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Meu melhor presente é você

Um conto de Natal

Jurema Gracioli
Copyright © 2020 Jurema Gracioli

Todos os direitos reservados.


É proibido o armazenamento e/ou a reprodução de qualquer parte dessa obra, através de quaisquer
meios – tangível ou intangível – sem o consentimento escrito do autor. A violação dos direitos autorais
é crime estabelecido na lei n°. 9.610/98 e punido pelo artigo 184 do Código Penal.Esta é uma obra de
ficção. Seu intuito é entreter as pessoas. Nomes, personagens, lugares e acontecimentos descritos são
produtos da imaginação da autora.
Qualquer semelhança com nomes, datas e acontecimentos reais é mera coincidência.
Outra obra semelhante, após essa, será considerada plágio; como previsto na lei.

Capa: L.A Creative – Larissa Aragão

Revisão: Paloma Oliveira

Diagramação: Jurema Gracioli


Sumário

PRÓLOGO
CAPÍTULO 1
CAPÍTULO 2
CAPÍTULO 3
CAPÍTULO 4
CAPÍTULO 5
CAPÍTULO 6
CAPÍTULO 7
CAPÍTULO 8
CAPÍTULO 9
CAPÍTULO 10
CAPÍTULO 11
CAPÍTULO 12
CAPÍTULO 13
CAPÍTULO 14
CAPÍTULO 15
CAPÍTULO 16
CAPÍTULO 17
CAPÍTULO 18
CAPÍTULO 19
CAPÍTULO 20
CAPÍTULO 21
CAPÍTULO 22
EPÍLOGO
DEDICATÓRIA
PRÓLOGO
OLIVIA CAMPBELL
Dia 07/12 – Sábado

Eu adorava o Natal, até esse ano.


O Natal sempre foi uma data controversa, alguns amam, outros
odeiam, tem aqueles que ficam tristes, o grupo dos solitários, e aqueles que
esperam o ano todo para reencontrar a família.
O meu motivo para adorar o Natal são os ares de festa, as pessoas
agitadas e alegres, fazendo compras e carregando pacotes coloridos e com
laços, andando pelas ruas e sorrindo, as decorações natalinas nas ruas, lojas e
casas, o ar de festa e de família exalando por todos os lados. O Natal tem
cheiro, tem cores, tem sabores, tem calor — das pessoas e das bebidas
quentinhas — e principalmente tem magia e esperança.
Ah! Os sabores do Natal! Humm! O biscoito de gengibre, o panetone,
chocotone e todas as suas variações. As bebidas quentinhas: o chocolate
quente, a Gemada e Cidra quente de maçã. E claro, tem aquele prato que
alguém em especial faz, e que é o melhor do mundo: a farofa da cunhada, a
maionese da tia, o pernil assado da mamãe, ou a sobremesa de um amigo, são
aqueles sabores que nos lembram qual a sensação de estarmos juntos de
quem amamos.
A parte da minha primeira afirmação que diz “até esse ano” pode ser
explicada por dois motivos bastante específicos: o primeiro é que pela
primeira vez em minha vida estarei longe da minha família na noite mais
colorida do ano, e a segunda, usar essa roupa ridícula de Mamãe Noel —
Noelete, como apelidei. Não trabalho no shopping sorrindo para uma fila de
crianças que querem tirar foto com o Papai Noel. Se fosse o caso, a fantasia
teria todo sentido porque eu estaria em um personagem e fazendo crianças
sorrirem. O que não faz o menor sentido é uma atendente de cafeteria ter que
usar essa fantasia ridícula, e o pior, ainda se sentir agradecida porque a roupa
poderia ser pior.
Quando meu chefe anunciou que neste ano queria entrar no clima de
Natal fiquei feliz, imaginei a decoração da cafeteria, os novos quitutes no
cardápio, pensei numa receita especial de café natalino, e o sorriso dos
clientes ao receber um biscoito de gengibre em formato de anjinho junto com
seu café. Mas nunca imaginei o que saiu da boca do Lewis.
— Esse ano entraremos mesmo em clima de Natal, contratei uma
decoradora para fazer uma bela decoração e tive que comprar até que
comprar uma árvore de Natal. Mas vocês também vão participar da
decoração! Entre o dia dois, e vinte e quatro de dezembro vocês usarão um
novo uniforme, um uniforme de Mamãe Noel!
O sorriso que saiu da boca dele quando terminou a frase, me fez ter
certeza de que ele compraria o uniforme em um sex shop. Mas acho que ele
ficou com medo da esposa, Nancy, que está gravida de oito meses e com o
temperamento bastante alterado. Tenho certeza de que a ideia da decoração
de Natal foi dela, e o marido com medo de suas explosões de mau humor
concordou.
Quando os uniformes chegaram um alívio se instalou no rosto de
todas as atendentes da cafeteria, não era um uniforme, era uma fantasia
horrível, mas bem-comportada, com comprimento até os joelhos e sem
decote. Em pensamentos agradeci a Nancy, com certeza meu patrão pensou
em não irritar a esposa ao escolher esse modelo.
O sábado começou atipicamente sem movimento e enquanto usava
esse uniforme grotesco, mas bem-comportado, me perdia em devaneios e
estava bastante distraída quando ele entrou pela porta. A minha reação foi
automática e levantei o corpo, um sorriso nasceu no meu rosto e tudo o que vi
em minha frente foram os olhos escuros, cabelos ruivos e dentes muito
bancos.
CAPÍTULO 1
OLIVIA
Dia 02/02 - Sábado

A decisão de sair de casa me pareceu a única possível, a situação se


tornou insustentável. Sempre amei meus pais e continuo amando, mas não
posso deixar que suas decisões guiem o meu caminho.
Diante disso, foi o que fiz, peguei minhas coisas coloquei em uma
mala e entrei no primeiro ônibus que me levaria para longe dali…
Agora, com olhos fixos em paisagens que via pela primeira vez,
através da janela do ônibus, repassei os acontecimentos que me trouxeram até
aqui.
Ontem quando me deparei com Aidan, em um jantar na minha casa,
achei que fosse somente uma das tentativas da minha mãe de me arrumar um
namorado daqueles que frequentava a igreja, afinal, para ela um bom partido
para se casar com sua única filha deveria ter um bom emprego e ser um
homem temente a Deus. Quanto a sua filha gostar desse homem, bom isso é
relativo, porque aos vinte e três anos nenhuma moça de família, digna e bem-
educada deveria estar solteira, e numa cidade pequena as opções são poucas.
— Você vai aprender a amá-lo com o tempo. — Era o que ela me
dizia cada vez que apresentava um candidato a ser “meu marido.”
Consegui fugir desses encontros arranjados por muito tempo, mas
naquela noite ela e papai me surpreenderam. Mamãe me pediu para me
arrumar bem porque teríamos visita para o jantar, não dei tanta importância,
mas me arrumei. Ao chegar na sala encontrei Aidan, já o conhecia, era nosso
vizinho há muito tempo, sempre nos encontrávamos na igreja quando
acompanhava meus pais, em festas de amigos em comum e sempre nos
esbarrávamos nos comércios vizinhos às nossas casas. Ele deveria ter dois ou
três anos a mais que eu, um emprego na prefeitura, lindos olhos verdes, um
sorriso amigável e um mal gosto enorme para se vestir. Sempre tive vontade
dizer a ele que camisas sociais com estampas tão coloridas não estão na moda
desde os anos setenta.
— Você está linda, Olivia. — Ele elogiou assim que entrei na sala, e
forcei um sorriso, não queria ser mal-educada com o convidado da minha
mãe.
— Obrigada. O jantar está pronto, mamãe?
— Sim, vamos para a mesa, espero que goste, Aidan. — Mamãe
respondeu quase derretendo.
Estranhei o sorriso dos meus pais, mas não comentei nada. O jantar
foi estranho e com pouco assunto, alguém falou do tempo, da vizinha que iria
se casar, e sobre a próxima festa da igreja. Nenhum dos assuntos me
interessava, então fiquei quieta e comi, afinal a mamãe cozinha
maravilhosamente bem.
Quando terminamos o jantar, meu pai nos convidou para ir à sala,
mamãe foi até a cozinha e voltou com uma garrafa de espumante de maçã,
era só esse que dava para comprar. Não entendi o que estava acontecendo até
me virar e ver Aidan ajoelhado na minha frente, com uma caixinha nas mãos,
imitando os galãs de filmes de romance. Ele abriu a caixinha estendeu para
mim e começou o discurso:
— Olivia, sei que parece cedo, mas sou apaixonado por você há muito
tempo, e agora posso te oferecer uma vida confortável e uma festa de
casamento do jeito que você quiser. Eu já pedi sua mão em casamento para
seu pai e ele aceitou, agora só falta você dizer sim.
Fala sério! Era para ser um pedido romântico? Só faltou falar do dote
para ser um pedido de casamento de dois séculos atrás. Olhei para meus pais
que estavam do outro lado da sala, minha mãe com as duas mãos juntas na
altura peito, em um sinal de felicidade e ansiedade pela minha resposta, e
meu pai ao lado dela com as mãos no bolso e olhos fixos em mim. Eu já sabia
que iria desapontá-los, mas ainda tentei ser o mais delicada possível.
— Aidan, levante por favor, estou incomodada com você assim. —
Ele se levantou e continuei. — Olha… é muito generoso da sua parte me
fazer uma proposta dessas, mas não nos conhecemos muito, e não posso
aceitar, me desculpa.
Não queria estender o assunto, então fui rapidamente para meu
quarto. Ouvi um Aidan furioso saindo pela porta e dizendo que não entendia
minha reação e que eu não sabia o que estava perdendo ao desprezar seu
amor. Enquanto ele saía, meu pai pedia um tempo para que eu pensasse
melhor. Fiquei até com pena do rapaz, mas realmente não estava disposta a
pagar para ver o que estava perdendo.
Na sequência ouvi a conversa de meus pais, se lamentando e usando a
frase favorita de pais descontes:
— Onde foi que erramos na educação dessa menina?
Meu pai estava realmente muito bravo, e minha mãe tentava acalmá-
lo. Depois de alguns minutos eles entraram no meu quarto, nem bateram na
porta, seus olhares estavam furiosos e vidrados em mim, achei por bem
abaixar a cabeça e ouvir, e foi meu pai quem começou.
— Olivia, sempre te oferecemos tudo o que podíamos, sempre
fizemos muito esforço para te dar educação, até para a faculdade para ser
professora você foi. Você dizia que não queria se casar para não atrapalhar os
estudos, a gente aceitou. Mas você se formou no final do ano, então agora vai
se casar. Filha minha tem que ser moça direita, não pode ficar solteira para
ficar falada por aí.
— Filha, eu e seu pai conversamos e achamos que o Aidan é um bom
moço para você. Então amanhã, você vai com seu pai na casa dele para se
desculpar e dizer que pensou melhor e aceita se casar.
Eu estava absolutamente incrédula, sabia que eles queriam que eu me
casasse, mas nunca pensei que me forçariam a isso. Quando fui abrir a boca
para contestar meu pai falou mais alto, como um urro de raiva:
— E isso não tem discussão, Olivia, já tivemos muita paciência com
você. Esteja pronta amanhã às sete da noite, vou marcar a visita com o Aidan.
Eles se viraram e saíram do quarto.
Primeiro eu chorei, depois chorei de novo. Quando acalmei pensei o
que realmente queria da minha vida. Não cheguei a uma conclusão. Mas eu
sabia o que não queria, e eu não queria me casar forçada com alguém por
quem eu sequer tinha afinidade. Analisei minhas opções, e não eram muitas.
Não tinha uma tia distante que pudesse ir visitar ou amiga que morasse em
outra cidade.
Contei minhas economias, e por sorte tinha guardado algum dinheiro
que conquistei trabalhando em uma escola infantil onde comecei a trabalhar
ainda durante a faculdade como estagiária, depois de formada fui efetivada, e
adorava o trabalho, as crianças, a vida simples.
Não foi fácil dormir, mas o cansaço me venceu.
Acordei com o movimento na casa, papai se levantou cedo para ir ao
trabalho, entrava na fábrica às sete horas da manhã. Mamãe sempre acordava
com ele, fazia café e depois que ele saía, ela ia para a Maison di Fiori, a loja
mais chique da cidade, onde ela trabalhava de costureira, fazendo acerto nas
roupas, todas as manhãs. Assim que o silêncio reinou em casa, me levantei,
tomei um banho e fiz minha mala, a única mala que eu tinha não era grande,
mas também não tinha muitas coisas para levar. Duas horas depois saí de
casa em direção à rodoviária, deixando para trás um bilhete com um pedido
de perdão e uma carta de demissão para ser enviada à escola onde trabalho.
Ainda serão mais dez horas de viagem até uma cidade muito maior do
que todos os lugares onde estive, meu ônibus seguia para Nova York, sinto
medo e esperança, sentimentos que parecem contraditórios, mas que neste
momento batem juntos no meu peito.
CAPÍTULO 2
OLIVIA
Dia 07/02 – Quinta-feira

Exausta! Era assim que me sentia apenas quatro dias depois de chegar
em Nova York, uma cidade muito grande, onde tudo era longe, e não
conhecia ninguém. E quanto mais o tempo passava, mais eu me sentia
insegura e com medo de ter tomado a decisão errada.
Ainda no ônibus, a caminho desta cidade, pesquisei pela internet
lugares para ficar, e encontrei um studio para alugar, o lugar é pequeno, mini
quarto, mini banheiro, algo que lembrava uma cozinha, as paredes com tinta
velha e algumas manchas que pareciam mofo não ajudavam a melhorar o
aspecto do lugar, mas era o que podia pagar. Também acho que essa deve ser
uma região bastante perigosa, porque o senhorio não me pediu nem mesmo
um documento quando fui alugar. O proprietário era um senhor barrigudo,
cheio de tatuagens, grossos colares de ouro, com cara de poucos amigos, e
morava em um apartamento no térreo do edifício. Me recebeu sem muitas
perguntas e simplesmente falou:
— Recebo adiantado, se não pagar no dia certo pode ter certeza de
que suas coisas estarão na rua no outro dia. Já vi que você não é daqui, então
vou te dar umas dicas, nunca deixe essa porta destrancada, não guarde
dinheiro no apartamento, fica esperta com sua bolsa, não seja simpática com
seus vizinhos e nunca ande por essa região tarde da noite. — Me entregou as
chaves, virou as costas e foi embora.
Foi difícil dormir na primeira noite, os pensamentos ficaram confusos,
a dúvida ficou maior. Mas sempre que pensava que se aceitasse a proposta
dos meus pais iria me casar só para ser dona de casa, e esse nunca foi meu
sonho, desta forma reforçava a certeza de que tomei a decisão correta. Eu
quero e vou ser professora em uma escola infantil.
No dia seguinte comecei a procurar empregos em escolas infantis,
percebi que a maioria era muito longe de onde moro, seria necessário fazer
uma caminhada, depois pegar um trem, e em alguns casos mais um metro,
para chegar até lá, e demoraria mais de uma hora, em alguns casos quase
duas horas. Mesmo assim investi em cada passagem com esperança de
conseguir um emprego. As recusas foram se acumulando, as escolas já
tinham o quadro de funcionários preenchidos para esse ano, algumas até
ficaram com meu curriculum, mas não me deram esperança porque não tenho
referências de escolas da cidade.
A vontade que eu tinha quando ouvia isso era de responder: “criança
não é igual em todo lugar? Por que não pegar referências na escola que
trabalhei na minha cidade?” Mas não adiantava brigar e talvez fechar a porta
para futuras oportunidades.
Então passei a procurar qualquer emprego, afinal minhas economias
não me manteriam por muito tempo, tudo era muito mais caro do que na
pequena cidade onde sempre morei. Depois de várias salas de espera e
entrevistas, finalmente fui contratada em uma loja de roupas femininas em
um shopping, que para minha sorte não era tão longe de onde morava.
Comecei hoje e o horário é bom, entro mais cedo e serei responsável
por organizar e deixar a loja pronta para a abertura. Como a loja abre todos os
dias minhas folgas serão alternadas entre os dias da semana, conforme uma
escala da loja. Achei ótimo porque nos dias em que a folga for durante a
semana poderei continuar procurando outro trabalho na minha área.
Ao chegar no shopping me dirigi até a loja e encontrei a proprietária
me aguardando, e tinha mais uma moça com ela.
— Bom dia, Srta. Olivia Campbell! — Sou recepcionada pelo sorriso
da Sra. Margot Spencer, a proprietária da loja.
— Bom dia, Sra. Spencer, gostaria de agradecer a oportunidade e
saiba que vou me dedicar muito no trabalho.
— Tenho certeza de que sim, essa aqui é a Roxie, ela vai te
acompanhar no restante dessa semana, até você aprender. Pergunte tudo que
tiver dúvidas, e saiba que não espero nada menos que perfeição para que você
continue trabalhando aqui. Sua permanência na loja depende de suas vendas
na próxima semana, o Dia dos Namorados[1] é uma grande oportunidade para
nós. Já vou indo, tenho alguns compromissos e passo aqui mais tarde para ver
como as coisas estão indo.
Ela saiu pela porta da loja, me deixando sozinha com moça muito
bonita, com cabelos longos com vários tons de dourado, se vestia muito bem
e parecia muito elegante.
— Oi, Olivia, você já trabalhou em lojas antes? — Roxie se
aproximou de forma simpática.
— Não, nunca.
— E você gosta de moda?
— Gosto, mas não entendo muito.
— Posso ver pela sua roupa. Não é nada muito moderno, não é? Bom,
depois vamos ter que mexer no seu visual, vou te dar algumas dicas de como
escolher as peças, de como se vestir, e depois de como indicar as roupas para
as clientes. Mas por enquanto vamos começar com a arrumação da loja.
Me concentro no trabalho e em aprender o máximo possível de tudo
que Roxie me ensinava.
CAPÍTULO 3
OLIVIA
Dia 24/06 - Segunda-feira
No final da tarde, quase ao final do meu turno, a Sra. Margot Spencer
entrou na loja espalhando o som característico de seus saltos, ela se
aproximou de mim e falou:
— Srta. Campbell precisamos conversar, pode passar na minha sala
antes de ir embora. — Nem esperou a resposta, saiu andando a passos firmes
sobre seu enorme salto agulha.
— Nossa! Amiga, hoje essa mulher está atacada, não sei o que ela
quer, mas fica esperta, Olivia — Roxie me avisou, me deixando ainda mais
ansiosa para essa conversa.
Nos últimos meses Roxie se tornou uma amiga muito próxima, me
ajudou muito no começo. Aprendi rápido e no último mês consegui ficar
entre as maiores vendedoras da loja.
— Estou até com medo ir até lá.
— Bom, vai ter que esperar para saber. Mas mudando de assunto,
conseguiu falar com seus pais?
— Mandei outra mensagem para minha mãe, ela não respondeu. Já
cansei de ligar. Então estou mandando uma vez por semana uma mensagem
com notícias minhas, ela lê, mas continua sem responder. Sei que saí de casa
de forma muito brusca, que magoei meus pais com essa atitude, mas, poxa,
ela é minha mãe. Será algum dia eles vão me perdoar?
— Oh, amiga! Claro que vão. O tempo de cada um para aceitar as
mudanças é diferente. E quando mexe com sentimentos é ainda mais
delicado, porque o coração só cicatriza depois que a gente consegue perdoar,
e isso vai acontecer! Eles são seus pais e te amam, só devem ter ficado
magoados com a forma que você saiu de casa, que até você reconhece que
não foi legal.
— Sim, e sinto muitas saudades deles, todos os dias.
Olhei no relógio e já estava na hora de enfrentar a Sra. Spencer, então
me encaminhei para sua sala.
— Posso entrar, Sra. Spencer?
— Sim, Srta. Campbell, por favor pode se sentar. Primeiro gostaria de
te parabenizar pelos seus resultados nesse mês. Você foi muito bem, e tenho
que reconhecer o quanto melhorou nesse período. Entretanto, nos próximos
meses prevemos uma diminuição no ritmo de vendas, então vou precisar
dispensar uma das vendedoras, e será você. Não foi fácil tomar essa decisão,
mas você é quem trabalha há menos tempo aqui. Vamos fazer uma ótima
carta de recomendação e receberá todas as horas trabalhadas e um pequeno
bônus de agradecimento.
— Nossa, por essa eu não esperava! Tem alguma coisa que eu possa
fazer para a senhora reconsiderar?
— Infelizmente não. Aqui está o endereço do escritório que cuidará
dos papéis, passe lá amanhã, já te esperarão. Realmente espero que encontre
um novo trabalho bem rápido, você é uma boa funcionaria.
Me levantei e nem olhei para trás ao sair da sala, ainda analisando as
palavras que tinha acabado de escutar. O que eu iria fazer agora? Terei os
valores da rescisão e o restante das minhas economias para me ajudar por
algum tempo, mas com certeza não será muito tempo, porque só trabalhei na
loja por quatro meses. Quando voltei para o salão de vendas meus olhos já
estavam cheios de lágrimas que eu tentava segurar. Mas não estava sendo
fácil.
— Amiga, que cara é essa o que aconteceu? — Roxie veio em minha
direção com os braços abertos para me envolver.
— Ela me demitiu, disse que precisava dispensar uma de nós e fui eu.
O que eu vou fazer agora, Roxie?
— Agora vai para casa descansar, levanta essa cabeça, porque você
vai conseguir outro emprego. Você tem que pensar positivo. Limpa esse
rosto.
— Obrigada pelas palavras, mas foi tão difícil conseguir esse
emprego, e agora vou começar aquela via-sacra de novo.
— Dessa vez vai ser mais fácil, acredite. Mas vou sentir tanto a sua
falta aqui. — Ela me soltou, limpou minhas lágrimas e nos despedimos.
Saí do shopping bastante triste, por sorte o metrô não demorou
chegar. À noite, em casa, senti meu celular vibrar. Busquei o aparelho para
ver se finalmente minha mãe respondeu uma de minhas mensagens, mas
encontrei uma mensagem da Roxie.

Roxie:
Amiga, o marido da minha prima tem uma
cafeteria muito chique, em Manhattan. Ela tinha
comentado comigo que iriam contratar, então mandei
mensagem para ela e falei de você. O salário não é
igual ao daqui, porque não tem comissão de vendas,
mas tem gorjetas, e pelo menos você não fica sem
nada. Depois pode encontrar outro emprego com calma.
Ela não prometeu nada, mas disse para você ir lá
conversar com o Lewis, que é marido dela, amanhã. O
que você acha?

Olivia:
Maravilhoso! Nem sei como te agradecer, Roxie,
muito obrigada!
Com certeza vou sim. Não posso ficar sem
trabalhar.

Roxie:
Que bom!
Daqui a pouco te passo o endereço, estou
esperando que ela me responda.
Beijinhos e boa sorte, amiga!

Em alguns minutos recebi uma mensagem com o endereço e o


horário, como é bom ter amigos que se preocupam conosco.
CAPÍTULO 4
OLIVIA
Dia 01/07 - Segunda-feira
Hoje é meu primeiro dia de trabalho na cafeteria. Quando vim para a
entrevista, não fiquei com muitas esperanças, porque não tinha experiência
em ser garçonete, ou com serviços de mesa, mas a indicação da Roxie contou
a meu favor.
A cafeteria ficava mais longe de casa do que o shopping, mas parecia
um bom trabalho. Ficava em um local com muitos prédios de escritórios, o
Lewis me disse que era o maior centro empresarial da cidade. As pessoas
andavam muito elegantes por aqui, homens de terno, e as mulheres pareciam
usar roupas que custavam mais que um mês do meu salário.
A cafeteria tinha um misto diferente de atendimentos, que incluía
serviços de mesas e também cafés rápidos para viagem, igual àquela rede
famosa de cafeteria, a fachada e logomarca da Star Cappuccino´s eram
vermelhas, mas sempre que olho para o desenho dessa mulher de cabelos
longos na fachada, me lembro da concorrente verde. O Lewis me disse que
foi inspirada na esposa dele, mas achei estranho porque o cabelo dela é bem
curtinho.
Meu primeiro dia começou agitado, ainda não sabia ao certo o que
fazer, o atendimento precisava ser bem rápido, acompanhei o preparo dos
cafés para a viagem enquanto tentava decorar os ingredientes de cada um.
Parecia tão simples quando estava do outro lado balcão fazendo o pedido.
Os clientes com cara de escritório entravam, faziam seus pedidos e
esperavam que o café estivesse pronto assim que terminavam de fazer o
pagamento, mais de um minuto de espera gerava um mau humor. Olhei para
o salão e vi várias cabeças abaixadas mexendo em seus celulares enquanto
aguardavam seus cafés, todos pareciam muito ocupados deveriam estar
trabalhando, ou será que estavam olhando suas redes sociais?
Em meio a tantas novidades, meu olhar foi capturado pela a porta,
assim que mais um homem de terno entrava na cafeteria, mas a diferença era
o recheio desse terno! Valha-me, Deus! Foi difícil segurar a baba na boca,
olhando de baixo para cima analisei os sapatos pretos, limpos e brilhantes
num modelo clássico; o terno ajudando a marcar seu corpo bem definido,
mãos enormes, alto — meus olhos demoraram a alcançar seu rosto —
maxilar quadrado, lábios que pareciam desenhados, olhos escuros,
sobrancelhas grossas da mesma cor do cabelo avermelhado.
— O que vai nesse café, já fizemos um desses hoje — Carrie me
questionou para saber se estava aprendendo os preparos das bebidas. —
Olivia, você está prestando atenção?
— Hem?! — respondi totalmente desconcentrada. — O café sim, qual
é mesmo o pedido?
Continuei tentando prestar atenção em Carrie enquanto ela fazia o
café, mas não conseguia tirar os olhos dele.
— Ah! já sei o porquê você perdeu a concentração — Carrie falou de
forma zombeteira. — O super gato ali, vem aqui todos os dias, mais ou
menos nesse horário. No começo ficava igual você, mas ele nem olha para a
gente ao fazer o pedido.
— Nossa, bonito desse jeito e mal-educado?
— Não chega a ser mal-educado, mas não é simpático. — Ela olhou
para o café que estava preparando e depois para a fila do caixa. — Está vendo
o moço que entrou com ele?
— Sim, também é muito bonito. Só tem homem bonito nesse lugar?
— Não deixa o Lewis te escutar, ele fala que não é para a gente ficar
dando trela para os clientes, que é para concentrar no trabalho. — Ela
balançou a cabeça em sinal negativo e chamou o cliente para pegar o café —
Camille, um capuccino com chantily, certo?
A cliente confirmou com a cabeça, sem tirar os olhos do celular e
levantou a mão para pegar o café. Carrie encaixou o café na mão da cliente,
pegou o próximo pedido e continuou a falar comigo.
— Então, o moço que entrou com o super gato é amigo dele, às vezes
eles vêm juntos aqui, mas são bem diferentes, já está chegando a vez deles.
Presta atenção como fazem os pedidos. — Esse pedido ela fez bem rápido e
já chamou o cliente para pegar. — Alex, um expresso duplo.
O cliente pegou o café e Carrie continuou preparando rapidamente, os
pedidos. Os dois bonitões chegaram no caixa, o primeiro a pedir foi o ruivo
super gato.
— Eu quero um capuccino com duplo expresso para a viagem, nome
Henrik.
Ele entregou uma nota para a Marcy, a moça que estava no caixa
nessa manhã, pegou o troco e foi até a parte do balcão onde são entregues os
pedidos. Antes do ruivo sair o outro bonitão já começou a conversar com a
Marcy.
— Bom dia, linda, hoje você parece mais bonita. — Marcy abriu um
largo sorriso. — Hoje eu quero um expresso, e o que você me indica para
comer?
— Bom dia, Erick, os Muffins acabaram de sair do forno. Pode ser?
— Aceito sua sugestão. — Ele entregou uma nota. Quando ela
devolveu o troco, Erick colocou algumas moedas no pote de gorjetas que
ficava ao lado caixa, foi para perto de onde os cafés eram entregues e
continuou sua conversa com o ruivo.
Carrie finalizou o próximo pedido e olhou para mim, não disse nada
porque os dois estavam muito próximos.
Depois de dois pedidos, ela chamou Henrik, entregou seu capuccino,
ele pegou o copo, ensaiou um sorriso que acabou mais rápido que um piscar
de olhos e saiu da cafeteria. Erick se aproximou do balcão, ele devia saber
que seu pedido seria o próximo.
— Oi, Carrie, tem amiguinha nova no pedaço? — Achei engraçado,
ele falava como se tivéssemos nos encontrado num churrasco no sábado à
tarde.
— Oi, Erick, essa é a Olivia, ela está começando a trabalhar aqui hoje,
então não assusta a garota. — Carrie respondeu com tom zombeteiro como se
fossem amigos próximos.
— Que isso, Carrie, você sabe que sou cara legal. Nunca ia assustar
uma moça bonita dessas.
— Aqui está seu pedido.
— Beijos, meninas, e bom dia. — Ele pegou o café saiu sorrindo.
Através da janela o vi encontrar seu amigo e começaram a caminhar
juntos.
— Viu a diferença? Tudo bem, o Erick é um cliente raro, parece que o
bom humor dele nunca acaba, e ele ainda quer espalhar isso para o mundo.
Com esse jeitinho brincalhão dele, todas às vezes que vem aqui nos faz sorrir.
— Ela me estendeu o pedido para que eu entregasse ao cliente.
— Ana, um chocolate quente e dois cookies de aveia. — A cliente
sorriu, pegou o pedido e foi embora. — Eles são bem diferentes mesmo, mas
o ruivo… como é bonito.
O restante do dia passou rápido. Aprendi o processo de preparo de
vários cafés, algumas regras de funcionamento do local, o cardápio para
oferecer no almoço, entre tantas outras novas rotinas.
Saí feliz ao final do dia, fui bem recebida pelas outras funcionárias,
experimentei umas coisas muito gostosas e acho que vou me adaptar rápido
ao novo trabalho.
CAPÍTULO 5
OLIVIA
Dia 09/10 - Quarta-feira
— Anna, um capuccino gelado — chamei ao terminar mais um
pedido.
Me acostumei rapidamente à rotina na cafeteria, e gostei mais do que
achava ser possível, isso ajudava muito, pois tenho trabalhado muitas horas
para conseguir me manter nessa cidade.
Gostava de ver as pessoas entrando e saindo a todo o momento,
alguns turistas falando em idiomas irreconhecíveis e com sotaques
engraçados. As pessoas que trabalhavam no café eram muito legais, fiz novas
amizades, principalmente com a Carrie.
Também tem tinha um motivo especial para ter gostado tanto de
trabalhar aqui nos últimos meses, a hora mágica do meu dia, quando o ruivo
de gelo entrava pela porta. Esse apelido começou porque ele nunca sorri, um
dia Carrie o chamou assim e acabou pegando. Assim todas as atendentes se
referiam à ele assim e precisámos nos policiar para não o chamar pelo
apelido. Embora eu achasse que algumas camadas de gelo tenham se
derretido nos últimos dias.
Depois que o atendi algumas vezes no caixa da cafeteria, passei a
sorrir e dizer “Bom dia Henrik”, antes que ele tenha feito o seu pedido.
Quando percebi que ele se acostumou com a saudação, acrescentei mais uma
parte: “Bom dia Henrik, vai querer um capuccino com duplo expresso?” Ou
então “O mesmo pedido de sempre?” Ele sempre respondeu educadamente,
com aquele sorriso de um milissegundo.
Nos últimos dias percebi que forçava os olhos no meu crachá e até
chegou a dizer:
— Obrigado, Olivia — Depois que entreguei seu troco.
Quase não dormi à noite de tanta felicidade. Sei que ele nunca vai
olhar para mim de verdade, sempre verá apenas uma caixa de pagamentos,
que se fosse eletrônico seria melhor, assim evitaria o contato humano.
Mesmo assim, ouvir meu nome saindo de sua boca algumas vezes me deixou
muito feliz.
Hoje Carrie estava no caixa e eu fazendo os cafés, gostava dessa
parte, tenho até arriscado algumas criações e sugeri ao Lewis colocar no
cardápio. Enquanto fazia os cafés, ficava de olho na porta, estava quase na
hora dele passar por aqui.
— Sarah, duplo expresso descafeina... do.
Minha voz até falhou quando o vi entrar, por alguns segundos nossos
olhos se cruzaram, foi rápido, mas tenho convicção de que ele olhou para
mim. Pelo menos eu gostaria que ele tivesse olhado.
Quando chegou sua vez de pegar o café, ele olhou nos meus olhos e
disse:
— Obrigado Olivia. — Pegou o copo e foi embora, me deixando de
boca aberta. Ele falou meu nome, sem forçar os olhos no crachá. Ele sabe
meu nome!
Logo que meu coração voltou a bater, o sorriso que carregava desde
ontem se tornava maior ainda.
— Meu Deus, Olivia, consigo ver todos os seus dentes apesar da
nossa distância — Carrie zomba. — Tudo isso por causa do ruivinho de gelo?
— Primeiro que não tem nadinha de “inho”, ele está mais para ruivão,
e é por ele também, você sabe que o considero um pedaço de mal caminho, e
agora ele sabe o meu nome. Mas estou muito feliz com outra coisa também.
Ontem minha mãe me mandou uma mensagem, e quando liguei para ela à
noite ela atendeu. Conversamos por uns quinze minutos, acho meu pai não
estava em casa. Josh, um chocolate quente.
— Que bom, espero que consigam se entender, me conta como foi.
— A mensagem dizia somente: “por favor, continue mandando
notícias”. Porque semana passada havia desistido de tentar falar com ela,
então parei as mensagens. Anne, um latte com baunilha, seus cookies estão
aqui, estão deliciosos, foi uma boa escolha. — Terminei de entregar o pedido
e continuei. — Acho que ela estava acomodada com minhas mensagens e
acabou ficando preocupada porque sumi. Quando liguei à noite, ela atendeu e
começou a chorar, pedi perdão para ela. E conversamos um pouco. Espero
que com o tempo possamos voltar a conversar normalmente.
— Eu sempre tive certeza disso, Olivia.
— Megan, um Macchiato de Caramelo e um Tost.
O restante do dia passou depressa, e hoje, era o dia que volto para
casa mais feliz desde que cheguei a Nova York. Ao sair da cafeteria e sentir a
brisa de outono soprando em meu rosto, me senti tranquila e com uma
coragem enorme para enfrentar essa cidade.
CAPÍTULO 6
Henrik McDowell
28/11 – Quinta-feira
Dia de Ação de Graças
Entrei no apartamento da minha mãe para o jantar de ação de graças,
o cheiro estava incrível! Espero que este ano ela tenha comprado a comida,
porque cozinhar não é o seu forte.
— Oi, meu filho, tudo bem? Estou com saudades, você não responde
minhas mensagens.
— Desculpe, mãe, foi muito corrido nos últimos dias, muito trabalho
nesse fim de ano.
— Isso você sempre diz, desde que saiu da faculdade só repete essa
frase: “Muito trabalho, mãe” — ela diz tentando imitar a minha voz. Eu a
abraço e a levanto do chão.
— Mãezinha, sabe que te amo, me desculpa.
— Tudo bem, mas para te desculpar você fica me devendo um
almoço, certo? Eu escolho o dia, e quero num final de semana, para você ter
tempo para mim.
— Combinado! Precisa de ajuda na cozinha?
— Sua? Claro que não. Parece um macaco em loja de louça quando
entra na cozinha.
— Olha que posso te surpreender! Morar sozinho faz a gente aprender
muitas coisas. Vamos lá, quero abrir esse vinho. O Dylan já chegou?
— O seu irmão está na cozinha com a namorada, ouviu?
NAMORADA. Quando você vai me apresentar uma?
Fui para a cozinha fingindo que não ouvi sua última pergunta, ela
sabia que eu tinha ouvido, e que não queria falar sobre isso. Minha mãe
sempre me cobrava uma namorada, mas ainda não encontrei alguém. Não
acho muito fácil procurar, porque não gosto de baladas. Também não me dou
bem com aplicativos de namoro, parecem um cardápio de pessoas, e apesar
de conhecer vários casais que se conheceram desta forma, para mim não
serve.
Os meus sócios sempre me convidavam para festas, às vezes os
acompanhava, mas não tenho o modo caça ativado vinte e quatro horas por
dia como o Erick e Mark, que não podiam ver um rabo de saia.
Para mim, essas coisas precisam acontecer naturalmente, e precisa ser
especial, não sei explicar direito, afinal nunca tive muita sorte com garotas.
Na escola sempre se referiam a mim como o nerd ruivo, e não era um
elogio. E como os nerds, meu lugar era bem longe das garotas bonitas e dos
caras populares. Nessa fase tive algumas amigas, mas nenhuma namorada. E
minha fama de nerd não me ajudou a conseguir um par para o baile de
formatura, que fui sozinho.
Na faculdade as meninas preferiam os rapazes dos times de football,
elas queriam ser as namoradas dos astros da NFL[2], levei tantos foras no
primeiro ano, que desisti. No segundo ano na faculdade comecei a cuidar de
mim, ir à academia e correr, mas os resultados demoraram para aparecer.
Quem olha para mim agora, não imagina que fui um garoto magrelo, e não
sabem o quanto me esforcei para ser ter um corpo definido.
Entre receio de levar um fora, e a vontade de conhecer alguém
especial saí com algumas garotas, me diverti, mas ainda não senti vontade de
ter um relacionamento sério com nenhuma delas.
Mas numa coisa minha mãe tinha razão, precisava reduzir um pouco o
ritmo de trabalho. Minha rotina é bastante intensa, acordar cedo, fazer
atividade física, ir para o trabalho, passar na cafeteria da esquina para pegar
um café e depois ir para o décimo quinto andar do prédio onde trabalho, e
praticamente passar ali os meus dias.
A cafeteria da esquina! Esse tem se tornado um momento agradável
do meu dia, depois que Olivia foi trabalhar lá eu gosto a cada dia mais desses
minutinhos à espera do café. Ela está sempre sorrindo, rosto angelical, olhos
com enormes esferas verdes, tem com um corpo lindo e cheio de curvas, que
consigo ver mesmo dentro daquele uniforme sem graça, seus cabelos loiros
estavam sempre presos em um coque. Ela era persistente, foi insistindo em
demonstrar sua atenção aos meus pedidos, então comecei a chamá-la pelo
nome, assim como ela me tratava, porque me sentia desconfortável com sua
atenção. Mas agora, eu gosto como o meu nome sai boca dela. Uma pena,
porque linda como ela é, com certeza já deve ter um namorado. Sempre foi
educada, mas nunca me deu abertura para falar mais que meu pedido matinal,
e eu nunca tentei com receio de ser mal-educado.
Entrei na cozinha e encontrei Dylan com uma morena muito bonita,
cabelos negros cacheados, muito longos, escorriam por suas costas, olhos
escuros, um corpo escultural e um vestido amarelo que destacava ainda mais
a cor de sua pele bronzeada, ele me apresentou sua namorada Mandy, que
claro era modelo. Meu irmão e eu sempre fomos muito diferentes, apesar de
mais novo ele sempre foi o garoto popular na escola, então desde cedo
sempre apresentou diferentes namoradas para minha mãe.
— Como vão as coisas no studio?
Dylan tinha um studio de fotografia, trabalhava como free lance para
várias revistas de Nova York, estava começando a ficar conhecido e cada vez
mais requisitado por revistas e sites de moda. Ficava feliz por ele, que
trabalhava com o que gostava, tinha horário flexível e poderia manter seu
jeito irreverente de se vestir. Que sorte ele tinha em não precisar usar
gravatas.
— Está tudo bem, nesta época é um pouco parado, mas trabalhei
muito nos últimos meses, e para o começo do ano já tenho alguns contratos.
Antes de nossa conversa engatar, minha mãe chamou todos para a
mesa que tinha mais comida do poderíamos comer no fim de semana inteiro.
Demos graças, oramos e aproveitamos os momentos em família. Pelo menos
até começarem a fazer os planos de Natal.
— Mandy, o Dylan te convidou para o nosso jantar de Natal? —
minha mãe perguntou e olhou para mim.
— Convidou sim, Sra. McDowell, e eu poderei comparecer, mas no
outro dia vou roubar seu filho, porque toda minha família se reúne para um
grande almoço e gostaria muito que ele fosse comigo.
— Pode me chamar de Sara, querida. Fico muito feliz que você
venha, sempre gostamos da família reunida nesta data, não é mesmo, Henrik?
— Mãe, já falei que não vou mais comemorar essa data, não precisa
contar comigo.
— Meu filho, você faz muita falta, e já faz três anos… Você tem que
superar, seguir em frente.
— Mãe, chega, eu nunca vou esquecer. Se para vocês dois é fácil
fingir que nada mudou, para mim não. Tudo mudou, e não quero festejar esse
dia nunca mais.
— E quando você tiver filhos? — Minha mãe tentava me levar ao
limite.
— Não sei, mãe, talvez não tenha filhos. E acho que já vou embora,
não quero entrar nessa discussão novamente.
— Tudo bem, vamos mudar de assunto. Dylan, me conte como foi
fotografar aquela modelo famosa na semana passada?
Minha mãe fez a pergunta ao meu irmão como se não estivéssemos
em uma discussão, Mandy, a namorada, estava com olhos arregalados e em
absoluto silêncio. Meu irmão engasgou quando percebeu o que nossa mãe
estava fazendo e tentou responder à pergunta, mas sua fala saiu no padrão
resposta surpresa.
— Foi muito interessante, mãe. — Resposta que servia para metade
das perguntas do mundo.
Terminamos a refeição e saí antes da sobremesa com a desculpa de
que precisava revisar uns documentos, claro que não ia embora sem mais um
protesto de minha mãe por estar trabalhando demais, e carregando vários
potinhos com peru, molho de cranberry, purê de batatas e até a torta de
abobora que seria a sobremesa. Coisas de mãe!
CAPÍTULO 7
OLIVIA
Dia 07/12 – Sábado

