez você esteja aí idealizando o homem


quebrado que nunca desejou amar.
Você está enganado.
Eu sempre quis amar.
Sempre desejei ter um dia o mesmo que meus
pais tiveram.
Eu era apenas um menino que nada sabia de
sentimentos ou relacionamentos, mas notava a
forma maravilhosa com que o amor conseguia
reinar em minha casa.
Sou filho único de pais que se amaram até a

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morte.
Mas eu também vi o lado feio de amar. O
lado que faz as pessoas sofrerem, faz com que
queiram morrer, queiram viver num casulo sem
vida ou razão para sair de lá.
E foi isso que me convenci de que o amor
não era tudo aquilo que eu imaginava.
Assim que minha mãe faleceu, quando eu
tinha apenas dezenove anos, cheguei em casa
depois de ter saído com uns amigos e notei um
silêncio atípico no ambiente.
Caminhei lentamente por entre os corredores
da mansão, dirigindo-me até o quarto de meus pais,
mesmo sabendo que eles provavelmente não
estariam lá, pois só se trancafiavam no quarto após
a janta.
Bati à porta cinco vezes e não obtive
resposta.
Foi quando Claudinha, a empregada de nossa
casa, me encontrou ali e veio correndo em minha
direção.
— Tony, venha! Ele está no escritório.
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Me chamou num sussurro alto, fazendo meu


coração apertar. O tom de voz dela parecia
cauteloso demais para um dia normal. Algo tinha
ocorrido e eu estava me preparando para aquilo.
Quando enfim me aproximei da porta do
escritório e bati, um susto causado pela voz de meu
pai me fez estremecer.
— Saia! Não quero ver ninguém se não for
minha Letícia!
Me virei para Claudinha, que estava com
lágrimas nos olhos com as mãos elevadas ao peito,
e perguntei:
— O... o que houve?
Ela respirou fundo, contendo a emoção nítida
no olhar, e falou num tom baixo:
— Sua mãe, senhor... Sua... Mãe...
Eu já havia entendido sem ela ao menos
completar a frase, mas, ainda assim, soquei a
parede, com raiva do que eu poderia saber.
— Minha mãe o quê? — Aumentei o tom da
minha voz.
— Ela acabou de falecer num acidente de
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carro, menino. Eu... sinto muito. —Abaixou a


cabeça e depois se virou, correndo para longe de
mim.
Sinceramente, naquele momento, tudo em
que eu me firmava, acreditava e confiava ruiu.
Lágrimas incessantes jorraram por meus
olhos, fazendo com que um soluço involuntário
escapasse de minha garganta.
Ela havia ido embora.
Tudo isso dentro das curtas horas em que eu
estava longe.
Sem pensar direito eu comecei a bater mais
forte na porta do escritório do meu pai. Se alguém
podia me contar melhor essa história, era ele.
Não estava acreditando. Não podia ser.
Minha mãe me deu um beijo na cabeça desejando
um ótimo dia naquela manhã, seria impossível que
ela simplesmente morresse ao fim do dia.
— Pai! Abre! Sou eu, Tony. Abre! — gritei e
implorei, mas ele não abriu.
Entendi, após ter passado onze horas em
frente àquela porta, que deveria resolver tudo
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sozinho. Deveria passar o luto e ir ao enterro


sozinho.
Pois meu pai não abriria a porta.
Ele não a abriu.
Não antes de 12 dias.

Imerso em pensamentos um tanto


conturbados, voltei para minha casa naquela
madrugada, após deixar Amanda em casa, como
Pedro me pediu.
O maluco tem tanto poder de persuasão que
me convenceu a cuidar da própria irmã maior de
idade e independente, para que ele pudesse sair
com uma mulher que havia acabado de conhecer.
Confesso que Amanda chamou muito a
minha atenção antes mesmo do pedido de Pedro.
Eu não conseguia fazer meus olhos desviarem dos
dela, como uma hipnose. Por mais distante que ela
estivesse de mim.

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O que ela fazia com aquele olhar?


Enfim... Notei que a mulher era um problema
quando começou a resumir a própria vida no
apartamento do irmão. Eu sabia que o cara que a
estava tratando com desrespeito na boate era algum
conhecido, mas depois do que ela contou, suspeitei
de que fosse o ex dela.
Fiquei com pena de tudo que me disse, mas
não pude ajudar mais do que o que fiz.
Infelizmente o amor causa essas coisas nas
pessoas, e sinceramente... Para passar por isso, eu
estou fora.
Já não bastava o que eu presenciei sobre o
amor todos esses anos com meu pai. Ainda tive que
ver a cena de Amanda sofrendo pelo maldito
sentimento. Fora todas as decepções que Bruna –
minha melhor amiga – me contava antes de se
casar.
Definitivamente, amar estava fora de
cogitação.
Mas ainda assim, estranhei o modo como
meus pensamentos foram preenchidos pela imagem

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da irmã de Pedro chorando e contando seu passado,


em contraste com a mulher sorridente dançando na
boate.
Ela era linda demais, preciso admitir. Um
corpo esguio, porém com curvas. Muito em forma
para quem tinha passado pela experiência de ser
mãe, pelo que eu soube. Já saí com mulheres que
são mães e todas elas reclamavam de alguma
insatisfação com seu corpo. Ainda bem que não
passo da primeira noite.
Deus me livre ter de encarar a rotina de uma
mulher e suas variações de humor.
Prefiro ficar com o lado alegre e sedutor. O
melhor lado.
Bom para mim, bom para elas. Ninguém
perde.
Assim que cheguei em casa, mandei a
mensagem para Pedro:

Sua irmã está a salvo em casa. Você me


deve seu último suspiro. Tony

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Ele me respondeu agradecendo, e enfim pude


dormir em paz. Parei aqui

O sábado começou cedo para mim. Me


levantei e corri até a academia do condomínio de
mansões onde moro e ali fiquei por duas horas
exercitando-me com a mente vaga. Eu sempre
gostei da rotina que levo em meu dia a dia. Não
preciso me incomodar com ninguém para dar
satisfações ou problemas empresariais em pleno
sábado. Porém, ao fim das minhas séries de
exercícios, ouvi meu celular tocando sobre a mesa
onde o havia posto.
Caminhei suado, peguei a toalha ao lado do
aparelho e enxuguei o rosto antes de atender a
ligação:
— Alô.
— Bom dia, irmão.
Era Pedro.
— Bom. Ligando essa hora no sábado? Caiu
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da cama? — Ri.
Ouvi uma risada sarcástica do outro lado da
linha. Atitude típica dele.
— Não. Na verdade estou ligando para
agradecer por ter cuidado da minha irmã. — A voz
dele soou realmente agradecida.
Eu sabia pouco sobre a vida dos dois.
Conhecia Pedro há um pouco mais de um ano,
apenas. Nossa amizade se iniciou por Nick e Lucas,
que se conheceram nas noitadas da vida e acabaram
por nos apresentar.
Mas uma coisa eu posso garantir com toda a
sinceridade do meu coração: meus amigos são
realmente como irmãos para mim, e Pedro, mesmo
estando há pouco tempo na minha vida, já tem se
mostrado muito importante.
— Não foi nada, boneca. Deu pra curtir a
noite?
— Ah, se deu! Cheguei agora em casa. Tinha
até esquecido que Amanda sairia cedo. Ela até já
foi, mas me avisou que estava tudo bem. E amanhã,
tudo certo?

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— Sim, todos aí para assistir ao jogo. Certo


sim.
— Então tudo certo. — Deu uma pausa. —
Bom, é isso, barbie. Qualquer coisa…
Reprimi uma risada pelo apelido carinhoso.
— Pode deixar.
Desliguei a chamada.
A nossa forma de demonstrar o quanto nos
consideramos importantes um para o outro é
sempre finalizando a ligação com essa deixa
“qualquer coisa...”. O melhor de tudo é que eles são
amigos para qualquer coisa mesmo. Qualquer
momento. Qualquer motivo.
Eles estão sempre lá.
E isso sempre me deu forças, de alguma
forma.
Nunca senti falta daquele sentimento que eu
via entre meus pais, porque sempre tive as
melhores pessoas ao meu redor.
Saí da academia e caminhei lentamente até
minha residência. Se tudo desse certo, de tarde eu
faria uma caminhada pelo bairro. Sábado era
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definitivamente um dia de exercícios.


Entrei em casa, passei pela sala e rumei à
cozinha. Minha casa era ampla e clara, sem muitas
cores. Os cômodos eram preenchidos por poucos
móveis, apenas os mais úteis. Minha cozinha era
um dos meus locais favoritos. Passava grande parte
do meu dia de folga nela.
Não cozinhando, e sim comendo.
Não sei cozinhar absolutamente nada.
Não que eu não tente, já tentei e realmente
não tenho talento para a coisa.
Mas sou um homem grande e isso exige uma
boa sustância.
Adentrei à cozinha já com um sorriso no
rosto, me encaminhando para a geladeira. A abri e
peguei minha vitamina.
A senhora que cuida da minha casa sempre
deixa a de sábado pronta em uma enorme garrafa.
Abri e andei até a sala ingerindo a bebida. Assim
que cheguei, sentei no meu amplo sofá cinza, de
frente para a tevê desligada.
Sábado era um dia bom, mas um tanto
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solitário, admito.
Meus pensamentos voaram até Amanda.
Como deve estar se sentindo hoje? Será que se
lembra de mim?
Um sorriso involuntário dançou por meus
lábios na menção dela em meus pensamentos.
Foi um tanto engraçado ver sua memória
embaralhada e sua situação demasiadamente
constrangedora quando me viu mais lúcida.
Finalizei a vitamina e logo notei o modo
como meus pensamentos estavam sendo
direcionados a ela.
— Eita. Chega, Tony. Passou, foi ontem,
acabou — repreendi-me em voz alta, para ver se a
mente colaborava.
Estávamos em uma guerra de conflitos.

O verão não é minha estação favorita, mas


para exercícios físicos, a mais eficaz. Poucos

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minutos de corrida já tinham feito-me transpirar


excessivamente.
Troquei a corrida por pequenos trotes e
continuei meu trajeto pelos quarteirões.
Ao dobrar uma esquina, meus olhos ávidos
de pronto notaram quando um carro também a
dobrou em alta velocidade, mas o que mais me
chocou foi ver que duas pessoas estavam acabando
de atravessar bem perto de mim.
Não pensei duas vezes ao correr até o começo
da pista, puxando-as para a calçada.
Acabei me chocando no chão, pela pressa,
mas graças aos céus, o carro não atropelou
ninguém.
Me levantei cauteloso e verifiquei se tinha
me machucado, porém mais preocupado estava
com as pessoas que acabei salvando de um
acidente.
Quando levantei os olhos, após verificar a
mim mesmo, notei a mulher me analisando de
baixo para cima. Quando encarei seu rosto curioso,
sorri sem ao menos sentir.

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— Ei! Você nos salvou? Eu queria agradecer.


— Foi o que saiu de sua boca.
Uau. Ela já tinha me esquecido. Por que essa
ideia não me soa tão agradável? — pensei.
— Sim, eu as puxei. Aquele carro pegaria
vocês em cheio — olhei-a nos olhos e mantive o
sorriso. — Acho que sempre nos veremos em
situações como essas, não é? Sou Tony, o amigo do
seu irmão, lembra?
Não contive a curiosidade em perguntar se
ela lembrava. Caramba, eu a trouxe para sua casa!
Bêbada, seu inútil — Meu consciente me
lembrou.
Os olhos dela aumentaram de tamanho e suas
bochechas coraram. Talvez ela lembrasse, afinal.
— Ah, sim. Me lembrei agora. Essa é minha
filha, Clara — confirmou e depois olhou para a
menina ao lado, que eu ainda não tinha notado por
ser bastante pequena. — Diga oi, filha.
— Oi. — Clara respondeu com um sorriso
tímido.
A menina agarrava a mão da mãe como se
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dependesse daquilo para viver, e o fato me intrigou.


Não parecia ser uma criança acostumada a se
relacionar com estranhos, então me abaixei para, de
alguma forma, inspirar confiança para aqueles
olhinhos cor de mel tão bonitos.
— Oi, Clara. Você é uma menina muito
bonita, quantos anos tem? — Tentei engatar uma
conversa com a menina.
Um curto sorriso nasceu em seu rosto.
— Eu tenho quatro. — Mostrou orgulhosa
quatro dedinhos a mim.
— Hum, isso tudo? Já é uma menina grande!
— Arregalei os olhos demonstrando admiração,
enquanto Clara sorria nitidamente envergonhada.
Estava pronto para conversar mais com a
pequena menina, quando ouvi um curto pigarro. Me
levantei e foquei a atenção em Amanda, que
mantinha uma expressão atônita no rosto.
— Bom, precisamos ir. Bom revê-lo, Tony.
— Seu tom de voz mostrou claramente que não
desejava permanecer por mais tempo na minha
presença e isso fez com que eu fechasse o sorriso.

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— Ah, e mais uma vez, obrigada


Respirei fundo e me despedi, conformado.
— Que nada! Até a próxima, então. Tchau
Amanda, tchau Clara. — Acenei, pois no fim da
frase elas já estavam rumando em direção à sua
casa.
— Tchau. — Clara retribuiu o aceno sorrindo
e olhando para trás.
Não evitei sorrir também, enquanto sua mãe
apenas assentiu me dando uma olhadela rápida e se
foram.

— Quem é ela? — Bruna perguntou ao


telefone.
Já era noite e eu não conseguia tirar a cena de
Amanda e Clara da minha cabeça. A menina estava
em que lugar ontem quando deixei a mãe dela em
casa? Mil interrogações pairaram sobre minha
mente desde o momento em que as vi e salvei do
quase-acidente.
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— Ela é a irmã de Pedro. Não comece com


paranoias, Bruna. Te conheço bem. — A adverti.
Bruna cismava em dizer que o conselho de
meu pai não era nada efetivo e bom.
— Mas eu nem disse nada! Você acha que
rolou algo? Hum… Uma química no ar?
Seu tom curioso me fazia rir. Era assim desde
a infância.
— Eu sou químico por um acaso, dona
Bruna? Nem sei do que está falando. Apenas estou
contando que minha mente tem me pregado peças,
mostrando a imagem dela por vezes demais. Agora
a imagem da menina também me invade. Tenho
curiosidade para saber da história delas, apenas
isso. Curiosidade. Nada mais.
Um curto silêncio do outro lado da linha me
fez suspirar arrependido. Ela não entenderia como
curiosidade, eu tinha certeza.
— Hã… Sei. Essa curiosidade por um
acaso… aflora algumas reações masculinas no
senhor?
Eu estava no sofá, tinha acabado de tomar
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banho e… Bem… A imagem dela surgiu no banho


me causando algumas reações… esquisitas demais
para um homem feito e não um adolescente
imaturo.
Pigarreei, disfarçando meu constrangimento.
Bruna sempre escolheu bem as palavras quando
queria introduzir desejo sexual na conversa.
— Bruna, eu realmente não quero falar disso
com você. Esse bebê não vai nascer logo não? Seu
marido não implica com o modo como cuida da
minha vida? Vai satisfazê-lo, Bruninha! —
brinquei, jogando o tema da conversa para ela.
— Boa jogada, Tony! Boa jogada! Logo
sondarei mais desse assunto. Se prepare, senhor
Gali!
Entre risadas, nos despedimos e encerrei a
chamada.
Sobre coisas loucas e sentimentais, eu só
falava com ela. Mas como não há nada de
sentimental em permitir que uma mulher bonita
invada meus pensamentos, não senti como se fosse
algo errado, do qual eu precisasse me prevenir.

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Mas eu mal sabia as emboscadas em que o


destino me colocaria, mais adiante.

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Capítulo 3

AMANDA

Pedro aceitou ter a sobrinha nos fins de


semana na casa dele, entendia que uma mãe
precisava estar próxima de sua filha e facilitava
para Clara ficar mais à vontade comigo sozinha.
Busquei minha filha na casa de Henri, o
antigo lar onde eu morava. Chegando lá, fui
recepcionada por um Henri manso, com uma ferida
no rosto.
Os flashes de cenas da noite anterior
insistiam em tomar posse de minha mente, um
momento ou outro, mas não associei nada à ferida
de meu ex-esposo quando o vi, imediatamente.
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Clara ficou silenciosa por toda a viagem. Na


realidade, após a separação, ela não falava mais
com tanta frequência. Eu já a havia levado em um
médico, mas era apenas uma fase, como todos
diziam.
Sábado era um dia de descanso para Pedro.
Ele ficava geralmente em casa. Comprava comida
pronta e jogava videogame — sim, ele ainda joga
videogame com a idade que tem. — Eu e Clara
passeávamos o dia inteiro pelo bairro. Íamos na
pracinha, no shopping e no fim do dia Pedro nos
levava à pizzaria. Era o momento do tio interagir
com sua sobrinha. E como nos últimos sábados,
aquele não foi diferente.
Após o almoço com Clara e Pedro, levei
minha pequena princesa para a pracinha, no parque
e, enquanto estávamos lá, tentei interagir com
minha filha e fazê-la falar.
— Minha linda, como tem sido na escola?
— Bem — respondeu olhando para os pés.
— O que você tem aprendido?
— Muita coisa — murmurou inexpressiva,

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enquanto se balançava no balanço.


Fiquei ainda mais preocupada. Algo de
errado estava acontecendo e eu tinha certeza disso.
Parei o balanço e agachei até ficar na mesma
altura de minha filha.
— Filha, você está triste com a mamãe?
Papai fica falando algo de mim para você?
Clara assentiu tímida e então abaixou seu
olhar para os pés.
Meu sangue subiu. Se aquele imbecil tivesse
contado alguma mentira para Clara...
— O que ele fala, filha? Me conta? — Tentei
não transparecer raiva em minha voz.
Eu sabia que assimilar a separação dos pais
aos quatro anos de idade nunca seria fácil, mas
tenho tentado de tudo para me manter perto,
levado-a no médico, sendo a mesma mãe que eu
era, mesmo que longe. O meu azar seria caso Henri
não fosse o mesmo pai e falasse alguma merda para
ela.
— Se eu falar, você vai continuar brigando
com ele e nunca mais vai morar com a gente de
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novo? — indagou com o olhar ainda em seus pés.


— O quê? Eu prometo não brigar com seu
pai, mas preciso que me diga o que ele fala de mim.
Concentrei meus olhos nos dela, aguardando
o som fino de sua voz entoar a justificativa.
— Ele diz que você foi embora porque eu
falo demais e desobedeço.
Uma singela lágrima desceu dos olhos de
Clara enquanto ela falava.
Mas que filho da...!
Fechei os olhos e respirei fundo. Odiava ter
que discutir com Henri, mesmo não sendo mais
mulher dele. No entanto, a cada dia me surpreendia
com a capacidade dele em ser um mau-caráter.
— Mas é claro que não é por isso, filha. Eu
jamais deixaria seu pai por algo tão bobo. Vamos
pra casa, eu converso com você quando chegarmos
lá, te conto tudo e então você vai ficar mais feliz,
ok? — Tentei acalmá-la mas, em meu interior,
queria chorar com ela.
Apesar de tudo, me sentia infeliz por não
poder dar uma família estruturada para ela, mas, ao
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mesmo tempo, sabia que ao menos havia tentado.


Esforcei-me por longos oito anos de
relacionamento.
Clara assentiu e a levei pelo braço
caminhando até o apartamento, que ficava a um
quarteirão de distância. Foi quando, ao
atravessarmos, notei que vinha um carro e me senti
retesar no meio da rua.
Pensei em minha vida, na minha filha e que
tudo poderia ruir naquele instante.

Fomos salvas pelo gongo!


Mentira, fomos salvas pelo amigo do meu
irmão que, coincidentemente, estava passando por
ali e nos puxou para a calçada.
Não o conhecia bem, mas já tinha notado que
o homem possuía alguma pinta de herói. Não era
possível que ele estivesse exatamente nos
momentos em que eu mais precisava de auxílio.
Mas tudo bem, eram as surpresas da vida,
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não?
Me surpreendi com a facilidade com que ele,
mesmo sendo enorme e forte, conseguiu fisgar a
atenção e cativar a confiança da minha filha, a
ponto dela sorrir e informar quantos anos tinha — o
que não dizia a ninguém, normalmente. — Mas
logo afastei os pensamentos daquele fato, quando
lembrei quão preocupada estava com o que minha
pequena podia pensar sobre as coisas que seu
estúpido pai havia introduzido na sua inocente
cabeça infantil.
Ao chegarmos em casa, Pedro não estava, o
que me deixou de certo modo mais aliviada. Sabia
que se meu irmão soubesse do que Henri andava
fazendo a Clara, ele iria, no mínimo, tirar
satisfações. Me sentei com Clarinha no sofá e
imediatamente comecei a contar algumas coisas
sobre o seu pai.
— Filha, o papai mentiu muito feio para a
mamãe. Foi uma mentira muito grande que mamãe
não podia mais aceitar, então tive de ir embora,
pois eu precisava ver outro lugar para você morar
comigo. Seu tio Pedro me deixou morar aqui por
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enquanto, até eu encontrar algum lugar bom e então


vou trazer você para morar comigo para sermos
muito felizes. A culpa de eu ir embora foi do seu
pai, não sua.
Segurando as mãos da minha filha, confessei
de um modo mais cauteloso para que Clara
entendesse o que aconteceu realmente. A menina
respirou fundo e, mirando-me fixamente nos olhos,
respondeu:
— Tudo bem, mamãe. Sinto saudades suas.
Papai não conta história para eu dormir. A babá é
muito legal, mas ela não é você. — Seu tom de voz
era triste.
Meu coração apertou tanto com aquela
declaração, que sem pensar em nada abracei minha
filha com todas as forças. Eu só queria voltar a
estudar e trabalhar, já seria um bom caminho
andado e poderia arriscar pegar Clara para morar
comigo em breve. Estava com uma prova de bolsa
para a faculdade marcada para a semana seguinte e,
durante a semana anterior toda, estudei focada em
consegui-la. Teria de levar Clara mais cedo no
domingo, se quisesse mais tempo para estudar. Era
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mais um dia que contaria muito para meu sucesso


na prova. Fora esse dia, eu só teria a segunda-feira
para finalizar meus estudos, pois na terça
aconteceria a avaliação.
Aquele sábado passou voando. Quando Pedro
chegou no fim da tarde em casa, eu e Clara
estávamos nos arrumando. Nós três fomos à
pizzaria escolhida por Pedro e lá demos muitas
risadas, falamos de desenhos animados, contei e
ouvi piadas e, no fim, interagimos com as fatias de
pizza como se fossem humanas. Tudo para que
Clara se sentisse em casa e amada.
Após o jantar, Pedro nos levou para casa e
entregou um presente que estava no carro, para
Clara. Um vestido elegante, para uma ocasião
especial, quando houvesse. A cada dia que passava
eu não sabia mais como retribuiria tudo que meu
irmão sempre fazia por mim, antes mesmo de eu
me casar. Um dia certamente eu o retribuiria à
altura.
Clara é uma menina amorosa e pacífica, uma
garotinha cheia de amor e luz. Onde ela passava as
pessoas ficavam deslumbradas com sua inteligência
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e pureza. Naquela noite, coloquei Clara para dormir


após contar uma linda história e depois fiquei
observando-a. Naqueles momentos com minha
filha, tinha certeza de que tudo que sofri valera a
pena. Pelo sorriso dela, por ela, por sua felicidade,
tudo valeu a pena.

O domingo era um dia daqueles todos iguais


e monótonos. Levei Clara pela manhã para casa,
desculpando-me com Henri pelo horário, dizendo
que precisava estudar. Na verdade, não queria
discutir com ele na frente de Clara, então combinei
de encontrá-lo durante a semana para que nos
falássemos, o que de fato era extremamente
necessário.
Ao chegar em casa, me senti aliviada, pois
sabia que teria silêncio para poder estudar. Era o
dia do futebol e, com certeza, Pedro estaria na casa
de algum amigo assistindo ao jogo em poucas
horas.
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Me sentei no sofá, despejando meu corpo


cansado da viagem de ônibus e notei meu irmão
saindo de seu quarto, rumando à cozinha.
— Clarinha já foi? — perguntou.
— Sim, hoje eu vou estudar o dia todo, tenho
a prova para a bolsa da faculdade na terça. Se eu
conseguir, em dois meses me matriculo e começo
meu semestre.
Ele estava remexendo em algo na cozinha,
mas nem me virei para ver o que era. Pedro tinha
uma paixão estranha por aquele cômodo.
— Humm. Que bom, Mandi. Fico feliz
quando vejo que você está se esforçando para
mudar de vida, Clarinha merece isso. Você é
jovem, bonita, determinada, pode ter o que quiser
na vida. Só te digo uma coisa: esquece namoro,
relacionamento. Isso não te ajudou nunca na vida,
só te prejudicou — alertou com aquela cautela de
quem sabe o que diz.
Suspirei. Meu irmão nunca namorou, deve
ser por isso que preza a liberdade, mas
definitivamente eu já tinha anulado esse quesito da
minha lista de projetos futuros.
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— Eu sei, irmãozinho lindo. Obrigada pelos


conselhos, mas realmente estou focada, não sinto
como se meu coração fosse me trair, mas obrigada
mesmo assim. O futebol hoje está de pé? Preciso de
silêncio para estudar.
Foi quando seus passos se aproximaram e ele
surgiu com um copo de água na mão, em minha
frente.
— Ixe. — Coçou a nuca, desconcertado. —
Marquei hoje com as tcholas aqui, Mandi,
desculpe. O futebol será assistido aqui em casa.
Estuda no quarto, tem como? Vou adiantar o
almoço.
Ah, não! — Meus pensamentos borbulharam
no instante em que percebi que seriam quatro
homens reunidos no apê de Pedro, ou seja, silêncio
zero! Bufei e revirei os olhos disfarçadamente, mas
não podia exigir nada, estava morando de favor e
meu irmão sempre foi amigo e cuidadoso comigo.
— Tudo bem, me viro. — Tentei não soar
decepcionada.
Imediatamente me levantei, fui para meu
quarto e comecei a arrumar meus cadernos e livros
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enquanto meu irmão preparava o almoço. Voltar


para a faculdade agora estava em meus planos
oficialmente. Abri o armário e tirei uma pequena
lista de sonhos a realizar onde havia escrito:
1 — Conseguir um emprego no setor
administrativo de uma empresa. (se possível)
2 — Voltar para a faculdade e concluir o
curso de Administração.
3 — Comprar/Alugar uma casa para morar
com Clara.
4 — Começar uma poupança pessoal para o
futuro de Clara.
5 — Nunca, absolutamente nunca mais casar.

Era uma lista curta, porém com objetivos


difíceis para mim. Estava em um bairro onde não
sabia por onde começar. Já tinha espalhado
inúmeros currículos pelas empresas das
proximidades e nenhuma entrara em contato. Mas
algo dentro do meu coração dizia que alcançaria em
breve todos esses sonhos. Tinha absoluta convicção
de que a sorte sorriria para mim um dia.

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Peguei a lista e fixei-a dentro do meu caderno


para que, quando sentisse sono ou preguiça de
estudar, pudesse relembrar o porquê de tanta
dedicação, então amontoei todo o material e fui
para a sala. Coloquei todos os livros e cadernos
sobre a mesa da sala de jantar e fui almoçar com
meu irmão.
Tentei me oferecer para ajudar, mas Pedro,
quando cozinhava — quase sempre —, odiava que
outra pessoa se intrometesse em suas receitas. Por
tal motivo, apenas arrumei a mesinha da cozinha e
aguardei até que tudo ficasse pronto, para
almoçarmos.
— Nossa, maninha, precisa disso tudo para
passar numa prova de vestibular? — Pedro
perguntou ao ver o monte de livros em cima da
mesa de jantar, ao lado da sala.
— Sim, é tudo que eu preciso por hoje —
respondi, dando de ombros.
— Tudo bem, vem, coloque seu prato e
vamos comer. Fiz uma macarronada, é rápido e
prático. Daqui a pouco os garotos estão aí pra
assistirmos ao jogo, se você se sentir incomodada
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me avisa, tá?
Me desloquei até a “área restrita do cheff” e
me servi de sua iguaria. Para qualquer mortal, “uma
macarronada” não era absolutamente nada de mais,
porém para meu irmão… é a mais completa e
desejosa maravilha!
Amo quando ele cozinha, mas ele não precisa
saber.
— Ok, só assistam sem gritar demais.
Acredito que eu consiga me concentrar mesmo
assim — concordei, mas em minha mente desejava
o silêncio absoluto.
Nós dois sentamo-nos à mesa da cozinha e
nos deliciamos com a macarronada. Não querendo
encher ainda mais a bola de Pedro, mas desde que
foi morar sozinho aprendeu diversas receitas e
adorava cozinhar. Eu pensava que, se ele não fosse
um administrador de hospital, seria um bom cheff.
— Vou tomar um banho, depois eu lavo essa
louça, ok? — indaguei, deixando a louça na pia e
indo até o banheiro, não aguardando sua resposta.
— Ok. — Pedro respondeu notoriamente

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mastigando ainda o último pedaço de comida.

TONY

Estávamos Lucas e eu em frente à porta do


apartamento de Pedro, no qual tínhamos livre
acesso na portaria, e eu não parava de pensar se ele
estava sozinho em casa ou com sua irmã.
Pensamentos doidos como esse realmente
não eram típicos de mim.
— Hey, minhas princesinhas! Chegaram
cedo.
Pedro abriu a porta com um sorriso no rosto.
— Culpa do Lucas, essa quenga. Chegou lá
em casa falando que era às 14h. — comentei ao
entrar.
Rolei meus olhos de modo cauteloso pelo
ambiente. A sala não era tão grande e a cozinha
americana era vista por inteiro por quem estivesse
próximo à porta principal.
— Tranquilo. Me ajudem a preparar algo pro
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lanche.
Nick, Lucas, Pedro e eu somos inseparáveis.
Sempre estávamos juntos nos fins de semana, como
bons amigos solteiros. Só não passávamos as noites
juntos pois cada um tinha suas relações temporárias
para cuidar. Mas suspeito que se não fosse por esse
motivo, até dormir juntos faríamos.
Coisa de louco, eu sei.
— Vou checar o que tem de bom na tevê
antes do jogo. — Lucas disse enquanto pegava o
controle e sentava no sofá, ligando a TV e passando
de canal em canal.
Segui Pedro até a cozinha, tentando ajudar
em algo para o lanche.
Ele me deu algumas funções complicadas,
mas como sabia que eu não entendo nada de
cozinha, terminou por me pedir apenas para montar
os sanduíches que ele tinha recheado.
— Ai meu Deus! — Ouvi uma voz feminina
gritar.
Levantei meus olhos e, mesmo da cozinha,
consegui contemplar uma cena bastante…
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inusitada.
Amanda estava com os cabelos úmidos
enrolados em um coque no alto da cabeça, e apenas
uma pequena toalha adornando seu corpo esbelto,
deixando as pernas à mostra.
Seu rosto transparecia pavor, e sua mão na
altura do peito confirmou que, na verdade, ela tinha
se espantado ao ver Lucas na sala de Pedro.
Será que ela não sabia que viríamos para o
jogo?
— Oi. Não se acanhe, delícia. — Lucas
sorriu. — Ei, Pedro, não sabia que você estava com
uma companhia tão agradável em casa — falou
alto, provavelmente para que Pedro ouvisse da
cozinha.
Não o permiti concluir a frase, pois ao fim
dela, estávamos eu e Pedro na sala de braços
cruzados lançando um olhar repreensivo para
aquele louco que chamamos de amigo.
— Ela não é qualquer pessoa, é minha irmã.
E tira o olho! Mandi não é pro seu bico — Pedro
alertou Lucas e se virou com um olhar culpado para

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a irmã. — Amanda, desculpa, eu esqueci de falar


que eles chegaram mais cedo, vai logo pro quarto
antes que eu tenha que encher Lucas de porrada.
—Ok. — Ela murmurou abaixando a cabeça
e correndo para seu quarto.
Percebi que o ar estava preso em meus
pulmões desde a hora em que a vi assustada
encarando Lucas como se ele fosse tratá-la mal.
Não sei, mas não gostei da forma como ele falou
com ela.
Me sentei no sofá ao lado dele, e em seguida
Pedro veio, já deixando os sanduíches sobre a mesa
de centro da sala.
— Ela é a da noite da boate, não é? Quantos
anos ela tem? Por que você não me disse que tinha
uma irmã tão gostosa?! O que são aquelas pernas
grossas? Naquele dia eu mal reparei nela.
Contive-me para não xingar meu amigo, e
foquei na propaganda que passava na tevê,
enquanto Lucas cuspia idiotices.
— Ei, cala a boca, maldito! Está falando da
minha irmã! Ela tem 28 e eu não quero minha irmã

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na mira de um imbecil como você. — Ouvi Pedro


alertar com raiva.
— Calma, barbie! Ela é casada ou algo do
tipo? Por que não está disponível? — Lucas insistia
em perguntar, enquanto eu apenas observava o
diálogo dos dois pela visão periférica, quieto,
próximo o bastante para prestar atenção em toda a
conversa.
— Divorciada. — Pedro falou entredentes.
— Hum... As divorciadas são as melhores.
Amarguradas, feridas, hum... — Lucas dizia numa
entonação provocadora, apenas para que Pedro
saísse dos eixos. Ele conhecia bem com quem
mexia.
E não demorou muito para Pedro avançar
sobre ele segurando seu pescoço, ordenando que
parasse de falar da sua irmã, pois ela não era para
nenhuma de nós.
— Gente, já era para o Nick vir, não? —
Entrei na conversa, acabando com o tema
“Amanda”.
Os dois se afastaram, mas Lucas mantinha

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um sorrisinho debochado no rosto. Aquele doido


amava provocar a todos nós, me deu até um pouco
de vontade de rir da cena deles quase se
espancando.
— É verdade, daqui a pouco ele chega.
Vamos prestar atenção, jogo já vai começar
— Pedro respondeu, se aprumando no canto do
sofá.
Amanda já estava vestida com uma bermuda
jeans, uma regata branca e os cabelos presos,
quando saiu do quarto e se dirigiu diretamente à
mesa dos estudos sem olhar para nenhum de nós.
Tentei firmar meu olhar na tevê, mas ele teimava
em se concentrar na mesa onde a irmã de Pedro se
manteve pelos 20 minutos seguintes até a
campainha tocar.
— Amanda, abre pra mim, por favor. Deve
ser o Nick. — Pedro pediu.
Ouvi um bufo baixo sair dela, que logo
dirigiu-se à porta.
Não ouvi a curta conversa que os dois
estavam tendo a alguns metros de distância dali,
mas pareceu que Nick se saiu melhor que Lucas,
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com Amanda.
Eu estava intrigado, e muito, muito
preocupado com minha falta de atenção para com o
jogo.
Será que estava nutrindo algum deficit?
Ainda assim, me mantive quieto pois não
queria participar de conversas sujas sobre Amanda
ou qualquer outra mulher, ali naquele local. Não
me parecia… certo.

Longos minutos haviam se passado, e no


jogo, nosso time ganhava apenas de um a zero.
Nick se mantinha concentrado como se sua vida
dependesse daquele jogo, assim como Pedro e
Lucas, mas eu não conseguia me manter fito à tela.
— Henri? Clara está bem? — Escutei a voz
um pouco baixa de Amanda, parecendo estar ao
telefone, mas não me virei para conferir.
Segundos depois, ela tornou a falar:

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— O quê? Não sei do que você está falando.


— O tom tinha baixado um pouco mais.
Mas suspirei derrotado, quando ela levantou
e andou a passos firmes até o quarto, trancando a
porta em seguida.
Um grito dela fez com que nós quatro
saltássemos do sofá.
— E daí?! O que você tem a ver com isso? E
se for meu namorado? Se for o meu peguete, meu
amigo colorido? Eu posso fazer o que quiser da
vida, Henri! Eu estou solteira! Se quiser sair com o
time inteiro de futebol, eu posso! Não tenho um
marido esgotado por cuidar da filha em casa sem
receber atenção pra me preocupar! Se for só esse o
motivo da ligação, pode desligar agora!
Encarei a Pedro com dúvida e ele apenas deu
de ombros e abaixou o volume da tevê, creio que
para saber se a irmã estava bem.
Minha mente se colocou no lugar de Pedro
naquele momento, talvez nossa amizade tenha me
dado esse sentimento fraternal por sua irmã. Será
que ela estava mal? Quem deveria ter ligado para
deixá-la tão nervosa? Seu ex? Estava muito curioso
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e sabia que isso não estava ajudando. Sentia a


necessidade de consolá-la mesmo que não
fôssemos amigos. Amanda pareceu tão diferente,
ela precisava de um ombro amigo.
Mas que diabos é esse pensamento de merda,
Tony?
Foi ali que notei: eu não estava sendo eu.
Não quando se tratava de Amanda.
Mas, por quê?
Em instantes ela saiu e quando chegou na
sala, olhou para Pedro com os olhos cheios de
lágrimas e disse:
— Vou para o terraço do prédio, preciso
respirar.
Antes que Pedro dissesse algo, ela já tinha
saído do apartamento, deixando seu irmão com
uma feição confusa e preocupada.
— Será que ela vai ficar bem? — Minha voz
finalmente se fez ouvir, dirigindo-se a Pedro.
— Não sei, pelo que ouvi ela falava com o ex
canalha que chamava de marido. Amanda é uma
mulher forte, ela vai ficar bem. Sempre fica.
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Tentei assimilar a informação, mas acabei


perguntando:
— Como assim, sempre fica?
Pedro suspirou e, notando que Lucas e Nick
já tinham aumentado o volume da tevê e
mantinham-se concentrados no jogo, me respondeu.
— Ah, ela passou por muitas coisas. Desde
os 15 anos vem sofrendo com relacionamentos,
logo depois teve a separação dos nossos pais, que a
quebrou. Daí Henri a consertou, sabe? O marido
dela era como um anjo na sua vida. Casaram,
tiveram Clara, mas ele a traía todos os finais de
semana, sabendo que tinha uma esposa maravilhosa
em casa que tinha desistido de tudo para ser mãe e
mulher. Um idiota. Nem sei como consigo falar
dele assim, minha vontade é ir até lá e destruir
aquele rostinho de galã dele.
Eram raros os momentos em que ele se abria
e contava algo da família. Me senti bastante
privilegiado por isso.
— Entendo. — Assenti pensativo. — Ela
estava estudando o que aqui? — prossegui nas
perguntas. Afinal, Pedro estava respondendo.
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— Prova para a bolsa de estudos da


faculdade. Ela trancou a faculdade de
Administração no penúltimo ano quando descobriu
a gravidez, agora está fazendo de tudo pra voltar.
Como ainda não conseguiu um emprego, quer
conseguir a bolsa integral para que possa retornar.
— Hum... bem esforçada. — Deixei o
pensamento sair em forma de palavras, mas logo
me repreendi. Pedro não iria gostar.
— Esforçada, linda, gostosa, divorciada.
— Lucas, que eu jurava nem estar prestando
atenção, incrementou com os olhos no alto,
provavelmente imaginando Amanda da forma mais
indecente possível.
—Cala a boca! — Eu e Pedro falamos ao
mesmo tempo.
Lucas apenas deu de ombros e levantou,
dizendo que pegaria algo para beber na geladeira.
Pedro me olhou com olhar agradecido, enquanto
então ouvimos:
— Amanda é uma mulher muito bonita, mas
tudo que ela passou só a fez ser mais linda ainda,
não só na aparência, mas no caráter. Ela é daquelas
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mulheres que você conhece, aposenta, para tudo e


vive só pra ela. — Nick comentou, fazendo todos
os olhares da sala se virarem para ele. — Com todo
respeito, Pedro.
Abri a boca, espantado com a sensibilidade
das palavras de Nick. Ele não falava aquele tipo de
coisa, e por um momento senti minha garganta
secar. Será que ele estava interessado nela?
Conheço Nick há tempo demais, meu amigo
jamais jogava verde sem querer colher maduro.
— Tudo bem, ela é esse tipo mesmo. Mas
não está aberta a relacionamentos. Diz que nunca
mais vai casar. — Pedro comentou. — Enfim,
chega de falar sobre minha irmã, ela não é para o
bico safado de vocês. Vamos nos concentrar no
jogo.
Depois disso, não a vi mais naquele dia. E
sinceramente, preferia não ver. Em poucos dias
minha mente já havia sido inundada de
pensamentos muito agradáveis sobre ela e aquilo
não era bom.
Não podia ser bom.

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“Esse é um sentimento que não vale apena,


filho. Ele sempre te trará sofrimento no final da
jornada.”
Sempre que eu passava momentos com
alguma mulher, era essa voz que me trazia à
realidade no dia seguinte, junto com todas as
lembranças dos quatro anos traumáticos que meu
pai passou após a morte de minha mãe.
A última coisa que eu preciso, é viver para
conferir se o sofrimento pode mesmo ser real.

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Capítulo 4

AMANDA

Depois de engolir, através do telefonema de


Henri, o fato de eu ter um “namoradinho”, me
estressei tanto a ponto de sair para tomar um ar no
térreo do prédio do meu irmão.
Provavelmente Clara deve ter contado sobre
Tony e o gesto heroico no dia anterior, o que
causou uma confusão na mente do meu ex,
acusando-me de estar com outro.
Como se ele tivesse o direito.
A única coisa que ficou em minha mente de
verdade, foi o fato da minha filha lembrar o nome
dele e contar dele para Henri, fora isso,
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absolutamente mais nada permiti ser absorvido ao


deitar naquele domingo.
A semana me traria muitas conquistas e eu
contava com isso.
Na terça, acordei cedo e me arrumei para as
provas. Vesti uma calça jeans e uma blusa social
básica com mangas dobradas e tecido para fora da
calça, cor azul. Olhei-me no espelho do quarto que
permitia ver todo o meu corpo e constatei que podia
me amar mais e cuidar melhor de mim. Queria
poder investir em novas roupas, maquiagens e
adereços para que minha autoestima me felicitasse.
Eu estava precisando.
Chegando na faculdade onde faria a prova,
segui até a sala que estava indicada no cartão de
inscrição e sentei na última fileira de carteiras, bem
no canto esquerdo. Já havia algumas pessoas na
sala, mas ainda faltavam 20 minutos para o início
das provas. Durante esses 20 minutos, fiz uma
revisão básica mental de toda a matéria estudada e,
passado esse tempo, uma professora entrou na sala
e distribuiu as avaliações.
O tempo total para completá-la era de três
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horas. Acabei concluindo em duas horas todas as


50 questões de português, matemática e
conhecimentos gerais presentes naqueles papéis.
Com um ar de trabalho concluído, entreguei minha
prova e saí da sala. Agora devia esperar duas
semanas para saber o resultado e então mais dois
meses para começar a estudar.
Saindo da faculdade, meu celular tocou.
— Alô. — O número era restrito.
— Senhorita Amanda Lice? — uma voz
feminina perguntou.
— Sim, em que posso ajudar?
— Sou dos Recursos Humanos da empresa
Gali Telecomunicações. Gostaria de agendar uma
entrevista com o diretor da empresa para a vaga de
assessora administrativa que temos disponível. A
senhorita tem interesse na vaga?
— Sim, mas é claro. Quando é a entrevista?
— Hoje às 15h, no sétimo andar. — Passou o
endereço completo a mim.
— Ok, estarei lá. Obrigada.
— De nada. Traga seu currículo atualizado e
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todos os documentos necessários para a admissão,


caso passe na entrevista.
— Pode deixar. Tchau.
Assim que desliguei o telefone, saltei no
meio da rua de felicidade.
Parecia que tudo finalmente estava
começando a se encaixar em minha vida. Uma
prova de vestibular bem-sucedida e agora uma
entrevista de emprego. Imediatamente liguei para
Pedro.
— Pedro? Pode falar agora?
— Se for rápido sim, Mandi. O que
houve? — perguntou preocupado.
— Tenho uma entrevista de emprego hoje à
tarde, torça por mim! E acho que fui bem na prova
pra bolsa de estudos. Queria apenas te falar.
— Ah, sim, que bom, mana, fico feliz, você
merece! Agora preciso trabalhar, qualquer
novidade me manda sms.
— Tudo bem, te amo. — Desliguei o telefone
e peguei um ônibus para casa.
Aquela manhã tinha sido fenomenal para
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mim, e logo após chegar em casa e almoçar, fui


para o banho animada para a entrevista que
ocorreria logo mais.
Coloquei meu melhor terninho preto, com
uma blusa social cor de rosa por baixo. Adicionei
cordão, anel e pulseira, calcei meu mais belo sapato
e me maquiei com o melhor que tinha. Me aprontei
da melhor forma que podia e fiquei feliz com o
resultado final. Me olhando no espelho, pude
contemplar uma nova Amanda, sabia que nada
podia abalar minha confiança em mim mesma.
Aquela era a Amanda que desejava ser, uma versão
confiante e bem-sucedida.
Após passar o perfume adocicado que
adorava, peguei todos os documentos necessários e
os inseri na minha bolsa, partindo enfim para a tão
aguardada entrevista.

Cheguei ao prédio da entrevista sorridente e


confiante, pois era a primeira para a qual fui
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chamada desde que me mudei para o apartamento


do meu irmão. Entrei no elevador e fui ao sétimo
andar, como a mulher no telefone havia orientado.
Chegando no andar indicado, percebi que tinha
candidatos numa sala de espera para a mesma
entrevista, mas isso não me esmoreceu, sabia que
poderia me sair bem e conseguir aquele emprego
finalmente, podendo em breve traçar planos para
morar com minha filha.
Sentada ali, na sala de espera após me
identificar, via cada candidato entrar na sala no
corredor em frente de onde eu estava. Todos eles
saíram de lá com o rosto confiante, até uma mulher
sair sorrindo tanto que me deixou desconcertada.
Será que ela foi contratada? O pensamento de que
a vaga já tinha sido preenchida fez com que o
sorriso, antes confiante, ficasse apreensivo em meu
rosto.
Já estava nervosa e um pouco ansiosa, pois
fui a última a ser chamada. Ainda assim, mantive
em minha mente a fé de conseguir o emprego que
tanto almejei.
— Senhorita Amanda Lice? — A secretária
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do diretor andou até mim seriamente.


— Sou eu — respondi levantando da cadeira.
— Sinto muito, mas sua entrevista foi
cancelada. Já está liberada para voltar para casa. —
Bruna, como o seu crachá indicava, disse em um
tom de voz desconfortável, fazendo com que eu
notasse a tristeza em sua voz ao dar a notícia que
acabaria com meu dia por completo.
— Como? A vaga já foi preenchida? Não
tenho os requisitos?
Quando perguntei, senti minhas esperanças se
esvaírem.
— Preciso falar com o diretor, me deixe pelo
menos dizer das minhas experiências! Se depois de
tudo ele me quiser fora eu irei — argumentei
calmamente, mas minha voz tremia, estava prestes
a chorar ali mesmo, na frente da secretária grávida.
— Ele não se interessou pelo seu perfil,
desculpe. — Apenas disse e se virou em direção à
sala do diretor.
Eu sabia que aquela era a sala onde as
entrevistas aconteceram. Sem pensar, fui atrás de
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Bruna e entrei depois dela.


— Senhorita, não pode entrar sem permissão.
— Bruna tentou conter-me no momento em que eu
adentrava à sala do poderoso chefão.
Foi quando levantei o olhar, antes cabisbaixo,
até o homem na imponente mesa.
Nossos olhares se encontraram, fazendo com
que eu sentisse algo percorrer minha espinha,
congelando todos os meus nervos e me deixando
em modo estático, apenas encarando o homem que
eu sempre pensei ser uma pessoa boa, ali, fechando
a porta de uma oportunidade para mim.

TONY

A terça começou agitada na filial que eu


dirigia da Gali Telecomunicações. Era dia de
entrevista para uma vaga importante, que sempre
prezei em escolher por mim mesmo e não por
qualquer outro funcionário da empresa. Depois de
encerrar algumas ligações, Bruna, minha secretária

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grávida, prestes a dar à luz, anunciou sua entrada


em minha sala naquela manhã.
— Com licença, Sr. Gali. Pietra me enviou a
lista das candidatas da entrevista de hoje à tarde.
Gostaria de deixá-la aqui para que possa avaliar
cada perfil antes das entrevistas.
— Sim, Bruna, deixe aqui em minha mesa.
Bruna se aproximou e deixou os papéis das
candidatas onde pedi. Antes dela se virar e sair da
sala, perguntei sobre o bebê e quando nasceria, pois
não conseguia lidar com o fato de que a barriga
dela podia aumentar mais do que já havia crescido.
— Ah, Tony, estou apenas aguardando ele
querer sair, pois pronto ele já está. O senhor ficará
sem mim por seis meses, quem vai aguentar suas
rabugices? — Bruna riu enquanto falava comigo.
— Bruna, você é insubstituível, mas ainda
não decidi o que fazer sobre sua licença. Você
merece mais do que seis meses, é uma funcionária
muito dedicada. E sobre quem vai me aguentar,
acho que terei que comprar um android. — sorri ao
final da fala, fazendo Bruna dar altas risadas.

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Sempre fomos amigos, desde que me entendo


por gente. Considero-a uma irmã mais nova, e creio
que ela também a mim.
— Coitado do pobre robô. Precisando de
mim, me chame, Sr. Gali, tenho alguns relatórios a
adiantar antes de minha licença — concluiu e logo
saiu da sala.
Desde que meu pai enfim decidiu me dar a
direção dessa unidade da Gali, sempre fui amigo de
minhas secretárias, nunca misturei o
relacionamento profissional com o pessoal.
Entendia sobre os processos que a empresa poderia
sofrer caso isso acontecesse, por isso mantinha uma
amizade superficial com todas as suas funcionárias
e funcionários da unidade de BH. Mas Bruna me
conhecia há anos e era a exceção. Por coincidência
e amizade, Nick trabalhava na minha unidade
também, ele era o “Relações Internacionais”, mas
isso não o impedia de ser mais do que amigo das
funcionárias. Quase todas já tinham frequentado
sua cama. Realmente eu não me importava com
isso, sabia que Nick era discreto e que dividia bem
essas relações dentro da empresa.
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Ao pensar em como Nick podia reagir à nova


contratação, o chamei até minha sala pelo ramal
telefônico e em cinco minutos meu amigo já
entrava nela perguntando o que poderia ter
acontecido.
— Nada. Sente-se, Nick — pedi,
gesticulando para que ele sentasse na cadeira à
frente de minha mesa.
Nick se sentou e ficou aguardando, olhando
em meus olhos.
— Bem, Nick, hoje eu terei algumas
entrevistas a fazer para a vaga de assessora
administrativa. Nessas fichas eu tenho cinco
mulheres e dois homens. Você sabe que o mais
provável é que eu contrate uma mulher, sempre
confiei mais no comprometimento e na organização
delas, mas queria pedir encarecidamente que não
ficasse com a minha futura funcionária — adverti.
— E como ela é? Já sabe quem será? Porque
se for muito irresistível não posso garantir nada.
— Nick disse com um sorriso malicioso pairando
no rosto.
— Não, nem conheço as candidatas
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pessoalmente ainda. Queria apenas pedir para que


evitasse ao máximo, ou posso ser processado um
dia. Já está na hora de você parar com isso e caçar
mulher fora do ambiente de trabalho, não acha?
— Tudo bem, chefão... Eu vou tentar, tá? —
respondeu sorridente.
— Ok. Pode ir, tenho entrevistas para fazer
daqui a pouco. — Me levantei e fui com Nick em
direção à porta, fazendo-o sair.
Logo voltei para minha mesa, sentei-me
confortavelmente e pus as mãos entrelaçadas na
nuca, jogando a cabeça para trás, relaxando.
Meus pensamentos pararam por um instante,
quando eles voaram até Amanda.
Por que eu estava pensando nela? Além de
lembrar o quanto ela é linda e forte, eu sentia tanta
vontade de saber como ela estava naquele
momento. Como ela ficou depois daquele final de
semana...
Ah, não, Tony, o que você está fazendo?
Deixa de ser idiota e pensa em todas as mulheres
que já teve, esquece essa separada que, inclusive, é

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irmã de um de seus melhores amigos. Deixe-a em


paz! — Minha mente e eu estávamos em embate.
Abanei a cabeça, tentando afastar os
pensamentos de Amanda e peguei as fichas com os
currículos das candidatas que entrevistaria em
alguns minutos.
— Gabriele... Com experiência, curso de
inglês, mora perto... Hum... Boa candidata. Lúcia...
Ricardo... Hum... Laura... Plínio... Amanda Lice...
Meus olhos paralisaram quando li o último
nome na ficha.
— Amanda? Não pode ser, deixa eu ver o
perfil profissional dela.
Solteira — Mentira. Separada — 28 anos,
mora perto, ensino médio, superior incompleto,
experiência de seis anos como secretária, fluente
em inglês, espanhol, italiano e português,
excelentes recomendações. Putz, ela tem um
currículo ótimo. Seis anos em uma só empresa?
Seis anos!
Pensei bem, na verdade passei longos
minutos ponderando sobre aquele currículo e o

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rumo que meus pensamentos estavam tomando


desde o dia em que a conheci. Decidi, por fim, que
não entrevistaria Amanda. Eu só precisava fugir
dos pensamentos impróprios que tinha com ela.
Não conviver com ela durante 9 horas todos os dias
úteis da vida me ajudaria.
— Bruna, venha até a minha sala — chamei
minha secretária pelo ramal e imediatamente ela
apareceu.
— O que posso fazer, Sr. Gali?
— Essa candidata está descartada. Pode
avisá-la, quando chegar, que a entrevista foi
cancelada, por favor?
Bruna pegou a ficha de Amanda e assentiu,
concordando e saiu imediatamente da sala.
Fiz todas as entrevistas naquela tarde com a
mente mais leve. Até que a última candidata entrou
e finalmente encontrei nela tudo o que eu procurava
para a vaga. Contratei-a imediatamente e a levei até
a porta para sua saída.
Naquele instante, olhei para o final do
corredor, onde a última candidata — e descartada

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— estava sentada, linda e elegante com suas mãos


sobre o colo segurando uma pasta de documentos.
Fechei minha porta e voltei para a mesa.
Tinha tomado a atitude certa, claro, e ninguém
precisava saber.
Ninguém podia saber que na verdade eu era
um medroso ridículo, que vivia com as frases
loucas do pai na mente.
Não sei por quanto tempo divaguei em
pensamentos, mas logo a porta se abriu em um
susto.
— Sr. Gali, desculpe, ela entrou de repente,
eu fiz como o senhor tinha me dito, mas ela entrou
mesmo assim.
Levantei o olhar e lá estava ela.
Meu Deus, eu podia dar as características
exatas dos seus contornos para um artista
reproduzir e, com certeza, sairia com perfeição.
Amanda expirava pesadamente, com os olhos
trêmulos e o corpo paralisado enquanto me olhava.
— Tudo bem, Bruna, nos deixe a sós —
ordenei enquanto meus olhos não se desprendiam
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dos de Amanda.
Bruna saiu da sala e o choque ainda estava no
rosto da irmã de Pedro, que permaneceu mais
alguns segundos calada de pé.
— Entendi. Agora eu entendi. — Finalmente
ela disse.
Mantive a nossa conexão de olhos, e
questionei:
— O que você entendeu?
Posicionei as duas mãos no queixo, apoiando
os cotovelos na mesa.
— Você não precisa de uma separada,
abalada emocionalmente, com uma filha de 4 anos,
para se preocupar em sua equipe. Precisa de alguém
normal psicologicamente, que possa fazer o
trabalho sem poder ser surpreendida por uma
ligação emergencial ou um momento de tristeza
que a fará chorar por perceber que é a mais
azarenta do universo e que não consegue e nunca
conseguirá nada do que sonha, pois as
oportunidades que teve jogou fora quando era mais
nova. — Amanda desabou em palavras, e eu só

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conseguia me sentir um merda.


Algo apitou dentro de mim: culpa ao
perceber o que tinha feito àquela mulher que,
apesar de ser tão forte, estava indefesa, dependendo
daquele emprego para seguir adiante na vida. Eu
tinha sido um canalha, como todos os homens da
vida de Amanda. Imediatamente abri a boca para
corrigir o que fiz, me colocando de pé, sem sair do
controle.
— Desculpe, não é nada disso. Eu já contratei
uma das candidatas para a vaga, você não tinha
mais o que fazer aqui. Apenas isso, desculpe...
desculpe. — Tentei ser o mais profissional
possível, pois não queria que ela mexesse com meu
emocional mais do que já estava mexendo nos
últimos 4 dias.
— Você não me deve desculpas, eu é que
devo. Fui estúpida em pensar que se eu falasse com
o diretor, poderia convencê-lo de minhas
capacidades profissionais. Poderia mostrar o quanto
sou esforçada e inteligente. Já vou me retirar,
espero não precisar revê-lo, Sr. Gali — respondeu
friamente.
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Enquanto Amanda virava para sair da sala, eu


apenas desejava que ela não fosse embora. Aquela
mulher mal tinha surgido na minha vida e já estava
bagunçando todo o meu controle. De repente tive
uma ideia para mantê-la ali e tentar me redimir pelo
que tinha acabado de fazer a ela.
— Espere! Amanda, espere um minuto. —
Arrastei minha cadeira para trás e andei a passos
largos até Amanda, que já estava abrindo a porta do
escritório.
— Diga. — Ela parou e se virou com o olhar
baixo, sem direcioná-lo a mim.
— Eu... eu tenho uma vaga de secretária
executiva particular. Como você deve ter visto,
minha secretária está grávida e vai tirar uma licença
em breve, de pelo menos seis meses. Preciso de
uma nova secretária. Você se interessa pela vaga?
As palavras apenas saíram, sem pedir
permissão. Eu tinha plena consciência de que, se
ela aceitasse, não tinha volta. Teria que aprender a
lidar com aquela coisa estranha que me fazia querer
protegê-la.
— Sim. — Seu rosto se tornou visível a mim
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novamente. — Tenho interesse, o que eu devo


fazer?
Inevitavelmente sorri aliviado e a chamei
para sentar à mesa comigo. Expliquei as funções do
cargo, tudo que estava relacionado ao trabalho e
disse que ela deveria estar presente em algumas
viagens de negócios e jantares com donos de
empresas junto a mim, como uma boa secretária
executiva faz. Os olhos de Amanda se arregalaram
quando mencionei o salário. Não sei o que deu em
mim, mas estava incluindo ocultamente mais
metade do valor do salário normal ao seu
pagamento, não sabia bem o porquê de ter feito
aquilo, mas sabia que a ajudaria muito e não podia
negar que tinha muita vontade de ajudá-la.
— Então, você é poliglota? — Em um dado
momento, perguntei para ela, como se a estivesse
entrevistando mesmo com a vaga garantida.
— Sim, aprendi primeiro inglês quando eu
tinha dez anos, depois espanhol aos 14 e italiano eu
fiz aos 17. Tenho diploma dos três, quase todos
consegui por bolsas de estudos.
Ela contou sorridente, com os olhos reluzindo
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esperança.
— Sabe, eu falo italiano. Minha família é de
origem italiana — afirmei.
— Antônio Gali, não é muito difícil de
descobrir a origem desse nome.
Ela nunca tinha dito meu nome completo, e
era diferente de tudo que eu já ouvi, pois ninguém
me chamava assim. Naquele momento adicionei
mais uma sensação inédita para a lista.
— É, bem comum e bastante italiano. —
Sorri, disfarçando o incômodo. Olhei para o relógio
e percebi que tinha uma reunião em 30 minutos.
— Desculpe, Amanda, mas preciso ir, tenho uma
reunião logo mais. Amanhã chegue às 8 horas,
Bruna vai te passar todas as funções e tudo que
precisará saber. Agora você pode deixar seus
documentos no setor de Recursos Humanos no
andar abaixo desse, tudo bem?
— Sim, obrigada, Tony. Quer dizer, Sr. Gali.
Daqui a pouco acostumo — respondeu sorrindo.
— Desculpe meu atrevimento, mas o senhor me
permite te dar um abraço?

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Apesar de sua feição transparecer inocência,


estranhei ao ouvir o pedido dela, mas aquiesci e
levantei para ir em sua direção. Não sabia como
começar aquilo, então apenas aguardei. Mas logo
Amanda chegou perto e me abraçou, envolvendo
meu corpo que ao lado do dela parecia de um urso,
enquanto agradecia pela oportunidade. Não hesitei
em retribuir o gesto, afinal fora totalmente
despropositado. Ao abraçá-la, senti seu aroma doce
e sedutor.
O que constatei naquele abraço, foi que
talvez toda a minha fuga do sentimento de meus
pais podia estar sendo, na verdade, um preparo. Um
preparo para algo que poderia mudar minha vida
totalmente.
E mesmo que fosse mudada para ruim, se for
para ficar naquele abraço, seria o melhor modo
ruim de se viver a vida.

O dia seguinte começou cedo para mim, que


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cheguei com uma hora de antecedência na empresa.


O motivo? Nem eu sabia ao certo, mas fiquei
andando de um lado para o outro dentro da minha
sala, como uma criança perdida dos pais,
aguardando todos chegarem ao estabelecimento.
Não vi Amanda naquela manhã, o que achei
bom, dadas as circunstâncias, mas Bruna me
informou tudo o que passaria para ela, e em poucas
horas concentrei-me em meu trabalho e a esqueci.
Em um momento na tarde daquele dia, Nick
entrou na minha sala enquanto eu checava alguns e-
mails e contabilizava relatórios em minha mesa.
Não prestei atenção a nada do que ele dizia, quando
fui surpreendido por duas pequenas palavras:
"Amanda" e "Jantar".
— O que disse? — indaguei a Nick,
completamente atônito.
— Eu falei que estava revisando os relatórios
do exterior de semana passada...
— Não, no final, o que disse sobre jantar?
— O interrompi, extremamente curioso.
— Ah, convidei Amanda para jantar hoje, e
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olha só, ela aceitou de primeira. Sou macho demais,


não sou? — Nick se gabou, alisando o peito.
Apenas rolei os olhos e arquejei.
— Muito irresistível, mas acho que tínhamos
um trato, não se lembra? — ralhei entredentes,
encarei-o e o lembrei do fato de termos combinado
que ele não sairia com mais nenhuma funcionária.
Na realidade, estava furioso, sem entender o
porquê.
Eu precisava consultar urgentemente um
profissional, essa mulher estava inaugurando
sensações inimagináveis em mim.
— Tudo bem, eu sei, mas é só um jantar,
nada de mais. Se surgir algo mais será fora daqui e
prometo não deixar ela muito apaixonada, ok? —
Nick comentou, piorando as coisas.
— Sai fora, Nick, deixa eu terminar meu
trabalho. — Passei a mão nos cabelos presos num
coque, como uma mania nervosa. — Que você
tenha um agradável jantar.
Tentei não soar rude, disfarçando meu
incômodo com aquela situação.
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— Obrigado, Chefe — agradeceu e saiu do


recinto.
Eu só queria entender o porquê de Amanda
aceitar o convite de Nick, sabendo que ela não
queria mais se relacionar com ninguém.
Pedro comentou sobre o fato dela estar
focada e tudo mais. Como no primeiro dia de
trabalho ela aceita um convite para jantar? Ainda
por cima do Nick?
De fato, eu não conseguia compreender.

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Capítulo 5

AMANDA

Meu primeiro dia na Gali foi bem produtivo.


Bruna é uma pessoa maravilhosa, e me ensinou
tudo com muito afinco durante toda a manhã. Após
o almoço daquele dia, Nick estava a caminho da
sala de Tony quando me reparou numa das mesas
de secretária, próxima à sala dele.
— Hey! Amanda, que bom te ver por aqui!
— Desviou-se do caminho da sala do amigo,
parando em frente à minha mesa.
— Obrigada, estou em treinamento para
secretária do Sr. Gali — informei sorridente.

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— Sr. Gali? Ele faz questão da irmã de seu


melhor amigo chamá-lo de Sr. Gali? Me poupe,
Tony é um idiota.
— Eu faço questão de chamá-lo assim. É
profissional. — O corrigi. Tony preferia
informalidade, mas eu fazia questão de me referir a
ele como os demais funcionários.
— Hum, entendi. Você está livre hoje à
noite? Queria jantar num restaurante novo, caso
você queira conhecer comigo... Como amigos, é
claro.
A princípio, suspeitei do pedido de Nick, mas
sabia que ele era inofensivo, já conhecia sua fama,
e o fato de eu estar com o coração congelado me
fazia imune a esses tipos de flertes. Que mal há em
ir a um restaurante com um cara? Não vi mal
algum, nem intenção maldosa por trás do pedido
dele.
— Ok, que horas nos vemos? — concordei.
— Às oito. Te busco em casa, tudo bem?
— Tudo bem.
Assim que ele entrou na sala do Sr. Gali,
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virei-me para Bruna, que me encarava de olhos


esbugalhados.
— Mas eu te falei que ele é um imbecil
conquistador, Amanda — advertiu-me num
sussurro.
— Eu sei, eu não estou interessada em
homens no momento. Jantar em um restaurante
novo de graça me pareceu bem convidativo. —
Soltei uma risada debochada depois de concluir.
— Doida, ele vai tentar te levar pra cama,
você sabe, não é?
— Tudo bem, deixa ele se iludir até o último
minuto. — Sorri, pensando em como faria Nick me
odiar no final do encontro que ele possivelmente
armou pensando que eu cairia feito pato, segundo
Bruna disse.
Quase me arrependi de aceitar o convite,
depois do alerta dela. Realmente não ansiava por
homem algum em meu pé. Não que eu fosse
alguém super desejável e me sentisse a rainha da
cocada preta. Mas não posso ignorar as
possibilidades.

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Naquele dia não vi mais ninguém na


empresa, nem Tony. Ainda assim me senti tão
confiante e feliz pela oportunidade de recomeçar
que a vida havia me dado, que cheguei em casa
extasiada.

— Eu falei que não casaria nunca mais, mas


isso não me impede de sair com homens —
expliquei ao meu irmão enquanto verificava o
armário à procura de uma roupa ideal para aquela
noite.
— Tudo bem, mas o Nick? Logo ele? Ele não
vale o pão que come, você não precisa disso,
Mandi.
Ele estava parado escorado no batente da
porta, tentando me convencer a não sair com seu
amigo cafajeste.
O ignorei por completo, porque às vezes ele
merecia, e encontrei um lindo vestido vermelho de
cetim com um decote longo na área dos seios, sem
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mangas, com acabamento nos ombros e comprido.


— Esse! É o vestido arrasador para hoje!
— Mas você não vai sair com Nick vestida
desse jeito nunca! — Pedro bufou após reclamar da
roupa.
Andou de um lado para o outro no meu
quarto, com as mãos passando pela cabeça,
parecendo ter um conflito interno
— Irmãozinho, não se preocupe, não vou
passar a noite com Nick, não vou me apaixonar por
ele. Pelo contrário, vou assumir o controle desse
jogo hoje à noite. — Parei em frente a Pedro e o
acalmei.
— Como assim, assumir o controle?
Meu irmão estava confuso. Ai Jesus, por que
homens acham que somos tolas?
— Ele pensa que sou como qualquer uma,
pensa que vai me enlouquecer e me ter em sua
cama. Vou deixar ele pensar, mas não darei o luxo
de realizar nenhum de seus pensamentos. Simples
assim! — Eu sabia muito bem o que estava falando.
Se tinha uma coisa que eu estava, era
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consciente de tudo que disse e estava prestes a


fazer, queria apenas me divertir e ver Nick provar
do seu próprio veneno, aproveitando o que todos
diziam dele. Entendia que ele não tinha culpa de
tudo o que sofri na vida, mas sabia também que
homens do tipo dele causavam isso em muitas
mulheres. Estava cansada de sofrer a vida inteira e
ver todos os homens saírem impunes dela. Era a
minha vez de brincar. Estava completamente
disposta a isso.
— Tudo bem. Faz como quiser, mas se não
for pedir muito, sou seu irmão. Você pode me
manter informado sobre os seus passos? — Um
sorriso malvado surgiu em seu rosto quando pediu.
— Eu adoraria ver Nick pirando!
— Seu malvado! Quer ver o amigo sofrendo!
— Gargalhei. — Vou te deixar informado, pode
deixar.
Pedro saiu de lá parecendo aceitar melhor a
ideia e prontamente comecei a me vestir. Sequei
meus cabelos que estavam enrolados em uma
toalha, molhados do banho, e depois tirei o robe e
inseri o vestido vermelho que me deixou
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incrivelmente sensual. Prendi o cabelo em um


coque, deixando algumas mechas caindo sobre o
rosto e pus uma maquiagem suave, com batom
vinho matte. Quando finalizei tudo, a campainha
tocou.
Em instantes Pedro bateu à porta do quarto,
avisando que seu amigo havia chegado. Os olhos de
Nick pareciam saltar das órbitas ao me ver, da
cabeça aos pés. Caminhei lentamente em direção a
ele, que estava do lado de dentro do apartamento
ainda perto da porta, e me aproximei de seu ouvido
enquanto o rosto dele permanecia imóvel.
— Vamos? — sussurrei, fazendo-o dar um
salto para trás.
— Claro. Adeus, Pedro. — Acenou para
Pedro e ofereceu seu braço para que eu o
envolvesse com o meu.
Descemos pelo elevador em silêncio e eu só
quis rir da feição embasbacada que Nick
demonstrava ao me ver. Abriu a porta do carro para
mim e segurou minha mão ao colocar-me dentro do
automóvel. Dirigiu até o restaurante, novamente
abriu as portas e me segurou pelas mãos enquanto
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saía do seu Land Rover.


— Obrigada, você é gentil — disse eu, ao
descer do carro, fazendo Nick sorrir.
Ao entrarmos no lindo restaurante recém-
inaugurado e elegante, nos encaminhamos à mesa
reservada por ele.
Os minutos foram longos, preciso admitir.
Nick era divertido em alguns momentos, e até
legal, mas eu estava entediada e queria voltar pra
casa.
— Sou o mais novo de meus irmãos — disse
ele no meio do jantar, parecendo querer me cativar.
— Interessante, quantos irmãos têm?
— Dois, todos moram fora do país.
— E por que você mora aqui, então? —
Realmente estava curiosa.
— Gosto daqui, fora que meu pai acha que
devo trabalhar duro antes de me mudar com esposa
e filho daqui.
— Ah, entendi. Ele na verdade quer que você
case.
— Sim. — Deu de ombros e fez uma careta
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de reprovação.
— Que droga. — Soltei sem pensar.
Nick parou por um instante e me encarou
confuso. Como uma mulher se refere a casamento e
filhos como uma “droga”? — Pode ter passado essa
informação na mente dele, e não o culpo. Poucas
mulheres teriam a mesma atitude que eu. Mas
escapou sem querer.
—Como assim “que droga”? — Nick
perguntou cautelosamente.
— Ah, Nick... Ser forçado a algo que não
quer é uma droga. E convenhamos, precisar ter uma
família para sair do país de uma vez por todas é
realmente uma droga! Quem faz isso? — Sorri,
tentando explicar.
Ele assentiu.
— Pensando por esse lado, realmente. Achei
que odiasse essa ideia. Sabe, ter filhos e casar...
— falou enquanto mexia na comida sobre o prato.
— Você quer que eu case com você, Nick?
Porque... eu definitivamente não estou a fim —
declarei enquanto levantava as duas mãos em sinal
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de defesa, ainda sorrindo para ele, em simpatia.


— Claro que não, nem penso nisso! — Ele
imediatamente respondeu, mas pareceu ter sido
pego de surpresa pelo assunto. Um silêncio
incômodo pairou pelo ambiente, que logo cortei.
— Ufa! Fico mais aliviada. Não sou contra
famílias e nem nada disso — disse enquanto
intercalava as pausas mastigando. — Mas já deve
saber que sou separada e tenho uma filha, não
quero mais nada disso, apenas quero pensar em dar
o melhor para Clara e viver livre.
— Ok, mude o assunto, não tenho mais nada
em mente para dizer. — Nick se rendeu.
Qual assunto eu poderia falar? Nick, por
favor, vamos embora? — Isso o deixaria um pouco
mal, tenho certeza.
— Você. Vamos falar de você. Onde nasceu?
Como foi sua infância? — inventei algo para
disfarçar, estava mais do que entediada com tudo
aquilo.
— Quer mesmo saber? Está parecendo uma
entrevista! — Ele riu.

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— Sempre quis ser repórter, mas sabe como


é, a concorrência é dura conosco! — brinquei,
fazendo-o rir e se abrir, contando tudo sobre seu
passado.
Ele começou a sorrir mais e descontrair, o
que me deixou mais aliviada. Quase não falei de
mim, e apenas perguntei sobre ele. Notei que Nick
gostava de contar coisas sobre si.
— Eu era um garoto um pouco rebelde,
porém nerd. Acredita que eu era do estilo rockeiro?
Usava piercing e tudo mais! Na adolescência eu
sofria bullying — Nick falou e eu só ria
constantemente.
— Não acredito! Como vou dormir agora
depois da imagem que meu cérebro criou de você
desse jeito? — zombei dele.
— Dorme comigo, posso tirar essa imagem
horrível de você — flertou tão descaradamente que
por um minuto nós dois ficamos sérios em silêncio.
Percebi ali que meu plano interno estava
dando certo, ele estava interessado em mim. E
podia arriscar que não era só por uma noite. Gostei
de saber que ele finalmente descobriria como é ser
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um canalha completo com alguém e sair ileso,


sentindo na própria pele.
Tinha certeza do que constatei pois, após a
traição do meu marido, passei a analisar mais as
pessoas ao redor. Sentia-me como uma
investigadora criminal. Tudo para não ser mais
enganada.
Meu outro lado, o mais afetuoso, dizia que eu
não tinha o direito de fazer aquilo, era cruel e sujo.
Queria apenas voltar para casa e dormir, me
concentrar nos meus objetivos e alcançá-los.
O silêncio foi cortado por uma gargalhada
minha.
— Bom! Muito bom! Mas... ruim! Péssimo.
Nick, não acredito que conquista as mulheres
assim! — Não conseguia conter o riso enquanto
falava.
— Ah, não me diga que não se sentiu tentada
nem um pouquinho por mim?! —arriscou ele, se
gabando e sorrindo.
— Sou imune a essas coisas. Vamos, já
terminamos. Quero dormir, juro que depois de rir

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tanto só penso na minha cama — afirmei enquanto


arrumava as minhas coisas para levantar do
assento.
— Ok, vamos, já está tarde mesmo, foi
divertido. Obrigado pela companhia. — Assentiu
olhando nos meus olhos, e nesse momento ambos
ficamos sérios.
Aquilo estava começando a ficar
constrangedor.
Após Nick pagar a conta — porque eu
sinceramente não faço questão de dividir — e
sairmos do restaurante, ele continuou sendo
cavalheiro, abrindo a porta do carro para que eu
entrasse e saísse, levando-me até a porta do
apartamento, sempre afirmando o quanto foi bom o
jantar que tivemos.
— Podemos repetir mais vezes — soltou,
evitando que eu entrasse logo em casa.
— Sim, eu te aviso quando tiver um
tempinho, ok? — O cortei, estava tão sonolenta que
não queria mais ficar ali, queria dormir.
Ele então se calou e me observou por um

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tempo, até se aproximar de mim. Se aproximar


demais, até. Ele me roubou um beijo!
Apenas recebi o beijo com susto e logo o
interrompi.
—Ei! O que está fazendo? — Afastei-o com
as mãos.
— Te beijando? — Nick respondeu com um
ar de “não é óbvio?”.
— Eu disse que queria beijá-lo? Eu liberei
esse beijo? Nick, não responda, mas comigo as
coisas são como eu quero. Se quisesse beijá-lo, eu o
beijaria, ou falaria algo para que me beijasse, mas
não quis beijá-lo, não quero beijá-lo. Peço que não
repita mais isso, pelo menos não comigo.
E entrei, o deixando lá pensando na afronta
que cometeu.
Os dias após aquele seriam longos e loucos.
Por que eu aceitei aquele convite, sabendo onde
poderia me meter?

TONY
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A noite daquele dia infeliz foi tão horrenda,


que nem horas na academia do condomínio onde
moro me fizeram extravasar.
Eu queria ser uma mosca, uma formiga, para
ver como estava sendo aquele jantar. Era
curiosidade, uma curiosidade muito aguçada,
confesso.
Será que ela cederia às investidas dele?
Será que Nick conseguiria seu objetivo final
com Amanda?
Eu sempre soube que, depois de conhecer o
lado bom da vida — que eu o apresentei —, seu
foco com as mulheres era sempre uma noite regada
de prazer. Com Amanda não seria diferente, mas só
de pensar nele a tocando… a beijando…
Agrrrr!
Amaciei meu travesseiro — soquei na
verdade — pela décima vez antes de deitar e tentar
apagar minha mente daquilo, depois de ter tomado
um banho.
Foi quando meu celular vibrou sobre o
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criado-mudo.
— Nick? Aconteceu algo? — Atendi ao ver o
número na tela.
— A Amanda aconteceu! Cara, preciso te
contar tudo!
Pronto, só aquela curta frase já me fez sentar
e respirar fundo, imaginando cenas horrendas dos
dois juntos. Bom, não curto ser egoísta, se Nick a
fizer feliz no fim das contas, é isso que importa,
certo?
— Não quero saber detalhes da sua vida
sexual, Nick! — decretei, não desejando saber
nada.
— Não! Calma, não desliga! Nós não
fizemos nada.
Em meu peito, reinou um alívio imediato, o
que fez com que eu estranhasse a sensação.
— Então o que houve? — indaguei revirando
os olhos.
— Fomos jantar, conversamos, foi fantástico!
Ela é maravilhosa, sensível, amiga, muito
interessante e madura. Sorria para mim de uma
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forma encantadora e quando eu brincava ela


gargalhava, uma gargalhada que fazia seus olhos se
fecharem, nunca a vi mais linda, Tony... Mas
então...
— Então? — Estava curioso, apenas curioso.
— A levei para casa e a beijei. Ela rejeitou
meu beijo e disse que não quer que eu faça isso de
novo! Como, Tony? Como uma mulher nega o meu
beijo?! — Nick parecia revoltado.
Reprimi uma risada. Meu Deus, como eu a
subestimei!
— Nick, para tudo há uma primeira vez. Às
vezes ela só quer sua amizade. Aceite ser uma
gazela dondoca e se assuma pro mundo! — afirmei
por experiência própria, aproveitando para zoar
meu amigo. Os conselhos de minha amiga de
infância sempre ajudavam a entender melhor as
mulheres.
— Vai pro inferno, idiota! Mas e agora? Eu a
quero, Tony! Eu quero ela toda, para mim, na
minha cama, na minha vida! Quero possui-la até
cansar! Putz, Tony, eu a quero! — Nick gritou.

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— Se acalma, você está se apaixonando, isso


é perigoso. Você já se apaixonou?
— Nunca, isso é se apaixonar? Eu acho que
não, hein! Mas eu a quero — afirmou convicto.
Eu conhecia bem meu amigo. O que havia
em seu íntimo era frustração causada pela rejeição.
— Amanhã nos falamos, Nick, tenho que
dormir — encerrei o assunto e desliguei o telefone.
Deitei em minha cama novamente tentando
afastar Amanda dos pensamentos. Sabia que ela era
especial mas, naquele momento, ao perceber como
ela mexeu com Nick, soube que ela era muito mais
do que especial. Soube mais ainda que não podia
ocupar meus pensamentos com a imagem dela, até
que ouvi um alerta em meu celular.
Era uma foto dela, tirada espontaneamente
por Nick.
Respirei fundo ao ver aquilo, Amanda com o
vestido longo colado no corpo e decotado de forma
sensual. Fiquei imóvel por alguns instantes apenas
observando.
Droga, o que Nick queria com isso?
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Aquela noite foi longa para mim, as


lembranças sobre tudo que presenciei na vida
fizeram com que meus pensamentos sobre Amanda
enfim fossem embora. Meus pais foram um casal
capa de revista, sempre amorosos e unidos. Eu
lembrava de quando tinha apenas 10 anos, comecei
a admirar o relacionamento deles em uma ceia de
Natal. Nesse dia meu pai fez um discurso de
orgulho por tê-la e minha mãe sorria de ponta a
ponta, apaixonada por ele. A partir daquele dia,
comecei a perceber como os dois se tratavam,
sempre com carinho e palavras amorosas. Meu pai
a presenteava sempre e quando ela ficava doente
ele faltava o trabalho para cuidar dela
pessoalmente. Até que, um mês após o meu
aniversário de 19 anos, minha mãe sofreu um
acidente de carro e faleceu. Presenciei o mundo de
meu pai ruir pelas suas mãos. Ele não falava mais,
não se mexia. Não foi ao enterro e nem trabalhou
mais. Assumi as empresas com o vice do meu pai,
esperando que tudo voltasse ao normal, mas não
voltou. Só após anos de terapia, voltou ao trabalho,
mas nunca mais casou e quando conseguiu sair do
estado catatônico do choque causado pela perda,
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ele me deixou um conselho:

Nunca se apaixone. O amor causa feridas,


ele dói. Não vale a pena se ferir dessa maneira,
proteja-se dele o máximo que puder.

Era uma lembrança daquele dia, e a única


coisa que conseguiu falar comigo, era sobre o amor
e como ele é cruel com quem o sente. Nunca deixei
de seguir o que meu pai ditava, e a partir daquele
dia levei como regra cada conselho seu.
E ano após ano, ele só me relembrava.
Viva, mas não ame.
Aproveite, conquiste, mas fuja do amor.
E era nisso que me apegava, sendo
plenamente realizado em minha vida, até aquele
instante.

AMANDA

O dia seguinte foi como eu esperava:


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Nick tentando se redimir, me dando um


arranjo lindo de flores e um cartão pedindo
desculpas. Deixei claro a ele que entre nós só
existiria amizade, e foquei em meu trabalho, pois
era esse que me ajudaria a ter minha listinha de
objetivos enfim alcançados.
Recebi mais orientações de Bruna, que fazia
me sentir orgulhosa do meu empenho. Me dedicava
excepcionalmente em tudo. Em um certo ponto de
dicas e conversas, senti Bruna se abrir ainda mais,
me dando permissão para que entre nós existisse
uma amizade muito bonita. Eu tinha gostado muito
dela.
— Sabe, Amanda, eu quero pedir demissão.
Quero ter meu bebê, e logo após a licença pedir
para sair. Não quero deixá-lo em uma creche ou
com uma babá. Quero eu mesma cuidar dele, sabe?
Quando ele tiver maiorzinho eu volto à ativa.
Ela comentou, num momento aleatório.
— Nossa, Bruna, isso é bom. Digo, não por
te substituir, mas por ver que você quer se dedicar
ao seu bebê. Mas não se esqueça de você, estipule
uma data certa para voltar a trabalhar, porque senão
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você acaba cedendo e cedendo, até que vê a vida


passar e você ficando para trás. Conselho de amiga.
— Sim. Pensei nisso. Mas de início é o que
eu quero. Jonas precisa de mim. — Bruna disse,
alisando a barriga. — Mas não conte a ninguém,
ainda não falei com Tony.
— Tudo bem. Você o chama de Tony? Juro
que sempre a vejo chamá-lo de Sr. Gali —
questionei, curiosa.
— Na verdade aqui dentro chamo de Sr. Gali.
Mas somos amigos, acredite se quiser. Eu o
conheço desde que ele tinha 7 anos. Ele não gosta
de formalidades comigo, mas eu gosto de ser
profissional.
— Fico feliz em saber que é próxima dele.
Deve conhecer meu irmão, Pedro Luca.
— Ah, sim, conheço. Um bom homem
também...
Fiquei feliz dela conhecer meu irmão, seria
uma convidada maravilhosa então na nossa casa.
Mas Bruna ficou pensativa de repente, e num
ímpeto levantou da cadeira ao meu lado.

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— É... Amanda, preciso dar uma palavrinha


com Tony. Qualquer coisa me chama na sala dele,
ok?
— Ok.
Não entendi a fuga repentina do assunto em
que eu e Bruna estávamos, mas não fiquei
pensando muito nisso. Apenas continuei meu
trabalho.

TONY

Problemas. A empresa estava com problemas


e, como sempre, recaíam sobre mim. Por mais que
meu pai hoje esteja gerenciando a empresa no
cargo de CEO, lá em Goiás, problemas sempre
sobram para mim.
No meio daquele telefonema com o vice-
diretor, braço direito do meu pai, Bruna entrou
tempestuosamente em minha sala.
Fiz sinal para que aguardasse, enquanto eu
finalizava a ligação.
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Assim que concluí, virei-me para ela ainda


sentado e pedi para que ela se sentasse também.
— É ela, não é? — Foi como o assunto foi
iniciado.
— Do que está falando, Bruna?
Respirei fundo, encarando a moça morena de
olhos sagazes.
— Da Amanda. Ela é a mulher em quem
você ficou pensando no final de semana. Agora faz
sentido! Não queria contratá-la. Tem medo de se
apaixonar por ela! Não acredito que estou
presenciando esse dia!
Bruna mantinha um sorriso zombeteiro no
rosto enquanto falava, quase cantarolando no
momento em que tentei desviar meus olhos dos
dela, pensando em algo para dizer.
— Bruna, pode agir de forma profissional,
por favor? — Senti meu rosto arder.
Droga! A última coisa que eu desejava era
que outra pessoa soubesse da minha cisma insana.
— Ok, Sr. Gali. Está ou não interessado nela?
Hein? — entonou com ironia.
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Ponderei as palavras, afinal não teria volta


qualquer coisa que eu proferisse ali. Tomei uma
respiração pesada e voltei a encarar Bruna, que
apenas aguardava minha resposta de sobrancelha
erguida.
Decidi por fim assumir.
— Estou — respondi tão baixo, que mais
pareceu um sussurro e logo abaixei os olhos para
meus papéis.
— Não ouvi. Está ou não está? — Bruna
insistiu.
Bufei, derrotado e levantei o olhar novamente
em sua direção.
— Estou! Pronto, Bruna, falei! — gritei.
Em meu interior, uma turbulência de
sentimentos me dominava. Admitir em voz alta
algo que apenas meus recônditos pensamentos
sabiam, me deixou desconcertado e nervoso.
Bruna abriu um sorriso gigante e correu para
me abraçar. Não compreendi o que ela estava
intencionando, mas retribuí o abraço, me
levantando.
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— Vou te ajudar a conquistá-la — disse.


Me afastei do abraço e parei por um
momento para organizar meus pensamentos. Então
a frase que meu pai falou há anos surgiu em minha
mente.
— Eu não quero conquistá-la. — Tentei
parecer preciso.
— Não vem me falar que não quer porque
você quer sim! Para de limitar sua vida, Tony. Digo
como sua melhor amiga. O amor não se resume ao
que seu pai enfiou em sua cabeça. Você precisa
amar!
Aquela baixinha era autoritária demais. Por
que fui admitir meu interesse?
— Não, não preciso, Bruna. Sou feliz com a
minha vida. Não quero alguém me desgraçando.
Até porque ela também não quer relacionamentos.
Acabou de se separar e tem uma filha.
— Então a desculpa é apenas que ela não vai
te querer. Tony, Nick fez tudo errado com ela, mas
você pode fazer o certo.
Liberei uma risada nervosa.
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— Não posso! E Pedro nunca vai me perdoar


se eu magoar sua irmã. — Tentava encerrar o
assunto, falhando miseravelmente.
Bruna era insistente.
— Tudo bem, Tony. Continue nessa sua vida
sem amor então. Não digo mais nada. Só te aviso
uma coisa: você merece sentir isso. Merece ter o
amor de alguém. Você é um homem bom.
Bruna se retirou da sala, da mesma forma
com que a adentrou, deixando-me pensativo por
alguns minutos.
Em seguida, voltei às minhas ligações.

— Sim, mas o que pretendem fazer? —


falava ao telefone com o diretor da unidade de
Recife, uma cidade ao nordeste do País.
— Pretendemos fazer uma reunião de
emergência para tentar solucionar a origem desse
desfalque. Precisamos de você aqui o mais urgente
possível.
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— Não posso mandar um representante? Não


há possibilidade de me ausentar por três dias
durante a semana. — Aguardei o “mas” do homem
e depois completei. — Vou amanhã e volto
domingo, assim decidimos durante o final de
semana sobre o que faremos. Parei aqui
Ele concordou de imediato.
— Ok, te aviso quando comprar as
passagens.
Desliguei a chamada e parei para pensar.
Recife estava passando por um grande desfalque e
apenas nesses últimos dias, depois de não
conseguirem solucionar por si só, a cúpula dos
diretores decidiu fazer uma reunião urgente.
Imediatamente chamei Amanda para minha sala
pelo ramal.
— Me chamou, Sr. Gali? — perguntou ela ao
entrar.
A indiquei a cadeira do outro lado da mesa, e
ela prontamente se sentou.
— Sim, lembra de quando a contratei e falei
que às vezes precisaria viajar a negócios comigo?

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— indaguei cautelosamente e ela aquiesceu.


— Então, a filial de Recife está com problemas nas
vendas, não sabemos se é uma queda comum ou
algum tipo de desvio de verba, eu preciso estar lá
pessoalmente em reunião com a diretoria e é
importante que vá comigo.
Sem nem hesitar, ela concordou comigo,
como a profissional que é.
— Quando partimos? — perguntou.
— Amanhã pela manhã — informei.
Ela pareceu um pouco surpresa com a viagem
repentina e mordeu o lábio enquanto parecia refletir
em algo.
— Quantos dias ficaremos?
— Até domingo à tarde. Tem algum
compromisso em mente? — perguntei, mas, no
fundo, realmente tinha curiosidade de saber a
resposta, não só como seu chefe.
— Amanhã é sexta, eu conversaria com meu
ex-esposo sobre algumas divergências que andamos
tendo, e no sábado eu buscaria Clara para passar o
fim de semana. Mas fique tranquilo, vou resolver
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tudo hoje para que não se preocupe. Conte comigo.


Ela levantou e andou até a saída, sem nem
esperar que eu falasse algo.
— Amanda, espere. A viagem é importante,
mas acredito que teremos alguns momentos vagos.
Leve sua filha, a empresa pagará todas as despesas.
— Pois é, eu estava agindo como um maldito
babaca se negando a entristecer essa mulher.
— Sério? Porque eu não quero atrapalhar
levando-a — respondeu lentamente, ainda
nitidamente incrédula da proposta que ouviu.
— Sim. Pode levá-la. Mais tarde passo as
informações sobre o voo.
Amanda sorriu feito criança e me agradeceu.
— Vou deixar tudo acertado agorinha
mesmo, Sr. Gali. Obrigada.
Ela então saiu da sala. Imediatamente
suspirei, como se todo o ar da Terra tivesse
finalmente solto em meus pulmões.
Minhas atitudes não estavam condizentes
com o que deveria estar. Permiti e pagarei para que
minha secretária leve sua filha a uma viagem de
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negócios. Realmente tudo estava confuso e


rumando para minha total ruína.

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Capítulo 6

AMANDA

Fiquei animada com a viagem que faria, era


mais uma oportunidade de mostrar minha
competência e, quem sabe, crescer na empresa.
Tudo o que queria era evoluir para que, finalmente,
minha pequena Clara morasse comigo. Durante
aquele dia, tratei de deixar tudo acertado com meu
irmão, informando sobre a viagem e que não era
para ele se preocupar com isso. Pedi para que ele
me avisasse caso recebesse alguma ligação ou
precisasse de mim para algo importante. Mesmo à
distância, gostava de ajudar meu irmão e retribuir
pelo que ele fazia por mim. Após finalizar meus

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preparativos, tanto na empresa quanto nas questões


pessoais, faltava apenas uma ligação: Henri.
Ainda em minha mesa, no meio da tarde,
liguei para ele, que logo atendeu.
— Oi Henri, é Amanda. Está podendo falar?
Meu coração palpitou forte quando ouvi sua
voz, ainda sentia algo por ele que só o tempo
poderia apagar, afinal foram 8 anos, infelizmente.
— Sim, fale.
— Viajarei a negócios amanhã, Clara irá
comigo. Meu chefe autorizou e eu faço questão de
ter o final de semana com ela, então ligue para a
escola e avise que ela faltará amanhã. Às oito em
ponto eu passarei aí para buscá-la — falei de uma
vez, sem dar a chance de Henri interromper-me
com perguntas, mas me surpreendi com sua
resposta.
— Tudo bem. Ela estará pronta às 8.
— Ok, adeus.
Ao desligar, respirei pesadamente. Nós só
brigamos desde a separação e ele nunca tinha me
tratado de uma forma tão seca e fria como naquela
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ligação.
Ele já deveria ter alguma mulherzinha para
curtir o fim de semana, devia ser isso. Claro, Henri
não deixaria Clara vir comigo assim tão fácil se não
tivesse algo mais interessante para fazer. É isso.
Amanda, esqueça esse idiota, pelo amor de Deus.
ES-QUE-ÇA!
Meus pensamentos desordenados invadiram
minhas emoções. Uma pequena lágrima já descia
por meu rosto e meus olhos estavam se fechando
para evitar que mais delas saíssem, quando ouvi
uma voz.
— Você está bem?
Ao abrir os olhos, avistei Nick. A última
pessoa que desejava ver naquele momento era o
homem que achou que me levaria para a cama um
dia antes tão facilmente. Porém, espantei esse
pensamento negativo sobre ele e decidi dar uma
resposta educada.
— Sim, estava apenas com saudade da minha
filha. E o senhor? O que deseja? Quer que eu
anuncie sua chegada para o Sr. Gali?

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— Sim, por favor.


E foi o que fiz, chamei-o pelo ramal e
anunciei a chegada de Nick. Após ele entrar na sala
de Tony, enfim relaxei e afastei meus pensamentos
pessoais. Decidi me concentrar em tudo que teria
que adiantar para que o dia seguinte não me
sobrecarregasse. Era o penúltimo dia de Bruna na
empresa, já tinha decidido tirar sua licença-
maternidade pois eu já havia aprendido tudo da
função.
Depois de alguns minutos, recebi uma
mensagem em meu celular.

“Amanda, por que me trata assim? Não


consigo parar de pensar em como seríamos
felizes se voltasse para mim. Não paro de pensar
em você.”

Era de Henri. Mas ele tinha agido com


neutralidade há tão pouco tempo. O que mudou?
Decidi ignorar a mensagem, pois com certeza, ele
agiria como sempre, mudando subitamente seu
humor como se nunca tivesse enviado uma
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mensagem como aquela.

Já era fim de tarde e eu tinha conseguido


organizar tudo concernente a viagem. Precisava
avisar ao meu chefe e informá-lo que não deveria
se preocupar mais com qualquer imprevisto de
minha parte. Me levantei e dirigi-me até sua sala.
Dei uma batidinha suave, que não foi respondida
então abri lentamente a porta, tendo de presente
uma visão que me tirou o ar.
A parede do lado contrário à porta, ficava
atrás da mesa de Tony, mas ele não estava ali.
Estava de pé, encarando a parede de vidro enorme
por onde raios do pôr do sol alaranjado invadiam a
sala, dando ao ambiente um ar tão pacífico, que me
permiti admirar um pouco antes de chamar sua
atenção para mim.
— É tão lindo. Digo, esse show de luzes, traz
paz. É revigorante, não acha?
Tony se virou e me viu próxima à porta,
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admirando o mesmo show que ele. O pôr do sol.


