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PARTE UM
HADES
RAFFAELE
CAPÍTULO 1
HADES
RAFFAELE
CAPÍTULO 2
HADES
RAFFAELE
CAPÍTULO 3
RAFFAELE
HADES
PARTE DOIS
HADES
RAFFAELE
CAPÍTULO 4
HADES
RAFFAELE
CAPÍTULO 5
HADES
RAFFAELE
CAPÍTULO 6
RAFFAELE
HADES
PARTE TRÊS
HADES
RAFFAELE
CAPÍTULO 7
RAFFAELE
HADES
CAPÍTULO 8
RAFFAELE
HADES
CAPÍTULO 9
HADES
RAFFAELE
PARTE QUATRO
CAPÍTULO 10
RAFFAELE
HADES
CAPÍTULO 11
RAFFAELE
HADES
CAPÍTULO 12
EPÍLOGO
A Vendetta é um voto secreto e solene, uma promessa ao inimigo.
Como um peão no tabuleiro de xadrez, uma peça para ser sacrificada a
fim de que o xeque-mate em cima do adversário aconteça, fui enganada para
acreditar que tinha alguma escolha, que o mundo em que nasci não precisaria
ser o único ao qual eu pudesse pertencer. Achei que poderia ser livre, mas me
tornei uma moeda de troca.
Ele tem sangue nas mãos, sem arrependimento algum em seus olhos.
Eu o chamei de Hades e, embora não seja um deus de verdade, é um dos reis
no submundo do crime.
Podemos ser como Romeu e Julieta, porque não vejo alternativa além
de um final trágico para nossa história. Mesmo que o ame como nunca serei
capaz de amar outro homem, vou honrar a promessa: fazê-lo sentir a mesma
dor que me causou no dia em que tirou de mim a única família que restava.
O herói que salvou minha vida e roubou para si o meu coração, depois
o deixou em migalhas. Todavia eu não consigo odiá-lo. O que torna tudo
ainda mais difícil, porque me tornei uma mulher com uma missão, e falhar
não está nos meus planos. Eu vou até o fim.
Sejam bem-vindos ao meu inferno particular.
Quando esquematizo um livro, sou um tanto metódica, por assim dizer.
Em HADES, eu usei o estilo de escrita que desenvolvi quando criei o
pseudônimo Tara Lynn O'Brian. Funciona assim:
1 POV (ponto de vista) do protagonista masculino ou feminino.
1 POV (ponto de vista) do protagonista feminino ou masculino.
Narrador-personagem: Conta e participa dos fatos ao mesmo tempo.
Neste caso a história é narrada em primeira pessoa.
1 CAPÍTULO
Narrador Onisciente: Esse sabe tudo sobre o enredo e os personagens,
revelando os sentimentos e pensamentos mais íntimos. Nestes capítulos, a
história é narrada em terceira pessoa.
Todos estes elementos correlacionam entre si, formando o enredo, que
é o desencadear dos fatos, a essência da história na qual se constituirá o
desfecho.
Inicialmente, dividi HADES na seguinte estrutura:
3 PARTES.
Cada parte composta de:
2 POVs
+ 1 CAPÍTULO
+ 2 POVs
+ 1 CAPÍTULO
+ 2 POVs
+ 1 CAPÍTULO
+ 2 POVs.
Então, ao todo seriam 9 CAPÍTULOS (narrados em terceira pessoa).
E ainda temos o PRÓLOGO e o EPÍLOGO.
Escrevi a história seguindo meu esquema lindamente. Eu já sabia como
ela terminaria, então, em determinado momento, dei uma pausa de onde
estava, e fui laaaaá nas últimas páginas. Escrevi o epílogo e o capítulo 9, que
deveria ser o último do livro.
Ou seja, eu queria que todo o desenvolvimento do enredo me levasse
até aquele desfecho.
Estava tudo sob controle e dentro do prazo. Eu ia subir o arquivo no dia
20 de maio, meu prazo final por causa da pré-venda, para o lançamento no
dia 25 de maio. Me preparando para entregar o prometido, em último caso, eu
adiaria a data do lançamento um ou dois dias, para ter mais tempo de subir o
arquivo final. Porém, houve um transtorno com o fuso-horário do sistema da
pré-venda, que me impediu de subir o arquivo a tempo e gerou o
cancelamento da pré-venda.
A partir deste ponto, sabendo que eu ainda teria mais alguns dias antes
de lançar, reli esses capítulos e senti que estava colocando várias tramas ao
mesmo tempo, e que no final eu acabaria confundindo o leitor com um
excesso de informações dentro de um livro só.
Deste modo, abortei a missão original. Sim, aos 45 minutos do segundo
tempo, jurando que ia fazer um golaço de última hora. Mas a verdade é que
eu precisava dos acréscimos para ter uma chance de salvar a partida pela qual
trabalhei duro durante todo o campeonato!
Ao apagar do livro esses elementos, para trabalhá-los melhor no futuro
deste "universa máfia" que criei, e poder focar na trama principal que
envolvia o casal protagonista deste livro, dando a eles o desfecho merecido, e
deixando os personagens secundários realmente em segundo plano, acabei
criando algumas lacunas na história, que precisavam ser preenchidas para
fazer sentido.
E isso logo quando? Na véspera do lançamento!
Foi desesperador porque eu não queria encerrar o livro de qualquer
jeito apenas para cumprir prazo, perdendo toda a qualidade do trabalho que
iniciei no dia 18 de janeiro de 2019.
Se fosse colocar tudo o que eu pretendia no plano original, este não
seria um livro único que eu prometi para as leitoras, onde o casal teria sua
história iniciada e encerrada toda em um livro só.
O problema em ser a mente criativa por trás de uma história, é que você
sabe o que acontece com todos os seus personagens a longo prazo (comigo, é
assim, pelo menos). O que vem depois do “felizes para sempre”… Quem vai
nascer, que irá morrer, quem vai embora e quem irá voltar. O que acontecerá
com cada “figurante” apresentado durante o desenrolar da trama… E isso me
deu a sensação de que eu não estava entregando o livro que queria entregar.
Aí entrei em desespero!
Foi preciso parar e assumir para mim mesma que, a coisa toda ganhou
uma proporção muito maior do que eu imaginava que seria, quando comecei
a escrever a história, em janeiro. O meu “universo máfia” se expandiu,
mesmo eu sabendo e já tendo planejado outros livros dentro desse universo,
com personagens e cenários ainda não apresentados.
Mas começou a se expandir dentro de HADES!
Então, tive que fazer os ajustes necessários, dando origem uma parte 4,
adicionando mais detalhes para o desfecho envolvendo os protagonistas, e
alguns momentos mais breves, porém, necessários, para os personagens
secundários, deixando plantada algumas sementes para o futuro do "universo
máfia".
Isso transformou o capítulo 9 em capítulo 11, dando origem aos
capítulos 9 e 10 que não poderiam ser resumidos em alguns parágrafos. Além
de algumas cenas bônus (um fan service para as românticas) mais para o
final, que embora sejam mais curtinhas e menos detalhadas, eu não quis
abortar do livro.
Para finalizar, nasceu um mini capítulo 12 que eu não pretendia mostrar
por enquanto, mas achei justo, considerando que eu já sei tudo sobre o futuro
deste “universo máfia” e vocês ainda não. E o epílogo, que já estava pronto
muito antes de eu chegar na metade do livro!
Esta foi a SAGA DE HADES, o livro que quase levou a autora, neste
caso eu, para um período de reabilitação mental e emocional, numa clínica
especializada. Mas, graças ao apoio de pessoas especiais, eu não surtei. Em
parte, foram minhas leitoras incríveis, que entenderam e tiveram paciência
comigo.
Entretanto, preciso agradecer a essas meninas em especial: Evelyn
Santana, Anne Naus, RoseMeire Molan, Elaine Silva, Nana Simons,
Margareth Antequera Revisora, Márcia Lima, Míddian Meirelles, Ésdra
Alves, Myllenn Maps, Sue Hecker, Sinéia Rangel, Cinthia Basso, Mai
Passos, Barbara Dameto, Alessa Ablle e Patricia Costa Aguiar! Vocês não
fazem idéia de como foram importantes durante todo esse processo! Eu acho
que só não surtei mais porque tinha vocês comigo em determinados
momentos, se revezando em me manter firme no meu propósito até que
consegui alcançar o objetivo. Um obrigado nunca será suficiente para
expressar minha gratidão ao que vocês fizeram por mim, muitas vezes sem
fazerem ideia disso. Que Deus abençoe muito vocês!
Amigas e leitoras, todas vocês são parte disso.
Esse livro é nosso!
VOCÊ PODE PULAR O DOSSIÊ
CLICANDO AQUI
Termos usados neste livro e seus significados, com base em
pesquisas históricas, havendo também elementos fictícios
acrescentados para a construção da trama elaborada pela
autora.
COSA NOSTRA: É o nome que foi dado à máfia italiana dentro dos
Estados Unidos, pelo FBI, e divulgado pela mídia. Tem suas raízes na máfia
Siciliana, possui ligações fortes com outros grupos criminosos italianos, mas
é independente. O nome surgiu da forma como um mafioso apresentava um
membro conhecido a outro, revelando que ambos pertenciam à cosa nostra (a
“nossa coisa”, o “nosso assunto”). Não se trata de um nome formal. Para os
membros desta sociedade criminosa secreta, não há necessidade de
nomenclatura, por isso não são utilizadas as iniciais em letras maiúsculas por
quem é de dentro. Inclusive, o termo máfia é usado por pessoas de fora da
organização, e não pelos próprios “mafiosos”.
FAMIGLIA: Família. É a denominação para os grupos que compõem
a Cosa Nostra. Cada Famiglia comanda um território, operando as mais
diversas atividades, tanto ilícitas quanto lícitas. Aos que pertencem a este
mundo, a Famiglia vem sempre em primeiro lugar, antes mesmo da
biológica. O plural de Famiglia é Famiglie.
CLÃ: São as famílias de sangue que compõem as Famiglie da Cosa
Nostra. É um termo usado para diferenciá-las.
BOSS: É o Chefe da Famiglia. Antigamente chamado de Capo. Está no
topo da hierarquia, é ele quem toma as decisões finais a respeito da Famiglia
e dá as ordens a serem executadas. Ao assumir a Cadeira, é o Boss quem
elege seu Underboss e Consigliere, sem interferência da Comissão. Depois do
Período de Renascimento, ficou definida a idade máxima de sessenta anos
para um Boss permanecer na Cadeira da Famiglia. O plural de Boss é Bosses.
DON: Título atribuído ao Boss de uma Famiglia. Todos os Bosses se
tratam por este título, seguido de seu sobrenome.
CADEIRA: É uma referência de poder à mais alta patente da Famiglia:
o posto de Boss.
CONSIGLIERE: É o braço direito do Boss, seu consultor. O
conselheiro da Famiglia. É o único com autorização de questionar as decisões
do Boss, oferecendo-lhe uma segunda opinião ou alternativas viáveis.
Encarregado de resolver conflitos internos e relatar as notícias e
acontecimentos referentes à Cosa Nostra. O Consigliere, ao contrário do
Underboss, não pode ser indicado à Cadeira, mas tem o direito de permanecer
no cargo sem restrição de idade máxima, podendo ser deposto quando um
novo Boss assume, ou continuando caso este o escolha. Dificilmente um Boss
troca de Consigliere durante seus anos de Cadeira, mas não é proibido que o
faça. Um Boss aposentado pode ser eleito Consigliere, desde que não seja o
atual antecessor. O plural de Consigliere é Consiglieri.
UNDERBOSS: É o Subchefe da Famiglia. Antigamente chamado de
Sottocapo. O segundo em comando. Executa as ordens do Boss e chefia os
Gerentes da Famiglia. Assume o lugar do Boss em casos de enfermidade,
prisão, viagem ou fuga (da polícia ou inimigos). Não é necessariamente o
sucessor do Boss em caso de morte ou aposentadoria, mas pode assumir a
Cadeira se for indicado e aprovado pela Comissão. Também pode ser
substituído, caso este seja o desejo do Boss. A lei de aposentadoria também
se aplica ao Underboss. Um Underboss aposentado pode ser eleito
Consigliere.
GERENTE: Antigamente chamado de Caporegime ou Capitão. Os
Gerentes são subordinados diretos do Underboss e encarregados de chefiar
uma equipe de Soldati e Associados. Cada Gerente é responsável pela
administração dos empreendimentos em uma determinada área no território
da Famiglia, repassando um percentual dos lucros para o Boss. A lei de
aposentadoria não se aplica aos gerentes. Um Boss ou Underboss aposentado
podem gerenciar alguns empreendimentos, desde que façam o repasse de uma
porcentagem dos lucros ao Gerente do território onde atuam.
MADE MAN/ SOLDATO: O Made Man (Homem Feito) é um
membro completamente iniciado na organização, que pertence à base da
hierarquia, ganhando a patente de Soldato (Soldado) da Cosa Nostra. São os
responsáveis por conduzir as operações nas ruas e repassarem uma
porcentagem dos lucros ao seu Gerente. Executam tarefas de maior
importância, sem contestar. Fazem o “trabalho sujo” sem nunca envolver o
nome de seus superiores. Ao serem iniciados, juram devoção total à Cosa
Nostra e fazem o voto de Omertà. São protegidos pela Famiglia, respeitados e
temidos pela comunidade, considerados intocáveis por outros criminosos. É
delito grave atacar ou matar um Made Man, não importando o motivo, sem a
permissão do Boss, sob pena morte. Qualquer tipo de queixa a um Soldato da
Cosa Nostra deve ser levada ao alto escalão da hierarquia. Para se tornar um
Made Man, um iniciado precisa “fazer seus ossos”, que consiste em cometer
um assassinato por ordem de uma das Famiglie. Homicídio por motivos
pessoais não são considerados. A partir dos catorze anos já é possível ser
iniciado. É obrigatório ter ascendência paterna italiana (pai, avô, bisavô ou
tataravô) para ser um Made Man e poder subir na hierarquia da Famiglia,
conquistando cargos de Gerente, Underboss, Consigliere ou Boss. O plural de
Soldato é Soldati. O plural de Made Man é Made Men.
HOMEM DE HONRA / HOMEN HONRADO: É como são
chamados os membros que juraram lealdade à Famiglia. São Homens Feitos,
mas que já não pertencem à base da hierarquia. Ao subir de patente, um
Made Man passa a ser chamado de Homem de Honra ou Homem Honrado.
