Você está na página 1de 324

Copyright 2023 © Juju Figueiredo

Todos os direitos reservados.


Criado no Brasil.
Capa: Crtl desing
Revisão: Lih Parreira
Diagramação Digital: Juju Figueiredo Esta é uma obra de ficção. Seu
intuito é entreter as pessoas. Nomes, personagens, lugares e acontecimentos
descritos são produtos da imaginação da autora. Qualquer semelhança com
nomes, datas e acontecimentos reais é mera coincidência.
Todos os direitos reservados. São proibidos o armazenamento e/ou a
reprodução de qualquer parte dessa obra, através de quaisquer meios —
tangível ou intangível — sem o consentimento escrito da autora.
Criado no Brasil. A violação dos direitos autorais é crime
estabelecido na lei n°. 9.610/98 e punido pelo artigo 184 do Código Penal.
Sumário
Sinopse
Prólogo
Mohammed
Capítulo 1
Samia
Capítulo 2
Samia
Mohammed
Capítulo 3
Samia
Capítulo 4
Samia
Mohammed
Capítulo 5
Samia
Capítulo 6
Samia
Mohammed
Capítulo 7
Samia
Capítulo 8
Mohammed
Samia
Capítulo 9
Samia
Mohammed
Capítulo 10
Samia
Mohammed
Capítulo 11
Samia
Capítulo 12
Mohammed
Capítulo 13
Mohammed
Samia
Capítulo 14
Samia
Mohammed
Capítulo 15
Samia
Capítulo 16
Mohammed
Capítulo 17
Samia
Capítulo 18
Samia
Mohammed
Capítulo 19
Mohammed
Samia
Capítulo 20
Samia
Mohammed
Capítulo 21
Samia
Capítulo 22
Mohammed
Samia
Capítulo 23
Samia
Capítulo 24
Samia
Capítulo 25
Mohammed
Capítulo 26
Samia
Capítulo 27
Samia
Capítulo 28
Samia
Capítulo 29
Mohammed
Capítulo 30
Samia
Capítulo 31
Mohammed
Samia
Capítulo 32
Mohammed
Capítulo 33
Samia
Capítulo 34
Samia
Capítulo 35
Mohammed
Capítulo 36
Samia
Capítulo 37
Samia
Capítulo 38
Mohammed
Epílogo
Samia
Agradecimentos
Mohammed Yilmaz é o herdeiro de uma rede de hotéis de luxo
mundialmente famosa. Um homem frio, que só pensa em trabalho, é direto
quando preciso e arrogante na maioria das vezes.
Samia Aksoy trabalha como camareira de um dos hotéis da família
Yilmaz. Dona de um sorriso terno, olhar doce e um espírito livre, ela é uma
mulher que corre atrás dos seus sonhos e batalha por cada um deles.
Ele precisa acabar com um casamento arranjado por seu pai quando
ainda era uma criança.
Ela descobre uma gravidez inesperada de um homem que não quer
nada com ela.
Ele acha que o melhor jeito de acabar com seu casamento arranjado
é aparecendo noivo de outra mulher.
Ela precisa de ajuda financeira para lidar com a chegada do filho.
Ele propõe um acordo de casamento por um ano.
Ela não tem outra alternativa a não ser aceitar.
Mas durante um ano muita coisa pode acontecer. Pode existir amor
entre duas pessoas que prometeram que jamais se apaixonariam?
Mohammed
3 MESES ANTES – TURQUIA

Ayla me encara como se pudesse me matar. Na verdade, tenho


certeza de que se ela pudesse, voaria agora mesmo no meu pescoço, apenas
para ter o prazer de me ver morrer em sua frente.
— Você não está me entendendo, Mohammed — diz, tentando soar
calma, mas é impossível. — Você não pode desfazer um casamento que está
arranjado desde que nascemos.
— Não só posso como vou, Ayla. Não adianta você tentar me
persuadir. Não vou mudar de opinião.
— Meus pais me mandaram aqui com o intuito de persuadi-lo a não
desistir do casamento. Pense em como essa união irá beneficiar nossas
famílias!
— Tem uma coisa que você ainda não entendeu, Ayla. Prefiro
morrer solteiro a me casar com você.
Ela solta uma risada sem graça e se apoia na mesa, inclinando o
rosto em minha direção. Não faço um movimento sequer, apenas deixo que
ela se aproxime de mim.
— Não me pareceu que você quisesse isso todas as vezes que
dormimos juntos — sussurra, de forma melodiosa.
— Entenda uma coisa, Ayla. Sexo eu consigo em qualquer lugar do
mundo, até mesmo com você, que estava achando que poderia me prender
dormindo comigo. Mas eu não sou esse tipo de homem, então pode desistir
dessa ideia de casar comigo, porque nunca vai acontecer.
Me levanto, pego minha pasta e meu terno.
— Vai mesmo passar três meses em Nova Iorque?
Não ouso me virar em sua direção.
— Vou.
— Pode passar até um ano, Mohammed, mas assim que você pisar
os pés na Turquia novamente, eu estarei te esperando para nos casarmos.
— Aconselho que espere sentada, Ayla. Como eu falei, jamais vou
me casar com você.
Deixo meu escritório e sigo em direção ao elevador.
Eu tenho três meses para pensar em uma maneira de cancelar esse
casamento ou não me chamo Mohammed Yilmaz.
Samia
3 Meses depois – Nova Iorque

Meu pé bate impacientemente no chão, evitando olhar para a mulher


que está me atendendo. Fixo meu olhar na entrada da farmácia e aperto as
mãos uma na outra de maneira afobada, com medo de algum conhecido
entrar e me flagrar aqui. Não que eu precise dar satisfação da minha vida
para alguém, mas imagina ter que explicar essa situação para algum
conhecido? Prefiro evitar que isso aconteça. — Aqui está, moça, são os
melhores testes que temos. — A atendente me encara com um olhar de
pena, afinal de contas, meu desespero é nítido.
— Obrigada! — agradeço e entrego o dinheiro para ela. Pego a
sacola de sua mão e confiro o conteúdo.

Três testes.
Três testes que estou pedindo aos céus que resultem em negativo.

Minha menstruação sempre foi regular, nunca atrasou um dia sequer.


Quando isso aconteceu pela primeira vez há um mês, estranhei, mas pensei
que poderia ser algo normal, que acontece com todas as mulheres ao menos
uma vez na vida. Mas quando o segundo mês chegou e ela não desceu
novamente, a preocupação me atingiu com força. Tudo que eu pensava era
em como eu criaria uma criança sozinha - com um salário que mal dá para
me sustentar -, e muito provavelmente sem a ajuda do pai desse bebê.
Me viro para deixar a farmácia e é nesse momento que meu corpo
colide com um bem maior que o meu. Mãos grandes seguram meus ombros,
me mantendo no lugar e impedindo que eu cambaleie para trás. Olho para
cima no instante que meu olhar cruza com o do homem mais lindo que eu já
vi em toda a minha vida.

Olhos verdes envolventes e sedutores. Um olhar completamente


enigmático e intenso, que me faz engolir em seco e dar um passo para trás,
o que me faz analisar melhor seu rosto. Ele tem um maxilar extremamente
marcado, coberto por uma barba bem-feita, que cobre seu rosto de maneira
harmoniosa, juntamente com o bigode que completa o visual. Sua expressão
séria e nada amigável me faz mexer os ombros para que ele me solte e ele o
faz.
— Deveria prestar atenção por onde anda — diz, a voz grave
reverberando cada célula do meu corpo e me fazendo tremer.

— Você deveria prestar atenção também, afinal de contas, eu estava


de costas — rebato.
— Então deveria ter ser virado antes de já sair andando por aí.
— Vai mesmo continuar achando que está certo? — Coloco as mãos
na cintura e arqueio uma sobrancelha. Acho que posso ter visto a sombra de
um sorriso passar pelos seus lábios, mas não tenho certeza.
— E você quer mesmo continuar discutindo comigo? Eu tenho mais
o que fazer, com licença.
Ele passa por mim e eu me viro para encará-lo.

— Só por que você tem dinheiro, acha que pode passar por cima das
pessoas? — Ele se vira em minha direção.
— Quem disse que estou passando por cima de alguém?

— Eu estou vendo isso! — falo e cruzo os braços.


— Acho melhor a senhorita cuidar da sua própria vida. Acredito que
tenha assuntos mais importantes para se preocupar do que um simples
esbarrão. — Ele aponta para a sacola com os testes em minha mão e eu a
coloco nas minhas costas imediatamente.
Ele não espera eu dizer mais nada e segue em direção ao
estabelecimento. Eu decido encerrar essa discussão. Viro-me e saio da
farmácia, voltando diretamente para o hotel. Eu preciso fazer esses testes o
mais rápido possível.

***
Minhas mãos tremem ao erguer o teste de gravidez.

Sinto minha visão embaçar ao enxergar duas listrinhas se formando.


Não, não, não!
É tudo que minha mente consegue gritar ao ver o resultado positivo.

Pego o segundo teste: Positivo.


O terceiro teste: Positivo.
Sinto as lágrimas se formarem, mas respiro fundo e faço o possível
para que elas não escorram pelo meu rosto. Eu preciso ser forte.
— Samia, você já está dentro desse banheiro há quinze minutos!
Estou ficando preocupada com você!
Lisa bate na porta novamente, e, criando uma coragem tirada do
fundo do poço, eu destranco o trinco. Lisa entra no banheiro e
imediatamente pega o teste da minha mão.

— Merda! — diz assim que vê o resultado.


Olho para a minha melhor amiga e não consigo mais segurar o
choro. Sinto as lágrimas escorrerem pelo meu rosto como uma cachoeira
arrebentando a represa.

— E agora, Lisa? O que eu faço? — pergunto com um fio de voz.


— Simples, você vai chegar no Liam e dizer que está esperando um
filho dele — fala como se fosse a situação mais fácil do mundo.
— Acha que ele vai mesmo acreditar em mim?

— Nada que um teste de DNA não resolva, Samia. — Minha amiga


se aproxima de mim e seca minhas lágrimas. — Não chore! Nós vamos
resolver essa situação, eu te prometo! Agora lave esse rosto, guarde esses
testes de gravidez e assim que o Liam voltar para o hotel à noite, você vai
atrás dele e conta que está grávida!
Eu queria que as coisas fossem realmente simples como a Lisa está
colocando, ou que apenas contar sobre a gravidez resolvesse o meu
problema, mas eu sei que não vai. Ela não conhece o Liam como eu
conheço, ela não sabe que ele terminou comigo há duas semanas porque
simplesmente “achou alguém melhor”, nas palavras dele.

Até tentei trabalhar o restante do dia, mas a todo instante minha


mente me levava a refletir sobre esse bebê em meu ventre. Parece ser algo
completamente surreal, não é? Eu, uma pessoa sem nenhuma perspectiva de
vida, que saí do meu país natal quando era criança e que hoje não tenho
nem como sustentar a mim mesma, cuidando de um filho.
— Você está com essa cara desde que descobriu da gravidez — Lisa
diz, aparecendo ao meu lado.

— Estou com medo — falo e pouso a mão no meu ventre.


— Eu sei, eu também ficaria apavorada, mas você não está sozinha.
Mesmo que aquele babaca do Liam não queira essa criança, eu vou ajudar
você, sempre.

— Obrigada, Lisa!
Dou um abraço nela, procurando coragem para contar essa bomba
ao pai da criança.
Liam é gerente de um dos melhores hotéis de Nova Iorque. Ele é um
homem sedutor que não mede esforços para levar suas funcionárias para a
cama e as descarta depois de alguns dias. Eu sempre soube disso e, por esse
motivo, tentei ao máximo me manter longe dele, mas ele foi insistente e
depois de uma noite, passamos a ter encontros esporádicos. Um deslize
resultou nesse filho que estou esperando agora.

Não quero um pedido de casamento ou algo do tipo, quero apenas


que ele assuma a criança e me ajude na criação do bebê. É o mínimo que ele
pode fazer. Eu sou uma das várias camareiras que já caiu na lábia dele e me
arrependo amargamente disso, pois sei que a partir de agora minha vida vai
mudar completamente.
Entro na área destinada aos funcionários e vejo todos afoitos,
correndo de um lado para o outro.
— O que está acontecendo? — pergunto ao Luke, um dos
responsáveis pela distribuição das limpezas dos quartos.
— O dono do hotel chegou aqui de surpresa e deixou todos os
funcionários malucos, pois disse que iria fazer uma inspeção geral — diz e
coloca as mãos na cintura, respirando fundo.

O hotel Yilmaz é um dos melhores de Nova Iorque. O dono é um


magnata turco, que vez ou outra, aparece nos hotéis espalhados pelo mundo
para verificar como estão as coisas. Desde que eu trabalho aqui, ele nunca
tinha aparecido. Até hoje pelo, menos.
— Calma, Luke, vai dar tudo certo — falo e coloco a mão em seu
ombro.

— Eu sei coração. Minha preocupação é outra. E você? Como está?


Andou chorando? Seu nariz está vermelho.
Sorrio de sua perspicácia. Ele sempre sabe dizer quando não estou
bem.
— Não se preocupe comigo, apenas os problemas de sempre —
falo, como se eu ficasse grávida todos os meses.
— Sabe que se precisar de algo, pode me contar, não é? — Assinto e
sorrio em agradecimento.
— Luke, sabe me dizer se o Liam já chegou?

Meu amigo me lança um olhar de questionamento. Ele sabe que me


envolvi com o Liam e até mesmo me aconselhou a ficar longe dele. Afinal
de contas, ele não merece um terço da minha atenção. Porém, mal sabe ele
que o assunto que preciso tratar com ele pode decidir todo o rumo da minha
vida.
— Samia...
— Eu sei que pediu para que eu não o procurasse mais, mas eu
preciso conversar com ele. É um assunto de vida ou morte.

Luke respira fundo e assente.


— Acabou de subir para o escritório dele, mas já adianto que ele
não está de bom humor.
— Não tem problema. Obrigada, Luke. Você é o melhor!
Beijo seu rosto e sigo para o elevador dos funcionários. Aperto o
botão que leva ao andar do escritório e espero pacientemente a caixa de
metal fazer seu percurso.
As portas se abrem e eu cumprimento a secretária do Liam com um
aceno de cabeça. Paro na porta do gerente e bato três vezes.