Então se voltou à imagem anterior antes de
responder:
— Sim, digo para mim mesmo essas palavras
todos os dias.
Me senti ainda mais íntima dele, como se
aquele momento e o que ele disse, fossem dignos
de pessoas próximas. Respirei fundo e justifiquei
minha ida.
— Eu... Vim apenas para dizer que está tudo
no esquema para amanhã, da minha parte. Gostaria
de saber que horas é o voo. Preciso buscar Clara às
8, acha que dá tempo? — perguntei
cautelosamente.
— Sim, voamos às 10 horas. Passo na sua
casa e buscamos Clara, tudo bem? — Tony
questionou ainda de olho no sol, que já estava
quase todo encoberto no horizonte.
— Tudo bem. Obrigada mais uma vez, Sr.
Gali.
— Tony. Pode me chamar de Tony.
— Prefiro Sr...
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— Por favor, Amanda. — Ele se virou e me


fitou nos olhos. — Seu irmão é meu melhor amigo,
você me conheceu como Tony. Me chame de Tony,
por favor?
Não tinha saída. Ele insistia na informalidade
e, por fim, achei que não seria de todo o mal. Mas
Tony ainda era íntimo demais pra mim.
— Antônio. Pode ser? Eu gosto de Antônio
— sugeri, dando um singelo sorriso.
— Tudo bem. — deu de ombros, ainda de
olhos ligados nos meus.— Me chame de Antônio.
— Ok. Nos vemos amanhã então, já está na
minha hora — despedi-me e saí da sala.

TONY

Mais cedo naquele dia, minha mente e mesa


estava atolada de serviço. Tudo sobre o desfalque
em recife, quando Nick entrou em minha sala.
— Hey, puto! — disse Nick ao fechar a
porta.
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— Oi, o que te traz aqui, boneca?


Ele se aproximou e posicionou as duas mãos
sobre minha mesa, ainda de pé.
— Olha, sei que não viajarei com você nem
nada, sei que está atolado de trabalhos e tudo mais.
Mas queria que saíssemos hoje. Lucas me ligou,
aquele maldito filhinho de papai vagabundo, e por
um momento eu consegui esquecer de tudo quando
ele disse “festa na piscina no meu apê” para mim
ao telefone — falou com um ar de persuasão tão
forte que de imediato arregalei os olhos.
— Nossa. Você devia ser nosso vendedor!
Vou te mandar para Recife, as vendas lá estão
horríveis, com você talvez melhore. — Dei uma
risada.
— Não me diga que não se sentiu tentado a
uma festa na piscina cheia de mulheres? Vamos,
será sua despedida antes da viagem chata de
trabalho.
Parei por um tempo e pensei na proposta.
Afinal, o que eu tinha a perder? Por um pequeno
instante considerei chamar Amanda, mas por outro
me lembrei de que tínhamos uma relação
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estritamente profissional e não podia passar disso.


Ela é minha secretária executiva pessoal, apenas
isso.
— Ok, vou à festa. Me passa o endereço por
mensagem — enfim respondi.
— Tudo bem, te vejo lá. Já está quase no fim
do expediente, vou finalizar minhas coisas.
Apenas assenti e logo meu amigo se foi.
Depois daquilo, fui surpreendido pela entrada
abrupta e inesperada de Amanda em minha sala,
logo no meu horário sagrado.
Eu tinha um ritual louco que tomei por hábito
há poucos anos, que era olhar o pôr do sol. Era
como se aqueles raios quentes, quando se punham,
transmitissem paz e revigorasse minha alma.
Sempre que possível, não me negava uma
visão daquelas.
Mas então ela chegou e complementou minha
rotina me fazendo companhia. Por fim, pediu para
me chamar de Antônio.
Nesse momento senti minha espinha
congelar, estava nervoso. Apenas minha finada mãe
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me chamava de Antônio, era pessoal demais para


mim. Mas nos lábios dela soou tão… certo.
Senti, depois da saída dela de minha sala, que
não importava mais nada. Amanda já estava
fincando-se sob minha pele.

No dia seguinte, sexta-feira, fui acordado às 7


da manhã pelo despertador, sentindo uma leve dor
de cabeça, então me lembrei da noitada imprudente
que passei na festa da piscina com Nick, Lucas e
Pedro. Ao olhar para o meu lado, vi uma mulher
nua dormindo e imediatamente a acordei.
— Ei! Não avisei a você sobre dormir aqui?
Vamos, acorde! — fui rude.
Não gostava de tratar mulher alguma de
modo grosseiro, mas existem algumas que não
compreendem limites.
— Oi? — A mulher acordou lentamente,
esfregando os olhos.
— A minha única regra é “não durma”.
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Vamos, levante e vá pra sua casa! — continuei


sendo desagradável, mas era assim que eu agia
quando se tratava de mulheres para diversão.
— Tudo bem! Estou indo. Achei que pudesse
dormir depois de você pedir pra eu ficar te
abraçando de madrugada. Mas já vou então.
De imediato me espantei ao ouvir a mulher
proferir tal absurdo.
— Eu? Nunca peço para me abraçarem! Nem
lembro seu nome!
Ela se levantou e começou a se vestir,
aparentando estar indignada. Era uma morena alta
de pele parda e cabelos negros. Permaneci sentado
na cama, não compreendendo ao certo o que ela
dizia.
— Amanda — ela disse antes que saísse do
quarto.
— Hein? —questionei confuso — O que tem
a Amanda?
Ela posicionou uma mão na cintura e falou
enquanto gesticulava.
— É meu nome. Achei que não esqueceria,
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assim que me apresentei você logo me beijou e me


trouxe pra cá.
Fechei os olhos com força e amaldiçoei meus
pensamentos loucos. A que ponto havia chegado
por causa do meu desejo louco por ela?
— Já pode ir! — rosnei para a mulher com
quem passei a noite.
Ela se foi e peguei meu celular para
imediatamente verificar as horas. Precisava buscar
Amanda em 20 minutos. Tomei um banho, peguei
as malas e pus no carro. Em seguida apanhei o
telefone e liguei para meu chofer.
— Bom dia, sr. Gali — ele atendeu.
— Bom dia, Gus. Vá para o aeroporto da
cidade. Esteja lá às 9. Estarei viajando e quero que
traga o carro para minha casa.
— Entendido. Estarei lá.
— Obrigado.
Desliguei e disquei em seguida para Amanda.
Ao quarto toque ela atendeu.
— Bom dia, Antônio.
Senti um choque atravessar minha espinha ao
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ouvir meu nome sair de suas cordas vocais,


acompanhado de um bolo na garganta, travando
minha voz.
— Antônio?
— Ei, bom dia! Estou saindo de casa. Se
puder me aguardar lá embaixo na porta do prédio,
seria bom.
— Ok, estou descendo. Até lá.
Ela desligou e eu suspirei com o telefone no
peito.
Vamos, Tony, ela é inofensiva. Que mal pode
ter uma mulher deslumbrante te chamar pelo nome
que apenas sua falecida mãe usava para se dirigir
a você? Nenhum! Claro que nenhum!
Espantei esses pensamentos da mente e fui
para o carro. Dei uma conferida no meu perfume e
no hálito, verifiquei as passagens de avião e então
fui buscar Amanda.
Ela me aguardava na rua, em frente à entrada
do seu prédio com uma mala média. Estava com
um vestido de manga curta azul colado no busto até
a cintura e depois solto até os joelhos. Cabelo s
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presos em um rabo de cavalo e sapatilhas azuis


combinando com o vestido. Reparei em cada
maldito detalhe quando me aproximava. Ela estava
radiante aos meus olhos. Parei o carro, saí e fui até
ela.
— Oi.
Sorri.
— Oi — ela respondeu, retribuindo o sorriso.
— Me dê essa mala. Vou colocar lá atrás.
Imediatamente me entregou, fiz como havia
dito e voltei para abrir a porta do carona para ela.
Amanda entrou e se acomodou dentro daquele
automóvel que deveria reconhecer por alto.
Sentei no banco do motorista e saí com o
carro. Ficamos em silêncio por alguns minutos,
estava um pouco constrangedor. Aquela cena dela
ao meu lado parecia íntima e tão bem encaixada.
Como se fosse extremamente normal tê-la
casualmente no meu carro.
— Me passa o endereço da casa onde vamos
buscar Clara — pedi, para quebrar o silêncio.
— Chegando lá eu te dou as coordenadas
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— Amanda respondeu, dizendo o nome do bairro.


— Ok.
Sabia onde era o bairro que me indicou e
segui focado até o local, mas em meus pensamentos
só havia confusão e um caos complicado de
arrumar.
Queria conversar com ela, ser flexível e
amigo como era com Bruna, para que não pensasse
que estou com segundas intenções. Porque, mesmo
estando interessado nela, jamais a desrespeitaria ou
tentaria conquistá-la sabendo da minha limitação.
Nunca a faria sofrer por ter de lidar com alguém tão
quebrado quanto eu.
Ela merecia alguém melhor.
— Você se lembra desse carro? — perguntei
enquanto dirigia. Ainda faltava um caminho longo.
— Hum... Achei familiar, mas não me
lembro não. Eu já estive aqui? — Amanda pareceu
titubear entre as palavras. — Naquele dia, eu...
Você... Nós?
Ah, meu Deus. Ela entendeu tudo errado.
Tratei de esclarecer.
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— Não. Não tivemos nada. Acho que você


merece saber tudo que aconteceu naquele dia. Quer
que eu conte ou se lembra de algo?
— Às vezes lembro de uns flashes de cenas.
Mas nada muito claro. Me lembro mais do
momento em meu apartamento. Que eu me
apresentei de novo a você e você se apresentou pela
milésima vez achando que eu não lembrava seu
nome. — Sorriu.
Tentei não me abalar com a forma suave dela
ao falar e os sorrisos sempre tão abertos, que
transmitiam serenidade.
Meu senhor, eu tava reparando em sorrisos
serenos? SORRISOS SERENOS?
— Então vou contar o que houve — desviei o
caminho de meus pensamentos e engatei a
conversa. — Logo após você chegar e ir dançar e
beber, eu fiquei com seu irmão próximo ao bar.
Estava aquecendo... Enfim. Foi quando eu vi você
um pouco tonta no meio da pista e alertei seu
irmão, que estava com uma menina do meu lado.
Ele quase implorou para que eu vigiasse você, pois
estava saindo com a tal menina da boate.
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— Nossa, meu irmão é um idiota e eu nem


sabia! — Amanda exclamou. — Enfim, ele tem
suas razões, não devia nem me levar lá, eu que
insisti. Mas me conte, o que aconteceu depois?
— Então... Eu fiquei lá de olho em você,
pensando que assim que você se entediasse eu te
levaria até algum táxi para voltar pra casa. Mas
você não se entediava nunca. Até que um homem
se aproximou e fez você bater nele. Eu achei que
devia te ajudar, você estava quase caindo de tão
bêbada. Quando me aproximei, ouvi algo parecido
com "o que você está fazendo aqui? Volta pra sua
casa!". Ele puxou seu braço e eu tirei você da frente
dele e o soquei no rosto.
Amanda ficou boquiaberta. Notei ao arriscar
algumas olhadas em sua direção, que ela parecia
muito surpresa. Apenas sorri e dei de ombros.
— Meu Deus, que vergonha! Você bateu nele
por minha causa?! — questionou, com as
bochechas rubras.
— Ele estava te apertando, gritando com
você, e você chorava. Desculpa, mas ele mereceu.
— Mostrei firmeza.
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O que fiz, faria por qualquer pessoa. Nenhum


homem tem o direito de tratar uma mulher daquela
forma.
— Tudo bem.
Respirei aliviado, mas ela logo emendou:
— Era meu ex-marido. Foi nele que você
bateu.
— Você se lembra?
— Não, como te disse, apenas algumas cenas.
Não sou muito de beber, então devo mesmo ter
exagerado pra não lembrar tudo. Mas lembro que
no dia seguinte o vi, e ele estava com o rosto
machucado. Se alguém tinha intimidade para me
mandar pra casa no dia da boate e não era meu
irmão, só podia ser ele. — A voz de Amanda estava
baixa e tensa.
— Eu não sabia, desculpe por bater nele
então — me desculpei, afinal, não sabia a relação
que eles compartilhavam, apesar de separados. E
Amanda parecia pensativa demais.
— Não, não se desculpe, ele merece. É um
idiota, canalha, imbecil — murmurou entredentes.
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Ficamos em silêncio até Amanda me dar as


coordenadas finais para chegar na casa de sua filha.
Tentei criar um vínculo maior com ela, mas acabei
tocando em um assunto um tanto delicado e preferi
não abusar da sorte.
Assim que estacionei de frente ao muro baixo
da casa, Amanda liberou uma boa dose de ar dos
pulmões e se virou na minha direção.
— Antônio?
— Sim. — Encarei-a.
— Obrigada.
— Pelo...? — Não entendia exatamente.
— Por tudo. Por cuidar de mim no dia da
boate, por me levar pra casa, por me salvar no dia
seguinte de um possível acidente, por me dar esse
emprego. Você está se saindo um anjo da guarda.
— Ela sorriu graciosamente.
Retribuí o sorriso e apenas assenti.
Anjo da guarda estava de bom tamanho.

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AMANDA

Estava agradecida ao sair do carro, mas meu


olhar de agradecido logo se tornou raivoso. Antes
mesmo que eu tocasse a campainha, uma mulher
abriu a porta. Era uma loira bonita e elegante, de
olhos azuis profundos.
— Oi. Você deve ser a Amanda, não é? — a
mulher perguntou calmamente.
— Sim, posso entrar?
— Claro, Henri e Clara estão lanchando na
cozinha — ela disse enquanto eu entrava.
Me acompanhou até a cozinha.
Chegando lá, Henri estava dando cereal na
colher para Clara, sorrindo. Quando seus olhos se
viraram para mim, o sorriso dele se fechou. A
mulher loira se aproximou e deu um selinho na
boca dele.
Eu tinha razão, ele estava com outra. O que
eu estava pensando? Que ele iria implorar meu
perdão e meu amor para sempre? Como eu sou
idiota. Precisava ir embora logo daquele lugar.
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— Bom dia, Henri — Disfarcei e o saudei.


— Bom dia, Amanda. Clarinha, meu amor,
vá escovar seus dentes, vou buscar sua mala.
— Sim, papai. Tia Lalá vem comigo?
— Clara se referia à loira, creio eu.
— Sim, princesa, vamos. — Ela sorriu e deu
a mão para Clara. As duas foram em direção ao
banheiro, deixando-me com Henri a sós na cozinha.
— O que é isso? — perguntei, assim que elas
saíram de vista.
— Isso? Não estou entendendo — Henri
desconversou enquanto caminhava em direção ao
quarto de Clara para pegar sua mala.
— Ela. É sua nova namorada?
Não contive a raiva na voz, que estava
trêmula. O nervosismo invadindo meus poros.
— Não deu pra notar? Achei que eu era o
lento para percepções — ele retrucou, dando o
mesmo fora que usei contra ele, anteriormente.
Eu tinha dito que ele era lento para
percepções quando deu um ataquezinho de ciúme
por causa de Antônio. Brigamos naquele dia ao
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telefone e não hesitei em afrontá-lo e mostrá-lo que


minha vida estava seguindo em frente.
Ao ouvi-lo, meu sangue subiu, mas precisava
manter a calma. Antônio estava lá fora e não podia
presenciar um descontrole meu naquele momento,
necessitava sair logo daquele lugar.
— Voltamos no domingo à tarde, espero que
esteja bom pra você. Aproveite seu dia. — disse
secamente e andei em direção à sala para aguardar
Clara.
Clara chegou, deu-me um beijão no rosto,
acompanhado de um grande abraço, me fazendo
sorrir.
— Mamãe, não te beijei antes pois minha
boquinha estava suja — disse apontando para a sua
boca.
— Tudo bem, meu amor, vamos? Dá tchau
pro seu pai e pra amiga dele.
— Tchau, papai. Tchau, tia Lalá.
Os dois acenaram para ela e foram conosco
até a varanda, nos vendo caminhar até o carro.
Assim que me aproximei do automóvel, Tony saiu,
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solícito e se ofereceu para guardar as malas. Virei


disfarçadamente na direção do meu ex e o notei
com os olhos arregalados, espantado.
Touchè!
— Tio Tony! — Clara correu até ele e o
abraçou.
Sinceramente, não conseguia compreender
como minha filha se afeiçoou ao amigo de meu
irmão de primeira. Só que estava ainda me
deleitando com a surpresa estampada nos olhos de
Henri. Queria que ele provasse um pouco do
próprio veneno.
Que se dane, tenho o direito de ser vingativa
ao menos uma vez!
— Clarinha! Como vai essa menina grande?!
— perguntou ele ao segurá-la no colo.
Eu só assistia a cena.
— Bem! Você vai viajar com a gente?
— Sim, vamos viajar nós três juntos!
Clara então sorriu e o abraçou mais uma vez.
Antônio a desceu de seu colo, e logo a
coloquei no banco de trás, bem segura em uma
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cadeirinha, antes de pegar sua bagagem. Fechei a


porta e fui até meu chefe.
Sabia que Henri ainda estava ali, com ou sem
a loira. Deus que me perdoasse pela ideia maluca
que passou em minha mente, mas não tinha tempo
para pensar em consequências.
— Antônio, sei que não tenho esse direito,
mas você pode me dar um selinho na boca?
Me arrependi no momento em que proferi as
palavras, estando próxima ao seu ouvido. Estava
sendo muito inconsequente.
— Oi? — Ele nitidamente se espantou com o
pedido, mas levantou o olhar para atrás de mim,
provavelmente enxergando Henri. Não sei se ele
entendeu o motivo implícito, mas logo me puxou e
depositou nos meus lábios um beijo lento, mais do
que um selinho, porém sem língua. Ao afastar-se de
mim, ele voltou a olhar na direção de Henri, mas eu
não virei para verificar meu ex em fúria.
— Obrigada, e me desculpe — sussurrei
próxima ao ouvido de Antônio e então me afastei
dele. Ele pegou a bagagem de Clara e colocou no
porta-malas do carro.
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Me senti uma vadia da pior espécie, mesmo


sabendo que não fiz nada demais.
Só que aquela atitude insana poderia me
causar consequências, como ser demitida.
Arghhh!
Me mantive em silêncio ao entrar no carro, e
evitei olhá-lo nos olhos. Estava com vergonha. Às
vezes, no começo do caminho, eu o encarava
sutilmente, e vi que seus olhos mantinham-se sérios
e focados. Assim como seu corpo, ao dirigir,
permaneceu firme, inabalável. Frio.
Durante o caminho até o aeroporto, Clarinha
puxou assunto com Antônio em um dado momento,
me fazendo gargalhar de tanto rir.
— Tio, eu nunca fui num avião, ele morde?
Eu tenho medo, tio, de longe pelas fotos parece um
passarinho, ele vai comer a gente? — perguntou ela
em toda sua inocência.
Foi ali que vi o primeiro sorriso despontar no
rosto daquele homem.
— Não, princesa, ele não é um bicho, é como
um carro, só que bem maior. Pode ficar tranquila
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que não vai sair machucada — respondeu


sorridente o tempo todo.
— Ah sim — replicou, compreendendo. —
Tio, meu pai falou que eu tenho que me comportar
como uma mocinha porque mamãe vai trabalhar,
você vai trabalhar também ou vai poder brincar
comigo?
— Clarinha, não pergunte essas coisas, filha!
— me intrometi, advertendo Clara.
— Tudo bem, Amanda. Eu posso responder.
— Tony fitou os olhos rapidamente nos meus e
sorriu.
Me senti até mais aliviada da culpa.
— Vamos a trabalho sim, Clarinha, mas lá
você poderá brincar também, terá uma cuidadora
com você quando sua mamãe estiver trabalhando e
quando estivermos livres vamos fazer muitas coisas
divertidas.
Um sorriso radiante surgiu em minha
pequena.
O quê? Ele vai dar atenção à minha filha?
Fiquei surpresa pela resposta dele.
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— Oba! Mamãe, eu tenho uma pergunta


sobre o papai, posso falar?
Ai meu Deus, o que mais pode acontecer hoje
que me surpreenda? — Foi o que pensei naquele
exato momento. E olha, eu estava certa.
— Pode, filha, fala.
Eu a olhava pelo espelhinho do carona o
tempo todo.
— A Tia Lalá sempre cuidou de mim depois
que você foi embora, mas ela não beijava meu
papai. Só que ontem eles se beijaram e hoje
também. Ela é namorada do papai? — seus
olhinhos inocentes estavam cheios de conflito e
dúvida.
Que pergunta! Deus, me ajuda!
— Não sei, filha, parece que sim. — Soltei
um suspiro um pouco infeliz.
Odiava admitir a mim mesma que ainda
sentia algo por aquele canalha.
— Mas não era pra você beijar o papai? Por
que você nunca mais beijou o papai?
Senhor, mas que perguntas! Suspirei ao notar
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que não tinha para onde fugir.


— Ah, filha... São coisas de adulto. Papai e
mamãe não são mais namorados, apenas isso —
queria cortar logo o assunto, mas parece que fugir
das perguntas de Clara não era uma boa saída,
afinal algum dia eu teria que falar sobre isso, só não
esperava que fosse logo. A cada dia que passava,
tinha mais certeza de que minha filha era
extremamente inteligente.
— Então... Você não beija mais o papai,
papai pode beijar tia Lalá... E você pode beijar o tio
Tony?
Fiquei estática, olhando para a estrada à
minha frente, sem saber o que responder. Eu não
queria que minha filha interpretasse aquele
pequeno beijo como algo maior, pois não desejava
algo maior com Tony, não sentia nenhuma atração
por ele, apenas admiração, como um bom amigo e
chefe que ele era. Imediatamente me arrependi
mais uma vez da estupidez cometida há pouco.
Não virei o rosto para ver a reação de
Antônio, apenas respondi minha filha.
— Filha, depois conversamos — enfim
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encerrei o assunto.
Logo chegamos ao aeroporto, fizemos check-
in e então decolamos.
A viagem toda foi silenciosa. Eu e Clara
cochilamos. Tony permaneceu em um assento um
pouco distante, concentrado em seu laptop, desde
que entramos.
Despertei no meio da viagem e sem saber
muito o que fazer, peguei meu celular. Vi que tinha
duas mensagens que chegaram antes de entrarmos
no avião e abri para lê-las.

9:25: Então esse é seu namoradinho? O


cara que me bateu na boate. Péssima escolha!
Achei que você fosse mais inteligente. E manda
minha filha parar de chamá-lo de tio Tony.

9:40: Amanda, por favor, me perdoa, eu


não suportei vê-la com outro, eu estou tentando
seguir em frente, mas o arrependimento me
corrói. Eu te amo, sempre vou te amar.

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Eram de Henri.
Eu precisava ser forte, minha filha
necessitava de meu apoio. Não podia mais ficar
nesse impasse.
Decidi ali que, assim que voltássemos, teria
uma longa conversa com Henri.
O avião pousou e Clara acordou, seus
olhinhos ficaram radiantes quando ela olhou pela
janela. A menina parecia muito contente em
finalmente passear comigo em algum local que não
conhecia.
Queria apenas dar a ela tudo que sempre
sonhou, sem restrições.
— Vamos? — Meu chefe nos chamou
direcionando-nos pelo caminho do aeroporto até a
limousine que nos aguardava do lado de fora.
Entramos no carro e nos acomodamos
enquanto o chofer guardava nossas bagagens.
— Sr. Gali — disse o motorista quando todos
já estavam dentro do carro.
Antônio sentou de um lado do banco
enquanto eu e Clara ficamos no banco de frente a
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ele.
— Bom dia, quase boa tarde, Nicolas — ele
respondeu.
— Confirmando o hotel — então disse o
nome.
— Sim, confirmado, nos leve para lá, por
gentileza.
O motorista saiu com o carro e
imediatamente me senti surpresa por saber que
ficaríamos no melhor hotel da cidade.
Eu não poderia permitir isso, já era demais.
— Antônio, não seria melhor se eu e Clara
ficássemos em um hotel menos... Como posso
dizer, mais condizente com nossa situação
financeira? —perguntei durante o caminho, com
um pouco de timidez.
Estava era morrendo de vergonha mesmo!
— Absolutamente não. Precisamos estar
próximos para que possamos ganhar tempo em
todas as reuniões — disse em tom estritamente
profissional.
— Ah, sim, tudo bem.
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Não era para me sentir daquela forma, mas


foi como se farpas congeladas me perfurassem com
seu tom de voz. Ele estava frio comigo. E o que eu
poderia querer? Que fôssemos amiguinhos?
Ao chegarem no hotel, ele seguiu na frente
para dar entrada na recepção, enquanto Clara e eu
ficamos no meio do hall de entrada absorvendo
todo aquele local enorme, lindo e muito elegante.
— Vamos? — disse Tony ao voltar para
próximo de nós.
Assenti e peguei Clara pela mão. Nós três
subimos os elevadores para o terceiro andar. Ao
sairmos de lá, ele retirou os cartões de acesso do
bolso e me entregou o meu.
— Seu quarto é o 305, o meu é o 306.
Qualquer necessidade, emergência ou dúvida, não
hesite em me chamar. A primeira reunião será
daqui a duas horas na empresa. Eu te pego em uma
hora no seu quarto, ok?
— Ok. E a cuidadora? Ela estará aqui?
— Sim, assim que eu chegar no quarto vou
verificar isso, pode ficar tranquila.

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— Obrigada mais uma vez. Te vejo daqui a


uma hora.
Ele assentiu sorrindo, mas não tão animado, e
seguimos cada um para o seu quarto. Clara
permanecia em silêncio até ver que o quarto na
verdade parecia um apartamento, tinha sala,
banheiro, uma área para se fazer as refeições, closet
e um quarto com uma cama king size enorme.
— Mamãe, isso é igual aos dos filmes de
princesa — Clara exclamou boquiaberta.
— Sim, filha, idêntico — também estava
boquiaberta.
Com Clara tudo era tão surreal, que me
permiti aproveitar um pouco do local e brincar com
ela. Assim que nos encaramos e olhamos para a
cama, tive a ideia.
— Pular na cama? — Clara perguntou
sorrindo, lendo meus pensamentos.
— Pular na cama! — exclamei, animada.
Então subimos na king size e começamos a
pular e nos divertir como mãe e filha que somos.
Nos abraçávamos, pulávamos e gargalhávamos até
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a barriga doer. Quando, um tempo depois, uma


batida na porta surpreendeu-me.
Corri para abrir e lá estava uma menina de
aparentes 18 anos, uniforme branco, cabelos cor de
mel e sorriso inocente.
— Dona Amanda, sou a babá. Meu nome é
Mel.
— Oi! Entre, Mel, fica à vontade.
Mel entrou e Clara veio ao seu encontro.
— Oi, meu nome é Clara. Qual o seu? —
perguntou com os olhinhos brilhando por ter uma
nova companhia.
— Mel, vim aqui para brincar com você, do
que quer brincar? — a jovem babá interagia com
Clara de uma forma surpreendente.
— Boneca. Estou cansada de pular na cama,
vou pegar minha boneca — tentou soar mais
madura ao desprezar os pulos dados há pouco.
— Ok — Mel sorriu.
Apenas as observava de longe e sorria, sentia,
apesar da minha estupidez, que tudo daria certo
naquele fim de semana e minha filha se divertiria
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como nunca. Por outro lado, também me sentia


como um incômodo a mais para Antônio. Ele fora
extremamente gentil ao permitir que levasse Clara
comigo, mais ainda por conseguir a babá. Minha
dívida com ele estava apenas aumentando e não
queria falhar em nada na minha função.
— Ei, Mel — caminhei até a babá.
— Oi, dona Amanda.
Ela se levantou. Estava brincando sentada
com clara no quarto.
— Me chame apenas de Amanda, por favor.
Quero que fique à vontade para brincar e cuidar de
Clara e quando eu voltar me passe tudo o que
fizeram, tudo bem?
— Sim, dona... É... Amanda — Mel sorriu
timidamente.
— Ok então, vou me arrumar, pois tenho uma
reunião daqui a pouco.
As deixei e fui ao banheiro, onde admirei
toda a sua extensão. Parecia um quarto e dentro
dele tinha uma banheira enorme de hidromassagem,
um box e uma parede espelhada que refletia todo o
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ambiente. Me senti no céu. Após admirar tudo


aquilo, entrei no box para tomar meu banho rápido,
mas jurei que na volta ficaria pelo menos meia hora
dentro da banheira. Depois de um dia louco
daqueles, precisava relaxar.
Já que estava lá, tinha que aproveitar algo,
afinal.
Mas uma coisa não saía da minha cabeça:
O que meu chefe deve estar pensando sobre
mim?

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Capítulo 7

TONY

Estava na banheira do quarto onde eu me


hospedei e minha mente insistia em pensar no beijo
que troquei com Amanda.
Foi algo tão mínimo. Não deveria me fazer
reviver a cena trocentas vezes em pensamento.
Meu consciente me alertava, lembrando-me
que ela não era ninguém. Apenas mais uma, era o
que tentava me convencer.
Só mais uma dentre tantas e tantas que eu já
tive.
Durante o caminho até o aeroporto, refleti
sobre aquele pequeno episódio. Obviamente não
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me incomodei nem achei ousado ou atirado da


parte dela, querer causar um pouco de ciúme no ex.
Não entendo pois nunca tive ciúmes, mas sei o que
isso pode fazer com as pessoas. Ela queria apenas
mostrar que estava bem e não precisava dele, e
aquilo, naturalmente, não deveria me incomodar.
O Tony de semana passada não se
incomodaria com um maldito roçar de lábios
quentes.
Mas, enquanto dirigia, me senti mal. Não
gostei de ter aquela pequena prova, apenas por
nada.
Pelo contrário, eu quis tanto continuar.
Meu Deus.
Queria beijá-la ainda mais. Não apenas
beijar, se é que me entendem. Eu já estava duro de
imaginar tudo que desejava fazer com ela.
Foi quando ali, na banheira enquanto
relaxava, que fechei os olhos e me deixei imaginar.
Tentava comandar meus próprios pensamentos,
mas sentia meu coração apertar de uma forma que
nunca senti ao pensar nela. Nos olhos dela, no

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sorriso que ela dava, quando soltou uma gargalhada


no carro e seus olhos fecharam, no perfume doce e
envolvente que exalava quando estava próxima a
mim, no modo dela andar de salto... E em como ela
ficaria perfeita sem toda aquela roupa.
— Já foi longe demais, Tony! Ela é sua
secretária, caramba! Foca no que seu pai te dizia,
foca nisso!
Finalizei o banho e saí dali o mais rápido que
pude.
Dizer que sou um cara diferente seria
mentira, era óbvio que imaginava todo o tipo de
imagem de Amanda, obscena ou não. É um ato bem
comum aos homens, alguns só disfarçam. Mas além
dessas imagens em minha mente, eu ansiava por
mais dela. Queria sua companhia, queria conversar,
abraçar, admirar a sua beleza. Mas então uma frase,
quase um mantra, invadiu meus pensamentos:

Nunca se apaixone, o amor não vale a pena.

Era nisso que me apegava e me ajudava a


espantar os pensamentos sobre Amanda.
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Enfim comecei a me arrumar.


Pus um terno azul-marinho, me perfumei,
penteei e prendi os cabelos. Estava nervoso pois
veria meu pai. Eram poucas as vezes em que o via
no ano, mas ele sempre falava do meu cabelo e em
como me achava imaturo por deixá-los longos.
Que se dane. Ao menos no meu cabelo
consigo mandar.
Saí do quarto e chamei Amanda, ficando ali
apoiado na soleira da porta. Quando ela abriu, não
consegui evitar que meus olhos corressem por todo
o corpo dela, que também estava adornado por um
terninho azul-marinho, como em combinação ao
meu. Irônico. Mas rapidamente me ajeitei e voltei a
ser o gelo profissional que era.
— Vamos, Amanda? — indaguei a
encarando fixamente.
Notei seus olhos me verificarem rapidamente
e gostei daquilo.
— Sim, Antônio. Podemos ir. —Ela deu
tchau para sua filha que estava com a babá e saiu
comigo em direção à empresa.

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Gali Telecomunicações da cidade de Recife


ficava a 10 minutos do hotel onde estávamos
hospedados, porém fiz questão de ir de carro. Havia
alugado um assim que chegamos e o Range Rover
me esperava no estacionamento do hotel.
Ao entrarmos no carro, Amanda cortou o
silêncio.
— Então, você ainda não me falou
exatamente o motivo de estarmos aqui. Qual o
problema da empresa?
Dei partida enquanto respondia.
— É complicado explicar, as vendas caíram
consideravelmente em pouquíssimo tempo.
Precisamos investigar para sabermos se houve
desvio de verba ou alguma insatisfação com os
produtos que fizeram as vendas caírem.
— Ah, entendi. Vou então anotar tudo da
reunião de hoje para que mais tarde, se você quiser,
possamos juntos analisar os fatos, os números e
bolar um plano. — Ela pareceu empolgada e aquilo
fez com que o foco dos meus pensamentos fossem
apenas os problemas da empresa.

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— Vamos ver primeiro o que nos aguarda


nessa reunião, e depois conversamos sobre isso —
falei profissionalmente sem desviar os olhos da
direção.
— Ok.

AMANDA

Ao chegarmos na empresa, fomos bem


recepcionados por uma mulher magra, de cabelos
pretos e pele pálida que estava no salão principal do
prédio. Ela veio em nossa direção assim que
entramos pelas portas principais. Eu poderia estar
julgando mal, mas os olhos dela pareciam querer
devorar Antônio por completo. Fiquei sem graça,
mas agi da forma mais profissional possível.
— Olá, Sr. Gali, que prazer revê-lo! — ela
falou diretamente a ele sem me olhar ao seu lado.
— O prazer é meu, Felícia, essa é Amanda,
minha nova secretária pessoal — Tony disse
apontando para mim.

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— Oi — ela falou comigo enquanto me


olhava de cima a baixo e logo voltou o foco para
Tony. — O que aconteceu com Bruna?
— Ela engravidou e entrou de licença para ter
o bebê. Felícia, nos acompanhe até a sala de
reuniões, por gentileza. Informe ao diretor local
nossa chegada.
— Ok, antes preciso te informar que seu pai
também está presente.
Eu apenas acompanhava os dois de uma certa
distância, pois percebi que os olhares de Felícia
para mim não eram amigáveis. Pela fama que
Antônio tem e pelo que meu irmão já falou dele, ele
deve ter transado com ela alguma vez na vida, mas
acredito que não faça mais isso, é antiprofissional.
Ela disse que o pai dele estaria presente. Eu sabia
que ele é o Diretor nacional da empresa, mais
conhecido como CEO, mas não esperava conhecê-
lo logo na minha primeira semana de trabalho. Isso
deve significar que o assunto é realmente
importante, não posso falhar em executar meu
trabalho nessa viagem.
Caminhamos em direção à sala de reuniões
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que fica no terceiro andar. Ao chegarmos, Felícia


anunciou nossa chegada e então entramos na sala.
Era uma sala enorme, cinza, com uma mesa oval no
meio e ao redor dela havia aproximadamente
quinze pessoas sentadas, do conselho da empresa e
diretoria. Logo Tony puxou uma cadeira para que
eu me sentasse e se sentou ao meu lado.
— Bom, já que estão todos presentes, vamos
começar logo — disse o homem de idade que
ficava na ponta da mesa regendo a reunião. — Sou
Douglas Gali, o diretor nacional da empresa, para
quem ainda não me conhece pessoalmente. A
reunião de hoje é de extrema importância. Eu não
poderia vir, porém o meu compromisso foi adiado e
imediatamente me dispus a estar aqui e participar
desse conselho. Peço que abram suas pastas
localizadas diante de cada um de vocês. Vamos
começar a analisar os gráficos.
Tony ficou silencioso durante a primeira hora
da reunião, apenas observando as páginas e
ouvindo seu pai e alguns participantes do conselho
falarem.
— Nesse gráfico da página 6, podemos ver a
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queda brusca em apenas dois dias de todas as


vendas de planos telefônicos, aparelhos celulares e
instalação telefônica em residências. Uma queda
que nossa empresa nunca registrou e que, se formos
analisar os gráficos regionais na página 7, veremos
que nesse mesmo período não houve quedas em
outras regiões do país. Como então apenas aqui em
Recife a tivemos?
Tony segurou minha mão e olhou em meus
olhos. Eu o fitei e seus lábios se moveram. Ele
estava querendo me dar algum aviso.
Atenção agora, foi o que sibilou. E logo sua
mão soltou a minha e seus olhos voltaram ao seu
pai.
Entendi o recado e fiz anotações, enquanto o
diretor geral da empresa analisava os gráficos.
— Sr. Gali, nossos vendedores alegaram que
houve uma rejeição dos clientes do telemarketing e
os vendedores das lojas afirmaram que o
movimento caiu não só em nossa loja, mas nas
demais ao redor também. Pode estar relacionado ao
momento econômico de nossa cidade. Devemos
avaliar como o governo tem se portado ou se há
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alguma crise interna acontecendo — um senhor um


pouco mais velho que Antônio, sério e forte, disse
ao diretor geral.
— Frank, é seu nome, não é? — Douglas
Gali perguntou.
— Sim, sou supervisor geral de vendas da
empresa, senhor.
— Tem alguma solução? Sugestão para
solucionarmos esse problema, além de me informar
possibilidades pelas quais ele possa ter sido
causado? — Douglas perguntou sério.
— Não, senhor, apenas tenho palpites de
como isso pode ter acontecido.
— Então faça seu trabalho, supervisione as
vendas e crie estratégias para que elas subam. A
causa da queda será analisada pelo comitê
investigativo. Mas obrigado pela opinião — rude e
seco, finalizou a intromissão do funcionário, que
queria apenas ajudar.
Eu vi quando os olhos de Douglas se viraram
para Antônio e depois para mim, voltando então
para a pasta em sua mesa. Mas o que Antônio com

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certeza não viu é que no momento em que seu pai o


olhou, ele estava com a mão na minha, sussurrando
em meu ouvido: “você tem alguma ideia do que
pode ter acontecido?”. Eu fiquei pálida quando o vi
me observar, e só após os olhos dele voltarem aos
papéis em sua mesa, respondi discretamente:
— Prefiro falar depois.
Aquele homem me dava medo.
A reunião foi longa, durou duas horas, porém
saímos de lá sem conhecer o motivo da queda das
vendas, nem com uma solução genial que a
aumentasse. Na saída eu caminhei até a porta e
Antônio veio após mim, porém percebi seu pai
puxá-lo para trás.
— Fique, quero falar com você — foi o que
ele disse.
Ele se virou para mim e assentiu, dando-me a
entender que eu deveria esperá-lo do lado de fora
da sala. Foi o que fiz, acenei em despedida para o
Diretor Geral e saí de lá.

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TONY

A reunião estava estática, não andava para


frente nem para trás. Eu me peguei admirando
Amanda pelo menos umas cinco vezes. O olhar de
concentrada que ela faz enquanto analisa os
gráficos, o bico que surge em seus lábios quando
anota alguma coisa e a ruguinha formada na testa
quando alguém fala e ela presta atenção. Tentei
disfarçar muitas vezes, mas não consegui, meus
olhos me desobedeciam, era involuntário.
Por fim eu pus a minha mão na dela, com o
intuito de chamar sua atenção, mas senti uma
corrente elétrica passar por mim e gelar todo o meu
corpo, era uma sensação inédita. Eu estava batendo
o recorde de sensações inéditas naquela semana.
Precisava me concentrar no trabalho. Ao finalizar
aquela reunião de duas horas, caminhávamos em
direção à saída quando meu pai me puxou pelo
braço.
Tudo bem, ele morava em outro estado e
quase não nos víamos, era para eu ser mais
receptivo e agradável com ele, mas não conseguia.
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Não conseguia conviver com ele sem reviver os


anos em que o vi como um zumbi dentro de casa.
Os anos em que eu tive que carregar nos ombros
toda a responsabilidade da família porque ele se
jogou num poço sem fundo. O amava, mas não
podia conviver com ele.
— Quero falar com você — disse-me,
fazendo com que eu ficasse enquanto via Amanda
sair pela porta.
Todos saíram, ficando apenas nós, eu e meu
pai.
— Quem é ela? — ele me perguntou, sem
rodeios.
— Oi, filho, que saudade, como tem
passado? Acho que isso precede uma boa conversa,
pai — respondi.
— Sem enrolação, quem é ela, cadê a Bruna?
— indagou rude.
— Entrou de licença-maternidade. Ela é
Amanda, a nova secretária, tão competente quanto
Bruna — falei com autoridade e porte que tinha.
— Sente-se — ordenou.
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Sentei e então nos olhamos nos olhos, um de


frente ao outro na mesa.
— O que sente por ela, filho?
Como assim? Meu pai querendo saber sobre
meus sentimentos? Já passou da hora disso, eu já
estava trancado em paredes de chumbo contra o
amor e joguei a chave fora onde nem conseguia
ver. O que ele queria com isso?
O mais irônico de tudo, era que nunca
tínhamos uma conversa normal. Era sempre
perguntando se eu estava “praticando” suas regras.
— O que sente, Tony, o que sente por ela? —
perguntou elevando o tom de voz.
— Admiração. Ela é muito competente,
apenas isso. Por que me pergunta uma coisa dessas,
pai? — Franzi o cenho.
— Filho, vi a forma como a olhava. Vi que
você a observou por cinco exatas vezes durante a
reunião. Por duas vezes você colocou sua mão na
dela, falando algo. Filho, eu sou seu pai, você sabe
como sofri, você sabe o que o amor faz com as
pessoas. Não preciso repetir o que disse há anos,

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não é?
Nem parecia que estávamos no meio de um
desfalque financeiro na empresa. Tanto assunto
para falar e ele só fala nesse maldito sofrimento.
Na mesma hora meu coração parecia ter sido
esmagado, eu não sabia o porquê, mas senti uma
dor miserável nele. Se pudesse arrancá-lo fora para
não sentir, eu o faria.
— Não precisa, pai, eu não a amo, não estou
apaixonado. E ela não se apaixona também, já
sofreu muito por amor. Amanda nunca me amaria,
então pra que sofrer, não é? Apenas a admiro, você
deveria conhecê-la — falei.
Tentei passar firmeza nas minhas palavras,
mas nem eu mesmo acreditava nelas. Não queria
amar, nem me apaixonar, mas tinha ciência de que
Amanda estava mexendo comigo de uma forma
diferente.
— Sendo assim... Quero conhecê-la. Ela
pareceu atenta na reunião, gostaria de ouvir o que
tem a dizer. Marque com ela um almoço amanhã no
meu bangalô da praia.

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— Você está no bangalô? — perguntei.


— Sim, você está aonde?
— No hotel. Então nos vemos amanhã, no
almoço.
— Combinado.
Saí da sala um pouco tenso pela conversa que
quase nunca tenho com meu pai. Eu estava
apaixonado? Eu estava amando? Acho que isso é
exagero, apenas gosto dela e reconheço suas
qualidades, nada demais. Fora que em nenhum
momento ela me deu esperança de que podia
retribuir qualquer coisa que eu pedisse, então não
tinha o que temer, não é?
Essas coisas de paixão não acontecem assim
do nada. Só nos filmes.
E eu definitivamente, não queria sentir nada
disso.
Amanda me esperava do lado de fora da sala.
Estava conversando com a secretária-executiva
dali, deveriam estar trocando experiências ou algo
do tipo quando as interrompi.
— Amanda, podemos ir?
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— Sim, podemos.
Descemos o elevador e caminhamos até o
carro. Quando saí do estacionamento com o
automóvel, lembrei que não tinha almoçado e que
estava quase na hora do pôr do sol. Não podia
voltar pro hotel e me trancar naquelas paredes sem
me sentir revigorado com a visão do sol se pondo,
mas Amanda estava comigo e queria ver sua filha.
— Se importaria se eu comprasse um lanche
e fôssemos à praia agora? É bem rápido.
Ela hesitou em responder, abriu a boca e logo
fechou, mas então finalmente respondeu.
— Tudo bem, só não podemos demorar
muito.
Um sorriso nasceu em meu rosto Eu queria
muito ver o pôr do sol na praia de Recife. Era
extraordinário.
Meus olhos perceberam pelo canto que
Amanda também sorria. De repente ela abriu a
boca.
— Também quero ver o sol se pôr nesse
paraíso — lendo meus pensamentos, me olhou
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sorridente.
Eu juro que naquele momento quase perdi a
direção do volante. O sorriso dela tem
superpoderes, tinha certeza disso. Senti meu corpo
derreter por dentro e queimar. O que ela fez ao
dizer essa frase? Um dia eu ainda perguntaria a ela.
Anotem: Eu estava virando um babaca
adolescente.
Então paramos numa lanchonete próxima à
praia, que também não era tão longe do hotel, e
compramos sanduíches e sucos para nós. Claro que
eu paguei, jamais deixaria Amanda gastar um
centavo, pelo bem do meu cavalheirismo, apesar de
ser um maldito pervertido. Ao sairmos da
lanchonete, fomos andando até a praia em silêncio.
A praia estava vazia, por incrível que possa
parecer. Havia apenas alguns jovens tomando
banho. Encontramos umas pedras grandes onde
poderíamos sentar, elas ficavam na posição mais
privilegiada para quem quisesse assistir o pôr do
sol.
Alguns minutos de silêncio enquanto
comíamos, me permitiu respirar tranquilamente
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aquele ar fresco.
— Sabe, eu nunca vim à praia — ela
comentou ao meu lado, olhando o mar.
Quando acabei de mastigar meu sanduíche,
abri minha boca para argumentar. Nunca foi à
praia? Isso não pode ser possível.
— Verdade? Nunca saiu de BH?
Ela balançou a cabeça negativamente.
— Tudo tem uma primeira vez. Bem-vinda à
praia do Nordeste — afirmei sorridente.
— Obrigada, estou muito feliz com a
recepção. Essa vista compensa completamente as
duas horas agonizantes dentro daquela sala de
reuniões — disse e logo se corrigiu. — Ops,
desculpe, não quis dizer isso.
Ri.
— Tudo bem, estava chato mesmo. Para te
dizer a verdade, se eu pudesse escolher minha
profissão, seria salva-vidas — falei enquanto
admirava o sol no horizonte.
Não era meu sonho de verdade, mas uma
vontade insana. Apenas usei daquilo para brincar
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no momento.
— Tudo a ver com você. Analisando pelo
fato de que me salvou três vezes. Você leva jeito
para salva-vidas, e ficaria na praia. Imagina ver o
sol se pôr na praia todos os dias?
Permaneci sorrindo. Não consegui conter a
alegria de poder livrar meus pensamentos de toda a
sobrecarga que eu recebo e imaginar minha vida
como um salva-vidas. Era uma profissão simples,
desvalorizada, mas eu amo a praia. Eu seria feliz,
com certeza. Amanda estava ao meu lado
sorridente também, então decidi cometer uma
loucura.
Sabia que entre nós não teria nada. Jamais a
obrigaria e isso fere tudo que prezo dentro da
unidade de BH, que é o relacionamento entre
funcionários. Mas me incomodava o fato de não
termos um “nome” certo para aquela relação tão
estreita que estávamos plantando.
— Amanda, sei que sou seu chefe, amigo do
seu irmão e tudo mais...
Ela me olhou assustada. Quando abriu a boca
para me interromper, decidi concluir logo a frase,
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antes que ela saísse correndo.


— Quer ser minha amiga? — respirei e
continuei. — Oficialmente falando, tipo a Bruna?
Percebi que, ao ouvir a palavra “amiga”, ela
relaxou. Não sabia que ela estava tão avessa a
relacionamentos assim.
— Ufa. Por um mísero instante achei que
estava sentada ao lado do Nick.
— Nunca, Nick é um bastardo louco. Meu
amigo, mas um grande idiota.
Ela riu.
— Aceito seu pedido. Digo, que mal tem em
ser amigo do amigo do meu irmão, que é meu chefe
também? Gosto da sua companhia, acredito que
serei uma amiga muito útil.
— Então, amigos.
Apertamos as mãos — meio infantil, admito
—, e voltamos a admirar o sol se pondo. Em
instantes o horizonte já estava coberto pelo
crepúsculo e voltamos em seguida para o hotel.
Chegando lá, Amanda e eu subimos juntos.
Ela entrou em seu quarto e quando eu estava
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prestes a entrar no meu, fui surpreendido por uma


voz.
— Oi, lindão, estava com saudades.
Quando me virei, deparei-me com Felícia.
Ela veio direto do serviço e estava me aguardando
no corredor.
— Então quer dizer que você e a secretária
não dormem juntos? Isso é bom! Posso entrar?
Ok, admito que não me relaciono com
funcionários, mas quando são da mesma unidade
que eu. Em Recife eu tive um pequeno histórico de
mulheres na empresa. Sei que é errado, mas elas
são ótimas em guardar segredos.
Eu não negaria aquela mulher que eu já
conhecia. Até porque, meu cérebro tinha que
desintoxicar e eu já estava precisando de um pouco
de alívio.
Abri a porta sem pensar duas vezes e deixei
Felícia entrar.
Aquela noite foi intensa, Felícia me provou
que estava mesmo com saudades e logo após
nossas sessões de sexo, fomos tomar banho em
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minha banheira, onde a possuí novamente, firme.


No final eu quis permanecer um pouco mais
no banho e ela saiu, tinha algum compromisso
naquela noite e não podia se atrasar. Quando olhei
meu relógio de pulso, já eram 9 da noite. O tempo
correu e eu estava muito cansado, queria e
precisava dormir. Mas, de repente, escutei alguém
bater à porta. Rapidamente me enrolei em uma
toalha e saí do banheiro com os cabelos soltos
ainda úmidos.
— Ele está ocupado, em que posso te ajudar?
— Ouvi a voz de Felícia. Segui em direção à porta
e vi que era Amanda.
Puta merda!
— Desculpe, me perdoe mesmo, não quis
atrapalhar. Mil perdões. Depois eu volto para falar
com Ant... Sr. Gali.
Miséria! Ela me viu com uma funcionária! O
que pensaria de mim agora?

AMANDA
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Assim que cheguei no hotel, Clara estava a


todo vapor brincando com a cuidadora. Ela me
passou tudo que as duas fizeram antes mesmo que
Mel abrisse a boca. Eu gostava da babá, era uma
menina muito prestativa. Então a liberei e fui dar
um banho em minha filha. Em seguida
conversamos sentadas na poltrona.
— Filha, queria te dizer que eu não sou
namorada do tio Tony, aquele beijo não foi nada.
Somos apenas amigos, tudo bem?
— Tudo bem, mamãe, eu gosto dele. Quando
poderei sair pra brincar?
— Acredito que amanhã poderemos nos
divertir, enquanto isso por que não vemos um
desenho bem legal na televisão, comemos pipoca e
depois dormimos?
— Tudo bem, posso escolher o desenho,
mamãe?
— Claro.
Clara escolheu assistir ao filme da Sininho,
era sua personagem favorita. Ela dizia que sempre

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quis voar e amava a personagem, pois ela tinha asas


lindas. Assistimos até quase às 9 da noite, quando
Clara caiu no sono e eu tomei meu banho. Decidi ir
ao quarto de Antônio e chamá-lo para o meu
quarto, queria comentar sobre as anotações que fiz
na reunião, talvez fosse útil. Não sabia o que
faríamos no dia seguinte e nem se teríamos tempo
para analisar sobre isso.
Bati à sua porta e uma mulher vestida,
enxugando o cabelo, abriu.
Merda, era a tal Felícia que nem me dirigiu a
palavra na empresa. Ela estava com ele ali e me
disse que Tony estava ocupado. Quando o vi
aparecer no fundo do quarto, estava apenas
enrolado em uma toalha na parte de baixo. Meus
olhos o sondaram por completo, ele era lindo e
gostoso demais, mas logo tratei de espantar o
pensamento.
— Desculpe, me perdoe mesmo, não quis
atrapalhar. Mil perdões. Depois eu volto para falar
com Ant... Sr. Gali. — Quase o chamei pelo nome,
sem formalidades. Não queria que ela me
confundisse com as mulheres que ele pegava, não
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sou dessas.
Saí correndo e entrei no meu quarto. Fechei a
porta e me recostei nela, ofegante. Naquele
momento senti um frio estranho gelar meu peito,
como uma aflição. Era a adrenalina, estava
espantada com o que vi, só podia ser isso.
Não pensei que ele era desse tipo, tudo bem
ser galinha e tudo mais, eu sabia da sua reputação...
Mas as funcionárias da sua própria empresa? Isso é
errado.
Logo a imagem dele apenas de toalha invadiu
minha mente. Meu Deus... Ele é lindo e muito,
muito, muito sarado. Por um pequeno instante me
permiti sonhar com aquele abdômen musculoso e
toda aquela altura e porte. Que mal tinha? E o que
são aqueles cabelos selvagens? Tentei espantar o
pensamento, logo depois me recompus e fui eu
mesma analisar minhas anotações na área de leitura
do quarto. Sim, tinha uma pequena área com uma
mesa, cadeira e livros.
Comecei a ler minhas anotações quando
bateram à minha porta. Fui atender e dei de cara
com um Tony preocupado, de bermuda cargo cinza
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e blusa regata branca. Ele estava lindo, com os


cabelos despenteados de uma forma sexy caindo
pelos ombros. Não preciso dizer que tudo ficou
ainda melhor quando foquei em seus olhos azuis
cristalinos, que transmitiam culpa.
— Queria esclarecer o que viu — disse.
— Não tem o que esclarecer. Quem sou eu
para te exigir isso? — menti, eu queria que ele me
esclarecesse.
— Mesmo assim vou falar. Posso entrar? —
Seu olhar exalava cautela, enquanto falava.
— Claro, entre.
Ele entrou e eu o trouxe até o pequeno
escritório, onde mostrei minhas anotações.
— Fui até seu quarto, pois queria que visse
isso. São as anotações de hoje — comentei
mostrando os papéis. Ele as pegou.
Cruzei os braços e o aguardei olhá-las.
— São ótimas — exprimiu analisando.
— Eu tenho quase 100% de certeza de que
tudo isso é uma fraude.
— O que disse? — Me encarou. Ele pareceu
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não ter entendido.


— Fraude. Parece que essa queda toda é uma
fraude. E das grandes, deve ter muitos funcionários
envolvidos. Desde vendedores e instaladores de
linha até chefes de setores financeiros e segurança.
— Por que diz isso?
— Porque eles projetaram tudo com
perfeição, não deixaram rastros nem nas lojas.
Acredito que devemos nós mesmos ir em pelo
menos algumas lojas e instalar câmeras avulsas de
segurança no caixa e na sala da gerência.
— E se não for fraude? Isso nos fará perder
muito tempo.
— Se não for fraude, vamos saber do mesmo
jeito. Confirmaremos que o problema é uma crise
financeira ou qualquer outra coisa apenas vendo os
vídeos das câmeras de segurança.
— É genial, Amanda. Vamos dizer tudo isso
ao meu pai amanhã.
— Amanhã? — O que ele estava falando?
— Não te disse? Meu pai nos convidou para
almoçar no seu bangalô amanhã. Ele quer conhecê-
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la melhor. Palavras dele — Ele sorria de modo


genuíno.
— Tudo bem. Mas só vou com Clara. Ela
ficou o dia todo aqui hoje, quero que saia amanhã,
se não for incomodar.
Me senti uma abusada por condicionar algo
que deveria ser obrigação minha, mas ele mesmo
me deu a oportunidade de trazer minha filha. Não
dava simplesmente para deixá-la no quarto o tempo
todo.
— Ok. Sem problemas — Tony garantiu. —
E... Amanda, queria falar que não durmo com
funcionárias. Sei que pensa o contrário, mas é que
eu fazia isso apenas quando não era da mesma
unidade que eu. Nunca fiquei com ninguém da
empresa em Belo Horizonte. E não quero mais sair
com ninguém da empresa toda a partir de hoje.
Ele era bem direto e sincero.
Respirei aliviada. Não sei por quê, mas saber
que ele não fazia isso com frequência me deu mais
ar para respirar.
Assenti.

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— Tudo bem, já disse que não me deve


explicações. Mas te digo que daria a você esse
mesmo conselho como sua amiga. Ainda bem que
se conscientizou a tempo. — Sorri.
Já estávamos sentados em cadeiras perto da
mesinha do escritório, conversando como amigos
de longa data.
— Posso te perguntar uma coisa? — Fitou os
olhos nos meus, concentrados.
— Sim.
Respirou fundo e estreitou o cenho.
— Como é se apaixonar? — Arregalei os
olhos em espanto e ele logo emendou. — Sabe,
amigos falam dessas coisas, não? — Me lançou um
sorriso tímido. Naquele momento me senti de
frente a um garoto de 15 anos. Ele nunca amou?
— Nunca se apaixonou? — perguntei
incrédula e ele negou com a cabeça. — Bem... Nem
na escola? Alguma menininha nunca o fez pirar?
— Eu estudei na escola até os dez anos,
depois só estudava em casa, não sei o que é paixão.
Só lembro como os meus pais tratavam um ao
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outro. Eu queria viver aquilo um dia. Mas, com a


maturidade, mudei de ideia.
Eu não queria constrangê-lo em perguntar
tudo da sua família e do seu passado, então decidi
falar do amor como eu o conhecia. Talvez ele
estivesse até começando a gostar de alguém. Sei lá,
aquela mulher lá que estava com ele. Quem sabe?
— O amor é meio maluco. Você começa
sentindo um nervosismo estranho quando está com
a pessoa amada, depois começa a te faltar ar nos
pulmões, você deseja proteger e estar ao lado dela o
tempo todo... Quando percebe, já se encontra numa
situação em que tudo que a pessoa quer, você faz.
Essa pessoa se torna tudo para você — falei quando
me lembrei de tudo que senti desde que conheci
Henri.
— Meu pai uma vez disse que o amor dói.
Nos machuca e não vale a pena sentir, se a dor vier
logo em seguida — ele comentou pausadamente
olhando o teto, recordando.
— Seu pai é um homem muito sábio —
concordando, proferi e ele me fitou sério. —
Realmente o amor nos deixa vulneráveis e nos faz
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sofrer quase em toda a sua totalidade. Não quero


que meu amigo sinta essa dor.
A palavra “amigo” ainda não estava saindo
com naturalidade. Como se algo pairasse entre nós
e não fosse amizade.
— Sério? Bruna sempre me disse que eu
preciso amar. Ela é minha amiga de infância. Mas
na empresa nos relacionamos apenas
profissionalmente. — Abanou a cabeça. — Nem sei
como estou falando tão abertamente sobre isso
contigo, nem com meus amigos consigo comentar,
mas… sei lá.
— Bruna é especial. Uma garota adorável —
afirmei. — E sobre conversas íntimas, eu sou um
túmulo.
Fechei a boca como um zíper e ele riu.
— Sim. Ela é... Obrigado pela conversa.
Então é isso. Te vejo amanhã? — encerrou o
assunto e logo se levantou para sair.
Eu estava tão à vontade que não queria que
ele saísse, mas não podia arriscar nossa amizade
com bobagens... Mesmo assim, minha boca não me

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obedeceu.
— Quer vinho? — Ofereci e me arrependi em
seguida. O que eu estava fazendo?
— Quero sim. Você tem? — Ele parou e
voltou até mim.
— Tenho, venha comigo.
Então o levei na saleta onde ficavam os
frigobares e louças. Pegamos duas taças, uma
garrafa de vinho e nos sentamos à mesa.
— Quer que eu peça um jantar? Estou com
muita fome — inquiriu sorridente.
Aquele sorriso de menino dele é uma graça.
— Seria ótimo. Eu também tenho fome.
Ele foi até o telefone e pediu uma janta para
dois. Pediu a sugestão do chefe para o dia. Eu sabia
que a sugestão do chefe era sempre o prato mais
caro, mas estava com fome demais para reclamar,
afinal ele estava sendo cavalheiro e eu gosto de ser
tratada como sou. Uma dama.
Enquanto a comida não chegava, ficamos
conversando bobagens e bebendo vinho.
— Pedro tem sérios problemas com roncos.
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Vocês são amigos e não sabia disso sobre ele? Que


péssimo amigo você é! — comentei em algum
momento, sorrindo.
— Não tenho culpa, sempre peço para ele
dormir de conchinha comigo, mas ele prefere as
mulheres. Quer que eu saiba como? — Ele ria da
própria piada e por um instante me peguei
admirando seu sorriso branco e lindo novamente.
Esse homem não tem defeitos?
— Eu não ronco, sou uma dama até
dormindo! Meu ex-marido teve muita sorte, mas
preferiu vagabundas na rua quando tinha uma
mulher que não ronca em casa! Quem faz essa
loucura?
— Eu jamais faria! Prezo a tranquilidade do
meu sono! — Tony riu e depois se calou por um
instante, ficando sério. — Seu ex foi o cara mais
estúpido que eu conheci. Você sem dúvida é o tipo
de mulher que faz caras como eu se apaixonarem.
Ou seja, a mulher-maravilha!
Ele não estava mais sorrindo. Seus olhos
estavam cravados nos meus, como se estivesse
hipnotizado. Isso não foi uma piada. Antônio falava
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sério. Eu precisava quebrar esse clima quente que


estava me envolvendo.
— Pena que não faço mais questão que se
apaixonem por mim! — Gargalhei, quebrando a
tensão do momento.
Ele abriu um sorriso pequeno nos lábios no
instante em que alguém bateu à porta.
Ufa, salva pelo gongo.
Ele foi buscar a janta e paramos de conversar,
focando apenas no salmão maravilhoso que
estávamos comendo.
Após terminarmos, nos despedimos.
— Obrigada pelo jantar — agradeci.
— Obrigado pela companhia. — Tony se
levantou da cadeira e caminhou em direção à porta
do quarto.
Virou-se e olhou seus pés. Parecia contido.
Vi novamente o menino de 15 anos transparecendo.
— Você... Me daria um abraço... De amigo?
— Arqueou uma sobrancelha e sorriu.
Eu gostava dele, achei fofa a forma como ele
pediu um simples abraço que não pude negar,
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apesar de enxergar algo mais por trás do pedido.


Seu rosto era sexy até sendo fofo, então o abracei.
Ao sentir seus braços ao meu redor, me senti
familiarizada, como se eu estivesse em casa. Isso
me deu medo e logo me afastei dele e me despedi.
Assim que fechei a porta, suspirei.
Eu não tenho interesse nele. Por que senti
isso que senti em seu abraço? Somos apenas
amigos, só amigos. E claro, chefe e funcionária.
Parece tão clichê, como num filme
hollywoodiano, mas o que estava começando a
nascer em mim não era nada bom.
Naquele momento eu só queria tê-lo
conhecido há dez anos. Talvez minha realidade
hoje fosse outra.

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Capítulo 8

AMANDA

Aquele sábado começou cedo. Eu e Clara


acordamos às 8 h, nos trocamos e descemos para
tomar café no restaurante no hotel.
— Nossa, mamãe. Aqui é mesmo enorme,
não acha? — Clara disse ao ver a imensidão do
restaurante.
— Sim, filha, mas você não veio aqui ontem?
— Não, eu e tia Mel comemos no quarto
mesmo, ela achou mais seguro.
— Gosto ainda mais da Mel agora. — Sorri.
— Vamos nos sentar, pequenininha?

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Nos sentamos e saboreamos de tudo um


pouco, que o buffet oferecia. Depois começamos a
conversar. Queria dar uma atenção a mais para
minha filha, ela sentia falta das nossas conversas.
— Mamãe, Mel falou que aqui tem um
parquinho para crianças, me leva até lá?
— Filha, hoje vamos almoçar na casa do pai
do tio Tony, ele nos convidou. Mas prometo que na
volta vamos fazer algo bem divertido, talvez ir
nesse parque que você falou.
Enquanto terminávamos de conversar, Tony
se aproximava.
— Bom dia, flores do dia!
— Oi, tio Tony! — Clara saiu do assento e
correu para abraçá-lo.
— Oi, princesinha, como foi seu dia ontem?
Ela se afastou e ele manteve as mãozinhas
dela nas dele.
— Não muito divertido, mas legal. Quero que
hoje seja melhor.
— Será. Vamos almoçar no meu pai, sua mãe
já te disse?
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— Uhum, e depois ela me prometeu que


vamos nos divertir.
— Claro, vamos sim — concordou.
Ele se sentou e Clara voltou para o seu
assento. Fiquei incomodada, sei que pedi tempo
para me divertir com ela, mas não significava que
ele tinha de estar presente. Não gosto de ser uma
sobrecarga para ninguém.
— Não precisa ir conosco, Antônio. Eu levo
Clarinha a algum parque ou até aqui mesmo no
hotel, tem um parquinho aqui.
Estava tentando não criar um vínculo maior
entre Tony e minha filha também, afinal somos
apenas amigos.
— Tudo bem, como quiserem — respondeu
formalmente.
Tá, admito que achei que ele insistiria, sei lá.
Na verdade eu gosto da companhia dele, e já até me
permiti supor situações onde o que havia entre nós
não era uma amizade ou relação de trabalho. Ele
estava despertando um interesse proibido em mim,
fazendo-me pensar seriamente sobre tudo que

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pontuei como objetivos futuros. Será que daríamos


certo como casal, nem que fosse casual? Não seria
cedo demais para pensar numa coisa dessas?
Não que eu queira namorar ou casar com ele,
claro que não quero. Mas imaginar beijar aqueles
lábios intensamente... Nossa, eu queria muito isso.
Não preciso me apegar sentimentalmente, apenas
sentir os lábios dele mais uma vez, e de verdade.
— Tudo bem... Pode ir conosco, sua
companhia seria bem-vinda, afinal somos amigos.
— Sorriu, revogando o que disse anteriormente.
— Tudo bem então, amiga. — Oh, céus, ele
foi bem irônico com esse “amiga”.
Ainda me lançou um sorriso de canto que me
fez corar.
Estava um pouco quente aquele dia, não?
— Eu quero muito que tio Tony vá. Você
também é meu amigo, não é, tio? — Clarinha
entrou no assunto, me livrando do flerte
constrangedor.
— Mas é claro! Você é uma amiga especial.
— Tony respondeu, ainda me olhando firme.
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Sorrimos e eu fiquei um pouco aérea. O que


mudou nesses últimos dias? Estava me sentindo
estranha, notando mais a forma como ele me
olhava. Seus olhos desejosos não podiam ser
apenas coisa da minha cabeça.
Finalizamos nosso café da manhã entre
conversas e gargalhadas, quando Tony sugeriu
algo. Ainda eram 9h30min da manhã, tínhamos
tempo antes de irmos para a casa do seu pai.
— Que tal irmos um pouco à piscina? Tem
uma enorme aqui no hotel, e é descoberta!
— Eu quero! — Clara imediatamente
respondeu, levantando os bracinhos para o ar.
Ai, droga. Vim completamente despreparada
para isso.
— Acha que é uma boa ideia? Eu não trouxe
biquíni — lamentei.
— Vamos ver um para você aqui na loja do
hotel. — Tony decretou.
Oi?
— Aqui tem uma loja de biquínis? — Estava
surpresa, o que mais aquele hotel poderia ter?
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— Tem sim, vamos lá.


Fomos rapidamente até a loja e, enquanto eu
escolhia os modelitos de biquínis, Clara e Antônio
ficaram na área infantil, jogando algum tipo de
videogame para clientes.
Não escolhi nenhum muito caro, até porque,
eu o pagaria. Não estava com muito dinheiro, mas
mesmo se meu chefe pagasse, o pediria para
descontar do meu salário. Não é justo ser bancada
até em itens de lazer.
Fui ao vestuário e experimentei o modelito
que mais me interessou, só que não estava cem por
cento certa de que era bom. Chamei a atendente, e
pedi que ela convocasse minha filha e Antônio para
darem uma opinião.
Ainda estava dentro da cabine, quando ouvi:
— Senhora, sua filha e seu esposo já estão
aqui.
Ela estava falando comigo?
Abri uma fresta da porta e vi Clarinha ao lado
de Antônio. Ela sorria radiante e quando levantei o
olhar para ele, o notei dar de ombros levemente
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enquanto fazia um bico desentendido.


Provavelmente ele também deve ter sido
pego de surpresa com essa história de “esposo”.
Eu sabia que não era nenhuma modelo da
victoria secrets, mas tinha um corpo bem cuidado.
Sempre prezei por isso. Então na minha
impulsividade, abri a porta por completo e dei uma
giradinha, permitindo que ambos verificassem
aquele biquíni em mim.
Provoquei um pouquinho, confesso.
— Que tal? — perguntei.
— Está linda, mãe! — Clarinha bateu palmas
e pulou animada.
Olhei para Antônio, que mantinha a mão no
rosto, tampando a boca numa forma analítica
enquanto seus olhos pareciam me devorar de baixo
para cima. Ele, porém, nada disse.
— O biquíni ficou perfeito, senhora, vai
levar? — A atendente perguntou.
Foquei no que ela dizia.
— Sim, mas achei que ficou um pouco
pequeno na parte de baixo, sei que é fio dental e
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tudo mais, mas queria maior, tem como trocar?


— Eu achei bom. — A voz firme e grossa de
meu chefe finalmente ecoou, sem me olhar
diretamente.
Sorri. Creio que ele apreciou bastante a vista,
sim?
— Claro — respondi ironicamente. — Mas
quero maior.
Quase supliquei para que trocassem. A
realidade era que fio dental não fazia muito meu
tipo.
— Infelizmente não tem como, apenas o
mesmo tamanho nas duas peças.
Ponderei minha decisão por uns segundos, e
cheguei a um veredito.
— Então... Antônio, procure algum short pra
que eu use com esse biquíni, por favor? — Virei-
me para ele, e notei que ele mantinha seus olhos
longe de mim. — Antônio?
— Oi, sim, sim, verei agora. — Saiu
rapidamente dali.
Eu hein, será que mexi tanto com ele assim?
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Não achei que estaria causando tanto reboliço


em sua mente. Afinal, ele é lindo, cavalheiro,
educado e pode ter a mulher que desejar. Não se
“abalaria” comigo assim.
Concentrei-me então em Clara, que ainda
estava ali, aguardando.
— Mamãe, papai colocou um maiô na minha
mala, mas queria um short como o seu, posso? —
pediu com os olhinhos do gatinho de botas.
— Sim, minha linda. Vamos ver um pra
você.
Em alguns minutos Tony voltou com um
shortinho de tecido vermelho florido. Sorri ao ver
que ele tinha bom gosto.
Vesti e o caimento era perfeito. Amei.
Mostrei a eles, que também adoraram.
— Linda! — Clara e Antônio disseram ao
mesmo tempo.
— Obrigada, vou levar — falei dirigindo-me
à atendente.
— Ok, algo mais? — Ela perguntou.
— Um short para minha filha. Vai lá,
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Clarinha, escolher.
— Vamos, princesa. — Ele a chamou e
juntos voltaram para a loja.
Retornei à cabine, tirei meu biquíni e me
vesti. Ao sair e voltar ao hall da loja, Antônio e
Clara já estavam no caixa pagando pelas compras.
Andei rapidamente até eles.
— Ei! Eu quero pagar! — adverti-o, em voz
baixa.
— Não, jamais deixaria minha esposa pagar
por um presente. — Piscou.
— Espertinho. Vai ter volta — sussurrei.
— Mamãe, tem que ver meu short, é lindo, é
da Sininho!
Clarinha pulava de alegria.
— Que legal, lindona, vamos pro quarto nos
aprontar! — afirmei, e após Antônio finalizar os
pagamentos, subimos juntos e cada um foi para seu
quarto.
Minha filha e eu tomamos um banho rápido e
nos aprontamos para irmos até a piscina. Eu com
meu biquíni novo, junto com o short, e Clarinha
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com seu maiô e short da Sininho. Ao finalizarmos e


pegarmos nossas bolsas com as toalhas, meu
celular apitou.

Estou apenas aguardando vocês. — era


Antônio.

Fique na porta, estamos saindo agora. —


Respondi

E assim fizemos. Saímos e ele já estava na


porta nos aguardando. Descemos até o térreo e ele
nos guiou até a área de lazer, onde havia um parque
para crianças, e mais à frente uma área com duas
piscinas enormes. Uma infantil e uma adulta.
Antônio nos deixou à vontade e seguiu para a
piscina adulta.
— Uau! — Clara exclamou.
— Me dê sua bolsa, Clarinha, vou guardar
para que entre.
Peguei a bolsa e escolhi uma das mesas que
tinha ao redor da piscina para acomodar nossos

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pertences. Logo depois, coloquei Clara na piscina


infantil e fui até o guardião da área.
— Olá. Você fica vigiando as crianças, não?
— Ele assentiu. — Aquela é minha filha, eu estarei
na piscina maior. Caso precise, pode me chamar,
ok?
— Sim, senhorita. Faço com todo prazer.
— Os olhos dele correram pelo meu corpo,
fazendo-me corar. Eu tinha mel por um acaso?
Simplesmente agradeci e me retirei dali
caminhando até a piscina de adultos.
Enquanto eu caminhava até lá, vi uma cena
que me deixou intrigada. Antônio já estava apenas
de sunga, andando até a borda, quando uma mulher
morena muito linda o parou. Ele sorriu e ambos
trocaram algumas palavras antes de entrarem juntos
na piscina.
Tive que respirar duas vezes. Ela não era
funcionária da empresa, então eu não precisaria
afastá-los. Se bem que ansiava por isso. Não gostei
da forma como ele sorriu pra ela, pareceu tão
íntimo. Agrrr, droga! Precisava tirar essas ideias
loucas da mente. Ele é solteiro e pode olhar e
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conversar com quem quiser! Enquanto eu sou


apenas uma separada que precisa de mais foco na
vida!
Deixa o homem viver, Amanda! — Meu
subconsciente me alertou.
— Pela escadinha? Temos o tobogã e o
trampolim, se quiser. — Uma voz masculina avisou
às minhas costas.
Me virei e vi o guardião da piscina dos
adultos. Uma estrada completa de mau caminho. O
que eu fiz para conhecer tantos homens assim em
um final de semana?
— Obrigada, prefiro a escadinha — respondi
gentilmente e entrei na piscina.
O guardião se virou e voltou ao seu posto.
Antônio mantinha-se nadando ao lado de sua
companhia que acabara de conhecer — ou não —
enquanto eu nadava sozinha. Às vezes nossos
olhares se encontravam e então eu sorria e desviava
meus olhos dele.
Depois de curtir um pouco e relaxar, saí da
água e me deitei em uma espreguiçadeira, a fim de

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tomar um pouco de sol. Porém meus olhos


teimavam em acompanhar a novela que acontecia à
borda da piscina.
Antônio estava com os braços e costas
apoiados na borda, enquanto a mulher o prendia
colocando os braços um de cada lado do corpo
dele.
Notei quando os dois se olharam por um
tempo e falaram alguma coisa. Em seguida ele a
beijou.
Respirei fundo. Ele a tinha beijado. Um beijo
daqueles dignos de óscar, do mesmo jeito que eu
imaginei ele me beijando.
Não era para eu me sentir mal ou ter raiva,
porém não aguentei ver aquilo. Na minha frente?!
Era uma falta de… de… Ah! Dane-se. Eu não
ficaria assistindo.
Por um impulso fui até o guardião da piscina.
Ele se manteve intacto no amor por tantos
anos ficando com muitas mulheres, eu consigo
fazer o mesmo. Por que não?
— Oi —disse ao guardião. —Acho que não
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fui educada. Me chamo Amanda.


Ele arqueou uma sobrancelha e me olhou de
cima a baixo.
— Tudo bem. Me chamo Ricardo.
— Queria me redimir, você me recomenda o
tobogã ou o trampolim? — Tentei lançar um olhar
sexy a ele, que respondeu com um sorriso de canto.
Eu estava um pouco enferrujada.
— O trampolim é muito mais perigoso, mas
eu gosto de perigo.
Okay, estava dando certo.
— Olha, eu também gosto. Essa piscina fica
aberta a noite toda? Você poderia me dar umas
aulas de como saltar no trampolim? — flertei.
— Essa não, mas a coberta dentro do hotel
fica. Posso dar aulas sim, pra você é grátis. — Deu-
me um sorriso aberto.
— Então, me dá seu telefone que te ligo lá
pelas 22 h?
— Ok, grava aí.
Peguei meu celular no local onde o tinha

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guardado e salvei o telefone de Ricardo. Despedi-


me e fui ao encontro de Clara. No caminho flagrei
Antônio anotando o telefone da mulher com quem
que ele estava no celular; disfarcei e passei direto
por eles até chegar em minha filha.
— Vamos, querida, temos que nos aprontar
para o almoço.
Ela estava se divertindo na piscininha, porém
imediatamente saiu.
— Tá bom, mamãe. — Clara sempre era
obediente.

Ao chegar ao bangalô do sr. Douglas,


Clarinha e eu estávamos um pouco intimidadas
com o local. Sinceramente, eu não sabia o que
esperar daquele almoço.
Nós três entramos pela porta principal e
fomos recebidos por uma empregada que nos levou
até uma área de lazer atrás da casa. Douglas estava
sentado aguardando-nos em uma mesa grande,
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coberta com algo parecido com um guarda-sol,


porém muito maior. Trajava óculos escuros e roupa
informal. Logo que nos viu chegar, levantou e nos
cumprimentou.
— Bem-vindos! Filho. — Abraçou o filho.
— Amanda. — Deu um beijo em meu rosto.
— Clara. — Agachou e beijou sua cabeça.
— É um prazer estar aqui, Sr. Douglas —
falei, sem saber muito como agir.
— Sua casa é muito bonita. — Clara
completou.
— Obrigado, meninas, sentem-se. Já estão
trazendo o almoço logo, logo. — Ele respondeu e
todos nos sentamos.
Após as primeiras apresentações e conversas
básicas, fazendo Antônio falar um pouco sobre
Clara e eu ao seu pai, o almoço chegou. Era
churrasco.
— Eu amo churrasco! — Clarinha articulou
empolgada.
Como sempre, minha filha atrai a atenção
com seus comentários tão puros.
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— Ama? Fico muito feliz em agradar uma


donzela tão bonita. — Douglas respondeu e ela
sorriu.
Antônio parecia um pouco deslocado do
ambiente. Não sabia muito bem como era a relação
dos dois, mas pelo que já tinha notado, não era tão
boa quanto poderia ser.
O almoço acabou e Clara foi para a piscina
do bangalô com os empregados a vigiando,
enquanto Antônio e eu permanecemos com
Douglas. Aquela era a hora de falar de negócios.
— Então, Amanda, Tony me disse que é uma
excelente secretária e que tem uma ideia muito boa
sobre o caso da queda das vendas.
Assumi minha postura profissional.
— Sim. Agradeço o elogio, mas apenas dou o
meu melhor. Sobre o caso da queda das vendas,
trouxe esses papéis que estive analisando e ontem
dei minha ideia ao seu filho sobre como
solucionarmos esse problema matando dois coelhos
com uma cajadada só. Vamos saber se isso foi uma
fraude, apenas insatisfação ou qualquer coisa
relacionada aos clientes em si com esse plano.
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— Interessante. Me conte.
Comecei a contar e às vezes Antônio
acrescentava algumas coisas. Douglas parecia
maravilhado com o que eu dizia. Ele ficou
espantado com a ousadia da proposta de instalar
câmeras clandestinas e foi bem positivo durante a
conversa.
— Amanda. Você tem qual formação
acadêmica?
— Parei a faculdade de Administração no
sexto período. Mas estarei voltando no próximo
semestre.
— Tenho uma proposta a fazer. — Ponderou
com as duas mãos enlaçadas sobre a mesa.
— Diga. — Apenas sorri, aguardando.
Estava um pouco nervosa, tinha acabado de
entrar na empresa e “propostas” nem sempre eram
coisas boas.
— Quero você responsável por esse caso.
Mude-se para cá. Te darei uma casa, um carro e
pagarei sua faculdade. Você entrará em treinamento
para ser a vice-diretora dessa unidade.
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— O quê?! — Antônio perguntou parecendo


se espantar.
O encarei, seus olhos azuis sondavam o pai
com aparente questionamento. Algo tinha por trás
daquilo, mas eu ainda estava um pouco chocada
para perceber. Surpresa era pouco para expressar o
que ouvira naquele instante. Mas logo vieram em
minha mente os obstáculos. Minha filha, mesmo
que fosse comigo, estaria muito longe do pai e de
todos os familiares. A prova que fiz da faculdade,
abriria mão de uma bolsa caso tivesse ganho, mas e
se nada desse certo e eu fosse demitida? Voltaria à
estaca zero novamente. A verdade é que eu não
queria ter aquilo tudo tão fácil, parecia surreal. Não
queria que fosse assim, queria conquistar aos
poucos. Senti um aperto no peito ao pensar em
deixar minha cidade, mas realmente precisava
pensar.
— É uma proposta maravilhosa e tentadora,
mas... — comentei pensativa.
— O que tem a perder? Precisamos de
alguém de confiança. Tony confia em você, não
confia? —O CEO inquiriu e se virou para o filho ao
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perguntar.
Também o fitei. Ele estava olhando para um
ponto distante, respirando pesadamente parecendo
pensar em coisas aleatórias.
— Sim — respondeu de forma seca.
Finalmente mirou o pai, mas os olhos dele
demonstravam surpresa, só que de uma forma
triste.
Não gostei muito daquele clima.
— Eu posso pensar e responder depois? —
propus.
— Tudo bem. Quatorze dias. Duas semanas.
— Douglas foi direto.
— Ok. Em 14 dias te dou a resposta final —
afirmei séria, olhando-o nos olhos.
— Bom... Acho que já vamos, pai. Está quase
anoitecendo. — Antônio interveio na conversa e se
levantou. Já eram 5 h da tarde, a conversa foi longa.
— Clara ainda está na piscina? — indaguei a
ele.
— Vou verificar. — Ele foi atrás de Clara.
Estavam apenas Douglas e eu ainda na mesa,
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em um silêncio absoluto, quando Douglas decidiu


falar.
— Sabe, Amanda... Meu filho Tony é um
bom garoto, mas ele sempre terá essa vida de farras
e muitas mulheres. Não é capaz de se apaixonar e
nem sustentar um relacionamento. Isso o impede de
amadurecer em algumas áreas. Mas prefiro que ele
seja assim. Já você, ele me disse que viveu
experiências dolorosas na vida, isso a faz madura e
admirável. Eu preciso de alguém assim na direção
de Recife. Preciso de alguém que possa subir mais,
quem sabe um dia ser até meu braço direito. Vejo
potencial em você. Vi naquela sala de reuniões e vi
ainda mais nessa mesa aqui. Espero mesmo que
decida aceitar minha proposta.
Apenas ouvi com atenção e não respondi de
imediato. Sentia-me tentada, mas era como se o
meu coração reagisse involuntariamente contra
aquilo. Não estava certa da decisão.
— Sr. Gali, agradeço os elogios. Meu sonho
é me realizar profissionalmente. Mas preciso
decidir racionalmente e não movida pelo momento.
As emoções momentâneas nunca colaboraram
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muito em minha vida e preciso realmente saber que


passo estou prestes a dar. Mas darei sua resposta
conforme combinamos, em 14 dias.
Antônio já estava voltando com Clara. Ela
parecia feliz e me fez sorrir radiante ao vê-la.
— Mamãe, eu brinquei no parquinho, foi
superincrível, até escorreguei no tobogã da piscina.
Obrigada por me deixar vir aqui. — Sua voz
entusiasmada fez todos sorrirem. Clarinha amou
aquele lugar.
— Sim, agora precisamos ir. — Abaixei e dei
um beijo na sua testa.
— Pai, obrigado pelo almoço e pela
conversa. — Antônio agradeceu.
— Foi um prazer. Espero vê-las novamente
em breve — falou enquanto íamos embora.
— Adeus! Obrigada. — Acenamos em
despedida.
Em seguida voltamos para o hotel.

TONY
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Assim que as deixei no hotel, pedi que se


aprontassem para sairmos mais tarde e fui sozinho
para a praia assistir ao pôr do sol.
Meus pensamentos ainda estavam
conturbados com o que aconteceu nessa tarde, eu
precisava de paz.
Assim que cheguei e encontrei um local
propício, me sentei admirando aquela paisagem
perfeita. Imediatamente, seus pensamentos se
voltaram para a proposta do meu pai para Amanda.
Por que logo ela? Ela estava bem comigo,
não queria dividi-la. Que babaquice eu tô
pensando? Eu preciso esquecê-la. Mas como? É
impossível não pensar naquele sorriso lindo, no
olhar paradisíaco dela, no seu jeito de argumentar,
no seu jeito de andar, nela de biquíni... Ai meu
Deus, eu nunca vou esquecer isso. E eu nem a amo,
mas já estou sofrendo. Meu pai tem razão, não
posso deixar isso acontecer. Será melhor ela vir
pra cá e me deixar viver minha vida como sempre
foi. Ela é forte, sabe se cuidar.
Quando menos percebi o sol já havia se posto
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e uma pequena lágrima solitária tinha descido do


meu olho. Sequei-a rapidamente e voltei para o
hotel. Não me lembrava da última vez que tinha
derramado uma lágrima. Logo tratei de afastar o
pensamento de Amanda, tinha prometido diversão
para Clarinha, não podia deixá-la na mão.
Assim que cheguei no hotel, fui ao meu
quarto e me aprontei para o passeio. Saí e me dirigi
até a porta das duas mulheres que fariam minha
noite mais divertida
— Tio Tony! — Clarinha abriu a porta e
pulou em meus braços quando me viu.
Era inevitável não sorrir na presença daquela
menina.
— Vamos nos divertir? — perguntei.
— Vamos! — Clara disse ainda em meu
colo. Amanda logo surgiu, trancando a porta após
me dar boa noite.
Segui com Clara no colo até o elevador e
Amanda veio atrás. As levei até o carro e disse que
era surpresa o local onde iríamos. Amanda ficou
em silêncio por todo o caminho e Clara cantarolava

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suas músicas favoritas.


— Chegamos! — exclamei ao parar o carro
de frente a um parque de diversões.
Aquele era o lugar perfeito onde poderíamos
marcar a viagem com diversão. Virei o rosto e notei
os olhos de Clarinha brilharem.
— Mamãe, isso é irado! — exclamou ao
sairmos do carro.
— Onde aprendeu essa palavra? — Amanda
perguntou com um sorriso nos lábios.
— Com tio Tony. Ele disse que é o mesmo
que muito legal. — Clarinha respondeu e depois
piscou para mim, que retribui a piscadinha.
No bangalô eu a ensinei a palavra, quando a
fui buscar na piscina. Conversamos um pouco e me
encantei ainda mais com seu jeitinho puro e
esperto.
Amanda riu de nós dois.
Já eram sete da noite quando chegamos lá.
Amanda foi na frente e comprou os bilhetes tão
rápido que nem consegui propor pagar. Clara
brincou em todos os brinquedos que sua idade
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permitia e Amanda tirava muitas fotos. Eu levei


minha câmera, gostava de usá-la para registrar
momentos importantes. Decidi que aquele seria e
também tirei fotos, filmei e peguei algumas
espontâneas. Às vezes Amanda e eu trocávamos
olhares, mas logo desviávamos, focando apenas em
Clarinha.
Hoje foi um dia bem intenso. Amanda não é
tão imune a mim quanto pensei. E se ela soubesse
como meus pensamentos são recheados de coisas
sobre ela…
Por fim vimos uma cabine fotográfica.
— Vamos! Quero tirar fotos! — Clara nos
puxou até a cabine.
— Ai, filha... Só você mesma!
— Para de ser velha, Amanda, deixa a
menina se divertir — caçoei dela.
Fomos para a fila, entre risadas e
brincadeiras. Ao chegar nossa vez de entrar na
cabine, Amanda sugeriu que fossem ela e Clara e
depois Clara e eu, mas a menina fez o olhar do gato
de botas e beicinho pedindo para nós dois

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entrarmos com ela.


Menina esperta!
— Por favorzinho? Venham!
— Tudo bem! — Nós dois respondemos ao
mesmo tempo e nos entreolhamos sorrindo.
Entramos juntos na cabine. Como
possuíamos dois bilhetes que valiam uma foto cada,
programamos para saírem duas fotografias
repetidas com as poses que faríamos lá dentro.
A foto era dividida em 4 partes, então
fizemos 4 poses diferentes. A primeira mandando
língua para a câmera. A segunda revirando os olhos
com a boca aberta. A terceira sugerida por mim, foi
apontar o dedo como uma arma para a câmera e
fazer cara de mau. A quarta foi sugerida por Clara;
ela pediu um beijo nosso, um em cada bochecha
sua, e assim fizemos.
Ao sair da cabine, Clara pegou as duas fotos.
— Uma pra mamãe e uma pro tio Tony —
declarou ao nos entregar.
Encarei aquela fotografia e algo em meu
peito se aqueceu. Seria uma boa forma de lembrar
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delas, caso Amanda aceitasse a proposta e


ficássemos longe. Já tinha me afeiçoado muito à
Clara. A achava uma menina muito inteligente e tão
amorosa, que a cada abraço dela me sentia
renovado.
Já eram 9 h da noite, então sugeri que
voltássemos para o hotel. Amanda não negou,
Clarinha bocejou, e voltamos.
Nós três passamos o caminho de volta ao
hotel cantando as músicas que Clara escolhia da
playlist do meu carro, o que rendia boas
gargalhadas e imitações baratas dos cantores
famosos.
Ao chegarmos no hotel, fomos logo para o
andar de nossos quartos, mas antes que eu entrasse
no meu, Amanda me chamou.
— Antônio?
Me virei, Clarinha já dormia em seu colo.
— Amanda?
Ela respirou fundo e sorriu antes de dizer:
— Queria agradecer por tudo. Você tem sido
um ótimo amigo e um belo anjo da guarda. Te
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conhecer trouxe sorte à minha vida. Veja só onde


eu estou? Há 10 dias eu estava desesperada, sem
saber o que fazer da vida e agora estou pensando
numa proposta de vice-diretoria de uma empresa!
Obrigada de coração.
Me comovi com as palavras dela. Eu estava
sendo egoísta em querê-la para mim, sem pensar no
que seria melhor para ela. Relembrei o dia em que
nos conhecemos e tudo que aconteceu desde então.
— Não foi nada, tudo é mérito seu. Eu que
tive sorte de estar na hora e no local corretos.
Ela sorriu e assentiu. Logo entrou em seu
quarto.
Entrei no meu, me recostei na porta ao fechá-
la e dei um longo suspiro.
Segui rumo a um banho. Daria uma volta na
rua, não sei. Não queria ligar para a mulher que
conheci na piscina, apesar de saber que poderia ter
uma noite regada à sexo sem amarras com ela.
Fomos diretos hoje cedo, porém não me sentia
animado para aquilo. Estava… Não sei.
Saí do banho e já estava vestido com uma

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calça jeans, sem blusa, quando alguém bateu à


porta. Assim que a abri, me espantei. Era ela. Os
olhos de Amanda correram por meu corpo e logo
fiz o mesmo, notando que ela não parecia pronta
para dormir.
— Amanda?! Não esperava você, entre! —
Abri espaço para que ela entrasse.
Adentrou ainda muda e se sentou na beira da
cama logo na primeira parte do quarto.
— Está de saída? Não queria incomodar —
disse parecendo um pouco envergonhada.
O que será que ela queria àquela hora vestida
daquele jeito no meu quarto? Deveria ser
alucinação minha. Meu Deus, como ela está sexy!
Preciso parar de olhar diretamente pra ela, senão
vou acabar possuindo-a aqui mesmo.
Eram meus pensamentos tortuosos sobre sua
pouca roupa. Ela estava apenas com um blusão e
dava para notar um biquíni debaixo dele.
— Na verdade eu sairia daqui a pouco, mas o
que precisa? — tentei manter neutralidade na voz.
— Queria falar sobre hoje cedo. Da proposta
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que seu pai me fez — se expressou em tom baixo e


tímido, olhando para os pés.
Sua voz suave estava penetrando minhas
células auditivas, causando um arrepio em minha
pele, instantâneo.
Sentei ao lado dela na cama e a olhei nos
olhos.
— Quer sentar à mesa?
Não podia deixar claro minha vontade de
devorá-la ali, então arrisquei o cavalheirismo.
— Não, estou confortável aqui.
Ah, Amanda... Você não está facilitando...
— Então me diga, o que quer falar sobre a
proposta?
— O que você acha? É meu amigo, meu
chefe, está na empresa desde sempre, quero sua
opinião.
Sua mão correu por sobre a cama e esbarrou
na minha.
Meu autocontrole querendo simplesmente
sumir daquele lugar.

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— Sinceramente, Amanda — falo ou não


falo pra ela que eu não quero que ela aceite? — É
uma oportunidade de ouro, todas as pessoas que
meu pai alguma vez propôs algo parecido estão na
empresa até hoje. Acho válido aceitar, mas...
— Mas? — Ela se virou e ficou de frente a
mim, posicionando uma coxa sobre o colchão.
Engoli em seco.
— Eu já me afeiçoei a você, à sua amizade.
Não queria que viesse. — Droga, eu tinha mesmo
dito?
— Você gosta de mim, Antônio? Da minha
amizade? — inquiriu e se aproximou lentamente,
ainda olhando em meus olhos.
Respirei fundo, ela era irmã do meu melhor
amigo, tinha um foco, não estava em meu alcance.
— Sim, é... Não quero parecer egoísta nem
nada, mas...
Não consegui responder até o fim, porque ela
simplesmente me beijou. Logo correspondi,
tomando seus lábios com voracidade e desejo,
ansiando que aquele momento não fosse uma
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alucinação.
E que Deus me ajudasse, eu faria tudo o que
ela me permitisse sem arrependimento algum.
A faria minha.
Hoje, amanhã, enquanto a vontade dentro de
mim não for saciada.
Eu me doparia de Amanda.

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Capítulo 9

AMANDA

Eu o beijei. Beijei mesmo e beijaria de novo


se pudesse reviver a cena. Não me arrependo, ele é
sexy ao extremo e sua boca praticamente me
chamava. Não estou nem aí se ele vai me achar
vulgar ou atirada, só preciso dele aqui, agora, hoje.
Quando decidi me aprontar para ligar para o
homem da piscina, pensei bem e algo se acendeu
em minha mente: Era minha última noite naquele
lugar, e talvez não houvesse outra chance de
mostrar para Antônio que sim, eu o desejava.
Não pedi permissão para beijá-lo, já sabia
que ele permitiria. Convivi com o mesmo homem
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por oito anos e consigo reconhecer o desejo em um.


Os olhos de Antônio chamuscavam quando me
fitavam de cima a baixo. Era desejo, intenso e cru.
O beijo dele é sedutor, hábil, lento e
absolutamente incrível.
Meu corpo inteiro se arrepiou e se encheu de
excitação em resposta, apenas por sentir sua língua
na minha boca, movendo-se lentamente num ritmo
sensual e lascivo. Seu gosto é viciante, inebriante,
misturado ao cheiro másculo e amadeirado que
exalava do seu corpo, me deixando calorosa,
desejando por mais.
Era pra ser só um beijo, eu queria apenas um
beijo.
Mas estava desejando que ele me tomasse por
completo. Literalmente.
Quando o ar enfim faltou, paramos para
respirar. Nossas testas estavam grudadas uma na
outra e nossos olhares se encontraram. Senti como
se todo o calor que meu corpo guardava viesse da
chama daqueles olhos. Naquele momento eu queria
mais, eu o queria.