ASSOCIADOS: Parcerias que prestam serviços para a organização,
mas não são membros oficiais da Cosa Nostra. Protegidos pela Famiglia onde
atuam como colaboradores, executando tarefas, na maioria dos casos para ou
com um Soldato. Se um associado tiver ascendência paterna italiana, ele pode
ser recrutado em algum momento a fazer parte da Famiglia e subir na
hierarquia. Caso sua ascendência seja materna, ele pode ser recrutado
mediante aprovação da Comissão, porém fica impossibilitado de assumir
cargos maiores, servindo a Famiglia apenas como um Soldato.
INICIADOS: Recrutas que começaram o processo de iniciação na
Cosa Nostra, fazendo o juramento de lealdade à Famiglia e cumprindo uma
série de etapas e rituais tradicionais até serem finalmente considerados Made
Men e ganharem sua patente de Soldato.
OMERTÀ: É o código de honra que dá importância ao silêncio, que
consiste na proibição categórica da cooperação com as autoridades policiais e
judiciárias; não podendo informar quando um crime é cometido (com
exceção em furto de automóvel, onde deve ser registrado o B.O para haver
meio de provar que não estava sob posse do veículo, evitando possíveis
transtornos legais); não interferindo em ações ilegais de terceiros; não
entregando o verdadeiro culpado caso seja acusado de um crime que não
cometeu, cumprindo a pena se for necessário, mesmo que o culpado não
pertença à Famiglia. A pena para aqueles que quebram a Omertà é a morte.
CASCITTUNI: O traidor. Aquele que viola a Omertà. Também
chamados de “rato”.
SORELLE D’OMERTÀ: “Irmã do Silêncio”. É como são chamadas
as mulheres admitidas na organização para exercer alguma função específica.
É necessário possuir vínculo familiar com um Homem de Honra. No caso das
solteiras, o pai. No caso das casadas, o marido. Isso porque é a eles que elas
devem fidelidade. Ser uma Sorelle D’Omertà não torna essas mulheres
independentes financeiramente. Elas podem trabalhar em um dos
empreendimentos da organização que esteja relacionado ao seu pai ou
marido, em ocupações que não as coloquem em risco de violência física.
Tarefas administrativas são as mais prováveis. Ainda são poucas as mulheres
que escolhem se envolver nos negócios e nem todos os Homens Honrados
permitem. O falocentrismo está enraizado nas tradições da Cosa Nostra, e
mesmo após o Período de Renascimento não houve mudanças significativas
referentes à forma como as mulheres da Famiglia são vistas e o que é
esperado delas.
VENDETTA: É a lei da vingança autorizada, que visa reparar uma
agressão ou morte. Criada após o Período de Renascimento. Dependendo da
violação do infrator, a punição é tortura ou morte. Deve-se fazer uma
denúncia ao Consigliere, solicitando o direito de Vendetta, apresentando
argumentos que justifiquem tal pedido. Ele agendará uma audiência com o
Boss, que dará a sentença final. Deve-se obedecer à sentença, mesmo que ela
não seja o que se esperava. Ir além do que foi permitido ou executar uma
vingança sem autorização é considerado Retaliação, cuja punição é a morte.
No caso de o infrator pertencer a outra Famiglia, é agendada uma reunião
entre os Bosses, que decidem juntos a sentença. Em casos mais graves, é
solicitada a presença de um Messaggero representando a Comissão e
executando o Voto de Minerva se necessário. Se o infrator pertencer a uma
das The Five Families, o Boss deve fazer a solicitação de Vendetta
diretamente à Comissão, por intermédio de um Messaggero. A solicitação de
Vendetta entre Famiglie não é tão comum na Cosa Nostra da atualidade, pois
as Famiglie convivem da forma mais pacífica possível após o Período de
Renascimento.
RETALIAÇÃO: É a vingança não-autorizada. Por conta dos muitos
conflitos e guerras no passado da Cosa Nostra, onde a rixas duravam meses,
até anos, causando pânico nas ruas, deixando rastros de sangue e morte,
chamando a atenção das autoridades e prejudicando os negócios da
organização, esse tipo de comportamento foi banido pela Comissão após o
Período de Renascimento, sob pena de execução para todos os envolvidos. A
diplomacia tornou-se a ferramenta principal entre os Homens de Honra,
fazendo com que os Bosses prefiram firmar alianças para a prosperidade dos
negócios em vez de perderem Soldati e arriscarem execução. A lei da
proibição de Retaliação vigora apenas entre os membros da Cosa Nostra. Em
se tratando de organizações rivais (como as máfias de outros países, cartéis e
gangues independentes) as Famiglie são livres para revidar qualquer tipo de
afronta, inclusive formando alianças entre si para derrotarem inimigos. A
Comissão não interfere nas decisões dos Bosses em conflitos externos.
CAPO DI TUTI CAPI: O “Chefe de todos os Chefes” é um título
pertencente ao regime da máfia siciliana, inicialmente implementado na Cosa
Nostra americana, onde apenas um homem exercia poder centralizador sobre
todos os Chefes dos clãs nos Estados Unidos, como uma única Famiglia, o
que com o tempo começou a gerar muitos conflitos.
THE FIVE FAMILIES: AS CINCO FAMIGLIE DE NOVA
IORQUE: Durante a chamada Guerra Sangrenta, na cidade de Nova Iorque,
onde o Chefe de um dos clãs brigava pelo posto de Capo di tuti Capi, outros
cinco Chefes se uniram em uma conspiração para reestruturar a Cosa Nostra.
Após assassinarem O Chefe de todos os Chefes e aquele que pretendia
assumir seu posto, eliminaram também todos os seus rivais e dividiram as
gangues remanescentes em cinco Famiglie, onde cada um assumiu o posto de
Capo. Os distritos de Bronx, Queens, Manhattan, Staten Island e Brooklyn
tornaram-se sede dessas Famiglie, que juntas criaram o que poderia ser um
conselho administrativo do crime organizado: a Comissão. A linha de
sucessão do comando dessas cinco Famiglie é por sangue, a fim de
perpetuarem o legado que construíram para a Cosa Nostra.
COMISSÃO: Criada pela The Five Families para substituir o título de
Capo di tutti Capi, após a Guerra Sangrenta. Buscando estabelecer um
consenso entre os grupos, para que pudessem gerir seus negócios sem que um
prejudicasse o outro, a Comissão se tornou um órgão regulador da Cosa
Nostra, dividindo os clãs das outras cidades em novas Famiglie, onde cada
Chefe passou a operar com independência e controle exclusivo sobre seus
empreendimentos, e elaborando um conjunto de regras e valores a serem
respeitados por todos. A partir dali, a finalidade da Comissão passou a ser
fiscalizar o cumprimento das regras, mediar conflitos entre as Famiglie e
tomar decisões importantes para o futuro e preservação da Cosa Nostra. As
principais delas são: aprovar um novo Chefe antes que ele possa assumir
oficialmente sua Cadeira na Famiglia; aprovar o recrutamento de um
Associado com ascendência italiana somente materna; autorizar assassinatos
preventivos para eliminar riscos ou assassinatos demonstrativos para advertir
e gerar medo, de autoridades do Estado ou pessoas de grande influência.
Também cabe à Comissão a decisão de executar um Chefe, caso este venha a
desonrar os principais valores da Cosa Nostra, em especial a Omertà.
Décadas mais tarde, a Comissão passaria por uma nova fase de
reestruturação.
MESSAGGERO: Também conhecidos como “Os Pacificadores”,
atuam em conjunto à Comissão, com imunidade em todos os territórios das
Famiglie. Responsáveis por representar os interesses da Comissão, são
também seus olhos e ouvidos na Cosa Nostra. Existem apenas três cargos
disponíveis e ambos são vitalícios. São escolhidos para compor a Trinità
(Trindade), membros sêniores da Cosa Nostra (acima de sessenta anos), suas
identidades são informadas a todas as Famiglie, para que cumpram a
diplomacia estabelecida. Quando um deles adoece, apresenta sinais de
demência ou fadiga crônica causados pela velhice, é mantido sob proteção da
Comissão e só é substituído após seu falecimento. Criado após o Período de
Renascimento, o cargo de Messaggero é recente. Quando a lei da
aposentadoria foi criada, a Comissão sofreria alterações assim que um dos
cinco Bosses se aposentasse, sendo o sucessor da Cadeira de sua Famiglia um
novo membro do comitê. Visando preservar a tradição, a formação da Trinità
foi uma alternativa de incluir membros antigos da Cosa Nostra, para que estes
orientassem os recém-empossados, cumprindo também o papel de
conselheiros do comitê. O plural de Messaggero é Messaggeri.
PERÍODO DE RENASCIMENTO: Período histórico na Cosa Nostra
que marcou a segunda reestruturação da organização, após quase ser extinta
dos Estados Unidos, em meados da década de 1990. Com anos de
investigações do FBI e alguns Capos arrependidos quebrando a Omertà ao
fazerem acordos com o Estado, houve o desmantelamento de vários
empreendimentos, seguidos de prisões, mortes, exílios e conflitos internos
que quase gerou uma nova guerra no submundo do crime. Em uma manobra
de emergência, a Comissão se reuniu com os Capos que mantiveram sua
lealdade. Traidores foram executados, Famiglie extintas e novas criadas,
territórios redistribuídos, cargos e funções redefinidos e novos Chefes
nomeados. A nomenclatura das patentes na hierarquia da organização
também sofreu mudanças (extinguindo o uso de Capo, Sottocapo, Capitão,
etc.) Por uma questão de proteção, nomes e sobrenomes foram alterados, mas
ainda mantiveram a descendência italiana. Levou alguns anos até que o
império criminoso se reerguesse novamente, mas dessa vez manteve a
discrição. Essa nova era da Cosa Nostra ficou registrada em sua história
como Período de Renascimento. Outra mudança implementada foi a lei de
aposentadoria, que obriga o Boss a indicar um sucessor antes de atingir a
idade máxima de sessenta anos, para a aprovação da Comissão. Não é
obrigatório o Boss ter laço sanguíneo com seu sucessor, com exceção das
Five Families, mas, de um modo geral, os Bosses tendem a preparar seus
filhos mais velhos para serem seus sucessores, a fim de manterem o comando
da Famiglia com o clã. A lei de aposentadoria foi criada para rejuvenescer a
organização através das novas gerações e manter certa rotatividade na
liderança, criando uma conexão entre o novo e o antigo, além de suprimir as
chances de algum Boss se arrepender de seu juramento à Cosa Nostra e
começar a colaborar com autoridades do Estado, violando a Omertà. Com
ajuda dos Messaggeri, a Comissão mantém uma fiscalização rigorosa e aplica
sua justiça quando necessário.
Enquanto as autoridades acreditam que a Cosa Nostra foi desmembrada
e enfraquecida, seu silêncio está longe de significar uma derrota. Quando não
há som de tiros nem morte nas ruas, é sinal de que a organização está
operando em perfeita harmonia. É desse jeito que o submundo do crime
prospera, desde que todos continuem fazendo a sua parte, como uma grande e
unida Famiglia.
AMICO NOSTRO: É um código usado quando Homens Feitos são
apresentados uns aos outros por um terceiro Homem Feito. O termo “nosso
amigo” significa que ele faz parte da Cosa Nostra e que seus assuntos podem
ser discutidos na frente dele, pois é de confiança.
AMICO MIO: Quando um Homem Feito apresenta um não-Iniciado
na Cosa Nostra, deixando claro que os negócios não podem ser discutidos na
frente dele, pois ele não fez juramento à Omertà.
‘NDRANGHETA: Uma das três principais organizações criminosas da
Itália, que se originou na Calábria. Não tão conhecida como a Cosa Nostra,
que se originou na Sicília, porém, atualmente a mais influente.
‘NDRINE: Um comparativo às Famiglie. A estrutura da 'Ndrangheta é
formada por famílias de sangue, sendo o filho mais velho com o último
sobrenome do pai quem assume, após sua morte, e assim sucessivamente.
CAMORRA: Uma das três principais organizações criminosas da
Itália, que se originou em Nápoles (região da Campânia).
GRAY WOLVES: Organização criminosa equivalente à MÁFIA
TURCA.
BLOOD ALLIANCE: Apelido do Cartel Gamboa. Equivalente à
MÁFIA MEXICANA.
BRATVA: Organização criminosa equivalente à MÁFIA RUSSA.
COSCA: Termo normalmente usado para se referir à uma Famiglia da
máfia na Sicília.
— Então é aqui que você se esconde. Boa escolha, amore mio, mas eu
te encontraria até no inferno, você sabe.
Três meses se passaram desde que foi embora, deixando tudo para trás,
inclusive seu coração. Não era mais a mesma, uma ruptura em sua alma a
impedia de seguir adiante. Nenhum dinheiro no mundo seria suficiente para
preencher o vazio que sentia, ainda assim, ela possuía o bastante.
Havia uma única pergunta a fazer, mas não a fez de imediato. Precisava
criar coragem para se virar e encontrar o olhar daquele que tinha o poder de
determinar seu destino. No fundo, sabia qual seria a resposta, e estava tudo
bem. Não sentia medo. Há algum tempo deixara de sentir qualquer coisa,
então não via problema algum em colocar um ponto final em tudo.
Contemplou o mar caribenho pela última vez. Escolhera Santa Maria
Del Mar, em Havana, porque sabia que ele a encontraria em qualquer lugar,
não importasse quanto tempo levaria. Ao menos não facilitaria as coisas, para
ter acesso a ela seria preciso entrar em território cubano, correndo o risco de
esbarrar em um inimigo. Mas parece que a sorte o havia contemplado, se é
que podia chamar aquilo de sorte.
Quando se virou, precisou reunir todas as forças que ainda lhe restavam
a fim de não sucumbir. Demonstrar fraqueza não era opção, embora por
dentro estivesse completamente destroçada. Manteve a postura impassível e
prendeu seu olhar ao dele.
Ainda o amava. Mas amor não era importante no mundo ao qual
pertenciam.
Ele estava ali por um propósito, executar o que nasceu para fazer
melhor que qualquer outro. Não era à toa que o chamava de Hades, o deus do
submundo. Embora ele não habitasse realmente o inferno, era responsável
por enviar muitas almas para lá.
A vez dela havia chegado.
— Veio me matar?
Raffaele nunca foi do tipo medrosa, mas isso porque ninguém ousaria
tocar na irmã de um Soldato da cosa nostra, principalmente uma protegida do
Boss. Estar longe da Famiglia, por conta própria, também tinha suas
desvantagens. Caminhar sozinha durante a noite, mesmo que não fosse um
bairro violento, não era agradável.
Eu devia ter pedido um táxi!