Quando o alarme tocou, acordei contrariada, mais um longo dia pela


frente. Me levantei rápido porque não tinha tempo a perder, já coloquei o
despertador no horário limite. Levantei me rápido, tomei um banho, me
arrumei e saí rápido para minha jornada. Às vezes chego a questionar o que
estou fazendo aqui sozinha, morando nesse lugar perigoso, longe dos meus
pais, mas bastava pensar nos arranjos de casamento que eles criaram que me
conformo com a vida que estou levando.
Ao chegar na rua sou recebida por uma lufada de ar frio, o inverno
veio com tudo neste ano! Me apressei em meu caminho e passei por um
tapume de uma construção a menos de um quarteirão da minha casa, a
calçada estava lotada de pessoas que andavam nos dois sentidos, procurando
meu espeço para passar me aproximei da parede provisória. Quando cruzei
com um rapaz que estava com cachorro enorme e com uma boca que caberia
meu braço, me aproximei ainda mais da parede de madeira e minha bolsa se
prendeu a um prego e rasgou. Mas não foi um buraquinho, todas as minhas
coisas se espalharam pelo chão, sem chance de continuar assim.
— Droga, vou ter que voltar em casa para encontrar outra bolsa!
Recolhi as coisas da calçada, deixando algumas moedas para traz e
voltei correndo. No prédio, subi as escadas de dois em dois degraus, nada
parecido com uma dama. Optei por uma bolsa rosa, quem sabe alegrava mais
o meu dia. Saí do apartamento e antes de chegar à porta fui interceptada pelo
meu senhorio.
— Olivia, como você está?
— Tudo bem, sr. Joe, só com pressa, não posso me atrasar para o
trabalho.
— Vai ser rápido só quero avisar que no próximo mês o aluguel vai
subir quinze por cento, e já sabe, se não ficar satisfeita saia antes de vencer o
mês, se não quiser ver suas coisas no meio da rua.
— Mas quinze por cento? Isso é muito, não estava esperando, e nosso
aquecedor nem está funcionando, está muito frio esses dias.
— Andei pesquisando preço de aluguéis na região e descobri que
estou cobrando muito barato pelos quartos. Se está com frio, compre um
cobertor elétrico! Já sabe as regras. — Ele virou e entrou em seu
apartamento.
Não tive tempo de responder que já tinha um cobertor elétrico, mas
quase congelava para chegar até ele. Saí correndo em direção à estação, nem
podia pensar nessa conversa agora, se perdesse o próximo trem chegaria
muito atrasada.
Cheguei à estação e vi o trem na plataforma, acelerei meus passos e
quando faltavam apenas dois passos, a porta se fechou na minha frente.
— Droga, droga, o que eu faço agora?
O próximo trem saía em quarenta minutos, não podia esperar. Voltei
para a rua e chamei um motorista pelo aplicativo, que informou que o tempo
estimado de chegada até o destino seria de trinta minutos. Ótimo, vou pagar
caro, mas vou chegar mais cedo do que se tivesse conseguido pegar o trem.
Depois de quinze minutos dentro do carro ouço o motorista falando
um palavrão.
— O que aconteceu, senhor?
— Olhe no seu aplicativo, teve um acidente na ponte e o trânsito está
muito lento.
— Droga, só pode ser brincadeira!
Quando a pressa é grande, os minutos correm mais rápido e a
sensação de desespero começou a tomar conta de mim.
Acabei chegando ao trabalho com quarenta e cinco minutos de atraso.
— Olivia, já estávamos preocupadas, o que aconteceu?
— Longo dia, Carrie, vou me trocar e virar uma linda noelete.
— Não pense que porque hoje é sábado, que não vi seu atraso, Olivia,
você sabe que vou descontar do seu salário, não é? — Ouvi a voz de Lewis
atrás de mim.
Me apressei em me trocar, e para piorar como era sábado não veria
meu ruivo hoje. Nos últimos meses ele foi minha alegria matinal, durante a
semana, principalmente depois que aprendeu meu nome e seus sorrisos
passaram a durar mais de um segundo.
Com meu uniforme de Natal, cheguei ao atendimento.
— Vou aproveitar que está tranquilo e vou até o depósito, preciso
conferir alguns itens para o Lewis fechar o pedido para os fornecedores.
Nesse frio sempre vendemos mais.
Carrie tinha razão, o sábado estava atipicamente sem movimento e
enquanto usava essa fantasia ridícula, mas bem-comportada, me perdi em
devaneios, ficando bastante distraída quando ele entrou pela porta. A minha
reação foi automática e levantei o corpo, um sorriso nasceu no meu rosto e
tudo o que vi em minha frente foram os olhos escuros, cabelos ruivos e
dentes muito bancos.
— Bom dia — ele diz sem o sorriso que andou ensaiando nas últimas
semanas, acho que ele ficou chateado de trabalhar no sábado, mas para mim
foi um presente, e vê-lo sem o terno, foi ainda melhor. A camiseta justa, mas
não colada, deixava visível seu corpo bem torneado. O jeans se ajustava tão
perfeitamente que parecia ter sido feito para ele, a barba por fazer deixava
claro que não era dia de trabalho e completava o visual casual, mas muito
charmoso.
— Bom dia, Sr. Henrik, vai querer o de sempre?
— Não Olivia, hoje preciso de mais cafeína. Quero um café
macchiato com expresso triplo e hoje quero um desses cookies, o cheiro está
ótimo.
— Eles acabaram de sair do forno! O café é sem açúcar, certo?
— Isso mesmo.
Ele abriu um grande sorriso, o melhor momento do meu dia, fez o
pagamento e fui para a máquina para preparar o pedido. Entreguei, ele
agradeceu e saiu da cafeteria junto com um suspiro que saiu dos meus lábios.
A manhã passou rápido, poucos clientes, mas constantes. Quando
Carrie voltou do depósito até estranhou o silêncio do lugar. Agora seríamos
duas noeletes, pelo menos não passaria vergonha sozinha. Logo depois que
minha colega voltou o movimento aumentou com os lanches do almoço e
nem tivemos tempo de conversar.
Por volta das treze horas, fiz um intervalo, peguei meu celular e vi
três chamadas perdidas. Tentei abrir minhas mensagens, mas o aparelho
voltou a vibrar em minhas mãos, o mesmo número das chamadas perdidas.
— Senhora Olivia?
— Sim, sou eu.
— Meu nome é Dana Felps e sou consultora de segurança de sua
empresa de cartão de crédito. Estou ligando para informá-la que seu cartão
foi clonado, mas nosso sistema de segurança conseguiu impedir que compras
fossem realizadas. Seu cartão foi cancelado e vou estar enviando um novo,
que deve chegar em vinte dias.
— Vinte dias? Como vou fazer as compras de Natal? Estava contando
com ele para comprar alguns presentes.
— Sinto muito, senhora, não há nada que eu possa estar fazendo. Boa
tarde.
O que mais faltava acontecer hoje? Melhor não perguntar, a resposta
poderia vir de uma forma que não vou gostar.
Apesar das minhas desconfianças a tarde foi bem tranquila, aos
sábados saía um pouco mais cedo, então às cinco horas, saí da cafeteria
apressada, a estação de trem ficava a quatro quarteirões e tinha cinco minutos
para chegar até lá. Depois de um dia com desventuras em uma sequência
incredível, só faltava meu trem passar adiantado — algo que nunca acontecia
— e eu ter que esperar mais quarenta minutos pelo próximo.
Andei rápido e olho para os dois lados em uma esquina não vi
nenhum carro e comecei a atravessar a rua, no meio do trajeto senti uma
pancada em meu corpo. Me vi em câmera lenta atingir o chão e tudo fica
escuro.

Acordei, mas não consegui abrir os olhos, a primeira coisa que pensei
foi “por que será que o despertador não tocou?” De olhos fechados comecei a
me lembrar do dia que tive, de sair da cafeteria e de sentir um impacto. Meu
Deus! Eu morri. Acho que não porque estou ouvindo muitas buzinas, no céu
não deve ter buzinas.
Queria abrir os olhos, mas tinha um medo enorme de abri-los.
Vagarosamente afastei minhas pálpebras, minha visão foi entrando em foco e
vi um carro, devagar virei o rosto e vi um anjo, um anjo ruivo olhando para
mim, bem perto do meu rosto, realmente eu morri e fui para o céu.
CAPÍTULO 8
Henrik
07/12 – Sábado
Geralmente não trabalho aos sábados, com as bolsas de valores
fechadas meu mundo ganha um pouco de paz. Hoje era um dia atípico,
precisava ir ao escritório finalizar a análise de uma empresa na qual um de
nossos clientes queria investir, antes da aquisição de uma grande quantidade
de ações, ele queria ter a segurança de que faria uma boa escolha, e uma parte
do meu trabalho entrava aí.
Depois de passar na cafeteria da esquina para pegar meu café, e ver o
lindo e delicado sorriso de Olivia, cheguei ao escritório que estava vazio e
silencioso, assim poderia me vestir de forma casual sem me preocupar em
usar aquela gravata irritante.
O andar todo era ocupado pela minha empresa, a Four K's Darings
Investments, quer dizer, não só minha, somos quatro sócios, garotos que
saíram da faculdade e resolveram ousar no mercado financeiro. Temos
formações diferentes, temperamentos diferentes, gostos diferentes, origens
diferentes, mas de uma forma improvável funcionamos muito bem juntos.
E foi por isso, e com um pouco de sorte, que conseguimos crescer
tanto. Em dez anos nossa empresa passou de um cômodo na casa de Erick,
um dos sócios, para um andar inteiro num dos endereços empresariais mais
elegantes de Nova York. E nossa amizade cresceu ainda mais nesse período.
Entrei na minha sala e olhei para janela, a vista daqui é linda, apesar
de muitos prédios ao redor conseguia ver muito longe, pena que poucas vezes
parava para observar. Voltei à minha mesa e me concentrei numa infinidade
de documentos. Traduzir os números em fatos é minha especialidade, e eu
gosto, desvendo e transformo em palavras simples o real significado de tantas
planilhas e relatórios, tinha um talento especial em encontrar informações
contraditórias, o que na maioria das vezes era uma tentativa de esconder a
verdadeira posição econômica de uma empresa.
Me concentrei tanto no trabalho que esqueci do mundo, quando olhei
as horas já eram cinco da tarde. Merda! Esqueci que tinha combinado de
encontrar minha mãe para um almoço, tínhamos marcado às duas da tarde.
Ela com certeza está uma fera comigo.
Juntei alguns documentos, desliguei o computador e conferi o
telefone enquanto aguardava o elevador. Cheguei à conclusão de que minha
mãe realmente estava brava! Eram oito chamadas não atendidas e doze
mensagens no WhatsApp, li as mensagens enquanto o elevador descia.
Cheguei à garagem, entrei no carro e conectei o telefone no sistema de áudio,
assim que saí da garagem, liguei para ela.
— Alô, mãe?
— Seu desnaturado, você não tem respeito com a sua mãe, promete
almoçar comigo e me deixa esperando no restaurante e nem me manda uma
mensagem dizendo que não poderia ir. Se tivesse me mandado uma
mensagem eu estaria brava, mas me deixou esperando e não atendeu meus
telefonemas então estou furiosa. Não pense que só porque tem esse seu
tamanho enorme que não vou te dar umas chineladas. Seu mal-educado, não
foi assim que te eduquei. A sua vida gira em torno do trabalho, seu mundo é
o trabalho, e as pessoas, não tem espaço na sua vida?
Saí da garagem, o trânsito estava tranquilo nesta parte da cidade,
afinal vários escritórios não abriam aos sábados, me mantive na avenida por
mais dois quarteirões onde viraria à direita.
— Calma, mãe, me desculpe, eu estava trabalhando, você sabe que
quando me concentro esqueço de tudo, meu celular estava no silencioso para
não me incomodar enquanto trabalho. Me perdoa, mãezinha.
— Você acha que só falando com esse dengo vou te desculpar?
— Puta merda!
— Henrik, que barulho foi esse? Henrik você está bem? Henrik não
me deixa falando sozinha...
Ao virar a esquina não vi uma pedestre, não estava rápido, mas não
deu tempo de frear e só senti seu impacto em meu carro. Desci correndo
enquanto ouvia os gritos da minha mãe nos alto-falantes do carro.
Quando cheguei à frente do veículo vejo cabelos loiros espalhados no
chão, me aproximei e tirei as mechas de seu rosto.
— Olivia. Olivia, fala comigo!
A atendente da cafeteria estava desacordada. Não podia acreditar que
eu conhecia a pessoa que atropelei. Preferia tê-la encontrado em outra
situação em que poderia aproveitar sua voz, seu sorriso, conversar com ela.
Mas consegui estragar tudo até sem abrir a boca. Esperava que não fosse
grave, minha cabeça funcionou rápido com mil pensamentos correndo e se
chocando, assim como a imagem de Olivia na frente do carro.
Voltei para o veículo e peguei meu celular, algumas pessoas
começaram a se aproximar e antes que a movessem eu gritei:
— Ninguém toca nela, estou chamando uma ambulância.
— Henrik, o que aconteceu? — Minha mãe ainda estava na linha.
— Mãe, atropelei uma garota, preciso tomar providências, te ligo
depois.
Desliguei o telefone sem nem mesmo escutar sua resposta e liguei
para o número da emergência enquanto voltava para frente do carro, passei o
endereço e informei que a vítima estava desacordada. Pedi para um senhor
que se aproximou para me ajudar a sinalizar o local, e evitar outros acidentes,
ele foi até o porta-malas do meu carro e tirou os equipamentos de segurança,
sinalizando à nossa volta.
Me concentrei em Olivia, ela parecia tão frágil e ainda tão linda. Por
que não prestei mais atenção ao virar a esquina? Tudo que eu queria era que
ela acordasse.
E se passaram longos minutos de agonia enquanto seus olhos estavam
fechados e a ambulância com paramédicos não chegava. Não tirei os olhos
dela, tinha medo de tocá-la e machucá-la ainda mais. Observei quando ela
abriu os olhos, fiquei imensamente feliz, me aproximei de seu rosto para
ouvir o que ela sussurrava.
— Eu morri. E você deve ser um anjo com o rosto dele, pode me
responder por que o céu tem tantas buzinas?
Ela não estava bem, acordou, mas arrastava as palavras e dizia coisas
sem sentido: “o rosto dele”? O que ela está vendo? Quem achou que eu sou?
Talvez tenha me confundido com seu namorado. Não gostei dessa última
ideia, mas não dou tempo para me apegar a ela.
— Olivia, você não morreu. Me chamo Henrik, nos vemos na
cafeteria, você lembra? Não se mexa, tudo bem?
Não deu tempo de ouvir sua resposta, o resgate chegou e os
paramédicos logo me afastaram. Eles a imobilizaram e colocaram-na em uma
maca. Meu coração se apertou ao ver aquela cena, como eu pude causar isso?
Tentei entrar na ambulância com ela, mas não deixaram. Eu teria que esperar
a polícia para dar meu depoimento. Mas nem por um instante eu tiraria os
olhos dela, eu era responsável por ela, pelo menos até que chegasse algum
familiar.
Voltei para carro e segui a ambulância até o hospital. Tive muita sorte
de encontrar uma vaga bem próxima, ainda conseguia ver quando tiraram sua
maca da ambulância e correndo cheguei à recepção do hospital junto com ela.
Me posicionei ao lado da maca enquanto aguardava o médico, tudo
era muito lento, nada parecido com a correria dos hospitais de seriados. Duas
enfermeiras vieram com uma maca do hospital, mais larga que a da
ambulância e trocaram Olivia de lugar, os paramédicos voltaram para a
ambulância e as enfermeiras a estavam levando para outra sala, e eu segui
acompanhando.
Quando cheguei perto vi que Olivia estava acordada, mas não falava
nada, apenas olhava para cima.
— O senhor é da família? — uma delas perguntou e eu sabia que se
dissese que não, nunca me deixariam acompanhá-la. Então respondi firme.
— Sim. — Não entrei em detalhes, esperaria a próxima pergunta, que
não veio. A enfermeira fez uma cara de desconfiança, franziu a testa, me
encarou com olhos semicerrados, e depois deu de ombros como se não se
importasse. Olivia arregalou os olhos, mas se manteve em silêncio.
— Os paramédicos disseram que ela está estável, então vai ficar na
sala de observação até o médico vir examiná-la. Você pode ficar com ela por
enquanto — a enfermeira me explicou ao mesmo tempo que empurrava a
maca.
Chegamos a uma sala com várias macas, uma ao lado da outra, todas
estavam ocupadas, o ambiente era pesado e os rostos ao meu redor
demonstravam dor e tristeza.
Esperamos por uma hora em silêncio, não sabia o que dizer para ela.
Que tal: “ei, me desculpa, eu quase te matei” ou talvez “eu te vejo todos os
dias, mas não queria te atropelar”, tinha uma melhor “oi, acho legal que você
se lembre do café que eu gosto”. Todas as frases que vinham na minha
cabeça pareciam ridículas. Não tinha a menor ideia de como começar essa
conversa. Então me senti aliviado ao ouvir sua voz.
— Sr. Henrik, por que o senhor está aqui?
— Não precisa me chamar de senhor, de só de Henrik. E... foi eu que
atropelei você. Não a vi quando virei a esquina. Me desculpe.
— Não precisa se desculpar, foi um acidente, não de propósito, não é
mesmo? Então não precisa ficar aqui, eu estou bem, e acho que vai demorar o
atendimento, o senhor, deve ter compromissos, pode ir embora.
— E eu vou ficar, eu te machuquei, preciso ter certeza de que você
está bem.
— Eu já disse estou bem, só estou com um pouco de dor no corpo,
acho que pela pancada. E... eu também preciso ir embora, não posso ir tarde
para casa.
— Nossa, me desculpa, nem perguntei. Você quer que eu ligue para
alguém? — Perguntei me sentindo ridículo por não ter oferecido, ela poderia
querer outra pessoa com ela neste momento.
— Não, obrigada, não tenho ninguém para avisar.
— Posso ligar para os seus pais ou para o seu namorado — disse
torcendo para que não existisse um namorado.
— Minha mãe mora em outra cidade, se ligar ela vai ficar
preocupada, e não tem nada que ela possa fazer agora, prefiro ligar para ela
quando chegar em casa. Eu não tenho namorado e ninguém para ligar. Como
eu disse o senhor não precisa ficar, não quero atrapalhar sua noite de sábado.
Acho que também já vou, já faz muito tempo que estamos aqui, pode me
dizer que horas são?
Ela começou a se levantar e eu a segurei, tentando mantê-la deitada.
— Calma aí mocinha! Não pode se levantar, você bateu a cabeça e
ficou desacordada, pode ser perigoso. E por favor, não me chame de senhor,
você sabe meu nome e nossa diferença de idade não deve ser tão grande
assim.
Ela sorriu e se calou, esperamos mais meia hora até um médico
baixinho, de cabelos grisalhos e a cara fechada chegar para atender Olivia.
Ele fez algumas perguntas, olhou sua cabeça e punho que ela dizia estar
dolorido, pediu para Olivia se sentar e eu a ajudei, enquanto ele fez algumas
anotações num papel e depois proferiu:
— Você está bem, pode ir para casa. Vai ficar em repouso por vinte e
quatro horas e vou te dar uma receita com remédios para a dor. Se você voltar
a desmaiar, volte aqui.
— Espera aí, mas você nem examinou ela direito. — Eu estava
realmente irritado com descaso no atendimento, primeiro a demora e agora
esse atendimento superficial.
— Você quer exames, tudo bem, se a paciente concordar.
O médico olhou para Olivia que parecia assustada, quando ela foi se
levantar eu a amparei, ela ficara muito tempo deitada e poderia ficar tonta ao
se levantar. Segurei suas mãos e trouxe seu corpo próximo ao meu, senti o
seu calor e seu cheiro adocicado.
— Não precisa já estou bem e vou embora.
— Não, Olivia, você precisar fazer alguns exames, olha seu punho. —
Sinalizei o pulso inchado, e vi o médico se afastando para atender outro
paciente.
— Henrik, meu plano de saúde não cobre exames, não tenho como
pagar, está tudo bem, só quero ir para casa. — Ela tentou sorrir, mas não
conseguiu curvar os lábios por causa da dor.
— Pode esperar aqui só um minuto, por favor. — Ela assentiu com a
cabeça e eu fui até a recepção.
As enfermeiras digitavam algo no computador e não me olharam.
— Por favor, estou acompanhando a Srta… a minha namorada, mas
acho que houve algum erro no atendimento, ela não será atendida pelo plano
de saúde, vou pagar o atendimento dela, mas quero o melhor possível. —
Estendi meu cartão de crédito para a enfermeira.
— Só um instante, Sr. McDowell — ela disse olhando meu nome no
cartão. — Vamos verificar com a recepção e o setor financeiro.
Voltei para o lado de Olivia e pedi a ela que aguardasse só mais um
pouquinho. Ela não parecia muito bem, e mesmo assim, novamente foi ela
quem começa nosso diálogo.
— Henrik, obrigada pela companhia. E desculpa por te dar esse
trabalhão, eu me lembro que olhei para os lados, mas não vi o carro.
— Eu estava errado, deveria ter prestado mais atenção, ainda bem que
estava devagar. Mas ainda estou preocupado com você, prefiro que passe por
outro médico.
— Não! — Ela estava ainda mais assustada, o que me deixou com
mais vontade de abraçá-la e dizer que ficaria tudo bem. — Não precisa, estou
bem, já disse. Além do mais, eu já disse que não posso pagar uma consulta
dessas. Preciso ir para casa. Ai… — Soltou um gemido de dor no final da
frase.
— De jeito nenhum você vai para casa assim, você está com dor. Eu
te feri e sou responsável por você, e claro que eu vou pagar a consulta e todos
os exames que precisar. E você só vai para casa depois que tivermos certeza
de que está bem!
Apesar da preocupação com ela, achei bom passarmos mais um tempo
juntos, quem sabe eu penso em algo melhor para conversarmos sem parecer
um idiota, ainda mais sabendo que ela não tem um namorado.
CAPÍTULO 9
Olivia
08/12 – Domingo
Eu já sabia que Henrik era lindo, claro era só olhar para ele, e eu fiz
isso todos os dias da semana nos últimos cinco meses. O que nunca imaginei
foi que ele me trataria com tanto cuidado, ficou comigo durante todo o tempo
depois do acidente e estava visivelmente preocupado. Sei que esse
acolhimento era porque ele se sentia culpado pelo acidente, mas também sei
que foi exatamente isso: um acidente, que por definição é um acontecimento
fortuito, não fui minha culpa e nem dele.
Apesar de saber que esse tratamento tinha um motivo e que logo
acabaria, eu estava adorando ficar ao seu lado. Enquanto aguardávamos
atendimento, fiquei observando-o. Ver cada detalhe do seu rosto, o formato,
as sobrancelhas no mesmo tom de seu cabelo avermelhado que contrastava
com a pele clara, os olhos escuros, pequenas sardas, lábios perfeitos e o
especial do dia: o charme de sua barba nascendo, que trazia uma penugem
avermelhada para seu rosto. Um pecado de homem!
Poucos minutos depois que Henrik foi na recepção, um enfermeiro
com uma cadeira de rodas, chegou ao meu lado e me pediu que sentasse,
ainda estava um pouco tonta e minha cabeça doía, meu pulso esquerdo estava
um pouco inchado e meu corpo suplicava por uma cama apesar ter ficado
várias horas deitada nesse hospital.
Seguimos para outra ala do hospital que mais parecia um hotel,
paredes claras, luzes aconchegantes, uma linda decoração, recepcionistas
uniformizadas e com cabelos impecáveis, poucas cadeiras de espera. Eu
nunca entraria num lugar desses, e tinha muito medo de quanto ficaria a
conta, porque provavelmente não conseguiria pagar nem com muitos meses
de trabalho. O enfermeiro me ajudou a me acomodar na cadeira de espera e
foi embora levando a cadeira de rodas. Em poucos minutos a recepcionista
nos chamou.
— Senhorita Olivia Mary Campbell.
Henrik me olhou curioso e perguntou:
— Alguém te chama de Mary?
— Só a minha mãe quando está brava. — Ele sorriu, eu penso que
gostaria que sorrisse dessa forma todos os dias para mim.
— Se incomoda se eu entrar com você? Gostaria de fazer algumas
perguntas ao médico.
— Tudo bem, não me incomodo, deve ser um atendimento rápido.
Ele sorriu, mas ficou em silêncio. Não era muito fácil continuar uma
conversa com ele, não sabia o que perguntar ou sobre o que conversar, e ele
pareceu bastante reservado até o momento. Nos levantamos e enquanto
caminhávamos até o consultório senti sua mão na base das minhas costas, me
pareceu um gesto protetor, como se ele tivesse medo de que eu desmaiasse a
qualquer momento. Me acostumaria fácil com seu contato em meu corpo.
— Boa noite, sou o Dr. Andrew Jenkins, como posso ajudá-los? —
perguntou um jovem médico à nossa frente, apesar de ser muito tarde ele não
parecia cansado, e mantinha um sorriso acolhedor.
Henrik explicou para o médico tudo o que aconteceu, incluindo meu
último atendimento. O médico fez algumas anotações e depois várias
perguntas sobre como me senti.
— Muito bem, vamos fazer alguns exames para vocês ficarem
tranquilos. O senhor pode aguardar na recepção, porque não são permitidos
acompanhantes durante os exames. Assim que terminarem peço para chamá-
lo, tudo bem?
— Ok. — Ele se virou para mim e pela primeira vez olhou dentro dos
meus olhos ao falar. — Estarei aqui te esperando.
Depois disso perdi a noção do tempo, já deveria passar da meia noite.
Me espetaram, apertaram, tiraram raio X do punho, me colocaram dentro de
uma máquina, passaram uma meleca na minha barriga e fizeram ultrassom,
me deram uma injeção e quanto mais exames faziam, mais eu me preocupava
com a conta. Não tinha ideia de quanto essa conta ficaria, e nem como esse
valor impactaria as finanças de Henrik, mas era impossível não me
preocupar. Quando finalmente terminaram, e me encaminharam novamente
para o consultório.
Entrei na sala e Henrik já estava em frente ao médico, ele se levantou
e me estendeu a mão, e não soltou nem depois que já estava sentada. Só então
o médico começou a falar.
— Olivia, em um acidente como o seu temos várias preocupações,
porque a pancada pode dar início a uma série de problemas, e alguns
sintomas não aparecem imediatamente. Por isso você fez tantos exames. Os
resultados foram ótimos, seu punho sofreu só uma luxação, gelo e remédio
para dor vão ajudar, em alguns dias estará bom. As imagens do abdômen
também estão ok e na cabeça nenhuma alteração.
Ele olhou para o computador e depois voltou sua atenção para nós.
— Entretanto nosso cérebro pode ter reações diversas nos casos de
uma pancada, mesmo que não apresentem sintomas físicos, que seriam
identificados nas imagens, você pode sentir alguns sintomas como dor de
cabeça, náuseas ou vômitos, tonturas ou problemas de equilíbrio, visão dupla
ou embaçada, sensibilidade à luz e a ruídos, sonolência, confusão ou
esquecimento sobre os acontecimentos recentes. Os sintomas de uma
concussão geralmente aparecem logo após a lesão, mas em alguns casos
podem levar horas ou dias para aparecer, as primeiras vinte e quatro horas
são as mais delicadas, por isso não pode ficar sozinha. O correto seria deixá-
la em observação aqui no hospital, mas como você só apresentou dores de
cabeça, posso te liberar se prometer que não vai ficar sozinha, geralmente os
pacientes se sentem mais confortáveis em casa, o que pode ajudar na
recuperação, e se você apresentar qualquer desses sintomas voltará aqui.
— Eu realmente prefiro ir para casa — disse rapidamente, afastando a
ideia da internação.
— Ótimo, aqui está a receita de seus medicamentos, hoje já tomou
uma injeção para dor, então comece amanhã, as especificações de como deve
tomá-los estão na receita. Mais uma coisa, será normal sentir um pouco mais
de sono, pelos remédios e emoções do dia, mas observe, porque passar o dia
todo dormindo pode ser um dos sintomas que relatei.
— Obrigada, Dr. Jenkins. — Peguei a receita de sua mão, levantamo-
nos e saímos do consultório.
Durante o caminho até a porta do hospital, Henrik voltou a colocar a
mão na base das minhas costas, eu adorei essa atitude e vou sentir muita falta.
Ao chegarmos na saída tomei consciência de que chegou a hora da despedida,
apesar das circunstâncias, tinha que reconhecer que realizei um sonho ficando
ao lado dele e conversando mais do que “um capuccino com expresso duplo.”
— Henrik, muito obrigada por tudo. Sei que foi um acidente e não
precisa se preocupar, estou bem, só preciso ir para casa descansar.
— Claro, vem, vou te levar.
— Não! Não precisa posso ir de táxi.
— Não vou te deixar entrar num carro com um desconhecido a essa
hora da noite, e vou me sentir melhor sabendo que chegou bem em casa.
— Mas… Moro muito longe daqui e é um lugar perigoso, não é muito
seguro ir até lá a essa hora, ainda mais num carro como o seu, chamaria muita
atenção. Não é seguro para você, prefiro ir de táxi.
— Olivia, você comentou comigo que seus pais não moram aqui e
que não tinha ninguém para ligar. Não quero ser intrometido, mas você mora
com alguém?
— Não, eu moro sozinha.
— Você sabe que o médico só deixou você sair se ficasse
acompanhada. Você pode voltar a sentir mal estar, e pode ser perigoso não ter
alguém para socorrê-la. — Achei ter visto carinho em seus olhos, mas
poderiam ser os analgésicos já fazendo efeito. Ele respirou e continuou:
— Eu me preocupo. — Ele levou uma das mãos ao meu rosto, com
um toque suave, uma carícia. — Vou ficar com você. E realmente está tarde,
minha casa é aqui perto, você pode dormir lá hoje. Tenho um quarto de
hóspedes, você vai ficar confortável, lá também é silencioso e poderá dormir
bastante para descansar.
— Não quero incomodar, e sua namorada pode não gostar que eu
fique em sua casa — respondi rápido e em completo pânico por sua proposta.
— Não tenho namorada, também moro sozinho. Ninguém vai te
incomodar. Também não sou nenhum tipo de psicopata, pode confiar em
mim.
— Acho que não me diria se fosse um!
— Com certeza não diria, vem vamos para casa.
Novamente ele pegou minha mão e começamos a caminhar até seu
carro, não tive muito tempo para pensar em sua proposta, em minha cabeça
passavam várias ideias, prós e contra de entrar naquele carro. Mas o cansaço
e sono me venceram, e claro a curiosidade, afinal poderia conhecer um pouco
mais do homem que fazia borboletas baterem asas em minha barriga todas as
manhãs. Enquanto caminhávamos pensei que entrar no carro de uma pessoa
que não conhecia, não parecia uma boa ideia, mas ao lembrar de como ele me
tratou no hospital, toda a preocupação e cuidado também contaram que eu
enfim entrasse em seu carro sem contestar mais.
— Estou com fome, e você?
— Muita na verdade.
— O que acha de uma pizza? Já peço agora, chega rapidinho, quase
junto com a gente.
— Acho ótimo.
— E qual sabor você prefere?
— Gosto de todos, mas está tarde, prefiro algo mais simples, como
Marguerita.
— Ótimo, também gosto muito.
Percorremos alguns quarteirões e paramos em frente a uma farmácia,
Henrik pediu a receita e não me deixou descer do carro, voltou rápido com
uma sacolinha com várias caixinhas dentro, sem tirar aquele maldito sorriso
charmoso do rosto, me entregou o pacotinho e seguimos.
O apartamento realmente não era longe, o carro entrou em uma
garagem subterrânea e logo estávamos no elevador. Henrik apertou o botão
do vigésimo quinto andar, o último botão do painel. O elevador abriu as
portas em um hall muito claro, decorado com um espelho, um aparador de
vidro e um vaso de orquídeas, uma única porta no andar. Ele abriu a porta e
fez sinal para eu entrar.
— Entre, e seja bem-vinda à minha casa.
Meus olhos correram pela sala, que era bem maior que o studio onde
eu morava, o teto alto, paredes claras, ao fundo uma lareira, e uma decoração
bem masculina com cores escuras em tons de preto e branco, os móveis
transmitiam uma sensação de aconchego e praticidade. Me aproximei da
janela e a vista era deslumbrante, eu podia ver as muitas luzes daqui, como se
observasse milhares de estrelas abaixo de nós. Senti a presença de Henrik
atrás de mim.
— Isso é lindo, essa vista é maravilhosa.
— Escolhi esse apartamento por causa da vista, mas agora, quase
nunca tenho tempo para parar e observar. Vem, vou te mostrar o quarto onde
você ficará essa noite.
Ele tomou minha mão e andamos pelo enorme apartamento, subimos
uma escada que nos levou a um corredor cheio de portas que estavam
fechadas. Meu anfitrião abriu uma porta e me puxou para dentro, o quarto
também era maior que a caixinha fósforo que chamava de lar, quantos studios
como o meu caberiam naquele apartamento? O ambiente era aconchegante,
paredes claras, uma cama com edredom e almofadas brancas e azuis, que
combinavam com o papel de parede ao fundo da cama que estava arrumada
igual às revistas de decoração, duas mesas ao lado cama, e uma televisão na
parede completavam um ambiente simples, mas muito elegante.
— Uau. Esse quarto é lindo.
— Fique à vontade, no banheiro tem toalhas e outras coisas que você
possa precisar. Não que eu receba muitas visitas, mas o quarto está sempre
pronto.
Antes dele sair ouvi o interfone tocar.
— Nossa pizza chegou, prefere comer ou tomar um banho primeiro?
— Comer, depois tomo um banho e durmo. Vou lavar as mãos e te
encontro na sala.
Ele me deu uma piscadinha sedutora e se retirou do quarto. Entrei no
banheiro e outra surpresa, nunca estive num banheiro tão luxuoso. Localizei
as toalhas, lavei minhas mãos e meu rosto.
Me dirigi até a sala e ouvi Henrik me chamar. Sigo sua voz até a
cozinha, e oh! Achei meu novo cômodo favorito na casa, acho que não vou
parar de me deslumbrar por seu apartamento. Olhei para Henrik e ele sorria,
não sabia se sorria para mim ou de mim, preferi escolher a primeira opção.
— Venha, está quentinha.
— O cheiro está ótimo, adoro o cheirinho do manjericão. — Digo me
aproximando da bancada e sentando em um banco alto.
— Estava pensando, vou pegar uma camiseta para você dormir mais
confortável.
— Não quero incomodar mais.
— Não é incomodo nenhum, aliás, estou gostando da companhia para
o jantar — ele disse olhando para a pizza à sua frente. Ele pareceu pouco à
vontade em dizer essas palavras, o que me deixava na dúvida se estava sendo
sincero.
— Obrigada, também estou gostando muito. Posso te fazer uma
pergunta pessoal?
— Pode perguntar, preciso ter medo?
— Não. — Comecei a rir. — Sempre quis saber sobre seu nome, ele é
um pouco diferente, tem alguma história?
— Sim, é o nome do avô do meu pai, eles eram bem próximos e
quando nasci ele fez uma homenagem. A história que eu ouvia quando era
pequeno era que meu bisavô saiu da Noruega em 1938, ele tinha receio de
uma invasão Alemã ou Russa e ele dizia que não queria receber ordens de
estrangeiros e nem ir para a guerra. Então pegou a esposa e um filho pequeno
e fugiu para a América, meu avô foi o terceiro filho e já nasceu aqui. E o
Henrik original tinha razão, o país foi invadido pelos Alemães dois anos
depois.
Conversamos mais um pouco enquanto comíamos. Falamos sobre
pizza, a cidade, o clima, nada sério e muito menos íntimo, mas estávamos à
vontade. Depois de comer, colocamos a louça na máquina, e voltei para o
quarto. Antes de entrar no banheiro ouvi batidas na porta, abri. Henrik estava
com uma camiseta nas mãos e me estendeu com um sorriso.
— Para você ficar mais à vontade, amanhã pode deixá-la aqui. Meu
quarto é naquela porta, se precisar de qualquer coisa, por favor, me chame.
Agradeci, fechei a porta, e fui tomar um banho. Um banho delicioso,
com jatos de água quente e forte que ajudavam a relaxar depois de um dia tão
longo e tenso. Vesti sua camiseta com leve cheiro de amaciante, conferi se as
cortinas estavam fechadas e me aconcheguei na cama macia entre várias
camadas de edredom, lençóis e almofadas. Comecei a me lembrar do meu dia
e como vim parar aqui, mas o sono foi mais forte e adormeci me sentindo
abrigada e envolvida pelo calor afável dos tecidos.
CAPÍTULO 10
HENRIK
Dia 08/12 – Domingo

