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Copyright © 2022 Olívia Molinari

Capa e Diagramação: Designer Tenório / Olívia Molinari


Revisão: Barbara Pinheiro

Leitura Crítica: Pâmela Peres

Shutterstock, PNGTree

Molinari, Olívia – 1ª Edição – Publicação Independente, 2022.

Romance Contemporâneo

Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens e acontecimentos


descritos são produtos da imaginação da autora. Qualquer

semelhança é mera coincidência

Todos os direitos reservados.


Proibida a cópia e reprodução, por quaisquer meios, sem a prévia

autorização por escrito da autora.

A violação dos direitos autorais é crime estabelecido pela lei nº


9.610/98 e punido pelo artigo 184 do Código Penal.
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Dedicatória
AVISO
Introdução
Prólogo
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Epílogo
Recadinho da Autora
Agradecimentos
Sobre a autora
Ouça as músicas que inspiraram essa história:

Spotify
Deezer
Para todas as que me incentivaram a escrever esta história.
Este livro é uma ficção.
Lugares, nomes, leis, facções, são frutos da minha imaginação.
Claro que tentei aproximar o máximo possível da realidade através

de pesquisas, mas para algumas coisas precisamos dar voz à


licença poética para fazer a história funcionar.
Deixando claro que não compactuo com as atitudes dos

personagens em várias situações.

ATENÇÃO AOS GATILHOS:


Apesar de não ser um livro Dark, contém gatilhos de tortura física,
abuso psicológico, palavras de baixo calão e conteúdo sexual para

maiores de 18 anos.
“É perigoso se apaixonar
Mas quero queimar com você esta noite

Me machuque
Há dois de nós
Temos a certeza do desejo
O prazer que há na dor e no fogo

Me queime.”
Fire Meet Gasoline - Sia
Sobre a “Organização”

Na era vitoriana (1837-1901) a Inglaterra passou por inúmeros


processos que a levaram para o seu auge econômico, político e
cultural, permitindo que uma grande e instruída classe média se

desenvolvesse.
Da segunda metade do século em diante, políticas do novo
imperialismo levaram a conflitos coloniais e, posteriormente, a

guerras. Internamente, a política tornou-se cada vez mais liberal


com mudanças, reformas políticas, alargando os direitos de voto.
Diante deste cenário, organizações criminosas se formaram

em vários lugares do Reino Unido, porém, uma em especial tomou a

atenção de Sua Majestade e dos Lordes que não sabiam como


controlá-los.

Até o dia em que um homem com grandes posses assassinou

o líder dessa organização e roubou o seu lugar, tornando-a a mais


forte da Inglaterra e, posteriormente, de toda a Europa, fazendo com

que apenas Deus pudesse exterminá-los.


E bem, nem Deus quis ter esse trabalho.

A Organização cresceu, se infiltrou em todas as esferas

sociais, políticas e sua liderança foi passada de pai para filho até os
dias de hoje.

Seja bem-vindo à “Brandy Blood”.


Emmeline

Foi em um inverno intenso, quando eu tinha acabado de

completar oito anos, que eu vi meu pai dar um beijo carinhoso em


minha mãe, enquanto alisava suas costas e dizia que ela era a
mulher mais importante de sua vida. Papai também abraçou a mim

e a Colin, meu irmão alguns anos mais velho, e prometeu que nos
traria presentes se nos comportássemos e ajudássemos nossa mãe
em tudo o que ela precisasse.

Depois do abraço, ele deu outro beijo carinhoso nela, pegou

sua mala, colocou o chapéu, o cachecol, as luvas de lã que mamãe


havia terminado alguns dias antes, e saiu de casa, prometendo que

em breve voltaria.

Três dias depois que ele saiu, recebemos alguns agentes da


Marinha Britânica, elegantes em seus uniformes brancos, que

trouxeram a notícia de que o barco em que papai estava tentando


fazer uma travessia da Inglaterra para a França, havia naufragado e

eles estavam trabalhando para encontrar os corpos.


Só que é claro que eles nunca foram encontrados.

Naquele dia, eu vi mamãe urrar de dor. Vi mamãe pedir que

Deus a levasse junto.


Foram meses de desespero. Ela mal comia, mal se levantava

da cama.

Colin e eu estávamos abandonados.


Até o dia em que um homem muito elegante bateu em nossa

porta e após uma longa conversa com nossa mãe, as coisas

voltaram ao normal.
Quer dizer, nem todas, mas pelo menos ela já cuidava de nós,

se vestia melhor, comia, lavava os cabelos...


Nas visitas que aquele homem nos fazia, ele trazia consigo o

seu filho.

Um garoto de cabelo preto e olhos profundamente azuis. Ele

era alguns anos mais velho que eu, mas assim que nos vimos pela

primeira vez, eu o temi.

E eu não sabia exatamente por que ele me dava medo.


Talvez fosse pelo modo como ele parecia entrar em minha

cabeça todas as vezes que olhava para mim ou talvez porque ele
era de uma classe social muito além da nossa.
Só que o tempo passou e chegou o dia em que não havia mais

o que temer naquele garoto. Ele era apenas mais um que ficava

esperando pelo pai, enquanto ele e a nossa mãe se trancavam no

quarto do segundo andar e ficavam por horas.

O garoto estranho de terno elegante, meu irmão e eu nos

tornamos amigos.
Mas então, depois de alguns meses, o garoto parou de

frequentar a nossa casa e seu pai disse que ele havia sido mandado

para estudar em um colégio no interior da Inglaterra.

Por algum tempo, senti sua falta.

Alguns anos se passaram e o homem elegante também parou

de ir.

Colin, meu irmão, foi o terceiro a nos deixar.


No final das contas, mamãe e eu acabamos sozinhas e eu

cuidei dela até o final de sua vida. E foi um pouco antes de sua

morte, quando eu tinha apenas 14 anos, que ela disse algo que

mudaria a minha vida para sempre:

— Emmeline, eu... você precisa saber. — Ela segurou meu


braço e me olhou com desespero. — Quando você fizer vinte e um
anos, ele virá. — Sua voz saía com dificuldade.

— Ele quem, mamãe?


Ela respirava com dificuldade.

— Henry.
Dei alguns passos para trás, porque fazia anos que eu não
ouvia aquele nome. Eu apenas me lembrava do garoto de olhos

azuis que era o nosso amigo e nos deixou sem explicações.


— Henry?

Mamãe deitou na cama, a falta de ar prensando seus pulmões.


— Eu... eu fiz uma promessa. Você precisará se casar com ele

quando completar vinte e um anos.


— O quê? — Franzi o cenho. — Mamãe, você está delirando.
Isso não existe.

Seu olhar era assombrado.


— Para eles... aquela família, existe — ela disse devagar. —

Pergunte ao Colin.
De repente, as lágrimas começaram a rolar pelo seu rosto,

chegando até o travesseiro velho e surrado.


— Eu não queria que fosse assim... queria que você
encontrasse o amor, assim como encontrei o seu pai — aproximei-
me porque ela estava fazendo muito esforço —, mas foi necessário,

foi parte do acordo.


— Que acordo, mamãe?

Ela me encarou.
— De sobrevivência.

— Descanse, mamãe. — Puxei o cobertor até seu pescoço. —


Descanse.

Era óbvio que eu não estava acreditando em suas palavras.

Naquela noite, mamãe deu seu último suspiro. E foi no dia


seguinte, enquanto o caixão descia até o fundo de uma cova, que

descobri que Colin era um homem muito importante dentro de uma


Organização Criminosa.
E que essa organização era liderada por Henry.

O garoto, que agora era um homem formado, me buscaria


assim que eu completasse vinte e um anos, para ser sua esposa.

Eu só conseguia pensar que aquilo tudo era loucura e que


Colin, assim como nossa mãe, estava delirando ao dizer aquelas

palavras, bem ali, na frente da sepultura da nossa mãe.


O problema foi que quando ergui os olhos, embaçados pelas
lágrimas, eu o vi.
Achei que estava vendo coisas, então passei os dedos pelos
olhos, limpei aquelas lágrimas e olhei novamente.
Henry estava do outro lado do cemitério, debaixo de uma

árvore, vestido com um terno preto, gravata da mesma cor e um


sobretudo que o protegia do frio intenso, encarando-me exatamente

como ele fazia quando eu era apenas uma criança.


Só que agora já não éramos mais crianças.
Henry era um homem formado e eu estava passando pela

adolescência.
Mesmo assim, eu soube que era verdade.

A minha vida estava atrelada à dele e não havia para onde


correr.
Vós, que sofreis, porque amais, amai ainda mais.

Morrer de amor é viver dele.


Victor Hugo

Emmeline

Seis anos depois


Londres – Reino Unido

Quando o dia começou a clarear, eu já estava em pé dentro do


trem.

Ainda estávamos no outono, mas por causa das baixas

temperaturas, o dia costumava clarear mais tarde e escurecer mais


cedo.

Não sei bem se eu gostava disso, porque com a correria que a


minha vida era, não me restava tempo para fazer outras coisas a

não ser ir de casa para o trabalho e do trabalho para o ballet.


Logo o trem se enfiou no subsolo de Londres e eu já não pude

mais vislumbrar a paisagem da cidade, restando-me apenas a


escuridão das estações.

Pessoas me apertaram quando chegamos à estação de South

Kensington, mas finalmente saiu uma boa parte, o que me


possibilitou sentar em um dos bancos.

Como ainda me restavam algumas estações, peguei o livro “A

Bela e a Fera” dentro da minha bolsa. Ele era uma edição especial
que eu tinha ganhado de Melanie, uma amiga que dividia comigo o

aluguel de uma casa simples e a única que eu podia confiar nos

últimos tempos.
Melanie e eu nos conhecemos nas aulas de ballet que eu

frequento desde os oito anos. Talvez fosse um pouco tarde para


uma jovem começar, mas me foi dada uma chance e eu aproveitei

com todas as minhas forças.

Quando minha mãe morreu, há seis anos, Colin me deu

suporte até eu completar dezoito e poder trabalhar. Ele alugou um

apartamento nos arredores de Mayfair, uma área nobre de Londres,

e ia me visitar uma vez a cada quinze dias para ver se estava tudo
bem. Quando arrumei um emprego, peguei minhas coisas e saí do

apartamento, sem olhar para trás.


Não gostava da sensação de estar usufruindo de coisas que
vinham de algo ilícito.

Colin havia escolhido aquele caminho, mas eu não.

Meu celular vibrou com uma mensagem.

“Invente uma desculpa para o Laurent, mas eu não vou hoje. A

bebedeira de ontem me deixou mal.”

Abri um pequeno sorriso.


Melanie era o oposto de mim em quase tudo.

Ela gostava de sair, curtir a vida. Gostava de beber e não

foram poucas as vezes que alguns amigos a trouxeram carregada

depois de ela exagerar na dose.

Melanie vinha de uma família rica, mas ela tinha abandonado

tudo porque dizia que não os suportava tentando mandar em sua


vida. Ela largou a chance de cursar uma faculdade em Oxford.

Enquanto eu... tentava apenas sobreviver e enterrar o meu

passado.

Durante os anos que Colin me deu suporte, foram poucas as

vezes que o vi. Estava magoada e não entendia por que ele havia
escolhido aquele caminho. Ele não fazia questão de esclarecer,

apenas dizia que era o melhor.


E agora, já fazia quase três anos que eu não o via.

“Descanse, então. Vou chegar tarde... aulas de ballet.”

Cliquei em enviar.
Não demorou muito, mais uma mensagem chegou, mas desta

vez era de outra pessoa.


Não segurei o sorriso que brotou em meus lábios.

“Vou buscá-la no pub para irmos juntos ao ballet.”

Era William.
William Levinsky era meu companheiro de dança e eu o

conhecia há apenas três meses.


Segundo ele, havia se mudado para Londres em busca de

novas oportunidades.
Nossa conexão foi imediata.

Nossa amizade...
E o romance que se iniciou, mesmo que meu foco não fosse
esse e sim em melhorar nossos passos. Entretanto, foi inevitável
quando seus olhos verdes me fizeram sentir coisas que eu nunca

havia sentido.

“Ok, vou esperar você.”

Cliquei em enviar e guardei o celular na bolsa.


Joguei minha cabeça para trás, encostando-a no vidro gelado
da janela e suspirei.

Mais um dia de trabalho...


Mesmo sabendo que não devia, eu já começava a fazer planos

na minha cabeça sobre o meu futuro com William.


Só que enquanto eu pensava nesses planos, eu me lembrava

de uma outra história.


E eu não gostava de pensar nisso, me trazia memórias ruins.
Preferia pensar que eu era apenas uma garota comum em

uma cidade grandiosa como Londres, lutando como qualquer outra


pessoa dentro deste trem por uma vida melhor.

Será que algum dia minha vida seria diferente disso?

~
Meus pés se movimentavam com passos leves e delicados,
enquanto eu mantinha minhas mãos esticadas na horizontal
seguindo o compasso da suave melodia de Tchaikovsky.

No ballet, os passos precisam ser delicados, mas certeiros. A


postura precisa ser a de uma princesa, sem ser esnobe. Precisamos

agir como se fôssemos fadas com giros e saltos, como se o território


onde estamos pisando fosse um grande parque de diversões.
— Muito bem, Emmeline! Muito bem! — Fui interrompida no

quarto giro. — Por hoje, chega.


Parei na posição En dehors1 com as mãos na minha cintura.

Respirei fundo algumas vezes, tentando entender por que a


professora Constance havia nos interrompido.

— Bem no momento que eu ia pegá-la? — William perguntou


com a voz frustrada.
— Vocês estão ótimos juntos — ela respondeu, erguendo

levemente suas sobrancelhas grisalhas. — O problema é que olhe


para o rosto de Emmeline. Ela está exausta. Precisa descansar.

Apesar de ser verdade, porque o dia fora extremamente


corrido no pub, descanso era a última palavra do meu vocabulário
nos últimos tempos.
— Ela tem razão. — William se aproximou e segurou meu
rosto entre as mãos. — Você precisa descansar.
— Não posso descansar. — Afastei-me das mãos de William e

do olhar preocupado de Constance. — Não se eu quero aquela


bolsa no The Royal Ballet School.

A Royal Ballet School era uma das maiores escolas de ballet


do mundo e era o sonho de todo bailarino entrar. O problema é que
não era qualquer um que conseguia, a não ser que você tivesse um

patrocinador. Porém, durante alguns meses do ano, eles faziam

algumas audiências e concediam bolsas de estudo.


No ano passado, eu tentei, mas não consegui por pouco.

Então nesse ano, estava me preparando muito mais do que antes,

porque não podia perder essa chance.

“Você será alguém grande nesta vida, Emmeline. Tenha certeza


disso. Nunca deixe o seu bom coração de lado.”

Era o que mamãe vivia dizendo enquanto eu cuidava dela em

seu leito de morte.


— Nós vamos conseguir, ok? — William se aproximou

novamente com seus olhos verdes que me arrebataram desde a


primeira vez que o vi. — Mas a professora Constance tem razão. E

com essa cara, você não vai passar do primeiro salto.


Respirei fundo e assenti lentamente.

— Ok, acho que vocês têm razão. — Peguei uma garrafa de

água em cima de um banquinho de madeira e a entornei. Depois


disse: — Mas amanhã eu estarei de volta.

Constance balançou a cabeça negativamente.

— Vou trancar a escola e quando as outras meninas

perguntarem o porquê fiz isso, direi que a culpa é sua, Emme.


Adorava quando Constance me chamava de Emme. Fazia-me

lembrar da minha mãe e da sua forma carinhosa de cuidar de mim.

— Se eu não posso voltar amanhã, quando eu posso?


— Na próxima semana — ela disse, enfática. — Assim como

você, William. Quero que tirem o restante da semana de folga e na

próxima ensaiaremos os outros passos que vocês ainda estão tendo


dificuldade.

William sorriu.

— A senhora é quem manda.

— Não me chame de senhora, garoto irritante. — Ela revirou


os olhos e foi na direção da porta com sua bengala dourada. —

Vejo-os na semana que vem.


Constance realmente era bem nova.

Seu cabelo estava começando a ficar grisalho agora, mas ela

ainda mantinha o corpo de uma jovem de dezessete anos.


Infelizmente, tinha sofrido um acidente quando ainda era nova, o

que lhe roubou o sonho de ser uma grande bailarina.

Entretanto, ela compensava isso, sendo uma ótima professora.

Quando Constance nos deixou a sós, William suspirou e me


encarou de uma forma muito séria.

— Você precisa de outro emprego.

— Preciso... — Olhei para as janelas da enorme sala de


ensaio. — Ou talvez eu precise de um patrocinador.

— Ou talvez você precise que seu irmão assuma o papel de

cuidar de você. — William se aproximou novamente e por alguns

segundos me perdi em seu rosto perfeito, marcado por lábios


rosados bem-desenhados, olhos verdes flamejantes e sobrancelhas

grossas cor de chocolate.

— Colin é um assunto que eu não gosto de lembrar. — Virei o


rosto, concentrando-me em nosso reflexo nos grandes espelhos.

Eu havia contado a William sobre meu irmão, deixando de fora

os detalhes que incluíam sua vida criminosa, era claro. Tudo bem

que William era bem curioso com a minha vida, mas consegui não
entregar tudo, deixando apenas a parte em que Colin e eu não nos

falávamos havia quase três anos e que ele era ausente, em todos
os aspectos.

— Esqueça seu irmão. — William puxou a minha mão e

entrelaçou nossos dedos. — Vamos? Eu vou acompanhá-la até sua


casa.

Sorri.

— Sempre tão cavalheiro, Will.

Ele sorriu de volta e encostou sua testa na minha.


— Você merece o homem mais cavalheiro do mundo.

Meu coração se aqueceu diante de suas palavras e esqueci

completamente que estávamos falando do meu irmão.


William era como o homem que eu havia imaginado em meus

sonhos.

Nossa aproximação foi inevitável quando ele chegou a Londres

e todas as vezes que olhava para o seu lindo rosto, ficava me


perguntando se ele era o homem que seria comigo o que o meu pai

foi com a minha mãe.

E eu realmente esperava que sim.


William me deu um beijo rápido nos lábios e nos afastamos

para trocarmos de roupa nos vestiários.


Guardei minhas sapatilhas no armário, peguei minha bolsa e

desci as escadas, encontrando-o no andar de baixo, já vestido

casualmente com uma mochila nas costas.

— Até logo, meninas! — ele se despediu de algumas alunas


que estavam cercando-o no hall.

Precisei controlar a minha vontade de revirar os olhos.

É claro que William, chamativo com sua beleza ímpar, fazia as


mulheres caírem aos seus pés.

— Venha comigo, não quero que pegue uma gripe. — Ele

abriu um guarda-chuva preto assim que saímos na calçada e me

puxou para si, passando um braço ao redor da minha cintura.


— As meninas estavam aborrecendo-o? — perguntei, já

caminhando ao seu lado.

— Não. — Ele sorriu, convencido. — Só estavam falando


sobre os nossos ensaios. Disseram que somos perfeitos juntos.

— Sei...

William deu uma risadinha e me puxou mais forte para si,

depositando um beijo em minha bochecha.


— Está com ciúme?

— Não, claro que não.

Eu estava, mas não ia deixar isso óbvio.


Atravessamos a rua e nos apressamos quando a chuva

começou a cair mais forte.


Londres e o seu clima chuvoso a maior parte do ano.

Estávamos no final de outubro, mas já estava bastante frio.

William, mesmo morando do lado oposto da cidade, me

acompanhou na viagem de volta até a minha casa. Sempre gentil,


segurando a minha mão, dizendo palavras bonitas...

Quando nos aproximamos da casa, vi que as luzes estavam

apagadas.
— Que estranho, era para as luzes estarem acesas. Melanie

está em casa... — Ergui as sobrancelhas. — A não ser que ela

tenha decidido sair.


— Estranho mesmo... — William concordou. — Hey, espere.

Ele me impediu de abrir o portãozinho para subir as escadas e

me puxou para si, mantendo o guarda-chuva sobre as nossas

cabeças. Nossos rostos ficaram a centímetros de distância e eu


sentia seu hálito quente em meu rosto.

— Vai entrar sem me dar um beijo?

Sorri.
— Claro que não.
Joguei meus braços ao redor do pescoço de William e encostei
minha boca na sua, em um beijo apaixonado.

Gostava de sentir seus lábios contra os meus.

Gostava do jeito que ele me fazia sentir especial.


— Sei que ontem eu exagerei e devia ter ido embora mais

cedo, mas era seu aniversário e eu queria aproveitar com você —

ele disse, assim que separamos nossos lábios. — E como hoje você
precisou trabalhar, acho que amanhã dá para escapar e aproveitar

um pouquinho, não dá?

— Não sei, Will... — Segurei as lapelas de seu casaco. — Mas

vou tentar. Posso sair um pouco mais cedo.


William me lançou uma piscada.

— Eu vou passar por lá. Diga ao seu chefe que o seu

namorado vai marcar presença a partir de agora.


— Namorado? — Arregalei os olhos, porque apesar de

estarmos saindo há pouco mais de um mês, William nunca


especificou o que tínhamos e, inclusive, isso era algo que me
incomodava bastante, mas eu não dizia nada.

— Namorado. — Ele acariciou meu rosto e eu esfreguei a


minha bochecha em sua mão enluvada. — Esse era o presente que
eu devia ter te dado ontem.
Isso era tudo o que eu podia sonhar.
Desde criança, mamãe me ensinou a querer um grande amor
como ela teve com meu pai. E eu sempre desejei isso, me

guardando para o homem certo e eu achava que finalmente o havia


encontrado.
William me deu mais um beijo repleto de paixão e quando

parecia ser o bastante para acender nossos corpos, ele se afastou.


— Melhor entrar. Não quero que fique resfriada.
Lancei um último sorriso e me virei para entrar correndo na

casa, escapando da chuva.


Quando cheguei à porta, virei-me para trás e sorri para
William.

Ele sorriu de volta.


Namorado...
Céus, eu só podia estar sonhando.

Girei a chave e abri a porta. A temperatura quente me


abraçando e eu soltei um suspiro apaixonado, feliz, porém cansado.

Tirei os sapatos, deixando-os perto da entrada.


Ainda tinham alguns balões da festa de ontem pendurados no
corredor da casa.
— Melanie? — a chamei. — Será que você está dormindo e
esqueceu de deixar as luzes acesas?
Nenhuma resposta.

Bati a mão no interruptor e a luz do corredor se acendeu.


— Melanie? — chamei-a novamente e dei alguns passos

adiante. — Melanie, que dia...


E foi nesse momento que meu coração quase parou quando
entrei na sala e a vi, ajoelhada em um canto, perto da lareira, com

uma fita cinza cobrindo seus lábios e outra amarrando seus pulsos.
Os olhos de Melanie estavam vermelhos de choro intenso.
— Melanie? — Corri em sua direção, mas antes que eu

pudesse me ajoelhar à sua frente, ouvi a voz:


— Olá, Emmeline. Senti saudade.
Direcionei meus olhos para o outro lado escuro da sala e o vi.

Henry abriu um sorriso preguiçoso enquanto seus olhos


percorriam-me da cabeça aos pés.
Faça uma oração para aqueles que estão lá em cima

Todo o ódio que você ouviu


Transformou seu espírito em uma pomba
Believer – Imagine Dragons

Emmeline

Doze anos antes

— Por que mamãe está usando aquele vestido vermelho,


enquanto arruma a mesa? — perguntei ao Colin, que não

desgrudava os olhos de um telejornal da BBC.

— Acho que teremos visita para o jantar — ele respondeu


baixinho.

Achei estranho, mas continuei observando-a.


Fazia alguns dias que mamãe estava diferente. Ela estava

sorrindo mais, mesmo que seu sorriso não chegasse aos olhos. Ela
estava mais falante e até foi ao cabeleireiro fazer um corte nos

últimos dias.
Eu a achava tão bonita.

Mamãe era um pouco diferente, sua pele era um pouco mais

escura e seus cabelos eram pretos brilhantes, lisos e sedosos,


embora estivessem malcuidados nos últimos tempos desde a morte

do papai.

Sua mudança, entretanto, aconteceu desde a visita daquele


homem.

Era estranho porque, nos últimos meses, não recebemos

visitas, exceto de pessoas da caridade, que nos ajudavam com


alimentos e roupas. Então, após sua visita, isso foi deixado de lado,

porque misteriosamente mamãe conseguiu arrumar dinheiro.


Ela estava cantarolando uma música dos Beatles enquanto

colocava os pratos em cima da mesa.

— Crianças! — Seus olhos se ergueram em nossa direção. —

Prestem atenção no que eu vou dizer. — Ela saiu de trás da mesa e

veio em nossa direção, abaixando-se na nossa frente. — Esta noite

receberemos uma visita muito importante. Quero que se comportem,


quero que tratem nossos visitantes com respeito e as coisas ficarão

bem. Entenderam? — Ela olhou para Colin, que assentiu e depois


se voltou para mim, que também balancei a cabeça. — Bons
garotos.

Ela se levantou e depositou um beijo em nossas cabeças.

E foi no exato momento que a campainha tocou.

Mamãe se retesou, olhou na direção da porta e respirou fundo.

Algo me dizia que as coisas não ficariam bem como ela havia

dito, mas o que eu poderia fazer a não ser acreditar em suas


palavras?

De qualquer maneira, eu tinha Colin, que estava segurando

fortemente a minha mão.

Mamãe recebeu nossos convidados, que era o mesmo homem

de uns dias atrás. Ele sorriu para nós, cumprimentou-nos e foi

quando um garoto que devia ter a idade de Colin, entrou em meu

campo de visão.
Seus olhos azuis praticamente encobertos por mechas de

cabelos pretos me fitaram e um arrepio percorreu a minha espinha.

Apertei com mais força a mão de Colin.

— Emmeline, Colin... venham aqui — mamãe nos chamou e

mesmo contra a vontade, nos aproximamos. O garoto ainda

continuava olhando para mim. — Lembram-se deste senhor? Ele


esteve aqui alguns dias atrás, mas não os apresentei formalmente.

Este é o lorde Spencer...


— Por favor, Eva, não precisamos de formalidades aqui — o

homem disse, abaixando a cabeça para olhar-nos. — E eles são


apenas crianças.
Mamãe respirou fundo e abriu um meio-sorriso.

— Ok, como quiser. Este é Charles Spencer e seu filho, Henry.


O homem nos cumprimentou como se fôssemos adultos e

quando chegou a vez do garoto, minhas mãos tremeram quando ele


apertou a minha mão e disse o meu nome de forma lenta.

— Emmeline... eu gosto do seu nome.


Você acha que não vejo

Quem você realmente é


Eu recebi novidades
Eu já vi tudo desde o início

Ruelle – Secrets and Lies

Emmeline

— Henry?
Minha voz saiu como um sussurro.

Fazia anos que eu não pronunciava seu nome e, por diversas

vezes, até tentei apagá-lo da minha mente, como se nosso passado


fosse apenas algo passageiro que em nada teria influência na minha

vida futura.
Seus olhos eram frios, como sempre foram. Ele mantinha uma

postura neutra, analisando as minhas roupas baratas que ele devia


saber que eu comprava na Primark e nas minhas sapatilhas

encharcadas.
Seu calcanhar direito descansava em cima da outra perna e

ele parecia bem confortável na poltrona em que estava sentado.

— Emmeline — ele repetiu.


Abri a boca para retrucar, porém a porta da frente foi aberta

com violência e eu ouvi gritos masculinos enquanto despejavam

ordens:
— Entre logo, porra!

Não demorou para eles entrarem no meu campo de visão.

Meu coração quase falhou quando vi William sendo carregado


pelo colarinho da camisa, pelo meu próprio irmão, enquanto um

filete vermelho-escuro já escorria de seus lábios.


— Colin! — dei um grito desesperado e tentei ir em sua

direção, mas Henry despejou uma ordem ao outro homem que o

acompanhava.

— Segurem-na.

O homem puxou meus braços com força para trás de mim.

— Me solte! Colin! — Eu já não conseguia mais segurar as


lágrimas. — Henry, por favor!
— O que está acontecendo, Emmeline? — William perguntou,
também desesperado.

Olhei para Henry, esperando uma explicação.

O homem mantinha a expressão neutra e entediada enquanto

olhava para William. Olhei de volta para o rosto do meu irmão, mas

ele não conseguia me encarar.

Praticamente três anos que não nos víamos e era assim que
ele aparecia.

— Me soltem! — William fez força para se soltar, mas Colin era

extremamente forte e conseguia contê-lo. — Seus desgraçados

filhos da puta!

Henry ergueu as sobrancelhas, surpreso.

Seus olhos finalmente encontraram os meus.

— Que decepção, Emmeline. — Ele estalou a língua e


balançou a cabeça negativamente. — Não contou ao seu

namoradinho do que você faz parte?

— Eu não faço parte de nada! — Tentei me soltar mais uma

vez, mas as mãos do homem me segurando eram fortes demais e

só me machucavam.

Henry se levantou calmamente e foi na direção de William com


os olhos sedentos de algo que eu só poderia denominar como
violência.

— O que é, cara? — William se debatia. — Quem são vocês?


O que querem comigo?

Henry pegou o rolo de fita adesiva que estava em cima de uma


poltrona e parou na frente de William, puxando uma tira.
— Eu realmente não quero ouvir a porra da sua voz — ele

disse, colando o adesivo na boca de William, que passou a emitir


apenas sons agudos. — Amarre-o, Colin. E se ele não parar com

esses grunhidos, apague-o.


Então ele se virou na minha direção e se aproximou.

Tentei escapar, tentei dar passos para trás, mas o homem me


segurava com muita força e eu não tinha escolha.
— Não precisa ter medo, Emmeline. — Ele se aproximou,

agigantando-se à minha frente. — Não sei nem por que está


surpresa. — Seus olhos varreram a sala, como se tentasse imaginar

como era a minha vida. — Claro que teria sido bem mais fácil se
você não tivesse fugido do seu irmão. — Ele deu uma olhadinha

para trás, apenas para ver Colin empurrando William no chão. —


Mas isso não tem mais importância, porque agora você finalmente
fez vinte e um anos.

Meu coração batia como louco e eu queria apenas fugir.


Não era possível que aquela história que minha mãe contou

fosse realmente verdade. Não, eu não queria acreditar. Tinha que


ser mentira.

Henry me olhou novamente, deu mais um passo e sua mão


direita veio até o meu rosto. Assim que seus dedos encostaram em

minha pele, senti uma corrente elétrica percorrer o meu corpo, mas
isso não era algo bom. Era a mesma sensação de medo de quando
nos conhecemos, há mais de dez anos.

Ele deu mais um passo e seus dedos percorreram a minha


bochecha, como se estivesse estudando um novo brinquedo.

— Solte-a, Nathan — ele ordenou, com os olhos fixos nos


meus.
— Mas, chefe... e se ela escapar?

— Ela não vai escapar — Henry disse, convicto. — Ela é


minha e sabe muito bem disso.

Nathan relutou alguns instantes, mas então seu aperto


afrouxou e logo suas mãos se afastaram de mim.

— Você se tornou uma bela mulher, Emmeline. — Henry


deslizou os dedos pelo meu maxilar e então segurou com um pouco
de força o meu queixo e me fez erguer um pouco a cabeça. —
Sabia que passei os últimos anos ansiando pelo momento em que
eu viria buscá-la?
— Duvido — retruquei, meu sangue fervendo nas veias. — Eu

o vi nas capas de revistas, na televisão, sempre acompanhado por


uma bela mulher. Acha que engana quem?

Ele ergueu uma sobrancelha.


— Elas eram apenas diversão, querida. Mas você... — seus
olhos desceram para o meu colo e depois pelo restante do meu

corpo —... você é a joia que eu esperei a vida toda.


As lágrimas desceram com mais força pelo meu rosto e Henry

afastou a mão, olhando para seus dedos, agora molhados.


— Prepare suas coisas, nós vamos embora deste — ele olhou

ao redor e fez uma careta — lugar.


Arregalei os olhos e fitei meu irmão, que mantinha uma
posição de estátua perto da saída.

— Colin! — Consegui me afastar e ir em sua direção. Grudei


minhas mãos nas lapelas do seu terno e comecei a chacoalhá-lo. —

Colin, me diga que isso é mentira! Me diga que é tudo invenção, que
meu destino não está selado desta maneira!
Colin me fitou pela primeira vez e disse:

— Sinto muito, Emmeline.


Afastei-me, atordoada, como se tivesse levado um tapa. Um
soco no estômago.
Olhei ao redor.

Melanie estava chorando silenciosamente em um canto,


William desesperado do outro.

E eu sabia que a culpa era toda minha.


Eu sabia que um dia ele voltaria, mas eu preferi acreditar que
aquilo não passava de uma história de uma pessoa doente ou que

fosse apenas uma maneira de Colin me ter em suas mãos.

— O que você vai fazer com eles? — perguntei, levantando o


rosto na direção de Henry.

Ele estava mais alto do que eu me lembrava. Seu rosto tinha o

formato quadrado, destacando seu maxilar forte. O cabelo preto era

o mesmo, liso, só que agora estava penteado para o lado, algumas


mechas caíam em sua testa. Seu porte físico também havia

mudado. De um menino franzino, ele havia se tornado um homem

forte. Suas roupas eram as mesmas. Ternos caros, feitos sob


medida.

— A Brandy Blood não deixa rastros, querida — ele

respondeu, como se fosse o óbvio.


Melanie começou a chorar ainda mais e eu temia pela vida de

ambos. Não podia deixar que o meu passado viesse à tona e os


destruísse junto comigo.

Então me joguei nos pés de Henry.

— Por favor, não faça nada com eles, eu imploro!


Henry se abaixou até ficar na minha altura.

— Você não deveria se importar com a vida deles. Na Brandy

Blood nos importamos apenas com a vida dos nossos.

— Eu não sou da Brandy Blood — falei, entredentes. — Não


posso ser de algo que eu abomino com todas as minhas forças. Não

fui eu que escolhi isso.

De repente, sua mão veio até a minha nuca e seus dedos se


infiltraram em meu cabelo. Henry se levantou e da mesma forma me

levou consigo.

— Quem cruza o nosso caminho, não tem escolhas na vida,


Emmeline. — Seu rosto ficou a centímetros do meu, e pude sentir

seu hálito de hortelã enquanto ele falava. — Suas únicas escolhas

no momento são: fazer isso de bom grado ou dificultar as coisas.

Mas se você escolher a segunda opção... — Ele olhou para Colin e


deu um aceno minúsculo com a cabeça, que o fez puxar um
revólver e apontar na direção da cabeça de William. — Vai me

obrigar a terminar isso mais rápido do que eu planejava.

Henry me soltou e eu caí de joelhos novamente, soltando toda


a pressão de lágrimas que me sufocavam.

— Bem, já sabe o que fazer, Colin. — Henry se recompôs e se

afastou na direção da porta, onde outro homem o esperava. —

Agora, senhoras e senhores, peço licença para resolver outros


assuntos.

Ele nos cumprimentou como o Henry magnata faria a qualquer

um de seus amigos, virou as costas e se foi, deixando-nos naquele


horror em que eu só queria que Deus interferisse acabando com

tudo.

— Colin... — Tentei me aproximar engatinhando, mas ele se

afastou.
— Cale a porra da boca, Emmeline — ele respondeu, nervoso.

— Você só arruma problemas, sabia?

— O quê? — Arregalei os olhos.


Colin respirou fundo e se inclinou em minha direção.

— Quem disse que você poderia se envolver com alguém? —

Sua pergunta soou baixa, perigosa. — Quem deu autorização para

você começar a sair com esse idiota?


— Eu não preciso da sua autorização!

Seus olhos me fitaram com reprovação.


— Agradeça aos céus por Henry não querer terminar este

trabalho ele mesmo. Henry não tem piedade.

— Henry não é o meu dono! — gritei, desesperada.


Meu irmão se abaixou e segurou meu rosto com força.

— Você não está entendendo, não é? Não há escolhas para

quem cruza o caminho de Brandy Blood, Emmeline. Você deveria

estar ciente disso. Se eles estão nessa situação, a culpa é sua. —


Ele me soltou e se afastou, respirando fundo. — Vá arrumar suas

coisas, nós vamos embora.

— Por favor, Colin! — Tentei implorar mais uma vez.


Ele olhou para cima e depois para mim.

— Vá arrumar as suas coisas. Chega dessa vida... Ballet,

trabalho, namorar? — Fez uma careta de desgosto. — Eu sabia que

você nos traria problemas.


— Colin, por favor... — Levantei em um pulo e grudei nos

ombros do meu irmão, tentando trazê-lo a si. — Pelo amor de Deus!

Você sabe que não pode fazer isso comigo!


— Eu posso fazer o que eu quiser. — Ele segurou as minhas

mãos e seus olhos frios se concentraram nos meus. —


Principalmente, quando isso tem a ver com o seu futuro.

Coloquei a última peça de roupa dentro da mala e puxei o

zíper com tanta raiva que, se fosse possível, ele teria saído em
minha mão.

— Terminou, garota? — A pergunta veio de Nathan, que foi

designado por Colin para me vigiar enquanto eu preparava minhas


malas.

— Achei que você precisaria de permissão para falar comigo

— retruquei, ácida.

O homem ergueu as sobrancelhas e deu uma risadinha. Então


deu alguns passos para dentro do quarto, aproximando-se de mim

como se eu fosse apenas uma pirralha que ele daria uma lição.

— Eu acho que você vai ser um problemão na vida do chefe.


— Seus olhos percorreram meu corpo e um calafrio me assolou. —

Bem, não posso externar meus pensamentos, mas... meu nome é

Nathan Jenkins e eu sou o braço direito de seu irmão.


— Eu não estou nem aí com quem você é — retruquei,

puxando a mala de cima da cama.


Ele abriu a boca para responder, mas foi no exato momento

em que Colin ultrapassou a porta do meu quarto.


— Pegou tudo o que precisa?

— Colin, por favor... — tentei mais uma vez fazê-lo raciocinar.

— Não adianta chorar ou espernear, Emmeline. Você já sabia

que um dia isso aconteceria.


Fechei os olhos e respirei fundo algumas vezes, lutando contra

o pânico crescente em meu peito.

A Emmeline chorona tinha ficado no andar de baixo. Quando


subi as escadas, já estava tentando raciocinar melhor sobre o que

eu faria. Eu não tinha escolhido aquela vida, não era justo que me

arrastassem daquela forma, destruindo todos os meus sonhos e


planos.

— Venha, já demoramos tempo demais. — Ele segurou meu

braço e me arrastou para fora do quarto.

Nathan, seu comparsa, ficou para trás cuidando da minha


mala.

Descemos as escadas e Colin me puxou para dentro da sala

de estar novamente.
William e Melanie estavam sentados lado a lado, ainda com as

mãos presas e as bocas tapadas, ainda aterrorizados, e a única


coisa que eu consegui fazer foi me jogar na frente deles, como se
pudesse pedir perdão por aquela situação.

— Segure-a. — Ouvi meu irmão dar a ordem a algum de seus

comparsas, que me arrastou para longe dos meus amigos, do meu


namorado. — Leve-a para o carro, vou dar um jeito nessa bagunça.

— Colin, pelo amor de Deus! — Tentei me soltar das mãos do

capanga. Queria enforcar meu irmão com minhas próprias mãos. —


Colin, não faça isso!

Meu irmão parou na minha frente, como se nada pudesse

abalá-lo.

Como ele havia se tornado tão frio? Eu não sabia. O que eu


sabia era que torcia apenas para ter nem que fosse um resquício do

Colin que segurou minha mão todas as vezes que eu tive medo

quando éramos crianças.


— Você ouviu o que Henry disse.

— Eu juro pela nossa mãe que se você fizer qualquer coisa


com eles, nunca vou perdoá-lo. E eu juro que na primeira
oportunidade, vou foder com a vida de todos vocês, começando por

Henry.
Colin olhou surpreso para seus comparsas e eles riram.
Mas logo o sorriso murchou nos lábios do meu irmão, que
puxou o meu braço com uma mão e com a outra apontou para
Melanie e William.

— Deem uma lição no dançarino, mas não o matem. Apenas


certifiquem-se de que não precisaremos voltar para lidar com ele.
— E com a vadia? — Nathan perguntou, os olhos brilhando

com crueldade.
— Façam o que quiserem com ela.
Dizendo isso, Colin me arrastou porta afora enquanto eu

gritava, lutava, esperneava e seus comparsas iam para cima das


duas pessoas que foram mais importantes para mim nos últimos
tempos como dois lobos famintos.
É isso o que se sente quando você está dobrado e quebrado

É isso o que se sente quando sua dignidade é roubada


Quando tudo que você ama está indo embora
Você se segura no que você acredita

Not Gonna Die – Skillet

Emmeline

Abri os olhos lentamente, tentando acostumar minha visão à


claridade do cômodo em que eu estava.

Minha cabeça estava pesada, meu corpo doía como se eu

tivesse corrido uma maratona e aos poucos comecei a me lembrar


das coisas que aconteceram antes de...

Céus, onde eu estava?


Sentei-me na cama, percebendo tarde demais que a ideia de

levantar com rapidez não foi boa, porque uma vertigem me atingiu e

eu precisei de vários segundos para voltar a mim.


Quando isso aconteceu, a porta do quarto se abriu.

— Ahhh! A senhorita acordou! — A voz de uma jovem com um


sotaque estranho me fez erguer a cabeça para visualizar seu rosto.

Ela não devia ter mais do que vinte anos e claramente não era

inglesa. Ela tinha a pele marrom e o cabelo preto, pesado. —


Precisa de ajuda?

Fechei os olhos porque minha cabeça estava dolorida. Meus

olhos ardiam e as memórias do que aconteceu em minha casa


voltaram de uma só vez.

— Onde está Colin? — perguntei, forçando seu nome, porque

até isso fazia meu estômago se revirar.


— O senhor Colin virá vê-la em breve — a jovem disse,

cautelosa. — Antes, pediu que eu cuidasse da senhorita.


Senhor Colin...

Senti vontade de rir assim que essas palavras saíram de sua

boca. Bem, no final das contas, era isso mesmo que meu irmão

queria.

Poder, respeito, temor...

Pelo visto, ele conseguiu muito mais.


Meu estômago embrulhou mais uma vez e eu desviei o rosto

para olhar para as janelas do meu quarto.


— Vou preparar um banho para a senhorita — a jovem disse
antes de virar as costas e entrar por outra porta, que devia ser o

banheiro.

Aproveitei sua distração com o meu banho e corri os olhos

pelo quarto. Ele tinha as paredes pintadas de um tom de creme bem

clarinho. Havia outra porta em frente à minha cama que talvez

levasse para uma sala adjacente. Ao meu lado, havia duas


mesinhas de cabeceira adornadas com abajures lindos de base

dourada.

Perguntei-me se aquilo era feito de ouro. Talvez fosse, mas

isso pouco me importava.

O lençol no qual eu estava sentada, provavelmente era feito de

seda. O tapete, de algum material persa.

Um luxo.
Tudo o que meu irmão sonhou, tudo o que eu nunca quis.

Pelo menos, não da maneira que era para ser. Eu queria ter

minhas coisas, mas à custa do meu trabalho, do meu esforço. Não

por ser a esposa troféu de um homem que eu não nutria nenhum

tipo de sentimento.

Um dia, eu talvez tenha sentido um carinho de amizade por


Henry, mas isso morreu quando eu soube que ele levou Colin para o
seu lado.

A porta se abriu novamente e meu irmão entrou, receoso.


— Você está acordada... — Sua voz preencheu o cômodo e eu

me afastei o máximo possível. Não queria seu toque, não queria


nem que me dirigisse à palavra.
Colin fechou a porta do quarto e respirou fundo.

Aproximou-se e se sentou na beirada da cama.


Meu irmão tinha traços bem diferentes de mim. Seu cabelo era

pretos e seus olhos azuis, chamativos.


Uma combinação muito bonita, se não fosse tão perigosa e

cruel.
Quando foi que eu perdi aquele menino que sempre me
protegia?

— Sei que está brava comigo — ele disse calmamente,


olhando para algum ponto em meu colo. — Mas eu fiz o que eu

precisava fazer, Emmeline. Você sabe que a nossa vida foi marcada
para sempre. Não dá para agir como se fosse diferente.

— Você me drogou, Colin. Eu apaguei por quanto tempo? Ou...


quantos dias?
Ele não respondeu.
— Está vendo por que não quero essa vida? — Pulei da cama

e me afastei até a janela. — Vocês agem de formas monstruosas


para conseguirem o que querem.

— Você acha que o mundo é colorido, Emmeline! — Colin


balançou a cabeça negativamente. — Maldita seja mamãe que

enfiou essas idiotices na sua cabeça.


— Idiotices? — Me coloquei na sua frente e o fiz me encarar.
— Amor, respeito, gratidão... isso são idiotices? Se você acha isso,

sinto pena pela sua alma.


— Eu não tenho alma. — Colin se levantou, sua voz continha

traços de raiva. — Pare de agir como uma menina mimada. Henry


será o seu marido e não há o que fazer. Agradeça aos céus por ele
ainda querê-la, depois de você ter começado a namorar com aquele

imbecil.
— Não fale assim de William! — Pulei no peito de Colin e

comecei a socá-lo. — Ele foi a melhor coisa que me aconteceu nos


últimos anos e eu não permito que você fale assim!

— Enfie na sua cabeça que você será uma mulher importante,


Emmeline! — Colin segurou meus braços e seus olhos fitaram os
meus. — Pare de acreditar em contos de fadas. Eles não existem!
— A mamãe me vendeu e você compactua com isso! — As
lágrimas que eu tentava segurar, começaram a rolar com força. —
Eu não tinha nem ideia do que era a vida quando ela fez um pacto,

ou seja lá como chamam essa crueldade. Será que não pensaram


que eu teria sonhos? Que eu ia querer uma vida? Que eu ia querer

me apaixonar por alguém e ser tão feliz quanto ela foi com nosso
pai?
— Você se iludiu com a alegria da nossa mãe! — Colin me

girou, colocando-me sentada na cama. — O que adiantou o amor


que nossos pais sentiam, se quando ele morreu nem uma porra de

uma libra ele deixou para nós? — Sua voz emanava raiva. — Sem
falar que existem outras questões em jogo. Mamãe fez o que

precisava fazer. Ela quis que você tivesse um futuro diferente do


dela. E você vai ter.
— O futuro que vocês decidirem que é o melhor — retruquei.

Colin respirou fundo e passou as mãos pelo cabelo.


— Escute — ele se abaixou, ficando na minha altura —, Henry

passou todos esses anos desejando você. Eu acredito que ele será
bom, mas você precisa andar na linha, fazer o que ele quer.
— E se eu não fizer?

Colin me encarou por longos instantes até dizer:


— Aí você irá nos destruir.
Eu estava ciente de que um homem poderoso valia por dez
homens comuns. Um homem como Henry, então, podia-se dizer que

valia por metade de toda a Inglaterra, com sua influência, seu


dinheiro, seus títulos.

Apesar de tudo, eu amava Colin e saber que minhas atitudes


poderiam também acabar com sua vida, fazia-me repensar em tudo.
Abri a boca para retrucar, porém, ele foi mais rápido e disse:

— Quero que descanse o resto da tarde. À noite você irá

encontrar-se com Henry e espero que se comporte. Sua vida será


grandiosa, mas só depende de você.

Não respondi, apenas virei a cabeça.

Meu irmão se levantou, cumprimentou a jovem funcionária que

estava próxima do banheiro, nos observando com os olhos


assustados, e abriu a porta, pronto para sair.

— Colin, como está William?

Pulei da cama e fui em sua direção, porém, ele foi mais rápido
e saiu do quarto, trancando-me.

— Colin! Colin! — Forcei e bati na porta várias vezes, mas eu

sabia que era em vão.


O meu destino estava selado.
~

O vestido vermelho de cetim se estendia pelo meu corpo como


a roupa mais incrível que já tive a oportunidade de usar em toda a

minha vida.

Seu corpete marcava a minha silhueta e até levantava um


pouco meus seios, que não eram pequenos, mas também não eram

grandes. O decote era um V que não revelava muita coisa, assim

como as tiras grossas que se estendiam em meus braços, como as


alças.

Era um espetáculo.

E o meu reflexo no espelho dizia que eu era a mulher mais

bonita que já pisou na face da Terra.


Mas os espelhos são mentirosos, não?

— A senhorita está linda.

Olhei para a jovem pelo reflexo do espelho.


Seu nome era Thalia e ela era sul-americana. Tinha vindo para

a Europa quando homens enganaram sua família dizendo que ela

seria uma modelo muito bem paga, por ter o corpo ideal e uma pele

incrível.
“— Eu poderia estar morta — disse ela, enquanto penteava

meus cabelos. — Mas lorde Spencer me salvou.”

Eu não sabia se merecia seu elogio, mesmo assim, respondi:


— Obrigada.

Meu cabelo estava preso em uma trança lateral com um

pequeno topete na frente. Um penteado que eu teria achado lindo

se fosse em outras circunstâncias. Agora, eu sentia como se


estivesse sendo levada para o meu funeral.

Colin havia mandado um recado dizendo que às sete e meia

um carro viria me buscar e que ele esperava que eu estivesse mais


calma.

Na realidade, eu não estava.

Reencontrar Henry tinha mexido com uma camada que eu

havia deixado no fundo do meu coração e eu não gostava de voltar


lá.

Uma batida na porta me fez acordar de minhas memórias e

Thalia foi até ela, abrindo-a. Por sorte, não era Nathan. Nosso
primeiro contato já me fez ter a certeza de o querer a quilômetros de

distância.

Era um homem de idade mais avançada, de cabelo branco e

um smoking elegante.
— Boa noite, vim buscá-la, senhorita... — ele ergueu um

cartão branco, checou e depois olhou novamente para mim —...


Jones. Emmeline Jones.

Respirei fundo e saí pela porta antes que eu perdesse a

coragem e mandasse tudo para o inferno.


Havia um carro Sedan preto esperando por mim na entrada do

hotel. O homem abriu a porta e eu entrei. Não trocamos nenhuma

palavra, nem quando ele entrou no lado do motorista e olhou para

mim pelo retrovisor.


Seis anos...

Claro que eu tentei enterrar o meu passado junto com a minha

mãe. Quando comecei a ver Henry nas revistas, na televisão,


sempre de braços dados com uma mulher exuberante, eu respirava,

aliviada, tendo certeza de que aquela profecia que minha mãe havia

dito, nunca se cumpriria.

Mas os lobos nunca esquecem suas presas...


Respirei fundo, mais uma vez.

O trajeto de carro não foi longo, me deu apenas tempo de

pensar no passado e não no que eu faria dali em diante para me


livrar dessa confusão.
Logo que estacionamos, o homem saiu e abriu a porta para

mim.

Suspirei assim que ergui os olhos e vi a bela fachada de uma

casa gigantesca no coração de Londres. Era uma mistura de


arquitetura moderna com antiga.

— Vamos? — o homem interrompeu meus pensamentos e eu

recolhi meu vestido para poder subir as escadas.


Parecia que já me esperavam, porque assim que subi o último

degrau, a porta foi aberta pelo mordomo, também um homem de

cabelo grisalho, que deveria ter mais de sessenta anos.

Ele sorriu e estendeu a mão para que eu entrasse.


Dei vários passos adiante, mesmo que meu coração estivesse

quase saindo pela boca.

Mesmo que eu soubesse que estava entrando no reino de


Satanás.

Parei em um grande hall com piso em preto e branco. No canto

direito, uma escadaria em formato caracol levava para o andar de

cima. Nas paredes, havia quadros de ancestrais, no teto, um


grandioso lustre dourado se erguia bem acima da minha cabeça.

Abaixei a cabeça lentamente vislumbrando cada centímetro

daquele lugar luxuoso e meus olhos foram direto para o homem


parado no meio da escadaria, observando-me.

Henry Thomas Spencer.


Agora as coisas eram diferentes.

Éramos dois adultos.

E eu sabia exatamente o que ele queria de mim.

— Emmeline... — Meu nome saiu com lentidão de seus lábios.


Uma voz grossa, poderosa. — Finalmente, você está aqui.
Pois essa vida é uma sinfonia agridoce

Tentando se manter, você é um escravo do dinheiro até morrer


Eu vou te levar pela única estrada que já segui
Você sabe, aquela que te leva aos lugares onde

todas as veias se encontram, sim


Bitter Sweet Symphony – The Verve

Emmeline

Contemplei o homem alto, forte, com um rosto digno de um

deus mítico descendo as escadas enquanto seu olhar percorria meu

corpo da cabeça aos pés.


Os olhares de Henry sempre me fizeram estremecer, desde a

primeira vez que nos vimos. Em um certo momento, isso foi deixado
de lado e nos conectamos em uma bela amizade.

Pelo menos, eu achava que era, até ele sumir de nossas vidas.
Henry estava belo em um terno preto justo ao corpo, colete da

mesma cor por cima de uma camisa branca de seda. Nos pés,
sapatos lustrosos completavam seus trajes que deveriam custar

milhares de libras.

Quando ele desceu o último degrau, aproximou-se devagar,


sem nunca deixar de encarar os meus olhos e, apesar de querer

sair correndo ou espernear pelos últimos acontecimentos, tinha

ciência de que eu não era mais uma garotinha para agir dessa
forma.

Eu era uma mulher forte.

Henry me queria aqui e aqui eu estava, e mesmo que fosse


para contemplar ou enlouquecer com o que o destino me reservava,

jamais me mostraria ser fraca.


— Meu lorde. — Abaixei-me em uma reverência bem-feita,

como fui ensinada ainda criança.

O som de sua risada preencheu o ambiente, mesmo assim, eu

não me levantei.

Ele deu mais um passo em minha direção e quando eu já

podia sentir o calor de seu corpo, ele levou sua mão grande até o
meu rosto e o ergueu delicadamente.

— Achei que não precisássemos de formalidades, Emmeline.


Levantei-me e mesmo que eu fosse vários centímetros mais
baixa que Henry, não queria demonstrar que essa diferença me

tirava a paz, então mantive os olhos fixos nos azuis de Henry.

— Formalidades são essenciais — respondi, quebrando o

silêncio. — Servem para colocar cada coisa em seu lugar. Cada

pessoa em sua posição... e assim por diante.

Henry inclinou um pouco a cabeça, seus olhos estudando o


meu rosto.

— Não faz nem vinte e quatro horas que eu a vi — sua

sobrancelha se ergueu um pouco, mas mantive a minha fachada

desinteressada — e está ainda mais bela.

Seus olhos brilharam com malícia e eu precisei de todo meu

autocontrole para não sair correndo.

— Henry Thomas Spencer, Duque de Cambridge, Barão de


Oxford, o décimo de sua linhagem... — Respirei fundo. — Esqueci

algum de seus títulos?

— Não. — Henry sorriu novamente. — Fico feliz que não tenha

se esquecido de mim, querida Emmeline.

Dei um passo para trás, completamente enjoada.

— O que foi? — Henry deu um passo em minha direção e suas


mãos vieram para o meu rosto, desta vez segurando-me com um
pouco mais de pressão. — Achou mesmo que eu ia deixar de lado o

que me pertence?
— Já vamos começar assim? — Minha voz saiu com raiva.

Suas mãos soltaram o meu rosto e ele deu um passo para


trás.
— Tem razão. As últimas horas foram... terríveis. Peço

desculpas pela maneira grosseira com que a tratei em sua casa,


mas confesso que fiquei confuso e com muita raiva por você estar

saindo com aquele moleque.


— William não é um moleque.

— Você diz isso porque não sabe o que é um homem de


verdade, querida. — Henry deu um passo em minha direção, então
abriu um meio-sorriso e estendeu a mão. — Me acompanha até a

sala de jantar?
Olhei para o rosto de Henry por alguns segundos, procurando

por aquela aura sombria, mas ela já havia passado, dando lugar ao
magnata sorridente das capas de revistas.

— Ok... — Encaixei minha mão na dele, que a colocou sobre o


seu antebraço.
Henry me guiou por uma porta grandiosa e a cada passo que

dávamos, eu tentava me controlar.


É apenas um jantar. Talvez tudo isso seja um pesadelo e

amanhã você acorde na sua cama, pronta para o trabalho.


— Espero que esteja com fome — ele disse assim que

entramos na sala de jantar e eu vislumbrei uma enorme mesa com


apenas dois lugares preparados. Um na ponta e o outro ao lado

direito. — Mandei que preparassem o seu prato favorito: cordeiro ao


molho madeira e como sobremesa uma Banoffee Pie2, do jeito que
você sempre gostou.

Eu só tinha comido aquilo duas vezes.


E foi quando o pai de Henry levou minha mãe a um restaurante

chique. Ela trouxe as sobras para mim e Colin e comemos até


quase furar as embalagens.
Apesar de tudo, assim que meus pratos favoritos foram

anunciados, meu estômago reclamou. Estava faminta, essa era a


verdade. Só tinha comido algo simples no hotel, que nem conseguiu

matar a minha fome.


— Pelo visto, acertei. — Henry puxou a cadeira e eu me

sentei, sem deixar de olhar para a grandiosidade dos talheres e das


taças de cristal à minha frente.
— É, acertou.
Henry deu a volta e se sentou na ponta da mesa. Ele pediu
para o mordomo nos servir e quando ele encheu pela primeira vez
minha taça com vinho tinto, não hesitei e virei tudo de uma só vez.

— Não faça isso, Emmeline. — Henry segurou o meu braço e


nossos olhos se encontraram. — Não quero que fique bêbada. Não

esta noite, pelo menos.


Respirei fundo e deixei a taça em cima da mesa.
Henry gostava de conversar, sempre foi assim. E já que eu

estava aqui, por que não? Talvez eu pudesse fazê-lo reconsiderar


tudo. Reconsiderar nossas vidas.

— Uma taça de vinho não vai me deixar bêbada.


— Uma pessoa que só ingere álcool socialmente não pode

dizer uma coisa dessas.


Ergui as sobrancelhas levemente.
— E quem disse que eu só bebo socialmente?

Os olhos de Henry continuaram grudados aos meus.


— Eu sei tudo sobre você, Emme. Cada passo que você deu

durante esses anos.


Depois da minha mãe e de Constance, Henry era o único que
me chamava de Emme.

E eu percebia agora que odiava isso.


— Você mandou me vigiarem, então? — perguntei,
encostando o queixo no antebraço. Precisava que Henry se abrisse
para que eu pudesse entrar em sua mente.

— Talvez.
Nosso jantar foi servido e eu ataquei a comida sem prestar

atenção em mais nada. Estava faminta, exausta, cansada. Mesmo


que depois aquela comida toda me fizesse sentir culpa.
— Apesar de saber todos os seus passos — Henry disse,

depois de um tempo em que ele mal tocou na comida e somente me

observou —, quero que me conte como era a sua vida.


— Era? — perguntei, antes de dar uma golada no vinho.

Ele abriu um sorrisinho.

— Pelo visto, a sua doce Constance não a deixava se

alimentar corretamente, não é? — Seus olhos desceram para o meu


corpo e eu me senti praticamente nua.

— Eu me alimentava, sim — o corrigi. — Entretanto, eu

precisei cortar vários alimentos para não ganhar peso. O ballet


exigia isso. E se isso te incomoda, por que fez questão de vir atrás

de mim?

— Não estou reclamando, Emmeline. Foi apenas um


comentário. — Henry se recostou na cadeira. Suas sobrancelhas
negras se ergueram um pouco. — Imagino que isso era torturante,

não? Desejar algo e simplesmente não poder ter.


Henry sempre gostou de brincar com as palavras e eu sabia

exatamente o que ele queria dizer.

— Imagino que você não saiba o que é isso. — Meus olhos


correram a sala de jantar elegantíssima, decorada com lustres de

cristal e ouro acima de nossas cabeças. — Sempre teve tudo.

— É um privilégio de poucos — ele admitiu.

— E você se considera um privilegiado, neste caso.


— Mas é claro, Emmeline. — Ele pegou um guardanapo de

linho e secou os lábios. — Pessoas matariam para ter um décimo de

tudo o que tenho.


Prendi os olhos nos de Henry por vários segundos, então eu

disse:

— Isso é algo que eu nunca faria, pode ter certeza.


Ele sorriu e então se levantou, afastando a cadeira e estendeu

a mão em minha direção.

— Venha comigo.

Surpreendi-me com o gesto, mas quando ele acenou


positivamente, deixei minha mão se encaixar na dele e me levantei,

acompanhando-o para só Deus sabia onde.


Atravessamos outro portal e mais outro e a cada segundo

Henry parecia mais eufórico. Isso estava me deixando

completamente confusa, porque eu esperava o homem brutal com


quem me encontrei em minha casa. Não esse... animado... feliz.

Quando chegamos em frente a uma porta dupla que era

praticamente duas vezes o nosso tamanho, Henry soltou minha mão

e abriu-as, revelando-me uma grandiosa sala com teto abobadado e


paredes com estantes que iam do chão até o teto, repletas de livros.

Lembrei-me de a Bela e a Fera, minha história favorita. Um

romance que ultrapassou gerações e que marcou milhares de vidas,


como a minha. Um romance entre uma garota sonhadora e um

homem amaldiçoado, um monstro.

Virei-me para Henry, ele me olhava com expectativa.

O problema era que diferentemente do conto de fadas, Henry


não era um homem amaldiçoado. Ele era um monstro e gostava de

ser.

E a nossa história passava bem longe de ser um conto de


fadas.

Suas palavras não podiam me iludir, nem os seus gestos.

Nem que aquela fosse a biblioteca dos sonhos.


— Quando eu a idealizei, estava pensando em você — Henry

disse, dando alguns passos em minha direção. — Eu sabia que


você ia gostar de ter um lugar como este na casa onde fôssemos

morar.

Respirei fundo e abaixei o rosto, fixando meu olhar nos


tapetes.

— Henry, eu não posso me casar com você.

— Por que, não? — Ele chegou tão perto que sua presença

bastou para me queimar. — Nosso destino já está selado,


Emmeline.

Suas mãos vieram ao meu rosto e o levantaram, fazendo-me

encará-lo.
Henry era o homem perfeito para todos, menos para mim que

conhecia as camadas obscuras de sua vida.

— Eu tenho sonhos — falei com a voz cheia de emoção,

tentando tocá-lo de alguma maneira.


— Você quer ser uma bailarina conhecida mundialmente, não

é?

— Quero.
— E o que mais você quer?
Ser feliz, encontrar o verdadeiro amor que eu tenho certeza de

que não será com você!

— Ser feliz — foi o que escolhi dizer em voz alta.

Os olhos de Henry escureceram um pouco, suas pupilas


dilataram e eu tive certeza de que estava trilhando um caminho

perigoso, mas precisava tentar.

— E você estava feliz com a sua vida?


— Estava.

Seus olhos ficaram presos aos meus por longos segundos.

A empolgação de antes deu lugar a um sentimento que eu não

sabia o que significava.


— Você estava feliz morando em uma casinha de quinta com

uma vadia que só sabia explorá-la? — Sua voz se tornou fria, cruel.

Suas mãos em meu rosto se tornaram mais como um aperto. —


Você estava feliz saindo com aquele imbecil que não tem onde cair

morto?

Fechei os olhos e de repente algumas lágrimas começaram a

cair.
— Eu era. Eu estava muito feliz.

Henry soltou meu rosto e eu pude sentir sua frustração

emanando de todos os seus poros.


Abri os olhos e o vi afastando-se pouco a pouco, com passos

para trás.
Seus olhos estavam transtornados.

— Pois então, Emmeline, aprenda a ser feliz com a sua nova

vida. — Suas palavras ecoaram por toda a sala. — Eu posso

comprar a porra do Bolshoi3 e te colocar no topo do mundo, mas a


sua vida sempre estará nas minhas mãos, queira você ou não.

— Henry! — gritei, jogando-me de joelhos no chão, conforme

as lágrimas desciam pelo meu rosto.


— Seja bem-vinda ao lar, querida.

E dizendo tais palavras, ele saiu da sala e fechou as portas,

deixando-me com minha amargura e com a maré de sentimentos


que só queria me levar para o fundo do poço.
Mentiras opacas, coração negro nos separando

Você respira o ar cheio de gelo dos meus pulmões


aos seus pulmões
Sing To Me – Delain

Emmeline

Doze anos antes...

— Por que você é sempre tão arredia com o Henry, querida?


— mamãe perguntou, enquanto colocava as louças sujas na lava-

louças antiga, mas que ainda funcionava bem.

Naquela noite, eu dei um suspiro agradecido quando o pai de


Henry disse que não podia ficar muito tempo e se despediu de nós

logo após o jantar, dando um beijo demorado em mamãe.


Já fazia alguns meses que vivíamos dessa forma.
Charles Thomas Spencer vinha nos visitar duas vezes na

semana. Geralmente, na terça e na sexta-feira. Jantava conosco,


depois subia para o quarto com mamãe enquanto ficávamos com

Henry, sentados assistindo à televisão.

Depois eles iam embora.


Algumas vezes, ele vinha aos finais de semana, durante o dia.

Eram nesses dias que Colin, Henry e eu íamos até o Hyde Park

alimentar os patos no lago com pedaços de pão amanhecido.


Mesmo assim, Henry nunca me deixava confortável.

Seus olhos azuis, sua pele extremamente branca, suas roupas

sempre tão arrumadas, bem diferente das que Colin e eu usávamos.


Sem falar da seriedade em seu rosto. Ele falava apenas o básico

conosco, mantendo-se em silêncio a maior parte do tempo.


Observando-nos.

— Ele me dá medo.

Mamãe deu uma risadinha.

— Henry é um bom garoto. E eu acho que ele gosta de você.

Nunca tira os olhos de cima de você.

Fiquei em silêncio pensando naquelas palavras.


Ele nunca me dirigia mais do que um cumprimento formal.

— Mas eu não gosto dele.


Mamãe suspirou pesadamente, fechou o lava-louças e veio em
minha direção.

Depois que o pai de Henry começou a nos visitar, sua

aparência melhorou muito, mas eu ainda podia ver a tristeza em

seus olhos.

Ela se abaixou até a minha altura e encarou meus olhos.

— Precisam ser amigos. Vai ser bom para o futuro de vocês...


— Seus dedos ajeitaram a gola da minha camisa. — Quem sabe,

vocês se casem algum dia.

— Eu não gosto dele, mamãe! — retruquei, irritada.

Mamãe suspirou e se levantou.

Seus olhos estavam cheios de água.

— Eu também não gostava de Charles, mas veja só como a

vida é absurda! Agora eu sou obrigada a gostar dele! — A repentina


explosão fez as lágrimas rolarem de seus olhos. — Eu amava o seu

pai, como nunca amei ninguém na vida. Mas o que me sobrou,

querida? Dívidas, credores, dois filhos que eu mal consigo

alimentar! — Então ela encostou na pia e ergueu a cabeça,

respirando fundo. — Há algumas maldições que não conseguimos

quebrar, Emmeline. Charles Spencer é a minha e, talvez, Henry será


a sua.
Suas palavras me fizeram ter medo, mas eu esperava que a

mesma sorte que a fez encontrar o meu pai, também chegasse a


mim no momento certo.

Eu via o quanto eles se amavam e era isso o que eu queria


quando crescesse.
A cada dia que passa nos tornamos menos humanos.

A Bela e a Fera

Emmeline

Perdi a noção de quantas horas fiquei deitada em uma


poltrona dentro daquela biblioteca, sozinha com meus próprios
pensamentos, com minhas angústias, com minhas lembranças.

Era difícil me lembrar de tudo, porque do momento em que


recebemos a notícia que meu pai havia falecido até o momento em

que minha mãe deu o último suspiro, tentei enterrar com meu

passado para não pensar mais sobre isso.


“— Tem algumas maldições que não conseguimos quebrar,

Emmeline. Charles Spencer é a minha e, talvez, Henry será a sua.”


Minha mãe já sabia o que seria do meu futuro e talvez fosse

por isso que ela sempre tentou fazer com que nos déssemos bem.
Em uma determinada hora, uma mulher usando um terninho

azul-escuro, com cabelo preso em um coque, apareceu,


apresentando-se como Greta. Ela ofereceu-se para mostrar onde

seria o meu quarto.

Tive vontade de rir, mas estava tão entorpecida com os últimos


acontecimentos que apenas me levantei e a segui, subindo as

escadas até o segundo andar. Era um extenso corredor com carpete

vinho e o meu seria o último quarto à direita, garantindo-me uma


visão privilegiada do Hyde Park.

Quando entrei no cômodo, não me surpreendi com a

elegância, muito menos que as minhas roupas já estavam lá, assim


como toalhas, um chinelo de pelinhos, escova de cabelo e outros

acessórios para higiene pessoal.


— Vou preparar um banho para a senhorita — Greta disse,

sumindo por uma porta adjacente.

Aproveitei e vasculhei minha mala em busca do meu celular.

Ele não estava lá.

Eu sabia que Henry podia ter mandado que dessem um fim no

meu aparelho, afinal, como ele mesmo dissera, minha vida estava
em suas mãos. Para que eu teria um celular? Mas também podia
ser obra de Colin, que estava apenas garantindo que eu não ia
tentar me comunicar com William ou com Melanie.

Fosse como fosse, eu só sabia que estava em um jogo

poderoso e precisava usar as peças certas se queria ter, pelo

menos, uma chance de vencer.

Greta saiu do banheiro dizendo que estava tudo pronto. Ao ver

o meu desânimo, disse que se eu precisasse de algo era só apertar


a campainha ao lado da cama, que ela viria ver como eu estava.

Eu apenas assenti.

O banheiro era ainda mais luxuoso do que eu podia imaginar.

Mármore revestia a enorme banheira cheia de espumas. Um

gigantesco espelho ficava atrás da pia e eu fiquei algum tempo

encarando meu reflexo.

Manchas pretas marcavam a pele das minhas bochechas,


denunciando o quanto eu havia chorado.

O medo e a incerteza eram sentimentos que eu não estava

acostumada a lidar. Eu sabia quem Colin era, mas desde que ele se

mantivesse longe de mim, tudo bem.

Mas meu irmão era conivente com tudo aquilo.

Tirei minhas roupas íntimas e mergulhei na banheira, soltando


um suspiro assim que a água quente envolveu meus músculos
tensionados.

Encostei a cabeça na borda e fechei os olhos.


Alívio...

Fiquei na água até ela esfriar completamente. Depois saí, vesti


um pijama que estava em cima da cama, provavelmente obra de
Greta, e me deitei na espaçosa cama de dossel.

Esperei que o sono viesse, mas ele não veio.


Minha cabeça estava a mil.

Não consegui pregar os olhos.


Estava preocupada com William e com Melanie, mesmo que

Henry tivesse razão em dizer que algumas vezes ela se aproveitava


de mim ou da situação.
Melanie tinha um jeito egocêntrico de agir, mas ela não

merecia sofrer por causa dos erros dos outros.


Virei de um lado, depois para o outro.

Não conseguia me conformar que a minha vida estava indo por


aquele rumo. Não queria acreditar que Henry seria tão cruel a ponto

de fazer-me sua esposa mesmo contra a minha vontade.


Em um certo momento da noite, fui vencida pelo cansaço e
adormeci. Acordei no dia seguinte com Greta abrindo as cortinas

para a claridade entrar.


— Bom dia, senhorita Jones — ela disse, um pouco mais

animada do que eu gostaria. — Vim avisá-la que o meu lorde vai


descer para o café da manhã em alguns instantes e ele gostaria da

sua presença.
Enfiei a cabeça no travesseiro e suprimi um grito.

Eu não queria ver Henry.