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— Amanda... Eu... — Tentou dizer, ofegante.


Eu entendi na mesma hora o recado, se não entendi
não estava interessada em entender mais nada.
— Não precisa pedir permissão — falei antes
dele concluir sua frase e abri o primeiro botão do
meu blusão.
Ele me olhou de baixo pra cima com
adoração, também me queria. Foi quando sorriu
maliciosamente, me beijou novamente abrindo
ferozmente meu blusão, arrebentando alguns
botões, e me deitou em sua cama.
Tudo nele exalava poder, virilidade e
masculinidade.
— Compro outro depois — murmurou, então
começou a beijar e acariciar todo o meu corpo.
Ele é maravilhoso. Como eu nunca me senti
tão viva assim? Antônio acariciava meu corpo,
beijava minhas curvas, e aos poucos tirava meu
biquíni.
Ele me admirou em silêncio por alguns
instantes quando me despiu por completo. Tomei
coragem, mesmo sentindo os batimentos de meu

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coração retumbarem frenéticos em nervosismo, e


tratei de despi-lo rapidamente, deixando-o apenas
de roupa íntima. Pouco tempo depois ele começou
a me devorar por completo. Iniciou por meu
pescoço, depositando beijos e mordiscos molhados,
descendo lentamente.
Seu corpo sobre o meu era quente, e sua
barba roçando por minha pele fez com que a
excitação e a sensibilidade em mim aflorassem
ainda mais. Ele traçou uma linha com sua língua
quente do meu colo até minha virilha e quando
chegou próximo à fonte do meu prazer, levantou
um pouco o rosto pra me olhar. Seus olhos estavam
inundados de desejo, então ele deu um sorriso de
canto.
Maldito safado!
Eu apenas me deleitei, enquanto ele me
adorava nos locais mais sensíveis. Minha mente já
estava turva, sem pensamentos coerentes, apenas
recebendo tudo o que ele queria me dar.
Depois da tortura que sua boca me fez passar,
ele começou a acariciar o interior das minhas
coxas. Seus dedos hábeis traçaram um caminho
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lento até meu ponto sensível onde, ao chegarem,


continuaram a me torturar.
O que mais me deixava ofegante era o seu
olhar. Ele sempre me olhava fixamente.
Mas eu queria mais, mais dele. Precisava tê-
lo por inteiro.
— Antônio... Pelo amor... De Deus... —
Ofeguei. — Por favor, vai?
— Hã? — O maldito se fez de desentendido.
Rolei os olhos e isso fez com que ele soltasse
suas mãos de mim. Ficou de pé e cruzou os braços.
— O que foi? — indaguei, confusa.
— Tsc, tsc. — Ele estalou a língua,
meneando a cabeça em negação. — Ah, Amanda…
Você não sabe onde se meteu.
Eu estava ali, exposta, nua, com a respiração
ofegante. Sério mesmo que ele me largou ansiosa
por mais e vai ficar me olhando com essa cara de
mandão?
Bufei.
— Acho que já podemos ir aos finalmente…
O que acha? — Meu tom foi baixo, sedutor.
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Ele meneou a cabeça mais uma vez e deitou


sobre meu corpo, sem pôr peso, apoiando com os
braços na cama.
— Calma, meu anjo. Quem brinca com fogo
tem que se queimar.
Ahhhhh grrr, eu parecia uma louca ansiosa.
Voltamos a nos beijar de modo intenso,
avassalador. Agarrei suas costas enquanto ele
pressionava seu corpo sobre o meu, me fazendo
sentir todo seu desejo por mim ali, bem nítido.
Depois de um tempo ele levantou O vi próximo da
cama, de costas, tirando a última peça que faltava
de seu corpo e abrindo a embalagem do
preservativo.
Ainda fora do seu ângulo de visão, ele
ordenou:
— Se vire de bruços pra mim.
Sua voz arrepiou minha espinha e logo o
obedeci.
O senti se aproximar e tocar meu corpo
lentamente, me ajustando a posição favorável para
ele. Com meus joelhos na cama, sem cerimônias o
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senti dentro de mim.


Meu Pai do Céu, que homem é esse?
Eu já não me lembrava como era um
momento tão íntimo com alguém, e naquele
instante, com ele, pareceu que estávamos
acostumados àquilo. Como se a vida inteira já nos
conhecêssemos intimamente.
Espantei os pensamentos sentimentais
demais, para focar no modo como ele me fazia sua.
Não foi sutil. Não foi delicado. Foi como eu
ansiava e esperava.
Forte.
Duro.
Fundo.
Suas investidas eram tão intensas que, além
dos nossos gemidos, o som que dominava o
ambiente era o espalmar de nossos corpos. Eu senti
o êxtase querer me invadir com poucos segundos
dele em mim.
Pareceu que finalmente eu tinha encontrado o
encaixe perfeito. Pena que era só por aquela noite.
Ficamos naquele modo por um tempo, e
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depois, com uma maestria absurda, ele girou meu


corpo, ainda unido ao dele, me posicionando em
sua cintura. Ele encostou-me numa parede e
continuou com o mesmo afinco. Nossos olhos
estavam abertos encarando um ao outro, frente a
frente.
— Isso. Quero que me veja marcando você.
Você não sabe o que está me causando, Amanda.
— Aproximou-se da minha orelha e continuou.
— Hoje você é minha e não me peça para parar.
Quero continuar sentindo seu corpo no meu até
quando eu quiser.
Ele continuou falando algumas palavras sujas
em meu ouvido, enquanto nossos corpos ditavam as
regras. Nunca pensei que ouvir sacanagens na cama
fosse tão excitante. Eu estava entregue, não tinha
mais nada que eu pudesse fazer. Antônio me deixou
drogada com esse cheiro de homem, misturado ao
suor de sexo que seu corpo liberava. Estava
fascinada em ver aqueles cabelos enormes
balançando junto com ele enquanto me possuía.
Eu gemi alto, gritei, enfim cheguei ao clímax
e cravei minhas unhas nele.
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Ele também era falante e barulhento, logo se


libertou comigo ainda em seu colo. Minha
respiração ainda estava ofegante e a mente,
embaralhada pelo que acabara de acontecer. Ele me
posicionou na cama e depois de fazer tudo que
precisou, voltou e se deitou ao meu lado.
— Uau. — Consegui dizer.
— Uau. — Ele repetiu ofegante.
Viramos de lado e ficamos nos olhando. Não
sei o que deu em mim naquele momento, mas
novamente senti que éramos conhecidos de longa
data. Me sentia à vontade. Eu levei minha mão até
seus cabelos dourados enquanto fitava o mar
azulado do caribe em seus olhos. Ele é lindo
demais.
— Eu gosto dos seus cabelos.
— Eu sempre prendo nessas ocasiões —
comentou ele, parecendo querer justificar o fato de
estarem soltos.
Sua voz ainda estava um pouco rouca,
tomada pela adrenalina do que fizemos.
— Quebrei sua regra — brinquei.
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A verdade era que eu estava tentando


camuflar o modo como nosso ato anterior mexeu
comigo. Ainda ansiava que meus batimentos
cardíacos e minha respiração voltassem ao normal.
— Acho que quebrar minhas regras é sua
missão na Terra. — Ele brincou sorrindo.
Não me lembro ao certo quanto tempo
ficamos nos olhando, acariciando um ao outro. Mas
não resistimos e logo estávamos nos entregando
novamente.
— Eu não vou cansar nunca disso — disse
ele, me beijando ao final.
— Não quero que canse. — Estava sendo
sincera.
Quando acabamos vi meu relógio, já eram 2
da manhã.
Pensei em Clara, mas Mel já estava avisada
que precisaria dormir. Ainda bem que não liguei
para o cara da piscina.
Deitamos um pouco, Antônio e eu, na sua
cama. Eu posicionei minha cabeça em seu peitoral
duro e musculoso enquanto acariciava sua barriga,
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contornando cada gominho de seu abdômen,


pensando somente em como tudo aquilo veio a
acontecer. Ele me abraçou e, com um braço
apoiado debaixo da cabeça, fitou o teto, pensativo.
— Clara está com a babá? — perguntou.
— Sim. Por quê?
— Dorme comigo? Pode voltar cedo pro
quarto, mas pelo menos fica um pouco, tudo bem?
— Titubeou. — Somos amigos, amigos fazem
essas coisas, certo? — pediu e, por fim, sorriu.
Eu não queria me envolver mais. Antes, isso
daria uma brecha para me apaixonar, mas hoje eu
estou imune. Mesmo ciente de como fiquei abalada
com tudo. Isso também o faria se apaixonar, talvez,
mas ele é o cara mais imune ao amor que conheci,
pelo pouco que já notei. Então que mal tinha em
ficar? Somos amigos, nada mais.
— Tudo bem. — Liberei um sorriso e
continuei aconchegada a ele.
Era estranho pensar que éramos chefe e
secretária. Não me sentia como sua funcionária e
sim como sua amiga. Ele devia estar pensando em

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como acabar com tudo no outro dia, sei que não vai
adiante com nenhuma mulher e nem liga no dia
seguinte.
Era para eu estar feliz, pois não queria
compromisso com ninguém. Mas me sentia
estranha. Um pouco... Decepcionada.
Cochilamos, mas durou poucas horas, pois
um pouco antes de amanhecer o dia, lá pelas 5 h da
manhã, me despertei e levantei, começando a juntar
meu biquíni do chão. Precisava de um banho
urgente. Antônio devia ter percebido que levantei,
pois logo acordou também. Veio até mim por trás e
começou a beijar minha nuca, pescoço e ombros,
mordiscando e causando arrepios em minha pele.
Meu Deus, esse homem é insaciável!
Me virei, mas acabei deslizando no biquíni e
caindo no chão por cima do tapete. Isso não foi
empecilho para Antônio, que fez do chão a nossa
cama naquele momento.
Dessa vez nossa intimidade foi mais lenta e
cheia de carícias. Ele me beijava e afundava em
mim, me olhando nos olhos. A cada instante, seu
rosto sério me presenteava com o mar azul. Eu não
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entendia porquê ele fazia questão dos olhos fixos


nos meus, mas aproveitei para memorizar seu rosto
tomado pelo desejo e o êxtase daquele momento
para quando não nos víssemos mais.
Por fim, o segurei firme, não querendo que
ele saísse de perto.
— Você é tão viciante. Estou arruinado,
Amanda — revelou com a testa grudada na minha e
olhos fechados, sério.
Não tive o que responder. Só pude relaxar e
apreciar aquele momento, pois jamais voltaria.
Nos levantamos após ter nossas respirações
reguladas e Antônio me chamou para tomarmos
banho juntos em sua banheira. O dia em breve
nasceria e eu precisava ir.
Enquanto tomávamos banho, conversamos
sobre diversos assuntos, inclusive nossa aventura
repentina.
— Nunca imaginei que uma certinha toda
focada como você fizesse tanto barulho! Meu Deus,
da próxima vou te amordaçar! — disse ele sorrindo
enquanto se ensaboava.

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— Você não fica muito atrás não, teremos


duas mordaças! — falei jogando espuma na cara
dele.
Pronto, eu já me sentia melhor com toda a
descontração. O bom da nossa “amizade” era essa
falta de pudor mesmo depois do que fizemos. Mais
uma vez parecíamos conhecidos de longa data.
— Agora, sério. Eu já tinha imaginado isso
algumas vezes. Fiquei decepcionado com a falta de
imaginação do meu cérebro. Meu Deus... Não se
compara…
Ele estava brincando, mas eu entendi bem o
que disse.
— Pervertido! Tinha pensamentos libidinosos
sobre mim!
— Não tenho culpa! É meu instinto! — Riu
enquanto eu batia no seu braço.
— Confesso que hoje eu tive... Por isso vim
aqui.
Ele abriu a boca, em espanto.
— Você já estava arquitetando tudo!
Maquiavélica! — Fez uma carranca e depois riu.
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— Mas é claro. Eu tenho todo o controle. Ha


ha! — Tentei dar uma gargalhada maléfica, sem
sucesso.
Ele arqueou uma sobrancelha, se
aproximando mais de mim.
— Vamos ver seu controle então. —
Começou a me fazer cócegas. E caramba... Isso é
meu ponto fraco.
— Para... Por favor... Me rendo! Bandeira
branca!... Para — falei gargalhando.
Céus, parecíamos duas crianças! Mas admito
que nunca tive aquilo, aquela plenitude de
sentimentos bons e constantes com a mesma
pessoa.
Antônio parou e me virou pra ele. Olhou em
meus olhos e então me beijou. Dessa vez eu senti
algo a mais nesse beijo. Um aperto no peito.
Oh, não.
Saímos da banheira, ele pegou a toalha e
começou a me secar como se eu fosse uma criança.
Apreciei esse gesto dele e me deixei levar. Depois
de seca eu me virei e agradeci. Ele simplesmente
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sorriu.
O sorriso de Antônio era o destaque do seu
rosto másculo e imponente, com traços fortes que
lhe davam um ar de superioridade, mas quando o
sorriso brotava, parecia apenas um menino feliz.
Seu sorriso era muito jovem e o deixava
ainda mais lindo.
Retornando ao quarto, ele pediu para que
deitássemos mais um pouco até amanhecer e eu
fiquei. Em pouco tempo cochilamos novamente.
Mas meu coração… Ah, não, esse continuou
trabalhando incansavelmente contra tudo o que eu
projetei em minha mente. Por mais que eu quisesse
controlar tudo a minha volta, ele estava
conseguindo fazer com que as coisas ficassem
descontroladas.
E eu senti medo. Apenas medo ao imaginar
aonde meu coração poderia me levar.

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Capítulo 10

AMANDA

Dormi um pouco e, quando acordei, eram


quase 7 da manhã. Decidi voltar ao meu quarto,
aquele era o último dia em Recife e precisava
deixar tudo organizado, fora que ansiava também
estar com minha filha antes que ela acordasse.
Antes de sair da cama, meus olhos foram até
Tony, que dormia como um anjo ao meu lado. Ele
fazia um biquinho deitado de bruços, com seu rosto
pressionado no travesseiro. Suspirei e o admirei por
um tempo, sabendo que o que tivemos acabou, fora
apenas aquela noite.

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Por impulso deixei um beijo na cabeça dele


antes de sair, não sabia muito bem como me portar
numa situação dessas, afinal sempre tive
namorados e o último foi meu esposo.
Definitivamente não sabia o que fazer depois de
uma noite daquela, sem nenhum compromisso.
Peguei uma blusa dele e a vesti, pois a minha
estava rasgada. Saí do quarto em passos suaves
para não despertá-lo e ao chegar no meu quarto,
percebi que Clara e Mel dormiam tranquilamente.
Ao constatar que elas não despertariam logo, sentei
no sofá próximo à cama e comecei a repensar a
noite maluca que passei.
E agora? Sei que não devo esperar que ele me
ame ou algo assim. Não quero isso, não quero um
namorado nem nada. Mas eu acho que se ele me
ignorasse eu não gostaria. Será que ele faz isso com
todas? As ignora no dia seguinte?
Caramba, foi um erro. Como vamos olhar um
para a cara do outro agora? E na empresa?
Meu Deus, Amanda! Pensa antes de fazer
uma loucura dessas outra vez!
Minha inexperiência gritava. Jamais dormi
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com alguém sem ser um namorado. Não sabia o


que fazer. Precisava conversar com alguém.
Já sei... Bruna.
Bruna já tinha provado ser uma boa amiga
em poucos dias de empresa, além de ser amiga de
Tony desde a infância. Quem melhor que ela para
aconselhar?

Bom dia, Bruninha, espero não incomodar.


Se estiver acordada teria como me ligar? —
enviei a mensagem.

Alguns segundos depois um bip anunciou


uma mensagem em seu celular.

Claro. Vida de recém-mamãe começa na


madruga! Estou fazendo o bb dormir e já te ligo.
Nasceu na sexta.

Que alegria! Sorri ao ler a mensagem. Estava


feliz por Bruna. Queria muito visitar seu bebê, mas
sabia que ela precisava de espaço. Era muito cedo

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ainda.
Enquanto esperava a ligação de Bruna, fui
arrumar minha mala, dobrando e guardando as
roupas. Quando finalizei, o telefone vibrou e me
dirigi ao banheiro para atender. Não queria acordar
Clara.
— Bruna. Bom dia!
— Oi, Amanda. Me conta, como está a
viagem?
— Boa, conseguimos criar uma solução para
o problema da unidade daqui. Mas estou ligando
por outro motivo.
A resposta demorou alguns segundos.
— Ai meu Deus. O que houve?
— Eu e Antônio... Nós... Ah, você sabe... —
estava morrendo de vergonha.
— Ah. Meu. Deus! E como foi????
Recostei-me na parede fria do banheiro e
deslizei até sentar no chão. Suspirei pesadamente,
pois precisaria falar em voz alta o que acabara de
fazer havia poucas horas.
— Bruna... Foi demais. Muito bom. A gente
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parecia ter uma conexão tão intensa, sabe? Depois


parecíamos como adolescentes tomando banho na
banheira, um implicando com o outro... Mas,
Bruna... Estou no meu quarto agora. Ele está no
dele, dormindo. Ainda nem nos vimos agora de
manhã. Queria saber como devo agir. Eu nunca fiz
isso antes. Sei que ele nunca se comprometeu com
alguém, não sei se ele vai me tratar mal ou me
ignorar, sabe? Ele sempre ignora as mulheres no
dia seguinte? Acorda e manda elas embora?
Desatei a tagarelar. Estava nervosa, confusa,
perdida.
— Calma, Amanda, respira. Ele mandou
você embora depois do sexo, é isso?
— Não, ele pediu pra que eu dormisse com
ele. Falou que queria que eu ficasse ao lado dele,
como amigos.
— Hum... Amanda... — Bruna deu uma
pausa.— Tony nunca dorme com alguém.
— Como assim? Nunca dorme? Mas então o
que ele faz? — Estava surpresa.
Meu coração querendo pular para fora da

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caixa torácica.
— Nunca dorme, Amanda. Depois do sexo
ele paga um táxi e dispensa a mulher. Ele nunca
dorme com ninguém, nunca dormiu. Ele sempre me
dizia que isso era para que ninguém esperasse algo
mais do que ele estava disposto a dar. Mas ele
pediu pra que você dormisse. Pra mim isso é
novidade.
— Mas ele disse que era como amigos. —
Tentei ignorar o sentimento de euforia em meu
peito.
— Independente disso. Ele não abre
exceções. Eu o conheço desde sua primeira mulher.
Ele definitivamente não dorme. Parece que ele
sente algo por você. Basta saber se você também
sente. Sente?
Ela parecia saber bem do que falava. Será
que ele já falou algo de mim a ela? Ah, não,
obviamente. O mundo não gira ao redor do meu
umbigo.
— Eu... Não sei. Foi apenas uma noite. É
pouco para dizer e pra mim ainda é cedo. Não
quero me relacionar com ninguém. Não quero
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sofrer nem fazê-lo sofrer. O que eu faço,


Bruninha??
As minhas mãos suavam. Imediatamente as
passei em meu cabelo em sinal de confusão.
— Seja sua amiga. Aja naturalmente. Se ele
insinuar que a quer, você saberá e então pode
decidir se o quer ou não. Agora, uma coisa eu tenho
certeza, ele não vai te ignorar. Relaxa.
Sabe aquela onda de alívio que invade e nos
traz plenitude com apenas algumas palavras? Eu
finalmente estava em paz. Pelo menos me ignorar,
ele jamais faria, segundo Bruna.
— Ufa. Minha preocupação era essa. Clara
gosta muito dele e estamos nos dando bem, sabe?
Não queria um clima chato entre nós.
— Não terá esse clima. Fique tranquila.
Amiga, o bebê acordou, vou dar de mamar.
Qualquer coisa me manda sms. Beijo.
— Beijo. Obrigada, Bruninha.
Desliguei o telefone e saí do banheiro ainda
pensativa, porém mais aliviada.
E se ele se apaixonar por mim? Eu não posso
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corresponder a isso. Não quero isso. Mas... Por que


eu sinto esse calor subindo no meu corpo quando
imagino ele comigo? Fico tão feliz ao lembrar de
ontem. Caramba, será que eu estou gostando
mesmo dele? Mas é tudo tão diferente... Não me
lembro como é sentir essas atrações há muito
tempo... Ai Meu Deus... O que eu faço?
Sentia-me imatura ao cogitar sentimentos tão
profundos da parte dele, mas já queria me preparar
para o pior ou, quem sabe, o melhor. Voltei ao
banheiro. Lavei o rosto, escovei os dentes e
coloquei uma roupa fresca para começar o dia. Um
short soltinho e uma blusinha regata. Conferi o
relógio. Já eram 7 e meia. Alguém bateu à porta.
Ao abrir, me surpreendi com um Antônio
sem blusa, com apenas uma bermuda cargo, de
mãos nos bolsos, olhando para os pés. Ao me ver
ele pareceu não pensar, andou em minha direção e
me puxou para um beijo. Um longo beijo quente
cheio de palavras não ditas. Ele entrou enquanto me
beijava e fechou a porta com um dos pés. Apenas
correspondi e comecei a abraçá-lo e acariciar sua
nuca enquanto o beijava. O beijo se intensificou e
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ele me pegou no colo, segurando-me pelas coxas,


colocando as mãos por dentro do meu short.
Completamente entregue, entrelacei as pernas na
cintura dele e o abracei. Lembrei que tínhamos
plateia e afastei o beijo, sussurrando em seu
ouvido:
— Minha filha e a babá estão aqui.
Comporte-se. — Ofeguei, cheia de desejo.
— Desculpe, não consegui me conter. Vamos
recomeçar. — Ele me soltou com calma e andou de
volta até a porta sem abri-la. Deu um sorriso e
estendeu a mão. — Bom dia, amiga!
Aquele sorriso safado! Eu estava ficando
derretida por cada sorriso dele, e isso não era bom.
Sorri timidamente em resposta, então virei-
me para olhar na direção da cama e vi que Clara e
Mel ainda estavam dormindo. Aproximei-me de
Antônio com coragem, dei um tapinha na sua mão
estendida, abaixando-a, e sussurrei:
— Não importa. Vem.
Deixei-me levar pelo desejo e alegria em ver
que ele não me rejeitou como esperado, e o beijei

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com todas as forças. Nossas línguas pareciam ter


ensaiado um ritmo intenso e profundo. Nosso beijo
era cheio de carícias, entre mordidas e risadas
abafadas. Estava feliz, e o queria ainda mais.
Quando enfim o beijo se acalmou, me afastei
e segurei delicadamente o rosto lindo dele, fitando-
o nos olhos.
— Bom dia, Antônio. — E dei um sorriso
aberto.
Ele retribuiu o sorriso e me abraçou. Senti
seus batimentos acelerados quando meu rosto se
acomodou em seu peito naquele gesto. Nós dois
éramos uma confusão só, eu poderia apostar nisso.
— Amanda. Eu não sei fazer isso —
murmurou, ainda abraçado a mim.
— Isso o quê? — Afastei-me dele e indaguei
confusa.
Aquele geladinho na barriga voltou com toda
força. O que será que ele diria?

TONY
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Quando acordei naquela manhã, Amanda já


tinha saído do quarto. Pela primeira vez senti falta
do calor do corpo de alguém ao meu lado, como se
ali, fosse o lugar dela.
Nunca acreditei em almas gêmeas ou pessoas
que nascem destinadas para alguém, mas não havia
outra explicação para tudo aquilo. Quando ela
mostrou que me queria, nem que fosse apenas por
aquela noite, senti meu coração palpitar, me
avisando que eu provaria dela e não conseguiria ter
mais de outra pessoa.
E foi o que aconteceu. Eu sabia que para ela
era apenas desejo sexual, coisa que passa. Mas para
mim foi mais, foi uma descoberta que passei a vida
inteira desejando saber. Inédito, era a palavra que
poderia descrever como foi vê-la ser minha, e
dormir ao meu lado, como se fosse algo comum e
rotineiro para nós dois.
Assim que levantei da cama, aprontei minha
mala e me arrumei rapidamente. Precisava vê-la e
ser claro com ela sobre o que está causando em
mim.
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Agora que eu sei como é sentir essa coisa


louca que me invade e me causa torpor e alegria,
não quero viver sem isso.
Não mais.
Conversaria com ela, seria sincero e
transparente. Poria todas as cartas na mesa,
disposto a tudo para que ela seja minha.
Eu a faria minha, dali por diante.
E não me importa o que eu precise fazer.

Depois de não resistir a um cumprimento


normal, agarrando Amanda deixando claro minhas
vontades, nos acalmamos e revelei o que queria
dizer.
Que eu não sabia nada do que estava
sentindo.
Passei uma mão na nuca, num gesto nervoso,
e franzi as sobrancelhas ao dar as devidas
explicações.
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Ela tinha questionado ao que eu me referia.


— Isso que estamos fazendo. Não sei o que é,
mas preciso que saiba que pra mim é inédito. Você
é diferente. Não sei se estou fazendo o certo.
Amanda apenas assentiu pareceu pensar.
Pensar demais, para meu gosto.
— Vamos combinar algo então. É novo pra
mim também, então que tal falarmos sempre a
verdade um pro outro? Somos amigos antes de
qualquer coisa — propôs.
Fiquei aliviado com sua proposta. Não foi
uma negativa, mas não foi uma promessa de
eternidade. Ela é realmente muito inteligente, o que
faz com que eu a queira ainda mais.
— Boa ideia. Posso começar? — pedi
colocando as mãos novamente nos bolsos frontais
da bermuda. Estava nervoso e ansioso para falar o
que tanto invadia meu peito e pensamentos.
— Pode. Vamos sentar à mesa. Vou pedir o
café da manhã aqui no quarto.
— Tudo bem.
Amanda ligou para o serviço do hotel e fez o
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pedido. Então sentamos à mesa que ficava numa


saleta próxima, ainda dentro do quarto.
— Comece — Amanda sugeriu a mim.
Estavam um de frente ao outro na mesa
redonda de mogno. Os meus pensamentos a todo
vapor, enquanto ela me olhava com profundidade,
aguardando.
— Então. — Titubeei. — Eu te desejava
desde o dia em que te vi naquela boate — Se é para
contar a verdade, lá vai. Ela parecia surpresa.
— Estou parecendo algum maníaco? Estou
parecendo o Nick? — Fiquei confuso pensando na
possibilidade de ter dito algo inconveniente.
— Não, você nunca agiu como um. Então
tudo bem. — Ela riu, tranquilizando-me. — Só
fiquei surpresa, aquele dia eu estava um pouco fora
de mim.
Assenti e me permiti relembrar a cena. Ela
dançando, nossos olhos se cruzando
esporadicamente. Suspirei.
— Mas seus olhos me encantaram. Acho que
você tem superpoderes. O que faz com os olhos e o

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sorriso? É algum truque? —indaguei sério.


Não me surpreenderia caso ela possuísse algo
sobrenatural, ninguém nunca fez-me sentir assim
antes.
— Como assim? — Franziu o cenho,
confusa. — Meus olhos e meu sorriso? Não, não
sou uma bruxa ou feiticeira. Por que diz isso?
Esboçou um sorriso de menina.
Ela fica imperfeita em algum momento?
Porque se a resposta for não, vai ser bem
complicado impedir o misto de sentimentos
agradáveis sobre ela.
Eu já tinha falado demais, me sentia um
garoto ingênuo.
— Esse negócio de falar a verdade está sendo
mais constrangedor pra mim do que pra você
Ela arregalou os olhos e respondeu:
— Prometo que respondo o que me perguntar
depois. Tudo. — Levantou a mão direita em sinal
de promessa.
— Ok. — Cedi e decidi falar logo tudo que
sentia. Seja o que Deus quiser. — Não sei o que faz
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comigo, Amanda. Mas é estranho. Quando você me


olha fixamente eu sinto meu corpo amolecer. —
Gesticulei durante o discurso. — E quando sorri,
sinto um choque me percorrer por inteiro junto com
algo gelado ao mesmo tempo. Não tenho a mínima
ideia do que isso seja... Mas ontem... Ontem eu me
senti tão extasiado com você, como se finalmente a
peça que faltava em mim estivesse ali comigo, se
encaixando. Pronto, falei.
Suspirei aliviado.
— Estou achando que isso tudo pareceu com
aqueles adolescentes que nutrem uma paixão
secreta pela professora… E se declaram nos
banheiros da vida, se é que me entende.
Acrescentei. Fechei os olhos, já tinha falado
besteira demais. Onde estava meu autocontrole?
— Não! — Amanda sorriu e seus olhos me
sondaram um pouco antes dela continuar.
— Nossa... Preciso absorver tudo isso. Comigo...
Não sei o que dizer, mas comecei a sentir algo
diferente quando o beijei na frente do meu ex, o
beijo de mentirinha. Mas ignorei, achei que fosse
normal. Daí viemos pra cá, nos divertimos tanto...
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E ver você olhando o pôr do sol, falando sobre suas


coisas comigo naquela praia... Me conquistou,
sabe? Eu queria mesmo ser sua amiga, até ver você
quase nu de toalha na cintura, naquele dia com a
mulher da empresa no seu quarto. Caramba...
Comecei a desejar você ali... Timidamente nos
meus pensamentos. Mas ontem... Eu senti
exatamente a mesma coisa que você disse que
sentiu. Parece estranho, não é? E para a minha
surpresa, mesmo sendo experiente em
relacionamentos, eu não tenho a mínima noção do
que eu estou sentindo. Acho que teremos que
descobrir juntos, se você estiver disposto. —
Completou enquanto a encarava ouvindo tudo que
ela dizia.
Era essa atitude que eu admirava em
Amanda. Ela parecia não ter medo de nada. Era
transparente e sincera. Quer? Quer. Não quer?
Tudo bem.
Um silêncio reinou entre nós. Porém, alguns
segundos depois, o quebrei.
— Estou com um pouco de medo. Preciso
que saiba disso. Mas eu quero muito saber o que
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estamos sentindo... Nossa, me sinto um maldito


virgem falando essas coisas. Quem diria? — Ri de
mim mesmo.
— Ok. Temos 13 dias. Ou não — afirmou
tranquila.
Chegamos ao ponto chave.
Prazos. Era algo com prazo e aquilo não me
deixava nada feliz. Mas, como não podemos ter
tudo, levei na esportiva.
— Já está valendo? Só me fala se no trabalho
amanhã eu posso beijar você? Porque eu
provavelmente vou querer — comentei com um
sorriso de canto.
— Vou pensar no seu caso, Antônio. — Ela
sorriu com um ar autoritário.
O café da manhã chegou e na hora que
recebemos a comida, Clara abriu seus olhinhos na
cama e Mel — a babá — também. Já eram mais de
8 h da manhã. Aquele dia seria bem cheio.
— Bom dia, princesinha! — Amanda foi até
Clara e beijou sua testa.
— Bom dia, mamãe. — Ela levantou e seus
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olhos me notaram enquanto eu levava as coisas


para a mesa — Tio Tony está aqui?
— Sim, filha, veio tomar café conosco.
— Eba! — A ouvi chamar pela babá.
— Vem, tia!
— Bom dia, estou indo.
Sorri sozinho ao ouvi-la. Essa menina mal
sabia que em poucos dias já tinha cativado um
espaço muito especial no meu coração.
Durante o café da manhã, com todos sentados
à mesa, não consegui evitar estar sorridente,
dirigindo meu olhar para Amanda o tempo inteiro.
Estava surpreso com o misto de sentimentos bons
que apenas estar ali, com ela, me causava: o
conforto e a sensação de liberdade. Ela pareceu
tentar disfarçar, mas retribuía cada olhada minha,
reprimindo um sorriso de canto.
— Vamos embora que horas, mamãe?
— Clara quebrou o silêncio.
— Daqui a pouco, temos que estar no
aeroporto às 11 h, o voo sai às 12 h — Amanda
respondeu.
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— Vocês já prepararam as malas? —


perguntei.
— Eu arrumei tudo pela manhã, falta só
Clarinha tomar um banho e se aprontar, não é,
filha?
— Sim! Estou com saudade do papai, mamãe
— respondeu e abaixou a cabeça, aparentando um
pouco de tristeza por estar longe do seu pai.
A observei e fiquei sério. Querendo ou não, o
pai de Clara sempre estaria ali entre nós de alguma
forma. Eu não queria que meu recente e não
compreendido relacionamento com Amanda
atrapalhasse isso, mesmo tendo um pouquinho de
receio, afinal, eles foram casados por anos.
Era todo um pacote que vinha junto com ela,
mas naquele momento eu não quis pensar no risco
que isso poderia me causar. Só queria continuar
sentindo.
— Tudo bem, filha, é normal sentir falta de
seu pai, não fique triste. Ele deve estar com
saudades também. Quer ligar pra ele antes de
irmos? — Amanda sugeriu à Clara.

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— Quero!
Ao finalizarmos o café da manhã, Amanda
dispensou Mel, a levando até a porta. Ela despediu-
se de nós e se foi.
— Agora quero falar com o papai! — Clara
saltou pelo quarto, animada com a ideia.
Me senti um pouco fora do ambiente e, sem
saber muito o que fazer, dirigi-me à porta principal.
— Vou deixá-las sozinhas para sua ligação,
daqui a pouco venho para darmos uma volta antes
de irmos para casa, ok? — comuniquei a elas.
Amanda assentiu e em seguida saí do quarto.
Era tudo novo para mim, não podia lidar com
aquilo ainda. Mal conseguia assimilar meus
sentimentos, menos ainda ter que compreender
outro homem na vida delas. Creio que em breve
tudo se resolverá, e no que eu puder ajudar, farei.
Parabéns, Tony, você mal passou uma noite
com a mulher e já quer tomar sua vida inteira nas
costas.
Ri sozinho enquanto zombava de mim
mesmo, antes de deitar na minha cama e aguardar.
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AMANDA

Assim que Antônio se foi, fiquei um pouco


incomodada. Ele agiu de forma tão neutra que eu
não conseguia ler seus olhos e suas atitudes, me
pareceu apenas um amigo qualquer naquele
momento.
Clara pegou o celular, entregando em minha
mão; então teclei o telefone de Henri, pus no viva-
voz e ele logo atendeu:
— Amanda?
— Não, papai, sou eu! Estou com saudades!
— Minha princesinha! Eu estou morrendo de
saudades, quando vamos nos ver?
— Hoje, daqui a pouco voamos, mamãe disse
que até às 15 h eu chego aí.
— Que bom, sinto sua falta. Não liguei por
causa do código de área e estive ocupado, fico feliz
que me ligou. Como tem sido a viagem?
— Muito boa, papai! Ontem eu, mamãe e tio
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Tony nos divertimos muito no parque de diversão!


Tiramos até foto, vou mostrar a você quando eu
chegar.
Clarinha e sua boca grande e inocente. Eu
contive uma risada, ao imaginar a reação de Henri
do outro lado da linha.
— O tio Tony está no mesmo quarto que
vocês? Ele esteve com vocês em tudo, é? — Ele
pareceu se corroer de ciúmes.
— Não, ele dorme no quarto do lado, mas
estava com a gente em tudo sim. Conhecemos até o
pai dele! Muito legal a casa dele, papai, tem
piscina, parquinho, brinquedos...
— Que interessante, filha! Quando você
chegar, termina de contar, sua mãe está aí? Quero
falar com ela.
— Sim, vou passar. Te amo, papai!
— Te amo, filha.
Clarinha estava radiante por ter falado com o
“canalhenri”e me deu o celular para que falasse
com ele. Sinceramente estava sem vontade alguma,
tanto que revirei os olhos antes de tirar do viva-voz
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e colocá-lo no ouvido.
— O que quer, Henri?
— Você. Por favor, Amanda, me diz que esse
Tony não é nada seu! Eu não suportaria perdê-la
para esse modelinho capa de revista! Eu te amo!
Esse final de semana foi um divisor de águas em
minha vida, eu mudei, quero que a gente converse,
pelo bem de nossa filha.
— Henri, não lhe devo explicações. Tchau.
Desliguei.
Lá, bem no fundo, ainda sentia algo por
aquele imbecil. Sabia que não era amor, pois
ninguém consegue amar genuinamente alguém que
só se aproveita da sua bondade. Só que era essa
“compaixão”, ou sei lá o quê, que me impedia de
mandá-lo para o inferno.
Eu evitava discutir com ele na frente de
Clara, mas ela já tinha presenciado alguns bate-
bocas. Era inevitável, Henri não media palavras e
quando eu via, já estava debatendo.
Respirei fundo para anular meus
pensamentos dessa parte negativa da minha vida e
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focar na minha filha e no que eu acabei recebendo


nessa viagem: Uma chance de recomeçar.
Antônio era um bônus, meu Senhor… E que
bônus. Nunca imaginei que me envolveria com
alguém tão rápido, mas parecia tão certo… Ele me
dava paz, e o que eu mais necessitava naquele
momento, era de paz.
Dei um banho em minha filha e a arrumei, ela
parecia uma princesinha. Levamos o vestido que
Pedro deu. Clara usaria ele na volta para casa.
Passados alguns minutos, já estávamos prontas.
Antônio voltou ao nosso quarto e pegou as
bagagens, entregando ao serviçal de hóspedes do
hotel. Descemos pelo elevador em silêncio. Faltava
apenas 1 h para irmos até o aeroporto, então ele deu
uma sugestão.
— Que tal irmos na loja do hotel e
comprarmos alguns presentes?
Abri a boca para negar, não podia mais gastar
nada.
— Eu amo presentes! Vamos! — Clarinha
arregalou os olhos e pulou animada, antes que eu
dissesse qualquer coisa.
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— Antônio... Não precisa se incomodar —


sussurrei.
O elevador abriu e nós três seguimos em
direção à loja.
— Eu não me incomodo, vamos lá. — Ele
nos guiou.
Ao entrarmos na loja, Clara logo saiu
correndo e foi para o setor infantil. Antônio riu da
atitude dela e seus olhos me encontraram. Eu estava
pensando ainda no que aconteceu mais cedo.
— Está tudo bem? — Abraçou-me por trás,
alisando meus braços em um gesto carinhoso.
Respirei fundo.
— Não está. Foi aquela ligação que fiz pro
Henri.
Estava nítido o receio na minha voz.
— E como foi? — perguntou, mas logo
completou — Não que você precise me contar…
Me virei e o fitei nos olhos. Aqueles olhos
tão sinceros e límpidos.
— Tudo bem. — Sorri. — Ele se diz
arrependido e quer me reconquistar. Disse que esse
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final de semana o mudou e quer que a gente tente


de novo, pelo bem da Clarinha. — Logo a
frustração em minha voz se tornou nítida. — Como
ele ousa? Eu ainda estou processando os absurdos
que ouvi.
Ele mantinha as mãos em meus braços, mas
os olhos sondaram meu rosto por completo antes de
sua boca se abrir e proferir as palavras que viram a
seguir.
— E... O que pensa em fazer? — inquiriu,
parecendo apreensivo.
Ele se calou e ficou me olhando parecendo
querer ler minha alma. Eu queria dar uma resposta
bem específica, então o puxei para atrás de algumas
araras de roupas adultas e sussurrei em seu ouvido:
— Você acha que eu seria idiota o bastante
para aceitar a proposta de Henri e voltar pra ele?
— Não. — De pronto respondeu. — Você é a
mulher mais inteligente que eu conheço.
— Pois é. Minha única preocupação é saber
do que ele seria capaz para me ter de volta —
revelei e depois dei um selinho nele. — Porque

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agora mesmo é que eu não tenho nenhuma vontade


de voltar pra ele.
O sorriso de menino brotou em seus lábios e
eu me senti aquecida apenas ao vê-lo sorrir. Fomos
ao encontro de Clarinha com as mãos unidas, como
uma resposta. Ao nos aproximarmos de Clara, notei
que ela tinha escolhido várias roupas do cabide
para experimentar.
— Clarinha! Que bagunça é essa, filha? — a
repreendi.
Ela quase saltou em susto no meio das araras
infantis e virou estendendo os cabides.
— Mamãe, eu quero provar. Eu amei todos
esses. Deixa eu vestir, por favor? — E fez aquele
olhar cativante de novo.
Como negar, Senhor!?
— Só vestir. Não garanto que levarei todos.
— Eba! Vem, mamãe, me vestir. Tio Tony
fica aí. Só meninas podem entrar. Mas eu venho pra
mostrar a roupa pra você, está bom?
— Ok — Antônio bateu continência.
— Daqui não saio sem sua ordem.
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Nós três rimos e depois Clara e eu nos


encaminhamos para as cabines.
Minha filha vestiu animada o primeiro
vestido. Era bege com babados na saia e um
elástico que marcava a cintura. Era lindo. Ao
sairmos da cabine, fomos mostrar a Antônio que
estava com sua câmera aguardando. Assim que a
menina apareceu, ele a fez desfilar como numa
passarela e filmou cada detalhe.
— Vamos lá, nossa modelo Clara com seu
vestido bege da princesa... — Ele não sabia que
nome de princesa poderia citar.
Nem preciso dizer como fiquei maravilhada
com aquele gesto dele, não é? O homem estava me
envolvendo de todas as formas.
— Bela. — Clara disse baixinho.
— Claro! A princesa Bela! Aplaudam! — E
os vendedores da loja estavam todos ao redor
aplaudindo, enquanto ela desfilava fazendo pose de
princesa, segurando as laterais do vestido e
sorrindo.
Foi assim com todos os que ela

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experimentou, um show de diversão e uma grande


aula sobre as princesas da Disney.
Meu chefe filmava tudo. Pelo menos uma
parte da viagem seria gravada.
— Mamãe, quero esses três! — Clara
mostrou-me no final, os três vestidos que escolheu.
O bege, um azul e um verde que, segundo ela, era
da Sininho.
— Filha... — Agachei e falei no seu ouvido.
— Mamãe não pode comprar os três. Escolhe um e
a gente leva, tudo bem? Você sabe que, se eu
pudesse, levaria todos, não é?
Ela assentiu, estava triste, mas sempre fora
compreensiva. Ela era extremamente obediente.
— Quero o da Sininho — escolheu e então
um sorriso nasceu em seus lábios.
— Ótimo. — Levantei, peguei o vestido e fui
ao caixa pagar.
Tinha uma fila curta no caixa, e avistei de
longe Clarinha ao lado de Antônio. Aguardei minha
vez e, assim que paguei pelo vestido, olhei ao redor
para ver se os dois ainda estavam lá. Um bip em
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meu celular chamou minha atenção.

Raptei a Clarinha um instante. Nos espere


do lado de fora da loja. Já já nos vemos. — Era
dele.

Sorri curiosa, querendo saber o que eles


aprontavam, mas obedeci ao pedido dele e fui até o
lado de fora da loja. Sentei-me em um banco e
aguardei.
Após alguns minutos, finalmente os vi
saindo.
— Finalmente! O que tanto compravam? —
perguntei ao vê-los saírem juntos, Clarinha com
uma sacola e Antônio com outra.
— Mamãe, tio Tony comprou pra mim! —
Veio saltitante e me entregou a sacola.
Semicerrei os olhos na direção de Antônio,
que se aproximou fazendo uma feição inocente.
— Antônio, você é incontrolável. — Abri e
vi o vestido na sacola dela. — Obrigada. Esse é o
vestido da Bela?
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— Sim. Ela escolheu. E não precisa


agradecer, é um gesto pela companhia dela nesse
fim de semana — afirmou sorridente.
Eu já estava ficando sem graça pelos gestos
tão lindos da parte dele. Não queria que pensasse
que a noite de ontem e tudo que conversamos hoje
o deram liberdade para me paparicar. Mas algo eu
precisava admitir, Antônio era magnífico, em todos
os aspectos. Seria difícil minha rotina com ele ao
lado, todos os dias.
—Ok, então, vamos?
Eles assentiram e seguimos até o carro.
Durante o caminho, Clarinha fez todos cantarem a
música da Frozen em alta voz. Peguei meu celular e
gravei aquele show. Após acabarmos de cantar,
mandei uma mensagem para meu irmão.

Chegaremos hoje, devemos aterrissar às 15


h. Não se preocupe, Tony nos levará para casa.

Fora ele mesmo quem insistiu em nos levar,


então concordei pois não queria dar trabalho para
Pedro.
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— Passa o vídeo pra mim, vou colocar na


minha videoteca. — Ele pediu.
— Agora! Recebe aí — Enviei
imediatamente para o celular dele. Ele o lançou na
minha mão para que aceitasse. — Feito! — falei ao
concluir.
Ao chegarmos no aeroporto, um dos
motoristas da empresa já estava lá para pegar o
carro de Antônio. Ele o entregou, nós três entramos
e logo fizemos o check-in. Embarcamos no avião e
o voo partiu na hora certa.
O trajeto foi tranquilo. Nos sentamos na
mesma fileira e descansamos por toda a viagem. Ao
chegarmos em Belo Horizonte eram quase 15 h.
Descemos, buscamos nossas malas e ao
caminharmos até o hall, paramos para admirar uma
moça sentada tocando violão. Sua voz era
melodiosa, linda. Muitas pessoas que passavam por
ali, paravam para admirar.
A canção era “Here comes the sun — The
Beatles”
Ficamos ali, unidos, absorvendo a letra da
canção.
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Lá vem o sol, lá vem o sol


E eu digo que está tudo bem
Queridinha, tem sido um inverno longo, frio
e só
Queridinha, parece que foram anos desde
que esteve aqui
Lá vem o sol, lá vem o sol
E eu digo que está tudo bem

Queridinha, os sorrisos estão voltando aos


rostos
Queridinha, parece que foram anos desde
que esteve aqui
Lá vem o sol, lá vem o sol
E eu digo que está tudo bem

Queridinha, eu sinto aquele gelo está


lentamente derretendo
Queridinha, parece que foram anos desde

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que ficou claro


Lá vem o sol, lá vem o sol
E eu digo que está tudo bem

Lá vem o sol, lá vem o sol


Está tudo bem

A canção preenchia meus poros, causando


paz em meu interior. Estávamos eu e Antônio lado
a lado, e Clarinha na minha frente, sendo abraçada
por mim.
A vidraça ampla atrás de nós, permitia que a
luz do sol incidisse próximo de onde estávamos,
como em resposta àquela canção que dizia que o
sol estava vindo.
Me aproximei mais do homem ao meu lado, e
como um ímã, ele envolveu um braço em meu
ombro, me aconchegando e depositou um beijo no
topo da minha cabeça.
Eu estava aquecida, como se o sol finalmente
chegasse na minha vida.
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Respirei fundo, inalando seu cheiro


envolvente e absorvendo o calor do seu corpo, para
quando não estivéssemos lado a lado.
Doía me confessar, mas eu sentiria falta dele,
caso aceitasse a proposta.
A música acabou, e muitos aplaudiram a
menina, inclusive nós.
— Amei essa música, mamãe! — Clarinha
pulou em meu colo enquanto caminhávamos até a
saída.
Um pouco mais à frente, avisei alguém
familiar.
— Antônio, Pedro está logo ali. Queria que
não soubesse de nós ainda, quero conversar com ele
com calma, tudo bem? — sussurrei ao lado dele
para que apenas ele escutasse.
Sua resposta foi um aceno, concordando.
— Pedro! — Acenei alegremente com a mão
ao ver meu irmão se aproximando.
Clarinha também acenou e caminhamos os
três em direção a ele.
— O que você faz aqui? — indaguei
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enquanto o abraçava.
— Não está feliz em me ver? — retrucou,
parecendo desconfiado.
— Tio Pedro! Estou com o vestido que você
me deu! — Clarinha pulou no colo dele, que a
recebeu de braços abertos.
— Ficou lindo, Clarinha! Vamos pro carro?
Eu vou levar você e sua mamãe pra casa. Vamos
dar um descanso ao Tony. — Declarou e no fim
piscou para o amigo, que sorriu em troca.
— Mas por que não avisou que vinha? —
insisti em perguntar.
Queria mais alguns minutos ao lado dele, que
mal tinha?
— É, eu as levaria com o maior prazer,
Pedro. — Antônio disse cordialmente.
Meu irmão aparentou estranhar essa nossa
proximidade, mas comentou tranquilo:
— Viu? — Apontou para ele. — É por isso.
Ele sabe que está cansado, mas esse jeito heroico
de querer ajudar a tudo e a todos não aceitaria que
eu viesse até aqui.
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Todos rimos e Pedro completou:


— Fora que hoje temos uma noite só dos
solteiros. Meu amigão aqui precisa descansar...
Planejamos tudo, Tony, você vai adorar!
Antônio deu um meio sorriso e me olhou de
soslaio. Retribuí o sorriso com desânimo, mas logo
cortei o assunto.
— Então vamos, não é? — disse a todos. —
Obrigada, Antônio, pela viagem. Mesmo sendo a
negócios, agradeço pela estadia e por sua
hospitalidade.
Estava sem graça com o comentário do meu
irmão e quis logo sair dali. Nem eu estava me
compreendendo, talvez fosse eficaz um tempo
longe dele para assimilar melhor as coisas.
— Não foi nada. Nos vemos amanhã na
empresa. — Meu chefe respondeu.
Fiquei ainda mais confusa ao ouvir aquilo.
Então ele iria mesmo à festa. Foi duro constatar,
mas se tem algo que sou boa, é em pescar as coisas
no ar.
Clarinha, Pedro e eu fomos para o carro, não
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antes de Clara dar muitos beijos no rosto de


Antônio e agradecer pela viagem e pelo presente.

No caminho até a casa de Henri...


— E aí, Mandi, quais são as novidades?
Como foi a viagem? — Pedro perguntou enquanto
dirigia.
— Algumas coisas sobre a empresa. Nada
muito divertido. Em casa te conto os detalhes.
— Olha, tio! A foto que tiramos na cabine do
parque no sábado! — Clara esticou seus bracinhos
para mostrar a foto em que eu e Antônio
beijávamos seu rosto. Foi a foto que recortei para
que ela levasse e guardasse de recordação daquele
dia. Pedro observou a foto de relance, então minha
filha a guardou.
— Espere aí, deixa eu ver essa foto de novo,
Clarinha — Pedro pediu.
Ela a mostrou novamente.

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— Linda, não é? — Clarinha comentou


animada, enquanto eu permanecia em silêncio,
olhando a estrada pela janela.
— Aham. Linda — respondeu num tom
sério. Virei o rosto para ver melhor a cena, e depois
que Clara guardou a foto, ele me olhou de rabo de
olho. — Rum.
Devolvi o olhar e abaixei a cabeça. Sabia que
haveria muitas perguntas assim que chegássemos
em casa. Pedro é sagaz.
— Temos mesmo que conversar em casa,
Amanda.
Bufei. Ele e essa mania de ser meu pai.
— Vai ficar me chamando de Amanda agora?
Relaxa, irmãozinho. — Sorri, mas não olhei em
seus olhos.
Chegando na casa de Henri, deixei claro que
queria evitar a qualquer custo dar de cara com meu
ex. Não queria que ele me afetasse justo no
momento em que me sentia tão recuperada de todas
as suas traições e palavras amargas.
— Pedro, leva ela você, por gentileza? Minha
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capacidade de ser neutra e educada na frente do


Henri já zerou — pedi, dentro do carro.
— Tudo bem. Mas se ele pisar fora da faixa
comigo, não respondo por mim — respondeu firme.
— Vamos, Clarinha.
O tio tirou Clara da cadeirinha, pegou sua
mala e a levou até seu pai. Henri não demorou a
atender a campainha. De longe avistei a feição dele
murchar quando viu que era Pedro, e não eu, a
entregar nossa filha.
Logo meu irmão retornou em silêncio, entrou
no carro e deu partida.
E em mim só vinha o frio, o frio que senti
quando me distanciei daquele homem que era a
amostra do próprio sol.
Minha vida estava uma bagunça.

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Capítulo 11

AMANDA

No caminho para casa, permaneci encostada


no meu assento, pensativa. Não queria ver Henri.
Dar de cara com meu ex-esposo poderia abrir
feridas e causar mais dor em meu coração. Ele não
era como Antônio, que me deixava tão alegre, tão
em paz. Não mesmo. Senti que, naquele momento,
o que mais precisava era de mais uma dose de
Antônio. Mas ele podia não estar acostumado
àquilo e seria melhor dar espaço, logo decidi que só
o veria no dia seguinte, no escritório.
Ainda imersa em pensamentos dentro do
carro, um bip me chamou atenção no celular.
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Ainda quero conversar com você. Não vou


desistir. — Henri

Idiota.
— Amanda... Sei que está cansada e
pensativa... Mas que raio de foto era aquela que
Clara me mostrou? Eu vi ali uma família feliz, não
um chefe e sua funcionária com a filha. — Pedro
mostrou-se curioso questionou sem delongas.
— Ah, maninho... Uma longa história. Somos
amigos — respondi, sucinta.
— Tudo bem, temos tempo. Assim que
chegarmos em casa, tome um banho e me conte
tudo. Sobre o trabalho, sobre essa sua amizade com
Tony. Tudo.
Em concordância, apenas assenti engolindo
em seco. Pedro tinha uma autoridade ao falar, como
se fosse um pai, não havia como desobedecer. Nós
permanecemos em silêncio pelo resto do caminho
até a casa.
Assim que chegamos, fui direto guardar as

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coisas da mala no armário, mas recebi outra


mensagem. Torci para não ser o canalhenri de
novo.

Oi! Chegou bem? — Era


Antônio.

Sorri ao abrir a mensagem e respondi de


pronto.

Cheguei sim. Clara está na


casa dela e eu e Pedro
acabamos de chegar em casa.

Ok.

Guardei o celular com um sorriso pairando


no rosto e voltei a organizar minhas roupas,
colocando-as no armário. Pedro foi para o seu
quarto direto, disse que cochilaria, mas que não
deixaria de conversar comigo mais tarde. Tomei
um banho e fiquei vagando em meus pensamentos.

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Ah… Quem diria que você ocuparia meus


pensamentos assim? Logo eu que jurei nunca mais
sentir nada tão envolvente por algum homem. Mais
uma vez meu coração me pregou uma peça, mas
com você eu serei cautelosa, somos dois aprendizes
nessa loucura toda e está sendo tudo tão rápido...
De um dia pro outro, como pode?
Ri como boba no box, enquanto me lavava.
Eu sabia que ele estava sentindo algo especial
por mim, pois demonstra com facilidade. Isso é
uma vantagem. Tinha até a outra quarta à noite para
pôr meus sentimentos em ordem e então decidir o
que faria da minha vida.
Ah... Eu estou com saudade dele... Ele me faz
tão bem.
Me permiti suspirar de saudade e anseio.
Ao sair do banho decidi, por impulso, enviar
uma mensagem para ele.

Sinto sua falta :(

Fiquei encarando a tela por longos segundos,


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mas logo deixei de lado e voltei ao meu quarto.


Enquanto penteava meus cabelos, a mensagem dele
chegou.

Estava pensando em você


agora. Sinto sua falta
também

Ah é? E no que pensava?
Algo bom né? Espero que
sim

Amanda a controladora!
Hahaha. Sim, pensava em
como eu estou maluco
deixando você preencher
quase todos os meus
pensamentos.

Ai, meu Deus! Ele podia dificultar um pouco


as coisas, não?

Que merda hein? Sinto dizer


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que você está também


fazendo um ótimo trabalho
de invasão de mentes. Pelo
menos na minha está rsrsrs

Isso é bom! Acaba de se


tornar meu lugar favorito.
Sua mente!

Pois pra mim sua mente


ainda não é meu local
favorito senhor Antônio...
Quero invadir outros lugares

Posso saber quais lugares


são esses, senhorita
Amanda... Só pra verificar se
por acaso você já não os
invadiu.

Hahaha bobinho... Não


falarei jamais! Hahaha!
risada maléfica
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Ok... Estou gargalhando


nesse exato momento. Como
faz isso? Está me
controlando à distância!!!

Superpoderes de invasão.
Acabo de invadir seu humor.

Ao enviar essa mensagem, estava rindo alto


sozinha no quarto, quando Pedro entrou.
— Aconteceu alguma coisa aqui? — falou da
porta do quarto, correndo os olhos pelo cômodo.
— Nada, estou conversando com alguém —
respondi e levantei o celular.
Antônio respondeu à mensagem.

Viu? Eu sabia que tinha


superpoderes desde
sempre!!! Hahaha

Logo respondi.

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Pedro está aqui querendo


fuxicar o assunto. Vou
conversar com ele e já volto.
Beijo

Travei o aparelho e pedi para que Pedro


sentasse na cama ao meu lado e ele obedeceu.
— Vamos lá... Me conta tudo, como foi essa
viagem, porque odeio estar por fora das coisas. —
Já sentou intimando-me.
— Tudo bem... Começo com o dia em que
fomos buscar Clara para ir pro aeroporto... Então...
Comecei a falar sobre Antônio e eu, e o
pedido repentino do beijo em frente à casa de
Henri. Pedro ouvia com atenção, claro que ele riu
dizendo imaginar a cara que Henri deve ter feito e
tudo mais, mas ainda assim estava atento. Ocultei
detalhes da noite de amor que passei com seu
amigo, mas deixei explícito que passamos a noite
juntos e Pedro ficou de boca aberta. Ao concluir
tudo, fiquei quieta, esperando que ele absorvesse as
informações.
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— Então... O que acha disso tudo? — não me


contive e acabei perguntando.
— Quero matar o Tony! Você é minha irmã!
— Rolei os olhos ao ver que ele deixou o ciúme
protetor falar mais alto. — Ele a seduziu?
Bufei e cruzei os braços. Mal sabia ele que
todo o plano de conquista veio de mim.
— Acha que sou inocente, irmãozinho? Pelo
contrário… Bem… Quem acabou se mostrando
interessada fui eu. — Dei de ombros, com um
sorriso enviesado no rosto.
A realidade deve ter atingido a mente do meu
irmão, pois ele pareceu refletir por um longo tempo
antes de dizer alguma coisa a mais.
— Meu Deus... Eu... Caramba... Loucura
total! E claro que um milagre também! Conheço
Tony há algum tempo, por causa da empresa e tal,
mas como amigo apenas há um. Eu sempre soube
que ele não dorme com as mulheres e tudo mais...
— Parou, se aproximou de mim, segurou meu rosto
e fitou-me nos olhos. — Ele está se apaixonando
por você, Amanda Lice. Sabe o peso disso? Tem
noção de tudo que fazia Tony para nunca querer
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amar e então você chega e… Buum! Quebra tudo e


o conquista!?
— Apaixonado? Acho que não. Por que acha
isso? — Senti algo apertar meu peito.
Era medo.
— Porque ele não faria nada com você se não
tivesse algum interesse, no mínimo, impossível de
controlar. — Soltou meu rosto devagar.
Respirei fundo, absorvendo a informação.
Pedro deveria saber bem do que estava falando, não
é?
— Não... Ele não me deu detalhes sobre essa
blindagem absurda dele. Eu devo me preocupar? —
Senti receio, ele diria se algo estivesse errado, não
diria?
— Acredito que não. — Pensou um pouco,
antes de continuar a falar. — Acho que você deve
se empenhar em fazê-lo feliz, tenho certeza que ele
fará o mesmo. Ele nunca amou para que não
sofresse. Só conversava essas coisas comigo, eu
não gostaria que ele finalmente se apaixonasse e
depois você o fizesse sofrer. Isso não é um jogo

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como o daquela noite com Nick, não, né? Porque,


Amanda, Tony é um cara muito bom, não merece
isso.
O que mais me surpreendeu foi o fato de meu
irmão não pensar em nenhum momento nos meus
sentimentos, e sim no amigo intocado pelo amor. A
coisa deveria ter sido mesmo muito séria.
— Claro que não, seu doido! Somos amigos e
eu realmente gosto dele. Quero descobrir esse
sentimento novo e diferente. Agora, sobre ele sofrer
ou não... Tem outra coisa que eu quero contar.
Antes mesmo que Pedro falasse algo,
comecei a contar da proposta que recebi de
Douglas Gali e que tinha até quarta à noite da outra
semana para responder.
— Putz! Isso sim é uma merda gigante! —
Pedro exclamou.
— Pedro, já estou acostumada. Estava tudo
indo bem demais. Na minha vida não dá tudo certo.
Quando dá certo de um lado, tem que dar errado do
outro — lamentei.
— Mas você já sabe se vai aceitar? Porque,

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Mandi... Isso é uma puta proposta!


— É... Eu sei. Estou pensando. Tem várias
coisas que me prendem ainda. A faculdade, se eu
passar, não irei, se nada der certo em Recife eu
volto à estaca zero. Clara vai ficar longe do pai
porque eu a levarei, tem o documento do divórcio
que ainda não saiu.
Pedro me interrompeu.
— Ah, que bom que falou. Sobre divórcio,
uma mulher ligou do cartório na sexta, disse que
falta apenas mais uma assinatura dos requerentes.
Disse que se vocês assinarem em até 15 dias, a
certidão sai na semana seguinte.
— Que ótimo. Vou resolver isso. Menos uma
preocupação. — Suspirei
Enfim o clima estava mais leve, não gosto de
esconder nada de Pedro. Só que a feição dele se
tornou um pouco alerta, como se lembrasse de algo.
Ih, lá vem bomba.
— Amanda, eu fiquei feliz por você e por
Tony... Mas hoje nós planejamos uma noite dos
solteiros na boate nova que inaugurou. Fechamos a
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boate para apenas convidados. Claro que terá mais


mulheres do que homens... Mas, se quiser, ponho
seu nome na lista.
Arregalei os olhos. Ele estava me
convidando? Sem pressão?
Uau.
— Quer que eu vá?
Ele me encarou com uma feição obvia.
— Se você não for eu proíbo Tony de ir. Será
algo bem particular e ele sabe muito claramente
sobre o que rola nessas festas.
Assenti, compreendendo.
— Pode colocar então. Eu irei. Mas não diga
a Antônio. Farei surpresa.
— Tudo bem. — Deu uma piscadela.
Ele saiu do quarto sorrindo, realmente
parecia estar feliz por mim.
A conversa foi longa, e quando dei por mim,
já eram quase 20 h. Então mandei uma mensagem
para o invasor dos meus pensamentos.

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Pedro já sabe de nós

Poucos segundos depois tive a resposta.

Que bom, estava agoniado


pra que ele soubesse

Você vai na noite dos


solteiros que seus amigos
planejaram?

Vamos lá, Amanda. Você é esperta, esse pode


ser um teste. Pedro disse que é impossível que ele
vá e não faça nada por lá, se ele for…
Não concluí o pensamento, a mensagem
chegou.

Sinceridade? Queria te ver.


Não estou animado para
boate hoje.

E mais uma vez me surpreendi com a

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sinceridade crua dele.


— Tá difícil achar defeito, meu querido —
falei a mim mesma ao ler aquela mensagem.

Você não precisa se privar


por minha causa. Vamos nos
ver amanhã. Relaxa que eu
não vou ficar chateada se for
na boate e pegar alguma
mulherzinha rsrs. Não temos
nada sério, estamos nos
conhecendo, certo?

Mentira, ficaria chateada sim, mas não podia


simplesmente pedir para um cara que conhecera há
uma semana e estava acostumado com a vida de
mulherengo para deixar tudo e ficar apenas comigo,
por mais que eu odiasse a ideia contrária.

O mesmo se aplicaria a
você? Pq se sua resposta for
sim, saiba que eu não
gostaria nada de dividi-la. E
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não estou afim mesmo de ir à


boate. Não quero outras
mulheres. É precipitado?

Meu peito quis explodir. Precipitado? Ai,


Senhor… Não me deixa ficar tão animada...

Acho que falei merda. Pq as


palavras estão saindo sem
passar pelo meu cérebro? —
ele enviou em seguida.

Apenas sorri como uma criança ao ler a


mensagem.

Se não for à boate com seus


amigos vou me sentir mal. E
vou em outra boate pegar
uns carinhas

QUE MERDA AMANDA...


Tá eu vou... Controladora!
Kkkk
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Ri de mim mesma e logo fui me arrumar para


a noite.
Escolhi um vestido azul tifany tomara-que-
caia, colado até o meio das coxas. Complementei
com um sapato de salto super alto branco. Fiz uns
cachos em meus cabelos e os deixei soltos.
Finalizei o look com uma maquiagem marcante nos
olhos e passei gloss nos lábios.
Pedro foi na frente. Eu queria fazer surpresa a
Antônio e fui logo depois, de táxi.
Chegando lá, os amigos do meu irmão já
estavam entretidos. Tentei me esconder e procurá-
los primeiro.
Ali estão eles. Vou observar um pouco antes
de aparecer — pensei ao encontrá-los.
Fiquei observando meu alvo e os meninos
por algum tempo. Antônio vestia uma calça jeans
preta e uma polo importada verde escura, seus
cabelos estavam soltos, jogados para um dos lados.
Lindo demais. Suspirei.
Notei que ele não bebia nada alcoólico. Isso

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me surpreendeu, achava que ele bebia de tudo. Os


garotos saíram um para cada canto e ele ficou
recostado no bar, rindo deles olhando para os
demais dançando na pista e azarando as mulheres,
quando uma bela loira parecida com uma Barbie
falsificada se aproximou dele, acariciou seu peito
de modo descarado e sussurrou em seu ouvido.
Assisti de longe e uma pontadinha de ciúmes surgiu
ao assistir aquela cena.
Só uma pontinha, ele era livre, não era?
Ele pode ter quem quiser, Amanda, para de
ser tola, vocês são só amigos coloridos.
Foi quando o vi assumir um rosto sério,
afastando a Barbie dele e balançando a cabeça em
negativa.
Trocaram algumas palavras, mas ele sempre
assumia uma negativa. Ela fez biquinho e saiu de
perto.
De repente ele pegou o celular e o manuseou.
Logo senti o meu vibrar.

Aqui tá um saco! O que vc ta

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fazendo?

Ri, ainda escondida detrás de uma pilastra.

Assistindo a um filme. Ta na
cena em que uma barbie
atirada se joga no galã numa
balada. Mas ele a ignora

Nossa. Que específica. Quer


companhia?

Ele não pareceu desconfiar da minha


narrativa.

Não, vai se divertir. Dança


um pouco, quem sabe não
encontra a mulher dos seus
sonhos hoje?

De longe o vi quando leu a mensagem. Ele


passou a mão pelos cabelos em frustração e

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estreitou os olhos. Depois balançou a cabeça


enquanto digitava a resposta.

Tá tudo bem? Eu fiz algo de


errado? Te disse que não sei
como isso funciona.

Relaxa, apenas curta sua


noite. Dance por mim.

Ele parou de responder e voltou a observar as


pessoas dançando.
Não muitos segundos depois, colocou o
aparelho no bolso da calça e saiu dali em direção
aos amigos.

TONY

Eu já estava me tornando um otário de


carteirinha. Tava na cara que ela não me queria, e
eu nem sabia o que tinha feito de errado.
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Mulheres.
Estava frustrado, sentindo uma dor estranha
no peito pelas suas mensagens tão neutras e frias,
então segui seu conselho, indo até a pista de dança.
Estava tocando uma batida eletrônica. Encontrei
Lucas e Pedro. De imediato ficamos zoando entre
nós.
Mal passaram-se alguns segundos, e senti
alguém pulando atrás de mim, tapando minha visão
me fazendo encurvar o corpo para o lado pelo
modo como me puxou.
— Opa! Vou acabar caindo em alguém. —
Achei graça daquilo, ainda com o corpo encurvado
para o lado para que as mãos conseguissem tapá-
los.
Não tenho culpa de ser bastante alto.
— Quem é? — perguntei.
— A infiltradora de mentes. — Ela sussurrou
ao pé do meu ouvido, usando uma voz sensual que
imediatamente reconheci.
Para descrever exatamente o que eu senti
naquele momento, só assemelhando a uma manhã
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de sol depois de uma noite de tormenta. Foi um


alívio imediato em meu peito.
— Hum... Acho que, na verdade, deve ser a
controladora! — Dei uma risada e ela decidiu se
deixar ver.
Assim que a vi, não me contive e a abracei
suspendendo seu corpo do chão, o que a fez rir
como criança. Queria apenas matar a saudade.
Estávamos há quanto tempo longe?
Algumas horas… Viu que absurdo?
Lucas e Pedro olhavam a cena sorridentes e
recebi aquilo como um incentivo.
Assim que a desci, não hesitei em beijá-la,
um beijo cheio de saudade reprimida. Sorrimos
entre os beijos e, por fim, a abracei novamente.
— Você é muito espertinha! — Ri enquanto
brincava com ela, tocando com o indicador na
ponta de seu nariz.
— Não. Sou controladora! — me corrigiu e
sorriu.
Então nos viramos para os outros dois, que
assistiam à cena.
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— Bom, fiquem à vontade. Vamos, Lucas?


— Pedro disse para nós, deu uma piscadinha para
Amanda e puxou Lucas, atônito com o que acabara
de ver.
Depois que eles se afastaram, fomos dançar
na pista, animados, apenas nos olhando e sorrindo
um para o outro, quando começou uma música
mais tranquila.
— Essa música diz muito do que ando
sentindo. — Amanda sussurrou em meu ouvido.
Sorri, atento a letra para quando iniciasse e a
puxei para mais perto. Sei inglês e foi fácil
distinguir a tradução na hora, pois não conhecia a
música. Quando chegou a uma parte específica da
canção, Amanda começou a cantar junto, me
olhando fixamente dançando para mim.
Essa mulher é minha ruína.

"Então me ame como você ama, me ame


como você ama
Me ame como você ama, me ame como você
ama

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Me toque como você toca, me toque como


você me toca
O que está esperando?"

Estava ficando maluco e já não consegui me


conter em ficar com ela apenas ali, dançando. A
puxei para um canto da boate, pronto para
demonstrar o quanto a desejava e sentia sua falta.
— Eu vou acabar enlouquecendo aqui, se
continuar me olhando desse jeito. Vamos para
minha casa? — sussurrei em seu ouvido enquanto
beijava seu pescoço.
Ela ofegou, passando imediatamente a mão
pelo meu corpo, me trazendo mais para perto dela.
— Vamos — disse e imediatamente saímos
juntos da boate.
Durante todo o caminho, ficamos com uma
mão entrelaçada e, de vez em quando, trocávamos
olhares cúmplices.
Ao chegarmos na minha casa, assim que
passamos pela porta, eu já não podia mais conter o
desejo latente de tê-la novamente pra mim. A
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trouxe para perto e a beijei de modo avassalador.


Amanda retribuiu, fazendo com que nossos lábios
ditassem as regras e assumissem a responsabilidade
de mostrar o quanto nos queríamos.
Eu a desejava mais do que nunca.
Fomos tirando nossas roupas pelo caminho.
Ansioso, eu não quis esperar chegarmos ao quarto,
a casa era grande e me sentia dependente dela
naquele momento.
— Aqui — disse ao parar em um corredor da
casa.
A posicionei encostada na parede e tratei de
despi-la por completo para que tivesse acesso ao
seu corpo. Depois a beijei no pescoço, desci por seu
colo, chegando até seu ventre e retornei à boca.
— Você será minha bem aqui hoje — falei
com meus lábios nos dela enquanto a posicionava
em meu colo. — Bem aqui nessa parede.
— O que está esperando? — Ela enlaçou as
pernas na minha cintura, ofegante de desejo.
Ah, mulher…
Eu estava perdido, louco, viciado, mas não
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perdi tempo e logo estávamos nos entregando um


ao outro.
Amanda gemia, ofegava e falava frases que
faziam meu ego chegar às nuvens, enquanto eu me
aprofundava em seu interior.
Senti suas unhas nas minhas costas,
arranhando enquanto eu mordia seu ombro, ainda
entregue àquele momento íntimo e profundo que
compartilhávamos.
Não era só sexo, eu já tinha plena consciência
disso.
Amanda, a cada toque, a cada proximidade,
se infiltrava permanentemente em minhas veias.
Eu já pertencia a ela.
Era o que cada batida descompassada do meu
coração, retumbava em resposta quando eu pensava
nela.
Dela.
Dela.
Dela.
Eu já era dela.

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Capítulo 12

AMANDA

Uma coisa eu podia garantir com toda a


certeza: Aquele homem estava mexendo comigo.
Antônio, com seu jeito intenso e verdadeiro,
unido à pessoa maravilhosa que ele era dia após
dia, estava fazendo com que minha mente me
tapeasse, tirando-me do foco de meus objetivos.
Eu não queria um romance, não estava pronta
para aquilo ainda, mas, mesmo assim, permitia e
queria que ele estivesse perto.
Depois das nossas loucuras no corredor da
casa, repetimos tudo no quarto até estarmos
exaustos. Cada vez que eu sentia suas carícias, seus
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beijos quentes marcando meu corpo, só conseguia


perceber como aquilo parecia certo.
Quando nos extasiamos, fomos tomar um
banho de banheira. Parece que aquela virou nossa
rotina e eu estava adorando. Após a banheira estar
devidamente cheia, entramos e relaxamos
abraçados, sentindo nossos batimentos
sincronizados. O peito forte de Antônio tocava as
minhas costas. Eu me encaixei perfeitamente ali,
naquele abraço. Mesmo sendo menor e delicada,
era como a peça correta para ele. Tudo parecia
certo.
— Nunca pensei que estar assim com alguém
fosse tão bom — a voz dele ecoou pelo ambiente.
— Nunca pensei que estaria assim com
alguém tão rápido.
— Somos meio loucos, né? — Riu.
— Dois malucos completos. Mas eu bem que
estou gostando dessa loucura.
— Eu estou amando.
Virei-me de frente para ele e encarei
fixamente seus olhos azuis tão transparentes e
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sinceros. Sua afirmação fora tão simples, mas


absorvi com ânsia, guardando dentro de mim
aquelas palavras. Logo voltamos a nos beijar
apaixonadamente e, em instantes, mais uma vez me
entreguei a ele.
Nós nos encaixávamos. Dois pedaços
quebrados, que se tornavam um completo.
Eu estava me apaixonando.
Simples assim.
Depois de me sentir completamente saciada
dele, senti fome. Ele também afirmou estar
faminto, e juntos saímos da banheira, nos secamos
e fomos para a cozinha. Ele me emprestou uma
camisa — que ficou enorme, mas ok. — e colocou
apenas uma toalha seca enrolada na cintura.
Eu seria obrigada a vê-lo me seduzindo sei lá
por quanto tempo mais, pode isso?
Assim que preparamos o suco e os
sanduíches, fomos para a sala comer. Antônio tinha
um X-box e eu adorava jogar nele. Só precisava
saber se tinha algum jogo que eu estava
familiarizada. Enfim encontrei um e o convidei
para uma partida.
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— Sabe que eu vou te humilhar no jogo, não


sabe? — Antônio perguntou cautelosamente e me
lançou um sorriso de canto.
Estávamos sentados no sofá em frente a tevê,
já saciados da fome.
Se ele pensou que me cativaria com o sorriso,
estava muito enganado. Naquele momento ele tinha
me desafiado.
— Veremos!
Começamos a jogar. Era uma cena
engraçada, joguei primeiro mostrando minhas
habilidades e ele jogou depois. Revezávamos para
ver quem se saía melhor. Em uma das minhas
vezes, ele me surpreendeu com poucas palavras.
— Preciso filmar isso! Ninguém vai acreditar
que minha mulher joga melhor que eu! — Correu
rumo ao quarto.
Fiquei estática. Minha mulher. Ele havia dito
minha mulher!
Ok, foi só um modo de dizer… Foi só um
modo de dizer, não é? — pensei, ainda surpresa, e
um tanto contente por aquilo.
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Assim que ele retornou com uma câmera,


brinquei, disfarçando o fato de ainda estar mexida
com o que ele havia dito.
— Ah, para, tá moleza esse joguinho. Filma à
vontade, depois eu filmarei sua cara de derrota! —
zombei dele, rindo. —Ha ha ha ha, filma minha
risada maléfica também!
Parecíamos dois adolescentes? Sim, mas eu
não estava nem aí.
Ele gargalhava durante toda a filmagem, e
quando minha vez acabou, ele apoiou a câmera
próximo dali para que filmasse a sua vez. Enquanto
ele jogava, decidi jogar também, mas de outras
formas. Comecei a alisar as costas dele, tentando
distrai-lo.
— Ah, meu bem... Pra que me vencer?
— falei, enquanto o abraçava no sofá, dando beijos
pelo seu pescoço. — Vamos nos divertir de outra
forma.
— Não vale, controladora! Está tentando me
controlar de novo! Isso é jogo sujo — retrucou
com os olhos atentos ao jogo, tentando manter a
concentração.
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— Adoro jogo sujo. — Por fim sussurrei com


uma voz sexy no ouvido dele.
Ele parou, pausou o jogo e lançou o controle
no chão. Não parecia tão controlado de si mesmo.
— Vai me pagar, controladora. — E me
agarrou ali mesmo no sofá.
Só que não era um casal qualquer. Éramos
Antônio e eu, então uns amassos nos guiaram até
muito mais.
Ele me abraçava com força, enquanto
investia contra mim.
— Vai me pagar por me fazer perder no jogo
— disse num rosnado.
— Eu. Nunca. Gostei. Tanto de...Pagar por
algo — respondi acompanhando seu ritmo intenso,
sem fôlego.
Acho que seria sempre assim, onde faiscava
virava incêndio.
Depois de chegarmos ao clímax, deitamos
ainda nus no sofá e ficamos nos olhando, enquanto
acariciávamos o rosto um do outro.
— Eu venci, HAHAHA! — exclamei
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sorridente.
— Não me importo! Ha ha ha! — ele
retrucou.
Dei um tapinha brincalhão no ombro dele,
enquanto me abraçava. Ele então levantou,
soltando-me de seu abraço e se posicionou de
frente a mim no sofá.
— Olha, pelo que eu vi hoje mais cedo com
aquelas mensagens suas, terei que te obrigar a fazer
uma promessa. — Mantinha uma expressão séria.
Estranhei a mudança repentina de humor e
fiquei séria também.
— A câmera está filmando de prova, hein! —
completou ele e logo ficou alerta. — Ela filmou
tudo que fizemos!
— Tudo bem, não me importo — Sorri, eu
confiava nele. — Me fala, o que é?
Ele respirou fundo e, parecendo um
cavalheiro do século XIX, segurou minhas mãos e
disse em bom som:
— Repita comigo: Eu prometo...
— Eu prometo — repeti.
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— Que nunca machucarei.


— O que é isso? — inquiri.
Realmente estava tudo muito confuso.
— Apenas repita. — Ele respondeu.
— Que nunca machucarei.
— Os sentimentos de Antônio Banelli Gali
em toda a minha vida.
— Os sentimentos de Antônio Banelli Gali
em toda a minha vida — repeti por fim.
Mas senti, no mesmo instante, que eu não
deveria tê-lo prometido, só ainda não sabia o
porquê.

TONY

Estava me sentindo uma criança com medo


de andar na montanha-russa e sair passando mal,
mas era o que meu coração sentia. Medo de ser
ferido.
Quando meu pai fez o pedido para que eu

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jamais me deixasse levar pelo amor, foi quase que


uma súplica da sua alma. Esse pedido foi a primeira
conversa que tivemos em quatro anos após a morte
da minha mãe, que o destruiu completamente.
Hoje, ele vive apenas com sua casca,
perambulando por aí, pois por causa do amor que
sentia por ela, grande parte dele também se foi
naquele fatídico dia.
Eu senti a dor, mas não sabia como era estar
no lugar dele. Meu pai sempre foi muito amigo
meu, sempre me deu os melhores conselhos e usou
de sabedoria em todas as fases da minha infância e
adolescência, explicando-me cada passo que eu
podia e precisava dar.
Eu continuamente o segui, e foi por tê-lo
sempre seguido, que acatei sua ordem sobre não
amar.
Realmente não queria a parte dolorosa,
mesmo sentindo um calafrio percorrer minha
espinha depois que Amanda prometeu nunca causá-
la.
Era como se, de alguma forma, fosse
inevitável sofrer.
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Mas não.
Eu não queria.
— Pronto. É isso, agora eu tenho sua
promessa e poderei cobrar. — Dei de ombros.
Amanda ficou séria, mas logo me abraçou e
ficou ali, em silêncio.
— Farei o possível para cumprir, mas por que
me pediu isso? — indagou.
Aquele era o momento de ser verdadeiro com
ela. Não dava mais para esconder.
— Porque eu sinto que estou me apaixonando
por você — admiti enquanto a abraçava e
acariciava suas costas. — Eu tenho quase certeza e
agora, mais do que nunca, sinto medo. O amor dói,
eu cresci ouvindo isso do meu pai, e agora eu estou
permitindo meu coração vivenciar esse sentimento
novo. Isso é complicado pra mim — assumi, sério.
Ela se afastou de meu abraço e sondou meus
olhos por um longo tempo.
— Obrigada, eu não sei o que dizer...
Promete cuidar de mim e nunca trair minha
confiança?
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— Prometo, sou bom em lealdade — garanti.


E realmente sou bom nisso. Jamais seria
desleal aos meus próprios sentimentos.
— Então demos mais um passo hoje, certo?
Queria aproveitar e saber sobre a história do seu
pai, por quê ele dizia essas coisas acerca do amor
para você — Amanda perguntou cuidadosamente.
Aquela era uma área delicada, mas se eu a
queria comigo, precisava ser transparente. Contei
tudo a ela, até perceber que a câmera ainda filmava.
Desliguei-a.
Nós dois conversamos sobre diversos
assuntos ainda no sofá, quando fomos tomados pelo
sono. Amanda adormeceu nos meus braços, e em
algum momento da madrugada, acordei e a levei
em meu colo para a cama.
Vê-la tão serena dormindo, só fazia meu
peito apertar de uma forma nova, como se eu
estivesse a cada dia descobrindo algo novo sobre
esse sentimento.
Mas eu tinha uma única preocupação:
Onde isso tudo vai dar?
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Uma semana se passou desde aquele


domingo. Amanda e eu estávamos a cada dia mais
unidos e desfrutávamos desse novo sentimento que
reinava entre nós. Era intenso e profundo. Eu sabia
que não tinha mais volta.
Fui o primeiro a chegar na empresa segunda-
feira. Estava animado para rever Amanda e para
colocar tudo em ordem. Os funcionários foram
chegando aos poucos e eu já estava na ativa em
minha sala, verificando documentos e números,
quando alguém abriu a porta. Era Nick.
— Bom dia, chefão. Posso entrar?
— Claro, entre, Nick.
Nick entrou e se sentou de frente a mim, do
outro lado da mesa.
— Primeiro quero te passar os contatos
internacionais que fiz na sexta, estão todos aqui
nesses papéis. — Ele entregou alguns papéis
grampeados. — Segundo, você está comendo a
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Amanda? Os meninos falaram comigo naquele dia


da boate algo sobre isso, mas não acreditei. Semana
passada não percebi nada demais entre vocês.
— Primeiro, obrigado pelos contatos.
Segundo, não estou comendo a Amanda. Estamos
nos relacionando de uma forma diferente.
— Um sexo fixo — reafirmou. — Sabe que
não precisa amenizar a situação pra mim. Vai me
dizer que aposentou as bolas agora?
— Vê se te enxerga, Nick. Continuo macho,
imbecil.
Ele riu.
— Macho… Macho… Baita vovô do INSS,
isso sim. Esconde o ouro dos amigos, tenho que
ficar sabendo da fofoca pelos outros. Tenho que
ficar tricotando que nem mulher por aí pra saber
que meu amigo estacionou de vez.
Ele tinha razão, não comentei com nenhum
deles sobre ela, ainda.
— Você ficou chateado? Eu sei que se
interessou nela — perguntei, mas realmente estava
preocupado com meu amigo.
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— Me interessei. Mas você sabe como sou,


não é? Parti logo pra outras, se é que me entende.
— Nick deu uma risadinha marota.
— Então tudo certo. Qualquer coisa, sabe que
pode contar comigo não é, irmão? — Estendi a mão
em menção a um aperto.
— Claro, meu gato dos cabelos sedosos!
Voltarei ao trabalho. Boa sorte, Tony. — Retribuiu
o aperto.
Ao chegar na porta, ele teve um sobressalto.
— Lembrei uma coisa!
Voltou até mim.
— Fala logo, qual a quenguice?
—Dia 20 de julho é a festa da véia. Me
avisou ontem, só tô confirmando. — Balançou a
mão no ar, referindo-se ao assunto como algo sem
muita importância.
— 20 de julho de novo? Sua vó quer tomar
posse do dia do amigo de vez, né?
A avó de Nick era uma senhora baixinha e
rechonchuda de 74 anos. Desbocada e festeira nata,
todos os anos comemorava seu aniversário no dia
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20 de julho, mesmo fazendo dia 15. Ela dizia que o


melhor dia para se comemorar é o dia do amigo, já
que a melhor amiga dela era ela mesma.
— Fazer o quê? Dona Euzira é dona Euzira.
— Nick deu de ombros.
— Conseguiu avisar aquele gastador do
Lucas? Todos têm que comparecer, inclusive ele.
— Ainda não, mas você sabe que ele vai,
nem que apareça descendo de helicóptero no fim da
festa. Lucas nunca perde as festas da vó — disse.
— Então tudo certo. Vai trabalhar logo, Nick.
Fingi ralhar com ele.
— Vai pro inferno, chefe de merda.
— Levantou o dedo do meio na minha direção, que
só ri.
Assim que ele saiu, Amanda chegou. Ao
entrar, eu estava verificando os papéis que Nick me
deu, mas quando olhei para ela, parei e sorri,
admirando-a.
Era inevitável.
— Bom dia!
— Boa noite, né, estou atrasada. Queria
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justificar. Eu estava pronta pra sair e, quando


cheguei no ponto do ônibus, ele tinha acabado de
passar, passou mais cedo hoje e eu o perdi, tive que
esperar outro. Desculpas — lamentou.
— A partir de amanhã te busco em casa —
afirmei com toda a autoridade de chefe. — Para
evitar atrasos, é claro.
Amanda era bastante insistente quanto às
suas vontades. Não queria que eu impusesse nada
além de seu próprio alcance e eu não a obrigaria a
aceitar tudo que eu estava disposto a oferecê-la.
—Ah, sim, estritamente profissional —
ironizou ela.
— Absolutamente.
Ficamos em silêncio, com os olhos
conectados. Amanda de pé, próximo à porta, e eu
sentado diante de minha mesa.
Não cansava de admirá-la. Ela parecia mais
linda a cada dia. Em meu íntimo, cada pulsação
ambicionava mais e mais dela. Um sentimento
totalmente singular.
— Tem algo diferente no seu rosto. Deixa eu
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ver, vem aqui. — Quebrei o silêncio, falando sério.


Amanda sabia que eu estava jogando, podia
ver isso nos seus olhos. Ela veio, e ao se aproximar,
virou o rosto para os lados para que eu visse o que
tinha de errado.
— Algo errado? — perguntou abaixando,
enquanto eu segurava seu rosto, visualizando cada
parte.
— Hum... Na verdade... Não. — Então a
beijei. Um beijo intenso e profundo como sempre,
deixando gosto de quero mais. — Você só está
mais linda e perfeita do que ontem. Isso é
progressivo?
— Acredito que seja, mas só você consegue
perceber. — Ela sorriu.
— Ufa. Ainda bem! — Retribuí o sorriso.
Ela me olhou com profundidade mais um
pouco, e depois retomou sua compostura.
— Bom, tenho que trabalhar, Antônio.
Precisando de mim é só chamar.
— Tudo bem. — A puxei novamente para
mais um selinho antes dela sair da sala.
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Já estava encrencado. Me sentia


completamente apaixonado por ela.
Esse efeito que ela tem sobre mim, tão
repentino... Como eu adoro isso.

BRUNA

Vida de recém mamãe é difícil. Poderia vir


junto com a criança, um manual de instruções. Eu
estava exausta!
Quando entrei de licença-maternidade pensei
logo em Tony e se tudo daria certo com a secretária
nova. Fiquei radiante ao notar que tudo estava
dando mais que certo e além de ter uma funcionária
competente, ele estava encontrando o amor pela
primeira vez.
Sempre desejei que isso acontecesse com
meu amigo, ele é um homem maravilhoso e merece
ter tudo o que a vida pode oferecer.
Estava arrumando o quartinho de Jonas, meu
bebê, quando o celular tocou.
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— Alô? — atendi.
—Sou eu, Bruninha, Amanda. Precisava
conversar com você, está ocupada?
Opa, novidades. Adorava quando Amanda
me ligava.
— Não, Jonas está dormindo, pode falar,
como tem se saído na empresa?
—Bem, tudo está em ordem, nada de mais. E
seu bebê, quando poderemos visitar?
Saí do quarto do meu filho, para não fazer
muito barulho e sentei no sofá na sala.
— Semana que vem marcarei um dia de
visitas, aviso a vocês. Ele está muito comilão, não
me dá descanso, mas eu estou amando essa vida de
mãe, ele me revigora. E você com Tony, como
estão?
A ouvi suspirar pesadamente.
— Bruninha, nós estamos vivendo algo tão
intenso, sabe? Em poucos dias eu estou me
sentindo tão diferente. Não consigo resistir a ele,
me sinto como uma adolescente.
— Espera aí, Amanda, está entrando outra
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ligação, só um minuto.
Coloquei a ligação de Amanda em espera e
atendi a outra.
— Tony?
— Bruna, que saudade!
— Eu estou também, semana que vem vou
marcar um dia de visitas para ver o Jonas, quero
que venha!
— Irei com certeza. Bruna, quero contar algo.
— Pode falar, mas fala logo que estou com
outra ligação na linha de espera.
— Estou apaixonado pela Amanda. Sei que
nunca senti isso antes e não posso ter tanta certeza,
mas... Ela me faz tão feliz e completo, deve ser
amor, não deve?
Oh, céus. Os dois já estavam loucos um pelo
outro!
— Calma aí, já volto. — Retomei a ligação
dela — Amanda?
—Oi, tô aqui.
— Então, um conselho. Cai de cabeça, Tony

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é um homem honesto, leal e responsável. Se eu


fosse você eu diria logo o que sente a ele.
— Dizer que estou me apaixonando? Que o
amo ou algo assim? Mas não sei se tenho certeza.
— Só um minuto, Amanda, já volto. —
Retomei a chamada dele. — Tony?
— Oi, Bruninha, fala.
— Isso é amor sim, não tenha medo, Amanda
é uma mulher que sofreu muito, mas é sensível e
forte, ela o fará feliz, não tenha medo. Agora espera
um instante. — Retomei a de Amanda. — Amanda,
diga logo ao Tony que você o ama, sem medo nem
receio. Ele vai gostar de ouvir, acredite em mim.
— Bruninha, você está falando com a
Amanda?
Ai, caramba! O que eu faço agora?
— Putz!... Estou. Finge que não ouviu isso,
pelo amor de Deus, não mudei a chamada aqui.
— Tudo bem! — Ele riu. — Mas admito que
amei o que escutei agora.
— Sei... Agora deixa eu desligar e falar com
ela. Tchau, Tony.
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Desliguei a chamada de Tony e voltei à


Amanda.
— Amanda, diga a ele como se sente, se
sente paixão, diga, se sente amor, diga. Ele merece
saber.
— Eu direi, Bruninha, obrigada, você tem
sido uma amiga e tanto! Semana que vem visitarei
o bebê. Beijos!
— Beijos, tchau.
Ufa!
E pensar que eu achei há poucos minutos ser
mãe complicado.
Complicado mesmo é ser amiga de duas
pessoas apaixonadas.

AMANDA

Eu estava com meu fôlego renovado, após a


ligação que fiz a Bruna. Sinceridade e verdade são
sempre os melhores ingredientes em qualquer
relacionamento e sou a prova viva de que, com
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Henri, não deu certo pela simples ausência desses


fatores.
Antes de ir até a sala de meu chefe, lembrei
de algo importante e enviei uma mensagem para
meu ex.

Oi, você deve ir ao cartório


para assinar um último
documento para liberar a
certidão de divórcio. Ainda
não assinou?

Ele prontamente respondeu.

Amanda, precisamos
conversar primeiro, por
favor me dê uma chance.

Não respondi a mensagem, já estava decidida


a virar essa página. Ignorara Henri todos os dias
desde a viagem e queria investir no que Antônio e
eu estávamos vivendo, pois naquele momento era o
que me fazia mais feliz.
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Como numa telepatia, ele me chamou pelo


ramal e em segundos entrei em sua sala.
— Me chamou, Antônio? — perguntei ao
entrar.
— Sim, se aproxime.
Me aproximei e ele tirou uma sacola debaixo
da mesa e estendeu em minha direção.
— É pra você, comprei lá no hotel, espero
que goste.
Fiquei surpresa! Era por aquilo que sumiu
com Clara no último dia.
— Não precisava... Eu não posso aceitar,
você já fez muito por mim. — Não contive a
timidez, ele estava fazendo demais.
— Por favor. Aceite. Eu comprei esse cartão
também, mas ainda não escrevi, então... — Deu de
ombros.
Peguei o cartão da mão dele e o verifiquei,
ainda constrangida pelo presente. Nunca fui tão
paparicada antes.
— Que pintura linda! Meu Deus... Amei o
cartão, nem precisa escrever — disse admirada.
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Era uma linda pintura do pôr do sol de


Recife. Uma lembrança perfeita daqueles dias
magníficos no paraíso.
— Eu quero escrever algo, depois eu prometo
que te dou — respondeu.
— Tudo bem... Então deixa eu ver o que tem
nessa sacola aqui... — afirmei abrindo a sacola, e
ao estender o vestido, fiquei boquiaberta. — Meu
Deus, Antônio... É... Esplêndido, maravilhoso...
Eu...
— Não precisa dizer nada, só use esse
vestido hoje à noite, vamos jantar — intimou.
Sorri, o encarando com admiração.
Ele não precisa fazer mais nada, eu estou me
apaixonando loucamente... Tem como ficar mais
perfeito esse homem? Ele me fazia ficar encantada
com cada gesto para me agradar, acompanhado do
sorriso meigo que lançava toda vez que me olhava.
— Aceito seu convite e o vestido, mas, por
favor... Pare de me mimar, senão ficarei mal-
acostumada! — Ri.
— Não me importo, desde que se mal-
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acostume do meu lado, eu fico feliz. — Deu de


ombros e sorriu.
Estávamos de pé, frente a frente. Num
impulso o abracei e fui retribuída com um abraço
protetor.
— Antônio... Eu... Quero dizer algo. — O
olhei nos olhos.
— Diga. — Ele engoliu em seco, parecendo
apreensivo.
Aquele não era o local certo para dizer que eu
o amava, sim?
Porque não tinha mais dúvida. Todos os
sintomas indicavam que era amor, um amor
repentino, veloz, inesperado, porém tão forte e
intenso. Eu me sentia parte daquele homem e não
queria mais estar longe.
— Não. — Ponderei. — Sei que gosta de
criar momentos especiais, então direi no jantar essa
coisa importante que tenho para dizer. Leva sua
câmera, vamos filmar e colocar na nossa videoteca!
— Concluí animada.
— Deve ser muito importante para entrar na
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nossa videoteca! — Ele respondeu sorridente.