— Pode entrar.
Abro a porta e entro, fechando-a logo me seguida. Liam ergue a
cabeça e me encara, mas logo volta a prestar atenção no que está fazendo.
— Liam...
— O que você quer, Samia? Não tenho tempo para brincadeiras
agora.
— Preciso conversar com você — falo.
— Se não for nada urgente, podemos conversar depois. O dono do
hotel está aqui e preciso preparar alguns documentos para ele ver.
— É um assunto de vida ou morte — falo.
— Que tipo de assunto de vida ou morte você teria para tratar
comigo, Samia? A não ser que você queira falar que está completamente
apaixonada por mim, eu não sei no que posso te ajudar.
— Eu estou grávida, Liam — falo de uma vez, chamando sua
atenção, e ele me encara, sério.
Samia
Liam me encara por alguns segundos, sem saber o que dizer. Sinto
meu coração martelar contra o meu peito, minhas mãos suam e minhas
pernas parecem que vão perder a força a qualquer momento.
— Liam...
— Meus parabéns — diz, sorrindo e se levantando. — Dizem por aí
que filhos são bênçãos em nossas vidas, não é mesmo? Fico imensamente
feliz por você, Samia.
Pisco várias vezes e ele se aproxima de mim.
— Esse filho é seu — falo e ele nega.
— Não, esse filho não é meu.
— Como?
— Esse filho não é meu, Samia — repete, dessa vez com uma voz
um pouco mais grave. Sinto as lágrimas se acumularem em meus olhos. —
Nós tivemos apenas alguns encontros esporádicos e em todos eles nós
usamos preservativos. Acha mesmo que eu vou acreditar que esse filho é
meu?
Solto uma risada de incredulidade.
— Esse é filho é seu sim e você sabe muito bem disso! Sabe muito
bem que teve uma vez que não nos protegemos!
— Você está mentindo — diz, sem nenhum traço de humor em sua
voz. — Eu não vou cair no golpe da barriga, Samia. Você é uma mulher
muito bonita e devo admitir que tem uma beleza rara, mas eu não sou burro
para cair no seu golpe.
Sinto as lágrimas caírem pelo meu rosto.
— Golpe? Acha mesmo que eu queria ficar grávida? — grito. —
Acha mesmo que eu queria ter esse bebê?
— Golpe ou não, acho que deve procurar o pai verdadeiro dessa
criança ao invés de gastar saliva comigo.
Ele se vira e eu parto para cima dele, batendo em suas costas. Liam
se vira e segura meus pulsos com força.
— O que pensa que está fazendo? — pergunta, aproximando o rosto
do meu.
— Você não pode simplesmente me deixar sozinha com esse bebê.
Você tem tanta responsabilidade com ele quanto eu!
— Acha mesmo que eu quero assumir esse filho, Samia? —
pergunta, sussurrando, a voz sombria, causando arrepios por toda a minha
pele. — Acha mesmo que eu vou parar a minha vida agora para cuidar de
um bebê? Pare e analise a porra da situação. Acha mesmo que eu vou sair
contando ao mundo que uma camareira vai ser mãe de um filho meu?
— Eu não tenho condições de criar esse bebê sozinha — sussurro,
desesperada.
— Então tire — diz tranquilamente, e me solta.
O encaro aterrorizada.
— Você está pedindo para que eu... que eu... — Não consigo nem
verbalizar o que ele quer dizer.
— Exatamente! Eu posso te indicar a melhor clínica para isso.
Garanto que você não vai sofrer nada. Será rápido e indolor.
Levo a mão até meu ventre, como se esse gesto pudesse proteger o
bebê do que ele está propondo.
— Você é um monstro, Liam — sussurro.
— Alguém precisa ser o prático da situação, Samia. Se não é você,
sou eu. Você tem exatamente duas opções: abortar esse bebê ou criá-lo
sozinha, porque eu nunca vou assumir essa criança.
As palavras dele soam como um golpe em meu estômago. Sinto
uma dor aguda no meu ventre e coloco a mão, me abaixando de dor.
— Não adianta tentar me convencer com um teatrinho, Samia.
Agora, se você puder, saia da minha sala.
A dor que sinto agora é tão intensa que não consigo me mover,
muito menos falar algo. Tudo que consigo fazer é permanecer quieta, como
se isso fosse fazer a dor diminuir.
— Já chega, Samia. Não tenho tempo para suas brincadeiras.
Ouço seus paços se aproximando de mim e ele segura meu braço
com força, me obrigando a ficar de pé.
— Ai, ai! — grito.
A porta se abre de uma vez e o Liam me solta, me fazendo cair de
joelhos no chão. Coloco os braços em volta de mim e me abaixo, sentindo
meu ventre doer.
— O que está acontecendo aqui? — Ouço uma voz grave dizer, mas
não consigo me levantar para ver o que está acontecendo.
— Mohammed, eu não esperava sua visita agora. Eu estava apenas
conversando com a Samia, nada de relevante e...
— Conversando? — O homem diz e consigo perceber o sarcasmo
em sua voz.
— Sim, ela está apenas...
As vozes começam a ficar distantes, a dor parece diminuir e então
tudo some.
Mohammed
No instante que a mulher cai desmaiada no chão, Liam arregala os
olhos, mas permanece parado no lugar. Corro para perto da moça e me
abaixo para pegá-la no colo. Quando seu rosto se vira em minha direção,
vejo que é a mesma mulher que discutiu comigo na farmácia mais cedo.
Seguro seu pulso e vejo que ela está gelada e seus batimentos estão
descontrolados.
Isso não é bom.
Me levanto com ela no colo e sigo para fora do escritório.
— Mohammed, isso deve ser algum truque dessa mulher. É claro
que ela não está desmaiada de verdade e...
— Cale a porra da boca, Liam — falo. — Quando eu voltar iremos
conversar.
A secretária do Liam arregala os olhos ao me ver com a mulher no
colo.
— Mohammed, o que aconteceu? — Mason, meu secretário, se
aproxima de mim.
— Para o carro. Temos que levá-la pra o hospital imediatamente! —
falo, e ele assente, já indo na minha frente para chamar o elevador.
Demoramos cerca de vinte minutos para chegar ao hospital mais
próximo. Assim que chegamos e me perguntam o motivo dela ter
desmaiado, paro um pouco para tentar me lembrar da conversa que ouvi
antes de entrar no escritório.
— Gravidez — informo, e eles a pegam do meu colo, colocando-a
na maca e levando-a para fazer os exames necessários.
Coloco uma mão na cintura e a outra eu passo no cabelo, penteando
os fios para trás.
— O que aconteceu? — Mason pergunta.
— Fui conversar com o Liam e ouvi a discussão dele com ela. Ela
está grávida dele e ele deu duas opções para ela: ou ela aborta ou cria o
bebê sozinha, pois ele não vai mover um dedo para ajudá-la.
— Então as denúncias são verdadeiras? — pergunta, e eu assinto.
Vim para o principal hotel de Nova Iorque para averiguar algumas
acusações que chegaram até mim sobre o gerente do hotel estar tendo casos
com várias camareiras e usando as dependências do hotel para seus
encontros amorosos. Quando fui até sua sala mais cedo, não imaginei que
fosse ouvir sua conversa com uma das camareiras justamente sobre isso,
muito menos que ele mandaria a mulher abortar o próprio filho.
— Acha que ela vai ficar bem? — Mason pergunta, e eu solto um
suspiro.
— Espero que sim. A última coisa que eu preciso é que ela faça
alguma denúncia que coloque o nome do hotel no prejuízo.
— Ela nasceu na Turquia — Mason diz, e o encaro.
— Como assim?
— Ela se chama Samia Aksoy. Começou a trabalhar como
camareira no hotel há uns seis meses, mora sozinha e tem 27 anos.
— Interessante — falo.
— Ela veio para Nova Iorque muito pequena, perdeu os pais aos 17
anos de idade e desde então tem se virado sozinha. Trabalhou em vários
lugares e se mudou muitas vezes.
— Você buscou todas essas informações sobre ela? — pergunto,
arqueando a sobrancelha.
— Sim.
— Você deve ser o pai do bebê! — Uma enfermeira aparece na
minha frente.
— Como?
— A sua namorada está bem. Você a trouxe rapidamente para o
pronto-socorro e conseguimos fazer o que estava ao nosso alcance. Ela e o
bebê estão bem, mas recomendo que, nessas próximas semanas, ela evite
trabalhar ou fazer qualquer movimento brusco para não ocorrer o risco de
ter um deslocamento da placenta.
— É...
— Vem, vou te levar até ela!
Ela se vira antes que eu possa dizer que não sou o pai desse bebê.
Olho para o Mason, que apenas indica que eu siga a senhora. Sem saber o
que fazer, vou atrás da enfermeira.
— Como ela está? — pergunto assim que entramos no quarto.
— Dormindo como um bebê. Demos a ela um remédio para aliviar a
dor e ela vai descansar por algumas horas. Quando ela acordar, podemos
liberá-la.
— Eu não sou...
— Bom, vou deixar vocês dois sozinhos. Qualquer coisa basta me
chamar.
Ela deixa o quarto e fecha a porta. Engulo em seco e me viro para a
mulher que esbarrou comigo duas vezes no mesmo dia.
Me aproximo da cama e consigo contemplar seu rosto com mais
calma agora. Igual pela manhã, seus cabelos estão soltos, os cachos estão
espalhados pelo travesseiro e parecem extremamente sedosos. Seu rosto
está tranquilo e ela dorme de maneira serena, como se não tivesse acabado
de ouvir do pai da criança que está esperando que abortasse.
Em um impulso, ergo a mão e traço o contorno de seu rosto. Sua
pele é macia e quente ao meu toque. Ela não esboça nenhuma reação.
Meu celular apita e eu me afasto dela. Pego o aparelho e confiro a
mensagem que chegou. É do meu pai, cobrando minha volta para a Turquia
o mais rápido possível. Bloqueio a tela e fecho os olhos. Passaram-se três
meses desde que deixei tudo apenas para não me casar com a Ayla e entrar
em um matrimônio fadado ao fracasso.
Agora meu tempo está acabando e eu não faço a mínima ideia de
como chegar à Turquia sem ir direto para o altar. Direciono meu olhar para
a mulher na cama e a voz do Mason vem à minha cabeça.
Ela veio para Nova Iorque muito pequena, perdeu os pais aos 17
anos de idade e desde então tem se virado sozinha. Trabalhou em vários
lugares e se mudou muitas vezes.
Em seguida, o que o Liam disse também vem à tona.
... abortar esse bebê ou criá-lo sozinha, porque eu nunca vou
assumir essa criança.
Viro-me para deixar o quarto em que a Samia está e encontro o
Mason me esperando do lado de fora.
— Seu pai acabou de...
— Eu sei, pode preparar as coisas, nós vamos voltar para a Turquia
— aviso.
— Se voltar, terá que se casar — ele diz e eu assinto.
— Eu vou me casar, Mason.
Meu secretário me encara, perplexo.
— Como?
— Eu vou me casar, mas não com a Ayla.
— E vai se casar com quem então?
Sorrio de lado e aponto para o quarto de onde acabei de sair.
— Irei me casar com a Samia.
Samia
Abro os olhos e os fechos novamente por causa da claridade do
local que estou. Assim que me acostumo com a luz, torno a abri-los e viro o
rosto para o lado, conseguindo identificar que estou em um hospital. Minha
veia tem um acesso para soro e eu estou vestida com as roupas do hospital.
Tento me sentar na cama, mas uma dor no meu ventre me faz gemer
baixinho. Coloco a mão em minha barriga e sinto meus olhos se enxerem de
lágrimas.
Será que eu perdi meu bebê?
É a pergunta que me atinge em cheio.
A porta do quarto se abre e uma senhora entra, com uma bandeja.
— Você acordou, querida! Que bom!
Ela se posiciona ao meu lado e começa a se preparar para tirar o
acesso do meu braço.
— Meu bebê... — É tudo que eu consigo falar.
— Está tudo bem, menina! Foi apenas um susto, mas deve tomar
cuidado a partir de agora. Evite esforço e trabalho pesado. Não queremos
complicações futuras, certo? — Solto uma respiração aliviada e encosto a
cabeça no travesseiro.
Meu bebê está bem, graças a Deus ele está bem.
— Seu marido ficou extremamente preocupado também. Passou a
noite aqui com você, mas teve que sair pela manhã. Disse que voltaria antes
de você receber alta.
Marido?
— Como?
— Que homem bonito, com todo o respeito, é claro! Não me lembro
de ter visto um homem tão bonito quanto ele em toda a minha vida. Já vi
muitos homens bonitos antes, mas ele parece superar a todos.
— Eu não sei...
A porta se abre e vejo um homem parado ali. Ele está usando um
sobretudo preto, os cabelos lisos estão penteados para trás e os olhos são
completamente hipnotizantes e misteriosos. Ele entra no quarto a passos
largos e para ao lado da minha cama. Ergo os olhos para ele, tentando
compreender quem ele é.
— Acordou, querida? — Sua voz é grave, intensa e arrepia minha
pele por completo.
— Já terminei aqui, vou deixá-los a sós.
O homem assente e a enfermeira deixa o quarto, fechando a porta.
Me viro para o homem.
— Quem é você?
Ele caminha até o sofá que tem no quarto e se senta, cruzando as
pernas e me olhando atentamente.
— Mohammed Yilmaz — diz, pausadamente. Quando me dou conta
de quem ele é, arregalo os olhos.
— Você é o dono do hotel — sussurro, e ele assente.
— Exato.
— Como... — Então me lembro. Na farmácia, o homem que
esbarrou comigo quando fui comprar os testes de gravidez, era ele. — Na
farmácia era você também.
Ele apenas assente e eu pisco, tentando entender o que está
acontecendo.
Mohammed se levanta novamente e começa a andar de um lado para
o outro do quarto.
— O Liam foi demitido — diz.
— Demitido?
— Sim, vim para o hotel de Nova Iorque apenas para verificar
algumas denúncias que surgiram sobre a conduta do gerente do hotel.
Acabei ouvindo sua conversa com ele e consegui as provas que precisava
para demiti-lo por justa causa, além de pegar algumas imagens da câmera
de segurança para usar caso ele tentasse alguma gracinha.
Baixo a cabeça e aperto as mãos, eu não posso fazer muito esforço
por cauda da gravidez, provavelmente serei demitida. O Liam não vai
querer me ver nem pintada de ouro e provavelmente vai me mandar tirar
essa criança. Por mais que as coisas estejam difíceis, eu jamais teria
coragem de abortar meu filho.
— Sei que você está grávida — Mohammed diz, e eu ergo os olhos
para ele.
— Um erro infeliz — falo e sorrio tristemente. — Quem poderia
imaginar que eu ficaria grávida daquele traste e que ele iria pedir para eu
abortar a criança? Agora eu não posso trabalhar, porque preciso ficar de
repouso. Provavelmente perderei o emprego e ainda corro o risco do Liam
vir atrás de mim e me culpar por ter perdido o emprego. — Balanço a
cabeça em negação e me viro para meu chefe. — Me desculpe por falar
tudo isso, você não tem nada a ver com minha vida. Agradeço por ter me
trazido para o hospital e por ter cuidado de mim. Eu vou pagar todas as
despesas e...
— Samia — chama meu nome e eu o encaro.
— Sim?
— Eu tenho uma proposta para você.
— Proposta? Que proposta?
— Eu quero...
A porta se abre e eu desvio o olhar para a entrada, vendo Lisa correr
em minha direção.
— Samia, meu Deus! — Ela me abraça. — Eu vou matar aquele
filho da puta do Liam! Vou cortar ele em pedacinhos e ele vai aprender a
não mexer com minhas amigas.
— Estou bem, Lisa — falo.
— Eu sei que está, mas aquele desgraçado... Meu Deus! — Ela se
afasta e segura meu rosto, beijando minha testa. — Se acontecesse alguma
coisa com você ou com essa criança, eu não me perdoaria.
— Não aconteceu nada.
— Fui eu quem disse para você ir atrás dele.
— Está tudo bem, Lisa. Ele já foi até demitido — falo, e ela assente.
— Uau! Eu nunca fui com a cara do Mohammed. Ele parece ser um
monstro só de ouvir as outras pessoas falando dele...
— Lisa...
— Mas ele foi extremamente foda demitindo aquele canalha e ainda
por justa causa...
— Lisa... — Olho para o Mohammed e, pela sua expressão, parece
não estar gostando de jeito nenhum da faladeira da Lisa.
— Ele subiu um pouco no meu conceito, mas não podemos dizer
que é grande coisa, já que...
— Lisa! — grito, e ela me olha assustada.
— O quê? — Aponto para o lado e ela se dá conta de que não
estamos sozinhas no quarto. — Puta merda!
— Irei deixar as duas conversarem — ele diz. Sério e sem um traço
de um humor em sua voz, se vira em minha direção. — Samia, nós não
terminamos nossa conversa, estarei esperando do lado de fora.
Ele se vira e deixa o quarto. Quando a porta se fecha, consigo
respirar aliviada.
— O que o Mohammed está fazendo aqui? — pergunta, com os
olhos arregalados.
— Foi ele quem me trouxe para o hospital ontem à noite. Se não
fosse por ele, eu teria perdido esse bebê — falo.
— Uau! Por essa eu não esperava.
— E você falando mal dele! — digo, dando um tapa em seu braço.
— Tudo o que eu disse é verdade, tá bom? — Encosto a cabeça no
travesseiro e minha amiga segura minha mão. — O que você vai fazer?
— Não sei, não faço a mínima ideia. Acho que cheguei a um ponto
da minha vida em que não sei que direção tomar, muito menos o que vai
acontecer daqui pra frente.
— Sabe que sempre vai poder contar comigo, né? Vou ser a melhor
tia que esse bebê vai ter.
Aperto sua mão e assinto.
— Com certeza, você vai ser a melhor tia. Não tenho dúvidas disso!
— Eu só vim ver como você estava. Preciso voltar para o hotel. —
Assinto. — Quando ele disser o que quer, você me conta.
— Não deve ser nada demais, Lisa. Apenas quer listar alguma das
muitas maneiras que posso pagar esse hospital.
— Não sei. Mohammed tem cara quem deixaria esse tipo de assunto
para o secretário — diz pensativa, mas logo suspira. — Vou indo, qualquer
coisa me liga.
Assinto e ela beija meu rosto. Assim que deixa o quarto, me
pergunto o que diabos o dono do melhor hotel de Nova Iorque teria para
conversar comigo, uma simples camareira.
**
Por sorte, a Lisa deixou uma bolsa com roupas minhas aqui. Depois
que minha amiga saiu, esperei o Mohammed por mais vinte minutos, mas
ele não voltou e eu acabei dormindo. Acordei na hora do almoço, com a
enfermeira dizendo que a médica liberou minha alta, mas que eu precisava
fazer alguns exames para começar a acompanhar a gravidez. Ela me passou
a lista e disse que todos faziam aqui.
O tempo está fechado hoje e dou graças a Deus que o inverno está
acabando. Odeio essa estação com todas as minhas forças. Visto a calça, a
blusa de frio e o casaco grosso. Em seguida, coloco as botas e o gorro.
A porta se abre e o Mohammed entra, com sua postura impecável
que grita a todos que ele não se abala com nada.
— Desculpe a demora — diz e me entrega um copo de chocolate
quente.
— Obrigada? — O agradecimento sai em forma de pergunta
enquanto pego o copo de sua mão. Tomo um gole e fecho os olhos assim
que o sabor doce invade a minha língua. Uma delícia.
— Samia, precisamos conversar.
— Olha, eu sei que a despesa desse hospital é extremamente alta.
Não vou conseguir pagar tudo de uma vez, mas você pode descontar do
meu salário até que eu consiga pagar tudo...
— Não é sobre isso que quero conversar com você, Samia — diz já