Entretanto, eu sabia que precisaria agir de uma forma
coerente, se eu quisesse atrair sua atenção e ganhar sua confiança.

Os pensamentos da noite me trouxeram a sabedoria de que


não adiantava fazer pirraça ou agir como uma criancinha de cinco

anos. Era exatamente isso que Henry queria e isso eu não ia lhe
dar.
Henry queria uma esposa? Ele teria uma esposa.

Eu me fortaleceria a cada dia e conquistaria sua confiança, e


no momento certo quebraria as correntes que nos aprisionaram por

tantos anos, quebraria enfim essa maldição e não seria como minha
mãe, que aceitou sua derrota com um sorriso no rosto.

Assim me veria livre para finalmente conquistar os meus


sonhos.
Na teoria, isso era lindo e perfeito, mas eu esperava conseguir

na prática.
— Tudo bem, eu vou me arrumar rapidamente.
Greta saiu do quarto e eu respirei fundo antes de sair da cama
e vasculhar em minha mala alguma roupa que me caísse bem.

Optei por um vestido de lã vinho com mangas compridas e


deixei meu cabelo castanho solto caindo ao redor do meu rosto.

Henry teria que se satisfazer com o que eu tinha para oferecer.


Fiz minha higiene pessoal e saí do quarto, tentando agir como
se eu não fosse uma prisioneira. Como se eu estivesse naquele

lugar por vontade própria e... agir assim, pensar dessa forma, era
como uma droga que eu tentava injetar em minhas veias para

anestesiar o que eu realmente estava sentindo.


— Bom dia, senhorita Jones. — O mordomo que me recebeu

na noite anterior, abaixou-se em um cumprimento assim que eu


desci o último degrau.
— Bom dia... ahn, não sei o seu nome.

— Alfred, minha lady.


— Eu não sou sua lady... — falei, tentando não soar de forma

agressiva.
— Mas será, em breve. — Ele sorriu e estendeu a mão na
direção da sala de jantar. — Meu lorde está esperando-a.
Um arrepio percorreu a minha espinha, mas eu assenti e
respirei fundo antes de marchar até a sala.
Era tudo tão grandioso, tão elegante...

Eu me perderia ali dentro.


Henry estava sentado despreocupadamente na ponta da

mesa, com um iPad aberto à sua frente e uma xícara de café


fumegante esperando pela sua atenção.
Inevitavelmente, assim que coloquei os pés dentro da sala,

seus olhos predatórios saltaram em minha direção e ele deixou de

lado o que estava lendo e se levantou para me receber.


— Bom dia, Emmeline. — Estendeu a mão, pedindo que eu

me aproximasse.

Aproximei-me devagar, como se ele fosse uma faísca que

pudesse me incendiar assim que o tocasse. Mesmo assim, estendi


minha mão direita e ele a pegou, depositando um beijo longo nos

nós dos meus dedos.

Seus lábios eram quentes e macios, porém, eu só queria que


isso acabasse logo.

— Espero que tenha dormido bem — ele disse, soltando a

minha mão e se afastando para puxar a cadeira na qual ele queria


que eu me sentasse. — Escolhi o melhor quarto desta casa para

você.
— Achei que o melhor quarto fosse o seu — retruquei,

sentando-me.

— Hum... tem razão. O seu é o segundo melhor. — Ele abriu


um pequeno sorriso e se sentou, sinalizando para que os

funcionários nos servissem.

Henry voltou sua atenção ao iPad e eu resolvi puxar assunto.

— Não gosta de jornais?


— Gosto — ele levantou o aparelho —, mas a tecnologia está

aí para facilitar a nossa vida.

Era o London Times que ele estava lendo e eu apenas ergui as


sobrancelhas em compreensão.

Quando os funcionários se afastaram, eu respirei fundo e olhei

ao redor.
Aquela casa era tão grande.

— Você vive aqui sozinho? — perguntei, sem conseguir conter

a minha curiosidade.

Eu sabia algumas coisas sobre a vida de Henry, dentre elas


que ele tinha uma irmã mais nova. Se minha memória não estivesse

ruim, ela se chamava Ellen.


— Sim, mas não fico muito aqui. — Ele deixou o iPad de lado e

me encarou. — Passo a maior parte do tempo viajando a negócios

ou resolvendo outros assuntos. Geralmente, fico aqui quando as


sessões no parlamento se iniciam e quando encerram; para o

recesso de final de ano, fico alguns dias em uma das nossas

propriedades em Hertfordshire.

— Hum...
Bebi minha xícara de chá consciente que Henry não tirava os

olhos de mim.

— Como está Ellen? — resolvi arriscar.


Henry relaxou um pouco a postura e eu soube que tinha

acertado o nome de sua irmã.

— Ellen está bem — ele disse, voltando a atenção à xícara à

sua frente. — Está no Harrogate4 Ladies College...


— Um colégio de elite para jovens damas — completei seu

raciocínio.

Henry me fitou novamente.


— Sim. E ela virá passar o Natal conosco.

Só de pensar em passar o Natal, uma época santa, ao lado de

Henry e toda aquela sujeira, fez o meu estômago embrulhar.

Mantenha o foco, Emmeline.


— Então... como não tenho muitas escolhas na vida e eu

claramente serei a próxima lady Spencer — dirigi meus olhos até


Henry e abri um meio-sorriso —, você poderia ser sincero comigo e

me dizer por que meu irmão escolheu ficar ao seu lado.

Colin nunca havia dito quais foram os seus motivos para se


unir à Brandy Blood.

Henry se recostou na cadeira e levantou as sobrancelhas.

— Colin será o meu braço direito assim que nos casarmos.

— Achei que ele já fosse — disse, antes de dar uma mordida


em um croissant. — Afinal, aquele dia na minha casa ele agiu como

um verdadeiro cachorrinho cumprindo as ordens do seu dono.

O sorriso que Henry abriu fez minhas entranhas revirarem.


— Todos que estão sob a minha lei precisam cumprir as

minhas ordens, Emmeline — ele disse calmamente. — E seu irmão

está bem ciente disso, desde quando nos conhecemos.

— E se alguém não cumpre as suas ordens? O que você faz?


Eu sabia que a resposta a seguir não me agradaria, entretanto,

eu não conseguia manter a minha boca fechada. Queria tirar aquela

calmaria de seu rosto nem que fosse à base da paulada.


— Existem muitas coisas que posso fazer, Emmeline. — Seus

olhos brilharam de forma sádica. — Mas... por que está perguntando


isso? Pensa em não seguir as minhas regras?

— Você me machucaria se eu não as seguisse?

Os olhos de Henry percorreram-me de forma intensa e eu

estremeci.
— Eu posso puni-la de várias formas, Emmeline. E, para ser

bem sincero, estou um pouco eufórico para que você me

desobedeça, que faça alguma loucura... — Ele abriu um meio-


sorriso. — Que tente ir atrás daquele seu namoradinho sem graça.

A simples menção de William fez meu coração afundar e toda

a fachada de noiva submissa quase foi ao chão em segundos.

Então consegui me recuperar e desviei o foco da conversa para o


que eu realmente queria saber.

— Você irá permitir que eu continue fazendo ballet?

Ele me analisou por vários instantes, até que disse:


— Talvez, se você se comportar.

Meu coração deu um salto. Pelo menos, uma pontinha de

esperança se acendeu em meu peito.

— E quanto ao concurso para a The Royal Academy? Eu


realmente precisava...

— Você não precisa da The Royal Academy, Emmeline. Você

será muito importante, poderá dançar no lugar que quiser.


— Isto é, se você permitir — retruquei.

Henry me analisou por alguns instantes.


— Você realmente gosta de ballet... — ele disse em voz alta,

mas parecia que estava falando consigo. — Sabe, eu a vi dançando

algumas vezes. Você parecia um cisne perfeito.

Meus olhos se arregalaram um pouco diante dessa confissão.


— Quando?

— Algumas vezes. Não espere que eu vá enumerá-las agora.

Fiquei em silêncio alguns instantes, até que perguntei:


— Você gostava de me ver dançar?

Se Henry gostava do que via, seria muito mais fácil manipular

a situação a meu favor.


Ele bebericou um pouco de seu café e depois secou a boca

com um guardanapo de linho branco.

— Gostava muito. Até o dia em que você começou a dançar

com aquele sujeitinho. — Seus olhos ficaram frios como gelo. — E


sabe o que eu tive vontade de fazer quando soube que ele estava

colocando as mãos no que era meu?

Minhas mãos começaram a tremer e meu coração começou a


bater como louco.

Henry sorriu.
— É, exatamente isso o que você está pensando, minha
querida... — Ele suspirou. — Eu queria quebrar as pernas dele e

teria feito isso, mas confiei que Colin seria forte o suficiente para

cumprir com o que era necessário. Só que... veja só, eu acabei me


enganando. Colin o deixou vivo e eu imagino que foi por sua

influência.

Meus olhos se arregalaram no mesmo instante.


— O que... o que você fez? Onde está Colin?

— Não fiz nada ao Colin — Henry disse, levantando-se da

mesa e vindo até atrás da minha cadeira, onde se abaixou e sua

boca pairou perto do meu ouvido. — Eu apenas dei um recadinho


através de uma pessoa muito importante para ele. Regras são

regras, Emme. Seu irmão as quebrou e precisava saber que isso

não pode acontecer.


Meu corpo estremeceu e Henry depositou um beijo demorado

em meu rosto.
As lágrimas que eu estava segurando até aquele momento
começaram a rolar, meu corpo tremia com confusão e medo e eu

estava dando graças a Deus que ele ia finalmente me deixar a sós,


quando Henry parou e se virou.
— Ah, eu já ia me esquecendo. Hoje à tarde, Stephanie virá
para ajudá-la a modificar seu guarda-roupa. A próxima lady Spencer
precisa estar elegante diante da sociedade — ele disse, sem se

importar com as lágrimas que estavam descendo pelo meu rosto. —


Nosso noivado será anunciado nos próximos dias e na semana que
vem daremos uma festa em comemoração.

Apenas balancei a cabeça afirmativamente, tentando me ver


livre dele o mais rápido possível.
— Emmeline, não fique assim. Colin virá vê-la hoje no jantar.

Dizendo isso, Henry virou as costas e me deixou sozinha.


Então eu soltei um grito e empurrei tudo o que estava na
minha frente para o chão.
Eu mantenho meu lado secreto

Escondido atrás de chaves e cadeados


Eu o mantenho preso, mas não consigo controlá-lo
Porque se eu deixar ele sair

Ele vai me despedaçar, me derrubar


Monster – Skillet

Henry

Fechei os olhos enquanto bombeava meu pau na boceta

quente, úmida e apertada de Stephanie.

Cravei as mãos com força em sua cintura e ela gritou meu


nome, acompanhado por vários gemidos de prazer. Então meti com

mais força até sentir os espasmos percorrerem o meu corpo


enquanto liberava o meu esperma.

Precisei de alguns segundos para me recompor, mas quando

isso aconteceu, afastei-me de Stephanie, tirei a camisinha, enrolei-a


e a levei até o lixo do banheiro. Voltei para a cama, peguei um maço

de cigarro e o isqueiro que estavam em cima da mesa de cabeceira


e relaxei enquanto dava uma tragada.

— Uau... você se superou, mais uma vez. — Stephanie veio

para o meu lado, mas eu me afastei. — Nossa, o que foi? Não


gostou?

— Você sabe que não gosto que me abrace.

Ela bufou e revirou os olhos.


— Não vamos criar laços amorosos por eu simplesmente me

aproximar de você. — Ela deitou nos travesseiros, puxando o lençol

sobre o corpo. — E você está quieto desde que chegou. Algo está
preocupando-o.

Traguei o cigarro e olhei para o teto de gesso com pinturas de


algum artista renascentista.

— Faz parte do trabalho. — Sentei-me na cama, dando as

costas para ela.

— Isso tem a ver com a sua bailarina?

Stephanie não era como as putas burras com quem eu fodia

de vez em quando para me aliviar. Ela era inteligente e perspicaz.


Era filha de um nobre e a única desse meio com quem eu me

permitia ir além, afinal, nossa ligação começou quando ainda


éramos crianças, muito antes de eu conhecer Emmeline e sua
família.

— Conte-me sobre ela... — ela pediu, aproximando-se por

trás. — Afinal, preciso saber seus gostos para poder ajudá-la a

comprar roupas e se vestir como uma verdadeira dama da

aristocracia.

Emmeline era a criatura mais linda que eu já havia visto em


minha vida, mas era óbvio que eu não sabia como colocar isso em

palavras. E não era apenas a sua beleza exterior. Sua leveza, seu

espírito livre, sua dedicação com o que amava... era um conjunto

que me enlouquecia, que me entorpecia.

E foi por querê-la tanto que eu a busquei assim que completou

os vinte e um anos. Eu sabia que a qualquer momento poderia

perdê-la e eu não iria permitir isso.


Emmeline era minha, sua vida me pertencia e eu queria ser

aquele que seus olhos brilhariam quando os dirigisse a mim.

— Você vai conhecê-la esta tarde — eu disse, tragando o

cigarro mais uma vez.

— Por que você não parece feliz? — Stephanie se deitou ao

meu lado. — Será que pela primeira vez alguma mulher não te
quer?
O desgosto no olhar de Emmeline era algo que eu não gostava

de lembrar porque fazia meu sangue ferver e eu queria cometer


uma loucura quando a possibilidade de rejeição me assolava.

Entretanto, esses eram sentimentos que eu nunca colocaria para


fora.
Stephanie estava me irritando com suas perguntas.

— Por que não cala a porra da sua boca, Stephanie?


Ela deu uma risadinha, então se ajoelhou na cama e grudou

nas minhas costas. Uma de suas mãos começou a percorrer meu


abdômen com movimentos leves enquanto a outra desceu até o

meu pau.
— Talvez você devesse desistir dessa putinha. Você sabe que
eu daria tudo para me casar com você ou então, nós podemos

dividi-la. Eu não sou ciumenta e até gosto de uma menina medrosa.


Ouvi-la falar de Emmeline daquela maneira ferveu o meu

sangue e em questão de segundos, eu já estava sobre o corpo de


Stephanie com as minhas mãos em volta de sua garganta.

— Chame-a assim mais uma vez e eu vou mostrar para você


quem é a puta aqui.
Stephanie arregalou os olhos azuis e suas mãos vieram para

as minhas, tentando tirá-las de seu pescoço.


— Henry! — Sua voz saiu com um soluço.

Então eu a soltei e saí da cama.


Stephanie se sentou, tossindo.

— Filho da puta! Isso não vai ficar assim!


— O que você vai fazer? — perguntei, indo até as minhas

roupas em cima da poltrona. — Vai chorar para o seu pai? Vá, fale
com ele. Seu pai é um merda falido que está nas minhas mãos e eu
posso acabar com ele a hora que quiser.

Stephanie me olhou com mágoa, algumas lágrimas desciam


pelo seu rosto.

— Seus dedos vão ficar marcados no meu pescoço.


— É bom que fiquem. — Vesti minha calça e depois a camisa.
— É uma lembrança para que você não se meta onde não foi

chamada.
Stephanie ficou em silêncio e eu terminei de vestir as minhas

roupas. Coloquei meu colete e por último o casaco, então me


aproximei do espelho e chequei minha aparência.

Voltei para perto da cama e Stephanie tentou se esquivar, mas


eu segurei seu rosto e a fiz me encarar.
— Acho que não preciso dizer que Emmeline não deve saber

sobre o nosso envolvimento, não é?


Seus olhos brilharam de medo.
— Não.
— Ótimo. — A soltei e peguei minha carteira em cima da mesa

de cabeceira.
Quando eu já estava para abrir a porta, Stephanie me chamou.

— O que é? — perguntei, impaciente.


— Essa é a última vez que vamos nos ver?
Eu não sabia como as coisas seriam com Emmeline dali para a

frente, mas eu esperava que assim que nos casássemos, ela me


fizesse o único em sua vida e, certamente, eu também retribuiria o

gesto.
— Veremos.

Abri a porta e saí do quarto, antes que Stephanie começasse


com mais lamúrias.
Assim que desci as escadas da elegante casa localizada na

região de Kensington, dei de cara com George, pai de Stephanie,


que estava entrando pela porta.

— Oh, que surpresa vê-lo aqui, meu garoto. — O velho ainda


insistia em me tratar como se eu fosse um menino de dez anos. —
Estava, huh... com Stephanie, suponho?
George não era idiota e sabia muito bem o que nós fazíamos.
A maior de suas esperanças era, no entanto, que um dia eu
decidisse formalizar o nosso caso, transformando-a na nova lady

Spencer.
— Sim, estava — respondi, ajeitando a manga da minha

camisa. — Mas já estou de partida. Tenho uma reunião com alguns


investidores daqui a pouco.
E desta vez eu não estava mentindo.

O meu lado aristocrata também exigia muita dedicação da

minha parte.
— Ah, sim. É claro. — Ele suspirou, então colocou uma mão

em meu ombro. — Jovem Henry... fiquei sabendo de alguns boatos

que estão circulando por aí, você sabe. — Ele deu uma risadinha. —

É verdade que está prestes a ficar noivo?


Olhei dentro dos olhos de George.

A sociedade londrina adorava fofocar, mas era impressionante

como em tão pouco tempo eles descobriam coisas que até Deus
duvidava.

— Mandarei o convite. — Retirei sua mão do meu ombro e me

encaminhei até a porta, onde Nathan e Colin já me esperavam do


lado de fora.
— Não temos boas notícias — Colin disse, caminhando ao

meu lado até a calçada.


— Sobre?

Ele parou na minha frente com o rosto preocupado.

— O carregamento que vinha da França foi roubado.


Ah, mas era só isso que faltava para o meu dia ficar perfeito.

— Então entre no carro e vamos descobrir que porra está

acontecendo.

Colin dirigiu até os cantos mais extremos da cidade, onde

mantínhamos alguns armazéns que estocavam alimentos e que,

mais tarde, eram distribuídos para todo o país. No entanto, no


subsolo, mantínhamos alguns de nossos verdadeiros tesouros,

como, por exemplo, um gigantesco laboratório que produzia vários

tipos de drogas da nova geração.


Essas drogas eram combinações potencializadas, faziam

efeito mais rápido e estavam no gosto dos jovens. Claro que havia

um número considerável de overdoses, mas isso já era um assunto

que eu tentava não me envolver.


Desci do carro e cumprimentei os trabalhadores dos negócios

lícitos. Eles gostavam de mim porque eu os pagava bem e dava

assistência às suas famílias, coisa que poucos funcionários faziam.


Para alguns, era mais fácil enxergá-los como seus escravos.

As coisas costumavam ser assim quando meu pai era vivo

também, mas quando assumi o controle de tudo, implantei essas

mudanças e, apesar de parecer loucura, me trouxeram um ótimo


retorno.

Pessoas felizes trabalhavam felizes. O serviço rendia, o

dinheiro entrava e no final todo mundo podia sair para beber e


comemorar.

Colin, Nathan e eu seguimos até o escritório, onde havia uma

passagem secreta para o subsolo.

— Vocês conseguiram pegar o López? — perguntei, enquanto


descíamos a escada em caracol.

— Ainda não, mas pegamos um dos sujeitos que estava no

caminhão — Colin respondeu. — Nathan já está com homens por


todo o país procurando pelos demais.

López era um filho da puta mexicano que trabalhava para mim

cuidando das travessias de mercadoria entre Dover e Calais, na

França.
Se as coisas deram errado, eu sabia que parte da culpa era

dele.
— Boa tarde, chefe — Albert me cumprimentou, assim que

passei pela sua área de experimentos.

— Boa tarde, Albert.


Ele era um velho cientista que a sociedade não quis dar valor

por achá-lo excêntrico demais. Eu, no entanto, vi potencial no

homem e, desde então, ele trabalhava produzindo boa parte das

substâncias ilícitas.
Andamos até a última sala do complexo, que era um depósito

de coisas que não usávamos mais e um ótimo lugar para fazer

interrogatórios por ter paredes acústicas.


Bem, isso, na verdade, nem era necessário, porque estávamos

bem abaixo do solo. No entanto, eu tinha projetado daquela

maneira, porque segurança nunca era demais.

Nathan abriu a porta e entramos.


— Então esse é o único que vocês pegaram? — perguntei,

olhando na direção do homem que estava sentado em uma cadeira,

com as mãos e os pés amarrados e uma venda nos olhos. Sua


cabeça estava tombada para o lado, provavelmente, adormecido por

alguma droga.
— Sim, chefe — Nathan disse. Dentro da Brandy Blood eles

nunca me chamavam pelo meu título. Aqui o tratamento era outro.

— Os outros ratos nojentos escaparam. Esse aí teve a má sorte de

ter um pneu furado, então conseguimos capturá-lo.


Olhei para o homem novamente.

Torturar pessoas que fugiam das regras ou simplesmente para

obter informações não era novidade para mim. Fazia anos que eu
estava naquela vida e apesar de ter sido difícil no começo, já tinha

me acostumado. Fazia parte de mim, de quem eu era... e em

algumas vezes isso até me fazia sentir vivo.

Sentia-me eu mesmo.
— Qual belezinha o chefe vai querer? — Nathan se aproximou

com uma caixa dourada onde algumas pistolas que eu gostava

repousavam em cima do veludo vermelho.


— Hum... — Peguei uma CZ 75 Shadow Line, uma pistola para

competições e a apontei para a frente. — Não. Vou pegar esta. —

Peguei outra, sua irmã gêmea, porém mais simples.

O que fazia os homens terem medo não era o tipo de pistola,


mas sim quem a empunhava.

— Traga um balde de água gelada e jogue nele — ordenei.


— Nem precisa pedir, chefe. — Nathan já tinha tudo

preparado. Ele sabia como eu lidava com aquelas pessoas.


Nathan jogou a água do balde e no mesmo instante o homem

acordou, tossindo.

— Où suis-je? — O homem perguntou “onde estou” em sua

língua natal, o francês. — Aidez-moi, s'il vous plaît!


Ele estava pedindo por socorro.

Retirei meu terno, entreguei para Nathan e me aproximei do

verme enquanto ele balbuciava outras frases em francês.


Olhei para Colin e dei sinal para que ele retirasse a venda. Era

hora de ter uma conversa com aquele porco imundo.

Quando a venda saiu de seus olhos e ele fitou a pistola em


minha mão, entrou em um frenesi de pedidos de socorro.

— Cale essa boca. — Colin deu um empurrão na cabeça do

homem e ele se calou no mesmo instante.

— Peço perdão, meu homem, mas não entendo a sua língua...


— falei, aproximando-me lentamente. O homem fedia a bebida de

péssima qualidade e urina. Estava realmente imundo. Quando

estava bem próximo, abaixei o tronco, ficando a centímetros de


distância de seu rosto inchado e vermelho. — Fale comigo usando a

porra do inglês, porque você não está no seu país.


— E quem é você? — o homem gritou, desafiando-me. — Eu
vou me soltar daqui e acabar com você, moleque. Foda-se o seu

país. Fodam-se vocês, seus ingleses de merda! — Ele abaixou a

cabeça e cuspiu em meus sapatos de couro.


O silêncio pairou ao meu redor enquanto meus olhos

vasculhavam o rosto inchado do homem à minha frente.

De repente, eu abri um leve sorriso, que se tornou em uma


risada.

Meus homens começaram a rir também.

Então eu engatilhei a arma e a encostei na coxa do imbecil.

Parei de rir.
— Isso é por ter cuspido em meus sapatos Gianvito Rossi.

Apertei o gatilho e o estrondo resultou no homem gritando e

implorando por misericórdia, enquanto sangue escorria de sua


perna.

Afastei-me um pouco para respirar porque o fedor era


insuportável.
Colin se aproximou com uma cadeira e eu me sentei, cruzando

as pernas de forma tranquila.


— Como já demos o primeiro passo nesta conversa, acho que
você pode me falar onde estão os seus comparsas com o meu
carregamento.
O homem chorava como um bebê.
— Eu não sei de nada, eu juro — ele disse, balançando a

cabeça de um lado para o outro, fazendo caretas de dor. — Por


favor, eu só estava dirigindo o caminhão. Não sei o que aconteceu.
— Ah, você sabe... — Inclinei o tronco levemente. A pistola

brincava em minha mão. — Ahn, como é o seu nome mesmo?


Porra, esqueci de perguntar o seu nome. — Respirei fundo. —
Alguém aqui sabe o nome desse francês filho da puta?

Apontei a arma para a cabeça dele e o homem chorou ainda


mais.
— Dilermando Dubois, segundo a carteira de motorista. —

Colin me entregou o documento surrado e eu o analisei por alguns


instantes.
— Hum... senhor Dubois, vou chamá-lo assim. — Olhei

novamente para o homem que agora parecia reconhecer a minha


influência. — Vou te contar uma coisa... — Com a arma ainda

empunhada, comecei a girar o pulso enquanto explicava as coisas


ao idiota. — Muitos homens que fazem coisas erradas e são pegos,
dizem que não sabiam de nada. Dizem que não eram cúmplices,

que eram inocentes e blá-blá-blá... — Os olhos de Dubois se


arregalavam cada vez que eu apontava a arma em sua direção. —
Mas posso ser sincero? — Ergui uma sobrancelha e aproximei-me
novamente de seu rosto. Então sussurrei: — Não há um único

homem que realmente era inocente.


— Eu sou inocente, eu juro! — o homem choramingou.

— Bem, eu acho que não. — Encostei a arma na outra coxa.


— Seu moleque filho da puta! — ele gritou, então eu apertei o
gatilho.

Sangue jorrava agora das duas pernas, acompanhado pelo


choro de desespero do homem.
— Já ouviu a frase “L'impatience est un obstacle majeur au

succès”... que na minha língua é algo como “A impaciência é um


grande obstáculo para o bom êxito”? Bem, é claro que deve ter
ouvido. Ela é de Napoleão Bonaparte. Acho que o senhor não é

ignorante sobre um homem que foi líder de sua nação... — falei,


respirando fundo. — Eu tenho todo o tempo do mundo, senhor
Dubois, e ficar aqui... — girei minha mão atada à pistola —... é ruim,

confesso. Aliás, eu deveria estar em uma reunião neste momento,


mas não tem importância. Alguns tipos de problemas eu mesmo

gosto de resolver. — Abri um leve sorriso sádico e me aproximei do


homem mais uma vez. — E acredite, eu resolvo todos eles.
Eu sei que não há escapatória

Uma vez que colocam os olhos em você


Mas eu não vou correr, tenho de encarar isto nos olhos
Stand My Ground – Within Temptation

Emmeline

— Posso entrar?

Ergui a cabeça do travesseiro e olhei na direção da porta.


Greta estava com metade do corpo para dentro, olhando-me com

expectativa.

Depois do desastroso café da manhã, eu havia corrido para o


meu quarto e estava ali, deitada na cama, pensando na desgraça

que era a minha vida.


— Você precisa mesmo pedir permissão? — perguntei, em um

leve tom de deboche.


A funcionária abriu um sorriso e entrou, fechando a porta logo

atrás de si.
— Vim saber se a senhorita gostaria de... dar uma volta?

Conhecer a casa?

— Henry a mandou aqui?


Seus braços estavam atrás de seu corpo.

— O senhor Spencer não deixou nenhuma ordem específica

sobre a senhorita. Mas acredito que não irá gostar de ficar aqui o dia
todo trancada.

Greta tinha razão.

Eu sempre gostei de ser livre, de experimentar coisas novas,


conhecer pessoas, lugares.

Acho que uma das coisas que mais me desesperava em minha


nova condição era a perspectiva de não ter mais uma voz. De ser

uma escrava, uma esposa troféu, apenas para desfilar ao lado de

um homem elegante na alta-sociedade.

Sinceramente, eu não sabia por que ela estava sendo gentil e

não sabia se podia confiar nela, mas era melhor ter a perspectiva de

alguém ao meu lado do que perceber que estava completamente


sozinha.
— Não quero arrumar problemas para você — falei, sentando-
me.

— Não vai arrumar. — Ela sorriu de forma confortante. —

Garanto que sou uma boa companhia.

Sorri de volta, levantei-me e fui até o espelho checar a minha

aparência.

Não era das melhores, mas era o que eu tinha naquele


momento.

Greta estendeu a mão para que eu fosse na frente e assim

saímos do meu quarto.

— Faz tempo que você trabalha aqui? — Sempre fui uma

pessoa curiosa e não era agora que eu ia parar de ser assim.

— Comecei a trabalhar para os Spencer quando eu tinha

dezoito anos — ela contou enquanto caminhávamos pelo corredor.


— Hoje eu tenho cinquenta e cinco... ou seja, faz muito tempo.

Arregalei os olhos levemente.

— Céus.

— Pois é, mas eu gosto do meu trabalho. Os Spencer sempre

me trataram muito bem, cuidaram da minha família e eu não consigo

sentir outra coisa a não ser gratidão, mesmo que algumas coisas
vão contra o que eu acredito ser o certo.
— Entendo...

— Bem, neste andar temos as suítes master. De um lado é a


da senhorita e do outro, a do patrão — ela explicou. — No andar de

cima temos os quartos infantis e mais um para visitas. Vou levá-la


para ver.
Meu sangue gelou quando ela fez referências a crianças.

Eu, definitivamente, esperava que Henry nunca esperasse de


mim povoar aquela casa.

Mesmo assim, segui Greta enquanto ela explicava algumas


curiosidades da casa. Pela forma como falava sobre as coisas, era

óbvio que ela realmente gostava de estar ali.


Depois de dar uma pequena olhada nos quartos infantis, a
governanta me levou até o andar superior. O último, que abrigava

uma extensa área de lazer, com uma piscina grandiosa de um lado


e do outro uma cozinha para quem quisesse fazer suas próprias

festinhas.
— Esta casa é antiga, mas passou por muitas reformas,

trazendo a modernidade dos nossos dias — Greta explicou. — O


senhor Spencer gosta de vir aqui depois do trabalho.
— Imagino que sim... — resmunguei, olhando para as vidraças

cercando todo o andar. — Ninguém pode nos ver aqui?


— Não. Este é o ponto mais alto da cidade.

Tentei imaginar Henry sentado em uma das espreguiçadeiras,


relaxado, mas eu não conseguia. Era estranho imaginá-lo como um

homem qualquer, sendo que ele tinha tanto poder nas mãos.
Greta me levou de volta até o primeiro andar e eu pude

vislumbrar com mais calma, com a claridade do dia que entrava


através das portas francesas.
— Estamos bem perto do Hyde Park — Greta explicou,

enquanto eu andava ao redor do piano de cauda. — Este bairro é o


mais caro de Londres, a senhorita deve imaginar.

— Claro que sim... — Apertei algumas teclas do piano.


Aquilo sempre foi algo que eu quis aprender, mas nunca tive a
oportunidade.

— Sente-se melhor? — A voz de Greta interrompeu meus


pensamentos e eu me afastei do piano.

— Sinto-me... vazia. — Olhei para ela com os braços caídos


ao redor do meu corpo. — Não sei bem como eu deveria me sentir.

Ela franziu os lábios e depois disse:


— Ele é um bom homem.
Senti vontade de rir, mas, caramba, aquela mulher conhecia

Henry desde que ele era criança. Talvez ela estivesse apegada
àquela imagem e não à do homem frio e cruel que ele se tornou.
— Se você diz...
Greta abriu a boca para responder, mas fomos interrompidas

pelo mordomo, Alfred.


— Perdão por interromper, mas chegou uma visita para a

senhorita Jones.
— Para mim?
— Sim, a senhorita Stephanie Thompson.

Lembrei-me de que Henry tinha falado sobre ela.


Greta revestiu-se de uma aura fria e disse:

— A senhorita precisa de ajuda para escolher algo para vestir?


Olhei para as minhas roupas simples.

— Não. Eu vou ficar desse jeito mesmo.


Ela abriu um meio-sorriso.
— Posso trazer a senhorita Thompson? — Alfred perguntou.

— Sim, claro. Vamos ver o que essa aí quer.


O mordomo fez uma reverência e se foi. Minutos depois, ele

voltou, acompanhado por uma mulher jovem, mas parecia ser um


pouco mais velha que eu.
Ela estava elegante em um sobretudo creme, escondendo um

belo vestido casual preto que ia até os joelhos. Seu cabelo era loiro
exuberante, encaracolado, caindo ao redor dos ombros. Seus olhos
eram extremamente azuis. Era como as mulheres que eu via
acompanhando Henry nas revistas.

Ela era linda.


Stephanie parou no meio da sala e seus olhos me fitaram da

cabeça aos pés.


Vi decepção.
Acho que ela esperava encontrar uma garota aristocrata, como

ela provavelmente era.

— Então você é Emmeline? — Seus olhos finalmente


encontraram os meus.

Ela abriu um pequeno sorriso.

— Sou eu... — Dei um passo em sua direção. — E você deve

ser Stephanie.
— Imagino que Henry já tenha dito quem eu sou...

— Disse que alguém viria me ajudar com roupas, mas não

disse que ia mandar uma de suas putas para isso.


Greta não aguentou segurar uma risadinha.

Stephanie ficou vermelha em questão de segundos e olhou na

direção da funcionária.
— O que está fazendo aqui? Acho que o meu assunto é com

Emmeline e não com você.


Greta voltou a ficar séria, então me encarou.

— Posso me retirar ou a senhorita precisa da minha

companhia?
Respirei fundo.

— Pode ir, Greta. Eu consigo lidar com isso...

Greta fez uma reverência perfeita, como se eu já fosse a

senhora daquela casa, e se retirou da sala, não sem antes dar uma
olhada fulminante em Stephanie.

Quando ela se foi, Stephanie se voltou a mim.

— Emmeline, não quero que comecemos nossa amizade de


um jeito ruim. — Sua voz se tornou doce. — Estou aqui para

oferecer a minha ajuda, de coração e, claro, a minha amizade.

Henry e eu somos apenas amigos de infância, não temos nenhum


tipo de relacionamento.

Não sabia se podia confiar naquela mulher, mas respirei fundo

e assenti. Depois, eu descobriria o que ela realmente era e, mesmo

que eles tivessem um relacionamento, eu não estava nem aí.


— Pelo visto, as minhas roupas não são boas o suficiente para

ser a próxima lady Spencer — falei, sentando-me em uma poltrona.


Stephanie também se sentou em outra. Foi nesse momento

que notei um cachecol enrolado em seu pescoço.

— Está calor aqui dentro, não quer tirar essas peças...?


— Não, não vamos demorar — ela falou, me cortando. —

Precisamos voltar logo.

— Entendo.

Stephanie abriu um sorriso desconfortável.


— Vamos? Eu prometi a Henry que você estaria de volta para

o jantar.

Levantei-me, mesmo contra a vontade e disse:


— Ok... vamos lá.

Passando pela Oxford Street, o paraíso das compras, nós

encontramos a Bond Street, que era a mesma coisa, só que voltada


para as compras de luxo.

E é claro que eu fui levada para lá.

Não foi a primeira vez que passei por lojas de grife, mas foi a
primeira vez que eu entrei em uma delas. Para não dizer que nunca
tive contato com algo luxuoso, eu tinha uma correntinha de ouro que

ganhei da minha mãe, um pouco antes de ela falecer.


Como era de se esperar, a rua estava movimentada. As

vitrines faziam o seu melhor para atrair a atenção das pessoas. Elas

gritavam: compre, compre, compre!


Stephanie me guiou até uma loja Chanel que ocupava quase

um quarteirão inteiro. E tinha vários andares. E era absurdamente

linda.

Senti-me diminuída.
Aquele não era o meu mundo.

— Lady Thompson. — Uma vendedora sorridente se

aproximou, mas seu sorriso morreu assim que olhou em minha


direção e viu as roupas baratas que eu usava.

— Olá, Mare. Esta é uma amiga e eu a trouxe para

escolhermos roupas, sapatos, bolsas e acessórios. — Stephanie

olhou para mim e sorriu. — Ah, temos que deixá-la se parecendo


com uma princesa.

— É claro, senhorita. — A vendedora abriu um meio-sorriso. —

Querem começar por onde?


Stephanie me olhou da cabeça aos pés.
— Roupas. Essa garota precisa de vestidos, os melhores

vestidos.

Respirei fundo, sentindo-me apenas uma boneca nas mãos de

pessoas que eu sequer conhecia e tudo isso para o quê? Para me


tornar um fantoche nas mãos de Henry Thomas Spencer, o homem

que eu nunca amaria em minha vida.

— Então me acompanhem, no próximo andar nós temos os


melhores vestidos que...

As vozes da vendedora e de Stephanie se apagaram dos

meus ouvidos enquanto eu as seguia até a escadaria.

Tudo o que eu queria naquele momento era fugir, encontrar


William e dizer o quanto eu o amava e sentia a sua falta. Porém, eu

sabia que isso seria impossível.

Henry nunca me deixaria ser livre.

Stephanie e eu fizemos muitas compras.

Da Chanel, fomos para outras lojas de grife, e eu estava


perdida com tantas sacolas e cansada de experimentar coisas,

quando ela decidiu que por hoje bastava.


O mesmo carro que nos levou até a Bond Street, nos buscou.

Eu não sabia quem era o motorista, mas pelo modo como Stephanie
o tratava, devia ser algum de seus motoristas particulares.

Quando chegamos à mansão de Henry, Alfred pediu para um

outro jovem funcionário ajudar a pegar as sacolas.

Entrei no hall, completamente exausta, então ouvi um grito:


— Senhorita Emmeline! — Thalia veio correndo em minha

direção, mas ao se deparar com Stephanie atrás de mim, ela

murchou. — Ahn, eu... ahn... queria dizer que...


— Diga logo, empregada — Stephanie a cortou, ríspida. —

Não vê que Emmeline precisa descansar para o jantar?

Thalia abaixou a cabeça envergonhada e eu tive vontade de


mandar Stephanie sumir. Sua fachada de boa amiga não me

convencia, mesmo ela sendo bem paciente quando eu

simplesmente não queria saber de mais nada.

— Não fale assim com ela. — Dei um passo até ficar ao lado
de Thalia. Passei o braço ao redor do dela, que arregalou os olhos.

— Thalia é uma jovem doce, que eu aposto que quer me dizer algo

bem importante, não é?


Stephanie revirou os olhos.
— Per... perdão — a jovem gaguejou. — Eu só queria dizer
que lorde Spencer mandou eu ficar aqui, para ajudar a senhorita no

que precisar. — Ela abaixou a cabeça.

Eu suspirei.
— Você quer me ajudar com a roupa desta noite?

Thalia levantou os olhos, animada.

— Sim! Sim! Eu adoraria!


Abri um meio-sorriso.

— Ok, então me espere em meu quarto, digo... — Era fora do

normal agir como se essa casa fosse minha, mas se eu realmente

me casasse com Henry, era isso o que aconteceria. — Sim, me


espere no quarto em que estou dormindo.

Thalia fez uma pequena reverência e saiu correndo em direção

à escadaria.
Quando ela se foi, Stephanie suspirou e disse:

— Não trate os empregados como se fossem seus amigos,


Emmeline. Lembre-se, eles são apenas empregados. Pagos para
nos servir. Nada mais.

Pensei em retrucar, mas Stephanie foi mais rápida e disse:


— Eu vou embora, querida. — Ela deu um passo em minha
direção e me deu um beijo na bochecha. — Eu voltarei em breve
para ajudá-la em mais alguma coisa, ok?
— Ok. Obrigada.
Ela sorriu e se virou para ir embora, despejando toda a

elegância natural de uma mulher criada para ser quem ela era, ao
contrário de mim, que sonhava apenas em ser uma bailarina e
conquistar o mundo através dos meus passos.

A vida nunca era justa.


Henry deveria ter cismado com ela para ser sua esposa, não
eu.

Virei-me para subir as escadas, quando dei de cara com


Alfred, observando-me do canto da escada com um sorriso ameno.
— O patrão vai chegar em uma hora, minha lady. Assim como

seu irmão, Colin.


Gostaria de saber como aquele homem sabia de tudo, mas
lembrei-me que a única desinformada da casa era eu.

— Ok, obrigada.
Subi as escadas de dois em dois degraus, focando meus

pensamentos em uma só coisa: ver meu irmão, mesmo que eu


quisesse matá-lo por consentir que eu fosse arrastada para esse
mundo.
Como se sente quando tudo com que está contando se desfaz?

Todo vento pelo qual você passou, uma tempestade.


Todo verão que você presenciou foi preenchido com chuvas de abril
Isso não é fácil, você não entende?

April Rain – Delain

Emmeline

Thalia me ajudou a colocar um dos vestidos que comprei em


uma das lojas de grife com Stephanie.

Ele era rosa-claro e ia até os joelhos com uma saia rodada.

Seu corpete era simples, com algumas pérolas incrustadas, suas


mangas iam até o meio dos meus antebraços com rendas e, no final

das contas, aquele era um look charmoso.


Nos pés, calcei sapatos de salto médio e no cabelo fizemos

uma trança embutida.


— A senhorita está linda! — Thalia disse assim que

terminamos a minha preparação. — Lorde Spencer vai cair de


amores.

Henry poderia cair de tudo, menos de amor.

Foi nesse instante que alguém bateu à porta.


Thalia se afastou para ver quem era, enquanto eu continuava

analisando a minha imagem no espelho.

Eu estava mesmo muito bonita.


— Senhorita, vieram avisar que lorde Spencer já está

esperando-a no hall, acompanhado por seu irmão, Colin.

Respirei fundo.
Levantei-me da penteadeira e fui na direção da porta. Não

adiantava adiar as coisas quando elas eram inevitáveis.


— Obrigada, Thalia. Por tudo.

Suas bochechas adquiriram um tom rosado e ela sorriu.

Passei pelo corredor, tentando andar com a confiança que eu

queria ter ou, pelo menos, deveria ter.

Quando cheguei à ponta da escada, os olhos de Henry

imediatamente vieram em minha direção, como se eu tivesse um


maldito ímã que o puxasse para mim.
Respirei fundo, tentei ignorar seu olhar predatório e desci
degrau por degrau.

Colin estava de costas para mim, falando alguma coisa

importante para Henry, mas quando percebeu que ele não parava

de olhar para mim, parou e se virou em minha direção.

— Emmeline... — foi o que ele disse, baixinho.

— Colin! — Desci o último degrau e me joguei em seus braços.


Meu irmão me abraçou e, por alguns poucos segundos, me

esqueci de onde estávamos, esqueci qual era a minha situação e o

que ele tinha feito para mim.

Seu abraço me fez lembrar de quando éramos crianças. Colin

sempre me protegeu, sempre cuidou de mim.

Ele deveria ter continuado fazendo isso.

— Você está linda — ele elogiou, afastando-me de seu corpo.


— Realmente linda — Henry deu um passo em minha direção

e Colin se afastou ainda mais. — Por favor, Emmeline. — Ele

estendeu o braço para que eu encaixasse o meu.

Olhei para Colin e ele apenas assentiu.

Faça isso, irmã. Faça isso e vai ficar tudo bem, era o que seus

olhos diziam.
Então eu o fiz.
~

O jantar transcorreu de forma tranquila, se é que jantar com

dois assassinos podia se considerar algo tranquilo.

Colin e Henry conversaram muito sobre negócios. Claro que


deixaram de fora as partes “sujas”, mas eu não era idiota. Eu sabia
que por trás de cada coisa, havia um submundo no qual eu

realmente não queria adentrar.


Algumas vezes, eles me incluíram na conversa e eu observei o

meu irmão o tempo todo. Se Henry realmente tinha torturado


alguém que ele gostava por não ter quebrado as pernas de William,

meu irmão sabia muito bem como manter a fachada fria.


Quando o jantar acabou, Henry sugeriu que saíssemos para
dar uma volta nos arredores. Eu não queria, mas o olhar de Colin

que dizia “não discuta” me desarmou completamente.


Então nós fomos.

A noite estava gelada, mas ainda era suportável sair sem as


luvas.
— Vocês se lembram de quando andávamos pelo Hyde Park?

— Henry perguntou, tirando do bolso de seu casaco um maço de


cigarros e um isqueiro. — Andávamos na beira do Serpentine...

— Você era o nosso único amigo — Colin disse.


Henry acendeu o próprio cigarro e depois ofereceu um ao meu

irmão, mas ele recusou.


Então ele sorriu, ainda com o cigarro na boca enquanto

guardava o maço e o isqueiro de volta no bolso.


— É, eu era.
Eu sabia que aquele não era um simples passeio. Henry queria

nos dizer algo.


— E eu sou o único amigo de vocês até hoje. — Henry ergueu

as sobrancelhas escuras e depois tragou o cigarro, soltando a


fumaça com delicadeza. Ele parou de andar e nós paramos
também. — Espero que saibam disso.

— É claro, Henry — Colin disse, abaixando levemente a


cabeça.

Henry deu um passo na direção do meu irmão, segurou seu


ombro e deu uma leve chacoalhada.

— Você é ótimo, Colin. Tem sido meu braço direito todos esses
anos. Após o casamento, vamos oficializar sua posição dentro da
Brandy Blood. — Seu olhar veio até o meu rosto. — Depois de mim,

seu irmão será poderoso. Tem ciência do que isso significa?


Balancei a cabeça negativamente.
— Seu irmão, um homem que não veio de berço de ouro, irá
assumir uma posição privilegiada. É a primeira vez na história da

Organização.
Observei os olhos do meu irmão e eles brilhavam com

entusiasmo.
Pelo amor de Deus.
— Será uma honra, chefe — Colin disse, anestesiado.

Henry deu uma risadinha e se afastou um passo.


— Sabe que não precisa me chamar assim quando estamos a

sós. Nós somos amigos, sempre fomos e sempre seremos. — Ele


me encarou novamente. — A conversa está ótima, mas preciso

resolver uns assuntos no meu escritório. Aproveite o tempo com seu


irmão, Emmeline. Conversem bastante.
Um arrepio percorreu a minha espinha e eu segurei a

respiração até Henry virar as costas e nos deixar a sós. Quando


isso aconteceu, voltei-me a Colin, desesperada.

— O que está acontecendo? — perguntei, puxando-o pelas


lapelas do terno. — Sabemos que Henry nunca faz nada por acaso.
Por que ele nos trouxe aqui? Por que disse essas coisas?

Colin respirou fundo.


— Não é nada.
— Como não é nada? — Meu tom de voz subiu vários tons. —
Pelo amor de Deus, você não pode permitir...

— Chega, Emmeline! — Colin me cortou, ríspido. Suas mãos


seguraram meus ombros com força. — Não dá para voltar no

passado e desfazer as coisas. Você sabia que o seu casamento


com Henry era inevitável. Mamãe te avisou, eu te avisei naquele dia
no cemitério. Não sei por que fez planos, por que se apaixonou...

De repente, as lágrimas começaram a rolar pelo meu rosto.

— Eu só queria ter uma vida normal!


— Eu também, mas não é assim que a vida funciona para

todos. — Seu rosto estava carregado de tensão. — Ouça,

Emmeline. Faça o que ele quer. Seja quem ele quiser que você

seja...
— Eu não quero... — Fechei os olhos.

— Faça-o se apaixonar por você — Colin continuou, desta vez

mais baixo. — Você sabe que ele sempre te quis. Pode ser uma
obsessão, pode ser loucura da cabeça fodida de Henry, mas se o

fizer se apaixonar, você estará no controle. — Abri os olhos e

encarei meu irmão com surpresa. — É isso, Emmeline. Um homem


apaixonado é capaz de coisas que nem o diabo sabe responder.
— Inclusive, dar a minha liberdade? — perguntei baixinho.

Colin me olhou por longos instantes e depois assentiu.


— Inclusive, a sua liberdade.

Voltei para a mansão com as palavras de Colin ecoando em


meus ouvidos.

“Faça-o se apaixonar por você e você estará no controle.”

Eu sabia que Henry me queria, porque mesmo que um acordo


tivesse sido selado e ele não gostasse de mim, duvido que ele

cumpriria sua parte. No entanto, eu tinha minhas dúvidas de que ele

realmente poderia chegar a me amar.

Homens poderosos como Henry só amavam o poder, o


controle. Eu duvidava que eles fossem capazes de nutrir um

sentimento tão lindo por uma outra pessoa.

Já estava tarde, então decidi ir direto para o quarto e tentar


pegar no sono para esquecer um pouco dos meus problemas,

porém, assim que subi o primeiro degrau, ouvi a melodia.

Curiosa, desci o degrau e segui o som das teclas de piano que

deslizavam com naturalidade tocando alguma bela canção de


Chopin.

Entrei na sala de visitas escura, iluminada apenas com a luz

que vinha do lado de fora, e encontrei Henry sentado ao piano. Ele


estava de costas para mim, mas eu conseguia ter o vislumbre de

seus dedos deslizando com naturalidade.

Seu cabelo preto caía em sua testa e seus ombros largos se

movimentavam conforme a melodia exigia.


Apesar de conhecer Henry desde criança, eu não imaginava

que ele tocava piano tão bem. Nunca tive a oportunidade de ouvi-lo.

E isso me chocou.
Por que Henry saber tocar piano me deixou assim, pasma?

Virei as costas para sair da sala, mas sua voz me paralisou:

— Colin já foi?

— Sim... — Virei-me para Henry, mas ele continuava


concentrado no que fazia. Agora, tocava uma melodia fúnebre e

isso, de alguma forma, me hipnotizou e eu me aproximei a passos

lentos. — Era para ele ter ficado?


— Não. — Henry tocava com tanta naturalidade que eu

poderia sentir inveja.

Esse era um dos benefícios de nascer em uma família rica.

Poder fazer quais e quantas aulas do que quisesse.


Respirei fundo.

— Não sabia que você tocava tão bem.


Henry abriu um meio-sorriso.

— Há muitas coisas que você não sabe sobre mim, Emmeline.

Deixei os braços caírem ao redor do meu corpo. Estava


cansada de tudo aquilo.

— Eu sei muitas coisas sobre você.

Henry parou de tocar e se levantou. Achei que ele ia se

aproximar de mim, mas foi até um armário onde continha um bar


escondido e encheu dois copos com alguma bebida escura.

— O que você sabe sobre mim? — Ele voltou e estendeu um

dos copos. Hesitei alguns instantes, mas depois o peguei. Ele tinha
acabado de encher na minha frente, não daria tempo de colocar

drogas.

E bebida alcoólica me parecia uma boa opção naquele

momento. Talvez eu me sentisse mais calma.


Henry parecia adivinhar meus pensamentos, porque deu uma

risadinha.

— Você sabe apenas o que eu deixo que você saiba.


Sua arrogância fez o meu sangue ferver.
— Eu sei quem você é, Henry. Um monstro que se esconde

atrás da fachada de um magnata que, céus, como a vida é injusta,

tem ainda mais poder por vir de uma família tradicional e

aristocrática. — Bufei, sem me importar que seus olhos azuis


estivessem presos em meu rosto. Dei um passo em sua direção,

ficando apenas alguns centímetros de distância e disse: — Eu sei

que você é um assassino cruel. Eu sei que os seus negócios


acabam com famílias inteiras de pessoas que não conseguem se

manter longe dos vícios.

Henry ergueu as sobrancelhas como se estivesse processando

o que eu tinha acabado de dizer. Depois, bebeu um gole e me


encarou novamente.

— Eu não obrigo ninguém a fazer nada, Emmeline. São as

pessoas que vêm até mim, não sou eu que vou até elas.
Eu sabia disso, mas me custava acreditar na frieza de uma

pessoa ao lidar com um assunto tão sério.

— Assim como o seu pai foi até a minha mãe?

O sorrisinho morreu nos lábios de Henry e eu sabia que havia


tocado em uma ferida. Não só para ele, para mim também. No

entanto, parecia que ainda doía quando mencionada a ele.


— Escute. — Ele suspirou. — Eu quero que tenhamos um

casamento feliz, Emmeline. — Henry deu um passo em minha


direção e eu dei outro para trás. Assim fomos até que minhas costas

encontraram a lateral do piano e já não havia mais para onde fugir.

— Você pode dizer que sou um monstro, que eu sou horrível e, sim,

eu também acredito que sou assim. — Seus braços se colocaram


um de cada lado do meu corpo e seu rosto se aproximou do meu. —

Mas eu esperei anos para tê-la e não vou desistir, assim, tão fácil.

Às vezes, eu não sabia se estava falando com o menino que


eu conheci aos oito anos, o magnata das capas de revistas, ou o

assassino cruel que se livrava de cumprir a lei por seus delitos

apenas por ser quem ele era.


Meus olhos perscrutaram seu rosto.

Henry era um homem muito, muito bonito. Eu não podia ser

hipócrita e dizer que ele não me afetava de alguma forma. Isso

acontecia quando éramos mais novos. Quando Henry me encarava,


eu ficava nervosa. Eu queria acreditar que era medo, afinal, quando

seus olhos pousavam em mim, meu corpo todo se arrepiava. Mas

então eu também achava que podia ser raiva. Ódio por ele achar
que em pleno século 21 podia ser o dono de uma pessoa.

Mesmo que realmente tivessem vendido a minha alma a ele.


— O que você quer de mim, Henry? — perguntei, fechando os
olhos e respirando com dificuldade. Meu coração começou a bater

como louco e tudo se tornou pior quando sua fragrância masculina

misturada ao tabaco e ao álcool adentrou as minhas narinas.


Sua mão veio para o meu rosto e ele acariciou minha

mandíbula com a ponta do indicador.

— Quero que seja minha amiga.


Abri os olhos e o encarei, perplexa.

Eu achei que ele diria que queria amor, que queria uma esposa

apaixonada.

“Quero que seja minha amiga.”


Céus.

— Sua amiga? — repeti tolamente.

Ele assentiu devagar.


Naquele momento, eu percebi, olhando dentro de seus olhos,

que Henry guardava muitos segredos.


Será que eu poderia descobri-los?
E se eu os descobrisse, poderia usá-los a meu favor?

Colin havia vendido sua alma conscientemente. Eu apenas


daria uma trégua, até realmente ter o controle da situação.
— Tudo bem, eu serei sua amiga — falei, tentando não soar
idiota demais.
Henry abriu um sorriso lento.

Não gostava dessa sensação de estar selando um acordo com


o diabo.
— Posso te beijar?

Sua pergunta foi como um tapa.


Homens como Henry jamais pediam permissão para fazer
algo.

Eu deveria ter dito não.


Mas apenas balancei a cabeça afirmativamente.
Abaixou a cabeça bem devagar e antes de seus lábios

encostarem nos meus, ele deu um suspiro. Preparei-me para sentir


nojo assim que ele me beijasse, mas o encostar de seus lábios nos
meus foi rápido, sem exagero. Um toque apenas, que me deixou

mais confusa do que antes.


— Boa noite, Emmeline. — Henry se afastou e virou as costas,

me deixando sozinha na sala.


Talvez não fosse difícil fazê-lo se apaixonar por mim. A
obsessão e a paixão andavam em uma linha tênue. O problema, no
entanto, seria lidar com Henry e com o furacão de sentimentos e
segredos que aquele homem guardava dentro de si.
E eu não sabia se estava preparada.
Demonize a necessidade que nos prende

Cavarei minhas memórias fundo o bastante pra conhecer


Storm The Sorrow - Epica

Henry

Doze anos antes...

Eu odiava o meu pai.

E aquele momento era um em que eu me esquecia que um dia


meteria uma bala no crânio do meu progenitor, simplesmente

porque a visão dela, caminhando alegremente à minha frente,

enchia o meu dia com uma perspectiva de algo bom no futuro.


Era sábado e estávamos passeando no Hyde Park à beira do

lago. Nossa rotina era essa nos últimos meses, porque às vezes
meu pai percebia que não era de bom tom que as crianças
ouvissem enquanto ele fodia a mãe de Emmeline no andar de cima

e nos mandava passear.


Emmeline era alguns anos mais nova que eu, Colin nem tanto,

mas eu esperava que eles entendessem o que realmente estava

acontecendo. Só que nenhum de nós falava sobre isso. Aliás, não


falávamos sobre praticamente nada.

Alguns passos atrás de nós, dois dos homens do meu pai nos

vigiavam.
— Então, vamos continuar caminhando em silêncio, fazendo

de conta que o seu pai não está lá fodendo a minha mãe? — Colin

perguntou de forma abrupta.


Surpreso, parei de andar.

— Achei que você fosse inocente em relação ao que nossos


pais fazem.

Foi instantâneo, mas eu passei a gostar de Colin pela sua

pequena explosão.

A verdade era que eu não ia até aqueles encontros por causa

do meu pai ou por causa de Colin. Eu ia simplesmente para ver a

garota de cabelo castanho.


Ela era um pequeno raio de sol em toda a minha escuridão.
— Ninguém é inocente nessa merda. — Ele chutou uma
pedrinha dentro do lago. — E eu sei bem o que vocês são.

— Colin! — Emmeline tapou os ouvidos. — Pare de falar

palavrão!

Olhei para o garoto.

— E o que nós somos?

Colin veio em minha direção como um galo de briga. Seu rosto


pairou a centímetros do meu.

— São todos uns fodidos que acham que mandam em tudo!

— Colin! Já falei para não falar palavrão! — Emmeline gritou

novamente. — Eu vou contar à mamãe que você é um boca-suja!

Meu olhar continuava fixo no de Colin quando eu disse:

— Mas nós mandamos em tudo. Se não fosse assim, meu pai

não estaria lá fodendo a sua mãe em troca de dinheiro.


O garoto inflou o peito e veio para cima de mim.

— Parem com isso! — Emmeline se intrometeu com a voz

chorosa. — Parem, não briguem!

— Não estamos brigando, Emmeline — Colin respondeu,

afastando-se de mim.

Ele sabia que não havia o que dizer. A verdade estava bem
diante dos nossos olhos.
— Não mesmo. — Olhei para Emmeline e abri um leve sorriso.

— Estamos apenas nos tornando amigos.


— Quem disse que eu quero ser seu amigo? — Colin cuspiu

no chão.
Aquela era uma reação interessante.
Colin Jones era vários níveis abaixo do meu, mas nem isso o

impedia de ser insolente.


Só que por um certo motivo, eu não o via como meu inimigo.

Muito menos, Emmeline.


Eu os queria ao meu lado.

— Se formos amigos, você terá poder o suficiente um dia para


fazer o que quiser — falei, dando um passo na direção do garoto.
— Inclusive, matar o seu pai?

Abri um leve sorriso.


— Isso sou eu mesmo que vou fazer — falei. — Mas você vai

poder matar quem quiser.


Colin me encarou por longos instantes.

Seu sangue não era frio, era quente como o meu. Nos olhos
azuis também estava estampado raiva, desespero. Talvez as suas
lutas fossem por algum motivo nobre, isso pouco me importava. O

que me importava era que eu poderia tê-lo ao meu lado.


— Eu posso cuidar de vocês — falei, dando mais um passo

adiante. — Mas vocês vão precisar confiar em mim.


Colin olhou para Emmeline, que estava com os olhos

vermelhos do choro.
Ela não entendia o que aquelas palavras significavam, mas um

dia ela descobriria.


— Você me dá a sua palavra? — Colin me fitou novamente. —
Vai cuidar de nós? Vai nos tirar dessa merda de vida?

Estendi a minha mão, prestes a selar um acordo.


— Eu dou a minha palavra — falei, direcionando meu olhar à

Emmeline. — Vou cuidar de vocês e dar um futuro no qual nunca


imaginaram, se, em troca, forem meus amigos.
Colin encaixou sua mão na minha e a apertou.

— Eu prometo que serei seu amigo, nas boas e nas más


circunstâncias. — Seu olhar se fixou no meu. — Mas, se algum dia

você romper com sua palavra, nossa amizade chegará ao fim e eu


juro que o matarei.

— Compreensível. — Dei um meio-sorriso.


Então nosso acordo foi selado, mas Colin e Emmeline mal
sabiam que a vida deles já estava destinada a mim, muito antes de

tudo isso acontecer.


Tu não deverás

Matar seus pais - destruir outra vida


Questionar tudo que nós agarramos por anos
Viver para sempre - planejar uma morte melhor

Confundir um mentiroso com um salvador do medo


Wherein Lies Continue – Slipknot

Emmeline

Alguns dias se passaram e conforme a festa que promoveria

nosso noivado se aproximava, eu começava a me sentir ainda mais

nervosa.
Depois da noite em que Henry me beijou diante do piano,

comecei a me sentir sem jeito. Então, eu sempre inventava alguma


desculpa para fugir de sua companhia.

Ao contrário do que eu imaginava, ele não me pressionou e,

em alguns dias fiz minhas refeições no quarto. Quando ele saía para
o trabalho ou sabe-se lá para o que, eu andava pela casa.

A verdade era que estava me sentindo sozinha, sem direção.


Colin não tinha vindo mais me visitar, Henry não se importava se eu

queria ou não a sua companhia, eu não tinha sequer uma notícia

sobre William ou Melanie.


E estava muito preocupada com eles.

— Senhorita Jones? — Greta abriu a porta e enfiou a cabeça

para dentro. — Posso entrar?


— Pode, claro. — Me sentei na cama.

Greta entrou com uma bandeja e vários envelopes dispostos

em cima.
— O que é isso? — perguntei quando ela colocou a bandeja

em cima do meu colo.


— São os convites da festa de noivado — ela explicou,

enquanto eu abria um e averiguava. — O senhor Henry achou que

era bom que a senhorita os visse e memorizasse os nomes.

— Eu não conheço nenhuma dessas pessoas — falei, olhando

envelope por envelope.

— Sim, claro. — Greta suspirou. — Mas o patrão acha que a


senhorita pode se familiarizar desde já, para quando os conhecer

pessoalmente ser mais fácil.


— É claro que ele sempre pensa em tudo, não é? — falei em
tom de deboche.

O convite era feito em um papel fino com letras delicadas.

Havia o nome de Henry e o meu, convidando aquelas pessoas para

o nosso noivado.

Eu queria jogar aqueles convites no fogo.

— Então é só isso que me deram para fazer hoje? — Ergui as


sobrancelhas. — Porque, sabe, minha vida está tão atarefada nos

últimos dias...

— A senhorita deveria falar com o senhor Henry. Talvez ele

possa lhe dar algo para fazer.

— Duvido. — Joguei um convite na cama. — Isso é um

treinamento para quando nos casarmos. Serei a esposa troféu,

aquela que ele usa para desfilar ao seu lado nos eventos e nada
mais.

Greta abriu a boca, mas então a fechou. Depois disse:

— Eu vou me retirar. A senhorita deseja que eu lhe prepare

algo antes do almoço?

— Não. Obrigada. — Joguei outro convite em cima da cama.

— Ah, Greta, espere.


Ela parou alguns passos antes da porta e se virou para mim.
— Como eu posso falar com Henry?

— Bem, a hora que ele chegar...


— Não quero esperar ele chegar — retruquei. — Quero vê-lo

logo.
Greta suspirou pesadamente.
— Oras, vai me dizer que não sabe onde encontrar o seu

patrão? — Abri um meio-sorriso. — Ele deve ter algum telefone


secreto no qual vocês ligam quando ele não está por aí bancando o

magnata, mas sim o mafioso.


— Não seja dura com ele... — Greta me repeliu, mas então se

calou. Depois disse: — Eu posso dar um jeito de colocá-la em


contato com ele. Mas não sei se ele poderá falar com a senhorita
neste momento.

Eu estava apenas brincando com Greta, mas já era tarde


demais.

— Diga a ele que estou entediada. Quero sair.


Greta se abaixou levemente e saiu do quarto.

Peguei os envelopes e comecei a ler nome por nome.


Eram convites para famílias tradicionais da Inglaterra. Pessoas
com níveis como o de Henry. Pessoas instruídas, da alta-sociedade.

Respirei fundo.
Será que foi com isso que mamãe sonhou quando entregou

minha mão a essa família?

Eu estava finalizando os convites quando Greta retornou.


— Vista-se logo, há um carro esperando-a do lado de fora.
— Sério?

— A senhorita não queria ver o meu lorde? Ele mandou que a


buscassem.

Uau.
Abri a boca, estupefata.

Então pulei da cama e fui direto para o closet. Escolhi um


vestido simples na cor preta, que ia até os joelhos. Coloquei meias-
calças grossas e um scarpin de salto baixo.

Deixei meu cabelo solto e apenas passei um rímel e um batom


rosa-clarinho.

Greta segurava um casaco e me ajudou a vesti-lo.


— Não sei onde Henry está, mas acha que esta roupa está

boa?
— Está ótima, senhorita. Perfeita.
Greta era o mais próximo que eu tinha de uma amiga, pois o
seu acolhimento nesses últimos dias fora essencial para eu não
enlouquecer com a minha nova vida.

— Ah, já olhei umas dez vezes esses envelopes — falei, antes


de sair do quarto. — Não sei quem é essa gente toda, mas também

não faço a mínima questão de saber. Fique à vontade para recolher


e enviar, se é isso o que mandaram você fazer.
Greta abriu um meio-sorriso.

— É claro, senhorita. Vá, o rapaz já está esperando-a.


Virei as costas e saí do quarto.

No andar de baixo, um homem alto, de cabelo escuro e uma


cicatriz que atravessava sua bochecha, me esperava com uma

careta infeliz.
— Triste por bancar o motorista particular da noiva do seu
chefe? — comentei, ácida.

Ele me olhou da cabeça aos pés.


— Eu só faço o que me ordenam. Seja carregar uma rainha

ou... uma pirralha.


Engraçado como aqueles homens me viam.
Henry poderia pensar da mesma forma, assim pouparia minha

vida e me deixaria em paz.


Dei de ombros e ele estendeu a mão para que eu saísse da
casa.
O homem deu um jeito de me passar e abriu a porta traseira

da elegante Mercedes preta. Antes de entrar, olhei para os dois


lados da rua e respirei o ar puro.

— Entre logo, não tenho o dia todo — ele resmungou.


Fiz uma careta e entrei no carro. Foi então que percebi quem
estava no carona.

— Olá, noivinha.

O nome dele era Nathan, se minha memória estava boa.


Seu sorriso continuava horrível.

— Não fale com ela, seu babaca — o outro, da cicatriz, disse

quando entrou no lado do motorista. — O chefe vai cortar o seu pau

se o vir falando com ela.


— Eu não disse nada de mais — Nathan retrucou. — E ela não

vai abrir a boca, não é?

— Não sei... — Ergui as sobrancelhas. — Você é bem


abusadinho. Talvez Henry devesse saber disso.

Nathan fez uma careta, o outro começou a rir.

— Não disse? É melhor calar a boca e fazer só o que pediram


para fazermos.
Os idiotas ficaram em silêncio e eu senti vontade de rir. Henry

era tão temido assim?


— O que foi essa cicatriz em seu rosto? — perguntei, curiosa.

O homem me olhou através do retrovisor, mas não respondeu.

— Eu fiz uma pergunta.


Nathan bufou, então tirou um maço de cigarro do bolso e

acendeu um.

— Ele não vai responder. Não quer problemas com o chefe.

— Eu não vou dizer a ele que vocês conversaram comigo —


falei, cansada. — Eu só... eu sou curiosa. Se você não me disser,

vou ter que perguntar ao Henry. Vai ser pior, porque ele vai saber

que vocês negaram a palavra à futura noiva dele.


O homem apertou as mãos no volante e soltou um grunhido.

— Foi uma briga com facas. Eu estava ganhando, mas fui

enganado pelo meu próprio ego, então ele viu isso como uma
fraqueza e me acertou.

— Meu Deus.

Nathan soltou a fumaça.

— Calma, ele tem outras cicatrizes para fazerem companhia a


esta.
Recostei-me no assento e minha mente começou a imaginar

como era a vida daqueles homens.

Eles gostavam de viver desta maneira?


Era assustador.

— Você também tem cicatrizes? — perguntei ao Nathan.

Ele deu de ombros.

— Todos temos.
Então pensei em Henry.

Seu rosto era belo, não havia nenhuma marca. Nem em seus

braços, embora eu só tivesse visto até metade de seu punho em


uma noite que ele ergueu um pouco as mangas da camisa.

Será que ele também tinha essas marcas?

Não querendo imaginar seu corpo por baixo das roupas, tratei

de mudar de assunto.
— O que vocês fizeram com a minha amiga e o meu... — Se

eu dissesse namorado, eles certamente contariam ao Henry. Engoli

em seco. — Ao meu amigo.


Nathan deu uma risadinha.

— Não falamos sobre como resolvemos nossos negócios,

querida. Se quiser, pergunte ao seu futuro noivo.

Meu coração se apertou no mesmo instante e eu me calei.


Já não tinha mais lágrimas para derramar, então me concentrei

na paisagem se desenrolando do lado de fora do carro.


Passamos pela Charing Cross no sentido do East End, uma

região que ficava ao norte do rio Tâmisa e que foi cenário de um dos

assassinos mais famosos do mundo: Jack, O Estripador.


Eu sabia que aquela região, mesmo depois de tantos anos,

ainda era palco para uma das profissões mais antigas do mundo. E

era para lá que aqueles homens estavam me levando.

Eles entraram em uma rua deserta e estacionaram o carro. O


homem da cicatriz desceu primeiro e abriu a minha porta. Então

puxou-me pelo braço e me levou até uma porta de ferro que já tinha

sido aberta por Nathan.


— Ai, está me machucando! — reclamei quando eles me

forçaram a entrar por outra porta e descer um lance de escadas.

— Desculpa aí, mas não podemos deixá-la fugir.

Quis retrucar, mas achei melhor ficar em silêncio.


Descemos até um lugar escuro, iluminado com luzes azuis e

vermelhas.

— Se não quiser ver isso, é melhor fechar os olhos e deixar


que nós te guiemos — Nathan falou próximo ao meu ouvido.

Mas já era tarde demais.


Havia muitos sofás, homens nus espalhados por todo o local.

Mulheres nuas fazendo sexo com eles como se estivessem em seus

próprios quartos.

Era a visão do inferno.


Fechei os olhos e virei as costas, pronta para sair dali, mas

Nathan me segurou.

— Você pediu para encontrar o chefe. Ele está esperando.


— Eu quero ir embora!

— Não seja uma menina mimada! — Nathan xingou. — Até

parece que não sabe que lugares assim existem.

Respirei fundo algumas vezes e Nathan tinha razão. Eu tinha


ido ali para falar com Henry e era isso o que eu ia fazer. Seus

negócios não me importavam.

Virei-me para continuar minha caminhada e tentei ignorar as


mulheres e os homens que me olhavam como se eu fosse um

pedaço de carne pronto para ser jogado a eles.

Nathan me guiou até um corredor.

Havia muitos quartos.


Meu coração começou a ficar acelerado ao pensar no que eu

estava prestes a encontrar.

Eu devia ter ficado calada e ter ficado em casa.


Na casa dele.

Céus.
— O dele é o último — Nathan parou de andar e apontou até a

última porta do corredor. Mesmo dali o som ainda era alto. — Vá, ele

a espera.

Eu não sabia se devia ir, mas a curiosidade era maior que


tudo.

Caminhei a passos lentos, com meu coração quase saindo

pela boca.
Meu Deus, quem era Henry?

Eu realmente não o conhecia.

Parei em frente à porta e levantei o punho fechado.


Nathan disse que ele me esperava, mas e se fosse mentira? E

se ele estivesse ali dentro com uma puta e eu fosse ainda mais

humilhada?

Bati.
Ouvi sua voz grossa e encantadora dizendo “Entre”.

Abri a porta e entrei, ainda com os olhos fechados. Não queria

ver se aquela fosse apenas uma manobra de humilhação. Já


bastava tudo o que eu estava sofrendo.

— Emmeline.
Deixei que a porta se fechasse atrás de mim.
— Por que está de olhos fechados? — Sua voz continha um

tom de divertimento.

