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Autora Alba Luccas

Copyright © 2022 ALBA LUCCAS


Capa: Vitória Maria
Revisão: Leticia Tagliatelli
Diagramação: Bianka Jannuzzi

Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens, lugares e


acontecimentos descritos são produtos da imaginação da autora. Qualquer
semelhança com nomes, datas e acontecimentos reais é mera coincidência.
Todos os direitos reservados.
É proibido o armazenamento e/ou a reprodução de qualquer parte
dessa obra, através de quaisquer meios (tangível ou intangível) sem o
consentimento escrito da autora. A violação dos direitos autorais é crime
estabelecido na lei nº. 9.610/98 e punido pelo artigo 184 do Código
Penal.2018.
Epígrafe
Playlist
Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
“Assim como viver sem ter
amor não é viver, não há
você sem mim e eu não existo
sem você.”

Vinícius de Moraes
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@albaluccas
Morar no Condado de Dublin tem muitas vantagens que Londres
jamais vai me proporcionar, uma delas é o fato que sempre estarei bem mais
à vontade aqui, porque é meu lar, é onde cresci.
Não importa meu status social, a minha conta bancária ou a minha
posição enquanto CEO de um grande conglomerado, sempre poderei ser eu
mesmo aqui, onde as pessoas sabem quem eu sou, me conhecem para além
das mídias sociais e manchetes de jornais, irão me cumprimentar e não
tentarão tirar nenhum proveito disso.
É o que mais gosto daqui. Sou apenas mais um morador nascido e
criado em Dublin.
Andar pelas ruas de paralelepípedos, curtir os pequenos parques após
um jogo de golfe ou então ir a pubs com meus irmãos e beber sem ninguém
se aproximar da gente com um gravador, ou nos acusando pelo aquecimento
global.
Porra, esse último ano está sendo um saco!
Mas é o preço a pagar quando se é o mais velho dos herdeiros e
assume o cargo de CEO da maior petrolífera europeia.
Eu sempre soube que a cobrança sobre mim seria alta, mas, pelo
menos, eu tenho a convicção que estou fazendo a coisa certa. Desde
criança, fui educado para ser um líder, o que se concretizou na realização do
sonho dos meus pais que adotei ainda muito jovem como o meu também.
— Vai querer mais uma rodada, senhor Jeremy? — o bartender
pergunta enquanto passa o pano no balcão e vê que meu copo de uísque já
está quase seco.
Olho para o líquido âmbar e reflito, “este é meu segundo copo e não
posso exagerar porque amanhã vou buscar Julian para passar os festejos de
final de ano conosco”.
É uma tradição nossa, porém, esse ano sei que será diferente porque é
bem provável que ele não volte mais para o colégio interno.
Admito que ultimamente isso tem sido uma grande questão para mim.
Só consigo pensar em como meus irmãos me matariam se eu
persistisse com a ideia de deixá-lo no internato e em como Julian e eu
teríamos um relacionamento totalmente diferente do que tenho com o meu
pai.
E eu sabia exatamente quem é o culpado.
Preciso tirar meu filho de lá, mas se eu tirar, sei que não poderei ser o
melhor pai para Julian porque…
Bem... porra!
Sinto que não tenho sido bom em nada há anos no que diz respeito a
ele e tudo isso porque Sofia, a minha falecida esposa, nos deixou cedo
demais.
Ela fazia tudo parecer mais fácil.
Eu consegui seguir em frente e, dentro do possível, superar a sua
morte. Afinal, já se passaram catorze anos desde que ela se foi.
Nesses anos, certamente aprendi muita coisa e não sou mais o mesmo
homem. Porém, tem uma coisa que nunca muda em mim e isso afasta as
pessoas que querem tentar, nem que seja minimamente, alguma relação
afetuosa comigo.
— Não, pode fechar a conta — respondo ao barista.
Dou o último gole da bebida e deixo o copo sobre a superfície do
balcão com firmeza.
Não sou muito de encher a cara, gosto de experimentar algumas
bebidas, degustá-las, mas nunca exagerar igual a meu irmão, Noah.
Embora nos últimos meses, desde que Liam, meu sobrinho, nasceu,
Noah tem mudado alguns hábitos em prol da sua família. Beber apenas
socialmente foi uma dessas mudanças.
Pago a conta e então me despeço do barista familiar. Me levanto da
cadeira e olho ao redor, só para ter certeza de que não estou esquecendo de
nada.
Admito que, algumas vezes, quero apenas me sentir menos CEO e
mais uma pessoa como todas as outras. Quero passar despercebido na
multidão frequentar bares, fazer caminhadas pelo centro e me misturar à
multidão ignorando qualquer separação de classes sociais. Esses são
prazeres que eu não me nego.
Noah diz com frequência que não consegue me entender por eu ser
um homem com hábitos bem marcados, sou pontual em todos os meus
compromissos, costumo quase sempre usar ternos de alfaiatarias
tradicionais e, quando quer me importunar, meu irmão diz que tenho uma
aparência que me faria facilmente ser confundido com um membro da
Família Real.
Ele acredita que eu poderia ser menos rígido comigo mesmo e com os
outros, mas a verdade é que me esforço para não exigir de ninguém algo
que eu mesmo não realizaria. Ser um chefe justo é algo importante para
mim.
Antes de passar pela porta, um senhor de meia idade que está sentado
em uma banqueta, assistindo um grupo de amigos jogar dardos, me
intercepta para avisar:
— Está chovendo lá fora, rapaz.
Olho para baixo e percebo que há muitas pegadas úmidas no chão
escuro.
— Obrigado por avisar — agradeço e dou um sorriso gentil.
— Não é bom molhar esse Brook’s Brothers, não é? — diz sobre o
meu terno.
Admito que fico impressionado por ele saber disso, por ter me
avaliado na luz fraca e intimista do bar.
— Como sabe que é um Brook’s Brother? — pergunto curioso.
— Trabalhei por muitos anos em uma alfaiataria. A gente fica
familiarizado com cada tipo de costura.
Isso é impressionante.
Um olhar observador.
Isso faz muita diferença na hora dos estudos também e é o tipo de
coisa que me faz gostar de andar em lugares improváveis; pois acabo
aprendendo também e conhecimento nunca é demais.
— Tem um olhar muito apurado, senhor — elogio e então aceno para
ele. — Tenha uma ótima noite.
Abro a porta e sou agraciado com o vento gélido e noturno. As
gotículas da água da chuva molhando meu rosto e meu terno preto.
Lá fora, a rua brilha refletindo as pálidas luzes dos postes, não há
ninguém no pavimento e o silêncio junto com o frio dão um ar solitário e
taciturno.
As luzes de Natal são as únicas coisas que dão um ar feliz ao cenário.
Modéstia à parte, é um cenário decadente para um cara como eu. Mas
há uma paz ali que não consigo encontrar em um restaurante super
badalado, ou então em alguma esquina de Londres.
Geralmente, sou perseguido por pequenos grupos defensores do meio
ambiente, mas é algo que já aprendi a lidar.
Não agradamos todo mundo, não é mesmo?
— … É MELHOR TROCAR OU ENTÃO VAI PERDER A ÚNICA
GARÇONETE QUE LHE RESTA!
Saio dos meus pensamentos quando gritam ao meu lado.
Olho curioso para a direita, de onde vem a voz e me deparo com uma
bela moça de cabelo castanho e grosso, preso em um rabo de cavalo. Ela
deixa o beco do pub e parece estar muito irritada com alguém.
“Sofia...”
— Você está fazendo tempestade em copo d’água — a outra pessoa
diz para ela, e é um homem. — Não tem o direito de pedir isso também.
— Então sinto muito, porque não posso mais continuar aqui! — ela
devolve.
— Eu sinto mais ainda, porque mais uma dessa e você estará na rua!
Dizendo isso, logo em seguida se ouve o som de uma porta batendo
com força e a garota se espanta, mesmo que o barulho fosse iminente. Ela
se vira de frente para a rua de braços cruzados e não se importa de estar
pegando chuva.
Está imóvel, mas seu semblante triste.
— Oi, tudo bem aí? — pergunto ainda de longe.
Ela me olha de canto e finge não me ver ou ouvir. Se mantém de
perfil para mim, mostrando ter um nariz perfeitamente arrebitadinho e
curvilíneo.
Ok, ela está certa.
Sou só um estranho e nem é do meu costume abordar pessoas na rua
desse jeito. Mas ela é uma mulher, está sozinha e provavelmente passando
por algum tipo de sufoco.
Recebi uma boa educação dos meus pais, o suficiente, para saber que
uma dama em apuros deveria ao menos se certificar de que ela não é
invisível e de que o problema está sendo visto por outros.
Mas como ela não diz nada, acho que por algum momento eu tenha
falado baixo demais. Afinal de contas, os pingos que caem se sobressaem a
cada segundo que passa, mostrando que a chuva vai ficar mais forte daqui
uns minutos.
— Tem espaço aqui embaixo, se quiser sair da chuva… — insisto
mais um pouco.
— Olha, eu tô bem, tá legal? — ela responde antes mesmo que eu
termine de dizer algo.
Ela não parece irritada, muito menos uma ignorante, ela só tenta de
todos os jeitos não soar um dos dois.
Fico imóvel, pois acho que mereci a resposta seca.
A verdade é que ninguém está pronto para responder gentileza com
gentileza, mas se a pessoa já não está tendo um bom dia, como esta garota,
esse tipo de resposta rude não é de se estranhar.
Ela está no modo defensivo, mas só quero ajudar. Então, permaneço
ali para me certificar de que ela está bem.
— Não é porque você está usando um terno caro que vou te dar bola.
— Continua a moça, parecendo que diz isso mais para ela do que para mim,
como se estivesse tentando provar alguma coisa para si mesma. — Por que
será que todo homem pensa que as mulheres são como peixes ansiosos para
serem capturados com linha e anzol?
Penso por três segundos, mas acabo rindo. Disfarço, claro, para que
ela não ache que estou rindo dela.
— Só estou tentando ajudá-la. Não sei o que está acontecendo, então
pensei que uma gentileza pudesse melhorar a sua noite.
Quando a olho, ela continua encarando a rua e balança a cabeça de
um lado para o outro, como se estivesse discordando impacientemente de
mim.
— Não ajudou, amigo — enfatiza. — Mas agradeço a tentativa.
— E há alguma maneira de ajudar?
Ela ri desacreditada e então olha para mim.
Porra, ela é linda pra cacete!
Parece até uma boneca de tão perfeita e mesmo sob a meia luz
consigo distinguir perfeitamente seus traços suaves e, ao mesmo tempo, tão
fortes. Como os olhos, a boca carnuda e o queixo arrebitado e bem
delineado.
Parece uma princesa embora não fale como uma.
— Seja lá o que você quer, nem tente. Não estou nem um pouco
interessada. — avisa e pelo seu tom, é como se ela não estivesse nem um
pouco surpresa com o tipo de proposta que acredita que eu estava prestes a
fazer.
— E o que faz você pensar que quero algo com você? — pergunto
curioso.
Isso faz com que ela me olhe de cima a baixo, em uma rápida
avaliação que nenhuma mulher foi capaz de fazer antes, tanto que me sinto
até um pouco desconfortável.
— Conheço o seu tipo. São homens que por usarem ternos e gravatas
e terem um carro legal, tem poder sobre tudo e todos. E há poucas razões
para estarem em lugares como este, em um lugarzinho tão escondido do
condado.
— Tipo o quê? — Tiro as mãos dos bolsos da calça e cruzo os braços.
Tudo o que ela diz pode estar me ofendendo, mas
surpreendentemente, me deixa curioso. Acho que é a primeira vez que de
fato converso com alguém desde o momento em que cheguei aqui, há uma
hora.
Ela dá de ombros e olha para o céu escuro, como se as respostas
estivessem lá.
— Traição, fetiches ou se escondendo de alguém. — Então olha para
mim, com aqueles olhos amendoados e tão penetrantes. — Ou então
afundando alguma mágoa, que ninguém mais pode ver. Acertei algum
motivo?
Não respondo de imediato, mas ela dá um sorrisinho arrogante
quando o meu silêncio parece dizer muito.
Eu me aproximo dela e quando quer recuar, aviso:
— Por favor, apenas saia dessa chuva. Não vou te fazer mal algum, já
tenho problemas demais. Só que você está certa e não vou dizer em qual
dos motivos, pois não pretendo expor a minha vida para uma completa
estranha.
A garota arqueia as sobrancelhas, como se eu tivesse dito algo óbvio.
— Agora me entende? Você é um estranho para mim. Não vou e nem
quero dar corda pra você.
— Já está fazendo isso, boneca — respaldo percebendo suas
bochechas ruborizando no mesmo instante e com certeza não é pelo frio.
— Boneca?
— Prefere que a chame você de rato molhado?
— Rato molhado?! — ela repete chocada e sorrio.
E claro, não direi que sua blusa branca úmida está deixando seu sutiã
rosa visível. Mas também não encaro descaradamente ao ponto de deixá-la
envergonhada, ou pensando que sou um pervertido.
Mas, porra, que belo par de seios!
— Que abusado! — Ela dá uma risadinha e então se vira.
— Eu não quis ser invasivo ou nada do tipo. Apenas fiquei
preocupado com seu estado e quis ajudar — digo sorrindo, mas confesso
que estou surpreso comigo mesmo, já que, geralmente, dispenso
brincadeiras.
Não costumo provocar desconhecidas por diversão. Essa deve ser a
primeira vez.
De modo geral, sou extremamente reservado, mas há algo nela que
me impele a querer saber mais a seu respeito.
— Bom, desconhecido, agradeço a sua vontade de me ajudar, mas não
há nada a ser feito. Eu já estou acostumada com essas injustiças que
acontecem no local de trabalho, e como sou apenas uma funcionária, devo
ficar engolindo sapo ou, então, como você ouviu, estarei na rua.
Agora ela explica de uma forma mais tranquila, como se estivesse
aliviada, ou esquecido do que a chamei minutos atrás.
— Você não é apenas uma funcionária, faz parte de um todo. Sem
você, esse lugar não funcionaria.
Seu sorriso se amplia um pouco, mas seus olhos continuam tristes.
— Eu queria que meu chefe pensasse a mesma coisa.
— Posso conversar com ele e convencê-lo, se quiser.
— Nem se incomode. — Ela faz um gesto com a mão, banalizando a
questão. — Será uma perda de tempo. O meu chefe é cabeça dura, ele só
vai se mancar quando perder tudo e espero que não demore.
— Parece justo, mas aí você ficaria sem emprego também, não é?
— Mas ainda assim, ele sairia perdendo — avalia. — Não estou
jogando uma praga ou desejando mal a ele, mas o karma funciona e se ele
continuar desse jeito, irá perder até os fornecedores.
Isso me fez desejar nunca mais colocar os pés ali.
Ainda não sei o que está acontecendo, mas só de ouvi-la falar já fico
com o estômago embrulhado.
Nem consigo imaginar a companhia da minha família com uma
reputação dessas, por isso tratamos nossos funcionários como
colaboradores, partes fundamentais da engrenagem.
— De fato. E o que você faz lá? Não vi você servindo — pergunto
franzindo o cenho, mas ela fica vermelha de novo.
— Eu já tinha terminado meu expediente e fiquei na dispensa
chorando depois que um babaca passou a mão em mim. Eu não queria que
alguém me vissem com o rosto inchado, mas todos ali sabiam o que estava
acontecendo.
Olho em direção ao pub.
Porra!
Ouvir aquilo me fez sentir algo irracional. Uma vontade
inexplicável de entrar uma última vez naquele pub pra descobrir quem foi o
miserável e fazê-lo engolir os dentes a socos. E eu nem sou um homem
violento.
— Qual é o seu nome?
Penso que poderia oferecer a ela um emprego na mansão O´Donnell,
ou até mesmo, na sede da companhia em Londres, de acordo com as
qualificações que ela possuir. No entanto, em resposta, a garota apenas
balança a cabeça negativamente.
— Meu nome não é da sua conta. Esqueça, não preciso de sua
piedade.
— Como é que é? — ela precisava ser tão insolente?
— Você provavelmente vai dizer que tem uma empresa e agora quer
me oferecer um trabalho muito melhor do que o meu atual, não é mesmo?
Mas da primeira vez que me fizeram uma proposta como essa e, trouxa,
aceitei, acredite, quase fui traficada.
Meu cérebro recebe o choque dessa informação e por um instante
tento processa erro que acabei de ouvir. Tomo fôlego antes de deixar claro:
— Sei que não nos conhecemos e, segundo o que você acaba de
afirmar, passou por situações que te colocaram em risco. Eu cogitei sim de
oferecer uma oportunidade de emprego. Contudo, entendo que confiar em
um estranho é algo difícil pra você. Só posso dizer que jamais faria mal
intencionalmente a alguém, independente do sexo.
— E acredito em você. Acredito que realmente acha que isso é
verdade. — ela diz me olhando bem no fundo dos meus olhos como se
tentasse e quase conseguisse enxergar a minha alma. E é quando sinto uma
conexão se estabelecer entre nós. Mas o que é isso? O que essa garota me
faz sentir?
E, de algum modo, percebo que ela também sente essa ligação
intensa entre nós. É quase palpável. Talvez, por isso ela ainda está aqui
falando comigo ao invés de ir embora, mas ela desvia o olhar,
repentinamente.
— Mas sempre começa assim, então vou me abster de boas
intenções, por ora. Afinal, de boas intenções o inferno está cheio, não é
mesmo? — a moça retoma seu tom desconfiado — Entenda, não estou o
acusando de nada, apenas sendo precavida.
E então, ela começa a andar na direção contrária. Se afastando de
mim.
— Aonde está indo? — pergunto enquanto continuo parado debaixo
de uma pequena cobertura.
— PARA CASA! — ela grita quando ganha uma certa distância. —
TENHA UMA BOA NOITE, ESTRANHO.
Eu não irei atrás dela, como eu disse, tenho problemas maiores que
essa moça desaforada. Ofereci ajuda, mas ela não aceitou. Fim da história.
Não estou aborrecido por isso, muito pelo contrário, ela só se
mostrou ser uma mulher firme e que sabe o que é melhor pra si.
Não posso julgá-la por ser cuidadosa, pois ela está absolutamente
certa.
No entanto, indo exatamente na contramão do que acabei de dizer
que faria, entro no meu carro e, por alguma razão que eu não consigo fazer
sentido, a acompanho a uma distância razoável. Não quero que ela pense
que sou algum pervertido ou stalker, só fiquei realmente preocupado com
seu estado depois do que ela disse ter passado. Queria ter certeza que ela
ficaria bem e que chegaria ao seu destino em segurança. Era algo que eu
simplesmente precisava ter certeza.
Paro um quarteirão antes do ponto onde ela está esperando o ônibus,
e quando o pega, sigo o transporte até chegar em um bairro residencial.
Fico com o carro desligado e quieto, até o ônibus partir e perceber
que ela anda até uma casa modesta e destranca a porta com a sua chave.
Antes dela entrar, aquela moça que presumo ter pouco mais de vinte
anos, se vira na minha direção. Ela acena se despedindo, como se o tempo
todo soubesse que a seguia, e então entra. Eu não consegui acenar de volta
depois de ser flagrado e vou embora me sentindo completamente ridículo.
Um grande idiota.

Passou o Natal, entrou um novo ano e não consegui tirá-la da minha


cabeça. E agindo novamente sem pensar, voltei ao trabalho dela, aquele pub
que prometi não colocaria mais os pés depois de descobri como aquela
garota era tratada.
Mas fui informado que ela já não trabalhava mais ali. Fiquei, de
certa forma, feliz com isso.
Aquela casa?
Por fim, reunindo toda minha falta de bom senso, fui àquele
endereço onde ela entrou e descobri que, na verdade, não era a casa onde
ela morava e me disseram que não sabiam de quem eu estava falando.
Por uns bons meses, pensei em ter apenas delirado, que ela nunca
foi real. E, pra piorar minha situação, ela passou a povoar meus sonhos. Eu
nem entendia como isso era possível. Eu a vi uma única vez e ela mal quis
conversar comigo, Como eu não conseguia esquecê-la, mesmo querendo
muito isso? E nem seu nome eu sabia.
Passei a chamá-la de garota dos meus sonhos.
Porque era onde eu a via.
E, nos meus sonhos, ela vinha até mim todas as noites.
Seis meses depois...
Estou de joelhos no chão, o esfregando com a ajuda de uma escova
para tirar o encardido dos rejuntes que um dia foram brancos.
Linha por linha.
A minha patroa é exigente, então tenho que deixar tudo limpinho
porque ela vai analisar e me pagar trezentos euros pelo serviço. Então,
preciso fazê-la sentir a necessidade em pagar cada centavo, ou até mais, se
uma divindade tocar seu coração.
Mas é bem difícil que isso aconteça.
Trabalhar como diarista não é uma tarefa simples, que tem respeito e
admiração. Creio que sou vista como uma ratinha que está apenas limpando
a casa dessa gente e que depois volto para alguma espécie de buraco, de
onde eles acham que saí.
Igual à Cinderela, ou talvez até pior.
Só que, honestamente falando, qualquer coisa é melhor do que a
droga daquele pub no Temple Bar. Lugar onde os turistas acham que podem
tudo só porque estão com grana e quando olham para uma mulher que
parece quebrada o suficiente, já encaram como putas ou desesperadas o
suficiente para abrirem as pernas por um trocado.
Infelizmente, esse pensamento só acontece porque tem mesmo quem
abra as pernas para esses turistas nojentos. Às vezes, é como algumas
conseguem uma grana extra.
Mas eu, não.
Prefiro mil vezes pedir demissão e tentar uma coisa nova, nem que
seja limpando privada de pessoas esnobes.
E aqui estou eu, fazendo exatamente isso, porque me demiti após
mais um ataque de assédio no local de trabalho.
Não era nem a primeira vez, mas antes era tudo verbal.
“Oi, boneca, quer companhia essa noite?”
“O que uma garota tão bonita como você faz em uma espelunca como
essa?”
“Venha comigo, vou mudar a sua vida para melhor.”
“Cinquenta euros, prometo que vai ser rapidinho.”
Era o tipo de coisa que ouvia.
Mas preferia mil vezes sair com minhas gorjetas a com uma quantia
maior que sei que me mancharia para sempre.
Só que da última vez, eu fui tocada...
Estava atrás do balcão limpando a bancada, quando um homem
esticou a mão e pegou descaradamente no meu seio. Eu fiquei paralisada e
ele sorriu para mim, com aqueles dentes nojentos.
“Segura essas belezinhas aí, estão chacoalhando muito!”
A minha única reação foi tirar meu avental e sair pelas portas dos
fundos, sem dar uma explicação. Quando parei na calçada, vi que estava
chovendo.
O ano novo havia acabado de começar e pela primeira vez não pedi
nada naquela virada.
Eu só existi.
Mas, o primeiro pedido que fiz naquela noite, por alguma razão, foi
que aquele homem misterioso estivesse ali na calçada para conversar
comigo.
Sei que faz tempo e que foi algo completamente aleatório na minha
noite, que não deveria ter nenhuma expectativa sobre aquilo e que poderia
estar muito enganada sobre ele.
Mas notei que estava sendo verdadeiro e se preocupou em ser legal
quando viu que eu não estava tendo um momento muito bom.
Quando percebi que ele me seguia, tratei de mudar a rota para casa.
Afinal de contas, não sabia quem ele era.
Ter sido legal comigo não significava nada, pois, lá no fundo, ele
podia ser uma pessoa ruim.
Ainda no ônibus, percebi que ele estava seguindo a rota, então, entrei
em contato com uma amiga que me ajudou a entrar na casa dela só para
despistá-lo.
Eu acenei.
Queria que ele visse que foi flagrado, e, então, não aconteceu mais
nada. Nunca mais o vi, foi como se tivesse sido apenas uma coisa da minha
cabeça.
Mas, às vezes, ainda me pego pensando nele, em seu cabelo escuro e
sedoso, na barba rala, no seu rosto viril com aquela aparência de homem
inteligente, charmoso e cheio de fogo escondido.
Não costumo dar bola para muitos homens, pois sei exatamente
quando eles querem uma coisa banal.
Mas aquele homem…
Em um mundo alternativo, acho que teríamos dado certo se eu não
tivesse sido tão difícil naquela noite.
Mas tudo bem, nem tudo é do jeito que a gente quer, senão agora
mesmo estaria na França!
Assim que termino o serviço, ela vem até mim.
— Aqui está, trezentos euros — diz a mulher elegante que me
contratou para a faxina em sua casa hoje.
Ela sai para verificar se está tudo ok e fico aguardando seu retorno
enquanto como escondido um biscoito que peguei do pote sobre a ilha da
cozinha.
Quando ela retorna, engulo em seco para não dar na telha de que
estive comendo sem autorização. Mas, também, depois de três horas de
faxina, o mínimo que esperaria era que ela viesse me oferecer alguma
coisinha para comer.
— Como sempre, impecável — elogia e dou um sorriso torto. — Está
acostumada a fazer faxina, Audrey?
— Não, senhora.
— Hum. — Ela passa o dedo sobre o balcão da cozinha e analisa o
dedo limpo. — Parece que fez isso a vida inteira.
Olho atordoada para o lugar onde apenas passei um pano com álcool
em gel.
Como gostaria de dizer a ela que isso, na verdade, é higiene básica e
que ela está tão acostumada a ter empregados que mal sabe como o ralo do
banheiro dela vive limpo, ou em como a sua cama recebe troca de lençóis
de três em três dias.
— Preciso entregar um bom serviço, senhorita Bergman.
Ela me olha por uns segundos enquanto adota uma expressão
sugestiva.
Por um momento, acho que ela vá me rasgar de “elogios”, só que para
meu espanto, calmamente ela diz:
— Então, seja honesta da próxima vez.
Franzo o cenho e a boca do meu estômago se aperta no mesmo
instante.
— Quer um biscoitinho? Fale.
Droga, é claro que ela percebeu!
— De-desculpe, senhora Bergman, estava com fome.
— E está saciada?
— N-não.
Meu Deus, quanta humilhação por um biscoitinho!
— Eu imaginei. No entanto, o que você fez foi inaceitável, Audrey,
pegar algo sem permissão. — Continua mantendo o sorriso ríspido, seu
olhar está firme em mim e a sua postura indica que vem se segurando para
não surtar.
— Foi só um biscoito. Imagino que a senhora não me negaria um, não
é?
Quando ela demora para responder, sei de imediato o que isso
significa.
— Não, eu não negaria. — Pisca várias vezes, como se fosse um
esforço dizer isso.
No entanto, fica visível que seu descontentamento é devido eu ter
pegado um biscoito, porque minha mão estava ali e não porque não pedi.
Isso é claro.
— Mas aqui em casa prezamos muito a educação primordial, que vem
dotada de bons modos! — salienta com orgulho, empinando seu nariz
arrebitado depois de umas cinco cirurgias.
Automaticamente, eu me lembro dos seus filhos, dois rapazes
mimados que estão sempre no Temple Bar, mijam nos muros, jogam latas
de cervejas no chão e fumam escondidos da mãe perfeita.
Sinceramente, chega a ser ridículo.
Isso o que ela está fazendo comigo não é para me orientar, é para que
eu sinta vergonha, para me humilhar e sentir o prazer de colocar pessoas,
como eu, exatamente onde ela acha que devem ficar.
No chão, como vermes.
Mas preciso engolir em seco, pois não posso responder à altura dos
meus pensamentos, senão ela será capaz de pedir a toda sua classe social
que não me contrate por motivos que teria o prazer de inventar. E não estou
dizendo isso só porque ela é rica, estou dizendo isso porque ela é rica e
esnobe.
E, caramba, não posso perder mais um emprego.
— Entendi, senhora Bergman — digo recuada, como ela gostaria que
estivesse me sentindo. — Isso não vai mais se repetir.
— Eu sei que não. Ah, não esqueça de me devolver cinco euros.
— O quê? — Franzo o cenho para ela.
— O biscoito que você comeu custa cinco euros cada unidade —
explica gesticulando seus dedos cheios de anéis de ouro que deve ter
comprado na Tiffany, compondo suas roupas de alfaiataria da Chanel. —
Considerando que em um pacote venha uns cinquenta desses, bem… Você
deve saber matemática básica, não é?
Isso só pode ser brincadeira!
Mas é tão surreal que fico sem reação a princípio.
Estou pronta para dar uma resposta, quando o celular dela toca em
outro cômodo, tomando a sua atenção.
— Bom, agora que já me pronunciei, espero vê-la na semana que
vem, ok? Tenha um bom dia, e não se esqueça de pedir primeiro!
A megera sorri como se fosse uma pessoa legal, e, então, se apressa
para sair da cozinha e ir pegar seu celular que está na sala de estar, como se
a sua vida se resumisse as notificações que chegam de dois em dois
minutos.
Continuo imóvel no mesmo lugar, ainda pensando se é uma boa ideia
gritar ou ir atrás dela para dar uma resposta.
Mas acontece que não penso em nada bom.
Não sou barraqueira e confesso que a única coisa que sinto nesse
momento é tristeza por existir realmente pessoas mesquinhas assim.
Olho para o pote de biscoitos de cinco euros a unidade.
O que tem de tão extraordinário neles?
Não senti nada além do gosto de chocolate, deve ser porque não
funciona com gente pobre.
Mas gente rica também vive gastando dinheiro com coisas fúteis.
E se a senhora Bergman é tão rica assim, imagino que tenha dinheiro
para comprar um outro pote cheio de biscoitos como esses.
Sinto a adrenalina correr em minhas veias quando tenho uma ideia
súbita, radical e instigante.
Não penso duas vezes antes de fazer e nem paro para ver se a mulher
irá me flagrar a tempo de ligar para a polícia.
Guardo o dinheiro dentro da minha eco bag, então pego o pote com os
biscoitos e o enfio debaixo do braço. Rapidamente saio pela porta dos
fundos, que fica na cozinha e corro a lateral do quintal como, ironicamente,
um rato que acabou de roubar um pedaço de queijo suíço. Então, saio pela
portinha da cerca e corro o mais rápido que consigo para longe da casa.
Devo estar parecendo uma ladra agora, mas corro por três quarteirões
e nada me acontece. Paro de correr e tenho uma crise de risos. Dou tanta
risada que caio no meio-fio e quando dou conta, estou devorando sozinha os
biscoitos caríssimos da mesquinha senhora Bergman.
Mamãe vai gostar dos biscoitos, afinal tem muitos e não consigo
comer tudo sozinha.
Quando estou fechando o pote, um SUV dobra a esquina e me levanto
na mesma hora. De repente estremeço, pensando que fui pega, mas os
Bergman não moram nessa rua.
O carro perde velocidade e então vai parando conforme vai se
aproximando.
Meu estômago encolhe e os biscoitos reviram dentro de mim.
A janela de trás desce lentamente, meu coração dispara e então…
— Jane?
Fico dopada de alívio quando vejo a simpática Jane, uma senhora de
sessenta anos que trabalha como governanta de uma família bilionária da
Irlanda há anos.
O brilho do sol reflete em seu cabelo ainda loiro e na aparência séria e
dócil, mas o sorriso que ela me dá é mais radiante que tudo.
— O que faz aí, Audrey?
— Estou indo para casa.
Ela olha para uma das ruas que forma o magnífico bairro encantado
de Malahide.
— É um pouco longe, não acha?
Balanço a cabeça em concordância porque não tenho como negar isso
a ela. Jane veio do mesmo lugar que eu, viu a minha mãe se tornar uma
adolescente e eu nascer, praticamente.
Apesar de morar na mansão em que trabalha, ela sempre está indo
visitar a sua antiga vida, pois tem muitos amigos em Rathmines.
— Isso é biscoito?
— É, sim. Eu os roubei.
Os olhos azuis escuros de Jane me olham com curiosidade.
— Venha, entre. Vamos para Rathmines juntas.
— Quer mesmo que uma ladra entre nesse carro? Se o seu patrão ficar
sabendo, vai ficar furioso com você.
— Você não é uma ladra, Audrey. — Abre a porta para mim. — Além
do mais, meu patrão não vê problema com caronas.
Não?
Que tipo de rico é o patrão dela?
— Vamos logo. A carona é de graça, mas Freud, o motorista, não tem
o dia todo. — Balança a sua mãozinha e entro.
O motorista não diz nada, apenas continua o caminho como se uma
estranha não tivesse acabado de entrar no carro luxuoso.
— Então, querida, me conte a história desses biscoitos.
Conto a ela tudo. Na verdade, me empolgo e digo tudo desde o
começo, de quando saí do antigo trabalho e vim parar nesse, onde
aconteceu a recente história dos biscoitos caros.
Jane fica olhando para o pote como se ele estivesse criado braços e
pernas.
— Na mansão do seu patrão tem esses biscoitos? — pergunto por fim.
— Não, mas se tivesse, qualquer um que estivesse com fome poderia
pegar um, ou até mais, ou ainda abrir a geladeira e simplesmente se servir.
“Realmente, é um tipo de rico muito estranho.”
Abro a tampa, ofereço um biscoito a ela que aceita e depois dou um
para o motorista que fica grato.
— Os Bergman devem ter conseguido a sua fortuna desse jeito, sendo
pão-duro. Aquela megera vai ficar sentada esperando os cinco euros porque
não vou dar coisa alguma e nunca mais vou voltar a trabalhar para ela —
comento.
— Vai sair deste emprego também? — ela pergunta espantada.
— Não, mas vou procurar outra família que aceite os meus serviços.
Um silêncio se instala dentro do carro.
Paro para curtir por um instante a sensação de estar dentro de um
SUV blindado com bancos de couro preto e o interior tão cheiroso que me
sinta uma mendiga perto dele.
— Audrey, me diga. Você gosta de animais?
Olho para ela surpresa devido a pergunta inesperada enquanto mordo
o biscoito.
— Gosto, são fofos.
— E de cachorros?
— Eles são bem divertidos. Por quê?
Ela dá um sorrisinho.
— Porque tenho uma proposta de emprego para você. Envolve
cuidados com um cachorro e certamente você vai amar. Está precisando de
um emprego que não cause problemas, menina.
— Isso parece mais interessante do que limpar o chão de gente rica e
mesquinha.
Jane começa a rir.
— No começo era fácil cuidar dele, sabe? Mas aí foi crescendo e foi
dando muito trabalho! O cão precisa de alguém que tome conta somente
dele — ela explica.
— Entendo. Mas para quem eu teria que trabalhar exatamente?
Porque certamente não vai ser o cachorro que vai pagar o meu salário.
O sorriso de Jane se ilumina mais ainda.
— Para os O’Donnell.

Se não conhecesse Jane, diria que a proposta era uma cilada pelo
simples fato da função que vou ter de cuidar de um cachorro.
Passear, é uma coisa, mas, cuidar?!
Eu só consigo pensar em como alguém decide ter um cachorro se mal
pode cuidar dele.
Mas não estou reclamando, afinal se foi a Jane que me indicou este
serviço, confiarei cegamente nela.
E nos dias que seguiram à sua proposta, não trabalhei mais como
faxineira, apenas esperei a sua ligação, como ela bem me instruiu a fazer.
Foi então que recebi o endereço e a data exata de quando começaria.
Agora estou diante da enorme porta de entrada da enorme mansão,
fazendo a casa da família Bergman parecer um barraco perto daqui.
A única coisa que ouvi falar, é que os moradores são donos de uma
petrolífera, mas não param aqui devido ao trabalho e passam mais tempo
em Londres. Não fiz questão de pesquisar sobre eles, mas sobre o tipo de
cachorro que teria de lidar.
— Audrey! — Jane se ilumina ao me ver, erguendo seus braços na
minha direção conforme se aproxima para um abraço. — Seja bem-vinda!
— Obrigada, Jane. — Eu a abraço, mas não consigo fingir costume
com o vestíbulo enorme, que mais parece um castelo. — Uau, aqui é lindo.
O chão de mármore brilha, o lustre no centro parece uma joia
pendendo sobre nossas cabeças e tudo aqui reluz em dourado, lembrando
ouro.
— Mas é tão silenciosa — comento.
— Os dias agitados aqui são raros — ela explica. — Mas logo será
verão e Julian estará aqui.
— Quem é Julian?
Seu sorriso abre mais ainda.
Jane começa a andar em direção a um outro cômodo da casa, onde há
poltronas e sofás, uma enorme lareira e uma estante que vai do chão ao teto.
— É o filho do Jeremy, o mais velho dos irmãos. Jeremy, Noah e Ian.
Nessa ordem. Julian ama o Theo, então eles irão brincar bastante.
— Imagino que nesse meio tempo estarei dispensada das minhas
tarefas — reflito.
— Não sabemos ao certo, Audrey. Pode ser que eles fiquem em
Londres, não sei ainda a programação da família para as férias de verão.
— Entendo. — Olho para a cornija da lareira e vejo alguns porta-
retratos. — É a família O’Donnell? — Vou me aproximando e logo atrás de
mim, Jane confirma:
— Sim, mas precisa ser atualizada. Agora tem Meredith e Liam na
família, mulher e filho do Noah.
Olho para as fotos que parecem ser a ordem cronológica deles.
Imagino que sejam naturalmente irlandeses, pois quando mais novos
possuíam muitas das características. Na adolescência, já eram rapazes
bonitos que deveriam deixar muitas meninas apaixonadas. E, agora, no
futuro, parecem homens feitos, de negócios e que venceram na vida.
Um deles é ruivo, quase loiro, o outro tem o cabelo escuro e parece
ser o mais novo, e o terceiro…
O terceiro…
Fico parada por alguns segundos.
Não pode ser ele.
Me aproximo e não satisfeita, pego o quadro com as mãos para olhar
mais de perto.
— Meus meninos são lindos, não é? — Jane pergunta toda boba.
Balbucio alguma coisa, mas não consigo acreditar no que meus olhos
veem.
— Quem é quem aqui, Jane? — pergunto como se estivesse apenas
curiosa.
— Oh, vejamos. — Ela se aproxima e analisa a foto. — Este mais
novo é o Ian, o ruivo é o Noah e este altão com pinta de galã de novela é o
Jeremy.
Jeremy...
É ele.
O homem que conversou comigo naquela noite desastrosa no Temple
Bar, no meu antigo trabalho. Ele foi legal comigo e o tratei como trataria
qualquer um dos cretinos que me assediavam no pub porque achei que no
final das contas ele seria igual a todos.
Mas, bem lá no fundo, algo me dizia que ele era diferente. Não foram
suas roupas caras, nem o perfume delicioso que vinha dele e parecia até
hoje impresso na minha mente, mas foi algo em seus olhos. Quando aqueles
olhos se prenderam aos meus, senti meu coração disparar e vi neles
sinceridade.
Mesmo assim, o tratei da forma mais rude que pude. Era desse jeito
que eu aprendi a lidar com homens estranhos que me abordam. Eles sempre
querem tirar algo de mim e minha vontade não parece importar para
maioria das vezes
Mas aquele desconhecido, estava preocupado com meu bem-estar. E o
que eu mais me impressionou naquela nossa conversa sob a chuva foi que
em nenhum momento ele tentou me tocar.
Mas, agora, vim parar na sua mansão, porque ele é o CEO da
Petrolífera O´Donnell. Um bilionário. Meu Deus! O que esse homem fazia
ali naquela noite?
Fico tão em choque que nem percebo quando o cachorro entra na sala
superfeliz para me receber. Deixo o porta-retratos de lado e começo a fazer
carinho nele.
É um Golden Retriever e parece contente em me conhecer.
Mesmo que esteja afagando com as mãos seus pelos sedosos e
brilhantes, não consigo tirar os olhos das fotos por descobrir finalmente
quem é o homem misterioso...
O único que ficou por tanto tempo em meus pensamentos.
Acordo mais cedo do que o normal.
Os últimos dias foram estressantes e não tive tempo o suficiente para
praticar qualquer atividade física.
Lá, no fundo, sei que a falta disso é o que vem me causando grande
incômodo em minha rotina.
Então, hoje, resolvi mudar.
Tomo um banho rápido só para despertar o corpo e visto uma calça de
moletom com blusa de desporto.
É verão e apesar de ainda estar clareando o dia, já sei que ficará
quente nas próximas horas, principalmente quando estiver suado.
Saio do meu apartamento que fica em Chelsea e sigo com destino à
Hyde Park, pois não irei demorar mais que uma hora para chegar.
As calçadas ainda estão vazias, embora, em geral essa parte de
Londres seja bem tranquila.
Passo por muitas casas de luxo e carros caros que fazem as ruas
parecerem uma vitrine.
Mas estou focado em meus pés.
Penso em como eles são fortes e ágeis, me permitindo ter como hobby
a liberdade de correr.
Não faço pausas e não desacelero meu ritmo, nem mesmo quando o
coração está batendo a mil por hora, ou quando os pulmões estão ardendo à
procura de qualquer fôlego existente.
Dou tudo de mim, na corrida, porque sempre é assim.
O primogênito, o irmão mais velho, CEO da maior petrolífera
europeia...
Nasci com este destino e desde muito novo, antes mesmo de aprender
a ler, já fui avisado sobre as minhas responsabilidades futuras. Então, tudo o
que fiz até aqui, todas as minhas conquistas, não foi porque nasci
privilegiado, foi porque agarrei meu destino.
Não deixei de lutar até que conseguisse concluir todas as etapas que
necessitava.
Pensar em como cheguei até aqui é o que me motiva a pegar mais
impulso na corrida. Não gosto de pensar em derrotas e motivos baixos
como combustão, pois já usei deste artifício antes e hoje ele não é mais útil
para mim.
Quando chego ao Hyde Park, paro perto do parquinho das crianças
que está vazio.
Eu e os guardas somos os únicos aqui.
Respiro fundo, arfando com dificuldade, afinal já tenho trinta e oito
anos e é um deleite que ainda tenha tanto fôlego.
Modéstia à parte, dos meus irmãos eu sou o menos sedentário. Gosto
de praticar esportes e atividades ao ar livre, como velejar, esquiar e até
mesmo caçar. São coisas que me fazem desconectar da realidade e me sentir
pleno.
Tomo água do bebedouro público.
Se a minha mãe ainda estivesse viva, ela me mataria por isso, mas não
tenho frescuras, estou cansado e com sede, e essa é a única fonte de água
limpa disponível.
Me deito na grama, debaixo da sombra de uma árvore e aqui fico.
Olho o meu relógio para verificar minha atividade e meu desempenho e, por
incrível que pareça, ainda fui lento.
Achou graça?
Afinal de contas é irônico em como estamos dando tudo de si,
achando que está tudo indo melhor do que se esperava para quando ver o
resultado, descobrir que poderia ter sido melhor, ou que já houve vezes
melhores do que isso.
É frustrante.
Mas nem todos os dias são iguais aos outros e preciso realmente levar
isso em consideração, principalmente no âmbito do trabalho.
Hoje, tenho algumas reuniões importantes antes de darmos largada às
férias de verão e não sei como o dia vai correr, mas preciso colocar meus
pés para trabalharem já.
Volto para casa andando, as vezes, dou uma corridinha, e, então,
caminho. Fico intercalando entre um e outro, até chegar em casa e ir direto
para meu telefone e verificar a caixa de mensagens enquanto preparo meu
café da manhã.
Alguns avisos de Mandy sobre as reuniões de hoje, meu pai
perguntando quando vou para Dublin e o último pin é um aviso da diretora
da escola preparatória do meu filho, um lembretezinho de que as férias irão
começar.
Como se precisasse de mais avisos.
Desde o Natal, Julian vem falando sobre como quer sair daquele
colégio e não quer voltar para lá depois das férias. Todo final de semana
quando eu ligava para saber se estava tudo bem, ele fazia questão de me
lembrar. Então, uns dias antes dele entrar oficialmente de férias, já deixei o
jatinho pronto para buscá-lo em Durham e levá-lo para Dublin, onde
passaremos as férias.
Bem, onde eu ficarei.
Quando termino de tomar meu café, subo para o quarto e vou para o
banheiro.
Apenas uma chuveirada gelada me despertará e tirará toda essa
canseira que a corrida me deu.
Eu me sinto revigorado.
Seria melhor ainda se tivesse como dar uma trepada, ou bater uma
punheta, mas nem isso.
Tem sido tempos difíceis para mim, em termos sexuais. Isso porque
não sou igual aos meus irmãos e não trato sexo como algo banal. Sexo, para
mim, sempre vai ser como não só a união de dois corpos, mas também a
junção de duas almas e não quero que qualquer pessoa esteja conectada a
minha.
Ironicamente, não sou o mais romântico ou o mais expressivo dos
três.
Sentimentos é algo que não estou habituado a expressar; um dia já
estive, era fácil, no entanto, desde que Sofia, a minha falecida esposa, se
foi, as coisas não foram mais fáceis.
Não porque estive recluso, mas porque as pessoas só tendem a piorar.
Eu não culpo o amor, culpo as pessoas por não saberem amar.
Desde Sofia, meu coração não esteve em mais nenhum outro lugar,
mas observo e sei quando não é o momento certo para me entregar.
Assim tem sido há malditos catorze anos...
Às vezes, me divirto um pouco em segredo, não gosto nem mesmo de
contar aos meus irmãos sobre as minhas relações supérfluas que servem
apenas para satisfazer os sacrilégios dos meus desejos.
Mas, às vezes, quando estou sozinho, tudo o que penso é em uma
boca carnuda, macia, suave e uma língua sagaz em volta do meu pau duro.
Penso nos olhos, no par de olhos cor de mel e no rostinho de boneca se
contorcendo em prazer.
Meu pau chega a latejar e quando me dou conta, já estou
completamente focado em me dar prazer pensando naquele rosto.
Porra, o quanto isso é errado?
Devo ser um completo fodido da cabeça, mesmo!
Mas, em minha defesa, mal sei o seu nome e mal a conheço. Apesar
de saber muito pouco, é o suficiente para saber que ela jamais se orgulharia
deste ato, que só estaria provando que sou mais um dos caras de terno e
gravata que a importunam.
Isso me enoja, pois, não quero ser esse tipo de canalha.
Mas, por que ela?
Por que nos últimos meses tudo o que estive pensando foi naquela
jovem misteriosa?
Acho que pelo fato de não saber quem ela é, me faz sentir menos
culpado quando agarro meu pau e me toco pensando nela. Contudo, queria
saber de quem ela se trata.
Fui outras vezes naquele maldito pub, mas em nenhuma das vezes a
reencontrei. Talvez tenha sido despedida, ou teve a coragem de se demitir.
Não sei.
De qualquer forma, não voltei mais lá e preferi viver uma obsessão
secreta, um desejo e curiosidade platônica pela moça do pubzinho em
Dublin.
E me surpreende que meu interesse esteja em alguém que mal sei o
nome.
Eu poderia acordar para a vida, se ela não aparecesse em meus
sonhos.
Aquela boneca é meu maldito e delicioso segredo.
Quando estou vestido para o trabalho, de terno e gravata, assumindo a
imagem de CEO bem-sucedido e poderoso ao ponto de intimidar qualquer
um, nem parece que enfrento tais problemas pessoais. No entanto, por estar
há catorze anos sem assumir um relacionamento sério, meu status civil já
foi tema de matérias de revistas, o que chega a ser questionável o conteúdo
dessas editoras.
De qualquer forma, no trabalho é onde esqueço esses mínimos
problemas. Então, vou para meu escritório e sigo com a programação do
dia.
— Ele não faz ideia de que estou o esperando — digo a Noah pelo
celular.
— Com certeza o garoto vai ficar muito feliz e criar altas
expectativas, então é bom que você dê o que ele quer — meu irmão diz,
muito provavelmente em Burford, fugindo um pouco da agitação da cidade
com a família.
— Errata, não vou dar isso porque ele quer, vou dar isso porque
Julian merece e porque vou tentar consertar as coisas entre nós, causadas
por mim mesmo — corrijo e ouço meu irmão bufar do outro lado da linha.
— Bom, pelo menos você tem consciência disso.
— Não sou esse canalha que você acha que sou, irmão. — Ouço sua
risadinha que diz concordar, mas o cretino nega:
— Eu nunca disse tamanha blasfêmia, é você mesmo quem está
dizendo.
Quando olho pela janela, vejo o jatinho em que Julian está, pousando
e sinto meu coração bater forte.
Estou ansioso por sua reação.
— Ele chegou — aviso. — Me deseje sorte.
Noah bufa e por mais que estamos distantes, posso vislumbrar seus
olhos revirando.
— É seu filho, vou desejar a você paciência, porque sorte você já tem
e muita, meu irmão.
— Tenho minhas dúvidas sobre isso. Vejo você em breve.
Desligo o celular assim que meu irmão se despede enquanto não
consigo tirar os olhos do jatinho. Vejo descerem a escada e poucos
segundos depois Julian surgir, em seu encalço vem Jane, a nossa
governanta.
Ambos estão sorridentes.
Parece que a viagem foi agradável, ou, talvez Julian já esteja
esperançoso por nunca mais voltar para aquele colégio interno.
Quando os dois já estão próximos o suficiente, me apresso para sair
do SUV e fazer a surpresa. Fico parado, com as mãos enfiadas nos bolsos
da calça jeans, mantendo um sorriso amigável.
Assim que me vê, Julian parece surpreso, mas não muito. Ele pisca
atônito e analisa a situação, o que me deixa nervoso.
Jurava que teria uma reação mais espontânea e alegre da sua parte,
mas tudo o que recebo é uma reação fria e um pouco indiferente.
Onde está aquele sorriso de poucos segundos atrás?
— Bem-vindo de volta! — vocifero tentando quebrar o gelo.
Julian me dá um sorriso amarelado, sem ânimo algum.
— Obrigado.
— Achei que estaria mais animado — comento.
— Estou animado.
— Bem, não é o que parece — ressalto e olho rapidamente para Jane,
que demonstra estar alheia, mas sei que seus ouvidos estão bem atentos.
Então Julian pisca seus olhos azuis, provenientes da sua falecida mãe,
fazendo o brilho do sol iluminar suas pestanas ruivas.
Um traço bem forte da nossa família que apenas Noah, e agora Liam,
foram capazes de herdar.
Ao me analisar de cima a baixo, meu filho indaga:
— Quantas reuniões milionárias o senhor teve que cancelar para estar
aqui?
Ah...
Ah, então, é isso.
Solto um suspiro.
Não me surpreende que ele tenha essa dúvida, afinal entendo que já
errei muito tentando acertar com meu filho.
Eu o magoei quando achei que estava arrebentando e mesmo com
todos os meus esforços, a falta de sinceridade em meus atos chegou a ser
mais pungente que a minha ausência.
Por isso Julian está desse jeito.
Solto um pigarro antes de responder com um certo orgulho:
— Nenhuma, porque estou de férias para curtir o verão com você. —
Sinto um prazer em dizer isso, principalmente quando seus olhos se
iluminam e mesmo assim, Julian se contém.
Ele balança a cabeça e encara os tênis All Star, tão típico do seu tio,
Ian.
— Hum, legal.
Ele vai até o porta-malas e guarda as suas coisas enquanto continuo
parado e lanço um olhar de socorro para Jane, que trabalha há anos para a
nossa família.
— Ele está cansado da viagem e quando digerir tudo, irá ficar
bastante animado — ela justifica com o seu jeitinho de mãezona.
— Imagino que não seja atípico que o filho venha a herdar traços de
personalidade do pai — comento me sentindo envergonhado.
Jane dá uma risadinha descrente.
— Não seja tão cruel com si mesmo, senhor Jeremy — diz
docemente.
Ela é tão amável e íntima da família, que a gente se recusa a fazer
qualquer programação sem envolvê-la. Jane participa de tudo, e agora ela e
meu pai não ficarão tão sozinhos na mansão de Dublin.
Ela completa:
— Julian está em fase de crescimento, é a pré-adolescência, como o
senhor bem deve saber.
— Sim, Jane. Infelizmente sei como é essa fase. E se você bem
lembra, por isso tenho motivos o suficiente para não ter orgulho dela.
Jane começa a rir em concordância.
Junto a Noah, eu aprontava todas.
Papai vive dizendo que o que tenho de quieto agora, não era na minha
adolescência, e isso é um fato.
Como que para chamar atenção, Julian entra no carro e bate com
força a porta. Olhamos na sua direção então ele abaixa a janela e pergunta:
— Vamos?
— Vamos — respondo assentindo e entro no lado do motorista.
Meus irmãos e eu não gostamos muito de ter motoristas particulares,
usamos apenas em momentos bem específicos, como eventos. Gostamos de
ter a liberdade de guiar por onde quisermos ir, sem estar dando ordens e
mais ordens.
Saímos do aeroporto e seguimos em direção a mansão que fica em
Malahide, a dezesseis quilômetros do centro de Dublin, ao norte da capital.
Um lugar calmo, com campos e mais perto do mar, nos
proporcionando praias incríveis para usufruir no verão.
A minha parte favorita é o porto, onde tenho meu barco ancorado e o
clube de Golfe.
Durante o trajeto, Julian não diz muita coisa, até porque tenho
pensado em deixar o melhor para o final. Todos já sabem da notícia, menos
ele, porque essa será uma surpresa.
Mas não penso muito e nem crio expectativas depois do nosso
reencontro não ter sido dos melhores.
Só quando estamos perto de casa, Julian parece se lembrar de algo:
— E o Theo?
Theo, é o bendito cachorro que Ian me deu de presente no último
Natal e que Julian amou.
— Jane me relatou que foi contratada uma cuidadora de cães
recentemente — explico.
Confesso que não sei muita coisa sobre o cachorro até porque não é
como se ele fosse a minha maior preocupação nos últimos tempos.
E sim, eu amo cães, mas não me apego mais muito a eles, desde que
meu último cão morreu de saudade de Sofia depois que ela faleceu. E tudo
o que conseguia pensar era: “Porra, como queria poder acabar com toda
essa dor assim...”.
No entanto, tive de enterrar a dor com o tempo e não deixá-la acabar
comigo.
— Ele ficou grande muito rápido e sou velha, não consigo dar conta
dele sozinha. Tivemos de contratar alguém para servir somente ao cão —
Jane complementa.
— Mas… Um cuidador de cães?! — Julian indaga profundamente
incrédulo, fazendo Jane sorrir. — Tipo, cuidador de idoso?
Desta vez, Jane e eu rimos.
Mas confesso que também estou curioso para saber mais sobre isso.
— É, tipo isso, Julian. Ela faz companhia a ele, o dia todo — Jane
explica melhor. — Theo ama passear, então ela sai com ele umas três vezes
ao dia.
— Talvez a gente não precise mais dos serviços dela agora que
estamos aqui — pronuncio.
— Mas o cachorro continuará precisando quando formos embora —
Julian comenta e há um pouco de tristeza em sua voz.
Não digo mais nada, muito menos Jane porque já sabemos o quão
Julian está equivocado.
E quando chegamos à mansão, o portão duplo de ferro torcido abre
assim que digito o código de segurança.
A trilha de terra batida que nos leva até a mansão é flanqueada por
enormes árvores pomposas, que fazem alusão a uma floresta ao nosso redor.
Dentro de nossas terras há diversas trilhas onde podemos nos
aventurar.
O carro contorna o chafariz que está ligado nessa manhã e ficará
assim até o final do verão.
Deixo o carro em ponto morto e então Jane sai, dizendo que vai
chamar o nosso segurança para ajudar com as malas, mas, na verdade, ela
só está me dando espaço e tempo enquanto dou a notícia a Julian.
— O cachorro terá a gente — concluo a conversa sobre o cachorro.
— Ele terá a você, Julian.
Meu filho me olha atônito, com o cenho franzido.
— O que o senhor quer dizer? — pergunta um pouco nervoso, como
se já tivesse esperança do que está por vir.
— Você não vai mais voltar para aquele colégio em Durham —
anuncio calmamente para que ele tenha tempo de digerir a notícia. — Você
vai morar comigo, Julian. Vamos para Londres e levaremos Theo com a
gente.
Espero que ele abra um sorriso, que pule em meus braços e tenha
qualquer reação empolgante. No entanto, para a minha grande surpresa,
Julian continua inexpressivo, sem demonstrar um pingo de alegria com a
surpresa.
Confesso que isso me abala ao ponto de me irritar.
— O que foi, filho? Não gostou da novidade?
— Sim, gostei. Mas me pergunto se não continuará a mesma coisa —
justifica.
— A mesma coisa? — repito as suas palavras.
— Sim.
— Que coisa?
Antes que ele possa responder, um latido incontrolável explode no
vestíbulo da mansão, ecoando como um chamado animado, roubando a
atenção de Julian de mim.
Bom, pelo menos alguém está animado nessa casa.
— Theo! — Julian exclama subindo a escada.
Ele e o cachorro se encontram ainda na soleira da porta dupla.
Os pelos dourados do cachorro se confundem ao cabelo loiro de
Julian, que mesmo de joelhos no chão, fica menor que o cachorro que pula
em cima dele como se fosse um brinquedo novo.
Estou subindo a escada calmamente, quando ouço uma voz dizer por
trás da parede, escondida:
— Ele ama quando a casa está cheia.
Meu coração vai de zero a mil.
“Não é possível!
Eu conheço essa voz!”
Me apresso para entrar, mas sem parecer afobado. Tento não
demonstrar muito choque também, mas é inevitável quando entro e a
primeira pessoa que vejo é ela.
A minha boneca...
A moça chateada do bar.
Ela é real e agora está mais linda do que nunca à luz do dia, com o
longo cabelo ondulado solto, caindo como cascata na frente dos seios fartos
que se exibem pelo decote do seu vestido romântico.
Estou prendendo meu fôlego, mas algo no meio das minhas calças
também se aperta.
“Aqui não, amigão.”
— Você… — digo.
Seus olhos castanhos que estão bem mais vivos e hipnotizantes nesta
manhã, me envolvem quando se arregalam em surpresa.
— Eu?
Ela não está me reconhecendo?!
Não esperava me ver?
Há tantas fotos minhas nessa casa!
A surpresa disso me deixa paralisado, tanto que quando me dou conta,
ela está fazendo uma reverência enquanto diz formalmente:
— É um prazer conhecê-lo, senhor Jeremy.
Ela se lembra de mim...
Posso ver isso em seus olhos e na curva do seu sorriso, mas, por
algum motivo, decidiu agir como se eu fosse um estranho, apenas o seu
patrão.
— Senhor Jeremy, esta é Audrey Smith, a cuidadora do Theo — Jane
diz, a apresentando.
Audrey Smith...
Agora tenho um nome para associar a pessoa.
Estico a mão para tornar mais física a apresentação e fico ansioso em
sentir o seu toque, o tão sonhado toque que sem conhecer antes, me levou a
loucura em muitas das vezes em que a imaginei me tocando com carinho e
sensualidade.
— É um prazer conhecê-la, Audrey.
Seu nome desliza deliciosamente em minha língua, como se a
estivesse passando em outro canto do seu corpo.
Essa comparação faz o meu corpo se arrepiar.
E quando ela retribui o cumprimento, sinto o toque suave da sua mão
macia e fico tenso.
— Igualmente, senhor Jeremy — ela diz com a voz suave e morna
como uma manhã florida de primavera.
Seu sorriso, mesmo que de um jeito silencioso, diz que está contente
em me ver.
E por isso, sorrio de volta, pois é recíproco.
Ele me reconheceu!
E isso me surpreende, porque não sou interessante o suficiente ao
ponto de ser lembrada. Não dei motivos o suficiente para pensar em mim e
aposto que um homem, como ele, deve viver coisas incríveis ao ponto de
tomar aquela ocasião em que nos vimos pela primeira vez algo supérfluo,
que ficaria esquecido no fundo do seu inconsciente.
Mas, no segundo em que ele me viu, foi como ter despertado alguma
coisa dentro de si.
Eu vi seus olhos brilharem e a sua força em conter a reação. Imagino
que pelo filho e a governanta estarem presente, Jeremy evitou uma reação
mais exacerbada, somente para não ter que explicar de onde nos
conhecemos. Talvez, ele não queira demonstrar que andou trocando
palavras com alguém como eu.
Só que os poucos minutos de interação é o suficiente para achar que
estou errada sobre ele.
Jeremy sobe com Julian para o andar de cima, mas seu olhar me
encontra duas vezes enquanto sobe a escada.
— Parece que ele gostou de você — Jane comenta e desvio o olhar
que o segue durante o caminho.
— O quê?
Ela sorri.
— Jeremy é um homem bondoso e simples. Ele trata todo mundo
bem, mas nunca o vi olhar dessa forma para qualquer pessoa.
— Que forma? — pergunto franzindo o cenho.
— Curiosidade… Interesse.
— Talvez ele esteja desconfiado da minha pessoa.
“Não, não! Ele lembrou de mim... Nossos caminhos se cruzaram mais
uma vez”, torno a pensar.
— Ah, não. Jeremy não é de julgar ninguém. Não sem baseamentos.
— De qualquer forma, acho que não vou durar, não é? Eles chegaram
e não sou mais útil aqui.
Jane toca meu rosto com a sua mão delicada e fria.
— Oh, minha querida, não seja pessimista. Aposto que o senhor
Jeremy não vai deixá-la sem emprego, ou sem folga remunerada. Ele vai
dar um jeito.
Jane se afasta e continuo olhando em direção à escada, para onde
Jeremy sumiu no corredor dos quartos.
Agora que ele está aqui, meu coração fica super acelerado e não gosto
disso por razões óbvias: um, ele e eu somos de realidades muito distantes e
isso nunca dá certo, só em filmes; dois, sou apenas quem cuida do cachorro
e três, o tanto de mulher linda que ele deve ter por aí, anula todas as minhas
chances.
Não que já esteja pensando em algo, mas Jeremy é um homem muito
lindo e é impossível não pensar em como seria estar em seus braços, ser
tocada por ele. E o melhor, ele está solteiro e não há nada de errado em
pensar nisso, ainda mais quando eu também estou mais sozinha do que
todos os solteiros de Dublin.
Saio atrás do Theo.
Estou trabalhando há três semanas nessa mansão enquanto cuido dele
e nem sabia que dava para ter uma rotina com um animal de estimação.
Basicamente, chego e a primeira coisa que faço é verificar se a tigela
dele está servida, uma com água e a outra com ração. Depois saímos para
caminhar, todos os dias e todas as manhãs.
Ele adora e eu também, pois curtimos juntos o sol da manhã.
Depois voltamos e ele toma banho, não todo dia, mas duas vezes na
semana porque ele ama brincar ao ar livre e está sempre cavando buracos.
A minha rotina é ficar fazendo companhia para ele, porque é um
cachorro que não gosta de estar só e a mansão por si só é imensa e vazia.
Isso o deixou doente nos primeiros dias em que veio para cá, segundo
Jane.
E os outros funcionários não podiam deixar seus afazeres para lidar
com ele, por isso estou aqui.
Quando chego a parte detrás da mansão, o vejo correndo no jardim
com Julian.
Acho que ele deve ter descido pelo elevador de emergência que
instalaram na residência há um ano. Como o patriarca da família está muito
debilitado, foi preciso instalar um para ele se locomover pela mansão.
Theo parece estar muito feliz com a chegada do seu amigo, Julian,
que é a cópia exata do pai, exceto pelo cabelo loiro, quase ruivo.
Eu me encosto no batente da porta e fico admirando o cenário a
minha frente, onde tanto o menino quanto o cachorro parecem se sentir
livres.
Sorrio.
Jane tinha razão, precisava de um trabalho assim, leve e que não me
trouxesse problemas.
Não sei até quando vai durar, mas quero curtir ao máximo.
Estou tão concentrada neles dois que nem percebo uma segunda
presença ao meu lado, com um metro e noventa de altura e tão cheiroso que
preciso evitar o revirar de olhos enquanto sou rapidamente enfeitiçada.
— De todas as situações, essa é a que eu menos esperava reencontrá-
la — Jeremy confessa.
Dou um sorriso, incapaz de conseguir olhar para ele ainda porque sei
que quando fizer isso, terei uma reação anormal. Além do mais, seus olhos
estão sobre mim como brasas.
Eu me sinto exposta de alguma forma, só porque ele está me vendo.
“Então quer dizer que não sou invisível?
Que nada daquilo é coisa da minha cabeça?”
— E você cogitava em me reencontrar? — pergunto, mas logo me
arrependo.
“Que tipo de pergunta é essa?!”
Ele é praticamente o meu patrão e não posso flertar com ele.
No entanto, para a minha surpresa, Jeremy responde:
— O tempo todo.
Viro para ele abruptamente, sem conseguir esconder a surpresa que
sinto ao ouvir as suas palavras. Ele me olha de um jeito sério e dá um
sorrisinho tímido de lado, como se soubesse o efeito que isso causa em
mim.
— Eu costumava me perguntar o que havia acontecido com a garota
daquela noite. Se ela havia pedido as contas, ou se continuava sendo
atazanada no local de trabalho.
Fico olhando para ele e acabo me sentindo confortável, o suficiente
para falar mais também.
— Você me seguiu naquela noite — lembro.
Jeremy pisca e então desvia o olhar envergonhado, como se tivesse
sido flagrado.
E bem, ele foi.
— Eu queria ter certeza de que você chegaria bem — explica, me
deixando quase sem fôlego.
— Mas, por quê? — Quero saber…
Eu quero saber há quase sete meses a razão disso.
Jeremy enfia as mãos dentro dos bolsos da calça jeans. Ele está
vestido de um jeito casual, com blusa de manga comprida e arregaçada até
os cotovelos, tênis Nike nos pés e um relógio caríssimo no punho direito.
Por fim, ele dá de ombros e toca os lábios ainda pensativo, para
chegar a uma conclusão:
— Não sei. Talvez por ser tarde da noite, estava chovendo e você era
uma mulher sozinha que estava passando por um momento ruim.
— Estou acostumada, sabe? — digo como se fosse uma questão
banal.
Mas Jeremy me olha de canto, um pouco descrente, como se estivesse
analisando também toda a minha vida através da única frase minha.
— Só porque está acostumada não significa que precise ser sempre
assim — pontua.
Não posso evitar um sorrisinho, afinal ninguém nunca me disse isso
antes.
Abaixo a cabeça ao perceber que esse homem está preocupado
comigo, afinal ele não tinha motivos e continua não tendo.
Outra coisa que sou acostumada é ter que lidar com homens
disfarçando o seu mau caráter. Não que Jeremy seja um mau-caráter ou
tenha um caráter duvidoso, ele realmente parece ser uma pessoa do bem,
porém, a vida me ensinou a viver na defensiva.
Desconfiar é o meu mecanismo de defesa.
— Tudo bem, não trabalho lá há um tempão mesmo. Eu só fico aqui
cuidando do cachorro, ao menos cuidava. — Olho para ele por debaixo da
minha franja longa que cai na frente do meu rosto e o vejo franzir o cenho.
É incrível como ele sempre fica tão atento em cada coisa que digo.
— Como assim, cuidava? — questiona.
Fico um pouco confusa no início e, então, balbucio:
— Jane me contou que com a chegada de vocês, o Theo vai ter
companhia agora. Então, teoricamente, meus serviços estão suspensos até o
final do verão, imagino.
— Não! — ele exaspera, para a minha surpresa.
Ele olha para mim e eu olho para ele.
Acho que nós dois ficamos surpresos demais com a sua reação.
Jeremy então apruma os ombros e solta um pigarreio, como se isso
pudesse disfarçar o que acabou de acontecer.
— Quer dizer, não há necessidade de você deixar o serviço agora,
Audrey. A intenção é curtir as férias ao máximo com meu filho e me
reaproximar dele. Claro que o cachorro estará conosco, mas nem sempre, eu
acho.
Fico olhando para ele e não resisto quando a copiosa pergunta que me
faço desde quando comecei esse trabalho, me surgiu:
— Desculpa, senhor Jeremy. Mas como o senhor resolve ter um
cachorro se não tem tempo de cuidar de um?
Ele solta um suspiro e se vira, ficando de frente para mim, assumindo
uma postura mais implacável e poderosa.
Eu quase fico sem ar quando me dou conta da potência do homem
diante de mim.
— Foi um presente do meu irmão mais novo, justamente para me
provocar. E, por favor, Audrey, não me chame de senhor.
— Mas o senhor é o meu patrão — enfatizo.
Sacudindo a cabeça, Jeremy explica:
— Eu sei, mas não consigo nos ver dessa forma.
— De que forma, então?
Tenho quase certeza de que vejo sua pele ficar vermelha, mas Jeremy
sabe disfarçar com excelência, só que notei antes mesmo dele se dar conta
da sua expressão corporal.
Eu também não facilitei e não sei o motivo de ter feito essa pergunta
que pode ser bastante sugestiva, principalmente quando há uma atmosfera
diferente entre nós dois, ao ponto de ser palpável.
Jeremy parece respirar fundo e pensar em uma resposta que faça mais
sentido.
E eu não sei o porquê, mas meu coração bate forte, como se esperasse
que ele dissesse alguma coisa que fosse digna de conto de fadas.
Mas como não estamos em nenhuma história romântica da Disney, ele
apenas diz:
— Amigos. Nos conhecemos de uma forma tão casual. Talvez faça
mais sentido que seja assim e não nada formal. Ouço todo santo dia isso,
então tudo o que preciso agora é de algo… Diferente — finaliza me
olhando profundamente, como se eu fosse a diferença em sua rotina.
Mas, talvez, seja apenas uma conclusão minha precipitada, pois não
devo mesmo fazer o estilo dele.
— Ah, entendo. Bom, posso tentar. Não sou acostumada a ter patrões
gentis que gostam de manter uma relação boa com seus empregados —
revelo.
— Este é o primeiro passo para o sucesso, querida, Audrey. Uma boa
relação com pessoas que o ajudam a crescer. Todo mundo tem de crescer
junto a você também.
Ele é CEO de uma petrolífera e deve estar acostumado a lidar com
coisas motivacionais assim.
No entanto, mesmo que não entenda nada do mundo business, sei que
ele está certo, pois, agora sinto que sou capaz de catar cada pulga que
apareça no Theo.
— É inspirador, senhor… Jeremy — corrijo quando lembro da sua
exigência.
— Perfeito, Audrey.
Ele gosta de falar o meu nome e o pronuncia com gosto, deixando
seus lábios se moverem com sensualidade e um tanto convidativos.
— PAI, VEM CÁ! — Julian grita ao fundo, enquanto Theo está em
seu encalço.
Jeremy olha em sua direção e faz um gesto com mão para o filho
esperar. Então, sua atenção volta para mim, uma última vez antes de ir até o
filho.
— Estou feliz em vê-la aqui — ele admite. — Feliz mesmo.
Contenho o sorriso largo, pois, não quero parecer exagerada. Mas
também não me contenho em dizer:
— Eu também.
O meu patrão…
Jeremy sorri com os olhos e, então, desce a varanda e a escada, até
alcançar o filho no jardim.
Fico olhando para a cena em que eles parecem ser bastante felizes e
unidos. Sinto uma sensação de paz, algo que não sinto há tempos e sorrio
como se isso se espalhasse por todo o meu corpo.
Então Jeremy se vira, me olha de longe, acena e sorri.
Eu poderia passar o dia todo o vendo fazer isso.
A última coisa que poderia cogitar no mundo, era encontrar aquela
garota na minha casa.
Audrey...
É tão bom associá-la agora a um nome, pois sinto que finalmente tudo
é real.
Mas, infelizmente, este fato me deixa um pouco inquieto e não
consigo evitar, pois, a perdição está sob o mesmo teto que eu.
Eu me senti sujo e um canalha quando olhei para o olhar doce dela.
Agora mesmo, sob a luz do dia, Audrey parece perfeitamente como
uma princesa, uma boneca de porcelana.
Estou somente encantado por ela, mas lembro dos meus pensamentos
impuros quando estava me sentindo sozinho demais.
Aquilo tudo foi errado e tenho consciência disso.
Além do mais, e se ela já tem alguém?
Não posso desejar uma mulher que já é comprometida. Mas, aquele
olhar de pidona, o lábio sendo mordido discretamente e seu corpo contido
só significa uma coisa: ela também sente algo.
E não faço ideia do que seja.
Talvez seja atração?
Porra, ela pode sentir até mesmo repulsa por mim!
Preciso me controlar...
Não consigo identificar o motivo por me sentir assim por ela tão
rapidamente, e esse detalhe é o que me mantém na defensiva, tanto que
tento escapar dos olhos de corça durante o resto do dia.
Julian deseja ficar com o cachorro, então deixo que ele curta primeiro
o animal. Audrey também está com eles, então não quero arriscar.
Aproveito para passar algumas horas com meu pai, que agora quase
não sai da cama.
Nos últimos meses, meu pai esteve internado devido seu problema no
coração. Um pouco depois do falecimento da minha mãe, veio a notícia que
nosso pai estava doente do coração, insuficiência cardíaca.
Aquilo foi um choque para nós, porque estava tudo bem, ou ao menos
achávamos.
Papai também sempre foi um exemplo saudável na nossa família.
Porém, isso é resultado de maus hábitos de quando mais jovem e agora a
conta veio.
Desde então, por precaução, ele decidiu deixar a responsabilidade da
petrolífera nas mãos dos três filhos.
O seu quarto é grande e as janelas da sacada vivem abertas, deixando
que o ar fresco entre. Tem uma cadeira de rodas ao lado da sua cama, mas
ele quase não a usa, somente quando vai para o banheiro.
Dói só de olhar e pensar que é muito possível que ele já tenha se
rendido de alguma maneira ao trágico fim ao qual todos somos destinados.
Meu pai não é um homem tão velho assim para se encontrar de forma
tão debilitada, porém, a agitação da vida de um petrolífero o fez ignorar a
saúde, principalmente depois que a mamãe se foi.
E apesar de não falar nada aos seus filhos, consigo facilmente
imaginar os seus motivos para deixar que o fim o abrace de algum jeito. O
amor da sua vida o espera, em algum plano astral que não podemos ver,
mas sentir.
Eu me sento na beira da cama, próximo a ele, que está sentado,
mantendo um sorriso comprimido formando a sua boca em uma linha muito
fina.
— Faz muito tempo que vocês chegaram? — ele pergunta alheio aos
cumprimentos.
— Não está nem com meia hora. Eu não vim antes porque a Jane
disse que o senhor estava dormindo — explico já que só agora estou o
vendo.
— Acordei com os latidos do cachorro e com os gritos do Julian.
— Sinto muito.
Papai faz um gesto com a mão.
— Não, tudo bem. Eu realmente gosto quando a casa está cheia de
gente, parece que ela fica mais viva, ou alguma coisa do tipo. Mas tem sido
assim já há algum tempo.
— Como assim? — pergunto franzindo o cenho.
— A moça nova que cuida do cão. — Ele aponta no rumo da janela,
de onde não só ouvimos os latidos e a voz alta do meu filho, mas como
também a risada gostosa e sonora de Audrey. — Sinceramente, é muito
bom acordar e ouvir a risada dela quando o cachorro decide brincar. Traz
uma tranquilidade imensa para mim.
Fico inerte com a sua revelação, mas, curioso também.
— E o senhor já a conheceu?
— Oh, sim. Nos conhecemos, mas não nos encontramos muito. Eu
não diria que ela é tímida, é uma mulher muito gentil e de atitude. Porém, o
dever dela não é cuidar de mim, mas do cachorro.
— Entendo.
— Vai mandá-la embora, agora que estão aqui?
Dou um sorriso desdenhoso, me levanto e enquanto contorno a cama
do meu pai, acrescento:
— Não. Ainda mais agora que descobri que ela faz bem ao senhor.
Além do mais, o cachorro continuará precisando dela.
“Será mesmo o cachorro?”
Quando chego perto da janela, apoio o braço no batente e enfio uma
mão no bolso enquanto assisto aqui de cima Audrey correndo com o meu
filho e o cachorro.
Essa é a desculpa mais óbvia, só que, por outro lado, o motivo de não
a dispensar agora está relacionado a interesses pessoais. Pois, percebi que
papai não é o único interessado na risada de Audrey, mas eu também.
— E quanto aos seus irmãos?
Mesmo que ele tenha mudado de assunto, a minha atenção continua
única e plena na mulher de longo cabelo castanho que corre pela grama do
nosso jardim, livremente.
— Ian está se preparando para uma conferência que vai acontecer
daqui três meses no Qatar e Noah está com a família em Burford. Eles
darão uma passada aqui antes de irem para a Califórnia — explico.
— E você?
Solto um suspiro enquanto repenso em minha agenda para as férias de
verão.
Ficaria aqui com Julian e então iríamos para Londres onde ficaríamos
por mais duas semanas. Mas agora preciso pensar melhor, não porque
houve um contratempo, mas porque talvez não tenha forças para sair de
Dublin sem um motivo maior do que o motivo que me fará ficar.
Pigarreio, porque pensando bem, não estou desesperado para
conquistar Audrey, no entanto, estou no mínimo curioso para entender o
que foi tudo aquilo que aconteceu.
Os olhares, os sorrisos e a conversa.
— Não sei quando volto para Londres — concluo. — Talvez eu fique
até o final das férias.
— Isso seria inédito — papai comenta e me viro para olhá-lo. —
Fique à vontade, meu filho. — Ele sorri, como se quisesse insinuar um
outro tipo de coisa.
Afinal de contas, aqui também é a minha casa e, por que não ficaria à
vontade?
Talvez meu pai já tenha percebido algo que ainda não vi. Mas não
posso levantar suspeitas de uma coisa que pode estar apenas na minha
cabeça, então dou apenas um aceno de cabeça para ele.
No final da noite, todas as minhas tentativas de não pensar em Audrey
vão por água abaixo, isso porque ela aparece em meus sonhos.
Cada detalhe do seu rosto está na minha mente e já não há mais volta.
Eu acordo e durmo, mas repetidamente costumo a voltar para o
mesmo sonho e ela sempre está lá.
Desta vez, Audrey está em meus sonhos de um jeito mais concreto e
por sua causa não durmo direito.
Vejo o dia amanhecer, dar sete da manhã e ela sair vestida de desporto
para caminhar com o Theo.
Essa é a rotina deles, afinal reconheço quando alguém está
acostumado a fazer a mesma atividade todo santo dia.
Mas hoje me recuso a participar, pois, não quero parecer desesperado.
Eu não estou desesperado.
Além do mais, preciso saber se ela tem alguém e, lá no fundo, espero
que não tenha.
Me junto a Julian e Jane na sala de jantar para o café da manhã.
A mesa está recheada e o ambiente bem iluminado com as cortinas e
janelas abertas, deixando um clima agradável rondar aqui dentro.
Olho para fora, esperando que ela volte da caminhada.
Será que ela já tomou café da manhã?
Jane não a deixaria fazer uma caminhada sob esse sol escaldante
sabendo que está de estômago vazio.
Observo que a jarra de suco de laranja não está cheia, o que significa
que alguém se alimentou aqui antes de nós.
— Algum problema, senhor Jeremy? — Jane pergunta, sentada do
outro lado da mesa enquanto corta uns pães. — Parece distante.
— Isso não deveria ser normal da parte dele? — Julian indaga em tom
provocativo.
Eu apenas movo meu olhar em sua direção.
— Estar distante em pensamentos não é normal para você? — rebato.
— É exatamente o que estou tentando saber do senhor.
Pisco confuso para meu filho de catorze anos.
Meu Deus, como ele parece estar impossível!
Mas isso é culpa minha.
É por isso que estamos aqui, para viver essas férias em família e ter
tempo de consertar tudo, antes que essa relação piore.
Dou então de ombros.
— Eu sou um homem muito atarefado, Julian, minha cabeça não para.
— Esse é o problema. Sempre pensando nessas tarefas, no trabalho e
trabalho.
— O que faz você pensar que não é a minha tarefa, Julian? — indago
e ele fica inexpressivo. — Ser pai não é um dom que surge
automaticamente com a notícia de que será um, é um aprendizado
constante.
— É um aprendizado quando o coloca em prática e não sei se o
senhor tem tanta assim.
Bato o punho sobre a mesa e me esforço para não apontar o dedo na
cara do meu filho. Deixo minha mão sobre a mesa e fecho os olhos
enquanto respiro fundo e contemplo o silêncio assustador dos dois perante a
minha reação.
Mas ele acaba de falar que não tenho experiência como pai.
— Vamos consertar isso, Julian, e vou precisar da sua colaboração —
digo por fim, mantendo a calma.
Quando abro os olhos, vejo meu filho se levantando com os punhos
firmes e um olhar inflexível sobre mim.
— Mas eu não fiz nada. — Ele se vira e se retira do cômodo.
— Julian! — Jane ainda faz questão de chamá-lo, mas faço um gesto
para ela parar, pois, sei que não adiantará de nada.
— Ele está muito chateado comigo, não vai facilitar, Jane — explico,
já me sentindo exausto.
— Mas, ele não comeu nada. — Aponta para o prato intocado do meu
filho.
— Julian já tem catorze anos e quando sentir fome irá procurar por
comida. Quero melhorar o meu relacionamento com o meu filho e não o
tornar um garoto mimado.
— E como o senhor pretende fazer isso?
Antes de pensar em uma resposta, o latido do meu cachorro invade a
casa. Olho com expectativa para a porta dupla aberta do cômodo que dá
para o corredor.
Primeiro, o vejo passando, e então, Audrey.
Seguro o copo com firmeza e ela para assim que me vê.
Observo que ela está só de legging preta que marca seu bumbum
redondinho e empinado.
Pressiono a coxa uma contra a outra para aquietar meu amigão lá
embaixo, mas ela está toda suada, com alguns fios de cabelo grudando na
testa; ofegante e seus seios sobem e descem no ritmo da sua respiração
excitante.
— Bom dia, senhor Jeremy — ela diz.
— Bom dia, Audrey. Já tomou café da manhã? — Indico a mesa e ela
olha para o conteúdo.
— Já, senhor. Mas obrigada mesmo assim. Agora só preciso de um
banho — explica com um sorriso sem jeito, como se ela estivesse se dado
conta de que é informação demais.
— Costuma sair toda manhã para caminhar? — pergunto curioso,
porque talvez me junte a ela.
Na verdade, seria uma ótima desculpa para passar mais tempo ao seu
lado.
Audrey pisca várias vezes, como se estivesse analisando o que eu
disse.
— Aah… É, acho que sim — responde.
— Audrey corre todas as manhãs com o Theo e estão sempre
mudando a rota — Jane explica.
— Mas nem temos tantas trilhas aqui na nossa propriedade —
comento, incrédulo.
— Eu nem sempre as uso — Audrey revela e me viro para ela um
pouco abismado.
Ela sorri sem jeito e acrescenta:
— Gosto de explorar a área, se não se importa.
— Qualquer parte da nossa propriedade que não seja demarcada pela
trilha é de acesso extremamente perigoso, Audrey.
Ela ruboriza.
— Bem, eu sei. Mas Theo é um excelente cão guia e nos divertimos
no caminho também — tenta explicar.
Fico olhando para ela, me segurando para não usar palavras rudes.
Mas quanta irresponsabilidade!
Ela pode se machucar muito feio e tudo o que pensa é em diversão.
Que coisa mais chata!
Conheço diversões melhores e gostaria que me permitisse mostrar a
ela.
— Só tome cuidado, Audrey.
Ela balança a cabeça em concordância.
— Eu tomarei, senhor Jeremy, com licença.
Audrey se retira, mas continuo olhando para o lugar onde ela estava
poucos segundos atrás.
Pelo visto, ela é proibida e teimosa, pois continua me chamando de
“senhor”.
Volto para meu café da manhã e flagro Jane sorrindo de um jeito
sugestivo para mim.
— O quê? — pergunto.
— Nada, estou apenas olhando.
— Gosta do que vê, Jane? — pergunto abrindo os braços, agindo feito
o Noah enquanto a provoco.
Jane é como uma mãe para nós, mas ela adora nos encher de elogios.
Noah e Ian às vezes ficam sem camisa na frente dela de propósito porque
sabem que isso a deixa muito vermelha e é engraçado vê-la sem jeito.
— Eu ando vendo outro tipo de coisa, Jeremy. Mas não irei tirar
conclusões precipitadas.
— Vou fingir que não entendi as suas intenções. — Dou um gole do
meu suco, enquanto ela sorri.
— Não são sobre as minhas intenções, são sobre as suas. Mas se quer
um conselho, seja você mesmo.
— Você está mesmo insinuando essas coisas? — Cruzo os braços e
ela faz uma carinha de quem está falando com o vento. — Que atrevida,
Jane!
— Oh, querido, Jeremy, sou apenas uma velha. Não me leve tão a
sério, sabe que gosto de brincar com você e seus irmãos.
Isso é uma verdade.
Já que estamos tendo essa conversa, me inclino mais ainda para perto
da mesa, como se eu fosse contar um segredo a ela.
Mas, na verdade, só estou curioso:
— Onde a encontrou? A Audrey.
— Ela é filha de uma amiga minha. Éramos vizinhas, antes de me
mudar de vez pra cá.
— Então ela já trabalhava com animais antes?
Jane faz uma careta e balança a cabeça negando.
— Garçonete e depois como diarista. Mas a coitada não teve muita
sorte, sabe? Era sempre tratada mal, mas é culpa dessa gente infeliz.
Aperto a mandíbula quando uma onda intensa passa por mim. Posso
ver aquela mesma garota molhada da chuva, completamente chateada por
ser destratada, como se já estivesse farta de tudo.
— Então aqui ela está tendo o tratamento que merece, suponho.
— Exatamente! Nunca vi Audrey tão feliz. Ela gosta do que faz, e,
principalmente, por a tratarem bem.
Isso já é um alívio.
Mas diante desses fatos, agora sinto que devo conversar melhor com
Audrey sobre o que aconteceu naquela noite, o que faziam a ela.
Eu só quero garantir que nada daquilo irá se repetir nunca mais. Não
enquanto eu estiver aqui e ela estiver sob a minha responsabilidade como
minha funcionária.
Jane então se levanta e pega o prato de Julian.
— Irei levar para Julian, não suporto ver gente sem comer.
— Obrigado, Jane.
Eu não sei ao certo sobre o que estou agradecendo, mas ela assente.
Quando Jane sai do cômodo, respiro aliviado e bastante irritado
comigo mesmo. Não queria deixar nada óbvio, mas parece que Jane já
percebeu o que está acontecendo aqui.
Eu também não posso julgá-la, pois nos conhece melhor que nós
mesmos.
Foi ela quem me ajudou a descobrir que Noah estava apaixonado por
Meredith e todos os conselhos que dei ao meu irmão foram baseados no
olhar analítico da nossa governanta.
Agora, sou eu que estou sob a sua mira e já sei que ela irá analisar
cada possibilidade.