Dormir sabendo que Olivia estava tão perto de mim, não foi nada
fácil. Assim como foi difícil disfarçar minha felicidade quando ela aceitou vir
para minha casa, amanhã vou tentar fazê-la ficar um pouco mais, afinal, ela
precisa de cuidados, e eu gosto muito da sua companhia.

Acordei com o sol entrando pela janela, e percebi que não fechei as
cortinas corretamente, que horas eram? Alcancei o telefone e descobri que já
eram nove horas da manhã. Me levantei, fui ao banheiro fazer minha higiene,
e quando saí do quarto estava o mais absoluto silêncio no apartamento. Parei
em frente ao quarto onde Olivia estava dormindo e pensei: será que devo
entrar? Acho que ela poderia se sentir ofendida. Pensei em bater na porta,
mas ela poderia se assustar. Continuei olhando para a porta até decidir que
somente iria incomodá-la se não acordasse até o meio-dia. Ponderei que
fomos dormir tarde nesta madrugada, além do efeito dos remédios, ela
precisava descansar.
Fui para a cozinha preparar o café da manhã, hoje eu merecia ovos
com bastante bacon, para compensar tantas emoções de ontem. Após tomar o
café, liguei o computador e procurei as notícias que poderiam impactar em
meu trabalho amanhã. Concentrei-me tanto que perdi a noção do tempo. O
relógio já marcava uma hora da tarde. Será que deveria acordar Olivia?
Cheguei à porta do seu quarto, queria ter o superpoder de ver além
dessa porta. Bati levemente na madeira, nenhuma resposta. Bati novamente e
chamei seu nome, nada. Girei levemente a maçaneta, abri a porta do quarto e
vi Olivia dormindo, muito tranquila sob o edredom, somente com a cabeça
descoberta, os cabelos espalhados no travesseiro e seu rosto estava suave, eu
poderia ficar aqui muitas horas observando ela dormir, parece um anjo
adormecido. Mas realmente precisava saber se estava bem, ou se
precisaríamos voltar ao hospital, então toquei levemente seu ombro e a
chamo.
— Olivia. Olivia, está na hora de acordar, você está bem?
Ela respondeu com um gemido, que fez meu tesão aflorar com a
velocidade da luz. Respirei fundo, tentando me acalmar e voltei a chamá-la.
— Olivia, sou eu Henrik, você precisa acordar.
Ela se espreguiçou de olhos fechados, se acomodou no travesseiro e
abriu os olhos.
— AAAAAHHHHH! — Olivia soltou um grito assustador e eu saltei
para trás levantando as duas mãos!
— Calma Olivia, sou Henrik, lembra?
Ela puxou mais ainda seu edredom como uma forma de tentar se
proteger ou se esconder, antes de me responder.
— Desculpa, me assustei, não estou acostumada a acordar com
alguém no meu quarto. Mas, o que você faz aqui?
— Eu que peço desculpas, não queria te assustar, eu fiquei
preocupado, você dormiu muitas horas, será que devemos voltar ao hospital?
— Não — ela respondeu rápido.
— Vou sair para você se levantar, tudo bem? — Ela assentiu com a
cabeça. — Faça tudo devagar e com calma, se sentir qualquer coisa me
chame. Vou te esperar na sala.
— Sim, obrigada, Henrik!
Como gostava de ouvir o som de sua voz pronunciando meu nome.
Saí do quarto e voltei para a sala para esperá-la. Me sentia empolgado com
sua presença aqui, precisava pensar no que pedir para o almoço. O que será
que ela gosta de comer?
Após alguns minutos a vi entrar na sala, com a mesma roupa que
estava vestida ontem, e minha camiseta em suas mãos, ela estava linda,
sorrindo e com a expressão muito melhor que ontem. Descansar lhe fez muito
bem.
— Henrik, obrigada por tudo. Há muito tempo não dormia tão bem e
me sentia tão quentinha e confortável. — Abaixei a cabeça pensando em
como adiar essa despedida. — Desculpa, não queria te constranger ou
incomodar.
— Não, nem uma coisa, nem outra. Só estava pensando que ainda não
fazem vinte e quatro horas desde o acidente, então você ainda precisa de
companhia. Passe a tarde comigo, te levo para casa à noite. Essa é minha
camiseta?
— É sim, vou levá-la para lavar e te devolvo na cafeteria.
— Nem pensar. Não precisa se preocupar com isso. — Peguei a
camiseta e aproveitei para segurar em suas mãos, quem sabe conseguiria ter
mais força no meu pedido para ela ficar. — Por favor, passe a tarde comigo.
Vou gostar da sua companhia, e ainda ficarei mais tranquilo se souber que
você está bem.
Ela olhava para baixo, sabia que estava analisando meu pedido, fez
um biquinho com a boca e mexeu para os lados, um gesto charmoso, que
deixava claro que ela estava pensando.
— Tudo bem, eu posso ficar mais um pouco, mas não posso ir embora
tarde.
— Combinado, deixe suas coisas no quarto, vou preparar alguma
coisa para você comer.
— Eu seria muito mal-educada se pedisse para comer um pedaço da
pizza de ontem? Estava muito gostosa.
Dei risada, como essa menina poderia ser tão simples? As garotas que
conheço pediram granola, suco verde, ou qualquer coisa fitness que estiver
na moda.
— Vou colocá-la no forno.
Ela voltou, subiu as escadas, enquanto jogava minha camiseta no
ombro, senti o cheiro dela que ficou no tecido e pensamentos pecaminosos
passaram pela minha cabeça enquanto ia até a cozinha aquecer a pizza. Logo
que terminei de programar o timer do forno, ouvi a campainha tocar. Droga!
A única pessoa que tinha autorização para subir sem ser anunciada era minha
mãe. Preciso que ela vá embora logo, antes que assuste Olivia com seu jeito
dramático.
Abri a porta e minha mãe entrou como um touro em busca do capote
vermelho.
— Henrik, não sei mais o que fazer para que entenda que eu me
preocupo com você. — Seu tom de voz era baixo, mas severo, diferente dos
gritos que eu imaginava ouvir. — Ontem você me assustou muito, e não
consegui falar com você o resto da noite. Você tem alguma ideia de como
uma mãe se sente quando seu filho diz que se envolveu em um acidente, sem
saber se você se machucou ou se matou alguém?
— Me desculpa, mãe.
— De novo? É isso que você vai sempre me falar?
Ficamos em silêncio, parados em frente à porta, nada do que eu
dissesse agora seria suficiente para acalmá-la, sei que está certa, e que não irá
acreditar em nenhuma promessa de ser um filho melhor. Neste caso
reconhecia que ela estava certa, mas realmente não entendia o que ela queria
de mim com tantas cobranças, sou focado no trabalho e ela sabia disso, mas
acabamos sempre nas mesmas discussões que envolvem eu ter tempo e uma
namorada.
Nosso silêncio foi quebrado quando ouvimos passos na sala, ao
mesmo tempo viramos nossas cabeças e encontramos Olivia parada sem
saber o fazer. Minha mãe me olhava aguardando a apresentação, enquanto me
aproximei de Olivia.
— Olivia, esta é minha mãe, Sara McDowell, e mãe, está é a srta.
Olivia Mary Capmbell. E foi ela que eu atropelei ontem.
Minha mãe entrou no modo super-mãe, como se não estivéssemos em
uma discussão segundos antes, e com um sorriso no rosto se aproximou de
Olivia, que ficou imóvel.
— Olá, querida, como você está? Sente dores? Conte o que
aconteceu? Henrik está cuidando bem de você?
— Si-Sim, estou bem, Sra. McDowell, Henrik me ajudou muito
ontem.
Em poucas palavras contei para minha mãe sobre o acidente, o
hospital, as orientações do médio, e disse que como Olivia não teria
companhia eu supliquei para que ela ficasse aqui.
Assim que terminei de contar à minha mãe, Olivia falou rápido.
— Desculpe se atrapalhei a conversa de vocês, não quero incomodar
mais, então já vou embora Henrik.
— Não! — Foi minha vez de responder rápido. — Minha mãe já está
indo embora, e sua pizza, já deve estar pronta, você precisa comer para tomar
os remédios.
— Henrik, você nem fez um almoço decente para a moça!
— Não precisa se incomodar, Sra. McDowell, acabei de acordar, por
causa dos remédios, e fui eu que sugeriu pizza. — Olivia sorriu sem graça.
— Por favor, me chame somente de Sara. Eu já vou indo, mas só se
me prometerem que vão jantar comigo nesta semana, e, Olivia, a convocação
inclui você, uma forma de pedir desculpas por meu filho ter sido desatento no
trânsito.
— Olivia, nem adianta tentar fugir, ela é capaz de fazer plantão na
porta da cafeteria para te arrastar para esse jantar.
— Tudo bem, sra… Sara.
— Vou combinar com meu filho e ele te passa os detalhes. Então já
vou indo, um beijo, querida. Tchau, Henrik, e não terminamos aquela
conversa.
Minha mãe saiu do apartamento, nos deixando novamente sozinhos.
Eu acompanhei Olivia até a cozinha, tirei a pizza do forno coloquei sobre a
mesa integrada à ilha no centro da cozinha, ela se acomodou em uma das
banquetas, enquanto eu a servia. O silêncio não era incomodo, me sentia
tranquilo, mas gostaria de perguntar várias coisas, saber sobre sua vida,
desvendar tudo sobre ela.
— O você acha de assistirmos um filme agora à tarde? Sua cabeça
ainda dói?
— Não dói mais, apenas meu pulso que ainda está dolorido, devo ter
caído sobre ele. Vou adorar assistir um filme, faz muito tempo que não faço
isso.
— Na verdade eu também. Acabo sempre trabalhando nos finais de
semana.
— Se incomoda se eu te perguntar com o que você trabalha? Sempre
te vejo de terno, e tenho curiosidade.
— Eu tenho uma empresa de investimentos, na verdade somos em
quatro sócios.
— Então você um CEO?
— Não, o CEO é o Mark, tem Frank que é advogado e eu e Erick
somos analistas em investimentos. Erick tenho certeza de que você conhece
da cafeteria, ele fala muito e está sempre fazendo alguma brincadeira, quando
vamos juntos lá observo que ele sempre chama todas as atendentes pelo
nome, inclusive você, e que todas o conhecem também. Mark e Frank, você
também já deve tê-los visto por lá.
— Claro que me lembro do Erick, ele é engraçado. E como chama sua
empresa?
— O nome da empresa é Four K's Darings Investments. Uma
brincadeira porque nossos nomes terminam todos com K, embora Frank seja
diminutivo de Franklin. Um dia te conto como começamos, mas nossa
empresa só funciona bem porque cada um trabalha naquilo que faz de
melhor, e nos entendemos muito bem.
— E que tipo de análise você faz, do mercado financeiro?
— Basicamente pego vários relatórios, planilhas, informações do
mercado e outras fornecidas pela empresa e faço a tradução em palavras
simples, digo se vale ou não comprar ações ou investir em determinada
empresa e os motivos dessa conclusão.
— Parece interessante, mas eu nunca teria talento para isso. — Ela
sorriu de uma forma muito doce.
Continuamos nossa conversa na cozinha, enquanto ela lentamente
comia a pizza, eu também comia um pedaço. Ela me contou de sua vontade
de trabalhar como professora, falou sobre seus pais, a cidade em que vivia.
Como ela pareceu bastante à vontade fiz outras perguntas sobre sua vida, e
depois de insistir um pouco, ela me contou sobre o motivo de ter saído de
casa e como foram seus primeiros dias em Nova York.
Um nó se formou na minha garganta, não sabia se sentia raiva dos
pais dela terem tentado obrigá-la a se casar ou se sentia alívio, porque foi isso
que a fez cruzar o meu caminho.
Gostaria de lutar contra o relógio, mas nossa tarde passou rápido.
Assistimos a um filme, com direito à pipoca, conversamos muito, cuidei para
que ela se lembrasse de tomar os remédios e até fizemos uma compressa de
gelo em seu punho.
Lá fora estava muito frio e nevava um pouco, mas dentro do meu
apartamento se instalou um calor aconchegante, e pela primeira vez desde
que morava aqui, senti como era estar em um lar. Gostaria de prolongar essa
sensação, gostaria que ela não fosse embora, pelo menos não hoje.
— Henrik, foi muito bom passar o dia com você, mas realmente
preciso ir embora, amanhã tenho de chegar cedo à cafeteria.
— Eu… Eu gostaria que você ficasse, mas te entendo. Vamos, vou te
levar.
— Não, eu vou de táxi. Já conversamos sobre isso, e não quero que
você se exponha a nenhum risco. Não moro em um local tranquilo e seu carro
chamaria muito a atenção.
Acatei seu pedido, mas pedi um motorista pelo meu aplicativo, com a
desculpa de queria pagar pela corrida, o que também era verdade, mas
aproveitei para pegar seu endereço e realmente me assustei quando ela me
falou onde morava. A vontade que sentia era dizer que de forma alguma ela
iria para aquele lugar, mas não poderia interferir em sua vida, ainda não
tínhamos intimidade para que eu pudesse ajudá-la a sair de lá. Mas tomei a
decisão de procurar uma forma de ajudar, e de trazê-la para minha vida.
Trocamos nossos números de telefone, e ela prometeu que me avisaria
assim que chegasse em casa, e me ligaria se sentisse qualquer um dos
sintomas que o médico falou.
Desci até a portaria do prédio com ela para aguardar a chegada do
motorista. O frio estava muito forte hoje, e apesar de nossos casacos, tive
vontade de abraçá-la para que ficasse mais quente. Quando o carro parou à
nossa frente, finalmente era hora da despedida.
Sem saber o que fazer me aproximei, cerquei meus braços em seu
corpo, um abraço apertado e amassei nossos casacos até alcançar seu rosto
para dar um beijo em sua face.
— Se cuida, Olivia, e me mande mensagem.
Observei o carro se afastar e um grande incômodo se instalou no meu
peito.
Voltei ao apartamento e minutos depois me vi com o celular na mão
aguardando por sua mensagem, mas a primeira mensagem que recebi foi de
minha mãe.
Mãe:
Espero você e minha nora para jantar na quinta-
feira, às sete horas da noite. Nem pense em faltar
dessa vez.

Henrik:
Vou verificar com Olivia se ela pode nesse dia.
E ela não é sua nora.

Mãe:
Mas espero que em breve seja. Boa Noite.
E você ainda me deve aquela conversa, e não
pense que vou esquecer.

Alguns minutos depois recebi a mensagem de Olivia:

Liv:
Cheguei bem em casa.
Boa Noite.

Henrik:
Boa noite Liv, tranque bem as portas.
Até amanhã.

