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Playlist

Nota da autora

Olá, queria leitora! Seja bem-vinda ao universo Milani. Aqui você


não vai encontrar um mocinho doce de início. Leonardo Milani é um
homem com vários traumas e isso o tornou controlador e obsessivo. Ao
contrário de Samanta, que é um doce. Eles são diferentes, mas se
completam. Espero que você se apaixone por esse casal assim como eu.

Obsecado Por Ela é um romance dark que contém gatilhos para


violência física, verbal, abuso psicológico, tentativa de estupro e morte. Se
você é sensível a qualquer um desses temas, por favor, não leia este livro.

Com carinho,
Adri luna
Sumário
Prólogo
01
02
03
04
05
06
07
08
09
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Herdeiros Milani
Agradecimentos
Copyright © 2023 Adri Luna

Capa: Vitória Santos


Diagramação: Larissa Braz

Livro registrado na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, em março de


2023.
Recife – Pernambuco, Brasil, 2023.

Todos os direitos reservados. Informamos que todos os direitos desta obra


são reservados e protegidos pela lei 9.610 de 19/02/1998. Nenhuma parte
ou personagens deste livro, sem a autorização prévia da autora por escrito e
registrada, poderá ser reproduzido ou transmitido, seja em quais forem os
meios empregados: eletrônicos, mecânicos, fotográficos, gravação ou
quaisquer outros.
Esta é uma obra fictícia, quaisquer semelhanças com pessoas reais vivas ou
mortas é mera coincidência.

CONTATO:

E-mail: adrianalunagaldino@gmail.com
Instagram: @autoraadriluna
Para a querida Jaqueline Chieza. Leonardo Milani é todo seu,
aproveite sem moderação.

E para todas as minhas maravilhosas leitoras, que fizeram esse casal ganhar
vida e cederam um espaço especial em seus corações para essa história.
Prólogo
A frieza do Lobo

Samanta Antonelli

É tarde da noite, quando chego em casa do trabalho, um clima


fúnebre de quem perdeu um familiar toma conta de todo ambiente. O meu
pai está agarrado a vários papéis sobre a mesa enquanto lágrimas caem dos
olhos da minha mãe, as quais ela tenta disfarçar cortando cebolas. Eu já
havia bisbilhotado os papéis várias vezes e outras tantas ouvi a minha mãe
falando sobre o assunto com o meu pai, dez parcelas em atraso, ele
hipotecou a nossa casa e recentemente recebemos a ordem de despejo. Olho
para o meu irmão que assiste TV na sala, ele tem seis anos e ainda não tem
muita percepção das coisas, o que me deixa um pouco tranquila.
O meu pai me olha e junta todos os papéis apressadamente, mesmo
que eu já saiba de tudo, ele se finge de forte e assume a postura de provedor
do lar.
— Boa noite, filha. Quer comer algo? — pergunta a minha mãe.
— Não, obrigada! Já comi no trabalho — dou um beijo neles e vou
para o meu quarto.
Pego o cartão que um rapaz me deu, ele é o assistente do homem que
se ofereceu para quitar a hipoteca da nossa casa em troca de passar uma
noite com ele. Aperto o cartão na mão com força e choro. Não vejo outra
saída e resolvo ligar para ele, o homem atende prontamente como quem
aguarda ansioso pela ligação.
— Alô… — diz ele.
— Senhor, aqui é a Samanta — falo, um pouco nervosa.
— Pode falar, estou ouvindo — ele é frio do outro lado da linha.
— Eu… eu… aceito a proposta do seu patrão — digo e ouço um
suspiro do outro lado da linha.
— Certo, senhorita. Em uma hora o motorista irá buscá-la para a
trazer até o local onde o meu chefe irá te encontrar.
— Tudo bem.
Encerrando a ligação, sigo para o banho, escolho uma roupa boa o
suficiente para ir até o homem a quem estou vendendo os meus sonhos de
encontrar um amor e me casar virgem. Queria que fosse como aconteceu
com os meus pais, únicos um para o outro.
Desço e todos já estão dormindo, fico aguardando na janela e logo
vejo o carro se aproximar. Saio, fechando a porta, caminho até o carro e um
homem com uns quarenta anos desce e abre a porta para que eu entre. Logo
me sento no banco de trás, vamos calados todo o caminho e percebo que, às
vezes, ele olha pelo retrovisor do carro. Esfrego as minhas mãos uma na
outra em um gesto nervoso, o meu corpo treme, estou apavorada, nunca
fiquei com um homem.
E se ele não for gentil?
— Chegamos, senhorita. O senhor lhe aguarda no vigésimo primeiro
andar, quarto cento e um — fala sem se virar para trás.
— Certo, obrigada — a minha voz saí como um sussurro.
Desço do carro e entro no prédio, me identifico na recepção e logo
entro no elevador, que sobe até o andar, caminho até a porta e bato.
— A porta está aberta, entre — uma voz forte e fria responde do outro
lado.
Entro em um quarto tomado pela escuridão e o que consigo ver é a
silhueta de um homem que está de costas, observando a cidade pela imensa
janela. Ele se vira para mim e, pela sombra que vem da pouca luz que entra
pelo vidro, consigo perceber o quanto ele é alto e forte. Ele começa a se
aproximar lentamente, e as minhas pernas tremem quando está bem perto.
Não consigo segurar as lágrimas que saem dos meus olhos, queria poder vê-
lo melhor, mas a pouca luz me impede de enxergar. Também não consigo
encará-lo por muito tempo, estou extremamente nervosa.
— Beba isso — ele é ríspido, e estende para mim um copo de bebida.
— Eu… eu não bebo, senhor… — a minha voz sai baixa.
— Beba logo isso, estou mandando! — ordena em um tom alto,
estrondeante.
Assusto-me e obedeço imediatamente, tomando tudo de uma vez.
Tusso algumas vezes, a bebida é forte demais.
— Boa menina — ele passa a mão pela minha cabeça. — Por que está
tão nervosa? Não pretendo machucar você, pelo contrário.
O homem levanta o meu rosto e passa o polegar pela minha face,
secando uma lágrima que escorre dos meus olhos.
— Vem cá, vou te ajudar a relaxar.
Ele me pega pela mão e nos leva para o meio da sala, a milímetros de
distância, sinto o seu cheiro e era bom. Os seus dedos percorrem
gentilmente a curva da minha cintura e depois sobem até as alças da blusa,
as puxando para baixo. Arfei, ainda mais nervosa e intimidada, engoli em
seco a vergonha que me estremece por dentro.
Em uma questão de segundos, os meus seios estão à mostra para um
completo estranho, penso em cobri-los com os braços, mas não faço. E
assim, peça por peça, ele tira a minha roupa com delicadeza. Não o olho
diretamente, mas sinto o seu olhar queimando a minha pele, enquanto ele
avalia cada parte do meu corpo. Então, surpreendentemente, o homem me
dá um beijo na boca, o meu primeiro beijo. Arfei assustada outra vez,
cobrindo de maneira sutil os lábios com os meus dedos, que tremem suando
frio.
— Tão inocente, minha menina — fala, enquanto passa a mão pelo
meu corpo. — Venha.
Entrelaçando os nossos dedos, me leva até a cama, o meu coração
palpita, ele me deita e sutilmente abre as minhas pernas, o meu corpo
inteiro treme de forma perceptível. Ele me observava e, pouco depois, se
ajoelha no colchão, abaixando o rosto até a minha intimidade. Até as pernas
tento fechar, mas ele me impede.
Sinto algo úmido e quente me tocar, gemi assustada, encarando o teto,
então, sinto de novo, pequenos gemidos de pânico ainda escapam dos meus
lábios, mas ele não parou. Não sei onde a sua língua toca, mas é
estranhamente bom. De um jeito inesperado, fico mais relaxada. Já não
sinto mais o meu corpo tremer tanto, os meus olhos se fecham
involuntariamente e, preciso confessar, aquilo me provoca uma boa
sensação. Agarro os lençóis enquanto os dedos dele se afundam na minha
coxa.
Queria gemer de novo, mas não mais assustada, porém, a vergonha
não me permite tal coisa, não sei se deveria, se ele quer isso. Sinto-o sugar
com força o meu pontinho sensível, então o temido gemido sai quase em
um grito, me fazendo arquear as minhas costas. Algo parecia começar a
explodir dentro de mim naquele momento, gemi outra vez, completamente
envergonhada, mas incapaz de me conter, sentindo algo me tomar por
inteiro. Ele ergue a sua cabeça e sorri, visivelmente satisfeito.
A sua língua me trouxe sensações que nunca tive. Ele volta com a sua
boca para minha intimidade, meu corpo ardia em fogo e eu continuo a me
contorcer na cama. Os meus dedos apertam cada vez mais forte o lençol, o
meu corpo treme em outra vibração. Sinto algo libertador minutos depois,
era uma sensação maravilhosa.
Antes de se levantar, ele deixa um beijo na minha virilha e, sem
pressa, retira a sua roupa. Na penumbra, observo o seu contorno, parece
lindo. Ele volta para cama, acomodando-se sobre o meu corpo, então, o
nervosismo volta a me abalar. O homem me beija outra vez, sinto a sua
língua tocar a minha.
— Tente relaxar — sussurra no meu ouvido.
Então, sinto uma pressão entre as minhas pernas e fecho os olhos com
força, virando a cabeça para o outro lado. A pressão contínua até que me
sinto totalmente preenchida e grito de dor quando finalmente ele rompe a
minha virgindade. Ele fica parado, a dor diminui, mas volta quando ele se
move, entrando e saindo de mim.
Os seus lábios tocam o meu ombro e pescoço, isso é bom e me ajuda
a relaxar. Logo, a dor e ardência interna dá lugar a uma sensação boa, em
minutos, outro gemido escapa da minha boca. Dessa vez, não teve sorriso,
ele corresponde a minha reação com gemido rouco e abafado na curva do
meu pescoço.
Sem eu deixar, as minhas mãos tocam as suas costas numa tentativa
boba de trazê-lo para mais perto de mim. Sinto algo agitado no peito, uma
coisa estranha que me deixa em agonia. Então, todo o meu corpo treme e
tenciona antes de uma sensação relaxante me tomar inteira novamente.
Escuto a sua voz abafada entre os seus gemidos quando ele fala:
— Agora é minha vez!
Sinto o seu membro pulsar dentro de mim.
— Você é muito gostosa — fala ofegante com os olhos fechados,
investindo rapidamente contra mim.
Ele geme uma última vez e o seu corpo desaba ao meu lado, ainda
ofegante. A sua mão acaricia os meus seios e me assusto ao notar que gosto
do seu toque. Ele se junta a mim novamente e coloca o meu seio na sua
boca. A minha mente fica entorpecida, nunca senti isso antes.
Ele abre as minhas pernas e leva a mão até a minha intimidade, aperto
o lençol outra vez, sentindo-me pronta para outra onda de prazer. Ele se
coloca de joelhos entre as minhas pernas novamente e, inclinando o tronco
para frente, segura os meus cabelos e entra em mim pela segunda vez.
Eu apenas o aceito.
— Vai pagar por ter me deixado louco de desejo por você — fala,
colocando mais força nos movimentos.
Não demora muito até que chegamos ao ápice juntos e eu completo a
minha terceira onda de prazer. Aquilo devia ser o orgasmo que todos
veneram e agora eu entendo o porquê. Segundos depois de mim, ele urra
como um lobo dentro de mim, achei aquilo instigante.
Ele se ergue e eu sinto o meu corpo doer, tenso. O homem me pega
nos braços e me leva até a banheira, colocando o meu corpo dentro da água
com espuma. O banheiro também está escuro, existe apenas uma fraca
iluminação de velas, que estão acessas ao canto do cômodo. Gentilmente,
lava o meu corpo, ele está sendo doce, o avesso do que pensei que seria.
Quando termina, me entrega uma toalha. Enquanto me seco, ele deixa
as minhas roupas na bancada da pia. Após me vestir, o ouço abrir uma
gaveta, chego até a porta e ele mexe em algo na mesa de cabeceira. Tratei
de não o encarar para não ser sem educação, embora, mesmo que eu fizesse,
seria impossível vê-lo totalmente naquele lugar tão escuro.
— Está aí o seu pagamento — fala, ríspido. — Pode sair agora, o
motorista vai te levar para casa.
E, em um estalar de dedos, ele volta a ser o homem frio e rude que
encontrei ao entrar no quarto. Ele coloca um envelope ao meu lado sobre a
cama e fica de costas, pegando uma bebida e voltando a olhar pela imensa
janela.
01
Um encontro inesperado

Leonardo Milani

Estava com os olhos fechados, mas de nada adiantaria se estivessem


abertos, o breu do quarto não me permitia ver nada além de uma mísera
luz que entrava por uma pequena fresta da porta. Conseguia ouvir as
batidas dos talheres nos pratos, era a terceira refeição do dia enquanto eu
não havia feito nenhuma. Eu tinha dezesseis anos e esse foi o meu último
dia naquela casa.
Fui abandonado com dias de vida, morei em um orfanato boa parte
da minha infância. Chegaram a me adotar por três vezes, nas duas
primeiras me devolveram como quem devolvia um cão ao abrigo, na
terceira, fui levado por um casal que não conseguia ter os seus próprios
filhos, mas fugi deles aos dezesseis anos.
Após a minha “mãe” conseguir enfim engravidar, o casal passou a
negar a minha existência naquela casa. Qualquer coisa que eu fizesse, logo
apanhava de um deles e era trancado em um quarto escuro como punição,
muitas vezes me esqueciam por lá sem água e comida. Ou, quem sabe,
apenas me ignoravam torcendo para eu morrer.
Hoje a escuridão é parte de mim, ela não me assusta como antes, ao
contrário, me fortalece! Não sou um homem que costuma demonstrar
qualquer sentimento e muito menos ter piedade de quem cruza o meu
caminho, talvez, ser um garoto órfão me ensinou isso!
Precisei viver nas ruas e disputar comida com os cachorros,
dormindo nos becos da cidade. Aos dezoito anos, comecei a trabalhar na
limpeza de uma empresa de investimentos, foi lá onde aprendi tudo que
precisava para ganhar o meu primeiro milhão ainda com dezoito anos.
Algum tempo depois, tornei-me sócio da empresa e logo depois abri o meu
próprio empreendimento.
Eu descobri o meu dom de “fazer o dinheiro se multiplicar”, comprei
um banco e hoje sou dono da principal rede com agências espalhadas pelo
mundo. Tudo que quero, eu tenho e o que não tenho eu compro.

***

Alguns dias antes do encontro no hotel…

Era fim de noite quando saí do escritório e resolvi pegar uma nova
rota para chegar à boate que costumo ir com frequência, nada melhor que
sexo, sem burocracia, chego, como, pago e vou embora. Mas, neste dia, o
meu motorista freou bruscamente por conta de um animal que atravessou o
nosso caminho e foi nesse exato momento que os nossos caminhos se
cruzaram. Uma garota de uns dezenove anos, cabelos castanhos, pele
branca, um corpo esculpido pela luxúria, uma boca carnuda e seios
pequenos que caberiam facilmente na minha boca, no entanto, apesar do
corpo sensual, ela tinha um ar doce e inocente.
Sinto o ar mais denso e um arrepio subiu pela minha pele, era algo
diferente que ia além de desejo, mas, até então, desconhecia esse tipo de
sentimento.
— Siga aquela garota — falo para o motorista que prontamente
obedece.
Ela entra em um café, que já está fechado, não demora muito e sai.
Continuo a segui-la, ela pega um ônibus, que nos leva até o subúrbio, e
entra em uma casa até arrumada para o local, uma casa média com primeiro
andar.
— Já vi o suficiente — falo ao motorista. — Dê a volta, estou indo
para casa. — ele me olha pelo retrovisor como se não entendesse, já que
diariamente eu ia a clubes e ‘boates’.
Chego em casa e só penso nela, preciso tê-la. Ligo para o advogado
da empresa e peço que me dê detalhes sobre a garota, passando as
informações que eu já tenho para ele.
— Quero amanhã na minha mesa — digo ríspido.

***
No dia seguinte, chego à empresa bem cedo, como todos os dias, e
entro no elevador particular que leva à minha sala. Eram nove horas da
manhã quando o meu advogado entra e me entrega as informações que pedi.
Eu sabia que ele conseguiria rápido, o banco de dados de um banco tem
muitas informações e qualquer detetive faria o resto.
Samanta Antonelli, 19 anos, estudante de contabilidade, trabalha em
um café do meio-dia às oito da noite. Tem um irmão de 6 anos, a mãe não
trabalha, o pai é funcionário em um dos meus bancos, ele tem a casa
hipotecada na mesma agência em que trabalha.
E o que me deixou ainda mais satisfeito, foi saber que ela nunca teve
namorado. Provavelmente ainda é virgem, por isso, tem todo aquele ar doce
e inocente…
O meu corpo esquenta só de pensar nela, aquela boca e o seu corpo
não saem da minha mente, eu precisava tê-la e já sabia, por onde iria atacar,
conseguir o que quero da forma convencional é cansativo e chato.
Volto a minha atenção para o meu advogado que está sentado à minha
frente.
— Como conseguiu essas informações tão pessoais da menina? —
pergunto, pois esperava saber apenas o que consta no sistema do banco.
— O pai dela é funcionário, como pode ver, então foi fácil saber de
algumas coisas com outros funcionários, dizem que o pai se orgulha muito
da garota e sempre fala sobre ela.
— Veja como está a dívida da hipoteca e as datas de vencimento,
pode sair agora — falo, voltando a minha atenção para os documentos que
tenho na mesa.
Saí da empresa mais cedo do que de costume e fui dirigindo
pessoalmente até o café. Ao chegar lá, me sento em uma mesa que me dá
uma visão total do local e lá está ela, puta que pariu, ela é muito gostosa.
Mesmo na farda que ela usava conseguia ser linda, percebo que não sou o
único a observá-la, outros a secam com fome, mas ela será minha, se quero,
eu tenho!

***

Samanta Antonelli
— Na noite passada tive a sensação de estar sendo seguida — digo
para Gabi, a minha amiga que trabalha comigo no café.
— Sério? Você precisa tomar cuidado, melhor não ir de ônibus para
casa hoje — diz ela preocupada.
— Não posso pegar um táxi, o dinheiro está contado, o meu pai está
juntando tudo que ganha para pagar a hipoteca da casa.
— Amiga, ainda não resolveram essa questão? — ela questiona
suspirando.
— Não, e o pior é que, se não resolver, vou precisar trancar a
faculdade, para ajudá-lo mais.
— Vocês vão encontrar uma saída, se eu tivesse esse dinheiro eu te
daria — ela tenta me encorajar, fazendo um bico.
— Eu sei, amiga, darei um jeito — digo, sem acreditar nas minhas
palavras.
— Aqui é um ‘Clube’ de encontro? Vamos trabalhar, vamos! — Jean,
o nosso gerente sacode as mãos no ar. — Mesa quatro, seis e sete, vamos
pegar os pedidos, vamos, vamos — fala, nos empurrando lentamente.
Sigo até a mesa quatro onde tinha um homem lindo, porém, de
semblante sério, ele deve ter 1,80 de altura, corpo atlético, cabelos loiros,
olhos cor de mel. Tinha uma pele branca como alguém que nunca desfruta
do sol, boca bem desenhada e rosto bem definido, a sua pele era de dar
inveja a qualquer um.
— Boa noite, senhor, o que vai pedir? — Abro um sorriso, mas ele
não esboça expressão alguma.
Está vestindo preto da cabeça aos pés, é de dar arrepios.
— Um expresso, por favor — fala, com uma voz forte e autoritária.
— Trago em um minuto — digo, me virando.
— Você viu que homem estranho? — pergunto, mostrando a Gabi,
assim que me aproximo dela.
— Ele é ‘sexy’ isso, sim, e rico — ela fala, mordendo a ponta do dedo
indicador.
— Você não tem jeito. — Balanço a cabeça negativamente sorrindo
para ela.
— Deixa que levo o café para ele — ela diz, sorrindo também.
— Faça como quiser. — Entrego a bandeja aliviada, a forma que ele
me olha me causa arrepios.
Fico de longe espiando Gabi levar o café.
— Aqui está o café, senhor, gostaria de algo mais? — ela passa as
suas mãos na dele e ele a olha com desdém.
— Apenas isso, pode se retirar — diz ele, num tom frio.
Os olhos dele encontram os meus e eu me escondo rapidamente atrás
do balcão. Ele tomou o café rapidamente, pagou e saiu.
— Que gato, deve ser muito rico, se um homem desse se interessasse
por mim… adeus pobreza, adeus café! — Gabi sempre está sonhando
acordada, ela suspira várias vezes vendo-o cruzar a porta.
— Para de sonhar, vamos limpar tudo logo, preciso ir para casa —
falo, trazendo-a para realidade.
Quando estamos fechando, Davi, nosso amigo, chega, como faz quase
todos os dias. Davi é filho de uma família rica e faz faculdade comigo, nos
aproximamos e hoje somos bons amigos.
Ele arregaçou as mangas da camisa, mostrando os seus braços com
músculos definidos, abrindo um lindo sorriso, exibindo os seus dentes
brancos e alinhados, alisa os cabelos negros que fazem um belo contrate
com a sua pele branca.
— Eu ajudo vocês — fala gentilmente, juntando as cadeiras e
passando pano molhado nas mesas.
— Nossa, obrigada, juro que se não fosse por você eu estaria mais
cansada — digo, me jogando na cadeira após horas em pé.
— Vou deixar você em casa. — Sinto um alívio, eu ainda estou
assustada pela noite anterior.
— Ótimo, amiga, o Davi vai te deixar em casa, então, vou mais
tranquila sabendo que está em boa companhia. — Gabi mora a uma quadra
do café, então, ela sempre volta a pé.
— Vamos, Samanta — ele fala, abrindo a porta do carro, vou sentada
ao lado dele.
Paramos em uma barraca de rua, compramos algumas guloseimas e
voltamos para carro, Davi me deixa em casa e segue o seu destino.
Entro em casa e os meus pais falam baixinho, algo sobre a hipoteca.
Aproximo-me e ouço a minha mãe falar, espantada:
— Dez parcelas? Como você deixou chegar a esse ponto? E agora,
como teremos dinheiro para pagar? É muito dinheiro! — o seu tom é
desesperador, sinto o meu coração apertar.
Entro no quarto, eles nem perceberam a minha chegada, fico
pensando no que fazer para conseguir mais dinheiro. Não podemos ficar
sem casa, ainda mais sendo esta casa a herança dos meus avós. Era
impossível ter uma noite tranquila de sono, porém, após secar toda água do
meu corpo de tanto chorar, adormeço.
02
A proposta

Leonardo Milani

Após passar pelo café onde a Samanta trabalha vim para casa, nada
mais me dava prazer e isso era frustrante.
Mas que porra é essa, sinto vontade de vê-la o tempo todo. Preciso
resolver isso logo, estou ficando louco!
Ligo para o advogado da empresa sem me importar com a hora,
queria me informar sobre a situação da hipoteca. Fico satisfeito quando ele
me diz serem muitas parcelas atrasadas e uma dívida impagável para um
simples assalariado.
— Mande a administradora do banco enviar uma carta de
cobrança, com ordem de despejo para daqui a dois dias — ordeno.
— Por que está sendo tão cruel com essa família? — ele pergunta,
visivelmente apiedado.
— Não que eu precise te responder, mas a resposta é muito simples…
cruzar o meu caminho é de fato muito perigoso, exceto se for feito sem que
eu os note. E, nesse caso, eu não só notei, estou muito incomodado.
Satisfeito? — falo ríspido.
— Certo, senhor, entendo e farei o que mandou agora mesmo —
responde, insatisfeito.
Encerro a ligação e sigo para meu quarto. A minha casa está sempre
vazia, não tenho empregados dormindo na propriedade, eles vem e
cumprem os seus horários, logo após seguem cada um para seus respectivos
lares. Não quero ter o desprazer de presenças na minha casa me perturbando
com algum ruído, o silêncio e a escuridão são coisas que eu preso, então, eu
sempre saio antes deles chegarem e volto depois que vão embora.

***

Samanta Antonelli
Acordo cedo para ir à faculdade, desço e encontro os meus pais
chorando.
— O que aconteceu? — pergunto preocupada, me aproximando.
— Recebemos uma ordem de despejo, filha, se não pagarmos a
hipoteca até amanhã, não teremos mais casa! — papai fala, aflito, passando
uma mão na outra enquanto anda de um lado para o outro.
Sentei-me sem reação.
— Darei um jeito, eu tentarei conseguir o dinheiro. Não sei, pedirei
emprestado ao Davi, quem sabe ele tenha — falo rápido, sem respirar.
Pronunciei as palavras para mim mesmo, tentando afastar a vergonha,
mas isso foi a única coisa que consegui pensar.
— Filha, você incomodará os seus amigos? Nem teremos como pagar
uma quantia tão alta — mamãe diz, se sentando ao meu lado e alisando os
meus cabelos, parecia querer me consolar, mesmo estando devastada.
O meu pai nada fala, ele está no limite e eu podia ver nitidamente.
— Tchau! Preciso ir para não me atrasar para a aula — digo, saindo
apressada.
Vou à faculdade sem tomar café da manhã, aliás, comida tem sido
luxo na minha casa, eu sempre como no café que trabalho, só assim o meu
irmão terá mais para comer em casa.

***

Não consigo me concentrar na aula e Davi percebe.


— Você está com algum problema? — pergunta ele, tocando no meu
braço.
— Podemos conversar depois da aula? — pergunto.
— Claro, te levo para comer e nós conversamos. Você está com cara
que não come a três dias — fala, em um tom divertido.
Dou um sorriso sem graça, ele nem faz ideia de que realmente não
tenho me alimentado direito esses dias.
Assim que a aula terminou, saímos da sala e fomos a uma lanchonete
no campus.
— E aí, o que tem te preocupado? — ele pergunta, tomando um
pouco do seu refrigerante.
— É… então… — a minha voz sai como um sussurro e eu estou bem
hesitante em falar.
— Fala logo, você está me deixando nervoso — o seu tom é aflito, ele
me encara ansioso pela resposta.
— Você teria quinhentos mil para me emprestar ainda hoje? Eu juro,
juro mesmo que te pago com juros! — Ele cospe o líquido quase na minha
cara, assim que me ouve se engasgando em seguida.
— Não tenho todo esse dinheiro, Samanta. E se eu pedisse aos meus
pais, certamente não me dariam, o meu irmão adotivo fodeu com os
negócios do meu pai e ainda estamos nos recuperando. Por que precisa de
tanto dinheiro?
— O meu pai hipotecou a casa que herdamos dos meus avós, ele não
tem conseguido pagar as parcelas e vamos ser despejados amanhã — o meu
tom não consegue expressar toda a agonia que eu estou sentindo.
— Posso te dar o que tenho na poupança, tem cento e cinquenta mil.
Posso vender o meu carro que custa uns duzentos, você teria que conseguir
o resto.
— Não precisa, sei que você faria isso por mim e agradeço a sua
amizade, darei um jeito de conseguir sem que você tenha que vender as
suas coisas, melhor eu ir para o trabalho agora. — Me levanto da mesa e ele
me acompanha.
— Eu te levo para o trabalho.
O caminho é feito sem muita conversa, estou triste e Davi respeita o
meu momento. Quando chego no trabalho, mudo de roupa e começo a
organizar a mesa, sem perceber que alguém havia entrado. Esbarro em um
homem, o mesmo que estava aqui no outro dia, ele é um tanto intimidador.
— Desculpe, senhor, eu não o vi.
Ele dá um passo para trás, como se o meu toque o incomodasse, e
senta em uma mesa, o seu olhar faz com que eu me sinta nua.
E, do nada, ele resolve falar.
— Está sozinha? — ele pergunta com um sorriso sombrio.
— Sim, estou! Mas, logo os outros funcionários vão chegar — diz,
para que ele não tente fazer nada comigo.
Ele dá uma gargalhada e eu mostro uma cara emburrada.
— O que quer? — pergunto irritada.
— Sente medo de mim? — pergunta, enquanto os seus dedos brincam
com os objetos na mesa e volta a rir.
— O que é tão engraçado? — pergunto, carrancuda.
O seu semblante muda de divertido para sombrio novamente, ele se
levanta e anda na minha direção, dou passos para trás, tentando fugir
daqueles olhos que me queimam, mas ele não recua, e eu me encosto no
balcão. Ele encosta todo corpo no meu, me fazendo sentir o seu peso, evito
o contato com os seus olhos, ele puxa o meu rosto e os nossos olhos se
encontram, está tão perto que posso sentir o seu hálito, que parece menta.
Tento me esquivar para o lado e ele me impede, apoiado as suas duas
mãos no balcão, impedindo que eu me mova.
— Você — diz, sem delongas
— Pareço piada para você?
— Piada? Foi isso que fiz parecer? — Ele sorri e volta a falar: — Eu
não brinco com as minhas presas — diz, chegando bem perto do meu
ouvido sussurrando. — Eu as devoro.
Fico imóvel no lugar, ele me solta e vai embora. As minhas pernas
perdem a força e eu caio sentada.
O que esse homem quer de mim?

***

— A senhorita Samanta Antonelli está? — Perto de fechar o café, um


homem aparece me procurando.
— Sou eu — digo, franzindo o cenho desconfiada.
— Podemos conversar?
— Claro! — Olho desconfiada e o convido a sentar à mesa para
conversarmos.
Ele vai direto ao assunto, pega uma folha de papel e põe na mesa,
com o seu cartão de visita ao lado.
— Esse é o documento da hipoteca da casa dos seus pais.
O olho espantada, por que ele tinha isso com ele?
— Como você conseguiu isso? — pergunto curiosa e nervosa.
O meu corpo gelou, por que esse homem teria esse documento?
— Acredito que não podem pagar essa quantia, mas esse documento
volta para você quitado, se aceitar a proposta do meu chefe. A questão não
é onde ou como eu consegui senhorita, a questão é, você poderá tê-lo de
volta e quitado, se aceitar a proposta do meu chefe.
— E o que ele quer? — pergunto irritada e mais curiosa que antes.
— Ele quer que passe a noite com ele — ele diz em um tom baixo,
sem jeito por me falar isso.
— O quê? — grito espantada e todos me olham.
— Se controle, senhorita! — fala baixo e envergonhado.
— Diga ao seu chefe que não sou prostituta, não vou aceitar isso —
esbravejei.
— Aqui está o meu cartão — ele diz o empurrando até a minha frente.
— Caso mude de ideia, ele espera hoje por você. É só ligar que dou ordens
ao motorista para buscá-la, mas pense bem, não ter onde morar não é nada
agradável.
A minha visão fica turva pelas lágrimas, eu estou me sentindo
humilhada, lutei contra elas, mas não teve jeito, levei a minha mão
rapidamente para o meu rosto enxugando as lágrimas que caiam sem pedir
permissão, corriam livremente pela minha face.
— Pensarei na proposta, mas, caso eu aceite, avise a seu chefe que
sou virgem e peça para ele ser gentil.
— Porque está me dizendo isso, senhorita? — O rubor tomou o seu
rosto que gaguejou pronunciando as palavras.
— Porque talvez eu não tenha coragem de dizer a ele — admito de
cabeça baixa, cogitando aceitar a proposta.
— Farei isso pela senhorita, então, não se preocupe. — Levantou-se,
arrumando a gravata que ele havia afrouxado durante a nossa curta
conversa.
Levantei-me em seguida, vendo-o sair e indo em direção ao vestiário,
me troquei e fui para casa.
03
Na toca do lobo

Leonardo Milani

Estou diante de uma imensa janela do quarto de hotel olhando a


cidade, checo o celular a cada cinco segundos, esperando ansioso pela
ligação do meu assistente.
— Ela virá, Leonardo, ela não tem saída — falo para mim mesmo,
levando o copo cheio de uísque à boca.
Estou ansioso como um moleque, que sensação terrível! Era só mais
uma que eu iria pagar para ter, mas eu ainda temo que o seu orgulho
nitidamente cravado nos seus olhos e ações que a impediam de vir.
Permaneci parado como um poste em frente à janela da cobertura e
sorri satisfeito quando o meu telefone toca, a segurança volta a me
preencher, ela viria.
— Senhor, a garota irá!
Um sorriso de satisfação preenche o meu rosto.
— Ótimo — respondo, prestes a desligar, mas ele continuou.
— Ela me pediu para avisar que é virgem, e que fosse gentil com ela
— o seu tom era envergonhado, percebi quando ele pronunciou tais
palavras.
— Por que está me passando o recado? Sente pena dela? — A frieza
na minha voz era espantosa e ele gaguejou.
— É… que… Hum, ela poderia ser minha filha, senhor… — havia
comoção na sua voz.
— Não planejo matar a garota, fique tranquilo — digo e encerro a
ligação.
Pego uma bebida e fico aguardando a sua chegada, enfim essa agonia
irá passar. Observo pela janela ansioso, como se fosse possível vê-la
chegando, a espera parece que nunca irá acabar e eu me pego sentindo algo
que não estou acostumado a sentir… medo e insegurança. Ela pode desistir
no caminho ou o carro pode nunca chegar até aqui, mas tudo muda assim
que ouço batidas fracas na porta e me viro, com o meu coração disparado.
— A porta está aberta, pode entrar. — Continuo de costas, olhando a
imensa janela.
Ela mal faz barulho ao entrar, eu espero um tempo até me virar, está
escuro do jeito que gosto, era impossível vê-la com clareza, mas eu não
preciso, o rosto dela não sai da minha cabeça.
Depois de um tempo, me viro para ela, que me observa atentamente,
tentando me ver melhor, e me aproximo lentamente.
— Beba isso. — Lhe entrego um copo cheio de uísque, isso a deixaria
mais leve.
— Eu… eu não bebo, senhor… — ela diz temerosa e com a voz
embargada.
— Beba logo, estou mandando — digo, num tom mais alto, e ela me
obedece de imediato, tomando tudo de uma vez.
— Boa menina — a trago para mais perto e acaricio os seus cabelos.
— Não pretendo machucar você, pelo contrário… — falo, tentando
tranquilizá-la.
Em um movimento involuntário, toco no seu rosto sentindo-o
molhado e constato que ela está chorando.
— Vem cá, vou te ajudar a relaxar — essa é a primeira vez na minha
vida que me preocupo com alguém que não seja eu.
Tiro as suas roupas com delicadeza, a deixando nua, analiso cada
parte do seu corpo, que é espetacular, a beijo e percebo que até nisso ela é
inexperiente.
— Tão inocente, minha menina — falo enquanto as minhas mãos
passeiam pelas curvas do seu corpo, esculpido com total perfeição.
A conduzo para a cama, deitando-a em seguida, abro as suas pernas e
abaixo até a sua intimidade, queria dar prazer a ela, algo com o qual nunca
me preocupei em dar a mulher nenhuma. Mas nunca tive ninguém tão
delicada quanto ela.
Ela geme baixo e puta que pariu, não vou aguentar ficar aqui muito
tempo, quero estar dentro dela. Não demora muito para que eu sinta todo o
seu corpo tremer e eu chupo todo o seu líquido delicioso.
Subo nela e a penetro devagar, estou sendo cuidadoso, não quero
machucá-la, logo rompo a sua virgindade, ela grita de dor e eu continuo
sendo cuidadoso, ela se tranquiliza e começa a gemer timidamente,
Samanta é muito gostosa e apertada, eu gemi também. Ela parece se excitar
ainda mais, e logo sinto o seu corpo tremer novamente quando o seu líquido
começa a escorrer pelo meu membro.
— Agora é minha vez — falo, sem conseguir segurar o meu orgasmo
por mais tempo. — Você é muito gostosa — sussurro entre beijos no seu
pescoço.
Desabo ofegante ao seu lado, eu não estou satisfeito, queria mais,
então, começo a acariciar os seus seios, ela estremece de prazer com o meu
toque, são tão delicados e cabem perfeitamente na minha boca. Ela fica
enlouquecida, se contorcendo na cama, abro as suas pernas, levando a
minha mão até a sua intimidade. A vejo apertar o lençol de tanto prazer,
porra isso me deixa louco, a coloco de joelhos na cama com o tronco
inclinado para frente, seguro nos seus cabelos e entro nela novamente.
— Você vai pagar por ter me deixado louco… — falo, colocando
mais força nos movimentos até que chegamos juntos ao orgasmo.
Deitamo-nos, ainda ofegantes. A pego nos braços, levo-a até a
banheira, preparada por mim antes da sua chegada, uma vela em um canto
distante era a única luz que havia ali, e lhe dou um banho. Sei que ela deve
estar dolorida, não sou um monstro, sei que acabei de tirar a sua virgindade.
Entrego uma toalha e as suas roupas, então, quando ela volta para o quarto,
apanho o documento na gaveta da mesa ao lado da cama e jogo na sua
direção.
— Está aí o seu pagamento. Pode sair agora, o motorista vai te levar
para casa.
Viro as costas, me sirvo de uma bebida e volto a observar a janela
Pronto, acabou, já posso voltar a minha vida normal.
Foi exatamente isso que pensei naquele momento.
04
Um sentimento miserável

Samanta Antonelli

Sai do hotel, o motorista me deixa em casa e eu subo para o meu


quarto, entro no banheiro, ligo o chuveiro e me esfrego com o máximo de
força que consigo. Sinto-me suja e usada, hoje eu me vendi e jamais pensei
que um sentimento miserável como esse tomaria conta de mim. Lágrimas se
misturam com a água, a minha pele está bem vermelha de tanto que eu me
esfrego, tentando tirar o cheiro dele e a lembrança do seu corpo no meu.
Saio do banheiro e me deito na minha cama, flashes do que aconteceu
ficam indo e voltando na minha cabeça. Embora eu tenha me deixado levar
por aquele momento, aquilo não era nada que eu queria de fato, sei que
o dia de hoje vai me transformar para sempre. Afundo-me nas minhas
cobertas, perdida em pensamentos e com lágrimas que não param de cair,
assim adormeço.
Acordo e me arrumo para ir à faculdade, entretanto os meus pais
ainda pareciam preocupados.
— Pai, mãe, aqui está o documento da hipoteca, consegui o dinheiro
para pagar. — Jogo o documento sobre a mesa.
Os seus olhos espantados me alcançam.
— Como conseguiu tanto dinheiro? — A voz desconfiada do meu pai
fez o meu corpo gelar.
— O Davi me emprestou, ele não tinha todo o dinheiro, então vendeu
um carro, uma moto, juntou com o que tinha na conta e me emprestou — a
mentira era a melhor opção naquele momento, embora ela gelasse ainda
mais o meu coração.
— Estou envergonhada! Ele vendeu os seus bens para nos ajudar?
Mas é muito dinheiro, como vamos pagar? — A minha mãe pergunta,
preocupada.
— Ele tem outros carros, não se preocupe, vamos dando um pouco
todo mês. Ele não está precisando do dinheiro agora — garanti.
— Traga-o aqui para jantar, quero agradecê-lo pessoalmente — o meu
pai fala, agora visivelmente mais tranquilo.
Eu também me sinto mais tranquila vendo que eles acreditaram na
minha conversa.
— Preciso ir, senão perco a primeira aula! — Corri cruzando a porta
da sala.

***

Chego à faculdade e Davi me espera na entrada.


— E aí, como estão as coisas? — ele pergunta preocupado.
— Deu tudo certo, consegui o dinheiro — a minha voz saiu tranquila
e ele me olha espantado.
— Sério? Onde conseguiu tanto dinheiro? — pergunta curioso.
O meu semblante cai e ele percebe que tem algo me incomodando,
porém, não planejo contar da minha noite para ele.
— Consegui outro emprego, falo que precisava desse dinheiro e
recebi um adiantamento e pagarei com os meus serviços — tento ser
convincente.
— Samanta, você está mentindo. Quem pagaria 500 mil de
adiantamento? — ele cerra os olhos me estudando.
— Esquece esse assunto, já foi resolvido, o que fará hoje à noite? —
Mudo de assunto
— Não tenho planos para hoje — fala ainda contrariado.
— Então, vamos sair para onde você quiser, agora você paga porque
eu não tenho dinheiro.
Ele me olha satisfeito e logo o vi relaxando novamente.
Nós dois rimos, ele balança a cabeça concordando e vamos para sala
de aula.

***

A aula acaba e Davi me leva para o café.


— Volto mais tarde para te pegar — fala, ainda no carro.
— Tudo bem — sorri acenando para ela.
Entro no café e Gabi já está arrumando as coisas.
— Amiga, eu e Davi vamos sair hoje, quer vir junto? — pergunto
animada
— Claro, aonde vamos? — questiona com a mesma animação.
— Não tem nada definido ainda. — Dou de ombros, o que eles
escolherem está bom.
— Então vamos a uma boate aqui perto que é bem badalada, só Vips,
quem sabe não acho o meu homem rico lá! — ela fecha os olhos, sonhando
com a possibilidade.
— Se é importante, como vamos entrar?
— E você pensa que o Davi não é importante? A família dele pode
não ter tanto dinheiro como antes, mas nome é tudo querida — ela diz com
tanta segurança que eu nem poderia duvidar das suas palavras.
— Está bem, então vamos — ri das bobagens dela.
— Na hora do nosso intervalo, compramos algumas roupas — ela
está extremamente animada, parece que eu tinha convidado ela para um
grande evento.
— Roupas? Não Gabi, não tenho dinheiro — falo descartando a sua
ideia.
— De forma nenhuma que você vai desarrumada, eu compro no
cartão e parcelo em doze vezes — diz abrindo a sua pequena bolsa e
levantando o cartão, sorrindo para mim.

***

— Gabi, você roda, roda e não compra nada — resmungo depois de


uma hora rodando o shopping. — Já estou tonta de tanto andar.
— Achei… perfeito! — grita eufórica, dando vários pulinhos em
frente a vitrine da loja.
Gabi encara dois vestidos como se eles fossem homens sarados sem
camisa, mas, de fato, as peças eram realmente belíssimas. Um é bem-
comportado, rosa e combina com o estilo que gosto, e o outro é vermelho,
acima do joelho e com um decote generoso. Entramos na loja indo até os
vestidos, virei a etiqueta para olhar o valor, ele deixaria de ser lindo em
segundos dependendo da quantidade de dígitos que tivessem escritos nela.
— Nossa! Muito caro, não podemos comprar nem com o salário de
dois meses — falo já virando de costas.
— Vai provar. — ela pega o vestido da arara ao lado, o entregando e
me empurra até o provador.
Eu não tinha chances contra ela, teria que provar o vestido e, quando
fechei o perder na lateral, sinto que ele havia sido feito sob medida para
mim, olho encantada para o espelho, já fazia um bom tempo que não
comprava roupas para mim.
— Uau! Você está incrível, vamos levar esse — ela afirmou, sem
delongas, assim que abro a porta do provador.
— Gabi é muito caro, não vamos levar! — Balanço a cabeça
negativamente várias vezes.
— Vai logo, tira o vestido que ainda temos trabalho — ordena sem
me dar atenção.
Ela paga os vestidos, pega as sacolas e entrega a minha, saímos da
loja e sigo aflita, pois nunca paguei tão caro em um vestido.

***

Ao fim do nosso expediente tomamos um banho no banheiro que há


para nós no café e nos arrumamos lá mesmo.
— Um espetáculo, é isso que estamos! — ela encara os nossos
reflexos no espelho nos admirando, mas a buzina do carro de Davi a fez sair
correndo para a entrada do café.
— Estamos prontas! — ela grita e corro até lá em seguida.
— Uau, meninas, vocês estão lindas! — De modo cavalheiro, ele abre
a porta e nós duas entramos no carro.
— Aonde vamos, meninas? — ele pergunta antes de ligar o carro
— Você conhece a boate “Vip” que tem aqui perto? — Gabi pergunta,
eufórica, o brilho dos seus olhos era intenso.
— Sim! — Davi responde, a olhando pelo retrovisor.
— Espero que você seja importante, porque é para lá que vamos —
ela fala, com um sorriso realizado de quem esperou muito esse momento.
— Acho que posso dar um jeito — ele sorri de volta, dando a partida
e seguimos para o local.
Chegamos na boate e Davi vai até à entrada, tira várias notas de
dinheiro da carteira e entrega a um dos seguranças, que acena positivamente
com a cabeça. Ele faz um gesto e nos aproximamos.
— Vamos, meninas, tudo certo.
Gabi entra observando tudo, os meus olhos estavam tão curiosos
quanto o dela, eu nunca entrei em nada parecido com esse lugar.
— Obrigada, Davi, você é incrível! — ela o surpreende com um
abraço apertado e olhando daqui eles formariam um belo casal.
— E você, o que achou? — Gabi indaga, com os braços em volta do
meu, assim que soltou o Davi.
— Não é um lugar que eu frequentaria normalmente — falo,
observando tudo ao redor, o lugar era refinado, o som muito alto e muitas
luzes.
Davi sai, indo buscar umas bebidas, Gabi não perde tempo e já está
conversando com um rapaz. Fico ali, analisando o local, ainda me sentindo
deslocada.
— Tome, peguei para você. — Davi me entrega um copo com uma
bebida colorida.
— O que é isso? Eu não tenho costume de beber — recuso de
imediato.
— Sam, se solta só uma vez na vida — diz, debochado e empurra o
copo em direção à minha boca.
— Está bem, só esse… — A bebida era doce e descia fácil.
Não me lembro de quantas tomei depois da primeira, mas eu já não
estou tão sóbria. Davi me chama para dançar e eu aceito, ele está bem
alegrinho, me puxando cada vez mais para perto e as suas mãos percorrem
o meu corpo.
— Davi, preciso ir ao banheiro.
— Quer que eu vá com você? — fala, bem perto do meu ouvido por
conta do som alto.
— Não precisa, eu volto logo. — Quero lavar o rosto, respirar um
pouco.
Quando saio do banheiro, sinto uma mão me puxar e me prensar
contra a parede. Tento me soltar, mas ainda estou sob efeito do álcool,
então, meus movimentos são lentos. Ele me prende ainda mais contra a
parede e começa a passar a mão pelo meu corpo, apertando os meus seios,
eu grito, mas ninguém me ouve…
05
Reconhecendo que quero mais

Leonardo Milani

No dia seguinte à noite do Hotel…

Acordo me sentindo magnífico, hoje a minha vida voltará ao normal,


foram dias de agonia e tara, eu confesso que ainda quero mais, porém, quis
poupá-la. Começo a pensar e logo meu “amigo” dá sinal de vida, odeio ter
que fazer isso sozinho. Preciso sair e fazer o que gosto, comer as putas e
voltar para o silêncio da minha casa.
Sigo sozinho para boate, nunca tive amigos ou qualquer pessoa com
quem eu interagisse, eu prefiro assim. Chego e fico em uma área reservada,
daqui tenho uma ótima visão de praticamente todo local, daqui que
escolho as minhas presas. Sou literalmente um predador que não se importa
com ninguém e nem sente pena na hora do abate.
Os meus olhos param, incrédulos.
Mas que merda!
— O que essa garota faz aqui? — me pergunto quando vejo Samanta
entrar na boate.
Ela entra com a amiga do café e o fedelho do Davi. Samanta
está vestindo um vestidinho rosa bem-comportado nada revelador, mas que
me deixa louco de tesão, ela entorpece a minha mente sem precisar fazer
nada.
Tento desviar o meu foco, o que ela faz não é da minha conta, mas é
mais forte que eu e fico a observando, então, vejo que o Davi a estimula a
beber cada vez mais.
Ela disse que não bebia!
— O que esse garoto está pensando em fazer?
Eu não estou gostando daquilo, o sentimento de posse toma conta de
mim.
Ele a toca várias vezes, a puxa para perto do seu corpo e isso está me
deixando louco de raiva. Estou a ponto de descer e arrancá-la desse lugar…
me viro de costas e tomo todo o uísque que está no copo, isso não é da
minha conta, não tenho nada a ver com isso.
— Preciso mudar o meu foco — respiro fundo.
Os meus olhos percorrem com desespero ao redor, até que vejo uma
mulher se insinuando para mim no espaço vip ao lado do meu, aceno com
as mãos para ela vir. Ela chega no local me beijando, já percebo ser
profissional e que não quer conversa, isso é ótimo. Tento me desligar de
tudo, mas não me concentro e resolvo olhar para baixo procurando a minha
menina.
Enlouqueço vendo Davi a tocar com intimidade, empurro a mulher de
lado e desço com a intenção de quebrar a cara daquele moleque que está
tocando no que me pertence. Quando estou me aproximando percebo que
ela está se afastando, indo a algum lugar. Ela está bêbada, mal consegue
andar, eu a sigo, mas encontro o dono da boate no caminho, o que me atrasa
um pouco.
— Mas, que porra é essa!
Os meus olhos queimam de ódio quando enfim consigo ir até ela.
Um homem agarra a Samanta, que se debate, tentando se livrar. Eu o
puxo com força e dou um soco na sua cara, que cai no chão. O homem até
tenta se levantar, mas dou um chute no rosto dele, que cai desmaiado. Ela
me abraça e eu fico sem reação, as pessoas não costumam se aproximar
muito de mim a não ser quando são pagas para isso.
— Obrigada, obrigada, senhor — a voz dela está trêmula e chorosa.
E em um reflexo, retribuo o abraço, tentando acalmá-la.
— Vou te tirar daqui — caminho em direção à saída da boate,
puxando-a pela mão.
Um desejo estranho de protegê-la toma conta de mim, ela aperta a
minha mão com força e a seguro firme para não a perder em meio à
multidão, que dança ao som da música eletrônica
— Os meus amigos… preciso encontrá-los — ela grita, tentando fazer
o som da sua voz sair mais alto que a música.
Olha algumas vezes ao redor os procurando, nem mesmo eu, que era
mais alto que ela, os vi.
— Não se preocupe, vou te deixar em casa — garanto, quando já
estamos na saída da boate.
— Não sei quem é você, não posso entrar no seu carro! — ela vira o
rosto, largando a minha mão.
Dou uma gargalhada e ela me olha chateada.
— Por que está rindo? — Coloca as mãos na cintura me encarando.
— Não se lembra de mim? — Olho fixamente nos seus olhos com um
sorriso debochado.
Ela aperta os olhos me estudando.
— Seu… O seu… Você é um desgraçado — esbravejou.
— Lembrou? — pergunto rindo, ela está muito bêbada e engraçada.
— Claro que sim, o que quer comigo? — Cruza os braços em frente
aos peitos. — Pensou que eu ia esquecer que me chamou de presa, lá no
café? Você é doido! — Franze o cenho.
— Do café? É de lá que me conhece? — A minha testa enruga.
— Sim, não volte lá para me intimidar — as suas palavras saíram em
um tom irritado em advertência.
Lembro-me que a escuridão do quarto do hotel não a deixou me ver
completamente e eu resolvo que é melhor assim.
— O que quer de mim? — Torna a me encarar enquanto torce o nariz,
revirando os olhos.
— Eu, querendo algo de você? Não quero nada, só ajudei você com
um cara que tentou te agarrar a força e agora acredito que você não tem
condições de ir sozinha para casa, seus amigos… hum… onde eles estão?
— Olho para os lados com os braços aberto e volto a encará-la com
deboche. — Mas, se não quiser a minha ajuda, lembre-se do que quase
aconteceu agora. Posso não estar por perto da próxima vez… — Viro as
costas me afastando lentamente.
— Não, tudo bem, pode me deixar em casa, tenho filmagens suas no
sistema do café — ela pega o celular e manda um áudio para amiga. —
Gabi aconteceu algo e estou indo para casa com aquele homem esquisito
que vai ao nosso café, se algo acontecer, puxe as câmeras e leve a polícia —
ela termina de dizer e guarda o celular na pequena bolsa que está o seu
ombro. — Pronto, agora estou mais tranquila — ela sorri orgulhosa, como
se uma mera mensagem fosse me deter de fazer algo se eu assim quisesse.
Dou um sorriso, não me lembro de quando sorri tanto em tão pouco
tempo, certamente isso nunca aconteceu. Caminhamos para fora da boate,
indo até o meu carro, desta vez, eu estou dirigindo. Abro a porta para que
ela entre e a fecho, indo para o lado do motorista. Ligo o carro e saímos
dali, não demora muito e escuto a sua voz doce.
— O senhor pode parar em uma conveniência?
— Precisa de algo?
— Bebida, quero beber — as suas palavras me surpreendem, mas a
obedeci.
— Pensei que não bebesse — falo lembrando do que ela me disse no
hotel.
— Só hoje, senhor. Quero esquecer os últimos acontecimentos da
minha vida. — O seu semblante mudou para triste.
Paro em frente a uma loja de conveniência, desço do carro, compro
bebidas e volto.
— Para onde quer ir?
— Pode parar em algum lugar, o da sua preferência. — Os locais que
prefiro, ela certamente não iria querer ir, isso me faz dar um sorriso.
Encosto em uma praia, abro o capô do carro e ela continua bebendo.
— Então, quais foram os últimos acontecimentos? Quer falar sobre
isso? — Estou bem curioso e estranhamente interessado no que ela tem para
falar.
— Você já vendeu algo muito importante para você? — A sua
pergunta veio acompanhada de um longo suspiro.
— Não, nunca! Estou acostumado a comprar, não preciso vender
nada. Por quê?
— Então, você não pode nem de longe sentir o que estou sentindo. Eu
era virgem ontem e hoje… — ela pega a garrafa de bebida e dá um gole e
eu não falo nada, só escuto. — Não contei aos meus amigos, sinto
vergonha, me sinto miserável, suja… e hoje tentaram me pegar à força —
diz e limpa uma lágrima, voltando a tomar a bebida.
— E o que você vendeu? Posso comprar de volta para você! — Eu
realmente compraria de volta se pudesse, as lágrimas que caiam livremente
pelo seu rosto me deixam tocado e eu uso o polegar para enxugar algumas
das suas lágrimas — Não precisa falar se não quiser — pronuncio vendo o
quanto aquilo está a machucando.
— Vendi o meu corpo — ela suspira. — Não é nada que possa
comprar de volta… me sinto miserável! — O seu choro veio acompanhando
de um urro de dor, eu sei que sou um miserável, não ela.
— Você deve ter tido bons motivos para isso. — Procuro confortá-la
com as minhas palavras, dizer que a entendo, só quero que ela saiba que
não é tão miserável, pessoas se vendem o tempo todo e por uma quantia
menor do que a que paguei pela nossa noite.
— Estou bêbada, certamente estou, por que contar esse tipo de coisa
para um estranho? — ela diz, respira fundo, limpa as lágrimas e torna a
tomar a bebida.
— Não sou estranho, sou cliente do café que você trabalha, mas não
se preocupe, o seu segredo está guardado comigo — tento tranquilizá-la.
— Obrigada por hoje, você até que não é tão assustador assim
olhando de perto — ela sorri e eu retribuo o sorriso.
Dei goles na minha bebida e ficamos calados por um tempo.
— Posso fazer uma coisa que estou com vontade? — falo, quebrando
o silêncio
— O quê? — questiona e me olha confusa.

— Isso… — A agarro a beijando, não estou conseguindo conter tanto


desejo.
A beijo e ela retribui, o beijo começa sem muita intensidade, a sua
língua brinca dentro da minha boca e vai ganhando ritmo. É delicioso,
viciante, o início da minha insanidade.
Deitamo-nos no banco de trás do carro, eu a beijo com desejo e ela
retribui cada vez mais. O meu sangue já está fervendo, o meu membro pulsa
em desejo, levanto o seu vestido e a minha mão encontra a sua intimidade
encharcada…
— Para… para… — ela fala ofegante, levanta e arruma a roupa.
Tento beijá-la e agarrá-la novamente, eu já estou louco, foi difícil
parar.
— Para, eu não quero! — diz ela me empurrando.
Passo as mãos nos cabelos ainda ofegante, e voltando a mim.
— Tudo bem — a minha voz sai em meio ao ar preso nos meus
pulmões.
Ela abre a ponta saindo do carro.
— O que está fazendo? — indago indo atrás dela.
— Vou para casa, senhor, me desculpe se fiz o senhor entender errado
— ela não anda, praticamente corre como se eu fosse um pervertido a ponto
de pegá-la à força.
— Volta para o carro, vou te deixar em casa. Estamos longe, não vou
deixar você voltar sozinha a pé e ainda a essa hora — falo tentando
convencê-la a voltar. — Não vou fazer nada que você não queria —
conclui.
O que acabei de falar nem fazia sentido na minha cabeça, eu
certamente iria deixar uma mulher que ousasse fazer isso comigo ir a pé até
outra cidade que eu não me importaria, mas, pela primeira vez, eu me sinto
culpado e tenho pena dela. Ela se sente miserável e usada, eu sou o culpado
por isso. Eu a pego nos braços e a coloco no carro, ela dá um grito se
assustando quando a tiro do chão.
— O que está fazendo? — ela indaga, com os olhos espantados.
— Vou te deixar em casa, consegue colocar o endereço no GPS? —
pergunto após colocá-la no banco da frente do carro.
Eu sei exatamente onde ela mora, mas ela não precisa saber disso.
Ela pega o meu telefone, digita o endereço e a localização aparece no
painel do carro, em seguida encosta a cabeça no banco e fica calada por um
bom tempo. Eu já estou acostumado com o silêncio, então, o ambiente me
parecia normal, mas não sei para ela, que tinha a boca contorcida em
agonia.
— Por que os homens são assim? — pergunta, quebrando o silêncio
que, aparentemente, a perturbava.
— Assim como? — questiono confuso.
— Conseguem transformar qualquer momento com uma mulher em
oportunidade de fazer sexo com elas sem haver sentimento, sabe? — ela
fala, sem me encarar.
— O que nós homens deveríamos sentir antes de fazer sexo com uma
mulher? — pergunto realmente querendo saber a resposta.
— Amor… — ela fala e me olha dessa vez.
Começo a rir e ela se irrita.
— E quem precisa de amor para fazer sexo com alguém? — gargalhei
com a sua inocência.
— Você nunca amou ninguém, né? — ela olha fixamente para mim,
ela era muito boba.
— Claro que sim, eu me amo muito — digo, dando uma piscadinha
para ela.
— E pelo jeito também nunca se sentiu amado, é realmente bem
triste… — ela me olha como se tivesse pena de mim.
Logo eu, ela era a única digna de pena aqui.
— Eu sonhava em encontrar alguém que eu realmente amasse e me
entregar depois do casamento… — o seu tom era angustiado.
— Sinto muito por você… — falo, embora eu não me arrependa do
que fiz.
— Não sinta, não foi com você que eu estava naquele quarto de hotel
— ela fala e sinto um leve desconforto.
Não sinto coragem de encará-la e apenas fico calado, mas ela volta a
falar.
— Aposto que chegará em casa e estará sozinho — adivinhou, porém,
isso é algo com que já estou acostumado.
— Por que acha isso? — Estou curioso pela resposta.
— Eu consigo te ver, você é frio e escuro… deve ser muito ruim viver
sozinho.
Embora eu goste de estar sozinho, o fato dessa criança me falar essas
coisas assim dessa forma, me deixa desconfortável. As pessoas nunca me
falam o que realmente pensam.
— Chegamos… pode parar aqui, obrigada pela ajuda hoje.
Ela desce do carro, espero ela entrar em casa e dou partida no carro.
Volto o caminho pensando em tudo que aconteceu, ela certamente me odeia
por fazer o que fiz. Mas pena? Pena não, por que alguém teria pena de
mim? Fico pensando nisso e sorrindo.
Entro na minha casa, me sirvo de uma bebida e sento no sofá, estar
sozinho nunca me incomodou, a casa está vazia, silenciosa e eu amo isso.
Os meus pensamentos me incomodam e me dizem que preciso dela, o meu
corpo precisa dela. Tenho que arrumar uma forma de tê-la perto de mim,
relacionamento definitivamente não é uma opção.
Gosto de ser sozinho, gosto de não me preocupar com ninguém, mas
eu a quero perto de mim. Sou um homem ruim e ela boa demais, sei que a
nossa aproximação a levaria a lugares escuros, porque é assim que sou…
escuro.
Mas não tem jeito, vou trazê-la para mais perto e observar no que vai
dar. Usarei o que sempre funciona, o dinheiro. Entretanto, dessa vez será de
uma forma diferente.
06
Um novo emprego

Samanta Antonelli

Chego em casa na ponta dos pés para não acordar ninguém, entro no
meu quarto e me jogo na minha cama.
Que dia louco!
Me pego lembrando do beijo e sorrio, ele beija bem e é muito gato
também.
— Samanta, que pensamentos são esses? Xô, xô! — Sacudi a cabeça
querendo afastar aqueles pensamentos.
Levanto-me e tomo um banho, logo depois visto a minha roupa de
dormir e me deito, fechando os olhos e esperando que o sono venha.

***

Acordo enjoada, beber daquele jeito acabou comigo. Que dor de


cabeça! Levanto-me e tomo um banho, me arrumo e desço.
— Bom dia! Pai e mãe, preciso ir, estou atrasada! — Dou um beijo no
meu irmãozinho e saio às pressas.
— Calma filha, tome um café — a minha mãe fala alto, porém, já
estou fechando a porta para responder.

***

Estou chegando na faculdade e os meus olhos não acreditam no que


estão vendo, o que ele está fazendo aqui? A presença dele é notada por
todas as meninas, elas caminham arrumando os cabelos e o
cumprimentando, já os rapazes olham para ele com olhar de desprezo e
certamente estão com ciúmes.
Um homem bonito e charmoso, com todo esse ar de superioridade
que ele emite, é muito desejável.
Ele me vê o observando de longe e vem andando na minha direção e
dou meia volta nervosa, afinal, nos beijamos ontem e eu não sei como
encará-lo, então finjo que não o vi e vou andando para lugar nenhum.
— Porque ele continua me seguindo! — exclamei, vendo-o logo atrás
de mim.
Ando nervosa, eu nem esperava vê-lo novamente.
— Vai voltar para casa a pé? — ele pergunta, em voz alta.
— Por que está me seguindo? — falo, me virando para ele.
— Eu, seguindo você? Só estou de passagem — diz desdenhoso.
— Certo, então siga o seu caminho — respondo, dando-lhe as costas
novamente.
— Você é sempre assim de manhã? Ou é só fome mesmo? — Os seus
lábios ensaiam um sorriso que ele não deu.
Olho para ele irritada, de fato estou faminta e ele falar isso em voz
alta me deixa desconcertada.
— O que você quer de mim? — pergunto de cabeça erguida e com
um olhar pretensioso.
Ele chega bem perto do meu ouvido e fala:
— Se eu disser o que quero, você vai me dar? — Ele se afasta com
um sorriso malicioso no rosto.
— Pervertido — falo carrancuda.
Viro-me de costas, voltando a andar, o ignorando.
— Espera! Podemos ir a outro lugar para conversarmos? É assunto do
seu interesse — garante, segurando o meu braço e o olho com um olhar
questionador. — Será rápido, prometo! — Ele pisca um olho para mim e
depois me encara com um olhar sexy, nunca havia visto um olhar assim em
toda a minha vida — Podemos ir até aquela lanchonete, assim comemos
algo, já que você está com fome! — Enquanto fala, me puxa pela mão,
deixando-me irritada novamente.

— Eu não estou com fome, comi bastante essa manhã — digo,


torcendo o nariz.
A minha barriga ronca e eu o olho envergonhada.
— Eu estava apressada, perdi a hora, bebi demais ontem, foi por isso
que não comi — justifico sem jeito.
— Eu não disse nada! — Ele dá de ombros com cinismo, como quem
me diz que não havia dito nada desta vez.
Seguimos a pé até o local e nos sentamos em uma mesa na
lanchonete, uma moça se aproxima abrindo mais o decote, que já não era
pequeno, ela para de costas para mim e inclina o corpo sobre a mesa, juro
que pensei que ela fosse colocar os seios na boca dele.
— O que vai pedir? — A sua voz era manhosa igual a de uma puta
que quase se jogou literalmente no seu colo.
— Traga um pouco de tudo, a garotinha aqui comigo, está faminta —
me provoca, sem nem sequer olhar na direção à fulana.
Lanço um olhar irritado para ele, que sorri.
— Bom, então qual é o assunto do meu interesse? — questiono sem
delongas.
— Seremos diretos, então — diz ele sorrindo. — Tenho uma proposta
para você, te pago cinco vezes mais do que o que ganha no café e vem
trabalhar para mim, na minha casa, em tempo integral. O que acha? — Sorri
satisfeito, como se estivesse me oferecendo um bilhete premiado da loteria.
— Cinco vezes mais? — Olho atentamente para ele, interessada. Não
eram milhões, mas ainda assim é muito dinheiro. — E o que eu teria que
fazer? — pergunto desconfiada.
— Cuidar de mim! — diz ele com um sorriso, revelando ainda mais
os seus dentes brancos e totalmente alinhados.
Ele não é de sorrir muito, mas quando o faz fica lindo e hoje pude vê-
lo sorrir várias vezes, o que o meu deu certeza do que estou afirmando.
— Você não está velho demais para precisar de babá? — indago
franzindo o cenho.
Ele me lança um olhar divertido, fugindo do normal que é frio e
misterioso.
— Preciso de alguém para arrumar as minhas coisas, manter a casa
em ordem, sabe?
— A sua casa deve ser enorme, por isso que está me pagando
tanto? — Quero saber mais, porém, ele está sendo econômico nos detalhes.
— Exatamente. O que me diz? — Me encara esperando pela resposta.
— Hum… acredito que não posso recusar tanto dinheiro. Quando
começo?
Ele me olha com um olhar satisfeito.
— Organize a mudança ainda hoje — pronúncia, estufando o peito
com muita satisfação.
— Mudança? Hoje? — pergunto espantada
— Você irá morar na minha casa, poderá ver os seus pais nas suas
folgas e, quanto a ser hoje, é porque a minha casa está uma bagunça — ele
fala, juntando os lábios e erguendo as sobrancelhas.
— Tudo bem, então! — falo concordando.
Após comer, nos levantamos, ele coloca os óculos escuro e voltamos
andando até a frente da faculdade, eu entro para aula e ele vai embora.
***

Após a faculdade vou até o café, preciso informar que não voltaria
mais e assim que entro encontro a Gabi trocando de roupa no vestiário.
— Gabi, estou mudando de emprego — as minhas palavras a pegam
de surpresa e ela me olha espantada.
— Para onde você vai, assim de repente? — O seu tom era um misto
de tristeza e surpresa.
— Vou trabalhar na casa daquele cliente que vem aqui no café! — Os
seus olhos se arregalam, a boca dela era um O perfeito.
— O quê? Aquele gato? Que sorte amiga! — O espaço fica pequeno
para tantos pulinhos que ela dá.
— Pois é, ele vai me pagar muito bem.
— Aliás, como foi aquilo dele te dar uma carona ontem à noite? —
ela pergunta curiosa.
— Eu estava muito bêbada, não encontrei vocês, ele me encontrou e
viu que eu não estava em condições de ir sozinha, então me ofereceu uma
carona.
— Sei, foi só isso mesmo? — Sorri com malícia enquanto me cutuca
com o dedo indicado.
— Claro, você acredita que um homem como ele olharia para mim,
Gabi? — Giro de braços abertos.
— Você é linda, amiga, até o presidente dos Estados Unidos olharia
para você.
Nós duas sorrimos e vejo o gerente chegar, abraço a minha amiga e
vou conversar com ele, alguns minutos depois já estou com tudo resolvido e
vou me despedir de Gabi.
— Tchau, amiga. Eu te ligo assim que resolver tudo por lá! — Nos
abraçamos forte antes que eu cruzasse a porta da saída.

***

Chego em casa e comunico aos meus pais, eles não gostam muito da
ideia de ir morar na casa de um homem, mas os tranquilizo informando que
tem outros empregados trabalhando lá e falo que com o salário poderá
ajudar mais os dois, que sempre virei vê-los nas minhas folgas.
Eles concordam desconfiados, porém, eu já sou bem crescida e posso
tomar as minhas decisões. Apanho o cartão que ele me entregou e ligo.
— Alô, senhor, pode me passar a localização? Pegarei um táxi e em 1
hora chego na sua casa.
— O meu motorista vai buscá-la, em trinta minutos ele chegará aí.
— Tudo bem, até mais então.
07
Fúnebre e sem vida

Leonardo Milani

Vejo o carro com o meu motorista pessoal se aproximando, ele para o


carro e a Samanta desce, ela para em frente à casa e os seus olhos observam
tudo ao redor, ela parece espantada diante do luxo, devo confessar que
gosto dessa reação.
Saio para recebê-la na porta.
— Vamos entrar? — falo, tirando-a do deslumbre dos seus
pensamentos.
— Claro! — Ela ainda olha tudo com muita curiosidade.
Entramos na sala e ela com uma expressão que não consigo decifrar.
— Algum problema? — pergunto confuso.
— Por que é tudo tão fúnebre, sem vida? É tudo tão silencioso… —
Samanta me olha e o seu olhar mostra tristeza.
— Por que me olha assim? — Sorrio sem jeito.
— Me desculpe, senhor! — As suas desculpas me deixam intrigado.
— Pelo quê? — Torno a ficar confuso.
— Quando disse que o senhor era escuro e sozinho, isso não me
passou pela cabeça — diz ela, me fazendo sorrir.
— Eu apenas gosto de preto, o silêncio e o escuro me tranquilizam,
você não precisa se desculpar. Vamos, vou te mostrar onde será seu quarto.
Ela continua olhando a minha casa atentamente, dos móveis até as
paredes, tudo na minha casa tem o tom escuro, as imensas janelas na maior
parte do tempo estão cobertas por cortinas, impedindo a luz do sol de
passar.
— Obrigada, vou guardar as minhas coisas, onde estão os outros
funcionários? — pergunta, sem ver ninguém além de nós dois na casa.
— Só temos aqui a equipe de segurança, eu e você.
— Vou cuidar disso tudo, sozinha? — Se formou um “O” na sua boca
e os seus olhos estão arregalados.
— Preciso aumentar o seu salário? — Tento parecer divertido com a
pergunta.
— Não…. Não é isso senhor. É que a casa é bem grande, enorme, na
verdade, e eu nem sei se vou precisar de um mapa para andar por aqui nos
próximos dias… — ela fala rápido e sem respirar.
Aproximo-me colocando o dedo nos seus lábios e ela para
instantaneamente, me observando assustada.
— Amanhã, você conhecerá os outros funcionários, 3 empregadas, 2
cozinheiras, 1 jardineiro e 1 motorista caso precise ir a algum lugar. Você é
a responsável por todos eles, fiscalizar e sinalizar se houver algum
problema, esse é seu trabalho. Vou te deixar descansar, até amanhã — falo,
saindo do quarto sem dar chance para respostas.
A minha vontade é de jogá-la naquela cama e fazer tudo que desejo,
porém, preciso ter calma, nunca fui de fazer jogos, mas, nesse caso, estou
me rendendo a eles.

***

Samanta Antonelli

A minha mente ainda gira diante disso tudo, quem moraria em um


lugar tão escuro? Tudo nessa casa é preto e quando falo tudo, é
absolutamente tudo. Dos banheiros à cozinha! Sinto pena dele, parece tão
sozinho, seus olhos sempre frios, sua personalidade escura, o silêncio desse
lugar é ensurdecedor, dá até para ouvir as batidas do meu coração.

***

De madrugada, sinto fome e desço até a cozinha, abro a geladeira,


apanho uma fruta e o copo para encher de água…
— Assaltando a geladeira de madrugada?
Grito me assustando, o copo cai no chão e sinto o meu pé doer com os
cacos de vidros que cortam a minha pele.
— Desculpa! Não queria te assustar, não se mexa! — Ele me pega
pela cintura, me suspendendo e me coloca sentada no balcão da cozinha,
acende a luz e me olha.
— Me desculpe, senhor! Eu senti fome e desci, não queria causar
problemas, eu limpo tudo…
Ele põe novamente o dedo na minha boca, já que estou falando sem
parar.
— Por que você está tão falante? Xi… — ele passa o dedo de maneira
provocante pelos meus lábios, eu fico imóvel. — Quero que fique tranquila
e pare de ficar nervosa na minha presença. Como vamos nos comunicar?
Será sempre assim, você falando sem respirar e eu tentando te acalmar?
Ele tem uma caixa na mão que nem sei de onde ele tirou, pega o meu
pé, coloca um medicamento e, por fim, um curativo.
— Prontinho, acenda a luz da próxima vez — diz, com um semblante
sereno.
— Claro, senhor! — Engulo em seco a minha vergonha.
Penso em me levantar e ele é mais rápido me segurando pela cintura,
fazendo pressão para que eu não levante do balcão. Ele se posiciona entre
as minhas pernas e me traz para mais perto do seu corpo.
— Preciso de algo… — sussurra no meu ouvido, eriçando todos os
pelos do meu corpo.
— O que, senhor?
— Preciso que pare de me chamar de senhor.
— Claro, se… — ele me olha e cola o seu corpo ainda mais ao meu,
sinto o seu corpo quente, mais do que o normal.
— Você sabe por que está aqui? — indaga, com o rosto colado ao
meu, sinto um hálito de menta familiar, mas meus pensamentos se distraem
quando ele puxa o meu rosto pelo queixo de uma forma delicada fazendo os
nossos olhos se encararem.
— Estou aqui para trabalhar — a resposta parecia óbvia para mim.
— Errado, está aqui porque o meu corpo queima de desejo por você e
você precisa muito de dinheiro.
08
Dormindo na mesma cama

Samanta Antonelli

Engulo a seco, a cor definitivamente fugiu do meu rosto.


— Como assim? — indago confusa e um tanto irritada.
— Você não entendeu ainda que quero você? — Ele encosta os lábios
aos meus, está muito quente e parece falar coisa com coisa, então, sem mais
nem menos, cai no chão.
Abaixo-me ao seu lado e coloco a minha mão sobre a sua testa, e
realmente parece estar com febre, vou até à entrada da casa e chamo um
segurança para que me ajude a subir com ele, pois não consigo sozinha.
O chefe dos seguranças entra e me ajuda a levá-lo para o quarto.
— Você pode ir, eu cuido dele! Obrigada.
— Sim, senhorita — fala, se retirando.
Todos aqui são muito discretos e silenciosos, acredito que seja uma
exigência para trabalhar aqui, se bem que ainda não conheci todos. Vou à
cozinha rapidamente e apanho um recipiente com água e volto para o
quarto, molho um pano e coloco sobre a sua testa, levanto a sua cabeça e
dou um remédio para baixar a febre que encontrei na sua pequena farmácia
que fica no armário do banheiro.
Não deixo de observar como o quarto é lindo e luxuoso, três vezes
maior do que o que eu vou dormir e aqui as coisas são ainda mais escuras,
nada sobre tom, como em determinados locais da casa, é tudo preto, como
uma pessoa vive em um lugar sombrio como esse? Cada pelo do meu corpo
se arrepia e eu abro as cortinas, a mansão tinha imensas janelas, mas a luz
parecia ser proibida de entrar.
Sento-me delicadamente na ponta da cama para checar se a febre
estava cedendo, porém, nada havia mudado, pensei em levantar e pegar o
pano com o recipiente com água para tentar baixar a temperatura do corpo,
mas suas mãos quentes e grandes me puxaram de volta para cama.
— Senhor… — a minha voz foi de baixa para quase um grito, eu
tento me levantar novamente.
— Não vá a lugar nenhum, fique comigo — ele segura o meu braço
com um pouco mais de força.
Não era como se eu tivesse escolha, já que era impossível tirar o meu
braço das suas mãos. Ele se acomoda no meu braço, me deixando em uma
posição desconfortável, como ele me segura com força, me vejo obrigada a
deitar ao seu lado na cama.
Estamos bem próximos, não me sinto confortável com tanta
aproximação, porém, não consigo me soltar, então, só relaxo o meu corpo
até que adormeço.