Durante o resto do dia, tento analisar possibilidades de como curtir as


férias com Julian. Estou fazendo algumas anotações em um bloco de notas,
na mesa de jardim quando vejo Audrey passando com o cachorro e logo
atrás dela vem Julian.
Chegamos há um dia e meu filho não tem se desgrudado desses dois
desde então.
Fico tamborilando com a caneta sobre a folha enquanto observo os
passos do trio.
Audrey escolhe um lugar a sombra e Julian não sai de perto dela.
Garoto esperto!
Mas o que ele está tramando?
Sei muito bem o que é ter essa idade e estar na puberdade, ficando tão
besta por mulheres que é capaz de fazer qualquer coisa por elas.
Audrey sorri e duvido muito que ele tenha dito alto engraçado. No
mínimo disse algo bobo o bastante que a faz rir dele.
Preciso conversar com Julian e explicar a ele como funcionam as
mulheres, ou então como impressioná-las.
Ela me nota e então acena.
Julian olha na minha direção, confuso, mas quando vê que se trata de
mim, logo fecha a cara.
Ele ainda deve estar emburrado, mas tudo bem, teremos o verão
inteiro pela frente e não vou ter pressa em agradá-lo.
No final das contas, mesmo que Julian tenha esse comportamento
ressentido sobre mim, continuo sendo o seu pai. Ele sempre irá precisar de
mim, independente de qualquer coisa.
Continuo mantendo os olhos neles, quer dizer, em Audrey.
Acho que ela gosta de vestidos leves e de cores neutras, pois está
sempre usando um. O cabelo vive solto, como se ela amasse sentir o vento
batendo nos seus fios castanhos.
Gosto de admirá-la.
Há uma beleza secreta nela que me deixa hipnotizado e o mais
engraçado de tudo é que não tem nada a ver com aquela mulher que conheci
naquela noite chuvosa.
Jane deve estar certa, finalmente Audrey tem um emprego que faz
bem a ela, porque parece estar bem.
De repente, Julian joga um disco que voa na minha direção, parando
perto da minha mesa, mas parece não notar, achando mais interessante
correr atrás de uma borboleta.
Meu filho não faz questão de vir pegar o disco, o que sobra para
Audrey que vem caminhando lindamente na minha direção.
Ela tem um corpo voluptuoso, cheio de curvas e o mínimo
movimento que faz, seus seios grandes dançam. Sua pele branquinha é tão
imaculada que sinto vontade de deixar as minhas digitais nela.
Tento apagar da minha mente a aparência da sua bocetinha.
Quando ela sorri para mim, me sinto um porco por me permitir ter
pensamentos tão depravados sobre ela.
Porra, Audrey é só uma menina!
Ela não deve ter mais do que vinte e três anos. Chuto uns vinte e dois.
— Oi — ela me cumprimenta quando se aproxima.
— Oi — respondo firme, sem demonstrar o que estive pensando
poucos segundos atrás.
— Quer participar? — Ela indica a sombra debaixo da árvore.
Dou uma olhada e estico as pernas debaixo da mesa, tentando afastar
a tensão que Audrey acaba me causando.
— Humm… Hoje está muito quente. Vou deixar para uma outra
oportunidade.
“Que estúpido!
Quente?
Jura?!”
— Então prefere a chuva? — pergunta de forma sucinta.
Mas há um segredo por trás desta pergunta que apenas nós dois
sabemos decifrar.
Dou um sorriso quando percebo que ela faz uma analogia à noite em
que nos conhecemos no Temple Bar.
— Devo dizer que prefiro quando tudo parece propício. O clima, as
circunstâncias, e no momento estou fazendo planos de como curtir o verão
ao lado do meu filho — finalizo analisando a folha do bloco de notas ainda
em branco.
— Ah, entendo... — ela diz suavemente, com os raios de sol da tarde
batendo atrás dela, dourando a sua silhueta. — Bem, sei que não deveria
opinar, mas essa é uma ótima oportunidade para começar a curtir o verão
com o seu filho. Através de um gosto em comum por cães.
— Como você pode saber do que gosto? — pergunto curioso e ela
cruza os braços.
— Como o cachorro é seu, deduzo que deve gostar de animais no
geral.
— Foi um presente do meu irmão, já disse isso a você. Mas eu gosto,
sim. Talvez tenha mais tempo para ele agora também.
— Os dois precisam do senhor.
Franzo o cenho para ela que fica meio pálida, como se desse conta de
que falou demais.
— Imagino que deva ser um homem muito ocupado — completa.
Balanço a cabeça em concordância, mas por ela estar certa e por
perceber que está nervosa.
— Eu sou, enquanto não tenho coisas mais importantes para terem a
minha atenção. — Cruzo os braços logo em seguida também, a olhando
firme. — Não é tudo que tem a minha atenção, Audrey. Modéstia à parte,
dou tempo apenas para coisas relevantes.
“Como agora...”
Queria que ela lesse as entrelinhas.
Sei que posso estar sendo bastante precipitado agora, mas não sou
homem de fazer cena, ou joguinhos. Quero deixar claro que Audrey tem a
minha atenção, mas não irei fazer isso de um jeito que a assuste e me faça
parecer um maluco.
— Eu só preciso me organizar — concluo.
Ela dá uma risadinha ao abaixar a cabeça na inútil tentativa de tentar
esconder.
— O que é engraçado?
— Desculpa, senhor, não é nada relevante.
Eu me inclino mais para a mesa e apoio os cotovelos sobre a
superfície.
— Ah, mas estou muito interessado em saber, Audrey.
Ela pisca várias vezes enquanto move os lábios, até dar um sorriso de
lado.
— É que o senhor não passa uma imagem de desorganizado. Parece
até ser a organização em pessoa.
Não posso evitar de sorrir.
— Não dá para ser bom em tudo, Audrey. É por isso que tenho uma
secretária e uma assistente pessoal que mantêm tudo organizado na minha
vida. Até mesmo onde vou almoçar, ou para onde vou viajar.
— O senhor gosta de controlar as pessoas? — pergunta em um tom
inocente, mas muito, muito curioso.
Por que a doce Audrey gostaria de saber sobre isso?
— Eu gosto de saber que tudo está acontecendo como planejei e que
tenho pessoas qualificadas para me ajudar nisso. Mas respondendo a sua
pergunta, acho que há um pouco de gosto por controle nisso também. Eu
sempre gostei de ser o líder, em tudo.
— Ah. — Ela arqueia as sobrancelhas e parece que vejo um
vislumbre de decepção.
“O quê?”
Fico incrédulo.
— Mas, por que a pergunta, Audrey?
Ela dá de ombros.
— Não sei. Acho que não o vejo assim, talvez decorrente da forma
informal em que nos conhecemos.
— Mesmo assim, você insiste em me chamar de senhor — anuncio.
— Eu sei, me desculpa, não consigo evitar as circunstâncias. O
senhor é meu patrão.
— Sim, eu sou. E aqui está você, me enchendo de perguntas.
Como se dando conta do que fez, Audrey bufa.
— É verdade. Irei deixá-lo em paz.
“Idiota!
O que você fez?!”
Levanto no mesmo instante em que ela faz menção em se retirar.
— Você não está me importunando de jeito algum, Audrey. Inclusive,
o que aconteceu com aquele seu emprego no Temple Bar?
Seus olhos ficam maiores e ela parece surpresa com a pergunta, o que
me leva a acreditar que algo muito ruim aconteceu, ou que talvez tenha
ficado surpresa por ter me lembrado.
No entanto, ela balança a cabeça.
— É melhor deixarmos para lá.
Aceno para ela, pois não irei ultrapassar esse limite, mas confesso que
fico mais curioso.
Audrey se vira, volta para junto do meu filho e do Theo e lá estão os
três de volta a brincadeira.
Ela parece se dar bem com esse tipo de interação, mas percebi que a
época em que trabalhou naquele pub foi um tanto sombria.
Senti como se ela não quisesse voltar para lá.
Não costumo dar uma de detetive, mas fico mais curioso para saber o
que aconteceu.
Amo as polaridades no contraste dessa mulher tão linda, doce, gentil e
enigmática.
Mas devo tomar cuidado, não por ela, mas comigo mesmo.
Papai está cada vez mais debilitado e assumi agora oficialmente o
cargo de CEO, por isso não posso me meter em situações que
comprometerá a nossa petrolífera e muito menos envolver Audrey em uma
realidade que ela não está acostumada.
Ou seja, Dublin pode ser o nosso refúgio.
Mas quando Sofia, a minha falecida esposa se foi, este lugar se
transformou em um inferno.
Já faz três dias que Jeremy chegou na mansão de Malahide e alguma
coisa mudou. Não para ruim, mas para algo curioso, porque, pelo visto,
apenas eu tenho sentido a diferença dele estar por perto.
Mas devo admitir, ainda estou tentando digerir as coincidências onde
acabamos nos reencontrando.
Sério, quais seriam as probabilidades?!
E tenho a impressão de que ele tem pensado a mesma coisa.
Às vezes, o flagro me olhando, e quando não está, aproveito para
admirá-lo porque é um homem muito bonito. É o tipo de homem que a
gente vê e pensa em como seria ser a sua esposa, o imagina preparando o
café da manhã e à noite, a protegendo em seus braços grandes e
musculosos, sob seu cheiro másculo, a fazendo se sentir a mulher mais
protegida e sortuda do mundo inteiro.
Sei que não é certo ficar fantasiando esse tipo de coisa,
principalmente sabendo que nunca terei essa chance.
Mas imaginar não custa nada, não é?
No entanto, a minha maior surpresa mesmo foi ter conseguido a
simpatia de Julian, o filho de catorze anos de Jeremy.
Ele é como se fosse uma versão mais nova do pai, só que loiro e de
olhos azuis.
Seu jeito perto do pai é meio ressentido, foi fácil de identificar as
divergências que ambos sofrem devido ao tempo em que fui criança e sofri
com a ausência do meu pai.
Confesso que tenho receio de fazer perguntas e não quero ser
considerada inconveniente, mas Jeremy parece de fato muito tentado a
testar todas as possibilidades de se reaproximar do filho.
Eu me pergunto o que pode ter acontecido e onde estará a mãe de
Julian.
Hoje mais cedo, Julian me pediu para que ficasse até mais tarde na
mansão, pois ele tinha comprado um jogo novo para o seu videogame e
queria alguém para se divertir junto com ele.
Na hora topei, mas assim que me sento no sofá, de frente para a
enorme TV pergunto:
— Por que não chama o seu pai também?
Julian bufa e revira os olhos.
Ele não parece gostar muito do assunto, tanto que continua apertando
os botões, com os olhos vidrados na tela colorida.
— Prefiro assim. Tenho certeza de que ele não quer ser incomodado
— Julian diz.
— Bom, talvez ele esteja esperando o convite, sabe.
— Convite? — Ele faz uma careta. — Estamos de férias. O que ele
está fazendo trancado no quarto? Por que ainda não passou tempo comigo o
suficiente?
— As férias de verão só começaram, Julian. Além do mais, desde que
chegou, você tem passado uma grande parte do tempo comigo.
Ele me olha de esguelha, parando tudo o que está fazendo.
— E o que isso tem a ver?
Olho para a TV e penso bem nas palavras, pois não quero magoá-lo.
— Bem, agradeço por ter me chamado, mas poderia ter chamado o
seu pai também.
— Se ele quisesse, estaria aqui.
— Mas ele está. Só não sabia que o filho ia parar para jogar
videogame — insisto.
Eu não me dou conta do meu posicionamento até Julian me olhar de
um jeito sugestivo e dizer:
— É impressão minha ou você está o defendendo?
Acho engraçado a forma como ele pergunta, mas ensaio apenas um
sorriso, não querendo parecer exagerada.
— Só estou fazendo uma suposição que você não está vendo. Tudo
tem um motivo, sabe?
— Aposto que você tem um ótimo convívio com o seu pai e diz como
se isso fosse algo fácil de lidar.
Abro a boca em formato de O, pois não consigo evitar a surpresa pelo
seu pré-julgamento e o quão está completamente equivocado por isso.
— Na verdade, o meu pai... Bom, ele literalmente nos deixou quando
eu tinha só oito anos. Ele foi viver com a outra família dele. Eu o culpo e
não gosto dele por isso.
Julian me olha um pouco chocado e completamente arrependido.
— Sinto muito, eu não sabia.
Dou de ombros e me levanto.
— Tudo bem. Eu quase não falo sobre isso com ninguém e hoje em
dia não tem um peso tão grande assim, já aprendi a lidar com isso.
“Mentirosa!”
— O que você vai fazer? — ele pergunta ao me olhar de cima a baixo.
— Vamos atrás do seu pai. Se você não o permite de se aproximar, se
age de forma arisca, como que ele vai se sentir seguro para dar o próximo
passo? — Começo a andar e faço um gesto para que ele me acompanhe.
Paro sob o arco da sala de TV e fico a sua espera.
Julian parece pensar mais um pouco na proposta e então se dá por
vencido. Ele se levanta, deixa o controle do videogame sobre a mesinha de
centro e vem ao meu encontro.
Sorrio em resposta, pois ele está indo bem.
Como não sei onde é o quarto do seu pai, permito que ele siga um
passo na minha frente. Talvez eu nem vá até À porta com ele, mas não
posso controlar o formigamento em meus pés quanto mais nos
aproximamos.
Estou ansiosa e com o coração a mil.
Nem sei o porquê, mas de repente, resolvi contar uma ponta do meu
passado para Julian, muito menos o porquê de ter amenizado a dor que foi
aquela traição e o quanto ela reflete na minha vida, assim como na da minha
mãe até os dias de hoje.
Mas não posso encorajá-lo a sentir mais chateação pelo pai, ou
alimentar uma mágoa que pode ser regada com o seu rancor.
Não, eu não posso fazer isso baseado no ódio que sinto pelo meu pai.
Afinal são situações diferentes, mas a dor da ausência paterna sempre será
semelhante.
Se puder ajudar essa relação em algo, farei o que for preciso, mesmo
não sendo problema meu, mas porque foi algo espontâneo e nunca dei de
cara com algo parecido.
— É aqui — Julian diz quando paramos em frente a uma porta
branca, com detalhes dourados e pesada.
Ele dá dois toques e espera.
“Eu espero.”
Tento disfarçar a inquietação que quer assumir o controle do meu
corpo, mas fica tudo uma confusão quando a porta é aberta e um Jeremy só
de toalha branca enrolada na cintura surge.
A minha respiração vai para o espaço, e para piorar, quando ele abre a
porta o seu olhar não vai direto para Julian, mas para mim. Prendo a
respiração e fico completamente petrificada com a intenção de ficar tão
inexpressiva ao ponto de não ter que passar por nenhum constrangimento.
O único movimento que faço é piscar, o que já deve ser ridículo o
suficiente.
— A que devo a visita inusitada dessa dupla? — Jeremy pergunta,
finalmente tirando os olhos de mim e olhando para o filho.
— Liguei o videogame na sala de TV. O senhor quer se juntar a nós?
Jeremy fica olhando para o filho, não pensando em uma resposta,
mas, surpreso por ter sido lembrado.
Droga!
Era isso que estava falando e queria que Julian se tocasse. Espero de
verdade que ele tenha notado a diferença.
— Seria uma honra, vou só me trocar — Jeremy anuncia antes de
fechar a porta, dá uma última olhada em mim para depois sumir com o seu
corpo esbelto.
Santo Deus, que homem!
Eu finalmente posso respirar aliviada, mas sinto que levarei para o
resto da vida a cena dele só de toalha amarrada na cintura.
O corpo sarado, as gotas de água escorrendo pela sua pele, umas
fazendo um caminho invejável até o cós da toalha branca.
E o cabelo molhado?
E o cheiro de loção masculina, que dá a ele uma aparência de limpo,
cheiroso e muito gostoso?
Minhas pernas ficam bambas.
“Puta merda!”
— Meu Deus, você está babando pelo meu pai.
Ouço Julian dizer e então percebo que o garoto na minha frente me
olha com diversão.
— Parece até que nunca viu um homem seminu.
— Já vi muitos.
“Mentira!”
Julian dá um sorrisinho.
— Aposto que não.
— Bom, a minha vida amorosa não interessa a você — aviso e dou
um peteleco na ponta do seu nariz.
— Ai! — Julian segura a região que bato com o dedo e recua. No
entanto, para a minha infelicidade, o moleque ri e acrescenta: — Se está
irritadinha, é porque é mentira.
Cruzo os braços.
Que abusado!
— Não estou irritada, mas não gosto de gente, principalmente
crianças curiosas se metendo na minha vida.
— Eu não sou criança, já sou quase um adolescente!
— Aposto que nunca beijou uma menina — rebato assumindo seu
posto de provocador.
Julian fica vermelho e é inevitável e instintivo, tanto que me seguro
para não rir.
— Olha, em minha defesa, estudava em um internato para meninos —
ele frisa. — Eu não podia beijar os meninos de lá, a não ser que realmente
gostasse, mas não gosto.
Começo a rir, a porta então abre de novo e um Jeremy aparece
vestindo calça de moletom e blusa polo escura.
Que rápido!
E ainda assim, continua lindo, mesmo com o visual casual.
— Pronto — Jeremy avisa e fica parado, observando nós dois.
É notável o quanto ele parece deslocado, mas pelo menos está
fazendo um esforço.
— O que vamos jogar? — pergunta ao filho.
— Street Fight.
Jeremy mostra a ele um sorriso.
— Esse é do meu tempo — admite e então olha para mim. — E você,
Audrey, gosta de Street Fight também?
Arqueio as sobrancelhas e pisco diversas vezes até confessar sem
jeito.
— Olha, sei que videogame também pode ser para meninas, mas
deixo isso com os homens.
Julian franze o cenho, profundamente arrasado.
— Era só o que você queria, não é? Uma brecha para escapar da
derrota — ele diz em um tom competitivo.
— Olha, realmente não sei como jogar isso, então a minha derrota era
iminente. Creio que será mais divertido jogar com o seu pai.
— Então você não vem? — Jeremy pergunta.
Tanto ele quanto o filho parecem tensos com essa possibilidade, afinal
de contas, prometi a Julian, mas a Jeremy…
Não consigo entender o porquê da tensão em seu olhar pela minha
resposta.
Dou a eles então um sorriso reconfortante.
— Eu irei, sim. Estou até pensando em fazer pipoca para assistir
vocês jogarem, se não for incômodo.
Alívio percorre a expressão de Jeremy que dá até mesmo um sorriso
sútil.
— Imagina. Vai ser divertido.
— A noite do videogame — Julian diz esporadicamente.
— Podemos fazer isso todas as sextas-feiras à noite, o que acha? —
Jeremy pergunta ao filho que dá um sorrisão em resposta.
— Vou lá terminar de iniciar o jogo.
Julian sai então na frente, às pressas porque a ideia de jogar
videogame com o pai, o empolga mais que tudo.
Fica somente Jeremy e eu no corredor, que de repente parece tão
pequeno, se estreitando cada vez mais.
Porém, é só ele sendo grandão.
Seus ombros são largos e seus braços compridos e musculosos, nada
exagerado, mas perceptível o suficiente para demonstrar que cuida do
físico.
Além do mais, há seu cheiro que faz parecer que estou sendo
abraçada por ele de alguma forma.
E gosto disso.
— Devo agradecer a você — ele diz.
— Agradecer? Mas, por quê? — indago.
— Não foi você que convenceu Julian a ir me chamar para jogar
videogame?
Ele espera por uma resposta, mas não digo nada.
— Eu vim pra cá com o meu filho porque fazia um tempo que não
passávamos um verão inteiro juntos. Eu, basicamente, o libertei e agora
quero melhorar a minha relação com ele.
Isso me faz lembrar de algo e penso cuidadosamente se devo
questioná-lo. Mas quando me dou conta, já estou pensando alto:
— Ele disse que estudava em um internato. Havia algum motivo
específico para isso?
Jeremy balança a cabeça e encara o piso de mármore mesclado.
Não estamos com pressa, andamos devagar para não alcançar a
escada rapidamente.
— Eu só achei que seria o melhor. Diferente de mim, Julian está
crescendo sozinho, não tem irmãos e nem primos.
— Isso foi motivo?
Ele me olha rapidamente, como se estivesse o insultado.
— Desculpa, isso com certeza não é assunto meu.
— Não fui um bom pai — admite e não vejo nenhuma faísca de
orgulho iluminar seu rosto, apenas mágoa. — Por muito tempo, não soube
como ser um bom pai para Julian e o internato de alguma forma me ajudou
com a educação e criação dele, sou muito grato por isso.
Chegamos à escada, mas nenhum de nós dois ousa descer. Ficamos
parados ali, na base dela.
Seguro o corrimão.
— O senhor não precisa me contar essas coisas.
— Bom, mas você perguntou.
— Não precisava ir tão fundo.
Jeremy dá um sorrisinho e abaixo o olhar envergonhada e pensativa.
Ok, o que foi isso?
Parece até que falei algo inapropriado que nos pegou de jeito.
Mordo o lábio e reformulo minha frase enquanto encaro o chão:
— São coisas pessoais demais para contar, não se dê ao trabalho.
— E se eu quiser? — ele pergunta e parece decidido.
Nossos olhos se encontram e há segurança e confusão.
— Não sei dizer o motivo, mas sinto que posso confiar em você,
Audrey — revela.
Prendo o ar, mas não consigo evitar o sorriso bobo. Tento disfarçar as
bochechas vermelhas com o cabelo, mas não ajuda muito.
— A coisa tá tão feia assim que recorre a uma estranha? Imaginei que
tivesse amigos para desabafar suas frustrações — digo sem querer. — Me
desculpa.
— Você está certa, estou desabafando. Costumo fazer isso com meus
irmãos, mas eles são uns chatos. E como você não é mais nenhuma
estranha, acho viável desabafar um pouco, até porque Julian acabou
gostando de você.
— Isso é algo raro?
— Um pouco. Mas ele está de mau humor quase sempre desde que
chegou em Dublin.
— Ou ele quer que você pense assim — menciono. — Julian é um
garoto adorável e muito gentil para a idade dele. Meninos de catorze anos
estão com os hormônios a flor da pele e entrando com tudo na adolescência,
mas ele não. Parece que ele só quer curtir, sem pressa de viver.
— Julian tem o espírito livre dos tios.
— E quanto a você? Quais suas características ele herdou?
Ele pensa um pouco e então conclui:
— Não seria arrogante se eu as pontuasse?
Dou de ombros.
— Não se alguém pediu para você fazer isso.
Antes mesmo que ele pense em algo, Julian surge no pé da escada.
— E aí, vocês dois vem ou vão ficar de papinho?
Julian sai como se tivesse vindo somente para lançar essa pergunta
que nos deixa sem jeito.
Jeremy desce um degrau e diz:
— Não ter medo. Temos isso em comum.
Ele se refere as características do filho, mas basicamente é uma
reprovação e ameaça devido a forma como Julian chamou a sua atenção, de
um jeito quase que autoritário.
Jeremy vai para a sala de TV e eu para a cozinha a fim de preparar a
minha pipoca.

Jane está na cozinha quando peço permissão para mexer nas coisas.
— Fique à vontade! — ela diz sorrindo com os olhinhos,
principalmente quando conto o que farei.
A cozinha dá duas da cozinha dos Bergman.
Pensando bem, faz tempo que não ouço nada sobre eles, desde o dia
em que saí, quer dizer, roubei o pote de biscoitos deles.
Naquela tarde, já em casa, contei todos que ainda tinham e vi que
tinham quatrocentos e noventa euros.
Bom, era motivo o suficiente para a senhora Bergman mandar a
polícia ir atrás de mim, mas ela não fez isso.
Deixei o pote dentro do armário lá de casa e contei para minha mãe
que havia ganhado.
Mas acho que ela gostou mais da notícia de que havia ganhado uma
oportunidade de trabalhar para os petrolíferos que viviam discretamente em
Malahide.
Há uma ilha bem no meio da cozinha, com várias panelas de cobre
penduradas no alto. Os eletrodomésticos são todos planejados para
combinar com o resto das mobílias de tom marfim. Encontro com a ajuda
de Jane, os milhos de pipoca imprensado, desses que vem com quase um
quilo de sódio e estouro dois deles no micro-ondas.
Pego uma vasilha grande e jogo tudo dentro. Está fumegante, mas não
vou para a sala de TV de imediato.
Vejo que Jane está de bobeira, sentada à ilha, descascando algumas
tangerinas que ela disse ser para o café da manhã do dia seguinte.
— Quer ajuda? — pergunto e ela abre um sorriso.
— Não, querida. Tudo bem. Eu gosto de distrair a mente com essas
atividades — explica animada.
Assinto para ela, mas não saio. Há uma coisa me perturbando, não
algo que seria digno de tirar o meu sono, mas uma curiosidade que ficou
piscando na minha cabeça depois do que Jeremy falou sobre não ser um
bom pai, ou sobre Julian ter ido para o internato.
Tamborilo os dedos na superfície de pedra da ilha, olho cheia de
hesitação para Jane e arranjo coragem.
— Hum, Jane?
— Sim? — Ela me olha, esperando que eu fale algo.
— O que aconteceu com a mãe do Julian? — Eu me sinto gelada
quando pergunto.
Sei que estou sendo inconveniente, mas é melhor perguntar a ela do
que a Julian ou Jeremy.
Ela franze as sobrancelhas feitas a lápis, porque Jane é uma mulher
vaidosa. Dá para ver isso em suas vestes elegantes, os acessórios vintage,
mas nada disso a impede de colocar a mão na massa.
Se eu não a conhecesse, acharia que era a mãe de Jeremy.
— Você não sabe mesmo?
Balanço a cabeça e ela larga o que faz.
— Oh, céus, isso é novidade. Mas também não posso culpá-la. Você
só tinha oito anos quando tudo aconteceu.
Fico mais curiosa ainda.
— Mas, basicamente, Jeremy vivia um casamento muito feliz com
Sofia. Demorou sete anos para que ele a pedisse em casamento. Jeremy
disse que só faria isso quando tivesse uma estabilidade no trabalho, mesmo
sendo herdeiro e cheio de privilégios por ser filho do dono de uma
petrolífera.
Jane não está mais só me contando sobre o que aconteceu com Sofia,
mas, a história de Jeremy com ela.
Sinto uma pontada de ciúmes.
Imagina você ser amada por um homem como ele. Garotas, como eu,
podem no máximo, apenas imaginar mesmo.
— Veio a gravidez e todos estavam felizes com a chegada do menino.
Mas não contávamos com uma eclampsia inesperada, que acabaria por tirar
a vida de Sofia. Ela faleceu poucos minutos após Julian ter nascido. Foi a
coisa mais triste e Jeremy ficou devastado por meses, anos.
— Posso imaginar. Foi por isso que ele não conseguiu criar sozinho o
filho?
— Também. Mas o luto de Jeremy foi a negação e depressão. Acho
que ele via Julian e lembrava que o início dele foi difícil, além de ser o fim
da mulher que ele amava.
Meu coração se aperta e fecho os olhos.
Será que Julian se culpa de alguma forma por isso?
Meu Deus, espero que não.
— Isso é muito triste, Jane.
— É sim, mas anos já se passaram e tudo o que Jeremy precisa fazer
agora é consertar o relacionamento com o Julian.
Não sei o motivo, mas acabo perguntando:
— É por isso que Jeremy não tem ninguém? Por que ele ainda a ama?
Ela fica pensativa, mas logo faz uma careta.
— Não mesmo. Jeremy só não encontrou alguém que fosse tão boa
como Sofia, além do mais, tem Julian. Ele não pode somente escolher
alguém porque quer, ele tem que escolher alguém sabendo que seu mundo
também gira em torno de outro ser. Apesar de tudo, Jeremy faria tudo pelo
filho e isso o menino não vê.
Olho na direção da sala de TV e imagino os dois jogando videogame,
um pouco mais próximos graças ao encorajamento que dei ao orgulhoso do
Julian.
— Entendo — digo pensativa.
— Mas, por que a pergunta, querida?
Dou de ombros e rapidamente invento uma desculpa:
— Eu não sou muito atualizada com essas coisas e queria saber para
não dar uma bola fora com o Julian principalmente, sabe?
— Ah, é claro. — Ela sorri, compreendendo o que havia dito.
— Bom, vou lá assistir aqueles dois jogarem, quer ir comigo? Acho
que é um pouco violento.
— Talvez apareça lá depois e faça companhia a você.
— Tudo bem. Obrigada por ter me atualizado, Jane, com uma
informação tão antiga.
— Estou aqui para isso. — Ela pisca e pisco de volta.
Volto para a sala de TV e os dois estão tão concentrados que nem me
veem chegar. Eu me sento no chão, sobre o carpete e deixo o balde de
pipoca sobre a mesa, onde todos tem acesso fácil ao conteúdo.
Fico olhando os dois jogarem, parecendo eufóricos e muito animados
enquanto continuo a comer pipoca, quietinha.
Nem parece que há algo a ser reparado entre pai e filho.
Passo a conhecer a risada de Jeremy e sorrio também nas vezes em
que ele se esforça para não proferir palavrões perto do filho.
Ele está tão relaxado que nem parece ser o CEO de uma petrolífera.
Em certo momento, estou tão concentrada no jogo que nem percebo
quando Jeremy me chama.
— Audrey? — cantarola. — Vamos jogar uma partida? — Indica o
controle, mas fico tensa.
— Oh, não! Obrigada, mas vou passar, realmente não sei jogar essa
coisa. Primeiro, porque sou totalmente contra violência.
— Não parece — Julian diz. — Chega estava vidrada na tela, em cada
nocaute.
— Bom, eu tinha escolha? — pergunto.
— Julian coloca o Mario Kart para você — Jeremy sugere.
Antes que relute, Julian já está trocando o jogo.
— Tudo bem — concordo.
Eu me levanto e me sento no sofá junto a eles, mas fico ao lado de
Jeremy, que agora está no meio de nós três. Ele me passa seu controle e,
então, começa a me explicar a função de cada botão.
É uma surpresa que um homem implacável dos negócios como ele
saiba essas coisas.
Mas essa não é a questão, porque enquanto me ensina, seus dedos
roçam nos meus, seus ombros largos se esquivam para mais perto de mim e
seu corpo inteiro está bem perto do meu.
Quase vou à loucura quando seu joelho encosta no meu. Travo no
mesmo instante, e fico torcendo para ele não ter percebido a minha reação.
Depois que entendo as funções dos botões, Julian ainda me dá a
chance de uma partida teste, onde testarei a minha habilidade.
Vou bem e assim que pego o ritmo, o jogo de verdade começa.
Sou eu contra Julian, mas a sensação de estar perdendo me deixa mais
nervosa.
Em algum momento, dou um gritinho e me encolho toda. Jeremy
então passa seu braço esquerdo por trás de mim e suas mãos pousam sobre
as minhas.
Fico paralisada e nem sei mais como se joga isso.
Mas aqui está, Jeremy O’Donnell, CEO de uma petrolífera, lindo e
tudo de bom, me ajudando a não perder para o seu filho de catorze anos que
está mais que se aproximando de mim, nos últimos dias.
A realidade é tão estranha que prendo o fôlego. Geralmente, esse tipo
de acontecimento só vem ao acaso na minha imaginação.
Mas agora é real.
Viro o rosto na direção de Jeremy.
Próximos...
Estamos muito, muito próximos.
Daqui sinto como se estivesse em seus braços de um jeito casual e
não por causa de uma partida de jogo. Ele me olha rapidamente, mas
quando se dá conta de que estou olhando para ele, volta a me olhar,
deixando de dar atenção ao jogo.
— Você é bom nisso — digo olhando em seus lábios.
Jeremy sorri.
— Sou bom em muitas coisas, Audrey — ele afirma.
Um calor se instala no meio das minhas pernas e o vazio grita por
algum tipo de preenchimento que ainda não conheço.
— Bom?! — Julian exaspera. — Ele está perdendo!
Jeremy me olha mais uma vez, volta a sua atenção para a TV e tira
seus braços de mim, quando o personagem de Julian vence e este começa a
pular com a vitória.
— UHU! EU SOU O MELHOR! — ele grita.
— Sexta que vem, vou massacrar você — Jeremy alerta e Julian faz
careta, nem um pouco assustado.
Ficamos ali assistindo Julian jogar um jogo de zumbis enquanto
comemos pipoca. Tento me distrair no celular, mas não dá para evitar o que
acabou de acontecer entre Jeremy e eu.
Aquela tensão louca e quente que surgiu e fica pairando sobre nós.
— Quer que eu leve você para casa? — Jeremy pergunta quando saio
da sala e me despeço deles, com a minha bolsa já no ombro.
—Não precisa, vou ganhar uma carona agora — aviso.
— Do seu namorado? — pergunta sério, mas dou uma risadinha.
— Eu não tenho namorado.
— Ah. — Ele enfia as mãos nos bolsos da calça. — Eu vou
acompanhar você.
Jeremy me guia até a frente da casa, enquanto ao longe uma
caminhonete prata com o farol alto se aproxima da propriedade. Já está de
noite e foi a primeira vez que fiquei até tarde na mansão.
— Obrigado por hoje, Audrey, significou muito para mim. Foi uma
ótima maneira de iniciar a minha aproximação com Julian.
Sorrio para ele, contente por saber disso.
— De nada, Jeremy. Pode contar comigo sempre que quiser.
Ele começa a sorrir.
— O quê?
Ele passa a língua no lábio inferior e eu me arrepio, pois, ela parece
ser atrevida.
— Você me chamou de Jeremy.
— Esse é o seu nome, não é?
O carro se aproxima.
— Sim, e o chame quando quiser — avisa.
Balanço a cabeça, concordando.
A caminhonete para em frente à escada e desço um degrau antes de
me despedir.
— Até segunda.
— Segunda? — Ele fica incrédulo.
— Não sou paga para estar aqui nos finais de semana, Jeremy —
aviso com humor e ele parece então se dar conta de que folgo nos finais de
semana.
— Vou começar a repensar nisso, Audrey.
Eu quase perco o controle das minhas pernas.
“Ele me quer por perto!”
— Até segunda.
Aceno para ele e entro na caminhonete do senhor Douglas, meu
antigo chefe e amigo da minha mãe.
O interior do carro está escuro e frio, e nem preciso olhar para o lado
para saber que ele está com seu famoso chapéu branco e as roupas
quadriculadas de fazendeiro.
— Então, o O’Donnell é seu novo chefe? — a pergunta retórica nos
mantêm parados.
— Sim. Podemos ir embora logo? — Fico olhando para fora da janela
que tem insulfilme escuro, e, mesmo assim, Jeremy permanece parado ali,
como um vigilante.
O senhor Douglas dá uma risadinha.
— Esse cara deve ter muita grana.
Olho feio para ele.
— Nem pense nisso. Vamos embora daqui e você me fala o que tanto
queria me contar.
— Não tenha pressa, menina. Não são boas notícias, para você.
Ele dá então a partida no mesmo instante em que Jeremy parece
pronto para verificar se está tudo bem.
Sinto uma forte ânsia no estômago.
Por mais que o senhor Douglas não seja um homem perigoso, sei para
quais fins as pessoas o procuram.
Eu sei como ele e minha mãe se tornaram conhecidos e isso não me
agrada nem um pouco.
A noite de jogos foi um sucesso, mas o que se aconteceu depois
daquela noite foi puro desastre.
Julian começou a passar mais tempo com o cachorro e não é nada
legal comigo, sempre me ignorando. Ele evita os mesmos cômodos que eu,
ou então está sempre de cara fechada para mim.
Uma semana se passou e já estou pegando uma moral com o seu
comportamento mesquinho.
Mas não posso me render facilmente.
No final de semana, rezei para ver Audrey logo na segunda. Não por
um instinto inapropriado, ou pela vontade de sucumbir ao desejo em ver
seus olhos grandes de avelã, ou até por sentir seu cheiro doce de morango.
Não!
É quase como uma bússola e sei o que estou procurando nela.
Na segunda-feira, logo quando acordo, antes mesmo do dia
amanhecer, a primeira coisa que faço é tomar um banho e vestir uma roupa
apropriada para praticar exercícios físicos.
Uma calça de desporto e uma blusa cinza de malha.
Calço meus tênis de corrida e coloco meu relógio digital que sempre
calcula meus passos, a quilometragem e as batidas do meu coração.
Eu me alongo, tomo meu café da manhã e espero. Por um momento,
penso: “Não preciso fazer isso”.
Poderia solicitar uma reunião mais formal com ela, poderia até
mesmo procurar alguém mais especialista na área, mas quero tudo o muito
discreto possível e com Audrey conseguirei isso.
Além do mais, tenho outras intenções por detrás do real motivo.
Isso faz de mim, um cretino, mas não posso fugir dos desejos, da
vontade de um homem solitário há anos que milagrosamente se viu
finalmente tão interessado em uma mulher diferente de todas as
possibilidades que já se pensou.
Espero pacientemente por ela enquanto eu me alongo mais um pouco
na sala de estar. Pela janela, vejo o dia amanhecer cinza e ir formando
nuvens densas da chuva que promete cair em alguns minutos.
Por um momento, imagino que ela não vá optar por caminhar com o
cachorro nessa manhã. Mas, para a minha surpresa, lá está ela, saindo com
Theo na manhã nublada.
Santo Deus, eu nem a vi chegar!
Audrey foi silenciosa, mas o cão foi mais ainda, pois não deixou
rastro algum de animação quando a sua pessoa favorita chegou.
Eu me apresso a ir para o lado de fora antes que ela pegue mais
distância.
Por sorte, os passos de Audrey são curtos.
Talvez, ela esteja hesitante sobre prosseguir com a caminhada. No
entanto, continua e eu a sigo.
Estamos indo para longe da mansão e das árvores do jardim. Ela evita
as trilhas demarcadas e a sigo feito um stalker maluco.
Preciso acelerar meus passos, senão nunca irei alcançá-la. E quando
estou mais perto, Theo para olhando na minha direção e começa a latir.
Isso chama a atenção de Audrey que se vira.
Ela está usando legging com um casaco cinza que revela a regata rosa
por debaixo do pano mais grosso. Seu cabelo está preso em um rabo de
cavalo nessa manhã, mas sempre volumoso e tão bonito de se ver. É
engraçado, porque ela não parece gastar milhares de euros com a aparência
dos fios e são naturalmente lindos.
— Pensei que nunca a alcançaria — digo sem parar meus passos até
ela. — Bom dia.
— Bom dia. O que faz aqui? — pergunta genuinamente.
Olho ao redor e paro, analisando a vastidão da nossa propriedade.
Esqueci do quão grande ela é.
— Costumo correr todas as manhãs em Londres e queria manter essa
rotina aqui. Precisam de mais um acompanhante? — pergunto como quem
não quer nada.
Ela olha para o cachorro.
— O que acha, Theo? Aceita mais um integrante no nosso pequeno
grupo? — ela pergunta ao cão e fico olhando para ele.
Mesmo que animais não tenham o talento de falar, eles se expressam
de alguma forma, por isso fico ansioso pela reação do meu cachorro, que eu
mal consigo cuidar direito.
O cão balança o rabo, então dá um latido e coloca a língua para fora,
como se estivesse pronto para a diversão.
— Acho que isso é um sim — Audrey diz.
— Mas é você? Quer que eu vá junto também? — pergunto com mais
expectativa ainda.
Ela arqueia as sobrancelhas em surpresa. Na verdade, deve estar
assustada por pedir permissão a ela.
Mas gosto da forma como fica quando faço perguntas inesperadas.
Audrey fica tão tímida, a pele meio avermelhada e ela tem o costume
de morder o lábio quando fica indecisa.
Fico a imaginar seus olhos revirando quando…
“Merda, não posso ter esses pensamentos agora!”
— Bem, para a sua sorte hoje vamos pegar a estrada principal. Vamos
até a segunda propriedade, o que dá uns três quilômetros de ida e volta. Vai
ser coisa rápida — explica e então olha para o céu. — Acho que vai chover,
então não é bom arriscar um caminho mais longo.
Aceno com a cabeça e começamos a caminhar lado a lado. Audrey
segura a coleira do Theo, mas sei que ele é um cachorro livre. Talvez, em
dias de chuva, ela não confie tanto assim nele sozinho.
— Então você curte praticar atividade física? — pergunto quando ela
parece bem entusiasmada ao me explicar o trajeto.
— Sim e não — responde pensativa. — Eu apenas sempre fui muito
proativa, em tudo, desde criança. Então ficar parada não é algo que curta
muito.
— Ah, entendo.
— E você? Se trouxe roupa para praticar atividade física, é porque
curte.
Maneio a cabeça enquanto penso no assunto.
— Na verdade, nem tanto. Eu gosto mesmo é de correr, mas as outras
atividades físicas… Prefiro esportes, em um geral.
— E isso não se enquadra em atividade física? — indaga
profundamente.
— Bem, se você considerar velejar, golfe e pilotar…
— São atividades físicas refinadas — emenda. — Espera, você
pilota?!
Sua surpresa exacerbada me arranca um sorriso sem graça.
Poucas pessoas conseguem isso, porque muitas delas fingem estarem
surpresas para me bajular e raríssimas fingem surpresa espontânea, como
Audrey faz na maioria das vezes comigo.
Eu acho isso muito satisfatório, pois me sinto único, especial, como
se estivesse fazendo tudo pela primeira vez. Quer dizer, como se alguém
realmente ficasse orgulhoso e interessado nas coisas que faço e ela me passa
essa sensação.
— Sim, tenho permissão para pilotar aeronaves — admito.
— Uau… — Ela parece estar muito surpresa e pergunta: — Tem
alguma coisa que você não sabe fazer?
Olho incrédulo para ela.
— Porque uma pessoa que pilota aeronaves sabe fazer praticamente
tudo! — explica e sorrio de novo.
— Não é bem assim. Eu não sei cantar, por exemplo.
Audrey solta uma risadinha anasalada e encara o chão de terra batida
por onde andamos.
Começa a cair chuviscos muito finos, então me concentrei em não
sair da nossa conversa.
— O quê? — pergunto curioso por qualquer reação dela.
— É engraçado. Você não é bom em coisas que sou excepcionalmente
ótima, modéstia à parte.
É a minha vez de ficar surpreso.
— Então você canta?
Ela me olha de um jeito convencido.
— Está olhando para uma pessoa que praticamente cresceu na igreja e
era obrigada a participar dos corais. Foi lá que descobri esse talento.
— Isso é muito interessante. Espero algum dia vê-la cantar.
— Será que posso dizer o mesmo sobre velejar ou pilotar com você?
Não há muita confiança em seu tom de voz e ela brinca, como se isso
nunca fosse possível de acontecer.
— Posso ver um dia para fazer isso. — Sinto minha pele
superaquecer com a ideia de velejar e pilotar com Audrey ao meu lado.
Quando ela me olha dessa vez, há um pouco de hesitação e
desconfiança em seu olhar.
Ela não sabe se acredita em mim.
O que a faz pensar que isso não se tornará possível?!
— Você me levaria, mesmo? — pergunta ainda desacreditada.
— Por que não levaria? Gosto da sua companhia — revelo, até
porque não gosto de esconder nada.
É como se eu fosse um garotinho ressentido.
— Mas… Por quê?
— Bem, se contar a você perde a graça.
A verdade é que ainda não consigo decifrar o que estou sentindo, mas
sei que gosto tê-la por perto.
Costumo ser um lobo solitário, não gosto de grude e nem de estar
sempre acompanhado, mas a presença de Audrey é tão tranquila que
passaria horas, dias ao seu lado. Tudo por esse momento de paz que ela me
transmite e, às vezes, vai além disso.
E é esse “além” que não consigo dizer a ela.
— Acha que vou me aproveitar disso?
— Não foi isso o que quis dizer. Mas há essências que não podem ser
desvendadas, não rapidamente.
— Entendo.
Não, acho que ela não entende, mas resolve aceitar.
— Além do mais, meu filho adora você — ressalto e isso a faz abrir
um sorriso adorável. — Você já deve ter percebido que Julian e eu não
temos uma boa relação. — Faço com que o tom da conversa mude e até
mesmo Audrey muda.
Não sei o que acontece, mas parece que ela tem uma conexão com
meu filho, como se o compreendesse ou tivesse visto qualquer coisa que
ainda não fui capaz de ver.
— Acho que isso pode ser mudado. Você só precisa se esforçar um
pouco mais. A noite do videogame não parecia que vocês tinham uma
relação ruim. Foi algo totalmente descontraído.
— Porque você estava lá. Tentei repetir a dose no final de semana,
mas não obtive sucesso — confesso me sentindo frustrado, ignorando a
chuva fraca que começa a cair. — Às vezes, acho que ele me odeia.
— Não diga isso! — ela se exaspera. — Julian quer chamar a sua
atenção, ver até onde você vai por ele e se faz de difícil por isso.
— Eu daria a minha vida pelo meu filho, Audrey — revelo, sentindo
meu coração dar um nó.
— Faça Julian perceber isso — aconselha. — Quer dizer, faça Julian
perceber que é o seu mundo.
— Como farei isso, se tudo o que faz é se afastar de mim?
— Insista. A gente só insiste naquilo que realmente amamos e vale à
pena lutar. Se quiser, eu ajudo você.
Olho para ela.
Era nesse ponto que queria chegar, mas não sabia como.
Seria muito inconveniente da minha parte e aposto que Julian se
sentiria ofendido se eu contratasse alguém especializado que ajuda pais a
lidarem com filhos adolescentes.
Só que Audrey cuida do Theo e eles ficaram próximos muito rápido.
Ele nunca desconfiaria disso, do empenho que Audrey colocaria sobre esse
assunto.
— Você faria mesmo isso? — pergunto só para ter certeza.
— Eu já estou aqui, não estou? Não me custa nada ajudar. Além do
mais, quando voltarmos, tenho certeza de que Julian já estará nos
esperando.
— Esperando vocês — enfatizo.
— Saia mais do quarto, deixe o celular de lado e as ligações. Se
concentre no aqui e agora, que ele vai ver uma brecha para deixar você
entrar, e vice-versa.
— Falando desse jeito, parece até que sou o adolescente revoltado
aqui — comento e Audrey gargalha.
A risada que adentra meus tímpanos e se instala na minha cabeça,
percorre por todo meu corpo como uma dose extra de endorfina. Minha tez
se arrepia e sorrio de volta com a sensação proporcionada, pelo contágio de
sua risada gostosa e verdadeira.
Parece uma canção, a sua voz é doce e harmônica.
Juro que quase posso ouvi-la cantar.
Bem, eu quero ouvi-la cantar.
E nesse momento de descontração, Theo dá uma guinada súbita,
puxando Audrey em um sifão. Ele late em alerta, olhando para dentro da
floresta quieta.
— O que foi, Theo? — ela pergunta.
Fico atento também, mas confiante, afinal essa área é a mais segura
de Dublin. Porém, há muitos animais silvestres por aqui.
O cão choraminga e mais uma vez se inquieta. Quando estou prestes a
assumir o controle da coleira para segurá-lo, com medo que acabe
machucando a Audrey, ele dá mais um puxão e desta vez é tão forte que ela
tropeça e o solta por um deslize, então a seguro pelo braço.
— Tudo bem? — pergunto e ela apenas balança a cabeça.
— THEO! — grita para o cachorro que já corre adentrando a mata.
Audrey faz menção de que o seguirá, mas a mantenho no lugar.
— O que está pensando em fazer? — pergunto.
— É bom irmos atrás dele! Pode ser perigoso.
— Bom, então deixe que eu faço isso.
Ela me olha de um jeito irritado e pela primeira vez, vejo seus olhos
virarem chumbo de tão duros que ficam.
— Esse é o meu trabalho, cuidar do cachorro.
— Mas estou aqui, posso ajudar. Tem algum problema nisso? —
pergunto, pois, a sua reação inesperada me incomoda.
— Eu só não gosto muito de homens me dizendo o que fazer. — Ela é
direta.
— Por causa do seu antigo trabalho? — pergunto sem receio.
Em resposta, Audrey desvia o olhar e foge do meu agarre.
— Só vamos atrás dele, tá legal? Podemos fazer isso em conjunto —
enfatiza, já indo sem medo na direção da mata.
Seja o que for, parece que Audrey não gosta muito de tocar no
assunto e não posso julgá-la por isso.
Todo mundo tem segredos e o passado às vezes é um monte de
bagunça onde você não quer que ninguém mexa.
Eu não quero mexer na bagunça dela, mas gostaria muito de entendê-
la.
Sigo Audrey para dentro da mata. Na verdade, é uma parte da floresta
que compõe toda a vegetação de Malahide. É uma área preservada, muito
bonita de ser ver, devo admitir, porém, com seus perigos iminentes, claro.
— THEO! — Audrey grita. — VEM AQUI, GAROTO!
— THEO! — Dou suporte e aproveito para assobiar, já que não tenho
tanta intimidade assim com o cão.
Talvez ele nem me obedeça, mas quero ajudar Audrey e não quero
que nenhum mal aconteça ao cachorro também.
— O que aconteceu com o seu último trabalho? — pergunto
esporadicamente, enquanto descemos a mata, não seguindo nada em
específico, apenas nos infiltrando cada vez mais para dentro da área.
— Por que você insiste tanto em saber disso?
— Porque foi onde a vi pela primeira vez.
— Bom, mas isso não faz sentido, porque meu último trabalho foi
como diarista.
— O quê? — Não posso conter a surpresa.
Jane não havia me contado sobre isso, nem mesmo Audrey, mas ela
quase não fala nada sobre sua vida.
— Sabe os Bergman, da segunda rua logo na entrada da vila?
Ela está a dois passos à minha frente e parece tão ágil em seus passos,
como se já tivesse mapeado cada parte da floresta antes, sabendo
exatamente onde pisar.
— Sim, eu sei — respondo.
— Antes de vir trabalhar aqui, eu trabalhei para eles. Na verdade, eu
trabalhava para outras famílias também, porém, mais para eles. Eu limpava
privadas, arrumava cama e escovava os rejuntes do chão. Era um trabalho
honesto, apesar da trabalheira.
— E o que aconteceu? — Fico curioso.
— Eu roubei um pote de biscoitos da casa deles — declara
simplesmente, com toda a naturalidade do mundo.
Mas eu não acredito nisso.
— Você o quê?!
— Isso mesmo. A senhora Bergman foi uma escrota comigo por
causa de um biscoito e revidei da melhor maneira que ela merecia. Não me
orgulho disso, mas quando lembro das palavras dela, não me arrependo de
nada.
— Ela não prestou queixa contra você? — Estou mais curioso do que
espantado com a revelação em si.
Audrey sorri e ainda descendo, olha para mim, por cima do ombro
para firmar:
— Não, mas espero mesmo que ela venha.
Sinto um pouco de raiva em suas palavras e de repente me vejo mais
curioso ainda para saber o que a senhora Bergman fez a ela. No entanto,
quando Audrey pisa, tenho tempo apenas de ouvir algo se partindo, ela
caindo e gritando.
— AUDREY!
Tento alcançá-la, mas ela desce rápido demais, bolando em meio as
folhagens e o meu coração falta sair pela boca. Tenho tanto medo que quase
travo, mas será pior se isso acontecer. Então, continuo correndo até ela, mas
não esperei tomar o mesmo destino.
Tropeço em algo duro e pontudo, talvez, uma pequena pedra, no
entanto, foi o suficiente para alcançar Audrey rápido demais.
Caio por cima dela e agarro meu corpo ao seu como um escudo. A
cena toda seria engraçada, se não estivéssemos correndo o risco de sair
mortos daqui, ou pelo menos desacordados.
Faço um esforço para que nossos corpos não deem de encontro com o
tronco de uma árvore que está logo no fim. Finco meus dedos na terra e isso
dói como inferno, tanto que solto um rugido.
Mas paramos.
Meu coração está acelerado a mil por hora devido ao susto. Porém, há
outra coisa que me deixa completamente louco nessa situação...
Uma Audrey sob mim, toda descabelada, suja de terra e folhas, com o
medo estampado no seu rosto angelical e o corpo completamente preso ao
meu.
Estou respirando com dificuldade e ela também, isso faz com que
seus seios fartos rocem no meu peitoral aquecido.
Nossos corpos estão bem colados e em qualquer outra situação seria
no mínimo para lá de interessante.
E está sendo.
Mas não quero parecer um louco.
Só que, porra, ela é tão gostosa e está me olhando de um jeito como
se estivesse pensando na mesma coisa que eu.
Não sobre ela, mas sobre mim.
Expectativa e desejo espreitam seu olhar.
Tenho trinta e oito anos, não tive muitos relacionamentos, mas já me
envolvi com algumas mulheres para reconhecer esse tipo de expressão
corporal. E sei que Audrey está tentando me dizer alguma coisa, ou pelo
menos, esconder.
— Cuidado onde pisa — digo por fim.
Nesse instante, a chuva engrossa, e mesmo debaixo das copas de
algumas árvores, é inevitável o banho que começamos a tomar.
Continuo em cima dela e não faço menção em sair enquanto nossos
corpos são molhados, as roupas. E mesmo com a chuva, posso sentir nossos
corpos se aquecendo.
— E-eu… — Ela tenta dizer algo.
Santo Deus, seus lábios avermelhados, sendo tocados pelas gotas da
chuva me deixam com inveja, pois queria ser eu a tocá-los.
— Cuidado, Audrey.
Mas já é tarde demais, porque me vejo sendo atraído por seus lábios
rosados e bem desenhados.
Eu me aproximo e ela não faz nada para me deter.
“Porra!”
Audrey está completamente paralisada debaixo de mim, mas de
repente sinto seu joelho se mover poucos centímetros para cima, e isso faz
com que ela roce o joelho no meu pau.
Não sei se é um acidente, mas acontece.
Eu quero tocar o seu corpo...
Quero senti-la, prová-la…
Eu quero tantas coisas...
Mas uma delas, é beijá-la.
E, para a minha surpresa, Audrey toma a iniciativa.
Seus lábios tocam os meus muito rapidamente, por três segundos, e
então se afasta, me deixando completamente em choque.
Audrey se afasta com olhinhos pidões.
Eu não sei dizer o quanto ela estava desejando isso, mas aconteceu.
Ela quer mais e com certeza darei a ela.
Eu a beijo com mais vontade e puxo seus lábios para mim, como se
estivesse puxando todo o seu fôlego. Provo seus lábios macios e gostosos,
que seria capaz de travar guerras só para senti-lo.
Percebo que ela está se entregando, que está cedendo a mim e isso me
deixa excitado pra caramba.
Quando enfio a língua dentro da sua boca e começamos uma dança
sensual em nosso beijo molhado, Audrey levanta uma perna, a direita,
envolvendo o meu corpo.
Puta merda!
Toco a lateral do seu corpo, subindo até o limite dos seus seios.
Não quero ultrapassar os limites, ou parecer um desesperado. Mas a
essa altura do campeonato, talvez ela já até esteja sentindo a protuberância
do meu pau roçando no pé da sua barriga.
Ao gemer dentro da minha boca, sinto que serei capaz de comê-la
aqui mesmo. No meio do mato.
Mas aí lembro que ela pode estar com alguma fratura, que talvez o
seu gemido seja de dor e que ela esteja me deixando chegar até aqui porque
está indefesa devido os metros abaixo que saiu rolando.
Lembrar disso me faz me sentir um idiota.
Estou sendo um idiota com ela.
Saio de cima dela rapidamente, como se tivesse levado um choque.
— Me desculpa — digo enquanto a vejo se erguer. — Você caiu e
tudo o que faço é ser um desastre também e ainda te beijar.
— Tudo bem, foi culpa minha. Eu o beijei — diz vermelha.
Eu não sei dizer se está assim devido à queda, pelo que acabou de
acontecer ou pelo constrangimento de agora.
Levanto e dou minha mão para ajudá-la.
— Você está bem?
Ela olha para o corpo.
— Sim, eu acho.
— Bom, podemos ir atrás de um médico para ver isso melhor.
— Tá tudo bem, mesmo, Jeremy. Não se preocupe com isso — frisa.
— Só vamos continuar procurando o Theo.
É um aviso discreto.
“Não vamos falar do beijo, ok?”
Acho que seria mais constrangedor.
Bem, ao menos penso ser por esse motivo.
E a forma como ela segue como se nada tivesse acontecido só revela
isso mais ainda.
E como um homem adulto que sou, apenas sigo em frente também.
Eu indagarei, mas não agora. Irei respeitar seu espaço e o seu
desconforto momentâneo. Isto é, se for a porra de algum desconforto, o que
duvido muito, pois aconteceu algo tão forte ali que ainda me vejo preso no
chão sobre ela, enquanto a beijava.
Além do mais, logo encontramos Theo.
Não encontramos a razão do que o deixou daquele jeito, mas tratamos
de voltar para a mansão porque ainda chove muito e não queríamos pegar
um resfriado com as nossas roupas molhadas.
Quando vejo Audrey subir para trocar de roupa, tenho a sensação de
ter estragado tudo.
De todas as formas possíveis.
Esmurro a parede do meu quarto, mas não com tanta força.
“Imbecil!”
Só espero que nada fique estranho entre nós dois.
Quando Theo escapou, fiquei desesperada. Imaginei que algum
animal grande e selvagem havia o atraído para dentro da floresta e depois
mesmo tentando bloquear o pensamento, não conseguia parar de imaginá-lo
machucado.
Havíamos criado um certo vínculo nas últimas semanas, antes mesmo
das férias de verão começarem.
O que me surpreendeu muito porque nunca fui tão próxima de
nenhum animal.
Jeremy estava comigo e ele parecia tão submerso na nossa conversa,
que mal conseguia acreditar que a fuga de Theo havia atrapalhado tudo.
Quer dizer, ele havia mesmo se chateado por isso?!
Por um momento foi o que pareceu.
Mas aí ele veio com todo aquele seu cavalheirismo de “Deixe que eu
vou” e minha reação pareceu assustá-lo, mas não sei se o pegou mais de
surpresa do que a mim.
Estive por tanto tempo aguentando abusos machistas naquele pub no
Temple Bar, que isso agora está de certa forma enraizado em mim.
Ter fugido para dentro da floresta e sair a procura do cachorro foi a
melhor desculpa que poderia ter para esquecer a forma como levantei a voz
na direção de Jeremy.
Aquilo era inaceitável, sem razão alguma. E ele tinha todos os
motivos para querer me mandar embora, se quisesse. No entanto, Jeremy só
mostrava mais curiosidade por mim, pela minha vida.
Ele fazia perguntas, talvez tantas quanto eu.
E confesso que é quase inacreditável que um homem do seu porte e
status veja algo interessante em mim.
Pensando bem, as vezes, acho que pode ser algum tipo de teste, só
para saber o tipo de pessoa a quem ele confia estar na mesma casa que ele e
a sua família.
Mas quando eu caí e saí rolando terra a baixo, o ouvi me chamar.
Tão desesperado!
Eu jurava que estava comendo terra e folhas, que meus joelhos
ralaram nas pedras e que alguns galhos me furaram. Por um instante, pensei
que fosse morrer, contudo, quando dei por mim, Jeremy já estava agarrado
em meu corpo e eu presa ao seu.
Quando enfim paramos, porque ele fez com que isso acontecesse,
estava respirando com muita dificuldade e sentia meu corpo completamente
dolorido.
Eu não seria capaz de mover um centímetro do meu corpo. Mas
parecia haver uma exceção.
Aquele homem em cima de mim, não facilitava nada. Seu peso contra
o meu corpo era excitante, assim com seu cheiro misturado a sua presença e
toda a energia naquele momento me deixava completamente tonta,
embriagada, fora de mim.
— Cuidado, Audrey — ele disse.
Eu podia ouvir a sua voz como um canto de feitiço, o seu olhar
penetrante em mim, como se quisesse ir além do que se via.
Eu só podia estar maluca quando decidi que deveria beijá-lo!
Só que o mais louco de tudo foi ele ter correspondido e me tocado.
Pela primeira vez, um homem havia me tocado e eu tinha gostado.
Bom, eu gemi, quando ele segurou meu seio e senti que de repente eu
queria sua boca ali.
Não sei o que deu na minha cabeça e quero batê-la contra a parede
por isso.
Me pergunto se tudo aquilo, por algum segundo, pareceu uma
tentativa minha de seduzir o Jeremy.
Por mais que estivesse de alguma forma enfeitiçada e surpresa por
sentir as coisas que ele me fez sentir, eu sabia que tudo aquilo era errado.
Eu o beijei e tenho fugido deste acontecimento como quem sonega o
imposto. E nem sei o que é pior, tê-lo beijado e gostado, ou se foi como
senti a sua ereção roçar contra mim, e em resposta, o meu joelho tocá-lo em
um movimento ímpeto.
Fiquei vermelha de vergonha!
Eu mal conseguia olhá-lo!
No final, saí com a desculpa de que deveria, e tinha mesmo, que
encontrar Theo.
Mas depois que o encontrei, apenas perambulando pela floresta,
completamente perdido, voltamos para a mansão.
Eu ignorava a dor no meu corpo e os machucados conquistados,
assim como ignorei os olhares curiosos e de surpresa de alguns funcionários
quando passei por eles toda suja de terra e folhagem, o cabelo uma bagunça,
e a postura de quem é culpada.
Eu sabia que Jeremy vinha logo atrás de mim.
Na verdade, ele nem se importou se vinha da mesma direção que eu,
com o mesmo aspecto visual e com seus funcionários testemunhando tudo.
Apenas deixei o cachorro no quarto de hóspedes que foi designado
para mim, e me tranquei com as minhas coisas que trago todos os dias em
uma mochila.
Peguei uma toalha e o sequei, tirando o excesso de água do seu pelo.
Tomo um banho e fico debaixo do chuveiro por uns bons minutos
enquanto penso em tudo o que aconteceu, revivendo cada momento.
O meu corpo parece ser a minha última preocupação.
Bom, não há nenhuma dor estranha que ganhe a minha atenção mais
do que o inesperado beijo em Jeremy O’Donnell, CEO e rico pra caramba.
Além de lindo, lindo!
Tão lindo que parece ter saído de uma novela.
E aquele volume marcado na calça…
Nossa!
Ele estava tão duro!
Lembro que o núcleo, no meio das minhas pernas, pegou fogo no
mesmo instante, mas algo travou dentro de mim, surpresa demais com todas
as reações físicas que demonstrei naquele momento.
Como olharei para ele agora?
Será que Julian perceberá que algo estranho aconteceu?
Que droga, como me odeio por ter feito o que fiz!
De repente, ouço batidas à porta e me agarro a toalha enrolada no
meu corpo, pensando ser ele.
— Audrey?
É Jane e nem sei o que sentir em relação a isso.
Mas eu deveria estar aliviada, não deveria?
— Sim?
— Querida, vista-se que o médico já está a caminho.
Médico?
— Você está bem? — ela pergunta.
— Sim, eu estou — respondo me olhando no espelho.
Aparentemente não há nenhum machucado grave evidente.
— Bom, o senhor Jeremy disse que você caiu feio, então é bom ser
avaliada por um médico. Ele já está a caminho.
Fico sem me mover por alguns segundos.
Não sei o que isso significa, nem sei se estou tão ruim assim ao ponto
de ser avaliada por um médico.
Mesmo assim, Jeremy achou que seria necessário.
Bom, ele está certo, afinal isso pode ser classificado como um
acidente de trabalho, já que estou em horário de serviço.
Mas a culpa foi completamente minha, por ter sido tão desatenta.
Procuro na minha bolsa a muda de roupa que sempre trago para vestir
depois das caminhadas matinais com o Theo. Coloco um short e uma regata
de babados, pois, a chuva fraca que cai é acompanhada pelos raios de sol.
Não está nublado, é a famosa chuva de verão.
Depois que escovo o cabelo, saio do quarto e espero. Fico sentadinha
na cama com o Theo, como uma menininha que aprontou uma e agora só
espera o momento da bronca.
No entanto, primeiro a advertência vem acompanhada de um médico.
O homem todo de branco entra no quarto quando Jeremy abre a porta.
Eu só consigo ter olhos para ele, mas tento disfarçar.
Ele já está de banho tomado, veste jeans e uma blusa de mangas
curtas.
Não sei o porquê ainda me surpreendo em não o ver de terno e
gravata.
— Então você é a moça que caiu em uma cena dramática dentro da
floresta? — o médico pergunta com um sorriso no rosto.
Cena dramática?!
Olho dele para Jeremy depois olho para o médico de novo, soltando
um pigarreio.
— Eu pisei em falso.
“Está mais para, caí nos lábios do CEO!”
Ele se posiciona na minha frente e ficou me olhando de baixo para
cima, como se eu fosse algum tipo de exposição. Em resposta, me encolho,
afinal não gosto de homens me olhando desse jeito, principalmente
estranhos, mesmo que seja por termos de saúde.
Mas, ironicamente, não me sinto assim quando flagro Jeremy me
secando com os olhos.
— Na maioria dos casos, pisar em falso causa uma torção de
tornozelo muito séria — o médico avisa.
— Não sinto que seja o meu caso. Estou bem, é sério. A minha roupa
me impediu que tivesse qualquer arranhão e lembrei de proteger a cabeça
na hora.
Jeremy me olha desconfiado.
— Bom, de qualquer forma, é bom testarmos todas as possibilidades
— o médico informa.
— Ok.
Ele pega um dos bancos do conjunto do divã, se senta de frente para
mim e pede para que eu faça alguns movimentos com as pernas, cada uma
delas por vez.
Preciso fazer sentada e em pé.
Jeremy fica parado no canto, observando tudo como um
acompanhante atento e preocupado.
Ele me vigia como um cão de guarda.
Seus olhos não saem de mim, parece estar muito focado em todos os
meus movimentos e atento a tudo o que o médico diz a respeito do que vê
em mim.
— Ela parece estar bem mesmo — conclui por fim.
Dou um sorrisinho.
— Já estou acostumada a levar tombos — comento e sinto que eles
ficam me olhando de jeito curioso. — Metaforicamente falando, sabe? Eu
realmente não sou tão desastrada assim.
— Mas peço que tome cuidado, senhorita — o médico diz enquanto
se levanta, segurando a sua malinha com os seus utensílios médicos. —
Outra queda e não sei se seu corpo irá resistir. Somos como o tronco forte
de uma árvore, no primeiro momento podemos não ceder, mas depois se
perde algumas lascas. Seu pé pode ter se safado, mas receio que outra
pisada em falso e a coisa realmente fique feia.
Olho incrédula para ele e sinto que Jeremy também fica tenso no
canto do quarto.
Por que ele se importa tanto?
— Tudo bem, não costumo ser muito imprudente assim — saliento.
— Ótimo. Bom, acho que isso é tudo — o médico diz mais para
Jeremy do que para mim.
— Obrigado, doutor. Estaremos por aqui nas férias de verão —
Jeremy informa sendo todo cortês.
— Que legal, senhor Jeremy. Espero de verdade que o senhor não
volte a me ligar, se é que me entende. Espero que não aconteça nada — o
homem brinca. — Mas, qualquer coisa, sabe como me encontrar. Até mais,
senhorita.
— Obrigada, tchau. — Aceno para ele e dou um sorrisinho.
Jane surge no quarto, pelo jeito estava esperando no corredor e disse
que acompanharia o médico até a saída. Jeremy permanece, me sento de
volta na beira da cama e seguro com firmeza à beira porque estou nervosa
demais. Se ficar em pé, será capaz dele ver as minhas pernas tremerem e já
estou tensa demais com tudo isso.
Para completar, Jeremy fecha a porta do quarto, então encosta as
costas nela e enfia as mãos nos bolsos enquanto me olha atentamente. Sinto
a minha boca seca, mas parece que seu toque ainda queima meu corpo e o
seu beijo parece um peso constante contra meus lábios.
Passo a língua no meu lábio inferior e o mordo.
— Eu nem perguntei se você estava bem — digo tomando a iniciativa
para quebrar o silêncio, para a minha surpresa. — Está tudo bem?
— Já estou acostumado a levar tombos também, Audrey. Mas estou
bem — ele enfatiza.
Seu olhar está firme e as palavras tão seguras quanto as minhas.
— Tive medo de que tivesse se machucado, a queda foi muito feia.
— Causando uma cena dramática — repito o que o médico disse e
Jeremy dá um sorrisinho de lado.
— Foi digno de filme, o que me preocupou mais ainda.
Abaixo o olhar e sinto meu rosto esquentar.
— E você não riu em nenhum momento de mim?
Ele franze o cenho.
— Por que teria rido de você, Audrey?
Dou de ombros e um silêncio se forma de novo.
Desvio o olhar muito rápido do seu, pois, não consigo olhá-lo por
tempo demais, porque sei onde minha mente me levará. Olho para o chão,
afinal não posso me fazer de boba agora.
— Quero pedir desculpas pelo meu comportamento, Jeremy. —
Procuro seus olhos, para que ele saiba que é real. — Eu não deveria ter feito
o que fiz.
Seus olhos escuros se estreitam para mim, confusos.
— O que você fez, Audrey?
Fico tão surpresa que sorrio nervosa.
— E-eu… Nós… Você sabe…
Jeremy toma distância da porta e começa a andar na minha direção,
com as mãos enfiadas nos bolsos da calça.
Mas posso muito bem visualizar um leão vindo em minha direção, um
líder nato, um rei, capaz de intimidar qualquer predador.
Só que não sou uma predadora, sou facilmente uma presa. Um
cordeiro que Jeremy teria facilmente em suas garras, em seus dentes, em
sua língua…
— Quero que me diga em voz alta.
Não, na verdade, isso está mais para uma ordem.
Ele está parado diante de mim, onde posso olhar para ele aqui de
baixo, parecendo uma submissa.
Aperto as coxas uma contra a outra e evito olhar para a sua calça,
mesmo lembrando o momento tão inadequado de como senti seu membro
tão duro.
Rapidamente abaixo a cabeça quando sinto que estou ruborizando.
Droga, odeio abaixar a cabeça pra homem!
Mas não sei o que está acontecendo comigo nesse momento.
Será que é porque isso tudo é tão errado?
— Quer que a situação toda fique mais constrangedora ainda para
mim? — pergunto de volta.
— Constrangedora? — repete como se não soubesse o significado da
palavra.
Bato as mãos sobre minhas pernas e me levanto no mesmo instante.
Ele não se move, o que faz com que a distância entre nós dois seja mínima.
— Eu me arrependo do que fiz, Jeremy. Não sei qual motivo me fez
beijar você.
— Você me beijou porque queria — ele frisa, para a minha surpresa,
porque pelo modo que diz, não parece estar zangado, como imaginei que
ficaria com toda a situação embaraçosa. — Somos dois adultos, Audrey.
Não vou agir feito um menino covarde e negar o que aconteceu naquele
momento. Você sentiu e eu senti. Você quis e eu quis. Deu no que deu.
Agora vem me dizer que está arrependida?
Fico paralisada, e agora, simplesmente não consigo desviar o olhar do
dele, porque Jeremy é capaz de me surpreender cada vez mais, destruindo
todo o estereótipo que inventei na minha cabeça de que gente rica não
presta e que homens de terno e gravata gostam de se aproveitar do poder
visual.
Pisco várias vezes antes de responder, preocupada com as
consequências que pensei que aquilo teria:
— Eu só não quero que uma atitude impulsiva minha resulte em algo
que não me agrade.
— Não vou demitir você só porque me beijou — ele assegura em um
tom tranquilo. — Foi só um beijo, certo?
Eu o encaro profundamente.
Um homem desses deve ter todo tipo de mulher aos seus pés. Deve
ter tantas e já levou todo tipo para casa que quando beija uma mulher,
parece que fez apenas um cumprimento de mão.
Fico com essa impressão.
No entanto, Jeremy não me parece ser esse homem que estou a
pensar, afinal já teve uma mulher que faleceu durante o parto.
Jeremy é tão maduro, já passou por tanta coisa, que um beijo pode ser
considerado o menor dos seus problemas.
Mas a sua expressão corporal é o meu álibi.
Jeremy pode dizer o que quiser, mas o seu corpo jamais, jamais
negará.
Então não, não foi só um beijo.
Como ele mesmo disse, eu senti e ele sentiu.
Mas, sentimos o quê?
Desejo?
Atração?
Isso é tão humano quanto cair!
Mas, não pelo homem que tem meus serviços. Não para alguém tão
diferente dele como eu.
Ainda assim, balanço a cabeça e digo:
— Sim, foi apenas um beijo.
Jeremy fica me olhando por um longo tempo, como se ele não
acreditasse nas minhas palavras. Até que estala a língua no céu da boca e
adverte:
— Escute, Audrey. Eu também agi, você não foi a única, então não se
culpe. A menos que tenha sido ruim demais. Foi ruim para você?
Sinto minhas bochechas virarem duas labaredas de tanto que elas
aquecem. Movo a boca, mas não consigo formular uma resposta.
Jeremy pode ter toda postura de um príncipe, um homem com modos
e princípios. No entanto, vejo um brilho de diversão espreitar em seu olhar,
como se ele estivesse se divertindo com o meu estado atual. Não por
maldade, talvez, porque ele me ache muito inocente, ou inexperiente
demais.
Bom, aqui vai uma curiosidade sobre mim, posso ser nova ainda com
meus vinte e dois anos, mas já vivi muita coisa.
Sou inexperiente, sim, com essa coisa de sedução e tudo mais, mas sei
como ficar na defensiva com homens que tentam de alguma forma chamar a
minha atenção.
E é isso o que Jeremy quer.
Por mais que ele não precise de esforço algum para isso, lá está ele
me fazendo esse tipo de pergunta para descobrir algo que, se ele for
inteligente de fato, já percebeu.
Cruzo os braços e pergunto de volta:
— Sabe, você só quer saber o que senti, ou como me sinto em relação
ao que aconteceu, mas não fala muito sobre o que você acha. Então, me
diga, foi ruim para você?
Desta vez, sinto que a pessoa a ficar sem reação é ele, mas de um jeito
charmoso. Ele não fica envergonhado ou intimidado, mas surpreso.
Talvez, com o meu posicionamento, suponho.
— Não, não foi, Audrey — ele quase sibila as palavras,
corajosamente e ainda emenda: — Depois de rolar na terra com você,
aquilo não poderia ter terminado de forma melhor. Com um beijo.
— Poderia ter terminado de muitos jeitos.
— Sim, mas eu gostei desse.
Meu coração bate tão forte que tenho medo dele perceber.
— Por que diz isso? Parece até que está flertando comigo.
— Mas, e se eu estiver? Faz tempo que não faço isso, então, não sei
se estou fazendo do modo certo, me desculpa. Porém, é uma forma de dizer
que acho você muito atraente, Audrey. Desde quando vi você naquela noite
no bar, tão chateada com alguma coisa.
“Meu Deus! Meu Deus! Meu Deus!”
Isso está mesmo acontecendo?
Jeremy então deixa de me olhar e encara seus pés ao admitir:
— Sabe, quando se tem uma rotina programada, de repente acontece
uma coisa que muda tudo e você passa a pensar naquilo como se fosse a
coisa mais incrível que aconteceu a você? Foi isso o que senti. Eu não
consegui parar de pensar em você pelos malditos meses que seguiram,
Audrey. Eu fui até o pub várias vezes na esperança de encontrá-la, mesmo
depois de descobrir que você não trabalhava mais ali. E agora você está
aqui.
É como entrar em uma dessas histórias que a gente vê nos filmes.
Mas Jeremy não parece estar apaixonado, talvez, ele esteja só feliz em me
reencontrar, animado o suficiente para considerar o beijo algo ingênuo da
minha parte e da dele também.
Mas, droga, por que estou em tanta negação?!
Por que simplesmente não consigo aceitar que isso pode ser real?
Bom, no final das contas, acho que isso é simples de saber.
Jeremy então finaliza, esticando a mão até meu rosto, onde acaricia
gentilmente com o seu polegar na minha bochecha e diz:
— Isso tudo é para dizer a você que estou feliz que esteja aqui,
Audrey. Não porque quero flertar com você, porque eu não quero. Flertar é
coisa de menino. Quando quero algo, pego para mim e faço minha
propriedade. Não fico fazendo joguinhos. De qualquer forma, estou feliz
que seja você.
Fico olhando para ele sem acreditar no que escutei.
O ar arde em meus pulmões, ao mesmo tempo que sinto uma
hiperventilação acontecendo dentro de mim.
Jeremy conseguiu uma coisa que homem nenhum foi capaz de causar:
a minha mais pura atenção e carinho, daquela que você sente e abraça.
Suas palavras parecem tão reais, que tudo o que mais quero agora é
abraçá-lo porque faz tempo que não me sinto tão importante assim.
Independente da conotação que isso tem, gosto de ser importante para
alguém, gosto da sensação de ter marcado a vida de alguém de forma
positiva.
Ele para de fazer carinho em mim e ficou esperando alguma reação.
As palavras de Jeremy são sucintas, ele não vai hesitar, ele não vai
fazer enrolações quando for acontecer o que aconteceu mais cedo e isso me
deixa empolgada por dentro.
Mas juro que estou tentando fingir o máximo de costume possível.
— Vamos, diga alguma coisa — diz um pouco preocupado.
— E-eu… Não sei, me desculpa. Acho que você me deixou sem
reação. Eu não esperava por isso.
Ele dá um sorrisinho adorável desses que acentuam o seu maxilar e só
deixa mais bonita ainda a sua barba.
— Tudo bem, só precisava dizer isso, senão ia acabar explodindo.
Espero que não se assuste com a minha sinceridade. Não sou muito de me
expressar e quando faço isso, é como se fosse um trem desgovernado.
Balanço a cabeça, pisco várias vezes e suspiro profundamente.
— Eu só não esperava mesmo que fosse tudo isso. Talvez uma
lembrança, porque você lembrou de mim. Mas essas coisas que você me
falou agora… E agora? O que acontece?
Ele dá de ombros.
— Agora você continua por aqui, trabalhando, sendo uma companhia
adorável no verão. Pretendo conhecer mais de você, Audrey. Não importa o
que isso significa, quero apenas que continue aqui, o tempo que for. Julian e
eu precisamos de você.
Abro um sorriso e meu coração fica tão aquecido, tão leve, que acho
que irei chorar de felicidade pelas suas doces palavras no final. Porque
ninguém, além da minha própria mãe, foi capaz de demonstrar tanto
interesse assim por mim.
Nesse instante, eu me sinto importante.
De fato, me aproximei demais de Julian. Mas, Jeremy…
É como se ele tentasse descobrir a razão da minha existência em sua
vida.
E não vou mentir, gosto muito disso.
— Obrigada por isso, Jeremy. Está tudo bem, de verdade — digo, o
tranquilizando sobre tudo.
— Ok, então. — Ele assente com a cabeça e por um momento parece
meio deslocado, sem saber o que fazer ou dizer. Então começa a se
movimentar: — Irei deixá-la descansando. Você precisa disso, não é?
— Eu tenho que trabalhar.
— Não se preocupe. Julian já acordou, ele ficará com Theo.
Não gosto muito de ficar impossibilitada de trabalhar. Além do mais,
já estou aqui, e bem, não custa nada exercer a minha função.
Mas não posso evitar o fato de que caí e sai rolando na terra íngreme
daquela floresta.
Eu preciso de um descanso, sim.
— Obrigada, Jeremy — agradeço de novo.
Ele sai do quarto e me dá mais uma olhada, é como se ele não
quisesse partir, ou esperasse algum convite para ficar.
Tenho que confessar que me sinto tentada a isso, mas não posso me
dar ao luxo. Mesmo com todas as suas palavras, não posso ceder de novo,
ou então parecerei uma desesperada.
E desesperada não estou.
Só um pouco curiosa…
Interessada nos beijos de Jeremy e o que aqueles lábios macios são
capazes de fazer.
Ainda não sei se fiz a coisa certa. Definitivamente, não era o certo a
se fazer, mas as consequências disso me deixa um pouco assustado.
Até agora não senti que Audrey tenha ficado totalmente estranha
comigo, mas os olhares, a energia que fica quando estamos perto ou no
mesmo cômodo…
Isso é inegável!
E por mais que eu confesse gostar...
Porra, como eu gosto da sensação!
Não posso deixar que outras pessoas percebam isso. Não quero que
pareça ser inadequado, não quero meus funcionários olhando torto para
mim.
Meus irmãos…
Droga, o que os meus irmãos dirão?!
Ian e Noah são muitos bons em observar e notariam logo, logo.
Por isso, talvez precise evitar, mas não quero.
Só que sou um homem que sabe assumir os danos e compromissos. A
verdade é que não devo e não quero me esconder feito um covarde. Tenho
que arregaçar as mangas e agir. Aliás, tenho um filho adolescente para lidar
e Julian é a minha principal responsabilidade aqui.
Devo focar mais nisso e por isso decido recomeçar.
— JULIAN, ACORDA! — grito enquanto bato à porta do quarto do
meu filho. — Você tem cinco minutos pra descer e vir tomar o café da
manhã. Temos muita coisa a fazer!
Ele resmunga e desço.
Meu filho pode estar chateado, mas ele não é desobediente. Educação
nunca faltou a ele. Às vezes, ele pode parecer um menino rebelde, mas sabe
reconhecer o seu lugar e o dos mais velhos.
Vou para a mesa do café da manhã que como sempre está um
espetáculo.
Jane sabe mesmo como tornar a manhã de alguém especialmente
incrível só pela forma como prepara a mesa.
Não demora muito, Julian aparece, de pijama, cabelo bagunçado, com
a cara amassada e de poucos amigos por ter sido acordado no melhor do
sono.
— Bom dia — digo.
— Bom dia — ele responde e sua animação é contagiante, para não
dizer o contrário.
— Achei que no internato vocês tinham o hábito de acordar cedo —
comento.
— É por isso que tenho dormido até tarde — responde e se senta.
— É, faz sentido. Vamos, alimente-se bem. Temos um longo dia pela
frente. — Tento transparecer entusiasmo.
— Temos? — pergunta indiferente.
Dou um gole no meu café puro, capaz de deixar acordado até um
cavalo por mais de quarenta e duas horas.
— Fiz planos para nós dois hoje. Golfe. O que acha?
— Parece chato.
Dou um sorriso de lado.
— É, eu pensava a mesma coisa quando tinha a sua idade e o seu avô
tentava me arrastar para os campos de golfe.
— Então, por que não fazemos outra coisa?
Por mais que isso expresse o seu desinteresse nos meus planos, não
me deixa chateado, porque ainda assim, Julian gostaria de fazer algo.
E não diria não a ele, pois é um jeito de recomeçarmos.
— Tudo bem, o que você tem em mente? Sou todo ouvidos.
Subitamente a sua postura muda e é como se ele tivesse finalmente
acordado.
Apesar de já ter catorze anos, vejo nele o ânimo genuíno daquele
garotinho de oito anos que ainda se divertia com tudo.
— Vamos para a praia. O tio Ian e o tio Noah chegam hoje, não é?
Podemos todos ir à praia.
— Seus tios chegam hoje?! — Fico incrédulo, pois não sabia dessa
informação e ela me pegou de jeito.
— Dizendo o tio Ian. Ele me ligou ontem.
— Que traíras! Não fiquei sabendo de nada. Se era surpresa, você
acabou de estragar tudo.
Ele ri e começa a mexer nos ovos mexidos que Jane preparou para
ele.
— Não era surpresa, mas o tio Ian disse que o senhor dorme cedo,
então achou melhor contar a notícia para mim.
— E que horas eles chegam? — Ainda estou bastante surpreso.
Meus irmãos...
A chegada deles aqui muda tudo, de um jeito mais desesperador e
impossível, porque logo sei a que tipo de situação estarei fadado com eles.
— Daqui duas horas.
Olho no relógio.
Às dez?
Bom, pelo menos dá tempo de ir à praia, almoçar no melhor
restaurante à beira mar e então voltar para casa.
— Eu sei que seus tios vão topar. Eles topam tudo.
— Vamos chamar a Audrey também — Julian sugere subitamente e
meu corpo gela.
— Audrey? Por quê? — pergunto tentando não demonstrar a minha
súbita mudança de postura, como se tivesse sido atado.
— Porque vamos levar o Theo e ele gosta dela. Será divertido
bagunçar na areia com o Theo e a Audrey por perto. Além do mais, talvez a
noiva do titio Noah goste dela e as duas façam amizade. Assim, Meredith
não ficará sozinha.
Puta merda, o garoto é um gênio!
Modéstia à parte, tinha que ser o meu filho.
Ele já pensou em tudo, e, para ser sincero, acabou ajudando a minha
vida ao facilitar uma forma de Audrey estar por perto, sem que eu pareça a
merda de um pervertido.
— Que sorriso é esse? — Julian pergunta todo desconfiado.
Só então me dou conta de que estou sorrindo feito um idiota.
Que merda está acontecendo comigo?
Ok, talvez a situação tenha me agradado, mas isso me deixa surpreso
de qualquer forma.
— Estava aqui pensando em como você é parecido comigo. — O que
é verdade e me deixava de certa forma orgulhoso, afinal não tenho nenhum
histórico ruim na minha vida, a não ser toda fofoca que circulou ao meu
respeito quando fiquei viúvo. — Pensa à frente e rápido, nos detalhes, prós
e contras. Isso é muito bom e será seu verdadeiro aliado na sua vida
profissional.
— Mas não quero ser um CEO.
— Tudo bem, não é a sua obrigação muito menos uma herança de
família que você precisa carregar, se não quiser. — Apoio os cotovelos
sobre a mesa e entrelaço os dedos em frente ao rosto, uma postura frequente
que costumo adotar nas salas de reuniões na hora de ouvir acionistas ou a
equipe da empresa. — Mas se você não quer estar no ramo dos negócios, o
que vai querer?
— Eu ainda não sei. Já deveria saber?
Observo que apesar de perguntar, ele não parece estar muito
preocupado.
— Quanto antes saber, melhor. Mas você tem a vida toda pra isso. O
seu tio Ian é um exemplo. Ele queria ser um rockstar, teve até uma banda na
adolescência, mas sempre foi muito bom em TI. Então, resolveu levar as
suas habilidades e conhecimentos para o ramo profissional.
— Não quero uma banda, não quero mexer com computador e muito
menos ser empresário — meu filho frisa.
— Ótimo, seja o que você quiser, desde que seja uma pessoa do bem.
A minha maior preocupação como pai é que você seja uma boa pessoa,
Julian.
Ele me dá um sorriso acanhado, mas não entendo o que isso quer
dizer.
E quando ele está prestes a me revelar, Theo late e entra. Em seu
encalço vem Audrey, cansada, usando a roupa de exercício físico. Desta
vez, está com um short frouxo que revela suas pernas brancas e lisinhas.
Desvio o olhar, mas não posso evitar o pensamento dos meus dedos
percorrendo aqueles longos centímetros, que ainda assim não a torna uma
pessoa muito alta.
— Ah, bom dia. — Ela parece estar meio sem jeito e já sabia o
porquê.
— Você não tinha se acidentado ontem? — Julian é direto.
Confesso que também fico me perguntando a mesma coisa quando
vejo que ela está voltando de mais uma caminhada matinal.
— E bom dia — Julian completa.
— Bom dia, Audrey. — É a minha vez de falar. Adoto uma postura
mais rígida, pois quero mostrar a ela que está tudo “normal”. — Achei que
o médico tinha dito para evitar esforços nos pés.
— Só estávamos caminhando pela propriedade, nada de mais — ela
explica, mantendo os braços para trás em uma postura formal, como se
soubesse que foi uma menina muito desobediente.
“Hummmm, interessante!”
— Acho que teria rido muito se visse, desculpa. Ainda bem que não
estava lá — Julian diz, rindo.
— Ela caiu, poderia ter se machucado muito feio e não tem nenhuma
graça nisso — digo.
— Calma, pai. Eu sei. A Audrey sabe que estou brincando também.
Olho para os dois e vejo que ela faz uma cara engraçada para ele,
como se desaprovasse e estivesse segurando uma risada ao mesmo tempo.
O quão amigos eles já estão?
Porra, é até irônico que meu filho já conquistou uma relação que eu
terei de ralar muito para conseguir.
Mas ele não tem a mesma posição que eu.
Eu sou o chefe, é natural que patrão e funcionário não se misture, não
fiquem amigos e troquem segredos. Mas, por um momento, achei que tinha
deixado isso claro na conversa que tive com Audrey depois que o médico
saiu.
— Aí, Audrey? Gostaria de ir para a praia com a gente mais tarde? —
Julian logo muda de assunto.
Seu olhar vem diretamente para mim, e, por um segundo, me vejo
sem reação.
Não esperava que ela fosse recorrer a mim.
— Meus irmãos chegam hoje e Julian quer dar uma passeada com a
família toda reunida.
— E-eu…
— Vamos! Diz que sim! — Julian insiste.
— Eu nem tenho roupa de praia aqui comigo — ela explica.
Julian me olha, como se pedisse silenciosamente para que eu fizesse
alguma coisa.
— O nosso motorista leva você até a sua casa para pegar o que
precisa, não se preocupe.
— Obrigada. Então, teria de fazer isso agora?
— Acho melhor. Logo mais meus irmãos estarão aqui e creio que
então não perderemos um minuto a mais.
— Ok. Eu vou… — Ela parece um pouco perdida.
— Theo! — Julian chama o cão para ajudar. — Pode ir lá, Audrey.
Ela dá um sorriso animado e então a vejo saindo, mas ainda assim o
seu rastro fica. A sua presença é tão tangível, que mesmo quando não está
mais aqui, ainda é fresca como uma tinta.
Igual à manhã de uma primavera.
Com o olhar distante e Julian concentrado em fazer carinho no
cachorro, penso alto:
— Você gosta da Audrey, Julian?
— Gosto, ela é legal e cuida bem do Theo. — Uma resposta bem
genuína, eu diria. — Mas, por que a pergunta?
— Nada. — Dou de ombros, mas ouço uma risadinha dele.
— Está com ciúmes porque me dei bem com ela e o senhor não?
Olho então abismado para meu filho e um pouco nervoso também
porque por isso não esperava.
— Que conversa é essa, Julian? — Tento me esquivar.
— Por que seria importante saber se eu gosto dela? Ela poderia muito
bem ser a minha irmã, ou a minha professora de artes, sei lá.
— Não foi com essa conotação a razão da minha pergunta, menino!
Só então percebo que meu filho já pode conversar sobre garotas
comigo, porque ele já tem idade para namorar se quiser.
Mas essa situação acaba tomando um rumo curioso.
Eu não queria saber se ele gostava de Audrey amorosamente, isso era
impossível e um crime.
Mas, de repente, acho interessante perguntar, porque estou curioso
com ela e desde que Julian nasceu, nunca apresentei uma namorada a ele
porque um; nunca tive uma depois da mãe dele e dois; as mulheres com
quem fiquei não passaram para essa fase, onde a introduzia na minha
família.
Mas Audrey já está aqui e parece ser ótimo que meu filho goste da
mulher que não tenho parado de pensar nos últimos meses.
Não vou negar que isso já parece o estopim para eu fantasiar
momentos com Audrey. E que já ser aceita pelo meu filho mudaria tudo,
principalmente me deixaria mais confortável e seguro para me envolver, se
ela quisesse.
Que droga, aqui estou pensando de novo sobre isso!
Nunca levei meus pensamentos tão adiante assim, confesso.
— Pai, vejo o modo como o senhor olha pra ela. — Julian é direto e
juro que sinto meu café da manhã querer voltar.
Meu filho me olha como se eu fosse bobo e ingênuo.
— Está interessado na Audrey.
Suspiro fortemente e arqueio uma sobrancelha. Penso em voltar para
o meu café da manhã, mas de repente nem consigo mais comer.
Um garoto de catorze anos acabou de desmascarar e isso me deixa
incomodado, mas não menos surpreso e orgulhoso.
Julian é um O’Donnell nato!
Tomo um gole longo do meu café antes de resolver contar a verdade
para ele, mas de um jeito discreto.
— Tem razão, acho Audrey uma menina interessante. Você sabia que
a conheci há muito tempo?
— Sério?! — Seus olhos chegam a brilhar.
Sim, é isso mesmo, Julian e eu estamos tendo a nossa primeira
conversa longa há anos.
— Ela trabalhava em um pubzinho no Temple Bar, estava chovendo
muito e o turno dela estava acabando. Ela estava zangada por algum
motivo. Conversamos um pouco, ofereci carona e ela não aceitou, mas a
segui só para ter certeza de que chegaria bem, afinal estava muito tarde.
— E depois?
Dou de ombros.
— Nunca mais a vi, até vir pra cá. Mas é legal saber que ela está bem
agora, em um trabalho seguro.
— O senhor se importa.
— Eu me importo com todos os meus funcionários — saliento e volto
a minha atenção para o meu café da manhã.
Talvez, se Julian me ver comendo, ele pare de fazer perguntas que me
comprometam, ou que revelem demais.
Ele parece entender isso e aceitar o que eu disse.
Além do mais, pode ter sido apenas um delírio meu, mas acho que o
vi ficar desanimado, como se não tivesse ouvido o tipo de resposta que
esperava.
Que droga, o que ele está querendo insinuar com isso?
Eu até perguntaria, mas acho que sobre este assunto chegamos no
nosso limite.
Terminamos o café da manhã e Julian volta para o quarto.
Estou orgulhoso do nosso avanço, da nossa conversa matinal, em
como percebi que sou capaz de decifrar meu filho e em como ele me
conhece também, mesmo tendo pouco contato durante os anos.
Poucas horas mais tarde, meus irmãos chegam, Ian e Noah com
Meredith e Liam, que fez um ano há pouco tempo.
Eu os recebo na porta da mansão, de braços cruzados, lançando a eles
um olhar de poucos amigos. Até mesmo o nosso pai, acamado, sabia disso
mais do que eu, que meus irmãos resolveram antecipar a vinda deles para a
mansão.
Ian é o primeiro a subir.
Cínico!
— Qual o problema, Jeremy? Caiu da cama hoje? O leite do seu café
estava azedo?
— Desde quando eu durmo cedo, Ian? — pergunto de volta.
— Ah, só queríamos fazer surpresa. Passar o verão em família, sabe?
Até porque essa é a única forma de aproveitarmos o verão sem que tudo
fique uma correria depois — meu irmão mais novo explica.
Atrás dele, Noah vem subindo com uma bolsa amarela, que suspeito
ser do filho.
— Caramba, Noah! Por que vocês não trouxeram uma babá? — Ian
pergunta ao ver o nosso irmão subir com as coisas de Liam.
Noah nos olha, incrédulo.
— Julian disse que já tinha uma babá aqui — Noah diz.
— O quê?! — exaspero.
— O pirralho disse exatamente isso — Noah completa.
Paro para assimilar por um segundo.
Audrey...
— Temos uma pessoa que cuida do cachorro e ela não é babá.
Ian ri e diz:
— Ah, mas seria interessante.
— Cala a boca, seu idiota! — Noah resmunga para Ian, que é um
cretino de primeira com suas provocações.
E confesso, o tipo de coisa que Julian fez, lembra muito o tipo de
coisa que Ian normalmente faria, ou fez muito em sua adolescência.
— O que vocês já estão praguejando aí? Mal chegamos — Meredith
diz conforme sobe com o meu sobrinho nos braços.
O menino está crescendo muito rápido, começou a andar com onze
meses e vem se mostrando ser um bebê muito esperto.
Eu não poupo tempo e abraço os dois ao mesmo tempo.
Minha grande e velha amiga, Meredith, que quando me matava de
estudar na biblioteca para o meu mestrado, ela estava trabalhando e ralando
como universitária.
Bem, Noah já pode me agradecer por tê-la apresentado a ele, e então
ter formado a sua linda família do jeito que ele sempre sonhou.
— É bom ver você. Como Noah tem se saído?
Os dois estão noivos e vem se planejando para o casamento na
próxima primavera.
— Um excelente noivo e pai. Não há nada do que reclamar — ela
responde e é perceptível a sua felicidade.
— Sendo assim fico mais aliviado — digo e Noah revira os olhos.
— Como se eu desse motivos para se preocupar. Eu já dei trabalho,
mas hoje não dou mais. Sou pai de família e um futuro esposo exemplar.
Espero que vocês me deem orgulho quando for a vez de vocês, viu? — ele
zomba e Meredith suspira, como se já estivesse acostumada com a
arrogância narcisista de Noah. — Mas e o papai?
Entramos na casa.
— Está bem, já tomou o café da manhã e se voluntariou a se juntar a
nós para ir até Killiney Beach — anuncio. — Espero que estejam cientes
disso, foi Julian quem decidiu.
— Ah, estamos sim — Ian diz.
— E como vai indo a relação de vocês? — Noah pergunta.
Ele sempre foi o principal a opinar sobre a forma como decidi criar e
educar Julian. Noah sempre achou que estivesse o enjaulando, mas eu
achava que era uma forma dele crescer com uma base boa em educação, já
que eu mesmo não tinha tempo e muito menos emocional para lidar com a
paternidade solo naqueles primeiros anos. Eu fui, por muito tempo, um
viúvo amargurado e preferia que Julian não vivesse isso.
Mas aqui está agora o resultado.
Paramos no vestíbulo quando resolvo responder.
— Acho que estamos progredindo, lentamente, mas acho também
que…
Faço uma pausa, medindo as palavras antes de acabar revelando
demais, pois, diria que contarei com Audrey para isso, só que eles não
sabem quem ela é, além de cuidar do cachorro.
— Que… — Ian espera.
Noah espera.
Meredith espera.
— Algumas coisas podem cooperar para que acabe sendo rápido e
natural — concluo de uma forma implícita.
— Essa é a intenção, não é? — Noah indaga.
Estou prestes a dizer ao meu irmão que não sou expert em ser um cara
legal, de sorrisos frequentes ou facilmente impressionável, quando Ian solta
um assobio ligeiro e discreto, seguindo da mesma frase:
— Que gracinha!
Antes de me virar, já sei do que se trata e sinto o sangue bombear em
meus tímpanos, mas preciso não demonstrar que esse gesto não faz meu
sangue esquentar.
Audrey está saindo da cozinha, carregando uma caixa que parece ter
brinquedos dentro. Ela fica nos olhando com tamanha curiosidade, surpresa
pelas novas pessoas na mansão.
Ao se aproximar pronta para subir a escada, Noah a intercepta antes
mesmo.
— Você deve ser quem cuida do cachorro.
Ela vai diminuindo os passos e sorri.
— Oi, sou eu sim.
Noah dá uma risadinha e diz:
— Está vendo o trabalho que causou, Ian?
— Pelo visto não foi uma coisa tão ruim assim — Ian deduz.
Canalha!
Ele está flertando com a Audrey.
A minha Audrey!
E ela sorri para ele, mas porque está sendo simpática, e talvez já tenha
associado os rostos.
O parapeito da lareira está cheio de foto nossa, então ela já deve ter os
reconhecido.
Ainda assim, tomo a dianteira, pois tenho que mostrar que sou o chefe
e preciso fazer as honras em apresentá-la para a minha família,
principalmente, deixar claro para Ian que ele deve manter suas garras longe
dela.
— Esta é Audrey, supostamente a babá que Julian mencionou, mas
ela cuida do Theo. Mesmo assim, faz parte da nossa equipe — digo firme,
sentindo a minha mandíbula endurecer a cada palavra.
Meus irmãos ficam olhando para mim, me estudando, mas não desvio
o olhar principalmente de Ian, que é um solteirão e pode fazer o que bem
entender.
Meredith dá um passo à frente e estende a mão para cumprimentá-la.
— Olá, Audrey. Eu sou Meredith, é um prazer em conhecê-la.
— Igualmente. O seu filho é lindo — Audrey diz com a face mais
doce do mundo.
Ela gosta de crianças?
Parece.
— Olha, não entendi esse lance de babá, mas se você quiser posso
ajudar pelo tempo em que você ficar aqui — Audrey diz de forma gentil
— Você não se incomodaria? — Meredith pergunta.
— Não, de jeito nenhum! — Audrey responde.
— Ficaríamos muito agradecidos, Audrey — Noah diz. — Mere não
é muito adepta a ideia de contratarmos uma babá. Por mim, teríamos duas!
— Eu passei anos querendo ser mãe e agora que sou, não posso
vivenciar isso? — a minha cunhada indaga, como uma mãe leoa, feroz.
— Ok, eu só estava dizendo. — Noah ergue os braços como quem
fica rendido.
— Estou indo lá pra cima — Audrey avisa, para mim.
— Tudo bem. Daqui a pouco já estaremos de saída — digo.
Ela sobe os degraus e a acompanhei com o olhar, só então me dando
conta que ela está com um vestido curto de saída de banho na cor verde e
sandálias nos pés, pronta para ir à praia.
Quando volto à minha posição normal, Ian me olha um tanto
desconfiado e pergunta:
— Tá rolando algum lance?
Fico sério, pois ainda estou irritado com ele.
— Não. Conheci Audrey há uma semana, praticamente. Além do
mais, não sou vocês.
— Olha o que você fala. — Noah já vai ficando na defensiva, mas
Meredith dá um sorrisinho, como se soubesse que aquilo era inegável.
— Só peço que mantenha o respeito — digo mais para Ian. — Julian
se deu muito bem com ela, então tente não estragar isso.
— Eu? Estragar?!
Por um instante, acho que ele se sentiu ofendido, mas logo fala:
— Se eu a tornar tia dele, aposto que ainda me agradeceria.
Na minha mente, o soco bem no nariz. No entanto, apenas contenho
toda ira em meus dedos.
Canalha!
Agradeço mentalmente quando Theo entrou com Julian.
— Ei, garotão! — Noah o cumprimenta e apenas me afasto para
evitar sentir mais raiva.
Meu filho é bem recebido pelos tios e ele fica maravilhado com Liam,
seu primo, tanto que não o solta até Meredith o pedir de volta para arrumá-
lo para a irmos à praia.
Depois disso, fico me perguntando como Julian se comportaria diante
de irmãos mais novos. Não que eu tenha pensado em ter mais filhos, mas,
às vezes, ele se demonstra ser carente de companhia, e talvez irmãos mais
novos suprissem isso de alguma forma.