impaciente.
— Não?
— Não.
— É sobre o que então?
— Tenho uma proposta para te fazer.
— Que proposta? — pergunto temerosa.
— Casamento — diz, me fazendo arregalar os olhos. — Você e eu
vamos nos casar.
Samia
A palavra “casamento” parece ecoar em minha mente como um
disco arranhando. Preciso me sentar na cama para conseguir entender o que
ele me disse.
— Casar? — pergunto.
— Sim, casar — diz naturalmente.
— Você é maluco ou algo do tipo? Nós mal nos conhecemos! Como
você pode me propor casamento desse jeito? E se você for um psicopata? E
se eu for uma psicopata?
— Isso eu sei que você não é. Fiz questão de pesquisar tudo sobre
você. Sei que nasceu na Turquia, veio para Nova Iorque ainda pequena,
perdeu os pais aos 17 anos, está a seis meses trabalhando como camareira
no hotel e agora está grávida e não sabe como vai cuidar desse bebê.
— Meu Deus, você é um psicopata! — falo, colocando a mão na
boca, assustada.
— Eu tenho uma proposta de casamento para você.
— Quem faz proposta de casamento hoje em dia? Isso só acontece
em livros!
Mohammed se aproxima de mim e inclino o corpo para trás.
— Não estamos em um livro, Samia. Estou sendo claro com você.
— E eu estou sendo ainda mais clara! Como me casar com você vai
resolver meus problemas?
— Assinaremos um contrato em que devemos permanecer casados
por um ano. Eu te darei toda a assistência que você precisa durante a
gravidez, absolutamente tudo. Assumirei a paternidade da criança, darei
meu nome a ela e garantirei que ela tenha uma educação primordial.
— Não entendo. Por que tudo isso? Por que eu?
— Você é a pessoa perfeita para isso, Samia — diz.
Nego com a cabeça e tento falar algo, mas não consigo raciocinar
direito.
— Por que precisa se casar?
— Preciso voltar para a Turquia em uma semana. Meus pais acham
que, assim que eu voltar, irei me casar com a Ayla. Ela é filha de um dos
maiores influenciadores políticos do país. Nossa união em matrimônio não
apenas beneficiaria nossa família financeiramente, como abriria várias
portas para a expansão dos negócios. No entanto, não quero me casar com
ela e apenas uma recusa da minha parte não está fazendo o efeito que quero.
— E onde eu entro nessa história?
Ele sorri de lado.
É a primeira vez que eu o vejo sorrir.
— Você só precisa interpretar o papel da noiva/esposa apaixonada,
feliz e que está grávida de um filho meu.
— Isso é loucura.
— Meu pai não vai se opor se conseguirmos convencê-lo de que
estamos perdidamente apaixonados e que quero me casar com você o mais
rápido possível. O bebê que você está esperando seria um bônus para fazê-
lo voltar atrás na ideia do casamento.
— Pelo jeito, você bolou um plano muito rápido. Nem imaginou que
eu possa negar o pedido? — questiono perplexa.
— É uma proposta muito boa para ser recusada, Samia.
— É uma loucura! E se descobrirem?
— Não correremos risco se você fingir estar completamente
apaixonada por mim.
Me afasto dele e passo as mãos em meus cabelos, amarrando-os em
um coque alto.
— Você sabe o quão maluco é chegar para uma completa
desconhecida e oferecer um contrato de casamento para ela?
— Se a situação não fosse desesperadora, eu não estaria fazendo
isso. Não será nenhum sacrifício para você, Samia. Basta seguir o que está
no contrato durante um ano e pronto, você estará livre e com uma segurança
financeira para a criança.
— Você tem noção do que está me pedindo? — pergunto pela
segunda vez. — Você quer assumir um filho que não é seu, dar o seu nome
a ele e garantir que ele tenha tudo do bom e do melhor? Meu filho vai ser o
herdeiro de tudo que você tem!
— Samia, eu gostaria que você não se preocupasse com isso agora.
Eu só preciso saber se você aceita se casar comigo.
— Mohammed — falo seu nome e me aproximo dele. — Aprecio
muito tudo que fez por mim, quando me trouxe até aqui, quando demitiu o
Liam, o hospital e tudo mais, mas não posso aceitar isso. Tenho certeza de
que quando você chegar no hotel e refletir sobre o dia de hoje, vai perceber
o quão absurda é essa proposta que me fez. Com licença.
Pego minha bolsa e passo por ele, mas paro ao sentir sua mão se
fechar em meu braço.
— Meu número pessoal está no seu celular. Sugiro que pense na
minha proposta. Te darei três dias para analisar os prós e contras desse
casamento e, se até lá você se mantiver firme em sua decisão, não irei mais
incomodá-la, mas apenas pense.
— Eu... — Fecho os olhos e solto o ar. — Irei pensar. Agora, com
licença.
Ele solta meu braço e eu deixo o quarto.
Assim que saio na rua, o frio me pega de surpresa. Passo os braços
em volta de mim mesma e sinalizo para chamar um táxi. Entro no veículo e
passo meu endereço ao motorista. Só então a ficha do que acabou de
acontecer.
— Meu Deus, eu fui pedida em casamento por um completo
estranho — sussurro.
Mohammed
— Acha que ela vai aceitar? — Mason pergunta e eu solto um
suspiro, bebendo de uma vez a dose de uísque.
— Ela vai aceitar. A proposta a pegou desprevenida e ela precisa
pensar.
— Até eu acho isso loucura — ele murmura.
— Não tenho outra saída, Mason. Passei três meses fora da Turquia
para fugir desse matrimônio e agora recebi uma intimação do meu pai para
voltar. Se eu voltar, com toda a certeza serei obrigado a me casar com a
Ayla e eu não quero isso.
— E por isso a melhor solução é se casar com outra mulher,
completamente desconhecida?
— A melhor solução para fugir de um casamento arranjado é me
casar por amor.
— Mas você não a ama — aponta.
— É por isso que temos que fingir que estamos completamente
apaixonados — falo.
— Não tem medo?
— Medo de quê? — pergunto, me servindo de outra dose de uísque.
— De se apaixonar por ela! Afinal de contas, ela é linda.
Sorrio de lado e bebo a outra dose.
— Ela é linda, isso é um fato. Mas não corro o risco de me
apaixonar por ela, fique tranquilo.
— Quem garante isso? — pergunta.
— Eu irei garantir, e o contrato também.
— A forma como você brinca com o destino é fora do normal! Em
algum momento você vai cair do cavalo — diz, e eu nego.
— Sou um homem de 34 anos, Mason. Se em todo esse tempo eu
nunca me apaixonei, não será um casamento de fachada que fará isso
acontecer.
Meu amigo sorri de lado e apenas assente, mas pela cara dele sei
que está esperando que eu caia do cavalo, mas isso não vai acontecer, pode
ter certeza disso.
**
Devo dizer que o Liam deixou uma puta bagunça nos arquivos de
administração para que eu arrumasse. Eu preciso contratar um novo
administrador urgente para a filial de Nova Iorque. Não posso ir embora e
deixar essa bagunça sem uma pessoa de confiança para lidar com tudo isso.
— Sr. Mohammed, aqui estão alguns currículos para serem
analisados. — Mary, antiga secretária do Liam, deixa algumas pastas em
cima da mesa e eu apenas assinto, enquanto mexo no computador.
— Obrigada, irei analisar todos — digo.
Segundos depois, ouço o barulho da porta se fechando.
Tiro os óculos de grau e respiro fundo. Parece que o antigo gerente
não apenas usufruía dos benefícios do hotel, como também estava
extraviando verbas sem saber que em algum momento seria descoberto.
— Eu vou colocar esse filho da puta na cadeia — falo, enquanto
faço a análise dos livros-caixa e vejo um desfalque de cerca de duzentos mil
dólares.
Meu celular começa a tocar e eu vejo o nome da minha irmã na tela.
Opto por deixar tocar e não atender, mas percebo que será a quinta vez que
faço isso hoje. Fico de pé e pego o celular, caminhando até a janela da sala.
— Eda...
— Mohammed, estou desde cedo querendo falar com você. Por que
não me atendeu?
— Desculpa, Eda! Estou resolvendo algumas pendências que
surgiram de última hora na filial de Nova Iorque.
— Vai mesmo voltar? — pergunta.
— Sim, na próxima semana.
— Sabe que se voltar vai ter que se casar com a Ayla, não é?
Aquela mulher não vai desistir até colocar uma aliança em seu dedo.
— Não vou me casar com a Ayla, Eda. Você sabe disso.
— E pretende fazer o que para persuadir nosso pai? Porque ele está
irredutível quanto esse assunto.
— Não se preocupe com isso. Eu já sei o que vou fazer e tenho tudo
planejado.
— Por que tenho a impressão de que você vai chegar com uma
bomba quando voltar para a Turquia?
— É bom que nosso pai esteja com os exames do coração em dia,
pois não me responsabilizo por nada que acontecer durante a minha volta.
— Mohammed, o que você está tramando?
— Não se preocupe, irmãzinha, eu sei cuidar de mim mesmo.
— Mohammed...
— Amo você, Eda. Estou com saudades, nos vemos na próxima
semana.
Desligo antes que ela possa falar qualquer outra coisa. Olho para o
céu azul de Nova Iorque. Apesar do frio, estamos sendo contemplados com
algumas horas de sol. Nada que seja suficiente para sentir calor, apenas
alguns minutos de vitamina D.
Amanhã é o dia da decisão final da Samia e espero que ela aceite a
minha proposta. Afinal de contas, nós dois só temos a ganhar com isso.
Samia
— Isso é loucura! — falo pela décima vez para a Lisa.
— Loucura ou não, é o que pode te salvar nesse momento — minha
amiga diz.
— Salvar? Lisa, tem ideia do que é isso? Um casamento falso! Um
casamento sem amor! Que tipo de homem faz essa proposta?
Me sento no sofá e passo as mãos nos cabelos. Durante os últimos
dias essa proposta vem atormentando minha cabeça e se eu não resolver
logo esse assunto, ficarei maluca.
— Nós sabemos que você quer um casamento de conto de fadas,
Samia — Luke se manifesta pela primeira vez. — Mas na situação atual,
acredito que você não tenha para onde correr.
— Como eu vou explicar para o meu filho que a mãe dele aceitou se
casar por meio de um contrato para não ter que deixá-lo passar
necessidade? — pergunto, sentindo as lágrimas começarem a se formar.
Malditos hormônios da gravidez, que me deixam mais emotiva do
que de costume!
— Você não vai contar isso assim que ele nascer, isso ainda vai
demorar anos! Até lá muita coisa pode acontecer, Samia — Lisa diz.
— Como o que, por exemplo?
— Você e o Mohammed se apaixonarem. — Ela sorri para mim,
como se fosse a coisa mais natural do mundo.
Tenho que soltar uma risada, completamente fria.
— Isso nunca vai acontecer, Lisa! Eu jamais vou me apaixonar por
aquele homem arrogante e babaca que acha que só porque é rico tem direito
de se meter na vida dos outros da maneira que achar melhor.
— Não podemos dizer “dessa água nunca beberei” — Luke reflete.
— E se, por um acaso, vocês se apaixonarem realmente?
— Pode anotar no seu caderninho: eu nunca vou me apaixonar por
aquele homem!
— Isso significa que você vai aceitar a proposta e se casar com ele?
— Lisa pergunta, esperançosa.
— Não! Gente, é um casamento por contrato, onde preciso conviver
com pessoas que eu não conheço e preciso fingir estar apaixonada por um
homem que eu vi apenas umas três vezes. Acham mesmo que isso vai dar
certo?
— Acho que, em primeiro lugar, você deve pensar nessa criança.
Vamos ser coerentes, Samia! Você não pode trabalhar agora, por ordens
médicas. O dono do local que você está morando já te deu uns dois avisos
de despejo, as contas estão super atrasadas e... — Lisa para de falar e segura
minha mão. — Amiga, por mais que o Luke e eu queiramos te ajudar, você
ainda vai passar necessidade.
— Eu não quero ter que chegar ao ponto de me casar com um
homem que eu não conheço por essa criança — sussurro.
— Pensa direitinho, Samia. — Luke segura minha outra mão. — Às
vezes algumas oportunidades vêm disfarçadas de outras e a gente precisa
aceitá-las, mesmo quando não queremos isso de jeito nenhum.
Puxo minhas mãos e seco as lágrimas em meu rosto.
— Foi muito bom conversar com vocês, mas eu preciso ir para casa.
Estou cansada.
— Eu chamo um táxi — Lisa fala e eu nego.
— Não precisa! Eu vou caminhando mesmo.
— Samia...
— Sério, Luke! Preciso pensar um pouco e refrescar a mente. Andar
vai me ajudar com isso.
— Tem certeza? — pergunta.
— Claro, não se preocupem. Assim que eu chegar em casa mando
mensagem para vocês!
Eles se entreolham, mas acabam assentindo. Dou um abraço em
cada um e deixo o apartamento da Lisa.
O frio ainda está grande, mas estou bem agasalhada. Minha casa não
é longe da casa da Lisa, então andar não vai me matar.
Ajeito o cachecol em volta do meu pescoço e sigo pelas ruas
geladas. Coloco as mãos dentro do bolso do casaco e, pela décima vez,
começo a pensar em todos os prós e contras a respeito desse casamento.
Quanto mais eu penso nesse acordo absurdo, mais certeza eu tenho
de que aceitar isso vai me limitar em vários aspectos. Fico pensando no que
meus pais diriam se estivessem vivos e chego à conclusão de que, com toda
a certeza, eles diriam que estou cometendo a maior burrada de toda a minha
vida.
Um contrato, um casamento com prazo de validade de um ano e
ainda fingir estar apaixonada por um homem que eu não conheço, é
loucura.
Isso nunca vai dar certo!
Posso ter todos os defeitos do mundo, mas sempre sonhei em me
casar por amor, em construir minha família com um homem que eu
conhecesse, confiasse e que realmente não medisse esforços para ficar
comigo. Agora me encontro em uma sinuca de bico, porque esse filho se
tornou uma das coisas mais importantes para mim e por ele eu faria
qualquer coisa... mas será que eu sou capaz de me casar com um homem
que não conheço por causa dele?
Respiro fundo e começo a andar mais rápido. Os dias no inverno são
mais curtos e o sol hoje não nos deu o privilégio da sua presença no céu
hoje.
— Samia! — A voz me faz parar na hora e, lentamente, me viro na
direção em que ela veio.
Sinto um arrepio percorrer meu corpo no instante em que vejo o
Liam parado atrás de mim. Seu olhar é gélido e sua expressão nada
amigável.
— Liam — sussurro seu nome, mas tenho certeza de que ele não
ouviu.
Ele dá três passos em minha direção e eu dou dois para trás. Seu
sorriso de lado parece sem vida. Ele olha para os lados e percebo que
estamos praticamente sozinhos.
— Achei que não fosse te encontrar — ele diz.
— O que você quer comigo?
— Por sua culpa eu perdi o meu emprego. — Dá um passo em
minha direção.
— Minha culpa?
— Por sua culpa aquele imprestável do Mohammed abriu um
processo contra mim e eu posso ser preso. — Outro passo.
— Eu não fiz nada disso. Isso tudo é culpa do que você fez com
várias outras funcionárias.
— Se você não tivesse entrado no meu escritório naquele dia e
inventado essa história de bebê, eu ainda estaria com meu emprego.
Coloco as mãos na barriga, como se isso pudesse proteger meu filho
desse homem.
— Você está louco, Liam! Eu não fiz nada.
— Você acabou com a minha vida, Samia! E eu vou acabar com a
sua.
Ele avança em minha direção e suas mãos se fecham em meu
pescoço, apertando. Seguro em suas mãos para tentar tirá-lo de cima de
mim, mas ele é muito mais forte do que eu. Sinto o ar faltar e arregalo os
olhos. Meus pulmões começam a queimar e eu tento bater nele para que me
solte.
— Liam... — Seu nome sai como um sussurro, conforme vou
perdendo as forças. Minha visão começa a ficar turva e eu começo a perder
os sentidos.
— Solta ela, seu desgraçado!
O aperto em volta do pescoço se vai e eu caio sentada no chão,
tossindo e respirando com dificuldade. Olho para cima e vejo um homem
com o semblante fechado, partindo para cima do Liam. Nesse momento
algumas pessoas começam a aparecer para separar a briga, pois o homem
começa a socar a cara do Liam e não parece que vai parar tão cedo.
Uma moça vem me ajudar a ficar de pé.
— Moça, você está bem? — pergunta, preocupada e eu assinto,
voltando meus olhos para os homens que separam a briga. O rosto do Liam
está sagrando e ele parece puto, olhando para o homem que acabou de bater
nele.
Ele ainda está de costas para mim e não consegui ver quem era
quando ele chegou.
— Se você se aproximar dela novamente, eu te garanto que vou te
mandar direto para o cemitério. — A voz grave, o jeito que ele falou... Não
pode ser!
Ele se vira em minha direção antes que eu possa concluir meu
pensamento.
Mohammed caminha em minha direção e segura meu rosto entre as
mãos, erguendo-o delicadamente e abaixando o cachecol.
— Não vai ficar marcas — diz. Seus olhos se prendem aos meus e
eu respiro fundo. — Você está bem?
Assinto, sem saber como responder. Mohammed se vira para a
mulher que me ajudou.
— Obrigada.
— Não precisa agradecer. — Ela sorri para mim e se afasta.
Mohammed segura minha mão e me puxa para que eu comece a
andar. Ainda não sei como reagir ou me afastar dele, então apenas deixo
que ele me conduza. Ele me guia até um carro preto, abre a porta de trás
para mim e eu entro, com ele logo atrás de mim.
O carro começa a se movimentar.
— Para onde estamos indo? — pergunto.
— Hotel.
— Quero ir para minha casa.
— A sua casa não parece ser um local seguro, ainda mais se o Liam
sabe onde você mora.
— Por que está tão preocupado comigo?
— Vamos nos casar, é normal isso.
— Não, não vamos nos casar.
Ele se vira em minha direção e inclina o rosto para perto do meu.
— Hoje é o dia da sua decisão final. Acredite em mim, Samia,
quando digo que esse acordo vai beneficiar muito mais a você do que a
mim.
— Você pode encontrar tantas mulheres para esse acordo! Por que
eu?
— Porque você é a pessoa certa para isso, Samia. Eu só preciso de
um sim seu, apenas isso e eu te prometo que o Liam não vai encostar um
dedo em você, que essa criança vai ter tudo do bom e do melhor e que você
vai ser tratada como uma verdadeira princesa.
Ele parece estar falando tão sério!
Um frio se instala em minha barriga e eu fecho os olhos por alguns
segundos. Talvez eu estivesse cometendo a maior burrada de toda a minha
vida, mas os prós desse acordo estão pesando mais que os contras e, pelo
meu filho, eu sou capaz de fazer qualquer coisa. Até me casar com um
homem que eu não conheço.
— Mohammed — chamo e puxo o ar com força, assentindo em
seguida. — Eu aceito me casar com você.
Ele assente, mas não dá nem um sorriso. Apenas volta a se encostar-
se ao banco e fala algo para o motorista, mas minha mente está tão
atordoada com tudo que não consigo processar mais nada.
Um acordo, um casamento falso, um ano. Apenas isso, depois
minha vida volta ao normal.
Isso tem que dar certo!
Samia