— Você está fodendo alguma delas aqui? — perguntei. —


Porque, se sim, eu vou embora.

Henry soltou uma gargalhada.

Fiz uma careta e fechei a mão em punho. Queria matá-lo.


Senti-o se aproximando e eu tentei me retrair ainda mais.

— Você queria que eu estivesse? — Sua voz em meu ouvido

fez todos os meus pelos se arrepiarem. — Ficaria excitada com

isso?
Henry estava me rodeando, mas eu ainda não queria abrir os

olhos. Então me restava apenas me agarrar à minha sanidade e não

deixar me ludibriar com sua voz de trovão e seu perfume


amadeirado que teimava em satisfazer o meu olfato.

— Você sabe que não.


Senti a ponta de seus dedos deslizarem pela minha bochecha.
— Que pena, seria uma honra deixá-la molhada, desejando

que eu estivesse dentro de você e não em outra... — Seus dedos


deslizaram até a minha garganta. — Mas vou encontrar outros
meios de deixá-la desta forma.
Então eu abri os olhos e encarei Henry, que se agigantava na
minha frente.
— Não me provoque — falei, entredentes.

Henry sorriu e se afastou.


— Foi você que quis me encontrar.
Nesse momento, eu vasculhei o local com os olhos.

Era um quarto, sim. Silencioso. Talvez fosse à prova de som.


Havia uma cama, mas ela estava arrumada. Havia um notebook
aberto em cima dela e uma garrafa de uísque ao lado, pela metade.

Henry estava de roupas, mas com a camisa meio aberta,


revelando um pouco dos pelos de seu peito.
Desviei o olhar, sem querer pensar em sua forma física.

— Achei que estivesse... sei lá, em alguma reunião do


parlamento? — falei, mudando de assunto.
Henry suspirou e se jogou em uma poltrona que havia do outro

lado.
Não queria nem imaginar o que faziam naquele lugar.

— O parlamento está entrando em recesso por causa do final


de ano — Henry esclareceu. — Mas eu trouxe alguns amigos para
cá e enquanto eles se divertem, resolvi trabalhar um pouco.
Sua voz era genuína e eu respirei fundo, deixando um pouco
da tensão de lado.
— Hum... certo.

— Quer beber um pouco? — ele perguntou, já se levantando e


indo até a garrafa em cima da cama.

— Ahn, sim... aceito.


Eu não bebia, mas quando estava perto de Henry, isso parecia
natural.

Ele sorriu e encheu um copo que estava em cima de uma


bandeja e outro para ele. Depois se aproximou e me entregou.
— Você está tensa.

— Qualquer um ficaria com a visão do inferno que eu tive lá


fora.
— Não julgue as pessoas pelos seus gostos depravados.

Beberiquei um pouco do líquido e fiz uma careta.


— Não estou julgando ninguém. Só estou dizendo que eu não
gosto disso.

— Será? — Henry ergueu uma sobrancelha. — Não podemos


dizer que não gostamos de algo se nunca o provamos.

Sua voz continha um ar sugestivo que fez as minhas


bochechas esquentarem em questão de segundos.
— Às vezes, não precisamos provar para saber que aquilo não
foi feito para nós — determinei, levando o copo até a mesinha.

Porém, quando eu ia me afastar, a mão de Henry segurou o


meu pulso e seu polegar começou a massagear a minha mão.
— Você queria me ver. Por quê?

Fechei os olhos, a pequena massagem estava me ajudando a


relaxar.

— Porque... — comecei a falar, mas já nem lembrava mais por


que eu tinha ido ali. — Porque...
— Pode dizer, querida. Quero ouvi-la.

Eu queria dizer algo, mas a minha mente estava nublada com


pensamentos estranhos.
Henry estava me tocando, massageando minha mão.

E ele tinha me beijado há algumas noites.


Um beijo casto, mas como seria um beijo de verdade vindo
dele?

Eu só tinha provado o de William, até então.


E me lembrar de William, fazia eu me lembrar do porquê tinha
ido até ali. E por que eu deveria odiar que Henry me tocasse.

— Céus! — Encerrei nosso contato, afastando-me dele. — Eu


quero ir embora. Agora.
Henry se acomodou no estofado e me olhou intensamente.

— Fique, vamos conversar um pouco.


Eu não podia ficar, meu corpo estava começando a me trair
por gostar daqueles toques e da sua forma de falar.

E pelo seu jeito de me olhar.


Qual mulher não gostava que um homem a visse como uma
verdadeira rainha?

Era assim que Henry me olhava.


— Não posso, eu... preciso memorizar os nomes dos convites

— falei, voltando-me para a porta.


Uma desculpa ridícula.
— Não precisa memorizá-los. Só quis que você se

familiarizasse para quando conhecê-los pessoalmente.


Eu sabia, mas fiquei em silêncio.
— Fique, Emmeline. Pelos velhos tempos... pelas conversas

que não tivemos quando éramos crianças.


Falar sobre o passado era algo que sempre mexia comigo.
Virei-me para Henry e fitei seus olhos azuis ansiosos.

Lembrei-me de quando passei a aceitá-lo como meu amigo.


Foi alguns dias depois de ele quase ter enforcado Colin por alguma
briga idiota de crianças.
Colin dissera que era melhor tê-lo como nosso amigo e que eu
deveria gostar dele, porque ele seria nosso protetor.
Daquele dia em diante, passamos a rir na beira do lago no

Hyde Park todas as vezes que alimentávamos os patos com pão


amanhecido.
Memórias... tão relapsas e confusas.

Respirei fundo e disse:


— Tudo bem, eu fico.
Juntos em todas essas lembranças

Eu vejo seu sorriso.


Memories – Within Temptation

Henry

Doze anos antes

Emmeline já não me olhava mais com tanto medo, desde o

acordo de amizade que selamos. Embora ela ainda ficasse receosa


sempre que eu me aproximava.

Era domingo e, como nos últimos meses, estávamos andando

na beira do lago.
Emmeline estava tão linda em um vestidinho branco, que ela

nem imaginava, mas eu tinha escolhido e pedido ao meu pai para


entregar à sua mãe.
— Esses homens algum dia irão deixar de nos seguir? — Colin

perguntou, irritado.
— Claro que não. Eles são homens de confiança do meu pai e

estão responsáveis por mim. Se qualquer coisa acontecer a mim, as

cabeças deles irão rolar.


Emmeline parou de andar e nos fitou, os olhos arregalados.

— Cabeças rolando? É sério?

Ela tinha oito anos, mas me fascinava o quanto ainda era


inocente.

Isso contagiava a minha alma.

— Sim... cabeças de pessoas que não cumprem seus deveres


da forma correta são arrancadas — falei, dando um passo em sua

direção. Queria assustá-la mais um pouco. — Consegue imaginar


isso, Emmeline?

— Pare de assustá-la, porra. — Colin puxou a manga do meu

terno. — Depois quem tem que aguentar a choradeira no meio da

noite sou eu.

Emmeline estava mais pálida do que antes.

— Eu não sou chorona! Eu só... — Ela desviou o olhar para o


lago. — Eu tenho medo. Não gosto de violência.
— Ela nem assiste aos filmes na TV. — Colin revirou os olhos.
— Uma baita menina chorona.

— Colin! — Emmeline gritou.

Dei mais um passo em sua direção e minha mão foi

automaticamente até o seu rosto pequeno.

Ela se retraiu assim que a toquei, mas eu não sabia como me

afastar.
— Eu gosto que seja assim. Sua inocência me fascina.

— Hey, tire a mão da minha irmã. — Colin puxou a minha mão.

Meu sangue ferveu no mesmo instante e eu me virei para ele

com raiva e o empurrei. Colin perdeu o equilíbrio e caiu no chão,

onde eu me coloquei por cima.

Nós tínhamos quase a mesma altura, mas eu ainda era mais

forte por conta dos treinamentos que tinha.


— Eu coloco a minha mão onde eu quiser. — Pressionei sua

garganta com força, ignorando os gritos de Emmeline e os homens

que já estavam vindo em nossa direção. — Ela vai ser minha um

dia, acostume-se com isso.

Então antes que eles me puxassem, eu já tinha saído de cima

de Colin.
— Por que fez isso? — Emmeline me encarou, enquanto se

ajoelhava ao lado do irmão. — Você disse que iria nos proteger.


— E eu vou, mas seu irmão precisa entender algumas coisas.

Colin me olhou com fúria, mas não disse nada.


Aquela foi a última vez que brigamos, porque daquele dia em
diante, o garoto fez questão de que eu me aproximasse de sua irmã

cada vez mais.


Qualquer que seja a profecia

Deixe-a ser, deixe-a ser


Viveremos tudo que há para se viver
Virtue and Vice – Delain

Emmeline

— Sente-se aqui.

— Não quero me sentar — falei, mas meu corpo idiota me


levou até a beirada da cama e eu me sentei.

Henry ergueu as sobrancelhas.

— Digo, sentar-me ao seu lado.


— Entendo... — Ele abriu um meio-sorriso e passou uma das

mãos pelo cabelo sedoso. — Pode aproveitar a distância por um


tempo. Você sabe que quando nos casarmos será diferente, não

sabe?
Olhei para baixo, consciente de que eu estava sentada em

uma cama.
Henry se levantou do sofá e veio em minha direção.

— Vai me obrigar a estar com você? — perguntei, erguendo a

cabeça.
Ele se aproximava com um olhar predatório, mas diferente do

medo que eu sentia dele quando éramos crianças, agora eu tinha

forças para lutar.


— Talvez. — Ele chegou mais perto e empurrou os meus

ombros, me fazendo cair de costas na cama. Antes que eu pudesse

dizer qualquer coisa, Henry se colocou por cima de mim. — Sabe,


Emme. Por muito tempo, eu relutei em ser como meu pai, ter o

poder que ele tinha. Manipular pessoas, jogar o meu jogo... — Seu
hálito quente estava a centímetros do meu rosto. Seus olhos azuis

na mesma direção que os meus. — Mas um dia, eu passei a gostar

disso. Eu gosto que as pessoas tenham medo de mim, eu gosto que

elas saibam que quem manda sou eu. — Ele segurou meu queixo e

virou meu rosto para o lado, descendo sua boca até a minha orelha.

— Gosto mais ainda quando elas tentam me enfrentar. E eu já fico


de pau duro só de pensar que você quer lutar contra isso. Contra o

meu domínio sobre a sua vida.


— Henry... — falei seu nome como uma súplica.
— Por que você age assim, Emmeline? — Seu nariz encostou

em minha garganta e depois ele deslizou os lábios, bem devagar.

Tentei empurrá-lo, mas ele segurou minhas mãos contra o colchão

macio. — Eu não quero fazer mal a você. Só quero o que é meu.

— Eu não sou sua propriedade!

— Ah, você é. — Henry puxou minhas mãos até o alto da


minha cabeça e segurou com força. — Sua vida foi entregue a mim

e eu prometi que cuidaria de você. É o que estou tentando fazer.

— Quer me obrigar a amá-lo, é isso? — Meu peito subia e

descia com a respiração agitada.

Eu sentia raiva, ódio, mas ao mesmo tempo sentia uma

necessidade de ter seus olhos em cima de mim.

— Um homem como eu não é digno de amor.


— Então que porra você quer de mim? — gritei, já frustrada

com tudo aquilo.

— Eu quero você.

Então Henry abaixou a cabeça e seus lábios vieram aos meus

com uma violência que eu não sabia de onde vinha.

Bem diferente da outra noite.


Resisti por alguns instantes, porque eu tinha esperança de que

ele desistisse e se afastasse, mas Henry não era esse tipo de


homem. Ele era sagaz e paciente e eu sabia que se eu não

retribuísse o beijo, ele faria de outra forma.


Abri a minha boca e seus lábios devoraram os meus. Sua
língua me invadiu e quando me dei conta, estava beijando-o de

volta.
Beijei-o com fúria.

Com ódio.
Nossas línguas duelavam e eu sabia que precisava sair dali ou

a minha consciência me mataria.


Henry estava tão concentrado no que estávamos fazendo, que
suas mãos relaxaram e soltaram meus pulsos. Desci as mãos pelos

seus ombros fortes, pelo seu peitoral, até o cós da calça.


Não havia nenhuma arma.

Então o mordi, frustrada.


Henry se afastou, levando as mãos aos lábios enquanto eu

pulava da cama, com a minha dignidade no chão.


— Estava procurando por uma arma? — ele perguntou, seus
dedos manchados de sangue. — Eu tenho meus próprios segredos,

Emmeline.
As lágrimas começaram a descer uma atrás da outra.

Parte era por desespero, por saber que eu estava sendo


guiada por um caminho no qual não escolhi. Parte também era por

ter gostado do beijo, por estar excitada com seu toque, com sua
presença.

Que tipo de pessoa eu estava me tornando?


— O que você fez com eles? — gritei, chorando, e fui na
direção de Henry. Empurrei seus ombros com força. — O que fez

com Melanie e William???


Henry segurou meus braços com força e eu caí de joelhos no

chão, humilhada em meu próprio desespero.


— Me fale, seu desgraçado!
Henry suspirou e se ajoelhou na minha frente. Eu me recolhi,

abraçando minhas pernas.


— Todo esse show por causa daquela sua amiga que deixava

você trabalhar até tarde, porque ela gostava de sair para foder com
o chefe? — Sua voz era calma e não havia resquícios de raiva por

eu tê-lo mordido. — Por um cara que estava saindo com outras


duas garotas enquanto iludia seu pobre coração?
— Você está mentindo.

Henry bufou.
— Eu posso provar.
De repente, meu coração foi tomado por pavor.
Fechei os olhos e balancei a cabeça inúmeras vezes.

— Você está mentindo! Você está mentindo!


— Eu não preciso mentir, Emmeline. Sua vida já é minha, você

sabe. Mesmo que aquele sujeito fosse um santo na Terra, você não
iria voltar para ele.
Derramei mais lágrimas, então de repente eu me aproximei de

Henry.
— Você quer me destruir. Você pode ter o meu corpo, mas

jamais terá o meu coração.


Seus olhos não desviaram dos meus.

— Não quero destruí-la. Você é a minha salvação.


Então me deixei cair novamente sentada e toda a dor e
sofrimento foram suficientes para que a minha consciência me

deixasse.

Braços fortes me seguravam enquanto eu via vultos tentando


se aproximar.
A urgência na voz masculina ordenava que abrissem caminho.
Apaguei novamente.

Abri os olhos lentamente.


Havia um homem à minha frente murmurando coisas que eu

não entendia.

Minha consciência voltou com força e eu tentei me levantar,


mas mãos fortes seguraram meus ombros.

— Acalme-se, senhorita.

— Emmeline. — A voz de Henry preencheu os meus ouvidos.


Por um instante, senti alívio por ouvir uma voz conhecida. —

Acalme-se.

— O que aconteceu? — perguntei, assim que o homem se


afastou.

Henry estava sentado ao meu lado, na cama.

— Você apagou.

— A senhorita precisa descansar — o outro homem falou,


anotando algo em uma prancheta. — Vou receitar alguns

comprimidos que vão ajudá-la a se sentir melhor.


Os dedos de Henry começaram a passear pela minha

bochecha de uma forma delicada.


Eu não queria, mas estava tão cansada daquela briga, que eu

simplesmente deixei.

— Compre esses comprimidos para ela e tudo ficará bem. —


O homem entregou o papel a Henry.

— Não precisa fazer exames? — ele perguntou, analisando a

folha em sua mão.

— Não. Só que acho melhor ela se afastar de situações de


extremo estresse. A garota está desnutrida. Ela não se alimenta?

— Ela era bailarina.

— Parem de falar como se eu não estivesse ouvindo! — Tentei


me sentar, mas minha cabeça deu uma pontada e eu a enfiei no

travesseiro.

— Emme, não faça movimentos bruscos — Henry disse,


colocando as mãos em meus ombros. — Você precisa descansar.

Respirei fundo várias vezes.

— A questão é: alimente-a bem e a deixe descansar — o

homem disse. — E compre os malditos comprimidos para ela. Volto


em alguns dias para ver como ela tem se saído.

— Ok.
Henry se afastou da cama e levou o sujeito até a porta. Eles

trocaram mais algumas palavras e depois ele se foi.

— Quem é ele? — perguntei assim que Henry fechou a porta.


— Tarsis, o médico da família — ele explicou. — Tem cuidado

de nós desde que éramos crianças.

Henry enfiou o papel dobrado dentro do bolso do terno e

suspirou.
— Preciso sair para resolver alguns assuntos. Você vai ficar

bem?

— Estou me sentindo sozinha — falei sem querer.


Henry me encarou por alguns instantes.

Bem, de qualquer forma, eu não estava mentindo. Os dias

nessa mansão eram assustadores, solitários. A minha vida nunca foi

vazia. Quando criança, eu tive Colin, depois de adulta, tive Melanie,


minhas outras colegas de ballet, Constance, os amigos do

trabalho...

William.
Será que Henry disse a verdade? Será que William estava

mesmo brincando com meus sentimentos?

Eu não queria, mas a incerteza já tinha se instalado em meu

peito.
— Eu vou ligar para o Harrogate College e pedir que mandem

Ellen para casa — Henry disse. — Sei que vocês se viram apenas
uma vez e foi bem rápido, mas acredito que a companhia de minha

irmã lhe fará bem.

Eu não sabia as origens de seu gesto, mesmo assim, disse:


— Obrigada.

Henry ainda me encarou por alguns segundos e abaixou o

tronco em um leve cumprimento.

— Descanse, Emme. Provavelmente, ficarei alguns dias longe,


até que se sinta confortável com nosso noivado.

Antes que eu tivesse a chance de dizer algo, Henry abriu a

porta e saiu do quarto, deixando-me sozinha com meus


pensamentos.

Alguns dias se passaram e faltava apenas um dia para a festa

de noivado.
Estava tomando os remédios receitados e, consequentemente,

eu estava mais calma.


Henry tinha cumprido sua palavra e estava distante. Diferente

de antes, agora era ele quem estava fugindo de mim. E, para ser

sincera, eu não sabia se isso era bom ou ruim, porque em breve

estaríamos casados e essa distância acabaria.


Há duas noites, Colin veio me visitar. Mostrou-se preocupado,

mas garantiu que eu ficaria bem.

Eu queria acreditar em suas palavras.


Na noite passada, cansada de me sentir só, procurei por

Henry. Mas logo me arrependi quando o vi destruindo seu escritório

por algum problema que eu não fazia questão de saber o que era.

Então me tranquei em meu quarto.


Peguei no sono e acordei com as cortinas sendo abertas de

forma brusca.

— Céus, a nova futura lady Spencer gosta de dormir, não é?


— a voz fina disse, andando de um lado para o outro. — Ah, mas

comigo aqui essas férias vão acabar.

— Meu Deus, quem é você?

Esfreguei os olhos e depois fitei a pessoa parada à minha


frente, observando-me como se eu fosse um novo brinquedinho.

— Ellen?

Ela abriu um sorrisão.


— Emmeline! — Então veio em minha direção e jogou os

braços ao meu redor. — Que felicidade a encontrar aqui. Henry


disse que deveria vir para lhe fazer companhia, mas achei que já

estivesse acordada.

— Que horas são? — perguntei quando ela se afastou.

— Meio-dia.
— Céus. Eu não durmo tanto assim — bocejei. — Desculpe. É

que não há muito o que fazer neste lugar, então estou um pouco

perdida no tempo.
Ellen sorriu.

— Não se preocupe. Eu vou ficar até o casamento, então

poderemos fazer muitas coisas juntas.


Ellen era uma menina magra, extremamente branca com

longos cabelos loiros e olhos verdes chamativos.

Ela e Henry não tinham nada a ver um com o outro.

— Já escolheu seu vestido para o noivado? — ela perguntou,


indo até o closet. — Nossa, que roupas são essas? Não sei se

combinam com você.

Respirei fundo.
— Stephanie me ajudou.

Ela voltou ao quarto com os olhos arregalados.


— Você é amiga daquela vadia?
— Não... eu não.

— Não confie nela! — Ellen apontou o dedo em minha direção.

— Sabia que ela é louca por Henry? Não duvido que esteja se
mordendo de inveja por você ser a noiva dele.

— Eu não ligo para o que ela pensa. — Deitei a cabeça no

travesseiro. — Se seu irmão ainda não te falou, não estou de acordo


com esse casamento.

— Você só pode estar louca. — Ellen saiu do closet segurando

um cabide com um vestido verde. — Vista-o, vamos sair para

comprar o seu vestido de noivado.


— Os Spencer são todos assim? — perguntei ao me sentar na

cama.

Ela deu uma risadinha.


— Se está dizendo sobre a nossa beleza e a nossa facilidade

de persuadir as pessoas, bem, sim, somos. E eu adoro isso.


Respirei fundo e peguei o maldito vestido.
— Vocês vão me enlouquecer — murmurei, marchando até o

closet.
— Não vamos te enlouquecer, querida. Se você está aqui, é
porque aqui é o seu lugar. Só falta você se acostumar.
Quis retrucar dizendo que eu nunca me acostumaria, mas uma
vez mamãe me disse que as coisas que não desejamos acontecem
para testar a nossa força.

E eu estava prestes a pedir que me trouxessem uma nova


bateria.
Um jogo do contador de histórias

Lábios que intoxicam


O centro de toda vida é um ilimitado baú de histórias
Storytime - Nightwish

Henry

— Destruir a porra do seu escritório não vai ajudar em nada.

Levei a bebida escura até meus lábios e entornei de uma só


vez, sentindo o gosto amargo que me ajudava a lidar com a porra

que a minha vida era.

— Por que não cala a boca, Colin?


Colin puxou uma cadeira no meio da bagunça que o meu

escritório estava e se sentou de frente para mim. Eu estava jogado


em um sofá, torcendo para que algum filho da puta fizesse alguma

merda para que eu pudesse me aliviar enfiando uma bala na cabeça

do sujeito.
— Amanhã é a festa do seu noivado e você está desse jeito.

Emmeline ouviu o seu surto ontem à noite?


— Emmeline está tomando calmantes. — Beberiquei mais um

pouco da bebida e fiz uma careta. — Duvido que ela estivesse

consciente o suficiente para ouvir.


Colin respirou fundo e assentiu.

— O que vai fazer a respeito?

— Não sei. Estou pensando. Não posso simplesmente meter


uma bala na cabeça do filho da puta do Rutherford. — Fechei a mão

em punho. — Ele agiu pelas minhas costas. Aproveitou o meu

momento de distração e a euforia dos malditos lordes em sair de


recesso para passar aquela maldita lei no Parlamento.

Oliver Rutherford era um membro da Câmara dos Lordes e sua


influência era bem grande, não como a minha, mas ainda assim ele

conseguia algumas coisas que atrapalhavam meus planos.

Nós nos odiávamos.

— Não consegue persuadir o primeiro-ministro?

— A porra da lei já tem a assinatura da rainha. — Franzi os

lábios. — Já saiu na mídia. Acha que as pessoas não querem um


país que não seja dominado pelas organizações criminosas? Isso

coloca a família real em evidência e os torna cada vez mais um


exemplo... — Dei uma risada amarga e balancei o copo com o resto
de bebida. — Mal sabem eles que metade daquela família está

comendo nas minhas mãos. Esses dias precisei dar um jeito de

encobrir o príncipe que estava cheirando cocaína nas tetas de uma

das nossas putas. Alguém tirou uma foto e ela só não saiu na mídia,

porque consegui intervir.

Tive uma longa conversa com o jornalista e com o sujeito que


tirou a foto. Voltei ensanguentado naquela noite, mas pelo menos

livrei o rabo do príncipe, que agora fugia das minhas vistas, porque

sabia que tinha uma dívida comigo.

— Eu me lembro desse caso. — Colin bufou. — Você acha

que isso tem a ver com o roubo da carga em Dover?

Eu já tinha pensado naquela possibilidade, mas Rutherford era

apenas um merda que gostava de se sentir o super-herói, sempre


criando leis que atrapalhavam meus negócios. Aquela não era a

primeira vez.

— Não sei, mas precisamos ficar atentos. — Inclinei o tronco e

encarei os olhos de Colin. — Você precisa ficar atento. Eu confio a

minha vida a você. Não quero ser decepcionado.

— É claro que não vai ser decepcionado. Nossa ligação é


muito mais forte do que alguém poderia imaginar. Eu também confio
a minha vida nas suas mãos.

Joguei a cabeça para trás e respirei fundo.


Minha cabeça estava uma verdadeira confusão.

Problemas para todos os lados.


O noivado estava se aproximando, meus sentimentos por
Emmeline eram complexos e eu não sabia como denominá-los.

Apenas sabia que existia uma força maior que tudo que sempre
levava os meus pensamentos até ela.

Desde o dia em que ela surtou e desmaiou em um dos meus


clubes, eu não impus mais a minha presença. Queria que ela

sentisse minha falta, queria que ela viesse até mim.


Mas o tempo passava e ela se mantinha distante.
Eu estava começando a acreditar que as coisas dariam muito

errado.
Entretanto, coisas dando errado na minha vida não me

assustavam. Papai vivia me dizendo que o meu nascimento havia


sido um erro. Assim como praticamente tudo o que se sucedeu na

minha vida desde que botei os pés neste mundo caótico.


— Como está a segurança para a festa de amanhã?
— Tudo certo. Teremos muitos homens infiltrados como

membros da alta sociedade. Fique despreocupado, não haverá


nenhum problema.

— Ótimo. — Bebi o restante do líquido em meu copo e depois


o joguei no chão. — Ellen está chegando. Espero que sua

companhia eletrizante sirva para acalmar os ânimos de Emmeline.


Colin se retesou no lugar.

— Não sabia que ela viria.


Eu adorava a minha irmã e ela era tudo em minha vida, mas
ela tinha uma obsessão por Colin desde que colocou os olhos nele.

Claro que ele nunca retribuiu, talvez por medo da minha opinião ou
talvez porque ele sempre foi apaixonado por outra.

— Então fique sabendo e redobre a segurança. — Levantei-


me.
Eu tinha passado a noite no sofá, depois de destruir o meu

escritório. Minha gravata estava pendurada em meu ombro, a


camisa entreaberta. Cheirando à bebida e a cigarro.

Um verdadeiro caos humano.


— Colin, me diga uma coisa. — Sentei-me novamente. Os

olhos azuis dele fitaram meu rosto, apreensivo. — Emmeline é


virgem?
— Não sei, mas acho que sim. Que eu saiba o único homem

com quem ela começou a sair foi o bailarino. E não acho que deu
tempo de...
Cocei o queixo.
— Descubra isso para mim.

— Por que eu, porra? — Colin perguntou, irritado. Seu sangue


sempre fora quente e eu gostava de provocá-lo. — Não quero saber

dessas coisas em relação à minha irmã.


— Porque você é irmão dela. Deveria saber disso.
— Se você quer fodê-la, vá e faça isso, mas não venha me

falar o que faz dentro de quatro paredes com a minha irmã. — Ele
se levantou, irritadinho. — Pensei que fosse esperar a porra do

casamento.
— É o que pretendo. — Soltei uma risada. — Mas sua irmã é

tão gostosa... não sei se vou conseguir me controlar. Estou ficando


louco a cada segundo que não posso tocá-la.
Colin ergueu as mãos e foi em direção à porta.

— Eu vou sair daqui. Não quero ouvir mais nenhuma palavra


sobre isso, seu doente filho da puta.

— Achei que estivesse de acordo com Emmeline sendo minha.


— Eu estou, porque eu nunca quis que o destino dela fosse
como o da nossa mãe — Colin vociferou. — Pelo menos, você tem

um pouco mais de decência que o seu pai.


Abri a boca para retrucar, mas aquele não era o momento para
essas discussões idiotas sobre o passado.
— Apenas faça o que eu ordenei. Descubra se sua irmã ainda

é virgem e me diga. Quero essa informação antes da festa de


noivado.

— E se ela não for?


Abri um sorriso malvado.
— Aí eu vou comemorar o meu noivado de outro jeito.
Eu sei que você não se decidiu ainda

Mas eu nunca te faria nada de mal


Eu soube desde o momento que nos conhecemos
Não há dúvida, em minha mente, onde você pertence

Make You Feel My Love – Adele

Emmeline

Ellen desceu primeiro do carro e eu logo em seguida. Quando


meus olhos subiram pela fachada da enorme loja na Old Bond

Street, meu coração quase parou.

— Uau... a boutique de Alexander McQueen.


— Não acredito que Stephanie não a trouxe aqui — Ellen fez

uma careta de desgosto. — Aquela vadia... mas claro, ela sabia que
você ficaria uma verdadeira rainha com essas roupas. Venha,

vamos.
Ellen me puxou para dentro da loja e não demorou para que

uma vendedora viesse nos atender.


Apesar de tudo, eu podia dizer que estava me sentindo

confortável ao lado de Ellen, bem diferente de quando saí com

Stephanie, que fez questão de me fazer provar cores excêntricas.


— Um vestido de noivado precisa ser delicado, mas também

sexy — Ellen disse enquanto seguíamos a vendedora loja adentro.

— Meu irmão precisa ficar fascinado com você.


— Se ele ficar um pouco mais fascinado, aposto que não vai

me deixar sair nem na sacada da casa.

Ellen deu uma risadinha.


— Henry pode ser um pouco obsessivo às vezes.

Era incrível como a garota encarava tudo aquilo com


normalidade.

— Desculpe a pergunta, mas com quem a senhorita irá se

casar? — A vendedora abriu um sorriso.

— Com Henry Thomas Spencer, Duque de Cambridge — Ellen

respondeu na minha frente.

A mulher arregalou os olhos.


— Uau, eu tenho o vestido perfeito. Me sigam, por favor.
Troquei um rápido olhar com Ellen, mas então seguimos a
vendedora até um elevador. Ela apertou no painel o número cinco e

nós subimos.

Quando as portas se abriram, tivemos a visão de inúmeros

manequins usando roupas elegantíssimas. Vestidos que só víamos

em cerimônias especiais na televisão.

— Este andar é reservado para pessoas da aristocracia e


celebridades de renome. — Ela sorriu novamente. — E aquele ali, é

o vestido que a senhorita deveria usar em sua festa de noivado.

Meus olhos seguiram na direção que ela apontou e bem no

canto, havia um vestido em tom creme, com mangas que iam até o

meio dos antebraços. Seu decote era em formato de coração e era

todo decorado com paetês, que lhe davam sofisticação e

delicadeza. A saia se ajustava ao corpo, abrindo-se conforme uma


fenda lateral, não muito grande, mas chamativa, exigia.

Era o vestido mais bonito que eu já havia visto em minha vida.

— Você precisa experimentar, Emmeline! — Ellen me fez

acordar de meu transe.

— Ok.

A vendedora me levou até um quarto separado e me ajudou a


colocar o vestido. Quando me olhei no gigantesco espelho, eu
soube que não havia outro.

— Eu poderia dizer que foi feito para você, Emmeline — disse


Ellen, toda animada.

— Digo o mesmo.
Então, por algum motivo que eu desconhecia, olhando para o
meu reflexo no espelho, pela primeira vez não senti repulsa por

aquele noivado.

Ellen e eu estávamos saindo da loja, quando demos de cara


com Stephanie.

— Ellen? Não deveria estar no colégio? — Seus olhos


estavam arregalados em surpresa. — Ahn, perdoe-me, Emmeline.
Como você está? — Ela se aproximou e depositou um beijo em meu

rosto. — É que fiquei assustada ao ver Ellen aqui.


— Não é da sua...

— Ellen veio para me fazer companhia — cortei Ellen, que me


olhou frustrada. — E não dava para perder o noivado do irmão, não
é?

Stephanie abriu um sorriso fingido.


— Claro. Como está o coração? Ansiosa?

Decidi trocar de tática e fazer Stephanie acreditar que eu


estava em total acordo com aquele noivado.

— Ah, estou muito ansiosa. Até vim comprar um vestido novo.


Sua feição mudou de repente e seus olhos desceram até a

sacola que eu segurava.


— Achei que fosse usar um dos vestidos que compramos
naquele dia.

— A noiva de um duque precisa vestir roupas que a


aristocracia usa. — Ellen deu um passo, ficando frente a frente com

Stephanie. Elas tinham uma pequena diferença de tamanho, mas


isso não impedia a irmã de Henry de ser geniosa. — Você deveria
saber disso e tê-la trazido aqui com antecedência.

Stephanie começou a rir.


— Ah, me perdoe. Mas as roupas que compramos também

são de altas grifes. Não achei que quisesse usar algo ainda mais...
— Não importa — a cortei. — Ellen já me ajudou com tudo.

Stephanie me fitou por alguns instantes e depois assentiu.


— Então nos veremos amanhã. Estou ansiosa para
testemunhar isso.

Devolvi o sorriso.
— Até lá, Stephanie.
Puxei Ellen em direção à saída, mas com a certeza dos olhos
cravados em nossas costas.

Quando saímos da loja, Ellen bufou.


— Eu a odeio.

— Você é muito nova para odiar alguém — falei, entrando pela


porta do carro que tinha sido aberta por um dos homens de Henry.
Ellen entrou logo em seguida.

— Eu tenho dezessete anos. Posso odiar com força. Henry já


me disse isso.

— Claro... — Bufei. Quem mais diria uma coisa dessas à


própria irmã?

O carro acelerou e fomos levadas de volta à mansão.


No caminho, Ellen contou algumas coisas, dentre elas que
tinha acabado de chegar e nem tinha visto Henry ainda, mas que

sua curiosidade para me ver era maior que tudo, por isso ela correu
para o meu quarto.

Eu respondia com poucas palavras, meus pensamentos


estavam na festa.
Eu era uma menina do subúrbio.
Não tive educação e nem sabia das etiquetas que uma futura
duquesa deveria ter.
Uma duquesa mentirosa, que ajudava a encobrir os crimes do

marido.
Era essa pessoa que eu estava destinada a ser.

Não demorou para chegarmos à mansão. Ellen não parava de


falar sobre como estava ansiosa e animada, que fazia muito tempo
que ela não participava de nenhuma festa.

E assim que entramos no hall, Henry estava vindo do escritório

com Colin.
— Henry!!!! — Ellen correu para os braços do irmão, que a

levantou e a rodopiou no ar. — Que saudade!

Ele a abraçou com força.

— Saudade também, Ellen.


Colin veio em minha direção e me deu um abraço.

Quando Henry a colocou no chão, seus olhos vieram para mim

e a sacola em meu braço.


Ele tinha a aparência de quem havia passado a noite inteira

bebendo.

— Compras?
— Claro... sua noiva estava precisando de um vestido lindo

para amanhã — Ellen respondeu, lançando-me uma piscadela. —


Ela vai ficar perfeita, vocês vão ver.

— Ela é perfeita — Henry disse com os olhos ainda grudados

em mim.
Minhas bochechas esquentaram.

— Ahn... eu acho que vou voltar ao meu quarto. Estou

cansada e sonolenta por causa dos remédios.

— Ah, eu posso ir com você e...


— Não, Ellen — Henry a cortou. — Deixe Emmeline

descansar. Nós temos que conversar.

A jovem assentiu, então seus olhos se voltaram para Colin.


— Oi, Colin. Não fala comigo por quê? Só por que Henry está

aqui?

Colin ficou desconfortável por alguns instantes.


— Olá, Ellen. Espero que esteja bem.

Ela abriu um sorriso largo.

— Estou ótima. Melhor agora, vendo-o.

Meu irmão fechou o rosto e eu arregalei os olhos.


Não acreditava que a pequena irmã de Henry estava de olho

em meu irmão.
Ah, céus.

— Ahn... então vamos? — Henry a puxou. — Deixe-os em paz

por algum tempo.


— Tá bom, eu vou. — Ellen se afastou dele e veio em minha

direção. Segurou meu rosto e depositou um beijo em minha

bochecha. — Eu já a considero minha irmã. É sério. Estou muito

feliz por vocês.


Segurei meus comentários ácidos. Olhei para Henry, mas seu

semblante nada revelava.

Ellen foi com ele para o escritório e eu fiquei em silêncio


pensando em tudo o que estava acontecendo.

Era possível que um dia eu me tornasse tão tranquila em

relação àquele mundo como Ellen?

— Precisamos conversar também, Emmeline — Colin disse,


trazendo minha atenção para si.

— Vamos ao meu quarto, então.

— Você ainda é virgem?


A pergunta de Colin veio sem rodeios, direta. Não tive nem

tempo para tentar imaginar o que ele queria saber, quando as


palavras saíram de sua boca.

— É sério que você está me perguntando isso? — Bufei,

colocando o vestido em um lugar reservado do closet.


— Eu preciso saber, Emmeline.

— Por quê? Seu chefe quer saber? — Ergui as sobrancelhas.

— Por que ele mesmo não vem perguntar ou... no caso dele,

averiguar?
Colin esfregou o rosto em frustração.

— Eu sei que é ruim, mas estou perguntando isso porque... —

Ele respirou fundo. — Veja bem, Henry não se importa. Mas ele
precisa saber se é inexperiente, ou você quer que sua lua de mel

seja uma grande porcaria?

— Não era nem para ter lua de mel.

— Emmeline, chega. Já passamos dessa fase. — Colin ergueu


o tom de voz. — Se ainda não entrou na sua cabeça que você será

a esposa de Henry, é melhor dar um jeito nisso até amanhã. Porra.

Fiquei em silêncio, frustrada com aquela conversa.


— Tudo o que está acontecendo é porque precisa acontecer.

Foi melhor assim... eu jamais permitiria que você acabasse como a


nossa mãe.

— O que você quer dizer?

— Nada, Emmeline. Nada. Só me responda logo. Você é ou

não virgem?
— Sou! — gritei e saí do closet, irritada. — Minha vida sempre

foi resumida a cuidar da nossa mãe, estudar e fazer ballet. Você

acha que eu tinha tempo de ter encontros? Acorda, Colin.


Vi uma expressão de alívio preencher a face do meu irmão e

eu senti ainda mais raiva.

— Vai embora daqui, eu não quero ver a sua cara nunca mais.

— Empurrei-o na direção da porta. — Eu te odeio. Te odeio com


todas as minhas forças por concordar com esse jogo estúpido!

Colin foi até a porta, mas então segurou o meu braço e me

encarou.
— Um dia você vai entender que tudo o que fizemos foi para o

seu próprio bem, e nesse dia eu quero estar lá para vê-la nos

pedindo perdão de joelhos.

— Nunca! — vociferei.
— Veremos.

Colin soltou o meu braço e saiu do quarto.

Deixei que as lágrimas rolassem pelo meu rosto.


~

As horas que antecediam a festa de noivado foram uma


verdadeira loucura.

Gente andando pela casa de um lado para o outro.

Floristas, cerimonialistas, pessoas que entendiam de festas da


alta-sociedade.

Então, na maior parte do tempo, mantive-me trancada no

quarto até a hora de me arrumar. Algumas vezes, Ellen vinha me ver

e ficávamos conversando por horas.


Thalia estava ajudando a arrumar o meu cabelo, quando disse:

— A senhorita parece mais feliz do que quando chegou.

Feliz não era a resposta certa.


— Que bom que você acha isso...

— Acho que o patrão precisa mesmo de alguém na vida — ela

disse, seus dedos cutucando meus cachos. — Ele sempre foi tão

sozinho. Digo, ele tem a senhorita Spencer, mas ela vive o ano
inteiro no colégio das damas. Seus primos aparecem de vez em

quando, mas eles preferem ficar em Birmingham...

— Eu não conheço o restante da família de Henry.


— Ah, sim. Mas hoje a senhorita irá conhecer. Aliás, hoje a
senhorita se tornará conhecida mundialmente. A próxima lady

Spencer... que inveja, desculpe, é uma inveja boa.

Dei risada e quase disse a ela que se quisesse trocar de lugar


comigo, o faria sem problemas.

— Você é uma jovem tola. — Levantei da penteadeira e

vislumbrei o meu vestido no espelho. — Estou bonita?


— Está perfeita. — A voz de Henry me fez dar um pulo e nós

viramos na direção da porta, onde ele estava, encostado ao batente,

olhando-me como se eu fosse a única mulher existente no mundo.

Engoli em seco, mas meus olhos traidores se arrastaram pelo


seu traje perfeito que emoldurava seu físico atlético. E se eu fosse

bem sincera, ele também estava lindo usando um fraque preto com

um colete vinho rendado.


Ele era a perfeição dos homens andando sobre a Terra.

E eu deveria odiá-lo ainda mais.


— Vou deixá-los a sós. — Thalia saiu rapidamente do quarto,
antes que eu tivesse a chance de pedir que ela ficasse.

Henry a deixou passar e depois fechou a porta.


O clima subiu vários graus e eu só queria ter mantido uma das
janelas abertas. Seria mais fácil de respirar, mesmo que seus olhos
ainda estivessem sobre o meu corpo.
— Queria que fosse a festa do nosso casamento — ele disse,
dando passos lentos em minha direção.

— E... por quê?


Ele parou na minha frente, a poucos centímetros de distância,
onde eu já podia sentir seu perfume amadeirado.

— Porque eu queria arrancar esse vestido com meus próprios


dentes.
Um arrepio percorreu a minha espinha e involuntariamente

olhei na direção da cama.


Lembrei-me da última vez que estivemos em uma.
O beijo.

A mordida.
Assustador.
— Este vestido foi caro. — Dei as costas e me aproximei da

janela. O que foi um erro, porque ele se aproximou, praticamente


encostando seu corpo ao meu.

— Mesmo que tivesse custado um milhão de libras — ele


sussurrou em meu ouvido. — Eu teria tido o prazer de arrancá-lo de
seu corpo — sua mão deslizou pelas minhas costas e eu segurei a
respiração — e depois eu me enterraria em seu corpo até nos
esquecermos de quem somos.
Apesar de tudo, aquele homem incitava coisas em mim que eu

não podia aceitar. Mesmo assim, era difícil afastá-lo, quando parte
do meu corpo sentiu falta disso nesses dias em que ele fugiu da

minha companhia.
— Henry... — Afastei-me, nervosa e com as bochechas
coradas. — Não diga essas coisas.

— Dizer o quê? — ele perguntou com um ar travesso. — Que


eu estou louco para fodê-la? Achei que já soubesse disso.
Respirei fundo.

Henry se aproximou, deu uma risadinha e suas mãos vieram


até o meu rosto.
— Não sei se consigo esperar até o casamento — ele

confessou. — Vai me dizer que não sente curiosidade, Emme? O


que um homem e uma mulher fazem em uma cama... quando se
tocam, fundindo-se um ao outro...

— Pare, Henry. — Afastei-me dele novamente. Estava


envergonhada e... brava... e nervosa. Não queria pensar em como

seria perder a virgindade com ele, mesmo que depois da conversa


com Colin minha mente estivesse pensando muito sobre isso. — O
que veio fazer aqui?

Ele deu uma risadinha e tirou do bolso uma caixinha.


— É para você.
Olhei desconfiada para a caixinha, então a peguei.

Puxei o laço, esperando encontrar uma joia caríssima, mas o


que encontrei me surpreendeu.

— Eu acho que você precisa ter algo que a coloque em


contato conosco — Henry disse ao ver que eu estava assustada ao
receber um celular de presente. — Espero que saiba fazer bom uso.

Existem três números salvos aí, o meu, de Colin e de Ellen.


Isso nada mais era que “seja livre, mas nem tanto”.
Mesmo assim, algo estilhaçou em meu coração e eu olhei nos

olhos de Henry.
— Obrigada. Isso... significa muito para mim.
Seu sorriso me desarmou completamente.

— Eu não teria dado, se eu não soubesse o que significava.


Então nos encaramos por longos instantes.
— Um dia você vai me falar sobre o passado? — perguntei

baixinho.
Sua expressão se esfriou, mas ele assentiu.
— Um dia.
Isso é justo, ou é o destino?

Ninguém sabe
As estrelas escolhem seus amantes
Salve a minha alma

The Other Side – Ruelle

Emmeline

Henry me deixou no quarto por mais algum tempo para que eu


pudesse me recompor, porque eu claramente estava muito nervosa.

Nervosa com a nossa conversa, com nossa aproximação dos

últimos dias e, principalmente, com seu gesto de me dar um celular.


Aquilo era um sinal de confiança e só me fazia acreditar que cada

vez mais Colin tinha razão em dizer que se eu tivesse o coração de


Henry nas mãos, seria fácil conseguir a minha liberdade.

Apoiei as mãos na penteadeira e respirei fundo várias vezes.


As palavras de Henry, seus gestos que me confundiam, sua

presença que estava cada vez mais constante em minha vida, tudo
isso era algo que estava me deixando à beira da loucura.

Eu queria seus beijos e não queria. Eu queria seus olhares

ardentes em cima de mim e não queria.


Eu estava me perdendo a cada segundo...

Respirei fundo mais algumas vezes e tentei vestir a minha

melhor máscara de noiva satisfeita.


Então saí do quarto.

Quando cheguei perto da escada, quase voltei para o meu

quarto ao ver Nathan encostado na parede, mexendo no celular.


Eu realmente não gostava dele.

— Achei que a princesinha havia desistido... — Seu


comentário estava cheio de sarcasmo e malícia.

Apesar de tudo, eu era noiva do chefe dele, então resolvi

entrar no papel.

— Achei que você só tinha permissão para falar comigo

quando eu falasse com você. O que será que Henry vai fazer com

você se souber que está colocando apelidos em mim?


Nathan empalideceu um pouco.

— Você não faria isso.


— Então não se meta comigo — retruquei. — Afinal de contas,
o que está fazendo aqui?

— Um dos meus trabalhos é ser sua babá esta noite — ele

retrucou, azedo. — Então, se vai mesmo ser a esposa do meu

chefe, é melhor se acostumar com a minha presença constante.

Era óbvio que eu não queria nenhuma babá no meu pé, mas

isso eu resolveria com Henry depois. Agora eu precisava mostrar,


principalmente para Nathan, que eu não era como as outras garotas

que ele estava acostumado a intimidar.

— Bem, faça o que quiser, desde que não fique no meu

caminho. — Passei por ele e desci as escadas, mas quase subi

correndo novamente ao ver o mar de pessoas andando pela casa.

Era óbvio que metade da alta-sociedade londrina estaria ali.

Era óbvio que todos queriam ver quem seria a nova lady Spencer,
título que estava adormecido desde que a mãe de Henry falecera.

Talvez eu não fosse tão heroína assim.

— Atenção, senhores! — A voz de Henry ecoou por todo o

salão e eu o encontrei, no meio da multidão, com uma taça de

champanhe erguida. — Apresento-lhes, Emmeline Jones! Futura

lady Spencer!
Eu estava paralisada no meio das escadas com pessoas

olhando em minha direção com curiosidade. Eles ergueram suas


taças e gritaram vivas, deixando-me ainda mais perdida.

Henry atravessou a multidão e veio em minha direção com um


sorriso nos lábios.
— Beije-a, Spencer! — um homem gritou e em seguida outras

pessoas se uniram a ele.


Aquilo estaria no London Times no outro dia.

— Não podemos decepcionar a multidão, não é, querida? —


Henry subiu os degraus e se agigantou na minha frente. Seus olhos

azuis estavam vidrados nos meus.


— Henry... — Soltei um suspiro.
Queria sair correndo dali, mas algo nos olhos de Henry me

paralisavam. Enfeitiçavam-me. Fazia-me lembrar de como foi ter


seus lábios nos meus, mesmo que depois eu o tivesse mordido e

arrancado um pouco de sangue.


Talvez sangue fosse algo que sempre estaria entre nós.

Ele sorriu e deixando a taça na mão de outro convidado,


segurou meu rosto e abaixou sua cabeça.
Segurei a respiração. Endureci meu corpo.

Ele sentiu.
É claro que sentiria.

— Emmeline... — Sua voz era um sussurro tenso enquanto a


multidão pedia por um beijo.

— Faça logo.
Era mais fácil ceder.

Henry encostou seus lábios quentes nos meus.


Achei que seria um beijo como o que ele me deu na sala de
música, dias antes, porque estávamos na frente da sociedade

londrina e aquela festa estaria nos jornais no outro dia.


Porém eu estava enganada.

Seus lábios começaram a se movimentar por cima dos meus e


de repente um de seus braços me puxou para si com força,
possessividade. E, por algum maldito motivo, eu me esqueci de

onde estávamos. Não conseguia deixar de pensar naquilo que


estávamos fazendo.

Sua língua lambeu meu lábio inferior e eu abri minha boca,


deixando que ela entrasse para encontrar a minha.

Seu cheiro de perfume amadeirado invadiu as minhas narinas


e eu estava bem consciente de que aquele era Henry, o homem que
eu deveria manter longe de mim, o homem que eu deveria repugnar,

mas que por um azar dos infernos, sabia como beijar.


Eu não sabia se era sortuda ou apenas uma infeliz que cruzou
o caminho do homem errado.
Um calor desceu até o meio das minhas pernas e se eu não

tivesse um pouquinho de consciência de onde estávamos, eu


poderia ter me esfregado nele para tentar encontrar o alívio.

— Céus. — Separei-me imediatamente ao perceber o tipo de


pensamento que havia cruzado a minha cabeça.
Henry estava com os lábios inchados, mas sorriu

maliciosamente.
Desta vez eu não o havia mordido.

Ele devia se sentir orgulhoso.


E em meio à chuva de vivas e aplausos, Henry abaixou a

cabeça e disse em meu ouvido:


— Podemos terminar isso mais tarde, se você quiser.
— Desgraçado.

Ele deu uma risadinha e se afastou, virando-se para a multidão


animada.

— Aprovaram a minha noiva? — perguntou em voz alta,


segurando a minha mão e entrelaçando nossos dedos.
Pessoas disseram sim, que eu era linda, perfeita.
Claro que não me passou despercebido mulheres que me
olharam com repulsa, afinal, eu não era deste mundo. Eu era
apenas uma jovem sonhadora, uma pessoa da ralé. E mesmo

usando roupas de grife, eu sabia que havia essa marca em mim.


Henry me puxou pela mão e nós descemos o restante dos

degraus.
Cumprimentamos pessoas que eu nunca imaginei que um dia
iria conhecer. Até mesmo o primeiro-ministro estava presente, além

de um dos príncipes.

Foi bom ter revisado aqueles convites, senão teria ficado mais
perdida do que nunca.

Será que todo mundo aqui sabia quem Henry era quando não

estava usando um de seus títulos?

Depois de cumprimentar inúmeras pessoas, Ellen se


aproximou e inventou uma desculpa para Henry. Ela me puxou em

direção à mesa de aperitivos.

— Sei que está nervosa com tudo isso, mas acho que você
está indo muito bem — ela disse, enquanto enchia um prato com

canapés. — Só queria te avisar de uma coisa.

— O quê?
— Ouvi Stephanie no banheiro conversando com uma de suas

amigas piranhas. Ela vai inventar alguma desculpa para levar Henry
ao escritório. Ela quer... você sabe, não é?

Ergui as sobrancelhas, surpresa.

— Sério?
— Seríssimo. Ela quer que você os encontre... e isso, claro, vai

humilhá-la perante as pessoas.

Respirei fundo, irritada.

Já não bastavam os meus problemas com Henry, essa


vagabunda aparecia para querer infernizar a minha vida.

— Não posso bancar a ciumenta, até porque o que ele faz, não

me importa.
Ellen parou de colocar coisas no prato e me encarou como se

eu fosse burra.

— Não se importa se meu irmão vai foder outra no dia do


noivado de vocês?

— Se ele quiser... eu não posso impedir. — Desviei o olhar até

onde Henry estava, cercado de homens que queriam sua atenção.

Ellen bufou.
— Você e meu irmão já transaram?
— Ellen! — ralhei. — Você não deveria estar falando essas

coisas. Você não está em um colégio de jovens damas? É isso o

que aprendem lá?


Ela me encarou e abriu um sorriso lento.

— Aprendemos várias coisas... — Seus olhos vagaram na

direção de Colin e ela suspirou. — Mas eu não sou nenhuma

menina inocente, Emme. Eu sou irmã de um mafioso e sei quando é


hora de nos posicionarmos. Agora é a sua vez. Não deixe aquela

piranha te humilhar.

Olhei novamente na direção de Henry e Stephanie estava com


a mão apoiada em seu braço enquanto ele estava com a cabeça

baixa, ouvindo o que ela dizia.

Um sentimento de ódio, humilhação e mais uma centena de

coisas ruins se apossaram de mim.


Eu não havia sido arrastada para esse mundo para aguentar

humilhação de ninguém.

— Espere. — Ellen segurou o meu braço quando incitei ir até


eles. — Espere irem para o escritório. Não faça nenhuma cena na

frente dessas pessoas. Elas sabem que você não é da aristocracia.

Vão fazer comentários maldosos.

— Eu pouco me importo com a opinião deles.


— Mas deveria, se você quer ser respeitada nesse covil. —

Ellen enfiou um canapé na boca e o mastigou. — Nossa, isso está


ótimo. Você deveria comer antes de ir lá puxar os cabelos da vadia.

Henry e Stephanie foram na direção do escritório e eu cruzei

os braços.
— Espere só mais um pouquinho...

— Para pegar os dois nus? — retruquei.

Ellen riu.

— Bem, não acho que meu irmão é tão rápido assim.


— Confesso que não gostei dela desde a primeira vez que a vi.

— E ela com certeza não gostou de você. — Ellen riu e enfiou

outro canapé na boca, mastigou e disse: — Vá, já dá para impedir


essa safadeza.

Respirei fundo e me encaminhei na direção do escritório.

Não sabia se era intencional ou não, mas a porta estava

entreaberta. Então parei e tentei ouvir o que eles diziam.


— Esperei por você a semana toda... — A voz de Stephanie

era melosa, porém, calma.

— Eu falei que não sabia se continuaríamos nos vendo.


Ela bufou.

— Emmeline já deu para você?


Henry ficou em silêncio, o que foi suficiente para fazer a vadia

cair na gargalhada.

— Ela é uma puritana, Henry. E some isso ao fato de ela não o

querer. Se você conseguir algo depois do casamento, sinta-se feliz.


Ouvi então um barulho de algo caindo no chão e estilhaçando

e a voz assustadora de Henry dizendo:

— Já falei para você ter cuidado com o que diz. Não vou ter
pena de você, Stephanie.

Ela começou a tossir e foi no momento que eu abri a porta e

entrei com tudo na sala.

— Mas que diabos está acontecendo aqui?


Stephanie estava vindo na direção da porta, com as mãos no

pescoço enquanto tossia.

— Eu te desejaria boa sorte, mas acho que você vai precisar


muito mais do que isso para lidar com esse louco!

Stephanie saiu da sala e fechou a porta em um estrondo.

Levei vários segundos para me recompor. Quando isso

aconteceu, olhei para Henry, que enchia tranquilamente um copo


com alguma bebida.

— O que estava acontecendo aqui? — perguntei. — Acho que

nunca vou conseguir separar os seus dois “eu’s”. Eles são como um
só.

— Eu não sou um monstro com quem não merece — Henry


disse. — Quer beber algo?

— Não, obrigada.

Ele entornou a bebida de uma só vez.

— Eu nunca vou fazer isso com você.


— E quem me garante isso? — perguntei, elevando o tom de

voz em alguns níveis. — Você estava enforcando Stephanie. O que

é? Eu sei que ela é sua amante.


— Era. — Ele tampou a bebida e se aproximou de mim. —

Stephanie não é mais nada em minha vida. Eu tenho você agora.

— Até se cansar de mim.


— Eu nunca vou me cansar de você. — Seus olhos azuis

estavam fixos em meu rosto.

Respirei fundo.

Então disse o que eu tinha ido ali para dizer:


— Já basta você ter me obrigado a essa vida. Eu não vou

aceitar traições, Henry. Não vou ser humilhada como a maioria das

mulheres que você conhece.


Ele levou alguns segundos para manifestar alguma reação e

quando isso aconteceu, ele abriu um meio-sorriso.


— Está com ciúme?
— Eu não tenho ciúme de quem eu não amo! — retruquei,

irritada.

— Mas vai amar, um dia.


— Céus... — Dei uma risada desgostosa. — Você acha que

consegue tudo com o seu poder e influência, não é?

Henry deu mais um passo em minha direção e seu perfume


invadiu minhas narinas, deixando-me de mãos atadas.

Queria fugir dali, mas não conseguia.

— Eu consigo tudo o que quero... — Ele abaixou o rosto e

depositou um beijo em minha bochecha. — Veja só... você está


aqui. É minha noiva oficialmente e em algum tempo será a minha

esposa. E, para ser sincero, eu acho vou invadir o seu quarto esta

noite e foder você até que grite o meu nome várias e várias vezes.
Engoli em seco quando as imagens do que ele acabou de

dizer tomaram vida em minha mente.


— Eu não sou sua noiva... — Dei um passo para trás. — Não
tenho um anel.

Henry deu uma risadinha.


— Tem razão... — Ele deu a volta na mesa de mogno e abriu
uma gaveta. Tirou de lá um saquinho de veludo e voltou até mim.
Seu olhar estava fixo ao meu.
— Eu ia te dar isso mais tarde, mas acho que podemos
adiantar. — Ele se sentou na beirada da mesa e me puxou para

mais perto.
Prendi a respiração.
Henry tirou do saquinho um lindo solitário com uma pedra

vermelha grandiosa. O arco era dourado e ao lado da pedra central


havia várias outras minúsculas. Diamantes.
Era a joia mais linda que eu já havia visto em minha vida.

— Este foi o anel que minha mãe ganhou quando assumiu o


título de Duquesa de Cambridge — Henry disse enquanto deslizava
a preciosidade pelo meu dedo anelar. — Minha mãe adorava essa

joia e um pouco antes de ela morrer, deixou sob os meus cuidados.


— Henry encarou meus olhos, havia emoções ali que eu não sabia
definir. Memórias que ele guardava a sete chaves. — E agora ele

pertence a você.
Olhei para o anel em meu dedo e respirei fundo.

Parecia haver muito mais do que uma obrigação naquele gesto


de me dar o anel que pertencera à sua mãe.
Henry era uma verdadeira incógnita.
— Ela é linda... — Suspirei. — Mas... — Dei um passo na
direção de Henry, ficando apenas um palmo de distância. — O que
você quer de mim?

Os olhos de Henry me fitavam de maneira intensa.


Sua respiração estava tranquila, mesmo que seu maxilar

estivesse travado.
— Eu quero seu coração.
— Isso não é negociável.

Ele me puxou pela cintura, encaixando-me no meio de suas


pernas.
— Não se trata de um jogo de sedução, Emmeline. Você me

enlouquece desde sempre. — Seus dedos começaram a percorrer


meus braços de forma lenta, cuidadosa. — Sabe o que andei
pensando? — ele perguntou, bem próximo ao meu ouvido.

Ele abaixou a cabeça e agora seus lábios percorriam meu


maxilar.
— Não...

— Em como seria o seu gosto — ele respondeu, sem pudor. —


Se a sua boca é tão doce, só consigo imaginar como é o gosto da

sua boceta.
Nunca um homem tinha ousado falar essas coisas para mim e
era para eu estapeá-lo e sair correndo, mas por algum motivo que

eu desconhecia, estava começando a gostar de ouvi-lo dizer


aquelas coisas.
— Henry...

Sua boca encostou em meu pescoço e ele me lambeu, até


perto da minha orelha.

— Hummm...
— Por que está fazendo isso? — perguntei, arrepiada, ainda
de olhos fechados. Por algum instinto, minhas mãos foram parar em

seus ombros largos e eu os segurei com força.


— Porque eu posso — ele respondeu simplesmente. — E eu
quero fazer isso.

Henry despejou alguns beijos em meu pescoço e depois em


meu maxilar.
Suas mãos se fecharam em minha cintura e fizeram um pouco

de pressão enquanto sua boca descia pelo meu colo.


E algo que nunca senti se apossou de mim.
Um desejo violento de conhecer o que ele tinha para me

oferecer. De sentir seu corpo contra o meu, de ser mulher em todas


as suas formas.
Meu corpo estava quente, algo no meio das minhas pernas

estava latejando, pedindo por atenção e eu só queria mais. Queria a


atenção de Henry, queria que ele me guiasse por aquele caminho.
Mesmo quando eu deveria odiá-lo.

— Eu passei os últimos anos pensando no dia que eu teria o


direito de fazer isso — ele disse, seus dedos avançando no zíper do
meu vestido. — Ah, Emmeline... eu quero te mostrar tantas coisas.

— Meu vestido cedeu e ele o puxou para baixo, deixando meus


seios à mostra. — Quero mostrar que às vezes a escuridão pode

ser boa.
Sua boca desceu pelo meu colo e ele despejou beijos ao redor
dos mamilos.

Fechei os olhos, arqueei um pouco minhas costas.


Ele abocanhou um dos meus mamilos.
A sensação era... estranha, mas gostosa.

Ainda mais depois que ele começou a lamber e chupar.


Enfiei minhas mãos por dentro de seus cabelos e arqueei
ainda mais o meu corpo, querendo mais.

— Henry... — Suspirei.
Um de seus braços estava em volta da minha cintura,
segurando-me com força.
Enquanto sua língua brincava com meu mamilo, seus dedos
brincavam com outro, fazendo carícias que estavam me levando à
loucura.

Eu deveria rechaçar isso e odiá-lo com todas as minhas forças,


mas minhas pernas estavam amolecidas e eu só conseguia pensar
que queria mais. Queria descobrir cada coisa que envolvia o mundo

da sedução e se fosse Henry a me mostrar, que fosse então.


— Você é tão linda — ele disse, suas mãos descendo para
segurar a minha bunda com força. — Porra, eu não vou aguentar

esperar até o casamento.


Então eu disse algo que surpreendeu até a mim:
— Então não espere.

Os olhos azuis de Henry encontraram os meus.


Não havia o sorriso sarcástico e nem malícia.

Ele puxou meu corpete para cima novamente e fechou o zíper.


— Você não quer isso de verdade. Está falando assim porque
está inebriada com as carícias. Eu vou tê-la quando você me pedir

para fazer isso.


Levei vários segundos para processar aquela informação.
E quando isso aconteceu, dei um passo para trás, atordoada

demais para pensar em qualquer coisa.


— Você está brincando comigo, é isso? — falei, irritada.
— Não é brincadeira, Emmeline.

— Você é cruel, você é um monstro. Se acha que vai ter o meu


coração, está muito enganado!
Então virei as costas e marchei para fora da sala, sentindo-me

humilhada.
Henry estava brincando comigo.
Mas se ele achava que eu iria pedir que dormisse comigo,

estava muito enganado.


Fechei a porta e me encostei nela.
Minha respiração estava acelerada, meu coração pulando

como um louco e a sensação da boca de Henry em meus seios


latejando como nunca.
Foco, Emmeline. Você precisa ter foco para alcançar seu

objetivo final que é sua liberdade.


Eu não podia me perder.

— Meu Deus, que cara é essa? — Ellen me encontrou quando


voltei ao salão, depois de me recompor. Mas, pelo visto, não havia
sido suficiente.
— Eu odeio seu irmão.

— Ah, eu também odeio, na maioria das vezes. — Ela sorriu


para uma mulher que nos encarava. — Conseguiu espantar a

abelha?
— Ele próprio espantou quando quase a enforcou — falei
baixo, dando um suspiro.

Ellen arregalou os olhos e depois riu.


Para ela era tão natural viver dessa forma.
— Bem, venha... quero que conheça alguns de nossos primos.

— Ellen me puxou na direção de um grupo de pessoas que


conversava animadamente.
Havia uma mulher que devia ter menos de cinquenta anos. Ela

era muito elegante, com maçãs do rosto protuberantes, lábios


pintados de vermelho carmim e um olhar ágil como o de uma
raposa.

— Olá, tia Polly... — Ellen adentrou o grupo e abraçou a


mulher. — Consegui trazer a noiva para a senhora conhecer.

Os homens, assim como a mulher, me olharam da cabeça aos


pés.
Ela abriu um sorriso preguiçoso e se aproximou, levando a

mão ao meu rosto.


— Henry tem bom gosto. Você é linda, querida.
Eu não sabia se devia confiar em suas palavras, mas seus

olhos não me transmitiam qualquer sensação de desconforto. Ela


era como se fosse... uma tia que eu nunca conheci.

— Obrigada.
— Ah, vejo que Ellen já trouxe Emmeline para vocês
conhecerem. — A voz de Henry ecoou atrás de mim, então ele se

colocou ao meu lado e enganchou uma mão em minha cintura. —


Ela é perfeita, não é?
— É sim, querido. — Polly olhou para ele com adoração e

sorriu. — Sua mãe teria adorado conhecê-la.


— Emmeline, esses são meus primos. — Henry apontou para
um loiro alto com sorriso sagaz. — Richard. E este outro é David. —

Apontou para um outro que estava com o semblante sério. — Eles


moram em Birmingham com minha tia.
Cumprimentei-os com um sorriso nos lábios e ali conversamos

um pouco sobre amenidades.


A todo momento, eu me perguntava se aqueles homens
também faziam parte dos esquemas de Henry ou se eles sequer
sabiam desses negócios. A julgar pela pose da tia Polly e dos
outros, eu podia acreditar que eles gerenciavam a máfia na região
de Birmingham.

Só que ninguém falava abertamente sobre esses assuntos em


uma festa de noivado.
— E então, quando será o casamento? — Polly perguntou,

direcionando o olhar entusiasmado em minha direção.


Olhei para Henry.
Era ele quem estava louco para isso, então que respondesse.

— Logo, tia. Ainda não reservei nenhuma data, mas tenha


certeza de que será logo.

Tia Polly abriu a boca para dizer algo, mas foi interrompida
com o grito de um homem.
Foi tudo muito rápido.

Quando me virei para ver o que estava acontecendo, senti a


mão de Henry me puxando para trás de si.
Ouvi o barulho.

Fechei os olhos com força.


Gritos.
Eu ia morrer? O que estava acontecendo?
Abri os olhos a tempo de ver o homem sendo esmagado pelos
homens de Henry, que o fizeram soltar a pistola no mesmo instante.

Dei um passo para trás, horrorizada.


Henry estava na minha frente.
Mas então ele caiu de joelhos.

E eu tive tempo apenas para raciocinar de que aquela bala que


era para mim, havia atingido Henry.
Creio que quase sempre é preciso um golpe

de loucura para se construir um destino.


Marguerite Yourcenar

Henry

Doze anos antes...

— Meu lorde, desculpe interrompê-lo — Alfred entrou em meu

quarto e eu enfiei rapidamente meu caderno debaixo do travesseiro.


— Seu pai deseja vê-lo.

Um arrepio percorreu a minha espinha.

Todas as vezes que meu pai desejava me ver, não eram para
coisas boas. E eu sempre saía de lá com um hematoma em alguma

parte do corpo que ninguém conseguiria ver, por causa das roupas;
ou com minha mente apodrecida por suas palavras que feriam tanto

quanto seus gestos.


— O que ele quer? — perguntei.

Alfred suspirou.
— Não sei, meu lorde. Mas é melhor ir logo, ele não tolera

atrasos.

Levantei-me da cama, pensando se eu deveria confiar em


deixar meu caderno de desenho debaixo do travesseiro ou não.

Alfred era confiável, mas eu não tinha certeza se ele seria capaz de

manter os olhos longe do que eu desenhava e escrevia.


— Eu vou acompanhar o senhor — ele disse, ciente da minha

dúvida.

— Ok.
Saí do quarto, ajeitando as minhas roupas. Alfred vinha logo

atrás.
E a cada passo que dávamos, eu tinha certeza de que as

coisas não seriam boas.

Nunca eram quando se tratava do meu pai.

A porta do escritório estava fechada, mas Alfred a abriu e

sinalizou para eu entrar.

Meu pai me esperava atrás da grande mesa de mogno,


fumando seu charuto favorito, que ele havia ganhado do príncipe,

logo que retornou de uma de suas viagens ao continente africano.


— Até que enfim — ele reclamou ao me ver. — Pensei que eu
mesmo precisaria buscá-lo.

Fiquei em silêncio e me aproximei de sua mesa.

— Obrigado, Alfred — ele se direcionou ao mordomo. — Agora

nos deixe a sós. Certifique-se de que ninguém chegará perto desta

sala na próxima hora.

— Sim, meu lorde. — Alfred fez uma reverência profunda e se


foi.

A cada segundo meu coração batia descompassado e a

sensação de pânico se apoderava.

O que é que ele queria de mim agora?

Eu não tinha feito nada de errado. Era cúmplice em seus

negócios ilícitos, estava aprendendo cada vez mais sobre a sua

segunda vida e ainda fazia companhia a Colin e Emmeline enquanto


ele fodia a mãe deles em troca de dinheiro e sustento. Eu sabia

atirar em pássaros, sabia me dar bem nas brigas e sem falar que eu

estava indo bem no colégio, com notas altíssimas e uma boa

perspectiva para a faculdade.

Olhei para um canto da sala e meu cachorro Bones estava

deitado, descansando a cabeça sobre as patas. Assim como eu, ele


também não gostava de ficar com meu pai.
Só que naquele dia ele estava estranhamente silencioso.

— Henry... recebi suas notas esses dias, você está indo muito
bem na escola — papai disse, erguendo alguns papéis. —

Cambridge será uma boa escolha.


— Quero ir para Oxford.
— Todos os Spencer foram para Cambridge e você não será

diferente — ele me cortou. — Escute, na verdade, pedi que viesse


aqui por outro motivo.

Os olhos azuis do meu pai me fitaram por longos instantes,


então ele disse:

— Qual é o tipo de interesse que você tem na garota Jones?


Emmeline.
— Nenhum. Por quê?

Meu pai jogou a cabeça para trás e riu.


— Não me engane, moleque! — Então ele socou a mesa e me

fez dar um pulo. — Eu sei que vocês são amiguinhos. Eu sei que
você não tira os olhos da garota. Eu sei que sua mente está

planejando algo para ela. Você é meu filho, eu estranharia se não


tivesse planos.
— Eu não tenho planos para Emmeline! — retruquei, irritado.
— Até a forma como você diz o nome dela é diferente... —

Papai coçou o queixo. Fumou o charuto mais algumas vezes. —


Você sabe que eu tenho planos para ela, não sabe? Ela é valiosa,

meu filho...
De repente, o pânico assolou as minhas veias e eu me

aproximei da mesa com fúria.


— Você não vai fazer nada com ela!
— Quero ver quem vai me impedir.

Eu sabia que se Emmeline caísse nas mãos do meu pai, sua


vida estaria acabada.

— Você não vai colocar as mãos nela! — gritei, nervoso. —


Mamãe pediu que eu cuidasse de Emmeline e é isso que vou fazer!
Nem que eu precise matá-lo para isso.

Papai me encarou por longos instantes com o charuto


pendurado na boca.

Eu nunca havia gritado com ele.


Eu nunca havia o ameaçado, embora, no fundo do meu ser, eu

sonhasse com o dia que enfiaria uma bala em sua cabeça.


Ele iria me espancar, eu tinha certeza.
Fechei os olhos, esperando que ele pulasse da cadeira e

desferisse socos e chutes em mim, como ele costumava fazer


quando eu desobedecia a alguma ordem.
Mas não veio nada disso...
Então ouvi sua gargalhada. Começou fraca e aumentou.

Abri os olhos, porque... diabos, ele não iria me bater? Era


assim que Charles Spencer resolvia seus problemas comigo.

— Você realmente a quer ou é apenas uma promessa ridícula


que fez à idiota da sua mãe?
— Não fale assim da mamãe! — Mandei a paciência ao inferno

e pulei em cima da mesa, puxando meu pai pelo colarinho da


camisa. — Não se meta com Emmeline e não ofenda a memória da

minha mãe!
Eu o odiava com todas as minhas forças.