Chegamos na praia de Killiney, há quase cinquenta minutos de


Milehide. Noah, Meredith vieram no mesmo carro com Liam na cadeirinha
do bebê. Ian trouxe Jane e o nosso pai, enquanto Audrey e Julian vieram no
meu carro, com Theo junto.
Julian fez questão que fosse atrás no carro com o cão, o que sobrou o
banco do passageiro para Audrey.
Ela pediu para que eu deixasse a janela do carro aberta e abri todas as
janelas automáticas. Percebi que ela gostava de sentir o vento bater no
cabelo castanho e sorria constantemente.
Confesso que gosto de vê-la curtir o momento, pois parece livre, em
paz.
Foi preciso de muito autocontrole para não ter que pousar a minha
mão sobre a perna dela exposta tão lindamente, imaculada.
Gosto de imaginar em como as minhas impressões digitais ficariam
ali.
A praia de Killiney é deslumbrante, mais ao Sul, com o mar
azulzinho. A praia é composta por pedrais que muitos turistas fazem
questão de levar uma pedrinha de lembrança. Na ponta da baía, há uma
colina onde um restaurante fino oferece um bom ponto para ficar e curtir o
dia na praia, oferecendo a melhor visão da praia.
Mas há as casas na beira e uma ponte que facilita a passagem.
Nos juntamos em uma mesa só no restaurante e Julian vai brincar à
beira do mar com Theo, que corre livremente, todo animado por conhecer o
mar pela primeira vez.
Não muito tempo depois, Audrey vai se juntar a eles.
Quando Julian respinga água nela, ela grita e logo depois tira a saída
de banho, revelando o biquíni preto e o corpo esbelto.
Ela tem quadris largos, pernas grossas e uma cintura finíssima, além
dos seios fartos.
Santo Deus!
Posso dizer que ela é o sonho de qualquer homem.
— Porra, alguém traz um penico pra aparar a baba desse homem —
Noah diz se sentado ao meu lado.
Ele esperou Ian se distrair em uma conversa com Meredith e meu pai
pedir para Jane dar uma volta com ele pela costa para se aproximar.
— Está sendo exagerado — digo me defendendo.
Noah fica me olhando.
— Você sabe que a pior pessoa que pode escolher para mentir é para
mim, não é?
— Mas não estou mentindo, só estou dizendo que você está sendo
exagerado.
— Então admite que existe pelo menos alguma coisa?
— Não existe nada, só já a conhecia. Ela era garçonete em um pub
que eu frequentava no Temple bar.
Noah me olha incrédulo.
— Não consigo imaginar você nesse tipo de lugar — comenta e dou
uma risadinha.
— É por isso que costumava frequentar. Ali era o último lugar que
iam me procurar.
— Mas, então, qual a sua opinião sobre? — Ele aponta na direção de
Audrey. — Todo mundo falava sobre como eu deveria sossegar, mas
ninguém fala sobre como você é quase um quarentão e ainda não tem
ninguém.
— Porque sou um cara discreto. O que ninguém sabe, ninguém
perturba ou empata.
— Isso, pra mim, é papo furado.
Dou de ombros.
— Acredite então no que você quiser.
— Eu quero acreditar que meu irmão mais velho está feliz, com uma
pessoa que o faça recomeçar de uma maneira que o passado ainda não seja
um fardo — salienta firmemente. Ele olha na direção de Julian e Audrey e
complementa: — Alguém que faça Julian se sentir bem, que vocês dois
gostem.
Olho para meu irmão.
— Que irônico você dizendo isso para mim, Noah.
Ele dá um sorriso sem jeito.
— Bem, você sabe. Sou um novo homem e nunca estive tão feliz,
irmão.
Liam está em seu colo, louco para descer, mas também distraído com
a flor sobre a mesa que balança de acordo com o vento forte.
— Eu sei disso e fico feliz por você, Noah. Por você e pela Meredith.
— Obrigado. Mas não desista.
— De quê?
— Dela. — Aponta de novo para Audrey.
“Não temos nada!”
Estou pronto para dizer isso, mas a minha cabeça diz: sim, não irei.
Não posso fingir que não passei os últimos meses pensando em
Audrey, a desejando, querendo tanto vê-la e agora sentindo que mal posso
ficar muito tempo longe porque é mais fácil assim.
Então, se Audrey me beijar de novo, só Deus será capaz de me parar.
Uma das coisas que nem sequer sonhei para este verão, era almoçar
no Waves, o badalado restaurante chiquérrimo ao sul de Dublin, em
Killiney.
Tirei até algumas fotos, só para ter provas de que um dia isso existiu,
embora não tivesse ninguém em especial além da minha mãe para mostrar.
Fiquei a maior parte do tempo na beira do mar, com os pés dentro da
água, brincando com Julian e o Theo. Conheci Meredith, cunhada do
Jeremy, que é muito legal. O tipo de mulher confiante, independente e
família que quero ser quando tiver a idade dela.
Sei que ainda sou nova, mas já penso no meu futuro.
O filho dela com Noah, o pequeno e ruivinho, Liam, é uma graça
também.
É notório o tanto que Julian ama o primo; quer dizer, ele gosta mesmo
de estar com o pequeno o tempo todo.
Eu me pergunto se esse pode ser um tipo de talento e amor notório
para uma possível futura profissão, ou se ele apenas seria um ótimo irmão
mais velho, ou até um excelente pai.
E por falar em pai, o dele não tirou os olhos de mim, nas horas que
passamos na praia.
Almoçamos caviar e alguns outros mariscos que nunca provei antes.
Tentei ao máximo ser aberta para as opções, mas confesso que alguns me
davam até receio de colocar na boca.
Uns me agradaram, outros, não.
Mas acho que nunca vou esquecer do caviar que é extremamente
gostoso…
E caro.
Este último talvez seja o principal motivo.
Mas, voltando a falar de Jeremy, uma coisa estranha aconteceu
quando ele estava com o filho vendo os aquários e me aproximei na surdina
da mesa, que ficava rodeada por cortinas brancas que voavam com o vento,
nos fazendo sentir estar em uma praia havaiana, ou qualquer coisa assim.
Estava apenas tirando algumas fotos da paisagem atrás de uma
daquelas cortinas e os irmãos de Jeremy não perceberam que eu estava por
perto, quando eles começaram a conversar:
— Ninguém vai mesmo falar sobre esse elefante na sala? — Foi o tal
de Ian que perguntou.
— E deveríamos? Sinto que se falar a respeito, vai ser como atear
fogo na gasolina — o irmão do meio respondeu.
— Bem, uma hora alguém vai ter que falar sobre como elas são
parecidas.
Eu ainda estou totalmente alheia ao assunto até que Noah suspira e
comenta:
— Que merda! Eu não gostaria de estar na pele dele, sabe. Tanta
mulher no mundo, tinha que ser logo quem cuida do cachorro?
Foi como um alarme na minha cabeça e meu corpo todo paralisou,
então apenas direcionei meus ouvidos ainda mais naquela direção.
— Ela parece ser legal — Ian disse.
— É claro, e nem estou querendo invalidar o emprego dela, mas… Eu
só quero dizer que ela está perto demais e pode ser ruim para os dois.
— Acha que ele pode acabar confundindo as coisas e se apaixonar?
— Não sei.
Eu comecei a me afastar, confusa e um pouco assustada. Estava
pronta para virar as costas e sair correndo, ou então perguntar na cara de
pau porque estavam falando de mim. No entanto, fui surpreendida pela
governanta, Jane, que estava atrás de mim, me olhando de um jeito
preocupado.
— Tudo bem, querida? Parece até que viu um fantasma.
— Si-sim. Tudo bem, eu… Eu só… — olhei para o lado, na direção
dos irmãos.
Ouvi Jane suspirar e então chamar a minha atenção de volta.
— Não ligue para eles, é só uma coincidência.
— Que tipo de coincidência? Você também ouviu o que eles falavam?
— Sim, eu ouvi, mas se quiser manter o emprego é melhor não se
meter no assunto deles. Talvez, com o tempo, eles comecem a conversar
com você também.
Pisquei para ela, bastante confusa, ciente de que aquilo só podia ser
onda com a minha cara e que todos eles estavam me deixando confusa de
propósito.
Ou será que era porque estava calor demais?
Soube de casos em que pessoas começavam a delirar no calor ou frio
excessivo.
— Vamos para a praia, querida — ela sugeriu com um sorriso doce,
me afastando daquela área.
Aquilo me deixou de cabelo arrepiado.
Mas, tudo bem.
Imagino que a coincidência que Jane falou, é sobre aquilo não ter sido
sobre mim.
Não, não tinha como ser, afinal não sou interessante a este ponto.
Me juntei então a Julian e sugeri que fôssemos brincar com Theo na
beira do mar, já que havia trazido o disco dele.
Ali ficamos e já me sentia sendo observada por Jeremy
constantemente. Então, Julian molhou a minha saída de banho. A única
coisa que trouxe além da toalha porque me vi desinformada.
O que usar na praia ao ir com pessoas ricas?
Quer dizer, no tempo em que eu fui com os amigos da escola,
entrávamos com a roupa do corpo e tínhamos que esperar secar se
quiséssemos voltar para casa de ônibus.
Mas não queria correr esse risco de parecer uma sem noção, então
fiquei só de biquíni e aquilo bastou para que me sentisse quase nua pela
forma como era observada.
Confesso que estava curtindo aquilo, afinal não sou insegura com o
meu corpo. Sempre soube que as meninas magras demais eram as mais
privilegiadas naquela região, mas fui abençoada pela herança das origens da
família da minha mãe, que é turca.
Logo, sou irlandesa e turca.
Por esse motivo tenho os olhos castanhos como chocolate e
amendoados, os traços marcantes no rosto e o corpo curvilíneo.
Eu sabia que estava chamando a atenção dele. Sabia que os olhos de
Jeremy estavam em mim, e por isso me demorei ali com Julian e Theo.
Não sou o tipo de mulher atirada, que fica se exibindo e tentando
chamar a atenção de um homem de todos os jeitos. Mas Jeremy confessou
sentir uma atração e que nos últimos meses não parava de pensar em mim.
Depois ele tentou fazer parecer algo normal, mas já era tarde demais.
Posso ser inexperiente ainda aos vinte e dois anos, mas não sou
nenhuma idiota.
Jeremy me queria.
E por mais que fosse difícil de acreditar nisso no começo, agora não
tenho mais dúvida. E tudo porque perto de mim, ele perde completamente
aquela sua postura de CEO imbatível.
Quem me dera estivesse apenas enganada, porque se não fosse isso,
por qual motivo teria o beijado?
Por que estaria pensando tanto em me arriscar outra vez só para sentir
meu corpo reagindo a ele e o mundo parando a minha volta?
Quando estávamos voltando para Milehide, por exemplo, algo
aconteceu.
— Pai, preciso ir ao banheiro. Acho que tomei muito refrigerante —
Julian disse no meio do caminho.
Estávamos voltando igual a uma carreata, onde o veículo de Ian era o
primeiro, o de Noah o segundo e o de Jeremy o terceiro.
Era como se os carros estivessem do menor para o maior, uma
Mercedez, uma BMW e então o SUV.
Uma coletiva de luxo.
Assim que Jeremy sinalizou que mudaria a rota pegando uma rua à
direita, não demorou mais que cinco segundos para o celular dele tocar. O
seu dedo apertou um botão no painel sofisticado do carro e logo soube que
a ligação estava conectada ao som do carro.
— O que aconteceu? — Era Meredith, que por sinal além de ser
cunhada, descobri ser a melhor amiga dele.
Ela teve a confiança em me contar a história dela com Noah, não em
detalhes, mas o que me contou, aposto que não sai contando a estranhos que
nem eu.
Mas gostei do voto de confiança que ela me deu, isso significa que
gostou de mim.
— Julian precisa ir ao banheiro, podem ir na frente. Tem um ponto a
dois quilômetros.
Então se ouviu uma risada, e de repente foi Noah quem assumiu a
ligação:
— O que custa mijar no acostamento?
— EU NÃO QUERO QUE NINGUÉM VEJA AS MINHAS
PARTES! — Julian grita lá de trás, nem um pouco intimidado pela minha
presença e aquilo fez Noah rir mais ainda.
— Como se essa coisinha fosse grande o bastante para outras pessoas
verem. Puxou ao seu pai! — Noah diz.
Nossa, será que tenho o direito de opinar sobre isso e defender
Jeremy?
Afinal de contas, já senti o tamanho do seu potencial enquanto nos
beijávamos!
— Noah! — Meredith o repreendeu enquanto ele achava graça.
— Você não quer mesmo falar sobre tamanho agora, Noah. Adeus. —
Jeremy desligou a ligação, tentando demonstrar controle diante daquela
exposição, mas dava para perceber sua apreensão.
— Esse assunto não foi nada respeitoso com a Audrey por perto —
Julian ressaltou.
— Que bom que você falou sobre isso! — Jeremy exclamou aliviado
e olhei para ele incrédula. — É mais cabeça que o seu tio, pelo visto.
— É só fingir que não estou aqui, gente — disse e Jeremy me olhou
só para mostrar que aquilo era impossível.
— Olha, meus irmãos quando eles falam esse tipo de coisa perto de
alguém, significa que estão se sentindo confortáveis. O que significa que
eles gostaram de você, Audrey. Acredite, eles não agem feito uns idiotas na
maior parte do tempo, mas quando estamos juntos… sei lá. Acho que deve
ser coisa de irmãos.
— Sou filha única, mas acho que entendo o que está tentando dizer —
disse o tranquilizando.
Jeremy deu um breve aceno de cabeça, como agradecimento por eu
ter demonstrado compreensão àquela conversa íntima de irmão que poderia
tê-lo comprometido, constrangido, ou os dois.
Quando o posto de abastecimento surgiu, ele dobrou até a lateral do
estabelecimento onde ficavam os banheiros, mas preferiu ainda assim
estacionar na sombra, alguns metros dos banheiros.
— Não irei demorar! — Julian avisou ao sair às pressas, antes mesmo
de Jeremy dizer “Ok”.
Levou dois segundos para nós dois ali dentro, com as janelas fechadas
e o ar condicionado ligado, fizesse algum efeito.
Podíamos estar em um SUV bastante espaçoso, mas era como se
fosse pequeno demais para nós dois.
Eu me encolhia o máximo que podia em meu corpo, mas com as
minhas pernas esparramadas no banco do passageiro, era quase impossível.
As mãos de Jeremy estavam sendo mantidas no volante, mas sentia
que ele podia colocar uma sobre a minha coxa, carinhosamente. Engoli em
seco com aquele pensamento, principalmente quando ele começou a mudar
as batidas do meu coração, a me dar hiperventilação e aquecer meu corpo
como uma máquina fora de controle.
E enquanto estava ali, tentando me controlar, o ouvi comentar:
— Você está cheirando a mar.
Arqueei as sobrancelhas, surpresa.
— E eu só molhei os pés — salientei, com um sorriso em sua direção.
“Mantenha-se calma, Audrey.”
— Devem estar salgados
— É.
Jeremy ficou me olhando revelando que ele pensava mais do que
falava. Como se fosse algo proibido, sombrio e inapropriado.
Eu quase podia ver a sua mente vagueando para algum lugar secreto.
— Se divertiu hoje? — perguntou na intenção de romper o silêncio
entre nós dois…
E aquela coisa pairando no ar, como uma densa nuvem aquecida.
— Sim, obrigada pela oportunidade. Os seus irmãos são bem legais.
— Tente não dizer isso na frente deles, são dois metidos.
Sorri, embora achasse que Noah fosse mais e que Ian fazia o tipo de
“Não tô nem aí pra nada”.
— Tudo bem, mas e você? Como está o seu desenrolar com Julian?
Ele olhou na direção ao banheiro, de onde o filho ainda não havia
saído.
— Estamos progredindo. Acho que você tem tido uma influência
nisso também, para ser honesto. Meu filho gosta de você. Mas acho que
você deve estar acostumada com isso, não é? Em se dar bem com todo
mundo.
Neguei com a cabeça.
— Não é bem assim. Às vezes, ser boa não significa agradar a todos
— respaldei. — Acho que a minha antiga patroa me odeia, inclusive.
— A senhora Bergman?
Olhei para ele quase espantada por ele lembrar daquilo ainda, ficando
rígida e ele deu um sorriso sagaz.
— Não se preocupe, está tudo bem e achei que foi bem feito, a Jane
me contou melhor a história. Você ainda tem os biscoitos?
— Talvez uns cinco ainda. Preciso ver. Não faço tanta questão.
— Você pode ficar à vontade lá em casa sempre que quiser, Audrey.
Não pense que somos mesquinhos e esnobes.
— Sim, eu já sei perfeitamente. Nunca fui tão grata por trabalhar em
um lugar finalmente decente.
— Você nunca vai me contar sobre o fim que deu o trabalho naquele
pub?
— Por que isso é tão importante? — indaguei estreitando meus olhos
para ele. — Quer dizer, eu pedi a minha demissão. Steven, o dono, não
queria me dar, mas eu saí de todo jeito. Não suportava mais aquele lugar e a
forma como era tratada.
— Sinto muito que tenha sido um tormento. Espero que nunca mais
volte lá — ele aconselhou sério e quase pude ver seu olhar queimar.
Mordi o lábio.
“Droga, se ele soubesse…”
— E você tem voltado lá? — perguntei, trocando o foco da conversa.
— Não fui mais desde que descobri que você não trabalhava mais lá.
Foi frustrante, mas um alívio ao mesmo tempo. Era nítido que você não
gostava dali.
— Obrigada, Jeremy. Isso é importante para mim.
Jeremy continuava apertando o volante e não pude resistir em olhar
para seus dedos tensos e o polegar inquieto. Ele percebeu para onde eu
olhava e meio que parou com aquilo, mas já era tarde demais.
Eu percebi pela segunda vez.
— Você está ansioso? — perguntei.
— Por que estaria? — ele retrucou e soube que queria tirar algo mais
de mim, tornar aquela conversa mais objetiva, enquanto eu parecia uma
ratinha recuada.
Respirei profundamente, sentindo uma onda de frio percorrer por todo
o meu corpo, como se estivesse febril, e foi horrível, porque meus seios
ficaram enrijecidos, tão evidentes que seus olhos pescaram a mudança no
meu corpo, os sinais.
— Para ser honesto, fica difícil desse jeito, Audrey. E não quero ser
um desrespeitoso prepotente com você. Não quero que você compare o meu
comportamento diante de você aos homens que a atormentavam naquele
pub… Na sua vida em geral.
— Não será — disse com firmeza, porque tinha receio de tomar a
dianteira, e seria incrível se ele me desse forças.
— Como você pode ter tanta certeza? Não me conhece direito. Posso
ser um bom homem, mas, as coisas que penso…
Ele não completou a frase, o que me deixou mais curiosa ainda.
O quê?
O que você pensa?
Estava prestes a perguntar, quando a porta de trás do carro foi aberta e
Julian entrou em disparada.
Voltei a respirar, com meu coração palpitando, meus olhos inquietos e
meu corpo aquecido.
Jeremy pigarreou, parecia tão atônito quanto eu e encontrou na
demora do filho para tentar mudar o clima, a tensão que o final daquela
frase incompleta formou.
— O que aconteceu? — perguntou já se preparando para sair dali com
o carro.
— Aaah, nada de mais. A privada estava entupida, então tive que
criar muita força para não mirar na parede — explicou, mas estranhamente
parecia estar mentindo.
Jeremy e eu nos entreolhamos, como se tivéssemos pensado na
mesma coisa.
— Esse é o tipo de coisa que seus tios teriam achado graça — Jeremy
disse.
— Mas foi — Julian disse de um jeito desconfiado. — Interrompi
alguma coisa?
— Não! — Jeremy e eu respondemos em uníssono.
— Estava dizendo para o seu pai que não vou ficar para o jantar. —
Bem, não era verdade, mas eu pretendia dizer.
Jeremy me olhou surpreso, mas não disse nada porque teve de manter
o contexto da minha desculpa.
Mas Julian teve a mesma reação:
— Ah, não, Audrey! Por quê?
— É, essa parte você não me explicou. — Jeremy entrou na atuação.
O senhor Rupert contou que estava querendo um jantar especial para
a comemoração das férias de verão e da junção da família para aquelas duas
semanas, que segundo ele, passaria muito rápido e que deveríamos
aproveitar o máximo possível.
Todo mundo concordou e Jane, como a governanta, já entrava em
contato com os funcionários da cozinha para alertar sobre o cardápio.
Fui convidada, o que foi uma honra. Na hora, agradeci por educação,
mesmo sabendo que teria de reconsiderar. Afinal de contas, tenho trabalho a
fazer no turno noturno agora.
— Acho que não há muito o que explicar, só tenho um compromisso
com a minha mãe. Desculpa.
Era uma mentira descarada e a forma como Jeremy me olhava,
mostrava que ele não acreditava naquilo nem um pouco. Mas, mesmo
assim, deu o braço a torcer.
— Tudo bem, você participará da próxima.
Estando de volta na avenida, Jeremy pisou fundo no acelerador.
Eu só queria entender o motivo dele fazer tanta questão.
Queria saber que coisas são essas que ele pensa…
Eu queria estar mais próxima de Jeremy e contar tudo a ele, da
mesma forma que ele parece tão retraído em não me contar, mas que
cederia em qualquer oportunidade.
Um homem firme e experiente como ele jamais me esconderia o jogo.
E tudo o que ele evitou até agora, eu reconheço que é pelos bons modos que
tem.
Confesso que isso me deixa ansiosa, porque nunca senti nenhuma
atração por um homem como tenho sentido com Jeremy. A forma como ele
desperta as sensações no meu corpo é inovador, e delicioso.
Sabendo que não ficarei para o jantar, ele fez a gentileza de me deixar
em casa. Não perguntei como ele sabia o meu endereço, já que da última
vez em que me seguiu naquela noite, mudei a minha rota propositalmente
só para despistá-lo.
Mas agora ele sabe.
— Obrigada — disse enquanto saía do carro. — Divirtam-se hoje à
noite.
— Você também — ele retrucou, como se soubesse da minha mentira
e dissesse aquilo de propósito.
Eu fechei a porta do carro e então entrei em casa. Ouvi quando o
carro deu partida somente quando já estava segura dentro do meu lar.
Eu me escorei contra a porta, fechei os olhos e tentei respirar direito,
mantendo a calma e deixando a minha mente quieta, mas não consegui,
pois, passei a reviver cada momento do meu dia.
Admito que ter chegado na minha humilde residência, foi como ter
voltado de uma realidade paralela. Nem parece que aquelas horas em
Killiney foram reais e que estive comendo caviar.
Às vezes, me pergunto se toda essa atração por Jeremy, é porque ele é
um CEO podre de rico. Mas aí lembro das vezes em que fui assediada por
ricos e lembro que não tem nada a ver.
Desde o princípio, os bons modos de Jeremy foi o que me fez olhar
para ele diferente.
E saber agora que é recíproco, só torna tudo mais real; um sonho, o
máximo que estarei perto de um conto de fadas.

A minha mãe tem uma dívida muito grande, não é porque ela é uma
irresponsável e que não soube lidar com o financeiro, mas porque ela já
acreditou muito um dia no amor. Ou pelo menos, no que demonstraram a
ela ser o amor verdadeiro.
E o meu pai é o grande cretino nessa história toda.
Ele sumiu com dezenas de dívidas e a maioria que ele fez no nome da
mamãe, eram as mais altas.
Empréstimos e jogos de azar que nunca deram em nada.
Em dado momento, pensei que ele apostaria nossas cabeças e foi o
que faltou.
Mamãe pensa que ele sumiu para não pagar a dívidas e eu concordo
com isso, mas também acho que ele tinha outra mulher.
E a resposta para isso era a forma desprezível como tratava a minha
mãe.
Talvez, um dos motivos para não ter me interessado muito por
relacionamentos até agora, é porque tinha medo de cair na lábia de caras
como o meu pai.
Por isso é preciso ter muito cuidado, pois eles estão por aí, só
esperando a mulher mais frágil para prometer o mundo, e, no final, só dar
decepções.
Não entendo como o ser humano pode ser tão imundo a esse nível.
O meu pai tinha um empréstimo pendente com o senhor Douglas,
avaliado em doze mil euros.
Na verdade, era dois mil, mas os juros foram correndo e continuam.
A vez em que me buscou no trabalho, foi para dizer em como estava a
situação. Mamãe havia escondido aquela informação de mim, e agora,
graças a essa bomba que caiu em nossos ombros, preciso lidar com um
segundo emprego.
Voltar a trabalhar no pub não era uma opção, mas o senhor Douglas é
amigo do dono e me fez pensar bem antes de voltar.
— Escute, menina. Eles adoram você, te acham uma gracinha. O
cretino do Steven está inclinado a pagar o dobro para você só para tê-la de
volta — ele me avisou naquela mesma noite também.
— Não vou me prostituir, se é isso o que você está tentando dizer. —
Fui logo direta, porque com homens daquele nível, só tinha uma escolha,
ser tão ruim que eles me odiariam ao ponto de me esquecer.
— Esquece essa porra de prostituição. Steven não é um cafetão,
ainda. Mas, veja. Você é bonita. Ele diz que o seu rosto era o que atraía
homens para o pub.
— Pois que ele vá à falência. Posso me virar de outro jeito para
conseguir essa grana.
— Ou então, tire vantagem já que ele está tão desesperado por você
— sugeriu. — Steven quer pagar o dobro, mas ofereça o seu trabalho pelo
quádruplo.
— A única pessoa que vai querer tirar vantagem disso vai ser ele —
ressaltei enojada. — Me pagando esse valor, ele vai achar que sou a puta
particular dele.
O senhor Douglas fez uma careta quando fui tão baixa.
— Eu não sabia que essa boquinha proferia tal obscenidade!
— Você não me conhece!
Naquela noite, chorei feito uma desgraçada debaixo do chuveiro, pois
nunca me senti tão suja, fácil e objetificada.
Eu quis sumir.
Eu quis estar com Julian e Theo, ou só olhar para os olhos de Jeremy,
sentir a sua tranquilidade, ouvir a sua voz e o seu jeito educado de lidar com
tudo.
Ele é tão raro!
E é decepcionante admitir que, mesmo depois de tudo, tive que ceder.
Voltei para o pub, porque mais nenhum outro lugar me aceitou, precisava
daquela grana o quanto antes e Steven não me recusaria.
Bem, ele se recusou a pagar o quádruplo, mas não o triplo.
Idiota desesperado, mas não tanto quanto eu.
Sou tão boba, mas não me aquieto enquanto não arco com minhas
responsabilidades.
Para a minha infelicidade, sou obrigada agora a usar um uniforme
humilhante.
Descobri que isso foi uma estratégia para incentivar a vinda de mais
homens para o bar e que estava funcionando, mas, segundo Steven, as
meninas são acanhadas e os homens gostam da ousadia, igual a minha.
Ousadia?
Ele de fato confundiu meu modo defensivo como um modo sedutor à
parte e isso embrulhava o meu estômago.
O novo uniforme consiste basicamente em um conjunto de couro
marrom, com o top tomara-que-caia, a saia curtíssima e um par de botas que
vai até abaixo dos joelhos.
Eu odeio isso ao extremo, mas é necessário porque agora o pub tem
uma pegada mais country e precisamos seguir o tema.
Pelo menos só nessa noite faturei cento e cinquenta euros em gorjeta.
Enquanto termino meu expediente penso nos olhares imundos para as
minhas coxas, e no roçar “desproposital” na minha bunda que fui
submetida.
É engraçado, porque se fosse Jeremy, não acharia nem um pouco
ruim.
Então, todo tempo que saí rodando pelo pub, pensei nele. Pensei em
seus olhos em mim e em como aquilo me fazia sentir confiante e não um
pedaço de carne.
Quando meu turno está prestes a acabar, uma coisa muito embaraçosa
acontece. Ian, o irmão mais novo de Jeremy, aparece na porta do bar.
Ele está com as mãos nos bolsos e atento, como se estivesse
procurando alguém, até que nossos olhares se encontram.
Eu fico completamente paralisada e seus ombros relaxam, como se
ele tivesse encontrado o que queria.
Cinco minutos depois que troco de roupa no almoxarifado, me
despeço das outras meninas e ignoro o adeus de Steven, saio pelas portas do
fundo, já sabendo o que encontrarei.
Ian está apoiado em sua Mercedez, pernas cruzadas e as mãos nos
bolsos da calça jeans.
Ele parece esperar alguém, no caso, eu.
— O que faz aqui? — Não posso evitar, até porque me sinto no
direito de perguntar.
Ele suspira forte antes de explicar.
— Um amigo meu me mandou uma foto e perguntou se a garota
daquela foto era a mesma que estava trabalhando na minha casa.
— Como ele sabia que era eu?
— Trabalhar para um O’Donnell é como ganhar na loteria. Todo
mundo descobre em algum momento.
Cruzo os braços, ainda não convencida e completamente perdida na
situação.
— E então… — Espero por mais explicação.
Ian se agita.
— Vamos, levo você até a sua casa.
— O quê? Mas, por quê? Não se dê ao trabalho.
— Porque é o que Jeremy gostaria que eu fizesse.
A noite estava quente, mas foi como sentir meus ossos congelarem.
— Você contou a ele?
— Não, mas conheço o meu irmão.
Balanço a cabeça, ainda muito confusa.
— Isso não faz sentido…
— Meu irmão gosta de você, Audrey, Julian também. E somos
ensinados a cuidar dos nossos.
— Não sou uma de vocês. Não… N-não faço parte disso.
— Ah, então você prefere voltar sozinha? Sendo que você pode ser
seguida a qualquer momento por um homem com más intenções —
especula.
Penso em quando que fui seguida por Jeremy, mas ele fez por
segurança e não porque queria me machucar.
— Eu prefiro que você não conte nada ao Jeremy. Eu disse a ele que
não voltaria mais para esse lugar.
Ian fica me olhando, como se tentasse extrair alguma coisa de mim,
no silêncio. Mas ele apenas se afasta do carro e se aproxima de mim.
Dos irmãos, ele é o mais diferente, parece um daqueles caras
underground que toca em bandas no centro de Londres e que mora em loft.
Mas também não tem nada a ver, porque essa comparação só acontece
quando se julga pela barba grande e o cabelo escuro, desgrenhado pelos
cachos.
Mas Ian se veste bem, cheira bem e parece ser muito inteligente,
apesar das piadinhas que faz e do espírito entusiasta de uma pessoa que
ainda está na casa dos vinte e poucos anos.
Quando se aproxima, Ian murmura:
— Não vou dizer nada se você aceitar a minha carona.
Fico olhando para ele e respiro fundo, pois não tenho escolha,
mesmo.
— Tudo bem. Mas você vai ter de me prometer também que não
contará nada!
Ele faz uma cara de pensativo que é um tanto suspeita.
Ian parece aquele tipo de cara que adora aprontar e que é impossível
ficar entediado na sua companhia. Lembro da forma como ele me olhou
mais cedo quando cheguei, lembro dele se divertir com o irmão ao provocá-
lo toda vez que se dirigia a mim, como se eu tivesse me tornado uma piada
interna para os dois.
— Prometo — ele diz, mas não acredito.
Entramos no seu carro e de repente já estamos bem longe do Temple
Bar.
— E então, por que você voltou pra esse lugar? — ele pergunta
depois de uns cinco minutos até sair daquela agitação noturna da Temple
Bar.
— Dívidas. Você reconhece essa palavra? — Sou grossa, admito.
Mas como eu disse, não tenho tempo e paciência para homens
enxeridos. Não que Ian seja igual aos homens do pub, mas sei que terei de
ser esperta ao seu lado.
— Ah, não seja tão difícil. Seja mais direta. Que dívidas?
Não disse?
Ele está me provocando!
— Se eu contar, terá de pagá-las. Até porque isso não é problema seu.
— Me diga o valor, que eu pago. Jeremy pagaria até o dobro, conheço
o irmão que tenho.
— É, você já disse isso. Então me diga, qual é a dele? Já que o
conhece tão bem.
Ian dá de ombros.
— Sobre o quê?
— Sobre… Bem, você disse…
— Ah, já entendi. — Ele muda a marcha no câmbio automático e não
tira os olhos da pista. — Sobre vocês e todo esse lance que todo mundo já
sacou porque ninguém é besta.
— Não tem lance nenhum — retruco, mas nem eu tenho certeza
disso.
— Se fosse uma questão apenas sexual, Jeremy já teria resolvido isso
de alguma forma e você parece que não é esse tipo de mulher. Parece ter
algo a mais, algo que faz tempo que nenhum de nós sentimos a ele em
relação a uma mulher — o irmão revela e tento evitar o choque na minha
reação.
— Isso parece tão difícil de ser real.
— Olha, não sou muito de dar conselhos, mas seja o que for, não
enrole o Jeremy. Ele é CEO, gosta de pessoas decididas, que vão lá e fazem
acontecer.
— O que está insinuando com isso?
— Chame meu irmão para transar.
— Ahg! — Reviro os olhos e bufo profundamente. — Essa é a ideia
mais ridícula.
— Pelo menos sana de vez com isso tudo. O que você prefere, viver
nessa tensão até o final do verão, ou curtir o verão?
O carro dobra a esquina e entra na rua da minha casa.
Que droga, andar em carro de luxo é como andar na velocidade da
luz.
Ian então completa:
— Como os americanos dizem, o que acontece no verão, fica no
verão.
— Não é sobre isso. Jeremy é meu patrão de qualquer jeito e preciso
manter o profissionalismo.
O carro para em frente à minha casa, mas ele não desliga o motor.
— Desculpa te dizer isso, mas você só cuida do cachorro. Mas acabou
que tem se tornado uma peça importante para a construção da relação
afetiva entre Jeremy e Julian. Você e o Jeremy são uma equipe agora.
— Isso é o que você acha.
— Olha, a minha opinião conta muito, tá. Eu cresci com todo mundo
achando que era o mais desligado da família, mas isso era só o meu plano
de estratégia em não ser notado. Mas sei muito.
— Então devo me preocupar com você? — Arqueio uma sobrancelha
enquanto demonstro desconfiança ao seu respeito.
— Não. Você, Audrey, acaba de ganhar um amigo. — Ele me dá a sua
mão para apertar.
— Por quê?
— Porque eu amo os meus irmãos e gosto do efeito que você causa
em Jeremy. Mas claro, não irei admitir isso a ele tão cedo. Primeiro, quero
fazê-lo ter ciúmes.
Eu rio dos seus planos.
— Por que você faria isso? Parece horrível.
— Todo mundo precisa de um encorajamento, não é?
Aperto então a mão dele e deixo claro:
— Não concordo com os seus planos, mas gostaria que fosse meu
amigo. Eu adoraria ter carona todas as noites.
— E eu queria ser casado com a Megan Fox.
Então o destemido Ian pensa em casamento?
Ok.
Não quero tirar proveito dessa amizade que está se formando, mas
não lembro a última vez em que precisei contar com um amigo. E, agora,
aceitei o convite da pessoa mais improvável no mundo. Talvez Ian seja
como eu e não tenha tantos amigos.
De qualquer jeito, os O'Donnell são interessantes de todas as formas.
Voltei a correr pela manhã com Audrey e Theo. Porém, ela não foi
muito longe e ficou nos parâmetros da nossa propriedade, fazendo o
percurso em círculos no campo do mesmo formato.
Mas estava sempre à frente, evitando conversas comigo, me evitando.
Ela fez isso por mais três manhãs e comecei a pensar que talvez
estivesse se dado conta de que eu estava sendo só mais um cara chato que
não sabia se controlar perto dela.
Aquilo me deixou desmotivado e de mau humor.
Por alguma razão, não soube chegar até ela e perguntar o problema.
Pela primeira vez, tinha medo de descobrir o problema, porque sabia que
não teria conserto e não queria que as coisas ficassem estranhas entre nós
dois.
Ainda assim, respeitei a sua decisão.
Se ela não queria falar ou me olhar, eu não a forçaria a nada.
No entanto, durante os quatro dias que se passaram, vi Audrey e Ian
mais juntos do que nunca.
Ele a fazia rir, daquele tipo de risada que o som causava um arrepio
nos ossos de tão bonita; às vezes, parecia que eles conversavam em
sussurros, para ninguém os ouvir.
Eu não sabia que merda era aquela, mas não estava gostando nem um
pouco.
Antes do final de semana chegar, Meredith convida Audrey para um
passeio à margem do rio Liffey.
Vão as duas, Liam e Julian enquanto eu e meus irmãos ficamos em
casa. Noah tem uma reunião por conferência a fazer, e como Ian está de
bobeira, não evito em ir atrás dele.
Eu o encontro na biblioteca, um cômodo grande e com três estantes
enormes cheias de livros.
Há bem no centro, uma sinuca. A luz pálida que pende sob ela, é a
única coisa a iluminar todo ambiente, já que as cortinas das janelas estão
fechadas.
Pego o decanter de uísque que o meu pai mantém aqui e abasteço com
o uísque mais caro e antigo.
Sirvo Ian com uma dose e depois outra para mim.
— Qual a graça em jogar sinuca sozinho? — pergunto o vendo jogar,
ficando do outro lado da sinuca.
— Não lido com a merda de competidores, simples assim —
responde sem desviar sua atenção da próxima tacada. — Mas eu poderia só
estar treinando, não é?
Dou de ombros.
— Eu não sei. Quando você tem hábitos estranhos, isso chega a ser a
coisa mais comum que você está fazendo — reflito.
— Ah, é? — Ele taca a bola de número seis no buraco e então se volta
para mim. — Eu não sabia disso. Cite uma delas.
— Agir feito um canalha com o seu irmão — eu quase rosno,
sentindo o álcool adentrar em minhas veias.
— Você não está sendo específico. Falando desse jeito parece até que
fiz algo a você.
— Não venha com esse papo agora, Ian. Você sabe muito bem aonde
quero chegar. — Mantenho a minha tranquilidade, mas o meu irmão ama
uma provocação.
— Enquanto você não for direto, eu também não serei.
O sangue ferve dentro de mim e preciso me controlar, senão serei
capaz de quebrar o copo de vidro na minha mão, ou avançar no pescoço do
meu irmão.
Mas não sou esse tipo de cara, por mais que ele estremeça dentro de
mim.
— Se afasta da Audrey, porra.
Ele já está se preparando para dar outra tacada, mas para no mesmo
instante e mexe o taco na minha direção enquanto faz a sua observação:
— Aí está a verdadeira natureza da coisa toda que queria ver desde
que cheguei. Você não estava facilitando com toda aquela desculpa, o que
foi uma surpresa. Você não é de esconder o jogo.
— Quem disse que estou escondendo o jogo? Já tratei deste assunto
com a Audrey.
— Não tratou, não. Senão vocês não ficavam igual dois bobos sempre
que estão perto.
— As minhas medidas de lidar com essa situação são diferentes das
suas, Ian. Não pode me dizer como fazer isso.
Meu irmão então avança.
— A minha opinião não vale só porque sou o mais novo? Ah, foda-se,
Jeremy! A Audrey não é sua.
Ela não é minha...
Escutar isso é como um soco no meu estômago, mas desejo que isso
não seja um fato a me incomodar.
— Isso não diz respeito sobre desrespeitá-la.
— Não, você só está com medo que eu a leve primeiro para a cama.
Solto o copo que se espatifa no chão e o cheiro de uísque preenche o
ar em questão de segundos.
Mas tudo isso para ter o pescoço de Ian em minha mão enquanto o
prendo contra a sinuca. Ele segura meu punho, mas não com força, pois
sabe que eu jamais o machucarei.
— Cogita em fazer isso que você vai se arrepender, Ian — aviso com
a voz rouca, sombria.
Meu irmão dá um sorrisinho.
— Não se preocupe, ela não faz o meu tipo. Só estamos virando
amigos… E estou sendo um bom irmão pra você. — Ele me empurra então
e cambaleio para trás. Ian olha consternado para o assoalho. — Porra, olha
a bagunça que você fez!
— Você sempre foi um bom irmão, Ian. Mas não sei que merda está
acontecendo com você, eu nem sequer esperaria algo de Noah. — Deixo
claro a minha indignação.
Ele toca no seu pescoço, como se estivesse colocando alguma coisa
no lugar.
— Jeremy, notei assim que cheguei que você e Audrey tinham
alguma coisa. Tentei me aproximar dela para descobrir alguma coisa a mais,
e, porra… Audrey vai me matar por isso, mas ela voltou a trabalhar no pub
do Temple Bar.
Um zumbido preenche meus tímpanos e fico estático.
— O quê?
— Eu tenho a acompanhado toda noite no trabalho, pela segurança
dela e por você também. Tentei convencê-la a não voltar, mas ela é teimosa,
não quer o nosso dinheiro.
— Ela me disse que não voltaria.
— Mas voltou, está com umas dívidas bem grandes.
— E quando pretendiam me dizer isso, porra?
— Tive de prometer que não contaria, mas eu sabia que esse dia
chegaria logo. Olha, hoje ela trabalha, então se você aparecer por lá, talvez
consiga conversar com ela.
— O que ela já contou a você? — pergunto curioso.
Sei que após o passeio, Audrey já ficará na sua casa e não demorará
para escurecer, mas já quero pegar o meu carro e esperá-la na frente do
maldito bar. No entanto, aproveito o tempo para conversar com Ian.
O cretino deu uma de investigador nos últimos dias, enquanto eu
morria de ciúmes por aquela súbita aproximação dos dois.
Meu irmão então me contou que tentou até mesmo convencer o dono
do pub, um tal de Steven, a deixar Audrey em paz. Mas parece que o
cretino tem uma espécie de obsessão maluca por ela, assim como alguns
dos seus fiéis clientes.
E isso parece soar tão ruim para mim.
Principalmente, quando ele menciona um uniforme que não passa de
duas faixas de tecidos, praticamente, sexualizando propositalmente as
funcionárias.
Trinco os dentes só de imaginar Audrey submetida a isso.
— Olha, mas não pensa que é fácil lidar com ela. Audrey é legal com
você, mas comigo ela é como um cão feroz — Ian comenta.
— Bem, você merece. Ninguém mandou ser tão enxerido.
— Sabe, achei que você agradeceria por isso.
Ian está escorado na mesa de sinuca e eu sentado no divã. Olho para
ele por alguns segundos e então me dou conta de que ele está certo, por
tudo que fez até agora, em como manteve Audrey salva, por ela e por mim,
enquanto eu não estava a par de nada.
Só que agora sei e se não agir imediatamente, não estarei honrando
meu nome e a minha imagem.
Então me levanto seguido de um suspiro exausto.
— Você tem razão. Obrigado e desculpe qualquer coisa, Ian.
— Ah, não esquenta. Irmãos servem para essas coisas, não é? Conte
comigo. Eu gostei de Audrey também, e sei lá, posso estar delirando, mas
acho que vocês formam um belo casal.
Sorrio em resposta.
Não é como se não tivesse nos imaginado juntos também. Isso agora,
acontece quase constantemente.
— Às vezes me pergunto se vou me apaixonar por uma funcionária
como aconteceu com Noah e você.
— Não estou apaixonado — digo rápido demais.
Ian me olha maneando a cabeça, como se não acreditasse no que falei.
E bem, é verdade.
Eu não paro de pensar nela nesses últimos meses, mas não digo ser
paixão.
É precipitado demais.
Eu só a quero.
Preciso dela porque…
Não tem explicação, apenas sinto que tem de ser assim.
Que o seu corpo implora pelo meu e tudo o que quero é fazê-la ficar
saciada.