— Para onde estamos indo? — pergunto, depois de perceber que


não estamos indo para minha casa.
— Hotel — Mohammed responde, simplesmente.
— Por que o hotel?
— Você precisa se preparar, Samia. — Acho que devo ter feito
alguma careta, pois Mohammed deixa o tablet de lado e me encara. — A
partir de agora você é minha noiva. Você tem até segunda-feira para
aprender tudo sobre mim e sobre minha família, para que possamos ir para
a Turquia.
Turquia.
Eu nunca pensei que algum dia eu voltaria para o país que nasci!
Não era um desejo meu, mas aqui estou eu, prestes a entrar em um contrato
milionário com um homem que eu mal conheço.
— Acha que isso vai dar certo? — pergunto nervosa, estralando os
dedos um no outro.
— Vai depender exclusivamente de você, Samia. Afinal de contas,
você precisa parecer perdidamente apaixonada por mim.
Seus olhos verdes se prendem aos meus e, por alguns segundos, me
esqueço como se respira. É inacreditável a maneira que ele consegue me
dominar apenas me encarando.
Abaixo os olhos e respiro fundo. A pergunta que ronda minha mente
agora é: eu fiz a coisa certa ao aceitar me casar com esse homem?
**
Chegamos no hotel e eu abaixo a cabeça quando entramos no
elevador.
— O que está fazendo? — pergunta.
— Eu trabalho aqui, Mohammed. O que as pessoas vão pensar se
me virem ao lado do dono do hotel?
— Você trabalhava aqui — me corrige.
— Você não pode me demitir — falo, desesperada.
— Entenda uma coisa, Samia: você é minha noiva agora e não
precisa mais disso. Além do mais, logo os funcionários vão descobrir sobre
nosso noivado.
— Isso não vai dar certo — murmuro.
— Vai sim! Basta você aprender tudo que vou ensinar nos próximos
dias. Não tem erro, Samia.
As portas do elevador se abrem e eu percebo que estamos na suíte
presidencial. Um quarto - se é que posso chamá-lo assim -, que cabe meu
apartamento quatro vezes. É praticamente uma casa.
Sigo o Mohammed e o vejo sentar no sofá e apontar para que eu
sente ao seu lado. Ele me entrega uma pasta preta.
— O que é isso?
— Nosso contrato de casamento. Quero que leia todas as cláusulas
cuidadosamente.
Pego a pasta em minhas mãos e respiro fundo. Parece que estou
segurando um pedaço de chumbo, de tão pesada que eu sinto a pasta em
minhas mãos.
Mohammed se levanta.
— Aonde você vai? — pergunto e ele se vira em minha direção.
— Preciso resolver algumas coisas sobre o hotel. Pode ficar à
vontade e, se quiser comer algo, é só pedir. Pode também dormir um pouco
ou tomar um banho. Voltarei na hora do jantar.
Ele não espera que eu diga mais nada, apenas deixa o quarto. Volto a
encarar a pasta.
Cuidadosamente pego o contrato e começo a ler. Conforme vou
avançando na leitura, mais certeza eu tenho de que estou cometendo uma
das maiores loucuras da minha vida.
“O presente contrato firma a união estável de Mohammed e Samia,
onde ambos entraram em um casamento falso. Ambas as partes estão de
acordo com o contrato. Como firmado verbalmente, o casamento terá
duração de um ano, onde a parte contratante promete arcar com todas as
despesas da parte contratada, além de assumir o filho que ela carrega, se
comprometendo a pagar uma mesada para a criança após o fim do acordo.
A parte contratada deve fazer o possível para que todos da família
do contratante acreditem que ambos estão perdidamente apaixonados. Ela
não pode, em hipótese nenhuma, se relacionar com outras pessoas. A
mesma coisa vale para a parte contratante.
Se, porventura, uma das partes descumprir o acordo e o contrato
for desfeito antes do tempo previsto, a parte prejudicada receberá uma
multa no valor de US$ 500.000,00.
Assim que o período de um ano terminar, as duas partes devem
entrar com um pedido de divórcio.
Ambas as partes estão de acordo com esse contrato.”