Estava a poucas quadras da estação de trem, mas o cansaço e a dor nos
pés por conta do salto alto a deixaram mais lenta. Estivera melancólica desde
que se despediu de Pietra, sabendo que não poderia continuar mantendo
contato com a amiga, para o próprio bem de ambas.
Soltou um longo suspiro e olhou para a estrada, parando rente à calçada
a fim de sinalizar para um táxi.
— Não grite ou eu te furo aqui mesmo — o sussurro próximo demais,
falado num dialeto italiano proveniente da região sul, drenou todo o sangue
do rosto de Raffaele, principalmente quando sentiu a ponta do que parecia ser
uma faca cutucando-a na coluna. Suas pernas enfraqueceram, mas quem quer
que fosse o homem que lhe abordara era forte o bastante para mantê-la de pé.
— Pode levar minha bolsa, há algum dinheiro nela. — Fechou os olhos
com força e tentou manter a calma para pensar com clareza em como poderia
sair daquela situação… viva!
— Eu não quero a porra do seu dinheiro, pitona[4]!
Era uma rua pouco movimentada, mas alguns transeuntes podiam ser
vistos. Ela quis gritar por socorro, porém temeu que o homem se assustasse e
acabasse por machucá-la antes de fugir. Não queria jogar com sua vida se
havia um grande risco de sair perdendo. Ele não disse mais nada, continuou
andando e levando-a junto ao seu corpo, dando a impressão de que eram
apenas um casal de namorados que não conseguia se manter afastado.
Seu corpo tremia, mas Raffaele se lembrou de quando o irmão lhe disse
para nunca demonstrar fraqueza diante do inimigo, pois estaria dando a ele
ainda mais poder. Desta forma, conseguiu suprimir a vontade de chorar e
com um tremendo esforço tentou agir como se o medo não a estivesse
dominando.
— Eu gosto de meninas comportadas, parece que você aceitou seu
destino. — Foi puxada para um beco entre dois prédios e teve a boca
encoberta por uma das mãos do homem. Ele era grande, largo e cheio de
músculos, praticamente uma parede humana.
Como vou sair dessa viva? Ou inteira?
Será que ele sabia quem ela era? Não que fosse importante ser uma órfã
sustentada pelo chefe de uma organização criminosa, mas para quem
estivesse buscando algum ponto fraco de Giorgio Barone, talvez seu gesto
altruísta passasse a impressão de que ele se preocuparia, caso sua afilhada
fosse sequestrada, o suficiente para entrar em negociação pela vida dela. Foi
o que passou pela mente de Raffaele quando tropeçou nos próprios pés,
perdendo um dos sapatos pelo caminho e sentindo a dor aguda causada pela
torção no tornozelo esquerdo.
O pavor a dominou por completo ao ter seu vestido rasgado com
violência. O frio na pele desnuda não era nada perto do que aconteceria em
breve. O puxão forte em seu cabelo fez com que inclinasse o pescoço para
trás, um gesto brusco que serviu de impulso para o homem arremessá-la
contra a parede. Soltou um gemido alto e esganiçado, a dor excruciante da
testa se chocando contra o concreto. Ela tentou gritar por socorro, esquecendo
o italiano e usando sua língua nativa. Era um pedido universal, qualquer
pessoa entenderia, principalmente pelo tom desesperador.
Seu choro se intensificou, não havia mais motivos para fingir que não
tinha medo. A risada de seu algoz era carregada de maldade, regozijava-se
com o terror que causava nela. Aquilo não passava de diversão para ele.
Raffaele estava a poucos movimentos de ser estuprada contra uma parede
suja, em um beco escuro e fétido, sem ninguém para interceder por ela.
Esperava, ao menos como uma forma de consolação, que estivesse
morta no final daquela noite. Pois a vida dela estaria arruinada, as esperanças
despedaçadas, e nada seria pior do que viver para reviver aquele momento
horrível em sua mente.
— Por favor, me deixe ir! — Era sua última tentativa, mesmo que fosse
em vão.
A visão turva e a mente zonza por causa do golpe na cabeça não
ajudavam Raffaele a se manter de pé. Estava desmoronando. Sentiu o hálito
de álcool e cigarro embrulharem seu estômago, assim que ele começou a
beijar seu pescoço, a lâmina cortante ainda pressionada contra sua pele no
lado direito do quadril. Os seios roçavam contra o concreto áspero, o vestido
jazia no chão após ser arrancado com um puxão violento. Apenas uma
calcinha minúscula a separava do ato cruel.
— Eu vou quebrar você em pedacinhos, pitona…
— Não, você não vai, filho da puta!
O quê?
Quem estava ali?
Havia mesmo alguém?
Estava tendo alucinações onde um herói estava prestes a salvá-la?
O gemido seguido de um engasgo a fez fechar os olhos com força,
tentando se preparar para o pior. Ainda em pânico, sentiu o corpo do agressor
amolecer e se afastar dela. Sem saber o que havia acontecido, Raffaele
deixou-se cair sentada no chão, bem acima do tecido que um dia foi seu
vestido. Passou as mãos pelo rosto molhado de lágrimas, abrindo os olhos
para se deparar com o corpo de um homem jogado no chão como qualquer
merda descartável. Seu algoz estava morto. Reparou no cabo do que parecia
ser uma faca cravada em sua nuca. Alguém acabara de matar o monstro que
estava prestes a roubar dela a única coisa que Raffaele achou que poderia
entregar a alguém por escolha própria.
Após o banho, fui até o quarto com uma toalha enrolada na cintura.
Olhei por sobre o ombro para a cama e me peguei sorrindo cinicamente. Que
noite de merda! A mulher que eu desejava foder estava ali, e eu, que
costumava dormir sem roupa, estava vestindo uma calça de moletom antes de
me deitar ao seu lado.
O toque do celular em cima do criado-mudo me colocou em alerta
outra vez.
— E então, o que tem pra mim?
Era Luigi.
— Não há Carabinieri nem Polícia Estadual, nem guardas locais.
Simplesmente porque não há corpo naquele beco. Também não encontrei os
sapatos ou a bolsa da moça. Tudo foi limpo, chefe. Um serviço bem-feito, por
sinal.
— Que porra você está dizendo, homem?
— Não faço ideia do que aconteceu. Mas se fosse um viciado fodido
qualquer, não o teriam tirado de lá.
Muito estranho! Será que tem a ver com ela ou foi um ataque
aleatório?
— A quem esse território pertence, Luigi?
— Camorra. Pelo que sei, não permitem ataques em Isola. Por causa do
turismo, é ruim para os negócios. É um bairro protegido, todos pagam o
pizzo[6].
— Então pode ser que tenham limpado para não gerar pânico, afinal, é
dever deles manter tudo sob controle. O problema é se encontrarem a bolsa
dela e decidirem procurá-la.
— Não conseguiu falar com ela?
— Está dormindo, mas o farei pela manhã.
— Vou ver se consigo descobrir qualquer coisa, se precisar de mim por
aí basta ligar.
— Vou tentar agilizar minha volta aos Estados Unidos o quanto antes.
— Pretende levá-la com você?
— Não existe outra opção.
Deixei o celular no criado-mudo e me sentei na cama, me ajeitando
para passar a noite velando seu sono. Talvez eu cochilasse um pouco, foi um
dia cheio, afinal. Mas bastou me concentrar em seu semblante tranquilo e
fixar minha atenção nos longos cabelos castanhos espalhados sobre seus
ombros para sentir meu corpo reagir outra vez. O magnetismo causado por
sua presença e o fato de não poder tocá-la soava como tortura para mim. Já
sobrevivi a dores terríveis sem sucumbir e estive em situações bastante
agonizantes a ponto de desejar a própria morte, contudo, tê-la tão perto e
ainda assim tão distante era o que me causava real sofrimento. O tesão
reprimido, a preocupação com seu bem-estar, o receio de que ela ainda
estivesse em perigo. Uma soma que resultava em um sentimento que pensei
jamais ser capaz de sentir e… porra! Poderia se tornar meu calcanhar de
Aquiles.
Eu não sou um homem bom, mas vou ser bom pra você, mia bella
bruna[7].
— Raffaele… — murmurou sonolenta, os olhos se abrindo com
dificuldade e um sorriso fraco se formando nos lábios carnudos, capaz de me
tirar o chão debaixo dos pés.
Meu corpo ficou tenso. Será que está me confundindo com alguém?
— Não, este não é o meu nome — respondi a contragosto, detestando
ouvi-la chamar por outro homem, mesmo que não soubesse quem eu era.
Foi eu quem salvou sua vida! Onde estava o tal Raffaele que não te
protegeu?
Ela ainda estava grogue, o doutor avisou que dormiria por horas e o
efeito dos remédios não havia passado. Sua risadinha fraca não chegava nem
perto da que ouvi no restaurante, mas foi o suficiente para animar meu pau, o
que só piorou quando ela umedeceu os lábios com a língua.
— Você perguntou como eu me chamava… eu me chamo Raffaele.
— Você tem nome de garoto?[8]
— É, tenho sim. Mas há uma vagina entre minhas pernas.
Ela disse mesmo o que acabei de ouvir? Devia ser algum efeito
colateral dos analgésicos.
— Talvez eu precise conferir por conta própria. — Decidi testar seu
nível de sobriedade com uma pequena provocação.
Ela não demonstrou medo mesmo depois de quase ter sido estuprada.
— Minha palavra é suficiente. Você deveria confiar em mim. —
Fechou os olhos e soltou a respiração, demonstrando a exaustão.
— Eu não confio em ninguém. — Não achei que ela tivesse me ouvido,
parecia ter caído no sono outra vez.
— Neste caso, terá que conviver com a dúvida.
— Você já fez o que tinha que ser feito, por que ainda não voltou pra
San Diego? Essa não foi uma viagem de férias, porra!
Ele não esperava que Mirko De Angelis ligasse para saber sobre seu
retorno. Havia se reportado ao Underboss desde que recebera o trabalho.
— Essa é uma pergunta feita pelo Boss ou pelo meu pai? Trata-se de
um esporro ou preocupação genuína com meu bem-estar?
— Não gosto do seu tom debochado, Dario. Esse temperamento ainda
vai lhe trazer problemas no futuro, o que significa problemas para a Famiglia,
já que será meu sucessor.
— Sim, e, quando eu for o Boss, qualquer um que tenha problemas
com meu temperamento pode dizer isso na minha cara e iremos resolver
como pessoas civilizadas.
Mirko soltou uma gargalhada, reconhecendo que Dario tinha mesmo a
quem puxar. Se não fossem tão parecidos fisicamente, a personalidade
provaria a paternidade antes mesmo de um exame de DNA. Os GoodFellas
estariam em boas mãos quando ele se aposentasse.
— É seu pai que está falando, garoto. Agora me escute com atenção:
preciso de você aqui imediatamente. Mudança de plano, vou me aposentar
antes do previsto. Em um mês você assume a Cadeira.
— Por quê? — Dario teve um mau pressentimento. Nenhum Boss
havia saído antes do prazo estourar, desde que a Lei de Aposentadoria foi
criada pela Comissão. Mirko De Angelis ainda tinha cinco meses até seu
aniversário de sessenta anos.
Ouviu a respiração pesada do outro lado da linha.
— Precisamos nos aliar com a outra Famiglia da Califórnia. Não quero
me aposentar com essa negociação em transição. Tem que ser feita por você,
Dario.
Estava demorando pra ele tocar nesse assunto!
— Achei que não estivesse falando comigo como um Boss, porra!
Tudo isso porque ainda não me casei? Tá parecendo um velho cupido
desesperado, papà! — Sabia que estava passando dos limites. Devia respeito
ao seu pai e a qualquer outro homem mais velho que ele.
— Não estou exigindo que se apaixone por alguém, mas você sabe que
deve se casar logo. Essa aliança precisa acontecer o quanto antes, Dario. A
Califórnia é o nosso território e dividir a fatia do bolo com os latinos e
irlandeses me causa indigestão há anos. Porém tenho recebido informações
de que os Gray Wolves estão interessados em um pedaço também. Você sabe
que eles são fortes no fornecimento de heroína pela Europa Ocidental. Além
disso, mexem com aquela porcaria de tráfico humano…
A coisa é mais séria do que pensei.
Dario sabia que se os Gray Wolves expandissem seus negócios para os
Estados Unidos, as Famiglie da Cosa Nostra seriam as primeiras na mira de
eliminação da concorrência. A organização criminosa turca tinha muita
influência em vários países da Europa, inclusive na Itália. Eles eram uma
verdadeira dor de cabeça. Se a política do governo americano era não
negociar com terroristas, mal sabiam o que estava por vir. A Cosa Nostra
também não pretendia negociar com os malditos, e isso só aumentava o mau
presságio de uma guerra no submundo. Uma guerra que poderia estourar
durante a sua administração.
— Não quero discutir isso por telefone, papà. Volto pra casa amanhã.
Raffaele saiu do quarto mancando bem menos que antes. Se tomasse
algum analgésico se sentiria melhor em relação ao desconforto pela torção.
Encontrou seu herói segurando um celular, ao que parecia, estivera falando
com o pai. Assim que finalizou a ligação, colocou o aparelho na bancada de
mármore negro da pequena cozinha. Aparentemente frustrado. Ela ouviu
quando mencionou sobre ir embora e a curiosidade por saber onde ficava sua
casa quase a fez perguntar, mas conseguiu conter o impulso. Não quis saber
seu nome para não procurar por ele depois e descobrir onde morava também
não podia acontecer. Só tornaria a despedida pior.
— Oi… Tô atrapalhando?
Dario se virou para Raffaele e engoliu em seco. Sim, era bom em
disfarçar emoções e manter-se impassível, mas precisava se policiar para o
fazer. Quando ouviu a voz doce da mulher que habitava sua mente desde que
a conheceu, ele não imaginou que se afetaria tanto com a visão. Raffaele
usava o vestido que ele escolhera na loja de departamento a uma quadra do
flat alugado. Os pés descalços e cabelo molhado faziam da sua simplicidade a
coisa mais sexy que já vira em uma mulher. O corpo dela era esbelto, não
muito cheio de curvas, mas atraente demais aos seus olhos. O rosto limpo,
sem nenhum traço de maquiagem, o fez perceber que na noite anterior ela
também não fizera uso de cosméticos, nem mesmo um batom nos lábios
avantajados. De toda forma, foi o aroma de baunilha em sua pele que ficou
gravado na memória dele e o mesmo aroma podia ser sentido agora,
deixando-o duro dentro das calças.
— Você é tão linda.