Esperava que a noite passasse rapidamente, para que no dia seguinte


pudesse vê-la na cafeteria.
CAPÍTULO 11
OLIVIA
Dia 12/12 – Quinta-feira

Essa foi uma semana estranha, reencontrar Henrik na cafeteria na


segunda-feira, foi uma explosão de sentimentos. Não sabia o que fazer, como
falar com ele, muito menos como ele me trataria. Meu maior receio era que
ele voltasse a me tratar de forma fria e impessoal, que voltasse a ser o ruivo
de gelo.
No domingo que passamos juntos ele foi um cavalheiro, me tratou
maravilhosamente bem, como se trata uma boa amiga, e era isso que eu
poderia esperar dele. Quando ele chegou na segunda-feira para fazer seu
pedido, a cafeteria estava lotada, então fez seu pedido e me perguntou se eu
estava bem, respondi rapidamente, não queria receber uma chuva de
perguntas das minhas colegas.
No restante da semana trocamos várias mensagens, conversamos sobre
vários assuntos, as mensagens foram se tornando cada vez mais íntimas e ele
me convenceu a ir ao jantar na casa de sua mãe. O que me apavorava mais a
cada segundo.
Pelo que entendi em nossas conversas, o apartamento de Sara era perto de
onde Henrik morava e bem longe da minha casa, por isso ia me trocar na
cafeteria, não tinha roupas chiques, e apenas um casaco que aguentava esse
frio todo, fiquei com receio de passar vergonha com minhas roupas simples,
mas era o que tinha para hoje.
E para piorar o tempo essa semana foi muito frio, e com neve todos os
dias, a cidade já estava branca com o acúmulo de neve nas ruas e calçadas.
Ainda não consertaram o aquecedor do meu prédio, e se não fosse pelo
cobertor elétrico, com certeza já teria congelado naquele lugar, e não tenho
ideia de como a água ainda continua saindo das torneiras. A previsão do
tempo é que a nevasca poderia aumentar essa noite, o que realmente me fazia
avaliar a possibilidade de sugerir adiar esse jantar, poderia ficar bem difícil
para eu voltar para minha casa, que mais parecia um freezer.
Pelo menos aqui dentro da cafeteria está quentinho, e por isso
continuamos usando esse uniforme ridículo de Noeletes, fico com muita
vergonha quando Henrik me vê com essa roupa. E foi só pensar nele que o vi
entrar na cafeteria sorrindo e parando na fila da caixa. Carrie, olhou para ele
depois para mim e finalmente falou:
— O ruivo anda bem sorridente ultimamente, não é? Será que arrumou
uma namorada para derreter o gelo?
Não consegui responder o comentário dela, porque imaginar Henrik com
outra pessoa era muito doloroso, sei que somos amigos, mas…
— Bom dia Liv, você está bem?
— Sim, estou bem, o pedido de sempre? — Ele assentiu com a cabeça.
— Liv, passo aqui às seis e vinte, pode ser?
— Claro, esperarei.
Carrie ouviu a conversa e sei vou ter que responder uma enxurrada de
perguntas. E o interrogatório começou assim que ele saiu da cafeteria e
acenou para mim.
— Olivia, o que foi isso? Ele te chamou de Liv? — Carrie estava
realmente espantada, mas até eu estava, então não podia culpá-la. — Você
vai a um encontro com o ruivo? Como isso aconteceu?
Passei a próxima meia hora contando para ela os vários eventos dos
últimos dias. Ela ficou zangada por eu não tinha contado antes,
principalmente sobre o atropelamento. Mas se animou com meu jantar e disse
que adorava uma história de amor.
— Eu já disse Carrie, ele não me deu nenhum sinal de ser mais do que
meu amigo. Não posso ter esperanças, ou vou me machucar demais. E a mãe
dele só quer ser gentil.
Às seis e quinze já estava pronta, apenas esperando por Henrik, que chegou
pontualmente cinco minutos depois.
— Nossa, Liv, você está linda, vamos?
— Obrigada, vamos sim.
Peguei minha bolsa e olhei para trás, Carrie estava com braços
apoiados no balcão e nos observava como se assistisse a um filme de
romance.
Na rua ainda nevava, e nas calçadas se formavam finas camadas de gelo,
que nem sempre conseguimos ver. Depois de dois passos na calçada,
escorreguei um pouco no gelo, mas consegui me equilibrar sem passar uma
grande vergonha. Henrik se aproximou mais de mim, passou as mãos pela
minha cintura. Quando ele me tocou meu coração bateu tão forte que tive
medo de que ele percebesse. Ele só se afastou um pouco quando chegamos a
porta de um prédio, à cerca de um quarteirão da cafeteria.
— Eu trabalho neste prédio, vamos, meu carro está na garagem.
Ele pegou minha mão e fomos até seu carro. A viagem até o
apartamento de Sara foi tranquila, uma música calma tocava no som, Henrik
estava sorridente, e eu estava tão ansiosa que só não estava roendo minhas
unhas, porque ainda não tirei as luvas. Sei que não é exatamente como se eu
estivesse indo conhecer minha sogra, mas é uma pessoa importante para o
meu ruivo, se ela não gostar de mim, ele pode se afastar.
— Liv, você está bem?
— Estou sim, só um pouco ansiosa, não quero passar vergonha na
casa da sua mãe. Sou muito simples, minha família é pobre e sempre vivi
com muita simplicidade, tenho receio de não saber usar aqueles vários
talheres, e de ser o tempo todo avaliada por ela.
Henrik deu uma sonora risada e olhou para mim.
— Fique tranquila, minha mãe não é uma dondoca, nem cheia de
excessos de etiqueta. Ela gosta de pessoas, de conversar, e quer te conhecer.
O maior perigo que você corre nesta noite é que ela tenha cozinhado. Torça
para que ela tenha comprado a comida.
— E por que ela quer me conhecer?
Henrik ficou alguns minutos em silêncio, prestando atenção no
trânsito e estacionou o carro. Não me respondeu a última pergunta.
— Chegamos — ele disse, assim que parou o carro. Ele desceu deu a
volta no veículo e me ajudou a descer, abriu a porta de trás e pegou uma
garrafa de vinho.
— Meu Deus, Henrik, eu deveria trazer alguma coisa?
— De jeito nenhum, só trouxe um vinho porque a adega da minha
mãe costuma estar vazia.
Ele fez uma cara engraçada e pegou minha mão, isso já se tornou
natural, mesmo com o pouco tempo que passamos juntos.
Sara já nos aguardava na entrada quando a porta do elevador se abriu,
ela vestia uma camisa de seda verde, larga e fluida e uma calça preta, estava
muito elegante, mas nada exagerado. Entramos e tiramos nossos casacos, o
lugar estava bem aquecido e com aroma de comida, senti saudades da casa
dos meus pais e do cheirinho da comida da minha mãe.
Sara se aproximou de mim e me abraçou carinhosamente, por um
momento não soube como reagir, então retribuí o abraço.
— Seja bem-vinda, querida. Fico muito feliz que vieram, só você para
trazer esse menino na minha casa.
— Mãe! Por favor.
— O que foi? Estou sendo sincera. Fiquem à vontade, preciso ver o
jantar. — Ela olhou para Henrik com cara de brava e continuou a falar. —
Sim Henrik, eu encomendei a comida.
Eles começaram a rir, e ela saiu da sala nos deixando a sós.
— Você aceita vinho?
— Uma taça sim, obrigada.
— Então vou abri-lo, fique à vontade, eu já volto.
A sala era decorada com móveis claros e elegantes, alguns aparadores
acomodados nas paredes com vasos altos de flores, decorações de Natal,
incluindo uma árvore bastante iluminada e muitas fotos nas paredes.
Me aproximei e comecei a observar as fotos, duas crianças ruivinhas
brincando num parquinho, uma foto de um casamento que imagino ser dos
pais de Henrik porque o noivo tinha a mesma cor de seus cabelos, uma festa
de Natal com crianças rindo ao redor de uma grande árvore decorada. Parei
em uma foto que parecia mais ser mais recente, porque Henrik não estava
muito diferente, Sara estava abraçada ao marido no centro, Henrik de um lado
e um garoto ruivo, um pouco mais novo do outro lado. Eles pareciam uma
família feliz. Nesse momento Henrik entrou na sala, se aproximou de mim e
estendeu uma das taças.
— Essa é uma das fotos favoritas da minha mãe. Foi poucos dias
antes do meu pai falecer. — Ele tomou um pouco do vinho e continuou. —
Esse é meu irmão Dylan, ele é cinco anos mais novo que eu, foi a última foto
de todos nós juntos.
— Sinto muito, o que aconteceu?
— Acidente de carro há três anos, fui um susto. É muito difícil
quando a morte chega sem ser anunciada, não temos tempo para entender o
que acontece, nem que é de verdade, e ainda passamos vários dias esperando
aquela pessoa entrar pela porta.
— Venham a lasanha está pronta. — A voz de Sara nos interrompeu.
Nos aproximamos da mesa e nosso jantar é bem agradável. Como eu já
esperava, Sara fazia muitas perguntas sobre mim, mas também descobri
algumas coisas sobre ela e sobre Henrik. Sara era psicóloga e sempre
trabalhou. Atualmente trabalhava em uma escola alguns dias por semana e
tinha seu consultório. A conversa estava muito agradável até que Sara entrou
em um assunto delicado.
— Olivia, e seus pais?
Decidi ser o mais sincera possível, porque embora nossa relação fosse
instável atualmente, sempre foram excelentes e fizeram por mim tudo que
estava ao alcance deles.
— Minha mãe, que se chama Agnes, é uma excelente costureira, ela faz
peças lindas, mas atualmente trabalha em loja da minha cidade fazendo
alguns acertos em roupas finas. Meu pai, Gerard, trabalha em uma indústria.
Eles sempre foram pais muito amorosos, e me apoiaram muito para
conquistar meus sonhos. Mas eles têm algumas opiniões muito conservadoras
sobre alguns assuntos. E por isso nos desentendemos nesse ano, e vim para
Nova York. Converso com minha mãe algumas vezes, mas espero poder
voltar a ter uma boa relação com eles um dia.
Sara compreendeu que esse era um tema incômodo, por isso mudou de
assunto e começou a contar algumas histórias engraçadas de Henrik, o que
me divertiu muito, enquanto ele ficava vermelho de vergonha e tentava
mudar de assunto. O clima era tão familiar, e me deixou tão confortável que
me esqueci que fazia tão pouco tempo que conheci aquelas pessoas.
Quando o jantar acabou, me despedi carinhosamente de Sara, que insistiu
em pegar meu número de telefone, ela disse que sentia falta de uma menina
para mimar de vez em quando, porque ter só filhos significava não ter
companhia quando se quer fazer compras ou ir a um salão de beleza. Passei
meu número, mas não tinha coragem de dizer que esses programas estavam
muito fora do meu orçamento, e que não poderia acompanhá-la. Apenas sorri,
agradeci e me despedi.
Ao chegar à rua percebemos que a nevasca se intensificou e o frio
também. Seria uma longa e difícil viagem para casa e uma noite pior ainda.
Virei para me despedir de Henrik, que agarrou minha cintura e olhou nos
meus olhos.
— Está tarde e a neve está muito forte para você voltar para sua casa. Por
favor, venha comigo, fique no meu apartamento, é mais perto e você já tem
um quarto lá.
A forma como ele falou foi tão carinhosa, que me confundi com suas
intenções, mas “você já tem um quarto lá” deixou bem claro que ele queria
manter distância. Acabei concordando porque realmente seria difícil voltar
para casa hoje. O sorriso que Henrik abriu, me deixou minhas pernas bambas.
Como ele podia ser tão bonito e carinhoso?
Gostaria que olhasse para mim de outra forma, mas sei que nossas
diferenças são tão grandes que ele nunca vai me tratar como mais do que uma
boa amiga. Ele abriu a porta do carro — adoro esse gesto — e depois que
entrei no veículo, ele deu a volta e se acomodou ao volante.
Estávamos realmente perto, porque a viagem até seu apartamento foi bem
rápida. Entramos e tiramos os casacos, mais uma vez parei em frente à janela
da sala para admirar a vista, senti que Henrik se aproximou e ficou ao meu
lado.
— Hoje não te respondi uma pergunta, Liv, não quero nunca te esconder
ou deixar dúvidas de nada, só não consegui responder naquela hora. — Ele
pôs as mãos nos bolsos e abaixou a cabeça, parecia um menino tímido. —
Minha mãe nunca tinha visto uma mulher na minha casa, então ela achou que
estávamos juntos. Por isso te convidou, tentei explicar durante a semana o
que aconteceu, mas ela me conhece bem e percebeu antes de mim o quanto
você tem se tornado importante.
Eu fiquei congelada e parada, nenhum músculo mexeu e tive dúvidas se
ainda continuava respirando. Ele ficou em frente a mim, colocou
delicadamente as mãos no meu rosto, como se segurasse algo muito precioso.
— Liv, já faz alguns meses que quero fazer isso quando te vejo de manhã.
Ele aproximou sua boca da minha, seu toque era suave, os lábios macios.
O beijo começou delicado, sua língua invadiu minha boca e nossos corpos se
aproximaram ainda mais. O beijo ficou mais intenso e ele agarrou minha
cintura. Gostaria que esse momento durasse para sempre, mas no mundo real
precisamos respirar, então nos afastamos um pouco, mas ele não me soltou.
Acomodou minha cabeça em seu peito e me prendeu em um abraço
silencioso e acolhedor. Alguns minutos se passaram antes que Henrik se
afastasse um pouco, apenas o suficiente para que eu visse seu rosto.
— Liv, dorme comigo essa noite, prometo não fazer nada que você não
queira. Eu só quero… Eu preciso sentir você perto de mim. Acho que você
também sente um pouco disso, não sente?
— Sim, eu sinto. Mas não me sinto pronta para… — Ele colocou um
dedo em meus lábios.
— Só o que você quiser. — Assenti com a cabeça e fomos em direção
ao seu quarto.
Ele me levou ao seu quarto, quando entramos percebi que era bem
parecido com o que fiquei na outra noite, mas possuía um aspecto um pouco
mais masculino com os móveis de madeira. Ele entrou por uma porta e voltou
com uma camiseta nas mãos.
— Para você ficar mais confortável, se for se sentir mais à vontade
em se trocar no outro quarto já sabe onde ficam as coisas, mas, por favor,
volte para cá.
A forma carinhosa como ele falava, não me deixou dúvidas do que
fazer, fui ao outro quarto, entrei no banheiro e vi que alguns itens que usei da
última vez que estive aqui continuavam no mesmo lugar, então escovei os
dentes, penteei meus cabelos e coloquei sua camiseta, que ficava larga e num
cumprimento razoável, pelo menos tampava todo o meu bumbum.
Voltei para o quarto e Henrik já estava na cama, dei a volta
lentamente, sentei do outro lado, não sabia o que fazer, nunca estive em uma
situação assim. Não sou virgem, mas também não tenho muita experiência,
minha primeira vez foi com um babaca no carro dele depois de uma festa,
claro que me arrependi, principalmente por sentir tanta dor e nunca mais falar
com ele. Depois com um namorado da faculdade, mas namoramos só até ele
me levar para a cama, no dia seguinte disse que descobriu que não gostava
realmente de mim. Então agora estou completamente perdida e não sei o que
fazer.
— Você está com medo de mim, Liv?
— Não, mas eu nunca dormi com ninguém. — Suas sobrancelhas
arquearam, em sinal de incompreensão, então continuei. — Não sou virgem,
mas nunca passei uma noite inteira ao lado de ninguém.
Ele levantou as cobertas e fez sinal para me aproximar, ele vestia
apenas uma calça de abrigo, e seu peito estava nu, podia ver as marcas de
seus músculos, nada muito exagerado, mas com certeza trabalhado em horas
de academia.
Me aproximei e ele me abraçou, me cobriu e pude sentir o calor de
seu corpo. Nos beijamos desesperadamente, enquanto ele acariciava minha
barriga por cima da camiseta, e com a outra mão acariciava minha cabeça.
— Meu Deus, Liv, você é muito linda e sensual. Vamos dormir, não
quero perder o controle, te prometi isso.
Ele me abraçou por trás encaixando nossos corpos, podia sentir em
minhas nádegas um enorme volume entre suas pernas. Ele parecia ser grande,
e isso com certeza me assustava. Envolvendo os braços em minha cintura,
nos acomodamos na cama. Depois de tantos meses me contentando com seu
sorriso pelas manhãs, parecia viver em um sonho, apreciei a sensação de estar
em seus braços, e em pouco tempo adormeci.
CAPÍTULO 12
HENRIK
Dia 13/12 – Sexta-feira
Acordei e pensei estar em um devaneio, minha mão continuava em
volta da cintura de Olivia, conseguia sentir seu calor e seu cheiro próximos a
mim. Levantei um pouco e observei seu rosto angelical, seus cabelos loiros e
cheios de ondas espalhados pelo travesseiro. Poderia me acostumar fácil a
acordar assim todos os dias. Mas tinha uma coisa que mudaria, gostaria de
acordá-la beijando seu corpo todo e tomá-lo para mim, sentindo como era
estar dentro dela.
Me levantei devagar para não a acordar, e antes que eu começasse a
fazer o que estava pensando, tinha medo de ser apressado e assustá-la.
Fui até a sala e observei pela janela, mais neve caindo, olhei para a
rua e tudo que conseguia ver era um branco infindável, com certeza caiu
muita neve nesta noite. Liguei a televisão e todos os canais tinham a mesma
notícia “a maior nevasca dos últimos cem anos paralisa a cidade de Nova
York”. Peguei meu celular e confirmei que as ruas estavam interditadas, a
prefeitura pedia para as pessoas não saíssem de casa por todo o fim de
semana, muitas linhas do metrô estavam desativadas, comércios fechados e
muita neve em todas as imagens.
Embora fossem notícias preocupantes, fiquei feliz, ganhei mais um
dia inteiro com minha Olívia. Precisava pensar no que poderíamos fazer aqui,
para aproveitar o dia.
Voltei para o quarto e ela ainda dormia, quando estava quase me
aproximando da cama, um som muito alto surgiu do outro lado da cama.

“Feeling my way through the darkness


Guided by a beating heart
I can't tell where the journey will end
But I know where to start[3]”

Comecei a rir, enquanto Olivia se debatia na cama à procura do


telefone para desligar o alarme.
— Liv, é sério que você acorda com isso todos os dias? — Ela ficou
vermelha e desligou o alarme antes de responder.
— Claro, é para acordar animada, no ritmo da música, além do mais
lembrar o nome da música já me diz o que tenho que fazer!
— E funciona?
— Às vezes. Preciso me levantar, vou chegar atrasada na cafeteria.
— Tenho o prazer de lhe informar que você não vai a lugar nenhum.
A cidade está parada por conta de uma nevasca, ninguém vai conseguir
chegar na porta da cafeteria, ainda mais porque continua nevando.
— Como? Eu preciso trabalhar! — Ela pegou seu celular e correu os
dedos rapidamente pela tela. — Tem uma mensagem do Lewis, dizendo
retornamos na segunda, porque a prefeitura pediu a todos para ficarem em
casa, e ele pediu para rezarmos para a esposa dele não entrar em trabalho de
parto hoje. Ele deve estar apavorado com a ideia de ter que fazer o parto.
Ela deu uma risada alegre, enquanto subi na cama e chegando perto
dela, a abracei e comecei a distribuir beijos em seu pescoço, senti seu corpo
amolecer em meus braços enquanto minha boca desceu para os ombros.
— Henrik… —Sua voz saiu baixa e sussurrada me deixa com ainda
mais tesão.
— Você sabe que vai ficar aqui hoje, certo? Não tem como ir embora,
e eu quero aproveitar cada segundo ao seu lado. Vou preparar um café da
manhã para nós, levanta-se antes que eu mude de ideia e não te deixe sair
nem desse quarto hoje. Eu te espero na cozinha.
Juntei tudo que me restava de forças para me afastar dela, entrei em
meu closet e peguei um conjunto de moletom.
— Vista isso, vai ficar grande, mas vai ficar confortável. Depois pode
colocar suas roupas na máquina, estarão secas até o fim do dia.
Voltei para a cozinha e enquanto arrumava a mesa com algumas
guloseimas para o café da manhã, ouvi o barulho do chuveiro, não falta me
faltava vontade de me juntar a ela. Quando o café estava pronto ela entrou na
cozinha, estava linda com minhas roupas, e abriu grande sorriso quando viu
tudo o que preparei para nós.
— Melhor do que tomar banho em um banheiro quentinho é ver toda
essa comida no café.
— Se o seu banheiro está frio deve ser porque o aquecedor não está
regulado corretamente, se quiser posso verificar para você.
O sorriso sumiu de seu rosto, ela abaixou a cabeça olhando para o
chão e ficou pensando antes de responder.
— Deve ser isso.
Ela continuou olhando para o chão enquanto juntava as mãos em
frente do corpo, estava nervosa por alguma coisa, repensei se disse algo de
errado e não me lembrei de nada que pudesse tê-la ofendido ou a deixado
chateada. Então me aproximei dela, segurei seu rosto com as duas mãos e
levantei delicadamente para que ela olhasse para mim.
— Sabia que você é uma péssima mentirosa? —Seus olhos se abriam
em um susto e continuei falando. — Liv, quero que confie em mim. Sei que
faz pouco tempo que começamos a conversar e nos conhecer. Mas faz meses
que vem tomando conta dos meus pensamentos a cada dia um pouco mais.
Ainda não sei o que é isso que sinto, nem o que vai acontecer entre nós. A
certeza que tenho é que quero você cada vez mais perto de mim, e para isso
precisamos confiar um no outro e sempre sermos sinceros, tudo bem?
— Sim, eu só não quero te incomodar. Me sinto bem e muito feliz
quando estamos juntos, não quero te aborrecer com meus problemas, tenho
medo de que você se canse e se afaste.
Eu a abracei muito forte, sua confissão não poderia ter me feito mais
feliz, ela também sentia o mesmo receio que eu. Ela não fazia ideia de como
tinha medo de perdê-la. Ficamos alguns minutos abraçados, sentindo o
carinho um do outro. Ela não sabia como era bela, atraente, doce e parecia
perfeita para mim. Então me afastei e voltei ao início da conversa.
— Me diga, o eu disse de errado para que você ficasse chateada?
— É que… — Sua voz cheia de receio falhou. — Meu apartamento
não é como o seu, é bem pequeno, sabe? Bem simples também. E o
aquecimento pode estar com algum probleminha.
— Seu apartamento está sem aquecimento? Onde diabos você mora?
— Desculpa, eu sabia que não deveria te incomodar, eu já vou
embora.
Olivia, virou e saiu andando a passos rápidos, sabia que estava
chateada. Merda! Por que eu falei dessa forma? Corri atrás dela e a alcancei
antes de chegar às escadas, com ela ainda de costas a envolvi em meus
braços. Senti seu peito arfar e ela tentou se soltar. Me aproximei do seu
ouvido e falei da forma mais carinhosa que consegui.
— Liv, me escuta, não quis te ofender. Você me contou sua história e
fico muito orgulhoso de tudo o que você conseguiu sozinha. Mas, meu anjo,
essa foi uma noite realmente muito fria, você poderia ter ficado muito doente,
ou até… Eu não quero imaginar isso. Não quero imaginar me afastar de você,
não quero imaginar você sofrendo ou precisando de alguma coisa. Porque
pensar que você não está bem, Liv, me dói no fundo peito. É a primeira vez
na vida que sinto isso e é apavorante, então por favor, me deixa cuidar de
você.
Ela se virou e me abraçou com muita força, nossos lábios se
aproximaram e nosso beijo foi terno, e carregado de nossas emoções.
Voltamos para a cozinha e tomamos o café, conversamos sobre coisas
amenas. Ela perguntou mais sobre meu irmão, como era filha única tinha
curiosidade de saber como era nossa relação, falei bastante de Dylan, embora
não tenhamos nos encontrado muito nesses últimos anos, éramos bem
próximos quando crianças e na adolescência também, talvez eu precisasse
voltar a me aproximar do meu irmão, sentia falta de nossas conversas.
O dia passou rápido, com Liv ao meu lado tudo parecia novo. Como
não poderíamos sair, fizemos várias coisas juntos, assistimos filmes,
cozinhamos, conversamos muito entre muitos beijos, que ficavam cada vez
mais quentes.
No jantar ela insistiu em fazer um macarrão com queijo e enquanto
esperávamos gratinar, nos sentamos na sala tomando uma taça de vinho e
assistindo as últimas notícias da nevasca, e a previsão do tempo para os
próximos dias, indicava melhora no clima e até sol, embora as temperaturas
baixas ainda permanecessem.
Liv ficou entre minhas pernas e se aninhou em meu peito, enquanto
uma de minhas mãos cercava sua cintura. Quando parei para observar a cena,
notei que parecíamos um casal de namorados, e não pessoas que estavam se
conhecendo há tão pouco tempo. Contudo, nada pareceu mais certo do que
tê-la comigo, exatamente desse jeito e agora. Nosso momento foi
interrompido quando o timer do forno anunciou que nosso jantar estava
pronto.
Descobri mais uma qualidade de Olivia, ela cozinhava muito bem. A
massa estava deliciosa. Claro que não poupei elogios e ela ficou corada a
cada um deles. Juntos colocamos a louça na máquina e fomos para o quarto.
Ao passarmos em frente do quarto de hóspedes, onde ela dormiu a primeira
noite na minha casa, Liv ficou parada, não sabia o que fazer, então ela olhou
para mim esperando uma resposta. Eu sabia muito bem o queria, mas não
podia obrigá-la, então pensei muito bem na minha escolha de palavras.
— Meu anjo, eu gostaria muito que você dormisse novamente
comigo. E como te disse, vamos somente até onde você quiser. Entretanto se
você não estiver à vontade, ou se quiser dormir sozinha, vou entender.
— Eu quero muito ficar com você, só não quero se canse de mim.
— Vamos — disse puxando sua mão. — Vai ser mais fácil você
cansar de mim, Srta. Olivia Mary Campbell.
Chegando ao quarto tirei a camisa e me deitei sob os edredons, fiquei
esperando por Liv que tinha voltado ao outro quarto para se preparar para
dormir. Quando ela chegou em meu quarto me assustei com o que vi, ela
estava enrolada em uma toalha de banho.
— Eu não queria dormir com outra camiseta sua, sr. Henrik, aliás já
compartilhamos bastante seu armário. Espero que não se incomode se eu usar
outros trajes hoje.
— Só quero que fique à vontade, meu anjo.
Então ela se aproximou da cama e deixou cair a toalha, ela vestia
apenas uma calcinha preta, que contrastava com sua cor de pele clara, parece
que cada centímetro que via era coberto com o mais perfeito e alvo alabastro.
Seus cabelos dourados desciam pelo ombro e tocavam seus seios redondos,
seus mamilos estavam duros e apontavam para mim. Olhei como quem
admira uma obra de arte e tentei gravar essa cena em minha cabeça.
Como demorei para reagir, ela fez um movimento para abaixar e
pegar a toalha, o que me tirou do transe.
— Venha aqui. — Puxei o edredom para que ela se aconchegasse. —
Você é perfeita, você é um anjo que entrou na minha vida, ou na frente do
meu carro. — Ela sorriu. — Tem certeza de que é isso que você quer?
— Nunca tive tanta certeza de nada. Só peço para ir devagar, faz
muito tempo, sabe? — Ela ficou corada e não aguentei mais, ataquei sua
boca, em um beijo desesperado.
Ela correspondeu ao beijo, e começamos com toques suaves,
reconhecendo cada parte de nossos corpos e nos fundindo cada vez mais até
alcançarmos o êxtase. Deitei me ao seu lado beijei seu pescoço, e passei
minha mão por seus cabelos.
— Liv, muito obrigado por isso. Foi maravilhoso, mas nem cheguei
perto de me saciar da vontade que sinto de você. Vamos precisar fazer isso
muitas vezes, antes que consiga te deixar passar por aquela porta!
Após outro beijo em seu pescoço, fui ao banheiro. Quando voltei, Liv
estava dormindo calmamente, sua respiração era leve, e quando a observei
teve mais certeza de que ela era um anjo que entrou em minha vida.
Me deitei ao seu lado e nossos corpos se encaixaram. Sua presença
pareceu preencher o meu mundo. Em alguns minutos também já estava
dormindo.
◆◆◆

Dia 15/12 – Domingo


Depois de três dias consecutivos, acordar ao lado de Olivia
rapidamente se tornou o momento favorito do meu dia, ela gostava de dormir
e imagino que tenha uma rotina pesada durante a semana. Ela morava muito
longe de seu trabalho, chegava cedo e eu sabia que trabalhava várias horas.
Por isso, saí bem devagar, do quarto e fui para a sala, preparei um café e parei
diante das enormes janelas da minha sala. Olhei mais para essa vista na
última semana do que havia feito em todo o tempo que morei aqui. Mais um
efeito de Liv em minha vida.
O dia tinha um sol enorme, e sua luz refletia na grande quantidade de
neve nas calçadas, consegui ver várias pessoas tirando a neve da frente de
suas portas e tratores liberando as ruas, o barro já aparecia nas ruas e
calçadas. Ao longo do dia a mobilidade voltaria à cidade, e amanhã toda a
correria e o movimento voltariam a fazer parte da rotina dos Nova Yorkinos,
que cobertos com enormes casacos, gorros, luvas e toda espécie de
apetrechos para se protegerem do frio, andariam por toda cidade.
Depois de responder algumas mensagens em meu celular, várias de
minha mãe, liguei a televisão e ouvi algumas notícias, enquanto preparava
uma bandeja com algumas coisas que já sabia que Liv gostava de comer pela
manhã. A previsão do tempo informava que apesar do sol, o frio continuaria.
Entrei no quarto e encontrei Liv, sentada, envolta nas cobertas, com o
cabelo bastante desgrenhado e mexendo em seu telefone.
— Bom dia, dorminhoca. Eu trouxe seu café da manhã.
— Bom dia, Henrik, que delícia! — ela colocou o telefone na
mesinha ao lado da cama. — Estava olhando a previsão do tempo, parece que
o frio veio para ficar. Quantas coisas gostosas nessa bandeja!
— São para você, meu anjo. — Seu olhar fez derreter meu coração,
nele podia ver agradecimento e carinho, sentimentos com os quais não estava
acostumado a lidar.
Depois de comermos juntos, voltei para a cama com Liv e passamos a
manhã toda nos beijando, trocando carícias e descobrindo os corpos e
prazeres, um do outro. O corpo dela era perfeito e reagia ao meu toque de
forma intensa. Na sexta-feira não foi a primeira vez dela, mas a forma como
se comportou me mostrou que não tem muita experiência em sexo, o que fez
com que eu tivesse ainda mais vontade de lhe dar prazer e mostrar quantas
coisas diferentes podíamos fazer juntos.
Quando enfim saímos da cama, notei que já passara da hora do
almoço, e depois de tanta atividade matinal não seria o único que deve estar
com fome. Depois de tomarmos banho juntos, separei para ela outra roupa.
— Não precisa, obrigada, minhas roupas já estão secas. Já posso
colocá-las, para ir embora daqui a pouco.
— Você não vai embora.
— Claro que vou, Henrik, preciso ir para minha casa, estou aqui há
dois dias, amanhã começo cedo na cafeteria e já abusei muito da sua
hospitalidade.
— Meu anjo, ainda está muito frio, não posso imaginar você naquele
lugar perigoso e que não tem aquecimento, você pode ficar doente. Por favor,
Liv, fique aqui comigo.
— Eu moro lá desde que cheguei a Nova York, é minha casa, onde
estão as minhas coisas, é o mais perto que tenho de um lar. Aqui é o seu
espaço e eu não posso ficar para sempre aqui, não está certo tirar sua
liberdade, invadir e mudar sua rotina. E o frio, eu posso dar um jeito.
— Nesse momento eu queria agir como um homem das cavernas e te
amarrar aqui para você não ir embora. Mas não posso, não é? Então porque
não fazemos um acordo, um meio termo. Você fica até amanhã, vamos juntos
para o trabalho, posso ir um pouco mais cedo para acompanhar seu horário, e
depois à noite você volta para sua casa. Ou muda de ideia e volta para cá
comigo.
— Engraçadinho, tudo bem. Eu fico hoje e amanhã volto para casa.
Não gosto de lembrar que vou passar o dia inteiro com aquela roupa ridícula
de Noelete.
— Noelete? Bom, pois saiba que imaginei muitas vezes você no meu
quarto com aquela roupa, e no que teria por baixo dela!
— Você sempre foi tão sério quando ia pegar seu café de manhã, eu
nunca iria imaginar você assim, pensando essas coisas e sendo tão carinhoso
comigo. — Ela sempre corava quando a provocava ou fazia elogios.
— Eu sou sério e um pouco tímido, mas isso é o que você fez comigo.
Passamos o restante do dia envolvidos em atividades domésticas e
conversamos bastante, para nos conhecer. Ela me contou que gostava muito
dessa época do ano, e que o Natal sempre foi especial em sua casa, por isso
estava triste porque seria o primeiro ano que ficaria longe de seus pais, e
provavelmente sozinha. Falou como se encantava com as decorações de
Natal, mas como trabalhava bastante não poderia andar pela cidade para ver
os pontos turísticos e as decorações natalinas.
Como Olivia foi muito sincera com suas palavras, tive coragem de
contar para ela sobre meus últimos Natais, sobre como essa data era
importante para meu pai, como comemorávamos e eram minhas melhores
lembranças com ele, e que nunca mais consegui comemorar depois que ele
morreu. Contei que minha mãe e meu irmão sempre estão juntos, e cobram
minha presença, mas sinto tanta saudade e são muitas lembranças
extremamente marcantes, que não consigo comemorar sabendo que ele não
está aqui.
— Não tenho ideia de como deve ser isso, Henrik, porque nesse
momento não tenho a melhor relação com meus pais, mas eles estão vivos. —
Liv falou com a voz doce e melodiosa. — Mas acredito que a melhor forma
de homenagear seu pai é aproveitando essa data, sendo feliz, trazendo novas
lembranças felizes e recordando dele com carinho. Isso também fará feliz
outras duas pessoas que você ama muito e que ainda pode aproveitar da
companhia delas, sua mãe e seu irmão. Não espere que eles não estejam mais
aqui para lamentar os momentos de alegria que poderia ter passado com eles,
mas preferiu ficar sozinho. Desculpe se fui muito invasiva, mas pense nisso.
As palavras de Olivia ficaram guardadas em minha cabeça, parece que
vou pensar nelas por um bom tempo.
CAPÍTULO 13
OLIVIA
Dia 16/12 – Segunda-feira
A segunda-feira chegou e com ela sol e muito frio, como combinado
Henrik foi mais cedo para o trabalho para que eu pudesse chegar em meu
horário na cafeteria. Quando cheguei já não tinha neve na porta de entrada,
mas alguns montes se acumulavam ao lado. Entrei e fui direto trocar de roupa
e colocar nosso uniforme natalino. Hoje eu ficaria no caixa e Carrie nos
preparos. No horário de sempre Henrik entrou na cafeteria, fiquei ansiosa
para saber como seria nossa interação, até que chegou sua vez de ser
atendido.
— Bom dia, Liv, um capuccino com expresso duplo e um beijo.
Abri um imenso sorriso e vi Carrie me olhar com imensa surpresa, se
distraiu e acabou deixando o leite transbordar do copo que estava preparando.
Me aproximei de Henrik por cima do balcão e dei um selinho nele. Finalizo
seu pedido e ele foi para o local onde eram entregues as bebidas, consegui
sentir seus olhos me observando durante todo o tempo em que estava na
cafeteria, antes de sair acenou para mim.
O frio atraiu muitos clientes em busca de bebidas quentinhas para se
aquecerem, por isso não vi o dia passar. Lewis me pediu para ficar até mais
tarde porque com o movimento Marcy que fazia o fechamento, não daria
conta sozinha. Achei bom para compensar as horas de trabalho que perdi no
sábado.
Quando finalmente consegui sair da Star’s Capuccino, já passava das
nove horas da noite e estava muito frio. Fui rápido até a estação de trem,
queria chegar o mais rápido possível em casa. Para minha sorte o trem estava
no horário e consegui um lugar para me sentar, peguei o celular e encontro
algumas mensagens de Henrik.

Henrik:
Liv, tem certeza de que não quer vir para minha
casa?
Vou ficar preocupado com você.
Pelo menos promete que me liga, se precisar de
qualquer coisa?

Olivia:
Já estou a caminho do meu apartamento.
Pode ficar tranquilo, vai ficar tudo bem.