Não consigo parar de pensar na situação da Audrey de volta àquele


maldito pub desde o momento em que Ian me confessou tudo.
Porra, onde ela estava com a cabeça?
Meu sangue ferve só de pensar naqueles homens nojentos olhando
para ela, tocando nela.
Não, é horrível pensar nisso e faz as horas se tornarem o pior tipo de
tortura que eu poderia imaginar.
Pensei em surgir no pub, de surpresa, colocá-la sobre um ombro meu
como se fosse um saco de batatas, mesmo sabendo que ela se debateria e
daria um tapa na sua bunda linda para mantê-la imóvel.
Mas ela continuaria relutando porque Audrey apesar de todo o seu
jeito doce, não gosta de ser domada, então não gostaria nem um pouco da
minha atitude de arrancá-la a força do trabalho.
Por isso tomo uma outra medida, vou até a sua casa, antes mesmo que
ela saia.
Sei que não tenho nenhuma autoridade sobre isso, mas se impedir
antes que aconteça algo da qual a deixe mal, melhor ainda. Não quero me
sentir culpado também, pensando em como poderia ter evitado qualquer
situação ruim.
E pensar em como ela deixou que Ian ficasse no pub naqueles últimos
dias, a acompanhando de longe, me faz pensar que não seria mal algum ir
até a sua casa.
Eu poderia dar qualquer desculpa, até fazê-la ficar.
É isso.
Farei Audrey ficar, se sentir motivada em estar comigo. E se o que
está rolando entre nós dois for real, ela não irá hesitar.
A chuva de verão cai antes que eu chegue em Rathmines, onde
Audrey mora. Geralmente as chuvas nessa época são rápidas e
acompanhadas de relâmpagos assustadores.
Ligo para Julian só para ter certeza de que eles já chegaram em casa e
ele me confirma.
Uma parte minha fica aliviada, até que eu me veja de frente para a
casa de Audrey, sabendo que a enfrentarei.
E como sei que ela está ali?
Bem, preciso admitir que ouvir Ed Sheeran bem alto a entrega.
Provavelmente, a mãe não esteja em casa e se ela estiver, vou ter que pensar
em uma forma melhor de passar mais tempo com Audrey.
Tomo coragem e sigo.
Ian estava errado sobre mim, não escondo o jogo. Eu o jogo o tempo
todo, da forma mais limpa e objetiva possível.
Dou três batidas à porta.
O volume do som é diminuído, a ouço falar depois ouço seus passos
rápidos até à porta.
Quando Audrey abre, fico bastante chocado com a roupa que ela
veste. É exatamente como Ian havia descrito, dois pedaços de pano,
curtíssimo que mostra muito do corpo dela. E a forma como o meu
responde a isso, só me deixa mais enojado ainda, porque significa que com
os outros homens não é diferente.
— Jeremy? — Ela arregala os olhos para mim, mas não parece estar
muito surpresa.
Talvez, lá no fundo, Audrey já estivesse esperando que Ian dissesse
alguma coisa, e eu intervisse de alguma maneira.
— Por que mentiu para mim? — Sou direto.
Nada irá me parar...
Nada.
Imediatamente ela sabe sobre o que falei, pois não questiona, apenas
segura a porta com um pouco mais de intensidade.
— Porque eu sabia que você tentaria me impedir e eu acho que
cederia, porque você estaria certo de qualquer forma. A única coisa que me
fez ter coragem de sair daquele pub, era o resto de dignidade que me
restava. — Ela olha para baixo, para as poucas vestes que é obrigada a usar
durante o expediente. — Agora acho que não tenho mais nada.
— Não volte para aquele lugar, Audrey.
Ela sacode a cabeça e vejo tristeza em seu olhar.
— Você não é capaz de entender, Jeremy.
— Sabe que posso ajudar.
— Acha que Ian já não me disse isso? E eu continuarei recusando.
Grata por tudo, mas nada vem fácil.
— Não consegue acreditar que pessoas podem ser boas e ajudar
também? E sem querer algo em troca?
— Eu não quero abusar da situação.
— Que situação?
Ela me lança um olhar profundo, então dá meia volta deixando a porta
ainda aberta. Entendo como um convite para entrar e o faço. Fecho a porta
atrás de mim e não paro para avaliar o seu lar, não quero que ela pense que
estou desprezando a sua casa por ser simples.
Mas isso é tudo o que posso notar, afinal há coisas mais sérias para
lidar, uma delas é a situação de Audrey e manter a porra do meu controle
em vê-la vestida desse jeito.
Odiaria com todas as minhas forças que ela saísse vestida assim, mas
confesso que adoraria domá-la usando essa roupa.
Ela está tão sexy que não arrancaria uma peça de roupa sua, eu a
deixaria do jeito que está e só me importaria em dar prazer a ela.
Estamos na minúscula sala, a minha cabeça quase raspa o teto baixo e
meus ombros largos podem facilmente preencher o ambiente todo.
Mas estou concentrado em Audrey, que vai até o armário onde apoia
o corpo e cruza os braços.
— Não quero ser a pobre garota que se livrou das dívidas ao receber
ajuda de um homem bilionário. Sei que para você o que devo parece ser
troco e que estou sendo uma tola em não aceitar, mas acredite, Jeremy, você
não é o primeiro homem que me oferece ajuda. Entende?
Ah, então é isso.
— Acha que sou como esses homens? — pergunto meio magoado.
— N-não. Desculpa se pareceu que eu quis dizer isso, mas, de
qualquer forma, o que o tornaria diferente?
— Quanto vocês devem?
— Muito.
— Escute, posso adiantar doze meses do seu salário. Mesmo que não
cubra, já é um tipo de ajuda. Você me entende?
— O que garante a você que ficarei por mais doze meses?
— Você não precisa garantir nada, Audrey. Olha, só quero que esteja
segura e bem. Não quero ajudá-la e pedir em troca sexo, se era isso que
pediam a você.
Os olhos grandes de Audrey me encaram profundamente e ela revela
lentamente:
— Se fosse a sua condição, jamais faria isso em troca de alguma
coisa. Naquele dia, eu não beijei você querendo algo em troca, Jeremy.
Puta merda!
Sinto minhas pernas pesarem neste instante, meu coração bate forte e
minha mente fica enevoada. Todos os músculos do meu corpo se contraem,
principalmente aquele lá embaixo, que se eu der mole, ficará fácil de ser
notado.
— Você não sabe o poder das suas palavras, Audrey. Então tenha
cuidado — aviso, porque sei muito bem o que farei se ela ousar falar
alguma coisa que me deixe louco.
— Estou sendo cautelosa há dias, Jeremy. E acho que você também.
— Descruza os braços, abaixando a guarda enquanto apoia as mãos na
quina do armário. — Mas acho que isso não vem ao caso agora, porque
você só veio aqui para me oferecer ajuda, não foi?
Fecho os olhos e respiro fundo. Parece que alguém aqui está querendo
me provocar. Então não sou o único a estar louco, com os desejos à flor da
pele.
Audrey está mostrando algo que não imaginava existir e está me
dando gasolina para atiçar a qualquer momento a chama existente, como se
quisesse ser incendiada.
— Para ser honesto, não vim só oferecer ajuda, eu vim pará-la e
tomar de uma vez a atitude de determinar esse lance. Jesus, como odeio
essa palavra.
Ela dá uma risadinha diante da minha consternação.
— E como você planejava fazer isso? — pergunta com um olhar doce
e pidão.
Essa Audrey…
Confesso que estou gostando de conhecer.
Ela está me surpreendendo e gosto de como não está escondendo o
jogo.
Sim, baby, vamos colocar o cavalo e a rainha nesse jogo.
Diante do cenário, dou dois passos em sua direção, o que é o
suficiente para encurtar o espaço entre nós, para perceber a sua respiração
mudar e seu corpo todinho se oferecer a mim.
Eu a admiro da cabeça aos pés, pés estes que tem os dedos retidos,
como se ela estivesse contendo alguma coisa dentro dela.
E eu estou louco para ver que coisa é essa.
— Eu ia dar um motivo para fazê-la ficar. Apenas um motivo,
Audrey. Era tudo o que necessitava.
— Que motivo era esse? Ainda pode ser útil.
Seus lábios se movem como se estivessem esperando os meus.
— Você está sozinha em casa, não está?
— Sim, mas agora você está aqui. Não estou mais sozinha.
Estico a mão que toca a sua face, o meu polegar acaricia sutilmente o
canto da sua boca e ela se vira para que eu possa fazer o mesmo em todo o
pedaço de carne macia e rosada, preenchida por um batom mais rosé.
Penso em como consegui chegar a tempo, pois ela parece já pronta
para sair.
— Eu pensei em retribuir aquele beijo que você me deu. Terminar de
alguma forma o que começamos naquela floresta. Sei que desde aquele dia,
algo entre nós dois ficou incompleto.
— Era assim que você pretendia me fazer ficar?
— Sim — respondo com a voz falha quando me aproximo mais e
inalo seu cheiro de morango.
Desejo passar a língua ao redor do seu pescoço.
Estamos ofegantes, de repente nenhum de nós dois parece respirar
direito e meu corpo já está contra o dela.
As mãos de Audrey estão no cós da minha calça, como se ela não
soubesse muito como fazer, embora saiba o que quer.
— Porque isso está me matando, Audrey, e faz muito tempo que eu
não me sinto assim. Desculpa o egoísmo, mas se não tomar uma atitude
hoje, sou capaz de enlouquecer. Principalmente quando sinto que você quer
o mesmo, você já nem consegue mais disfarçar.
— Tá tão óbvio assim?
— Eu não esperaria menos da garota que me beijou, mesmo depois de
sair rolando chão a baixo. Você nem pensou em ver se estava com algum
osso quebrado, seu primeiro ato foi me beijar. E agora que não estamos
caindo, quero que me dê a honra de fazer isso direito desta vez.
Quando Audrey abre seus olhos, eles estão tão lascivos e acesos que
posso dizer que uma outra Audrey assumiu o controle.
Mas, não, é a mesma pessoa e isso se chama desejo.
Ela está sendo consumida pela forte excitação e quase posso sentir o
seu cheiro.
— Sim.
É a sua última palavra antes de alcançar o sinal verde, cobrir a sua
boca com a minha, sentir o mundo se fundindo em luz e calor, uma massa
forte e densa, capaz de me fazer segurá-la com força. Seus seios enrijecidos
quase me perfurando, a sua boca doce e macia, o perfume e a sensação
mágica de estar com ela em meus braços. Audrey pode não ser minha, mas
agora eu a farei ser minha.
A esta hora, deveria estar a caminho do trabalho. Deveria ter saído
mais cedo, mas me atrasei porque não encontrava o meu par de meias.
Foi quando ouvi alguém bater à porta.
Eu ainda não sabia que era ele, mas acho que sempre esperei que
fosse ele, em qualquer lugar, em todas as horas.
Jeremy queria me ajudar, assim como Ian quis fazer e eu recusei. Mas
ele não estava ali só para oferecer ajuda, Jeremy queria me impedir de ir
trabalhar naquela noite, e de voltar para o pub.
Como?
Bem, a resposta está na forma envolvida em que nos encontramos
agora mesmo.
Suas mãos estão em mim, me segurando, e a sua boca está colada na
minha, enviando calor e desejo para todos os cantos do meu corpo.
Paro de respirar por uns segundos, com o coração batendo quase na
boca e um calor forte irradiando entre nossos corpos enquanto o beijo é
tudo o que parece existir entre nós dois.
Mas eu me sinto bem.
Sei exatamente o que estou fazendo e o que quero.
Fiz com que Jeremy percebesse que estava pronta, porque não
aguentava mais toda aquela angústia me domando, tanto que quase não me
reconhecia mais.
Vivia no mundo da Lua, não conseguia fazer simples tarefas porque
meus pensamentos estavam em Jeremy e na curiosidade constante que tinha
em relação a ele.
Falei coisas que fossem propositalmente instigantes para que ele não
ficasse acuado.
Sei que um homem como Jeremy não precisa de incentivos, mas eu só
iria se ele viesse. Afinal ninguém atravessa um sinal fechado, sem a
iminência de algo dar errado.
Sinto sua mão subir pela minha lateral, parando bem debaixo do meu
seio, acariciando sutilmente essa região. Mas é o suficiente para arfar dentro
da sua boca e como um aviso silencioso, ele me toma em suas mãos e me
tira dali.
Não sei quais são os seus planos, mas travo minhas pernas e ele se
afasta, me olhando atônito.
— O que foi?
Ergo a cabeça para olhá-lo melhor.
— O que vamos fazer? — pergunto nervosa.
— Quer saber mesmo, pequena?
A sua mão grande entra por trás do meu cabelo, ficando os dedos com
uma força radiante em meu couro cabeludo.
Sinto a minha intimidade se contrair fortemente.
Jeremy aproxima seu rosto, se curvando um pouco para baixo para
me alcançar. Sinto a sua barba roçar na parte sensível do meu pescoço,
juntamente ao seu hálito refrescante conforme ele murmura:
— Eu sempre imaginei como seria sentir o seu gosto na minha língua,
sempre imaginei como seria esses olhos grandes me desejando, implorando
para que eu fosse fundo e rápido.
O ambiente esquenta mais ainda.
— Imaginei nós dois fazendo coisas que, se eu contasse para você
agora, talvez a fizesse correr, de alguma maneira. — Seu olhar então buscou
o meu e seus olhos têm a pupila dilatada. Jeremy completa com uma voz
que se iguala aos trovões do lado de fora: — Posso ser um homem bom,
Audrey, mas gosto de ser um pouquinho mal.
Acho que sinto meu sangue correr de trás para frente.
Qualquer pessoa teria corrido, uma vez que essa “maldade” que ele
mencionou, ainda é algo desconhecido. Mas eu não corro, na verdade, gosto
muito. Gosto da sensação de não saber onde estou me metendo com esse
homem gigante e lindo na minha frente.
— Por isso que fiquei fascinada por você. Somos quietos e,
geralmente, pessoas quietas costumam fazer estragos.
Jeremy ensaia um sorrisinho satisfeito.
— Sim, isso mesmo, pequena. Você parece um anjo, mas às vezes me
pergunto o tipo de diabo que espreita em você.
Ele beija meu pescoço e as minhas pernas amolecem. Minhas mãos
percorrem pelos braços longos e sutilmente musculosos de Jeremy,
enquanto ele me agarra pela cintura e faz movimentos que mexem no meu
ponto mais baixo, aguçando.
É como se ele estivesse insinuando alguma coisa.
Eu me viro, ficando de costas para ele, que coloca meu cabelo para o
lado e começa a baixar seus dedos em direção ao meu ventre. Com muita
dor, eu o impeço no meio do caminho.
— Preciso contar uma coisa a você. — Mordo o lábio inferior.
— Conte.
Fico apreensiva, mas Jeremy precisa saber onde está se metendo.
— E-eu… Eu sou virgem.
Faz um silêncio tão profundo no ambiente, que de repente dá para
ouvir a música do Ed Sheeran que toca no meu quarto e coloquei baixo o
suficiente para não atrapalhar.
Sinto como se estivesse febril quando Jeremy não diz ou faz nada.
Será que estraguei tudo?
Eu já estou sentindo toda a excitação me deixar como um banho de
água fria. Mas Jeremy pergunta:
— Por que, Audrey?
Estou tensa, porém, logo sinto a sua outra mão livre descer por meu
ombro, como se estivesse me consolando.
Logo entendo que Jeremy está tentando me deixar relaxada.
— Nunca me interessei por nenhum homem. — É a primeira vez que
falo isso em voz alta. — O meu pai enganou a minha mãe e nos deixou
quando eu ainda tinha oito anos. Eu vivi com aquela ideia de que homens só
me dariam trabalho, assim como o meu pai deu para a minha mãe. Eu não
queria aquilo para mim.
— Nas você nunca quis tentar, pelo menos uma vez? Nunca sentiu
nenhum tipo de atração? — pergunta com os lábios roçando o lóbulo da
minha orelha e logo entendo o que ele está fazendo.
Jeremy não quer perder o clima.
Mas nego com a cabeça.
— Homens me irritavam no geral. Quando eu conheci você, estava
pronta para ser uma antipática, mas você foi legal e aquilo mexeu comigo
por meses. Ainda mexe. Algumas noites, eu lembrava de você. — Solto a
sua mão, mas a impulsiono sutilmente para baixo, para que ele saiba que
pode continuar com o que interrompi.
Jeremy entende o recado e segue enquanto ainda digo:
— Eu imaginava cenas, onde tínhamos uma conversa legal, onde eu
me apaixonava por você, ou que você fazia coisas comigo que jamais
imaginei fazer com outro homem.
Ele arregaça a barra da minha saia justa mais para cima e toca no
interior das minhas coxas, tão quentes.
Fecho os olhos, e com Jeremy atrás de mim, repouso minha cabeça
em seu peitoral, me deliciando com as coisas que ele está prestes a fazer.
— Eu deixava você fazer tudo comigo. Eu quis tanto você que
quando o reencontrei tive tantos sonhos, Jeremy. Sonhos esses que estava
decidida a não hesitar quando estivesse tão perto de torná-los reais.
— Eu também, pequena. — Seus dedos grandes pressionam contra a
minha calcinha melada e ele arfa profundamente. — Juro que irei tornar
tudo realidade e farei a porra de qualquer coisa para realizar esses sonhos.
Você não faz ideia, Audrey!
A sua mão invade minha calcinha e encontra a minha intimidade
completamente encharcada, quente e pulsante.
Ele arfa de novo, como se tivesse sido queimado.
Seu dedo do meio explora a minha fenda úmida, para cima e para
baixo, até que o desliza para dentro de mim e em resposta solto um gemido,
envolvendo meu braço esquerdo nele para me apoiar.
Jeremy O’Donnell está me masturbando na sala da minha humilde
casa.
Olho para baixo, para vê-lo em ação, mas já me contorço toda em
prazer. Vendo que estou completamente desestabilizada de prazer, Jeremy
cola meu corpo mais ao dele conforme ele me penetra com o seu dedo.
Sinto a sua ereção, mais dura do que a primeira vez, tanto que a ponta
está quase perfurando a minha coluna, e por alguma razão isso me deixa
mais excitada ainda.
Mordo meu lábio com força, estou me sentindo completamente
extasiada em seus braços conforme me dá prazer.
Segurando o meu rosto, a sua boca procura a minha para um beijo
feroz, urgente.
Seus lábios são um vício sem fim, o seu sabor, tão viril, e a sua
língua…
É tão ágil, que fico curiosa sobre como se comportaria uma vez que
estivesse lá embaixo, e como eu reagiria a ela.
— Jeremy… Po-por favor — imploro após pensar no que mais
poderia ser feito.
Não me contenho, desabo de joelhos no sofá, mas ele não me larga.
Seu dedo parece um gancho em mim, e ainda assim, ele insere mais um.
— Então você quer, Audrey? — pergunta com a voz rouca, carregada
de luxúria. — Quer que eu faça sexo com você, que eu tire o seu
cabacinho?
— S-sim. É o que eu mais quero.
Jeremy para o que faz e me vira para ele.
— Então me leve para o seu quarto, Audrey.
Não sei se ele irá caber lá, mas a ideia parece ser excitante.
Um homem desse porte no meu quarto minúsculo.
Então o guio pelo local, quando chegamos, abro a porta e entro
porque acho que indo na frente, não precisarei me espremer entre ele para
vê-lo.
Jeremy fecha a porta e seus olhos não saem de mim.
Acho que poderia tê-lo levado a um banheiro que não teria notado
que não era um quarto.
Mas gosto de me sentir observada por ele, desejada…
Jeremy se aproxima e toca gentilmente meu rosto, como se o toque
fosse a única coisa sutil que fará comigo pelos próximos minutos.
— Você é tão linda. Amo a ideia de trepar com você usando essa
roupa provocativa, mas seria incrível se você estivesse completamente nua,
Audrey.
Engulo em seco, não porque estou nervosa ou com medo, mas porque
nunca fiz isso antes. E pela forma como Jeremy me olha, sei que é a coisa
certa a fazer e que não me arrependerei, porque esperei tanto por sua boca
em cada canto do meu corpo.
Começo a tirar a saia, não poupo e tiro a calcinha junto, logo depois o
meu top.
O ar beija meu corpo nu e fico toda arrepiada.
Jeremy inclina a cabeça para o lado ao ver como reajo, mas logo
depois analisa muito bem cada parte do meu corpo.
E não me intimido.
Gosto disso, enquanto ele parece pensar nas coisas que fará comigo.
Lançando um olhar sombrio, ele apenas faz um gesto com a cabeça
em direção a minha cama e entendo rapidamente o recado.
Sento como uma garota que se comportou mal, e agora levará a sua
lição. Faço questão de que meu olhar transmita isso, de que serei sua para
ele me domar.
Uma pequena, como ele gosta de me chamar, aprendiz.
Jeremy se aproxima e toca meus lábios com o seu polegar enquanto
mantenho meu olhar nele.
— Juro por Deus, que quero fazer tantas coisas com você, mas a
missão de inseri-la nesse mundo do prazer me traz uma responsabilidade
que devo adotar nessa situação — avisa como se isso doesse, mas que fosse
de pura satisfação também.
— Você fala como se fôssemos fazer isso mais vezes.
— Eu teria que ser muito idiota para não querer ter você mais vezes,
Audrey.
Abaixo a cabeça e mordo a ponta do seu polegar.
— Que bom, porque você me deixou muito curiosa. — Com a
respiração desregulada, olho fixamente para a calça sôfrega de Jeremy pela
ereção.
Eu o toco, sem nenhum aviso prévio e ele quase pula.
— Mas posso surpreender muito também, Jeremy. Logo de primeira.
— Estou certa de que farei isso nele.
Tento abrir seu zíper, começar por algum lugar.
Primeiro, estou salivando para experimentá-lo, e só de imaginá-lo, eu
me sinto muito depravada.
No entanto, sou impedida no meio do caminho, Jeremy me pega pelo
pulso e me olha atentamente.
— Eu gostaria muito que você fizesse isso, mas não agora, pequena.
— Por quê?
Ele se agacha na minha frente, ficando de joelhos e abre minhas
pernas como se fossem uma janela que daria a ele a vista mais deslumbrante
em uma manhã de primavera.
Sinto um certo conforto com esse gesto, mas me acomodo.
— Porque vou garantir que na sua primeira vez, você se sinta o centro
do universo. — Olha para mim por mais um momento, então se afunda
entre as minhas pernas.
Meu coração bate muito forte, meu peito sobe e desce em um ritmo
frenético, e tudo o que vejo antes de fechar os olhos e me render, é a boca
de Jeremy se fechar na minha boceta.
— Ah!!! — Não contenho o primeiro gemido, que soa tão dolorido.
Fazendo o movimento de novo, vejo estrelas.
Começo a deslizar na mesma direção em que a língua de Jeremy me
lambe, de cima para baixo, e depois em movimentos circulares, no meu
clítoris, que está mais do que sensível.
Suas mãos agarram a minha cintura, trazendo meu corpo mais para si,
como se ele não estivesse satisfeito com o que tem. Enquanto isso, solto
alguns gemidos feito uma louca, porque nunca experimentei tamanha
sensação inebriante.
— Isso, pequena, se liberte. Vamos deixar as coisas mais
interessantes.
Seu dedo afunda dentro de mim, me penetrando e gosto de pensar que
já é o seu pau.
A junção do seu dedo e a língua só me leva mais a loucura ainda, não
me contenho e começo a mexer os meus quadris.
— Você é tão fogosa! Está doida para ser fodida, não é? Ser penetrada
pela primeira vez.
Eu apenas faço que sim, com a cabeça.
Toco meus seios e começo a massageá-los, à medida que isso fica
mais gostoso.
— Isso está tão bom, Jeremy — deixo registrado, arfando. — Não
vou suportar…
— Não. — Ele me interrompe e logo para o que está fazendo. —
Quero que o seu primeiro orgasmo seja comigo dentro de você.
— Quem disse que eu nunca tive orgasmos?
Ele parece surpreso e então confesso:
— Quando pensava em você, costumava ter muitos.
Ele me lança um olhar sugestivo e então retira a sua blusa azul-
escura, que cai nele tão bem e logo depois as partes de baixo da sua roupa.
Não sei disfarçar quanto a ver um pau ao vivo e em cores pela
primeira vez. E ainda mais sendo o de Jeremy.
É engraçado e completamente tentador como o seu membro combina
tão bem com ele.
Jeremy é um homem esbelto, de fisionomia viril, nada musculoso,
mas também nada muito magro.
E o seu pau…
Grosso.
“Não vai caber”, é o meu primeiro pensamento.
— Pequena, você está babando tanto no meu cacete — ele diz
enquanto segura o seu amigão e faz movimentos sutis nele.
Vejo um líquido brilhoso expelir da ponta.
— Parece bom — comento.
— Quer tê-lo dentro de você?
Pisco atônita ao imaginar aquilo dentro de mim.
— Jeremy…
Ele se inclina, ficando por cima ao subir na cama e assumir mais uma
vez o controle.
— E-eu… Parece tão… Grosso.
— Só melhora mais quando está dentro de você — sussurra no meu
ouvido. — Deite-se — pede e eu obedeço.
Deito na minha cama, que parece ser tão minúscula com ele aqui, já
entre as minhas pernas.
— Eu nunca irei machucar você, Audrey — avisa em um tom gentil.
— Mas, vou ter que fazer isso. Apenas me diga se não estiver aguentando,
ok?
Olho bem para ele que fala sério. Talvez, isso devesse me deixar
assustada, mas não deixa.
Eu apenas assinto com a cabeça e ele se ajusta.
Sinto algo duro e macio ao mesmo tempo, se deitando sobre a minha
fenda.
É quentinho.
O pau de Jeremy está deitado sobre mim, deslizando para cima e para
baixo, me estimulando e se lambuzando de mim.
— Vamos com calma. Bastante calma…
Sinto a ponta do seu pau na minha entrada, deslizando lentamente
para dentro, enviando uma dor aguda, como se estivesse quebrando algum
osso meu.
travo o olhar nele enquanto meu corpo se mantém imóvel. Jeremy
deixa que a sua mão esquerda me tranquilize, mas estou tranquila.
Eu estou.
Seguro o dorso da sua mão e olho para ele com firmeza, pois preciso
transmitir confiança também.
Aceno com a cabeça para que ele prossiga. Então, Jeremy se afunda
em mim, um pouco mais e mordo o lábio, contendo o grito, mas acabo
gemendo.
É uma dor gostosa, que só se intensifica à medida que ele me alarga
mais e mais.
Meu corpo inteiro parece entrar em combustão, mas não irei parar
isso.
Jamais!
Ele então continua e só para quando atinge o meu limite.
Peço a Deus que ele não veja as lágrimas se formando no canto dos
meus olhos.
— Tudo bem aí? — pergunta enquanto continua parado.
— Sim. É… Um pouco estranho, incômodo, mas sei que vai passar.
— Vai sim — assegura.
Para me distrair justamente do incômodo, Jeremy me beija. Não um
beijo selvagem, de arrancar o fôlego, mas um beijo sutil, que despertaria o
fôlego de qualquer romântico.
Ele está sendo cuidadoso, guia os meus lábios em movimentos que
parecem ser ensaiados.
Eu gosto da forma como nossas bocas se encaixam, parece ter o
encaixe perfeito.
E no momento em que me perco em seus beijos sedutores, é quando o
sinto se movimentar dentro de mim.
Cuidadosamente, Jeremy sai e então volta de novo. Ele está lento e
permanece nesse ritmo até o incômodo se transformar em puro prazer, até
eu estar gemendo, envolvendo meus braços nele e cravando minhas unhas
em suas costas.
— Oh, meu Deus… Jeremy! — digo gemendo com mais intensidade
quando as penetrações se transformam em estocadas.
Até mesmo Jeremy ergue o corpo mais um pouco, só para ganhar
mais intensidade no ritmo.
Ele segura as minhas pernas para cima, e me fode.
Quando acho que não posso mais lidar com isso, ele me troca de
posição em uma agilidade que me deixa um pouco atordoada. E, de repente,
estou de costas para ele, que enfia uma almofada debaixo de mim e arrebita
mais a minha bunda.
Ele dá um tapa de respeito em meu bumbum e grito.
— Ai! Achei que disse que ia pegar leve — protesto, mas só de
brincadeira, porque gosto desse seu lado que ninguém pode sonhar existir.
— E estou, pequena — salienta.
Eu deveria me preocupar?
Se Jeremy não considera isso leve, não consigo imaginar o que ele
considera ser pesado.
— Sempre fui louco pra fazer isso. Tem noção do quanto a sua bunda
é linda, Audrey? — Ele dá um tapa no outro lado. — Tem!?
— NÃO! — grito, fazendo uma cara de dor, mas mordendo o lábio
em puro prazer.
— Quero comê-la olhando essa bunda linda. Mas, num geral, parece
até que estou pilotando uma Ferrari, meu bem.
Ele então segura a minha cintura, visualiza bem e o que vejo depois
deixa a situação mais íntima e depravada ainda. Jeremy cospe em mim.
Assim que sinto, arqueio meu corpo.
Acho isso delicioso, principalmente quando ele me penetra e desta
vez a sensação é triplicada.
Agarro a cabeceira da cama, sabendo que pegará fogo.
Sinto Jeremy ir bem no fundo, alcançar lugares novos que antes não
fora. Eu choramingo, porque é tão bom, mas tão bom, que me dá vontade
de chorar.
— Porra… Isso tá muito gostoso! Quero essa boceta todinha pra mim.
Está me ouvindo, Audrey?
Sou capaz apenas de balançar a cabeça.
— Por mim, você ainda voltaria naquele pub?
— N-não.
— Isso, boa garota. Quero você comigo — declara.
— Estou com você, Jeremy.
— Está mesmo?
— S-sim.
Sinto que ele está crescendo dentro de mim e que uma coisa nova está
acontecendo.
— Então goza comigo, pequena… Go-goza!
Ele está tendo espasmos e não demora muito para que um líquido
quente e abundante me preencha.
Quentinho, quentinho.
Isso é o suficiente para me levar à loucura e gozar logo em seguida.
Parece a batida de dois trens, pois estou completamente em êxtase,
respirando com dificuldade e tão, tão satisfeita.
Tudo parece mais leve e mais bonito.
Jeremy toma cuidado comigo logo depois. Me deita na cama e
confere se eu havia sangrado.
Só um pouco.
Mesmo assim ele pega uma toalha e me cobre. Ele não hesita em se
deitar ao meu lado, como dois amantes que se amam e vivem uma vida
juntos.
— E então, o que achou? Sexo é basicamente isso.
— Eu adorei — digo rápido demais. — Será que podemos fazer mais
depois?
Jeremy dá uma risadinha nervosa.
— Toda hora, mas você precisa descansar. Vai ficar muito dolorida
ainda.
— Você fala sério sobre querer de novo?
— Por que eu não falaria?
Dou de ombros e me aninho a ele.
— Não sei. É só difícil de acreditar que você esteja aqui.
Ele esconde uma mecha do meu cabelo atrás da minha orelha com
carinho.
— Idem. Mas não é só sexo, Audrey. Gosto realmente de você. Eu
não entregaria meu corpo a uma pessoa que não quisesse conhecer a alma.
Uau!
— Isso foi muito… Profundo — analiso.
— Foi mesmo, né? Mas é como me sinto. Sexo, é isso. Mas pode ser
muito mais, como a conexão de duas almas, por exemplo.
— Estava de corpo e alma, pode ter certeza.
Jeremy me olha, então beija o topo da minha cabeça e me abraça.
— Estava sim, pequena. Eu senti… Eu senti.
Não sei o que ele quer dizer com isso e decido não perguntar, mas
viver esse momento.
Mamãe está no trabalho, chegará daqui duas horas, tempo perfeito
para aproveitar a companhia de Jeremy e pensar em como será de agora em
diante, sabendo que já não seremos mais os mesmos depois disso.
Enquanto isso, lá fora, a chuva só aumenta, acompanhada de trovões
e aproveito para fechar os olhos e descansar nos braços de Jeremy.
— ESTÃO PRONTOS? — grito no pé da escada para que Julian e
Audrey me ouçam lá de cima.
Volto a atenção para minhas munhequeiras brancas que geralmente
uso para jogar golfe, porque hoje é dia.
Dei a ideia mais uma vez, porque estava louco para praticar o esporte
e meu filho não pestanejou desta vez.
Iremos para o campo de golfe da família Hauston, ficaremos por lá e
então iremos para o SPA logo depois, será algo relaxante.
Mas essa parte do SPA, na verdade, foi uma desculpa para que eu
fizesse com que Audrey relaxasse depois do que aconteceu na sua casa.
Eu sabia que ela recusaria a minha oferta, bem como tem recusado até
agora qualquer ajuda que poderei oferecer a ela. Então pensei que a única
forma de fazê-la aproveitar sem que dissesse “não” para mim, era se aquele
momento estivesse incluso na nossa programação do dia.
Pela nossa privacidade e paz, tenho me mantido na linha.
Voltei para casa, tomei um banho e fiquei quieto, com a cabeça no
travesseiro enquanto sonhava acordado com o episódio que eu achei que
daria errado.
Porra, como estava com receio de dar errado!
Porque tinha tudo para dar.
Eu só não contava com que Audrey estivesse esperando por mim e
essa foi a porta aberta pela qual passamos juntos.
Virgem...
Ela era virgem, nunca havia tido nenhuma experiência sexual devido
às referências ruins de homens cretinos que teve na vida. Isso era muito
ruim para mim, pois manchava a minha imagem como homem, por mais
que não seja nada do que ela já teve até agora.
Eu faria Audrey perceber que nem todo homem é igual e que ela pode
sim, ter a sorte de encontrar alguém incrível.
Modéstia à parte, ela já achou, mas acha que não é o suficiente para
isso.
Como dizer que Audrey foi a coisa mais doce e deliciosa que já
provei?
Não estou blefando, muito menos só dizendo isso porque transei e
tirei a sua virgindade, mas digo isso porque ela é um tipo diferente, a qual
nunca me envolvi antes.
Às vezes, se levo meus dedos até o nariz, posso sentir o cheiro dela
ali ainda, tão inebriante. Seu eu fechar os olhos e escutar com calma, posso
ouvi-la gemer, posso visualizar seu corpo se contorcendo em prazer e a
forma safada que ela me olhava.
Ela era uma virgenzinha fogosa e estava muito contente em ser
escolhido para ser o primeiro homem em sua vida.
Só me perguntava quando aconteceria de novo.
— Estamos prontos! — Julian vocifera descendo a escada
rapidamente.
— Já estamos bem atrasados — comento e entrego para ele uma bolsa
com nossos tacos especiais. — Seus tios já estão lá.
Quando ouço passos descendo os degraus, eu já sei que é Audrey. Eu
me viro para vê-la descer, só não esperava ser tomado pela surpresa em vê-
la vestida adequadamente para a ocasião.
Prendo o fôlego e me vejo imóvel, pois não é fácil resistir à beleza
dela. Tão suave e sutil.
Parece muito com uma boneca.
No entanto, preciso admitir que o maior causador da minha reação
boba, foi vê-la vestida com uma blusa branca de manga curta, tão justa que
seus seios parecem ter aumentado de tamanho.
Audrey veste também uma saia plissada branca e tênis branco com
meias brancas.
Porra, ela está mesmo me provocando, não é?
As suas pernas à mostra, só me faz pensar em coisas sórdidas.
— Você parece pronta para acertar todas as bolas no buraco, Audrey
— comento quando ela desce o último degrau.
— Meredith tinha uma sobrando e me emprestou. Acha que ficou
bom?
— Sim, mas, se eu fosse você, manteria distância de mim, pelas
próximas horas — sussurro essa parte.
Mesmo que Julian esteja nos esperando na porta, eu não consigo
confiar.
Vejo as bochechas dela corar, mas desta vez, Audrey não as esconde,
deixa que eu veja que a afeta.
— Eu deveria saber a causa deste aviso quase que ameaçador?
— Melhor não. Mas se estiver com vontade de descobrir, não fugirá
de mim.
— Só um criminoso foge, Jeremy. E não estou cometendo nenhum
tipo de crime — diz em um tom muito provocativo e ciente de seus efeitos
sobre mim.
Audrey se afasta, andando cheia de confiança, como se soubesse que
eu estou observando a sua bunda linda.
Bom, mas o único crime que Audrey comete, é de estar nessa roupa
de golfe, super provocante.
Que Deus me ajude.
No carro, não dá outra, a saia dela diminui de tamanho quando está
sentada no banco do passageiro.
Julian vai atrás, muito concentrado em seu celular e ciente disso, vez
ou outra trocamos olhares que meu filho não será capaz de testemunhar
enquanto está distraído.
Juro que, se estivéssemos a sós, meus dedos já estavam dentro da sua
saia maldita.
O que me pega em Audrey, é que mesmo tendo esse ar angelical, ela
consegue ter uma pegada maléfica.
Digo, a caminho do Golf Club, ela me olha algumas vezes, morde o
dedo e fica abrindo e fechando as suas pernas, de forma bem sutil. Como se
quisesse mostrar o quão excitada já está.
Isso me deixa perturbado.
Nenhuma mulher sob algum envolvimento comigo, ficaria na mão.
Então Audrey jamais precisaria se preocupar com esse tipo de coisa. Exceto
agora, que não posso fazer nada!
Quando chegamos ao clube, reconheço os carros dos meus irmãos no
estacionamento. Entrego a chave ao manobrista e então saímos para nos
encontrar com Noah e Ian, que ainda não haviam começado sem nós.
— Finalmente! — Noah diz assim que nos aproximamos. — Você
inventa de colocar munhequeiras e nós ficamos esperando.
— Você diz isso porque seus punhos não são ruins desde a
adolescência, porque era eu que vinha pro golfe com o papai — rebato sem
querer me estressar.
Ian revira os olhos.
— Pelo visto os anos de experiência não renderam boas habilidades a
você. Quer jogar golfe movimentando o seu punho, dá nisso — diz meu
irmão mais novo, que se vira para Audrey e complementa: — Jeremy pode
ser bom em muitas coisas, mas no golfe é horrível. Isso eu garanto.
Dou um sorriso descrente, sabendo que ele está fazendo isso para me
irritar.
Aliás, o que Ian e Noah não fazem com a intenção de me tirar do
eixo?
Eles sempre foram tão incomodados com o fato de eu ser o mais
organizado e na linha. Noah, por exemplo, um pouco antes de eu conhecer
Sofia, me enfiou em um apartamento com seis acompanhantes de luxo,
todas prontas para dar tudo o que quiséssemos.
E eu fugi.
Saí correndo, mas antes pedi desculpas para as moças e que eu não
era tão canalha quanto o meu irmão.
Elas riram e algumas suspiraram.
Acho que gostaram pela forma honrosa que as tratei.
Independente do tipo de mulher, todas gostam de serem tratadas como
damas.
— Vamos ver se você irá dizer a mesma coisa depois da surra que irei
dar em você hoje — disse na defensiva, me mantendo aprumado, muito
confiante.
Mas aí Ian se aproxima e sussurra só para mim:
— Isso se você não estiver com as pernas bambas. Trouxe uma ótima
distração para si mesmo.
Ian passa por mim, já se sentindo um vitorioso e espertão.
Eu sei exatamente de quem ele está falando.
Audrey...
E não é mentira.
Se eu conseguir marcar ponto nas partidas, será um milagre, porque
Audrey está sendo muito boa em tomar toda a minha atenção.
— Vocês são uns bebês, sabiam? — Meredith anuncia enquanto passa
seguindo a mesma direção que Ian. — Quando estão juntos, nem parecem
homens de negócios que saem na capa da Forbes.
Noah sorri.
— É o nosso jeitinho. Aliás, meu amor, você sabe como ninguém que
irmãos têm suas provocações, não é? — Ele lançou a ela uma piscadela e
Meredith olhou para ele como se seu olhar fosse afiado demais para parti-lo
ao meio.
No entanto, sabemos o quanto Meredith está bem com a sua irmã
agora. É tia e cada uma vive a sua vida bem e saudável.
— Acho que já estamos todos com sangue nos olhos para a partida.
Isso parece promissor — digo ao perceber que mal chegamos e alguns
conflitos já foram instalados entre nós.
Noah e Meredith foram atrás de um carrinho, já Audrey se aproximou
e perguntou um pouco preocupada:
— Está tudo bem entre você e seus irmãos?
Dou uma risadinha tranquila.
— Não se preocupe, somos assim, mas nos damos muito bem.
— Ian ama vocês.
— Ama?
Seus olhos arregalam, revelando mais deles que tem a cor bonita dos
pelos de uma corça sendo banhada pela luz do sol.
— Deveria ser segredo? Desculpa se falei demais, eu só queria
melhorar o clima.
— Bom, não é segredo, só não temos o costume de ficar declarando
isso um para o outro, sabe? Fica estranho. Além do mais, o clima não está
estranho, pode ter certeza. Noah e Ian são muito competitivos. Por mais que
Ian não admita isso, eles gostam de botar pressão em tudo o que fazem.
— Ah, entendi. Fico mais aliviada. — Ela então olha na direção dos
carrinhos. — Eu sempre quis ter irmãos, nunca gostei de ser filha única.
— Não sabe o privilégio que tem.
— Você está brincando, não é?
Dou de ombros.
— Talvez.
Pego um carrinho desses de golfe e desta vez é Julian a vir ao meu
lado. Ele está empolgado e isso é uma surpresa.
Ele já tinha alguns ensinamentos sobre o esporte, mas Noah quis
ensiná-lo um pouco mais. Eu quis ensinar a Audrey também, mas Meredith
se encarregou de fazer isso porque elas formarão uma dupla de mulheres e
ela quer ganhar, mesmo com uma pessoa não muito habilidosa.
O espírito otimista de Meredith sempre foi algo a se admirar.
Por fim, sobrou apenas Ian e eu, observando tudo de longe.
Mas, na verdade, é até bom. Eu queria conversar mais com o meu
irmão, que me incentivou a ir atrás de Audrey.
Está muito quente hoje, depois da noite passada chuvosa, Dublin vem
enfrentando um calor infernal. Acho que faz uns quarenta graus nessa
manhã.
Meu irmão toma então um longo gole de água da sua garrafa VOSS, e
manda:
— E, então, como foi?
Mantenho meu olhar em Audrey.
— Como foi o quê?
Ian rosna impaciente.
— Ah, vai se foder, Jeremy. Não venha dar um de João sem cabeça
agora. Você demorou para voltar e parece estar com a cabeça nas nuvens
desde então. Está nítido que vocês transaram. Olha só para Audrey, mal
consegue andar direito!
— Mais um comentário ofensivo e quebro a porra da sua boca —
ameaço, embora eu também tenha notado que às vezes, ao andar muito,
Audrey inclina um pouco o corpo como se estivesse com dor.
Ela também anda um pouco travada.
Porra, deveria conversar com ela sobre isso.
— Eu só estou querendo dizer que conheço você. Quer dizer, merda,
somos irmãos, já nos vimos nus…
— Que papo estranho, Ian! — reclamo olhando para ele como se
estivesse louco.
Contudo, mesmo assim, ele continua:
— Porra, você é um brutamonte e a Audrey toda pequena. Não sei
como isso deu certo.
— Você tem esses papos com mulheres? Deve ser por isso que ainda
está solteiro.
— Eu sou um clássico romântico, é por isso que não dou certo com
nenhuma mulher. Mas as mulheres de hoje em dia gostam de um papo
sacana.
Olho para ele que me olha de volta e dou um sorrisinho de lado.
Ok, isso parece ser verdade.
Lembro de como Audrey desenvolveu a nossa conversa de ontem
para chegar em um foco onde acabaríamos envolvidos.
E ela se mostrou tão sedutora, sedenta mesmo sendo virgem.
Aquilo me chocou de um jeito positivo.
Contudo, não estava a fim de falar sobre a minha relação sexual com
Ian, então meu sorriso foi morrendo conforme lembrava de outros detalhes.
— Ela não aceitou a minha ajuda — revelo. — Mas antes de sair da
casa dela, disse que não voltaria para o pub. Ian, você chegou a conhecer
esse homem?
Meu irmão balança a cabeça.
— Não, quase ninguém o conhece, na verdade. Mas tenho uma teoria
de que ele é tão problemático que se mantém no anonimato para ser
colocado atrás das grades. Parece que houve um tempo que ele colocou uma
de menor para trabalhar lá. A menina foi abusada no banheiro, deu um baita
problema, mas um tal de Douglas acobertou tudo para ele não ir para a
cadeia.
— Quem é Douglas?
— Também não conheço muito bem, além de que ele tem uma
caminhonete.
A minha respiração fica pesada e o ar mais quente.
— Cor prata?
— Como sabe? — Ian parece surpreso.
— Ele já foi buscar uma vez a Audrey lá em casa. — Lembro desse
dia, foi logo depois da noite dos jogos, tradição que continuamos mantendo
desde então às sextas. Olho para Audrey, sabendo que ela não me contou
tudo: — Quem é esse cara, afinal?
Ian dá de ombros.
— Não sei. Mas ele e Steven são como unha e carne, vivem
cochichando.
Às vezes, acho que Audrey está me poupando das palavras, o que é
uma verdadeira agonia para mim.
Olho para ela e me preocupo.
Talvez Steven já tenha mexido com ela em algum momento. Fico
com enjoo só de imaginar isso.
Eu seria capaz de matá-lo se isso fosse verdade.
— Eu queria entender porque ela voltou pra lá. Havia outras maneiras
de ganhar dinheiro, o que mais tem no Temple Bar, são pubs.
— Ofereceram a ela um bom dinheiro.
— Nós também e em troca teria que sair daquele inferno. Mas, por
que não aceitou quando a nossa oferta era tão boa quanto a dele?
Ian se vira, olha para Audrey e eu faço o mesmo.
Ela não para de rir a cada tacada horrível que dá, enquanto detona a
grama bonita.
É como se os seus problemas não a alcançasse ali e é essa segurança
que quero dar a ela.
De repente, Ian comenta:
— Todo mundo tem segredos, não é?
•••
Formamos duplas, Noah com Ian, Audrey com Meredith e eu com
Julian.
E é claro que meus irmãos venceram, de lavada. Mas no final da
partida já nem me importava mais com o jogo.
Meus irmãos tentaram me provocar de todo jeito, mas eu já havia sido
atingido bem antes da partida começar.
Confesso que não parei de pensar na conversa que tive com Ian,
minutos atrás. Ele abriu tantas perguntas na minha cabeça, que eu mesmo
fiquei me questionando se não me deixei levar por um rostinho bonito e um
caráter supérfluo.
Mas quando olhava para Audrey, eu me sentia horrível por estar
duvidando dela e me inclinando a ver um lado mais obscuro.
Não quero me meter na sua vida, mas também não posso deixar que
alguém que eu não conheça cem por cento entre na minha de um jeito tão
fácil. Porque eu deixei as portas abertas para ela e estava fadado a fazer
mais, só porque ela confiou tanto em mim para um momento tão importante
na sua vida.
Há muitos casos de mulheres oportunistas e sei que esse não é o de
Audrey, mas me faz lembrar e temer.
Depois que terminamos a partida, Meredith espalha um lençol de
piquenique na grama, entre arbustos que formam uma espécie de cerca,
debaixo das copas de uma árvore que forma uma sombra e um vento
relaxante.
O espaço não permitia isso, mas Meredith fez mesmo assim por causa
de Liam, que está conosco e precisa descansar.
No entanto, uma criança de um ano está com todo gás e meu sobrinho
não para quieto.
Enquanto Noah e Ian voltam para o clube para pegar um pouco de
comida, porque de repente Julian e Meredith decidiram lanchar, fico ali com
Audrey, sob a árvore enquanto Meredith e Julian brincam com Liam.
— A sua família é linda — Audrey comenta enquanto admira os três
se divertindo. — Eu falei sobre gostar de ser filha única, mas, certamente
não gostaria de ter apenas um filho.
Hum.
Deitado ali de lado, olho para ela que está com as pernas esticadas,
balançando de um lado para o outro, com os braços esticados sobre o lençol
xadrez.
— Por quê? — pergunto lançando um olhar curioso a ela.
Bem, eu ainda gosto dela e continuo me sentindo muito atraído,
mesmo que ela seja tão enigmática.
— A minha família não deu certo. Quer dizer, ela é toda
desestruturada. Se eu fosse formar uma família, certamente pensaria em
recomeçar e quero que ela seja bem grande!
Ela parece falar sério e me vejo mais interessado ainda nessa
conversa, para descobrir mais sobre Audrey Gallagher.
— Então você pensa em ser mãe?
Audrey faz uma careta.
— Não. Sim… Talvez. Mas, não agora. Bem diferente de Meredith.
Ela me contou que sempre sonhou muito com isso. Mas, eu não. Acho que
ainda é muito cedo.
— E certamente, teria de ser com a pessoa certa.
— Sim, claro. Seria horrível engravidar de um escroto igual ao meu
pai.
— Sinto muito, Audrey. Mas você sabe o que penso sobre isso. Nem
todo cara…
— É igual — ela completa a frase sorrindo. — Eu sei. Você me fez
ver que essa frase é verdade. Olha só Noah, um pai e esposo incrível.
— Bom, de onde ele veio tem mais.
Ela se encosta em mim e força uma risadinha sem graça.
— há, há, há! Engraçadinho! Disso eu tenho certeza também.
Logo sorrio também, porque, de qualquer jeito, somos bem parecidos.
Eu vejo o meu reflexo em Audrey e ela se vê em mim.
Nem sei por que diabos pude achar que ela esconderia algo de mim,
além do mais, como Ian disse, todos tem segredos e não sei se Audrey está
pronta para lidar com o meu.
Na verdade, não é um segredo, mas um detalhe que prefiro manter
ofuscado porque não sei o que ela pensaria. Às vezes, penso em comentar,
mas, acho que é o tipo de coisa que toda mulher acharia no mínimo
estranho.
Mas eu juro, que foi pura coincidência.
— Você está bem? — pergunto em um tom suave, me sentindo
culpado pelos meus pensamentos.
Audrey olha para mim e inclina a cabeça, como se estivesse curtindo
o momento. E ela geme.
— Acho que nunca estive tão bem. Está sendo um dia incrível.
— Jura?
Ela balança a cabeça em afirmação.
— Bem, ainda terá o SPA depois.
— Isso vai ser excitante.
Olho incrédulo para ela.
— Como é?
Audrey gargalha.
— Ah, não sei. Vão ficar me tocando, fazendo massagens enquanto
derramam óleo em mim e coisa do tipo. E se for homem?
Fecho a cara.
— Irei me certificar de que não tenha nenhum para atendê-la,
principalmente sabendo que você ficará excitada.
— E quem disse que já não estou?
Porra!
Eu quase posso sentir meu pau pulando da jaula. Fico tão surpreso
que olho para Audrey por mais segundos. Vejo, principalmente, quando ela
morde o lábio e olha na direção onde Meredith, Julian e Liam brincam. E,
ao certificar de que estão longe e distraídos, com a cerca de arbustos
tapando a metade da visão, Audrey abre às pernas, vagarosamente, como se
fosse uma tesoura.
A minha respiração fica mais pesada e sei de imediato o que ela
planeja. Quer dizer, estamos em uma posição bem favorável. Ela está ao
meu lado, mas estou um pouco inclinado para a sua frente. Tanto que,
quando ela afasta as pernas, vejo a sua deliciosa calcinha de renda.
— Isso é um convite?
Audrey olha para os lados, estudando o ambiente, se certificando de
que não seremos flagrados.
— É bom fazer logo, não temos muito tempo — avisa.
E é engraçado como essa Audrey safada não me assusta nem um
pouco. As suas escolhas me assustam um pouco, mas isso, as suas atitudes
de uma mulher decidida…
Porra!
Isso sim, não questionaria nunca.
Faço o que ela quer.
Mais uma vez estando de saia, enfio minha mão lá dentro e deixo que
meus dedos façam seu trabalho o quanto antes.
Eu odiaria ser interrompido, sem fazê-la chegar ao clímax.
Afasto a sua calcinha para o lado e sinto sua boceta carnuda toda
melada para mim.
Solto um gemido só de sentir a sua umidade.
Passo o dedo pela sua fenda enquanto mordo o lábio, contendo a
vontade de deitá-la ali mesmo e chupá-la até seus gritos ecoarem por todo
clube.
Mas preciso me conter.
Pelo menos Audrey está gostando e eu também, confesso. Amo levá-
la à loucura. E ela está tão molhada e excitada, que seria um prazer dar
prazer a ela.
Enfio dois dedos na sua boceta e ela arfa.
— Você gosta de ser fodida, não é?
— S-sim. Isso é tão bom, Jeremy — murmura.
Fico a penetrando, ouvindo o doce e sórdido som da sua bocetinha
molhada, sendo invadida pelo meu dedo.
Percebo que sua respiração está completamente descompassada, ela
não se contém e começa a mexer o quadril, como se estivesse rebolando na
minha cara.
— Imagina o meu pau entrando em você — digo com a voz rouca. —
Te alargando toda, entrando e saindo, deliciosamente, te dando prazer,
fazendo você revirar os olhos e querer se desfazer. Imagine meu pau quente
e duro dentro de você, pequena.
— Oh, Jeremy…
— Shhhh. Não queremos ser vistos, lembra?
Ela morde o lábio e balança a cabeça.
— Hurum.
— Mas lembre-se… — Continuo tirando meus dedos de dentro dela e
indo até o clítoris, onde começo a massagear. — A minha língua, a minha
boca bem aqui.
Audrey inclina a cabeça para trás.
Porra!
Nem um pouco discreta, mas está muito bom.
Meu pau lateja dentro da calça e tudo o que quero fazer depois é
colocá-la de quatro aqui mesmo e fazer mamar em mim.
— Você gostaria disso, Audrey?
— S-sim. Por favor, Jeremy, me chupe.
Sorrio.
Ela parece não ter pudor e o anjo, parecia tão diabólica agora.
— Calminha, pequena. Outra hora. Mas, imagine.
— Não quero imaginar. Quero você.
— Você me terá, Audrey. Meu pau só entrará em você e eu serei o
único a entrar em você, está me entendendo?
— Sim.
— Quem fode essa boceta?
— Você.
— Você quem?
Sinto seu grelinho inchar.
— Você, Jeremy. Só você!
E então, o corpo de Audrey fica todo tenso e ela se deita, enquanto se
contrai todinha e fecha a boca para não gritar enquanto tem seu orgasmo.
Penetro meu dedo nela de novo, só para me certificar de que isso será
finalizado de um jeito mais completo.
Ela respira com dificuldade e nesse momento parece só existir nós
dois.
Chegamos até ignorar o fato de estarmos ao ar livre.
Tanto que quando me dou conta do som dos outros, principalmente
dos meus irmãos se aproximando no carrinho, é quando percebo tudo ao
meu redor.
Mas não parece que fomos flagrados.
Chupo os dedos responsáveis por seu orgasmo e Audrey sorri.
— Esconda esse dedo, ou vá lavá-lo — aconselha.
— Não, gosto do cheiro. Eu penso muito nele.
Ela estica a mão e toca meu rosto com carinho.
— Eu nunca pensei em fazer algo assim, ao ar livre. Até porque até
ontem, ainda era virgem.
Sorrimos juntos.
— Posso realizar todos os seus desejos.
— Você tem algum?
— Acho que acabei de realizar.
Audrey me mostra outro sorriso.
— Sem nenhum beijo?
Olho para meus irmãos que se aproximam.
— Eu tenho dois idiotas como irmãos. — Passo a língua nos lábios,
louco para beijar a sua boca. — E Julian está bem ali.
— Você acabou de me masturbar e o seu filho estava a poucos metros
de distância.
— Eu sei, mas…
— Tudo bem, Jeremy. Eu entendo. Talvez esse momento chegue,
talvez não. Mas até lá, tudo bem ficarmos assim, ok?
Balanço a cabeça, me sentindo menos pior por não querer assumir a
relação sem rótulo ainda na frente da minha família.
Eu sei que a fiz gozar agora pouco, mas isso foi discreto. Às vezes,
um beijo é mais estrondoso do que o sexo.
E eu sei, o quanto um beijo é capaz de revelar muito. Afinal beijos
despertam sentimentos profundos, até mesmo quando alguém está
apaixonado.
Por ora, não sei como definir isso, mas algo está acontecendo.
Eu sei que está.
Quando comecei a trabalhar no pub do Steven, tinha apenas dezoito
anos. Comecei na cozinha, porque Steven achou que seria mais seguro para
mim, e como não tinha experiência com bar, era melhor me manter na beira
da pia ou do fogão. Vez ou outra, ele ia conferir se estava tudo bem e, às
vezes, ficava até por tempo demais.
Era bastante desconfortável.
No entanto, confesso que gostava de ficar “escondida” ali.
Principalmente, quando tinha uma pilha de louça para lavar, pois, colocava
meus fones de ouvido e ficava bastante distraída em meus pensamentos.
Quando acabava, já ia para o banheiro dos funcionários, porque não
queria sair daquele meu mundinho fantasioso.
Trabalhei naquele lugar por quatro anos.
Lembro de quando finalmente me tornei garçonete, afinal já não
aguentava mais todo o assédio que sofria da parte dos funcionários.
Steven se colocava à diante como meu defensor, mas não era menos
desconfortável.
Eu o achava e ainda acho tão asqueroso, sem contar que sempre
duvidei do seu caráter.
Naquela noite, em que os homens haviam me tocado durante o
trabalho, ultrapassado todos os limites e me feito recuar, Steven não fez
nada. Se ele tivesse a coragem o suficiente de dizer: “Podem pegá-la é
cortesia da casa”, ele teria feito.
Mas Steven é um covarde, sempre foi, afinal nunca protegeu seus
funcionários.
Quando aquela palhaçada aconteceu com a de menor que estava
trabalhando lá, tudo o que fiz foi ser uma das poucas pessoas que contou
tudo o que vi. Eu saí do pub por um mês, depois voltei porque estava
precisando, e porque ele me convenceu.
Não sou o tipo de pessoa facilmente manipulável, mas Steven
conhece o senhor Douglas, e eles a minha mãe. Sendo assim, achava que
aquele vínculo poderia ser de alguma forma proveitosa e poderíamos
resolver algumas dívidas pendentes no diálogo.
Agora, estou de frente para o pub de pedras, conhecido por ser rústico
e elegante ao mesmo tempo.
Não é o favorito dos turistas, mas dos irlandeses.
Desta vez, vim decidida a romper de uma vez com esse vínculo. Eu
disse a Jeremy que faria isso e não estou a fim de enganá-lo mais uma vez
com essa história.
Gosto do que temos e não quero que acabe logo agora que
começamos.
Hoje está muito quente, por isso decidi usar apenas um vestido
confortável, mas só o escolhi porque sabia que a esta hora do dia o lugar
ainda estaria vazio.
Quando passo pela porta da frente, sinto o cheiro familiar de materiais
de limpeza e alguns hambúrgueres já pré-assados.
As cadeiras estão desemborcadas sobre as mesas e o ambiente inteiro
está silencioso e vazio, aparentemente.
— Faz três dias que você não aparece.
A voz de Steven surge atrás de mim e meu corpo inteiro ressente a
sua presença. Me viro em sua direção e percebo que ele parece voltar do
banheiro enquanto enxuga as mãos em um pano.
Parece estar sóbrio, quer dizer, isso é perceptível porque a sua
fisionomia fica menos flácida.
Acho que ele tem uns cinquenta e pouco anos, mas a bebida o
envelhece mais vinte. Seu cabelo é quase grisalho, é um pouco gordo e é
quase da minha altura. Seus olhos são azuis e vive usando um relógio de
ouro para mostrar que tem dinheiro.
O que é uma mentira, pois todo mundo sabe que ele deve pagar esse
relógio até hoje.
— Estou caindo fora. — Sou direta. — Na verdade, eu já caí. Vim
apenas formalizar e pegar algumas coisas que esqueci no armário.
Então me viro e ando em direção aos fundos do pub. Passo pelo
balcão com a maior intimidade do mundo.
Bem, eu tenho essa intimidade com o local, afinal foram quatro anos
trabalhando aqui e não me parece errado estar tomando a frente.
Steven continua andando atrás de mim, e então entro no
almoxarifado.
— Você é uma piranha indecisa! — ele pragueja atrás de mim, mas
não dou ouvidos ao que diz. Mesmo assim, ele continua: — Eu fiz o que
podia para ajudá-la e você pula do barco como se o cretino do seu pai não
tivesse ido embora devendo quase a cidade inteira!
“Mantenha o foco, Audrey. Não revide. Não revide!”
Abro minha portinha do meu armário, onde há um fone de ouvido,
guarda-chuva e alguns trocados que eu recebi como gorjeta e achava que
manter ali poderia ser seguro, já que apenas eu tenho a chave.
— Como vai se livrar das suas dívidas agora?! — ele continua
exasperado, parado na porta.
Olho para ele inexpressiva.
— Você fala como se importasse com isso, mas nós dois sabemos que
só está irritado porque isso está acontecendo de novo e agora é pra valer.
— Ah, claro. Não dou três semanas pra você voltar rastejando de
novo!
Enfio as minhas coisas dentro da bolsa, então fecho a portinha do
armário com um pouco de brutalidade e me viro para ele exasperada.
— Sabe o porquê fazia isso? Porque você era amigo do meu pai. Você
e o senhor Douglas sempre foram amigos dele e achei que se mantivesse o
contato, vocês facilitariam um pouco a questão das dívidas. Mamãe me diz
que você influenciava o meu pai a pedir dinheiro emprestado ao senhor
Douglas. E, AGORA, PARECE QUE ME USAM COMO SE FOSSE A
ATRAÇÃO PRINCIPAL NO SEU CIRCO DE HORRORES QUE É
FAZER DESTE LUGAR COMPLÔ DE ASSEDIADORES! — grito a
última parte sentindo meus pulmões em chamas e a minha pele formigar.
Fecho os dedos em punhos, como se fosse socá-lo a qualquer
momento, mas preciso me manter equilibrada, porque uma boa parte da
minha concentração foi para o espaço.
— Eu. Tô. Fora. Steven! — sibilo e então passo por ele esbarrando
em seu ombro com agressividade.
Antes que tome distância, sinto que me agarra forte pelo braço. Eu
quero gritar e me debater, pois, sinto muito nojo dele. Mas apenas me viro
com a ira estampada em minha face, meu corpo tremendo, me sentindo
pronta para arranhar a sua cara com as unhas se ele decidir me ameaçar.
Para o meu incômodo maior, Steven sorri. O tipo de sorriso
espertinho que a pessoa dá ao se sentir demais e você querer arrancá-lo com
a mão.
— Acha que os O’Donnell vão ajudá-la? — ele pergunta e meu corpo
travou.
Não consigo evitar em arregalar os olhos quando ele menciona os
O’Donnell.
— Pobre Audrey. Acha que trabalhar para os esnobes vai garantir
alguma coisa a você. Quem nasce em um buraco, querida, não sai dele.
Puxo meu braço com raiva.
— Você não sabe de nada! — cuspo as palavras em sua cara.
Quando passo pelo balcão, pronta para sair, o senhor Douglas está
chegando e solto uma risada bufada.
“É inacreditável”.
É o tipo de coincidência de merda que só acontece comigo.
— OLHA SÓ, DOUGLAS! OLHA QUEM ESTÁ INDO EMBORA
DE NOVO! — Steven grita permanecendo atrás do balcão.
Pelo menos ele não me segue mais.
Douglas olha para mim e, então, para a minha bolsa. Permanece
parado em frente à porta, como se fosse uma parede, como se fosse me
impedir de levar essa situação adiante.
— ACHO QUE ELA PENSA QUE CONSEGUIRÁ QUITAR AS
DÍVIDAS ABRINDO AS PERNAS PARA UM O’DONNELL! — meu ex-
patrão grita aos risos e meu estômago revira.
O homem de chapéu de fazendeiro olha para mim, um tanto
desconfiado, como se duvidasse disso.
— Eu não vejo problema, desde que pague as dívidas que o pai dela
me deve há anos!
— E a mim também! — o asqueroso do Steven completa.
Meu coração bate forte e todos os meus órgãos se comprimem diante
da vergonha e humilhação.
Eu poderia dizer que eles estão enganados sobre muitas coisas ao meu
respeito, mas também não ficarei mais acanhada em frente a eles.
Engulo todas as sensações frustrantes que sinto e firmo meus pés no
chão. Tenho como alvo os olhos de Douglas e Steven, antes de dizer:
— Não importa como, mas vou quitar todas as dívidas e me livrar de
vocês. Não é mais uma questão de responsabilidade, porque nunca foi uma
responsabilidade minha, mas, agora é sobre liberdade. Os dois sempre
acharam que podia estar comendo na mão de vocês, mas estavam
enganados. Essa palhaçada termina aqui!
A adrenalina que corre em minhas veias pode ser capaz de me cegar.
Sinto uma súbita vontade de avançar em Douglas e atirar uma dessas
cadeiras em Steven, mas não faço. Quer dizer, não sou o tipo de pessoa
violenta, mas essa situação toda desperta algo ruim em mim.
Um silêncio estranho se forma no espaço entre nós três, enquanto
sinto dois pares de olhos me olhando com surpresa. Chego a achar que
podem estar chocados com a minha posição, no entanto, eles explodem em
uma risada que me faz piscar atônita, completamente constrangida, me
desfazendo de toda minha autoconfiança.
Fico olhando de um para o outro, vendo os dois se contorcerem em
risadas.
Eles estão rindo de mim.
— Vão se ferrar! — praguejo segurando com firmeza a alça da minha
bolsa no ombro, então faço menção de sair do pub, no entanto, Douglas me
intercepta. — Me solta! — grunho para ele tentando sair do seu agarre.
— A cobrança será bem maior, Audrey. Você não sabe o que está
perdendo ao se afastar de nós assim.
— Eu? Sair perdendo? — repito dando uma risada sarcástica para ele.
— Não sou eu que parece estar desesperada nesse momento. Quem será que
está perdendo mesmo, Douglas?
No instante de distração dele, puxo meu braço mais uma vez e
consigo me livrar do seu agarre. Puxo a maçaneta da porta da frente e a
claridade do dia ofusca minha visão por uns segundos, então olho para o
chão.
Ouço alguns passos atrás de mim, mas de repente, não é o senhor
Douglas, mas Steven.
— VOCÊ É UMA INGRATA DO CARALHO! OPORTUNISTA! —
ele grita e viro em sua direção, o encontrando apontando o dedo para mim.
A minha respiração fica mais pesada e o meu peito dolorido. Meus
olhos ardem e sei que não vou aguentar por mais tempo segurar as lágrimas.
— Você e a sua mãe merecem viver naquele buraco! Não é à toa que
o Hawkins se mandou!
Steven diz sobre o meu pai.
Estou prestes a me pronunciar, mesmo sabendo que me derramarei
em lágrimas na primeira palavra. No entanto, sinto uma mão pousar nas
minhas costas e gelo.
— Algum problema?
A voz grave e firme faz meus pelos se arrepiarem.
Steven não recua, mas parece olhar para um ponto alguns centímetros
mais alto logo atrás de mim.
Olho por cima do ombro e me deparo com Jeremy, em seu terno
escuro, com uma expressão de poucos amigos, a sobrancelha arqueada e os
olhos brilhando em puro ódio. Parece até mesmo mais alto do que já é.
Acho que nunca o vi assim antes.
— Eu perguntei se há algum problema? — pergunta de novo quando
ninguém responde.
Steven olha para ele com uma carranca.
— SE MANDA DAQUI! NÃO É NADA QUE TE INTERESSA! —
O dono do pub grita.
Ele perto de Jeremy parece ser tão pequeno quanto eu, isso porque
Steven sendo homem e agindo dessa forma, só parece ser um cachorro
latindo.
— Parece que você está a incomodando. Qualquer mulher que estiver
sendo importunada por um homem sem noção, vai ser assunto de todos —
Jeremy sibila, na verdade, ele quase rosna cada palavra que diz.
— O’Donnell?
Douglas o reconhece assim que sai para ver a discussão e Steven sorri
de um jeito maldoso.
— Ah, ora, ora. Então, você é um O’Donnell — Steve diz olhando
para Jeremy como se fosse um pedaço de merda e, então, olha para mim,
como se eu fosse a fossa toda. — Certifique-se de fazer cada centavo seu
valer a pena quando estiver fodendo com essa piranha.
Eu quase posso sentir o mundo parando ao meu redor quando ele diz
isso. No entanto, logo depois, tudo acelera. Vejo um braço se esgueirando
na direção de Steven, um soco acerta bem a sua cara, e tudo o que ouço é
um baque do ato violento. Logo vejo Steven cambaleando para trás, atônito.
— Deixe-a em paz — Jeremy avisa com a voz sombria e todos os
meus ossos estremecem. — Ou eu juro que vou tirar tudo o que é seu, até
você sentir medo de olhar para ela!
— Você não tem esse poder — Steven revida.
Quando olho para ele, vejo sangue brotar do seu nariz.
Talvez, nem ele tenha se dado conta ainda.
— Só porque é rico, você não me assusta.
— Eu não sou rico, eu sou bilionário — Jeremy sibila cada palavra e
apesar de soar arrogante, faz com que os músculos do meu corpo se
tencionem e meu clitóris se contrai só de ouvir a sua voz proferindo tal
coisa. — Posso acabar com a sua raça sem precisar encostar um maldito
dedo em você.
Esse Jeremy, certamente nunca vi antes.
Eu sempre detestei gente desse tipo, sempre falei mal, achava que
nunca me daria bem por vivermos em realidades diferentes. Porém, aqui
estou eu, ficando excitada na ocasião mais imprevisível, mas porque é
Jeremy assumindo o controle, mostrando a sua força e em como ele sabe
dominar todo tipo de situação.
Sim, isso está me deixando com tesão, mas irritada ao mesmo tempo.
As coisas já não estavam boas o suficiente para mim, e, agora, com ele
agindo dessa forma, não sei mais o que irá acontecer. Então seguro seu
braço e tento puxá-lo para longe dessa situação.
Mas Jeremy é mais alto, mas corpulento e forte, e mal sai do lugar
quando tento fazer alguma coisa.
— Esqueça e se afaste — avisa mais uma vez. — Não queira provar
da minha ira.
— Jeremy… — Tento puxá-lo mais uma vez.
Agora, ele parece ceder um pouco mais.
Steven o encara com um olhar cortante e que me deixa assustada.
“Matador.”
Começo a puxá-lo um pouco mais em direção à rua para
atravessarmos, mas Jeremy ainda hesita, principalmente quando Steven
cospe e abre um sorriso, revelando seus dentes manchados de sangue.
— Eu não tenho medo de gente que nem você. E não irei fazer
ameaças a você, sabe por quê? Gente da sua raça costuma cavar seu próprio
buraco e cair dentro dele. Você não me assusta, O’Donnell. — ele profere
como se estivesse rogando uma praga.
— Por favor, vamos… — imploro a Jeremy.
Olho para os dois lados da rua e quando não vem ninguém,
atravessamos. E mesmo a metros de distância, Jeremy ainda olha para onde
Steven esta, até mesmo depois que ele foi volta a entrar no pub com
Douglas que permanece calado e fecha a porta com força.
Eu fico parada na calçada, tentando respirar direito, mas ainda me
tremo toda.
Nunca me meto em confusão, às vezes, sou rude, mas é o meu modo
de defesa. Só que o que aconteceu hoje foi inédito.
— Você está bem? — Jeremy pergunta.
Começo a balançar a cabeça, completamente confusa.
— Você tinha mesmo que fazer isso tudo? — Olho para ele e vejo que
isso o deixa mais em choque do que as palavras de Steven. Solto um suspiro
bufante: — Olha, eu agradeço muito que você tenha me defendido, mas
essa briga é minha, Jeremy.
— Isso passou dos limites, Audrey — ele rebate com a voz calma,
mas indignado. — Enquanto eu me importar, não posso agir como se nada
disso estivesse acontecendo!
— Acontece que você só pode ter piorado toda a situação para mim,
agora. Você deu um soco no Steven!
— O filho da puta mereceu. Ninguém fala mal de você na minha
frente, Audrey.
“Porra!”
A minha respiração esquenta e fricciono as coxas.
Juro que quero que nesse momento ele me coloque dentro do carro e
faça alguma coisa comigo, que me tire essa sensação de angústia.
Mas ainda estou irritada e a minha preocupação é maior que tudo.
— Você não faz ideia com o tipo de coisa que já precisei ouvir ao
meu respeito ao longo desses anos.
Ele me olha fixamente.
— Não espero que me agradeça, mas que pelo menos fique longe
desses caras.
Fecho os olhos, me sentindo uma idiota.
Apesar do que estou sentindo nesse momento, não posso negar que
Jeremy fez algo muito corajoso.
Ele se envolveu em uma briga por mim!
O CEO bilionário, herdeiro da maior petrolífera europeia se metendo
em um escândalo por mim.
Isso é sexy, no final das contas.
— Obrigada — digo toda tímida, encarando o chão. — Eu só não
estou acostumada com pessoas me defendendo desse jeito.
Sinto quando ele se aproxima e vejo a ponta dos seus sapatos sociais.
Esse terno, os sapatos elegantes…
De onde ele veio?
Pensei que estivesse de férias e que por isso não se envolveria em
trabalho.
Jeremy ergue a minha cabeça quando toca meu queixo. Olho para
cima e nossos olhares se cruzam.
— É bom que se acostume, pequena.
— Você fala como se tivesse poder sobre mim, ou alguma
responsabilidade — comento com a voz mais suave.
— Só quem pode determinar isso é você — diz escondendo uma
mecha atrás da minha orelha, como um gesto cuidadoso que aquece o meu
coração. — Mas, você está comigo, e enquanto estivermos assim, sinto que
é o meu dever cuidar de você.
Seguro seu punho e beijo a sua mão, delicadamente, sentindo a
sensação que é eletrizante toda vez que toco seu corpo desse jeito, como se
Jeremy fosse meu.
Mas não é.
— Sabe, eu já ouvi muitas coisas ruins ao meu respeito desses caras.
Mas o que me deixava mais aliviada, era saber que nada daquilo era
verdade. Só que agora…
— Não. — Ele é direto. — Não pense que estamos fazendo isso por
algo em troca, ouviu? Nada do que aquele idiota do Steven falou é verdade.
Você sabe que eu seria capaz de ajudar mesmo que não estivéssemos juntos,
mesmo que você fosse apenas alguém que trabalhasse para mim.
— E não é o que eu sou? Não sou apenas alguém que trabalha para
você? — Fico olhando para ele com expectativa, afinal de contas, Jeremy e
eu não temos nada definido.
Geralmente, pessoas da minha idade diriam que somos “ficantes”,
mas tenho certeza de que ele não definiria desse jeito.
— Você trabalha para mim, você é uma boa companhia para o meu
filho, você tem se tornado uma amiga para Ian e alguém muito especial para
mim. Acontece que você é tudo isso, Audrey.
Sorrio para ele, um pouco mais aliviada até.
— Vamos pagar esses caras e fingir que eles nunca existiram —
completa.
— Bem, aí vou ficar devendo para você — ressalto.
— Sei bem como você pode me pagar. — Ele me olha de cima a
baixo, indo exatamente pelo mesmo caminho que repreendeu agora a
pouco.
— Seu… — Eu o empurrei, irritada.
— Audrey, estou brincando! Ok?
— Odeio você! — Não falo sério, mas dou as costas e começo a
andar na direção contrária.
— EI, AONDE VOCÊ VAI? — ele grita.
— Não interessa!
— Foi só uma brincadeira sem graça, me desculpa. — Ele vem atrás
de mim, tentando me alcançar.
Jeremy quase esbarra em mim, quando paro subitamente e olho para
ele:
— Eu sei disso, mas foi perfeito para me lembrar que ainda estou
chateada por todo esse alvoroço. Eu não compactuo com violência, Jeremy.
Além do mais, preciso saber o que tudo isso vai resultar.
— Desculpa por tudo! Não era a minha intenção chatear você.
Bufo.
Droga, odeio quando ele faz essa cara de magoado!
Eu não consigo resistir, mas preciso ser firme.
— Tudo bem, agora só preciso ficar sozinha. A gente se vê amanhã.
— Posso levá-la para casa?
— Vou de ônibus, é bom pra colocar a mente no lugar.
Jeremy fez uma careta como se eu falasse grego.
— Você nunca vai saber como é. Mas, sim, andar de ônibus é bom
para refletir um pouco.
Jeremy então acena sutilmente com a cabeça, como se estivesse
entendendo tudo.
— Entendi. Então, sem caronas.
— Isso.
Ele ajeita o terno e me olha só mais uma vez.
— Muito bem. Mas, por favor, não hesite em me ligar se você
perceber qualquer coisa estranha.
— Eu vou ligar pra polícia!
— Ligue para a polícia e depois ligue para mim — ordena e sorrio.
— Você gosta mesmo de ser um controlador. Tchau, Jeremy. Tome
cuidado também.
— Eu tomarei.
Vou andando até a calçada mais próxima.
Admito que é meio difícil me afastar, sabendo que Jeremy continua
me olhando, como se fosse um guarda-costas.
Atravesso a faixa de pedestre quando o sinal fica vermelho, então
alcanço o outro lado da rua e paro no ponto de ônibus.
Do outro lado da rua, Jeremy acena para mim, e aceno de volta. Desta
vez, sou a vê-lo indo embora, voltando para o seu carro.
Percebo que meu coração bate muito rápido e que é difícil respirar,
como se estivesse sufocada com alguma coisa.
E essa sensação se estende até mesmo quando estou no ônibus. Algo
quentinho se instala em meu peito, principalmente quando penso em
Jeremy.
Audrey não estava brincando. Ela ficou mesmo chateada e depois do
que aconteceu fiquei me perguntando se exagerei.
Porra, é claro que exagerei!
Dei um soco na cara do tal de Steven e ainda o ameacei. Eu nunca
havia batido em ninguém, muito menos usado do meu status financeiro para
recorrer a ameaças.
Embora realmente tenha a possibilidade de destruir o negócio de
Steven apenas com uma ligação. O prédio em que aquele pub funciona é
antigo, quase um patrimônio histórico de Dublin, porém, já aconteceu tantas
infrações ali que apenas uma ligação derrubaria o castelo de cartas dele.
Mas não faço nada, porque Audrey achou que assim seria melhor.
Pensando bem, ela tem razão sobre eu ter irritado Steven mais ainda,
então me coloco de prontidão e fico atento a qualquer movimento seu. No
entanto, nos dois dias que se seguiram, ele não fez nada de suspeito e
ninguém recebeu uma ligação estranha, o que já é um ótimo sinal.
Só que o final das férias está chegando e me pergunto como diabos o
tempo passou tão rápido.
Uma semana...
É o tempo que temos para curtir ao máximo. Até mesmo meus irmãos
deram o fora e foram curtir o final das férias cada um à sua maneira.
Mas eu permaneci na mansão com o meu filho e melhoramos o nosso
vínculo, fiquei mais próximo do cachorro, e tem a Audrey também.
Cheguei até me perguntar muitas vezes como faria para mantê-la por
perto, afinal de contas, ela continuará aqui em Dublin, na Irlanda, e eu
voltarei para Londres.
É sexta-feira, noite dos jogos com o Julian.
Papai desceu para apreciar esse momento, já que depois que meus
irmãos foram embora, a casa ficou silenciosa.
Papai ama como crianças dão vivacidade a casa, até mesmo Theo
com seus latidos.
Como passa a maior parte do tempo acamado, esses sons o lembram
de que ainda está vivo e que pode manter as esperanças.
Julian e eu estamos sentados no sofá principal que faz um formato em
L e papai está sentado em sua cadeira de rodas especial, com um manto
sobre as suas pernas porque ele sente frio na maior parte do tempo devido
aos calafrios que lhe dão.
— Não sei como isso funciona, mas você parece muito bom nisso,
Julian — papai diz para o neto que está muito concentrado em matar o
zumbi.
Julian então dá uma machadada na cabeça do bicho, esguichando
sangue e papai protesta:
— Só é muito violento. Isso não faz mal para você?
O meu filho dá uma risadinha.
Ele sempre ri com as perguntas do seu avô que soam bobas.
— É só um jogo, vô. Não influencia em nada — Julian assegura.
— Ainda acho que deveríamos jogar Mortal Kombat — digo
começando a me sentir entediado depois que Julian decidiu jogar esse jogo
solo.
— Parece que o senhor só conhece esse jogo. Não havia muitas
opções na sua época?
O moleque quer zoar de mim, então, inclino a cabeça para o lado e
penso em uma resposta.
— Havia muitas e são relíquias demais para a sua geração jogar.
— Relíquias? Com todos aqueles pixels ruins?!
— Está falando como o seu tio Ian.
— Eu só estou falando como uma pessoa que sabe facilmente
diferenciar um jogo em 4K para um jogo de qualidade duvidosa. Sabe,
parece até Minecraft.
— Mine o quê?
Ele revira os olhos e pausa o jogo.
— Ah, esquece! Vou colocar Street Fight, ok?
— Era um dos melhores. — Pego meu controle de volta e fico
esperando Julian colocar o jogo.
Quando percebo que ele demora, olho para ele que está encarando a
minha mão. Dou uma rápida olhada e prendo o fôlego.
Ok, não esperava encontrar isso ali.
Os nós dos meus dedos estão roxos, como se tivesse socado uma
superfície muito dura, mas, a verdade, é que apenas soquei a cara de Steven
e ainda posso sentir meus ossos se colidindo com o nariz dele e fazendo um
estrago.
Lembro de ter sentido dor por quase um dia, mas não lembrei de olhar
o resultado depois.
Mas aqui está, uma mancha roxa com detalhes verdes.
Volto a olhar para Julian que parece confuso.
— Como conseguiu isso? — pergunta baixinho, deixando com que a
sua voz não se sobressaia ao som da TV porque ele sabe que o seu avô
questionaria.
Parece que ele sabe que eu estava aprontando e queria me livrar de
encrenca.
No final, é até cômica essa ironia.
— Só não falo porque não quero dar um mau exemplo, mas acho que
você já sabe como pode ter acontecido.
— O senhor foi atrás dele, não foi?
Fico olhando para meu filho de um jeito um tanto que idiota, como se
eu tivesse sido pego no pulo.
E o pior é que eu nem consigo disfarçar.
— O cara que ficava infernizando a vida da Audrey — explica.
— Co-como você sabe disso? — gaguejo porque estou bastante
surpreso com isso.
Julian dá de ombros e volta a sua atenção para a minha mão.
— Eu não sou mais uma criança, sabe? Posso só ter catorze anos, mas
já entendo algumas coisas. Como por exemplo, que a Audrey tem, ou pelo
menos tinha, um trabalho à noite para compensar com esse. Eu percebi isso
quando ela ia embora às pressas. Ela ama ficar aqui, então, por que iria
embora como se a noite aqui fosse algo fatal a ela? Simplesmente não
entendo. Quer dizer, agora eu entendo, né?
Balanço a cabeça, ciente de que Julian agora é um menino grandinho
e que precisava aceitar que algumas conversas ele já poderia compreender.
E o que eu poderia dizer?
Fico olhando para a TV que roda o jogo que ele colocou no
videogame, e então para o roxo na minha mão.
— Olha, Julian, vou te dar um conselho — começo a dizer, pensativo.
— Quando uma mulher estiver passando por problemas, não hesite em
ajudar. Mesmo que ela não queira, ajude. E se for necessário que você parta
para a agressão para defendê-la, só faça se for extremamente necessário.
Você me entendeu?
Ele dá de ombros.
— É, acho que sim. Tio Ian diz que eu nunca devo hesitar, ele diz que
se eu acertar a garganta, é fatal. E se possível, fazer chacota de homem do
pau pequeno porque isso destrói o ego deles.
Porra!
Que tipo de coisa Ian andou dizendo para o Julian?!
— É… Então... Não. Não para tudo, Julian. Você já tem catorze anos
e sabe que esse tipo de ofensa é coisa da quinta série — esclareço, embora
essa questão do pau pequeno seja pura verdade, mas inapropriado, ainda
assim.
O meu filho revira os olhos claros e sacode a cabeça.
— Tanto faz, não vou me meter em briga mesmo. Até quando eu for
para a escola nova.
— Você deve estar pronto para os novos colegas de escola — aviso.
— Devo bater neles? — Ele me olha como se a pergunta fosse a
pergunta decisiva.
— Não. Só se eles baterem em você. Caso contrário, deixe os
valentões de lado.
Julian pisca pensativo e depois encara a TV.
— Queria que fosse como em um jogo, onde dá para resetar a vida,
ou simplesmente acionar habilidades fatais — ele desabafa.
— Se a vida fosse como em um jogo, as coisas seriam bem mais
complicadas — pondero.
— Ah, entendi — diz mais absorto, como se a sua mente estivesse
vagueando longe. — E então, vamos jogar?
Olho para ele, percebendo que Julian se distraiu, ou se cansou dessa
conversa. Talvez, ele esteja apenas ignorando, por ser um garoto de catorze
anos que acha um saco conversar sobre a vida com um homem de trinta e
oito anos, como eu.
Tudo bem, talvez seja isso mesmo e preciso compreender.
Voltamos a nossa atenção para o jogo e começamos a escolher nossos
personagens. Olho de relance e vejo meu pai concentrado na TV, tão mais
velho do que dois anos atrás, antes dos seus problemas cardiovasculares se
intensificarem.
Queria que Julian entendesse a importância desse momento, em como
ele poderá nunca mais voltar e como é importante preservarmos isso.
Será que quando eu for mais velho, Julian terá o mesmo cuidado
comigo?
E se eu ficar sozinho, igual o meu pai e não pelo destino, mas por
opção?
Acho que não quero isso para mim.
Seria interessante envelhecer ao lado de alguém. Imagino que ele
gostaria que tivesse acontecido o mesmo, mas, mamãe se foi primeiro, e
essa solidão…
Tenho medo dela.
Perceber isso me deixa nervoso.
Mas não sei se teria a mesma sorte que ele, em encontrar uma mulher
tão incrível.
Ou teria?
Quer dizer, eu já encontrei?
Penso em Audrey, sempre ela, a dona dos meus pensamentos.
Isso deveria significar algo?
Espero que não.
Ela é uma mulher muito firme, independente e que não se
impressiona fácil. Não acho que ela se envolveria com alguém. Além do
mais, nossos interesses incomuns não ultrapassam os desejos carnais.
Ela está se descobrindo e me quer para auxiliá-la. Mas, de alguma
forma, sinto que ainda é pouco.
Depois do que aconteceu em frente ao pub, resolvo me redimir com
Audrey.
Como Julian está empenhado em adestrar Theo, só porque ele viu um
documentário sobre cães inteligentes, pego Audrey e “fugimos” no meu
carro.
É uma surpresa e nem ela sabe para onde iremos.
Em algum momento, alguém na mansão sentirá nossa falta, mas já
estaremos longe demais.
Antes mesmo de sair, precisei fazer algumas ligações para que outras
pessoas me ajudassem a preparar a surpresa. Quer dizer, queria poupar
tempo e para isso, precisava que essas pessoas que trabalhavam para mim,
adiantasse algumas coisas.
Quando vi que o dia seria lindo, sem sombras de chuvas, e já indicava
a chegada do outono em duas semanas, achei que seria melhor se
aproveitarmos juntos cada instante do dia.
— Mas… Jeremy! — Audrey protesta quando ela topa em uma das
frestas das tábuas do deque, quase tropeçando, mas a seguro a tempo. —
Onde estamos? Isso é água? — pergunta se referindo ao som da água
agitada no portuário.
— Eu disse que seria surpresa — digo enquanto a guio pelo caminho
de tábuas, já que um pedaço de pano tapa seus olhos.
— Ouço o som das gaivotas, o cheiro do mar salgado e o agito da
água. Posso dizer onde estamos.
Seguro seus ombros, mas abaixo as mãos até a sua cintura e então até
o seu quadril, apertando seus flancos e a ouvindo gemer com o toque
inesperado.
— Você se acha muito espertinha, não é? — pergunto baixinho, perto
do seu ouvido, como se tivesse pessoas para nos ouvir por perto.
Mas aqui está apenas nós dois.
— E você acha que pode me enganar — rebate.
— Não estou te enganando, estou fazendo uma surpresa, é diferente.
— Mas continua sem me contar nada. Vamos lá, Jeremy O’Donnell,
me mostre logo.
Quando vejo o barco flutuando sobre a água, ainda ancorado, paro e a
posiciono de frente para ele.
Audrey finalmente fica quieta e me aproximo mais ainda dela.
— Você não gosta de surpresas, não é?
Ela se remexe, já demonstrando a resposta com a sua expressão
corporal.
— Não é que não goste, eu só nunca recebi uma — diz de forma
natural, porque é a verdade, mas meu coração se aperta diante disso. — A
sensação é… Estranha — completa.
Massageio os dedos ao redor dela.
— Então é melhor ir se acostumando. — Retiro a venda e fico
esperando a sua reação.
— Você tem um barco?
— Sim, eu tenho.
— Meu Deus, é claro que você tem.
— É um barco à vela, simples — digo tomando o lugar ao seu lado.
— Mas este não é um simples barco à vela, parece até um iate —
protesta.
— Então você não gostou?
Audrey me olha espantada.
— Tá brincando?! Eu nunca andei em uma coisa dessas, nem sequer
de canoa.
Sorrio.
— Bem, você vai gostar da sensação. Iremos fazer um passeio
relaxante, só nós dois.
O olhar doce de Audrey se torna felino e tão profundo.
Principalmente, quando diz:
— Da última vez que você disse que eu iria relaxar, as coisas ficaram
bem intensas entre nós dois.
Ela fala sobre o episódio do clube de golfe.
Enfio as mãos no meu calção de praia branco e sacudo as pernas
discretamente para que não fique de pau duro aqui mesmo só de lembrar
daquele dia.
— Então agora você já sabe que posso ser muito bom em
preliminares. — Dou a minha mão para ela segurar. — Vamos, senhorita?
Audrey segura a minha mão, faz uma reverência, e, então, a guio
cuidadosamente até o barco.
Primeiro, entro e ela vem logo em seguida.
Audrey veste um short jeans e uma blusa azul leve que eu sei que não
resistirá ao vento que está fazendo hoje.
Para um bom passeio de barco à vela, as condições dos ventos
poderiam ser, ou não, um bom aliado.
Nessa manhã está perfeito.
— Você sabe conduzir isso? — ela pergunta tocando no leme
envernizado.
— Sim, eu sei — respondo enquanto desancora o barco.
— Então será mesmo só nós dois. — É uma afirmação, mas soa como
uma pergunta.
— Sim, também. Algum problema com isso?
Audrey me olha por cima do ombro e posso ver o brilho da
lascividade encher seus olhos, além do brilho do dia que reflete em seus
olhos que estão claros.
Porra, ela já está excitada?
Acho que começo a decifrar seu olhar quando isso acontece. Audrey
sabe ser muito transparente, como desde o primeiro dia em que a vi na
mansão, onde suspeitei que ela já sentia alguma coisa por mim, porque ela é
tão expressiva.
Sei quando está com raiva, pensativa ou chateada. Mas está excitada,
principalmente.
Não acho que seja um talento, mas um jeito de querer agradar
Audrey, a todo custo, seja sendo sua companhia quando necessário, ou
dando espaço quando preciso.
Agora, sei exatamente o que passa na cabeça dela, porque é o mesmo
que passa na minha.
Ajusto as velas que é o que nos dará impulso para a nossa aventura.
Ajeito tudo para os cantos, cordas, prendedores, lonas.
— Quer ajuda aí? — ela pergunta ainda segurando o leme, como se
tivesse gostado da sua forma.
— Obrigado, mas já estou concluindo. — E é verdade, pois se não
fosse pelos meus funcionários que já ficam de prontidão no porto, ainda
estaria limpando o barco. — Pronto. — Me aproximo dela e assumo o leme.
Audrey se afasta.
— Bom, agora é hora de tirar o barco e é um processo meio chato
porque ninguém além de nós, resolveu passear de barco nesse lindo dia,
então terei que ter cuidado para não esbarrar em nenhum desses outros.
— Isso é bom? Só nós velejando por aí…
Olho para ela de esguelha e dou um sorrisinho.
— Isso é ótimo, pequena.
Quando olho para a frente, João, um dos funcionários, empurra a proa
e o barco começa a ir para trás. Giro o leme o máximo que consigo e então
estamos pegando impulso para sair dali.
— Segure-se firme! — exclamo animado para Audrey.
— SIM, SENHOR CAPITÃO! — ela grita de volta, capturando o
espírito do momento.
Audrey se encosta nas barras de ferro de proteção e observa com um
sorriso no rosto todo trajeto até pegarmos distância do porto.
Quando já estávamos longe o suficiente dos outros barcos, a chamo
para conduzir o leme junto comigo e ela não hesita.
Coloco Audrey na minha frente e ajusto minha mão sobre a dela.
Aproximo meu corpo do dela, sinto seu perfume gostoso e ouço nada além
do vento, do mar e o som da sua voz empolgada.
— É mais fácil do que imaginava — ela comenta depois que pega
rapidamente o conhecimento de conduzir um barco à vela.
— Às vezes, dá para conduzir o barco usando apenas a vela mestra,
vai muito da pessoa.
Ela deita a cabeça em meu peito e me olha.
— Aposto que você prefere o leme — supõe.
Arqueio uma sobrancelha.
— Por que acha isso? — Aperto as mãos em volta das dela, enquanto
deixo a minha boca mais perto da sua orelha.
— Por causa do controle, de como você gosta de conduzir tudo com
as próprias mãos.
Dou um sorriso.
— Tão observadora.
— Gosto de como sou inexperiente, mas você me conduz, me ensina,
faz tudo parecer tão… Natural. Como se você soubesse do que preciso.
— É claro que sei. — Solto sua mão.
Saio andando em direção à popa, onde logo no canto há um banco
encapado com couro. Tiro a blusa, logo depois o calção, ficando só de
sunga. Eu me sento no banco e estico as pernas grandes e musculosas, as
exibindo e abro meus braços no encosto da popa.
Fico olhando para Audrey.
— Mas, do que eu preciso, Audrey? — pergunto por fim. — Será que
você sabe me observar tão bem assim?
Ela larga o leme e se vira lentamente na minha direção, com seu olhar
me queimando e o seu corpo me querendo.
— Vai pegar um solzinho? — Ela ignora a minha pergunta.
Dou a ela um sorrisinho.
— Sim, vitamina D é sempre bem-vinda, não é? — Jogo a cabeça
para trás, fechando os olhos com força enquanto os raios do sol poente pega
forte.
— Desse jeito você não só vai tomar Vitamina D, como vai pegar a
bela de uma queimadura também.
— Tem protetor solar nesse compartimento logo atrás do leme.
Não preciso abrir os olhos, pois estou de fato curtindo o calor. No
entanto, ouço atentamente quando Audrey abre a pequena portinha atrás do
leme onde tem coisas necessárias como protetor solar, kit de primeiros
socorros e boias salva-vidas.
Ouço também quando ela se aproxima.
— Eu não trouxe biquíni — reflete.
— Sabe que não precisa disso.
— Considera que eu fique só de calcinha e sutiã?
Dou de ombros.
— Estamos praticamente à deriva, só nós dois aqui. Se quiser ficar
nua, quem além de mim, vai presenciar isso? — Abro um olho, só para
espiar, e vejo Audrey parada, como se estivesse contida, completamente
hesitante a respeito dessa ideia.
Fecho os olhos de volta.
— E então, pequena, do que eu preciso? — pergunto de novo.
— Protetor solar — ela responde como se fosse uma pergunta
estúpida e a resposta, óbvia.
Mas sorrio.
— Isso mesmo — respondo.
Fico mais um tempinho curtindo o calor com os olhos fechados. Eu
não me importo em ficar bronzeado, mas preciso fazer isso com cuidado,
afinal de contas, gosto quando Audrey me toca e será horrível se o seu
toque for uma tortura para mim, só porque estou com a pele queimada.
Estou completamente distraído quando sinto algo molhado e frio
jorrar no meu abdômen, em resposta arfo profundamente.
— Aaaah! — Eu me contenho.
— Fica quietinho enquanto cuido de você — ela murmura, inclinada
sobre mim, e então finalizou com uma mordida na minha orelha. — Relaxa,
Jeremy.
Tento me conter ao seu avanço.
Audrey espalha o produto pela minha barriga, em cada centímetro,
começando abaixo do meu umbigo, e então subindo para o meu peito,
fazendo seus dedos deslizarem com graça e sensualidade.
A essa altura, eu já encolho as pernas e pressiono as mãos em punhos.
Continuo de olhos fechados, saboreando a sua delicadeza sórdida em
me tocar, e por isso não consigo conter os gemidos de prazer pela sua
massagem tântrica, ou o meu pau crescendo, duro e latejante.
Umedeço os lábios na expectativa quando ela passa a mão pela lateral
da minha sunga, mas não faz nada.
Eu quase solto um grunhido em desagrado, mas me mantenho firme.
No entanto, quando Audrey começa a passar protetor solar nas minhas
pernas, sei que não saberei me conter por muito tempo, e que ela irá ver o
efeito que tem sobre mim.
Ouço sua risadinha sórdida.
— Parece que você está gostando muito, Capitão — ela comenta
cheia de gracinha, mas com uma voz mais lasciva.
— Juro, você está me matando — admito com a voz rouca e arrastada
a cada toque.
— Você está sendo legal. Não vejo nada de mais no que estou
fazendo.
— Não? — Ergo a cabeça atônito, mas não abro os olhos.
Confesso que gosto da ideia de estar no meio do mar, com Audrey
diante de mim, me tocando desse jeito, enquanto estou completamente à
vontade aqui.
— Mas, posso melhorar.
É questão de segundos até sentir ela agir, colocando meu pau para
fora da sunga.
Sinto o calor, o vento e a excitação trincando cada nervo meu que
logo depois melhora.
Audrey segura meu pau e então passa a língua da base até a cabeça,
lambendo o pré-gozo como se fosse uma calda de chocolate, em resposta
solto um gemido.
— Caralho, Audrey!
— O que foi, Capitão? — pergunta com um ar de inocente.
Fico ansioso, afinal de contas, é a primeira vez que ela faz isso em
mim, porque até então não havia deixado brecha para tal coisa.
Audrey está começando a sua vida sexual agora e quero fazê-la sentir
todo tipo de sensação, ter os melhores orgasmos e toda atenção no ato.
Quero que ela se lembre de mim, mesmo depois desse verão.
No entanto, agora ela toma as rédeas da situação e me deixa com as
quatro rodas arreadas por ela.
Foda-se a porra de curtir o momento!
Afinal não estava em uma sessão de meditação ou terapia.
Estou praticamente à deriva, Audrey está de joelhos, me chupando e
tudo o que quero é ver esse momento.
— Porra! — exaspero quando tenho a surpresa de encontrá-la nua!
Fico até sem palavras e nem sequer sei o que fazer direito.
A minha falta de reação parece fazê-la achar graça.
— O que foi, Capitão?
Percebo que ela gostou mesmo de me chamar assim.
— Onde está a sua roupa, Audrey?
Ela dá de ombros.
— Eu não trouxe biquíni, mas também não curto muito a marquinha
que fica, então… Achei melhor tirar tudo. Fiz mal?
Porra!
Balanço a cabeça negando, já pensando em tudo o que eu farei com
ela.
— Você está tão duro, Jeremy — diz enquanto alisa meu pau, para
baixo e para cima. — Isso me dá água na boca.
— O quê? — pergunto incrédulo, mas me fazendo de bobo, porque
quero ouvi-la falar sacanagem.
— O seu pau, duro, melado, me querendo… Eu imaginei tanto como
era tê-lo na boca — admite seguido de um gemido, e então, ela me engole.
— Aaah, caralho! — praguejo quando sua boca quentinha e macia
desce pelo meu pau.
Audrey parece ter um pouco de dificuldade, como se meu pau não
tivesse condições de caber em sua boca.
Mas ela é persistente.
É visível em seu corpo inquieto que isso a deixa excitada.
Conforme me chupa, Audrey balança o quadril e daqui vejo a sua
bunda em formato de coração implorando para ser fodida.
Ela está de quatro e me olha como se estivesse magoada, mas, na
verdade, está extasiada em prazer.
Depois que ela pega ritmo da coisa e sua boca se emoldura ao meu
pau, começa a performar. Ela geme e balança a cabeça, como se estivesse se
enroscando no meu pau.
É delicioso.
— Isso, sua safada, engole a porra do meu pau todinho. Trate de
deixá-lo bem molhado porque vou metê-lo com força em você.
— Hummmmm — ela geme com a sua boca ocupada.
Quando sinto meu pau inchar, sei que estou prestes a chegar ao meu
limite, porque nunca estive tão excitado. Então, trato de mudar a posição.
— Minha vez — digo ao me levantar de súbito.
Audrey fica de joelhos, me olhando como uma submissa obediente.
Ela é linda, sensual e sabe muito bem como se comportar nessas
horas.
Agarro o topo da sua cabeça e pincelo a sua boca com o meu pau. Ela
coloca a língua para fora e bato como se estivesse amolecendo carne.
— Espere aqui — digo enquanto vou até à comporta do leme e pego
uma toalha.
Quando volto, a estendo sobre uma parte mais inclinada logo atrás
dela.
— Pronto. Assim a sua pele perfeita não fica machucada.
Ela se deita sem hesitar e sorri.
— Sempre tão cuidadoso.
Pego o protetor solar, mas estou abobalhado com essa mulher deitada
diante de mim, totalmente exposta e confortável, como se fosse uma sereia
que pulou dentro do meu barco e está me enfeitiçando.
Faço o mesmo que ela fez comigo. Passo o protetor solar na sua
barriga, e então saio espalhando por cada canto do seu torso.
Meu pau continua duro, tão duro que já está doendo e ela joga a
cabeça para trás, se entregando aos meus toques.
Massageio seus seios na intensidade tântrica. Depois disso, abaixo
para as suas pernas, mas não permito que ela abra as pernas.
Eu gosto de ver a sua boceta lisinha, carnuda e inchada de tão
excitada que está.
— Você é linda, Audrey, e muito gostosa. Essa sua bocetinha… —
Passo a língua nos lábios e ainda que ela esteja de pernas fechadas, afundo
os dedos mesmo que o caminho esteja difícil. Sinto a sua umidade e solto
um gemido. — Aaah, sempre pronta para mim. Parece que você quer muito
o meu pau aqui, pequena.
— Eu quero a sua boca e depois tudo de você.
O corpo de Audrey está todo embebedado no protetor solar, mas
conforme seca se torna um óleo, que deixa a sua pele toda brilhante.
— Então abra as suas pernas para mim, pequena, lentamente —
ordeno.
Olhando para mim, Audrey encolhe as pernas, a inclina mais para
cima e então vai abrindo as duas como se tivesse flexibilidade demais para
isso. Mas ela tenta e faz exatamente do jeito que eu queria. A sua boceta
fica exposta para mim, melada e pulsante, tão rosadinha que me deixa
completamente inebriado.
— Bom apetite, Capitão. — Ela dá sinal verde para eu avançar.
Desço até seu sexo, não tirando meus olhos dela em nenhum
momento enquanto ela assiste a tudo.
Passo a língua de baixo para cima, provando o seu sabor delicioso que
explode em minha língua.
Mas é Audrey quem se desfaz.
Faço de novo e ela parece estar prestes a ter um ataque. A minha
língua arrasta de novo e de novo, e a sinto estremecer.
— PORRA, JEREMY! — ela grita.
— Aqui você pode gritar o quanto quiser, ninguém vai ouvir você.
Ninguém.
Então caio de boca nela, a devorando, chupando e mordendo o seu
grelinho inchado. Audrey se segura em mim, e começa a rebolar o seu
quadril, me conduzindo no ritmo que ela quer.
E ela parece estar completamente desesperada.
— Ai, meu Deus, Jeremy… Isso tá tão gostoso!
— Eu sei, pequena. — Enfio dois dedos em sua cavidade. — Ah, do
jeitinho que a deixei da última vez. — Volto a lamber seu clítoris, sentindo
como isso a deixa louca, como se o mundo fosse se partir em dois.
Seguro meu pau com a outra mão, como que o acalmando, pois ele já
tem espasmos involuntários, louco para se afundar nela.
Sabemos que Audrey é diferente e que não há nada igual a ela.
— Por favor, Jeremy. Eu preciso de você.
— Precisa?
— Pensei que você soubesse exatamente do que eu precisava — ela
provoca.
— Mas eu sei. Só preciso que você fale, pequena — digo ainda
focado em chupá-la como se fosse a porra de um cubo de gelo.
— Bom, eu preciso que você venha me foder agora mesmo. Que cada
centímetro seu esteja dentro de mim.
Paro de chupá-la subitamente e me arqueio até ela, roubando um beijo
denso, enfiando a minha língua dentro da sua boca como um amante cheio
de saudade.
Ela quer gemer dentro da minha boca, mas não deixo. Então Audrey
morde meu lábio e me puxa mais ainda para si.
— Você quer a porra do meu leite em você, não é?
— Descendo quente entre as minhas coxas — completa.
Merda!
Essa mulher sabe como me deixar louco mesmo.
Então apenas assinto para ela.
Sento e seguro uma de suas pernas. Eu a mantenho assim enquanto
encaixo a cabeça do meu pau na sua grutinha.
Audrey geme e olha que nem entrei nela ainda.
Sorrio por ela ser tão volátil no sexo, pois vai de uma mulher sexy,
selvagem, a uma menina indefesa, completamente domável.
Eu me enterro nela que arfa.
Saio e entro de novo, sentindo cada parte sua se contrair diante à
minha presença, com prazer.
— Pelo amor de Deus, Jeremy! — diz com a voz carregada. — O seu
pau é tão gostoso.
— É porque você tem a bocetinha mais apertada e gostosa. Porra,
Audrey, você está tão molhada que eu tô deslizando em você!
Procuro um melhor apoio, então aumento as estocadas. Sinto quando
vou até o seu limite e quando isso acontece, Audrey se contorce toda.
— Quero você me fodendo — confesso, já tratando de trocar as
posições. — Hoje, você está totalmente no controle, pequena.
Deito sobre a toalha e coloco os braços atrás da cabeça.
Quero que Audrey veja que não a forçarei e a deixarei fazer isso
sozinha, porque sei que ela consegue.
E então, Audrey se coloca sobre mim e desce lentamente no meu pau.
Sinto um frio na barriga e solto um gemido alto junto com ela.
— Jesus! Porra, Audrey!
Percebendo que isso me deixa louco, ela faz de novo. Desce e sobe
lentamente, sabendo do seu poder sobre mim, do seu corpo e de suas
artimanhas sexuais para me dar prazer.
Ainda sem um pouquinho de jeito, Audrey começa a cavalgar em
mim.
Ela está tentando encontrar um jeito.
Quando ela fica em uma posição que sei que será agradável a ela,
seguro as suas coxas, dando apoio.
— Venha, cavalgue na porra do meu pau, Audrey.
E ela faz, completamente indomável.
Seus seios pulam no mesmo ritmo em que me fode e a cara que ela
faz…
Porra, a cara que ela faz!
Fico muito excitado e dou um tapa de leve em seu rosto, só para não a
assustar.
Mas ela gosta.
Morde o lábio, como se aquele gesto tivesse dado a ela mais prazer.
— Eu sinto você… Bem fundo!
— Continue assim — aconselho.
O bico dos seus seios estão tão enrijecidos que os toco, como se
estivesse sintonizando as estações de um rádio.
Quando sinto os músculos da sua boceta me apertarem, sei que
Audrey gozará.
— Vem, meu bem. Vem pra mim.
— Ah, Jeremy… E-eu vou…
— Goza, Audrey. Goza para mim. Eu também… — O frio na minha
barriga se intensifica e meu corpo todo se arrepia, junto com o meu pau que
só incha. — Eu vou gozar, Audrey!
Mal termino de falar e já estou jorrando dentro dela como a porra de
uma mangueira sem controle.
E, de repente, Audrey está perdendo o controle, gritando enquanto
goza.
Ninguém nos ouve...
Ninguém.
E ela tira bastante proveito disso. Grita e geme como a porra de um
animal selvagem.
E, nesse momento, sei que estou dando muito prazer a ela e que nunca
se esquecerá de mim.
Audrey se joga sobre mim, suada. Estamos encharcados de suor, com
a respiração pesada, exaustos, resfolegando como se tivéssemos corrido
uma maratona.
Depois de uns segundos, ela começa a sorrir.
— O que foi? — pergunto enquanto tiro seus fios de cabelo grudados
no seu rosto suado.
— É a segunda vez que fazemos isso e não estamos usando nada para
nos proteger.
— Estamos fodendo no meio do mar, você quer falar sobre proteção
agora?
Audrey ri mais ainda.
— Você sabe o que eu quis dizer, seu bobo!
Sim, eu sei muito bem e ela não está errada em questionar. Mas o fato
de eu não ter dado tanta importância a esse detalhe me deixa
desconfortável.
Porra, como podemos esquecer das camisinhas?
— Irei providenciar na próxima vez.
Audrey me olha, séria.
— Gosto de sentir você naturalmente.
— Que bom, porque eu também. — Aliso seus braços. — Assim que
voltarmos, iremos marcar uma médica para você, ok?
— E se já for tarde demais? — ela pergunta e fico olhando para ela.
Hummm, filhos.
Bom, eu já tenho um, e, sinceramente, nunca fui contra a paternidade.
Só o fato de eu ser um idiota que não sabe conciliar bem as minhas
responsabilidades. Mas, essa possibilidade nunca me assustou de qualquer
jeito.
Meus irmãos e eu nunca tivemos esse problema. Talvez, Ian ainda
tenha aversão, mas ele é romântico e não acho impossível ele ser de nós três
o que levará melhor o dever de pai.
— Adultos sempre dão um jeito, Audrey. Se acontecer qualquer coisa
da qual não estamos esperando, pode ter certeza de que saberemos lidar
com a situação. Imprevistos acontecem para serem superados.
— Você fala como um CEO — diz e então se afasta de mim, se
erguendo e esticando seu belo corpo pequeno e curvilíneo.
— Então eu falo a coisa mais sábia.
Ela dá um sorriso desdenhoso e fica me olhando como se estivesse
considerando tudo o que eu disse.
— Bom, não sei o motivo, mas acredito em você. Porém, você pode
estar pronto, Jeremy, mas eu, não.
— Está tudo bem, Audrey? — pergunto preocupado por conta desse
assunto logo após o nosso sexo.
— Sim! E-eu só… Sexo sem camisinha parece ser perigoso para
pessoas como nós, Jeremy, que não tem nada.
Eu me levanto logo em seguida e me aproximo.
Nós dois ali, nus.
— Nós vamos mesmo verificar isso o quanto antes, ok? Mas, agora,
você sabe nadar?
— O quê? — Ela me olha séria.
Sei que parece que estou evitando esse assunto, mas é porque tenho
certeza que Audrey não está grávida. A mesma condição que assolou Noah,
que teve tanta dificuldade de engravidar a sua mulher, quase aconteceu
comigo também.
É um problema quase hereditário, mas que foi todo para ele. Ian e eu
temos um pouco disso. Bom, o fato é que eu engravidei a minha falecida
esposa depois de oito anos de namoro e nem usávamos preservativos. Então
quanto isso devo dizer estar seguro.
— Vamos dar um pulo? — Indico a água brilhante, completamente
chamativa.
O rosto de Audrey se acende, e, para a minha surpresa, ela é a
primeira a se jogar e vou logo depois.
Afundo no mar, por dez segundos, o mundo fica silencioso, mas
depois tudo volta ao normal quando emerjo.
A água está gelada, o que me causa um choque térmico.
Sem conseguir aguentar, Audrey vem atrás do meu calor corporal,
entrelaçando suas pernas em volta de mim, aos risos.
Não aguento e beijo a sua boca com delicadeza, suavemente.
Somos só nós dois no mar, metros e metros de profundidade sob
nossos pés. Isso parece ser assustador, mas Audrey consegue apagar todas
essas coisas ruins. Principalmente, quando a sua língua roça para dentro da
minha, delicadamente…
Apaixonadamente.
Não sei, mas pode ser qualquer coisa, menos paixão, afinal paixões de
verão são coisas de adolescentes.
Porém, eu não me importaria se isso fosse real e ter isso não só no
verão, mas em todas as estações do ano.
Sentir que a vida é plena, que é isso e o beijo tranquilo de Audrey,
mesmo estando à deriva.
O final do verão nunca foi significativo para mim. Tanto fazia a
chegada e o término dele, que nunca mudou nada em minha vida. No
entanto, desta vez estou contando os dias, pensando em como será chato
quando ele chegar ao fim, porque não sei se estou pronta para as
despedidas.
É só eu pensar na ocasião, que meu coração acelera e fica apertado.
Meu estômago embrulha e fico de fato, muito ruim com tudo isso.
Não é nenhuma surpresa que tenha me agarrado a Jeremy e a Julian,
até mesmo no cão, o Theo.
Vi neles uma boa influência para tentar coisas melhores para a minha
vida e me cercar de pessoas que realmente podem fazer o bem para mim.
Eu sei que sentirei falta de ficar com Jeremy, de conversar com ele e
tirá-lo completamente daquele eixo de “homem perfeitinho”. Mas o que
mais irei sentir falta, certamente, vai ser de me sentir uma pessoa melhor,
totalmente diferente do que eu era.
Meu maior medo, então, é voltar à estaca zero.
— Não saiu mais cedo hoje — mamãe avalia quando começou a
colocar as coisas sobre a mesa para o nosso café da manhã. — O que
aconteceu?
Jeremy pagou a nossa dívida, quitou tudo, e com isso, adiantado meu
salário, que acabei investindo no mercado.
Mamãe ficou super grata pela gentileza do Jeremy, e eu também, mas
confesso que ainda sinto que devo a ele.
Não é certo ele gastar seu dinheiro com uma coisa que ele não tinha
nada a ver. Mas Jeremy pode ser bem insistente, principalmente, quando ele
sabe que está fazendo a coisa certa.
E de qualquer forma, eu aproveitarei.
Acho que dever para um bilionário é melhor do que dever para
pessoas miseráveis que usam essa desculpa para rebaixar e fazer de
marionetes as pessoas envolvidas.
Steven e o senhor Douglas não me verão nunca mais!
Pego um pão do cesto e o corto para colocar queijo e presunto
enquanto mamãe nos serve o café.
— Não sei bem, só não acordei com tanta disposição assim. Acho que
vou menstruar, me sinto tão indisposta ultimamente.
— Você não costuma ser assim nem naqueles dias — mamãe ressalta.
E ela tem razão, mas dou de ombros mesmo assim.
— Pode ser essa mudança de clima intercalando entre verão e outono.
— Tento justificar.
Pego meu café e dou um gole, mas o seu aroma forte é a primeira
coisa que entra em mim. Sinto algo pesado dentro de mim, rejeitar o cheiro,
que sobe até a minha cabeça e envia um tipo estranho de embrulho até o
meu estômago.
Não é a primeira vez que venho sentindo isso.
Fecho os olhos e tento respirar fundo para fazer isso passar e tomar
meu café da manhã em paz. Porém, só continuo com ele ali parado na
minha frente, como se estivesse ainda processando essas sensações
estranhas.
— Não sei… Você está tão mudada nessas últimas semanas — ela
comenta. — Ao mesmo tempo que está mais radiante, está mais…
— Desculpa, mãe. Não consigo tomar café. — Eu a interrompo,
largando a xícara sobre a nossa mesa que ainda é de plástico, e o pão
também que mal havia mordido.
— Falei alguma besteira? — pergunta preocupada.
Coloco a mão em frente a boca, tentando me concentrar na minha
respiração e ignorar a urgência que só cresce dentro de mim, fazendo a bile
subir. A ânsia me faz levantar de supetão, empurrando a cadeira com força e
correndo até o banheiro.
Me agacho perto do vaso e abro a tampa. O que vem depois me faz
lagrimar e me contorcer no chão, do jeito mais humilhante possível.
Sinto que minha mãe está aqui, me prestando ajuda enquanto segura
meu cabelo comprido.
Tenho que lembrar de apará-lo.
Sua mão afaga minhas costas, como em uma tentativa de fazer isso
passar.
— Isso não é bom, Audrey. E confesso que temia isso — ela diz mais
preocupada.
— O quê? — Limpo a boca com o dorso da mão e me viro para ela.
Mamãe suspira e então parece exaurida. Ela se ergue e vai até à porta,
me dando espaço para respirar melhor enquanto ela diz:
— Eu sou mulher também, sabe? Percebo as mudanças que você
andou aparentando recentemente, principalmente quando voltei do trabalho
naquela noite e você não foi trabalhar. Estava aqui em casa, suspirando
pelos cantos e com um sorriso constante no rosto. Você estava radiante,
Audrey. Não me contou o que aconteceu, mas suspeitei.
Droga, isso é um pouco constrangedor, principalmente quando
percebo que ela fala da noite em que Jeremy apareceu aqui, transamos pela
primeira vez e que perdi a minha virgindade para ele.
— Eu não vejo problema em você ter a sua relação sexual, filha, mas
tenho receio com quem você faz isso. Jeremy pode ter quitado as nossas
dívidas, mas não estamos com condição de aumentar a família. Não há
ninguém em Rathmines capaz de arcar com isso, sendo que estávamos
quebradas e agora estamos tentando nos reerguer.
Confesso que ouvir isso me dói.
De qualquer forma, é um sermão, mesmo sabendo com quem havia
me deitado nessas últimas semanas desde quando comecei a transar. Mas,
no meio disso tudo, mamãe pensou que eu seria altamente irresponsável
com algum infeliz do nosso pacato e pobre bairro.
Ok, talvez eu tenha sido irresponsável com Jeremy.
Não nos protegemos em nenhum momento, mas, depois que ele me
contou sobre a sua condição e de seus irmãos, que era uma coisa quase
hereditária que os impedia de ter filhos, talvez, não impedisse, mas tornaria
o processo mais difícil e fiquei mais despreocupada.
Só que agora mamãe me vem com essa e volto a ficar nervosa e
preocupada.
— A senhora acha que estou grávida? — pergunto acanhada.
— Não acho que seja gastrite — ela enfatiza. — Você precisa ver isso
o quanto antes, Audrey, e ser forte. Porque se for de fato um bebê, seremos
três agora, e é melhor não duvidarmos da nossa sorte por enquanto. —
Mamãe sai do banheiro e permaneço no mesmo lugar.
Eu me pergunto se estraguei tudo, logo agora que achávamos que
poderia ter um bom recomeço.
Levanto, puxo a descarga, lavo a boca e escovo os dentes. A minha
barriga agora está mais vazia, mas aparentemente há coisas maiores a se
pensar e uma possibilidade de que a minha barriga não esteja totalmente
vazia assim.