— Às vezes acho que isso é tudo o que sou. — Havia um traço de
amargor em sua declaração, como se tivesse ouvido aquilo vezes demais
quando o que realmente desejava era ser reconhecida por algo além de
características físicas e padrões de beleza.
Dario perdia a noção de tudo quando colocava os olhos sobre ela. Era
uma mulher jovem e talvez não tão experiente. Mesmo que desconhecesse
sua idade, podia garantir que tinha alguns bons anos a menos do que ele. Isso
não era um problema, o deixava ainda mais curioso a seu respeito. Os olhos
azuis de Raffaele eram como pedras preciosas, capazes de hipnotizá-lo cada
vez que capturava o desejo escondido dentro deles. Ela podia tentar ocultar,
mas não conseguiria negar a verdade se ele perguntasse. Sabia que era
correspondido. Talvez Raffaele desconhecesse a intensidade do que estava
acontecendo entre os dois, mas Dario faria questão de fazê-la entender. Não
havia como fugir do destino, ela pertenceria a ele por inteiro.
— Pra mim é como se você fosse um anjo que caiu do céu, justamente
no caminho do homem mais fodido desta Terra. Então me parece que eu
recebi uma chance de fazer algo bom pra alguém, quando tudo o que sei fazer
são coisas ruins. — Caminhou lentamente até Raffaele, rondando-a como um
predador fazia com sua presa.
Estava testando até que ponto ela era capaz de ir sem sentir medo dele,
porque ainda o impressionava que não tivesse acontecido. Se ela o fizesse,
seria a única chance de Dario deixá-la para trás. Muitas pessoas o temiam, ele
não precisava de mais uma.
— O céu não é meu lugar. Talvez eu tenha nascido e me criado no
inferno? — Um sorriso malicioso invadiu seus lábios. Raffaele não podia
revelar nada sobre o mundo ao qual pertencia, mas não iria posar de boa
garota quando havia assumido para si mesma que ao voltar para casa,
aceitaria seu papel na Cosa Nostra, independentemente de qual fosse. —
Talvez eu seja um demônio. Afinal, a tentação precisa ser atraente, pois é o
mal disfarçado na beleza.
Quando ele finalmente tocou sua face, Raffaele não se afastou.
Inclinou-se para encontrar os olhos castanhos do homem que fazia seu
cérebro virar pasta de amendoim, deixando-a incapaz de raciocinar com
clareza. Sabia que devia se afastar, mas não conseguia.
— Nunca estive no céu, Raffa. Mas já estive no inferno mais vezes do
que posso contar e, acredite em mim quando digo: você não pertence a ele, eu
sim.
Para de me olhar desse jeito!, quis gritar para assustá-la, mas não pôde.
Será que não enxerga o perigo que represento?
Dario por fim entendeu que ela não podia enxergar o perigo porque ele
não representava isso para ela. Raffaele via nele o seu salvador e, ao fazer
isso, uma parte dele queria ser o herói dela também.
— Então, você esteve muitas vezes no inferno… é como se fosse o
dono de lá? — Tentou descontrair, sentindo a tensão sexual aumentar a cada
segundo.
Sabia que não podia se apegar, mas cogitou ser tarde demais para
impedir. Tinha plena consciência de que não havia expectativa de futuro entre
eles, contudo poderia aproveitar o que parecia ser um presente. Como se o
universo estivesse tentando compensá-la de alguma forma por ter que se
despedir de uma liberdade que nunca mais teria quando voltasse para casa.
— Pode ser que eu tenha ganhado o direito sobre aquelas terras, por
adubá-las com as almas de gente que não prestava. — O tom sombrio
reforçava a intenção de mostrar seu lado mais perverso.
Fuja de mim, Raffaele. Porque não sou capaz nem mesmo de dar um
passo para trás quando se trata de me afastar de você.
Dario podia não revelar toda a verdade a respeito de sua vida, mas
sentia que Raffaele já havia captado a mensagem de que ele não era um
simples homem. Queria que ela soubesse através dele, que o homem do beco
não fora sua primeira vítima nem seria a última.
Ela entendeu.
Sei que preciso sair daqui o mais rápido possível, mas não pelos
motivos que deveriam importar. Ele é um assassino e quer que eu saiba
disso. Porém, agora que sei, simplesmente não me importo. Não é o bastante
para me fazer ter medo dele. Devo estar ficando louca!
— Quando cogitei que você poderia ser um deus grego entre os
mortais, pensei em Apolo, mas estava errada. Você é Hades.
Ele riu com vontade. Segurando o rosto dela agora com as duas mãos,
inclinou-se para deixar um beijo em sua testa, evitando o ferimento
arroxeado. Estava cada vez mais difícil conter a vontade insana de tomá-la
nos braços e beijá-la até perderem o fôlego, mas um último resquício de
autocontrole o fez perceber que a conversa ainda não tinha chegado ao fim.
— O deus do submundo é bem apropriado, eu acho. Isso não te assusta,
Raffa?
Ela não me parece o tipo de pessoa que joga com o perigo. Então por
quê?
— Sei que deveria, mas não. — Segurou-se nos braços dele. Adorou
quando a chamou pelo apelido. — Algo dentro de mim sabe que você não
quer me machucar.
— Eu me mataria antes disso, pode acreditar em mim.
— Eu acredito.
Foda-se! Ela é minha!
Deveria ter sido delicado, mas, assim que sua boca encostou na dela,
Dario perdeu o controle do seu desejo. Raffaele não pareceu incomodada,
abrindo o caminho para que a língua dele fosse em busca da sua. Ele era uns
bons vinte centímetros mais alto, precisando se curvar um pouco para que a
garota não tivesse que levantar os pés.
Uau! Que beijo é esse?, foi o pensamento de Raffaele enquanto se
perdia no momento mais intenso da sua vida. Nunca teve a boca explorada de
forma tão possessiva e visceral. Não havia romantismo, mas não se importava
com isso. Deu tudo de si, entregou-se sem reservas. Quando as mãos dele
deixaram o seu rosto e escorregaram pela lateral até alcançarem os quadris,
Raffaele soube o que aconteceria e não o impediu.
Dario suspendeu-a do chão, levando-a para mais perto de si. Ela
enlaçou as pernas em torno dele enquanto tentava conter os gemidos cada vez
que as mãos do homem lindo apertavam suas coxas com mais firmeza.
Raffaele segurou seu rosto, não permitindo que ele se afastasse nem mesmo
para respirar. Queria consumi-lo e ser consumida. Nada mais parecia
importar. Se pudesse, ao menos uma vez na vida, ter o direito de fazer o que
bem entendesse, Raffaele certamente escolheria se entregar sem reservas ao
homem que fazia seu coração quase saltar pela boca.
Dio mio! O que estou fazendo?
Nenhum dos dois parecia disposto a parar, até o roncar de estômago
ecoar como lembrete de que Raffaele estava há muitas horas sem ingerir
qualquer alimento, inclusive água. Descolando os lábios dos dele e
recolhendo sua língua, a jovem sentia-se envergonhada por aquela ser a
segunda vez que seu corpo agia por conta própria, pedindo por comida. Ela
tentou não rir, mas foi inevitável. Ainda segurava o rosto dele, sentindo o
pinicar da barba em suas mãos. Respirando com dificuldade, tinha certeza
que os lábios estavam inchados, porque era assim com os dele também.
— Desculpe — pediu timidamente.
— Nunca peça desculpa, Raffaele. A não ser que seja realmente
necessário, e este não é o caso. Ambos estamos famintos, mas a sua fome é
mais importante do que a minha, por agora. — Mordeu o lábio inferior da
garota e caminhou com ela ainda em seu colo, levando-a para a bancada da
cozinha e a deixando se sentar no mármore. — Eu fiz café.
Assim que ele se afastou, ela percebeu que ignorou a dor no tornozelo
quando se prendeu em torno do quadril do homem. O que era uma dorzinha
como aquela, em comparação ao formigamento que sentiu entre as pernas?
Nada! Totalmente irrelevante.
Raffaele observou seu herói enquanto ele despejava café em duas
canecas de porcelana. A forma como se comportavam após o beijo era como
se fossem íntimos há muito tempo, beirando o conforto, ambos à vontade um
com o outro, desfrutando da rotina de mais um dia.
Como isso é possível? Será que todos os relacionamentos normais são
assim? Ela não era ingênua de acreditar que os casais formados através dos
arranjos entres os clãs da Famiglia agiam daquela forma. Mas também nunca
se envolveu com alguém tempo o bastante para ter noção de como
funcionava uma relação saudável.
— Quer açúcar no seu café?
Deixando a caneca para ela em cima da bancada, Dario pegou o saco de
papel na pia e desembrulhou os brioches, colocando-os em um prato.
— Eu gosto de café amargo, obrigada.
— Passa das duas horas e eu não fazia ideia do que você gostaria de
comer. Fui no mais óbvio, já que os italianos parecem respirar esse tipo de
pão. — Deu uma risadinha e piscou para ela, oferecendo-lhe o prato com os
brioches. — Esses não estão recheados.
— Está ótimo pra mim. Não sou como as pessoas daqui, que têm o
hábito de colocar Nutella em tudo que comem.
Dario observou Raffaele morder um pedaço do brioche e fechar os
olhos, deliciando-se com o pãozinho. Ele esteve tão hipnotizado pela beleza
da moça que esqueceu o fato de ela ainda não ter se alimentado. Egoísta do
caralho! Repreendeu a si mesmo.
— Você não é italiana. — Continuou apreciando Raffaele se alimentar,
fascinado por cada gesto dela. Devo estar parecendo um idiota.
— Sou sim. Mas não fui criada aqui. Estive muitos anos nos Estados
Unidos, estudei lá até concluir o Ensino Médio. Considero o inglês minha
primeira língua, voltei pra cá há pouco tempo. — Não era mentira, mas
Raffaele ficou em alerta para não dar informações demais. — Por que a
afirmação e não uma pergunta?
— Você falou comigo em inglês quando estava grogue. Onde estudou?
— Dario considerou um ponto a seu favor ela estar familiarizada com os
Estados Unidos, talvez não fosse tão difícil convencê-la a ir com ele.
Raffaele mordeu o brioche e o mastigou sem pressa, aproveitando para
pensar no que diria. Bebericou o café, começando a ficar nervosa com o
interrogatório, sentindo medo de ele perceber sua reticência. Mas foi criada
para se esquivar de perguntas pessoais, embora não fosse uma mentirosa
profissional. Todas as garotas da Cosa Nostra sabiam como se comportar e
medir as palavras para não revelarem mais do que o necessário.
— Nova Iorque. — Outra verdade. Passou anos no colégio interno só
para garotas.
Dario manteve alguns passos de distância, embora estivesse escorado
contra a bancada. Quis deixá-la confortável depois do beijo, temendo assustá-
la. Afinal, Raffaele tinha sofrido uma tentativa de estupro recentemente e ele
já havia colocado as mãos em cima dela e quase a levado para sua cama.
Mesmo que ela tivesse correspondido, cabia a ele ser sensato. Aproveitaria o
momento para saber mais sobre a mulher que o havia fisgado sem muito
esforço.
— Quantos anos você tem, Raffaele?
Ela hesitou um pouco, pois sabia que ele era mais velho.
— Farei vinte dentro de três meses.
Mais de treze anos de diferença. Ainda assim, não era problema para
Dario. A própria Famiglia consideraria que Raffaele estava passando da idade
ideal para se tornar esposa de um Made Man, principalmente considerando a
importância que davam à virgindade. O recato feminino era supervalorizado.
Nem mesmo eles acreditavam que suas mulheres pudessem se manter
intocadas por tanto tempo, embora fossem criadas para a castidade até o dia
do casamento. Para Dario, muitos dos costumes antigos não faziam sentido
na atualidade, ele mesmo pretendia revisar alguns pontos quando se tornasse
Boss. Se a intenção de colocar à frente da Famiglia um homem jovem era
manter a Cosa Nostra atualizada, e não parada no tempo, não se mostrar
acomodado às tradições e apresentar mudanças poderia fazer dele um
visionário aos olhos dos mais velhos, porém ele administraria para as
gerações futuras.
— Precisa avisar alguém sobre estar bem e segura?
— Não, eu não tenho ninguém aqui. — Prendeu seu olhar ao dele.
— E a bartender do restaurante? Vocês pareciam próximas. — Ele se
serviu de mais café, tentando demonstrar casualidade para não a intimidar
com tantas perguntas.
No ponto de vista de Dário, era muito mais fácil arrancar informações à
base de tortura física e psicológica, como fazia com traidores, devedores ou
membros de gangues inimigas. Não tinha que se conter, gostava de infligir
dor para arrancar tudo o que precisava saber até mesmo dos mais silenciosos.
Dificilmente não obtinha sucesso. Para alguns, a dor era pior que a própria
morte e, quando não podiam mais suportá-la, revelavam o que ele queria
saber, com o propósito de receberem um golpe de misericórdia. Um tiro na
cabeça cessava a agonia.
Mas a situação diante de si fugia completamente da sua zona de
conforto. Não era um interrogatório, estava apenas buscando conhecer
melhor a mulher que entrara em sua vida de forma repentina e inusitada.
Logo teria que ir direto ao ponto, o que, tinha quase certeza, a assustaria. Que
homem, em sã consciência, conhece uma mulher e em menos de vinte e
quatro horas pede a ela que vá viver com ele em outro país? Sem mencionar
que Raffaele teria que ser sua amante, vivendo um relacionamento discreto,
pois mais cedo ou mais tarde Dario teria que se casar com uma mulher de seu
mundo, aquela que lhe daria herdeiros e se encarregaria de educar seus filhos
dentro dos costumes da Cosa Nostra.
— Sim, nós somos amigas. Mas Pietra não deve ter sentido minha falta.
— Alguém no trabalho?
Raffaele negou com um gesto de cabeça, estendendo a caneca na
direção dele, pedindo que lhe servisse mais café.
— Tô sem emprego no momento.
— No que você trabalhava? — perguntou quando lhe devolveu a
caneca reabastecida.
Ela podia ser universitária, ponderou ele, devido sua idade.
— Modelo de passarela e campanhas publicitárias. — Não escondeu a
tristeza em sua voz, deixando Dario intrigado. — Estava começando, mas
não deu tão certo quanto esperava.
Fazia todo sentido, pensou Dario. Raffaele tinha uma aparência exótica.