Olho para o espaço onde devo assinar e me pergunto, pela décima,


vez se estou fazendo a coisa certa. Pode parecer uma decisão fácil, mas a
verdade é que isso vai mudar completamente a minha vida.
Deixo a pasta em cima do sofá e decido aproveitar um pouco da
suíte, já que ele disse que eu poderia fazer o que eu quisesse. Então, vou
fazer exatamente isso.
Não é à toa que esse é um dos hotéis mais luxuosos de Nova Iorque.
Cada detalhe aqui grita dinheiro e, para a suíte presidencial, não poderia ser
diferente. Vou em direção ao banheiro e, ao entrar, paro em frente ao
espelho - que é enorme -, diga-se de passagem. Olho para trás e vejo a
banheira enorme e um sorriso nasce em meu rosto. Por que não aproveitar,
certo?
Começo a encher a banheira e vou tirando a minha roupa. Observo
que meu pescoço está um pouco vermelho, mas nada que uma maquiagem
não resolva, ou mesmo o próprio cachecol.
Caminho em direção a banheira e solto um gemido quando a água
quente entra em contato com a minha pele.
— Meu Deus, isso é muito bom! — sussurro, me acomodando na
banheira.
Eu poderia viver assim, não iria achar ruim.
Ergo a mão com um pouco de espuma e assopro, sorrindo em
seguida. Se eu puder tomar banho em uma dessas durante os próximos 365
dias, não vou achar ruim.
Olho para o teto e suspiro, passando a mão no meu ventre.
— Estou fazendo isso por você meu filho. Para te proporcionar uma
vida digna e sem dificuldades. Apenas por você.
Mohammed
— Não acredito que ela realmente aceitou — Mason diz.
— Nem eu, mas é isso, eu tenho uma noiva e menos de quatro dias
para que ela pareça estar completamente apaixonada por mim.
— Acha que vai dar certo?
— Precisa dar certo, Mason. Agora não é mais questão de
probabilidade. Eu preciso que dê certo.
— Entregou o contrato para ela?
— Sim, e pedi que ela lesse cada item cuidadosamente. Preparou o
que eu pedi? — questionando, deixando o notebook de lado e o encarando.
— Aqui está.
Ele me entrega o tablet e eu vejo tudo que precisamos situar a
Samia.
— Quero que entre em contato com o hospital que a Samia ficou,
pois ela precisa fazer alguns exames para saber como o bebê está. Não
podemos viajar antes da realização desses exames.
— Vou agendar uma consulta para amanhã. — Assinto e meu
celular vibra em cima da mesa. Vejo uma mensagem da Ayla e bloqueio a
tela, sem me dar ao trabalho de ler o que ela mandou.
— Consulta marcada. Mohammed, vai contar a ela sobre a Ayla?
— Já comentei com ela sobre a Ayla. Samia precisa estar preparada
para tudo que vai enfrentar assim que chegarmos a Istambul. Isso inclui a
Ayla, a família dela e o meu pai.
— É bom você estar pronto para o seu pai também. Ele não vai
aceitar esse relacionamento tão fácil.
— Por isso é primordial que as pessoas vejam o quanto estamos
apaixonados.
— Essa eu quero ver — murmura e eu arqueio uma sobrancelha.
— Acha que não tenho capacidade de fingir estar apaixonado por
uma mulher?
— Pelo contrário, Mohammed, você tem plena capacidade. Quero
ver se ela tem capacidade de fingir estar apaixonada por você.
— Ela vai ter que aprender — falo, sendo sucinto e direto.
É a minha única solução para fugir de um casamento constituído por
interesses.
**
Tinha avisado para a Samia que voltaria para o jantar, porém acabei
ficando no escritório mais tempo que o esperado. Pedi que o Mason
providenciasse algumas roupas para a Samia e mandei um recado pra ela,
avisando que não tinha hora para voltar, pois ainda estava no escritório.
Agora é mais de meia noite e ela já deve estar dormindo.
Abro a porta do quarto e encontro algumas luzes apagadas, mas a
luz da sala está acessa. Caminho até o local e sorrio de lado ao ver a Samia
dormindo no sofá. Ela está usando calça de moletom e uma blusa de manga
cumprida. Como ela tem um livro em sua mão, presumo que ela tenha
pegado no sono enquanto lia.
Tiro o terno e deixo em cima do sofá. Com cuidado, tiro o livro da
mão dela, deixo em cima da mesa e me abaixo, pegando-a no colo. Samia
faz uma careta, mas continua dormindo profundamente.
Sigo para o quarto e a deito na cama, ajeitando as cobertas em cima
dela. Samia se aconchega na cama e eu me aproximo dela, tirando os fios
de cabelos que ficaram grudados em seu rosto.
Samia se mexe, mas logo volta a respirar profundamente e continua
dormindo.
— Que confusão você se meteu, menina — sussurro e me levanto.
Preciso tomar um banho e dormir um pouco, amanhã temos um dia cheio.
Samia
A primeira coisa que eu sinto quando acordo é a macies do colchão
e dos cobertores que estou envolvida. Parece que estou dormindo em
nuvens, de tão confortável que estou. Não me lembro de o sofá ser tão
macio... Abro os olhos imediatamente e me sento. Olho para os lados e a
única claridade presente no quarto vem das janelas que estão parcialmente
cobertas pelas cortinas.
Em que momento eu vim parar na cama?
Me lembro de ter ficado no sofá lendo um livro depois do jantar e,
com toda certeza, eu adormeci ali. Tenho plena certeza de que não vim para
o quarto depois. Eu não me esqueceria de um detalhe tão importante quanto
esse!
Passo as mãos no rosto e solto um suspiro. Olho para o lado e vejo o
relógio na mesa de cabeceira da cama e arregalo os olhos quando vejo que
já se passa das 10h.
Como eu posso ter dormido por tanto tempo?
Saio da cama rapidamente e vou direto para o banheiro, onde escovo
os dentes e lavo o rosto. Vejo o estado de calamidade que está meu cabelo,
mas, como não tenho meus produtos aqui, apenas faço um coque alto e
deixo dois cachinhos soltos na frente do rosto. Volto para o quarto e vejo
algumas sacolas em cima da poltrona. Não havia notado antes.
Tem um bilhete grampeado pelo lado de fora. Arranco o bilhete e
leio.
“Pensei que pudesse precisar de algumas roupas. Espero que sirva.
Mohammed.”
Abro as sacolas e retiro uma calça jeans, uma calça térmica, uma
blusa térmica, um casaco longo, cachecol, luvas, gorro e ainda tem uma
caixa de sapatos no chão.
Solto um suspiro e começo a me vestir. Por um milagre tudo coube
perfeitamente, até mesmo o par de botas de salto baixo. Coloco o cachecol e
pego as luvas, o gorro e deixo junto com a minha bolsa, para que eu possa
colocar quando for sair.
Afinal de contas, se alguém me manda tudo isso significa que eu
terei que sair para algum lugar. Quem usaria essas roupas dentro de um
quarto aquecido?
Assim que deixo o quarto, encontro um homem de óculos na sala.
Ele está tomando uma xícara de café enquanto mexe no celular.
— Bom dia — arrisco um cumprimento e ele imediatamente me
encara, sorrindo polidamente.
— Samia, espero que tenha dormido bem. — Ele se levanta e aponta
para que eu me sente à sua frente.
— Dormi até demais — digo um pouco envergonhada.
— Café? — pergunta, já indo até a cafeteria.
— Por favor.
Não me lembro de tê-lo visto em algum lugar, mas ele parece saber
muito bem quem eu sou.
— O Mohammed...
— Está em uma reunião de trabalho superimportante, mas chegará
por volta das 12h. — Ele me entrega uma xícara com o café.
— Obrigada.
— Bom, hoje a senhorita tem três consultas agendadas pela manhã,
seu almoço será com o Mohammed e...
— Só um instante: que consultas?
— Para o bebê, é claro. O Mohammed não quer fazer nenhuma
viagem que possa colocar a sua vida ou do bebê em risco.
— Ele não precisa se preocupar com isso — falo, timidamente.
— Ele deixou claro que a partir de agora ele tem total
responsabilidade com você e com a criança.
— Ainda não assinei o contrato — pondero.
— Mas sabemos que vai assinar.
— E você, quem é?
— Me chamo Mason e trabalho com o Mohammed há mais de cinco
anos como seu secretário. Te auxiliarei nesses próximos dias.
— Não quero tomar seu tempo, Mason.
— Não se preocupe, senhorita. Estou fazendo isso porque realmente
quero ajudá-la.
Assinto e sorrio de leve.
— Agradeço.
— Vamos? Temos um longo dia pela frente.
— Vamos.
Termino de tomar meu café e Mason me guia para fora da suíte
presidencial.
Nesses últimos seis meses andei por esses corredores e elevadores
como uma mera camareira, que precisava urgentemente de dinheiro para
conseguir pagar as contas e sobreviver. Agora estou andando como a futura
esposa do dono do hotel. Tem noção do quão maluco isso pode ser?
Sou cumprimentada por algumas pessoas, que não faço ideia de
quem são, mas procuro sempre manter meu rosto abaixado. Afinal de
contas, não quero que ninguém descubra quem sou.
O elevador para no saguão do hotel e eu preciso respirar fundo para
sair dele.
— Algum problema, senhorita? — Mason pergunta e eu nego.
— É muito diferente andar por esse hotel como se eu fosse a dona
dele — falo e começo andar, sendo seguida por ele.
— Para essas pessoas, logo você será a esposa do dono de tudo isso.
— Mas sabemos que será uma mentira — sussurro.
— As pessoas não precisam saber disso, senhorita. O que importa
para elas é o que seu status representa.
Sou recebida pelo frio de Nova Iorque e Mason segue à minha
frente, abrindo a porta do carro para mim.
— A partir de agora as coisas vão mudar drasticamente para a
senhorita e meu conselho é que aproveite muito essa nova etapa que está se
iniciando.
Sorrio em agradecimento e entro no carro. Ele se senta no banco da
frente e o carro logo entra em movimento. Pego meu celular dentro da bolsa
e solto um suspiro.
Aproveitar.
Será que eu realmente consigo fazer isso?
**
— Como ele está? — pergunto e a médica sorri gentilmente para
mim.
— Seu bebê está saudável, não se preocupe. O sangramento daquele
dia foi apenas um susto.
— Eu realmente não planejava essa gravidez, mas a ideia de perder
esse bebê me causou um medo tão grande! — falo mais para mim mesma
do que para a médica.
— É o instinto materno, um filho é sempre um presente para nós.
Mesmo não sendo planejado, nosso corpo espera isso constantemente e,
quando acontece, todos os nossos instintos de proteção são ativados. É
nesse momento que percebemos que podemos mover o mundo por conta de
um ser tão pequeno e indefeso.
Sorrio da sua fala e confirmo, tendo plena noção do que ela fala.
— Meu noivo pediu para perguntar se eu posso viajar sem me
preocupar com a minha saúde ou com a do bebê.
— Vão viajar por quanto tempo? — questiona.
— Na verdade, estamos voltando para a Turquia.
— Sério?! Que maravilha!
— Realmente — falo.
Mason me aconselhou a perguntar para a médica se eu estava
liberada para viajar, visto que em alguns dias retornaríamos para a Turquia.
— Você pode viajar sem problemas, Samia. Minha recomendação é
procurar acompanhamento médico assim que chegar lá, pois é importante
para a sua saúde e a do bebê. — Confirmo com um aceno de cabeça. — No
mais, te desejo tudo de bom e que você e seu marido aproveitem essa nova
etapa. A gravidez é um momento único na vida de um casal.
Tento não esboçar o sorriso triste que tive vontade de lhe dar, então
apenas assinto.
Eu sei que o Mohammed vai fazer o papel de pai dessa criança, mas
não será a mesma coisa. Ele não é o pai de verdade desse bebê e não nutre
nenhum tipo de sentimento por mim. A gravidez pode ser o momento mais
importante da vida de um casal, mas, para mim, será um dos mais solitários
que já enfrentei.
Deixo o consultório e o Mason fica de pé assim que me vê.
— Terminou, senhorita? — pergunta e eu assinto. — Mohammed já
está te esperando para o almoço, vamos?
— Vamos sim!
**
Um restaurante árabe, eu deveria imaginar esse tipo de coisa! Mason
disse que o maître já foi orientado a me levar até a mesa onde o Mohammed
estava, bastava apenas dizer meu nome.
Assim que entro sou surpreendida pelo luxo do local. Acho que em
toda a minha vida eu nunca tinha visto um lugar tão lindo e tão bem
decorado. Nem mesmo o hotel é tão lindo desse jeito!
— Senhorita, bom dia. — Me viro em direção à voz e sorrio.
— Bom dia! Estou procurando Mohammed Yilmaz, sou Samia
Aksoy.
Ele assente e aponta em direção ao salão.
— Por aqui, senhorita.
Sigo o maitre, que parece me levar a uma sala mais reservada. Ele
abre a porta para mim e eu prendo o ar ao ver o Mohammed sentado,
mexendo no celular. Ele ergue os olhos para mim e eu engulo em seco.
Lentamente, entro no ambiente e ouço a porta ser fechada atrás de
mim. Mohammed acompanha meus passos até eu me sentar à sua frente. É
incrível a maneira como seus olhos me deixam hipnotizada e inquieta.
— Como foi a consulta? — pergunta, deixando o celular de lado.
— Está tudo certo comigo e com o bebê. Podemos viajar sem
problemas nenhum — falo.
— Isso é ótimo. Estava esperando você chegar para pedirmos nossa
refeição.
— Claro.
Pego o cardápio e peço algo que pareça ser bom apenas observando
os ingredientes e, para beber, peço um suco de laranja.
Nosso pedido é anotado e logo ficamos sozinhos de novo. Aperto as
mãos uma na outra e olho para os lados, observando os detalhes da sala.
— Samia.
— Sim? — Olho imediatamente para o Mohammed, que me estende
a mesma pasta que li ontem à noite.
— Leu o contrato?
— Sim, eu li.
— Está de acordo com tudo que está descrito aqui? — pergunta e eu
assinto. — Então precisamos assiná-lo.
Mohammed coloca a mão no bolso e me entrega uma das canetas
mais bonitas que já vi na minha vida. Ergo a mão para pegá-la e só então
percebo que estou tremendo.
Abro a pasta e aperto a caneta para sair a ponta e pouso a mão no
papel, mas não começo a assinar de uma vez, apenas ergo meus olhos para
o homem a minha frente. Minha vida mudará completamente após assinar
meu nome nesse documento.
— Você tem certeza de que está disposto a se casar com uma
desconhecida? — pergunto.
Mohammed aproxima o rosto do meu, apenas o suficiente para que
eu fique presa em seus olhos.
— Absoluta certeza, Samia. Eu só preciso saber se você também
tem certeza disso.
Engulo em seco.
Eu não tenho mais certeza de nada e estou fazendo isso pelo meu
filho. Apenas por ele.
Olho para o papel e assino meu nome completo. Devolvo a caneta
para ele, que rapidamente assina também.
Nos encaramos.
Não tem mais volta. Minha vida vai mudar completamente daqui
para frente, pois acabei de assinar fazer um acordo com um magnata turco e
isso vai fazer minha vida dar um giro de 180° graus.
Mohammed
Agora é oficial. Samia e eu temos um contrato de casamento.
A mulher de cabelos cacheados, olhos ternos e olhar marcante me
encara como se me perguntasse qual o próximo passo. Sei que a partir de
agora as coisas vão ficar um pouco mais difíceis para ela.
— E agora? — pergunta.
— Vamos almoçar, Samia. Depois nós vamos realmente começar a
trabalhar.
Ela assente. Bebo um gole do meu vinho e ela fica olhando para os
lados, envergonhada. Nossa comida chega nesse mesmo instante e
agradeço, pois não sei exatamente o que conversar com ela. Sei que
precisamos falar sobre diversas coisas, mas agora eu realmente não sei por
onde começar.
— Obrigada — ela agradece quando é servida.
Quando ficamos sozinhos novamente, o silêncio volta a reinar sobre
nós. Observo ela começar a comer. Seus olhos se fecham quando ela sente o
sabor da comida e dou sorriso de lado com a sua expressão.
— Isso é muito bom! — diz, me olhando.
— Fico feliz que tenha gostado. É bom se acostumar com o cardápio
árabe, muitas das nossas comidas são assim.
— Acho que consigo me acostumar fácil — fala, continuando a
comer.
— Já tinha se imaginado voltando para a Turquia? — Ela me
encara, pensando na pergunta.
— Não, nunca foi algo que me passou pela cabeça. Posso ter
nascido na Turquia, mas vivi minha vida praticamente inteira em Nova
Iorque. Por que eu voltaria para um lugar que não conheço?
— Seus pais não tinham vontade de voltar?
— Meus pais tinham vontade de voltar, mas nunca deu certo e,
quando eles pensaram que daria certo, não puderam realizar o sonho deles.
— Morava em qual lugar da Turquia?
— Nós viemos de um vilarejo que ficava na cidade de Ordu.
— Já ouvi falar.
— Não tenho muitas lembranças dali. Saímos da Turquia quando eu
tinha quatro anos.
— Por que saíram?
— Perdemos tudo em um terremoto, que destruiu tudo que
tínhamos. Então meus pais acharam que seria uma boa ideia tentar a vida
em outro país.
— Por que Nova Iorque?
— Meu pai disse que poderíamos viver uma vida melhor aqui e que
poderíamos viver sem medo. Minha mãe não se importou muito, afinal de
contas, ela queria estar onde meu pai estivesse e eu estive com eles até os
últimos dias. Eles queriam muito ter voltado para a Turquia, que era o país
dele, mas não deu certo.
Assinto, sem saber o que falar para ela, mas ela começa a sorri e me
encara.
— O que foi? — pergunto confuso.
— Quem diria que eu iria conhecer um turco em Nova Iorque e ele
iria propor um casamento junto com uma viagem para a Turquia? — Sorrio.
— Acho que isso nem seus pais poderiam prever.
— Jamais — sussurra.
— Acho que você vai gostar de Istambul. — Ela me encara, de
olhos arregalados.
— Nós vamos para Istambul?
— Sim, eu moro lá.
— Eu deveria ter imaginado...
— Por quê?
— Você é milionário, dono de um hotel cinco estrelas, que têm
filiais em vários países. É claro que você moraria em Istambul!
— Você tem um ponto.
— Mohammed...
— Sim?
— Tem um ponto importante que estamos esquecendo.
— Qual?
— Eu não falo turco. Quer dizer, eu ainda me lembro de algumas
palavras, mas não sei como vou conseguir entender algo.
— Não se preocupe quanto a isso. Toda minha família se comunica
em inglês e, com toda a certeza, eles falarão com você em inglês.
— Melhor! Achei que teria que recuperar o turco de uma hora para
outra.
— Isso vai acontecer com o tempo. Vamos terminar de comer?
Temos muita coisa para resolver nos próximos dias.
Ela assente e voltamos a comer.
**
Depois de uma hora deixamos o restaurante e meu carro já está nos
esperando. Abro a porta para a Samia e ela sorri em agradecimento.
Entramos no carro e o motorista segue em direção ao hotel. Durante o
trajeto, pego meu celular e vejo que tem várias mensagens da Ayla, todas
perguntando quando eu vou voltar para a Turquia, mas decido ignorar todas.
— Tudo bem? — Samia pergunta.
— Eu te disse que estamos nos casando para que meu compromisso
com a Ayla seja desfeito, não é?
— Sim, me lembro disso.
— Ela não é uma pessoa fácil e vai duvidar a todo o instante que nós
temos algo sério. Acredito que uma das coisas mais difíceis será fazer todos
acreditarem que estamos apaixonados. Portanto, quanto menos pessoas
souberem sobre nosso contrato, melhor será.
— Eu sei que as famílias turcas são bem tradicionais em relação ao
casamento — comenta. — Principalmente se a noiva não for do agrado
deles.
— Meus pais firmaram um compromisso de matrimônio para mim e
para a Ayla quando eu tinha cinco anos de idade, mas, conforme fui
crescendo, percebi que não era isso que eu queria.
— Conversar...
— Se uma conversa adiantasse, teria feito isso antes, Samia. Quando
chegarmos à Turquia, precisamos parecer perdidamente apaixonados um
pelo outro. O filho que você espera vai ser a cereja do bolo para que meus
pais desistam do compromisso com a família da Ayla. — Ela solta uma
risada sem graça e me viro para ela. — O que foi?
— Quem diria que eu iria entrar em um casamento e meu filho seria
a peça-chave para outro casamento se desfazer.
— Não quis me expressar assim.
— Mas se expressou. Olha, Mohammed, podemos estar em
qualquer tipo de acordo, mas não vou permitir que você use meu filho como
moeda de troca ou qualquer outra coisa.
— Eu não vou fazer isso.
O carro estaciona em frente ao hotel e Samia não espera que a porta
seja aberta. Ela mesma abre e desce do carro, seguindo para o hotel. Desço
em seguida, sendo recebido por um olhar curioso do Mason.
— Aconteceu algo? — pergunta.
— Preciso ter cuidado quando me referir ao filho da Samia — digo.
— Acho melhor o senhor começar a treinar — diz.
— Treinar?
Franzo o cenho e seguimos para dentro do hotel.
— Sim, a partir de agora ele é seu filho, Mohammed. Se soltar uma
dessa na frente do seu pai, ele pode ficar desconfiado.
Assinto, ele tem razão.
— Começarei a fazer isso.
— Outra observação, senhor.
— Sim?
— Devem começar a se comportar como casal. Os dois ainda
parecem estranhos um ao outro e vamos voltar para a Turquia depois de
amanhã. Vocês precisam parecer íntimos um do outro, afinal, tem que
demonstrar que estão apaixonados.
Solto um suspiro. Acho que isso vai ser mais difícil do que eu
imaginei.
— Temos três dias para parecermos completamente apaixonados um
pelo outro.
— Exato.
— Não se preocupe quanto isso. Eu darei o meu jeito.
Mason não fala nada, apenas me segue em direção ao andar
presencial. Nesse contrato, o lado que mais pode ser prejudicado é o meu,
porém preciso de um esforço grande da parte da Samia para que tudo dê
certo.
Eu tenho três dias para que a Samia pareça estar completamente
apaixonada por mim e, definitivamente, farei isso acontecer.
Samia
A cada segundo que se passa eu me pergunto se fiz a coisa certa ao
assinar aquele contrato. Pouso a mão no meu ventre e respiro fundo. Precisa
ser a coisa certa, afinal de contas, agora eu não posso mais voltar atrás.
Uma batida na porta do quarto chama minha atenção e eu me
levanto para abrir.
— Lisa! — falo, assim que minha amiga entra com o carrinho para
servir o lanche da tarde.
— Samia, você quer me matar do coração? — ela pergunta e me
abraça.
— Desculpa, desculpa!
— Como você está? — Ela se afasta e me analisa da cabeça aos pés.
— Estou bem, eu juro!
Ela olha para o quarto e solta um assovio.
— Estou vendo, você está realmente bem. Não acredito que vai
assinar aquele acordo! — fala, enquanto anda pela sala do apartamento.