— Sim, é. Agora vou almoçar, pedi comida.
Vou comer aqui na empresa mesmo, estou relendo
documentos da época da Bruna. Queria ver se você
podia me liberar uma hora mais cedo, preciso dar
uma passada no cartório para assinar o último papel
do divórcio — pedi cautelosamente.
Ainda estávamos abraçados, porém nos
olhando diretamente.
— Eu te chamaria para almoçar, mas tudo
bem. — Deu de ombros — Sobre sair mais cedo...
Por ser algo que me interessa extremamente, eu
deixarei. — Deu uma risada e depois um selinho na
minha boca.
Me afastei e logo senti a ausência do seu
calor. Precisava me recompor.
— Obrigada! Vou indo então... — Saí da
sala.
Ele acenou e voltou ao trabalho.
Aquele dia passou rapidamente. Nós não nos
falamos mais até minha saída, que fui em sua sala
apenas para me despedir e combinar o horário do
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jantar.
Desci do prédio da empresa e peguei um
ônibus para o cartório, que ficava um pouco longe
dali. Sentei no banco, encostada na janela e, ao
olhar para fora, percebi que o sol estava começando
a se pôr aos poucos. Lembrei de Antônio e de como
estava me apaixonando rapidamente por ele. Logo
pensei na minha filha, e na vontade que eu tinha de
tê-la perto de mim outra vez. Acho que seríamos
felizes juntos, nós três. Não que eu idealizasse
casamento ou qualquer coisa do tipo, mas fiquei
muito contente ao ver como ela adorou meu chefe,
e isso era bom. Muito bom.
Chegando ao cartório, fui logo atendida e
assinei o papel.
— A outra parte já assinou? Henrique Barros
Portela? — perguntei à atendente ao entregar os
papéis com minha assinatura.
— Ainda não, senhora. Ele tem até sexta para
assinar, senão o documento entrará em atraso.
— Tudo bem, falarei com ele.
Retornei para casa e decidi que depois ligaria

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para Henri, não estava com paciência para discutir


com ele naquele instante. Só conseguia pensar em
Antônio. Tomei um banho e fui para o quarto. Meu
celular estava no criado-mudo e, quando me deitei
na cama, de toalha, apenas para dar uma relaxada
antes de me arrumar para o jantar, ele tocou.
— Alô?
— Amanda Lice de Almeida Portela. Sou
Douglas Gali. Pode falar?
Caramba, tinha esquecido disso.
— Sim, senhor Douglas. Boa noite, como
vai?
— Bem, estou ligando apenas para lembrá-la
de que preciso de sua resposta até quarta à noite,
pois na quinta pela manhã teremos uma reunião do
caso em Recife. Estarei lá e gostaria que estivesse
também.
— Tudo bem, pode deixar.
— Então te aguardo. Boa noite. Tchau.
— Tchau.
Aquilo trouxe uma aflição ao meu peito.
Comecei a pensar sobre a proposta e afastei os
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pensamentos de meu chefe e o sentimento que


compartilhamos. Precisava pensar racionalmente,
sem minhas emoções no controle. A semana
anterior havia sido tão intensa entre nós, que por
um momento esqueci do prazo da proposta.
Levantei, abri o armário e peguei o caderno de
estudos com a lista dos meus objetivos. O li duas
vezes e, imperceptivelmente, uma pequena lágrima
deslizou por meu rosto. Doía pensar em afastar-me
dele, logo quando prometera jamais machucá-lo,
porém também doía ver que podia, talvez, estar
cometendo o mesmo erro, anulando-me pelo amor.
— Ah, Antônio... Por que você apareceu na
minha vida agora? Infelizmente eu terei que pensar
baseada nas minhas metas escritas aqui. Não posso
falhar comigo mesma. — Pensei em voz alta.

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Capítulo 13

TONY

Ao avistá-la saindo do prédio onde morava,


fiquei admirado em ver como aquele vestido tinha
ficado perfeito nela. Saí do carro e fui abrir a porta
do carona para que ela entrasse.
— Boa noite, minha controladora linda —
disse ao abrir a porta e a dei um beijo.
— Boa noite, meu chefe lindo — ela
respondeu, sorriu e entrou no carro.
Eu estava eufórico, desde a ligação que fiz à
Bruna, pois sentia que finalmente seria
correspondido sobre todos os sentimentos que me
invadiam. Amanda diria que me ama e enfim,
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poderíamos dar mais um passo nessa relação louca


que temos.
Fomos a um elegante restaurante italiano
escolhido por mim, jantamos e conversamos sobre
muitos assuntos, demos diversas risadas
descontraídas e eram nesses momentos que tinha
ainda mais certeza de que a queria perpetuamente
ao meu lado.
Tudo parecia precipitado, mas o pavor que
me assolava ao imaginar uma vida longe dela só
podia ter um motivo.
Amor.
— Acho que está na hora de eu dizer a coisa
importante, trouxe a câmera? — declarou ao
finalizar a sobremesa.
— Trouxe, vou pegar no carro. — Me
levantei e me dirigi ao automóvel.
Durante o trajeto, tentei conter a euforia
dentro do meu peito. Ela tinha usado de uma mania
minha — que era filmar momentos especiais —
para fazer daquele momento, também digno de ser
chamado “especial”.

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Retornei já filmando antes de me aproximar


da mesa, falando algo baixinho para que somente a
câmera gravasse o áudio. Ao me aproximar de
Amanda, narrei:
— Amanda Lice, minha controladora, dirá
algo importante nesse exato momento e, como não
poderia ser diferente, filmaremos para que isso seja
lembrado no caso dela não querer repetir nunca
mais na vida as mesmas palavras — descontraí,
sentando-me na mesa.
Ela riu, ao ouvir minhas palavras. Nós dois
nos encontrávamos numa área reservada do
restaurante, com privacidade para conversas
descontraídas e filmagens, como estávamos
fazendo.
— Bobinho. Vou falar — ela se arrumou,
passando a mão na roupa, e pigarreou. — Bom,
estamos no dia 15 de maio de 2015, são exatas
21h47min. Estou aqui com Antônio Gali, meu
chefe e atual par romântico. Venho falar à câmera e
a qualquer pessoa que possa assistir... Um
pouquinho da minha história. Sou separada, tenho
28 anos e passei por muitas experiências ruins na
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vida, minha última foi um relacionamento de 8


anos que me presenteou com uma filha linda de 4
anos, mas infelizmente meu ex-esposo me traía
quase todas as noites dos fins de semana desde que
nossa filha nasceu, me deixando em casa jogando
Xbox enquanto aguardava sua chegada. — Deu
uma risada fraca. — Eu nunca suspeitei, acreditava
na cara de pau dele e confiava tanto que meu amor
por ele me cegava. Então, um belo dia descobri
tudo e enfim... Decidi nunca mais amar. Saí de casa
e fui morar com meu irmão, moro com Pedro há
quase 3 meses e decidi que começaria a trabalhar,
voltaria à faculdade e, assim que me estabelecesse,
pegaria minha filha para morar comigo outra vez...
Acontece que conheci esse senhor aqui. Aponta a
câmera para você, Antônio.
Ainda aturdido e ansioso para o fim de seu
discurso, virei a câmera para mim, dei um sorriso e
acenei, depois retornei para Amanda.
— Esse lindo e encantador senhor se tornou
meu anjo da guarda, me salvou de um vexame
numa boate, me defendeu dos amigos galinhas, me
salvou de um quase acidente na rua, me contratou
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em sua empresa e me levou para resolver um


problema com ele em Recife, que me rendeu uma
proposta de promoção absurda com a qual sempre
sonhei. Acontece que esse senhor, o senhor
Antônio Gali, em poucos dias conseguiu mudar
toda a minha vida pessoal e profissional, apenas
faltando uma pequena área que eu jurei que
ninguém jamais tocaria novamente. Meu coração.
Amanda pausou e tomou fôlego. Parecia
extremamente nervosa, mas seu semblante era
determinado.
— Mas hoje, Antônio, aqui com você, eu
tenho certeza de que você me preenche por
completo e posso dizer com todas as letras nos
quatro idiomas que eu falo... EU TE AMO.
Paralisei.
Não conseguia distinguir bem o sentimento,
mas estava atônito, sorrindo enquanto filmava a
declaração dela. As emoções conflitavam-se dentro
de mim, devido àquelas palavras tão ao ponto e
profundas. Não esperava que fosse tão direta, tão
perfeita, tão… Apaixonante.
Após a conclusão, precisei também falar,
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então virei a câmera para mim e finalizei dizendo:


— Também a amo, Amanda Lice! — Usei da
sua mesma entonação, com o nome completo. —
Amo mesmo e nada mais importa a não ser esse
amor, só quero te fazer a mulher mais feliz do
universo. Meu Deus, eu estou amando! Isso
realmente precisa ser gravado! — Já nem me
importava muito com a câmera, aproximei-me de
Amanda e comecei a enchê-la de pequenos beijos
enquanto ainda filmava.
Aquela seria uma cena marcante na
videoteca.
Finalizei a gravação, apoiei a câmera na mesa
e uni minhas mãos sob o queixo, encarando-a
admirado, em silêncio.
Finalmente encontrei a dona do meu coração.
Me sentia patético, mas não a deixaria. Ela
precisava saber que seria minha para sempre,
independente de qualquer circunstância.
Não tinha mais volta.
— Você me deu o maior presente que eu
poderia receber — afirmei, quebrando o silêncio

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entre nós.
Seus olhos estavam brilhando, um pouco
marejados enquanto apenas me encarava sorrindo.
Num ímpeto se aproximou de mim, puxou minha
mão para si e deitou com o rosto sobre ela.
— E eu ganhei um anjo da guarda que é meu
amor e meu chefe — rebateu suave, sua voz como
sinos angelicais aos meus ouvidos.
Eu queria fazê-la minha. Levá-la para minha
casa e marcar todo seu corpo, enquanto a chamava
de “minha”, de modo oficial… Qual seria o nome
apropriado para o que tínhamos?
Hã… Um namoro?
— Quer ser minha namorada? Acha cedo pra
isso? — pedi, usando a mão livre para segurar a
dela.
O sorriso não abandonava seu rosto.
—Sim, quero ser. Na verdade não acho mais
nada, minha cabeça está rodando, só sei que te amo
— disse e riu.
Acho que está na hora de consumarmos esse
“título”.
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— Então, vamos embora, namorada? —


Levantei, e assim que ela também o fez, apoiei o
braço ao redor da cintura dela.
— Sim, vamos pra minha casa hoje, quero
ver uns filmes, topa?
— Tudo bem. Vamos lá.
Bom, meus planos de possui-la até cansar
talvez tivessem que ser transferidos. Estava curioso
para chamá-la de namorada enquanto a fazia
minha.
Incrível como a descoberta do amor muda
totalmente qualquer um que se veja dominado por
ele. Eu nunca pedi ninguém em namoro, nem
permissão para algo cogitaria solicitar. Tinha
ciência de meu poder de sedução e de tudo que já
realizei na vida. Mas ali, naquele momento, não era
qualquer pessoa. Era a mulher a quem entreguei um
sentimento tão puro e genuíno. Mesmo parecendo
um jovem imaturo, quis fazer as coisas bem feitas.
Se era algo novo, deveria ser tratado como tal. E,
pelo visto, deu certo.
Ao chegarmos na casa de Amanda, Pedro já
estava lá.
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— Pedro, eu e Antônio vamos ver filmes,


quer ver conosco?
Ele saía da cozinha, onde acabara de jantar,
quando nos viu.
— Sério? Não... Vou dormir. Mas sabe?
Gosto de ver vocês juntos.
— Estamos namorando — revelei, testando a
carícia da palavra em meus lábios.
Pedroca arregalou os olhos, quando falei
aproximando-me dele e dando um tapinha nas suas
costas.
— Que isso, sério? Fico feliz em saber! —
exclamou.
Uau… Não achei que seria tão fácil com ele.
Logo ele, sempre tão cauteloso e protetor com a
irmã.
Pedro estava indo em direção ao quarto
quando virou e nos deu uma advertência.
— Só não fiquem íntimos demais na minha
casa, sabem do que estou falando. Sou um irmão à
moda antiga.
Ah, tá. Sei.
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Rimos assentimos, já acomodados no sofá.


Pedro foi dormir, enquanto minha namorada
e eu víamos filmes, entre beijinhos e declarações.
Há algumas semanas, eu riria caso visse essa
cena, mas naquele dia, ali ao lado da mulher
possuidora dos melhores sentimentos que eu já
pude produzir em mim, era de fato, uma cena feliz.
Nós éramos um casal irreverente e bem
sincronizado. Eu agia sempre sincero e carinhoso
com ela, e Amanda sempre sorridente e amorosa.
Estávamos completamente loucos um pelo outro,
era nítido para quem quisesse ver.
A hora foi passando, acabei dormindo lá
mesmo, com Amanda em seu quarto, comportando-
me como um namorado à moda antiga por respeito
a Pedro.

AMANDA

A manhã de terça foi agitada. Antônio teve


reuniões com alguns sócios, enquanto eu fazia
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todas as anotações. Pela tarde liguei para a


faculdade, pois era o dia em que o resultado da
bolsa de estudos sairia.
— Boa tarde, gostaria de saber a
porcentagem da bolsa de estudos da vestibulanda
Amanda Lice? — solicitei.
— Boa tarde, verificarei, aguarde. — A
atendente se calou por um tempo. — 80 por cento,
senhorita. A aluna deve efetuar a matrícula em dois
meses. Agosto será o início do semestre.
— Obrigada, estarei me matriculando.
Assim que desliguei, fui correndo contar a
novidade a meu namorado. Queria compartilhar a
alegria.
Ainda estava assimilando bem essa loucura
de estar “namorando” depois de tantos anos.
— Chefe! Tenho uma notícia maravilhosa!
— disse ao entrar na sala dele sem avisar.
Meu namorado — tô adorando isso! — se
surpreendeu ao me ver assim, tão animada,
entrando em sua sala.
— Nossa! Desembucha então, mas não me
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assusta assim da próxima vez que entrar. — Riu.


— Exagerado! — Retribuí o riso.
— Consegui 80 por cento de desconto na
faculdade!
Levantei os braços, sorridente.
— Isso é muito bom! Pode se matricular até
quando?
— Em dois meses, caso eu me matricule. —
Abaixei a voz no fim da frase.
Para quem sabe ler, o pingo é letra, certo?
Essa minha “incerteza” fez com que Antônio
fechasse o sorriso.
— Bom... Parabéns, Amanda, eu preciso
finalizar uns documentos aqui... Depois nos
falamos — parabenizou-me sério e focou nos
papéis sobre a mesa.
O choque das suas palavras secas me
golpeou, percebi a possibilidade dele ter entendido
naquele momento a gravidade do que estávamos
vivendo e que tudo poderia ser arruinado se eu
aceitasse a proposta do pai dele.
Saí da sala em silêncio, um pouco chateada
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pela atitude dele. Mas quem era eu? Uma mulher


com sonhos que não podia simplesmente largar
tudo por amor novamente. Eu já tinha feito isso
uma vez, será que ele não compreendia?
Eu mal sentei-me à mesa onde trabalho e ele
me chamou pelo ramal novamente. Cheguei em
instantes e fechei a porta da sala dele.
— No que posso ser útil, senhor? — inquiri
de pé, com as mãos nas costas em uma posição
profissional.
Já que era para ser seco, eu também seria.
— Para com isso, Amanda, vem aqui. Por
favor, me desculpe pelo tratamento que te dei agora
há pouco.
Andei a passos lentos na sua direção, ele
levantou e abriu os braços para que eu me
aconchegasse em seu tronco forte e sempre quente.
— Você sabe como está sendo difícil pra
mim essa história de se apaixonar e... Pensar em te
perder está acabando comigo — lamentou, com
tom triste.
Simplesmente o abracei forte. Queria que
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tudo se resolvesse num passe de mágica, mas a vida


não é tão simples assim.
— Está ainda mais difícil pra mim. O pior é
que tudo diz pra eu aceitar e te deixar aqui, mas...
— Mas...? — Ele acariciava meus cabelos.
Por que dói tanto imaginar meus dias sem sua
voz firme em meus ouvidos? Sem seu carinho tão
protetor?
— Eu... Eu quero que tudo dê certo entre a
gente, dói pensar em estar longe disso, do seu calor,
do seu abraço, dos seus beijos — sussurrei, ainda
abraçada nele, mantendo os olhos fechados e
exalando seu aroma delicioso.
— Então fique. — Ele me afastou e segurou
meus braços, olhando em meus olhos. — Fique e
eu te darei tudo que meu pai te prometeu. Eu não
tenho vice nessa unidade, você será a primeira vice-
diretora. Compro um apartamento pra você e pago
sua faculdade. Te dou o que for preciso, mas fique.
Fique, Amanda... Fique... Meu amor.
A voz dele tremulava, bem no fundo. Como
se ele se esforçasse para manter o porte imponente

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mesmo pedindo algo tão… profundo.


Senti meus olhos arderem ao ouvi-lo me
chamar de “amor”, não conseguia ignorar aquele
pedido, então simplesmente o beijei
apaixonadamente, cada beijo dizia o quanto
estávamos ligados. Havia mais do que sentimento,
era uma ligação rara que a vida colocou entre nós.
Mesmo se estivéssemos a quilômetros de distância,
sentiríamos a força do amor do outro.
— Amor... Você me chamou de amor. Nunca
amei tanto ser chamada assim — comentei por fim,
com o olhar para o alto, focado no dele.
— Nunca chamei ninguém de amor, espero
que nunca precise chamar outra pessoa jamais —
enunciou dando aquele sorriso de canto que me
derretia por inteira.
— Quero te chamar de algo inédito também...
—comentei pensativa, me deixando levar pelo
momento único.
— Pode ser amor. Não me incomoda o fato
de você já ter chamado outro antes disso. O que
importa é o agora. Que palavra descreveria melhor
o sentimento entre nós?
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Faz sentido. Céus, eu o amo.


— Tudo bem, amor. — Ri.
— Viu? Adorei. Agora vamos trabalhar
porque hoje eu e minha namorada vamos a um bar
country — informou.
Senti que ele passou por cima da apreensão,
tentando não dar ênfase no assunto que poderia
causar momentos tristes entre nós.
— Sua namorada? Nossa, me apresente essa
mulher magnífica que roubou seu coração —
brinquei.
— Ela é linda e tem um sorriso encantador.
Onde ela chega a luz entra... E é um pouco
controladora também — replicou sério, mas ao fim
deu uma risadinha.
Foi inevitável a risada que escapou de mim.
— Que coincidência! Meu namorado acabou
de dar uma de controlador, me convocando a um
bar country. — Fiz cara de espanto.
Ele envolveu seu braço na minha cintura, me
colando ao seu corpo e roçou sua barba em meu
pescoço até seus lábios alcançarem minha orelha.
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— Aprendi com a melhor. Leva as roupas


para trabalhar amanhã com você quando eu for te
buscar, porque vai dormir lá em casa hoje. Amanhã
é o seu dia decisivo, quero estar ao seu lado o
máximo que eu puder — sussurrou deixando beijos
por minha pele em seguida.
Impossível não obedecer desse jeito, viu?
— Mandão. — Dei um tapinha no braço dele,
que se afastou um pouco para me encarar nos
olhos.
— O que eu posso fazer? — Fez um
biquinho. — Estou com saudades.
Suas mãos habilidosas percorreram pontos
sensíveis em meu corpo. Minha mente já estava
turva.
— Eu também — acrescentei fechando os
olhos, recebendo a carícia.
— Seu irmão nos empatou ontem. Mas ainda
temos hoje.
— Podemos dar o troco quando for a vez dele
— sugeri ainda grudada a ele.
— Com certeza.
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— Nos vemos mais tarde então, seu fominha!


— O afastei.
— Ok, meu amor. — Ele sorriu e me levou
até a porta, como um exímio cavalheiro.
Assim que saí da sala dele, encostei-me à
porta do lado de fora e suspirei.
Eu precisava me concentrar... Precisava me
decidir logo. A cada dia estava ficando mais difícil
e eu estava quebrando todas as regras que estipulei
a mim mesma.
Voltei ao meu trabalho, dispersando os
pensamentos loucos e apaixonados por temas sérios
naquele momento. Foi quando, num momento
aleatório, estava na minha mesa redigindo alguns
termos de contrato no computador, que meu celular
apitou.

Amanda, precisamos conversar, é sério,


me liga. — Henri

Ah meu Deus, será que algo aconteceu com


Clara?

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Nós fizemos um acordo ao nos separarmos,


de que eu não ligaria durante a semana para minha
filha, para não causar nenhum abalo emocional à
pequena. No fim de semana comigo, Henri também
não ligaria. Era uma forma de Clara se acostumar
com os dois separadamente. Mas se fosse algo
urgente, esse acordo estava quebrado e eu precisava
saber se minha filha estava bem.
— Henri? Algo aconteceu à Clara? — Foi a
primeira coisa que eu perguntei ao ligar para meu
ex e ele atender imediatamente.
— Ela está na escola. Me escuta apenas,
Amanda.
Senti um alívio, pelo menos não era nada
grave.
— Fala logo, que estou no trabalho.
— Ok. Eu quero te pedir perdão por tudo que
te fiz, me arrependo demais, você não sabe como
tem sido difícil pra mim viver dia após dia vendo
que perdi o meu bem mais precioso, que me custou
tanto para ter. Você, Amanda, foi a pessoa que
mudou minha vida. Me lembro ainda quando nos
conhecemos, você me evitava em tudo, demorei
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meses para convencê-la a sair comigo... E hoje, se


for preciso, vou insistir para tê-la de volta. Eu
preciso de você, meu amor. Eu fui estúpido e
infantil achando que você não me queria mais
depois que nossa filha nasceu, pois sua atenção era
exclusiva para ela. Eu pensei que não se importava
mais comigo e comecei a beber e te trair achando
que me completaria. Mas não, me sinto vazio,
apenas você me completa, me dá mais uma chance?
Aquele discurso era novo.
Respirei fundo, organizando minhas ideias
para saber exatamente como o responderia.
— Henri, eu te amei, te amei tanto que não
cabia no meu peito. A base do relacionamento é a
comunicação e a verdade. Você não se comunicava
e mentia. Isso pra mim não tem volta. E agora que
eu estou me curando, conseguindo juntar os cacos
disso tudo, não quero me ferir novamente me
arriscando a te dar uma chance. Fora que em dois
dias sairei do Estado, pretendo aceitar uma
proposta que recebi da empresa e voltarei assim
que tudo estiver certo por lá para buscar Clara. Seja
feliz, Henri, eu te perdoo.
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Então desliguei.
Senti um alívio no peito ao perdoar Henri,
isso era essencial para que minha vida avançasse.
Sinceramente, não queria aceitar a proposta de
Douglas, queria ficar com o homem que iluminou
meus dias escuros e viver esse amor, mas o medo e
a dúvida me consumiam. Ele nunca amou, podia
estar sentindo outra coisa e pensar que era amor,
assim, quando isso acabasse, eu me machucaria.
Deixar uma proposta decisiva na vida por um amor
não estava nos meus planos. Eu precisava de
solidez.
Após pensar bem nisso, decidi que aquele dia
seria o melhor que passaria com Antônio. Faria de
tudo para que fosse uma despedida inesquecível,
pois no dia seguinte aceitaria a proposta de
Douglas.
No fim da tarde, fui até a sala dele e juntos
assistimos o pôr do sol abraçados, em silêncio. Não
queria que fosse uma despedida e meu coração,
aflito, só ansiava permanecer naqueles braços por
toda a vida.
— Vamos, amor? — Sua voz me chamou
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atenção, quando estava dispersa em pensamentos


ainda abraçada a ele, olhando pela janela.
— Sim! Vamos. — Sorri.
Antônio me deixou em casa e marcou de me
buscar em meia hora. O bar abria cedo e ele queria
aproveitar bastante as danças country comigo.
Tomei banho, deixei meu cabelo solto e
largado, coloquei uma blusa preta com um blusão
colorido quadriculado por cima e um short. Claro
que não podiam faltar as botas.
Meu namorado estava básico, uma blusa
vermelha, um chapéu de Cowboy, uma calça
desbotada e botas. Fomos felizes e sorridentes no
carro dele até o bar e lá já chegamos animados e
dançando.
Dançamos muito por horas, cantávamos as
músicas e vira e mexe nos beijávamos
apaixonadamente.
As canções, na sua maioria eram de acordo
com o ambiente, mas depois de um tempo, algumas
mais populares, variadas e leves começaram a
tocar.

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Eu estava abraçada a ele, aconchegada em


seu peito, quando uma música deu início e ele
sussurrou em meu ouvido:
— Acho que é minha vez de dizer que essa
música diz tudo o que sinto.
Lembrei da surpresa na boate no domingo,
ele usou as mesmas palavras para, daquela vez, se
declarar com uma música.
Permaneci ali, atenta, enquanto ele arriscava
cantar em inglês com Jason Mraz, a música “I’m
yours”

Bem, você acabou comigo e pode apostar que


senti isso
Tentei ficar frio, mas você é tão quente, que
derreti
Caí nas rachaduras, agora estou tentando me
recompor
Antes que o frio passe, eu darei o meu melhor
E nada, além de uma intervenção divina, vai
me parar
Eu acho que é a minha vez de ganhar ou
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aprender algo
Mas não vou mais hesitar, não mais, não
mais
Isso não pode esperar, eu sou seu
Bem, abra sua mente e veja como eu
Considere outros planos e caramba, você se
libertará
Olhe para seu coração e encontrará amor,
amor, amor
Então por favor não, por favor não, por favor
não
Não precisa complicar
Porque nosso tempo é curto
Esse é, esse é, esse é nosso destino, eu sou
seu!

Absorvi cada letra, cada palavra.


Meus olhos arderam imediatamente, ao notar
como estávamos envolvidos. Ele era meu, e eu só
queria que as coisas fossem diferentes.
A noite estava perfeita, logo disfarcei o
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conflito de sentimentos e fomos caçar uma mesa


para sentar e comer algo.
— Fica aí, amor, vou pedir algo pra nós. —
Antônio disse, apontando uma mesa para que eu
sentasse.
Assenti e fui até lá.
Em poucos minutos ele voltou com alguns
aperitivos no prato.
— Por enquanto, até a comida chegar. —
Sorriu se sentando e oferecendo os pastéis.
— Hummm, amo pastel — proferi, pegando
um do prato.
Nos dedicamos a deliciarmo-nos com aquele
pastel dos deuses. Ao finalizarmos, ficamos
esperando a comida num silêncio sepulcral. O peso
da decisão sempre estava lá entre nós.
— Amanda, eu queria dizer algo a você sobre
meus sentimentos. Não quero parecer chato e
meloso, nunca fui disso, mas... Com você tudo é
tão diferente... Eu preciso dizer isso.
Ele quebrou a tensão que dominava o
ambiente, me fazendo como uma menina ao ouvi-
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lo. Amava-o tanto, tão rápido, que até estranhava a


sensação.
— Diga, meu amor. Eu não te acho meloso
nem chato, você é tudo que eu preciso na dose
certa. — Sorri, incentivando.
— Então lá vai... Eu sempre disse que meu
coração estava trancado entre paredes gigantes e
que nunca me apaixonaria, que ao colocar meu
coração nessa prisão eu lancei a chave fora, onde
não conseguiria nunca buscar... Sabe... Eu acho que
você achou as chaves porque eu me sinto tão
liberto!
Oh, meu Deus!
Os olhos dele brilhavam. Sempre fora sincero
comigo, mas pela primeira vez, expressou seus
sentimentos de uma forma absurdamente clara. Não
tinha como deixar de me maravilhar.
— Meu amor! Você é... Meu Deus... Por que
não te conheci há dez anos?
— Acho que você não teria chance, eu estava
de luto, começando a administrar uma empresa sem
saber nada. Estava sem cabeça para romance.

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Deu de ombros, e notei seus olhos perderem


um pouco o brilho anterior. Deve ter sido uma fase
ruim.
— Hum... Deixa eu te perguntar algo. Você
se ofereceu para ajudar seu pai esses anos todos, se
tornou diretor e nunca passou disso? Digo... Não
que seja ruim, mas você é o único herdeiro das
empresas Gali Telecomunicações, deveria estar ao
lado do seu pai como vice-presidente, não acha?
Ele passou as mãos pelos cabelos soltos,
pensativo, soltou uma boa dose de ar e me fitou
profundamente.
— Ah... Eu me ofereci sim, amadureci muito
com essa decisão, estudei Administração e
Economia, aprendi muito com a prática também,
mas nunca quis forçar meu pai a me dar mais do
que eu já tenho. Não temos um relacionamento
muito agradável como pai e filho por causa disso.
Não pelo dinheiro ou cargo, mas porque eu decidi
por mim mesmo tomar a frente de tudo, pois ele
estava abalado emocionalmente. Se eu não fizesse
isso a empresa ruiria ou seríamos roubados até o
último centavo.
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— Ele nunca disse o porquê de não te


promover ou te levar pro lado dele na presidência?
— Estava curiosa.
— Na verdade, há dois anos tivemos uma
conversa, ele veio com um papo de que eu sou
inteligente e faço tudo certo, mas não sou cem por
cento maduro para assumir a presidência. Eu não
entendi, mas não retruquei, afinal não havia pedido
nada a ele.
Nossa, esse pai dele é mesmo duro como
pedra.
— Que chato... Não ficou mal por ele ter me
oferecido algo tão grande em tão pouco tempo?
Eu precisava perguntar. Sabia que Antônio
não era dado a inveja ou ciúmes, ele me parecia
muito maduro para aquilo, mas não consegui me
conter.
— Fiquei pelo fato de me afastar de você.
Mas fiquei feliz em saber que você está sendo
valorizada como merece. Meu pai tem um olho
clínico para pessoas em potencial, ele nunca erra
uma promoção desse nível. Como eu te falei antes,
todos os que receberam propostas parecidas com a
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sua estão fiéis na empresa até hoje, são pessoas


gratas e fiéis. Então... Não fiquei mal, não.
— Hum... Entendi.
O garçom chegou com o jantar e o assunto se
encerrou ali. Depois, voltamos para a área do bar e
da pista e dançamos mais um pouco, até decidirmos
voltar para casa.
— Vem, vou te levar em um lugar antes de
irmos lá pra casa. — Ele me puxou pelo braço de
modo animado. Colocou-me no carro e entrou logo
depois.
Dirigiu até um local um pouco deserto do
bairro em que morávamos, uma pista de chão e um
morro. Subimos o morro por alguns minutos até
chegarmos no cume. Ao estacionar, Antônio
destravou os cintos dele e me ajudou com os meus.
Em seguida falou:
— Chegamos. Vamos?
Ainda silenciosa assenti, e saímos do carro.
Ele me levou a um monte alto de onde era
possível ver a cidade quase em sua totalidade. Era
um show de luzes distantes, a vista era maravilhosa
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e, com o contraste do céu estrelado, parecia tudo


uma pintura magnífica.
— Meu Deus, Antônio... Isso é lindo!
— Vem, encosta aqui comigo. — Ele me
puxou e me posicionou na frente dele, recostado no
capô do seu Dodge, abraçando-me. — Esse lugar é
meu esconderijo, eu venho aqui sempre que me
sinto sozinho ou fico com saudades da minha mãe.
Ela me trouxe aqui um dia antes de morrer.
A voz dele estava firme, mas senti o esforço
que fazia para controlar as emoções. Notei, naquele
momento, a importância daquela confissão e pensei
que aquele tipo de assunto não era algo banal para
ele. Me senti importante por estar ali, ouvindo-o.
— E você está se sentindo como, agora? —
perguntei.
— Apaixonado e com saudade dela.
— Suspirou. — Sinto tanta falta dela, queria que
estivesse aqui para que eu contasse isso tudo que
estamos vivendo. Ela era tão sorridente e alegre,
Amanda, onde ela chegava a tristeza ia embora.
Nunca a vi chateada ou emburrada, era a alegria em
forma de gente. Sempre amorosa e carinhosa
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comigo e meu pai.


— Qual era o nome dela?
— Letícia. E não podia ter outro nome, pois
Letícia significa alegria. Ela era a alegria em pessoa
— disse, admirando o céu.
Nos calamos por um instante, então, tocada
com tudo aquilo, me virei, fiquei de frente para ele
e segurei seu rosto.
— A cada dia me surpreendo mais com sua
sensibilidade. Nunca acreditaria se me contassem
que você é assim por dentro. Eu estou amando
quem você é por dentro, amando muito.
Ele deu um sorriso tímido e não evitei beijá-
lo. Um beijo cuidadoso que mostrava adoração e
cuidado, um beijo sensível e lento.
Ele era meu lar, e a cada dia me sentia mais e
mais amada.
Ao fim, encostamos nossas testas uma na
outra e nos olhamos.
— O que você fez comigo? — perguntamos
em uníssono e depois rimos.

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Capítulo 14

TONY

Naquele momento eu não pensei mais em


nada, apenas no grande amor que nos envolvia.
Voltamos a nos beijar, dessa vez um beijo quente
com carícias íntimas e envolventes. Puxei Amanda
para dentro do carro e recostei os bancos para que
nos acomodássemos ali. Então continuamos a nos
beijar e nos acariciar apaixonadamente, quando
Amanda interrompeu.
— Eu nunca fiz amor no carro — disse
tímida.
— Eu nunca fiz amor no carro em cima de
uma montanha — respondi sorridente.
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— Eu nunca fiz amor no carro numa


montanha, vestida de cowgirl. — Ela sorriu.
— Eu nunca fiz amor no carro na montanha
vestido de cowboy com minha namorada.
— completei e nós dois gargalhamos.
— Você venceu! — ela falou.
Logo o clima ficou sério e quente. Amanda
começou com suas carícias no meu rosto, me
beijando como se não houvesse amanhã. O beijo
era cúmplice, profundo e envolvente. Um beijo de
adeus.
Eu não queria um adeus, mas eu a queria.
Após o beijo, ela abriu minha calça e me
acariciou. Sem precisar dizer nada, apenas
encarando seus olhos que davam ordens implícitas,
permiti que fizesse o que quisesse comigo.
Levantei as mãos em sinal de rendição, deitei
no banco e deixei minha namorada à vontade.
Minha namorada.
Minha.
Meu amor.
Logo sua boca foi capaz de me causar
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prazeres inimagináveis, de formas que nem se eu


descrevesse cada detalhe, conseguiria transmitir a
perfeição.
Eu não conseguia parar de gemer e murmurar
sei lá o quê pra externar o que eu sentia naquele
momento, Amanda fazia pressões nos pontos
certos, investia de um modo intenso, fazendo com
que eu ansiasse por muito mais daquele ato.
Quando enfim não me contive e cheguei ao
ápice, ela afastou-se e notei sua garganta se
movimentar.
Não, ela não tinha feito aquilo.
Puta merda… Não dá para descrever o
sentimento pré-histórico que se apossou de mim ao
notar que o seu interior estaria repleto da minha
marca.
Me apaixonei mais, tem como?
— Eu te amo — falei.
— Ama o prazer que eu te dou, isso sim —
ela brincou.
— Amo também, mas amo mais ainda a
mulher que me causa tudo isso. —Ri.
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Ela passou a mão por meu corpo, chegando


ao local onde sua boca acabara de marcar.
— Eu amo muito isso aqui.
Me lançou um sorriso enviesado, que fez com
que eu arqueasse uma sobrancelha desafiadora em
resposta.
— Só essa parte? E todos esses dois metros e
dez cheios de músculos? — provoquei alisando
meu corpo.
Era uma discussão muito insana, mas eu
sabia bem onde nos levaria.
—Hum... — Ela ficou pensativa, me
analisando de cima a baixo. — Amo cada
centímetro dos seus dois metros e dez — disse,
subindo as carícias pelo meu corpo.
Eu já estava duro de novo, de tanto desejo
nessa mulher.
— Então vem cá. Senta aqui, pois estou cheio
de fome de Amanda.
Agarrei aquele corpo pequeno e delicado,
posicionando minha namorada sentada sobre mim,
com as pernas abertas. Eu já estava deitado no
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banco arriado do carro e a deixei à vontade para


guiar a partir dali.
Amanda ama estar no controle.
Ela mal sabe que já possui todo o controle
sobre mim.
Em instantes já estávamos seminus, com
nossas intimidades expostas.
Amanda começou nos guiando em um
movimento intenso de vai e vem, fazendo pressão e
ofegando do jeito que só ela sabia fazer.
Me sentir em seu interior quente, sendo
envolvido por ela era algo colossal. Como se a vida
inteira nada do que eu tivesse experimentado fosse
suficiente.
Até sua chegada.
Ela era mais que suficiente.
Nosso amor durou um bom tempo, e mesmo
ela estando no controle, eu a estimulei de todos os
modos possíveis para que chegássemos ao clímax
juntos daquela vez.
Amava ver seu rosto tomado pelo prazer.
Quando esse momento chegou, nos
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abraçamos até nossa respiração voltar ao normal.


— Amor? — chamei.
— Oi, gostoso.
Ela não sabe o que faz com meu ego me
chamando assim.
Esses elogios fazem com que eu me sinta um
deus grego.
— Você é a única que faz com que esses
momentos sejam tão maravilhosos. Não sei, eu
tenho sorte de ter te encontrado.
Ela, aconchegada sobre mim com o rosto no
meu pescoço, suspirou.
— Eu que tenho, amor. Eu que tenho.
Ficamos mais um tempo conversando e
rindo. Depois nos vestimos para retornarmos à
minha casa.
Chegando lá, fomos direto para a cozinha.
— Hum… Estou com fome. Gastei muita
energia — brincou, risonha.
Abri a geladeira e peguei alguns iogurtes.
— Toma, não é bom comer coisa pesada essa
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hora — afirmei.
Bebemos os frascos de iogurte e fomos para
meu quarto.
— Amor, vamos ver algum filme? — sugeriu
assim que adentramos o cômodo.
Olhei-a fixamente e balancei a cabeça,
afirmando um não.
— Mas por quê? — Ela se fingiu de inocente.
— Você acha que, correndo o risco da
mulher que eu amo ir embora, e de isso aqui —
Apontei pra ela e pra mim — ser uma despedida...
O que eu desejo muito que não seja... Acha que não
farei de tudo pra ficar pra História?
Arqueei uma sobrancelha e dei meu sorriso
de canto.
O sorriso que faz a calcinha dela encharcar,
com certeza.
Viu? Falei! Ela já estava mordendo os lábios
e esfregando as pernas uma na outra vindo até mim,
como se desfilasse.
— Você, Antônio Gali, é muito fominha!
Sorte a sua que eu tô afim de te saciar!
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Perfeição.
É a palavra que define essa mulher!
— Vamos marcar alguns locais da casa hoje.
Topa? — sugeri, abraçando-a e sussurrando em seu
ouvido.
— Topo. Com você eu topo tudo! — Me
encarou, sorrindo, e eu a joguei na cama a fim de
iniciarmos nossa maratona de sexo.
Mas agora não era mais sexo, era amor.
Seus olhos castanhos brilharam, me
encarando de baixo pra cima. Eu estava de pé,
admirando-a deitada enquanto me aguardava.
Jamais imaginei que um dia estaria tão ansioso pra
estar com alguém. Não só pelo sexo, mas pelo
contato. Pela proximidade. Sentia como se meu
corpo fosse dependente do seu toque. Seus gestos
de amor eram anestésicos. Destruíam qualquer
barreira minha.
Subi na cama e comecei sendo bonzinho e
arrancando suas roupas devagar. Beijei cada ponto
do seu corpo antes de começar a lamber sua pele
deliciosa. Assim que ela ficou nua, eu me despi por

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completo e comecei a lambê-la, começando em sua


perna. Corri meus lábios por ela e lambi sua
panturrilha. Sei que lá é um ponto sensível, quase
na dobra do joelho, então investi nisso. Depois fui
subindo e troquei de perna. Enquanto uma eu
beijava e lambia, a outra eu acariciava com as
mãos. Beijei o interior das coxas antes de chegar
próximo à virilha.
— Ahhh, meu gostoso. Você me deixa
sedenta só com esses carinhos! — Ela falou num
gemido delicioso.
Continuei, calado, com minhas carícias, até
chegar na sua entrada. Pulei-a de propósito e ouvi
um gemido frustrado de minha controladora.
Calma, amor, vou chegar lá!
Lambi seu umbigo e tracei uma linha suave
com a língua até o vale entre seus seios. Agarrei-os
com as duas mãos e massageei antes de deliciar-me
com eles.
Depois de um tempo dando atenção naquela
área, eu subi mais e a beijei.
Nosso beijo era quente, nossas línguas se
entrelaçavam com desejo e fúria.
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Assim é o nosso amor, ardente, avassalador.


Segurei seu corpo o abraçando pela cintura,
espalmando minhas mãos em suas costas e a
posicionei deitada de barriga pra cima, com o corpo
em diagonal na cama. Levantei suas pernas e as
deixei bem abertas para mim. Pedi um minuto e fui
colocar o preservativo.
Ela estava ofegante de prazer só com minhas
carícias.
E eu não aguentava mais, precisava me
enterrar logo naquela mulher.
E foi o que fiz nos minutos seguintes, tendo
em resposta suas frases recheadas de elogios, seus
gemidos e ofegares que me faziam subir ao céu e
voltar.
Nossa intimidade durou o máximo possível,
Amanda era insaciável. Eu tenho muita sorte.
Quando finalizamos, nos levantamos nus, e
fomos até a sala de estar. Peguei uma bebida sem
álcool para passarmos um pouco de tempo até
estarmos preparados pra outra. Quando
começamos, eu a deitei na mesinha de centro e

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marcamos aquele local.


Não finalizei. Puxei-a e encaixei seu corpo no
meu comigo de pé. Andei com ela em meu colo até
chegarmos na cozinha. Encostei seu corpo na
geladeira, deixei uma perna dela no chão e segurei
a outra no ar.
— Posição nova — eu disse.
E também marcamos aquele local da casa,
indo até o fim.
O quarto lugar da casa foi a poltrona do meu
escritório particular.
Levei minha linda até o escritório, que ela
ainda não conhecia, e mostrei cada cantinho dele.
— Nossa, é lindo esse lugar, amor — disse
maravilhada.
— Aqui é como uma minibiblioteca também,
tem todos esses livros. Eu já li todos que estão
nessa estante. — Mostrei uma estante cheia de
livros do teto ao chão, em uma das paredes.
— Uau, amo ler.
— Também amo, amor. Mas nesse instante
eu quero te apresentar essa linda cadeira. — Eu a
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dirigi até a poltrona onde sento para ler.


Ela riu da minha apresentação à cadeira.
— Vem, linda! — Sentei e posicionei ela em
cima de mim, e nos amamos ali mais uma vez.
Não enjoava nunca da forma como ela agia
naqueles momentos. Como eu enjoaria? Sinto uma
atração irresistível por essa mulher. Acho que nem
morrendo eu perderia esse fogo.
Durou bastante tempo daquela vez, e já
cansados, chegamos ao clímax batendo nosso
recorde juntos.
Voltamos para a cozinha, fizemos um lanche
leve e fomos dormir, já perto das três da manhã.

Eu acordei cedo, na verdade nem dormi, mas


estava pouco me importando com isso. Não queria
nem que esse dia chegasse pra não pensar na
maldita resposta que Amanda daria ao meu pai.
Decidi acordá-la da melhor forma.

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Devorando seu corpo com minha língua.


Vai que ela desiste de me deixar?
Que merda, Tony! Tá dependente demais,
hein?
SIM, EU TÔ!
Enquanto eu, após subir sobre ela e chegar ao
centro do seu prazer, me deleitava, minha mulher
foi acordando e já me saudou com excitação,
mostrando sua reação às minhas carícias.
— Ah.... Bom... Diaaaaa. — Ela tentava dizer
enquanto gemia.
Assim que eu acabei, levantei e me deitei ao
seu lado.
— Ainda tá cedo, amor, mas bom dia. Dá pra
dormir mais um pouco, vem. — Puxei-a pros meus
braços e adormecemos juntos.
Só sei dizer que eu desejava que o dia não
acabasse.

AMANDA
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Após noite intensa e apaixonante e todo


aquele bom dia da madrugada, meu namorado e eu
dormimos juntinhos.
O relógio apitou às 8 da manhã, despertando-
me.
— Amorzinho, acorda. — Beijei e sussurrei
no ouvido do meu lindo.
Ele abriu os olhos lentamente, se espreguiçou
e sorriu.
— Bom dia.
— Hoje é um dia decisivo, vamos trabalhar,
vem, levanta. — Puxei-o carinhosamente pra fora
da cama.
— Levanto... Mas só se tomar banho comigo!
— Espreguiçando-se, respondeu ao levantar.
— Então precisamos ir logo, vem.
Corri até o banheiro com ele a tiracolo,
tomamos banho de chuveiro, enquanto
implicávamos um com o outro e ríamos.
— Você está começando a ficar controlador,
hein? Estou te obedecendo sem nem retrucar! —
Brinquei durante o banho.
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— Tive aulas com você, a maior controladora


que existe na face da Terra!
— Idiota! Apenas faço as coisas de uma
forma que ninguém consegue me contrariar. — Ri.
— Simples assim! — Me agarrou e beijou
meu pescoço, subindo para a orelha e acabando em
minha boca.
— Acho que assim não trabalharemos hoje,
mocinho. — Interrompi o beijo.
— E ela tenta me controlar mais uma vez!
— falou rolando os olhos, enquanto desligava o
chuveiro e saíamos de toalha.
— Bobo!
Nos arrumamos e fomos para a empresa.
Entramos abraçados nos entreolhando, enquanto
caminhávamos por toda a Gali até chegarmos em
nossas respectivas salas. Os funcionários que já
tinham chegado e nos olhavam sorridentes,
cochichando entre si.
Assim que organizei minha mesa, peguei o
celular e liguei para Bruna. Precisava conversar
com alguém sobre tudo que estava assolando minha
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cabeça confusa.
— Bruna? Bom dia.
— Oi, Amanda, bom dia, o que me conta de
novidade? Já se decidiu?
— Sim, decidi, Bruninha. Vou aceitar a
proposta do Douglas.
Por dentro eu estava suando frio.
— Mas e o Tony? Amiga, o coração dele vai
se quebrar em pedaços!
O meu também...
— Eu sei... Mas eu preciso aceitar. A vida
toda fui guiada pelas minhas emoções e
sentimentos e olha no que deu! Eu preciso aceitar,
se tiver que ser a gente vai ficar junto um dia.
— Amanda... Eu não te entendo. Você tem
certeza de que quer isso?
Eis a pergunta de um milhão de dólares.
— Não quero, não tenho certeza, mas
aceitarei. Vou agora pedir um voo pras 4 da manhã
de amanhã. Chegarei antes da reunião sobre o caso
da queda em Recife.

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— Amanda, me diz apenas uma coisa: você o


ama? Disse a ele que o ama?
Suspirei ao pensar em tudo que havia vivido
naqueles dias com ele. Era amor, sim, de um modo
mais intenso, como nunca sentira antes.
— Amo, Bruna, amo muito, como nunca
mais pensei que amaria. Eu nunca me apaixonei tão
rápido assim, amiga, nunca mesmo. Tenho medo
desse sentimento jamais deixar meu peito, mas não
posso permitir que isso me guie. É a oportunidade
da minha vida — argumentei com Bruna, tentando
convencer a mim mesma.
—Tony me contou que te fez uma proposta
parecida com a do pai, mas para que você ficasse
aqui em Belo Horizonte. Por que você não aceita?
— Ah, amiga... Ele me fez a proposta apenas
porque o pai fez primeiro, fora que é mais para me
manter por perto do que por mim mesma. Não
quero crescer assim, não parece justo.
— Putz, te entendo, amiga. Pensa bem antes
de qualquer coisa para não se arrepender.
— Eu precisava conversar com você sobre

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minha decisão, alguém precisava saber. Hoje eu


vou falar com Douglas de noite, informar minha
decisão e depois ligarei para Antônio e falarei com
ele.
— Boa sorte então, Amanda.
— Obrigada. Um beijo, amiga.
Assim que finalizei a ligação, comprei minha
passagem pela internet, imprimi o comprovante e o
guardei em minha bolsa. Fui até a sala de meu
chefe verificar se ele precisava que adiantasse algo
para ele. Não gostaria de deixar trabalho
acumulado, já que iria embora no dia seguinte.
— Meu amor, tem algo que eu possa fazer?
— perguntei ao entrar na sala dele.
Ele estava sentado, imponente, à sua mesa,
apenas mexendo no computador.
— Não, linda, estamos devagar essa semana,
está tudo tranquilo. Almoça comigo hoje? Aqui
perto tem um restaurante ótimo.
Levantou o olhar na minha direção e sorriu.
Quando meu coração vai parar de falhar uma
batida com esse sorriso?
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— Tudo bem, meio-dia então vamos. Vou


voltar para minha mesa. Te amo. — O fiz sorrir
ainda mais, lançando um beijinho no ar, e saí de
sua sala.
A hora passou voando. Antônio e eu fomos
almoçar. Decidimos ir caminhando até o
restaurante, que ficava próximo da empresa.
— O tempo hoje mudou, mais tarde deve
chover — comentei ao olhar o céu, de braços dados
com ele, caminhando até o restaurante.
— É verdade, com certeza chove, o céu
chega a estar preto — afirmou.
Logo chegamos ao restaurante e escolhemos
uma mesa no canto, apenas para nós dois. Coloquei
minha bolsa na cadeira, enquanto Antônio sentava.
— Vou ao toalete, já volto — avisei a ele,
que assentiu.
— Vou adiantar nosso pedido — informou.

TONY

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Amanda se foi e, depois que fiz o pedido, o


celular dela começou a tocar. Fiquei indeciso em
atender ou não.
E se for algo importante? Se for uma ligação
urgente? Clara, ela deve precisar de algo, tinha de
atender.
Peguei o celular na bolsa de Amanda e vi que
a chamada era de Bruna, então decidi atender e
pregar uma peça nela. Quando abriria a boca para
dizer algo, Bruna começou a falar antes.
— Amanda, calma, só me escuta. Sei que
decidiu ir pra Recife e deixar tudo para trás, mas eu
tenho que falar com você antes. Preciso conversar
com você, não posso deixá-la pegar seu avião de
madrugada sem antes conversar contigo. De
preferência antes de você falar com Douglas. Me
liga mais tarde, quando sair da empresa, tá?
Como?
Ela… Me deixaria mesmo?
Estava sem reação ao que acabara de ouvir,
senti meu peito comprimir-se com a revelação, mas
decidi abrir a boca e dizer alguma coisa.

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— Bruna... Sou eu... Tony.


Um suspiro de lamento fora ouvido do outro
lado da linha.
— Ah meu Deus... Tony... Eu não queria
que...
— Tudo bem, Bruna, não precisa se
incomodar. O fato da minha melhor amiga não me
avisar que a mulher que eu amo vai me abandonar
não muda em nada a minha merda de vida. Amanda
está no banheiro, estamos almoçando. Não direi
que você ligou, não diga a ela que eu sei disso, por
favor — respondi de forma seca e profissional,
como o antigo Tony sempre fazia.
— Desculpas... Eu ligo depois. — Desligou.
Fechei os olhos e respirei fundo.
Só queria ter o poder de voltar no tempo e
apagar tudo que vivi naqueles dias. A dor de amar
estava começando a invadir meu peito e as palavras
do meu pai sobre isso surgiam em minha mente de
forma agressiva. Quando Amanda voltou do
banheiro me viu estático, sentado com seu celular
na mão, encarando-o.

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— Amor? Alguém me ligou? — Ela


perguntou e se sentou.
Saí do transe e a olhei. Teria que disfarçar a
decepção no tom de voz.
— Bruna. Ela ligou, mas quando fui atender
já tinha desligado. Deve tentar ligar de novo depois
— falei calmamente, ansiando por algum tipo de
explicação espontânea por parte dela.
— Então tudo bem, vamos comer? — Sorriu,
pegou o celular e o guardou.
Simulei um sorriso que não fez com que
Amanda desconfiasse, provavelmente, pois ela
nada falou. O garçom chegou com a comida e logo
almoçamos em silêncio.
Por fim, paguei a conta e fomos juntos, ainda
em silêncio, para o escritório. Chegando na minha
sala, Amanda decidiu entrar comigo. Quando
fechou a porta, ela pôs seus dedos no meu queixo e
perguntou:
— Você está bem?
Não, Amanda, eu estou destruído, será que
não vê?
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Mas decidi não explodir ali, apenas respirei


fundo.
— Amanda, lembra que prometemos que
seríamos sinceros, sempre falando a verdade? — A
recordei.
— Sim, lembro — respondeu e encolheu a
mão para si.
Ela deve ter entendido implicitamente o que
eu lembrei, pois envolveu-se com os braços, como
se de alguma forma, eles a aquecessem.
— Então, serei verdadeiro mais do que nunca
agora. Desde aquela noite que passamos em Recife
eu nunca menti pra você ou escondi meus
sentimentos, fui sincero dizendo que não sou
experiente em relacionamentos e no amor. Mas,
sabe, Amanda, agora eu fiquei com medo. Medo
disso tudo, de toda essa verdade acabar, ruir de vez
e eu nunca mais sentir isso na vida. Me diz que não
preciso ter medo. Me diz que não vai me deixar. —
Respirei fundo, fechando os olhos. — Sei que hoje
é o dia da sua decisão e preciso que me escolha. —
Concluí, não conseguindo conter as lágrimas que
nasceram em meus olhos.
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Seu olhar pareceu piedoso, e em segundos se


encheram de lágrimas também, antes que abrisse a
boca para me dar sua resposta final.

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Capítulo 15

TONY

Ainda de pé, em frente a ela no meio da sala,


eu aguardava sua resposta.
— Eu quero você, não sei o que decidir, mas,
ainda assim, eu fiz a escolha. Vou pra Recife,
aceitarei a proposta do seu pai, mas isso não
significa que nosso amor acabou. Eu estarei sempre
aqui e quero que sempre vá lá me ver. Não sei
como faremos isso, mas... Se tiver que ser, será.
Ela não parecia tão certa daquilo, mas se sua
certeza da nossa relação dependesse de mim, eu
confirmaria o que precisasse.
Um pequeno alívio se apoderou de meu peito
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ao escutar aquilo, mesmo que não fosse o tipo de


relacionamento que sonhava levar.
— Então... Não precisamos terminar nosso
namoro de poucos dias? — Abri um curto sorriso.
— Não, não vamos terminar. Apenas vamos
nos ver menos, mas vamos continuar. — ela me
confortou.
Nos abraçamos, sentindo ambos o calor e os
batimentos cardíacos um do outro. Naqueles
momentos, só queria que as coisas fossem mais
simples, mas se era o melhor para ela, eu deveria
apoiar. Decidi que daria a ela essa chance e não
tentaria impedi-la, mesmo sabendo que seria difícil
pela distância. Estava disposto a tudo por ela.
No fim do dia não conseguimos ver o sol se
pondo. Deixei Amanda em casa e dei um beijo de
despedida apaixonado nela. Decidi não entregar o
cartão-postal do pôr do sol que já havia escrito.
Prometi a mim mesmo que, quando nos víssemos
novamente, o faria, e ela decidiu que passaria a
noite organizando suas coisas para a viagem e
ajustando tudo com meu pai. Apenas concordei,
como um bom namorado faria, e a deixei sozinha
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para isso.
Voltei para minha casa feliz de um lado, mas
sentindo uma aflição do outro.
Deveria ter sido o susto de perdê-la,
provavelmente passaria logo.

AMANDA

Ao chegar em meu quarto, deitei sobre a


cama e meu celular tocou. Era Bruna.
— Fala, Bruninha, me ligou?
— Liguei cedo, mas decidi ligar agora, pois
sei que está em casa.
— Tudo bem, o que tem pra dizer?
— Amanda, você não precisa aceitar a
proposta de Douglas, na realidade você pode
aceitar, mas não precisa concordar com todos os
termos, faça uma contraproposta! — Bruna falava
animadamente.
— Como assim, Bruna? — Uma chama de
esperança acendeu em meu peito.
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— Coloque os seus termos, o que você faria


se fosse a dona da empresa?
— Ah, eu colocaria o Antônio como o vice-
presidente ou me juntaria a ele para sermos
diretores da Gali Recife, para que ficássemos
juntos. — Nem pensei ao responder.
— Sugira isso! Diga a ele que aceita ser a
vice-diretora de lá, se Antônio for o diretor com
você. Se ele colocar a diretoria da unidade de BH
como empecilho, vocês podem sugerir dirigir as
duas unidades daqui da cidade mesmo, fazendo
viagens periódicas a Recife apenas para verificar os
números. Daí o atual diretor continua lá apenas
para manter a ordem e cumprir o que vocês
determinarem.
— É uma boa ideia. — Um calafrio percorreu
minha espinha. — Bruna, acha que ele vai aceitar?
— De imediato, não, mas ele vai analisar e te
ouvir. Se esses forem seus termos, ele deve pensar
bem antes de negar, afinal, ele precisa de você, não
precisa?
Ai, meu Deus. Seria essa uma chance de não
sair perdendo em nada?
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— Sim. Farei isso, mas falarei amanhã. Vou


até lá participar da reunião e ver como tudo anda,
depois conversarei com Douglas e veremos no que
dá.
— Isso, amiga, vai dar tudo certo!
— Obrigada, Bruninha, vou agora tomar um
banho que daqui a pouco Douglas liga, o poderoso
chefão! — Ri.
— Ok, qualquer coisa me fala, beijos.
— Beijos.
Desliguei aliviada, realmente o plano de
Bruna era ótimo e pouparia o amor que sinto por
Antônio, além de dar oportunidade para ele crescer
e se preparar para assumir a empresa futuramente.
Tomei um banho rápido, vesti meu pijama e
fiquei aguardando a ligação de Douglas Gali. Após
alguns minutos de espera, ele ligou.
— Alô.
— Amanda, novidades?
—Sim, senhor Gali. Irei amanhã para Recife.
— Fico feliz em saber que tomou a melhor
decisão. A reunião é às 8 aqui na empresa, já estou
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aqui em meu bangalô. Fez sua reserva no hotel ou


quer que eu adiante para você?
— Fiz sim, amanhã conversamos, gostaria de
avaliar alguns termos da minha admissão, tudo
bem?
—Sim, claro, vejo você amanhã.
— Até amanhã.
Depois de desligar, comecei a arrumar as
malas. Arrumei para três dias, não sabia qual seria a
decisão de Douglas, então não precisava levar
muitas coisas. Estava confiante de que tudo daria
certo. Às 23 h me deitei para cochilar. Teria que
acordar cedo, pois o voo era às 4 h da manhã, até
que naquele momento, meu telefone tocou.
— Fala.
— Amanda, por favor, volta pra mim! —
Henri chorava do outro lado da linha.
— Henri, você está bem? Parece bêbado.
— Eu bebi porque você não me quer, volta
pra mim, Amanda, eu te amo!
Ah, não… O que fiz para merecer isso?
— Henri, vai pra casa cuidar da nossa filha,
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ela não merece um pai bêbado.


— A babá está lá, ela está bem, mas não paro
de beber até você voltar pra mim, preciso de você!
Senti medo, ele nunca foi de fazer ameaças
ou pôr em risco sua saúde por minha causa.
Desliguei o telefone apavorada, não conhecia esse
lado de Henri, ele parecia arrasado, mas eu não
podia me deixar abalar. Liguei para a casa dele,
tentaria falar com a babá.
— Alô.
— Oi, aqui é Amanda, mãe da Clara, você é a
babá? — perguntei sem rodeios.
— Sim, no que posso ajudar?
— Vigie bem Clarinha, por favor, Henri está
bêbado. Me ligou sem conseguir falar coisa com
coisa e preciso que a mantenha segura, por favor.
— Oh... Ela está dormindo, eu a vigio sim,
pode ficar tranquila — A babá pareceu preocupada,
pela voz.
— Bom. Obrigada.
— Tudo bem, tchau.
Fiquei um pouco mais tranquila, mas não
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conseguiria dormir mais depois daquilo tudo. Ouvi


um estrondo do lado de fora, fui até a janela e vi
uma tempestade absurda caindo do céu, com
relâmpago por todos os lados.
— Putz... voo com chuva. Que sorte!
Fiquei um pouco receosa sobre meu voo e, de
tanto pensar nisso, acabei cochilando. Acordei de
madrugada, me arrumei e peguei as malas. Quando
fui para a sala, Pedro chegava em casa.
— Isso são horas, irmãozinho? — perguntei.
— Estava por aí, e você, já vai pro
aeroporto? — rebateu.
— Vou sim, você me emprestaria seu carro?
Está chovendo muito, não quero molhar a mim e a
bagagem esperando táxi.
— Tudo bem, sei que dirige bem. Se eu não
estivesse tão cansado, te levaria, sem problemas,
mas toma aqui. — Lançou as chaves a mim. — Vai
e deixa no estacionamento do aeroporto, coloca as
chaves em meu nome nos armários de pertences
que ficam no primeiro andar de lá. Eu busco de
manhã.

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— Obrigada, maninho, você é o melhor —


agradeci e saí de casa. Ao entrar na garagem, decidi
ligar para Antônio antes de sair com o carro.
Eu preciso dar mais um adeus antes de viajar.
Ele deve estar dormindo, mas vou falar que o amo
mais uma vez. Afinal, não sei o que me espera em
Recife.
Entrei no carro do meu irmão, guardei minha
bagagem e peguei o celular.
Aguardei alguns toques, mas logo a voz
rouca e sonolenta do meu amor acariciou meu
ouvido.
— Oi, amor.
Respirei fundo, controlando a vontade de
largar tudo e ir até ele.
— Antônio, eu… Queria me despedir. Sei
que dará tudo certo e vamos ficar juntos, mas
precisava reforçar que o amo, o amo demais.
— Ah, Amanda… — ele sussurrou, mas o
cortei em seguida.
— Me deixe terminar, por favor — funguei,
contendo as lágrimas. — Eu nunca vou esquecer
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tudo o que passamos, cada um dos momentos


lindos. Eu te amo, por favor, não me esqueça, viu?
— Por que diz isso? Você não vai voltar? É
isso?
Eu não sabia responder, não tinha mais
certeza de nada, só sentia uma aflição enorme no
peito, como uma premonição.
— Eu… Sempre voltarei por você. Sempre.
Haja o que houver, passe o tempo que for. Mesmo
se você quiser me deixar ou… — Minha voz
embargou. — Não sei, Antônio, eu não sei de nada,
só preciso dizer que te amo. Nunca vou te esquecer.
— Amor… Quer que eu vá? Quer que…
— Não. — Mais uma vez o cortei. — Preciso
dar esse passo sozinha. Eu amo você.
— Também amo você. Você é a pessoa que
me ensinou o verdadeiro sentido da vida, Amanda.
A única coisa que eu peço, é que não me deixe
aqui. Eu vou atrás de você no inferno, se
necessário.
— Eu vou esperar, amor.
Desliguei e me debulhei em lágrimas. Mesmo
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tentando confortá-lo, eu não podia garantir que


aquele relacionamento à distância permaneceria. E
se ele sentisse falta de uma mulher e quisesse
alguém? Doeria demais, mas não o proibiria.
Saí com o carro e dirigi lentamente em
direção ao aeroporto, pois a chuva me deixava
quase cega e a pista estava bastante escorregadia.
Consegui controlar as lágrimas, para não me
atrapalharem e foquei no trajeto. A rua não tinha
muitos carros, mas estava encharcada pela chuva.
Quando estava na metade do caminho, meu celular
tocou. Achei que poderia ser Antônio. Não vi o
nome, apenas atendi e coloquei no viva voz.
— Amanda, não vai embora, eu te amo! —
Era Henri.
— Henri, estou dirigindo, indo pro aeroporto,
me deixa em paz!
— Amanda, por favor, vou me matar se você
for embora, preciso de você!!! — A voz dele estava
embargada.
Meu coração acelerou em preocupação e
comecei a tremer, detestava imaginar ser o motivo
de qualquer problema e não podia deixar Clara sem
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pai. Naquele momento percebi que meu ex-esposo


precisava de ajuda profissional, ele não estava bem.
— Tudo bem, Henri, se acalma, vou ficar
com você, ok? Onde você está? — menti.
— Na rua, na chuva, num bar aqui no centro.
— Não estou te ouvindo direito, espera aí.
E no momento em que virei meus olhos para
o telefone que estava no banco do carona para tirar
do viva voz, o sinal da avenida se fechou, mas não
notei de imediato. Continuei dirigindo sem os olhos
na estrada, quando percebi dois faróis vindos
rapidamente de um cruzamento, na minha direção.
Por impulso, acelerei e desviei para a segunda
pista, fazendo o carro capotar dando três voltas e
cair em meio à pista da contramão.
Estava inconsciente, com a cabeça sangrando
sem parar e meu telefone estava quebrado, porém
ligado.
— Amanda? Que barulho foi esse?
Amanda? — Henri perguntava do outro lado da
linha.
E foi a última coisa que ouvi, porém não
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consegui sequer responder. Minha cabeça doía,


girava e senti um líquido quente percorrer meu
rosto.
Eu não estava mais lá.

TONY

Algo não estava bem. A sensação de “perda”


que meu peito sentia não podia ser normal. Fiquei
andando de um lado para o outro no quarto, após a
ligação de Amanda, torcendo para que um milagre
acontecesse e ela desistisse da viagem.
Mas outra coisa aconteceu, e não foi um
milagre.
Quando me ligaram do hospital, avisando que
Amanda Lice de Almeida Portella estava sendo
atendida pela emergência, mal troquei minhas
roupas e corri como um louco dirigindo rumo ao
local.
Liguei para Pedro, que demorou a atender,
mas não hesitou em ir até o hospital também.
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Passei em sua casa e o busquei, mas não conseguia


proferir palavra alguma.
Minha controladora estava correndo risco de
vida, pelo que entendi.
E se algo acontecesse a ela, eu jamais me
perdoaria.
— Cadê ela? Onde ela está, o que houve? —
perguntei desesperado à recepcionista, dando os
dados de Amanda, assim que chegamos.
— Ela está sendo atendida, chegou
inconsciente, porém viva. Peço que aguarde as
informações que formos recebendo. Sente-se na
sala de espera, por favor.
Pedro estava sentado nessa sala de espera,
enquanto eu pedia informações.
— Tudo bem, eu sou o namorado dela. Por
favor, não hesitem em me informar seu estado.
— Tudo bem, fique tranquilo.
Me sentei, ainda em desespero, já chorando
por pensar que o amor da minha vida corria risco
de vida ou podia sofrer sequelas do acidente, mas
não tinha noção do que realmente havia acontecido.
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Pedro tocou meu ombro, a fim de me


consolar.
— Ei... Como ela está? Fica calmo, vai dar
tudo certo, Amanda é forte, ela vai sair dessa.
Pedro era assim, por fora uma fortaleza. Mas
eu sabia que ele deveria estar pirando por causa
dela.
— Ainda não falaram nada, teremos que
aguardar. Estou tentando ficar calmo, mas não dá.
Ficamos ali, aguardando. Alguns minutos
depois, vimos um homem entrar no hospital,
acabado, com o cabelo bagunçado, gritando.
— Minha Amanda!!! Cadê minha Amanda?!
— Ele gritou com a atendente.
Pedro e eu nos aproximamos dele e o
seguramos pelos braços. Ele estava fora de si, e
chamava Amanda de “minha”. Pelo olhar raivoso
de Pedro, aquele deveria ser o ex que eu não
recordava bem da feição.
Só o tinha visto em duas ocasiões. Uma na
boate escura e outra à distância.
— O que faz aqui? Já se olhou? Vai pra casa,
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Amanda está em boas mãos! — Pedro falou


furioso.
— Mãos de quem? Desse riquinho meia-boca
aí? — retrucou apontando para mim. — Ela é
minha esposa! Não assinei papel nenhum de
divórcio, então sou o responsável por ela, me
soltem!
Pedro e eu trocamos um olhar cúmplice.
Odiei ouvir aquela merda, mas precisava me
controlar. Pedro soltou Henri — esse era o nome do
canalha — e fiz o mesmo.
— Olha só, se fizer vexame ou qualquer
coisa que me irrite, eu trato de fazer com que você
seja o próximo paciente acidentado a ser atendido
aqui. — Meu cunhado ameaçou, apontando o
indicador para o rosto de Henri.
Eu sabia bem que Pedro tinha plena
capacidade de fazer uma coisa daquelas.
Me contive e permaneci calado, nós três nos
sentamos e aguardamos por algumas horas.
Um médico se aproximou da área de espera.
— Parentes de Amanda Lice de Almeida?
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— Eu. — Pedro, Henri e eu levantamos ao


mesmo tempo.
O médico olhou para nós e se aproximou.
— Bom, o estado de Amanda é estável.
Tivemos que induzir o coma devido ao inchaço
causado pela concussão. Não sabemos exatamente
quando ela acordará. Teremos de aguardar.
Senti meu chão desaparecer, estava
preocupado e frustrado. Levantei e me encarreguei
de bancar qualquer despesa do hospital e perguntar
tudo que podia sobre o estado de Amanda ao
médico. Estava me odiando por não tê-la impedido.
Podia, ao menos, ter me oferecido para levá-la, mas
minha necessidade de deixá-la livre para assimilar e
decidir tudo por si falou mais alto.
Assim foram os oito dias seguintes: espera,
agonia e ansiedade.
Eu soube que Henri ligava todos os dias para
o hospital, perguntando do estado de Amanda.
Pedro e eu a visitávamos sempre que permitido. No
oitavo dia, recebemos a notícia de que Amanda
acordara e corremos para o hospital.

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Meu coração mantinha apenas uma


esperança: Dela voltar para mim saudável e bem.
Saber que não morreu e se recuperava bem era
meio caminho andado.
— Ela está bem, a lesão desinchou e Amanda
reage normalmente. Esteve acordada por pouco
tempo, mas o suficiente para termos certeza de que
ela terá uma sequela. — Doutor Jay explicava a nós
três.
Sim, o maldito do ex insistiu em estar.
— Que tipo de sequela? — perguntei.
— Perda da memória. Quando ela acordou
pela primeira vez, dizia não se lembrar do acidente.
As lesões cerebrais em casos de choques são
ocasionadas pelo golpe e contragolpe do cérebro
com o crânio — explicou o médico. — As fibras
que conectam os neurônios são lesionadas e alteram
o funcionamento mental. São encontrados em casos
de capotagem de carros. Muitas vezes, as lesões
corporais são leves, mas as cerebrais, graves. Isso
acontece justamente pela movimentação da massa
cerebral durante os choques que ocasionam a
concussão. Não sabemos quanto e o que ela
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esquecerá. Pode se esquecer do último dia, da


última semana, mês ou ano... Ou até anos.
Não consegui esconder o choque em meu
rosto com aquela notícia.
Tudo o que eu não precisava, era que ela
simplesmente esquecesse de mim.
Por que o ar ficou tão rarefeito?
Por que meu peito doía?
Eu precisava sentar.
— Então... Ela vai ficar bem, mas terá
esquecido um período do passado? — Henri
perguntou.
— Provavelmente. Teremos que fazer mais
testes com ela assim que acorde, para saber se não
será amnésia retrógrada, que é quando esquece
apenas um período passado, ou amnésia
anterógrada, fazendo-a esquecer tudo de tempos em
tempos. Por exemplo, ela vai viver o dia e amanhã
pode esquecer, daí viverá o amanhã e depois de
amanhã esquecer de novo. Temos que ter certeza de
que isso não acontecerá com ela. Por isso ela deve
ficar um tempo em avaliação conosco, pois isso é
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raríssimo. — O médico disse.


— Ela nunca mais terá as memórias de volta?
Depois que ela acordar, podemos vê-la? — Pedro
perguntou.
— Em casos em que não há morte de
neurônios, a recuperação da memória acontece,
mas quando neurônios morrem... Não. Podem vê-la
agora. Ela está apenas dormindo, mas podem vê-la
um de cada vez.
Eu ainda estava estático, sentindo a dor
daquela notícia batendo forte em meu peito.
Ela poderá se esquecer de nós.
O primeiro a visitá-la naquele dia foi Henri,
pelo grau de parentesco. A atendente pareceu
confusa ao ver o marido e depois o namorado dela
ali, afinal já estava acostumada com as visitas
diárias minhas a Amanda.

HENRI

Aquela era minha chance.


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Se o riquinho babaca pensa que vai ter tudo o


que quer na vida, como sua maldita riqueza, está
enganado. Amanda é minha, e esse acidente está
dando a chance do destino devolvê-la para mim.
Entrei na sala e a vi enfaixada em toda a
cabeça, deitada, dormindo na maca. Ao lado dela,
em uma mesinha, tinha uma sacola transparente
com o telefone e a carteira dela. O hospital não
liberou seus pertences a nenhum parente desde o
dia do acidente. Antes de falar com ela, ainda
desacordada, peguei seu telefone.
— Vou apagar tudo, mensagens, fotos,
vídeos, ligações... Ela pode esquecer dele e voltar
pra mim.
Depois da limpeza, sentei-me ao lado de
Amanda e lamentei.
— Meu amor... Quem sabe a vida não está
nos dando mais uma chance? — Beijei-a na testa e
saí do quarto.
A vida tem dessas coisas, eu recuperaria
minha esposa, por bem ou por mau.

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TONY

Assim que o idiota saiu, Pedro entrou


rapidamente, a beijou na cabeça e disse que estaria
lá todo o tempo para ajudá-la e que a amava
demais.
Isso foi o que ele me disse ao sair, falou que
foi rápido para dar mais tempo na minha vez.
Eu estava tremendo, minha garganta fechada,
com medo do que poderia encarar dali em diante.
Entrei e sentei ao lado dela.
Foi inevitável controlar as emoções então
comecei a chorar, enquanto segurava suas mãos.
— Meu amor, eu te amo tanto, mas não pude
te proteger dessa tragédia. Eu poderia ter me
oferecido pra te levar, mas quis te deixar à vontade,
fui um tolo. Agora você está aqui, podendo ter
esquecido de tudo entre nós... — Tentei suavizar a
respiração. — Como eu te amo... Não me deixa,
por favor...
Sua aparência frágil e semblante sereno não
mostravam reconhecimento algum à minha voz.
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— Não importa o que aconteça, você sempre


voltará para mim e não irá me esquecer, não é isso?
Fechei os olhos, controlando as últimas
lágrimas antes de sair do local. Levantei para ir
embora antes que tudo doesse mais ainda, quando
então senti um aperto em minha mão.
Amanda tinha apertado os dedos nos meus.
— Ai meu Deus, vou chamar o médico. —
Saí correndo até a sala principal e fiz o que devia.
Henri e Pedro levantaram da cadeira ao me
ver.
— O que houve? Ela acordou? — Pedro
perguntou.
— Não, ela apertou meu dedo quando segurei
a mão dela, vem, ela deve acordar logo — contei
animado e notei Henri revirar os olhos.
Aguardamos o médico chegar e o seguimos
até o quarto em que Amanda estava.
Ele verificou os batimentos cardíacos e os
olhos dela, que começavam a abrir. Do outro lado
da maca estávamos Eu, Henri e Pedro, nessa ordem
de proximidade. Amanda abriu os olhos e os correu
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por todo o quarto.


O silêncio só não era completo porque as
batidas do meu coração pareciam altas até para um
surdo.
— O... o que... aconteceu? — Ela proferiu
com a voz ainda rouca e fraca.
— Você sofreu um acidente, como já havia
dito. Se acalme, estamos cuidando de você — o
médico explicou.
Ela semicerrou os olhos e percorreu pelo
ambiente. Respirou fundo, parecendo muito
confusa, e senti minha mão suar, ansioso para seu
reconhecimento.
Ela não me esqueceria, eu tinha fé.
Foi quando viu os três homens ao lado dela
na cama. Olhou cada rosto e, por fim, sorriu.
— Pedro — o chamou. — Irmãozinho.
— Sou eu, maninha, que bom que se lembra
de mim. — Aproximou-se dela e acariciou sua
mão.
Ela olhou para o homem ao lado dele.
— Henri…
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Logo seria eu, logo seria eu.


Pedro deu espaço para que Amanda
visualizasse todos da melhor forma, e se afastou.
— Estou aqui, amor, estou aqui, vai ficar
tudo bem — Henri disse, se aproximando e também
segurando a mão dela.
Cínico.
Ela então olhou para mim, que estava mais
próximo dela. Seus olhos semicerraram-se,
verificando meu rosto.
Lembra, amor. Por favor… Lembra?!
— Você... Eu não... Quem é você? —
perguntou a mim.
Naquele momento meu coração despedaçou.
Como uma lâmina afiada, senti suas palavras
percorrerem meu corpo, rasgando-me em pedaços.
Enfim senti a dor da perda, a dor que meu pai
sentia e quis que o filho evitasse. Eu tinha certeza
de que era aquela dor, mas disfarcei. Ela não tinha
culpa.
Encarei o médico, e o notei abanar a cabeça
em negação. Aquela era uma dica, eu não deveria
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dizer quem era, de fato.


Henri e Pedro me olharam com receio,
transparecendo curiosidade pelo que eu diria.
Segurei a mão dela com cautela e puxei uma boa
dose de ar aos pulmões antes de dizer qualquer
palavra.
Coragem, Tony.
— Eu... sou... — Engoli em seco, as palavras
cortavam. — Eu sou seu chefe, você é minha
melhor funcionária.

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Capítulo 16

AMANDA

Eu não sei como vim parar aqui. Despertei


ouvindo uma voz, alguém dizendo algo sobre amor,
mas não reconheci. Quando abri os olhos, vi uma
confusão à minha frente; um médico, meu irmão,
meu esposo e um homem enorme e misterioso, de
olhos azuis profundos e um olhar triste. Nunca o vi,
mas ele parecia amigável. Ao reconhecer todos,
exceto o último homem, me senti melhor, não
estava com ninguém tão estranho. Meu esposo e
meu irmão estavam ali do meu lado. Passei os dois
dias seguintes fazendo testes de memória. Segundo
o enfermeiro que cuidava de mim, eu sofri um

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acidente de carro e perdi fragmentos dela.


— Qual a última cena que se lembra? Um
momento especial.
Eu forcei um pouco a mente alguns dias após
acordar e veio a imagem da última coisa que eu me
lembrava.
— Estou numa festa, uma festa infantil,
estamos batendo parabéns, eu, Henri e Clara, nossa
filha. No final dos parabéns ela assopra uma vela.
A festa era da Sininho e a vela era de dois anos,
minha filha fez dois aninhos. E depois tudo ficou
preto e eu abri os olhos nesse hospital — contei.
—Quantos anos você tem?
— 26.
— Que dia foi a festa da sua filha? De dois
anos.
— 20 de fevereiro de 2013.
— Amanda, você perdeu dois anos da sua
memória. Estamos em 31 de maio de 2015.
Fiquei espantada, achei que o dano na minha
memória fosse pouco. Eu precisava entender tudo
que aconteceu nesse tempo que perdi. Depois que o
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enfermeiro foi embora, almocei no quarto mesmo, e


de tarde Pedro veio me visitar.
— Boa tarde, cabeçuda! — Ele entrou,
falando animado.
— Cabeçuda?
— Sim, agora esse é seu novo apelido, como
se sente?
— Melhor, novinha em folha. Fiquei sabendo
hoje que perdi dois anos da minha memória, e por
enquanto não tive mais nenhuma perda dos últimos
acontecimentos desde que eu acordei nesse
hospital.
— Então... Você não se lembra de nadinha?
— O olhar do Pedro estava em conflito.
— Apenas do aniversário de dois anos da
Clara pra trás.
Ele suspirou coçando a cabeça, parecia triste.
— O que foi? — perguntei.
— Quer que eu atualize os acontecimentos?
Ou Henri já te atualizou?
— Não, ainda não atualizei, mas vou
atualizar agora. — Henri disse ao entrar de repente.
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— Gente, o que aconteceu pra vocês se


olharem assim? — Percebi um olhar fatal entre os
dois.
— Calma, irmãzinha, deixa seu esposo contar
tudo. — Pedro afirmou e depois virou para Henri.
— Não é, cunhado? Vai contar tudo?
— Claro... Minha princesa. — Henri se
acomodou ao meu lado na cama. — Depois do
aniversário de dois anos da Clara, tudo ficou na
mesma, você cuidava dela e eu trabalhava. Clarinha
cresceu rápido, ela é linda e inteligente. Mas há uns
meses você cismou que queria trabalhar e voltar a
estudar, discutimos e eu tive uma crise de ciúmes.
Você decidiu se separar de mim assim, sem mais
nem menos. Eu sofri demais, você morou um
tempo com Pedro e conseguiu um emprego na Gali
Telecomunicações, mas é claro que vai largar o
emprego e voltar comigo para nossa casa.
Vi Pedro abrir um pouco a boca e franzir o
cenho na direção de Henri. Algo estava errado.
Logo ele me encarou e começou a falar.
— Amanda, escuta, você passou com 80 por
cento de bolsa pra faculdade, recebeu uma proposta
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de diretoria com apenas 4 dias de empresa e foi o


presidente nacional que a ofereceu! Você estava
indo pro aeroporto rumo a Recife pra aceitar a
proposta, quando sofreu o acidente. Você não
precisa voltar a ser dona de casa apenas, você pode
ser mais, tem potencial. Seu emprego é ótimo, você
ganha bem e Tony te trata com todo o respeito que
merece.
Naquele momento, lembrei do homem
presente no dia em que acordei. Ele disse que era
meu chefe.
— Quem é Tony? Meu chefe? O cara que
estava aqui? — perguntei.
— Sim, você lembra de algo sobre ele? — Os
olhos de Pedro pareciam esperançosos.
— Na verdade lembro de quando acordei, ele
disse que eu era sua melhor funcionária.
— Ah... — exprimiu.
— Enfim, peça demissão e volte para casa
comigo. — Henri concluiu.
Eu amava meu marido, de coração, mas não
estava me sentindo bem com essas coisas que ele
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disse. Se eu tenho um bom emprego e posso voltar


a estudar, ele deveria me apoiar, não me prender
dentro de casa. Concluí que devia ser por isso que
eu me separei, ele parecia possessivo demais.
— Henri, quero ficar aqui onde estou, trate de
alugar uma casa por aqui, quero voltar ao trabalho e
à faculdade. É uma oportunidade boa pra mim e
preciso crescer.
Um sorriso se abriu nos lábios de Pedro.
— Babaca, minha irmã é dona do nariz dela,
inútil! — Ele disse a Henri.
— Babaca? Acho bom a gente estar em
concordância, cunhadinho! — Henri ralhou com
ele.
— Gente, chega. Ainda ficarei mais uns dias
aqui, precisam avaliar mais o meu cérebro, mas
Pedro, trate de ver se ainda tenho meu emprego e
Henri, alugue uma casa o mais perto possível, o
quanto antes, e traga Clara para que eu a veja.
— Ok. — Os dois falaram e saíram do
quarto.
Que confusão... Eu perdi dois anos e quando
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começo a saber sobre minha vida, me vejo em uma


discussão.
Quero trabalhar e estudar, quero crescer e
parar de depender de Henri e, pelo visto, eu fiz isso
muito bem antes do acidente. Não vai ser um
marido possessivo que irá me impedir.
— Amanda? — Pedro apareceu na porta
novamente, depois de um tempo.
— Oi, Pedro...
Ele se aproximou de mim e sentou na cadeira
ao meu lado.
— Gostaria de falar com você, já que o idio...
o seu marido já foi.
— Pode falar, sou toda ouvidos.
— Então... Queria falar sobre o Tony, seu
chefe.
Ai meu Deus... ele estava aqui quando
acordei, Henri queria que eu pedisse demissão,
agora Pedro quer falar dele... Será que ele e eu... ai
meu Deus, não. Me sinto uma vadia agora.
— Pode falar, irmãozinho.
— Ele e você criaram um laço muito grande
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de amizade nos 20 dias que trabalharam juntos.


Você é a secretária executiva pessoal dele. Ele
gosta muito mesmo de você...Como amigos. Então
eu queria que, quando voltasse ao trabalho, fosse
legal com ele. Ele te trata bem e te respeita, então...
Só seja legal com ele — pediu.
Se tenho uma característica que nunca mudou
ao longo dos anos, é minha capacidade de captar
mensagens subliminares no ar.
Sentia que Pedro me escondia algo, mas daria
tempo para que me contasse.
— Então eu ainda tenho um emprego? —
respondi radiante, disfarçando a desconfiança. Eu
queria mesmo trabalhar.
— Sim, ele disse que você tem seu emprego
garantido, e que, caso se saia bem, vai te tornar a
vice-diretora dele. — Pedro sorriu.
— Uau! Meu Deus, eu não podia receber
notícia melhor, obrigada, maninho. Você e ele são
amigos, não é?
— Sim, somos, melhores amigos.
— Percebi, você só defende amigos que
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valem a pena. — Lhe presenteei com um sorriso e


ele sorriu de volta.
Depois da visita de Pedro naquele dia, eu
fiquei mais feliz, não sei, senti uma paz no meu
coração. Parece que finalmente as coisas se
ajeitariam para como estavam antes do acidente.
Tenho meu marido de volta, minha filha, meu
emprego e a faculdade, o que mais eu poderia
querer?
Os dias passaram rápido, os médicos me
garantiram que meu problema não era progressivo e
que eu não sofreria nenhuma futura perda de
memória, foram apenas os dois anos anteriores ao
acidente e isso me confortou, pois eu poderia voltar
ao normal com minha vida.
Henri trouxe Clarinha apenas no dia da
minha alta, 3 de junho.
— Princesa! Como você está grande! — Eu
admirei minha filha, que agora estava dois anos
maior do que minha última lembrança dela.
— Mamãe, estava com saudades, vamos
morar juntas de novo? — Ela me abraçou.

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— Sim, filha, vamos! — Eu estava de pé,


minha cabeça já não tinha ataduras, apenas um
pedaço raspado de cabelo, que eu cobri facilmente
com o outro lado.
— Amor, vou deixar ela um pouco aí,
enquanto chamo o médico para te liberar. — Henri
comentou da porta e logo saiu.
Olhei minha filha mais uma vez. Ela estava
tão linda, com um vestido bege que lembrava uma
das princesas da Disney.
— Amei o vestido, filha! Deixa você mais
linda ainda!
— Claro que amou, mãe, você me ajudou a
escolher. Mas foi Tio Tony que comprou.
— Tio Tony?
Aí tinha coisa!
— É, do seu trabalho, ele é muito legal, eu
gosto dele.
— Ah, sim... ele é legal sim — afirmei,
tentando entender qual o nível de amizade que eu
tinha com esse Tony, que deve se chamar Antônio,
Tony é apelido, com certeza. Um dia eu perguntaria
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a ele.
— Vamos? — Henri entrou na sala com o
médico.
— Aqui está sua alta, Amanda. Todo o
diagnóstico e os remédios que deve tomar caso
sinta uma dor de cabeça muito forte, ok? — Doutor
Jay era atencioso o tempo todo comigo.
— Obrigada, doutor.
Saímos do hospital com toda a equipe
acenando para nós. Eles diziam que eu era uma
paciente muito forte e que mesmo que eu tenha
perdido um fragmento da memória, eles não se
surpreenderiam se algum dia eu voltasse a me
lembrar. O que talvez fosse impossível, já que até
então nada acontecera, mas eu tinha esperanças.
Chegamos na nossa nova casa alugada. Henri
foi dirigindo seu carro devagar pelas ruas. Nossa
casa era simples, com dois quartos, um pequeno
quintal, garagem, uma sala grande, cozinha e um
banheiro apenas. Era aconchegante. Henri disse que
foi muito difícil conseguir aquela casa, pois tudo
era muito caro.

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Ao entrarmos, tudo já estava arrumado,


minhas roupas e os móveis, o quarto de Clara, tudo
estava em seu lugar.
— Meu amor, gostou da casa nova? — Henri
me abraçou por trás e me deu um beijo.
— Sim, adorei. — Eu tinha que fazer valer a
pena essa nova chance na vida.
Henri estava me tratando muito bem, até
demais. Parecia que se redimia por alguma coisa
toda vez que fazia algo por mim, eu parecia um
bebê indefeso nos seus braços quando me abraçava,
mas até que estava gostando.
Aquele dia passou voando, eu liguei para a
empresa e me comunicaram que estava tudo certo
para minha volta no dia seguinte. Confirmei local e
horário e me animei de pensar que finalmente
voltaria à ativa. Henri não gostava da ideia, mas ele
me entendia, era um bom esposo.
— Meu amor, hoje eu faltei para te buscar,
mas amanhã vou ter que ficar até tarde no trabalho
para compensar as horas, tudo bem? — Henri
informou quando estávamos deitados, prontos para
dormir.
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— Tudo bem... — Respirei fundo antes de


continuar. — Eu sei que tive alta hoje e não posso
fazer muito esforço, mas só tive ferimentos na
cabeça, meu corpo está normal... Será que
podíamos... Fazer amor? — Eu pensava nisso desde
o dia em que acordei, imagina passar mais de 10
dias sem sexo? Não dá, né? Não sei como fiquei
separada e sem sexo antes de perder a memória,
mas enfim.
— Ah, meu amor, podemos, mas eu estou um
pouco cansado, fica por cima, tudo bem? Deita em
mim que te abraço pra não se esforçar muito. —
Henri murmurou, desanimado.
Nossa, aquilo me quebrou, nem parecia me
desejar, era mais frio que um congelador e me
deixou mal com essa atitude... Mas, não sei porquê,
eu tive a impressão de que podia ser bom, então
aceitei.
Fizemos, na verdade eu fiz e então ele
dormiu.
Pensa num sexo murcho? Foi assim...
Mas eu o amo, ele é meu marido e quem sabe
não fosse melhor na próxima noite?
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TONY

Terceiro copo.
Quarto.
Quinto.
Sexto.
Eu não bebia. Não depois de saber que a
bebida causou a morte da minha mãe. Sempre
evitava beber, eram raras as vezes que cedia.
Mas lá estava eu, com a única coisa alcoólica
que tinha em minha casa: Vinho.
— Ah! Acaba logo! Acaba! — Joguei a taça
longe, fazendo com que se quebrasse em vários
pedacinhos de vidro, na parede.
Por que essa dor enorme não acaba?
Era assim que era amar? Era disso que me
protegi a vida inteira?
Essa era a maldita dor?
Andei pela sala, desolado com as mãos nos
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cabelos de forma desesperada.


Ela não se lembrava de mim.
Simples assim.
Por que a vida tinha de ser tão injusta? Por
que tinha de fazer com que pessoas como eu
sofressem?
Não, eu não me achava o super-homem ou
melhor que ninguém, mas nunca, jamais fiz mal a
alguém na proporção que estava recebendo.
Será que isso tudo foi devido aos corações
que já quebrei?
Será que é uma maldição? Meu pai estava
agorando meu relacionamento?
Não acredito nessas coisas, mas o que mais
poderia definir essa mudança repentina no quadro
da minha história?
Eu e Amanda seríamos felizes. Tinha certeza
disso. Poderíamos namorar aos fins de semana, eu
não me incomodaria com isso. Quero vê-la feliz,
crescendo em todas as áreas da vida sem medo de
ser reprimida.
Mas quando menos esperamos, a vida mostra
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que não é assim que se joga.


Sentei-me no sofá e abracei meus joelhos
enquanto mergulhava nas memórias que tínhamos
juntos.
— Eu ainda as tenho, Amanda. Deve valer de
algo, não? — falei com o além, talvez ele me
ouvisse.
Eu possuo as memórias. E são suficientes
para mim e para ela.
Quem me dera poder revivê-las e mostrar
como nosso amor é maravilhoso e tão… certo.
Lágrimas continuaram jorrando de meus
olhos como uma cachoeira, enquanto meu peito
saltava entre soluços causados pela dor.
Eu era a dor em pessoa.
Eu era a dor por inteiro.
Quando o doutor negou com a cabeça no
momento em que ela perguntou-me quem eu era,
entendi que não podia revelar a verdade, e na hora
que saímos do quarto, eu e Pedro procuramos saber
o porquê.
— Se tudo der certo, ela lembrará das coisas
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no decorrer do tempo. Em breve já poderá lembrar


de tudo, mas caso não lembre… Melhor é evitar
conflitos mentais que podem causar dor e exaustão
nela. Amanda pode não compreender e a realidade
das suas memórias entrarão em colapso.
— Então não posso contar que o maldito do
ex-esposo não vale o pão que come? — Pedro
indagou, com os braços cruzados e cenho franzido.
— Ainda não. Ela se lembra de uma
realidade diferente da que vivia. Vamos aguardar
para que se recorde aos poucos.
— Tudo bem. — Garanti.
Mas não estava tudo bem.
Não podia contar nada pra ela, nem visitá-la
mais. Apenas garanti que as despesas do hospital
fossem pagas por mim até o último dia de
atendimento dela, e fui para casa.
— Tem certeza de que vai ficar bem? —
Pedro tocou meu ombro, quando me virei para ir
embora.
Estávamos na recepção do hospital, poucos
minutos após saber o diagnóstico da Amanda.
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— Não, Pedroca, não ficarei. Mas estou vivo.


Farei o possível para permanecer. — Tentei sorrir.
Seu rosto transparecia compaixão pela minha
situação, mas eu sabia que ele nunca teve ninguém
e jamais entenderia o que é perder quem se ama.
— Vai lá. Tire o seu tempo, irmão.
E foi o que eu fiz, vindo para casa.
Ainda imerso em lembranças, viajei até o dia
em que a vi pela primeira vez, na boate.
Como poderia existir exemplar feminino
mais perfeito que ela?
Lembrei de quando Pedro afirmou em um
dia, que ninguém jamais faria sofrer quem ele ama.
Eu tinha o mesmo sentimento pela sua irmã.
Nunca, jamais a faria sofrer ou aguentaria ver
alguém causando sofrimento a ela.
Mas agora, não me restava mais nada.
Apenas cacos.
E o desejo de que ela se recorde de mim
algum dia, nem que seja apenas para entender como
eu a amo.

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Isso já me faria viver tranquilo.

AMANDA

O dia seguinte amanheceu com um sol lindo


na minha janela. Henri já havia saído e deixado
Clara na escola. Um recado dele no criado-mudo ao
lado da cama dizia que a babá a buscaria e cuidaria
dela até eu voltar do trabalho. Fiquei tranquila por
ele ter pensado em tudo. Era um ótimo pai.
Me arrumei, coloquei meu terninho azul
favorito, meu perfume doce de costume e uma
maquiagem suave. Peguei o ônibus e fui para o
trabalho. Eu já tinha recebido o endereço por
mensagem de Pedro.
Chegando lá, fui recebida com aplausos e
boas vindas, parece que todos gostavam de mim.
Uma mulher simpática veio me abraçar sorrindo.
— Amanda! Quebrei meu resguardo para
suas boas vindas! Vou te mostrar sua nova sala e
tudo que precisa saber sobre o trabalho — disse

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animada.
— Obrigada... Mas... Qual é seu nome? —
perguntei, afinal, eu nunca a vi na vida.
— Bruna. — Ela entristeceu o olhar alegre.
— Esqueci do detalhe da memória, desculpe, mas
somos grandes amigas, venha!
Fiquei feliz ao lado dela, ela me transmitia
algo bom. Ao chegar nas salas ao fim do corredor,
ela mostrou a sala do meu chefe. A minha ficava
exatamente ao lado. Era uma sala ampla com uma
mesa enorme perto da janela, e que janela! Era algo
colossal que ia de ponta a ponta, dava pra ver toda
a cidade dali, sempre quis uma sala com janelão.
— Uau... Que sala linda... E essa janela...
Adorei — falei enquanto entrava e andava pelo
ambiente.
— Essa é sua mesa, decore como quiser, mas
Tony já deixou sua marca aqui também, olha esse
porta-retrato, que lindo. — Bruna pegou um porta-
retrato que tinha um tipo de cartão-postal com uma
pintura do pôr do sol que me deixou profundamente
emocionada.