Eu já estou pronta para o trabalho, mas enrolo um bom tempo até


pegar o ônibus e ir para Malahide, porque não fui direto, como faço toda
manhã. Desta vez, fui até a farmácia e comprei um teste de gravidez.
A balconista ficou me olhando com pena e um olhar de surpresa.
Imagino que ainda hoje, todos de Rathmines dirão que estou grávida,
afinal as notícias correm rápido por aqui.
Me atraso para chegar na mansão e deve ser a primeira vez que vou
tão desanimada para o trabalho, com receio até mesmo de olhar para
Jeremy.
Quando chego na mansão, vou subindo de mansinho, pois, a última
coisa que quero é esbarrar com ele, embora isso seja inevitável em algum
momento.
Jeremy não hesitava em questionar se eu já estava ali e era o primeiro
a sugerir aventuras entre Julian, eu e ele.
E o Theo também, é claro.
Mas hoje será tudo diferente.
Entro no meu quartinho de hóspedes e largo a bolsa sobre a cama. Me
enfio no banheiro com o teste em mãos e leio a instrução, com as mãos
tremendo. Então com um pouco de dificuldade faço tudo o que se pede na
caixinha. Coloco a ponta do teste na urina e espero.
Espero os malditos cinco minutos e estou para infartar no banheiro.
A minha vontade é de deixar o teste sobre a bancada e sair correndo o
máximo que posso, feito uma louca, mas acho que isso chamará atenção
demais.
Meus pés não param e começo a andar de um lado para o outro,
verificando o tempo no celular a todo instante.
Ironicamente, quando dá o tempo, tenho medo de ver. Olho para o
teste como se fosse uma bomba e me aproximei dele com medo de
desarmar a arma.
Positivo.
O teste escancara na minha cara que estou grávida, que o que fiz pode
ter sido gostoso e divertido, mas que agora o resultado disso parece ser
bastante assustador.
Fico olhando para o teste como se a minha vida toda estivesse ali, não
consigo mover um músculo enquanto meu coração parece bater na minha
boca.
Grávida...
Eu estou grávida.
Existe um coraçãozinho batendo dentro de mim, sangue do meu
sangue e do sangue de Jeremy também.
Um O’Donnell.
Irmão ou irmã mais nova de Julian, sobrinho de Ian e Noah, neto do
senhor Rupert. Mas, se a minha mãe descobrir, ela achará que é de algum
marmanjo do pequeno bairro de onde moramos.
Sinto que não sei o que fazer com essa informação.
Ouço batidas à porta.
— Audrey?
Parece ser a Jane.
Tento me recompor, largo o teste sobre a pia e me viro abruptamente
em direção à porta que só deixei encostada, por isso Jane vai entrando.
— Oh, me desculpe, a porta estava entreaberta então fui logo
entrando. — Ela me olha e faz uma cara feia. — Meu Deus, você está bem,
menina?
— E-eu…
— Estava passando mal? — pergunta enquanto vê o meu estado.
Jane também olha para a provada, parecendo procurar algum
resquício de vômito.
Será que ela também desconfia assim como a minha mãe?
No entanto, Jane é um pouco mais sagaz. Ela vê que posso estar com
problemas, mas que estou principalmente muito desconfiada, então estuda o
ambiente para encontrar alguma prova. Tento esconder o teste sobre a
bancada de pedra da pia, mas já é tarde demais.
Jane vê o teste e arregalou os olhos no mesmo instante.
— Audrey, você está grávida?!
— Shhhh! — Avanço em sua direção e ela rapidamente fica calada. —
Por favor, Jane, não diga isso a ninguém.
— Então você está? — insiste me olhando com uma expectativa
empolgante, diferente da minha mãe mais cedo, que me deu um sermão.
Foi compreensível, mas aquilo ficou na minha cabeça até agora.
— Parece que sim. Mas testes de gravidez não são eficazes, não é?
Ela me olha como se eu fosse uma boba, então se esgueira até o teste
e diz:
— Não sei não, mas pra mim, parece que você está muito grávida. —
Aponta para o teste com seus dedos enrugados e completa: — Isso são
todas as palavras cabíveis para grávida.
Isso não me tranquiliza em nenhum nível.
Fico olhando para o teste, tendo que aceitar que isso é real e que
ninguém me dirá ser um erro de fábrica.
Está certo e não tenho para onde fugir.
Mãe, eu serei mãe.
Sinto meus olhos se enchendo de lágrimas enquanto a realidade me
pega de jeito. Olho fixamente para o chão enquanto sou tomada por uma
avalanche de sensações.
— Eu não estou pronta para ser mãe, Jane — admito baixinho, como
se ela e o resto do mundo fosse me julgar por isso. — E-eu só tenho vinte e
dois anos, agora que ia começar a planejar um futuro brilhante para mim.
— Ter filho não é o fim do mundo, Audrey. Na verdade, um filho
pode ser o melhor incentivo para você correr atrás dos seus sonhos —
aconselha otimista, com seu sorriso rotineiro que faz a vida ser sempre bela.
— Não sei, Jane… Só não acredito que isso tenha acontecido logo
agora.
— É por causa do pai? — pergunta e olho para ela porque não
lembrava que Jane poderia saber sobre Jeremy e eu. — Você acha que o pai
da criança não é bom o suficiente?
Ela não sabe, caso contrário teria mencionado Jeremy. Talvez não
tenha ficado tão claro assim que ele e eu estamos tendo um caso.
Mas prefiro deixar assim, pois não quero que ninguém pense que eu,
uma pessoa quebrada financeiramente, engravidou de um bilionário como
Jeremy por puro interesse.
Acho que Jane nunca pensaria isso de mim, mas quando se é pobre,
como eu, se envolver com um homem rico e mais velho significa apenas
uma coisa para a grande maioria.
— Ele é incrível — digo a verdade. — Mas não sei como reagiria
diante disso.
Jane toca meu cabelo carinhosamente.
— Oh, menina, tenha coragem e diga. Você nunca vai saber se não
contar. Vai viver com a dúvida? Além do mais, você precisa contar com a
ajuda dele.
Mais do que ele já me ajudou?
Não mesmo.
Fiz Jeremy gastar vinte e dois mil euros comigo, só por causa das
dívidas que tínhamos. Ele fez isso sem nenhum interesse, apenas com o
desejo de ajudar, de me ver longe daquelas pessoas que eram
suficientemente perigosas para mim.
Sempre serei grata a ele por isso e a última coisa que irei querer é
dizer a ele que estou grávida.
Não há amor, não há previsão de futuro nenhum comigo.
Então, por que eu teria que contar alguma coisa a ele?
É mais fácil não dizer nada.
Não parece ser uma decisão difícil de tomar no momento, então
respiro fundo, certa de que deixarei as coisas assim.
— Jane, faz um favor para mim?
— Sim, querida.
— Poderia não comentar isso com ninguém?
Ela pisca seus olhinhos como se eu tivesse cortado as suas asinhas.
— Eu preciso ver o que farei primeiro.
— Não pretende tirá-lo, não é?
A minha garganta quase se fecha.
— Não! Pelo amor de Deus, não! Eu só… Estou numa fase de
aceitação, ok? Não quero ninguém me dando felicitações enquanto ainda
estou tentando me adaptar a isso.
— Oh, claro, eu entendi. Bom, então esse pode ser o nosso segredo,
não é?
— Isso!
— Um segredo que você não vai poder guardar por muito tempo
porque barriga de grávida cresce.
Desta vez, é ela quem corta minhas asinhas.
E só posso imaginar a barriga grande e em como daqui uns meses ela
estará mais visível.
— Verdade, mas por enquanto vamos manter segredo sobre isso.
— Tudo bem, já que você insiste. Mas, parabéns.
Olho para ela que está me dando felicitações e sorrio.
— Estou brincando. Mas é sério, parabéns. Sei que você vai se sair
uma ótima mãe. — Ela sai do banheiro e fico sozinha de novo.
Mal tive tempo de agradecer, mas não sei se quero isso.
Como falei, estou em fase de adaptação e não consigo acreditar que
estou grávida. Prefiro pensar que o teste estava errado, porque afinal de
contas, nem sempre ele está certo.
“Está quebrado, está quebrado”, digo a mim mesma.
A mansão está vazia.
Bom, parcialmente vazia.
Meu pai, Jane e Julian já saíram faz uns dez minutos, enquanto os
outros funcionários já saíram há uma hora, o que significa que estou
sozinho com Theo, mas o coloquei para cima para cuidar de tudo aqui
embaixo com mais tranquilidade.
Mas não sei se estou totalmente tranquilo.
Olho para o relógio de pulso e vejo que faltam trinta minutos para dar
o horário que marquei com Audrey para o jantar. Um jantar surpresa,
porque ela pensa que todo mundo estará aqui, mas, na verdade, meu pai foi
convidado para jantar na mansão da família Hauston e me prontifiquei a
arranjar uma desculpa para conseguir esse momento.
Não parei desde que fiquei sozinho.
Eu não queria levantar suspeitas alguma do que estava fazendo, mas
passei a tarde toda rondando a cozinha, inspecionando os ingredientes e
acho que Jane estranhou, mas também não perguntou nada.
Quando foi mais tarde, já sabia exatamente o que fazer, tinha o
cardápio todo na minha cabeça. Algo não muito pesado, mas que também
fosse o suficiente para nos deixar satisfeitos.
Preparei primeiro a salada Caesar com crispy de queijo como entrada,
para o prato principal, salmão grelhado ao molho de ervas e não pensei em
nada para a sobremesa, mas certamente o sorvete no congelador irá servir.
Preparei a mesa de jantar, só salão formal, onde usamos raramente,
como para fazer a ceia de Natal, por exemplo, ou outras datas importantes.
Eu queria que fosse algo bem intimista, então procurei por uma toalha de
mesa vermelha, mas ficaria muito exagerado, então optei pelo corredor de
mesa de um vermelho sangue e coloquei sobre a mesa de mogno. Distribui
em dois cantos da mesa candelabros e as louças de porcelana e prata que
escolhi na dispensa guardadas há muitos anos, planejada por minha mãe.
Depois que estava tudo pronto, subi e fui me arrumar. Tomei um
banho rápido e aparei um pouco da barba que já estava crescendo. Vesti
uma calça social azul-escuro e uma blusa branca de manga comprida,
deixando um botão de cima aberto.
Eu queria que fosse algo especial e elegante, mas também não muito
formal. De qualquer jeito, planejava que não tivéssemos nenhuma roupa no
final da noite.
O nosso verão em Dublin termina na semana que vem e não sei se
estou pronto para me afastar de Audrey.
Verdade seja dita, apesar de eu ser o meu chefe, não estou alheio as
responsabilidades que este cargo de CEO me oferece. Muito pelo contrário,
tenho muito trabalho a fazer.
Depois daqui, ficarei em Londres por um mês para resolver as
pendências, reuniões, palestras, plano de administração e outros eventos.
Depois disso, uma visita à plataforma petrolífera e então, alguns outros
deveres que tenho ao redor do mundo.
Mas não quero focar nisso agora.
Tirei minhas férias agora não só para passar mais tempo com Julian,
mas também para relaxar um pouco a mente e o corpo. Ter encontrado
Audrey nesse meu objetivo foi pura sorte, porque tinha a sensação de que
ela tornava tudo mais completo.
Então, como ficaríamos?
Em uma noite em que eu a vi, ela passou seis meses ocupando um
lugar na minha cabeça. E agora que a conheço de corpo e alma, como será
que vai ficar a questão da distância?
Talvez eu deva propor para que se mude comigo para Londres. Mas,
não sei, pode ser radical demais.
Eu já tenho trinta e oito anos, não tenho receio de arriscar e cair de
cabeça em algo novo.
Mas, ela…
Eu não quero que ela pense que estou tentando de alguma forma
prendê-la a mim. Que toda sua vida acabe em minhas mãos.
Sei que Audrey é jovem, tem muita coisa a fazer e conquistar ainda.
Pode ser que em algum momento da sua vida, ela encontre a sua alma
gêmea.
Mas, não gosto desse pensamento.
Quisera eu que a sua alma gêmea fosse eu, pois seria o homem mais
sortudo do mundo.
Ouço quando pneus atravessam a entrada de cascalho da mansão.
Rapidamente, vou até a porta da entrada e desço a escada para abrir a porta
do sedã do aplicativo que a veio deixar aqui.
Audrey sorri para mim e ofereço a mão que ela aceita gentilmente.
— Senhorita. — Eu a ajudo descer.
— Quanto cavalheirismo.
Dou um sorriso galanteador para ela e então vou até à janela do
passageiro da frente e estendo para o motorista uma cédula.
— Aqui está, é da viagem dela.
— Obrigado, senhor.
Ela me olha surpresa enquanto faz uma rápida inspeção minha de
cima a baixo.
— Algo me diz que esse jantar não será um jantar em família e que
seremos só nós dois — supõe cirurgicamente.
— Você é muito espertinha.
Quando o carro vai embora, começamos a subir a escada ainda de
mãos dadas. Reparo que Audrey usa sandálias de salto alto, mas uma coisa
discreta, apenas para combinar com o seu vestido de cetim cor cobre, que
cai sutilmente em seu corpo espetacular.
É como se ela já soubesse os meus planos e por isso veio vestida para
provocar. A parte de cima dos seus seios aparecem sutilmente, mas o pano
ajustado dá um vislumbre do seu formato grande sobre a cintura fina e o
quadril largo.
Tão gostosa!
— Você está linda, a propósito.
— Eu imaginei que devesse caprichar. Mas acho que se fosse um
jantar mesmo em família, eu teria escolhido uma coisa mais comportada.
— Então você desconfiou de tudo? — pergunto um pouco incrédulo
por descobrir que não havia arrasado tanto assim e que precisava melhorar
em fazer surpresas.
Audrey anda mais um pouco e só para quando já estamos dentro do
vestíbulo. Ela olha ao redor, como se tivesse notado alguma coisa.
— Nem tudo. Na verdade, sabia que o seu pai iria para um jantar na
casa de velhos amigos, mas não imaginei que a casa estivesse tão vazia.
— Pois é, estamos só nós dois, pequena. — Eu me aproximo e enfio a
mão por trás da sua nuca.
Ela inclinou a cabeça na minha direção e fica me olhando como se
esperasse algo. Me aproximo de seus lábios, mas não os toco.
— Eu preparei muitas coisas para nós hoje. Isso, você não vai
conseguir adivinhar o que pode ser.
— Talvez eu faça ideia — ela provoca e dou uma risadinha.
— Não me conte agora, podemos brincar de adivinhações depois. —
Ela me dá um sorriso travesso.
Sei nesse momento que essa será a noite mais divertida de todo verão
até agora e que ela topará qualquer coisa.
Eu a levo até o salão de jantar formal e sinto quando fica sem fôlego.
Observo cada reação sua, principalmente quando ela vê a mesa preenchida
e o ambiente tomado pela meia luz misteriosa e sensual das velas acesas.
Ela se aproxima e toca a quina da mesa como se fosse uma joia, mas,
na verdade, só está fascinada.
— Uau, você preparou tudo isso sozinho?
Enfio as mãos nos bolsos, me sentindo demais, pois fazia um tempo
que não preparava uma coisa dessas.
— Pois é. Não está espetacular, mas queria fazer por mim mesmo,
e…
— Jeremy? — Ela me interrompe com seus olhos abismados, como
se eu tivesse dito algo profano, mas então seu sorriso ilumina tudo. — Meu
Deus, isso tá perfeito… Vo-você caprichou! Também fez a comida?
Dou um sorrisinho de lado.
— Sim.
Audrey dá dois passos e fica de frente para mim.
— Então quer dizer que além de CEO, um bom jogador de golfe,
comandante, pai, filho, ainda sabe cozinha?
Faço questão de me inclinar até ela.
Mesmo que estivesse só nós dois no ambiente, seguro sua cintura e
sussurro:
— Ainda trepo como ninguém, pequena.
Ela arqueia uma sobrancelha e parece ficar lívida quando a lembro
disso.
— Tem algo mais que você seja bom e ainda não sei?
Aperto os dedos contra ela, contendo o desejo de deitá-la de quatro
sobre a mesa, levantar a barra do seu vestido e fodê-la aqui mesmo.
Respiro fundo e encaro seus lábios pintados de vermelho.
Porra, amo imaginá-los dessa cor em volta do meu pau. Pensar em
como ela ficaria extremamente sensual sendo fodida com essa maquiagem e
vestido.
— Talvez a surpreenda até o final da noite.
Ela inclina a cabeça para o lado.
— Essa noite não vai durar para sempre, não é?
— Pode durar muito mais tempo no meu quarto. Ninguém entra lá e
ninguém saberá com quem estou.
— Sou o seu segredinho? — A minha garganta aperta.
Sei que esse é um assunto delicado e a noite mal começou. Porém,
não estou a fim de estragar tudo logo agora, muito menos magoar a Audrey.
— Você gostaria que fosse mais explícito? Eu não veria problema em
mostrar que estamos ficando juntos — respaldo sendo sincero.
Seus olhos se arregalam, como se tivesse tocado em um ponto que
não a deixa muito animada também.
— Não, tudo bem. Você tem razão, sabe? Vamos continuar desse
jeito. — Ela rapidamente parece deixar seu lado antagônico de lado.
Audrey se vira para a mesa de volta e aponta para as louças cobertas
por redomas de vidro.
— O que temos aí?
Puxo a cadeira da ponta para ela que se sentou logo em seguida.
— Salada Caesar, salmão grelhado, e claro, muito vinho. — Pego a
garrafa que escolhi da adega do meu pai e quando estou prestes a servi-la,
Audrey põe a mão sobre a boca da taça, me impedindo. — O que foi?
Ela parece um pouco sem jeito.
Droga, mal perguntei se ela bebe.
Bem, Audrey trabalhou por muito tempo em um bar, talvez fosse
compreensível que ela curtisse uma bebida, mas agora ela parece um tanto
alheia.
— Desculpa, Jeremy, mas não posso.
— Não pode?
Audrey pisca e parece ficar nervosa.
— Pois é. Eu… Bem. Na verdade, estou tomando antibiótico, sabe? E
o álcool é completamente proibido durante o tratamento.
Rapidamente coloco o vinho de volta à mesa.
— Eu não sabia que você estava doente, o que é?
— Não sei. Andei sentindo uma dor de estômago e o médico me
passou esse antibiótico. Se não passar, deveremos ir mais a fundo nos
exames para descobrir.
— Audrey, por que não me contou? Eu a teria mandado para um
médico mais eficiente, ele não hesitaria em descobrir no mesmo dia o que
você tem.
Ela dá uma risadinha desdenhosa e segura o corpo fino da taça de
cristal como se fosse apenas um hábito.
— O que faz você achar que tudo o que acontece na minha vida, irei
sair correndo para contar para você?
Ergo as sobrancelhas, surpreso pela sua pergunta.
— Nossa, Audrey…
Ela fecha os olhos, como se tivesse sentido só então o peso das suas
palavras.
— Eu sei, isso foi estupido. Mas o que quis dizer é que não posso
correr para você toda vez que estiver passando por alguma situação difícil.
Eu deveria saber me cuidar sozinha, não é?
Solto um suspiro e então trato de começar a servi-la, pois quero que
tenhamos tempo de fazer tudo antes do pessoal da casa chegar.
— Sei onde está querendo chegar, Audrey. Tudo bem. E sei que não
tem como você adivinhar quando estarei sendo gentil, mas, só esperava que
você pudesse contar comigo, como sempre enfatizei.
— Você quer ser o meu pai, Jeremy? — ela pergunta com uma voz
sensual, e mesmo sabendo que isso é errado, sinto meu sangue todo indo
para o meu pau. — Às vezes, parece que você quer cuidar de mim, como se
fosse um.
Coloco a salada em seu prato.
— Bom, se este fosse o caso, eu faria você não esconder nada de
mim.
— Acha que escondo alguma coisa de você?
Dou de ombros e pego um pedaço de salmão para ela.
— Você parece ser muito boa em guardar segredos — respondo
enquanto coloco molho sobre o salmão.
Audrey então sorri, como se estivesse menos tensa agora.
— Não se preocupe, vou ficar bem, Jeremy. Obrigada por sempre se
importar. Meu Deus, isso tá com uma cara muito boa.
— E eu posso assegurar de que está bom mesmo — digo sem soar
muito arrogante, afinal esse não é meu papel aqui.
Depois que servi-la, coloco água em sua taça. Por mais que ela não vá
beber comigo, não posso deixá-la com sede.
— E onde você aprendeu a cozinhar?
Vou para a outra ponta da mesa, onde me sento e começo a me servir,
mas sem muita pressa.
— Acredite ou não, foi com a Jane. Quando a minha mãe adoeceu e
ficou um tempo acamada em casa, eu gostava de fazer comida para ela. Era
uma distração para a minha mente.
— Eu sinto muito, Jeremy. — Há pesar em sua voz e a sua expressão
se torna triste.
A última coisa que quero é tornar esse momento especial em algo
pesado.
Já sofri muito com as perdas que tive ao longo da vida e hoje lido
melhor com elas. Claro que ainda são perdas significativas e tristes, mas,
preciso ser uma pessoa melhor a cada dia e ficar remoendo o passado nunca
vai me fazer evoluir.
Eu apenas vivo do jeito que acho que tanto a minha mãe quanto Sofia
achavam que devo viver.
— Não, tudo bem. Foi uma época feliz, até. Mamãe ficava muito feliz
com as receitas novas que eu aprendia. Ela era sempre a primeira a
experimentar.
— Bom, então é uma honra provar da sua comida.
— Obrigado. Eu fiz com muito carinho e amor.
— Querendo me impressionar, O’Donnel? — pergunta de mansinho,
tomando a sua água como se fosse uma bebida sexy.
— Ao longo da noite é o que mais tentarei fazer. Impressionar você.
— Mas, por quê? Acha que não tem o suficiente de mim?
“Não, não tenho.”
Sei que a sua pergunta é apenas uma brincadeira, uma forma de entrar
no clima de luxúria que acabamos criando. No entanto, na minha mente,
penso em uma resposta sincera.
Apesar de ser legal comigo e confiar completamente em mim, Audrey
ainda parece um tanto hesitante ao meu respeito, como se eu fosse causar a
ela algum mal, ou talvez ela tenha suas opiniões sobre isso.
Igual a uma feminista socialista que se recusaria a se juntar a um
machista escroto capitalista. Sei que é uma comparação nada a ver, mas
penso que nossos mundos diferentes às vezes nos distancia de algum jeito.
— Acho que tenho muito de você. Mas uma dama precisa ser
conquistada diariamente, de todos os jeitos — respondo, sentindo orgulho
das minhas palavras.
Audrey parece surpresa e então dá uma garfada no salmão. Vejo
quando seus ombros se afrouxam e ela quase se desmancha na cadeira. Ela
também geme e juro que quero ser mastigado desse jeito, desde que esteja
dentro da sua boca, ou da sua boceta.
Porra, só a queria agora gemendo e se contorcendo desse jeito!
— Ok, você acaba de me conquistar pela barriga — admite e me olha
fixamente. — Mas você sabe, Jeremy, não precisa de muito para me
conquistar, você já se mostrou um homem incrível inúmeras vezes.
Calor irradia entre minhas pernas e meu pau faz menção em ficar
duro, mas solto um suspiro.
“Agora, não.”
— Estou ansiosa para descobrir seus outros dotes — ela completa
com um sorrisinho travesso.
Não sei se está duvidando de mim, ou se isso foi espontâneo.
— Ah, Audrey — suspiro. — Não me faça abrir caminho nessa mesa
para você vir engatinhando até mim.
Ela olha para as coisas em cima da mesa.
— É tentador, mas acho que faríamos uma bagunça danada e não
podemos levantar suspeitas, imagino.
Dou de ombros.
— Não estaríamos fazendo nada de errado. Mas concordo com a parte
da bagunça. Jane me pegaria pela orelha e diria para me divertir em outro
canto.
Audrey gargalha, jogando a cabeça para trás.
— Os O’Donnell são tão poderosos, mas quando a questão é
mulheres, deixam mostrar quem manda. O sexo oposto.
Pisco atônito, sabendo que ela tem razão sobre isso. Dou um sorriso
sem jeito e bebo um pouco do meu vinho, afinal ainda nem toquei na
comida.
Confesso que nem estou com fome.
Quando se é o cozinheiro e você prova aqui e ali, tende a ficar cheio,
sem fome e esse é o meu caso.
— Mas não qualquer mulher — enfatizo. — Posso contar nos dedos
de uma única mão quem tem esse poder sobre a gente.
— Parece ser um grupo muito seletivo.
— Vagas estão abertas, pequena. Quer entrar?
Audrey fica me encarando, como se estivesse pensando no assunto.
“Quer entrar?”
Que idiotice!
No entanto, só não podia admitir a ela que já era uma dessas
mulheres.
Sim, Audrey é.
Porra, olha só o que já fiz por ela!
Confesso que não faria essas coisas por qualquer uma, mas quando se
trata dela, nem hesito, apenas ajo como tem que ser feito, como o meu
coração manda.
— Eu não sei se isso foi uma pergunta séria ou apenas uma
brincadeira sua — ela diz por fim. — Mas, de qualquer jeito, acho que já
estou dentro — enfatiza olhando para mesa, ciente de que eu não fazia nada
daquilo por qualquer mulher.
Dou a ela um sorrisinho orgulhoso.
— Minha espertinha.
Conversamos entre uma garfada e outra. Mesmo sem estar tomando
vinho, Audrey parece entrar no calor do momento e curtir ao máximo o
singelo jantar surpresa que preparei para ela.
A minha comida foi elogiada tantas vezes, que apenas senti vontade
de cozinhar mais e mais para ela.
No entanto, vou buscar o sorvete para ela. Três bolas de sorvete de
chocolate em uma taça elegante, com calda de morango por cima, o seu
favorito, segundo ela.
Depois de terminarmos de comer, nos sentamos de frente um para o
outro, nas duas cadeiras próximo à janela que há no salão onde jantamos.
Eu continuo com o meu vinho e ela cruza as pernas, com os braços sobre os
braços das cadeiras, como se fosse uma rainha em um trono.
Seu sorriso é constante e mal sai do rosto, isso significava que ela
estava gostando.
Dou um último gole no vinho, um gole longo e profundo. Deixo a
taça na mesinha de canto e a flagro me olhando.
— Nossa, você está mesmo com sede — ela brinca.
— Eu tinha planos de que secássemos uma garrafa hoje. Mas você
não pode, então irei acompanhar você.
— Por favor, não se incomode. Pode ficar à vontade.
— Faço questão, Audrey. Até porque já tomei umas três taças dessas,
o suficiente para mostrar a você mais uma coisa em que eu sou bom.
— Hummm, então chegamos no ápice da noite.
Maneio a cabeça enquanto pego o celular e o conecto a caixa de som
discreta que fica atrás de um vaso da mesa de canto próximo à porta.
Frank Sinatra, I’ve got you under my skin começa a tocar e me
levanto erguendo a mão para Audrey pegá-la.
— Este ainda não é o ápice, mas com certeza o início de um.
— Vamos dançar? — ela pergunta segurando a minha mão e se
levantando lentamente, olhando em meus olhos.
Subitamente, colo o seu corpo contra o meu, a segurando pela cintura
e ela solta um gritinho de surpresa.
Eu a posiciono na postura que deveremos ficar para dançar.
— Com certeza — asseguro.
— Mas eu não sei dançar, Jeremy.
— Eu vou conduzir você, não se preocupe. Apenas confie em mim.
— Mas eu confio.
Abro um sorriso para ela, então começo a dar os primeiros passos,
que ela tenta acompanhar.
Audrey pisa no meu pé umas duas vezes.
— Meu Deus, sou horrível nisso. Desculpa!
Colo meu rosto ao dela e sussurro no pé do seu ouvido:
— Todo mundo começa por algum canto, um dia. Lembra da sua
primeira vez? — Rodo com ela mais um pouco e sinto seus dedos apertando
meus ombros em resposta. — Você estava nervosa, mas sabia exatamente o
que estava acontecendo e eu tive todo prazer do mundo em mimar apenas
você. Irei fazer a mesma coisa com a dança. — Afasto nossos corpos e
levanto seu braço para fazê-la virar e voltar para mim.
A música ganha um ritmo mais animado, acompanhado de trompete,
saxofone e uma bateria que parece sacudir no mesmo ritmo do meu peito.
Parece que quanto mais a música fica mais dançante, Audrey se
entrega e fica mais confiante.
Agora ela não parece mais ter medo e seu sorriso preenche o som da
música.
Eu a conduzo, faço com que ela se sinta livre e, ao mesmo tempo,
segura em meus braços.
Dançar é sobre isso, confiança e sensação de liberdade.
Audrey não tomou um pingo de álcool hoje, no entanto, se entrega
como estivesse inebriada pela música.
Dançamos mais três músicas de jazz, até que a próxima começa com
o som sensual de Wicked game, do Chris Isaak. Automaticamente, eu a viro
de costas para mim e colo seu contra o meu, dançando calmamente,
agarradinhos.
Audrey entende o que o momento pede e inclina a cabeça para o lado,
me permitindo colar os lábios contra a pele fina do seu pescoço, onde
começo a distribuir beijos e vou descendo até o seu ombro direito, que
convenientemente, por um movimento sutil seu, faz com que a alça fina
deslize para o seu braço que começo a acariciar.
Seu outro braço se envolve no meu pescoço, me atraindo mais para si.
Nesse momento, com o seu bumbum roçando no meu pau, eu já sinto o
sangue do meu corpo todo começar a bombear no meu membro, sendo
impossível evitar a ereção iminente.
Mas Audrey sabe o que está fazendo e não protestarei.
— Você sabe mesmo dançar. É perfeito, Jeremy. Tem algum defeito
seu que eu deveria saber?
Aliso a ponta do meu nariz contra a sua pele e fecho os olhos, me
abstendo de fazer qualquer comentário, pois não queria estragar o
momento.
— Achei que você me achasse um louco por controle e liderança —
digo, afinal de contas, precisava dizer alguma coisa.
Ela dá um sorrisinho e suspira muito relaxada.
— Bem, às vezes, em certas situações, parece ser bem apropriado. —
Ela se vira de frente para mim, mordendo o lábio inferior. — Faz eu me
sentir mais confiante, bonita e sexy, como agora.
Subitamente, me empurra e cambaleio, me sentando na cadeira,
completamente anestesiados pelo seu comportamento. Quando percebo,
Audrey já está tirando os sapatos, e me olhando como se fosse uma
predadora.
Lullaby, do The Cure começa a tocar logo depois e ela dá um
sorrisinho.
— Por acaso você criou uma playlist só com músicas sensuais? —
pergunta de um jeito atrevido.
— Não. Mas acho que o aleatório está a nosso favor.
Ela ri.
Estico o braço e toco seu vestido, o alisando na parte do quadril.
— Vai tirá-lo para mim?
— Não há muita coisa debaixo desse vestido, sabe? Então, que tal
fazermos isso juntos?
Desta vez, é ela quem me dá a mão e não penso duas vezes antes de
pegá-la e me levantar. Aproveito para tirar os sapatos e as meias.
Audrey me guia para fora do salão de jantar.
Não sei quais são os seus planos, mas fico animado em perceber que
ela também pensou em algo.
Antes de subirmos a escada, já estou desabotoando a blusa e Audrey
sobe degrau por degrau, rebolando abunda bonita enquanto faz menção de
subir seu vestido e tirá-lo. No entanto, não faz nada.
Quando ela me olha sobre o ombro, eu já estou tirando a blusa e a
largando sobre o corrimão.
Audrey me lança um olhar lascivo e então puxa pela cabeça o seu
vestido cor cobre, o largando sobre os degraus, caindo como líquido.
Seu corpo se revela esculpido, irresistível e a calcinha branca rendada
quase me leva à loucura. Eu a puxo para mim, na escada mesmo, virando o
seu rosto na minha direção e beijando a sua boca com uma necessidade
urgente ao enfiar a minha língua nela.
— Você me deixa louco, porra! — Solto um grunhido contra a sua
pele, enquanto esfrego a minha barba, o que a faz gemer.
Enfio minha mão dentro da sua calcinha, encontrando a sua bocetinha
melada, já prontinha para mim.
Audrey quase se desfaz quando toco seu clítoris, a fazendo
estremecer.
— Me apresente a sua cama, quero conhecer cada canto dela — pede
com dificuldade na respiração.
— Não quero esperar chegar no quarto — digo, a virando para mim.
Audrey me olha pestanejando, mas entende o recado.
Ela se senta no degrau mais próximo, apoiando os cotovelos em um
degrau mais acima e estica suas pernas, as esparramando pela escada.
— Eu sei que você adoraria fazer isso — ela adivinha.
— Caralho! — praguejo já me ajoelhando diante dela.
Não há mais enrolações, por isso puxo a sua calcinha para o lado e
vou direto na sua boceta como se estivesse perdido no deserto e ali fosse a
única fonte de água existente.
Eu a chupo como se estivesse tomando a sua boca para mim, louco e
desesperado, lambendo o seu clítoris inchado e tão sensível.
Seus gemidos ecoavam na mansão e ela não se intimidava com a
onipotência majestosa do lugar.
Estamos a sós, ela faz bom proveito disso e parece que gosta de como
seus gritos e gemidos invadem os cômodos imaculados.
Eu também gosto, afinal é tão excitante.
Eu amo sentir seu fluido encher a minha língua, me ajudar a deslizar
na sua fenda, lisinha. Seu cheiro também me deixa perturbado da cabeça e
nada mais parece ser tão incrível quanto isso.
Olho para cima e vejo Audrey se contorcendo de prazer. O bico dos
seus seios fartos enrijecidos, seus dentes mordendo o lábio inferior com
força.
— Porra, eu quero muito foder você! — vocifero com o coração
batendo tão forte que eu quase me sinto sufocado.
— E o que você está esperando? — ela pergunta com a voz rouca,
nada doce como de costume.
Levanto e ajudei Audrey a se levantar.
Está gostoso aqui, a chupando, mas é desconfortável.
Quando fico de pé, a beijo de novo, melando a sua boca com seus
fluidos que saíram do seu corpo. Passo bem a minha língua em seus lábios,
para que ela sinta bem o seu sabor.
Seguro seu rosto com um pouco de força, sentindo o suor escorrer
pelo meu corpo.
— Quando eu chupo você, durmo pensando no seu gosto, sabia? Na
sensação de estar com a língua na sua bocetinha. Porra, eu sou tão viciado
nela!
Desta vez, a conduzo até o final da escada, e então, ao corrimão do
mezanino. Eu a viro de costas para mim e coloquei suas mãos sobre o ferro,
onde seus dedos seguram firme.
Trato de tirar a minha calça e é um alívio quando meu pau fica livre,
no entanto, ainda parece ser uma tortura. Ele está tão duro quanto o ferro e
necessito sentir Audrey.
Não estou brincando com isso.
Sigo até a sua calcinha e ela geme quando sente o pano delicado ser
rasgado como se fosse um mero papel.
— Empine essa bunda gostosa pra mim, pequena.
Audrey inclina o corpo mais para baixo, amassando os seios contra o
corrimão e estica as pernas, arrebitando seu bumbum em formato de
coração na minha direção.
Seguro seu cabelo, enrolando na minha mão em um punhado e
virando o seu rosto um pouco na minha direção, enquanto passo a língua na
linha da sua mandíbula e começo a entrar com meu pau grosso e latejante
na sua grutinha.
— Aaah! Meu Deus, Jeremy… Você é tão grosso, porra! — diz
gemendo sem fôlego.
— Diga isso de novo, pequena. Amo quando você fala coisas
obscenas nessas horas — admito.
Entro nela, sentindo o seu interior quentinho e macio.
“Tão apertado, porra!”
Gememos juntos e nossos corpos parecem entrar em um tipo de
transe.
— Soca a porra desse pau bem fundo, Jeremy — diz atendendo ao
meu pedido, fazendo o meu coração bater muito forte. — Rápido o
suficiente, como se fosse tirar a minha alma.
Deixo escapar um sorrisinho de satisfação e orgulho.
— Então segure firme, meu bem. — Deposito um beijo nela antes de
pegar pesado.
Eu me ajusto, a segurando pela cintura e então começo a penetrá-la
com mais força, indo fundo.
Porra, sinto meu saco bater no seu grelinho de tão rápido que a fodo,
tocando o seu fundo, a abrindo só para mim.
— Oh, Meu Deus! Oh, Meu Deus!
Puxo seu cabelo.
— Implore só por mim, Audrey — rosno.
— JEREMY! — ela grita.
Passo saliva no meu polegar e o deslizo delicadamente no seu cuzinho
quando desacelero só um pouco. Audrey não se esquiva, mas me olha um
pouco assustada por cima do ombro. Eu também não tiro o meu dedo,
principalmente quando percebo que ela não diz nada a respeito.
De repente, seu olhar assustado foi se tornando algo mais lívido.
“Permissão.”
Cuidadosamente, vou inserindo o meu polegar em seu buraquinho
virgem e ela lambe os lábios.
Porra, ela está tão excitada!
Fecha até mesmo os olhos enquanto se delicia e se entrega a nova
sensação.
— Porra! — Solto o gemido com a boca aberta, sentindo que isso me
dá um puta de prazer também. — Juro por Deus, Audrey, ainda vou foder
esse cuzinho.
— Apenas se ocupe em me fazer gozar.
— Acha que não estou fazendo isso? — Sorrio.
Mantenho meu polegar, mas volto a fodê-la com força.
— AH, PORRA! — ela grita.
Sinto quando seu interior começa a pulsar e se apertar cada vez mais e
mais.
Eu sei que Audrey irá gozar.
No entanto, luzes de faróis atravessam as janelas e o som de pneus
sobre cascalho nos mantêm em alerta.
Paro no mesmo instante.
— O quê?! — exclamo.
— Caramba, Jeremy!
“Porra! Porra!”
Eles chegaram mais cedo e estamos no mezanino trepando pra valer.
— Isso não vai nos atrapalhar — digo com firmeza.
— Mas o q…
Antes que Audrey termine de falar, eu já estou indo com ela para o
corredor adjacente que dá ao meu quarto.
“Merda!”
É difícil de explicar, mas estou disposto a assumir esse B.O. Há
nossas roupas espalhadas pela escada e o meu pai e meu filho prestes a
entrar pela porta da frente.
Isso parece ser muito ruim, mas sei que eles ainda vem pela estrada.
— Vamos lá, Audrey. Isso vai ser divertido.
Eu a sento sobre a mesa de canto, grande o suficiente para caber a sua
bunda gostosa. Arqueio seu quadril mais para mim, mas apoio seu corpo
contra o meu, enquanto ela mantém as pernas bem abertas para mim.
Audrey não questiona nada e muito menos me para. Estamos tão
extasiados de prazer que nada irá nos parar.
Ela sabe que temos pouco tempo, mas, ao ver pela sua cara, a situação
toda parece ser excitante pra caralho, igual quando a masturbei no campo de
golfe.
Eu a penetro e ela geme alto.
“De propósito”.
Eu também não consigo resistir e solto um gemido gutural. Eu a fodo
com força, fazendo a mesa ranger e os vasos com flores balançarem de um
jeito perigoso.
Cada um vale uns dois meus euros.
— Goza pra mim, meu bem. — Eu me inclino em sua direção e
abocanho um seio, onde começo a lamber seu mamilo duro. — Encharca a
porra do meu pau todinho.
— AAAAH, JEREMY! — ela grita, junto com o som do carro cada vez
mais próximo da mansão.
De repente, Audrey começa a se contorcer toda, a sua pele fica
vermelha e seus músculos ficam tensos.
— Isso. Isso. Isso!
Audrey grita ao chegar em seu ápice, choramingando e me olhando
de um jeito mortal. Meu interior se aquece, ao mesmo tempo que sinto tudo
dentro de mim, se esvaziar após uma explosão de sensação jorrar de dentro
para fora, a inundando, quente e fluidamente.
Mesmo respirando com dificuldade, eu a coloco no chão. Estou meio
tonto, mas fico em alerta quando ouço o som de portas do carro se
fechando.
— Vá para o quarto. — É tudo o que digo antes de sair correndo em
direção a escada.
Nunca fui tão ágil em toda a minha vida.
Saio pegando todo tipo de roupa que deixamos pelo caminho. Mas
não dará para esconder que estou com visitas.
Quando subo de volta, ouço a porta da frente sendo aberta. Antes de
eu sumir no corredor, olho para o lado e vejo Jane parada na porta, me
olhando estranho. Mas antes que eu suma, ela faz uma cara de surpresa e o
sinal de joinha com a mão.
Sei que ela está se referindo a minha nudez.
Entro no quarto feito um furacão e Audrey já está debaixo das
cobertas, rindo como nunca. Fecho a porta atrás de mim, a trancando e
coloco as coisas sobre uma cadeira.
— E aí? — ela pergunta tensa, mas rindo.
— Acho que a Jane viu a minha bunda — comento e ela gargalha.
Passei a mão no cabelo. — Porra! Tenho que cuidar do resto.
— Sabe, eu ainda tenho as minhas coisas lá embaixo. E se Julian
encontrar o meu celular?
Olho para ela um pouco estático e bufo.
— Porra, vou ter que voltar.
— Mas vista algo desta vez.
Lanço a ela um sorriso.
— Você se diverte com isso, não é? — Eu me aproximo e beijo a sua
boca sutilmente. Meu coração bate forte quando sente o contato, é uma
batida que faz doer tudo dentro de mim. — Você será minha a noite toda —
enfatizo olhando em seus olhos.
Mas falo sério.
Estou encantado por Audrey e isso não posso mais negar.
— Mal vejo a hora.