A viagem foi longa e gelada, ao chegar na estação próxima à minha casa,


andei a passos rápidos, não gostava de andar sozinha à noite nessa região,
alguns trechos eram bastante escuros e me assustavam. Entrei no prédio
aliviada, subi rapidamente as escadas e ao me aproximar da porta do meu
apartamento estranhei que estivesse entreaberta.
Me aproximei devagar, abri a porta, mas não entrei. Não consegui ver
ninguém lá dentro, vi apenas que tudo estava revirado, parecia ter que
passado um furacão lá dentro.
— Oi, tem alguém aí?
Nenhuma resposta. Aguardei mais um pouco e não escutei nenhum som
vindo de dentro do apartamento. Respirei fundo e entrei. O que vi me leva
imediatamente às lágrimas, além de estar todo revirado, levaram todas as
minhas coisas, um pouco de dinheiro que mantinha ali para pequenas
despesas, roupas, os poucos sapatos que já estavam muito usados, meu
perfume, minhas bijuterias, meu único eletrodoméstico que era um micro-
ondas, a geladeira velha que já estava no apartamento continuava aqui, mas o
cobertor elétrico não estava.
Um desespero me invadiu, minhas lágrimas turvaram minha visão. Não
tinha mais nada, nem onde ficar, porque agora tinha muito medo de continuar
aqui, tinha medo de sair na rua à noite, tinha medo de ficar nesse
apartamento. Sem ter o que vestir ou como me aquecer. Alguns minutos se
passaram sem que eu conseguisse reagir, então escutei meu telefone tocar,
não olhei para o visor antes de atender.
— Oi, meu anjo, você não respondeu minha última mensagem, queria
saber se você chegou bem em casa.
Não consegui responder, porque cheguei bem, mas aqui não estava nada
bem, apenas continuei chorando com o telefone grudado no ouvido.
— Liv, o que aconteceu? Por que você está chorando? Liv, por favor me
responde, fala comigo. Você está machucada?
— Não estou machucada — falei com o que me restava de voz.
— E onde você está?
— No meu apartamento.
— Por que está chorando? Continue falando comigo.
— Cheguei e a porta estava arrombada, levaram tudo, todas as minhas
coisas, não tenho mais nada. Não sei o que fazer, não quero voltar para a casa
dos meus pais, mas…
— Liv, você consegue trancar sua porta por dentro? Veja se a trava de
segurança ainda está aí. E continue falando comigo.
— Sim está.
— Então trave a porta e me espere, vou tentar chegar o mais rápido
possível. Não abra a porta para ninguém.
Henrik desligou o telefone antes que eu tivesse tempo de protestar, fechei
a porta e passei a frágil tranca, não sabia se ajudaria muito se alguém
realmente quisesse entrar. Peguei uma cadeira que estava derrubada no chão e
me sentei, juntei as mãos em meu colo e voltei a olhar o ambiente revirado.
Não sabia quanto tempo se passara até que ouvi batidas na porta.
— Liv, sou eu, pode abrir.
Me levantei e corri em direção à porta, Henrik me abraçou forte e
sussurrou que ficaria tudo bem. Levantei o rosto e vi que tinha alguém parado
perto da porta e me assustei.
— Calma, meu anjo, ele está comigo, veio nos ajudar. O que você tem
aqui que é seu?
— Nada, levaram até minhas roupas.
— Então vamos embora.
— Não tenho para onde ir.
— Hoje você vai ficar comigo, depois pensamos nisso, ok?
Ele circundou seus braços por minha cintura e passamos pela porta onde
homem-armário vestido de preto estava parado, descemos as escadas, quando
abrimos a porta para sair do prédio escuteio a voz de Joe.
— Eu te falei para ficar esperta, garota. E não precisava desse circo todo
para sair daqui, não faz bem para os negócios, esses caras batendo em todas
as portas, menos mal que minha foi a primeira, assim já te encontraram logo.
Acho que já posso alugar seu apartamento para outra pessoa, certo?
Antes que eu conseguisse dizer algo, Henrik falou por mim.
— Seu desgraçado, ela não vai voltar aqui nunca mais. — O homem que
acompanhava Henrik, encostou em seu ombro e fez sinal para continuarmos.
Quando olhei para a rua vi dois grandes SUVs parados em frente ao
prédio, me apertei ainda mais em Henrik, que me acalmou.
— Essa é nossa carona, vem comigo.
Entramos no carro e vi mais homens bem grandes ocupando os lugares da
frente, Henrik ficou abraçado comigo. Em algum momento parei de chorar,
mas permaneci em silêncio, sentindo o conforto de seus braços durante todo o
trajeto até seu apartamento.
Quando entramos, ele me diz para tomar um banho bem quente, para
ajudar a relaxar, e que o “meu moletom”, se referindo à roupa que havia me
emprestado outro dia, já estava limpo e ele deixaria separado para mim.
Aceitei sua proposta e tomei um banho relaxante, deixando a água cair
sobre meus ombros, como se fossem a solução para levar meus problemas
embora. Quando saí do quarto e procurei por Henrik, o achei em seu quarto.
Ele fez sinal para eu me aproximar de sua cama.
— Deite-se aqui, vou cuidar de você, já estou ficando bom nisso.
Tentei sorrir, mas não consegui. Entrei debaixo do edredom junto com ele.
— Deite-se aqui, vou cuidar de você, já estou ficando bom nisso.
Tentei sorrir, mas não consegui. Entrei debaixo do edredom junto com ele.
— Não sei o que vou fazer, Henrik, tudo o que eu tinha se foi. Não tenho
onde ficar e nem o que vestir, tenho algumas economias, mas não são
suficientes para tudo isso.
— Vai ficar tudo bem anjo, tome esse remédio, também fiz esse chá,
vão te ajudar a dormir hoje, amanhã pensamos em algo, tudo bem?
Eu bebi o chá e o remédio. A verdade era que naquele momento eu
realmente queria esquecer o que estava acontecendo. Um medo assustador de
ter que voltar para a casa dos meus pais estava cada vez mais forte no meu
peito. Se eu voltasse significaria que fracassei, e realmente não queria que me
vissem como uma perdedora, e o mais grave, eu sabia as regras deles, logo
me arrumariam outro pretendente e só de pensar em me afastar de Henrik, ou
de ser tocada por outra pessoa, meu coração se partia em mil pedaços. Sinto
os braços do meu ruivo em volta do meu corpo, essa era a melhor sensação
do mundo, foi a última coisa que pensei antes de adormecer.
CAPÍTULO 14
OLIVIA
Dia 17/12 – Terça-feira

Acordei com a claridade entre as cortinas, não sei que horas são, não
ouvi meu telefone despertar. Olhei para o lado e estava sozinha na cama, saí
em busca de Henrik, uma boa noite de sono me deixou mais calma, mas hoje
seria um dia de difíceis decisões para mim.
Ele estava na sala falando ao telefone e olhando pela janela, parei
alguns minutos para admirar a vista dentro do apartamento, o terno se
ajustava perfeitamente ao seu corpo, marcando seu bumbum! Cada vez que o
olhava o achava mais bonito, queria guardar essa imagem em minha cabeça.
Ele se virou e quando me viu abriu um sorriso de dentes brancos e perfeitos,
desligou o telefone e caminhou a passos rápidos em minha direção.
— Bom dia, você dormiu bem? Como acordou?
— Muito obrigada por tudo novamente, eu dormi muito bem. Mas
acho que a realidade me esmagou agora de manhã, tenho muito o que pensar
e preciso ir para o trabalho.
Ele colocou a mão em cima da minha e olhou nos meus olhos.
— Calma, estava esperando você acordar para podermos conversar.
Sente-se aqui. — Ele me puxou até o sofá e se sentou ao meu lado. — Liv,
ontem eu quase morri de medo de que alguma coisa acontecesse com você.
Não sei se lembra, mas tinha várias pessoas lá comigo.
— Me lembro de um homem grande e um carro preto.
— Depois da sua ligação, entrei em contato com um cliente que tem
uma empresa de segurança, ele disponibilizou alguns homens para irmos te
resgatar, eu não tinha ideia do que iria encontrar, nem se você estaria bem.
Não ficamos lá muito tempo, mas sei que aquela região é muito perigosa, não
quero desmerecer seu esforço, mas aquele lugar estava um gelo, e o espaço
era tão pequeno que nem dava para colocar um peixinho dourado, na verdade
ele morreria congelado.
Ele tentou sorrir, mas não conseguiu, respirou fundo e continuou.
— Você já me mostrou de tantas formas que é uma garota forte,
independente, que quer conquistar as coisas sozinha, que eu fico encantado.
Mas agora, eu quero te ajudar, me deixa te ajudar, Liv.
Meus olhos estavam marejados, mas fiz de tudo para conter as
lágrimas, não queria parecer uma menina chorona.
— Henrik, você já me ajudou demais, e de tantas formas que nem
tenho como te agradecer. Mas, quando diz que quer me ajudar, no que você
pensou?
— Para começar, tenho um pedido muito egoísta para te fazer, fica
aqui comigo. Gosto muito da sua companhia, sinto a casa mais alegre quando
você está aqui, e não me sinto sozinho. Você pode ter o seu espaço, naquele
quarto de hóspedes, não vou te incomodar, nem invadir a sua privacidade,
mas claro que prefiro você na minha cama.
— Nossa, isso é muito, não tenho como pagar um aluguel, até daquele
quartinho gelado era difícil!
Henrik soltou uma alta risada, e eu continuei séria, acho que ele não
compreendeu minha angústia.
— Meu anjo, não quero seu dinheiro, quero sua companhia. Podemos
fazer um teste, nessa época do ano é muito difícil procurar algum lugar para
alugar, então você fica aqui até depois das festas, no começo do ano
conversamos novamente. Mas você fica aqui por enquanto, topa?
Passar mais tempo com Henrik era uma proposta tentadora, além do
mais poderia economizar nesse fim de ano para comprar novas roupas e
alugar um novo apartamento, ou até procurar alguém para dividir um espaço
mais adequado, com calma e tempo para fazer melhores escolhas. Só
esperava que ele não se cansasse de mim antes disso.
— Tudo bem, eu aceito, mas precisa me deixar fazer algumas tarefas
da casa, eu posso ajudar, sei limpar, lavar, cozinhar. E assim que for possível,
vou procurar um apartamento, vou tentar te incomodar o mínimo possível.
— Você não me incomoda, entendeu? E não vai precisar fazer nada
por aqui, tenho algumas ajudantes, já está tudo organizado. Quanto à você
procurar outro apartamento conversamos mais para frente. O importante é
que agora você vai morar comigo.
— Obrigada novamente, estou sempre te agradecendo, mas agora
preciso ir trabalhar.
— Ainda não terminamos. Hoje você não vai trabalhar.
— Claro que vou, eu preciso ir, não posso perder esse emprego.
— Liv, já falei com seu chefe, o Lewis, entendeu o que aconteceu e
disse que te espera amanhã.
— Você tinha o telefone dele?
— Não tinha, mas não foi difícil conseguir.
— E quem você disse que era? Digo, como se apresentou para ele?
— Como seu namorado, claro.
Meu coração quase saiu pela boca, nunca havíamos conversado sobre
o que era nosso relacionamento, nem se continuaríamos a nos encontrar, foi a
primeira vez que sorri. Ele percebeu minha reação e continuou falando:
— Eu sei que não conversamos sobre isso, mas quero muito que seja
minha namorada, você aceita, Olivia?
Pulei em seu colo e uni nossos lábios, em meio ao caos que estava
minha vida, uma onda de alegria me atingiu em cheio.
— Claro que aceito, Henrik.
— Ótimo, mas saiba que sou muito ciumento. E tem mais uma
coisinha que gostaria de falar com você.
— Agora vem a má notícia?
— Eu acho que para uma moça, deve ser uma ótima notícia. Falei
com minha mãe agora cedo, e ela irá com você fazer algumas compras. Você
precisa ter as suas roupas, antes que decida usar meus ternos. — Ele deu uma
gargalhada. — Falando sério, sei que perdeu tudo, então precisa de algumas
coisas de mulher, como não sei aonde ir ou o que fazer pedi ajuda da minha
mãe, espero que não se incomode.
— Henrik, eu não posso aceitar, tenho algumas economias e como
vou ficar aqui, posso ir comprando as roupas aos poucos. Não quero
incomodar sua mãe, e o que ela vai pensar de mim? Que sou uma golpista,
claro. Em pouco tempo venho morar com você, e você ainda faz compras
para mim. Eu não quero que gaste mais o seu dinheiro comigo.
— Olivia, tenho dinheiro, se parar de trabalhar hoje, posso viver por
muitos anos muito bem. Mas nunca tive o desejo gastar o meu dinheiro com
muitas coisas. Tenho um ótimo apartamento, um bom carro e foi só o que eu
tive ânsia de comprar. Hoje sinto uma vontade enorme de gastar esse dinheiro
com você. Estará me fazendo muito feliz se aceitar ir com minha mãe fazer
algumas compras. O dinheiro não me fará falta, e saber que te ajudei, ver um
sorriso no seu rosto, vale muito para mim. Então, por favor, faça isso por
mim.
Como se alguém estivesse ouvindo atrás da porta, a campainha tocou
e Henrik se levantou para abrir a porta. Sara entrou na sala com uma roupa
muito elegante e um casaco maravilhoso.
— Querida, você ainda está de pijama, se apresse, temos muito o que
fazer hoje.
— Mãe, ela ainda nem tomou café.
— Bom dia para você também, Henrik, podemos fazer isso na rua, se
importa, Liv?
Meu Deus a mulher parecia um furacão!
— Só um minuto, Sara, vou me trocar.
Coloquei as roupas do dia anterior, dei uma arrumada nos meus
cabelos e enquanto fechava meu casaco, andando para fora do quarto, pronta
para sair com Sara, pude ver Henrik entregando seu cartão. Acabei ouvindo
parte da conversa deles.
— Mãe, tudo que ela precisar, compre também alguns vestidos de
festa, ainda preciso conversar com ela, mas tenho alguns eventos para
comparecer e quero levar minha namorada comigo.
— Até que enfim estou ouvindo essa palavra da sua boca, preciso
achar a lista de promessas que fiz para você me apresentar uma namorada,
talvez seja fácil cumprir todas.
Fiquei um pouco sem jeito, desci as escadas fazendo barulho e entrei
na sala.
— Estou pronta, podemos ir, Sara.
Henrik se aproximou de mim, me deu um beijo, se despediu de mim e
de sua mãe, ele ficou parado na porta enquanto entramos no elevador. Não
sabia o que dizer para minha sogra, se eu estivesse no lugar dela certamente
me julgaria mal. Quando entramos no carro, fiz questão de esclarecer
algumas coisas.
— Sara, eu não preciso de muitas coisas. E eu não quero me
aproveitar da generosidade do Henrik, ele já me ajudou muito, realmente não
quero que ele gaste comigo. E, também não sei o que você está pensando de
mim, mas quero que saiba que eu gosto muito dele e…
— Pode parar de se justificar, Olivia. — Me assustei com sua
interrupção, ela já havia me julgado. — Você não tem que se preocupar
comigo e nem agradecer a mim ou ao meu filho. Na verdade, sou eu quem
tem que te agradecer pelo que você está fazendo por ele. O Henrik sempre foi
um menino muito tímido, com medo de mostrar seus sentimentos para
qualquer pessoa, deve ser por isso que ele se dá tão bem com números. As
únicas pessoas com quem Henrik sempre demonstrou carinho, fomos eu e seu
pai. Mas apesar dessas manifestações de afeto conosco, nunca soube se ele
iria se abrir para o mundo. Depois que perdeu o pai, ele se fechou mais ainda.
E olha o que você fez, abriu o coração dele, a forma como ele te chama,
como se preocupa, ele te enxerga como um cristal raro e delicado, que ele
tem que cuidar para não quebrar. E eu também vejo como você olha para ele,
tem devoção nos seus olhos. Então minha querida, eu quero aproveitar o dia
com minha nova filha. Aliás já tinha lhe falado que queria te mimar, uma
pena que não posso te encher de laços cor de rosa.
Fiquei mais tranquila depois da conversa com Sara, passamos em uma
cafeteria e compramos cafés e muffins para viagem. Depois ela dirigiu até um
shopping que eu não conhecia. Ao entrar, a única coisa que conseguia ver
eram as decorações nos corredores, bolas e laços vermelhos se espalhavam
por todo o corredor, onde seguia uma fila de árvores iluminadas, tudo estava
lindo e nem havíamos chegado à praça central, prestei tanta atenção na
decoração, que nem notei quando Sara me puxou para uma loja.
Ela conversou com uma vendedora que após alguns minutos voltou
com calças, blusas, casacos, roupas de inverno, algumas de verão, elas me
colocaram no provador e me fizeram experimentar muitas roupas. Vesti todas
as que Sara pediu, não queria ser indelicada, porque ela estava me ajudando
muito. Já estava exausta, quando terminamos. Separei as cinco peças que
mais gostei, duas calças e três blusas, e entreguei para a vendedora. Sara foi
até o caixa, e voltou sem nenhuma sacola, olhei para ela com curiosidade.
— Eles vão guardar no meu carro, passo dentro de meia hora para
pegar minha chave, assim não ficamos carregando sacolas.
Assenti, mas não entendi a necessidade daquilo, afinal eu poderia
naturalmente carregar uma sacola.
Nossa próxima parada foi em uma loja de sapatos. A loja estava com
uma decoração de Natal ainda mais bonita que a dos corredores, e Sara notou
que eu estava admirando a decoração, ela perguntou o número do meu
calçado, falou com a vendedora que saiu em direção aos fundos da loja, e
depois voltou para falar comigo.
— Você gosta de decoração de Natal?
— Sou apaixonada, o Natal é muito importante na minha família, uma
pena que esse ano estarei longe deles.
— Você já conversou Henrik, sobre essa data?
— Sim, ele sente muito a falta do pai. Mas não preciso te esconder o
que disse para ele. Falei que ele deveria aproveitar esses momentos com as
outras pessoas que ele também ama e que ainda estão vivas. Posso te pedir
para não comentar sobre isso com ele? Ele pode se sentir chateado.
— Liv, cada vez gosto mais de você, querida. Esse será nosso
segredinho, mas só de saber que disse isso para ele, mostra que você é uma
menina de bom coração e que valoriza a família.
Sentamo-nos em uma cadeira e começamos uma nova maratona de
tira e põe calçados, andava um pouquinho, parava um pouquinho, trocava o
sapato. Fiquei assustada quando chegaram algumas bolsas que combinavam
com os sapatos, o preço deveria ser muito alto, então nem quis ver. Escolhi
um par de sapatos baixos, um par de botas, que poderia usar com todo tipo de
roupas e um scarpin de salto fino que combinava com tudo, para quando
fosse sair com Henrik. Não queria que ele ficasse com vergonha das minhas
roupas.
— Antes de almoçarmos, acho que podemos dar mais uma paradinha,
o que acha?
— Acho que já compramos tudo que o eu preciso, estou satisfeita.
— Claro que não minha querida, ainda temos várias coisinhas para
ver, confie em mim.
— Tudo bem, então podemos fazer uma parada.
Entramos em loja de lingerie, foi impossível não ficar corada, afinal
minha sogra estava ao meu lado.
— Querida, você precisa de lindas lingeries e algumas roupas para
dormir. Vamos escolher algumas peças.
Olhamos vários conjuntos, de diferentes cores e modelos.
Experimentei alguns, e notei que algumas marcas se ajustaram melhor ao
meu corpo, então escolhi algumas peças. Pelo menos desta vez não tive que
desfilar.
— Liv, quero ver mais algumas peças para mim nessa loja, o que você
acha de olhar a decoração da praça central? Te encontro lá em dez minutos.
Concordei e saí da loja, ainda admirando as cores, luzes e o tamanho
das decorações. Em minha cidade, tinham muitos enfeites, mas nada parecido
com o luxo desse lugar. Na praça central me deparei com enormes ursos e
uma árvore de Natal que subia por todos os andares do shopping. Fiquei
alguns minutos observando todos os detalhes, até ouvir a voz de Sara.
— Vamos comer algo, querida. — Sara chegou perto de mim, ainda
sem sacolas, será que teríamos que passar em todas as lojas novamente, só
para pegar algumas sacolinhas?
— Nossa, estou faminta.
Paramos em um restaurante no próprio shopping e optamos por uma
comida leve, salada e salmão grelhado. Há muito tempo não comia salmão.
A conversa com Sara fluiu muito bem durante o almoço, ela
confessou que seu marido sempre teve uma posição financeira muito boa,
mas que ela nunca abriu mão de trabalhar, se afastou um pouco quando os
meninos eram muito pequenos, assim que pôde conciliar os horários
escolares deles com seu trabalho, retomou as atividades.
Conversamos bastante sobre escolas e crianças, sobre como eu
trabalhava na escola de minha cidade, e sobre como era a escola em que ela
trabalha. Ela me pediu um currículo e prometeu levar até a direção para caso
aparecesse uma oportunidade.
Ao final do nosso almoço, fomos para mais uma loja, mas por essa eu
realmente não esperava. A loja era de vestidos finos, para festas elegantes,
cada modelo daquele poderia estar no tapete vermelho do Oscar.
— Sara, o que estamos fazendo aqui? Vamos embora, por favor.
— Você precisa de alguns vestidos de festa para acompanhar Henrik
em alguns eventos. Ele sempre é convidado para eventos beneficentes e
festas organizadas pelos seus clientes, e você precisa estar linda para
acompanhá-lo. E tem mais, meu filho fica maravilhoso de smoking.
— Mas podemos comprar os vestidos numa loja mais simples, certo?
— Não, vamos experimentar alguns aqui, você deixar Henrik de boca
aberta.
Mais uma vez comecei a sessão do põe e tira os vestidos, a diferença
foi que a cada peça que colocava me sentia mais bonita, as roupas
valorizavam meu corpo e ficavam muito elegantes. Adorei desfilar nessas
roupas e acho que Sara também gostou, porque enquanto experimentava os
vestidos, ela tinha uma taça de champanhe na mão. No fim ficamos em
dúvida sobre dois vestidos e acabei optando por um verde-musgo com um
tecido em que algumas partes apresentavam alto relevo com desenhos
abstratos, mas sem brilho, o decote em V bem ousado, cintura marcada e a
saia um pouco rodada, dando movimento ao vestido deixando aparecer a
fenda na frente que subia até o joelho, apesar de não mostrar nada, tinha um
ar bem sexy.
O vestido ficou na loja para um pequeno ajuste na barra, mas fiquei
maravilhada com a ideia de Henrik me ver com aquela roupa ao invés de
uniforme, e nem me lembrei da roupa de Noelete ou o tradicional jeans e
camiseta.
Ao sairmos da loja, passamos em frente a uma farmácia, dessas que
parecem um pequeno supermercado, então me lembrei que precisava comprar
itens de higiene pessoal, pois saí correndo do apartamento e nem lembrei de
olhar se ainda estavam lá.
— Sara, preciso comprar algumas coisinhas na farmácia, você poderia
esperar?
— Vamos fazer o seguinte, enquanto você faz suas compras vou
buscar a chave do carro. Ah, agradeço se não comprar anticoncepcionais,
preciso de netos urgente.
Fiquei corada e não respondi. Entrei na farmácia, terminei minhas
compras o mais rápido possível e aguardei alguns minutos até Sara me
encontrar na porta da farmácia, ela carregava uma sacola nas mãos, o que
achei bastante interessante, afinal fugiu o dia todo delas. Seguimos para o
carro e assim que entramos ela me disse para olhar meu telefone, tínhamos
andado tanto que até me esqueci dele. Encontrei uma mensagem de Henrik.

Henrik:
Vamos começar as coisas do jeito certo.
Afinal ainda não tive um encontro com minha
namorada.
Aceita jantar comigo?

Olivia:
Claro que sim.

Sara já tirava o carro do estacionamento enquanto eu suspirava.


— Você já sabia que ele ia me convidar para jantar?
— Claro que sim, então vou te dar dois presentes de Natal adiantados.
O primeiro está nesta sacola no banco de trás, consegue pegá-la?
Me estiquei entre os bancos e peguei a sacola, que Sara carregava ao
sairmos do shopping.
— Vamos, Olivia, ande, abra logo.
A embalagem parecia ser de uma loja muito chique, abri com cuidado
e encontrei um vestido preto, com decote quadrado e mangas compridas, um
vestido simples, mas muito elegante. Ainda dentro da sacola estava um
sobretudo preto, outra peça coringa e maravilhosa. Com certeza Sara tem
muito bom gosto.
— Sara, os presentes são maravilhosos, eu adorei, realmente não
precisava. Vão combinar com os sapatos de salto que escolhi. Você existe
mesmo ou estou sonhando?
— Os sapatos e uma meia mais grossa, estão em uma sacola atrás do
seu banco. Mas esse foi um dos presentes.
— Como assim?
— Já estamos chegando no outro presente, sempre quis ter uma filha
para fazer isso comigo.
Andamos mais um pouco e Sara estacionou o carro, me pediu para
levar as roupas e os sapatos. Chegamos a um salão de beleza enorme.
Estanquei na porta.
— Não posso entrar, é muito caro.
— Querida, nunca diga não a um presente de sua sogra, mesmo que
seja um suéter de alces. Vamos.
Entramos e percebo que Sara já é conhecida no local. Primeiro
fizemos as unhas, depois limpeza facial, massagem, depois somos levadas a
quartos separados para tomarmos banho, depois cuidamos dos cabelos, que
recebem uma hidratação, corte e escova.
Entramos e percebi que Sara já era conhecida no local. Primeiro
fizemos as unhas, depois limpeza facial, massagem, depois fomos levadas a
quartos separados para tomarmos banho, depois cuidamos dos cabelos, que
receberam uma hidratação, corte e escova.
— Meu bem, seu cabelo é maravilhoso, só faltava um cortezinho,
fazia tempo que essas pontinhas não viam tesoura, não é mesmo? — Lion, o
cabelereiro perguntou em tom de afirmação, e ele tinha razão, corte de cabelo
não estava na minha lista de prioridades nos últimos meses. Respondi com
sorriso sem graça.
— Agora só falta a maquiagem, mas com esse rostinho, humm, vou
só dar uns toques para valorizar esse olhar. — Pronunciou Kenny, um
maquiador que tinha bastante estilo.
Quando terminaram a maquiagem, olhei no espelho e me achei linda,
não ficou exagerada e realmente valorizou meus pontos fortes. Me indicaram
um dos quartos para me trocar e encontrei meu vestido e casaco passado, e…
uma lingerie vermelha. Sara não parava de me surpreender.
Troquei de roupa e voltei para o salão, onde sabia que ela me
esperava. Ao seu lado estavam o cabeleireiro e o maquiador, quando me
olharam vi seus olhos se abrirem, e pequenos gritinhos tomarem conta do
ambiente.
— Meu Deus, Olivia! Você está lindíssima, meu filho vai derreter ao
olhar para você.
— Garota, quem não quer um kit desses? Vem com um super corpão
desses, um gatão ruivo maravilhoso e uma sogra que parece fada madrinha!
Em que lua você nasceu? — Foi a vez de Lion comentar. Hoje eu realmente
acho que ele tem razão.
— Muito obrigada, eu realmente me sinto linda, não sei como
agradecer. — Minha voz saiu cheia de emoção.
— Para mim é fácil. — Sara foi a primeira a se manifestar. — Faça
meu filho feliz.
— Bom, garota, nós queremos postar uma foto sua e marcar você em
nossas redes sociais, você tem, né? E depois volte com Sara mais vezes,
vamos adorar. — Novamente foi Lion quem respondeu.
— Eu até tenho, mas não conheço muita gente.
— Pode acreditar, com aquele gato do seu lado e com essa produção,
rapidinho seu perfil vai bombar! Fique em frente àquele painel para tirarmos
algumas fotos. — Kenny me levou até o local onde seriam tiradas as fotos.
Fui para o local indicado, mas não sabia o que fazer com as mãos ou
como me portar, os meninos que me atenderam deram algumas dicas e
quando vi as fotos que eles tiraram fiquei envaidecida. Realmente estava
muito bonita, quase não me reconheci na foto.
— Então vamos, Sara?
— Não.
— Não?
— Henrik está te esperando lá fora, aproveite a noite, querida.
Olhei para fora e senti minhas pernas mais fracas, estava ansiosa para
ver Henrik. Saí no frio da noite e do alto da escada vi meu ruivo encostado
em seu carro, com um sobretudo preto, muito elegante, e olhando para mim.
CAPÍTULO 15
HENRIK
Dia 17/12 – Terça-feira
Maravilhosa! Olivia desceu as escadas devagar, parecendo estar
flutuando.
— Boa noite, Henrik — ela disse assim que ficou na minha frente.
— Boa noite, Olivia — falei enquanto a abraçava e lhe dava um beijo
casto, não queria estragar sua maquiagem. — Você está linda.
Abri a porta do carro para ela, quando me sentei em meu lugar, olhei
mais uma vez para acreditar que ela estava comigo. Quando liguei para ela
ontem e a ouvi chorando, meu coração ficou muito apertado, uma sensação
que nunca havia sentido na vida tomou conta de mim. Tudo o que mais
queria era tirar Olivia em segurança de seu apartamento. Eu a encontrei tão
frágil e tão quebrada, que a sua dor também doía em mim. A vontade de
protegê-la foi ainda maior, uma sensação de que nada mais importava se ela
não estivesse em segurança. Então quando a vejo tão sorridente ao meu lado,
me sinto completamente preenchido, percebo que faltava um pedacinho de
mim, mesmo que eu não soubesse, e agora eu o encontrei.
— Aonde vamos? Estou curiosa.
— Pensei em ir em um restaurante italiano que eu gosto muito, já
notei que você gosta deste tipo de comida.
— Sim, eu adoro. — Seu sorriso não diminuía do rosto, tão diferente
de ontem, com certeza eu preferia assim.
Olivia ficou em silêncio durante o caminho, e eu também sorria e me
lembrava de como hoje o dia foi diferente: começou com uma ligação para
minha mãe, primeiro expliquei o que aconteceu com Olivia e pedi sua ajuda,
e para minha alegria ela se dispôs rapidamente. Confesso que estava curioso
para saber como seria a interação delas, até começar a receber algumas
mensagens de minha mãe.

Mãe:
Querido, ela quer levar apenas umas poucas
peças.
Diz que não quer que você gaste com ela.
Como você achou uma mulher que ganha um passe
livre para compras e não quer utilizar?

Henrik:
Oi mãe, sabe não a achei, eu atropelei ela!
Kkkkkk
Se achar que é muito pouco, compre outras
coisas que você perceber que ela gosta e precise.
Talvez ela fique um pouco incomodada, mas não
pode ficar sem roupas.

Mãe:
OK, vou pensar o que posso fazer.

Henrik:
Tem mais uma coisa mãe, quero levá-la para
jantar hoje.
Que horas vocês voltam para minha casa?

Mãe:
Que tal mais uma surpresa para ela?
Daqui a pouco te passo o endereço de onde você
irá buscá-la para o jantar.
Confia em mim?

Henrik:
Cuide bem dela!
Aguardo o endereço. Beijos.