Era alta e magra, mas não do tipo anoréxica como muitas modelos que ele
conhecia. Os cabelos em cascatas onduladas eram muito bem-cuidados e a
simetria facial, combinada aos olhos marcantes e lábios bem-desenhados, a
colocavam em um patamar muito apreciado pela ditadura da beleza. Se
incluísse a postura elegante e somasse o sorriso cativante como bônus, ela era
a combinação perfeita para ser o rosto de alguma marca mundialmente
famosa.
Essa constatação o fez se lembrar de como ela pareceu desconfortável
quando ele enalteceu o quanto a achava linda: “Às vezes acho que isso é tudo
o que sou.”
— O que deu errado?
— Não quero falar sobre isso. — Seu tom não estava aberto à réplica.
Dario deixou a caneca de lado e se aproximou de Raffaele, sentindo
necessidade de tocá-la para ter certeza de que era mesmo real. Não podia ser
mais tolo que isso?
Foda-se! Eu não me importo.
Quando as mãos dele seguraram seu rosto com delicadeza, ela se sentiu
preciosa. O toque cuidadoso das mãos grandes e um tanto ásperas a fizeram
amolecer e agradeceu mentalmente por estar sentada na bancada da
cozinha.
— Porra! Você tem ideia de como me fascina? Nunca estive tão
interessado em uma mulher antes, mas tem algo em você que me prende.
Qual é o seu segredo, Raffaele?
Será que ele desconfia de algo?
— O quê? N-não… eu … não tem segredo nenhum. — Balançou a
cabeça em um gesto de nervosismo, mas ele a acalmou com um beijo rápido
nos lábios.
Ela gostava de sentir a barba dele roçando em seu rosto. Além disso, tê-
lo tão perto permitia inalar mais do perfume masculino que ele exalava. Uma
mistura de fragrância amadeirada e da própria pele. Sua fórmula exclusiva,
pensou a garota.
— Eu vivi o suficiente para saber o quanto isso entre nós é incomum,
Raffaele. Não sei quase nada sobre você, mas posso dizer que se sente da
mesma forma em relação a mim. Estou errado?
— Não está. Mas não consigo explicar o que é. — Tocou sua barba,
querendo manter a proximidade.
— Alguns sentimentos não precisam ser explicados. Basta sentir e
pronto. Ninguém pode palpitar a respeito. Que se foda ter sido rápido demais.
Tem gente que passa a vida toda procurando algo que nem faz ideia do que
seja e morre sem encontrar. Confesso que eu não estava procurando. Mas
então eu te encontrei e daí apenas soube.
— Soube o quê? — Engoliu em seco.
Dario não hesitou, mesmo sabendo que não tinha volta.
— Que você é minha. E eu sou seu.
Por que eu tinha que conhecer você logo agora?
Por que a vida quis me dar algo assim se não posso aceitar?
— Shhhh. Não precisa dizer nada. — Escorregou o polegar sobre os
lábios dela, impedindo-a de dizer algo que estragasse o momento. — Não
quis te assustar.
Raffaele soltou a respiração gradativamente.
— Não me assustei… quer dizer, só estou surpresa. Foi muito repentino
e eu também não estava procurando por… seja lá o que é isso.
Dario riu e roçou a ponta do seu nariz no dela. Nunca foi afetuoso
antes, mas gostava de fazer isso com Raffaele. Parecia certo.
— Isso tem um nome, Raffa. Mas não precisamos rotular.
— Dio…
— É. Que Ele nos ajude, principessa.
O segundo beijo começou mais calmo, parecendo uma forma de
consolar a ambos, mas não demorou a se intensificar. Raffaele voltou a
enlaçar suas pernas em torno de Dario, que apertava a cintura dela contra si.
Tornaram-se ofegantes outra vez, mas não se afastaram. Entre respirações
entrecortadas, gemidos contidos e línguas exploradoras, ambos esqueceram
quem eram e a que mundo pertenciam, deixando de lado por alguns instantes
a realidade que não lhes era favorável.
Tenho que levá-la comigo para San Diego… Dario traçava um plano.
Tenho que recuperar meu juízo, lamentou-se Raffaele, sabendo que
estava prestes a ultrapassar uma linha perigosa.
— Eu preciso de um banho frio. — E aliviar minhas bolas no chuveiro,
porra!
Ela percebeu o significado do que ele dissera assim que reparou a
protuberância no jeans. Mordeu o lábio inferior para disfarçar o
constrangimento.
— Você pode me dar uma carona até meu apartamento depois? Perdi
minha bolsa e estou sem dinheiro.
Ele assentiu, afastando-se dela para recuperar o autocontrole.
— Claro. Mas nós precisamos conversar, Raffaele.
— Tudo bem. Eu espero. — Sorriu, tentando sua melhor interpretação,
assim como fizera com Pietra na noite passada.
— Eu não demoro.
Ela o esperou ir para o quarto antes de descer da bancada, com cuidado
para não forçar o tornozelo machucado. Inquieta, Raffaele olhou em volta,
sem saber o que fazer.
O que será que ele quer conversar comigo?
“Eu vivi o suficiente para saber o quanto isso entre nós é incomum…”,
ele disse, muito seguro de suas palavras.
— O que estou fazendo aqui ainda? — sussurrou para si mesma,
começando a entrar em pânico. Não posso fazer isso… não posso!
“Minha palavra é a melhor coisa
que tenho a oferecer.”
Salvatore Profaci (Família Colombo – Nova Iorque)
Eu podia ter boa aparência, dinheiro e até me comportar bem diante das
convenções sociais. Podia sorrir, ser educado e cavalheiro. Não era o tipo de
cara que tratava mulher feito lixo, mesmo as que usava como distração para
sexo durante uma única noite, elas tinham o que sabiam que iam ter de um
homem como eu, nada mais. Não era sobre ser um cafajeste. A coisa toda não
tinha realmente nada a ver com isso. Em resumo, a verdade é que eu não era
um bom homem. Podia parecer bom em alguns aspectos, conseguia até me
aproximar de algo como o sonho molhado de uma mulher quente. Porra, eu
gostava disso. Mas em nenhuma hipótese eu seria o tipo de cara que podia ser
considerado um bom ser humano e não havia nenhuma célula do meu corpo
que desejasse o contrário disso. Sempre gostei de ser assim.
O mundo é como uma gigante empresa, onde existem muitos cargos e
funções para que a engrenagem da porra toda continue funcionando. Há a
parte limpa e atraente para impressionar e vender, mas também há o trabalho
sujo, aquele que não aparece na vitrine com o resultado final, porém faz parte
do processo de produção até que o consumidor tenha a sua coisa bonita e
agradável em mãos.
Eu sempre fiz parte do time que executava o trabalho sujo, estive nos
bastidores do grande show e desta forma tudo funcionava muito bem, porque
eu fazia um trabalho sujo perfeito do caralho. E para que algo assim fosse
possível, não havia como ser um bom homem. O que isso fazia com minha
alma não importava, já tinha desistido dela há muito tempo. Mas eu poderia
ser bom para alguém, se quisesse. Principalmente para Raffaele. Não era
como se eu fosse incapaz de ter bons sentimentos, só não saía por aí os
distribuindo aos montes, nem para qualquer um. Nunca pensei que valeria a
pena me esforçar para manter o que eu senti quando estava na presença dela.
Não a esperança de redenção, mas um novo propósito além de continuar
existindo. Era o verdadeiro desejo de viver porque havia um motivo
realmente importante para isso.
Quando se passa tempo demais consumido pela escuridão, é bom ter
alguém que te puxe um pouco para a luz. Alguém que não te deixe esquecer o
quanto é importante abrir os olhos de vez em quando, só para encontrar
motivos de querer mantê-los abertos por mais tempo. E quando se encontra
alguém capaz disso, não se pode deixar escapar. Esse tipo de equilíbrio pode
ser a salvação da sanidade, quando a alma já está condenada ao inferno.
Foram muitos os pecados que cometi e ainda tinha os que estavam por
vir, mas era possível continuar na superfície sem me afundar completamente
na perversidade. Raffaele seria a âncora que me impediria de estar à deriva, e
meu porto seguro para onde eu voltaria depois de cada jornada. Ela e somente
ela seria a ponte que me permitiria voltar do submundo e caminhar entre os
homens bons, mesmo sabendo que nunca seria como qualquer um deles.
Eu só precisava convencê-la, provar a ela sua importância.
Após boa parte da tarde chorando a perda de algo que nem mesmo
cheguei a ter, tomei um analgésico para aplacar a dor de cabeça e comecei a
fazer as malas. Ainda não havia providenciado minha passagem, mas o faria
assim que terminasse de ajeitar tudo. Mudei de ideia quanto a avisar meu
padrinho ou irmão, usaria o dinheiro que estava em minha conta. Se estava
voltando para os braços protetores da Famiglia, usufruiria de cada benefício.
Quando a campainha tocou, sobressaltei-me, assustada. Será que ele me
encontrou?
Tensa, me aproximei da porta e chequei através do olho mágico.
— Riccardo? O que você está fazendo aqui?
“De todas as minhas contradições
De todas as minhas imperfeições
Dos medos que coexistem comigo
Das palavras de um discurso inútil
Pelo menos você fica de fora
Do meu diário de erros…”
Il Diario Degli Errori - Michele Bravi
“Na hora da verdade,
quando o cara tem uma
arma apontada para a cabeça,
é aí que ele mostra
quem é realmente.”
Sam Giancana (Família Outfit – Chicago)
Manter a discrição, sempre. Principalmente quando estava fora do país.
— Eu juro que não disse nada a ninguém! — foram as últimas palavras
de Luigi.
— Apenas vamos garantir que essa situação não mude. — Com o alvo
na mira, Dario estava pronto para fazer o que tinha que ser feito. — Afinal,
defuntos não violam a Omertà.
O tiro foi certeiro, o som, amenizado pelo supressor de ruído. Era o
último detalhe a ser resolvido antes de pegar o voo de volta à América. Não
havia mais ninguém além dele e Raffaele para contar aquela história, mas a
garota deixou bem claro que preferia esquecê-la, em vez de dar continuidade,
portanto, ele faria o mesmo.
Dario precisou assumir que havia cometido um erro. Deixou-se seduzir
por uma boceta e quase colocou tudo a perder. Mas aprendeu a lição, não
seria tolo uma segunda vez. Sua vida estava prestes a mudar e ele pretendia
marcar seu nome na história da Cosa Nostra, queria ser lembrado pela
competência, o Boss que fez a Famiglia de San Diego prosperar. Tinha
planos ambiciosos e focaria sua atenção totalmente neles.
ATUALMENTE...
Assim que me aproximei da casa de Riccardo, avistei o El Camino
estacionado em frente ao portão e Vicenzo Donati escorado no capô,
fumando um cigarro.
O que ele está fazendo aqui a essa hora?
Era tarde, o que significava que Vicenzo me torraria a paciência com
um sermão sobre andar sozinha, já que eu não tinha um guarda-costas.
Talvez eu tenha e não saiba. O que pode ser ruim para Pietra…
Mannaggia! Preciso ser mais cuidadosa!
— Minha babá invisível não avisou que eu estava no Píer? — Optei por
jogar uma isca. — Há quanto tempo está aí me esperando?
Ele estava elegante e sensual no terno de três peças e sapatos bem-
lustrados, exalava autoconfiança e tinha a postura de alguém que não se
intimidava com qualquer um. A barba rasa e escura contrastava com a pele
alva, seus cabelos negros sempre perfeitos a ponto de ser irritante. Era sempre
um bom momento olhar para Vicenzo Donati, mesmo que não me sentisse
atraída por ele. Infelizmente, sua beleza e sensualidade natural não surtiam
efeito em minha libido, nem faziam bagunça alguma no meu coração.
Recentemente, percebi que seria um problema a menos em minha vida
se eu fosse o tipo de mulher que conseguisse deixar os sentimentos de lado
para agir em benefício próprio. Se me casasse com Vicenzo, o futuro Boss de
Los Angeles, minhas chances de conseguir a vingança que desejava seriam
elevadas. Mas não havia essa possibilidade, porque eu era incapaz de algo
assim. Precisaria, no mínimo, estar atraída fisicamente por ele, o que não era
o caso.
— Embora eu ache que deveria, você não tem um Soldato te vigiando
— respondeu-me, inabalável. — Por que não atendeu minhas ligações?
Parei em frente ao portão, virando-me para encará-lo.
— Embora eu soubesse que devia, não quis atender — revidei com
sarcasmo. — Mas não se preocupe, não é nada pessoal.
Sua gargalhada só completava o pacote de sedução perigosa, mas para
mim era apenas uma demonstração de humor.
— Acredito que o mesmo não se aplica ao seu padrinho, já que o tem
ignorado deliberadamente. Don Barone tem se mostrado muito paciente
contigo, Raffaele. Mas eu te aconselharia a não brincar com a sorte.
Foi minha vez de rir, só que não achei graça nenhuma no que ele
dissera.
— Não acho que eu tenha qualquer sorte. — Abri o portão e entrei no
pátio, deixando-o aberto para que Vicenzo entendesse como um sinal,
autorizando-o a me seguir. — Por que está aqui?
Ouvi seus passos logo atrás de mim.
— Vim pessoalmente te contar a novidade.
— Que novidade? — perguntei enquanto destrancava a porta da casa.
— Estamos noivos.
— O quê? — Vire-me para encontrá-lo a dois passos de distância.
Por que meu padrinho mudara de ideia a respeito de me casar com
Vicenzo?
Seu sorriso cínico estava ali, enfeitando o rosto bonito. O olhar intenso
não escondia o perigo que podia representar, se assim o desejasse.
— Bem, deixe-me esclarecer melhor: você e eu, ambos estamos noivos.
Mas não um do outro, e sim com outras pessoas.
Abri a porta com raiva, recusando-me a acreditar no que ele acabara de
dizer.
— Não achei graça nenhuma, Vicenzo. Nunca pensei que você fosse do
tipo que gostava de fazer piadinhas ridículas. — Entrei em casa e fui direto
para a cozinha.
— Não é piada, Raffaele — insistiu ao me alcançar. — Eu vou me
casar com Antonella Rugiero, irmã do Underboss de San Diego.
San Diego… Não!
— E eu? — Era inútil aquela pergunta, quando eu já sabia a resposta.
— Confesso que adoraria me casar contigo, mas Don Barone prometeu
você a Dario De Angelis.
“Quantas vezes você passou
Quantas vezes você passará
E toda vez é sempre um golpe na alma …"
Un Colpo All'anima – Ligabue
“Você consegue muito mais com
uma palavra amável e um revólver
do que somente com uma
palavra amável sozinha.”