— Chefe, está tudo bem aí? — A voz de um dos capangas do


meu pai ecoou da porta enquanto eu bufava de ódio e ele me olhava
apenas com frieza.

— Será que ninguém entende a porra das minhas ordens


nesta casa? — papai gritou. — Não quero que ninguém interrompa

a minha conversa com meu filho!


O filho da puta, que eu também odiava por cumprir cegamente
as ordens do meu pai, resmungou alguma coisa e então saiu da

sala.
Soltei meu pai e dei alguns passos para trás.
Papai ajeitou a gravata.
— Acho nobre de sua parte agir desta forma, porém, você

sabe que eu não gosto de perder. Emmeline será uma mulher muito
bonita no futuro, apesar de ter alguns traços do filho da puta do pai.

Mesmo assim, ela ainda herdou a beleza da mãe e é isso o que


importa... — Ele abriu um sorriso malicioso. — Entretanto, você será
o meu herdeiro e eu me importo com o seu futuro. Você a quer?

Podemos fazer um acordo.

Eu sabia que se meu pai descobrisse meu interesse por


Emmeline, usaria isso para me atormentar. O problema era que eu

não esperava que ele descobrisse tão rápido.

— Que tipo de acordo?

Papai sorriu.
— Você vai me entregar a sua alma. Vai fazer tudo o que eu

mandar, inclusive, aquilo que sempre se recusou, por ir contra os

seus princípios. — Ele se levantou, deu a volta na mesa e veio em


minha direção. — Você irá se afastar de Emmeline, irá se iniciar na

Brandy Blood e será digno de me suceder.

Papai queria me ver matando uma pessoa.


Ele dizia que em outras gangues, máfias, garotos mais novos

que eu, já haviam sido iniciados.


— Você é apenas um moleque mimado. — Ele me encarou de

perto, com seus olhos de assassino. — Mas essa garota... esse

desejo de protegê-la... de cumprir um maldito desejo... é um


vislumbre do seu potencial. E acredite, eu quero explorá-lo agora

que consegui perceber isso. Basta você me entregar a sua alma.

— Se eu fizer isso, você vai deixar Emmeline em paz? —

perguntei, desconfiado. — Vai deixá-la crescer até ter a idade de se


casar comigo?

Papai deu uma risadinha.

— Sua mãe e essas regras tolas que ela trouxe do buraco em


que veio... — Ele suspirou. — Sim, Emmeline ficará em paz até ter a

idade para que você se case com ela. Claro, se for esse o alvo que

você quer ter nas costas por causa de uma promessa idiota.
— Ok, eu aceito.

Papai me encarou por longos instantes, abriu um sorriso e

então pegou a pistola que estava no coldre dentro de seu casaco e

me estendeu.
— Então me prove que você está falando sério.

Olhei para a arma sem entender.


— Pegue-a.

Engoli em seco.

— Está com medo? — ele perguntou, diabolicamente. — Eu


posso fazer com que as coisas sejam piores.

Peguei a pistola. Odiava quando ele me tratava como se eu

fosse uma criança inocente.

— Ótimo. — Ele sorriu e deu um passo para trás de mim. Suas


mãos vieram até as minhas e ele ergueu o braço em que eu

segurava a pistola. — Você quer a garota, Henry?

Eu olhava para a arma em minha mão.


— Quero.

— Então atire.

Meus olhos focaram no alvo e meu coração quase parou ao

ver Bones me olhando.


— O quê? — Tentei dar um passo para trás e abaixar a mão,

mas meu pai a segurou com força.

— Você quer ou não quer a garota? Se não fizer o que estou


mandando, eu vou garantir que a vida daquela garota seja um

inferno! — ele disse rispidamente em meu ouvido. — Se quer ter o

controle da vida dela, seja homem e faça o que estou mandando.

Agora, se você é um covardezinho de merda, saia da minha sala,


mas esqueça a garota. Eu vou tratar de você nunca colocar as mãos

nela, porque eu vou mandá-la para o lugar que ela pertence.


A essa altura, meu peito doía e o desespero já havia tomado

conta das minhas veias.

As lágrimas rolavam pelo meu rosto.


— Atire, Henry.

— Pai, por favor...

— Se você não está disposto a se sacrificar por ela, você não

é digno de tê-la. — Sua voz estava colada ao meu ouvido,


atormentando-me. — Se você não é capaz de cumprir uma ordem,

nunca será digno de herdar esse império.

Fechei os olhos.
Minha boca estava seca. Eu queria fugir, queria correr. Queria

ter nascido em outro lugar, com outra família.

— Atire, Henry.

Eu não podia fazer isso, era crueldade, era absurdo. Era


loucura!

— Você é um fraco, um merdinha. Nunca será digno dela, eu

vou fazer com que todos saibam o que você é, e acredite, seus
amigos vão atormentar a sua vida enquanto você estiver neste

mundo, Henry.
Eu tremia por inteiro.

Lembrei-me da minha mãe, que morreu de desgosto pelo seu

casamento com meu pai.

Um casamento infeliz, que a adoeceu ao longo dos anos.


Eu não queria ser como meu pai, mas não havia muitas

escolhas para mim. Se eu não seguisse seus passos, seria

pisoteado pelos outros, porque ele faria questão disso.


— É só um maldito cachorro — ele disse.

Era o meu cachorro, que ganhei de presente da minha mãe no

meu décimo aniversário.

Era o único elo que eu ainda tinha com ela e talvez fosse por
isso que meu pai queria destruí-lo. A compaixão, o amor, tudo isso

que eu havia herdado, ele queria arrancar de mim.

— Se você quer a garota, faça o que estou dizendo!


Apontei a arma e os olhinhos marrom me olharam sem

entender o que estava acontecendo.

Fechei os olhos.

Respirei fundo.
Eu iria direto para o inferno.

Então, mesmo com toda a dor em meu peito, apertei o gatilho.


Sim, eu estou infinitamente
Desmoronando

E virando do avesso
Hysteria – Muse

Emmeline

— Emmeline, espere! — Colin segurou meu braço quando eu

fiz menção de acompanhar Henry e seus homens até o escritório. —


Melhor deixá-lo a sós.
— A sós, porra nenhuma! — gritei, soltando-me de seu aperto.

— Eu sou a noiva dele! — Ergui a mão com a aliança, irritada e

frustrada, independente se havia centenas de pessoas me


encarando. — Eu vou acompanhá-lo!

Colin não discutiu.

Virei-me na direção de onde alguns homens seguravam Henry


e o levavam e fui atrás.
A festa havia acabado.

Colin iria cuidar do homem que atirou em Henry.


Mas agora Henry precisava de cuidados.

Ele foi colocado sentado no sofá enquanto jorrava sangue da

lateral de sua cintura. Henry apertava com força, mas o


sangramento não parava.

Havia uma correria dos homens, Nathan estava chamando o

médico da família.
Aproximei-me de Henry e me ajoelhei ao seu lado no sofá.

— O que precisa de mim? — perguntei, levando a mão ao seu

ferimento. — Quer que lhe traga uma bebida?


— Bebida seria ótimo. — Henry estava soando frio. Seu rosto

se retorcia de dor. Levantei-me para ir pegar, mas ele puxou a


minha mão. — Não, fique aqui comigo.

Assenti e fiquei ao seu lado.

A porta se abriu com violência e o médico que havia cuidado

de mim, dias antes, entrou com tudo segurando uma maleta.

— Porra, Henry... você vai ter que ir para o hospital.

— Sem hospital! — Henry gritou de volta. — É só uma bala.


Você consegue resolver isso.
— E se perfurou algum órgão? — Ele me olhou com desgosto.
— Pelo amor de Cristo, homem. Qualquer dia desses, você vai se

matar.

— Cale a boca e dê um jeito nessa porra.

O médico tirou da bolsa uma tesoura e cortou a camisa de

Henry. Afastei-me para que ele tivesse a liberdade de trabalhar no

ferimento em paz.
— Vamos ficar do lado de fora, chefe — Nathan disse.

— Diga ao Colin para não matar o desgraçado — Henry disse,

com dificuldade. — Diga que o quero vivo. Entendeu?

Nathan assentiu, então olhou para mim e balançou a cabeça

negativamente como se eu tivesse sido a autora e metido uma bala

no crânio de seu chefe.

— Hey, não faça essa cara. — O segui até a porta, irritada. —


Não fui eu que atirou em Henry.

Nathan tirou uma pistola da cintura e bufou.

— Você é problema, garota. Não é a primeira vez que ele

quase perde a vida por sua causa.

— O quê?

Nathan balançou a cabeça e se afastou pelo corredor.


— Procure saber sobre o seu passado. Você terá suas

respostas.
Fiquei parada na porta por vários segundos digerindo aquela

informação.
— Emmeline, venha cá. — Ouvi Henry me chamando. — Fique
aqui comigo, por favor.

Fechei a porta, respirei fundo e olhei para ele.


Henry tinha entrado na frente da bala que era para ser minha.

Mas por quê?


Havia tantas perguntas sem respostas...

Aproximei-me dele, estirado no sofá, enquanto o médico fazia


os procedimentos corretos, sentei-me na beirada e quando ele
estendeu sua mão grande e fria, eu não recusei.

Entrelacei nossos dedos.

— Eu posso descer para me alimentar, Emmeline... — Henry


puxou o lençol e fez menção de se levantar da cama, mas o impedi,
colocando a bandeja em seu colo.
— O médico mandou você ficar em repouso por, no mínimo,

quinze dias.
— Eu vou enlouquecer se ficar mais um dia nesta maldita

cama — ele resmungou.


Dez dias se passaram desde o acontecido e eu estava

cuidando de Henry como se fosse sua enfermeira particular.


Ele não havia me pedido isso e nem eu sabia exatamente por
que estava fazendo, mas eu sabia que queria fazer aquilo e eu

achava que, no fundo, ele também gostava.


Então quando Henry começava a comer, eu me sentava em

uma cadeira ao lado da cama e lia um livro.


— O que está lendo hoje? — ele perguntou, enquanto cheirava
a comida.

— A Bela e a Fera... — falei, olhando para a capa do livro. —


Achei na sua biblioteca. É a mesma edição que Melanie me deu

antes de...
As palavras morreram na minha boca.

Henry mastigou a carne do ensopado, depois disse:


— Leia um trecho para mim, por favor.
— Ahn, bem... esta versão é a original, escrita por Madame de

Villeneuve em 1740 e diz assim: “Pelos elogios insensatos que me


faz, julgo que deseja que eu me case com ele; me aconselharia a
satisfazê-lo?”, perguntou Bela ao desconhecido. “Ai de mim! Se por
um lado ele é tão encantador quanto horrendo, você trancou o meu

coração não só para ele, como para qualquer outro, e não me


acanho de confessar que não posso amar senão a ti.” Uma

confissão tão encantadora não fez senão lisonjeá-lo, mas sua


resposta foi simplesmente: “Ame quem a ama, não se deixe
enganar pelas aparências e liberte-me da prisão.”

— E, no final das contas, o desconhecido era apenas o seu


príncipe.

Fechei o livro, com interesse renovado.


— Você conhece essa versão?

— Conheço. — Henry me encarou. Seu rosto estava marcado


pela barba por fazer, dando-lhe um aspecto ainda mais cruel,
porém, elegante e sexy. — E não foi Melanie quem lhe deu aquela

versão, fui eu.


— O quê?

Henry desviou o olhar para a enorme TV em frente à sua cama


e respirou fundo.
— Era o seu aniversário de 20 anos e eu queria que se

lembrasse de mim. Porém, pelo visto, sua amiga decidiu que o


presente era dela.
Melanie realmente não gostava de livros e, até aquele
momento, eu sempre me perguntei por que e como ela decidiu me

dar aquela versão de uma história que eu sempre gostei desde


criança.

A resposta estava ali.


Meu Deus, como eu fui ingênua.
— De certo, ela deve ter mentido para mim em um monte de

coisas.

Henry me encarou.
— Sinto muito.

Apesar de tudo, eu ainda não conseguia desejar algo ruim

para Melanie.

— Me diga que ela está bem.


Henry sabia sobre o que eu estava falando.

Ele bufou.

— Ela está. Depois que Colin lhe drogou, ele voltou e impediu
que os homens fizessem algo com ela. Claro, agora ela está com

medo até da própria sombra, mas vai ficar bem com o tempo.

Alívio preencheu meu coração e eu finalmente pude respirar


em paz.
Sobre William, eu nem perguntaria, porque eu não queria tocar

neste assunto e arruinar tudo.


William...

Fazia tempo que eu não pensava nele.

Eu sequer me lembrava de como era ter seus lábios nos meus.


Minha mente estava cada vez mais preenchida com a imagem

de Henry, seu corpo forte, alto e quente contra o meu. Suas mãos

me segurando, seus lábios me beijando...

— Não aguento mais comer sopa, Emmeline. — Henry me


trouxe de volta com sua reclamação. — Por favor, tire isso daqui.

Levantei frustrada e peguei a bandeja.

— Você é um reclamão. A sopa está deliciosa.


— Quero ver você dizendo isso após passar vários dias

comendo a mesma coisa — ele disse enquanto eu levava até uma

escrivaninha. — Vem, sente-se aqui comigo e continue lendo, eu


gosto de ouvir a sua voz.

Henry estava batendo no espaço vazio ao seu lado na

gigantesca cama de dossel.

Durante esses dias que eu estava cuidando dele, várias vezes


fui assolada por pensamentos pecaminosos. Lembrando-me de seu

corpo por cima do meu, sua boca em meus seios...


E vê-lo nu da cintura para cima não ajudava em nada a

controlar meus pensamentos.

— Ok.
Peguei o livro em cima da cadeira e dei a volta na cama. Tirei

os sapatos e me sentei ao lado de Henry.

O calor de seu corpo foi um alívio e eu quase suspirei quando

seu braço forte passou por cima do meu ombro.


Ele soltou um gemido.

— Hey, cuidado — falei, levando a mão ao seu ferimento

coberto por uma gaze nova. — Não pode forçar para não abrir e
sangrar novamente.

— Não vai abrir. — Henry não tirava os olhos de cima de mim.

— Por que não se deitou comigo todos esses dias? Você sabe que

eu não poderia ter feito nada enquanto estivesse dopado de


remédios.

— E agora você não está?

Seu sorriso se tornou malicioso.


— Agora não...

— Então talvez eu devesse ir para longe.

Henry jogou a cabeça para trás e riu.


— Você é adorável, Emmeline. Anda, leia... quero ouvir o

restante.
Abri o livro e respirei fundo, consciente de sua presença, de

seu calor e de seus olhos azuis em cima de mim, observando-me,

querendo-me.
Então comecei a ler.

E foi assim que, depois de um bom tempo, Henry adormeceu

e, ao invés de levantar e sair dali, deixei meu corpo quentinho

colado ao dele e adormeci, com a proteção de seu braço ao meu


redor.

Abri os olhos lentamente.


Não fazia ideia de que horas eram, mas devia ser tarde. Ainda

estava escuro e o quarto era iluminado apenas pelas luzes das

arandelas e os abajures.

Foquei minha visão à frente da cama e então o vi.


Ele estava se vestindo.

— O que está fazendo? — perguntei, tentando me levantar.


Henry deu a volta na cama e segurou meu rosto entre as

mãos.

— Preciso sair, mas volte para o seu quarto. Tranque a porta...

— Seus olhos continham um aviso. — Não me espere acordada,


Emmeline.

— Aonde você vai? — perguntei, assustada. Henry soltou meu

rosto e abriu a terceira gaveta da mesa de cabeceira, de onde tirou


uma pistola preta, bonita. — Meu Deus, Henry! Você não pode sair

ainda. O médico disse que...

— O médico não sabe de nada. — Ele abriu o tambor e

verificou quantas balas tinham. — Faça o que eu disse, Emme. Não


é uma ordem, mas... é um pedido. Não quero machucá-la quando

eu voltar.

Abri a boca para retrucar, para impedir o que estava em sua


mente, mas Henry já tinha virado as costas e saído do quarto.

Achei que era um pesadelo no qual eu acordaria em breve,

mas no fundo eu sabia que não.

Henry era real e o seu desejo por sangue também.

~
O relógio em cima do rack marcava três horas da manhã e

apesar de Henry ter dito que era para eu me trancar em meu quarto
e ir dormir, a verdade era que eu andava de um lado para o outro,

sem conseguir pregar os olhos.

Já fazia três horas que Henry havia saído e tudo me

preocupava.
O que ele tinha ido fazer, seu ferimento que podia se abrir...

Henry me enlouquecia, de uma forma ou de outra.

E eu não podia fazer nada a não ser esperar.


O celular que ele me deu, eu ligava e só caía na caixa-postal.

Eu não podia nem mesmo acordar Ellen, porque, céus, eles iriam

me achar louca. Na cabeça de todos desta casa, Henry era quem


era e o que ele fazia, era como seguir o roteiro de um filme.

Foi então que ouvi a porta da frente se abrindo.

No meio da madrugada, com tudo apagado, podia-se ouvir os

sons mais inusitados.


Ouvi os passos subindo os degraus.

Olhei para a fechadura da minha porta. Ele tinha mandado

trancá-la.
Eu deveria fazer isso...

Mas, por alguma razão, eu não queria trancar.


Os passos começaram a se aproximar pelo corredor.
O quarto de Henry ficava do outro lado. Ele estava vindo até

mim.

Para mim.
Conforme ele se aproximava, dei passos para trás, até minhas

pernas encostarem na beirada da cama.

A maçaneta girou lentamente.


A porta se abriu.

Prendi a respiração.

Os olhos azuis de Henry encontraram meu rosto, mas eu não

sabia definir o que havia neles.


Eu não sabia definir quem era aquele homem à minha frente.

Seu peito subia e descia com a respiração acelerada. Seus

cabelos estavam bagunçados. Ele estava um caos humano. A roupa


suja de sangue em várias partes.

As mãos vermelhas.
Ele se aproximou lentamente.
— Eu disse que era para trancar essa porta, Emmeline. — Ele

parou na minha frente e eu tentava respirar com calma, mesmo que


todos os meus poros exalassem medo. Suas mãos sujas vieram ao
meu rosto e ele segurou com um pouco de pressão. — Se eu peço,
você não faz, se eu ordeno você também não faz. Que porra você
quer fazer com a minha vida? Quer foder o meu juízo, é isso?
Seu rosto se abaixou até o meu e ele passou o nariz pela

minha bochecha.
— Henry... — Tentei trazê-lo de volta a si, mas ele parecia
entorpecido.

Ele se afastou um pouco, então suas mãos grudaram em


minha cintura e me puxaram para si.
— Henry... o que aconteceu?

Henry abaixou a cabeça e seus lábios capturaram os meus em


um beijo violento. Ele não esperou nem que eu retribuísse, porque
sua língua invadiu a minha boca e ele me provou com toda a luxúria

que um homem pode guardar dentro de si.


— Preciso de você, Emme.
Suas mãos foram para a minha bunda. Ele a apertou com

força e puxou minhas pernas para circundar a sua cintura. No


mesmo instante, joguei os braços ao redor de seu pescoço e devolvi

o beijo na mesma violência.


Era assustador como meu corpo respondia às suas carícias
imediatamente. Era assustador que ele conseguisse me deixar

excitada com somente um beijo.


Mas então a consciência voltou com força.
Henry estava sujo de sangue...
Eu não podia me entregar desta forma, para um assassino.

Para um homem que se deliciava em atormentar outras pessoas.


A consciência de que eu não fazia parte daquele mundo, de

que eu havia sido arrastada para ele mesmo sem querer.


Endureci meu corpo e Henry sentiu na mesma hora.
Seus olhos me encararam, mas agora eu conseguia distinguir

seus sentimentos:
Mágoa, rejeição.
Ele me soltou no chão e deu uma risada de escárnio, enquanto

apoiava os braços na coluna da cama e me olhava como um animal


ferido.
— Peço perdão se você não pode lidar com um homem como

eu, Emmeline. — Sua voz estava carregada de fúria. — Eu esqueci


o quanto você é frágil.
— Eu não sou frágil... — retruquei, irritada.

Henry se afastou e as suas próximas palavras foram como um


tapa em meu rosto:

— Tem razão. Eu acho que... você é a pior escolha que eu já


fiz na minha vida.
Dizendo isso, Henry virou as costas e bateu a porta com força
ao sair.

Eu não era frágil. Ele estava muito enganado.


Eu apenas estava... confusa. Meu corpo desejava suas
carícias, mas a minha mente entrava em um conflito infernal ao

pensar em tudo o que aconteceu para que eu chegasse ali.


Abri a porta para ir atrás dele, mas quando cheguei ao meio

das escadas, ele já estava saindo pela porta da frente.


Mas que inferno!
Belas criaturas, você e eu
Toda vez que nos tocamos é perigoso

Essa faísca é mais do que química


Belos mentirosos, afundando
Toda noite brigamos e é quente como um inferno

Mas parece um paraíso debaixo dos lençóis.


Monster in me – Little Mix

Emmeline

— Colin, pelo amor de Deus... me diga onde Henry está —

falei ao celular enquanto andava de um lado para o outro em meu

quarto. — Ele saiu sem dizer para onde ia e ele está machucado,
cheio de sangue. Meu Deus, você deve saber de alguma coisa!

Encostei na porta e escorreguei lentamente até o chão.

— Que porra, Emmeline. Eu não posso dizer onde ele está.


— Por quê? — Meu coração batia acelerado. — Ele me deu

este celular para quando eu quisesse localizá-lo. E já que ele não


me atende, você precisa dar um jeito.

Colin murmurou outro palavrão.

— Primeiro porque eu não faço ideia de onde ele está — ele


disse, bravo. — Segundo porque eu nem sei se ele quer que você

saiba sua localização.

— Eu sou a porra da noiva dele! — gritei.


— Então devia ter pensado antes de tê-lo magoado.

Fiquei em silêncio pensando nas palavras de Colin. Quando

liguei para ele, eu não tinha dito nada sobre a briga.


Como diabos ele sabia?

— Você está com Henry, não está? — perguntei chorosa. —


Por favor, eu preciso falar com ele. O ferimento... vai abrir e, meu

Deus, ele pode morrer.

— Ele não vai morrer. Henry já passou por isso. — Colin

respirou fundo. — Eu vou dizer onde ele está, mas promete que não

vai surtar?

— Prometo.
Colin respirou fundo.

— Está no Garrick’s. O pub que você já visitou antes.


— Ele está sozinho?
Por algum motivo, a perspectiva de imaginar Henry se

aliviando com outra mulher me irritou profundamente.

— Ainda não.

— Como assim “ainda não”?

— Henry mandou buscarem... Stephanie. — Ele bufou. —

Chega dessa conversa, eu vou desligar. Se ele souber que te falei


essas coisas, vai infernizar a minha vida. Vá descansar, depois

vocês conversam.

Colin se despediu e encerrou a ligação.

Lágrimas vieram aos meus olhos.

Ódio, raiva, frustração.

Era assim que ele iria resolver os problemas quando

brigássemos? Nos braços daquela vagabunda?


Deixei o celular de lado, amarga com a minha própria vida.

Não havia outro caminho para mim, por que eu simplesmente

não aceitava tudo o que me era imposto e seguia feliz por, pelo

menos, ter um homem como Henry me desejando?

Bati minha cabeça contra a porta algumas vezes.

Ah, mas se esse filho da puta pensava que isso iria ficar dessa
forma, ele estava muito enganado.
Eu já tinha atrapalhado seu encontro com Stephanie uma vez,

poderia atrapalhar uma segunda.


Se ele achava que eu era a pior escolha que já fez na vida, eu

ia mostrar que ele tinha razão.

Encontrei Nathan dormindo na biblioteca.

— Hey, acorde! — Joguei um livro em cima dele, que pulou de


susto e já puxou a pistola da cintura, apontando em minha direção.

— Meu Deus, o que é isso? — perguntou, atordoado. — Não


faça isso, garota. Eu podia ter atirado em você.

— Depois você teria que se ver com Henry — falei, enfiando o


celular dentro de uma bolsinha. — Vamos, quero que me leve ao
Garrick’s.

Nathan guardou a pistola e deu uma risadinha.


— Quer ir lá para desmaiar de novo?

— Não interessa o que vou fazer lá — retruquei. — Apenas


quero que me leve agora.
— São quatro horas da manhã, garota.
— Eu vou ter que reclamar com Henry que você não consegue

seguir as minhas ordens?


Nathan arregalou os olhos verdes e se aproximou de mim,

agigantando-se na minha frente com seu peitoral definido e


músculos de dar inveja a qualquer homem comum.

— Eu não sigo as suas ordens.


— Mas deveria, eu sou a noiva do seu chefe.
— Será que vamos ter casamento, mesmo? — Ele ergueu

uma sobrancelha em forma de deboche. — Se não me engano, ele


acabou de mandar alguém ir buscar a amante... — Ele estalou a

língua e seu dedo indicador brincou com meu cabelo. — Acho que
você não vai dar conta, queridinha.
— Cale a boca, seu imbecil! — gritei, afastando-me. — Vamos!

Não vou repetir.


Nathan ainda continuou me olhando por vários segundos, mas

foi até a cadeira onde estava dormindo antes e pegou seu terno,
vestindo-o com rapidez.

— Se eu fosse o chefe, já teria dado um jeito em você...


Ele foi na frente enquanto mandava uma mensagem de voz
para algum outro comparsa encontrar-nos na frente da casa com o

carro.
Segui-o, ciente de que eu poderia chegar muito atrasada e
flagrar algo que eu realmente não queria ver.
Eu odiava Henry.

O Garrick’s estava exatamente como da última vez que apareci

aqui.
Só que agora, havia muito mais pessoas. Homens que
deixavam suas famílias em casa para se divertirem com as

prostitutas que lhes eram oferecidas em uma bandeja.


— Henry deve estar em seu quarto privado... — falei por cima

das batidas da música ensurdecedora.


— Não, queridinha — Nathan disse em meu ouvido. — O
chefe está bem ali, apreciando aquelas belezinhas...

Olhei na direção do palco onde mulheres nuas dançavam e


esfregavam-se em canos que iam da base até o teto. Algumas

usavam penduricalhos nos seios, outras estavam completamente


sem roupas.

Era um show e elas se revezavam na dança, se é que eu


podia chamar assim. Havia outros homens em volta, oferecendo
dinheiro e outras coisas. Havia um sofá na frente daquele palco e eu
vi a cabeça com a cabeleireira preta, prestando atenção ao show
enquanto uma outra estava sentada ao seu colo, esfregando os

peitos em seu rosto, despejando beijos em seu pescoço.


Senti-me humilhada.

Queria virar as costas e sair dali, nunca mais olhar para o rosto
de Henry e nunca mais voltar em um lugar como aquele.
Mas eu não podia me recolher ao meu mundinho como estava

fazendo desde que fui levada para a mansão.

Chega.
— Nathan. — Puxei a manga de seu terno. O safado já estava

alisando a bunda de uma das garçonetes. — Vá ao seu chefe e diga

que estou aqui. Diga que quero falar com ele agora.

— Tá bom, espere aqui — ele disse, mas antes de sair, deu


uma olhada para o sujeito da cicatriz, que estava logo atrás de mim.

Nathan se foi e observei quando ele se abaixou até Henry e

cochichou em seu ouvido. Logo depois, Henry cochichou algo de


volta. Nathan assentiu e depois voltou.

— Vamos. — Ele me puxou pelo braço em direção à saída. —

As ordens são de levar você para casa.


— O quê??? — gritei, me afastando de seu aperto. — Eu não

vou voltar porra nenhuma!


Meu sangue estava fervendo de ódio e eu só queria esfregar o

rosto de Henry no chão. Fazê-lo sofrer pelo menos um pouquinho.

Como ele podia me tratar assim?


— Eu não vou discutir com você, garota! — Nathan me puxou

de volta.

E foi nesse momento que uma ideia absurda se formou em

minha mente.
— Espere, eu vou! Mas preciso ir ao banheiro, estou muito

apertada.

Nathan trocou um olhar com o sujeito da cicatriz e assentiu.


— Vá logo, vamos esperar do lado de fora.

— Não precisa, podem esperar aqui... — E foi quando uma

outra garçonete toda sorridente se aproximou e foi suficiente para


roubar a atenção dos idiotas.

Então eu aproveitei e enquanto ia para o banheiro, fiz um

pequeno desvio.

~
O camarim das garotas era como eu imaginava.

Uma bagunça, mulheres rindo e falando sacanagens enquanto

se pintavam em frente aos espelhos das penteadeiras.


— Nossa, não sabia que tinha garota nova na área. — Uma

mulher que parecia mais velha se aproximou e me olhou da cabeça

aos pés. — Qual é o seu número?

— Meu número? — perguntei, confusa.


Elas nem imaginavam quem eu era.

— Sim, garota. Que horas você vai entrar?

— Eu... — Engoli em seco. — Entro em dez minutos.


— Meu Deus. — Ela arregalou os olhos. — Então se troque

logo. Já sabe o que vai vestir?

Ela apontou para um armário de lingeries ousadas.

Minha intenção era apenas entrar no palco e chamar a atenção


de Henry de alguma maneira, mas aquilo... era a cereja do bolo.

Ele ia me odiar mais ainda.

— Posso escolher? — perguntei.


A mulher deu de ombros.

— Não restou muitas, porque a maioria já foi usada em outros

números da noite, mas vá, escolha e se vista logo.


Aproximei-me do armário e comecei a vasculhar entre as

roupas que haviam sobrado.


Havia na parte de baixo sapatilhas e... uma sapatilha de

bailarina.

Meus olhos brilharam no mesmo instante.


Peguei a menor lingerie que vi na frente e as sapatilhas.

Fui para trás de um bimbo e me vesti, nervosa pelo que eu

estava prestes a fazer.

Onde eu estava com a cabeça, pelo amor de Deus?


Talvez fosse resultado da raiva, do ódio, da frustração e todos

os sentimentos perversos que existiam no mundo. Na verdade, eu

não sabia o que estava me movendo naquele momento, mas sabia


que era aquilo que eu precisava fazer.

Quando terminei e me olhei no espelho eu estava...

Linda.

Sexy.
Como eu nunca tinha me visto.

A calcinha era apenas um fio dental, mas o que veio por cima

era como um vestidinho de renda. Deixava à mostra minha barriga


lisa e levantava meus seios, dando-lhes o aspecto de serem

maiores.
— Pronta, garota? — A mulher apareceu e quando me viu,

arregalou os olhos. — Caralho, você é bonita, hein. O chefe vai

gostar. Ele está na primeira fila hoje assistindo aos números.

— Então vamos agradar a porra do seu chefe — murmurei.


Saí do biombo e segui a mulher pelo corredor que levava até o

palco.

Meu coração batia como louco.


Mas agora não tinha volta.

Por sorte, o palco estava escuro na parte de trás, a luz neon

azul concentrada apenas nas meninas que dançavam na frente.

Havia uma movimentação de homens no fundo da casa e eu


só podia imaginar que os idiotas estavam me procurando.

Então as luzes trocaram de cor para rosa pink e foi quando a

mulher me empurrou.
— Vá, é a sua vez.

Entrei no palco timidamente.

Henry estava beijando o pescoço de uma garota nua em seu

colo enquanto sua mão grande acariciava um dos seios dela.


A MESMA MÃO QUE ACARICIOU OS MEUS.

Filho da puta.

Eu o odiava.
Eu não sabia sensualizar, mas uma coisa que aprendi muito

bem foi o ballet.


Aqueles pervertidos iriam assistir a uma peça de ballet naquele

instante.

Então comecei os meus passos, tão bem ensaiados por tantos

anos. Passos que deveriam ter me levado para a Academy Royal de


Ballet. Que poderiam ter me levado à Rússia.

Passos que ficariam somente na minha memória assim que a

aliança de Henry entrasse em meu dedo.


Ouvi um burburinho das meninas, que olhavam para mim,

impressionadas por meus passos. Eu levantava a perna, dava saltos

e giros, como se eu estivesse no palco do Bolshoi.


E foi em um desses momentos que Henry ergueu a cabeça.

Seus olhos vieram de encontro aos meus.

Houve o reconhecimento.

Ele congelou no lugar.


Não sabia se ele estava com raiva ou se me desejava porque

seus olhos eram uma faísca e eu estava sendo a gasolina jogada a

seu favor.
A música era alta e isso me dava mais confiança no que eu

estava fazendo.
Homens começaram a gritar absurdos.
E foi nesse momento que Henry pareceu voltar a si.

Ele empurrou a mulher de seu colo e sua face transtornada de

ódio completamente direcionada a mim.


Henry se levantou e pulou em cima do palco e como um

verdadeiro animal me segurou pelas pernas, jogando-me em seu

ombro.
Os homens reclamaram, mas enquanto ele se afastava comigo

em seus ombros, eu conseguia sentir seu ódio. Vi também o olhar

assustado de Stephanie que, pelo visto, havia acabado de chegar e

não estava acreditando no que seus olhos estavam vendo.


Ergui o dedo do meio e abri um sorrisinho.

Hoje não, sua filha da puta.

Henry me levou ao seu quarto, no qual eu tinha desmaiado da

outra vez.
Quando passamos pela porta, ele a bateu com força e depois
me jogou na cama como se eu fosse um saco de lixo.
— Mas que caralho foi isso que acabou de acontecer??? —
ele gritou, afastando-se até uma mesinha que tinha uma garrafa de
bebida. Tirou a arma que estava em sua cintura e a descansou lá.

Depois encheu um copo.


— Eu queria falar com você, foi o único meio que encontrei
de... — Henry voltou e segurou meu maxilar com força.

— Eu não quero falar com você.


— Mas eu quero! — Empurrei-o e me afastei na cama. — Não
queria falar comigo, mas foder com Stephanie queria, não é?

— Ela não me rejeita pelo que sou! — Seus olhos estavam


injetados de ódio. Henry deixou o copo de lado e pulou na cama,
vindo para cima de mim. — Stephanie gosta do meu toque, gosta

dos meus beijos. — Seu rosto estava acima do meu e eu só


conseguia sentir seu hálito de bebida. — Stephanie e qualquer outra
mulher aqui neste lugar dariam tudo para estar no seu lugar. Mas

você... é só uma garota mimada que eu tive o infeliz desprazer de


cruzar o caminho.

Henry me olhou com tanto nojo que suas palavras vieram


direto para o meu orgulho.
Ele se afastou, saiu da cama e pegou o copo de bebida.
Meu coração estava em frangalhos, mas eu sabia que eu
queria aquele homem, mesmo que depois a minha mente me
martirizasse do quanto era errado.

Naquele momento parecia certo.


Deixei lágrimas escaparem.

Estava tão cansada daquela guerra.


Os dias me sufocavam, meus desejos duelavam dentro de
mim.

Eu sabia que era errado desejá-lo, mesmo assim, eu o


desejava.
Henry estava de costas. Seu corpo exalava tensão. Ele estava

fervendo. Se eu o tocasse, poderia me queimar.


Arrastei-me para fora da cama.
Aproximei-me dele bem devagar.

Doía.
Deixar minhas muralhas caírem, deixar a minha consciência
fora disso.

Doía admitir que eu o queria com tanta força que era capaz de
esquecer quem eu era.

Só que eu não era nenhuma menina mimada. Eu tinha


consciência que meu corpo flamejava por aquele desgraçado desde
a primeira vez que ele me tocou, semanas antes.
Então eu disse:

— Eu te quero, Henry... eu só... — Respirei fundo. — Você é a


tormenta em minha vida, mas também é o homem que eu não
consigo deixar de fora dos meus pensamentos.

O copo de bebida parou a poucos centímetros da boca de


Henry.

Ele já não estava mais sujo de sangue e eu sequer sabia onde


ele havia conseguido aquele colete para colocar por cima da camisa
branca, mas sabia que ele era perfeito.

— O que você disse? — Seus olhos me fitaram, aterrorizados.


Doeu repetir aquilo, porque era como se eu estivesse enfiando
uma faca em meu próprio peito.

— Eu quero você. Não deveria, mas eu quero.


Henry me olhou por vários segundos, que pareceram horas.
Ele havia desistido de mim, era isso.

E mais uma humilhação eu não aguentaria.


Virei as costas para sair dali, mas a mão de Henry segurou o
meu braço e me puxou para si.

— Eu não quero fazer amor, Emmeline. — Sua voz era um


aviso e sua mão se infiltrou em meus cabelos puxando a minha
nuca, fazendo-me encará-lo. — Não esta noite. Esta noite eu só

quero foder uma boceta disposta. Se você não está disposta a ser
minha, vire as costas e saia daqui, mas não me impeça de ter o que
eu quero.

Eu já estava no inferno.
Ver o homem que Henry realmente era talvez me ajudasse a
tirá-lo dos meus pensamentos. Talvez me ajudasse a odiá-lo um

pouco mais.
— Eu quero ser sua.

E sua boca veio direto para a minha.


Eu quero usar
E abusar de você

Eu quero saber o que está dentro de você


Sweet Dreams (Are Made of This) – Marilyn Manson

Emmeline

Henry me beijava como se não houvesse amanhã.

Sua língua não era generosa, ela entrava em minha boca e


duelava com a minha. Raspava em meus dentes, acariciava o céu
da minha boca enquanto seus lábios se emolduravam aos meus.

Eu estava inerte, entregue às suas mãos quentes que

percorriam meu corpo e me reivindicavam como se eu fosse sua


propriedade.

Henry apertou a minha bunda, em seguida deu um tapa com a

mão cheia, que ardeu a princípio, mas eu não tive como reclamar,
porque sua boca faminta ainda estava sobre a minha.
Mas então ele se afastou um pouco.

— Ninguém deu permissão para você mostrar essa bunda por


aí — ele disse, seus lábios passeando pelo meu maxilar. — Eu acho

que preciso dar uma lição em você, Emmeline. Essa bunda é minha,

ninguém tem o direito de vê-la a não ser eu.


Arfei em resposta. Ele massageava o local do tapa, mas eu

desconfiava que isso era uma artimanha para o tapa que viria em

seguida.
E foi isso mesmo que aconteceu.

Henry me segurou pela cintura e me virou de costas para si.

Estávamos em frente a um espelho que eu não tinha notado da


outra vez, mas agora estava ali. Ele nos mostrava da cabeça aos

pés e eu via a minha respiração acelerada, meu peito subindo e


descendo, meus lábios vermelhos e inchados.

— Eu queria arrancar os olhos daqueles filhos da puta que

estavam olhando para você — Henry falou em meu ouvido. Suas

mãos percorriam a minha cintura, então subiram até os meus seios

e ele os apertou com força. — Queria atirar na cabeça de todos e se

eu fizesse isso, a culpa seria sua, Emmeline.


Henry puxou as alças finas da lingerie e liberou meus seios,

que preencheram suas mãos grandes.


— Minha culpa? — perguntei, arfando.
Meu corpo traidor me impulsionava para ele, como se eu

pudesse me fundir ao homem atrás de mim. E quando senti seu pau

encostando em minha bunda, eu praticamente enlouqueci.

— Sua culpa, desgraçada. — Henry apertou meus mamilos

com a ponta dos dedos e eu praticamente gritei. — E eu vou fazer

você sofrer por isso.


Ele me virou de volta para si e sua boca sugou um dos meus

seios como ele havia feito naquele dia no escritório.

Fechei os olhos, minha respiração acelerada. Gemidos saíam

de meus lábios enquanto sua língua quente percorria meus

mamilos. Henry chupava, mordia e eu só queria mais. Queria que

ele tivesse tudo de mim.

Minhas pernas não aguentaram, mas, por sorte, a cama estava


bem atrás de mim e suas mãos me seguravam. Ele me deixou cair

lentamente sobre a cama.

Henry se afastou só um pouco.

Seus olhos estavam vidrados em meus peitos vermelhos e

inchados por causa das suas mordidas e brilhantes por causa de

sua saliva.
Aproveitei para tirar as sapatilhas e jogá-las longe.
— Você não devia ter vindo, Emmeline. Eu não a queria aqui.

Se bem me lembro, mandei que a levassem para casa — ele disse,


abrindo os botões de seu colete, um por um. — Caralho, eu disse

para trancar a porra da porta! Por que não fez o que pedi? Teria sido
tão fácil...
— Eu não quis trancar! — gritei de volta. — Eu queria ver do

que você era capaz.


Henry jogou o colete no chão e em seguida começou a

desabotoar a camisa.
Eu não conseguia desviar os olhos.

Seu corpo era tão bonito. Henry era forte, mas sem exageros.
Ele parecia um deus grego, esculpido na forma de estátuas de
gesso que ficavam expostas nos museus europeus. Ele parecia feito

para mim.
E eu iria aproveitar.

Quando sua camisa caiu no chão, meu olhar foi direto para o
seu machucado.

O curativo estava um pouco vermelho.


— Henry...
— Cale a boca, Emmeline — ele me cortou. — Eu estou pouco

me fodendo para esse ferimento.


Fiquei em silêncio no mesmo instante.

Ele veio para cima de mim e, automaticamente, eu fui para trás


na cama. Henry se colocou sobre mim.

— Se quiser fazer um pedido, faça agora. — Seus olhos


tomados de luxúria e raiva encararam os meus. — Porque depois eu

quero ouvir somente os seus gemidos.


— Me faça esquecer quem eu sou.
Henry abaixou a cabeça e seus lábios capturaram os meus

mais uma vez. Depois ele se afastou, enterrando a cabeça em meus


cabelos.

— Cheiro de baunilha — ele disse. — Me faz lembrar o xampu


que você usava quando era criança.
Suas palavras me surpreenderam. Como ele conseguia se

lembrar disso?
— Era só o que tinha no banheiro.

— Depois vou agradecer à Greta.


Sua boca percorreu meu maxilar, sua língua me lambeu até

perto da minha orelha.


Minhas mãos seguraram seus ombros com força. Henry beijou
meu pescoço com extrema lentidão, apreciando cada momento.

Então ele mordeu e eu soltei um grito.


— Apenas marcando o que é meu. — Sua voz era
odiosamente sedutora e eu estava enlouquecendo a cada minuto.
— Henry... — Suspirei.

Sua boca se afastou pelo meu colo. Suas mãos voltaram a


brincar com meus seios, preparando-os apenas para sua boca

tomar a cada um no seu devido tempo.


— Porra, que peitos deliciosos, Emmeline — Henry deu uma
chupada com força, fazendo um estalo ao soltá-los. — Desse jeito,

eu vou querer mamar você todos os dias.


Arqueei minhas costas, dando-lhe total acesso ao meu corpo.

O prazer era absurdo, era algo que eu nunca havia sentido. No


meio das minhas pernas eu sentia o doce latejar de que algo maior

estava por vir.


E, bem, a julgar pelo volume em suas calças, era maior
mesmo.

Seria possível sentir essas ondas de prazer todos os dias?


Por que ele me fazia sentir essas coisas? Eu sonhava com o

amor, mas também sonhava em ser adorada, desejada.


E era isso o que Henry estava me dando.
Sua boca desceu pela minha cintura e quando o tecido fino da

lingerie foi o empecilho, Henry se afastou e com as duas mãos a


rasgou, sem dó.
— Você é linda pra caralho. — Seus olhos percorreram meu
corpo nu.

E naquele momento, eu percebi que, mesmo querendo me


punir, Henry só conseguia me adorar.

Seus dedos se entrelaçaram no tecido da calcinha e ele a


puxou, deslizando lentamente pelas minhas pernas. Quando enfim a
tirou, cheirou-a e isso me deixou mortificada.

— Sabe por que você está assim, querida? — Ele passou um

dedo pela minha intimidade.


Balancei a cabeça negativamente.

— Porque você quer isso tanto quanto eu. E, porra, eu vou

fazer você esquecer seu próprio nome esta noite.

Gemi em resposta.
— Abra as pernas para mim, meu amor — ele disse,

colocando-se de joelhos à minha frente.

Fiz o que ele disse, morta de vergonha por estar tão exposta.
Por sorte, um dia antes da festa de noivado, eu tinha me depilado.

Henry parecia tão feliz, tão satisfeito.

Ele segurou uma das minhas pernas e começou a beijar desde


o calcanhar e foi subindo lentamente até as minhas coxas.
— Eu disse que queria provar seu gosto... — Henry voltou a

mim, com o olhar nublado de desejo, luxúria. — E é isso o que vou


fazer.

Minhas bochechas esquentaram um pouco e eu tentei desviar

o olhar, mas ele segurou meu rosto.


— Quero que olhe nos meus olhos quando eu disser que

quero te chupar ou te foder até que perca os sentidos. Você é minha

mulher, não tem por que ter vergonha.

Ele disse essas palavras de forma tão hipnotizadora, que eu


apenas concordei.

Então Henry sorriu, beijou-me nos lábios mais uma vez e

depois os abandonou, para se concentrar em minha intimidade.


O primeiro toque de sua língua quente foi a coisa mais intensa

que eu já senti em toda a vida. Joguei a cabeça para trás e me abri

ainda mais. Eu queria sentir aquilo, queria que ele me levasse até o
ápice de todas as emoções.

La douce mort, como os franceses definiam o orgasmo.

Sua língua começou a brincar com meus grandes lábios,

provocando meu ponto sensível. Arqueei as costas, levantei o


quadril e deixei que ele abocanhasse com vontade.
Meu peito subia e descia com a respiração acelerada.

Gemidos escapavam da minha boca e eu não sabia como tinha me

privado por tantos anos, esperando o cara certo.


Henry se deliciava me chupando enquanto espasmos

percorriam meu corpo e o orgasmo se aproximava.

— Henry! — Apertei os lençóis com os dedos.

— Eu sabia que você era deliciosa — Ele levantou o rosto, um


sorriso se formou nos lábios lambuzados, mas ele não parecia se

importar. — Quero ouvir meu nome saindo da sua boca mais uma

vez.
Henry abaixou a cabeça e voltou a me chupar. Sua língua

acariciou meu clitóris e eu enlouqueci.

Gritei seu nome várias vezes.

Mas ainda não era o suficiente, pelo visto. Henry enfiou um


dedo em minha boceta, trazendo uma nova onda de prazer.

— Apertada pra caralho — ele murmurou. — Estou louco para

meter o meu pau na sua boceta, Emmeline. Vamos chegar aos céus
juntos, meu amor.

Aquela era uma promessa sórdida, mas eu queria. Queria com

todas as minhas forças.


Henry me provocou mais algumas vezes, seu dedo entrando e

saindo com força que eu perdi a completa noção da vida. Meu corpo
estremeceu, meu mundo parou.

O orgasmo veio, fazendo meu corpo estremecer.

Não parecia existir nada além de mim e daquela sensação de


prazer se apossando dos meus poros.

Mas logo fui trazida à realidade quando Henry começou a

despejar beijos em minha barriga. Ele subiu lentamente como um

tigre à espreita da sua presa.


Então ele pairou por cima, apoiado em seus braços.

— Você já tinha se tocado antes?

Aquela era uma pergunta íntima, coisa que eu não gostava de


compartilhar com ninguém, mas eu tinha acabado de gozar na boca

de Henry, segredos eram coisas que não existiriam mais entre nós a

partir desse momento.

— Não.
Ele ergueu as sobrancelhas, surpreso.

— Por quê? — Ele se abaixou e beijou meu pescoço. — Você

nunca foi religiosa.


— Claro que não, mas... — Suspirei, deslizando meus dedos

pelas suas costas e foi aí que percebi as marcas. — Eu não sei,


acho que sempre foquei meu tempo e minhas forças em outras

coisas.

— Hummm... — Henry me encarou novamente. — Eu vou ter o

maior prazer em te mostrar tudo relacionado ao sexo.


— Isso soa empolgante — falei, dando uma risadinha.

— E vai ser. — Ele se afastou e se levantou da cama.

Quis perguntar sobre as cicatrizes, mas sabia que esse não


era o momento.

Henry abriu o cinto da calça e depois o botão. Seus olhos

estavam presos em mim, mas eu não conseguia desviar o olhar do

que estava por vir.


Ele abriu o zíper e abaixou a calça junto com a cueca.

Eu arfei assim que seu pau saltou.

Eu já tinha visto o órgão masculino em revistas, na internet,


mas eu nunca tinha visto um pessoalmente.

Henry era todo lindo, até mesmo seu pau. Grande, grosso e

por um instante eu me perguntei se caberia dentro de mim.

— Quer tocar, Emmeline? — ele perguntou ao perceber que eu


não tirava os olhos de si.

— Quero.

Ele sorriu maliciosamente.


Arrastei-me na cama e me aproximei dele.

— Como devo tocá-lo?


Henry pegou a minha mão e a fechou em torno de seu pau.

— Assim. — Ele soltou um suspiro. — Aí você sobe e desce...

desse jeito.

Henry fez alguns movimentos por cima da minha mão para me


mostrar como funcionava e eu não conseguia desviar o olhar de seu

rosto se retorcendo de prazer.

Era delicioso, assim como tocá-lo em sua intimidade.


Seu pau era macio e minha mão se tornava pequena ao tocá-

lo. Quando ele me soltou, usei o polegar para tocar a glande e

espalhar o líquido pré-gozo que estava ali. Acariciei suas bolas com
a outra mão, mas ainda não satisfeita, abaixei minha cabeça e o

lambi na ponta.

Isso fez Henry entrar em combustão.

— Chega, porra! — Empurrou meus ombros para que eu


caísse novamente na cama. — Isso já é tortura demais e eu disse

que quem ia sofrer esta noite seria você!

— Eu acho que vou gostar de torturar você — falei, assim que


ele se colocou por cima de mim. — Eu vejo em seus olhos que você

gosta disso.
Henry sorriu maliciosamente.
— Eu gosto de várias coisas, bebê. Você vai saber aos

poucos.

Fechei os olhos e abri as pernas, preparando-me para o que


estava por vir.

Não podia ser tão ruim assim.

O orgasmo de minutos antes havia sido maravilhoso e eu já


queria repetir.

— Você começou a tomar o anticoncepcional? — ele

perguntou, esfregando seu pau em minha entrada.

Arfei, sendo pega novamente pelo prazer, mas consegui


responder:

— Sim...

Um dos remédios que o médico havia me receitado era


anticoncepcional. No começo relutei em tomar, mas depois achei

que seria melhor... porque eu nunca iria colocar uma criança


naquele mundo sujo, mesmo que agora eu estivesse me entregando
de bom grado.

— Ótimo.
Henry posicionou seu pau na minha entrada e começou a me
penetrar bem devagar.
Doeu, claro que doeu.
Ele precisou parar várias vezes para que eu pudesse me
acostumar ao seu tamanho dentro de mim e mesmo vendo em seus

olhos que ele queria enfiar tudo de uma vez, lá no fundo, Henry
sabia que me machucaria de verdade.
— Tudo bem, Emmeline? — ele perguntou, sua voz tensa.

— Sim, eu só... caralho, isso dói.


Henry soltou uma risada.
— Era para doer mesmo.

— E se eu disser para você parar?


Ele me encarou por longos instantes.
— Você quer que eu pare?

— Não — falei, sendo bem sincera.


Os olhos de Henry brilharam com maldade e me lembrei de
suas palavras, dizendo que ele me teria quando eu fosse atrás e

pedisse.
Filho da puta.

Ele se abaixou até o meu ouvido e disse:


— Eu disse que a teria quando você viesse até mim. E agora,
querida, vamos derramar sangue como prova que você é minha. —
Então ele me penetrou até o fundo de uma só vez e eu soltei um
grito.
Ardeu, segurei as lágrimas porque não queria me mostrar

fraca, frágil como ele havia me acusado horas antes.


Só que Henry não se movimentou. Sua respiração estava

tensa, mas ele estava me dando tempo para me acostumar ao seu


tamanho.
Silenciosamente, agradeci por isso.

De alguma forma, aquilo estava me fazendo sentir-me mulher.


Eu queria que fôssemos até o fim.
Henry se concentrou em chupar e brincar com meus seios e

logo eu esqueci a dor, anestesiada pelo prazer de sua boca contra a


minha pele. Suas mãos passeando pela minha cintura, até que seus
dedos voltaram ao meu clitóris e ele começou a massagear.

Ao mesmo tempo, ele começou a entrar e sair bem devagar.


Arrastei minhas unhas pelas suas costas. Henry não parecia
se importar, mesmo que houvesse feridas ali.

Ele foi fundo, segurei com força o lençol ao meu lado. Henry
ergueu-se contra o meu corpo e depois desceu, penetrando-me.

Fazendo-me sua. Seu quadril bombeando seu pau para dentro de


mim. Seus olhos cheios de luxúria. Seus cabelos caindo em seus
olhos.

Era uma visão e tanto.


Chegou um ponto que eu já não sentia mais dor, apenas a
ânsia de tê-lo cada vez mais.

E Henry não me decepcionou.


Ele assumiu um ritmo ágil, entrando e saindo, estocando-me

com força e gemidos escaparam de nossos lábios. Estávamos


suados, cansados, mas parecia que o momento era perfeito para
nós.

Havia apenas o barulho de nossos corpos se unindo. A cama


balançando, ele metendo com força. Seu corpo quente contra o
meu. Minhas mãos espalmadas em seu peito, meu corpo aceitando

o dele, levando-me à loucura.


— Eu vou gozar, Emmeline. — Henry suspirou em meu ouvido.
Eu já tinha me retorcido de prazer sob o seu corpo. Ele se

afastou e com uma mão segurou meu rosto.


— Eu quero gozar olhando em seus olhos.
Seu quadril aumentou a intensidade enquanto seus olhos se

esforçavam para manter-se vidrados nos meus.


Logo Henry fechou os olhos e urrou. Senti o líquido quente

entre as minhas pernas. Alguns segundos depois, ele saiu do meu


corpo e se deitou ao meu lado na cama, puxando-me para si.
Eu deveria ter me afastado, mas apenas relaxei contra o seu

corpo e apoiei minha cabeça em seu peito.


Seus dedos deslizavam pelos meus cabelos bagunçados.
Nossas respirações estavam aceleradas.

Se essa noite não havíamos feito amor, eu realmente não


sabia o que havia acontecido entre nós, porque nesse momento me

dei conta de que estava nos braços do vilão.


Eu quero você

Sim, eu quero você


E nada chega perto
Da maneira que eu preciso de você

Oceans – Seafret

Emmeline

Abri os olhos lentamente enquanto me acostumava à


sensação do meu corpo relaxado contra lençóis macios.

O quarto estava iluminado apenas por um abajur e o meu lado

direito da cama estava vazio.


Uma pontada de decepção me atingiu, mesmo eu não

entendendo ao certo por que estava assim. Bem, talvez fosse o fato
de pensar que após uma noite como a que Henry e eu tivemos, ele

estivesse ao meu lado.

Mas era óbvio que não seria assim.


Agora que Henry tinha conseguido o que queria, eu tinha

quase certeza de que ele me descartaria. Para ele, tirar a minha


virgindade havia sido apenas uma punição por não o obedecer.

Enfiei a cabeça no travesseiro e choraminguei. Meu corpo

estava dolorido e eu só queria dormir o dia todo. Porém eu


precisava focar em outra coisa senão enlouqueceria.

Não queria pensar em como tudo tinha sido perfeito, mesmo

que Henry fosse o homem errado. Mesmo que seu lado violento
tivesse dado as caras em vários momentos. Não queria pensar que

eu havia gostado de estar em seus braços e, para ser bem sincera,

estava desejando repetir tudo.


Eu sabia que os homens conseguiam separar sexo de

sentimentos. Alguns deles nunca nutriam sentimentos por ninguém.


Será que eu poderia ser assim? Talvez eu pudesse aproveitar

o que Henry me oferecia, mas ainda assim continuar rejeitando

aqueles sentimentos confusos.

Levantei-me da cama, com o lençol enrolado no corpo,

procurando pelas minhas roupas. Mas lembrei que eu tinha chegado

ali apenas de lingerie e... essa lingerie estava destruída no chão.


Olhei para a mesinha ao lado de onde Henry tinha dormido e

pisquei para me certificar de que eu estava enxergando direito.


Havia uma pistola.
Ela reluzia como uma estrela brilhante, chamando-me para

tocá-la.

Dei a volta na cama e me aproximei devagar, como se ela

pudesse começar a disparar sozinha.

Será que ele havia saído desarmado? Não me lembrava de ter

visto duas... apenas uma, que ele deixou em cima de outra mesa
quando veio irritado para cima de mim.

Levei os dedos devagar até a pistola e engoli em seco. Qual

era a sensação de segurar uma? Será que ela realmente dava ao

homem a sensação de poder?

Olhei para a porta, certificando-me de que ninguém entraria ali.

Olhei de volta para o objeto e respirei fundo.

Então meus dedos tocaram-na.


Seu cano era frio como gelo.

Peguei-a e a puxei para mim.

Ela era um pouco pesada. Perfeita para as mãos grandes de

Henry e não para as minhas, pequenas e delicadas. Mesmo assim,

uma leve sensação de poder se apossou de mim.

— Achei que dormiria a tarde toda.


A voz de Henry me fez dar um pulo e eu me afastei com

passos rápidos até que minhas costas encontraram a parede.


Seus olhos azuis voaram de mim até a mesinha de cabeceira e

ele ergueu as sobrancelhas em compreensão. Então se afastou da


porta e veio em minha direção como um gato charmoso.
— Me perdoe por tê-la deixado sozinha — ele disse,

aproximando-se. — Recebi um chamado de Ellen e precisava


verificar sobre o que se tratava.

— Ellen? — Franzi o cenho.


A pistola ainda estava nas minhas costas. Com a outra mão

livre, eu tentava segurar o lençol contra meu corpo.


— Sim... Ellen quer participar de alguns jantares e eu
precisava autorizar. Só que, como sempre, ela não pode esperar

que eu chegue em casa para falar disso. — Henry parou na minha


frente e seus olhos desceram pelo meu corpo. — Como você está?

Meu coração batia como louco e minha respiração estava


acelerada.

— Bem, eu acho.
Ele inclinou um pouco a minha cabeça.
— Vamos precisar de uma boa maquiagem para cobrir isso.

Lembrei-me da mordida.
Henry abriu um sorriso malicioso.

— Achou que depois de dormir comigo se tornaria outra


pessoa?

Mordi o lábio.
— Não.

— Me dê a pistola, Emmeline.
— Que pistola? — fingi desentendimento.
Henry deu mais um passo e desta vez não havia mais espaço

algum entre nós. Havia apenas seu corpo alto, forte e cheiroso
contra o meu, prensando-me na parede.

— A pistola que está nas suas costas, princesinha — ele


sussurrou em meu ouvido.
Respirei fundo algumas vezes.

Ele não podia me desestabilizar desse jeito. Eu precisava


mostrar que eu ainda era a mesma e que mesmo desejando-o,

ainda tinha meus princípios.


Tirei a arma das minhas costas e a levei até o seu queixo

perfeitamente desenhado.
— Esta pistola aqui, querido? — Ergui as sobrancelhas de
forma desafiadora.

Os olhos azuis pareciam surpresos.


Eu queria que ele sentisse medo de mim, assim como eu senti
medo dele quando o conheci.
Mas Henry nunca teria medo de mim.

Quem eu era perto daquele homem?


— Você quer apertar o gatilho? — ele perguntou.

Eu queria?
Não sabia responder.
— Talvez.

— Por que não aperta, então? — Sua voz era sedutora. —


Poderia virar as costas e ir embora, sabendo que nunca mais veria o

meu rosto. Teria a sua tão amada liberdade. Bem, isso se você
conseguisse chegar até a porta do Pub.

— Isso soa bastante sedutor... eu poderia tentar — repliquei,


meus olhos fixos no meu dedo atado ao gatilho.
Ele abriu aquele sorriso que eu odiava.

— Sabe, Emmeline... — Henry afastou a arma de seu rosto e


em um movimento ágil, me puxou pela cintura, virando-me de

costas, colocando-me contra o seu corpo e me prensando contra a


parede. Quando percebi, a pistola já estava em sua mão. — Você é
a primeira que consegue ficar com a arma apontada em minha

direção por mais de um minuto.


Meu sangue ferveu e eu quis esmurrá-lo e sair de seu aperto,
mas não podia negar que estava adorando ter seus braços ao redor
da minha cintura e seu corpo quente contra o meu.

Meu Deus, eu estava cada dia mais louca.


— Só para constar... — Henry abriu o tambor da pistola e me

mostrou. — Eu nunca a deixaria carregada perto de você. Pelo


menos, por enquanto.
Senti-me completamente mortificada, mas antes que eu

pudesse formular uma resposta, Henry me virou para si, puxou o

lençol com força e me empurrou contra a cama, subindo por cima de


mim.

— Vai ficar tirando sarro da minha cara agora? — perguntei,

levando as mãos aos seus ombros cobertos por uma camisa de

linho branca.
— Claro que não, embora eu admire a sua coragem.

Henry grudou seu olhar no meu por bem mais que um minuto.

— Então você a deixou ali de propósito?


— Talvez.

— Nós nunca vamos entrar em um consenso? — perguntei

devagar, meus olhos descendo pelo seu tronco. As memórias da


noite anterior invadiam a minha mente e eu começava a sentir os

rastros do que eu podia denominar como desejo.


Minha intimidade já estava latejando, mesmo sem suas mãos

me tocando.

— E o que seria entrar em um consenso para você? — Henry


perguntou, então ele se levantou um pouco e encostou a arma na

minha garganta. — Deixar você ir embora?

Engoli em seco, porque embora eu soubesse que ela estava

vazia, os olhos de Henry se transformavam quando ele segurava


uma arma.

— Talvez.

Ele suspirou, então desceu a pistola pelo vale entre os meus


seios.

— E o que eu ganharia com isso? — Ele franziu o cenho. Seus

olhos já não estavam mais em meu rosto e sim na pistola descendo


lentamente pelo meu corpo.

— Você tem tudo, Henry.

— Agora eu tenho tudo. — Seus olhos voltaram a encontrar os

meus. Com a mão empunhada na arma, ele desenhou círculos ao


redor dos meus seios. — Agora que eu sei como é tê-la... — Ele
fechou os olhos e respirou fundo. — É o paraíso. É o único

momento que me sinto fora do inferno.

Fechei os olhos e respirei fundo. Eu já estava completamente


excitada, querendo seus toques, seus beijos.

— Você disse que eu fui a pior coisa a cruzar seu caminho.

O cano desceu na minha barriga devagar, frio e medonho.

— É eu disse... — Ele suspirou. — Mas já lhe disseram que


não deve confiar na palavra de um assassino?

Henry desceu o cano mais um pouco e eu arfei quando ele a

encostou em minha boceta.


Isso era tão... errado. Tão absurdo.

Mas por que diabos eu estava gostando?

— Eu nunca estive perto de um assassino, até então —

respondi com dificuldade. Meu corpo já estava arqueando e eu


queria me bater por estar cheia de tesão com aquele homem

terrível.

— Já esteve sim. — Henry abaixou a cabeça e sua língua


percorreu a minha barriga. — Desde que nos conhecemos, você

sempre esteve perto de um.

Eu queria chorar por estar excitada daquele jeito, mas eu não

sabia o que fazer a não ser me entregar.


É só sexo, Emmeline.

A língua quente de Henry circulou meus mamilos e eu enfiei


meus dedos em seus cabelos macios. Ele mordiscou, chupou e eu

soltei alguns gemidos pedindo por mais.

— Eu já tenho a minha nova frase favorita. — Henry se afastou


de mim e desceu da cama para tirar suas próprias roupas.

— E qual é?

— “Me foda, Henry. Por favor, Henry.”

Minhas bochechas esquentaram violentamente, mas antes que


eu pudesse dizer qualquer coisa, ele voltou para cima de mim,

completamente nu, seu pau grosso e lindo apontado em minha

direção.
— Eu adoro ver as suas bochechas vermelhas. — Ele a beijou

e depois seus lábios grudaram nos meus em um beijo violento que

me fez esquecer porque eu o odiava tanto.

Os braços de Henry envolveram meu corpo e quando percebi,


já estava por cima do seu. Nossas bocas se moviam com facilidade,

como se tivessem sido projetadas uma para a outra. Henry me

mordiscava, então lambia, sua língua brincava com a minha,


deixando tudo ainda mais aceso dentro de mim.
Suas mãos começaram a percorrer pela minha cintura e

desceram para a minha bunda. Ele apertou com força e eu gemi

contra sua boca.

Henry sorriu.
— Diz que você gosta que eu te aperte aqui.

— Eu gosto. — Fechei os olhos, irritada por ele ter o controle

sobre mim.
— Gostosa pra caralho. — Henry me virou na cama e se

colocou por cima de mim.

Sua boca desceu pelo vale entre meus seios e foi na direção

da minha intimidade. Seus olhos estavam cheios de malícia.


Primeiro ele me tocou com o dedo.

— Completamente molhada para mim, Emme. — Ele suspirou.

— Que delícia, eu vou te chupar até você perder os sentidos.


Henry abaixou a cabeça e fez exatamente o que prometeu.

Não consegui segurar os gemidos, pedindo sempre por mais.

Suas mãos apertavam as minhas coxas e eu erguia os quadris. Seu

nome escapava dos meus lábios com facilidade enquanto eu


apertava os lençóis com força.

O orgasmo veio, deixando-me devastada.


Henry voltou até mim e me beijou, me fazendo ter a sensação

poderosa de sentir meu gosto em seus lábios.


— Adoro ouvir o meu nome saindo de seus lábios enquanto

você goza. — Henry começou a beijar meu pescoço, então ele

segurou a minha cintura e trocou nossas posições. — Monte em

mim, querida — pediu com uma voz doce.


Encarei seus olhos.

— Eu não sei fazer isso.

Seus dedos vieram ao meu rosto e ele acariciou-me com os


polegares.

— Eu vou te guiar. Quero ensinar tudo para você.

Nós nos encaramos por vários segundos.


De repente, pensei nas mulheres que já estiveram com Henry.

Elas deviam ser experientes, maravilhosas na cama. Stephanie...

quantas vezes ela provou disso tudo? Quantas vezes ele a fez

chegar ao céu com sua boca?


— Hey, o que foi? — Henry ergueu meu rosto, porque eu tinha

abaixado para que ele não visse minhas frustrações.

— Nada.
— Emmeline.

Respirei fundo.
— Eu não sou experimente como as outras — falei, afastando
sua mão do meu rosto.

— Não me importa as outras.

— Você disse que eu era...


— Porra, Emmeline. — Henry me puxou para mais perto de si.

— Eu estava puto, ok? Falei sem pensar, sei lá. Quis te machucar,

porque... — Seus olhos assumiram um ar triste. — Eu fiz... tantas


coisas horríveis para cuidar de você. Não estou dizendo que é sua

culpa, eu fiz porque quis, mas... — Ele bufou. — Melhor não

falarmos disso agora.

— Henry. — Segurei seu rosto. — Eu quero saber tudo. Se vou


ser sua esposa, quero que me conte. Me mostre tudo... talvez, não

sei, quem sabe eu consiga entender.

Henry me deu um beijo leve.


— A única coisa que você precisa entender agora é que meu

pau está pronto para você. — Ele abriu um sorriso malicioso.


— Ok... — Coloquei minhas pernas uma de cada lado de sua
cintura e Henry guiou seu pau até a minha entrada. — Não vamos

deixá-lo na mão.
— Desça lentamente — ele instruiu.
Fiz o que ele disse e fechei os olhos enquanto era preenchida
por sua grossura. O prazer inundava o meu corpo mais uma vez. Os
olhos de Henry brilhavam enquanto suas mãos seguravam a minha

bunda. Então ele começou a me guiar do jeito que ele queria,


subindo e descendo lentamente.
Apoiei as mãos em seus ombros e deixei que ele me guiasse

até que meu corpo começou a se movimentar sozinho, por instinto.


Em um vaivém lento e gostoso, consegui arrancar gemidos dos
lábios de Henry.

O prazer era algo que eu não sabia explicar, assim como a


sensação de poder ao estar no controle da situação. Ouvir seus
gemidos também me deixavam consciente de que naquele

momento, ele estava totalmente entregue a mim.


Então resolvi aumentar o ritmo e isso enlouqueceu Henry.
— Porra, Emmeline!

Eu apenas abri um sorrisinho.


Suas mãos deixaram a minha bunda, assim que ele percebeu

que eu havia pegado o ritmo certo e então subiram pela minha


cintura até chegar aos meus seios. Ele os apertou e os acariciou
com a ponta dos dedos.
Coloquei as mãos para trás e senti a ponta da pistola jogada
perto de nós.
Eu a peguei e a coloquei na barriga de Henry.

— Isso sempre vai estar entre nós? — perguntei com a voz


ofegante.

— Sempre.
— Então me foda apontando-a para mim — falei, para ver se o
choque de realidade me trazia de volta daquele emaranhado de

sentimentos conflitantes. Era como um jogo de tudo ou nada.


Henry deu uma risadinha e me jogou de costas na cama.
— Seu desejo é uma ordem, minha lady.

Henry se afastou um pouco, mas depois voltou e meteu sem


dó. Soltei um grito que ele abafou com uma mão na minha boca. A
outra, segurava a arma apontada para o meu rosto.

Henry começou a estocar com velocidade e era para eu odiar


aquilo. Era para eu me sentir péssima e mandá-lo ao inferno, mas
céus, a visão daquele homem maldito me fodendo e mostrando

quem ele realmente era, estava me deixando mais excitada do que


nunca.

Então, numa tentativa de estragar tudo aquilo, eu mordi sua


mão com força.
Henry não parou.
Seus olhos estavam vidrados nos meus enquanto ele metia

fundo.
— Eu já lidei com dores bem piores, minha querida.
Automaticamente, olhei para o curativo em sua barriga. Estava

limpo e eu só podia acreditar que ele tinha trocado quando se


levantou.

Mordi com mais força, até sentir o gosto acre.


Seus dedos agora estavam sangrando na minha boca.
E por algum motivo, isso me deixou alegre.

E não foi difícil alcançar o orgasmo mais uma vez quando isso
aconteceu.
Talvez eu tivesse dentro de mim um pouco da loucura de

Henry e ele fosse o ímã que estava puxando isso, trazendo à tona.
Eu só sabia que as coisas nunca mais seriam as mesmas.
Henry continuava com a pistola apontada para o meu rosto.

Seu rosto preenchido por satisfação.


Éramos loucos.
Contorci-me e gemi seu nome várias e várias vezes enquanto

meu corpo tremia com espasmos e eu sentia a minha alma sair e


voltar para o meu corpo enquanto ele se tornava pesado.
Henry deu suas últimas estocadas antes de gemer o meu

nome e derramar seu gozo dentro de mim.


Quando tudo acabou, ele jogou a arma em um canto qualquer
e eu pensei que ele estaria furioso por eu tê-lo mordido, porém, ele

me puxou para si e me beijou com força.


— Você é tudo o que eu sempre quis.
Ontem à noite foi a última noite da minha vida passada

Estou aqui tipo, você nunca vai conseguir me entender


Past Life – Trevor Daniel feat. Selena Gomez

Emmeline

— Está doendo? — perguntei ao enrolar a última volta de


esparadrapo no dedo de Henry.

O dedo que eu havia mordido na hora do sexo.


— Não. — Ele ergueu a mão e olhou com admiração para o

curativo. — Onde aprendeu a fazer curativos assim?

— Eu fazia muitos nos dedos dos meus pés — falei, enfiando


os materiais dentro da caixinha de primeiros-socorros. — O ballet é

lindo, mas acaba com os dedos.


— Entendo...

Dei uma rápida olhada para Henry. Ele estava com o olhar

perdido.
— Não seria bom chamar o médico para averiguar seu

ferimento de bala? — perguntei, olhando para o curativo recém-


trocado.