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Ao me aproximar da imagem, senti algo


ardendo no meu peito quando concentrei minha
mente ali... Sei lá, um aperto estranho.
Não notei quantos segundos haviam se
passado, mas de repente senti minha bochecha
umedecer.
Uma lágrima desceu dos meus olhos.
— Amanda, está tudo bem? — Bruna
perguntou, enxugando a minha lágrima.
— Sim... Eu só... Não sei, me emocionei com
a pintura, eu amo o pôr do sol. — Ainda não
confiava nela pra dizer essas coisas profundas,
parecia tipo um pressentimento.
Ela assentiu, aparentemente desanimada pelo
meu jeito de agir com ela, e saiu da sala, deixando-
me sozinha para absorver tudo aquilo. Me sentei na
cadeira e olhei ao redor por um bom período.
Era tudo novo, não me recordava de
absolutamente nada daquele local, e me sentia
inútil por isso.
Não sei quanto tempo passou, mas uma
pontada estranha no peito, me aflingia estando ali,
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naquele lugar.
Tomei o remédio pra dor que o médico me
orientou, mesmo sendo dor no peito e não na
cabeça.
Os dias a partir daquele, com certeza, seriam
longos.

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Capítulo 17

TONY

Bruna queria contar tudo para Amanda, mas


não podia. Ela me prometeu que não contaria nada.
Desde que Amanda acordou depois do
acidente, sem se lembrar de mim, não voltei para
visitá-la no hospital. Meu coração ficou em
pedaços. Naquele dia não fui trabalhar, não podia,
não conseguia. Dias foram se passando, e ao
imaginar minha vida arruinada por causa do amor
que sentia por Amanda, senti-me amargamente
arrependido de tudo que fiz.
Todos os dias depois do trabalho ia para
minha casa e afundava-me na cama.
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— Eu mereço isso! Mereço. Estou pagando


pelos meus pecados, por ter quebrado muitos
corações na vida — falava para mim mesmo. —
Ah, pai, você torceu por isso, não é? — esbravejei
ao vento.
Alguém deveria levar a culpa, e eu não
aguentava mais saber que ela não retornaria para
mim. Ficava na cama remoendo e revivendo as
lembranças, concentrado para que nunca se
apagassem de mim.
— Os vídeos! — lembrei. — Vou ver os
vídeos.
Levantei-me em um pulo da cama e me sentei
à mesinha do escritório particular que tinha em
casa. Liguei o computador e abri a pasta onde
estava a nossa videoteca. Comecei a assistir na
ordem que filmamos. Primeiro o vídeo de Recife,
Clarinha desfilando com os vestidos, depois o
vídeo em que cantamos no carro com Clara, o
vídeo jogando videogame com a declaração no
final e os beijos intensos, acrescidos da nossa
intimidade e, por fim, o vídeo do restaurante...
Quando o vídeo do restaurante começou, eu
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já estava em prantos. Foi como se as lágrimas que


contive por toda a vida enfim encontrassem sua
libertação depois que Amanda entrou na minha
vida. E emoção foi tanta, mas tanta, ao ouvir mais
uma vez o discurso de como Amanda se apaixonou
por mim, que meu peito não podia suportar tanta
dor.

... Esse lindo e encantador senhor se tornou


meu anjo da guarda, me salvou de um vexame
numa boate, me defendeu dos amigos galinhas, me
salvou de um quase acidente na rua, me contratou
em sua empresa e me levou para resolver um
problema com ele em Recife, que me rendeu uma
proposta de promoção absurda com a qual sempre
sonhei. Acontece que esse senhor, o senhor Antônio
Gali, em poucos dias conseguiu mudar toda a
minha vida pessoal e profissional, apenas faltando
uma pequena área que eu jurei que ninguém jamais
tocaria novamente. Meu coração. Mas hoje,
Antônio, aqui com você, eu tenho certeza de que
você me preenche por completo e posso dizer com
todas as letras nos quatro idiomas que eu falo...

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EU TE AMO.

Enquanto assistia aquele vídeo, entregue em


saudade, resolvi pensar na nossa última ligação. Ela
disse que sempre voltaria para mim e quando falei
que iria atrás dela no inferno, ela respondeu que me
aguardaria.
Decidi que não me entregaria tão fácil,
precisava dela. Então aceitei a ideia de tentar ser
amigo dela de novo, mesmo que tivesse voltado
para o ex e não lembrando de mim. Seria um bom
amigo. Quem sabe um dia, de tanto olhar para meu
rosto, ela não lembrasse de algo?
Os dias se passaram lentamente. Amanda
ainda estava internada, quando Pedro telefonou.
— Fala aí, amigo.
— Oi, Pedro, Amanda está bem?
— Sim, seu amorzinho está bem, o problema
da memória não é progressivo, em breve ela terá
alta. Estou me corroendo pra contar tudo a ela, mas
os médicos aconselharam a não dizer ainda. Pode
deixá-la estressada à toa, pois ela não lembra. Ela

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obrigou o marido canalha a alugar uma casa aqui


perto, disse que vai continuar trabalhando e fará a
faculdade, será que a vaga dela na sua empresa
ainda está de pé?
Foi quando vi uma oportunidade de estar
perto dela e não hesitei.
— Claro. Só peço que não fale o que tivemos
pra ela, por favor, sei que está querendo falar, mas
ela não lembra e quero respeitá-la. Quero ser amigo
dela. Ah, pretendo colocá-la em breve como vice-
diretora, se tudo der certo.
Ainda estava doendo, mas eu precisava ser
forte.
— Tudo bem, então. Obrigado, parceiro!
Torço pra ela lembrar de você.
Nesse dia, estava em minha sala trabalhando
como louco, fazia de tudo para não pensar em
Amanda, mas com a notícia de que ela voltaria para
a empresa, tratei de arrumar uma sala para ela,
grande e digna de uma diretora com a mesma visão
do pôr do sol que a minha tinha, ou seja, coloquei-a
ao meu lado. Liguei para Bruna para avisar do
retorno dela e pedi que ela estivesse presente
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quando isso acontecesse.


No fim daquele dia, abri a gaveta da mesa e
vi o cartão-postal do pôr do sol pintado de Recife.
Decidi colocá-lo num porta-retrato e deixar como
enfeite na mesa de Amanda. Com certeza ela
adoraria.
O grande dia chegou. Amanda voltou para a
empresa e Bruna estava com ela, mostrando tudo e
ensinando novamente as funções do cargo. Eu não
quis sair da minha sala, estava nervoso como um
adolescente, mas não queria ser mal-educado.
Quando estivesse desocupada, falaria com ela.
Estava pensativo, admirando a rua pela
janela, de costas para a minha mesa, quando
alguém entrou na sala lentamente. Aquele perfume
doce invadiu todo o ambiente, era ela.
Antes que eu me virasse, ouvi sua voz
dizendo:
— Com licença, desculpe entrar assim... Eu
queria agradecê-lo, Sr. Gali, pela segunda
oportunidade — proferiu em tom profissional.
Eu absorvia cada palavra como se dependesse

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delas para viver. A amava mais do que imaginava.


Virei-me e a observei de cima a baixo
rapidamente. Abri a boca, mas o som não saía.
Depois de muito esforço, consegui falar.
— Não precisa se incomodar, amo...
Amanda. Eu separei a sala do lado pra você. Caso
precise de ajuda, pode me chamar. Você em breve
será minha vice-diretora, Pedro falou?
— Sério? Eu não esperava que...
— Sério sim — a interrompi. — Você é
capaz de muita coisa. Vai, com certeza, se
readaptar rapidamente.
— Obrigada mais uma vez, Sr. Gali. — Eu
odiava quando ela falava assim comigo, que
saudades de ouvir Antônio ou amor.
— Senhor Gali não, por favor, Tony. Somos
amigos — a corrigi, queria que ela se sentisse
confortável comigo.
— Hum... Eu não me lembro de você, mesmo
sabendo que somos amigos, não sei se me
acostumo a te chamar de Tony... Na verdade eu
quero perguntar algo ao senhor, quer dizer, a você
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— entonou cordialmente e eu só conseguia olhar


aquela boca e se recordar dela na minha.
— Pode perguntar o que quiser — falei, com
receio do que viria.
— Seu nome é Tony mesmo? Não seria um
apelido para Antônio? — O olhar curioso dela me
fez sorrir. Ali estava minha velha Amanda.
— Sim, é apelido de Antônio.
Minha mente, já me pregando peças,
suplicava por meu nome saindo de sua boca.
— Então te chamarei de Antônio. Prefiro,
tudo bem? É um meio termo. — Ela sorriu... E eu
fui possuído por uma euforia descomunal, ao notar
aquele sorriso.
— Claro. — Tentei não comemorar na frente
dela. — Antônio está ótimo.
Meu sorriso de babaca não saía do rosto.
Quando a gente ama, qualquer coisinha é
motivo para risos desnecessários. Já tinha
aprendido.
— Então... É isso, Antônio, vou pra minha
sala. O que precisar, estarei à disposição — disse e
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saiu.
Ah, Amanda... Minha Amanda... Se você
soubesse como nos amávamos, como éramos um
com o outro... Mas preciso me concentrar na
amizade, serei apenas isso pra você... Lembre-se
logo de mim…
Torci ao vê-la sair.
Os médicos do hospital disseram que
Amanda talvez nunca lembrasse daqueles dois anos
perdidos. Teríamos de esperar e acreditar. Estive lá
depois da sua alta, para verificar sobre as cobranças
do hospital. Nada mais justo arcar com elas, uma
vez que seu acidente foi causado rumo a uma
viagem de trabalho.
Indenizei-a também pelo acidente, achei que
deveria. Comprei um carro novo para Pedro, que
não queria aceitar, mas não teve escolha.
Agora, sobre o nosso amor... Eu ainda tinha
um fio de esperança cada vez que lembrava do que
vivemos. Foi tão intenso e verdadeiro, não podia ter
se perdido assim na mente dela, ou podia?
O dia passou voando, Amanda não foi mais

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na minha sala nem eu na dela, queria evitar


constrangimentos. Se fosse lá à toa, ela poderia me
achar um babaca qualquer, e não queria isso.
Então chegou o momento mais maravilhoso
do dia, o pôr do sol. A hora que mais amo, quando
me sinto livre e em paz.
Posicionei-me, olhando para fora da janela,
assistindo aquela cena maravilhosa pela
milionésima vez, sem nunca enjoar. Notei logo
alguém entrando na sala, mas não me virei de
imediato.
Depois de alguns instantes de admiração com
o pôr do sol, uma voz quebrou o silêncio.
— É tão lindo. Digo, esse show de luzes, traz
paz. É revigorante, não acha?
Um arrepio percorreu minha espinha ao ouvir
a suavidade daquela voz. Então virei e vi Amanda
próxima à porta, dentro da sala, admirando a
mesma cena que eu. O pôr do sol. O destino é louco
e tive de virar à imagem anterior e sorrir, pela
coincidência.
— Sim, eu digo para mim mesmo essas

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palavras todos os dias — respondi.


Sabia que aquela cena já tinha acontecido,
queria que Amanda também lembrasse, então ao
ouvi-la falando exatamente as mesmas palavras da
primeira vez, decidi responder também com as
mesmas palavras.
— É estranho. — entonou suave e isso me
fez virar novamente, olhando em seus olhos.
— O que é estranho? — questionei,
esperançoso.
Ela balançou a mão no ar, olhando ao redor.
— Déjà-vu. Acabei de ter um. Sabe, como se
você já tivesse vivido isso? Dizem que são coisas
do subconsciente — afirmou tranquilamente.
— Ou pode ser uma memória voltando? —
sugeri, em dúvida.
Ela me encarou confusa.
— Você acha que... Essas visões repentinas
podem ser memórias? Já vivemos essa cena? —
indagou aparentando estar repleta de curiosidade.
Digo ou não? — Ponderei meus
pensamentos.
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— Acho que talvez possa ser sim, já vivemos


essa cena. — Me aproximei um pouco dela e
abaixei o tom de voz. — Exatamente igual. —
Finalizei olhando em seus olhos, com esperança
dela conseguir lembrar.
— Mas não me lembro, como pode? Minha
memória não me ajuda, não vai voltar. — Balançou
a cabeça, descrente. — Tenho que me atentar a
essas pequenas visões. — Olhou para o teto,
refletindo. — Aconteceu algo hoje cedo também, já
que somos amigos, você podia me ajudar a
entender.
Aquilo já era demais. Ela não lembrava, não
adiantava forçar.
Amanda, não me faça contar sobre nós, por
favor. Não quero destruir sua vida e sua
recuperação dessa maneira. Não posso ser tão
egoísta.
— Fala, se puder ajudar, eu ajudarei. —
Suspirei. — Sente-se.
Ela se sentou e eu também o fiz.
— Você deixou uma foto em um porta-

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retrato na minha mesa, parecia uma pintura do pôr


do sol na praia, certo?
— Sim, é uma pintura do pôr do sol na praia.
— Sorri.
Imediatamente fui invadido pelas lembranças
de nós dois. Notei um curto sorriso nascer nos
lábios dela ao me ver.
— Então, quando eu peguei aquela foto, me
senti como se já tivesse ido lá, senti algo no meu
peito, estranho, sabe? Quando dei por mim, estava
chorando.
Tentei manter a concentração e a neutralidade
ao ouvi-la, mas por essa eu não esperava. Meu fio
de esperança... Algo dentro dela estava voltando
para mim, podia sentir isso.
— E o que você acha que deve ser? —
perguntei.
— Não sei, não me lembro de ter ido à praia
na minha vida, pode ser algum pressentimento, eu
sempre fui um pouco sensitiva.
Lembrei que não deveria falar demais.
— É, pode ser.
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Ela passou as mãos pelas coxas, como se


estivesse um pouco constrangida pelo assunto e
depois se levantou.
— Então é isso... Não deve ser nada de mais.
Bom, já deu minha hora, até amanhã. — Acenou e
saiu da sala.
Fiquei abobado com tudo aquilo. O que a
vida estava fazendo comigo e com ela era algum
tipo de pegadinha? Se for, não estava achando
graça nenhuma.
Quando percebi que a empresa já estava
vazia, coloquei o DVD com os vídeos no
computador. Decidi que os veria todos os dias para
nunca esquecer do que vivemos e sentimos um pelo
outro. Após assistir tudo, o guardei no cofre e fui
pra casa. Tomei um banho e dormi. Aquele dia me
rendeu muitas emoções.

AMANDA

Depois daquele dia de trabalho, fui para casa

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pensando nos acontecimentos do dia, mas logo


espantei o pensamento quando vi Clarinha vindo
em minha direção, correndo sorridente.
— Mamãe! — Ela pulou em meus braços e
me beijou.
Uma babá ruiva e jovem vinha atrás dela com
um sorriso fechado.
— Senhora, aqui está tudo que fizemos hoje.
— Ela entregou um papel em minhas mãos. Parecia
um relatório.
— Obrigada, está liberada... Qual o seu
nome? — perguntei.
— Katerine, mas pode me chamar de Kate.
Sou a nova babá, seu esposo me contratou após o
acidente que houve com a senhora.
— Tudo bem, fique à vontade, Kate, nossa
casa é sua. Até amanhã.
— Tchau, senhora.
Depois que Kate se foi, Clara e eu assistimos
desenho e brincamos um pouco. Logo depois, Clara
adormeceu e logo a coloquei em sua cama. Tomei
um banho e decidi esperar Henri. Eu queria tentar
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mais uma vez, uma noite maravilhosa com meu


marido.
22 h, nada de Henri chegar. 23 h, 00 h...
Desisti e fui dormir, nem jogar Xbox passou pela
minha cabeça.
Estava cansada, um pouco aflita por não ter
lembrado de nada desde o dia em que saí do
hospital e ansiosa para que o dia seguinte me
trouxesse boas coisas.
Durante a madrugada, percebi Henri se
acomodando ao meu lado na cama, mas não falei
nada e dormi novamente.

Um lindo pôr do sol em uma praia. Sinto a


areia nos meus pés, é tranquilizante. O sol já está
quase sumindo e ouço uma risada suave. Me viro e
não vejo o rosto da pessoa que sorri, mas vejo o
seu sorriso, um belo sorriso de canto com os dentes
brancos e brilhantes, uma boca macia e bem
desenhada e um calor forte no meu peito.
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Despertei em um susto.
— Amor, está tudo bem? — Henri abriu os
olhos e me confortou, preocupado.
— Sim, tudo, foi um sonho. Eu não tenho
sonhos desde o acidente, hoje foi o primeiro.
Ele alisou meu rosto e me olhou com ternura.
— Quer falar como foi?
Respirei fundo, talvez ele me ajudasse.
— Eu estava em uma praia vendo o pôr do
sol. Quando olhei pro lado, vi um sorriso, mas não
vi quem era — contei, um pouco assustada.
Henri ficou alguns segundos em silêncio,
antes de falar.
— Não foi nada, amor. — Me abraçou. —
Deve ter sido algum filme ou novela que viu, ou
apenas sua imaginação.
Sua voz transparecia um pouco de temor. Eu
não era boba, ele parecia ter medo do meu sonho.
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Mas… Por quê?

Amanheci e fui trabalhar novamente. Todos


os dias eram iguais. Em casa Henri me tratava bem,
mas não me agradava sexualmente. No trabalho,
Antônio me tratava com respeito e ensinava tudo
que eu precisava para me sair bem, junto com
Bruna. Em duas semanas enfim recebi a promoção
de vice diretora, oficialmente.
— Parabéns, Amanda! — Os funcionários
me parabenizavam na sala de reuniões onde meu
chefe fez o anúncio.
— Obrigada, pessoal, obrigada. — Sorri com
alegria, profundamente grata por mais um passo em
minha carreira.
Nunca achei que poderia ser tão rápido, mas
acredito que esse tipo de coisa acontece.
Raramente, mas ocorre. E, por sorte ou destino, a
afortunada fui eu.
— Amanda, vamos sair para comemorar? —
Antônio aproximou-se e sugeriu. — Os
funcionários, todos — completou, me dando a
entender que fora tudo com as melhores intenções.
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Ele sempre era gentil e cavalheiro, nunca tive


do que reclamar. Ninguém da empresa nunca me
desrespeitou.
— Tudo bem, preciso avisar meu esposo —
concordei.
Ele virou o rosto por uns segundos e depois
voltou a sorrir para mim.
— Tudo bem, vai lá e depois me fala. —
Após dizer, voltou para a sua sala e eu segui para a
minha.
Assim que entrei no meu local de trabalho,
sentei-me à mesa com o peito ardendo de
felicidade. Era algo que precisava compartilhar
com Henri. Então o liguei.
— Amor, está podendo falar? — perguntei
quando ele atendeu.
— Sim, amor, fala.
— Fui promovida, o pessoal da empresa vai
sair pra comemorar hoje. Você vai ficar até tarde
no trabalho de novo ou vem comemorar comigo?
— Promovida? Mas já? Quanto vai receber?
Odiava essa coisa de competição. Já era a
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quinta vez que ele falava em diferenças de salários


entre nós. Mesmo que eu deixe claro que na nossa
casa não há isso, é tudo nosso.
— Depois falamos disso. Vai ou não vai?
— Vou esticar um pouco, mas apareço lá, me
manda o endereço por mensagem.
— Ok, te amo.
— Também.
Pus o telefone no peito e aquela pulga atrás
da orelha ainda não conseguia sair. Porém, mantive
a alegria e euforia com a notícia da promoção e fui
avisar meu chefe que iria.
Entrei na sala de Antônio com um sorriso
radiante.
— Hey! Eu vou pra comemoração! —
cantarolei fazendo uma dancinha animada.
Quando ele me notou, gargalhou da minha
espontaneidade.
— Que bom! Só não dance assim na frente
dos demais funcionários, pode assustar! — zombou
de mim.
Nossa relação apesar de respeitosa, estava
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bastante estreita. Eu gostava muito dele e vira e


mexe descontraíamos com algumas piadas sem
graça alguma.
— Bobo! Estou tão feliz, já fiz a matrícula na
faculdade, agora sou vice-diretora da empresa,
minha filha me dá mais orgulho a cada dia e meu
esposo vai me acompanhar hoje na comemoração!
Me sinto muito feliz! — soltei, alegremente.
O sorriso dele se fechou lentamente. Ele, que
estava no meio da sala, de pé, desviou os olhos,
antes concentrados em mim, focando-os em
qualquer ponto em sua mesa.
— Seu esposo vai? — perguntou sério.
— Sim, claro. Algum problema com ele? —
inquiri, um pouco incomodada.
Não era novidade que Henri odiava meu
emprego e todos que conviviam comigo nele, mas
achei que não era recíproco.
— Não, só... Você sabe que ele não gosta de
mim, né? — justificou, pondo as mãos nos bolsos
frontais da calça.
— É... Sei, mas ele não vai lá pra te ver, vai
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pra me acompanhar. Deixa de ser velho, Tony, por


que não leva uma mulher também? Parece até que
você não vive! — tentei brincar.
Minha sugestão fez com que ele semicerrasse
os olhos na minha direção. Por um momento curto,
mantivemos uma conexão direta e sobrenatural,
algo tão esquisito que causou um alvoroço singular
no meu estômago, acompanhado do descompasso
em meu coração.
O que estava acontecendo?
Quebrei o contato visual, não compreendendo
o motivo de ter dito algo do tipo para ele. Não
parecia certo.
— Não ligo pra mulheres, Amanda. Eu ligo
pra isso aqui, trabalho! — Ele alterou um pouco a
voz, mostrando seriedade.
Ainda assim, tensa pelo que senti, insisti em
tentar descontrair novamente e acabei cometendo
mais uma gafe, mesmo inconsciente daquilo.
— Ui! Desculpa, chefe. Se quiser conversar
sobre isso... Ela não te ama, é isso?
— Não é isso. Amanda, eu não quero falar
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disso com você. Sei que somos amigos, mas... Por


favor, não. — Foi seco.
— Tudo bem... Quando quiser falar, sabe que
sou sua amiga. Quero o seu melhor.
— Ok, nos vemos mais tarde então — me
cortou.
Saí um pouco desapontada da sala e voltei
para a minha.
Ao sentar-me novamente, virei os olhos para
a parede que separava Antônio de mim e senti uma
tristeza estranha no peito. Eu queria ajudar meu
amigo e chefe, mas não sabia como. Apesar da
conexão notória que tive há poucos minutos com
ele, tratei de ignorar. Então meus pensamentos
voaram até o sonho que já se repetia por 14 dias
seguidos.
Aquele sorriso... Não me é estranho.
Refleti e finalmente decidi pesquisar na
Internet sobre distúrbios de memória e sonhos
repetitivos. Após muito procurar, achei um artigo
científico que tinha uma afirmação curiosa.

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Para quem sofreu perda de fragmentos da


memória, há uma pequena possibilidade de ter as
memórias mais marcantes guardadas no
subconsciente. Muitas vezes essas imagens tentam
retornar para a memória do tempo presente em
forma de sonhos ou visões esporádicas. É bom
fazer uma análise médica para que se tenha certeza
de que o sonho ou visão realmente fez parte de uma
memória perdida.

Fechei os olhos depois de ler aquilo e voltei


novamente ao sonho. Um sorriso lindo e cativante,
uma praia e um pôr do sol.
Sorriso.
Praia.
Pôr do sol.
Assim que abri meus olhos, eles foram de
imediato para a foto da pintura que Antônio
colocou em minha mesa.
Em instantes, numa sagacidade comum para
mim, juntei as peças.
Era ele, só podia ser ele.
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Capítulo 18

AMANDA

Não contei a ninguém sobre minhas


suspeitas. Decidi investigar por mim mesma até
descobrir quem estava escondendo algo ou
mentindo para mim. Odiava mentiras, só de pensar
que podia ser lesada sobre os dois anos perdidos da
minha vida, senti um embrulho no estômago. O que
poderia acontecer que me surpreendesse? Por fim,
decidi observar as atitudes de todos ao meu redor,
começando pela comemoração por minha
promoção naquela noite.
Telefonei para a babá avisando que
chegaríamos tarde e dando permissão para que
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dormisse em casa com Clara. A babá se


disponibilizou imediatamente, como sempre fazia,
deixando-me aliviada por tê-la. O dia passou
correndo e quando eram seis horas da tarde, todos
se preparavam para irem juntos à comemoração.
Decidiram ir a um restaurante jantar e depois
finalizar a noite com chave de ouro em uma boate.
Eu, claro, não estava com cabeça para esse
tipo de coisa.
— Ah, gente, não precisa, vamos apenas
jantar e pronto — reclamei.
— Deixa de ser idosa, você agora é vice-
diretora, vamos comemorar com estilo! — disse
Nick, cutucando-me com o ombro no meu.
Nick e eu criamos um laço singelo de
amizade, eu até o aconselhava quando o assunto era
mulheres.
— Não sou idosa, idiota. Apenas tenho
marido e filha, não posso simplesmente curtir uma
boate sem mais nem menos.
— Seu esposo não ia também? — Nosso
chefe entrou no assunto.

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Nós descíamos o elevador com mais dois


funcionários, além de nós três. Bianca, a assessora
administrativa e Pietra, a chefe do RH.
— Vai, mas ele vai chegar um pouco tarde —
respondi, desanimada.
Queria que ele participasse mais das minhas
coisas. Mas eu precisava entender de uma vez por
todas que Henri seria o mesmo de sempre,
fissurado em trabalho.
— Relaxa, Amanda, vamos aproveitar o
momento — Pietra soltou.
— Isso, afinal, hoje é sexta! — Bianca
completou.
Todos demos uma risada leve e então o
elevador se abriu.
— Nos vemos no Konisses, tudo bem pra
vocês? — Antônio perguntou a todos.
Todos concordaram, e eu assenti.
Cada um pegou seu carro. Eu, que ainda não
tinha um, fui com Pietra no dela. Os homens já
estavam no restaurante. Assim que chegamos ao
local, admirei a beleza e requinte do restaurante,
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mas meus pensamentos apenas focavam em como


pagaria uma conta caríssima que provavelmente
teria naquele simples jantar.
Afinal, ainda não tinha nem recebido meu
primeiro salário, e o que tinha de indenização pelo
acidente usamos para adiantar meses do aluguel da
casa.
— Amanda, não chamou Pedro pra
comemorar? — Nick indagou.
Pedro… Depois que saí daquele bendito
hospital mal tenho dado atenção ao meu próprio
irmão. Tomara que ele não se incomode com isso.
— Hum... Não chamei, ele e meu esposo não
tem se entendido muito bem, então preferi deixar
pra lá.
— Seu esposo parece um cara difícil. — Nick
murmurou e depois olhou de rabo de olho para
Tony, que fixava os olhos em qualquer ponto do
cardápio em suas mãos.
Percebi a atitude de Nick e pensei que aquela
olhada poderia significar algo mais do que
simplesmente uma mera olhada.

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— Na verdade ele não é o cara mais amoroso


nem mais gentil do mundo, mas o amo — afirmei,
séria.
Ao ouvir isso, Antônio estremeceu
levemente, fechando as mãos. Eu notei, claro, mas
fingi não ter visto.
— Afinal, é meu esposo. Tenho que amá-lo
até que a morte nos separe — complementei e sorri
no final.
— Ou até que ele arruíne com tudo. — Nick
falou baixinho, mas eu estava atenta a tudo e
escutei.
— O que disse, Nick? — Sentia que ali
estava algo oculto.
Ele balançou a cabeça em negativa, olhando
para os lados.
Debochado!
— Nada, pensei alto. Afinal, os casamentos
geralmente acabam com a morte ou uma decepção
forte. Como sei que é uma mulher decente e digna,
jamais decepcionaria seu esposo... Já ele não posso
garantir, pois não o conheço — tentou corrigir a
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gafe.
— Entendi... — Suspirei e tentei aceitar
aquela explicação. Não devia ser nada de mais. —
Vamos pedir logo, estou com fome!
— Tony, escolheu algo? — Nick chamou a
atenção do amigo.
Ele assentiu, chamou o garçom e fez o
pedido. Estava pensando que eu escolheria, pois
pagaria o jantar, não?
O jantar fluiu tranquilo, entre risadas e
brincadeiras sobre as pessoas da empresa, algumas
imitações bizarras que Nick fez da senhora da
faxina e os absurdos que Pietra escutava
diariamente. Antônio surpreendeu a todos quando
imitou o seu pai, dando ordens em reuniões
importantes.
— O que você está dizendo contribuirá para a
resolução deste problema? Pois então guarde seu
comentário para você — dizia ele com uma voz
mais grossa do que a normal e um olhar superior,
imitando seu pai, que eu ainda não conhecia.
Todos caíram na gargalhada e, apesar

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daquele restaurante ser extremamente requintado,


os donos não se incomodaram com a descontração,
afinal era Antônio Gali um dos ilustres clientes
sentados à mesa.

TONY

Descontrair, fingir que está tudo bem.


Era meu mantra.
Estava insuportável ter que conviver ao lado
dela sem tocá-la ou dizer qualquer coisa que sinto.
E naquele dia, em especial, pareceu que Amanda
estava me provocando com seus questionamentos e
sua forma de falar do marido.
Quanta raiva do canalha eu sentia!
Todos estavam à vontade e sorridentes,
quando a maître se aproximou de nós, exatamente
ao meu lado e de Amanda, que estávamos no fim
da mesa. Eu na cabeceira e ela na lateral.
— Bom revê-los por aqui! Estão
aproveitando bem o jantar? — Ela intercalava o
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olhar entre Amanda e eu, depois olhou a todos.


Foi uma péssima ideia escolher o mesmo
local onde fizemos o último vídeo. O vídeo da
declaração de amor.
— Sim, está tudo uma delícia, não poderia
ficar melhor! — Amanda respondeu sorridente.
— Nós é que agradecemos, senhorita, fico
feliz com a satisfação dos senhores. — Mirou a
todos, que assentiram sorridentes.
Eu apenas torcia para que ela não lembrasse
de Amanda e não comentasse nada.
— Senhora. — Amanda corrigiu
delicadamente a maître, que fez cara de confusão,
enquanto todos nos calamos.
— Não entendi, senhorita. — Ela realmente
parecia confusa.
Abaixei a cabeça com olhar desconcertado e
comecei a mexer na comida.
— Sou casada. Por isso não sou senhorita, e
sim senhora. — Levantou suavemente a mão com a
aliança e sorriu.
Acompanhei tudo com a visão periférica,
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porém ao vê-la levantar a aliança, subi lentamente o


rosto tentando mandar uma mensagem subliminar
para a maître
Ela, porém, correu rapidamente os olhos para
as minhas mãos e, percebendo que eu não tinha
aliança, corou parecendo constrangida. Balbuciou
um “Me desculpe, com licença” e se retirou.
Naquele instante, me arrependi de ter
escolhido aquele restaurante.
Não sei se Amanda notou algo, mas ela
parecia demasiadamente atenta. Um silêncio com
sabor de abismo reinou na mesa, até que foi
quebrado com a chegada de alguém.
— Perdão pela demora, boa noite a todos. —
Henri se aproximou, deu um selinho em Amanda e
se sentou de frente a ela.
— Boa noite — todos, incluindo eu, o
cumprimentamos.
Depois daquele fato, o jantar ficou mais
silencioso, apenas contendo alguns comentários de
Nick para quebrar o gelo e Henri falando sobre o
orgulho de ser esposo de Amanda, esfregando isso

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na minha cara o tempo todo.


Apenas fingi sorrir e adorar o jantar.
Desejava que tudo logo acabasse, e aquela pontada
afiada no meu coração cicatrizasse. Será que terei
de esperar muito para isso?
Quando enfim todos finalizaram, Amanda
puxou sua bolsa.
Notei que ela estava achando que pagaria. Eu
não seria eu se permitisse.
— Ei, não acha que vai pagar, não é? — a
interrompi.
— E não vou? — perguntou.
— Não, a conta será debitada diretamente da
conta da empresa, é um brinde pela sua promoção.
Ouvi um bufo baixo sair da boca do homem
perto de mim, o “marido” dela.
— Então tudo bem. — Ela deu de ombros e
sorriu. — Vamos? — disse a Henri.
— Não... Vamos para a boate, não vamos? —
Pietra lembrou.
Henri olhou fulminante para Amanda como
quem diz “não-me-obrigue-a-isso”.
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— Vão vocês, Henri e eu estamos cansados,


vamos para casa. Qualquer coisa, se mudarmos de
ideia, encontramos vocês lá.
— Ok, estaremos na Drink — Bianca
informou.
— Ok — ela respondeu.
Mais um lugar para me torturar com
lembranças de nós dois. A boate Drink foi onde nos
conhecemos, onde Amanda bebeu até cair e eu a
levei para casa. O local onde tudo começou.
A última coisa que eu desejava era reviver o
início da minha queda.
— Acho que vou para casa também, estou
indisposto — informei, desanimado.
— Nananinanão! Você vai à boate conosco.
Quero meu amigo de volta, chega dessa vida aí —
Nick exclamou, quase enfiando o dedo no meu
rosto.
Nick era sem noção até tentando me animar!
Amanda despediu-se formalmente de todos
nós e se foi com Henri.
— Tudo bem, mas não precisava falar essas
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coisas na frente dela! — o repreendi.


— Por quê? Ela não lembra mesmo! Pra ela
você sempre foi esse adulto sem graça e velho!
Nem parece que há menos de dois meses você não
passava sequer dois dias sem ter uma mulher
diferente na sua cama! — Nick se manifestou,
petulante.
— Acho melhor irmos logo, vocês estão
parecendo dois pirralhos. — Pietra interrompeu e
Bianca concordou com ela.
Aquilo estava mesmo parecendo um debate
sem rumo algum.
— Vamos, podem ir na frente, vou apenas
trocar uma palavrinha com a maître — avisei e
todos se foram.
Tentei me manter firme, pois queria contar
um pouco sobre o que aconteceu comigo para ela.
Não que devesse alguma explicação, mas seria bom
para eventuais momentos futuros.
Levantei e caminhei até ela, que estava em
sua posição habitual, observando a movimentação
do estabelecimento por alto.

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— Olá novamente — falei ao me aproximar.


Meu rosto mantendo a seriedade do assunto.
— Olá — respondeu, ainda um pouco
desconcertada.
— Então... Sobre o episódio que houve na
mesa, queria contar algo... — contei tudo sobre o
acidente, sobre o emprego e sobre a comemoração
da noite.
A funcionária do restaurante ficou estática e
descrente com tudo aquilo. Chegou a sentir dó de
mim. Aquilo só me lembrava o quão miserável eu
estava.
Sinceramente aquele não estava sendo meu
dia.
— Meu Deus, eu lamento tanto! Senhor Gali,
o senhor deve estar sofrendo demais, mil perdões
pelo meu infeliz comentário. — Surpresa, tapou a
boca.
— Não tem do que se desculpar, você não
sabia. Mas está sabendo agora. — Arrisquei um
sorriso falho.
Me despedi dela e fui para o meu carro.
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Antes de dar partida, recostei a cabeça no assento e


suspirei fortemente.
Está mais difícil do que parece fazer tudo
isso, seria mais fácil não vê-la novamente... Nunca
mais.
Em meio àquela reflexão decidi que
precisava dar um basta na solidão que comandava
minha vida. Iria, ou ao menos tentaria, curtir a noite
na boate.

AMANDA

Um tempo depois de sair do restaurante,


chegamos em casa. Clara já dormia e a babá
ressonava em um colchão ao chão no quarto dela.
Decidi que aquela noite seria decisiva. Estava
de saco cheio de sexo baunilha e sem graça.
Ao entrar no meu quarto, após cada um ter
tomado seu banho, Henri e eu começamos a nos
trocar lentamente. Ele colocou uma cueca para
dormir, estava quente, apesar de já ser inverno, e eu
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fiquei nua, me aproximando lentamente com um


olhar sensual e fatal para meu marido, que já estava
recostado na cama.
— O que está fazendo? — ele perguntou.
— Tentando algo diferente. Não diga nada,
apenas obedeça — respondi suavemente,
arriscando uma voz sexy.
— Tudo bem.
Subi na cama e comecei a acariciar o corpo
dele, começando pelos pés, subindo lentamente,
beijando toda a área nua do corpo, passando direto
pela cueca, pois decidi tirá-la por último. Quando
cheguei na boca dele, o beijei ferozmente enquanto
ele retribuía. Eu estava com um fogo por dentro,
precisava ser saciada do modo certo e se não fosse
naquele dia, não sei o que faria!
Quando desci para finalmente tirar sua cueca,
parei.
— O que significa isso? — alternava os olhos
entre o membro flácido e os olhos do meu marido.
— Eu estou com muitos problemas na
cabeça, deve ser por isso que nada aconteceu... —
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Henri tentou se defender, mas aquilo me matou.


Lágrimas jorravam dos meus olhos sem nem
pensar em um motivo aparente. Naquele momento,
comecei a suspeitar de que talvez ele pudesse ter
outra mulher. Não era possível que depois de tudo
o que fiz, nada, simplesmente nada acontecesse!
— Você não me deseja! Eu fiz todo esse
showzinho pra você nem sequer conseguir me
pegar de jeito! — gritei indignada.
— Vai acordar Clara! — rebateu.
— Que se dane! Deixa ela saber que o pai é
um broxa! Quer saber? Vou pra boate!
Decidi de modo repentino. Sei que Henri
odeia quando saio sozinha, então faria exatamente
o que ele odeia.
Me levantei e caminhei até o armário.
Comecei a remexer os vestidos.
Ainda batia o pé, descontroladamente no
piso, quando Henri tentou me abraçar por trás.
— Não, amor, vem, vou me animar, vamos
ter uma noite inesquecível!
A, há! Queridinho, não sou boneca de pano,
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me poupe!
— Não quero! Não ouse me tocar! — alertei,
mas ele continuou tentando me agarrar.
— Amor, não precisa ser radical, nós
transamos quase todo dia! — argumentou.
Agora ele tinha ido longe demais, eu não
queria transar, queria amor, queria o momento, o
interesse.
— Cala a boca e, se tentar me impedir, não
respondo por mim! — retruquei ainda escolhendo o
vestido, quando vi um maravilhoso branco rendado.
Era lindo, perfeito!
— Esse! É perfeito. — Me arrumei, coloquei
o cabelo de lado, passei uma maquiagem marcante
e um perfume doce. Coloquei algumas joias e um
salto enorme nos pés. Só queria caprichar para que
meu marido se arrependesse amargamente pelo que
fez. Ao finalizar, virei para ele, que estava com
cara de bunda, sentado na cama.
— Pronto, estou indo. Não me espere. Me dê
as chaves do carro.
— Na mesa da sala — respondeu
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desanimado, porém conformado que já tinha


perdido aquela batalha.

TONY

Fui para a boate, mas não contive os


pensamentos intensos sobre Amanda e despejei
todo meu sofrimento no bar. Naquele dia decidi
beber, queria sentir o que era ficar bêbado de
verdade pelo menos uma vez, já que quase nunca
bebia.
— Mais uma tequila? — O barman
perguntou, após eu ter ingerido rapidamente a sexta
seguida.
— Só mais... — Solucei. — Mais uma —
pedi.
Mais uma tequila foi a descida para o abismo.
Fui dançar sem saber exatamente o que estava
fazendo e com quem. Dancei com várias mulheres
diferentes, todas elas dispensava quando olhava
atento e via que não era Amanda.

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— Puto, o que foi, você bebeu? — Nick se


aproximou de mim em um dado momento.
— Só um... Pouquinhozinhoinho.
Falava fazendo sinal com os dedos e
fechando os olhos.
— Putz, você está bêbado! — lamentou.
— Quero esquecê-la, Nick! Tenho que virar
homem de novo! — esbravejei com a voz de
bêbado que estava, porém determinado.
— Fica perto de mim, vou arrumar alguma
mulher e trago outra pra você, mas vê se vai até o
fim e não dispensa, tudo bem?
— Ooook! — Fiz sinal com o polegar.
Fiquei em um canto próximo à pista de
dança, enquanto aguardava Nick voltar com alguma
mulher para mim, que irônico! Nessa hora senti
falta de Lucas, ele sim era um cara que jamais
passaria por aquilo. Naquele momento ele devia
estar em uma viagem quente com várias mulheres
ao redor.
— Que inveja, Lucas, que inveja! — gritei
para mim mesmo.
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— Inveja de quem? — A imagem de um anjo


reluzente, maravilhoso, surgiu na minha frente.
Céus, era a mulher mais linda e perfeita que
já vi.
Deveria ser alguma alucinação, com certeza.
— Você é re-real? — Gaguejei e toquei o
nariz dela com o indicador.
— Putz! Antônio, você está bêbado! — Ela
contorceu o rosto e afastou-se um pouco de mim ao
perceber meu bafo de bebida.
— Isso pareceu bem real, hein? Você é uma
anjinha muito ousada! — afirmei lentamente,
encurvando o corpo na direção dela e cambaleando
ao final.
— Opa! Segura! Vem, vem comigo. — Ela
me estabilizou e me posicionou ao seu lado,
apoiando o meu braço nos ombros dela.
— Eu quero dançar! Ei, garota! Me deixa
curtir a noite! Vou falar pro meu amigo que você é
uma moça má! — Tentei debater com o anjo, mas
ela me levava até a saída da boate.
De repente, ela parou e virou para mim
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novamente. Ainda não a enxergava bem, pela parca


luz, mas parecia muito com minha controladora.
— Quer dançar? Então tá, vamos dançar
apenas uma música e depois você vai pra casa. Vai
acabar sendo expulso ou caindo no chão de tão
bêbado — ralhou comigo.
Soltei uma risada involuntária.
— Vai dançar comigo, garota? Anjos sabem
dançar? — Ainda um pouco tonto, perguntei
encarando-a.
— Sim, anjos dançam, agora vamos lá na
pista e depois, casa! — Soou autoritária.
Okay, meu dia seria salvo por um anjinho
ousado e iluminado. Então eu estava bem.

AMANDA

Meu Deus... O que eu estou fazendo? Ele não


diz coisa com coisa!
Quando cheguei na boate, ele foi a primeira
pessoa que enxerguei. O cabelo solto e a altura não
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me permitiam ver mais ninguém. Me aproximei


tentando apenas interagir, estar perto de alguém
conhecido, mas tive a surpresa ao vê-lo pra lá de
bêbado.
Enquanto andávamos até a pista de dança, ele
cantarolava as músicas errando quase todas, quando
repentinamente disse algo que chamou a minha
atenção.
— Alguém já te disse que você está sendo
muito controladora? Me lembra muito minha
namorada. — Soluçou. — Namorada não, ex-
namorada agora — dizia, levantando o indicador no
ar.
Eu sabia que ele não era fechadão à toa! Algo
tem nisso, e eu vou descobrir!
— Então você tinha uma namorada, Antônio?
— o indaguei quando chegamos à pista de dança.
Assim que eles começamos a dançar,
começou a tocar uma música mais lenta, com uma
letra romântica.
Ele levou sua mão à minha cintura e eu
coloquei as minhas no pescoço dele, atenta para

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que ele não caísse. Então ele fechou os olhos e se


deixou levar pela música, cambaleando às vezes.
— Apenas minha ex-namorada me chamava
de Antônio... E minha falecida mãe. — Abaixou até
meu ouvido e sussurrou. Aquele sussurro me fez
arrepiar.
— E agora eu — respondi ao pé do ouvido
dele. Ele permaneceu com a cabeça apoiada no meu
ombro, como se estivesse quase sem forças.
— E agora você, o anjo que apareceu na
minha noite — murmurou lentamente. — E ainda
mais com o cheiro dela.
Meu coração começou a bater forte, demais
até. Então um calor estranho subiu no meu
estômago, revirando-o. O que estava acontecendo?
Pensei que seria melhor desviar daquele clima
envolvente.
— Eu gostei dessa música — falei para tentar
mudar o assunto. Tentar.
— Ela também amava — respondeu ainda de
olhos fechados, encurvado, apoiando o queixo no
ombro dela.

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— Você a amava muito? — ousei perguntar.


Algo dentro de mim me dizia que aquilo
estava muito estranho, que eu precisava saber mais,
ao mesmo tempo de que poderia me surpreender
com as respostas.
Ele demorou um pouco para responder. Após
um período de tempo, o escutei fungar. Ele estava
chorando?
Ah, meu Deus, ele está chorando! Concluí ao
afastá-lo e olhá-lo nos olhos.
Uma pontada de dor tomou meu peito, dando
vontade de chorar com ele, mas não o fiz. Apenas
decidi que aquela era a hora de levá-lo para casa,
quando, de repente, Nick se aproximou. Até então
eu não o tinha visto, então acenei para que ele fosse
embora e balbuciei um “deixe comigo”.
Estava sentindo muita pena dele, achei que
indo até a boate todos da empresa poderiam
aproveitar, mas ao ver meu chefe tão vulnerável,
não resisti e decidi cuidar dele. Algo dentro de mim
ordenava aquilo.
— Vamos, garotão, já para casa. Onde estão

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suas chaves? — O apoiei em meu ombro, como


antes, e caminhamos para fora da boate.
Ele tirou a chave do bolso e apertou o botão
num click. Um Dodge preto reagiu ao comando,
fazendo com que eu soubesse que aquele era o
carro. Coloquei-o no banco do carona, peguei as
chaves e fui para o banco do motorista.
Sabe quando a gente não tem certeza do que
está fazendo, mas sente que deve?
Eu sentia isso.
Ao dar partida, olhei para ele, com as
lágrimas secas no rosto e os olhos fechados.
— Eu ainda a amo. A amarei por toda a
minha vida — falou baixo, quase num sussurro.
Absorvi aquela informação, e algo mudou
dentro de mim. Senti vontade de abraçá-lo, dar
carinho a ele, porém, graças aos céus, ele fechou os
olhos e pareceu cochilar.
Você é casada, Amanda, esse homem não
devia mexer com você desse jeito, ainda mais
depois de descobrir que ele ama outra mulher. Isso
é falta de sexo bom, deve ser, está te deixando
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sensível demais!
Era o que minha mente julgava enquanto eu
dirigia o carro dele depois de vê-lo tão vulnerável.
— Me fala onde fica sua casa, pelo menos
consegue me dar essa informação? — perguntei,
acordando-o.
Ele abriu os olhos lentamente e respondeu
com a voz embargada.
De imediato liguei o GPS do carro e o levei
até seu condomínio. Era uma mansão enorme em
um condomínio chique. Assim que aproximei-me
do portão, ele imediatamente se abriu. O segurança
que ficava na cabine acenou quando o encarei.
Naquele momento tudo ficou confuso. Não era para
ele me parar? Ele nem me conhecia!
Estacionei em frente à casa dele, como me
indicou e, ao desligar o carro, tive outro déjà-vu.
Droga, provavelmente eu já estive aqui.
Estou ficando com medo do que posso descobrir.
Antônio ainda parecia lento, mas já estava
um pouco acordado. Saí do carro, dei a volta, abri a
porta dele e o sacudi. Ele voltou a si e ao me olhar,
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pareceu assustado, como se tivesse pensando


finalmente com clareza. Não deve ter enxergado
meu rosto, pois a luz do poste atrás me ofuscava,
mas levantou lentamente do assento e esfregou os
olhos. Deu um salto para trás ao me ver.
— Am-Am-Amanda? — Me analisou da
cabeça aos pés.
— Sim, sou eu. Parece que parou de achar
que sou algum tipo de anjo. Você estava bêbado
demais na boate, resolvi te trazer para casa. Sei lá,
acho que foi meu instinto materno falando mais
alto — justifiquei-me dando de ombros, com os
braços cruzados.
Estava começando a ficar encabulada, ele me
olhava de um modo tão intenso, como nunca olhou
antes.
Sua mão foi até a cabeça, ele coçou a nuca e,
parecendo um pouco desconcertado, estendeu a
outra mão na direção da sua casa.
— Quer... Quer entrar? Já me sinto um pouco
melhor, mas... Um pouco enjoado. Quer comer ou
beber algo? —perguntou parecendo medir palavras.
Estava nervoso, era nítido.
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Mas… Era só eu ali. Não tinha motivo para


nervosismos.
— Tudo bem, eu depois devo ir pra casa
depois, não quero chegar muito tarde — avisei.
Ele assentiu e entrou, abriu a porta para mim
como um cavalheiro e seguiu atrás. Indicou a
cozinha e a sala, e pediu que eu o esperasse no sofá
enquanto ele pegava algo na cozinha.
Aguardei quieta, sentada no sofá, enquanto
ele tomava um remédio para ressaca e bebia algo
para neutralizar a dor de cabeça. Meus
pensamentos atordoados, pois temia que as visões,
sonhos, dejà-vus fossem memórias.
E temia mais ainda que a mulher da história
de Antônio fosse eu.
Mas precisava averiguar mais.
Corri os olhos pela sala, precisava descontrair
com algo.
— Então você tem um Xbox? — gritei para
que ele ouvisse.
— Quer jogar? — ele respondeu.
— Hum... Posso? — realmente gostava disso.
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— Pode, escolhe o jogo que já, já estarei aí.


Em instantes ele vinha com alguns
sanduíches em pratos, me servindo.

TONY

Preparei alguns sanduíches enquanto


desanuviava minha mente.
Amanda estava na minha casa novamente,
com o vestido que a presenteei, sem nem saber
como nos amávamos há um mês atrás.
Assim que voltei para a sala, tentei uma
conversa amigável. Aquela situação estava ficando
estranha demais para meu gosto.
Me sentei próximo dela, no sofá e a servi.
— Não sabia que jogava — menti.
Peguei o sanduíche e o ingeri.
— Na verdade nunca gostei, mas meu esposo
tem um desse. Desde que começou a demorar a
chegar em casa por conta das horas extras, eu
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ocupei meu tempo aprendendo a jogar... E, não


quero me gabar, mas sou muito boa — contou,
sorridente.
— Acredito nisso. — Liguei o jogo e a deixei
à vontade. — Pode jogar.
— Não quer jogar também?
— Não, quero ver se você é boa mesmo —
menti mais uma vez, queria apenas admirá-la.
— Ok. — Ela começou a jogar, intercalando
as fases com o sanduíche.
Aquilo parecia mais uma miragem. Era uma
sacada muito sagaz do destino fazer com que
Amanda me “socorresse” justamente como fiz com
ela assim que nos conhecemos.
Ri mentalmente dessa ironia, mas não contive
a curiosidade em perguntar algo que já estava me
incomodando. Eu não sabia se Henri a tratava bem,
e aquilo me corroía por dentro.
— Seu esposo ainda chega tarde do trabalho?
— perguntei em um momento aleatório, realmente
queria saber.
— Sim, mas hoje e ontem ele chegou cedo,
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estava fazendo hora extra pelos dias que foi me


visitar no hospital.
Sei... Cara de pau, ele devia ter mudado,
aproveitado sua segunda chance. Aquilo me deixou
furioso.
— Ah, sim — disse apenas.
— E você, quando namorava, via sua
namorada sempre?
Sua pergunta me assustou.
Mas… Como?
— Como sabe que eu namorei? — questionei
com os olhos arregalados ao lado dela.
— Você estava falando muito dela na boate,
até chorou — respondeu, ainda fitada no jogo.
Maldição.
Como escaparia daquele questionário?
Amanda é esperta demais...
— Meu Deus... Eu chorei? Que... droga! O
que as pessoas vão pensar de mim? — Ri.
Não era muito resistente para bebidas e não
me lembrava muito do que disse na boate.

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— Foi fofo, na verdade, dá pra ver que você a


amava muito. O que houve com ela? Desculpa
perguntar. Somos amigos, certo? — Amanda, que
naquele momento mais parecia uma investigadora
do FBI, tentava sondar a história.
Mas de mim não tiraria muitas coisas,
querida Amanda. Não é assim que desejo que saiba
de nós.
— Sim, somos amigos, mas acho que já tinha
dito que não gosto de falar dela — rebati, sério.
Ela mantinha-se concentrada na tevê, porém
atenta demais à nossa conversa.
— Que pena. Porque eu realmente queria
saber sobre ela. Além do cheiro e do fato de te
chamar da mesma forma como te chamo — disse
suavemente.
Merda!
Que mico maior eu posso ter cometido?
Estou com receio do que posso ouvir.
— O que mais eu falei enquanto estava
bêbado? — Não contive a apreensão nas palavras.
— Que eu cheiro como ela e quando te
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chamei de Antônio, você disse que apenas ela e sua


mãe o chamavam assim... Ah, tocou uma música
que eu gostei muito na boate e você também disse
que ela gostava.
— Love me like you do — proferimos em
uníssono.
Enchi o peito de ar e soltei lentamente, não
tinha como negar o fogo que sentia ao vê-la, ao
estar ao lado dela, ao ouvi-la. Queria tanto que ela
lembrasse… Não que descobrisse, mas que
lembrasse. Amanda pausou o jogo e virou-se na
minha direção.
— Antônio, era eu? — ela perguntou, séria.
Sua feição curiosa e determinada me chocou,
os olhos castanhos profundos eram indagadores. Eu
não sabia o que dizer, estava sofrendo e sabia o que
aquela conversa podia acarretar em meu peito: dor,
mais dor e mais dor.

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Capítulo 19

TONY

Sabe quando a gente nota que há algo


regendo o universo e que aquele momento exato foi
arquitetado?
Eu sentia como se tudo fosse uma grande
construção e a pergunta da Amanda, chave para o
encaixe crucial daquela obra.
Ponderei meus pensamentos por tempo
demais, até que ela pigarreou, tirando-me de
devaneios aleatórios. Não, eu não poderia ser tão
egoísta.
Ela não lembra, contar não mudaria nada.
— Amanda, eu... Desculpe, não quero falar
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dela.
Acabei sendo um pouco rude, dando cabo ao
assunto, fazendo-a temer ao arregalar os olhos pelo
meu tom de voz. Ela abaixou a cabeça, nitidamente
envergonhada.
— Desculpe a mim, estava sendo intrometida
e tudo mais... É que... Odeio mentiras e sinto que
estão escondendo algo de mim. Quando eu o
conheci, no hospital...
— O quê? — a interrompi. Será que ela
sentiu algo?
Tudo era uma grande loucura, mas não podia
ficar ali sem nem saber se ela lembrou ou ao menos
cogitou algo entre nós.
— Você estava sério, não me lembrava de
você e depois, quando comecei a trabalhar contigo,
ainda não lembrava e sempre o via sério... Ou,
quando sorria, eram gargalhadas abertas.
— O que tem isso tudo? Aonde quer chegar,
Amanda? — perguntei, curioso.
— Eu... — ela suspirou. — Vou contar. Na
noite em que entrei na minha sala pela primeira vez
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e vi aquela foto do pôr do sol e... Depois, no


mesmo dia, quando assistimos o pôr do sol na sua
sala e eu tive aquele déjà-vu... Eu tive um sonho.
— E... Como foi esse sonho? — continuei a
indagar, olhando sério nos olhos dela.
Ela tornou a falar, gesticulando e olhando ao
redor, como se voltasse ao sonho.
— Eu estava na praia, vendo o sol se pondo,
sentada em algum lugar com os pés na areia, e
então ouvi uma voz. Quando virei, não vi o rosto,
mas vi o sorriso, um sorriso de alguém que eu não
conhecia e nunca tinha visto. Como eu pude sonhar
com algo que nunca vi?
Aquilo me deixou nervoso, passei as mãos
por meus cabelos longos e olhei para tudo ao redor
da sala, menos para Amanda.
— Então... Eu pesquisei e descobri que,
quando as memórias são muito marcantes e a gente
passa muito tempo pensando nelas, elas ficam no
subconsciente e mesmo que acontecesse algo como
o que aconteceu comigo, algumas dessas
lembranças que o subconsciente guarda podem
aparecer como sonhos ou visões — ela concluiu.
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Meu peito ardia… A ansiedade corroendo


meus ossos.
— E então? — finalmente a olhei.
— Então achei que você fosse o dono do
sorriso. Mas é loucura, não é? Afinal, somos
amigos e já éramos antes, deve ser isso — Amanda
finalizou.
Ah, Amanda... Como eu queria contar... Mas
jurei não atrapalhar sua nova vida, eu te amo tanto,
mas não posso fazer isso. Você não se lembra e não
me ama, se afastaria de mim se eu contasse tudo.
— Sim, deve ser. Fica tranquila, não foi nada
disso que me contou. Só está se lembrando de mim,
pois me viu muitas vezes e sou a pessoa mais
próxima a você que não lembrou assim que
acordou. É normal associar essas visões a mim — a
tranquilizei.
Por dentro, permanecia em cacos.
— É, deve ser. Fui idiota... Vou pra casa, já é
tarde.
— Eu te levo, me sinto melhor já.
— Tem certeza?
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— Sim, te levo.
A levei até a boate para buscar o carro de
Henri e depois a segui até sua casa para garantir sua
segurança.
Voltei para minha casa frustrado. Não
aguentava mais tudo aquilo, estava deixando meu
interior em pedaços ter Amanda tão perto e não
poder acariciá-la ou beijá-la, nem dizer que a
amava. Jurei a mim mesmo e fiz Pedro jurar que
não contaria nada sobre nós a ela.
Assim que cheguei em casa, deitei em minha
cama e logo adormeci. Talvez nos sonhos as coisas
pudessem ser diferentes.

AMANDA

Aquela noite foi bem confusa. Minha mente


estava em conflito com as informações que me
davam e as coisas que eu sonhava ou imaginava.
Sempre fui uma pessoa inteligente, apesar de achar
que algumas outras pessoas têm o poder de me

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manipular. Ultimamente tenho notado como estou


sendo manejada semelhante a uma boneca de pano.
Vivendo tudo o que me disseram para viver.
Entrei em casa ainda um pouco pensativa
sobre aquela noite. Eram coincidências demais.
Mas como estava muito cansada, decidi dormir
logo e voltar a pensar nisso no outro dia.

Um restaurante chique, com muitas pessoas


ao redor, uma mesa onde estávamos apenas eu e
alguém de frente para mim. Uma câmera. Eu
estava falando algo para a câmera... No fim de
tudo, o sorriso, aquele mesmo sorriso.

Acordei em um susto, percebi que já era


tarde, 10 da manhã, e meu esposo não estava na
cama.
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Me levantei calmamente e caminhei para o


banheiro. Lavei o rosto, escovei os dentes e me
dirigi à cozinha.
— Mamãe! Bom dia! Vamos brincar hoje, é
sábado! — Clara correu para meu colo ao me ver
entrar na cozinha.
— Bom dia, filha. Vamos sim. Cadê seu pai?
Ela apontou um dedinho para o quintal.
— Lá fora, ele está falando no telefone com
alguém.
— Tudo bem, vamos lanchar, daqui a pouco
ele volta.
Comemos fartamente naquela manhã e fomos
para o sofá assistir desenhos. Henri entrou na sala e
nos viu.
— Bom dia, meus amores! — Ele deu um
beijo na testa de Clara e depois um selinho em
mim.
— Bom dia, vamos levar Clara no parquinho
hoje? — perguntei.
Ele coçou a nuca, pensativo.
— Só se for rápido, hoje vou sair com meus
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amigos à noite. — Me encarou com uma


sobrancelha desafiadora arqueada.
— Ah, é? E para onde querem ir? Posso
saber? — indaguei, mas não sentia nem um pingo
de ciúme.
— Não pode não. Você curtiu ontem, minha
vez hoje.
Infantilidade reina nesse senhor!
Apenas dei de ombros e voltei a fitar a TV.
— Tudo bem, depois do almoço então vamos
pro parquinho e em seguida você nos deixa em casa
e vai sair com seus amigos — ironizei.
— Ótimo.
Nossa família estava longe de viver em
harmonia, Henri estava mudando a cada dia que
passava, tornando-se mais distante e arrogante. Mas
quando eu ameaçava afastar-me, ele pirava e fazia
de tudo para me agradar. Era um mimo
momentâneo, mas, ainda assim, eu não queria
desistir deles, pensava antes de tudo em Clara e em
como sua vida podia ser melhor tendo os pais
unidos.
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Depois do almoço fomos para o parque.


Brinquei com minha filha, enquanto Henri nos
observava cautelosamente e às vezes atendia
telefonemas. Não desconfiava mais dele, na
realidade confiava até demais. Pensava que os
problemas que tínhamos poderiam ser devido a
estresses, porque mal ou bem, ele nunca me
rejeitava. Sabia que ele tinha defeitos, mas trair
minha confiança com outra mulher, já era demais.
Achava que o problema dele poderia ser qualquer
coisa, menos isso.
Mas sabe quando nosso sexto sentido apita?
Eu teimava em acreditar que não tinha nada.
Que a cena do dia anterior não foi influenciada por
ter outra mulher no meio, mas a curiosidade em
saber sobre o que ele falava, gritou em mim.
Me aproximei lentamente dele por trás, que
falava eufórico ao telefone, e acabei ouvindo uma
parte da conversa.
— Em breve, espera ela vacilar que eu chuto
ela fora, dessa vez quem vai sair por cima serei eu!
— Com quem fala, Henri? — O interrompi.

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Sobre o quê ele falava?


Ele desligou e se aproximou de mim.
— Ninguém importante, meu amor, é do
trabalho. Querem me derrubar, mas sabe como eu
sempre consigo me dar bem, não sabe? — Ele
alisou meus braços enquanto me envolvia em um
abraço.
— Sei... Vamos pra casa? — Não acreditei
muito, mas também não quis saber mais.
Minha confiança nele estava oscilante.
Depois que Henri nos deixou em casa e se
foi, dei um banho em Clarinha, brincamos um
pouco mais, lanchamos e assistimos filmes.
De vez em quando os meus pensamentos
voavam até o sonho que tive aquela noite. Depois
de sonhar com o sorriso e o pôr do sol todos os
dias, finalmente o sonho variou. Não sabia como
podia acontecer tudo aquilo, ainda mais com o
mesmo sorriso nos dois sonhos, mas queria muito
saber.
Então, quando não lembrava do sonho,
pensava no meu chefe, em como ele é bonito, forte
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e em como devia estar sofrendo pela sua amada.


Ah meu Deus, Amanda... não pensa nele,
você é CASADA!
Notei naquela noite, que meu coração
palpitava quando pensava nele, ele estava tão
indefeso no dia anterior, tão sensível, tão...
Absurdamente admirável e lindo.
Decidi afastar os pensamentos de Antônio
quando percebi que minha filha dormira em meu
colo no sofá. Peguei-a nos braços e coloquei em
seu quarto. Fui para meu próprio quarto e deitei na
cama.
Minha mente estava cansada e a cabeça
começou a doer. Imediatamente tomei o remédio
que foi receitado e voltei a deitar, até que dormi.

Estou em um banheiro, numa banheira, nua.


Olho ao redor e vejo espumas, a banheira é grande
e requintada, sinto a água no meu corpo. Uma
espuma atinge meu rosto; quando limpo, olho para
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frente e o vejo, também na banheira, nu, coberto de


espuma e gargalhando para mim. Não vejo seus
olhos, mas seu corpo e seu sorriso me invadem,
sinto uma alegria absurda preencher meu peito. Eu
estou feliz... Com ele.

Acordei novamente assustada, como nos dias


anteriores, mas daquela vez… Eu chorava.
— Eu... Estava feliz. Não pode ser... Eu tinha
alguém e esse alguém não era Henri. — falei
baixinho e olhei para o lado, percebendo que Henri
ainda não chegara. — Henri, vou esperar. Ele terá
que me contar.
Vesti um robe por cima da camisola e saí do
nosso quarto com uma sensação ruim pairando por
meus pensamentos. Clara dormia serenamente em
seu dormitório e eu não conseguia me concentrar
em fazer o mesmo. Me preocupava com meu
marido e com o que podia descobrir.
Depois de tanto andar em círculos pela sala
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com os braços cruzados na altura do peito e


pensamentos a todo vapor, olhei as horas, eram 2
da manhã. Fui para o sofá da sala e comecei a fazer
o que fazia há anos, quando essa era minha rotina:
Jogar Xbox aguardando Henri chegar em casa.
Ele chegou 40 minutos depois. Desliguei a
tevê com pressa e andei até a porta da frente,
ouvindo a chave na tranca.
— Henri? — indaguei ao vê-lo entrar.
Ele não respondeu, entrou apoiando nos
móveis, cambaleando. Fechei a porta e o segui.
— Henri, você está bêbado? — Me
aproximei e tentei estabilizá-lo.
Mas quando o toquei, tive uma reação sua
que não esperava.
— Sai! Eu estou bem! Está tudo bem! —
Escapou de meu toque.
— Vem, senta aqui, vou fazer algo pra você.
— O puxei para o sofá.
Meu coração começou a palpitar. Nunca o
tinha visto naquele estado e algo me dizia que havia
coisas por trás de toda aquela cena.
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— Não quero nada! Eu não quero nada de


você, você arruinou minha vida! — Henri gritou e
me empurrou para o sofá.
Meu corpo caiu em choque no móvel macio e
abanei a cabeça para clarear meus pensamentos.
Aquele não era meu marido.
Ao menos não o que eu recordava ser.
— Não sei do que está falando, me deixa
cuidar de você! — insisti, levantando e andando na
direção dele, que já estava seguindo rumo ao
corredor dos quartos.
O puxei pelo braço, trazendo seu corpo de
encontro ao meu. Chochamo-nos um com o outro e
notei seus olhos, banhados de lágrimas e
vermelhos, darem lugar a uma ira que jamais havia
visto em toda minha vida.
Ele me empurrou, fazendo com que eu
cambaleasse para trás.
— Ela não me quer mais por sua causa!
Vadia! Louca! Fique com suas lembranças idiotas!
Volta pro galãzinho e me deixa! — e proferindo
essas palavras, estapeou-me gerando uma dor
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desconhecida para mim.


A ardência do tapa me fez recuar e acariciar
meu próprio rosto. Eu não entendia, não sabia de
quem ele estava falando mas meus olhos estavam
em prantos e meu semblante, em choque. O tapa
doeu, mas minha cabeça latejava mais do que
nunca pela agressão. Não podia acreditar que
aquele homem era meu marido, o homem que me
fazia juras de amor.
— Eu... Te odeio, Henri... Você não devia ter
feito isso comigo!
Ainda tive a coragem de encará-lo, mesmo
com o rosto dolorido e lágrimas desenfreadas
banhando minha face. Nunca fiz nada para merecer
a forma como me tratou naquele dia, e mesmo que
fizesse, nada justifica a violência que ele estava me
fazendo passar em uma simples noite por motivos
que nem ao certo eu sabia.
— Se chegar perto, farei mais! Eu perdi! Que
se dane! Perdi de novo, a perdi e perdi minha vida!
— Henri falou chorando, erguendo os braços
enquanto gesticulava sem parar.
Após ter dito isto, entrou no nosso quarto e
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meus batimentos puderam enfim ser audíveis. Eu


estava tremendo, doendo, chorando.
Corri desesperadamente para o quarto de
Clara e me tranquei lá. Levei meu celular e fiquei
ali, tremendo de medo e chorando a noite inteira
sentada com as costas na porta, sem conseguir
dormir até o amanhecer.
Meu rosto estava pálido, exceto na área em
que Henri bateu, onde permanecia inchado e muito
vermelho.
Encarei-me no espelho do banheiro às 8 h da
manhã. Clara ainda dormia. Henri já não estava
mais em casa, mas não sabia se comemorava ou me
preocupava. Para onde ele teria ido, eu não fazia
ideia, mas aquele dia, com certeza, deu muitas
respostas a mim sem nem ao menos perguntar.
— Pedro? Pedro! — Minha primeira reação
foi ligar para meu irmão.
— Oi, maninha, o que houve? Sua voz está
trêmula. Está chorando? — respondeu preocupado,
como o superprotetor que era.
Enxuguei o rosto, com ódio e tristeza

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retratados nas lágrimas que escorriam dos meus


olhos.
— Me busca agora! Busque a mim e à Clara
aqui em casa, agora, depois te conto tudo — pedi.
— Ok, vou agora — respondeu e desligou.
Em 20 minutos, Pedro chegou e eu já tinha
acordado Clara e a vestido. Eu, no entanto,
coloquei apenas um short e uma blusinha para
agilizar. Entramos no carro do meu irmão. Ele
percebeu a vermelhidão no meu rosto de imediato,
mas o encarei seriamente, queria falar daquilo
longe de Clara. O caminho até a casa de Pedro foi
silencioso. Chegando lá, coloquei Clara no quarto e
fui com meu resgatador até o quarto dele.
Revivi as cenas, contando tudo o que
aconteceu na noite anterior: o tapa, as ligações
suspeitas, tudo.
Depois de ouvir meu irmão xingar trinta
palavrões e quase socar a parede, com raiva, ele
perguntou:
— Mas por que você estava esperando ele às
2 da manhã acordada?

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— Ainda bem que eu estava! Imagina o que


ele teria feito a mim se eu dormisse?
Estávamos de pé, eu encostada na parede e
ele andando de um lado para o outro.
— Tem razão... Eu vou matá-lo! Que ódio eu
tenho daquele filho da puta, nunca podia ter
concordado com essa loucura!
— Pedro... Concordado com o quê? Que
loucura? — Ai meu Deus, do que ele estava
falando?
Senti o coração acelerar, o ar faltar. Estava
aflita para saber. Odiava ser ocultada das coisas e
ficar parecendo uma idiota para quem sabia da
verdade.
— Ah... Que se dane, vou contar. — Pedro
suspirou e continuou andando de um lado até o
outro do quarto, com a mão na cabeça. — Você se
separou do Henri porque ele te traía, te traía
descaradamente! Então você não tinha dinheiro,
nem pra onde ir. Eu te acolhi, você morou aqui.
Tenho os livros que você usava pra estudar, vou te
mostrar. — Ele pegou os livros que guardou em seu
próprio armário e me deu. Analisei as páginas e
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então vi a lista dos objetivos que escrevi.


— Você queria isso pra sua vida: Foco,
trabalho, carreira. Um dia você decidiu ir comigo
pra boate, para a Drink. Lá apresentei meus amigos.
Entre eles, Tony. Tony nunca namorou, nunca nem
sequer se interessou por nenhuma mulher além de
sexo, ele nunca dormiu uma noite inteira na vida
com nenhuma mulher, sempre a descartava depois.
Sei que parece cruel, mas ele teve motivos
profundos na vida para ser assim, feridas
profundas, que mesmo não contando ao certo o que
são, eu sei que existem. Daí você naquela noite
bebeu demais, eu estava com uma garota e ele
estava sem ninguém no bar, e como ele não é de
beber, pedi pra que te vigiasse pra mim.
Naquele momento tapei a boca em espanto.
Não sabia o que esperar. Meu coração acelerou
ainda mais, eu sentei na beira da cama para digerir
tudo.
— Calma, ele cuidou de você naquela noite
como se fosse eu. Te trouxe pra casa e então foi pra
dele. Daí, na semana seguinte, você foi numa
entrevista para a empresa dele. Ele não sabia que
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você era uma das candidatas, mas ao te ver, decidiu


te colocar como sua secretária pessoal. Viu que
você tinha potencial e tudo mais, daí vocês
começaram a ser amigos, isso até fazerem uma
viagem pra Recife, onde foram resolver problemas
da unidade de lá. Clara também foi. Não sei o que
aconteceu lá, mas vocês voltaram diferentes e na
semana seguinte estavam namorando. Eu levei um
baque forte, achei que você estava brincando com
ele, pois não queria relacionamentos e achei que ele
estava louco, pois nunca ficou com ninguém assim,
você foi a primeira. Era nítido o amor entre vocês,
mesmo rápido e inesperado, o amor ardia em seus
olhos e você era feliz. — Uma lágrima caiu dos
meus olhos ao ouvir aquilo. — Então... Veio o
acidente, você não lembrou dele e ele decidiu não
atrapalhar sua vida, queria que você gostasse dele
como amigo naturalmente e não sendo influenciada
por uma história que não lembrava. Henri se
aproveitou da situação para voltar pra você. Eu
aceitei pela Clarinha, mas não achei que ele fosse
arruinar essa chance, achei que ele faria certo dessa
vez... E Tony... Bom, ele ainda te ama muito, mas
está conformado em ter só sua amizade. É isso.
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Não conseguia falar nada, estava chorando,


boquiaberta. Nem se eu me esforçasse sairia algum
som da minha garganta. Não sei por quanto tempo
fiquei ali, chorando, sentindo aquela aflição no
peito, mas quando enfim consegui falar, contei das
visões.
— Eu... Então os sonhos e as visões...
Realmente eram ele.
— O quê? — Pedro perguntou, sentando ao
meu lado.
Contei sobre os dejà-vus e dos sonhos que
tive, falei da pesquisa que fiz e de tudo que
descobri. Pedro sorriu e me abraçou.
— Amanda, isso é um milagre! Meu Deus...
Tony vai enlouquecer com isso. — dizia, animado.
— Não! Não conte a ele que eu sei e nem
nada. Preciso investigar mais, preciso me sentir
mais segura, quero saber se eu sinto algo por ele,
sei lá... Ter certeza de que isso pode voltar —
implorei.
— Tudo bem. Estou com você para o que
precisar. — Ele reforçou o abraço e me confortou.
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— Mas hoje vamos denunciar esse canalha do


Henri, ele te bateu!
Respirei fundo, aquele era mais um dos
problemas que eu tinha que enfrentar de peito
aberto.
— Tudo bem, vamos.
Quem sabe a vida finalmente entraria nos
seus eixos?

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Capítulo 20

AMANDA

O domingo passou como um borrão, e deixei


para denunciar Henri na segunda-feira, não estava
apta emocionalmente para tal.
No dia seguinte cedo, mandei Clara para a
escola e voltei para casa para me arrumar e ir
trabalhar. Enquanto pensava em como agiria no
trabalho, me preocupei com Henri, ele estava muito
alterado e fora de si, dizia coisas sem sentido que
me assustaram.
Mas ainda assim, achava que o certo era
denunciá-lo.
Depois pensei em Antônio.
Preciso saber mais, preciso de mais provas
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de como foi nosso relacionamento e de tudo que


passamos, sinto algo estranho quando estou ao
lado dele, ele me faz sorrir, me sinto protegida e
em casa. Isso deve ser resposta do meu coração ao
que passamos um dia, mas não posso arriscar,
tenho um marido perante a lei e preciso pensar
muito bem antes de tudo. Não direi nada por
enquanto.
Foi o que decidi.
Ao chegar no trabalho, percebi que não tinha
ninguém no escritório e optei por ir à cozinha para
tomar café. Quando me aproximei, ouvi cochichos,
eram as duas faxineiras da empresa conversando.
— Eu sinto tanta pena pelo que ele tá
passando, parecia que eles estavam tão felizes.
— É, eu juro que ele tinha mudado mesmo,
nunca o vi com ninguém e de repente aparece
namorando com ela. Com certeza ele gosta dela,
viu como ele ficou depois do acontecido?
—Outro dia eu peguei ele chorando depois
do expediente, todos já tinham ido embora e ele
ficou na sala. Estava assistindo algo no
computador, vi pelas persianas que ele chorava.
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Levei a mão à boca, surpresa pelas


informações.
— Coitado, pena que não podemos ajudar em
nada, ele merece ser feliz, é um chefe tão bondoso
e responsável.
— É verdade.
Dei meia volta, assustada, não queria
acreditar que elas estavam falando de Antônio e do
que ele passou por minha causa. Sentia-me mal e
incomodada. Parecia que uma ferida no meu peito
se abrira quando Pedro contou toda a verdade. Mas
precisava averiguar mais, precisava saber mais.

PEDRO

Naquela segunda não fui trabalhar, tirei uma


folga acumulada e fui atrás de Henri. Ao tocar a
campainha da antiga casa de Amanda, não obtive
resposta. Provavelmente ele tinha ido trabalhar.
Decidi ligar para o trabalho dele, e descobri que
também não fora. O que será que podia ter

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acontecido?
Ainda com raiva percorrendo minhas veias,
pulei o muro e arrombei a porta da sala, chequei
todos os cômodos e pareceu que estava tudo
intacto, como se Henri não tivesse nem dormido lá.
Claro, farrista como ele, deveria estar com
alguma amante qualquer.
Mas mesmo achando que Henri estava
farreando e nem sequer foi pra sua casa à noite,
ainda assim me preocupei. Liguei para o celular
dele, não queria ter que falar com aquele imbecil
pelo telefone, mas era minha última alternativa.
Depois de 6 toques, ele atendeu.
— Alô.
— Oi, canalha, aqui é o Pedro, onde você
está?
Fez-se um pequeno período de silêncio e
depois Henri ofegou.
— Cara, eu me arrependo do que fiz, mas
mereço uma punição, não se preocupe comigo. Em
breve se livrarão de mim.
E assim, Henri desligou a ligação.
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O que ele quis dizer com “em breve se


livrarão de mim”? Preciso informar Amanda agora!

AMANDA

Estava já há alguns momentos revisando


relatórios financeiros dos últimos períodos da
empresa quando meu celular tocou.
— Oi, Pedro.
— Oi, maninha, olha só, é o Henri.
Senti meu peito gelar.
— O que tem ele? — No fundo me
importava, não queria o seu mal, apesar de tudo.
— Ele está estranho, bom... Almoça comigo
hoje. Vou contar tudo do início.
— Ok, nos vemos lá.
Pedro desligou e imediatamente senti uma
angústia dominar meu corpo. Henri podia ser
descontrolado e possessivo, mas nunca quis que ele
fosse infeliz, pelo contrário, com a separação ele
poderia ser livre para ter quem quisesse, mesmo
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que fosse preso, quem sabe? O que poderia ter


acontecido de tão grave para Pedro precisar
almoçar comigo para contar tudo?
As horas se arrastaram e, no almoço, Pedro
parecia preocupado, não falou nada nos primeiros
minutos.
—Vamos, Pedro, desembucha! — supliquei,
impaciente.
Ele bufou e me olhou de um modo
preocupado.
— Acho que Henri precisa de ajuda.
Franzi o cenho, questionando o que ele
acabara de dizer.
— Sei que parece estranho, mas ele parecia
transtornado, a voz dele no telefone estava grogue e
triste e, por fim, disse que em breve nos livraremos
dele.
Realmente, esse tipo de declaração não era
típica dele.
— Mas você ligou pra ele do nada?
— Não, eu queria tirar a limpo o que ele fez
com você. Fui até a casa dele, ele não estava, liguei
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pro trabalho dele, não estava também, então invadi


a casa. Percebi que estava tudo intacto, nem roupa
de cama bagunçada achei, era como se ele não
tivesse nem dormido lá e então me preocupei e
liguei pro canalha.
Fiquei boquiaberta.
Pelo que eu pouco notava, dava pra ver como
as ideias dele mudavam de modo repentino. Era
como se algo se apossasse da mente dele num
momento, e no outro ele ficasse normal, como se
nada tivesse acontecido.
— E-então... Acha q-que ele?…
A conclusão que cheguei não foi nada boa.
— Sim, acho que ele pode se matar ou
cometer alguma coisa semelhante. — Pedro disse
com firmeza.
Meu irmão estava na minha frente, separado
de mim por uma pequena mesa quadrada onde a
comida que escolhemos, estava quase intacta.
Não sentia fome, ainda mais depois de chegar
àquela conclusão.
— Preciso avisar Antônio, vou atrás do
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Henri, tenho que impedi-lo. — Me levantei


rapidamente da cadeira, estava desorientada.
— Calma! Calma. Eu aviso o Tony depois.
Consegui rastrear a ligação que fiz agora há pouco
pro celular do Henri, ele está num prédio na
avenida principal, vamos juntos até lá, ok?
Pedro levantou e me conteve, segurando meu
braço.
— Como rastreou?
Ele passou as mãos no cabelo, nervoso. Seus
olhos azuis estavam tempestuosos, nublados.
— Eu paguei uma fortuna por um aplicativo
que rastreia ligações, tudo bem? É isso. Pode ser
útil um dia.
Achei estranho demais esse comportamento
de meu irmão, mas não contestei, não havia tempo
para isso.
— Obrigada, Pedro, vamos agora.
— Calma, vamos comer primeiro, acredito
que se ele tivesse feito algo você já teria recebido a
ligação. — Me acalmou.
Suspirei. Meu irmão tinha razão. Não podia
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levar ao extremo e ficar sem me alimentar por


causa de uma suspeita. Logo sentei novamente à
mesa e o encarei com mais alívio no olhar.
— É verdade.
Almoçamos. Comi pouco pois todo aquele
tema estava me causando náuseas e rapidamente
fomos até o local indicado pelo rastreador.
Era o prédio mais alto de toda a avenida e,
por incrível que pareça, ao olhar o topo, enxerguei
uma pessoa próxima à borda. Só podia ser ele.
— Deve ser ele ali, Pedro, vamos, rápido.
Pedro assentiu e subimos todo o prédio sem
dificuldade alguma. Não quis saber como Henri
conseguiu entrar lá, mas ao passar pela segurança,
apenas avisamos que tinha um homem tentando se
matar no topo e fomos liberados para subir.
Os seguranças acionaram os bombeiros
enquanto pegamos o elevador.
Ao chegar no terraço, o enxerguei e logo
gritei.
— Henri!!!
Henri estava em cima da mureta, pronto para
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se lançar de barriga para baixo ao chão, quando


virou o rosto e me viu.
Pedro e eu caminhamos lentamente em sua
direção, mas num dado momento eu pedi que meu
irmão ficasse apenas olhando. Continuei indo, com
toda cautela até ele.
— Vai, vai embora, não mereço sua
compaixão!
Estiquei minha mão, estando há uns três
metros de onde ele estava, por segurança.
— Desça daí, Henri, desça, preciso falar com
você! Você não pode cometer essa loucura! Tem
uma filha, tem pessoas que te amam, por favor, não
faça isso!
Ele enxugou as lágrimas que desciam
desenfreadas do seu rosto e eu torcia para que não
acabasse daquele jeito.
Meu Deus, ele não via como aquilo era
loucura?
— Minha filha tem a você, tem o seu irmão e
o riquinho. Ninguém me ama, Amanda! Como
alguém pode amar um ser desprezível que bate na
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esposa, trai com uma amante há anos? Quer saber a


verdade? Eu nunca fui fiel a você, achei que te
amava, mas nunca consegui dispensar ela, ela
sempre foi meu amor verdadeiro, desde a infância.
Sempre ficamos juntos, ela queria que eu me
casasse com ela, mas aí conheci você, a conquista
demorou tanto que achei que te amava. Nos
casamos, mas percebi que nunca a esqueceria, vivi
com você e com ela por todos esses anos, ela
sempre entendendo e aceitando. Quando finalmente
você me largou, dei graças a Deus, logo coloquei
ela pra morar comigo e estávamos bem, mas então
você teve que conseguir um namoradinho e me
encher de ódio. Jurei pra mim mesmo que te
reconquistaria, olha que egoísmo!
A dor nas palavras dele, fez com que eu
chorasse, surpresa.
— Então houve o acidente, você não sabe
como eu fiquei feliz em ver a cara do riquinho
quando você não o reconheceu, era minha chance.
Prometi a todos que cuidaria de você e que tentaria
de tudo pra te fazer feliz, mas então... Ela me
deixou, depois de 20 anos, ela me deixou. Disse
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que sumiria pra nunca mais me ver novamente! —


A voz dele embargara em meio às lágrimas. — Eu
fiquei fora de mim, você sonhando com o riquinho
e a minha outra mulher me abandonando. Percebi
como sou idiota, egoísta e maldoso. Amanda, por
favor, preciso fazer isso, minha vida não tem mais
sentido!
Quando ele acabou, eu já soluçava. Lágrimas
de dor não só pelo que Henri dissera, mas por ver
que ele não daria uma chance à sua própria vida.
Não queria vê-lo morto. Nunca quis seu mal.
— Henri, isso não é motivo pra tirar sua vida.
A vida é a maior dádiva de Deus, não se condene
ao fazer isso, você pode ter um futuro maravilhoso,
ainda dá tempo. — Dei um passo à frente,
indicando que tentaria impedi-lo.
— Não! Eu já decidi. Me deixa! — Ele
espalmou as mãos no ar, impedindo-me de
continuar.
Sua aparência era derrotada, sem luz. Os
olhos dele já tinham sido entregues à morte.
Não tentei mais me aproximar dele, com
medo da sua reação, então apenas fui me afastando
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aos poucos, com a mão na boca e as lágrimas


caindo.
Meu peito parecia querer saltar da caixa
torácica.
Henri pegou um celular no bolso e ligou para
a polícia dando seus dados pessoais, avisando de
um suicídio na avenida principal. Desligou e então
se jogou.
—Nããããããão! — gritei com todas as forças,
mas já era tarde.
Henri não quis lutar pela sua vida.
Ele já havia perdido as esperanças de ser
feliz.
Pedro e eu descemos rapidamente. Ele, me
carregando, pois eu chorava de modo desolado pelo
pai de minha filha. Jamais imaginara um fim
daquele. E como nunca notei que Henri não era
feliz? Como não percebi que ele tinha gatilhos
suicidas?
Chegando ao solo, evitei a visão do que
restou de Henri, pois apenas em imaginar já sentia
náuseas. Passei direto e entrei no carro de Pedro.
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Ao dar partida, ele quebrou o silêncio.


— Foi escolha dele, não se culpe.
Encarei os olhos do meu irmão, mas o que ele
disse contrastava com o que seu olhar mostrava.
Pedro também tinha lágrima nos olhos, mas se
controlava para não desabar na minha frente.
Ele era assim.
Eu sabia que ele, por mais que odiasse Henri,
também não conseguiu resistir àquela cena.
Controlava-se para não demonstrar dó e
sentimentos de afeto na minha frente, para ser
minha fortaleza. Aquilo me fez chorar ainda
mais… Até alguém para desabafar Henri
provavelmente não tinha. Ainda assim assenti,
ainda muito abalada, e pedi para que Pedro me
levasse em outro lugar, apenas para espairecer até
me sentir forte e voltar ao trabalho.
Fiquei por algumas horas sentada em uma
praça próxima da empresa, pensando em tudo que
me lembrava da vida. Forcei minha mente levando
a todas as memórias de Henri. Em como ele era
amável e solícito quando nos conhecemos, como
foi cavalheiro no nosso primeiro jantar, como me
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acarinhava na noite de núpcias, prometendo ser o


homem dos meus sonhos, como chorou
emocionado ao saber que seria pai e em todos os
momentos dele comigo e Clara, como família.
Chorava pelo meu falecido marido. Ele
pensou em tudo para que ninguém fosse culpado de
seu suicídio.
Então, como um flash, algumas imagens da
memória perdida após o aniversário de Clara
surgiram em minha mente. Comecei a lembrar.
Não foram muitas cenas, apenas algumas
memórias mais importantes daquele ano, e nada
mais. Mas para mim, foi um avanço.
Ao entardecer, decidi voltar para a Gali
Telecomunicações, tinha deixado minhas coisas lá
e precisava avisar tudo a meu chefe. Poucos
minutos antes, recebi a ligação do hospital, onde
deram o óbito de Henri e confirmaram o suicídio. O
enterro seria no dia seguinte. Ao chegar na
empresa, percebi que os funcionários já tinham ido
embora.
Fui para a minha sala e peguei meus
pertences. Sem querer, esbarrei no porta-retrato do
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pôr do sol, que caiu no chão e quebrou, revelando


uma parte escrita atrás.
Ainda trêmula por tantas emoções naquele
dia, peguei o papel e o li:

“Amanda, meu amor. É estranho escrever


para você, sabendo que está tão perto de mim na
sala da frente. Mais estranho ainda, pois nunca
escrevi para mulher nenhuma, então lá vai. Sei que
já falei sobre meus sentimentos por você inúmeras
vezes, mas quando te vejo, é como se fosse a
primeira vez novamente. Quando você me chama
pelo nome, eu sinto que seu coração é o meu lar.
Todos os nossos momentos juntos só reforçam a
cada dia que na minha vida só existe você, apenas
você. Eu te amo e para mim tem que ser você, sem
motivo, sem razão, apenas tem que ser você,
sempre você.
Te amarei até não mais respirar.”

Era de Antônio... Para mim. A data dizia que


ele escreveu antes do acidente e ali estava uma
prova da relação que tínhamos. Mesmo imersa em
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uma tristeza profunda por causa de Henri, senti


uma ponta de esperança ao ver aquele pequeno
cartão. Optei por guardá-lo para algum momento
futuro e fui até a sala dele, do meu chefe.
Ao me aproximar da sala, ouvi soluços e sons
que pareciam choro, abri devagar a porta e o vi.

TONY

Desde que cheguei na empresa não falei nem


soube nada sobre o resto do fim de semana de
Amanda. Ainda estava pensando sobre o que houve
na sexta, a forma com que ela cuidou de mim e
como nos demos tão bem em um momento
descontraído. Quase pensei que ela poderia lembrar
de tudo e voltar a ser como antes, mas a realidade
bateu na minha mente e eu precisava trabalhar
focado. Passei o dia inteiro centrado em minha sala.
Tentaria esquecer. Na sexta estava focado em
esquecê-la e a partir daquele dia faria de tudo para
isso.
Mas falhei miseravelmente.
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Amanda não veio falar comigo, deu uma


sumida durante a tarde da empresa e aquilo me
preocupou. Pedro me ligou e disse que ela teve uma
emergência e me explicaria depois. A realidade era
que ela estava agindo como se nada tivesse
acontecido enquanto eu ficava na minha, passando
o tempo.
No final do expediente, enfrentei uma luta
interna sobre assistir ou não os nossos vídeos no
computador, mas perdi contra mim mesmo,
revendo cada mísero momento quando pensei que
todos os funcionários já tinham saído do andar.
Já estava quase no final, quando enquanto
meus olhos repletos de lágrimas acompanhavam o
vídeo, a porta se abriu lentamente.
Ao perceber que Amanda era quem estava
ali, parei o vídeo imediatamente e limpei o rosto.
— Hum... O que deseja? — perguntei,
controlando a voz embargada.
Ela me olhava com cautela, de pé numa
posição profissional. Mas seus olhos estavam
tristes.

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— Desculpe incomodar, eu queria avisar


sobre minha saída repentina de hoje.
Pedi para que ela sentasse, Amanda o fez e
me contou tudo. Quando ela chegou no momento
da morte de Henri, fiquei chocado e sem reação.
Não acreditava que ele seria capaz disso e Amanda
estava com o rosto cheio de lágrimas ao dizê-lo.
Me levantei, e como o cavalheiro e amigo que
sempre demonstrei ser, fui até ela.
— Meus pêsames, posso abraçá-la? — pedi.
Estava sendo egoísta pensando apenas nos
meus sentimentos o dia inteiro, quando ela só
queria ajudar o ex a não tirar a própria vida. Me
sentia mal com aquilo, precisava ajudá-la.
Ela assentiu e logo a abracei.
Aquele momento não era para romances, era
um momento doloroso e a consolei como um amigo
faria.
Fazia um pouco de ideia da dor que estava
sentindo por ele. Perder alguém sempre será como
uma faca afiada no peito. A sensação de vazio em
um canto onde só a pessoa morava dentro de si.

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AMANDA

Agradeci mentalmente por tê-lo ali e por me


apoiar, envolvendo-me em seus braços acolhedores.
Sozinha eu jamais saberia o que fazer. Ele se
afastou e me olhou nos olhos.
— Eu... Quero ajudar. Vou na recepção pegar
o telefone da capela para providenciarmos um
velório adequado. — Ele não esperou resposta e
logo saiu da sala, deixando-me só.
Sentei novamente, com os ombros caídos,
cansada pelo dia que passei.
Em meio a tudo aquilo, lembrei que ele
estava chorando quando eu cheguei ali e então, por
curiosidade, fui até o computador e vi que o
arquivo de vídeo estava em um DVD. Abri o leitor
de CD e peguei o DVD que estava lá. Guardei na
bolsa e voltei ao meu lugar.
Me senti mal por ter feito aquilo, mas era
preciso, poderia ser algo importante em relação a

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nós e eu precisava saber.


Ele voltou e juntos acertamos tudo sobre
enterro e velório. Antônio me deixou em casa no
final de tudo e me senti ainda mais grata por ser ele
a pessoa a me ajudar.
O passo mais difícil era avisar Clara quando
chegasse em casa, e foi mesmo difícil.
Clara chorava sem cessar, gritava, escondia o
rosto, ela estava muito triste pela perda do pai. Não
a contei que foi suicídio, apenas acidente. Minha
filha era muito pequena para entender sobre esse
tipo de morte.
Aquele foi o dia mais doloroso e chocante
das nossas vidas, mas precisávamos ser fortes, pois
Henri nunca mais voltaria.

*O personagem Henri é portador de um

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transtorno psicológico chamado Borderline. Saiba


mais no fim do livro.

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Capítulo 21

AMANDA

Haviam-se passado 4 dias desde o enterro de


Henri. Acho incrível como familiares dos confins
da terra surgem de repente em caso de morte. Eu
estava lá com Pedro, e Antônio também foi, nos
dando apoio e consolo. Agradeci por tê-los naquele
momento, pois realmente eu não sabia mais o que
faria a seguir, precisava colocar minha mente em
ordem.
Pedro me consolou durante o sepultamento
até que, de repente, começou a ficar nervoso,
olhava de um lado pro outro e esfregava as mãos.
— Mandi, não tô muito legal. Vou para casa.