***

Leonardo Milani

Acordo dando de cara com o seu rosto colado ao meu, então essa
seria a visão do céu? Ela é perfeita até dormindo, o meu coração bate tão
forte que fecho a boca, ainda entreaberta, com medo de que ele saia por ela.
Uma vontade queima cada parte do meu corpo, a vontade de tê-la só para
mim.
— Linda — digo baixo e me sento ao seu lado, contornando o seu
rosto com um sorriso bobo nos lábios.
Sigo a minha rotina diária, levantando cedo e me arrumo para ir ao
trabalho antes que os funcionários cheguem, olho mais uma vez para ela e
antes de sair do quarto. Cruzo a porta do quarto, sentindo como se cada
partícula dela me puxasse de volta, eu poderia facilmente passar todos os
dias apenas a admirando.
— Deixe de pensamentos bobos, Leonardo. — Sacudi a cabeça, a fim
de afastá-los da minha mente.

***

Chego na empresa e a minha secretária me traz o café da manhã,


analiso alguns documentos enquanto como rapidamente, depois sigo para
reunião.
Tudo está indo normalmente até que recebo uma mensagem do Davi.
Oi, Maninho, quanto tempo! A sua casa é incrível por dentro, uma
pena que nunca tenha me convidado para uma refeição, mas podemos
almoçar juntos se tiver um tempo. Me responda para que eu não espere
tanto tempo em vão…
“Mas que droga ele faz na minha casa? ”, indago na minha mente.
Jogo o telefone sobre a mesa, batendo com força a palma da minha
mão, os olhares assustados percorrem toda a sala e me alcançam, eles se
entreolham, enquanto o homem que apresenta o novo projeto de marketing
treme, com os olhos marejados de lágrimas.
— A reunião acabou! — Me levanto e atravesso a porta como um
raio.
Dirijo para a minha casa com a mesma pressa, estaciono cantando
pneu, entro como um raio pela porta da mansão.
— Nossa, chegou rápido, não sabia que tinha tantas saudades assim
de mim.
O sorriso debochado de Davi aumenta o meu ódio, ele está sentado no
meu sofá tomando a minha melhor bebida e no meu melhor copo.
— O que quer aqui na minha casa? — o meu grito ecoou por toda
casa.
Os empregados olham assustados, entre as portas dos outros
cômodos, os meus olhos procuram por Samanta, que vem apressada na
minha direção, o sangue parece ter fugido do seu corpo, ela passa direto por
mim indo até o fedelho ainda sentado no meio da minha sala.
— Davi me disse que vocês são irmãos, e que ele ficaria feliz em te
ver — a sua voz sai trêmula, os olhos estão aflitos, ela sacode as mãos
como se não tivesse controle sobre elas.
— Somos irmãos, Sam, não se preocupe com isso — ele sorri para ela
tranquilo e volta a me olhar. — Podemos conversar, Leo? — diz
naturalmente, se pondo de pé.
Ensaio um sorriso desdenhoso, as minhas mãos estão fechadas, foi
impossível não lançar um olhar furioso para Samanta.
— Quem diabos disse que você pode deixar qualquer um entrar na
minha casa? Qualquer um que diga que é meu parente, você abre a porta?
— Os meus gritos fazem o seu corpo tremer, as pernas fraquejaram a
obrigando a segurar firme a mesa na sua frente.
— Me desculpe, senhor, eu não sabia…
— Se não sabia, então que me perguntasse antes — falo, ainda aos
gritos, antes que ela termine o que ia falar.
Olho ao redor, os cochichos e os olhares, respiro várias vezes
tentando voltar a mim.
— Não precisa falar assim com ela, eu sou o culpado, a Sam
acreditou em mim e por isso me deixou entrar. — Davi sai na sua defesa.
— Vamos ao meu escritório. — Ando na frente ouvindo os seus
passos me seguindo.
Davi fecha a porta atrás dele e senta sem que eu sequer permita.
— O que você quer? — pergunto-lhe, sem rodeios.
— Sou eu que pergunto, o que você quer com a Samanta? — O seu
tom de voz mudou completamente, o seu ar arrogante e altivo tomam conta
das suas atitudes, afinal, essa é a verdadeira face do meu irmãozinho.
— Ela trabalha para mim, não percebeu? E você não tem nada a ver
com isso.
— Você pensa que sou idiota? Pediu que ela ficasse em tempo
integral, você não passa de um lobo solitário, nunca se aproxima de
ninguém. Escute uma coisa, a Samanta é importante para mim e eu não
permito que a machuque! — Bate na mesa com a palma da mão aberta,
apontando o dedo indicador em seguida para a minha direção.
— O que faço com os meus empregados não lhe diz respeito e, até
onde sei, você não tem nada com ela, ou tem? — O medo da resposta me
fez tremer por dentro.
Ele cerra os punhos e me olha com ódio.
— A Samanta gosta de mim, penso em me declarar para ela e pode ter
certeza de que, se ela me aceitar, não chegará mais perto de você — ele
anuncia, em um tom de alerta.
— Está me desafiando? — Um vinco se formou no meu da minha
testa.
— Não… A Sam não é um jogo para mim e eu não deixarei que você
brinque com ela.
— Ela não é ninguém com quem quero brincar e me desfazer do dia
para noite. Desejo jogar muito com ela por muito tempo, depois que a
brincadeira perder a graça entrego ela a você, o que me diz? — Ensaio um
sorriso sarcástico enquanto pronuncio as palavras com deboche.
— Desgraçado! — Ele dá um soco na mesa, saindo apressado da sala.
— Samanta, arrume as suas coisas, você não vai ficar aqui, com esse
desgraçado.
— O que aconteceu? Vocês brigaram? — Os seus olhos passeiam
pelo punho sangrando de Davi e me analisa em seguida.
— Samanta, pega logo as suas coisas, aliás mando alguém vim
pegar! — Ele a arrasta cruzando a porta de saída.
— Para, Davi, estou trabalhando, você não tem com o que se
preocupar, eu sei cuidar de mim. — Puxa a sua mão, o fazendo parar e olhar
para ela confuso.
Eu não me pronuncio, apenas os observo, qualquer um diria que são
um casal e eu queria ter certeza de que não são.
— Você não precisa disso, vamos Samanta — Exige a puxando
novamente.
Ela o segue até o jardim e continua os observando, na verdade, estou
tentando saber o quanto ela se importa com ele. Até que ele a abraça e sinto
o meu sangue ferver.
— Solte… — grito em alerta ainda da porta, andando apressado na
sua direção. — Você está sendo ridículo e infantil, a Samanta trabalha para
mim e isso é tudo!
Samanta faz um sinal positivo e ele suspira em derrota, não poderia
obrigá-la a ir com ele.
— Davi, a gente se fala mais tarde… — Ela cruza a porta da mansão
apressada sem olhar para trás.
— Deixarei algo avisado, se você a ferir, eu te mato! A Sam me disse
sobre o dinheiro que havia recebido do novo empregador para pagar a
hipoteca, foi você quem emprestou?
Eu o olho sem entender, até onde sei a Samanta não sabe que fui eu
quem quitou a dívida. Então, percebo que ela pode ter mentido para ele.
— Sim, eu quitei a dívida, por quê? Algum problema? — confirmo a
história.
— Em troca do quê? — indaga ele entredentes.
Sorri com sarcasmo encarando o seu olhar furioso.
— A Samanta nunca cederia por dinheiro — afirma irado.
— O dinheiro compra tudo maninho, você sabe muito bem disso.
Esqueceu que os seus pais desejaram que eu fosse filho biológico deles ao
invés de você, um moleque que não tem um tostão no bolso?
— Você até pode comprar as pessoas, mas nunca terá o amor delas.
Você está avisado, não toque na Samanta, entendeu?
— Passar bem — debocho, virando as costas, eu não preciso
continuar a discussão, Samanta entrou na casa, ela escolheu a mim e isso,
por hora, é suficiente.
09
Você precisa de dinheiro

Samanta Antonelli

Eu queria poder me esconder, aliás, evaporar seria a melhor saída,


torço os lábios nervosa, sacudi as mãos como se aquilo fosse aliviar a
minha tensão.
— Desculpe, senhor, eu não sabia que a sua relação com ele não era
boa… eu nunca nem soube que o Davi tinha um irmão e do nada ele fala!
Acreditei que não seria um problema, até fiquei feliz já que a nossa, o
senhor é irmão do meu melhor amigo….
— Já chega, Samanta! — O seu grito me fez estremecer, eu já me
sinto desempregada, o olho nos seus olhos e me sinto envergonhada. —
Volte ao trabalho — ordena.
Olhei espantada, ainda estou empregada.
— Sim… me dê licença! — Corro rápido para o mais longe que
consigo.
O clima na cozinha estava tenso, os funcionários me olham de
esguelha, vejo que tem um homem sentado à mesa, rindo, achando muita
graça. Pego água e me sento.
— O que é tão engraçado? — pergunto carrancuda.
— Você… — responde entre gargalhadas.
— Ah, sério? Devo me candidatar à vaga de palhaço da próxima vez?
— Viro o rosto para o lado oposto, eu quebraria o nariz dele se continuasse
o encarando com o seu deboche.
— Não fica chateada, eu sou Mateus o jardineiro, prazer. — Estende a
mão na minha frente.
— Certo, sou Samanta. — Não me dei ao trabalho de responder a sua
mão estendida, torcendo o nariz ainda irritada.
— Estou trabalhando aqui há três anos e nunca vi o senhor mais que
três minutos e hoje esse espetáculo, no seu primeiro dia de trabalho! Você
tira ele do escritório e o faz vir aqui, você é realmente diferente.
— Devo tomar isso como um elogio? — Encolho os ombros, o
encarando com ironia.
— Não ligue para ele, minha filha, tome, coma uma fruta. Sou Maria,
muito prazer, eu trabalho aqui desde que o senhor Leonardo comprou essa
casa, então, já faz bastante tempo.
Olho para a senhora de cabelos grisalhos, eu não havia notado a sua
presença quando entrei, ela parece ser uma boa pessoa.
— Essa é Teresa, e essa é Ana, elas trabalham há cinco anos aqui —
ela afirma, apontando para as duas mulheres jovens, uma em cada canto da
cozinha, uma lavava os pratos e a outra mexia algo que estava no fogo.
— Me desculpe pela forma que entrei na cozinha, eu nem notei a
presença de vocês! — Isso soou um tanto arrogante e eu logo corrigi: — Eu
estava preocupada, nervosa pelo ocorrido, mais uma vez, me desculpem.
— Não se preocupe, minha querida, percebemos que entrou nervosa
— Maria sorri, me servindo pedaços de manga cortados em um prato.
— Vocês devem conhecer bem esse temperamento dele? — O rubor
toma conta do meu rosto, depois de tudo, me sinto envergonhada pelo que
aconteceu.
— Sim e não. Ele não costuma aparecer na casa nos horários em que
estamos, mas é um ótimo chefe, nos bonifica e nos dá muitas folgas —
Maria não economiza nos elogios para Leonardo.
— Isso é bom, eu ainda estou aqui, então, de fato, ele deve ser um
bom patrão, uma mancada dessa seria meu passaporte para o desemprego
— sorri contidamente. — Me chamo Samanta, muito prazer — falo
calorosa. — Fui contratada para ser supervisora de vocês, e repassar os
possíveis problemas para o senhor Leonardo — completo encarando os
olhares desdenhosos das outras duas funcionárias.
— Chegou hoje e já está se achando! — Ana, a que está no fogão,
sussurra, me olhando por cima dos ombros.
Cruza o meu caminho com uma panela enorme com água quente,
sinto o vapor esquentando a minha pele, sobressalto para trás assustada
perdendo o equilíbrio sendo envolvida pelos braços de Mateus, que me livra
de uma queda.
— Você não tem serviço para fazer no jardim? — Leonardo esbraveja
da porta nos encarando com fogo nos olhos.
— Claro que tenho, chefe! — O homem sai apressado pela porta dos
fundos sem sequer olhar para trás.
— Maria, sirva o almoço, vou comer em casa hoje e você… — Os
funcionários se entre olharam abismadas, já esse não é um comportamento
normal dele. — Você, venha até o meu escritório! — Os seus olhos me
encaram, mas ele logo vira as costas deixando o local.
— Claro, senhor! — Corro tentando acompanhar os seus passos
apressados.
Ele entra no escritório e apoia o corpo na mesa, entro logo atrás
fechando a porta atrás de mim.
— Serei breve e direto com você — começa a falar, antes mesmo que
eu pudesse dar dois passos para dentro do escritório.
O seu semblante sério e a sua respiração apressada faz o meu corpo
tremer, ele anda na minha direção encurtando a distância entre nós, dei
vários passos para trás tentando respirar um ar que não fosse o que saía das
suas narinas de tão próximo que ele estava. Encontro a parede e me seguro
a ela, como se ela fosse uma porta preste a se abrir.
— Essa é a minha casa, tudo aqui me pertence, eu uso e faço o que
quero com qualquer coisa que esteja aqui, isso vale para objetos a pessoas.
Os meus olhos se arregalam e certamente eu havia ficado pálida, pois
sinto o sangue fugir das minhas veias.
— Do que está falando? — A minha voz falha e sai mais baixa do que
planejei que saísse.
— Ainda não terminei de falar — o grito foi seguido de um murro na
parede rente ao meu rosto.
— Você lembra o motivo de estar aqui?
Engulo em seco, incapaz de responder, não tinha forças para abrir a
minha boca.
— Responda! Você sabe por que está aqui? — Exige aos gritos
mantendo os nossos rostos bem próximos.
— Estou aqui para cuidar dos assuntos da casa — a minha voz é
trêmula e os meus olhos se enchem de lágrimas.
— Errado novamente… vou clarear a sua mente, o meu corpo precisa
de você e você precisa de dinheiro, é por isso que está aqui.
Olho enojada para ele, uma raiva percorre cada pedacinho do meu
corpo.
— Eu não sou um objeto, senhor, não vou aceitar ser tratada como
um.
— Ah, não? E não foi você quem se vendeu?
As lágrimas queimavam nos meus olhos.
— Eu não deveria ter confiado em você, um estranho! — Tento me
soltar dos seus braços que me prendem contra a parede, mas as tentativas
eram inúteis.
— Você gosta daquele moleque do Davi? — exige a resposta.
— Isso não diz respeito a você! — ele está agindo como o meu dono.
As suas mãos me apertam forte contra o seu corpo, ele desce os lábios
com exigência, esfregando-os contra a minha pele.
— Me solta! — Grito o empurrando. — Vou embora daqui você está
louco! — Me solto dos seus braços, saindo rápido da sala com ele no meu
encalço.
Subo as escadas correndo, entrando no meu quarto, apanho a minha
mala e começo a colocar as minhas roupas dentro dela com pressa. O toque
do meu telefone me trouxe de volta a mim, embora eu não estivesse em
condições de atendê-lo.
— Samanta, pare com isso! — Ele segura os meus braços, trazendo o
meu corpo para próximo ao dele novamente.
— Me solta! — Grito.
O telefone ainda toca sem parar e como não houve resposta, uma
mensagem apareceu na tela.

Filha venha correndo ao hospital,


o seu irmão está na UTI.

A minha vista embaça, eu não tenho forças para me manter em pé,


sinto os braços de Leonardo me segurarem antes que eu alcance o chão e a
escuridão me envolve.
10
A solução está na sua frente

Samanta Antonelli

Volto a mim com o olhar dele preocupado.


— Você está bem? O que aconteceu? — ele pega o telefone das
minhas mãos com pressa.
Um grito de desespero sai da minha garganta.
— Samanta, eu te levo lá, vamos.
Eu não estou em condições para aturá-lo, às suas mãos me seguram
carinhosamente e a sua voz era doce, que droga de pessoa muda de humor
tão rápido assim?
— Não, irei sozinha — falo tentando me recompor.
— Você não está em condições, eu levo você até o hospital — insiste.
— Vou ligar para o Davi, em alguns minutos ele retorna e me leva até
lá. — Tento recuperar o meu telefone, mas ele o segura com força.
— Não precisa ligar para ele, já disse que levo você — percebi
naquele momento que eu não teria opção a não ser aceitar, ele não me
deixaria sair dali sem ele.
Pego a minha bolsa sobre a cama e sigo lentamente até o carro,
escolho o silêncio durante o caminho, encaro a janela, os pensamentos
enchem a minha mente, me deixando exausta.
— Me desculpe pelo que aconteceu — sussurra, ele é o tipo de uma
pessoa que nunca pede desculpas e permaneci em silêncio. — Eu não te
vejo como um objeto, na verdade, eu não sei o que tem se passado pela
minha cabeça. Eu nunca quis tanto estar com alguém… poderia olhar para
mim, por favor! — Consigo observar a sua expressão pelo vidro do carro,
eu estou vendo a angústia que está nos seus olhos e na sua voz.
Viro-me para encará-lo.
— Samanta, eu não quero que vá embora — o seu tom de voz é de
quem está implorando.
— Não estou com cabeça para ter essa conversa agora, o meu irmão
não está bem — torno a olhar para o outro lado, encarando a paisagem que
passa pela janela.
Eu não sei o que faria ainda e nem estou disposta a conviver com as
mudanças de humor dele, estou com medo.
— Claro, me desculpe. É que ter a ideia de te ver se afastar de mim,
não me deixa raciocinar direito.
Do que ele está falando? Quando fomos próximos? Conversamos
duas vezes, nem somos tão próximos assim! Franzi o cenho olhando a
paisagem confusa.
— Sei que deve me achar um louco, mas você é a primeira pessoa
com a qual tive mais contato em quatorze anos, desde que saí da casa dos
pais do Davi.
Avisto o hospital e suspiro aliviada, o ar está denso e a conversa um
tanto estranha.
— Chegamos, pode parar para que eu desça? — falo apressada,
soltando o cinto e abrindo a porta antes mesmo que ele estacione.
Assim que ele para, corro apressada pelos corredores do hospital,
seguindo as placas que indicam o UTI.
— Pai, mãe, o que aconteceu? — pergunto, assim que os encontro.
— O médico disse que ele tem uma doença rara e que precisa de um
tratamento bem específico e caro, teremos que ir a outro estado fazer o
tratamento. Não sei onde arrumaremos tanto dinheiro — ela diz, entre
soluços, mal havíamos resolvido a questão da hipoteca e agora isso.
Sento-me no banco de concreto grudado à parede, um sentimento de
derrota e incapacidade me invade, Leonardo me encara escorado na entrada
do corredor e claro que ele ouviu tudo, mas isso não era da sua conta. Baixo
a cabeça, apoiando nos meus joelhos e abraço as minhas pernas, juro que
me vender novamente passou pela minha cabeça, balanço a cabeça tentando
afastar aqueles pensamentos, eu não posso fazer isso novamente, tem que
haver outra solução.
O som dos passos do sapato de couro de alta qualidade ecoa pelo
corredor, em pouquíssimo tempo, ele se abaixa na minha frente, sinto as
suas mãos passando pelas minhas costas como quem conforta um amigo,
ele sussurra:
— Não se preocupe, eu tenho muito dinheiro e posso ajudar — a sua
voz tranquila e extremamente persuasiva fez todos os pelos do meu corpo
se eriçarem.
Levanto os olhos para olhá-lo.
— Já avisei, eu não sou um produto que você pode comprar —
sussurro de volta.
— Você está me entendendo errado, Samanta, seremos amigos, você
ficará ao meu lado e, se eu tiver muita sorte, você será minha mulher, eu
posso te dar tudo… tudo que nunca sonha.
— Do que ele está falando? — Olho irritada enquanto ele se senta ao
meu lado.
Não é como se ele fosse um homem asqueroso ou impossível de se
viver. Ele é bonito, tudo nele exala poder, é sexy com esses olhos cor de
mel, qualquer mulher gostaria de estar ao seu lado. Porém, sua
personalidade fria, prepotente e arrogante, achando que pode comprar tudo
e nunca envolve sentimento nas coisas, não me deixa confortável ao lado
dele. E nesse momento sei que sou um objeto que ele quer muito ter.
Os meus pais olham ansiosos para o fim do corredor e acompanho os
seus olhos, o médico se aproxima sendo direto.
— Preciso que me respondam se vão poder arcar com a transferência
imediata do paciente e essa é a lista de remédios que precisam comprar. —
Me levanto e me aproximo dos meus pais.
— São muitos! — Me espanto com a folha A4 repleta de nomes de
remédios.
— Precisamos transferi-lo de imediato e providenciar os
medicamentos o mais rápido possível — o médico continuou.
Leonardo me encara com um ar satisfeito, ele sabe que agora ele é a
minha melhor opção.
— Quais são seus termos? — pergunto o puxando para longe dos
meus pais.
— Vamos conversar no café do hospital. — Anda na frente e eu o
sigo.
Ele senta em uma mesa afastada no canto do café, uma mesa apenas
para duas pessoas, me sento de frente para ele, que apoia os cotovelos sobre
a mesa e me encara.
— Então, o que você quer de mim? — Tenho medo da resposta, mas
preciso dela.
— Só preciso que fique comigo, ao meu lado, e que seja minha
mulher — ele responde, com naturalidade, como quem propõe uma ida ao
cinema.
— Mulher? — Indago, com a minha mente percorrendo tudo que eu
teria que fazer para ser a sua mulher.
— Não vou te obrigar a nada, se é isso que teme. Mas também não a
quero para ser um móvel na minha sala, porém, espero até que você
também queira.
— E se não acontecer? Se eu não quiser nunca? — A minha voz sai
baixa, mais do que eu gostaria, aquela conversa era constrangedora.
— Não acredito que isso vá acontecer — ele sorri convencido.
— Mas, e se acontecer? — pergunto realmente considerando a
questão.
Ele pega as minhas mãos, eu tento puxar, ainda surpresa. Ele as
segura firme e alisa o dorso da minha mão com o seu polegar.
— Eu só quero que esteja comigo, se me quiser, eu serei seu.
Puxo as minhas mãos rapidamente sem ser impedida por ele dessa
vez.
— O que nós seríamos? Namorados? — Um sorriso irônico nasce no
meu rosto.
— Não me importo com o nome que daremos à nossa relação.
Podemos ser o que você quiser, da forma que te deixe mais confortável —
ele fala, me dando controle
— Tudo bem, resolva a questão do meu irmão e eu fico na sua casa!
— Levanto apressada, me recusando a encarar o seu sorriso satisfeito por
mais tempo.
Ele é um predador e, nesse momento, está satisfeito por conseguir a
sua presa. Leonardo anda grudado a mim pelos corredores, os meus pais
nos encaram com desconfiança.
— Quem é seu amigo? — O meu pai pergunta, nos encarando com o
cenho franzido.
— Sou namorado da sua filha, Leonardo Milani, muito prazer. —
Estende a mão para o meu pai que olha espantado.
— Namorado? — Tremo, diante do seu tom irritado, ele olha do
Leonardo para mim e volta a olhar para Leonardo novamente, que logo
coloca as mãos no bolso, sem jeito após mantê-la estendida sem resposta.
— Mas podemos conversar em outra hora, senhor, vamos resolver a
questão do garoto! — Enche a boca para falar que ele poderia fazer algo.
— Como planeja resolver — o meu pai não parece que seria fácil.
— Tenho muito dinheiro — Leonardo volta a encher a boca, isso é
algo que ele se orgulha muito.
— Certo, mas não é nada da família, por que daria tanto dinheiro? —
O meu pai olha com desconfiança para nós dois.
— Se ele quer ajudar, vamos deixar que ele nos ajude! Não temos o
dinheiro dos remédios, estamos cheios de dúvidas… — a minha mãe lhe
entrega a extensa lista.
O meu pai não vê outra opção a não ser aceitar, ele sempre ouvia
muito a minha mãe e, se ela concorda, ele não discute.
O médico volta com um semblante preocupado.
— Resolveram? — ele pergunta, com as mãos no bolso.
Leonardo toma a frente falando com o médico.
— Sim, pode transferir o garoto e comprar toda medicação
necessária, o coloque no melhor quarto do hospital, dê tratamento vip a ele.
Aqui estão os meus dados para mandarem toda a conta para mim, não
poupem esforço ou dinheiro, use o que for necessário sem pena — diz com
um tom altivo.
O médico ignora o olhar surpreso dos meus pais e se atenta apenas a
Leonardo, que tinha a solução para o problema “dinheiro. ”
— Ótimo, que bom que ele receberá o tratamento adequado — o
médico fala, tentando passar naturalidade, mas chocado com as palavras de
Leonardo, dava para ver no seu rosto.
— A partir de hoje, não se preocupem com dinheiro, cuidarei muito
bem da Samanta, se assim os senhores me permitirem. E quanto ao garoto,
darei todo apoio financeiro que precisarem — sorri com satisfação e
naturalidade.
— Por que só estamos sabendo desse namoro agora? — O meu pai
volta ao assunto que o incomoda.
— Estamos juntos a um mês, senhor, estávamos esperando o melhor
momento para contar — ele toma a frente novamente, me impedindo de
falar.
O meu pai solta um longo suspiro antes de falar.
— Vamos conversar a sós — o meu pai propôs.
— Claro! — Leonardo responde, o seguindo.

***

Leonardo Milani

Retorno ao café do hospital com o pai da Samanta, ele caminha em


silêncio ao meu lado, o desconforto está estampado no seu rosto e eu nunca
me importei com isso, eu estou em busca do meu conforto, dos meus
benefícios.
— Desde quando estão juntos? — ele pergunta, ainda no caminho.
— A um mês, senhor — volto a mentir.
— É para você que ela está trabalhando? Ou ela mentiu sobre o
trabalho e foi morar com você? — ele pergunta me estudando e sentamos
em uma mesa.
— Eu realmente precisava de alguém para gerenciar a casa e ofereci
pagar a Samanta, mas claro que quando a gente se casar ela não vai precisar
trabalhar, tenho muito dinheiro — casamento? De onde essa palavra saiu?
— Não me importo se você tem dinheiro ou não, isso nunca foi a
fórmula da felicidade e eu quero que a minha filha seja feliz, amada.
Agradeço o dinheiro do tratamento, mas espero poder pagar a você, não
quero que a minha filha se sinta pressionada a estar com alguém só porque
nos ajudou financeiramente.
— Claro, o Senhor tem toda razão, também quero que a Samanta seja
feliz e se sinta amada.
“Não entendo tanta obsessão pelo amor, sempre vivi sem ele e estou
vivo. ”
Sorrio com o meu pensamento.
— Você parece ser um bom moço, porém, é bem mais velho que a
minha filha — diz, me estudando.
— São apenas quinze anos de diferença e, convenhamos, Samanta é
bem madura para a idade dela.
— Você está certo, ela é muito madura — suspira mais uma vez
passando a mãos pela barba mal-feita. — Vou lhe dar um voto de confiança.
Vibro por dentro, a situação veio em um momento ótimo, quando
senti que perderia a Samanta.
— Eu agradeço. — Estendo a minha mão novamente e, dessa vez, ele
responde com um aperto de mão.
Levantamo-nos, voltamos para encontrar Samanta e a sua mãe, de
longe eu já pude ver os olhos aflitos da minha menina, tudo ficaria bem
agora, pois ela tem a mim.
— Filha, espero que seja feliz e marquem logo o casamento, ou você
irá comigo, não vou deixá-la morando com um namorado.
— Tudo bem, pai! — Ela assente.
— Vamos, temos que arrumar as coisas — ele fala para a mãe da
Samanta, que concorda.
— Deixo vocês em casa — Samanta não me encara, mas isso logo
iria passar.

***

Já no carro, entrego um cartão a eles.


— Senhor, são para as despesas da mudança e estadia, use à vontade
sem se preocupar, aluguem um apartamento próximo ao hospital, quero que
fiquem confortáveis.
— Não precisamos disso, vou pedir transferência do meu emprego
para que eu ganhe a minha própria renda — o pai dela fala orgulhoso e, de
fato, teria a transferência se assim ele quisesse, eu mesmo cuidarei
pessoalmente disso.
— Certo entendo, mas por favor receba isso como presente, não é
muito dinheiro para mim.
— Marido, aceite! Podemos precisar e, se não precisar, é só não usar
— a mãe da Samanta fala baixinho e o pai dela cede
— Tudo bem, mas vou devolver cada tostão.
— Certo, fico feliz que não rejeite.
Deixo os pais da Samanta em casa, eles se despedem com abraços e
choros, planejam formas de se verem e se comunicar. No carro, no caminho
de volta para casa, Samanta está abatida, calada, imagino que ela se sentirá
sozinha com os seus pais longe.
— E aí, qual a data do casório? — Tentei deixar o ar divertido.
— Do que está falando? Não foi isso que combinamos.
— Ah…. Então, vai ser minha mulher sem casamento, achei que
fosse mais tradicional — sorri.
Ela não responde e vira a cabeça para a janela, voltando a ficar em
silêncio.
— Você sabe que não sou mais virgem… não tenho mais esses sonhos
bobos — percebo uma lágrima saindo dos seus olhos e as suas mãos vão
apressadamente as enxugando. — Vamos fazer um contrato — ela fala, me
olhando diretamente nos olhos desta vez.
— Contrato? Que tipo? — pergunto, uma ruga se formou entre as
minhas sobrancelhas.
— Quero que tudo fique claro, o que pode ou não ser feito.
Estaciono o carro no acostamento e pergunto:
— E o que não pode ser feito? — Tiro o cinto de segurança e me
aproximo dela.
— Não pode me forçar a nada e nem me tocar sem a minha
permissão — exige, com uma voz altiva.
— E quando terei permissão? — indago sorrindo, afinal é exatamente
isso que eu quero. — Agora posso tocá-la, já que ainda não temos um
contrato? — O meu tom malicioso fez o seu rosto ser coberto por um rubor,
ela baixa os olhos encarando o chão.
Levanto o seu rosto pelo queixo delicadamente, os nossos rostos
ficam próximos, eu a beijo com delicadeza nos seus lábios, ela não
corresponde, eu levo a minha mão por baixo da sua blusa sentindo a sua
pele. O seu corpo estremeceu de desejo, então paro de beijá-la e dou um
sorriso.
— Acho que não terei problemas com esse contrato, com apenas um
beijo e uma carícia, já vi o seu corpo implorando por mais — sorri
convencido.
— Não seja convencido — ela torna a virar o rosto para o lado
oposto, apertando uma mão na outra.
11
Não é real

Samanta Antonelli

Já faz uns dias que eu estava aqui nessa casa, até então tudo está indo
bem, Leonardo mantinha a sua palavra e vínhamos nos dando bem.
— Pedi que a Maria colocasse as suas coisas no meu quarto. —
Leonardo cruza a porta do meu quarto, sentando na ponta da cama.
— E por que fez isso? — Franzi o cenho, virando o rosto para encará-
lo.
— Está mais que na hora de você dormir comigo — um sorriso sexy
estampa o seu rosto.
— Você diz que não me obrigaria a nada! — retruco, com o coração
acelerado.
— E o que tem de tão ruim em dormir comigo? Só dividiremos a
mesma cama.
— Gosto da que durmo — sorri, me fazendo de desentendida.
— Se o problema é esse, posso pedir que coloquem essa lá no meu
quarto — ele responde no mesmo tom com que eu havia lhe respondo,
entrando no jogo.
— Você entendeu muito bem o que falo. — Me viro para o espelho,
voltando a me arrumar para a faculdade.
Ele me abraça por trás carinhosamente, apoiando o queixo no topo da
minha cabeça.
— Você é linda… — fala enquanto observa o nosso reflexo no
espelho.
Vira-me de frente e sela os meus lábios com um beijo suave e sem
exigência, a sua mão desenha o meu corpo e sinto a minha pele queimar. Eu
não sei o que sinto por ele, mas sei que nada disso é real, que estou aqui
pelo dinheiro e o desconforto que isso me causa faz com que eu me afaste
dos seus braços.
— O que foi? Fiz algo errado? — Me olha curioso, inclinando a
cabeça para o lado, me estudando.
— Estou indo à faculdade, não quero me atrasar. — Apanho a
mochila que está sobre a cama e ando apressada em direção à porta.
— Eu te deixo lá! — Ele me puxa gentilmente pelo braço, me
prendendo nos seus braços novamente, o seu dedo indicador trilha as linhas
do meu rosto, chegando até os meus lábios, onde ele faz um breve passeio,
me encarando com luxúria.
Sinto as minhas bochechas esquentarem, abaixo a minha cabeça
envergonhada, viro as costas para ele e descendo as escadas com pressa. Os
empregados já estão na casa, o que não era comum, o ar parecia ter ficado
denso e eles não nos encaram, apenas olham de soslaio. Leonardo nem
sequer os cumprimenta, indo direto para a garagem e me esperando lá,
assim que chego, ele abre a porta e entro, então ele faz o mesmo.
— Por que não foi a empresa hoje? — indago com curiosidade, ele
sempre ia à empresa cedo, todos os dias.
— Eu ainda vou — responde naturalmente, encarando o caminho à
sua frente.
— Pensei que sempre saísse cedo.
— Isso era antes, agora tenho você! Gosto de aproveitar o máximo de
tempo que eu puder ao seu lado. — Ele tira uma das mãos do volante e
acaricia os meus cabelos rapidamente. — Por que me olha assim? — Franze
o cenho, tirando os olhos da estrada por alguns segundos para me encarar.
O meu olhar para ele era confuso, de fato eu ainda tento entendê-lo e
a tudo o que está acontecendo comigo em relação a ele, além de tentar
conhecê-lo melhor.
— Eu não entendo você, só isso — a minha voz sai baixa e eu viro o
rosto para o lado oposto.
— Posso te explicar, o que quer saber? — a naturalidade da sua voz
me faz sentir como se fosse a estranha.
— O que você sente por mim? — Eu vinha me fazendo essa pergunta
a dias e ela vinha me consumindo por dentro.
Ele levanta uma das sobrancelhas, um semblante pensativo estampa o
seu rosto.
— Sei que você é a minha droga, eu quero tê-la perto de mim sempre,
o tempo todo, necessito disso — ele fala com uma expressão de dor, era
nítido o quanto a necessidade de ter alguém lhe causa desconforto.
— Sou apenas mais uma pessoa a quem você comprou para satisfazer
as suas vontades — a minha voz sai em um sussurro, eu não tenho coragem
de encará-lo.
— Não, você não é mais uma! É a primeira que faço isso. Nunca tive
interesse em estar tão próximo de alguém, sempre foi apenas sexo… —
Percebo a agonia na sua voz.
— E por que eu? — O encaro dessa vez, eu quero estudar cada linha
da sua expressão.
— Não sei, só sei que te quero cada dia mais e se você me aceitar, te
darei tudo, é só pedir e você terá — fala, oferecendo a única coisa que ele
sabe dar.
— Você pensa que só preciso do seu dinheiro? — Forço um sorriso.
— Julga que tudo se resume a isso? — Sacudi a cabeça negativamente,
mantendo o sorriso sem humor.
— E não é por isso que está aqui agora? — fala dando de ombros.
— Você nunca amou ninguém? — A minha pergunta o fez sorrir com
sarcasmo.
Ele estaciona o carro em frente a faculdade e me encara.
— Por que as pessoas falam tanto em amor se nunca conseguem amar
nada além de si próprios? — Ele havia inclinado o corpo para perto de mim
e eu abaixo a minha cabeça, ele levanta o meu queixo, me fazendo olhá-lo.
— É isso que você acha? Então não acredita no amor? — A minha
voz soa incrédula.
— Nunca senti tal sentimento, mas fica tranquila que o que sinto por
você pode não ser amor, mas é o suficiente para que você não precise de
mais ninguém, eu posso ser tudo que você precisa — ele inclina o rosto
para selar os meus lábios, usando o dedo polegar para acariciar o meu rosto.
Eu não sei o que estou sentindo neste momento, como uma pessoa
pode chegar a este ponto? Que coisas ele viveu para ser a pessoa que é
hoje? Fria e escura?
— Obrigada por me trazer! — Antes que eu consiga abrir a porta do
carro, ele me puxa para outro beijo, dessa vez mais exigente, e fecho os
olhos, me deixando levar pelo seu beijo entorpecedor.
Quando os abro, os seus olhos olham satisfeitos para fora do carro e
sigo o seu olhar, Davi está parado na entrada da faculdade nos observando.
— Passo te pegar mais tarde? — pronúncia com um lindo sorriso de
satisfação.
— Não precisa, o Davi sempre me leva depois da aula.
Eu não pretendo afrontá-lo com as minhas ações, mas foi assim que
ele se sentiu, os seus olhos pareciam facas me cortando ao meio, ele aperta
forte o meu braço.
— Não quero você andando por aí com outros homens, entendeu? —
esbraveja rudemente.
Eu não respondo, apenas liberto o meu braço do seu aperto, sentindo
ele doer e desço do carro. Davi ainda me espera na entrada, a sua expressão
confusa me alcança e ele me questiona em um tom de quem julga um
assassino.
— O que foi isso? Você está namorando esse cara? — Ele sibila
irritado.
— Sim, estamos juntos — tento ser o mais natural possível, ele não
precisa saber dos detalhes.
A sua expressão muda, o vejo engolir seco e os seus olhos ficam
úmidos.
— Por que, Sam? Ele não é homem para você! Vai te machucar, esse
cara não sabe o que é amar alguém — eu não tenho certeza de tudo isso,
mas sei que em algo Davi está certo, aquele homem nunca amou e nem foi
amado.
— Por que fala assim do seu irmão? — pergunto curiosa, ele me disse
serem irmãos, eu queria entender melhor essa relação.
— Esse bastardo não é meu irmão! — diz entredentes. — Os meus
pais o adotaram antes do meu nascimento, depois ele mostrou o monstro
que é, ele tem uma natureza ruim. Depois que fugiu de casa, ele voltou
muito rico, nem sabemos o que ele fez para ter tanto dinheiro, perseguiu os
meus pais, tentou nos destruir. Ele não presta, Samanta, só pensa nele e vai
te machucar.
— Vamos para aula, Davi — trato de mudar de assunto e ando
apressada.
— Sam, pare com o que está fazendo, eu sei que não tem sentimentos
por ele — insiste no assunto.
Paro, me virando para ele com as mãos na cintura e pergunto, o
desafiando:
— Como pode ter tanta certeza?
— Porque eu te conheço e sei que não está apaixonada — tive que
encolher o ombro e dar um suspiro de derrota, ele de fato me conhece.
As palavras de Davi não saiam da minha mente, eu não quero
acreditar que ele era tão ruim assim, ele tem me ajudado, não tem me
forçado a nada conforme prometeu. Talvez ele seja um pouco bipolar,
estranho… hum… Mas perigoso, não! Sacudi a minha cabeça a fim de me
livrar daqueles pensamentos.

***

O sinal toca e corro para fora da sala, Leonardo ainda não havia
chegado e me atrasei alguns minutos procurando as chaves do meu armário,
um táxi seria uma boa opção, ele não disse nada sobre isso. Quando desço
do táxi, avisto o jardineiro atrevido de longe, ele acena com as mãos, vindo
na minha direção, trato de mudar a minha cara, mostrando uma expressão
mais acessível, ele não é ruim, o episódio com o Leonardo de fato tinha
sido engraçado.
— Boa tarde, senhorita! — Ele tem um sorriso bobo na cara.
— Oi, Mateus, como está? — Tento ser simpática.
— Muito bem, obrigado por perguntar. Está na hora do almoço, vou
até à cozinha comer! — Ele deixa os objetos que usava num canto escorado
em uma árvore e eu sigo os seus paços.
— Hum… estou com muita fome, acredito que vou com você.
— Vai comer na cozinha? — pergunta surpreso.
— Sim, não posso? — Dou de ombros, o encarando.
— A senhorita pode comer onde quiser — ele mantém o sorriso fácil
que tinha, mas passa as mãos no cabelo, parecendo nervoso.
— Então vamos logo, porque dá para sentir o cheiro delicioso da
comida da Maria daqui de fora! — Ele sorri com as minhas palavras.
Entro pela cozinha, surpreendendo os outros funcionários que já estão
à mesa comendo.
— Senhorita, por que entrou pela cozinha? — Maria me olha confusa
e vem na minha direção.
— Estou com muita fome, Maria! — Passo por ela indo até as
panelas, checando-as.
— Deixa que coloco a comida para vocês, dois esfomeados! — Torce
os lábios com um ar divertido.
— Vá para sala, menina, que levo comida para você.
— Vou comer aqui mesmo, Maria, pode me servir — me sento à
mesa.
— Então, como conheceu o patrão? — Mateus me pergunta com
curiosidade.
— Ele era cliente no café que eu trabalhava, a nossa ele me dava
medo! — Faço uma careta e sorrio em seguida.
— Ele me dá medo até hoje — diz divertido.
As gargalhadas tomam conta do ambiente, mas o ar fica denso numa
fração de segundos, Maria tem um olhar esbugalhado para a porta e eu os
sigo. Leonardo nos observa e a sua expressão é sombria.
“Droga, ele deve ter escutado o que estávamos falando. ”
— Levante-se e me acompanhe — a ordem foi de um patrão para uma
empregada e eu sobressalto, me levantando apressada.
Leonardo segue na frente em direção ao quarto e eu o sigo, mesmo
que todo o meu corpo esteja dormente pelo medo que a sua expressão me
causou.
— Entre e feche a porta — ele fala e eu obedeço, fechando a porta
atrás de mim. — Por que não me esperou? Eu disse que iria te buscar — os
seus olhos me queimam viva.
— Eu disse que não precisava — tento passar firmeza na voz, mas
estou acuada, ainda encostada na porta.
— Já disse que não quero você com outros homens por aí — grita
novamente, me assustando ainda mais.
— Peguei um táxi, não vi problema nisso, não quero que se sinta
incomodado, tendo que ir me levar e trazer.
Ele zera lentamente o espaço que existe entre nós, me deixando sem
saída encostada na porta, segura firme o meu rosto com força e, com o rosto
bem próximo ao meu, fala:
— O que fazia comendo na cozinha com o jardineiro? E o que era tão
engraçado? — Ele aperta o meu maxilar com a mesma força com que trinca
os dentes para falar.
— Você está me machucando — falo com dificuldade e sinto as
lágrimas queimarem nos meus olhos, mas elas não caem, eu as seguro até
mesmo quando sinto o meu rosto doer assim que ele o solta.
— Estou esperando a resposta — brada com toda a força que ele pode
ter nos seus pulmões.
— Estávamos apenas conversando, não vi problemas nisso — a
minha voz sai como um sussurro, sequer levanto o rosto para olhá-lo.
Ele esmurra a parede rente ao meu rosto, grito fino com o susto, não
tenho mais forças para me manter de pé, mas me seguro, deixando livre
apenas as lágrimas quentes a descer pelas minhas bochechas. Eu já o havia
visto assim descontrolado, mas hoje parece ainda pior, o ciúme faz o seu
corpo tremer, a veia do seu pescoço fica visível e eu estou ali acuada na
porta com medo de me mover, impotente, indefesa e com muito medo.
— Existe problema sim! Você é minha, entendeu? Não quero outros
homens te olhando com desejo — vociferou, com a respiração acelerada.
Ele me envolve nos seus braços e me beijava com violência,
exigência e dependência. Sinto nojo, raiva, me sentindo um nada e deixo
que os soluços saiam junto ao choro.
— Qual o problema? — Ele me olha se afastando, as minhas ações
estão descontroladas.
— Me deixe ir agora, por favor — imploro, os meus joelhos teriam
alcançado o chão em súplica, mas ele busca o ar com pressa e dependência,
se afastando ainda mais de mim, eu o vejo passar as mãos pelos cabelos
várias vezes enquanto anda tentando respirar.
— Você pode sair — a voz rouca de quem puxa o ar foi quase
inaudível, mas ansiei tanto por estas palavras que teria lido os seus lábios se
fosse necessário.
Procuro forças e saio rapidamente para meu quarto.
12
Mudando de atitude

Samanta Antonelli

Entro rapidamente no meu quarto e tranco a porta. Jogo-me na cama


com o meu rosto enfiado no travesseiro, muitas coisas passam pela minha
cabeça e a principal delas é ir embora daqui.
Os meus pensamentos são interrompidos pelo toque do meu celular, o
tiro do bolso atendendo-o.
— Alô, filha — ela fala ansiosa do outro lado da linha.
Puxo o ar para os pulmões, me acalmando antes de responder.
— Mãe, está tudo bem? Como o Samuel está?
— Filha, o seu noivo é muito generoso, ele nos comprou um
apartamento muito grande e estamos em um hospital muito luxuoso. Você
acredita que o quarto do Samuel tem um quarto para podermos dormir, sala
de estar e banheiro? Tudo muito confortável. Além de que o médico que
atende o Samuel é o melhor especialista, somos tratados como reis no
hospital, aqui tudo custa uma fortuna, estou bem tranquila e sei que ele está
em boas mãos.
— Fico feliz, mamãe, que esteja tudo bem com vocês e o Samuel,
espero que ele se recupere logo e que vocês voltem, sinto saudades — a
minha voz sai chorosa, eu queria muito o colo da minha mãe, mas também
não quero preocupá-la.
— Acredito que logo ele ficará bem, filha, os médicos estão bem
otimistas e ele tem reagido bem ao tratamento — a sua voz é animada.
Deito-me direito na cama com o telefone ainda no ouvido.
— Está certo, mãe, agora vou dormir um pouco, estou cansada.
— Certo, minha filha coma e durma bem, te amamos!
Encerro a ligação e volto a chorar. Preciso ter forças, minha família
precisa desse dinheiro. Tomo um banho e decido que farei diferente, a partir
de hoje, serei o que ele quer que eu seja e terei tudo que ele estiver disposto
a me dar. Se estou nesse jogo, preciso jogá-lo bem. Já estou ferida o
suficiente, não sou mais virgem, preciso agir como uma mulher e tê-lo nas
minhas mãos.

***

Acordo me sentindo mais animada, salto da cama escolhendo a


melhor roupa das que tenho, após fazer a minha higiene pessoal e me
arrumar, desço e ele já não está mais na casa, como hoje é sábado, ele não
me esperou e foi direto ao escritório. Ele costuma almoçar por lá, então
levarei o seu almoço hoje.
Vou para a cozinha, a mesa do café da manhã ainda está posta e Maria
já prepara o almoço.
— Maria, se importa se eu fizer a comida do Leonardo hoje? — Me
encosto na bancada aguardando a respostas.
— Claro que não, minha filha, vai levar até o escritório?
— Sim, será que ele vai gostar?
— Acredito que ele vai amar a surpresa — pronúncia, sem me olhar,
cortando as verduras sobre a bancada.
— Espero que ele goste, quero agradá-lo.
Assim que tudo está pronto, coloco tudo em marmitas e sigo para
carro que fica à minha disposição, mas que eu nunca o uso. Entro no carro e
abaixo o vidro, antes de seguir, grito para Maria, que me olha da porta:
— Maria coloque as minhas coisas no quarto do Leonardo, por favor
— ela dá um largo sorriso e acena positivamente com a cabeça.
— Senhor, me leve até o escritório do Leonardo, por favor.
— Claro, senhorita — o motorista responde dando a partida.
O carro para em frente ao imenso prédio, eu já havia passado por ele
algumas vezes, mas nunca prestei atenção no luxo que era aquele local,
entro deslumbrada, andando pelo imenso salão.
— Bom dia! — Me encosto no balcão da recepção.
— Sim, em que posso ajudar? — A moça, de cara enjoada, me estuda
de cima a baixo.
— Preciso falar com o Leonardo, por favor! — Ela arqueia as
sobrancelhas, me encarando com desdém.
— Tem hora marcada com ele?
— Não, na verdade, quero fazer uma surpresa — sorrio animada.
— Surpresa? — Conteve o riso.
— Você pode ligar e dizer que a Samanta está aqui?
— Ele está em reunião, creio que não será possível falar com ele
agora. — Revira os olhos.
— Tudo bem, posso esperar e me avise quando eu puder subir — digo
antes de virar e me sentar na recepção.
Sento-me e ela volta a me olhar dos pés à cabeça, dando uma
gargalhada.
— Vai esperar? O Senhor Milani não tem tempo para atender as
iludidas que acreditam que tem chance com ele. Vá embora, eu tenho mais
o que fazer. — Sacudiu as mãos no ar como se espantasse um cachorro
sarnento.
— Iludida, eu? Sou a noiva dele, garota — falo de boca cheia.
— Ah! Sério, a noiva dele? — Ela solta outra gargalhada. — Esse
homem não socializa nem com ele mesmo — retruca. — Mas se é a noiva
dele, por que não liga para seu celular e avisa que está aqui? — Me desafia.
— Farei isso. — Tiro o telefone da bolsa ligando, mas a ligação cai na
caixa postal, o que me deixa ainda mais irritada com a situação.

***

Leonardo Milani

Passo a reunião olhando para o relógio, quero que as horas passem


rápido, quero vê-la. Não paro de pensar nela e o que faço para reverter a
situação de ontem.
— Ok, terminamos por hoje! — Eu nem olho para os presentes na
sala, os meus olhos estão fixos no relógio e caminho até a porta que dá
direto a minha sala, recolho tudo que preciso, colocando na pasta e desço
apressado.
Franzo o cenho assim que o elevador abre e tenho uma visão da
recepção.
Samanta? O que ela faz aqui?
Envio uma mensagem, informando que o meu assistente não desça
agora, Samanta não pode vê-lo ou saberá que foi comigo que ela dormiu
naquela noite. Vou em direção a ela, que parece bem nervosa com a
recepcionista, a funcionária me vê de longe me aproximando delas, arruma
a postura e coloca um sorriso amigável no rosto.
— O que está acontecendo aqui? — Aperto os olhos, confuso.
O som da minha voz fez Samanta virar imediatamente para mim, ela
me lança um lindo sorriso, os meus olhos ficam presos nele por alguns
segundos, mas logo a confusão volta para a minha mente.
— Meu amor… — as palavras vieram acompanhadas de um abraço,
ela fica nas pontas dos pés, permitindo que os seus lábios toquem os meus.
Os meus braços ficam abertos e estou sem reação.
— O que é isso? — indago um pouco alto para ela, considerando que
ela esteja acometida por uma loucura.
— Meu amor, essa garota me insultou — ela morde o lábio inferior
falando manhosa, deixando cada parte do meu corpo eriçado.
Os meus olhos caminham até a recepcionista que engole seco.
— Senhor, quer que eu chame os seguranças para tirá-la daqui? —
indaga, tropeçando nas palavras.
— Por que faria isso com a minha noiva? — As minhas palavras a
surpreendem.
Um sorriso satisfeito brota no rosto de Samanta, que me olha
orgulhosa, uma felicidade absurda toma conta de mim, nunca imaginei ficar
tão feliz em deixá-la satisfeita e orgulhosa.
— Senhor, perdão, eu não sabia que era noivo — ela me olha com
aflição e vejo um pingo de suor escorrer pela sua testa.
— O que quer que eu faça com ela, meu amor, a dispenso? —
pergunto alisando o rosto de Samanta, que vira a cabeça para a funcionária.
— Senhorita, me perdoe, eu… eu…. Preciso desse emprego —
suplica de mãos juntas.
Samanta a encara com um olhar que conheço bem, vindo da parte
dela, era “pena”.
— Tudo bem, meu amor, deixe que ela fique. Vamos embora, trouxe
algo para você — ela entrelaça o seu braço ao meu me puxando para fora da
empresa.
— Espera! — Me viro, voltando a minha atenção para a funcionária
que volta a arrumar a postura quando me vê retornar. — Da próxima vez,
me comunique se alguém vier me ver, sou eu que decido quem quero
receber.
— Claro senhor! — Balança a cabeça apressada.
Volto a olhar para Samanta, que me espera sorrindo no meio do
caminho, ela pega na minha mão e saímos do prédio.
— O que deu em você hoje? — Um vinco se forma no meio da minha
testa e eu a estudo enquanto entramos no carro.
— O quê? Não gostou de me ver? — pergunta, tranquila e relaxada,
mas claro que aquilo me deixa desconfiado.
— Se eu pudesse, não me desgrudava de você. — Encosto a minha
cabeça no encosto do banco e ela faz o mesmo, nos encaramos e levanto a
minha mão traçando o caminho pelo seu braço, alisando-o até chegar nos
seus cabelos. — Para onde vamos?
— Ao parque — diz com um sorriso maroto.
— Ok, para o parque! — Dirijo até o parque, curioso e ansioso para
saber o que me espera lá.
— Pare o carro nessa parte do parque — ela fala, apontando.
— O que tem em mente? — Estou curioso.
— Só pare! — responde sorrindo enquanto encosto o carro.
— Me ajude com todas essas coisas! — Ela desce e vai para o porta-
malas, o abro e Samanta pega uma bolsa térmica e um tecido nas mãos.
— O que é tudo isso?
— O nosso almoço, eu fiz para comermos juntos, forre esse pano bem
aqui! — Ela dá um pequeno salto sobre o local que é para forrar com a
toalha e sorrio para ela.
— Vamos comer aqui? — Torço o nariz.
— Sim, vamos comer aqui, planejei uma tarde diferente.
— Sério? — Inclino a cabeça, a estudando.
— Sim, muito sério, venha, sente ao meu lado.
Sento-me ao seu lado, cruzando uma perna sobre a outra, me sinto um
adolescente deslumbrando. Ela coloca a lancheira de lado e me encara,
mordendo o lábio inferior, parecia tímida, as suas bochechas ficam
vermelhas enquanto ela ergue os braços e os envolve em volta do meu
pescoço. Estou suando feito um menino, esperando pelo beijo que era certo
que viria, os meus olhos não desviam um só minuto dos seus que se fecham
quando os nossos lábios se encontraram dando início ao um beijo tímido.
As nossas línguas se moviam lentamente e não foi o nosso primeiro beijo,
mas esse foi diferente.
13
Do que você precisa?

Samanta Antonelli

Estamos sentados em um parque como se fossemos um casal real e,


depois de vários beijos, eu consegui observar o seu olhar satisfeito. Ele fez
tudo que pedi, eu ia propondo sem nenhum tipo de resistência, na verdade,
ele parece estar à vontade, e eu até consigo vê-lo com outros olhos, era
como se ele fosse uma pessoa diferente, uma pessoa que eu conseguiria me
adaptar com facilidade.
— O que achou? Acha que já posso casar? — indago em um tom
divertido assim que ele dá a última garfada na comida que eu havia
preparado.
Ele sorri acariciando o meu rosto com o polegar e após desenhar os
meus lábios ele selou os seus aos meus.
— Vamos para casa — diz, guardando os potes de volta na bolsa
térmica, eu o ajudo e em poucos minutos já havíamos finalizado.
— Você não me disse se gostou — falo assim que me sento no banco
do carona.
— Claro que gostei, muito obrigado — diz, voltando a sua postura
séria e dando partida no carro.
— E, por que está tão sério? — Me viro para encará-lo.
— Eu não costumo ser sério? — Ele dá um sorriso assimétrico um
tanto malicioso. — O que deu em você hoje? — pergunta, sem tirar os
olhos da estrada.
— Como assim o que deu em mim hoje? — Sorrio nervosa, não era
essa a reação que eu esperava.
— Do que precisa? — indaga, com mais seriedade dessa vez, jogando
um balde de água fria em mim.
Sinto os meus lábios tremerem de nervosismo.
— Acha que fiz tudo por interesse? Não acha que posso gostar de
você e da sua companhia? — falo, como se estivesse indignada com a
pergunta que ele havia me feito.
— Na verdade, eu não me importo com isso, posso te dar o que você
quiser, é só pedir. Não me importa o motivo de estar ao meu lado, tenho
muito dinheiro, pode tê-lo contanto que esteja comigo, então se quer algo
apenas fale.
— Nossa, você torna um dia especial em algo fútil rapidamente, estou
decepcionada… — Me viro, olhando novamente pela janela, sentindo o
meu rosto queimar de vergonha.
— Sei que você não está apaixonada por mim, Samanta, não sou um
moleque bobo e iludido, já estive com todo tipo de mulher, nenhuma igual a
você, confesso, mas ainda assim, consigo ver interesse quando me deparo
com ele.
— Não acredita que alguém possa se apaixonar por você ou até
mesmo amar? — indago sem encará-lo, a vergonha ainda não me permitia
tal ato.
— Então será minha essa noite? Acredito que não se negue isso a
quem se ama.
Viro o rosto rapidamente para ele, que me lança um olhar divertido e
um sorriso que eu poderia chamar de sexy. Ele gargalhou em seguida,
exibindo uma postura mais leve que a de cinco minutos atrás.
— Continue assim, minha menina, eu gosto, estou adorando essa
nova versão de você.
— De qual? A versão interesseira? — pergunto um pouco chateada.
— Não é bem assim, cada um de nós tem um motivo para estarmos
juntos, eu sei os seus e você os meus, não vejo problema nisso. Não vejo
nada de mais em você querer algo de mim. Eu já lhe disse, Samanta, você
tem tudo de mim se quiser e eu estou lhe oferecendo, sempre foi assim,
você nunca veio até mim pedir nada, então desfaça essa cara amarrada e
seja minha, peça o que quiser, tenha o que sempre sonhou e ponto final.
Ele está certo, eu não tenho motivos para me chatear, a nossa relação
foi aberta desde o início, nunca fizemos juras de amor, sempre foi uma
relação clara, ele me dá o que quero e eu… dou o que ele quer.
Ele estaciona o carro em frente a mansão e contorna rápido à frente
do carro, abrindo a porta para mim e espero por ele, não faço como antes
que descia desesperada encarando o seu olhar reprovador, ele gosta de abrir
a porta para mim e quero agradá-lo em tudo. Leonardo entra na mansão
segurando a minha mão, como dois namorados, ainda tem funcionários, o
que era óbvio pelo horário que chegamos, subimos direto para o quarto
— Preciso tomar um banho, me sinto suada — falo em frente a porta
do quarto que era só dele até hoje de manhã.
— Tudo bem, nos vemos depois — ele beija o topo da minha cabeça
e se vira, preste a abrir a porta. — Algum problema? — indaga me vendo o
esperar.
— Eu estava esperando você abrir a porta do nosso quarto — abro e
entro saltitando.
— O que está fazendo Samanta? — Um vinco se forma entre as suas
sobrancelhas.
Ele entra no quarto, os seus olhos me estudam.
— Estou entrando no nosso quarto, Leo — repito.
— Que novidade é essa? — Vi um sorriso sincero surgir, a satisfação
logo estampa o seu rosto.
— Gostou? — Sorri de volta.
— Eu? Estou adorando a novidade! — Me abraça pelas costas,
traçando um caminho com a boca até a minha nuca, um calor toma conta do
meu corpo, eu estou em combustão.
— Então acho que não vai se importar em dividir o seu banheiro
comigo?
— Divido o banheiro, o chuveiro, a cama e tudo mais que você
quiser! — Me vira de frente, segurando a minha nuca, a sua língua pede
passagem, abrindo os meus lábios, eu o beijo sem reservas, sinto o desejo
que o domina em uma mordida contida nos meus lábios.
— Preciso de um banho! — Me afasto sem um pingo de vontade,
entrando rápido no banheiro, mais rápido que as suas mãos, que tentam me
puxar de volta para o calor dos seus braços.
Entro embaixo do chuveiro nervosa, hoje seria a minha segunda vez
com um homem, mas é como se fosse a primeira. Minutos depois, saio do
banheiro enrolada na toalha, ele estava enxugando os cabelos após tomar
banho em outro banheiro, vestia apenas uma bermuda de moletom.
Ele senta na ponta da cama, me encarando faminto.
— O que está esperando? Que a toalha caia? — Sorrio
— Não, eu estou esperando que você a tire para mim.
O rubor toma conta do meu rosto e ele sorri, vendo as minhas
bochechas vermelhas, eu podia senti-las queimar.
— Está com vergonha? — Se aproxima, traçando um caminho com o
seu dedo indicador, ele vem do meu braço até os meus lábios, alisando
carinhosamente.
— Sinto como se fosse a minha primeira vez… — assumi, revelando
a minha insegurança e medo.
— Então serei o seu primeiro. — Todo o meu corpo se arrepia quando
os seus lábios tocam a minha nuca, eu tremi e ele recua.
— Se não se sentir pronta, posso esperar — diz, encurtando a
distância entre nós.
Eu o vi como nunca o havia visto antes e essas palavras me tocam
como eu nunca imaginei que me tocariam, ele está sendo um cavalheiro e
eu sinto que queria aquilo tanto quanto ele.
Solto a toalha que eu vinha segurando com força e timidez, os seus
olhos brilham vendo o meu corpo despido, ele umedece os lábios, zerando a
curta distância entre nós. Os meus olhos não saem dos seus lábios, que se
aproximam tranquilamente dos meus, ele os sela rapidamente e começa a
traçar um caminho pelo meu pescoço, chegando aos meus seios. Tremo
quando sinto a sua língua quente e úmida tocar o bico dos meus seios e um
gemido sai da minha boca, aquilo era bem melhor do que me lembro.
— Me faça a sua — falo entre um gemido.
— Tem certeza, Samanta? — Ele para o beijo para me encarar.
— Me faça a sua — imploro dessa vez.
— Samanta, você vai acabar comigo — admite, com uma voz sofrida
e rouca, tomada pelo desejo.
— Seja meu — falo, desejando que aquele homem me visse como
alguém a quem ele pudesse amar, eu realmente desejo isso nesse momento.
— O que mais você quer de mim? — Ele me deita na cama
delicadamente, se posicionando entre as minhas pernas, acariciando a
minha entrada com a ponta da sua intimidade e entrando lentamente, sem
afobação, eu sinto uma enorme vontade de rebolar em cima dele, de senti-lo
melhor, mas sinto vergonha de tomar a iniciativa.
Ele entra com mais pressão, me fazendo gritar de tanto tesão.
— Eu quero que você seja apenas meu — digo, tomada pelo desejo.
— Não sinto desejo por nenhuma outra… — a sua boca alcança a
minha e iniciamos um beijo exigente, parando apenas para soltar gemidos
altos. — Eu não consigo me segurar com você.
Não entendi o que ele estava me falando, mas sinto os seus
movimentos ganharem mais velocidade, todo o meu corpo treme e uma
onda de prazer acompanhada de vários tremores toma conta de mim, ao
mesmo tempo, em que ele urra dentro de mim.
— Caralho! Chegamos ao orgasmo juntos? — Parece feliz com isso,
ele se joga ao meu lado com a respiração acelerada.
— Eu acho que sim — digo, sem um pingo de certeza.
— Claro que chegamos juntos, eu senti — ele fala com satisfação.
Ele passa o braço por baixo da minha cabeça, puxando o meu copo
para mais perto, repouso a cabeça no seu peito, ele acaricia os meus cabelos
e, aos poucos, a sua respiração e os seus batimentos cardíacos iam voltando
ao normal. Fico curiosa para saber quem de fato ele era, se esse homem
caloroso e amável, ou o outro que me deixa assustada.

***

— Não vem deitar? — pergunto para ele, que está sentado à mesa
olhando algo no notebook.
— Preciso responder um e-mail, minha menina, mas já me deito com
você.
Deito-me de pernas para cima e fico o encarando, ele me olha às
vezes e sorri para mim. Eu já estava sonolenta quando ele deita ao meu lado
e me beija deliciosamente.
— Você é deliciosa, eu te quero cada vez mais, estou cada dia mais
viciado. — Ele segura o meu rosto entre as suas mãos e volta a me beijar.
Ele para de repente, enfia a cabeça no travesseiro e encara o teto.
— Qual foi o problema? — Levanto o corpo para encará-lo.
— Me prometa que não vai embora quando já tiver tudo o que deseja
de mim… — o seu olhar era vazio enquanto encara o teto.
O meu coração se aperta de uma forma que sinto a dor me rasgar,
quão solitário ele é? O quão triste é saber que todos se vão quando já tem
tudo que precisam.
Encosto o meu queixo no seu peito, o que faz ele olhar nos meus
olhos.
— É simples, me dê algo que ninguém mais poderia me dar, me deixe
viciada nisso e faça com que eu só encontre isso em você.
— O que seria isso? — Vi a confusão atravessar os seus olhos. —
Quero muito poder te dar.
— O que te faz me querer tanto? O que tenho que as outras não têm?
— É uma dúvida que tenho e que poder ser a chave para as respostas que
ele procura.
— Não sei… — o seu semblante era pensativo, ele caça as respostas
na sua mente, mas, no final, parecia decepcionado.
— Assim que descobrir, faça com que você também tenha esse algo
que não posso encontrar em outros homens e eu nunca irei para longe de
você — garanto.
— Vou me certificar de achar para que você nunca se vá — diz,
acariciando os meus cabelos.
E essa foi a primeira vez que dormimos juntos, com os nossos corpos
abraçados.
14
Não acredito no amor

Leonardo Milani

É a primeira vez que acordo com a luz do sol entrando pela pequena
brecha na cortina mal fechada, os braços de Samanta estão sobre mim, me
viro lentamente e a encaro, os nossos rostos estão praticamente colados, o
cheiro dos seus cabelos invade as minhas narinas e os meus olhos se
perdem na sua beleza. Ela é apenas uma garotinha, mas que me leva a
loucura como nenhuma outra mulher experiente um dia sonhou em levar.
Abraço-a, esperando que esse momento nunca acabe e, pela primeira vez,
sinto medo de ficar sozinho.
Olho para o meu quarto escuro e me sinto incomodado, não pertenço
mais à escuridão e sei que tudo isso acontece porque quero estar perto da
luz que ela reflete em mim. Pergunto-me se isso é o que chamam de amor e
dou um sorriso, zombando dos meus próprios pensamentos.
Como você é idiota, Leonardo, desde quando acredita no amor?,
indago para mim em pensamento ainda sorrindo
Eu nunca estive tão próximo a alguém, em nenhum momento me
perguntei sobre os meus sentimentos a respeito de outra pessoa, nenhuma
vez senti necessidade de cuidar, proteger e querer só para mim, jamais senti
um mínimo de vontade de entregar tudo que tenho por um mísero sorriso.
Não, Leonardo, o amor não seria tão egoísta…
Torno a rir dos meus pensamentos, o amor não poderia ser isso, um
desejo louco de possuir, uma vontade avassaladora de matar quem quer que
ouse se aproximar.
O sol chega ao rosto de Samanta, que espreme os olhos, tentando
fugir da luz que a incomoda, sorri da sua expressão fofa e ela abre os olhos
lentamente, se espreguiçando.
— Bom dia, Leo — diz, com um sorriso, essa é a melhor visão para
se iniciar o dia.
Onde está todo inferno que eu sempre vivi? Eu me sinto no céu, com
todo o meu corpo flutuando.
— Bom dia, minha menina! Tem planos para hoje?
— Achei que iria trabalhar, já que nunca para em casa. — Ela se
senta, cruzando as pernas uma na outra.
— Hoje ficarei com você, o que acha de um passeio de barco? — Ela
levanta os olhos bem arregalados para mim.
— Barco? — parecia surpresa.
— O quê? Não gosta?
— Nunca andei em um — diz, com um certo deslumbre que me
agrada.
— Então se arruma, vai andar em um hoje — sorri com satisfação.
Ela salta da cama apressada e torna a se sentar com a mesma pressa.
— O que foi?
— Me senti tonta, levantei rápido demais — sorri tímida.
— Não precisa de tanta euforia, o sol acabou de nascer! — Me
levanto, indo em direção às grandes janelas, abrindo as cortinas que nos
privava da luz solar.
— Você tem razão, é que nunca fiz nada de tão divertido aos
domingos a não ser ver filmes com o Da… — calou-se.
Eu sabia o que ela queria dizer ao hesitar em pronunciar e sinto o meu
corpo queimar em raiva, quando ela começa a falar o nome daquele
pirralho.
— Desculpe, eu não falo por mal.
Eu não consigo conter a minha expressão furiosa, aquele sentimento
de posse é novo para mim e eu não sei como contê-lo. Ela se aproxima de
mim, sentando no meu colo e envolve os seus braços em volta do meu
pescoço, traça o caminho com as mãos segurando o meu rosto entre elas.
— Sou sua, eu e o Davi somos só amigos! Eu não faço sexo com os
meus amigos.
Ela pega as minhas mãos e começa a conduzi-las pelo seu corpo, o
meu sangue esquenta e logo já sou um lobo atacando a minha presa.
— Samanta, quando ficou tão ousada? — sussurro em um tom
satisfeito.
— É você quem me deixa assim — sorrio orgulhoso com a resposta.
Fizemos amor loucamente, nunca vi a minha menina assim tão
entregue, tão incrível, se eu não soubesse das circunstâncias que a
trouxeram até aqui poderia jurar que realmente somos um casal apaixonado.
Deitamos suados um ao lado do outro, a Samanta desenha o meu
rosto com o seu dedo e me dá leves beijos, estampando um sorriso fofo de
menina.
— Você não quer ir para o barco? Podemos ficar aqui o dia todo, por
mim tudo bem! — Dou de ombros.
Ela dá um pulo da cama, correndo em direção ao banheiro e eu sorrio,
nunca havia medido a minha felicidade no sorriso de alguém.

***

Samanta Antonelli

Entro no banheiro animada, eu sempre quis andar de barco, parece


que ele leu a minha mente. A tontura que eu havia sentido volta, o meu
estômago está embrulhado, a minha vista escurece e eu me apoio na parede,
espero até que a sensação ruim passe.
— Samanta, está tudo bem aí? — Leonardo bate gentilmente na porta.
— Sim, está tudo bem — grito abrindo o chuveiro.
Tomo um banho rápido, me enxugo e saio enrolada na toalha,
Leonardo está terminando de arrumar a bolsa que está sobre a cama.
— Nossa, você é rápido! — Vou até a cama e analiso o conteúdo da
bolsa com um olhar rápido.
— Quer mudar alguma coisa? Ou acrescentar?
— Não, está perfeito — sorrio, me virando para ele.
Ele me abraça e me beija, em seguida passa a mão nos meus cabelos.
— Vou tomar um banho rápido.
Após me arrumar, me sento, na cama, com biquíni e uma minissaia,
ele vira a cabeça me analisando e sorri sexy para mim.
— Se você não correr agora desse quarto, eu não vou poder garantir
que a gente vá a esse barco hoje — fala, mordendo o lábio com maldade.
— Vou te esperar lá embaixo! — Levanto rápido, atravessando a
porta com pressa.
Não demora muito e logo ele desce, vestindo uma bermuda preta,
camisa polo preta e um óculos de sol, ele é perfeitamente lindo.
— Uau! — exclamo divertida.
— Gostou? — ele pergunta, me dando um beijo na testa.
— Sim, está lindo.
— Então…. Vamos? — Anda na frente comigo no seu encalço.
Ele dá um sorriso, abrindo a porta traseira do carro, põe a bolsa e abre
a porta do carona em seguida para que eu entre.

***

Chegamos rápido à praia, já que a mansão não fica longe, mas era
uma área da praia que eu não conhecia e olho tudo atentamente.
— Aqui é onde fica a marina — Leonardo responde e eu penso se eu
havia falado em voz alta.
— Qual é o seu? — digo, indo em direção à um barco que imaginei
ser o dele.
— Por que você acha que é esse? — indaga com um ar divertido,
quando parei em um luxuoso iate preto.
— É o único preto que tem aqui — respondo como se fosse óbvio.
— Se não lhe agrada o preto, podemos ir em outro, é só escolher! —
Abre os dois braços apresentando as opções.
— Como assim? — Olho confusa.
— São todos os meus — responde naturalmente.
Não tive como conter o meu olhar admirado, tem muitos iates
ancorados aqui.
— Por que tantos? — A pergunta sai em um tom assombrado.
— Não faço ideia de como gastar o meu dinheiro, então gosto e
compro. — Dá de ombros, como se ele acabasse de me apresentar uma
coleção de sapatos.
Ele me ajuda a subir, o iate é incrivelmente luxuoso, eu nunca vi nada
igual, aliás nunca havia visto um iate de perto.
— Gostou? — Ele me abraça pelas costas, afastando os meus cabelos
para beijar a minha nuca.
— Sim, é lindo.
— Pretendo fazer amor com você em cada canto desse barco, em cada
centímetro.
— Cada centímetro? — Arregalo os olhos para o tamanho, ele sorri
da minha reação, me vira de frente e me dá um beijo exigente.
Uma hora depois já estamos em alto mar e eu me sinto cada vez mais
enjoada.
— Se sente mal? — A sua expressão é de preocupação, me vendo
com as mãos na boca tentando conter o enjoo. — É normal que se sinta
enjoada, você não está acostumada, logo vai passar.
Os enjoos vêm acompanhados de uma dor abdominal e isso está me
deixando preocupada.
15
Grávida

Leonardo Milani

— Venha, sente-se aqui. — Pego na sua mão, a guiando até uma


cadeira. — Vou lhe trazer água! — Saio e volto em poucos minutos
trazendo-lhe água.
— Obrigada! — Ela leva o copo com água até a boca, bebendo todo
líquido de uma só vez.
— Logo se sentirá melhor — garanto.
— Não se preocupe tanto, Leo, eu ficarei bem, é só um mal-estar,
como você mesmo disse.
— Vem aqui! — Me sento com as pernas abertas e a coloco entre as
minhas pernas. — Assim que o mal-estar passar você vai poder aproveitar o
passeio! — Beijo o topo da sua cabeça e ela repousa sobre o meu peito. —
Sente-se um pouco melhor?
— Um pouco — responde com uma voz fraca, o que me fez levantar
para olhá-la.
— Você está pálida… — Aliso o seu rosto com um olhar preocupado.
— Samanta vamos voltar, vou te levar a um médico.
— Médico? — As minhas palavras parecem ter piorado a sua
situação, ela corre em direção ao banheiro e eu a sigo, ela se ajoelha em
frente ao sanitário e vomita.
Abaixo-me ao seu lado, segurando os seus cabelos, ela senta no chão
e abraça as próprias pernas, umedeço uma toalha e limpo ao redor da sua
boca.
— Vai ficar tudo bem, é normal ter enjoos quando se anda de barco
— repito me sentando ao seu lado. — Vamos retornar, vou levá-la ao
médico.
Ela abaixa a cabeça sobre os joelhos e grita em meio ao choro.
— Que droga, Samanta! — Grito, já de pé em direção à porta e ela se
assusta com o grito.
— Me desculpe, eu não quero estragar o nosso dia, por favor, Leo, me
desculpe.
Retorno ouvindo-a, ela havia entendido errado, me ajoelho, levanto o
seu queixo com carinho e ela me encara.
— Samanta, não estou chateado com você, estou apenas preocupado!
— Dou um beijo na sua testa e volto para a direção do barco.