Continuei a trabalhar, mas não deixei de pensar em Olivia e minha


mãe juntas.
Estava sorrindo em frente ao comutador quando Mark entrou na sala.
— Henrik, esse relatório que me enviou para a reunião das duas horas
… — Ele parou a alguns passos da mesa, parou de falar e ficou me olhando.
— Desde quando você sorri assim?
Erick resolveu entrar exatamente nesse momento.
— Desde que atropelou a moça da cafeteria — Erick respondeu por
mim. — Não sei como ele fez isso, nosso amigo tão reservado, quase mata
uma garota e depois a leva para sua casa. E agora fica aí, com essa cara de
bobo.
Erick e minha mãe foram as únicas pessoas que acompanharam minha
aproximação com Olivia desde o início. Considerava todos os meus sócios
muito amigos e próximos, entretanto como passava mais tempo com Erick
por nossas atividades na empresa serem complementares, acabei tendo mais
afinidade com ele. Mark se aproximou da minha mesa e fez uma ligação.
— Frank, reunião de emergência agora na sala do Henrik. Isso agora.
— Assim que desligou o telefone, sentou-se em uma cadeira à minha frente.
— Acho que precisamos ser atualizados de alguns acontecimentos, embora
eu preferisse que você tivesse nos convidado para tomar uma cerveja e
conversar. Mas é você, Henrik, então vamos fazer isso numa reunião do
escritório mesmo.
Frank chegou rapidamente ao meu escritório. Meus três sócios
estavam sentados à minha frente, e começo a contar a história, com algumas
intervenções de Erick sobre eu ser muito lento e não ter convidado a garota
para sair antes.
Quando terminamos nossa “reunião” verifiquei meu telefone e vi que
minha mãe enviou o endereço onde deveria buscar Olivia, uma rápida
pesquisa na internet e descobri que elas iriam a um salão de beleza juntas,
tive certeza de que as mulheres da minha vida se deram muito bem. Foi um
dia daqueles difíceis de passar, até para mim que adoro meu trabalho.
Olhando para Liv agora, sei que minha mãe cuidou muito bem dela.
Chegamos ao restaurante que eu havia reservado, solicitei uma mesa
em local que tinha ampla visão do restaurante, as mesas com toalhas xadrez
em azul e branco sobrepostas por outra branca, bem mais curta, a madeira nas
paredes e as luzes amarelas tornavam o ambiente aconchegante, e as mesas
arrumadas com taças, talheres e pequenos pratos incorporavam uma
sofisticação ao local.
Nos sentamos e pedi um vinho tinto e uma seleção de queijos.
Aguardo o garçom nos servir para voltar a conversar com Liv, que apesar de
estar com um grande sorriso, parece um pouco desconfortável.
— Liv, está tudo bem?
— Sim, esse é um lugar muito bonito, nunca estive em lugar tão
elegante.
— O restaurante é bonito, mas ter você ao meu lado é o mais
importante para mim. Sem contar que com certeza estou com a mulher mais
linda desse lugar.
O sorriso em seu rosto se abriu ainda mais e vi seus olhos brilharem,
essa mulher me encantava a cada dia mais, algo explodia dentro de mim a
cada segundo que passava ao seu lado, e todos eles pareciam insuficientes
para aplacar minha ânsia de estar ao seu lado.
Conversamos assuntos amenos, aproveitamos a companhia um do
outro. Escolhemos nossos pratos. Eu optei por um Spaghetti alla Carbonara
e Liv escolheu um Bucatini all’Amatriciana.
— Hummm! Essa comida está deliciosa! — Liv comentou enquanto
fazia uma expressão muito engraçada.
— Que bom que você gostou, Liv.
— Henrik, o que você geralmente faz no Natal? Você já comentou
comigo que não comemora com sua família.
— Na verdade, Liv, eu fico em casa. Não tenho vontade de estar com
ninguém depois que meu pai faleceu. E você já pensou o que fazer nesse ano?
Pensou em ir visitar seus pais? — perguntei já com receio da resposta, não
gostaria que ela se afastasse de mim agora, apesar de recente já sentia sua
falta.
— O Natal sempre foi uma data muito importante na nossa família,
nosso jantar na véspera do Natal sempre foi alegre, cheio de parentes,
comidas gostosas e abraços calorosos. Não sei o que fazer esse ano. Eu tenho
muita dúvida de como seria recebida, principalmente por meu pai.
— Se você quiser posso ir com você, ou podemos ficar juntos nesse
dia, o que acha?
— Gostaria muito de apresentar você aos meus pais, mas primeiro
preciso me resolver com eles. Eles precisam me perdoar e aceitar minhas
decisões, e eu preciso encontrar uma forma de me desculpar por ter saído de
casa de forma tão brusca.
— Entendo sua decisão.
— Hoje à tarde sua mãe comentou que fará um jantar, e que seu irmão
e a namorada estarão lá. Você ainda tem alguns dias para reconsiderar sua
decisão e passar essa data com as pessoas que você mais ama.
— Vou pensar, você iria comigo?
— Claro que sim!
Terminamos nosso jantar com uma conversa mais amena e logo
fomos para casa, foi um dia muito intenso e cansativo para nós dois.
◆◆◆

Dia -18/12 - Quarta-feira


Eu realmente adorava acordar com Liv, nossos corpos enroscados, seu
semblante tranquilo enquanto dormia e seu cheiro adocicado, eram a melhor
definição de como começar um bom dia.
— Bom dia, meu anjo — disse baixinho em seu ouvido para que ela
acorde.
— Bom dia, meu alarme ainda não tocou. Mas tudo bem, prefiro
acordar com sua voz.
— Muito bom saber disso, assim posso tirar aquela música do seu
despertador.
— Vamos, levante-se, antes que eu mude de ideia e te prenda o dia
todo nessa cama.
— De jeito nenhum, não posso faltar mais nenhum dia do trabalho.
— Então vamos, suas compras estão no outro quarto, pedi para
deixarem lá, por enquanto.
Ela se levantou e foi em direção ao quarto onde dormiu a primeira vez
que esteve em minha casa, fui junto com ela, pois queria ver sua reação ao
abrir a porta. Olivia bocejou no caminho, abriu a porta e acendeu a luz.
O quarto estava cheio de sacolas, muito mais coisas do que ela
escolheu. Minha mãe fez algumas escolhas a mais para ela, para que ela
tivesse um guarda-roupas como merecia. Seus olhos percorreram o quarto e
ela se virou para mim.
— Henrik, acho que houve um engano, não fiz todas essas compras,
eu juro que só escolhi algumas coisas.
— Eu sei, você não parece muito boa em aceitar presentes, mas não
pode ficar com tão poucas peças de roupa, então pedi à minha mãe que desse
uma incrementada nas suas compras, ela me disse que escolheu as peças que
você demonstrou ter gostado. Mas se tiver alguma que não goste, pode trocar.
— Meu Deus, Henrik, são coisas demais. E ainda tem algumas coisas
que nem pensei em comprar, como essas maquiagens, cremes, perfumes e
brincos, eles parecem muito caros, não sei quando vou conseguir te pagar
tudo isso.
— Acho que você não entendeu a parte em que eu disse que são
presentes. Não quero e não aceito que me pague nada. O que desejo é ver
você feliz e linda usando cada uma dessas peças.
— Henrik, muito obrigada! Eu nem sei o que dizer. — Ela me
abraçou e vi lágrimas escorrendo em sua face.
— Hei, eu disse, quero ver você feliz!
— Estou mais do que feliz e muito grata por tudo o que você tem feito
por mim. Obrigada, Henrik!
Tomei sua boca em um beijo carinhoso, que foi interrompido pela música
de seu alarme, que nos puxou de volta ao mundo onde o relógio nos guiava
entre os deveres diários.
CAPÍTULO 16
OLIVIA
Dia 19/12 - Quinta-feira

— Henrik, eu já disse que posso ir de metrô, não precisa sair mais


cedo.
— Vamos, já estou pronto. Sabe, até estou gostando de chegar mais
cedo, tenho alguns minutos de silêncio para trabalhar. Liv, por favor pegue
roupas bem quentinhas quero te levar em lugar à noite.
— Posso saber aonde vamos? Preciso saber o que vestir.
— Surpresa, é claro, mas vai precisar ficar bem aquecida, nada
chique, só confortável. Passo na cafeteria no final do dia e saímos de lá.
Combinado?
— Claro, gato! — Eu passei por ele deixando um beijo em sua boca.
No caminho para nossos trabalhos abri minha rede social para ver as
fotos que o salão postou, para minha surpresa vejo que meus seguidores
subiram de cinquenta para cento e cinquenta em uma noite. Não sei
exatamente como aconteceu, e não conhecia a maioria das pessoas que
passaram a acompanhar minhas postagens. Então abri o perfil do salão e
constatei que a foto teve mais de mil curtidas. Nunca imaginei que isso
poderia acontecer com uma foto minha.
Ainda impressionada com a explosão de seguidores em minha rede
social, comecei meu turno no preparo dos cafés. O dia seguiu tranquilo, o que
agradeci muito, afinal foram muitas emoções nos últimos dias.
Já até me acostumei com esse uniforme de Noelete, nem reclamo
mais, e para ser sincera, talvez eu até sinta saudades desse uniforme. Acho
que não!
Henrik chega à cafeteria às seis e quinze e já estava pronta para
sairmos, coloquei meu gorro e minha luva. Ele abraçou minha cintura e
saímos juntos da Star’s Capuccino.
— Ansiosa?
— Estou mais curiosa, aliás fiquei curiosa o dia todo!
Ainda estávamos na calçada da cafeteria quando ouvi gritos de uma
voz conhecida, mas não identifiquei imediatamente de quem se tratava.
— O que você está fazendo com minha noiva? Tire as mãos dela!
Viramos juntos para ver o que estava acontecendo e vi Aidan com um
olhar furioso e um casaco tão antiquado quanto as camisas que costumava
vestir.
— Já falei para você tirar as mãos da minha noiva! — ele gritou e
apontou para mim.
— Oi? Noiva? — Henrik olhou para mim e nem precisou dizer nada,
seu semblante já perguntava “que porra está acontecendo aqui?”
— Você se lembra quando te contei de como saí de casa? Foi ele
quem fez o pedido — falei olhando para Henrik e depois me voltei para
Aidan. — E que eu me lembre, Aidan, recusei seu pedido de casamento.
Recusei dez meses atrás e não nos falamos esse tempo todo!
— Ah! — Henrik murmurou enquanto me puxava para mais perto
dele, e podia ver a cara de fúria de Aidan em minha frente. — Bom, se o
mal-entendido já está resolvido, vamos embora, meu anjo.
— Quem você pensa que é para falar com ela nessa intimidade?
Olivia, precisamos conversar, não sei porque você fugiu daquele jeito, mas eu
te perdoo. Eu já havia acertado nosso noivado com seu pai, era só um
protocolo você dizer que sim. Quando você não aceitou fiquei chateado e por
isso saí da sua casa daquela forma! Mas quando me acalmei, percebi que
você só estava surpresa e não soube como reagir. Vamos embora, e
conversamos com calma. — Aidan deu um passo em nossa direção e nós
recuamos mais.
Henrik, estava tranquilo, mas eu não sabia o que fazer. Apenas
balancei a cabeça negando, e incrédula com o que ele disse. Nunca imaginei
reencontrar Aidan, muito menos que ele imaginasse que teríamos algum
compromisso. Ele abaixou a cabeça, andou novamente em nossa direção e
voltou a falar:
— Saiba que não parei de pensar em você nenhum dia. Volta comigo
para casa, seus pais estão com saudades e eles gostam de mim também. A
gente pode se entender e nos casar, já disse que pode escolher o quiser para o
casamento. Eu queria ter vindo antes para te buscar, mas só agora consegui
seu endereço. Eu te amo e posso te perdoar, seremos muito felizes, anda logo,
Olivia, sai de perto desse cara e vamos embora.
Comecei a pensar que Aidan usou alguma droga ou medicamento, não
podia ser normal uma pessoa agir assim. Ele sempre pareceu uma pessoa tão
calma e bem-vista na cidade. Depois dessa última frase, realmente me
assustei com a atitude dele. Henrik me apertou ainda mais ao seu corpo.
— Eu sou o namorado dela, e se você chegar perto da Liv novamente,
meus advogados vão garantir que você tenha uma longa estadia bem longe de
nós — Henrik falou muito firme e me conduziu para irmos embora.
— Então é isso, Olivia. — A voz de Aidan estava cada vez mais cheia
de raiva. — Eu vi sua foto na rede social, toda chique, você se vendeu para
ele, como uma puta.
Foi tudo muito rápido, Henrik me soltou, se virou e deu soco no rosto
de Aidan, que não esperava por isso, e caiu de costas no chão. Henrik ainda
estava em postura de briga esperando a reação de seu oponente, mas ela não
veio, ele apenas sentou-se na calçada com mão no rosto.
— Minha paciência com você acabou, Aidan, nunca mais chegue
perto de nós ou fale com Liv, esse é meu último aviso.
Henrik se virou, pegou minha mão e andamos a passos rápidos até o
estacionamento. Quando entramos no carro, nossos suspiros foram
simultâneos.
— Henrik, eu juro que nunca tive nada com ele, nem namoramos,
nada. Não poderia imaginar que ele teria uma atitude como essa,
principalmente depois de tanto tempo.
— Tudo bem, meu anjo. Mas acho bom ficarmos de olho, ele não
pareceu uma pessoa normal. E você, garota, anda agitando minha vida, não
é? — respondeu tentando suavizar a situação.
— Ele estragou nossa noite. Vou entender se quiser ir para casa.
— De forma alguma, vamos manter nossos planos, espero que você
goste, o que aconteceu hoje ficou naquela calçada.
Henrik dirigiu por alguns minutos pelas avenidas de Manhattan, o
trajeto foi feito em silêncio, precisávamos de um tempo para esquecer o
episódio em frente à cafeteria. Quando entrou em um estacionamento
procurei por alguma placa que pudesse dizer onde estávamos, mas não
encontrei nada que me chamasse a atenção. Saímos do carro e começamos a
caminhar, estava realmente frio. Entre as luzes que enfeitavam as fachadas e
entradas dos prédios, e as árvores iluminadas, eu procurei por algo diferente à
nossa volta, e nada, estava muito curiosa para saber aonde íamos.
Ao virarmos em um esquina eu entendi onde estávamos, no Bryant
Park, um dos lugares que eu queria muito visitar nesta época do ano. De
longe avistei a enorme árvore de Natal, quando chegamos mais perto me
encantei com uma feira de artigos de decoração de Natal. Eram várias
barracas, lado a lado que pareciam pequenos chalés, as luzes amarelas deram
um tom aconchegante ao local. A cada barraca me encantei mais com objetos,
artesanatos, peças de vestuário, e um cheiro ótimo na área destinada a
gastronomia.
Andamos mais um pouco e me deparei com uma enorme pista de
patinação no gelo, as pessoas passavam de um lado para o outro parecendo
flutuar, alguns arriscavam pequenas manobras como giros e outros se
agarravam às barras de proteção para não cair. Algumas cadeiras estavam em
volta da pista e as pessoas sentadas assistiam ou esperavam.
— Henrik, eu amei esse lugar, quero comer, comprar enfeites e
assistir patinação no gelo. Quer dizer, desculpe, posso colocar alguns enfeites
de Natal na sua casa, bem discretos. — Fiz a minha melhor cara do gato de
botas! — É Natal, entendo sua hesitação com a data depois de nossas
conversas, mas é impossível não se empolgar com tantas decorações lindas e
esse clima de alegria das pessoas à nossa volta.
— Podemos fazer um acordo, Liv. Você pode escolher quantos
enfeites quiser, menos uma árvore, mas com uma condição. Vamos patinar
no gelo!
— Ha-ha-ha. Muito engraçado, eu nunca cheguei perto de uma pista
de patinação, não sei fazer isso. Essa é uma condição que não posso cumprir,
isso não vale.
— Não disse que você vai sozinha, eu disse que nós vamos. E eu sou
muito bom nisso, já joguei Hokey[4], nada profissional, claro, mas sei me
mover no gelo, eu te seguro. Vem comigo, temos que alugar os patins e
comprar os ingressos.
— Você tem certeza, não pode escolher outra condição? — Ele foi me
puxando enquanto observava as pessoas na pista de gelo.
Depois de alguns minutos já estávamos sentados em um banco,
calçando os patins, não tinha ideia de como me levantar, muito menos andar
até a pista, e meu Deus, o gelo escorrega!
— Liv, estamos bem pertinho da pista, primeiro vamos nos levantar,
aí você vai se equilibrar sobre o patins, depois vamos até a entrada, eu entro
primeiro, depois você segura a minha mão e vamos começar a nos mover.
Hoje a pista está muito cheia, então fique perto de mim, certo?
— Nada certo. Por favor, não deixe minha cara ficar grudada no gelo
da pista. Olha lá aquela menina caiu de quatro!
Henrik deu uma gargalhada, como poucas vezes o vi fazer. Devagar
fizemos exatamente o que ele falou. Aos poucos fui me soltando e sentindo o
gostinho de deslizar no gelo. O medo aparecia quando alguém passava em
alta velocidade perto de mim, precisavam avisar essas pessoas que não tinha
prêmio para quem chegasse primeiro.
— Henrik, vamos tirar uma foto nossa? Ainda não temos uma, e
adorei esse lugar.
Ele pegou o telefone de minha mão, me abraçou e estendeu o braço
para tirar uma selfie. Nossa foto ficou linda.
— Amei essa foto. Se importa se eu postar na minha rede social?
— Não me importo, assim todos já ficam sabendo que você é minha
namorada. Por favor, marque meu perfil, não uso muito essas coisas, mas
faço questão de postar nossa primeira foto juntos.
Postei a foto, adicionei e marquei Henrik, fiz uma anotação mental
para dar mais tarde dar uma olhada em suas fotos anteriores, guardei o
telefone e continuamos a patinar. Quando já sentia confiança, fiquei perto da
barra que cercava a pista e meu namorado foi dar uma voltinha. Isso foi o que
ele disse, mas ver aquele homem enorme, deslizando rapidamente pelo gelo,
desviando de obstáculos, digo dos mais lentos como eu, com rosto
concentrado e expressão fechada, foi sexy para caramba.
Ficamos na pista mais alguns minutos andando lentamente, até que
enfim fomos ao meu prêmio por ter enfrentado o desafio no gelo. Escolhi
algumas peças de decorações natalinas, para a sala, bem discretas e uma
guirlanda para nossa porta. Nossa porta, era assim que me sentia, mesmo com
tão pouco tempo morando ali.
Enquanto fazia minhas compras Henrik foi buscar o jantar, preferimos
comer em casa e sair daquele frio todo. Com embalagens nas mãos fomos em
direção ao carro. Eu já estava pensando em como agradecer a surpresa, seria
em nossa cama, com muitos beijos, carinhos e toques especiais, para
incendiar nossos corpos.
CAPÍTULO 17
Olivia
Dia 21/12 – Sábado