Desta vez, Henry tinha permitido que eu o ajudasse, já que nas

outras ele mesmo se encarregava disso.


— Não.

— Mas você se esforçou e...

— Já passei por coisas piores, Emmeline. — Seu olhar


encontrou o meu. — Estou bem, confie em mim.

Assenti lentamente.

Henry e eu já havíamos tomado banho e estávamos vestidos,


prontos para irmos embora. Por sorte, ele havia pedido para um de

seus homens ir até a mansão buscar algumas roupas para mim.


Levantei-me e peguei a caixinha, levando até o banheiro

adjacente ao quarto. Guardei-a no mesmo lugar que a encontrei e

quando voltei para o quarto, Henry estava ainda com o olhar

perdido, então disse baixinho:

— Minha mãe cuidou dos meus ferimentos até eu atingir os

oito anos de idade. Um dia meu pai descobriu que ela me ajudava e
a espancou. — Seu olhar veio direto para o meu rosto. — Desse dia
em diante, ele me machucava de propósito para que ela não
pudesse mais cuidar de mim.

Um arrepio percorreu a minha espinha.

— Você é a primeira pessoa que faz um curativo em mim,

tirando o médico, claro, depois de tantos anos.

Então lembrei-me das cicatrizes que estavam em suas costas.

— Mas... como fazia com as que estavam nas suas costas? —


Eu não sabia se devia tocar naquele assunto agora, mas não

consegui conter minha curiosidade.

Henry desviou o olhar para um ponto além de mim.

— Eu só deixava sangrar... — disse, parecendo reviver

memórias bem ruins. — Então elas paravam, cicatrizavam e a vida

seguia.

Um silêncio mortal reinou por alguns instantes.


— Por que ele fazia isso? — quis saber.

Eu me lembrava de poucas coisas a respeito do pai de Henry,

mas ele nunca foi violento nem comigo nem com Colin. Eu jamais

podia imaginar como era a realidade dentro de sua casa.

A pergunta o fez levantar a cabeça e me encarar. Então ele se

levantou e estendeu a mão.


— Vamos para casa? Estou morto de fome e aposto que você

também.
Eu realmente estava.

— Ok, vamos.
E por algum motivo desconhecido, encaixei minha mão na de
Henry.

Henry e eu estávamos de mãos dadas e no momento que

começamos a atravessar o salão, as mulheres pararam o que


faziam e começaram a cochichar.

— Venha, não quero que fique olhando para elas — Henry


disse, puxando-me em direção à saída.
— Elas sabem quem sou?

— Agora sabem.
Saímos na calçada e o vento forte nos atingiu, Nathan abriu a

porta do carro preto e eu entrei. Henry entrou pelo outro lado.


— E o que elas estão dizendo? — perguntei quando ele se
acomodou ao meu lado. — Sobre o meu número ontem...
Achei que Henry ia ficar puto com a menção ao que

aconteceu, mas ele deu uma risadinha.


— Elas acham que foi combinado. Que você queria fazer uma

surpresa para mim.


— De certa forma, elas estão certas... — murmurei, olhando

para a cidade se desenrolando do lado de fora do carro. — Não sei


se gosto dessa coisa de prostituição.
Henry bufou.

— Eu não obrigo ninguém a isso, Emmeline.


— Mas você poderia oferecer-lhes outro tipo de trabalho. —

Olhei para ele novamente.


— Não se trata disso, Emme. Algumas delas gostam do que
fazem e... aquelas que não gostam, não obrigamos. É o caso de

Thalia, sua acompanhante. Ela estava sendo levada para o leste


europeu quando eu a interceptei. Então consegui outro tipo de

trabalho para ela.


Thalia realmente adorava Henry e agora eu começava a

entender o porquê.
— Foi nobre de sua parte. — Coloquei minha mão por cima da
dele e Henry automaticamente olhou para baixo.
Bem, eu também estava um pouco em choque com minhas
próprias atitudes.
O que estava acontecendo comigo?

Entretanto, de repente Henry retirou sua mão e seu olhar se


perdeu mais uma vez. A conexão que havia se estabelecido entre

nós parecia estar prestes a ruir.


— Chegamos — ele anunciou.
O tempo tinha passado tão rápido que eu nem havia

percebido.
Nathan pulou do carro e abriu a minha porta. Henry veio ao

meu encontro, colocando sua mão em minha cintura enquanto


entrávamos na mansão.

— Os pombinhos chegaram! — Ellen gritou do alto da escada


assim que entramos no hall. — Achei que deixariam a lua de mel
para depois.

— Ellen! — Henry a repreendeu.


Ela sorriu, aproximando-se.

— Preciso falar com você, querido irmão.


Bem, aquela era a deixa que eu precisava para me retirar.
Então disse:

— Vou deixá-los a sós. Estou cansada...


Ellen me encarou com um olhar e sorriso sugestivo, que tentei
ignorar. Henry pegou o envelope que ela lhe estendia, mas então
olhou em minha direção.

— Descanse, à noite iremos jantar fora.


— Hum... ok.

Virei as costas e segui na direção das escadas, ciente de que


seus olhos não me deixaram um só segundo.
E eu já estava pensando em como seria o nosso próximo

encontro.

Henry

— O que é isso? — perguntei, erguendo o envelope.

Ellen deu de ombros.


— Enfiaram no buraco das cartas e eu estava passando por

aqui bem na hora. Achei que não fosse uma correspondência oficial,

porque não tem um selo, mas tinha seu nome. Não sei do que se

trata.
Olhei para o envelope novamente.
— Ok, obrigado.

Virei as costas para seguir até o meu escritório.


— Não! Espere! — Ellen gritou e veio correndo ao meu lado.

— Eu disse que precisava falar com você.

— Então fale logo.


— Caroline já está em casa para o recesso de final de ano e

eu gostaria de dormir na casa dela esta noite. Você me dá

permissão?

Abri a porta do escritório e Ellen me seguiu.


— Não.

— Por quê? — Seus olhos se arregalaram.

— Porque eu sei que isso é uma desculpa para vocês irem a


alguma balada. E você sabe que não nos misturamos com os

Rutherford.

Ellen bufou.
— Eu não tenho culpa dos problemas entre você e o pai dela!

— ela gritou. — Caroline é minha única amiga. Eu poderia levar

Emmeline, mas duvido que você iria permitir.

— Nem fodendo que Emmeline vai com você a uma dessas


baladas — falei, tirando o maço de cigarros e acendendo um. —

Arrume outra amiga.


— Meu Deus, Henry! — Ela bateu as mãos em cima do tampo

de madeira da mesa. — Isso não é justo!

— Não é justo você me atormentar com esta merda. Já disse


que não, agora vá, eu tenho mais o que fazer.

Ellen respirou fundo várias vezes.

— Mande Colin ir conosco.

— E você acha que Colin é algum tipo de babá? — perguntei,


exasperado. — Colin é meu homem de confiança, cuida de merdas

muito maiores do que os seus caprichos, Ellen. Eu já disse que não,

e saia daqui, preciso me concentrar em outros assuntos.


Ellen começou a chorar, mas virou as costas e saiu da sala,

amaldiçoando-me até a morte.

Eu amava a minha irmã e era por isso que eu a mantinha

longe das pestes. Mesmo que ela não enxergasse desta forma.
Traguei o cigarro, pensando em tudo o que havia acontecido

em menos de vinte e quatro horas.

Era óbvio que eu havia notado a diferença em Emmeline com


relação à minha presença desde que levei um tiro no lugar dela. Ela

precisava entender que eu faria aquilo mesmo que fosse para

morrer em seu lugar.

Foi isso o que eu havia prometido.


Fechei os olhos, lembrando-me daquele dia:

“— Você será um homem poderoso como seu pai, querido...


mas você precisa ser diferente dele. A primeira pessoa que você

deverá cuidar, será ela. Você fará isso em minha memória,

entendeu?
Balancei a cabeça positivamente enquanto mamãe terminava

de arrumar a minha gravata.

— A vida dela estará nas suas mãos. Mas cabe a você

escolher o melhor caminho.”

Porra, havia tantos segredos... tantas coisas que eu gostaria

de contar à Emmeline.

Começando por sua origem.


Mas eu sabia que ela não estava preparada para aquilo,

principalmente, para uma das revelações que me consumia todos os

dias.

Soltei a fumaça, liberando com ela toda a tensão que acometia


meu corpo quando pensava nessas merdas.

Se eu pudesse, mataria meu pai pela segunda vez.


Peguei o maldito envelope, abri e as palavras que estavam ali

me surpreenderam.

“Emmeline já sabe de tudo? Será que ela irá perdoá-lo por

esconder segredos tão sujos?”

Obviamente, estava sem assinatura.

Amassei o papel e me levantei. Joguei-o na lareira acesa, a

mesma que foi testemunha de uma das maiores loucuras que já


cometi na vida.

Mas isso não ia foder a minha mente bem agora.

Não mesmo.
Eu traí a mim mesma

Da forma que eu sabia que ia acabar acontecendo


You Know I’m no Good – Amy Winehouse

Emmeline

O restaurante que Henry estava me levando ficava no bairro


de Mayfair, não muito longe de nossa casa.

Nossa casa...
Se fosse algum tempo atrás, eu preferia ter dado um tiro em

minha cabeça a pensar em algo assim, mesmo sabendo que após o

casamento, eu seria também dona de tudo aquilo que Henry


colocava as mãos.

As coisas estavam mudando em uma proporção que chegava


a ser assustadora.

Quem poderia explicar a vontade que fiquei durante todo o dia

de ir atrás de Henry e repetirmos tudo o que fizemos na noite


passada e hoje pela manhã?

Eu realmente estava ficando louca.


— Este restaurante é de uma alta gastronomia francesa —

Henry disse, atraindo a minha atenção. Foi nesse momento que

percebi que sua mão estava sobre a minha no banco. Ele a apertou
gentilmente. — O dono é um amigo da família... eu frequentava

quando era criança. Minha mãe adorava a comida.

Era estranho como ele falava de uma forma amargurada de


sua infância ao mesmo tempo que seus olhos brilhavam todas as

vezes que citava a mãe.

Eu queria saber mais sobre ela.


As únicas coisas que eu sabia era que Catherine Spencer

morreu dois anos antes do meu pai. Nem a causa de sua morte me
fora revelado na época.

— Seus olhos brilham quando você fala sobre a sua mãe.

Henry desviou o olhar para a janela e sua mão se soltou da

minha.

— Minha mãe era a mulher mais especial que já conheci. —

Ele virou o rosto em minha direção novamente. — Claro, isso sem


contar você.

Não aguentei e abri um sorriso tímido.


— Conte-me mais sobre ela.
— Vou contar, mas daqui a pouco... já chegamos.

O capanga do rosto marcado estacionou em frente ao

restaurante e Henry saiu do carro sem mesmo esperar Nathan abrir

a porta. Ele estendeu a mão e eu segurei, impulsionando meu corpo

para fora.

“Le Mare Catherine” era o nome do restaurante.


— Uau, agora entendi por que ela gostava de vir aqui.

Henry abriu um sorrisinho enquanto colocava a mão em minha

cintura e me puxava pela entradinha tímida do restaurante.

— Diz a lenda que o dono, Louis, era apaixonado pela minha

mãe. Como todos os homens da Inglaterra devem ter sido. Ela era

belíssima.

Antes que eu pudesse perguntar mais, um homem vestido de


terno elegante veio nos atender com um sorriso.

— Lorde Spencer, que agradável tê-lo conosco esta noite. —

Seus olhos vieram para mim. — Imagino que esta seja a futura lady

Spencer. Adorável, mas ainda mais bonita do que as fotos que vi na

internet.

— Internet?
— Sim, querida. Do noivado. As notícias estão... pelo mundo

todo.
— Ah, sim, tem razão... — Sorri, enfiando uma mecha do meu

cabelo atrás da orelha. — Estou tentando me acostumar a essa


nova vida, ainda.
O homem deu uma risadinha.

— Entendo, meu nome é Luigi, irmão de Louis, e sou sócio


proprietário deste lugar. Bem, o lugar reservado para os senhores já

está pronto, sigam-me, por favor.


Henry estendeu a mão para que eu fosse na frente.

O restaurante era elegante, com paredes pintadas de verde-


musgo e o chão revestido com carpete quadriculado em vermelho e
azul. Tocava uma música ambiente, calma. As mesas estavam

distribuídas pelo salão, com toalhas brancas finíssimas. Não havia


muitas pessoas, talvez por ainda ser cedo, mas as que estavam ali,

cravaram os olhos assim que nos encaminhamos até a nossa mesa.


— Fiquem à vontade. — O homem entregou-nos o cardápio.

— Voltarei logo para anotar os pedidos.


Aquela era a primeira vez que eu conseguia deixar de lado
quem Henry realmente era e como ele havia entrado em minha vida

e como havíamos sido levados até aquele noivado.


Eu podia considerar isso um encontro?

— O que sua mãe gostava de comer? — perguntei, dando


uma olhada rápida nos pratos. Não fazia ideia do que pedir.

— De entrada, ela sempre pedia Tartar de carne com salada e


de prato principal ela adorava o Magret de pato. Ele vem

acompanhado com batatas douradas com alho. É incrível.


— Então é isso que vou querer — falei, fechando o cardápio e
o colocando sobre a mesa.

Henry sorriu e me encarou.


— Quer escolher o vinho?

— Não, eu não entendo nada disso.


Henry ergueu a mão e quase que imediatamente o homem
veio anotar nossos pedidos.

Aproveitei enquanto eles conversavam para olhar pela janela.


Nathan e o outro capanga estavam conversando do lado de fora,

mas eu sabia que estavam alertas.


Colin estava ocupado com outras coisas relacionadas à

Brandy Blood e fazia dias que não nos víamos. Estava começando a
sentir falta do meu irmão cabeça-dura.
— Eles vão ficar assim conosco para sempre? — perguntei,

voltando a olhar para Henry.


O homem já tinha ido buscar nossos pedidos.
— Sempre. Não podemos abaixar a guarda... — Seus olhos se
tornaram frios de repente. — E mesmo não abaixando a guarda,

veja só o que aconteceu na nossa festa de noivado.


Se não fosse por Henry, eu poderia estar morta.

— Você sabe por que aquele homem queria me matar?


— Não.
Olhei dentro de seus olhos. Ele parecia manter uma

informação só para si... e claro que eu queria saber, mas não iria
pressioná-lo agora. Eu sabia que até mesmo homens como ele não

resistiam ao charme feminino.


Então falei algo que já estava pesando em minha mente havia

dias.
— Quero que me ensine a atirar.
Henry ergueu as sobrancelhas em surpresa.

— Você quer aprender a atirar...


— Sim.

— E por quê? Está planejando me matar após o casamento?


Dei risada.
— Bem, não. Ahn... — Mordi o lábio, desviando o olhar. — Já

que estou entrando nisso, não quero ser nenhuma idiota que não
sabe se cuidar.
— Você tem a minha proteção e a dos meus homens.
— Eu sei, Henry. — Cruzei os braços em cima da mesa e o

encarei. — Mas entenda, eu sempre fui independente. Sinto falta


disso... e, se eu não posso voltar para a minha vida antiga, me deixe

construir uma nova vida que eu consiga ter, pelo menos, um pouco
do controle de antes.
Seus olhos me encararam por longos instantes.

— Eu vou ensiná-la — ele disse e então o alívio inundou meu

peito. — Não só a atirar, mas também a lutar. Tem certeza de que


quer isso?

— Tenho.

— Pois bem, suas aulas começam em breve.

Sorri e teria pulado em cima da mesa para lhe dar um beijo se


não fosse o homem trazendo a nossa garrafa de vinho.

Mas ainda tinha uma noite inteira pela frente...

— Céus, está cada vez mais frio — falei assim que entramos

no hall da mansão.
Henry fechou a porta e me ajudou a tirar o casaco.

— Acredito que até o Natal vai nevar.


— Eu adoro neve — falei, observando-o pendurar nossos

casacos no cabideiro.

Lembrei-me de uma vez em que estava nevando, mesmo


assim, fomos até o Hyde Park para nossas caminhadas matinais

aos sábados. Naquele dia, Colin pegou uma gripe horrível e ficou

uma semana de cama, o que resultou que no outro sábado eu tive

que ir sozinha com Henry.


E foi divertido.

— Eu sei... — Ele sorriu. — Você gostava de fazer bolas de

neve e atirar nos outros.


Dei risada.

— Como consegue se lembrar tão bem das coisas da nossa

infância? — perguntei com Henry se aproximando. Seu calor já


começava a me afetar. — Tudo o que eu fiz durante os anos foi

tentar apagar cada resquício do passado.

Henry parou bem próximo de mim e suas mãos cobertas pela

luva de couro vieram ao meu rosto.


— Por que eu iria querer apagar o passado? Foi ele que me

trouxe você.
Respirei fundo e fechei os olhos.

Não queria pensar em mais nada naquele momento. Nem em

promessas, nem em acordos, nem em casamento. Eu só queria


viver o momento.

— Preciso resolver umas coisas em meu escritório — ele

disse, quebrando o momento mágico e deu um passo para trás,

suas mãos se afastando de mim. — Amanhã... ahn, nos falamos.


Logo pensei em perguntar se ele iria ao meu quarto, mas... era

melhor ficar calada. Talvez eu precisasse também ficar a sós para

colocar os meus pensamentos em ordem.


— Tudo bem — assenti e dei alguns passos na direção da

escadaria. — Até amanhã, Henry.

— Até.

Subi as escadas conforme ele se encaminhava ao escritório.


Era isso...

A nossa noite acabava por aqui.

Mas ela foi boa. Jantamos, conversamos como duas pessoas


civilizadas fariam, Henry me contou um pouco mais sobre a sua

mãe e descobri que ela morreu de tristeza, pelos maus tratos que

recebia do marido. Então comemos a sobremesa e voltamos para

casa.
Mas, porra... eu não queria encerrar a noite.

Parei no topo da escada com as mãos na cintura.


E eu não estava nem aí se Henry tinha trabalho ou não. A

culpa dessa minha loucura recente era dele e ele tinha que lidar

com isso.
Virei as costas e desci as escadas novamente. Nathan estava

entrando na casa quando cheguei ao último degrau.

— O que está fazendo aqui? — perguntei.

— Vou... ahn, o chefe me chamou.


— Você não vai a lugar algum. — Ergui o dedo indicador,

parando-o. — Quem vai falar com o chefe agora, sou eu.

Nathan abriu a boca para responder, mas eu virei as costas e


segui na direção do escritório.

Abri a porta e o encontrei sentado atrás de sua mesa, fumando

um cigarro enquanto lia as páginas de algum caderno. No entanto,

assim que me viu, Henry o fechou rapidamente.


— Emme? Precisa de algo?

— Preciso, sim... — Fechei a porta e atravessei a sala com

passos firmes. O barulho dos meus saltos ecoando em nossos


ouvidos.
Henry virou a cadeira em minha direção e eu o puxei pela

gravata, trazendo a sua boca até a minha.

E ali tudo se tornou um caos.

Ele me empurrou contra a mesa, nossos lábios ainda grudados


um no outro. Suas mãos arrastaram as coisas para o chão e me

colocou sentada em cima do tampo de madeira.

— Eu falei pra você ir dormir, caralho — ele grunhiu, deixando


a minha boca e percorrendo meu maxilar, enquanto suas mãos

desciam pelas minhas coxas.

— Eu não quero dormir. Quero que você me foda até eu perder

os sentidos.
— Ora, safada do jeito que eu gosto. — Ele me olhou

rapidamente e deu uma risadinha. — Eu tenho uma reunião com

meus homens e eles vão chegar a qualquer momento.


— Eles vão esperar do lado de fora, prometo fazer sons bem

convincentes para eles não entrarem aqui — falei, minhas mãos já

puxando o nó da gravata de Henry.

Ele murmurou um palavrão e sua boca voltou a explorar a


minha com fúria.

Nosso beijo era assim, cheio de raiva, tensão e talvez era isso

que me deixava ainda mais excitada.


Henry subiu a mão pela minha coxa e adentrou o meu vestido.

Com o outro braço ele me levantou apenas um pouco para puxar a


meia-calça grossa.

— Você quer me enlouquecer — ele disse contra os meus

lábios enquanto suas mãos deslizavam o tecido pelas minhas

coxas.
— Talvez — admiti, sentindo aquela sensação deliciosa dos

lábios inchados pelo beijo nada gentil.

— Então eu acho que vou ter que te enlouquecer primeiro.


Segurei os ombros de Henry e sorri.

— Vamos ver.

Henry

Emmeline sabia como foder a minha mente.

A sua inexperiência atrelada ao desejo de descobrir o mundo

do sexo era uma mistura que me deixava à beira da insanidade.


E naquele momento, eu realmente não estava nem um pouco

preocupado com meus homens esperando do lado de fora.


Emmeline tinha vindo me procurar e eu não a deixaria sair daqui
frustrada.

Afastei-me um pouco para puxar sua meia-calça pelo restante

das pernas torneadas. Primeiro tirei os sapatos de salto fino que a


deixavam ainda mais estonteante e depois puxei o restante da meia.

Aproveitei para despejar beijos no peito do pé e fui subindo

lentamente enquanto ela se derretia sobre a mesa.


— Eu adoro a sua pele — falei, subindo pelas coxas. — Uma

delícia passar a minha língua sobre ela.

— Henry... — Emmeline estava de olhos fechados. Suas mãos

espalmadas atrás de si, dando-lhe apoio na mesa.


— Eu acho que vou torturar você primeiro. — Afastei minha

boca e me ergui, puxando-a para mais perto de mim. — Quero ouvir

você implorando para eu estar dentro de você.


Minha mão se infiltrou por dentro do vestido e eu acariciei a

bunda redondinha e firme de Emmeline. Ela gemeu e se abriu mais,


do jeito que deveria ser.
— Você quer que eu a toque aqui, Emmeline? — perguntei,

meus dedos brincando com o tecido fino de sua calcinha.


— Quero. — Ela suspirou.
Deitou-se um pouco na mesa e eu aproveitei para enterrar a
minha mão por dentro do tecido. Meu indicador e o polegar tocaram
na carne úmida e quente e comecei a massageá-la.

Ela desabrochou como uma flor.


— Henry! — Emmeline disse entre um gemido e outro. — Não
pare, por favor.

Intensifiquei o movimento dos meus dedos, extasiado por vê-la


totalmente entregue a mim.
Quantas noites eu não sonhei com isso? Agora era real.

Apesar da noite passada, eu ainda tinha as minhas dúvidas se


aquilo não era apenas um sonho e que logo eu acordaria em minha
cama com Emmeline alegando me odiar para sempre.

Esfreguei os dedos com um pouco mais de força, Emmeline


gemia, sempre pedindo por mais. Ela estava tão molhada que a
única coisa que eu queria naquele momento era meter fundo e não

sair dali jamais.


Enterrei o dedo médio em sua boceta e ela soltou um grito,

então comecei a fodê-la com meu dedo e um sorriso desabrochou


em meu rosto ao vê-la tão empolgada em me receber.
— Você é tão apertada, Emmeline — falei em seu ouvido. —

Tão feita para mim.


Emmeline gemeu mais algumas vezes, então senti as paredes
pulsando ao redor do meu dedo enquanto seu rosto se desfazia em
um belo orgasmo. Ela abriu os olhos e eu retirei o dedo, lambendo-o

logo em seguida.
— Deliciosa.

Suas bochechas adquiriram um tom rosado, adorável.


Aproximei-me dela e minhas mãos foram até as alças de seu
vestido. Enquanto meus lábios beijavam os dela, puxei o vestido

para baixo, liberando seus seios nas minhas mãos.


Circulei com os dedos os mamilos rosados e os apertei
levemente. Foi o suficiente para despertar uma nova onda de fúria

em Emmeline. Então seus braços se apertaram ao redor dos meus


ombros e sua língua buscou a minha com luxúria enquanto ela se
apertava a mim, buscando por mais prazer.

Afastei-me de Emmeline e a deitei na mesa.


Aquela porra daquela mesa fora testemunha de muitas
atrocidades. Fora testemunha do momento em que meu pai me deu

o aval sobre a vida de Emmeline e agora ela era a testemunha de


que Emmeline definitivamente era minha.

Eu iria fodê-la ali com muito gosto.


Abri o cinto da calça de forma bem lenta. Seus olhos estavam
grudados em meu pau que já aparecia sob a calça. Ela mordeu os

lábios. Eu queria morder e arrancar sangue dali, exatamente como


ela fizera comigo, depois eu ia lambê-la e iria ficar tudo bem, porque
éramos assim, ímãs que atraíam a loucura interior um do outro.

Abaixei minha calça apenas o suficiente para que meu pau


saltasse livre em sua direção.

— Eu adoro o fato de que o meu pau é o único que você viu e


vai ver em toda a sua vida, Emmeline — falei, abaixando-me para
capturar seus mamilos em minha boca.

Ela arqueou as costas.


— Eu já vi outros paus.
— Ao vivo e em cores, não.

— Desgraçado.
Chupei com força um dos mamilos e dei uma risadinha.
— Seus xingamentos são como música aos meus ouvidos,

querida. — Esfreguei sua boceta um pouco com a cabeça do meu


pau, apenas para vê-la se retorcendo, então me posicionei e a
penetrei de uma só vez.

Soltou um gemido alto, então logo relaxou. Respirei fundo e


comecei a estocá-la em movimentos rápidos e precisos.
Emmeline se entregou sob o meu corpo. Cada arremetida ela

gemia mais alto e eu estava perdendo a noção apenas pelo prazer


de suas paredes extremamente apertadas estarem ao meu redor.
Ela jogou os braços atrás de si, gemendo cada vez mais alto

enquanto eu entrava e saía. Por sorte, aquela maldita mesa era bem
forte. Segurei suas pernas e grunhi quando o orgasmo se
aproximou. Então eu o segurei e saí do corpo de Emmeline.

— O que, por quê...


Eu a puxei para fora e a virei de costas para mim. Emmeline se

deitou, os peitos prensados contra a mesa.


— Eu falei que ia te dar uma lição... — Arrastei minha mão
pela coluna, desde a nuca até a parte de baixo de suas costas.

E antes que ela dissesse algo, desferi um tapa em sua bunda


redonda, deliciosa.
— Henry! — Emmeline reclamou, mas havia aquele fundo de

prazer no tom de sua voz.


— Gostosa pra caralho! — Amaciei o local onde dei o tapa,
que agora estava adquirindo um tom avermelhado dos meus dedos.

— Isso é só o começo, meu amor.


Dei outro tapa, com um pouco menos de força e penetrei sua
boceta melada mais uma vez. Emmeline ergueu o tronco, gemendo
em resposta.
Ela gemia e eu a penetrava com mais força, levando-nos à
beira da loucura, da exaustão. A prova líquida de seu orgasmo

começava a se espalhar entre as minhas bolas, meu pau deslizava


com facilidade para dentro de sua boceta porque, porra, ela estava
tão entregue, tão excitada, tanto quanto eu.

Enfiei meus dedos por dentro de seus cabelos e a puxei,


erguendo sua cabeça, então aproximei meu rosto de seu ouvido e
disse:

— Diga que é minha.


Olhou-me de esguelha com raiva, mas quando dei uma
arremetida com força e puxei mais o seu cabelo, ela gemeu e disse

em resposta:
— Eu sou sua, desgraçado.

— Diga que vai se casar comigo.


— Porra, Henry.
— Eu não sou inexperiente, Emmeline. Sei me controlar e

posso ficar aqui torturando-a por um bom tempo ainda.


— Eu vou me casar com você!
Soltei os cabelos de Emmeline, segurei seus ombros e meti

com força.
Quando ela gozou pela terceira vez, me permiti gozar também.
Emmeline estremecia embaixo do meu corpo. Eu ainda estava

dentro dela, recuperando-me do sexo delicioso, mas eu sabia que


precisava fazer aquilo.
Abaixei-me, depositando um beijo em sua coluna, arrastei meu

nariz pela extensão de suas costas, aproximei meus lábios de seu


ouvido e disse:
— Então vamos nos casar amanhã.
O jeito como você sabe o que eu pensei que sabia
A batida do meu coração pula quando estou com você

Mas eu ainda não entendo


Como o seu amor consegue fazer o que ninguém mais consegue
Crazy in love - Beyoncé

Emmeline

Eram quase quatro horas da manhã, mas eu simplesmente

não conseguia dormir.

As palavras de Henry ainda ecoavam em minha mente.

“— O que disse?

— Eu disse que vamos nos casar amanhã. — Henry estendeu


a mão até uma gaveta e pegou uma caixa de lenços. Saiu de dentro

de mim e com delicadeza começou a me limpar.


— Espere. — Virei-me, tomando o lenço de sua mão e

secando-me com rapidez. — Você falou sério?


Henry estava ajeitando suas roupas.

— Muito sério.

— Por quê?
— Porque eu quero. — Seus olhos azuis voltaram aos meus.

Ele deu um passo e começou a me ajudar a arrumar meu vestido.

— Porque eu não quero esperar passar o Natal para estarmos


casados e porque eu posso fazer o que eu quiser, inclusive, me

casar com você amanhã.

— Tá, mas... — Desci a saia do vestido. — Como vamos fazer


isso?

Ele abriu um sorrisinho.


— Não se preocupe, meu amor.

Encarei Henry por longos instantes, então disse:

— Achei que você queria um casamento grandioso.

Henry colocou uma mão em meu rosto e com o polegar alisou

o contorno dos meus lábios.

— Eu quero ser seu, apenas isso. E quero que você seja


minha, definitivamente.
Nós nos encaramos por longos instantes, então ele desceu o
rosto e depositou um beijo leve em meus lábios.

E foi nesse momento que Colin abriu a porta do escritório.

— É bom ver que finalmente vocês se entenderam, mas, porra,

vamos ter que esperar quanto tempo mais do lado de fora?”

Meu irmão... sempre tão nervosinho.

O engraçado era que eu não podia reclamar, porque, no fundo,


eu também tinha herdado esse gênio terrível.

Arrastei o cobertor e me sentei na cama.

Não havia meios de pregar os olhos, não diante da perspectiva

de estar casada com Henry em algumas horas.

Arrastei os dedos pelos cabelos e respirei fundo.

O que tinha acontecido comigo? Por que essa ideia não me


deixava com ânsia ou com vontade de fugir? Por que a perspectiva

de ser esposa de Henry Thomas Spencer agora fazia o meu

coração bater como louco?

Olhei para o anel de noivado em meu dedo.

Será que eu estava tão anestesiada por sua presença, por seu

calor, que eu simplesmente anulava tudo o que ele era e tudo o que
ele representava em minha vida?
Henry tirara meus sonhos, machucara pessoas que eu amava.

Mesmo assim...
Agora eu não conseguia deixar de querer seus lábios em meu

corpo, suas mãos segurando-me com possessão. Seus olhos


queimando de desejo por mim.
Eu sabia que não devia flertar com o inimigo, mas era

exatamente o que eu estava fazendo.


Peguei o celular em cima da mesinha de cabeceira e me

levantei. Vesti o robe que estava nos pés da cama e me encaminhei


até a porta. Abri-a lentamente e saí do quarto.

O corredor estava escuro e vazio.


Liguei a lanterna do celular e me encaminhei até a escadaria.
Só havia o silêncio da madrugada como companhia e isso era

tudo o que eu precisava naquele momento.


Desci as escadas lentamente, não precisando tanto da

iluminação do celular porque as luzes da rua entravam pela janela e


já ajudavam com aquele tom azulado, misterioso.

Assim que cheguei ao último degrau, virei para ir em direção à


biblioteca, mas trombei com alguma coisa e, imediatamente, um
copo de vidro estilhaçou em meus pés.
— Meu Deus, senhorita! Perdão. — Greta se abaixou,

desesperada. — Cuidado.
Olhei para cima, com medo de Henry ter acordado. Bem, a

verdade era que eu nem sabia se ele estava em casa, porque


depois que saí de seu escritório, não voltei a vê-lo.

— Eu que peço perdão, Greta. — Tentei abaixar para ajudá-la,


mas ela segurou meus ombros.
— Não, deixe que eu limpo isso. O que a senhorita faz

acordada a essas horas? Está com fome? Quer que eu leve algo em
seu quarto?

— Não, eu... estava indo à biblioteca. Não consigo dormir.


Ela assentiu.
— O lorde Spencer a usou para reunir seus homens. Se

quiser, posso ver se ela está apropriada para a senhorita...


— Não, não. Eu mesma vejo. — Afastei-me dos cacos de

vidro. — Obrigada, Greta.


— Por nada, senhorita.

Greta foi na direção da cozinha pegar os utensílios para


recolher a bagunça, e eu continuei a minha jornada. Porém, quando
passei em frente ao escritório de Henry, desisti da ideia da

biblioteca.
Talvez eu pudesse ter a minha mente iluminada ali, no lugar
onde ele tomava a maioria de suas decisões. Inclusive, aquela que
mudaria completamente a minha vida em algumas horas.

A porta não estava trancada e eu dei um suspiro de alívio.


O escritório estava iluminado apenas com a luz que vinha da

rua.
Assim, de madrugada, era o lugar mais assustador onde eu já
tinha colocado os meus pés.

Havia algo ali...


Uma presença.

Uma lembrança.
Olhei para os quatro cantos.

Para a lareira apagada. Para a mesa de madeira escura. Para


a cadeira imponente, digna de um magnata como Henry.
Um arrepio percorreu a minha espinha e eu sabia que devia

sair daquele cômodo, mas algo me incitava a ficar ali. Como se


aquele lugar tivesse coisas a me contar.

Olhei para os papéis espalhados no chão. As coisas que Henry


empurrou quando me jogou em cima da mesa.
Um sorriso brotou em meu rosto.
Eu podia arrumar aquela bagunça, afinal, um pouco era culpa
minha.
Dei a volta e ajoelhei-me diante da papelada no chão. A

primeira coisa que meus olhos focaram foi no porta-retratos com a


foto de uma mulher muito bonita.

Ela tinha cabelos pretos iguais aos de Henry, assim como os


olhos azuis brilhantes e a pele um pouco mais escura do que
estávamos acostumados a ver em Londres.

Não havia dúvidas de que ela era Catherine Spencer.

Passei os dedos pela fotografia. Meu coração se apertou ao


pensar o que uma mulher tão linda havia passado nas mãos de um

homem cruel. Tanta dor que a levou à morte.

Levantei os braços e coloquei o porta-retratos em cima da

mesa. E uma chave caiu no chão.


Ela estava dentro do porta-retratos.

Bem, eu não sabia de onde era aquela chave, então coloquei-a

de volta em seu lugar.


Henry amava a mãe e aquela foto nunca deveria sair dali.

Voltei aos papéis, mas meus olhos se direcionaram a um

caderno com capa de couro.


Era o mesmo que Henry estava lendo quando entrei.
Se ele me pegasse bisbilhotando suas coisas, certamente

ficaria furioso.
Mesmo sabendo do risco, peguei o caderno nas mãos e o abri.

A primeira folha tinha uma dedicatória.

“Para o meu amado e gracioso filho, Henry.


C.S”

Uau, aquele caderno parecia ser um diário.

Virei a próxima página e havia um desenho feito a lápis, com


traços delicados.

Era um cachorro.

Embaixo do desenho havia um nome: Bones.

Virei a página e havia mais escritos:

“Querido diário,

Meu nome é Henry Thomas Spencer e estou completando oito

anos hoje. Minha mãe me deu este caderno (escondido do meu pai)
e ela disse que se eu começasse a desenhar e escrever meus

sentimentos, me sentiria melhor.

Hoje meu pai me levou para matar pássaros.


Eu chorei dizendo que não queria fazer isso, mas ele me bateu

com a espingarda, várias vezes.

Eu odeio meu pai.


Um dia eu vou matá-lo com minhas próprias mãos.”

Sentei-me com força no chão assim que terminei de ler

aquelas palavras.

Passei pelas folhas rapidamente.


Elas estavam todas preenchidas, além de ter vários desenhos

que se tornavam macabros com o passar das páginas.

Eram segredos de Henry, era a sua vida que estava ali.


E eu queria ler.

Queria descobrir cada fragmento de seu passado.

As primeiras páginas do diário de Henry contavam um pouco


sobre a sua infância.

Já desde os oitos anos ele estava sendo encaminhado para

entrar na Brandy Blood, de um modo mais calmo para alguns, mas


para outros, assustador da mesma forma.
Seu pai era um monstro e em cada página havia descrito o

quando Henry o odiava.


Ele contava um pouco sobre as constantes brigas dos pais.

Sobre as agressões que sua mãe recebia.

Detalhes horríveis, que me deixaram ainda mais perplexa.


E chegou um momento que eu precisei fechar o diário e

respirar fundo. Eram informações demais e eu precisava processar

um pouco de tudo aquilo que estava escrito.

Então guardei o caderno comigo e voltei para o meu quarto.


Eram cinco horas da manhã quando consegui fechar os olhos

e dormir um pouco.

Porém, acordei horas depois, quando ouvi gritos no andar de


baixo.

Gritos que ecoavam meu nome pela casa.

Saí do quarto e fui na direção das escadas para ver o que

estava acontecendo.
Pessoas estavam entrando com tapetes, flores e um monte de

outras coisas.

Henry estava no centro do hall, dando ordens para algumas


pessoas.

— O que é isso? — perguntei, bocejando.


Ele se virou.

Henry estava lindo usando um colete preto por cima de uma

camisa vinho. Seus cabelos estavam brilhantes e penteados para

trás.
Ele sorriu de satisfação ao me ver.

— Olá, meu amor, que bom que acordou. Hoje é o nosso

casamento.
Desci as escadas lentamente, desconfiada. Aproximei-me

dele.

— Henry, são... nove horas da manhã.

— Sim, e vamos nos casar ao entardecer. — Sua convicção de


que aquilo estava certo era tão grande que eu nem sabia o que

dizer. — Ahn, olhe, essas pessoas vão cuidar de você.

Olhei para três jovens que estavam atrás de si, apenas


esperando suas ordens.

— Céus, isso vai mesmo acontecer hoje?

— Vai, sim... — Ele sorriu e segurou meu rosto com

delicadeza. — Não é empolgante? — Ele abaixou a cabeça e se


aproximou do meu ouvido: — Claro que o que eu vou fazer com

você depois vai ser muito mais...

No mesmo instante, um arrepio percorreu meu corpo inteiro.


— Henry...

Ele riu, me abraçou e depositou um beijo em meu rosto.


— Vá se trocar, tomar café da manhã e esteja preparada para

esses jovens cuidarem de você.

Não aguentei segurar o meio-sorriso que apareceu em meus

lábios.
Ele parecia uma criança feliz.

Dei passos para trás, voltando para a escada.

— Você pensou em tudo, não é?


— Com certeza.

— O senhor é habilidoso, lorde Spencer.

Henry estufou o peito ainda mais, como se fosse possível.


— Eu sou a porra do dono da Inglaterra! O que eu digo é lei.

O poder de suas palavras reverberou até em lugares que não

deveriam, inclusive no meio das minhas pernas.

Ele era um desgraçado, mas eu estava começando a gostar de


ver a sua influência diante dos meros mortais.

E eu só conseguia pensar no que estava por vir depois do

casamento.
Em nosso quarto.
Minha loucura está à solta

E correndo, em cima de você


Por favor, me leve a lugares que ninguém vai
Você me deixou viciada nesse sentimento

Gangsta - Kehlani

Emmeline

— Meu Deus, a senhorita está linda! — Thalia se afastou com


as mãos no rosto. — Que inveja, meu Deus!

Abri um meio-sorriso.

Virei o rosto e encarei meu reflexo no espelho ornamentado


com arabescos de ouro.

Eu estava linda, de verdade.


— E que honra para nós podermos fazer parte deste momento

único em sua vida, senhorita Jones — o rapaz asiático que arrumou

meus cabelos disse, com orgulho.


— Obrigada. — Sorri. — Vocês fizeram um ótimo trabalho.

Meu cabelo estava preso em um coque alto com várias


mechas finas caindo ao redor do meu rosto. Havia uma tiara de

diamantes, que Henry mandou entregar durante o dia. Fazia parte

do acervo de joias de sua família, segundo o bilhete que ele deixou


anexado ao pacote.

Do lado de fora do quarto estava escurecendo bem

lentamente.
Levantei-me e me aproximei do espelho de corpo inteiro. Meu

vestido era longo, branco e todo rendado. Era em decote V e a saia

se moldava ao meu corpo de uma forma sexy e ousada.


Eu queria saber como Henry conseguira a peça, mas essa

pergunta ficaria para outro dia. Importava era que ela serviu
perfeitamente, como se ele tivesse memorizado as minhas medidas.

Estava mesmo acontecendo.

Em poucos minutos, eu seria a esposa de Henry.

Por que isso não me assustava mais?

Fechei os olhos e respirei fundo.

Queria que meus pais estivessem aqui. Mamãe me olharia nos


olhos e diria que eu era a noiva perfeita. Aquela que saiu dos contos
de fadas. Aquela que se casaria com o príncipe e seria feliz até que
a morte os separasse.

Ela gostava de Henry, por algum motivo que nunca me

revelou.

— A noivinha já está pronta? — Nathan abriu a porta com

tudo, fazendo-nos dar um pulo.

— Meu Deus, Nathan! — Thalia levou uma mão ao peito. —


Não faça isso. Quase me mata de susto!

Ele deu uma risadinha e cruzou os braços.

— Colin já chegou e está esperando por ela... — Seus olhos

percorreram-me da cabeça aos pés, mas eu não recuei, mantive

meu queixo erguido. — Que Deus me livre de um dia passar por

isso.

— Você não quer se casar? — perguntei, franzindo o cenho.


— Não, minha querida. Casamento é para gente louca, como o

chefe. Então, só posso desejar boa sorte a vocês. Não sei se mais a

ele, que vai precisar lidar com uma criança, ou se a você, que vai

dividir a vida com a mente fodida dele.

Nathan era o cara mais estranho que eu conhecia.

No começo, ele me tratou como se eu fosse apenas um


pedaço de carne e eu realmente senti medo de que ele tentasse
qualquer gracinha. No entanto, fui surpreendida ao ver que ele

mantinha distância. Talvez fosse por medo de Henry, eu não sabia.


— Você é um homem estranho, Nathan... — falei,

aproximando-me devagar. — Será que não é um dos homens que


arquitetou o ataque a mim no dia do meu noivado? Será que, no
fundo, você não quer ver o meu futuro marido morto?

Nathan arregalou os olhos como se eu tivesse dito uma


blasfêmia.

— Eu sei que não presto, mas jamais trairia o chefe.


— Diz isso apenas por ter medo de Henry? — zombei.

Ele cruzou os braços.


— Não tenho medo do chefe, tenho respeito. Ele conquistou
isso de nós com o passar dos anos. Então... se em algum momento

fui desrespeitoso com você, foi porque pensei que seria apenas uma
distração. Não achei que se tornaria minha senhora.

Suas palavras fizeram meu estômago gelar.


Eu costumava esquecer que assim que me tornasse de Henry,

adotaria também a sua segunda vida.


— Mas que porra de demora... — As palavras de Colin
morreram assim que ele entrou no quarto e seus olhos pousaram

em mim.
Podia apostar que um filme se passou em sua cabeça.

— Você está linda, Emme... — Sua voz saiu com dificuldade.


Seus olhos se fixaram em meu rosto e ele suspirou, depois disse: —

Deixem-me a sós com minha irmã.


Nathan, Thalia e os outros saíram imediatamente.

Colin se afastou até a janela e disse:


— Como você está se sentindo?
— Sinceramente? Não sei.

Ele me olhou, depois deu uma risadinha.


— Só pelo fato de você não estar tentando se jogar da janela,

acredito que já fizeram um grande avanço.


Minhas bochechas queimaram e eu olhei para o chão.
— Colin... você convive com Henry há muito mais tempo que

eu. — Voltei a encará-lo. Ele se sentou na beirada da janela. —


Você acha que... ele pode algum dia me amar?

Colin ficou em silêncio por alguns instantes.


— Ele disse que te daria o mundo se você pedisse. Por que

não pede isso a ele?


Para mim, o sentimento de Henry nunca passou de uma
obsessão. Uma fantasia que ele criou em sua mente e nada mais. E
não era isso o que eu queria, embora agora eu me sentisse bem
diferente em relação à sua euforia em me ter.
Olhei para cima e respirei fundo.

— Eu só queria construir uma família como a nossa um dia foi,


quando o papai ainda era vivo.

Colin voltou a olhar para a janela.


— Henry será um bom marido.
— Quem me garante isso? E se depois do casamento, ele me

mandar para alguma de suas propriedades como seus


antepassados faziam com as mulheres que não queriam mais?

— Você está delirando, Emmeline.


— Eu estou falando a verdade! — Cortei a distância entre nós

e puxei a mão de Colin, segurando-a com carinho. — Quem pode


me garantir que meu casamento será bom?
— Henry me deu sua palavra.

— E você confia na palavra dele?


— Cegamente.

Encarei os olhos do meu irmão por vários segundos.


Sinceramente, eu não entendia de onde vinha aquela ligação
tão forte entre meu irmão e Henry, sendo que logo quando cheguei,
Henry mesmo disse que o machucou de alguma forma por não ter
seguido suas ordens.
— Mesmo quando ele o faz sofrer por não cumprir com suas

ordens?
Colin soltou minha mão e se levantou.

— Eu falhei naquele dia. Deveria ter feito o que ele mandou,


mas coloquei o seu desejo em primeiro lugar. — Sua voz continha
um tipo de emoção que fazia meu coração doer. — Às vezes,

fazemos escolhas que nos custam caro, Emmeline. Talvez você não

entenda, mas, quem sabe um dia, consiga entender.


Meu irmão havia escolhido esse caminho por não saber da

existência de outros. Ou talvez ele sabia, mas não achou que seria

capaz de seguir em frente sem nos condenar.

— Ela é... bonita? — perguntei baixinho.


Seu rosto adquiriu um tom vermelho e ele deu uma risadinha.

O safado sabia exatamente sobre o que eu estava falando.

Fazia anos que eu não via um sorriso tão bonito. Tão genuíno.
— É linda.

— Ela virá ao casamento?

Seu semblante se fechou.


— Não. Ela... foi para a Alemanha. — Ele suspirou. — E é

melhor, sabe? Essa coisa toda de sentimento só serve para nos


deixar fracos e vulneráveis.

Fiquei em silêncio por vários instantes.

Não conseguia deixar de pensar que tipo de vida era aquela


que levávamos. Existia uma vida em que as pessoas podiam

escolher seus próprios caminhos? Uma vida em que as pessoas

fossem livres para amar quem elas quisessem?

— Às vezes, eu me sinto dentro de uma história. Um conto de


fadas... só que aqui eu não me caso com o mocinho, mas sim com o

vilão.

— E quem disse que o vilão não pode ser o mocinho? — Colin


ergueu meu queixo e sorriu. — Eu já disse que tudo depende de

você. E pelo que percebi, você tem feito milagres...

— Como assim? — Afastei-me de Colin, completamente


corada.

— Bem, Henry estava bem calmo ontem... e na reunião não

atirou em ninguém. Acho que já é um progresso bem grande.

Dei risada e balancei a cabeça negativamente.


Céus, o que estava acontecendo comigo?

— Bem, está pronta? Estamos atrasados para a cerimônia.


Aproximei-me do espelho e me olhei pela última vez. A tiara de

diamantes em minha cabeça denunciava a princesa que eu não era.

O vestido branco glamouroso mostrava que eu era apenas uma


criança sendo levada ao cativeiro.

Mesmo assim, com a mente entorpecida, eu disse:

— Estou pronta.

Henry estava me esperando ao lado do celebrante, que estava

atrás de uma mesinha adornada com uma toalha branca de cetim.

Meu braço estava atrelado ao do meu irmão enquanto ele me


levava até Henry através do tapete vermelho.

Olhei para os convidados.

De onde eles haviam saído? Bem, alguns rostos eu conhecia.

Eram os bem íntimos. Se tinham trinta pessoas naquela cerimônia,


era muito.

Claro, seus homens estavam ali também. E desta vez eles

nem disfarçavam o que eram.


Foquei meu olhar no homem bonito e elegante que me

esperava na frente. Henry estava usando um terno preto com


gravata borboleta. Estava lindo e eu já não conseguia mais deixar

de olhá-lo.
Como foi que aquele homem cruzou a minha vida?

Tudo parecia tão surreal.

Colin me entregou a Henry, que agradeceu dando-lhe um


abraço apertado. Depois, pegou a minha mão e depositou um beijo

delicado.

O celebrante falou muitas coisas sobre casamento. Mas a

verdade era que minha atenção estava apenas na mão grande


entrelaçada à minha.

Se Henry pudesse me amar...

Talvez eu fosse capaz de esquecer todo o passado e focar no


futuro em que seríamos felizes.

— Senhorita? — Voltei a mim quando o homem chamou a

minha atenção.

— Ah, desculpe. Me perdi.


Ouvi risadinhas ao fundo.

— Fique tranquila, apenas perguntei se é de sua livre e

espontânea vontade se casar com Henry Thomas Spencer, e assim


se tornar sua esposa perante Deus e os homens, conforme o

sagrado matrimônio na Inglaterra de Vossa Majestade, a Rainha.


Olhei dentro dos olhos de Henry.

Ele parecia apreensivo. Com medo.

— Sim, é de minha livre e espontânea vontade — falei,

voltando a olhar para o celebrante.


Henry relaxou.

E assim a cerimônia prosseguiu.

Fizemos nossos votos.


Trocamos alianças.

O celebrante nos declarou casados.

E Henry me beijou como se não houvesse amanhã.

— Cunhadinha... sua festa está maravilhosa! — Ellen se

aproximou com um copo de bebida na mão. — E olha que foi tudo

de última hora.
— Henry é louco.

Ellen deu risada, então se sentou ao meu lado.

Eu estava sentada em um sofá porque o sapato estava


machucando meus pés, então pedi licença a todos e procurei um

lugar. Ellen tinha acabado de me encontrar.


— Falando em Henry, onde ele está? — ela perguntou, seus

olhos varrendo a pequena multidão. — Ah, lá está. Conversando


com lorde Thompson.

Fiz uma careta de desgosto.

— Não acredito que ele teve a ousadia de convidar essa

gente.
— Não dava para fugir. Lorde Thompson é amigo de nossa

família há anos — Ellen esclareceu. — Mas não fique assim,

Stephanie está mantendo a distância.


E estava mesmo, para o meu gosto.

— Você não vai dançar? — Ellen perguntou.

— Não sei, este sapato está me matando.


— Eu queria dançar com Colin, mas ele claramente não quer.

— Ela fez uma careta.

Olhei para Ellen e tive vontade de dizer a ela para esquecer

meu irmão, porque o coração dele já tinha dona. Porém eu não


conseguia destruir suas ilusões assim.

— Desculpe interromper a conversa, mas eu vim reivindicar a

minha esposa. — Henry se aproximou, estendendo a mão. —


Chegou a hora da nossa dança, meu amor.

— Meu sapato está me machucando.


Ele ergueu as sobrancelhas em compreensão, então se
abaixou na minha frente e ergueu um pouco o meu vestido. Com

delicadeza, tirou meus sapatos e começou a massagear os meus

pés.
Meu corpo começou a relaxar.

— Dance descalça, mas não podemos deixar passar este

momento.
— Tudo bem...

Henry sorriu e se levantou, me estendendo a mão, que eu

aceitei de bom grado.

Ele me levou até o meio do salão e, de repente, uma valsa


começou a tocar. Ele colocou uma mão na minha cintura e a outra

encaixou na minha estendida.

Seus olhos se grudaram aos meus.


E nossos corpos começaram a se movimentar conforme o

ritmo da música.
Henry girou meu corpo, o que me fez soltar uma risada.
Relaxei em seus braços.

Estava tão entregue ao ritmo da música e aos braços ao meu


redor, que me esqueci completamente que estávamos sendo
observados pelos convidados.
Henry soltou minha mão e seus braços grudaram em minha
cintura. Os meus se fecharam ao redor de seu pescoço.
Henry era meu.

E eu era dele.
Não havia como fugir disso.
E eu também não queria mais...

Agora eu queria conhecê-lo. Mergulhar em sua mente obscura


e descobrir quais eram os seus segredos.
Alguém assobiou, fazendo graça da nossa dança, e eu desviei

o olhar na direção da pessoa.


E então eu o vi.
Ele estava parado, atrás do homem que fez a graça.

Os olhos verdes que um dia eu quis mergulhar.


Meu corpo inteiro se retesou e de repente fiquei atordoada.
— Emme? Você está bem? — Henry perguntou, preocupado.

Voltei a olhar para ele, mas eu já não tinha mais ânimo para
aquela dança.

— Eu... estou, eu... preciso de um pouco de ar, apenas. —


Olhei novamente na direção, mas ele havia sumido.
Será que eu estava ficando louca?
— Quer que eu a acompanhe até o jardim? — Henry
perguntou.
— Não... eu já volto. Vou até o banheiro.

Afastei-me de Henry, na direção do corredor.


Será que eu estava vendo coisas?

Quando atravessei a segunda porta, senti uma mão me


puxando para dentro de um dos cômodos da casa.
— Emmeline?

Congelei no mesmo instante que ouvi aquela voz.


Não, não podia ser.
— Emmeline, sou eu.

Sim, claro que era.


E meu coração quase parou.
— William?
É perigoso se apaixonar

Mas quero queimar com você esta noite


Fire Meet Gasoline - Sia

Emmeline

Existem coisas que são difíceis de apagar da memória,


principalmente, quando começam a criar raízes em seu coração.

Aqueles olhos verdes... tão lindos. Duas esmeraldas


apreensivas que me olhavam como se eu fosse a última pessoa a

existir na face da Terra.

— Emmeline, sou eu. — William deu um passo em minha


direção e seus lábios vieram aos meus, esfomeados.

Porém meu corpo endureceu.


Aquele nervosismo que eu sentia todas as vezes que William

me beijava, a ansiedade, o tremular das pernas...

Onde estavam?
Então eu o empurrei.

— O que está fazendo aqui? — perguntei, um pouco irritada


com sua audácia de me beijar sabendo que agora eu era uma

mulher casada.

Ele deu um passo para trás, como se tivesse levado um tapa.


— O que estou fazendo aqui? Eu vim salvá-la... vim livrá-la

desse filho da puta.

— Psiu! — Dei um passo em sua direção, com os olhos


arregalados e o dedo indicador nos lábios. — Tem noção de que se

Henry souber que está aqui, sua vida acabou? Meu Deus, você

precisa sair daqui agora!


William estava disfarçado, usando uma peruca preta e um

pouco de maquiagem no rosto para disfarçar seus traços


característicos. Além da roupa de garçom, que fazia com que

passasse despercebido pelos funcionários.

— Emmeline, me escute. — Ele juntou as mãos e as levou à

boca. — Eu tenho um plano, ok? Tem uma pessoa que vai nos

ajudar, ela está do nosso lado e...

— O quê? — Dei mais um passo em sua direção. — Você está


dizendo que o meu marido tem um inimigo aqui dentro?
E foi nesse momento que William me encarou como se tivesse
visto a morte estampada em meu rosto.

— Meu marido? — Seu rosto se contorceu em uma careta de

nojo. — Puta que pariu, Emmeline. Você está apaixonada por

aquele assassino?

Recuei um passo.

Apaixonada?
Não, essa era uma palavra forte demais.

— William. — Respirei fundo. — Eu só quero que você vá

embora. Se Henry souber que você está aqui, vai matá-lo. Pelo

amor de Deus, seja sensato!

William balançou a cabeça negativamente e se aproximou.

Suas mãos vieram ao meu rosto. Seus olhos estavam atordoados.

— Emmeline, me diga que ainda me ama. Diga que você vai


comigo. Eu estou arriscando a minha vida aqui por você. Não posso

ir embora sozinho, por favor.

Fechei os olhos, sentindo o calor de suas mãos em minha

pele.

Por que as coisas tinham que ser assim? Até algum tempo

atrás, eu teria pulado de alegria ao ver William e teria me jogado em


seus braços, teria o beijado com todo o meu coração.
Mas agora...

Eu não sentia mais nada, a não ser temor por Henry nos pegar
a sós.

— Você chegou tarde, William. — Tirei suas mãos do meu


rosto e dei um passo para trás, em direção à porta. — Agora eu sou
Emmeline Jones Spencer e não há volta para isso.

— Emmeline... — Ele fez menção de se aproximar, mas eu me


afastei mais ainda.

— Se não quiser que eu conte ao Henry que esteve aqui, é


melhor ir embora agora. E leve também o seu cúmplice, porque não

vamos ter piedade quando descobrirmos quem ele é.


Então abri a porta da sala e saí.
Recostei-me nela e respirei fundo várias vezes.

Céus, o que eu estava me tornando?

— Meu Deus, Emmeline... o que houve? — Ellen perguntou


assim que eu saí do banheiro e estava voltando para a festa. —
Precisei segurar Henry no lugar. Ele queria entrar no banheiro para

ver se tinha acontecido algo.


— Estou bem, foi apenas um mal-estar. — Ajeitei o cabelo. —

Onde ele está? Eu acho que preciso descansar um pouco.


— Ele está conversando com alguns lordes. Mas se quiser,

posso dizer a ele que você foi para o seu quarto.


— Você faria isso por mim? — Virei-me para Ellen, uma jovem

linda e graciosa que estava cada vez mais entrando em meu


coração.
— Claro, cunhada. Vai lá... e eu tomo conta para não deixar

aquela vadia se aproximar do seu homem.


Dei risada e joguei os braços ao redor de seus ombros.

— Obrigada, querida.
Ellen me abraçou de volta.
— Fico feliz que você entrou na vida de Henry. Eu nunca vi

meu irmão tão apaixonado.


Ellen era apenas alguns anos mais nova que eu, mas eu a

considerava uma criança. E crianças falam de tudo, sem saber o


que realmente significa.

— Aproveite o restante da festa.


Afastei-me e segui na direção da escadaria. Henry me
observava e queria vir falar comigo, mas sua irmã o interceptou e

falou ao seu ouvido. Ele assentiu e me encarou com compreensão.


Subi as escadas e quando cheguei ao andar de cima, olhei na
direção do meu quarto.
Mas a verdade era que eu não queria ir para lá.

Virei na direção oposta e fui até o último cômodo. Abri a porta


e o cheiro de Henry invadiu as minhas narinas. Um cheiro de

perfume amadeirado, misturado com tabaco. Cheiro de homem.


Cheiro do meu homem.
Fechei a porta e apreciei o silêncio por alguns instantes.

Será que eu estava me apaixonando por Henry?


Eu não queria... por motivos óbvios.

Henry não era um homem bom. Ele era um assassino frio,


cruel. Ele ultrapassava os limites para conseguir o que queria. Um

homem que era totalmente o oposto do que meu pai fora um dia.
Aproximei-me da cama coberta por lençóis negros, tirei meus
sapatos e me deitei.

O travesseiro também tinha seu cheiro.


Fechei os olhos e aspirei fundo.

Será que nosso casamento realmente poderia dar certo?

~
Henry

Subi as escadas e fui em direção ao quarto de Emmeline. Abri


a porta, esperando encontrá-la dormindo, mas o que encontrei foi a

sua cama vazia.


— A senhora foi para o seu quarto, meu lorde. — Greta

apareceu atrás de mim com uma montanha de lençóis nos braços.

— Meu quarto? — perguntei, ainda um pouco perplexo.


Não que isso fosse ruim, mas... era diferente. Novo. Emmeline

me aceitando como seu marido era... estranho. E essa nem era a

melhor palavra para definir a confusão que se formava em minha


cabeça.

— Sim, e ela já me pediu para levar as coisas dela para lá.

Uau.

— Ok, vou até lá, então.


Greta me olhou com um sorriso.

Ok, isso era realmente diferente de tudo o que eu esperava.

Virei as costas e segui pelo corredor até o meu quarto. Abri a


porta e entrei devagar, tomando cuidado para não fazer barulho.

Estava tudo escuro, iluminado apenas com a luz da lua que

vinha pela janela. Aproximei-me da cama, onde Emmeline estava


deitada com os olhos fechados, seu peito subindo e descendo com

aquela paz que um dia eu gostaria de provar.


Eu tinha muitos pesadelos, dormia pouco. Passava a maior

parte das minhas noites trabalhando, para evitar a loucura que era

deitar em minha cama e ser atormentado por todo o meu passado,


por toda a vida que eu levava.

Abaixei-me um pouco para observá-la.

Emmeline era a mulher mais bonita que eu já tinha visto em

toda a minha vida. Seus traços eram delicados e eu não conseguia


manter minhas mãos longe de seu corpo.

Arrastei meu polegar pelos lábios bem-desenhados. Depois,

desci os dedos pelo braço desnudo.


Porra, eu era um maluco, mas Emmeline era a minha vida.

Jamais a deixaria livre.

— Henry? — Ela abriu os olhos pesados, sonolentos.


— Oi, querida. Estou aqui.

Sentei-me ao seu lado na cama, Emme se levantou um pouco.

— Nossa, eu dormi muito? — ela perguntou com a voz

sonolenta, então abriu a boca em um bocejo gracioso.


— Um pouco... — admiti, desviando o olhar até suas pernas.

— Por que não tirou o vestido para se deitar?


Suas bochechas coraram.

— Achei que você ia querer fazer isso.

Um sorriso se formou em meus lábios.


— Tem razão, lady Spencer.

Ela deu uma risadinha e se afundou no colchão.

— Acho que nunca vou me acostumar com isso.

— Vai, sim... — Minhas mãos deslizaram em sua perna, por


cima do vestido. — E com outras coisas também.

— Tipo o quê? — Ela abriu um sorrisinho safado.

— Tipo passar a madrugada inteira trepando com seu marido.


— Henry! — Ela virou o rosto, afundando-o no travesseiro.

Dei risada e me levantei, tirando o terno e jogando-o em cima

de uma cadeira.

— Venha aqui, deixe-me ajudá-la com esse vestido.


Emmeline se levantou e veio em minha direção. Seus cabelos

estavam bagunçados, sua maquiagem borrada, o vestido torto.

Mesmo assim, ela me roubava o maldito fôlego.


— Vire-se.

Ela se virou e eu me aproximei, levando meus dedos aos

botões de seu vestido. Seu perfume adocicado invadiu as minhas


narinas e eu só queria me enterrar em seu corpo até nos

esquecermos de quem éramos.


Abri botão por botão e quando sua pele ficou aparente, pousei

minhas mãos. Ela estremeceu sob o meu toque.

— O que foi? — perguntei, mordiscando sua orelha. —


Nervosa?

Ela respirou fundo.

— Não sei. Acho que sim.

— Você acha? Hoje é a sua noite de núpcias, meu amor.


Precisa aproveitar com todas as suas forças.

Ela assentiu.

Passei o meu nariz pela sua nuca. Feliz por cada pelo de seu
corpo se arrepiar ao meu toque.

Empurrei o vestido por seus braços e ele caiu aos nossos pés.

Caralho.

Emmeline estava usando uma combinação de rendas brancas.


— Tem noção que meu pau já está petrificado só de ver isso?

— perguntei, deslizando meus dedos pela sua barriga lisa. — Je

suis complètement fou de toi. Ma puce. — Desci minha mão e


comecei a brincar com a carne úmida de seu sexo. — Mon petit

chatte.
— O que você disse? — ela perguntou, ofegante, enquanto eu

massageava seu clitóris por cima da calcinha.

— Eu disse que sou completamente louco por você. Minha

querida e aqui... — pressionei meus dedos e ela ofegou, empinando


a bunda em minha direção —... é a minha pequena boceta.

Ela ofegou novamente.

Um de seus braços se enroscaram em meu pescoço.


Emmeline soltava gemidos e se esfregava em mim.

Aproveitei para beijar a região do pescoço e da nuca. Com a

outra mão livre, comecei a brincar com um de seus seios,

massageando-os levemente.
— Henry... — Emmeline estava entrando em combustão e eu

estava apenas começando.

— Calma, amor.
Parei de tocá-la e a virei de frente para mim. Peguei sua mão e

a encostei em meu pau.

— Estou assim por você.

— Não esperava outra coisa, lorde Spencer.


— Henry. Para você eu sou apenas Henry.

Ela assentiu e eu abaixei a minha cabeça, capturando seus

lábios nos meus.


Beijei-a como se não houvesse amanhã.

Sua boca era macia, seu gosto maravilhoso. Minha língua a


invadiu e se moveu contra a dela, tornando tudo mais erótico e sexy.

Emmeline tirou as mãos da minha cintura e se concentrou no

colete que eu estava vestindo. Os dedos finos e nervosos

começaram a abrir botão por botão em uma calma que eu mesmo


não teria se estivéssemos em lados opostos.

Quando conseguiu, Emmeline o empurrou contra os meus

ombros. Nossos lábios se separaram para tomarmos fôlego. Sua


boca estava vermelha, os lábios inchados. Perfeita, perfeita.

Seus dedos voltaram à minha gravata e sem dizer nada, a

arrancou. Eu podia ver em seus olhos a luxúria, o desejo de ser


minha mais uma vez. E era óbvio que eu estava pronto para

satisfazê-la.

Emmeline começou a abrir os botões da minha camisa. Agora

ela estava com mais pressa, atrapalhando-se no processo. Então


segurei seus braços e fitei seus olhos:

— Calma. Temos a noite inteira.

— Não quero ter calma. Quero tocar a sua pele.


E a promessa não dita de que ela queria me tocar de uma

forma como jamais tocou, foi o que me fez soltar suas mãos e deixar
que ela voltasse ao seu plano inicial.
Assim que a camisa caiu no chão, Emmeline se aproximou e

percorreu meu peito com o nariz fino, delicado. Fechei os olhos. Ela

depositou um beijo no centro do meu peito.


Uma de suas mãos pousou em cima do meu coração.

— As batidas do seu coração precisam ser apenas minhas.

— Elas são — respondi.


— Então me faça sua.

Dei um passo na direção de Emmeline. Minhas mãos

seguraram seus cabelos e dei um puxão de leve, apenas o

suficiente para que meus lábios pudessem tocar os dela novamente.


Emmeline se entregou, beijando-me de volta.

Seus braços se jogaram ao redor dos meus ombros e eu soltei

seus cabelos e a peguei pelas coxas. Então a virei na direção da


cama.

— Ai, meu Deus, você vai me jogar na cama com tudo, não é?
— Ela se apertou ainda mais ao meu pescoço.
Dei uma risadinha enquanto a levava sem pressa.

— Posso ser delicado, se quiser.


— Eu, ahn... — Ela se afastou apenas um pouco para olhar em
meu rosto. De repente, vi o mesmo brilho de quando éramos
crianças e Emmeline havia aceitado ser minha amiga. — Acho que
não sei.
Fiquei paralisado olhando para o seu rosto.

Será que Emmeline também se dera conta disso? Será que ela
percebia que estava me aceitando em sua vida?
Seria possível que ela me aceitasse em seu coração?

— Então acho que vou ter que te ajudar a descobrir. — Joguei-


a em cima do colchão e antes que ela tivesse tempo para reclamar,
me posicionei por cima de seu corpo. — Eu posso ser um pouco de

cada.
Emmeline riu e eu me enterrei em seu pescoço. Beijei-o em
cada parte. Beijei sua clavícula, mordisquei sua orelha. Falei frases

ousadas em seu ouvido e para cada uma delas, havia um gemido


como resposta.
Desci os lábios pela barriga e arranquei sua calcinha com os

dentes. Emmeline não reclamou, porque antes que ela dissesse


algo, me posicionei entre as suas pernas e a chupei.

Ela ergueu o quadril, exigindo por mais. Lambi, chupei e


mordisquei seu clitóris. Seus dedos se enterravam nos lençóis
enquanto gemidos escapavam de sua boca.
A prova de seu prazer escorria pela minha boca e ela era tão
deliciosa. Seu cheiro era delirante. Estava viciado em seu gosto.
Queria chupá-la daquela maneira todas as noites. Queria vê-la

atingindo o orgasmo sempre com a minha boca em sua boceta.


Subi minha boca por sua barriga e abri o fecho do sutiã,

livrando-a da peça, deixando-a inteiramente nua para mim.


Emmeline era linda, eu nunca me cansaria de admirá-la.
— O que foi? — ela perguntou, o rosto cheio de consternação

pós-orgasmo.
— Você é linda pra caralho.
Comecei a beijar seus seios e depois percorri minha língua ao

redor dos mamilos. Enfiei dois dedos na boceta molhada e a


estimulei mais uma vez, entrando e saindo, levando-a à loucura.
— Henry! — Emmeline gemia o meu nome.

— Goza de novo para mim, meu amor — falei em seu ouvido.


— Vamos lá.
Estoquei os dedos com mais rapidez, com o polegar voltei a

massagear seu clitóris. Emmeline se desfez, sua boceta se


comprimindo ao redor dos meus dedos, levando-a em outra onda de

orgasmo.
— Eu quero você dentro de mim. — Ela segurou o meu rosto.
— Por favor.

Beijei-a nos lábios, deixando-a provar de seu próprio gosto.


Então me afastei, livrei-me da calça e da cueca.
Os olhos de Emmeline pousaram com fome em meu pau.

E era isso o que me satisfazia, saber que ela me queria com


tanto entusiasmo.

Voltei até ela e segurei sua cintura, puxando-a em minha


direção. Seus braços se enroscaram em meu pescoço e eu a beijei.
Quando nossos lábios se separaram, Emmeline disse:

— Me foda, Henry.
Respirei fundo, colando minha testa na dela.
— Não vou te foder hoje, Emmeline. Vou fazer amor com você.

Então a penetrei devagar, sendo recebido pelo calor úmido e


acolhedor. Emmeline gemeu e eu precisei buscar meu autocontrole
para não fazer do meu jeito, mas sim do jeito que ela merecia.

Apoiei uma mão na base de sua coluna e com a outra voltei a


estimular seu clitóris, enquanto entrava e saía em um ritmo calmo,
sem pressa. Eu queria vê-la gozando mais uma vez.

— Meu Deus, Henry — gemeu.


— Caralho, Emmeline. Você me enlouquece.
Acelerei meus movimentos, meu corpo se chocando contra o

dela. Meu prazer se aproximando a cada segundo.


Ela era perfeita e agora era minha, em todos os aspectos.
Seus dedos subiam pelo meu peito em carícias quentes. Eu

nunca havia permitido que nenhuma outra mulher me tocasse desse


jeito.
Emmeline abriu as pernas ainda mais e eu fui mais fundo.

Estava prestes a perder o controle.


— Olhe para mim — ela pediu, puxando meu rosto para si.

Abri os olhos e encontrei Emmeline suada, com os cabelos


bagunçados. A melhor visão que eu poderia ter na porra da minha
vida.

— Quero que você goze olhando em meus olhos — ela disse.


— Então, vamos trocar de posição. — Segurei Emme pela
cintura e a coloquei sentada, com as pernas ao meu redor.

Gememos juntos assim que nos acomodamos na posição.


— Você vai me fazer gozar, Emme — falei, as mãos apoiadas
em sua cintura.

Ela assentiu.
Suas mãos grudaram em meus ombros e começou a cavalgar
o meu pau com entusiasmo.
Ela era novata nisso, mas já havia pegado o jeito.
Ela tentou fechar os olhos, mas mordisquei seus lábios.
— Olhe em meus olhos — ordenei.

Ela abriu um meio-sorriso, mas estava tão concentrada em seu


corpo subindo e descendo no meu, que o sorriso logo se desfez e
deu lugar aos gemidos.