— Eu já assinei — falo e ela se vira para mim, arregalando os olhos.
— Já assinou?
— Sim, hoje na hora do almoço.
— Meu Deus!
— Só que agora to me perguntando se fiz a coisa certa.
Puxo-a para se sentar no sofá comigo.
— Não tem como voltar atrás, Samia.
— Eu sei e é por isso que isso precisa dar certo.
— Você vai se casar com um homem rico e lindo, que vai ter que
fingir estar perdidamente apaixonado por você. Tem como dar errado?
— Lisa, você não conhece a cultura da Turquia, principalmente
quando envolve casamentos. O que o Mohammed e eu estamos fazendo é
uma verdadeira afronta. Estou me preparando para ser odiada por todos ali
dentro.
— Não é possível que seja tão difícil assim!
— Vai ser e estou tentando me preparar mentalmente para isso. —
Solto um suspiro e minha amiga segura minha mão.
— O que está te deixando preocupada?
— Preciso fingir estar perdidamente apaixonada pelo Mohammed
— falo.
— Tem medo de que essa mentira se torne verdade?
— Não, não existe a menor possibilidade de eu me apaixonar pelo
Mohammed.
— Tem certeza?
— Absoluta. O que o Mohammed e eu temos é um contrato de
casamento que não envolve nenhum tipo de ligação emocional e, além do
mais, eu jamais me apaixonaria por um homem como ele.
Minha amiga apenas me analisa e assente. Sei que ela duvida do que
eu disse, mas é a verdade: eu jamais vou me apaixonar por ele de verdade.
Samia
Estou lendo um livro deitada no sofá, quando Mohammed entra de
uma vez. Me sento imediatamente e fecho o livro.
— Pensei que fosse chegar mais tarde — falo e ele me encara por
alguns segundos.
— Temos que organizar algumas coisas. Está ocupada?
Nego e me coloco de pé.
— Desde que cheguei aqui não tenho feito nada, então, estou com
mais tempo livre que o normal.
Observo ele tirar o terno e ficar apenas com o colete e a camisa
social.
— Pode ligar a televisão, por favor? Preciso projetar algumas coisas
para te mostrar.
Faço o que ele pede, Mohammed se senta na poltrona e eu volto
para o meu lugar. Ele mexe no celular e uma imagem é projetada na TV.
— Vou fazer uma apresentação simples da minha família — diz e eu
assinto. Olho para a TV e aparece a foto de um homem mais velho, um
pouco parecido com o Mohamed. — Esse é o meu pai, Osman Yilmaz.
Nosso maior problema será ele e todo o acordo que foi feito envolvendo o
casamento.
— Ele não parece ser um homem de fácil acesso — comento,
observando o rosto fechado e a expressão mais severa, um pouco parecida
com a do próprio Mohammed.
— E ele não é. Para fazê-lo acreditar que estamos apaixonados será
ainda mais difícil.
— Compreendo — falo, em um sussurro.
Ele passa para frente. Aparece a foto de uma mulher de cabelos
pretos e sorriso terno, com uma expressão mais amável, porém não deixa de
ser um pouco dura também.
— Essa é a minha mãe, Erin Yilmaz.
— Ela é linda — falo, espantada com a beleza dela.
— Ela é uma das mulheres mais lindas e incríveis que eu conheço.
— Nível de dificuldade? — O encaro.
— Ela pode ser difícil no início. Mas, se souber conquistá-la, tenho
certeza de que terá uma aliada ali dentro. — Assinto e ele passa para a
próxima foto. — Essa é a minha irmã, Eda.
— Ela puxou para a sua mãe.
— Eda tem uma beleza que é capaz de encantar a todos e uma
sabedoria invejável. De todos, a Eda é a única que apoia o fato de eu não
querer um casamento.
— Ela me aceitaria?
— Com toda a certeza! Entretanto, apesar da Eda ser uma ótima
pessoa e me apoiar em qualquer decisão, não será sensato da nossa parte
contar a ela sobre nosso contrato.
— Entendo perfeitamente.
Ele passa para a próxima foto onde uma mulher de cabelos cor mel,
olhar doce e sorriso singelo aparece.
— Essa é...
— Ayla, a noiva que meus pais me arrumaram — diz.
— Ela é linda — comento.
— Beleza não é algo que garante que um casamento será duradouro.
Ela pode ter esse olhar doce ou parecer uma pessoa fácil de lidar, mas lidar
com ela é mais difícil do que parece.
— Pelo jeito que você fala ela é o tipo de pessoa que quer se casar
com você de todo o jeito.
— Sim.
— Com certeza, não será fácil de lidar com ela — murmuro,
arqueando a sobrancelha.
— Ayla e eu já tivemos um caso.
Olho para ele, surpresa por esse fato, já que isso não é comum na
Turquia.
— Sério isso?
— Sim.
— E não quer se casar com ela?
— Samia, existe uma diferença muito grande entre se ter um caso
com uma pessoa e deixar que ela entre na sua vida dessa maneira.
— Por que teve um caso com ela se não iria se casar?
— A Ayla é uma mulher que não mede esforços para alcançar seus
objetivos, sejam eles quais forem. Ela pensou que, passando algumas noites
comigo, me faria mudar de ideia sobre cancelar o casamento.
— Ela sabe que você não quer se casar.
— Isso não é segredo para ninguém.
Ele desliga a televisão.
— Mohammed, eu tenho uma pergunta.
— Sim?
— Como pretende que as pessoas acreditem que estamos
completamente apaixonados? Somos estranhos um para o outro, você não
sabe nada sobre mim e eu não sei sobre você. Como quer que isso dê certo?
Ele me observa atentamente por alguns segundos, se coloca de pé e
caminha em minha direção. Meu coração acelera contra meu peito quando
ele se inclina em minha direção. Meu corpo inclina para trás e eu bato as
costas no encosto do sofá.
— Acho que essa vai ser a parte mais fácil de toda a história — diz,
lentamente.
Engulo em seco. Seus olhos verdes parecem que vão me engolir a
qualquer momento, minha respiração fica presa na garganta e eu sinto
minha boca secar.
— O que quer dizer com isso? — pergunto, em um sussurro.
— Você sabe muito bem como a Turquia é em relação à exposição
de sentimentos em público, então quanto a isso não teremos problema. Mas
convencer as pessoas ao nosso redor que estamos apaixonados será simples,
basta nos tratar com carinho, respeito e nos olharmos apaixonadamente.
— Acha que as pessoas vão acreditar nisso?
Ele aproxima ainda mais seu rosto do meu e eu olho para baixo, pois
olhar dentro de seus olhos por mais tempo que o normal parece ser íntimo
demais.
— Olhe para mim, Samia.
Volto a olhar dentro dos seus olhos.
— Nós podemos fazer isso. Fingir que estamos apaixonados não é o
fim do mundo.
— Nunca fingi que estava apaixonada por ninguém.
— Para tudo tem uma primeira vez, girassol.
— Girassol? — pergunto, arqueando uma sobrancelha para ele.
— Acho que será interessante te chamar por algum apelido. Afinal
de contas, parece que somos ainda mais íntimos um do outro.
Acabo sorrindo e balançando a cabeça em negação.
— Se você acha que vai dar certo, vou confiar em você, hubby.
Acho que desde que eu conheci o Mohammed essa é a primeira vez
que o vejo sorrir e devo confessar, ele tem um dos sorrisos mais lindos que
já vi na minha vida. Abaixo os olhos quando vejo que estou encarando-o
demais e ele se afasta.
— É melhor você dormir, Samia. Amanhã temos um dia cheio e
precisamos comprar algumas coisas para você.
Assinto e fico de pé.
— Você vai dormir...
— Não se preocupe comigo, durma bem.
— Você também — falo e sigo para o quarto. Fecho a porta e me
encosto na madeira, ainda sentido meu coração acelerado.
— Girassol... — repito o apelido que ele me deu e não consigo
deixar de sorrir.
Balanço a cabeça em negação e vou para o banheiro.
Um ano, Samia. Você só precisa aguentar tudo isso por um ano.
Mohammed
Nós viajaremos amanhã para Istambul, por isso hoje decidi sair com
a Samia para comprarmos algumas roupas para ela. Não vamos comprar
muita coisa, afinal, quando chegarmos lá tenho certeza de que a Eda vai
ajudá-la nesse aspecto. Mas a princípio é bom ajudá-la com algumas coisas.
Já passamos em várias lojas, compramos algumas coisas, mas ainda
precisamos comprar algumas roupas mais adequadas, ainda mais para
conviver com a minha família, que segue as tradições fortemente.
— O senhor deseja alguma coisa? Água, café?
Ergo os olhos para a mulher que vem nos atendendo desde que
chegamos e é nítido o interesse dela em mim.
— Não obrigada, estou esperando minha noiva e...
— Mohammed, o que você acha desse...
Viro o rosto em direção a voz da Samia e paro por alguns segundos.
Seus cabelos estão presos em um coque alto, feito às pressas apenas colocar
o vestido, mas que lhe caiu perfeitamente bem. Ela está usando um vestido
que tem o cumprimento abaixo do joelho, com botões em toda a sua
extensão e mangas cumpridas, além de um decote discreto.
Ela está linda.
Não que ela não fosse, mas parece que agora consigo realmente
enxergar isso.
— Mohammed? Hubby? — pisco, me atentando que ela está
falando comigo e usou o apelido que me deu na noite anterior.
Ao sairmos hoje propus a ela que tentássemos nos comportar como
um casal de verdade e ela aceitou. Afinal de contas, precisamos saber como
vamos nos comportar diante das outras pessoas.
— Gostou?
— Você está linda, girassol. — Percebo que ela fica sem graça
quando uso o apelido. Suas bochechas ficam levemente coradas e ela dá um
sorriso singelo.
— Acho que vou levar esse — diz e se vira para o espelho.
Fico de pé e caminho até ela, parando logo atrás dela.
Nossos olhos se encontram através do reflexo e ela parece me
perguntar o que eu estou fazendo. Passo os braços em volta da sua cintura e
a sinto estremecer quando a puxo delicadamente contra meu peito. Seus
olhos se arregalam por alguns instantes e ela puxa uma respiração profunda.
— Relaxe, Samia — sussurro, para que apenas ela ouça. — Esses
gestos precisam ser comuns entre nós dois.
Aos poucos sinto seu corpo relaxar e ela me lança um meio sorriso
quando consegue.
— Você está linda — repito.
— Pensei que estava dizendo isso apenas pela atuação.
— Meus elogios para você nunca serão uma atuação, Samia. Você
realmente é linda, entenda isso.
Ela assente e eu me afasto dela, virando para a atendente, que parece
ter acreditado que somos um casal. Volto para o meu lugar e pego meu
tablet, mas ainda sinto o olhar da Samia sobre mim. Sorrio de lado e
continuo respondendo meus e-mails.
Essa deve ter sido a loja em que mais compramos coisas.
— Ainda temos que passar em um lugar — falo e seguro sua mão.
Ela me encara, olhando nossas mãos entrelaçadas em seguida.
— Que lugar?
Viro-me para o Mason.
— Pode levar tudo isso para o carro. Estaremos lá em quinze
minutos.
— Pode deixar.
Saio, puxando a Samia comigo. Ela precisa correr alguns passos
para conseguir me acompanhar.
— Para onde estamos indo? — pergunta.
— Falta comprarmos algo muito importante.
Paro em frente a uma joalheira e aponto para ela. Samia me encara e
arregala os olhos.
— Está maluco, Mohammed? Não precisa de nada disso!
— Precisa! Você é minha noiva e precisamos mostrar isso.
— Estamos em um noivado falso, não tem necessidade de...
— Samia, por favor.
Ela me encara por alguns segundos, volta a encarar a joalheira e
então assente. Entramos no ambiente e sou recebido por uma mulher
elegante, que sorri ao me ver.
— Em que posso ajudá-los?
— Eu vim mais cedo e pedi para separem um anel de noivado —
digo e ela assente, sorrindo.
— Claro! Irei buscar!
Ela se afasta.
— Você já tinha vindo aqui?
— Vamos precisar disso, Samia. Por que não correr logo atrás?
— Aqui está! — A mulher me entrega uma caixinha branca. —
Espero que você goste, moça!
— Eu... eu... — Samia não consegue verbalizar a frase
corretamente, pois no mesmo instante eu abro a caixinha e revelo o anel de
noivado.
É um solitário de diamante, todo feito em ouro e com uma pedra
central bem maior, e várias outras cravejadas ao longo da peça.
— Mohammed — ela sussurra meu nome e me encara, sem
conseguir expressar o que sente ao ver o anel.
Pego o objeto da caixa e seguro sua mão esquerda, deslizando a
peça pelo dedo anelar.
— Combina com você — falo e levo sua mão até meus lábios,
depositando um beijo casto.
Samia me encara, ainda sem acreditar. Me aproximo dela e a abraço,
deixando-a ainda mais sem reação.
— O que está fazendo? — sussurra, me abraçando em seguida.
— Abraçando minha noiva — respondo. — Gostou?
Ela se afasta de mim e encara a mão, sorrindo em seguida e me
encarando.
— É perfeito! — Ela sorri para mim e sorrio de lado para ela.
Acho que agora não falta mais nada, já podemos partir para a
Turquia e começar de vez o nosso contrato.
Samia
Olho para todas as malas à minha volta e sinto meu coração apertar
dentro do meu peito. Isso realmente está acontecendo! Eu estou voltando
para o país onde nasci e pronta para me casar com um magnata dono de
uma das redes de hotéis mais famosas do mundo.
Pego minha bolsa e saio do quarto. Os funcionários do hotel ficaram
responsáveis por retirar as malas. Passo em frente ao espelho e me encaro.
É incrível como não consigo nem me reconhecer direito: a maquiagem, algo
que raramente uso, as joias delicadas, o cabelo menos rebelde.
Solto um suspiro e sigo para a sala. Mohammed está ali, mexendo
no celular e segurando uma xícara de café. Ele desvia os olhos do celular e
me encara por alguns instantes.
— Está pronta?
— Se eu disser que sim, estarei mentido — falo.
Ele se aproxima de mim.
— Eu sei que te fiz uma proposta praticamente impossível, Samia.
Mas estamos juntos nisso, independentemente de qualquer coisa. Prometo
não deixar que nada dentro da minha casa, ou algo que meus pais fizerem,
abale sua estrutura emocional.
Assinto e lhe dou um breve sorriso.
— Vamos tomar café?
— Posso pular essa refeição? Eu acordei com enjoos.
— Mas você está bem? Acha que precisa ir ao médico? Ou chamá-
lo aqui? É melhor você se sentar e...
— Mohammed! — chamo, quando ele começa a me levar para o
sofá.
— Sim?
— Está tudo bem! É normal sentir enjoos, faz parte desse primeiro
trimestre da gravidez.
— Tem certeza?
Assinto.
— Tenho, não precisa se preocupar.
— Se você sentir qualquer coisa durante o voo, tem que me falar.
— Pode deixar.
Ele me solta e olha para os lados.
— Está pronta? — pergunta, e eu assinto.
— Estou.
— Então vamos.
Sigo o Mohammed para fora do quarto e, em seguida, para o
elevador. Pego meu celular e aperto o aparelho entre as mãos. Luke e Lisa
falaram que iam até o saguão para se despedir de mim. Espero que eles
consigam.
Assim que as portas do elevador se abrem e vejo a quantidade de
pessoas ali, é como se meu corpo perdesse completamente o senso de
movimento. Mohammed nota minha hesitação e se vira em minha direção.
— Está tudo bem? — pergunta.
— Muita gente. Acho que boa parte vai me reconhecer.
— Tem algum problema nisso?
— Só boatos de que apliquei o golpe da barriga no CEO do hotel,
nada demais — falo, ironicamente.
Mohammed segura minha mão.
— Não importa o que essas pessoas falem, Samia. Durante um ano
você será minha esposa, dona de tudo isso — sussurra ele, e eu assinto.
Ele sai do elevador e me leva junto. Começo a ouvir vários
burburinhos conforme algumas pessoas vão me reconhecendo, e tenho que
fazer o possível para não abaixar a cabeça.
O novo gerente do hotel se aproxima para cumprimentar
Mohammed.
— Espero que sua estadia aqui tenha sido proveitosa, e agradeço
mais uma vez a confiança de deixar o hotel em minhas mãos.
— Tenho certeza de que o senhor fará um excelente trabalho. Ficarei
um tempo sem voltar à Nova Iorque — diz e se vira para mim. — Minha
noiva e eu precisamos ficar um tempo na Turquia para resolver assuntos
sobre o casamento.
Ele assente e se vira para mim.
— Desejo felicidades a vocês.
— Obrigada — digo em um sussurro.
Mohammed segue para fora do hotel e eu vou junto, sendo puxada
por ele, já que nossas mãos estão entrelaçadas. Mason abre a porta do carro
assim que nos vê e o Mohammed abre passagem para que eu entre primeiro.
Agradeço com um sorriso e coloco um pé dentro do carro.
— Samia!
O grito me faz parar e olhar para frente. Sorrio ao ver meus amigos
correndo em minha direção. Olho para o Mohammed e ele assente
sutilmente. Sorrio e vou ao encontro deles. Lisa me abraça assim que chega
perto de mim.
— Meu Deus! Pensei que não fosse chegar a tempo! — ela fala em
meu ouvido.
— Eu também!
Me afasto dela e abraço o Luke.
— Se cuide, Samia! E saiba que pode ligar para a gente sempre que
precisar.
Assinto e os abraço mais uma vez.
— Vou mandar meu convite de casamento — digo e eles sorriem.
— Não se preocupe com isso, dificilmente vamos conseguir ir —
Lisa diz.
— Vou sentir falta de vocês.
— Nós também, nós também.
Eles me abraçam de novo.
— Senhorita? — Mason me chama, e eu me afasto dos meus
amigos.
— Amo vocês, muito!
— Nós também — Luke diz.
— Não deixe de mandar notícias — Lisa pede, e eu assinto.
Sinto as lágrimas molharem meu rosto, e eu enxugo rapidamente.
Aceno para eles e volto para o carro, entrando e me sentando ao lado do
Mohammed, que me estende um lenço.
— Você parece gostar muito deles — fala, quando o carro começa a
andar.
— Eles são a única família que eu tenho.
Solto um suspiro e encaro a janela do carro. Está na hora de
começar uma vida completamente diferente do que eu já planejei para mim.
Mohammed
Ergo os olhos do tablet e vejo que a Samia está dormindo. Ela se
acomodou na poltrona em frente à minha e pegou no sono após tomar café
da manhã. Deixo o tablet no assento ao lado e fico de pé. Pego uma coberta
e coloco em cima dela, que se mexe um pouco, mas continua em sono
profundo.
É bom que ela descanse, são 12 horas de voo e vamos chegar
quando o dia estiver nascendo, devido ao fuso horário. Lá agora já deve ser
madrugada.
Vou até onde o Mason está sentado e me sento de frente para ela.
— Ela dormiu? — pergunta e eu assinto. — Decidiu se vai ficar na
casa dos seus pais ou alugar um apartamento?
— Acredito que alugar um apartamento será melhor. A Samia está
acostumada a ter sua privacidade, então acho que morar na casa dos meus
pais vai deixá-la menos à vontade.
— Isso é um fato.
— Além disso, será melhor para mim também. Passei tanto tempo
morando sozinho que voltar para a casa dos meus pais não é uma ideia tão
agradável. — Mason ri e volta a mexer no tablet. — Mas e você? Ansioso
para voltar para Istambul?
— Eu sei por que você está me fazendo essa pergunta — fala e
arruma os óculos no rosto.
— Obvio, não é?
— Estou voltando apenas porque trabalho para você, Mohammed.
Não precisa se preocupar com isso — explica ele.
— Não estou preocupado, sabe disso. Mas tenho certeza de que Eda
vai querer conversar com você.
— Nós dois já entendemos que não existe a possibilidade de termos
um relacionamento, Mohammed, e por mais que a Eda queira ser livre,
viver da maneira que quer e fazer as próprias escolhas, ela jamais iria contra
os pais.
— Você subestima muito a minha irmã.
— Eu apenas aprendi que alguns amores são feitos apenas para
serem sentidos e jamais vividos, só isso. Eu sou apenas seu secretário, e por
mais que eu tenha o respeito dos seus pais, eles jamais apoiariam um
relacionamento entre a gente.
Não falo nada, porque sei exatamente o que ele quer dizer. Assim
como eu, Eda tem um casamento por contrato à vista, mas ela nunca quis
saber disso, porque ela é apaixonada pelo Mason desde que o conheceu,
mas nossos pais nunca apoiariam essa decisão, primeiro porque uma união
como essa não traria nenhum benefício para nossa família.
O que eu vou fazer, levando a Samia comigo, já é uma afronta
grande, afinal de contas, meus pais não sabem o que está acontecendo. O
fator surpresa é sempre a melhor jogada com eles.
— É melhor descansar, Mohammed — Mason diz, ficando de pé. —
Quando pousarmos em Istambul, vai sentir falta do silêncio.
Ele bate no meu ombro e se afasta, me deixando sozinho. Ele tem
razão, assim que esse avião pousar, a última coisa que terei será paz e
silêncio, porque eu vou chegar revolucionando tudo dentro da família
Yilmaz.
Samia
Foram 12 horas de vôo. Quando eu era pequena, não me lembrava
da trajetória que fizemos para sair da Turquia e ir para Nova Iorque, mas
imagino que deva ter sido mil vezes mais cansativo. Afinal de contas, meus
pais não tiveram um jatinho particular que atendesse todas as necessidades
deles, como eu estou tendo.
Termino de retocar a maquiagem e me encaro no espelho. Pelo
menos eu consegui dormir e não estou com olheiras. Guardo minhas coisas
na nécessaire e saio do banheiro.
Assim que me sento na minha poltrona, Mohammed aparece na
minha frente e me entrega uma xícara com chá.
— Conseguiu dormir? — pergunta ele, e eu assinto, provando do
chá logo em seguida.
— Sim, pensei que não fosse conseguir. Acho que a gravidez
contribuiu para isso. Estou sentindo mais sono que o normal.
— Nós estamos chegando — avisa ele, e eu assinto, virando meu
rosto para a janela do avião, vendo o sol nascer.
— Uau!
Deixo a poltrona que estou sentada para me sentar perto da janela e
contemplo um dos espetáculos mais lindos que a natureza pode me
oferecer: o nascer do sol.
— É uma cena linda, não é?
— Perfeita. Se eu pudesse, eu pintaria esse momento à mão, só para
deixar registrado.
— Senhor, nós vamos pousar em dez minutos. — Olho para uma
das comissárias, e Mohammed assente e se vira para mim.
— Está chegando a hora — diz e eu concordo. Volto para o meu
lugar e respiro fundo. — Nervosa?
— Só vou conhecer a sua família e há 99% de chance de que ela me
odeie, então sim.
— Não se preocupe com isso, nós vamos contornar essa situação —
diz e eu assinto.
Atenção, senhores passageiros, aqui é o piloto e informo que em dez
minutos pousaremos na base particular da família Yilmaz. Apertem o cinto
de segurança e obrigado pela viagem.
Fecho o cinto de segurança, e Mohammed faz o mesmo. Devo dizer
que é incrível como Mohammed tenta me passar confiança, mas não dá para
negar que o frio que sinto em minha barriga começa a aumentar