***

— Chegamos à costa, minha menina, vamos eu te ajudo! — A


levanto do chão onde ela ainda está, na mesma posição que eu havia
deixado. — Vamos ao médico — digo assim que entramos no carro.
— Não precisa, vai passar, por favor, me leve para casa — implora, e
eu não insisto mais.
Dirijo apressado para casa, já que ela insiste em não ir ao médico e se
altera quando insisto em fazê-lo.
— Chegamos! — Tiro o meu cinto de segurança e o dela em seguida,
saio do carro apressado e abro a porta para ela.
— Estou bem, não se preocupe, foi só um mal-estar e vai passar logo
— reafirma encarando os meus olhos preocupados.
Sei que andar de barco para quem não está acostumado causa
incômodo, mas ela está pálida e andando um pouco curvada como quem
sente dor. A deito na nossa cama, ela se encolhe e volta a chorar, eu nunca
tive preocupação por alguém, me sento ao seu lado alisando os seus
cabelos.
— Se está tudo bem, por que chora tanto? — Imagino uma dor forte
ou até algo pior.
— Devo estar de TPM, sabe? As mulheres ficam mais sensíveis nessa
época, sentem dores abdominais, até enjoos, isso é normal. Choro porque
estou triste, eu desejei aquele passeio.
— Podemos ir outro dia, passaremos um mês ou um ano velejando,
então, não chore por isso.
Levanto-me da cama e pesquiso no celular algo para aliviar os
sintomas da tal TPM. Chocolate, sorrio quando leio, esperei achar o nome
de um remédio.
— Certo, isso não é difícil — digo para mim mesmo descendo para
procurar por chocolates na cozinha. — Droga! — exclamo, irritado, não
achando nada que eu procuro.
— Precisa de algo, senhor? — pergunta o segurança, parado na
entrada da mansão.
— Preciso de chocolates, onde eu encontro?
— Posso comprá-los para o senhor.
— Me leve até lá, quero comprá-los pessoalmente.
— Claro, senhor! — Fomos a uma conveniência próxima, tinha uma
variedade imensa de doces.
— Posso ajudá-lo? — Uma funcionária se aproxima, achei bom já
que é uma mulher.
— Sim, pode me ajudar, preciso de chocolates, quais me recomenda?
São para TPM — um sorriso contido escapa dos seus lábios.
— Depende do gosto da sua namorada — diz encarando as minhas
mãos para saber que classificação daria.
Eu não faço ideia do gosto da Samanta para doces.
— Me dê vários, de todos os tipos! — Coloco vários de forma
aleatória na cesta na sua mão.
— Nossa, que fofo — torna a sorrir
— O que é fofo? — falo de cara amarrada.
— Desculpe, senhor, não quis ser inconveniente, mas acho lindo essas
demonstrações de amor.
Pego a sacola das suas mãos após pagar e saio sem dizer uma só
palavra.
— Amor? As pessoas só falam sobre isso — resmungo para mim
voltando para o carro.
Quando retorno, encontro Samanta adormecida, então, coloco os
doces ao seu lado.

***

Samanta Antonelli

Acordo com o barulho da água que caía do chuveiro, a porta está


entreaberta, o silêncio da água veio acompanhado da aparição de Leonardo
na porta, completamente nu, enxugando os seus cabelos castanhos claros.
— Acordou, minha linda? Pode ficar na cama se ainda estiver
indisposta.
— Estou bem, não se preocupe, vou tomar um banho e correr para
aula! — Viro o rosto, sentindo o rubor tomar conta da minha face, não era a
primeira vez que eu o vi nu, mas ainda é estranho ter um homem mostrando
as suas partes íntimas.
— Ainda sente vergonha? — ele diz e me viro, Leonardo exibe um
sorriso malicioso, ele me impressiona com a rapidez que coloca as roupas
dando apenas os últimos retoques na gravata.
— Não é bem assim. — Levanto e esbarro em uma sacola de onde cai
vários tipos de doces e chocolates.
— Uau! De onde saiu tudo isso? — Pego a sacola constatando a
quantidade e os diversos tipos.
— Comprei para você, vi que é bom quando se está de TPM — fala
naturalmente
Não resisto e o envolvo em um longo abraço.
— Obrigada, você é incrível!
— Sério? Tudo isso por uns meros doces? — Me encara com um ar
surpreso.
— Não são pelos doces, mas sim porque você se preocupou comigo.
Obrigada por isso! — Fico na ponta dos pés, encurtando a distância dos
nossos lábios, os seus lábios se curvaram em um sorriso antes de se abaixar
e me beija rapidamente.
— Vou tomar um banho e me arrumar.
— Vou te esperar lá embaixo, ok? Não demora — ele beija o topo da
minha cabeça.
— Tudo bem, não vou demorar — sorrio para ele antes que cruze a
porta, agradeço por ele sair rapidamente, enfim pude correr para mais uma
sequência de vômitos matinais.

***

O Leonardo me deixa na porta da faculdade, espero o seu carro sumir


na esquina e chamo um táxi, eu desejo ter a minha mãe comigo agora!
Entro no carro e vou até o café, quero ver a Gabi, já faz alguns dias que o
seu telefone dá fora de área e eu estou para ir visitá-la no café. Porém, não
consegui ir e agora eu ainda posso pedir a sua ajuda, seria bom o apoio de
uma amiga se realmente for o que estou pensando.
— Olá, bom dia! — Os meus olhos vasculham por todo café.
— Samanta, está procurando a Gabi? — A voz enérgica de Jean me
surpreende, ele nunca foi simpático.
— Sim, onde posso encontrá-la?
— Ela precisou ir até a sua cidade natal, ela foi às pressas, parece que
a saúde da mãe não está bem.
— Entendi! — Respondo com a voz abatida. — Se tiver notícias dela,
por favor diga que vim procurá-la.
— Sim, eu aviso — sorri acenando com as mãos já em despedida.
Crio coragem e vou diretamente a uma farmácia, peço dois testes de
gravidez, essa seria a explicação mais lógica para tantos enjoos e o atraso
na minha menstruação. Volto para a faculdade e me tranco em uma das
baias no banheiro, eu não vou me arriscar e fazer o teste em casa, aqui é o
melhor lugar.
Sacudi o objeto nas mãos, aperto os olhos, adiando a resposta que
provavelmente já está disponível. Abro os olhos lentamente e torno a fechá-
los, me sentindo uma covarde por estar adiando o inevitável.
— Não pode ser, não pode ser! — Respiro fundo, tentando conter as
lágrimas. — Dois meses! — digo as palavras para mim mesma vendo a
informação dada pelo teste.
O desespero vai tomando conta de mim lentamente, eu sinto o ar
denso. Eu nem sei quem é o pai da criança e se eu o achasse, o que eu diria?
Olha! Fiquei grávida no dia em que você comprou a minha
virgindade.
Gargalhei da minha desgraça, o sinal informando o início da aula
toca, procuro forças para sair daquele banheiro e agir como se tudo
estivesse bem, até quando eu poderia esconder uma gravidez que já vai em
dois meses? Certamente a barriga logo ficará saliente! Jogo o exame na
bolsa apressada e saio indo em direção à sala de aula.
— Sam, onde você estava? — Davi cochicha preocupado, afinal, eu
era a pessoa que vivia repetindo para ele que cada segundo de aula era
valioso e agora entro atrasada, após ter perdido a primeira aula.
— Eu só me distrair com uns assuntos. — Sento ao seu lado.
— Está doente? — Ele coloca a mão sobre a minha testa.
— Eu não estou doente, só estive indisposta. — Tiro a mão dele de
mim com um movimento rápido.
— Tem certeza? Quer que eu te leve ao médico?
— Não precisa, estou bem! — Apanho a minha bolsa para retirar o
estojo e sem notar que ainda estava aberta, deixo o teste cair.
— O que é isso, Samanta? — Ele alcança o objeto em um movimento
rápido. — Caralho, Samanta, você está… — Coloco a mão rapidamente na
sua boca, lhe impedindo de finalizar a frase.
— Não fala isso em voz alta — reclamo.
— Mas que droga, Samanta, você não estava se prevenindo? —
murmura em um sussurro.
— Não preciso de alguém para me julgar! — Torço o nariz.
— Não estou te julgando.
— Vão continuar de cochicho ou preferem compartilhar o assunto
que é mais importante que a matemática financeira? — a voz rouca e
irritada do professor ecoa pela sala.
— Desculpe, senhor — peço envergonhada.

***

— O Leonardo já sabe disso? Vão se casar? — Davi continua com o


interrogatório após a aula.
— Ainda não, não sei como contar para ele.
— Como assim, ele é o pai! — Baixo a cabeça com a afirmação. — O
quê? Ele não é o pai? — Me olha confuso.
— Claro que é, pare de me fazer questionamentos, eu já tenho muitas
coisas na cabeça. Eu só preciso fazer um exame de sangue e ter certeza! —
Minto.
— Levo você ao médico, escolha o dia.
— Vou sozinha, obrigada.
— De jeito nenhum, eu vou com você, a sua família está longe, você
não tem ninguém para te acompanhar, sou o seu amigo e farei isso por você
— sorri me abraçando pelo ombro.
— Está bem, vou com você! — Aceito que ele vá derrotada.
— E lá está ele, o lobo bonitão. — Davi faz uma careta enquanto
pronúncia as palavras.
Ando lentamente até ele, que me espera encostado no seu conversível
preto. Leonardo havia tirado o terno e está mais despojado, com o sorriso
lindo que ele tem exibido para mim desde que resolvi ceder-lhe.
— Como foi a aula? — indaga, levantando o meu queixo assim que
me aproximo e me surpreende com um beijo rápido nos lábios.
— As pessoas estão olhando. — Sinto as minhas bochechas
queimarem com os olhares sobre nós.
— E daí? Eles nunca viram um casal se beijando? — diz com
sarcasmo.
Entrei no carro e sigo calada boa parte do caminho.
— O que está te preocupando? — Ele interrompe o silêncio.
— Só uma matéria difícil, matemática financeira! — Tento convencê-
lo com um tom de voz firme.
— Posso te ajudar, me fale as suas dúvidas.
— Não quero esse tipo de assunto em casa, quando podemos estar
curtindo um filme juntos.
— É, eu gosto dessa ideia.
Chegamos e subo apressada para o quarto, me tranco no banheiro
para um banho longo.
— Uau! Que mulher gostosa essa que tenho! — Ele acaricia o meu
queixo, me olhando e sentando na ponta da cama.
Se levanta e começa a me beijar, a sua boca traça um caminho pela
minha nuca, era bom, porém eu não tinha clima para isso.
— Para, eu não quero nada hoje, não estou me sentindo bem.
— O que está acontecendo? Por que está me evitando? — Ele se
afasta contrariado.
— Já disse, não me sinto bem.
— Vamos ao médico amanhã — fala firme.
— Não precisa, eu juro, eu vou ficar bem em alguns dias.
— O que está te incomodando?
— Nada, já disse, deve ser da TPM.
— E quando isso acaba? — Senta na cama sem tirar os olhos de mim,
arrumando os cabelos demonstrando nervosismo.
— Em alguns dias.
— Tudo bem, vou tomar um banho. — Passa direto por mim e retorna
no meio do caminho, abaixando e me beijando no topo da cabeça antes de
se trancar no banheiro.

***

Leonardo Milani

Os dias iam passando e nada muda, Samanta continua distante e


mesmo dormindo comigo na mesma cama nada rola, ela se vira na cama
durante toda a noite e acorda com olheiras pela péssima noite de sono, tem
algo que ela não está me contando e eu preciso descobrir. Saio mais cedo do
que de costume do escritório, eu pretendo apenas dar umas voltas pela
cidade, mas acabo em frente a faculdade, estaciono o carro em um lugar
reservado e resolvo esperar até ela sair.
O carro de Davi chega a faculdade minutos antes do horário deles
saírem, isso me deixa atento, mas quando Samanta sai do carro e entra na
faculdade me deixa furioso.
— Ela não assistiu à aula hoje? — esbravejei.
Cada músculo do meu corpo treme e está difícil dirigir os poucos
centímetros que me levam para a frente da entrada da faculdade.
— Se vocês estiverem saindo pelas minhas costas, eu mato os dois!
— Aperto forte o volante tentando aliviar a minha raiva
Os meus olhos queimam de raiva quando vejo Samanta saindo da
faculdade acenando para mim como quem esteve nela o dia todo.
— Boa tarde, Leo. Obrigada por vir me buscar! — Ela ainda tem uma
expressão preocupada, porém, força um sorriso sempre que me vê
encarando-a por mais de um minuto.
Eu não consigo pronunciar uma só palavra e o silêncio fez a minha
garganta doer.
— Você está bem? — Ela quebra o silêncio.
— Por que não estaria? — A minha resposta estúpida fez ela se
encolher próxima à porta.

***
Estaciono o carro e atravesso a porta da mansão sem esperá-la.
Coloco uma dose de whisky e me sento na poltrona do quarto esperando
que ela entre.
— Você parece cansada ultimamente. — falo brincando com o gelo
no copo.
— À faculdade suga as minhas energias.
— Sério? E como foi a aula hoje? — Franzi o cenho a estudando.
— A aula? — Dá de ombros. — Bom… foi tudo bem com a aula, por
que está me fazendo essas perguntas?
— Há algum problema se eu perguntar?
— Claro que não, tive o dia puxado na faculdade, eu quase nem
consegui sair no horário, mas corri para fazer tudo no horário e não queria
te deixar esperando.
— Por que diabos está mentindo? Por que está mentindo para mim,
Samanta? — Disparo o copo de whisky contra a parede a fim de aliviar a
minha raiva, mas foi inútil.
— Mentindo? O que é mentira no que te falo? — Ela me encara com
os olhos arregalados.
— Cínica — esbravejo a acusando. — Cheguei mais cedo à sua
faculdade hoje e vi você saindo do carro do Davi perto da aula acabar, onde
vocês têm ido pelas minhas costas?
— A lugar nenhum, Leonardo — sussurra com a voz trêmula.
— É assim que me agradece por tudo que tenho feito por você? É
assim, porra? — grito, zerando a distância entre nós, o seu cheiro desperta a
pior parte de mim, o lobo, o alfa. A agarro pelo braço, usando bastante
força.
— Para, Leonardo — os seus gritos se intensificam quando a jogo na
cama, arrancando as suas roupas que se rasgaram como papel.
O ódio me cega e ouvir os seus gritos parece cada vez mais
impossível.
— Para! Para! Eu não quero! — Ela usa toda a sua força tentando se
soltar das minhas mãos, que acariciam o seu corpo com violência.
— Você não acha suficiente o que tem aqui? Tem que fazer sexo com
o Davi e sei lá com quantos mais.
— Por favor, Leonardo, você está me machucando, você vai me
estuprar? — Cambaleio para trás, as suas palavras entram como facas
amoladas, mas logo me recomponho firmando os meus pés no chão.
— Você é minha, entendeu? A minha, Samanta, eu pago para você me
satisfazer e não para sair com aquele pirralho pelas minhas costas. Eu o
mato se você continuar a me desafiar, eu mato qualquer um que tentar se
aproximar de você!
Ela solta um grito vindo da alma, sinto a revolta que sai do seu peito,
aquilo doí em mim, me olho no espelho e vejo um monstro, está difícil
respirar. Apanho a garrafa de whisky e bebo diretamente dela. Olho
novamente para Samanta que está agarrada nas próprias pernas sobre a
cama, eu não queria machucá-la dessa forma, saio do quarto e vou para o
meu escritório.
— Mas que droga! — Exclamo irado. — Eu não sou um monstro,
porra, eu nunca forcei uma mulher a nada!
A vontade de tê-la só para mim está fugindo do meu controle, a ideia
dela com outros homens está me deixando louco, ela é só minha!
16
A imagem do diabo

Samanta Antonelli

Estou deitada por horas encarando o nada, vejo o sol se despedir


dando lugar a lua que trouxe consigo ainda mais escuridão para essa casa
fúnebre, aliso o meu ventre, existe um alguém aqui, uma vida que não
merece essa vida. Um imenso sentimento de proteção me invade, eu não
estou mais só e preciso proteger o meu filho.
— Se Leonardo descobrir? — Volto a me questionar com desespero.
— Preciso encontrar o pai dessa criança! — Pronuncio para mim, como se
essa fosse de fato a solução para os meus problemas, um homem que eu
nem sei como é, e que pagou para me ter. No mínimo, ele riria de uma tola
que não se cuidou para isso não acontecer, mas que opção tenho agora?
Salto da cama em um pulo, eu não lembro de ter jogado fora o
número do assistente, apanho a minha mochila jogando tudo sobre a cama,
onde eu o guardei? Pensa Samanta, pensa…
O meu telefone vibra sobre a mesa, havia várias ligações de Davi,
mas dessa vez ele mandou apenas uma mensagem.

De Davi: Sam, já comprei os remédios que o médico passou, amanhã


te entrego na aula. Você já deve estar dormindo, então bons sonhos.
De Samanta: Bons sonhos…

Repito as últimas palavras antes de entrar no banheiro, enquanto


deixo a água morna molhar o meu corpo, eu faço uma promessa: ser forte e
proteger o meu filho. Nunca mais iria permitir que alguém me machucasse
dessa maneira, eu iria estudar e trabalhar duro e nunca mais seria humilhada
dessa forma.
Acompanho o caminho que a água traça pelo meu corpo e estremeço
com raiva e revolta ao observar o meu corpo com marcas roxas.
— Você precisa ser forte, Samanta — repito várias vezes para mim
sem forças para conter as lágrimas que se misturam com a água do
chuveiro.
Troco-me e deito naquela cama imensa cercada da mais pura seda e
algodão, mas nada me traria conforto.

***

Acordo com o nascer do sol, que mesmo fraquinho invade o quarto


com a sua luz, me viro lentamente, ainda me espreguiçando, o meu corpo
dói como se eu tivesse sido atropelada por um carro.
— Nossa! — exclamo, vendo Leonardo sentando na cama me
observando.
— Desculpe, não queria te assustar — a sua voz tranquila me causa
ânsia de vômito.
Sento-me rapidamente me afastando dele.
— Não vim para machucar você, Samanta.
Viro o meu rosto quando vejo a sua mão estendida prestes a me tocar,
sinto o vento dos seus movimentos, quando ele recua a aproximação que
recusei.
— Não vou à faculdade hoje, pode seguir o seu caminho — digo, sem
encará-lo
— Não se sente bem? Posso fazer algo por você? — Sinto uma
lágrima quente percorrer o meu rosto.
— Me deixe sozinha, você já fez o suficiente.
— Tudo bem, vou esperar que se acalme e então voltaremos a
conversar. — Levanta me deixando sozinha no quarto.
— Esperar que eu me acalme? Espere que eu me acalme no inferno
— pronuncio com raiva e corro em seguida para o banheiro para minha
seção de enjoos e vômitos matinais.
Em seguida fico em pé como um poste em frente à janela e aguardo o
seu carro sair da propriedade, agora seria a hora de vasculhar tudo
novamente e achar o número do assistente
Reviro todas as minhas coisas e não consigo encontrar.
— Droga! Lembro que guardei por aqui.
Depois de algumas horas de busca encontro em um bolso escondido
em umas das minhas bolsas um pedaço de papel bem amassado, a caneta
borrada, mas ainda consigo ver o número.
— Perfeito!
Pego o telefone apressada, os meus dedos tremem em cada número
discado, o que eu falaria a esse homem? No mínimo ele me chamaria de
golpista e me acusaria de tentar dar o golpe da barriga. Em meio a tantos
questionamentos na minha mente, aperto em ligar e ponho o telefone no
viva voz, cada toque parece uma eternidade, eu estou prestes a desistir
quando a voz grossa fala do outro lado da linha.
— Alô!
— Alô, Senhor. Talvez não se lembre de mim, eu sou a garota que…
que… — não consigo terminar a frase e ele responde.
— Sei quem você é, o que quer comigo? — indaga com frieza.
— Senhor, preciso encontrá-lo, tenho algo importante a pedir.
— Não tenho tempo esses dias — responde, rapidamente sem me dar
importância e sinto que está prestes a encerrar a ligação.
— Senhor, por favor, é muito importante, só me ouça e decida se pode
me ajudar, por favor, senhor — imploro.
— Tudo bem, hoje no endereço que vou te passar e te encontro dentro
de duas horas.
— Ótimo, estarei lá! Obrigada senhor.

***

Leonardo Milani

— Pegue os relatórios sobre a mesa e reveja, vou precisar que você


faça uma viagem curta — falo ao meu assistente, que parece congelado
olhando a tela do telefone que vibra na sua mão.
— O que foi? Quem é? — pergunto, curioso diante do seu olhar
arregalado para a tela.
— A senhorita — ele responde hesitante, virando a tela para mim,
que pude constatar que a senhorita em questão era a Samanta.
— Que diabos ela quer? — me questiono. — Era para você ter
trocado de número, porra! — digo irado, mas nem eu mesmo me atentei a
isso — Atenda! — Ordeno.
Ele atende prontamente colocando no viva voz.
— Alô, senhor. Talvez não se lembre de mim, eu sou a garota que…
que… — A sua voz falha e eu faço sinal com a mão para que ele fale.
— Sei quem você é, o que quer comigo?
— Senhor, preciso encontrá-lo, tenho algo importante a pedir — ele
me olha e faço um sinal negativo com a cabeça.
— Não tenho tempo esses dias — faço sinal para que ele encerre a
ligação.
— Senhor, por favor, é muito importante, só me ouça e decida se pode
me ajudar, por favor, Senhor — ela aguça a minha curiosidade com a sua
voz desesperada.
Afirmo com a cabeça para que ele aceite, escrevo rapidamente o que
ele deve falar.
— Tudo bem, hoje no endereço que vou te passar e te encontro dentro
de duas horas.
— Ótimo, estarei lá! Obrigada Senhor.
Esmurro a mesa de punho fechado, assim que ele desliga a ligação.
— Que diabos você está aprontando, Samanta?
— O que devo fazer, senhor?
— Grave toda a conversa, quero ouvir tudo.
— Entendido, senhor — ele limpa a garganta e continua. — E se ela
estiver procurando pelo senhor? O que devo falar?
— Escute o que ela tem a dizer e não dê uma resposta, diga que
pensará a respeito, a única coisa que me interessa é saber o que ela quer.
— Entendido, senhor — ele envia a mensagem com a localização
para ela e sai em seguida para o seu encontro.

***

Samanta Antonelli

Ando de um lado para o outro, sinto o meu estômago revirar mais do


que o normal dentro desses dias atípicos. Aperto com força o telefone nas
minhas mãos, não quero correr o risco de não ver a mensagem chegar. E em
alguns minutos a notificação chega, ele irá me encontrar em um café perto
da propriedade, desço apressada e chamo por um táxi.
Ao chegar os meus olhos varreram o local, eu acreditava que não
lembraria do tal homem, mas lá está a minha mente me mostrando que ela
era melhor do que eu imaginava, eu quero correr na sua direção, mas realizo
o percurso lentamente.
— Bom dia, senhor — digo ao me sentar.
— Bom dia, senhorita.
— Obrigada por ter vindo — sorrio tímida, afinal esse homem é um
dos poucos que sabe o que fiz naquela noite.
— O que quer de mim? — Ele parece irritado, indo direto ao assunto.
— Desculpe, não quero lhe causar problemas — o seu desconforto é
nítido. — Preciso que me diga onde encontrar o seu chefe — sou direta.
Os seus olhos estão em mim, mas ele abaixa os olhos para voltar a me
encarar com os olhos arregalados dessa vez.
— Por que isso agora? — indaga com curiosidade.
— Senhor, por favor, é muito importante, preciso que ele me ajude
em algo.
— E por que acha que ele iria ajudá-la, seja no quer for que precise
dele? — Ele para de repente me olhando espantado novamente. — Quer
repetir a noite?
Fico em silêncio, eu não podia revelar o real motivo de estar ali, eu
quero dizer, pessoalmente e rastejar aos seus pés por ajuda.
— Senhor, por favor é muito importante, ele precisa me ajudar.
Preciso sair de onde estou senhor, por favor.
Ele tira um lenço do bolso do paletó, enxugando a testa suada, indo
até a cabeça onde quase não tem cabelos.
— Senhorita, não sei se posso ajudá-la. Volto a entrar em contato com
você assim que tiver uma resposta do meu chefe.
— Senhor, não demore, é muito importante! — Junto as mãos em
súplica.
Ele levanta apressado e visivelmente nervoso da mesa, sinto que ele
quer me impedir de continuar falando, como se tivesse medo por mim.
Tomo um táxi voltando para a mansão, sinto o frio passar pela minha
espinha quando avisto o carro de Leonardo estacionado em frente a
propriedade.
— Senhorita — Mateus, o jardineiro acena vindo na minha direção.
— Oi! Faz tempo que não te vejo, nem parece que você trabalha onde
moro — falo o mais natural possível.
— Algum problema, senhorita? Está pálida! — Os seus olhos me
estudam, ele repara em algumas marcas roxas que estavam descobertas —
O que são essas manchas roxas no seu braço? — pergunta incomodado.
— Ah, isso… não foi nada, eu comecei a fazer academia e sou um
tanto desastrada como você já sabe — forço um sorriso.
— Se precisar é só me chamar senhorita, não hesite em fazê-lo.
— Agradeço, mas não é necessário, está tudo bem comigo e preciso
subir agora, tchau.
Sei a que ele se referia, todos aqui sabem o que está acontecendo
entre mim e o Leonardo, todos me olham por cima dos ombros e a Maria
sempre me dá palavras de força.

Olho em direção à janela do nosso quarto e lá está ele com uma


garrafa de whisky nas mãos, ele parece uma estátua imóvel, me encarando,
daqui não tive uma visão perfeita da sua expressão, mas sei que as coisas
não estão favoráveis.
Subo as escadas como se uma força me puxasse de volta, eu quero
retroceder e sair correndo, eu quero o colo da minha mãe e me sentir segura
novamente.
Hesito em frente a porta, a maçaneta parece queimar com o meu
toque, mas eu teria que encará-lo, encho os pulmões de coragem e abro a
porta, eu não poderia fraquejar, agora preciso me impor.
— Bom dia, não o esperava em casa tão cedo — forço um sorriso,
antes mesmo que ele se vire para me encarar e quando ele o faz, os seus
olhos me alcançam como fogo e vi a imagem do próprio diabo.
17
Você é minha!

Leonardo Milani

Sai logo após o meu assistente sair, vou para casa esperar Samanta.
Muitas coisas passam pela minha cabeça, eu nunca imaginei que eu estaria
nessa situação por alguém, eu sempre vivi sozinho, que porra!
Está impossível respirar, retiro a gravata com uma das mãos enquanto
a outra permanece no volante, eu dirijo rápido e entro igual a uma bala para
o quarto e aguardo pela volta da Samanta em pé em frente à janela, para ver
o exato momento em que ela surgiria.
Recebo o áudio do meu assistente e me seguro, sentindo faltar forças
nas pernas ouvindo o seu conteúdo.
— Mas que porra, Samanta, o que você quer? Ela quer me deixar? Ela
quer fugir de mim? — As perguntas não respondidas me deixam louco de
ódio e de ciúmes. — No final, você é igual a todos que fingem ter
sentimentos por mim, mas, no fundo, só querem o meu dinheiro.
Não demora muito e ela chega, os meus olhos estão vidrados nela
acompanho o seu olhar que caminha para o meu carro estacionado na porta,
sinto a sua hesitação antes de continuar andando em direção à casa. Vejo
quando o jardineiro a chama e ela para, falando com ele.
— Essa amizade já está passando dos limites — esbravejo, levando a
garrafa de whisky à boca.
Sinto a raiva tomar conta de mim e os meus olhos queimam de ódio,
quando ele toca o seu braço, ela se afasta rapidamente e se despede
voltando a caminhar em direção à casa. Estou ansioso pela sua chegada ao
quarto, mas acredito que ela esteja vacilando bastante durante o caminho,
pois ela levou mais que o dobro do tempo normal até atravessar a porta.
— Bom dia! Não o esperava em casa tão cedo — ela diz com uma
voz firme.
Eu queria ter controle naquele momento, mas me viro lentamente e
pelos seus olhos arregalados, a minha expressão era péssima.
— Onde estava? — vocifero, sentindo os músculos da minha face
tremer.
Ela tenta se manter de pé, se apoiando na mesa ao lado da porta.
— Não é da sua conta, não sou a sua prisioneira — responde
entredentes.
— O que disse? — indago, sem acreditar nas palavras que ela acabou
de pronunciar.
— Não quero falar onde estive, você não precisa saber cada passo que
dou — diz, me desafiando.
Aperto com muita força a garrafa nas minhas mãos e atiro contra a
parede, acertando no seu lado, um grito fino escapa da sua boca e ela se
abaixa, usando os braços para se proteger dos milhares de pedaços de vidros
que voaram para todos os lados. Eles cortam a sua pele em várias partes do
corpo, estou cego de raiva e ciúmes, estou a ponto de enlouquecer.
Caminho na sua direção e a levanto do chão pelos braços e a jogo na
cama.
— Você acha que é livre? É isso que você acha? — berro.
Embora o seu corpo trema de medo, o seu olhar permanece firme, ela
não chora como das outras vezes.
— Você pode fazer o que for, mas não vai me impedir de ir embora
daqui na hora que eu quiser.
— Saia agora! Não vou te impedir de ir! — Aponto para a porta.
Ela me encara confusa e eu continuo falando:
— Mas fique ciente que quando atravessar aquela porta, deixo de
pagar pelo tratamento do seu irmão, acha que é barato? Tenho investido
muito nisso tudo, Samanta.
Os seus olhos antes seguros agora mostram ódio, ela cerra os punhos
me encarando, eu já estou acostumado a esse olhar, eu costumo provocar o
sentimento de ódio nas pessoas, esse sou eu de natureza ruim, nunca serei
merecedor do céu.
— Talvez eu não vá embora hoje, ou amanhã, mas também não
ficarei aqui para sempre — diz com um tom afrontoso.
Sinto o chão se abrir, eu nunca a deixarei ir e sempre estará presa a
mim, as pessoas nunca deixam de precisar de dinheiro.
— Você é minha, Samanta, e você não tem autorização para me
deixar, eu digo quando você pode ir, entendeu?
— Entendi, senhor, algo mais? — Não respondo ao seu deboche, saio
de cima dela me virando e vou para o escritório onde me tranco.
Jogo-me no sofá em busca de controle, se quero que ela fique preciso
saber o que ela quer, o que ela tem de tão importante para falar a pessoa que
ela odeia por comprar a sua virgindade? E ainda mais querer pedir por
ajuda, ela parecia satisfeita com o que eu estava oferecendo, ela parecia
entregue e fui diferente com ela… Samanta tem tudo de mim.

***

Samanta Antonelli

Olho-me no espelho horrorizada, vários pontos de sangue espalhados


pelo meu braço, parece que eu havia brigado com vários gatos.
— Eu não posso continuar assim, eu preciso me libertar deste inferno
que estou vivendo.
Tiro as minhas roupas e entro embaixo do chuveiro, sinto a minha
alma escorrer com a água.
— Ele é doente, essa era a resposta que você procurava Samanta, nem
amor, nem paixão, nem carinho… isso é obsessão, isso é o que ele sente por
mim… — Volto a alisar o meu ventre, eu preciso proteger o meu filho, ele
vai surtar se descobrir.
No dia que voltei do médico com o Davi, cogitei contar onde eu havia
ido, mas depois de tudo que aconteceu, só tive mais certeza de que não
posso fazê-lo.

***

— Maria, estou faminta — falo me sentando na mesa da cozinha.


— Filha, o que aconteceu? — Ela diz alarmada, vendo os pequenos
cortes espalhados pelo meu corpo — Tereza, vá buscar a caixinha com
medicamentos — a abraço e deixo que as lágrimas corram livre pelo meu
rosto.
— Vem aqui, cuido disso para você.
— Obrigada, Maria.
Ana volta com a caixa nas mãos e não fica na cozinha, Maria tira uma
pomada e passa pelos machucados.
— Prontinho, minha filha, agora coma, você precisa estar bem
alimentada.
— Obrigada mais uma vez Maria — digo com a voz embargada.
Boa parte dos funcionários já haviam ido embora, só tinha Maria e
Tereza, que adiantam o serviço para o dia seguinte aqui na cozinha.
Olho ao redor da casa, temendo encontrá-lo pelos cômodos, saio para
andar no jardim, era um lugar que Leonardo não costuma frequentar, mas
nesse dia a minha manobra falha, em uma área afastada da mansão o avisto
sentado em um banco. Ele me vê também, penso em recuar, mas ele acena
com a mão e ando lentamente na sua direção.
— Samanta, sente-se aqui.
— Estou bem em pé. — Cruzo os braços sobre o peito.
Ele levanta e caminha na minha direção, recuo alguns passos para trás
e ele avança alguns metros, zerando a distância entre nós.
— O que quer comigo? — indago, torcendo o nariz, ele, por sua vez,
revela um sorriso assimétrico e maligno, para então revelar uma expressão
calma e tranquila, eu não tinha mais dúvidas, ele é doente.
Os seus braços se ergueram e eu recuo assustada, os seus braços
envolvem o meu corpo, ele repousa a cabeça no meu ombro, os meus
braços estão imóveis esticados, eu não sei como reagir a essa nova postura.
— Me desculpe, eu não queria machucar você. Perdi o controle, eu
sinto ciúmes e raiva quando mentem para mim, não suporto a ideia de outro
homem te tocando.
— Você me obriga a mentir, Leonardo, não quero ser uma prisioneira
nessa casa, você não é o meu carcereiro e nem o meu dono.
— Você não é prisioneira, Samanta, ajude-me a ser o homem que
você quer que eu seja — ele segura os meus ombros e me olha firme nos
olhos. — Me diga do que precisa? Fala-me, o que falta para você? O que
posso fazer para que você se sinta feliz comigo? O que faço para que você
não precise ir atrás de outro homem? O que faço para você não me deixar?
— Não há nada que você possa fazer nesse momento, as coisas só
aconteceram assim Leonardo — digo com a voz embargada.
— Do que está falando? Por que não me fala o que está te
incomodando Samanta?
Eu não posso falar sobre a gravidez, agora. Mas temos mais assuntos
a tratar.
— O que você acha que somos um para o outro, Leonardo? — Eu
estou confusa em relação a isso.
— Me responda você, eu sou o que você quiser que eu seja.
— Eu não sei o que quero, ainda mais depois do que aconteceu a
poucas horas, eu não posso viver com medo dos seus surtos — sou sincera.
Os seus olhos ficam vermelhos pelas lágrimas presas, ele engole seco
antes de fala:
— Samanta, eu nunca imaginei que eu fosse estar tão dependente de
alguém, isso está me assustando, eu não sei como agir, você não precisa se
preocupar com os meus surtos, eu cuidarei para que isso não aconteça
mais… eu nunca mais quero ver medo nos seus olhos.
Os seus olhos percorrem para os pequenos ferimentos nos meus
braços e começa a beijá-los, o seu toque provoca um misto de sentimentos
em mim, ele consegue ser doce nesses momentos em que ele se controla e
eu sinto a sua sinceridade, ele vai da água ao vinho em segundos.
Seria essa a sua forma de amar? Ele não sabe como amar.
Resisto ao seu beijo e sinto as suas lágrimas molharem o meu rosto e
por mais que eu queria afastá-lo, nesse momento sinto que posso ser a
pessoa que pode curá-lo.
18
Vou te levar ao médico

Leonardo Milani

Acordo com o despertador que toca baixinho ao meu lado, o sol ainda
se prepara para nascer e, como eu vinha fazendo a uns dias, as cortinas
estão abertas, deixando a luz entrar nos presenteando com os primeiros
brilhos do sol. Viro-me para o outro lado e Samanta dorme completamente
nua, fico a admirando e estou feliz, afinal, ela está aqui, a minha mulher!
Tivemos uma noite deliciosa, nunca achei que as reconciliações
pudessem ser tão prazerosas. Fico mais um tempo observando ela dormir
calma e tranquila, e é essa visão que quero ter para o resto dos meus dias,
nunca vou deixá-la ir, eu lhe darei motivos para ficar.
— Bom dia, minha menina. — Ela se vira lentamente se
espreguiçando.
— Bom dia, ainda está na cama? Não vai trabalhar hoje?
— Sou o dono, querida, vou quando quero — digo divertido.
— Então você sempre quer, não lembro um dia sequer em que você
não estivesse trabalhando, até em casa você trabalha.
— Hoje será diferente, ficarei com você o dia todo. O que acha de
darmos um passeio?
Eu não havia me esquecido de tudo que aconteceu nos últimos dias,
mas se eu a quero, preciso saber o que ela deseja, preciso dar o que ela quer.
— Aonde vai me levar? — Ela deita com os pés para cima, os
cruzando no ar, e apoia o queixo sobre a palma das mãos.
— A praia, pensei em passarmos dois dias por lá, em uma casa à
beira-mar.
— Acho ótimo — sorri para mim. — Vou tomar um banho! — ela
salta da cama com pressa, entrando rápido no banheiro.
Eu ainda consigo ver que alguma coisa a incomoda, algo que ela não
quer compartilhar comigo. Eu me sinto a cada segundo mais inseguro e
assustado, não consigo controlar os meus sentimentos, tudo está intenso, eu
a quero e é só nisso que consigo pensar, nunca senti tanto medo de voltar a
ser sozinho.
O telefone de Samanta vibra sobre a mesa e me tira dos meus
pensamentos, respiro fundo algumas vezes, tentando manter a calma
quando vejo que a ligação é do Davi.
— Alô — atendo em um tom irritado.
— Liguei para Sam, não para você! — ironiza.
— a minha mulher está no banho, o que você quer?
— Então ligo outra hora.
— Não a procure, você não é necessário — ordeno em um tom firme
e sussurrado, temendo ser ouvido por Samanta.
— Você destrói tudo que toca, e destruir vidas é a sua especialidade
— sibila com escárnio.
— Do que está falando? Quem acabou com a vida dela? — o meu
tom agora era confuso, afinal, ele está me acusando de algo que não tenho
conhecimento da razão.
— Fique ciente que sei de tudo, eu levei Samanta ao médico e
comprei os remédios receitados que preciso entregar a ela, mas como ela
não tem aparecido na faculdade, então não tive como entregar.
Ela está doente? Que diabos está acontecendo com a Samanta? Por
que ela foi ao médico com o Davi e não comigo?
Eram muitas perguntas e nenhuma resposta, e isso não era bom para a
minha insegurança.
A porta do banheiro se abre, Samanta enxuga os cabelos compridos e
está vestida com um roupão, eu tenho certeza de que ela se assustaria com a
minha expressão, eu estou tomado pelo ciúme e quero respostas, desligo a
chamada colocando o seu celular no lugar sem que ela perceba.
***

Samanta Antonelli

Não demoro no banheiro, mas esses minutos foram suficientes para


encontrar outro homem no quarto, quero ler os seus pensamentos e
desvendar o motivo da sua raiva repentina, ele morde o lábio e aperta as
mãos várias vezes com força. Quero ir embora, fugir e esse é o meu
primeiro pensamento, mas me lembro que estou disposta a tentar e que não
iria fugir, estou aqui para ajudá-lo.
Sem falar nada, me aproximo dele, envolvendo a sua cintura com os
meus braços, lhe aperto forte contra o meu corpo, ele está rígido. Apanho as
suas mãos e aperto com os meus dedos, fazendo-o abri-las, então puxo os
seus braços, os envolvendo em volta da minha cintura, fico na ponta dos pés
e ergo as minhas mãos, trazendo o seu rosto para perto do meu. Encaramo-
nos por alguns segundos.
— Obrigada por ser o meu homem e me fazer a sua mulher. — Fecho
os meus olhos esperando que ele entenda, sinto os seus lábios tocarem os
meus e a sua língua explora a minha boca com exigência, aos poucos, sinto
o seu corpo relaxar e ele me joga na cama, as suas mãos percorrem o meu
corpo e eu o desejo tanto quanto ele me deseja. Às vezes tenho a impressão
de que já conheço esse toque e já havia experimentado esse beijo muito
antes do nosso primeiro encontro, ele parece conhecer cada pedaço do meu
corpo antes mesmo de tocar cada centímetro.
— Me possua! — gemi e ao seu toque delicioso o meu corpo
estremece de prazer.
O gemido rouco e abafado que sai dele me deixa ainda mais louca de
tesão, ele se posiciona entre as minhas pernas, mas não me penetra com
pressa e afobação, pelo contrário, entra lentamente, esfregando a sua
intimidade no meu clitóris.
— Que delícia! — digo em meio aos gemidos.
— Deliciosa é você! — Traça uns caminhos com os seus beijos,
descendo pelo meu pescoço e sugando os meus seios.
A sua língua quente e úmida caminha pelo meu abdome e ventre, um
dos seus dedos me estimula, eu sinto que não aguentaria muito, ele me leva
a loucura. A sua língua encontra a minha intimidade, ele chupa como se
provasse a mais saborosa fruta e eu não resisti, me desmanchando entre os
seus beijos.
— Isso, me dá tudo! — Ele me chupa com mais vontade, com mais
empenho, sem desperdiçar nem um pingo do líquido que escorreu de mim.
Então, me penetra sem aviso, apertando os meus seios, que já estão
sensíveis, me beijando com muito desejo,
Sinto a sua intimidade pulsar dentro de mim e ele urra, chegando ao
orgasmo, então cai ofegante ao meu lado e a sua expressão volta a ser dura.
— O que te incomoda? — pergunto, passando o meu braço sobre o
seu peito.
— Quero que você seja minha e me considere o seu, Samanta — diz,
ainda ofegante, mas não pela transa que acabamos de ter, ele respira rápido
buscando o ar com desespero.
— Seja claro, Leo, o que você está querendo me dizer?
— Por que foi ao médico com o Davi? — Ele me encara com um
olhar sofrido. — Eu te chamei várias vezes, mas você preferiu ir com ele —
fala, com a voz embargada.
Levanto o corpo e o encaro assustada, até onde ele sabia? Estou
apavorada, com medo da sua reação, ainda mais quando souber que estou
grávida, havia decidido ficar com ele, mas antes de contar preciso ter
certeza de que não irá surtar e machucar o meu filho.
— Fui à faculdade e me senti mal, o Davi me levou ao médico, foi
apenas isso. — Me sento de costas para ele.
— E por que não me contou isso no dia em que perguntei onde vocês
haviam ido?
— Achei que tínhamos colocado um fim nesse assunto! — Levanto e
logo sinto as suas mãos me puxarem de volta.
— Que remédios são esses que ele quer te entregar? — Sinto a minha
barriga revirar.
— Andou olhando o meu celular?
— O Davi ligou e, como você estava no banho, eu atendi, mas agora
que eu sei, resolva esses assuntos comigo.
— São para estresse os remédios, o médico diz que estou nervosa… é
só isso — tento falar o mais firme possível tentando convencê-lo.
— Estresse? É por isso que ele me culpa? Sou culpado por te deixar
nervosa?
— O Davi não tinha nada que ter esse tipo de conversa com você! —
Levanto, andando de um lado para o outro no quarto.
— Ele te conhece melhor que eu, Samanta, faz questão de esfregar
isso na minha cara sempre que nos falamos.
— Estou aqui com você! Me ajude a te mostrar quem eu realmente
sou, me deixe ser eu mesma com você, quero me sentir segura e dividir
tudo com você.
— Me deixe te levar ao médico — insiste.
— Não precisa, eu já estou bem! — A minha voz começa a ficar
alterada, por mais que eu tentasse manter a calma.
— O que você está me escondendo, Samanta? Só estou pedindo que
seja sincera comigo.
— Nada! Não existe nada — grito deixando uma lágrima escapar dos
meus olhos.
— Então me deixe levá-la ao médico — torna a insistir.
— Tudo bem, Leonardo, faremos do seu jeito! — A minha intenção
foi ganhar tempo e mudar de assunto o quanto antes.
Um sorriso satisfeito se forma no seu rosto.

***

— Minha menina, como você está? — Maria me olha preocupada


enquanto desço as escadas.
— Bem, Maria, obrigada.
— Sente-se, o que quer comer? E o patrão, já foi trabalhar?
— Estou aqui Maria — Leonardo fala do topo da escada exibindo um
sorriso típico, que os funcionários não costumam ver.
— Parece animado, menino.
— Sim, estou! — Ele se senta ao meu lado beijando o topo da minha
cabeça. — Se apresse, Samanta, o médico está nos esperando.
— Médico? — Olho confusa.
— Sim, minha menina, você concordou, lembra? — O seu sorriso
tinha um ar de deboche.
— Não sabia que iríamos hoje! Leonardo, não precisa…
— Princesa, será rápido. De lá podemos seguir para a praia e
continuar com os nossos planos, eu só preciso que você me deixe cuidar de
você.
A minha expressão logo muda de leve para preocupada, eu não estou
pronta para isso.
— Nunca te vi comer tanto, menino.
— Estou com muita fome — ele sorri cínico me encarando e o meu
rosto queima de vergonha.
— E você, menina, ainda não mexeu na comida.
— Perdi a fome, Maria.
***

Leonardo Milani

O caminho até o hospital está silencioso, Samanta esfrega uma mão


na outra, o seu olhar aflito vagava pela estrada. Tiro uma das mãos do
volante rapidamente e seguro na sua mão, ela dá um sorriso diferente de
todos que eu já vi no seu lindo rosto, aliso os seus cabelos antes de acariciar
o seu rosto e voltar com a mão para o volante.
— Por que está tão nervosa com uma simples ida ao médico?
— Por favor, Leo, vamos voltar, eu estou bem — implora, aflita.
Um suspiro escapa dos meus pulmões, estaciono o carro no
acostamento e olho fundo nos seus olhos.
— Eu volto, se você me disser o que está tentando esconder de mim.
Ela desvia os olhos dos meus e solta um suspiro, puxo o seu rosto
com delicadeza pelo queixo, os seus olhos estão vermelhos e eu estou cada
vez mais preocupado.
— O quão sério é o que você teme me contar? — Inclino a cabeça
para o lado, estudando-a.
— Vamos conversar em outro local? — Ela torna a virar o rosto
fugindo dos meus olhos.
— Para onde quer ir?
— Volte para casa e conversamos.
— Tudo bem, vamos voltar e você me conta o que está acontecendo.
O carro volta a ser silencioso, dei partida voltando para a estrada.
— Merda! — Tento desviar de um animal que cruza o nosso caminho,
mas não consigo e piso no freio instintivamente.
— Leonardo! — Samanta grita apavorada quando o nosso carro gira
na estrada e eu perco o controle dele. O carro só para quando saio da
estrada se chocando em uma árvore.
— Droga! — exclamo tentando me livrar do airbag. — Samanta…
Samanta… — grito desesperado vendo-a desacordada. — Onde está o
telefone? — digo desesperado, as minhas mãos tremem e o nervosismo me
cega.
— Samanta, acorda, Samanta — imploro, mas ela não se move.
Procuro forças nas pernas para sair do carro, mas o pavor que corre
pelas minhas veias, me paralisa.
— Senhor não se mexa, vamos chamar a ambulância — uma voz
calma ecoa, trazendo um pouco de alívio para o meu coração, olho em
direção à voz e vejo uma senhora de cabelos brancos, junto ao que parece
ser o seu esposo, ele está com o telefone no ouvido.
— A minha mulher está ferida — digo com a voz fraca.
— Já estamos ligando, não se preocupe, em breve eles estarão aqui.
— Samanta, por favor acorde — torno a pedir, os meus olhos a
checam, até que eles encontram sangue que escorre pelas suas pernas. —
Merda, Samanta! — O frio atravessa a minha espinha.
O som da ambulância tira um peso de mim, deixo que as lágrimas
caírem livremente.
— Senhor, consegue sair?
— A minha mulher, a minha mulher primeiro — grito, recusando ser
socorrido antes dela.
— Venha senhor, vamos tirar a sua esposa também! — Sai do carro
com ajuda e só então noto a minha perna ferida, eu nem consigo sentir a
dor.
— A minha mulher, tirem ela do carro — grito novamente quando
noto que eles ainda não haviam ido até ela.
— O senhor precisa se acalmar, também está ferido.
— Samanta, Samanta! — digo desesperado.
— Ela ficará bem senhor, venha, me acompanhe até a ambulância.
— Não! Eu não quero, quero a Samanta, tirem ela do carro agora.
— Estamos fazendo o procedimento senhor, me acompanhe até a
ambulância — ando apressado puxando a perna, indo em direção à Samanta
que agora está sendo colocada na maca.
— Ela ficará bem senhor, precisa colaborar, entre na ambulância.
— Quero ir na mesma que ela — exijo.
A enfermeira suspira em derrota e abre espaço, apontando para o
veículo.

***
Dedilho a maca impaciente, o curativo em um pequeno corte na
minha perna parecia interminável.
— Já está suficiente — digo ansioso, me colocando de pé.
— Aguarde, colocarei só mais um esparadrapo, o corte foi pequeno,
mas está fundo. Então os cuidados foram necessários — a enfermeira que
me atende fala irritada.
— Tudo bem, agradeço, agora me diga onde ela está? Para onde a
levaram?
— Se acalme, senhor, a sua esposa está na sala de urgência com o
médico, logo vai poder vê-la.
Sento-me no corredor na urgência e os meus pés se movem sem parar,
abaixo a cabeça com as mãos na nuca, os passos ecoam no corredor
silencioso me fazendo sobressaltar.
— Como ela está? Posso vê-la? — Indago com pressa ao médico que
caminha na minha direção.
— Ela está bem, poderá vê-la agora, me acompanhe — o sigo
andando ao seu lado. — O seu estado de saúde é estável, está sedada e logo
irá acordar. Quanto ao bebê, ela bateu forte na barriga e perdeu bastante
sangue, solicitei alguns exames e assim que ela acordar iremos fazê-los.
— Bebê? — Olho confuso entrando no quarto onde a Samanta está.
— Não sabia que a sua esposa está grávida? Suponho que com pouco
mais de dois meses.
Sinto o chão se abrir debaixo dos meus pés.
— Um filho? — Um sorriso bobo se forma no meu rosto, eu choro e
sorrio, me sento no chão quando sinto as minhas pernas fraquejarem.
— Sente-se bem? — O médico estica os braços para me ajudar a
levantar.
— Estou bem, estou bem! — Recuso a sua ajuda, ficando ali por mais
uns minutos.
— É sempre um momento muito emocionante a chegada de um filho,
parabéns, senhor Milani, vou deixá-lo sozinho com a sua esposa e se
precisar de algo nos chame — diz a caminho da saída.
— Muito obrigado — agradeço e ele sai do quarto.
Levanto-me e me sento na poltrona ao lado da cama, eu não paro de
sorrir, eu nem tinha planos de ter filhos, mas parece ótimo agora, o meu
coração está em êxtase.
— Um filho? — Repeti e repeti, sem deixar de sorrir. — Por que não
me disse, Samanta? Por que ela estava escondendo isso de mim? — Me
pergunto várias vezes.
Fico ali por horas alisando os seus cabelos.
— Que porra, Leonardo! — Quero entender o que estou sentindo, eu
nunca quis tanto alguém.
— Leo? — Samanta diz, sem força.
— Estou aqui! — Estico as minhas mãos pegando as dela, a trazendo
até os meus lábios. — Como está se sentindo?
— Não tenho certeza — responde tão baixo quando um sussurro.
— Minha linda, eu vou chamar o médico, espere só um minuto.
Ela segura a minha mão antes que eu consiga me afastar, vira o meu
corpo de volta para ela.
Ela passa a mão pelo seu ventre.
— O meu… o meu bebê? — A sua voz sai com soluços, as lágrimas
caem rápido.
Seguro o choro, sentindo a minha garganta doer.
— Vai ficar tudo bem, Samanta — a minha voz saiu com dificuldade.
— Não nos machuque — aperto os olhos, as suas palavras me deixam
confuso.
— Por que eu machucaria o meu filho? — Viro a cabeça de lado a
analisando.
— Ele não é seu filho — os soluços aumentam e o choro se
intensifica.
Sorrio nervoso, mordo o lábio e balanço a cabeça negativamente.
— Como assim não é o meu filho, Samanta? — Não consigo conter o
riso nervoso. — E quem é o pai da criança?
— Eu não sei o nome dele — admite com pesar.
— Samanta, você bateu a cabeça e não sabe o que está falando.
— Quase três meses — sussurra. — Três meses, Leonardo. Esse
filho não é seu e sim daquele com quem dormi no hotel.
É por isso que ela o procurou para falar sobre a gravidez? Sinto-me
aliviado, se esse era o motivo, ela nunca teve a intenção de me deixar.
— Minha Menina, você é minha e eu sou seu, esse bebê será nosso, se
acalme, tudo ficará bem, eu nunca voltarei a machucá-la e nem farei isso ao
nosso filho.
O seu rosto se ilumina e vejo um lindo sorriso nascer.
— Você irá aceitar o filho de outro homem? — O seu tom era cético.
— Samanta, no meu mundo só existe eu, você e agora o nosso filho.
Quero contar a verdade e gritar para ela, dizer que tinha sido eu, mas
o medo de perder tudo que tenho, agora foi maior.
19
Nunca vou te deixar sozinho

Samanta Antonelli

Leonardo volta para o quarto acompanhado do médico.


— Como está se sentindo? — O homem de meia-idade e de sorriso
simpático pergunta, se aproximando.
— Estou bem, mas quero saber como o bebê está! — Aliso o meu
ventre enquanto pronuncio as palavras.
— Vamos fazer alguns exames, mas agora vamos verificar o
coraçãozinho.
Leonardo fica em pé ao meu lado, segurando a minha mão, ele parece
ansioso olhando atentamente cada ação do médico.
— Nossa, é gelado! — Os meus pelos se arrepiam com o gel que ele
aplica na minha barriga.
— Sim, um pouco — dá um sorriso simpático. — Então, aqui está o
bebezinho — Leonardo me encara com os olhos cheios de lágrimas e volta
a encarar a tela.
— E esse som? — Leonardo indaga, com um sorriso bobo.
— É o coração — o médico responde.
— Está rápido — falo preocupada.
— Está normal, não se preocupem.
Ele acaricia os meus cabelos e olha atentamente para tela, eu não sei o
que somos de fato, mas estou enganada sobre ele. Sinto o meu coração bater
forte e um misto de emoções ao olhar para seus olhos.
— O bebê está bem, podem ficar tranquilos, faremos outros exames,
mas tenho certeza de que amanhã você poderá voltar para casa.
— Obrigada, doutor — sorrio para ele.
— Qualquer coisa que sentir, nos chame, vou deixar você descansar
agora.
— O bebê está bem, agora fique tranquila. — Leonardo encosta o seu
rosto no meu e me beija suavemente nos lábios, dá um leve gemido assim
que se senta na poltrona ao meu lado.
— E você, como está? Foi sério? — Aponto para a sua perna.
— Estou bem, minha menina, você que quase me matou de susto!
Você não tem autorização para morrer antes de mim, ok.
Sorri divertida, como eu poderia controlar isso?
— Vou me esforçar para continuar viva.
— Acho ótimo, os lobos vivem com uma única parceira até o fim das
suas vidas, então certifique-se de viver muito, eu não quero voltar a ser um
lobo solitário! — Me sento na cama.
— Vem aqui. — Dou leves batidas na cama, o chamando para o meu
lado.
Ele se levanta e senta com o braço por trás da minha nunca.
— Você nunca mais ficará sozinho. Eu te amo! — sussurro no seu
ouvido, parece rápido e até eu me assunto, mas era exatamente isso que eu
sentia naquele momento.
Os seus músculos enrijecem e a sua expressão muda, era indecifrável.
— Algum problema? — O encaro preocupada. — Me desculpe, eu
não queria assustar você! — O rubor toma o meu rosto, o tornando quente,
me sinto idiota.
— Sou eu quem te devo desculpas, eu não sei como reagir a essas
palavras. Talvez você precise ter um pouco de paciência… — O seu lábio
inferior treme. — Ninguém nunca tinha me dito que me amava. — A
tristeza nublou a sua feição
— As pessoas às vezes não dizem com palavras, mas demonstram
com atitudes. — Demonstro empatia, eu não conheço a sua história e não
sei o motivo do seu bloqueio.
— Então essa é a primeira vez que alguém me ama, e eu estou feliz
que… — calou-se hesitante.
— Que… — o encorajo a continuar.
— Que esse alguém seja você, eu realmente quero te fazer feliz,
Samanta, eu quero que o nosso filho seja muito amado.
— Nunca achei que te veria emotivo com a ideia de ter um bebê, eu
não tinha ideia da sua reação.
— Gosto da ideia de tê-la comigo, então, por favor, nunca mais me
esconda nada. Tentarei controlar o meu ciúme e o meu jeito explosivo, me
perdoe! — Vejo o arrependimento nos seus olhos e sinto a sinceridade
dentro dos seus braços que me apertam forte.
— O que está fazendo? A cama do hospital não cabe nós dois — falo
divertida, quando ele deita se acomodando ao meu lado.
— Se você ficar bem agarradinha a mim, vai caber nós dois, sim! —
Sorri divertido.
Aninho-me nos seus braços, os seus dedos passam delicadamente
desenhando no meu rosto e com a outra mão ele alisa os meus cabelos.
Como eu poderia imaginar que conheceria o céu dentro de tanta
escuridão?

***

Volto para a faculdade depois de uma semana distante, Leonardo me


encheu de cuidados ao longo desses dias, os enjoos já não são mais um
problema, os remédios têm me ajudado bastante com isso.
Davi me vê de longe e acena, era bom vê-lo de novo.
— Achei que tinha abandonado a faculdade! — ironiza quando me
aproximei.
— Sofri um acidente, deveria estar me abraçando e dizendo que está
feliz em me ver.
— Estou muito feliz em vê-la, senhorita Antonelli — pronúncia
divertido.
— Já sabe onde vai estagiar? — pergunto, me sentando ao entrar na
sala, ainda tínhamos alguns minutos para conversar antes do início da aula.
— Vou estagiar na empresa dos meus pais — responde, como se fosse
óbvio. — E você, já escolheu uma empresa?
— Não é nada simples, eu escolho e no outro dia estou lá, Davi, não é
tão fácil quando não se tem bons contatos.
— Samanta, o Leonardo é dono do grupo mais importante do país,
não venha falar que não tem contatos — ele desdenha.
— Quero conseguir por conta própria! — Dou de ombros.
— Então não diga que o problema é contatos.
Davi tem razão, eu poderia pedir a Leonardo um estágio no grupo
Milani, mas eu nunca iria misturar as coisas.
***

— Hum… o cheirinho está ótimo — digo entrando silenciosamente


na cozinha, Maria está finalizando o almoço.
— Já chegou, minha menina? — Ela tira os olhos rapidamente do
fogão para me ver sentar à mesa da cozinha.
— Sim e estamos com fome — falo alisando o meu ventre, a minha
barriga ainda é imperceptível.
Como junto aos empregados, Leonardo não ia mais me buscar no
final da aula e não vinha para o almoço. Subo, tomo um banho e me sento
na cama com o notebook no colo, eu já havia selecionado algumas
empresas que eu julgava ser boa para o meu currículo, passo a tarde inteira
mandando currículos
— O que está fazendo? — Leonardo cruza a porta do quarto,
sentando ao meu lado na cama.
— Mandado o meu currículo para as empresas, estou buscando um
estágio.
— Hum… por que não vem estagiar na Milani? — Ele me olha
confuso, como se eu ir para Milani fosse algo certo na cabeça dele.
— Quero conseguir sozinha, mas agradeço a ajuda.
— Quem disse que ajudarei? Contratamos vários estagiários por mês,
se não quer a minha interferência, mande a proposta e passe pela seleção!
— Dá de ombros.
— Não quero misturar as coisas — digo recusando sem nem pensar
sobre o assunto.
— Misturar o que, minha menina? Você é minha mulher, aquela
empresa também é sua.
Ouvi-lo falar assim, eu até acredito que aquilo tudo é meu.
— Mande o currículo, não vou interferir em nada, embora eu saiba
que será contratada, você é perfeita em tudo que faz.
— Você promete que ninguém vai saber sobre nós dois? Não quero
ter privilégios.
— Prometo! Agora vem aqui me dar um beijo, estou morrendo de
saudades de você.

***
Estou a caminho da faculdade, quando recebo um e-mail da Milani
me convocando para a seleção.
— Que carinha é essa? Notícia boa? — Leonardo questiona vendo o
meu sorriso encarando o celular.
— Vou para uma seleção hoje lá na Milani, eu não sabia que me
chamariam tão rápido.
— É final de mês, sempre temos estagiários espalhados pelas
agências e eles sempre iniciam no primeiro dia do mês. Te desejo sorte,
embora eu já saiba que você será escolhida.
— Sabe? — Olho para ele desconfiada.
— Você é a melhor, eu já disse isso — sorri divertido.

***

No final da aula vou direto para a Milani, era a segunda vez que
estava na empresa e ainda me impressiono com o tamanho do prédio. Entro
procurando pela recepcionista da outra vez, ela seria o fim da tentativa de
camuflagem, mas, para minha surpresa, uma loira artificial com cachos
largos estava no seu lugar, as suas sobrancelhas eram bem escuras.

— Oi! Vim para a seleção de estágio.


— Pode aguardar ali ao lado, junto dos outros candidatos, a seleção
começa em alguns minutos — ela me atende com um sorriso, pelo menos é
mais simpática
— Obrigada! — Os meus olhos correm em direção apontada por ela
para então notar a dezena de pessoas sentadas aguardando o início da
seleção.
Sento-me um pouco afastada, eles parecem ser filhos de famílias
ricas, eu fico um pouco sem jeito com os olhares que alguns me lançaram
por cima do ombro.
— Você está nervosa? — Olho para onde vinha a voz, um rapaz alto,
deveria ter a minha idade, ele passa as mãos pelos seus fios loiros e exibe o
seu sorriso branco impecável.
— Um pouco e você? — Ele se senta ao meu lado e suspira com
desdém.
— Eu também! O meu pai é o diretor financeiro daqui, se eu não
passar, ele me mata e eu nem quero essa vaga! — Torce os lábios após
revirar os olhos. — E você? — Me olha como se me estudasse.
— Eu? Há…. Quero a vaga, senão eu não estaria aqui. — Dou de
ombros, com um sorriso sem graça, afinal, a resposta parecia óbvia.
— O presidente da empresa é o demônio em pessoa, todo mundo tem
medo dele.
Ele tem razão, às vezes Leonardo era assustador.
— Sério? Espero que a gente cruze pouco com ele — contenho o riso.
— A seleção vai começar, por favor, me acompanhe! — Nos
levantamos rapidamente seguindo a funcionária até uma sala imensa, com
muitas cadeiras vazias que se tornou até desproporcional para a quantidade
de participantes.
— Sente-se ao meu lado! — O tal filho do diretor financeiro me puxa,
eu não vejo uma alternativa e me sento. — Não me apresentei, eu sou
Lucas, prazer — Estende a mão.
— Samanta, prazer — respondo o seu aperto de mão, que era bastante
firme por sinal.
— Boa sorte, Samanta.
— Para você também — sorrio sendo simpática.
Fomos submetidos a uma prova que durou horas e foi bem cansativa,
estávamos aguardando o resultado e, quando pensamos que aquela seria a
única etapa, a funcionária responsável entra na sala.
— Vamos ter uma última fase da seleção apenas com os nomes
citados! — Ela segura uma prancheta que provavelmente contém os
resultados das provas. — As pessoas que vou falar o nome, me sigam até a
sala de reuniões, Lucas Pontes, Jessica Castro e Samanta Antonelli. Esses
são os nomes para a próxima fase. Aos demais, agradecemos o interesse em
fazer parte da nossa equipe, mas não foi dessa vez! Não desistam, espero
vocês na próxima seleção.
— Chegamos na fase mais difícil, encarar o presidente e os diretores
da empresa. — Lucas esfrega uma mão na outra com um sorriso zombeteiro
na face.
— O presidente? — Arregalo os olhos, mas o que eu estava
pensando? É claro que eu o veria aqui, ele é o dono.
Lucas gargalhou com o meu espanto.
— Nem pense que vai passar porque é mulher, nunca o viram com
nenhuma mulher que não tenha sido paga! — Pisca o olho sorrindo com
malícia.
— Do que você está falando? — Não pude evitar o tom repressor e
ele torna a gargalhar.
— Estou falando de prostitutas, ele só fica com esse tipo de mulher.
— Você deve estar exagerando! — Balanço negativamente a cabeça.
— Não é nenhuma mentira, sempre ouvia o meu pai falar que
encontrava com ele em boates cheias de mulheres.
— Isso não significa que ele só saia com prostitutas. — Reviro os
olhos.
— Não seja inocente, Samanta, é exatamente como eu disse, sem
nenhum exagero.
Entramos na sala bem menor que a anterior, nos acomodamos ao
redor de uma mesa imensa de vidro, lentamente várias outras pessoas
entraram e tomaram os seus acentos. Eles olham o relógio como se
estivessem com pressa, mas a postura logo muda quando Leonardo entra na
sala, com um ar imponente e soberano. Ele olha todos por cima do ombro e
senta na ponta da mesa.
Ele me olha e tira os olhos rapidamente de mim.
— Estou suando frio, sinta. — Lucas coloca a sua mão sobre a minha
e mesmo eu puxando a minha mão rapidamente, a cena foi registrada pelo
olhar irritado de Leonardo.
— Pare! O que está fazendo? — sussurro quase que inaudível.
— Me desculpe, vamos prestar atenção ao que eles dizem! — Ele
torna a mostrar o seu sorriso fácil.
— Sim, vamos fazer isso — digo sem encará-lo
Os diretores se apresentam e falam um pouco das suas atividades na
empresa, foi inspirador e me deu uma sensação de que eu queria muito essa
profissão, que estou no caminho certo. Quando Leonardo levanta, abre um
slide e nos mostra fotos de como tudo começou, de como ele havia
começado e que história incrível! Eu me dei conta do quão pouco eu o
conheço, de zelador a dono de uma empresa mundialmente conhecida, era
uma grande história de superação e conquista, ele não havia herdado a
empresa de pais ricos, ele construiu e criou cada valor e visão deste lugar.
Todos nos deram boas-vindas e enfim fomos dispensados para retornar no
dia seguinte, para o nosso primeiro dia de estágio.
— Samanta! — Lucas grita quando me vê cruzar a porta onde estava
acontecendo a reunião, ele conversa descontraído com Jessica, que acena.
Aceno de volta caminhando até eles.
— O que vai fazer agora? Eu e a Jessica combinamos de sairmos e
comemorar.
— Desculpe, mas não posso hoje, fica para outro dia.
— Vamos, vai ser rápido, tem um local aqui perto, vamos trabalhar
juntos, será uma forma de nos conhecer! — Jessica me encara com aqueles
olhos redondo e verde-esmeralda, ela tem um sorriso fofo e joga os seus
cabelos que passam um pouco do ombro para trás fazendo um biquinho
manhoso. — Vamos! — insiste.
Por que estou tão assustada? É só uma saída com colegas de
trabalho e não tem nada de mais nisso.
Afirmo para mim, enquanto ambos encaram o meu ar pensativo
aguardando a resposta.
— Ok, vamos, mas não posso demorar — advirto.
— Perfeito! Vamos no meu carro! — Lucas tira as chaves do bolso e
nós duas o seguimos.
20
Eu não quero me anular

Samanta Antonelli

Lucas para em um restaurante próximo a Milani, o lugar é bem


acolhedor. É possível ouvir uma música ambiente ao fundo, o clima é
agradável, as pessoas conversam descontraídas, eu não conheço o lugar,
aliás ultimamente venho notando que eu não conheço nada além do
caminho da faculdade, o café que eu trabalhava e a casa onde moro.
— O lugar de sempre senhor? — Indaga o recepcionista do
restaurante a Lucas, que o cumprimenta calorosamente.
— Sim, só que mesa para três desta vez — diz divertido.
Ele é extrovertido e está sempre sorrindo, eu sei, eu o conheço a
menos de vinte quatro horas e ainda não vi a sua expressão séria.
— O que vão pedir? — indaga o garçom assim que nos acomodamos
na mesa.
— Quero gim com tônica — Jessica responde rapidamente. — E
você, Samanta?
— Uma água com gás. — Nem cogito envolver álcool nessa saidinha.
— Ha… água, Samanta? — O sorriso descontraído veio
acompanhado de um tom desapontado.
— Sim, eu não tenho o costume de beber álcool — justifico
encolhendo os ombros.
— Não sabia que era tão fofinha — Lucas fala antes de apertar as
minhas bochechas, me deixando sem jeito, olhando ao redor como se eu
tivesse acabado de cometer um crime.
Jessica olha a cena desconfortável, já está ficando nítido que ela havia
ficado interessada no Lucas.
— Você ficou vermelha só porque toquei nas suas bochechas?
— Você deveria parar de ficar me tocando o tempo todo! — tento
falar naturalmente para não parecer grosseira.
— Por que não posso te tocar, você tem namorado?
— Tenho — respondo sem delongas.
— Sério, quem ele é? — Todo o rosto de Jessica se ilumina com a
minha resposta e foi a primeira vez que vi Lucas amarrar a cara torcendo o
nariz.
— Ele é só uma pessoa comum — respondo dando de ombros.
— Vamos marcar para sair novamente, você vem com ele e nos
apresenta o que acha? — E ali está Jessica se empenhando para ter um
encontro duplo.
— Sim, podemos marcar — eu só não sei em que dia.
— O que vocês acharam do senhor Milani? — Jessica muda de
assunto.
— Ele é meu ídolo, o cara tem tudo que quer, todos o temem, ele fez
o primeiro milhão aos dezoito anos. É muito inteligente, sem falar que deve
pegar muita mulher gata — os olhos de Lucas brilham enquanto ele
pronúncia as palavras com admiração.
— Nossa, Lucas e você acha bom ser temido? — Jessica o olha com
reprovação.
— As pessoas o respeitam, ninguém se atreve a mexer com ele, eu
iria gostar que todos me respeitassem assim! — Dá de ombros levando
alguns amendoins à boca.
— Ele é muito bonito, você não achou Samanta? — Jessica cora e
suspira sonhadora.
— Sim, ele é — respondo sem dar muita ênfase.
— Vocês não têm chances com ele — sorrio do tom enciumado de
Lucas.
— Por quê? — Jessica o encara esperando a resposta, levando o copo
de gim até a boca.
— Ele não mantém contato com ninguém e mulheres, só as que ele
paga para ter, putas, meninas.
— Nossa, como você é grosseiro — Jessica torce o nariz com o
linguajar de Lucas.
Ele por sua vez dá ombros sorrindo.
— Mas é a verdade, homens com muito dinheiro tem medo de casar e
depois ter que dividir a fortuna — termina de dizer e solta uma gargalhada.
Eu sinto o desconforto me atingir em cheio minha expressão mudou,
nada que Lucas está falando é mentira na totalidade e eu me sinto mal com
as suas palavras.
— Preciso ir! — Olho para o relógio e me levanto apressada, o ar está
denso, eu só quero parar de ouvir sobre Leonardo e a sua “vida amorosa”
— Ainda é cedo! — Lucas retruca se pondo de pé em seguida.
— Acho que ela quer comemorar com o namorado, afinal, não é todo
mundo que é aceito na Milani. Acertei? — Jessica pisca o olho e um sorriso
fofo se forma no seu rosto.
— Acertou em cheio — retribuo o seu sorriso de forma simpática.
— Posso ficar mais um pouco. — Jessica segura o braço de Lucas,
que olha para ela e volta os olhos para mim.
— Tudo bem, vocês podem ficar, eu pego um táxi — respondo, já
dando as costas para eles, eu não iria mesmo querer voltar com Lucas.
— Até amanhã, Samanta! — Olho para trás e aceno com a mão para
Jessica antes de cruzar a saída do restaurante.
O relógio marca quase oito da noite quando entro no táxi, o meu
telefone havia descarregado quando eu ainda estava na Milani, imagino que
Leonardo esteja preocupado e isso me deixa com o coração apertado.
Durante o caminho, as palavras de Lucas embrulham o meu estômago, no
final das contas recebi muito dinheiro para estar ao lado do Leonardo.
Acho estranho o taxista estacionar em frente a mansão totalmente
escura.
— Senhorita é aqui mesmo que vai ficar? Parece que não tem
ninguém — ele fala abaixando a cabeça para olhar o interior da
propriedade.
Um foco de luz acende, clareando o carro.
— Senhorita, seja bem-vinda de volta — diz o funcionário abrindo o
portão.
Pago o táxi e desço um tanto assombrada, nunca havia visto a casa em
total breu.
— O que aconteceu aqui? — pergunto ao segurança, que me
acompanha até a porta.
— Isso é comum, senhorita, o senhor Leonardo pede para que tudo
fique escuro quando ele não está com um bom humor.
— Entendi… — um sorriso nervoso surge no meu rosto, mas era algo
que ele não conseguiria ver, já que apontava a lanterna apenas para guiar o
caminho.
Esbarro nos móveis na entrada, eu nunca decorei as suas localizações
e nem achei que precisaria. O barulho desperta um rosnado vindo da sala de
estar, acendo a luz do abajur e lá está ele, afundado em uma poltrona tão
escura quantos os outros móveis da casa, a sua cabeça estava baixa e com
os dois braços apoiados na perna, ele segura um copo de whisky
— Boa noite! — digo enquanto me aproximo, mas o silêncio veio
como resposta e ele era ensurdecedor.
Torno a tropeçar, só que dessa vez em garrafas vazias de whisky,
acendo outro abajur ao lado da poltrona, ele levanta os olhos para me
encarar e os seus olhos estão vermelhos. O seu silêncio me assusta mais do
que se ele estivesse quebrando tudo e gritando como sempre fazia quando
algo saia do seu controle, eu não sei o que se passa na cabeça dele e isso é
angustiante.
Arrasto um puff e me sento de frente para ele, arrasto as minhas mãos
pelas suas pernas e faço um caminho até as suas mãos.
— Estava me esperando? — questiono em um tom tranquilo, mesmo
que por dento eu grite de pavor.
— Da próxima vez que não for vir direto para casa, ligue avisando —
diz frio, encarando o copo nas suas mãos.
— Me desculpe, o telefone descarregou, por isso não comuniquei —
respondo prestes a me pôr de pé, mas a sua mão me impede e eu volto a
sentar.
— Onde esteve? — Os seus lábios tremem, eu vi o quanto era difícil
para ele pronunciar essas palavras assim em um tom baixo.
— Sai com a Jessica e o Lucas, eles queriam comemorar a entrada na
Milani, parece que isso é motivo de orgulho, eles estavam felizes, eu
também fiquei.
Os seus dedos estão brancos da força com que ele aperta o copo, a
bebida vibrava junto ao tremor das suas mãos. Nenhuma ação agressiva,
gritos ou coisas quebradas, apenas um homem fazendo um esforço enorme
para se manter calmo e eu reconheço o seu esforço em controlar o seu
ciúme.
— Você me disse uma vez que não entendia por que as pessoas falam
tanto em amor, pois só amam a si mesmos, naquele momento eu senti pena
de você e eu pensei “ele certamente é um coitado que vive a sua vida
sozinho e não tem o afeto de ninguém”. Talvez esse tenha sido sim um fato
é que você tenha estado sozinho por todo esse tempo — os seus olhos
perfuram os meus enquanto ele me ouve atentamente. — Obrigada, eu
agora entendo.
— Pelo que está me agradecendo?
— Por me ajudar a entender o que realmente é o amor! — Sim, eu
havia acabado de descobrir.
— E como fiz isso? — Ele me encara com a testa enrugada.
— Um homem olha para uma mulher e vê nela tudo que sempre quis,
ele acredita que ela suprirá todas as suas necessidades e o mesmo ela pensa
quando olha para um homem, enxerga nele tudo que acredita que precisa e
isso vai de bens materiais a desejos carnais. A uma busca incessante em
suprir as expectativas e preencher as necessidades, no final, você estava
certo, as pessoas estão cheias de amor-próprio e são incapazes de amar o
próximo entregando tudo de si, é sempre sobre receber e nunca sobre se
doar.
— O que você está querendo me dizer com isso?
— Que o verdadeiro amor não está naquilo que recebemos, está no
que estamos dispostos a dar, eu sei o esforço que está fazendo para se
manter calmo nesse momento e eu agradeço. Agradeço por você querer me
dar o seu melhor e não esperar que eu sempre te dê o que você espera de
mim, eu farei o mesmo por você. Estarei aqui quando você não conseguir,
ou quando eu falhar, porque quero te dar o meu melhor, mas eu não quero
ter que me anular para caber no seu mundo, Leonardo. — Ele se põe de pé
ficando de costas para mim, eu posso ouvir a sua respiração acelerada,
torno a ficar na sua frente e envolvo a sua cintura com os meus braços, ele
não tem nenhuma reação, mas continuo ali ouvindo as batidas aceleradas do
seu coração.
Os seus músculos tensos foram relaxando, ele se vira e os seus braços
fortes me envolvem, ele levanta o meu rosto com delicadeza, os seus olhos
ainda refletiam tristeza e imagino o quanto foi doloroso segurar as lágrimas
que se empossaram nos seus olhos.
— Vocês são tudo que tenho — ele pronúncia lentamente com a voz
embargada. — Eu não quero perdê-los… — As lágrimas desabam dos seus
olhos e um soluço escapa da sua boca.
— Eu também não quero perder você, eu te amo — sussurro na sua
boca colada a minha.
Ele toma os meus lábios com exigência, segura o meu rosto entre as
suas mãos grandes, as suas mãos descem rapidamente tirando as minhas
roupas e me colocando sobre o sofá. Ele veste apenas uma bermuda de
moletom que foi facilmente largada no chão, posso afirmar que foi uma
noite incrível, eu já era dele e ali já era um caminho sem volta.
21
Apenas você

Samanta Antonelli

— Leonardo, acorda — sussurro no seu ouvido — Leo! — Passo a


mão pelo seu peito nu.
— O que foi? Está querendo me seduzir a essa hora da manhã? —
Indaga ainda de olhos fechados, exibindo um lindo sorrio.
— Não seria uma má ideia, porém, eu já estou indo para faculdade —
digo me levantando da cama.
Os seus braços fortes envolvem a minha cintura e em segundos, eu
estou deitada com a cabeça sobre o peito dele.
— Seremos rápidos! — Se posiciona por cima de mim beijando o
meu rosto.
— Você é insaciável ou o quê? Quase não dormi essa noite! — Me
liberto dos seus braços me pondo de pé em frente a cama.
— Você tem certeza de que tem que ir para aula? — fala em um tom
malicioso.
— Tenho, esqueceu que perdi muitas aulas?
— Tudo bem, eu te deixo lá então — suspira em derrota.
Quando desço, Maria arruma a mesa para o café da manhã,
cantarolando e exibindo o sorriso de sempre, ela dá o toque de mãe aqui na
casa.
— Fiz tudo que você gosta — pronúncia com satisfação.
— Hum… estou vendo, mas vou apenas comer uma fatia de bolo.
— Samanta, se alimente corretamente, você esqueceu que carrega um
bebê na barriga? — Leonardo entra na sala e puxa uma cadeira. — Venha,
sente-se e coma adequadamente, ainda temos muito tempo até a sua
primeira aula.
— Tudo bem, senhor — fiz uma careta, me sentando, ele se senta ao
meu lado montando um prato que daria para duas pessoas comer
tranquilamente e ainda guardar para o lanche.
— Onde você foi ontem? — Me encara mordendo uma fatia de pão.
— Um restaurante perto da Milani.
— E o Lucas, esse é nome dele, certo? — pergunta, despretensioso.
— Sim, esse é o nome dele, ele se revelou ser o seu fã, diz que sonha
com a sua vida, fortuna, respeito e mulheres! — Dou de ombros.
— Mulheres? — gargalhou. — Eu só tenho você.
— Parece que a imagem que eles têm de você é outra, mulheres
lindas, deslumbrantes e contratadas para dar prazer. — Ele morde o lábio
inferior e suspira em seguida.
— Isso é passado — a sua expressão escurece e eu me calo, nós dois
sabemos em que condições cheguei até aqui.
Ficamos um tempo em silêncio, ele fecha a cara e eu não sei como
retomar a conversa. Estou prestes a entrar no carro quando ele fecha a porta
que eu havia acabado de abrir e me prende entre o carro e o seu corpo.
— Você é diferente delas, eu sei que isso que ele fala incomoda você,
mas você é diferente!
O rubor sobe para o meu rosto, eu certamente estou olhando para ele
como uma boba apaixonada, os seus lábios se curvam num sorriso após
selar os meus lábios em um beijo rápido.