Al Capone (Família Outfit – Chicago)
— Está me entregando a ele porque não sou importante para a Famiglia
— disse Raffaele ao seu padrinho, sem esconder a decepção ao encará-lo do
outro lado da mesa, no escritório do complexo da Dragna em Pasadena.
Vicenzo fora buscá-la a pedido de Don Barone. Depois de ignorá-lo por
semanas, ela finalmente estava frente a frente com o Boss da Dragna. A
notícia de que havia sido prometida a Dario De Angelis ainda lhe parecia um
sonho ruim.
— Pelo contrário, bambina. Você é a mais preciosa, por isso estou
tomando esta decisão. Um dia entenderá meus motivos.
Ela se levantou, sentindo a inquietude dominá-la.
— Nunca serei capaz de entender o que motiva suas ações, Don
Barone. Principalmente quando se trata do meu futuro. — O tom mordaz em
sua voz não foi proposital, mas inevitável. — Fizemos um acordo e o senhor
voltou atrás em sua palavra de honra, e fez isso pelas minhas costas!
— Não estou gostando do seu tom, Raffaele — repreendeu o homem,
ligeiramente surpreso e desgostoso com a ousadia de sua protegida.
— Sinto muito decepcioná-lo, padrinho. Mais uma vez, por sinal.
Talvez seja por isso que esteja se livrando de mim, não é mesmo? Sou um
fardo para o senhor.
— Está agindo como uma menina tola e mimada. — Levantou-se e deu
a volta na mesa, aproximando-se de Raffaele. — Sabe exatamente o que
penso sobre você, e isso não mudou. Pode não enxergar os benefícios que
este matrimônio lhe trará, mas com o tempo perceberá que não havia decisão
melhor que essa.
— Assim como não havia decisão melhor quando permitiu que aquele
homem matasse meu irmão? — Levantou-se, encarando o padrinho
desafiadoramente. — Por que tanta distinção entre o fim de Riccardo e o
meu? Ele servia aos propósitos da Famiglia, enquanto eu nunca fui
verdadeiramente útil…
— Já chega! — vociferou Don Barone, perdendo a compostura. — Não
tornarei a falar sobre Riccardo!
— Como pôde descartá-lo tão facilmente? — Uma risadinha sardônica
escapou. — Bem, é o que está fazendo comigo agora. Se nunca se importou
com a gente, por que não nos entregou aos cuidados do Estado?
Giorgio não pensou com clareza quando desferiu o braço direito num
impulso e estapeou com força a face de Raffaele, pegando-a de surpresa e
desequilibrando-a a ponto de fazê-la cambalear e cair no chão. O golpe foi
intenso e doloroso, fazendo-a gemer de dor, tanto pela agressão quanto pela
queda brusca. Mas seu orgulho não lhe permitiu derramar uma lágrima
sequer. Estava farta de demonstrar fraqueza com choro, decidiu que toda a
sua tristeza, raiva e mágoa seriam canalizadas para o propósito final:
vingança.
Vicenzo conteve o impulso de ir até Raffaele para ajudá-la a se
levantar, cerrando os punhos dentro dos bolsos da calça, observou o
arrependimento nos olhos de seu Boss e ainda assim o odiou pelo que acabara
de fazer à garota. Sabia que Don Barone nutria afeição pela menina e que a
tinha como filha, e nos anos em que o conhecia nunca presenciou o Boss de
Los Angeles agredir uma mulher da Famiglia. Não era santo, mas tinha os
próprios princípios e sabia que Giorgio havia extrapolado. Contudo, não
podia ir contra ele, nem para defender a jovem que ganhara sua admiração
com o passar do tempo. Se demonstrasse contrariedade ao Boss, poderia
prejudicar seu futuro como sucessor e então as chances de fazer a diferença
estariam aniquiladas. Precisava se manter contido, até que finalmente
assumisse a Cadeira. Mas diante da cena que acabara de testemunhar,
sentindo-se um canalha por não interceder, o Homem Honrado dentro dele
sabia que precisava fazer algo a respeito, principalmente depois que Giorgio
Barone havia agido pelas costas ao lhe arrumar casamento com uma mulher
da GoodFellas.
O Boss de Los Angeles sabia que tinha ido longe demais, porém nunca
admitiria. Jamais se perdoaria por ter levantado a mão contra sua afilhada,
mas o erro já havia sido cometido. Observou em silêncio enquanto Raffaele
se levantava, o maxilar travado demonstrava a teimosia em não se submeter,
mas os olhos revelavam o quanto se sentia ferida. Giorgio desejava que a
jovem aceitasse o pedido de casamento, passando por cima do fato de Dario
ter matado Riccardo, pois sabia que a felicidade dela dependia de tal decisão.
Após a conversa que tivera com o Boss de San Diego, onde muito foi
esclarecido, não havia dúvidas de que o futuro de Raffa era ao lado daquele
homem. Giorgio fez o que pôde para protegê-la, mas ela já era adulta e ele
não tinha o direito de mantê-la sozinha para que a menina continuasse
fazendo parte de sua vida, só porque olhar para ela o fazia se lembrar de Sara.
O tempo dele como Boss estava acabando e tinha sua própria filha e esposa
para zelar. Viver preso ao passado era um grande erro que o fizera cometer
muitos outros mais. Tinha consciência de que cedo ou tarde seus pecados
começariam a ser cobrados e queria Raffaele longe de quaisquer
consequências. E não havia ninguém melhor que Dario De Angelis para
assumir a responsabilidade de proteger sua afilhada. Se para isso teria que
fazer Raffaele odiá-lo, Giorgio estava disposto a pagar o preço.
— Grazie — murmurou Raffaele, sem se importar com as
consequências. Simplesmente havia se dado conta de que não tinha mais nada
a perder. — Meus olhos estão bem abertos agora. Acho que finalmente
consigo enxergar quem é Don Giorgio Barone, o Boss de Los Angeles.
Ela manteve o olhar firme, e Giorgio soube que havia rompido o laço
fraterno entre eles.
— É bom que o faça. Enxergar somente o que lhe convém só alimenta
uma ilusão que não se sustentaria por muito tempo.
— De fato. — Engoliu em seco. — Mas não muda a verdade
questionada: quebrou sua palavra de honra.
Vicenzo manteve-se espectador, escorado na parede do escritório, os
braços cruzados e a presença praticamente esquecida pelos outros dois.
Giorgio chegou mais perto e Raffaele, com muito esforço, manteve-se
inerte. Não recuaria nem demonstraria medo, exatamente como Riccardo
tanto insistiu ao ensiná-la e só agora ela entendia o porquê. O Boss tocou-lhe
no queixo, segurando-o com determinação para que a jovem não se afastasse
nem desviasse o olhar.
— Eu lhe dei muito, bambina. Mais do que qualquer mulher desta
Famiglia já teve. E se não me falha a memória, acordamos que em
determinado momento eu colocaria sua lealdade em xeque. E você iria prová-
la, sem contestações. Pois a hora é essa. Don De Angelis exige uma esposa
para selarmos de vez a aliança entre Dragna e GoodFellas. Ele não pode
esperar mais tempo, como fez com Serena. Não temos nenhuma outra moça
com idade adequada, não uma que seja digna de se casar com um Boss.
— E eu sou digna?
— Sim. Você é.
Raffaele não disse nada por um tempo, encarando o Boss enquanto
tentava decifrar a mente manipuladora do homem que tanto admirou
cegamente por anos. Não via mais o padrinho, apenas o chefe de uma
organização criminosa. Já não conseguia separar os dois.
Será que Riccardo foi assim também?
Será que Dario De Angelis é assim?
Como sobreviver no meio de homens que se diziam honrados, mas
jogavam com a vida de outras pessoas como se não servissem para nada além
de seus próprios interesses?
Preciso começar a pensar como eles, agir como eles.
— Eu me casarei com De Angelis — disse por fim, calculando cada
palavra. — Mas não como a prova de lealdade que me exige, e sim porque
não tenho escolha. Depois disso, não lhe devo mais nada. A Dragna ficará no
meu passado assim que eu me tornar esposa do Boss de San Diego, e a
GoodFellas será minha Famiglia e minha lealdade estará voltada para ela.
Sem medo das consequências, Raffaele afastou-se bruscamente de
Giorgio e lhe deu as costas, saindo do escritório sem pedir autorização.
Vicenzo caminhou até uma das poltronas em frente à mesa de seu Boss
e sentou-se, aguardando Don Barone recuperar-se do ato impetuoso de sua
afilhada. Não disse nada, pois sabia que o momento demandava cautela.
Observar era sempre uma boa alternativa.
— Você deve achar que fui duro demais com Raffaele — murmurou
Giorgio, voltando a se acomodar em seu lugar. — Mas eu precisava fazê-la ir
em direção a San Diego. Espero que tenha conseguido e que ela não faça
nenhuma besteira, como sua irmã fez ao se matar.
— Raffaele não vai se matar, ela é teimosa demais para isso. — O
Gerente manteve-se impassível, nem mesmo sua respiração entregava o
desejo súbito de sacar a arma e disparar um tiro na testa do homem à sua
frente. — Mas confesso que não entendi a violência gratuita. Sempre a tratou
com muito respeito.
— E ela nunca me enfrentou da forma que fez, Vicenzo. Eu sou o Boss,
antes de tudo. Raffaele precisa entender. Além disso, minha decisão foi para
seu próprio bem.
— E quanto à decisão de me casar com a irmã de Andrea Rugiero? Em
nenhum momento cogitamos um segundo casamento entre Dragna e
GoodFellas. O que mudou?
Casar-se por conveniência era algo que nunca incomodou Vicenzo
Donati, ele sabia que cedo ou tarde aconteceria e estava em idade para se
casar. Mas como futuro Boss da Dragna, não imaginou que tal escolha seria
feita sem que o consultassem. Os Homens de Honra escolhiam suas esposas,
mesmo que elas não pudessem escolher seus maridos. Nem sabia se
Antonella Rugiero era atraente aos seus olhos. Queria ao menos sentir tesão
pela mulher que acordaria todos os dias ao seu lado, visto que pretendia ser
um marido fiel.
— Você ouviu as palavras de Raffaele antes de sair? Ela não está se
casando de bom grado, e Dario de Angelis não me inspira muita confiança
quando se trata da aliança entre as Famiglie. Quem garante que após o
casamento ele não mudará de ideia?
— Não acho que De Angelis seria tão desonroso a esse ponto. Ele não é
burro.
— Não é, mas não coloco minha mão no fogo por ninguém. Muito
menos por ele. Por isso seu casamento com a irmã do Underboss é de suma
importância.
— Por que uma Rugiero? — Ele não havia questionado Don Barone
desde que soubera sobre o casamento. Controlou-se e agiu condescendente,
mas não pôde evitar tocar no assunto agora.
Giorgio sorriu.
— O clã Rugiero é um dos mais benquistos da cosa nostra. Além disso,
tê-lo como cunhado do Underboss pode fortalecer a aliança. Antonella é a
mulher ideal para você. Bonita, educada, inteligente e de boa família, além de
muito próxima do irmão. Tenha a garota sob seu controle, faça-a ser leal a
você e, quando se tornar o Boss da Dragna, a influência que exercer sobre ela
pode ser benéfica no relacionamento com a GoodFellas.
— Você e meu pai decidiram sem me consultar — mencionou Vicenzo,
mantendo o tom complacente.
— Era uma carta na manga. Giacomo e eu estivemos conversando
sobre a ideia, mas, durante minha reunião com De Angelis, percebi que
precisava fazer esta exigência ao me ver sem saída em concordar com o
casamento dele com Raffaele. Tive que arrancar algo da GoodFellas, quando
me vi obrigado a ceder pelo bem da Dragna. No dia em que se tornar o Boss,
Vicenzo, terá que fazer escolhas súbitas e ter um raciocínio rápido para lidar
com situações inesperadas. De Angelis não podia sair daqui achando que nos
tinha na palma de sua mão. Por isso exigi seu casamento com uma mulher de
San Diego e, obviamente, não podia ser qualquer uma.
Vicenzo sabia que as decisões de Giorgio eram em prol de colocar a
Famiglia em primeiro lugar, prova disso foi sacrificar Riccardo em uma
Vendetta e prometer Raffaele em casamento para o assassino do próprio
irmão. Nunca viu com maus olhos as escolhas que seu Boss tivera que fazer
ao longo dos anos, pelo contrário, sempre admirou a perspicácia e mãos de
ferro com que o homem administrava Los Angeles. Mas quando se tratava de
Raffaele, desde o plano malfadado no beco em Milão, ele tinha restrições.
Testemunhar Giorgio agredindo a garota sem mover-se para agir em sua
defesa o fez se sentir um covarde e isso ainda o incomodava, mais até do que
seu noivado com a garota Rugiero.
— De agora em diante, eu pretendo participar de tudo que diz respeito
ao meu compromisso com Antonella.
Giorgio sorriu com arrogância para o homem à sua frente. Fez uma boa
escolha ao indicar Vicenzo para a Cadeira, a Comissão já havia aceitado,
inclusive, mesmo que o Gerente e seu pai ainda não soubessem, por uma
questão de segurança pessoal. Don Barone tinha mais três anos para
comandar a Famiglia e pretendia usufruir de tal poder até o último dia.
— Claro, Donati. É um direito seu.
Naquela tarde, após Dario ter ido embora, dei o segundo passo em meu
plano.
— Transferi mais dinheiro para sua nova conta — avisei Pietra pelo
celular descartável. — Agora é com você. Lembra-se do que combinamos?
— É claro. Já estou em San Diego. A entrevista é hoje.
— Ótimo. Espero que dê tudo certo, não tenho um plano B.
— Não se preocupe, Raffa. Andrea Rugiero vai amar minha
performance. Eu sou muito boa no que faço.
Dez dias depois, eu estava com tudo pronto para uma nova etapa da
minha vida.
“Tudo começou por um capricho teu
Eu não confiava… era só sexo
Mas o sexo é uma atitude
Geralmente como a arte
E talvez eu tenha entendido e aqui estou…”
Imbranato – Tiziano Ferro
“Juízes, advogados e políticos
têm uma licença para roubar.
Nós não precisamos deles.”
Carlo Gambino (Família Gambino – Nova Iorque)
— Tem certeza de que quer fazer isso?
Raffaele encarou Vicenzo Donati e lhe deu um sorriso irônico.
— Espero que esteja se referindo ao El Camino, porque se for sobre
meu casamento com De Angelis, você sabe muito bem que não tive escolha.
Foi a vez de o homem lhe dar um sorriso.
— É claro que estou falando do carro. Pertenceu ao seu irmão.