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Eu já sabia quando ele estava tenso, e mesmo


não sabendo o porquê, entendi quando ele quis ir
embora sem mais nem menos. Pedi que levasse
Clara, que insistira em dar um último adeus ao pai,
mas parecia cansada, e ele assim o fez. Sorte que
meu chefe estava lá e ficou ao meu lado, me
levando para casa depois.
Após todo o processo do enterro, eu vi a dita
cuja um pouco mais distante do aglomerado de
familiares, chorando e sendo consolada por outra
mulher, que devia ser sua amiga. Me aproximei
dela, solícita, e pedi a Antônio que me aguardasse
do lado de fora do cemitério.
— Oi, Laira — disse ao encontrá-la.
Laira arregalou os olhos inchados de tanto
chorar, mas não disse nada.
— Laira está passando por uma fase de
tristeza profunda, essa perda só piorou o estado
psicológico dela. — A amiga, uma mulher negra
absurdamente linda e esguia, tomou as rédeas da
situação. — Sou Valentina, a melhor amiga da
Laira. — Me cumprimentou com dois beijos.
— Prazer, Valentina. Sou a esposa de Henri.
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Não estou aqui para julgar Laira, nem prejudicar


seu estado emocional. Eu soube da verdade da
relação deles, quero dar meus pêsames e pedir
perdão por ter sido o pivô da ruína do
relacionamento deles no passado.
Fui sincera. Henri foi o culpado desde o
início, não Laira. Ela era uma criança quando eles
se conheceram, ela o amou esse tempo todo.
Merecia meu perdão e compaixão.
Laira me abraçou e se debulhou em lágrimas,
pedindo perdão e repetindo que o amava. Trocamos
telefones e prometi que a visitaria sempre que
pudesse para ajudá-la no que fosse preciso. Eu
sentia essa necessidade em meu coração.
Fiquei de folga por 4 dias e aproveitei para
ver a papelada da poupança pessoal de Henri. Ele
havia guardado uma boa quantia em dinheiro,
suficiente para comprarmos um apartamento
simples para Clara e eu.
Ainda não tinha verificado o DVD que
peguei na sala de meu chefe. Não tinha cabeça para
isso, mas estava chegando a hora.
Naquela tarde, eu arrumava algumas coisas
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na sala da casa do meu irmão, onde estávamos


hospedadas até a papelada da casa sair, quando a
campainha tocou.
Era Antônio.
Não o via há dias, e foi como se parecesse
uma eternidade. A ciência do que passamos juntos
somado ao meu desejo natural reprimido, fazia com
que as batidas do meu coração se agitassem ao
encarar aquele lindo mar em seus olhos azuis.
— Boa tarde. Não queria incomodá-las, mas
eu precisava saber como estavam e se precisam de
alguma ajuda. Não pude e não quis falar por
telefone, desculpe. — Disse ele, educadamente,
quando abri a porta.
— Tudo bem, entre. — Dei passagem.
Ao entrar, pareceu desconcertado. Senti que
ele queria falar algo, mas se continha.
— Está tudo bem? É algo na empresa? —
perguntei.
— Sim e não — disse. — Na verdade eu vim
te dar uma notícia.
Do nada um embrulho no meu estômago me
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deixou nervosa e enjoada. Eu não estava pronta


para admitir que alguns flashes de memória
estavam retornando por meio de sonhos e déjà-vu,
mas também não queria que Antônio sofresse mais
do que já devia ter sofrido por mim.
— Venha, sente-se aqui no sofá. — Guiei-o.
Clara estava brincando no quarto e ainda não
tinha percebido a presença de Antônio em nossa
casa.
Nos sentamos e aguardei.
— Diga.
— Bom, é que... — Ponderou. — Meu pai
tinha te proposto a diretoria de Recife e a chefia no
caso da queda das vendas, como já te informei. —
Assenti. — Só que ontem ele me ligou e disse que
quer que eu vá pra lá definitivamente e que você
fique aqui. Claro que terá ajuda e eu sempre estarei
por aqui de tempos em tempos, mas já é uma
promoção a mais pra você. O que acha?
Antônio falava olhando pro chão,
entrelaçando as mãos num gesto aparentemente
receoso.

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Eu não sabia o que dizer.


Pedi uma explicação detalhada e ele contou
que não encontrou alguém de confiança para guiar
a investigação, e como eu não me lembrava da
ideia, só restava ele. Eu ficaria em Belo Horizonte
como diretora enquanto ele cuidaria das coisas por
lá.
Okay, admito que tenho assimilado o serviço
com uma velocidade imprescindível e tenho
exercido papeis de liderança naturalmente lá
dentro, antes mesmo de me tornar vice dele.
Mas...
Uma pontada começou a nascer no meu
peito, senti algo ser cravado lá dentro, mesmo sem
entender muito bem o que se passava.
Eu não estava nem aí pra minha promoção.
Eu só conseguia ouvir a parte que ele disse
sobre ir embora pra Recife.
Ele.
Vai.
Embora.
Pra longe.
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Por que meu peito dói ao pensar nisso?


— Eu... — Tentei falar, ofegante. — Não
consigo... Respirar... — Apontei para meu peito. —
Dói.
Eu puxava fortemente o ar aos meus
pulmões, mas eles não me obedeciam. Antônio
finalmente me olhou nos olhos, com medo, e
segurou meu rosto.
— Ai meu Deus, o que você tem? Está
pálida! Dói muito? — Ele esfregou meu colo numa
massagem circular. — Deita aqui no sofá. Vou
pegar um copo de água.
Segurou meu corpo e o posicionou deitado no
sofá, deu um salto e correu até a cozinha.
A dor ainda estava lá.
O ar ainda faltava.
Continuei a massagem no mesmo local onde
ele a iniciou, até seu retorno com a água.
— Toma, bebe um pouco, depois prende a
respiração por 30 segundos e respira devagar
quando voltar. — Me orientou.
Obedeci.
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Quando os 30 segundos acabaram a dor


estava indo embora. Não sei o que pode ter sido
isso, mas eu precisava ter forças para falar o que eu
sentia.
— Antônio — chamei-o já sentada, recostada
no sofá.
— Oi — respondeu ao meu lado.
Seus olhos assustados pelo que acabara de
acontecer, me fitavam com receio.
— Por favor. — Respirei fundo. — Não vá.
— Tomei mais uma dose de ar e senti uma fina
lágrima descer de um dos meus olhos. — Não me
deixa sozinha.
Eu disse tudo isso olhando diretamente nos
olhos dele, que me lembram o mar do Caribe.
Azuis, cristalinos, verdadeiros, transparentes.
Todos me enganaram esse tempo todo, há
mais de um mês desde que perdi minhas memórias,
mas ele não. Ele foi a única pessoa que fez de tudo
para me ajudar, mesmo sabendo como poderia ser
doloroso.
Não o queria longe de mim. Não o queria.
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— O... Que... — Ele titubeava entre as


palavras, um pouco surpreso com meu pedido. —
Não estou entendendo... — Balançou a cabeça em
negativa.
— Quero que fique — repeti.
Por um impulso, me aproximei dele e
acariciei seu rosto barbado. Ele fechou os olhos,
provavelmente curtindo a sensação de minhas mãos
em sua pele.
Meu Deus… Eu precisava saber como era…
Como me sentia...
Quando Antônio os abriu novamente, eu
enxerguei algo mais. Suas pupilas estavam
dilatadas e uma chama diferente ardia neles.
— Não aguento mais, Amanda. — Segurou
meu rosto e tocou seu nariz no meu, cerrando os
olhos. — Eu te amo, eu te amo, eu te amo demais.
Não aguento mais ter que ficar longe. Me perdoa
por ser fraco e não respeitar seu luto nem seu
tempo, mas eu te amo, Amanda. Nada nem
ninguém vai mudar isso nunca. Vou levar esse
amor comigo até além da vida.

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E me beijou.

Clic

Lá no fundo da minha mente eu ouvi esse


som. Algo se encaixou na hora em que os lábios de
Antônio tocaram os meus. Eu não sabia o que
estava sentindo, nem nada da nossa história, mas eu
sabia que aquele homem enorme, forte, lindo e
rústico era meu lar. Eu estava novamente em casa.

TONY

No dia anterior a visita que fiz a Amanda,


recebi o pedido de meu Pai. Ele estava preocupado
com Amanda e tinha ciência do nosso
relacionamento sem eu nem ter dito nada. Não
jogou na minha cara o sofrimento que o amor me
causou, mas ordenou que eu me afastasse. Que
aquilo seria melhor pra mim.
Em vinte e nove anos de vida, nunca precisei

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tomar decisões baseadas no que me orientavam.


Claro, sempre avaliava e decidia o melhor.
Mas decidia por mim. Por minha vontade.
Meu coração ordenava que eu ficasse perto
de Amanda, mas após o final de semana conturbado
e a semana de luto que se sucedeu… Não tinha
mais esperança alguma.
Foi quando, mesmo em meio a um vale
escuro sem solução, eu vi uma luz. E foi justamente
quando ela me pediu para ficar. Seus olhos
denotavam sentimento, mesmo que sua expressão e
suas palavras não correspondessem a ele.
A Amanda lá de dentro, a que um dia fora
minha, estava falando alto.
Num impulso a beijei, e finalmente me senti
completo outra vez. A dor e o espaço vazio que
meu peito acomodava estava acabando comigo dia
após dia. Não consegui mais suportar ao ouvir
minha Amanda proferir aquelas palavras tão
profundas, eu sentia que as palavras não vinham do
cérebro e sim do coração.
Ela ainda me amava. Em algum lugar ali

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dentro, mas me amava.


Desde a perda da memória dela, me mantive
afastado para não influenciar negativamente na
vida dela. Estava apagado de sua memória e ela
tinha um marido e uma filha para se preocupar.
Quando Henri faleceu, afastei os pensamentos
egoístas de ter Amanda de volta, pois não era certo
com alguém que acabara de ser sepultado, ter sua
mulher nos braços de outro tão rapidamente.
Mas naquele momento, apenas 4 dias após o
sepultamento de Henri, não consegui me conter. A
queria mais do que nunca e respeitaria qualquer
decisão que ela tomasse após falar tudo o que sentia
por ela e o que passamos juntos.
Depois, caso ela deseje, mostrarei os vídeos,
que graças a uma mania de menino que possuo em
gravar tudo que desejo, aqueles vídeos seriam, a
partir daquele dia, as memórias perdidas de
Amanda.
O beijo findou-se e nos olhamos fixamente,
absorvendo toda aquela informação repentina do
momento que acabamos de vivenciar.
— Antônio, quero te contar uma coisa.
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— Diga. — Segurei suas mãos e aguardei.


— Eu tenho tido aqueles déjà-vu que te disse,
mas também tenho sonhado com algumas coisas.
Depois comecei a juntar as peças e perceber que em
alguns momentos as pessoas tentavam esconder
algo de mim. Até Pedro me contar realmente tudo o
que houve entre nós.
Fiquei boquiaberto. Meu amigo prometera
não contar nada a Amanda, por que não cumpriu?
— E o que Pedro disse?
Ela abaixou o olhar, parecendo tímida.
— Tudo. Nossa viagem para Recife, nosso
namoro, como nos relacionávamos. Como
parecíamos apaixonados. — Lágrimas começaram
a descer de seus olhos, acompanhado da voz
embargada. — Eu não queria te magoar, eu só
queria lembrar.
— Shhhhiu... Calma, meu amor — A
consolei, enxugando as lágrimas que deslizavam
pelo rosto dela. — Você não teve culpa de ter
sofrido aquele maldito acidente. Na verdade, eu fui
o culpado, apenas paguei por não tê-la protegido e

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a acompanhado até o aeroporto naquele dia. Eu


queria te dar espaço pra pensar e não queria te
pressionar em nada. Me perdoa.
Ela levantou o rosto, descrente.
— Você não teve culpa, meu Deus… Você
nunca teria culpa. — Respirou fundo e enxugou as
lágrimas. — Eu encontrei algo na sua sala uns dias
atrás.
A observei enquanto ela levantava e ia até
uma gaveta de um dos móveis da sala e retirava
uma pequena capa de CD de dentro.
— Achei isso por lá. O que é? — perguntou.
— Desculpe por ser enxerida.
Fiquei petrificado.
Como ela conseguiu os vídeos?
Mas por dentro, senti aquele bendito alívio.
Enfim poderia mostrar as provas de tudo que
passamos. Tomei coragem para o que fiz a seguir.
— Quer assistir? São vídeos nossos. —
Levantei e andei até ela.
Amanda assentiu, com as bochechas rosadas
— tão linda! — até que uma voz infantil se
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instaurou no ambiente.
— Tio Tony! — Clarinha acabara de sair do
quarto e me avistou de pé na sala.
Correu e saltou em meus braços, me
abraçando forte.
— Clarinha, minha princesa. Como você
está?
— Eu estava com saudades. Você quase não
veio me ver mais. Ainda somos amigos? —
perguntou com brilho nos olhos.
Meu Deus, eu amava aquela pequena.
— Mas é claro que somos! Mais do que
a Sininho e o Peter Pan!
— Mais? — Os olhinhos dela se arregalaram
cintilantes.
— Muito mais — Beijei sua testa e a desci do
colo.
Amanda acompanhava-nos com os olhos.
Acho que a relação com sua filha também era
novidade para ela.
Ah, doce, Amanda… Nada vai me impedir de
mostrar tudo sobre nós, cada pequeno detalhe.
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Estou determinado em cumprir essa meta.

AMANDA

Olhei para aquela cena, estupefata com a


intimidade que meu ex-talvez-futuro-namorado
tinha com minha filha — que confusão! Na
verdade, fiquei maravilhada com mais uma
qualidade positiva que descobria em meu chefe.
— Bom, vamos comer alguma coisa, está na
hora do lanche! — exclamei animada.
Ele e Clara sorriram e me acompanharam até
a cozinha.
Após um lanche descontraído, minha filha
voltou ao quarto para continuar assistindo seus
desenhos, como sempre fazia. Antônio me pediu
que o acompanhasse até a porta, para que fosse
embora.
Estávamos do lado de fora do apartamento,
com a porta encostada, quando ele indagou:
— Como Clarinha tem absorvido tudo isso
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do pai?
Cocei a nuca, um pouco constrangida em me
lembrar de como minha criança tem absorvido
tudo.
— No dia em que contei ela ficou péssima,
até ontem estava chorosa e triste. Mas hoje acordou
melhor, disse que o papai está com Papai do céu,
então está protegido. — Dei de ombros.
— Clara é inteligente demais, fico abismado
com ela. — Ele sorriu. Um sorriso aberto e
genuíno.
— Ela é — concordei. — Teria como
assistirmos o vídeo amanhã? Clara passeará com
Pedro durante o dia e então poderemos ver com
calma. Quando quer que eu retorne à empresa?
Ele me fitou fixamente nos olhos e pôs as
mãos nos bolsos de sua calça. Não deixei de notar
como meu corpo reagiu ao reparar com mais afinco
sua estrutura física.
— Tudo bem. Venho aqui amanhã pela
manhã, então. Sobre a empresa, não se preocupe,
volte semana que vem. — Se aproximou de mim e

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depositou um beijo na ponta do meu nariz.


Fiquei parada, absorvendo seu cuidado. Ele
segurou firme meu rosto, em seguida.
— Eu te amo — disse fechando os olhos,
enquanto recostava a testa na minha e balançava o
rosto, fazendo nossos narizes roçarem num gesto
carinhoso.
Apenas sorri. Conseguia sentir o amor
penetrando meu coração no momento em que ele
proferiu aquelas palavras.
— Até amanhã. — Me afastei, despedindo-
me.
— Até.
Antônio se foi. Tornei a entrar em minha casa
com o coração num misto de sentimentos.
Ao mesmo tempo que estava ainda triste pelo
falecido esposo, sentia-me feliz por ter Antônio por
perto. Era uma felicidade que eu não conseguia
evitar, simplesmente sentia. Não queria me culpar
por isso.
Logo, ao pensar em Henri, me lembrei de
Laira.
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Preciso entrar em contato com ela. Quero


saber tudo que Henri me ocultou todos esses anos.
Preciso ajudá-la, ela não parecia nada bem.
Imediatamente sentei no sofá da sala e
verifiquei o número de Laira no meu celular.
Disquei e, no terceiro toque, alguém atendeu.
— Alô.
— Alô, aqui é Amanda Lice. Falo com Laira?
— Não. Aqui é Valentina, a amiga dela.
Lembro de você, Amanda. Tudo bem?
— Tudo caminhando, Valentina. Gostaria de
agendar uma visita a Laira, não quero perturbá-la,
mas quero muito ajudar de alguma forma e
entender tudo que eu não soube todos esses anos.
Valentina pareceu respirar fundo.
— Amanda, desculpe, sou a psicoterapeuta
dela também. Laira está num quadro de depressão
profunda no momento. Ela não tem se alimentado
nem dormido bem. Peço que aguarde um tempo,
pois estou tratando pessoalmente dela. Após ver
melhora no seu quadro clínico, te ligo e marcamos
uma visita. Tudo bem?
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— Tudo bem. Onde ela está sendo tratada?


Em algum hospital ou clínica?
— Não, está hospedada em minha casa, perto
do centro.
— Ah, perto, então. Estou morando próxima
ao centro também, na casa do meu irmão. Conheço
bem o bairro. Quando ela estiver melhor me avisa
então, por favor.
— Pode deixar.
Então uma luz acendeu-se em minha mente.
— Ah, Valentina! Tive uma ideia melhor!
— Qual seria? — Ela parecia curiosa.
— Será que você, como amiga e doutora
dela, não prefere vir falar comigo? Acho até
melhor, para não incomodar Laira.
— Por mim tudo bem, também quero
entender algumas coisas. Amanhã às 18 h, pode
ser?
Aceitou de imediato e aquilo me deixou tão
feliz.
— Perfeito. Vou passar o endereço de onde
estou via sms. Beijo.
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Após desligar, fiquei um pouco mais aliviada.


Sentia que devia ajudar Laira de alguma forma.
Algo dentro de mim a ordenava.
O restante do dia foi um borrão. Cuidei de
Clara como de costume, cozinhamos juntas o jantar
e depois fomos para a cama dormir. Ela passou a
dormir ao meu lado, para que não ficássemos
sozinhas. A perda de Henri ainda era muito recente
para a menina.
O sono não quis chegar na minha mente, eu
meditava em tudo que ocorrera naquele dia. Meu
cérebro ainda não conseguia se lembrar de nada
nitidamente, mas conseguia sentir, sempre fui uma
mulher sensitiva. Acreditava em meu sexto sentido,
ou no milagre do sentimento poder falar mais alto
que a razão.
Se tudo isso que aconteceu hoje foi realmente
parte do meu passado esquecido, eu preciso
continuar e insistir nessa realidade. Fui enganada
por Henri mais de uma vez e ninguém me contou
nada. Me esconderam a verdade. Ninguém teve um
motivo real, apenas Antônio. Nele eu acredito, pois
mesmo se quisesse, jamais poderia me contar tudo
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que vivemos. Se não fossem os déjà-vu e os sonhos


eu jamais me lembraria dele, jamais me
aproximaria dele novamente, nem cogitaria desejá-
lo como desejo.
Permiti-me imaginar aqueles olhos azuis
como o mar caribenho e suspirei deitada em minha
cama. O desejava.
Mas aquela Amanda era a Amanda de dois
anos atrás, ainda um pouco reprimida e contida nas
palavras, a Amanda que aceitava sua condição
ainda não tinha sido alertada pelos seus sonhos e
objetivos de forma tão clara.
Aquela Amanda ainda tinha como prioridade
ser mãe acima de tudo.
Aquela Amanda queria trabalhar e estudar,
mas esse ainda não era seu foco principal.
Aquela Amanda pensava em sua filha antes
de qualquer coisa.
Não podia simplesmente mudar toda minha
vida por causa de um desejo insano.

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Capítulo 22

AMANDA

O dia seguinte chegou, com ele pude


contemplar os olhinhos cor de mel da minha filha
preciosa se despedir de mim para passear com o tio.
Ao deixá-la na porta do carro de Pedro, ela me
abraçou.
— Mãe, quero dizer uma coisa —
Demonstrou receio.
— Diga, filha...
Eu admirava minha pequena a cada dia mais.
— Você cresceu tanto, está tão
independente... Eu te amo, filha. — Meu coração
encheu-se de emoção ao notar como ela crescia
rápido.
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— Eu te amo muito, mãe — Clara respirou


fundo. — Sinto falta do papai. — Abaixou os
olhos.
Eu sabia que minha filha sofreria por muito
tempo, afinal Henri podia ter sido péssimo marido,
mas sempre amou e cuidou da filha como devia.
Nunca negou seu papel de pai.
— Filha, papai está longe agora, infelizmente
ele não voltará, mas você tem a mim para sempre.
Eu vou ser tudo pra você. Serei sua mãe e seu pai,
serei sua amiga e sua irmã, serei seu tudo.
Eu já estava em lágrimas. Andava muito
sensível ultimamente.
Pedro assistia a tudo calado. Sabia que seu
desejo mais do que nunca, era ver sua irmã e
sobrinha felizes outra vez.
— Vamos, Clarinha. Hoje vai ser dia de
diversão com o tio Pedro! — Pedro tentou animá-
la.
Clarinha beijou meu nariz e entrou no carro.
Ao retornar para casa, espantei pensamentos
negativos sobre a perda de Henri ou como minha
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filha assimilaria tudo com o tempo, e fui tomar um


banho, mas antes abri meu armário para verificar se
tinha cera depilatória na minha necessaire.
— Hum... Escova de dentes... Cotonetes... O
que é isso? — Espantei-me ao ver um pacote de
absorvente interno lacrado bem ao fundo da bolsa.
No mesmo momento a realidade bateu.
Ainda não tinha usado sequer um absorvente
após o acidente.
Mentalmente fiz as contas.
Fazia pouco mais de um mês da ocorrência
do acidente, talvez meu ciclo menstrual tivesse
ocorrido na semana anterior ao evento e agora
estava em atraso, nada de mais.
Ou não.
— Meu Deus... Será? — Bati na própria
testa, espantada. — Mas se eu sofri o acidente e
ninguém falou nada, deve estar tudo bem, não é?
Comecei a suar frio, peguei a cera depilatória
que estava logo ali próxima aos absorventes e fui
tomar meu banho.
Ao sair do banho, ainda de toalha, fui
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surpreendida pela campainha tocando.


Ao ouvir a campainha tocar, gritei “já vai!” e
corri para o quarto. Arrumei-me rapidamente e
coloquei um vestidinho leve lilás.
Retornei à sala, abri a porta principal e sorri.
— Antônio, bom dia! — Olhei radiante para
meu chefe, que estava a cada dia mais
deslumbrante aos meus olhos.
Ele vestia uma camisa básica e uma bermuda
cargo, seus cabelos estavam presos em um coque
bagunçado dando um charme lindo ao seu visual.
— Bom dia, Amanda. — Ele se aproximou e
estendeu o buquê antes escondido detrás do corpo.
— Meu Deus! — Fiquei espantada com
aquele tratamento tão carinhoso e peguei
delicadamente as flores. — Obrigada!
O abracei e ele depositou um breve beijo em
minha cabeça.
— Vem, vamos entrar. — Me afastei e
permiti a entrada dele na casa.
Quando o vi passar pela porta, percebi o
quanto já o notava com outros olhos naquele dia.
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Seu aroma amadeirado fresco exalava no ambiente,


me deixando com palpitações.
E seu tamanho...
Notei com mais cautela que ele era muito alto
e grande, a porta quase não suportou sua
imponência e altura ao passar por ela.
Ele era realmente lindo.
— Vou... Guardar as flores. — Decidi
quebrar o silêncio constrangedor causado pela
admiração ao vê-lo. — Hum... Fica à vontade, pode
sentar ali no sofá.
Ele assentiu e caminhou até o sofá.
Amanda, para de ser idiota, não tem motivo
pra ficar assim toda nervosinha e cheia de calor
— repreendi a mim mesma em pensamento.
Depositei as flores em um jarro com água na
cozinha, e voltei à sala.
— Bom... — ponderei. — Quer tomar café?
— perguntei a ele, ainda de pé.
Ele estava verificando o celular quando fiz a
pergunta. Virou-se e me lançou um olhar
penetrante de admiração antes de dar qualquer
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resposta.
— É... Não precisa se incomodar, comi algo
em casa. — Sorriu.
Deu aquele sorriso de menino, aberto e
radiante, que os dèja-vus me mostravam.
Constatei ali, que tinha acabado de me
encantar com o sorriso dele.
Meu Deus... Eu não estou normal... Está
calor aqui.
Aproximei-me lentamente de Antônio.
— Vamos ver os vídeos então? — sugeri.
Ele assentiu.
Bom, que se inicie o que tiver de ser.

TONY

Havia acordado cedo naquela manhã,


empolgado em ver Amanda e juntos finalmente nos
entendermos. Minha esperança era tanta, que
levantei e saí para correr um pouco e conter a

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euforia, precisava relaxar. Ao voltar para minha


casa, tomei um banho e saí com o carro em direção
à casa dela, não sem antes passar em uma
floricultura e lhe comprar um belo buquê de flores
coloridas.
Quando a vi tão linda naquele vestido, meu
desejo se aflorou. Estava resistindo para não tomá-
la para mim de uma só vez. Os pensamentos
desordenados por estar ali com ela faziam com que
me sentisse um garoto imaturo novamente. Era
como se estivesse tentando conquistá-la outra vez.
Levei flores, agia de modo gentil e cavalheiro, não
estava sendo inconveniente… Tudo para que ela
me aceitasse e quisesse estar comigo.
No dia anterior, informei meu pai sobre a
decisão. Não me afastaria de Amanda. Por um
tempo, pensei que poderia ser bom, mas quando a
vi vulnerável, me pedindo para que ficasse com
ela… Meu coração despedaçou-se. Não
conseguiria.
Amanda pegou o DVD guardado na gaveta
do móvel da sala e ligou a TV. Inseriu o disco no
aparelho e pegou o controle, sentando-se ao meu
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lado em seguida.
Ela estava estática ao meu lado, aparentando
não saber muito bem o que dizer ou fazer, então me
olhou de soslaio. Não sei se ela percebeu como eu
estava esperando ansioso para que o vídeo
começasse, mas segurou minha mão.
Me virei em sua direção, foquei os olhos da
mão de Amanda na minha até seu rosto e sorri,
soltando um leve bufo nervoso.
— É agora que você saberá de tudo.
Ela deu play.
— Vamos lá, nossa modelo Clara com seu
vestido bege da princesa...
— Bela.
— Claro! A princesa Bela! Aplaudam!

AMANDA

Ansiosa, nervosa, confusa, era o que me


definia. Estava atônita e sem reação ao ver todas
aquelas cenas. Era eu ali, era eu, minha filha e meu
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chefe protagonizando aqueles vídeos.


— Ah, para, tá moleza esse joguinho. Filma à
vontade, depois eu filmarei sua cara de derrota!
Ha ha ha ha, filma minha risada maléfica também!
— Ah, meu bem... Pra quê me vencer? Vamos
nos divertir de outra forma.
— Não vale, controladora! Está tentando me
controlar de novo! Isso é jogo sujo.
— Adoro jogo sujo.
— Vai me pagar, controladora!
Quando o vídeo da guerra do videogame
começou, eu ri. Achava engraçada a descontração
que havia entre nós e o relacionamento leve que
tínhamos. Porém, meu sorriso se fechou no
momento em que começamos o amasso no sofá.
— Posso pausar? — pedi a Antônio.
— Sim, claro.
Pausei o DVD e coloquei as mãos nos
joelhos, um pouco envergonhada por perceber o
que aconteceria naquele vídeo.
— Nós... Hum... Nós... Você sabe...? —
perguntei um pouco receosa para Antônio.
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Ele sorriu de canto e segurou as minhas


mãos.
— Sim. Já te afirmo que foi muito gostoso.
Ri, mas de nervoso.
— Você é sempre assim tão direto e claro?
— Semicerrei os olhos em sua direção.
— Você sempre gostou dessa minha
característica. — Deu de ombros.
Meu Deus!
Eu precisava pensar.
Pensar.
Levantei, andei um pouco pela sala e depois
voltei a olhá-lo, que permanecia sentado enquanto
me aguardava, recostado relaxadamente no sofá.
— Quero ver o resto do vídeo. — Decidi.
Sentei-me novamente. Logo começou a
passar a cena em que nos amamos no sofá da sala.
Corei e não tive coragem de encarar os olhos dele
naquele momento. Após esse vídeo, começou um
de um restaurante.
... Esse lindo e encantador senhor se tornou

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meu anjo da guarda, me salvou de um vexame


numa boate, me defendeu dos amigos galinhas, me
salvou de um quase acidente na rua, me contratou
em sua empresa e me levou para resolver um
problema com ele em Recife, que me rendeu uma
proposta de promoção absurda com a qual sempre
sonhei. Acontece que esse senhor, o senhor Antônio
Gali, em poucos dias conseguiu mudar toda a
minha vida pessoal e profissional, apenas faltando
uma pequena área que eu jurei que ninguém jamais
tocaria novamente. Meu coração. Mas hoje,
Antônio, aqui com você, eu tenho certeza de que
você me preenche por completo e posso dizer com
todas as letras nos quatro idiomas que eu falo...
EU TE AMO.
Depois ele se declarava. Naquele vídeo eu
contava tudo.
Uma lágrima pesada deslizou pelo meu rosto
quando o vídeo se encerrou.
Não consegui conter a emoção… Eu estava
realmente feliz com ele.
Ainda com os olhos fitos à tela, sussurrei
desacreditada:
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— Eu... Meu Deus... Nós...


Meu olhar era de espanto com o que tinha
visto. E só em saber que ele deve ter visto os
mesmos vídeos por inúmeras vezes, fazia com que
meu peito doesse ainda mais.
— Nos amávamos muito. — A voz grossa,
dolorida e pesada de Antônio instaurou-se.
O choque daquela palavra, Amor, me fez
estremecer ainda sentada no sofá. Eu não sentia
aquilo, não lembrava daquele sentimento, mas
sabia que o que vi no vídeo foi real. Eu o amara
intensamente. De quebra, ainda soube mais um fato
da memória perdida, a veracidade da traição de
Henri e o período que morei com meu irmão.
Eu quero saber como é, eu preciso saber se o
que eu sinto agora pode se tornar amor. Eu quero
dar uma chance a ele. — refleti.
— Antônio?
Me levantei, colocando-me de pé diante dele
e estendi uma mão em sua direção.
Ele me encarou com o cenho franzido,
estranhando a atitude, porém deu a mão a mim.
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Logo nós dois estávamos de pé, um de frente para o


outro.
— Preciso te dizer que, por mais que eu me
esforce, eu não consigo mesmo lembrar de tudo
aquilo, não consigo entender como algo tão intenso
não faz parte de minhas lembranças…

TONY

Enquanto ouvia aquelas palavras, sentia a


mesma sensação que me dominou nos últimos dias:
dor. Sofri a cada dia lentamente, relembrando-me
do amor que vivemos e do amor que ainda sentia e
que nunca poderia apagar do peito, por minha
amada Amanda.
— Amanda — a interrompi. — Não quis que
assistisse ao vídeo para tentar me amar ou querer
voltar pra mim. Reconheço que não se lembra e que
precisa levar a vida como desejar. — Acariciei seu
rosto com delicadeza, prendendo uma porção dos
cabelos escuros e longos dela atrás da orelha. — Eu
só queria não te esconder mais nada, já que de
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qualquer forma você veria os vídeos. Pedro é seu


irmão e pode atestar tudo o que eu disse. Não tenho
nenhum interesse egoísta com relação a você,
apesar de ainda amá-la com toda a minha alma e
minhas forças.
Sua respiração se tornou pesada, e seus olhos
correram pelo recinto antes de voltarem a mim.
— Eu... — Segurou meu rosto e o focou em
minha direção. — Quero tentar.
Minha mente estava conturbada com o misto
de sentimentos, mas ao ouvir da boca da mulher
que amo a palavra “tentar”, foi como nascer de
novo. Finalmente vi uma luz no fim do túnel.
Naquele momento não quis mais falar do passado.
O que passou não mais importava, eu estava
recebendo uma nova chance e faria tudo dez vezes
melhor para reconquistar o amor da minha vida.
—Tentar? — Meus olhos brilharam, com
toda certeza e um sorriso espontâneo surgiu em
meus lábios.
Amanda riu de modo contido, provavelmente
pela minha reação contente.

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— Sim. — Levantou os braços em sinal de


rendição. — Pode me beijar à vontade agora —
disse sorrindo.
Não precisei ouvir a ordem duas vezes,
imediatamente a segurei pela cintura e pus uma
mão em sua nuca quando a tomei para mim em um
beijo lento, provocante, contendo toda a saudade e
o sentimento que reprimi durante o tempo em que
estive longe dela.

AMANDA

Retribuí o beijo com vontade. O desejava e a


vontade de agarrá-lo estava dominando todos os
meus sentidos. Não queria me culpar por estar
recém-viúva ou por não me guardar por mais tempo
até saber exatamente o que sentia pelo meu chefe.
Aquela Amanda queria Antônio ali, naquele
momento.
— Como eu estava com saudades dessa sua
boca deliciosa — disse ele enquanto me beijava,
faminto.
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Eu apenas sorria recebendo suas carícias.


Fazia tempo que minha mente não lembrava o quão
bom é se sentir verdadeiramente desejada. Henri
jamais fazia-me sentir assim. Pelo menos nos
últimos anos de minha memória e nos últimos
momentos após o acidente.
Antônio parou de me beijar e mirou
fixamente em meus olhos castanhos.
— Merda, não sei como devo agir. Quero
fazer amor com você e não sei se irá me achar
atirado se eu sair arrancando sua roupa. — Virou o
rosto de lado, em confusão.
Comecei a rir, pois na verdade eu estava
tímida e esperava que ele conduzisse tudo do jeito
que quisesse.
— Desculpa por rir, é que você é tão fofo.
Faça o que quiser, estou tímida pra tomar alguma
iniciativa, desculpe. — Abaixei o rosto de leve,
corando.
Aquela Amanda de dois anos atrás jamais se
imaginaria numa situação tão inusitada. Eu era
aquela Amanda.

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Seus olhos percorreram meu corpo de modo


fugaz, enquanto suas mãos mantinham-se em meu
rosto, até que ele finalmente tomou as rédeas.
Pegou meu corpo delicado e me levou até a
parede da sala próxima aos quartos, me prensando
lá.
Agarrei a cintura dele com as pernas
enquanto meus braços envolviam seu pescoço. Eu o
queria ainda mais.
Ele me beijou enquanto me devorava em
cada parte do corpo descoberto delicadamente,
adorando e venerando-me por completo.
— Não sabe como sonhei com isso — disse
enquanto lambia o meu pescoço, me fazendo arfar.
— Não sabe como eu te amo — continuou a
dizer enquanto eu apenas ouvia, gemendo.
Então comecei a sentir meu interior se
aquecer, fazendo com que eu ansiasse por seu
toque. Não conseguia crer no que apenas seus
beijos e carícias inocentes estavam causando em
mim.
— Eu quero você agora, logo. Por favor —
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ofeguei, num pedido ousado.


Ele afastou o rosto de meu pescoço e me
olhou, arqueando uma sobrancelha.
— Tem certeza?
Assenti, arrisquei uma olhada sexy para ele e
mordi o lábio inferior.
Ele acompanhou cada ato meu, com os olhos
escuros em desejo.
— Mulher, mulher… Vem cá. — Puxou-me
até o sofá circular da sala de Pedro. Um sofá
diferente, mais confortável, que ficava na ponta da
sala.
Começou a tirar meu vestido enquanto me
venerava. Eu, deitada, apenas o permitia conduzir.
— Você está ainda mais linda do que eu me
lembro — disse ele ao terminar de me despir.
Sorri. Meu sangue estava todo nas minhas
bochechas.
— Sua vez. — Levantei a blusa dele, que deu
permissão elevando os braços.
Ele sentou ao meu lado, me permitindo tirar
sua roupa.
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— Uau. Você é um maldito gostoso! —


exclamei ao ver seu torço definido.
Me repreendi mentalmente, não queria falar
em voz alta. Ele riu.
— Sou todo seu, minha linda. — Agarrou-me
pela cintura e despiu-me por completo, deixando-
me completamente nua. — Agora vou amar você
todinha nesse sofá e depois vamos repetir até dizer
chega, porque não aguento mais essa droga de
celibato!
Sua voz grossa me fez arrepiar.
Imediatamente ele levantou, enquanto tirava as suas
peças de baixo.
Quando encarei seu corpo do modo como
veio ao mundo, arregalei bem os olhos, um pouco
receosa.
Ele não era… Como posso dizer? Não era
como eu estava acostumada.
Era mais.
Ah, era mais.
Bom, se já o tive intimamente antes, tudo
ficaria bem, sim?
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Ele deitou sobre mim, ali no sofá e levou seus


lábios em todos os pontos sensíveis do meu corpo,
me fazendo ansiar por mais e muito mais do que
apenas beijos úmidos.
Quando ele desceu para minha intimidade, eu
estava ansiosa, mas ainda tímida. Ele porém, não
me permitiu sentir nada além de prazer, quando
invadiu-me com os lábios, e depois usando as
mãos.
Eu só conseguia sentir posse por ele. Ele era
meu.
Meu chefe.
Meu Antônio.
Meu amante.
Meu.
— Eu te quero. Agora. — Implorei, num
gemido ansioso.
Ele levantou o rosto e sorriu, soltando os
cabelos em seguida, mexendo neles com uma mão.
Meu Deus! Que visão.
— Você está ansiosa, hã?
Assenti, reprimindo um sorriso.
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Em instantes o senti sendo meu, por completo


com suas investidas rápidas e rítmicas.
Nos entregamos sem reservas ou pudor,
àquele momento.
— Você é a mulher da minha vida —
sussurrou em meu ouvido, aprofundou suas
investidas e depois foi diminuindo a velocidade.
Durante todo o ato, sempre nos
entreolhávamos, apenas desviávamos quando
éramos tomados pelo prazer intenso. Chegamos
juntos ao ápice e depois fomos para o quarto, onde,
após um tempo curto, continuamos a matar a
saudade que nossos corpos possuíamos um do
outro.
Era inevitável dizer que sentia saudades. Meu
corpo ansiava pelo dele, como numa conversa
sobrenatural, que por mais que meu cérebro não
compreendesse, eu notei.
Depois daqueles momentos, ele me
posicionou deitada na cama.
— Vamos descansar um pouco, amor —
disse.

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Nos acomodamos, abraçados e ofegantes,


aguardando as batidas do coração voltarem ao
normal.
— Não consigo nem dizer como amei estar
contigo hoje. — O abracei na cama, dizendo
sorridente.— Prometo que pode ser assim sempre,
se você quiser. — Me olhou com ternura, senti que
era mesmo o que ele queria.
Me sentia tão bem, como se tudo fosse certo,
enfim. Fomos tomar banho juntos e descansar por,
pelo menos, uma hora antes de almoçar. Depois do
descanso, preparamos juntos o almoço, entre
risadas e brincadeiras.
— Não acredito que você nunca fritou um
ovo! — Exclamei rindo, enquanto temperava o
feijão.
— Juro! Só sei preparar coisas fáceis.
Sanduíches, pães, essas coisas. Mas sou um bom
aprendiz, aprendo tudo! — Ele replicou.
Me sentia bem, estava feliz ali com ele. Ele
queria me agradar, ser útil e, de alguma forma,
mostrar que se importava comigo, eu via aquilo.

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— Mas agora é sério. Não precisa mesmo de


ajuda? — perguntou se aproximando de mim por
trás e abraçando meu corpo frágil.
— Definitivamente você não está ajudando
com esse carinho todo — Ri.
— Carinhos são a minha especialidade, ainda
mais em certos locais. — Desceu a mão, deslizando
da barriga dela até mais abaixo, acariciando.
— Ah... Meu Deus... — Recebi a carícia,
satisfeita.
Abaixei o fogo do feijão e virei-me para
Antônio. Caminhamos até o balcão da cozinha e
começamos a nos beijar.
— Assim não vamos comer hoje —
murmurei entre beijos.
— Eu já estou satisfeito, muito bem
alimentado — replicou.
Ri abertamente, soltei os cabelos dele, que
antes estavam presos novamente, e os sacudi. Olhei
para a obra completa que era meu chefe ex-talvez-
futuro-namorado e sorri ao admirar seu rosto bem
traçado, em conjunto com seus olhos azuis
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cristalinos e a boca bem delineada, envolvida pela


barba aparada. Ele era a cada dia mais lindo aos
meus olhos.
— Você é lindo. Eu gosto do seu cabelo
assim, solto — disse numa voz baixa e amorosa.
Ele me puxou pela cintura, agarrando e
grudando meu corpo ao seu, e sorriu.
— Ahhh! Não tem como deixar de amar
você. Meu Deus...

TONY

O amor é assim, muda completamente o


comportamento das pessoas. Eu, que antes era rude
com as mulheres com quem me relacionava, agora
estava mais para romântico paparicador, mesmo
não sabendo muito sobre relacionamentos.
Voltamos a nos beijar, e logo os beijos se
tornaram intensos e convidativos para outras coisas,
mas Amanda os conteve.

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— Vou queimar a comida! — Depositou um


selinho na minha boca e se afastou. — Depois a
gente continua. — Lançou uma piscadela sexy em
minha direção.
Eu, que agora estava de costas, com o corpo
apoiado no balcão pelas duas mãos, segurando-o
enquanto admirava a mulher alvo de meu amor,
sabia que em minha mente existia apenas uma
palavra para definir o que aquela manhã significou
para mim: TUDO.
Sabia que, por mais que eu tentasse, um dia
sucumbiria e diria tudo o que passamos para
Amanda, mas não imaginava que esse momento
chegasse tão cedo, e ainda fechasse com chave de
ouro com situações sensacionais que me relembrou
o quanto sou viciado, além de apaixonado, por ela.

AMANDA

Alguns minutos depois, estávamos comendo


à mesa, quando o meu novo celular tocou.
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— Alô — atendi.
— Oi, Amanda?
— Sim.
— Aqui é Valentina, estou ligando apenas
para confirmar nossa conversa logo mais. Vou
trabalhar até às 17 e depois vou direto praí, tudo
bem?
— Tudo ótimo, estarei em casa sozinha,
poderemos conversar à vontade.
— Combinado, beijo!
— Beijo.
Desliguei e sorri relembrando que começaria
minha boa ação. Valentina me ajudaria a me
aproximar de Laira naquele momento difícil. Não
queria ver o mesmo fim que Henri procurou, na
mulher que foi alvo de seu amor a vida toda.
— Antônio? — perguntei assim que voltou à
mesa.
— Hum? — Ele murmurou mastigando a
comida, fitando seus olhos nela.
— Eu decidi ajudar Laira, sabe, a ex-amante
do Henri. — Contei, um pouco desconcertada.
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Queria inseri-lo na minha vida, para tentar ser


como era antes, mesmo sem saber como realmente
foi minha convivência com ele. Mas pelos vídeos,
percebeu que éramos como melhores amigos.
Ele engoliu a comida lentamente e tomou um
gole do suco de maracujá.
— Você tem um coração enorme. Poucos
fariam isso. Acho isso maravilhoso. Sério. Se tudo
que Henri falou foi verdade, ela deve estar
passando por maus bocados agora. Precisa de ajuda
também.
— Foi o que eu pensei. Sabe, ela não teve
culpa e eu, quando a vi no enterro, me comovi
muito com o estado dela. Você tinha que ver, ela
estava arrasada, em prantos, estava destruída. Meu
Deus... Não desejo aquilo pra ninguém.
— Eu sei bem como é — Comentou
abaixando os olhos, mas logo pareceu notar o que
disse. — Desculpe, não era pra ter mencionado
isso.
— Tudo bem. — Dei de ombros. —
Aconteceu, não há pra onde fugir. E você também
foi muito bondoso em não tomar qualquer atitude
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contra Henri… Nem todo mundo agiria assim.


Ele pareceu pensar um pouco no que eu
disse, antes de responder.
— Isso não anula a vontade que eu tive de
matá-lo todos os dias ou raptar você para mim,
conta? — Riu, e eu o acompanhei. — Mas falando
sério, sou humano, foi horrível… Enfim, passou,
certo?
Assenti. O passado realmente não era algo
bom para ser mencionado. Finalizamos o almoço e
juntos decidimos assistir a algum filme.
Eu estava me sentindo como uma adolescente
com seu primeiro amor. Antônio era atencioso e se
precavia com tudo. Ele me passava segurança, às
vezes até exagerava um pouco nos cuidados.
— Cuidado! — disse ele ao perceber que eu
não alcançava o controle do Home Theater na parte
superior do rack. — Deixa que eu pego.
O filme continuou, entre pequenas pausas
para carinhos e beijos entre nós.
Me deixei levar pelo hoje, sem me preocupar
com o amanhã. Ainda estava incerta de meus
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sentimentos, apenas queria dar uma segunda chance


a nós e esperar para ver no que daria.
A tarde estava terminando, quando Antônio
se despediu naquele sábado e deu um beijo
caloroso em meus lábios, dizendo que sentiria
saudades.
Meu coração estava aquecido. Suspirei contra
a porta quando a fechei. Depois fui tomar mais um
banho pois o dia foi longo. Precisava me aprontar
para receber Valentina.
Durante o banho, meus pensamentos foram
inundados pelo dia maravilhoso que passei ao lado
do meu chefe. Logo algumas imagens do período
perdido de quando minha filha ainda tinha dois
anos retornaram à tona em minha memória. Dos
dois anos inicialmente perdidos, eu já possuía nove
meses de volta.
Sorri. Sorri, pois estava progredindo, mas
queria ir a um médico a fim de obter uma avaliação
melhor. Às vezes ainda tinha algumas tonturas e
vertigens, precisava ver se estava tudo bem.
Ao sair do banho e me aprontar, o celular
tocou.
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— Alô.
— Mandi! Podemos voltar? Clara está aqui
no último brinquedo do parque e está cansadinha.
Tony já foi? Se entenderam? — Pedro perguntou
animado.
— Calma! — Ri. — Meu Deus, isso tudo é
animação por causa de Tony? Pode vir sim, ele já
foi. E nos entendemos sim, depois converso contigo
com calma. Manda um beijo pra minha princesa.
— Tá bom. Daqui a pouco estamos aí. Beijo.
— Tchau.
Depois de alguns minutos, a campainha
tocou.
Ao abrir a porta, olhei bem a mulher diante
de mim. Valentina era semelhante a uma modelo de
passarela, com belos olhos verdes e pele negra,
magra, com cabelos ondulados negros até a metade
das costas. Com certeza faria qualquer homem
rastejar aos seus pés.
— Seja bem-vinda, Valentina. — A recebi,
solícita e sorridente.
Enfim entenderia um pouco mais do que
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Henri viveu.

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Capítulo 23

AMANDA

— Obrigada, Amanda — Val depositou um


beijo em meu rosto e entrou.
Pedi para que conversássemos no sofá, de
modo descontraído.
Ao sentarmos, após eu oferecer um lanche
com algo para beber a Valentina, começamos a
falar de Laira.
— Eu não sei como ajudar, mas quero muito.
Henri falou antes da sua morte que sempre amou
Laira desde a infância.
— Sim, eles se amavam. — Ela respirou
fundo antes de concluir. — Eu tentei nos últimos
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meses abrir a mente dele e tratar o transtorno


borderline que ele tinha, mas foi muito difícil, ele
não queria aceitar que precisava de ajuda e eu nem
podia tratar dele por ser uma pessoa próxima, mas
mesmo assim o fiz.
Fitei fixamente em seus olhos esverdeados.
— Você conhece Laira há muito tempo? —
indaguei.
— Sim, eu nasci e morei até os quatorze anos
aqui em BH, a conheci na escola, éramos melhores
amigas. Depois que voltei para a cidade, nos
aproximamos novamente, e foi quando percebi que
ela e Henri eram duas pessoas com sérios
problemas psicológicos. Estou de volta aqui há
apenas um ano. — Valentina sorria, transmitindo
confiança a mim.
— Ah, entendi. Como deve saber, eu perdi
dois anos da minha memória, então não posso
afirmar sobre o comportamento de Henri nesse
período, mas antes disso eu já via a forma como ele
tentava conter certas atitudes. Às vezes ele parecia
muito descontrolado, chegava muito tarde em casa.
— Laira e Henri estavam juntos desde
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sempre. É uma tristeza falar isso aqui, para você,


mas... Ele a amava mesmo. O amor dele por ela era
muito genuíno, apesar dos problemas. Não posso
detalhar o estado mental de Laira nesse momento
pois, por mais que seja minha amiga, ainda é minha
paciente, mesmo contrariando toda a ética, pois não
consegui deixá-la como estava. Mas sobre Henri
posso contar tudo que sei, pois ele já se foi. — Sua
voz abaixou o tom no fim da frase, em lamento.
— Como acha que posso ajudá-la? Ela
precisa de companhia, dinheiro, remédios? —
Evitei saber mais sobre Henri.
Eu não sentia raiva, nem rancor. Era como se
realmente tivesse passado por cima daquela lacuna.
— Não, tenho suprido todas as necessidades
financeiras dela, mas sua companhia e seu perdão
mais pra frente podem ajudá-la a aceitar, dentro de
sua mente, que não precisa se culpar mais. Seria
bom que vocês, pelo menos, tentassem criar um
vínculo de amizade, nem que fosse apenas
superficial. É bom para ela saber que você a
entende e quer ajudá-la.
Admirei a imponência na voz de Valentina.
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Ela tinha classe e firmeza ao falar sobre assuntos


que entendia bem e uma pose convicta que
transmitia muita confiança.
— Então é o que eu farei. Me fale de você,
Valentina. Preciso conhecer você também, né?
Afinal, sou uma pessoa que adora fazer novas
amizades e já que estamos aqui... — Dei de
ombros, sorrindo.
— Ah, eu sou uma psicoterapeuta formada na
UFRJ com honras, fui financiada no fim do meu
curso por um político importante do Rio de Janeiro,
que investiu em mim e, devido à ajuda dele, hoje
possuo uma rede de consultórios no Rio e aqui em
Belo Horizonte. Mas passei por poucas e boas até
chegar onde estou.
Conversa vai, conversa vem, nós já
estávamos gargalhando, conversando sobre
assuntos supérfluos, descontraídas, sentadas no
sofá. Após um tempo, a porta da sala, que fica na
outra extremidade do ambiente onde estávamos,
abriu-se.
— Mamãe! Mamãe! — Clara entrou
correndo e gargalhando em minha direção. — O tio
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vai me pegar! Ele é um zumbi, um monstro,


mamãe!
Rapidamente pulou em meu colo
escondendo-se de Pedro que, antes de aparecer na
porta, deu um rugido grosso do corredor.
— Ahhhhhhhh! Eu vou comer seu cérebro!!!
— Apareceu andando lentamente, estendendo as
duas mãos para a frente e olhando para o alto, como
um zumbi apartamento adentro.

PEDRO

O passeio foi bom, calmo e muito proveitoso.


Torci o dia inteiro para que minha irmã e Tony se
ajeitassem logo. Não que eu me incomode de tê-la
na minha casa ou qualquer coisa com relação a ela,
mas eu via como meu amigo estava sofrendo. E de
sofrimento eu fiz pós, até me tornei mestre.
Não desejo o que vivi a ninguém.
Assim que chegamos ao meu prédio, ainda
dentro do elevador, fingi ser um zumbi para
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implicar com Clara. Ela sempre curtia minhas


imitações. Foi então quando entrei em meu
apartamento, que notei ela saltar para o colo de
Amanda.
— Ahhhhhhh! —A menina gritava.
— Calma, filha! Ele não vai te pegar! —
Amanda abraçou-a. — Para, Pedro! Vai assustar a
garota! — gritou para mim, rindo.
Comecei a rir e parei com a imitação barata
de zumbi, mas assim que me posicionei perto de
minha irmã, vi que tinha uma outra componente
sentada no sofá.
Imediatamente minha feição se fechou,
tornando-se séria.
Encarei a mulher, rindo internamente das
desgraças do destino com minha vida. Aquilo não
deveria estar acontecendo, não daquele jeito.
Imediatamente o rosto dela também se fechou
e seus olhos arregalaram-se na minha direção.
Pois é, querida. Lembra de mim?
Amanda, ainda com Clara no colo, olhava a
cena sem entender.
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— Pedro — pigarreou. — Esta é Valentina,


lembra que eu mencionei sobre a psicoterapeuta do
Henri e da Laira? — Virou-se para Val. —
Valentina, esse é meu irmão, Pedro.
Sorriu.
Mas nós dois não estávamos sorrindo.
Ficamos sem reação. Parecia um filme pausado. Eu
de pé ao lado de Amanda, que estava sentada no
sofá, e Valentina de frente para Amanda e eu,
sentada e paralisada, também no sofá.
— Prazer em conhecê-lo! — Valentina
levantou e estendeu a mão.
Oi? Como assim “prazer em conhecê-lo?”
Meu rosto com certeza demonstrou minha
confusão mental, porém apertei a mão dela com
firmeza.
— P-prazer... É, o prazer é todo meu — disse
ainda um pouco desconcertado.
Assim que Val soltou minha mão — que
parecia queimar — , Amanda quebrou o clima
tenso do ambiente.
— Bom, estávamos conversando, maninho.
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Vai tomar um banho enquanto a gente acaba de


conversar, porque você deve estar exausto do
passeio de hoje, né? — inquiriu tranquilamente.
Eu, ainda fitando Valentina, assenti e me
retirei dali em silêncio.
Entrei em meu quarto, ainda em choque pelo
que presenciei. Eu a reconheceria do outro lado do
mundo. Eram ainda os mesmos traços, a mesma
beleza, os mesmos olhos carinhosos, mas ainda
assim, era diferente.
Mas ainda era ela.
Era ela.
Na minha casa.
No meu sofá.
Na minha vida novamente.
Porém, não na minha cama.
Não da forma como imaginei o reencontro.
Sentei na minha cama, sentindo meus
batimentos cardíacos desenfreados, e refleti sobre a
forma como ela me tratou, fingindo não me
conhecer apesar dos longos anos. Isso fez com que
eu jurasse a mim mesmo que ela não me afetaria.
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Não mais.
Nunca.

AMANDA

— Eu, hein? — falei olhando para onde meu


irmão acabara de sumir. — Estranho. Não liga pra
ele não, Val, às vezes ele é meio antipático assim
mesmo.
Valentina parecia um pouco aérea, mas sorriu
e assentiu. Logo voltou a conversar comigo
tranquilamente.
— Bom, voltando ao assunto...

A noite chegou e Valentina foi embora. Pedro


não saiu do quarto até ser chamado para o jantar e
Clarinha, após o banho, ficou brincando com suas
bonecas no meio da sala, enquanto eu preparava a
comida.
Durante a janta, com todos à mesa, não me

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contive e perguntei:
— O que foi aquilo? — Olhei para Pedro.
Estava com minha língua coçando desde
quando Valentina foi embora. Ele não agiu de uma
forma muito comum ao lado dela.
— Aquilo o quê? — Agiu como se não
tivesse feito nada.
— Aquela atitude mal-educada com
Valentina. Ela é um amor, sabia?
Ele rolou os olhos.
— Me poupe, Amanda.
Opa, ele me chamou Amanda. Então não
estava animado para conversas. Decidi mudar o
assunto.
— Tony e eu vamos tentar — soltei um
tempo depois, entre as garfadas.
Clarinha comia quieta, apenas nos assistindo.
— Opa, boa notícia. Finalmente vou ver
aquele puto sorrindo de novo. Não aguentava mais
choramingo no meu ouvido.
Irmãos são uma bênção, mas tem dias que

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parecem estarem “virados”. Acho que Pedro estava


tendo um desses dias.
— Ah, sério que ele ficava falando as coisas
pra você? — Estava mesmo curiosa, queria saber
mais do meu chefe.
Pedro bufou.
— Só queria saber de você. Nem um "e aí,
parceiro, como vai?", ou um "cara, tá precisando de
alguma coisa?". Não... Apenas "Amanda tá bem?",
ou "como ela tem falado da empresa pra você?”,
“acha que ela vai gostar de mim?". Tony já estava
no nível babacão master!
Não me contive, ri alto e meneou a cabeça
em negativa.
— Para de falar assim dele, ele é um fofo e
muito amoroso comigo. — Corei. — E você daqui
a pouco tá babacão também. Aposto que em breve
vai estar caidinho por um rabo de saia e vai
entender tudo que Antônio passa!
Ele largou os talheres no prato e me encarou
firme.
— Vii intindi tidi qui intini pissi —
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resmungou, me repetindo com voz fina, rolando os


olhos. — Tá amarrado!
Só consegui rir daquela atitude do meu
irmão, mas torcia para que ele fosse feliz. Pedro
merecia ser feliz em tudo que desejasse, com
alguém ao lado ou não.
Após o jantar, todos fomos dormir, estava
cedo, mas o dia para Pedro e Clara foi cansativo.
Coloquei minha pequena para dormir ao meu
lado na cama, não sem antes contar uma história e
pedir proteção ao Papai do céu pela vida dela. Ela
era o porto seguro da minha vida, a certeza de que
tudo valia a pena.
Após Clara pegar no sono, peguei o celular e
decidi mandar uma mensagem para Antônio.

Oi, já dormiu?

TONY

Meu dia foi simplesmente extraordinário.


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Depois da manhã e tarde que passei com Amanda,


meu fôlego se renovou. Ainda tinha um longo
trajeto a seguir, e isso incluía conquistá-la e fazê-la
sentir tudo o que sinto por ela. Eu queria estar em
tudo na sua vida. Tudo.
Passei o resto do dia em casa, treinando na
minha academia particular, após ter saído da casa
dela. Precisava extravasar a tensão que me
dominava, a ansiedade de ser finalmente feliz com
Amanda e toda a vontade que tinha de prendê-la em
mim para nunca mais soltar.
Consegui relaxar tarde da noite, depois tomei
um banho e fui deitar. Estava em minha cama
pensando se deveria ligar para ela ou não, quando a
mensagem chegou.
Logo visualizei, sorrindo, com o corpo
recostado à cama.

Ainda não, o que está


fazendo?

Nada, senti sua falta agora,


rs. — Ela respondeu.
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Ao ler a mensagem, esfreguei os olhos para


verificar se era realmente aquilo que lera. Estava
tudo começando a se encaixar finalmente. Poderia
tentar ser feliz com o amor da minha vida.

Eu sinto sua falta como sinto


a falta do ar para respirar.
Você tem meu coração,
Amanda.

Queria que ela sentisse as palavras lá, onde


estava.

Eu me sinto honrada,
obrigada por não desistir de
mim.

Eu te amo com tudo que sou,


jamais desistiria.

Pode me ligar? — pediu.

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Em vinte segundos ela já atendia minha


chamada.
— Oi.
— Oi, anjo — respondi.
— Eu estou quase dormindo, fica comigo,
sua voz me conforta. — Amanda pediu, com a voz
cansada.
— Claro, sempre. Quer que eu fale sobre o
quê?
— Sei lá, conta uma história. Vou colocar no
viva-voz.
Ri mas logo pensei numa história magnífica
para contar.
— Lá vai... Era uma vez uma menina muito
linda, ela era a princesa mais perfeita que todo o
reino presenciou. Um belo dia ela se magoou com
muitas pessoas do reino e tentou fugir.
— Ah... — Amanda lamentou. Sua voz era
dengosa, como de uma menininha.
— Daí ela conheceu um príncipe de outro
reino, um príncipe forte, alto e muito bonito, que
nunca na vida havia se apaixonado. Eles se
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apaixonaram, pois o destino quis assim e juntos


foram os melhores rei e rainha que os dois reinos já
viram na história. Fim.
Quando finalizei, não ouvi sua resposta.
— Amor? — perguntei e então ouvi a
respiração pesada atravessando o telefone.
Apenas sorri e desliguei. Mandei uma
mensagem dizendo “te amo” e também adormeci,
em seguida.

AMANDA

Oito dias se passaram desde aquele fim de


semana.
Eu me sentia feliz, apesar das circunstâncias,
e a cada dia me admirava mais com o homem que
Antônio revelava ser. Porém, também a cada dia
daquela semana, suspeitava cada vez mais da
anormalidade do meu estado de saúde. Na segunda-
feira senti enjoo matinal ao sentir o cheiro do café
na cafeteira. Na terça tive vertigem ao subir o
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elevador da empresa, na quinta vomitei antes de


dormir, colocando toda a comida para fora, e no
sábado senti uma vontade absurda de comer
Yakissoba, o que não costumava comer
normalmente.
A segunda chegou novamente e então decidi
ir ao hospital onde fui internada após o acidente,
para tentar entender o motivo de tantos sintomas
aleatórios.
— Oi, doutor Jay. Voltei aqui para que me
explicasse melhor sobre os exames que fiz após o
acidente — relatei todos os sintomas que me
assolavam havia alguns dias, quando o doutor me
recebeu.
O médico pegou meu prontuário, que ainda
estava nos arquivos do hospital, e prontamente me
informou sobre o acidente.
— Aqui está escrito que você não sofreu
nenhuma sequela no corpo, foi apenas a batida na
cabeça pelo vidro lateral do carro durante a
capotagem, você estava de cinto de segurança,
então seu corpo não sofreu nada, foi amortecido
pelo airbag. Apenas a cabeça sacolejou
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lateralmente durante o acidente, quebrando o vidro


da porta do motorista e causando arranhões
superficiais no corpo e aquele sangramento na
cabeça. Quando se internou aqui, cuidamos do
primordial, que foi seu cérebro. O resto do corpo
recebeu atenção, mas os exames superficiais
alegaram normalidade e o exame sanguíneo não
mostrou nenhuma alteração hormonal.
— Mas... Então, o que pode ser? Será devido
à perda da memória?
— Pode ser, mas isso te causaria apenas
algumas tonturas vagas, e nessa altura do
campeonato, não mais. — Doutor Jay pigarreou e
sentado comigo à mesa em seu consultório, olhou-
me nos olhos. — Me desculpe pela indiscrição, mas
você teve relações sexuais após o acidente?
Eu, no fundo da minha mente, suspeitava de
que talvez pudesse ser aquilo. Mas não... Não
poderia ser.
— Sim, mas... Eu sempre tomei
anticoncepcional injetável. Era para aguardar
minhas regras virem e tomar a próxima dose —
afirmei.
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— E elas vieram? — Ele perguntou,


cauteloso.
— Hum... Não.
O doutor se levantou de sua mesa e foi até
um armário na lateral do consultório. Pegou um
teste de gravidez e entregou a mim.
— Faça e depois volte aqui.
Congelei, com aquilo na mão.
— Mas... Não pode ser, eu... Meu marido
morreu, não posso estar grávida. Não posso. —
Minha voz começou a embargar. Pensei em
Antônio e em como ele ficaria decepcionado se eu
estivesse esperando um filho de Henri.
O médico sorriu solícito e afagou meus
ombros.
— Se acalme, vamos tirar essa dúvida hoje.
Vá ao banheiro, faça o teste e depois vemos o que
podemos fazer por ti.
Assenti e sai da sala.
Meus pensamentos estavam embaralhados,
minha visão turva com lágrimas ameaçando sair e o
coração em frangalhos. Não era possível que logo
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quando tudo começava a caminhar, algo fosse


acontecer. Eu amaria meu filho caso estivesse
grávida, mas não poderia obrigar Antônio a aceitar
uma criança que não era dele.
Fui ao banheiro, fiz o teste e esperei as
benditas barrinhas vermelhas.
Positivo.
Respirei fundo e retornei lentamente à sala do
Doutor Jay.
— E então? — Ele perguntou assim que me
viu entrar.
— Positivo — respondi com a voz fraca.
— Sente-se. Se acalme.
Me sentei e fiquei encarando aquela barrinha
contendo a resposta da minha vida a partir daquele
dia. Não podia acreditar que aquilo estava
acontecendo.
— Me disse que tomava anticoncepcional
injetável, não? — O doutor indagou.
Afirmei com a cabeça.
— Mas isso é o que se lembra. Na verdade,
não sabe se parou de tomar.
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E era verdade, eu sabia que fiquei dois meses


separada de Henri antes de conhecer Antônio. Eu
poderia ter parado de tomar o medicamento,
cortando o efeito. Ou talvez já não o tomava há
mais tempo. Pena que não me lembrava.
— Pode ser.
— Vamos fazer uma ultrassonografia agora.
Temos vaga disponível para daqui a 20 minutos.
Aqui está o pedido. Após o exame, pode ir direto
nessa doutora aqui. — Anotou o nome da
Ginecologista e Obstetra no papel. — Ela vai te dar
o melhor atendimento.
Não contive o sorriso pela generosidade do
doutor. Ele estava sendo muito solícito e isso me
acalmava de alguma forma.
— Obrigada. — Peguei o pedido e fui.

— Hum... Temos um bebezinho muito lindo


aqui — revelou a mulher que fazia a
ultrassonografia intravaginal.
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Encarei a tela, vendo aquela manchinha


branca tão perfeita.
— É? Ele está bem? Está saudável? —
perguntei preocupada, queria que tudo ficasse bem
com meu bebê, independente de quem fosse o pai.
— Sim, é saudável. Vamos ouvir o
coraçãozinho. — Ela ligou o som do aparelho e em
instantes, uma batida rítmica, rápida e frenética
ecoou pelo ambiente.
Lágrimas escorreram pelos meus olhos ao ter
a prova auditiva do ser que carregava em meu
ventre.
— Meu Deus... Vou ser mãe de novo — falei
com a voz embargada.
— Sim. Quer saber a idade gestacional?
— Sim, por favor.
Ela começou a anotar alguns dados
pertinentes ao bebê no computador e então se virou
para mim.
— Oito semanas. Com margem de duas
semanas para menos ou para mais. Pelo que sei,
parece mesmo um bebê de 8 semanas gestacionais.
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2 meses.
Imediatamente meu cérebro fez as contas.
Batia exatamente com o dia do acidente. Não era
possível.
Não tinha como ter sido nesse dia, se sofri
um acidente, era para não estar grávida. Ou era?
Ainda um pouco chocada com o exame em
mãos, após aguardar o resultado, liguei para a única
pessoa que poderia me confortar:
— Oi! — disse ao ouvir a voz dele do outro
lado da linha.
— Oi, meu amor, como foi no médico, está
tudo bem? — Antônio perguntou parecendo
preocupado.
— Sim, não era nada demais. Apenas quis
ouvir um pouco da sua voz.
Estava sentada no salão principal do hospital,
assimilando ainda a minha realidade.
— Ah, tá... Já posso te buscar? Como se
sente?
— Um pouco enjoada e emotiva, mas logo
passa. — Pausei e respirei. — Antônio, me diga
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uma coisa. Nós fazíamos muito sexo sem proteção?


Ele pareceu pensar um bocado antes de
responder.
— Como? Se fazíamos sem camisinha?
Fizemos acredito que poucas vezes. Não dá pra
saber exatamente, pois nós fizemos sexo muitas
vezes, muitas mesmo. Mas uma vez você me disse
que tomaria a pílula do dia seguinte. Por quê a
pergunta?
Ah, então eu não tomava nenhum
medicamento. Concluí.
— Por nada, só curiosidade. Daqui a pouco te
ligo para me buscar. Beijo.
— Beijo, anjo.
Desliguei.
Antônio insistira que todos os dias me
buscaria em casa e me levaria do trabalho para lá
no fim do expediente. Ele queria garantir minha
segurança. Achava aquilo um tanto protetor
demais, mas não reclamo.
Ainda em busca de respostas, fui até o andar
da maternidade e procurei pela doutora indicada
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pelo doutor Jay.


Ela estava de plantão naquele dia e me
atendeu prontamente, após liberar duas gestantes.
— Bom dia, querida. Sente-se. — Bianca era
seu nome, uma jovem senhora de pele pálida e
rosto fino, magra, com um olhar carinhoso e sorriso
amigável.
Me sentei e entreguei o exame para a médica.
— Gostaria, antes de tudo, de explicar minha
situação para a senhora — disse à doutora.
Bianca assentiu. Contei tudo o que sabia, do
relacionamento com Antônio antes do acidente, do
acidente, da perda da memória, do ex-marido e da
descoberta recente da gravidez.
— Uau. Sua vida dá um livro! — Bianca
exclamou, por fim.
Tive de rir abertamente pela primeira vez no
dia. Aquela médica fazia-me sentir bem.
— Quero entender se há possibilidade desse
filho ser do meu namorado de antes do acidente e
não do meu esposo depois. Pois, se eu estou de 8
semanas, não tem como ser do meu ex-esposo, pois
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só transei com ele três semanas após o acidente, se


não me engano.
Um frio se apossou de minha espinha, me
fazendo sugar uma boa dose de ar aos pulmões, a
fim de controlar meu nervosismo. Aquela resposta
poderia mudar tudo.

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Capítulo 24

AMANDA

A doutora avaliava cautelosamente os dados


fornecidos por mim e pensava sobre isso.
— Sim, há uma possibilidade. — A solução
acendeu como uma lâmpada em sua mente, pela
sua expressão. — Você pode ter sido copulada no
dia do acidente ou no dia anterior.
Não me lembrava. Queria poder afirmar
quando foi, mas não podia.
— Bom... Verei isso depois com calma,
então. Só dessa possibilidade existir eu fico mais
aliviada. — Sorri.
O resto da consulta foi inteiramente sobre os
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cuidados e os acompanhamentos que teria de fazer


a partir daquele momento. Ao fim, a doutora
receitou algumas vitaminas para que eu tomasse
durante a gravidez e marcou uma próxima consulta,
com uma nova ultrassonografia, para o mês
seguinte.
Assim que saí do consultório, enviei uma
mensagem para Antônio, avisando que poderia me
buscar. Queria contar para ele antes de todos.
Estava com medo? Sim, muito, mas precisava ser
verdadeira. Tinha um relacionamento com ele e
relacionamentos só funcionam com a verdade.

TONY

Estava na minha sala sem muito o que fazer


devido o movimento tranquilo, quando a secretária
do andar da diretoria solicitou entrada.
— Senhor Gali, uma candidata à estagiária
em Relações Internacionais está aguardando para
entrevista.
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Proferiu de pé numa pose profissional.


— Ué? Não seria Nick a fazer essa
entrevista? — indaguei surpreso.
— Sim, mas ele entrevistou uma candidata
anterior a essa e depois simplesmente saiu pra
almoçar. A menina está esperando.
Nick e seus desleixos. Estava a cada dia mais
impaciente com a irresponsabilidade do meu amigo
em algumas coisas. Custava entrevistar as duas
candidatas e depois ir almoçar?
— Ok, manda ela entrar que eu entrevisto.
A secretária saiu e, em instantes, uma mulher
baixinha, magra, com olhos grandes, de traços
fortes e cabelos loiros ondulados entrou em sua
sala, vestindo um terninho social. Ela estava com
salto alto, mas mesmo assim, devia estar com no
máximo 1,65 de altura.
— Com licença, senhor Gali — disse ao se
aproximar.
— Fique à vontade. Como se chama? —
gesticulei para que ela se sentasse e ela obedeceu.
— Larissa. Larissa Mendes — disse ao se
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sentar.
Pedi o seu currículo e fiquei um tempo
analisando-o.
Larissa se saía bem em todas as perguntas e
me deixava maravilhado com sua desenvoltura e
perspicácia.
— Tem experiência com contabilidade.
Muito bom. Está com notas altas no curso? —
perguntei durante a entrevista.
— Sim, sou uma aluna muito dedicada. Na
minha experiência anterior tenho ótimas
referências, se quiser pode ligar para minha antiga
gerente, que ela falará tudo sobre mim — Larissa
dizia, aparentemente sorridente e confiante.
Uma mulher bem confiante de si, pensei.
— Bom, gostei de você. Por tudo que vi no
currículo e tudo que me informou, está contratada.
Só peço que tenha paciência com seu chefe, o
responsável pelo setor de Relações Internacionais.
Ele é um pouco difícil de lidar. Você tem jeito com
as pessoas? — indaguei, atento.
— Sim, nunca arrumei problema nos meus
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trabalhos. Possuo uma personalidade forte, mas sei


onde é meu lugar. Prometo contribuir muito com a
empresa.
Assenti e passou todas as informações
pertinentes a salários, benefícios e carga horária
para a nova estagiária de Nick. Logo informei a
Larissa onde ficava o setor de Recursos Humanos e
passei um ramal para a atendente de lá, informando
que a nova estagiária estava indo para admissão.
— Muito obrigada, Senhor Gali. — Larissa
se levantou e estendeu a mão em menção a um
aperto.
Apertei sua mão pequena e sorri em resposta.
Liberei sua nova funcionária e recebi em seguida a
mensagem de Amanda.
Sai correndo como um velocista e em
minutos estava buscando o amor de minha vida,
que me aguardava na porta do Hospital.
Amanda entrou no carro e me deu um breve
beijo antes de partirmos para a empresa.
— E aí, amor? Como foi? — perguntei
enquanto dirigia.

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Amanda parecia nervosa. Tamborilava os


dedos nas coxas.
— Vamos comer algo primeiro, aí te conto.
— ela sugeriu.
Senti uma onda de preocupação me invadir,
mas concordei e então dirigi até um restaurante
para almoçarmos.
Era um restaurante requintado, que já tinha
visitado algumas vezes. Nos sentamos próximo da
janela em uma mesa para dois, ela ficando de frente
para mim. Enquanto saboreavam a comida,
Amanda parecia pensativa demais. Apenas
aguardei o que ela tinha para dizer.
— É... Como foi de manhã na empresa? Fiz
falta? — perguntou, jogando conversa fora.
Estava começando a ficar desconfiado.
Primeiro ela me liga mais cedo e pergunta algo sem
pé nem cabeça, depois fica silenciosa e diz que
contará algo, mas quando estamos finalmente em
um bom momento, me pergunta trivialidades.
Repousei os talheres no prato, limpei a boca com o
guardanapo e sorri.

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— Pra mim fez, mas se sua preocupação é


com trabalho acumulado, fique tranquila. Hoje foi
bem calmo — garanti.
Um silêncio sepulcral se instaurou no
ambiente e o nervosismo de Amanda se tornou
mais evidente.
— Hum... Antônio?
Eu não tirei os olhos dos dela.
— Oi?
— O que faria se eu estivesse grávida?
Assim... Apenas uma suposição. — Ela apoiou o
cotovelo na mesa e encostou o queixo na mão,
aguardando minha resposta.
Grávida?
Minha mente imediatamente se invadiu com
a imagem de Amanda barriguda gerando um filho
meu, então sorri.
Era uma pergunta fácil.
— Eu amaria ser pai — falei sorrindo.
Amanda engoliu em seco. Por que parecia
não gostar muito da ideia? Então ela abaixou os
olhos e voltou a remexer na comida com o talher,
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quando disse:
— É que... Eu estou... — Parecia
constrangida.
A voz de Amanda dizendo que estava grávida
ecoou em minha cabeça então a ficha caiu
lentamente, deixando-me branco como um papel e
boquiaberto.
Seria possível?
— G-g-grávida? — gaguejei.
Ela assentiu.
— Eu... Vou... Ser pai? Existe essa
possibilidade? — perguntei, interessado.
Eu queria mesmo saber. Afinal, sabia que
tivemos relação algumas vezes sem preservativo,
então havia uma pequena possibilidade.
— Bom, a princípio não existia, mas então a
obstetra me informou que, se o bebê foi “fabricado”
no dia do acidente ou no dia anterior, pode ser que
seja seu. A idade gestacional é de 8 semanas e bate
exatamente com o dia do acidente. Podendo ter
uma margem de erro de duas semanas pra mais ou
pra menos, mas na ultrassonografia pareceu ser de
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8 semanas mesmo. — Amanda falava devagar,


parecendo ter medo da minha reação.
Só que ela se surpreendeu. Com certeza se
surpreendeu. Porque não havia o que temer… Eu
estava completamente maravilhado.
— Ai, Deus! Amanda, jura que eu vou ser
pai? — indaguei eufórico. — Deixa eu ver a ultra?
Amanda riu levemente e pegou o papel do
exame. Deu em minhas mãos e mostrou o pequeno
embrião na foto.
— Aqui... O bebê — indicou.
Simplesmente segurei o pedaço de papel
negro contendo a ultrassonografia com as mãos
trêmulas inundadas de emoção ao saber que seria
pai. Não apenas pai, mas pai de um filho da mulher
que amo.
— Não... Puta merda... — balancei a cabeça,
desacreditado. — Amanda, isso não é alguma
piada, né? Porque se for, você vai ser obrigada a ser
torturada por mim vivendo apenas de sexo até
engravidar de verdade — a alertei, temeroso.
Amanda levantou as sobrancelhas em
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desafio.
— Acho que eu sobreviveria muito bem com
esse tipo de tortura. — Sorriu. — Mas não, não é
piada. Estou mesmo grávida.
O mundo tinha parado de girar naquele
instante. Senti meus olhos arderem. Eu ainda fitava
a imagem do meu filho, em mãos.
— Droga, tô sensível... Vou ser pai mesmo...
Vou ser pai — dizia para mim mesmo em voz
contida. — Amor, tem noção do que é isso? Não...
Você não deve ter.
Levantei os olhos para Amanda, que parecia
apreciar o momento. Estava feliz demais, aquilo
era… Um presente da vida. Uau… Não me contive
e levantei, estava nervoso andando de um lado para
o outro, passando a mão pelos cabelos soltos,
próximo à mesa onde estava sentado com Amanda,
que assistia a tudo calada.
Um garçom, vendo o movimento,
aproximou-se cautelosamente, solícito.
— Senhor Gali, algum problema?
Eu não respondi, estava ainda um pouco em
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transe. Aquela novidade mudou totalmente minha


vida.
— Ele está bem, não é nada. Pode se
despreocupar — Amanda afirmou ao garçom.
Ele assentiu e se retirou.
— Antônio? — Ela levantou-se e parou de
frente a mim.
A encarei, com os olhos arregalados pelo
espanto da notícia e, depois de alguns segundos,
despenquei nos braços dela, abraçando-a
fortemente.
Como a amava! Como amava esse
bebezinho! Meu Deus… Eu seria mesmo pai de
uma criança. Logo pude sentir algumas lágrimas
escorrerem por meu rosto, acompanhadas de um
soluço involuntário que escapou da minha garganta.
— Não acredito... Isso não pode estar
acontecendo comigo. Eu não mereço... Eu sou um
filho da mãe, o que eu vou ensinar pro meu filho?
Olha pra mim, chorando como um bebê! — dizia
com o rosto afundado no pescoço de Amanda.
Seríamos uma família.
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Ela, eu, Clarinha e nosso bebê.

AMANDA

Fiquei absurdamente surpresa com a reação


de Antônio à notícia da gravidez. Ele sequer
cogitou a dúvida da paternidade e aquilo me deu
muito mais ar para respirar. Meu medo era que ele
temesse não ser o pai. Na verdade, eu ainda temia,
mas saber que ele agiu como um homem disposto a
arcar com as consequências comigo, me fez gostar
ainda mais dele.
Eu ainda o acarinhava e passava suas mãos
pelas costas dele, tentando acalmá-lo. De todas as
possibilidades, aquela nunca havia passado pela
minha mente. Vê-lo chorando de emoção, não
contendo as palavras embaralhadas que saíam
desenfreadamente na hora do nervosismo.
— Calma, vai dar tudo certo. Estamos juntos
nessa — o consolei.
Senti ele aproximar o rosto do meu ouvido.
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— E agora? Como eu vou sair desse lugar


com a cara vermelha de choro? Vão me achar uma
barbie chorona.
Não contive o riso, uma risada alegre e
aberta, e me afastei dele para olhar seu rosto.
Ele cruzou os braços e abaixou a face,
deixando os cabelos cobrirem provavelmente com
vergonha da cena e demonstração desse lado tão
frágil dele. Parecia um menino birrento.
Me aproximei e levei a mão até o cabelo dele,
prendendo-o detrás da orelha e levantando o seu
rosto pelo queixo lentamente, fazendo com que o
mar azul de Antônio encontrasse com o meu olhar
acastanhado.
— Você está ainda mais lindo, mais homem e
mais maravilhoso com essa cara vermelha cheia de
lágrimas. — Meu peito se aqueceu de forma
profunda ao vê-lo assim.
Ele arriscou um sorriso de canto e me puxou
para mais perto. Segurou meu rosto e me encarou
com profundidade.
— Estamos juntos nessa, é o que diz? Quero

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que case comigo. Nosso filho ou filha terá os pais


juntos pra sempre.
Ao ouvir esse pedido que mais parecia uma
ordem, estremeci. Não estava pronta para esse
passo. Casamento é algo muito sério, acabara de
sair de um pela segunda vez e não queria, nem se o
amasse, entrar em outro agora.
— Antônio, vamos voltar para a empresa e
conversamos melhor.
Não quis parecer fria, mas percebi o olhar dele perder
um pouco do brilho. Também notei que ele tentou disfarçar
sua decepção pelo que acabara de dizer a mim. Então apenas
assentiu, pagou a conta e juntos fomos embora para a
empresa.

— Mas que merda, hein? Tô esperando você


há séculos, Barbie. — Nick disse ao nos ver chegar
na sala de Antônio, onde o esperava.
— O que faz aqui, Nick? — ele perguntou,
enquanto caminhava e sentava em sua cadeira.
Me sentei em um sofá próximo à mesa de
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Antônio e fiquei assistindo aos amigos.


— Você fez a merda de contratar uma
estagiária quando eu já tinha acabado de contratar
outra! — falou impaciente, ainda de pé, encarando
o amigo apoiado em sua mesa.
Notei Antônio refletir um pouco antes de
responder.
— Era para ao menos ter avisado, a menina
ficou te aguardando para a entrevista sem saber de
nada — explicou à Nick.
— E agora? — replicou.
Nosso chefe respirou fundo, uniu as duas
mãos as entrelaçando e levando-as ao queixo de
forma pensativa, enquanto apoiava os cotovelos no
braço da cadeira giratória.
— Não sei. Verifica se ela tem alguma outra
experiência no currículo e transfere ela de setor.
Não precisa cancelar a contratação dela, eu a achei
muito competente.
Nick bufou.
— Competente é a que eu contratei — ele
simulou uma silhueta feminina no ar. — Se é que
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me entende.
A feição de Antônio ficou imediatamente
brava. Socou a mesa, como se estivesse
martelando.
— Não acredito, Nick! Contratou a estagiária
pela beleza? Tu não presta mesmo... Estou quase te
demitindo!
Nick levantou as mãos no ar.
— Não, chefe! Desculpe — ele começou a se
explicar. — Também é linda, mas muito
competente na área profissional. Juro.
Eu apenas via a cena e continha as risadas
para mim. Nick era incorrigível, estava para nascer
alguém que o colocasse nos trilhos.
— Vai logo, Nick, resolva isso e depois me
passa. — Antônio encerrou o assunto.
Ele assentiu e saiu da sala, mas antes se
despediu de mim, que o respondi com um sorriso.
Assim que ele se foi, me levantei do sofá e
caminhei até aquele homem lindo por quem estava
começando a nutrir sentimentos fortes, ficando de
pé atrás dele, quando o tal estava sentado em sua
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cadeira, tenso.
— Calma, Nick vai resolver isso. —
Massageei seus ombros em tentativa de relaxar sua
tensão.
Antônio jogou a cabeça para trás e fechou os
olhos, recebendo a massagem que eu fazia
delicadamente.
— Não sei o que seria de mim sem você —
disse ele.
Sorri, continuando minha missão.
— Digo o mesmo. Você tem sido meu salva-
vidas — afirmei entre as massageadas que dava em
meu chefe.
— Ah... Isso é bom. — Ele soltava o ar e
gemia com a carícia. — Vem cá, amor. — Abriu os
olhos e me puxou para sentar em seu colo.
Me sentei de lado e aconcheguei meu rosto
no peito dele, que começou a acariciar meus
cabelos e braços.
— Quando eu não achava que podia ser mais
feliz, você me presenteou com mais um motivo de
felicidade. Obrigado — disse num sussurro rouco
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que me fez arrepiar.


— Eu não sei o que dizer — respondi,
também sussurrando.
— Shiiiiu — ele me cortou. — Não diga.
Não precisa. Apenas fique em meus braços e nunca
mais vá embora.
Naquele instante senti em meu íntimo, lá no
fundo do meu coração, que não conseguiria viver
longe dele outra vez.
Ele era meu lar.

Era uma noite de julho de 2015, quando


cometi a loucura de, pela primeira vez, dormir na
casa de Antônio e deixar minha filha na casa de
Pedro, aos cuidados da babá. Nós passamos uma
noite magnífica de intimidade e conversas pessoais,
onde ele contou novamente sobre seus pais,
revelando seu passado e tudo o mais que, segundo
ele, eu não recordava. Revelou também que não
hesitou em ficar quando seu pai pediu que ele fosse
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para Recife, pois eu o havia pedido para


permanecer aqui.
Dentre as conversas que aconteceram, ele
perguntou:
— Amor, você nunca me falou de seus pais,
sabia?
Para mim era difícil mencioná-los.
Provavelmente não estava pronta para falar sobre
isso, mas ali com Antônio decidi me abrir. Não
éramos apenas um casal novamente, agora teríamos
um filho juntos.
— Meus pais se divorciaram quando eu tinha
18 anos. Foi uma briga feia pelo dinheiro da casa
onde morávamos. Eles venderam a casa, dividiram
o dinheiro e foram cada um para um canto. Minha
mãe foi curtir a vida e meu pai levou sua namorada
de 20 anos na época, para morar com ele longe de
nós.
Antônio me abraçava debaixo da coberta,
tentando passar conforto e compreensão pelo que
eu revelava.
— O que houve com você, então? Onde foi

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morar? — perguntou calmo e deu um beijo em


minha cabeça. Eu estava recostada em seu peito nu.
Cutucar feridas do passado não era muito
bom, mas levei uma boa dose de ar aos pulmões
antes de falar.
— Pedro. Às vezes penso que Pedro
amadureceu muito rápido. Ele estava juntando
dinheiro desde sei lá quando. Eu nunca perguntei o
porquê dele juntar tanto dinheiro, mas assim que
nossos pais se separaram, ele me contou que tinha
um bom dinheiro guardado e que poderíamos morar
de aluguel, deixando a casa paga por um ano inteiro
— pausei. — Foi o que fizemos, a princípio. Eu
arrumei um emprego de secretária em uma boa
empresa e Pedro continuou a faculdade pública de
administração, enquanto nas horas vagas estagiava
e trabalhava em dois lugares diferentes. Não me
pergunte como ele sobreviveu, mas nunca me
faltou nada.
Ele revelou que Pedro sempre se comportou
como um irmão protetor, até antes de me conhecer.
Realmente nunca teria irmão melhor que ele.
— Pedro é meu ídolo a partir de hoje. Me
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lembra de quando visitá-lo, beijar aquele pé


chulezento dele — brincou e eu ri.
— Eu queria ter tido a garra dele, sabe? Mas
logo conheci Henri e... Bom... O resto você já sabe
— concluí.
— Sim. Nunca mais entrou em contato com
seus pais?
— Apenas quando casei. Liguei pra eles
avisando do casamento. Meu pai me desejou
felicidades pelo telefone e minha mãe
simplesmente disse “ah, que bom”. Não sei
exatamente em qual momento eles deixaram de se
importar comigo e com Pedro, mas eu não sentia o
amor deles há muito tempo antes da separação.
Realmente tudo que eu sou devo ao meu irmão. Por
isso nunca reclamo quando ele me pede algo ou
quando precisa de mim. Não hesito em ajudá-lo.
Morei com ele mais jovem, morei com ele
recentemente, antes de te conhecer, moro de novo
com ele agora. Meu irmão nunca me diz não e eu
fico só pensando quando será o momento dele parar
de querer salvar a pátria e pensar em sua própria
felicidade.
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Antônio ficou pensativo. Pareceu pensar em


inúmeras coisas antes de falar.
— Realmente, Pedro é o líder. De nós quatro, eu,
Nick, Lucas e ele, quando Pedro ordena, todos
fazem. Há algo nele que nos faz obedecê-lo. Deve
ser essa coisa paterna que ele tem desde sempre
com você — afirmou sério.
— Deve ser. Ele já tem 30 anos quase e ainda
não se apaixonou, nem encontrou alguém legal pra
dividir a vida. Não que eu ache que ele precise
disso pra ser feliz, mas eu sempre imaginei Pedro
como aqueles paizões de família, sabe? Com a casa
cheia de filho pra cima e pra baixo. Dando bronca,
botando moral ou até mesmo imitando zumbi,
como faz sempre com Clara. Ele seria um bom
esposo e pai. Tenho certeza.
— Bom saber, porque eu não sei nada dessa
coisa de ser pai. Vou pedir uns conselhos pro
Pedroca. Enquanto isso... Deixa eu dar um beijinho
nesse forninho quente que tá com o bebê mais lindo
da face da Terra — falou abaixando o corpo até
alcançar meu ventre.
Ao chegar lá, depositou muitos beijinhos e
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carinhos que me fizeram rir e admirar.


Céus, eu estava a cada dia mais envolvida por
ele. Seu cuidado e o modo como me tratou desde
sempre que me lembro, só mostrava veracidade em
tudo que dizia.
— Vou te contar um segredo, bebê. A mamãe
é muito gostosa e infelizmente não será só sua. Eu
vou deixar você ter o corpo dela por um tempo,
mas é emprestado, por que esse corpinho é só meu,
tá bom? — falou dirigindo-se ao bebê.
— Meu Deus... Já sei que vai ter ciúme da
criança — afirmei, sorrindo.
Ele levantou o rosto para ela, fazendo cara de
sonso.
— Ciúme, eu? Não sei nem o que isso
significa, né, bebê? — Voltou ao bebê. — Viu? Eu
sabia que ia concordar com papai.
Só balancei a cabeça achando engraçado toda
aquela euforia dele com a criança. Um dia
conversamos sobre questão da paternidade, mas
Antônio foi taxativo quando falou: “eu te amo, te
dou prazer e te quero. Eu sou o pai e ponto”.

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Depois daquilo não discuti mais e aceitei de bom


grado, afinal, ele queria assumir o filho como dele,
mesmo com as pequenas dúvidas que ainda
circundavam a minha mente.
— Vem cá. — Agarrei seus cabelos,
levantando-os até minha altura.
— Ai... O cabelo não, princesa. O cabelo é
sagrado! — disse ao sentir o puxão.
— Quero beijo — disse olhando em seus
olhos.
Ele estava com o corpo sobre o meu, sem
forçar o peso, enquanto eu falava.
— Apenas beijo? — Então ele roçou sua
masculinidade em minhas coxas. — Tô afim de te
dar isso aqui. Quer? — E devorou minha boca
naquele instante.
Nossa língua começou uma dança lenta e
sedutora com sabor de desejo, que fez com que eu
ansiasse por mais dele imediatamente.
— Quero — confirmei após o beijo.
— Você que manda. — Então ele se
posicionou e começou a estocar sensualmente,
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enquanto intercalava as reboladas.


— Vem... Me faça sua...
O sexo entre nós era sempre daquela forma,
surreal. Magnífico, novo. Nunca parecia velho ou
monótono. Amávamos dar prazer um ao outro e
conseguíamos nos conectar ainda mais nesses
momentos.
Após nós dois tomarmos um banho, vimos
que já era tarde da noite e decidimos deitar e
dormir.
— Amor... Eu esqueci que semana que vem
tem o aniversário da avó do Nick — lembrou ao
verificar o calendário no celular antes de se deitar
novamente.
— Tudo bem. Todos vão?
— Sim, você vai conhecer o Lucas pela
segunda vez. Não se assuste — brincou.
— Tudo bem. — Sorri. — Você estará lá,
então não tenho nada a temer.
Depois disso, nos aconchegamos e ficamos
nos acariciando até o sono bater.
No dia seguinte, um sábado, nós dois
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acordamos cedo, pois decidimos juntos sair com


Clara para o shopping. Lá tinha um parque de
diversões bem completo, o que poderia animá-la.
— Eu amo muito a Clarinha. O que acha que
ela vai dizer sobre a ideia do irmãozinho ou irmã?
— Antônio perguntou, enquanto subíamos o
elevador do prédio de Pedro a fim de aprontá-la
para o passeio.
— Sei que a ama, dá pra ver. Acho melhor
esperarmos um pouco. Não sei como ela reagiria —
respondi.
Ele assentiu e então chegamos ao andar.
Eu já tinha a chave de casa, então não
precisei bater nem tocar a campainha. Ao entrar,
percebi o silêncio. Pedi a Antônio, em um sussurro,
que aguardasse sentado no sofá da sala, enquanto ia
verificar se Clara estava acordada no quarto. Ao
chegar no aposento, vi que minha filha ainda
dormia, mas a babá, que devia estar ao lado dela,
não se encontrava.
Será que ela tinha ido embora cedo?, pensei.
Decidi ir ao quarto do meu irmão, para avisar

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que já tinha chegado e sairia com Clara e Antônio.


Mas, ao abrir a porta, surpreendi Pedro
totalmente pelado, com os lençóis bagunçados pela
cama e, ao lado dele, Kate, a babá, também nua.
Não acredito! — pensei com raiva.
— Com a babá, Pedro? Sério? — dei um
grito, fazendo com que os dois saltassem da cama e
despertassem.
— Ai, merda. Não foi como você pensou,
Mandi... Eu estava só...
— Cala a boca! — o cortei. — Você! —
apontei para a babá. — Está demitida, nunca mais
te contrato.
— Me desculpe, senhora, eu... — Ela tentou
argumentar.
— Demitida! E se algo acontecesse com
minha filha durante a madrugada? Se ela acordasse
antes de todos e não visse ninguém? Pior... Se ela
vem ao quarto do Pedro e é presenteada com a
mesma visão que eu? VOCÊS SÃO LOUCOS?! —
esbravejei.
Eu estava muito, muito estressada ao ver
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aquilo. A babá, muito constrangida, levantou-se e


catou suas roupas. Já estava andando em direção à
porta do quarto, onde eu estava, quando foi contida.
— Ei! Vai sair assim? Coloca a roupa que
meu homem está na sala. Não quero ele vendo essa
pouca vergonha! — Apontei o indicador para o
corpo nu dela.
Ela assentiu e começou a se vestir ali. Pedro
assistia a tudo sentado, quieto, na cama.
Devidamente vestida, Kate saiu do quarto,
pegou seus pertences e foi embora sem dizer mais
nada. A vergonha que ela sentia, provavelmente
falou mais alto.
Eu ainda estava de frente à cama de Pedro,
com os braços cruzados o fitando séria, quando
Antônio entrou no quarto.
— Hahaha! Espertinho! Quando a gente não
acha que pode se surpreender com seus recordes,
você bate mais um! Comer a babá, Pedro? A
menina tem o quê? 18 anos? — Ele riu, zombando
do amigo.
— Acho que 19, mas são todas iguais. —

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Deu de ombros.
— Meu Deus... — sussurrei e balancei a
cabeça em negação.
Por que homens são assim?
— Mandi, não vou tentar me defender, sei
que foi errado e que Clarinha devia ter sido vigiada.
Mas você reparou a roupa daquela garota? Quem
vai trabalhar de babá vestida daquele jeito? Juro
que tentei respeitar e tudo mais, o direito é dela,
mas aí do nada ela começou a dar bandeira, fazia
umas caras sexys e me atentava... Apenas dei o que
ela queria. Juro que eu fiz ela me dizer claramente
o que queria e ouvi com todas as letras, "quero que
você me fo...”
— Eca, Pedro — o cortei. — Não me dê
detalhes! Você é meu irmão!
Pedro riu da minha reação e se levantou.
Vestiu a cueca, uma bermuda e passou por mim e
Antônio em direção à cozinha.
— E vocês, aproveitaram muito? Pouco?
Intermediário? — perguntou ele da cozinha,
enquanto abria a geladeira.