***

Leonardo Milani

— Senhor, com licença, trouxe uns documentos para o senhor revisar!


— A minha secretária entra com algumas pastas nas mãos.
— Deixe aqui na minha mesa, obrigado.
Pego o celular sobre a mesa e digito uma mensagem para a Samanta,
hoje é o primeiro dia dela no estágio, ela deve estar nervosa.

Você já chegou?
Para Samanta

A resposta veio imediatamente.


Sim, meu amor.
De Samanta

Sorri lendo a resposta.


— Precisa de alguma coisa, senhor? — Encaro o olhar assustado da
minha secretária que nunca me vê saindo da sala antes do final do
expediente.
— Está tudo bem, continue o que está fazendo — respondo, passando
apressado por ela
Caminho pelos setores e tive que ignorar os olhares assombrados dos
funcionários, que não costumam me ver andando pela empresa, depois que
transferi o meu assistente de anos para outra unidade, houve comentários de
pessoas com medo dos seus cargos considerados estáveis aqui na empresa.
— Você já viu a estagiária nova? Muito gostosa! — A voz vinha da
copa, caminho até lá, tomar um café não parecia ser uma má ideia.
— De qual você está falando? — Eles continuam sem notar a minha
presença.
— Acho que é Samanta o nome dela.
— Sim, é muito gostosa mesmo, mas ela contou na entrevista que tem
namorado e que ele é bem ciumento, então arrumem o que fazer em vez de
ficar de papo na copa — digo.
— Claro senhor, já estávamos de saída — passa apressado por mim,
sem coragem de levantar os olhos para me encarar.
Continuo andando pelos setores, os funcionários estão em estado de
atenção, a notícia da minha ronda pela empresa já foi repassada pelos
andares. Enfim chego na sala da Samanta ao lado do Lucas, eu os observo
de longe, ele parece à vontade ao lado dela, consegue até arrancar sorrisos
dela. Preciso conter o meu ciúme, de certo a minha expressão não é a mais
favorável.
— Algum problema, senhor? — Os meus pensamentos são
interrompidos pela voz da gerente contábil, que acompanha os meus olhos e
para nos novos estagiários dividindo um pacote de salgadinho.
— Problema nenhum, estou voltando para a minha sala.
— Coloque na minha agenda, uma hora diária para caminhar pela
empresa — informo a secretária antes de voltar para a sala.
Preciso andar mais pela empresa, talvez das próximas vezes ela não
me encare como se eu fosse um fantasma.

***

Espero Samanta na saída, estacionado do lado de fora da minha


própria empresa, escondido como se fosse um adolescente que namora sem
os pais saberem, ela sai sozinha, apanho o telefone para ligar.
— Samanta — ergo a cabeça imediatamente ouvindo uma voz
masculina chamando.
Os seus olhos parecem surpresos e um largo sorriso surge no seu
rosto, ele se aproxima lhe abraçando, cada centímetro do meu corpo fica
tenso. Os sigo com os meus olhos até um banco próximo a Milani, onde
eles sentam e conversam.
Observo a intimidade com que eles se falam, eu acho que já sabia
muito sobre ela, estaciono o carro e caminho em direção a eles.
— Boa noite. — Samanta sobressalta com os olhos arregalados.
— Boa noite. — A reação de Samanta o fez me olhar confuso.
— Achei que já tivesse ido para casa! — Dou um beijo rápido nos
seus lábios.
— Estava indo quando encontrei um amigo. Esse é Rafael, estudamos
juntos na época de escola e fomos vizinhos por um bom tempo — ela virou-
se para ele. — E esse é… é… — procurou pelas palavras enquanto tinha
um dedo apontado para mim.
— Sou Leonardo Milani, o noivo dela, prazer — estendo a mão e ele
fez o mesmo, me cumprimentando.
— Não sabia que estava noiva — diz desapontado.
— Pois é! — Deu de ombros sorrindo apertando os lábios.
— Bom, foi ótimo te ver de novo, Samanta, preciso ir agora.
— Tchau! — Acena virando-se para mim em seguida.
— Está com fome? — indago caminhando com ela até o carro.
— Um pouco.
— Vamos comer alguma coisa! — Entramos no carro e seguimos até
um lugar adequado.
Estaciono o carro em um restaurante de comida italiana.
— Como foi o seu primeiro dia de estágio? — pergunto quando
sentamos a mesa
— A Milani é um sonho, o salário é incrível e os benefícios são
ótimos, eu estou feliz — sorri com a resposta sincera.
— Ah, fico feliz que a Milani tenha bons benefícios e que chame a
atenção de bons profissionais. Quem é o Rafael? Só um amigo mesmo? Ou
vocês foram namorados? — Mordo o lábio enciumado.
— Somos apenas amigos, da forma que eu disse.
— E o que somos, Samanta? — As minhas sobrancelhas se juntam.
— Noivos… — Desviou os olhos repetindo o que eu disse lá fora
— Você parecia não saber a alguns minutos atrás.
— Na verdade, isso nunca foi oficial, nunca conversamos sobre isso!
— Encolhe os ombros.
— Foi só por isso?
— Claro, e por que mais séria?
— Então resolveremos isso, já que as formalidades te incomodam,
vamos noivar oficialmente! — Ela me lança um sorriso fofo e me lembro o
quanto ela ainda é uma menina, mesmo que muitas vezes ela parece ser
madura demais para a sua idade.
— Você pediu bastante coisa, vai aguentar comer tudo isso? — Olho
abismado para a quantidade de comida que chega na mesa.
— Claro, estamos com muita fome — responde alisando o seu ventre,
onde está o meu filho.
— Alimente bem o meu filho! — Ela gosta de me ouvir chamá-lo de
filho, o seu rosto se ilumina, mas o motivo me preocupa, ela ainda acha que
eu não sou o pai biológico.
— Ouvir falar de um evento da empresa que será em uma semana —
diz antes de levar um garfo com macarrão à boca.
— É um evento grandioso, você quer ir?
— Claro! Deveria mandar convites para os estagiários também.
Não é como se ela precisasse ir como estagiária, ela ainda não
entendeu quem ela é de fato, mas sorrio concordando antes de responder.
— Claro! Mandarei convites para todos.
22
Outra mulher

Samanta Antonelli

No dia seguinte, na Milani não se fala de outra coisa a não ser a festa
onde os novos projetos são apresentados, os funcionários recebem
premiações generosas, o que não é de se admirar vindo de Leonardo.
— Você recebeu o convite? — Lucas exibe o enorme envelope preto
com letras douradas.
— Sim! — Agito o meu envelope no ar.
— Vamos juntos! — Sugere animado. — Ah…. Esqueci, você deve
levar o seu namorado — o sorriso desaparece do seu rosto.
— Ainda não sei se ele vai — encolho os ombros.
— Então você me diz se ele não for que passo para te pegar — pisca
o olho sugestivamente.
— Acho melhor nos encontramos lá — forço um sorriso.
— Tudo bem, nos encontramos lá então. — Torce nariz antes de
voltar a sua atenção para o trabalho na sua mesa.
Mas o seu mau-humor durou pouco, logo ele virou a cadeira com os
olhos brilhando pronto para fazer o que mais gosta, “fuxicar”.
— Já está sabendo da novidade? — Pelo tom da voz, a fofoca da vez
é das grandes.
— Qual? — pergunto curiosa.
— A diretora responsável pela filial da Inglaterra está aqui — suspira,
se encostando na cadeira.
— O que tem de mais nisso? — Faço pouco caso do comentário,
afinal não era nada demais.
— O que tem de mais? Você não ouviu tudo ainda, a fofoca vem
agora, ouvir falar que ela já teve um romance com o presidente.
— Um romance? — Sinto os meus lábios tremerem.
— Sim e com certeza ainda deve rolar, ele deve pegar quando tem
oportunidade.
— De onde você tira todas essas coisas, Lucas? — Finjo desinteresse
— Todos estão comentando só você que não sabia ainda.
Viro a cadeira, ficando de costas para ele, e torço para que ele para de
falar, eu estou a ponto de ter uma síncope.
Samanta não se preocupe com isso, ele é seu… E só seu! Se concentre
no trabalho…. Aí…. Não consigo…. Preciso vê-la pessoalmente.
Levanto da cadeira em um salto, indo apressada em direção à saída da
sala.
Só existem duas salas no andar da presidência, uma vazia e a outra é a
do Leo, eu queria subir e teria que ter uma boa desculpa para isso, mas
enquanto ninguém me impedia, apenas caminho até lá sem a menor ideia do
que falar quando chegar.
Ando apressada pelos corredores, eu não levanto o rosto, não queria
ser parada no caminho ou olhar alguém nos olhos.
— Ai! — exclamo e caio de bunda no chão.
— Você está bem? — antes de levantar os olhos para checar quem
está na minha frente, o meu corpo treme ouvindo a voz de Leonardo, mas
logo me recompus levantando os meus olhos para então vê-lo em pé ao lado
de uma loira alta e refinada, os seus cabelos brilham e a sua pele parece um
veludo.
Ela me olha por cima dos ombros torcendo o nariz com um ar de
desprezo.
— Acho que estou — toco no meu ventre, eu sabia que era golpe
baixo e que estou fazendo um drama exagerado.
— Ela está bem, Leonardo, vamos agora ou chegaremos atrasados no
jantar! — Ela deu alguns passos para então perceber que ele não lhe
acompanha.
Jantar? Mas quem ela pensa que é?
Não contive o meu olhar irritado para ele.
— Ai… ai… — Levanto fingindo dificuldade.
— Está sentindo alguma coisa? — A sua voz preocupada fez a loira o
olhar irritada, voltando a me encarar.
— Garota, não faça tanto drama por uma queda tão insignificante —
zomba
Percebo os olhos de Leonardo para o seu segurança que sabe bem
quem sou, ele não demora em se aproximar.
— A senhorita, está bem? Vou levá-la até a enfermaria.
Eu não havia notado a quantidade de pessoas que observavam a cena,
as pessoas não se aproximam muito do Leonardo, então isso para elas são
um espetáculo.
— Estou bem, não se preocupe, podem ir para o jantar, não se atrasem
por minha causa.
— Está vendo, Leo, a garota está bem, vamos! — Mesmo que
Leonardo tivesse sido rápido, tirando as mãos dela do seu braço, eu não
consigo conter o meu olhar furioso tomado pelo ciúme.
Leo é um caramba, senhor Milani para você!
Resmungo em pensamento.
Ando apressada retornando para a sala.
— O que aconteceu? Por que está com essa cara? — indaga Lucas,
notando a minha mudança de humor.
— Nada!
— Foi aquela garota que esbarrou no presidente? A nossa, que
vergonha — duas funcionárias riem enquanto apontam o dedo para mim.
— Do que elas estão falando? — Lucas me olha curioso.
— Lucas, você é um ótimo repórter investigativo, faça o seu trabalho
e colha as informações, o meu expediente acabou estou indo embora! —
Saio batendo os pés apressada após recolher as minhas coisas da mesa.
— O que falei que te deixou tão irritada, Samanta? — Indaga ele
confuso
— Aí, Leo, ela está bem, vamos embora — digo, imitando a sua voz
insuportável aos meus ouvidos, com um tom debochado.

***

Leonardo Milani

Hoje o dia na empresa foi bem corrido, os responsáveis pelas minhas


filiais estão aqui e isso inclui a Gabrielle com quem tive um caso de
algumas noites e, de certa forma, sempre que nos encontrávamos rolava
alguma coisa.
Ela é uma mulher muito atraente, que gosta de liberdade, então
sempre foi casual, é uma ótima profissional e eu confio a minha filial aos
cuidados dela. Durante todo o jantar que tivemos com os diretores, os meus
pensamentos estavam presos no olhar irritado que Samanta lançou para
mim, foi a primeira vez que eu a vi com ciúmes e sorri dos meus
pensamentos.
Olho para o relógio impaciente, as conversas já não eram relevantes
para a empresa, então me levanto, me despedindo. Eu já estou abrindo o
carro quando os sons dos sapatos de salto ecoaram pela garagem do local.
— Aonde vai com tanta pressa? — Sorri com cinismo, antes de virar
sério e encarar Gabrielle exalando luxúria.
— Preciso ir para casa, mas divirta-se. A conta está paga, peça o que
quiser. Nos vemos amanhã na empresa.
— Posso pedir o que eu quiser? — A sua mão traça um caminho que
começa no meu peito e parou no meu pau.
— Peça o que quiser no cardápio, eu estou indisponível hoje! —
Entro no carro me livrando das suas mãos habilidosas.
— É impressão minha ou está fugindo de mim? — Ela apoia os
cotovelos na janela, expondo o seu decote nada comportado.
— Fugindo? — Sorrio
Ela me encara segura, esperando que eu volte atrás e abra a porta do
carro para levá-la para uma noite de transa intensa, eu teria essa noite
quente, mas não com ela.
— Tenha uma ótima noite, Gabrielle. — Pisco o olho saindo com o
carro.
Eu nunca havia recusado suas investidas, aliás, eu sempre iniciei as
investidas e a conhecendo como conheço, ela não ficará nada feliz. Mando
várias mensagens para Samanta durante o caminho, mas não tive retorno, eu
estaria mais preocupado se os seguranças não estivessem me passando
informações, dizendo que ela está bem e segura em casa.
Quando chego em casa pude ouvir umas gargalhadas vindas da sala
de estar, me escoro na porta e fico vendo Samanta jogada no sofá com um
balde de pipoca, assistindo a um filme, com os pés sobre o sofá e as suas
pernas expostas em um vestido fino e curto. Aproximo-me sem dizer
nenhuma palavra, me sento na poltrona em frente ao sofá e fico a
admirando, sinto a força que ela faz para não me encarar, um canto da
minha boca se eleva, ela está zangada e estou a achando muito fofa com
ciúmes.
— Posso assistir com você? — pergunto me sentando ao seu lado no
sofá
— Já acabei, tenho coisas melhores para fazer agora! — Torce o
nariz, me olhando por cima do ombro.
— Sério? O que você tem para fazer agora? — Mordo o lábio com
um ar malicioso.
Ela inclina todo o copo na minha direção e cheira cada centímetro da
minha pele que se arrepia com o seu hálito quente perto de mim. Um sorriso
escapa dos meus lábios, ela está engraçada com ciúmes.
— Parece que andaram atacando o meu homem! — Torce o nariz
com uma expressão de nojo.
As suas mãos passam a desabotoar a minha camisa e confesso que já
estou bem animado para o que pode vir a seguir
— Você sabe como é difícil de tirar mancha de batom e cheiro de
perfume barato das roupas? — Ela tem a minha camisa em uma das mãos
enquanto a outra está apoiada na sua cintura. — O que me diz sobre isso,
Leo? — enfatiza o meu nome jogando, a camisa branca manchada por
batom vermelho em mim.
A puxo pela cintura e ela cai sentada no meu colo.
— Não faço ideia do quanto é difícil tirá-las da roupa, mas foi fácil
rejeitar a oferta, já que estou bem servido em casa.
O seu rosto inteiro se ilumina.
— Sou seu, minha menina — digo antes de tomar os seus lábios com
paixão.
Sou um animal faminto e só ela me deixa saciado, ela me leva a
loucura e, embora eu tenha sido sua primeira experiência, ela não fica
abaixo de nenhuma outra mulher mais experiente. Nesta noite, assim como
todas as outras, fizemos amor feito dois animais insaciáveis até dormirmos.
23
O céu e o inferno provêm do mesmo coração

Samanta Antonelli

Acordo com um cheiro de comida maravilhosa no quarto, me viro


quase que instantaneamente.
— Bom dia, minha menina. — Leonardo me encara com um lindo
sorriso, enquanto arruma uma linda mesa de café da manhã.
— Você acredita que vou te desculpar com um simples café da
manhã? — Faço uma careta.
— Penso que você já tinha despejado toda a sua raiva enquanto
cravava as suas unhas nas minhas costas — ele sorri com malícia.
— Bom… serviu apenas para amenizar a minha raiva! — Dou de
ombros. — Achou mesmo que seria fácil assim? Uns beijos, umas carícias e
tudo estaria resolvido?
— Claro que não, nunca pensei que seria tão simples assim!
Ele se aproxima de mim tirando uma caixa de veludo preto do bolso e
a exibe sobre a palma da sua mão.
— O que é isso? — Franzo o cenho.
Ele abre, mostrando o conteúdo da caixa, embora eu estivesse
vibrando por dentro, mantive a minha pose de durona, só para me
desmanchar no seu sorriso me encarando enquanto tira a aliança e se
ajoelha na minha frente. Ele pega a minha mão direita com delicadeza e
coloca a aliança a beijando, em seguida, ele estica a sua mão, me
entregando a sua aliança, mordo o lábio segurando uma lágrima de emoção.
— Pronto, agora todo mundo vai saber que tenho uma dona.
Satisfeita? — diz, admirando a sua aliança no seu dedo.
Jogo-me nos seus braços, o derrubando no chão e distribuindo vários
beijos pelo seu corpo, me viro, ficando ao seu lado ainda no chão, estico a
minha mão e encaro a aliança no meu dedo, nessa hora, as lágrimas correm
livremente pelo meu rosto.
— Se eu soubesse que te deixaria tão feliz, já teria te entregado antes
— diz enquanto ria da minha, talvez exagerada, emoção.
Embora o Leonardo nunca tenha dito que me ama, ele vinha
demonstrando isso diariamente e eu me sinto com muita sorte de tê-lo
comigo.

***

Chego mais cedo à empresa, pois tive uma aula a menos na faculdade,
eu sempre chego com fome, mas hoje eu teria tempo de comer com calma
no refeitório da empresa.
— Samanta — os gritos animados de Jessica vieram acompanhados
de vários acenos, ela está em uma mesa com Lucas, que também acena.
— Chegou cedo hoje — diz Lucas, assim que me aproximo da mesa.
— Tive uma aula a menos na faculdade — justifico.
— Que bom, como somos de setores diferentes, raramente nos vemos
— Um bico fofo se forma nos lábios de Jessica. — Vem senta aqui do meu
lado — ela afasta a cadeira e puxa para mais perto dela. — Fico muito feliz
em poder comer com vocês hoje, sempre faço isso sozinha.
— Samanta, já comprou o seu vestido para a festa da Milani?
— Ainda não, eu nem havia pensado nisso ainda.
— O que acha de irmos juntas? — Me pergunta animada, sugando o
refrigerante pelo canudo.
— Acho uma ótima ideia, quando você quer ir?
— Vamos hoje depois do expediente, o que me diz?
— Perfeito, vamos hoje então.
— Posso ir com vocês? Só para dar a minha opinião masculina, sabe?
— Lucas encolhe os ombros e é claro que eu diria sim, nunca tiraria esse
prazer da Jessica, que responde que sim com um sorriso largo e eu me
pergunto se Lucas já havia notado que ela está caidinha por ele.
— Uau! O que é isso no seu dedo?
Pelo espanto dela, imagino tudo, menos que ela estivesse falando da
aliança, então respondo assustada:
— O quê? Onde? — Sacudi a mão procurando algo anormal.
— Estou falando dessa belezinha aqui! — Ela toca com o dedo
indicado.
— Ah… é só uma aliança de compromisso, ainda vamos marcar o
noivado e anunciar oficialmente.
— Uau! Uau! Posso ver? — Ela diz eufórica.
— Claro! — Estico os dedos e ela olha encantada.
— Samanta, você mentiu! — A sua boca tinha um formato de O.
— Por que diz isso? — Recolho a minha mão sem entender.
— Você nos diz que o seu namorado era um homem comum, mas isso
aí no seu dedo está avaliado em cinco milhões de Euros.
Agora foi a minha boca que se abre em um O, eu olho espantada para
a minha mão.
— Você deve estar enganada, olhe direito, nem é verdadeira! — Sinto
os meus lábios tremerem, como alguém coloca cinco milhões na mão de
alguém que anda de ônibus por São Paulo?
— Você não sabe que a minha família é do ramo de joias? Somos os
maiores designers de joias do país e isso aí no seu dedo não é falso, me
deixa eu te mostrar uma coisa! — Estica a mão, pedido a aliança, tiro do
dedo e depósito na sua mão esticada.
— Olha que coisa linda! — Ela puxa as extremidades da aliança,
revelando um encaixe.
Os meus olhos brilharam quando ela mostra uma pedra em formato de
coração, metade preto e metade azul-celeste.
— É um diamante raro — diz, olhando fixamente para a joia, a sua
reação era a de alguém encontrando o seu ídolo pela primeira vez. — Ele é
muito lindo! — suspira — Sempre quis vê-lo de perto, muito obrigada
amiga. — Me abraça.
— Nossa! Não sabia que queria tanto ver — digo envergonhada, me
sentindo um pouco mal por não saber o que carregava no dedo.
— “O céu e o inferno provêm do mesmo coração. ” — ela diz
encarando a joia.
— O quê? — pergunto curiosa quando ela pronúncia a frase.
— É uma frase xintoísta, é o significado da joia.
— Xinto o quê? — pergunto, sem entender e ela sorri — Nossa, não
sabia que eu usava algo tão valioso no dedo.
— Pois é.… deveria nos contar quem é o bilionário! — Arqueia as
sobrancelhas.
Lucas não pronunciou uma palavra, ele parecia me estudar, enquanto
ele comia alguns petiscos que estavam na mesa.
— Bilionário? — sorri sem humor. — Vamos deixar essa conversa
para outra hora, ainda preciso comprar algo para comer! — Levanto
apressada saindo do refeitório, eu encaro a minha mão novamente. — O
que faço com você? Uso ou guardo em um cofre?
24
Não me deixe falando sozinho!

Samanta Antonelli

Estou encarando os números do elevador, ele parece que nunca


chegará ao térreo.
— Oi, garotinha, como você está? — nem preciso olhar para trás para
saber de quem era a voz enjoada.
— Como pode ver, estou ótima! — Me viro para encará-la e os meus
olhos encontram o de Leonardo parado ao lado dela.
Viro-me novamente para encarar o elevador, mas antes, inclino a
cabeça e vejo que o elevador da presidência está em manutenção.
— Que maravilha! — murmuro baixo.
Quando enfim o elevador chega ao térreo, entro apressada.
— Garotinha, vá no próximo, não vê que o presidente vai subir?
— E daí? Tem muito espaço aqui. — Me movimento com os braços
abertos, percebo que nenhum funcionário entra, mas onde está o problema
de subir no mesmo elevador que o presidente da empresa?
— Nossa, é muito sem noção — resmunga, entrando logo atrás de
Leonardo.
— Cheguei ao meu andar, tenham um bom dia. — Aceno, saindo
saltitante.

***

Leonardo Milani

— Acha graça no que essa garotinha faz? — Gabrielle pergunta


irritada, encarando o meu sorriso para Samanta.
— Acho ela bem ousada, você não acha? — Dou de ombros.
— Ela é petulante, isso sim — diz ao revirar os olhos.
Ela anda grudada a mim por todo corredor até a minha sala.
— O que é isso? — Ela pega em minha mão para verificar a aliança
mais de perto.
— É exatamente o que você está vendo — respondo como se fosse
óbvio.
— Mas o que significa? — pergunta sem acreditar.
— Pretendo me casar, Gabrielle — sorrio, contornando a mesa e me
sentando na minha cadeira.
— Nunca soube estar com alguém, quando vai me apresentar? Na
festa? — o seu tom era cético,
— Ela não quer ir à festa comigo. — Encolho os ombros.
— Quem não iria querer ir com você? — Acena negativamente com
um sorriso.
— Para você ver, tem sempre uma.
— Vai mesmo se casar? — insiste, incrédula.
— Sim, eu já disse, e não se preocupe, você será convidada para a
festa.
— Mas ainda podemos nos divertir? — Desliza pela mesa até parar
ao meu lado, se jogando de forma sexy no meu colo.
A coloco em pé pela cintura, ela senta sobre a mesa, sem se dar por
vencida, levanta o vestido, abrindo as pernas e coloca uma em cada braço
da minha cadeira. Gabrielle conduz as minhas mãos, traçando o caminho a
partir da perna e parando nos seus seios fartos, puxo as mãos rapidamente,
não tinha o menor interesse.
— Você não pode entrar — os gritos da minha secretária vieram
depois que a porta se abre sem aviso.
Samanta coloca as mãos na cintura, os seus olhos me queimam.
Sobressalto, me recompondo, Gabrielle quase caiu no processo.
— Perdão, senhor, não consegui contê-la.
— Pode deixar! — Aceno com a mão para que ela se retire.
— Não sabe bater na porta, garotinha? Estávamos ocupados. —
Gabrielle toma a frente, a afrontando.
— Talvez não tenha escutado as batidas, já que estava concentrada
demais no trabalho — ela fala em um tom irônico e vira a cabeça, me
estudando.
— Você pode sair Gabrielle, tenho assuntos para tratar com ela.
— O que teria para falar com essa pirralha? — ela pergunta,
desdenhosa
— Não se meta nos meus assuntos, Gabrielle — esbravejo.
— Posso voltar outra hora, senhor, não quero atrapalhar, vi que o
assunto estava bem quente, quer dizer sério, continuem! — Ela vira as
costas indo em direção à saída.
— Samanta! — grito, batendo as minhas mãos abertas sobre a mesa,
ela para no caminho e se vira para mim.
— Você está bem, Leo? — Gabrielle se aproxima com os olhos
arregalados.
— Já disse para sair, Gabrielle — falo firme novamente.
— Tudo bem, volto outra hora! — Ela caminha rápido, fechando a
porta nas suas costas.
Dei passos, me aproximando dela.
— O que veio fazer aqui? — Tenho o silêncio como resposta, ela
ainda me encara com raiva. — Não vai dizer nada? — indago, ansioso.
— Vou! Você é um bastardo filho da mãe — esbraveja.
Envolvo o seu copo com os meus braços, a puxando para um abraço,
os seus braços permanecem apontados para baixo e a solto para encará-la,
ela acerta um tapa no meu rosto.
— Pode me bater se isso vai te deixar mais calma. — Dou o outro
lado para ela bater.
— Faça o que você quiser, estou indo embora! — Volta a caminhar
em direção à saída.
— Samanta, você sabe que a Gabrielle dá em cima de mim — me
justifico.
Ela para no meio do caminho e se vira para me encarar.
— Não me importo com o que ela faz e sim com o que você permite
que ela faça, Leonardo, agora eu realmente preciso ir, marquei de ir ao
shopping com a Jessica.
— Samanta, volta aqui — grito para a porta fechada na minha frente.
— Por que está tão estressado, meu lindo? — Gabrielle volta e entrar
na sala, ela zera a distância entre nós e alisa o meu peito.
— Não encosta em mim, Gabrielle, é melhor você ir! — Volto para a
minha mesa, me sentando na ponta dela, a minha respiração está rápida, ela
me deixou falando sozinho? Eu não lembrava da sensação de ser ignorado.
— A garotinha te interessa? — indaga manhosa. — Eu nem
precisava perguntar, percebi desde o primeiro minuto em que estendeu a
mão para levantá-la do chão, algo inédito para alguém que não se aproxima
de praticamente ninguém.
— Isso não é da sua conta! — Ando nervoso de um lado para o outro.
Ela me deixou falando sozinho?
Questiono-me, ainda irritado.
— Vou precisar sair agora! — Passo por ela apressado saindo da sala.

***

Samanta Antonelli

Jessica anda de uma loja a outra, nunca as de departamento, sempre


as mais refinadas, eu lembro da última vez que estive no Shopping com
Gabi, sinto falta dela, às vezes nos falamos por alguns minutos ao telefone,
ela parece cansada, já que é filha única e agora cuida dos pais.
— Samanta, este é perfeito! — O grito fino veio acompanhado de um
longo sorriso, ela puxa a minha mão, me arrastando para o interior da loja.
— Samanta, sinta esse tecido, é magnífico.
— Realmente é lindo, perfeito! — Olho a etiqueta, fazendo uma
careta com o valor.
— Prova, Samanta, vai ficar lindo em você! — Ela me entrega o
vestido.
— Não posso pagar por ele, prove você, ficará linda! — Devolvo para
ela.
— Tem certeza de que não quer provar? Ele parece que foi feito para
você.
— Não se preocupe comigo, pode ir, vá! — Dou leves empurrões, a
conduzindo até o provador.
Tenho esperanças de achar algo mais acessível no interior da loja,
mas tudo valia bem mais do que eu um dia sonharia em ganhar.
— Tudo aqui é muito caro, não posso pagar por nada aqui — digo a
Lucas, que me segue.
— Prova esse, vai ficar lindo em você — ele me entrega um vestido,
eu não podia negar que ele tinha bom gosto. — Não precisa comprar, eu só
quero ver como fica em você.
— Qualquer coisa aqui deve cair bem, é tudo muito lindo! — Coloco
o vestido no lugar.
— Ouvi dizer que mulheres amam provar roupas, parece que
encontrei uma que não gosta. — Torce os lábios.
— Tudo bem, deixe-me ver como fica! — Pego o vestido de volta e
vou até o provador.
Antes que eu entre no provador, Jessica sai, deslumbrante, parece
uma princesa em um vestido verde que faz um sobre tom com os seus olhos
de esmeralda.
— Nossa! Você está linda — digo, de queixo caído.
Nada ficaria feio em Jessica, ela é linda e tem um corpo que até com
trapos ficaria lindo.
— Você achou? Devo comprar? — ela me pergunta, mas os seus
olhos buscam a aprovação de Lucas pelo reflexo do espelho.
— O que achou Lucas? — pergunto, vendo o rosto de Jessica se
iluminar.
— Não tinha como não ficar lindo — ele responde, dando uma
piscada de olho.
— Você vai arrasar na festa, compre sem medo — a encorajo.
— Agora é a sua vez, prove o vestido! — Agora foi a sua vez de me
empurrar até o provador.
O vestido havia ficado perfeito, eu giro várias vezes em frente ao
espelho, mas o valor ainda me incomoda.
— Samanta, saia, quero ver — Jessica grita, batendo na porta ansiosa.
— Estou saindo! — Abri a porta, o tecido era tão leve e confortável
que eu me sinto nua.
— Jesus! — Ela me encara boquiaberta. — Ficou magnífico.
Lucas levanta os olhos e me olha surpreso.
— Eu sabia que ficaria linda, mas não imaginei que ficaria tanto.
— Vamos levar os dois! — Jessica exibe o seu cartão black, imagino
que seja importante pela olhada que a vendedora deu.
— Não tenho como levá-lo hoje, venho outro dia! — Volto para o
provador e o tiro com pressa, porém com cuidado, Deus me livre danificar o
vestido.
— Samanta, me deixa pagar para você… — Ela faz um bico
manhoso.
— Não, sério, Jessica.
— Pagarei por ele, aceite, é um presente meu. — Lucas tira a carteira
do bolso.
— Não precisa mesmo, sério, volto para pegá-lo outra hora.
— Então leve e me pague de volta outro dia.
Antes que eu pudesse recusar novamente, o papel havia saído da
maquininha confirmando o pagamento.
— Vou deixar vocês em casa — Lucas fala quando chegamos ao
estacionamento do shopping
— Não precisa, eu pego um táxi. — Dou sinal com as mãos para que
ele não insista mais.

***

— Senhorita, tem um carro nos seguindo e dando sinal para que eu


pare, conhece a pessoa do carro? — O motorista do táxi pergunta,
preocupado.
Viro-me de imediato e reconheço o carro de Leonardo.
— Não sei quem é, pode continuar, ele deve estar nos confundindo
com outra pessoa! — Coloco os fones de ouvido e encosto a cabeça no
banco, eu sei que teria que encará-lo, mas não seria agora.
Uma freada brusca me joga para frente, olho assustada e um frio
passa pela minha espinha, o carro de Leonardo está atravessado na via e ele
anda na nossa direção.
— Saia do carro, Samanta — esbraveja irado.
— Senhorita, é melhor falar com o seu namorado. — O motorista
destrava a porta.
Olho irritada para o motorista, pago a corrida e desço do carro em
seguida. Leonardo me arrasta pelo braço e me joga no carro, batendo a
porta com força.
— O que você está fazendo? Está louco? — grito, assim que ele entra
e esmurra o volante irado.
— Nunca mais me deixe falando sozinho, Samanta! — Os seus lábios
tremem.
— Então facilite as coisas, não tente explicar o que não tem
explicação! — Viro o rosto, para o lado oposto.
Ele fica em silêncio durante o caminho para então gargalhar.
— Onde está a graça? — Olho furiosa, ele ria do meu ciúme e sei que
está me achando patética.
Desço do carro e entro na casa, sigo direto para o quarto subindo as
escadas correndo, ouvindo os seus passos no meu encalço. Entro no quarto
e jogo a sacola com o vestido em cima da poltrona.
— Espera, Samanta! — Me sento na ponta da cama com os braços
cruzados em frente ao peito.
— O que foi? — indago afrontosa.
Ele inclina o corpo na minha direção apoiando as mãos na cama, me
inclino para trás até ter todo o seu corpo contra o meu. O seu dedo
indicador desenha os meus lábios e desce, acariciando os meus seios, o meu
corpo me trai e eu arfo em um beijo apaixonado.
— Você é a única — sussurra na minha boca. — Diga a ela que sou o
seu homem — para o beijo por alguns segundos para me encarar com um
sorriso sexy.
Torna a me beijar com mais intensidade, os seus lábios traçam um
caminho pelo meu pescoço, as suas mãos puxam a minha blusa, expondo os
meus seios, a minha intimidade lateja sentindo-o chupar os meus peitos. Ele
tira a minha calcinha e a sua mão alcança a minha intimidade.
— Leo — gemi o seu nome, arqueando as costas sentindo o prazer se
intensificar.
— Eu sou seu, minha menina — volta a sussurrar.
Ele intensifica o estímulo e entra sem aviso, um tremor correu pelo
meu corpo, gemendo tão alto quanto eu, nossos corpos em total sintonia.
— Você é uma delícia! — ele diz em um gemido. — Eu não quero
mais ninguém.
Leo volta a chupar um dos meus peitos, enquanto os seus dedos
brincam com o outro, ele levanta o meu corpo rápido e me senta de frente
para ele, pressionando o meu corpo contra a sua intimidade pela minha
cintura. Ele urra e eu estava tão perto quanto ele, o seu pau incha dentro de
mim, o meu corpo treme.
— Eu vou gozar — aviso em um gemido, sentindo que ele fará o
mesmo.
Deitamo-nos ofegantes um ao lado do outro.
— Seja a minha acompanhante amanhã.
— Me deixe terminar o estágio — ele suspira, derrotado.
— Por que está dificultando as coisas? — indaga insatisfeito.
Deito-me com a cabeça no seu peito, ele me aperta nos braços e
acaricia os meus cabelos.
— Eu te amo, Leo — espero uma resposta, eu já havia me declarado
tantas vezes, ele levanta o corpo me deixando por baixo dele e toma os
meus lábios com ternura.
25
Uma puta

Samanta Antonelli

Ouço vozes vindas da sala quando saio do banho, não é algo normal,
aqui sempre é muito silencioso, barulho só quando faço. Coloco um vestido
soltinho e deixo os cabelos soltos, percorro as escadas ainda tentando
identificar o que está acontecendo, no meio do caminho vejo Leonardo
sentado à mesa com a “Chatielle” e outro homem que eu já vi algumas
vezes com ela na empresa.
Pensei em voltar para o quarto devagar sem ser notada e nos meus
primeiros passos ouço Leonardo me chamar.
— Samanta, aonde está indo? — Olho por cima do ombro, me
virando em seguida.
— Por que não me disse que você teria visitas?
— São as suas visitas também, vem, vamos para sala. — Estica o
braço na minha direção, pegando a minha mão em seguida.
— Essa é minha noiva, que vocês queriam tanto conhecer — diz
orgulhoso.
Os olhos de Gabrielle se arregalam e percorrem para as nossas mãos,
ainda grudadas, ela retorna os olhos, me encarando, e espero o fogo dos
olhos dela me queimarem viva.
— Oi! — Aceno timidamente.
— Bom, Gabrielle você já a conhece, quanto a ele, o seu nome é
Sebastian, ele é irmão da Gabrielle.
— É um prazer, senhorita! — Ele me olha com malícia, me deixando
desconfortável.
— Sente-se, você deve estar com fome, vou até a cozinha pegar mais
suco para você — Ambos observam atentamente o cuidado de Leonardo
comigo, parecem não acreditar.
Movo a cabeça confirmando.
— Me deem licença, vou até o lavabo! — Chatielle vai atrás do
Leonardo, levanto meus olhos para vê-la sumir e suspiro em seguida.
— Pensando em ir atrás deles? — Sebastian fala quando estou prestes
a levantar.
— Por que eu faria isso? — indago, me acomodando na cadeira.
— Você deve saber que eles ficam — sorri malicioso.
— Que eles ficavam, sim, eu sei — o corrigi. — Mas não planejo
fazer uma lista de todas as mulheres que ele já levou para cama! — Dou de
ombros.
— Claro, eu, sendo você, também não estaria preocupado com isso,
quanto ele te paga para você dormir com ele? — Levanto os meus olhos
arregalados para encará-lo.
— Por quê? A sua irmã costuma cobrar por esse tipo de serviço? —
Umas das minhas sobrancelhas se arqueiam.
— Ela tem muitos benefícios, não é só sobre receber o malote depois
de uma transa, você sabe do que estou falando — sorri debochado.
— As coisas não funcionam assim entre a gente — tento mostrar
indiferença.
— Claro que não — zomba. — Posso ser muito melhor de cama do
que ele, você é jovem e muito gostosa, não se sente entediada?
Ele passa a mão pela minha perna por baixo da mesa, sobressalto
assustada.
— O que está fazendo? — grito.
— Eu também tenho dinheiro, quando acabar as coisas por aqui
podemos nos encontrar — alisa o meu braço.
— O que está acontecendo aqui? — Ele está muito próximo a mim
quando Leonardo retorna.
— Nada! — Sebastian sorri com deboche, levantando as mãos em
rendição.
— Samanta? — Inclina a cabeça, me analisando, e uma lágrima caiu
dos meus olhos. — Seu filho da puta! — O barulho da jarra de suco se
mistura ao som do nariz de Sebastian sendo quebrado, Leonardo está
descontrolado e não para de bater, mesmo com idiota caído no chão, com os
braços em frente ao rosto tentando se proteger.
— Leonardo, chega! Você vai matá-lo! — Gabrielle grita, pulando
nas costas de Leonardo.
— Ajudem! — grito para os seguranças, que entraram apressados, foi
preciso três homens para tirar Leonardo de cima de Sebastian, que grita de
dor com as mãos no nariz.
Os seguranças levantam o homem do chão, Leonardo está sentado,
ofegante no chão, as mãos molhadas de sangue, ele levanta os olhos irados
e me encara.
— Que droga aconteceu aqui, Samanta? — esbraveja se levantando
zerando a distância entre nós.
— O que você acha que aconteceu? — grito tão alto quanto ele.
— Estou te perguntando o que aconteceu aqui! — Ele bate com a mão
aberta sobre a mesa.
— Você está me ofendendo, Leonardo! — Viro as costas indo para o
quarto com ele no meu encalço.
— Não pense que vai me fazer de idiota, Samanta! — Ele segura o
meu braço com força.
— Você está nervoso, comece a raciocinar direito — digo
entredentes, puxando o meu braço de volta e volto a andar para o quarto.
— Pare de andar, estou falando com você, não me deixe falando
sozinho.
— O que você quer? Quer que eu diga o que aconteceu? Ele achou
que eu era uma puta e me ofereceu dinheiro para ir para cama com ele!
Satisfeito? — Subo as escadas e bato a porta do quarto com força antes de
me afundar nos travesseiros.

***

Leonardo Milani

— Se acalma, Leonardo, você prometeu! — Sinto todo o meu corpo


tremer. — Como ele foi capaz de assediar a minha mulher dentro da minha
casa? Ninguém mais vai humilhar ela, depois de hoje as pessoas vão ter que
respeitá-la. Preciso me acalmar, hoje é o dia do evento.
Encho um copo com whisky, não muito, apenas o suficiente para
relaxar. Estou na casa anexo e apago depois de duas doses.

***
Acordo horas depois com o despertador, eu sou o anfitrião do evento,
não posso me dar ao luxo de atrasar. Apanho o telefone e encaro a foto de
Samanta nos contatos por alguns segundos e resolvo mandar uma
mensagem temendo que ele desista de ir ao evento.

Certifique-se de ser pontual


ao horário do evento,
estou te esperando lá.
Para Samanta

A resposta a minha mensagem veio de imediato.

Sim, senhor.
De Samanta

Sigo sozinho para o evento, Gabrielle já está no seu posto, eu não


esperava que ela viesse depois do ocorrido.
— Leo, me desculpe pelo meu irmão, ele achou que… — calou-se
mordendo o lábio.
— Ele não tem que achar nada na minha casa e muito menos ousar
olhar para a minha mulher, espero que ele não tenha vindo e providencie a
demissão dele do grupo Milani.
— Mas Leonardo! — exclama, descontente.
— O quê? Questionando as minhas ordens, Gabrielle? — Franzi o
cenho.
— Claro que não, irei providenciar a demissão.
— Perfeito! Vou dar uma volta pelo evento, me ligue se precisar de
algo.
Ando pelo evento e paro um pouco no jardim, a ansiedade está me
sufocando, eu preciso ver a Samanta. Fico observando as pessoas chegando,
alguns me veem e me cumprimentam, outros não me notam.
Volto para o salão de festa e afrouxo a gravata, ainda estou com raiva,
Gabrielle veio para o meu lado, recepcionando os convidados.
— Você não passou nada nas mãos. — Segura a minha mão e eu a
puxo rapidamente, eu estou tentando não ser indelicado, considerando os
nossos ótimos momentos, mas ela está pedindo.
— Você não precisa me tratar dessa forma, Leonardo, não fui eu
quem fez bobagens com a sua noiva — o seu tom de voz era desesperado,
certamente com medo de perder o cargo também.
— Eu sei, só quero evitar mais problemas com a Samanta, ela não
gosta de te ver tão próxima — um sorriso convencido surge no seu rosto.
— Ela sente ciúmes?
— Ela não precisa sentir ciúmes sabendo que ela me tem por
completo, na verdade, é só um desconforto de ver sempre alguém agarrado
ao que pertence a ela.
Ela limpa a garganta, se recompondo, e volta a atenção a recepção dos
convidados.
Alguns pescoços se viram para a entrada lateral, ouve um burburinho
e logo algo chama a minha atenção. Viro-me para checar do que se trata de
uma mulher deslumbrante cruza a porta em um vestido vermelho, sexy, que
marca cada detalhe do seu corpo, parece ter sido moldado para ela. Uma
fenda ia até o meio das suas coxas e o decote ressalta os seios de tamanho
médio, mas que eu amava tê-los dentro da minha boca, a minha mulher está
deslumbrante e cercada pelos olhares de leões famintos.
Ela percebe a atenção que recebe na entrada, um rubor sobe até as
suas bochechas, os nossos olhos se encontraram e ela desvia rapidamente,
caminhando para o lado oposto. Eu a sigo, mantendo uma certa distância,
pego uma dose de whisky da bandeja do garçom que passa na minha frente.
— Não me admira que esteja enfeitiçado, ela é realmente muito linda
e gostosa.
Não reconheço a voz atrás de mim e me viro para ver quem está
falando comigo. Sorrio sem humor, o ignorando e voltando a minha atenção
para ela.
— Ela trabalha na sua empresa? Será que gosta de homens mais
velhos? Poderia me apresentar para ela! — Trata-se de um dono de uma
rede de construtoras, ele costuma fazer altos investimentos no meu banco.
— Você sabe com quem está falando? — indago, com as
sobrancelhas juntas.
— Claro que sei — responde como se fosse óbvio.
— E acha que somos amigos para vir me contar sobre os seus desejos
e luxúrias?
— Não vi problema, já que estamos cobiçando a mesma garota.
— A garota em questão é sim muito gostosa, mas ela costuma gritar
pelo meu nome todas as noites na minha cama, então, se contente em
apenas babar por ela, porque caso contrário, não vou me importar de usar os
punhos novamente hoje.
Os seus olhos escorregam para as minhas mãos feridas e voltam para
o meu rosto, onde eu expunha um sorriso debochado.
— Me dê licença, senhor Milani — limpa a garganta, se recompondo.
— O senhor tem toda! — Retorno a minha atenção para a minha
mulher, que agora dança graciosamente no meio do salão ao lado dos
colegas de trabalho.
Fico hipnotizado com o seu ar doce de menina.
— Vai ficar o dia todo olhando para ela? Não é suficiente que a veja
em casa? — Gabrielle se aproxima, me tirando dos meus pensamentos. —
Você precisa subir no palco agora, cumprimentar os convidados e abrir
oficialmente o evento.
Faço um gesto positivo e caminho para o palco, parando na frente do
microfone assim que a música para de tocar.
— Boa noite a todos — digo e todas as atenções se voltam para mim.
— Antes de começar a falar, preciso que a minha noiva suba ao palco e me
acompanhe no evento.
Samanta levanta os olhos arregalados enquanto todos se questionam
quem poderia ser a noiva que ninguém nunca ouviu falar. As pessoas
movem os pescoços de um lado para o outro, ansiosos para conhecer a
eleita.
Vi Samanta dar vários passos para trás de certo ela iria correr em
alguns minutos
— Suba, Samanta, as pessoas querem te conhecer — os seus olhos
voltam a me encarar arregalados, mas os seus pés parecem estarem colados
no chão.
26
A minha noiva

Samanta Antonelli

— Noiva? Quando foi isso? — ouço os sussurros abismados ao meu


redor.
E eu não acredito que ele esteja fazendo isso! As minhas bochechas
queimam e um frio atravessa a minha espinha, dou vários passos para trás e
estou pronta para correr para longe.
— Suba, Samanta, as pessoas querem te conhecer.
Mesmo que Jessica e Lucas estejam ouvindo o meu nome, eles
acreditam que o nome seria uma coincidência, pois eles faziam o mesmo
movimento com a cabeça procurando ao redor. Leonardo desce e o vejo vir
na minha direção, os olhos de todos o acompanham, sacudo a cabeça
negativamente sem parar, estou a ponto de ter uma síncope, a sua mão agora
está esticada na minha frente, os meus colegas de trabalho me olham com
surpresa.
Leonardo me puxa pela mão, me levando até o palco.
— Por que não veio quando chamei e me fez descer para buscá-la? —
sussurra no curto caminho até o palco.
Seguro as lágrimas de pavor, os flashes me cegam, as várias perguntas
me deixam tonta.
— Quando foi o noivado?
— Quem é ela?
— Ela é herdeira de algum grupo?
— Como se conheceram?
Eram muitas perguntas, as minhas pernas tremem, sinto que não
poderei me manter de pé, o braço de Leonardo envolve a minha cintura e
mantém o meu corpo firme grudado ao dele.
— Não se preocupe com nada, apenas sorria — sussurra, me trazendo
segurança.
Forço um sorriso e lanço um olhar seguro.
— Teremos outra oportunidade para responder essas perguntas em
outra ocasião, hoje o nosso foco aqui é outro, eu apenas quis que ela
estivesse ao meu lado em um dia importante para todos.
Ele diz mais algumas palavras e dá oficialmente início ao evento.
Leonardo desce do palco sem largar a minha mão, eu tento me livrar do seu
aperto, mas os seus dedos pareciam uma algema, quando mais força faço
para me livrar, mais eles me apertam.
— Parabéns, não nos convidou para o noivado! — Leonardo para ao
cumprimentar o homem acompanhado da esposa.
— Ainda não fizemos uma festa, não se preocupe, serão convidados
— sorri simpático, sem prolongar a conversa.
As pessoas continuam nos analisando, ou melhor, me analisando.
Leonardo não solta a minha mão, embora ele não tenha parado um minuto
desde que descemos do palco.
— Leonardo, preciso que venha um minuto. — Gabrielle vem na
nossa direção com uma prancheta nas mãos para lembrar a Leonardo as
suas obrigações no evento.
— Aconteceu alguma coisa?
— Não, alguns empresários esperam você na sala vip.
— Tudo bem, será rápido, minha linda! — Me beija rápido nos lábios
e acompanha a Gabrielle em seguida por um corredor na lateral do salão
principal.
Eu me sinto deslocada, um frio percorre a minha espinha e sinto os
olhares me queimando. Sento-me em uma mesa afastada, a única que está
vazia, eu não acho o Lucas e Jessica e os minutos se arrastam.
— Com licença, se importa se eu me sentar? — Um homem alto, com
alguns cabelos grisalhos, se aproxima.
Dou de ombros e ele senta em uma cadeira depois da minha.
— Você é linda, não me admira que o Leonardo tenha resolvido
assumir um compromisso.
Olho por cima do ombro e viro o rosto para o lado oposto, torcendo
para que ele pare de interagir.
— Você não parece ser o tipo de mulher que aceita dinheiro para sair
com alguém. — Volto a encará-lo, os meus olhos disparam ódio por ter
mais um que pense que sou esse tipo de mulher.
— Calma, não estou querendo te ofender! — Levanta as mãos. —
Todos sabemos que o Leonardo só tem esse tipo de relacionamento, vocês
não devem ter se conhecido de maneira diferente, se eu tivesse te
conhecido, teria feito o mesmo, você deve ser bem gostosa para deixar um
cara feito ele doido assim. — Ele desenha os próprios lábios com o dedo
indicador, me olhando com luxúria, eu estou preste a me levantar quando
ouço a voz de Leonardo.
— Algum problema, Samanta? — os seus olhos estão fixos no
homem sentado à mesa, ele puxa a cadeira e senta entre nós dois.
— Milani. — O homem estende a mão.
— Chegou atrasado na festa? — Leonardo indaga, sem mover as
mãos para cumprimentá-lo.
— Não, cheguei bem cedo! — Dá de ombros.
— Então por qual motivo está aqui puxando conversa com a minha
mulher? — ele fala em um tom baixo, mas a sua mão treme sobre a minha.
— Não sabia que era tão possessivo — o homem à nossa frente sorri
debochado.
— Você nem imagina o quanto… — Leonardo aperta o ombro do
homem, as coisas acontecem rápido e discretamente.
— Com licença, vou me retirar. — Leonardo dá um tapa no seu
ombro, o fazendo sentar novamente.
— Fique à vontade, já estamos de saída! — Ele me levanta da cadeira
e caminhamos rápido até o carro, as suas mãos estão suadas.
— Você está bem? Por que está suando tanto? — Ele não me
responde, entra no carro em silêncio dirigindo rápido até a mansão.
— O que aconteceu, Leonardo? — O silêncio dele está acabando
comigo.
Ele estaciona nos fundos da mansão, desce do carro e abre a minha
porta, desço e depois ele fecha a porta com muita força em seguida.
— Vamos entrar! — Anda apressado, subindo pelas escadas e me
puxando pela mão.
— Leonardo, o que está acontecendo? — pergunto aflita dessa vez.
Ele abre a porta do nosso quarto, assim que entro ele me prende
contra a parede, me beija com muita necessidade.
— Estava doido para te jogar em uma parede e arrancar o seu vestido
com a boca! — Ele me dá leves mordidas pelo meu corpo que estremece.
— Você é minha, Samanta! — Ele abre em um flash o meu vestido,
que cai no chão, se abaixa e tira a minha calcinha com a boca.
— Abre as pernas para mim, Samanta — ele ordena e eu obedeço
Os seus lábios tocam a minha intimidade, uma onda de calor percorre
o meu corpo, procuro forças para me manter de pé, ele me levanta pela
cintura, me colocando sentada sobre cama, desabo o meu corpo sobre o
colchão, sinto os seus dedos me penetrando e a sua língua estimulando o
meu clitóris.
— Leo! — grito o seu nome, segurando no seu cabelo, pressionando
o seu rosto contra a minha intimidade, a sensação é incrível, o meu corpo
estremece, eu estava preste a ter um orgasmo, ele sente e levanta, colocando
o seu membro ereto para fora, e me penetrando.
— Gostosa — diz entre gemidos. — Goza para mim! — Ele nem
precisava pedir, o meu corpo explode e o prazer que me entorpece. — Isso!
Isso! Eu vou com você — urra dentro de mim.
Ele cai ofegante ao meu lado.
— O que deu em você? — Eu também estou ofegante e ele gargalha,
divertido.
— Você foi espetacular na festa, eu estava doido para ficar sozinho
com você.
— Não pense que não fiquei chateada por fazer algo que pedi que
não… — ele me impede de continuar colocando o dedo nos meus lábios de
forma sexy e tira, me beija explorando a minha boca com a sua língua.
— Quero que todos saibam que você é a minha mulher e que a
respeitem. Que eles te olhem e saibam que se cruzar o meu caminho eu não
vou deixar passar, aquele bastardo teve sorte de ter saído vivo daqui.
Eu queria sentir raiva, mas os seus motivos só me mostram que tudo
que ele quer é me proteger, eu já o amo e passo a admirá-lo cada dia mais.

***

— Você precisa comprar roupas novas, uns sapatos, precisa andar


como uma Milani — ele diz, assim que saímos do banho.
— O que tem de errado com as minhas roupas? — Giro em frente ao
espelho.
— Nada… Só não estão à altura da sua posição. — Ele me abraça por
trás olhando o meu reflexo pelo espelho.
— A partir de amanhã vou disponibilizar um carro e seguranças para
você e isso é para os seus gastos, eu já deveria ter dado ele a você — diz,
me entregando um cartão.
— Por que tudo isso? — Coloco o cartão sobre o aparador do quarto.
— Agora que todos sabem da nossa relação, você vai precisar dos
seguranças, do carro, roupas e sapatos, toda mulher gosta — sorri. — Estou
ansioso. — Alisa o meu ventre.
Os meus olhos se encheram de lágrimas, eu gosto de saber que ele
está confortável com o bebê.
— Eu te amo, sabia? — Me viro para ele, passando os meus braços
em volta do seu pescoço e ele se abaixa para me beijar.
27
Garota de programa

Samanta Antonelli

Acordo com vários beijos pelo meu corpo, me espreguiço abrindo os


olhos devagar.
— Bom dia! Já são dez da manhã, fiquei preocupado e vim ver se
estava viva! — Um sorriso divertido se forma em seus lábios.
— Nossa! Dez horas? Eu dormi demais! — Me espreguiço.
— Se apresse, estou te esperando para o café da manhã! — ele beija a
minha testa antes de sair do quarto.
Leonardo está fazendo o meu prato quando chego na sala, me sento
ao lado dele e ele me mima, me servindo. Encosto a minha cabeça no seu
ombro e ele para o que está fazendo para envolver o meu corpo com o seu
braço.
— Não se sente bem? — indaga, alisando os meus cabelos.
— Só me sinto cansada — respondo, manhosa.
— Deve ser da gravidez, as mulheres ficam bem cansadas, são os
hormônios. — Maria entra com um bolo de fubá que havia acabado de sair
do forno.
— Quer ficar em casa? — Alisa o meu rosto com delicadeza.
— Não, eu vou trabalhar! — Tomamos café da manhã e fomos para a
empresa.
— Ainda está cedo, vou encontrar a Jessica no refeitório — falo,
assim que ele estaciona na garagem do prédio.
— Certo, vou subir, tenho uma reunião em meia hora. — ele me beija
rápido e sobre sozinho.
Aceno de longe para Lucas e Jessica sentados juntos na mesa.
— Posso sentar?
— Claro, Samanta — Jessica responde sorrindo.
Lucas vira a cara chateado, eu imaginei que eles estariam, já que não
contei a eles sobre mim e Leonardo.
— Me desculpem! — Torço os lábios e junto as mãos.
— Estou chateado, você nos fez de bobo, poderia ter contado sobre o
Milani — Lucas fala, mal-humorado.
— Desculpa, eu não queria que me tratassem diferente, por isso não
contei — justifico com um olhar manhoso.
— Achei que nos considerasse os seus amigos — ele torna a falar
sério.
— Não exagera, Lucas, está tudo bem, Samanta, você teve os seus
motivos — Jessica fala, com um sorriso amigável.
— Lucas, me desculpa! — Faço biquinho.
— Amanhã já estarei melhor, não se preocupe — diz, ainda chateado
— Então me conta, como vocês se conheceram? — Jessica pergunta
curiosa e Lucas sorri.
— Por que as pessoas estão me olhando assim? — Sinto o meu
coração acelerar, quando noto os olhares e os cochichos dos funcionários
para mim.
— Não se preocupe com isso — a voz de Jessica era preocupante, ela
gagueja trazendo o meu rosto para ela.
— É por causa disso — Lucas joga o telefone na mesa, com notícias
sobre mim e o Leo.
Garota que está noiva do empresário Milani, teria o conhecido
durante um programa.
Empresário cobiçado, pensa em se casar com uma garota de
programa.
Tinham várias, mas todas diziam o mesmo. As minhas mãos tremem,
as lágrimas correm pelo meu rosto.
— Isso não é verdade, meus pais… eles vão ver isso! — Sobressalto
com desespero, como se eles estivessem na sala ao lado e eu pudesse correr
para vê-los.
Os meus olhos rodaram nos sorrisos debochados, a minha vista
escurece e eu não vejo mais nada que veio depois.

***

Leonardo Milani
— Mais que droga é essa que estão falando? — Bato na mesa com o
punho cerrado
Ligo para o meu advogado mandando que ele tire os boatos de
circulação.
— Quero que processe esses infelizes — esbravejo.
— Certo senhor, será feito! — Encerro a ligação.
— Droga, a Samanta já deve ter lido! — Ligo para o telefone dela e
rapidamente ela me atende.
— Samanta, onde você está? — pergunto ansioso.
— Senhor, é a Jessica — Me sento esperando pelo pior.
— Jessica? Onde está a Samanta? — a minha voz sai embargada.
— Estamos na enfermaria da empresa, ela desmaiou… — Não espero
ela terminar, encerro a ligação e corro para enfermaria.
— Minha linda, está tudo bem? — Corro para o seu lado,
encontrando-a acordada.
— Vou deixá-los sozinhos. — Jessica diz, saindo da sala, e confirmo
com a cabeça.
Samanta me abraça com desespero, as lágrimas correm pelo seu rosto,
ela soluça tentando falar.
— Já pedi que as notícias fossem retiradas, minha linda, não se
preocupe com isso, estamos juntos, vamos superar isso juntos! Eu não
queria te expor dessa forma, merda! — exclamo irado
Ela se afasta de mim, encostando a cabeça no travesseiro e olha para
o teto, ela inclina a cabeça para olhar o telefone que toca sobre a mesa de
apoio, mas deixa chamar até parar e já tem mais de trinta ligações dos pais.
— Não se preocupe, eu vou resolver isso — torno a falar.
— Se você não tivesse agido sem pensar, se tivesse feito o que eu te
pedi…
— Samanta, eu não me importo com nada que essas pessoas estão
falando. Estou preocupado com você.
— Sabe o que me dói, Leo, é que tudo que eles estão dizendo é
verdade, eu me sinto a pior pessoa do mundo.
— Samanta, o único miserável, aqui sou eu, e não é verdade, você
não é uma qualquer. Você é uma mulher respeitável, digna, eu sou o único
que vivia uma vida lamentável antes de você. Vamos marcar a data do
casamento, vou comunicar a imprensa e em seguida vamos até os seus pais.
Ela me beija, me dá um abraço longo e todo o meu medo e
insegurança vão embora. O medo de que ela me deixasse, de ser rejeitado
mais uma vez… eu não suportaria.
— Vou marcar o médico, quero saber como o meu filho está e você
precisa se acalmar, Samanta, por ele, certo?
— Obrigada por nos proteger.
— Como não o faria? Vocês são tudo que eu tenho. Vamos, vou te
levar para casa, consegue andar?
— Posso, sim, Leo — ela sorri com a minha pergunta.
Saímos de mãos dadas pelos corredores da Milani, quem eles pensam
que são? Todos têm que aprender a respeitá-la, agora ninguém se atrevia a
olhar na nossa direção.
— Meu amor, não abaixe a cabeça, isso tudo é seu, eles são seus
funcionários e se eles te irritam, nós podemos trocar todos! — ela ergue a
cabeça apertando o meu braço.
— Leo, e a sua reunião? Você pode chamar um táxi para mim, posso
ir sozinha — ela diz assim que chegamos no carro.
— E por que eu deixaria a minha mulher que carrega o meu primeiro
filho ir sozinha para casa? Nada é mais importe que vocês! — O telefone
dela toca novamente, ela encara o aparelho com o semblante caído.
— Vamos até lá — garanti.
— Onde?
— Até os seus pais, vou pedir que eles preparem o jatinho e vamos lá.
— Quando?
— Agora mesmo se quiser.
— Obrigada — ela diz com um sorriso.
— Sou eu que agradeço por você não desistir de mim.
28
Foi você quem pagou pela hipoteca

Samanta Antonelli

Leonardo faz ligações remarcando as reuniões e compromissos


enquanto faço as nossas malas.
— Não coloque muitas coisas, se precisar compramos por lá — diz,
interrompendo a ligação.
— Tudo bem! — Fecho a mala com o que já tinha colocado.
— Está tudo pronto? — Acenei positivamente.
— Então vamos.

***

Em menos de duas horas já estávamos na cidade onde os meus pais


estão morando, eu estou com muitas saudades e queria muito vê-los, mas
não nessas circunstâncias.
— É aqui? — indago quando ele estaciona em frente a um prédio de
luxo.
Ele abaixa os óculos escuros e olha o número do prédio.
— Sim, é aqui, minha linda.
— Então vamos logo, estou com muita saudade! — Desço
entusiasmada, esquecendo o motivo que me levou até lá.
Leonardo desce em seguida, os meus olhos brilham, como é lindo.
— Por que está me olhando assim? — Me abraça, beijando o topo da
minha cabeça.
— Não é nada, só estou vendo o quanto você é lindo — ele gargalhou
e se inclina para me dar um beijo rápido.
— Vamos subir — ele suspira, pegando na minha mão.
Nós já havíamos avisado estarmos vindo para a cidade, então os meus
pais já nos esperam.
— Vai ficar tudo bem, vamos explicar tudo a eles. — Leonardo
envolve os braços ao redor do meu corpo, e eu mordo os lábios, suava como
se estivesse em frente a uma fogueira.
— Filha — a voz da minha mãe na porta do elevador fez as minhas
pernas tremerem.
Estou envergonhada, eu tinha medo do julgamento deles, mas
Leonardo aperta a minha mão me encorajando a sair do elevador.
— Como você está? — ela me abraça em lágrimas.
— Estou bem mãe — digo dentro do seu abraço mágico, todo medo
havia ido embora.
— Entrem, devem estar cansados — Entramos e o meu pai está de
costas olhando a janela.
— Pai? — falo com a voz embargada
Ele se vira vindo na minha direção, a cena parecia rodar em câmera
lenta na minha cabeça, ele levanta a mão acertando o meu rosto com força
suficiente para me levar ao chão.
Seguro a perna de Leonardo que avança furioso na minha defesa.
— Leonardo! — grito e ele volta a sua atenção para mim, me
levantando do chão, a sua mão treme e ele segura forte a minha.
— Como pode vender o corpo por dinheiro? — o meu pai esbraveja,
andando de um lado para o outro com as mãos na cabeça.
— Pai, eu não fiz nada de errado! — digo com a voz embargada.
— Não? Está em todos os locais, onde me viro tem pessoas falando
de você, eu sinto vergonha, não tenho coragem de sair de casa!
Não era como se alguém nessa cidade soubesse que ele é meu pai.
— Prefere acreditar no que estranhos escrevem do que acreditar na
sua filha?
— Você é um desgraçado, que abusou da minha filha, foi você quem
pagou pela hipoteca! — dispara o meu pai acusando Leonardo.
As palavras atingem Leonardo como um soco e as suas pernas
vacilam.
— Do que está falando? — A sua respiração acelera e ele gagueja
nervoso, como eu nunca havia visto.
— Pai, Leonardo não tem nada a ver com isso — digo em meio às
lágrimas.
— Então você anda se vendendo para outros homens?
— Pai!
— Eu paguei pela hipoteca da casa, a Samanta é minha noiva e vamos
nos casar, tudo que é meu pertence a ela também! — agradeço por
Leonardo tomar a responsabilidade para ele naquele momento. — Senhor,
tenho as melhores intenções com a sua filha.
— Se casem e acabem com a minha vergonha! — Olho nervosa para
Leonardo, que tenta não se alterar.
— Me casarei hoje, agora, se for a sua vontade. Vamos até um
cartório, me casarei com ela.
— Agora? — Arregalo os olhos.
— Sim, minha linda, se isso deixa o seu pai tranquilo, podemos fazer.
— Vocês acabaram de chegar de viagem, se sentem, descansem — a
minha mãe alisa os braços do meu pai, tentando acalmá-lo enquanto dirige a
palavra para mim e Leonardo.
Sentamo-nos, o ar estava denso, o meu pai encara Leonardo como se
ele tivesse algo mais a falar.
— Como está o meu irmãozinho?
— Ele está ótimo, acredito que terá alta e poderemos voltar em breve,
ele continuará o tratamento com um médico em São Paulo — a minha mãe
suspira aliviada.
— Isso é ótimo, eu sinto muitas saudades de vocês — sorrio sem
humor, uma lágrima solitária escorre pelo meu rosto.
— Não pense que te abandonamos, você precisou amadurecer cedo
por conta de toda a nossa dificuldade, mas ainda é a minha menina linda. —
A minha mãe levanta, se sentando ao meu lado e me envolve nos seus
braços.
— Meu filho, e os seus pais? Quando vai nos apresentar? —
Leonardo levanta a cabeça rápido, um lado da sua boca se ergue e ele
mordeu o lábio nervoso.
— Não tenho pais para apresentar… — Foi a primeira vez que eu o vi
falar sobre isso com dor.
— Eles morreram? Me desculpe — ela diz, nervosa.
— Não precisa se desculpar, eu não os conheço, cresci em um
orfanato, fui adotado, mas não me dou bem com os meus pais adotivos. —
ele toma uma postura defensiva, era um assunto delicado e eu só queria que
a minha mãe parasse. Mas os seus olhos se encheram de lágrimas e ela
continua.
— Nossa, você deve ter se sentido muito sozinho — a sua voz sai
embargada.
— Mãe, estamos com fome, vamos comer algo? — Mudo de assunto
tão rápido quanto pude.
— Claro, vamos até a cozinha, marido me ajude! — Ela arrasta o meu
pai carrancudo com ela.
— Você está bem? — Me viro preocupada para Leonardo.
— Sou eu quem tem que te fazer essa pergunta, minha linda… — As
suas mãos alisam o local onde levei o tapa. — Você tem passado por
momentos difíceis por minha causa, me perdoe! — Ele me abraça e me
beija rápido nos meus lábios. — Iremos voltar casados, ok? — Ele segura o
meu rosto entre as suas mãos usando o polegar para alisar as minhas
bochechas.
— É isso que quer? — indago, sem desviar os olhos dele, que sorri.
— Como pode me fazer tal pergunta após ser tão julgada? Claro,
quero me casar com você e que o meu filho tenha o lar que eu não tive.
— Eu te amo — sussurro pausadamente.
O seu rosto se ilumina, não era como antes que ele ficava nervoso
com as palavras, aos poucos ele vai se acostumando, aquele homem frio e
arrogante ia dando lugar a um homem amável.

***

Leonardo Milani

A Samanta sai para dar uma volta com a mãe e me deixa sozinho com
o seu pai, ele me encara com raiva e evito falar, não quero piorar as coisas
entre Samanta e o pai.
— Como convenceu Samanta a ficar com você em troca da hipoteca?
— Levanto os olhos para encará-lo.
Baixo a cabeça e fecho os olhos, eu deveria apenas me manter em
silêncio, quanto menos eu falasse seria melhor.
— Minha filha devia estar muito desesperada para aceitar isso… —
Vejo a raiva nos seus olhos se transformarem em remorso.
O que ele sabia sobre isso?
— Não sei do que está falando, senhor, as coisas parecem distorcidas
na sua mente.
— Acha que não sei, que é dono do banco onde eu tinha a hipoteca?
Demorei para associar, como um mero faxineiro não fui capaz de te
reconhecer.
— Nunca obriguei a Samanta a nada, se é disso que está me
acusando.
— Sou idiota, fiquei sabendo agora pouco depois do anúncio do
noivado, as pessoas parecem bem interessadas em falar tudo que sabem
sobre o novo casal. Eles nem sabiam que ela era a minha filha, mas falam
sobre os seus relacionamentos. — ele se refere aos funcionários da filial que
ele está trabalhando. — Você deu ordem para que fizessem a cobrança da
dívida com a ordem de despejo e induziu a minha filha a dormir com você.
O meu corpo treme, eu não iria admitir, mas ele parecia ter certeza e
essa informação deve ter vazado depois do anúncio do noivado.
— Senhor, me perdoe pelo que fiz, não conte a Samanta, ela não sabe
que era eu naquele quarto — imploro.
— Seu bastardo infeliz, ainda tem coragem de me pedir isso? Você
está enganado a minha filha? Ela nem sabe o tipo de pessoa com quem vai
casar! Enganar os outros por motivos egoístas está na natureza humana,
mas nunca imaginei que seria tão baixo com uma garota.
— Eu sei que o que fiz foi errado, eu praticamente a obriguei diante
das circunstâncias, eu não me sinto bem por isso, mas eu realmente gosto da
sua filha.
— Gosta? — ele me encara com desprezo.
A minha boca treme, o meu coração aperta, não gosto dela, sou louco
por ela e apaixonado, ou talvez seja tudo junto.
Eu a amo, grito na minha mente, percebendo que todas essas palavras
se resumem em uma única frase.
— Eu gosto muito! — digo, omitindo o que sinto como um covarde.
— Me perdoe, me permita casar com a sua filha, vou fazê-la feliz, eu
prometo.
— Acha que ela nunca vai descobrir? Nada fica escondido por muito
tempo, arrume uma forma de contar para ela! Se realmente a ama, faça isso
logo.
— Obrigado — digo com um suspiro.
A porta da sala se abre, Samanta volta mais rápido do que eu
esperava, me recompus voltando a sentar no sofá.
— Aconteceu alguma coisa? — ela me olha preocupada, sentando-se
ao meu lado. — O meu pai… Ele falou algo ou fez alguma coisa? Vocês
brigaram?
— Não, minha menina, está tudo bem, nós apenas conversamos. —
Aliso o seu rosto.
— Por que está com essa cara e suando desse jeito? Nunca te vi tão
tenso.
— O seu pai me dá medo, minha linda — forço um sorriso.
— Bobo, desde quando tem medo de alguma coisa? — Bate no meu
peito com um sorriso divertido.
— Desde do momento em que te conheci, tenho medo de ficar
sozinho novamente — fui sincero, me declarando.
— Eu nunca vou te deixar, prometo — levanta a palma da mão
enquanto faz a promessa.
Ela é todo o meu mundo e não permitirei que a tirem de mim.
29
Eu a amo!

Samanta Antonelli

— Vamos amanhã até o cartório e nos casamos, esperamos os seus


pais voltarem para São Paulo com o seu irmão, então faremos uma festa.
— Não precisa correr, Leo, podemos esperar até que os meus pais
voltem e faremos tudo em um só dia.
— Samanta nos casamos amanhã, já está decidido.
— Tudo bem, então faremos amanhã.
— Samanta tem certeza de que o ama? Tem certeza de que o conhece
o suficiente para se casar? — O meu pai senta em uma poltrona na nossa
frente. — Sugeri o casamento no calor do momento, mas é a sua felicidade
que está em jogo.
O semblante do Leonardo se fecha ficando sério, ele está com um dos
seus braços em volta do meu corpo e eu seguro uma das suas mãos, sinto os
seus músculos ficarem rígidos.
— Pai, claro que o amo — respondo, como se fosse óbvio. — Quero
me casar com o Leonardo. — sorrio nervosa.
— Como se conheceram? — O seu olhar me estuda.
Consigo ouvir o coração acelerado de Leonardo, a sua respiração está
cada vez mais pesada.
— Filha, não se sinta pressionada, o conheça primeiro e vocês têm
tempo — ele levanta a hipótese de descartar o casamento.
— Tempo de quê? De nos casarmos depois que o bebê nascer? —
Existe deboche e irritação no tom de voz de Leonardo.
— Bebê? — Os meus pais falam juntos.
Sinto o meu sangue fugir do meu corpo, por que ele fez isso?
— Por que não nos contou que está grávida, Samanta? — Vi a
decepção nos olhos da minha mãe.
Encaro Leonardo com raiva e ele encolhe os ombros.
— Se é dessa forma, então é bom que se casem — o meu pai suspira
derrotado.