Tudo que aconteceu nas últimas duas semanas pareceu absolutamente


irreal. O principal motivo era que eu tinha Henrik ao meu lado depois de
tantos dias esperando a porta da cafeteria se abrir para ver seu sorriso, ele
parecia inacessível para mim e ainda me surpreendo com cada toque e cada
palavra de carinho que ele dirige a mim.
Hoje vamos a um baile de gala, ele me disse que lá estarão alguns
funcionários da empresa, também alguns de seus principais clientes. Por isso
escolhi o vestido verde que Sara me ajudou a escolher em nosso passeio no
shopping. Também nunca imaginei ir a um lugar assim ou ter uma roupa tão
requintada e bela.
E ir pela segunda vez na semana a um salão de beleza, me fez
questionar se realmente não estava vivendo um sonho. Quando comentei com
Henrik que iria me arrumar em casa, ele rapidamente negou e disse que já
havia solicitado sua mãe, no dia em que estivemos no salão, que deixasse
agendado o atendimento de hoje. Insisti que não precisava se preocupar e
nem ter mais gastos comigo, sua resposta foi:
— Você precisa aprender a deixar que cuidem de você!
Mas eu poderia aprender a deixar outras pessoas a cuidarem de mim?
Nos últimos meses aprendi a viver só e a cuidar de mim mesma, e se eu abrir
a guarda e me acostumar com isso, o que vou fazer quando Henrik não
estiver ao meu lado?
Não quero me afastar dele, mas ele poderia perceber que somos muito
diferentes, principalmente quando eu me mudar, porque o nosso acordo é que
eu ficarei em sua casa até o começo do próximo ano. Não sei como será
minha vida depois de tudo que temos passado juntos, vai ser difícil me afastar
depois de me acostumar a dormir em seus braços todas as noites. Então
aprender a deixar que cuidem de mim, não pode ser uma opção.
Apesar dos meus receios, não pude negar o pedido de Henrik e vim
me arrumar no salão. Desta vez, me sentia mais à vontade, porque já sabia o
que esperar e também conhecia os profissionais que iriam me atender.
Como sempre fui muito bem recebida e a recepcionista, que avisou
que o meu vestido já foi entregue e comentou que a mãe de Henrik acabou de
sair do salão. Meu atendimento começou e o processo de arrumar as unhas,
os cabelos e a maquiagem se repetiram. Para as unhas optei por um branco
delicado, e bem discreto. Para os cabelos, Lion me recomendou um penteado
com os cabelos semi presos, deixando meu rosto em evidência e destacando
meus cachos que caiam em cascata nas costas, valorizando meu rosto e o
decote do vestido. Pedi para Kenny uma maquiagem leve, ainda queria
parecer eu mesma, mas valorizando meus olhos, ele concordou, mas me
convenceu a colocar mais cor nos lábios com batom vermelho, que segundo
ele não sairia da boca nem se eu beijasse por doze horas seguidas. Quando
Kenny finalizou a maquiagem segui para o quarto onde encontrei o vestido
pendurado, a loja havia entregue diretamente no salão, ele era ainda mais
lindo do que eu me lembrava, seu tom de verde-musgo contrastava com
minha pele clara e seu tecido se acomodava em meu corpo. Calcei os sapatos
de salto e coloquei alguns itens em uma pequena bolsa de mão. Bem na hora
combinada eu estava pronta.
Voltei ao salão e todos me olharam, inclusive algumas clientes que
ainda estavam no local, me deixando um pouco constrangida. Novamente
Lion e Kenny, me encaminharam para um painel muito bonito onde eram
tiradas as fotos para as redes sociais do salão, acenderam algumas luzes, que
segundo eles eram esplêndidas para as fotos e começarem a me orientar como
deveria me posicionar. Me senti linda e como uma estrela prestes a entrar no
tapete vermelho do Óscar.
— Garota, você foi um sucesso essa semana, suas fotos foram muito
comentadas aqui no salão. E com esse vestido hoje será mais uma semana em
que você vai estar na boca do povo — Lion disse sorrindo muito enquanto
olhava as fotos.
— Não me sinto confortável em saber que estão falando de mim.
— Olha, Oliva, aproveita porque são elogios. Sabemos que Henrik é
discreto e não muito famoso nas colunas sociais. Mas é lindo e tem vários
clientes importantes, que estarão nesta festa, vários estarão com esposas e
filhas que com certeza adoram comentar os looks da festa e tem grandes
chances de procurarem você nas redes sociais. Então vamos caprichar. Ok?
— Kenny terminou de falar e pegou o grosso casaco que usarei no caminho.
O local da festa possuía aquecimento, estarei confortável com o
vestido mesmo com seu decote e os braços desnudos. Enquanto colocou o
casaco continuava falando:
— Aproveito para dizer que andei olhando sua rede social, precisa dar
uma levantada nela, está muito sem graça. Mas achei fofa a foto que postou
com seu ruivo! Você tem potencial para fazer sucesso nesse meio, precisa só
de umas dicas, como gostei de você, da próxima vez que vier, enquanto faço
a maquiagem vou te dando algumas instruções. Agora vai se divertir, porque
arrasar tenho certeza de que vai!
Kenny e Lion levaram as mãos próximas ao peito e bateram palmas
em movimentos quase silêncios, me encaminhei para porta enquanto sentia
como se milhões de borboletas batessem asas em minha barriga, só espero
que Henrik também goste do vai ver.
Vesti meu sobretudo, abri a porta do salão e senti o ar frio batendo em
minha face, olhei para a rua à procura de Henrik, ele estava encostado no
carro, de braços cruzados e olhando para mim. Desci os degraus que nos
separavam e observei que embaixo de seu casaco ele usava uma gravata
borboleta, rapidamente o imaginei de smoking, minha curiosidade teria que
aguardar até o salão.
Enquanto descia ele me estendeu uma das mãos e pela segunda vez na
semana me senti como uma princesa em um conto de fadas. Peguei sua mão e
ele me conduziu para dentro do carro, só então notei que estávamos em uma
limusine, a parte interna era enorme e uma luz clara iluminava seu interior.
Henrik fechou a porta, sentando-se ao meu lado.
— Eu tenho convicção de que você será a mulher mais linda da festa,
e todos os homens vão ficar com muita inveja de mim! Você não vai sair do
meu lado — ele disse de forma carinhosa e um pouco possessiva. — Mas
parece que está faltando alguma coisa em você!
— Nossa, eu fiz algo de errado? Esqueci de pegar alguma coisa?
Você não gostou do vestido? — Senti a ansiedade subir pela garganta e soltei
em uma sequência de perguntas que foram interrompidas pelo sorriso e a voz
de Henrik.
— Não. Mas talvez isso aqui ajude você a ficar ainda mais
deslumbrante.
Ele tirou uma caixinha de veludo preta do bolso de seu casaco e me
entregou, fiquei com receio de abrir. Com as mãos trêmulas abri a caixinha e
encontrei um maravilhoso par de brincos, a peça era longa, na extremidade de
cima estava uma pedra verde, e por trás dela saíam três fios dourados que se
entrelaçavam até a parte inferior onde envolviam outra pedra verde. Tive a
sensação de que meus olhos dobraram de tamanho, com certeza era uma joia.
— Henrik, são lindos e combinam com meu vestido! — Tentei dizer
ainda extasiada pelo brilho da joia em minhas mãos. — Essas pedras são
magníficas, elas são…
— Sim, são esmeraldas. Perguntei para minha mãe a cor do seu
vestido, mas fui eu quem escolhi os brincos! — ele disse orgulhoso de ter
escolhido algo que realmente gostei muito.
— Henrik, não fica bravo comigo, mas tenho receio de usá-los. E se
eu os perder e não puder te devolver depois da festa?
— Me devolver? — Ele começou a rir. — Você realmente não
entende nada sobre ganhar presentes. Deixe-me ajudá-la, vão ficar lindos em
você.
Ele pegou a caixinha de minhas mãos, retirou um dos brincos e me
entregou. Depois que o ajustei ele me entregou o outro.
— Ficaram lindos!
— Obrigada, pelos brincos e pelo elogio. Mas depois conversamos
sobre ser um presente.
Ele me olhou de lado e sorriu. Depois pega uma de minhas mãos e
depositou um beijo suave e carinhoso. O restante do caminho conversamos
sobre coisas amenas, até estarmos quase chegando ao local da festa.
— Meu anjo, alguns fotógrafos podem estar na porta. Alguns de
nossos convidados são bastante conhecidos na cidade, e sempre tem alguns
paparazzis aguardando uma foto. Não se assuste com os flashs.
— Eu não sei o que fazer nessas situações.
— Estarei ao seu lado o tempo todo, apenas caminhe devagar. Talvez
seja necessário parar em algum momento da entrada para tirar fotos, se
conseguir sorria. Não precisa responder à nenhuma pergunta. Logo estaremos
dentro do salão e vai se sentir mais à vontade, mas com certeza não será o fim
das fotos. Tudo bem?
— Ao seu lado, sempre me sinto segura. Então sim, está tudo bem. —
Também disse para tentar me convencer, será a primeira vez que vou a um
evento desses. Quando via essas festas na televisão ou em filmes ficava
imaginando como seria se eu estivesse ali. Hoje, com certeza vou descobrir,
mas não me sinto tão à vontade como as pessoas dos filmes.
O carro parou e vi vários flashs sendo disparados, não consegui ver o
que acontecia do lado de fora. Mas aquele frio na barriga se instalou
novamente em meu corpo.
— Está pronta, meu anjo?
— Lá vamos nós!
Ele saiu do carro e me estendeu a mão, desci com sua ajuda e parei ao
seu lado. Ele acomodou a mão na base da minha coluna, me transmitindo
segurança e mostrando a todos que eu estava com ele. Depois de alguns
passos em direção ao salão vemos alguns flashs sendo disparados, mas
continuamos caminhando.
Ao entrar no salão passamos pela antecâmara onde estava a
chapelaria, tiramos os casacos que foram guardados ali antes de seguirmos
em direção à festa. Quando meu ruivo tirou o casaco, consegui ver como ele
ficou garboso com um smoking preto, que claro se ajustava ao seu corpo,
fazendo com que ele parecesse ainda mais alto e forte. Esperava que ele
realmente não saísse do meu lado essa noite, porque tenho certeza de que
muitos olhares femininos estarão no homem ao meu lado.
Novamente vi flashs no corredor à nossa frente. Henrik circundou
minha cintura com os braços e disse próximo ao meu ouvido:
— Ali estão alguns jornalistas convidados. Você está bem?
— Sim, estou. — Embora o tremor das minhas mãos contradiga o
estou dizendo.
Novamente enfrentamos as fotos, mas desta vez tivemos que parar.
Henrik não se afastou nenhum instante de mim, que consegui sorrir para os
jornalistas. Então começaram as várias perguntas, que nem consegui
identificar de onde vinha.
— Quem é sua acompanhante, Henrik?
— De qual estilista é seu vestido?
— Qual a relação de vocês?
— Henrik, espera fechar muitos negócios nesta noite?
— Senhorita, pode nos dizer seu nome? Você também trabalha no
mercado financeiro?
Continuei sorrindo e sem saber o que dizer e grata por sentir os braços
de Henrik me tocando. Ele quebrou nosso silêncio se dirigindo aos
jornalistas.
— Para a noite de hoje espero que nossos convidados se divirtam, dos
negócios falaremos na segunda-feira. — Alguns jornalistas sorriram. — Esta
é minha namorada, Olivia.
Ao fim de suas palavras, ele me conduziu para dentro do salão, mas
ainda continuei ouvindo algumas perguntas dos jornalistas. Então percebi que
ele disse que somos namorados para a imprensa. Embora ele diga que é muito
discreto e não apareça em colunas sociais, entendi isso como um grande
passo, e fiquei satisfeita mesmo que não tenhamos conversado abertamente
sobre isso. Ele assumiu para quem quisesse ouvir que somos namorados,
senti uma grande felicidade invadir meu peito, essa foi mais uma
demonstração de que ele gostava de mim, e mais do que isso, que levava
nosso relacionamento a sério, que é importante a ponto de divulgar para
quem quiser saber.
Depois de alguns passos e muitos pensamentos que passaram rápido
por minha cabeça, me deparei com um espaçoso salão repleto de grandes
mesas redondas, a decoração toda em vermelho e dourado e com várias velas,
com temas natalinos, tudo de extrema elegância e bom gosto.
Nos dirigimos a uma mesa próxima à pista de dança onde já havia um
casal sentado. Nos aproximamos e Henrik iniciou as apresentações.
— Boa noite, Mark, que bom que já chegou. Essa é Olivia Campbell,
minha namorada.
— Olha só, finalmente conheço o motivo de tantas mudanças de
humor nos últimos dias. Senhorita Campbell, muito prazer, sou Mark Vargas,
por favor, me chame apenas de Mark. — Estendi a mão com a intensão de
apertamos as mãos, mas ele levou minha mão aos lábios, num gesto
charmoso, que não passou despercebido por Henrik.
— O prazer é meu, e, por favor, somente Olivia.
Meu namorado olhou para o lado de Mark onde uma loira voluptuosa
estava parada e sorrindo para nós. Ele fez um pequeno gesto de cabeça para
que Mark nos apresentasse sua acompanhante. Ele percebeu e começou a
desastrosa apresentação.
— Ah! Essa é… a… é… — Ele se enrolou com as palavras, deixando
claro que não lembrava o nome da moça.
— Muito prazer, sou Lana, amiga de Mark.
Assim que finalizamos os cumprimentos, a mãe de Henrik,
acompanhada de um casal chegou à mesa. Então sou finalmente apresentada
a Dylan e sua namorada Mandy, ambos foram muito simpáticos comigo. Ao
lado de Sara me senti mais à vontade, começamos a conversar sobre as
diversas sacolas que encontrei em meu quarto outra manhã, ainda não havia
me encontrado com ela depois que descobri a gigantesca compra que fez para
mim.
Um garçom passou com taças borbulhantes de champanhe e serviu os
convidados da mesa, fiz uma nota mental para não beber muito, afinal não
estou acostumada e o que menos precisava era ficar bêbada e passar um
vexame na festa.
Não demorou para outros sócios de Henrik chegarem, sou apresentada
a seu sócio Frank e sua escultural acompanhante Melani, e Erick, que já
conhecia da cafeteria, me cumprimentou de forma alegre e nos apresentou
sua amiga Wendy, outra loira saída de capa de revista.
Olhando as companhias dos demais sócios de Henrik fiquei um pouco
intrigada, nenhum deles apresentou suas acompanhantes como namoradas, as
moças eram muito bonitas, usavam vestidos maravilhosos, algumas joias
muito brilhantes e pareciam bem caras. Entretanto seus sorrisos não pareciam
naturais, e nem estou falando do perfeito alinhamento e brancura impecável,
mas de parecerem que foram forjados, como se suas faces estivessem imóveis
naquela posição.
Meus devaneios acabam com Henrik me chamando para me
apresentar a algumas pessoas. Esse gesto se repetiu várias vezes, até que as
luzes do salão diminuíram e os convidados voltaram aos seus lugares. Em
nossa mesa estavam Sara, Dylan e Mandy, os três sócios da empresa e suas
acompanhantes e um senhor para quem não fora apresentada.
— Henrik, quem é aquele senhor em nossa mesa? — perguntei
tentando ser discreta.
— Ele é o pai de Mark, Sr. Emilio Vargas, ele é um pouco …
ranzinza para dizer a verdade. Naquelas duas mesas estão as famílias de Erick
e Frank — ele disse sinalizando as mesas. — Daqui a pouco vou precisar te
deixar sozinha, mas volto logo.
Um apresentador entrou no palco, começou a falar e chamou os
sócios da Four K's Darings Investments para subir ao palco. Eles se
levantaram e subiram, ficando um ao lado do outro. O apresentador entregou
o microfone para Mark que começou seu discurso de agradecimento aos
colaboradores e clientes, desejando que essas parcerias perdurem por muitos
anos e finalizou seu discurso falando sobre o Natal:
— O Natal é uma data muito especial para os cristãos de diversas
religiões. Mas a comemoração desta data consegue transcender as divisas
religiosas e espalhar ao redor mundo um sentimento que conhecemos como
espírito de Natal. Nessa época do ano, podemos refletir sobre nossas atitudes
e estamos mais abertos a enxergar o outro. É no Natal que o perdão, a
compaixão, o amor e a esperança ficam ainda mais fortes em nossos
corações. Por isso desejo que todos os presentes possam aproveitar esse Natal
para sentir e aplicar cada um desses sentimentos em suas vidas, se preparando
para serem ainda melhores e mais felizes no ano que se iniciará. Feliz Natal a
todos e um ano novo repleto de bons negócios com a Four K's Darings
Investments! Aproveitem a festa!
Ao finalizar sua fala os quatro sócios da empresa desceram do palco
enquanto os convidados aplaudiram o discurso. Eles pararam ao lado da mesa
e o apresentador continuou sua fala.
— E depois de um discurso repleto de emoção, chamamos para abrir a
pista de dança ao som da banda da noite, Mark, Frank, Henrik e Erick.
Ouvi vários aplausos e senti Henrik pegar minha mão, olhou nos
meus olhos e sussurrou para que eu o acompanhasse. Será que a lista de
coisas que nunca fiz um dia terão fim? Embora soubesse que não, esperava
que essa experiência fosse agradável. De mãos dadas seguimos para pista e
começou a tocar My Way Of Life de Frank Sinatra. Senti braços em volta da
minha cintura e levei os meus ao redor do pescoço de Henrik, que me puxou
para mais perto de seu corpo. Ele me conduziu pela pista por alguns minutos
e sussurrou em meu ouvido um trecho da letra da música:
— You are my way of life, Make me a way of life, Don't ever go.[5]
Logo vi outros casais chegando à pista de dança. Ao final da música
uma meia-luz iluminou o salão e as pessoas voltaram a circular entre as
mesas.
A festa continuava agradável, embora eu apenas conversasse com
minha sogra, meu cunhado e Mandy. As demais moças da mesa estavam
mais afastadas, e permanecesse com seus sorrisos engessados. Quando Sara
se levantou para falar com alguns parentes de Erick, e Henrik estava em uma
animada conversa com um de seus clientes próximo a nossa mesa, me
levantei para ir ao toalete.
Assim como o salão, o banheiro era enorme, revestido de mármore
travertino, vários espelhos e até sofás. Entrei em uma das cabines e fechei a
porta, tentando equilibrar meu vestido com a vontade desesperada de fazer
xixi. Quando finalizei e estava arrumando a saia para sair, ouvi a porta do
banheiro abrir e duas vozes comentando:
— Você viu aquela namorada do Henrik? O vestido dela é lindo!
Me senti envaidecida e levei a mão à porta para abrir, mas estanquei
quando escutei outra voz falar:
— Eu aposto que é uma golpista! Henrik é lindo e rico. E aparece
aqui com uma desconhecida, que ninguém nunca viu ou sabe de onde saiu?
Tentei várias vezes sair com aquele monumento ruivo, mas ele sempre tão
sério nunca retribuiu as minhas investidas. E aí ele aparece aqui com essa
coisinha. Não engulo essa história.
— Concordo com você, será que ela já deu o golpe da barriga nele, e
por isso ele está a apresentando como namorada?
Meu sangue ferveu quando terminei de ouvir aquelas acusações. A
primeira coisa que passou em minha cabeça foi que talvez eu não estivesse à
altura de estar com Henrik, sou pobre, não tenho vivência de uma grande
cidade, muito menos de frequentar lugares elegantes, deu-me uma vontade de
sair correndo e ir para casa, mas isso não resolveria nada. Depois de algumas
respirações percebi que aquilo era veneno de duas cobras peçonhentas. E não
iria mesmo deixar elas me picarem.
Saí da cabine e fui lavar minhas mãos, ouvi os suspiros enquanto
Melani e Wendy me encaravam pelo espelho enquanto seguravam seus
batons. Lavei e sequei minhas mãos e somente depois me dirigi a elas que
ainda não haviam se mexido.
— Olá, meninas, por acaso sabem que é bastante deselegante falar
mal das pessoas? Principalmente de pessoas que vocês não conhecem, como
é o nosso caso. O meu relacionamento com Henrik e os motivos de estarmos
juntos, dizem respeito apenas a nós dois. E se existe alguém no mundo para
quem precisamos dar alguma satisfação, com certeza não é para vocês. Por
isso, agradeço se deixarem o meu nome e o do meu namorado bem longe de
suas bocas.
Deixando as duas no mesmo lugar, voltei para à mesa e encontrei um
sorridente Henrik, me aguardando.
— Não pense que vou me contentar somente com aquela dança!
Ele me levou de volta para a pista onde vários casais estavam
dançando. Ao terminar a música, Mark e Sara que dançavam juntos se
aproximaram e trocamos os casais. Dancei com os três sócios de Henrik, que
eram muito simpáticos comigo, fizeram várias perguntas e cada um de sua
forma afirmou estar feliz pelo nosso namoro, principalmente por ter
melhorado o humor de Henrik.
Assim que consegui voltar à mesa o jantar foi servido, eu optei pelo
prato de peixe, filet Saint Peter ao limão com legumes, e Henrik pelo Fillet
com Prosciutto e batatas. A comida estava divina. Enquanto comíamos notei
que a banda começou a tocar músicas mais animadas, o que atraiu um
público mais jovem para a pista de dança. A sobremesa, um delicioso
Cobbler de frutas vermelhas com sorvete, me fez rezar enquanto comia.
Antes que eu terminasse a sobremesa, meu namorado aproximou sua
boca do meu ouvido e falou com voz baixa.
— Vamos embora? Não vejo a hora de tirar seu vestido. Vou fazer
isso bem devagar, quero sentir cada pedacinho do seu corpo arrepiar e o que
você está escondendo sob esse monte de tecido. Depois vou descer beijando
todo seu corpo até …
— Agora, sim vamos embora agora. — Cortei sua fala que já estava
me deixando excitada, e me levantei. Ele calmamente se levantou, abotoou o
smoking e nos despedimos dos presentes na mesa.
Nossa saída da festa foi rápida, o caminho até em casa foi cheio de
beijos e mãos por todos os lados. Mais uma noite de carícias e descobertas ao
lado desse homem me faz cada dia mais feliz.
CAPÍTULO 18
HENRIK
Dia 23/12 – Segunda-feira
Voltar a trabalhar depois de um fim de semana tão intenso com Liv
não foi nada fácil. Mas a expectativa de receber sua visita na hora do almoço
me deixou bastante animado, era a primeira vez que viria ao meu escritório,
ela cismou que eu me alimento mal durante o dia e que viria me trazer uma
salada da cafeteria. Quando cheguei ao prédio autorizei sua entrada, e então
me foquei no trabalho.
A manhã começou com uma reunião com os sócios que somente
voltariam a trabalhar no dia dois de janeiro. Depois me concentrei em
algumas análises que deveriam ser entregues ainda hoje, precisavam ser
alteradas por uma oscilação no mercado futuro de comodities e que
impactava diretamente nas projeções de um cliente. Confesso que não percebi
a hora passar, até que meu telefone tocou e vi o ramal da secretária que
divido com Erick, já que temos poucas demandas para ela.
— Sr. McDowell, sei que não gosta de ser incomodado, mas achei
essa uma ligação peculiar. Estou no telefone com uma pessoa que se
apresentou como Carrie, e disse que é amiga de sua namorada e precisa falar
com o senhor ou com Olivia com urgência.
A fala da Sra. Brooks me deixou em alerta, olhei no relógio e já havia
passado mais de duas horas do horário que combinamos que Liv me traria o
almoço, não havia notado porque estava absorto demais no trabalho. Estanhei
ainda mais Carrie ligar em meu escritório.
— Por favor, Sra. Brooks, passe a ligação.
Ouvi quando a ligação foi transferida.
— Boa tarde, Carrie, é o Henrik, tudo bem?
— Boa tarde, Henrik, desculpe te ligar. Não sei que safadeza estão
fazendo na hora do almoço, mas duas horas é demais! Tentei ligar no telefone
da Olivia, mas ela não atendeu, então procurei o telefone de seu escritório na
internet. Por favor, fala para a Olivia voltar agora! O Lewis está soltando
fogo pelo nariz de tão bravo.
— Carrie, não estou entendo, Olivia não está aqui.
— Então ela já está voltando, falo com ela assim que chegar.
— Não, Carrie, ela não esteve aqui, ela disse que me traria o almoço,
mas não veio.
— Henrik, ela saiu daqui para levar seu almoço, disse que voltaria em
meia hora e já passaram duas horas! Só estou ligando porque Olivia está
demorando demais e nosso chefe está muito bravo.
— Vou descobrir o que aconteceu, falo com você daqui a pouco.
Levantei-me correndo, entrei no elevador em direção ao térreo, esse
elevador nunca demorou tanto para descer. Fui à recepção para verificar se
Olivia entrou no prédio, mas não havia registro de sua entrada. Então falei
com os seguranças da entrada, mas eles também não a viram.
Saí correndo do prédio em direção à cafeteria. Entrei na Star’s
Capuccino, muito nervoso. Carrie estava no balcão e naquele momento não
atendia ninguém. Ela confirmou tudo o que me disse ao telefone, em resumo
Liv saiu da cafeteria e não chegou ao prédio, o que poderia acontecer em cem
metros de distância?
— Carrie, pode chamar o Lewis?
Lewis, chegou com uma cara de poucos amigos, mas não me
incomodei, neste momento tinha outra prioridade.
— Boa tarde, Lewis, a Olivia saiu daqui para me visitar, mas não
chegou lá, estou preocupado, você tem câmeras de segurança que pegam a
calçada?
— Oi, aquela menina vai se entender comigo, já são muitas faltas e
agora sai para passear e não volta. Com certeza se distraiu com alguma coisa
no caminho.
— Lewis, meu escritório fica na esquina, ela sabia que eu estava
aguardando por ela, pode me mostrar as imagens, por favor?
— Tudo bem, entra aqui. Mas não acho que vamos encontrar nada.
Comecei a seguir Lewis para uma sala no fundo da cafeteria, ele se
sentou atrás de uma mesa e fez sinal para sentar-me à sua frente, virou o
monitor de lado, de forma que nós dois conseguimos ver as imagens na tela.
Ele voltou as imagens para o horário de meio-dia e conseguimos ver Liv
saindo da cafeteria com uma embalagem nas mãos, a câmera pegou apenas a
frente do estabelecimento, e ela logo saiu do foco da câmera caminhando em
direção ao meu prédio.
Não esperei um comentário Lewis, sei que nada de útil virá de suas
colocações. Passei por Carrie e lhe passei o número do meu celular, pedindo
para ela entrar em contato caso tivesse notícias de Olivia. Saí da cafeteria em
direção ao meu prédio, observei onde mais poderia encontrar câmeras de
segurança, outras duas lojas na mesma calçada, meu prédio e outras duas
lojas do outro lado da rua.
Entrei no meu prédio e pedi ao segurança para verificar as imagens
das câmeras que estavam no caminho onde Olivia deveria ter passado, mas
ele disse que somente seu supervisor poderia autorizar. Olhei em seu crachá e
observei o que a empresa que fazia a segurança do prédio era a Palladium
Security, a empresa do meu cliente Russell Wentworth. Depois do resgate de
Liv no dia do assalto em seu apartamento, Russell havia me aconselhado a
contratar seguranças por algum tempo, mas achei exagerado. Peguei o celular
e liguei para ele, que atendeu rapidamente.
— Henrik, como vai? Quais são as boas indicações de negócios para
hoje?
— Russell, hoje vou ser seu cliente novamente. Minha namorada
trabalha na cafeteria que fica aqui perto do prédio onde é a sede da minha
empresa, ela saiu de lá para me trazer o almoço, mas não chegou, já faz mais
de duas horas. Gostaria de ver as imagens da câmera de segurança do prédio,
sei que é sua empresa que faz a segurança aqui, consegue me ajudar?
— Henrik, você arrumou uma garota que te traz grandes emoções,
meu caro. Vou providenciar as imagens das câmeras de segurança, também
vou mandar o Clark para te ajudar, ele é nosso melhor especialista em
sequestros.
— Sequestro?
— Não podemos definir ainda o que aconteceu, mas essa é uma
possibilidade, já havíamos conversado sobre isso, se alguém do prédio onde
ela morava te reconheceu ou seguiu Olivia para descobrir quem a tirou de
casa daquela forma, vocês dois podem ter virado alvos. Clark também é
nosso melhor rastreador, o que quer que tenha acontecido ele vai descobrir e
te ajudar a tomar as melhores decisões para encontrar sua garota.
— Obrigado, Russell.
Desliguei o telefone e fiquei na recepção do prédio, aguardando
alguém da empresa de segurança. Novamente enviei algumas mensagens e fiz
algumas ligações para Olivia e não obtive retorno.
— Senhor McDowell? — Um senhor de terno se aproximou de mim,
e assenti com a cabeça. — Sou Max Rice, por favor, me acompanhe, o
Senhor Wentworth, solicitou que eu lhe acompanhasse à nossa sala de
monitoramento.
Acompanhei o sr. Rice até uma sala ainda no térreo do prédio onde
vários monitores estavam nas paredes, havia imagens dos elevadores, da
recepção, das garagens e outros lugares que não identifiquei. Passei para ele
todos os dados que tinha para localizarem as imagens e rapidamente vi Liv
em uma das telas.
A cena foi rápida, ela vinha em direção à empresa, quando foi
abordada por um homem. Ela deu alguns passos para trás e depois seguiu em
sua direção, passou pelo homem que se virou lentamente acompanhando seus
passos, neste momento, consegui ver um objeto em suas mãos, mas não
identifiquei o que era. Rapidamente os dois saíram do foco da câmera.
Ainda sem compreender o que estava acontecendo pedi que
repassassem a cena mais uma vez, e antes que iniciassem ouvi outra pessoa
entrar na sala.
— Sr. McDowell, sou Clark Pritchard, e vim ajudar em sua busca,
pode me contar o que aconteceu?
Repeti a história com o máximo de detalhes, e revimos a cena, mas
em câmera lenta. Clark identificou o objeto que o homem segurava como
uma arma, e pediu que aproximassem a imagem. Com maior foco no rosto
reconheci o desgraçado que levou Liv: Aidan.
Contei para Clark tudo o que sabia sobre Aidan, e não era muito.
Questionei se deveríamos acionar a polícia e ele me pontuou que os métodos
da polícia eram diferentes, e poderiam limitar sua atuação, mas assim que ela
fosse localizada e tivermos informações consistentes, poderemos avaliar
novamente se será necessário acionar a polícia.
Clark fez algumas ligações, mas não estava concentrado. Apenas
conseguia pensar que deveria ter tomado mais cuidados com Olivia, no dia
que fomos abordados por aquele louco, percebi que ele estava fora de si, e
uma pessoa que estava desequilibrada a ponto de dizer aquelas coisas e agir
daquele modo, era muito perigosa. Não conseguia parar de me culpar por não
ter Liv ao meu lado agora.
Quando Clark terminou as ligações, me pediu os telefones da família
de Liv, afinal, pela história que ela me contou eles eram próximos a Aidan.
Não possuía os telefones, porque nunca fomos apresentados, e relação deles é
bastante delicada. Então conto tudo que Liv me falou sobre eles e Clark
retorna ao telefone, alguns minutos depois ele voltou com os números dos
telefones. Como será que ele consegue essas coisas tão rápido? Preferi não
questionar seu trabalho.
Clark se senta à minha frente e liga para a mãe de Liv.
— Boa tarde, falo com a Sra. Agnes Campbell? — Ele colocou o
telefone no viva voz para que eu pudesse ouvir a conversa. — Sra. Campbell,
aqui quem fala é o especialista em sequestros Clark Pritchard, de Nova York.
Sinto muito informar que sua filha Olivia, ela foi sequestrada nesta tarde, e
temos convicção de que a senhora e seu marido conhecem o sequestrador, um
homem chamado Aidan.
— Nossa! O sr. me passou um susto. Acho que houve algum engano,
Aidan é amigo da nossa família, passei o endereço da cafeteria onde minha
filha trabalha para ele na semana passada. Sabe, ele gosta muito dela! Devem
ter se entendido e espero agora possam se casar.
Quando a mãe de Olivia terminou de falar meu coração apertou ainda
mais, apenas imaginar que ela não estará em minha vida, ou que prefira outra
pessoa, me deixava sem ar. Senti vontade de falar algumas coisas nada
educadas para a senhora do outro lado linha, mas tentei me conter. Meus
sogros, pois é desta forma que já me sinto em relação a eles, ainda não
sabiam de nosso relacionamento e não poderia entrar em um enfrentamento
que causasse uma má impressão neste momento, por isso juntei todas as
minhas forças para tentar me controlar. Clark fez um sinal para eu me
acalmar e retomou a ligação.
— Sra. Campbell, não sei exatamente como é seu relacionamento
com sua filha, mas Olivia tem um namorado aqui em Nova York, e ele está
muito preocupado com ela. Há alguns dias, Aidan os abordou na rua e foi
bastante agressivo. Também temos imagens de algumas câmeras de
segurança que mostram quando ele a obrigou entrar em um veículo enquanto
apontava uma arma para ela. Olivia não foi de forma consensual, foi obrigada
a entrar no veículo.
— Ai, meu Deus, minha filha! Como ela não me disse que estava
namorando? Ela deve ter ficado com receio da reação do pai dela. Meu Deus,
Aidan não faria mal a ela, conhecemos ele desde pequeno. Sr. Pritchard, ele
não seria cruel com ela, certo?
— Senhora, não podemos afirmar nada neste momento, o mais
importante é encontrar sua filha, e para isso precisamos da sua ajuda. Sabe
nos dizer se Aidan tem algum parente ou amigo que mora aqui em Nova
York? Ou pense em qualquer informação que saiba sobre ele.
Clark continuou a conversa com a mãe de Olivia, fez várias perguntas
e a sra. respondeu todas, mas a única informação útil foi de um primo de
Aidan que morava em Nova York. Ao final da ligação ela estava muito
emocionada e chorando, quando perguntou ao detetive:
— Sr. Pritchard, e o namorado da minha filha? Ele é um bom
homem?
Clark fez sinal para que eu falasse com aquela senhora, mas não
soube o que dizer num momento como esse, o que posso dizer para amenizar
a mesma dor e preocupação que me corrói?
— Olá, Sra. Campbell, meu nome é Henrik McDowell e sou o
namorado de sua filha. Tenho que confessar que sou um homem apaixonado,
estamos muito felizes e vou fazer de tudo para trazê-la de volta, o quanto
antes. Sei que a senhora e o seu marido não aprovam a vinda dela para Nova
York, e ela sente muito a falta de vocês.
— Sr. McDowell, eu fico feliz que minha filha tenha alguém que
goste tanto dela e se preocupe. Por favor, me ligue se tiver qualquer notícia,
pode me deixar seu telefone? Quando meu marido chegar do trabalho vou
conversar com ele, e ele pode querer falar com o senhor.
— Pode me chamar de Henrik. E é claro que vou deixar meu contato,
e caso queiram vir a Nova York, posso ajudá-los com isso, basta me avisar.
Com as saudações educadas, terminamos nossa ligação. Levantei os
olhos e percebi que Clark estava em outro telefone, olhei para a tela à minha
frente e vi a imagem de Liv, sob a mira de uma arma. Precisava dela de volta
aos meus braços e tive receio do que pudesse estar acontecendo minha
Olivia.
— Sr. McDowell — Clark me chamou, e levantei meus olhos. —
Localizamos a casa do primo de Aidan, vamos até lá. Preciso que o senhor
fique aqui junto com um de meus homens, para caso ele voltar querendo
atingir o senhor ou ligar para alguma forma de contato, ou que Olivia consiga
ligar.
— Eu quero ir junto, se Liv estiver lá ela pode estar fragilizada, vai
precisar de mim, e eu quero vê-la o quanto antes.
— Eu entendo, mas para sua segurança e a dela, precisa ficar aqui.
Clark saiu, sem me deixar opções e repleto de angústias.

As notícias demoraram e me perdi em desespero. Como pode uma


garota que entrou há tão pouco tempo em minha vida se tornar tão
importante? Não tenho resposta para essa pergunta, somente sinto.
Senti o telefone vibrar e vi o nome de Dylan na tela, com certeza ele me
ligou para falar sobre o jantar de amanhã. Mas assim que ele começou a falar
eu o interrompi e contei o que aconteceu. Ele tentou me consolar e disse que
viria o quanto antes, pediu para avisar se tiver alguma notícia. Sabia que
daqui a pouco minha mãe também estaria aqui, meu irmão iria se encarregar
de contar a ela. Aproveitei e aumentei o som das chamadas, nãia quero correr
o risco de não ouvir alguma ligação.
A espera continuou por mais de uma hora até que meu telefone tocou.
Vi um número desconhecido. Fiz um sinal para um dos homens que estavam
na sala, ele se aproximou antes que eu atendesse.
— Henrik McDowell falando.
— Sr. McDowell, aqui é Clark. — Fiz um novo sinal e o homem se
afastou. Esperava boas notícias. — Entramos na casa, mas não estavam lá,
encontramos o telefone de Olivia, então é um sinal de que estiveram aqui.
Um de nossos analistas teve acesso a algumas câmeras de segurança e
identificamos o carro em Aidan está com sua namorada. Agora é uma boa
hora para acionarmos a polícia, assim teremos como cobrir uma área maior
em busca do veículo. Vou acionar um inspetor que é um velho conhecido. O
senhor pode receber a visita de alguns policiais, eles têm um procedimento a
cumprir, então responda as perguntas até o momento em que teve acesso às
imagens. Entendeu?
— Sim, mas vamos esperar todos esses procedimentos para procurar
por Olivia? E esse primo que é dono da casa? —perguntei de forma
exasperada.
— O primo não sabia de nada, recebeu Aidan, que dizia ter ido visitá-
lo. Saiu para o trabalho e quando voltou nos encontrou em sua casa, ficou
bastante assustado, diria se soubesse de algo. E não vamos parar a busca por
Olivia esperando a polícia, Henrik, confie em mim! — Ele desligou o
telefone antes que eu pudesse perguntar alguma coisa.
Fiquei aguardando a chegada dos policiais, solicitei que gravassem as
imagens para que eu pudesse entregá-las a polícia. Não tentei mais ligar para
Olivia, sabia que ela não iria me atender.
No início da noite meu telefone tocou, e novamente: número
desconhecido.
— Henrik McDowell falando.
— Boa noite, sr. McDowell, quem fala é Gerard Campbell, sou pai da
Olivia.
— Boa noite, sr. Campbell, pode me chamar de Henrik.
— Quero saber que história mais fantasiosa é essa que minha esposa
me contou? E quem é você para ligar aqui e fazer essas acusações a um
amigo da família? Você deixou minha esposa assustada, seu moleque
irresponsável, fica passando trote.
O tom de voz austero de Gerald me deixou irritado, respirei duas
vezes antes de voltar a responder, e acabei entendendo um pouco dos motivos
que levaram Liv a sair de casa. Não tinha energia e nem vontade de discutir,
então optei pelo “ver para crer.”
— Não é um trote, sr. Campbell, nesse número que está falando
comigo o sr. tem aplicativo de mensagens?
— Claro que sim, não sou um velhote. Por que quer saber, não tem
coragem de falar e vai começar a me enviar mensagens?
— Não, senhor, vou lhe enviar as imagens de um câmera de
segurança que mostram o momento em que Olivia foi abordada por Aidan.
Depois de ver as imagens, se quiser voltar a falar comigo, pode me ligar. Mas
se não acreditar no que verá, então não se incomode em ligar novamente, eu
encontrarei Olivia e cuidarei dela.
Desliguei o telefone e pedi para preparem as imagens para enviá-las
ao pai de Olivia, apenas a abordagem e a cena aproximada que mostrava
Olivia sob a mira da arma de Aidan. Enviei as imagens e alguns minutos
depois Gerald voltou a ligar, esperei que a conversa agora seguisse por outro
caminho.
— Henrik, aqui é o pai da Olivia. É muito difícil para eu acreditar que
aquele idiota foi capaz de levar minha filha à força. Será que podemos
começar novamente? Tenho muitas perguntas.
A conversa com Gerald foi longa, ele quis saber como conheci sua
filha, quais eram meus sentimentos por ela, quais os dela por mim, se nosso
relacionamento era sério, como ela estava antes do sequestro, porque nunca
falou sobre mim com a mãe, por que Aidan a levou, se a polícia já foi
acionada, como estavam as buscas, se eles poderiam ajudar de alguma
forma… Não tinha todas essas respostas, mas respondei da forma mais
sincera possível.
Ao final da ligação novamente os convidei para vir a Nova York. Ele
diz que não tem condições de vir, e não pode se afastar do trabalho. Como
amanhã seria véspera de Natal e muitas empresas não irão trabalhar, imaginei
que o motivo fosse mais financeiro, e ele não demonstrou ser um homem que
aceitava ajuda, assim como minha Liv. Prometi avisar assim que tiver
notícias.
— Sr. McDowell, acho que vai querer ver isso. — Escutei a voz de
Max Rice me chamar.
Levantei a cabeça e vi imagens de alguns faróis de carro, a legenda do
canal de notícias descrevia “perseguição em alta velocidade nos arredores de
Nova York”. Não consegui entender o que o apresentador estava narrando,
mas foquei nas imagens que não eram muito nítidas pelo contraste da
escuridão da noite, os faróis dos carros, as sirenes da polícia e a iluminação
da rua.
— Sr. Rice, por que acha que eu gostaria de ver essas imagens?
— As imagens são ao vivo, e nesse carro da frente está Olivia e
Aidan.
Meu coração errou algumas batidas ao imaginar o que poderia
acontecer com Olivia dentro daquele carro. Meus olhos grudaram no televisor
à minha frente e o mundo sumiu ao meu redor.
O carro em alta velocidade estava em uma estrada, não conseguia ver
os passageiros, mas podia distinguir quais eram os carros da polícia. Se o
veículo colidisse ou capotasse Olivia poderia se machucar muito. A imagem
se afastou, notei que estava sendo gravada a partir de um helicóptero ou um
drone.
— Não, não, volte a filmar os carros.
Quando a imagem se ampliou pude visualizar uma praça de pedágio,
repleta de veículos parados ou passando muito lentamente. O carro que Aidan
dirigia precisava parar ou iriam colidir, não tinha outra saída. Me peguei
murmurando uma oração para que Deus protegesse minha namorada,
enquanto a câmera se aproximava um pouco e eu conseguia ver a
aproximação com a praça de pedágio, o motorista pareceu acelerar ainda
mais. Quando chegou próximo aos veículos tentou uma manobra para virar o
carro, que começou a capotar de lado.
— Nãooo, Olivia!! — Meu grito saiu forte, mas não chegaria aonde
ela estava.
Senti braços ao redor do meu corpo enquanto lágrimas desciam, não
me lembrava a última vez em que chorei, mas nesse momento nenhuma
fortaleza seria capaz de segurar o desespero que desceu líquido por meu
rosto.
Olhei para o lado e vi minha mãe e meu irmão, eles me abraçam, mas
não disseram nenhuma palavra. Voltei meus olhos para o televisor, mas não
houve movimento no veículo, que foi cercado por viaturas e muitos curiosos,
as ambulâncias chegaram rapidamente, deviam estar por perto. A câmera se
afastou aos poucos e um apresentador no studio apareceu nas imagens,
informando que trariam mais informações ao longo da noite.
CAPÍTULO 19
OLIVIA
Abri os olhos e vi luzes brancas, tudo estava branco. Não sei onde
estou, meu corpo dói. Não conseguia me mover, e um som de batidas
contínuas e rápidas me deixava ainda mais confusa. Tentei lembrar de onde
conhecia esse som, mas não lembrava apenas me incomodava. Desta vez,
tenho certeza de que morri, mas por que não consigo me mover? Fechei os
olhos com força e abri novamente, tudo continuava branco.
— Henrik…
Algo parecido com uma voz saiu de minha garganta. Me lembrei que
saí da cafeteria para vê-lo, e onde estou agora? O som cessou e senti meu
corpo se mover, mas não estou me mexendo. Fechei os olhos porque essa era
uma sensação muito ruim.
— Olivia, você acordou? — Uma voz masculina, baixa e harmoniosa
falou ao meu lado. Abri os olhos e vi branco, mas diferente, agora parecia
que estava vendo o teto, mas não reconheci o lugar.
— Sim. — Outro sussurro.
— Eu sou o Dr. Jenkins, atendi você no início de mês quando foi
atropelada. Você está novamente no hospital, agora sofreu um acidente de
carro e bateu a cabeça novamente. Você se lembra?
— Acidente? Mão. — Consigui ver o médico em meu campo de
visão, embora parecesse um pouco fora de foco.
— Isso é normal. Você foi imobilizada assim que chegou para que
pudéssemos fazer os exames, daqui a pouco vamos te soltar, não tente se
mexer. Você acordou enquanto fazíamos o exame de ressonância magnética,
já terminamos os exames. Preciso que me responda algumas perguntas você
acha que consegue?
— Sede.
— Não posso te dar água antes de saber se será necessária alguma
intervenção cirúrgica, só mais alguns minutos. Se concentre nas perguntas.
O médico fez uma série de perguntas, sobre mim, minha família, que
ano estamos, se doía em algum lugar, se estava enxergando, se sentia
algumas coceiras, se sentia os toques que ele me dava em várias partes do
meu corpo.
— Muito bom, você é uma garota, forte. Vamos te transferir para o
quarto, e vai dormir mais um pouco, seu corpo e sua cabeça precisam
descansar. Quando acordar deve se sentir melhor e voltaremos a conversar.
Agora vou lá fora dar notícias para um namorado muito bravo que queria
invadir a sala de exames para te ver.
O médico saiu do meu campo de visão e logo tudo ficou escuro
novamente.
CAPÍTULO 20
HENRIK
Dia 23/12
Andei de um lado para o outro, minha mãe me olhava e não dizia
nada, já fazia muito tempo que cheguei aqui e me informaram que Olivia
estava fazendo exames, devia ser um bom sinal, Liv estava viva.
Esse deve ser o dia mais longo da minha vida. Depois de ver o
acidente de Olivia pela televisão entrei em pânico pensando que ela havia
morrido. Clark ligou em poucos minutos e informou que ela fora retirada das
ferragens e que um helicóptero iria levá-la ao hospital, pedi para que a
encaminhassem ao mesmo hospital onde a levei no dia do acidente, e solicitei
que Clark garantisse que ela tivesse o melhor atendimento.
Saímos do prédio onde eu trabalhava em direção ao hospital, Dylan
não me deixou dirigir e minha mãe tentava me acalmar. Meu telefone
começou a tocar repetidas vezes, assim como os sons de mensagens
chegando. Minha mãe pegou o telefone e se encarregou de atender e
responder as mensagens que eram sobre Olivia.
Ao avistar um médico saindo em direção às famílias dos pacientes, o
reconheci do último atendimento que rebemos aqui, corri em sua direção.
— Dr. Jenkins?
— Olá, Henrik, está aguardando notícias de Olivia, certo? — Assenti
com a cabeça, embora a resposta fosse desnecessária. — Ela está indo para o
quarto, mas optei por deixá-la sedada até amanhã, ela precisa descansar. Em
breve você poderá entrar para vê-la, mas antes quero conversar sobre seu
estado clínico.
O médico me encaminhou para sentar-me em uma das poltronas da
recepção e se acomoda em outra à minha frente, minha mãe e Dylan logo se
aproximaram. O médico voltou a falar:
— Olivia está bem, na medida do possível. Ela sofreu várias
escoriações pelo corpo, não se assuste quando encontrá-la, ela está bastante
machucada com cortes dos estilhaços de vidro, mas são superficiais e vão
cicatrizar logo. Alguns hematomas foram causados pelas cordas que a
amarravam, nos punhos e nos tornozelos; há hematomas no pescoço, e está
um pouco rouca, sintomas condizentes com tentativa de estrangulamento. A
ressonância não identificou nenhuma lesão em órgãos e nem na coluna, o que
é praticamente um milagre, se considerarmos o acidente que ela sofreu.
— Então Olivia teve apenas pequenas lesões? — perguntei me
animando.
— Não, duas coisas são bastante preocupantes no caso dela. A
primeira foi sua perna direita que se quebrou em duas partes. Embora não
seja grave, e nem tenha precisado de cirurgia, precisa de muito
acompanhamento no início, para evitar complicações, considerando o quadro
geral dela. E depois que tirar a imobilização irá precisar de fisioterapia.
— E a segunda? — Ouvi a voz de minha mãe desta vez.
— Essa é a segunda concussão dela em menos de um mês. As
consequências são imprevisíveis. Ela acordou por breves minutos e chamou
por você, rapaz. Estava com dificuldades de falar, mas respondeu bem as
perguntas que fizemos, não parece ter perda de memória, embora ela não se
lembre do acidente, isso é normal. Ela pode se lembrar amanhã, acordar um
dia e se lembrar ou nunca mais. Vamos precisar observar como ela irá reagir.
Por isso ela ficará aqui, pelo menos nas próximas quarenta e oito horas,
dependendo da sua recuperação podemos estender a internação ou liberá-la
para ir para casa.
— Agora posso vê-la, Dr. Jenkins?
— Sim, ela dormirá até amanhã, então você pode entrar por alguns
minutos, uma enfermeira irá acompanhá-lo. E você pode voltar amanhã bem
cedo.
Ele fez sinal para uma enfermeira, que me acompanhou até o quarto
onde estava Olivia, o corredor parecia não ter fim. Ao chegarmos a
enfermeira abriu a porta e me informou:
— Vou deixá-los a sós por alguns minutos, não tente acordá-la. Volto
daqui a pouco.
O ambiente estava iluminado por um abajur. Vi Olivia deitada na
cama com fios ligados ao seu corpo, o soro que estava ligado ao seu braço
gotejava lentamente e um lençol cobria suas pernas. Me aproximei da cama e
vi o quanto ela era frágil e estava muito machucada. Toquei levemente sua
mão, tenho medo de feri-la ainda mais. Um misto de alívio e preocupação
correu em minhas veias.
— Liv, você está segura agora — murmurei próximo ao seu ouvido.
— Volte para mim, você é meu caminho, lembra? Prometo cuidar melhor de
você, não aguento mais nenhum susto pensando que vou te perder. Preciso
que volte para que eu possa respirar de novo. Meu anjo, descanse agora,
amanhã estarei aqui quando você acordar.
Fiquei no quarto por mais alguns minutos até que a enfermeira voltou
para me retirar. Na recepção minha família aguardava, e depois de uma longa
discussão me convenceram a ir para casa tomar um banho e descansar um
pouco, para estar bem quando Olivia acordar. No caminho minha mãe me
informou que falou com os pais de Liv, com sua amiga e também com meus
sócios.
Em meu apartamento, tudo parecia vazio sem ela. Observei os
enfeites que compramos em nosso passeio ao Bryant Park, e me recordei de
sua felicidade ao escolher cada lugar para posicioná-los. A sala começou a ter
novas cores com o toque de Olivia, assim como vida.
Depois de um banho me deito em nossa cama, que agora parecia
enorme e fria. Meus pensamentos estavam naquele hospital e demorei para
dormir por conta disso.
CAPÍTULO 21
HENRIK
Dia 24/12
Quando os primeiros raios de sol apareceram no horizonte já estava
em frente ao hospital onde Olivia estava internada, hoje era véspera de Natal,
uma data que Olivia adora, e este ano não poderá comemorar. Me recordei de
todas as nossas conversas sobre a festa de hoje, e gostaria muito de dizer que
tinha razão em tudo o que me disse.
As enfermeiras demoraram para liberar minha entrada, queriam
aguardar o médico chegar, mas como Liv estava sozinha, permitiram que eu
ficasse no quarto aguardando ela acordar. Ao me aproximar de sua cama,
com a luz do dia incidindo sobre seu corpo, vi melhor seus ferimentos, eram
várias cores em sua pele e a raiva voltou com força. Apertei minhas mãos em
punho, mas não tinha onde esmurrar. Então fechei os olhos tentando me
acalmar. Ela vai precisar de mim quando acordar.
— Henrik?
Ouvi uma voz fraca me chamando, abri os olhos e encontrei os de
Liv.
— Oi, meu anjo, estou aqui. Consegue me dizer como se sente?
— Como se tivesse sofrido um acidente de carro — ela respondeu
tentando sorrir. — Estou com muita sede.
Peguei um copo na mesa ao lado da cama e coloquei água. Eu a
auxiliei para que conseguisse sorver parte do líquido e ela voltou a se deitar.
— O que aconteceu, Henrik? Me lembro de sair para te levar o
almoço.
— Muitas coisas aconteceram, Liv, mas não acho que seja a melhor
hora para conversamos sobre isso.
— Por favor, me conte. Preciso saber!
— Vou resumir o que sei, porque exatamente o que aconteceu
somente você poderia contar. Mas, por favor, não tente lembrar agora. Aidan
te sequestrou quando ia ao meu escritório. A polícia foi em sua busca e na
fuga, vocês sofreram um acidente.
— Meu Deus!
— Liv, estou aqui e você está em segurança, eu não vou sair do seu
lado. O médico vai passar daqui a pouco para conversar com você. Tudo
bem?
— Preciso de mais uma resposta. O que aconteceu com Aidan?
— Ele não sobreviveu ao acidente.
Ela se calou e fechou os olhos, não sei o que fazer. Segurei sua mão,
para que ela soubesse que estava aqui. Quando ela abriu os olhos eles
estavam cheios de lágrimas. E fiquei em dúvida sobre o motivo delas,
poderiam ser de dor, de uma culpa que ela não tinha, de medo, e o motivo
que mais me incomodava, pela morte de Aidan.
— Você me salvou outra vez, não foi?
— Não exatamente, mas fiz o pude. E foi pouco, muito pouco. Porque
a verdade é que eu deveria ter cuidado de você antes, para que ele nunca
chegasse perto, para que nunca te fizesse mal.
— Não me lembro como foi, mas tenho certeza de que você não
poderia ter feito nada para evitar. Não foi sua culpa. Você não pode me
proteger de tudo, Henrik, não pode me colocar numa redoma de vidro e
impedir que nenhum mal me atinja, porque também privaria de toda a alegria
que existe do lado de fora dela. Mas fico muito feliz em saber que está ao
meu lado para me ajudar com as feridas do meu caminho, e aproveitar
comigo toda a felicidade que pudermos encontrar do lado de fora dessa
redoma.
— Você é realmente um anjo, não é?
— Não sou, tenho muitos defeitos para um anjo. Para começar serei uma
pessoa desempregada. Porque se não voltei ontem e não fui hoje, com certeza
já tem outra pessoa trabalhando em meu lugar. — Ela tentou sorrir
novamente, mas seu sorriso morreu em uma careta de dor. Ela respirou e
continuou. — Novamente, não sei como te agradecer! Mas não quero te
trazer mais problemas, você foi muito bom para mim. A melhor pessoa que já
conheci, e não quero que você tenha mais gastos ou trabalho comigo. A
julgar por todos os lugares que doem devo estar um caco. Talvez seja a hora
de voltar para a casa dos meus pais e assumir que fracassei. Assim também
posso devolver seu espaço e abrir caminho para que você possa continuar sua
vida, sem um peso ao seu lado.
— Liv, você ainda está sob os efeitos do remédio ou não entendeu
nada? Como consegue ver algumas coisas de forma tão clara e simplesmente
não ver o que está na sua frente? — perguntei com a voz baixa e próximo ao
seu rosto.
— O que eu não entendi?
— Não posso e não vou te amarrar, porque quero que você seja feliz.
Mas precisa entender que eu me apaixonei perdidamente por você, que te
quero do meu lado todos os dias, quero cuidar de você, ver suas cores pela
casa, acordar com você ao meu lado, descobrir novas coisas juntos, fazer
planos, e apesar de nunca termos conversado sobre isso quero ver nossos
filhos correndo pela sala. Se quiser ir embora, vai ter que dizer que somente
eu sinto isso. Você não sente, não quer?
— Eu sinto e quero tudo isso.
— Então pare de achar que é um peso para mim, tudo o que faço por
você também me faz feliz. Não quero nunca mais achar que vou te perder,
porque isso me enlouquece. Então me promete que só vamos entrar
novamente num hospital no nascimento do nosso filho?
Dessa vez o riso dela saiu alto, mas a cara de dor veio na sequência.
Aguardamos alguns minutos até a chegada do médico, que fez alguns exames
no quarto mesmo, fez várias perguntas e depois explicou para Olivia
detalhadamente seu quadro clínico e que se sua recuperação continuasse
poderia antecipar a previsão de alta para amanhã.
Logo após o almoço minha mãe veio visitá-la e ficou com ela
enquanto fui em casa tomar um banho. Aproveitei para comprar o presente de
Olivia. Também peguei meu carregador para o telefone, que minha mãe
devolveu no hospital, mas estava descarregado, uma troca de roupas para que
eu pudesse dormir no hospital e outra para ela sair de lá amanhã, não entendo
muito de roupas femininas, mas acredito que um vestido seja o mais fácil,
optei por tal peça porque sei que fica bem soltinho e leve em seu corpo, como
estava frio peguei um casaco longo e já pensei na forma mais rápida de
chegar ao carro e depois levá-la ao apartamento sem que ela passasse muito
frio no caminho.