— Agora pertence a você.
Vicenzo observou-a de soslaio enquanto dirigia rumo ao terminal
privado do Aeroporto Internacional de Los Angeles. Raffaele estava pronta
para ir a San Diego e ele não podia fazer nada a respeito. Gostava mesmo
dela, porém percebeu que, após a morte de Serena, foi como se tivesse
transferido para Raffaele toda a preocupação fraternal que nutria pela irmã.
Talvez fosse porque ela também perdera um irmão, mas sua empatia era
genuína. Queria protegê-la.
Desde a conversa com Dario, Vicenzo esteve pensando sobre o futuro
da Dragna e o seu próprio. A decisão que tomara era arriscada, mas mudaria
o jogo a seu favor. Não confiava no pai para pedir qualquer tipo de conselho,
principalmente depois dos arranjos por debaixo dos panos para que se casasse
com uma mulher de quem sequer sabia a aparência. Estava farto de ser
conivente com Giorgio Barone para garantir que a nomeação à Cadeira
acontecesse. Não queria ser um maldito maccolona[28], queria ser o Boss de
Los Angeles, porra!
Após passar pela entrada exclusiva, o Gerente de Pasadena segurou o
volante com firmeza, travando uma batalha interna entre a consciência pesada
e a lealdade que um dia jurou ao seu Boss, mas que se abalava a cada nova
decisão de Don Barone. Se estava às vésperas de tramar contra o futuro
antecessor, nada o impedia de jogar limpo com Raffaele agora.
Parando o carro antes de se aproximar da pista de voo, Vicenzo fez sua
escolha,
— Preciso te contar uma coisa.
“Ah, Julieta querida, como você pode estar tão bela ainda?
Será que o fantasma da morte, esse monstro horrível,
se apaixonou por você e a escondeu
aqui na escuridão para fazer de você sua amante?”
- Romeu Montecchio
"Calem-se os ultrajados um pouco,
até que esclareçamos tais enigmas
e, conhecendo-lhes causas e fontes,
aqui possamos comandar a dor,
e guiar-vos — talvez até pra morte.
Até então que a paciência impere.
Trazei aqui, agora, os dois suspeitos."
Raffaele recebeu alta, mas antes de irmos embora da clínica pediu que
eu a esperasse tomar um banho. Enquanto isso, repassei nossa conversa e o
desejo de acabar com Don Barone apenas se fortaleceu. Saindo do quarto,
para não correr o risco de ser ouvido, caminhei até o final do corredor
enquanto iniciava uma chamada para Vicenzo Donati. Embora estivesse com
raiva do homem, não podia continuar agindo impulsivamente. Descartar sua
cooperação era uma possibilidade, sobretudo depois do que Raffaele me
contou, porém, com a suspeita de uma conspiração contra a minha Famiglia e
a Dragna como possível rival, seria através do Gerente que eu buscaria a
resposta que estava procurando.
Acabei me lembrando do que disse meu pai, pouco antes de partir para
a Catânia com a mamma:
— Controle seus inimigos. Mantenha-se atualizado de onde estão,
descubra no que estão pensando e, principalmente, em quem confiam. Se
permitir que pensem ser iguais a você, logo eles se sentirão superiores, mas é
preferível que subestimem sua esperteza. Se não puder vencê-los, ao menos
faça o possível para que a vitória do oponente seja a um custo muito alto. E
lembre-se: assim como as vitórias são temporárias, as derrotas também o são.
[31]
Vinte e dois dias. Esse era o tempo que havia passado desde aquela
tarde, em Santa Monica, quando depois de semanas afogada em tristeza,
enfim, emergi para descobrir a verdade que me fez chegar aonde eu estava
agora.
Vinte e dois dias também que meu caminho e o de Pietra se cruzaram
novamente, me dando a aliada que eu precisava para levar adiante meu novo
propósito.
Vinte e dois dias em que eu havia me tornado uma Mulher Feita, no
mesmo sentido de um Made Man para a cosa nostra. Porque foi quando
aceitei de uma vez por todas que esse era o mundo ao qual eu pertencia, e que
a partir dali começava o meu processo de iniciação, passando por todas as
etapas que fossem necessárias até que eu me tornasse, de fato, quem
pretendia ser: alguém capaz de matar.
Tudo o que eu tinha em mente, vinte e dois dias atrás, era o olhar triste
do meu irmão enquanto ele dizia “Acho que, de um jeito ou de outro, eu já
sou um homem morto”.
Quanta coisa pode acontecer em menos de um mês…
No quarto dia, Pietra e eu combinamos como seria a sua participação e
demos a largada, sem ao menos ter noção de quanto tempo levaria para
atingir o primeiro objetivo. Foi também quando eu soube que meu padrinho
havia me prometido em casamento para Dario De Angelis.
No quinto dia, o homem que me protegeu a vida toda tornou-se um
completo estranho para mim ao me apresentar sua verdadeira face. E aquele
que puxou o gatilho, encerrando a participação de meu irmão no mundo, me
reivindicou como pagamento de uma dívida pendente. Mas apesar de no
início eu ter sido relutante com a ideia, cheguei à conclusão de que aquela era
a melhor maneira de alcançar o objetivo final.
Eu estaria mentido se dissesse que me entregar a Dario foi um meio
para um fim. Por mais que minha mágoa pelo que ele fez ainda existisse,
aceitei que continuar negando o sentimento involuntário que crescia em
paralelo com o desejo sombrio do qual meu coração vinha se alimentando
seria uma batalha interna que eu perderia. Então dei a mim mesma uma
recompensa temporária, saciando uma fome antiga e me permitindo vivenciar
algo que renunciei no passado.
A parte mais perigosa sobre o que planejava fazer era se eu me
descuidasse e não conseguisse mais distinguir qual dos dois sentimentos era o
mais importante. Chegaria o dia em que eu teria que me decidir de uma vez
por todas qual deles manter e qual abandonar. Não dava para ter as duas
coisas. Se eu escolhesse o amor, precisaria abrir mão da minha vingança. Se
eu escolhesse a vingança, por consequência perderia o homem que descobri
amar.
No sexto dia eu ainda estava convicta de que a vingança era minha
melhor escolha.
No décimo sexto dia, eu perdi o rumo.
Estar ciente de que precisaria abrir mão de Dario quando a hora
chegasse era algo no qual eu estava trabalhando aos poucos, usando a razão
para domar o coração. Ao ser pega de surpresa, no momento em que foi
Dario a abrir mão do que tínhamos começado, logo quando eu estava
completamente vulnerável e suscetível ao meu sentimento por ele, o caos
sobressaiu à ordem, causando um conflito dentro de mim. E o desequilíbrio
entre amor e o ódio, que até então eu considerava em pé de igualdade, me fez
enxergar que um deles havia se sobressaído ao outro. E foi justamente aquele
que eu estava perdendo com a desistência de Dario ao não querer mais se
casar comigo.
A dor foi tão insuportável, que o propósito que eu tinha encontrado
para a minha vida há dezesseis dias desapareceu. O caminho pelo qual
escolhi trilhar tornou-se escuro de repente, e, sem saber para onde ir, acabei
me perdendo de mim mesma.
No décimo sétimo dia, eu encontrei um novo caminho, onde o destino
tornou-se incerto.
Duas. Esta foi a quantidade de vezes em que a chance de real liberdade
me foi oferecida por alguém que eu amava, em dezessete dias.
Duas. Também foi a quantidade de vezes que recusei esta chance.
Eu não estava pronta para abrir mão do amor que assumi sentir por
Dario. Não depois de saber que ele me queria ao seu lado e que
compartilhava de um sentimento tão forte quanto o meu. Não depois de ser
apresentada ao homem por trás de Hades.
No décimo oitavo dia, eu descobri que o desejo de vingança continuava
me corroendo e que parte de mim ainda não havia desistido dela. Foi também
quando percebi que o amor pode causar dependência, exatamente como uma
droga circulando no sistema sanguíneo, pedindo sempre por mais daquela
sensação prazerosa e manifestando a falta de uma nova dose com reações
incômodas e dolorosas, causando medo pela possibilidade de não ter mais o
que descobriu precisar tanto.
— Eu não posso prometer que vou conseguir voltar pra você sempre,
mas garanto que nunca vou desistir de tentar.
— É suficiente.
Ele riu, beijando minha testa em um gesto de carinho.
— Nunca será suficiente — replicou Dario. — Você merece o melhor.
E hoje eu percebi que estou longe de ser o melhor. Mas sou egoísta demais
para te fazer perceber isso.
Continuei acariciando sua barba, sentindo a calma que sua presença
trazia de volta ao meu estado de espírito.
— Isso entre nós, você sabe, não é bom. — Senti que precisava dizer
isso em voz alta, para que ambos refletíssemos a respeito.
— Como não pode ser bom, se nos faz bem?
Precisei de um tempo para pensar em como expressar com palavras o
que nós estávamos vivenciando.
— Há certa obsessão de sua parte. Você me quis e não teve. Mas agora
você tem, e está tentando se compensar pelo tempo que ficou sem.
— E quanto a você?
— Eu sabia que não podia te ter. Agora tenho, e estou consumido tudo
pelo tempo que me for permitido.
— Se depender de mim, Raffa, eu te permito me consumir até o fim
dos nossos dias.
— Está acontecendo rápido demais, com intensidade demais. E eu
tenho medo do que essa soma pode resultar no final.
Dario balançou a cabeça e então me deu um sorriso reconfortante.
— Não pense tão longe. Vamos aproveitar o que temos agora.
Assenti, mesmo não estando convencida. Dei a ele um sorriso
complacente.
— Tudo bem.
Dario se afastou e se levantou da cama.
— Preciso de um banho. Hoje foi um dia difícil.
Você não faz ideia!
— Você não me disse por que optou por convidar Salvatore, em vez de
Antonio, para estar aqui hoje — disse Raffaele, afastando-se do futuro
marido, escorando-se na porta do quarto. — Está tudo bem entre vocês? Não
estão mais treinando juntos pela manhã e eu não vejo há dias…
Mesmo desejando mantê-la em seus braços, Dario aceitou a curta
distância que ela impôs de forma sutil.
— Não o convidei em respeito a você.
— A mim? — Sentiu a tensão dominá-la.
Nos três últimos dias, Dario esteve pensando em todas as formas de
demonstrar a Raffaele o seu desejo de fazê-la feliz. Estava longe de ser o tipo
romântico, nem seria o homem que demonstraria diante de todos o quanto
aquela mulher dominava seu coração. No sexo, tinha certeza de que não
havia dúvidas em Raffaele sobre o quanto ele a desejava. Em questões
materiais, nada faltaria, Dario daria a ela tudo o que sua fortuna pudesse
comprar, mas já havia percebido que ela não se seduzia fácil pelo dinheiro.
Quando disse que desejava lhe dar um presente de casamento, mas não
sabia o que ela gostaria de ganhar, a resposta de Raffaele o deixou sem
reação.
“Eu me contento em não perder mais nada. É suficiente, por
enquanto.”
— Você não quis um casamento religioso, Raffa. Não tinha amigas que
pudessem ser madrinhas. E nem teria o seu irmão para guiá-la até o altar, nem
seu papà, nem padrinho. Eu também não tenho meus pais aqui hoje, e Andrea
não pode se ausentar quando estou fora San Diego. A presença de Toni ao
meu lado, a quem eu considero um irmão, pesaria, pela falta que Riccardo faz
a você. Hoje se trata de nós dois, Raffa. Só você e eu. Salvatore é um Soldato
leal, a quem confio sua segurança. E você se sente segura com ele, também
confia.
— Sim, é verdade.
— Acho que é uma forma de me desculpar com vocês dois por aquela
noite em que fui um idiota, quando tudo o que Sal fez foi ajudá-la a tirar os
pontos.
— Eu aprecio o gesto. Obrigada por pensar nisso.
No que mais ele poderia pensar, senão em maneiras de tentar
compensá-la por tudo o que já perdera na vida?
— Eu tenho que ir agora. Você pode descansar um pouco antes de
entrar naquele vestido lindo e me dizer sim na frente do Elvis.
— É sobre meu presente de casamento? Ele já está aqui?
Dario assentiu, admirando a mulher à sua frente. Quando Raffaele disse
que finalmente havia pensado em algo que gostaria que ele fizesse por ela,
nunca teria adivinhado que seria aquilo.
— Acha mesmo que é uma boa ideia?
O sorriso travesso brotou nos lábios pornográficos de Raffaele quando
ela respondeu, e ele soube que precisava sair dali o quanto antes, ou
acabariam se atrasando para o próprio casamento.
— Parafraseando uma canção da Rihanna: “Talvez seja isso o que
acontece quando um tornado encontra um vulcão.”[34]
Para Dario, Raffaele sempre foi uma mulher extraordinária. Aos vinte e
três anos, sua bella bruna com olhos de topázio e lábios pornográficos era
jovem demais para carregar o peso de tudo o que a vida jogou para cima dela
sem aviso prévio. Porém não tão frágil a ponto de ser incapaz de seguir em
frente, transformando todo aquele peso imposto em força e capacidade de
superação.
Agora, observando-a caminhar em sua direção, fascinado por sua
beleza etérea, no sentido poético da palavra e intrinsecamente relacionado à
religião, elevando-a ao divinal, mas não por seu nome de anjo. Dario sorria
para Raffaele que, naquele vestido branco, sorriso sublime e segurando um
buquê de narcisos, apenas reforçava sua crença de que ela era uma deusa e
ele havia finalmente encontrado a mulher perfeita para ser sua companheira
de vida.
— Por que está me olhando desse jeito? — perguntou ela, assim que se
juntou a ele diante do homem fantasiado de Elvis Presley, na capela mais
antiga de Las Vegas.
— Quando Hades sequestrou a deusa Perséfone para levá-la ao
submundo, onde governava, e então torná-la sua esposa, ela estava colhendo
narcisos no campo.
Raffaele encarou Salvatore, ainda assimilando o que Dario acabara de
lhe dizer. O Soldato deu a ela um sorriso enigmático e assentiu com um
balançar de cabeça. Voltando-se outra vez para Dario, ela não conseguiu
dizer nada que pudesse expressar com justiça o que sentia por ele naquele
momento.
O homem vestido de Elvis Presley iniciou a cerimônia que não teve
nada além do tradicional. Tudo o que pudessem dizer em seus votos já havia
sido dito antes. Bastou que ambos dissessem o “sim” nos momentos
solicitados. A troca de alianças foi feita em silêncio, bem como a assinatura
dos documentos, sendo Salvatore a única testemunha. Em menos de trinta
minutos, tornaram-se marido e mulher.