***

Leonardo Milani

Samanta dorme tranquila no quarto e eu estou na varanda da sala


pensando em como falar a verdade para ela, sinto medo mais uma vez, eu
não quero perdê-la, mas não posso apagar o que aconteceu.
— Já sabe como vai contar? — O pai da Samanta me tira dos meus
pensamentos.
— Preciso de um tempo… — Olho rapidamente para ele e volto a
minha concentração para o nada.
— Você a engravidou de propósito? — Me pergunta entredentes e
claro que ele pensaria isso.
— Eu não faria isso, ela não sabe que o filho é meu.
— Não faria? Não sabe como se evita os bebês? Não é um
adolescente, é um homem.
— Não foi planejado — digo de forma mais dura.
— Você sabe quantos sonhos a Samanta tem? O quanto se esforçou
para estar na faculdade?
— A Samanta não precisa deixar a faculdade, ela terá pessoas para
cuidar do bebê para que ela estude, quanto a sua carreira, não se preocupe,
ela está estagiando na minha empresa e eu vou fazer com que ela viva da
melhor maneira.
Estou disposto a dar a ela muito mais do que eles poderiam, eu acho
que ele não entendeu ainda.
— Você a ama?
— O que o senhor chama de amor? — Me viro para encará-lo.
— É cuidar, querer estar perto, sorrir feito bobo, mas acima de tudo é
respeitar e ser honesto, não é amar porque precisa e sim precisar porque
ama — sorrio quando ele pronúncia a última frase.
— Certo dia, Samanta me disse que as pessoas amam porque
precisam e que amar é mais sobre dar do que receber, a sua filha é muito
sábia para idade. Eu sempre achei que precisaria dela a todo custo.
— E em que conclusão chegou?
— Continuo achando que preciso dela a todo custo, preciso muito
dela e não espero receber nada em troca, eu ficaria feliz e satisfeito, talvez
orgulhoso por receber, mas ela desperta em mim a vontade de dar e não falo
de dinheiro ou objetos luxuosos, ela nunca me pediu nada disso.
— Eu sei, ela nunca se importou com isso — fala orgulhoso da
educação que deu a ela.
— Quero dar o meu melhor todos os dias e esse é o ponto, eu preciso
dela porque eu a amo. Demorei para entender isso, porque eu nunca soube o
que era amor — as lágrimas ardem nos meus olhos, não permito que elas
caiam, mas eu me sinto aliviado por falar o que eu sinto.
Ele caminha lentamente, se encostando na parede varanda, sinto uma
leve batida no meu ombro antes que ele volte a falar.
— Estou confiando a minha única filha a você e não é pelo seu
dinheiro, nem pela sua posição social ou pela imensa ajuda que está dando
ao meu filho, e sim porque está disposto a fazê-la feliz.
— Obrigado, senhor, eu darei o meu melhor.

***

Estou sentado olhando Samanta dormir, eu consigo ver a barriguinha


se formando, sorri orgulhoso, imaginando ela com a barriga bem
redondinha.

— Meu filho! — Encosto a cabeça na poltrona, às vezes parece um


sonho, um sonho que eu nunca ousei sonhar.
Levanto-me e caminho até a cama, fazendo um carinho no seu rosto.
— Samanta, você já dormiu demais — sussurro ao me aproximar do
seu ouvido.
— Posso dormir mais um pouco… — Se encolhe puxando o lençol.
— Não, levanta, nós vamos nos casar — digo com sorriso na voz.
— O nosso casamento? — indaga com espanto.
— Espero que tenha esquecido devido ao sono, porque se me disser
que mudou de ideia levo você a força.
— Não seja dramático — sorri se levantando. — Nunca mudaria de
ideia! — corre até a sua mala, pegando-a, e começa a jogar as roupas de
dentro em cima da cama.
— Qual o problema? — indago notando o seu olhar insatisfeito.
— Não sei o que vestir, não vim pronta para isso! — Se joga na cama
suspirando derrotada.
Eu me jogo na cama ao lado dela e sorrio enquanto a encaro.
— Por que está rindo? — pergunta carrancuda.
Levanto-me pegando um pacote e a entregando.
— O que é? — analisa curiosa.
— Abra! — Me sento esperando a sua reação.
— Nossa! Que lindo! — É um vestido simples, branco que marcava
bem as curvas dela, mas ainda assim era bem-comportado.
— Fico feliz que tenha gostado, te prometo que na nossa festa te darei
algo melhor, mais luxuoso, como você merece.
— Leonardo, hoje é o nosso casamento oficial, depois de hoje serei a
senhora Milani — ela gargalhou. — Senhora? Senti-me velha! — torna a
rir. — Esse vestido é perfeito, e você é perfeito por sempre pensar em mim.
— Leonardo, o seu advogado está na sala — Lídia, a mãe da
Samanta, avisa da porta.
— Obrigado! — Me levanto indo até ele.
Eu havia pedido que o meu advogado pessoal viesse e resolvesse as
questões burocráticas.
— Tudo certo? — pergunto o encontrando.
— Sim, trouxe todos os documentos necessários para dar entrada no
casamento e aqui está o acordo pré-nupcial, acredito que o senhor irá
precisar de um.
— Não vou precisar — ele me olha espantado, mas não questiona
guardando o documento de volta na pasta. — Já que está tudo pronto, me dê
licença, pois tem um casamento me esperando.
30
Acabou!

Samanta Antonelli

Encaro a minha certidão de casamento algumas vezes durante o


caminho, ainda me custa acreditar que eu era uma mulher casada.
— Queria que você me olhasse da mesma forma que está encarando
essa certidão — Leonardo diz enquanto dirige de volta para casa.
— Eu nunca pensei que fosse me casar tão jovem, achei que
demoraria para achar alguém com quem eu quisesse passar toda a minha
vida.
— Chegamos, senhora Milani.
— Que bom chegar em casa, estava com saudades da minha cama.
— Só da cama? — ele pergunta com um sorriso malicioso.
— Samanta! — Me viro em direção de onde ouço falarem o meu
nome.
— Davi, que surpresa! — Vou até ele.
— O que veio fazer aqui? — Leonardo pergunta de cenho franzido.
— Vim ver a Sam — responde olhando para mim. — Você se casou?
— Levanto a minha mão.
— Sim, hoje. Mas vamos fazer uma festa e você será convidado.
— Desejo que você seja muito feliz, Sam! — Beija a minha testa. —
Podemos conversar? — pergunta, olhando para Leonardo.
— Vamos entrar. — Anda na frente com Davi no seu encalço.
— Então eu vou subindo — digo, assim que cruzamos a porta da sala.
Eles vão até o escritório e eu os sigo, estou curiosa para saber o que
eles iriam conversar, então fico espiando pela brecha da porta.
— A Samanta é massacrada pela imprensa e você faz um casamento
rápido, sem anunciar? — Davi diz, assim que entra no escritório.
— Você não ouviu a Samanta? Vamos fazer uma festa e convidar a
todos, será grandiosa e até em marte ela será comentada. Não se preocupe
com a minha mulher, ninguém vai se atrever a humilhá-la novamente.
— Acho bom que a faça feliz, mas vim aqui te dar um recado, os
meus pais querem te ver.
— Eles têm que mandar uma criança dar o recado? — indaga com
desdém.
— Eles te convidaram para um jantar amanhã à noite, lá em casa, leve
a Sam.
— O nome dela é Samanta e eu não estou interessado no que os seus
pais têm para falar, mas agradeça o convite por mim.
— Tudo bem, o convite foi feito — Davi dá de ombros.
— Do que precisam? — Leonardo pergunta.
— Talvez não haja interesse dessa vez — Leonardo sorri.
— Davi, você é só um menino, não tem culpa dos pais que tem e se
não fosse esse pequeno muro entre nós, poderíamos até ser amigos! Você é
um menino bom, quando não está dando em cima da minha mulher.
— Não quero ser seu amigo — Davi responde com desdém.
— Avise aos seus pais que não tenho interesse no convite e se eles
quiserem falar de negócios, que marquem uma hora e vão me ver lá na
empresa.
Corro, subindo as escadas com pressa quando vi Davi se aproximando
da porta. Disfarço abrindo a mala quando ouço Leonardo entrar no quarto.
— O que você acha que pode ser? — O seu tom era sério.
— Do que está falando? — Finjo não entender a pergunta.
Ele me puxa pela mão, nos sentamos na cama.
— Eu sei que estava ouvindo a conversa — diz divertido
— Fui descoberta? — Mordo o lábio inferior.
— Podia ter entrado no escritório se estava curiosa — sorri,
encostando o queixo no meu ombro e deitando a cabeça sobre ele em
seguida.
— Me desculpe, eu não deveria ter escutado a conversa dessa forma
— ele leva a minha mão até a boca a beijando em seguida.
— Eu tentei várias vezes me aproximar deles, eles eram a única
imagem de família que eu tinha… — os seus olhos ficam marejados.
— O que aconteceu entre vocês? — Me viro ficando de frente para
ele, eu sempre quis saber o que havia acontecido.
— Eu senti um certo acolhimento até uma certa idade naquela casa,
mas nunca me senti amado, eles me tratavam bem, porém, sempre via os
olhos tortos quando eu fazia alguma travessura de criança. Não posso
afirmar que as coisas mudaram com a chegada do Davi, mas minhas
recordações só pioraram durante a gestação, sempre me trancavam em um
pequeno quarto escuro, fome, desprezo… — uma lágrima corre pelo seu
rosto e ele se cala.
— Não, precisa falar se não quiser.
Mas ele continua:
— Eu era uma criança, queria ter pais e me sentir como qualquer
outra criança, eu não sei o que mudou ou que fiz de errado.
— Já pensou em tentar descobrir quem são seus pais verdadeiros?
— Não! Eles não me quiseram, por que eu iria querê-los? — Ele deita
na cama com as mãos atrás da cabeça, me deito ao seu lado, passando uma
das mãos pelo seu corpo o abraçando.
— Prometa que não vai me deixar, Samanta. — Ele encara o teto.
— Eu prometo.

***

Sigo a minha rotina, saindo da faculdade e indo para a Milani,


Leonardo havia deixado um motorista a minha disposição, ele disse ser
mais seguro agora que algumas pessoas conheciam o meu rosto dos sites de
fofoca.
— Como você está, Samanta? — Jessica pergunta, me encontrando
na Milani.
— Estou bem, passei dois dias na casa dos meus pais, cheguei ontem.
— Você viu a nota que saiu sobre você?
— Não vi, me mostra! — Espero ela abrir o site ansiosa.

O Solteiro mais cobiçado não está mais disponível, ele


oficializou o matrimônio em cartório, de forma privada
apenas para familiares. A festa de casamento promete ser
luxuosa e glamourosa.

— Olhando para sua mão, vejo que foi verdade — ela diz, pegando o
celular de volta.
— Sim, é verdade — sorri.
— Onde está o Lucas?
— Ele está doente, não vem hoje, vou passar na casa dele, quando
acabar o expediente e te deixo informada.
— Tudo bem, obrigada, agora preciso subir.
— Tchau, amiga, nos vemos no horário de almoço! — Acena com a
mão.
Na minha sala, as coisas mudaram, as pessoas já não me encaravam,
embora os olhares pelas minhas costas me queimassem, eu queria muito
evitar isso, mas agora que todos já sabem, me sinto até aliviada de não
precisar esconder nada.
— Samanta. — Gabrielle acena da porta me chamando.
— Oi, achei que já tinha ido embora — digo me aproximando.
— Estou indo hoje, podemos conversar um pouco?
— Claro! — Nos sentamos em umas poltronas que fica no corredor.
— Parabéns pelo casamento, você deve estar bem feliz! — Tudo nela
soava falso.
— Obrigada, faça uma ótima viagem de volta — respondo, com a
mesma falsidade.
— Agradeço, mas antes me conta uma coisa, como conheceu o
Leonardo?
— Parece que essa pergunta virou obsessão das pessoas! — Reviro os
olhos e ela sorri igual a uma cobra venenosa.
— O Leonardo não é do tipo que se envolve com alguém por acaso e
claro que isso iria gerar curiosidade.
— Mas para tudo a uma exceção, não nos conhecemos em um
programa se é isso que quer saber.
— Conheço o Leo há muito tempo, Samanta. Eu te analisei por um
tempo e você realmente quer me convencer de que se cruzaram por mero
acaso?
— Mas foi exatamente dessa forma — a minha voz já está alterada.
— Pense, Samanta, não aconteceu nada de anormal com você antes?
Problemas familiares, financeiro… pense bem — ela insiste.
— Por que está me perturbando com isso, Gabrielle? — Me levanto
irritada.
— Você parece ser uma boa garota e que não sabe quem é o
Leonardo. Primeiro ele investiga a vida de quem ele quer, segundo ele acha
um ponto franco, terceiro ele a deixa sem saída e por último você cede. É
desta forma que funciona o jogo dele, Samanta.
— Por que está me dizendo isso?
— Só para não ser enganada por tanto tempo, que se resolver ficar
seja porque quis e não por que não sabia a verdade, agora preciso ir para
não perder o voo. Não fique desapontada, eu já fui uma peça nesse jogo, só
não sou uma garota boba igual a você, eu também sei jogar — diz, se
levanta e sai.
Fico olhando ela sumir no imenso corredor… E se ela tiver razão?
Não, Samanta, isso é loucura, vocês se conhecem do café e uma coisa não
tem nada a ver com a outra ou tem?

Lembro do meu pai me perguntando se eu realmente conhecia o


Leonardo, balanço a minha cabeça afastando os pensamentos.
— Claro que você o conhece, Samanta, ele tem demonstrado todos os
dias que te ama, pare de pensar nisso — digo para mim mesma, me
levantando.
Vou até a copa, pego água e volto para sala, os burburinhos
continuam, essa situação é bem irritante e eu sinto falta de Lucas
conversando bobagens comigo.

***

O expediente acaba e Leonardo aparece na minha sala pegando todos


de surpresa, inclusive eu.
— Já terminou? — Ele encosta na minha mesa.
— Ainda não, me distrai hoje.
— Sério? O que deixou a minha esposa distraída?
— Nada muito importante — finjo um sorriso.
— Deixa isso aí, vamos comer que o meu filho deve estar com fome!
— Ele me levanta suavemente da cadeira pelos ombros.
Entramos no carro, os meus pensamentos não me largam e eu olho,
estudando-o.
— Aonde quer ir? — ele pergunta antes de dar partida no carro.
— Fique à vontade para escolher! — Ele dirige até um cake shop.
— Vai comer doces no jantar? — Olho confusa.
— Vamos apenas comprar alguns, me parece que você precisa deles
hoje, você estava bem hoje pela manhã, o que aconteceu?
— Não tenho nada — minto, ainda com as palavras da Gabrielle na
minha mente.
Ele sai do carro e volta com algumas caixas.
— Tantos? — Arregalo os olhos.
— Vou fazer o sacrifício de comer com você — sorri para mim,
colocando as caixas no banco de trás.
Suspiro sentindo o coração apertar.
— Leo, quando foi que me viu pela primeira vez? — pergunto assim
que ele sai com o carro.
Ele tira os olhos da estrada com o cenho franzido e me encara.
— No café, Samanta, por que essa pergunta?
— Por nada — forço um sorriso.
Ele para o carro em um acostamento e olha bem nos meus olhos,
tento desviar o olhar, mas ele segura o meu queixo entre os dedos.
— O que está passando pela sua cabeça, minha menina?
— Você me esconde algo? — A sua feição muda e a sua respiração
ficar acelerada, ele tira os olhos do meu.
— Sei pouco do amor, mas tenho dado tudo de mim a você — ele
morde o lábio e volta a me encarar.
— Você me esconde algo? — insisto.
— Eu não quero te perder, Samanta. — Ele abaixa a cabeça, sobre as
mãos que estão no volante.
Os meus olhos se encheram de lágrimas e um nó se forma na minha
garganta.
— O que você está me escondendo? — Uma lágrima corre pelo meu
rosto e uso o dedo polegar para enxugá-la.
— Vamos para casa e conversaremos.
O silêncio foi o nosso companheiro durante o caminho, ele em alguns
momentos tira uma das mãos do volante e alisa os meus cabelos. Imagino o
que poderia ser, o que ele havia escondido. Desço do carro sem esperá-lo e
sento no sofá e o esperando entrar.
— O que quer comer primeiro? — indaga abrindo as caixas sobre a
mesinha de centro na sala de estar.
Puxo a sua mão e ele senta ao meu lado, a sua expressão é de
preocupação, eu aliso o seu rosto, posso sentir a sua hesitação. Ele segura a
minha mão entre as suas e a beija fechando os olhos, em seguida a
segurando contra o seu rosto.
— E se você não me perdoar? — A sua voz sai embargada.
— O que você fez? — Eu já não reprimia as lágrimas que caiam
livremente.
— Eu te vi pela primeira vez no café, aliás você voltava apressada
para ele, eu nunca tinha sentido o que senti quando eu te vi, juro, você me
hipnotizou — sorri sem humor.
— E? O que fez depois disso?
— Fiz o que o meu instinto sempre me levou a fazer, eu queria ter
você, eu sou idiota, Samanta, eu poderia ter dado flores e chocolates, ter te
chamado para sair e ter sorrido com você em uma praça da cidade,
poderíamos ter nos beijado sob a luz da lua.
— Você não fez isso, me cercou no café, me seguiu até a boate e
esperou o melhor momento? — Sugeri a resposta que seria aceitável para
mim.
— Sou o pai biológico do filho que você está esperando — a voz dele
sai embargada.
— Como assim? — Sorri tentando processar a informação.
— Eu não imaginei que você não fosse me reconhecer, eu sei, estava
escuro, você não me viu, mas sei lá… talvez reconhecesse a minha voz…
— ele dá de ombros.
— Você faz ideia de como eu estava naquela noite? Acha que eu iria
lembrar da sua voz? Quantas palavras você trocou comigo, três? Quatro?
Eu não conseguia nem ouvir a minha respiração, eu estava nervosa e a
minha mente se fechou. Você deveria ter me dito, você teve oportunidade,
Leo, eu tive medo de te falar que estava grávida de outro e o filho é seu? —
Levanto e ando de um lado para o outro, tentando processar tudo que eu
havia escutado.
— Eu deveria ter dito, mas eu ouvi você falar daquela noite com nojo,
com revolta, eu senti medo porque eu não quero te perder.
Ando em direção à escada, eu não quero mais ouvir nada, as suas
mãos se envolvem em volta da minha cintura, ele se agarra a mim, as suas
lágrimas escorrem pelo meu braço.
— Me perdoa, Samanta — diz em meio a soluços. — Fale alguma
coisa — ele implora.
— Eu queria te bater, queria gritar com você — digo entredentes.
— Então faça, só não me deixe! — Abre os braços esperando a minha
fúria.
— Acabou, Leonardo — digo já de costas, incapaz de encará-lo.
— Não, Samanta! Você disse que me ama.
— E eu o amo, o que acabou não foi o amor, Leonardo, e sim a gente,
o sentimento vale a pena, a gente não!
— Eu não vou te deixar ir embora, eu não sei como parar de amar
você.
— Você sabe o quanto esperei para você dizer que me ama? — Me
viro olhando nos seus olhos vermelhos.
— Eu te mostrei isso todos os dias — diz baixo.
— Você sabe o quanto eu me senti usada, do quão mal você me fez?
— Eu sei, me sinto culpado por tudo isso.
— Culpado? Se você fez, está feito, a culpa não serve de nada! É o
sentimento mais inútil de todos.
Desvencilho-me dos seus braços e subo para o quarto, era como se eu
estivesse vivendo tudo novamente, a sensação de me deitar com um
estranho, a vergonha de gemer naquela cama, eu me sinto suja.
— Como não o reconheceu, Samanta? — me pergunto enquanto ando
de um lado para o outro no quarto.
A resposta veio rápido, eu tentei esquecer aquela noite e não quis
lembrar daquela voz, não quis recordar do seu toque, eu não quis… me
lembrar de nada!
31
Não vá

Leonardo Milani

Acordo sentindo o meu corpo doer, eu estou agarrado a uma garrafa


de whisky no chão da sala, a minha cabeça lateja e sei que não é por conta
da bebida, estou mais que acostumado a beber e pensei a noite toda em uma
forma de fazê-la ficar. Levanto-me e subo para o quarto, preciso fazer com
que ela fique!
— O que está fazendo? — Samanta arruma a mala aberta sobre a
cama.
— Vou para a casa dos meus pais — diz, sem me encarar.
— Somos casados, Samanta, você está grávida de um filho meu! —
digo tentando fazê-la repensar.
— Eu não quero ficar, preciso de espaço — sua voz era fria, ela não
me olha.
— Não vá! — imploro, tocando os meus joelhos no chão, quebrando
a minha promessa de nunca mais me curvar diante de alguém, todo o meu
orgulho se foi e ela levaria a minha vida com ela assim que cruzasse aquela
porta.
Não era saudável, eu tenho ciência disso, mas o que eu poderia fazer
se de todos que já me abandonaram, ela é a única que sinto que preciso para
continuar vivendo.
— Não torne as coisas mais difíceis, Leo — eu me agarro na sua
cintura e ela não tem a coragem de levantar as mãos, nem para me soltar do
seu corpo.
— Você não vai a lugar nenhum, Samanta! — Levanto, decidido a
mantê-la ali, a minha voz sai firme e ela interpreta as minhas palavras da
forma que quiser.
— Você vai me manter como prisioneira aqui? — Coloca as mãos na
cintura em uma posição defensiva.
— Samanta, precisa ficar aqui e se acalmar — a minha voz sai quase
um rosnado encarando os seus olhos frios.
— Não quero ficar, Leonardo, você não tinha o direito de me enganar
dessa forma, eu acreditei nos seus sentimentos por mim, achei que esse
filho era de outro — sorri nervosa. — Quando pretendia contar?
— Eu te amo, Samanta.
— Eu não consigo olhar na sua cara, não agora, Leonardo.
— Não fala isso, Samanta, eu não vou suportar o seu desprezo.
— Você teve muitas oportunidades de me falar a verdade, você me
fez de idiota todo esse tempo, sabia que eu me referia a você quando falava
daquela noite, faz ideia de como eu me senti? Faz ideia do que sinto agora?
— Fique e pense melhor, ok? Você está grávida, nós vamos ser uma
família, eu os amo.
— Pensarei melhor, mas não aqui, vou para casa dos meus pais,
necessito de espaço, Leonardo, e preciso pensar sozinha.
— Eu não vou te deixar ir, Samanta, se acalme e pense melhor, então
voltamos a conversar.
Eu não vejo uma outra alternativa de fazê-la ficar, e em um momento
de desespero eu a tranco no nosso quarto,
— Leonardo, abra a porta, você não pode me manter presa aqui! —
Ela exige aos gritos, esmurrando e chutando a porta.
— Samanta, acalme-se e vamos voltar a conversar — digo, do outro
lado da porta.
— Eu não vou mudar de ideia, abra a porta, Leonardo — torna a
exigir, com as batidas mais fracas dessa vez, sendo vencida pelo cansaço.
Deparo-me com os olhares assustados de alguns funcionários, os
gritos de Samanta ecoam por toda casa.
— Não quero que ninguém abra a porta para Samanta, se alguém se
atrever a abrir, será demitido.
— Menino, isso não está certo, ela é sua esposa e não prisioneira.
— Não se meta, Maria, foi só uma briga boba.
— Se foi boba, por que a prendeu, meu menino? — indaga aflita.
Eu não preciso responder, eu sei exatamente o que estou fazendo.

***
Samanta Antonelli

Já dizia a minha mãe, quando a cabeça não pensa o corpo padece e eu


estava prestes a descobrir isso. Afinal, neste exato momento, não estou
raciocinando direito, a raiva havia me cegado, tudo que quero é sair dessa
casa e não precisar olhar para Leonardo por um bom tempo.
Eu já estou pensando como as mocinhas de filme e traçando na minha
mente uma fuga pela janela, não seria difícil amarrar alguns lençóis.
Quando a noite chega, ela parece não ter fim, as horas passam lentamente, o
sono custa a vir, fico pensando se é assim que os presidiários se sentem.
Balanço a cabeça em negação, eu ainda tenho uma cama confortável para
dormir.
Acordo com Leonardo deitado ao meu lado me acariciando.
— Você está mais calma? — indaga, com um semblante preocupado.
— Eu trouxe comida para você. — Aponta para a mesa posta no nosso
quarto.
— Não estou com fome. — Viro o rosto.
— Samanta, você tem que comer, não esqueça que tem um bebê
dentro de você.
— Me deixe ir embora, eu não quero ficar!
— Você vai me deixar por tão pouco? Não vai considerar tudo que
vivemos, tudo que evoluímos?
— Você tem que respeitar a minha decisão, eu não quero estar aqui,
olhar para você está me fazendo mal, as lembranças daquela noite ficam
voltando a minha mente e me sinto envergonhada, Leonardo, eu imagino
você rindo da minha idiotice e da minha falta de atenção.
— Não sei se notou, mas eu não costumava sorrir antes de você, então
tire isso da cabeça, você nunca foi motivo de piada para mim. Preciso que
me perdoe! — implora.
— Por que devo te perdoar? Por que está dizendo que me ama? E daí?
Se não fosse esse o caso, você teria me usado como uma qualquer e hoje eu
estaria grávida de um filho sem pai, já pensou nisso?
— Não vamos pensar no “se”, Samanta, e sim no que é real, eu, você
e o nosso filho — sinto os seus lábios tocar o meu braço, enquanto a sua
mão alisa os meus cabelos.
— Me deixa sozinha — peço, me afastando do seu toque.
Aperto os olhos com força, até ouvir a porta ser trancada novamente e
então relaxo, eu estou faminta, então corro para mesa que tem tudo o que
gosto. Eu não posso pedir ajuda ao Davi e envolvê-lo em uma briga com
Leonardo, nem posso voltar para casa dos meus pais, e não tenho dinheiro
suficiente para ir para longe. Olho para minha mão e lembro do valor da
aliança.
— Bom, acho que dinheiro não será um problema — digo, a
encarando, mas logo um aperto atingiu o meu coração, eu nunca iria
conseguir me desfazer de algo tão significativo.
Então lembro de Gabi, eu poderia encontrá-la em Campos do Jordão,
mesmo que eu não soubesse exatamente onde, mas isso eu poderia resolver
assim que chegasse lá. Eu já havia maquinado tudo, inclusive amarrado os
lençóis que deixei escondido no closet, espero a visita de Leonardo a noite,
finjo estar dormindo até ele trancar a porta novamente.
Amarro forte o lençol ao pé da cama e o jogo para fora da janela,
neste horário alguns seguranças sempre estão na cozinha jantando, então as
minhas chances de sucesso são enormes. Aos poucos tudo que eu
imaginava sobre fugir com lençóis ia se desmistificando da minha mente, os
nos pareciam que iriam se soltar em algum momento e eu parecia não ser
capaz de me agarrar no tecido e nem mesmo ele suportaria o meu peso.
— Droga! — exclamo, sentindo que seria incapaz de segurar por mais
tempo, um grito fino e abafado escapa da minha garganta assim que chego
ao chão após largar o lençol, eu caio de pé e sinto ele doer quando tento
andar.
Ando lentamente até a garagem, agradeço pela escuridão que está me
favorecendo, os seguranças olham atentos para pontos estratégicos, afinal,
um morador sair da sua casa e andar pelo jardim não seria uma ameaça.
Leonardo tem muitos carros e ele usa todos com frequência, embora o
conversível fosse o seu modelo favorito, a noite ele sempre usa carros mais
discretos e foi um deles que escolhi para sair. Apesar de saber dirigir, eu
não tenho carteira de motorista, mas um ponto a meu favor, ninguém iria
esperar uma fuga desse tipo comigo dirigindo.
Na saída, não sou impedida por ninguém, eles acreditam se tratar de
Leonardo deixando a mansão. Tenho em mente chegar a Campos do Jordão,
assim que possível comprar um celular novo e entrar em contato com Gabi.
Uma chuva repentina era tudo que eu não precisava, agora quero parar o
carro, mas sinto mais medo da estrada vazia do que da chuva, eu já estou
bem distante da cidade e logo acharia um lugar seguro para parar e dormir.

***

Leonardo Milani

— Algum problema? — pergunto quando encaro o olhar confuso de


um dos seguranças assim que me vê aparecer no jardim da mansão.
— Acabei de ver o seu carro passando, senhor, achei que tivesse
saído, e como não nos chamou, achei que logo voltaria.
— O meu carro? Droga! — Corro até a garagem com ele no meu
encalço.
— Algum problema, senhor?
— Considerando o fato do meu carro ter saído pela porta da frente,
facilmente acho que sim, temos um problema! Acenda as luzes — ordeno.
— Onde está a BMW que iria para o concerto amanhã? Foi ela que
viu sair? — Eu tinha uma garagem imensa e muitos carros, então, procuro a
que definitivamente não poderia ter saído.
— Foi justamente ela que saiu senhor.
— Você não fez isso, Samanta! — Sinto as minhas pernas presas ao
chão, o pânico tomou conta de cada parte de mim, busco toda força que
tenho para correr até o quarto, comprovando que ela não está lá. — Há
quanto tempo ela saiu?
— A quase três horas, senhor.
— Para que eu pago você? — grito esmurrando a porta. — Peguem
vários carros, vamos nos separar, tragam ela de volta e se alguma coisa
acontecer com ela… — Fecho os olhos e o meu coração dói ao imaginar. —
Eu mato vocês! — conclui, sentindo as lágrimas queimarem nos meus
olhos.
— Vamos nos separar — diz o chefe dos seguranças quando
chegamos na garagem,
— Mandem alguns para o antigo emprego, para a faculdade, para a
casa dos colegas de trabalho e para a casa dos meus… — me calei. — A
casa do Davi, lembrem-se, ela talvez não queira ser encontrada, então,
fiquem apenas de olho na movimentação! — Todos fazem um gesto
positivo com a cabeça e entram nos carros. — Eu dirijo! — digo entrando
no carro e os meus seguranças que ficaram comigo, entram.
A minha primeira opção foi a casa dos pais dela, embora fosse pouco
provável que ela tivesse ido para lá.
— Samanta — grito saindo do carro, assim que estaciono.
— A porta está trancada, senhor.
— Abra a porta — Sei que ele tem habilidades para isso.
Entro ansioso, os móveis ainda estão cobertos por lençóis e tudo está
empoeirado.
— Subam e vasculhem tudo! — Tenho certeza de que ela não está na
casa, mas não poderia ir sem vasculhar, eu não faço ideia de onde procurá-
la e o desespero começa a tomar conta de mim.
— Nada senhor — diz um dos seguranças voltando dos quartos.
— O carro está com defeito, ele está com defeito! — repito para mim,
porém em voz alta.
Fomos surpreendidos por uma chuva forte, o meu coração fica a cada
segundo mais apertado, eu ando sem rumo com o carro, atravessando a
cidade.
— Alguma notícia? — indago, tentando manter a esperança.
— Não, senhor, nenhum a encontrou, mas eles estão fazendo o
mesmo que nós, senhor, rodando pela cidade.
— Merda! — Esmurro o volante.
— Abram uma denúncia de roubo de carro, se tiver algum bloqueio
eles vão pará-la. Chequem notícias de acidentes de carro — dei a segunda
ordem com a voz embargada.
— Certo senhor, agora mesmo — antes que ele faça a primeira
ligação, o telefone toca e vejo a sua expressão séria.
— O que acontece? — pergunto tentando respirar.
— Acharam o carro, senhor — ele desliga o telefone.
— Onde? — as minhas mãos tremem, ele diz acharam o carro, o
silêncio dele me deixou ainda mais nervoso. — Onde está o carro, porra! —
grito.
— Caído em um barranco, senhor, ancorado entre duas árvores. —
Freio o carro bruscamente, o sangue foge do meu corpo, o meu coração já
não bate mais.
— E a Samanta? — A minha voz sai arrastada pela falta de ar que
sinto.
— Não a encontraram ainda.
— Pegue a direção, me leve até lá — falo saindo do carro trocando de
lugar, eu não estou mais em condições de dirigir, as minhas mãos tremem e
o ar parece escasso. — Ela está viva, ela está viva! — repito essas palavras
durante todo caminho enquanto busco o ar com desespero.
— Estamos perto, senhor.
— Quero estar lá e não perto — pronuncio irritado.
— É aqui, senhor. — Abro a porta com o carro ainda em movimento
e salto quando ele está a ponto de estacionar.
— Não pode passar, senhor — sou impedido por policiais que já estão
no local.
— É o meu carro, a minha esposa está nele — falo me
desvencilhando dele escorregando pela areia molhada até o carro.
— Samanta? Samanta? — O meu grito é de desespero.
— É impossível que alguém tenha sobrevivido a esse acidente —
olho para trás encarando os oficiais furioso.
— Impossível por quê? Onde está a ambulância? — grito.
Desço até o carro, havia muito sangue. Caio sentado no chão.
— Onde ela está? — imploro pela resposta.
— Senhor, se acalme, não encontramos o corpo da sua esposa.
— Ela está viva! A minha mulher está grávida, e viva! — reafirmo.
Sinto os olhares de pena sobre mim, o tipo de olhar que não é comum
para mim.
— Samanta… Samanta… procurem por ela! — ordeno aos meus
seguranças, eles são preparados para tal serviço.
— Senhor, estamos fazendo buscas pelo local, se ela estiver aqui a
acharemos — ignoro as palavras do policial, eu quero confiar nos órgãos
públicos, mas esse não era o caso, quando se trata de algo que eu quero para
agora e que seja feito com afinco.
— Tragam mais homens — falo para o chefe de segurança.
— Sim, senhor.
— Ele é aquele banqueiro famoso? — Aos poucos curiosos iam
aparecendo e começam a me reconhecer.
— Se for ele o caso vai ganhar repercussão — os burburinhos só
aumentam.
— Senhor, vamos para o carro, vai voltar a chover — diz um dos
meus seguranças.
— Eu vou procurá-la, não posso deixá-la na chuva — tento me
manter de pé e andar com firmeza, mas a areia molhada me derruba. —
Samanta, onde você está, meu amor? — Os meus joelhos estão no chão, eu
não me importo com quem está me vendo, eu a queria e queria já.
— Senhor, vamos para o carro, nós vamos continuar procurando, a
impressa já está no local, lembre-se dos pais da senhora, imagine senhor —
o sigo de volta para o carro com dificuldade, devido à areia molhada.
— Liguem para o meu advogado, eu não quero notícias com o meu
nome.
— Não se preocupe, senhor!
Fecho os olhos e encosto a cabeça no banco do carro, ela não está ali
e embora o meu coração esteja apertado, eu tenho esperanças de encontrá-la
com vida.
32
Me salve!

Samanta Antonelli

É cada vez mais difícil de ver o que está na minha frente, eu não
tenho o hábito de dirigir e não estava contando com essa chuva, dirigir a
noite já é um grande problema.
— Samanta, é melhor parar — digo para mim mesma, vendo que a
chuva não daria trégua. — Mas o que é isso? — Um frio atravessa a minha
espinha, o carro não me obedece, os freios não pegam e o carro acelera,
indo contra as minhas tentativas de frear.
O pânico me deixa incapaz de raciocinar, eu não vejo alternativa a
não ser tentar o freio de mãos.
O carro capota várias vezes e se arrasta pela pista pelo capô. O
barulho dos vidros blindados trincando me dão a sensação de vários
estilhaços me acertando, o cinto se desprende, me jogando de uma vez no
teto do carro. Penso na morte em várias perspectivas, os meus pensamentos
são tão rápidos quanto o carro, que desliza até ancorar em duas árvores,
sendo as únicas coisas que o impede de continuar descendo o barranco.
Penso no Leonardo e no quanto fui precipitada. Na hora da tragédia,
eu já estou arrependida por estar ali presa em um carro prestes a descer um
barranco íngreme, que parece não ter fim devido à escuridão.
— Aqui, eu achei — ouço a voz vindo de longe, uma luz de lanterna
alcança os meus olhos.
— Senhor, é perigoso, o carro vai deslizar — alguém o alerta em tom
de repreensão.
— É uma mulher! — Suspiro aliviada e finalmente tenho esperanças
de sair dali viva. — Droga, o carro é blindado, desça e traga alguma coisa
que me ajude abrir a porta — ele diz, num tom de ordem e eu só quero
fechar os meus olhos que estão pesados.
— Me ajude! — sussurro.
— Fique acordada, ok? — ele força a porta, eu sinto o carro balançar,
mas ele não desliza e fico grata por isso. — Consegui! Venha, me dê a sua
mão. — Estico a minha mão com dificuldade, mas ele está empenhado em
me ajudar a ponto de arriscar a própria vida — Peguei! — vibra me
puxando.

***

Abro os meus olhos lentamente, todo meu corpo dói e queima em


certos pontos.
— Acordou? — A voz era conhecida, se trata do homem que me
salvou, viro o rosto para encará-lo, ele está em pé ao meu lado, com um
sorriso assimétrico e um tanto preocupado.
— Onde estou? — Olho ao redor com curiosidade, sei que ali é um
quarto de hospital e não era bem essa a minha pergunta.
— Trouxe você para o meu hospital, a vários quilômetros de onde foi
o acidente, eu pensei em te levar para um mais perto, mas eu te ouvi falar
enquanto estava inconsciente, “quero ir para longe, ele vai me achar” —
sorri sem graça. — Fiquei preocupado e pensando quem poderia ser, então,
o meu hospital é seguro — diz, alisando os cabelos lisos e escuros que
caíam sobre os seus olhos. — Era sobre o seu esposo? Se quiser posso ligar
para ele.
— Não quero que ligue para ninguém, como está o meu filho? —
Levo a minha mão para o meu ventre e ele não está mais lá. — O meu filho,
meu filho! Onde ele está? — os meus gritos desesperados fazem os seus
olhos azuis se arregalarem. — Onde ele está.
— Por favor, se acalme — as suas mãos seguram a minha com força.
— Quero o meu filho — falo ainda aos gritos.
— Você teve sorte de ter quebrado apenas o pé e ter alguns arranhões
pelo corpo, foi um milagre ter saído viva daquele acidente.
— Mas e o meu filho? — Choro.
— Sinto muito, seria impossível ele ter sobrevivido — a sua voz está
embargada, eu vi as lágrimas presas nos seus olhos e suspiro derrotada, um
grito sai da minha garganta, isso era tudo que eu podia fazer, gritar.
— Eu o matei? — sussurro.
— Sei que nada que eu diga irá confortar você nesse momento.
— Estou grata por ter me salvado, por descer lá, a areia estava
encharcada pela chuva — choro me lembrando do terror que vivi.
— De quem estava fugindo? Quer que eu ligue para o seu marido?
— Eu matei o nosso filho — digo em meio ao soluço.
— Foi um acidente, não foi? — Me olha com dúvida.
— Leonardo não vai me perdoar…. Onde estamos?
— Em uma cidade pequena, deve estar achando o quarto pequeno,
são menores que as clínicas do centro, eu vivo aqui e ajudo as pessoas que
não tem acesso aos hospitais.
— O senhor é ótimo!
— Não sou um santo, eu só gosto do que eu faço. — Covinhas
aparecem nas suas bochechas que ficam rosadas de vergonha.
— E sobre a conta do hospital eu não tenho dinheiro, mas fique com
isso, volto para resgatá-la — falo tirando a aliança do dedo, ele impede a
minha ação.
— Não se preocupe com isso e apenas melhore, eu já lhe disse que
essa clínica atende pessoas sem muitos recursos. A propósito, eu sou
Ricardo, sinta-se à vontade para me chamar quando precisar.
— Obrigada!
— Vou deixar você sozinha para checar outro paciente — ele sai do
quarto e abraço o meu ventre, meu ventre vazio, onde eu costumava passar
horas alisando e conversando com o meu filho, que antes mesmo de nascer
virou um anjinho.

***

Eu já estou a uma semana de repouso, a comida já não desce com um


sabor adorável e os dias eram os únicos momentos em que os meus
pensamentos se desviavam do Leo e do meu filho. Ando com a ajuda de
uma cadeira de rodas elétrica que Ricardo cedeu para mim gentilmente,
para me ajudar a circular pelos corredores e me distrair com outros
pacientes.
— Você não vai comunicar aos parentes da garota que ela está aqui?
— Ouço vozes alteradas vindas da sala de Ricardo e paro.
— Não, ela não quer ser encontrada ainda, assim que ela quiser o
farei — ele responde tranquilo.
— Ela não é a Vitória, sabe disso, não sabe?
— Claro que sei, de onde está tirando isso?
Quem era Vitória?
— Você passou a noite ao seu lado, vi quando acariciou o seu cabelo
e ela realmente lembra a Vitória, ela é jovem e bonita, mas a Vitória
morreu, supere isso!
— Morreu? — repito baixo a palavra.
— Não se preocupe, primo, eu lembro disso todos os dias, aliás, é
algo que eu não preciso lembrar, já que não esqueço! — A porta se abre de
repente e eu fui pega no flagra, sinto as minhas bochechas queimarem de
vergonha.
— Me desculpe, eu não quis ser intrometida, eu só estava passando
— digo, atropelando as palavras.
Ricardo sorri, ao contrário do outro, que torce o nariz, passando direto
por mim.
— Entre, veio me visitar? Vejo que está gostando muito do
empréstimo.
— Sim, eu gostei muito, me distraio, converso, tem sido bom — torço
o lábio e baixo os olhos. — Eu não queria te causar problemas.
— É sobre o que ouviu? — Olho timidamente admitindo. — Vitória
era a minha noiva, ela era jovem assim igual a você, nós havíamos brigado
naquela noite e eu não deveria tê-la deixado sair de carro naquele dia. Eu
não cheguei a tempo no dia do acidente, mas, veja, a vida me deu a chance
de salvar uma garota meses depois e ela está aqui na minha frente, Vitória
me deu a chance de me redimir com a vida — ele força um sorriso.
Um nó se forma na minha garganta e seguro as lágrimas mesmo que
elas queimassem nos meus olhos, sorri grata pela sua bondade.
— Samanta, tenho boas notícias — sorri mudando de assunto.
— Quais notícias? — Sorrio de volta com entusiasmo.
— Você vai receber alta e já pode ir para casa, o seu marido ficará
feliz em te ver. — Torço os lábios, uma pontada de preocupação toma conta
de mim.
— Qual o problema? Não ficou feliz? — Me olha preocupado.
— Não quero voltar ainda, não sei como dizer a ele sobre o nosso
filho.
— É só por isso que não quer voltar?
— Não sei como encarar o Leonardo, não sei se devemos continuar e
estar longe dele é a única forma de me decidir sem que ele me force a fazer
o que eu não quero.
— Como assim a force? — Me olha ainda mais preocupado e forço
um sorriso.
— Me ajude a encontrar um lugar para ficar, apenas por uns dias.
Pode me ajudar?
— Claro, eu vou te ajudar, mas preciso que me conte detalhes sobre
isso — fala me advertindo.
33
Ela está viva!

Leonardo Milani

Quinze dias depois do acidente...

— Senhor, o detetive está aqui — a minha secretária fala entrando na


sala
— Mande ele entrar — digo e ela faz um gesto positivo com a cabeça
e ele entra. — Descobriu alguma coisa? — pergunto antes que ele cruze a
porta por completo.
— Ainda não, aliás nada de concreto.
— Como assim? O que quer dizer? — Cada dia que se passa fico
mais ansioso, após idas e vindas a vários hospitais e IML, eu já não sei mais
que desculpa dar aos pais dela, quando eles ligam, eu temo de ter que dizer
sobre acidente, embora fosse o certo a fazer.
— Existe uma possibilidade de ela estar em uma cidade bem pequena
que fica a poucas horas do local do acidente.
— E por que ainda não foi lá? — indago alterado.
— Enviei um homem para lá, a uns três dias, mas ainda não a
encontramos. Ou ela está se escondendo, ou não está mais viva, senhor.
— Não fale besteiras, claro que ela está viva e ainda deve estar
chateada, por isso não voltou. O seu trabalho é encontrá-la, é para isso que
eu te pago.
— Encontrarei, senhor, mas me diga uma coisa, ela tinha alguém que
pudesse ajudá-la? Digo alguém influente que consiga escondê-la caso ela
tenha passado por um hospital.
— Não sei nada sobre isso, Samanta não tinha ninguém além dos
pais. — Dou de ombros. — Por que acha que ela pode estar nessa cidade?
— pergunto curioso.
— É uma cidade pequena, poucos habitantes, sem muito acesso à
internet e tecnologias. Seria fácil se esconder lá, é praticamente zona rural.
— Me dê o endereço, eu mesmo vou para lá e vou trazê-la comigo.
— Certo, senhor, mas não se preocupe, tenho um homem no local e
qualquer sombra da sua esposa será notada, ele me enviará a foto de
imediato.

***

Samanta Antonelli

— Samanta, pode rever esses documentos? — Ricardo fala com


vários papéis nas mãos.
— Claro! — Tenho ajudado Ricardo com alguns documentos da
clínica, eu sei que ele faz isso para passar o tempo enquanto ele me
convence de que preciso voltar.
— Tem planos para o fim de semana? — ele indaga e sorrio divertida.
— Pensei em um cinema — zombo, considerando que aqui não tem
nada.
— Vou a um congresso, quer me acompanhar?
— Congresso? — Mordo o lábio hesitante.
— Por que tem tanto medo de ser encontrada pelo seu marido? —
pergunta, vendo a minha hesitação.
— Ele não concordou com a minha decisão de dar um tempo, quis me
manter presa em um quarto e no dia do acidente eu estava fugindo.
— Você não o ama mais e quer o divórcio, mas tem medo dele? É
isso?
— Eu o amo, só não tenho certeza se devemos estar juntos, não
depois do que ele fez. Ele me decepcionou, me fez de boba, escondendo
algo importante.
— Você está sendo infantil, Samanta, ele deve estar desesperado.
— Talvez ele não me perdoe quando descobrir que perdi o nosso
bebê, nem eu me perdoei por isso! — digo com a voz embargada.
— Acho que deveria procurá-lo, esclarecer as coisas, vocês são
casados e ele deve te amar muito, com certeza está bem preocupado. —
Ricardo sai para atender os pacientes.
Ele tem razão, Leonardo deve estar louco me procurando ou pode
achar que estou morta, penso no quanto ele pode estar sofrendo e isso faz o
meu coração apertar.

***

— O que acha de jantar comigo hoje? — Ricardo fala, no fim do


plantão.
Eu aperto os lábios em uma linha dura.
— Vai viver trancada pelo resto da vida? — ironiza.
— Claro que não.
— Precisa enfrentar os seus problemas, fugir não é a melhor solução,
encontre-o e diga o que sente — sugere quando entramos no carro.
— Como você consegue ser tão legal? — sorrio para ele.
— Então, senhorita, desfrute da minha bondade e generosidade, saia
para jantar comigo — pisca um olho e sorri, balançando a cabeça em
afirmação.
A cidade é muito pequena, então não tem muitos locais para ir, apenas
um pequeno restaurante que serve vários pratos e não uma única
especialidade e é lá que ele estaciona o carro.
— O que quer comer? — pergunta enquanto descemos do carro.
— Fique à vontade para escolher.
— Eu te vi falando com alguém ao telefone — diz curioso.
— Eu estava falando com Gabi, uma amiga, eu pretendia ir para casa
dela antes do acidente.
— O que aconteceu? — pergunta quando me vê olhando para os
lados assustada.
— Tenho sensação de estar sendo observada.
— Passou tanto tempo trancada que deve ter ficado um pouco
paranoica — sorri e entramos no restaurante, somos levados até uma mesa
vazia e nos sentamos.
— Não tem graça — falo batendo na palma da sua mão.
— Essa aliança que usa é linda, posso ver?
— Claro — tiro entregando-lhe.
— O quão rico o seu esposo é? — pergunta curioso olhando a aliança
e abrindo a parte de encaixe.
— Por que pergunta isso? — Coloco os dois cotovelos sobre a mesa,
apoiando o meu rosto.
— Acredito que saiba o valor da joia na sua mão — fala, me
devolvendo, um garçom se aproxima e fazemos o nosso pedido.
— Sim, eu sei — falo, voltando a minha atenção para a aliança, então
dou de ombros, a colocando no dedo novamente.
— Sempre tive vontade de vê-la de perto e tocar, ela é tão incrível! —
diz fascinado. — Quase aceitei quando quis me dar como pagamento. —
sorri divertido.
Aliso a minha mão, encarando a aliança e a nossa comida chega.
— Você deve ter sido luz na vida dele, para ele te dar uma joia com
esse significado — encaro a comida e brinco com ela no prato. — Falei
algo que não gostou? — indaga em um tom preocupado.
— Não, eu apenas me lembrei da forma que conheci o Léo e de tudo
que vivemos juntos, quando ele me deu algo que representa o céu e o
inferno. Eu deveria sempre lembrar de salvá-lo, já que ele me considera o
seu céu, mas continuo o arrastando para o inferno, ou ele que me arrastou
até lá quando mentiu sobre algo tão importante.
— Não te convidei para ficar deprimida, vamos comer.
— Claro, vamos comer.
34
Quem é esse homem?

Leonardo Milani

— Alô! Novidades? — Atendo a ligação do detetive ansioso.


— Sim, vou mandar fotos, a encontramos! — Um frio corre pela
minha espinha, eu sinto medo do que poderia ver.
— Me mande logo, quero vê-la, me passe a sua localização.
— Claro, mas talvez não goste muito do que vai ver — a sua voz é
hesitante.
— Que merda você está falando? — A minha voz sai tremula.
— Veja com os seus próprios olhos, vou enviar fotos e informações.
— Ok — falo encerrando a ligação e em segundos as imagens
chegam, vários bips.
Perco as forças, o meu coração parece querer sair pela boca, eu era
incapaz de me manter de pé por mais tempo, tateio os móveis me jogando
sobre a cadeira.
— Que droga é essa? — todo o meu corpo treme. — Quem é esse
homem que está com ela? Por que eles estão jantando juntos? E que sorriso
é esse, Samanta? — As lágrimas correm pelo meu rosto, eu as enxugo com
pressa.
Arrasto o braço pela mesa à minha frente, jogando tudo no chão.
— Senhor, está tudo bem? — Maria entra assustada, com os olhos
espantados, vendo tudo quebrado no chão.
— Você pode sair, volte ao que estava fazendo! — Forço a minha voz
para que ela saísse, buscando desesperadamente pelo ar.
Fui até o meu celular que também está no chão, o apanho e volto a me
sentar para checar a ficha do homem que está com a Samanta.

Nome: Ricardo Tavares.


Profissão: Médico.
Viúvo, herdeiro de um grupo com vários hospitais
espalhados pelo mundo.

— O que você está fazendo, Samanta? — pronuncio com dificuldade,


um nó havia se formado na minha garganta.
Procuro a chave do carro em meio aos objetos caídos no chão, ligo
para a minha secretária em seguida.
— Cancele todos os meus compromissos, eu não sei quando volto —
digo e encerro a ligação saindo do quarto, desço as escadas pulando alguns
degraus e vou para a garagem.
Entro no carro, coloco as mãos sobre o volante, sem saber se
conseguiria dirigir.
— Algum problema, senhor? — indaga o meu chefe de segurança.
— Entre, dirija o carro para mim — falo, indo para o banco do
carona, os outros seguranças entram em outros carros e saímos.
— Qual a localização, senhor? — Digito no celular, mandando para o
computador de bordo do carro.
Seguimos em silêncio, o meu corpo treme e seguro as lágrimas, eu
não queria mostrar a minha fraqueza.
— Aonde quer ir exatamente, senhor? — indaga assim que cruzamos
a cidade.
— Volte para o carro com os outros, eu assumo daqui — ele encosta o
carro no acostamento, desço indo para o lado do motorista, ele desce do
carro e entro seguindo para onde Samanta está.
Pergunto a umas pessoas que passam onde fica o hospital, a cidade é
muito pequena, não foi difícil achar. Paro na frente do hospital e uns vinte
minutos depois vejo Samanta chegando com ele, que contorna o carro e
abre a porta para ela descer. O meu corpo arde em ódio quando ela desce
sorrindo para ele, eles entram juntos no hospital e eu saio do carro indo em
direção a eles, mas sou parado na recepção.
— Bom dia, senhor, tem horário marcado com algum médico? — a
recepcionista pergunta.
— Preciso falar com Ricardo.
— Ah, o doutor Ricardo acabou de passar por aqui.
— Ele é o que estava acompanhado daquela moça? — Eu já sei, mas
queria ouvir a resposta dela.
— Sim, ela foi paciente dele, parecem ser namorados, não é? Todos
aqui acham que eles combinam — ela sorri para mim, que tenho uma
expressão dura, então o seu sorriso logo se apaga. — Vou comunicar que
ele tem visita — ela pega o telefone para informar
Eu havia visto em que sala eles entraram, então aproveito a sua
distração para entrar de uma vez.
— O senhor não pode entrar assim! — Ela diz assim que percebe que
não estou mais na sua frente, corre até mim, andando apressada no meu
encalço.
Abro a porta sem bater, Samanta está sentada e sobressalta assustada
me encarando, o sangue foge do seu rosto.
— Senhor, não pode entrar assim — diz a recepcionista ofegante.
Os olhos do tal médico passeiam pela Samanta e param em mim.
— Você pode sair, obrigado — ele fala para a garota da recepção.
— Sim, senhor — ela fecha a porta atrás dela.
— Pela reação da Samanta, acredito que se conhecem. — Morde o
lábio arqueando as sobrancelhas.
Os olhos de Samanta estão fixos aos meus cobertos pela raiva, sei que
ela sente medo de mim e eu não gosto de despertar esse sentimento nela.
— E quem é você? — Repouso os meus olhos sobre ele por alguns
segundos até retornar para ela.
— Sou Ricardo, muito prazer. — Ele estende a mão, porém eu não o
cumprimento, mantendo as minhas mãos no bolso. — Devo deixá-los
sozinhos? — pergunta olhando para Samanta, que continua imóvel.
Vejo os seus olhos se encherem de lágrimas, ela esfrega as mãos sobre
a calça.
— Samanta? — A minha voz a faz sair do transe que parecia estar.
— Vou deixá-los sozinhos, pode me chamar se precisar, Samanta —
ele parece disposto a facilitar as coisas.
Mas ela estica o braço, o impedindo de avançar até a porta, vejo o
olhar confuso dele, mas ele faz o que ela pede com um único gesto. Eu não
estou mais em mim e temo por isso, avanço às pressas até eles, ele bloqueia
o meu caminho temeroso.
— Do que tem medo, Samanta? — indaga com desconfiança, sem
tirar os olhos de mim. — Você precisa manter a calma — fala direcionado a
mim como se eu fosse machucá-la. — Se ela quiser que eu fique, vou ficar.
— Fecho os punhos o acertando bem no meio do seu rosto, ele tenta se
manter de pé, mas cai.
— Ricardo, você está bem? — Ela se abaixa o acudindo.
Eu nunca fui um homem paciente, eu sempre fui um lobo furioso e
Samanta está passando dos limites.
— Vem, vamos conversar, você me deve isso! — A puxo do chão, eu
não suporto vê-la tocando em outro.
Ela me olha friamente, puxando o braço de volta.
— Ricardo, eu não demoro — diz, se recompondo.
O meu sangue ferve de raiva e torno a puxá-la pelo braço, a
arrastando às pressas até o carro.
— Por que está agindo assim? Está me traindo com ele? — indago
aos gritos, prendendo-a entre o meu corpo e o carro.
— Claro que não! — grita de volta, se desvencilhando de mim e
entrando no carro, faço o mesmo em seguida.
— E o que você estava fazendo jantando com ele? — digo ofegante,
tentando manter a calma e os seus olhos se arregalam ao me encarar.
— Como sabe disso? — diz parecendo surpresa.
— Como acha que eu te encontrei? — respondo como se fosse óbvio.
— Somos amigos, ele está me ajudando e é só isso! — O seu tom de
voz era frio.
Eu nunca acreditei em amizade entre homem e mulher, isso não
existe, mas respiro várias vezes buscando controle antes de voltar a falar.
— Achei que tivesse morrido, você tem ideia de como foram esses
dias para mim? Porra, Samanta! Você não pensou nos seus pais? Fiquei
apavorado pensando em como você estava, estive preocupado com o nosso
filho, você viu a gravidade do acidente? — despejo tudo que estava
guardado no meu peito.
Um soluço escapa da sua garganta, ela chora compulsivamente.
— Que diabos, Samanta! O que você está fazendo? Por que está
chorando?
— Eu morri naquele acidente, Leonardo — a dor atravessa os seus
olhos.
— Do que está falando? — Uma angústia atravessa o meu peito.
Ela se agarra as pernas, chorando com a cabeça baixa sobre os
joelhos.
— O que está acontecendo, Samanta, por que você está chorando
assim?
— O nosso filho se foi e eu sou a culpada! — diz em meio aos
soluços.
— Como assim? — sussurro buscando forças para falar.
— Eu quase morri naquele acidente, Leonardo, se eu não tivesse
saído daquela forma… — Calou-se. — Foi minha culpa! — grita em
lágrimas batendo no próprio peito.
Eu urro devastado pela dor, esmurro o volante várias vezes, o sangue
escorre entre os meus dedos.
— Acho que as coisas acabam por aqui — sussurra, quase inaudível.
— Samanta, eu estou devastado e destruído, olha o que fiz a você! —
encosto a minha cabeça no volante e me permito chorar. — Esse é o meu
castigo, eu sou um pecador! Samanta, você me ama? — A encaro
segurando o seu rosto contra o meu.
— Não temos mais jeito, Leonardo.
— Você me ama? — volto a perguntar.
— Sim, mas… — a calo selando os meus lábios aos dela.
— Se você me ama não existe “mas”, eu te amo, eu demorei para te
dizer isso, eu demorei para entender os meus sentimentos, eu não vivo sem
você, volte comigo e vamos superar isso juntos! — Torno a beijá-la usando
o dedo polegar para enxugar as suas lágrimas.
— Eu me senti sozinha, senti a sua falta — admite entre os beijos.
— Eu quase morri sem você! — Ficamos um tempo em silêncio, eu
estou em luto e devastado, me sinto tão culpado quanto a culpa que ela
carrega agora.
— Tenho que me despedir do Ricardo.
— Por quê? — pergunto enciumado.
— Ele me ajudou nesse tempo e foi ele que salvou a minha vida, ele
viu o acidente, se ele não estivesse lá, talvez eu tivesse morrido, sou grata a
ele por estar viva.
— Você tem razão, minha menina, se é da forma que me conta, eu
devo desculpas a ele.

***
— Está tudo bem? — Ele se vira às pressas assim que atravessamos a
porta do consultório e a encara, checando cada parte do seu corpo.
— Sim está! Quero agradecer por tudo que fez por mim.
— Está indo embora? — indaga, apertando o lábio desapontado.
— Sim, eu vou voltar.
— Fico feliz que tudo tenha se acertado, mas sentirei a sua falta. —
Eu me queimo de ciúmes vendo os seus olhos apaixonados para a minha
mulher, mas me contenho sendo grato por ela estar viva.
— Eu lhe devo desculpas, muito obrigado por salvar a minha esposa,
sou Leonardo, muito prazer. — Estico as mãos para cumprimentá-lo dessa
vez.
— Eu sou médico, salvar pessoas é o meu trabalho. — Aperta a
minha mão gentilmente.
— De qualquer forma sou muito grato, a Samanta é minha vida! — A
puxo pelo ombro trazendo o seu corpo para perto do meu.
— Sei bem como se sente… — a sua boca se transforma em uma
linha dura e a tristeza atravessa os meus olhos.
Viro o rosto para não ver o abraço que Samanta dá nele, me virando
apenas para apertar a sua mão e agradecer mais uma vez.

***

Durante a volta, Samanta alisa o seu ventre em vários momentos, não


sei se por força do hábito ou por saudade, tiro a minha mão do volante
rapidamente para alisar os seus cabelos. Assim que chegamos à casa, ela
sobe apressada, passa horas no banheiro com a porta trancada e se joga na
poltrona coberta pelo roupão, ela suspira se encostando na poltrona olhando
fixamente para o teto.
— Onde você está? — indago, envolvendo os meus braços nela, me
inclinando por trás da poltrona.
Eu vejo a dor nos seus olhos, sinto a energia dessa casa, que lembra
tudo que eu queria esquecer.
— Não consegue me perdoar? — Beijo o seu rosto.
Ela permanece em silêncio assim como todo o caminho de volta no
carro.
— Você sabe o quanto mudei por você, o quanto a quero do meu lado,
eu não sabia disso, naquele dia, mas eu te amei desde o primeiro segundo
em que eu te vi. Samanta, eu aprendi durante a minha vida que eu deveria
comprar as coisas e percebi que as pessoas também se vendiam, eu nunca
tive o afeto de ninguém, as pessoas que me cercam estão ali porque são
pagas para isso, eu nunca havia conquistado o afeto sincero de ninguém. Sei
que tudo que você quer de mim é que eu te ame e eu te amo, muito mais do
que eu poderia imaginar que seria capaz, vamos superar juntos.
— Por que não foi sincero desde o início? — fala com a voz
embargada.
— Não me preocupei com isso no início e não tinha intenção de te
amar, de manter você comigo por tanto tempo.
— Mas, e quando descobriu sobre a gravidez? Quando nos casamos?
— Eu senti medo da sua reação, eu estava esperando um momento
para dizer, eu sei que você deve estar achando que eu nunca teria falado ou
que eu nunca acharia o momento e você está certa! Eu nunca teria coragem
de admitir por medo de perder você. Sei que sou um idiota egoísta, mas
hoje consigo dizer que te amo e eu nunca imaginei que eu diria isso um dia.
— Devo esquecer tudo porque você me ama? — diz com frieza, sem
me olhar.
— Não estou te pedindo para esquecer, estou te pedindo perdão, estou
te pedindo para superar isso… te pedindo para que você me aceite como o
seu amigo, homem e esposo. Você saiu daquele quarto de hotel carregando
a minha vida com você, aliás, você entrou me entregando uma vida que eu
nunca tive e se hoje posso sorrir, é porque você me fez viver.
Já de frente para ela a levanto, ela me surpreende com um abraço, eu
beijo os seus olhos que choram, desenho os seus lábios com o meu polegar
e a aproximo de mim pela cintura, a sua pele se arrepia com o meu toque e
ela fecha os olhos à espera do meu beijo. Começo beijando as suas mãos e
braços, subo até o seu pescoço, alcançando os seus lábios onde a minha
boca necessita estar.
Não fizemos amor, embora eu ansiasse por isto, mas eu queria apenas
que ela sentisse que temos mais do que sexo e que ela me completa em
todos os sentidos. Eu a levo até a cama no colo, me deito ao seu lado e a
envolvo nos meus braços, sentir a sua respiração é meu melhor presente
hoje.
35
A última estrela do universo

Samanta Antonelli

Acordo e não sinto o Leonardo ao meu lado, passo a mão pela cama
sem me virar.
— Está me procurando, minha menina? — Abro os olhos me virando
e vejo aquele homem lindo, em pé, próximo à imensa janela, o sol reflete na
sua pele, o que o deixa ainda mais radiante.
Ele segura uma xícara de café com um sorriso largo no rosto, os seus
olhos possuem um brilho surpreendente, sem falar que ele usa apenas uma
calça de moletom, o peito está totalmente nu e o abdômen incrivelmente
definido é maravilhoso de se ver, os meus olhos se perderam dentro daquela
imagem.
— O que foi, meu amor? Daria um doce pelos seus pensamentos,
porque pela forma que me olha, são impuros — ele sorri e contorna os
próprios lábios com o dedo indicador, seus olhos, é pura luxúria.
— Você se acha a última estrela do universo? — falo desdenhando.
Ele vem andando na minha direção e a minha mente passa a funcionar
em câmera lenta.
Samanta acorda, Samanta, isso só pode ser carência.
Esfrego bem os olhos e o encarei.
— É real o que está vendo, meu amor. — Ele pega a minha mão e
passa pelo seu abdômen incrivelmente firme, uma quentura atravessa o meu
corpo e desce, se concentrando bem no meio das minhas pernas.
— É tudo o seu para ser usado quando você quiser — ele fala
docemente, como uma raposa querendo me ludibriar.
— Prefiro tomar um banho, tenho que ir à faculdade, faz tempo que
não vou às aulas. Meu Deus! Perdi muitas aulas — começo a falar rápido,
sem respirar, e me levanto, tentando correr para o banheiro.
Ele me agarra pela cintura, me trazendo para perto, colando o seu
corpo ao meu e sinto a sua ereção no meu abdômen. Ele me beija com
vontade, sugando a minha boca com desejo, as nossas línguas se
entrelaçam, ele aperta um dos meus seios e eu solto um gemido na sua
boca.
— Eu não aguento mais, Samanta, eu estou faminto de você! — Ele
se agarra aos meus cabelos, vira-me de costas e inclina o meu corpo no
aparador do quarto, levanta e afasta as minhas pernas, já trêmulas de desejo,
então afasta a minha calcinha.
— Gostosa — sussurra no meu ouvido, cada parte do meu corpo se
eriça.
Penetra-me com um dos dedos, e estimula a minha intimidade.
— Puta que pariu, Samanta, toda encharcada! — Ele delira a cada
toque.
Então me vira de frente e me senta na mesa com as pernas abertas, se
encaixando entre elas.
— Nunca mais deixe o seu homem faminto desse jeito, entendeu,
Samanta? — Ele bate forte na minha intimidade, as minhas pernas tremem
de desejo.
— Entendi, Leo — falo entre gemidos enquanto ele estimula a minha
intimidade, me deixando louca.
— Você agora vai pagar por ter me deixado assim… — Ele dava
leves mordidas pelo meu corpo, passando a língua em seguida.
Eu me contraio de prazer, louca para tê-lo dentro de mim, gemendo
feito uma louca desesperada.
— Implora, Samanta, implora para que eu te possua — exige,
puxando os meus cabelos, levando a minha cabeça para trás e percorrendo o
meu pescoço com a língua.
— Me possua, Leo, eu quero você dentro de mim — imploro entre
gemidos.
— Implora mais — diz, passando o seu pau na minha entrada.
As minhas pernas tremem, eu teria um orgasmo antes que ele entrasse
em mim.
— Entra, Leo — digo sem forças, baixando a mão para me tocar.
— De jeito nenhum, não vai me tirar esse prazer! — Me agarra pelo
bumbum e me joga na cama, abrindo as minhas penas com agilidade,
segurando os meus braços em cima da minha cabeça e entrando com tudo
em mim. Grito enlouquecida, ele me beija com paixão. — Goza para o seu
homem — o meu corpo obedece à ordem de imediato. — Isso meu amor,
isso, adoro sentir o seu corpo tremer, senti a sua intimidade vibrar dentro de
mim — ele urra dentro de mim, se jogando ofegante ao meu lado em
seguida.
— Nossa! — exclamo ofegante.
— Vamos ficar nesse quarto o dia todo, preciso recuperar o tempo
perdido — sorri com malícia.
— De jeito nenhum, preciso ver a minha situação na faculdade,
preciso ir trabalhar — paro e encaro. — Ainda tenho emprego? — gargalha
com humor.
— Estou te falando que você deixou o seu homem com muita fome e
você vem me falar de emprego e faculdade? Que se dane tudo isso, eu
quero é ter você o dia todo! — Volta a me beijar com desejo, em poucos
segundos a sua ereção já está me pressionando novamente.
— Epa… epa… — falo, colocando as duas mãos no seu peito. —
Nem pense nisso, tenho muito o que resolver, o nosso mundo não pode se
resumir a sexo.
— Quem disse que não? Já trabalhei o suficiente, tenho muitos
funcionários para trabalhar para mim. Você pode simplesmente trancar a
faculdade e voltar no próximo semestre e, quanto ao trabalho, ele continua
lá, porém você como a minha esposa assumindo um cargo de estagiário me
deixa desconfortável.
— E o que sugere? — Franzo o cenho, o estudando.
— Você tem duas opções, a primeira é assumir a sua condição de
milionária e passar a fazer compras o dia todo — diz sério, mas soou como
uma piada e dou uma risada alta.
— Sério que isso é uma opção a se considerar?
— Claro, muitas mulheres vivem assim e pode acreditar, elas se
sentem sortudas e estão bem satisfeitas. — Pisca um olho me encarando
com orgulho.
— Certo e qual é a segunda opção? — O meu tom é divertido.
— Ok, se a primeira não te deixa feliz, posso te dar um cargo na
diretoria.
— Nem me formei ainda, sou muito nova para assumir um cargo com
essa responsabilidade.
— E daí? A empresa é sua e você faz o que quiser nela, contanto que
não seja nada que me deixe desconfortável e pareça que sou mesquinho
para minha mulher — sorri com diversão. — E aí, o que prefere? A
primeira opção parece ótima para mim! — Dá de ombros.
— Eu acho que… — ele coloca o dedo indicador nos meus lábios, me
interrompendo de continuar.
— Vamos fazer o seguinte, você já sabe como é a rotina de trabalho
na empresa Certo? — Sorri com malícia. — Então vamos experimentar a
primeira opção e você me diz o que prefere depois.
— Experimentar como? — indago confusa.
— Se apresse, tome um banho, se arrume, que te espero lá embaixo.
— M-mas... — tento falar sendo empurrada para o banheiro.
— Sem desculpas, vai tomar banho sozinha ou está precisando da
minha ajuda? — Morde o lábio me encarando.
— Posso fazer isso sozinha! — Torço o nariz.
Quando eu desço, ele está me esperando na sala, não sei como
consegue ser tão lindo! Ele usa uma roupa mais despojada, uma polo azul-
marinho que marca bem o músculo do braço, uma bermuda branca, que é
algo inédito para mim, um sapato social esportivo e um óculos escuros que
repousa na sua mão. Vou me aproximando e o seu perfume me embriaga,
tudo nele é perfeito, ele se inclina e me beija os lábios delicadamente.
— Tome o seu café da manhã e não demore.
— Você já comeu?
— Claro, você parecia uma noiva para descer.
— Bobo! — sorri. — Cadê todo mundo? — digo procurando os
funcionários.
— Dei folga a todos hoje, queria ficar sozinho com você.
— Por que mudou de ideia?
— Não mudei, vamos voltar cedo — fala, me entregando um prato
repleto de frutas e enche um copo com suco em seguida.
Já no carro pergunto para onde ele está me levando.
— Meu amor, hoje você vai experimentar viver a sua nova vida.
— Como assim? — pergunto com as sobrancelhas juntas.
— SPA, salão de beleza, compras, parada para comer em um
restaurante, voltar para as compras e no fim do dia ter gastado o equivalente
à renda anual de um funcionário com um cargo mais elevado — os meus
olhos se arregalam quando ele termina de falar.
— E por que eu faria isso? Isso é uma rotina? Você quer que eu
trabalhe gastando o que você trabalha para ganhar? — o meu tom é
divertido.
Ele dá uma gargalhada da minha pergunta e me olha como se eu fosse
uma boba por tal questionamento.
— O quê? Você gasta isso diariamente? — questiono dando de
ombros.
— Não todos os dias, pois não tenho tempo suficiente para isso, é por
isso que estou contratando você para o serviço, se esforce muito e gaste o
quanto puder.
— Foi isso que fez quando ganhou o seu primeiro milhão, gastou tudo
comprando?
— Sim, até o último centavo — pisca o olho com um sorriso
divertido.
— E o que comprou? — O olho curiosa.
— Ações, em pouco tempo eu já tinha sete vezes mais — diz
orgulhoso.
— Nossa, você é muito bom em ganhar dinheiro — digo de queixo
caído.
— Eu espero que você seja boa em gastar — solta uma gargalhada.
— Vou precisar pegar prática — afirmo com determinação.
— Você aprende rápido.
— O que acontece quando eu já tiver comprado tudo que eu preciso?
— Você doa e compra tudo de novo. — Dá de ombros encarando a
estrada.
— Estão simplesmente posso dar o dinheiro para caridade — falo
como alguém que tem uma grande ideia.
— Pode, faça qualquer coisa contanto que esteja feliz e ocupe o seu
tempo.
— Agora, falando sério, Leo, pode apenas me dar um emprego na
Milani?
— Você ainda nem experimentou o novo cargo, vamos aproveitar o
dia e resolvemos o resto depois — diz enquanto estaciona no shopping.
36
Surpresa!