Quando desço para pegar as nossas coisas, acho que todos já


entenderam o recado, ou ao menos Jane fez com que papai e Julian
cooperassem.
Papai foi direto para o seu quarto, e isso era inevitável, mas Julian,
acho que ela o driblou de algum jeito, impedindo que ele ficasse acordado
ali embaixo.
Terei de lembrar de agradecer a ela no dia seguinte.
Volto para o andar inferior só para pegar nossas coisas e então volto
correndo.
Parece um crime deixar Audrey em meu quarto esperando, sozinha.
Mas como eu disse, à noite será toda nossa.
No banheiro, trepamos debaixo do chuveiro, e, em algum momento
na madrugada, debaixo das cobertas, fizemos algo parecido com fazer amor.
Sutil e apaixonante, até porque não podíamos fazer muito barulho
igual mais cedo.
Depois disso, ela dormiu em meus braços e sabia que eu tinha tudo
ali. Era como se finalmente alguma peça tivesse se encaixado no meu
mundo.
Sua respiração era algo que fazia tudo ao meu redor ter mais sentido.
O cheiro do seu cabelo, da sua pele…
Porra, amo estar com ela, e de repente me dou conta de que isso é
tudo o que preciso.
No entanto, no silêncio da noite, sabendo que meu coração parece
bater apenas por ela, sinto um sentimento de culpa que me toma por
completo.
Abraço Audrey mais forte, com medo de perdê-la, sabendo que
apesar de me fazer tão bem, ela desperta meus pesadelos há muito tempo
adormecidos.
A última semana de férias de Jeremy foi uma loucura. Aproveitamos
ao máximo, tanto Jeremy e eu sozinhos quanto com Julian e Theo.
Todos os dias era algo diferente, vivendo como se cada dia fosse o
último. Só que isso no final da noite era doloroso, pelo menos para mim.
Não pensei que fosse gostar tanto deles, dessa convivência, em me
ver tão ansiosa para chegar na mansão e ouvir o latido de Theo, ganhar um
abraço de Julian ou então ser beijada por Jeremy. Parece que antes disso,
nada fazia sentido, e agora, é como se finalmente tivesse me encontrado.
Mas não é fácil, para variar.
Mantenho um segredo que pode arruinar com tudo isso em questão de
segundos.
Como poderei saber se todos da família lidarão com isso de um jeito
bom?
Lembro muito bem quando Meredith me contou que Noah pensou
que ela estivesse dando um golpe da barriga e nada impediria Jeremy de
pensar a mesma coisa de mim, ou até mesmo seus irmãos.
Julian me odiaria por isso?
Por Deus!
O quão estranho seria se eu chegasse em uma bela manhã e dissesse
“Olá, gente, bom dia. Julian, você vai ganhar um irmão, parabéns. Jeremy,
você vai ser pai”.
Como seria vista após isso?
O meu convívio com eles durou quase três meses e não sei se teria
coragem e ousadia em chegar desse jeito, revelando tal bomba.
Não é como se Jeremy e eu não fôssemos responsáveis por isso,
porque demos brecha para que acontecesse. No entanto, ele parecia bastante
confiante de que tal coisa não aconteceria e confiou na genética familiar
que dificulta a fertilidade entre os irmãos.
Mas agora estou aqui, com sete semanas de gestação.
Comprei um teste mais moderno que dizia as semanas, mas ainda não
tive forças para ir a uma obstetra.
Já aceitei essa gestação, mas em quanto Jeremy estiver na Irlanda,
meu consciente bloqueia esse fato. Deve ser pelo receio de que a verdade
venha à tona. No entanto, às vezes me sinto muito mal, sabendo que omitir
os fatos será só mais catastrófico.
A noite antes de Jeremy partir para Londres com Julian e Theo, Jane
prepara um jantar especial para todos nós. Até mesmo o senhor Rupert está
conosco à mesa e o clima é de pura alegria.
Sentada à mesa, lembro da minha mãe e em como queria que ela
estivesse presente. Eu já a perdoei sobre a nossa discussão na mesma manhã
em que descobri a minha gravidez, mas estamos mais otimistas agora que
nos livramos das dívidas.
Acho também que ela finalmente tem começado a aceitar que vai ser
avó.
Por mais que não conte nada a Jeremy, pelo menos teremos a nossa
pequena família.
Eu, mamãe e o bebê.
— Audrey?
Ouço a voz de Julian me tirar do transe.
Ele riu quando me dou conta e diz:
— Você está no mundo da Lua? Me passa o espaguete, por favor.
— Ah, claro. Desculpa. — Pego a tigela com a massa ao molho de
tomate e entrego a ele.
— Deve ser o molho apimentado — Jeremy brinca. — Toda vez que
coloco na boca dou uma reiniciada também.
Começamos a rir disso porque o molho do espaguete está mesmo
apimentado, mas não parece incomodar Julian ou Jane.
Jeremy e eu ainda damos risada sempre que lembramos da noite em
que estávamos transando no mezanino e eles chegaram do jantar da família
Hauston. Jeremy foi atrás das nossas roupas antes que vissem a bagunça
que deixamos e das coisas sórdidas que estavam acontecendo ali. No
entanto, a governanta acabou vendo a bunda nua dele.
Ela não comentou nada sobre o ocorrido, além de que o jantar que ele
havia preparado naquela noite estava espetacular, porque ela havia provado.
E bem, era verdade.
Sentirei falta também de Jeremy cozinhando para mim.
— Está preocupada, Audrey?
Ouço o senhor Rupert perguntar da ponta da mesa e olhamos para ele.
— Desculpa, senhor Rupert. Eu não entendi o que o senhor quis dizer.
Ele dá de ombros como se fosse algo óbvio.
— Jeremy e Julian vão embora amanhã e o cachorro vai com eles.
Você não vai junto, não é?
— Não, e-eu acho que não — digo sem jeito e olho para Jeremy que
também parece confuso. — Mas, por quê?
— Como fica o seu trabalho? — pergunta para mim, mas logo trata
de questionar Jeremy também: — Você pensou em algo que possa ampará-
la?
— Hum, não. Mas posso ver isso ainda hoje.
— Por favor, não se incomode. É muito fácil conseguir um emprego
aqui em Dublin, principalmente com a experiência que tenho.
— Voltar a trabalhar como garçonete está fora de cogitação — ele
rebate rapidamente, como se fosse uma ordem.
— E acho que a senhora Bergman garantiu que mais nenhuma outra
família contratasse você como diarista — Jane enfatiza e isso chama a
minha atenção.
— O quê? Como assim?
— Ela espalhou para todo mundo a história com os biscoitos —
Jeremy explica e sinto meu rosto esquentar de vergonha. — Na verdade, o
caso foi até a polícia, mas Jane cuidou disso com a ajuda do papai bem
antes de eu chegar em Malahide.
Fico olhando atônita para eles, como se tivessem escondido um
segredo de mim a vida toda.
Viu?
A sensação disso não é nada boa.
É por isso que estou inclinada a contar sobre a gravidez para Jeremy,
por mais que as consequências disso possam ser previsíveis.
— Agora todo mundo sabe sobre isso? — Sinto a comida embrulhar o
meu estômago. — Pensam que eu sou uma… Ladra?
Jeremy me olha com desvelo e sua voz me acalma um pouco.
— São só biscoitos, Audrey. Além do mais, de acordo com o que eu
ouvi, foi merecido o que você fez com ela. Não que isso seja certo, mas sei
que você não fez por ser uma má pessoa, mas porque foi humilhada. Esse
tipo de coisa é perdoável.
Balanço a cabeça e escondo o rosto atrás das mãos.
— Meu Deus, que vergonha. Não acredito que estamos conversando
sobre isso.
Para a minha surpresa, ouço o senhor Rupert gargalhar. Ele parece tão
bem nessa noite, tão vivido.
Acho até que melhorou um pouco mais nos últimos dias.
— Fica tranquila, Audrey. Os Bergman são um bando de mesquinhos.
Veja só, aqui está você jantando conosco. Acho que esse é o tipo de coisa
que mais da metade das famílias nobres da Irlanda não fariam — o senhor
Rupert completa.
— Isso é verdade — admito mostrando a minha cara de novo, ficando
mais relaxada ao perceber que não serei julgada por aquilo. — Bem,
obrigada por terem limpado a minha barra quanto ao ocorrido na mansão
dos Bergman.
— Nós que agradecemos, Audrey — o patriarca da família continua a
falar. — Eu pude notar que a sua presença nesse verão foi essencial e fez
muita diferença para o meu filho e neto, então, sinta-se em casa, conte com
a gente sempre.
— Mesmo que não estejamos aqui o tempo todo, as portas da mansão
estarão abertas para você — Jeremy complementa com aquele brilho no
olhar que parece querer dizer muito mais.
Sinto meu peito inflar e meus olhos arderem. Eu quero chorar, mas
preciso me segurar.
Não tive uma vida miserável, mas ao longo dos anos ela foi solitária e
tive pouco afeto como estou tendo agora. A minha mãe trabalhava tanto que
nunca tinha tempo para mim, quando pequena.
Tive todas as chances de crescer sendo uma mulher fria e sem
sentimentos, mas aqui estou eu, sentindo uma coisa maravilhosa a respeito
de dar e receber.
— Isso parece mesmo um adeus — comento.
Jeremy me olha, piscando os olhos, como se isso o tivesse pegado de
jeito também.
— Vai sentir a nossa falta, Audrey? — Julian pergunta em tom de
humor para não demonstrar muito sentimento, mas sei que a sua pergunta é
séria.
— Mas é claro. Quem mais vai me levar pra jogar golfe? E a sexta à
noite dos jogos? Vai ser estranho passar um dia inteiro sem ouvir os latidos
do Theo.
— Bem, eu estarei aqui e Rupert também — Jane frisa.
— Além do mais, Londres não fica tão longe. Qualquer coisa mando
o nosso jatinho vir buscá-la e passar um final de semana conosco — Jeremy
sugere e sorrio.
— Obrigada, gente — digo olhando para todos e então fixo meu olhar
com o de Jeremy. — Foi um verão incrível.
Discretamente, ele acena com a cabeça.
Mas sei o que queria dizer.
Todos aqueles dias, desde o dia em que nos beijamos após a nossa
queda, sujos de terra e grama, até agora, quase todas as noites foram
resumidas em nossos corpos entrelaçados, foi mágico.
Eu não sei dizer se todos já suspeitam de nós dois, no entanto, é
necessário afirmar que Jeremy e eu estivemos mais próximos do que nunca.
Meu coração bate até de um jeito mais louco quando ele está por perto, e às
vezes preciso disfarçar o modo como o olho, admirada.
O pior de tudo é perceber nos últimos minutos que me apaixonei por
ele. Quando fecho os olhos, costumo a visualizar nós dois juntos, com o
nosso bebê.
A família que nunca tive, faria o meu bebê ter e isso é o maior motivo
para contar a ele sobre a gravidez.
Depois do jantar, nos reunimos na sala da TV para uma última noite
dos jogos. Até mesmo Jane e o senhor Rupert se engraçam para jogar um
jogo de corrida que Julian colocou para eles.
Julian filma tudo para mostrar para os tios em Londres.
— Licença, vou pegar mais aperitivos — digo conforme saio com as
vasilhas já vazias.
— Vou ajudar você — Jeremy diz logo atrás de mim.
Saio sorrindo em passos apressados até a cozinha, sabendo que as
intenções de Jeremy não são de fato me ajudar, embora ele realmente seja
cavalheiro a este ponto.
Chegando na cozinha, mal tendo tempo de largar as vasilhas sobre o
balcão, sou abraçada por trás de um jeito já familiar, que eu gosto tanto.
Não me esquivo, faço questão de estar em seus braços.
Sinto a respiração de Jeremy contra a minha orelha e o seu hálito
quente conforme ele murmura:
— Só para deixar claro, nada disso é um adeus. Eu mudo você para a
porra daquela cidade desde que estejamos perto um do outro.
— Eu não duvido disso, mas você sabe pelo menos se quero me
mudar? Aliás, não vou a lugar nenhum sem a minha mãe.
— Pode levar a sua mãe, cachorro ou papagaio. Não tenho coragem
de deixá-la aqui sozinha.
Me viro para ele e molduro seu rosto com as minhas mãos, sentindo a
sua pele aquecida e as maçãs do seu rosto bem definidas. Ele aparou a barba
recentemente e está gostosinha de sentir.
— Não confia em mim? — pergunto olhando no fundo dos seus olhos
que tem a tonalidade de verde oliva.
— É claro que confio. Mas a ideia de você sozinha, precisando de
carinho, de beijos, sabendo que sou o único capaz de dar o que você
merece, me deixa louco!
— Irei esperar por você — sussurro. — E se eu não conseguir, terei
que voltar aos tempos antigos. — Ergo a mão e balanço os dedos
suavemente. — Toda vez que eu lembrava daquele estranho que me seguiu
até em casa naquela noite, eu me divertia… Sozinha.
Jeremy solta um grunhido e inclina a cabeça, como se tivesse sido
provocado.
— Eu também costumava me tocar lembrando de você — ele
confessa. — Era a melhor punheta que eu batia na minha vida. Fiz muitas
vezes.
Deixo que minhas falanges toquem seus lábios quentes com
suavidade. Jeremy fecha os olhos, hesitante em morder meus dedos.
— Você é o homem mais incrível que apareceu na minha vida, sabia?
E olha que foram poucos, mas você sempre será inesquecível, Jeremy
O’Donnell.
Ele me olha com as suas pupilas dilatadas e a respiração ofegante.
— Eu juro que quando voltar para Dublin, farei de você a minha
mulher — afirma.
Meu coração dá uma pirueta, mas sorrio nervosa.
— Estou falando sério, Audrey — diz com mais afinco. — Talvez
não demore nem um mês.
— Então você quer mesmo ficar comigo? — pergunto sentindo meus
olhos se encherem e o corpo amolecer diante das suas palavras.
— Quero muito mais do que só ficar com você.
Antes de qualquer outra palavra ser proferida, Jeremy une seus lábios
aos meus, como se fosse a promessa de suas palavras, a firmeza de que seu
desejo é real.
Meu peito se enche, envolvo os braços nele e mordo seu lábio, o
puxando para mim, o querendo, o desejando.
A sua mão na minha cintura marca a posse que tem em mim,
enquanto a outra mão que vai até a minha nuca, demonstra a sua paixão e o
beijo, o desejo absoluto.
Sinto meu clitóris ficar inchado no mesmo instante e começo a sentir
a necessidade de tê-lo aqui e agora.
Seus dedos se apertam em mim e cola meu corpo mais ao dele, como
se quisesse nos tornar uma unidade.
Conheço Jeremy ao ponto de saber que ele me deitaria sobre o balcão
da ilha e faria coisas sórdidas comigo, ou então, em como ele apenas me
deixaria de quatro e me foderia por trás.
O pensamento fértil me deixa mais aquecida ainda.
No entanto, ouço passos e me afasto no mesmo instante, ficando de
costas para a porta, sabendo que meu rosto deve estar todo arranhado e
vermelho devido a barba de Jeremy.
— O refrigerante acabou também — Julian entra já informando.
Jeremy pigarreia e vou atrás dos salgadinhos na dispensa.
— Não é bom se entupir de refrigerante nessa hora, não acha? —
Jeremy perguntou ao filho enquanto toma tempo para que eu possa me
recompor.
Além do mais, Jeremy enrola, sentado com as pernas debaixo da
bancada para esconder a ereção.
— Ainda é cedo. Além do mais, tenho catorze anos. Adolescentes da
minha idade amam refrigerante e comer besteiras — Julian protesta
enquanto vai até à geladeira e pega uma Coca Cola.
— É a desculpa mais esfarrapada que já ouvi na minha vida. Você não
quer ser obsedo mórbido e ter acompanhamento de nutricionista regrado
antes mesmo dos sessenta, certo?
— Posso compensar com as atividades físicas que eu faço.
Jeremy dá uma risadinha, sabendo que não poderá competir com a
teimosia de um garoto de catorze anos.
— É o meu filho, mas poderia ser facilmente do Ian também.
Vejo Julian fazer uma careta quando sai da dispensa com um monte
de pacote de salgadinhos nos braços. Julian me olha e franze o cenho.
— O senhor não disse que ia ajudá-la?
Jeremy rapidamente se levanta e vem na minha direção. Trocamos um
olhar suspeito, mas Julian não chegou a ver.
Ele é um menino muito esperto e se já percebeu algo, resolveu não
mencionar nada. Talvez assim como os demais, só esteja esperando uma
confirmação oficial de nós dois.
— São muitos salgadinhos — Jeremy comenta, fazendo Julian dar
uma risadinha enquanto sai.
— Viu, a sua namorada come besteiras tanto quanto eu.
Jeremy e eu ficamos petrificados, olhando para ele como se
tivéssemos visto um fantasma.
Ouvimos a risada de Julian vindo do corredor, como se ele soubesse o
que tinha feito e gostado.
— E-ele… — Tento dizer algo, mas não consigo.
— Prometo que irei conversar com ele ainda hoje.
— E o que vai dizer? — pergunto engolindo em seco.
— Que eu ainda não cheguei nessa parte — diz dando um sorrisinho
de lado e pegando alguns pacotes de salgadinhos.
Ele sai então da cozinha com a mesma postura que o filho saiu poucos
segundos atrás.
Continuo parada ali, sem saber o que fazer. Mas porque Jeremy
deixou claro que tinha planos para nós dois e isso me deixou bastante
otimista.
Significa que ele vai amar a notícia da gravidez e que ficaremos
juntos, completamente inseparáveis.

Acordo na cama de Jeremy.


Passamos a noite juntos, para variar. Ele não conversou com Julian,
pois parecia ser muito em cima da hora para ter esse tipo de conversa, mas
prometeu que não deixaria escapar quando estivessem em Londres.
Achei melhor assim, afinal não sabia qual seria a reação de Julian se
descobrisse que seu pai e eu estamos ficando.
Eu não queria que ele me olhasse estranho na manhã antes de partir.
Estou tão ansiosa e deprimida que não consigo pregar os olhos. No
entanto, deixei Jeremy exausto após três transas intensas que tivemos
durante a noite.
Em algum momento, ele pegou a sua gravata e tapou a minha boca
com ela como se fosse uma mordaça, tudo para que não gritasse.
Evitamos a cama ao máximo, para variar, pois, não queríamos
nenhum objeto entregando nossos atos sórdidos.
A verdade é que ninguém me viu indo embora.
Jeremy e eu permanecemos ali embaixo até que todos tivessem dito
boa noite e subido. Era dessa forma que eu conseguia ir para o seu quarto
sem ser notada.
Mas a forma misteriosa como surgia na mansão pela manhã começou
a ser algo suspeito.
O lado bom disso tudo é que essas entradas furtivas irão acabar em
breve.
Daqui umas…
Três horas.
Vejo o amanhecer, nuvens rosas e laranja iluminando o campo lindo
da mansão.
Visto apenas uma blusa de Jeremy que fica parecendo um vestido em
mim. O cabelo está bagunçado e cheiro a sexo.
Lembranças da noite passada vem à tona e é inevitável segurar o riso
bobo.
Olho para ele dormindo tranquilamente na cama, os braços largados
sobre os travesseiros, musculosos e bem desenhados. As suas costas são
definidas também e está arranhada.
É possível ver as linhas paralelas e vermelhas se sobressaindo a sua
pele branca.
Eu aprendi a gostar muito de vê-lo dormir. Jeremy parece um sonho,
o tipo de homem que a gente só encontra em filmes ou livros.
Mas agora eu o tenho e tenho também um bebê dele sendo gerado
dentro de mim, o que parece a coisa mais louca e incrível do mundo todo.
A minha vontade é de montar nele e acordá-lo com um sexo oral
caprichado, mas me esquivo da ideia. Preciso de um banho, pois a última
coisa que eu quero é exalar cheiro de sexo, embora tenha a certeza de que
quando Jeremy acordar, a primeira coisa que vamos fazer é transar.
Vou para o closet dele que dá acesso ao banheiro. Olho para o
ambiente clássico e para as roupas penduradas por divisórias. Me aproximo
das blusas sociais, suas favoritas e passo o dedo nelas suavemente. Talvez
eu pegue uma para me fazer companhia nas noites solitárias.
O pano tem o seu cheiro.
Vejo a gaveta das gravatas, talvez eu pegue uma também para me
vendar enquanto me toco pensando nele me penetrando.
Ao longo desses dias, percebi que ele ama a cor azul-escuro que cai
tão bem nele.
Bem, ele não vai sentir falta se eu pegar uma pra mim também, não é?
Mordo o lábio com a ideia maluca.
Caramba, eu sou mesmo uma ladra!
Mas, desta vez é por uma boa razão e tenho certeza de que Jeremy vai
aprovar eu pegar emprestado as suas coisas.
Vou contar isso a ele, certamente irá deixá-lo excitado.
Quando seguro a gravata enroladinha e a puxo, o separador da gaveta
afunda. Meu coração quase despenca também.
Meu Deus! Será que quebrei?!
Tento colocar o separador no lugar e percebo que não está quebrado,
mas deslocado.
Um fundo falso.
Por que ele teria um fundo falso aqui?
Puxo o separador, o tirando da gaveta.
Estou tão imersa nisso que nem me importo com o fato de estar
xeretando nas coisas alheias.
E se aqui tiver algo que não é do meu interesse?
Bom, tarde demais, porque encontro uma caixa de tamanho médio,
branca e simples.
Meu coração bate forte porque sei do risco, quer dizer, se está aqui é
porque ninguém deve ver.
Olho para o lado, ainda está tudo silêncio. Jeremy está dormindo
ainda e ele nunca vai descobrir que estive vasculhando no meio das suas
coisas.
Meu Deus, sou uma péssima pessoa para se ter um relacionamento!
Escondo as coisas e ainda estou sendo inconveniente!
Jeremy não me merece mesmo.
Mas, olha só que coisa, já estou com a caixa nas mãos, a colocando
sobre sua mesa de relógios que fica bem no centro do closet.
Bom, pelo menos não tenho interesse algum em pegar um desses
Rolex.
Seguro a tampa, mas não a levanto no mesmo instante.
Sei que a curiosidade matou o gato e tenho medo de ser o gato. Mas,
se eu não abrir vou viver pensando nisso e em como eu fui tonta.
E se tiver algo aqui que seja do meu interesse?
Levanto a tampa e descubro que é do meu interesse.
Prendo o fôlego e, por um momento, a minha mente se esvazia como
se tudo dentro de mim, tivesse se tornado um nada, ou simplesmente
congelado.
É tão bizarro que fico sem reação.
Seguro a foto com cautela, como se ela fosse desmanchar em minhas
mãos. Estranhamente, a caixa exala um cheiro forte, algo como fuligem. Eu
espirro, mas ignoro a coceira que aquilo causa em mim, porque há mofo
também, o que revela um fato interessante, são fotos antigas.
Porque não é só uma, são várias.
E o detalhe mais bizarro ainda vou dizer agora, é como se fosse a
minha cópia. Uma outra eu, só que de longas mechas loiras.
Isso me deixa bastante confusa, no entanto, é como se finalmente as
nuvens espessas estivessem se limpando na minha mente, fazendo tudo ter
mais sentido agora.
Solto um espirro e outro.
Pego tudo que está na caixa com as mãos, jogo no chão, espalho e me
coloco de joelho sobre os registros.
A mesma mulher que se parece comigo, foi capturada em vários
momentos, vestida de noiva, na praia, grávida e muito feliz com um homem
jovem como ela.
E não é difícil de reconhecer Jeremy.
É ele.
Nesse instante, não é nenhum mistério que aquela mulher seja a sua
falecida esposa.
Por uma razão óbvia, isso me destrói por dentro, como se todo o meu
interior estivesse se quebrando em pedacinhos. De repente, aquela conversa
de Ian e Noah que eu ouvi sem querer na praia finalmente fez tanto sentido.
Eu deveria ter suspeitado de tudo ali, mas ignorei porque achei que
estivessem falando do meu jeito ser igual ao dela, mas agora eu sei que
somos idênticas.
Exceto pela cor do cabelo e dos olhos.
Eu juro que isso é a porra da coisa mais estranha que eu já vi na vida!
É como olhar para o seu reflexo!
Mesmo depois de catorze anos morta, Jeremy mantém as coisas dela
aqui e bem escondido. Não só as fotos, mas como também o convite de
casamento, as cartas que ela mandava para ele, os CD´s de músicas que os
representavam. Há até um anel de ouro e pelo tamanho, acho que era dele.
Jeremy ainda tem tudo.
Percebo que já choro quando dou uma fungada. A alergia passou,
certamente sendo tomada pela sensação de mágoa profunda, colocando para
baixo todos os planos que fiz enquanto não conseguia dormir.
Por essa eu não esperava, não mesmo!
Me ver como uma tapa buraco, alguém que possa suprir a perda de
alguém amado na família.
— Audrey?
Ouço uma voz grave e sonolenta chamar por mim, mas não olho de
imediato.
Segundos se passam e só quando Jeremy se dá conta do que está
acontecendo, ele repete:
— A-Audrey? Co-como achou isso?
Seguro uma foto em que o rosto dos dois estão colados. Se eu
mostrasse a um estranho, ele diria facilmente que era eu e que loiro caía
bem comigo.
Respiro fundo antes de dizer baixinho:
— Sabe o que é mais louco nisso tudo? É que todos vocês sabiam da
semelhança, mas ninguém teve a coragem de me falar. Como se a verdade
fosse me fazer correr. Quando, na verdade, era o suficiente para que eu
ficasse aqui e tapasse o buraco que ela deixou, não é?
Ele solta um suspiro alto também.
— Pelo amor de Deus, Audrey, isso tudo foi uma coincidência muito
doida!
— Coincidência ou não, a semelhança facilitou tudo, não é? — Olho
para ele ali de baixo. — Toda essa gentileza comigo, em dizer que a casa
está de portas abertas para mim, que posso contar com vocês... Isso tudo é
porque eu pareço com ela! — Aponto com força na direção das fotos. —
Vocês não veem a Audrey, vocês veem a Sofia! A falecida esposa! A antiga
cunhada! E a antiga nora!
— Você está se precipitando em suas palavras. Você e Sofia não têm
nada a ver uma com a outra!
Fico olhando para ele e então me levanto, ficando cara a cara. Por
mais que tenha acabado de acordar e por causa dos meus espirros, eu
imagino, Jeremy já estava bastante alerta.
— É claro que não somos a mesma pessoa, temos a nossa diferença.
Mas sabe o que temos em comum além da aparência? Sentimentos por você
— confesso com um nó no estômago. — Eu me apaixonei por você,
Jeremy, mas não sei se que quem você vê é a Sofia ou a Audrey. Meu Deus,
isso é tão bizarro!
— O que faz você achar que não sinto nada por você, Audrey?
Olho para ele sentindo a minha pele formigar e minha memória
funciona como uma máquina, o que não é bom, porque ter lembrado dá a
resposta que ele precisa.
— Quando nos conhecemos, naquela noite, eu ouvi você dizer o
nome dela. Eu não entendi na hora, mas depois fez todo sentido. Você diz
que ficou pensando em mim por meses, mas era porque você não conseguia
acreditar que havia uma pessoa tão parecida com ela. Você ficou obcecado
por mim depois disso, não foi?
Jeremy balança a cabeça, confuso e passa a mão no rosto.
— Audrey… É claro que a semelhança me assustou pra caramba. Por
um momento pensei que estivesse vendo um fantasma, mas, por mais que
vocês sejam iguais, tem suas diferenças.
— Mas você admite que somos iguais e que isso traz algum tipo de
nostalgia para você? — pergunto, porque essa é a verdade nua e crua que
Jeremy estava tentando me esconder.
Não há escapatória, toda essa situação é estranha, sentir que você está
ocupando o lugar de uma outra pessoa e que todos olham para você
pensando nela.
Meu Deus, será que Julian olha para mim e vê a mãe?
Ele a perdeu assim que nasceu, não chegou a conhecê-la, mas essas
fotos…
Elas dizem muito sobre ele ter a conhecido de algum jeito.
O silêncio de Jeremy quase me mata, mas forma um buraco em meu
peito de qualquer forma. Tão profundo que quase afundo nele mesmo.
— Toda às vezes que você transou comigo…
— Audrey…
— ERA NELA QUE VOCÊ PENSAVA?! — grito.
Ele balança a cabeça, mas não me responde, talvez nem ele saiba a
resposta.
Cheguei a achar até que ele negaria, mas percebo rapidamente, que
além de dor, Jeremy carrega culpa e vergonha em seu semblante.
“Isso é um sim.”
Choro.
— Oh, Meu Deus! Meu Deus! — Arfo com a mão no peito para
tentar acalentar a dor que sinto.
De repente, Jeremy começa a agir. Ele tenta se aproximar, mas recuo,
o que o deixa louco.
— É complicado, tá legal? Se é estranho para você, é mais estranho
ainda pra mim. Porque ela já está morta! Há catorze anos eu vivi com esse
fato me corroendo por dentro e você me aparece, Audrey. É claro que isso
mexeria comigo!
— Que droga!
— Mas eu sempre soube que você não era ela. Mas a semelhança
física… Passado e presente se misturavam de um jeito que me deixava
tonto.
— Porque você percebia que gostava dela ainda e não de mim.
— Não é bem assim, está tentando colocar palavras na minha boca,
Audrey.
Olho para ele duramente.
— Você ainda a ama?
Jeremy relaxo os braços.
— Sofia está morta, Audrey. Eu a perdi para a morte, ela se foi e
levou o meu coração junto com ela. Passei catorze anos vivendo uma vida
solitária e então você apareceu… Eu juro que tentei me esquivar, mas você
se mostrou uma pessoa incrível e não consegui mais me ver longe.
— Eu nem sei se consigo acreditar em você. — Balanço a cabeça e o
contorno para sair do closet.
Mas Jeremy me segue.
Pego o short assim que o avisto no chão.
— Sabe, sinto muito dizer isso, mas essa desculpa de que ela já está
morta para amenizar toda a situação só me deixa mais brava ainda com
tudo.
— Não sei o que mais eu poderia dizer a você, Audrey, já que as
minhas palavras não são o suficiente. Mas… — Rapidamente ele pega
minha mão e a traz para perto do seu peito.
Eu quero recuar como se estivesse tocando em brasa e aperto os olhos
quando sinto seu coração bater tão forte.
— Tudo o que sinto por você está aqui.
Puxo minha mão e visto meu short. Não tenho coragem de tirar a
blusa dele, pois, de repente, a minha nudez na sua frente vira um tabu.
Me apresso em pegar as minhas coisas, mas lembro de algo.
— Como posso saber que é por mim? Como posso saber que é pela
Audrey e não pela Sofia? — friso. — Olha só para você, Jeremy. Um
homem cheio de conquistas, CEO e que poderia estar com qualquer mulher
que quisesse. E do nada você escolhe justamente a mim? Qual o segredo
nisso tudo? Acho que já sabemos a resposta. Um homem como você jamais
teria interesse em uma mulher como eu. Ah, não ser, que eu fosse muito
parecida com a única mulher que você já amou na vida.
Ele fica parado, me encarando de um jeito vazio, mas que precisa
pensar nas coisas que digo como se elas estivessem finalmente fazendo
abrir a cabeça para algo que nem ele sabia decifrar sozinho e agora o ajudei.
Se parece difícil para ele é mais ainda para mim.
— Tudo aquilo que você fez por mim, toda preocupação, até mesmo a
forma como você fazia amor comigo… Às vezes eu achava que era porque
tínhamos aquela conexão como se nos conhecêssemos há anos, mas era só
você se lembrando dela.
Jeremy se mantém de cabeça baixa e ando até ele com passos
pesados, me sentindo uma idiota.
— E agora eu acho que isso não vai doer tanto, porque não é ela que
você está perdendo agora, mas a Audrey. A verdadeira mulher que não
sabia que existia por detrás dessa fantasia que você criou como se eu fosse a
reencarnação da Sofia. — Passo por ele e toco a maçaneta com o coração na
boca e os lábios trêmulos.
Não era dessa forma que eu esperava começar o dia.
— O mais triste nisso tudo, Jeremy, é que você está percebendo a
verdade só agora, como se estivesse finalmente vendo tudo com mais
clareza. E eu não sei se você me verá com os mesmos olhos pelo simples
fato de eu saber a verdade.
— Audrey… — Ele parece estar derrotado, sem força alguma.
— Por favor, Jeremy, não venha atrás de mim. É mais fácil se for
desse jeito. — Abro a porta do seu quarto e saio, mas a fechei com cuidado,
pois não posso fazer cena em plena seis horas da manhã.
Está muito cedo ainda e a mansão está quieta demais.
Não acho impossível nossa discussão ter sido escutada, mas já nem
importa mais.
A minha única vontade nesse momento é sair daqui o mais rápido
possível.
No entanto, quando dobro a esquina do corredor para chegar à escada,
trombo com uma Jane assustada, só de roupão e me olhando com aqueles
olhos azuis arregalados e fantasmagóricos.
Respiro fundo, com pressa. E em meio a minha fuga, tudo o que ela
diz é:
— Ele é o pai do seu bebê, não é?
Sinto outro soco, afinal já havia até me esquecido disso, mas agora foi
adicionado a dor, somando e fazendo tudo só parecer mais tenso.
— Não conte nada a ele. É uma escolha minha, por favor, não
contrarie isso.
Jane pisca, confusa, mas também não questiona, apenas acena com a
cabeça em concordância.
— O motorista já está na cozinha, tomando café. Se você pedir a
ele…
— Não precisa, Jane.
— Eu insisto, Audrey. Pelo menos, só hoje.
Olho por cima do ombro, aceitando que Jeremy obedeceu a minha
ordem.
Ele não virá atrás de mim.
— Ok — digo a ela.
Desço a escada, sem trocar mais uma palavra com Jane, afinal a
considero cúmplice nisso tudo. Até ontem, o lugar e as pessoas aqui me
pareciam bastante confiáveis, mas agora parece que eu caí em um buraco e
me sinto solitária e perdida.
Vou direto para fora para ficar esperando ao lado do SUV.
Quando o motorista aparece, ele não diz nada além de bom dia e eu
respondo educadamente.
Antes de entrar no carro, dou uma última olhada para a mansão.
É tão estranho pensar que não a verei mais e que a Audrey talvez
nunca tivesse sido aceita aqui se não fosse o gritante detalhe da semelhança
com Sofia.
Vejo a figura de Jeremy na janela, parado, me observando.
Ele irá me ver partir e não irá fazer nada, porque ele sabe, até ele
sabe, que merece isso.
Quando conheci Audrey naquela noite, pensei que estivesse tendo
alguma alucinação, ou então preso a um sonho lúcido demais, enquanto
bêbado no balcão do pub.
A verdade era que mantive a tranquilidade, a postura, mas estava
sendo atormentado.
Naquela noite, não a segui porque queria mantê-la segura, a segui
porque queria saber quem era ela, onde morava e o que fazia. Só assim para
ter certeza de que ela não era uma alucinação minha.
Confesse que naqueles últimos meses em que me pegava pensando
nela, estava de fato muito confuso.
Tive algumas recaídas, parecia que estava revivendo aquele pesadelo
da perda mais uma vez.
Algumas vezes, o lado da minha cama vazia parecia aquecida e me
perguntava se era de alguma forma a Sofia.
Ninguém volta do mundo dos mortos, é impossível.
Eu sabia que aquela garota muito parecida com Sofia não era a minha
falecida esposa, mas foi o suficiente para desencadear um monte de coisa
em mim.
“Não é ela”, eu dizia a mim mesmo e depois que tentei diversas vezes
a reencontrar e não obtive nenhum resultado, comecei a acreditar que havia
sido apenas uma alucinação minha.
O que não era nada incomum.
Depois que perdi Sofia, cabelo loiro, olhos, voz e até mesmo perfume,
tudo me lembrava ela. Era muito fácil me ver perdido, tentando encontrar
qualquer característica sua em uma mulher qualquer.
E Audrey era a cópia exata dela, só que de cabelo e olhos mais
escuros.
Quando a reencontrei não mansão, cuidando de Theo, senti aquela
sensação estranha de novo.
E o mais louco de tudo, Audrey tinha também alguma atração por
mim.
— Será que é algum tipo de reencarnação? — Ian chegou a comentar
quando chegou em Dublin.
Os meus irmãos foram discretos, mas a surpresa em ver Audrey não
estava só na sua beleza, mas o fato dela ser tão parecida com a falecida
cunhada deles.
Ian tentou quebrar o gelo de alguma forma ao mostrar interesse,
aquilo não era só para me irritar, mas uma forma de dizer “Ok, não vamos
nos abalar com isso”.
— Impossível. Quando Sofia morreu, Audrey já deveria ter uns nove
anos. — Noah justificou.
É claro que eles falariam sobre aquilo em algum momento e foi
justamente quando estávamos jogando sinuca, tarde da noite e todos já
haviam ido dormir.
Pensei que, por algum tipo de respeito e até mesmo para não despertar
antigos fantasmas, ninguém falaria a respeito.
Mas, naquela mesma manhã, quando estávamos na praia e levamos
Audrey conosco, meus irmãos já estavam tocando no assunto.
Chegamos a suspeitar que Audrey havia escutado algo, mas ela não
mencionou nada e ninguém mais tocou no assunto.
A questão é que todos nós sabíamos o que aquilo significava e
preferimos ignorar de certa forma porque não queríamos perder a presença
de Audrey, mas também não queríamos que ela saísse correndo por achar
aquilo tudo bizarro demais.
Só que agora aconteceu exatamente tudo o que mais temia.
Audrey descobriu e com razão suspeitou de mim, como se eu fosse a
porra de um criminoso.
Há tanta coisa para explicar que não sabia por onde começar, então a
deixei ir não porque ela havia desvendado tudo, mas porque Audrey não
merecia achar que era uma espécie de tapa buraco.
Mas até agora tenho contido a vontade de pegar um jatinho, voltar
para a Irlanda, ir atrás dela e me ajoelhar…
Porra, eu cometeria um crime desde que isso provasse meus
sentimentos por ela.
Agora estou no escritório, tentando fingir que o mundo não desabou
sob meus pés.
Três semanas se passaram e desde então tenho vivido uma agonia sem
igual.
Um toque rápido na porta me faz sair do transe, mas fico
massageando minhas têmporas.
Noah passa pela porta em silêncio, fecha, então se aproxima da minha
mesa e não diz nada pelos próximos segundos.
Antes de qualquer coisa, o vejo colocando um copo de vidro sobre a
mesa, bem na minha frente. Olho incrédulo para ele e tento pará-lo assim
que o vejo com uma garrafa de uísque em mãos.
— Espera aí, o que acha que está fazendo? — pergunto sem conseguir
disfarçar a minha indiferença.
— Você tá mal pra caralho, merece uma dose.
— Estou no trabalho — rebato.
Noah fica me olhando como se eu tivesse dito alguma besteira.
— Você está no trabalho, mas não está, me entende? É óbvio que
você só está aí vegetando.
Olho para o relógio no meu pulso e constato que temos uma reunião
em duas horas.
— Chegou cedo para a reunião, é um milagre — comento me
sentindo amargo.
— Não vai ter mais reunião, pedi para que a sua secretária cancelasse
— avisa com maior naturalidade e me remexo na minha cadeira giratória.
— Você fez o quê?
Noah me ignora e serve a dose de uísque empurrando o copo para
mim.
Mas recuso e me mantenho alheio.
— Jeremy, você não tem condição alguma de fazer essa reunião hoje.
— Quantas vezes você já veio de ressaca para as reuniões, Noah? Ao
ponto de sentirmos o cheiro de álcool sair dos seus poros!
— Não seja tão idiota, Jeremy. Eu não sou a cabeça disso tudo, certo?
É você quem dirige isso tudo. Pelo menos aceite a bebida, porra. — Ele se
serve e vai logo dando um gole.
Noto que Noah parece estar agitado também, talvez esse encontro
inesperado tenha um propósito.
— Aconteceu alguma coisa? — pergunto.
Meu irmão balança a cabeça, apoia as mãos na cadeira, mas não faz
menção em se sentar.
— Eu sabia que isso ainda ia dar ruim.
Franzo o cenho para ele, ainda confuso.
Noah parece perder a paciência quando nota que estou lento demais
no raciocínio.
— Que porra você estava pensando, Jeremy, ao se envolver com uma
mulher parecida com a Sofia? É sério?!
Bufo, me esparramo na cadeira de couro escuro e coço barba.
Pelo visto meus irmãos já sabem.
Se Noah sabe, Ian também e é só questão de tempo até que Jane
comente alguma coisa. Além do mais, foi ela que ajudou a Audrey a ir
embora, sem insistir porque sabia que ela estava no direito de estar
chateada.
Mas, honestamente, às vezes me pergunto se por termos a deixado ir
com facilidade, não teria deixado uma impressão de que aquilo não mudava
em nada.
— E você só descobriu isso agora? — pergunto inexpressivo, sem
tocar na dose de uísque separada para mim.
— Era só uma brincadeira e não achei que você fosse de fato se
envolver, porque seria muito comprometedor com o seu passado. Além do
mais, ela era a sua funcionária, não era? Achei que era “proibido”. — Faz
aspas no ar com os dedos e olho sério para ele.
— Você não tem moral alguma para falar sobre isso — enfatizo, já
que ele está noivo da sua ex-assistente.
— A questão é que sempre ignorei essa regra, sabe disso. Mas você…
Isso com certeza é novidade.
— Olha, Audrey mostrou total interesse. Eu também sentia o mesmo
e não conseguia ignorar. Tudo foi evoluindo. Quando percebi, sabia que já
era tarde demais para me explicar sobre esse detalhe, pois sabia que ela
desistiria de mim. Da gente — desabafo.
— E aconteceu o que mesmo? — A sua pergunta é retórica.
— Ainda não entendi, Noah. Você veio aqui só para cancelar meus
compromissos, jogar as coisas na minha cara e acabar mais ainda com a
porra do meu dia?! — explodo.
— Vim ser o seu irmão. — Dá um único gole na bebida cor âmbar,
deixando o copo vazio depois larga na mesa com uma força que faz o vidro
da superfície estremecer. — Dar uma atenção para essa situação que você
acabou envolvendo todos nós! Porque ninguém teve coragem de dizer para
a menina que ela se parecia com a Sofia!
— Então a culpa não é só minha — concluo com a voz meio sombria.
— Ah, me poupe! Era você que estava a levando para a cama,
Jeremy! Essa responsabilidade era totalmente e unicamente sua!
— Obrigado por falar o óbvio. — Levanto da cadeira e então
explodo: — Mas já é meio tarde demais, você não acha?! — Contorno
minha mesa e caminho até a janela ampla que acomoda a parede toda,
dando uma bela vista das cores vivas que ainda tomam a cidade antes do
outono começar a tirar a vivacidade de tudo, trazendo mais chuva e dias
nublados.
Enfio as mãos nos bolsos da calça, lembrando de como Audrey me
fazia pensar em primavera, flores e dias bonitos.
Estar com ela era como viver um dia lindo, deslumbrante. Isso me fez
recordar mais uma coisa que infelizmente não tive tempo de contar a ela.
— Pode me xingar e acusar o quanto quiser, mas você sabe, Noah,
todos nós sabemos que Audrey e Sofia são parecidas só na aparência —
digo com a voz firme, mas não estou tão seguro assim. Estou até mesmo um
pouco enjoado. — Mas o jeito delas… São duas pessoas totalmente
diferentes.
“Sofia era ambiciosa, introvertida e muitas das vezes era difícil saber
o que estava acontecendo com ela.
“Bem diferente de Audrey, que é leve, alegre, fala até demais, gostava
de estar presente e fazia eu me sentir bem.
“Era diferente sim, Noah!
“Eu amava Sofia, mas há catorze anos ela se foi. E por alguma
coincidência cômica do destino, Audrey surgiu”.
Faz-se um silêncio por uns segundos e abaixo a cabeça, devastado.
Logo depois Noah está do meu lado, segurando o copo de uísque que ainda
não havia bebido.
Meu irmão é insistente, mesmo assim olho para ele com uma surpresa
preguiçosa.
— Ainda bem que não estou na sua pele, afinal é uma situação de
merda isso tudo. Julian me contou que você anda estranho há três semanas.
Isso tudo me faz pensar que estivemos ignorando a pessoa mais afetada
nisso tudo, o próprio Julian, e você sabe disso, irmão.
Fecho os olhos e suspiro.
Desta vez não consigo me conter, pego o copo dele e dou apenas um
gole. Eu nem sinto o gosto amargo e pungente da bebida me afetar tanto
assim.
— Ainda sou um pai ruim, não é mesmo?
— Para com isso. Você sempre foi um bom pai, só nunca teve muita
sorte com coisas específicas da vida.
— Isso não me tranquiliza, Noah.
— Só estou querendo dizer que para Julian, ver uma pessoa parecida
com a mãe dele deve ter sido o cúmulo! Pensa bem, ele se apegou em
Audrey por esse detalhe.
Meu irmão dá um sorrisinho e então dá dois tapinhas amigáveis em
meu ombro e continua:
— Vá até Dublin, diga a Audrey tudo o que você acabou de me dizer
e mais um pouco, claro. Abra o seu coração, irmão.
Balanço a cabeça, me negando a seguir com essa ideia.
— Audrey não quer me ver pintado nem de ouro. Toda aquela
indignação dela foi com razão e não vou ser hipócrita e dizer que não
pensei em Sofia. Em algum momento isso deve ter acontecido, mas foi o
meu cérebro agindo e não o meu coração. E quer saber? Isso está me
matando por dentro. Mas vou respeitar a decisão dela, porque continuo
sendo o errado nessa história toda e preciso manter a minha dignidade.
— Para quê?
Dou de ombros.
— Não sei. Talvez para algum momento no futuro, porque nunca sei
quando irei para Dublin atrás dela. Poderia ser amanhã mesmo.
— Ir amanhã parece uma ótima ideia.
Reviro os olhos.
— Não fode, Noah. Você quer mesmo ter um irmão a menos, não é?
Precisava ver a forma como Audrey me olhava. Porra, eu jurava que ela ia
arrancar as minhas bolas ou enfiar os dedos nos meus olhos!
— Como ela descobriu, afinal? Achei que você tinha escondido tudo
após aquele incidente com Julian.
Olho para o meu irmão, tenso, ficando logo arrepiado ao lembrar do
dia em que Julian quase incendiou a mansão de Dublin.
Meu peito abafa até as batidas, pois faz tempo que não recordo este
fatídico dia.
— Eu escondi. Passamos a noite juntos e acordei com a cama vazia
ao meu lado. Ouvi uns espirros e quando fui ver, Audrey já estava lá,
mexendo em tudo que estava espalhado no chão. A caixa estava escondida
debaixo do separador de gravatas.
— Que específico.
— É, eu sei.
— Será que Julian não comentou nada com ela? — pergunta atônito.
— Não, porque tratei de deixar esta informação longe dele.
Noah solta um longo suspiro e então se afasta, deixando o copo sobre
a minha mesa.
— Bom, talvez seja necessário que você comece a fazer alguma coisa
e pelo Julian, se possível. Já conversaram sobre isso?
Nego com a cabeça.
— Acho que Audrey pode estar certa, ninguém falou nada sobre essa
coincidência porque era mais conivente para todos nós. Julian e eu
sabíamos dessa semelhança, mas ignoramos porque acho que não
queríamos perceber que era só uma coincidência.
— A forma como Sofia se foi, tão rápida, sempre será difícil de
superar. Mas não precisa agir como se você ainda a amasse.
— O que eu posso dizer, Noah? Eu a amei um dia, mas ela se foi e
agora apenas superei a realidade.
— Bom, então boa sorte para você. Talvez seja bom mesmo dar
tempo ao tempo, saber o que você viu de verdade em Audrey. Se foi algo
especial, ou se apenas voltou ao passado.
— Você voltou? — pergunto a ele por cima do ombro, antes mesmo
que ele saía. — Quando via Audrey, você via a Sofia?
Meu irmão parece pensar um pouco e então solta um suspiro para
depois negar com a cabeça.
— Não. Porque você tem razão, são pessoas totalmente opostas.
Felizmente, esse pode ser o seu álibi, irmão. — Abre a porta, mas para
antes mesmo de sair.
— Olha, Ian e eu estamos na cidade, até mesmo Meredith. Se precisar
de alguém, estamos aqui para confortá-lo.
Solto um grunhido.
— Não me esperem — comento e meu irmão dá uma risada.
— Você sem a Audrey é apenas um homem ranzinza e amargo.
Tchau, Jeremy.
Idiota!
Pior é que ele tem razão.
Meu irmão vai embora e volto a ficar sozinho.
Agora pior do que nunca, porque meus pensamentos estão aguçados
depois da nossa conversa.
Preciso me servir de mais uma dose.
Eu odeio beber no trabalho, mas agora parece tão necessário.
Bebo a dose em um único gole e então me sirvo de novo.
Porra, pareço tanto com o Noah agora, descontando tudo em uma
garrafa de uísque velho e caro.
Foi a primeira vez que falei sobre esse assunto em voz alta e me doeu.
Foi como ter levado um soco da minha realidade dolorosa.
Infelizmente, parece ser apenas o começo de uma fase sôfrega da qual
a culpa é toda minha, por achar que estava tudo sob controle.
Mas Audrey me mostrou que de alguma forma que por mais que você
tenha controle de tudo, destinos podem mudar o jogador de posição e que
um pequeno segredo, pode ser como uma faísca que vai explodir tudo
depois.
Seis meses depois...
— Tem certeza de que está tudo bem? — mamãe pergunta pela
milésima vez enquanto saímos do mercado. — Eu falei que você poderia
esperar em casa. Santo Deus, olha como seus pés incharam!
Nem tento olhar para baixo, pois sei que não conseguirei, a minha
barriga está pontuda e faz tempo que não vejo a minha intimidade, quem
dirá a ponta dos meus pés.
Bem, não enquanto ando, aí que é difícil mesmo.
— Eu fiquei com medo da senhora comprar a pasta de amendoim
errada — rebato tentando não soar cansada enquanto andamos até o carro
estacionado.
São só mais vinte metros, eu conseguirei!
— E tinha como isso acontecer? São todas iguais! — ela protesta
indignada, embora esteja preocupada por eu ter passado meia hora a
perseguindo pelo mercado.
— Não essa. Há pedaços de chocolate dentro, o que a torna especial
— tento explicar, mas sei que não foi um bom argumento.
— Pelo amor de Deus. Se a sua obstetra descobre essa sua tara por
doce, é capaz de ela prendê-la até esses bebês nascerem!
— Mãe, eu me permito comer um docinho uma vez por semana. A
senhora sabe que vou comer só uma colher disso e depois vou esquecer.
— Então, por que faz tanta questão? — Ela para o carrinho de
supermercado ao lado de um Opel Corsa cinza que ela comprou quando eu
ainda estava no quinto mês de gestação.
— A senhora não quer que seus netinhos venham ao mundo com cara
de pasta de amendoim, não é?
Mamãe me olha estranha enquanto coloca as sacolas dentro do porta-
malas.
— Acho que o excesso de doce não está fazendo bem para a sua
cabeça, inclusive — comenta e sorrio.
— Quer ajuda aí?
— Quero que você entre logo no carro, querida. Sabe que estamos só
contando os dias, não quero que você se canse ou se estresse até lá.
Aliso a barriga por cima do tecido leve do vestido, sentindo a
protuberância enorme, equivalente a quase duas melancias.
Os bebês estão quietos, geralmente eles deixam para ficarem agitados
à noite enquanto quero dormir.
— Tudo bem, grávida indo para dentro do carro — digo enquanto
contorno o veículo.
Sento no banco do passageiro e então fecho a porta. Eu não quero
congelar com o frio que faz lá fora, afinal de contas, ainda estamos no
inverno, ou no final dele, o que consiste em estar frio pra caramba.
Embora, descobri durante a minha gestação que grávidas estão mais
propensas a sentir calor, então o frio não foi um grande vilão nesses últimos
meses.
Exceto na hora do banho.
Lembro como foi uma loucura quando descobrimos que eram
gêmeos, um casal para ser mais exata.
Eu já estava com dois meses quando Jeremy foi embora e fiz a minha
primeira consulta de pré-natal. O ultrassom revelou dois fetos, e três meses
depois, descobrimos que era uma menina e um menino.
Aquilo não estava em nossos planos e deixou mamãe bastante
preocupada. No entanto, ela se apegou rapidamente aos netos, pois quando
dei por mim, a flagrei cochilando após passar uma noite em frente à TV
enquanto tricotava sapatinhos para eles.
Eu soube ali que ela já tinha uma ligação com os netos.
Para mim, isso é o suficiente.
Estamos tão ansiosas para vê-los que mais nada no mundo parece
importar.
— Olha, eu sei que vocês devem estar dormindo e que aí dentro é
muito confortável, mas acho que já está na hora dos dois acabarem com a
folga — converso baixinho com meus gêmeos. — Eu sei que a maternidade
não vai ser fácil, mas a vovó está certa, não posso fazer mais muito esforço.
Até andar um pouco tem sido muito cansativo.
Por mais que saiba que eles não estão me ouvindo e que muito menos
irão me responder, gosto de conversar com eles, falar sobre coisas que
normalmente escreveria em um diário.
A porta do lado abre e mamãe entra.
— Pronto, agora, vamos para casa. Tudo bem? — ela pergunta
quando percebe que pareço meio distante.
— Estava pensando no que você disse, que é só questão de tempo
agora para eles chegarem.
Mamãe estica sua mão e toca a minha que ainda está espalmada sobre
a saliência da minha barriga.
— Vai dar tudo certo, minha filha. Uma mulher já consegue dar conta
sozinha dos filhos, imagine duas.
Mas não foi isso o que esperei, pelo menos não no começo.
No entanto, sorrio para ela em resposta.
— É verdade, vamos conseguir. — Esboço um sorriso e coloco o
cinto de segurança, me acomodando mais um pouco no banco do passageiro
enquanto mamãe dá ré com o carro, nos tirando dali rumo a nossa casa.
Eu achava que seria difícil lidar com a gestação depois que fiquei
bastante chateada com Jeremy e descobrir o detalhe sobre a sua falecida
esposa. Principalmente, porque já estava certa de que contaria a ele sobre a
gravidez e imaginei uma vida ao seu lado, onde o bebê teria uma linda
família, muito diferente de mim.
Bem, pois ainda acho que meus bebês terão uma linda família, mas
agora sem um pai, um irmão mais velho, tios babões e um avô que
certamente daria muito amor e carinho.
É estranho pensar em como eles podem estar vivendo suas respectivas
vidas em Londres, sem fazer ideia de que estou grávida.
Menos Jane.
A governanta deles sabe de tudo e vem escondendo o segredo como
um baú onde a chave foi jogada no mar.
— O segredo é seu para ser contado, não meu — ela dizia sempre
que perguntava se ela havia dito algo ou não.
E sou muito grata pela sua lealdade.
Às vezes, quando está pelas redondezas, ela nos visita e leva algumas
tortas agridoce, ou aparece com algum presente para os gêmeos. É muita
generosidade da sua parte, mas tenho receio que um dos O’Donnell fique
curioso sobre o meu paradeiro. Como Ian, por exemplo.
Da última vez, soube que ele estava na cidade para o dia de San
Patrício e estive fugindo dele igual o meu pai fugia dos caras que viviam na
porta de casa o cobrando.
Mas, ele não apareceu e foi melhor assim.
Por mais que eu pedisse segredo, duvidava que Ian fosse esconder
essa informação do irmão e que eu fosse esconder a verdade sobre o pai dos
bebês.
Acho que não só Jeremy, mas a família toda deve ter ficado
envergonhada por terem me aceitado nela por pensar que eu podia ser a
falecida esposa de Jeremy. Às vezes, penso em como fui rude comigo
mesma, ou até mesmo com ele e com o que tínhamos.
Bom, o que sentia por ele era para se sobressair qualquer coisa, não
era?
Se estava mesmo apaixonada por Jeremy, aquele detalhe que me
deixou enfurecida seria uma mera poeira perto do que sinto por ele.
Certo?
Errado!
Eu já estava insegura o suficiente com o que os outros iriam achar
dessa gravidez repentina e depois que descobri que me pareço com a mãe
de Julian, aquela que todos amavam e deixou a família subitamente, tive
uma crise de identidade.
Sempre tive problemas com a solidão e nunca achei que alguém
gostaria de verdade de mim.
Mas Jeremy e a sua família mostraram o contrário e eu acreditei.
Eu me senti acolhida, finalmente recebendo o tipo de atenção que eu
merecia.
Desde criança não sentia aquela energia familiar e de que certa forma
não estava só.
No entanto, depois tudo caiu por terra porque não era sobre mim, era
sobre Sofia.
A última imagem que Jeremy teve dela, era dela ainda grávida e agora
estou grávida. Sei que isso afetaria a nós dois de modos distintos e foi o que
me manteve firme na escolha de permanecer distante, porque Jeremy quer
Sofia e não eu.
Me afasto dos pensamentos quando a minha mãe entra no famoso
Temple Bar e então na antiga rua onde costumava trabalhar no pub.
Mantenho meu olhar na via à minha direita e vejo o antigo pub de Steven.
O carro para no sinal e não contenho a curiosidade.
— A venda? — verbalizo o que está escrito no cartaz em frente à
porta. — Pensei que fossem demolir. Daqui a pouco vai estar desabando por
si só em cima das pessoas de tão antigo que é esse lugar.
— Mas, por que eles demoliriam o estabelecimento? Querendo ou
não, é propriedade cultural da cidade — mamãe profere seu contentamento.
— Hum, não sei. Talvez o lugar só não me traga boas lembranças.
Não importa, para mim, o fim que ele terá, sabe?
— O senhor Douglas me disse que Steven vendeu por uma pechincha
a ter que ser entregar pela polícia por causa das denúncias de assédio sexual
e trabalhista no pub. Imagine só, um tipo de suborno só para ter que fazer
Steven desaparecer do mapa da Irlanda.
Olho para ela incrédula.
— A senhora ainda fala com o senhor Douglas? Sabia que ele me
humilhou quando fui embora deste lugar? E como assim suborno?!
Mamãe pisca repetidas vezes, dá seta e muda a rota, virando a direita.
De repente, meu coração começa a bater forte, principalmente quando
percebo que ela pega o acesso para o estacionamento exclusivo do
estabelecimento.
— Mãe, o que está acontecendo?
Ela para o carro em uma vaga, mas não desliga o carro. Apenas ficou
me olhando, parecendo perdida e desorientada.
— Droga, eu… Eu sabia que deveria ter te falado, filha, mas juro que
eu só queria fazer surpresa.
— Co-como assim?
Seus dedos seguram com força o volante e sei que está nervosa.
Mas seu suspiro é decisivo para contar o que ainda não sei.
— O senhor Douglas veio me contar que Steven ia vender o pub e
que seria tão barato que até a nossa casa valia mais. Ele salientou o meu
talento na cozinha e aflorou antigos sonhos que eu tinha em ter um
restaurante. E, bom… — Ela dá de ombros.
Vejo a animação tomando a sua postura e sua feição, junto aos olhos
que parecem lacrimejarem.
— Eu só pensei que como não tínhamos mais dívidas desnecessárias,
além do carro, eu pensei, “Hum, por que não?”. E então, eu… Eu comprei o
antigo pub.
Não consigo gerir a informação de imediato, mas fico olhando para
ela, pensando que ela me diria a qualquer instante que isso é só uma
pegadinha. No entanto, mamãe se esgueira até o porta-luvas e pega um
molho de chaves que reconheço de imediato.
Puta merda!
Ela comprou mesmo o pub de Steven!
— E-e… Eu… Mãe, eu não sabia que você tinha um sonho de ter um
restaurante — friso antes de qualquer coisa.
Porque sonhos são o que nos move e sempre achei a minha mãe tão
monótona.
O meu maior receio sempre foi que tivesse uma decepção amorosa
tão grande como a dela, que fosse largada, roubada e passasse a viver no
automático, como se a vida não tivesse cor o suficiente.
Ela sorri, limpando rapidamente a lágrima que escorreu por sua face.
— Mas você sempre elogiou a minha comida!
— Isso com certeza.
Pego a minha mão e sinto seu aperto me envolver como se todo nosso
futuro dependesse disso.
— Eu só quero saber o que você acha disso. Na verdade, a minha
intenção era contar quando tudo já estivesse pronto, mas já estamos aqui,
então acho que não há mais tempo a perder, não é mesmo?
Reflito por uns segundos.
A minha mente graceja uma linha atemporal onde lembro de Jeremy
pagando todas as nossas dívidas. Nosso emprego deu então uma aliviada e
tudo o que recebemos serviu para ir para o fundo de emergência e para as
nossas vontades também. Como uma mesa de jantar nova.
Depois que Jeremy foi embora e consequentemente levou Theo com
ele, fiquei desempregada. Jane insistiu em outras opções de emprego que
ele havia deixado para que não ficasse desamparada, no entanto, sabia que
qualquer uma delas me dariam um tipo de ligação a ele.
Mas então surgiu uma oferta inesperada, que eu fosse para Gales.
Uma antiga amiga minha estava de mudança com os seus pais e eles
não queriam recorrer a uma empresa imobiliária porque não queria perder a
taxa que normalmente cobram. Ela perguntou se ainda estava de bobeira, se
aceitaria ficar na casa e receber uma graninha por isso, principalmente
porque a apresentaria para futuros compradores.
Fiquei bastante pensativa sobre a oferta, mas aceitei.
Eu sabia que seria bom para mim, e quando fui embora para Gales,
me perguntava se isso não iria atrapalhar Jeremy e as suas tentativas de
falar comigo.
Isto é, se ele ao menos tentasse.
Mas, aí os dias e semanas foram passando e ele não deu qualquer
sinal de vida. Então, fui aceitando a realidade.
Em resposta, levanto o olhar para a minha mãe e sorrio.
— Quero viver os seus sonhos e quero que a senhora viva os meus. —
Percebo o momento em que parece ficar aliviada, como se um peso tivesse
saído dos seus ombros. — Se é isso o que a senhora quer, para mim, tudo
bem. Vai ficar lindo e será tudo sempre muito gostoso porque a senhora
cozinha com amor.
— Audrey…
— Não dá pra ficar a vida toda cozinhando na casa dos outros, não é,
Anabel? — indago e ela sorri. — E então, não vai me contar os seus planos
para o restaurante?
— Sabe, fiquei preocupada depois que você disse que esse lugar está
para desabar.
— Na verdade, não. É que esse sempre foi o meu desejo enquanto
Steven estava aqui, mas agora que a senhora assumiu o controle, espero que
dure a vida toda!
Mamãe se anima e então desliga o carro. Tiro o cinto de segurança e
saio quando ela faz o mesmo.
A última vez que eu a vi tão empolgada assim, foi quando descobriu
que havíamos quitado as dívidas. Eu disse a ela que o senhor Rupert nos fez
esse favor. Fugi do nome de Jeremy porque ela suspeitaria de algo entre nós
dois e a última coisa que queria, era que ela começasse a criar especulações
sobre nós dois, ainda mais agora que deu tudo errado.
Seria vergonhoso demais.
Entramos no pub, onde as luzes estão apagadas, mas reconheço cada
canto mesmo no escuro.
Ainda está tudo no mesmo lugar, até as bebidas antigas e caras que
Steven vendia mais caro do que o normal para os turistas.
Ele deve ter corrido igual um cordeiro foge de um lobo.
Covarde!
Mamãe começa a contar seus planos para o restaurante e a ouço
atentamente.
Confesso que a medida que ela vai falando, eu também vou ficando
empolgada com a ideia. Afinal de contas, o restaurante será uma garantia de
um futuro bom para nós.
Tudo aqui nesse lugar prospera, graças aos turistas.
Sento em uma cadeira e fico imaginando o lugar do jeitinho dela,
enquanto a ajudarei atrás do balcão, ou atendendo os clientes.
— Talvez mantenha essa decoração e troque os quadros das mulheres
seminuas para algo mais alegre e receptivo — ela comenta fazendo cara
feia para as pin-ups sexualizadas.
— Aposto que a senhora vai tornar o ambiente bem agradável de se
estar e trabalhar. Posso ser a sua primeira funcionária?
Ela me olha como se eu tivesse soltado algo profano.
— E os gêmeos?
— Humm, bem, não sei. Mas em algum momento vou ter que
trabalhar, não é mesmo?
— Não sei, Audrey. Serão duas crianças, vai ser um pouco
complicado, não vou mentir.
— Poderemos contratar babás.
— Si-sim… E você terá a mim. Mas, trabalhar… Acho que isso vai
exaurir você em um nível muito estressante.
— Mãe, não posso parar. Tenho que ajudar você, ser ativa…
— Você está falando como se as coisas ainda estivessem ruins para
nós — ela diz com cuidado, mas de um jeito profundo.
— Não quero me escorar não senhora. Sabe? Eu também tenho
sonhos. Pretendo conseguir o meu diploma de ensino superior um dia —
digo me levantando.
— Eu entendi, Audrey… E o pai? Sei que você detesta falar sobre
isso, mas se ele fosse presente iria ajudá-la muito também. Nos ajudar a
construir nossos sonhos e quem sabe, sermos uma família completa.
Ouvir isso é como uma faca em meu peito, tanto que o sinto se apertar
a medida que a realidade me afeta.
O pai dos meus bebês…
Jeremy.
Eu sinto tanta falta dele que chega a doer.
Às vezes, antes de dormir, fico me torturando com pensamentos
felizes sobre como seria as nossas vidas se tivéssemos continuados juntos.
Eu me culpo tanto por tê-lo afastado, mas ele também não fez nada para que
eu ficasse.
Jeremy simplesmente não moveu um dedo nesses últimos meses e
não tenho notícias dele desde então. Não que eu quisesse que ele ficasse
rastejando por mim, mas cada vez mais tenho certeza de que ele se deu
conta de que o motivo de eu ter ido embora era justo.
Às vezes, costumava pensar que a presença dele acontecia de forma
sutil.
A sua liderança, o seu poder…
“Eu não sou rico. Eu sou bilionário.”, disse certa vez, quando
ameaçou Steven.
Eu odiava arrogância, mas aquilo foi tão sexy, atraente.
Mas ter lembrado disso desencadeia algo.
— Quem subornou Steven a vender esse lugar por um preço tão
baixo?
— Nossa! Isso sim, foi uma mudança muito grande de assunto! —
mamãe exclama, mas percebo que ela fica aliviada por isso. — Não sei,
Audrey. O senhor Douglas me disse que um homem sabia dos crimes que
Steven cometia e usou isso contra ele. Parece que ele só queria que Steven
desse o fora daqui o mais rápido possível e para bem longe.
— Que homem? — Meu coração bate mais forte.
— Não sei.
— Isso foi há quanto tempo?
— Não sei, Audrey. O que foi? Você acha que sabe quem é?
Balanço a cabeça e fico de costas para que ela não veja as lágrimas.
Jeremy...
Foi ele que subornou Steven a ir embora.
Me surpreende que ele não tenha o colocado logo na cadeia, mas
parece que queria garantir algo a mais ao dar essa oportunidade para a
minha mãe. Com certeza foi ele também que mandou o senhor Douglas
atrás dela para oferecer o lugar.
Mas, como ele poderia saber que esse era o sonho dela?
Um frio percorre minha espinha.
Será que ele estava me observando?
Não, impossível!
Eu já teria notado, afinal sou uma boa observadora também.
— Quero ir pra casa — anuncio já indo em direção à porta dos
fundos.
— Tudo bem — mamãe diz logo atrás de mim.
Por um instante, esqueço que estou grávida e só consigo pensar na
possibilidade de Jeremy ainda se importar.
No final das contas, isso deveria significar algo, não é?
Mas, quase nove meses já se passaram e ele não deu nenhum sinal.
E se esse foi seu único sinal, ainda é ridículo, porque não quero a sua
pena, a sua humildade.
Eu quero o seu amor, a sua alma, o seu coração e o seu corpo por
completo.
Quero Jeremy só para mim e não as coisas que ele podia me dar, nos
dar.
Seguro a minha barriga, sentindo algo se movimentar.
Eles acordaram.
Quero que meus bebês tenham um pai. Quero que apesar de tudo,
Jeremy ame e conheça os seus filhos.
O casamento de Noah e Meredith será daqui seis semanas e é legal
que eles tenham escolhido a mansão em Dublin para este evento íntimo e
familiar.
No entanto, é um pouco assustador para mim, devo confessar.
Não venho aqui desde o verão passado, afinal as nossas festas de final
de ano foram todas feitas em Londres mesmo, mas porque papai precisava
fazer alguns exames na capital.
Só que agora que estou aqui e é um pouco estranho para mim.
Jamais pensei que o meu lar fosse me deixar tão mal, que essas
paredes parecem se fechar ao meu redor pelo simples fato de terem
presenciado uma evolução na minha relação com Audrey.
Desde que peguei o jatinho em Londres, só tenho pensado nela. Por
mais que saiba que ela já não trabalha mais não mansão, fico ansioso, como
se fosse vê-la assim que atravessar a porta da frente.
Mas não acontece nada e a frustração me abraça de um jeito mais
intenso que o próprio nervosismo.
Estamos todos aqui, Ian, Noah, Julian e Meredith. Será apenas um
final de semana, no domingo à tarde já estaremos de volta, mas Meredith
insistiu para que viéssemos fazer um ensaio no local.
Mesmo que seja tudo simples e intimista, Meredith quer nos
proporcionar uma boa cerimônia, assim como Noah, afinal de contas, ele
finalmente vai se casar com a pessoa certa.
Julian liberta Theo que começa a correr pelo campo da nossa
propriedade. Ele está grande, mas quando corre ao longe, parece ser apenas
um pontinho caramelo.
Nos últimos meses, pensei que era o único morrendo de saudade de
Audrey, sofrendo com a sua ausência, o seu carinho, a sua voz, tudo de bom
que existe nela, mas fui percebendo que não era o único. Theo se manteve
“preguiçoso” e o levamos ao veterinário que perguntou se alguém da
família havia morrido, porque ele estava triste.
Sim, até cachorros ficam deprimidos na ausência de alguém querido.
E como se não fosse o suficiente, Julian também parecia distante,
magoado.
No entanto, me parecia meio injusto, principalmente porque não sabia
se ele estava sentindo falta da Audrey ou da mãe que ele pode ter visto de
alguma forma nela.
Julian era propício a fazer aquilo, mas eu também nunca o questionei.
Meu filho e eu temos algo muito em comum, se não falamos sobre o
assunto é mais fácil de pensar que não existe.
Sentado na cadeira da mesa de jardim, enquanto desfruto dos
primeiros dias bonitos da primavera, jogo a cabeça para trás e respiro
fundo.
Estamos na primavera e sempre associei Audrey à primavera.
As flores e o verde ao redor cheiram bem, traz uma harmonia e um
complô de paz que me faz sentir bem pela primeira vez em meses.
“Ela está aqui”, penso.
É como se eu pudesse sentir a presença de Audrey na primavera.
Mas, inferno!
Não consegui encontrá-la, é como se Audrey tivesse sumido do mapa
da Irlanda, o que é assustador.
Me pergunto se o senhor Douglas fez mesmo a oferta à mãe dela que
eu exigi fazer após ameaçar entregar Steven para a polícia, caso ele não
vendesse aquele lugar por um preço tão baixo que o comprador estaria
pagando apenas pelo teto.
Eu nunca parei de pensar em Audrey, em nenhum segundo.
Ter feito isso, foi uma forma de dizer que ainda me importava, mas
que manteria distância.
Era o certo, não é?
Eu merecia a sua ausência, o seu desprezo.
Confesso que dói, mas eu sempre assumi as consequências.
— O que houve? Você está inquieto — papai salienta sentado ao meu
lado enquanto toma um banho de sol junto comigo no jardim.
Desde o momento em que chegamos, ele fez questão de sair do quarto
e ficar junto aos filhos.
— Algum problema na companhia? — pergunta também.
— Problema nenhum, está indo tudo em perfeito estado.
— Então, qual o problema?
Bebo um gole da água, pensando na resposta, mas com receio de
contá-la.
— Não há problema algum, eu só estou… Pensativo.
— E a Audrey? — pergunta cautelosamente, me fazendo ficar tenso,
sentado no banco de ferro.
No entanto, não consigo me esquivar da resposta.
Nos últimos meses, sempre pensava em uma desculpa que todos
aceitariam como resposta, mas desta vez não consigo fugir e deixo que meu
silêncio seja a única resposta possível.
Olho para o meu pai, de um jeito avaliador, afinal nem meus irmãos
são tão diretos assim. Na verdade, eles me poupam da dor, mesmo sabendo
que já estou sofrendo, mas sabem que verbalizar a situação só irá piorar
tudo. E o meu pai acabou de perguntar sobre ela em voz alta, mas não
acredito que saiba de alguma coisa.
— Não sei do que o senhor está falando. — Me mantenho difícil,
inescrutável.
Ele solta uma risada bufada.
— A resposta não é muito difícil. Pensei que vocês tivessem mantido
contato.
— Bem, sim… Quer dizer, essa era a intenção. Mas acho que a
magoei.
— Magoou?
— É uma longa história, pai. Mas, como está inacabada, nem irei
contá-la.
— Mas, por que, Jeremy? O que aconteceu? — insiste.
Olho para meu pai de soslaio e ele parece muito intrigado.
Faz tempo que não vejo assim.
Até mesmo quando ele vai para as suas consultas médicas e o doutor
dava uma péssima notícia, ele encarava com tédio.
Porém, as vidas dos filhos sempre pareceu ser a sua principal
preocupação. Tudo o que ele faz, é pensado em nós, até mesmo depois de
adultos. Isso me faz pensar em como estarei sendo um babaca mesquinho se
usasse a ignorância com ele.
Nenhum pai merece isso.
— Eu errei e preciso arcar com os meus erros. Normalmente, iria
atrás de repará-los, mas isso é na técnica, algo que se aplica facilmente no
trabalho. Mas, quando se trata sobre os sentimentos de outra pessoa, um
erro pode ser irreparável.
— Não acho que seja irreparável. Todo erro, há uma solução.
— Diga isso a quem causou o acidente nuclear em Chernobyl —
comento usando o típico humor ácido de Ian e isso faz papai rir. Então logo
completo: — Diga isso a Audrey e se ela não der um chute no senhor, vai
ser pura sorte.
— Ela chutaria um velhote doente como eu? — pergunta e dessa vez
sou eu a sorrir, mas logo fica sério. — Eu não sabia que envolvia
sentimentos e que era tão profundo assim.
— O senhor nem imagina… E por isso tem razão. Sinto falta dela.
Não só falta, mas como nos últimos meses descobri amá-la profundamente
— desabafo, sentindo um alívio nos ombros.
Me pego pensando, “eu realmente falei que a amo em voz alta?”.
— Jeremy… Não dê chances a uma vida solitária e sofrida — alerta.
— Pai, o senhor viu… Viu o quanto elas são parecidas. Acho que
Audrey detestaria ter que conviver com isso, ela viveria insegura, do
mesmo jeito que ficou quando descobriu a semelhança com Sofia.
— Isso é pura besteira. Vocês jovens de hoje em dia se irritam com
qualquer coisa. O quão ela deve ser insegura com si mesma para pensar que
você não se apaixonaria por ela, mas pela aparência dela?
Pisco e pisco, vendo sentido em suas palavras e o quanto fazem
sentido agora.
— Jeremy… Filho. — Ele se aproxima mais e então parece mais
calmo enquanto me aconselha: — A Audrey não deve ter medo por ser
parecida com Sofia, ela com certeza tem medo de não ser amada. E se você
a ama, precisa deixar isso claro e fazê-la se sentir única.
— Ela é — diz uma terceira voz logo atrás de nós, é Julian.
Antes de me virar, Theo passa trotando para debaixo da mesa redonda
de ferro retorcido, e então, Julian se posiciona entre papai e eu.
— Audrey é única — ele enfatiza.
— O que quer dizer? — pergunto me sentindo estático, com os ossos
tensos.
Meu filho comprime os lábios e sei que também não é um assunto
fácil para ele. Mas ele está sendo corajoso, assim como eu também agora.
— Eu sei que ela e minha mãe se parecem, mas nunca a vi como a
mamãe. Quer dizer, no início foi um pouco assustador, mas eu sabia que
não era ela, porque Audrey é jovem demais. Ela é como uma irmã, ou uma
tia… Uma grande amiga. Eu gosto dela, sinto falta dela, o Theo também…
E o senhor. — Aponta para mim.
— Eu?
Papai dá uma risadinha.
— Jeremy, todo mundo via a forma como vocês se olhavam. Apenas
um tolo ignorante seria capaz de não enxergar a conexão entre vocês —
Julian explica.
— Ah, isso com certeza — Ian diz ao se aproximar por outra direção.
Solto uma bufada, relaxando na cadeira.
— Agora pronto. Isso é por acaso com algum tipo de convenção sobre
a minha vida amorosa? Só falta o Noah aparecer com a Meredith.
— Não vão. Eles estão muito ocupados lá em cima, fui literalmente
expulso do meu quarto porque essa casa é velha demais e a gente ouve tudo
— explica entediado.
— Se você não fosse tão sozinho, não estaria reclamando da relação
amorosa dos outros — pontuo.
— Olha, vamos só lembrar que estamos aqui para falar da sua vida
amorosa — Ian diz.
— Este assunto já encerrou — digo me levantando, pronto para ir
embora.
— Não, este assunto não se encerrou — papai declara mais sério,
igual costumava fazer quando ainda era CEO da petrolífera. — Precisamos
falar muito sério agora, Jeremy. Sobre a Audrey.
— Não há nada o que ser dito. Eu passei meses a procurando pela
Irlanda toda e nunca obtive nenhum resultado. Audrey não quer ser
encontrada. — Elevo o tom da voz, o que não queria porque quase posso
sentir Ian pular no meu pescoço por isso. Então solto um suspiro exausto e
completo: — Vocês ainda não entenderam que eu sou o culpado? Nós
somos culpados por não ter dito nada a ela, e, por um segundo que fosse,
realmente pensasse que fosse Sofia.
Ian e Julian abaixam a cabeça, pois eles sabem que isso é verdade.
— Você não entende, Jeremy. Há motivos agora que certamente
deixaria essa história toda para trás porque há apenas uma coisa que
importa agora.
— O que, pai? Me diga. Se o senhor acha que não seria capaz de
tentar qualquer coisa para ter Audrey de volta, está enganado.
Papai me analisa, como se estivesse tentando ver através de mim, a
veracidade das minhas palavras.
Será que ele ainda desconfia de mim?
Ele desconfia que estou apenas blefando?
Ele então solta um suspiro, e diz:
— Há quatro dias, fui até à feira com Jane. Eu queria passear um
pouco, mas não saí do carro porque havia muitas pessoas. Jane foi só e
fiquei no carro com o motorista. E… Bem, eu… Eu vi a Audrey. Ela está na
cidade. E… Filho, ela está grávida. Muito, mas muito grávida — ele
enfatiza fazendo um gesto de bola com os braços em frente a barriga.
Mas não dou muita atenção depois do “grávida”. Fico paralisado, com
os pés colados ao chão, sentindo como se uma avalanche estivesse prestes a
colidir contra mim.
Sinto meu coração afundar dentro do peito, junto com um frio que
abraça minhas entranhas. E, de repente, estou hiperventilando, sentindo que
o mundo ao meu redor está se encolhendo.
Audrey, grávida?
O suor escorre pela minha nuca, mesmo que o clima esteja agradável.
— Caramba, você está parecendo um palmito de tão pálido que ficou,
irmão — Ian comenta. — Acho que não precisamos ser nenhum Einstein
para fazer esse cálculo, não é? — meu pai pergunta e eu apenas aceno com
a cabeça.
Não, não precisamos, afinal é uma conta bem simples, na verdade.
Sete meses se passaram desde que vi Audrey pela última vez naquela
manhã, se soma mais dois meses da tarde em que tirei a sua virgindade e
que transamos pela primeira vez, o que dá uns nove meses.
É tão simples, que até mesmo Julian, beirando seus quinze anos de
idade, entende o que isso significa.
Sinto meu estômago embrulhar e não porque Audrey está grávida de
mim, mas porque passei os malditos últimos meses longe, sem estar ao lado
dela nessa fase.
E, de repente, me sinto horrível por isso.
Mesmo Julian estando ao meu lado, ouço a sua voz distante:
— Espera, isso significa então que… Eu vou ter uma irmã?
— Ou irmão — Ian completa.
Porra!
Ok, isso é o limite para mim.
— Preciso ir atrás dela — digo me afastando deles.
— Espera! Você não acha que está bem atordoado para dirigir? — Ian
diz, vindo logo atrás de mim.
— Não vou ficar mais parado, Ian. Fiz isso por Audrey, mas sei que
ela agora precisa de mim.
— Então, por que ela nunca o procurou?
Me viro tão rápido que nem dá tempo dele reagir.
— Porque eu sou um estúpido, um idiota e ela com certeza deve ter
pensado que eu não agiria de outro jeito. Acha que ela se submeteria a uma
humilhação, ainda mais estando grávida?!
— Mas você está agindo.
Sinto água se formando no canto dos meus olhos, expondo meu lado
frágil. Normalmente esconderia isso, mas não agora.
— Estou agindo e muito arrependido por não ter feito isso antes, Ian.
Ele balança a cabeça, como se me entendesse.
Meu corpo todo treme e tudo o que quero é ter o poder de me
teletransportar, porque a cada maldito segundo que passo longe de Audrey,
parece que um pedaço meu foi retirado.
Vejo Ian tirar do bolso da calça jeans uma chave de carro.
— Vamos, deixa que eu dirijo.
Meu irmão passa por mim em disparada e não irei interferir, pois, ele
tem razão, não estou na condição de dirigir do jeito que estou.
Então apenas o sigo.