Era uma doce tortura.


Grudei minhas mãos em sua bunda e adicionei um pouco de
rudeza aos seus movimentos.

Emmeline tentou jogar a cabeça para trás, mas eu não deixei.


Então ela encostou a testa na minha.
Seus dedos tocaram o meu rosto.

Sua boca beijou a minha.


Ela gozou e eu sorri ao ver seu rosto se contorcendo de

prazer.
Logo depois, eu gozei também, encerrando tudo com um
gemido de satisfação.

Ficamos ainda um tempo olhando um para o outro.


Estávamos suados, bagunçados, mas satisfeitos.
Levantei o corpo de Emmeline, tirando-a do meu pau e a

coloquei deitada na cama. Fiz menção de me levantar, mas ela me


puxou.
— Fique aqui comigo. Daqui a pouco a gente toma banho.

Assenti e me deitei ao seu lado.


E essa foi a primeira vez que eu dormi sem ter nenhum
pesadelo.
Estou sonhando com todas as possibilidades

Estou beijando todo o seu corpo, minha Nefertiti


E toda vez que penso que os planetas estão alinhados
Você ainda está tão perto, mas mesmo assim tão longe

Still Don’t Know My Name - Labrinth

Emmeline

Algumas semanas depois...

O Natal era em dois dias e a minha vida estava uma loucura.

Ninguém me preparou para as responsabilidades que um

casamento com um homem da aristocracia britânica me traria. Eram


jantares, almoços, apresentação à Rainha e tudo o mais.

Eu estava ocupada desde o segundo dia de casamento.


Henry, no entanto, havia me prometido que depois das festas

de final de ano, tiraríamos um mês para viajar.


“Qualquer lugar” ele dissera e eu já estava fantasiando em

conhecer as praias mais bonitas do mundo.


Nosso casamento estava... quente. Se essa era a palavra

apropriada.

Henry e eu éramos loucos e a melhor parte do nosso dia,


definitivamente, era quando ele me jogava em seus ombros e me

levava para o quarto. Então lá, ele tirava as minhas roupas,

apreciava cada parte do meu corpo lentamente e depois me levava


até as estrelas com a sua língua ou com seu pau maravilhoso.

Eu não tinha motivos para reclamar.

— Sorriso de quem foi bem comida a noite inteira... — E o


sorriso morreu em meus lábios na mesma hora em que Ellen

entrava na sala com uma bandeja de chá e guloseimas.


— Ellen...

Ela deu uma risadinha e se sentou na poltrona à minha frente.

Pegou um biscoito, mordeu e deu de ombros.

— Não fique envergonhada. Todo mundo nesta casa sabe que

você e Henry estão fazendo sexo até no teto.

Minhas bochechas queimaram ainda mais, mas eu me inclinei


e peguei um biscoito.

— Eu estava mesmo com fome. — Mastiguei com vontade.


Ellen encheu duas xícaras de chá e peguei uma.
— O que está lendo? — Ellen perguntou.

— Ahn, comecei um romance que se passa em 1800 e alguma

coisa. — Dei uma risadinha. — Uma autora norte-americana que

escreveu.

Ellen inclinou a cabeça para verificar mais de perto.

— Nossa, eu já ouvi falar sobre esses livros. Tem mais dessa


série, viu?! Soube que vão virar filme, alguma coisa assim.

Bem, eu nunca estava por dentro das notícias, então

realmente não sabia o que acontecia no mundo contemporâneo.

Mesmo assim, abri um sorriso e disse:

— Espero poder assistir, então.

Ellen sorriu de volta, mas antes que eu pudesse dizer mais

alguma coisa, Henry e Colin entraram pela porta da frente e vieram


nos encontrar na sala.

— Chegamos em uma hora boa. — Henry se aproximou e

depositou um beijo demorado em meus lábios. — Eu adoro os

biscoitos que a Greta faz. — Então ele pegou um e enfiou na boca.

Colin se juntou a nós, dando um beijo em minha cabeça.

— Foi a Greta que fez os biscoitos? — perguntei.


— Sim — Ellen assentiu. — Ela também sabe cozinhar, mas é

claro que prefere cuidar da organização da casa junto com o Alfred.


Greta e Alfred eram muito gentis comigo e estavam claramente

felizes por eu ter me casado com Henry.


— E então, sobre o que falavam? — Henry se sentou ao meu
lado, um braço passando por cima do meu ombro e me puxando

para si.
— Estávamos falando mal de vocês. — Ellen fez uma careta.

Colin se sentou no mesmo sofá que ela, só que tomando


cuidado para não ficar muito perto.

— Mal de nós? — Henry se fingiu ofendido, então inclinou-se e


roubou mais alguns biscoitos. — Nós somos tão bonzinhos.
Ele parecia uma criança animada.

— Bonzinhos como o diabo, só se for — ela retrucou. — E


você, Colin. Como está? — Ellen se virou para o meu irmão,

jogando o cabelo para trás, em um típico flerte.


— Bem. Cansado, mas bem.

— Você não parece nada cansado... — Ela tentou se


aproximar para tocá-lo, porém, Henry a fulminou com o olhar. — Ah,
claro. Meu irmão está no auge da lua de mel e se esquecendo dos

deveres. Você está sozinho fazendo todo o trabalho sujo, não é?


Henry tomou um pouco do meu chá e olhou feio para a irmã.

— Por que caralhos você é tão inconveniente assim? Acho que


preciso mandá-la de volta ao Harrogate.

— Não! Desculpa... eu estou brincando.


Colin respirou fundo e trocou olhares com meu marido.

— Bem, estou mesmo trabalhando bastante... mas com


problemas que já estávamos lidando antes do casamento de vocês.
Henry não me falava sobre seus problemas, mas a verdade é

que agora eu queria saber. Queria estar por dentro de cada detalhe.
Toquei sua mão.

— Quer compartilhar?
Ele me fitou e seus ombros relaxaram.
— Não é nada de mais. Um dos membros da Câmara dos

Lordes tentou aprovar uma lei que ia nos prejudicar, mas já lidamos
com isso. O problema é que agora surgiu outra pessoa espalhando

boatos entre os lordes para prejudicar a minha imagem.


— Que boatos?

Seus olhos azuis fitaram os meus.


— Que eu a sequestrei. Que eu a forcei a este casamento.
Engoli em seco.
A verdade era que eu não sabia o que dizer, porque até um
certo momento, aquilo podia ser verdade. Mas então as coisas
mudaram e eu concordei com o casamento.

Sem falar que havia o fato de William ter invadido a nossa


festa. Eu estava mantendo aquilo em segredo, mas sabia que em

algum momento teria que contar ao Henry.


— E você sabe quem é que está espalhando esses boatos?
— Não. — Ele afastou sua mão da minha e coçou o queixo. —

Mas eu vou descobrir logo.


— Mas por que alguém faria algo assim?

Colin suspirou.
— Manchando a imagem de Henry, isso pode deixá-lo

vulnerável para ataques inimigos. E acredite, Emmeline, muita gente


quer a cabeça do seu marido.
Um arrepio percorreu a minha espinha.

Eu precisava contar.
— Mas não se preocupe. — Henry se levantou. — Eu vou

descobrir quem é e vou tratar do assunto com minhas próprias


mãos. Enquanto isso, fique em casa com Ellen... reforcei a
segurança de vocês, mas não as quero andando por aí à toa.

Assenti.
Henry se abaixou e me beijou.
— Hoje tenho uma surpresa para você. Coloque o seu melhor
vestido.

— Sério? O que é?
— Falei que é surpresa. Às sete, venho buscá-la.

Assenti novamente e depois me despedi de Colin, e eles se


foram.
— Emmeline, por que seu irmão me odeia? — Ellen perguntou,

atraindo novamente a minha atenção.

— Ele não te odeia.


— Então por que ele é tão arredio?

— Porque... às vezes o que nos assusta é o que mais nos

atrai.

Eu não sabia para onde exatamente Henry estava me levando,

mas optei por um vestido dourado que era em decote canoa e sua

saia se abria ao longo das minhas pernas. Ele também tinha


detalhes em renda preta, que deixava o dourado um pouco mais

escuro.
— Eu já disse que você está linda? — Henry beijou minha

mão.
— Essa é a quarta vez desde que entramos no carro.

Ele sorriu.

— Linda pra caralho.


Sorri de volta.

— Vai me dizer aonde vamos?

Ele olhou para fora da janela e apontou para um prédio, que

estávamos passando em frente.


— Sabe onde estamos?

Olhei ao redor e é óbvio que reconheci o local. Quantas vezes

caminhei por aquelas ruas.


— Covent Garden?

— Exatamente. E o que temos em Covent Garden que exigiria

um vestido bonito e um terno elegante como o meu?


Minha mente começou a trabalhar com força, pensando nas

inúmeras possibilidades.

Henry me olhava com expectativa. Como se aquele momento

fosse único.
E então arregalei os olhos.

— The Royal Opera House? — arrisquei.


Ele sorriu largamente.

— Ah, meu Deus! Henry! — Meu coração começou a bater

como louco.
A The Royal Opera House era uma casa de ópera, uma das

mais famosas do mundo. Ali se apresentavam artistas, grupos de

ballet famosos e era tudo o que havia de mais lindo e que um dia

fizera parte dos meus sonhos.


O carro parou na Bow Street e Henry desceu primeiro,

estendendo a mão para eu me apoiar nele. Havia fotógrafos, que

quase me cegaram com seus flashes, mas logo fomos conduzidos


ao interior do Palácio.

Henry me guiou até o camarote separado para nós. Quando

nos sentamos, pude apreciar a multidão que se formava nos

assentos de baixo e em outros camarotes.


Era como se eu estivesse dentro do romance que eu estava

lendo, apenas esperando a ópera começar.

— Espero que goste do espetáculo. — Henry encaixou sua


mão na minha e sorriu. — Espero também que não lhe traga

lembranças ruins, porque depois eu tenho mais uma surpresa.

Sorri diante de sua promessa.


Percebi vários olhares em nossa direção. Pessoas curiosas

para ver o duque e sua duquesa modernos.


Foi quando as cortinas do palco abriram, que meu coração

quase parou.

Era uma apresentação de ballet.


Passei metade da apresentação chorando. A outra metade,

sorrindo.

Era tudo tão lindo, tão grandioso, majestoso.

Eu me vi na bailarina que dava saltos e giros no palco com a


leveza de seu corpo. Como um verdadeiro cisne, encantando não só

o príncipe da peça, mas também ao seu público.

Podia ser eu naquele lugar...


Mas a vida tinha reservado outros planos para mim.

Quando a apresentação chegou ao fim, Henry me tocou com

insegurança.
Acho que ele esperava que eu surtasse, dizendo que a culpa

de não ser eu naquele palco era dele. Mas eu apenas sorri e disse:

— Obrigada, eu amei a apresentação.


O receio deixou seus olhos e ele sorriu de volta.

— Fico feliz que gostou.

Nós nos levantamos para ir embora, mas ele me puxou na

direção oposta, que levava ao camarim dos bailarinos.


— Henry, nós não vamos...

— Eu disse que as surpresas não tinham acabado — ele me

lembrou. — Venha, vai ser rápido.


Acompanhei-o pelos corredores e então entramos no camarim

dos bailarinos.

Eles ficaram surpresos, mas sorriram, admirados por nos

conhecerem.
Uma mulher de meia-idade se aproximou com um sorrisão

estampado no rosto.

— Lorde e lady Spencer, é ótimo tê-los aqui conosco.


— Emmeline, esta é Frances Friendtknovich, e ela é a diretora

da The Royal School Ballet — Henry disse e no mesmo instante

meus olhos se arregalaram. — Eu falei para ela que você é bailarina

e que seu sonho era entrar na companhia para dançar com eles.
— Você não fez isso... — falei baixinho, anestesiada.

Henry sorriu.

— Fiz sim, querida.


— Vai ser um prazer tê-la conosco, minha Lady. — A mulher

sorriu ainda mais. — É claro que este ano nosso cast está formado,
mas no ano que vem a senhora poderá dançar conosco, se assim

desejar.

Olhei para Henry, atordoada.

Aquilo era sério?


Eu pensei que...

— A sua felicidade é tudo o que eu quero, Emmeline. — Henry

se virou e segurou meu queixo com delicadeza. — Eu vou ser o


primeiro da fila apreciando os seus passos naquele palco.

E naquele momento, eu soube que dizer sim foi a melhor coisa

que eu tinha feito em minha vida.


Joguei meus braços ao redor de seu pescoço e o beijei com

paixão, com todo aquele sentimento que eu estava começando a

nutrir em meu peito, que eu ainda não queria definir o que era, mas

que já me consumia a cada dia.


— Obrigada, obrigada, obrigada — agradeci, emocionada

demais para formular alguma outra frase.

Ele me abraçou.
— Eu disse que eu te daria o mundo, meu amor. Isso é só o

começo.
Imagino que existe um mundo com

todas as respostas,
elas estão escondidas dentro de mim?
The Skeleton Key - Epica

Emmeline

“Mamãe se trancou no quarto há cinco dias.

Ela não quer comer, beber ou falar comigo.


Já bati várias vezes na porta, fiquei horas sentado esperando

que ela a abrisse para mim, mas ela não quer. Diz que quer ficar

sozinha.
Eu acho que ela está assim desde a última briga que teve com

meu pai.
Ele lhe deu um tapa e a chamou de puta.

Disse também que ela deveria lhe agradecer por ele ter se

casado com ela.


Quero ajudar minha mãe, mas não sei o que fazer.

Meu pai é um monstro.


Ele diz que sou fraco, que só me tolera porque sou seu filho

legítimo.

Mas ele diz que um dia vai me transformar em um homem


digno de ser seu herdeiro.

Não sei se quero isso.”

Na próxima página, havia o desenho de um homem com uma


bala na cabeça e uma poça de sangue ao redor.

Fechei o diário com força e respirei fundo.

Que porra era essa?


Com a loucura do casamento apressado e minhas novas
responsabilidades, eu não tinha conseguido avançar muito na leitura

do diário, mas esta manhã decidi pegá-lo novamente para tentar

entender a mente de Henry.

— Emmeline? — A voz de Henry no corredor me fez esconder

com rapidez o diário embaixo do travesseiro. — Ah, você está

acordada. — Ele entrou no quarto com toda a elegância que lhe era

uma característica natural. — Como está?


Henry se abaixou e depositou um beijo leve em meus lábios.
Uma de suas mãos acariciou meu rosto e ele se sentou na beirada

da cama.

— Estou bem. Você saiu da cama muito cedo.

— Eu tinha coisas a resolver — ele respondeu. Sua mão

começou a brincar com a minha. — Mas agora estou livre até depois

do réveillon. Por isso, pedi aos funcionários que arrumassem nossas


malas. Quero que você conheça um lugar importante para mim.

Seus olhos brilhavam de ansiedade.

— Que lugar é esse?

— Fica em Hertfordshire. É a casa onde nasci e fui criado até

os oito anos de idade.

Saber que Henry queria me levar a um lugar que era especial

para ele, fez o meu coração inflar.


— E a que horas vamos?

— Daqui a pouco, minha lady. — Ele pegou a minha mão e

depositou um beijo sem deixar de encarar meus olhos. — Só vou

esperar você trocar de roupa e tomar o café da manhã.

— Ok, então... — Afastei o edredom e me levantei.

Henry não desviou o olhar do meu corpo enquanto eu ia até o


closet.
— Você não acha que é melhor pedir para a Greta trazer o

café da manhã aqui? — Voltei ao quarto, mas Henry continuava me


encarando.

— Eu acho que vamos atrasar mais que o esperado. — Ele se


levantou e veio em minha direção, como um leão indo atrás de sua
presa. Seu braço rodeou a minha cintura e me puxou para si. —

Não acho que sou capaz de aguentar até a noite para me enterrar
em você novamente.

Ofeguei no momento que ele mordiscou a minha orelha.


— Então o que você tem em mente?

— Oh... mon petit, eu vou te mostrar agora mesmo.


Henry se abaixou e me pegou pelas pernas, o que me fez
soltar um gritinho surpreso.

Ele riu e me levou até a cama.


— Tire a roupa — ordenou, enquanto se afastava para tirar as

suas próprias.
Fiz o que ele disse e fiquei completamente nua, com os

cabelos espalhados no lençol branco. Quando Henry também ficou


completamente nu, subiu na cama e veio para cima de mim.
— Não me canso de admirar você — ele disse, seus olhos

percorrendo toda a minha extensão. — E não me canso de querer


você.

Suas mãos percorreram as minhas pernas, seus dedos


experientes mergulharam entre os meus lábios úmidos e quentes.

Arqueei as costas, pedindo por mais. Sua boca brincou com meus
mamilos e para cada chupada, eu tinha um gemido como resposta.

Henry me estimulou com os dedos até eu gozar. Então, sem


cerimônias, ele me penetrou, nossas peles unidas em um só
objetivo: alcançar o prazer.

— Abra mais as pernas, querida. Deixe-me ir fundo — Henry


disse enquanto entrava e saía com lentidão.

Fiz o que ele disse e Henry aumentou sua velocidade,


estocando com mais força.
— Henry... — gemi seu nome pela milésima vez.

Seus lábios percorriam meu pescoço e revezavam com beijos


e mordidas.

— Minha, só minha — ele dizia, aproximando-se do meu


ouvido. — Eu vou estripar quem ousar olhar para você.

— Eu sou sua.
— Isso mesmo, meu amor.
Henry apoiou os braços ao meu redor e seu quadril ganhou

velocidade. Apoiei minhas mãos em seus ombros e deixei que ele


me levasse até as estrelas.
Estremeci quando alcancei o orgasmo, completamente
satisfeita. Henry gozou logo em seguida, os lindos cabelos pretos

caindo em seus olhos, a pele brilhando de suor.


Se existia coisa melhor que aquilo, eu desconhecia.

Henry saiu de dentro de mim e foi até o banheiro, onde pegou


uma toalha e trouxe para mim. Com cuidado, se ajoelhou na cama e
me limpou de seu sêmen.

— Você ainda está tomando o anticoncepcional, Emme? — ele


perguntou.

— Ahn, sim... por quê?


— Porque eu quero que você pare.

Suas palavras me chocaram, mas no momento que ele se


deitou ao meu lado, apoiei-me em seu peito e o encarei.
— Se eu parar, posso engravidar.

Ele abriu um meio-sorriso.


— E isso seria maravilhoso.

— Achei que não quisesse ser pai agora.


Henry colocou uma mecha do meu cabelo atrás da orelha e
suspirou.
— A vida é muito curta, Emmeline. Você sabe quem eu sou...
pessoas como eu estão em uma guerra todos os dias. — Ao ver o
meu olhar alarmado, ele logo se retratou: — Hey, calma. Só estou

dizendo que quero ver um filho meu na sua barriga, é isso.


— Pode ser filha.

— Melhor ainda.
Henry sorriu e me virou de costas na cama, apoiando-se em
cima de mim.

Então ele me beijou.

E meu corpo se acendeu mais uma vez.

A viagem até Hatfield, uma cidade do condado de

Hertfordshire, durou cerca de uma hora, com Henry dirigindo com


tranquilidade.

— Eu nunca saí de Londres — falei, olhando para a janela do

carro.

— A cidade de Hatfield é tranquila, histórica... acho que você


vai gostar.
Ele seguiu a viagem por uma estradinha cheia de curvas e

depois entrou em uma outra rua que nos levou até o centro da
cidade. Havia casas modernas, mas eu duvidava que era ali a nossa

parada.

Henry dirigiu mais um pouco, afastando-se das casas.


Entramos em uma estrada pavimentada, mas que devia estar

abandonada há algum tempo. Então finalmente nos aproximamos

de uma construção majestosa, que certamente era datada do século

passado.
— Seja bem-vinda à Spencer House.

Conforme o carro se aproximava do palácio, meus olhos o

vislumbravam de cima a baixo.


Era, de fato, a casa de um duque.

Já havia alguns funcionários esperando na escada principal

que levava à entrada da casa.


Henry estacionou o carro e logo atrás dois de seus capangas

também pararam.

Ele desceu, deu a volta e abriu a porta para mim, estendendo

a mão. Segurei-a e impulsionei meu corpo para fora, ainda sem


saber como agir diante daquela magnitude.
Não que a casa de Londres não fosse majestosa, mas ela era

moderna. Este era um palácio digno de uma princesa, uma mulher

com sangue real. Coisa que eu não tinha.


— Gostou? — Henry perguntou com um meio-sorriso.

— É impressionante.

Ele parecia animado.

— Espere só até ver toda a propriedade. — Ele apoiou uma


mão na minha cintura e me guiou até o corredor de funcionários. —

Temos de tudo aqui. Inclusive, cavalos, eu vou te ensinar a montar.

Você quer aprender?


De repente, a minha atenção se fixou na palavra “cavalos”.

Cavalgar sempre foi algo que eu quis aprender.

— Sim, eu quero.

Ele sorriu.
— Então você vai aprender.

Henry se voltou na direção dos funcionários e os

cumprimentou com um sorriso que ele destinava a poucas pessoas.


Eles se abaixaram em uma reverência perfeita.

— Quero que conheçam Emmeline, minha esposa — Henry

disse, orgulhoso. — A nova Duquesa de Cambridge. A dona deste

palácio e a senhora de vocês.


Minhas bochechas coraram, mas eu não tive tempo para

responder, porque os funcionários vieram me cumprimentar,


animados. As mulheres me olhavam como se eu fosse uma boneca

de porcelana.

— Acalmem-se, vocês terão tempo de conhecê-la melhor —


Henry disse, puxando-me para dentro da casa. — Watkins?

— Sim, meu lorde! — Um homem de terno elegante como

Alfred apareceu em nossas vistas.

— Cada dia mais velho, não é? — Henry brincou com o


homem, que deu uma risadinha.

— E o senhor sempre mais bonito.

Senti que havia admiração tanto de uma parte quanto de outra


e isso me deixou ainda mais curiosa.

Como um homem como Henry conseguia tantos olhares de

admiração por pessoas tão simples?

Esse homem era meu marido, mas ainda era uma incógnita
em vários sentidos.

— Nosso quarto está pronto? — Henry perguntou, enquanto

entrávamos no palácio.
— Sim, meu lorde. Tudo pronto para a estadia de Vossas

Graças.
— Ótimo.

Entramos no hall do Palácio e eu me perdi com a

grandiosidade. Havia quadros de ancestrais nas paredes, uma

grandiosa escadaria de mármore que levava ao andar de cima. O


chão também era de mármore e havia aquela antiguidade presente

em cada detalhe.

— Estou me sentindo em um conto de fadas...


Henry sorriu.

— E é tudo seu, meu amor. — Ele se aproximou e me abraçou

por trás. Depositou um beijo em meu pescoço. — Estou ansioso

para lhe mostrar tudo.


— E eu estou ansiosa para conhecer.

Henry me puxou pela mão e me levou até uma sala grandiosa,

que era onde, provavelmente, recebiam as visitas. Os móveis eram


antigos, preservados.

Parei em frente a um quadro que continha um homem

imponente, em uma pose aristocrática.

— Esse é Rudolph Spencer, o primeiro Duque de Cambridge


— Henry disse, parecendo orgulhoso de sua árvore genealógica. —

Sabe como esse título veio parar na minha família?

— Como?
— Rudolph Spencer assassinou um homem em nome da

Coroa Britânica. — Seu sorriso se alargou. — Pois é, querida... —


Seus dedos vieram até o meu queixo e ele fez um carinho. —

Sangue é algo que sempre estará nas nossas mãos.

Engoli em seco.

Apesar de estarmos em perfeita harmonia há um tempo, havia


coisas que eu preferia não pensar.

— Você é louco, Henry.

Ele deu uma risadinha e beijou meu pescoço.


— Eu sou. Sempre fui... mas também sou louco por você.

Meu coração errou uma batida.

Virei-me para o outro lado da sala e havia uma grandiosa


árvore de Natal. Na lareira, meias penduradas.

— Você pensou em tudo, não é?

Ele suspirou e se afastou até uma das poltronas, onde se

sentou e cruzou as pernas.


— Eu nunca comemorei essas datas, mas achei que você ia

gostar disso.

Henry estava agindo de uma forma tão... romântica, que às


vezes eu me assustava.
Acho que no começo, eu esperava que ele me maltratasse, me
humilhasse, e vê-lo agindo de forma diferente, me deixava por

várias vezes sem chão.

Henry era exatamente o oposto do meu pai, mas ao mesmo


tempo era igual.

— Venha aqui — ele me chamou e eu não perdi tempo.

Aproximei-me dele e suas mãos me puxaram para o seu colo.


Cruzei os braços em seu pescoço e aspirei seu perfume

amadeirado. Então depositei um beijo em seu rosto macio, recém-

barbeado.

— Este palácio é mal-assombrado? — perguntei.


Henry deu uma risadinha.

— Eu já ouvi gemidos... e acho que esta noite meus

funcionários também vão ouvir.


Joguei a cabeça para trás, rindo.

— Você é incorrigível, lorde Spencer.


Seus olhos fitaram meu rosto.
— Henry, para você é apenas Henry.
Você se levanta, eu caio

Eu me firmo, você rasteja


Você se contorce, eu me transformo
Quem será o primeiro a queimar?

Black Sea – Natasha Blume

Emmeline

Quando abri os olhos, Henry estava deitado ao meu lado,


olhando para o outro lado, na direção da janela. Sua respiração

estava calma e ele parecia perdido em seus próprios pensamentos.

— Bom dia... — falei baixinho.


Ele virou a cabeça na minha direção e seus olhos se

iluminaram rapidamente.
— Bom dia, Emme.

— Pensando na vida? — Me engatinhei até o seu peito,

encostando-me nua em seu corpo.


Sua mão grande ajeitou o meu cabelo atrás da orelha.

— Acho que sim.


— Quer compartilhar?

Henry olhou novamente na direção da janela e respirou fundo.

— Este lugar me traz muitas lembranças. Boas e ruins... —


Seus olhos voltaram ao meu rosto. — Minha mãe nunca gostou da

casa de Londres, porque ela preferia morar em um lugar mais

afastado. Longe da civilização, mas, principalmente, longe do meu


pai.

Encostei o queixo em seu peito.

— Seu pai não a amava?


— Meu pai amava somente a si — Henry disse, parecendo

reviver memórias sombrias. — E como a maioria dos casamentos


na minha família, mamãe foi prometida ao meu pai ainda jovem.

— Ela também era da nobreza?

— Em partes... — Henry suspirou. — Mamãe era de uma

família importante na Itália.

Meus olhos se arregalaram.

— Isso explica os cabelos pretos que você herdou.


Henry abriu um meio-sorriso.

— Sim, eu puxei bastante de seus traços.


— Lindos traços. — Subi um pouco e depositei um beijo na
ponta do nariz de Henry. — Você é o homem mais bonito que já

conheci até hoje.

As bochechas de Henry adquiriram uma coloração

avermelhada e eu comecei a rir.

— Henry Thomas Spencer com vergonha!

— Pare com isso. — Ele também riu e me virou na cama,


colocando-se por cima de mim.

— Conte-me mais sobre a sua mãe — pedi, olhando dentro de

seus olhos.

Henry respirou fundo.

— Não há muito o que dizer, apenas que ela foi obrigada a se

casar com meu pai por causa da tradição de família e sua vida se

tornou um inferno. Meu pai nunca a amou, ele tinha uma obsessão
por... — Então suas palavras morreram e seus olhos se tornaram

duas pedras de gelo.

— Obsessão pelo quê?

Henry saiu de cima de mim e se sentou na cama.

— Vamos descer para tomar o café da manhã, quero levá-la

para explorar a propriedade.


Abri a boca para fazer mais perguntas, mas Henry foi mais

rápido, se levantou e foi até o banheiro, onde se trancou até eu


desistir e deixar o assunto para outro dia.

Depois do café da manhã, Henry me pediu para acompanhá-lo


até os estábulos.

— Nossa, você tem muitos cavalos — falei, passando pelas


baias.

— Nós temos — Henry me corrigiu. — Você também é dona


de tudo isso agora.

Dei uma olhadinha para trás e sorri enquanto ele me seguia.


— Posso escolher qualquer um, então?
— Desde que seja manso... não vou permitir você montar um

cavalo que possa matá-la.


— Esse aqui? É manso? — perguntei, parando na frente da

baia de um cavalo imponente, de cor baunilha.


— Esse é perfeito, mas ele pertence à Ellen — Henry explicou,
passando a mão pelas orelhas do animal. — Ele é um American
Cream Draft5 e existem poucos deles por aí no mundo. Mas eu

posso conseguir um para você.


— Sério? — Arqueei as sobrancelhas.

— Claro. — Ele sorriu. — Vou pedir para selarem para darmos


um passeio por aí.

Ele se afastou para falar com um cavalariço e eu aguardei,


brincando com o animal.
— Ela gostou da senhorita — disse o rapaz, assim que se

aproximou de nós. — Se bem que Penelope gosta de todos.


— Penelope? — Dei uma risadinha. — É um nome fofo, mas

não sei se combina com o animal.


— E qual nome você pretende colocar no seu? — Henry
ergueu as sobrancelhas.

— Hum... Baunilha, para combinar com a pelagem.


Henry deu risada e me puxou para si, beijando-me com

vontade na frente do funcionário. Por outro lado, o rapaz nem


parecia incomodado, preocupado apenas com seu próprio trabalho.

Após algum tempo, o rapaz nos interrompeu:


— Prontinho, meu lorde.
— Ahn, ok. Venha, Emmeline. Vou ensiná-la a montar.
Henry me guiou até a égua e começou a me explicar as coisas
básicas sobre o animal. Ele falava como um verdadeiro professor e
sua concentração era tão intensa que agora eu entendia como ele

conseguia equilibrar sua vida como um duque e como chefe da


Brandy Blood.

Fiquei pensando o que ele passou para chegar a este patamar.


E essa resposta, certamente, estava dentro daquele diário.
Henry me ensinou a montar na égua, a puxar as rédeas

quando eu quisesse que ela parasse. A incitá-la a ir mais rápido. E


sua paciência comigo era extrema, inclusive quando eu quase caí

pela primeira vez.


Mas depois eu fui pegando o jeito.

E em pouco tempo, eu já estava rodando o jardim.


Claro, toda sorridente.
Então o cavalariço se aproximou de nós com um outro animal,

só que desta vez um cavalo grande, preto. Lindo.


— Venha, Emme. Por hoje, chega... amanhã você pode treinar

mais um pouco — Henry me chamou. — Quero levá-la para dar


uma volta ao redor da propriedade.
Desci do animal, um pouco triste por não ter mais tempo para

cavalgá-la. Quando Henry me colocou sentada no seu cavalo, junto


ao seu corpo, ele mordiscou a minha orelha e disse:
— Não fique triste, o que vou te mostrar vai valer a pena.

Henry me levou para lugares que eu — que nunca havia


pisado fora de Londres — nem sonhava que pudessem existir.

Passamos por algumas de suas terras e falamos com alguns de

seus arrendatários.
Não pude deixar de me surpreender em como Henry os tratava

bem e vice e versa. As pessoas pareciam adorá-lo e isso só me

deixava cada vez mais confusa.


Como ele conseguia ser um homem tão bom com alguns e

mau com outros?

Quando a fome falou mais alto, Henry me levou até um


restaurante simples, mas com uma comida adorável e nos

deliciamos enquanto a dona do estabelecimento contava histórias

de seu passado.

Não me decepcionei um só instante.


Quando saímos do restaurante, Henry disse que queria me

levar a um lugar que ele tinha quase certeza que eu ia amar.


Apesar de estar cansada, não recusei, eu precisava adicionar

na categoria de coisas que eu gostava de fazer com Henry: cavalgar


com ele segurando a minha cintura e mordiscando a minha orelha.

Seu corpo era quente e era impossível controlar as memórias

dos nossos corpos unidos.


Henry galopou até uma pequena floresta, no meio do nada.

Deixamos o cavalo preso em uma árvore e com entusiasmo,

Henry me puxou pela mata, levando-me até um riacho, escondido

por pedras gigantescas ao redor.


Era lindo.

Estávamos cercados pela mata de um lado e do outro

grandiosas rochas, um verdadeiro refúgio.


— Venha, estamos chegando. — Henry me puxou para o outro

lado, atravessamos algumas pedras e quando percebi estávamos

dentro de uma rocha, onde a nossa sombra podia ser vista na água
cristalina.

— Eu gostava de vir aqui quando era criança — Henry

confessou, puxando-me para os seus braços. — Me trazia paz.

— É lindo.
Ele sorriu e sua testa se encostou na minha.

— E sabe por que eu a trouxe aqui agora?


Um arrepio percorreu a minha espinha. Sua voz tinha adquirido

um tom sedutor.

— Por quê?
— Para te foder bem aqui, no meu lugar secreto. — Ele

abaixou a cabeça e beijou a minha clavícula enquanto sua mão se

concentrava em abrir o meu casaco.

Foi como um fósforo sendo aceso e jogado em um tonel de


gasolina.

Quando o casaco caiu no chão, joguei os braços ao redor de

seu pescoço. Nossas bocas se uniram e nos perdemos em um beijo


quente e cheio de tesão.

— Eu te quero — falei quando nos separamos para tomar ar.

— Eu te quero mais.

Meus dedos nervosos empurraram o casaco de Henry e


comecei a abrir os botões de sua camisa. Um a um. Não me

importei se sua camisa ficaria suja, apenas a empurrei para o chão.

Henry também se dedicou à minha blusa. Tirou-a e a jogou no


montante de roupas que estava começando a se acumular no chão.

Estava frio demais, mas Henry conseguia deixar o meu corpo

em chamas e nada mais importava a não ser alcançar o prazer que

sempre se mostrava presente quando nossos corpos se uniam.


Suas mãos abriram o zíper da minha calça e ele se abaixou

para tirá-la enquanto depositava beijos em cada uma das minhas


pernas. Então me ajudou a tirar as botas e em questão de

segundos, eu estava somente de lingerie.

— Você é a única que eu trouxe aqui — ele disse, levantando-


se.

— Fico feliz em saber.

Henry deu uma risadinha, então sua boca colou na minha

novamente enquanto suas mãos se ocupavam de tirar o meu sutiã.


Quando ele caiu aos nossos pés, Henry deixou a minha boca e

desceu até o meu pescoço, espalhando beijos molhados, enquanto

suas mãos acariciavam meus mamilos.


— Tem certeza de que ninguém vai nos pegar aqui? —

perguntei, sabendo do perigo que corríamos.

— Ninguém.

Soltei gemidos entusiasmados, então Henry deixou meu


pescoço e abocanhou um dos meus mamilos. Sua língua os

circulou, depois ele deu uma mordidinha, sempre feliz por me levar

à loucura.
— Henry!
— Diz que sentiu minha falta e eu vou te fazer ter o melhor

orgasmo da sua vida — ele falou, ainda se revezando entre os meus

seios.

— Você me fodeu ontem à noite.


— Mas parece que faz uma eternidade.

Céus, aquele homem era insaciável.

— Não vou falar isso! — Empurrei-o de leve.


— Então só quem vai gozar aqui hoje sou eu.

— Arghhhh! — Mordi seu ombro com força, esperando

arrancar sangue igual da outra vez. — Você quer que eu volte a

odiá-lo, não é?
Henry fitou meus olhos.

— Desde que você me ame mais...

Um lado da minha mente queria dizer a ele que aquilo era


impossível, que o que tínhamos era apenas físico, empolgação de

começo de casamento e que logo passaria, mas o outro lado da

minha mente gritava aqueles sentimentos que eu tentava enterrar a

cada dia que passávamos juntos.


E eu sabia, pelas palavras que li em seu diário, que Henry

tinha um coração despedaçado.


Eu queria remendá-lo, consertá-lo, mas ainda tinha medo de

me perder naquela escuridão.


— Por favor, Henry.

Ele suspirou e suas carícias se intensificaram.

Suas mãos percorriam meu corpo e eu me entregava a cada

segundo. Sua boca voltou à minha e nossos lábios se moviam em


cumplicidade, enquanto seus dedos se infiltravam em minha

intimidade.

Precisei me apoiar em seu corpo quando o prazer assumiu o


controle das minhas emoções. Ele massageava o meu clitóris e eu

pedia por mais. Ele enfiou os dedos em minha boceta e começou a

entrar e sair. Gozei forte, completamente entregue aos seus dedos.


Henry os retirou da minha boceta e os lambeu.

— Porra, você é tão gostosa. Nunca vou me cansar disso.

Minha respiração estava ofegante. Minhas pernas trêmulas.

— Achei que só você ia gozar aqui hoje — falei, em um tom de


provocação.

Henry segurou meus cabelos e os puxou para trás.

— Até hoje você não me deu o prazer de ter a sua boca no


meu pau.

Ele soava perigoso, terrível.


— Eu... eu...
— Ajoelhe-se, Emmeline. Chegou a hora de pagar pelos seus

pecados.

Meus joelhos atingiram a terra e eu sabia que ficariam feridos,


mas havia algo de sedutor na dor.

E eu queria experimentar aquilo.

Olhei para seu pau rosado, grosso e grande. Aquilo jamais


caberia inteiro na minha boca.

Eu queria fazer aquilo há algum tempo, mas não imaginava

que seria assim.

Mexi meus joelhos e fiz uma careta de dor quando minúsculos


pedacinhos de pedra entraram em minha carne.

— Está com medo de me machucar, querida?

Balancei a cabeça negativamente.


— Então o que é?

— Eu não sei fazer isso. Você pode não gostar.


— Eu vou ajudá-la — ele disse, parecendo sentir prazer em
me ensinar mais uma coisa. — Use sua língua, mas não morda, ok?

— Ok.
Segurei seu pau com uma mão e então raspei a minha língua
desde a ponta até a base.
Henry soltou um grunhido.
— Porra, Emmeline.
Abri a boca para engoli-lo, mas ele deu um puxão no meu

cabelo e me olhou com advertência.


— Não morda, hein?!
Assenti rapidamente e abri a boca novamente.

Eu realmente não sabia como fazer um boquete, mas deixei


que os instintos me levassem. Engoli-o até uma parte e o chupei,
como achei que deveria ser.

Henry gemeu e sua mão fez um pouco mais de pressão na


minha cabeça.
— Continue, meu amor.

Lambi a glande e voltei a engoli-lo. Henry mexia os quadris de


forma que seu pau se encontrava com meus movimentos.
Engasguei quando ele tentou ir mais fundo, mas depois me acalmei

e estabelecemos um ritmo só nosso.


Henry estava tão entregue quanto eu.

Era mais gostoso do que eu podia imaginar. Ver que eu podia


lhe dar prazer de outra forma.
— Que porra de boca deliciosa! — ele urrou. — Caralho,

Emmeline. Continue, assim. Isso. Você é ótima, meu amor.


Ele empurrou mais vezes, anestesiado de prazer.
— Eu vou gozar na sua boca e quero que você engula.
Eu poderia ter dito não.

Eu poderia ter me afastado... sabia que ele não iria me obrigar.


Mas eu queria que ele gozasse na minha boca.

Eu queria sentir o seu gosto.


Henry fez suas últimas estocadas e logo senti o líquido meio
adocicado, meio ácido preenchendo a minha boca.

Ele se abaixou apenas um pouco para encarar o meu rosto.


— Quero vê-la engolir.
E eu engoli.

Seus olhos brilharam com a escuridão que havia dentro de si,


então quando pensei que estava tudo acabado, Henry me deu um
beijo apaixonado, sem se importar se a minha boca ainda estava

melada com seu próprio sêmen.


Então me lembrei de uma coisa que ele disse um pouco antes
de nos casarmos:

“Às vezes, a escuridão pode ser boa.”


Eu sei que você pode me amar

Quando não há mais ninguém para culpar


Então esqueça a escuridão
Ainda podemos encontrar uma maneira

Porque nada dura para sempre


Nem mesmo a chuva fria de novembro
November Rain – Guns and Roses

Emmeline

“Passei o dia todo desenhando enquanto mamãe estava

adormecida em sua cama.


Ela não gosta de Londres, diz que é uma cidade sufocante. Ela

gosta do campo, porque diz que a lembra de sua infância no interior


da Bolonha. Viemos para cá por causa das reuniões do meu pai

com o Parlamento.

Eu a desenhei com os olhos fechados.


A desenhei com flores à sua volta...

E depois vi que eu a tinha desenhado dentro de um caixão.


Rasguei o desenho e o joguei na lareira, mas quando meu pai

entrou no quarto e me viu chorando, me deu vários tapas e chutes.

Disse que eu era um moleque mimado e que precisava entrar na


linha e virar homem de verdade. Ele me proibiu de ficar com minha

mãe e disse que vai mandá-la de volta a Hertfordshire.

Eu disse que quero ir junto.


Ele riu e disse que só se for para eu vê-la morrer.”

Fechei o diário, trêmula.

A cada linha do diário, tinha mais certeza da infância terrível


que Henry tivera.
Suas dores, seu sofrimento. Um pai abusivo...

Olhei para a janela, estava escuro do lado de fora, chovendo

bastante.

Depois do passeio da tarde, Henry e eu voltamos para casa e

eu me deitei no quarto enquanto ele disse que precisava resolver

algumas coisas no escritório.

Acabei jantando sozinha e já era bem tarde. Algo me dizia que


Henry não voltaria para o quarto tão cedo. Então levantei-me, vesti
um robe, guardei o diário no meio das minhas roupas, joguei um
cobertor por cima das costas e saí do quarto. Desci as escadas e

virei na direção do escritório, porém, vi que ainda havia um pouco

de luz na sala principal.

Aproximei-me e encontrei Henry, sentado no chão com as

pernas cruzadas, nu da cintura para cima, olhando para a lareira

crepitante, com uma garrafa de vinho ao seu lado, que já estava


pela metade.

— Não vai vir para o quarto?

Ele me olhou sobre o ombro.

— Ah... você está acordada. Venha, fique aqui comigo.

Aproximei-me e ele abriu as pernas para eu me sentar

encaixada em seu corpo. Ele pegou o cobertor e jogou em suas

próprias costas e quando me acomodei, seus braços me


circundaram e o cobertor nos abraçou, trazendo calor para aquela

noite fria de dezembro.

— Xampu de baunilha — ele disse, ao aspirar o cheiro do meu

cabelo.

— É... eu trouxe na mala.

— Que ótimo. Eu adoro esse cheiro.


Fechei os olhos e relaxei contra o corpo de Henry. Agora a

chama da lareira estava me aquecendo também.


— É difícil para você, não é? — perguntei.

— O quê?
— As memórias.
Henry ficou em silêncio e eu pensei que ele não ia responder,

mas então ele disse:


— São difíceis. Mas eu aprendi a lidar com elas durante os

anos... só que desta vez... — Ele suspirou. — Parece que estou


carregando um caminhão em minhas costas.

— Será que é por que estou aqui?


— Talvez.
Eu queria saber por que Henry cruzara o meu caminho. Por

que e como seu pai conhecia minha mãe. Mas eu sabia que, talvez,
ele não estivesse preparado para me dar aquelas respostas.

Ou talvez nem ele mesmo soubesse por que nosso destino era
interligado.

— Me conte um pouco sobre a sua infância... digo, antes de


nos conhecermos.
Henry suspirou, então puxou a garrafa de vinho e a taça.

Encheu-a e me entregou.
— Beba.

Bebi um gole apenas, queria ouvir sua história de seus


próprios lábios.

— Não tenho muitas novidades. Meu pai me odiava e com isso


me criou de forma rígida, e a verdade é que sempre fui mais

próximo da minha mãe. — Henry parou de falar. Seus olhos se


fecharam e eu sentia a dor que emanava de si ao se lembrar do
passado. — Frequentei os melhores colégios, a melhor faculdade.

Fui treinado para ser o chefe da Brandy Blood e aqui estou. — Seus
olhos se abriram, agora frios. — Minha vida nunca foi interessante,

Emmeline.
Bebi mais um gole do vinho e abaixei a cabeça.
— Eu... ahn, me recordo de algumas coisas da minha infância

— comecei a falar porque agora era a minha vez de deixá-lo


conhecer a Emmeline de antes da morte do pai. — Mamãe gostava

de colher girassóis no jardim. Ela sempre arrumava um vaso com


muitos girassóis e o colocava em cima da mesa do jantar. Papai

adorava, porque... não me recordo bem, mas acho que ele era
jardineiro antes de se casar com minha mãe.
— O que mais você sabe sobre seus pais? — Henry

perguntou.
— Pouca coisa. Não conheci meus avós, nem sei se tenho tios
ou tias. Se tenho primos. Não sei nada disso... — Desenhei um
círculo no tapete felpudo. — O que eu sei era que meus pais eram

extremamente apaixonados. E mamãe quase morreu quando ele se


foi.

Henry ficou em silêncio por um bom tempo.


— Acho que essa conversa está tirando o nosso foco — ele
disse.

— Que é...?
— Apreciar a presença um do outro. — Ele deu uma risadinha

e me beijou na têmpora, apertando-me em seus braços. — Anda,


beba logo esse vinho e vamos para a cama. Quero me esquentar

debaixo das cobertas com você.


E eu sabia o que aquelas palavras significavam.
Bebi todo o resto da taça de uma só vez.

Henry riu e se levantou. Então me pegou no colo e me levou


como um verdadeiro homem das cavernas.

O problema era que eu adorava aquilo.

~
A manhã de Natal estava fria como as outras, mas, por sorte, a
chuva tinha parado. E nem havia sinal de neve, o que costumava
acontecer em alguns anos.

Fui surpreendida por Henry que trouxe uma bandeja de café


da manhã na cama. Junto, havia uma caixinha vermelha com um

lindo colar de diamantes. Fiquei sem graça porque eu não havia


comprado nenhum presente para ele, mas ele disse que não
precisava de nada, apenas de mim.

Depois do café da manhã, nós nos encontramos do lado de

fora, onde pratiquei mais uma vez andar a cavalo. Depois, Henry me
levou até uma sala e quando digitou um código na parede, um

arsenal de armas se revelou e eu arregalei os olhos.

— Centenas de milhares de libras estão aqui — ele disse,

orgulhoso de sua coleção. — Escolha uma.


— O quê?

— Você não disse que queria aprender a atirar? Vamos

começar suas aulas.


Aproximei-me do arsenal, sem saber qual escolher.

Eram tantas, de vários modelos, grandes, pequenas...

Peguei uma.
— Essa é uma 9mm simples — Henry disse, pegando uma

outra bem mais sofisticada. — Ela veio dos Estados Unidos. Acho
que é uma boa arma para você começar.

Respirei fundo e ergui minha mão atada à pistola.

Não era a primeira vez que eu segurava uma, mas... eu


realmente ia aprender a usá-la?

O que aquilo ia fazer comigo? Ia me dar a sensação de poder?

Ia me destruir?

Deixei a arma em cima da mesa e me afastei, de repente


enjoada.

— Emmeline?

— Não, é que... — Ele ia rir de mim, mesmo assim, eu falei: —


Tenho medo de aprender a usar isso e me tornar outra pessoa.

— Você tem o poder da escolha, Emmeline. Aprender a usar

uma arma não significa que você vai sair matando pessoas por aí.
Isso é tudo parte de um círculo vicioso. Meu pai era assim, meu avô

também... está no meu sangue e na responsabilidade que foi

passada a mim. Você não precisa ser nada disso. — Ele pegou a

pistola, deu a volta na mesa e a estendeu para mim. — Você pode


escolher usá-la quando achar que é necessário. Quando sua vida

estiver em perigo... essas coisas.


Olhei para o objeto e respirei fundo várias vezes.

— E se eu acertar alguém por engano?

Henry riu.
— Eu vou ensiná-la. E você não vai ter uma dessa à sua

disposição, assim, tão fácil. Então fique tranquila.

Estendi a mão e peguei a pistola.

— Ok, então. — Virei-me na sua direção. — Só não reclame


depois quando eu acertar o seu braço.

Ele balançou a cabeça negativamente rindo e apertou um

botão que escondeu novamente o arsenal.


— Antes o braço do que o coração.

Apertar o gatilho não era difícil.

Difícil era acertar o alvo.


Mesmo assim, Henry foi paciente o tempo todo. Me dando

dicas, mostrando como ele fazia. E eu não queria admitir, mas ele

ficava extremamente sexy empunhando uma pistola como aquela.


Então quando a hora do almoço se aproximou, ele pediu para

eu trocar de roupa, que nós íamos sair.


— Aonde vamos? — perguntei, quando ele me puxou para o

seu cavalo.
— Vamos participar de um almoço de Natal com alguns

amigos.

— Ah, meu Deus, então deixe eu trocar essa roupa! — Tentei


descer do cavalo, mas ele me segurou.

— Não, está ótima assim. Essa família não é como você

espera que sejam.

Estranhei, mas não disse nada.


Henry nos levou pelos campos a galope e quando percebi, nos

aproximávamos de uma propriedade com uma casinha de madeira

antiga. Ela estava decorada com itens de Natal, mas não era nada
extravagante. Coisas bem simples.

— Mas ora, vejam só! Quem é vivo sempre aparece! — Um

homem de aparência idosa e com cabelos grisalhos, saiu da casa

com entusiasmo.
Henry desceu do cavalo e suas mãos vieram à minha cintura,

ajudando-me também.

— Meu bom e velho Harris! — Henry abraçou o homem e eu


não consegui esconder a minha surpresa.

— Lorde Spencer, que bom vê-lo aqui.


Eles se separaram do abraço e o homem olhou em minha

direção.

— Suponho que esta bela mulher seja a nova lady Spencer. —

Ele se abaixou em uma reverência. — É um prazer conhecê-la.


— O prazer é meu... — falei, dando uma olhadinha para Henry.

Ele estava atento à casa antiga.

— Emmeline, este é Harris. Um dos meus arrendatários.


Quando venho a Hertfordshire, gosto de visitá-los.

— E nós sempre ficamos bem felizes com sua visita —

concordou o homem. — Mas, venham. As garotas estão lá dentro

preparando o almoço. Ahn, claro, deixe-me levar o seu cavalo, meu


lorde.

Harris tomou as rédeas do animal e saiu na frente,

completamente extasiado.
Henry o esperou se afastar um pouco, então seus dedos se

entrelaçaram com os meus e começamos a segui-lo.

— Mesmo estando em pleno século vinte e um, algumas

famílias são muito humildes e, algumas vezes, eu preciso ajudá-los


de alguma forma — Henry explicou. — A Brandy Blood também

toma conta dessas famílias, dando-lhes o que é preciso para

sobreviverem.
— Entendo...

— Harris fazia parte da Brandy Blood. Mas ele estava cansado


dessa vida e quando meu pai morreu, deixei que ele se

aposentasse.

— Sério? — Eu sabia que naquele mundo não havia

“aposentadoria” e as pessoas só saíam com a “morte”.


— Sim. Harris foi... o único que me ajudou em várias ocasiões.

Eu o considero muito.

Ver Henry falar daquela maneira de alguém era uma forma


diferente de enxergá-lo.

Meu coração se estufou mais um pouquinho.

Mas também pensei nas coisas que eu estava escondendo


dele desde o nosso casamento.

Eu precisava contar, antes que algo ruim acontecesse.

Quando entramos na casa humilde, duas jovens vieram ao

nosso encontro com um sorriso animado. Elas tinham cabelos loiros


e eram bem parecidas, magras, estatura baixa. Deviam ter quase a

minha idade.

— Vossas Graças. — Elas se abaixaram em uma reverência


perfeita. — Sejam bem-vindos.
— Estas são minhas filhas, Louise e Amabel — Harris as
apresentou. — E elas estavam ansiosas para conhecer Vossa

Graça.

— Me chamem apenas de Emmeline — falei, porque ainda era


estranho usar aquele título. — Meu marido não se importa em

deixarmos as formalidades de lado, não é?

— Claro que não. — Henry tirou o casaco e entregou ao


homem.

Então ali se iniciou uma conversa animada sobre o tempo

instável e a falta de neve em pleno Natal. As garotas me levaram

até a cozinha e eu as ajudei a arrumarem as coisas em cima da


mesa enquanto as conhecia melhor.

Henry ficara na sala conversando com o homem.

— E então, o que vocês fazem da vida? — perguntei às


garotas, que estavam tirando a ave do forno.

— Nós ajudamos o nosso pai com a propriedade — Louise


disse. — Mas, na verdade, gostaríamos muito de ir para Londres.
Queríamos fazer faculdade.

— E por que vocês não vão?


— Porque não temos dinheiro... — Amabel respondeu. —
Tudo o que nosso pai recebe, investe na propriedade e nos gastos
do dia a dia. Não dá para pensarmos nesses luxos.
Meu coração diminuiu um pouco e eu passei todo o almoço
pensando naquelas palavras. Henry estava bem à vontade,

conversando com todos. Nem se parecia com o homem por trás da


Brandy Blood. Aquele era o verdadeiro Henry, que aquelas pessoas
amavam.

Nunca fui uma pessoa religiosa, mas mamãe costumava dizer


que Deus permitia situações para nos levar a lugares
desconhecidos e, assim, poder cumprir com o nosso chamado à

Terra.
Meus sonhos haviam sido enterrados quando Henry apareceu
em minha casa, meses atrás. Mas agora eu tinha o poder de realizar

os sonhos de outras pessoas.


E foi enquanto nós voltávamos para casa, que eu disse:
— Henry, eu quero pagar a faculdade daquelas garotas.

— Isso é... admirável, Emmeline.


Lancei um meio-sorriso.

— Elas precisam ter um futuro e eu vou oferecer isso a elas.


Então me olhe nos olhos

Diga-me o que você vê


Paraíso perfeito
Se desfazendo

Eu queria poder escapar


Eu não quero fingir
Eu queria poder apagar

Fazer seu coração acreditar


Bad Liar – Imagine Dragons

Emmeline

Dormi pelo restante da tarde.

Quando acordei, já estava escuro. Eu nem fazia ideia de que


horas eram, até pegar meu celular e ver que já se passavam das

oito da noite.

Eu só sabia que precisava falar com Henry.


Guardar aquele segredo estava me sufocando e ele precisava

saber o que estava acontecendo. Havia um traidor entre nós e


quanto mais tempo demorássemos para pegá-lo, mais perigoso

seria.

O problema, no entanto, é que eu sabia que assim que


mencionasse o nome de William, Henry ficaria louco e o caçaria por

toda a Inglaterra. E, apesar de não estar mais apaixonada por

William, eu não queria que ele fosse morto.


Eu, definitivamente, não queria o seu sangue em minhas

mãos.

Então, por isso protelei por todos aqueles dias para falar com
Henry. Apesar de ele estar sendo bem gentil e dócil, eu sabia que

aquilo podia ruir em questão de segundos.


Um assassino nunca deixa de ser assassino, mesmo quando

está apaixonado.

Apaixonado...

Suas ações comigo mostravam esse lado, mas a verdade era

que eu não sabia o que Henry definitivamente sentia por mim. Se

fosse apenas uma obsessão, a essa altura já era para ele estar
enjoado. Se fosse amor...

Bem, eu não queria pensar naquilo.


Amor era uma palavra forte demais.
Levantei-me da cama, mas assim que estendi a mão para

pegar o robe, a porta do quarto se abriu e Henry entrou.

— O jantar está pronto... — ele disse, fechando a porta e se

aproximando. — Cheguei na hora certa, pelo visto. — Seus dedos

tocaram meu queixo e ele deu uma risadinha. — Está com a cara de

quem acabou de acordar.


— É... estou muito sonolenta esses dias. Não sei se é por

causa do ar do campo.

— Ou porque não estou te dando paz um só segundo desde

que nos casamos.

— Pode ser. — Dei uma risadinha. — Henry... eu...

— E então? — Sua cabeça se abaixou e seus lábios

encostaram em minha clavícula. — Está com muita fome?


Minhas mãos se apoiaram em seu peito.

— Um pouco...

— Hum... — Suas mãos grudaram em minha cintura e eu

fechei os olhos quando elas se infiltraram por dentro da calça de

moletom que eu estava usando. — Porra, você está sem calcinha?

Henry me encarou.
— Aham.
Seus olhos se tornaram perigosos.

Um sorriso malicioso surgiu em seus lábios.


— Que delícia.

— Henry...
Ele me calou ao puxar com tudo a minha calça para baixo.
— Conversas ficam para depois, Emmeline. — Ele me

empurrou contra a cama e se colocou por cima de mim.


Seus lábios tomaram os meus com fúria.

Livrei-me da calça e ele desceu o quadril com seu pau


latejante sob a calça encostando-se em minha intimidade.

Éramos como fogo e gasolina.


Sempre me esquecia das coisas que eu tinha que dizer ou do
que eu precisava fazer quando sua boca estava na minha ou suas

mãos percorrendo o meu corpo.


— O jantar pode esperar. — Henry se afastou para tirar a

própria camisa e a calça. Eu aproveitei para tirar a minha blusa, e


ele sorriu quando viu que eu também estava sem sutiã. — Caralho,

você sabe como me esperar.


Eu sorri.
Henry voltou para cima de mim e sua boca deslizou entre os

meus seios, minha barriga. Seus dedos se infiltraram em meus


grandes lábios e ele começou a massagear, revezando com

pequenas estocadas de seus dedos em minha boceta.


Gemi sob seu toque.

Arqueei as costas pedindo por mais.


Henry sugou meus mamilos, enterrou seu rosto em meu

pescoço, deu mordidas, marcou-me como sua.


— Goza para mim, meu amor — ele pediu, olhando dentro dos
meus olhos.

Seus dedos intensificaram os movimentos. Joguei a cabeça


para trás, meu corpo estremecendo com a sensação do prazer se

aproximando.
— Não pare — pedi.
— Eu não ia parar mesmo.

Henry me beijou nos lábios com força. Seus dentes


capturaram meu lábio inferior e depois ele o lambeu.

Ele aumentou as estocadas de seus dedos e eu só gemia e


pedia por mais.

— Eu adoro a sua boceta apertadinha, Emme — Henry disse


em meu ouvido. — Todos os dias, fico duro imaginando quantas
maneiras diferentes eu posso te foder.

— Henry!
Ele deu uma risadinha e quando estremeci de prazer, se
afastou para tirar a cueca.
— Fique de quatro para mim, meu amor.

O maldito não precisava pedir duas vezes.


Virei-me na cama e me posicionei com os antebraços e os

joelhos na cama. Henry deslizou os dedos pela minha boceta.


— Puta que pariu, como você é deliciosa, Emme.
— Então, está esperando o que para me foder?

Ele deu uma risada gostosa.


Suas mãos juntaram meus cabelos e ele deu um leve puxão.

— Cada dia mais exigente... — E em uma só estocada, ele me


preencheu. Dei um grito, e ele saiu de mim. — Eu gosto assim, uma

mulher que sabe o que quer.


Fechei os olhos e Henry meteu mais uma vez.
— O que mais você quer de mim, Emmeline?

Henry estabeleceu um ritmo lento, torturante. Uma mão


segurava a minha cintura com força e a outra puxava o meu cabelo.

— Eu quero que você me ame.


Henry não disse nada, apenas aumentou o ritmo de suas
estocadas.

Nós gememos juntos.


Sua mão soltou o meu cabelo e grudou na minha cintura
quando ele quis ir mais fundo e mais rápido.
— Eu amo você, Emmeline — ele disse, extasiado de prazer.

— Porra, eu sempre amei.


Fechei os olhos com o prazer tomando conta do meu corpo.

Henry sabia como fazer, sabia como me levar ao céu em qualquer


que fosse a posição.
Ele disse o que eu queria ouvir, mas...

Bem, não importava.

Henry estocou com mais força e eu estremeci de prazer


quando minhas paredes latejaram ao redor de seu pau. Gemi alto,

apegando-me aos lençóis. Em poucos instantes, Henry urrou e logo

senti o líquido quente me preencher e escorrer um pouco pela

minha perna.
Henry deu o tempo apenas de se recuperar, saiu de dentro de

mim e foi até o banheiro, onde pegou uma toalha e voltou, secando-

me.
Caí no colchão com a respiração acelerada.

Ele se deitou ao meu lado.

Estávamos cansados.
Então a culpa me atingiu porque eu não deveria ter me

deixado levar pelo momento. Eu deveria ter contado a verdade a


ele.

— Henry, eu preciso te falar uma coisa.

Ele estava com os olhos fechados, o antebraço em cima da


testa.

— O quê?

Droga, por que eu enrolei tanto? Agora parecia ser mais difícil

ainda.
— É sobre o dia do nosso casamento.

— O que tem?

Deitei-me de lado. Henry estava relaxado, os olhos fechados,


tentando se recuperar do sexo.

Bem, talvez ele não ficasse tão furioso.

— No dia do nosso casamento... havia uma pessoa dentro da


casa.

— Havia muitas pessoas dentro de casa...

— Não, eu sei... — Respirei fundo. — Estou me referindo a

uma que não foi convidada.


— Impossível, Emme.

— Pois é possível, sim. Estou falando de William.


Henry abriu os olhos no mesmo instante.

— O que disse? — Ele se sentou na cama, atordoado.

— William, eu não sei como... — Sentei-me também, puxando


o lençol para cobrir a minha nudez. — Ele estava vestido como os

funcionários e conseguiu entrar na casa sem ser reconhecido.

Henry me encarou e fazia um bom tempo que eu não o via

daquela forma.
Ele estava atordoado.

Possuído por um demônio.

Ele pulou em cima de mim.


— E agora você está dizendo isso??? — Sua voz estava cheia

de descrença. — O que ele disse para você???

— Henry! — Estava assustada. Ele se apoiava nos braços,

mas seus olhos estavam loucos. — Ele queria que eu fugisse, disse
que tinha uma pessoa lá dentro que ia nos ajudar.

Henry se afastou, atordoado.

Então ele começou a vestir sua cueca e depois a calça.


— Henry! Fale comigo.

— Falar o quê? — ele disparou. A tensão exalava de cada um

de seus poros. — Por que caralhos escondeu isso? — Ele voltou


para cima de mim e segurou meu queixo com força. — Você ia fugir

com ele?
Meus olhos ardiam pelas lágrimas que eu tentava segurar.

— Não. Claro que não.

Isso deve tê-lo acalmado, mas foi só um pouco.


Ele soltou o meu queixo e se levantou.

— Henry, fale comigo! — pedi, as lágrimas descendo pelo meu

rosto. — Eu não falei antes porque eu sabia que essa seria a sua

reação!
— Ah, e você queria que eu reagisse como? — Seus olhos

estavam arregalados, cheios de ódio. — Vou caçar aquele filho da

puta e vou eu mesmo estourar a cabeça dele.


— Henry, pelo amor de Deus! — Desci da cama e me coloquei

na sua frente. — Me escute!

— Eu não vou escutá-la, Emmeline — Ele segurou os meus

braços e me afastou de si. — Você escondeu uma informação


importante. Sabia que estamos correndo perigo? Sabia que Ellen...

Seus olhos se arregalaram.

E foi nesse momento que batidas na porta chamaram a nossa


atenção.
Henry me soltou e foi até ela, abriu-a, mesmo sem estar

vestido da cintura para cima.

— O que foi, Watkins?

— Vossa Graça, perdão por vir aqui chamá-lo, mas acabei de


receber uma ligação urgente de Londres. Aconteceu algo com a

senhorita Ellen.

Dei um passo para trás como se eu tivesse levado um soco.


Henry congelou por alguns instantes, então ele me olhou sobre

o ombro e apontou o dedo.

— Fique aqui até eu voltar.

E saiu do quarto, batendo a porta com força.

É claro que eu não esperei por Henry. Assim que ele saiu, vesti

minhas roupas e desci as escadas. Fui até o escritório e tentei ouvir


atrás da porta.

A porta se abriu e eu quase caí.

— Arrume suas coisas — Henry disse, passando por mim.


— O que houve? Aonde vamos? — perguntei, seguindo-o.

— Vamos voltar a Londres. Agora.


— Henry! — gritei quando chegamos perto da escada. Ele

parou e me encarou. — O que aconteceu?


— Ellen sofreu uma tentativa de sequestro! — ele disse,

furioso. Então se aproximou e segurou meu rosto. — E eu só tenho

uma coisa a dizer, Emmeline: reze ao seu Deus, se é que você tem

um, para que minha irmã esteja bem, porque se algo acontecer a
ela, eu vou culpá-la pelo resto das nossas vidas.

Então ele soltou o meu queixo e subiu as escadas

rapidamente.
Abaixei-me no chão, desesperada.

As lágrimas brotavam uma atrás da outra.

Como eu pude ser tão burra? Como não pensei nas pessoas
ao meu redor?

Se algo acontecesse à Ellen, eu jamais me perdoaria.


Nós gladiamos, mas acho que estamos realmente

lutando contra nós mesmos


Endurecendo nossas mentes para estarmos
prontos quando a hora de matar chegar

Glory and Gore - Lorde

Henry

Quinze anos antes

— Meu lorde? Posso entrar? — Greta enfiou a cabeça na porta

entreaberta. Guardei rapidamente o caderno que eu estava


desenhando embaixo do travesseiro.

— Pode.
Ela entrou e seus olhos vieram na direção do caderno que eu

tinha acabado de esconder.

— Estava desenhando?
— Sim.

Ela abriu um meio-sorriso.


— Sinto muito interrompê-lo, mas seu pai deseja vê-lo.

— Ok.

Levantei-me e fui na direção da porta. Greta me seguiu.


Desci as escadas e fui ao escritório, porque já era costume

encontrá-lo lá, sempre fumando, bebendo ou algumas vezes com

alguma prostituta que ele fazia questão que eu apreciasse.


Só que, desta vez, não era para nenhum dos seus shows

particulares que ele havia mandado me chamar.

No canto do escritório, sentada na poltrona, havia uma mulher


maltrapilha, com um vestido rasgado segurando uma criança de

colo.
— Henry, que bom que chegou. — Papai saiu de trás da mesa

de mogno e veio em minha direção. — Quero lhe apresentar uma

pessoa.

Ele segurou o meu ombro e me guiou na direção da mulher

com a criança.

— Henry, esta bebê se chama Ellen e ela viverá conosco a


partir de hoje.

Olhei para a criança por vários segundos.


— Ela é minha irmã?
— Não, não é sua irmã. — Papai deu uma risadinha. — Seus

pais a deram como pagamento de uma dívida. Claro que agora eles

estão mortos, mas... acho que já sabe o que vou fazer com ela

quando crescer, não é mesmo?

A mulher maltrapilha estendeu a criança em minha direção.

Eu nunca havia segurado um bebê antes, mas quando olhei


para o seu rostinho, tive vontade.

Estendi os braços e a segurei com força.

— Não se apegue a ela, Henry — ele disse, voltando à sua

mesa. — Ela nunca será uma de nós.

Olhei para o meu pai, então virei-me com o bebê nos braços e

fui na direção da porta.

Subi os degraus da escadaria e fui até o quarto de Greta.


Bati.

— O que... meu Deus, de quem é esse bebê, Henry? — Greta

perguntou com os olhos arregalados.

— A partir de hoje, ela é minha irmã. Preciso que me ajude a

cuidar dela, você me ajuda?

Greta se abaixou e olhou do bebê para mim.


— Você é um garoto especial, Henry. É claro que vou ajudar.
Olhei para o bebê e, mesmo sabendo que ela não entenderia

nada do que eu ia dizer, eu disse:


— Você é uma Spencer a partir de hoje. As pessoas deverão

fazer reverências a você. E enquanto eu viver, vou cuidar para que


elas a respeitem. Eu juro.
Eu tinha uma passagem só de ida ao lugar

Onde todos os demônios vão


Onde o vento não muda
E nada na terra pode crescer

Sem esperança, apenas mentiras


E você é ensinado a chorar em seu travesseiro
Mas eu sobrevivi

Alive - Sia

Henry

— Você vai me ignorar até quando? — Emmeline perguntou


baixinho.

Minha concentração estava na estrada à minha frente


enquanto eu pisava no acelerador, impaciente para chegarmos logo

a Londres.

Eu estava puto.
Furioso.

Queria estripar alguém.


E Emmeline deveria saber que essa não era a melhor hora de

me fazer perguntas, ainda mais depois de ter me escondido algo tão

sério.
— Henry, por favor. Vá devagar.

— Eu preciso chegar a Londres o mais rápido possível,

Emmeline. A vida da minha irmã estava em perigo.


Ela respirou fundo e fechou os olhos. Pelo canto do olho, vi

lágrimas rolando por seu rosto.

— Eu não queria mentir para você. Sinto muito, achei que era
o melhor a se fazer...

— Sabia que Ellen não é minha irmã de sangue? — perguntei.


Seus olhos se arregalaram. — Pois é, mas quando ela chegou a

mim, ainda um bebê, eu jurei que ia cuidar dela e matar qualquer

um que ousasse fazer mal a ela. Você ocultou uma informação de

extrema importância, Emmeline. A vida de todos nós está em jogo e

você queria o quê? Proteger aquele filho da puta, era isso?

Ela não respondeu, o que me deixou ainda mais louco.


Pisei com mais força no acelerador.
— Pare de correr, Henry! — ela gritou. — Quer nos matar, é
isso?

Diminui um pouco a velocidade, mesmo assim, fiquei em

silêncio. Não queria conversar, não mesmo.

Eu tinha feito tudo por Emmeline.

Tinha cumprido uma maldita promessa que fiz à minha mãe.

Tinha me apaixonado por ela.


E agora a maldita preferia defender um sujeito que ela mal

conhecia.

Eu me sentia usado, enganado.

E aquela dor era pior do que todas que já senti em minha vida.

Acelerei um pouco mais para que chegássemos logo.

Eu estava louco para colocar minhas mãos nos homens que

tentaram sequestrar Ellen.


Eu estava louco para tocar o terror, mesmo que isso mostrasse

à Emmeline quem eu realmente era.

Para todos os efeitos, já estava na hora de ela ver o lado

estragado e fodido que herdei do meu pai.

~
Eram quase duas horas da manhã quando estacionei o carro

em frente à minha casa de Mayfair.


— Ah, vocês chegaram. — Colin estava descendo as escadas

bem no momento que ultrapassamos a porta de entrada. — Achei


que só viriam amanhã.
— Onde está Ellen? — perguntei.

— Está no quarto, dormindo. Precisei dar alguns comprimidos


para se acalmar. Ela estava fora de si.

Passei as mãos pelos cabelos, nervoso.


— Vamos ao escritório, quero que me passe todos os detalhes

— falei, virando-me para ir.


— Eu posso ficar com Ellen? — Emmeline perguntou, atraindo
a nossa atenção.

Eu queria dizer não, queria que ela sofresse a angústia que


estava em meu peito.

Mesmo assim, eu disse:


— Ok, mas não a acorde.

Emmeline assentiu.
Então virei-me e segui até o escritório, com Colin em meu
encalço.
— Problemas no paraíso? — Colin perguntou assim que

entramos.
— Sua irmã quer foder com o meu juízo. — Fui até o bar e

enchi um copo com uísque. Virei-me para Colin e me aproximei,


então apontei o copo em seu peito junto com o dedo indicador: —

Você sabia que a porra do William Levinsky esteve aqui no dia do


meu casamento? E ainda conversou com a Emmeline, tentando
persuadi-la a fugirem juntos?

Colin ficou genuinamente surpreso.


— Claro que não sabia.

Olhei dentro de seus olhos por vários instantes.


— Se você tivesse feito o seu trabalho direito, não teríamos
esse tipo de problema.

— Qual é? — Colin se afastou até uma poltrona. — Vai jogar


isso na minha cara até quando? Eu já aprendi a lição.