Samanta Antonelli

— Aonde vamos primeiro? — suspiro assim que atravessamos a


entrada do shopping.
— Vamos renovar o seu closet, a loja é essa! — diz parando em
frente. — Droga! — exclama apalpando os bolsos.
— O que aconteceu?
— Deixei a carteira cair no carro, entre e eu te encontro em alguns
minutos.
Sinto-me uma E.T. entrando na loja, as atendentes me olham por cima
dos ombros e me medem com os olhos.
— Algum problema? — indago, me sentindo desconfortável.
— Não, fique à vontade — uma delas responde, forçando um sorriso.
— Posso ajudar senhora? — A cara entojada da vendedora logo deu
lugar a um sorriso satisfatório, com a entrada de outra cliente.
A mulher entra de nariz empinado, ela nem sequer olha para onde
pisava.
— Procuro um vestido para um casamento que irei hoje, será luxuoso,
então tem que ser esplêndido e exclusivo — diz com superioridade.
— Claro, temos o vestido perfeito — responde a vendedora,
conduzindo-a para outro local que não me dei ao trabalho de acompanhar
com os olhos.
Olho o relógio impaciente, Leonardo está demorando mais do que
disse que seria.
— Nossa, como ele é lindo — os cochichos me chamam a atenção e
fico ouvindo mesmo sem me virar para não transparecer a minha
curiosidade.
— Sim, que homem. — Abana sutilmente as mãos.
— Se ajeitem, meninas, esse é o senhor Milani, o banqueiro, o
atendam bem. — Giro a cabeça imediatamente com as palavras da gerente
da loja.
Ele travessa a loja com os olhos fixos em mim, passando direto pela
vendedora que tentou se aproximar,
— Desculpe a demora, meu amor — selou rápido os meus lábios. —
Do que você gostou? Quem está te atendendo? — Mordo o lábio com um
olhar desconcertado. — O que foi Samanta, aconteceu alguma coisa?
Quem está atendendo a minha esposa?
Vi a reação de surpresa, é claro que Leonardo entende o que está
acontecendo.
— Ela está escolhendo a um tempo, senhor — a voz da atendente sai
trêmula olhando espantada para nós.
— Isso é tudo que vocês têm? — Ele passa a mão pelas peças com
um ar desdenhoso. — Entrei em uma loja de departamentos? — indaga,
com um sorriso irônico.
— Temos a área vip, senhor, com peças exclusivas.
— Ah, tem? E ainda assim a minha esposa estava aqui vagando pela
loja sem um atendimento adequado.
— Perdão, senhor, não sabíamos que ela era a sua esposa — o rosto
da mulher fica vermelho, os seus lábios tremem.
— Está tudo bem, Leo — digo tentando amenizar a sua fúria.
— Não precisa saber que ela é a minha esposa, apenas que é uma
cliente. Acho que está aqui para atender.
— Perdão, senhor — torna a pedir aflita.
— Errou novamente, não foi comigo que vocês erraram, mas com ela.
Vamos, meu amor, essa não é a única loja, aliás errei feio em te trazer para
um lugar que não tem profissionais capacitados.
— Está tudo bem. — O abraço, ele parece bem irritado.
Olho tudo com muita atenção, eu nunca andei por esse andar do
shopping, sempre soube que tudo ali era muito caro, até mesmo quando vim
com Jessica ficamos no piso inferior.
— Senhor Milani? — a vendedora veio nos receber na entrada da loja
— Humm, veio agradar a sua esposa! — Os seus olhos passam por mim
pousando na minha mão esquerda.
— Sim, vim mimá-la — sorri satisfeito com a recepção.
— Venha, pedirei que as modelos apresentem a nova coleção, a sua
esposa é belíssima, tudo cairá com perfeição.
A loja era incrivelmente luxuosa e quando ela fala que as modelos
apresentariam a nova coleção, eu não imaginei que elas desfilariam com as
peças.
As roupas são um sonho, eu nem sei em que ocasião usar peças tão
lindas.
— Senhora Milani, o que está achando? — A mulher se aproxima
com um largo sorriso.
— As peças são lindas, as cores me agradam.
— É tudo exclusivo, nunca vai esbarrar em alguém com roupas iguais
— pronúncia, orgulhosa.
Eu nem me importava com isso, estava acostumada com promoções
de loja de departamento e esbarrar com dez peças iguais no ônibus, sem
falar na variedade de peças que eles fazem com a mesma estampa.
— Qual o estilista? — Leonardo a interrompe com a pergunta.
— Giorgio Armani — enche a boca para falar.
— Embale tudo, mande para este endereço e se tiver sapatos que
combinem com a coleção, mande a coleção completa.
— A coleção veio bem expressiva, senhor temos em torno de cem
peças.
— Perfeito, é exatamente isso que eu preciso — Leonardo abre a
carteira, mas ela o impede.
— Senhor, não se preocupe com isso agora, sei que deve estar
ocupado e podemos aguardar o seu assistente para acertar essas questões.
— Agradeço — ela sorri indo para onde as modelos entraram.
— Você comprou uma coleção inteira? — Digo, sem acreditar no que
ouvi.
— Sim, você disse que gostou.
— Sim, eu amei, mas não preciso de tantas coisas… — o meu
coração ainda palpita lembrando dos valores nas etiquetas.
— Claro que precisa, você não tem nada no seu closet. Vamos, se
apresse, ainda temos muitas coisas para fazer, pedirei que o meu assistente
compre as bolsas, maquiagens e outros acessórios.
— Ok! — Resolvo não argumentar mais.
Entramos em uma loja de joias, o gerente veio na nossa direção com
um largo sorriso.
— Que prazer, senhor, a quanto tempo? Sempre mandava seu
assistente vir comprar pulseiras e gargantilhas! — Leonardo coça a garganta
indicando que o que foi dito não era apropriado e logo deduzi para onde ia
os tais mimos.
— Que bela senhorita — ele me checa dos pés à cabeça.
— Senhor, ela é a minha esposa — sorri sem humor, enquanto ando
pela loja com uma expressão amarrada.
— Algo em especial dessa vez?
— Sim, é a respeito desta coleção, que foi leiloada e adquirida por
essa loja. — Levanta a minha mão mostrando a aliança.
— Sim, é uma belíssima coleção, tínhamos curiosidade em saber
quem possuía a única peça que não arrematamos.
— Onde estão as outras peças?
— Aqui na loja temos apenas fotos, considerando o valor expressivo,
as joias estão em um cofre. — Leonardo sorri com satisfação, suspirando
com alívio em seguida.
— Fico feliz que ainda estejam disponíveis, quero todas as peças
neste endereço em três horas, considerando o valor expressivo como foi
citado, o meu assistente cuidará da transferência do valor e virá cuidar das
questões do transporte.
— Claro, senhor! — Ele sorria sem parar, imagino que está pensando
na comissão.
— Como assim do transporte? — indago quando saímos da loja.
— Um carro forte, meu amor — responde naturalmente.
— Para, Leo, eu ando com uma das peças tranquilamente por São
Paulo — sorri nervosa.
— Nesse caso a pedra está escondida e ela parece ser uma aliança
comum, mas continue andando tranquila, se ficar nervosa vão achar que
você está andando com dinheiro vivo na bolsa — zomba.
— Já estou cansada — falo reclamando ao sair da loja.
— Meu amor, um expediente normal dura oito horas, ainda estamos
na metade. — Encolho os ombros com uma expressão manhosa.
— Vamos a um lugar que vai gostar! — Saímos e entramos no carro,
Leonardo dirige alguns minutos do shopping até pararmos em uma mansão
linda.
— Que lugar é esse? — não parece ser uma residência e olho curiosa.
— Um spa, minha linda — fala ao estacionar o carro na propriedade.
Os funcionários parecem nos esperar, não tem clientes no local, mas
eu não quero acreditar que Leonardo havia alugado o espaço só para mim.
— Sejam bem-vindos, senhor e senhora — retribuo os sorrisos
simpáticos dos atendentes.
— Meu amor, vamos nos separar por algumas horas e logo nos
encontraremos.
— Nos separar? — O encaro descontente.
— Sim, minha linda, você vai fazer unhas, cabelos, vou resolver uns
assuntos e venho te buscar. — Beija o topo da minha cabeça antes de voltar
para o carro.
Em poucos minutos estou em uma banheira enorme com pétalas de
rosas, me dei o prazer de recostar a minha cabeça e relaxar, não parece ser
difícil se acostumar com tudo isso. Algumas horas depois, já havia
recebido massagens e tratamentos de pele, estou agora sentada enquanto
várias mãos faziam procedimentos nos meus cabelos, outras finalizavam as
minhas unhas.
— Está divina! — diz o cabeleireiro orgulhoso com um olhar
admirado.
— Posso ver? — pergunto ansiosa, já que todos os espelhos estão
cobertos.
— Ainda não, querida, vamos ao toque final.
— O toque final? — questiono curiosa.
Eu nunca havia ido a um spa, então para mim aquilo tudo era normal,
inclusive o vestido que me espera na sala ao lado a que eu estou.
— Nossa, é lindo! — exclamo com ele já no meu corpo.
Era um vestido delicado com o cumprimento no meio das minhas
coxas, ele é branco com muitas pedras, o busto e as mangas tinham detalhes
em renda.
— Nossa, e o seu marido é um sonho — pronúncia com deslumbre o
profissional que arrumou os meus cabelos. — As joias chegaram? Ótimo —
ele foi até a moça que segura uma caixa nas suas mãos, a pega e a abre. A
caixa é luxuosa, eu pude entender o que Leonardo falou sobre a pedra estar
escondida na aliança, eu penso ter ouvido Jéssica falar que era um diamante
raro, mas agora estou com um imenso pendurado no meu pescoço.
— Nossa, você está incrível — as mulheres no local suspiram.
— Parece que alguém vai a um jantar luxuoso — diz o estilista desta
vez. — Agora você está pronta.
Pequenas luzes dedicadas a mim foram acesas, os tecidos que
cobriam os espelhos caíram e me olho deslumbrada, quase perco o
equilíbrio quando vejo a minha imagem no espelho.
— Obrigada, eu estou linda — me admiro com fascínio.
— Hora de ir, o seu esposo a aguarda. — Aceno positivamente.
Entro em uma Mercedes modelo retrô que me aguardava na saída do
spa.
37
Um sonho realizado

Samanta Antonelli

O motorista segue em silêncio e chegamos a um caminho repleto de


flores, entramos em uma mansão com um jardim incrível, flores de várias
cores e uma fonte no centro, a casa era linda, clara de uma arquitetura que
achei que tal perfeição eu só veria no céu. Boa parte das paredes é de vidro,
mas estão cobertas por enormes cortinas brancas
— Onde estamos — pergunto quebrando o silêncio.
Ele estaciona o carro, sai em seguida e abre a porta me ajudando a
sair.
— Pai? — Olho surpresa para ele, que me espera ao lado da fonte.
— Você está linda! — Ele beija as minhas mãos com os olhos cheios
de lágrimas.
— Não estou entendendo nada, quando chegou? Cadê a mamãe? —
Ele me observa em silêncio, apoiando o meu braço no dele, caminhamos até
a imensa porta e paramos, olhando para os lados como quem procura
alguém.
Uma mulher se aproxima e coloca sobre o vestido uma saia de tule
com uma calda enorme e aos meus cabelos um véu foi preso. A imensa
porta é aberta e eu vejo Leonardo me esperando em um altar montado no
meio da sala, ele está de branco, sim, de branco, como um príncipe que
sonhei quando criança. Ele abre um lindo sorriso, as suas mãos estão no
bolso, ele faz movimentos para frente e para trás visivelmente nervoso.
Ouço a marcha nupcial e vários flashes na minha direção enquanto
sou conduzida ao altar, os meus olhos estão fixos aos do Leo, mas não pude
deixar de prestar atenção em todos os presentes, muitos eu não conhecia,
mas eu podia ver Jessica, Lucas e Davi. Seguro as lágrimas o máximo que
pude, mas a cada segundo que me aproximo de Leonardo sinto as minhas
pernas tremem e não tenho forças para conte-las mais, as deixando correr
livre para demonstrar o tamanho da minha emoção.
Ele beija as minhas mãos assim que papai me entrega a ele e em
seguida passa o dedo polegar enxugando minhas lágrimas, beijando o meu
rosto em seguida.
— Eu te amo — sussurra ao meu ouvido.

***

Depois que disseram: pode beijar a noiva, penso que nada mais vai
me surpreender, quando Leonardo pega o microfone.
— Samanta, vou ler para você os meus votos de casamento.
— Votos de casamento? — indago com um sorriso largo no rosto.
Como ele consegue ser tão romântico?
Então ele pega um papel do bolso e começa a ler:
— Em um dia como todos os outros dias, por acaso encontrei alguém
que me fez perder os sentidos, o meu coração parou de bater por alguns
segundos no momento em que a vi, mas naquele momento eu não entendi.
Quis te ver novamente e ser notado, mas fingi ser o acaso. Os nossos olhos
se cruzaram e vi o brilho intenso que a minha vida escura tanto procurava.
Beijamo-nos e os seus lábios eram viciantes, os seus beijos foram intensos e
a sua pele sensível ao meu toque, o começo da minha obsessão te querendo
a cada segundo, se tornando o meu primeiro e último pensamento, um
desejo sufocante, o qual não consegui conter. Te trouxe para mais perto e
cada vez mais perto até nos tornamos um e eu, que sempre vivi no inferno,
passei a agradecer a Deus, aquele a quem eu duvidava da existência. Eu
falo, olhando para o céu, obrigado pelo presente, pois mesmo sem merecer
Ele havia me dado você, e eu, que só conhecia o ódio, passei a conhecer e
sentir o amor.
Os seus braços me envolvem, ele sela os meus lábios suavemente e as
pessoas aplaudiam. A festa segue e havia pessoas que nunca vi, mas
Leonardo diz serem pessoas influentes e que ele precisava convidar.
Cumprimentamos os convidados, mato um pouco da saudade da minha mãe
e do meu irmão, que parece ótimo, Davi vem nos cumprimentar e é a
primeira vez que vejo o Leonardo sorrindo para ele.
— Nossa, que novidade! Quando foi que a simpatia entre os dois
surgiu?
— Estou muito feliz para me preocupar com qualquer outra coisa! —
Ele leva a minha mão até a sua boca e deposita um beijo.
— Como conseguiu fazer tudo isso da noite para o dia? — A festa era
luxuosa e não é nada que desse para organizar em vinte quatro horas.
— Não foi da noite para o dia, comecei assim que nos casamos e
mesmo com você sumida continuei, aliás, o que achou da casa?
— Ela é linda! E essas paredes de vidro, nossa! A casa deve ser bem
iluminada e que jardim! Ela é magnífica… — ele sorri do meu deslumbre.
— Quer conhecer o resto da casa? — fala apontando para as escadas.
— Claro — subimos de mãos dadas, por horas eu encostava a minha
cabeça no seu braço e mantinha o meu braço envolvido ao dele.
A casa esbanja luxo, os tons claros dos cômodos trazem paz e
aconchego, existem muitos quartos, tantos que nem pude contar e sem
deixar de mencionar a imensa academia, sauna e a piscina parecia olímpica.
— Uau! — digo abismada entrando em uma sala que parece um
cinema.
— Você gostou?
— Nossa! Você acredita que eu sempre sonhei com uma dessa, na
minha casa.
— Jura! — sorri divertido.
— Deve morar uma família enorme aqui.
— Atualmente são cinco empregados, três jardineiros, vinte
seguranças e um homem recém-casado com a sua linda esposa, que espera
ansioso para encher a casa de crianças — sussurra no meu ouvido.
— Essa casa é sua? — O encaro de olhos arregalados.
— Não, ela é nossa! — Ele me puxa pelo braço, subindo mais uma
escada.
— E por último, mas não menos importante, o quarto do casal —
sussurra no meu ouvido, ele tinha os braços em volta da minha cintura.
Os meus olhos passeiam por cada minúsculo espaço, as cores suaves
e elegantes, a cama nem parecia ser apenas para dois, as paredes de vidro
davam para a parte de trás do imenso jardim.
— O que achou? — A sua voz grossa e sexy me tira de um transe
momentâneo.
— Magnífica! — O meu tom era deslumbrado.
— Vem ainda tem mais, não será possível viajar hoje, imaginei que
iria querer curtir os seus pais e o seu irmão.
— Onde está me levando? — pergunto descendo a escada dos fundos
da casa.
— Não tenha pressa, meu amor. — chegamos à beira de um lago
afastado da mansão.
— O que é aquilo? — indago, apontando para um caminho iluminado
com pequenas lâmpadas de led.
Ele caminha sem responder seguindo as luzes, no final do caminho vi
casa entre as árvores para ser mais específica, ela ficava em cima de uma
árvore.
— O que achou? — me pergunta quando paramos em frente à casa.
— a nossa noite de núpcias? — Sorri enquanto aponto para o alto.
— Sabia que ia gostar! — Ele me puxa pela cintura tomando os meus
lábios com paixão. — Acho que já poderíamos pular para parte de
enchemos a casa de filhos. — Leo fala desenhando os próprios lábios com
uma expressão maliciosa assim que entramos na casa da árvore.
As suas mãos são rápidas e já começam a abrir o vestido beijando a
minha nuca.
— Ainda não disse os meus votos a você — sussurro me virando e
passando os braços pelo seu pescoço.
— Eu quero muito ouvir. — Ele se senta na cama me encarando com
um lindo sorriso.
— Então, vamos lá, eu não escrevi nada, então, foque em mim —
digo divertida.
— Nunca desviei os meus olhos dos seus — diz de forma sexy e
envolvente.
— Hoje, mais do que nunca, nos tornamos um do outro, eu te
entreguei tudo, te dei uma morada no meu coração e não tenho dúvidas que
é em você o meu lugar. Olho para o nosso passado que nem é tão distante e
vislumbro o nosso futuro, mas sem deixar de viver o agora, sem que haja
preocupação com o que está por vir, ou mágoas do que já se foi. Hoje
somos só um com os nossos futuros fundidos, sem os medos que um dia me
assombrou e sem incertezas do que me espera, o nosso amor foi posto à
prova e superamos os obstáculos, agora não há mais dúvidas de que
estaremos mais fortes e juntos na eternidade.
— Você pensou em tudo isso agora? — indaga me puxando para o
seu colo.
— Talvez. — Dou de ombros o encarando com um sorriso maroto.
Ele me joga na cama, os seus olhos me estudam e uma expressão
pensativa surge no seu rosto, ele continua me analisando com o dedo
indicador na boca.
— Assim não vai dar certo, onde arrumaram tanto pano? — diz
desapontado. — Deveriam fazer um vestido mais prático que ajudasse os
noivos na noite de núpcias — foi impossível segurar a gargalhada.
— Vem aqui… — ele me ergueu pelo braço, me agarrando pela
cintura e me virando de costas, voltando a desabotoar os botões.
— É sério isso? — ele indaga com frustração. — São muitos… —
completa com um longo suspiro.
Eu sorrio, me divertindo, mas não demora muito até que o meu corpo
fique livre de todo aquele vestido e o calor do seu toque é a única coisa que
a minha pele sente. O vestido vai completamente ao chão e Leonardo me
olha como quem vê algo inédito, analisando cada parte do meu corpo. Ele
tira o meu sutiã e a minha calcinha enquanto beija as minhas costas e dá
uma leve mordida no meu bumbum. O ajudo a tirar as suas roupas, a minha
mão explora cada músculo do seu corpo, a sua mão começa a explorar cada
centímetro da minha pele, ele passa a mão pela minha nuca e me deita
lentamente na cama, ficando por cima de mim, me beijando docemente e
dando uma leve mordida nos meus lábios. Os seus beijos descem pelo meu
pescoço e chegam até os meus seios, as chamas tomam conta do meu corpo,
as suas mãos vão até a minha intimidade e solto um gemido alto, me
contorcendo de prazer a cada toque.
— Eu te amo! — sussurra na minha boca enquanto entra com ainda
mais intensidade. — Diz que eu sou o seu homem.
— Você é o meu homem — digo entre gemidos, ele urra dentro de
mim, a sua boca encontra os meus seios, ele chupa e dá leves mordidas.
— Goza para mim. — Não foi um pedido, foi uma ordem, o meu
corpo estremece dentro do orgasmo que vem em simultâneo com o dele.
Ele se joga ao meu lado, um sorriso estampa o seu rosto enquanto
morde o lábio, se recompondo.
— Ainda vamos precisar voltar a festa? — Me viro o abraçando.
— Só se for da sua vontade. — Beija docemente os meus lábios.
— Acho que para encher a casa de filhos temos que treinar mais! —
Os meus dedos traçaram o caminho pelo seu corpo.
— Acho a ideia ótima — os seus lábios voltam a tomar os meus com
desejo.
38
Matando a saudade

Leonardo Milani

Acordo antes da Samanta, Maria bate na porta e deixa a comida que


eu havia pedido, monto um café da manhã na mesa da varanda na casa da
árvore e me sento na poltrona próxima à cama. Minutos depois os raios de
sol começam a beijar a sua face, os seus cabelos sobre o seu rosto e
completamente nua, é realmente uma visão para se ter no início do dia, eu
apenas a aprecio em silêncio.
Ela vai despertando preguiçosamente, as suas mãos passeiam pela
cama à minha procura, ainda de olhos fechados e se agarra ao meu
travesseiro, respirando como se sentisse o melhor aroma, a minha boca se
curva em um sorriso.
— Gosta do cheiro, meu amor? — Ela sorri abrindo os olhos
lentamente.
— O que faz aí calado? — Esconde o rosto envergonhada e levanto
sorrindo da poltrona, indo até ela.
— Estava observando você dormir — digo, sentando ao seu lado e
alisando a sua pele nua.
— Seu pervertido! — exclama com um sorriso divertido, cobrindo o
corpo com o lençol de seda fino, que desenha com perfeição os seus seios.
— Não tem nada aí que eu não já tenha visto. — Pisco um olho. —
Aliás, você parece estar querendo me seduzir enquanto dormia, ressonando
alguns gemidos — falo em um tom divertido, acariciando as suas coxas.
— Tire já a mãos daí. — Ela dá uma leve tapa na minha mão. — Me
deixe levantar, tomar um banho e comer, eu estou faminta! — Se ergue
rápido da cama.
Fico sentado na cama, tomando café e lendo alguns e-mails, ela sai do
banheiro enrolada na toalha.
— E agora, o que vou vestir? — Olha o vestido de noiva cogitando
colocá-lo.
Vou até um gaveteiro e tiro peças íntimas e um vestido para ela.
— Hum… preparou tudo muito bem, pensou em tudo — o seu tom
era orgulhoso.
— Você esqueceu que se casou com uma mente brilhante, meu amor?
— A envolvo em um abraço. — Agora venha, sente-se que vamos comer e
acredito que está com saudades da sua família! — Puxo a cadeira para que
ela sentasse.
— Claro, estou morrendo de saudades do meu pequeno e dos meus
pais! — Os seus movimentos ganham rapidez, como alguém que faz com
muita pressa.
— Não precisa ter pressa, vamos vê-los assim que terminar.
— Não vai trabalhar? — Me olha confusa, eu queria que ela tirasse
essa imagem de um homem que trabalha até a morte, era estranho ouvi-la
sempre me perguntar se eu iria trabalhar, até no dia seguinte do nosso
casamento.
— Claro que não, onde já se viu um recém-casado em lua de mel sair
para trabalhar?
— Não vamos viajar? — Ela dá de ombros.
— Podemos ir se quiser, onde você quer ir? — digo e me olha
pensativa, eu espero que ela diga o óbvio! Paris, Veneza.
— Qualquer lugar? — A pergunta veio depois de vários minutos
pensando.
— Sim, contanto que seja no planeta terra — digo divertido.
— Sim, fica na terra, eu quero ir para o Havaí — ela pronúncia com o
garfo apontado para cima e o seu olhar distante se imaginando no lugar.
— Havaí? — pronuncio surpreso. — Tudo bem, se é aonde quer ir,
então nós vamos! — Ela salta no meu colo me dando vários beijos, era
muito fácil deixá-la feliz.
— Então vamos para mansão, ou pretende morar na casa da árvore
para sempre?
— Não seria nada mal, você já viu o tamanho disso? Aqui tem tudo,
dá para uma família morar aqui! E sem falar que aqui sempre é só eu e
você… — Envolve os braços em volta do meu pescoço.
— Sabe que não seria nenhum sacrifício ficar aqui para sempre,
sozinho com você! — Ela sai do meu colo, se pondo de pé, eu me levanto, a
abraçando pela cintura, tirando-a do chão e beijando-a.
— Vamos, logo antes que você me prenda e nunca mais me deixe sair
desse quarto.
— Certo, vamos. — A coloco no chão.

***

— Nossa! Que casa linda — ela fala ainda com deslumbre.


— Fico feliz que tenha gostado, branca e clara do jeito que você
queria.
— Só é exagerada, não acha grande demais?
— Por enquanto somos só nós dois. — A abraço enquanto
atravessamos o jardim.
— Que saudade, parece que faz uma vida que não te vejo — Samanta
abraça Maria assim que cruza a porta da mansão.
— Também senti a sua falta, menina, nunca mais saia de casa assim
— o seu tom era repressor.
— Foram alguns dias difíceis, mas agora está tudo bem! — garante
Samanta, com um sorriso.
— Sam! — Samuel, o irmão de Samanta, corre pelas escadas direto
para os seus braços.
— Meu Deus, eu não sabia que ainda estavam por aqui! — ela tira o
garoto do chão. — Cadê? Deixa eu ver, hum… — Samanta gira várias
vezes o irmão e o analisa. — Você está muito grande, andou trapaceando?
Desse jeito logo vai estar maior que eu! — diz em um tom divertido,
arrancando sorrisos do garoto.
— Bom dia — a mãe da Samanta nos cumprimenta.
— Já tomaram café da manhã? — Samanta pergunta.
— Sim e o seu pai já saiu para acertar a transferência dele para cá
novamente, eu e Samuel vamos ficar a manhã com você antes de voltar para
casa.
— Não tenha pressa, fique o quanto quiser, quanto ao seu pai,
Samanta, eu disse que ele não precisava ter pressa quanto a transferência,
mas você o conhece. — Dou de ombros.
— Eu sei, meu amor.
— Bom, vou deixar vocês sozinhas, devem ter muito para conversa.
***

Já havia se passado uns dias eu e Samanta ainda vivíamos a fase de


lua de mel, estávamos no nosso melhor momento.
— Senhor! — A recepcionista anda apressada na minha direção assim
que cruzo a entrada do prédio da Milani.
— Algum problema? — Olho confuso.
— Tem uma senhora dizendo ser a sua mãe, pedi que esperasse na
recepção.
— Bom dia, filho! — Ela desfila na minha direção.
Viro as costas indo em direção ao elevador com ela no meu encalço.
— Eu não tenho mãe, então, deixe de encenação e seja breve, fale o
que quer — digo sem encará-la.
Entro no elevador e ela continua me seguindo.
— Você casou, fiquei ofendida por não receber o convite para a festa,
eu queria ter te acompanhado até o altar.
— Seja breve, não vou demorar muito na empresa — falo, entrando
na sala e fechando a porta atrás de mim.
— Nunca imaginei que iria se casar um dia, afinal, você nunca foi
muito de sentimentalismo, isso desde criança — ela fala casualmente, com
se fossemos amigos. — Eu e o seu pai queremos conhecer a sua esposa,
vamos marcar um jantar.
— Não tenho tempo para perder, apenas fale o que quer — falo em
um tom irritado, vasculhando os papéis na minha mesa.
— Tudo bem, serei direta, o seu pai está com problemas na empresa.
Agradecemos quando parou de nos perseguir, foi generoso da sua parte,
mas as coisas ainda andam mal e tem o Davi, eu gostaria que você
ensinasse o seu irmão a ser um bom gestor.
— E por que você acha que vou ajudar?
— O que você acha de saber quem são seus pais biológicos? — Paro
o que estava fazendo na mesma hora para encará-la.
— Não tenho interesse — respondo forçando um sorriso.
— É uma pena, parece que o seu pai está perto de morrer e gostaria
muito de saber quem é o filho que foi roubado dele quando ainda era um
bebê — as suas palavras saem cheias de veneno.
— Roubado? — indago a encarando.
— Exatamente — sorri, satisfeita por despertar a minha curiosidade.
— De quanto precisa? — Tento não mostrar interesse, mas além de
interessado, fico ansioso por mais detalhes, descartando a possibilidade de
investigar por conta própria, eu queria respostas imediatas.
Ela sorri com satisfação arrastando a sua oferta em um pedaço de
papel, arqueio as sobrancelhas, o valor era tão baixo que parecia uma
ofensa.
— Ok, vou transferir o valor e o Davi pode começar aqui na empresa
comigo, mas antes vou checar se as informações são verdadeiras e quero
saber como descobriu — falo voltando a minha atenção aos papéis sobre a
mesa.
— Acho que como eu descobri é irrelevante, se você quisesse saber já
teria ficado sabendo e por muito menos do que vai me pagar agora. Está
aqui o endereço e fotos dos seus pais, os visite e faça o teste de DNA se
quiser! — Ela arrasta o envelope pela mesa.
— Saia, já falamos tudo que tínhamos para falar, aguarde o contato do
meu assistente depois que eu checar as informações. — Ela se levanta,
sorrindo, e sai em silêncio.
Não abro o envelope, o pego, guardando na maleta e volto a minha
atenção para o trabalho.
39
As minhas raízes

Leonardo Milani

Chego em casa e está tudo em um completo silêncio, subo para o


quarto e tomo um banho, então me jogo na cama, afundando o meu rosto
nos travesseiros. Viro-me, encarando o envelope que deixei sobre a mesa de
apoio, o pego, jogando as fotos sobre a cama. Eu não sei se toda essa
história é real, mas meu coração aperta vendo a casa e as condições que as
pessoas da foto vivem.
— Leo, não vi quando chegou. — Samanta entra no quarto e se senta
na cama ao meu lado.
— Desculpe, estava muito cansado e subi direto.
— Cansado? — ela me estuda com os olhos. — O que está te
incomodando? Você nunca reclamou de cansaço — Arrasto as fotos na sua
direção e ela pega confusa.
— Quem são essas pessoas? — Ela olha as fotos com um olhar
confuso e curioso.
— Não tenho certeza, mas podem ser meus pais biológicos. — Os
seus olhos me encaram com surpresa.
— Como os encontrou?
— A mãe do Davi esteve lá na empresa hoje e me vendeu as
informações.
— Nossa, que nojo desse povo movidos a dinheiro — sorri do seu
tom enojado sobre uma atitude que estou mais que acostumado.
— Quando vamos lá? — indaga me entregando as fotos.
— Você acha que devo ir? — Encolho os ombros sem saber o que
fazer.
— Claro! Vamos quanto antes… — ela inicia, falando com muito
entusiasmo, e diminui o tom de voz no final, hesitando.
— O que foi? — pergunto quando pausa de repente.
— Desculpe, achei que pudesse estar sendo invasiva, é seu tempo e
vamos quando achar que está pronto, se você achar que quer ir.
— Se você estiver do meu lado, eu consigo encarar tudo, meu amor.
— Junto as suas mãos nas minhas e as beijo em seguida.
— Então, vamos resolver logo esse assunto, eles parecem bem
humildes, talvez estejam precisando de ajuda — fala, de uma forma não
natural, tão carinhosa, que percebo que estou ao lado da mulher certa.
— Iremos amanhã! — Ela levanta os olhos espantada.
— Amanhã? — Sorri em seguida.
— Você tem razão, eles podem estar precisando de ajuda.

***

Tomo o meu café na varanda como todos os dias, olho Samanta


dormir, o despertador toca e ela salta da cama.
— Por que tanta euforia? — indago confuso diante da cena incomum.
— Como não ficar eufórica? Talvez você complete a sua família.
— A minha família já está completa, meu amor, você é a minha
família e já imagino essa casa com muitas crianças — vi a sua expressão
mudar, desde que ela voltou, eu tenho falado sobre filhos e começo a achar
que estou sendo insensível, consideramos que acabamos de perder o nosso.
— Me desculpe, eu falo por falar! Você já me basta, o resto virá com o
tempo.
— Vou tomar um banho e volto para irmos.

***

Já no carro, ela fica em silêncio por um bom tempo, embora eu esteja


ansioso e nervoso, eu não pude deixar de notar.
— Meu amor, me desculpe se fui insensível, eu sei que acabamos de
perder o nosso filho, não se sinta mal.
— Está tudo bem, vamos focar nos seus possíveis pais biológicos,
estou feliz com essa possibilidade, estou feliz por você — ela me mostra
um sorriso sincero e embora eu considere desistir várias vezes no caminho,
eu não quero desapontá-la, mostrando a minha covardia em encarar a minha
história.
Entro com o carro em um bairro humilde, a cidade fica a poucas horas
da nossa casa. Samanta olha atentamente, tentando ver os números nas
casas, muitas delas não tem, mas temos foto da casa e isso seria de grande
ajuda.
— Achei, Leo! — A sua voz sai animada e o meu coração acelera, os
meus olhos seguem a sua mão esticada.
Ver a situação da casa me fez os meus olhos se encherem de lágrimas,
ela desce apressada assim que estaciono o carro, desço em seguida e avisto
uma senhora na janela da casa com um ar abatido, semblante caído, cabelos
desarrumados e vestindo trapos.
— Bom dia, senhora — a voz da Samanta era bem animada, ela acena
com a mão e espera pela resposta.
— Bom dia, procuram por quem? — A senhora nos lança um olhar
desconfiado, nos estudando com os olhos.
— Estamos um pouco perdidos, pode nos ajudar, já andamos
bastante, estou bem-casada também, sabe! — Samanta sorri simpática e a
senhora então sai de trás da janela, abrindo a porta em seguida.
— Ah, claro, saiam do sol, entrem! — Ela anda lentamente,
atravessando o quintal e abrindo o portão da casa. — Sentem-se aqui, vou
buscar água para vocês ou um café — diz, indo até a cozinha, que dividia
com a pequena sala.
— Água, obrigada — Samanta agradece e aceita a gentileza, tudo é
bem humilde, porém tudo limpo e organizado. — Estamos um pouco
perdidos, se importa em nos fazer um pouco de companhia? — Samanta
pergunta quando ela volta com água e o café, já que eu não disse qual seria
a minha preferência.
— Imagina, será um prazer, passo muito tempo aqui sozinha — ela
sorri simpática sentando em uma cadeira de plástico em frente a nós.
— A senhora vive sozinha aqui?
— Não, o meu marido está em um hospital muito doente, foi sorte me
encontrarem em casa, eu passo muito tempo lá.
— E os seus filhos onde estão?
— Tive apenas um que foi arrancado dos meus braços quando ainda
mamava — a dor toma conta dos seus olhos e parecem sinceros, um frio
atravessa o meu corpo e se tudo isso fosse uma armação daquela cobra? —
Ele deve ser um homem lindo assim igual a esse moço calado aí do seu
lado.
— Nossa! Quem tiraria uma criança dos braços da mãe? — Olho para
Samanta, que está concentrada emprenhada em arrancar informações. —
Me desculpe, não quero ser indelicada, não responda se não quiser.
— Tudo bem, minha filha, eu posso falar. O Meu pai é de família rica
e o meu marido muito pobre, o meu pai nunca aceitou o meu
relacionamento com o meu marido, então, quando descobriu que eu estava
grávida, me trancou em casa e deu o meu filho assim que nasceu! — Os
seus olhos se enchem de lágrimas, um nó se forma na minha garganta e se
aquilo tudo fosse verdade?
— Tudo bem, não precisa continuar se as lembranças te machucam —
Samanta fala, mas a senhora continua.
— Consegui fugir de casa e hoje vivo aqui com o meu marido,
tempos depois tive uma doença onde foi preciso tirar o meu útero, então,
não pude mais ter filhos — conclui em meio aos soluços. — Estou
envergonhada de chorar assim! — Levanta indo para a cozinha, lavando o
rosto na pia.
— Ficaria feliz se o encontrasse? — Sei que a resposta dela seria
óbvia para a pergunta, qual mãe que se diz ter tido o filho tirado dos seus
braços iria dizer que não queria conhecer o filho?
Sinto medo mais uma vez de que tudo fosse uma armação para me
extorquir, mas deixo que Samanta conduza a situação que eu não estou
conseguindo lidar.
— Claro, o meu único filho por quem chorei e orei a Deus para que
colocasse pessoas boas no seu caminho, para que não passasse fome e fosse
um homem inteligente e bem-sucedido. Eu tentei descobrir onde ele havia
deixado ele, mas fui perdendo as esperanças ao longo dos anos.
— Esse é o seu marido? — Samanta arrasta a foto até a senhora.
— Sim, mas por que tem a foto dele? — Ela olha desconfiada dessa
vez.
— Porque achamos que podem ser os pais do meu marido —
Samanta foi direta.
A senhora levanta os olhos, ela se mostra incrédula, ficando em
choque, parada me encarando e eu também não tenho reação.
— o meu filho? — pronúncia em um sussurro.
— Não temos certeza, mas é uma possibilidade. — Samanta dá de
ombros.
— Como você é lindo! — Levanta com as mãos esticadas na minha
direção, elas tremem e me aproximo notando a sua hesitação, ela desenha o
meu rosto, as lágrimas banham a sua face. Estou nervoso e as minhas mãos
soam, sinto vontade de abraçá-la, mas me contive com medo de me
decepcionar caso o resultado do DNA fosse negativo.
— A senhora se importa em fazer um teste de DNA, para termos
certeza? — Samanta interrompe o momento.
— Claro, minha filha, claro que aceito! — Os seus olhos estão fixos
aos meus, eu quero correr dali e chorar as lágrimas presas nos meus olhos.
— Meu filho amado — ela sussurra sem desviar os olhos.
40
Muito tempo sozinho

Samanta Antonelli

Algumas semanas depois, com o resultado positivo nas mãos,


Leonardo foi até o hospital e conheceu o seu pai, foi um encontro lindo e
emocionante, totalmente libertador. Leonardo parecia outra pessoa, tinha
um sorriso no rosto e um brilho diferente, um ar mais leve, eu podia ver o
peso da rejeição caindo. Ele organizou a transferência do pai para um
hospital particular aqui perto, quando a sua mãe cogitou alugar um
apartamento, mas a nossa casa é tão grande e imensa que eu não vi
problemas de ela ficar aqui, pelo menos por um tempo.
Ainda lembro dos olhos de Diane, a minha sogra, ao ver a casa do
filho, não ficou tão deslumbrada, acredito que ela já tenha morado em algo
parecido já que veio de uma família rica. Ela apenas repetia que Leonardo
havia puxado o avô, inteligente com um bom tino para os negócios. Diana
sorri quando conto como o filho é genioso, eu ainda tive a coragem de dizer
que ele certamente precisou de umas palmadas quando criança, mas que
agora estava tudo sob controle.
Estamos sentados à mesa, conversando e sorrindo, o meu coração
transborda em felicidade, eu sei que nesse momento todas as suas feridas
estavam se fechando, e é bom ele saber que ele sempre foi amado pelos
pais.

***

— No que está pensando? — pergunto a Leonardo quando saí do


banho e o encontro distante deitado na cama.
— Olho para trás e me arrependo do tempo que estive sozinho, se eu
tivesse sido menos orgulhoso e impulsivo, estaria com os meus pais a mais
tempo, como me doeu vê-los vivendo de forma tão precária enquanto vivo
no luxo todo esse tempo… — Me deito ao seu lado e ele acaricia os meus
cabelos.
— Não pense nisso, eles agora estão aqui perto, nós estamos juntos e
todo esse caminho te fez crescer como pessoa.
— eu amor, acho que os nossos pais vão adorar um neto, o que
acha de tentar um bebê? — ele fala apalpando o meu bumbum.
— Eu acho que você perdeu a prática — sorrio de forma divertida.
— Acho que precisamos praticar mais então — diz exalando luxúria.

***

— Que delícia! — acordo com vários beijos pelo meu corpo, abro os
olhos lentamente e me viro para ele. — Que sorriso lindo esse agora de
manhã.
— Como não sorrir tendo você comigo — me encaixo nos seus
braços, sentindo o seu calor, o seu cheiro…
— Vamos descer, tomar café, vamos buscar o seu pai hoje — o
lembro.
— Sim, eu queria passar o dia todo com você assim agarradinho, mas
você tem razão, ele deve receber alta cedo. — Levantamos e entramos
juntos no banheiro.
— Mas acho que dá tempo de namorar um pouquinho no chuveiro —
a sua voz rouca de quem ainda está acordando, sussurrada no meu ouvido,
me deixa sem fôlego, e as suas mãos grandes envolvem os meus seios, não
tenho como resistir a esse homem.

***

Descemos e vejo a Maria com a minha sogra trocando receitas, elas


parecem se entender bem.
— Filho, acordou! — Ela vem na sua direção e ele se abaixa para
receber um beijo no rosto.
O brilho nos seus olhos enche o meu coração de ternura, eu o amo e
não posso me sentir menos feliz do que estou agora.
— a minha nora, precisa comer isso para os bebês virem logo, sente-
se aqui e coma para poder ficar forte — ela fala se aproximando e me puxa
até a mesa que fica na cozinha.
— Acho que a senhora está certa, vou precisar de muita força para dar
conta do fogo do seu filho! — Leo me lança um olhar tímido que eu nunca
havia visto e sorrio alto.
— O que foi? Falei alguma mentira? — indago, o deixando ainda
mais tímido.
— Meu amor, desse jeito elas vão achar que sou uma máquina
insaciável — nós três rimos do seu tom envergonhado e as suas bochechas
vermelhas de vergonha.
— Não se preocupe, minha filha, sei como é, o pai dele era igual
quando jovem, não me deixava sair do quarto.
— Nossa, não precisava nem de DNA para confirmar a paternidade
— gargalhamos. — Quando entro naquele quarto, nunca sei quando verei o
resto da casa novamente — completo ainda rindo.
Leonardo morde o lábio contendo um sorriso sexy.
— Conte a todos a verdade, meu amor, é você quem não me deixa
sair do quarto — diz em um tom divertido, mas logo se recompõe.

***

— As duas já comeram? — Confirmamos com a cabeça.


— Então vamos para o hospital! — ele já tem até as chaves do carro
nas mãos.
— Temos sempre que andar com tantos seguranças? — Diane
pergunta.
— Na maioria das vezes. Isso te incomoda, mãe? — ele a olha pelo
retrovisor.
— Não, eu só tinha me esquecido como era viver assim, o seu avô
sempre nos fez andar cercados de seguranças.
— Quem é ele? — pergunto curiosa.
— Ele vive em outro país agora, com o meu irmão e o filho, não vale
a pena.
— Claro, tem razão — sorri, voltando a minha atenção à estrada.
Chego ao hospital e vamos direto para o quarto do meu sogro, ele está
sentado em uma cadeira de rodas, de frente para a porta, imagino que nos
esperando.
— Pai, chegamos, viemos te buscar — sinto a emoção nas palavras de
Leonardo.
— Sogro, bom dia! — Aceno.
— Vocês chegaram cedo. — Leonardo abaixa para abraçá-lo e se
levanta enxugando uma lágrima que acaba de cair dos olhos.
— Quer ficar mais tempo? — Diane fala de forma divertida, dava
para notar o quanto eles se amam.
— Claro que não, vamos para casa.
— Bom dia, o paciente vai ter alta hoje e fico feliz que, após tanto
lutar pela vida, enfim terá alta — o médico diz, entrando no quarto
animado. — Está aqui a alta do paciente, agora precisa cuidar mais da
saúde, da alimentação e nada de ficar sem comer tanto tempo, não tem
idade para fazer dietas.
Leonardo olha para o médico sem dizer uma palavra, ele não tinha
como imaginar que eles estavam passando por um momento difícil e que
não tinha muita comida em casa, mas não o culpo, ele não sabia de nada!
Leonardo abaixa a cabeça, noto os seus olhos pesar e ele tenta conter as
lágrimas.
— Não se preocupe, doutor, ele vai se alimentar muito bem e cuidar
bem da saúde — garanto com um sorriso. — Agora vamos, que aposto que
o meu sogro está doido para chegar em casa.

***

Já de volta em casa, Leonardo faz um tour com o pai apresentando a


mansão e por último mostra o quarto todo adaptado, apresenta as
enfermeiras que iriam assisti-lo de agora em diante, já que ele ainda precisa
de fisioterapia para voltar a andar depois de um AVC. Deixamos os pais de
Leonardo no quarto, sozinhos e seguimos para o corredor.
— Você realmente não se importa que os meus pais morarem
conosco? — Ele me olha fixo nos olhos, aguardando a resposta.
— Claro que não, meu amor, vocês passaram tanto tempo separados e
a casa é tão grande.
— Eu te amo, não imagino a minha vida sem você — ele fala me
dando vários beijos.
41
Quero um filho

Leonardo Milani

Alguns meses depois…

— Samanta, meu amor… acorde! — Distribuo vários beijos pelo seu


corpo, ela abre os olhos lentamente, enquanto se espreguiça.
— Você está muito preguiçosa esses dias — provoco.
— É você quem está me deixando assim — sorri lindamente.
— Vamos, se apresse que estamos te esperando para tomar café da
manhã. — Levantei-a pelo ombro, conduzindo-a até o banheiro.
— Estamos? Quem está aí embaixo? — pergunta curiosa.
— Os seus pais e o Davi com a namorada.
— Os meus pais? E desde quando Davi tem namorada? — indaga em
um tom confuso.
Após passar tanto tempo juntos, eu e o Davi nos tornamos próximos,
isso deixa a Samanta feliz. Não tenho me sentido mal com a sua presença,
ele é um moleque bom apesar dos pais que tem. Espero por ela sentado na
cama, mas levanto assustado quando a vejo saindo do banheiro em
lágrimas.
— O que aconteceu, meu amor? — A envolvo no meu braço.
— Menstruei de novo — diz entre soluços.
— Está tudo bem! — Levanto o seu rosto pelo queixo com o dedo
indicador e a beijo rápido nos lábios.
— Você acha que não vou conseguir mais ter filhos? — fala com
tristeza.
— Claro que vai, vamos ao médico se você quiser, se for preciso dou
tudo que tenho para que você volte a engravidar! — garanto, tentando
confortá-la.
— E se eles falarem que não posso ter mais filhos? — indaga em
meio às lágrimas.
— Podemos adotar, quantas crianças você quiser — ela sorri triste,
abaixando a cabeça em seguida.
— Vamos descer, todos estão esperando. — Samanta se troca e coloca
um pouco de maquiagem tentando esconder os olhos inchados pelo choro.
A abraço e beijo os seus olhos enquanto enxugo as lágrimas que
teimosamente caem dos seus olhos.
— Eu te amo — sussurro no seu ouvido.

***

— Minha garotinha. — Lilian, a mãe da Samanta, anda às pressas


para abraçar a filha.
É estranho ver tantas pessoas em casa, mas eu não acho ruim, é
apenas um sentimento diferente, um sentimento bom de ter uma família e
de alguém para quem voltar todos os dias.
— Sam — Davi a abraça e lhe dá um beijo na testa.
— Onde está a sua namorada? — ela pergunta olhando para os lados.
— Aqui! — A vejo paralisada e virando lentamente.
— Gabi? — um sorriso lindo, feliz e sincero desenha no seu rosto. —
Não acredito que Davi é o seu namorado! — Ela abraça a amiga e pelo
menos naquele momento sei que ela se esqueceu das suas frustrações.
— Venha a minha nora, sente-se, fiz esse caldo para você — a minha
mãe fala entrando e colocando na mesa o prato. — Você vai ver que logo
vai encher essa casa de netinhos — Samanta me encara com os olhos
aflitos, a sua expressão muda rapidamente.
— Não pressione a Samanta, perdemos um filho a pouco tempo, o
bebê virá no tempo certo — falo, tirando o caldo de perto da Samanta.
O ar fica tenso e todos se entreolharam.
— Sam, estou organizando um jantar de noivado, todos aqui estão
convidados — Davi abraça a amiga de Samanta, desviando o foco da
conversa.
— Noivado? — Ela volta a sorrir.
Ela gosta muito dessa amiga, elas às vezes ficam horas conversando
ao telefone.
— Não vai comer, meu amor? — pergunto me sentando ao seu lado e
colocando frutas no prato.
Ela sorri mordendo um pedaço de melancia.
— Estou pensando, você deveria voltar a trabalhar — sugeri, a
encorajando para ter uma distração.
— Você acha? O que eu poderia fazer? — diz interessada.
— Escolha qualquer coisa, o que você quiser fazer eu te apoio.
— Sim, é uma boa ideia, voltar a trabalhar — Lilian concorda.
— Você pode ir para um dos bancos, Samanta, você sempre disse
querer trabalhar em um banco — Davi sugere.
— Vou pensar no assunto.
Voltamos a conversar sobre assuntos diversos, em seguida Samanta
fica horas com a amiga no jardim.
— O que acha de fazermos a viagem que tinha me proposto? —
pergunto quando ficamos a sós novamente. — Me desculpe, eu fui
desleixado com a nossa relação, já deveríamos ter feito isso. — Coloco uma
mecha de cabelo que caia nos seus olhos atrás da orelha.
— Você nunca foi desleixado, sempre foi o melhor amigo, namorado,
marido e amante. Você é completo, eu nem sei se merecia tanto — sorri e
me beija carinhosamente.
Toda essa história de filhos deixa a Samanta tensa, apreensiva, lógico
que quero ter filhos, mas eu a quero muito mais que qualquer outra coisa.
42
Primeiro dia de trabalho

Samanta Antonelli

Passo dias analisando a sugestão de Leonardo e resolvo aceitar o


trabalho no banco, sair de casa um pouco e fazer coisas produtivas. Mesmo
com a insistência do Leonardo em me colocar na diretoria do local, eu o
convenci que a gerência já é o bastante, pois não tenho muita experiência e
preciso aprender.
Depois que tirei a minha habilitação, passei a dirigir um dos carros da
casa e ir sozinha para os locais, eu faço questão de chegar mais cedo ao
banco, o coordenador já me espera.
— Olá, Samanta, eu sou Rubens, seu coordenador, é um prazer
conhecê-la. — Ele estende a mão e sorri simpático.
— Obrigada, o prazer é meu! — respondo ao cumprimento.
— Vem, vou te mostrar a sua sala — Caminha na frente e eu o sigo.
— Essa é sua sala, sente-se, vou te passar o trabalho.
Ele me mostra documentos e me ensina a usar o sistema do banco,
eram muitas informações e mesmo que eu anote tudo ainda teria dúvidas.
— Muitas dúvidas? — Ele sorri da minha expressão confusa.
— Imagina, você explica bem, eu consigo entender perfeitamente,
mas lógico que ainda vou lhe fazer muitas perguntas.
— Estou aqui para lhe ajudar, pergunte o que quiser — diz com
simpatia.
Ele tem um estilo despojado, mesmo com roupas sociais, o seu ar de
moleque era bem visível, os cabelos não estão sobrecarregados de gel, eles
possuem um balaço natural e por vezes umas das pequenas mechas caem
sobre os olhos em um tom dourado.
— Faz muito tempo que é coordenador aqui do banco? — indago
curiosa, ele parece ser bem jovem para o cargo.
— Não, fui promovido a uns dias, eu era gerente, tecnicamente você
está no meu antigo emprego — pronúncia orgulhoso.
— Ah… entendi, então estou aprendendo com que sabe bastante — o
meu tom foi divertido e ele sorri.
— Recebi ordens para te passar tudo nos mínimos detalhes e se
precisar de ajuda, não hesite em me chamar.
— Claro, não se preocupe — digo em tom de promessa.
— Então vamos, vou te apresentar a equipe.

***

Leonardo Milani

Estou na empresa quando a minha secretária comunica que tem


alguém querendo falar comigo, uma tal de Vanessa, ela tem vindo a vários
dias a minha procura e fica boa parte da manhã na recepção esperando que
eu a receba, nego como todos os dias e volto ao meu trabalho.
Quando enfim o expediente acaba, vou até o carro como todos os
dias.
— Senhor Milani — os gritos no corredor me fazem virar, olho
rapidamente e volto a andar sem reconhecer a pessoa que está me
chamando.
— Sou a Vanessa — grita, fiz uma breve pausa, mas volto a andar
sem encará-la novamente.
— Senhor, quer que eu verifique? — Um dos meus seguranças
pergunta.
— Não se preocupe com isso — respondo entrando no carro e dando
partida.
— Senhor! — Sou forçado a frear quando a tal mulher se joga em
frente ao carro.
— Que merda essa mulher quer? — digo irritado. — Saia e resolva
isso.
Mas antes que o meu segurança saísse, ela bate do meu lado na janela,
eu não olho na sua direção, os meus seguranças já estão a afastando do
carro.
— Preciso que me ajude, o seu filho está mal no hospital precisando
da sua ajuda — ela grita, tentando se soltar e a palavra filho chama a minha
atenção, abro a janela gesticulando para que eles a tragam até mim.
— Entre no carro — ordeno saindo e indo para o banco de trás.
Ela entra ainda ofegante e senta ao meu lado.
— Do que está falando? Eu nunca te vi na minha vida, pare de fazer
escândalos na porta da minha empresa, eu não tenho filhos.
— Tivemos um caso de uma noite e engravidei de você, agora o
nosso filho precisa da sua ajuda — ela diz em meio às lágrimas e mordo o
lábio sorrindo incrédulo.
— Se você tivesse mesmo um filho meu, já teria me procurado atrás
de pensão, não acha? — indago com deboche.
— Não estou atrás do seu dinheiro, o nosso filho só tem seis anos, por
favor ajude, não teria vindo se não fosse urgente, faça um exame de DNA,
faça o que quiser, mas nos ajude — ela implora.
— Eu não tenho filhos, sai do carro! Não tenho tempo para golpistas.
— Ele está com leucemia e precisa de doação de medula, eu não sou
compatível.
— Saia! — digo ignorando as suas súplicas.
— Eu imploro. — Junta as duas mãos em lágrimas.
Eu nunca fiquei com nenhuma mulher sem usar camisinha, a não ser
Samanta, na nossa primeira noite, ela era virgem e eu estava tomado pelo
tesão.
— Saia do carro e não volte aqui para dizer esse tipo de coisa, ou vou
processá-la
— Por favor, ele precisa da doação e pode morrer se não receber a
medula rápido.
— Sinto muito. — Viro o rosto para o lado oposto
— Nos conhecemos em um programa, usamos camisinha, você foi
bem taxativo em relação a isso, mas não sei, aconteceu — diz apressada.
— Se foi esse o caso, essa criança pode ser de qualquer um —
desdenho.
— Mas também pode ser seu, já pensou que uma criança pode
morrer? Por favor, eu imploro!
— Onde a criança está? — pergunto e um sorriso aliviado surge no
seu rosto.
— Obrigada, obrigada… — ela repete várias vezes.
— Farei o teste de DNA e o de compatibilidade para ver se posso
doar a medula, deixe os dados com os meus seguranças, entrarei em
contato.
Não faço ideia de quem ela é, mas eu não me lembro de praticamente
nenhuma mulher que eu já fiquei e foram muitas, se essa criança for
realmente o meu filho, vou querer tê-lo por perto.

***

— Leo, você tinha razão! Estou gostando muito do trabalho, de ver


pessoas e de ocupar a minha mente — Samanta fala entusiasmada quando
já estamos na cama.
A minha mente está distante, eu penso sobre a criança e na aparição
daquela mulher, que sentido isso faria? Seis anos, não faz nenhum sentido, e
sou bilionário, ela teria me procurado.
— Leo? Leo? — Desperto dos meus pensamentos com Samanta me
chamando.
— Oi, me desculpe! — Me fixo nos seus olhos para não me perder
mais em pensamentos, eu estou deitado com a minha mulher, a mulher que
amo e que me completa.
— Em que está pensando? — Ela se senta na cama e me encara.
— Em nada meu amor, só me distrai, me desculpe, mas eu consigo te
ouvir, o trabalho está te fazendo bem e fico feliz que esteja gostando.
— Vira, eu vou te fazer uma massagem! — Ela se levanta da cama e
retorna com hidratante nas mãos. — Ainda não tirou a roupa? — Me olha
com luxúria e sorrio.
— Vamos pular essa parte, o que acha? — lhe puxo e beijo os seus
lábios com paixão, mas a minha mente ainda está longe, eu sei o quanto
Samanta é madura e compreensiva, mas estou com medo de sua reação,
uma mulher e um filho não será, algo que ela vá engolir facilmente.
— Por que continua aéreo? — Ela se afasta dos meus beijos e me
estuda com os olhos.
— Me desculpe meu amor, mas estou preocupado com alguns
assuntos, não se preocupe, eu vou resolver logo. — Ela deita do meu lado e
a envolvo em um abraço acariciando os seus cabelos.
Se a criança realmente for meu filho, não posso ignorar, preciso de
uma forma de fazer isso funcionar sem perder a minha relação com a
Samanta.
No dia seguinte desvio o caminho e vou direto ao hospital, Vanessa
abre um largo sorriso quando me vê entrar pela recepção.
— Obrigada por ter vindo — fala se aproximando.
— Sejamos breves com isso. — Passo por ela sem lhe dar muita
importância, eu duvido muito que essa criança seja de fato o meu filho.
Fui até o laboratório do próprio hospital colher o sangue para o exame
de DNA.
— Em alguns dias teremos o resultado — afirma o funcionário e
assenti com a cabeça.
Sigo para a saída do hospital, mas ela está lá à minha espera.
— Não quer conhecer o Miguel?
— Não, teremos tempo para isso caso o resultado dê positivo.
— Venha, apenas venha conhecê-lo! — Ela me puxa pelo braço e eu
o puxo de volta.
— Não force, espere o resultado do exame sair, eu sou casado e não
quero problemas para o meu casamento, então não se iluda! Se
hipoteticamente essa criança for realmente o meu filho, lembre-se em que
circunstância ele foi gerado e não ultrapasse a linha.
43
Agindo estranho

Leonardo Milani

Já haviam se passado alguns dias e o hospital enviou uma mensagem


informando que o resultado do exame estava pronto. Olho o imenso jardim
da varanda do meu quarto, mas eu não enxergo nada à minha frente, eu
havia recebido algumas fotos da criança e o meu assistente me mantinha
sempre informado. Pedi a um detetive que investigasse a vida da Vanessa,
ela trabalhou em uma das boates que eu costumava frequentar e sim, ela foi
uma das tantas que tive na cama. Ela estava morando com um homem rico
que conheceu na boate, ele sempre bancou ela e o filho, ele morreu a pouco
tempo e ela não ficou com nada, isso justificaria ela vir atrás de mim só
agora caso o menino seja mesmo meu.
— Ainda está em casa? — Samanta acorda e fala ainda na cama, sorri
indo na sua direção.
— Vamos tomar café da manhã juntos? — A beijo rapidamente.
— O que deu em você? Está estranho esses dias…. Quer conversar
sobre o assunto?
— Vamos conversar mais tarde, agora quero comer com você —
torno a beijá-la e ela baixa a cabeça mordendo o lábio.
— O que te deixou triste? — Levanto o seu rosto.
— Nada, estou bem — ela força um sorriso e se levanta da cama,
indo direto para o banheiro, saindo alguns minutos depois, troca de roupas
em silêncio e eu a observo sentado na cama.
— Como está no trabalho? — indago a abraçando.
— Estou amando — fala sem muitos detalhes e o meu telefone toca e
é a Vanessa, me afasto um pouco e atendo.
— Alô! — Atendo da varanda.
— Você vem pegar o resultado do teste de DNA?
— Sim, eu vou — respondo com frieza.
— Miguel passou mal hoje, esse hospital não tem estrutura para dar a
assistência que ele precisa, Leonardo — ela chora do outro lado da linha.
— Estou indo aí. — Encerro a ligação.
— Quem era, meu amor?
— Ninguém importante, vou precisar sair agora.
— Achei que iríamos tomar café da manhã juntos.
— Preciso resolver um assunto importante, Samanta. — Dou um
beijo na sua testa e vou direto para o hospital.

***

O meu coração pesa, eu já deveria ter conversado com Samanta sobre


isso, mas a dúvida sobre a paternidade me faz recuar. Ela sabe o quanto
desejo um filho, eu sei o quanto ela se sente culpada por perder o nosso e
por ainda não ter conseguido engravidar novamente.

***

Samanta Antonelli

O comportamento do Leonardo não está normal esses dias, ele está


estranho, sempre ocupado com alguma coisa, anda com a cabeça longe e eu
poderia dizer que ele está muito preocupado, já o vi levantar várias vezes a
noite e ficar naquela varanda por horas, depois do comportamento estranho
dele hoje de manhã, se afastando para atender o telefone, resolvo agir como
uma esposa ciumenta e o sigo.
Em vez de ir para a empresa, ele vai para um hospital infantil, o que
já me deixa com a orelha em pé, ele é recebido por uma mulher que o
abraça em lágrimas. Ele a afasta imediatamente, mas ele está ali por ela,
não consigo ouvi-los, dou as costas indo para o trabalho, ali não é local para
questioná-lo. Estaciono o carro na garagem e encosto a minha cabeça no
banco, fico uns minutos de olhos fechados, a minha cabeça latejava e a
minha barriga roncava de fome.
— Samanta, o que faz aí? — Rubens bate no vidro do carro.
— Estou com um pouco de dor de cabeça, mas já estou de saída. —
Ele espera até que eu saia do carro e me acompanha.
— Já tomou café da manhã? — Sorri com a pergunta, ele sempre está
comendo algo, não sei como consegue manter um corpo atlético, deve ser
pela pouca idade. Ele não deve ter mais de vinte oito anos, as mulheres do
banco suspiram por ele e não só pela sua boa aparência, mas por ele ser de
uma boa família.
— Ainda não, acabei saindo de casa sem tomar café. — Ele estala a
língua algumas vezes, balançando a cabeça negativamente.
— O café da manhã é uma refeição muito importante, vou fazer o
sacrifício de dividir o meu com você — sorri falando em um tom divertido.
Chegando na sua sala, ele põe uma bolsa média na mesa e tira vários
potes com sanduíches, bolo e petiscos.
— Nossa, trouxe tudo isso? Pensa em comer tudo isso sozinho? —
indago impressionada.
— Não, eu estava pensando em te convidar para comer comigo —
responde com um sorriso divertido.
— Hum, que delícia! — falo provando um pedaço do bolo.
— Você não parece bem, aconteceu alguma coisa? — ele é muito
detalhista, ou eu não estou disfarçando direito.
— Não, estou bem! Obrigada por se preocupar — viro as costas para
limpar uma lágrima teimosa que escorre pelas minhas bochechas, mas a
minha voz embargada me delatou.
— Pode confiar em mim, se quiser desabafar, a minha boca é um
túmulo — pisca um olho sorrindo em seguida.
— Obrigada, mas vamos comer antes que os serviços apareçam aos
montes — me sento direito enchendo o prato.

***

Esperei Leonardo na sala, mas desisti, já era tarde e ele ainda não
havia voltado, vou para o nosso quarto e me sento na cama, pegando um
livro para ler, mesmo eu não conseguindo me concentrar em nenhuma linha
sequer.
Depois de alguns minutos, Leonardo entra no quarto, eu posso sentir
o cheiro de álcool.
— Me desculpe, meu amor, tive um dia cheio. — Ele se joga no sofá
e encosta a cabeça, um logo suspiro escapa dos seus lábios.
— E o que fez hoje o dia todo? Você bebeu? — Ele senta apoiando os
cotovelos nas pernas e me encara.
— Precisamos conversar, Samanta… — o seu tom de voz fez o meu
sangue gelar.
— Está me deixando por outra? — indago com a voz embargada.
— De onde você tirou isso? — Se levanta apressado vindo na minha
direção e me abraça com força.
— Eu o vi hoje de manhã no hospital com uma mulher — digo sem
delongas.
— Eu nunca te trocaria por nada nesse mundo, eu nunca vou amar
outra mulher mais do que amo você!
— Então o que é? Quem é aquela mulher? — A minha voz sai em
meio aos soluços do choro que não consigo conter.
— Eu descobri que tenho um filho, Samanta, e ele está doente
naquele hospital, a mulher que você viu é a mãe dele — ele fala de cabeça
baixa sem coragem de me encarar, sinto o mundo se abrindo e me
engolindo.
— Filho? — pronuncio em choque.
— O resultado do exame saiu hoje confirmando a paternidade — ele
tira o papel do bolso e me entrega.
Estou em choque, as minhas lágrimas encharcaram o papel nas
minhas mãos, Leonardo queria muito um filho, mas eu não consigo ficar
feliz, como eu ficaria feliz?
— Isso não muda nada entre nós, Samanta. — Leo, usa o dedo
polegar para enxugar as minhas lágrimas, que correm feito um rio pelo meu
rosto.
Não é isso que o meu coração está sentindo, para mim as coisas já
estão diferentes.
— Ele tem seis anos, está com leucemia — sinto a dor nas suas
palavras e lógico que sinto muito pelo menino.
— Sinto muito! Quanto a mãe, o que sente por ela? — Ele segura o
meu rosto com os olhos cravados nos meus e me beija docemente.
— Eu te amo, não pense em bobagens. — A sua testa está colada à
minha enquanto fala.
— Não sei o que pensar, Leonardo.
— Me acompanhe ao hospital, quero te apresentar ao Miguel, aliás eu
também não o conheci ainda, estará ao meu lado? — Apenas assinto com a
cabeça.
— Vocês foram namorados? — pergunto ainda insegura.
— Não, foi um programa e não sei como isso aconteceu, eu sempre
me cuidei, a não ser com você — dá de ombros.
— E por que só agora? Digo, por que ela só apareceu agora?
— Vem aqui, não pense muito nisso! Você é a minha esposa, ainda
teremos muitos filhos nossos e eu nem me lembro dessa mulher, então, não
pense nisso. — Ele me abraça forte acariciando os meus cabelos. Sei que
muitas coisas viriam a partir disso, mas eu o amo e não desistirei de fazer o
nosso casamento dar certo.
44
Conhecendo Miguel

Samanta Antonelli

No dia seguinte, acordo antes do Leo, aliás eu não dormi direito.


Levanto, tomo banho, desço para fazer a minha refeição em silêncio,
enquanto todos ainda dormem, Leonardo ainda não contou aos pais sobre o
neto e estou só imaginando a reação.
Alguns minutos depois, vejo Leonardo já arrumado descendo as
escadas.
— Bom dia, meu amor, por que não me acordou? — pergunta me
beijando rapidamente.
— Acordei muito cedo, você parecia estar em um sonho bom — forço
um sorriso e ele me abraça por trás, colocando o seu rosto no meu ombro.
— Eu te amo, Samanta, não perca o sono por coisas pequenas —
beija o meu rosto e se senta ao meu lado.
— Essa “coisa” pequena — faço aspas com os dedos — vai crescer,
Leo, e vai te chamar de pai, quando vai contar aos seus pais? — pergunto,
sem olhá-lo.
— Não pensei nisso ainda, não é um grande acontecimento, vou
apenas dizer quando estivermos todos juntos. — Posso ver o esforço que ele
faz para não mostrar o quanto está feliz, ele queria muito um filho. — Você
já está pronta? — pergunta, se pondo de pé.
— Deixe-me ligar para o meu coordenador e avisar que chegarei mais
tarde. — Apanho o meu celular na bolsa e ligo para ele.
— Oi, Sam, por que me liga tão cedo? — ele pergunta antes eu diga
qualquer coisa.
— Vou chegar mais tarde, tenho uns assuntos a tratar agora de manhã
— falo sem dar muitos detalhes.
— Você está bem? A sua voz parece triste, aconteceu alguma coisa?
— Ele demostra preocupação do outro lado da linha.
— Não se preocupe, são só assuntos pessoais e estou bem de saúde —
havia um sorriso na minha voz e eu literalmente sorri no final da frase.
— Agora que escutei o seu sorriso, fico mais aliviado — ele sorri
também.
— Tudo bem, obrigada por se preocupar e até mais tarde! — Encerro
a ligação me virando para Leonardo, que me analisa com um ar
desconfiado.
— Vocês estão assim tão próximos? — indaga com os olhos fixos aos
meus.
— Por que essa pergunta? — Desvio os meus olhos do dele e apanho
a minha bolsa que está no sofá.
— Não é educado responder com outra pergunta, Samanta — diz ele
zerando a distância entre nós.
— Sim, estamos um pouco próximos, passamos muito tempo
trabalhando juntos, é normal haver uma proximidade — encolho os ombros
respondendo naturalmente.
— Você tem razão — diz, forçando um sorriso.

***

Leonardo Milani

Samanta fica calada durante todo o percurso, eu posso ver o quanto


ela está incomodada e eu me sinto péssimo por estar causando isso a ela. O
medo de que ela se afaste de mim está me deixando surtado.
— Chegamos, meu amor — falo estacionando o carro, descemos e
apanhando a sua mão, caminhamos para dentro do hospital, mas a sua
celular toca.
— Leo, vou atender, pode ir — faço um gesto positivo e sigo para
dentro do hospital, com Samanta andando atrás de mim com o celular no
ouvido.
— Leo, você chegou? — Vanessa vem apressada em minha direção e
me abraça, tiro os seus braços de mim com rapidez.
Samanta vinha logo atrás, ela abaixa o telefone encerrando a ligação e
vejo o ódio com que ela encara Vanessa, puxo Samanta pela mão para ela
fique ao meu lado.
— Vanessa, essa é minha esposa, Samanta — o seu sorriso para
Samanta foi fingido e forçado.
— Muito prazer, Samanta. — Ela estende a mão a cumprimentando e
Samanta não tira a mão da minha, apenas acena com a cabeça para Vanessa,
que abaixa a mão desconcertada.
— Os resultados dos exames saíram e você poderá ser o doador — eu
havia feito o exame de compatibilidade antes do resultado de DNA sair, e a
notícia me deixa feliz, eu iria poder ajudá-lo. — Ele está dormindo, acho
que não poderá falar com ele agora — fala olhando para Samanta.
— Vim enfim conhecê-lo.
— Ah… Claro, vamos, ele ficará feliz em conhecer o pai. — Samanta
suspira descontente quando Vanessa termina de pronunciar a frase e a
seguimos.
Entramos no quarto, os meus olhos se encheram de lágrimas, ele era
fofo.
— Miguel, esse é o seu papai, lembra que eu te falei que você iria
conhecer o seu papai verdadeiro?
— Sim, eu lembro — ele responde com uma voz baixa e tímida.
Ele ainda era pequeno e não sei quantas vezes ela mudou de parceiro,
isso deve tê-lo deixado confuso.
Ficamos um tempo com ele, Samanta fica um pouco distante e era
nítido o desconforto, eu nunca iria julgá-la por isso e estou surpreso
também, um filho de outra era algo que eu não esperava.
— Vou até a administração acertar as contas e ver quando realizarão a
cirurgia. — Beijo a Samanta antes de sair do quarto.

***

Samanta Antonelli

— Faz tempo que estão casados? — Vanessa pergunta assim que


Leonardo cruza a porta.
— Não muito.
— Ah…. Por isso ainda não tem filhos? Miguel vai adorar ter irmãos
— sinto a ironia que vem das suas palavras.
— Claro, se depender do Leo, vamos montar um time de futebol —
sorri sem humor.
— Como primogênito, o Miguel tem alguns direitos — sorri
debochada.
— Entendo, não pretendo me opor aos direitos do Miguel, mas
lembre-se que mesmo ele sendo o primogênito é ilegítimo e, quanto a você,
não esqueça o seu lugar. Você não passa de uma transa de uma noite que o
Leonardo nem se lembra, então, procure o seu lugar e não fique cercando o
meu marido como uma raposa.
— Não seja tão egoísta, Samanta, eu já provei aquele homem e sei
que ele dá conta de mais de uma — debocha.
— Está tudo resolvido, então algumas semanas faremos a cirurgia —
Leonardo fala voltando para o quarto.
— E quando ao hospital?
— Não se preocupe com o hospital Vanessa, já falamos sobre isso,
eles são referências, o menino ficará bem.
— Se você diz. — Ela dá de ombros revirando os olhos.
— Vamos, vou te deixar no trabalho — fala saindo do quarto de mãos
dadas comigo.
Ele anda apressado até o carro e abre a porta para mim.
— Sobre o que conversaram? — pergunta assim que senta em frente
ao volante.
— Vanessa parece estar querendo muito de você. — Mordo o lábio
mostrando preocupação.
— Não tenho nada a ver com ela, só com a criança — ele responde
olhando para a estrada.
— Como será depois que o garoto ficar bem? Ela volta para a cidade
dela? Aliás, de onde ela saiu? — Ele mordeu o lábio arqueando as
sobrancelhas sem me dar uma resposta.
— É normal que queira conhecer o seu filho melhor — digo, sem
encará-lo.
— Não quero que isso seja um problema entre nós dois, eu te amo e
isso basta para que você não se preocupe com qualquer outra coisa. —
Ouço calada, ele estaciona no banco.
— Obrigada por me trazer — falo descendo do carro.
— Vou te levar até lá dentro. — Ele desce em seguida me
acompanhando.
As pessoas parecem perder o ar quando o ver entrando pelos
corredores do banco. Ele anda de cabeça erguida com toda a sua elegância e
charme natural, não tem uma mulher que não vire o rosto para olhá-lo e
mesmo que não soubessem quem ele é, tenho certeza de que a reação não
seria diferente. Era impossível não se perder olhando para 1,80 de pura
beleza e sensualidade.
— Onde é a sua sala? — indaga, como se não notasse todos os
olhares sobre ele.
— Quer conhecê-la? — pergunto confusa.
— Claro, estava devendo essa visita.
— Aqui — falo apontando e me assusto ao abrir a porta, Rubens está
lá arrumando um vaso de flores na minha sala.
Leonardo aperta os olhos encarando Rubens.
— Samanta, achei que as flores ficariam boas na sua sala — ele sorri
sem graça, mas não recua.
— Claro, são lindas! — A minha voz treme e a minha tentativa de
passar naturalidade foi frustrada. — Esse é meu marido, Leonardo Milani
— digo, apontando para Leo, que ainda segura a minha mão.
Rubens arregala os olhos, parecendo só o reconhecer depois que
pronuncio o sobrenome.
— É um prazer, Rubens — Leonardo fala, me surpreendendo com a
sua simpatia e ainda estende a mão para cumprimentá-lo. — Vou aproveitar
que estou aqui e vou até a sua sala, verificar uns números pessoalmente.
Bom trabalho, meu amor! — Me beija rapidamente e sai da sala
acompanhando Rubens.
45
Um neto

Leonardo Milani

O nervosismo do rapaz era nítido, eu sei que precisava fazer essa


visita, entro na sua sala, me acomodando na poltrona em frente a sua mesa,
ele permanece de pé, balançando o copo de café que havia pegado para
frente e para trás.
— O que acha da Samanta? — pergunto checando alguns documentos
sobre a mesa.
— A Samanta é uma ótima gerente, sempre chega no horário, é
prestativa… — Jogo os documentos sobre a mesa e passo a encará-lo.
— Certo, mas não foi isso que perguntei, serei direto, então, está
interessado nela? — A minha voz era tranquila, mas os meus olhos o
queimam.
— De forma nenhuma, ela é casada e nunca a veria com outros olhos.
— A sua boca treme e ele anda de um lado para outro enquanto responde
— Você mente mal! — sorrio sem humor. — Eu não me importo que
esteja interessado nela, ela é linda, uma mulher desejável. Só não a cerque,
costumo ser bem ciumento e possessivo com a minha mulher — digo
enquanto ando na sua direção.
— Claro, entendo perfeitamente! — diz, dando uns passos para trás se
afastando de mim.
— Bom, o meu assunto por aqui acabou, tenha um bom dia de
trabalho — bato no seu ombro antes de me virar e sair da sala.
Volto até a sala da Samanta, ela está concentrada nos papéis sobre a
mesa.
— Meu amor, estou indo e tenha um bom dia de trabalho — falo indo
até ela e a beijando rapidamente.
— Já? — ela diz, se levantando e passando os braços pelo meu
pescoço, envolvo os meus braços em volta da sua cintura e a beijo com
paixão.
— Eu te amo — sussurro na sua boca, ela para e me encara com um
sorriso. — Agora vou te deixar trabalhar, se eu ficar aqui por mais alguns
segundos sou capaz de te jogar nessa mesa e daí você já sabe o que
acontece — sorri com malícia, contornando os seus lábios com o meu dedo
polegar.
Saio do banco e vou direto para casa almoçar com os meus pais.
— Não esperava te ver para o almoço — a minha mãe fala ao me ver
entrar, ela está sentada no sofá com o meu pai.
Vou até eles com um sorriso e a beijo na testa.
— Parece preocupado, aconteceu alguma coisa? Já faz dias que te
vejo estranho — ela diz, me olhando preocupada.
— Estou tendo uns problemas — suspiro em derrota.
— Com a Samanta?
— Não diretamente. — Me sento ao lado do meu pai.
— O que tem lhe perturbado? — ele pergunta dessa vez.
— Vocês têm um neto de seis anos — digo sem delongas.
Eles se olham surpresos e um pouco confusos.
— Um neto? — perguntam quase ao mesmo tempo.
— O descobri a pouco tempo, a mãe dele me procurou porque ele está
doente e precisa de transplante de medula óssea e eu serei seu doador.
— Nossa, tão pequeno e já passando por tudo isso, quero conhecer o
meu neto! — A minha mãe fala com um tom entusiasmado.
— Vocês vão conhecê-lo.
— Por que não está feliz? Um filho é motivo de alegria.
— A Samanta não está feliz, ela não consegue engravidar e mesmo
com os médicos dizendo que está tudo normal — essa situação está
acabando comigo.
— Mas ele é seu filho, ela tem que aceitar! Ela terá os dela, eles virão
— o meu pai diz, pegando na minha mão.
— A Samanta é minha vida, foi ela quem me salvou quando eu não
tinha nenhum motivo para estar vivo, ela me aceitou com os meus defeitos,
suportou coisas horríveis e ela me amou em um momento em que nem eu
me amava — pronuncio com amargura.
— Você não vai deixar de amá-la por conta do seu filho, são
sentimentos diferentes — ela diz acariciando os meus cabelos e eu repouso
a minha cabeça no seu ombro.
— Eu não quero que ela se sinta infeliz — digo com o meu coração
pesado.