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Antônio e eu voltamos para a sala e nos


entreolhamos. Sorrimos cúmplices e assentimos.
Era hora de Pedro saber da gravidez, finalmente.
— Maninho lindo.
Pedro parou imediatamente o que estava
fazendo — o seu sanduíche — e olhou
semicerrando os olhos em direção a mim, pela
parede aberta da cozinha americana.
— Maninho lindo? Que bicho te mordeu?
Antônio reprimiu uma risada e se sentou no
sofá, quieto.
— Nada. Bom... Temos uma notícia.
Foi quando Pedro ficou estático feito gesso,
ao retornar para a sala no exato momento em que
pronunciei as palavras “tio” e “grávida”.
— Pedro? Entendeu o que eu disse? —
perguntei um tempo depois.
O olhar dele estava longe. Reflexivo
— Putz, era pra ser... Eu vou ser tio de novo
— falou enfim.
— Tio de um filho meu. Finalmente vamos
ser família, mano! — Antônio se levantou do sofá e
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foi abraçar o cunhado.


Pedro, ainda um pouco aturdido com a
notícia, recebeu o abraço e depois encarou o amigo,
segurando em seus braços.
— Tu sabe o que minha irmã passou esses
anos todos, não sabe, pela saco? — Firmou a voz e
indagou a ele, que ficou sério, porém assentiu. —
Se eu souber que minha irmã derramou uma
mínima lágrima, do tamanho de um espermatozoide
sequer, ou que você a magoou ou que não está
sendo um bom pai... Juro que, além de acabar com
a nossa amizade, você vai ter uma séria conversa
com meus punhos. Tá ouvindo, maldito?!
Ai, meu Deus. Rolei os olhos para aquela
cena ridícula de irmão mais velho.
Antônio assentiu.
— Pedro, para de palhaçada. Você sabe mais
do que ninguém o quanto ele me ama e quer me
proteger — entrei no meio deles.
— Sei... Mas tá avisado. — O largou e virou-
se para mim. — E você se cuida. Quero meu
sobrinho ou sobrinha muito saudável e forte. —

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Finalmente desfez a carranca e sorriu, dando um


abraço em mim. — Parabéns, Mandi.
— Obrigada, maninho. Eu te amo muito. Um
dia, quem sabe, não será você tendo filhos?
Ele logo afastou o abraço e enrijeceu.
— Acho que não. — E voltou para a cozinha
a fim de finalizar o sanduíche.
Não entendia ainda o motivo dele fugir
quando falávamos de um futuro com esposa e
filhos. Eu, hein.
Encarei o pai do meu bebê, sem entender
muito e demos de ombros, conformados. Logo
fomos acordar Clara e em alguns minutos já
tínhamos nos aprontado, lanchado e saído para o
passeio.
— Tio Tony, você é namorado da mamãe de
novo? — ela perguntou no carro, durante o trajeto.
Ah, minha pequena… Só você mesmo!
Antônio sorriu.
— Sim, e dessa vez é pra sempre — falou.
Também sorri e afaguei a mão, a que não
estava no volante, do meu namorado em um gesto
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de gratidão e conforto.
Clarinha ficou feliz e logo começou a
tagarelar sobre princesas, Sininho, Frozen e outros
clássicos da Disney.
O passeio daquele dia foi incrível. Primeiro,
fomos ao parque dentro do shopping. Brincamos de
bate-bate, simulador 6D, carrossel, jogos de corrida
e muitos outros que Clarinha fazia questão de
brincar. Após algumas horas nós almoçamos e
depois fomos ao cinema ver um desenho que estava
em cartaz. Clara quis falar durante todo o filme e
Antônio conseguiu convencê-la a ficar quieta com a
pipoca. Deu certo e nós três conseguimos assistir ao
filme em silêncio.
Após o cinema, Antônio quis fazer algumas
compras para mim, o bebê e Clara. Mesmo não
sabendo o sexo, ele queria comprar algo. Já não me
sentia tão constrangida com suas atitudes
espontâneas e o segui onde quis.
Enquanto andávamos pela loja de bebês e
crianças, ele puxou conversa.
— Amor, o que sua intuição diz sobre o
sexo?
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Eu, que estava vendo uma sessão de bodys


divertidos, parei e fiquei pensativa antes de
responder.
— Acho que amaria se fosse menino ou
menina. Tanto faz. Por quê?
— É que... Eu sempre tive um sonho
reprimido depois que minha mãe faleceu, de... Se
um dia eu tiver uma filha mulher, colocar o nome
dela — falou um pouco receoso.
Olhei para seu rosto tão límpido e
transparente, e só pude sorrir.
— Por mim tudo bem. Letícia é um lindo
nome — o confortei, sabia que doía o peito do meu
namorado ao falar de sua mãe. Na noite anterior, já
tínhamos falado sobre todas as dores passadas.
O beijei.
— Obrigado — disse ele olhando em meus
olhos e então continuamos o passeio pela loja.
Por fim, ele comprou dois bodys. Um branco,
escrito "Cópia reduzida e autenticada de papai e
mamãe", e outro com os dizeres "Não perturbe.
Jogando videogame com o papai".
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— Meu Deus... Você é uma figura. — Ri,


enquanto lia os dizeres dos bodys.
— Só li verdades. — Antônio deu de ombros
e riu. Virou-se para minha filha. — Vamos,
Clarinha?
Clarinha estava no setor para crianças
maiores. Ela escolheu algumas roupas e ele fez
questão de comprá-las.
— Vamos, tio. — Ela deu as mãos a nós, mas
não perguntou nada sobre as roupas de bebê.
Ela estava muito entretida, escolhendo suas
próprias roupas, para imaginar qualquer hipótese,
suponho.
Fomos lanchar no fim da tarde e, ao nos
deliciar com o lanche, Antônio olhou um pouco
adiante e pareceu assustado.
—Aquele não é Pedro? — Chamou minha
atenção.
—Onde? — Olhei na direção apontada e
também fiquei surpresa.
— Quem será aquela mulher?
— É... A Valentina — respondi um pouco em
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choque. — A psicoterapeuta da Laira. Mas o que


será que ela quer com Pedro? Será que estava
querendo falar comigo?
Não fazia sentido algum.
— Não sei. Vamos observar, eles parecem
discutir algo.
Pedro e Valentina não pareciam estar em uma
conversa amigável e, do nada, ele se virou, dando
as costas para ela, saindo a passos largos pelo
shopping. Val bateu as mãos nas coxas e foi atrás
dele. Ao alcançá-lo, puxou seu braço, mas Pedro se
soltou, falou algo para ela e se foi, deixando-a
estática no fim da praça de alimentação, sozinha
com as mãos na cabeça, em sinal de preocupação.
— Depois vou falar com ele — comentou e
Antônio concordou.
Tinha caroço naquele angu.
Ao finalizarmos o passeio, Antônio nos levou
para sua casa a fim de passarmos a noite lá, com
ele.
Clarinha entrou animada e saiu correndo até a
TV.
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— Vamos ver Sininho? — perguntou dando


pulinhos.
Me aproximei, depositei minha bolsa pelo
sofá e abaixei na sua altura.
— Filha, mais uma vez? Você já vai fazer
cinco anos em breve.
— Por favooooor? — suplicou unindo as
mãozinhas.
Então aquele dia acabou com nós três unidos
como uma família assistindo desenhos, devorando
pipoca e rindo à toa.

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Capítulo 25

AMANDA

O dia do aniversário da avó de Nick chegou


e, com este dia, muitas surpresas e descobertas.
Antônio, Clara e eu fomos juntos no carro dele para
a fazenda onde seria realizada a comemoração. A
fazenda ficava em uma cidade vizinha, a algumas
horas de distância de Belo Horizonte e era
estonteante em seus hectares. Nick e Pedro foram
juntos, enquanto Lucas alugou um helicóptero para
ir com sua namorada da vez, pelo que meu
namorado informou.
A avó de Nick aguardava na soleira da porta
enorme do casarão, até que viu os nossos carros se
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aproximarem.
Antônio foi o primeiro a saltar porta afora e
correr para o outro lado. Abriu a porta para mim e
me retirou, pegando-me no colo.
Ele andava protetor em excesso.
— Não precisa! Consigo descer! — reclamei.
— Precisa sim, tem que tomar cuidado com
nosso bebê. Você pode cair dessa altura toda. —
Colocou-me no chão e abriu a porta de trás para
retirar Clara.
— Tio, que lugar lindo! — ela exclamou,
espantada com o belo sítio decorado.
A casa era enorme, muito semelhante às
usadas em novelas de época, e a área externa estava
toda decorada com bandeirinhas penduradas no
alto, ligadas de árvore em árvore. A decoração era
caipira.
Ainda era meio-dia, porém a festa mesmo
seria à noite.
— Vó Euzira! — Antônio recebeu o abraço
da senhora, que foi imediatamente até onde
estávamos.
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— Meu neto gigante! A cada ano mais


gostoso, as mulheres que se cuidem! E esse cabelo?
Quando vai cortar? Já falei que na minha época
homem que se prezava andava de cabeça raspada
ou batidinho com gel. Esse cabelo todo é muito
afeminado pro meu gosto — ela dizia ao afastar-se
do abraço.
Reprimi uma risada e Clara também.
— Ela diz isso todos os anos — ele virou-se
na minha direção e comentou, logo retornando sua
atenção à avó de todos. — E não fale assim
comigo, agora sou homem de uma mulher só. Te
apresento minha namorada e sua filha. — Fez as
devidas apresentações.
Ela me olhou com carinho e me deu um
abraço apertado.
— Você foi a feiticeira então? — Euzira,
após me cumprimentar, questionou.
Feiticeira?
— Como assim? — Estava achando
engraçado o jeito dela. Espontânea e desbocada
como o neto.

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— Nick me disse uma vez que uma mulher


lançou um feitiço para Tony, que fez ele se
aposentar — falou descaradamente. — Nick nos
contou tudo sobre você! — riu.
Todos riram das palavras dela enquanto eu só
abanava a cabeça sorridente com aquele clima
acolhedor.
Entramos enfim. Pedro e Nick chegaram logo
atrás, mas estacionaram um pouco mais distantes.
Antônio chegou a comentar sobre um chalé onde
moravam as filhas recatadas dos funcionários da
fazenda. Parece que Nick adorava revê-las.
Quando eles enfim chegaram no interior da
casa, todos nós já estávamos numa conversa aberta,
sentados à mesa, já almoçando.
— Já roubaram meus avós de vez, né? —
Nick comentou.
— Para de graça, netinho lindo. Como vai
meu Dominic? — Euzira perguntou com uma voz
melodiosa.
Ele andou ao lado de Pedro até nós.
— É, Dominic. Você que nos abandonou,
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nunca mais deu notícias. Já se aposentou como


Tony também? — Frederico, seu avô,
complementou.
— Quantas vezes eu tenho que falar que me
chamo Nick? Dominic foi uma forma do capeta me
infernizar. Soprou o maldito nome no ouvido do
meu pai e ele registrou, mas é Nick, caramba! —
esbravejou ao se sentar.
— Boa tarde, gente, desculpe a falta de
educação. Vó, vô — Pedro cumprimentou os avós
de consideração e se sentou.
Ele me contou apenas uma vez sobre os avós
de Nick. E foi depois de eu conhecer seus amigos.
— Você deve ensinar bons modos ao seu
amigo, Pedro Luca — Frederico sugeriu entre as
garfadas. — Dominic anda muito nervoso, tenho
percebido apenas por esses últimos minutos aqui.
Antônio deu uma gargalhada contida, ao meu
lado e todos focaram nele.
— O que houve, Tony? — Euzira perguntou.
Ele acabou de mastigar, limpou a boca e
apontou o garfo na direção de Nick.
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— Nick tá estressado mesmo. Contratamos


uma estagiária...
— Ah, não! Não vai começar a falar da
maldita! — Nick interrompeu.
— Ah, fala, quero saber tudo! — A avó deu
risada e pediu.
Eu ainda não conhecia a bendita estagiária,
mas para tirar Nick do sério, merecia meus
parabéns.
— Bom... — meu namorado prosseguiu,
mesmo vendo o amigo ficar com a cara mais
emburrada da face da Terra. — Contratei uma
estagiária no mesmo dia em que Nick já tinha
contratado outra, daí falei pra ele transferir a
menina que eu contratei pra outro setor. Então ele
foi conversar com a menina e descobriu que ela é
uma versão dele, só que de saia. Daí tá assim,
implicando com a coitada.
Todos riram, mas Nick permanecia
emburrado.
— Ah, filho, isso é tesão reprimido. Essa
menina deve ser muito atraente — seu avô

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comentou, fazendo as risadas aumentarem.


— Tesão reprimido... A garota é a bruxa em
forma de miniatura da Cachinhos Dourados. Baita
anãzinha marrenta. Quero é que vocês mandem a
garota embora, é isso que eu quero.
— Ah, mas não mando mesmo. — Antônio
zombou do amigo.
— E eu adoraria ver as cenas de gato e rato
de vocês — acrescentei. — Antônio, me apresenta
ela semana que vem? — pedi a ele.
— Claro, amor. Você vai gostar. A menina é
muito inteligente. Claro que é, eu que a contratei —
gabou-se.
—Miti intiliginti — Nick murmurou,
zombeteiro. — Só quero manter distância. Ainda
bem que ela tá no financeiro.
Todos focaram em seus almoços por um
tempo, até que Euzira quebrou o silêncio.
— Pedro, meu amor, você está muito calado.
Tudo bem contigo?
Ele, que estava finalizando sua comida,
largou os talheres e olhou ao redor. Todos o
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encaravam curiosos, inclusive eu.


Ainda não tive uma conversa aberta e séria
com ele. Queria questionar o porquê de estar tão
absorto ultimamente.
— Tudo ótimo. Apenas passando por uns
problemas no hospital. Farei uma prova de
promoção em breve, poderei ser promovido a
administrador-supervisor — disse tranquilamente,
num modo mecânico.
Mas eu o conhecia. Sabia que escondia algo.
Ah, maninho…
— Que ótimo, filho! — ela o parabenizou. —
Você, sempre esforçado. Parabéns.
Pedro agradeceu e logo todos fomos servidos
com a sobremesa, até que um barulho fez com que
ficassem atentos.
Instantes depois, o motivo do barulho entrou
na sala de jantar.
— O homem mais gostoso da face da Terra
chegou! E aí, vó, com saudades do seu diamante
negro? — Um homem negro, alto e forte entrou
exibindo-se, vestido como cowboy.
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Deveria ser o Lucas.


— Meu neto! Vem aqui dar um abraço na sua
vó. Que saudade, meu neguinho tentação! —
Euzira abraçava o homem.
— Ah, quero que conheçam minha
namorada. Patrícia! — gritou. — Bora, Patrícia,
vem aqui conhecer a família.
Naquele momento eu fiquei bem feliz. Ao
menos um amigo do meu namorado e do meu
irmão estava comprometido.
Uma ruiva sem muitas curvas e magrinha
entrou tímida, de calça jeans, botas e camisa
quadriculada, com os cabelos em um rabo de
cavalo alto, no local. Lucas deu um beijo nela e a
levou até Euzira e Frederico, na cabeceira da mesa.
Após as devidas apresentações e todos
almoçarem e comerem suas sobremesas, cada um
recebeu a tarefa de ajudar em alguma parte da
ornamentação da festa.
Antônio, Clarinha e eu pendurávamos as
lamparinas pelo salão. Pedro pregava os objetos
decorativos nas paredes, Nick e Lucas buscavam as

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caixas com as bebidas no galpão e colocavam na


cozinha, e Patrícia recortava enfeites de papel.
— Fiquei feliz por mais de um amigo estar
namorando, afinal — comentei com Antônio.
Estávamos em um espaço do lado de fora da
casa, onde seria a recepção dos convidados.
— Lucas namora hoje e amanhã termina. Não
deve estar nem há uma semana com essa garota.
Que pena, queria que ele crescesse. É o mais velho
de nós, porém o mais infantil.
Refleti bem. Não o conhecia então não
poderia julgá-lo, mas ainda assim gostei de ver
alguém dando chance a relacionamentos. Meus
pensamentos eram cada vez mais fortes sobre meu
namorado e começava a sentir que enfim estava me
apaixonando por ele. Mas ainda queria esperar, era
cedo para decidir sobre um sentimento tão forte.
— Me ajuda aqui, meu lindo — pedi a ele,
enquanto subia a escada para pendurar a lamparina.
Antônio virou-se para ajudar a me segurar no
momento em que deslizei o pé no degrau e estava
prestes a cair. Por pouco o pior não acontecia. Ele

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me segurou nos braços e, muito aflito, colocou-me


sentada em uma cadeira.
— Meu Deus, amor! Quase morro do
coração, não faz mais isso não. Fica aqui quietinha
que eu penduro tudo! — dizia rapidamente, com a
respiração ofegante.
Ele parecia transtornado. Meu Deus, tudo
bem que seria um tombo feio, mas não era pra
reagir como se eu fosse de porcelana.
— Ei! Antônio... — tentei chamar sua
atenção.
Ele juntou todas as lamparinas, alheio ao meu
chamado, e colocou numa caixa perto da escada,
organizando ali, murmurando que ele mesmo as
penduraria.
— Antônio!!! — gritei, e finalmente ele me
ouviu, puxou uma cadeira e sentou ao meu lado.
Clarinha abria as lamparinas de papel e
adiantava o serviço enquanto isso.
O encarei sem entender. Por que estava
agindo daquela forma? Mas alguns segundos de
silêncio foram suficientes, logo ele começou a
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falar.
— Amor... Nosso bebê, ele não pode sofrer
nada, tá entendendo? Nada! — explicou,
preocupado.
Sua testa estava franzida, seu olhar… revolto.
Eu precisava respirar, não era a primeira vez que
suportava seus cuidados excessivos.
— Calma! Meu Deus... Antônio, eu não estou
gostando dessa maneira que você está agindo. Quer
me proteger até de um alfinete, eu me sinto uma
inválida, me sinto uma inútil que não consegue
fazer nada sozinha. Obrigada por me salvar,
realmente foi necessário, mas não precisa me
interditar e me proibir de correr os riscos que eu
quero, a vida é assim, feita de aprendizado e riscos.
Não quero que fique me pegando no colo pra subir
ou descer do carro, não quero que me segure no
elevador da empresa por causa do balanço, não
quero que fique me dando esporro por poucas
coisas. Poxa, será que consegue me entender? —
Estava triste, pois em meio a tanto sentimento bom,
isso era a única coisa que me afastava dele. —
Estou sufocando.
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Ele respirou fundo.


Me olhou de modo tão intenso que me senti
despida, mas nada disse.
Simplesmente deixou os enfeites sobre a
mesa, levantou e saiu caminhando pelo gramado.
Em meu peito, uma dor horrível. A última
coisa que eu desejo na vida é magoá-lo.

TONY

Eu não conseguia entendê-la.


Só pensava que, se estivesse ao lado dela no
carro no dia do acidente, ela não perderia a
memória. Se tivesse lutado por ela desde o início,
ela não teria morado com o ex-marido e sofrido
com ele. Se eu não fosse covarde como tinha sido
até o dia em que vimos os vídeos, muitos desastres
teriam sido evitados. Por isso eu não a entendia.
Não queria e não permitiria que ela sofresse
de novo.

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Ainda mais agora, esperando um filho ou


filha meu.
Se já a protegia com toda a alma antes, agora
a protegeria com o impossível.
Imediatamente me levantei, coloquei as
coisas que estava segurando dos enfeites em cima
da mesa e fui caminhar pela fazenda. Deixei
Amanda e Clara sozinhas, enquanto tirava um
tempo para mim. Um tempo para pensar.
Enquanto caminhava pelo vasto espaço
gramado do local, pensava comigo mesmo se
estava fazendo a coisa certa. Se realmente não
estava sendo protetor demais, meloso demais...
Apaixonado demais.
— Mas eu não sei o que fazer, droga! —
exclamei ao vento.
Não queria perdê-la, mas tê-la sufocada e se
sentindo mal era ainda pior do que saber que ela
estava longe. As palavras que Amanda proferira
foram duras, porém as absorvi com maturidade e
fiz o que devia ser feito. Dei espaço a ela.
A inexperiência em relacionamentos gritava

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em meu peito e, ao imaginar viver uma vida inteira


ao lado da mulher que amo, errando e me
desculpando sempre, sabia que não a faria feliz
como queria.
— Preciso dar espaço, preciso deixá-la
respirar — repetia o mantra, enquanto me acalmava
em minha caminhada.
Parei perto do estábulo e admirei os cavalos
sendo selados, enquanto outros corriam pelo espaço
cercado reservado a eles.
— E aí, meu neto? Como tem passado?
Assim que ouvi a voz, me virei. Era
Frederico, vindo de perto dali. Ele apoiou-se na
cerca, ao meu lado.
— Precisando de um conselho sábio —
respondi pensativo, enquanto meus olhos fitavam o
céu.
— Diga no que esse velho cheio de histórias
pode ajudar.
Desabafei e contei a Frederico a história de
amor de minha vida e de Amanda. Contei desde o
dia da boate até o pedido de horas atrás que ela me
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fez e, por fim, bufei e disse:


— Então estou aqui sem saber absolutamente
nada do que fazer.
Frederico deu um tapa amigável nas minhas
costas, forradas por uma camisa leve de algodão, e
sorriu.
— Mulheres são complicadas, meu caro...
Muito complicadas.
Ri fraco e prendi os cabelos em um coque
antes de virar de frente para Frederico e encará-lo
nos olhos.
— E o que fazer? — perguntei curioso.
— Ah, meu filho... Quando me casei com
Euzira, passamos os primeiros anos de casados em
um mar de pétalas de rosas. Uma maravilha. Muito
amor, muita virilidade... Se é que me entende. Mas,
assim que tivemos Venâncio, as coisas mudaram
um pouco. Euzira vivia sensível. Eu não entendia
mais nada do que ela queria, isso quando não
mudava de ideia a cada minuto. Percebi que, por
mais que tentasse ajudar, eu só a atrapalhava.
Eu escutava atento à experiência do meu avô
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de consideração. Pensava que Nick tinha sorte de


tê-lo em sua vida desde sempre.
— Sua mulher está grávida do segundo bebê
e isso já afeta muito seus hormônios. Imagina a
pessoa perder a memória e do nada descobrir que
está grávida de um homem com quem nem lembra
de ter se relacionado? E ainda bem que você é um
bom homem, mas e se fosse uma pessoa ruim?
Como ela lidaria com tudo isso sozinha e ainda
tendo a filha mais velha pra criar?
Pensando por esse lado, me coloquei no lugar
de Amanda e a resposta foi: “eu não saberia o que
fazer ou enlouqueceria de vez”.
— Pense que a mente dela ainda está muito
confusa, mas pelo que percebi há um amor muito
bonito entre vocês. Ela te ama.
— Tem certeza? — Arregalei os olhos em
espanto e perguntei ao senhor à minha frente.
— Com toda a certeza. É nítido o sentimento
mútuo que compartilham. Algo único e, com
certeza, duradouro. Dê tempo a ela. Sugira um
espaço pra que ela pense e coloque as coisas em
ordem. Você não precisa se afastar dela nem do
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bebê, mas a deixe à vontade para decidir como


levar a vida. Mulheres gostam de um pouco de
controle e gostam de se sentir importantes.
Eu não queria dar esse espaço a Amanda. Queria
prendê-la a mim e nunca mais libertá-la. Era tanto amor, que
não cabia em meu peito. A amava além do que qualquer
pessoa poderia imaginar.

A festa foi divertida e cheia de momentos


alegres. Dona Euzira foi a noiva caipira e seu
Frederico, o noivo. Os dois comemoravam e
festejavam como dois adolescentes em plena
puberdade. Todos os amigos do casal foram
prestigiá-los, acompanhados de Nick e nós, seus
amigos, que já estávamos por lá.
Pedro logo arrumou uma caipira para curtir a
noite. Nick foi no mesmo embalo. Lucas e Patrícia
sumiram no meio da festa e eu suspeitava de que
eles podiam estar brigando ou se pegando por aí.
Clarinha brincava nos atrativos e fez vários
amiguinhos durante a festa. Dona Euzira se
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apaixonou pela menina e ficou ao lado dela o


tempo todo, quando não estava bebendo ou
dançando.
— Vamos dar uma volta, amor? — sugeri à
Amanda.
Tinha decidido ir com calma, e ela parecia
mais tranquila depois do tempo que dei naquela
tarde a ela.
Ela assentiu e me deu sua mão.
Caminhamos e nos afastamos um pouco do
movimento da festa, aproximando-nos do casarão,
que estava fechado para convidados.
— Quero te mostrar uma coisa. — Arrastei
Amanda, eufórico, para dentro da casa.
Entramos sorrindo e cheios de carinhos no
casarão. A guiei até o segundo andar e, juntos,
entramos em um quarto. O quarto de Nick. Nesse
quarto havia uma parede negra toda rabiscada em
giz de cera, contendo diversos recados de seus
amigos e algumas fotos coladas.
— Esses somos eu e Nick, com 15 anos. —
Mostrei uma foto de nós dois fazendo "muque"
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com os braços finos de adolescentes para o alto e


peito nu sem nenhum gominho aparente.
— Vocês evoluíram. — Amanda riu.
Logo começamos a ler os recados, entre eles
as zoações dos amigos.
“Nick gosta de meninos!”
“Dominic é mongol e não sabe beijar na
boca!”
“A Juliana deu um fora no Nick e ficou com
Tony.”
Amanda encarou boquiaberta, semicerrando
os olhos na minha direção.
Levantei as mãos em sinal de rendição.
— Não tive culpa, Nick era um trouxa e eu só
tinha 16 anos na época, acho — falei em minha
defesa.
“Nick virgem!!!”
“Nick finalmente pegou alguém aos 21 anos
de idade!”
— O que foi isso? — Amanda sinalizou o
recado sobre a virgindade de Nick.

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Sorri, relembrando.
— Ele era lerdo demais. Assim que descobriu
que era bonito e que as meninas eram interessadas
pelo jeitinho todo tímido dele, começou a
conquistar finalmente as garotas e aos 21 virou
homem. — Dei de ombros. — Queria que visse um
pouco disso pra saber da nossa história. Tudo bem
que tem mais Nick que eu aqui, mas é uma forma
de te mostrar meu passado.
Amanda sorriu.

AMANDA

Passei a tarde inteira, pensando se não tinha


ido longe demais, mas vi que deu certo meu pedido
de tempo para respirar, pois Antônio voltou mais
calmo e menos protetor que antes.
Quando nos aprontamos para a festa, notei
que ele se segurava para não me proteger de coisas
pequenas, ou me repreender por bobagens.
Mas ali, naquele quarto, eu apenas quis unir-
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me a ele até o mundo acabar.


Sabia que aquele calor no peito que sentia
toda vez que ouvia a voz grossa e sexy de meu
namorado não era algo passageiro. Sabia que toda
vez que ele me presenteava com o mar do caribe ao
olhar-me, poderia derreter o polo norte com o calor
que gerava dentro de mim.
Já estava entregue a ele e compreendia que
era irreversível.
Não precisava me lembrar de nada para isso.
— Quero tanto você — sussurrei agarrando a
camisa de cowboy dele, encarando-o nos olhos.
Um sorriso enviesado nasceu em seu rosto.
Lindo!
— Vem, tem um esconderijo. — Levou-me
até os fundos da casa, no andar de baixo, onde
havia um pequeno quarto que estava sendo usado
como depósito.
Acendeu a única luz amarela do local e
fechou a porta. Lá dentro, começamos a rir da
situação constrangedora em que nos
encontrávamos.
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— Meu Deus, me sinto uma colegial.


— Me sinto um fugitivo da lei — ele
completou rindo.
— Vem me pegar então, bandido! —
Brinquei, arriscando uma voz sexy.
— Só se for agora. — Então ele me tomou
para si.
Em uma fração de segundos, fizemos amor
loucamente em uma posição não muito confortável
dentro do quartinho, de pé, encostados na parede.
Calávamos um a boca do outro para que os
gemidos não fossem ouvidos por quem passasse
perto dali, e após longos momentos de intimidade,
nós, super suados e ofegantes, saímos do quartinho
como dois fugitivos, de mansinho.
Depois conversamos. Antônio me pediu que
revelasse tudo o que andava sentindo e assim o fiz.
Por fim, decidimos ir com calma em nosso
relacionamento e ele disse que me deixaria respirar,
porém ainda seríamos namorados.
Ele não me pressionaria nem sufocaria, me
deixaria à vontade e, no momento certo,

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retomaríamos a mesma conversa.


O fim da festa foi maravilhoso e, ao
amanhecer, todos retornamos para nossas casas e
nossas vidas.
Duas semanas se passaram e o “tempo” que
demos um ao outro, ainda estava no ar. Nos
víamos no trabalho, mas não rolava mais beijinhos,
amassos, nem sexo. Eu sentia falta, obviamente,
mas era um namoro racional apenas por um curto
período, para que soubéssemos exatamente o que
fazer dali por diante.
Estava eu em minha sala na empresa em uma
manhã, quando senti a dorzinha da saudade de meu
chefe apertar, como vinha ocorrendo todos os dias.
— Ah, chega disso, não aguento mais. —
Levantei-me da mesa e decidi ir até ele e voltar ao
que éramos antes.
Mas o que eu falo? Que eu o amo?
Comecei a pensar se o sentimento que nutria
por ele poderia ser amor.
Eu o quero e o desejo, sinto sua falta, me
preocupo, me sinto segura, me sinto feliz, não me
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imagino sem ele e... Nossa... Eu o quero para


sempre.
Putz, eu o amo sim.
Admito que demorei um pouco para entender
que o que sentia por Antônio era amor, sim. Os
medos do passado e as inseguranças me deixaram
reprimida e receosa quanto ao futuro e ao
sentimento novo que estava experimentando, mas
agora eu sabia e tinha certeza de que era ele, sim. O
homem que queria ao meu lado para sempre.
— Vou lá agora, finalmente. Preciso dizer
tudo a Antônio — falei comigo mesma e caminhei
para fora da sala.

TONY

Duas semanas.
Eu estava a ponto de ter um colapso.
Mas, ainda assim, aguardava nossa conversa
ansiosamente. Pensava em Amanda ao acordar,
durante o dia, ao dormir, em todos os instantes. Só
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queria que nosso “tempo” acabasse logo.


Estava digitando alguns contratos
calmamente em minha sala, quando a porta se
abriu.
— Felícia? — Espantei-me ao ver a
recepcionista da unidade de Recife na minha frente.
— Oi, docinho. Estou a trabalho, não me
tente com essa carinha logo cedo. — Aproximou-se
sensualmente de mim e depositou alguns papéis em
minha mesa.
Mas… O que ela queria?
— Hã? — Não entendi. — O que faz aqui?
— Estou de férias. Como eu já viria pra cá,
seu paizinho querido que, por sinal, é um homem
muito cavalheiro, me pediu pra entregar esses
papéis. Demoraria muito enviando por malote e não
tinha como ser via e-mail. — Deu de ombros.
— Entendi. — Peguei os papéis e comecei a
analisá-los.
Eram documentos importantes.
— Quem te deixou entrar? — questionei
enquanto verificava o conteúdo dos documentos.
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Era o resultado da investigação sobre as


quedas das vendas em Recife. Meu pai tinha
conseguido outra pessoa para seguir o plano inicial
e descobriram que realmente houve fraude. Me
admirei pois ele só me informou naquele instante,
quando tudo já fora encerrado.
— A secretária. Informei quem era e ela me
deu permissão.
Ela deu a volta e ficou de pé, detrás da minha
cadeira.
Não estava me sentindo confortável com ela
ali, tão próxima. Mas ainda assim, permaneci
olhando os papéis até entender o seu conteúdo
completo.
— Então... Já que estou aqui... Podemos
relembrar os velhos tempos — disse, abaixando-se
e sussurrando em meu ouvido.
Ah, então era por isso que veio pessoalmente!
Pigarreei, desconcertado, e me levantei.
— Felícia, fico feliz pelo seu favor em trazer
esses papéis, são realmente importantes. Mas não
estou interessado em nada mais, sou
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comprometido.
Falei, fitando-a nos olhos a uma distância
considerável.
Ela rolou os olhos, andou até onde eu estava
novamente e enlaçou os braços em volta de meu
pescoço.
— Tá bom, finjo que acredito. Estou com
saudades da sua potência, gostosão. — Tentou me
beijar, porém desviei.
Minha paciência chegando no limite.
— Ah, para de se fingir recatado! — Agarrou
a blusa branca que eu usava e deixou uma marca de
batom na gola. — Olha que sexy, posso marcar
você todinho! — falou sorrindo.
— Que merda, Felícia! Sai, sai daqui! Não
queria ser rude, mas você não entende nada! —
Afastei-a e corri para o banheiro dentro da minha
sala.
Minha vida não estava ruim, mas não queria
inserir um problema na lista. A droga da gola não
ficava limpa nem por um decreto, e ao tentar
limpar, acabei sujando ainda mais. Decidi tirá-la.
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Pediria outra pelo telefone a alguém.


Escutei a porta do escritório se abrir, se eu
estivesse com sorte, não precisaria ser rude
novamente com aquela mulher e naquele instante
ela estaria indo embora, porém, no exato momento
em que eu saía do banheiro, de calça social, sem
blusa, segurando a camisa nas mãos, o cenário se
tornou um inferno.
Amanda estava na porta e entrou, fechando-a
em seguida, e ao ver a cena na sua frente, o seu
rosto de radiante passou a abatido em segundos.
— Não acredito — pronunciou lentamente.
Foi quando notei Felícia deitada no sofá do
canto da sala, apenas de lingerie. Onde estavam as
roupas dela? Fiquei estático na porta do banheiro.
Voltei a encarar Amanda, que sofria com o olhar e
então apertei os olhos, respirando fundo.
— Amor, sei que parece clichê, mas
realmente não é nada disso que está pensando.
— Amor? — Felícia se levantou e andou até
Amanda, com olhar de desdém. — Então essazinha
aí que você falou em Recife que jamais comeria é

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seu amor?
— Cala a merda da boca, Felícia! —
esbravejei e me dirigi até Amanda, preocupado, a
passos largos.
Felícia levantou as mãos rendida e fez uma
cara de falsa ofendida.
Amanda parecia paralisada, como se aquilo
fosse tão inacreditável, que fez meu coração se
encher de pânico, a cada passo que eu me
aproximava mais dela.
Uma fina lágrima escorreu de seus olhos.
Ela soluçou, parecendo querer desabar, mas
se manteve firme antes que eu encostasse nela.
— De novo, não — falou espalmando a mão
para que eu parasse, e saiu da sala.

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Capítulo 26

AMANDA

Saí da empresa arrasada e tomei a liberdade


de voltar pra casa. Não estava me sentindo bem
depois da cena que presenciei.
A única coisa que me agoniou, foi o fato de
eu ter confiado tanto no amor de Antônio, sendo
incapaz de desconfiar de sua integridade. Droga!
Eu já fui traída! Passei um casamento inteiro sendo
corneada, e a última coisa que eu queria era repetir
a dose.
Algo em meu peito latejava em dor, ao
relembrar a cena fatídica.

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Eu confiava tanto, mas tanto nele… O que


aconteceu então?
Cheguei em casa, e fui direto atrás de meu
irmão em busca de algum conselho.
— Pedro? Irmãozinho? — Caminhei pelo
local, chamando-o. Pedro havia dito que ficaria
alguns dias em casa esperando a tal transferência de
cargo. Ele havia passado na prova e aguardava as
ordens a seguir.
Optei por entrar no quarto dele, com um
pouco de receio sobre o que veria. Fazia pouco
tempo que o vi nu com a babá na cama. Repetir a
imagem não seria nada legal.
Mas, ao abrir, levei um susto ao ver meu
irmão sentado no chão, com a cabeça apoiada na
cama, dormindo, e uma garrafa de uísque vazia
perto de seu corpo, acompanhada de um copo,
também vazio. Sobre a cama havia muitos papéis,
papéis que eu sentia muita curiosidade em ler,
porém me aproximei dele e sussurrei em seu
ouvido:
— Ei, Pedro, acorda.

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Pedro nitidamente estava de ressaca, porém


abriu os olhos lentamente e os focou em mim.
— Para de gritar, pelo amor de Deus — tapou
os ouvidos em um gesto involuntário e balançou a
cabeça.
— Levanta daí, Pedro, o que aconteceu, por
que você está assim?
Ele se levantou lentamente, passando a mão
pelo corpo e se arrumando. Sentou-se na cama em
cima dos papéis emaranhados e amassados. Seu
rosto era de alguém abalado pela vida, triste e cheio
de mágoa.
Ao me olhar, sondou meu rosto por alguns
segundos. Tentei não parecer tão triste e abatida.
— Eu estou bem, mas você não está. O que
aconteceu na empresa hoje? — tentou fugir das
perguntas que eu com certeza, faria.
Deixei os questionamentos sobre sua situação
para depois, sentei-me ao lado dele e bufei. Não
queria ter que contar tudo o que aconteceu e tudo
que estava em minha mente para Pedro, porém
precisava desabafar e pedir uma opinião, afinal não

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me sentia segura sobre nada do que acontecera na


minha vida desde o acidente. Minha cabeça era um
absoluto caos.
— Peguei Antônio com outra na sala dele.
Pedro se espantou.
— O quê?! — gritou.
— A secretária da unidade de Recife veio pra
cá. Andei averiguando e descobri que eles tiveram
um caso por lá. Pelo que me pareceu, estavam bem
entretidos. Cheguei na hora H.
Contei com lágrimas nos olhos. Não queria
acreditar que aquilo que vi realmente estava prestes
a acontecer. Achava que podia ser a falta de sexo,
talvez. Estávamos há duas semanas sem nos tocar e
Antônio talvez pudesse se sentir ansioso por isso.
Mas não era motivo para me trair após ter ditos
tantas e tantas vezes que me amava.
Eu não entendia esse tipo de amor.
— Algo está estranho nessa história — Pedro
comentou, pensativo.
— Como assim?
— Me deixa tomar um banho e uns
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analgésicos e então vou procurar saber melhor


disso tudo, tá, maninha? — Acariciou meu rosto.
Sorri.
—Tudo bem. — Levei os olhos até os papéis
na cama. — O que são esses papéis?
Pedro suspirou. Fitou os papeis com
desânimo e balançou a mão no ar.
— Apenas papeis. Lixo. Vou jogar fora. Um
dia te falo sobre eles, ok?
Assenti e o vi juntar os papeis de forma
desordenada e jogá-los dentro de uma caixa de
sapatos.
Pedro em seguida fez o que pretendia,
enquanto eu comia algo na cozinha. A fome que
sentia pelo princípio da gravidez era enorme e
poderia causar um grande prejuízo na geladeira do
meu irmão. Pelo menos eu ajudava nas despesas.
Enquanto comia, pensava sobre minhas
memórias perdidas. Já havia conseguido lembrar de
um ano e meio de memórias e tentava ao máximo
lembrar mais. Porém, meu esforço fora em vão.
— Bom, vamos resolver seu problema. —
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Um Pedro apenas de cueca saiu do banheiro e se


apoiou no balcão da cozinha americana.
Que mania!
— Ei, coloca uma roupa. Eca. — Caçoei do
fato de estar seminu.
Ele deu de ombros, pegou uma maçã na
fruteira e a abocanhou. Apenas ri e balancei a
cabeça em negação. Realmente meu irmão seria
sempre o mesmo. Impetuoso e protetor.
— Me diga o que achou de toda essa coisa da
traição? — Me sentei do outro lado da bancada, de
frente a ele.
Ele terminou de mastigar a maçã e a engoliu.
— Acho que Tony não faria isso.
— Só? Apenas acha que ele não faria?
— Olha, maninha, se ele fizesse, não seria na
sala do lado da sua, dentro da sua própria empresa.
A barbie sempre prezou essa coisa de conduta
dentro da empresa, de não dormir com
funcionárias. A de Recife, com certeza, foi
exceção, afinal ele nem é de lá, então pode ter feito
algo com ela, sim.
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Ainda assim, eu estava desconfiada.


— Ele é todo certinho, como você mesmo
disse. Não dorme com funcionárias, porém comigo
dormiu. Não faz nada dentro da empresa, porém
comigo fez. Como você justifica? Não consigo
anular minhas desconfianças através dos seus
argumentos, Pedro.
Pedro pensou por um segundo, apontou o
indicador no meu nariz e sorriu.
— Aí é que está. Você foi a única, a primeira
que o fez quebrar as próprias regras. O maldito te
ama e, mesmo odiando ter que admitir isso, não
merece uma porrada desfiguradora do seu irmão. Já
tentou ouvi-lo? Já tentou saber o que aconteceu?
Não, pensei.
— Eu não quero ouvir. Tenho medo do que
vou ouvir. Ficou tudo muito claro assim que entrei
naquela sala e... Apenas não quero ouvir —
balancei a cabeça, fechando os olhos.
Pedro deu de ombros e voltou para o quarto
murmurando “eu tentei”.
Será que tinha alguma explicação para
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aquilo?

TONY

Já era fim da tarde quando me preparava para


ir embora. Estava cansado e derrotado. Jamais
desistiria de Amanda e de seu amor, mas por que as
coisas tinham que ser tão difíceis?
Mais cedo liguei para Bruna, contei o
acontecido e ela me jurou que faria algo ao meu
favor. Se Amanda não me ouviria, ao menos Bruna
pode falar sobre quem realmente sou. Ela é uma
amiga leal.
Saí da empresa sem falar com ninguém e
liguei para meu pai. Ele ouviria todo o meu ódio
por ter mandado alguém que arruinou com minha
vida em míseros minutos.
Estacionei o carro na vista sobre o monte na
cidade, onde minha mãe me levava na infância e
onde levei Amanda algumas vezes para vermos as
estrelas. Lá era um bom local para esbravejar e

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xingar meu genitor.


— Alô? — Douglas atendeu.
— O responsável pela minha infelicidade se
encontra? — ironizei.
— Ah, você. Que bom te ouvir, filho.
Lembrou que tem pai?
— Infelizmente. Preciso apenas que saiba de
umas coisas e que nunca mais me ligue após isso.
Ouvi sua respiração pesada.
— Diga, filho.
— Eu estou apaixonado pela Amanda, aquela
que conheceu, e você já sabia disso. Eu a amo com
tudo o que sou, com todas as minhas forças e
nunca, tá me ouvindo? Nunca a trairia, nunca a
faria mal e nunca a abandonaria. Eu te odeio por
mandar Felícia até aqui, te odeio por saber que ela
sente uma paixão platônica por mim e te odeio por
achar que eu cairia no papinho dela. Sei que fez
tudo bem pensado, pai, eu o conheço e não adianta
negar, mas saiba que acabo de renunciar tudo que
leva o nome Gali. Empresa, carro, apartamento,
casa, tudo. Não sou mais seu filho a partir de hoje
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e, se for pra ser pobre, sem um teto pra morar e sem


herança, mas com ela ao meu lado, eu prefiro ter
apenas o amor dela. Pois é o amor que me faz feliz,
é o amor que me dá força, é o amor que me mantém
de pé nessa maldita vida que eu vivi até encontrá-
la.
Estava nervoso, precisava me conter um
pouco mais.
— Filho, eu não... — tentou se explicar,
porém o interrompi mandando-o para lugares muito
específicos e desliguei.
Respirei fundo e fiquei ali, contendo minha
fúria sobre a desordem que estava minha vida.

AMANDA

Clara chegou naquele fim de tarde da escola.


Agora estudava em horário integral, pois despedi a
babá. Nós duas ficamos fazendo deveres e
estudando sentadas à mesinha de escritório em meu
quarto quando, ao escrever a data no trabalho de

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minha filha, me lembrei que o dia seguinte era


aniversário de Pedro. Ele faria 30 anos.
— Filha, amanhã é aniversário do seu tio e eu
esqueci completamente!
— Vamos fazer surpresa pro tio? — ela
perguntou animada.
— Vamos pensar em algo. Preciso falar com
Antônio — suspirei. De alguma forma, teria que
falar com ele.
— O tio Tony vem? Eu quero que ele venha!
— Clarinha perguntou.
— Acredito que sim, flor, ele vem. Vou ligar
pra ele.
Deixei minha pequena brincando após os
deveres no quarto e fui até a sala ligar para ele.
Pedro estava no quarto, provavelmente dormindo
após a ressaca.
— Amor? — Sua voz fez-se ouvir logo no
primeiro toque.
— Antônio, amanhã é aniversário de Pedro,
veja como reunir os amigos e vamos fazer um bolo,
algo aqui em casa mesmo, em segredo — disse,
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seca.
Ele demorou alguns segundos para responder.
Parecia pensativo.
— Vamos poder conversar?
— Não sei, amanhã veremos. Teria como
resolver isso pra mim? Vou pedir o bolo e comprar
algumas coisas amanhã cedo.
— Tudo bem, eu faço o que pedir. Que horas
será a comemoração?
— Umas oito da noite acho que tá bom. Não
vamos demorar muito, pois Pedro não é chegado a
festas. Só pra não passar em branco mesmo.
— Tudo bem, meu amor. Eu te amo, tá?
Senti meu peito se aquecer, a vontade de
dizer que também o amava me invadia, porém
precisava ser forte até ter tudo claro.
— Obrigada, Antônio, nos vemos amanhã.
Desliguei a chamada, mas meu telefone tocou
em seguida.
— Alô?
— Amanda? Aqui é Bruna, lembra de mim?

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Desculpe o horário.
Bruna, minha colega de trabalho. Eu gosto
dela.
— Sim! Lembro sim, Bruna, tudo bom?
— Tudo. Eu queria falar sobre o Tony,
desculpa ligar apenas pra isso, mas eu não sabia se
iria se lembrar de mim ou querer falar comigo.
— Tudo bem, Bruna, eu gosto de você. Pode
falar, fica à vontade.
Então sentei no sofá e escutei o que Bruna
dizia.
— Bom, não vou falar que ele te ama. —
Quando ela disse, gelei. O que então Bruna teria
para dizer? — Porque o amor é algo que se pode
sentir a quilômetros de distância. Não preciso
confirmar, você sente que ele a ama. É algo nítido.
— E realmente era, sentia o amor dele. — Então só
queria dizer que você deve dar uma chance a si
mesma de ser feliz. Ele não a trairia. Pode ter
errado em confiar que Felícia não faria nada de
mais, pode e errou. Mas homens são idiotas e se
nós mulheres formos sempre agir radicalmente por

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tudo, vamos viver em pé de guerra, pois os homens


nunca vão saber ao certo como nos sentimos ou
como nos agradar, não é verdade?
Respirei sorrindo. Ela tinha razão.
— Sim, pior que é verdade — respondi.
— Então, Amanda, sugiro que converse com
ele. Tente ver em seus olhos a verdade e a
sinceridade. Tony não tem por que mentir. Ele
ficou tanto tempo sofrendo por não tê-la de volta,
acha que faria algo tão terrível agora que a tem?
Fazia todo o sentido o que Bruna e Pedro
falaram naquele dia. Eu precisava ouvi-lo e ler em
seus olhos a verdade.
— Obrigada, Bruna. Queria aproveitar sua
ligação e convidar você e sua família a virem aqui
amanhã, no aniversário do Pedro.
— Opa! Pedroca vai envelhecer?
Gargalhei internamente. Bruna realmente
andou muito ao lado de Antônio durante toda a
vida, até parece um dos amigos dele. Ele me contou
tudo sobre a amizade que compartilham nas últimas
semanas e eu achei o máximo.
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— Sim, vamos fazer uma surpresa amanhã,


aqui no apartamento dele, às 8 da noite. Venha!
— Vamos, sim, vou falar com meu esposo.
— E o bebê?
— Grande e guloso, já tem até manha!
Amanhã vamos nos ver, daí te mostro como ele
está forte e lindo!
— Ah, eu adoraria vê-lo! Até amanhã,
Bruninha!
— Até.
Após a ligação, fiquei mais tranquila.
Realmente o que Bruna disse me fez pensar.
Antônio, pelo que eu conhecia, jamais me trairia.
Ao menos era o que ele me fazia sentir e pensar.
Tinha ciência que a nossa relação era além do sexo,
do físico. Era algo que causava dependência. O
amor, era o amor.
O dia seguinte chegou e logo cedo Pedro saiu
para caminhar. Ele parecia entediado em casa sem
nada a fazer. Não o parabenizei, fingi que nem
lembrava. Se bobear nem ele mesmo lembrava do
próprio aniversário.
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Assim que acordei, fui com Clarinha na


confeitaria perto do prédio onde morávamos. Lá
encomendaram o bolo e doces para mais tarde.
Depois recebi uma ligação de Antônio, avisando
que nos buscaria para irmos juntos comprar os
refrigerantes.
Ao ouvir a voz daquele homem, tremi dos
pés à cabeça. Parecia sempre a primeira vez, o
primeiro toque, o primeiro contato. Jamais deixaria
de me sentir desejosa por ele. O amava e o queria a
cada dia mais.
Em instantes, ele chegou. A ida ao mercado
foi tranquila. Clara nos distraía falando sobre a
escola, seus amigos e coisas que havia aprendido.
Antônio tinha o dom de atrai-la a uma conversa
espontânea e infantil. Enquanto isso, eu apenas os
admirava.
Lembrei que já estava com praticamente três
meses de gestação e na semana seguinte começaria
minha faculdade e tinha uma ultrassonografia para
fazer.
— Antônio.
Ele virou o rosto para me olhar, porém
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continuou atento ao trajeto, empurrando o carrinho


de compras com as mãos.
— Oi, amor.
— Semana que vem começo as aulas, estou
empolgada. Tem também uma ultra marcada, vai
querer me acompanhar?
Ele parou o carrinho no meio do corredor e
semicerrou os olhos em minha direção.
— Você cogitou a possibilidade de eu não
ver meu bebê na ultra? — perguntou, descrente.
Dei de ombros e ri.
— Claro que não, quis apenas confirmar —
falei, sem graça.
Clara estava dentro do carrinho, alheia à
nossa conversa, com uma boneca Barbie na mão,
enquanto comprávamos as coisas para a festa.
Antônio tentava a todo custo roubar nem que fosse
um beijinho meu, porém me mantive firme e, por
fim, disse que conversaríamos mais tarde na festa.
— Tenho algo pra te contar — ele comentou
ao subirmos o elevador do prédio de Pedro com as
sacolas nas mãos.
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— O quê?
Antônio respirou fundo e olhou para o teto do
pequeno cubículo.
— Não sou mais diretor da empresa, larguei
tudo.
Senhor!
— Como!? — perguntei espantada.
— Liguei pro meu pai. Essa coisa da Felícia
tem dedo dele, eu posso sentir. Falei que preferia
mil vezes ficar com você do que com a empresa e
ele podia tentar o que quisesse, que não me faria
desistir de te amar.
Ah, não… Aquilo já era demais. Fiquei
furiosa e revoltada!
— Mas como você foi estúpido! Não se larga
uma empresa de família por um motivo tão bobo!
Antônio, seu pai depende de você! E se foi ou não
ele a armar isso tudo, que se dane. Muda alguma
coisa? Não muda, então segue a vida! Meu Deus,
eu não acredito que você foi tão infantil. Ao menos
deixou ele falar?
Ele meneou a cabeça em negação,
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constrangido.
— E se não foi ele? Você nem o deixou
falar?
Foi quando ele me encarou firmemente de
forma desafiadora, e imediatamente fui atingida
pelo significado daquele olhar.
Eu também não o havia deixado falar.
Fiz com ele o mesmo que ele fez ao pai.
— Droga. Eu também fui infantil, né? —
suspirei.
— Não, amor da minha vida. Não foi — me
consolou, tocando meu rosto.
Nossa, eu me senti horrível naquele
momento. Precisava passar por cima daquela
situação para que tudo voltasse ao normal entre
nós. Juntos caminhamos nós três até o apartamento.
Chegando lá, pedi minha filha que ficasse um
pouco no quarto, pois falaria algo com tio Tony.
Ela prontamente obedeceu dizendo que faria alguns
desenhos. Nos sentamos no sofá e então
começamos a conversar.
— Antônio, eu...
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— Tudo bem, eu preciso pedir perdão antes


de qualquer coisa. Fui babaca deixando aquela
idiota achar que teria alguma chance e não notei
claramente suas investidas. Ela sempre foi daquele
jeito e eu juro que achei que respeitaria o limite,
mas então ela tentou marcar minha gola e isso pra
mim foi a última gota.
Ele estava virado de frente para mim. Seus
olhos azuis transparecendo nada mais do que a
verdade.
— Não precisa me contar, tudo bem. Eu
acredito em você.
— Sério? — Me olhou incrédulo. — Porque
eu posso colocar o vídeo da câmera de segurança
pra você assistir, se quiser.
Suspirei, cansada.
— Olha, eu estou farta dessas loucuras que
têm acontecido na minha vida desde o acidente. Já
fui enganada e apenas tive medo de ser enganada
de novo. Só quero que me prometa sempre me
respeitar e nunca me dar motivos pra desconfiar de
você. Preciso que prometa também que vai
conversar com seu pai de novo. Não quero você e
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ele mal um com o outro.


Ele bufou e desviou os olhos dos meus.
— Isso eu já não sei.
— Então nada feito. — cruzei os braços,
irredutível.
— Hã? Ele tenta nos separar e você quer que
eu volte a falar com ele?
— Não. Quero que tenha um relacionamento
ao menos maduro com ele. Ele pode ser o homem
mais desprezível do mundo, mas ainda é seu pai.
Eu não tive um bom exemplo de pais, mas você
pode mudar isso, vocês ao menos ainda se falam
quando necessário. Não deixe o tempo passar, pode
ser sua última chance.
E aquilo era verdade. Às vezes eu só queria
que meus pais fossem menos frios e tentassem uma
reaproximação. Quem sabe não poderíamos voltar a
ser ao menos, apoiadores uns dos outros?
— Tudo bem, mas vou fazer no meu tempo,
ok? — Arqueou uma sobrancelha, indagando.
— Tudo bem, amor — sorri satisfeita.
E sim, o chamei de amor de propósito. Meu
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Deus, eu amo esse homem!


Ele notou a palavra em destaque, pois seu
rosto entrou em alerta.
— A... Você me chamou de amor? Com
todas as letras? — Aproximou-se de mim e segurou
meu rosto, deslumbrado.
— Sim, seu bobo. — Revirei os olhos e dei
um empurrãozinho nele. — Droga, eu te amo, seu
idiota! Você conseguiu me conquistar, ok? Agora
não abuse da sorte, pois eu sou durona, hein? —
Apontei um dedo em sua direção.
Ele riu.
— Eu sei, minha linda, você é muito durona
mesmo, tão dura que já me deixou duro aqui de
saudade. Podemos partir para a reconciliação? —
sussurrou se aproximando novamente.
— Shiiiiiu, sai pra lá. Clara está no quarto,
seu pervertido! — Bati de leve no ombro dele,
enquanto ria.
— Tá, mais tarde então, depois da festinha do
Pedroca? — Fez cara de pidão.
— Não adianta fazer essa cara de cão
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abandonado pedindo pra ir pra casa, não! Vou


pensar no seu caso, o aniversário é do meu irmão!
— argumentei.
Mas sim, eu estava ansiosa. Meu Deus, o
queria logo!
Num gesto impulsivo ele me agarrou e me
encheu de beijos ali no sofá mesmo, enquanto eu
ria da sua intensidade.
— Me solta, seu bruto! Clara vai aparecer
aqui e ver tudo!
— Deixa ela ver que eu te amo, que você é e
sempre será minha! — Continuou a depositar beijos
no meu rosto e pescoço.
Tentei me soltar, mas ele é grande, forte e
muito irresistível, então preferi me render e
correspondê-lo.
Começamos a nos beijar de modo
apaixonado, com promessas para algo mais. Um
beijo que tinha gosto de casa, de reconciliação.
O amo, e finalmente tinha dito a ele.

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Acariciava minha pequena barriga de


grávida, ainda imperceptível, enquanto andava para
cima e para baixo, enchendo bexigas e arrumando a
casa para a pequena comemoração de Pedro.
Consegui, por um milagre, convencer meu irmão
que precisaria do apartamento até às 8 da noite e
que Antônio iria me visitar. Pedro entendeu que eu
queria ter um momento de conversa com ele, então
disse que curtiria um pouco na rua e depois voltaria
para casa.
— Meu bebê. Já te amo tanto — cantarolei
sorridente, olhando para a barriga.
Por um momento me deixei imaginar como
seria a aparência do bebê. Será que seria como eu,
com os olhos castanhos e cabelos cor de mel, ou
seria como o pai? Ao pensar no pai os pensamentos
voaram até Antônio e seus olhos azuis, mas
também lembrei-me de Henri, que tinha olhos cor
de mel como os de Clara. Logo em seguida
lembrei-me de Laira e em como me preocupava
com a sua saúde mental.
Meus pensamentos foram interrompidos pelo
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toque da campainha. Já eram 7 da noite quando, ao


abrir a porta, deparei-me com Valentina do outro
lado.
— Valentina?
Estava surpresa, não a esperava ali. Ela
sorriu, parecendo um pouco tímida.
— Desculpe não avisar que viria. Eu te
liguei, mas só dava desligado. Queria te contar as
novidades sobre o quadro de Laira. Se não puder
falar agora, eu volto e nos vemos outro dia.
— Nossa! Deixei o celular desligado
carregando e esqueci! Entre, por favor, não me
atrapalha em nada, estou organizando uma pequena
festinha. Mas me diga, como Laira está?
Os olhos de Valentina brilharam ao falar da
melhora da amiga. Com certeza ela a amava muito.
— Nossa, Amanda. Eu fiquei tão feliz hoje
pela manhã, quando ela pediu para sair e dar uma
volta na rua. Já foi um grande avanço e eu
precisava compartilhar com alguém. Desculpe te
encher com isso, mas não tenho muitos amigos
confiáveis. Você se mostrou tão solícita que achei

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que podia...
— Que isso. Não precisa se incomodar. Em
mim terá uma amiga a hora que precisar. Fico
também feliz com o avanço de Laira e torcendo pra
que em breve possamos nos ver.
Pedro sempre me elogiou pelo coração
generoso, apesar de não ser boba, eu amava ajudar
as pessoas.
Valentina olhou ao redor e então perguntou
num tom de voz mais baixo.
— Está sozinha?
Enquanto ela falava, eu prendia bexigas umas
nas outras com as mãos, mas parei e encarei minha
nova amiga.
— Clara está no quarto e meu irmão saiu.
Percebi Valentina relaxar o corpo lentamente.
Algo tem. E eu sanaria minha dúvida naquele
momento.
— Então, Val. Posso te chamar assim? —
perguntei e Valentina assentiu sorrindo. — Você já
conhecia meu irmão? Vi os dois no shopping um
dia desses. Desculpa perguntar, é que me pareciam
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íntimos. Pareciam discutir algo.


Ela arregalou os olhos e pigarreou, parecendo
constrangida.
— Na verdade, eu...
Porém o som da campainha nos interrompeu.
Pedi licença e fui atender. Eram Antônio, Nick e
Lucas.
Dei um beijo no meu namorado e falei para
os demais ficarem à vontade.
— Amor, chegou cedo — sussurrei no
ouvido de Antônio em meio ao abraço que
trocamos.
— Viemos pra ajudar. Você não pode ficar se
esforçando muito, sozinha.
Revirei os olhos e me afastei.
— De novo isso? — Cruzei os braços.
Ele se fez de desentendido.
— De novo o quê? Para de bobeira, mulher,
deixa os machos te ajudarem. — Apontou para os
amigos que já estavam colocando a mão na massa.
Ri e assenti. Seguimos até Valentina, então o

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apresentei a ela.
— Esse é meu namorado, Val. Antônio. —
Apontei para Val. — Essa é a doutora de que te
falei, amor. Valentina.
Os dois se cumprimentaram e logo Lucas
chegou no meio da conversa.
— Opa! Carne nova no pedaço! Prazer,
Lucas. Ou lindo, tesão, bonito e gostosão, se
preferir. — Estendeu a mão para Valentina, que
estava sentada no sofá.
Meu Deus, ele era mesmo louco!
Ela riu e o cumprimentou.
— Prazer, Valentina. Mas eu sou noiva,
obrigada.
— Poxa. Não vai vir nenhuma solteira pra
festa do Pedroca? — perguntou ele, a ninguém
específico.
Val se remexeu no assento, eu notei, e
enquanto os homens continuavam a conversar,
arrumando as coisas, ela se aproximou de mim
novamente.
— Bom, acho melhor ir. Conversamos mais
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outro dia.
Ha há! Quero juntar as peças do meu quebra-
cabeças, linda. Vai ficar sim.
— Não! Fica, por favor. Quase não terá
mulheres e os homens vão ficar falando
sacanagens, já conheço. Fica e me faz companhia,
não vai me incomodar não — respondi de modo
educado.
— Hum... Acho melhor não, não quero
estragar a festa. Ninguém nem me conhece. —
falou um pouco tímida.
— Mas eu conheço, ah, para. Fica aí —
insisti.
A verdade era que eu suspeitava de algo entre
ela e meu irmão, mas como era mais esperta
sempre, agia por baixo dos panos até confirmar as
suspeitas. Sem querer me gabar, mas eu sou muito
mais sagaz do que todos imaginam.
— Tudo bem — Valentina aceitou. — Só não
demorarei muito pois, logo, logo meu noivo me
ligará perguntando onde estou.
— Ótimo, fica à vontade que vou preparar os
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lanches.
— Eu ajudo! — Ela levantou solícita e foi
comigo até a cozinha.

TONY

— Eu já falei que o patrão vai dar um


chilique quando chegar e ver um monte de gente
aqui no apê dele — Nick comentou conosco,
enquanto prendíamos as bolas e enfeites pelo local.
— E essas boiolices? — Apontou para as bolas. —
Tinha que ser coisa da Amanda.
Lucas riu enquanto eu fiquei sério.
— Não fala da minha mulher, trepador de
quinta.
— Cara, eu esperei tanto tempo pra ver Tony
pior que pneu arrastado no asfalto por uma mulher
— Lucas gargalhava. — Agora tô achando uma
comédia, cara. Muito pau mandado, muito otário.
Lancei um olhar afiado na direção dele. Ele

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não tinha papas na língua.


— Tá achando o quê? Lembra que eu ainda
sou o maior de todos e o mais forte, uma
apertadinha nesse teu pescoço fino de donzela e
você paga por toda merda que já disse na vida —
deixei a ameaça no ar.
Lucas levantou as mãos em rendição.
— Ok — falou calmamente. — Tudo bem,
calma. Quero ver quem é o próximo. Estamos
ficando velhos, daqui a pouco o amigo para de
subir com muita frequência, vamos ter de
estacionar. Quem vai querer ficar sozinho? Eu que
não.
Balancei a cabeça em negativa.
— Vocês não valem nada. E aquela sua
namorada, Lucas?
— Mandei pastar, tava muito chata — disse,
dando de ombros.
— Isso aí, mano. Tem que mostrar pra
mulher quem é que manda — Nick comentou.
— Eu aposto todos os meus órgãos vitais
que, quando vocês aposentarem, serão os maridos
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mais babões do mundo. Vou dar babador de


casamento pra cada um.
— Cruz-credo! — Nick fez o sinal da cruz no
peito.
— Tá amarrado! — Lucas uniu as mãos e
olhou para o céu, numa prece.
Em instantes, começaram a chegar os
convidados. Já eram 8 da noite e Pedro ainda não
tinha dado sinal de vida nem avisado que chegaria.
Eu ficava ali, apenas olhando Amanda
organizar tudo de longe, para não atrapalhar,
ansioso para nossa pós-festa.

AMANDA

Todos estavam curtindo a festa sem o


aniversariante, bebendo e comendo, quando meu
celular tocou. Abaixei o som e pedi silêncio a
todos.
— Alô?
— Oi, Mandi, já conversaram? Preciso do
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apartamento.
— Hã... Sim, sim. Vamos até dar uma
saidinha agora, pode ficar tranquilo que eu tranco
tudo.
— Ótimo, bom passeio.
— Beijo, tchau — disse e encerrei a ligação.
Acenei para que todos se unissem no meio da
sala e falei em voz baixa:
— Ele está vindo, vou apagar as luzes e
vamos ficar todos aqui perto do sofá. Quando ele
chegar e acender, a gente dá o susto.
Todos concordaram, porém Nick resmungou.
— Viadagem ridícula... Mas o patrão merece.
Todos riram e ficaram nas suas posições.
A sala era ampla, tinha dois espaços. O local
perto da porta, que era como uma recepção ampla
com alguns quadros na parede e alguns aparadores,
e mais adiante o outro espaço com os sofás, TV e
mesa de jantar.
Desliguei o celular e corri para trancar a
porta. Voltei e fiquei ao lado do meu namorado
após apagar as luzes. Todos ficaram cochichando
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em silêncio, aguardando a chegada de Pedro.

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Capítulo 27

PEDRO

Mais cedo, naquele dia, deixei Amanda à


vontade com meu apartamento e saí para me
distrair. Era meu aniversário. Uma data que não me
importo de lembrar a cada ano que passa, mas
ainda assim, uma realidade da qual não posso fugir.
Me distraí com inúmeras atividades, e quando
começou a noitecer, peguei Jenifer em casa e a
levei até a minha. Jenifer é uma bela ruiva cheia de
curvas que me fornece noites casuais. Somos fixos,
quando um precisa do outro, estamos disponíveis. E
bem… Naquele dia eu precisava aliviar a tensão.
— Vamos, a noite é só nossa, hoje —falei ao
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abrir a porta do carro para a mulher sair.


Subimos juntos trocando beijos e amassos
dentro do elevador. Meu corpo já estava em
combustão, queria chegar logo em casa, tomá-la
para mim e aliviar toda a tensão do dia péssimo que
foi meu aniversário.
Minha solução sempre se resumia em
mulheres.
Finalmente o elevador chegou ao andar de
destino. Saímos eufóricos do cubículo e
caminhamos rapidamente até a porta certa, onde
enfim poderíamos fazer o que desejávamos.
Abri lentamente a porta, torcendo para que
Amanda já tivesse saído.
— Ótimo, ninguém em casa — sussurrei
quando avistei o escuro silencioso.
Sem pensar duas vezes trouxe Jenifer para
dentro, fechei a porta e pressionei aquela linda
mulher na parede, onde começamos a nos beijar
loucamente.
Minhas mãos percorriam o corpo da ruiva e
em instantes tirei sua blusa e seu sutiã, depositando
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beijos quentes em todo o seu corpo descoberto,


ainda no escuro.
Em um momento acendi a luz para guiar-me
melhor, porém não virei para trás. Jenifer estava
com os olhos fechados, recebendo as carícias
eróticas que eu dava e gemendo a cada toque.
A beijava ardentemente e acariciava o corpo
da mulher, enquanto mordiscava seus lábios e
pescoço. No momento em que parei para tirar a
própria blusa, levei um susto
Ouvi alguém batendo palma três vezes, rindo.
Quando notei que não estava sozinho, saltei
de susto. Jenifer me acompanhou, assustada,
tampando os seios com a mão.
— Olha, eu sabia que nosso patrão garanhão
era o maior comedor de todos, mas fazer show com
plateia assistindo... Foi demais, Pedroca. Sou teu fã,
assina aqui, ó.
Virei e dei de cara com Nick com a blusa
levantada, me mostrando as costas onde eu deveria
“supostamente” assinar algum autógrafo.
Levei a mão até a testa, irritado e
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constrangido. Então lembrei que a ruiva estava sem


blusa e me coloquei na frente dela.
Xinguei um palavrão sem nem pensar.
— Coloca a blusa logo... Jen...Jas... — Não
lembrava o nome da bendita.
— Jenifer — ela respondeu e logo se abaixou
para catar a blusa e a vestir.
Fiz o mesmo, colocando a minha, e
finalmente parei para olhar todos que estavam
enfiados no canto da minha sala.
— Ma... Que que tá acontecendo? —
perguntei.
Todos começaram a cantar parabéns,
inclusive a ruiva que veio comigo, que acabou
caindo no momento descontraído. Aquilo tudo era
uma festa surpresa. Eu ainda estava furioso, odiava
ter um momento como aquele interrompido, mas
era por uma boa causa, então puxei a mulher que
estava em meu encalço pela mão e fui
cumprimentar as pessoas que estavam ali me
prestigiando.
Tony, Amanda e Clara foram os primeiros
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que saíram dali e vieram até mim.


— Desculpa, maninho, não sabia que tinha
planos e...
— Relaxa, Mandi. Clarinha não viu nada,
viu?
— Não, eu tapei os olhos dela — sussurrou
cúmplice.
Assenti.
— Depois eu empato vocês também e tá tudo
certo.
Ela e meu cunhado riram.
— Parabéns, mano. Você é como um irmão,
desejo tudo de bom pra ti — Tony me abraçou.
— Obrigado.
Em seguida abaixei para agarrar minha
sobrinha inocente.
— Parabéns, tio! Que papai do céu te dê
muitos anos de vida — Clara pulou no meu colo e
beijou minha bochecha.
— Obrigado, princesinha. — Coloquei-a no
chão e beijei sua testa.

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Alguém soltou a música e logo o movimento


voltou ao normal, segui cumprimentando as
pessoas. Logo fui até Lucas, que estava ao lado de
Tony.
— Tu não perde tempo, sou seu fã número 2,
porque o 1 é o Nick. Parabéns, putão! — Ele me
deu um forte aperto de mão e um abraço em
seguida.
— Valeu.
Já não estava tão mal-humorado depois de
falar com meus amigos mais íntimos. Depois segui
cumprimentando os outros poucos convidados, mas
ao chegar num canto do sofá, me deparei com a
imagem de alguém.
— Ora ora ora... — debochei.
Vejam só se meu dia não poderia ficar
melhor? Ironicamente falando, é claro.
— Sua irmã me fez ficar — Valentina logo se
explicou. — Ah, parabéns.
Pensei bem. Ela estava ali, então o que custa
agir com cortesia?
— Obrigado. Não vai me dar um abraço,
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não? — Abri os braços de pé, enquanto Valentina,


sentada, me encarava de baixo para cima.
Ela pareceu ponderar um pouco meu pedido,
mas é claro que não negaria um abraço ao
aniversariante do dia. Então se levantou e me
abraçou.
Eu sorria zombeteiro enquanto a abraçava.
Logo desci a mão das costas de Valentina até sua
bunda. Fiz com a finalidade de provocá-la. E
funcionou.
Ela se contorceu e afastou o abraço, lançando
um olhar mortal em minha direção, que rebati com
um rolar de olhos. Logo saí de perto dela e voltei
propositalmente a dar atenção à bela mulher que
levara para outras finalidades.
A festa rolou tranquila. Os homens, como
sempre, conversavam sobre futebol, sexo e se
gabavam de seus últimos feitos, enquanto as
mulheres colocavam a conversa em dia, falando
sobre sei lá o quê.
Tentei ignorar que meu tormento de anos a
fio estava ali, sentada no sofá, constrangida por
uma atitude insana minha. Mas que se dane! Se não
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quisesse me ver, não ficava. E logo diverti-me com


meus amigos, jogando conversa fora.

AMANDA

A campainha tocou e de pronto atendi. Era


Bruna com o esposo e o filho em um bebê conforto.
— Oi, Bruna! Nossa, que bom que veio!
— Eu tô feliz por vir aqui. Esses são meu
filho e meu esposo. — Apontou para o homem ao
seu lado. — Onde está Pedro?
— Menina, você tinha que ter vindo mais
cedo. Perdeu a maior cena! — contei rindo.
— Sério? Me conta então depois. Vamos ali
rapidinho falar com Pedroca. — Piscou para mim e
sorriu.
Bruna se foi com sua família e eu fiquei
olhando para toda aquela festinha que organizei.
Senti-me orgulhosa. Sabia que no fundo Pedro
tinha amado a surpresa. Adorava quando alguém

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lembrava dele.
Tudo bem que ele quase estragou se pegando
com a mulher que trouxe. Por sinal, uma mulher
que nunca vi na vida, mas são coisas da vida. Não
pude evitar notar como Valentina ficou
constrangida quando viu a cena.
Deixando os problemas dos outros de lado,
percorri com os olhos pelo ambiente e os pousei no
homem mais alto e parrudo do aglomerado de
pessoas. Fiz uma checagem de baixo para cima,
começando pelos sapatos estilosos nos pés e subi
até suas pernas torneadas pouco destacadas pela
calça que, mesmo um tanto larga, não suportava
algumas partes fortes de seu corpo. Meus olhos
percorreram a cintura. Ele estava com o braço
levantado, apoiando em algum móvel no instante
em que olhei naquela direção. Sua blusa, um pouco
levantada pelo movimento, mostrava um trajeto
suave de pelos na linha do umbigo que me fez
morder os lábios ao imaginar o restante daquele
corpo másculo sobre mim. Mas a checagem não
parou aí. Subi um pouco mais e percebi como a
camisa demarcava seu peito forte, suspirando. Para
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acabar meu momento de admiração, lá estava


aquele belo rosto barbado. Pelos loiros em tons
mesclados preenchiam a face do homem que
sugava todo o meu oxigênio. Os lábios desenhados
e os olhos tão sinceros e cristalinos como o mar do
Caribe em conjunto com todo aquele cabelo que
caía em seu rosto. Cabelo que vira e mexe era
lançado para trás num gesto involuntário, porém
sensual.
Então ele sorriu.
Admirava de longe o meu homem, o homem
que amava, e não consegui conter o desejo que se
apossou de meu corpo.
Antes passei os olhos pela sala e vi que
minha filha estava ao lado de Bruna, com Jonas,
seu bebê, sentados no sofá em uma conversa
animada em meio às músicas.
Instantaneamente segui a passos largos até
Antônio, alheio à minha presença, imerso na
conversa com seus amigos até sentir um toque no
ombro.
— Amor, preciso de uma ajudinha. — Fiquei
nas pontas dos pés e sussurrei próximo ao ouvido
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dele.
— Algum problema? — Ele devolveu,
preocupado.
— Venha.
Segurei sua mão e o guiei até o banheiro, de
modo discreto para que ninguém percebesse o que
pretendia em plena comemoração social.
Assim que entramos no amplo cômodo,
fechei a porta e a travei. Posicionei-me encostada
contra a porta e respirei fundo.
— Amor, o que houve? Tá passando mal?
Enjoada? Com azia? Desejo? — Ele perguntava
com os olhos arregalados e preocupados.
Ai, amorzinho… Te amo tanto!
Fechei os olhos e sorri. Em seguida, estendi a
mão espalmada na direção do meu namorado,
pedindo para que ele aguardasse.
Logo minha respiração voltou ao normal e
enfim o encarei.
— Não estou passando mal, mas estou com
desejo — afirmei séria e depois levantei o canto do
lábio num sorriso sugestivo.
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Antônio franziu o cenho ainda um pouco


confuso, porém ao me olhar melhor, pareceu
entender o que eu queria dizer.
— Opa... Eu estava brincando naquela hora, a
gente pode esperar até mais tarde ou amanhã. Tudo
bem, amor — disse e depois me puxou para si, em
um abraço carinhoso.
Não aguentei com aquilo, pois gerou ainda
mais fogo em minhas entranhas. Afastei-o,
espalmando a mão em seu peito e o olhei nos olhos.
— Quero você. Agora — falei decidida.
Ele sorriu. Claro que não me negaria nada,
ainda mais sexo. Então quando comecei a beijá-lo,
ele logo retribuiu.
Se dependesse de mim, faríamos tudo
naquele banheiro, mas Antônio estava mais
racional e não permitiu que eu me despisse. Ele
apenas me deu prazer com as mãos enquanto me
beijava e me permitiu chegar ao ápice para aplacar
a vontade louca que me preenchia.
Aquele homem um dia ainda me faria
cometer sérias loucuras, não poderia ser normal

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tanta beleza e um poder de persuasão tão magnífico


pertencerem ao mesmo homem.

VALENTINA

Não tinha a mínima noção do porquê aceitei


ficar na festinha particular de Pedro. Sinceramente,
eu precisava de algum tratamento pois quem faz
esse tipo de coisa é masoquista. Não que eu sinta
algo por ele, mas não dá pra simplesmente apagar o
passado da gente.
Bom, eu achava que não dava, pois pra ele
era como se nada tivesse acontecido. Pedro bebia
cerveja animado com os amigos, enquanto papeava.
A mulher que veio com ele estava sentada em seu
colo, também envolvida na conversa. Eu nem sabia
se eles tinham alguma coisa, mas parecia que não
era nada sério.
Fiquei ali isolada no canto do sofá, sem
muito a fazer enquanto assistia os demais
convidados. Vi a filha de Amanda próxima a mim e
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decidi dar atenção à pequena menina, que estava


deslumbrada com o bebê de uma outra mulher ao
meu lado.
— Oi! Tudo bem? — Aproximei-me de
Clara.
Ao menos sabia o nome dela. Clara sorriu e
me respondeu radiante:
— Oi! Meu nome é Clara, você é amiga do
meu tio Pedro?
Passou longe, viu, lindona?
— Não, não somos amigos — respondi. —
Você gosta de bebês? Está tão animada com o
bebezinho.
— Sim, eu amo bebês. Minha mãe vai ter um
bebê. Eu, ela e tio Tony vamos morar em uma casa
muito bonita e alegre, junto com meu irmãozinho
ou irmãzinha. Mamãe falou que eu vou ser uma boa
irmã mais velha. Você acha que eu vou ser uma boa
irmã mais velha?
Clara desatou a tagarelar. Me pareceu que o
assunto da gravidez de Amanda era algo recente
para a menina. Parecia tão empolgada que me fez
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sorrir.
— Eu acho que você já é uma boa irmã. Olha
como você cuidou direitinho desse menino do seu
lado! Parabéns — a elogiei.
— Obrigada — Clara corou. — E você, tem
bebês?
Fechei o sorriso. Falar de bebês era um tanto
delicado, mas no momento em que ia responder à
Clara, ouvi um barulho estrondoso.
Socos na porta do banheiro.
— Não acredito que estão fazendo isso no
meio da minha festa! — Pedro espancava a porta
do banheiro, mas não estava chateado, apenas
parecia fazer cena. — Bora, saiam daí!
Logo seus outros amigos começaram a bater
à porta, juntos.
— Se Pedroca não pode, ninguém pode! — O
loiro gritou.
— Eu também tô na seca hoje. Tem lugar pra
mais um? — O negro adicionou.
Os três começaram a rir como crianças e eu
só pude revirar os olhos pela cena infantil. Até que
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a porta se abriu e Amanda saiu com um olhar


mortal direcionado ao irmão. Tony, seu namorado,
saiu logo atrás.
— Precisam fazer esse escândalo? Tem
crianças aqui! — Tony repreendeu ninguém
específico.
— Tivesse pensado nas crianças na hora que
quiseram fazer o ritual de fabricação de mais
crianças lá no banheiro, mano — O loiro deu de
ombros, ainda rindo.
Mas eles não ficaram nem cinco minutos lá
dentro, gente! Quanto exagero!
— Não houve nada, okay! Vamos voltar com
a festa normalmente! — Amanda acalmou a todos,
gesticulando para que ninguém focasse nela e no
namorado.
Foi aí que eu ri. Queria ter conhecido
Amanda naquela época, tenho certeza de que a
amaria tanto quanto estou gostando de me
aproximar dela hoje.

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AMANDA

Fiquei vermelha como um tomate pela


brincadeira de Pedro com os garotos. Ele era
incorrigível! Mas assim que me aproximei dele
para me desculpar, fui cortada.
— Vamos logo cantar esse parabéns e liberar
o pessoal porque quem quer aliviar aqui sou eu! —
Me pegou pelo pulso, levando-me até a cozinha. —
Aonde tá o bolo?
Ele não aparentava estar chateado nem
furioso… Só, talvez, nervoso. Inquieto.
— Na geladeira. Desculpe, Pedro, os
hormônios da gravidez...
— Cala a boca, Mandi. Não tô chateado por
saber que se pegaram no meu banheiro durante a
minha festa. Ninguém aqui é santo.
— Então por que tá com essa cara de mau?
— Cruzei os braços e encarei seu rosto.
Pedro passou a mão nos cabelos e suspirou,
olhando para o teto, antes de abrir a geladeira e

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retirar o bolo de lá.


— Coisas — disse em voz baixa, porém pude
escutar.
— O quê, maninho? Não gostou da surpresa?
— Não é isso, tá tudo lindo, legal, gostei.
Obrigado. — Pausou, pensativo. — É que eu tô
tenso e ainda não tive o que queria hoje, entende?
Ele me lançou um olhar cúmplice, logo
entendi que estava se referindo a sexo e à mulher
que chegou com ele no apartamento.
— Entendi. Vou pegar um refrigerante e o
fósforo para a vela.
Minutos depois todos estavam em volta da
mesa de jantar cantando parabéns para Pedro, como
se fossem colegas de escola. Era algo simples e um
pouco infantil talvez, mas aquele momento talvez
fizesse com que o coração um pouco congelado
pela vida dura que ele levou se aquecesse e olhasse
com compaixão para as pessoas ao redor, que
abriram mão de um pouco do seu tempo para
prestigiá-lo naquele dia.
Isso incluía Valentina. Uma pessoa que eu
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precisava investigar mais.


O bolo foi servido, os convidados começaram
a ir e Valentina foi uma das primeiras a se despedir
de todos com um simples aceno envergonhado. Me
deu um beijo e um abraço e se foi. Fiquei um pouco
com Jonas, o bebê de Bruna, no colo, enquanto
conversávamos sobre diversos assuntos
relacionados à maternidade, filhos, vida a dois e
muito mais.
Os amigos de Pedro foram os seguintes a se
despedir, deixando o recinto. Antônio sugeriu que
Clara e eu dormíssemos em sua casa para deixar a
noite para Pedro e sua convidada. Ele conhecia bem
o amigo.
Pedro me agradeceu pela iniciativa e, se
despediu de nós, que fomos os últimos a deixar o
apartamento apenas para ele e sua convidada.
Ao chegar na casa de Antônio, eu, que estava
com Clarinha dormindo no colo, sentada no banco
de trás do carro, pedi para que ele a levasse para
seu quarto de hóspedes, enquanto tirava as bolsas
com algumas sobras da festa e algumas coisas
pessoais do veículo.
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Já em casa, após nos entregarmos um ao


outro com saudade e ânsia, relaxamos juntos
abraçados na cama, comentando sobre o dia que
passamos.
— Uau, cansei, essa festa acabou comigo.
— Comigo também, estou bastante cansado.
Acho que é a idade — ele brincou.
Rimos juntos e logo começamos a nos beijar
apaixonadamente.
Nossas línguas deslizavam de maneira
sensual, enquanto o beijo se aprofundava e dava
abertura para carícias íntimas e provocadoras. Me
coloquei no colo dele, posicionando as pernas uma
de cada lado com meu corpo virado na sua direção.
— Eu já disse que te amo hoje? — perguntei.
Ele fez uma cara de confusão disfarçada,
arqueando uma sobrancelha e respondeu:
— Hum... Não. Você me ama, é?
Balancei a cabeça positivamente, enquanto
pressionava os lábios, fazendo um rosto fofo para
meu namorado. Envolvi seu pescoço com os dois
braços e dei um beijo em seu nariz.
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— Eu te amo demais, demais, demais,


demais. Meu Deus, parece que eu vou explodir! —
Brinquei.
Antônio sorriu, e em qualquer lugar do
mundo esse sorriso causaria o mesmo efeito dentro
do meu peito. Alegria, euforia, felicidade.
Ele segurou meu rosto, acariciando meus
cabelos e os colocando para trás.
— Você me faz tão feliz. Já nos amamos,
vamos ter um bebê em breve, somos felizes, acho
que falta apenas uma coisa.
Não entendi bem o que ele quis dizer e
perguntei:
— E o que seria?
Ele ainda sorria.
— Quer ser minha esposa? Casa comigo,
Amanda? — pediu com um olhar tão profundo e
sincero que senti uma pontada de tristeza pelo que
diria a seguir.
— Ainda não. Não sinto que quero casar
agora.
O brilho nos olhos dele deu uma leve
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apagada.
— Por quê? — Sua voz era um sussurro.
Respirei fundo, sentei-me novamente ao lado
dele, saindo do seu colo, e o encarei.
— Já nos amamos, já somos felizes. Não
precisamos de um papel pra oficializar nada,
entende? Eu fui casada por oito anos, não quero ter
esse peso agora. Não sei, apenas não quero.
Eu tinha ciência de que Antônio jamais seria
Henri. Ele era mil vezes melhor, mas ainda tinha o
medo e as coisas que sempre desejei e não
conquistei por estar casada e presa. Por mais que o
ame, não convivemos tempo o suficiente juntos. Eu
não me sinto ainda segura, ele precisa entender.
O que parece que não aconteceu, pois
Antônio só assentiu e se levantou.
— Quer ver um filme? — Tentou descontrair
de alguma forma para aplacar a decepção no tom de
voz.
Ah, meu anjo da guarda… Não fique
magoado comigo!
Tentei passar por cima daquele
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constrangimento, usando a proposta dele de assistir


ao filme como motivo para empolgação.
— Sim, vamos! — respondi animada.
Então aquele dia encerrou-se conosco
agarradinho no sofá, vendo um romance meloso,
com intervalos longos de demonstração de amor.
Queria que ele entendesse que nossa história
estava apenas começando.

A semana seguinte começou bastante


movimentada. Mas logo na segunda foi meu
primeiro dia na faculdade, e Antônio fez questão de
me levar e buscar.
— Não precisava me trazer, amorzinho —
disse a ele, durante o trajeto.
— Trago e venho buscar. Tem que pensar no
nosso bebê e não ficar andando por aí sozinha. O
mundo está muito perigoso — Antônio foi
irredutível e sério em suas palavras.

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— Tudo bem. Às vezes me irrito com essa


proteção toda, mas também acho fofo. Tô ficando
meio doida, acho que são os hormônios que me
deixam sensível.
Meu lindo riu.
— Tomara que sejam eles mesmo.
Assim que chegamos em frente ao enorme
prédio, combinamos certinho de eu avisar quando a
aula acabasse, para que ele viesse me buscar.
Antônio pareceu muito feliz pela minha conquista e
me deu vários beijos antes de eu descer do carro,
dizendo o quanto estava orgulhoso.
Em instantes entrei ali, onde uma nova parte
da minha vida estava recomeçando.

TONY

Assim que deixei minha namorada na


faculdade, voltei rapidamente para casa. Queria
fazer alguma coisa de útil enquanto a aguardava.
Clara já estava no Pedro e isso era motivo de
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tranquilidade para Amanda.


Enquanto eu aguardava, comia alguma coisa
deitado no sofá da sala, quando meu celular tocou.
— Amanda? — atendi sem ao menos ver o
nome.
— Sou eu, amorzinho, que tal um alívio pelo
telefone? — Nick, imitando uma voz feminina,
zombou.
— Ah, é você, Nick! O que quer?
Esperei Nick parar de rir do outro lado da
linha para depois pigarrear.
— Sério, Tony. Agora que você tá no meio
dessa boiolice de se apaixonar, se aposentou e
entende esses negócios sentimentais, posso
compartilhar com você uma coisa? Um segredo.
— Ai ai... Lá vem bomba. Fala, princesinha.
— É que eu tava aqui em casa, sem muita
coisa pra fazer, segunda-feira à noite e tal... Peguei
um livro qualquer na biblioteca e comecei a ler, só
que era de poema.
— Tá, e aí?
Ele demorou um pouco pra responder.
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— Teve um aqui que eu não entendi. Você


que ama deve entender. Posso falar?
Suspirei. Aquele tipo de rotina não fazia parte
de Nick. O conheço há anos e nunca o ouvi falando
de poemas, versos ou coisas sentimentais demais.
Nem quando era nerd.
— Nick, você está bem?
— Tô! O que te faz pensar que eu tô mal? Tô
parecendo mal? Tô parecendo estranho?
Tá, muito, pensei.
— Não. Fala logo essa merda aí.
Nick coçou a garganta e recitou:

Amor é fogo que arde sem se ver, é ferida


que dói, e não se sente; é um contentamento
descontente, é dor que desatina sem doer.
É um não querer mais que bem querer; é um
andar solitário entre a gente; é nunca contentar-se
de contente; é um cuidar que ganha em se perder.
É querer estar preso por vontade; é servir a
quem vence, o vencedor; é ter com quem nos mata,
lealdade.
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Mas como causar pode seu favor nos


corações humanos amizade, se tão contrário a si é
o mesmo Amor?*

Um silêncio sepulcral reinou na ligação.


— Tá aí, bebê? — Nick perguntou.
— Putz, que merda, Nick, você quer que eu
te explique o amor, é isso?
— Não! Eu só tava lendo essa porcaria de
poema, daí não fez muito sentido e.... Ah, que se
dane, sabia que você não ia ajudar. Esquece, tchau.
— Calma, tchutchuca! Vou explicar. Me fala
uma frase de cada vez que eu explico, ok?
E assim Nick fez. Eu estava achando estranho
esse questionamento dele, de repente, mas jamais
deixaria meu amigo pensando que eu não me
importava. Após dizer o que achava de tudo, Nick
concluiu:
— Então amar é a mesma coisa que lixo
nenhum! Porque se você não consegue identificar,
mas sente, e sempre quer estar mais feliz do que se
está, querer se prender no outro e ainda achar
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aquilo o máximo, e ser leal à pessoa que pode te


matar, eu prefiro ficar de boas comendo geral.
— Ufa, eu tava achando que você não
voltaria nunca! — zombei.
— Tá, parceiro, valeu pela explicação. A
partir de hoje odeio poemas.
— Vai ler um drama, um suspense, sei lá.
Aquelas coisas nerds que você lia quando era
virgem enquanto eu pegava suas amigas — caçoei
mais ainda, gargalhando.
Nick me mandou tomar vocês imaginam
aonde, e desligou.
Só consegui rir sozinho deitado no sofá.
Definitivamente Nick estava esquisito.

AMANDA

A aula começou e as primeiras horas foram


maravilhosas, consegui lembrar muita coisa que eu
tinha estudado há anos atrás. No intervalo enviei

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uma mensagem para Antônio avisando a hora que


ele poderia me buscar.
Não adianta, mesmo com toda a intimidade e
o amor entre nós, eu não queria aparentar “peso”
demais para ele. Sentia-me um fardo em alguns
momentos e por isso odiava quando percebia que
meu namorado vivia apenas por mim. Isso não era
certo, ele precisava pensar nele também e parar de
ser tão solícito. Quem sabe assim não me sentiria
mais à vontade e exterminaria o sentimento chato
que se apossava da minha mente?
Mas tive uma surpresa quando, ao fim da
aula, Antônio simplesmente deu um ataque de
ciúmes quando viu um colega de classe me
ajudando a descer as escadas do lado de fora, pois
começou a chover e estava escorregadio.
Ele pirou, foi grosso com o homem e me
tomou pelo braço, me carregando até o carro.
Nunca o vi daquele modo. Realmente foi
surpresa.
O homem em questão trabalhou comigo há
alguns anos, na mesma empresa onde conheci
Henri. Era um colega antigo, que já estava casado
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com dois filhos lindos. Naquele momento eu odiei


a atitude de Antônio e sua cautela exagerada.
Realmente não esperava que ele agisse desse modo,
tão impulsivo.
Quando entramos no carro, a voz dele ficou
mais branda.
— Amor, eu...
— Não. Fala. Comigo. Agora — o cortei
pronunciando cada palavra pausadamente.
Ele fechou a boca e ligou o carro.
Todo o trajeto até o apartamento de Pedro foi
feito em silêncio. Estava de cabeça quente e não
queria falar nada que me levasse ao
arrependimento. Ele deveria estar sem saber o que
dizer, pois a crise de ciúmes que deu foi tão infantil
que deve tê-lo causado vergonha.
Ao estacionar na calçada do prédio, quebrei o
silêncio.
— Vou subir sozinha. Obrigada por me
trazer, Antônio. Depois conversamos.
Não dei tempo nem dele se retratar, pois me
retirei rapidamente e corri para dentro do prédio
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com minha bolsa na mão.

TONY

— Imbecil. Idiota — xinguei a mim mesmo


dentro do carro, esmurrando o volante. — Ah, meu
Deus... Por que é difícil se controlar? Por quê?
Ele a tocou de um modo cuidadoso demais.
Meu Deus, ele a segurou pela cintura!
Nunca fui impulsivo nem ciumento.
Consegui suportar ver a mulher que amo com o ex
sem cometer loucura alguma, mas eu estava
recebendo uma nova chance da vida. Era injusto ter
qualquer indício de que poderia perdê-la. Eu morria
de medo disso.
Em meio aos pensamentos turbulentos,
retornei para casa e me lembrei do que disse a Nick
sobre o amor.
O expliquei que amar vai além de pensar em
si mesmo. Amar é se doar, é às vezes se anular até,
para deixar o outro feliz. Amor é confiança,
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amizade, respeito.
De uma vez só feri a amizade, desrespeitei e
desconfiei de Amanda ao ver um homem
desconhecido próximo demais. Meu interior sabia
que jamais seria traído ou magoado de propósito
por ela. Então por que agi de modo tão imaturo ao
vê-la naquela situação? Estava chovendo, ele
poderia estar apenas a ajudando.
Meditava sobre minha atitude, deixando a
água do chuveiro lavar toda a minha vergonha e
levá-la para o ralo, juntamente com a imaturidade.
Já era hora de amadurecer e virar homem de
verdade que consegue, sim, fazer uma mulher feliz
ou ao menos oferecer momentos alegres durante a
convivência.
Se eu a quero para toda a vida, preciso
aprender a lidar com as mais diversas situações. O
cuidado demais, o ciúme, que apesar de não ser
algo rotineiro, me dá medo. Nessas horas meu pai
seria de grande ajuda se não tivesse se tornado um
idiota.
Assim que saí do banho, fui surpreendido
pelo celular tocando de modo insistente sobre a
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mesinha da sala. Corri para atender, porém não


reconheci o número.
— Alô.
— Senhor Antônio Gali?
— Sim.
— Aqui é do Hospital Geral do Coração de
Goiás. Seu pai, Douglas Gali, sofreu uma parada
cardíaca e está internado. Você é o único parente
nos contatos telefônicos dele. Mesmo estando em
outro estado, ficaria viável vir o mais rápido
possível?
Meu coração acelerou. As palavras de
Amanda soaram em minha mente.
“Pode ser sua última chance”.
— Eu vou pegar o próximo voo.
Assim que encerrei a ligação após perguntar
tudo que precisava saber, enviei uma mensagem
para Amanda, me desculpando e avisando da
viagem repentina. Passei toda a direção da empresa
para ela, afinal era a vice-diretora, e arrumei as
malas.
Se aquela fosse a última chance para que meu
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pai e eu nos resolvêssemos, eu não a perderia.

AMANDA

Clara e eu já estávamos deitadas quando o


celular apitou.
— Cadê esse telefone? — resmunguei,
esticando a mão até o criado-mudo, tateando na
pouca luz.
Assim que o encontrei e li a mensagem de
Antônio, fiquei muitíssimo preocupada.
Imediatamente deixei de lado qualquer mágoa boba
e respondi a mensagem.

Tudo bem, não hesite em me mandar


notícias e avisar assim que chegar em Goiás.
Farei minha parte por aqui. Te amo muito. Boa
sorte com seu pai.

— O que houve, mamãe? — Clara perguntou

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no momento em que tornei a deitar.