exponencialmente conforme o avião começa a pousar.
O jatinho pousa e eu engulo em seco. Mohammed rapidamente fica
de pé e eu tiro o cinto, levantando-me também. No entanto, sinto minhas
pernas fraquejarem e perco as forças, mas rapidamente ele me segura pela
cintura.
— Está bem? — pergunta ele, ajudando-me a sentar novamente.
— Nervosa, acho que é isso — respondo.
Ele se abaixa na minha frente e me encara.
— Eu estou com você, Samia. Pode se apoiar em mim.
Confirmo com um aceno de cabeça e ele fica de pé, estendendo a
mão para mim. Mesmo incerta, eu coloco a minha sobre a dele. Fico de pé e
ele passa um braço sobre minha cintura, ajudando-me a caminhar até a
porta.
Minhas pernas ainda estão tremendo, mas me apoiar nele me ajuda a
criar mais confiança.
Mason está na porta e acena com a cabeça para nós dois. Assim que
chegamos à porta somos recebidos pelo vento e o frio no rosto. Vejo vários
carros parados próximos e um homem saindo de um deles. Ele está vestido
perfeitamente e usando óculos de sol. Presumo que seja o pai do
Mohammed.
— Seu pai? — pergunto enquanto descemos as escadas.
— Sim, eu disse que não precisava que ele viesse me buscar, mas
pelo jeito continuo não sendo ouvido — sussurra.
Terminamos de descer as escadas e paramos. Eu espero que o
Mohammed me solte, mas isso não acontece. Sua mão continua firme em
minha cintura, me deixando colada com ele.
— Mohammed.
A voz profunda do homem à minha frente me gera um pouco de
medo e, involuntariamente, eu me aproximo mais do Mohammed, que sente
e aperta minha cintura.
— Pai — ele responde, em inglês.
Apesar do senhor estar de óculos escuros, consigo sentir seu olhar
sobre mim, me analisando e se perguntando quem sou eu.
— Posso saber o que isso significa? — Ele tira os óculos e me
encara diretamente.
Acho que durante toda a minha vida, nunca senti um olhar de
desprezo sobre mim igual a esse homem me olha.
— Pai, essa é a Samia, minha noiva — Mohammed diz.
— Noiva? — Ele continua me encarando e dá um passo em minha
direção, mas Mohammed entra na minha frente, me deixando atrás dele.
— Noiva e futura esposa.
O homem ri, sem achar graça nenhuma.
— Acha que tenho cara de palhaço, Mohammed? Ou que sou
alguma criança que não conhece seus truques para fugir das suas
responsabilidades? Acha que vou acreditar nessa farsa?
— Se o senhor acredita ou não, não me interessa. Estou apenas lhe
comunicando que a Samia é a noiva que eu escolhi, a mulher com quem
vou me casar e passar o resto da minha vida, o senhor queira ou não.
Mohammed segura minha mão e começa e me puxar para sairmos
dali.
— Você tem um compromisso com a família da Ayla! — Ouço seu
pai gritar.
— Não, pai, o senhor tem um compromisso com a família da Ayla.
Eu já deixei bem claro que nunca vou me casar com ela. Se quer tanto esse
casamento, case-se o senhor mesmo!
Chegamos no carro e Mohammed abre a porta e eu entro, sendo
seguida por ele.
O motorista nos cumprimenta em turco e Mohammed dá um
comando. Não consigo entender de primeira, afinal ainda estou meio
travada, mas decido não perguntar o que ele disse.
— O pior já foi? — pergunto e olho para Mohammed. Sua
expressão está fechada e sei que não gostou nada de ter sido recepcionado
pelo pai.
— Tudo isso foi apenas o começo, Samia. Ainda tem muita coisa
para acontecer.
**
O carro para em frente a um hotel luxuoso e eu abro a janela para
conseguir vê-lo melhor. Se eu achava o hotel em Nova Iorque lindo, esse
parece ter sido feito para reis se hospedarem.
— Nós íamos ficar na casa dos meus pais — Mohammed diz e me
viro em sua direção —, mas acho que não vai dar certo. Por causa disso,
vamos ficar hospedados nesse hotel por alguns dias, até eu conseguir
resolver o problema do apartamento.
— Vamos para um apartamento?
— Achei que seria bom para você, para termos privacidade e para
meus pais não ficarem em cima de você quando eu não estiver presente —
diz.
Assinto e olho para o hotel. A porta do carro é aberta e eu desço,
seguida do Mohammed. Ele agradece ao motorista e mais uma vez eu
demoro um tempo para entender o que ele disse.
— Estou mais enferrujada no turco do que eu imaginava —
comento, enquanto seguimos para a entrada do hotel.
— Não se preocupe, logo você pega a prática novamente.
Entramos no saguão e uma mulher imediatamente vem conversar
conosco.
— Queremos uma suíte para casal — Mohammed diz, em inglês.
— Senhor Yilmaz, por que não avisou que viria antes? Teríamos
preparado a melhor acomodação para vocês — diz.
— Decidi de última hora, mas não se preocupe, vamos ficar apenas
alguns dias — diz.
— Certo! — Ela se vira para mim. — Que mulher encantadora!
— Obrigada — respondo, sem graça.
— Quero que a trate muito bem — Mohammed diz. — Essa é a
minha noiva, Samia.
A mulher arregala os olhos e assente, perplexa.
— Sem sombra de dúvidas, senhor! Por favor, me acompanhe.
O quarto que ficamos se assemelha muito à suíte presidencial no
hotel de Nova Iorque e me pergunto como seria a suíte presidencial daqui.
— Podem ficar à vontade, se precisarem de algo basta telefonar —
diz, sendo bastante simpática.
— Pode mandar servir o café da manhã no quarto, por favor? —
Ouço Mohammed pedir, mas não ouço a resposta da mulher, pois estou
encantada com a decoração daqui.
Mais uma vez o local parece um apartamento, de tão grande. Tem a
sala principal, a varanda e o quarto separado. Caminho até a varanda e
sorrio ao ver a cidade daqui de cima. É um dos cenários mais lindos que já
vi.
— Gostou? — Levo um susto com a voz do Mohammed, mas
apenas assinto.
— Amei, é lindo.
— Peço desculpas pelo meu pai — diz e em seguida me viro para
ele.
— Foi uma surpresa para ele.
— Por ter sido uma surpresa, ele agiu daquela forma e foi brando.
Ele pode achar que vai ser uma brincadeira no início, mas precisamos
mostrar para ele o quanto estamos apaixonados. Ele precisa acreditar nesse
relacionamento.
— Será que assim ele vai te deixar em paz?
— Sempre tem a opção de nos casarmos escondidos também — diz,
em tom de brincadeira, e eu arregalo os olhos.
— Você não teria coragem — digo, e ele sorri de lado, negando.
— Apesar de não querer um laço conjugal forçado, quero a presença
dos meus pais no meu casamento. Mas se isso não acontecer, a
possibilidade de chegarmos casados será analisada.
Assinto e encaro novamente o céu, respirando fundo.
— Mohammed? — chamo, sem tirar o olho do céu.
— Sim?
— Estamos juntos nessa. Vou fazer de tudo para que seus pais
acreditem que estamos completamente apaixonados — falo.
— Obrigado, Samia. Vou usar o banheiro. Fique de olho na porta,
nosso café da manhã deve estar chegando.
— Claro.
Ele me deixa sozinha e eu tento controlar a velocidade do meu
coração, pois sinto que fazer a família Yilmaz acreditar nesse teatro será
mais difícil do que imaginamos.
Mohammed
Deixei a Samia descansar e fui me encontrar com o Mason no
restaurante do hotel.
— Pensei que fosse descansar — comenta assim que me sento.
— Acha mesmo que vou conseguir descansar agora com uma
bomba prestes a explodir na minha cabeça?
— Acredito que não — fala. — O que pretende fazer?
— Recebi uma mensagem da minha mãe me intimando a
comparecer na mansão.
— Vai levar a Samia?
— Não, irei sozinho primeiro. Eles devem estar furiosos com tudo
que está acontecendo.
— Quer acalmá-los primeiro?
— Exato — Solto um suspiro. — Eu tenho plena consciência de vai
ser difícil fazer meus pais aceitar a Samia, mas também tenho certeza de
que quando a aceitarem, eles vão adorá-la.
— E com toda a certeza eles vão ficar putos da vida quando vocês
se divorciarem — diz e sorri de lado.
— Que tal nos preocuparmos com uma coisa de cada vez? —
Arqueio uma sobrancelha e ele ergue as mãos em sinal de rendição. — Mas
e você?
— O que tem eu? — pergunta.
— Pronto para reencontrar a Eda? — Mason sorri de lado.
— Você adora cutucar a ferida, não é?
— Foi você quem começou — digo.
— Não se preocupe quanto isso. Irei fingir que nem conheço a sua
irmã.
Assinto, mas sei que não é verdade. É impossível você agir de uma
maneira imparcial com alguém com que se tem um vínculo emocional.
Meu celular vibra em cima da mesa e eu pego aparelho ao ver uma
mensagem da Eda. Como dizem por aí, quem é vivo sempre aparece.
— Acho bom você estar certo do que disse — falo enquanto digito a
resposta para a pergunta da minha irmã.
— Por quê?
Bloqueio a tela e olho em direção à entrada do restaurante. Sorrio de
lado ao ver minha irmã me procurando no restaurante. Ergo a mão e ela
rapidamente me vê, vindo em nossa direção.
— Porque ela está vindo em nossa direção — respondo.
Mason se vira nesse mesmo instante e Eda paralisa ao vê-lo, mas
isso dura apenas alguns segundos, pois ela se recompõe e termina o
caminho até nós.
— Mohammed!
Me levanto para abraçá-la.
— Eda!
Seus braços me envolvem e a sensação que tenho quando a abraço é
de finalmente estar em casa. Meus laços com a Eda sempre foram
profundos e verdadeiros. Me preocupo verdadeiramente com ela e com seu
bem-estar.
— Que saudade que estava de você, Mohammed! Meu Deus! — diz
ela e me aperta.
— Eu também, Eda, eu também!
Me afasto dela e lhe dou um beijo na testa.
— Venha, sente-se conosco — digo, afastando a cadeira para que ela
se sente.
— Mason — diz, cumprimentando meu secretário.
— Eda, como vai?
— Vou bem. — Ela sorri, sem muita vontade, e volta a me encarar.
— Que história é essa de você ter uma noiva?
— É uma longa história — falo.
— Que maravilha, eu tenho tempo de sobra.
— A conheci em Nova Iorque, e por incrível que pareça, ela nasceu
aqui na Turquia — digo.
— Sério, que mundo pequeno! E como ela é?
— Como?
— Sim! Ela é bonita?
Como posso descrever a Samia agora?
— Ela é linda — falo e acabo sorrindo. — Os olhos dela são bem
expressivos e quando ela sorri parece conseguir iluminar todo o ambiente.
Ela é inteligente e ama ler.
Minha irmã sorri.
— Você deve estar realmente apaixonado, porque para passar por
cima do acordo de casamento que nossos pais fizeram com a família da
Ayla, tem que estar perdidamente apaixonado.
— Sim, e tem mais uma coisa, Eda — falo, pronto para fazer a
revelação bombástica.
— O que?
— Ela está grávida — revelo, e minha irmã arregala os olhos.
— Está falando sério?
— Sim, eu vou ser pai.
— Meu Deus! Uau! Eu não sei nem o que dizer! Meu Deus,
Mohammed, isso muda completamente o curso das coisas!
— Eu sei, é por isso que a trouxe comigo. Além disso, eu não
conseguiria deixá-la, muito menos me casar com outra mulher, sendo que
meu coração pertence a Samia.
— Você está realmente disposto a enfrentar a fúria do todo-poderoso
Osman Yilmaz para se ficar com ela?
— Eda, pela Samia, eu sou capaz de enfrentar o mundo inteiro, se
precisar.
Minha irmã assente e sorri.
— Fico feliz que você tenha encontrado alguém que mereça o seu
amor, Mohammed. Alguém por quem você vai lutar para ter ao lado,
independente das circunstâncias. Ela é uma mulher de sorte.
Fico calado, pois a indireta foi bem certeira para o meu secretário,
que apenas abaixa a cabeça e começa a mexer no celular.
— Você vai encontrar alguém assim, Eda — falo e seguro sua mão
por cima da mesa.
— Na verdade, já me confirmei com meu destino. Estou pronta para
me casar com quem meus pais mandarem e viver sendo a esposa que todo o
marido sonha.
— Eda...
— Quando vou poder conhecê-la? — Me interrompe.
— Ela está descansando. Acredito que possamos dar um tempo para
ela se adaptar e aí você pode conhecê-la.
— Mal posso esperar!
Ergo o pulso e confiro a hora.
— Quer companhia até em casa? Acho que nossos pais querem me
ver — falo e ela assente.
— Estou prestes a assistir a terceira guerra mundial, mas saiba que
estou do seu lado, maninho. Isso vai dar certo!
— Não existe a opção de dar errado, Eda — digo e me coloco de pé.
— Vamos?
Minha irmã assente, Mason fica de pé e nós três deixamos o
restaurante. Está na hora de lidar com meus pais.
**
Chamar de mansão a casa que meus pais moram é completamente
errado. O local parece um verdadeiro palácio. O motorista estaciona o carro
em frente à entrada principal.
— Pronto? — Eda pergunta.
— Nem um pouco, mas preciso enfrentar isso — falo e abro a porta
do carro, sendo seguido por ela.
Eda para ao meu lado e nós dois subimos a escadaria. Assim que
terminamos os degraus vejo minha mãe na porta.
— Mohammed! — diz, vindo me abraçar.
— Mãe!
Abraço a mulher pequena e a aperto.
— Que saudade, querido. Meu Deus! — Ela se afasta e segura meu
rosto. — Você parece mais magro, tem se alimentado direito?
— É impressão sua mãe. Estou comendo bem sim!
— Meu Deus, nem acredito que você finalmente está em casa!
— Estou.
Ela me encara e aperta os lábios por alguns segundos.
— Seu pai quer conversar com você.
— Eu imagino.
— Querido, peço que reconsidere sua decisão. Você sabe como o
casamento com a Ayla trará benefícios e...
— Mãe, minha decisão já está tomada. Eu sei que você está do lado
do meu pai, mas dessa vez eu não posso fazer o que vocês querem.
— Não pode ter se apaixonado tão rapidamente.
— Não foi rápido, mãe. — Seguro sua mão e beijo o dorso. — Só
quero que entenda que eu não vou voltar atrás e meu pai pode fazer
qualquer tipo de ameaça, mas não vai surtir efeito.
— Mohammed...
Solto sua mãe e sigo em direção a entrada. A porta principal leva
para a primeira sala e logo vejo meu pai, sentado em uma poltrona tomando
um copo de alguma bebida alcoólica logo pela manhã.
— Pai.
— Mohammed. — Ele se coloca de pé e dá dois passos em minha
direção. — Posso saber que história é essa de noiva? — diz, sério.
— Exatamente o que o senhor ouviu mais cedo: a Samia é minha
futura esposa.
— Você tem um acordo de casamento com a Ayla.
— Não, o senhor tem acordo de casamento com a Ayla. Eu nunca
quis me casar com ela e o senhor sabe muito bem de disso.
— Aqui não importa o que você quer ou não, Mohammed. Importa
o que é bom para a família.
— E o que bom para mim não conta? Eu não tenho direito de me
casar com a mulher que eu amo por causa de um acordo que o senhor fez
quando eu tinha menos de cinco anos de idade?
— Você precisa pensar na sua família em primeiro lugar!
— Eu estou pensando na minha família — falo, dando um passo em
sua direção. — A família que eu quero construir, com a mulher que eu
escolhi para a minha vida, com a mãe dos meus filhos.
— Passou três meses fora e acha que está no direito de decidir sua
própria vida?
— Não só posso, como eu estou fazendo isso.
— Mande aquela mulher de volta para Nova Iorque, case-se com a
Ayla e as coisas não precisam chegar ao limite — ameaça.
— Eu não vou mandar a Samia embora. Eu vou me casar com ela e
você não pode me impedir.
— Mohammed, não teste minha paciência. Você não sabe do que eu
sou capaz.
— E nem o senhor sabe do que eu sou capaz para mantê-la em
minha vida, então pense duas vezes antes de atacar quem eu amo. Passar
bem.
Me viro e dou dois passos em direção a porta, mas sua voz me faz
parar.
— Mohammed, essa conversa está longe de estar acabada.
— É o que veremos — respondo, sem me virar para ele.
Passo pela minha mãe e irmã, que me encaram, boquiabertas. Deixo
a casa dos meus pais e desço as escadas rapidamente, já entrando no carro.
— Como foi? — Mason pergunta e o carro começa a se
movimentar.
— Péssimo, ele não vai aceitar tão facilmente a Samia.
— Mas já sabíamos disso.
— Sim, quero que contrate um segurança para ela. Ela não precisa
ficar sabendo disso.
— Pode deixar, senhor. — Ele fica em silêncio por alguns segundos.
— O que pretende fazer agora?
— Vamos seguir o plano — digo. — Eles precisam continuar
achando que sou perdidamente apaixonado pela Samia e que nunca vou
abrir mão dela.
— Certo.
— Mason?
— Sim, senhor?
— Pode procurar um apartamento a Samia e eu morarmos. Não vai
ser bom para o bebê ficar nesse ambiente.
— Pode deixar, senhor. Já estou correndo atrás disso.
Assinto e olho para a janela do carro. Meu pai não faz ameaças à toa
e eu não posso permitir que ele machuque a Samia ou o bebê que ela está
esperando.
Mohammed
Abro a porta do quarto e vejo Samia se levantar imediatamente,
vindo em minha direção.
— Como foi?
— Pensei que estaria descansando — falo e ela solta um suspiro.
— Não consegui, fiquei preocupada com o que o seu pai poderia
fazer ou dizer.
— Meu pai não vai fazer nada, Samia, não se preocupe.
— E agora? O que vai acontecer? — pergunta, me encarando.
— Nós vamos dar entrada na papelada do casamento, vamos marcar
uma data o mais rápido possível e vamos nos casar.
— Mohammed, seus pais vão fazer o impossível para impedir esse
casamento.
— Eles podem mover céus e terra, mas não vão conseguir impedir o
casamento de acontecer. Não se preocupe.
Ela me encara e solta um suspiro, assentindo.
— Descansou? — pergunto e ela assente, se sentando no sofá em
seguida.
— Na verdade, como dormi muito no avião, não consegui dormir
novamente, mas não estou cansada. Acho que a euforia por estar em
Istambul está me deixando elétrica.
A encaro e assinto, então verifico o pulso e, como não tenho nada
programado para hoje, uma ideia passa pela minha cabeça.
— Venha comigo — falo.
— Ir com você? Para onde? — pergunta.
— Você vai conhecer Istambul com o melhor guia que existe.
— Quem?
— Eu.
Ela acaba sorrindo e sorrio junto com ela.
— Ok, senhor. Vamos lá, então.
Ela se levanta e se aproxima de mim, inconscientemente já seguro
sua mão e entrelaço nossos dedos. Seguimos para fora do quarto, em
direção ao elevador.
Paramos no térreo e seguimos para a recepção. Uma mulher me
cumprimenta em turco e eu peço a ela um carro particular.
— O que você pediu? — Samia pergunta, enquanto a seguimos.
— Um carro — sussurro.
— Mas onde está o Mason?
— Cuidando de um assunto para mim, ele deve voltar mais tarde.
— Ah sim, entendi.
A mulher nos deixa a um estacionamento de carros e me entrega
uma chave. Agradeço e seguimos para o veículo, paro ao lado da porta do
passageiro e eu abro para a Samia.
— Vai dirigir?
— Por que a surpresa? Pensou que eu não dirigisse?
— Não é isso, é que... — Ela pisca algumas vezes. — Na verdade,
pensei sim.
— Quando estou em outros países, prefiro ter um motorista ao meu
serviço, pois ele conhece todos os locais melhor que eu. Aqui em Istambul
também, mas eu conheço essa cidade como a palma da minha mão. Dirigir
aqui é como andar dentro de casa de olhos fechados.
Ela sorri e assente. Aponto para o banco do passageiro e ela entra.
Fecho a porta, dou a volta e entro também. Ajeito todos os acessórios do
carro e dou a partida.
— Está pronta para conhecer um pouco de Istambul?
— Mais do que pronta — fala.
— Então vamos.
Deixo a garagem do hotel e seguimos para as movimentadas ruas de
Istambul.
Samia
O primeiro local que paramos é a Mesquita Azul. Pelo que li sobre
ela, é uma das principais mesquitas de Istambul. E devo dizer que é muito
mais linda pessoalmente do que por fotos. Parece que a câmera não
consegue registrar com precisão as cores que ela tem. São muito mais
vívidas e brilhantes pessoalmente.
— Esse é a Mesquita Azul — diz Mohammed, parando ao meu lado
após trancar o carro.
— Eu li sobre ela, é incrivelmente linda — sussurro, sem conseguir
tirar os olhos dela.
— Sim, por dentro é mais linda ainda.
— Podemos entrar?
— Claro que podemos, mas você precisa de um... — Ele para de
falar quando me vê abrindo a bolsa e tirando um lenço de dentro.
— Acho que conheço um pouco da minha própria cultura, mesmo
que eu não a siga precisamente.
Coloco o lenço na cabeça e Mohammed se aproxima para me ajudar.
Quando todos os meus cabelos já estão dentro do tecido, dou um meio
sorriso para ele, que segura minha mão e me direciona para dentro do
templo.
A sensação que sinto ao entrar nesse local é indescritível. A beleza
dentro dela não se compara ao que vemos de fora. O ambiente parece
transmitir uma paz e eu sinto como se pudesse ficar horas aqui, sem me
lembrar dos meus problemas ou de qualquer outra coisa.
Paz descreve bem o que estou sentindo nesse momento.
Conforme vamos andando, vejo várias pessoas ajoelhadas no chão,
agradecendo a Allah[1]. Após minha família se estabelecer em Nova Iorque,
acabamos nos convertendo ao catolicismo e confesso que ver as pessoas
dessa maneira me fez ter saudades de quando eu era criança, antes de sair
do meu país, quando ia às mesquitas prestar culto a Allah.
— Está tudo bem? — Mohammed pergunta, e eu assinto.
— Só estou sentindo nostalgia por estar aqui. Passei anos sem pisar
em uma mesquita e não tenho muitas lembranças da minha infância.
— Pode vir aqui a qualquer hora. Basta pedir ao motorista.
— Que motorista? — pergunto, e ele sorri.
— Vou deixar um motorista à sua disposição sempre que quiser sair.
— O quê? Não precisa, Mohammed. Eu posso me virar, não precisa
gastar seu dinheiro para isso e...
— Isso já está feito, Samia. Não vou voltar atrás.
— Isso é um exagero!
— Nada relacionado à sua segurança é um exagero — diz ele, e eu
não consigo encontrar algum outro argumento para convencê-lo a desistir
dessa ideia absurda.
Solto um suspiro, e ele segura minha mão.
— Vem, quero te mostrar um lugar.
O sigo sem falar nada.
Consigo perceber que ele parece mais leve agora. É como se estar
aqui, dirigindo e não apenas preso ao trabalho, o deixasse completamente
normal. É como se ele se esquecesse por alguns momentos de que é um dos
homens mais ricos da cidade e fosse apenas uma pessoa comum.
— Vamos andar uns dez minutos, tem problema?
— Nenhum. Eu gosto de andar, e a médica disse que é bom para o
bebê.
— Ótimo!
Deixamos a Mesquita Azul e andamos um pouco mais de cinco