***

Samanta Antonelli

No dia seguinte Leonardo me chama para ir com os pais até o


hospital, ele havia contado sobre o filho que acabou de conhecer e lógico
que eles ficaram bem animados, eu obviamente aceitei acompanhá-los.
Quero que Leonardo saiba que estou ao lado dele, sei do esforço que ele faz
para que eu não me sinta excluída, nem negligenciada. Ele, sempre que
pode, tira sua atenção da estrada para me lançar olhares carinhosos e tira
uma das mãos do volante para acariciar os meus cabelos ou rosto, os
pequenos gestos dizem tudo. Retribuo os seus carinhos com sorrisos, mas
me sinto culpada por ele não estar pulando de alegria pelo filho, sei do
esforço que ele faz para não me magoar.
Chegamos ao hospital e vejo a satisfação no rosto dela em ver os pais
do Leo.
Oportunista barata!
— Mãe, pai — os chama de forma íntima.
Muito cara de pau!
— Mãe e pai, essa é Vanessa, a mãe do Miguel, meu filho — todo o
meu corpo treme quando o ouvi falar “meu filho”.
— Nossa, você está tão abatida, onde tem ficado? — Diane pergunta,
alisando o rosto da cobra.
Abatida, não sei onde ela está vendo isso, uma cínica, isso que ela é!
Leonardo faz questão de me deixar próximo a ele, me puxando pela
cintura colando o meu corpo ao dele, Vanessa olha por cima dos ombros,
observando a nossa aproximação.
— Estou dormindo aqui no hospital, somos de outra cidade, não tenho
onde ficar — ela tem um ar de coitadinha com a voz chorosa.
— Leo, leve-a para sua casa, ela não pode ficar aqui sozinha, precisa
ser acolhida nesse momento tão delicado. — Arregalo os olhos encarando a
minha sogra.
Como assim na nossa casa?
Contenho um riso descontente que grita para sair de dentro de mim.
— Vou alugar um apartamento para ela ficar aqui perto — Leo,
responde rápido, trazendo alívio para a minha alma.
— Ótimo, mas venha me visitar, será bem-vinda — a minha sogra
fala, arrancando um sorriso satisfeito da vigarista, usando a doença do filho
para se beneficiar.
Às vezes até duvido que ela seja realmente mãe dele.
— Vou pedir para o meu assistente cuidar desse assunto, agora vamos
ver o Miguel — Leonardo fala apressado, impaciente com o assunto.
Depois do hospital, Leonardo me leva para o banco, a minha sogra
fala o tempo todo sobre como o menino é lindo e como a Vanessa é uma
coitada, que as mulheres precisam de assistência ainda mais nessas
situações. Suspiro sem paciência, o garoto é fofo, lindo e eu vou amá-lo,
mas daí dizer que ela é coitada já é demais.
— Quando é a cirurgia? — ela pergunta.
— Na próxima semana — Leonardo responde.
— Não pode deixar que o leve para outra cidade, arrume uma forma
de fazê-la ficar por perto — fala ansiosa e isso já está parecendo uma
obsessão da parte dela, Leonardo poderia visitá-lo com frequência mesmo
que ele morasse em outro país.
— Não se preocupe com isso agora, mãe.
Não se preocupe que ela não vai largar o osso assim tão fácil!
— Chegamos, meu amor, quer que eu entre com você? — pergunta
me beijando rápido.
— Não precisa, se apresse e leve os seus pais para casa, eles devem
estar cansados.
Não é a criança que me incomoda e sim aquela vigarista, ela quer
muito mais do que apoio para a criança.
46
Na nossa casa

Samanta Antonelli

— Em que está pensando? — Rubens pergunta assim que entra na


minha sala.
— Em nada demais — forço um sorriso.
— Não é nada de mais, porém, está te incomodando — ele fala
puxando a cadeira para perto de mim.
— O que veio fazer aqui? — pergunto levantando.
— Vim deixar uns documentos para você! — Ele coloca as pastas que
tinha nas mãos sobre a mesa.
— Obrigada. — Me encosto na mesa verificando o conteúdo das
pastas.
— Bom, vou te deixar trabalhar — ele sorri sem jeito, pela minha
falta de receptividade na conversa e me deixa sozinha na sala.
As horas passam arrastadas, o que me deixa cansada e não consigo
me concentrar no trabalho. Na saída, tem um motorista me esperando,
Leonardo mandou já que eu não havia vindo de carro. Antes de abrir a porta
já fui surpreendida por risadas vindas da sala, eu não queria acreditar, mas
lá está ela, a vigarista sentada no meu sofá aos risos com a minha sogra. O
carro de Leonardo está na frente da mansão, então, ele deve estar no nosso
quarto.
— Samanta, sente-se aqui. — A minha sogra dá leves palmadas no
assento ao seu lado.
— Obrigada, vocês podem ficar à vontade — falo já subindo as
escadas.
Abro a porta lentamente, Leonardo está sentado na poltrona com um
copo de whisky na mão, ele levanta os olhos quando me vê entrar, o seu
olhar era de pura agonia.
Sento-me no seu colo passando as minhas mãos em volta do seu
pescoço.
— Me perdoa, as coisas estão saindo do meu controle — ele encosta a
cabeça no meu peito.
— Eu não tenho nada para te perdoar.
— Ela vai passar uns dias aqui — a sua voz sai partida e sobressalto
encarando-o
— Qual a necessidade de ela ficar aqui?

***

Leonardo Milani

As coisas saíram do meu controle, não consigo afastar a Vanessa o


suficiente do meu casamento. Levanto-me aproximando-me da Samanta
que ainda me olha com reprovação.
— Vou resolver isso, apenas tenha paciência. — Aliso o seu rosto.
— Por quê? — ela pergunta.
— A minha mãe, ela fala e fala…. Me tornei um idiota, Samanta, não
sei como agir com a minha mãe — admitir isso doí e as palavras saem
sofridas da minha boca.
Ela passa as mãos pela minha nuca e cola os seus lábios aos meus, me
dá um beijo apaixonado, meu corpo esquenta… sou louco por ela.
— Me dê um filho, Leo — os seus olhos se enchem de lágrimas e o
meu coração se parte em vários pedaços, era tudo que eu mais queria.
— É o que eu mais quero, meu amor — digo com os meus braços em
volta do corpo delicado dela.
— Leo, desça, venha jantar — a minha mãe fala do outro lado da
porta.
— Acha que pode fazer isso? — pergunto e ela acena positivamente
com a cabeça. — Já estamos indo! — digo para a minha mãe olhando nos
olhos da Samanta.
— Não posso fugir dos cômodos da minha própria casa — responde
firme, entrando no banheiro e voltando depois de um banho rápido.
Descemos e Vanessa já está sentada junto a minha mãe na mesa, o
meu pai não diz nada, mas seu olhar era reprovador.
— Leo, senta aqui — Vanessa bate na cadeira ao lado.
Puxo a cadeira para que a Samanta se sente e me sento ao lado da
minha esposa.
— Oi, Samanta, espero que eu não te incomode que eu fique aqui uns
dias, o apartamento está com mofos, mas ele fica em uma localização
ótima, bem próximo ao hospital, logo o problema será resolvido.
— De forma nenhuma, você não incomoda, eu quero ter o meu neto
próximo — a minha mãe responde tomando a frente.
— Pode ficar, não quanto tempo quiser, mas o tempo necessário —
Samanta sorri com deboche. — Mas não esqueça que a casa é minha e o
marido também é meu, você está aqui apenas de favor. — Samanta dá uma
boa golada no suco em seguida.
— Samanta, não seja grosseira — a minha mãe diz com um tom
repressor.
Abro a boca para responder, mas Samanta toma a frente.
— Minha sogra, grosseiro é uma pessoa se meter onde não foi
chamada e falar o que não sabe. Leo, me desculpe, mas perdi a fome —
Samanta fala, se levantado, batendo as mãos abertas sobre a mesa.
— Mãe, concordei com algo provisório, depois das suas insistências,
mas não quero desrespeito com a minha esposa. — Me levanto seguindo
Samanta, ela se joga na cama irritada e eu vou precisar dar todo o meu
apoio, ela está certa, eu sou o único errado em submetê-la a isso.
— O que a sua mãe quer? Que você me deixe e fique com a Vanessa?
É isso que ela quer? — Cruza os braços irritada me dando as costas.
— Não importa o que ela quer, eu quero você, sempre foi e será só
você! — a beijo e ela se entrega ao beijo e logo sinto os seus músculos
relaxando. — A questão dela não é a Vanessa, é o Miguel, parece que ela se
sente culpada por ficar longe de mim tanto tempo e está querendo
compensar, eu não sei.
— Não é fácil ter que deixar essa mulher na nossa casa, Leonardo, ela
fica dando em cima de você e isso é irritante, chega a ser constrangedor.
— Entendo você, minha linda, vou mandá-la embora, mesmo que isso
signifique criar uma situação com a minha mãe e ela terá que entender.
47
Não se afaste de mim

Samanta Antonelli

No dia seguinte desço e encontro a Vanessa tomando café da manhã,


Leonardo saiu mais cedo como fazia antes quando evitadas os empregados
da casa, a que ponto chegamos! Mudar a nossa rotina devido a uma pessoa
que não tem nada a ver com essa casa.
— Bom dia, minha filha, coma alguma coisa — Diane vem ao meu
encontro.
— Não se preocupe comigo, vou comer no caminho e sintam-se à
vontade na minha casa — digo forçando simpatia e continuo caminhando
até a saída.
— Você está com algum problema ou chateada comigo? — Paro no
caminho para encará-la.
— É o que está parecendo? — pergunto com cinismo.
— Minha filha, aquela garota não tem ninguém por ela aqui, o filho
está em um hospital, deveria ter mais empatia.
— Empatia? — sorrio sem humor. — Ela está na minha casa,
comendo da minha comida, dando em cima do meu marido na cara dura e
eu deveria fazer o quê? Há, já sei… devo sair de casa para que ela fique
ainda mais à vontade.
— Samanta, você está interpretando as coisas errado.
— Me faça um favor, não venha mais falar desse assunto comigo, não
enquanto estiver impondo ao Leo que essa mulher fique na nossa casa. —
Ando apressada até o carro para não ouvir nenhuma outra palavra.
Chego mais cedo do que de costume, recosto a cabeça na cadeira e
suspiro derrotado. Estou irritada, nervosa e querendo me livrar daquela
mulher.
— Ei! Você está bem? Bati na porta e não tive resposta. — Rubens,
entra na sala e se senta na poltrona.
— Não estou nada bem — torno a suspirar.
— O que você tem? Se puder falar, é claro, não quero parecer
invasivo — sorri sem graça.
— Estou com problemas em casa — admiti, eu não deveria falar com
ele sobre isso, mas estou engasgada.
— Sério? O senhor Milani parece tão apaixonado.
— Não é diretamente com ele o meu problema. — Inclino o meu
corpo para frente encostando os cotovelos na mesa.
— Entendi… — Arqueia as sobrancelhas, apertando os lábios em
seguida. — Bom, você já comeu? Chegou tão cedo que não acredito que
tenha tido tempo.
— Tive uma indisposição essa manhã.
— Eu trouxe comida, venha até a minha sala! — Ele me tira da
cadeira pelo braço.
— Não precisa, estou sem fome. — falo, tentando me desvencilhar.
— Não seja boba, venha. — Acabo cedendo as suas insistências e vou
até a sua sala.
Chegamos a sua sala e ele monta um banquete na mesa, eu não vejo
maldades nas suas atitudes, eu sempre o vi como alguém extremamente
simpático e um tanto dado.
— Você ia comer tudo isso? — Além da quantidade, tudo está muito
caprichado.
— Na verdade, eu já pensava em te convidar para me acompanhar no
café da manhã, eu gosto de ter companhia para comer — sorri simpático.
— Hum…. Isso está muito bom! — falo colocando um pedaço do
bolo na boca e ele me olha satisfeito.
— Posso trazer todos os dias se quiser — sorri me lançando um olhar
sedutor, eu paraliso pensando nas consequências que isso poderia causar.
— Está tudo ótimo, mas preciso ir agora! — Largo o prato na mesa e
me levanto.
— Você não comeu quase nada, venha, sente-se. — ele me senta
rápido na cadeira, colocando mais um pedaço de bolo na minha boca, eu
fico sem ação, os meus olhos se arregalam.
— Hum-hum… — um som de alguém limpando a garganta me fez
sobressaltar da cadeira assustada.
— Leo? — falo me recompondo.
***

Leonardo Milani

— Atrapalho o café da manhã de vocês? — A minha voz soa irônica,


eu não estou enxergando a Samanta.
— Bom dia, senhor Milani — Rubens fala com uma voz tranquila,
não viro o rosto na sua direção, agora não é o momento para uma cena de
ciúme.
— Vamos para a minha sala, Leo! — Ela vem apressada na minha
direção e me puxa para fora da sala.
— Sam, pegue alguns e leve para comer na sua sala, eu fiz para você
— o seu tom era orgulhoso e eu não suporto a audácia dele.
— Você fez para ela? — Retorno caminhando rápido na sua direção.
— Sim, percebi que ela vem sem comer pela manhã a alguns dias —
sorri com ironia.
— Você está se preocupando demais com a minha esposa, não acha?
— Não seja ciumento, somos apenas amigos — ele sorri
pronunciando as palavras.
— Amigos? — Os meus olhos vão da Samanta para ele novamente.
Arrasto o meu braço pela mesa jogando tudo no chão, Samanta grita
assustada e tenta me conter, esmurro a mesa com muita raiva e o vidro
temperado trinca cortando a minha mão.
— O próximo vai ser na sua cara, você me entendeu? — vocifero
segurando a gola da sua camisa que fica com as marcas de sangue. — Ah…
e outra coisa! O nome dela é Samanta, não a chame de Sam.
— Vamos, Leonardo. — Samanta me puxa para fora da sala, vários
funcionários rondam pela sala ouvindo a discussão.
Ela me leva até o estacionamento e para em frente ao meu carro,
afrouxo a gravata, abrindo alguns botões e busco o ar com desespero.
— Droga! Droga! — Esmurro o carro várias vezes, eu estou
descontrolado e havia perdido o controle das coisas.
— Chega, Leonardo, chega! Você precisava criar toda aquela cena?
— diz com um tom alterado.
Sorrio sem humor, passando a mão pelo queixo.
— Você não acha que eu ao encontrar um cara colocando comida na
boca da minha mulher não é o suficiente? — indago tentando manter um
tom passivo.
— Não consegui evitar, foi muito rápido — ela se justifica.
— Que droga foi fazer ali, Samanta? — grito esmurrando o carro
novamente.
— Não grite comigo, ok? Tenho sido muito paciente com você,
esqueceu que tem uma mulher que você comeu sentada na minha mesa,
comendo da minha comida e dando em cima de você o tempo todo na
minha cara? — A sua voz sai mais alta, dessa vez completamente alterada.
— O que está tentando me dizer? Que vai ficar com ele para se
vingar? — Zero a distância entre nós, mantendo a minha testa colada a dela.
— É você quem está tirando as suas próprias conclusões, Leonardo
— fala, calma dessa vez, dando um paço para trás.
— Samanta, por favor, não faça isso comigo — imploro, incapaz de
conter as lágrimas.
— O que estou fazendo, Leonardo?
— Não se afaste de mim — pronuncio, tocando o seu rosto.
— Estou no meu limite. — Os seus olhos encaram o chão.
— Tenha paciência, eu vou resolver — imploro.
— Não sei até quando vou suportar — sinto a dor nas suas palavras
que sai sofrida.
— Vamos para casa — falo puxando ela para o carro.
— Não vou agora, quando terminar o meu expediente eu vou. — Se
solta de mim e caminha de volta para o banco.
— Você não vai voltar para lá, Samanta. — Puxo-a de volta.
— Vai me tirar o único lugar onde eu me sinto em paz? — Uma
lágrima cai dos seus olhos e isso aperta o meu coração.
48
Já chega!

Leonardo Milani

Vou direto para casa, eu não tenho cabeça para mais nada, as coisas
não deveriam estar assim, não nessa proporção.
Vanessa está com a minha mãe no jardim e considero passar direto.
— Filho, venha aqui! — Minha mãe acena com um sorriso largo e
caminho até elas.
— Vanessa, o que está fazendo aqui, esqueceu do filho no hospital?
— digo antes de qualquer coisa.
— Claro que não, estamos esperando o motorista para nos levar até o
hospital — ela fala, envolvendo os braços em volta da minha mãe.
— Depois que voltar, faça as suas malas e vá para o apartamento que
comprei para você e se não quiser, vá para um hotel e mande a conta para o
meu assistente, só saia da minha casa.
— Por que está agindo assim? — Minha mãe me olha confusa.
— Ela não tinha onde morar e eu comprei um apartamento, não tem
necessidade de ela estar aqui, me incomodando e incomodando a minha
esposa.
— Não vamos resolver as coisas dessa maneira, filho, ela já disse que
vai assim que o apartamento estiver pronto e logo o Miguel sai do hospital,
eu gostaria de tê-lo aqui.
— Você o terá aqui, mãe, ele é o meu filho e virá sempre. — Viro as
costas para entrar em casa, mas me viro novamente. — Vanessa, não quero
dizer novamente, arrume as suas coisas e vá embora! — Saio entrando na
mansão.
— Espere bem aí — a minha mãe me segue irritada e eu paro para
ouvi-la. — A Samanta está agindo como uma garota mimada e insegura!
— Garota mimada? Desde quando acha isso dela? — A encaro.
— É puro capricho da Samanta querer que a Vanessa vá embora às
pressas, ela tem que entender que o Miguel é seu filho, ele é sua família, é
seu sangue e inevitavelmente a Vanessa virá aqui.
— Não quero discutir com senhora, Vanessa vai embora — falo
firme. — A Samanta é minha esposa, é a dona dessa casa e o garoto poderá
vir quando quiser ou pode ficar aqui comigo, não importa como será, ele é
meu filho e será amparado, mas da forma correta. Quanto a Vanessa, o lugar
dela não é aqui, atrapalhando o meu casamento — digo pausadamente para
que ela entenda que o assunto não é negociável.
— Quando voltar do hospital converso com você — ela vira as costas,
puxando Vanessa com ela.
Suspiro derrotado, me sento na mesa do jardim e peço para Maria
trazer uma garrafa de whisky para mim. Bebo sozinho no jardim por horas,
o dia já está se findando quando vejo o carro que levou a minha mãe e a
Vanessa voltar do hospital, o relógio marca sete da noite, ligo para Samanta,
mas ela não atende.

***

Já no meu quarto me sento na varanda com a garrafa de whisky do


lado e espero Samanta voltar, a demora dela está me deixando louco.
Eu não posso perder a Samanta… os pensamentos gritam dentro da
minha cabeça.
Ela está com raiva, vulnerável, e se eles estiverem juntos agora?
Os meus pensamentos estão me deixando louco. Aperto o copo com
força e o jogo contra a parede, passo a beber diretamente da garrafa, o
relógio marca nove horas da noite, está cada vez mais difícil controlar o
ciúme e a raiva.
— Se controla, Leonardo — digo para mim mesmo, quando o carro
dela estaciona na entrada da mansão.
Ela sobe e entra no quarto, eu continuo na varanda com as luzes
apagadas, o barulho das garrafas faz ela vir conferir o local.
— Nossa! Você me assustou! — Os seus olhos me estudam. — O
quanto você bebeu? — Olha os cacos de vidro e volta os olhos para mim.
— Bebi pouco — respondo, virando o rosto, ela caminha lentamente
na minha direção e tira a garrafa da minha mão.
— Onde você estava? Com aquele babaca ou vai me dizer que
trabalhou até tarde? — digo com deboche.
Ela permanece em silêncio olhando para além do jardim da casa.
— Por que não me responde, Samanta? — O meu tom foi mais
ríspido dessa vez.
— O que você quer ouvir, Leonardo? O quanto você é idiota? Ou o
quanto quero bater em você agora? — diz com a voz embargada.
— Estou destruído, Samanta, eu estou com ciúmes e com medo que
você me deixe… — as lágrimas começam a correr pelo meu rosto.
— Vem, eu vou te dar um banho. — Ela tenta me puxar da poltrona.
— Eu vou matá-lo se ele encostar em você, entendeu? — esbravejo
com todo ódio que está dentro de mim.
— Fui visitar os meus pais, desculpe não ter ligado — a sua voz soa
fria.
— Não faz isso comigo, Samanta, eu te amo — imploro com toda a
força que eu ainda tenho.
Ela senta no meu colo me encarando, passo as minhas mãos a sua
cintura.
— Eu não quero te deixar, eu não quero outra pessoa, eu quero você,
quero a nossa paz e a nossa vida, é isso que quero, Leonardo…. Eu também
te amo.
A beijo com desejo e desespero, ela corresponde aos meus beijos e
como estou com saudade de senti-la, como tive medo de perder tudo isso.

***

Samanta Antonelli

Eu o beijo com o mesmo desejo que ele me beija, ele repousa a


cabeça nos meus peitos quando os beijos cessam. Fazia muito tempo que eu
não o via desta maneira, inseguro, possessivo e com tanto ciúme, eu preciso
ajudá-lo a passar por essa situação, está sendo difícil para ele também,
preciso ser a mulher madura e edificar o meu casamento.
— Me desculpe, não vai mais acontecer. — Volto a beijá-lo
— Ainda não resolvi a questão da Vanessa — fala com dor.
— Shii… — Coloco o dedo nos seus lábios — Não vamos mais falar
nela ok! Pelo menos por hoje, por agora! — Volto a beijá-lo e ele levanta da
poltrona comigo nos seus braços, sinto o meu corpo esquentar, é isso que
nós dois somos, fogo e desejo.
Fizemos naquela noite as pazes da melhor forma, na cama, nos
amando, sem conter os meus gritos de prazer. Esse homem é meu e eu
pertenço-lhe.

***

Acordo e Leonardo ainda dorme tranquilo, desenho o seu rosto com o


meu dedo, eu não podia ter tido sorte maior, lindo, romântico e apaixonado.
— Bom dia, minha menina — fala abrindo os olhos, preguiçoso.
— Bom dia! — sorri o abraçando.
— Eu te amo! — ele fala desenhando o meu rosto.
— Eu te amo ainda mais — sussurro apaixonada.
Faz tempo que não acordávamos juntos, sempre um, saia antes para o
trabalho.
— Vamos tomar café da manhã juntos? — fala, já sentado na cama.
— Vamos, mas antes preciso de um banho — me levanto e ando
apressada.
— Então, vamos juntos para o banho — ele fala me alcançando.
Consigo ouvir a voz espalhafatosa de Vanessa ainda das escadas, fazia
uns dias que eu não tomava café da manhã com o meu marido na nossa
casa, mas ela quem tem que se sentir desconfortável, não eu!
— Eu não vou mais incomodar vocês, estou indo para o apartamento
que o Leonardo comprou — Vanessa fala assim que nos sentamos à mesa.
— Como assim, Vanessa, o apartamento já está pronto? — Diane
indaga contrariada.
— Vou me mudar no meio da reforma, não tem problemas — ela
responde com ar de vítima.
— Você não precisa ir com pressa — Diane toca nas mãos de
Vanessa, que a encara com um ar de coitada. — Filho? — Ela olha para
Leonardo cobrando uma resposta.
— Fique o tempo que precisar Vanessa, a minha sogra faz gosto em
tê-la aqui, então sinta-se à vontade, mas não tanto, aqui não é um hotel para
que você faça o que quiser. Aqui é a minha casa, então me respeite como tal
e o meu marido não tem que te sustentar, arrume algo para fazer. Ele é dono
de banco, mas não é um caixa eletrônico para você retirar dinheiro quando
quiser e, por último, grave bem essa palavra: casado — digo pausadamente.
— Pare de se jogar para cima dele.
— Do que você está falando? — Diane parecia em choque.
— A senhora entendeu o que a Samanta disse, mesmo com a Samanta
dizendo que ela pode ficar, eu não a quero aqui, pegue as suas coisas e vá,
Vanessa! — sorrio com satisfação com as palavras de Leonardo.
— Leonardo e se ela resolver voltar para a cidade dela e se ela afastar
o menino?
— Mãe, já chega! Já está decidido, a Vanessa vai, não a quero aqui e
já disse para não se preocupar em relação ao menino. — Vanessa sai da
mesa indo em direção ao quarto com a minha sogra no seu encalço.
— Essa guerra é inútil no final, está claro o que ela quer! — O meu
sogro nunca se metia, mas ele parecia ser o mais sensato.
49
Leonardo Milani, prazer

Samanta Antonelli

Leonardo faz questão de me deixar no trabalho e eu não discuti,


aceito a oferta.
— Em dois dias vai ser feita a coleta da medula óssea, tudo dando
certo, o Miguel sai do hospital em três semanas depois do transplante —
Leonardo me atualiza enquanto dirige.
— Vai ocorrer tudo bem — digo alisando a sua mão.
— Você consegue gostar dele? — Ele tira os olhos da estrada por
alguns segundos para me encarar.
— Que tipo de pergunta é essa? É claro, ele é só uma criança —
respondo como se fosse óbvio.
— Me desculpe pela pergunta, Vanessa vem causando problemas e no
final, isso reflete nele.
— Ele é seu filho, vou amá-lo, ele não vai ser tratado diferente dos
nossos filhos — ele me encara sorrindo. — O que foi? — pergunto com um
sorriso.
— Você disse os nossos filhos, fico feliz de te ouvir assim animada e
cheia de esperanças.
— O que você acha de fingirmos que não nos conhecemos e
dormimos juntos? — digo com um tom divertido.
— Por que isso? — Ele me olha confuso.
— Parece que você gosta de fazer bebês na primeira noite! — Mordo
o lábio com um sorriso maroto e ele gargalha.
— Não fala isso, tenho medo da quantidade de mães com os seus
filhos podem surgir pedindo pensão e abrigo na nossa casa — torna a
gargalhar e o olho carrancuda. — O quê? Você sente ciúmes? — pergunta
divertido.
— O que você acha? O meu marido já dormiu com a quantidade de
mulheres que daria para encher um estádio de futebol em dia de final de
copa do mundo, é claro que sinto ciúmes — ele solta outra gargalhada
divertida.
— Acredite, não chegou a tanto, talvez a metade do estádio — zomba
e eu dou várias tapinhas no seu ombro.
Chegamos no banco, desço e ele faz o mesmo, me puxa pela cintura e
me beija apaixonadamente, mordendo levemente os meus lábios e tornando
me beijar com desejo. Separamo-nos dos beijos, ofegantes.
— Leonardo, estamos em um local aberto, estão todos olhando! — O
meu rosto queima de vergonha com os olhares dos funcionários que estão
chegando.
— Deixe que olhem, eu não me importo — sorri com malícia.
— Tchau! — Aceno andando apressada.
— Venho te buscar — grita e paro para olhar para ele que está
mordendo o lábio com um sorriso sexy.
— Bom dia, senhora — alguns funcionários me cumprimentam e
sorriem disfarçadamente.
— Bom dia, Samanta — Rubens me acompanha até a sala. —
Hum…. Está com uma carinha ótima hoje — sorri fechando a porta atrás
dele.
— Pois é, estou muito bem hoje — suspiro apaixonada sorrindo em
seguida.
— Isso tem a ver com a pessoa que veio te trazer? — Pisca um olho e
mostrando o sorri perfeito que ele possui.
— Do que está falando? — As minhas bochechas queimam pela
vergonha.
— Já te falaram que você fica linda quando fica tímida? — Ele as
aperta e sorri.
— Acho melhor você ir para sua sala. — Me levanto abrindo a porta.
— Só queria te pedir desculpas por ontem, você sabe que é linda e
inteligente, qualquer homem ficaria radiante em te ter ao lado, me desculpe
por fazer o seu marido achar que deveria ter ciúmes de mim — o seu tom
era sincero.
— Tudo bem, desculpas aceitas. Somos amigos, certo?
— Claro! Mas se um dia achar que não o quer mais, me considere
como uma opção — diz em um tom divertido saindo da sala.
***

Leonardo Milani

Após deixar Samanta no banco, vou para empresa, revejo alguns


documentos, participo de algumas reuniões e volto cedo para casa. O meu
pai está no jardim fazendo a sessão de fisioterapia. Fico um tempo o
observando de longe e não conversamos muito, ele é o avesso da minha
mãe, sempre calmo e com um ar tranquilo.
Ele me vê de longe e acena, vou até ele e nos sentamos no banco do
jardim.
— Percebi que está com uma cara melhor hoje — diz, batendo a mão
no meu ombro.
— Me acertei com a Samanta — sou breve.
— Fico feliz, dá para ver o quanto você a ama e ela também ama
muito você. Uma menina de ouro!
— Sim, ela é muito importante para mim — sorrio.
— Você fez certo em mandar a Vanessa ir embora, ela não deveria ter
vindo. A sua mãe não me ouve! — Revira os olhos. — A sua mãe está
obcecada por esse neto e não percebe que está tendo atitudes horríveis, não
que eu não goste do garoto, mas quero te ver feliz — ele me encara com um
sorriso
— Obrigado! — sorrio de volta.
— Imaginei que morreria sem te conhecer — diz com a voz
embargada.
Deixo uma lágrima cair dos meus olhos, estou com um nó na
garganta, eu me sinto culpado por não os ter encontrado antes.
— Tudo acontece no tempo certo, filho, não se sinta culpado por nada
— ele parece ter lido a minha mente.
Levanto para abraçá-lo e choro nos seus braços.
— Eu te amo! — digo entre soluços.
— Eu sempre te amei — ele responde, derretendo dentro de mim uma
parede imensa de gelo, talvez a última que faltava para que todas as minhas
feridas fossem curadas.
Volto a me sentar ao seu lado, conversamos por um tempo assuntos
diversos.
— Preciso ir, vou buscar a Samanta no trabalho, vou te ajudar a
entrar.
Deixo o meu pai sentado vendo TV e subo, tomo um banho e desço.
A minha mãe havia chegado e está ao lado do meu pai e me sinto aliviado
de não ver a Vanessa, saio sem ser notado.

***

Estou no estacionamento do banco olhando ansioso para o relógio, eu


optei por esperar por Samanta ainda do carro, ela sai do banco olhando para
os lados e vê o carro de longe. Desço e ando na sua direção, ela me espera
com um lindo sorriso. Passo direto por ela sem contato visual.
— Leo? — ela fala confusa. — Ainda de costas para ela, dou um
sorriso e me viro lentamente para encará-la
— A senhorita me conhece? — contenho a risada, indago com
seriedade e um sorriso divertido se forma nos seus lábios. — Certamente
não a conheço, eu reconheceria esse sorriso até em outras vidas se já tivesse
visto — o meu tom era galanteador.
— Desculpe, confundi você com outra pessoa — responde entrando
na brincadeira.
— Hum…. Esperando o namorado?
— Não tenho namorado — responde com a voz manhosa.
— Parece que hoje é meu dia de sorte, então, Leonardo Milani,
prazer! — falo estendendo a mão.
— Samanta Antonelli, o prazer é meu! — Ela estende a mão e eu a
puxo, lhe dando um beijo no rosto.
— O que acha de um jantar? Você parece faminta — digo sugestivo.
— Acho que pode ser uma boa ideia. Mas não pense que saio para
jantar com todo estranho que esbarro, estou aceitando porque estou
realmente com fome e você me parece confiável — diz com um sorriso
sexy.

***

— Onde gostaria de ir? — indago já com o carro na estrada.


— Pode parar em uma conveniência? — Ela tinha um sorriso contido
nos lábios e eu entendi qual era a cena que iremos recriar.
— Precisa de alguma coisa? — Franzo o cenho.
— Bebida! Quero beber — ela diz divertida e eu estou revivendo o
nosso primeiro encontro depois da noite do hotel.
— Eu achei que você não bebesse.
— Só por hoje, quero esquecer os últimos acontecimentos da minha
vida.
Paro o carro, vou até a loja e volto com uma garrafa de bebida.
— Para onde quer ir? — pergunto assim que volto para o carro.
— Pode parar em algum lugar, onde preferir! — Pisca um olho
sugestiva.
Encosto na mesma praia do dia da boate, abro o capô do carro e nos
sentamos no banco de trás.
— Então o que foram os últimos acontecimentos? Quer falar sobre
isso? — pergunto, dando um gole na bebida direto da garrafa.
— Descobri que tem alguém interessada no homem que amo, isso
tem me deixado incomodada. — Ela encara o mar.
— Tenho certeza de que ele não é idiota para ter olhos para outra
mulher, tendo você interessada por ele — sorrio.
Ela sorri de volta e dá um grande gole na bebida, em seguida me
entrega a garrafa e eu faço o mesmo.
— Sim, ele não é idiota, pelo contrário é a pessoa mais inteligente que
conheço — gargalhei com orgulho.
— Não precisa ter um Q.I. elevado para perceber que você é uma
mulher incrível! — Ela se vira para mim, levanta a mão, a levando até o
meu rosto e acaricia com carinho.
— Posso fazer algo que quero fazer desde o primeiro minuto em que
nos esbarramos no banco? — Mordo o lábio malicioso.
Ela sorri afirmando com a cabeça e eu a beijo loucamente, essa é a
mulher da minha vida e eu nunca vou deixá-la ir. Os meus dedos se enrolam
nos seus cabelos, eu desço os beijos pelo seu pescoço, ela levanta se
sentando no meu colo de frente para mim. Levanto o seu vestido afastando
a sua calcinha, ela geme sentindo o meu toque estimulando a sua
intimidade.
— Estou vivendo algo que eu queria ter vivido naquele dia — ela diz
entre beijos.
— Que bom que não vai me deixar passar vontade dessa vez! —
sussurro entre os beijos.
50
Doando vida

Leonardo Milani

Samanta bebe a noite toda, ela me conta as suas desventuras e


alternava com algumas piadas, eu a observo em silêncio, eu amo o timbre
doce da sua voz. Ela fala rápido, sempre ri das próprias piadas. Em alguns
momentos olho para o céu e agradeço por esse presente, por esse momento
e por ter a Samanta. Ela é uma mulher doce e muitas vezes ingênua, mas já
havia me ensinado muito sobre a vida. Olho para o céu, dá para contar as
estrelas de tão gracioso que está, então peço a Deus que nos dê outro filho e
prometo que não serei negligente, que cuidarei dele com a minha vida.
Aproximo-me de Samanta tocando no seu rosto suavemente, beijando
a sua face, ela, que ainda fala como se não precisasse respirar, para e me
olha, como se lesse os meus pensamentos.
— Eu também te amo — diz com um lindo sorriso

***

Samanta Antonelli

O dia da doação de medula havia chegado, Leonardo está nervoso e


aperta as suas mãos suadas nas minhas, nós estamos a caminho do hospital.
— Vai ocorrer tudo bem — digo com um sorriso.
— Só espero que ele fique bem.
— Ele ficará!
Chegamos ao hospital e Leonardo foi direto para a sala de coleta, eu o
aguardo na sala de espera. Será um procedimento simples, a coleta será por
aférese. O médico havia explicado que essa máquina colhe as células-tronco
e devolve ao doador os elementos não necessários. É um procedimento tão
simples que não precisa nem de internação e anestesia.
Poucas horas depois Leonardo volta e parece um pouco tonto.
— Aconteceu alguma coisa? — indaga Vanessa, se aproximando
dele, ele passa direto por ela e vem até mim.
— Está se sentindo mal? — pergunto.
— Está tudo bem, eu estava ciente do que poderia acontecer depois da
doação. — Alisa os meus cabelos encostando a testa na minha.
— Vamos ver o Miguel, quero contar a novidade — Vanessa puxa
Leonardo pelo braço, entrando no quarto apressada.
Entro logo atrás deles, Miguel pôs um sorriso animado quando nos
viu entrar, ele estava visivelmente debilitado, mas matinha um sorriso fofo
no rosto.
— Papai! — diz em um tom amoroso.
Vejo quando Leonardo enxuga uma lágrima que cai dos seus olhos.
— Vai ficar tudo bem a partir de agora. — Leonardo alisa os cabelos
de Miguel.
— Nós vamos brincar muito juntos? — indago com uma vozinha
fina.
— Sim, filho. Vamos ficar juntos de agora em diante — Vanessa
responde tocando no ombro Leonardo.
— Vamos morar juntos? — A pergunta parece ser ensaiada, Vanessa
olha satisfeita para o filho quando ele a faz.
Leonardo suspira e lança um olhar nada satisfeito para Vanessa, mas
logo a sua atenção se volta para criança.
— Não importa onde você more, você sempre terá o seu pai por perto.
— Ele ainda alisava a cabeça da criança.
— Bom Miguel, agora precisa descansar para cirurgia — uma
enfermeira entra no quarto dando o aviso.
Sei que Leonardo não está bem, ele controla a respiração. Ele se vira
para Vanessa imediatamente assim que saímos do quarto.
— Não queira usar uma criança para os seus propósitos, Vanessa. Eu
já te dei um apartamento, um carro, você tem as suas despesas pagas, o que
quer mais? Pare de ser inconveniente, nunca fomos um casal e você sabe
disso — diz irado.
— O que quer com essas palavras? Me humilhar? Jogar na minha
cara todo o seu dinheiro? — fala, se fazendo de ofendida.
— Não! Quero que você entenda que isso é a única coisa que pode ter
de mim. Nunca seremos uma família de comercial de margarina. Eu já amo
o garoto, eu quero tê-lo por perto, mas você não ultrapasse a linha ou entro
na justiça e peço a guarda do meu filho e, se eu ganhar, você não verá mais
nem um centavo meu. Fui claro com você? — Leonardo diz irritado, ela
não responde e os seus olhos refletem o ódio.
— Vamos, Samanta — Leonardo fala, me puxando pela mão.
Leonardo bate no volante com raiva, ele nunca foi bom em controlar a
sua raiva. Seguro a sua mão e a aliso, aos poucos a sua respiração vai
voltando ao normal.
— Obrigado, eu estou bem. — Solta todo o ar dos pulmões. — Não
vou permitir que essa… — calou-se — Que essa mulher me manipule, ela
não sabe quem eu sou? — indaga irado.
— Vai ficar tudo bem, você vai ver, logo as coisas vão se encaixar.
Não pense demais nisso, vamos deixar as coisas acontecerem e acredito que
ela não vai querer perder a vida boa que tem agora.
— Vamos, vou te deixar no banco — diz dando partida no carro.

***

Ele estaciona no banco e desce dando a volta no carro para abrir a


porta para mim.
— Vou te deixar na sua sala — diz, pegando a minha bolsa e
colocando no ombro, entrelaça os seus dedos aos meus em seguida.
— Bom dia! — Rubens nos cumprimenta com um sorriso, Leonardo
aperta forte a minha mão.
— Bom dia! — respondo com um sorriso singelo, então puxo
Leonardo de forma discreta para dentro da minha sala e ele aperta os olhos
me estudando.
— O quê? Por que está me olhando assim? — Dou de ombros.
— Você sabe que tenho vontade de quebrar a cara dele e mandar que
lhe cortem a língua para que ele não fale mais com você. — O seu
semblante é sério.
Uma risada contida escapa da minha boca e ele me olha irritado.
— É sério que o meu marido está com ciúmes? — indago divertida.
Ele zera a distância entre nós, se agarrando aos meus cabelos e traz o
meu rosto para colar ao dele.
— Quando se trata de você, eu sou apenas um homem que sente
ciúmes, apenas um homem inseguro que não quer perdê-la! — Beija os
meus lábios devorando a minha língua.
— Me desculpe, meu marido, por deixar que a insegurança invadisse
o seu coração — digo quando cessamos o beijo e ele volta a tomar os meus
lábios, explorando o meu corpo com as suas mãos.
— Estamos no meu local de trabalho, melhor você ir — digo,
empurrando-o para a porta.
Ele tranca a porta e me olha com malícia, voltando a me beijar, sinto a
sua ereção e o afasto.
— O que está fazendo? — pergunto sentindo o corpo esquentar.
— Ainda não notou o que estou fazendo? — Me senta na mesa se
colocando entre as minhas pernas.
— Senhora? — Leonardo suspira insatisfeito e logo coloca a mão na
minha boca.
— Não responda! — fala beijando o meu pescoço.
— Leonardo, estou no trabalho — falo o afastando e vou até a porta
me arrumando. — Pode entrar — falo abrindo a porta e vejo Leonardo
descontente sentando no sofá do canto da imensa sala.
— O diretor-geral quer ter uma reunião com a senhora — informa
uma funcionária.
Antes que eu consiga falar qualquer palavra, o homem na casa dos
cinquenta anos, já apresentando cabelos brancos, entra na sala com um ar
altivo.
— Bom dia, senhorita — ele estende a mão com os olhos fixos nos
meus e nem sequer olha ao redor da sala, então, nem nota a presença de
Leonardo que permanece sentado me observando.
— Não sabia que se tratava de uma senhorita tão linda — diz
malicioso antes de sentar na cadeira em frente à minha mesa.
Os meus olhos se arregalam, os meus músculos ficam tensos.
— Como anda a administração?
— Trabalho em conjunto com Rubens, ele já está a mais tempo no
banco, poderia ser interessante que ele se juntasse a nós — ele abre um
sorriso sugestivo.
— Eu não estou gostando da administração do banco e vim ver
exatamente isso, ainda não falei com Rubens sobre isso, mas acredito que
podemos resolver entre nós dois, sei que irá cooperar! — As suas mãos
avançam na minha direção e ele acaricia o meu braço, sobressalto da
cadeira assustada.
— Como vai Ricardo? — o tom irritado de Leonardo ecoa pela sala.
51
Colo de mãe

Leonardo Milani

— Senhor Milani, quando entrou? — Ele se pôs de pé apressado.


— Na verdade, eu já estava na sala quando entrou, mas a beleza da
minha esposa lhe cegou — falo com um sorriso debochado, me
aproximando de Samanta.
— Esposa? — gagueja, me olhando e depois para Samanta.
— Sim, esposa! Mas independente do status da Samanta, espero mais
profissionalismo da sua parte com qualquer outra funcionária, eu não aceito
nenhum tipo de assédio na minha empresa. — Inclino o meu corpo para
frente apoiando as mãos sobre a mesa.
— Não houve assédio, senhor! — Os seus lábios tremem.
— Certo, então me explique, o que tem te deixado insatisfeito?
Aproveite que estou aqui e vamos discutir sobre os problemas do banco, irei
cooperar — sorrio com ironia.
Puxo a cadeira e me sento aguardando que comece a falar. Ele limpa a
garganta e faz menção de se levantar.
— Continue sentado, estou bem curioso para saber que assuntos tem
lhe incomodado tanto.
— Podemos deixar para outra hora, senhor Milani! — Levanta
apressado.
— Acredito que não terá outra oportunidade, está demitido e não só
por assediar a minha esposa, mas por todas as outras que não tenho dúvida
que já tenha feito. Não temos mais assuntos para tratar, pode se retirar.
— Mas, senhor, trabalho para a Milani há muito tempo, sou de total
confiança, sempre trabalhei pelo bem da empresa — ele implora.
— Nem acredito que ainda tem o disparate de falar algo — retruco.
Ele levanta os olhos e me encara com ódio.
— Por que está se fazendo de santo, quando todos sabemos que é o
pior? Só porque tem muito dinheiro e comprava as mulheres, se acha em
condições de me julgar? — O meu sangue ferve com as suas palavras.
— Melhor que saia antes que eu não responda pelos meus atos! —
Aperto as minhas mãos na mesa tentando me controlar.
— Senhor, é melhor ir. — Samanta sai de trás da mesa o conduzindo
até a porta.
— Acredito que custou bastante para você, considerando que ainda é
uma garota — ele insiste em falar, fazendo Samanta travar no meio do
caminho.
— Até quando vai continuar falando? — indago irado.
Os gritos chamam a atenção dos seguranças que entram na sala.
— Algum problema, senhor? — um deles pergunta.
— Podem acompanhar o ex-diretor até a saída do banco por gentileza
— digo entredentes.
Eles se entreolham confusos, mas seguem as ordens. Esmurro a mesa
com força assim que eles cruzam a saída.
— Se acalma, Leo, ele já saiu — Samanta fala com um tom tranquilo.
— Que droga! Já estou cansado das pessoas te julgando. Que merda!
Sou eu quem deve ser julgado pela vida que eu levava e não você! — A
minha respiração está pesada, eu odeio quando Samanta passa por esse tipo
de constrangimento.
— Isso não me incomoda mais, Leo, nós nos amamos e é isso que
importa. — Ela tem o meu rosto entre as suas mãos e me encara com
tranquilidade.
— Mas me incomoda, Samanta, e foi por isso que eu disse para não
trabalhar, você não precisa disso! Mas depois você ficou triste em casa e
achei que seria uma boa ideia — ela recua, dando uns passos para trás.
— Você está sendo machista, Leonardo, você nunca foi assediado no
seu trabalho? — pergunta como se fossem situações iguais.
— Não queira comparar, Samanta — sorrio.
— Por quê? Só porque sou mulher? — questiona desdenhosa —
Poderia ter me defendido sozinha se não estivesse aqui — diz firme.
— Meu amor, vamos deixar esse assunto de lado, ok? — me levanto a
puxando para os meus braços, faço carinho nos seus cabelos sentindo o
cheiro delicioso de morango que vem deles. — Não quero brigar com você,
já concordei que trabalhe aqui ou em qualquer lugar que queira, só quero te
ver feliz. — Me afasto e a beijo. — Vou te deixar trabalhar, venho te buscar
mais tarde — digo me despedindo.

***

Samanta Antonelli

Algumas horas depois saio do banco e vou visitar os meus pais,


muitas vezes sinto falta do colo da minha mãe.
— Samanta? — Ela lava os pratos do almoço quando entro pela porta
da cozinha.
— Onde está todo mundo?
— O seu pai foi trabalhar e o seu irmão está na escola — responde
sorrindo.
— Ele já está na escola nova?
— Sim, ele está amando.
— Leonardo quer formar investidores mirins, até disse que ele tem
talento para os negócios.
— O seu marido é um homem especial, você tem sorte — ela diz,
secando as mãos e vou para a sala.
Jogo-me no sofá e ela senta ao meu lado me fazendo carinho na
cabeça, então deito com a cabeça no seu colo.
— O que você tem? Ainda não resolveu os seus problemas com o seu
marido?
— Sim, resolvermos por hora, até que surjam novos — suspiro em
derrota.
— E você acha que isso não é a vida? Achou que seria tudo perfeito?
O seu marido te ama, faz de tudo para te ver feliz, leve isso em
consideração e esteja ao lado dele lhe apoiando!
O meu coração está apertado e pesado.
— Não sei se sou madura o suficiente… — uma lágrima solitária
escorre pela minha face.
— Você já tem sido. — Ela acaricia os meus cabelos.
— Mas não sei até quando! Miguel sairá do hospital, a Vanessa
voltará a se enfiar na nossa casa, a mãe do Leonardo continuará jogando na
minha cara que ele é seu único neto.
— E o Leonardo? É ele quem realmente importa.
— Ele vai se render a criança mamãe, é só uma questão de tempo e
ele estará realizando todos os gostos do menino.
— Está com ciúmes de uma criança, Samanta? — O seu tom é de
repreensão.
— Não é isso! Tenho medo de que o Leonardo deixe de se importar
comigo e faça tudo por ele, inclusive aceitar a Vanessa na nossa casa, ou…
— me calo.
— Ou nada! Cuide de si e fique bem, pare de se preocupar com o
Miguel, Vanessa, ou a sua sogra e se concentre no que importa, você e o seu
marido. Quem sabe você já não tem uma sementinha aí e nem sabe — ela
acaricia o meu ventre.
— Estou sendo castigada, mamãe, eu matei o meu filho e não sei se
mereço ter outro — digo em meio aos soluços.
— Já chega, Samanta! Levanta, vamos fazer alguma coisa juntas. Não
venha com essa negatividade, tudo tem o seu tempo e você não terá um
bebê, terá um time de futebol se quiser! — Ela enxuga as minhas lágrimas
sorrindo. — Levanta, vamos arrumar o que fazer.
52
O meu primo

Samanta Antonelli

A minha mãe me puxa pelo braço subindo as escadas, me levando até


o meu quarto. Tudo estava do jeitinho que eu havia deixado.
— Sente falta do seu quarto? — Sorri saudosa.
— Sinto falta do cheirinho da comida da senhora todo dia de manhã
— respondo a abraçando.
— Por falar em comida, preciso organizar a cozinha e começar a
pensar no jantar, fique aí enquanto organizo as coisas.
Fico matando a saudade das minhas coisas, pego uns cadernos de
anotações e algumas fotos, me deito na cama, sinto os meus olhos pesando
e pouco tempo depois adormeço. Desperto com vozes vindas da sala e uma
voz masculina em especial, não era a voz do meu pai. Desço apressada,
reconhecendo a voz.
— Sam? Como você está linda — o meu primo que eu não via há um
tempo fala me abraçando.
— Quando você chegou, Arthur? — indago ainda no abraço.
— Não faz muito tempo, para ser mais exato, algumas horas.
— Vai ficar quanto tempo?
— Estou procurando emprego, quero ficar por aqui.
— Ah…. Veio para ficar? Posso ver algo para você no banco.
— Sério? — pergunta animado.
— Claro, amanhã falo com o coordenador e vejo algo para você.
— Obrigado, prima! — Torna a me abraçar.
— Não vão comer, Samanta e Arthur? — A minha mãe pergunta da
mesa
— Estamos indo agora — respondo.
O meu pai chega com o meu irmão e me agarro ao meu pequeno.
— Que saudades de você, meu menino lindo! — O abraço E o beijo
fazendo algumas cócegas nele.
Foi uma ótima tarde, eu estava precisando disso, dos meus pais, do
meu irmão. Eu precisava desse momento.
— Caramba, já são oito horas da noite e nem vi o tempo passar —
apanho o meu celular e vejo várias chamadas do Leonardo, ele deve estar
preocupado! Eu deveria ter ligado para ele. — Preciso ir — dou um beijo
nos meus pais e no meu irmão.
— Vai como? — O meu primo pergunta.
— Vou pedir um táxi — respondo.
— Eu te deixo na sua casa, ainda não conheço o seu esposo.
— Vai conhecê-lo hoje! — falo aceitando a carona, nos despedimos
dos meus pais, do meu irmão e saímos de casa.
Apanho o telefone e ligo várias vezes para Leo, porém só cai na caixa
postal.
— Ligando para o seu marido?
— Sim, mas está dando caixa postal.
— Entra, sou piloto de fórmula um — diz divertido.
Fomos conversando, o caminho é longo, o que nos permite atualizar
os assuntos.
— É aqui. — Aponto para a casa.
— Uau! A sua casa é incrível, Samanta — diz boquiaberto.
— Vou te mostrar ela por dentro — digo me identificando para que os
seguranças abrirem o portão e Arthur olha tudo abismado.
— Vou usar todo o tanque de gasolina até chega na entrada da casa —
sorri divertido.
— Já estamos chegando — sorrio de volta. — Vamos aproveitar que
está aqui e vem conhecer o Leonardo.
— Farei, prima! — diz estacionando o carro.
A mansão está quieta como sempre, a minha sogra está sentada no
sofá.
— Boa noite, a senhora viu Leo? Não vi o carro dele aí na frente.
— Achei que ele tivesse ido te buscar no trabalho — responde. — E
esse aí, quem é?
— Ah… desculpe, esse é meu primo, Arthur e essa é minha sogra! —
Eles se cumprimentam. — Vou subir e apresentar a casa para ele — digo
indo em direção às escadas com ele no meu encalço.
— Iria demorar uma semana para decorar tudo nessa casa — fala
ainda no primeiro degrau.
— Não seja exagerado — sorrio, lembrando que pensei o mesmo
quando cheguei na casa antiga.

***

Leonardo Milani

Chego em casa e vejo um carro diferente na entrada, entro


desconfiado, eu havia ligado bastante para Samanta a ponto de ficar sem
bateria no celular e como ela não atendeu achei que algo de ruim poderia ter
acontecido. A casa está calma, a sala vazia, do meio da escada ouço uma
voz masculina e a voz de Samanta, continuo subindo seguindo o som da
voz e paro em uma varanda que dá para os fundos da casa.
Samanta está distraída, ela sorri bastante e ele a toca várias vezes, ela
apoia a cabeça no seu ombro. Confesso que sinto ciúmes da forma que ela
olha para ele, os seus olhos brilham, é nítido que ali está alguém especial
para ela.
— E o seu marido, nada de chegar? — ele diz olhando para ela.
— Estão me procurando — digo e Samanta sobressalta se assustando.
Ela me lança um lindo sorriso e não resisto a esse sorriso, embora eu
esteja encabulado com esse rapaz ao seu lado.
— Leo, onde você estava? — pergunta como se eu estivesse sumido e
não ela.
— Estava a sua procura — respondo sério.
— Ah, meu amor, desculpa, eu estive na casa dos meus pais — se
justifica.
Devo me lembrar disso, ela sempre me esquece quando vai para lá.
— Esse é Arthur, o meu primo — sua voz era orgulhosa, como quem
apresenta alguém muito importante.
— Muito prazer. — Estendo a mão e ele responde ao meu
cumprimento.
— Vamos descer, vou fazer um lanche e podemos beber alguma coisa
— ela está realmente eufórica com a visita, as minhas sobrancelhas se
arqueiam observando-a, porém não faço nenhuma objeção e os acompanho.
— Então, Arthur, veio a passeio? — pergunto, realmente curioso,
assim que Samanta nos deixa sozinhos.
— Na verdade, vim para ficar e estou procurando emprego.
— Hum, sério… — finjo interesse.
— Pronto! — Samanta volta com uma bandeja cheia com petiscos e
bebidas, a colocando sobre a mesa de centro.
— Ele está estudando contabilidade, Leo, acha que posso achar algo
no banco para ele? — pergunta me olhando com aqueles olhos brilhantes.
— No banco? Em qual? — Me faço de bobo.
— No que trabalho, Leo! — responde como se fosse óbvio.
Mordo o lábio controlando a minha vontade de gritar “não! ”
— Pode ser, mas me diz uma coisa, vocês são primos de primeiro
grau? — O primo levanta os olhos me olhando entendendo o recado.
— o meu pai é irmão do pai da Samanta — ele responde, porém,
ainda não descartando nenhuma possibilidade.
— Tenho uma vaga para você lá na empresa — ofereço, afastando as
chances de ele ficar grudado na Samanta o dia inteiro.
— Agradeço a oferta, mas ele vai trabalhar comigo no banco —
Samanta argumenta.
— Acredito que ele aprenderá mais trabalhando comigo. O que me
diz? — pergunto batendo no ombro dele.
— Acho perfeito! Pensei que teria que procurar muito por trabalho e
agora, estou sendo disputado — o seu tom é divertido. — Sam, preciso ir, já
está tarde — fala olhando para o relógio.
— Durma no quarto de hóspede — Samanta fala rápido e eu lhe lanço
um olhar desconfortável, porém ela nem me olha.
— Tudo bem para você, Leonardo? — pergunta e olho para ele.
— Claro, tudo bem. — Dou de ombros.
Bebemos por várias horas, embora eu estivesse cansado, fiquei ali
firme até que, pela graça divina, o primo resolve ir dormir.
— Bom, está ficando tarde — diz olhando o relógio.
— Te deixo no seu quarto — falo o guiando pelo ombro. — Aqui,
fique à vontade — falo abrindo a porta do quarto.
— Obrigado, foi um prazer te conhecer e você é exatamente tudo que
a Samanta me falou, ela tem sorte em ter você.
— Obrigado — respondo simpático.
Subo para o nosso quarto, eu estou extremamente cansado, será banho
e cama. Foi isso que pensei até abrir a porta do nosso quarto.
— Amor — a sua voz soou como um gemido, ela está deitada apenas
de roupa íntima na cama — Acho que deveríamos terminar o que
começamos hoje pela manhã no escritório! — diz manhosa.
— Concordo plenamente! — Me aproximo dela desabotoando a
minha camisa, a jogando no chão.
53
Resolva!

Samanta Antonelli

Levanto primeiro que Leonardo, ele dorme como se estivesse lutado


uma guerra na noite anterior. Desço, pretendendo tomar um café da manhã
tranquilo, mas a visão da Vanessa sentada à mesa tão cedo destrói todas as
minhas expectativas de uma refeição agradável.
— Bom dia, não sabia que viria hoje.
— Bom dia, Samanta, dormiu bem? — O seu tom de voz foi de
deboche.
— Tenho que confessar a você que dormi pouco, a noite foi bem
animada no meu quarto — respondo com naturalidade, sem deixar evidente
o ar debochado.
— Bom dia — o bom dia do Arthur foi animado.
— Bom dia, dormiu bem? — pergunto, batendo na cadeira ao meu
lado para que ele sente.
— Sim, obrigado, tinha roupas no closet, peguei para usar, espero que
não seja um problema. — fala, se sentando ao meu lado.
— Imagina, fique à vontade, as roupas são do Leo.
— Quem é você? — Vanessa pergunta escorando os cotovelos na
mesa.
— Arthur, sou primo da Samanta — responde com educação. — E
você, quem é?
— Vanessa — ela se limita a dizer apenas o primeiro nome.
— Prazer, Vanessa — ele sorri amigável.
— Vanessa, o que faz aqui tão cedo? — Diane fala entrando na sala.
— Hoje é o dia da cirurgia do Miguel e eu estava me sentindo sozinha
— diz manhosa.
— Nossa verdade, vamos tomar café da manhã e depois ficamos
juntas lá no hospital até que acabe o procedimento de transplante do meu
neto — o seu tom foi aflito.
— Acho ótimo, mas eu também queria que o Leo fosse.
Eu observava o diálogo das duas, como essa Vanessa é sonsa. Artur
me olha sem entender, acredito que ele não saiba da história, mas ele nota
que fico desconfortável, então ele fala:
— Leo? Não acha íntimo demais falar assim de um homem casado e
ainda mais na frente da esposa? — indaga irritado.
— Está tudo bem, não dê atenção a ela, vamos tomar o nosso café da
manhã tranquilo — tento amenizar.
— Tudo bem, uma ova, deixa eu ver se entendi direito, você tem um
filho com o meu “cunhado”, e acha que pode vir fazer pouco da Samanta na
casa dela? — o seu tom era ainda mais irritado.
— Garoto, veja como fala, tenha modos — Diane fala incomodada.
— Veja como fala? — ironiza — A senhora nem sequer nos deu bom
dia quando entrou e me manda ter modos? — sorri debochando. — O que
você é? Ex-esposa? Ex-namorada ou ex-noiva? — Arthur pergunta olhando
para Vanessa, ela o encara com cinismo e não responde. — Ah…. Já sei,
foi uma transa infeliz e resultou em uma criança — gargalhou.
— Garoto, respeite as pessoas — Diane fala irritada dessa vez.
— Já temos problemas a essa hora da manhã? — A voz grave de
Leonardo ecoa pela sala.
— Não, Leo, só vim para ter companhia no hospital na hora da
cirurgia do Miguel — a sua voz era doce e qualquer pessoa que não a
conhece diria que ela é a vítima.
— Podia ter esperado no hospital, já disse que não a quero enfiada na
minha casa. — Ele para, se sentando do meu lado.
— Pare de tratá-la como se ela não fosse da família Leonardo —
Diane fala irritada.
— E ela não é! Deve vir apenas se for convidada — responde irritado.
— Não vai ao hospital comigo? — ela pergunta manhosa.
— Irei ao hospital, Vanessa, mas não com você, te encontro lá, pode ir
com a minha mãe se quiser.
— Termine o seu café da manhã, nós vamos juntas — ela diz a
Vanessa.
Leonardo me olha, mas não diz nada, apenas beija a minha mão e põe
fruta no meu prato.
— Isso é ridículo, é constrangedor — o meu primo fala, se levantando
da mesa.
Faço menção de me levantar e Leonardo segura a minha mão contra o
braço da cadeira.
— Termine o seu café da manhã — ele fala tranquilo, volto a me
sentar na cadeira. — Essa é a sua casa, não se sinta intimidada — fala alto.
Após o café da manhã, vou até o quarto onde Arthur havia dormido.
— Estou indo embora, vou para casa — ele fala assim que entro no
quarto.
— Vou te deixar em casa! — Leonardo fala entrando logo atrás de
mim.
— Não precisa, estou de carro — o tom de voz do meu primo ainda é
irritado.
— Vou pedir que um motorista guie o seu carro até a casa dos pais da
Samanta, não é lá que está? — Leo pergunta.
— Sim, estou lá.
— Então vamos, eu te deixo lá.
— Tudo bem, então vou indo trabalhar — me despeço dos dois e
deixo Leonardo com ele.

***

Leonardo Milani

O primo de Samanta veio de cara amarrada no carro o caminho todo,


ele está tomando partido por ela e é compreensivo.
— Algum problema? — pergunto já sabendo a resposta
— A Samanta não tem que aturar esse tipo de coisa — diz ríspido,
sem me encarar.
— Você acha que eu não sei disso?
— Então resolva! — vocifera com a respiração acelerada.
— Você tem alguma dica para me dar? Como você acha que posso
resolver isso? — pergunto sério.
— Não permita que ela humilhe a Sam, nem permita que a sua mãe
trate a Samanta como se ela fosse sua amante e não esposa.
— Concordo com você, concordo com tudo que me diz. E quanto a
mim, tem algo que quer acrescentar?
— Não acho que seja um homem ruim para Sam — a sua voz saiu
baixa como um sussurro.
— Amo a Samanta, mas não consigo controlar as ações das pessoas e
posso respeitar a Samanta, cuidar, impor o respeito que ela merece, mas
ainda, sim, não posso controlar as ações das outras pessoas — me justifico.
— Isso está acontecendo dentro da sua casa, com a sua mãe
consentindo e você me diz que não pode controlar? — Ele sorri com ironia.
— Já tem gente demais para atrapalhar, não seja mais uma —
imploro.
— Não quero isso, mas também não verei a Samanta sendo tratada
daquela forma na própria casa. Você tem muito dinheiro, apenas coloque a
sua mãe em outra casa e deixe que ela viva grudada com a Vanessa ou com
quem ela quiser, mas na casa dela — ele fala sério e tudo que ele diz faz
sentido.
Samanta nunca iria me pedir para colocar os meus pais em outra casa,
mas eu poderia fazer isso por ela, para que voltássemos a ter paz na nossa
casa. Então sorri para ele que me olha confuso.
— Pode funcionar, obrigado pela dica — falo, tirando a mão
rapidamente do volante dando uma tapinha no seu ombro. — Você começa
amanhã lá na empresa, chegue cedo e me procure.
54
Um novo teste de DNA

Samanta Antonelli

Depois de duas semanas da cirurgia, Miguel está se recuperando bem


e a cada dia a minha sogra fica mais obcecada pela criança, acredito que
isso seja porque ela não teve a oportunidade de criar o filho, de certa forma
pode ter gerado um trauma, sei lá! Não sei explicar tal atitude tão obsessiva.
Ela mandou reformar um quarto para o Miguel e comprou vários
brinquedos, o único problema é que no quarto tem duas camas e a outra eu
já imagino de quem seja, Leonardo andou bem calado esses dias, acho que
está tramando algo.
— Boa tarde! — Leonardo chega em casa com Arthur, eles têm
passado muito tempo juntos, acho ótimo que eles tenham se tornado
amigos.
— Prima! — Ele me cumprimenta.
— Onde vocês estavam? — indago curiosa.
— Conheci a sua antiga casa, acabamos de vir de lá — responde
Arthur.
— O que faziam lá?
— Estou reformando a casa, pretendo dá-la aos meus pais —
Leonardo responde.
Olho surpresa para ele que sorri, eu não esperava por isso, embora
estivesse me sentindo incomodada com a mãe dele trazendo a Vanessa aqui
para casa.
— Está nos expulsando, Leonardo. — A minha sogra aparece na sala
após ter ouvido a conversa.
— Claro que não! A casa será toda adaptada para o papai, ele poderá
circular mais, contratarei mais cuidadores e vocês vão ter mais privacidade.
— Foi você? A ideia foi sua? — indaga olhando para mim.
— Minha? — pergunto confusa.
— A Samanta não tem nada a ver com isso, mãe, eu só acho que eu e
ela temos que ter privacidade, da mesma forma que a senhora e o papai
também. Será bom para todo mundo! — Ele se justifica.
— Bom? Me manter longe de você por que ela se sente incomoda em
ter o seu único filho em casa?
— Não, isso não é verdade — retruco.
— Mãe, pare de acusar a Samanta, eu já tomei a minha decisão — ele
está se mantendo firme e eu estou disposta a ver até quando.
Diane sai da sala batendo os pés com força, Leonardo me olha
entristecido, mostrando um sorriso forçado.
— Não se preocupe, vai ficar tudo bem — ele tenta acreditar nas
próprias palavras.
— Eu já vou, só vim para te ver Sam, mas não quero demorar —
Arthur se despede.
— Você acredita que está fazendo o certo? — pergunto assim que
ficamos sozinhos.
— Não vamos falar sobre isso! — Beija o topo da minha cabeça.
— Eu te amo e quero que você esteja bem, vou te apoiar no que você
decidir, estamos juntos para tudo! — Ele precisa saber disso, eu aceitaria a
mãe dele aqui por uma vida inteira se isso o fizer feliz.
— Eu sei, faço isso por nós dois, quero que você viva tranquila na
nossa casa — fala abraçado ao meu corpo.
— Vamos nos deitar, estou cansada — falo manhosa.
— Vamos, eu vou cuidar de você para ter uma boa noite de sono —
diz sugestivo.
— Em que está pensando?
— Nada além te deixar relaxada — sorri com luxúria.

***

Leonardo Milani

No dia seguinte fui visitar Miguel no hospital e me encho de alegria


quando o encontro bem e disposto.
— Bom dia — falo animado entrando no quarto.
— Papai! — fala sorrindo. — Vou morar com você quando sair
daqui? — pergunta me olhando com aqueles olhinhos pidões.
— Você vai morar com a sua mãe, mas ainda assim vamos nos ver
sempre.
— Quero morar com você e a minha mãe — diz manhoso.
— Vamos resolver isso, apenas se concentre em ficar bem! — Beijo o
topo da sua cabeça.
— Não vai atender o pedido do seu filho? — pergunta a minha mãe,
entrando no quarto. — Eu estava prestes a entrar e ouvi vocês conversando.
— Não vamos falar sobre isso na frente da criança — respondo.
— Pense bem, Leonardo, você não sabe como é ruim ter um filho
longe e não poder criá-lo. Não deixe que a Vanessa leve ele para longe de
você — Fico em silêncio e ela continua. — Você ama essa criança?
— Claro que o amo, mas ele tem que saber que eu e a mãe dele não
somos um casal, ele é o meu filho, portanto parte da minha família e ela
não.
— Ele é muito pequeno, não vai entender isso e não o distancie de
você ou de mim — implora.
— Darei o meu melhor para que ele se sinta amado por mim e a
Samanta fará o mesmo.
— Você não enxerga que, para Samanta, o Miguel é um estorvo!
— Não fale assim, você não conhece a Samanta e eu nem teria lhe
encontrado se ela não tivesse me apoiado, ela é a melhor pessoa que eu já
conheci e ela me aceitou quando eu era a pior pessoa.
— Está com ela por gratidão? — Levanto os olhos para encará-la, que
merda de pergunta é essa!
— Eu a amo, amo mais que a minha própria vida e logo seremos uma
família, com o Miguel.

***

Samanta Antonelli

No fim da tarde vou até o hospital para visitar o Miguel e, quando


estou prestes a entrar, no quarto, ouço a Vanessa falando com o garoto.
— Você precisa pedir para morar com ele e que eu vá junto, entendeu,
Miguel? Vou te jogar fora se você não fizer o que mando, entendeu?
Lembre-se que se eu não te quisesse você estaria jogado na rua.
— Certo vou fazer — ele diz entre soluços.
Que espécie de pessoa faz isso com uma criança?
Ouço passos da Vanessa em direção à porta e me escondo em outro
corredor, volto para o quarto quando ela deixa o hospital.
— Olá, Miguel, boa tarde! Como está se sentindo hoje? — pergunto
entrando no quarto.
— Sai daqui, não quero te ver, a minha mãe diz que você é má e não
quer que eu fique com o meu papai — ele ainda chora.
— Isso não é verdade, Miguel, eu e o seu pai somos casados, nós nos
amamos e amamos você também! O seu pai nunca vai te abandonar,
entendeu. — falo enxugando as suas lágrimas.
— Mas a minha mãe disse que tenho que morar com ela e o meu pai,
juntos, ou ela vai me abandonar, na rua — o choro dele parte o meu
coração.
Mato aquela vadia!, penso indignada.
— E você a ama? — pergunto
— Tenho medo de ficar sozinho — fala se agarrando ao meu braço.
— Você nunca mais ficará sozinho — tento tranquilizá-lo.
— Você jura? — pergunta ainda choroso com um olhar fragilizado.
— Juro! — falo alisando os seus cabelos. — Vou até o lixo onde
Vanessa acabou de jogar o copo de café, o lixo havia acabado de ser trocado
então só havia o copo no cesto, coloco eu um saco e volto a minha atenção
para o Miguel.
— Tchau, Miguel, e amanhã eu estarei de volta para te ver — me
despeço.
— Já vai? Eu vou ficar sozinho de novo? — o meu coração aperta.
— Hum… acho que posso ficar mais, o que quer fazer? — pergunto
animada.
— Primeiro vamos assistir desenho e depois você me conta uma
história.
— Tudo bem — falo puxando uma poltrona e sentando ao seu lado.
Ficamos assistindo desenhos, ele sorria animado e isso me deixa feliz,
eu estou decidida a desmascarar Vanessa e ajudar o Miguel, ele não merece
ser aterrorizado daquela forma.
— Pronto, tia Samanta, agora me conte uma história! — fala, se
encolhendo na cama, em posição para dormir.
Crio uma história qualquer sobre heróis e ele se diverte me ajudando
a criar a história. Ele é uma criança incrivelmente fofa e que provavelmente
terá traumas parecidos com o do Leonardo se não for liberto daquela
vigarista
Ele adormece e o cubro, beijo a sua testa e saio de lá direto para o
laboratório do hospital, peço um exame de DNA. Como não tinha os
documentos para solicitação, fiz um pouco de charme para o funcionário e
lhe pago muito bem, então ele aceita realizar o exame e me diz que ficará
pronto em alguns dias.
Olho para o relógio e já é muito tarde, deixo algumas recomendações
para a cuidadora de Miguel e vou para casa.
— Onde estava? — Leonardo pergunta assim que entro em casa.
— Eu estava com o Miguel! — Ele me olha surpreso.
— Foi visitá-lo? — pergunta.
— Sim, assistimos desenhos e fiquei para lhe contar histórias até ele
dormir — sorri satisfeito e me abraça.
— Obrigado, meu amor.
— Você não tem que me agradecer, ele é seu filho e precisa de você,
eu estarei ao seu lado sempre! — Lembrei-me do que ouvi da Vanessa, mas
antes de conversar com ele sobre isso preciso confirmar as minhas
suspeitas.
— Se tivesse me dito que iria para lá, eu teria ido com você.
— Eu queria fazer isso sozinha, queria passar um tempo a sós com
ele.
— Você jantou?
— Ainda não — respondo sorrindo.
— Vem, vou te servir alguma coisa — fala, me levando até a cozinha
e me sento à mesa.
Fico observando a sua expressão carinhosa enquanto prepara um
sanduíche e espreme laranjas para fazer um suco.
— Você sabia que eu te amo? — digo, me sentindo a mulher mais
sortuda do mundo e ele sorri.
— Você é a minha vida! — responde, trazendo a comida e sentando
ao meu lado.
— Espero não estar atrapalhando o casal — o meu sogro fala,
entrando na cozinha.
— O senhor não atrapalha! Acordado a essa hora? — pergunto
sorrindo.
— Estou sem sono e vocês são muito fofos — ele sorri.
— Sério?
— Antes eu não sabia onde o meu filho estava, mas eu tinha certeza
de que onde ele estivesse ele era um grande homem — fala orgulhoso.
— Nem sempre foi assim pai, a Samanta é responsável pelo homem
que sou hoje. — Leonardo me beija no rosto.
— De jeito nenhum, você sempre foi um homem incrível, só era
possessivo.
— Isso porque eu nunca havia encontrado uma mulher que me
deixasse louco, que eu tivesse muito medo de perder.
— Então, tenho que te agradecer por você fazer do meu filho esse
homem, Samanta? — O seu tom era divertido.
— Eu que agradeço ao senhor por colocar ele no mundo, para que eu
o encontrasse.
Ficamos um bom tempo conversando e rindo, eu fico satisfeita em ver
o Leonardo feliz, eu sei que ele faz de tudo para me ver bem e eu quero dar
o meu melhor a ele também.
55
Sejam bem-vindos!

Leonardo Milani

Dois dias depois…

Vim visitar o meu filho no hospital e recebo a maravilhosa notícia que


ele está de alta.
— Olha que máximo, você está de alta, vamos poder ir para casa —
falo animado.
— Vamos arrumar tudo então, vamos passar uns dias aqui e logo
poderemos voltar para nossa cidade, não é meu amor — Vanessa fala para o
Miguel
Olho para ela, furioso, sei qual é o jogo dela.
— Mas quero ficar com o meu pai — ele diz manhoso.
— Pergunte ao seu pai se ele quer ficar com você — as palavras dela
são puro veneno.
— Vamos resolver isso entre nós dois, Vanessa, não envolva o nosso
filho — insisti irritado.
— O seu pai e eu já voltamos, Miguel — diz, caminhando para a sala
ao lado do quarto.
— Pensei bem e resolvi voltar para minha cidade — diz sem
delongas.
— Por que isso?
— Toda a nossa vida está lá, inclusive os amiguinhos do Miguel e
aqui eu me sinto sozinha.
Passo a mão pelo cabelo nervoso.
— Não vou deixar você levá-lo — falo irritado.
— Você pode entrar na justiça e solicitar a guarda compartilhada. —
Dá de ombros.
— O que mais você quer, Vanessa? — conto até dez na minha mente
tentando me controlar.
— Quero que o meu filho tenha uma família, quero morar com você
— fala astutamente
— Isso não é possível, Vanessa! Você tem um apartamento bem
próximo a minha casa, é grande, confortável e colocarei o Miguel na
melhor escola. Já entrei com o pedido para ele ter o meu nome, ele terá
todos os direitos como o meu filho.
— Ok, Leonardo, de antemão comunico que estamos voltando para
nossa cidade, entre com o pedido de guarda compartilhada — fala tranquila
— Você sabe que tenho muito dinheiro, posso mover céus e terras
para tê-lo comigo, não sabe? — falo a advertindo
— Sei, mas você não teria coragem de afastar o seu filho da mãe e vê-
lo sofrer, ou você entra em um acordo comigo, ou será o Miguel quem vai
sofrer no meio disso tudo. — Torna a dar de ombros.
Mordo o lábio com força procurando me controlar, mas foi
impossível e eu soco a parede com raiva.
— Que espécie de mãe você é? — vocifero.
— Moramos juntos ou volto para minha cidade, você quem decide!
— fala voltando para o quarto do Miguel.
Sento-me na sala nervoso, com raiva e só volto a mim quando
Samanta me liga.
— Oi, meu amor — atendo com a respiração descompassada.
— Algum problema, Leo?
— O Miguel está de alta.
— Uau! Isso é ótimo… — ela comemora — Mas qual o problema?
— pergunta confusa.
— Vanessa quer levá-lo para a cidade dela de volta.
— Leve-os lá para casa, é isso que ela quer e ganhamos tempo até
resolver isso — a sua proposta me traz alívio.
— Você tem certeza, Samanta? Eu não quero que isso seja um
problema para nós dois. — me preocupo.
— Não, pode levá-los! — ela fala segura
— Obrigado, Samanta. — sei o quanto isso será difícil para nós dois.
— Eu te amo, vamos resolver isso juntos! Agora se apresse e leve-o
para casa.
Encerramos a ligação, me levanto indo até o quarto comunicar que
eles iriam lá para casa, e a cara de satisfação de Vanessa só aumenta a
minha raiva.