Não sei qual é a porra do problema com o tempo e a estrada. Estamos


em um Jaguar que corre tão rápido que Ian derrapa a cada curva, pois ele
está dirigindo feito um louco.
Não é preciso de muito para fazer um carro dessa potência correr,
basta um clique da ponta do pé e ele zarpa.
Mas Ian não está sendo nada cauteloso.
Saímos de Malahide em questão de cinco minutos e talvez
chegaremos em dez minutos na casa de Audrey.
— Pensei que você na direção seria mais seguro, porra! — exclamo
enquanto meu estômago embrulha.
Eu já nem sei mais o que me deixa desse jeito, se as últimas notícias,
ou porque Ian está se sentindo fazendo parte do filme Velozes e Furiosos.
— E eu pensei que você estivesse apressado — ele diz
tranquilamente. — Mas relaxa, você tá comigo.
— Esse é o problema, não é?
Meu irmão dá um sorrisinho e ignora minhas reclamações.
— O único problema aqui foi você não ter ido atrás da Audrey bem
antes. Sério, cara. Qual é o seu problema?
Olho para a rua à minha frente e pela primeira vez não me importo
com a velocidade do carro.
— Não sei, só fui muito idiota em pensar que Audrey não iria querer
me ver nem pintado de ouro. Mas depois quando finalmente criei coragem,
já era tarde demais, não a encontrei em lugar algum, principalmente na sua
casa, que é para onde estamos indo agora.
— Bom, se ela te ama, realmente deve ter feito muita falta. Isso é
horrível.
— Obrigado pelas palavras de conforto — ironizo.
— Conte comigo para tudo. Mas, sério, não passou pela sua cabeça
em nenhum momento que Audrey poderia querê-lo de volta?
— É claro! Inúmeras vezes. Por isso me arrependo de não ter feito
isso logo nos primeiros dias após voltar para Londres. Eu só queria dar um
tempo para aquela situação e descobri que não foi a melhor escolha.
— Com certeza não foi.
— E se ela estiver bem sem mim? E se ela já estiver com algum cara
que de repente resolveu assumir esse bebê? — Quero pular para fora do
carro em movimento só em pensar nessa possibilidade.
— Acha que existe esse tipo de cara na Irlanda? — Ian zomba. —
Honestamente, só dela estar grávida eu duvido muito que algum cara tenha
se aproximado. Quer dizer, você marcou território, sabe? Ah, não ser que já
tivesse alguém interessado nela bem antes. Tinha? — pergunta tenso.
— Não, eu fui o primeiro homem na vida da Audrey — respondo
olhando para ele.
— Ah. — Meu irmão arfa e então seu semblante muda várias vezes,
de surpreso para confuso, e então, algo se ilumina em sua face. — Ah!
Entendi.
— Santo Deus, Ian. Como você pode ser a pessoa mais inteligente na
nossa equipe petrolífera?!
— Olha, só porque sou o irmão mais inteligente e bonito, não
significa que deva saber de tudo, não é?
Sorrio para ele.
Só Ian para me fazer sorrir em momentos de tensão.
Mas não adianta muita coisa porque volto à estaca zero quando
entramos no bairro em que Audrey mora.
Algo dentro da minha garganta está travado. Principalmente, quando
vejo sua casa, simples e humilde, mas parece ter uma energia diferente
desta vez.
O pequeno jardim da frente está feito, com mais vida. Nenhum som
alto toca como da última vez em que a vi ali. Talvez, ela nem esteja em
casa, mas a esperarei, nem que precise acampar na sua porta.
Das outras vezes eu apenas batia à porta e a sua mãe nunca estava. O
trabalho dela como cozinheira a fazia trabalhar para diversas famílias e a
noite era mais difícil ainda de encontrá-la porque provavelmente acabava
dormindo na casa dos patrões.
Depois de um tempo, um vizinho me falou que ela viajou, mas que
não falou para onde.
Todo aquele suspense faltava só me matar
— É aqui — digo mais para mim mesmo do que para Ian.
— Já pensou no que vai dizer para ela, além de dizer “Como está o
meu bebê”?
— Não serei rude nesse nível. Você faria algo assim?
— Nem sonhando.
Desafivelo o cinto, pronto para sair.
— Que bom para você. Mas, se encontrá-la aqui será pura sorte, então
apenas me deseje isso, ok? — digo saindo do carro.
— Boa sorte, mas eu vou com você — diz já me seguindo.
— Isso é algo muito pessoal, Ian — digo já impaciente de suas
gracinhas.
Isso é sério!
— Prometo que não vou me intrometer, mas só vou garantir que ela
não pule no seu pescoço, caso queira esganar você.
Fico olhando para ele.
— Eu vou ficar bem ali, naquela moita. — Aponta e reviro os olhos.
— Tem certeza de que somos irmãos? — Viro em direção a casa de
novo e então sigo até à porta, parando sobre o carpete de boas-vindas.
Minha respiração fica mais pesada e o coração bate na boca, mas
respiro fundo e bato duas vezes contra a superfície.
Não ouço ninguém, além do som de algo se arrastando contra o
assoalho, como uma cadeira.
Isso é um bom sinal.
Pela primeira vez terei uma resposta e alguém abrirá a porta para
mim.
“Audrey está na cidade.”
Me preparo, mas internamente. Não consigo, por mais que queira,
transparecer segurança, porque não há segurança de nada nessa situação.
Eu quero que Audrey veja o estado em que estou, que ela possa
enxergar a minha dor através da minha postura.
A porta abre e Audrey ilumina o espaço que a enquadra. Ela fica
pálida e o brilho some na mesma proporção em que apareceu.
Me sinto horrível, pois ela detestou me ver.
Sei disso.
— Oi — digo completamente estático.
No entanto, Audrey permanece imóvel e calada. Exceto pelo
movimento repentino que faz ao tocar a barriga.
E que barriga!
Está tão grande e pontuda!
— Audrey… E-eu…
— O que faz aqui? — pergunta tão seco que meus olhos lacrimejam,
como se ela tivesse jogado areia contra mim.
No entanto, parece tão assustada quanto eu.
Por mais que o seu barrigão de grávida chame atenção, eu só consigo
olhar para o seu rosto.
Linda...
Ela está mais linda ainda.
O rosto mais redondo devido a gestação, seu olhar brilha e a sua pele
tão limpa e macia.
Boneca...
Ele sempre pareceu uma boneca de tão perfeita.
— Essa não é nem a primeira vez que apareço, foi tão difícil
encontrá-la. Você não faz ideia do tanto te procurei.
Ela respira fundo e alisa a barriga mais uma vez. A sua feição se
contrai, como se ela estivesse sentindo algo.
Surpresa?
Sim, ela está estão surpresa que pode chorar.
— Jeremy… — Ela tenta dizer algo, mas a interrompo.
— Não, Audrey. Da última vez eu não disse nada e você falou tanto.
Agora está na minha vez de falar e preciso que você me escute, senão não
sei que tipo de homem além de covarde eu serei se fugir disso mais uma
vez.
Audrey movimenta a cabeça suavemente, tão tensa, o que parece ser
um sim, então continuo:
— Eu deveria entender que o seu sumiço significasse que queria
evitar qualquer tipo de contato.
“Eu deveria entender que as coisas que aconteceram no verão,
ficaram no verão. Mas eu não estava satisfeito, porque não era justo que
terminasse daquele jeito.
“Não era justo que terminasse.
“Independentemente da coincidência que acarretou a confusão entre
nós dois, não quero que nada se resuma a isso, porque vai além, Audrey.
“Eu senti na pele e na alma durante esses últimos meses que com
certeza esses sentimentos complexos não eram para mascarar dores
antigas”.
— Jeremy, eu… — Sua voz parece transpassar dor e demonstra que
ela irá chorar a qualquer momento.
“Será que ela está acreditando em mim?”
— Eu preciso de você, Audrey. A única saudade que quase me
dilacerou, foi a sua, porque foi exatamente com você que pude me sentir
bem novamente.
“A sua linda e pura alma.
“E porque sei que você também quer isso com a mesma força que eu.
“Criamos algo que apenas nós dois somos capazes de sentir e
entender”.
— Jeremy… E-eu. — Audrey faz uma careta, parece não conseguir
respirar.
— Audrey? — Dou um passo na sua direção.
Ela solta um gemido de dor e água escorre por suas pernas, molhando
o chão, deixando suas pernas trêmulas.
Fico estático, com um silêncio rompendo entre nós dois.
— Eita, porra! — Ian diz inesperadamente ao meu lado.
Mas o ignoro e Audrey me olha assustada, pois sabemos o que acabou
de acontecer.
— A bolsa estourou — ela verbaliza.
Audrey solta um grito de dor e antes das suas pernas cederem, a
levando direto para o chão, a seguro em meus braços. Ela se apoia em mim,
enquanto a conduzo até o sofá mais próximo. No entanto, se recusa a ficar
deitada.
— As contrações estão fortes? — pergunto a ela.
— Está doendo muito, Jeremy! — ela avisa, já suando horrores. —
Eu posso senti-los.
— Sentir o bebê saindo? — Ian pergunta preocupado.
— LIGA PRA AMBULÂNCIA, IAN! — grito com o meu irmão.
— Por que não a levamos no carro, droga?
— VOCÊ ACHA QUE VAMOS CONSEGUIR LEVÁ-LA EM UM
JAGUAR?! — grito de volta.
— Meninos…
— EU NÃO PAGUEI MILHÕES NESSE CARRO PARA NÃO SER
CAPACITADO NEM PARA ACOMODAR UMA MULHER EM
TRABALHO DE PARTO! — meu irmão grita inconformado.
Olho para ele por cima do ombro.
— Liga para a ambulância — sibilo para ele como se fosse uma
ameaça.
— Ok. Ok.
Quando ele se afasta, Audrey se inclina.
— Não vai dar tempo, Jeremy. Não vai dar. Não vai dar — ela avisa
desesperada.
Olho atentamente para ela e colo minhas mãos contra o seu rosto.
— Meu amor, me diga o que está acontecendo — digo com mais
calma, ciente de que o pânico não ajudará em nada.
— Os bebês já estavam perto de nascer, o momento é agora e vai ser
rápido…
— Espera, bebês? — Fico imóvel e Audrey me olha.
— Um casal de gêmeos.
Engulo em seco.
Por céus!
Audrey não espera só um bebê, mas dois!
Isso significa que o parto será diferente e um pouco arriscado
também. Mas do jeito que ela já está entrando em trabalho de parto, não sei
se teremos tempo.
— Audrey, preciso ver como isso está.
— Você precisa ver? — Ian repete, parecendo bastante nervoso. —
Você é parteiro agora por acaso? Já chamei a ambulância e já está vindo!
— Acontece que Audrey vai ter gêmeos, por isso ela não pode ficar
sentindo dor e muito menos segurando os bebês ali dentro enquanto o parto
deve acontecer de forma natural!
— Ah, claro. E você entende tudo sobre isso agora!
— Eu tenho um filho, Ian. Esqueceu?
Presenciei o nascimento de Julian, mas quando os médicos viram que
Sofia estava em um estado complicado, me retiraram imediatamente da
sala.
Foi a última vez que a vi com vida, naquela sala de cirurgia, com
Julian chorando ao fundo e uma agitação que me causa pânico até hoje.
Não quero viver aquilo de novo.
Eu sei que a primeira experiência não tem nada a ver com essa, mas o
que tiver de ser feito, eu farei. Não posso perder Audrey, não posso perder
nossos bebês.
Eu lutarei e farei qualquer coisa por eles.
— Audrey, meu bem, você confia em mim? — pergunto um pouco
receoso, porque não sei se ela irá ou não aceitar a minha ideia.
Ela fica me olhando, enquanto lágrimas já se misturam ao suor.
Sua respiração está completamente exaurida, como se estivesse há
horas sentindo a dor da contração.
No entanto, Audrey sacode a cabeça.
— Eu confio, sim. Por favor, Jeremy, faça essa dor parar.
Me aproximo dela, unindo nossas testas e inalo seu perfume que tive
tanto medo de nunca mais sentir novamente.
— Eu farei, meu amor. Venha. — Levanto e coloco algumas
almofadas sobre o chão depois ajudo Audrey a se levantar e então a ficar
agachada até que se deita no chão.
— Jeremy, o que você está fazendo, porra? — Ian se agacha logo
atrás de mim, enquanto eu me posiciono entre as pernas de Audrey que
inclino cuidadosamente.
— Ian, esses bebês têm que nascer agora. Não há tempo. Audrey só
estava esperando esse momento, e por Deus, que sorte estarmos aqui!
— Sorte? — Ian pergunta com a voz trêmulo, nervoso.
Olho para Audrey que parece estar tão atordoada que tem apenas um
único objetivo e mais nada além disso parece importar.
Enfio minhas mãos debaixo do seu vestido e puxo a sua calcinha
molhada devido ao líquido amniótico.
A imagem é clara.
— I-isso… É… — Ian balbucia atrás de mim e tudo o que ouço
depois é um forte baque contra o chão.
Olho por cima do ombro e vejo meu irmão caído.
— Ele desmaiou? — Audrey pergunta.
— Ele não está acostumado a fortes emoções — comento.
— Nem eu — Audrey completa.
Dou um sorriso para ela, me sentindo nostálgico com as nossas
conversas.
Olho então de novo para a entrada de Audrey, onde já posso ver a
cabeça do bebê despontando.
— Preciso que você comece a fazer força, ok? Estou vendo a cabeça
do bebê, você vai conseguir, Audrey.
Ela balança a cabeça, pois não consegue falar muito, mas então faz
força e grita como se a sua vida toda dependesse desse único esforço.
E então ela faz de novo e de novo.
Audrey empurra, faz força e por um segundo, acho que ela não será
capaz de conseguir fazer isso do jeito mais natural possível, principalmente
quando sangue começa a sair dela.
Porra, juro que meu coração já está prestes a sair pela boca de tão
nervoso, mas preciso ser forte por ela.
Preciso transmitir segurança e confiança, antes de qualquer coisa.
— Isso, meu amor. Você está indo muito bem, Audrey. Vamos colocar
mais força, ok?
Ela tenta de novo e quando a cabeça do bebê pula para fora, me
prontifiquei a ajudar, segurando sua cabecinha.
— Respire fundo três vezes e então empurre, Audrey.
Ela respirou três vezes e então empurra.
— Empurra! Empurra!
Faço o que posso enquanto seguro a cabeça do bebê. E, vejo quando
aos poucos, seus ombrinhos deslizando para fora, então seu corpinho todo
sai acompanhado do cordão umbilical.
É uma menina e ela chora desesperadamente.
Não contenho o sorriso em pegar a minha filha pela primeira vez nos
braços.
Tão linda, de cabelo escuro igual ao da mãe.
Quando olho para Audrey, ela chora e sorri, completamente
fascinada.
Me inclino até ela, onde cuidadosamente deixo a bebê em seu
aconchego.
— Oi, filhota. Seja bem-vinda — digo sorrindo.
— Co-como sabe que… — Audrey me olha, espantada.
— Eu sinto que é. Parece óbvio, mas quando eu soube, tive apenas a
certeza antes mesmo de pensar sobre qualquer coisa.
— Não está zangado comigo?
Dou de ombros.
— Estou feliz, Audrey. Neste momento eu só estou feliz.
Ela concorda e solta um suspiro reconfortante.
— E como ela irá se chamar? — Quer saber.
Olhando para a filha, Audrey sem desfazer o sorriso responde:
— Allegra.
— É um nome muito bonito.
Ela me olha e por mais que não diga nada, seu olhar conversa comigo.
Audrey parece estar feliz, grata.
No entanto, uma dor a acomete, e, de repente, é Audrey e Allegra
fazendo barulho, mas eu não ligo.
Volto e vejo que o segundo bebê já está a caminho, tão apressado,
como se ele não quisesse ficar para trás.
— Vamos lá, meu bem. Você já se mostrou ser muito forte, conseguiu
da primeira vez e vai conseguir agora, Audrey. Força!
Agora que tem Allegra em seus braços, Audrey parece estar mais
empenhada em trazer o segundo ao mundo. Como uma mãe selvagem e
guerreira, ela empurra dando tudo de si. Nada parece a abalar e depois
disso, será necessário algo muito, muito forte mesmo para derrubar Audrey.
Ela respira, empurra e o bebê já desponta dela.
Por um momento, penso que ela não aguentará, quando chora e prevê
fraquejar.
Mas avanço um pouco mais para o seu lado e seguro a sua mão livre
enquanto não tiro os olhos do segundo bebê.
Audrey aperta a minha mão com força e posso sentir toda a sua
energia em cada força que ela aplica para o beber nascer.
E é em uma dessas forças que a cabeça dele sai. Eu o seguro no
mesmo instante com a minha outra mão livre.
— Ele está vindo, Audrey — aviso. — Só mais um pouco, só mais
um pouco.
Ela empurra e então vem.
O segundo bebê sai com mais vontade, afobado, como se não quisesse
mais perder tempo para conhecer o mundo e o aconchego de sua mãe.
Pego meu filho nos braços que chora em soluços.
Não é tão escandaloso quanto Allegra.
Sua mãozinha segura meu dedo assim que o aproximo do meu corpo.
— Oi, filhão, seja bem-vindo. Vamos conhecer a mamãe?
Quando levo o bebê para os braços de Audrey, o som de sirenes soa
ao longe.
Nos olhamos sabendo que já terminou e que está tudo bem.
— E como ele irá se chamar? — pergunto, admirando a cena de
Audrey com os gêmeos nos braços.
— Eu ainda não escolhi um nome. Sempre pensei que você pudesse
escolher, mesmo sabendo que seria difícil nos reencontrar de novo.
Olho para Audrey e sinto algo muito forte tomar conta de mim.
Esperança...
Ela sempre teve esperança sobre nós dois, sobre a nossa família.
— Está chorando, Jeremy?
Dou então um beijo no topo da sua cabeça.
— Obrigado, Audrey. Saiba que eu amo você e que este momento
significa muito para mim.
Ela não diz nada.
Mas também não esperava que dissesse algo logo agora.
Estou completamente anestesiado, domado por sentimentos e
emoções únicas que fazem desse momento algo especial demais para poder
conseguir digerir tudo muito rápido.
Eu não tenho olhos a não ser para meus filhos e Audrey. Meu mundo
todo está bem aqui.
— Ethan. Ele pode se chamar Ethan, é um nome muito bom — digo
por fim.
— Ethan — ela repete. — Gostei. É lindo.
Ouvimos quando a ambulância para na frente da casa e Ian cambaleia
enquanto acorda, totalmente atordoado.
Ele pisca os olhos na nossa direção e sorri quando pergunta:
— O que perdi?
Quando descobri a existência dos meus filhos dentro de mim, foi uma
surpresa não muito inesperada.
Acho que, lá no fundo, sabia que as minhas diversões desprotegidas
com Jeremy acabaria em algum momento desse jeito.
Eu os amei no primeiro segundo, apesar de toda confusão na minha
cabeça.
No meio do caminho, tive que ser forte porque cheguei a imaginar
que seria apenas nós três contra o mundo.
Ok, eu dava conta.
Já éramos uma família, uma unidade, e o mais importante de tudo,
não precisávamos de ninguém, porque o amor já bastava.
Eu sabia que independente da situação, se eu amasse os meus bebês,
eles teriam tudo.
E quando eles nasceram, descobri o amor incondicional de uma mãe.
O primeiro olhar e o primeiro toque.
Aquilo significou tanto para mim, que não consigo nem colocar em
palavras. Mas o meu coração cresceu, senti que ele se encheu de algo puro e
terno.
Admito que amo olhar para eles o tempo todo, além de tocar e sentir o
cheirinho deles.
Parece ser o paraíso.
Acho que ser mãe foi a maior reviravolta que a minha vida poderia
dar, porque finalmente, me senti alguém especial, tão importante que de
repente o mundo pareceu se tornar um lugar melhor.
E por mais que admitisse que tudo isso se dê por conta da
maternidade, devo confessar que Jeremy tem uma parcela de culpa nisso
também.
Pois, ele finalmente me encontrou.
Não que estivesse me escondendo dele, mas parece que a vida decidiu
nos unir em um evento em que nossas vidas se tornariam especiais e
decisivas.
Ele apareceu na minha porta e, pela primeira vez, não parecia ser
aquele homem dominante, líder que estava sempre acima de todos.
Não, Jeremy parecia apenas um homem triste, desesperado e
completamente rendido a qualquer coisa que eu ordenasse.
Vê-lo de novo depois de meses não só mexeu com o meu coração,
como fez a minha bolsa estourar, o que só mostra como nossas emoções
têm grande influência sobre o nosso corpo.
De qualquer forma, a última coisa que poderia imaginar era que eu
daria luz aos gêmeos na sala de casa, com Jeremy fazendo o parto.
Ele foi essencial naquele momento e por um segundo parecia até que
ele só estava arrumando a bagunça que fez.
Mas Jeremy estava sendo mais do que isso.
Ele estava sendo pai e estava tentando me proteger também, o que foi
algo que mexeu bastante comigo.
Eu não conseguia olhar direito para a cara dele, aliás, não contei sobre
a gravidez e agora ele está aqui, babando nos filhos que descobriu a
existência há umas cinco horas, fez o parto e agora dá amor e carinho como
se sempre soubesse da existência deles.
Eu deveria estar aliviada por ele simplesmente estar bem com isso,
mas ainda fico tensa.
Depois que os gêmeos nasceram, fui levada para a ambulância e
Jeremy ordenou que eles me levassem para o melhor hospital de Dublin.
E aqui estamos nós, em um quarto privativo super chique, com
enfermeiras e uma obstetra nos dando atenção redobrada.
Graças a Deus está tudo bem com os gêmeos e eu.
A obstetra e até mesmo os socorristas por diversas vezes
parabenizaram a coragem e os conhecimentos de Jeremy, pois aquela
situação não teria dado em outra. Os bebês nasceriam de qualquer jeito, mas
o apoio e auxílio dele fez toda a diferença.
E isso me enche de orgulho.
Além do fato dele não ter se afastado desde então.
O parto me exauriu tão profundamente que dormi direto, assim como
os bebês.
Eles estavam cansados, de alguma forma.
Quando acordo, o quarto está em total silêncio e há tantos buquês de
rosas brancas espalhados pelo quarto, além de balões de boas-vindas e do
cheirinho único de bebê.
Olho incrédula para a decoração nova que não estava ali antes, mas a
minha atenção se prende a Jeremy, deitado na poltrona reclinável, dormindo
em paz.
Droga, ele continua estupidamente lindo!
O homem que um dia achei tão inalcançável, agora está aqui, no
mesmo quarto de hospital que eu após ter me ajudado no nascimento dos
nossos gêmeos.
Allegra dá um gemidinho, ela tenta coçar o nariz, mas cada
movimento parece uma novidade. Ela está enroladinha em um cueiro rosa,
parece até um charutinho.
— Oi?
Ouço Jeremy dizer já de pé.
Parece que ele também foi despertado pela filha.
— Oi. Allegra acordou você?
— Não, tudo bem. Estava só dando um cochilo, não era nada
profundo — diz enquanto se aproxima. — Conseguiu descansar?
— Acho que sim. Mas acho que devo tirar a palavra descanso do meu
vocabulário, agora sou mãe.
— Você vai tirar de letra, garanto. E outra coisa que posso garantir é
que você não fará isso sozinha.
Ensaio um sorriso gentil, pois apesar de tudo, sei que Jeremy se
mostrará um excelente pai.
— E o que significa tudo isso? — pergunto me referindo aos agrados.
— Bem, isso se chama tios entusiasmados com a novidade e uma tia
muito babona que tem um fascínio enorme sobre a maternidade.
Sei que ele fala dos irmãos e Meredith, então desta vez sorrio mais.
— Diga a eles que agradeço, é muito fofo.
— Você mesma pode fazer isso — diz dando uma olhada no relógio
de pulso. — Às seis da noite tem visita, então aposto que vão aproveitar a
oportunidade.
Hum, visita?
Droga!
Pessoas preocupadas com os gêmeos…
E comigo, aparentemente, mesmo com as circunstâncias visivelmente
delicadas.
— E a minha mãe?
— Está em casa, também irá aparecer mais tarde. Mas está tudo bem,
Audrey, não há com o que se preocupar. Aproveita para descansar porque
você gastou todas as suas energias, mas foi muito corajosa e forte, isso eu
garanto. Se quiser, posso dizer que você não está a fim de receber visitas.
— Não, tudo bem. Acho que vai ser bom receber visitas.
Um brilho ilumina o rosto de Jeremy, como se ele estivesse tão
orgulhoso de tudo o que diz, ou simplesmente tão feliz que isso já emana
dele.
— Obrigada, Jeremy, pelo que você fez hoje por mim e pelos gêmeos.
Ele fica me olhando, como se eu tivesse dito alguma asneira.
Jeremy se aproxima pela esquerda, perto da incubadora de Ethan,
logo ao lado da minha cama.
— Você não precisa agradecer, Audrey. Essa era simplesmente a
minha missão e eu a cumpri, como tinha de ser feito.
Comprimo os lábios me sentindo tensa.
Meu Deus, ele sempre tão cordial e generoso!
— Me desculpa por isso também. Você ficou tantos meses sem saber
da minha gravidez, não se sinta obrigado a aceitar isso só porque é o pai.
— Você tá brincando, não é?
Fico imóvel, sentindo meu rosto esquentar em vergonha.
— Audrey, sou homem o suficiente para assumir as minhas
responsabilidades. Mesmo que não sentisse nada que sinto por você, saiba
que ainda estaria aqui.
Não consegui tirar da minha cabeça a sua declaração também.
Lembro que Jeremy parecia estar desesperado pelo meu perdão, como
se ele tivesse cometido um crime muito grave.
A essa altura, eu nem estava mais tão zangada como antes, mas era
estranho pensar que nos últimos meses ele não veio me procurar.
— Eu queria ter contado, mas… É complicado, Jeremy. Não sei se
um dia você entenderá o meu lado, mas quando você é um homem podre de
rico e eu uma pobretona que aparece grávida, isso só quer dizer uma coisa.
— Que os dois foram irresponsáveis na hora do sexo — ele brinca e
imagino que esteja querendo apenas descontrair o clima, ou me fazer sorrir.
O que dá certo.
— Não! E sim, mas… Você sabe, golpe é a primeira coisa que eles
falam.
— Eu não teria pensado nada disso, porque conheço a sua índole,
Audrey. Eu sempre soube com que tipo de pessoa estava me envolvendo.
— E mesmo assim, você teve tanta dificuldade em me encontrar. —
Lembro de quando ele disse que ficou me procurando pelos últimos meses.
Ao notar a minha dúvida, Jeremy se aproxima mais e se inclina sobre
a minha cama, na intenção de chegar mais perto de mim.
— Acredite, Audrey, eu vim atrás de você. Pergunte aos seus
vizinhos. Talvez eles já estivessem prestes a me denunciar. Mas estive aqui
muitas vezes atrás de você, mas parece até que não era o momento certo,
pois sempre dava errado. E justamente hoje…
— A sua aparição surpresa foi o que induziu o meu corpo a se
preparar para o parto, Jeremy — comento e ele me olha como se tivesse
ciência disso também. — Ver você depois de meses me causou uma emoção
tão forte que até a minha bolsa estourou.
— Será que isso significa que você ainda sente algo por mim? — ele
pergunta com a voz rouca e um pouco sôfrega também.
— Você fala como se deixar de sentir um sentimento tão forte fosse
tão fácil assim. Sofremos o mesmo período. Você é capaz de dizer que
ainda sente algo por mim? — rebato.
Vejo a pupila de Jeremy dilatar e ele dizer com fervor:
— Cada célula do meu corpo e cada fibra do meu coração vibra por
você, Audrey.
É preciso segurar o choro, por isso passo a língua em meus lábios
ressecados e então abaixo a cabeça para que ele não veja meus olhos já
úmidos.
Por meses, pensei que Jeremy havia me esquecido, que eu havia sido
apenas uma versão atual de Sofia e que ele não sentia nada pela Audrey e
por isso eu cairia facilmente no seu esquecimento. No entanto, estava
enganada.
— Eu vivo a cada hora, a cada dia, pelo seu perdão, por um recomeço
e que você principalmente acredite em mim, Audrey. Não tem sido fácil nos
últimos meses e sei que na minha posição é difícil conseguir provar tudo o
que eu digo, mas agora eu sei que tudo depende de você — ele completa
segurando a minha mão esquerda com gentileza.
Seu toque quase me desfaz.
É incrível as ondas de energia que ele envia pelo meu corpo como se
fosse o tipo de recarga que precisasse para me sentir bem.
Olho para Jeremy de novo, ciente de que verá os meus sentimentos
mais vulneráveis desta vez.
Mas não me importo e apenas decido confessar o que aconteceu:
— Quando descobri que estava grávida, tive medo de que você não
aceitasse, porque eu era apenas um caso seu, não tínhamos nada de especial
e você tinha tantos problemas para lidar. Mas aí, no final do último tempo,
eu vi quem realmente era Jeremy O’Donnell e tive certeza ali que você
nunca soltaria a minha mão, mas acho que nenhum de nós dois contava com
aquele imprevisto. Eu ia contar, Jeremy, mas depois achei melhor não. Fui
egoísta, queria você só para mim, queria que eu fosse sua e que não
pensasse que eu pudesse ser outra pessoa. Quis ser única, mas você não
veio. Esperei por você, mas a sua demora só queria dizer uma coisa, você
não se importava.
Ele balança a cabeça, em contraponto.
— Foi nas primeiras semanas que mais errei. Deveria ter ido atrás de
você naquele momento, Audrey. Mas assim como você, estava confuso, me
sentindo culpado e me achando merecedor de seu desprezo.
“Quando decidi que eu a amava e que aquele sentimento me
consumiria se eu não a tivesse em meus braços, já era tarde. Eu não
conseguia encontrar você em lugar algum da Irlanda.”
Esboço um sorrisinho, só de pensar em como isso é trágico, mas
cômico.
— Eu estava no País de Gales, em Tregaron, para ser mais exata.
Jeremy franze o cenho como se tivesse provado algo azedo.
— Tregaron? O que você fazia naquele fim de mundo?! — exaspera e
sorrio mais ainda.
— Uma velha amiga me chamou para cuidar da casa dela. Ela havia
se mudado com os pais e não estavam achando um comprador, então me
pagavam para ficar na casa e a apresentava aos possíveis compradores.
— Eles não podiam simplesmente pagar uma agência imobiliária
especializada nisso?
— Sairia caro. — Encosto a cabeça no travesseiro.
— Então você basicamente aceitou morar em um lugar estranho por
um pagamento miserável?!
Jeremy está indignado e com razão, afinal mamãe também teve o
mesmo receio nas primeiras semanas.
— Só fui porque sabia que era uma forma de manter a cabeça limpa.
Sabe, eu fiquei em Dublin por um mês esperando um sinal seu, quando não
tive nada e essa oportunidade surgiu, achei que seria melhor assim.
Os ombros de Jeremy relaxam, como se ele tivesse compreendido o
meu lado.
— Ou seja, continua sendo tudo culpa minha — ele afirma.
— Não vai me culpar por não ter contado sobre a gravidez?
— Não há o que culpar, Audrey. Você estava magoada e isso é
compreensível. Não posso culpar você por isso na intenção de igualar
nossas escolhas e ações.
— Você sempre foi tão bondoso e gentil comigo. Às vezes, nem
acredito que você é real.
Jeremy dá um sorriso abobalhado.
— Sou tão real que sou falho, pequena — completa beijando o dorso
da minha mão.
Estreito os olhos para ele, ciente de que também falhei.
— Sabe naquela manhã em que descobri as fotos?
— Você não precisa relembrar isso agora, Audrey — avisa, como se
estivesse tenso.
— Tudo bem, eu só queria que você soubesse que eu estava xeretando
as suas coisas, eu… Bem, talvez eu estivesse, mas como você ia embora
naquela manhã, eu só queria ter alguma coisa para lembrar de você no
tempo que ficasse fora. Tentei levar uma gravata e foi quando descobri o
fundo falso e a caixa. Me desculpa.
Sua mão estica até o meu rosto e afaga a minha face que se deleita
com seu toque.
— Ei, não precisa se desculpar. Aquele foi o lugar mais seguro que
encontrei para manter as fotos escondidas de Julian — conta e isso me faz
ficar curiosa.
— Por que você esconderia as fotos da mãe dele?
Jeremy recua e então se vira um pouco enquanto parece ir para um
lugar distante em sua mente.
— Quando Julian tinha sete anos, ele gostava muito de ver as fotos da
mãe como lembrança. Tínhamos várias delas pela casa.
“Certa noite, quando todos já estávamos dormindo, Julian capturou as
fotos da mãe e levou tudo para o seu quarto.
“Nesse mesmo dia, houve um evento do Dia das Mães na escolinha e
ele ficou chateado por ser o único da turma por não ter mãe.
“Parece que alguns garotos haviam dito que Sofia havia o
abandonado e nunca mais voltou.
“Naquela mesma noite, ele decidiu queimar as fotos da mãe, mas o
fogo acabou pegando no carpete e um incêndio se iniciou”.
Sinto a boca do meu estômago se fechar só de imaginar a situação
extremamente perigosa.
— Julian ficou em estado de choque com as chamas, não conseguia se
mover e por isso acabou inalando bastante fumaça. Ian foi o primeiro a
chegar lá e conseguiu tirá-lo do quarto, mas… Enfim, cheguei bem depois.
“Ciente de que estava tendo um incêndio, eu já tinha um extintor em
mãos, mas o desespero que senti me perturba até hoje em meus pesadelos.
“Foi quando decidi esconder as fotos que permaneceram intactas, mas
não consegui me livrar delas, pois seria uma falta de respeito.
— Jeremy, o que aconteceu com o Ian? — pergunto quando percebo
que ele não quer contar o resto.
Nem me importo em estar sendo inconveniente, apenas pergunto.
Ian é um amigo e tio dos meus filhos, no final das contas.
— Ian se queimou nas costas, queimadura de terceiro grau. Foi
horrível, Audrey, a cena do meu irmão caído no chão, gritando de dor. Até
hoje ele tem uma insegurança terrível por conta das cicatrizes, fora o
trauma. Não lembro de ter visto Ian sem blusa nos últimos anos.
— Meu Deus, Jeremy. Eu não sabia de nada disso. — Estou em
choque.
— Não tocamos muito no assunto, ainda mais por causa de Julian. Ele
era muito pequeno e não lembra de muita coisa. Acho que nós também não
falamos porque é horrível lembrar. O fogo foi controlado, mas Ian carrega
as cicatrizes desse dia até hoje. Era pra ter sido eu, Audrey.
Me ergo ainda na cama até estar mais perto dele, sentindo o meu
coração na mão com o seu relato e a culpa.
Jeremy parece ser um boneco de pano, onde há várias agulhas o
perfurando, devido a culpa de coisas que aconteceram na sua vida e que não
remetem a ele nenhuma responsabilidade.
Ergo minhas mãos até o seu rosto, para que ele olhe em meus olhos.
— Você não precisa se martirizar por tudo o que acontece, Jeremy.
Pare já com isso.
— Sou culpado de quase ter perdido você para sempre, por causa de
um erro bobo! — diz com a voz embargada e juro que ele está prestes a
chorar.
— Mas não perdeu, ok? Eu estou aqui, seus filhos estão aqui, Jeremy.
As suas mãos se fecham nos meus pulsos, estamos presos um ao
outro.
— Você está aqui, mas, está comigo, Audrey?
Olho para ele, sentindo a sua dor.
Umedeço meus lábios e então encosto a minha testa na dele.
— Eu preciso ser forte agora, Jeremy. Preciso me organizar, agora sou
mãe, quero fazer isso direito. Principalmente relacionado a nós.
— Entendo, Audrey, de verdade. E acho que você está fazendo a
coisa certa.
Sinto tristeza na sua voz, então logo trato de explicar:
— Mas eu adoraria ser forte ao seu lado, Jeremy. Somos os pais de
dois bebês agora, estamos conectados de qualquer jeito, certo?
— Certo.
Posso sentir sua respiração contra a minha, o seu hálito me invadindo
e a presença do seu corpo tão perto do meu, me deixando nas nuvens.
Mordo o lábio, lembrando de como éramos quando estávamos juntos,
chamas e amor.
— No que está pensando, Audrey? — pergunta com a voz rouca,
como se soubesse exatamente a resposta.
— Em você — respondo naturalmente. — O tempo todo, sabe?
Nunca deixei de pensar em você, Jeremy.
Sinto quando seus dedos se apertam em volta do meu pulso como
resposta.
— Eu também não conseguia. Você sempre foi a garota que invadia
os meus sonhos e ainda é até hoje. Por favor, me prometa que não vai se
afastar de novo.
Me afasto dele, só para ver melhor o seu rosto.
Jeremy parece implorar.
— Prometo, Jeremy.
— Que bom, porque não pode ser hoje, mas juro que ainda irei te
reconquistar, pequena.
Ele se inclina na minha direção e, inesperadamente, deposita um
selinho gentil e impactante em meus lábios. Como uma promessa de que em
breve haverá mais.
Não o questiono sobre isso, pois quero ajeitar as coisas, ainda mais
agora que temos os gêmeos.
Poderia simplesmente manter o meu orgulho, no entanto, nos meses
em que pensei que Jeremy não estava nem aí para mim, sofri e ele também
sofreu.
Foi tempo demais negando o óbvio.
Agora que estamos aqui, não dá para fugir disso. Eu não quero e
Jeremy também não, então tudo o que podemos fazer, é tentar mais uma
vez, mas com cautela.
Será um processo de adaptação e aceitação.
— Está tudo pronto, senhor.
Sou informado por telefone de que os quartos dos gêmeos estão
prontos na nossa mansão de Dublin.
— Ótimo, muito obrigado pelo serviço de vocês. Chegaremos em
breve — anuncio antes de encerrar a ligação, guardando o celular no bolso
da frente do meu jeans.
Audrey ajeita as bolsas dos gêmeos, mas para o que está fazendo para
me olhar curiosa.
Ela cruza os braços em frente aos seios e me olha de forma
avaliadora.
— Então é isso? Quer mesmo que a gente fique lá?
— Por que não ficariam? Não que esteja invalidando a sua casa, mas
na mansão você pode dispor de mais descanso, além de que terá a rede de
apoio necessária que precisa para seu puerpério ser saudável.
Ela fica me olhando e então dá um sorriso de lado.
— O quê? — pergunto um pouco confuso ao me dar conta de que ela
está rindo de mim.
— É engraçado ver você falando desse jeito. Perde a postura de CEO
e faz parecer ser um homem… Comum.
— Hum, isso é bom ou ruim? — indago curioso.
— Bom. Excepcionalmente bom — completa e percebo que o olhar
de Audrey, na verdade, é de pura admiração.
Hoje faz três dias que estamos na maternidade, mas também é o dia
que estamos deixando o local.
Os bebês estão bem, passaram em todos os testes possíveis, assim
como Audrey.
A obstetra me parabenizou diversas vezes pelo trabalho bem-feito na
hora do parto.
Eles a examinaram e descobriram que não houve nenhuma fissura,
que Audrey estava limpa.
Ela só precisava fazer os gêmeos pegarem o peito, e então, teriam
alta, o que aconteceu em questão de três dias.
Agora estamos aqui, fazendo as malas, prontos para voltar para casa.
Não dispensei o convite a Audrey, afinal os quero perto de mim, é o
mínimo que posso pedir depois de estar ausente por todos esses meses, sem
que soubesse da existência dos bebês.
Acho que Audrey entendeu o meu lado, pois não hesitou. No entanto,
ainda está meio insegura.
Acho que ela ainda está meio ressentida sobre o que aconteceu e
ninguém até então conversou sobre a respeito desse assunto.
Mas iremos fazer isso em algum momento.
Por ora, quero apenas que Audrey possa desfrutar do momento e
conseguir digerir tudo o que está acontecendo, assim como eu.
Será melhor irmos por partes, assim teremos mais certeza das coisas.
Depois que está tudo pronto, os gêmeos estão em seus respectivos
bebês confortos.
Caramba, fazia tempo que não usava termos de maternidade!
Audrey já tinha muita coisa, mas complementamos com mais coisas
nos últimos dias.
Com tudo pronto, temos certeza de que já é o momento de sair, já que
mais cedo a médica veio nos dar alta.
— Bom, então é isso. Estão prontos para conhecer o novo lar de
vocês? — pergunto aos gêmeos, mesmo sabendo que não terei resposta,
além de gracejos fininhos.
— Por tempo determinado — Audrey completa.
— Não joga água fria em mim — brinca.
— Você fala como se lá fosse o nosso lar — ela rebate.
— Mas é e agora mais do que nunca. Não pode fugir disso, por mais
que você queira.
Ela arqueia uma sobrancelha e se aproxima, encurtando a distância.
— Quem disse que quero fugir? Quero resolver isso mais do que você
imagina, Jeremy — ela admite.
— Isso é ótimo — digo tocando carinhosamente em uma mecha do
seu cabelo.
Apesar de tudo, não consigo deixar de ser quem eu era com Audrey.
Às vezes, quero abraçá-la, beijá-la e fazê-la completamente minha, mas
então lembro que as coisas não estão como antes, que há um muro entre nós
dois, impedindo essa interação que é tão intensa e palpável.
Tudo o que posso fazer é demonstrar em gestos de carinhos como
esse. Não é nada que posso ultrapassar um limite e sinto que Audrey curte
isso.
Quero que ela sinta que mesmo depois de ter dado à luz, continua
sendo uma mulher atraente e muito deslumbrante.
— Bom, vamos? — sugere após suas bochechas ficarem vermelhas.
Assinto e a ajudo então com as bolsas e os bebês.
Nos despedimos da equipe médica que nos auxiliou nos últimos dias e
então o manobrista traz meu carro.
Preciso ajustar os bebês confortos na parte do banco de trás e apesar
de estarem bastante seguros, Audrey faz questão de ir no meio, entre eles
para manter os olhos nos gêmeos.
Eu nunca tive dúvida de que ela seria uma mãe excepcionalmente
incrível. Quanto a mim…
Porra, ainda tenho as minhas dúvidas!
Nem sequer gosto de tocar nesse assunto com Julian, pois sei que não
fui um bom pai para ele.
Obviamente que tentarei compensar agora de qualquer forma, mas
preciso saber o que ele acha disso.
Julian está em Londres e agora estuda em uma escola comum, de
tempo integral.
Ele estava aqui quando soubemos da gravidez, mas precisou voltar
porque está em época de provas.
Ele ficou chateado, mas prometi que em breve verá os irmãos
pessoalmente.
Quando chegamos à mansão, sinto que Audrey fica um pouco
acanhada, então me aproximo na intenção de deixá-la mais tranquila.
— Ei, tudo bem. Somos as mesmas pessoas de antes, nada mudou.
Ela olha para mim, bastante tensa.
— O mais engraçado é que sei disso. Mas, da última vez que estive
aqui… — Ela não consegue completar a frase.
— Sei e compreendo isso. Eu também não conseguia lidar toda vez
que voltava pra cá e sentia a sua falta o tempo todo.
Vejo quando seus olhos caem sobre os meus lábios, como se o
desejassem. Passo a língua por eles, completamente tentado também em
ceder à isso.
Parece que mantemos um animal trancado em uma jaula.
A porta da frente abre e então Noah e Ian passam por ela.
Meu irmão mais novo vem estendendo o braço na direção de Audrey
enquanto a recebe de um jeito bem estimulante.
Os dois sabem o quão gosto de Audrey e que estou apaixonado por
ela.
Sei que eles farão de tudo para me ajudar a reconquistá-la, mas devo
confessar que mal vejo a hora deles voltarem para Londres e eu me ver a
“sós” com ela. Pois, ainda há papai e Jane.
— Aí está a nova família! — Ian exclama. — É muito bom que esteja
de volta, Audrey.
— Seu irmão insistiu. — Ela deixa claro quando ele vai abraçá-la.
— Ah, isso é uma qualidade do Jeremy, ser persistente e chato. Mas é
bom ver você aqui com os meus sobrinhos. Não dê moral para o Jeremy —
Ian diz.
— Obrigado, Ian. Você como sempre sendo bem generoso. — Sou
sarcástico.
Noah desce a escada da frente aos risos.
— Como foi a história mesmo? O Ian desmaiou quando viu a Audrey
dando à luz? — Noah zomba.
— Foi a coisa mais hilária que eu já vi — Audrey diz, para a nossa
surpresa. — Eu não sabia que você poderia ser tão fraco assim, Ian.
— Olha, em minha defesa não estou acostumado com as coisas que o
corpo humano é capaz de fazer. Na minha cabeça tudo tem um limite. E
aquilo… Porra, toda mulher deveria ter seu lugar no céu reservado!
— De fato, não é fácil — Audrey completa e então aponta para os
bebês que estão tão bem acomodados. — Você poderia…
— Ah, claro!
Ian se apressa em pegar o bebê conforto que está com Ethan,
enquanto carrego o com Allegra.
Noah se movimenta e ajuda com as bolsas.
Apesar de termos funcionários o suficiente para fazer esse papel,
meus irmãos não gostam de fugir das obrigações masculinas.
Nenhum de nós foge do instinto masculino, então fazemos tudo o que
está ao nosso alcance.
Do lado de dentro, papai nos espera no pé da escada em sua cadeira
de rodas. Percebo que este detalhe deixa Audrey um pouco surpresa, afinal
de contas, da última vez que o viu ele andava pouco, mas ainda era
totalmente autossuficiente.
Ela me olha como quem diz, “o que aconteceu?”, e apenas inclino a
cabeça, como se quisesse dizer "depois eu conto”. E ela entende.
— Seja bem-vinda, Audrey — papai a cumprimenta.
— Obrigada, senhor Rupert. Espero não estar incomodando, mas
Jeremy insistiu.
Papai faz um gesto com a mão, banalizando as desculpas
desnecessárias dela e diz:
— Parece que você já esqueceu a conversa que tivemos naquela noite
antes do Jeremy voltar para Londres. As portas sempre estarão abertas para
você. Ainda mais agora, que é mãe dos meus netinhos.
É a primeira vez que papai vê os gêmeos e ele parece estar encantado.
— Gêmeos. Bem, é como acertar na loteria, não é? — meu pai diz.
— Não mesmo — Ian responde fazendo uma careta.
— Idiota! — Noah resmunga para ele.
— Se soubesse de você e Jeremy, teria percebido no instante em que a
vi na feira que esperava os meus netinhos — papai comenta pensativo.
— Jeremy me contou que o senhor me viu. Deveria ter ido falar
comigo.
Papai balança a cabeça e então olha para o chão.
— Não consegui, minha querida. Eu soube o motivo que a fez ir
embora bastante chateada. No entanto, devo dizer que eu pelo menos nunca
ousei fazer tamanha comparação desproporcional — papai diz e encolho os
dedos dos pés com receio dele falar algo que magoe a Audrey. — Jeremy
sabe do que estou falando.
Isso faz com que ela olhe para mim, confusa. Dou um sorriso amarelo
e então tomo a dianteira da situação.
— Que tal irmos subindo? Seria bom que vocês se acomodasse logo.
Os gêmeos precisam conhecer o quarto deles. Pai, já descemos, tudo bem?
— É claro. Ficarei por aqui, esperando vocês para o jantar — ele
responde.
Faço sinal para subirmos e então Audrey e meus irmãos me seguem.
Quando chegamos ao segundo andar, Audrey que está ao meu lado
parece completamente inquieta.
— Vamos, pergunta logo — digo e ela me olha.
— O que aconteceu com ele?
— Papai está proibido de fazer qualquer esforço físico. O coração
dele está cada vez mais frágil e tudo o que come precisa ser regulado, assim
como os remédios dados na hora certa. Temos agora uma equipe de
enfermeiros prestando atendimento a ele. — Quando chegamos em frente à
porta do quarto dos gêmeos que foi adaptado para eles e Audrey na última
hora, completo a informação: — Daqui uns dias ele irá embora para
Londres com Noah e Ian. Todos os recursos que ele precisa está lá e Jane irá
acompanhá-lo, então não ficará ninguém na mansão. — Faço uma breve
pausa e então recapitulo o último ponto: — Ninguém, não. Porque
estaremos aqui.
“Só nós dois”, penso.
— Eu sinto muito, Jeremy. Espero que ele possa melhorar — ela diz
visivelmente triste com a informação.
Não sou capaz de dizer qualquer coisa, além de balançar a cabeça.
“OBRIGADO, MAS AS COISAS ESTÃO REALMENTE RUINS”, é o
que o meu pensamento grita.
Papai não tem nenhuma perspectiva de melhora e todas as notícias
que os médicos dão são ruins o suficiente para não levantar nenhuma
esperança.
Eles dizem, “aproveitem ao máximo”.
Ian é o único que se nega a acreditar que a palavra de um profissional
basta, mas Noah e eu, apesar de não querermos, já estamos nos preparando
para o pior.
Essa fase lembra muito a época que mamãe faleceu, já éramos
adultos, mas Ian era um pouco mais novo e muito apegado.
— Venha, este é o quarto dos gêmeos. — Abro a porta e então
Audrey entra.
Ela parece estar maravilhada com tudo.
Dois berços, um rosa e um azul, ocupam ambos os lados opostos do
quarto. Logo no canto, ao lado da janela, uma poltrona reclinável está à
disposição. Na parede ao lado há também vários nichos e na parede
paralela, um armário para as roupinhas deles.
— Era um antigo quarto de hóspedes e podemos melhorar bastante
futuramente. Talvez fazer um quarto para cada e…
— Jeremy, está tudo lindo.
— Você gostou? — Olho para ela cheio de expectativa.
— É incrível. Será que já podemos colocá-los nos berços? —
pergunta bastante animada.
— Se você quiser assim…
Quando me viro em direção à porta, me deparo com os bebês conforto
sobre o chão enquanto Ian e Noah estão parados em frente à porta, no
corredor.
— Vamos deixar vocês a sós agora — Noah diz.
— Me pergunto se é uma boa ideia — Ian refuta e Noah revira os
olhos, o afastando para longe.
Idiotas!
Pensei que já estivessem longe.
Me abaixo e então pego Allegra primeiro, a minha menina.
Ela é tão pequena e delicada, parece até uma bonequinha. Quando me
viro para o berço, vejo que Audrey já está sentada na poltrona.
Imagino que a escada a cansou.
Aninho Allegra em meus braços e fico a embalando.
Ela é tão perfeita, tem todos os traços de Audrey e quando abre os
olhos, as bolas azuis que herdou da minha família simplesmente irradia em
sua face.
Ela sabe que está em um lugar novo e por isso olha para tudo com
curiosidade.
Ela é tão curiosa quanto a Audrey.
Eu a deixo no berço e ela resmunga um pouquinho.
— Gosta do colo do papai, né, filhota? — pergunto quando ela parece
estar incomodada de ser colocada ali dentro.
É nítido o quão Allegra gosta de um colo e de atenção. Isso
certamente parece ser uma característica do seu tio Noah.
Logo depois é a vez de Ethan, um menino mais calmo, não tão chorão
quanto Allegra. Ele é muito dorminhoco e observador, além de gostar muito
dos seus dedinhos.
Talvez, ele seja bastante parecido com Julian.
— É uma boa hora pra vocês descansarem. A mãe de vocês tá louca
para dormir um pouco.
— Gostei da proposta — diz esticando as pernas.
Nos últimos três dias, Audrey ganhou olheiras e um semblante mais
cansado.
Eu sabia que ela não tinha como fugir disso por querer sentir na pele
o papel de mãe após dispensar qualquer serviço de babá que sugeri.
— Seu quarto é logo ao lado. Imaginei que você não fosse gostar de
dividir a mesma cama que eu, então pedi para arrumarem um quarto
separado.
— Que bom que pensou de forma minuciosa — diz ao se levantar e
olha para os gêmeos quietos em seus berços. — Vamos fazer isso de forma
profissional, séria.
Olho incrédulo para ela, enfiando as mãos nos bolsos da calça.
— Por que não faríamos? — pergunto de um jeito sonso, afinal
apenas quero ouvir qualquer coisa saindo da boca de Audrey que seja a
respeito de nós dois. — Falando assim parece que somos até dois
descontrolados.
Ela sorri.
— Só acho que é meio óbvio. Eu honestamente não gostaria de
facilitar as coisas, acho que temos coisas mais sérias a tratar agora — diz e
então olha para os gêmeos ao se referir a eles.
— Eu entendo, Audrey. Por isso vou respeitar o seu espaço. Não irei
fazer nada do que você não queira. Irei ficar ao seu lado, como o pai dos
gêmeos e seu parceiro, porque isso exige parceria, não é?
Audrey olha para mim, como se estivesse chocada demais com o meu
posicionamento.
Será que ela não esperava isso de mim?
O que passava na cabeça dela caso eu descobrisse essa gravidez bem
antes?
Contudo, ela balança a cabeça, aceitando a oferta.
— Tudo bem, você está certo.
— Vamos lá conhecer o seu quarto.
Vou na frente e ela vem logo atrás.
O seu quarto é logo a frente do quarto dos gêmeos, justamente para
não ter preocupações, caso ficasse longe demais.
É uma suíte simples, com cama e mesinha de canto. Há um armário e
um banheiro também, onde ela poderá colocar suas coisas.
A janela dá vista para a lateral do jardim, o que parece animá-la.
— A sua mãe disse que ligaria assim que terminasse de arrumar suas
coisas, então o nosso motorista irá pegar as suas coisas.
Ela assente e então se senta na beira da cama, de frente para mim. De
um jeito tímido, Audrey diz:
— Tudo o que você está fazendo é muito legal, Jeremy. Obrigada. Eu
não esperava esse tipo de reação e hospitalidade.
— Assim como não esperava que você fosse querer me dar a chance
de fazer o meu papel — admito dando de ombros e ela abaixa a cabeça. —
E se você cogitou pensar algo do tipo, tudo bem. Eu entendo, Audrey. Você
é a mãe, afinal de contas, sabe o que é melhor.
— O que o seu pai quis dizer com aquilo lá embaixo? — ela dispara e
só então me dou conta de que estávamos falando do assunto errado, pois
não era aquilo que a incomodava, mas o que estava prestes a me perguntar:
— Sobre ele não ousar em me comparar com Sofia e que você sabia do que
ele estava falando?
Lá no fundo, sabia que ela havia ficado intrigada com aquilo. Papai
deu todas as cartas para que ela viesse a ficar curiosa, e agora que estamos
aqui, só nós dois, parece a oportunidade perfeita.
Solto um suspiro e então ando para mais perto dela, onde me apoio na
parede, logo ao lado da janela.
— Você disse que é parecida com Sofia e que comparamos isso por
muito tempo de forma cega, mas, na verdade, vocês são muito diferentes,
Audrey. E quando você é muito diferente da outra pessoa em termos de
personalidade e postura, você se torna única e isso é tudo o que a gente vê
— Começo a falar. — Sofia era uma Hauston.
Ela então me olha chocada, como sabia que me olharia.
— Hauston… do clube de golfe? — Quer saber.
— Isso mesmo.
“Ela era uns três anos mais nova do que eu, mas crescemos juntos e
havia muito interesse da família dela em nos unir.
“Crescemos com aquela ideia de que deveríamos ficar juntos e nos
primeiros anos em que começamos a namorar na adolescência, parecia ser o
certo, mas porque todos diziam que era certo.
“Porém, não era bem assim.
“Sofia era ambiciosa, egoísta e muito narcisista.
“Ela não ligava para o amor, apenas para o que construiríamos com a
nossa união.
“Mesmo sabendo disso, quis me casar com ela, ter uma família e
quando ela partiu não sofri apenas com a dor da perda, mas também com o
seu mundo de mentiras desabando em minhas costas.”
E é aqui que entra a razão pela qual passei um bom tempo sendo
assunto na boca dos moradores de Dublin.
Eu sempre penso nisso, mas evito dizer em voz alta.
Só que com Audrey aqui, isso parece ser tão insignificante que não
vejo problema algum em relatar tudo a ela.
— Sofia pretendia pedir divórcio assim que Julian nascesse. Ela tinha
um amante e já tinha até mesmo comprado uma casa para onde se mudaria
com ele quando se separasse de mim.
“Foi uma sensação podre que senti.
“Eu não só sofri com o luto, mas com a traição também.
“Comecei a viver uma vida que classificaria como ruína e por isso me
vi incapaz de criar Julian.
“Fui julgado na cidade inteira por isso quando a história se espalhou e
as coisas só melhoraram quando passei a me dedicar ao trabalho, somente a
isso”.
Quando olho em direção a janela para tentar me distrair com qualquer
coisa que não seja as lembranças daquela época, percebo que Audrey se
levanta da cama e anda até mim.
— Você não precisava remoer isso tudo de novo por minha causa. Eu
não deveria ter sido tão inconveniente assim, afinal você não me deve o seu
passado.
— Devo sim — afirmo olhando para ela.
Seus olhos castanhos brilham e estão tão intensos que quero me
afundar neles.
— Porque depois de um tempo, eu passei a odiar a Sofia. Que Deus
me perdoe, mas não gostaria de vê-la de novo. E aí você surgiu e pensei que
fosse uma assombração, mas você se mostrou ser diferente, o tipo de pessoa
que eu sempre sonhei a vida toda, me fazendo perceber que você não era
ela.
“Estava muito longe de ser pelo simples fato de ser melhor”.
Seus lábios estremecem e seus olhos ficam vermelhos. Sei que
Audrey quer chorar, mas se mantém forte.
— Eu poderia ter odiado você quando a vi naquela noite, mas no
último segundo, antes de você ir embora, percebi que não era a mesma
pessoa.
“Confesso que isso me deixou curioso no início.
“Afinal como poderiam ser tão iguais, mas, ao mesmo tempo, tão
diferentes?
“Mantive esse segredo só para mim, desde então.
“Sinto muito, Audrey.
“Essa é a verdade”.
Ninguém diz mais nada pelos próximos segundos, há uma atmosfera
condensada entre nós dois e sei que isso pode ter sido um tiro no pé, ou não.
Quero dizer a Audrey que tudo depende dela agora, mas também não
quero pressioná-la.
Passo a mão no cabelo, escovando as mechas para trás e então a ouço
dizer:
— Tudo bem.
Olho para ela.
— O quê?
Audrey dá de ombros.
— Tudo bem, Jeremy, e eu entendo você. Não sabia desse lado e
imagino que não seja fácil. Além do mais, acho que já deixei essa história
de lado há muito tempo. Eu só queria ficar em paz com os meus filhos,
sabe? Mas você me deu uma explicação mais limpa, então acho que isso só
deixou tudo mais nítido agora.
Meu coração galopa.
O que isso significa?
Fico olhando para Audrey, na espera de outra coisa que seja
promissora.
— Eu queria que você tivesse me contado isso antes, queria ter te
ouvido, mas acho que nós dois não estávamos bem o suficiente para isso.
Mas tudo o que aconteceu nos preparou para este momento agora — ela
diz, me deixando surpreso.
— Por um momento, pensei que ainda me odiasse.
Ela sorri, fazendo passar a sensação de alívio para mim.
— Você é o pai dos meus filhos, não posso te odiar.
— Pode dizer que ainda sente por mim o que sentia antes? — Vou
além e não sei se faço certo perguntar isso justo agora.
Mas quando Audrey fica séria, me arrependo amargamente de ter sido
tão impulsivo.
Ela balbucia algo, como se fosse me dar uma resposta, ou estivesse
evitando falar qualquer coisa.
E, para a minha surpresa, Audrey confessa:
— Eu certamente gosto de você, Jeremy. Mas tenho assuntos maiores
para lidar agora do que os meus sentimentos que estão simplesmente
emaranhados.
— Compreendo — digo sentindo o banho de água fria que ela me
deu.
Mas é verdade.
Meus sentimentos por Audrey nunca mudaram. Mas ela está sendo
mãe pela primeira vez e por isso merece respirar um pouco.
Sei que o que estou fazendo é errado e muito indelicado.
Por isso me afasto da janela e ando em direção à porta. Mas antes de
sair, digo:
— Não vou pressionar você a nada, mas saiba que estarei sempre
aqui, Audrey. — Saio e fecho a porta para dar mais privacidade.
Logo depois verifico se os gêmeos estão dormindo e assim que
confirmo, vou para o meu quarto e me tranco lá dentro.
Audrey pode ficar o tempo que quiser por aqui que não voltarei para
Londres tão cedo.
Estou ciente de que este tempo que será nos dado, terei de ser
paciente e esperar pela sua permissão de avançar o sinal verde.
Não irei forçar nada com Audrey, mas também não prometo ser um
homem comportado.
Um mês depois...
A decoração de casamento lá embaixo está linda.
Hoje é o dia em que Meredith e Noah irão dizer sim, um para o outro.
O dia que ela tanto esteve esperando e comentando comigo desde o dia em
que me conheceu.
“Você será a minha convidada”, ela disse.
Na época, me senti bastante lisonjeada, pois já sabia que seria algo
bem intimista no jardim da mansão.
Eu só não esperava que duas semanas antes do casamento acontecer,
ela fosse me chamar para ser a sua madrinha.
— Eu?! — indaguei surpresa quando saímos juntas para uma tarde
das meninas no centro de Dublin.
Meredith é mãe há quase dois anos e sabe que momentos como
aquele são raros e especiais na vida de uma mãe integral. Por isso, sempre
que está em Dublin, ela faz questão de me sequestrar por umas horinhas.
— Sim, você. Eu não tenho tantas amigas, sabe. Então sempre pensei
em você, mas sei lá, acho que previa que Jeremy fosse machucar você.
— Po-por quê? — quis saber enquanto fazíamos uma rápida parada
em um sebo.
O lugar cheirava a livros antigos e alvejante.
Era estranhamente bom.
— Não sei, mas parece uma regra, sabe? Homens bonitos e ricos
sempre serão propícios a quebrar o seu coração. Veja o meu exemplo.
A história de Meredith com Noah não era menos pior que a minha e
também incluía uma mulher que poderia ter estragado tudo, mas o amor
falou mais alto e Noah teve vergonha na cara em ir atrás de Meredith, que
também teve seu filho após fortes emoções.
— Não tenho como dizer que está blefando — comentei a fazendo rir.
— E então, você aceita ser a minha madrinha?
Sorri para ela, porque nunca fui lembrada em momentos especiais
como aquele.
— É claro! Eu serei a madrinha no casamento de vocês!
E agora, aqui estou, terminando de ser maquiada por uma equipe de
maquiadores profissionais que veio apenas para nos arrumar para mais
tarde.
Meu cabelo está preso em um coque que eles chamam de “podrinho”,
por não ser tão arrumadinho.
Pedi uma maquiagem leve nos olhos, mas algo mais provocante nos
lábios, como um batom cor vinho que combina com o meu vestido rosa
gold.
Dois dias atrás, acordei e a caixa branca com laço rosa estava na porta
do meu quarto, como se fosse manhã de Natal e o Papai Noel estivesse
passado ali.
Peguei e tinha um cartão amigável de Jeremy, me avisando que não
precisava me preocupar com o vestido, pois ele já estava ali e era um
presente. Ou seja, não precisava devolver.
Aquilo foi muito gentil da parte dele e não recusei, é claro.
O casamento já estava em cima da hora e não tinha tanta opção, muito
menos uma condição financeira de alugar um vestido.
O sapato foi presente de Meredith, um salto elegante, de tiras sutis
que dão duas voltas no meu tornozelo. Fica lindo com o vestido, pois a
fenda na lateral esquerda permite uma bela visibilidade do sapato, além da
perna.
Um mês e duas semanas passaram desde o nascimento dos gêmeos, o
puerpério já passou, mas a vida de mãe continua.
Meus seios estão maiores do que nunca, vivo cansada, mas acho que
se não tivesse toda rede de apoio que tenho aqui, seria mais difícil.
Não sei mais o que é dormir direito e somente ontem tive tempo de
me depilar.
Qualquer tempo livre que surge, o tomo para descansar e onde me
escoro, já durmo, o que considero ser uma das novas habilidades que
adquiri depois que me tornei mãe.
Tenho o apoio total de Jeremy.
Ele fica em Londres durante a semana, mas logo volta voando para
Dublin no final de semana e então dá tudo de si enquanto pode.
Ele é simplesmente incrível e sei que grande parte do seu incentivo
em ser um pai presente é porque não foi um para Julian.
Jeremy ama fazer os gêmeos dormir e conversa com eles como se
fossem dois adultos, o que é uma graça.
Às vezes, me pergunto se Julian tem ciúmes, mas é só ver a forma
como ele trata os irmãos que rapidamente tenho a minha resposta.
Julian sempre quis ter irmãos para não se sentir sozinho e quando há a
oportunidade de nos visitar, ele assim como o pai, não largam os gêmeos.
— Oh, Meu Deus! Você está linda! — mamãe diz quando entra no
meu quarto.
Ela parece realmente muito chocada.
Ultimamente ela tem passado bastante tempo aqui comigo. Posso ter
dispensado uma babá, mas não podia dispensar a ajuda da minha mãe. Se eu
fizesse isso, era capaz dela me matar.
O que ela quase fez, quando descobriu que o pai dos gêmeos é o
Jeremy.
— Obrigada, mãe. Nem lembro quando foi a última vez que me
produzi toda assim.
Mas depois vem uma lembrança e descubro que lembrava sim, só não
é uma memória apropriada para contar a ela. Foi no jantar que Jeremy fez,
uma noite antes de discutirmos. Estava usando o vestido cobre lindo, ele
tirou a minha roupa na escada e transamos ali mesmo.
Até hoje é difícil subir a escada e não lembrar desse momento.
— Parece que a noite será bem divertida. Você está deslumbrante,
querida, pode curtir a vontade.
Faço uma careta e resmungo.
— Não sei se consigo sabendo que vocês estarão aqui em cima.
— Ficaremos bem. Aliás, vou participar da cerimônia, irei assistir.
Mas você sabe como eu sou, durmo cedo, então ficarei fazendo companhia
para os meus netinhos — ressalta.
— Eu nem sei como te agradecer por isso, mãe.
— Bom, pode começar aceitando a proposta do CEO gatão em ter
uma babá.
Reviro os olhos, contendo o sorriso.
Mamãe depois que conheceu pessoalmente Jeremy ficou maravilhada
por ele, principalmente quando tive minhas dúvidas firmadas sobre ele ter
sido a pessoa que facilitou a venda do antigo pub para ela.
Tudo está indo tão bem. Mamãe está realmente indo muito rápido e
em breve seu restaurante irá nascer.
— É exagero. Enquanto estiver o tempo todo livre, irei dispensar tal
serviço — resmungo.
— Bom, então que sorte a sua que você tem a mim.
Sorrio.
— Isso é verdade. Tenho muita sorte mesmo. E os gêmeos?
Mamãe se senta na beira da cama e então deita esticando as costas.
— Dormindo. Eles amam dormir. Que bom, não dão muito trabalho,
mas também vão ganhar fama de preguiçosos. Enchem a barriga, cagam e
então vão dormir. Eu diria que essa vida boa eles só vão ter agora, mas aí
lembro que são herdeiros de uma das famílias mais bilionárias da Europa.
Você tem noção disso?
Dou de ombros.
— Não fico pensando muito nisso, faz parecer que foi até proposital.
— Bem, eu sei que não foi. Mas, caramba, não tem como ignorar!
Até hoje ela ainda não sabe lidar com essa informação.
— E no fim das contas, os O’Donnell são as pessoas mais incríveis
que já conheci. O que é irônico, porque até então só havia conhecido ricões
mesquinhos — digo.
— Tudo tem a sua exceção, não é mesmo?
Olho para ela e começamos a rir.
Três batidas à porta chamam a nossa atenção.
— ENTRA! — grito.
A porta abre e apenas uma cabeça passa pela fresta. Reconheço o
cabelo loiro de imediato.
— Julian!
— Oi, Audrey. Vim buscá-la para a cerimônia.
— Oh, já está na hora? — Olho para trás e vejo que ainda está claro
demais.
— Na verdade, Meredith precisa das madrinhas reunidas para as fotos
e toda essa frescura de casamento — ele diz com a voz grossa, de menino
que está se tornando homem.
— Frescura? — mamãe repete.
Como ela sempre está por aqui, já é até normal que ela esteja
entrosada na família. Na verdade, ela sabe fazer isso melhor do que eu.
Socializar é com ela mesmo.
Julian dá então um sorriso sem jeito, sem conseguir nos encarar
diretamente.
— Ah, sei lá. A única parte boa parece ser a comida.
Mamãe olha perplexa para ele e tomo a frente da situação antes que
ela deixe o menino mais desconfortável ainda.
— Muito bem. Conversa resolvida. — Ando até a porta. — A gente
se vê lá embaixo, mãe. Vamos, Julian?
Forço para ele um sorriso de desespero, para darmos logo o fora do
quarto.
Fecho a porta e quando está só nós dois no corredor, respiro aliviada.
— Você está muito bonita, Audrey — ele diz como um verdadeiro
cavalheiro.
— Humm, obrigada, sir — brinco e ele sorri. — Pois o senhor
também está muito elegante!
Morar em Londres e estudar agora em uma escola de tempo integral
parece fazer bem a Julian. Mesmo assim, ele não mudou em nada, parece
até que saiu de uma escola preparatória para lordes.
— É só o terno. A sua mãe é engraçada — ele comenta mudando de
assunto.
— Bem, sim… Mas até certo ponto — completo. — Às vezes, não
temos nada a ver, sabe? Mas isso é legal.
— Hum, sei sim. Eu sou muito parecido com o meu pai, mas também
sou parecido com meus tios, o que irrita o papai.
— Acha que seus irmãos irão herdar múltiplas personalidades
também?
— Espero que não. — Faz uma careta. — Mas, não tenho múltiplas
personalidades, Audrey!
— Eu sei que não — admito sorrindo enquanto chegamos no
mezanino. — Mas parecer com os três O’Donnell parece algo muito…
Intenso.
Começamos a descer a escada e fico preocupada com o silêncio de
Julian.
Será que falei algo demais?
Droga!
Ainda nos damos muito bem, talvez até melhor do que antes. Mas
ainda não sei a opinião de Julian sobre tudo isso, e, às vezes, me assusta um
pouco ter que saber. Afinal de contas, a única coisa que me mantém
insegura ainda é o fato de não ser aceita.
E não sei mais o que preciso para perceber isso, pois a família
praticamente me acolheu.
Por fim, depois que chegamos ao vestíbulo, Julian pergunta:
— Acha que darei certo na vida como meu pai e o meu tio Noah?
— Ah… Bem, creio que sim. Por que não daria? — pergunto sem
parar os passos.
Julian está muito bem-vestido de terno e gravata.
Parece até mais velho.
Ele é o herdeiro na segunda linha de sucessão dos O’Donnell, e,
mesmo assim, até onde eu sei, o menino não tem grandes ambições.
Mas aqui está a sua primeira preocupação da vida, o sucesso na vida.
— Bom, não falo da vida financeira e nem profissional. Já nasci
bastante privilegiado e acho que essas são as últimas coisas que terei que
me preocupar. Então o que quis dizer, é se terei sorte com alguém na vida,
assim como o tio Noah e o papai tiveram.
Ah, então é sobre o amor que está falando.
Passamos pela porta e então alcançamos a varanda do jardim. Julian e
eu andamos até a balaustrada que está serpenteada por flores e ramos. Fico
pensando em uma resposta coerente e que faça sentido.
Mas tudo em que penso é no que ele disse sobre Jeremy.
— Acha que o seu pai teve sorte com isso?
— Ele teve, não teve? — pergunta como se fosse óbvio. — Ele tem
você e os gêmeos.
Quase me engasgo ao ouvi-lo dizer isso. Então começo a tossir
enquanto tento me recompor. Preciso pigarrear antes mesmo de responder
sem jeito:
— Você fala como se o seu pai e eu tivéssemos algo.
— E não tem? — indaga incrédulo, como se eu tivesse dito algo
óbvio, como o fogo queima.
— Bem, não do jeito amoroso que você talvez pense. Nós só somos…
Amigos.
Ele dá um sorrisinho e me sinto uma estúpida.
— Eu vejo a forma como vocês se olham, muito antes de você ter
sumido e aparecido grávida. Vai além da amizade. Eu sei que tenho quinze
anos, sou novo, mas não sou idiota.
Sorrio sentindo nostalgia e então passo a mão no seu cabelo que
parece ser fios de ouro.
— Eu sei, você já falou isso muito antes.
— E então, não vai admitir? — insiste e então olho para ele,
avaliando a situação.
— Julian, eu não entendi. Você quer que eu diga que gosto do seu
pai?
— Quero que me diga que você vai ficar e que não vai mais sumir —
diz de um jeito triste que faz meu coração se apertar.
— E-eu não sumi porque quis. Talvez eu tenha deixado de dar sinais,
mas foi algo que aconteceu e só estava seguindo o ritmo da coisa toda.
— Eu sei. Mas, promete, Audrey? Não quero ficar longe da Allegra e
do Ethan. Assim como meu pai não quer ficar longe de você, eu também
não quero. Poderíamos ser uma família, acho até mesmo que já somos.
— Julian… — A minha voz sai fraca e os olhos já estão marejados.
Dentre todas as coisas que já ouvi, o posicionamento de Julian era o
que mais esperava. Logo, ouvir Julian falar isso se torna muito
significativo.
Eu nem sequer posso acreditar!
Antes que possa dizer qualquer coisa, uma terceira pessoa surge entre
nós. Quando olho, vejo Jeremy completamente deslumbrante, sorrindo um
pouco tímido e surpreso.
Sei pelo seu olhar que ele ouviu uma parte da conversa.
Então ele já estava aqui?
Meu Deus, eu nem percebi.
— Julian, não é bom fazer a madrinha chorar antes da cerimônia —
Jeremy disse ao filho.
— Eu sei, na verdade, eu já disse o que tinha de dizer.
— E parece que deixou Audrey bem abalada, olha só para ela. — Os
olhos de Jeremy estão fixos em mim. — Filho, posso ter uma conversa com
a Audrey?
O menino não hesita.
— Pode, mas a tia Meredith tá esperando ela faz tempo — ressalta já
se virando.
— Tudo bem, não vai demorar.
Julian então se afasta com apenas um aceno.
É difícil de acreditar que um garoto de quinze anos me desestabilizou
com as suas palavras.
Eu não estou assustada ou bastante surpresa com isso ao ponto de
parecer ter sido algo inesperado e exagerado. No entanto, confesso que
estou sem reação porque era justamente isso o que eu precisava ouvir para
ficar mais tranquila, e não sabia até Julian falar.
— Você ouviu tudo? — pergunto a Jeremy.
— Cheguei na parte do promete, depois ouvi tudo. Julian gosta de
você, assim como eu. E para ser sincero, faço as palavras dele as minhas.
— Nossa… Isso foi muito… Ok. Acho que entendi. Eu
definitivamente não vou embora, sei que há laços agora.
— Que bom. Eu deveria me sentir mal por um garoto de quinze anos
ter convencido você a algo que tenho tentado há um mês? — pergunta com
uma indignação sutil e começo a rir.
— Se Julian disse, então tá dito — brinco, mas logo depois fico séria,
olhando para Jeremy como se ele fosse o meu único ponto de vista. — Mas
acho que estou mais aliviada agora que ele disse algo. Independente de
qualquer coisa, Jeremy, não estou aqui para tomar o lugar de ninguém.
— Sei que não está — ele frisa guardando então uma mecha de
cabelo atrás da minha orelha e deslizando o seu polegar depois para a linha
da minha mandíbula.
Meu coração começou a bater forte.
— Mas vimos em você uma peça única, é por isso que fazemos tanta
questão. Você percebe, Audrey, o quão rara é?
Meu corpo estremece.
É sempre assim.
Essas últimas semanas foram uma tormenta por saber que estava sob
o mesmo teto que Jeremy.
Às vezes tudo o que queria era me enfurnar dentro dos seus lençóis e
me enrolar com ele ali enquanto fazíamos amor.
Precisei diversas vezes terminar aqueles pensamentos me tocando, o
desejando. E o pior de tudo, era saber que possivelmente ele fazia o mesmo.
Quando acordava de pijama, nos encontrávamos no quarto dos
gêmeos à noite e ele só de calça moletom, às vezes, podia ver a sua ereção.
Podia sentir seu corpo aquecendo e a minha aproximação o atiçava porque
era como gasolina pura.
E se estava sendo difícil pra mim, não consigo imaginar para ele.
— Posso perguntar uma coisa a você?
— Tudo o que você quiser.
Passo a língua nos lábios e respiro fundo enquanto crio coragem.
— Como tem sido suas noites?
— Horríveis. — Ele é direto. — Principalmente quando estou aqui. E
nem falo isso por causa dos gêmeos que acordam três vezes de madrugada
chorando.
Sorrio porque isso é verdade.
Jeremy continua:
— Mas não é fácil, Audrey. Eu viro na cama e tudo o que quero é que
você preencha aquele vazio. No silêncio, a sua voz e a sua risada vêm me
fazer companhia e o seu cheiro é algo que consigo imaginar sempre que
quero. Você, pra mim, é como se fosse uma matéria, cerca tudo à minha
volta e não consigo mais viver sem isso.
Meu coração está galopando e sinto que meu fôlego está indo embora.
Mas isso tudo é efeito do que Jeremy causa em mim.
— E isso não é só nas noites é durante o dia todo! Há quase onze
meses venho sentindo tudo isso, então você tem noção do quão péssimo a
vida tá pra mim, sem ter você sendo somente minha?
Respiro fundo e aprumo a postura.
— Talvez eu saiba. Pois, não tem sido fácil também pra mim. E eu
costumo me odiar por fazer cada segundo uma tortura.
— Não é culpa sua, está no seu direito. Você queria um tempo para
organizar a vida, não queria?
Fecho os olhos, me sentindo uma estupida.
— Eu sei. Só que tempo é a coisa mais rara do universo. Não sei se
consigo perder mais desse tempo — confesso, sentindo o coração bater na
boca.
A mão de Jeremy que antes estava pousada no meu rosto, o
acariciando, desce até o comprimento do meu pescoço. Seus dedos apertam
e percebo quando ele diminui a distância entre nós dois.
Estou preparada para um beijo, para que ele faça isso na frente de
todo mundo. Porque pela primeira vez depois de tanto tempo, eu sentia que
estava fazendo a coisa certa.
E eu quis tanto que esse momento chegasse.
Eu não diria mais não, para Jeremy.
Estou pronta para voltar a ser dele.
— Audrey!
Alguém me chama lá de baixo, onde está toda a ornamentação da
festa.
— Bora logo!
Sinto um ar gelado descer pelo meu corpo, afinal estava pronta para
selar a nossa reconciliação.
Mas não foi dessa vez.
— Juro que irei matá-la! — Jeremy pragueja baixinho para Meredith,
a culpada de ter interrompido o momento.
Dou um sorrisinho e então me afasto.
— Não, tudo bem. Eu já estou atrasada. Não posso deixá-la me
esperando para as fotos.
— As fotos que espere! — ele exclama pegando a minha mão. —
Quero você para mim, agora.
Toco seu rosto e então me aproximo para dar um beijinho em seu
rosto.
— Não perderemos tempo… Mas depois do casamento.
Jeremy bufa como um menino frustrado.
— Vamos sobreviver, certo? — pergunto e ele parece fazer um
esforço.
— Até o final do casamento — ele frisa. — Depois disso, você será
minha para sempre.
Isso pareceu tão dominador e possessivo, mas confesso que gosto.
Eu quero ser todinha de Jeremy e ouvir isso da sua boca me deixa
excitada e louca para tornar aquilo realidade.