— Você é a rainha do meu submundo agora.
— O que Andrea quis dizer com aquilo? — perguntou Raffa, assim que
nos deitamos, horas mais tarde. — Sobre eu não permitir que você mude?
Depois do episódio com Antonio e Andrea, meu estado de espírito não
estava dos melhores. Mostrando o quanto já me conhecia tão bem, Raffaele
se aproximou e me deu um abraço. E só. Sem perguntas, sem cobranças.
Apenas a mensagem silenciosa de que ela estava ali para quando eu sentisse
que podia compartilhar um pouco do peso que carregava.
Acabei contando sobre Antonio e Cierra, repetindo aquela história do
passado pela segunda vez no dia, o que acabou despertando em mim o
sentimento de culpa. Sim, foi escolha minha não ter revelado a Antonio que
sua garota já o tinha deixado antes de ele o fazer, e eu não tinha ideia na
época do quanto amar alguém da forma como nós éramos capazes de amar
tornava tudo mais doloroso também. Talvez se, naquela época, a minha
decisão tivesse sido a de contar a verdade, Toni sofreria também, mas teria
aprendido a lidar com a dor até que ela desaparecesse, e não estaríamos
passando por isso agora.
Raffaele apenas ouviu, e fiquei grato por isso. Ter com quem desabafar
sem esperar o julgamento era reconfortante. Até mesmo quando fui à igreja
para uma confissão, quando esta foi a alternativa que minha mamma
encontrou para tentar, de algum jeito, salvar minha alma, recebi do padre uma
penitência. Eu não precisava de ninguém para dizer o que era certo ou errado,
porque eu sabia a diferença. Cada uma das minhas escolhas e ações eram
cientes de que eu podia estar me condenando de alguma maneira, fosse em
vida, com a justiça dos homens ou do Estado, fosse em morte, com a
condenação da minha alma. Até acreditava em Deus de vez em quando, mas
não podia afirmar que era temente a Ele. Se eu fosse de verdade, não teria
feito todas as coisas ruins que já fiz, das quais pouquíssimas me arrependia.
Portanto, penitência não me ajudaria em nada, e por isso nunca mais falei
para outra pessoa sobre o que eu fazia, sentia, ou estava pensando em fazer.
O silêncio sempre foi a minha melhor garantia.
Mas Raffaele estava se tornando, aos poucos, minha confidente.
Eu deveria protegê-la de tudo isso, mantê-la afastada desse meu lado
ruim. Mas para isso eu teria que voltar a passar a maior parte do dia fora,
sendo o Boss, para que, quando passasse pela porta de casa, eu me tornasse
apenas o marido.
Exatamente como Andrea fazia com Teresa.
Mas a ideia de me dividir, dando a Raffaele apenas um lado meu,
mesmo que fosse o melhor deles, não parecia certo. Não quando ela já tinha
entendido que eu tinha um lado ruim. Não quando ela já havia sofrido ao
testemunhar o pior de mim. Com isso, escolhi me entregar a ela por inteiro.
Porque minha companheira de vida era forte o bastante para lidar com isso.
Se os garotos da cosa nostra se tornavam Homens Feitos a partir do
momento em que tiravam uma vida em nome da Famiglia, as garotas da cosa
nostra se tornavam Mulheres Feitas a partir do momento em que passavam a
amar um de nós.
— Não importa. Porque ele está errado.
Raffaele foi até Pietra, que até aquele momento não teve coragem de
sair do carro. Apavorada, a garota tinha até mesmo urinado na própria roupa.
— Você vai pegar esse carro e sair daqui — instruiu Raffaele. — Então
vai pegar nossas coisas e ficar aguardando o meu contato.
— Como você consegue ver eles fazerem tudo aquilo com Antonio e
não desmoronar? — Pietra não conseguia parar de chorar, e Raffaele a
abraçou.
— Eu sinto muito por ter te envolvido nisso, Pietra. Principalmente
pela sua condição.
— Não, a culpa não é sua. Eu sabia o que estava fazendo, Raffa. Só não
tenho frieza o bastante para ver aqueles homens serem cruéis.
— Também não consigo, acha que fiquei olhando? Vomitei todos os
meus órgãos. — Afastou-se da amiga. — Agora vai e deixa tudo pronto.
— Vai mesmo matá-lo, Raffa?
— Não cheguei até aqui para nada.
Dario esperou até que Raffaele entrasse no carro e Sal desse a partida.
Tinham tanto o que conversar… havia tanta coisa que ele precisava
dizer a ela.
Mas antes precisava se livrar de um corpo e limpar a cena de um crime.
Um crime que a mulher que ele amava havia cometido sem remorso
algum.
— Ela não conseguiu — revelou Andrea, assim que Dario entrou no
armazém.
— O quê? — Ele ainda estava pensando em Raffaele e não entendeu o
que seu Underboss acabara de dizer.
— Raffaele não o matou. — Dario nunca viu Andrea tão perplexo
antes. — Antonio ainda está vivo.
— Depois de toda aquela tortura e três tiros? — Sentiu a raiva
crescendo dentro de si outra vez. — Pensei que ela fosse atirar na cabeça,
como fiz com o irmão dela. De toda forma, não deve levar muito tempo.
—Antonio não está morrendo, Dario. Raffaele não atirou nele.
Não demorou muito tempo para Dario se dar conta do que Raffaele
tinha feito, mas não disse nada. Ainda estava pensando no que fazer a
respeito.
Queria ir atrás dela, mas não podia deixar esse assunto inacabado.
— Quando tentei convencê-la a desistir, Raffaele estava convicta de
que queria matá-lo, o que pode tê-la feito mudar de ideia?
— As respostas. — Dario olhou na direção de Antonio, não o
reconhecendo mais como um irmão. — Ela conseguiu o que queria sem
precisar matá-lo. E agora quer que eu o faça.
— Você vai fazer?
Dario encarou o Underboss e soube que, apesar de ter torturado
Antonio e jogado para cima dele uma fração da raiva que sentia, ele não
conseguiria assumir para si a responsabilidade de matá-lo.
Aquela era uma decisão única e exclusivamente sua agora.
— Eu não serei o irmão que mata o próprio irmão. — Cerrou os punhos
com força, tentando não perder o controle.
Caminhando a passos firmes na direção de Antonio, Dario pediu que
Andrea o acordasse, jogando alguns baldes de água para limpar um pouco da
bagunça na qual seu Consigliere havia se transformado. Que permanecesse
consciente tempo o bastante para ouvir sua sentença, depois, estaria à mercê
do caos que causou a si mesmo.
— Fratello… perdonami[43].
Dario ignorou o apelo de Antonio e pediu que Andrea os deixasse a
sós, até que ele o chamasse de volta.
— Antes de sermos iniciados, a mamma nos obrigava a acompanhá-la à
igreja todos os domingos — quebrou o silêncio após se sentar numa cadeira,
em frente a Antonio, e observá-lo por um tempo, ganhando a certeza de que
sua decisão era definitiva. — Eu me lembro de um, em especial. Onde o
padre falou a respeito de Caim e Abel. Em como Caim preparou uma
emboscada para o irmão e o matou, movido por ciúmes. Então Deus puniu
Caim, expulsando-o das terras em que vivia e… — Fez uma pausa breve e,
perdendo o pouco da paciência que ainda lhe restava, se levantou, chegando
bem perto de Antonio para que ele olhasse diretamente em seus olhos. —
Não lembro muito bem o restante da história, mas você estava lá comigo,
deve ter prestado mais atenção do que eu.
Toni esboçou o que deveria ter sido um sorriso de deboche.
— Você, Tonino, matou o irmão dentro de mim — sentenciou. — Eu
estou muito longe de ser Deus, mas sou o dono dessa cidade, e o Boss dessa
Famiglia. Não há lugar pra traidores entre os GoodFellas.
— Então pode me matar…
— Não! — Seu tom era baixo, um sussurro carregado de ódio. — Em
respeito ao seu pai, que sangrou pelo meu pai. Não será um De Angelis a
derramar o sangue de um Sorrentino. Mas devem ter outras pessoas além da
fronteira que podem te ajudar com isso, se é a morte que você deseja.
— Muito misericordioso da sua parte, Boss — resmungou, em um tom
de derrota.
— Não sou seu Boss, porque você não pertence mais à cosa nostra.
— Eu sei que você queria que eu matasse Antonio, Raffa. Mas não
consegui.
Raffaele encarou o homem ajoelhado à sua frente, do qual podia sentir
a textura da barba pinicando sua mão trêmula, e então a mão trêmula do
homem repousando sobre a dela.
E só.
E foi suficiente para enxergar e entender.
Dario cometeu alguns erros e fez coisas muito ruins, que resultaram em
perdas dolorosas para Raffaele. Mas quando ele a feriu, consequentemente,
feriu a si mesmo.
Raffaele, sentindo toda a dor da perda, escolheu trilhar por um caminho
que a levou a cometer alguns erros e a fazer coisas muitos ruins, que
resultaram em perdas dolorosas para Dario. E quando ela o feriu,
consequentemente, feriu a si mesma.
Agora ambos estavam sofrendo a dor que um causou ao outro.
— Um homem sem honra não dura muito tempo, Hades. Deixe que
Antonio viva seu próprio inferno.
Raffaele inclinou-se para ele e Dario a recebeu em seus braços,
inspirando o aroma de baunilha que só surtia efeito em seus sentidos quando
mesclado à pele de sua bella bruna.
— E quanto a mim, amore? — ele perguntou, ainda abraçado a ela. —
Por quanto tempo mais eu tenho que viver meu próprio inferno?
— Não sei… — Ela se afastou do abraço para encará-lo, e Dario viu
que ela chorava. — Já faz algum tempo que eu me perdi dentro do meu.
A única coisa que Dario era capaz de odiar em Raffaele eram suas
lágrimas, simplesmente pelo fato de que era ele o motivo de ela as derramar.
Mas então ele sorriu e em seguida ficou de pé, estendendo a mão para ela.
— O que eu disse a você, assim que cheguei aqui?
Raffaele aceitou a mão estendida e se levantou da cama. E então,
depois de muito tempo, a ponto de acreditar que nunca mais seria capaz de tal
reação, ela começou a rir. Ainda era um riso fraco e sem grandes
expectativas, um riso sem humor, sem alegria. Mas, ainda assim, uma risada.
E para Dario foi um sinal de esperança.
— Que me encontraria até no inferno.
— E eu te encontrei, minha Perséfone. — Segurando-a pela cintura,
Dario a suspendeu do chão.
E como costumava fazer sempre que ele a pegava daquele jeito,
Raffaele enlaçou as pernas em torno dele e segurou-se em seus ombros.
— Vamos pra casa?
Porque seu lugar sempre seria ao lado de Hades.
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[1] Parla come mangi: Tradução literal: fale como come. É uma gíria italiana que significa “vá direto
ao ponto”.
[2] Che Schifo: Expressão popular italiana, significa “que nojo”.
[3] Mannaggia: Expressão em italiano bastante usual. Significa: “Droga!”
[4] Pitona: Expressão popular italiana. Equivalente a “vadia”.
[5]Carabinieri: Uma das cinco forças de segurança da Itália, cujas atribuições e competências são: a
defesa nacional, polícia militar, segurança pública e polícia judiciária.
[6] O pizzo é um dinheiro de proteção pago para as máfias, muitas vezes na forma de uma transferência
de dinheiro forçada, resultando na extorsão.
[7] Mia bella bruna: “minha bela morena” em italiano.
[8] Na Itália, Raffaele é nome masculino.
[9] Non esiste: Expressão popular italiana. Tradução literal: Não existe. Significado: De jeito
nenhum!|Pode esquecer!|Sem chance!
[10] Figurati é uma expressão popular italiana que significa “não se preocupe”. | Fratello: Irmão.
[11] The Arm: Apelido da Famiglia de Buffalo-NY.
[12] Meyer Harris Cohen, vulgo "Mickey", foi chefe da Família, em Los Angeles, entre 1930 a 1960.
Não é um personagem da autora.
[13] Provérbio siciliano: “A família se reconhece ao fechar a porta”.
[14] Nuddu ammiscatu cu nenti: “ninguém misturado a nada”.
[15] MCs: Motorcycle Club – Clube de Motociclistas.
[16] Sniper: Franco-atirador. Especializado em armas e tiro de precisão à longa distância.
[17] Rat rod: prática que consiste em dar aspecto envelhecido ao que já é antigo.
[18] Moccioso: Moleque, em italiano.
[19] Camomillati: Expressão popular italiana, significa “acalme-se!”.
[20] Leccalulo: Expressão italiana de conotação bastante vulgar e pejorativa. Significa “lambe cu”, no
sentido de puxa-saquismo, bajulação.
[21] Che cazzo di donna: Que mulher do caralho, em italiano.
[22] Chissenefrega – Tradução literal em italiano: “Quem se esfrega”. Expressão popular italiana com
sentido pejorativo, significa: “Eu não me importo”.
[23] Vito Corleone: Personagem fictício, interpretado por Marlon Brando no filme Poderoso Chefão.
[24] Vito Rizzuto: Chefe da Família do Crime Rizzuto, em Quebec, Montreal – Canadá, na década de
1980 até meados de 2013.
[25] Rudolph William Louis Giuliani é um político e advogado americano, descendente de imigrantes
italianos da região da Toscana, ex-chefe do governo municipal da sua cidade natal. Tornou-se famoso
por implementar uma política de "tolerância zero" contra criminosos, o que diminuiu as taxas de
criminalidade da cidade.
[26] Um loop infinito é o mesmo que uma “repetição infinita”.
[27] Pigiamino: tradução literal em italiano, pijaminha (roupa de dormir). Expressão popular italiana
para se referir ao preservativo (camisinha).
[28] Maccolona: Expressão popular italiana, para “puxa-saco”.
[29] “A rainha de San Diego”, em italiano.
[30] Victoria's Secret é uma marca de lingerie e produtos de beleza, e as modelos que desfilam para a
marca são chamadas de “Angels”.
[31] Trecho inspirado em uma compilação do livro THE MAFIA MANAGER, de Michael Franzese.
[32] Baixa Califórnia: em castelhano “Baja California” é um dos estados do México.
[33] Las Vegas Marriage Bureau: É cartório responsável pelas licenças de casamento que precisam
ser emitidas antes das famosas cerimônias de casamento realizadas nas capelas de Las Vegas. Leva em
torno de 20 minutos para tirar a licença.
[34] Trecho traduzido da música Love The Way You Lie – Eminem Ft. Rihanna