Ao retornar ao seu quarto a encontrei dormindo, minha mãe se


despediu e eu me acomodei na poltrona ao seu lado. Depois que o celular
carregou um pouco eu liguei e descobri muitas mensagens em meu celular,
todas para Olivia. Comecei a ver as mensagens trocadas e minha mãe fez um
tipo de resposta padrão muito criativa:

“Olivia está bem na medida do possível, o


mais grave foi uma perna quebrada e ter batido a
cabeça, por isso ficará em observação e depois
por repouso por alguns dias. Tenho certeza de
que ela gostaria de receber uma mensagem sua,
que tal gravar um pequeno vídeo para ela?
Atenciosamente,
Sara McDowell”

A resposta foi melhor do que eu esperava e várias pessoas enviaram


vídeos. Meus sócios, do meu irmão, de Mandy, Carrie enviou quatro vídeos,
a sra. Agnes enviou duas mensagens. Peguei meu fone de ouvidos e comecei
pelas mensagens de sua mãe, não gostaria que ela ouvisse nada que a
magoasse, uma mensagem era de uma pessoa que não conheço, mas imaginei
que fosse uma amiga e outra de sua mãe, achei melhor não as ouvir.
Olivia acordou melhor do que pela manhã e parecia mais animada,
perguntou onde estava minha mãe e ficou chateada por não ter conseguido se
despedir.
— Olivia, você sabia que muitas pessoas se preocupam com você?
— O que quer dizer, querido?
— Primeiro que gosto que me chame assim. E segundo, algumas
pessoas enviaram mensagens para você.
Me aproximei dela e me sentei em sua cama, com cuidado para não a
movimentar, peguei o telefone e comecei a lhe mostrar as mensagens.
Comecei pelo meu irmão, Mandy, depois Frank e Mark, que foram muito
simpáticos e Erick que literalmente fez Liv chorar de tanto rir, no vídeo ele
apareceu vestido de Papai Noel, com gorro, barba, barriga falsa e tudo mais:
— Olivia não gostaria que passasse essa noite no hospital, então fiz
um plano perfeito para te resgatar. E para começar era uma boa desculpa para
falar com aquela sua amiga gostosa da cafeteria, iria pedir a ajuda dela no
meu plano, vou te contar como seria: eu iria entrar com essa fantasia de Papai
Noel no hospital… — Liv começou a rir quando ele falou de sua amiga e não
parou durante todo o vídeo. A cada passo do plano maluco e fantástico de
Erick mais ela ria. Precisaria agradecer a ele depois. — Bom o plano era
perfeito, não acha? Mas ERA, porque a tia Sara ameaçou acabar com meu
parquinho de diversões se eu te tirasse do hospital sem alta médica. Então me
desculpe, mas eu gosto muito do meu parquinho! Um abraço!! Vou te ver
quando estiver em casa!
Depois abri as mensagens que Carrie enviou, a primeira era dela
mesma, a segunda das outras garotas que trabalhavam na cafeteria e a terceira
de uma garota chamada Roxie, que emocionada Olivia me contou que foi ela
quem lhe indicou para o emprego na cafeteria. E a quarta mensagem foi de
Lewis e Nancy, que seguravam um bebê muito pequeno enrolado em um
cobertor azul:
— Olivia, só ficamos sabendo o que aconteceu com você nesta
manhã, ontem à tarde Nancy entrou em trabalho de parto e a uma da manhã
nasceu o John, nosso pacotinho de Natal, ele se parece comigo, não é?! —
dizia o pai todo dengoso.
Nancy disse algumas palavras e se despediram.
Só restaram os vídeos que sua mãe enviou, fiquei com receio de como
eles afetariam Liv, mas eu teria que mostrar a ela.
— Olivia, os últimos dois vídeos foram enviados por sua mãe —
avisei antes de mostrar a ela.
— Mas como? — Ela estava realmente assustada.
— Muitas coisas aconteceram ontem, e eu precisei falar com ela. Sei
que a relação de você não é das melhores, mas foi realmente necessário.
— Você já viu o que tem aí?
— Pensei em ver, mas acho que é você quem tem que decidir se quer
ou não ver.
Ela assentiu e coloquei o primeiro vídeo, ela confirmou que era uma
amiga de sua cidade, que era muito próxima dela. E depois começou a
mensagem enviada por sua mãe.
— Olivia, nem sempre as coisas acontecem da forma como a gente
imagina para os filhos, pensamos que sabemos o que é o melhor, sempre
pensando proteger. Eu e seu pai só queríamos te ver feliz e com um futuro
tranquilo, a gente não queria se livrar de você, queria te proteger. Filha, me
desculpa por tudo o que você sofreu, e me perdoa por ter falado para aquele
homem horroroso onde você estava, foi culpa minha, não imaginava que ele
fosse capaz de te magoar, me perdoa? Eu sempre te amei e sempre vou te
amar, minha filha querida.
Quando o vídeo terminou lágrimas escorriam pelo rosto de Olivia,
que se emocionou muito com a mensagem da mãe. Ainda chorando
conseguiu gravar uma mensagem de voz para responder:
— Mãe, você não tem culpa de nada, sempre foi uma ótima mãe. Eu
também te amo muito. Amanhã eu te ligo e conversamos mais, um beijo.
Eram sete horas da noite quando ouvimos batidas na porta, Olivia já
havia se recuperado das emoções da tarde e fez questão de responder a todas
as mensagens que recebeu, todas por áudio, porque não gostaria que a vissem
tão machucada. Os visitantes não esperam resposta para entrar no quarto,
minha mãe, Dylan e Mandy.
— Voltei, Olivia, como se sente? — minha mãe disse se aproximando
da cama.
— Oi, Sara, não precisava se incomodar em voltar, afinal vocês têm
um jantar hoje, certo?
— Temos sim, então o jantar vai para onde a família está. Viemos
jantar com você, querida. — Ela e Mandy levantaram algumas sacolas. —
Mas nosso jantar será mais cedo, porque as visitas precisam ir embora antes
das nove horas.
— E como não existe Natal sem árvore, trouxemos uma para você. E
até que é bonitinha! — Mandy disse sorrindo e levantou uma miniatura de
plástico de árvore de Natal.
Mandy e minha mãe organizaram algumas comidas na mesa que
estava no quarto, Dylan se aproximou e começou a conversar com Olivia e
aos poucos o ambiente se tornou agradável e leve. Todos estavam à vontade
apesar de estarmos em um hospital. Demorei algum tempo para perceber que
era o primeiro jantar de Natal que passava com minha mãe e meu irmão
desde que meu pai faleceu. Foi preciso Olivia aparecer em minha vida para
me mostrar que podemos criar novas lembranças sem esquecer e sem deixar
de amar as pessoas que perdemos em nossa vida.
Se me perguntarem como me apaixonei tão rápido por uma garota, a
resposta é que não foi tão rápido, foram necessários vários capuccinos com
duplo expresso. O destino acabou de nos unir no dia em a atropelei, porque
tive a chance de conhecer melhor sua fragilidade e sua força, sua sabedoria e
sua inocência, sua simplicidade e seu requinte, seus medos e sua coragem. E
cada parte dela me tocou tão fundo que fiquei completamente desarmado,
enquanto ela foi se acomodando em cada pedacinho do meu coração e da
minha vida.
CAPÍTULO 22
OLIVIA
Dia 25/12
— Olivia, estou impressionado com sua recuperação, seus reflexos
estão ótimos, sua cicatrização vem respondendo muito bem aos
medicamentos. E você não teve nenhum sintoma da concussão. Vou te dar
alta, mas você precisa de repouso absoluto por uma semana, com essa perna
sempre para cima. Também já deixei agendado o retorno ao ortopedista que
te atendeu e irá te acompanhar, a primeira consulta será logo após o
Réveillon.
— Dr. Jenkins, muito obrigada pela atenção. Estou muito feliz em ir
para casa!
Henrik ao meu lado pareceu ainda mais feliz que eu, como uma
criança que ganha o presente que pediu no Natal. Ele é tão atencioso que
trouxe uma roupa para eu sair do hospital, pediu às enfermeiras que me
ajudassem a tomar banho antes de ir e até ouvi ele pedindo o telefone de uma
delas para caso eu precisasse de algo, não fiquei com ciúmes, afinal era uma
senhora de sessenta anos.
Ao chegarmos em seu apartamento ele não me deixou colocar o pé no
chão, me pegou no colo, sem esforço, e subimos pelo elevador. No Hall de
entrada ouvi algumas vozes, mas antes que eu pudesse perguntar quem estava
lá, Sara abriu a porta com sorriso enorme.
— Bem-vinda de volta!
Ela falou e saiu da frente da porta para eu passar. Quando entramos
no apartamento vi Dylan, Mandy e… e… meus pais! Esfreguei os olhos
porque não pude acreditar. Eles estavam em pé em frente ao sofá, devem ter
se levantado quando entramos. Henrik continuou andando até o sofá do outro
lado da sala, onde me colocou gentilmente. Rapidamente pegou um pufe para
que eu pudesse apoiar minha perna. A sala continuou em silêncio nesse
momento.
— Oi, mãe, oi, pai.
— Meu Anjo, eu vou tomar um banho rápido e já volto. — Assim
meu namorado subiu as escadas.
E então foi a vez de minha sogra quebrar o silêncio.
— Dylan e Mandy, venham me ajudar com o almoço.
E assim ficamos somente eu e meus pais na sala, nos olhando e nos
reconhecendo, depois de tanto tempo. Minha mãe caminhou em minha
direção rompendo as barreiras criadas pelo silêncio e pela distância.
— Minha filha, o que aquele monstro fez com você? Ele te machucou
demais. — ela disse enquanto me abraçava, sem me apertar, como se eu
pudesse quebrar.
— Estou bem, mãe, foi um susto, mas vou sarar.
— Foi culpa minha, me perdoa?
— Mãe, olha para mim. — Nossos olhos se fixaram e consegui ver a
dor que ela carregava. — O único culpado por eu estar assim, não está mais
aqui. Você não tem culpa de nada. Sou eu que tenho que pedir desculpas a
vocês dois pela forma como saí de casa. Sei que ficaram magoados comigo,
mas eu precisava descobrir meu próprio caminho, e acabei encontrando
Henrik.
Olhei para frente e fiz sinal para meu pai se aproximar, ele andou
devagar e sentou do outro lado. Me senti em casa sentada entre meus pais.
— Pai, o senhor me desculpa?
— Filha, você sabia que seu acidente passou na televisão? — ele
falou devagar e baixo, diferente da última vez em que conversamos. Fiz sinal
de negativo com a cabeça e não tive ideia de onde ele queria chegar, meu
coração apertou com medo de sua conclusão. — Estavam filmando do céu,
eu vi quando o carro capotou, foi feio. Pensei que você tinha morrido, e não
está certo um pai perder um filho, minha única filha! E ainda sem ter a
chance de dizer a ela que errei tentando acertar e de poder pedir desculpas por
isso. Então, mesmo ainda não concordando com sua decisão de ter saído de
casa, sou eu quem pede desculpa, peço de coração.
Antes dele terminar de falar já estava chovendo em meu colo, e as
gotas saíam dos meus olhos. Ao meu lado escuto os soluços de minha mãe,
esse foi um dos momentos mais intensos que nós três vivemos.
— Então, a gente se desculpa, certo? — falei puxando os dois para
um abraço, as dores que sentia no corpo sumiram por alguns segundos para
que eu pudesse aproveitar o calor que emanava carinho dos abraços de meus
pais.
Levamos alguns minutos para nos recompormos, e os McDowell nos
deram privacidade para conversar. Meus pais disseran que a porta de casa
estava aberta se eu quisesse voltar, me perguntaram sobre Henrik e contei
como nos conhecemos e como ele cuida e se preocupa comigo.
Eu perguntei como vieram até Nova York e eles disseram que foi Sara
quem organizou tudo, que logo depois do acidente eles conversaram bastante
com ela, porque ela estava com o telefone de Henrik. Então Sara foi
informando como eu estava e também organizou a viagem para Nova York,
até avião de última hora ela conseguiu, e enviou as passagens para que
chegassem nesta manhã. Depois Dylan foi buscá-los no aeroporto. Eles
elogiaram muito minha sogra e tive de concordar com eles que ela é
maravilhosa e realmente me trata como uma filha.
Henrik voltou do banho, que não foi tão rápido assim, estava
cheiroso, de barba feita e parecia mais lindo do que nunca. Ele me pegou no
colo e me levou até a mesa me colocando sentada em uma cadeira, meu pai
me trouxe o apoio da perna. Todos se sentaram e Sara e Mandy colocaram as
comidas na mesa, estavam cheirosas e pareciam muito apetitosas.
— Henrik, eu ouvi seu suspiro! Não foi mesmo eu que cozinhei, pode
ficar aliviado.
Dylan e Mandy começaram a rir e expliquei para os meus pais que a
cozinha não era o ponto forte de Sara. Eles pareceram mais à vontade nesse
momento. Logo, Sara pediu a palavra.
— Esse é um Natal especial para mim, um Natal diferente do que
planejamos. Mas estou muito grata de estar nessa mesa com todos vocês,
porque aqui eu consigo sentir, mais forte do que qualquer outro ano o espírito
do Natal. Consigo ver no milagre do renascimento de Olivia; na capacidade
de perdoar a si mesmo e aos outros, posso ter ouvido pedacinhos da conversa
de vocês; no amor que emana de cada um de nós nessa mesa; na esperança de
um futuro feliz; e depois dos aprendizados desse ano, no início de uma nova
vida para cada um de nós.
Ela ergueu a taça e todos acompanharam o brinde. Começamos o
almoço que estava uma delícia, descobri que meus pais ficariam até o final da
semana e já estavam em um quarto de hóspedes aqui. Fiquei muito feliz com
a notícia. Mandy e Dylan contaram seus planos para Réveillon, que seria com
a família dela, já que não foram no Natal. A conversa seguiu tranquila até os
pratos estarem vazios, minha mãe ajudou Sara e Mandy a retirarem os pratos
e as sobras, e trazerem a sobremesa. Me assustei quando Henrik se levantou,
e olhei para ele que me deu uma piscadinha.
— Olivia. — Sua voz era forte e todos pararam e olharam para ele. —
Depois da conversa que tivemos ontem, não tive mais dúvidas que o sentimos
é recíproco, de que nesses últimos e avassaladores dias nossos corações se
aproximaram, ou se fundiram e não quero esperar para dizer que eu te amo e
repetir que quero passar o resto da minha vida com você. — Ele se sentou
novamente para ficar na minha altura e tirou uma caixinha do bolso, olhou
nos meus olhos antes de continuar, eu já sabia o que ia acontecer e meu
coração quase explodiu em batidas que pareciam tirá-lo do peito. — Meu
anjo, aceita se casar comigo?
Olhei para o lado e vi vários cinco pares de olhos que nem piscavam.
Meu pai tinha uma expressão indecifrável. Eu só tinha uma resposta para dar
para Henrik:
— Claro que sim.
Ele se aproximou, colocou um lindo anel com uma pedra de
esmeralda no centro e alguns pontos de diamante ao redor, em meu dedo. A
joia era expendida!
— Bom, se vão mesmo morar juntos, que pelo menos seja com seu
noivo. — Escutei meu pai resmungar. — E acho bom o casamento sair logo.
— E os netos também! — Sara emendou e meu pai se engasgou com
o vinho que estava levando à boca, minha mãe precisou socorrê-lo. Enquanto
todos na mesa sorriam.
Meu noivo me pegou no colo e se dirigiu aos demais na mesa.
— Bom, pessoal, vou levar minha noiva para descansar, ela já fugiu
bastante do repouso por hoje.
Acenei me despedindo de todos. Estava tranquila porque ainda teria a
companhia de meus por mais alguns dias. Henrik subiu as escadas e fomos
direto para seu quarto, ele me acomodou em sua cama, garantindo que minha
perna ficasse mais alta. Depois se sentou ao meu lado.
— Gostou do seu presente de Natal?
— Não poderia ser melhor, muito obrigada, por ele e por tudo. Mas
não comprei um presente para você.
— Olivia, o meu melhor presente é você!
EPÍLOGO
OLIVIA
SEIS MESES DEPOIS
O tempo tem andado cada vez mais rápido, só não foi mais rápido que
as mudanças que estavam acontecendo em minha vida. Ainda não me
lembrava do que aconteceu no dia do meu sequestro, embora carregarei as
marcas dele para sempre. As feridas superficiais sararam rapidamente, assim
como a maior parte das dores. Mas minha perna foi mais difícil, foram quase
dois meses até que eu pudesse colocar os pés no chão, e depois muita
fisioterapia até voltar a andar normalmente.
Não voltei para a cafeteria, no começo por não ter condições de ficar
muito tempo em pé e depois quando já estava preparada, porque minha sogra
me indicou para substituir uma professora que entrou em licença maternidade
no final do semestre, foram apenas dois meses de substituição até o início das
férias de verão. Mas a experiência foi boa e a escola me contratou para o
próximo ano letivo.
Depois da festa de gala da empresa do Henrik os seguidores em
minhas redes sociais cresceram bastante. As fotos postadas pelo salão e pelos
jornalistas que compareceram à festa foram responsáveis para que eu
atingisse mais de mil seguidores em menos de uma semana, esse número foi
crescendo ainda mais nas semanas seguintes e se multiplicam a cada novo
evento que compareço com meu noivo. As dicas de Kenny sobre como tirar
fotos, sobre o que postar, como mencionar pessoas e o assunto, ajudaram
nesse processo. O mais curioso era que o vestido que usei naquele evento foi
confeccionado por um estilista em ascensão, que também marcou meu perfil.
Nas demais festas que compareci com Henrik sempre usei vestidos lindos e
de estilistas pouco conhecidos, mas aprendi que era importante para eles que
eu mencionasse seus nomes nas festas. Agora com milhares de seguidores
sempre sou procurada por novos estilistas para divulgar suas roupas, afinal
alta costura não era feita apenas por grandes marcas.
Meus pais continuaram a conversar sempre comigo por chamadas de
vídeo, quando minha perna melhorou também fomos visita-los, eles gostaram
do meu noivo e o acolheram bem, embora sempre me cobrassem a data do
casamento porque como diz meu pai: “moça direita tem que casar para morar
junto”. A minha mãe e minha sogra desenvolveram uma amizade a distância
e minha mãe tem dado aulas de culinária por vídeo chamada para Sara, que já
aprendeu a fazer um bolo bem gostoso para a surpresa de seus filhos.
Ficar em repouso também me mostrou quem eram minhas amigas.
Carrie e Roxie, sempre vinham me visitar, por isso desenvolvemos uma forte
amizade nesse período e agora temos uma noite das meninas a cada quinze
dias.
Minha relação com Henrik melhorava a cada dia, nos conhecemos
mais e estamos aprendendo nossos limites, criando nossas rotinas e nossas
regras como casal. Nosso relacionamento amadureceu e agora me sentia
segura para agendar a data de nosso casamento. Por isso enviei uma
mensagem próximo ao horário em que ele costumava sair do escritório.

Olivia:
Decidi a data do nosso casamento, mas preciso
saber se você concorda.

Henrik:
Que surpresa maravilhosa!
Que data escolheu, meu anjo?
Olivia:
Isso você só vai saber quando chegar em casa.

Henrik:
Vai me deixar curioso?
Olivia:
Um incentivo para voltar logo!
Bjs.

Estava ansiosa para vê-lo chegar e descobrir a surpresa que preparei,


decorei a casa toda com enfeites natalinos, uma música natalina tocava suave
no ambiente e pedi a Carrie que conseguisse na cafeteria uma daquelas
fantasias de noelete, por baixo uma linda lingerie vermelha.
Ouço a porta se abrindo e Henrik franzindo o cenho sem entender a
decoração, saí da cozinha e fui em direção à sala. Quando seus olhos me
encontraram fui escaneada de baixo para cima e vi seu peito subir e descer.
— Adorei a data que escolheu, embora esteja muito longe. Você sabe
que sempre quis saber o que tinha por baixo desse uniforme, não é?
— Sim, e hoje você pode descobrir.
Ele avançou em minha direção e me agarrou pela cintura, invadiu
meus lábios com desespero, e me apertou contra seu corpo. Consegui sentir o
volume entre suas pernas crescer. O gelo que envolvia meu ruivo derreteu, e
agora eu sentia somente o calor que emanava do seu corpo. Não tive tempo
reagir antes que ele me pegasse em seu colo e subisse as escadas em direção
ao seu quarto, íamos começar nossa comemoração da escolha da data de
nosso casamento.
DEDICATÓRIA
Dedico esse livro a todos os familiares e amigos que tornaram meus
Natais especiais ao longo dos anos.
As boas lembranças sempre vão me acompanhar!
Algumas sempre marcam mais, como: montar uma barraca no meio
da sala; descobrir a receita da torta de sorvete ou da farofa de soja; os
presentes “bomba” da tia Marilze; escolher o melhor pinheiro de verdade
com a minha mãe; na casa do Miguel, arrumar as mesas natalinas — que
ficam maiores a cada ano — com carinho e lindas decorações; os amigos
secretos; os copos e taças cheios de sorrisos e conversas; e principalmente o
carinho e alegria das pessoas que compartilharam esses momentos comigo!
Amo todos vocês!
Livros da Autora:

OS CAMINHOS QUE ME LEVAM ATÉ VOCÊ


Ele veio para essa vida a passeio, por isso nada de relacionamentos
sérios ou mocinhas grudentas para atrapalhar seus planos.
Ela é focada no trabalho e sonha com uma família, com laços e
sentimentos que a vida tirou dela.
O destino caprichosamente faz os caminhos de Theo e Mia se
cruzarem em uma viagem, um encontro permeado de sensualidade e
descobertas que abala as estruturas dos dois.
Ao regressarem para suas cidades levam em suas malas desejos e
sentimentos novos. A paixão e o desejo serão suficientes para superar a
distância e o choque entre essas duas personalidades?

Faixa etária: 18
Livro com conteúdo Erótico.

Vamos conversar?

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[1] Nos Estados Unidos o Dia dos Namorados é comemorado no dia 14/02, chamado de
Valentine’s Day.
[2] A National Football League (NFL) é a liga esportiva profissional de futebol americano dos
Estados Unidos.
[3] Sentindo o meu caminho em meio à escuridão
Guiado pela batida de um coração
Não sei dizer onde a jornada vai acabar
Mas sei por onde começar
Wake Me Up - Avicii
[4] Hokey – Em português, hóquei sobre o gelo é um esporte olímpico jogado num ringue de
patinação. Os jogadores patinam no gelo e usam tacos para movimentar um disco de borracha.
[5] Você é o meu modo de vida, Faça-me seu modo de vida, Nunca vá
embora

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