Meredith e Noah trocam seus votos ao pôr do sol. Foi lindo e


emocionante, e agora eles não desgrudam um do outro enquanto Liam fica
perto deles o tempo todo.
A imagem perfeita de uma família feliz.
Apesar de ter conhecido o casal há pouco tempo, estou feliz por eles.
Comemoramos a união como deve ser feita, com muita dança,
comida, conversas e registros.
Os gêmeos acordam um pouco depois da festa começar e mamãe
surge com eles, com a ajuda da cerimonialista com quem conversamos mais
cedo.
Rapidamente, Jeremy e eu tomamos nossos postos de pai e mãe.
Estava com Ethan nos braços e Jeremy com Allegra, que ele
movimenta no ritmo da música e ela gargalha.
Logo depois Julian se junta a nós quatro e então ficamos no nosso
mundo particular, onde babamos nos gêmeos. De repente, não só começo a
entender o que Julian me disse mais cedo, como posso ver.
O mundo deles dois está aqui, nos gêmeos. Jeremy e Julian parecem
de fato tão conectados a eles que é possível sentir.
Não é a minha intenção tirar isso deles, muito pelo contrário. Percebo
que quero fazer parte disso e que já faço, pois estou aqui e eles me querem
como parte disso.
Logo eu, que cresci apenas com o carinho da minha mãe e soube
apenas o que era o amor materno, agora estou aqui, desfrutando do amor
familiar.
Jeremy faz uma pausa na brincadeira com os filhos.
Sim, seus três filhos.
Então me olha, sem conseguir tirar o sorriso do rosto ainda.
— Eles estão bastante acordados — comenta, já que nem Allegra e
Ethan parecem querer ficarem quietos.
— Espero que você esteja também — emendo.
— Gente! — Meredith chama ao fundo. — Vou jogar o buquê!
De repente, as mulheres presentes correm para o meio da pista, até
mesmo a minha mãe.
— Você não vai lá? — Jeremy pergunta.
Eu me encolho.
— Acha que devo ir? — pergunto olhando para ele, como se isso
devesse ter algum significado.
— Vamos ver se hoje é o seu dia de sorte.
Levanto do sofá onde estamos e então dou um sorriso provocador.
— Meu dia de sorte, porque vou pegar o buquê, ou porque posso não
o pegar, assim me livrando de ser a próxima?
Confiante, Jeremy responde:
— Porque você vai pegar este buquê e será uma mulher de muita
sorte.
Sinto meu corpo se animar com o que ouço.
— Tudo bem. Eu vou.
Eu me arrasto para o meio da pista onde as outras convidadas estão.
Acho que nunca pensei em casamento de forma tão séria. Talvez, em
algum momento eu tenha fantasiado isso com Jeremy, mas não foi algo que
enfeitei com a imaginação, porque não era uma certeza.
Casamento é coisa séria.
Mas aqui estou, tentando ser a próxima a ficar noiva porque Jeremy
me convenceu a isso.
Ele me pedirá em casamento?
Droga, não duvido de nada!
Inclusive tenho certeza de que direi sim a ele. Já passei muito tempo
em recusa e tudo o que quero agora é ele para mim.
— VAMOS LÁ, SE PREPAREM, MULHERES! — Meredith grita e
fico de prontidão.
Quero o buquê para mim!
— Um... Dois… Três… E… Já!
Ela joga o buquê e dou tudo de mim.
Não saio derrubando ninguém, apenas estendo o braço e sinto um
leve empurrão na costela.
Me desequilibro no salto, mas alguém me pega pela barriga.
Quando percebo, o buquê está nas minhas mãos e todo mundo vibra.
Ao longe, Ian gargalha e começa a fazer gestos para Jeremy. Noah se
aproxima do irmão mais velho e o abraça.
Parece até que já era algo previsto e com quem.
Percebo que fui empurrada por mamãe. Ela me ajudou a ir na direção
do buquê e uma garota que é amiga de Meredith, foi quem não me deixou
cair.
— Parabéns! — elas dizem juntas.
— Você é a namorada do Jeremy, mesmo? — Outra quer saber.
— Sou mãe dos filhos dele — respondo.
— Nossa, isso que é sorte.
Inalo o buquê de rosas vermelhas para disfarçar o sorriso e fico
olhando para Jeremy enquanto caio em uma conversa sobre noivado. As
meninas não me largam, nem sequer me dão chance de ir até Jeremy e
entregar a ele o buquê.
É como se ter pegado esse item, já fizesse de mim, uma pessoa
comprometida. E que agora iremos comemorar a minha despedida, rodeada
por pessoas que me parabenizam.
“Espera, isso é a festa de casamento da Meredith com o Noah, ou a
minha festa de noivado?”
Só sei que resolvo me entregar. Principalmente, quando estamos na
pista de dança. Me entrego a música, o que é uma surpresa porque
demonstrava não precisar de nenhuma bebida para ficar encorajada.
Eu me sinto confiante perto dessas pessoas, completamente segura.
É essa confiança que tanto queria sentir antes, é como se finalmente
não só percebesse o que quero, com quem ou como, mas principalmente eu
me aceito.
Não sou só uma mulher muito parecida com outra mulher que já até
deixou de existir...
Eu sou a mulher, única e rara, como Jeremy bem me disse.
E eu falei que iria entregar o buquê a ele, mas farei isso no momento
certo.
Logo quando a festa começa a ficar vazia e a música baixar de
volume, já é hora de subir, ir para a cama e tomar um belo banho.
Mamãe já subiu com os gêmeos, eles ficaram logo cansados e ela
também, pronta para dormir no seu quarto de hóspedes.
Hoje dancei tanto que meus pés ficaram doloridos. Esqueci
completamente de tirar os sapatos, mesmo quando a sola dos meus pés
começaram a reclamar de dor.
Mesmo assim, Jeremy acha que é uma boa ideia me ajudar a subir a
escada.
— Já disse que estou bem. Eu passei quase nove meses com dois
bebês na minha barriga. Você viu o tamanho que estava! O que é um pé
com calo? — insisto.
— Será que vou ter que pegar você no colo para ficar calada? Eu já
entendi, mas quero te acompanhar — ele explica com seu jeitinho meio
bruto e, às vezes, inquieto.
O que chega a ser engraçado porque Jeremy, na verdade, é apenas um
cavalheiro emburrado.
— Você não pode me pegar no colo enquanto não estivermos em lua
de mel — rebato.
— Ah, sério?
— Eu peguei o buquê, lembra?
— Mas não disse com quem iria se casar.
— Bem, você disse que eu seria uma mulher de sorte — relembro
olhando incrédula para ele, enquanto atravessamos o mezanino. — E acho
que se referia ao fato de que me casaria com você.
— Muito esperta, Audrey, querida.
Sinto quando sua mão me pega pela nuca e ele me leva em direção ao
corredor dos quartos com mais pressa.
Engulo em seco devido surpresa e esboço um sorriso frágil, débil,
como se fosse uma menininha apaixonada.
Quando me encosto a uma parede, ele se aproxima de mim,
prensando seu corpo contra o meu, excitando a minha intimidade com o seu
peso e o seu cheiro.
Tão perto...
— Então vamos supor que você já seja a minha noivinha. Sabe como
vou parabenizar você? — pergunta com seus lábios a poucos centímetros
dos meus, fazendo a minha pele se arrepiar.
— Como? — sussurro.
— Pegando você de volta para mim. Fazendo de você minha. — A
sua outra mão livre toca a minha cintura e quero me prender a ele.
Olho profundamente para Jeremy e digo:
— Eu sempre fui e serei sua.
É o que basta para ele me beijar. Seus lábios tão ávidos, urgentes,
como se a sua vida toda dependesse unicamente disso.
Ele sabe o que está fazendo, cada lambida, chupada, mordida…
Jeremy não toma a minha boca para si, ele a domina. Principalmente,
quando a sua língua se envolve com a minha.
A cada empurrada que ele dá com a sua língua para dentro da minha
boca, ele pressiona seu corpo mais ainda contra o meu. Inclusive já posso
sentir a largura do seu pau roçar no meu ventre e quando permito que
minhas mãos passeiem pelo seu corpo, sinto cada músculo do seu corpo
reagindo a mim.
Eu amo isso, perceber que sou a causadora da reação em seu corpo
gostoso.
— Porra, senti tanta falta do seu beijo — ele diz com nossos lábios
colados.
As mãos afobadas de Jeremy então agarram cada pulso meu e ergue
meus braços para cima, os prendendo contra a parede, me deixando
completamente imóvel.
Mas eu também não irei para nenhum canto.
Seus beijos então descem para o meu pescoço e jogo a cabeça para
trás para ceder a ele mais espaço.
A essa altura já larguei o buquê.
Isso é tão impuro, mas gostoso pra caramba.
Quando seus dentes arranham meu pescoço e ele suga a pele logo em
seguida, deixo um gemido escapar.
— Aah, Jeremy... Sinto a sua falta, muito! — Caço seus lábios com a
minha boca.
Quando ele entende o que quero, volta a me beijar.
Mais uma vez é nós dois nesse corredor e agora correndo um risco
pior ainda de sermos flagrados.
Mas isso não parece importar.
Eu só quero envolver as pernas ao redor dele e deixar que ele faça
amor comigo aqui mesmo.
Jeremy passa a segurar meus pulsos com uma mão só, e com a outra
abaixa o decote do meu vestido, permitindo que um lado do seio fique à
mostra.
— E você não faz ideia do quanto eu senti, pequena. Caralho! — ele
chia, como se doesse na pele.
Ele está tão quente e não acho difícil que seu interior esteja
queimando, assim como o meu.
Se inclinando na direção do meu seio exposto, Jeremy começa a
passar a língua por ele.
Sabemos muito bem o que acontecerá se ele chupar, mas Jeremy é
sagaz enquanto usa a ponta da língua para me deixar excitada.
Isso é demais para mim.
— Ah, Jeremy! Por favor… — choramingo, precisando dele.
— Por favor o quê? — ele pergunta com a voz rouca.
Eu o quero mais que tudo!
Quando vou dizer a ele isso, um som estridente rompe entre nós dois.
Tão alto e desesperado, sem interrupções.
Choro.
Apenas um choro, que logo se tornam dois.
Ficamos nos olhando por uns segundos, para ter certeza de que isso
está acontecendo.
Contendo o riso, Jeremy pergunta de novo:
— Por favor o quê, Audrey?
Fecho os olhos, respirando fundo, ciente de que isso foi um banho de
água fria.
— Por favor, vá ver os gêmeos.
Claro que não queria dizer isso antes, mas agora parece ser mais
apropriado.
Mas Jeremy está rindo.
Ele levanta o meu decote e dá um beijo carinhoso no topo da minha
cabeça.
— Agora mesmo, mãezona.
Eu não percebi que estávamos no corredor dos quartos principais e
duas portas depois é o quarto dos gêmeos.
Vou seguindo Jeremy.
— O que aconteceu, pessoal? — ele pergunta aos gêmeos que se
sacodem nos berços.
— Deixa que eu pego a Allegra — digo indo em direção a ela.
Eu a pego com cuidado e quando me viro, Jeremy já está com Ethan
nos braços também. Olhamos um para o outro e começamos a rir enquanto
tentamos acalmar os gêmeos.
— Fico feliz que isso seja com você — ele diz se referindo a situação.
— Idem.
Os gêmeos podem até ter nos interrompidos, mas este momento
parece valer muito mais. Principalmente, quando Jeremy tem a ideia de
irmos para a sua cama, uma Kong Size e lá ficamos com os gêmeos.
Nos deitamos e dou de mamar para eles.
Lembro de ter adormecido com Jeremy me olhando e os gêmeos
acordados, mas quietos.
Em algum momento da madrugada, acordo e vejo Jeremy dormindo
com os gêmeos.
Sorrio ao ver a cena.
Parece ser o retrato real de uma família, onde os pais queriam se
divertir e os filhos acordaram, todo mundo foi para a mesma cama e os pais
ainda com a roupa que voltaram da festa. Onde a vontade de se divertir era
grande, mas o cansaço foi maior.
É uma cena que memorizo e guardo no meu coração, quentinha e
adorável.
Estou acordado há um bom tempo, mas não faço questão de olhar o
relógio. Tenho o receio do tempo passar e de repente perder a visão mais
bela que está bem diante de mim.
Audrey dorme tranquilamente, a sua respiração é suave e o alvorecer
doura a sua pele e seu cabelo que cai como cascata sobre os seios e o tecido
de cetim do seu belo vestido de madrinha ainda da noite passada.
Estávamos tão exaustos que simplesmente desmaiamos de sono.
Os gêmeos continuam aqui.
Faz tempo que tenho esperado por esse momento, onde acabo
dormindo na mesma cama que ela e nossos filhos. Sempre quis
experimentar essa sensação, de que a minha família está completa e que há
sentido finalmente nela.
Devo agradecer a Audrey pela minha boa relação com Julian e como
os gêmeos só estão melhorando as coisas.
Julian tinha razão, afinal.
Nós a queremos aqui, com a gente, porque é difícil de se ver longe
daquilo que parece tão certo.
E na noite passada, tive a certeza de que Audrey finalmente cederia.
Ela cedeu, mas a vida de pai e mãe falou mais alto, o que não foi um
problema, pois sabemos que apesar de tudo, estamos bem.
Eu só tinha receio de acordar e tudo ser um sonho.
Mas já descansei por tempo o suficiente.
Ainda com a roupa de ontem, mas sem o terno e a gravata, duas
coisas que procurei me livrar logo, levanto da cama e me espreguiço.
Não bebi muito como Ian fez, mas estou mais quebrado pelo fato de
ter dormido em um canto só da cama, com receio de rolar para cima dos
gêmeos.
No geral, foi uma noite bem inquietante para mim.
Vez ou outra acordava para ver se estava tudo bem. Não sei, mas
parece ser um medo natural que acompanha os pais de primeira viagem.
Saio do quarto, noto que a casa está muito quieta e quando chego ao
andar inferior, rastros da noite passada estão por todo canto.
A atmosfera aqui deixa nítido que houve uma festa, todo mundo
encheu a cara e agora dormirão até meio-dia.
Mas aposto que papai já deve estar acordado.
Saio para a varanda do jardim e fico dali vendo o que restou do
casamento. Apenas algumas estruturas, as mesas e cadeiras, a mesa de
comida está coberta e cheira a vinho e champanhe, como se eles tivessem
tomado o suficiente para ter empesteado o ambiente a céu aberto.
Não consigo evitar um sorrisinho.
Noah está casado e agora é com certeza com o amor da sua vida.
Ele e Meredith estavam incríveis ontem e Liam levando as alianças,
certamente foi o auge da noite. Mas não tanto quanto o momento em que
Audrey e eu ficamos sozinhos lá em cima.
Eu gostaria mesmo de ter terminado com aquilo, mas foi impossível.
Não quero parecer um tarado desesperado, mas sinto muita falta dela
e agora que eu sei que ela é minha, não preciso ter tanta pressa assim.
Pensando nela, logo atrás de mim, ouço um gemido e então duas
mãos familiares e delicadas me abraçam por trás enquanto desliza os dedos
pela extensão do meu peito.
— Humm, bom dia — ela diz de um jeito muito manhoso.
— O que faz fora da cama essa hora, pequena?
— Senti a sua falta. — Ela deita a cabeça contra as minhas costas e
parece querer carinho.
Seguro sua mão que me acaricia e começo a retribuir o toque.
— E os gêmeos?
— Ainda estão na sua cama, mas avisei mamãe antes de descer. Acho
que eles tem um novo lugar favorito.
Sorrio e então me viro de frente para ela. Audrey ainda tem um pouco
da maquiagem da noite passada, mas continua linda. Seu cabelo que estava
preso em um coque na festa, se desfez, formando belos cachos ondulados.
Ela cheira a manhã e sua pele parece seda sob a luz do sol.
Não me contenho e deixo que minhas mãos acariciem seus braços.
— Posso comprar outra cama para nós — comento a fazendo sorrir de
lado.
— Isso é um convite para que eu me mude de quarto?
— Bem, você poderia ter feito isso há muito tempo, mas tudo bem ser
agora. Antes tarde do que nunca. — Me inclino até ela e então provo seus
lábios com gentileza, como tem de ser feito no primeiro beijo matinal.
— Por que está aqui em baixo?
Solto um forte suspiro e olho para o céu.
— Vim pensar um pouco. Agradecer por tudo o que tem acontecido.
Sinto finalmente que estou em paz, que as coisas agora fazem tanto sentido
quanto antes.
— Devo ter atrapalhado o seu momento de reflexão.
Quando Audrey tenta se esquivar, a prendo mais ainda em meus
braços.
— Não, você… Nunca pense que é um empecilho, Audrey.
Ela balança a cabeça, concordando.
E então uma curiosidade me surge também:
— E você estava me procurando? Por quê?
Seu sorrisinho é um pouco malicioso.
Interessante…
— Apesar de ter dormido, acabei sonhando com a gente. Então
acordei pensando na gente também, ontem de noite, e lembrei de uma coisa.
O sol que desponta ao leste, atrás das árvores, finalmente brilha cada
vez mais, iluminando o rosto de Audrey como ouro.
“Linda!”
Aos poucos, a natureza também se desperta. No entanto, quando
Audrey vai falar, há um silêncio.
— Lembrei que percebi que amava você naquela manhã que você ia
embora. Eu acordei e vi você. Minha cabeça soube no mesmo instante o que
estava acontecendo com o meu coração. E agora, nesta manhã, quando
acordei e não vi você, fiquei um pouco desesperada, porque tive medo de
ter sido apenas um sonho. O nosso beijo de ontem… Eu só não queria que
tivesse sido a minha imaginação.
— Não foi. E isso tudo não foi apenas um sonho. Às vezes eu me
pergunto a mesma coisa, mas coisas simples me mostram a verdade. Como
o som da sua voz, ou da sua risada, o choro dos gêmeos e até mesmo o seu
cheiro. — Solto um forte suspiro, sentindo meu coração se apertar. — Não
sei mais viver sem isso, Audrey. Dói só de imaginar como seria se de
repente você partisse.
— Por que eu iria embora?
Dou de ombros.
— Você foi da primeira vez e com razão. Mas eu não darei mais
motivos. Se tem uma coisa que eu tenho medo é de perder a minha família
que é o meu mundo. Eu lutarei até o final por vocês, mesmo que precise
lutar contra mim mesmo.
Essa é uma das poucas certezas que tenho na vida.
Audrey tocada pelo momento, fica nas pontas dos pés e me beija. É
uma forma de me confortar, e, principalmente, mostrar que ela está aqui e
que está tudo bem.
Ela fica mais abraçada a mim e a envolvo em meus braços, querendo
torná-la uma parte minha.
Quando se afasta, seu nariz ainda roça ao meu enquanto acrescenta:
— Nada irá nos separar, Jeremy O’Donnell. Eu sou sua e nada poderá
mudar isso.
Fico olhando para ela, então seguro a sua mão e a guio até a escada da
varanda, muito decidido do que fazer.
— Aonde estamos indo? — ela pergunta quando começamos a
atravessar a decoração do casamento e então alcançamos o campo do
terreno da mansão.
Eu não respondo da forma como ela quer, apenas sorrio e peço para
ela apressar o passo porque senão irei me esquecer do que estou fazendo, o
que não é verdade.
Pegamos uma das trilhas que ela costumava usar para caminhar com
Theo, então cortamos a área marcada, atravessamos o mato e algumas
árvores.
Claro que eu a ajudo, para ela não se machucar ou rasgar seu vestido,
pois eu ainda o quero inteiro.
— Eu deveria começar a me assustar? — ela pergunta e sorrio de
novo.
— Quero mostrar para você um lugar especial que encontrei meses
atrás.
— Pensei que esse lugar já fosse todo mapeado por ser uma
propriedade particular, principalmente.
— É, mas não estamos mais nos parâmetros da mansão, então…
Eu a ajudo a descer, a pegando pela cintura e então a colocando no
chão.
Audrey está descalça, eu também, mas só pisamos em terra e musgo,
o que indica a umidade do local e que estamos chegando.
— Como foi que você encontrou esse lugar? — Ela quer saber.
Suspiro antes de confessar algo que escondo até mesmo dos meus
irmãos nos últimos meses:
— Toda vez que eu vinha pra Dublin, não ficava na mansão. Eu não
aguentava porque tudo passou a me lembrar de você. Então ficava em um
hotel, o mais próximo da propriedade. Certo dia, quando tive que ficar por
mais tempo aqui, procurei uma forma de me distrair. Eu fui andar sozinho e
acabei encontrando este lugar. — Paro e olho para a frente.
Audrey faz o mesmo e lá está o belo lago de água cristalina que
descobri em uma das minhas caminhadas tristes.
Ela fica de queixo caído e confesso que também tive a mesma reação
na época, porque o lugar parece ser um mini paraíso.
— Passei muito tempo aqui apenas pensando no dia em que o
mostraria a você — confesso.
— E você está me mostrando agora.
— Sim. E eu tenho certeza de que não quero mais nada, além disso,
Audrey. Quero que esse seja o nosso lugar secreto. Quero vir aqui com você
toda primavera e pensar em como consegui realizar a primeira coisa que
pensei quando estive aqui, que foi trazer você. — Passo a ficar atrás dela e
massageio seus ombros.
Prontamente, Audrey relaxa e inclina a cabeça para o lado.
— Parece que você pensa muito em mim — ela sussurra.
— O tempo todo — sussurro em seu ouvido e deixo minhas mãos
deslizarem por seus braços. — E ontem à noite, se não tivéssemos feito as
pazes, eu teria enlouquecido porque não aguentava mais ficar longe de
você. Até mesmo agora, tenho a leve sensação de que você continua tão
distante de mim. — Pressiono meu corpo contra o dela que arfa.
Eu sei o que isso...
Desejo matinal.
Como se já não fosse o suficiente a forma como fomos dormir na
noite passada, carregados de prazer, mas domados pelo cansaço. E agora de
manhã, nós dois aqui, só mostra que nada mudou nas últimas horas.
— E eu quero que você admita, Audrey, que veio me procurar por
isto. — Começo a brincar com a alça do seu vestido, mas não as tiro do
lugar, pois tenho certeza de que no tempo certo, elas despencarão.
— Todos esses dias vivendo sob o mesmo teto e você agindo como se
o seu corpo não estivesse implorando por nós. Eu observava cada
movimento seu e eu tinha certeza do que você precisava. — Desço a mão
pelo seu corpo e sua cabeça se deita em meu peito.
Quando olho para ela, a vejo de olhos fechados e mordendo o lábio,
como sabendo exatamente o que eu queria fazer, e ela está justamente aqui,
se entregando.
— Jeremy… — Sua voz sai sem forças.
Porra, ela está quase se desmanchando e eu nem a toquei direito,
apenas deixo minhas mãos passearem por lugares “permitidos”.
— Sim, pequena?
Audrey passa um braço por mim, se envolvendo ao meu pescoço.
— Você fala de mim, mas e quanto a você?
Dou um sorrisinho.
— Nem preciso dizer que foram dias de tormenta, não é? Foram
tantos momentos em que precisei me aliviar sozinho enquanto pensava em
você, nesse seu corpo gostoso. Meu coração e minha alma pertencem a
você, mas o meu corpo, ele sempre vai querer o seu. É apenas o seu que o
deixa louco. — Afundo minha mão no vão da sua boceta.
Antes mesmo de começar a estimular, Audrey já está se perdendo em
mim.
Sinto quando seu braço se aperta em meu pescoço e me vejo tentado a
colocar mais força e vontade enquanto a toco sobre o pano macio do seu
vestido.
— Eu senti tanta a sua falta, Jeremy... — ela choraminga, se virando
totalmente para mim, enquanto toco o meu rosto. — Você foi o meu
primeiro homem e quero que seja o único.
Observo Audrey retirar as alças do seu vestido que deslizam como
uma pluma por seu corpo, revelando a sua pele linda e macia, e as curvas
que ficaram só mais bonitas depois da gravidez.
— Você continuará amando o meu corpo, mesmo não sendo mais o
mesmo?
Eu a olho, procurando pelas razões que a levam dizer isso.
— Eu só poderia estar muito louco. — Pego seu queixo para que olhe
para mim. — Meu amor, no dia que julgar o seu corpo, me deixe. Eu não
serei mais homem o suficiente para lidar com uma mulher e você irá
merecer coisa melhor.
Audrey exibe um sorriso, a puxo para mais perto e seus olhos brilham
quando ela sente a minha ereção.
— Mas, para a sua sorte, não serei capaz de fazer isso, porque quero
ser o homem perfeito para você, Audrey. — Tomo seus lábios com mais
urgência.
Já demos o primeiro beijo matinal, então esse deve ser mais feroz,
porque é o que exatamente o momento pede.
Deixo que a minha língua invada a sua boca, cheia de calor e desejo.
— Como vamos fazer amor aqui? — Audrey pergunta sorrindo,
sabendo exatamente onde isso terminará.
Com nós dois juntos.
— O lago não é tão fundo — aviso e ela dá um sorrisinho, dando
mais uns beijos singelos e convidativos.
— Então espero você lá dentro — ela diz.
Audrey, que já está quase nua, apenas tira a calcinha, então entra
lentamente no lago de água cristalina e totalmente limpa.
O lugar parece ser um santuário, rodeado de árvores, rochas, a luz do
amanhecer iluminando o local e o cheiro limpo da natureza.
Ela não entra totalmente no lago, permitindo que a água bata até suas
coxas, enquanto me espera. Então começo a tirar a roupa e Audrey fica me
observando, como se eu fosse a porra de um deus.
Depois de já estar nu, entro na água ignorando a água fria, mas meu
pau lateja. Meu sangue todo está ali, bombando o músculo.
Quando me aproximo de Audrey, antes mesmo dela me beijar, sua
mão se fecha em torno do meu membro e solto um gemido dentro da sua
boca quando a beijo com vontade. Seus dedos tocam meu pau e o
movimento para cima e para baixo, em um ritmo que parece ser o tipo de
movimento que ela gostaria que eu fizesse dentro dela.
— Você não é o único que sentiu falta de tocar. Eu também quis tanto
tocar você, por tantas noites, Jeremy. Mais uma vez, sozinha, pensava em
você — ela admite com os lábios próximos aos meus.
Tomado por um desejo além da compreensão, a pego com destreza e a
levo para a margem do lago, onde a deito na beira.
Audrey vibra quando a água encosta nas suas costas, mas logo me
recebe de braços abertos quando me posiciono em cima dela.
— Você sabe o que quero fazer aqui e agora, não é?
Ela apenas balança a cabeça, como se não pudesse mais aguentar
também.
Eu quase posso ver Audrey implorando por isso.
— Apenas faça — ordena, arqueando suas pernas, para facilitar.
Sorrio satisfeito, por ela estar tão disposta.
Começo beijando o seu pescoço, deixando a minha mão passear por
seu corpo conforme beijo a extensão do seu pescoço esbelto e desço em
direção aos seus seios enormes.
Passo a língua neles e ela geme, arquejando o quadril, já pedindo por
mais.
Eu não posso julgá-la, pois também estou desesperado.
Mas será a primeira vez de Audrey, em meses, e após ter tido bebê,
então quero “prepará-la”.
Traço uma linha invisível em sua barriga com a minha língua e isso a
faz arfar. E a medida que vou me aproximando do seu sexo, sinto urgência
em chegar logo lá.
Sinto quando Audrey pega o topo da minha cabeça e me empurra para
baixo, me fazendo sorrir.
— Tá apressada, pequena?
— Não brinque comigo, Jeremy.
Bem, não quero provocá-la e farei o que ela quer, com todo prazer.
Passo a língua em sua fenda, me demorando em seu grelinho inchado.
Audrey quase grita, mas se contém. Então passo a língua de novo, até
abri-la completamente.
— Oh, meu Deus… — ela geme, segurando meu cabelo com força.
Seu gosto continua incrível, é macia e quentinha, do jeito que gosto.
Faço de tudo para o meu pau não entrar na água gelada, então começo
a me masturbar enquanto a chupo.
— Porra, tão gostosa! — murmuro com a cara deitada em sua
bocetinha, enquanto eu me lambuzo dela, passando a minha barba, a boca e
a língua. — Eu fico louco com isso aqui, sabia? — rosno, voltando a chupá-
la com mais selvageria.
Por um momento, penso que Audrey gozará, mas ela se mantém
firme. Vejo quando se apoia nos cotovelos, seu cabelo está ensopado e isso
molha o resto do seu corpo.
Caralho, ela está sexy pra cacete!
Paro de chupá-la e me aprumo de joelhos diante dela. Audrey é tão
pequena diante de mim, e posso fazer o que quiser com seu corpinho.
Seguro sua perna e me encaixo em sua entrada. Ela fica me olhando e
sem dizer uma palavra, me afundo nela, aos poucos, a vendo morder os
lábios, ficando vermelha enquanto segura os gemidos altos.
— Isso te lembra algo?
Ela sorri.
— Só você mesmo pra causar essas sensações em mim.
— Eu vou fazer amor com você, Audrey, mas depois quero trepar pra
valer — aviso a deitando de volta na beira do lago.
Começo a me mover dentro dela, lentamente, e então, logo depois,
com força o suficiente para ser prazeroso, mas nada selvagem.
Porra, ela continua tão apertada e macia e amo isso.
Estamos fazendo amor, lábios colados, braços envolvidos um no
outro enquanto a penetro como um cavalheiro.
Parece ser uma necessidade estarmos assim e podia sentir tudo de
forma mais intensa, porque Audrey sentia o mesmo que eu.
É como se fôssemos nos desfazer aqui mesmo.
Inesperadamente, ela então faz força para inverter a situação, e de
repente, Audrey está em cima de mim, comigo ainda dentro dela, onde ela
faz apenas cavalgar como se eu fosse a porra do seu cavalo.
Nesse instante, entendo que ela quer mais e que se entregará a mim,
no meio da natureza, com os animais servindo de testemunha e um
amanhecer exuberante.
Quando Audrey começa a cavalgar em mim, percebo como a luz
doura um lado do seu corpo. Seguro seus seios e ela joga a cabeça para trás.
— Eu amo que seja você, Jeremy.
Eu me ergo e seguro seu cabelo, a fazendo reparar em mim, enquanto
tomo uma decisão que certamente, me fará mais feliz ainda a partir da
resposta dela.
— Eu te amo, Audrey. Seja a minha esposa.
Ela me olha surpresa, até mesmo parando de cavalgar em mim.
— O quê?
— Case-se comigo. O que mais resta? Temos filhos lindos e
saudáveis, nos amamos e podemos ter uma casa só nossa. O que mais
impede de nos casar?
— Você quer se casar comigo?
Sorrio diante da sua confusão.
— Eu quero, agora só falta saber se você quer. Aliás, você pegou o
buquê, não foi?
Ela balança a cabeça e sorri.
— Sim, eu peguei.
— Eu disse que você seria uma mulher de muita sorte e a minha
missão é fazer isso ser verdade.
Ela encosta a cabeça contra a minha, com a respiração ofegante.
— Eu já sou essa mulher, Jeremy. Mas, eu aceito, porque quero
continuar tendo essa sorte ao seu lado.
Eu a beijo e seguro a sua cintura.
Sentada em meu colo, Audrey volta a se movimentar.
Então é isso. Iremos nos casar e isso faz toda diferença nesse
momento, pois estamos fazendo amor como noivos pela primeira vez.
Nossos gemidos ecoam na floresta como canção.
Sinto meu pau endurecer como estaca e então chegar ao clímax,
derramando tudo dentro de Audrey, que me aperta dentro de si e parece ir à
loucura.
Sou tomado por um momento em que a vida não parece ser real e me
sinto dentro de um filme, ou livro, pois a cena é bela e o que temos é
verdadeiro.
É isso o que resume a Audrey...
Beleza e verdade, como o nosso amor.
O pedido de casamento que fiz para Audrey não foi uma coisa que
simplesmente fiz na emoção do momento, eu realmente queria fazer aquilo
com ela, nos tornar um só, fazê-la usar o meu sobrenome e poder chamá-la
de minha esposa. Por isso, decidimos nos casar ainda no verão, quando
completou um ano que nos conhecemos.
Eu tinha certeza de que não precisávamos esperar mais tempo, afinal
aquilo era o certo e o tempo também parecia ser ideal.
Não tinha como relutar contra aquilo.
No entanto, casar requer preparos e tempo. Porém, tudo o que
queríamos era só fazer uma coisa legal e aproveitar o tempo bom.
Papai então nos sugeriu a ideia de um cruzeiro e pensamos, “por que,
não?”.
O Cruzeiro Dom é um dos maiores que cruzam o Mediterrâneo e
pesquisamos a respeito, até descobrirmos que eles fazem cerimônias de
casamento, disponibilizando não só o lugar, como também os funcionários e
uma cerimonialista particular.
Pareceu ser perfeito, porque era tudo o que precisávamos.
Então, agora estamos aqui, navegando pela Sicília e daqui a dois dias
será o casamento.
Estamos nos preparando, apesar de que vai ser uma coisa mais
intimista.
Convidamos amigos e familiares, os mais próximos possíveis.
Nada era tão importante do que apenas oficializar a união entre
Audrey e eu, e deixar de alguma forma registrado, com um buffet incrível,
os melhores champanhes e fogos de artifícios.
Estou no salão de jogos com Noah, acabamos de ganhar uma partida
de poker e agora estamos relaxando em uma mesa próxima às paredes de
vidro.
Noah está inquieto, parece que é alguma coisa sobre como ele não se
dá bem em estar em alto-mar e por isso precisa de remédios para lidar com
enjoos.
— Você parece estar bem, irmão — comento ironicamente, tentando
disfarçar o sorriso.
— Depois disso, espero mesmo que você me considere o seu irmão
favorito. Olha só o que estou passando por você! — ele exaspera.
— Bem… Obrigado?
— Se depois desses dias navegando pelo Mediterrâneo eu não ficar
bom disso, nunca mais ficarei.
— Isso é um jeito bem otimista de ver esse lado da situação.
— Ah, vá à merda!
Começo a rir do meu irmão.
E nesse instante, Ian surge. Ele pega uma cadeira, se senta, parecendo
estar exausto e não é porque está curtindo o cruzeiro adoidado.
Não, Ian não é tão festeiro e galinha quanto Noah era. Ele é mais na
dele, um homem que apesar de toda personalidade agradável, acaba sendo
uma incógnita para mim, no final.
— Não são nem onze horas da manhã e vocês já estão discutindo —
ele relata.
— Desde que não seja com a minha esposa, tá de boas — Noah
admite.
— Vocês parecem tão bobões com esse negócio de esposas — Ian diz.
Torço o nariz pra ele.
— Pensei que você fosse super a favor de casamentos. Quer dizer, o
que aconteceu com o Ian que escrevia cartas românticas para as meninas do
ensino médio, propondo casamento e um futuro feliz?
Noah ri quando digo isso e Ian me olha, entediado. E antes que ele
possa ter a oportunidade de se defender, Noah acrescenta:
— Ele está com inveja, Jeremy, porque é o único irmão agora sem
mulher e sem filhos.
— Para alguns isso seria considerado sorte — Ian diz para se
defender, mas sabemos que o pensamento dele não é esse.
— Não é o seu caso, não é? — Noah pergunta.
— A questão é que sou novo e tenho muito a viver ainda.
— Você vive de trabalho, está sempre em convenções e enfurnado em
laboratórios com a sua equipe de TI. Então, não, você nem sequer parece
saber o que é viver.
Ian fica olhando para Noah, como se soubesse que nada dá para
rebater isso.
Sinto o clima mudar, como se até mesmo Ian tivesse sido atingido
pelo que foi dito. Porque verdades podem ferir e Noah tá pouco se lixando,
afinal é o irmão que adora encrencar, ficando pouquíssima coisa atrás de Ian
nesse quesito.
Eu diria que a briga é deles, então eles que se entendam.
No entanto, como sou o irmão mais velho, tenho o dever de apaziguar
a situação.
— É a vida dele, Noah. Não pode forçar o Ian a mudar o que está
bom para ele.
Ian me lança um olhar de esguelha e, nesse momento, sei que estou
enganado.
— Ou não está? — pergunto preocupado.
Silêncio se forma e Ian desvia o olhar, como quem está
envergonhado.
Porra, talvez Noah tenha razão!
Ian pode estar não com inveja, por ser um sentimento ruim, mas
carente.
Ian sempre foi um cara alto astral e dificilmente o vemos tendo um
dia ruim. Claro que com a morte da nossa mãe, ele andou mais deprimido,
mas depois de um tempo se recuperou.
Sei que Ian também tem insegurança com a cicatriz nas costas e que
isso o deixa um pouco longe das mulheres, principalmente quando elas
veem a cicatriz.
Confesso que me sinto culpado até hoje.
Era para ter sido eu, não ele.
No entanto, na mesma proporção que aquilo o incomoda, Ian também
se orgulha. Não é à toa que é tão próximo de Julian. Pelo sobrinho, meu
irmão faria aquilo de novo e de novo.
Antes que Ian pense em dar uma resposta, risadas femininas passam
pela porta quando um grupo entra no local.
É Audrey, Meredith, a irmã dela e mais uma loira que não faço ideia
de quem é.
As quatro parecem estar em uma conversa agradável, que rouba toda
a atenção delas.
Enquanto ainda estão longe o suficiente, Noah comenta:
— Ainda não acredito que finalmente Audrey cedeu ao serviço de
babás.
Solto um suspiro aliviado, porque eu também ainda não acredito e
estou feliz por isso. No entanto, Audrey ainda chegou a hesitar quando dei a
ideia, porém, não havia para onde correr. Precisávamos de uma babá no
cruzeiro, e então, curtir ao máximo o nosso casamento.
— Ela precisava aproveitar. Nós precisávamos — comento, a vendo
se aproximar, tão linda, cheia de luz e feliz.
Felicidade é sem dúvida o melhor adjetivo para resumir a Audrey.
— Meredith também dificultou muito, mas depois que ela passou a
trabalhar com outras coisas, cedeu. E foi bom, porque ela percebeu que isso
não anulou o papel dela de mãe e nem o meu de pai.
Quando estão se aproximando, Ian dispara:
— Querem saber o que me dá medo?
Noah e eu não dissemos nada, enquanto Ian apenas encara o horizonte
do mar azul e responde:
— Não é o casamento. Eu ficaria muito feliz se tivesse uma mulher.
Mas… Filhos? Às vezes sinto que não sei cuidar nem de mim. E, até certo
tempo, isso não me preocupava. — Olha para Noah e depois para mim, um
pouco espantado. — Até o Noah conseguir engravidar a Meredith e você ter
se tornado pai de gêmeos. Como isso foi possível? Não deveríamos ser tão
bons assim, não é?
Ele se refere ao fato de que não costumávamos ser bons reprodutores.
Tivemos alguns problemas quanto a isso, tanto que apesar de namorar
desde os dezessete anos, me tornei pai aos vinte e quatro. Noah passou
também por um longo, demorado e inesperado processo, mas aconteceu.
E agora, quinze anos depois, eu me tornei pai de novo, e de gêmeos.
A preocupação de Ian é compreensível.
— Cara, apenas use camisinha — Noah aconselha.
Mas Ian continua preocupado.
— Olá, bom dia! — Audrey diz quando se aproxima. — O que estão
aprontando?
Noah arqueia as sobrancelhas.
— Por que acha que estamos aprontando algo? — ele pergunta como
se estivesse se sentindo ofendido.
— Ah, pelo amor de Deus, amor, todo mundo sabe que vocês três
juntos só tem artimanhas — Meredith diz a Noah.
Noah me olha e diz depois de parecer pensar em uma desculpa.
— Bem, se quer saber, estávamos pensando em uma acompanhante
para Ian para o dia do casamento.
Olho incrédulo para ele, mas logo entendo o que está querendo dizer.
— Ah… É. Sim, pois é. Uma acompanhante para o Ian — confirmo.
— Para mim?
— É, só para a noite ser mais divertida — Noah tenta explicar. —
Aliás, todo mundo estará de casal e você de repente se sentirá melhor com
alguém.
— Não — Ian rebate indiferente. — Eu não preciso de ninguém.
No meio do silêncio que se forma, uma risadinha chama a nossa
atenção, principalmente a de Ian.
A loira de olhos azuis que chega com as meninas segura uma
prancheta nas mãos, então coloca a mão em frente a boca e fica séria.
— O que foi? — Ian pergunta.
— Ah, nada. — Ela apruma a postura e exibe um sorriso gentil a
todos. — A propósito, sou secretária do senhor Domenico, dono do
cruzeiro. Ele pediu para ver se está tudo em ordem com os preparativos
para o casamento.
— Está tudo ótimo. A hospitalidade de vocês é incrível, Grace.
Obrigada — Audrey diz logo atrás de mim, onde começa a fazer massagens
nos meus ombros.
— Ah, que bom! O Cruzeiro Dom fica muito feliz com este feedback!
— Grace diz.
— Grace, vai estar no casamento? — Noah pergunta.
— Ah, si-sim, senhor Noah. Mas estarei provavelmente para
acompanhar o processo de organização e essas coisas. Tenho que passar
depois tudo para o meu chefe.
— Sei como é — Meredith comenta.
— Bom, vai ser uma honra tê-la na festa — Audrey diz.
— É. Posso até apresentá-la ao meu irmão Ian. — Noah dá um
tapinha no ombro do nosso irmão, que faz uma careta.
— Não! — os dois dizem em uníssono e há surpresa nos demais.
A garota que anda toda bem-vestida, ajeita a postura e pigarreia.
— Não, obrigada, mas vou ter que recusar.
— Algum problema em me conhecer? — Ian pergunta.
Ela olha para ele que retribui o gesto e ficam se encarando.
Dou uma olhada de esguelha para Audrey.
O que está acontecendo aqui?
Minha noiva dá um sorrisinho nervoso.
— É que eu já conheço você — Grace responde.
— Somos famosos mesmo — ele rebate.
Ela torce o nariz quase discretamente e nesse momento sei que deve
nos odiar, ou talvez tenha algo contra Ian, em particular.
— Mas a sua fama não é boa, só para esclarecimento — ela
exemplifica.
A essa altura, Noah e eu estamos nos segurando para não rir do nosso
irmão que está se dando mal com uma mulher, bem na nossa frente.
— Então você não me conhece — Ian enfatiza.
Grace o olha por mais um tempo, piscando atônita e então se vira para
Audrey e eu, o ignorando completamente.
— O casamento de vocês será daqui dois dias. Se quiserem qualquer
coisa recorrente a cerimônia, podem vir até mim. Comida, decoração,
bandas… Todas essas coisas podemos agilizar.
— Isso é muito legal, Grace. Obrigado — digo a ela.
Ian é mais rápido:
— Vem cá. Você é a assistente do dono, ou organizadora de eventos?
Ian está sendo debochado.
Poucas vezes vi o meu irmão agir desse jeito, mas é o suficiente para
saber que ele está interessado pela simples forma como a olha.
— Os dois. Agora, se puderem me dar licença. — Ela é gentil, mas
afiada na pronúncia.
Grace se afasta, logo saindo do salão. Mas Ian não para de olhar na
direção em que ela some.
Noah solta um assobio e as meninas riem sem jeito.
— Ok, isso foi… — Audrey começa.
— Intenso — Meredith diz.
— Intenso, não. Tenso, mesmo — a irmã da minha cunhada diz. — O
Ian visivelmente não é a pessoa favorita dela.
Quando ela diz isso, vejo um sorriso se formar no rosto de Ian.
Conheço o meu irmão e sei que poucas coisas no mundo fariam meu
irmão caçula reagir dessa maneira.
E isso é interessante, pois, só mostra que ele encontrou algo para ter a
sua total atenção durante os próximos dias...
E ela é loira, alta, com pinta de modelo, secretária de um magnata
italiano e se chama Grace Doyle.
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