***

Samanta Antonelli

Com a notícia da chegada do Miguel em casa, saio mais cedo do


banco para recebê-lo. Chego em casa e encontro a minha sogra eufórica,
provavelmente com a notícia sobre o Miguel.
— O Leonardo vai trazê-lo para cá — fala animada para o meu sogro.
— Boa tarde, Samanta. — O meu sogro fala educadamente.
— Boa tarde — sorrio para ele. — O que estão fazendo? — pergunto
mesmo sabendo a resposta.
— Organizando, tudo tem que estar esterilizado, temos que nos
adaptar — Diane fala com euforia.
— Claro! — sorrio — Já contratei uma enfermeira e uma
nutricionista para cuidar do Miguel, não se preocupe tanto, tudo ocorrerá
bem! — Ela apenas confirma com a cabeça.
Horas depois eles chegam e Vanessa está com uma cara convencida,
ela nem imagina o que a espera.
— Sejam bem-vindos! — Abro o meu melhor sorriso e Leonardo vem
e me dá um beijo rápido, o seu olhar era de gratidão.
— Venham, me deixem ajudar com as malas — a minha sogra fala
indo até Vanessa.
— Obrigada.
— Está com fome, Miguel? — pergunto e ele me olha animado, mas
logo olha para a sua mãe e muda o seu olhar.
— Não quero nada de você! — responde carrancudo, se agarrando as
pernas da mãe.
Vadia, usando uma criança!
— Tudo bem, mas o que precisar, pode falar comigo que posso te
ajudar, certo?
— Não se preocupe, cuidarei do meu filho — Vanessa diz, puxando-o
para mais próximo do seu corpo.
A minha sogra os leva para mostrar toda a casa a Miguel e Leonardo
fica comigo.
— Está tudo bem mesmo? — O seu tom era preocupado.
— Você sabe que bem não estou, mas vou fazer o possível para ficar!
— Ele me abraça e me beija.
— O reconhecimento da paternidade sairá logo, já pedi para
adiantarem o processo, depois disso pedirei a guarda do Miguel — ele
pronúncia com segurança.
— Devemos ficar de olho no tratamento da Vanessa com o Miguel. —
Já está na hora de compartilhar com ele as minhas desconfianças de maus
tratos, foi por isso que aceitei que ela viesse com ele para cá.
— O que quer dizer com isso? — pergunta confuso.
— Eu a vi usando ele para conseguir o quer de você.
— O que viu?
— Ela quer se fixar aqui e conta com ele para que cobre que ela fique
sempre com ele. Vanessa mandou ele dizer isso, ameaçando abandoná-lo
sozinho se não o fizesse, mas o que mais me deixou curiosa foi que ela
disse que se ela não o quisesse, ela o abandonaria na rua.
— Quando foi isso? — Ele me encara pensativo.
— Em uma das minhas visitas ao hospital, eu achei estranho e paguei
por um teste de DNA que sairá em breve, quero saber se ela é mãe dele de
verdade.
— Por que não me disse antes?
— Não queria te preocupar com suspeitas, mas hoje vi o quanto
Miguel tem medo dela, acho que devemos ficar de olho.
— Você tem razão, investigaremos e, se ela estiver mentindo todo
esse tempo e maltratando o Miguel, eu acabo com a raça dela.
— Assim que o resultado sair vemos que caminho devemos seguir —
ele confirma com a cabeça.
— Atrapalho? — Vanessa entra na sala.
— De forma nenhuma, você é nossa convidada, sintam-se à vontade.
— Sorrio com deboche.
— Espero que não tenha dias tão ruins, Samanta.
— Lhe desejo o mesmo.
— Vamos subir! — Leonardo fala, me puxando pela mão, sinto uma
tontura ao me levantar do sofá e perco um pouco do equilíbrio
— Está tudo bem? — indaga preocupado.
— Sim, estou bem, acho que com todos esses acontecimentos, não
tenho cuidado muito bem de mim e pulado algumas refeições.
— Então não seja imprudente com você, acho melhor irmos ao
médico?
— Não seja exagerado, Leonardo, foi só uma tontura — respondo.
Subimos com o olhar da Vanessa nos acompanhando, não desvio os
meus olhos do dela. Se ela acha que vai se sair bem dessa, é porque ela não
sabe com quem está se metendo.
56
Do seu marido que te ama

Samanta Antonelli

Acordo com o sol entrando pela janela, estico o braço procurando por
Leo e no seu lado da cama tinha uma rosa de cor vermelha com um cartão.

Maravilhoso é começar o dia olhando para o amor da


minha vida. Estar com você é a certeza de que,
aconteça o que acontecer, você estará me apoiando e
caminharemos juntos. Ter você é certeza de uma vida
feliz, não conheço melhor sensação do que dormir e
acordar ao seu lado! Bom dia, meu amor.
Do seu marido que te ama.

Viro para o lado me espreguiçando com um sorriso bobo no rosto, me


levanto e coloco a rosa em um vaso em cima da penteadeira.

***

— Bom dia, meu amor — falo animada, encontrando Miguel


tomando café da manhã com a enfermeira.
— Bom dia, tia Samanta. — responde retribuindo o sorriso.
— Então, o que está comendo? Hum…. Parece bom — falo olhando
para o seu prato cheio de frutas.
— Sim, estão uma delícia — fala colocando um pedaço grande na
boca.
— Quais serão os planos para hoje? — pergunto a enfermeira
— Vamos fazer alguns exercícios recomendados para ele, não se
preocupe, ele vai brincar enquanto fazemos os exercícios.
— Hum…. Perfeito! Quero ver esse garotinho, 100% correndo por
essa sala e indo ao parque — toco com o dedo indicador no seu nariz
enquanto pronuncio as palavras.
— Se ele ficar aqui vai depender de muitos fatores — Vanessa entra
falando e a criança muda completamente, se tornando retraída e um olhar
inseguro, como se tivesse algum roteiro a seguir.
— Você tem que ir embora, deixar o meu pai em paz — fala para
mim malcriado.
Dou um sorriso debochado para Vanessa.
— Sei que a pessoa para quem você quer dizer isso não é a mim,
Miguel! — falo encarando Vanessa.
Ele não volta a falar, afinal, é só uma criança ainda muito novo e nem
sabe o que está acontecendo.
— Você acha que é para quem? Sou a mãe dele — desdenha.
— Será, Vanessa, que você ama essa criança como um filho?
— O que você sabe da vida? Uma moleca que acabou de sair da
adolescência — sorri com deboche.
— Já terminamos, Miguel, vamos brincar no quarto — a enfermeira
fala tirando Miguel da mesa e indo para o quarto.
— Você acha mesmo isso? Sou uma moleca para você? — Sorrio
alto. — Você está me subestimando, Vanessa.
— Você não tem moral nenhuma para falar de mim, Samanta, afinal
todo mundo sabe que o seu filho, aliás o seu feto, morreu porque você não
soube cuidar dele — contenho as lágrimas.
— Isso não é assunto seu! — vocifero de punho cerrado.
— Claro que não, acho ótimo que ele tenha morrido e que Miguel
seja o único herdeiro, porque pelo que vejo você não pode mais engravidar.
— Você está passando dos limites, Vanessa.
— Falei alguma mentira? Veremos até quando você ficará nessa pose
de rainha sem herdeiros! — Levanto a minha mão acertando no seu rosto,
ela continua rindo debochada até ver a minha sogra entrando, ela passa a
mão no rosto dramaticamente.
— O que aconteceu? — pergunta alarmada.
— Não sei mais o que fazer, a Samanta não me aceita e nem ao
Miguel, eu já disse que não queremos roubar o lugar dela, mas Miguel tem
direito como filho legítimo do Leo — o drama continuou repleto de veneno.
A minha sogra me olha furiosa, mas não pronúncia uma única
palavra. Deixo a casa sem mais discussões, afinal, o que é dela está vindo
de Ferrari de mil cavalos. Assim que entro no carro, recebo uma mensagem
do funcionário do hospital informando que o exame de DNA está pronto e
que ele mandará o resultado para o meu e-mail.
— Perfeito! — exclamo satisfeita, afinal tenho certeza do resultado.
— a sua hora chegou querida. — falo sorrindo dando partida com o carro
indo para o grupo Milani.
Chego na empresa, passo direto pela recepção indo para o elevador.
— Sam? — Arthur fala me encontrando. — Aconteceu alguma coisa?
— pergunta com um tom preocupado.
— Acabei de receber o exame de DNA da Vanessa com Miguel. —
Ele me olha confuso.
— Como assim?
— Tenho certeza de que ela não é a mãe do Miguel.
— Por que tanta certeza?
— Não sei, eu só penso assim. — O elevador chega e subimos juntos.
— Está gostando de trabalhar na Milani? — pergunto
— O que você acha? Tudo aqui é incrível, sem falar que o meu
cunhado é muito habilidoso e me ensina muitas coisas — fala satisfeito.
— Fico feliz que seja assim!
Passei direto pela secretaria de Leonardo e entro na sala sem ser
anunciada.
— Meu amor, que surpresa — diz vindo em minha direção.
57
Deus nos ouviu.

Samanta Antonelli

— Recebi o resultado do exame — falo abrindo o e-mail. — Estou


ansiosa.
— Vamos ler juntos!

Conclusão do teste de DNA

Conforme os testes realizados entre a criança: Miguel dos


Anjos Alves
A suposta mãe: Vanessa dos Anjos Alves
O Suposto pai: Leonardo Milani
Concluímos que Vanessa dos Anjos Alves, é a mãe biológica
da criança, enquanto Leonardo Milani não é o pai biológico
da criança Miguel dos Anjos Alves.

Uma onda gelada passeia pela minha espinha, eu encaro os olhos


desapontados de Leonardo.
— Como assim? — A minha voz sai trêmula e a mão dele treme.
— O que aconteceu com exame anterior? — indaga baixo quase em
um sussurro. — Eu não acredito nesse exame! — grita transtornado,
derrubado vários objetos da mesa
Essa notícia poderia ser boa se não fosse o apego que criamos com a
criança.
— Você precisa se acalmar, Leonardo — Arthur fala do fundo da sala.
— Me desculpe, não queria isso, Leo, eu não pedi que eles
realizassem um novo teste com você — as lágrimas caem rápido dos meus
olhos.
— Eu não estou te culpando de nada, Samanta. Vamos refazer os
testes — retruca saltando da cadeira. — Fui seu doador de medula, éramos
compatíveis. — repetia para si.
— Aonde você está indo? — Ando apressada o seguindo.

***

Leonardo Milani

Eu não quero acreditar no resultado do exame, ele está errado, não


tem como ele estar certo.
— Aonde você está indo? — Ouço a Samanta perguntar. —
Leonardo… — ela fala com uma voz fraca, olho para trás e a vejo
perdendo as forças e desmaia nos braços de Arthur.
— Samanta… Samanta! — Retorno apressado.
— Sam? Vamos levar ela na enfermaria.
— Pode soltar, eu a levo — falo, trazendo-a para mim.

***

— Não se preocupem, foi apenas um desmaio. Vamos aguardá-la


acordar naturalmente enquanto os resultados dos exames saem — diz o
médico.
Já havia passado algum tempo e ela ainda não havia acordado, ando
de um lado para o outro, a minha cabeça está latejando, as minhas mãos
suam, enquanto Arthur me encara irritado.
— O que causou o desmaio? — indago assim que o médico retorna.
— Você ainda pergunta isso? — Arthur fala alterado. — A culpa é
sua, não viu a forma que falou com ela?
— Você quer parar de falar como se eu não cuidasse dela? Volte ao
trabalho, eu cuido da Samanta.
— De jeito nenhum, não vou deixá-la.
— Não preciso que duas pessoas fiquem aqui — falo irritado
— Senhores, já estou com o motivo do desmaio nas minhas mãos, já
podem parar de discutir — o médico nos interrompe.
— Então o que aconteceu? — pergunto ansioso.
— Parabéns, senhor Milani, o senhor vai ser papai.
— Papai? Tem certeza? — questiono ainda cético
— Claro que tenho, está aqui o exame — fala me entregando os
papéis do exame e os meus joelhos tocam o chão e choro igual a uma
criança. — O senhor me ouviu? — ele fala e olho para cima.
— A Samanta vai ficar louca com a notícia! — Arthur festeja, me
levanto e o abraço.
— Você nem imagina como estou feliz.
— Deixarei vocês sozinhos, mas pondere nas suas atitudes. — Arthur
fala se retirando da enfermaria.
Sento-me ao lado da Samanta e espero ela acordar, alguns minutos ela
começa a abrir os olhos lentamente.
— Enfermaria da Milani? — Sorri sem humor, reconhecendo o lugar.
— Sim — digo, beijando a sua mão.
— Me desculpe! — ela fala triste.
— Meu amor, isso não tem nada a ver com você, é entre mim e a
Vanessa.
— Eu não deveria…
— Shii… — Coloco o dedo nos seus lábios. — Vamos resolver isso,
agora pare de se preocupar ou o nosso filho ficará estressado novamente. —
Ela aperta os olhos para me encarar confusa.
— Do que está falando? — Não respondo com palavras, ergo as
minhas mãos e aliso o seu ventre.
— Vamos ser pais! — falo, beijando os seus lábios, deixo que as
minhas lágrimas de felicidades molhem o seu rosto.
— Deus me ouviu! — diz em meio às lágrimas.
— Fomos presenteados por Ele, meu amor.
Choramos feito duas crianças, por um longo tempo.
— Sente-se melhor? Já pode levantar? — pergunto.
— Sim, me sinto melhor — responde, sentando na cama.
— Então, vamos, vou te levar para casa — falo a ajudando a se
levantar.

***

— O que fará em relação ao Miguel? — pergunta assim que assumo a


direção ao carro.
— Vou refazer o teste.
— Certo! — fala abaixando a cabeça.
— Não fique assim, vai ficar tudo bem.
— Estou triste porque ela é a mãe dele, eu tinha esperança de mandá-
la embora e ficarmos com ele.
— Ainda podemos fingir que não sabemos, o interesse dela é em
dinheiro, ela provavelmente conseguiu fraudar o outro exame, vou pedir
que investiguem, pegamos provas que a incriminam, posso chantageá-la e...
— calei-me.
— Depois tiramos a criança dela, era isso que ia falar, não era? — não
tive coragem de encará-la, eu sei que isso era desumano com o garoto. —
Mas ela é a mãe e certamente o Miguel tem sentimentos por ela — os seus
olhos se enchem de lágrimas.
— Vamos refazer o teste e resolvo depois.
Chegamos em casa e a Vanessa está na sala com Miguel e os meus
pais.
— Que bom que estão todos juntos! — falo caminhando até eles. —
Acabamos de descobrir que a família está crescendo, a Samanta vai ter um
bebê — despejo a notícia sem muitas cerimônias.
— Filho, fico muito feliz por vocês — o meu pai me olha radiante.
— Que novidade maravilhosa! — a minha mãe levanta para nos
parabenizar.
— Miguel, você pode vir aqui? — O chamo.
Ele levanta e vem andando na nossa direção, me abaixo para ficar na
sua altura e seguro as suas pequenas mãozinhas.
— Você ganhará um irmãozinho ou irmãzinha, mas isso não significa
que vou te amar menos, eu e a tia Samanta vamos te amar igual! — Ele me
surpreende com um abraço.
— Eu sei, papai, vou amar ter um irmãozinho — diz ainda me
abraçando.
— Vamos, Miguel, darei um banho em você — Vanessa fala tirando o
garoto de perto de mim.
— Mãe, você pode levar o Miguel? Quero falar com a Vanessa —
falo impedindo Vanessa de levá-lo
A minha mãe faz o que pedi e logo estamos só nós três na sala.
— Você espera que eu acredite que tudo será igual? — Ela sorri
nervosa.
— Não me importo com o que você pensa, só espero que não
envenene a cabeça do Miguel.
— Veremos como as coisas ficarão! — Ela vira as costas saindo da
sala, mas antes ela encara a Samanta de uma forma que eu não gosto
nenhum pouco.
— Não gostei da forma que ela me olhou — Samanta tira as palavras
da minha boca.
— Ficaremos em alerta com ela, vou resolver logo sobre o que
faremos em relação ao Miguel. Agora vem, me deixe cuidar de você! —
falo puxando-a pela cintura para mais perto e subimos para o nosso quarto.
58
Louca!

Leonardo Milani

Samanta não demora para dormir e desço para comer alguma coisa.
— Boa noite, não esperava mais vê-lo hoje — Vanessa fala assim que
passo pela sala e por ela sem dizer nada. — Vai me ignorar? — indaga me
seguindo.
— Não estou a fim de conversar, Vanessa.
— Deve estar bem feliz com a novidade, de fato é uma boa notícia, a
sua bebezinha vai te dar um filho — zomba.
— Sim, estou muito feliz que a mulher da minha vida vai me dar um
filho.
— O Miguel ficou com ciúmes — pronúncia igual uma cobra
venenosa.
— Pare de usar a criança, deveria ter vergonha disso.
— Bom… vou me deitar, felicidades a Samanta! — Vira as costas
bocejando em seguida.
Nada retira da minha cabeça que ela vai aprontar, volto para o quarto
e me deito ao lado da Samanta, ela dorme tranquila e eu fico um tempo
admirando-a até que durmo.

***

Samanta Antonelli

Acordo disposta, ao contrário da outra vez, eu não sinto enjoos


matinais e tenho bastante apetite. Estou na varanda quando vejo a
enfermeira sair com Miguel para o jardim com a fisioterapeuta para fazer os
exercícios.
— Bom dia, minha linda, o que está olhando? — Leonardo pergunta
ainda na cama.
— O Miguel no jardim!
— Não vamos perdê-lo — diz, levantando-se.
— O problema é o preço a pagar por isso. — O encaro preocupada.
— Eu tinha esperança de que ela não fosse a mãe dele, tudo seria mais fácil
para nós.
— Já mandei refazer os exames — diz me abraçando por trás
apoiando o queixo no meu ombro.

***

— Bom dia, Sam — Rubens fala entrando na minha sala. — Como


você está? Faz tempo que não conversamos, você está com uns horários
loucos.
— Desculpe a ausência.
— Você pode, você é a dona — ele sorri.
— Mas não esqueço que você é meu chefe. — Sorrio de volta.
— Vamos almoçar juntos hoje? — pergunta.
— Eu gostaria muito, mas vou visitar os meus pais hoje, então, vou
fazer tudo que tenho rapidamente e comer aqui mesmo.
— Vai mandar as esmeraldas pelo carro forte? O leilão já é amanhã
— fala a respeito de umas joias que estão no nosso cofre, vejo os
documentos dela sobre a mesa.
— Vou levá-las comigo e deixo lá amanhã bem cedo, acabei não
mandado elas no lote, então eu as deixarei pessoalmente.
— Tudo bem, o nosso almoço fica para próxima vez — diz
desapontado. — Vou te deixar com as suas coisas e até amanhã, caso não te
veja mais hoje — fala, se despedindo.
No fim do expediente arrumo tudo e ligo para Leonardo assim que
entro no carro, como ele não atende deixo uma mensagem de voz
informando que vou à casa dos meus pais. Ele sempre fala que quando vou
para lá não aviso e ainda volto tarde, então resolvo informá-lo dessa vez.

***

Já era fim de tarde, me apresso para dirigir com o céu ainda claro, eu
não costumo ouvir música enquanto dirijo, mas ouço uma música bem
animada e vou cantando acompanhando a cantora, eu tenho motivos para
cantar.
Um carro atravessa o meu carro me obrigando a frear bruscamente.
— Desce do carro, Samanta. — Vanessa desce do carro com uma
arma nas mãos.
— Você ficou louca?
— Para de falar bobagens, Samanta, e desce antes que eu atire em
você — ordena aos gritos.
O caminho para a minha casa passa por uma estrada próximo a uma
mata, de dia as pessoas fazem trilhas, mas a essa hora não tem um fluxo
grande de carros. Desço com as mãos para cima, ela enrola os dedos nos
meus cabelos e me joga no banco traseiro do carro. Há dois homens com ela
e um assume a direção ao meu carro.
— O que está fazendo, Vanessa?
— Vou fazer você sumir, você só atrapalha os meus planos, garotinha
mimada, não sei o que Leonardo vê em você — pronúncia irritada.
— Para com isso, Vanessa, você está louca?
— Vi o DNA nas suas coisas, você já mostrou para o Leonardo, ele já
sabe que não é o pai do Miguel? — pergunta transtornada, parece uma
louca. — Por que se meteu onde não foi chamada, Samanta? A culpa é sua,
você me obrigou a isso!
— Você falsificou o primeiro DNA?
— Eu realmente dormi com ele e logo depois engravidei do Miguel,
mas descobri que o filho não era dele, mas poderia ser e eu queria muito
que fosse. Me aproximar dele não era fácil, quando o Miguel ficou doente e
vi a oportunidade perfeita para amolecer o coração do Leonardo, falsificar o
documento foi fácil e a questão da medula foi sorte! — diz, entregando o
jogo.
— Não tem vergonha de usar uma criança?
— Pior é viver na pobreza! Depois que sumir com você, aquela velha
idiota vai me ajudar a conquistá-lo — ela dá uma gargalhada diabólica.
Olho para os lados e penso em uma forma de me livrar dela,
considero pular do carro em movimento, mas temo pelo meu filho.
— O que vai fazer? — pergunto aflita
— Te matar, mas antes você vai cavar a própria cova.
***

Leonardo Milani

Recebo a mensagem da Samanta e resolvo ir até a casa dos meus


sogros encontrá-la, não vou lá com frequência e penso em surpreendê-la,
então, ligo para a minha sogra do caminho.
— Oi, querido — fala assim que atende
— A Samanta já chegou aí?
— A Samanta não veio para cá. — Freio bruscamente sentindo o meu
corpo gelar.
— Tudo bem, achei que ela tinha ido. Muito obrigado, ligarei para
ela. — Encerro a ligação preocupado, porém não quis preocupá-la.
O telefone de Samanta só dá desligado, bato várias vezes no volante
do carro, nunca deveria ter aceitado o seu pedido de andar sem seguranças.
— Que droga, aconteceu alguma coisa, eu sinto! — digo para mim
mesmo.
Ligo para o banco e fui informado que ela já havia saído, o desespero
toma conta de cada pedacinho de mim. Penso no Rubens, ele pode ter
notícias da Samanta.
— Rubens, você sabe se a Samanta tinha algum compromisso hoje?
Ela sumiu, estou com um mau pressentimento.
— Samanta estava vendo uns documentos importantes e um deles era
referente às esmeraldas que vão para leilão, ela ficou de levar as joias
amanhã antes de vir para o banco.
— Onde quer chegar com tudo isso? — pergunto sem entender.
— Sempre usamos carros fortes, então todos têm chips de rastreio,
mandarei o código de rastreio para que você confira a localização.
— Perfeito! — Solto o ar dos pulmões.
Abro o sistema do banco no computador de bordo do carro e coloco o
código que ele havia enviando, a localização é próxima de onde estou,
então vou rápido seguindo o GPS que está se movimentando em um local
de mata.
Mando o chefe dos seguranças chamar os outros e a polícia, eu não
sei o que me espera.
— Não se preocupe, estou chegando, Samanta.
O GPS para de se mover e acelero o carro ansioso para encontrá-la,
mas chegando no local só encontro o automóvel vazio, também daqui é
impossível seguir com o carro.
59
Em choque

Samanta Antonelli

— Anda, sua vagabunda, deixa de moleza — Vanessa fala quando


caio cansada de tanto andar.
Já havia me afastado bastante da via principal e estamos andando por
uma trilha.
— É aqui — afirma um dos homens que acompanha Vanessa e ela
joga a pá em cima de mim.
— Vai piranha, começa a cavar — sorri com deboche.
— Vanessa, pare com isso — imploro ofegante, quase sem forças para
erguer a pá.
— Para de conversar e começa logo a cavar — fala agarrando os
meus cabelos na sua mão e me joga no chão.
Procuro forças para começar a fazer o que ela manda, mas não sou a
única a cavar, o homem começa a cavar também. O desespero começa a
tomar conta do meu corpo e as lágrimas caem descontroladamente dos
meus olhos, ouço a gargalhada alta de Vanessa.
— Vão te pegar, Vanessa, você acha que se eu sumir, ninguém
desconfiará de você?
— Cala a boca! — Ela dá um tapa no rosto me fazendo cair no chão,
novamente ela se abaixa e segura o meu maxilar com força. — Achou que
eu não iria descontar o tapa que me deu? — Joga a minha cabeça com força
no chão.
Cada vez mais o buraco está fundo e eu perco as esperanças de
permanecer viva, o desespero toma conta de mim.

***

Leonardo Milani
Já liguei para polícia que está vindo para o local, cada passo que eu
dou eu me desespero mais.
— Senhor, veja isso — um dos meus homens me mostra um pedaço
de roupa que parece ser de Samanta.
— Eles passaram por aqui — falo, me enchendo de esperança. —
Vamos, estamos perto.
Não estamos gritando o nome de Samanta, eu temo que ao assustar a
pessoa que a pegou o faço reagir contra ela, então andamos
silenciosamente. Nós já havíamos andado muito e as minhas esperanças
começam a dar lugar a mais desespero.
— Samanta… — grito com toda força enquanto caio chorando no
chão.
— Senhor, não faça barulho, vamos continuar — ouço um dos
homens que está comigo dizer.
— Cada segundo é precioso — outro fala.
— Vocês têm razão, vamos rápido! — Me ergo, enchendo o peito de
esperanças novamente.
— Estão ouvindo isso? — pergunto.
— Sim, são mulheres falando — um deles responde.
— Vamos devagar, fiquem prontos — falo, andando na frente os
guiando.
Cerro os punhos quando vejo Samanta apanhando de Vanessa, teria
agido precipitadamente se um dos meus homens não tivesse me contido.
— Desgraçada!
— Cuidado, senhor, ela está armada! Vamos deixá-los cercados —
um dos meus homens fala.
— O que eles estão fazendo? — Aperto os olhos e mesmo que a
resposta fosse óbvia, temo a confirmação.
— Cavando uma cova, senhor — a confirmação me fez estremecer.
— Vamos agora, eu vou primeiro! — Ando apressado em direção a
elas. — Vanessa, vocês estão cercados, é melhor se entregar — falo.
Ela pega Samanta a fazendo de escudo antes que eu consiga puxá-la
para o meu lado. Vanessa começa a se afastar com a arma apontada para
cabeça da Samanta e os cúmplices dela correm, mas são perseguidos por
alguns dos meus homens.
— Vanessa, larga a Samanta, vamos resolver isso! — As minhas
mãos estão para cima mostrando rendição.
— Leo, quando ela não existir mais, seremos felizes, nós três! — Ela
parece ter perdido o juízo.
— Você tem razão, Vanessa, podemos viver felizes nos três — falo,
alimentando o seu delírio e ganhando tempo.
— Você está mentindo! — grita.
Ela anda para trás agarrada a Samanta, que está apavorada.
— Anda para frente, Vanessa — grito quando a vejo indo em direção
ao penhasco.
— Chegou a sua hora, Samanta — ela gargalha como uma louca.
Vejo Samanta puxar todo o ar para os pulmões, se enchendo de
coragem e sinto medo do que virá depois dali. Ela se agarra ao braço de
Vanessa o mordendo com força, quando a arma atinge o chão, Samanta
chuta para baixo do penhasco, mas as duas se desequilibram caindo. Corro
desesperado e consigo segurar Samanta pelo braço, enquanto Vanessa se
segura nas mãos de Samanta.
— Samanta, não me solta! — ela implora.
— Não vou soltar, nós vamos subir.
Eu queria desencorajá-la a segurar Vanessa, ela está usando toda a
força que tem, mas não consigo puxá-las para cima e ela está sendo uma
âncora para Samanta. Não consigo puxá-la porque ela faz força para se
manter presa a Vanessa.
— Me ajudem! — grito desesperado.
— Não aguento mais! — Vanessa grita antes de soltar o braço de
Samanta.
Fecho os olhos para não ver a queda, mas continuo segurando firme
os braços de Samanta, a subindo com facilidade desta vez.
Os seus olhos estão fixos ao nada, ela fica imóvel, em choque.
— Vai ficar tudo bem meu amor, acabou! — Eu a abraço forte e ela
não tem nenhuma reação, os meus olhos percorrem o seu corpo ferido e
arranhado.
Eu não havia notado, mas a polícia já está no local e seguram um dos
cúmplices de Vanessa.
— Vai ficar tudo bem, meu amor — ela apenas chora com um olhar
fixo ao nada.
***

— Acho que ela vai precisar de um acompanhamento psicológico —


afirma o médico. — É normal ficar em choque após passar pelo que ela
passou, vamos administrar calmantes e ver se ela vai voltando a si
lentamente.
— Tudo bem, mas não se esqueça que ela está grávida. — Me sento
ao lado da Samanta que não reage, apenas olha para o nada e chora.
A minha cabeça está a mil, eu não sei como contar a Miguel o que
havia acontecido
— Preciso de você, meu amor, seja forte! — digo com as suas mãos
entre as minhas.
Algumas horas depois os meus pais chegam para visitá-la, ela ainda
dorme à base de calmantes.
— Nunca imaginei que Vanessa seria capaz de algo assim — a minha
mãe fala.
— Eu sempre te disse para não se meter demais na vida do nosso
filho — o tom do meu pai era reprovador.
— Vamos passar uma borracha nesse assunto, só espero que a
Samanta fique boa logo e que vá para casa.
Alguns minutos depois meus sogros chegam desesperados.
— Samanta! — A minha sogra entra falando no quarto.
— Ela adormeceu com o efeito do calmante, mas não se preocupem,
fisicamente ela está bem.
— O que quer dizer com fisicamente? — O meu sogro pergunta.
— Ela viu Vanessa caindo do penhasco enquanto tentava segurá-la,
sem falar em todo terror que ela viveu.
— Como pode ser tão displicente, Leonardo, colocar dentro da sua
casa uma mulher perigosa — o meu sogro fala irritado.
— Me desculpe! — Abaixo a cabeça sem coragem de encará-lo.
— A culpa é minha — minha mãe fala. — Eu insisti para que ela
ficasse — conclui, mostrando arrependimento.
— Não falaremos mais nisso, a Samanta está bem, isso é o que
realmente importa! — A minha sogra fala, ela é sempre muito sábia e sabe
mediar os conflitos, não me admira que Samanta seja tão madura tendo tão
pouca idade.
Eu me sinto culpado, como sempre o meu passado volta e fere a
mulher que eu amo.
60
Culpada

Leonardo Milani

Samanta ainda passa poucas horas acordada por conta dos calmantes,
eu havia combinado com Arthur para ele vir ao hospital ficar com a
Samanta. Preciso resolver as questões na polícia e a burocracia do enterro
da Vanessa enquanto me preparo para a pior parte, conversar com Miguel.
Não faço ideia de como agir com ele, eu realmente preciso da Samanta
comigo para isso.
— Ainda não acredito no que aconteceu, como a ambição deixa as
pessoas descontroladas — ele fala com pesar.
— Ela sempre queria mais, eu já tinha feito tudo para deixar ela e o
Miguel confortáveis.
— Não se sinta culpado, nem você e nem a Samanta tem culpa.
— O que faço com Miguel? Estou perdido.
— Acho que deveriam levar ele a um profissional, não acho que será
fácil explicar isso. O que você planeja fazer em relação à paternidade, agora
que garoto ficou órfão?
— O meu nome foi incluído na certidão de nascimento dele, eu já
havia feito o pedido de reconhecimento, considero deixar as coisas como
estão.
— Você já parou para pensar que o verdadeiro pai pode aparecer?
— Não quero pensar nisso! — respondo, sentindo um frio atravessar
a minha espinha, eu estou muito apegado ao garoto.
— Aonde você vai agora? — pergunta, sentando-se na poltrona,
abrindo o notebook na mesinha na sua frente.
— Darei o meu depoimento à polícia, um cúmplice da Vanessa já
assumiu, o outro ainda está desaparecido, mas o que foi preso falou tudo
que aconteceu e agora vou lá dar o meu, depois acredito que eles vão pegar
o depoimento da Samanta.
— Claro, vai lá, eu fico por aqui, não se preocupe. — Dou um beijo
na testa da Samanta antes de sair.
Após horas na delegacia, recebo autorização judicial para cremar o
corpo da Vanessa, eu penso muito a respeito e resolvo não levar o Miguel,
nem fazer uma cerimônia de cremação. Com quase tudo resolvido, volto
para o hospital e encontro a minha sogra no quarto.
— Oi, filho, não precisa voltar, eu iria cuidar da Samanta, você parece
cansado! — fala carinhosamente.
— Obrigado, mas quero estar aqui quando a Samanta acordar! — Me
sento ao lado da minha mulher. — Mas fique à vontade se quiser ficar
também, vou adorar a sua companhia.
— Vou ficar sim! — diz, se sentando no sofá no canto da sala com
algumas caixas de linha, as preparando na agulha de crochê.
— Estou feliz que serei vovó, mas estou muito mais feliz porque a
Samanta foi abençoada com um filho, ela estava sofrendo, a culpa a estava
correndo por dentro.
— Eu nunca a culpei pela morte do nosso bebê, a culpa foi mais a
minha do que dela. Ela estava magoada, ferida e eu não era um homem
bom! — Me entristeço lembrando de tudo que eu a fiz passar.
— Preciso discordar das suas palavras, você sempre foi o homem que
é hoje. Esse homem sempre existiu, ele estava escondido por trás de
traumas e amarguras.
— A senhora tem razão, eu precisava ser curado — suspiro escorando
a cabeça na poltrona.
— Tenho certeza, a Samanta faria tudo igual no passado se esse fosse
o preço para ter você no presente, a minha filha é feliz com você e eu te
agradeço por ser essa pessoa para ela.
Tento não chorar na frente dela, os meus olhos ardem pela força que
faço, mas o choro está preso a dias dentro de mim e eu apenas permito que
as lágrimas caíam livremente. Ela se levanta e me puxa para um abraço, a
minha sogra é uma mulher sábia, eu sempre a vi como uma mãe.
— Atrapalho o momento fofo? — Ouvimos a voz de Samanta.
— Meu amor, como se sente? — pergunto ansioso, enxugando as
lágrimas.
— Me sinto como se estivesse sido atropelada por um caminhão. —
Força um sorriso.
— Sente dor em algum lugar? — pergunto preocupado.
— Os machucados ainda doem um pouco, mas eu não consigo tirar os
gritos da Vanessa da cabeça e isso está acabando comigo, Leo! — Ela volta
a chorar como fez das outras tantas vezes desde que chegou ao hospital.
— Queria ter vivido tudo aquilo no seu lugar, você não tinha que
passar por isso.
— Você foi meu herói, eu tenho o super-homem do meu lado — sorri
e logo o seu semblante cai novamente — E como está Miguel?
— Ainda não falei com ele, preciso da sua ajuda para isso. Se cuide
para ficar bem logo, o nosso filho sente a sua tristeza — ela alisa o ventre.
— Assim que você sair daqui, vamos contar juntos para o Miguel o
que aconteceu. — O seu olhar fica distante e as lágrimas voltam a cair dos
seus olhos. — Calma, meu amor. — Beijo as suas mãos, lhe pedindo calma,
mas entendo e sinto a sua dor.
— Filha, vai ficar tudo bem! — A minha sogra fala dessa vez.
— Eu não consegui segurá-la, mãe, ela me implorou para não soltar,
eu vi o medo nos seus olhos, a vi caindo, os gritos ainda ecoam na minha
mente — ela diz em meio aos soluços.
— Tenho certeza de que você deu o seu melhor, que você tentou.
— O Miguel vai me odiar, eu fui fraca, não salvei a mãe dele! — O
seu choro se torna mais intenso a cada palavra que ela pronuncia.
— Pare de se culpar, você podia ter caído com ela, faz ideia da força
que fiz para ficar te segurando? Você foi corajosa, lutou até o fim — digo
abraçando-a.
— Me leva para casa, Leo.
— Claro, meu amor, vamos falar com o médico e ver se já pode
ganhar alta.

***

Samanta Antonelli

Eu nunca imaginei viver algo parecido, eu tinha nas minhas mãos a


chance de salvar a vida de alguém e falhei. A imagem dela suplicando para
viver não sai da minha mente, eu fecho os olhos e vejo Vanessa caindo.
— Mãe, eu me sinto péssima! — falo, recebendo o seu abraço
— Ela procurou esse final, Samanta, ela queria te matar e você ainda
tentou salvá-la. Estou orgulhosa de você, da mulher que se tornou.
— Obrigada, mãe.
— Levante a cabeça, supere isso e seja feliz com o seu marido, o seu
filho e ajude o Miguel, ele não tem mais ninguém além de vocês dois. Faça
isso pela Vanessa, ame o filho dela como se fosse seu, mude o foco em vez
de se culpar, veja o quanto você é iluminada e capaz de amar o filho de uma
pessoa que queria a sua morte, que te machucou.
Sei que tudo que a minha mãe fala é certo, mas não é fácil apagar essa
história da minha mente, não é fácil presenciar a morte de alguém!
61
O meu mundo é você!

Samanta Antonelli

No dia seguinte, recebo alta do hospital e chego em casa, meus


sogros, meus pais, Arthur e Samuel estão na sala me esperando.
— Onde está o Miguel? — pergunto assim que entro.
— Ele está dormindo, meu amor — Leonardo responde. — Vem senta
aqui, você deve estar com saudades de todos.
— Claro, estou com muitas saudades de todos vocês!
Passamos a manhã conversando, percebo o esforço de todos em me
manter distraída, falando dos mais diversos assuntos.
— Tia Samanta, eu estava com saudades, a senhora já está boa? —
Miguel aparece correndo pela sala e me envolve com os seus bracinhos.
— Sim, estou ótima e logo vamos poder brincar juntos! — falo dando
beijinhos no seu rosto.
Eu me apeguei muito ao Miguel, eu o vejo como o meu filho e o meu
coração já havia o adotado há muito tempo, ele é uma criança doce e
carinhosa, não consigo entender como ficou assim, tendo a mãe que teve e
sofrendo pressões psicológicas o tempo todo. No fundo, a Vanessa tê-lo
trazido até nós, foi o melhor presente que a vida poderia ter nos dado.
— Vai com cuidado, mocinho, a tia ainda está bem machucada —
Leo fala, se abaixando e agarrando o Miguel carinhosamente pela cintura.
— Serei o médico dela, papai, vou cuidar para que ela fique boa logo
— todos nós sorrimos.
— Nossa, já sinto que vou ficar bem logo, já que tenho o melhor
médico comigo — digo de forma divertida.
— Vamos almoçar, todos devem estar com fome — a minha sogra
fala, levantando do sofá.
Sentamo-nos à mesa e foi o dia mais tranquilo em meses, enfim pude
ver a paz reinar no nosso lar novamente, eu não desejei a morte da Vanessa,
mas ansiei por ver a minha família assim, reunida e feliz. Leonardo havia
me dado um lar, ele sempre me olha como se eu fosse sua salvação e é
sempre grato, mas, no fundo, eu não seria nada sem ele. Depois do almoço,
os meus pais com o meu irmão e o meu primo se despedem, voltamos a
ficar um pouco na sala.
— A casa já está quase pronta, acredito que na próxima semana já
poderemos nos mudar — a minha sogra fala depois de um longo suspiro.
— Não precisa ir se não quiser.
— Nós queremos, acho que vocês precisam ter privacidade, ficaremos
bem lá.
— Não se sinta pressionada.
— Te devo perdão, Samanta, você sempre foi um doce de menina e
eu fui uma bruxa com você, eu passei por cima dos seus sentimentos e sei
que a magoei.
Dou de ombros arqueando as sobrancelhas, eu me sinto triste e
magoada por todo esse tempo, mas não sinto coragem de jogar isso na sua
cara agora que as coisas parecem estar voltando para o eixo.
— Me perdoe, eu perdi um pouco o rumo das coisas, acreditei em
tudo que a Vanessa me dizia, eu queria ter o garoto, fiquei cega!
— Vamos esquecer esse assunto, acabou, vamos virar a página! —
falo e as lágrimas tornam a cair dos meus olhos, a culpa ainda me consome,
eu não sei o que falar para o Miguel.
Talvez hoje ele não entenda, mas depois, quando ele for grandinho e
tiver uma percepção melhor das coisas, vai entender o que aconteceu? Isso
está rondando a minha cabeça.
— O que você acha de subir, tomar um banho e ficar sem fazer nada
na nossa cama? — Leonardo sugere.
— Vamos, preciso mesmo de um banho — subimos e Leonardo me
ajuda com o banho e na troca de roupa, nos deitamos na cama em seguida.
— Estou apreensiva com a reação do Miguel.
— Pare de se preocupar com isso, vamos conversar com ele assim
que você descansar e se sentir confortável.
— Agora eu só preciso de carinho — repouso a minha cabeça em seu
peito.
— Eu queria te dar mais que carinho, mas julgo ser impossível agora
— ele sorri me abraçando.
— Nossa! Você só pensa nisso? — Sorri de volta.
— Sei que você também pensa — Balança as sobrancelhas sorrindo.
— Ok, então vamos mudar de assunto — gargalhei com ele.
— Davi ligou, ele está vindo de Boston com a sua amiga para te ver,
eles ficaram preocupados.
— Sinto saudade deles, precisei quase morrer para que eles viessem
me ver.
— Se estava com tantas saudades, eu teria levado você até lá.
— Faz tempo que prometemos uma viagem, porém não saímos do
lugar. — Me levanto, cruzando os braços para encará-lo.
— Pois é, dizem que dinheiro é suficiente para se ter paz e viajar o
mundo, porém não conseguimos nem chorar em Paris as nossas desventuras
— fala divertido e eu dou uma gargalhada alta.
— Você está muito engraçadinho.
— Prometo te apresentar o mundo meu amor e você poderá escolher
qual vista quer ter quando acordar, se será da torre Eiffel na França, a torre
de Pisa na Itália, mas também pode ser Las Vegas ou Atlanta nos Estados
Unidos…
— Eu já entendi, Leonardo — o interrompo. — Mas quero morar
onde meu coração está e ver todos os dias o homem que amo ao acordar,
nem me importo se vou abrir minha janela na periferia ou se vou estar na
melhor cidade de Paris, eu só quero que você esteja comigo! — O abraço.
— Sei disso, meu amor, e é por esse motivo que quero te dar o
mundo.
— Meu mundo é você! — falo o beijando.
62
Momentos únicos

Samanta Antonelli

Acordo cedo e vou para varanda, é a hora em que Miguel está saindo
para fazer as atividades no Jardim, fico o observando, tão pequeno e já
passou por tantas coisas.
Ouço o barulho do chuveiro ser desligado e Leonardo sai do banheiro
— Por que, acordou tão cedo? — Leonardo pergunta, me dando um
abraço pelas costas.
— Você está todo molhado! — Me viro para abraçá-lo.
Ele balança os cabelos, fazendo com que os pingos caiam em mim, e
nós dois sorrimos.
— Vou tomar um banho e descer, precisamos conversar com Miguel.
E a guarda dele, como ficou? — pergunto, voltando para o quarto.
— Para todos os efeitos sou o pai, o documento de paternidade já
havia sido emitido, deixarei as coisas como estão.
— Você acha seguro? — pergunto, preocupada, eu não quero que o
Miguel fosse tirado de nós.
— Se alguém, por alguma hipótese, questionar, fingimos que não
sabíamos e resolvemos a questão, você sabe que dinheiro ajuda a resolver
muitas coisas e isso temos sobrado — afirma, com segurança.
— Vou procurar uma escola, ele já deveria estar estudando.
— Acho ótimo, você já é uma ótima mãe — fala e me beija
rapidamente nos lábios. — Não esqueça que temos o pré-natal marcado.
— Não vou esquecer, vou tomar um banho e já te encontro lá
embaixo.

***

Sai do banho e Leonardo ainda está no quarto sentado na cama.


— Ficou me esperando? — pergunto confusa.
— Vou te ajudar com as escadas — sorri vindo até mim.
— Consigo descer, bobo.
— Mas quero ajudar, não posso? — Zera a distância entre nós, me
abraça e me beija docemente.
— Ai! — gemo baixo, o meu joelho ainda está bem machucado.
— Vem, assim vai ser melhor — Leonardo me pega nos braços.
— O que está fazendo? Consigo andar, você vai me deixar mal-
acostumada — sorrio como uma boba em seus braços.
— Que fique mal-acostumada, vou te mimar todos os dias! — Me
enche de beijos.
— Bom dia! — Diane está na sala de jantar ajudando Maria com a
mesa de café da manhã.
— Bom dia! — Eu e Leonardo falamos ao mesmo tempo, ele me
senta e me serve o café da manhã.
— Está bom, você já colocou muita comida — digo, contendo as suas
mãos apressadas enchendo o meu prato.
— Você tem que comer muito — responde colocando mais comida.
— Não seja exagerado — tiro do prato metade do que ele havia
colocado.
— Estou feliz de vê-los de tão bom humor — o meu sogro fala se
juntando a nós no café da manhã.
Depois do café da manhã fomos ao jardim e uma onda de tristeza
volta a nebular o meu coração.
— Tia Samanta! — Miguel vem correndo e me dá um abraço.
— Hum… que abraço bom! — Me abaixo o abraçando de volta.
— E o papai, não ganha um abraço? Estou com ciúmes — Leo fala,
se abaixando de braços abertos, aguardando por um abraço que veio em
seguida e nos sentamos na grama.
— Como você tem se sentido esses dias, Miguel? — pergunto o
colocando no meu colo.
— Onde minha mãe está, por que ela não veio me ver? — Eu nunca
havia passado por isso, então nem sei como responder a sua pergunta, os
meus olhos encontram os de Leonardo, que me olha triste.
— A mamãe fez uma viagem, bem longa, talvez não volte, mas ela
ficará te vendo de lá onde ela está.
— Ela me deixou? — ele pergunta e engulo seco contendo as
lágrimas.
— Ela não te deixou completamente, toda vez que você olhar para o
céu, você poderá falar com ela.
— E como vou ouvir ela? — Ele me encara com os seus olhinhos
confusos.
— Quando você chamar por ela, ela vai te encontrar nos seus sonhos
— digo com a voz embargada.
— Entendi, então vou dormir agora porque estou com saudades dela
— fala e não consigo conter as lágrimas.
— Vem aqui! — Leonardo pega ele no colo. — Eu e a Samanta
vamos cuidar muito bem de você, nós te amamos muito, então sempre que
se sentir triste, nós estaremos aqui para te alegrar, ok? Sei que não
substituiremos sua mãe, mas vamos te amar muito para que você sempre se
sinta acolhido. Quando quiser um abraço da mamãe, você vem e abraça a
tia Samanta, pois a mamãe deixou muitos abraços com ela para ela te dar,
não só abraços como deixou vários beijos de boa noite também. Então,
quando quiser sentir o beijo e o abraço da mamãe, você pede a tia Samanta
que ela te dará — ele dá um lindo sorriso, ainda está triste, mas agora se
sente mais confortado.
Ele sai dos braços do Leonardo e me abraça, se abrigando em meus
braços.
Eu não sei se tudo ficará bem, mas sei que quero que tudo fique.
Então não pouparei esforços para que Miguel se sinta muito amado para
que um dia, quando ele tiver uma percepção melhor das coisas, possa me
amar e me perdoar por não conseguir salvar a mãe dele.

***

Leonardo Milani

Havíamos passado toda manhã com Miguel vendo filmes infantis e


comendo pipoca.
— Cadê as pessoas dessa casa? — Davi e Gabi, amiga de Samanta,
chegam de surpresa.
— Que saudades de vocês! — Samanta tenta andar rápido já que não
pode correr e os abraça.
— Você está muito bem, cada dia mais linda — ele fala sorrindo
Dou um tapa em sua cabeça, ele está dizendo que minha mulher está
linda na minha frente.
— Olá para você também, Leonardo — fala divertido
— Que saudades de você, amiga, me diz que ele está cuidado bem de
você? — Samanta pergunta para a amiga.
— Muito bem, você não imagina o quanto ele me mima, mas quero
saber como você está? — diz analisando Samanta dos pés à cabeça.
— Estou bem — responde com um sorriso fofo.
— Me conta como vocês estão? — Diz Davi indo até a noiva e a
abraçando.
— Vem senta aqui, pedirei um lanche para vocês — Samanta fala
indo até a cozinha.
— Como estão as coisas na empresa? — Pergunto.
— Tudo bem, estamos tendo lucros absurdos, você deveria dar
mentoria, já considerou dar aulas na faculdade? — fala em um tom de
brincadeira, já que fui seu mentor.
— Você tem talento, é mérito seu! — respondo, dando um tapinha em
seu ombro.

— Nossa, estão puxando o saco um do outro, se eu contar como vocês


eram, ninguém vai acreditar — Samanta ri, voltando para a sala.
— Não gosto de ser filho único, então aceito esse bastardo como meu
irmão — Leonardo fala em tom divertido
— Em troca, eu tenho a minha melhor amiga como cunhada — ela
diz, sentando ao lado da amiga e a abraçando.
— Como estão meus sobrinhos? — ele pergunta.
— Miguel está dormindo e o outro sobrinho, está bem aqui no forno
da mamãe — Samanta responde, acariciando a barriga.
— Ficamos muito preocupados com você, mas agora que estamos te
vendo, ufa! Dá um alívio — a amiga de Samanta fala, a abraçando
novamente.
— Passamos por um susto, mas tudo está bem agora! — Bato com a
mão no sofá a chamando para o meu lado.
Passamos uma tarde com eles, pouco tempo depois Arthur também
chegou, Davi ainda não o conhecia, logo a pequena reunião se tornou em
uma festinha particular, estávamos comendo e bebendo um pouco, jogando
conversa fora. Momentos de paz e confraternização haviam se tornado
raros, então nas pequenas oportunidades deveríamos aproveitar a
companhia das pessoas que amamos. Olho para eles e vejo quanto tempo
perdi sendo rancoroso e vivendo sozinho, não tem nada melhor que estar
assim entre amigos e me permitir viver esses momentos únicos.
62
Um grande presente

Samanta Antonelli

Meses depois…

O sol começa e entra pelas janelas, sinto um pequeno peso sobre meu
braço na cama.
— Tia Samanta…. É hoje que veremos meu irmão? — Ouço a
vozinha do Miguel na cama e viro meu rosto para ele.
— Você deveria estar dormindo, mocinho, ainda é cedo! — falo, o
envolvendo em meus braços, Leonardo acorda se virando para nós dois.
— Hum… o que temos aqui, um intruso! — O seu tom é divertido.
— Meu irmão dorme aqui todos os dias — protesta.
— O seu irmão nem nasceu e você já está com ciúmes? — Leonardo
fala fazendo cócegas em Miguel, que ria se divertindo na cama.
***

— Por que está suando tanto? — pergunto no carro a caminho do


hospital.
— Estou ansioso para saber o sexo do bebê.
Nós já havíamos feito outros exames, mas de início Leonardo queria
que fosse surpresa, então só perguntávamos se o bebê estava bem.
— Que mudança — sorrio.
— Meu amor, preciso saber se posso pintar tudo de rosa ou de azul.
Não fui forte o suficiente — fez uma careta divertida. — O que prefere,
filho? — ele pergunta para o Miguel.
— Um menino — ele responde firme.
— E por que não uma menina? — Me viro para olhá-lo no banco de
trás.
— Meninas são choronas — Miguel responde, fazendo uma careta, eu
e Leonardo rimos.
Chegamos e fomos até a sala onde iria ser o exame.
— Hum… o irmão mais velho veio conhecer o irmãozinho ou a
irmãzinha? — O médico fala assim que vê Miguel de mãos dadas comigo e
Leonardo.
— Sim e vai ser um menino! — Bate o pé pronunciando de forma
marrenta.
— Ah, tudo bem, então, vejamos se seu desejo vai se tornar realidade
agora — o médico sorri, ele já sabe o sexo e apenas nos deixa ansiosos.
Me deito e ele passa o gel na minha barriga.
— Senhor Milani, está pronto para saber o sexo do seu novo
herdeiro? — O médico torna a falar, divertido.
— Estou ansioso, na verdade — ele responde olhando fixamente para
a tela.
— Vejamos o que temos aqui — O médico fala enquanto passa o
aparelho. — Ouçam as batidas do coração — sorri como quem contém a
língua para não falar de uma vez.
Lágrimas caem dos meus olhos e Leo beija minha mão com um lindo
sorriso no rosto.
— Parece que tem vários corações — Leonardo fala sorrindo.
— O grupo Milani é grande, acredito que o senhor deva ser um bom
administrador — o médico fala enigmático e nós ficamos sem entender a
comparação.
— Sim, ela é muito grande — Leonardo responde.
— Vai haver uma disputa acirrada daqui a uns anos, dizem que os
herdeiros brigam pelo trono — ele sorri com diversão.
— Do que está falando? — Leonardo pergunta confuso.
— São dois meninos e uma menina, parabéns aos papais! — Diz sem
mais delongas.
— Como assim? — pergunto incrédula.
— Você está falando sério? — Leonardo pergunta sem acreditar.
— Seríssimo, senhor Milani, o seu desejo virá em dobro Miguel e
você ainda ganhou um brinde — fala, bagunçando os cabelos de Miguel
— Uau, como pode caber tantos bebês aí dentro? — Miguel pergunta
e todos rimos com o olhar espantado dele.
***

— Vamos fazer um jantar e comunicar a notícia a todos de uma única


vez? — indago.
— Vamos, vamos claro! — Leonardo responde, ele nem parecia estar
aqui na terra.
— O que você tem, meu amor? — indago rindo da sua cara de bob —
Você está suando frio, Leo, o que você tem? Está se sentindo mal? — Meu
tom é de preocupação.
— Samanta, eu ainda não estou em mim, três bebês? — Balança a
cabeça como quem tenta despertar de uma alucinação.
— Não gostou? Sei que não planejamos ter quatro filhos, seriam
apenas dois, mas aconteceu e você não acha que Deus nos abençoou… —
Ele freou o carro bruscamente me encarando.
— Fecha os olhos Miguel — ele ordena e Miguel tapa os olhos
espiando entre os dedos. — Sou o homem mais feliz e completo do mundo!
— Ele toma os meus lábios em um beijo demorado, as lágrimas caem dos
nossos olhos e eu não poderia estar mais feliz.
— Eu te amo, amor! — fala, alisando o meu rosto
— Eu também te amo.
— Eca! — Miguel fala. — Vocês beijaram na boca.
As risadas tomam conta e Leonardo torna a andar com o carro.
— Vamos fazer uma festa grande, eu quero contar ao mundo todo —
diz olhando a estrada.
— Você levou a sério a missão de encher aquela casa imensa com
vários filhos.
— O que acha de mais três? — Tira os olhos da estrada para piscar
para mim, me presenteando com o seu sorriso sexy em seguida.
— Leonardo… — retruco com um tom repressivo.

— O que foi? Temos espaço, não temos? — Sorri divertido.


— Sim, temos espaço, mas não vamos fazer isso, a lei da gravidade é
cruel, onde acha que meus seios vão chegar? — Eu os toco com um ar
pensativo e ele sorri divertido
— Você é uma delícia meu amor, não importa como fique depois da
gravidez, ainda serei louco por você.
— Você fala isso agora, até aparecer uma secretária peituda na sua
frente — falo manhosa.
— Podemos resolver essa questão, se eles te incomodarem, existem
vários cirurgiões plásticos que vão te deixar do jeito que você quiser ficar,
mas continuarei afirmando que você será sempre linda e desejável aos meus
olhos.
— Hum rum! — digo cética.
— O que foi, minha Sam? — Ele tira a mão rapidamente do volante e
toca em meu rosto.
— Sam? Você nunca usou esse apelido para se referir a mim! — Ele
gargalha.
— Tudo bem, minha menina. — Morde o lábio exibindo em seguida
o seu sorriso que sempre me entorpece.
— Miguel, é um segredo, não vamos contar a ninguém agora que a tia
Samanta vai ter três bebês, posso contar com você? — pergunta Leonardo,
assim que estacionamos na mansão.
— Tudo bem, papai, não conto, esse é o nosso segredo. Tchau,
mamãe! — fala descendo do carro correndo atravessando a entrada.
— Mamãe? Ele me chamou de mamãe? — sorrio e choro, eu amo
muito aquela criança, eu o amo mais do que achei que seria possível.
— Sim, ele chamou — Leonardo fala também em lágrimas.
Hoje é o dia mais feliz da minha vida, Deus não me deu um ou dois
filhos, logo serei mãe de quatro, sou imensamente feliz ao lado do homem
que amo e que me ama incondicionalmente.
63
O final é apenas o começo

Leonardo Milani

— Como foi? — A minha mãe pergunta assim que entramos em casa.


— Vamos reunir todos e revelar o sexo — falo misterioso.
— Estão fazendo suspense? — pergunta em tom de protesto.
— Isso, estamos! — Eu e Samanta nos olhamo-nos, sorrindo.
— Miguel vai contar se seu irmão é menino ou menina? — O meu pai
pergunta.
Miguel simula trancar a boca com uma chave e após afirmar, ele abre
a boca e finge engolir, nós rimos nos divertindo.
— Vou subir, eu estou um pouco cansada.
— Vou subir com você.
— Nossa, agora entendo por que está tão pesada — fala se referindo a
minha barriga.
— Logo vamos tê-los em nossos braços, meu amor! — Beijo o seu
rosto carinhosamente.

***

— Já está pronta, meu amor? — Ela se analisa em frente ao espelho.


— Por que se olha tanto? — pergunto, a abraçando por trás.
— Estou bem redonda, não acha?
— Você está linda, sexy, maravilhosa e se eu continuar aqui te
olhando nós não vamos descer, porque vou te agarrar e te jogar na nossa
cama…. Você me deixa muito excitada! — falo virando-a de frente a
beijando com muito desejo.
— Para, Leo, vamos descer! — Se afasta ofegante.
— Tem certeza? Não podemos demorar uns minutos a mais?
— Não, eles estão nos esperando — sorri se afastando de mim.
— Tudo bem, vamos! — suspiro contrariado.
— Olha eles aí — Davi fala assim que apontamos na escada.
— Hum…. Agora vamos desvendar esse mistério — minha sogra fala
e Gabi confirma.
Nos sentamos no sofá com todos à nossa volta.
— Quem arrisca um palpite? — Samanta pergunta com um lindo
sorriso.
— Vai ser um menino, um garotão! — Davi responde.
— Menina, será ótimo uma menina, linda igual à Samanta — minha
mãe fala dessa vez.
E as opiniões se dividem, cada um dando seu palpite, rindo e
descontraídos.
— Mas que horas vão acabar com a nossa curiosidade? Falem logo, já
estou sem unha — a minha sogra protesta.
— Ok! Tudo bem, vamos acabar com a curiosidade de todos! — Fico
de pé.
— Ah, que ótimo, então! — Meu pai fala ansioso.
— Quer falar quem acertou, Miguel? — pergunto sorrindo. — É
menino ou menina? — ele me olha com uma cara de mistério e sorri sapeca.
— Hum…. Quem será que acertou? — Ele faz mistério, todos acham
fofo e sorriem.
— Foi o Davi? Ou a vovó? — Ele tinha uma expressão pensativa.
— Fala, Miguel, estamos curiosos! — Minha sogra fala fazendo
cosquinhas nele que sorri.
— Todos acertaram! — Ele dá de ombros.
— Como assim? — Davi pergunta confuso — São dois?
— São três… — Samanta fala sorrindo.
— Dois meninos dividindo a mesma placenta e uma menina — falo
orgulhoso
— Uau! Que incrível, parabéns! — Davi fala me abraçando.
— Aí! Leo…. Aí! — Samanta geme apoiando as mãos embaixo da
imensa barriga.
— O que está sentindo? — Sinto o meu sangue fugir do meu corpo e
a seguro preocupado.
— Não sei, dói muito, mas ainda é cedo — fala, seguido de um grito
fino.
— Será que vão nascer? — Minha sogra veio até Samanta ansiosa.
— Vamos, vou te levar para o hospital. — Pego-a nos braços, a
colocando no carro.
— Ainda é cedo, Leo — o seu tom é de preocupação.
— Não se preocupe, eu estou com você! Dirija mais rápido —
ordeno.
Assim que chegamos ao hospital, ela entra direto para a sala de
cirurgia, para ter um parto cesariano.
— Mas ela só está com sete meses — argumento com o médico.
— Se acalme, são três, é normal esse tipo de parto ser prematuro às
vezes, se arrume se quiser assistir o parto.
Me apresso e corro para a sala de cirurgia, fico ao lado dela, que ainda
me olha preocupada.
— Vai dar tudo certo, meu amor — beijo o topo da sua cabeça.
Foram os momentos de maior aflição na minha vida, eu estou nervoso
e ansioso para conhecer os amores da minha vida, minutos depois um
chorinho fino ecoa pela sala.
— Nasceu o primeiro menino — o médico diz com satisfação.
Em seguida vem o segundo menino e por último a minha pequenina.
— E minha esposa? — pergunto.
— Estão todos bem, não se preocupe, senhor Milani — eu não sei se
sorrio ou se choro, uma explosão de sentimentos invade meu coração.
— Sua esposa está sob efeito de anestesia e os bebês vão precisar
ficar na incubadora, já que são prematuros — diz em seguida.
— Mas eles vão ficar bem? — Pergunto preocupado
— Sim, não se preocupe.

***

Samanta Antonelli

Alguns dias depois…

— Leo, você já deu a mamadeira a esse! — falo sorrindo quando vejo


Leonardo tentar dar mamadeira pela segunda vez para o Hiago.
— Você tem certeza, meu amor? Eles são tão iguais! — Olha
confuso.
— Sim, tenho certeza, esse é o Hiago e esse o Higor — falo
apontando.
— Tudo bem…. Tudo bem… vou dar ao Higor agora, esse daqui
certo? — pergunta, ainda confuso.
— Ana Clara, já está satisfeita também, acho que todos vão dormir
agora — falo exausta.
— Descansa meu amor, eu ajudo as babás a colocar os bebês para
dormir — sugere e eu aceito, afinal eu estou bem cansada.
À tarde, quando acordo, vejo Leonardo sentado no banco de balanço,
os gêmeos deitados nos berços e Miguel deitado em seu colo quase
dormindo enquanto Leonardo conta histórias para ele. Ele é incrível, um
homem perfeito, olhar para ele me faz crer que fiz a escolha certa, todos os
dias acordo ao lado do homem que me completa, meu parceiro, meu
mundo.
— Acordou meu amor? — indaga quando me sento na cama, ele se
aproxima com o Miguel no colo, ele senta o colocando deitado ao meu lado,
me puxando para mais perto e alisa os meus cabelos.
— Sim, meu amor, acordei, muito obrigada.
— Está me agradecendo por cuidar dos nossos filhos enquanto você
descansava? — fala sorrindo.
— Isso mesmo — sorrio também.
— Você sabe que tudo tem um preço, não sabe? — Ele alisa o meu
rosto percorrendo a mão pelo meu corpo.
— Para, Leo, o Miguel está aqui na cama! — digo o lembrando.
— Vou levá-lo para o quarto dele! — Pisca um olho, se levantando e
pegando o Miguel em seus braços, saindo com ele.
As babás entram e pegam os gêmeos, sorrio e Leo entra no quarto
trancando a porta
— Pronto, meu amor, agora me pague o que me deve — diz, ainda
parado na porta do quarto.
— Eu te amo — sussurro em seu ouvido quando ele se senta ao meu
lado.
— Não mais do que eu, te amo — afirma entre os beijos.
***

Leonardo Milani

Estamos no jardim, Miguel, que antes jogava bola comigo, faz uns
chutes sozinho, me sento ao lado da Samanta e dos nossos filhos, deitados
em cadeiras de descanso, então contemplamos o pôr do sol.
A calma virou rotina e a paz parece ter feito as pazes conosco.
— Meu amor, me envolva todo em seus braços e será perfeito,
completo. Seja sempre minha esposa, amante e companheira — peço,
olhando eu seus olhos.
— Eu não conheço outra forma de viver — ela sorri, alisando o meu
rosto.
Se algum dia vivi no inferno, eu literalmente não me recordo. Às
vezes em que me senti só, foi porque eu havia fechado as portas para os
outros. Nem de longe eu poderia me imaginar casado e pai, comprovei que
tudo que falam sobre amor é verdade! Ele por horas é cego, por horas é
possessivo, por horas é calmaria, é desejo, é fogo…. Tudo que sofremos foi
aprendizado, toda lágrima foi para limpar nossa alma e quando achei que
tinha perdido tudo, foi quando começou a nossa melhor fase.
Hoje sou completo, filhos são presentes raros com os quais fui
agraciado. Quero ser o melhor pai, o melhor marido, quero viver esses
momentos para sempre!
Junto a minha mão a dela, a beijo docemente, um beijo calmo, porém
com muito desejo. Nos encaramos, ela sorri e eu gravo esse momento para
nunca esquecer que é nesse sorriso que sou feliz.

FIM?

P.S.: Vire a página.


Herdeiros Milani
Livro 1
Lançamento em breve, na Amazon!

Capítulo 01

— Pai, quem vai me levar ao aeroporto? — Ana Clara pergunta,


arrastando as malas pela sala.
— Por que tanta euforia para abandonar os seus pais? — Leonardo
fala, apertando as bochechas de Ana, que faz uma careta.
— Ai, pai! Não seja dramático, são só quatro anos. Passam rápido —
diz ao pai, que a olha com desgosto.
— Não estamos no Halloween, mas contemplem a cara de morto vivo
do meu pai. Tudo isso porque hoje é o último dia da minha irmã no Brasil,
ela vai estudar no Canadá, pessoal — Hiago diz ao entrar na sala,
zombando do pai para câmera do celular. Bom, não só para câmera, mas
também para as dezenas de milhares de seguidores que tem e o
acompanham ao vivo neste momento.
Na vida como digital influencer, ele exibi o dia a dia de um herdeiro
bilionário, ostentando carros de luxo, roupas da mais alta costura e baladas
onde apenas pessoas como ele, nascidas em berço de ouro, podem entrar. A
conta no Instagram acumula mais de treze milhões de seguidores ao redor
do mundo. Mas apesar da ostentação, Hiago possui uma personalidade leve
e divertida, o oposto de Higor que é mais fechado e um tanto intimidador
com um olhar cético e severo. Um pouco parecido com o pai, diria.
— Vamos agora? — pergunta Higor, ao se juntar a eles. — Vocês
estão fazendo um drama desnecessário em torno disso. — O seu tom é
desdenhoso.
— E vocês vão sem mim? — Samanta desce com os olhos inchados e
molhados de tanto chorar pela partida da Ana Clara. Não que ela não
quisesse que a filha voasse do ninho, mas era difícil deixar uma parte dela e
a sua única menina partir.
— Meu amor, quando sentir muita saudade, apenas pegue o jatinho e
vá visitá-la — diz Leonardo, abraçando a esposa e beijando a sua testa com
carinho em seguida. — Agora, se você continuar a chorar assim, eu tranco a
porta e ninguém mais sai dessa casa — fala com divertimento, olhando para
filha em busca da sua reação. Ana Clara cruzou os braços à frente e fez um
biquinho fofo, enrugando o cenho, brava.
— Me ligue várias vezes por dia. — Samanta se aproxima dela. — E
não aceito menos do que chamadas de vídeo. — Começa a chorar outra vez.
— Está bem, mãe. Eu prometo! Mas agora, vamos! Eu vou perder o
voou — Ana Clara fala com agonia. Leonardo dá de ombros. No fundo,
queria mesmo que ela perdesse o voo. Como Samanta, sofria muito com
despedida da sua filha.
— Pode perder o voo e usar o jatinho — diz ele.
— Não, pai!
Ele insistiu várias vezes naquele mês para que ela fosse no avião
particular da família, achava ser mais seguro, mas Ana Clara alegou querer
ir em um voo convencional. O seu desejo era chegar no novo país tentando
ter uma vida mais parecida com o normal possível. E quando ela diz
normal, quer dizer uma vida que pertence a mais da metade da população
em boa parte do mundo. Durante os próximos quatro anos de faculdade,
Ana Clara não quer ser a garota que herdará bilhões. É claro que ela gosta
da vida privilegiada, mas crescer cercada por isso, nem sempre é tudo
flores. Ela quer ser a Ana. Apenas a Ana Clara, mais uma caloura dormindo
em um quarto pelo campus.

***

Após voltar do aeroporto, Samanta e Leonardo subiram as escadas


indo em direção ao quarto. Eles estavam um tanto tristes, mas apenas
Samanta demonstrava isso.
— Ouvi dizer que Miguel também está no Canadá. Ele passou tão
pouco tempo conosco, sinto saudade dele — Samanta diz com pesar.
— Era o certo a fazer, meu amor. Já falamos sobre isso. Você sempre
volta a esse assunto, sempre remoí com pesar a nossa decisão e se pergunta
se foi a correta. Se enche de dúvidas sobre como seria e se deveríamos ter
tentado fazê-lo ficar.
Depois do DNA negativo, o pai biológico de Miguel apareceu alguns
meses após a morte da Vanessa. Ele reivindicou os seus direitos como pai
do menino, que inclusive rapidamente o reconheceu como pai, referindo-se
a ele como o meu outro pai. Leonardo investigou a vida do homem e
concluiu que tudo o que ele contou sobre quem é, era verídico. E não tendo
opção, teve de deixá-lo levar Miguel consigo.
Quando ainda era muito pequeno, ele sempre vinha a mansão e
passava um ou dois dias com a família Milani. Mas as visitas foram
diminuindo de acordo com que ele foi crescendo. Até um belo dia, quando
o menino leu na internet a notícia sobre a morte da sua mãe. Ele tinha uns
13 anos na época. Não foi fácil saber de tudo que a mãe – a mulher de quem
sentia tanta falta – fez para Leonardo e as pessoas ao seu redor. Era
extremamente complicado para uma mente jovem entender a maneira como
a morte da sua mãe ocorreu. Depois desse dia, Miguel não mais quis ir vê-
los. No entanto, Leonardo continuo depositando para ele uma pensão da
qual não tinha nenhuma obrigação, mas fazia com amor. Ele dizia que
aquilo era para que o menino pudesse viver tranquilamente pelo resto da
sua vida. Os depósitos não eram devolvidos, então ele entendia que Miguel
estava bem e fazendo uso do dinheiro. O menino, mesmo não sendo o seu
filho, ainda carregava o peso do nome Milani.

***

Enquanto isso, no Canadá...

Hoje, aos 22 anos, Miguel divide o seu tempo entre a pós-graduação e


o trabalho na cafeteira da faculdade. Todo o dinheiro que usava para
sobreviver vinha do auxílio que recebia da sua bolsa de estudos e do
salário-mínimo mais as gorjetas no café.
— Vamos para a festa dos calouros hoje? — Pedro, seu melhor
amigo, pergunta. Ele parece bem animado, tem um enorme sorriso no rosto.
Pedro era filho de uma família rica. Os dois se conheceram no início
da faculdade. A amizade se desenvolveu bem rápido. Agora eles moram
juntos, dividindo um Flat na cidade.
— Eu vou, estou escalado para trabalhar lá, no buffet — Miguel
reponde.
— Não sei por que trabalhar tanto, eu já vi o seu extrato, tem muito
dinheiro lá — Pedro diz isso um pouco irritado. Ele acha um absurdo ver o
amigo contar moedinhas, quando tem uma conta tão recheada de grana.
— Eu tenho os meus motivos, pretendo devolver cada centavo desse
dinheiro. Não quero! — fala rancoroso. — E você pare de mexer nas
minhas coisas — conclui, bravo.
— Então vamos aproveitar que está sem trabalhar agora e vamos ver
as calouras. — Pedro o puxa para outra direção. — Essa é a melhor época
do ano, cara! Conhecer gatas novas, muito sexo, muita bebida e festas —
diz todo empolgado, observando as garotas sentadas sobre o gramado no
campus.
— Boa sorte nas suas conquistas, mas arruma uma solteira dessa vez.
Vou indo, tenho muito trabalho. — Miguel o deixa sozinho e caminha em
direção ao trabalho, na cafeteria. Ele andava um tanto alheio as pessoas na
sua volta, sem notar muitos as que cruzavam o seu caminho. Sempre que
lembrava daquele dinheiro, sentia-se um pouco estranho, atônito. De
repente, alguém tão alheia quanto ele, o atropelou com o próprio corpo
pequeno e franzino.
— Ai! Me desculpe, eu estou um pouco enrolada — Ana Clara diz
para o menino que ela quase derrubou no chão. Ela ri do seu jeito
estabanado, recolhendo os seus livros no chão, o quais o estranho nem
sequer se manifestou em ajudar a pegar.
— Olha por onde anda da próxima vez — Miguel fala irritado,
ríspido, deixando Ana assustada e constrangida. Ela o olha com uma feição
irritada pela sua grosseria.
— Estúpido — fala chateada, tirando os olhos dele. Miguel sorri ao
ouvir a garota.
Com um pouco de pena, ele se abaixa recolhendo as anotações dela,
espalhadas pelo chão. Miguel tem um pequeno livro de bolso na mão, que
coloca sobre a grama. De dentro dele, desponta algo que parece ser um
cartão de crédito prestes a se perder pelo caminho, estava quase saindo de
entre as páginas. Ana Clara o puxa, vendo ser o cartão da biblioteca. Nele,
tem apenas um nome: Miguel De Angelis.
— É você? — ela pergunta, estendendo o cartão para ele.
— Não devia mexer nas coisas dos outros! — fala ríspido novamente,
levantando-se do chão após tomar o cartão da mão dela.
— Desculpe. — Colocou-se de pé também. — Não quis ser grosseira.
Ele estava quase caindo de dentro do livro — fala chateada.
— Siga o seu caminho! — O tom dele era rude e a sua postura, rígida.
Miguel deu-lhe as costas e se foi.
— Você poderia ser mais educado! — ela gritou. — E também
poderia me ajudar. Estou perdida — confessou em um tom mais baixo,
sentindo-se derrotada. Porém, ele a escutou. Miguel parou e pensou por um
segundo se devia ajudá-la ou não. Virou-se para ela, se aproximando
devagar. Ana sentiu-se intimidada pelo seu andar lento e o olhar sério e
cerrado, que encarava quase que a sua alma. Engolindo em seco, recuou,
encontrando uma árvore com as suas costas. Miguel não parou de caminhar
na sua direção, até que ficasse a milímetros dela, prendendo-a entre ele e o
tronco áspero. Ana abraçou os seus papéis com força e desviou os olhos
dele, nervosa.
— Você já observou a quantidade de pessoas ao nosso redor? Por que
quer que eu te ajude? Peça a qualquer um!
Ele se inclina, tentando olhá-la nos olhos. Ana Clara o olha outra vez.
Ele é bonito, muito bonito. E o seu hálito tem cheiro de café expresso. O
olhar duro de Miguel se esvai quando a encara tão profundamente, vendo o
tanto de inocência que há nos olhos. Isso soou um tanto sedutor para ele,
que chegou mais perto, dando a Ana um sensação de que estava prestes a
ser beijada. A respiração dela ofega, levemente, chamando a atenção do
homem à sua frente. Ele percebe o que acabou de causar nela e que é hora
de recuar. Então, sorri com divertimento.
— Suponho que seja isso que você queira, mas eu não posso te dar.
Sou um homem e você não passa de uma moleca no auge dos seus
dezessete anos. — Ele ri, afastando-se. — Vai arrumar o que fazer, pirralha.
E não fala mais comigo — diz sério, desfazendo o sorriso. A maneira como
ela quase o hipnotizou, o assusta.
Miguel torna a se afastar a passos apressados, deixando Ana Clara
com a respiração e o coração descompassado. A reação do seu corpo e a
sensação que sentiu a deixaram confusa. Ela não se lembra de nunca na sua
vida ter sentido aquilo que não sabia definir ou dar um nome. Por um
minuto – apenas por um minuto! – ela esperou e desejou ser beijada.
Respirando fundo, rapidamente se recompôs, ajeitando a sua postura.
— Esse garoto é perturbado! — fala para si mesma, prometendo em
silêncio manter distância dele.

Continua...
Agradecimentos

Quero agradecer a todos que de forma direta e indireta colaboraram


para que esse livro chegasse até aqui. Em especial para a autora Larissa
Braz, que mais uma vez me ajudou em tudo que pôde e ainda aturou os
meus dias de ansiedade. A Letícia e Joyce da assessoria Fênix por cuidar de
cada etapa do lançamento do livro com dedicação e profissionalismo. E por
fim agradeço as minhas leitoras por amarem tanto a família Milani quanto
eu.

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