— Seu tio Tony, filha. Vai precisar viajar
com urgência. Deite, está tudo bem — respondi,
acarinhando minha filha.
Clara adormeceu em instantes, porém fiquei
pensando em Antônio e em como ele deveria estar
preocupado e nervoso. Queria estar com ele, mas a
empresa precisava de mim e agora tinha a
faculdade também. Fora que, se eu fosse, teria que
ver alguém para cuidar de Clara, pois Pedro já
havia retornado à sua rotina de trabalho.
O dia seguinte amanheceu nublado, porém
sem chuva. Após mandar Clara para a escola, tomei
um banho e sentei-me na banqueta da cozinha para
tomar café. Optei por preparar torradas e chocolate
quente, deixando um pouco para meu irmão, que
ainda não acordara.
— Bom dia — Pedro, ainda sonolento e
esfregando os olhos, me cumprimentou assim que
saiu do quarto e me viu.
— Bom dia, dorminhoco. Muito trabalho
hoje? — perguntei.

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Pedro respondeu que não e pediu licença para


ir ao banheiro. Ao retornar, sentou-se ao meu lado e
começou a ingerir o que eu havia separado para ele.
— Hoje irei apenas em dois hospitais.
Moleza. Chego cedo em casa.
— Ah, bom saber. Pode buscar Clara pra
mim? Talvez eu demore hoje, pois Antônio foi pra
Goiás e a empresa vai ficar sob meu comando.
— Fazer o que em Goiás? — perguntou
Pedro, surpreso.
— O pai dele teve uma parada cardíaca.
— Puta merda, que horror.
Terminamos de lanchar em silêncio. Pedro
concordou em buscar a sobrinha na escola e me
deixou mais tranquila. Em pouco tempo, cada um
seguia rumo ao seu trabalho.
Ao chegar na Gali Telecomunicações,
percebi um alvoroço cujo motivo não sabia qual
era. Segui ao meu andar e notei alguns funcionários
cochichando e outros com um olhar desesperado.
Segui até a recepcionista e a saudei.
— Bom dia, querida.
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— Bom dia, senhorita Amanda.


— Qual o motivo da movimentação dos
funcionários, saberia me dizer?
O olhar dela era temeroso. Apenas balançou a
cabeça, negando.
— Onde está o Nick? Vou perguntar a ele,
com certeza saberá me informar.
— Desceu tem dez minutos, foi na
contabilidade.
— Ok. Vou lá.
Fiz o trajeto retornando ao elevador e apertei
o botão do andar da contabilidade. Chegando lá,
encontrei todos em silêncio, mas de algum canto do
setor eu conseguia ouvir gritos.
— Celina, querida. Onde está Nick? —
perguntei à recepcionista do andar.
— Na sala da senhorita Mendes. — Apontou
para minha esquerda. — Segue reto, terceira à
direita.
— Ok, obrigada.
Segui a passos lentos até a sala, e os gritos
coincidentemente foram aumentando de volume.
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Quando toquei na maçaneta da pequena sala da


assistente contábil, presenciei a cena.
— Eu não sou uma máquina, seu
almofadinha imbecil!
Arregalei os olhos, com a porta ainda
entreaberta.
— Eu, imbecil? Checar os últimos números
da empresa é sua obrigação, seu serzinho
desprezível esquecido pelo Biotônico Fontoura! —
Nick rebateu.
— Não quando um maldito idiota vem te dar
ordem como se fosse dono de tudo, Dominic! —
Larissa argumentou.
— É Nick! Droga de anã marrenta... —
aproximou-se dela, mesmo estando separados pela
mesa, e direcionou o indicador em seu rosto. —
Olha aqui, garotinha, se não chegar com esses
cálculos em duas horas na minha sala, eu trato de
fazer com que fique nesse setor pro resto da vida!
— Falarei todas as suas malditas ameaças
para o senhor Gali, assim que eu tiver a chance.
A respiração dos dois emanava ódio e enchia
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o ambiente, de tão pesada que estava, até que decidi


pigarrear, atraindo os olhares dos dois.
— Desculpa atrapalhar o espetáculo, mas
Nick, me aguarde na sala do senhor Gali, por
gentileza? — pedi.
Ele, envergonhado, assentiu e saiu. Não sem
antes de passar à porta, virar e lançar mais um olhar
de ódio na direção de Larissa.
— Ele já foi. Bom, podemos conversar? —
pedi para a jovem assistente.
Larissa assentiu, entrei e fechei a porta.
— Me desculpe, dona Amanda, é que...
Levantei a mão na direção dela, antes de me
sentar, cortando-a.
— Não sou dona de nada. Apenas Amanda
ou senhorita Amanda, ok?
— Ok. Fique à vontade.
Me acomodei no assento e respirei fundo.
Não dava para ignorar tamanha discussão no meio
do horário de trabalho.
— Bom, Larissa, não é? — Ela assentiu e
então prossegui. — Dá pra ver que não gosta do
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Nick, mas por qual motivo se rebaixa a tão pouco


dando corda às suas provocações e xingando no
ambiente de trabalho?
Larissa bufou, sentada do outro lado da mesa.
— Me perdoe, mas é que com ele eu não
consigo me controlar. Ele consegue me fazer odiá-
lo tanto, a ponto de querer voar naquele pescoço de
modelinho da Calvin Klein que ele tem e torcer —
dizia entredentes —, mas torcer tanto, até acabar
com ele. Acredita que me pediu um balanço
periódico completo pra agora? Assim, no meio do
mês, do nada!
Meu Deus, ela o odiava mesmo!
— Nick às vezes passa dos limites, mas você
precisa se manter afastada pra que ele não afete seu
desempenho na empresa. Eu, na realidade, estou
aqui pra saber por que andam todos afobados?
Larissa me olhou fixamente nos olhos e
suspirou em lamento.
— Parece que as ações caíram devido à
internação do senhor Douglas. Tem gente já louca
desesperada, achando que vai ter corte de

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funcionários e tudo mais.


Que absurdo!
— Mas gente! Claro que não. Quem disse
isso? Antônio foi resolver tudo por lá, ver como o
pai está. Fora que aqui somos apenas uma unidade,
não somos a sede, temos que aguardar o que eles
vão dizer pra nós.
— Eu pensei nisso, mas tem gente que
prefere levar boato adiante. — Ela deu de ombros.
— Bom, prazer falar contigo, Larissa. Gostei
de você. Pouca gente tem colhões pra encarar o
Nick no nível que às vezes ele merece. Apenas
cuidado, ok?
— Obrigada, senhorita Amanda. Vou ter
cuidado, sim.
Me levantei e retirei-me da sala. Voltei para
meu andar, porém segui até a sala de Antônio, onde
Nick ne aguardava.
— A anã fez minha caveira, né? — Nick
perguntou assim que entrei na sala.
Ele estava sentado no sofá do canto da sala.
— Não, me falou como é a convivência de
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vocês. Disse que tá caidinha por você — inventei,


apenas para ver qual seria a reação de Nick.
— O quê? — Nick gritou, espantado.
Já vi filmes mais clichês, Nick. Me poupe.
— É, ué. Vai dizer que não pegaria? Ela é
linda, esforçada, gente boa...
— Bate na madeira, Amanda! Cancela essas
palavras da sua boca, que Deus Pai não ouça você
elogiando aquele projeto de minion chato demais.
Morro de medo dela se apaixonar por mim, tá
maluca? Bebeu no caminho? Cuidado com a
gravidez, hein, álcool e bebê não combinam!
Não aguentei, gargalhei intensamente, ao
perceber que sim, ele teve a reação que eu
esperava.
— Tá rindo do quê? Ela falou isso mesmo?
Não é possível! O que eu fiz pra merecer tanta cruz
na vida, senhor! — Colocou as mãos na cabeça e
dramatizou, olhando para o teto.
— Calma, Nick. O mundo não gira ao seu
redor e ela não está interessada em você. Relaxa.
Acho que se tem uma pessoa no mundo que eu
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apostaria até meu último fio de cabelo que talvez,


se quisesse, conseguiria fazer você ficar de quatro,
é a Larissa.
Me sentei na cadeira do meu namorado, e ele
ficou lá, no sofá.
— Amanda, olha só. Somos amigos —
levantou e apontou para si e depois para mim. —
Eu e você. Não estraga nossa amizade, tá? Por que
me mandou ficar te aguardando aqui?
Imediatamente lembrei-me do assunto mais
sério e indiquei a cadeira para Nick sentar, de
frente a mim. Ele logo obedeceu.
— Sabe das notícias que estão correndo pela
mídia, sobre Douglas? — Nick assentiu. — Estarei
na frente da empresa enquanto Antônio não volta,
mas preciso da sua ajuda em algumas coisas. Por
exemplo, mais tarde tenho uma ultrassonografia
marcada. Quero que saiba de tudo o que acontecer
na minha ausência e que a partir de agora saia pela
empresa acalmando o povo. Não quero ninguém
histérico e esquecendo de trabalhar.
Nick bateu continência.

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— Sim, chefa! Só isso?


Sorri com a brincadeira de Nick.
— Sim, só isso.
Ele saiu da sala e eu fiquei ali por um tempo,
sentindo aquele ambiente que era repleto do cheiro
do meu namorado, com seus toques pessoais. Já
estava morrendo de saudades e preocupação com
ele e seu pai.
As horas seguintes passaram de modo veloz
e, após o almoço, me preparei para ir à consulta do
mês, onde faria também a ultrassonografia.
Pedi um táxi e, durante o caminho até a
clínica, pensei novamente em Antônio. Até aquele
momento ele ainda não tinha dado notícias nem
ligado. Será que estava tudo bem?
Peguei o celular e enviei uma mensagem.

Amor, como está tudo aí?


Estou preocupada.

Em poucos segundos recebi a resposta.

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Não se preocupe, logo te


informo de tudo. Te amo.

Respirei fundo e soltei o ar lentamente. Ao


menos ele havia me respondido. A angústia de não
saber o que estava acontecendo não era nada boa,
mas precisava confiar nele e deixar as aflições de
lado, pelo bebê.
Assim que a consulta pré-natal se encerrou e
fui encaminhada para a sala exclusiva onde seria
realizada a ultrassonografia, sentiu um leve tremor,
quase imperceptível, no baixo-ventre.
— Opa... Será que já quer dar sinal de vida,
meu bebê? — perguntei, alisando a barriga.
A gestação estava na sua 13ª semana e
mesmo sendo aparentemente impossível sentir o
movimento do pequeno feto dentro do útero, jurei a
mim mesma que o movimento era sim do meu bebê
em resposta à minha aflição. Ele estava querendo
acalmar a mamãe naquele momento tão difícil.
Ao ver meu pequeno frutinho no monitor do
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ultrassom e ouvir da doutora que estava tudo


passando excelentemente bem, relaxei ainda mais,
concentrando-me apenas em dar meu melhor para
que os dias fossem produtivos, pois em breve veria
o amor da minha vida novamente.

*Poema de Luis Vaz de Camões (Amor é um


fogo que arde sem se ver)

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Capítulo 28

TONY

A vida é mesmo uma passagem. A passagem


em uma estrada longa e solitária onde você só pode
finalizar o trajeto deixando tudo o que conquistou
pra trás e carregando consigo a sua essência.
De que adianta ter milhões na conta do
banco, casas, bens, poderes, se nada disso,
absolutamente nada te fará viver nem que seja um
segundo a mais quando for a sua hora de morrer?
Quando é a nossa hora, nada pode atrasar ou
adiantar. É pra ser.
Assim que cheguei em Goiânia — Goiás e
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rumei ao hospital onde meu pai estava internado,


meu coração palpitava de modo frenético. Era
medo, tensão, saudade.
Sim. Eu sentia saudade do pai que eu tive
antes da morte da minha mãe. Sentia saudade da
nossa amizade, da nossa cumplicidade. Ele sempre
sabia o que me dizer e me dava os melhores
conselhos.
Daí que eu tirei a conclusão de que a morte
não mata só quem se vai com ela. Mata quem se
deixa morrer aos poucos por estar ao redor. Meu
pai morreu há dez anos, quando o corpo da minha
mãe foi enterrado. O pai que ele era, o marido, o
homem se foi, ficando apenas a casca fria e vazia,
que após anos de terapia conseguiu seguir “em
frente”, porém nunca mais foi o mesmo. É preciso
dar um basta nisso e será hoje.
Não vou permitir que a morte leve meu pai
sem que ele saiba o que sempre significou pra mim.
Sem saber que eu ainda lembro o ser humano
incrível que ele foi.
Ele precisava saber.
Chegando lá, um grupo enorme de repórteres
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e jornalistas aglomeravam-se em frente ao local e


assim que eu saí do táxi, vieram direto até mim.
— Com licença. O que o senhor tem a dizer
da internação de seu pai? O ataque cardíaco foi
devido aos estresses da empresa?
Uma repórter começou a perguntar e eu senti
vontade de lançá-la longe. Mas apenas meneei a
cabeça, dando uma negativa, e adentrei o hospital.
Tem gente que não tem mesmo noção de que
em certos momentos não se deve forçar serviço.
A primeira coisa que eu fiz, ao chegar, foi
procurar o médico responsável pelo atendimento ao
meu pai. Ele me mostrou em prontuários e
explicações o seu quadro e disse que o pior já havia
passado, mas que ele precisaria permanecer para
um check-up e ficar em repouso por um tempo.
Segui até o quarto onde ele estava internado e
toquei a maçaneta fria de inox da porta lentamente.
Girei-a e abri a porta, colocando minha cabeça
dentro do recinto antes de entrar, verificando se ele
estava dormindo ou apenas repousando.
Estava dormindo.

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Entrei e fui até ele.


— Ah, pai... — lamentei enquanto segurava
sua mão ao lado da cama.
Puxei uma cadeira e sentei ao seu lado.
Suspirei e depositei um beijo na sua mão frágil. Eu
ainda não estava preparado para perdê-lo e, ao
ouvir do médico que o pior já havia passado, um
alívio imprescindível se apoderou de meu corpo.
— Queria que tudo fosse tão diferente, pai.
Queria que jamais tivesse me afastado. Me
rejeitado. Eu queria que você estivesse perto para
ver o homem que seu filho se tornou. Tudo o que
eu amadureci por todos esses anos — respirei
fundo. — Mas ainda dá tempo. Você ainda está
aqui. Podemos fazer certo dessa vez.
Senti sua mão apertar a minha naquele
instante, então uma fina lágrima desceu de meus
olhos.
— Sei que ainda está fraco. Mas eu estou
aqui. Independente de tudo, pai. Não vou deixar
você. Me lembro até hoje os momentos que
passamos na minha infância. Sabe o dia em que
aprendi a ler na escola? Lembra?
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Sorri relembrando o momento.

—Papai! Papai! — Eu vinha correndo assim


que cheguei em casa do colégio.
Pulei no colo de meu pai que, ao me ouvir,
levantou-se e abriu os braços para me receber.
— Filho! Que alegria! Aconteceu algo novo
hoje?
— Sim, papai. Eu aprendi a ler! Eu aprendi,
agora pareço com você, papai! Posso te ajudar!
Ele riu de maneira aberta.
— É, Tony? Vai ajudar o papai no trabalho?
— Sim. Eu vou ler todas as letras do mundo!
— gritei orgulhoso.
Meu pai me abraçou forte e beijou o topo de
minha cabeça.
— A cada dia mais inteligente. Você me dá
muito orgulho — ele sussurrou, me olhando nos
olhos.

Ao relembrar a cena, mais lágrimas caíram de


meus olhos sem que eu percebesse. Douglas
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sempre fora um excelente pai. O maior


incentivador do meu futuro.
E minha mãe, sempre tão generosa e
amorosa. Minha mente me levou até o dia em que
ela leu um livro sobre o amor. Eu tinha apenas oito
anos.
Eu estava deitado em minha pequena cama
infantil. Ao meu lado, Letícia, minha mãe,
acariciava meus cabelos loiros com ternura,
enquanto contava uma linda história para eu
dormir.
— O coelho pai então perguntou ao coelho
filho: O quanto você me ama? O coelho filho
respondeu: Te amo até o fim da estrada que leva
ao riacho.
— Nossa, mamãe. É muita coisa — comentei,
deslumbrado.
— Sim, mas então o coelho pai disse que
amava o coelho filho até além do riacho. O filho
achou que era muito amor e, como estava um
pouco sonolento, deitou-se no colo do pai e olhou
para o céu, quando viu a lua. O coelho filho então
disse: Papai, eu te amo até a lua.
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— E o filho ganhou? O que o papai


respondeu? — perguntei.
— O coelho filho bocejou, cansado. Seu pai
pensou que realmente até a lua era uma boa
distância de amor. Então beijou a testa do filho e,
no momento em que o menino adormeceu,
sussurrou: Eu te amo até a lua. Ida e volta.
— Eu te amo até a lua, ida e volta, mamãe.
— Eu também, pequeno Antônio. Eu também.

Acabei adormecendo entre lembranças e


lágrimas. Quando acordei, meu pai já estava
sentado na cama, acordado e comendo algo que a
enfermeira havia levado.
— Boa tarde, filho — ele disse com a voz
ainda fraca.
— Boa tarde, pai. Como se sente?
Ele respirou fundo.
— Um pouco melhor. Foi apenas um susto.
— E que susto. Precisamos conversar.
Me levantei e me estiquei. Dormir sentado é
bastante desagradável e eu queria estar bem para
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conversar com meu pai.


— Tudo bem, filho — ele disse e depois
liberou a enfermeira. — Obrigado, pode se retirar.
Ela saiu e ficamos a sós no quarto de
hospital. Aquele era o momento em que eu falaria
tudo e não deixaria nada para depois.
Assim que tomei fôlego para começar a falar,
meu celular tocou. Peguei-o e percebi ser uma
mensagem de Amanda. Ela estava preocupada,
claro que estaria. Eu esqueci completamente de
mantê-la informada.
Respondi a mensagem com um sorriso no
rosto e guardei o celular.
— Era ela? — Douglas perguntou.
Me sentei ao seu lado novamente, no banco
que eu ocupava anteriormente, e assenti.
— Sim, pai. Era ela.
Ele sorriu fraco.
— Você a ama mesmo, não é?
Aquele era o momento de colocar tudo às
claras.

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— Sim, eu a amo mais que a minha própria


vida, pai. E gostaria de saber por que, após tantos
anos, ainda insiste em dizer que o amor é algo
ruim?
Ele me encarou de modo firme e pigarreou.
— Filho. Eu estive agora há pouco entre a
vida e a morte. Se tem algo que a gente aprende
com isso é deixar o orgulho de lado e abrir o
coração. A única coisa de que me arrependi foi de
ter lhe dado uma falsa ilusão do amor, devido ao
meu sofrimento pessoal. Acabei sendo um pai
péssimo e fazendo atrocidades com você, que na
época era apenas um jovem imaturo. Me perdoe.
Permaneci sério e compenetrado, prestando
atenção a tudo o que ele me dizia, apenas
assentindo e confirmando nas horas certas.
— Quando me ligou falando do que Felícia
fez, eu... Me senti mal. Me senti tão imbecil por tê-
la autorizado a levar documentos importantes a
você, que pensei que jamais o veria novamente.
Pensei naquele momento que o havia perdido pra
sempre. Eu não armei nada com ela, mas a liberei
para ir até você, pois eu sabia que ela daria em
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cima como sempre fez e, se você realmente


estivesse amando, não cairia. Isso serviu para que
eu soubesse que você realmente a ama e que o
amor que sente é o que eu sentia por sua mãe.
Meu pai parou de falar. Sua voz embargou e,
ao fitá-lo nos olhos, percebi que chorava de modo
controlado. Já fazia dez anos, mas ao citá-la ele
ainda sente. Ele ainda chora.
Isso pra mim é incrível.
Afaguei sua mão.
— Tudo bem, pai. O que você fez foi ruim,
pois depois de tudo que eu fiz pra ter Amanda de
volta, aquilo me complicou muito. Mas já passou e
está tudo bem. Eu a amo sim. Tanto que não
importa o que me diga, pai. Nada conseguiria
apagar esse sentimento. Por um lado, até te
agradeço, pois se eu não fugisse do amor como
sempre fiz, talvez estivesse infeliz com outra
pessoa.
— Não, filho. O que eu fiz foi péssimo.
Nenhum pai pode privar o filho de amar. A vida é
feita de amor. Sem amor, nada faz sentido. Eu fiz
você viver uma vida sem sentido por dez anos. Me
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perdoa?
Ele segurou firme em minhas mãos. Eu não
estava esperando que nossa conversa franca fluísse
tão facilmente. Nem que ele confessasse sem toda a
capa de orgulho o que fez a mim por todos esses
anos. Aquilo causou um aperto em meu peito, mas
não de dor. De libertação. Eu estava me sentindo
livre e o peso que ele lançou sobre mim, finalmente
estava se esvaindo.
Tomei fôlego e sorri.
— Te perdoo. Agora mais ainda, pois o
senhor será avô.
— Mesmo? — Seus olhos refletiram a
surpresa pela notícia. —Terei um netinho ou uma
netinha?
— Sim. Ainda não sabemos o sexo, mas
quero você por perto, pai. Vem pra Minas?
— Eu também pensei nisso, filho. Vou
chamar o escrivão e transferir a direção-geral da
empresa para você. A partir de hoje você será o
CEO da Gali e eu vou me aposentar. Sei que você é
capaz e pode assumir tudo com perfeição, ainda

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mais com uma mulher inteligente como Amanda ao


seu lado. Vou pra Minas, sim. Quero estar perto de
você novamente, meu filho — tomou fôlego e, após
alguns curtos segundos calado, começou a chorar.
— Quero viver meus últimos anos perto de você.
Eu te amo.
Não contive a emoção nos meus olhos e
chorei também. Então o abracei. Abracei-o tão forte
como nunca fiz nos últimos dez anos. Eu
finalmente teria meu pai ao meu lado. Não apenas
como pai, mas como amigo, parceiro. Como avô e
companheiro. Parecia um sonho.
Me afastei e limpei as lágrimas.
— Bom — sorri —, parecemos duas
cachoeiras, mas valeu a pena eu ter vindo até aqui.
Não sei o que teria feito se tivesse morrido, pai. Eu
não...
— Shiiiiu — ele me cortou. — Estou aqui,
Tony. Estarei até o fim dos meus dias ao seu lado.
Obrigado por me aceitar. Por me perdoar.
Ficamos conversando um pouco mais até
anoitecer, e depois fui para o hotel. Deixei avisado
no hospital que me ligassem em qualquer
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circunstância e garanti que estaria alerta a tudo


sobre meu pai.
Cheguei cansado no quarto e, após um banho
morno relaxante, me deitei nu na cama. Estava um
pouco quente e eu estava sozinho mesmo. Suspirei
e pensei na minha princesa.
Amanda... Minha Amanda. Você mudou a
minha vida.
Ao lembrar dela, me levantei e fui buscar
meu celular, que estava no bolso da calça que eu
vestira mais cedo. Peguei-o e retornei até a cama,
me deitando de modo despojado, enquanto
verificava se havia alguma mensagem. Não havia.
Abri o whatsapp. Mandei “oi” pra ela.
Eram quase onze da noite e provavelmente
Clara já estava dormindo.
Em dois minutos ela respondeu.

Oi amor, como foi tudo aí hoje?

Eu não queria falar por letras. Fiz uma


ligação de vídeo.
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Logo a imagem um pouco escura dela surgiu


na tela. Amanda estava de camisola de cetim, com
os cabelos soltos e um sorriso maravilhoso nos
lábios. Percebi que estava sentada na cabeceira da
cama de casal do seu quarto.
— Amor, onde está Clara?
Ela virou o celular para o lado e a imagem de
Clarinha dormindo profundamente um pouco
adiante surgiu na tela. Depois voltou a focar em si.
— Ela dormiu tem um tempo. Não mandei
mais mensagens, pois achei que pudesse estar
ocupado ou com seu pai. Mas estou morrendo de
curiosidade pra saber tudo — ela disse.
Não pude evitar sorrir ao relembrar o dia que
passei.
— Meu pai e eu nos entendemos. O perdoei e
em breve ele voltará para Minas. Agora sou o CEO
da empresa e ele vai se aposentar.
Ela arregalou os olhos, surpresa.
— Nossa, quanta coisa! Hoje foi a
ultrassonografia. Depois mando uma foto legal pra
você ver o bebê — Amanda disse animada. Logo
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pareceu correr os olhos pela tela com o rosto um


pouco curioso. — Você está pelado?
Eu sorri.
— Estou. Aqui está calor e como estou
sozinho... — Dei de ombros.
— Está sozinho, é? — Ela mordeu o lábio
inferior lentamente e, com a mão livre, deslizou
uma alça da camisola para baixo.
— Não faz isso, Amanda — suspirei.
Aquela mulher conseguia me seduzir sem
esforço e só naquele olhar que ela me lançou
através da tela, enquanto deslizava a alça da
camisola pra baixo, me fez delirar.
Minha situação já estava bastante
comprometedora.
Voltei a encará-la na tela. O rosto dela estava
inundado de desejo e eu só queria estar ao seu lado
agora.
— Se prepara, pois eu vou voltar faminto.
Vou te deixar dolorida de tanto que vou cansar
você. Vou matar toda a saudade numa noite só.
— Meu Pai... — Ela arregalou os olhos. —
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Promessa é dívida, hein? Vou cobrar.


Amanda sorriu.
Nos despedimos e, após desligar, tomei mais
um banho frio e fui dormir. Estava ansioso para
voltar para casa. Tudo enfim começava a se ajeitar
em todas as áreas da minha vida.
No dia seguinte, foram realizados todos os
exames necessários em meu pai. Eu precisei apenas
estar presente quando o escrivão da empresa
chegou, para me transferir o poder total dela e
depois meu pai me liberou para retornar a BH.
Fiquei preocupado com ele, mas sua saúde
estava melhor e ele me garantiu que ajeitaria tudo
com calma para morar perto de mim. Então
comprei minha passagem aérea para a madrugada
seguinte e retornei.
Antes de entrar no avião, enviei uma
mensagem para Amanda, dizendo a hora que eu
chegaria. Queria vê-la antes de todos e, assim que
eu chegasse na cidade, correria pra sua casa.
O voo foi tranquilo e, no horário esperado,
cheguei na cidade. Era cedo ainda, mas assim que

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eu desembarquei e desci ao salão principal, lá


estava ela. Os olhos de Amanda se encontraram
com os meus e rapidamente acompanhei com o
olhar sua corrida até mim.
Ela correu de modo urgente e, assim que se
aproximou de mim, liberei minhas malas no chão e
segurei seu corpo contra o meu. Abracei-a tão forte
que suspendi seu corpo durante o abraço.
— Meu Deus, isso tudo é saudade? — falei
enquanto a agarrava.
— Muita. Muita saudade, meu amor — ela
parou, me olhou nos olhos e começou a depositar
muitos beijos carinhosos no meu rosto. — Meu
Pai... Eu te amo tanto... Não sabe o que aconteceu
antes de eu dormir.
Afastei-a um pouco antes de encará-la. Será
que houve alguma coisa ruim?
— O que houve?
Ela sorriu. E foi seu sorriso que fez meu
coração ficar mais calmo.
— Eu me lembrei. — Seus olhos estavam
enchendo-se de lágrimas. — Eu me lembrei da
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noite em que nos conhecemos. Foi tudo tão... real.


Fiquei ansiosa pra te contar. Me lembrei da boate,
de Henri, de você batendo nele e me trazendo
bêbada pra casa. Lembrei que você parecia um anjo
e me tratou com respeito naquele dia. Eu... — as
lágrimas começaram a cair — ...Eu te amo tanto,
ainda mais agora, ao lembrar disso.
Amanda me abraçou forte novamente e eu
retribuí, afagando suas costas enquanto beijava o
topo de sua cabeça.
Fechei os olhos e respirei fundo. Finalmente
ela havia lembrado algo sobre mim.
Em curtos dias aprendi lições valiosas sobre a
vida. A maior delas é que você sempre vai colher o
que plantar. Meu pai estava recebendo uma chance
nova da vida, mas poderia ter sido diferente. E eu,
estava enfim, após meses de agonia apenas
aguardando que ela lembrasse o mínimo que fosse
de mim em sua vida, feliz e aliviado porque sim,
tinha sido paciente e aguardado seu tempo, sem
pressioná-la.
Eu só podia ser grato a Deus por mais esse
sinal de que eu escolhi o melhor. Eu escolhi amá-la
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até o fim dos meus dias.

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Capítulo 29

AMANDA

Cinco meses se passaram.


Já era Janeiro, verão, época de calor e mais
um ano novo havia iniciado. 2016. Já estava com
oito meses de gestação e morava em minha casa,
comprada após a morte de Henri. O bebê que eu
esperava estava grande e forte. O sexo foi
descoberto quase no sexto mês de gestação, pois o
bebê sempre cruzava as pernas.
Foi um dia de muitas emoções para Antônio e
eu. Estávamos eufóricos, sentados na sala de espera
do consultório onde seria feita a ultrassonografia.
— Amor, será que hoje vamos saber? —
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perguntou ele, num misto de curiosidade e


ansiedade.
— Tomara que sim, não aguento mais essa
agonia — respondi, acariciando a barriga.
Em instantes fui chamada para a sala.
No momento em que a doutora começou o
procedimento e a imagem do bebê invadiu a tela,
Antônio ficou hipnotizado, como em todas as vezes
que via o bebê através daquele exame.
— Hum... Temos novidades dessa vez — a
doutora falou.
De imediato sorri.
— Diga que vamos saber o sexo?
— Exatamente, descobrimos finalmente o
sexo do bebê.
— Graças a Deus! — Meu namorado
suspirou. — E qual é?
Ela mexeu o aparelho na minha barriga e
posicionou em um local específico, depois
congelou a tela do computador onde a imagem
estava sendo passada e apontou para o órgão
genital do bebê, um pouco embaçado, mas que ela
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entendia.
— Parabéns, papais, vocês estão esperando
uma linda menina!
Antônio e eu nos entreolhamos sorridentes.
— Letícia — dissemos juntos.
O nome não foi um problema, pois havia
achado excelente colocar o nome de minha filha
como o da avó, mãe de Antônio.
Nem preciso dizer que, para ele, aquele dia
rendeu muitas lágrimas e beijos na minha barriga,
né?
Quase prestes a ter o bebê, eu sofria com o
verão. Estava quente demais e, mesmo que não
abrisse mão de trabalhar, contra a vontade de
Antônio por pura preocupação com Letícia, às
vezes faltava um dia ou outro para não arriscar.
Nós dois continuamos morando em casas
separadas. O pai dele, Douglas, mudou-se para
Belo Horizonte e estava morando no mesmo
condomínio que o filho.
Antônio, agora CEO da Gali
Telecomunicações, vivia trabalhando demais. Eram
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muitos documentos, relatórios, problemas


internacionais e nacionais que vinham para ele.
Havia muitas coisas acumuladas, pois seu pai já
não vinha desempenhando tão bem suas atividades
como gostaria, em seus últimos meses de gestão. A
melhor decisão foi mesmo passar tudo para as mãos
do filho.
Estava eu em minha casa, numa tarde
ensolarada com Clarinha, brincando de caça-
palavras, quando a campainha tocou.
Ao abrir, me deparei com Bruna.
Bruna foi escolhida a dedo para ser madrinha
de Letícia. Não havia amiga melhor. Ela
acompanhou todo o relacionamento e deu
conselhos de ouro para nós dois.
— Bruninha! — A abracei. — Entre!
Bruna estava com Jonas em um carrinho. Seu
filho, agora bem maior, dormia como um anjo.
— Amanda, minha amiga. Tony me ligou
dizendo que não se sentia muito bem. Vim ver
como está, se precisa de alguma ajuda.
A indiquei o sofá para que Bruna sentasse e
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ela o fez.
— Antônio é tão exagerado — respondi sem
graça. — Não quero te incomodar, amiga, sei que
vida de mãe é desgastante e você ainda está
fazendo aqueles freelancer de assistente lá na Gali.
Não se preocupe comigo.
— Não, me preocupo sim. Para de bobeira.
Sabe como eu gosto de me sentir útil. Sobre a Gali,
Tony tem feito um excelente trabalho. E vocês,
quando vão juntar os trapos? O bebê não vai nascer
tendo duas casas, não é? Pais juntos, porém
separados, é isso? — Bruna brincou.
Assunto delicado e bastante complexo. Dei
um sorriso contido.
— Não entendo. Por mim nós morávamos
juntos, não me incomodaria em nada, eu o amo.
Mas ele insiste em casamento. Prometi a mim
mesma que não me casaria outra vez. E estamos
ainda solidificando tudo entre nós, entende?
Eu não tinha lembrado mais nada depois da
noite em que conheci Antônio na boate, e aquilo
me desanimou pois esperava que, ao menos me
recordasse do início do sentimento entre nós. Ainda
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sentia essa lacuna em minha mente.


Bruna assentiu séria e suspirou.
— Olha, sei que se amam. É impossível
ignorar o sentimento que exala de vocês quando
estão juntos. Mas pense comigo, Tony teve um
passado obscuro e abriu mão de tudo quando se
apaixonou por você, mas você não consegue se
livrar desse pensamento bobo de não casar. Por
quê?
Bruna sempre tão sensata. Relaxei no sofá e
encarei minha barriga protuberante.
— Não sei, Bruna. Quero ver se vai dar certo,
não temos nem um ano juntos ainda, muita coisa
pode mudar. Já percebi que ele é muito ciumento,
mesmo se controlando. Teve um dia na faculdade
que ele falou poucas e boas pra um amigo casado
meu! Fora as pequenas coisas que ele pensa que eu
não percebo, sabe? Acho que pra casar tem que ter
muita certeza, não só amor. Por mim eu não casaria
nunca mais. Mas eu o amo, eu sei que vai feri-lo
ficar comigo por longos anos sem sermos casados,
mas ainda não sinto que é a hora. Entende? Um
papel não muda o que somos um para o outro.
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Bruna ficou olhando, pensativa.


— Entendi. Sabe que eu acredito muito em
vocês, não é? Acho que seriam muito felizes juntos.
Casados. Vamos ver se Tony para de bobeira então
e, pelo menos, pergunta se quer que morem juntos,
né?
Dei de ombros.
— É. Eu aceitaria. Só não faço a proposta eu
mesma, pois não quero parecer desesperada pra
prender homem, sabe? Confio nele, sei que ele me
ama, pra mim isso basta.
— Mas estar juntos na mesma casa faria bem
ao bebê — Bruna completou.
— Com certeza. — Levantei. — Aceita um
suco? Clarinha! Vem falar com a tia Bruna! —
chamei minha filha que, ao perceber que eu
receberia visitas, fugiu para o quarto a fim de
brincar.
Clarinha saiu correndo e abraçou Bruna,
depois fez carinho em Jonas.
— Tia Bruna, tudo bem? — perguntou
risonha.
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— Tudo ótimo, Clarinha! E você?


— Estou de férias da escola. Mamãe tá me
ensinando muitas coisas legais todos os dias sobre a
minha irmãzinha, pra quando ela nascer.
Clara sentou no sofá e, sorridente, falava.
— Mesmo? Você vai cuidar bem da sua
irmã?
— Vou, vou trocar a fralda, vou dar banho.
Sou uma menina grande, sei ajudar.
Bruna riu.
— Verdade, você vai ser uma excelente irmã,
Clarinha!
Fui preparar um lanche para minha filha e
Bruna. Nos deliciamos sentados à bancada da
cozinha conversando sobre temas onde eu poderia
incluir minha filha que estava animada para
conversar. Depois de um tempo, após o lanche, a
campainha tocou.
Estava estranhando tantas visitas em apenas
um dia, mas fui atender mesmo assim.
Era Valentina.
Valentina e eu solidificamos a amizade
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durante os últimos meses, porém ainda suspeitava


de que Valentina escondia algo de mim. Sempre
quando eu perguntava do seu noivo, percebia o
semblante de Val esmorecer e ela mudava o
assunto. Sobre Laira, consegui visitá-la duas vezes
e sua melhora foi surpreendente. Apesar de ainda
não sair muito de casa, Laira estava conseguindo
superar aos poucos o luto.
Mas a feição de Valentina naquele momento
era de se assustar. Ela estava chorando, ofegante.
— Ah, meu Deus. O que houve, Val? Tá tudo
bem? Entra! — Abri passagem para a amiga entrar.
Valentina logo sentou no sofá, cumprimentou
Bruna e Clara e deu um sorriso contido ao bebê.
— Quer água? — perguntei.
— Aceito — respondeu, ainda ofegante.
Depois de retornar com a água e esperar
Valentina bebê-la e se acalmar, todos os olhos da
sala viraram-se para Val.
— Desembucha. O que houve? — perguntei,
já sentada ao seu lado, afagando seus braços.
Valentina secou as lágrimas e abriu a boca.
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Estava nervosa, trêmula e esfregando as mãos uma


na outra para criar coragem para falar.
— Eu... Eu... Não sei o que eu faço da minha
vida.
Ai meu Deus. Nesses meses que convivi com
ela, nunca a vi tão aflita. Estava com medo do que
ouviria.
— O que aconteceu, Val? Pode contar
conosco. Eu e Bruna somos de confiança — frisei.
Ela respirou fundo.
Olhou nós duas seriamente.
— Eu vou ter de cancelar meu casamento.
Não entendi muito bem, fiz uma expressão
que demonstrava total confusão. Pedi para Clara ir
ao quarto brincar e depois tornei ao assunto.
— Mas isso é grave?
Valentina tentava respirar com mais calma,
ainda olhando para as mãos no colo.
— Não, mas o motivo pelo qual eu terei de
cancelar é grave. Eu estou morrendo de medo —
ela disse com a boca tremendo.

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Parecia realmente nervosa e aflita aos olhos


de quem a visse ali.
— Mas então... Qual foi o motivo? —
perguntei, acariciando seus cabelos ondulados.
Ela abriu a boca algumas vezes para falar,
depois a fechou. Parecia estar ganhando coragem.
— Eu estou grávida. — Valentina disse de
uma vez e em seguida se debulhou em lágrimas.
Chorava incessantemente, de soluçar. Nunca
havia visto alguém tão desesperada como Valentina
na vida. Ela chorava tanto, que os olhos estavam
vermelhos e inchados.
Bruna a olhava com compaixão, segurando o
filho no colo. Eu me aproximei mais dela e a
abracei.
— Mas... desculpe me intrometer. Um filho
não é algo grave. Você acha que Juliano não quer
filhos? — perguntei, afagando minha amiga.
Val fungou e me encarou.
— Ele... — Tampou o rosto —... o filho não
é dele.
Bruna e eu exclamamos “oh” ao mesmo
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tempo, assustadas.
— É, isso mesmo que vocês estão pensando.
Eu o traí. — Ela começou a chorar novamente.
Já vinha percebendo algumas coisas
estranhas acontecendo com Valentina havia um
tempo, mas nunca achei que ela tivesse coragem de
trair seu noivo. Ela sempre se mostrou correta e
generosa, uma pessoa boa e amiga. Essa notícia foi
um choque.
— O pai... Já sabe? — Bruna perguntou
receosa.
Valentina transformou o rosto em puro ódio.
Meu Deus, eu não queria estar em sua pele.
— Não quero falar dele. Eu fui idiota
entrando nesse problema sozinha, eu vou dar um
jeito de sair — respondeu firme. — Precisava
apenas... Contar pra alguém.
— Você não está pensando em... — comecei,
porém fui interrompida.
— Sim. É a única maneira de eu apagar de
vez tudo e casar com Juliano. Me arrependo tanto...
Fui tão desleal, ele não merecia... — logo Valentina
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chorava outra vez.


Aquilo estava estranho e eu descobriria como
posso ajudá-la. Uma mulher não deve
simplesmente achar que aquilo é a melhor solução
antes de ponderar todos os fatos. Eu já estava muito
apegada a Valentina, estava sofrendo por ela.
Após consolá-la, me despedi de Bruna e em
seguida de Valentina, que pediu segredo sobre o
que contara.
A noite chegou e Antônio foi até minha casa,
como fazia quase todos os dias.

Ele chegou à noite, um pouco tarde e bastante


tenso. Entrou usando a chave que possuía e se
esparramou no sofá, exausto.
Eu tinha acabado de colocar Clara para
dormir, quando saí do quarto para ir ao banheiro e
levei um susto ao vê-lo no sofá, com a blusa social
aberta e a calça desabotoada, juntamente com os
olhos fechados e o corpo relaxado, deitado em sinal
de cansaço.
— Meu Deus! — Levei a mão ao peito. —

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Que susto, nem avisa que chegou.


— Mmmmmmmmmm — ele murmurou
ainda de olhos fechados.
“Deve estar acabado, coitado”, pensei e segui
para a cozinha. Bebi um copo d'água, depois fui ao
banheiro fazer xixi. Esse último período da
gravidez me deixava com a bexiga em trabalho
intenso.
Após sair do banho, me sentei ao lado de
Antônio e toquei seu ombro.
— Amor, amor — chamei.
— Hum...? — ele respondeu.
— Vai tomar um banho e descansar, você
parece morto.
Um sorriso lento nasceu em seus lábios
quando ele abriu os olhos.
— Estou acabado. Hoje na empresa não
restou nada de mim. Me dá carinho, amor? —
pediu, manhoso.
— Dou sim, mas vamos primeiro pro banho,
pois você está todo suado e cheirando a papéis
guardados — brinquei.
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Ele levantou-se lentamente e tirou toda a


roupa na sala mesmo, andou um pouco sonolento
até o banheiro e, sem trancar a porta, entrou no
chuveiro, mesmo com cueca.
Começou a despertar com a água em
temperatura ambiente descendo sobre o corpo e, e
assim que levantou os olhos, me viu, já nua, na
porta do banheiro.
— Acho que vou me juntar ao meu homem
— afirmei, numa voz lenta e sensual.
Imediatamente pude notar que ele já estava
pronto para mim. Lambi os lábios de desejo por ele.
Sentia como se toda vez que o visse nu, fosse a
primeira. Fosse a última.
Caminhei lentamente até ele e ofeguei ao
entrar no box. O desejava a cada dia mais e mais, e
os hormônios da gravidez só atiçavam mais esse
desejo todo.
Começamos a nos beijar lentamente. Antônio
rodeava sua língua de modo faminto e lascivo na
minha boca e eu retribuía com ardor. O beijo foi
acompanhado de carícias pelo meu corpo, me
fazendo sentir o coração acelerar com seu toque.
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O beijo, o toque, o corpo dele me aqueciam


instantaneamente. Era praticamente involuntário o
calor que subia em meu corpo ao perceber e me
familiarizar com o dele. Ele tivera um dia intenso
de trabalho e estava esgotado, merecia relaxar.
— Amor — afastei o beijo. — Apenas sinta.
Pedi e desci suas mãos pelo corpo esculpido e
forte de Antônio, agachando. Ao chegar onde eu
queria, sorri. Amava dar prazer ao homem que
amo, e amava mais ainda as reações dele ao receber
minhas carícias.
Pouco tempo depois, quando ele enfim estava
saciado e relaxado, continuamos nosso banho cheio
de promessas para mais tarde.
Saímos do box nos enxugamos. Ele me pegou
ainda úmida no colo e correu comigo para o quarto;
parecia ansioso.
— Calminha, lembra o que a obstetra disse
do sexo — o alertei no momento em que ele me
posicionou na cama.
— Vamos fazer apenas as posições
permitidas, amor. Mas vou te dar prazer gostoso. 1

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- Porque eu te amo — ele levantou um dedo no ar,


depois levantou mais um. — 2 - Porque você tá
gostosa demais com essa barriguinha de grávida,
esperando minha filha. 3 - Porque eu morro de
tesão nesse corpo maravilhoso e sou o cara mais
sortudo da face da Terra por ser o único que pode
tê-la à vontade. 4 - Sou possessivo sim, você é só
minha sim e relaxa que agora vou me afundar em
você até cansar.
Sua voz rouca e sexy me fez gemer ansiosa
ao ouvir cada argumento dele. O desejava tanto,
mas tanto, que sabia que ao seu lado seria feliz sem
me importar com mais nada.
Então apenas relaxei e recebi tudo o que ele
queria me dar. Imediatamente ofeguei ao sentir seu
rosto de barba mais aparada descendo pela minha
barriga, causando arrepios.
Logo ele estava na fonte do meu prazer, me
estimulando e sendo magnífico como sempre.
Mesmo chegando ao ápice somente com
aquelas carícias, ele queria me satisfazer ainda
mais, então me posicionou de um modo permitido
para grávidas, e em instantes o senti dentro de mim.
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Nossos gemidos e ofegares eram confundidos


naquele quarto. Não podia evitar a satisfação que
sentia toda vez que tínhamos momentos íntimos
como aquele. Eu o amava demais. Para sempre.

TONY

Eu queria dar a ela esse prazer para sempre.


Assim que saí de dentro dela e a levantei,
abracei seu corpo e acariciei sua barriga.
— Eu te amo tanto.
— Eu te amo ainda mais — Amanda
completou.
Trinquei os dentes. Era sempre o mesmo
orgulho pré-histórico que sentia ao ouvi-la dizer
que me ama. Amanda conseguia me fazer esquecer
de tudo, naquele momento eu só queria ter o corpo
da mulher que amo fundido no meu novamente.
— Sua vez — ordenei.
Então deitei, já preparado apenas aguardando

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Amanda subir em cima de mim.


Daquela vez, chegamos juntos ao clímax e
deitamos um ao lado do outro para respirar e repor
as energias. Foi então que, depois de um tempo, já
abraçados na cama, começamos a falar um para o
outro sobre o dia.
— Amor, eu estou preocupada. Você está
trabalhando muito e, quando vem pra cá, chega
muito cansado. Bruna não estava ajudando?
Suspirei.
— Sim, ela ajuda muito, mas ficaram tantas
coisas acumuladas, meu anjo. Eu tô enlouquecendo
com tudo que tenho que fazer, cortar, mudar. Está
me tirando do sério — revelei baixinho, enquanto
acariciava os cabelos de Amanda.
— Daqui a pouco nossa filha nasce. Melhor
evitar um pouco o estresse. Que tal trazer alguma
coisa do trabalho pra casa e aqui a gente trabalha
juntos? Não estou todos os dias lá, mas posso fazer
algo daqui.
Neguei com a cabeça.
— Não. Casa não é lugar de trabalho. Não
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quero virar um maníaco daqueles pais de família


que não dão atenção para os filhos nem pra esposa
por causa de trabalho que trouxe pra casa. Daqui a
pouco tudo fica melhor, amor, relaxa, tá? — a
confortei.
E era verdade. Estava tudo muito pesado e
sacrificante, mas eu preferia chegar mais cedo ou
sair um pouco mais tarde do que trazer trabalho
para casa. Tanto na minha quanto na dela, quero
que seja um lugar de paz.
Amanda aninhou sua cabeça em meu peito e
a senti sorrir.
Um dia ela falou que amava saber que eu
pensava na nossa família acima de tudo, e é o que
tenho tentado fazer sempre. Priorizar minhas três
princesas.
— Amor, lembrei de algo. Sabe a Valentina?
Minha amiga psicoterapeuta?
— Lembro.
— Ela estava muito mal hoje. Veio chorando
aqui pra casa, descobriu que estava grávida e quer
abortar. Está desolada. O noivo dela é estéril, ela

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admitiu que o traiu, mas está arrependida. Não sei


como posso ajudá-la.
Ah, não… Que situação!
Arregalei os olhos, surpreso.
— Como assim? Ela traiu o noivo com
quem?
— Não sei. Estava muito mal. Com raiva,
com os nervos à flor da pele. Ela passou por tanta
coisa na vida, tadinha. Merece ser feliz. Sempre
teve tudo com tanta dificuldade, abriu mão de um
amor de adolescente, de alguém que a amava tanto
pra poder investir no seu futuro. Tudo pensando em
sua família, sabe?
Eita, caramba… Eu conheço essa história.
— Ela... Teve um amor na adolescência?
— Teve, outro dia me contou mais ou menos
a história.
Então Amanda contou tudo o que Valentina
tinha dito a ela. Não pude evitar ficar nervoso.
Estava reconhecendo a história, já a tinha ouvido,
mas não pela Valentina.
Ponderei sobre revelar para Amanda a
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coincidência louca que eu guardava como segredo,


e decidi contar.
— Amor, preciso te contar algo — disse, por
fim. — Seu irmão vai me matar, mas não aguento
mais esconder isso de você.

AMANDA

Depois que Antônio revelou o tal segredo a


mim, levantei e jurei que mataria meu próprio
irmão. Naquele momento quis ir até ele e degolá-lo,
mas faria isso mais tarde.
Estava esperando um bebê, não podia me
estressar muito.
Tentei deixar os problemas para o dia
seguinte, onde eu e Antônio faríamos de tudo para
resolver o mal entendido (ou não) que houve com
Valentina antes que fosse tarde demais.
Agora finalmente estava tudo claro sobre
minhas suspeitas.
Deitei novamente junto a ele, relaxando
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apenas curtindo mais um dia onde me sentia


completa e realizada.
Logo teríamos nossa bebê, e se tudo desse
certo, moraríamos na mesma casa para construir
nossa família.

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Capítulo 30

TONY

— AHHHHHHH! — Amanda gritou às


quatro da manhã, quando sentiu uma pontada grave
em seu ventre.
Eu havia pedido há uma semana para que
morássemos juntos, e agora vivia com ela todos os
dias em minha casa no condomínio onde sempre
morei. Reformei o quarto ao gosto dela e fiz o
mesmo nos quartos de Clara e de Letícia.
Faltava uma semana para completar as 40 de
gestação e Amanda optou pelo parto normal. Não
sabia muito bem como essa contagem funcionava,
mas entendia que seria pego de surpresa em algum
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momento. Estávamos felizes juntos, como uma


família.
Saltei da cama, desesperado, e corri de um
lado para o outro.
— O que foi? Ai meu Deus, o que eu faço?
— indaguei.
— Me leva pro hospitaaaaaaaaaaaal — ela
tentou dizer, mas gritou gemendo de dor.
Aquela cena estava tomando tudo de mim.
Ela parecia ter sido atropelada por um trator e eu
estava estático, sem saber como começar. Passei a
mão nos cabelos em sinal de desespero e coloquei
uma camiseta e uma bermuda. Tinha mania de
dormir apenas de cueca. Amanda estava colocando
sua roupa já separada para um caso de emergência,
no criado-mudo ao lado da cama.
Peguei a bolsa do bebê e de Amanda, levei
até o carro e retornei para pegá-la e colocá-la no
veículo.
Ao pôr Amanda no banco de trás no carro,
acomodada, corri para acordar Clara e a arrumei
para ir conosco.

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Assim que dei partida no carro, Amanda


respirou fundo.
— Liga pro Pedro. Vamos deixar Clara lá.
Ela parecia controlar a respiração, num ritmo
intenso.
— Ele não está aqui. Esqueceu? Vou ligar
pra Bruna.
E foi o que fiz. Ligou para Bruna e coloquei
no viva-voz. Ela concordou solícita em olhar Clara,
enquanto Amanda fazia seu parto.
Deixei Clara na casa de Bruna e rumamos ao
Hospital.
Chegando lá, Amanda foi direcionada à sala
de pré-parto para todos os procedimentos padrão.
Orientaram-me a permanecer na sala de
espera, e assim fiz, avisando através de ligações a
todos os parentes, amigos e familiares que minha
filha nasceria. Fiquei algumas horas aguardando,
até que uma enfermeira foi até onde eu estava.
— Está na hora, papai. Quer acompanhar o
parto?
Não pensei duas vezes.
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— Sim.
Acompanhei a enfermeira até a sala de parto.
Lá, após vestir os trajes adequados, posicionei-me
ao lado de Amanda e segurei sua mão.
A cada grito dela, meu interior gelava. Estava
suando de nervosismo e ansiedade. Nunca
presenciei tal cena e estava admirado com a força
da minha mulher ao trazer um filho ao mundo.
Depois de longas contrações, gritos e forças,
Letícia nasceu.
— Quer ajudar a cortar o cordão, papai? — a
obstetra perguntou.
O misto de emoções que inundou meu peito
naquele instante, ao ver minha pequena bebê pela
primeira vez, fez com que meus olhos marejassem.
Assenti. Minha voz estava embargada de emoção.
Segui as instruções e cortei o cordão
umbilical que ligava Letícia à Amanda. Depois a
bebê foi levada para a lateral da sala e colocada em
um respirador.
Me sentei na banqueta ao lado da maca onde
Amanda estava, ainda fraca, e sorri, afagando sua
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mão.
— Ela é linda, meu amor. Obrigado, eu te
amo tanto — disse a ela.
Amanda sorriu, ainda um pouco extasiada
pelo momento que passara.
— De nada. Estou morta, queria um
hambúrguer gigante — soprou.
Ela é realmente única e incrível.
Imediatamente sorri.
— Você acabou de parir e pensa em
hambúrguer?
Estávamos nós dois suados, com os olhos
cheios de lágrimas, emotivos demais porém com o
senso de humor firme.
— Claro! Meu estômago está vazio. Quero
comer.
Após esse momento de descontração, pediram para que
eu me retirasse pois terminariam de tratar de Amanda e
Letícia.

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As primeiras semanas após o nascimento de


Letícia foram recheadas de visitas.
Para a surpresa de Amanda, recebeu uma
carta de sua mãe. Eu insisti em procurá-la apenas
para avisar que a filha estava bem e teria mais uma
filha, com a permissão de Amanda. A mulher não
quis nem saber, disse que depois falaria com ela. A
carta realmente foi uma surpresa.
Já o pai, apareceu pessoalmente parecendo
arrasado. Ele prometera a Amanda que faria de
tudo para se reaproximar dela e do irmão em breve,
mesmo morando muito longe.
Eu não era o melhor exemplo de filho que
perdoa o pai, apesar de ter aceitado de bom grado o
perdão do meu, mas incentivei-a a seguir sem
mágoas. Nossa vida juntos merecia.

Era uma tarde, ainda de verão. Amanda,


Clara, Letícia e eu estávamos na área de lazer do
condomínio. Clara e Amanda mergulhavam na
piscina enquanto eu brincava com Letícia nos
braços.
Sabe, nunca tive dúvidas de que era o pai
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dela. Jamais duvidei desde o momento em que


soube de sua existência. Eu sentia.
O sentimento paterno inflava sempre em meu
peito quando, como naquele momento ali na beira
da piscina, Letícia arregalava os imensos olhos
azuis como o mar do Caribe e dava uma risada
banguela gostosa.
Letícia era um bebê feliz. O que mais eu
poderia querer?
— Gosta de rir pro papai, né? — Toquei o
queixinho dela. — Você gosta, né?
Ela gargalhava ainda mais ao ouvir minha
voz. Dizem que antes mesmo de nascer, os bebês
criam vínculos com seus pais através das
conversas, e se tem algo que eu investi pesado, foi
em bater papo com essa princesinha.
— Alguém traz um babador pra esse pai,
gente! — gritou Amanda, aproximando-se com
Clara.
Todos rimos.
Clarinha sentou ao meu lado, na cadeira
debaixo do guarda-sol, e estendeu os braços.
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— Posso segurar minha irmãzinha? — pediu


carinhosa.
A posicionei devagar nos braços dela e fiquei
bem próximo, tomando conta.
— Ela é tão fofinha! — disse Clara.
— Vocês duas são lindas — comentei
orgulhoso.
Ela sorria encarando a linda bebê em seus
braços, até que em um momento, levantou o rosto
em um semblante sério e olhou para mim.
— Tio. A Letícia é sua filha. Vai te chamar
de papai... Eu... — titubeou envergonhada. —
Posso te chamar de papai também?
O mundo com certeza parou de girar por um
segundo naquele instante. Eu já a amava como
filha, já fazia de tudo pela família linda que possuo,
mas com aquele pedido, meu coração inundou-se
de emoção naquele instante. Apesar de amá-la
como minha, não queria tomar o lugar de Henri.
Não sabia se era certo.
— Tem certeza? — perguntei para a menina.
Ela balançou a cabecinha confirmando,
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fazendo seus cabelos cor de mel se agitarem ao


vento.
— Tenho. Quero ser sua filha também —
completou.
Fiquei maravilhado com as palavras que
saíam da boca de Clara. Ela sempre demonstrou ser
absurdamente inteligente, então, sem pensar outra
vez, assenti.
— Sim, minha filha. Pode me chamar de pai.
Clara deu um sorriso enorme, capaz de
iluminar a galáxia inteira.
Amanda estava ali perto e pareceu orgulhosa
ao presenciar a cena. Veio até onde eu estava e me
beijou, depois retornou à piscina a fim de se
refrescar um pouco mais.
Após posicionar Letícia de volta ao carrinho,
avistei naquela manhã ensolarada uma pessoa
familiar se aproximando da área onde estávamos.
— Como estão minhas netinhas mais lindas?
— Douglas caminhava sorrindo.
Desde que se mudou para Belo Horizonte,
tornou-se o homem que tanto negou ser por anos.
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Sua experiência de quase-morte o ensinou a


valorização dos pequenos momentos e agora agia
como um avô babão e coruja com Clara e Letícia.
No instante em que proferia o nome da neta
mais nova, seus olhos teimavam em marejar. Era
saudade. Mas ele sabia que aquela pequena bebê
era uma outra Letícia. Sempre dizia para mim que
faria de tudo para que a nova Letícia fosse feliz ao
extremo e a protegeria de qualquer mal.
— Vovô! — Clara correu para os braços de
Douglas.
Ela já o chamava de avô desde o primeiro
instante em que ele veio para a cidade onde
moramos.
— Princesinha linda! Como está hoje?
Ela estava sorridente em seu colo.
— Eu tô bem. Peguei Lelê no colo e agora tio
Tony é meu pai! — arregalou os olhinhos e sorriu
contente. — Viu, vovô? Eu e Lelê temos o mesmo
papai!
Mesmo que eu não mereça, ele insistia em
dizer quão orgulhoso da minha conduta ele era.
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Nesse pequeno período de tempo, nos meses que


estava morando ali no mesmo condomínio que nós,
dizia que admirava a bondade do meu coração. Eu
não sabia o que responder, apenas me esforçava
para nunca deixar alguma área de minha vida
deficiente. Fazia de tudo para ser um bom filho, um
bom pai, um bom homem para Amanda e um bom
líder na empresa.
— Fico muito feliz, minha linda.
Douglas abaixou e liberou Clara de seu colo.
Então ele andou até o carrinho onde há pouco
depositei minha filha de poucos meses e a
observou. Sua pele clara e seu rosto redondinho,
semicoberto por cabelos dourados, realçados por
seus intensos olhos azuis, estavam focados em
Douglas naquele instante. E eu, ao lado, apenas
assistia.
— Saudade do vovô? — perguntou.
Letícia soltou uma curta gargalhada e
balançou as perninhas e os bracinhos.
Admirei a cena de coração alegre. Jamais
imaginei que veria algo semelhante acontecer um
dia. Eu, feliz ao lado de uma mulher com duas
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filhas amadas, meu pai ao lado, sempre presente


nos momentos importantes, e o amor inundado e
intenso ardendo em meu peito a cada dia.
Só pude sorrir.
— Fica um pouco com elas, pai? — pedi.
Ele concordou e então me levantei, dei a
volta na grande área em volta da piscina e fui até o
chuveiro que ficava à beira. Me molhei e lancei-me
na água. Amanda estava na beirada, admirando
nossas filhas, quando cheguei e a agarrei por trás.
— Tá aí fazendo o quê, minha gostosa? —
sussurrei em seu ouvido.
— Para com isso, amor. Estamos perto das
crianças — repreendeu-me, porém riu.
— As crianças estão com meu pai. Agora
eu... — Deixei que ela notasse meu estado debaixo
dágua, ao roçar meu corpo no seu.
Amanda fechou os olhos, recebendo a carícia.
— Ai meu Deus... Estou pagando até hoje
pelo período do resguardo. Por que você é tão
insaciável? — Virou de frente para mim.
Não me faça perguntas difíceis, minha linda.
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Com minha mente já inundada de cenas, grudei


meu corpo enorme no seu frágil e pequeno e
encostei nossas testas.
— Porque eu esperei demais. Agora que a
gente pode fazer à vontade, eu não quero perder
nenhuma chance. E porque eu te amo e te desejo
mais do que nunca. Tá bom pra você?
Seus olhos brilhavam.
— Tá ótimo pra mim. Fechamos a piscina só
pra nós? — sussurrou.
— Não, mas podemos. — Arqueei uma
sobrancelha sugestivo.
— Tive uma ideia — Amanda sorriu
maliciosamente.
Saiu da água e pediu que meu pai levasse as
meninas para dentro de casa. Clara estava cansada e
Letícia, dormindo. Ele concordou e se foi com elas.
Amanda voltou, fechou a grade externa da
área da piscina e pulou dentro dela. A vi se
aproximando por baixo d'água e aguardei.
Mas Amanda não emergiu ao chegar perto de
mim. Tocou a única peça de roupa que eu vestia e
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abaixou, acariciando-me em seguida.


— Ai meu Deus! — murmurei e olhei para os
lados, com medo de sermos vistos.
Não havia ninguém ao redor. Estava tudo
bem fechado e cercado. Amanda levantou e limpou
o rosto.
— Gostou do carinho? — Enlaçou seus
braços em meu pescoço.
— Eu já disse que você é a mulher mais
incrível do mundo? — perguntei mantendo um
aperto firme no seu corpo.
— Hoje não. — Minha mulher riu.
Não me canso jamais de repetir como ela é
preciosa na minha vida. Toquei a ponta do seu
nariz.
— Pois então saiba. Eu amo cada pequeno
toque seu, meu amor. Amo suas carícias e seus
olhares. Amo esses olhos castanhos inundados de
desejo olhando pra mim. Me sinto o maioral. Me
sinto o cara mais gostoso da face da Terra.
Ela fez um biquinho, cruzando os braços.
— Mas você é o cara mais gostoso da face da
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Terra. E é meu.
Cada vez que ela se declarava, poderia ser
com um “eu te amo” ou com algo semelhante ao
que acabei de ouvir, sentia que meu peito podia
explodir com o poder dessas palavras. Nunca me
acostumaria com o efeito que ela tem sobre mim.
Peguei-a no colo e a coloquei sentada na beirada da
piscina. Sem pensar duas vezes, fiz com ela o
mesmo que fez a mim, minutos antes.
— Antônio... e se alguém nos... ahhh, que
delícia...
E era sempre assim, mesmo depois de tudo
que já vivenciamos, passamos e enfrentamos.
Sempre estamos dispostos a recomeçar e nos amar,
como se o amanhã não existisse.
Depois de alguns atos insanos, saímos da
piscina, tomamos uma ducha e entramos em casa.
— Ainda bem que ninguém nos viu —
Amanda sussurrou ao passar pela sala.
— É, vamos nos arrumar logo, daqui a pouco
Letícia acorda — a alertei.
Trocamos as roupas e voltamos para a sala.
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Como um sensor, Letícia acordou chorando com


fome. Douglas acabou despertando também, devido
ao choro do bebê e Amanda a tirou do carrinho
para amamentá-la.
E eu fui até Clara, que estava no quarto,
acordei-a e a coloquei no banho.
Assim era minha rotina de pai de família, e
eu estava completamente apaixonado.

Tempos se passaram e todos estávamos


reunidos em um jantar, comemorando o retorno de
Amanda à empresa e um ano desde o acidente.
— Caramba, passou tão rápido, né? Já fez um
ano que Amanda perdeu a memória. — Nick
comentou durante o jantar.
— É verdade, me lembro até hoje como Tony
ficou desolado — Pedro incluiu.
— Um ano mudou completamente todas as
nossas vidas — Valentina acrescentou, dando um
singelo sorriso.
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Já que todos estavam falando, decidi falar


também.
— Eu só tenho a agradecer por essa mulher
maravilhosa que tenho ao lado — comecei. —
Minha melhor amiga, minha melhor funcionária,
minha parceira, minha mulher, mãe das minhas
filhas e dona da minha felicidade. Você foi o
melhor presente da vida pra mim, meu amor. —
Segurei em suas mãos. — Eu não vejo a hora de
vermos nosso futuro juntos, eu te amo tanto.
— Mas é um pau mandado mesmo... — Nick
zombou.
— Somos os únicos blindados dessa mesa,
Nick. Essa virose de aposentadoria não vai nos
atingir tão cedo — Lucas acrescentou.
Todos deram gargalhadas.
— Fico tão feliz em ver vocês felizes, torci
tanto por isso — Bruna comentou.
— Eu queria falar algo — Meu pai, atento a
tudo, finalmente se pronunciou.
Já me sentia feliz em ter todas as pessoas que
amo e admiro reunidas em um jantar como aquele.
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O que mais poderia ocorrer para incrementar a


alegria? Acho que Amanda também estava
extasiada, apenas aproveitando o momento, pois só
sorria sem muito a dizer, mas eu via as emoções
cruzando pelos seus olhos.
— Pode falar, pai.
— Diga, sogro — Amanda comentou
sorridente.
— Bom — pigarreou. — Quero agradecer à
Amanda por entrar em nossas vidas. Não só mudou
a vida do meu filho, como mudou a minha também.
Sei que na vida nunca sabemos ao certo o que
acontecerá e temos de aproveitar todas as
circunstâncias e oportunidades impostas pelo
caminho, mas... Essa mulher aqui é a mulher mais
forte que conheci. — Amanda já estava enxugando
as lágrimas que desciam por seus olhos, eu sabia
que ela já estava à borda. — Ela tomou uma
decisão pensando no seu melhor e no melhor para a
sua filha, largou a vida que levava com o ex-marido
e lutou por si mesma. Ano que vem ela se forma,
agora é vice-diretora de uma multinacional, mãe de
duas meninas lindas, futura esposa do meu filho,
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assim espero, e uma sobrevivente das artimanhas


da vida. Mesmo não tendo recuperado todos os
fragmentos de memória, não se prendeu a isso e
seguiu em frente. Eu quero dizer que a admiro e
agradeço por mudar nossas vidas.
Abracei minha amada, pois ela merecia mais
do que uma homenagem ou um jantar. Amanda
sussurrou agradecimentos enquanto eu a abraçava
com carinho, enxugando suas lágrimas.
— Minha mulher merece um brinde! Ela é
uma lutadora! — Ergui a taça, propondo o brinde.
Todos brindamos pela vida dela, seu retorno
à empresa e sua luta pela vida.
As memórias posteriores à noite da boate
nunca retornaram à mente de Amanda. As imagens
dos nossos dias passados em Recife, dos momentos
que passamos juntos com Clara e da nossa noite de
amor nunca mais retornaram, mas de uma coisa
Amanda tinha certeza e sempre dizia para mim: o
futuro lhe pertencia.

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Era uma tarde refrescante de inverno, quando


percorri a sala e olhei maravilhado para a foto de
família que fizemos em um estúdio fotográfico.
Nela estavam eu, Amanda, Letícia e Clara,
abraçados, sorrindo e felizes como sempre.
Suspirei ao lembrar em como minha vida
mudou em pouco mais de um ano. Lembrei das
lágrimas, dos sorrisos, do amadurecimento e do
aprendizado. Consegui controlar mais os ciúmes, a
proteção exagerada. Consegui me dedicar à Gali e
deixar a empresa de vento em popa, e alcancei com
esforço, o sonho de dar tudo que sempre quis para a
mulher que amo.
— Meu tesouro, vou viver o resto dos meus
dias por vocês — sussurrei ao olhar o quadro preso
na parede.
Depositei um beijo na foto e me afastei dela,
sentindo apenas gratidão.
A vida é engraçada. Nos prega peças e nos
faz querer muitas vezes desistir de tudo. Mas
quando passamos a entender a imensidão à nossa
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volta, as conquistas que podemos alcançar e os


sonhos que podemos realizar, tudo se expande, se
abre, se clareia.
Viva cada dia como o último, lute, se esforce,
ame, dedique-se, pois o futuro pertence a quem se
atreve a ir atrás dele. Sempre levando o amor
dentro de si, porque de todos os sentimentos
humanos que podemos ter, o amor é e sempre será
o maior deles.

"Agora, pois, permanecem a fé, a esperança


e o amor. Porém o maior desses é o amor." (1 Cor.
13:13 — Bíblia Sagrada)

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Epílogo

Tony e Amanda viveram felizes para sempre,


com suas filhas e seu amor a cada dia mais forte.
Não, esse não foi o fim da história.
No aniversário de um ano de namoro deles,
Tony a convidou para jantar, levando sua amada no
melhor e mais caro restaurante da cidade. Após
todo aquele romantismo, ele a pediu em casamento.
Amanda disse não.
Na realidade, os argumentos dela foram
exatamente esses:
Não precisamos casar. Você sabe que já sou
sua e você é meu. Um papel não vai mudar em
nada os nossos sentimentos. Vamos ficar como
estamos. Eu estou feliz assim.
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Mas a realidade era que aquela promessa da


lista que escrevera ainda estava em sua mente.
No segundo aniversário de namoro, Tony
tentou novamente. Queria garantir que sua
namorada fosse sua perante a lei. Ele queria, sentia
necessidade de casar com ela de qualquer forma.
Ouviu mais uma vez o "não".
No terceiro ano, ele jurou para si mesmo que
ela aceitaria. Levou-a para viajar de helicóptero.
Ainda no ar, foram até um enorme campo gramado
de um famoso estádio de futebol. No gramado
estava escrito em pétalas de rosa com letras
gigantes: “Casa comigo?”. Mais uma vez, Tony
recebeu uma negativa.
Os argumentos de Amanda eram sempre os
mesmos. Ele nem perguntava mais o por quê.
Apenas fechava o rosto e voltava para casa com
ela.
No quarto ano, ele fez melhor. Levou-a para
uma cidade cenográfica onde, durante o passeio,
inesperadamente atores começaram a coreografar
em volta deles, e por fim, um grupo se aproximou,
fazendo serenata e cantando "Marry You" para os
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dois.
A resposta de Amanda? Um balançar constrangido
de cabeça.
No ano seguinte os dois foram parar na TV,
conhecidos pelo Brasil inteiro como o casal que
nunca se casa, mas cujo noivo faz o pedido todos os
anos.
Deram entrevistas, fizeram sessão de fotos...
Mas nada de Amanda aceitar o pedido de
casamento de Tony.
Passaram-se estes anos de namoro e no sexto
aniversário, ainda de madrugada, depois de uma
intensa noite de amor, Amanda perguntou:
— Qual vai ser o pedido desse ano? Ah,
parabéns pra nós, amor! Seis anos de união não é
pra qualquer um.
Tony a abraçou, deitado com ela na cama.
— Obrigado, meu anjo. — Depositou um
beijo no topo de sua cabeça. — Quem diria que eu
estaria há seis anos com a mesma mulher, e sem
vontade nenhuma de mudar essa realidade? Esse
ano não farei nada.

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— Nada? — Amanda arregalou os olhos em


espanto.
— Nada. Me conformei. Desisto de te pedir
em casamento — disse, dando de ombros.
— Por quê?
Amanda sentou na cama, prendeu o lençol na
altura do seio e, com o cenho franzido, aguardou a
resposta dele.
— Porque eu já sei a resposta. Mas sabe,
amor? Desde o início, desde o primeiro pedido de
casamento, eu sempre tive em mente que aquilo
não nos faria melhores nem mais unidos. Minha
vontade sempre foi apenas de te chamar de esposa,
te dar meu nome, colocar uma puta aliança enorme
no seu anelar esquerdo e acordar todos os dias
falando para mim mesmo o quanto eu me sinto
orgulhoso e feliz em ter uma esposa maravilhosa,
que me deu duas filhas que amo mais que tudo e
que vai ser sempre assim enquanto eu viver.
Sempre pensei nisso, mas hoje eu entendo seu lado.
Ainda quero casar, mas te entendo. Não vou insistir
e levar mais um não. — Riu.
Amanda sorriu e acariciou o rosto do homem
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a quem entregou de corpo e alma seu coração.


Suspirou, então disse:
— Eu aceito.
— Eu sei que não. Mas... — Tony parou no
meio da frase, percebendo o que acabara de ouvir.
— Você disse “aceito”?
Ela assentiu, sorrindo.
— Sim. Aceito.
— Ah, não! Isso não está acontecendo! —
Balançou a cabeça em negação. — Cadê as
câmeras? É uma piada, né?
Amanda começou a gargalhar.
— Claro que não, meu amor. Você é tão
bobo. Eu disse sim, vamos nos casar. Isso tudo que
me falou agora, além dos anos que estamos juntos,
me fez pensar e decidir. Quero casar com você.
Mas tem que ser com aquelas tralhas todas de véu,
vestido branco e o que for, hein!
Tony estava boquiaberto.
— Repete que vai casar comigo? —
Levantou e foi até a sacada da casa com Amanda a
tiracolo. — Ei, vizinhos! Amanda vai se casar
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comigo!
Ela gargalhava intensamente.
— Eu vou casar contigo! — repetiu ela,
gritando para todos ouvirem.
Não tinha ninguém da vizinhança na rua, mas
só em gritar em alto e bom som que aceitava o
pedido dele, Tony abraçou forte sua amada e a
levou de volta para a cama.
— Agora um amorzinho gostoso pra
comemorar.
Três meses depois, chegou o grande dia.
Tony já estava no altar da igreja, contando os
minutos para a chegada de Amanda.
Ao lado, todos os amigos com suas respectivas
esposas a postos, homens de um lado e mulheres do
outro. Cada um em um degrau da escadaria enorme
do altar.
— Finalmente, hein, barbie, convenceu o
sargento! — Nick provocou o amigo.
— Só não te xingo e te mando para, você
conhece bem o lugar, por respeito ao local em que
estamos — Tony rebateu.
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— Perdi a aposta. Torci pra Amanda dizer


não de novo. Agora vou ter que fazer greve de
sexo. Minha mulher vai me matar — Lucas disse e
sua esposa do outro lado do altar escutou.
— Arranco "ele" fora — ela sibilou,
apontando para o ventre dele. Lucas entendeu o
murmúrio e ficou quieto, sério.
— Pau mandado de uma figa — Nick
zombou de Lucas em voz alta.
— E quem é que manda no seu? — sua
esposa perguntou, retrucando a frase do marido. —
Tô de olho!
Nick arregalou os olhos e parou de rir.
— Você, amorzinho. Você manda, linda. Te
amo. — Mandou um beijo pra ela no ar.
Tony ria dos amigos. Passe o tempo que for,
eles eram sempre os mesmos e sabia que a amizade
seria por toda a vida. O único que não estava rindo
era Pedro. Sua esposa estava entre as madrinhas
também, mas com 38 semanas, gestante do quarto
filho. Ele permanecia ao lado dela, acariciando sua
barriga protuberante.

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— Relaxa, amor, vai pro seu lugar. Daqui a


pouco sua irmã chega.
— Não. E se você passar mal? Olha essas
escadas... E se você cair? Se a bolsa estourar? Até
eu te socorrer, o bebê já nasceu e saiu correndo por
aí. Daqui não saio, daqui ninguém me tira. — Foi
categórico.
— Tá bom, meu lindo. Eu te amo — ela
concordou, orgulhosa, e os dois permaneceram lado
a lado no altar.
A marcha nupcial começou a tocar,
anunciando a chegada da noiva tão esperada.
— Finalmente! — Tony disse, aliviado,
olhando para o céu.
O casal de noivinhos entrou. Sua filha Letícia
era a noivinha, acompanhada do filho mais velho
de Pedro. Logo atrás, espalhando pétalas de rosas,
vinha Clara, que já era uma moça de quase doze
anos, em um belo vestido branco, de cabelos longos
presos pela metade, sorridente.
Então a noiva fez sua entrada.
Amanda estava chorando, porém sorria como
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uma criança em seu belo vestido tomara que caia


branco, cravejado de diamantes por toda a sua
extensão. Usava véu e grinalda, um buquê lindo de
lírios e deslizava lentamente pelo tapete vermelho,
indo em direção ao amor da sua vida.
— Usa o lencinho, Tony — Nick alertou ao
ver Tony se debulhando em lágrimas.
Ele riu e obedeceu, pegando o lenço.
Enxugou as lágrimas de alegria e recebeu sua noiva
no altar.
A cerimônia foi rápida e logo após o “sim”,
foram consagrados marido e mulher, selando a
união com um beijo.
Durante a festa, após receber os
cumprimentos de todos os amigos e convidados,
Tony, Amanda e as crianças se reuniram em um
espaço ao ar livre, ainda na festa, com seus outros
amigos casados e respectivos filhos.
— Pai, pai! — Clara correu até Tony e o
abraçou forte.
— O que foi, filha? — ele perguntou,
preocupado.

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— O Maurício, aquele imbecil, não para de


me irritar! — ela resmungou, cruzando os braços e
rolando os olhos.
Tony semicerrou os olhos e os focou na
direção de Nick.
— Dominic, mantenha seu filho adolescente
cheio de espinhas e hormônios longe da minha
princesinha!
Nick estava desatento, porém ao ouvir seu
nome, alertou-se. Sua esposa segurou forte em sua
mão, o confortando.
— Vai lá, lindo — disse ela.
Ele foi até o filho, que já estava emburrado,
sozinho em um canto do vasto espaço gramado.
— Maurício, filho — chamou-o.
— Oi.
— Clara está dizendo que você a está
irritando — aproximou-se do seu ouvido,
cochichando. — Ela tá falando a verdade ou tá de
doce?
Maurício riu.
— Eu só quis dar um beijinho no rosto dela.
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Só isso. Coisa boba.


Nick deu dois tapinhas em suas costas.
— Mas tu é meu filho mesmo. Muito macho,
isso aí. Finge que eu te dei uma bronca e vai lá
pedir desculpa para ela na frente do Tony.
Ele assim o fez.
O filho mais velho de Pedro brincava com as
outras crianças de pique-esconde, enquanto sua
irmã de três aninhos não largava a perna do pai,
envergonhada.
— Vai brincar, minha linda — Pedro abaixou
e falou com a menina.
— Não quelo, papai. Quelo ficá com voxê.
Ele a pegou no colo e a abraçou. O mais novo
estava com os avós.
Lucas e sua esposa participavam de
conversas agradáveis com Amanda.
— E vocês, quando vão encomendar um
bebê?
Ela sabia da condição dos dois sobre ter
filhos.

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— Pra quê? Não basta essa filharada dos


tcholas espalhada por aí, não? — Lucas rebateu a
pergunta.
— Em breve, Amanda. Eu quero — sua
esposa completou com doçura.
— Não vão se arrepender. É uma delícia —
acrescentou Amanda.
Ao fim da festa, houve a jogada do buquê,
que caiu no colo de uma funcionária da empresa.
Amanda e Tony se despediram de todos e
foram na limousine de recém-casados em direção
ao hotel, onde passariam a noite de núpcias antes
de viajarem para as ilhas Cayman.
Após a primeira noite como marido e mulher,
os dois se acariciaram, deitados na cama, sorrindo
feito crianças.
— Finalmente, oficialmente minha — Tony
sussurrou e beijou a ponta do nariz dela.
— Finalmente, oficialmente e eternamente
sua — ela rebateu.
— Eu te amo ainda mais do que antes. Me
surpreendo com esse amor a cada dia, pois só
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cresce. O que mais me deixa feliz é saber que,


mesmo me esquecendo, ainda me amou novamente.
Obrigado.
Ela sorriu, orgulhosa com o comentário de
seu esposo, abraçando-o com força.
— Não dá pra esquecer o que está gravado no
coração, meu amor. Você, em mim, foi
inesquecível.
Ele sugou uma boa dose de ar aos pulmões.
Nunca esqueceria todos os momentos em que
passou ao lado dela. O amor deles já estava
gravado na tábua de ambos os corações, e ela tinha
certeza de que não poderia ser diferente. Seu
marido era, sempre foi e será o homem da sua vida.
— Eu te amo ainda mais e mais, Antônio
Gali.
— E eu infinitamente mais, Amanda Gali.
Selaram seu amor com mais um beijo.
E foi assim, entre tantas reveses que a vida
dá, que um amor inesquecível sobreviveu às
reviravoltas do destino.

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FIM

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Nota sobre a doença de


Henri

Henri era portador de um tipo de distúrbio de


personalidade:
Transtorno de Personalidade Borderline:
Indivíduos instáveis em suas emoções e
muito impulsivos, com esforços incríveis para
evitar abandono (até tentativas de suicídio). Têm
rompantes de raiva inadequada. As pessoas à sua
volta são consideradas ótimas, mas frente a recusas
tornam-se péssimas rapidamente, sendo
desconsideradas as qualidades anteriormente
valorizadas. Costumam apresentar uma hiper-
reatividade afetiva, em que as situações boas são
ótimas ou excelentes, e as ruins ou desfavoráveis
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são péssimas ou catastróficas.


Elas temem o abandono real ou temido, com
frequência vivenciam sentimento crônico de vazio
e reação pungente ao estresse, protagonizando
sucessivas ameaças (ou tentativas) de suicídio e
automutilação. O modus operandi desses pacientes
traz um sofrimento enorme tanto para si próprios,
bem como para os que com eles convivem. Uma só
palavra mal colocada, uma situação inesperada sem
relevância ou uma leve frustração pode levar o
borderline a um acesso de raiva e ódio que duram
em média poucas horas. Outra característica
importante é que o borderline nem sempre sabe
lidar com o êxito. É comum que eles abandonem ou
destruam seus alvos e metas justo quando a
perspectiva de alcançá-los é real e próxima.
Fonte de pesquisa:
http://www.minhavida.com.br/saude/temas/transtorno-
de-personalidade-borderline

Sobre o suicídio:
Gostaria de citar algumas curiosidades sobre
suicídio:
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1- O suicídio mata mais jovens atualmente do


que o vírus do HIV.
2- O Brasil é o 8º País com maior índice de
suicídios no mundo.
3- Os métodos mais usados para o suicídio
incluem enforcamento, estrangulamento ou
sufocação, disparo de arma de fogo e pesticida,
independentemente da faixa etária e do gênero
analisados.
4- Rio Grande do Sul tem a maior taxa de
suicídio do Brasil.
5- Mortes por suicídio são cerca de três vezes
maiores entre homens do que entre mulheres.

Como evitar o suicídio? Perceba os sinais


nas pessoas ao seu redor:
1 – Frases de alarme: Quero sumir, quero
morrer, não aguento mais.
2 – Mudanças inesperadas: Alguém tinha
um hobby e abandona tudo, era supervaidoso e fica
desinteressado. A mudança de comportamento é o
momento em que a gente se aproxima da pessoa
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para saber o que está acontecendo, porque quem


sabe dividindo ela vai entender que é só uma fase.
3 – Depressão e drogas: O maior coeficiente
de suicídio se dá por transtorno de humor associado
ao uso de substâncias psicoativas, mais da metade
dos casos de suicídio. Depressão e consumo de
álcool e drogas é responsável pelo maior número de
mortes no mundo inteiro", afirma o psiquiatra Jair
Segal.
4 – Pode não ser só
"aborrescência": Existe uma falsa ideia de que a
depressão atinge mais pessoas adultas. O
adolescente apresenta outros sintomas, ele vai se
trancar no quarto, não vai falar com ninguém, e isso
vai ser entendido como fenômeno da adolescência
normal, já que ele não consegue expressar seu
sofrimento de uma forma clara.
5 – Preto no branco: Para o deprimido, o
mundo deixa de ser colorido, é preto e branco. Ele
tem baixa autoestima, desinteresse por todos e fica
muito voltado para ele mesmo", explica o
psiquiatra Aloysio Augusto d'Abreu. Quando em
depressão severa, a pessoa se isola dos outros e não
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vê motivos para continuar viva. É um alerta de


urgência.
6 – Bom demais para ser verdade: A
simulação de melhora é comum em diversos casos
de suicídio, então, se uma pessoa que normalmente
é deprimida parecer subitamente alegre, é
importante acompanhá-la para garantir que ela não
tentará o suicídio.

O QUE VOCÊ PODE FAZER POR UMA


PESSOA SUICIDA?
Segundo o psiquiatra da Rede Brasileira de
Prevenção do Suicídio Carlos Felipe Almeida
D'Oliveira, o ideal é conversar com a pessoa e não
deixá-la sozinha. Ao conversar, procure não falar
muito e ouvir mais, já que muitas vezes a pessoa só
precisa ser ouvida. "Se possível, acompanhe-a a um
profissional de saúde e peça orientação", diz. Outra
medida é retirar acesso de ferramentas
potencialmente destrutivas dentro de casa - como
armas, remédios e substâncias tóxicas - para evitar
o uso delas em um impulso.

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Fonte de pesquisa:
http://revistagalileu.globo.com/Sociedade/noticia/2014
sinais-de-comportamento-suicida.html

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Agradecimentos

Esse é o momento para dizer para todos,


incluindo a quem já leu o livro de um modo
“diferente” antes.
Sabe… Eu, quando comecei, nunca pensei
que desejaria levar essa vida a sério. A escrita.
Confesso que, quando usava o pseudônimo
anterior, eu levava tudo na esportiva, como se não
fosse uma profissão e sim um impulso, uma ideia
momentânea… Mas então eu escolhi parar com
isso.
Parar de levar na brincadeira e fazer de
qualquer jeito, para que sim, eu viva disso, por
mais complicado e difícil que seja a escrita e a vida
de um escritor iniciante no Brasil.
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Não estou mostrando isso aqui para que


fiquem com pena ou desejem seus sentimentos,
jamais apelaria desse modo. Quero apenas dizer
que sim:
Valeu a pena.
Esse é o primeiro livro da série que consegui
reescrever em 45 dias. 45 dias que foram difíceis,
corridos, sem tempo pra fazer muita coisa, mas que
me deram um retorno IMPAGÁVEL!
Cada comentário de vocês, leitores antigos ou
novos do Wattpad, me encheu de energia e
motivação para continuar e continuar… Sem vocês
não valeria o esforço.
Sim, vale a pena insistir na plataforma,
quando tenho pessoas tão especiais ao meu lado.
Agradeço ao meu esposo, que mesmo
demorando a compreender a grandeza do que
escrever significa para mim, me deu apoio
incondicional quando eu contei que pretendia
reescrever os livros. Ele é quem diz todo orgulhoso
para todos os nossos amigos, que sou escritora
(risos), ele quem fica anunciando aos quatro ventos
o quanto se orgulha de eu finalmente ter encontrado
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algo de que gosto de fazer.


Obrigada, amor.
Agradeço ao meu filho, Samuel, de apenas
quatro aninhos, que entende quando eu peço
silêncio para trabalhar. Às vezes ele também pega o
laptop e senta ao meu lado, dizendo que vai
trabalhar também. Obrigada, meu amor, por mais
que não esteja lendo isso agora.
Agradeço à Poliana Cunha, meu anjo em
forma de gente. Ela quem me divulga nas redes
sociais, quem me ajuda nas artes, quem me
incentiva e me escuta quando quero chorar. Você
vale mais que qualquer pedra preciosa. Você é
única! Eu te amo!
Agradeço às meninas do grupo do whatsapp,
Divas da Dê, que acompanharam essa transição de
perto, desde junho do ano passado até agora, e não
me abandonaram quando mais precisei. Vocês são
valiosas demais pra mim!
Agradeço à Talita Laquimia, que se
disponibilizou a conferir o arquivo final comigo
para ver se estava tudo okay. Amo você, muito
obrigada por ser tão parceira e incentivadora!
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Agradeço aos grupos de amigos autores ASD


e DDP, pois a união na literatura é tudo!
Agradeço a você, leitor do wattpad. Você que
já tinha lido esse livro antes e a cada capítulo
comentava comigo ou aqui dizendo que estava
muito melhor. Você, leitor novo, que leu com ânsia
e paixão e deixou comentários carinhosos me
mostrando o quanto a história te cativou.
E você leitor do Amazon, por ter dado uma
chance ao meu livro!
Vocês são muito especiais!
Agradeço por último, mas não menos
importante — pelo contrário, o mais importante —
, a Deus, meu Pai Eterno e grande amigo, que
elucidou minha mente para que eu fizesse algo que
o agradasse, que mostrasse a força do amor de um
modo romântico e valioso. Ele é quem me motiva
mais a cada dia, quem me dá força e ideias
mirabolantes para que você esteja lendo qualquer
coisa que eu venha a escrever.
E por fim, agradeço a todos, todos, todos.
Sem vocês isso não seria nem metade do que

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é hoje.
Obrigada
Andressa Gomes — A. G. Moore.

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Sobre a autora

A. G. Moore é o pseudônimo para Andressa


Gomes. Uma carioca romancista apaixonada por
contos de fadas. Sua paixão pela leitura e escrita
nasceu junto com sua alfabetização e de lá não
parou mais. Porém, apenas há poucos anos decidiu
embarcar no sonho da escrita profissional, dando
vida a enredos românticos e enigmáticos que sua
mente desde sempre projetara. Hoje ela é casada,
tem dois filhos e se esforça diariamente em busca
da realização dos seus sonhos.

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Redes Sociais
Email: a.g.mooreautora@gmail.com

Facebook: Andressa Gomes Autora

Página: A. G. Moore

Grupo do facebook: Andressa Gomes — A. G.


Moore

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Trecho do próximo livro:


Imensurável.

“A semana inteira Pedro e eu tentamos pensar em


como faríamos para continuar o que tínhamos. Tinha que dar
certo. A gente se amava! O amor supera tudo, não é isso que
vemos nas novelas?
Na véspera da minha partida, me entreguei a ele. Não
entendia muito bem o que estava entregando naquele
momento, mas o amor que fizemos ficou marcado em mim
para sempre.
Até que nossa separação iminente chegou e eu me
mudei, confiando que as cartas que trocaríamos seriam
suficientes para sustentar nosso amor pelos próximos anos.
Dizem que o amor tudo suporta, tudo espera e tudo crê.
Os anos se passaram, eu fiz meus 15, 16, 17 anos e,
durante esse tempo, Pedro e eu sempre nos escrevemos.

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Até que o resultado do vestibular que eu tinha feito


saiu.
Dediquei meus últimos anos a dar meu melhor e
conseguir me formar em uma universidade pública. Na minha
mente sempre vinha a vergonha que passara na infância ao
não ter o suficiente para comprar frutas, alimentos e demais
itens para minha casa. Minha mãe sempre trabalhou muito,
mas nunca estudou. Eu seria diferente.
Consegui passar em sexto lugar na faculdade de
Psicologia na UFRJ — Universidade Federal do Rio de
Janeiro.
— Filha, que orgulho! — Minha mãe me abraçou
dentro do meu pequeno quarto na mansão dos patrões dela.
— Obrigada, mãe. Minha vida vai mudar, você vai ver!
Enquanto nós duas começávamos a projetar o futuro,
minha mãe revelou apenas uma preocupação.
— Filha, aquele garoto já sabe que você ficará pelo
menos mais uns anos por aqui?
Meu sorriso esmoreceu.
Eu amava Pedro com todas as minhas forças, e mesmo
sabendo que nossos planos poderiam mudar, confiava que
poderíamos passar por tudo juntos.
Mas veio o medo, o receio dele não querer esperar ou
estar ao meu lado.
— Não. Ele acha que eu voltarei para BH.
Minha mãe segurou minhas mãos sobre a cama, e me
olhou com ternura.

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— Filha, ouça sua mãe. Sei que se gostam e tudo mais,


mas você não pode deixar o menino preso a você por todo
esse tempo. Ninguém sabe o futuro. Não o iluda, deixe o
garoto viver sua vida. Se um dia tiver que ser, será.
Eu sabia que ela estava com a razão. Ela sempre tinha a
cabeça no lugar para tudo. Por muitas vezes já tinha pensado
o mesmo, sobre não aprisioná-lo a mim.
— Vou escrever pra ele agora, mãe.
Ela assentiu e saiu do quarto. Me levantei e sentei na
cadeira da escrivaninha que tinha no canto do local e pus-me
a escrever.
Eu precisava pensar…
Não queria deixá-lo, mas também não podia
obrigá-lo a ficar comigo à distância.”

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Conheça as outras obras da


autora:

Gênero Chicklit — Minha


Sapatilha Mágica

O que você faria se pudesse retornar uma


hora no tempo, no momento que quisesse?
Lorena sempre foi o tipo de mulher regrada e
esforçada.
Tem seu trabalho, seu apartamento, suas
melhores amigas. O que mais ela poderia querer?
Mas quando a data de seu aniversário se
aproxima, o inesperado acontece: Azar. Logo na
vida da pessoa mais comum do universo, os dias
começam a ser cheios de catástrofes, sendo uma
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delas um quase atropelamento causado por um


motoqueiro misterioso.
Quando completa 25 anos, ganha um par de
sapatilhas mágicas e começa a acreditar que sim,
nem tudo está perdido. Até ter de conviver com sua
nova rotina cheia de magia e o motoqueiro, que
agora parece aparecer em sua vida como um carma.
A raiva logo se torna em curiosidade, que em
dias transforma-se em paixão.
Lorena se apaixona por um homem cuja
rotina e passado são escondidos.
Será a magia da sapatilha capaz de ensinar
Lorena a lidar não só com os mistérios da sua
própria descendência, mas sim, também os da
paixão?

O diário de uma recém


milionária

Alessa é uma mulher divertida, com uma


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personalidade forte, trabalhadora e atrapalhada. Sua


vida sempre foi previsível e simples, até que um
incidente a faz receber visitas de seu passado não
compreendido e uma grande responsabilidade cai
por seus ombros: Agora ela era milionária.
O que faria se se tornasse herdeira de um
grande império milionário da noite pro dia?
Ela não sabia o que fazer, mas sua vida nunca
mais foi a mesma depois da morte de seu avô.
Agora ela teria que se mostrar digna de seu império
milionário em apenas 1 ano e 3 meses.
O que Alessa não esperava era ter que
conviver com um homem arrogante como seu
instrutor, desafiando sua paciência ao cumprir sua
missão.
Uma história romântica com uma pitada de
humor e muitas descobertas desse novo mundo em
que Alessa nunca se preparou para entrar.

Conto — Acende a Luz?

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Clarissa Monteiro é estudiosa e reservada.


Com muito sacrifício conseguiu passar pra UFF
Universidade Federal Fluminense, no Rio de
Janeiro, em medicina. Tudo está bem até ela
perceber que a faculdade é uma versão hard da
escola, onde os babacas populares ditam as regras
da sociedade. Sem intenção de se arriscar, se torna
a nerd invisível do canto das aulas. Até que um dia
decide ir na sua primeira festa, a festa das luzes,
onde ninguém consegue ver ninguém. Lá ela acaba
sendo escolhida para o quarto escuro, onde passa
meia hora com um cara que se identifica e acaba
beijando.
Antes das luzes acenderem e ela finalmente
conhecer o homem encantador que acabou de
beijar, ela foge.
Illan é o cara mais popular da faculdade.
Rico, independente e rei das festas, vai se
surpreender com a menina que conheceu na festa
dentro do quarto. Mas o que ele não sabe é que na
real, ela o odeia. Illan cria uma fixação por Clarissa
ao descobrir que ela é a garota que fugiu e fará de
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tudo para conquistá-la.

Conto — 4 amigos: Como tudo


começou — Série Feelings 0

Como entender quando uma amizade para a


vida toda nasce?
Saiba como esse sentimento sublime uniu a vida de
quatro homens para sempre.

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