— Não, você não aprendeu a porra da lição, Colin. —


Aproximei-me, deixando-o sem saída a não ser olhar dentro dos

meus olhos. — Agora nós temos dois problemas: William Levinsky


tem algum infiltrado que quer ajudá-lo a ter Emmeline; e essa
tentativa de sequestro de Ellen. Você não acha que tudo isso

acontecendo ao mesmo tempo não é muita coincidência?


— Tem uma coisa que preciso te contar. Duas, na verdade.
Dei um gole na minha bebida e me afastei, esperando que ele
falasse.

— A primeira é que o Thompson está indo a favor de


Rutherford e isso te desfavorece muito no Parlamento.

— Velho desgraçado. Eu vou dar um jeito nisso.


Colin assentiu.
— E a segunda coisa é que... eu descobri algo sobre William

Levinsky. — Colin pegou uma chave que eu mantinha dentro de um


porta-retratos com a foto da minha mãe, foi até um quadro, e abriu

um cofre gaveta que tínhamos ali para nossos arquivos pessoais.


Tirou uma pasta de lá e me entregou. — Eu ia esperar você voltar

de viagem para falar, mas agora que já voltou...


— O que é isso?
— A vida de William Levinsky, ou, melhor dizendo, Giovanni

Domenico.
Sentado no escuro, não posso esquecer

Até mesmo agora, percebo o tempo que nunca terei


Uma outra história das Amargas Pílulas do Destino
Dead Memories - Slipknot

Henry

Quinze anos antes

— Mamãe, você mandou me chamar? — Aproximei-me da


cama, onde ela descansava, com seus longos cabelos pretos

contrastando no lençol branco.

— Mandei, querido. Aproxime-se mais.


Mamãe tinha olheiras profundas. Seu corpo estava bem magro

e ela respirava com dificuldade. Os médicos diziam que ela podia


fechar os olhos a qualquer momento e nunca mais abri-los.
Sentei-me ao seu lado e ela segurou a minha mão com o

pouco de força que ainda restava dentro de si.


— Henry, você sabe que eu tenho orgulho de você, não sabe?

Balancei a cabeça minimamente.

— Meu garoto lindo. Você foi um presente de Deus na minha


vida. — Sua mão soltou a minha e acariciou meu rosto. — Quando

eu achei que não havia nada que me fizesse feliz, você surgiu.

Seus olhos estavam cheios de lágrimas e eu queria poder, de


alguma forma, cessar a sua dor.

— Não gosto de vê-la assim, mamãe.

Ela abriu um sorriso triste.


— Isso logo vai passar, meu amor. — Sua mão agarrou a

minha novamente. — Mas eu pedi que viesse aqui, porque preciso


que faça algo por mim.

— Claro, mamãe, o que a senhora pedir.

Mamãe abriu outro sorriso triste.

— Meu filho, você é o herdeiro legítimo de seu pai. Um dia,

todas as posses serão suas. Os títulos, as terras, o nome. Eu

preciso saber que... — Ela respirou fundo. — Preciso saber que


você será um homem bom.

— Eu serei, mamãe.
Ela balançou a cabeça negativamente.
— Você se lembra da sua tia Eva?

Lembrava-me pouca coisa. Tia Eva nunca veio à nossa casa,

mas algumas vezes acompanhei mamãe até a casa dela, sempre

escondido de nosso pai, onde havia um garoto quase da mesma

idade que eu.

— Lembro.
Mamãe respirou fundo.

— Ela tem uma linda menina de dois aninhos. Ela se chama

Emmeline — mamãe disse, apertando minha mão com um pouco

mais de força. — Henry, você precisa jurar a mim que vai cuidar de

Emmeline e de Colin. Quando chegar à idade certa, vocês deverão

se casar.

— Casar?
Eu tinha apenas oito anos, mas já sabia o que significava um

casamento.

— Essa é a única forma de protegê-la! — Os olhos de mamãe

se arregalaram. — Nossa família na Itália vai requerer a menina

quando ela fizer vinte e um anos. Não podemos deixá-la voltar para

aqueles homens, muito menos cair nas mãos de seu pai. Só você
poderá fazer isso. Jure para mim, Henry. Você irá protegê-la como

se fosse a sua vida. Jure, querido. Eu preciso da sua palavra.


Homens como eu se formavam honrando sua palavra.

Eu sabia que no momento que eu fizesse aquele juramento, a


vida de Emmeline e Colin seria minha.
Eu precisaria protegê-los.

E, ao mesmo tempo, estaria condenando a minha própria vida.


Mesmo assim, aquilo parecia ser o certo, então eu disse:

— Eu juro, mamãe. Protegerei Emmeline e Colin, para o resto


de nossas vidas.
Há uma luz e uma estrada escura

Há uma noite e uma esperança que some


Havia um sonho que, uma vez, foi meu
Mas agora parece que passou com o tempo

The Other Side - Sirenia

Henry

Subi as escadas de dois em dois degraus.


Fui até o quarto de Ellen e quando abri a porta, encontrei

Emmeline, sentada em uma poltrona ao lado da cama.

— Preciso falar com você — falei, chamando-a para fora do


quarto.

Emmeline pareceu relutar alguns instantes, mas então


suspirou e veio em minha direção.

— Resolveu falar comigo agora?


— Não estou com tempo para essas merdas agora, Emmeline

— retruquei. — Só vim aqui para dizer duas coisas.


Ela cruzou os braços e ergueu as sobrancelhas.

A maldita não tinha sequer um resquício de medo de mim.

Eu não sabia mais se eu adorava isso ou se era uma afronta a


tudo o que eu havia me tornado.

— A primeira — ergui o dedo indicador — é que eu vou sair e

não sei quando vou voltar. E a segunda é que em hipótese nenhuma


você ou Ellen devem sair desta casa. Me entendeu?

— Nem com seus capangas?

— Nem com eles. Não quero que vocês coloquem a ponta do


nariz na rua. Fui claro?

Ela deu um passo para trás.


— Mais claro que água.

Olhei para o seu rosto por segundos mais do que deveria.

Queria tocá-la e maldito fosse eu por querer beijá-la. Mas eu não ia

fazer isso, porque Emmeline tinha trazido tudo o que havia ruim em

mim de volta e agora para enterrar isso, só quando eu pegasse

aquele desgraçado e acabasse de uma vez por todas com o


passado que teimava em nos assombrar.

— Fique em casa, Emmeline. E cuide de Ellen.


Ela assentiu e eu virei as costas, seguindo pelo corredor.
— Henry?

Parei e virei-me para ela.

— Você vai atrás de quem?

— Vou atrás do nosso passado e enterrá-lo de uma vez por

todas.

Emmeline abriu a boca, mas eu não esperei para ouvir mais


uma de suas perguntas.

Quando desci as escadas, Colin e Nathan me esperavam no

hall.

— Aonde vamos primeiro? — Colin perguntou, entregando-me

uma de minhas armas.

— Primeiro vamos fazer uma visita aos Thompson.

Stephanie Thompson adorava dormir até tarde.

E o mais engraçado era, sem dúvidas, os gemidos que ela

emitia enquanto dormia. Provavelmente, por causa de algum sonho

erótico, já que a vagabunda adorava dormir nua depois de se tocar

até os dedos caírem.


Ela tinha sorte de que o seu quarto ficava bem longe do de seu

pai.
Eu só gostaria de saber se ela tinha consciência da presa frágil

que era.
Aproximei-me de sua cama e a observei por alguns segundos.
Seu sono era tão pesado que nem mesmo com a minha presença

ali, ao seu lado, ela acordava.


Peguei minha arma do coldre e deslizei pelo vale entre seus

seios. Ela se remexeu, mas ainda assim não acordou. Desci a arma
mais um pouco e circulei seu umbigo com ela.

— Henry... — ela gemeu baixinho.


Hum, ela ainda sonhava comigo.
Que interessante.

Isso facilitaria muito o que eu pretendia.


Desci minha arma mais um pouco e quando ela abriu as

pernas instintivamente, enfiei o cano em sua boceta.


Stephanie acordou em um salto e eu tapei a sua boca com

minha mão enluvada assim que ela tentou soltar um grito.


— Quietinha, Steph — falei em seu ouvido. — Vim apenas
conversar.

Seus olhos estavam arregalados, sua respiração ofegante.


Sentei-me na beirada da cama e guardei a arma. Tirei a mão

de sua boca.
— O que está fazendo aqui a essas horas? — ela perguntou,

virando-se de lado. — Sentiu saudade, é?


— Não fale merdas, Stephanie. Preciso que você faça algo.

— Hum... o que você precisa?


Respirei fundo.
— Seu pai não está dançando conforme a música. Recebi

informações de que ele está a favor de Rutherford. E você sabe que


isso me prejudicaria bastante, não sabe?

Stephanie suspirou.
— Claro. Mas o que eu posso fazer? Meu pai ficou furioso
porque você não se casou comigo.

— Seu pai devia saber que eu jamais me casaria com uma


putinha como você — falei, indo para cima dela. — Você já disse a

ele as maldades que costumava fazer no colégio? Você tem a alma


tão podre quanto a minha, Stephanie. É óbvio que eu jamais

colocaria uma aliança em seu dedo.


— Você me magoa falando desse jeito. — Suas mãos vieram
ao meu peito. — Eu te faria feliz. Dois iguais podem se completar.
— Dois iguais podem foder com tudo, isso sim. — Então saí de
cima de Stephanie e me levantei. — Quero que dê um jeito de
persuadir o seu pai a desistir da Câmara dos Lordes e deixar o lugar

para o seu primo, Gabriel.


— E você acha que eu tenho tanto poder assim sobre o meu

pai?
— Você sabe que tem.
Virei-me na direção da porta.

— E o que eu vou ganhar com isso?


Stephanie ainda ia me deixar louco.

— O que você quer?


Ela se levantou e veio em minha direção.

— Quero uma noite com você.


Stephanie tentou jogar os braços ao redor do meu pescoço,
mas eu segurei.

— Eu não vou trair a minha esposa com você.


— Ela não sente mais repulsa quando você a toca? — Ela deu

uma risadinha. — Ela geme o seu nome como eu fazia?


Dei um passo e segurei o rosto de Stephanie.
— Emmeline é muito mais do que você foi, Stephanie. Ela não

é um passatempo, ela é a minha esposa. Ela é a minha vida. Isso


você nunca vai entender, porque sempre foi uma vadia egoísta. —
Soltei seu rosto com brusquidão. — Agora faça o que eu mandei ou
eu vou ter que resolver com seu pai de outra forma. E acho que isso

você não vai querer, não é?


Stephanie me olhou com raiva.

— Sua amada Emmeline já sabe sobre o passado dela ou


você foi covarde ao ponto de esconder da sua esposa que ela é a
porra da sua prima?

— Cale essa boca, Stephanie. — Dei um passo em sua

direção, mas ela correu pelo quarto. — Se eu souber que você disse
algo à Emmeline, eu juro que acabo com a sua vida.

— Vá embora, Henry! — ela gritou. — Ou eu vou chamar a

polícia!

Comecei a rir.
— Você é louca.

Virei as costas e saí do quarto, batendo a porta com força.

Bem, pelo menos uma coisa estava resolvida.


Agora, eu precisava cuidar do nosso passado.

~
Emmeline

O peito de Ellen subia e descia conforme o ritmo de sua


respiração.

Estava amanhecendo e eu tinha cochilado um pouco na

poltrona ao lado de sua cama.


Nem se eu quisesse teria conseguido dormir.

Primeiro por Ellen, pela culpa que eu sentia... também por

Henry.
Eu não sabia ao certo ao que ele se referia quando disse “Vou

atrás do nosso passado e enterrá-lo de uma vez por todas”.

Mas eu tinha medo.

Ele mesmo dissera que vivia em uma guerra constante. Um


tiro acidental... meu Deus, sua vida podia ser arrancada em um

piscar de olhos. E é claro que mesmo estando magoada pela forma

com que ele me tratou desde que soube sobre William, eu não
desejava ver o meu marido morto.

Ah, céus.

Quem eu havia me tornado nesses últimos meses?

— Emmeline? — Levantei a cabeça assim que ouvi o meu


nome saindo como um sussurro nos lábios de Ellen.
— Oi, querida. Estou aqui. — Sentei-me na beirada da cama

enquanto ela se sentava também.

— Minha cabeça está doendo. O que aconteceu?


— Você se lembra de algo da noite passada?

Ellen rolou os olhos pelo quarto, em reconhecimento. Depois

me olhou novamente.

— Nossa, mas... espere. Que dia é hoje?


— 26 de dezembro.

— Meu Deus. — Seus olhos se arregalaram e ela se encolheu

na cabeceira da cama. — Onde está Henry? Eu quero meu irmão.


Lágrimas começaram a rolar pelo rosto de Ellen e eu a puxei

para mim.

— Henry precisou sair para resolver as coisas, mas eu estou

aqui. Pode confiar em mim.


Ellen relaxou contra o meu abraço e logo seus braços também

me envolveram.

Ela começou a chorar com mais força.


— Eu tive tanto medo. Achei que eles iam conseguir me

pegar... — Sua voz estava entrecortada. — Se não fosse por Colin,

eu... meu Deus, eu poderia estar morta.


— Já acabou, querida. — Comecei a massagear suas costas.

— Você está segura. Estamos aqui para protegê-la.


Ellen continuou abraçada a mim por vários instantes, até que

eu falei:

— Quer me contar o que houve?


Ela respirou fundo.

— Eu tinha ido a uma festa de Natal com a minha amiga. A

filha do Rutherford. Sei que Henry vai querer me matar por isso,

mas eu consegui persuadir um dos nossos homens a nos levar. —


Ela olhou para baixo, completamente envergonhada. — Estávamos

sentadas no balcão, quando um rapaz simpático apareceu. Não me

lembro o nome dele, mas ele era muito bonito. — Um sorrisinho


surgiu em seus lábios. — Ele tinha os olhos verdes, cabelo loiro. Um

deus grego. — De repente, o sorriso sumiu de seus lábios. —

Conversamos bastante. Eu estava bebendo e só me lembro de

começar a me sentir sonolenta. Alguns rapazes se aproximaram e


estavam me levando para os fundos do bar, mas aí eu vi Colin

entrando como um louco e eu não sei o que aconteceu depois.

Quando ele me pegou, eu já estava quase apagada. — Ela chorou


novamente. — Ele me ajudou a livrar a droga do meu organismo,
mas depois eu entrei em pânico. Acho que foi um dos efeitos

tardios.

— E você não se lembra do nome do rapaz?

Ela negou com a cabeça.


Meu coração se apertou e uma sensação estranha se apossou

do meu peito.

— Se você o ver novamente, vai conseguir reconhecer?


— Não quero vê-lo nunca mais.

Ellen voltou a chorar e eu não quis mais tocar no assunto.

Sabia que era difícil lidar com aquilo e nem eu sabia se estava

pronta para ajudá-la.


— Que tal se descermos para tomar café da manhã? —

perguntei, tocando a sua mão. — Estou morta de fome. Acho que

minha última refeição foi ontem à tarde... uma banana.


— Meu Deus, Emmeline. Vamos comer, então.

Ela pulou da cama e foi direto para o closet, onde escolheu

uma roupa simples. Calça de veludo e suéter para ficar em casa.

Por alguns instantes, invejei a forma como ela se recompunha


tão rápido das situações a que era exposta.

Talvez um dia eu me tornasse assim também.


Descemos juntas e dei graças a Deus quando Greta disse que

o café da manhã estava pronto e seria servido na sala de refeições.


Ellen e eu nos acomodamos na grandiosa mesa e fomos

servidas com bacon, ovos, chá, leite e bolinhos dos mais variados

tipos.

Comemos como se não houvesse amanhã.


E, por algum tempo, Ellen conseguiu esquecer o que tinha

acontecido.

Mas logo Alfred entrou na sala de refeições e fez uma


reverência.

— Vossa Graça, chegou essa correspondência para a

senhora. — Ele deu a volta na mesa e me entregou um envelope de


cor creme.

Estranhei porque... bem, eu não recebia correspondências

desde que cheguei ali.

Olhei para Ellen sem entender, mas ela estava entretida com
algo no celular.

— E de quem é, Alfred? — perguntei, ao ver que não havia

nada na parte de fora do envelope a não ser o meu nome.


— Não sei, senhora. A carta foi deixada embaixo da porta, há

poucos instantes.
— Hum, ok. Obrigada.
Alfred fez outra reverência e se retirou da sala.

Comi mais um bolinho, olhando para o envelope em cima da

mesa.
— O que é isso, Emmeline? — Ellen perguntou, curiosa.

— Não sei. Já vou ver... só preciso terminar esse chá.

Ellen deu de ombros e nós continuamos comendo e bebendo


chá.

Quando já estávamos satisfeitas, ela suspirou e disse:

— Cunhada linda, acho que vou voltar ao quarto. Preciso

descansar.
— Faça isso mesmo. — Apertei sua mão disposta em cima da

mesa. — Descanse. Se Henry voltar, direi a ele para ir até o seu

quarto.
A jovem se levantou, veio em minha direção e me deu um beijo

no rosto.
— Fico feliz por você estar em nossas vidas. Henry tem muita
sorte.

Meu coração se apertou porque ela nem imaginava que o seu


quase sequestro aconteceu por uma falha da minha parte.
Ela virou as costas e me deixou sozinha.
— Posso recolher as louças, Vossa Graça? — uma funcionária
perguntou.
— Sim, por favor.

Saí da sala de refeições e me encaminhei até a escadaria


enquanto abria o envelope. Puxei o papel que havia dentro e meus
olhos correram pelas letras escritas em um computador:

“Seu marido esconde coisas de você. Coisas sobre o seu passado.


Quer saber quais são as suas origens?

Vasculhe o escritório.
Lá tem todas as informações que você precisa saber.”

Não havia assinatura.


Meu coração afundou em questão de segundos.

O que era aquilo?


Quais segredos Henry escondia?
Então, mais uma vez, suas palavras vieram à minha mente:

“Vou atrás do nosso passado e enterrá-lo de uma vez por todas.”

Eu precisava descobrir a verdade.


Agora a escuridão chegou às rosas

O fogo está chegando ao fim


As cores que eu criei
De repente estão voando para longe

Let Us Burn – Within Temptation

Emmeline

Entrei no escritório de Henry e fechei a porta.


Ainda estava trêmula com a carta em mãos, mas eu precisava

saber se aquilo estava certo ou se era apenas uma brincadeira de

mau gosto.
O problema era que, no fundo, eu sabia que aquilo era

verdade.
Meu destino nas mãos de Henry sempre foi uma incógnita.

Tantos “porquês”, tantas dúvidas nunca respondidas.


O escritório cheirava a tabaco e madeira envelhecida. Aquela

sala era assustadora para o desavisado que entrasse ali sem ser
convidado. A aura maligna, persuasiva... uma sala que deveria ter

inúmeros segredos.

Henry havia saído com Colin há muitas horas, mas eles,


provavelmente, não voltariam tão cedo. Era o tempo que eu tinha

para conseguir as minhas respostas.

Desencostei-me da porta e fui na direção da mesa de mogno.


Eu quase podia ver nossos corpos unidos ali, naquela noite de sexo

animal em que eu aceitei me casar com Henry de livre e espontânea

vontade.
Eu podia ter dito não.

Mas eu quis dizer sim.


Sentei-me em sua cadeira e comecei vasculhando os papéis

que estavam em cima da mesa.

Nada mais eram que papeladas voltadas ao Parlamento

Britânico. Um chamado da Rainha, um encontro com o príncipe,

contas, cartas de arrendatários.

Nada que me interessasse.


Dediquei-me a procurar nas gavetas da mesa. Tirei toda a

papelada e a coloquei no chão. Abri as outras gavetas, peguei todo


o conteúdo e despejei com os outros para que eu pudesse averiguar
com calma.

Sentei-me no chão e me perdi no meio de papéis que nada

tinham a ver com a minha vida, exceto com o Henry “Duque de

Cambridge”.

Não era possível.

Eu tinha encontrado o diário bem ali, era certo que eu poderia


encontrar mais alguma coisa.

Fucei em outras gavetas, armários.

Tirei todas as papeladas que encontrei em meu caminho.

Li vários relatórios. Cartas que um dia pertenceram ao pai de

Henry.

Eu já estava começando a ficar aflita, porque nada naquela

sala dizia respeito à minha vida.


Abri livros, peguei pastas e as coloquei no chão junto com os

montantes de papéis que eu revirava.

Nada.

Não sei exatamente quanto tempo se passou, mas cada vez

mais eu perdia as esperanças.

Aquela pessoa devia estar brincando comigo.


Sentei-me no chão, olhei para os papéis à minha frente e

respirei fundo.
Eu precisava saber.

Ergui a cabeça e meus olhos foram diretamente para um


quadro de Boticelli, um famoso pintor italiano.
A questão, no entanto, não era o quadro ou a pintura em si,

mas sim a forma como ele estava posicionado.


Levantei-me e me aproximei devagar.

O quadro estava a centímetros da parede.


Olhos comuns não poderiam perceber a diferença, mas meus

olhos estavam atentos, procurando pelo que havia de errado dentro


daquela sala.
Meu coração gelou.

Levei a mão até a borda da pintura e a puxei em minha


direção.

Então as minhas suspeitas se concretizaram.


Atrás da pintura, havia um cofre.

E embaixo do cofre, havia uma espécie de gaveta.


Meus dedos deslizaram pelo cofre e em seguida pelo buraco
onde se enfiava uma chave na gaveta de aço.

Eu não tinha uma chave, muito menos a senha do cofre.


Foi nesse momento que as lembranças da madrugada em que

eu achei o diário de Henry vieram à minha cabeça.


A chave no porta-retratos.

Virei-me na direção da mesa e pulei em cima do porta-retratos.


Desmontei-o e, para a minha grande surpresa, a chave ainda

continuava ali.
Peguei-a e voltei ao cofre.
Enfiei na gaveta e tanto o cofre quanto a gaveta abriram.

Dei um passo para trás.


Se Henry me pegasse ali, ele surtaria.

Mas eu não podia voltar e desistir. Parecia tão perto... parecia


certo. E a cada segundo, meu coração batia ainda mais.
Expectativa, ansiedade...

Medo.
Será que o que eu estava prestes a encontrar mudaria a minha

forma de enxergar Henry? Ou apenas esclareceria o meu passado?


O nosso passado.

Avancei na direção do cofre e o abri.


Havia montantes de notas de libras, além de pistolas de vários
modelos. Puxei a gaveta de aço e meu coração quase parou

quando encontrei uma pasta preta repleta de papéis.


Peguei-a e voltei até a mesa.
Eram muitos papéis, ela estava pesada, então precisei de
apoio.

Abri a pasta. Ela era do tipo de arquivo, então tinham


divisórias.

E meu coração quase parou quando vi o primeiro nome, na


primeira divisória.
Colin Jones.

Peguei todos os papéis que estavam ali.


O primeiro deles era seu histórico escolar. Suas notas eram

excelentes e disso ele não podia se envergonhar. Havia um outro


papel, com uma foto do meu irmão de cabeça raspada.

Provavelmente, na época em que ele entrou para a Brandy Blood.


Mais alguns papéis relacionados ao passado do meu irmão.
Algumas fotos da época. Uma foto dele e Henry juntos segurando

espingardas. Eles estavam felizes, a julgar pelo sorriso em seus


rostos.

Eles eram tão parecidos.


Eu nunca havia parado para comparar seus traços, mas eles
eram muito parecidos. Quase como se fossem irmãos.

Um arrepio percorreu a minha espinha.


Olhei para a porta e não havia nem sinal de Henry.
Passei mais alguns papéis e um deles me chamou a atenção.
Era do Hospital de St. Mary.

Parecia ser um tipo de exame.


Meus olhos correram pelo papel.

Probabilidade de compatibilidade de sangue: 99,9999974%

Amostras colhidas entre Henry Thomas Spencer e Colin


Jones, o que indica que o grau de parentesco é de: 99,9999974%

Minhas mãos deixaram o papel cair no instante em que li

aquelas palavras.
O que era aquilo?

Peguei a foto novamente.

Porra, aquilo não podia ser real.


Não, não, não.

Se Colin era... pelo amor de Deus, eu não conseguia nem

pronunciar aquilo.

Porque não era real! Não podia ser!


Vasculhei a próxima divisória. Era um arquivo completamente

dedicado ao meu pai.


Richard Osborn Jones.

Havia fotos do meu pai, um documento exclusivo sobre a sua


vida.

Ali dizia que ele fora jardineiro dos Spencer de 1989 a 1994,

onde pediu demissão e se mudou para o interior da Inglaterra, na


cidade de Bristol, junto com sua esposa grávida.

E foi ali que ele se empenhou na vida marítima.

Deixei o relatório de lado. Não estava conseguindo respirar

direito.
O que era tudo aquilo?

Os próximos papéis eram recortes de jornal da época.

“O acidente que chocou marinheiros.”

“A Scotland Yard diz que acidente pode não ter sido uma fatalidade.”

Era o acidente marítimo que levou a vida do meu pai.

Os outros papéis eram cheques.


E um testemunho por escrito de ninguém menos que Charles

Spencer, pai de Henry, declarando sua inocência nas investigações

sobre o naufrágio do barco 665, Rochester Scow.


A porta do escritório abriu e eu não tive tempo para nada.

Os olhos de Henry encontraram os meus e depois voltaram

para a papelada no chão, na mesa, em minhas mãos.


A cor sumiu de seu rosto.

— Emmeline?

Dei um passo para trás, com os recortes de jornal prensados

em meu peito.
As lágrimas já estavam descendo.

— O que significa tudo isso, Henry?

Ele olhou na direção da porta, passou uma das mãos pelo


cabelo e respirou fundo.

— Emme, eu posso explicar...

Ele deu vários passos em minha direção.

— Eu não quero mais uma de suas mentiras, Henry! — gritei,


desesperada. — Eu quero a maldita verdade! Quero-a agora!

Henry olhou novamente para os papéis e eu vi o desespero

atravessar o seu rosto.


— Você quer a verdade? Ok, então eu vou contar.

~
Eu estava sentada na poltrona de couro negro quando Henry

me trouxe uma pasta com o nome “Eva Catherine Jones”.


— O que é isso? — perguntei.

— A vida da sua mãe.

Ele puxou uma cadeira e se sentou à minha frente.


Minhas mãos estavam trêmulas, mas abri a pasta.

Lágrimas começaram a rolar pelo meu rosto assim que vi uma

foto dela.

Tão linda, tão perfeita.


Só que no relatório, havia uma foto dela com o cabelo curto,

estilo Chanel. E ao lado havia outro nome: Elisa DeSantis Ferrari.

Sua data de nascimento e a cidade de Bolonha, na Itália.


Em outro papel, anexado, havia um relatório. A foto era da

mãe de Henry, também com o cabelo curto, estilo Chanel. E o nome

era Elena Catarine DeSantis Ferrari. Com a mesma data de

nascimento da minha mãe e a mesma cidade.


— O que significa isso, Henry?

Minha cabeça estava um verdadeiro nó. Eu não estava

entendendo absolutamente nada.


— Se você quer conhecer o passado, precisamos voltar a ele

— ele disse, transparecendo uma calma que eu não sabia de onde


vinha. — Nossas mães eram italianas e pelo que você pode conferir

nestes documentos, eram irmãs.

— Não, Henry. Não. — Levantei-me, frustrada, estressada,

cansada. — O que está dizendo? Você percebe o absurdo que é


tudo isso?

— Eu não tenho por que mentir, Emmeline. Está tudo

documentado. Você estava lendo antes de eu chegar.


Coloquei as mãos na cabeça e fechei os olhos.

Isso era absurdo.

— Minha mãe era uma pessoa humilde! De família humilde!

Ela... pelo amor de Deus!


— Minha mãe foi a primeira a vir para a Inglaterra — Henry

começou a falar. — Os DeSantis Ferrari a entregaram em

casamento ao meu pai. Claro que ela precisou mudar o nome,


porque a sociedade londrina sempre foi preconceituosa. Ela se

tornou Catherine Spencer e criou uma identidade para si — Henry

falava como se finalmente pudesse colocar tudo para fora. — O

casamento dos meus pais foi apenas um acordo para os negócios


que não iam muito bem com os italianos. Só que em menos de um

ano de casamento, mamãe soube que Elisa, sua mãe, estava para

ser entregue em casamento ao filho de um chefe de uma


Organização inimiga, na tentativa de apaziguar os ânimos entre

eles. — Os olhos de Henry encontraram o meu rosto. — Mamãe


sabia que seria o fim de Elisa, porque os Domenico não tinham

piedade nem dos animais que caíam em suas mãos. — Ele respirou

fundo, passou uma das mãos pelos cabelos e continuou: — Elisa foi

trazida para a Inglaterra escondida. Deram-lhe uma nova identidade:


Eva. Só que o que era para ter sido um tiro certeiro, se tornou um

inferno. — Henry fechou os olhos e esfregou o rosto. — Meu pai se

encantou com Eva e ela se tornou sua obsessão. — Ele se levantou


e se aproximou, ficando alguns centímetros de distância. — Meu pai

estuprou a sua mãe e a engravidou.

Fechei os olhos, sentindo o peso daquelas palavras.


Aquela história era maluca, mas as memórias dos anos em

que vivi com minha mãe vieram à tona em minha cabeça.

Não foram poucas as vezes em que a peguei falando outra

língua. Cantando músicas que não eram típicas da Inglaterra. Eu


sempre lhe perguntava o que significava, ela dizia que a fazia se

lembrar de sua infância.

O exame do Hospital de St. Mary.


O nome de Colin e Henry.
— Meu Deus... — Dei um passo para trás, até sentir a moldura
da janela em minhas costas. — Você e Colin são...?

Henry balançou a cabeça afirmativamente.

Arregalei os olhos.
— Então eu...?

— Não, você não. Você é filha de Richard Osborn. — Henry

suspirou. — Embora, tenhamos o mesmo sangue nas veias por


parte de mãe. Você é minha prima, Emmeline.

Fechei os olhos e as lágrimas caíram com força.

Aquilo era um pesadelo?

Céus, eu precisava acordar.


— Seu pai era jardineiro dos Spencer — Henry continuou

falando e eu tive vontade de mandá-lo se calar, mas eu precisava

ouvir até o fim. — Eva se apaixonou por ele assim que chegou à
Inglaterra, mas é claro que nunca pôde viver seu amor, porque meu

pai os perseguia. — Ele parou e respirou fundo. — Só que depois


que ela engravidou, as coisas se complicaram. Naquela época,
ainda era inaceitável uma mulher solteira grávida e então meu pai

concordou que o melhor era deixá-la livre para viver com Richard.
Ele aceitou criar Colin como se fosse seu próprio filho... Ele amava a
sua mãe.
Fechei os olhos, lembrando-me do meu pai.
Não era à toa que sempre desejei encontrar um amor tão puro
e verdadeiro como o deles.

— Mamãe os protegeu enquanto pôde — Henry continuou e


deu um passo em minha direção. — Mas então, o inferno estava
acontecendo na Itália. Os DeSantis Ferrari tinham caído do poder e

os Domenico, assumido. O homem que ia se casar com sua mãe


estava furioso e de alguma maneira, ele descobriu que você tinha
nascido. — Eles juraram que iam buscá-la quando você estivesse

maior e que se vingariam da vergonha que Elisa, agora Eva,


provocou ao fugir do casamento.
— Chega, Henry! — Afastei-me dele. — Eu não posso... meu

Deus, isso é surreal.


— Você precisa ouvir até o fim, Emmeline.
— Eu não quero! Chega!

Ele se aproximou e segurou meus braços com um pouco de


força.

— No leito de morte, minha mãe me fez jurar que cuidaria de


vocês como se fosse a minha própria vida. E foi isso o que eu fiz,
Emmeline. Todos esses anos, eu sempre estive por trás, cuidando

de vocês. Eu trouxe Colin para o meu lado, porque além de tudo, ele
é meu irmão! É o meu sangue. Precisava estar comigo! E depois, eu
fui atrás de você, porque eu jamais deixaria que você caísse nas
mãos erradas!

— E então eu caí nas suas!


Henry me soltou e se afastou alguns passos como se eu

tivesse lhe dado um tapa.


— Tudo o que eu fiz, foi sempre para protegê-la, Emmeline.
Você não faz ideia do que ia acontecer se você caísse nas mãos

dos Domenico.
Fechei os olhos, precisava de ar. Precisava colocar em ordem
todos os meus pensamentos.

Aquela loucura, aquelas descobertas.


— E isso aqui? — Peguei os recortes de jornal sobre o
acidente do meu pai e os ergui. — O que significa isso?

Henry demorou alguns instantes, mas então disse:


— A morte do seu pai não foi acidente. Meu pai mandou
afundar aquele barco.

Aquilo era tudo o que eu precisava ouvir para me destruir de


vez.

Soltei um grito enquanto as lágrimas rolavam com força e


meus joelhos cediam.
Meu pai...
Tão carinhoso, tão bondoso.

Um fim cruel, um destino miserável, tudo por causa da


obsessão de um louco.
Agora eu entendia por que Charles Spencer entrou em nossas

vidas.
Por que ele nos tratava tão bem.

A verdade é que ele nunca quis deixar minha mãe em paz.


As palavras da minha mãe voltaram à minha mente:

“Tem algumas maldições que não conseguimos quebrar. Charles


Spencer é a minha e, talvez, Henry será a sua.”

Levantei-me rapidamente.
Precisava sair daquele escritório.

— Emmeline. — Henry fez menção de vir atrás de mim, mas


eu o parei.
— Me deixe em paz! — gritei. — Não quero ouvir mais

nenhuma palavra!
Ele passou as mãos pelos cabelos, em sinal de nervosismo.
Agora eu via o desespero em seu rosto.
— Leia o meu diário, Emmeline. Você precisa saber de tudo.

Como Henry sabia que o diário estava comigo, eu não fazia


ideia. Apenas virei as costas e saí do escritório.
Eu estava afundando em minha própria dor.
Dou piruetas no escuro

Vejo as estrelas através de mim


Um cansado coração mecânico
Bate até que a canção desapareça

Shatter Me – Lindsey Stirling feat. Lzzy Hale

Emmeline

Corri até o closet e abri a gaveta onde guardava minhas blusas


de frio. Puxei-as para fora e peguei o diário. Abri-o e retomei

exatamente de onde eu tinha parado.

Várias folhas continham somente desenhos macabros.


Pessoas mortas, corpos pendurados em árvores, a constante

imagem de um homem com um tiro na cabeça...


Henry ficou anos sem escrever, constatei assim que folheei

mais páginas.
Já estava quase desistindo, quando cheguei a uma página que

havia apenas a seguinte frase: “Hoje eu os reencontrei.”


A caligrafia estava diferente, assim como a pressão na caneta,

o que significava que aquilo devia ser de quando Henry tinha 14

anos e nós os conhecemos.


Na próxima folha havia o desenho de uma garota.

Era eu.

Exatamente a forma como eu me vestia, o cabelo preso em


uma trança lateral...

Virei a próxima página e havia um pouco mais de texto:

“Acho que Emmeline não gosta de mim.


Ela me olha com medo, como se eu pudesse fazer algum mal
a ela.

Só que tudo o que eu quero é que ela seja minha amiga.

Vai ser mais fácil quando precisarmos nos casar.

Eu prometi à mamãe e não posso decepcioná-la.

Cuidarei de Emmeline e Colin.”

As lágrimas rolavam pelo meu rosto, mas continuei passando


as páginas e lendo.
“Papai me obrigou a matar o meu cachorro.
Eu acho que nunca vou esquecer o sangue inocente

inundando o escritório do meu pai.

Mas eu fiz isso por Emmeline.

Se eu não fizesse, ele a levaria de volta para a Itália.

E eu nunca mais a veria.”

Levei a mão à boca, completamente horrorizada.

“Meu pai não quer que eu o acompanhe mais às visitas na tia

Elisa, que, na verdade, se chama Eva, agora.

Eu não me importo com o que ele faz com ela.

Mas não consigo sentir menos ódio por ele, por me afastar de

Emmeline. Justo agora que ela finalmente quer ser minha amiga.”

“Eu vou matar o meu pai e no dia que eu fizer isso, vou beber
o seu sangue em um de seus copos favoritos.”

Essa foi a última inscrição antes de um longo período sem

escrever nada.

Nem mesmo desenhos.

Era como se a mente demoníaca de Henry tivesse se calado.


Passei mais páginas e finalmente encontrei uma com escritos.

Novamente a caligrafia estava diferente, assim como a


pressão da caneta.

“Trouxe Colin para viver comigo.


Quando lhe contei a verdade de quem ele é, achei que me
rejeitaria, que me odiaria. Porém não estava preparado para ver o

sorriso fácil e a felicidade em seus olhos, mesmo sabendo que ele


era fruto de um estupro.

Ele não quer que contemos à Emmeline.


Não, ainda.

Pelo menos, até chegar à idade de eu tomá-la como minha


esposa.
Aí precisaremos contar toda a verdade.

Só que ele não quer ser um Spencer. Colin quer continuar


sendo um Jones.

Ele diz que seu pai era o jardineiro e isso ninguém vai mudar.”

Meu Deus, Colin sabia.


Todo esse tempo...
Como eu fui tão ignorante? A ligação absurda entre os dois, a

aparência que era idêntica praticamente.

“Hoje foi o enterro da tia Eva.

Fui até o cemitério e vi Emmeline. Fazia anos que não nos


víamos.

Colin estava ao seu lado, amparando-a.


Queria estar lá, mas não era a hora ainda.
Ela me olhou com aqueles mesmos olhos assustados de

sempre.
Será que algum dia ela deixará de me olhar assim?

Preciso me afastar, deixá-la viver...


Mas por que deixá-la experimentar a vida, se depois eu vou ter
que roubá-la?”

O diário estava praticamente no fim.


Não queria ler mais, não queria mais ver aqueles desenhos

macabros.
— Continue lendo, Emmeline. — A voz de Henry me fez dar

um sobressalto. Ele me olhava da porta do closet, o rosto


completamente atordoado. — Leia a última página. Se tiver que me
odiar, precisa saber de tudo o que eu já fiz nesta vida infeliz.
Fechei os olhos e balancei a cabeça negativamente.

Eu não suportaria mais nenhuma palavra.


— Leia, Emmeline. Você precisa saber do que sou capaz. Que

não sou nem um pouco diferente do meu pai.


Encostei-me na parede e desci lentamente até o chão.
Eu só queria que aquela dor acabasse.

Não sei quanto tempo fiquei ali, mas sei que quando abri os
olhos, estava sozinha novamente.

Então abri o diário e fui até a última página.

“Essa é a última coisa que vale a pena escrever neste diário.

Já fazia algum tempo que meu pai havia descoberto um câncer


de estômago.
Eu o via definhar a cada dia.

E cada vez que ele tinha uma crise, eu sorria.


Queria vê-lo morrer bem lentamente.

Só que isso me tornava igual a ele, e mamãe sempre disse


que eu deveria ser diferente.
Bem, talvez eu pudesse criar as minhas próprias leis em meu
mundo.
Poder para isso, eu logo teria.

Um dia, fuçando em algumas coisas, eu descobri os cheques


que papai pagou para os criminosos afundarem o barco onde o pai

de Emmeline estava.
Descobri que ele foi o culpado por Emmeline crescer sem o
pai.

Então eu fiz uma proposta para Colin.

Ele também o odiava e embora não fosse na mesma


proporção que eu, seu rancor era considerável e o seu amor por

mim era o suficiente para que me ajudasse em qualquer coisa que

eu pedisse.

Estávamos cansados de sua exigência, de sua loucura que se


tornava cada vez pior.

Os homens dentro da Brandy Blood estavam loucos querendo

a sua cabeça.
Mas ninguém teria esse prazer, a não ser eu.

Então em uma certa tarde, papai estava sozinho em seu

escritório.
Entrei com a arma apontada para sua cabeça.
O desgraçado riu.

Perguntou o que eu tinha na cabeça.


Eu respondi que queria sangue. O sangue dele.

Papai riu novamente.

Disse que eu não teria coragem.


Disse que eu era apenas uma criança mimada.

Que ele deveria ter se casado com Eva e não com a mamãe,

assim seu herdeiro seria Colin.

Eu poderia ter atirado e acabado com aquele discurso ridículo.


Meus olhos estavam um pouco embaçados e eu não sabia se era

por ódio ou lágrimas.

Papai disse que ia me destruir.


Foi então que ele se levantou e encostou a testa no cano da

minha arma.

— Sabe o que vai acontecer, Henry? — ele perguntou, seu


olhar sádico preso ao meu. — Você vai virar as costas, vai voltar

para a sua vida medíocre e eu vou atrás daquela garota. Ela está

com quantos anos, hein? Hum... ela já sangrou? Porque acho que

seria bem mais divertido se ela ainda fosse uma menininha.


— Seu filho da puta — falei, concentrado no meu dedo no

gatilho. — Eu vou acabar com você agora.


A porta da sala se abriu e os olhos do meu pai brilharam

quando ele viu Colin entrando.

— Ah, filho, ainda bem que você chegou. Será que consegue
colocar um pouco de juízo na cabeça do seu irmão? — ele disse,

um sorrisinho fingido para Colin.

Só que ele não contava que Colin estaria ao meu lado.

— Acabe logo com isso, Henry. Temos pouco tempo para lidar
com tudo.

Meu pai deu um passo para trás, horrorizado.

Foi ali que ele entendeu que o seu reinado havia chegado ao
fim.

Eu abri o sorriso mais demoníaco que eu já sorri em toda a

minha vida.

— Você criou o seu próprio monstro, papai. Fique feliz por


isso. Nos vemos no inferno, velho filho da puta.

E apertei o gatilho.”

Joguei o diário longe.


Meu Deus, Henry tinha matado o próprio pai.

E com a ajuda de Colin.


Eu sabia que o nível de crueldade daqueles homens era algo

no qual eu nunca poderia imaginar. Mas... ver a frieza de suas


palavras, era assustador.

Minha mente estava bagunçada.

Eu só precisava ficar longe disso.


Eu não havia pedido para isso acontecer. Minha vida não podia

ser baseada na loucura que foi a vida dos meus pais. Eu... céus, eu

tinha o mesmo sangue que Henry.

Senti-me suja, de repente.


Sangue de assassinos corriam em minhas veias.

Levantei-me e corri para fora do quarto. Precisava de ar,

precisava sair dali o mais rápido possível.


Desci as escadas e ignorei Alfred, que me disse alguma coisa.

Abri a porta da frente e corri.

O frio me assolou, eu estava somente com roupas finas.

Mesmo assim, não consegui voltar para casa. Meus pés estavam
me levando para longe.

Foi então que quando me aproximei da esquina, uma Van

branca que estava parada abriu a porta e de repente alguns homens


pularam na minha frente, cercando-me.

— Saiam de perto de mim — falei, tentando me afastar.


— Bela hora para uma caminhada, meu amor. — Um homem

me abraçou por trás e então um pano com um cheiro horrível foi

colocado em meu nariz e meus sentidos começaram a se apagar,

deixando-me completamente vulnerável para quem quer que fosse


aquele homem.

Henry

— Caralho, Henry! Dá para parar de destruir a porra do

escritório? — Colin gritou, mas eu não queria ouvi-lo. Só aquilo

podia me acalmar naquele momento.


Virei a mesa com fúria.

— Onde está Emmeline? — ele perguntou.

— Lendo o diário. Acabou, Colin. Acabou — falei, o desespero

tomando conta das minhas veias. — Eu perdi Emmeline. Ela vai


saber o que eu fiz e vai me odiar.

— Por que caralhos ela vai te odiar? — Colin me puxou pela

camisa. — Você matou o homem que assassinou o pai dela! Por


que ela vai odiar você?
— PORQUE EU SOU IGUAL A ELE! — gritei de volta. — Eu

sou um assassino tão cruel ou até pior!


Então, de repente, senti lágrimas correndo pelo meu rosto.

A última vez que eu tinha chorado fora na morte da minha

mãe.

— Eu sou a porra de um assassino — falei, afastando-me até


a poltrona. — Ela vai me odiar. Como é que ela vai amar um

assassino? Eu escondi dela que somos primos, porra! — gritei, eu

estava enlouquecendo, implodindo a cada segundo. — Se


Emmeline me deixar, eu vou dar um tiro na minha cabeça!

— Henry, escute aqui — Colin veio em minha direção e se

abaixou até ficar na minha altura. — Emmeline te ama. Só não vê


isso quem não quer. Ela pode ficar confusa, mas só precisa de um

tempo para colocar a cabeça no lugar.

Joguei a cabeça para trás.

— Eu não mereço o amor da Emmeline.


— Nenhum de nós merece amor algum, Henry. Somos todos

uns fodidos e vamos apodrecer no fogo do inferno, mas você

cumpriu a porra da sua promessa. Emmeline está em segurança e é


assim que as coisas vão ser para sempre.
Quando Colin terminou o seu discurso, a porta do escritório se
abriu e Alfred entrou, apavorado.

— Vossa Graça! Desculpe interrompê-lo. Mas aconteceu algo

muito importante e acho que o senhor...


— Fale logo, homem! — Colin respondeu por mim.

— A senhorita Emmeline acabou de sair correndo para a rua,

atordoada.
Levantei-me imediatamente.

Saí da sala, atravessei o hall e abri a porta. Quando saí na

calçada, meu coração quase parou ao ver Emmeline sendo enfiada

dentro de uma Van branca, que acelerou, deixando-nos para trás.


— Caralho! — Virei-me para Colin, atordoado. Eu sabia

exatamente quem estava dentro daquela Van. — Chame nossos

homens. Eu quero todos no encalço daqueles filhos da puta. Eu


quero destruir os Domenico com minhas próprias mãos. — Entrei

em casa, já puxando a pistola na cintura. — Hoje eles vão ver o


diabo em carne e osso.
Ideal seria que todas as pessoas soubessem

amar o tanto que sabem fingir.


Bob Marley

Emmeline

Abri os olhos lentamente.


Estava tudo embaçado.

Havia alguém na minha frente, balançando a mão.


— Até que enfim acordou — a voz masculina disse, mas eu

não conseguia definir seu rosto. — Porra, ainda está drogada.

Meus olhos começaram a focar no homem pouco a pouco.


Minha mente começou a trabalhar e quando eu vi quem era, dei um

grito alarmado.
— Psiu! Cale a boca! — Ele tapou a minha boca com a mão,

então fez sinal para alguém, que lhe entregou um rolo de fita crepe,
que ele rapidamente puxou e colocou no lugar. — Não quero gritos,

Emmeline.
William.

Seu rosto estava perfeito como sempre foi.

Seus cabelos loiros estavam brilhantes e reluzentes. Seus


olhos verdes pareciam duas esmeraldas de tão chamativos que

eram.

Olhei para os lados e havia outros homens com ele. Todos


vestidos de preto, mas aqueles homens eram diferentes. Tinham

características físicas mais fortes, a pele era mais escura, os

cabelos também.
— Eu sei, meu amor... — William se abaixou na minha frente.

Seus olhos fixos aos meus. — Eu sei que você está confusa,
querendo entender o que está acontecendo aqui. E logo você vai

saber... — Ele apertou a minha coxa e eu me retraí. — Não faça

assim, Emmeline. Você sempre foi uma garota dócil. Claro que não

me esqueci das palavras que disse no dia do seu casamento... —

Seu olhar voltou ao meu, magoado. — Mas eu sou um bom homem

e posso perdoá-la, se... você colaborar.


Eu queria falar, queria gritar, mas meu corpo ainda estava mole

e meus sentidos não estavam totalmente em alerta.


— Preciso resolver umas coisas, mas em breve eu volto. Fique
quietinha.

William se levantou e chamou um dos homens para ir consigo.

Ainda ficaram dois ao lado da porta, me encarando.

Estávamos em uma sala escura, parecia ser subterrânea. O ar

era difícil de ser respirado e o cheiro de esgoto era muito forte.

Fechei os olhos e me lembrei de tudo o que tinha acontecido.


Henry.

Colin.

Mamãe e papai.

As descobertas.

Então as lágrimas voltaram a cair.

Henry

— Nathan, o que descobriu? — perguntei assim que ele

ultrapassou a porta da biblioteca.

— A Van desapareceu em um dos túneis que ligam às

estações abandonadas. Acredito que estão usando a de Down


Street.

— Down Street? Tem certeza? Pelo que eu saiba, ela foi


fechada em 1932.

— Se eles estão lá, é porque tem ajuda de gente grande... —


Colin disse. — Você sabe que existem muitas salas e esconderijos
que foram usados por gente importante do governo.

— Incluindo Winston Churchill6 — Gerard, membro da Brandy


Blood, completou.

— Então vamos até eles e invadir aquela porra — Paul, outro


membro da Brandy Blood, disse.

— Não, não vamos até eles assim — falei, encostando-me na


mesa. — Você faz ideia de quantos metros quadrados de túneis
abandonados a porra da cidade tem? Down Street é uma suposição,

não sabemos se é verdade. E se invadirmos o lugar errado? O


tempo que levaríamos para procurar em lugares que eles

supostamente estão, seria o suficiente para deixá-los sair do país


com Emmeline.

Foi nesse instante que um alerta se acendeu em minha


cabeça.
— Saiam todos. — Virei-me de frente para a mesa. — Eu

preciso pensar.
Os homens se levantaram, resmungaram, então saíram da

sala.
— Colin, tente descobrir mais evidências — falei, porque ainda

sentia sua presença perto de mim.


— Claro, eu já estou acionando todos os subchefes dos

municípios vizinhos e condados.


— Também quero que comunique a mídia. Quero estampado
em todos os jornais o sequestro da Duquesa de Cambridge.

— Ok, mas... isso não vai trazer visibilidade e questionamentos


para a Brandy Blood?

— Eu estou pouco me fodendo com isso — retruquei, virando-


me para o meu irmão. — Eu só quero Emmeline de volta. E se for
preciso recorrer ao amparo da lei, eu vou fazer isso.

Colin assentiu levemente.


— Henry. — Ele deu um passo em minha direção. Suas mãos

vieram até meus ombros. — Estou vendo o desespero em seu rosto,


mas aja com a cabeça. Você é um ótimo estrategista, sempre foi.

Não vai ser agora que vai dar errado.


Suas palavras foram como um chute em minha armadura.
— Eu... não sei o que vou fazer se algo acontecer à Emmeline.

— Olhei para o teto e respirei fundo. — Eu vou exterminar até o


último Domenico, eu juro.
— Eu sei que vai. — Ele deu um tapinha em meu braço. — E
eu vou te ajudar. Mas agora, respire fundo e não surte. Não

precisamos do seu lado fodido em ação, precisamos do Henry frio e


calculista que conseguiu o apoio de todos os homens dentro da

Brandy Blood muito antes da morte do nosso pai.


Olhei dentro dos olhos de Colin e assenti.
Ele tinha razão.

Por dentro, eu estava desmoronando, implodindo com meus


próprios sentimentos, mas por fora eu precisava ser o homem que

salvaria Emmeline. Porque além da promessa que eu tinha feito à


minha mãe, eu estava completamente apaixonado por ela.

— Então faça o que eu disse. Quero em todos os jornais,


revistas e televisão o sequestro da Duquesa de Cambridge. Eu vou
cuidar de outros assuntos enquanto os homens tentam levantar os

dados de onde podemos encontrá-los.


Colin se afastou e caminhou até a porta.

— Nos falamos em breve.


— Ok.
Quando Colin se foi, peguei meu celular e disquei um número

que poucas pessoas tinham, apenas alguns privilegiados e eu


estava entre eles, era claro.
— Porra, Spencer, o que você quer?
— Boa tarde, príncipe de Gales — falei em tom de deboche. —

É um prazer falar com o senhor também.


Ele resmungou um palavrão.

Sua voz era sonolenta e eu não duvidava que àquela hora do


dia ele estava na cama com alguma puta barata.
— O que você quer?

— Minha esposa foi sequestrada e eu quero a sua ajuda.

— O quê? — Seu tom era de descrença. — Até parece que eu


vou me meter com essas briguinhas de gângsters que não têm o

que fazer.

— Olha aqui, seu filho da puta. — Soquei a mesa. — Você me

deve um favor. Um não, vários... mas vamos focar em apenas um.


Se não fizer o que eu quero, vou acabar com a porra do seu país e

eu vou fazer de tudo para o seu irmão ser o favorito ao trono

britânico e não você, seu merda.


O príncipe ficou em silêncio por vários instantes.

— O que você quer que eu faça?

Agora sim, estávamos começando a nos entender.


— Quero que fechem os aeroportos, rodovias, eurotúnel.

Quero encurralar os filhos da puta aqui em solo britânico.


— Você está louco, caralho? — ele quase gritou. — E o que

vão dizer? Que fechei a porra do país por causa do sequestro de

uma garota?
— O sequestro da minha esposa! — gritei de volta. — E é isso

mesmo. Não me interessa o que você vai dizer, quero que coloque

todos a meu favor, isso é o mínimo que você pode fazer.

O príncipe respirou fundo.


— Tá, tá, tá. Você sabe que isso vai custar muito dinheiro, não

sabe? E quando pegá-los, o que você pretende fazer?

— Vou exterminar um por um.


— E atrair os outros para cá em uma guerrinha de gangues?

— Eu já disse que vou exterminar um por um. Faça a sua

parte, Vossa Alteza, do resto eu cuido.


Ele resmungou mais alguns palavrões, mas depois concordou

e encerrei a ligação.

Enquanto isso, eu ia fazer uma visitinha a uma velha bailarina.

~
Emmeline

Não sabia exatamente quantas horas haviam se passado, mas

era bastante tempo. O turno dos homens trocou, vieram outros que
me trouxeram biscoitos e leite.

A fome era tanta que mesmo com vontade de gritar para sair

dali, me mantive ocupada enchendo a boca com o que me era

oferecido.
E quando terminei, colocaram novamente o esparadrapo.

Minhas costas doíam, minhas pernas também e meus braços.

Estavam todos amarrados e eu já quase não sentia mais a


circulação do sangue.

Ouvi vozes se aproximando da sala e me atentei ao que

estava prestes a acontecer.

A porta se abriu e William voltou, acompanhado por outro


homem que eu não conhecia.

— Ah, querida, sinto muito pela demora — ele falou,

aproximando-se. — Deram-lhe de comer?


Balancei a cabeça afirmativamente.

Eu queria fazer um milhão de perguntas a William, mas eu

sabia que ele manteria a minha boca fechada se eu gritasse. Então


comecei a olhá-lo com ar de quem precisa de piedade.

William suspirou.
— Quer que eu tire isso da sua boca?

Balancei a cabeça novamente.

Ele assentiu.
— Ok, mas se você gritar, eu vou tapar novamente.

William arrancou o esparadrapo de uma só vez. Então eu

disse:

— O que significa tudo isso, seu filho da puta?


O tapa veio de mão cheia.

— Eu disse que queria silêncio, Emmeline! Não vou tolerar que

me desrespeite, principalmente na frente dos meus homens.


Meus homens???

Que porra era aquela?

Virei a cabeça lentamente em sua direção, minha bochecha

ardendo pelo tapa.


William suspirou e puxou uma cadeira para se sentar à minha

frente. Ele tentou tocar a minha mão, mas eu a afastei.

— Ok, me perdoe. Não queria machucá-la.


De repente, o desespero tomou conta do meu corpo e eu

comecei a derramar mais lágrimas.


William olhou para os homens.

— Saiam, deixem-me a sós com ela.

— Giovanni, não é bom ficar sozinho com ela... — um deles

falou, tocando em seu ombro.


— Por que não seria bom, padrinho? — William disse com um

sotaque completamente diferente do que eu estava acostumada a

ouvi-lo falar. — Ela logo será minha.


— Ela é carne estragada.

— Ela é minha! — ele retrucou, irritado.

O homem engoliu em seco e assentiu, então saiu da sala junto

com os outros.
Giovanni... era assim que ele tinha chamado William.

Mas por quê?

— Meu padrinho é tão preocupado comigo... — William disse,


dando uma risadinha. — Sabe, Emmeline, não foi fácil para ele

deixar-me sair da Itália para vir até aqui só para buscá-la. Ele

precisou assumir os negócios da Famiglia e...

— Que porra você está dizendo? — o cortei.


William bufou, então se levantou, empurrando a cadeira para

trás de si.
— Eu não sou quem você pensa! — ele disse, afastando-se.

— Eu sou Giovanni Domenico, o homem no qual você estava


destinada a se casar, se não fosse pela intromissão daquele filho da

puta que se aproveitou de você! — Ele veio em minha direção e se

abaixou na minha frente. — Eu vim resgatá-la, Emmeline. Você é a

última DeSantis Ferrari e é por direito minha.


Então minha memória vagou pela longa conversa que Henry e

eu tivemos antes de eu surtar e sair de casa.

Domenico.
Aquilo só podia ser um pesadelo.

— Eu sou Emmeline Spencer... — falei, as lágrimas descendo

pelo meu rosto. — Não sei do que você está falando.


— É claro que sabe. — William, Giovanni... eu já nem sabia

mais como chamá-lo, puxou meu rosto para encará-lo. — Acha que

quem mandou aquele bilhete para você? Eu queria que você

descobrisse toda a verdade. Eu sabia que quando você soubesse


os segredos que seu marido guardava, não suportaria. E era óbvio

que eu estaria lá te esperando.

Meu Deus.
— Eu esperei por anos para isso, Emmeline. — Ele soltou o

meu rosto e voltou a se sentar na cadeira. — Saí da Itália, aprendi a


dançar ballet, aprendi a esconder o meu sotaque, tudo para estar
perto de você. Mas, confesso que fui ingênuo de achar que aquela

família de psicopatas ficaria longe de você.

— Pare, William, por favor.


— William, não! — Ele pulou em cima de mim e segurou meu

rosto com força. — Meu nome é Giovanni Domenico e você vai me

chamar assim a partir de agora.


Balancei a cabeça afirmativamente e ele desceu o rosto e

encostou seus lábios nos meus.

Meu estômago embrulhou, quis empurrá-lo para longe.

Todo o amor que senti um dia por ele estava enterrado.


William foi apenas uma ilusão.

— Por que não me beija de volta, hein? — Ele puxou minha

cabeça para trás. — O que aconteceu com você? Você costumava


gostar dos meus beijos.

— Você não é o William!


— Não, não é isso. — Seus olhos arregalados perscrutavam o
meu rosto. — Você está pensando naquele filho da puta, não é?

Não respondi, então ele puxou com mais força o meu cabelo.
— Diga, Emmeline. Em quem você está pensando?
— No meu marido! — gritei. — E eu tenho certeza de que ele
já está movendo céus e terra para encontrar você, seu filho da puta!
O segundo tapa veio com mais força.

William se afastou e deu um pontapé na cadeira, jogando-a


longe.
Seu peito subia e descia com força.

— Achei que eu estava enganado naquele dia em que invadi a


sua casa. Pensei que você tinha falado aquelas coisas porque
deveria haver câmeras ou o medo de que aquele psicopata nos

pegasse a sós. Achei que estava temendo pela minha vida! —


Giovanni balançou a cabeça negativamente. — Sabia que fui eu que
organizei o roubo das cargas de drogas que vieram da França? —

ele perguntou, seus olhos arregalados, injetados de ódio. — Fui eu


que tentei sequestrar a sua cunhadinha... é claro que isso era
apenas uma manobra de distração. — Ele deu uma risada. — Ah...

e era eu que estava usando peças dentro do Parlamento para foder


com seu marido. Sempre fui eu, Emmeline... tentando desviá-lo de

você. Tentando tirar a credibilidade daquele cretino para que eu


pudesse finalmente colocar minhas mãos em você. Mas é claro que
eu não contava que ele escondesse tantos segredinhos sujos.

William começou a rir e eu fechei os olhos.


— Foi você que mandou aquele homem atirar em mim? —
perguntei, desolada.
— Não... aquilo foi um erro que quase me custou todo o meu

plano. — Ele bufou. — O desgraçado era um grande amigo do meu


pai e quando viu o que o seu marido havia feito comigo, surtou. Eu

tentei fazê-lo entender que não era a hora de revidar, mas ele
acreditou que se tivesse matado você, o problema estaria resolvido.
Respirei fundo.

— Bem, eu iria matá-lo, mas o seu marido fez o favor para


mim.
Nunca fui uma pessoa de ter fé em Deus. Para mim, tudo não

passava de histórias que a igreja contava para conseguir


seguidores.
Só que, naquele momento, a única coisa que eu conseguia era

pedir que se realmente existisse uma força sobrenatural no


universo, que colocasse Henry em nosso caminho.
Talvez essa força não nos ouvisse, porque, céus, nós éramos

os piores seres humanos que podiam pisar na Terra. Egoístas,


mentirosos, assassinos, mas a igreja também pregava sobre o

perdão e eu esperava que fôssemos dignos dessa graça. Pelo


menos, uma vez na vida.
A porta se abriu em um estrondo e o homem intitulado como
“padrinho”, entrou afobado.

— Giovanni, precisamos ir. Descobriram nosso esconderijo.


Um sorriso quis se formar em meus lábios, mas isso morreu
quando os olhos assassinos de William focaram em meu rosto.

— Escute aqui, sua vadia. — Ele se aproximou e segurou a


minha garganta. — Nossa família acabou com a sua muitos anos

atrás. Se nós cairmos desta vez, você vai junto. Vai ser sangue por
sangue, mais uma vez.
Não se aproxime muito

É escuro aqui dentro


É onde meus demônios se escondem
Demons – Imagine Dragons

Henry

O apartamento localizado no Soho era velho e era tão

pequeno que caberiam três dentro da sala da minha casa.


Estava escuro e eu sabia que ela chegaria a qualquer

momento.

O problema era que esperar sozinho, naquela escuridão, no


silêncio da noite, me fazia ter todos os tipos de pensamentos que eu

não podia ter naquele momento.


Emmeline ficaria bem. Eu a encontraria em breve.

E acabaríamos com aquele infeliz juntos.


Mas então, garras invisíveis sufocavam-me a mente. Vozes

gritavam em meus ouvidos dizendo que Emmeline estava morta. E


eu gritava, tapando os ouvidos, porque eu não queria ouvir aquilo.

No meu coração, eu sabia que encontraria a minha esposa.

Respirei fundo.
Barulho de passos se aproximaram pelo corredor. A chave foi

enfiada na fechadura e logo ouvi o clique. A porta se abriu e a

mulher entrou, apoiada em sua bengala.


Eu devia sentir pena pela fatalidade que roubou o sonho de

Constance em ser uma bailarina reconhecida no mundo inteiro. O

problema era que eu não sentia pena alguma.


A desgraçada estava tão assustada, que não me viu. Bem, eu

estava em um lugar estratégico. Escuro, silencioso.


Ela ligou a televisão e sintonizou em um telejornal.

Havia a foto de Emmeline estampada, a mobilização que

estavam todos fazendo para encontrar a minha esposa sendo

documentada a cada segundo.

— Era isso o que queria, não? — falei, revelando a minha

presença.
Constance deu um grito e eu coloquei o indicador nos lábios

enquanto erguia a minha 9mm em sua direção.


— O que quer aqui? — Ela deu um passo para trás.
Seus olhos estavam aterrorizados.

Levantei-me do assento e me aproximei lentamente.

— Eu quero saber onde está Emmeline.

— E como eu vou saber? — ela perguntou, exasperada. — Eu

estava em uma cafeteria quando vi a notícia e vim correndo para

casa. Precisava saber se era verdade.


Dei uma risada incrédula.

— Por que não deixamos os jogos de lado, Constance? Eu sei

exatamente quem você é, e sei que com a sua ajuda aquele filho da

puta se infiltrou, fingindo ser quem não era.

— Do que está falando? Eu não faço a mínima... — Ela parou

de falar assim que engatilhei a arma.

— Eu não estou com paciência para o seu fingimento. — Dei


um passo em sua direção. — Vou ser bem sincero, Constance. Eu

não gosto de torturar mulheres, mas se você não começar a abrir a

boca e falar tudo o que sabe, eu acho que vou começar aleijando-a

da outra perna.

Constance começou a chorar e pedir por misericórdia.

— É engraçado como vocês fazem as merdas e depois pedem


clemência. — Sentei-me novamente na poltrona, ainda com a arma
apontada para ela. — Mas é aquilo... você esperou por tantos anos.

Emmeline nunca imaginou que sua professora de ballet tão querida


era a namorada que o jardineiro trocou por causa da mãe dela —

falei com a voz calma, queria provocá-la. — Deve ter doído, tantos
anos olhando para o lindo rosto da menina. Filha da sua melhor
amiga com o seu namorado.

Os olhos de Constance se injetaram com ódio.


Era isso o que eu queria.

— Cale a boca! Você não sabe o que está dizendo!


— Então me conte, quero ouvir dos seus lábios.

Constance chorou mais um pouco, então ela secou as


lágrimas.
— No começo, foi difícil, sim. Eu quis odiar Emmeline, mas não

consegui. A tinha como uma filha. Na verdade, a considero assim,


até hoje.

— Então por que caralhos ajudou Domenico?


— Eu não sabia! — Mais lágrimas rolaram e eu estava

começando a ficar irritado com aquela choradeira dos infernos. —


Quer dizer, William... Giovanni, se aproximou com uma conversa
totalmente diferente. Então eu o ajudei, colocando-o como par de

Emmeline nas danças. Mas eu juro que achei que ele era um bom
homem. — Ela respirou fundo. — Se eu soubesse que ele era

assim, eu nunca teria o ajudado!


Levantei-me em um salto e fui até ela. Enterrei os meus dedos

em seus cabelos e puxei sua cabeça, jogando-a contra a parede.


— Ela já tinha a mim!

— Eu achei que você ia fazer mal a ela! — Constance gritou.


— Eu queria que Emmeline fosse feliz e não vivesse em uma gaiola
de ouro enquanto você a traía com outras.

— Eu nunca trairia Emmeline — grunhi no ouvido da maldita.


Então a puxei de volta e encostei a pistola em seu queixo. — Agora

eu quero que me conte o que sabe sobre o sequestro.


— Não sei nada, eu juro! Tudo o que eu sei é que ele queria
levá-la de volta para a Itália!

Porra.
Eu precisava de muito mais do que isso para descobrir o

paradeiro de Emmeline.
Meu celular começou a tocar e eu soltei Constance, que caiu

de joelhos no chão.
— O que é, porra? — atendi a ligação.
— Onde você está? Acabei de conseguir uma informação

importante. Acho que já sei onde Emmeline está.


— Qual informação?
Colin estava ofegante.
— Há um caminho desativado que liga Down Street até o

aeroporto de Gatwick. São inúmeros quilômetros, mas era uma rota


muito usada na Segunda Guerra Mundial. Acho que é um plano

perfeito, se eles quiserem tirar Emmeline do país.


— Estou indo para lá agora.
— Não, espere. Temos que agir com cautela. A mídia está em

cima de nós, não dá para chegar lá atirando em todo mundo. Pode


colocar a segurança de Emmeline em risco.

Por mim, eu chegaria metendo bala em todo mundo, mas por


Emmeline, eu iria me controlar.

— Sejam discretos. Faça com que essa informação não vaze.


Nossos negócios resolvemos do nosso jeito.
— Ok, onde nos encontramos?

— Estou no Soho. Te espero aqui.


— Que porra você está fazendo no Soho?

— Colin, faça o que estou dizendo.


Ele bufou, mas concordou.
Encerrei a ligação e enfiei o celular no bolso. Minha arma

ainda continuava apontada na direção de Constance.


— Você é uma grande filha da puta, sabe. Mas Emmeline iria
ficar muito triste por eu matá-la, então vou poupar a sua vida
medíocre. — Olhei ao redor e fiz uma careta de nojo. — Levante-se

e me prepare um chá.
Ela ergueu a cabeça em minha direção.

— Um... chá? — perguntou, incerta.


Sentei-me na poltrona e cruzei a perna.
— É, um chá. Eu preciso me acalmar antes de ir encontrar

Emmeline. Dizem que os chás têm propriedades terapêuticas e

essas porras todas, não é?


Constance me olhou por vários instantes como se eu fosse um

lunático.

E para a sorte dela, eu era.

— Levante logo, porra! — Ameacei levantar-me da poltrona


com a pistola em sua direção e ela deu um pulo, esquecendo-se até

da perna machucada. — Não faça eu me arrepender dessa decisão!

— Eu, eu... já vou. Já estou indo. Por favor, acalme-se.


A maldita foi para a cozinha e eu dei uma risadinha.

Estava ansioso para colocar minhas mãos em Giovanni

Domenico.
~

Emmeline

— Eu vou te soltar, mas não quero que faça nenhuma

gracinha, está me entendendo, Emmeline? — Giovanni perguntou,

puxando minha cabeça para trás. — Quero que troque suas roupas
e vista as que vou te entregar.

— Ok.

Giovanni me soltou e pegou um punhado de roupas dobradas


que um de seus homens lhe entregou.

— Saiam todos.

Os homens saíram da sala e quando ficamos a sós, Giovanni

deixou as roupas em cima de uma mesinha. Então tirou um canivete


da cintura e se aproximou.

Os pelos do meu corpo se arrepiaram, ainda mais depois de

ver o seu sorriso lunático. Então ele se abaixou na minha frente e


cortou de uma só vez as amarras nos meus pés.

Senti o alívio me preencher.

E foi a mesma coisa quando ele soltou minhas mãos.

— Vamos, se vista logo. Temos que sair, rápido.


Giovanni jogou as roupas em minha direção.

— Privacidade, por favor? — pedi, incerta.

Giovanni riu e recostou-se na porta.


— Não precisa se esconder de mim, Emmeline. Assim que

estivermos em solo Italiano, vou te mostrar tantas coisas...

A vontade de chorar foi imediata, mas eu segurei. Não ia mais

demonstrar fraqueza diante do inimigo.


Virei-me de costas para ele e tirei minha blusa.

Eu sabia que seus olhos estavam grudados em meu corpo.

— Você deveria me agradecer, Emmeline. Você não é mais


virgem, é uma puta traidora e, mesmo assim, eu a quero. Eu poderia

simplesmente matá-la e a vingança estaria cumprida.

— Por que tanto ódio contra a minha família? — Vesti a outra

blusa, então me concentrei na calça.


— Sua família sempre foi fraca. Senão, não teriam selado

acordo com os ingleses. E depois, ainda permitiram a fuga de sua

mãe, que era para ser a mulher do meu pai. Nós teríamos poder
juntos, como ninguém mais em solo italiano viu. Porém eles

trataram tudo com tanta infantilidade... — Giovanni suspirou. — Foi

mais fácil exterminar a todos.


— Mas vocês não exterminaram a todos. Ainda existem Colin

e eu.
— Seu irmão tem o sangue sujo dos Spencer. Não interessa

para nós. Mas você... — Ele deu uma risadinha. — É uma DeSantis

Ferrari da cabeça aos pés. Vai ser muito agradável cumprir a


vingança do meu pai em você, querida.

Abotoei a calça e me virei para Giovanni.

— Claro, e qual é o plano? Você vai me enfiar dentro de um

avião e me levar para a Itália? Será que não percebe que Henry vai
caçá-lo até o inferno?

— Ele pode vir, estou preparado para isso. Vai ser um banho

de sangue, claro. — Ele deu um passo em minha direção. — Mas


vai valer todo o esforço que fiz para me aproximar de você.

— Você é um homem morto, Giovanni. Escute o que estou

dizendo: essa é a sua última noite de vida.

Giovanni deu um passo em minha direção e tocou meu rosto.


— Vamos ver, querida. Se ele vier, desta vez a bala vai acertar

o coração do seu pobre marido.

~
Giovanni tinha colocado um casaco com capuz em cima de

mim e me arrastava por um túnel escuro e malcheiroso.

Em um certo momento, ele me enfiou dentro de um carro e

percorremos quilômetros.
A cada segundo, eu ficava mais nervosa.

Minha vida estava nas mãos daquele homem louco e se Henry

não conseguisse me encontrar a tempo, estava completamente


perdida.

Não tinha conseguido arrancar muitas informações, mas eu

sabia que ele estava me levando para a pista de pouso do aeroporto

de Gatwick, que ficava ao Sul de Londres.


Quando o carro parou, Giovanni me arrastou para fora e

novamente começamos a caminhar. Eu sabia que estávamos ainda

no subsolo, porque tudo o que eu ouvia eram ecos.


Ele me puxava como se eu realmente quisesse ir com ele

nessa aventura, mas só eu sabia o quanto estava desesperada para

que no momento que botássemos a cabeça para fora, Henry

estivesse com os nossos homens à espera.


Nossos homens...

Alguns meses atrás, eu nunca teria pensado em algo assim.


Mas a vida era uma verdadeira caixinha de surpresas e,

quando menos esperamos, ela nos surpreende.


Giovanni tirou o capuz da minha cabeça e sorriu.

Os homens de Domenico estavam ao nosso redor enquanto

caminhávamos apressadamente. Eles resmungavam coisas em

italianos e eu não entendia sequer uma palavra.


Foi então que um deles se adiantou e abriu uma porta lateral

no túnel. Giovanni me puxou para ela e nós começamos a subir uma

escada íngreme. Estávamos voltando à superfície.


Quando chegamos à outra porta, Giovanni parou e me

encarou.

— Agora, querida... nós vamos entrar no aeroporto. Você só


precisa fingir que está indo fazer uma singela viagem. E tudo ficará

bem.

— O quê? Você vai colocar a vida de outras pessoas em

risco???
Eu sabia que entrar na área comum do aeroporto era uma

maneira de despistar ou intimidar nossos homens, caso eles

estivessem a postos para nos pegarem.


Quando havia vida inocente no meio, o cenário era outro.
— Não me importo com a vida delas, me importo somente em
sair daqui com você — ele retrucou. — A mídia está toda a postos,

querida. Se o seu marido tentar algo, vai ser pior para ele... —

Giovanni sorriu. — Imagine as câmeras mostrando para o mundo o


assassino que ele é, por trás da fachada de magnata.

Fiz uma careta de nojo.

— Você pensou em cada detalhe, não é?


— Claro que pensei... enquanto você ia para a sua casa

dormir, eu estava lá na casa de alguma daquelas meninas do ballet,

fodendo-as, até elas perderem os sentidos. Ah, inclusive, a sua

amiguinha Melanie adorava as carícias que eu fazia em seu corpo.


Então, quando elas dormiam, eu ficava pensando em cada detalhe

do que estava por vir.

— Desgraçado. — Tentei avançar em Giovanni, porém, um dos


homens me segurou.

— Não fique assim, Emmeline. Logo serei todo seu.


Giovanni abriu a porta e me puxou consigo.
Entramos em uma área cheia de cidadãos andando para lá e

para cá.
Giovanni me fez enganchar meu braço no seu e começamos a
caminhar na direção do embarque.
Achei que os policiais iriam nos parar, mas não.
Eles já tinham sido comprados.
Malditos.

Ele me forçou a continuar caminhando.


Eu sentia o cano de sua pistola por dentro do casaco,
apontada na minha barriga.

As pessoas estavam tão aflitas que nem perdiam tempo em


olhar para o nosso rosto. E com aquelas roupas comuns, só uma
pessoa muito atenta conseguiria me reconhecer.

Ele me guiou até uma outra porta, que deu na área externa do
aeroporto.
Havia um jato particular esperando por nós.

Estava ventando muito.


Olhei para trás e não havia nem sinal de Henry ou de algum
homem da Brandy Blood.

As minhas esperanças estavam indo pelo ralo a cada segundo.


— Venha, Emmeline! — Giovanni me puxava, mas eu tentava

resistir. Eu os tinha ouvido dizer que o plano estava indo por água
abaixo. Só precisava de mais tempo! — Anda, porra!
— Eu não vou! — gritei, já estávamos bem próximos do jato,

que já estava ligado, apenas esperando por nós.


— Você vem, sim! — Giovanni apontou a pistola para mim. —
Não me obrigue a usá-la, Emmeline!
E foi nesse momento que um disparo atingiu o ombro de

Giovanni.
Olhei para os lados e homens começaram a surgir,

encurralando-nos.
Os homens de Domenico sacaram suas armas, mas os
homens que estavam escondidos estrategicamente ao redor da

pista de decolagem eram mais espertos.


Giovanni caiu no chão e sua pistola voou para longe.
Os disparos não paravam e estávamos no meio do fogo

cruzado.
Joguei-me no chão e tentei engatinhar até a arma, mas
Giovanni me segurou e uma luta começou entre nós.

— Sua desgraçada! — Mesmo ferido, ele conseguiu me virar e


se colocou em cima de mim. Suas mãos vieram ao meu pescoço e
ele fez pressão, sufocando-me. — Eu disse que seria sangue por

sangue!
Tentei empurrá-lo para longe, mas Giovanni era mais forte.

O ar já não chegava mais aos meus pulmões.


Minha visão começou a ficar embaçada e eu desisti de lutar.
A morte era o meu destino.
Foi nesse momento que eu o vi, agigantando-se por trás de

Giovanni.
Sua 9mm sempre tão apreciada, agora apontada no crânio de
meu inimigo.

— Tire a porra das suas mãos da minha esposa!


Giovanni afrouxou o aperto.

Os disparos tinham cessado.


Não sei quanto tempo havia se passado que estávamos
naquela luta, mas agora eu via homens caídos ao nosso redor.

Sentei-me, tossindo, enquanto Giovanni era arrastado para


longe de mim.
— Emmeline! Emmeline! — Colin se jogou ao meu lado e suas

mãos vieram ao meu rosto. — Fale comigo, irmã!


— Eu estou bem. — Tossi mais uma vez e então foquei no
rosto tão parecido com o de Henry. — Eu estou bem.

Ele abriu um meio-sorriso.


Ouvimos um disparo e um grito.
— Isso é só o começo, seu filho da puta! — Henry chutou

Giovanni no estômago. — Estou louco para estripá-lo e dar cada


pedacinho para os cachorros da rua!
Levantei-me para ir na direção de Henry.

Precisava falar com ele.


Precisava dele!
Mas estaquei assim que seus olhos vieram em minha direção.

Ele estava possuído.


E mesmo que eu quisesse, não conseguiria trazer meu marido
de volta. Não enquanto seu inimigo estivesse vivo.

— Leve Emmeline para casa — ele ordenou ao Colin.


— Você não pode me matar! — Giovanni gritou. Sua boca

estava cheia de sangue. — Eu sou o filho do Capo! Se fizer isso, vai


atrair uma guerra sem precedentes para o seu país!
— E você acha que eu já não dei uma ordem de extermínio

para a sua organização medíocre? — Henry pisou no peito de


Giovanni até ouvirmos o estalo. Ele gritou e mais sangue jorrou de
sua boca. — Pois é, meu caro. Não é só os Domenico que querem o

trono. E, por sorte, eu sou muito amigo de uma Organização que só


estava esperando uma ordem minha para acabar com os seus.
— Você não pode fazer isso!

Henry engatilhou a arma e apontou para a cabeça de


Giovanni.
— Eu posso e sabe por quê? — Ele se abaixou só um
pouquinho. — Porque eu sou o dono da porra da Inglaterra!
Colin virou-me bem no minuto em que Henry fez o disparo.

— Acabou, Emme. Acabou.

Quando cheguei em casa, Ellen me abraçou aos prantos.

Greta e Alfred também.


Prepararam-me um banho quente e comida, que eu comi sem
reclamar.

Quando subi as escadas, fui para o quarto de Henry.


Seu cheiro invadiu as minhas narinas.
Havia tanto para conversarmos, para nos entendermos.

Quando pensei em me deitar, a porta se abriu e Henry me


encarou.

Ainda havia a escuridão em seus olhos, o desejo insano por


sangue. Mas tudo o que eu precisava era dele.
Então corri ao seu encontro e me joguei em seus braços.

Henry me segurou no colo e seus lábios encontraram os meus


em um beijo apaixonado.
— Meu amor, acabou — ele disse entre um beijo e outro. —
Acabou. Você finalmente está em segurança.

E eu sabia que sim.


Neste mundo, somos apenas nós

Você sabe que não é igual a como era antes


As It Was – Harry Styles

Emmeline

Desta vez, eu não me importei que houvesse sangue nas


mãos de Henry. Muito menos que o cheiro de morte ainda estivesse

rondando-nos. Não tive medo quando ele me deitou na cama e


subiu por cima de mim, com os olhos perturbados, cheios de

demônios.

Aquele era Henry.


O meu Henry.

O homem no qual eu estava perdidamente apaixonada.


Seus lábios procuraram os meus e eu o beijei com fervor.

Minhas mãos se enroscaram em seus cabelos e seu corpo prensou

o meu com mais força.


Eu o queria com desespero.

— Eu tive medo de perdê-la. — Henry se afastou apenas para


puxar o laço do meu robe. Seus olhos brilharam assim que ele viu a

lingerie que eu tinha colocado para esperá-lo. — Eu teria dado um

tiro em minha cabeça.


— Não diga isso. — Toquei seus lábios com a ponta do dedo.

— Você jamais vai me perder.

Henry voltou a me beijar.


Desta vez foi mais selvagem. Nossas línguas se movendo uma

contra a outra. Suas mãos percorrendo meu corpo de forma

possessiva, fazendo que cada pedacinho de mim se acendesse.


Com dedos ágeis, comecei a abrir os botões de sua camisa.

Henry deixou minha boca para se livrar da roupa, jogando-a no


chão. Quando ele voltou, começou explorando meu pescoço com

sua língua quente e seus lábios atormentadores.

Henry forçou seu quadril contra a minha intimidade e eu gemi.

Era gostoso senti-lo tão duro, desejoso pelo que estava por vir tanto

quanto eu estava.

Suas mãos apertaram meus seios sob a lingerie branca. O


vermelho de suas mãos se espalhou pelo tecido de renda e aquilo,
que antes me deixaria completamente chocada, desta vez me
deixou excitada.

Era o sangue de nosso inimigo que estava impregnado em

Henry e eu desconhecia sensação maior do que aquela de saber

que aquele homem tinha matado outro para me proteger.

Para salvar a minha vida.

Sua boca estava brincando com a minha barriga, espalhando


beijos enquanto suas mãos puxavam a minha calcinha. Ele deslizou

o tecido fino pelas minhas pernas, seu olhar sempre grudado ao

meu.

Eu queria falar tantas coisas, mas eu sabia que não era o

momento. Henry estava preso em seu próprio mundo e eu precisava

deixá-lo lidar com isso da forma que ele melhor sabia.

Henry segurou meus tornozelos e abriu minhas pernas com


brusquidão. Sua língua raspou em toda a minha intimidade e eu

soltei um gemido alto, fechando meus olhos e me entregando ao

prazer que ele me proporcionaria.

Sua língua sugou meus grandes lábios. Desfiz-me em

gemidos, apertando os lençóis como se pudesse rasgá-los. Henry

abriu-me ainda mais, tendo acesso completo ao centro do meu


prazer.
— Henry... — Suspirei.

Ele chupou-me com mais força, descendo sua língua até a


entrada da minha boceta. O orgasmo se aproximava a cada

segundo que ele me atormentava com aquelas carícias ousadas.


Seus dedos pressionavam minhas coxas com força e eu sabia
que ficaria a marca. Mas eu não me importava, porque eu pertencia

a ele.
De corpo, alma e sangue.

Arqueei as costas assim que o prazer tomou os meus sentidos.


Henry voltou a mim e sua boca encontrou a minha, lambuzada

pelos resquícios do meu orgasmo e eu me entreguei em um beijo


apaixonado. Seus dedos se concentraram em meu sutiã e ele o
arrancou, jogando-o longe.

Quando achei que era o bastante, Henry provou que também


sabia me fazer ter outro orgasmo apenas acariciando meus seios.

Lambendo-os, mordiscando-os.
Suas mãos acariciavam cada parte do meu corpo. Ora ele me

apertava com desespero, como se eu pudesse escapar, ora ele


tentava ser gentil e eu amava como conseguia ser um monstro e o
homem que eu precisava, todos em um mesmo lugar.
Henry tirou as calças rapidamente, seu pau saltando da cueca

em minha direção. Ele me puxou para si e me colocou sentada em


seu colo. Sua boca grudou na minha e ele me beijou com paixão.

Quando desci meu quadril em seu pau, o prazer foi o


combustível para nós. Suas mãos seguraram a minha bunda, mas

não precisei de muito para cavalgá-lo, já que meu corpo estava


necessitado daquele contato.
Segurei seu rosto com minhas mãos, beijei-o e movi minha

cintura ao seu encontro. Henry gemeu baixinho contra a minha


boca.

Nós nos perdemos em nosso mundo.


Não havia palavras.
Na verdade, nem precisávamos.

As batidas do nosso coração eram suficientes para dizer tudo


o que estava dentro de nós.

Henry me abraçou e com nossos corpos ainda conectados, me


virou na cama e começou a entrar e sair com força.

Seus braços estavam ao lado da minha cabeça. Ele fechou os


olhos, suor escorrendo de sua testa, seus cabelos pretos
bagunçados. Henry me fodia como se fosse a última vez.

— Olhe para mim — pedi, deslizando um dedo pelo seu rosto.


Ele me encarou.
— Eu te amo, Henry.
— Não mais do que eu te amo, Emmeline — ele disse e meteu

fundo, me fazendo gemer em resposta. — Minha, apenas minha.


Para sempre.

— Eu sou sua.
Henry aumentou a velocidade de seus movimentos, entrando e
saindo do meu corpo. Gemidos eram os sons que escapavam de

nossos lábios. Nossos corpos suados, fundindo-se um ao outro.


Quando Henry gozou, seu corpo inteiro tremeu com a força de

seu orgasmo. Ele se retirou e seu líquido se espalhou em mim,


como deveria ser. Henry se deitou ao meu lado e me puxou para os

seus braços.
— Temi que você me rejeitaria — ele disse, sua respiração
voltando ao normal enquanto deslizava a ponta dos dedos em meu

braço.
— E por que eu faria isso? — Imitei seus movimentos,

deslizando os dedos entre os gomos de sua barriga definida.


— Você sabe o porquê, Emme.
Ergui a mão e puxei seu rosto para encarar o meu.
— Eu entendi tudo, Henry. Não temos culpa do que aconteceu
em nosso passado e, muito menos, das escolhas dos nossos pais.
— Mordi o lábio e depois disse: — Agora quem se sente

envergonhada sou eu. Eu fui tão má com você.


Tentei me afastar, mas Henry me prensou contra a cama e sua

testa encostou na minha.


— Você fez o que precisava. E eu jamais a vi dessa forma... —
Ele abriu um sorrisinho. — Na verdade, eu adorava a sua rejeição.

Me deixava apenas mais louco para tê-la.

Não aguentei e dei uma risada.


— Você é louco.

— Eu sou. Por você. Sempre fui... desde aquele dia em que

meu pai me levou até sua casa. Você era só uma criança de oito

anos, Emmeline... e eu sei que isso é doentio, mas eu já conseguia


imaginar a mulher que você se tornaria e, porra, eu mal podia

esperar para reivindicá-la.

Fechei os olhos e sua boca tomou a minha em mais um beijo


apaixonado.

Agora sim eu me sentia em casa.

Em meu lar.
~

— Como Nathan está? — perguntei ao entrar na biblioteca


onde Colin estava fumando um cigarro, jogado em uma das

poltronas.

— Vai ficar bem. — Ele soltou a fumaça pelo nariz. — Só


Monster que talvez precise se aposentar antes do esperado. A bala

pegou em uma parte importante de sua perna... — Quando descobri

o apelido que deram ao homem da cicatriz fiquei chocada. Mas


Henry explicou que ele não ligava e até gostava, porque no fundo

ele realmente era um monstro. — Perseguições usando uma

bengala não nos ajudam em nada.

Aproximei-me da janela e olhei para o lado de fora. A vista da


biblioteca dava para o jardim dos fundos.

— Perdemos dois homens... — falei, ainda concentrada na

paisagem. — Precisamos cuidar de suas famílias. — Virei-me para


Colin. — Dar-lhes assistência em tudo o que precisarem. Pagar a

faculdade de seus filhos... e por aí vai.

Colin se levantou e foi até o cinzeiro em cima da mesa, onde

apagou o cigarro.
— Você diz isso de uma forma tão... calma.
— O quê? — Cruzei os braços.

— Como se finalmente tivesse aceitado o nosso destino.

— Mas eu aceitei.
Colin ergueu a cabeça e me encarou por alguns instantes.

— Eu estava esperando algum tipo de rebeldia da sua parte —

ele confessou. — Algo como “Eu odeio você por ter me escondido

tantas coisas”. Mas... acho que me iludi.


Balancei a cabeça negativamente e dei uma risadinha.

Aproximei-me de meu irmão e segurei as lapelas de seu terno.

— Eu fiquei com raiva, sim, no primeiro momento. Mas depois,


eu tive tempo para refletir tudo — falei, olhando para o seu peito. —

Acho que se Henry não existisse... eu teria um destino muito triste.

Colin segurou meu rosto delicadamente.

— Não se importa de ele ser seu primo?


— Não, não me importo.

Meu irmão sorriu e depositou um beijo em minha testa.

— Me perdoe por ter me afastado quando você era uma


criança. Eu... precisava me assegurar que as coisas dariam certo e

que aqueles desgraçados nunca a tocariam.

Assenti e então uma coisa me incomodou.

— Ellen sabe que você é irmão de Henry?


— Sabe.

— Você nunca pensou na possibilidade de se casar com ela?


Colin fez uma careta, depois começou a rir.

— Emme... você tem uma imaginação tão fértil. — Ele tocou

meu queixo e depois se afastou na direção da porta. — Ellen é um


bebê. Desde quando eu quero uma criança?

— É bom saber que você me acha apenas uma criança, Colin.

— A voz ecoou da porta e nós nos viramos bem a tempo de

encontrar Ellen parada na porta, com o rosto completamente


desiludido. — Eu nunca te achei tudo isso, mesmo. Babaca.

Ela ergueu o dedo do meio e bateu a porta com força.

— Caralho...
Cocei a cabeça.

— É, querido irmão... vivendo e fazendo merdas, não é? — Dei

uma risadinha. — Agora quero ver você conseguir se retratar com

ela.
— Porra, que inferno! — Colin saiu bravo na direção da porta.

— Agora ela vai reclamar com Henry que eu fui grosseiro e ele vai

falar no meu ouvido até não querer mais! Vocês mulheres nos
enlouquecem! Malditas sejam.

Colin saiu da sala e eu ri sozinha.


Olhei para a biblioteca que Henry havia montado para mim.

Era linda, confortável...

Só que antes, eu não a tinha olhado desta maneira. Achava

que era apenas uma forma de conseguir a minha aprovação.


Comprar o meu amor. E, no final das contas, ele conseguiu o meu

coração sendo ele mesmo.

— Senhora Spencer? — Virei-me com um sorriso bobo e


encontrei Greta parada na porta com uma bandeja nas mãos. —

Posso entrar?

— Claro, Greta. O que é isso?

Ela se aproximou a passos largos e me estendeu a bandeja.


Havia um pequeno envelope de cor amarelada.

— Acredito que seja um convite, minha lady.

Peguei o envelope e o abri.


Realmente era um convite.

Em três dias, seria o Ano Novo, e estavam nos convidando

para celebrar a passagem do ano na casa de lorde Thompson.

Fiz uma careta de desgosto.


— Sério isso? Não acredito que eles queiram a nossa

presença de verdade. — Entreguei o convite à Greta, que leu com

calma.
— Eles são muito amigos de lorde Spencer... é natural que os

convidem para essas festas, minha lady. A senhora não precisa ir,
se não quiser, mas se seu marido faltar, é quase como um

desrespeito à prestigiada família.

Eu sabia que sim.

Não fui criada no meio aristocrático, mas algumas etiquetas eu


tinha conhecimento.

— Quero só ver o que Henry vai dizer.

— O que Henry vai dizer sobre o quê? — A voz masculina


preencheu a biblioteca e involuntariamente abri um sorriso bobo

assim que meus olhos se voltaram para ele.

— Chegou um convite de lorde Thompson, para a festa de final


de ano. — Balancei o envelope entre os dedos.

Henry se aproximou, um braço envolveu a minha cintura e com

a mão livre pegou o papel e leu.

— Ahn... eu já imaginava. Ele tem o costume de fazer essas


festas e chamar a todos. Como se as festas dele fossem grandes

coisas. — Henry jogou o papel para trás e agora com as duas mãos

livres, pegou-me pelas pernas e colocou-me em cima da mesa.


Dei um gritinho assim que algumas coisas caíram no chão.
— Greta, acho que é melhor... — Mas ele nem precisou
terminar sua fala, porque a porta se fechou com um barulho que

significava “estou caindo fora”.

Henry riu.
Sua boca se grudou à minha e nos beijamos com avidez.

Suas mãos se infiltraram por dentro da minha blusa.

— Henry... — Afastei-me só um pouco. — Aqui não. Vai que


algum dos homens entra ou...

— Psiu... — Sua boca começou a brincar com meu pescoço.

— Se alguém entrar, vai ter um belo vislumbre da minha bunda já,

já.
Joguei a cabeça para trás, rindo.

— Você é incorrigível.

Ele sorriu. Seus dedos já estavam nos botões da minha


camisa.

— E você adora.
Então com um puxão, os botões voaram longe.
Henry tinha razão.

Eu o adorava.
Eu o amava.
Me beije intensamente antes de ir

Tristeza de verão
Eu só queria que você soubesse
Que, amor, você é o melhor

Summertime Sadness – Lana Del Rey

Emmeline

Escolhi um vestido vermelho longo que era em decote V para


compor o meu look da noite.

Estava colocando meus brincos, quando Henry entrou no

quarto.
Quase perdi o fôlego ao vê-lo.

Sempre tão bonito, tão elegante. O smoking era apenas um


detalhe para deixá-lo ainda mais chamativo.

— Uau, os homens de Londres terão sérios problemas esta

noite — ele disse, aproximando-se e enlaçando a minha cintura por


trás.

— É? Por quê?
— Porque eu vou furar os olhos de cada um que ousar olhar

para você. — Ele beijou meu pescoço. — Talvez fosse melhor

desistirmos dessa festa idiota e aproveitarmos o réveillon em nossa


cama...

Suas mãos começaram a massagear minha coxa e eu precisei

conter um gemido.
— Pode ser uma boa ideia, mas... — Afastei-me de seus

braços. — Seus amigos vão se sentir ofendidos se não formos a

essa festa idiota.


Henry respirou fundo e enfiou as mãos nos bolsos da calça.

— Tem razão, mas... — Ele se aproximou novamente, tirou


uma mão do bolso e segurou meu queixo com delicadeza. —

Podemos ficar só um pouco. As festas dos Thompson sempre são

chatas.

Sua voz estava cheia de terceiras intenções.

— É claro.

Henry me olhou nos olhos por um bom tempo.


— Stephanie te incomoda? — ele perguntou, soltando-me, por

fim.
Eu podia ter mentido, mas ele veria a verdade em minha íris.
— De certa forma, sim.

Henry suspirou. Suas mãos vieram à minha cintura.

Desviei o olhar, envergonha pelo ciúme idiota que queria me

assolar.

— Emme, olhe para mim.

Olhei para seu rosto.


— Stephanie nunca chegou aos seus pés. Ela era apenas

uma... diversão. Distração, chame como quiser.

Bufei.

— Por que a mandou me ajudar quando cheguei? Achou que

eu não descobriria o caso que vocês tiveram?

— Eu não tinha outra pessoa de confiança para fazer isso,

Emmeline. Stephanie pode ser uma puta, mas é da nobreza. Ela ia


saber o que comprar para você.

Respirei fundo e assenti.

— Promete que nunca mais vai ter nada com ela?

— Claro que prometo. Que história é essa, Emme? — Suas

mãos seguraram meu rosto e sua testa encostou na minha. — O

que está te incomodando?


Naquele dia eu não tinha acordado muito bem, essa era a

verdade.
Durante a noite tive um pesadelo, no qual Henry e eu

estávamos em uma estrada sinuosa, ele corria como na noite em


que voltamos para Londres, então perdeu a direção e atravessamos
uma ponte, caindo dentro do rio.

A água entrava pelos orifícios do carro. Gritávamos. Henry


tentava soltar o meu cinto, mas a água estava quase cobrindo

nossas cabeças.
Ele conseguiu me soltar e com um pouco de força, eu saí do

carro, mas quando olhei para trás, ele continuava preso no banco.
Então não houve mais tempo.
Acordei suando, desesperada, e só me acalmei quando toquei

o torso nu de Henry e constatei que ele ainda respirava.


Passei o dia todo com um aperto no peito, talvez pelos

acontecimentos recentes. Não conseguia ainda digerir o fato de ter


sido enganada tão facilmente por William, Giovanni.

— Isso vai passar, Emme. — Henry massageou minha


bochecha com o polegar. — É tudo muito recente. Imagino os
pensamentos que devem estar rondando a sua mente.

Assenti minimamente.
— Bem, vamos? — Ele se afastou e segurou minha mão. —

Essa festa maldita nos espera e se queremos sair cedo, precisamos


chegar cedo também.

Dei uma risadinha, mas então Henry me puxou para si e seus


lábios grudaram nos meus de forma possessiva.

— Porra, como eu queria mandar essa festa para o quinto dos


infernos — ele disse, ofegante assim que nos separamos. — Às
vezes, eu odeio estar nessa posição.

Limpei meus lábios com a ponta dos dedos e chequei


rapidamente se meu batom estava destruído. Por sorte, ele era à

prova de beijos ardentes.


— Às vezes? — Dei uma risadinha, aproximando-me de onde
ele estava, parado na porta.

— Só às vezes. — Ele sorriu. — Porque na maioria das vezes,


eu gosto de quem eu sou.

E podia ser loucura, mas eu também gostava.


— E eu gosto de quem eu sou quando estou com você.

Henry entrelaçou nossos dedos e sorriu enquanto


caminhávamos pelo corredor.
— E quem você é quando está comigo?

— Eu sou completa.
~

Ellen estava conosco no carro porque se recusou a estar no


mesmo espaço que Colin. Ela estava emburrada desde que ouvira

as idiotices de meu irmão.


— Sabe, Ellen... estou pensando em algo para você — Henry

disse, quebrando o silêncio. — Logo você vai se formar no


Harrogate e estará pronta para ser uma dama da sociedade.
— E o que você pretende, irmão?

— Hã... — Ele ajeitou a gravata borboleta. — Acredito que em


breve Gianluca Tommaso vai começar a procurar por uma esposa.

Você seria uma ótima opção.


Ellen fitou-nos com interesse.
— Esse é o novo Capo que assumiu o lugar dos Domenico,

não é?
Henry assentiu.

— E ele é bonito?
Dei uma risadinha. Ellen sempre levava as coisas com bom

humor.
— Isso não importa, Ellen. O que importa é que se um
casamento entre vocês acontecer, seria ótimo para criarmos laços
com os italianos. — Sua mão apertou a minha levemente. — Um

novo começo. Poderíamos reescrever nossas histórias, de uma


forma diferente.

Ela respirou fundo.


— Bem, eu gostaria de conhecê-lo primeiro.
— Claro. — Henry sorriu.

O carro parou em frente à mansão dos Thompson e abriram a

porta para nós. Henry desceu na frente e ajudou sua irmã, em


seguida me ajudou e nos encaminhamos até a entrada.

Colin e um outro homem seguiam logo atrás de nós, além dos

que estavam em outros carros. Depois de tudo o que aconteceu,

Henry triplicou a nossa segurança, porque nunca sabíamos de onde


o inimigo podia surgir.

Fomos recebidos pelo patriarca, todo sorridente.

Ele cumprimentou Henry com um aperto de mão e um abraço


caloroso. Na minha vez, depositou um beijo na minha mão e disse

que eu estava deslumbrante.

— Você sabe que se ele pudesse tirar você da jogada e


colocar a filha dele, faria sem nenhum remorso, não sabe? — Ellen
perguntou baixinho, assim que nos afastamos.

— Claro que sei.


Abri um sorriso forçado para o próximo que veio nos

cumprimentar.

E pelos próximos minutos tudo o que fizemos foi falar com


pessoas. Todos se mostrando preocupados pelo que tinha

acontecido comigo.

Tive que repassar a conversa que Henry e eu tínhamos

ensaiado sobre o sequestro. Nada de máfias, nada de segredos do


passado, apenas um louco que achava que podia tocar na Duquesa

de Cambridge.

Todos acreditaram com facilidade.


— Fico feliz que você está bem, Emmeline. — Stephanie se

aproximou com um sorriso falso. — Não sei o que seria de Henry se

algo tivesse acontecido a você.


— Eu disse a ela que teria dado um tiro em minha cabeça —

ele disse, enlaçando a minha cintura e me puxando para si.

Stephanie deu uma risadinha.

— Bem, aí também já é exagero, não é?


Henry a fitou seriamente.
— Nem um pouco de exagero. Eu já disse que sem Emmeline

eu não sei viver.

As bochechas da vadia ficaram um pouco vermelhas e eu não


sabia se era de vergonha ou de ódio por ver que aquela guerra ela

havia perdido.

— É bom que vocês sejam assim. — Ela sorriu largamente. —

Quem sabe, um dia, eu encontre um amor tão forte como o de


vocês.

Ela pediu-nos licença e saiu para conversar com outras

pessoas.
— Não ligue para ela. — Henry bufou. — Venha, quero te

mostrar uma coisa.

Ele puxou-me pela mão e levou-me até os fundos da mansão,

onde havia uma fonte com um anjo esculpido em pedra. A água


jorrava com calma e luzes coloridas animavam o fundo, onde as

águas descansavam.

— Sabe quem deu essa fonte aos Thompson? — Henry


perguntou, posicionando-se atrás de mim. Seus braços circundaram

a minha cintura.

— Quem?
— Minha mãe. Ela gostava de George... era o único amigo que

tinha. — Henry suspirou e se afastou, enfiando a mão dentro da


fonte. — Suspeito que eles tiveram um caso.

— Seu pai também suspeitava?

— Não. Se ele suspeitasse, teria matado minha mãe ou


George com as próprias mãos.

— Entendo...

Às vezes, eu tentava pensar como tinha sido a vida de

Catherine. No silêncio da casa, eu quase podia ouvir os seus


choros, sentir a sua dor. O seu pesadelo de viver com alguém que

não amava, que só a maltratava.

— Deve ter sido horrível quando ela faleceu.


— Foi. — Henry secou a mão na calça. — E mesmo depois de

tantos anos, George não deixa tirarem a fonte daqui.

Abri um meio-sorriso.

— Eu também não tiraria.


Henry sorriu de volta e se aproximou. Segurou meu rosto com

delicadeza e quando estava prestes a me beijar, ouvimos uma

tossida bem atrás de nós.


— O que é tão importante que você ousa interromper o beijo

que eu estava prestes a dar em sua irmã, Colin? — Henry


perguntou, ainda olhando para o meu rosto.

— Sinto muito, mas vocês terão a vida toda para se beijarem.

Aquele comerciante francês que você queria conhecer, acabou de

chegar e está ansioso em ver você.


— Querida, pode me dar um segundo? — Henry perguntou. —

Eu juro que não queria trocá-la por um comerciante, mas...

realmente vai ser muito bom fazer negócios com esse sujeito.
— Tudo bem, eu entendo. — Sorri. — Vou procurar Ellen.

— Você é maravilhosa.

E então ele me deu um beijo rápido e se afastou com Colin em

seu encalço.
Fiquei um tempo olhando para a fonte, pensando em tudo o

que havia acontecido em minha vida em tão pouco tempo.

Era uma loucura.


Mas eu podia chegar à conclusão de que estava feliz.

— Emme? O que está fazendo aqui sozinha? — Ouvi a voz de

Ellen e me virei. — O imbecil do meu irmão a deixou sozinha, não

é? — Ela bufou e então se aproximou e me puxou pela mão. —


Vem, vai começar a contagem regressiva.

Segui Ellen de volta para o salão.


Estavam todos se organizando na sacada da mansão para ver

a queima de fogos.
Quando Henry me viu, cumprimentou o homem e veio em

minha direção.

— Por sorte, foi mais rápido do que eu imaginava — ele disse

em meu ouvido. — Pronta para virar o ano e começar uma nova


vida, senhora Spencer?

— Prontíssima.

Nós seguimos até a sacada e a contagem regressiva


começou.

Quando o ponteiro bateu meia-noite e os fogos começaram,

Henry me abraçou e nos beijamos, da maneira que Colin havia nos


interrompido perto da fonte.

As pessoas ao nosso redor soltavam gritos eufóricos,

comemoravam erguendo suas bebidas, com sorrisos nos lábios,

porque toda virada de ano trazia a perspectiva de coisas novas.


— Com licença. — Um garçom interrompeu-nos com uma

bandeja em mãos. Havia uma taça de champanhe nela. — Pediram-

me para entregar essa bebida para a senhorita.


Estava tão eufórica que nem perguntei de quem era o gesto.
Eu a peguei, porém, quando levei aos lábios, Henry segurou
meu braço.

— Deixe-me provar se é do que eu estava bebendo agora há

pouco. Porque tem um outro que estava horrível.


Sorri com sua preocupação em me oferecer o melhor e deixei

que bebesse.

E foi quando Henry engoliu o primeiro gole que ouvimos o


grito.

— NÃO! NÃO! — Stephanie voou em nossa direção, mas Colin

a segurou pela cintura. Ela estava com os olhos vidrados,

desesperados. — NÃO BEBA ISSO!


Aconteceu tudo muito rápido.

A taça se estilhaçou assim que caiu no chão.

Em seguida, Henry caiu aos meus pés.


Ele estava convulsionando.

— HENRY! — Caí junto ao seu corpo, que tremia


violentamente. Seus olhos se reviravam e sangue começou a
escorrer de sua boca. — HENRY!

O caos se formou em questão de segundos.


— CHAMEM UM MÉDICO! — agora eu gritava, desesperada
com Henry convulsionando em meus braços. — UM MÉDICO,
PELO AMOR DE DEUS!
As lágrimas rolavam pelo meu rosto e o desespero estava me
sufocando a cada segundo.

Henry parou de tremer, mas seus olhos se fecharam.


— Henry! — gritei, completamente em choque. — Não faça
isso comigo! Pelo amor de Deus!

Um homem se ajoelhou à nossa frente.


Era o médico que me atendeu quando desmaiei na boate.
Puxaram-me para longe de Henry, mas eu não queria.

Precisava acordá-lo. Precisava dele.


Olhei para onde Colin estava, segurando Stephanie pelos
braços.

Ela estava chorando, em choque tanto quanto eu.


E foi, pela primeira vez em tantos anos, que meu irmão soube
ler exatamente o que se passava em meu rosto.

Eu queria a cabeça daquela filha da puta.


Apenas pare de chorar

É um sinal dos tempos


Bem-vindo ao show final
Espero que você esteja vestindo suas melhores roupas

Sign Of The Times – Harry Styles

Emmeline

O barulho agudo da máquina ligada ao coração de Henry


estava quase me enlouquecendo.

A cada segundo que se passava, eu tinha medo de que as

linhas que subiam e desciam, se transformassem em uma linha reta,


com aquele sinal sonoro que indicava que não havia mais

esperança.
Esperança...

Era a palavra que eu repetia em minha mente todos os dias,

tentando me apegar a ela como se fosse uma corda jogada para me


salvar naquele mar de escuridão.

— Emmeline? — Colin se aproximou e eu nem tinha percebido


que ele entrou no quarto. — Você precisa ir para casa. Já faz uma

semana que você está dormindo pouco e se alimentando mal.

— Não quero ir — falei, balançando a cabeça negativamente.


— Não posso sair daqui. Quando Henry acordar, ele precisa ver que

estive ao seu lado todo esse tempo.

Colin não disse nada, apenas se aproximou de onde eu estava


em pé, segurando a mão de Henry.

— Ele não vai gostar quando acordar e ver que você não está

se alimentando direito.
De repente, as lágrimas começaram a rolar em meu rosto.

Henry teve duas paradas cardíacas e depois entrou em coma.


Os médicos tinham sido bem sinceros ao dizer que não havia muito

o que fazer. A qualquer momento, ele poderia ir de vez. Ou... se

sobrevivesse, poderia ter sequelas muito sérias.

— Era para ter sido eu, Colin — falei, as lágrimas jorrando com

força. — Ele só bebeu primeiro porque queria se certificar que

estavam me servindo do melhor.


Colin também estava emocionado, mas meu irmão conseguia

segurar muito mais que eu.


— Uma vez ele levou uma facada por mim. — Colin respirou
fundo. — Henry era um louco e isso incluía se colocar na frente do

perigo por quem ele amava.

Olhei para seu rosto inexpressivo, coberto pela máscara de

oxigênio ligada ao tubo que entrava por sua garganta.

— Isso não é justo. — Passei os dedos pelas lágrimas. — Eu...

só queria um pouco de paz. Achei que agora que nossos problemas


estavam resolvidos, poderíamos ser felizes. Sabia que ele me disse

que queria um bebê?

Colin abriu um meio-sorriso.

— E você também queria?

— Queria, mesmo sabendo que é loucura trazer uma criança

para esse mundo no qual vivemos.

Ficamos em silêncio por um tempo, perdidos em nossos


próprios pensamentos, enquanto observávamos Henry.

— Emmeline, eu sei que aqui não é o momento disso, mas...

— Eu sei, Colin — o cortei. — Eu preciso resolver isso.

Havia uma coisa na qual eu estava protelando já fazia dias.

— Você pode deixar em minhas mãos — ele disse, afastando-

se até uma poltrona. — Eu sei como lidar com essas coisas.


— Não — falei com veemência. — Eu quero cuidar disso. É o

meu dever para com o meu marido.


Colin assentiu e se levantou.

— Então resolva logo. Está ficando difícil manter a polícia


longe.
Olhei novamente para Henry e levei minha mão até seus

cabelos. Afastei-os com cuidado.


— Ok. Vou resolver isso o mais rápido possível.

Abri a porta do escritório e entrei. Fui até a mesa e abri a

primeira gaveta.
Dias antes do acontecimento, Henry havia me dito que
guardaria uma pistola ali, por precaução.

Peguei a 9mm e a observei. Era pesada. E eu só tinha usado


uma arma uma vez na vida.

Mesmo assim, não me sentia intimidada com o que eu


precisava fazer.
Enfiei a pistola em minha bolsa e saí do escritório.

~
Atravessei o corredor gelado e úmido com o barulho dos meus

saltos ecoando por toda a sua extensão.


Não era a primeira vez que eu tinha ido até ali. Dois dias após

o que havia acontecido na festa de Ano Novo, eu tinha ido, com a


cabeça quente, atrás de vingança.

Só que eu soube que precisava de tempo.


Queria resolver aquilo com o sangue frio.
Mas agora esse tempo estava se esgotando, eu precisava

resolver aquela situação.


O túnel nunca parecia ter fim.

Por um lado, eu entendia a sua extensão. Aquele lugar serviu


de transporte para os cadáveres das pessoas que morriam nos
andares de cima. Ali, hoje, era os destroços de um grande hospital

psiquiátrico abandonado ao Leste de Londres.


Eu quase podia sentir o cheiro de formol e outras substâncias

químicas que eram usadas nos corpos, mesmo depois de tantos


anos desativado.

As luzes no teto piscavam e se fosse em outros tempos, eu


teria medo. Mas desde que entrei naquele mundo, soube que
apenas os vivos podiam fazer suas maldades.
O fim do túnel dava em uma sala fria, onde, na época em que
o hospital estava em atividade, faziam as autópsias e só Deus sabia
quantas atrocidades aconteceram ali.

— Boa noite, minha senhora. — Nathan estava parado em


frente à porta dupla de ferro.

— Boa noite, Nathan.


Ele abriu uma das portas e eu entrei.
Havia outros dois homens com braços cruzados e assim que

me viram, ajeitaram suas posturas.


— Boa noite, senhora — eles me cumprimentaram.

Dentro da Brandy Blood ninguém usava o meu título, assim


como era com Henry.

— Boa noite, onde está Colin? — perguntei, olhando ao redor.


— Está na outra sala com a vadia — um deles respondeu.
— Ok.

Encaminhei-me na direção da sala anexa à principal. As


paredes do local estavam cobertas de limo e o cheiro era

insuportável. Cheiro de gente morta. De atrocidades.


Antes que eu abrisse a porta, Colin saiu da sala.
— Ah, você chegou. — Ele me olhou da cabeça aos pés. —

Tem certeza de que quer fazer isso?


— Já disse que quero — falei, entredentes. — Conseguiu as
coisas que eu pedi?
— Consegui.

— Ótimo.
Fiz menção de passar por Colin, mas ele segurou o meu

braço.
— Você não precisa fazer isso. Ele é o meu irmão...
— Mas ele é o meu marido, porra! — Puxei meu braço de

volta. — E eu sou a sua senhora. Sendo meu irmão ou não, você

precisa respeitar as minhas decisões!


Colin e eu travamos uma batalha de olhares por longos

instantes.

Ele assentiu, derrotado.

— Perdoe-me.
Respirei fundo, passando uma mão pelo cabelo.

Estava exausta.

— Ela está consciente?


— Está.

— Ótimo.

Entrei na sala que era praticamente metade da que eu estava


antes, mas era ainda mais fria.
Em um canto, havia um colchão, um copo de água e um

pedaço de pão.
No centro da sala, uma cadeira, onde Stephanie estava com

as mãos e pés amarrados, além da boca que estava tapada com

uma fita cinza.


— Olá, Stephanie.

Seus olhos se abriram e ela me fitou com desespero.

Começou a gritar, mas o barulho era abafado pela fita em sua boca.

Colin, Nathan e os outros dois homens se juntaram a nós na


sala. Havia mais outros, que estavam no andar de cima, cuidando

da segurança de nossos negócios.

Stephanie estava um caos.


O cheiro de dias sem tomar banho se juntava ao horror

daquele lugar. Seus cabelos que antes eram loiros exuberantes,

agora não passavam de uma massa ensebada e opaca.


— Eu vou tirar a fita de sua boca — falei, aproximando-me. —

Mas você precisa prometer que vai fazer silêncio.

Stephanie assentiu. Seus olhos cheios de medo.

Puxei a fita de uma só vez.


Ela soltou um gritinho, então começou a chorar.
— Por favor, Emmeline... me solte — ela pediu. — Esses

homens querem me matar.

Eu queria que ela falasse.


Então abaixei-me, como se fosse uma grande amiga na qual

ela pudesse contar uma fofoca.

— Sério? E por que meus homens querem te matar?

— Eles acham que envenenei Henry. — Mais lágrimas rolaram


de seu rosto. — E você sabe que eu não faria isso. Eu... me perdoe,

Emmeline, mas eu o amava.

Ouvir aquela vagabunda dizer que amava o meu marido fez o


meu sangue se elevar a níveis astronômicos. Levantei-me, levando

minha mão até seu pescoço e o segurei com força, cravando

minhas unhas em sua pele.

— Não, você não o amava. Não diga o nome do meu homem,


porque você não passa de um lixo. — Cuspi em seu rosto. — Por

sua culpa, Henry está em coma e a qualquer momento ele pode

morrer. Stephanie... — Soltei sua garganta, completamente


atordoada. Algo dentro de mim começava a queimar. Enfiei a mão

dentro da minha bolsa e peguei a 9mm. — Você não faz ideia do

que eu quero fazer com você!


— Por favor, Emmeline! — Stephanie chorava e suplicava. —

Eu jamais faria isso com Henry!


— Mas comigo faria, não é? — Segurei suas bochechas com

força. — Estou esperando você assumir o que fez, Stephanie.

Ela balançou a cabeça negativamente.


— Eu não fiz isso! Eu juro!

— Ah... você jura? — Afastei-me e olhei para Colin. Dei o sinal

positivo e ele pegou o celular, discando um número. Os olhos de

Stephanie iam de mim para ele, confusos.


— Um segundo — Colin disse e me entregou o aparelho.

— Coloque-o na linha — ordenei para a pessoa do outro lado

da ligação.
Coloquei o celular no viva-voz.

— Alô? Quem é? — A voz de George Thompson ecoou pelo

viva-voz. — Alô???

— Pai??? — Stephanie gritou.


— Olá, lorde Thompson — falei calmamente. — Como senhor

está?

— Stephanie? Filha? Onde está? Quem são esses homens e o


que eles querem aqui?
— Papai! Fuja! — Stephanie gritou, porém, Colin tapou sua

boca ao meu comando.

— Eu acho que posso explicar quem são esses homens, lorde

Thompson. — Suspirei. — Mas me diga, como o senhor está?


— Quem é? Emmeline?

— Ah, o senhor acertou! — Dei uma risadinha sem humor.

— Emmeline, pelo amor de Deus! Já faz dias que esses


homens estão na minha casa, ninguém me dá notícias sobre a

minha filha, também não me deixam sair. Eu preciso saber o que

está acontecendo!

— Bem, o que está acontecendo, meu lorde, é que meu


marido está em coma e a culpa disso é da sua filha.

— É mentira, pai! — Stephanie conseguiu gritar. — Emmeline

está louca!
— Louca? Talvez eu esteja mesmo. — Arregalei os olhos,

irritada com a petulância daquela vadia. Apontei a arma em seu

joelho. — Já decidiu começar a falar a verdade e confessar os seus

pecados?
Stephanie balançou a cabeça negativamente.

— Peço perdão, meu lorde... — falei ao telefone. — Mas vou

ter que usar métodos nada convencionais para arrancar a verdade


de sua filha.

Então engatilhei a arma e atirei em seu joelho.


Stephanie gritou, assim como o pai.

— EU VOU TE MATAR, GAROTA! — George Thompson

começou a esbravejar no telefone. — FUI EU QUE DEI O VENENO

PARA STEPHANIE COLOCAR EM SUA BEBIDA. VOCÊ É UMA


PRAGA QUE ATRAVESSOU O CAMINHO DA MINHA FILHA — ele

despejava tudo de uma só vez. Stephanie chorava e sangue

escorria de seu joelho. — EU AJUDEI GIOVANNI A VIR PARA A


INGLATERRA E ESTAVA TUDO INDO BEM, ATÉ QUE HENRY SE

ENCANTOU COM VOCÊ, SUA VADIA ORDINÁRIA. EU VOU

ACABAR COM VOCÊ.


— Oras, senhor Thompson... está vendo como dizer a verdade

é libertador? — Afastei-me um pouco. — E pensar que Henry

gostava do senhor...

O homem continuou me chamando de vários nomes absurdos,


até que eu dei outro tiro na coxa de Stephanie. Então o tom de sua

voz mudou e ele começou com suas súplicas.

— Por favor, poupe Stephanie. Ela não tem culpa... fui eu


quem arquitetou tudo. Ela só foi um instrumento na minha mão. Por

favor, Emmeline.
Ele chorava e fungava.
E eu estava cansada daquela merda toda.

— Eu sinto muito, lorde Thompson... — falei lentamente,

olhando dentro dos olhos aterrorizados de Stephanie. — Mas nós


não perdoamos traidores.

Então virei-me para Nathan, que segurava um tonel com

gasolina.
— Jogue nela — ordenei.

Nathan imediatamente começou a jogar litros de gasolina em

cima de Stephanie, que gritava pedindo por misericórdia, assim

como o pai em ligação.


Minha mente estava tão em êxtase que eu não conseguia

sentir nada em relação ao que estava fazendo.

— Aqui, senhora. — Um dos meus homens me entregou um


isqueiro prateado.

— Emmeline, por favor! — Stephanie chorava. — Tenha


misericórdia. Eu fiz o que fiz por amor! Eu queria Henry, não
conseguia aceitar que ele havia me trocado por você. Mas eu jamais

quis que isso acontecesse a ele.


— Você vai sentir a dor que estou sentindo, Stephanie — falei
com veemência. — Vai sentir na pele!
— VOCÊ NÃO PODE FAZER ISSO, GAROTA! — o pai dela
gritou ao telefone.
E foi ali que eu perdi a paciência.

Fiz sinal para Colin se afastar e abri o isqueiro, erguendo bem


na altura dos meus olhos.
— Eu posso fazer o que quiser, lorde Thompson. — Acendi o

isqueiro, vislumbrando a chama laranja e bonita. Lembrando-me de


uma coisa que Henry adorava dizer. — Eu sou uma DeSantis Ferrari
e agora eu sou uma Spencer... e para a sua tristeza e da sua filha,

eu sou a porra da dona da Inglaterra!


Então joguei o isqueiro em cima de Stephanie que acendeu
como uma grande fogueira.

Virei-me para sair dali.


O pai dela ainda gritava ao telefone, mas um de meus homens
pegou o aparelho de sua mão.

— Senhora?
— Acabe com ele. E queime tudo.
Deixe-me escapar em seus braços

Querido eu sou sua, querido eu sou sua


O amor não vem fácil mesmo
Eu sinto tanto a sua falta, eu sinto tanto a sua falta

Diga-me isso é liberdade, querido?


Perseguindo o perigo, fazendo meu coração correr, woah
Be Together – Major Lazer feat. Wild Belle

Emmeline

Três meses depois.

Algumas pessoas olhavam em minha direção enquanto eu


atravessava o extenso corredor com um buquê de lírios brancos em

meus braços.
Sempre eram lírios brancos.
Eu não sabia quais eram as flores favoritas de Henry, mas

esperava que quando ele acordasse e as visse no vaso em frente à


sua cama, gostasse da visão. Por isso, eu as trocava a cada dois

dias.

Abri a porta do quarto e não me surpreendi ao ver Colin,


sentado em uma poltrona, adormecido.

Nos revezávamos a maior parte do tempo, só que agora ele

estava ficando um pouco mais com Henry, desde que os enjoos


começaram e às vezes me levantar da cama era quase impossível.

— Ah, você chegou... — Ele abriu os olhos lentamente. —

Como está se sentindo?


Tirei os lírios velhos do vaso e os joguei no cesto de lixo.

Coloquei os novos e os ajeitei.


— Estou bem.

— Greta me disse que você não queria comer esses dias —

ele disse, irritado. — Sabe que isso pode fazer mal ao bebê, não

sabe?

Passei as mãos pela minha barriga que estava começando a

aparecer.
A situação em que eu estava...
O inferno que teimava em me puxar para dentro. A depressão
que me rondava a cada segundo que Henry passava deitado

naquela cama sem nenhuma perspectiva de acordar.

— Eu sei, mas um pouco era por causa dos enjoos.

Colin suspirou.

Eu tinha descoberto a gravidez alguns dias depois de ter

acabado com os Thompson.


Começou com um mal-estar, então percebi que minha

menstruação estava atrasada.

Quando Henry disse que queria um filho, parei imediatamente

com o anticoncepcional. Bem, depois eu percebi que não foi difícil

engravidar, porque antes eu já não tomava direito.

Não sei bem quando engravidei, mas tinha acontecido.

E era a única coisa que estava me dando forças para não


surtar e estilhaçar de vez.

— O médico disse que quer falar com você hoje — Colin disse,

se levantando. — Vou chamá-lo.

Meu coração se acendeu com a esperança de que fosse uma

notícia boa.

Eu vivia esperando por isso.


Quando meu irmão saiu do quarto, aproximei-me de Henry. Ele

tinha emagrecido bastante.


Segurei sua mão.

— Será que teremos uma boa notícia, querido?


Depositei um beijo nos nós de seus dedos.
A porta se abriu e Colin voltou com o médico responsável

pelos cuidados com Henry.


— Senhora Spencer, boa tarde — ele me cumprimentou. —

Estava esperando a senhora chegar, porque precisamos ter uma


conversa bem séria.

Ele estava com uma prancheta nas mãos.


Afastei-me de Henry e cruzei os braços.
— Fale, então.

O homem olhou para a prancheta por longos instantes e


depois me encarou.

— A senhora sabe que a situação de seu marido é bastante


grave, não sabe?

Meu coração estava começando a afundar a cada segundo.


— O que o senhor quer me dizer, doutor?
Ele respirou fundo.
— O que quero dizer é que, não há esperanças para que ele

acorde. Ele saiu do coma, mas não responde a nenhum dos nossos
estímulos. Ele pode ficar assim por anos e nunca mais voltar a ser

quem era.
Suas palavras me jogaram em um abismo no qual eu não

estava preparada.
Colin me amparou quando eu quase caí, chorando em
desespero.

— Sinto muito — o médico disse. — Mas o melhor que


podemos fazer por esse homem, seria desligar os aparelhos.

— Você está dizendo que vai matar o meu marido? — Olhei


com raiva para o médico. — Não ouse dizer uma coisa dessas! Eu
posso acabar com a sua vida e com este hospital!

— Emme, calma. O bebê... vai fazer mal — Colin tentou me


acalmar.

— Saiam daqui! Eu quero ficar sozinha com meu marido!


Meu irmão relutou a princípio, mas logo cedeu. O médico

desgraçado também se foi.


Então me inclinei sobre o peito de Henry e chorei tudo o que
eu estava guardando nos últimos meses.
— Por favor, Henry. Volte para mim — falei em desespero. —
Eu não posso ficar sozinha nesse mundo. Não faça isso comigo.
Eu... não quero viver se você não estiver aqui. — As lágrimas

desciam com força. — Não te falei antes, porque queria te contar


quando você acordasse, mas acho que já está na hora de você

saber. — Peguei sua mão inerte e a coloquei em meu ventre. — Nós


vamos ter um bebê. Do jeito que você queria. — Meu coração
estava em pedaços enquanto eu dizia aquelas palavras. — Como

essa criança vai crescer sem o pai? Me diga, Henry. Você sempre
soube de tudo. Como não sabia que eu já estava esperando um

filho seu? — Soltei sua mão e me inclinei novamente em seu peito.


— Eu preciso de você, meu amor. Nosso bebê também precisa. Por

favor, volte para mim.


Fechei os olhos.
A dor era tão grande que eu mal conseguia respirar.

Comecei a me lembrar de nossa infância. Dos momentos em


que rimos na beira do lago no Hyde Park. Lembrei-me de quando

nos reencontramos no cemitério. E depois quando ele me buscou.


Henry Thomas Spencer nunca tinha sido o vilão.
Ele sempre fora meu príncipe encantado, mesmo que fosse

aos seus moldes.


De repente, senti um leve puxão em meu couro cabeludo.
Ergui a cabeça só um pouquinho para ver os dedos de Henry
se enroscando nas mechas do meu cabelo.

Olhei para ele imediatamente.


Seus olhos queriam abrir.

E eles abriram.
Dei um passo para trás, atordoada.
— Henry? Henry? — Encostei-me na cama e coloquei as mãos

em seu peito. — Henry? Meu Deus, eu não posso estar louca de

vez!
— Emme? — Sua voz saiu como um sussurro.

— UM MÉDICO! AGORA! — comecei a gritar.

Estava tão eufórica que já não sabia mais o que fazer a não

ser gritar com todas as minhas forças.


Colin e o médico desgraçado voltaram, assustados.

— O que foi, Emmeline?

— Henry acordou!
O médico olhou para o meu marido e eu vi o assombro em seu

rosto.

— Afastem-se, precisamos checá-lo.


Eu não queria sair dali, mas Colin me arrastou para longe

quando uma equipe de enfermeiros e médicos entraram no quarto.


Meu irmão me abraçou e eu chorei mais ainda.

Mas agora era de felicidade.

— Hey, doutor, eu posso entrar? — Avancei no médico assim

que ele apareceu no corredor.

— Sim, senhora. Mas... — Ele respirou fundo. — Vá com


calma. O senhor Spencer ainda está confuso com muitas coisas e

até que ele se recupere, não podemos estressá-lo, ok?

Tive vontade de mandar o médico ao inferno pela milésima

vez, mas tudo o que importava agora era poder falar com Henry.
Os médicos tinham nos expulsado do quarto para fazer os

procedimentos com ele e acharam que seríamos empecilhos para

desempenharem seu trabalho.


— Ok, agora me dê licença. — Empurrei o médico para o lado

e segurei na maçaneta da porta.

Eu ainda achava que estava sonhando.


Depois de tantas lágrimas, tantas incertezas, Henry finalmente

estava acordado.

Olhei para meu irmão, apreensiva.


Ele assentiu, dando-me forças como sempre fez nos últimos

meses.

Girei a maçaneta, abri a porta e entrei no quarto.

Uma enfermeira estava ajeitando o travesseiro de Henry.


Então ela se afastou e os olhos azuis intensos vieram

diretamente para mim.

Uma emoção violenta tomou conta do meu corpo e eu sabia


que não devia chorar, mas eu não conseguia me controlar. O medo

de perdê-lo, a sensação de impotência, o pavor de ter que seguir a

vida sozinha... eram sentimentos que me acompanharam a todo

instante nos últimos meses.


E agora ver que ele estava aqui, de volta para mim, era mais

do que eu podia acreditar.

— Emme — ele disse, abrindo os braços. — Vem aqui, meu


amor.

E eu corri para seus braços, chocando-me contra ele e

derramando tudo o que havia dentro de mim.


Henry acariciava minhas costas, brincava com meus cabelos e

eu não queria me desgrudar de seu corpo.


— Não chore, meu amor. Estou aqui. Por que você está

assim? — Ele me afastou de seus braços e fitou meu rosto. — Meu

Deus, eu a fiz sofrer?


Balancei a cabeça afirmativamente.

— Mas não foi culpa sua.

Ele fez uma careta.

— Estranho. Vou tentar não dormir tanto da próxima vez.


— Ah, meu Deus, Henry — Dei risada e chorei ao mesmo

tempo. — Eu te mato se houver uma próxima vez.

Abracei-o novamente e ficamos ali por um bom tempo.


Até que as perguntas começaram.

— Estou confuso, querida... — ele disse e eu me afastei,

sentando-me na beirada da cama. — O médico disse que eu estive

em coma. Isso é sério?


— Sim... você não se lembra do que aconteceu?

Ele coçou a cabeça.

— Lembro-me da festa de Ano Novo. Estávamos bebendo e


comemorando... então tudo se apagou.
— Você foi envenenado — falei, pegando a sua mão e

trazendo-a até meus lábios. — Stephanie tinha colocado veneno em

uma taça de champanhe que mandou entregar a mim. Era para eu

ter bebido, mas você tomou em meu lugar.


Os olhos de Henry se acenderam da maneira que eu me

lembrava de vê-los quando ele sentia ódio.

— Stephanie... Thompson? — Ele colocou uma mão na


cabeça. — Inferno, ainda está tudo confuso em minha cabeça.

— Calma, não fique assim — Aproximei-me e o puxei para

mim. — Suas memórias vão voltar com o tempo. O que importa é

saber se você sabe quem eu sou e quem você é.


Henry deu uma risadinha.

— Eu sei quem eu sou. O filho da puta mais sortudo por ter a

esposa mais linda do universo.


— Esposa essa que... — Segurei sua mão e a levei até o meu

ventre. — Está esperando um bebê.

Os olhos de Henry se arregalaram.

Novamente as lágrimas começaram a rolar pelo meu rosto.


— Achei que você não ia ver o seu filho no meu ventre — falei,

chorosa. — Eu não sei o que seria de nós, Henry.


Sua mão começou a acariciar a minha barriga e de repente

lágrimas começaram a descer pelo seu rosto.


— Um bebê? Nós vamos ter um bebê?

— Sim!

Henry me puxou para si e seus lábios vieram aos meus em um

beijo apaixonado.
E nesse momento eu soube que, mesmo que sua mente

estivesse confusa, seu coração ainda era completamente meu.

Os próximos meses foram complicados.

Henry havia voltado, mas tinha ficado uma sequela. Suas

pernas não se movimentavam.


No começo, foi desesperador, mas o médico nos garantiu que

seus movimentos voltariam, porque ele não era completamente

alheio aos estímulos que eram feitos na sola de seus pés.

Então começamos uma série de fisioterapia ao mesmo tempo


que ele ia retomando sua vida como Duque de Cambridge e o chefe

da Brandy Blood. Nesse quesito, Henry tirava tudo de letra. Era

como se ele realmente tivesse nascido para ser quem é.


Quando ele soube o que eu tinha feito com os Thompson, ficou
levemente assustado, depois começou a rir e no final disse que eu

era simplesmente perfeita. A mulher que ele havia pedido a Deus.

E eu só conseguia amá-lo ainda mais a cada dia.


Por outro lado, minha gestação estava indo tudo bem. Depois

dos enjoos do começo, o restante foi muito tranquilo.

Henry me acompanhou em cada consulta médica. Cada


ultrassom. Ouviu as batidas do coração do nosso bebê e se

emocionou quando descobrimos que esperávamos uma menina.

E agora, eu estava na última semana, preparando tudo para a

chegada da nossa princesa em seu quartinho cor-de-rosa, quando


Henry entrou, apoiado nas muletas.

— Querida, quero te mostrar algo — ele disse, animado.

— E o que é? — Virei-me em sua direção.


Ele sorriu, levantou os braços e as muletas caíram.

— Tcharam! Chega dessas porras!


Henry começou a caminhar em minha direção e eu corri ao
seu encontro.

Nossos corpos se chocaram como se fosse a primeira vez.


Nossos lábios se tocaram como se fosse a primeira vez.
E eu me apaixonei, como se fosse a primeira vez.
Mas como a vida parece conspirar para quebrar os nossos
momentos mágicos, senti uma pontada no ventre e um líquido
transparente começou a escorrer pelas minhas pernas.

— Ah, meu Deus, Henry. A bolsa estourou!

Henry

Felicity Catherine Eva Jones Spencer nasceu às 21 horas do


dia 12 de Setembro de 2021 no hospital de St. Mary, de parto
normal.

Ela era a criança mais linda que eu já havia visto em toda a


minha vida.
E era minha.

Minha filha.
Não tinha palavras para explicar o tamanho dos sentimentos
que eu carregava dentro do peito quando eu olhava para Emmeline

e depois para a nossa filha, que nesse momento estava sendo


batizada pelo Arcebispo na Abadia de Westminster em uma

cerimônia simples, a portas fechadas.


Emmeline e eu, depois de tudo o que passamos, chegamos à
conclusão de que não estaríamos vivos se não existisse uma força
maior que tomasse conta das nossas vidas. E mesmo que, na

maioria das vezes, estejamos mais no caminho do inferno do que do


céu, a misericórdia e o amor podiam ser sentidos em alguma área

de nossas vidas.
— Você está feliz? — Emme perguntou enquanto saíamos
pelo corredor da nave principal em direção à porta que estava sendo

aberta por dois jovens vestidos de branco.


— Extremamente.
Felicity se remexeu em meus braços.

— Antes de entrarmos na igreja, ouvi uma pessoa dizendo que


não éramos dignos de batizar a nossa filha ou sequer colocar os pés
dentro de uma igreja.

— E quem disse isso?


Emme deu de ombros.
— Uma senhorinha idosa, cheia de preconceitos.

Dei uma risadinha e assim que chegamos à porta da igreja,


surpreendi-me com a quantidade de jornalistas esperando-nos para

tirar fotos da nossa filha.


Éramos algum tipo de celebridade agora?
— Nós podemos tudo, Emmeline — falei, virando-me para ela.
— Sabe por quê?

Ela abriu um meio-sorriso, aproximou-se um passo.


— Por quê?
— Porque somos a porra dos donos da Inglaterra!

Então com a mão livre, enfiei por dentro dos cabelos de


Emmeline e abaixei-me, capturando os lábios da minha esposa em

um beijo apaixonado. Daqueles que fazem nosso coração pular no


peito, que mexem com as nossas estruturas.
Porque Emmeline e eu éramos feitos do mesmo material.

Sangue, alma e espírito.


Querido, continue me amando

Apenas me ame, sim


Apenas me ame
Tudo que você precisa fazer é me amar, sim

Love On The Brain - Rihanna

Emmeline

Oito anos depois

— Não, querida... isso, desse jeito. Sinta a leveza do corpo e

deixe seus braços abertos, para lhe dar equilíbrio.

A garota fez exatamente como eu disse e seu passo de ballet


saiu perfeito.

— Professora, a aula acabou! — uma outra garota disse,


interrompendo-nos.

— Acabou?
— Lorde Spencer acabou de chegar e todas nós sabemos que

quando ele chega é sinal de que a aula terminou.


Dei uma risadinha.

— Tá bom, estão dispensadas. Até amanhã.

As meninas saíram em êxtase da sala e eu respirei fundo, indo


até a mesa onde minhas coisas estavam.

Não ouvi a porta se abrindo, mas senti seus passos se

aproximando.
— É impressão minha ou essas garotas têm medo de mim?

— Elas têm medo de você.

Henry bufou.
— Isso é ridículo, ainda mais quando estou com um bebê nos

braços.
Virei-me para Henry e meu coração derreteu ao vê-lo com

nosso segundo filho nos braços. Seu nome era Louis, ele tinha

apenas um aninho e estava adormecido nos braços do pai.

— Talvez elas pensem que você sequestrou essa criança por

aí.

— Deve ser. — Henry deu uma risadinha e se aproximou.


Beijou a minha testa. — Como você está?

— Cansada... não está sendo fácil treinar essas meninas.


— Mas você é a melhor professora deste lugar. Vai se sair
bem.

Fazia quatro anos que eu estava dando aulas na The Royal

Academy e era um sonho ensinar àquelas meninas algo que eu

amava tanto. Isso, claro, depois de rodar o mundo me apresentando

com as maiores companhias, inclusive na Rússia.

Durante esses oito anos, sempre tive o apoio de Henry, que


nunca mediu esforços para me fazer feliz.

— Bem, acredito que você veio me buscar para almoçarmos?

— perguntei, puxando a bolsa e a jogando em meu ombro.

— Sim... mas hoje vamos almoçar em casa, porque Ellen e

Gianluca acabaram de chegar.

Ellen havia se casado com o italiano e... estava feliz, na

medida do possível.
Ele era um homem bonito, agradável, a respeitava e com o

casamento de ambos conseguimos estabelecer novas conexões

com os italianos, cessando uma rixa de anos.

— Céus... precisamos nos preparar, então — falei, saindo da

sala. — Você sabe que Ellen sempre solta comentários ácidos na

frente da esposa de Colin. Espero que desta vez ela se comporte.


— Ela vai se comportar. — Henry abriu a porta da frente para

mim. — Ainda mais agora, que está grávida.


Parei de andar, com os olhos arregalados.

— Ellen está grávida?


— Está, sim. — Henry abriu um sorrisinho. — É, querida... a
vida costuma seguir rumos que às vezes nos surpreendem.

E aquilo era realmente uma surpresa.


— Mas se ela está feliz, é o que importa — falei, entrando no

carro assim que Henry abriu a porta para mim.


Ele colocou nosso filho adormecido no banco de trás e veio até

o lado do motorista.
— Vou buscar Felicity no Harrogate para ver Ellen e ficar
conosco por alguns dias — Henry disse, colocando o cinto. —

Enfim, a vida não é perfeita, mas ela é muito boa, não acha, Emme?
Aproximei-me dele e depositei um beijo em seu rosto.

— A nossa vida é perfeita.


Seus olhos brilharam de carinho.

— Tem razão. A nossa vida é perfeita.


Henry me beijou, então se concentrou no volante e acelerou.
No final das contas, eu me considerava a pessoa mais sortuda

do mundo.
Eu tinha um marido maravilhoso.

Filhos perfeitos.
E a certeza de que onde nossas mães estivessem, elas

estavam orgulhosas de nós.

Fim.
Olá! Se você chegou até o final, MUITO OBRIGADA!
Henry e Emmeline foram uma grata surpresa em minha vida e
eu me apaixonei muito por esse casal e essa história cheia de

percalços, mas com um final feliz, afinal, quem disse, que mafiosos
não podem amar?
Quero dizer que eu tenho uma ideia para uma possível história

entre Ellen e Colin. Mas... será que isso é o desejo de vocês?


Enfim, se você gostou desta história, não deixe de avaliar na
Amazon, Skoob, Goodreads e fique à vontade para me marcar no

Instagram, enviar mensagem, surtar eetc... nós autores vivemos do


surto de vocês. : )

Mais uma vez: MUITO OBRIGADA!


São muitas pessoas que preciso agradecer aqui, mas em

primeiro lugar: a Deus, que é o meu amor maior. Quem me dá


forças nos momentos de tristeza e desânimo. Depois, às minhas
leitoras que gostam e apoiam o meu trabalho. Às meninas do

Bonde! Vocês são demais! Eu amo todas. Bah Pinheiro, minha


revisora e amiga para todos os momentos. Crys Carvalho, que
surtava toda vez que eu mandava um trechinho. À Kelly, minha

psicóloga que está me ajudando a encontrar o meu caminho. Aos


meus pais e, principalmente ao meu marido, que não mede esforços
para me ver feliz.

Muito obrigada!
Nascida e criada em Jacareí, interior do Estado de São Paulo,
Olívia é casada e mamãe de um gato laranja. Desde criança sempre
foi apaixonada por livros, gastando horas dentro da biblioteca da

escola. Aos quinze anos começou a escrever fanfics que


conquistaram leitoras em sites como Nyah! Fanfiction. Sempre

gostou de criar personagens femininas fortes, que apesar de seus


conflitos interiores, lutam pelos seus sonhos. Acredita que os livros

transformam as pessoas.

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Notas

[←1]
Este é um dos passos essenciais no ballet, que significa para fora, manter os
calcanhares virados para fora. O movimento da perna é feito em direção circular da
frente para trás.
[←2]
A banoffee pie nasceu na década de 1970 pelas mãos de Ian Dowding e Nigel
McKenzie, em East Sussex. A torta feita a par r da base de biscoito, coberta por leite
condensado cozido (ou doce de leite), bananas e chan li foi ba zada pela
combinação de banana e caramelo. A massa finalizada pode ser polvilhada com
chocolate ou café.
[←3]
O Teatro Bolshoi é considerado uma das melhores para dançar balé e além de ser
um edi cio histórico da cidade de Moscou, capital da Federação Russa. Foi
desenhado pelo arquiteto Joseph Bové para abrigar espetáculos de ópera e balé.
[←4]
Harrogate Ladies 'College é um internato independente e uma escola diurna
localizada na cidade de Harrogate, North Yorkshire, Inglaterra. Fundada como uma
escola para meninas em 1893, a faculdade agora educa meninas de 2 a 18 anos e
meninos até 11 anos. É membro da Associação de Escolas de Meninas e Escolas
Afins.
[←5]
O American Cream Draft é uma raça de cavalo de tração, sendo a única que foi
desenvolvida nos Estados Unidos que ainda existe. É reconhecida por sua pele de
coloração creme, conhecida como "champanhe dourado", produzida pela ação
do gene champanhe sobre uma pelagem cor branca-rosada, e por seus olhos azuis
(quando ainda potro) e, posteriormente, âmbares, avelãs ou verdes (na idade adulta),
também característicos do gene.
[←6]
Winston Leonard Spencer-Churchill, foi um polí co conservador e estadista
britânico, famoso principalmente por sua atuação como primeiro-ministro do Reino
Unido durante a Segunda Guerra Mundial. Ele foi primeiro-ministro britânico por
duas vezes

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