minutos, parando ao lado de outra Mesquita.
— Apesar da Mesquita Azul ser a principal hoje em dia, essa já foi a
principal e é a minha favorita — diz ele.
— Mesquita Sofia. Ela que foi construída como mesquita anos atrás
e depois virou um museu, mas agora se tornou uma mesquita novamente?
— Exatamente!
Mohammed continua segurando minha mão e me guia para dentro
do local, começamos a nos dirigir para o lado oposto de onde os turistas
estão.
— Para onde nós estamos indo? — pergunto.
— Logo você vai descobrir.
Conforme vamos andando, começamos a ficar sozinhos nos grandes
corredores da mesquita.
— Mohammed, se alguém nos descobrir aqui...
— Calma, ninguém vai nos ver.
Paramos no meio do corredor, perto de um quadro de um dos sultões
do passado, que não consegui identificar. Dou um pulo de susto ao ouvir a
parede começar a se mover. Mohammed sorri e, assim que a parede termina
de se mover, vejo uma escada.
— Como...? — O encaro e ele sorri de lado para mim.
— Vamos descer.
Ele segura minha mão e começamos a descer as escadas.
— Quando eu era criança, eu adorava vir aqui. Era meu lugar
favorito para pensar e ficar sozinho.
— Como descobriu esse lugar?
— Acabei descobrindo por acaso, mas um dos seguranças acabou
me encontrando, porém ele não brigou comigo. Na verdade, ele gostava de
me deixar vir aqui todas as vezes que estava com a cabeça cheia.
Assim que terminamos de descer as escadas e eu vejo o local, acabo
sorrindo. É como uma sala secreta. Tem um sofá, uma adega e várias outras
coisas.
— O que é exatamente essa sala? — pergunto, me soltando dele e
indo explorar o local.
— Acredito que seja alguma sala para se proteger de ataques ou de
terremotos, mas essas salas secretas são extremamente normais em
construções antigas.
— Verdade. O que aconteceu com o segurança que deixou você
ficar aqui? — pergunto.
— Ele faleceu há dois anos.
— Meus sentimentos.
— Ele foi um bom amigo e sempre me disse que eu deveria me
impor mais contra a minha família, porque dessa forma eu seria respeitado e
minhas decisões seriam acatadas.
— Vocês devem ter sido grandes amigos — comento e ele assente.
— Ele foi.
— Amei esse lugar.
— Quero que preste muita atenção em como abrir e em como
chegar aqui — falo.
— Por quê?
— Se em algum momento você precisar se esconder e eu não estiver
por perto, deve vir para cá imediatamente. É o único local que eu sei que
estará segura — afirma.
Analiso a sua expressão e sinto um arrepio percorrer a minha
coluna.
— Tem medo de que algo aconteça comigo? — pergunto.
— Gosto de ser um homem prevenido, Samia. Apenas guarde tudo
que eu te disse. Se em algum momento você se sentir ameaçada, venha para
cá e eu irei te encontrar em seguida. Será o primeiro lugar aonde vou te
procurar.
Assinto e me aproximo dele, pegando-o de surpresa ao segurar sua
mão.
— Não se preocupe, não vai acontecer nada comigo.
— Eu espero que não. — Ele solta minha mão e respira fundo. —
Está com fome? Podemos comer fora do restaurante hoje.
Assinto, sorrindo.
— Estou faminta — falo e ele sorri.
— Então vamos almoçar.
**
Passamos o restante da tarde fora também. Mohammed me levou a
um dos melhores restaurantes daqui e depois fomos a alguns parques.
Fiquei encantada com o cuidado e aconchego de tudo aqui.
Voltamos para o hotel no fim da tarde, com o sol já se pondo.
— Mohammed? — chamo, mas não o encaro. Continuo com meus
olhos fixos na janela do carro.
— Sim?
— Sempre vi nos programas de televisão aqueles passeios de balão.
Isso acontece aqui?
— Acontece em Capadócia. A região é bem conhecida por isso.
— Acho lindo — comento, perdida em pensamentos.
— Gostaria de conhecer? — pergunta.
— Não! Não precisa se dar ao trabalho.
— Não é trabalho.
— Mohammed, sério, apenas pensei alto, ok?
Ele fica calado e dou a conversa por finalizada. O restante do
caminho é feito em silencio. Mohammed para o carro em frente ao hotel e
eu desço, sem esperar por ele, mas logo o sinto atrás de mim.
— Apenas fiz uma pergunta, não precisa ficar magoada.
— Do jeito que você parece ser, se eu dissesse que gostaria de
conhecer, você alteraria tudo e me levaria lá imediatamente! — digo e paro
de andar, me virando para ele.
Mohammed me analisa por alguns segundos.
— Eu não faria isso — diz e eu assinto, sentindo meu coração bater
forte contra meu peito.
— Mohammed Yilmaz, finalmente você chegou!
Olho para trás e vejo uma mulher de cabelos escuros e sorrio
cativante se aproximar de nós. Ela parece ignorar completamente o irmão,
pois quando me vê, abre um dos sorrisos mais lindos que já vi.
— Você deve ser a Samia. Meu Deus, você é completamente linda!
— diz ao se aproximar de mim e me dar um abraço, me pegando
completamente de surpresa.
Pela recepção, acredito que seja a Eda, a irmã mais nova do
Mohammed.
Ela se afasta de mim e sorri.
— Eu...
— Mohammed, devo dizer que estou impressionada, sua noiva é
mais linda do que eu imaginei!
Me viro para o Mohammed, que parece ter sido pego de surpresa
pela aparição da irmã.
— Agora entendi por que quer se casar com ela o mais rápido
possível! — ela continua, sem deixar que nenhum de nós dois falemos algo.
— Consigo perceber que estão apaixonados de longe!
Samia
A personalidade de Eda e Mohammed são completamente opostas.
Enquanto ele é reservado, sério e raramente sorri, ela é sorridente, falante e
inquieta.
— Eda, você vai assustar a Samia desse jeito — ele diz quando ela
não para de falar por um instante sequer.
A mulher de cabelos lisos e olhar marcante me encara, assustada.
— Estou falando demais para um primeiro encontro, não é? —
pergunta, em um tom de desculpas.
— Não, apenas estou vendo a diferença entre você e o Mohammed.
Ela sorri.
— Todos fazem isso. Sinto muito se isso te assustou.
— De maneira nenhuma.
— O que acham de continuar essa conversa em um jantar? Gostaria
de comer conosco, Eda? — convida Mohammed.
— Eu adoraria! Se você não se importar, Samia, é claro!
— Não me importo, vai ser bom ter companhia para o jantar.
— Então vamos? — questiona meu noivo, e eu assinto, junto com a
Eda, que parece estar mais animada do que o normal.
Confesso que me sinto muito mais a vontade agora que a Eda está
conosco. Eu realmente preciso me acostumar a ficar sozinha com o
Mohammed sem me sentir desconfortável, apesar de que hoje à tarde foi
muito tranquilo. Até me surpreendi com tudo que aconteceu, pois não
imagino que ele faça o tipo guia turístico ou que se preocupe com alguém.
Não parece fazer parte da personalidade dele.
Chegamos ao quarto e Mohammed tira o sobretudo, e eu faço o
mesmo, deixando em cima do cabideiro.
— Vou tomar um banho e deixar vocês duas conversando um pouco
— diz, e eu arregalo os olhos para ele.
Como eu vou conseguir lidar sozinha com a irmã dele?
Ele nota minha hesitação e aproxima a boca da minha orelha.
— Relaxe, girassol, não é o fim do mundo.
— Como...
— Não se preocupe, você vai se sair bem — diz e se afasta, nos
deixando sozinhas.
Quando some do meu campo de visão, me viro lentamente para a
Eda, que não consegue parar de sorrir.
— Estou tão feliz por estar conhecendo você — diz e se aproxima
de mim, segurando minhas mãos em seguida.
— Está? — Não consigo esconder o espanto em minha voz, e ela
sorri mais ainda.
— Claro! Eu nunca imaginei que o Mohammed se apaixonaria
enquanto estivesse fora. Foi uma surpresa para todos.
— Para mim também — sussurro, ainda perdida.
— Sei que está nervosa. Toda essa coisa de conhecer a família do
noivo deve estar te deixando apavorada!
— Sei que não vão me aceitar facilmente — confesso.
— Isso é com meus pais, mas eu sempre torci pela felicidade do
Mohammed. Queria que ele encontrasse uma mulher que valesse a pena e
que o fizesse entender o que era amar de verdade.
— Mohammed me contou que você seria mais tranquila.
— Digamos que eu tenha um sensor... — Ela me puxa para nos
sentarmos no sofá. — Sei na hora quando as pessoas são boas ou não.
Quando bati o olho em você ali embaixo, soube que você é uma pessoa que
tem um bom coração.
— Obrigada. — Sorrio para ela. — Você é bem diferente do seu
irmão.
— Sempre tem alguém na família com um parafuso a menos, essa
sou eu. Mohammed ficou com toda a seriedade e comprometimento, eu
fiquei com a diversão.
— Estou percebendo.
— Eu queria te conhecer antes da minha família inteira, apesar do
meu pai já ter te visto. Mas queria conversar com você antes, para te
entender melhor. Quero que saiba que tem uma aliada dentro dessa família.
O Mohammed deve ter explicado que não será fácil para nossos pais
aceitarem esse casamento, principalmente pela Ayla.
— Ele me contou tudo isso.
— Pois é, mas se você realmente amar o meu irmão e estiver
disposta a enfrentar tudo por ele, eu sei que vocês vão conseguir vencer
todos.
— Às vezes eu imagino que vai ser mais difícil do que vocês dizem.
— Talvez não, você precisa cativar as pessoas. Se conseguir fazer
isso com todos, será muito mais fácil. Mas devo dizer que cativar o meu pai
não será simples. Não estou dizendo que será impossível. Tudo depende da
forma que você vai se comportar.
— Entendo... — Solto um suspiro. — Se esse é o preço para entrar
na família, então, eu pagarei.
— Eu tenho fé que você vai conseguir!
— Já pediram algo para o jantar?
Me viro para trás e perco o ar por alguns segundos. Mohammed está
com o cabelo molhado, usando uma camiseta preta e uma calça de moletom
cinza, completamente diferente daquele homem sério que veste terno e
gravata o tempo todo.
— Ainda não! — Eda diz. — Ficamos conversando e nem vimos o
tempo passar.
— Então posso pedir?
— Claro!
Mohammed pede nosso jantar e enquanto esperamos, observo ele
conversar com a irmã. Eles têm a mesma sintonia, se entendem com um
olhar, e ele fica mais relaxado na presença dela.
Nosso jantar chega e nos sentamos à mesa para comer.
— Vocês planejam ficar no hotel? — Eda pergunta.
— Não, pedi para o Mason que providenciasse um apartamento para
nós.
— Imaginei que você não iria voltar para casa dos nossos pais — ela
comenta.
— Mesmo se a Samia não estivesse comigo, eu não voltaria, Eda.
Depois que você descobre como é bom estar sozinho, voltar para a casa dos
pais parece um martírio.
— Eu imagino. Depois que você prova da liberdade, é difícil voltar
para a prisão — lamenta. Ela se vira em minha direção. — Samia, se você
precisar de alguma ajuda com decoração, pode me chamar que eu vou na
hora.
— Eu não quero incomodar — falo, receosa.
— Não é incomodo nenhum! Eu vou amar ajudar você!
— Eu vou entrar em contato!
— Eda, você poderia ajudá-la com outra coisa — Mohammed diz.
— Com o quê?
— Roupas. Trouxemos poucas na viagem, seria mais viável comprar
tudo novo.
— Eu vou amar! — Ela se vira para mim. — Podemos ir amanhã, o
que acha?
— Estou com muito tempo livre, então para mim está perfeito!
— Ótimo! Me passa o seu número de telefone que amanhã cedo
entrarei em contato com você para saber se está livre!
Ela me entrega o aparelho telefônico e eu digito meu número,
entregando-o para ela depois.
— Obrigada, Eda! — agradeço e ela sorri, como se isso não fosse
nada.
— Eu é quem tenho que te agradecer. Você chegou para mudar
completamente a família Yilmaz!
**
Após o jantar, Eda se despede de nós e vai embora, alegando ter um
compromisso inadiável. Solto um suspiro quando volta a ser apenas o
Mohammed e eu.
— Está tudo bem? — ele pergunta, sentando-se na poltrona e
pegando um tablet.
— Sim, apenas cansaço. O dia de hoje teve mais surpresas do que eu
imaginava.
— Acho melhor você ir descansar. Você não dorme desde que
pousamos em Istambul.
— Vou fazer isso — falo e me coloco de pé. — E você, onde vai
dormir?
— Não se preocupe comigo, apenas descanse.
Assinto e começo a caminhar em direção a porta do quarto, mas
paro no meio do caminho e me viro para o homem com quem vou me casar.
— Mohammed?
Ele ergue os olhos do tablet e me encara.
— Sim?
— Obrigada por hoje, foi incrível conhecer aqueles lugares e
também conhecer a sua irmã.
Ele me dá um meio sorriso e assente.
— Descanse, Samia. Ainda tem muita coisa para acontecer.
Me viro e sigo para o quarto. Solto um suspiro ao ver a cama
enorme e caminho até ela, me sentando em seguida. Solto um suspiro
profundo e coloco a mão em cima do meu ventre.
— Sabe meu filho, estou cada vez mais certa de que algumas coisas
em nossa vida aconteceram por determinação divina.
Aliso minha barriga por alguns segundos e sigo para o banheiro, vou
tomar um banho e dormir em seguida.
Mohammed
A máquina de café apita, informando que meu café está pronto.
Visto meu sobretudo e vou pegar meu café. Após o beber o primeiro gole,
ergo o pulso e confiro a hora: são quase 6h da manhã. Entrei no quarto mais
cedo e vi que a Samia estava em um sono profundo, pois ela não me ouviu
por nenhum instante. Eu ainda a cobri e fiquei cerca de uns dois minutos
olhando para ela.
Solto um suspiro e deixo a xícara em cima da bancada. Me pergunto
o que está acontecendo comigo para que eu fique desse jeito perto dela. Às
vezes, sinto como se ela fosse de porcelana e fosse quebrar a qualquer
momento. Em outras vezes, sinto que ela é mais forte do que aparenta. Mas
tudo que eu queria fazer é apenas dizer para que ela não tenha medo e
confie em mim, pois não vou deixar que nada aconteça com ela.
Meu celular toca e eu atendo ao ver o nome do Mason.
— Bom dia, senhor.
— Já chegou?
— Acabei de entrar no hotel.
— Estou descendo, por favor, peça para prepararem o café da Samia
e mandarem entregar no quarto por volta das 9 da manhã?
— Sim, senhor! Farei isso.
Encerro a chamada e deixo o quarto, seguindo direto para o
elevador.
Chego no saguão e vejo meu secretário mexendo no celular.
— Mason. — Ele ergue os olhos no instante em que me ouve.
— Mohammed, bom dia.
— Bom dia, fez o que eu pedi?
— Sim, senhor.
— Então podemos ir.
Ele aponta para frente e eu sigo na direção apontada. Mason abre a
porta do carro para mim, eu entro e ele entra em seguida, dando as
instruções para o motorista para onde vamos.
— Avisou para a Samia que iria sair? — pergunta, depois de um
tempo, e eu o encaro.
— Não, deveria ter avisado?
— Não acha que ela pode ficar preocupada se acordar e não te ver?
Isso nem passou pela minha cabeça. Não digo nada, apenas pego
meu celular e digito uma mensagem de texto para ela afirmando que estaria
de volta para o almoço e que fui resolver uma questão importante.
Bloqueio a tela do aparelho e volto a prestar atenção no documento
que estava lendo.
— A Eda conheceu a Samia — falo e sinto o olhar do Mason sobre
mim.
— Já?
— Conhece minha irmã, ela não iria sossegar enquanto não a
conhecesse.
— Eu sei como ela é — fala e volta a mexer no celular.
— Estou avisando porque acredito que ela vai estar muito mais
presente agora, não quero...
— Não vou me envolver com a Eda novamente, Mohammed — diz,
me interrompendo.
— Comentei apenas para te deixar informado, afinal de contas,
ainda está nítido que você tem sentimentos por ela.
— Sentimentos não são suficientes para nada nessa vida, e eu já
aprendi isso.
Não falo mais nada e volto a me concentrar no documento que estou
lendo, tentando entender por que eles dois são tão complicados assim um
com o outro.
Samia
Assim que eu acordo, sigo direto para o banheiro, tomo um banho
demorado e faço toda a minha higiene matinal. Finalizo meu cabelo e seco-
o com difusor. Já no quarto, acabo optando por usar um vestido de tamanho
médio, com mangas compridas, meia-calça, bota e um casaco de frio. O
inverno está terminando e mal posso esperar para usar roupas mais leves
novamente.
Termino de me arrumar e olho em direção à porta, estranhando o
fato de não ter ouvido o Mohammed ainda. Pego meu celular e me assusto
ao ver que são quase 9h da manhã. Eu estava realmente cansada, pois assim
que deitei para dormir, apaguei e não vi ou ouvi mais nada depois disso.
Vejo uma mensagem do Mohammed e abro imediatamente.
Mohammed: Bom dia, Samia. Espero que tenha dormido bem. Tive
que sair cedo, pois tinha um compromisso de trabalho, mas estarei de volta
até o almoço. Pedi para eles servirem o seu café. Tenha uma ótima manhã e
não se esforce muito. Se sentir qualquer coisa pode me ligar
imediatamente.
Prendo o lábio inferior entre os dentes e solto junto com um suspiro.
Me pergunto se ele dormiu no sofá ou na poltrona. Preciso me lembrar de
perguntar para ele depois.
O som da campainha chama minha atenção e eu vou até a porta para
atender.
— Bom dia, senhora — a camareira diz, em inglês.
— Bom dia — digo, ao ver um carrinho com o café da manhã.
— Seu noivo pediu que seu café fosse entregue no quarto. Com
licença.
Dou espaço para ela, que logo deixa tudo em cima da mesa e se
despede de mim. Fecho a porta e olho para a mesa, que parece ter sido feita
para um batalhão de gente.
— Mohammed, você exagerou um pouco — sussurro, indo me
sentar.
Nunca vou conseguir comer tudo isso sozinha, vai ser um
desperdício.
Outra batida na porta chama minha atenção e eu me levanto para
atender.
— Eda! — falo, assim que atendo a porta.
— Samia, bom dia! — diz, animada e já me abraçando e entrando.
— Uau! Que café da manhã de rainha, em?
— Seu irmão exagerou um pouco — digo e fecho a porta. — Quer
comer comigo?
— Vou aceitar, não comi nada antes de sair de casa. Meus pais
estavam discutindo então apenas peguei minhas coisas e saí.
Ela se senta e começa a se servir; faço o mesmo.
— Amo a comida daqui, é uma das melhores — diz.
— Realmente.
— Meu irmão está?
— Não, ele saiu cedo. Nem vi que horas saiu.
— A cara dele, parece um fantasma andando. — Sorrio com o que
ela diz e tomo um gole de suco. — Agora que estamos sozinhas, me conte.
— Contar o que? — pergunto, preocupada.
— Como você e o Mohammed se conheceram?
É claro que ela iria perguntar algo assim, mas, para minha sorte, nós
dois preparamos tudo. Se queríamos que as pessoas realmente acreditassem
na nossa farsa, a história de como nos conhecemos precisaria ser
impactante.
— Eu era camareira na filial do hotel em Nova Iorque — revelo, e
ela arregala os olhos.
— Não brinca!
— Não estou brincando.
Resolvemos manter a parte em que eu era camareira. Seria mais
fácil para todos acreditarem nisso e, caso o pai dele fosse atrás, poderia
confirmar essa história. Mas ele não acha que ele vá fazer isso.
— Eu nunca imaginaria que o Mohammed fosse se envolver com
alguma funcionária — murmura.
— Ele não sabia que eu era funcionária, muito menos eu sabia que
ele era o dono do hotel.
— Está falando sério?
— Sim! Eu só queria um trabalho e continuar pagando minhas
contas. Pouco me importava saber quem era o dono.
— E como se conheceram?
— Ele me salvou de um babaca que estava saindo comigo um tempo
atrás e não aceitou o término do relacionamento.
— Esse é bem o tipo do meu irmão mesmo — comenta.
— Sim, ele gosta de ajudar pessoas indefesas, mas depois desse dia
passamos a nos encontrar algumas vezes. Quando vi, já estava envolvida
demais com ele e então descobri que ele era o dono do hotel.
— Não ligou os nomes?
— Não, sou desligada para essas coisas. Cheguei a pensar em
terminar várias vezes, mas algo sempre me levava de volta para o
Mohammed. — Sorrio no final da frase.
— Não teve medo do que as pessoas iam falar?
— É o que eu mais tenho — falo, e não deixa de ser uma verdade.
Isso me apavora. — Mas eu aprendi que se gostamos de verdade de uma
pessoa, temos que estar dispostos a enfrentar tudo por ela,
independentemente das situações que nos cercam.
— Pelo Mohammed vale a pena enfrentar tudo?
— Vale! Eu sou capaz de enfrentar absolutamente tudo para ficar
com ele.
— Ele me contou que você está grávida. — Arregalo os olhos e
coloco a mão na barriga imediatamente.
— Contou?
— Sim.
— Não quero que pense nisso como uma forma de prendê-lo, nem
que estou dando o golpe da barriga e...
— Hey! — Ela segura minha mão por cima da mesa. — Eu jamais
pensaria isso de você. Eu te disse ontem que tenho um sensor para detectar
pessoas boas e não tão boas. Você passou no meu teste de primeira. Eu
estou feliz por você, pelo Mohammed e por esse bebê. Prometo que vou ser
a melhor tia que essa criança poderia ter.
— Eda, não sei o que dizer — falo, sentindo as lágrimas se
formando em meus olhos.
— Não precisa dizer nada, apenas saiba que pode contar comigo
para qualquer coisa. Você e o Mohammed são um exemplo a ser seguido
quando o assunto é liberdade e enfrentar a família por algo em que
realmente acredita. Eu queria encontrar alguém assim... — Vejo uma
tristeza em seus olhos quando ela diz isso, seu suspiro denota que ela já
encontrou esse alguém, mas talvez as coisas não tenham dado tão certo.
— Você vai encontrar alguém assim — falo e ela sorri, negando.
— Já desacreditei disso, Samia. Dizem que na vida nós só temos um
verdadeiro amor, eu já encontrei esse amor, mas ele não está disposto a
enfrentar a sociedade para ficar comigo e eu decidi que mereço mais do que
ele tem a me dar.
— Sinto muito — falo e ela balança a mão.
— Não sinta, nem todos têm a coragem que você tem. — Ela sorri
para mim e logo bate palmas. — Vamos comer, temos que sair. Pesquisei
várias lojas para irmos, estou animada para o dia de hoje.
É impossível não sorrir com empolgação dela, então apenas assinto.
— Sim, senhora!
Terminamos de tomar café e deixamos o hotel em seguida.
**
Sair com a Eda é mil vezes mais divertido do que eu poderia
imaginar. Ela tem razão quando diz que tem um parafuso a menos. Ela é
completamente fora da caixinha dela. Parece que a sua personalidade não
condiz com nada do lugar onde ela mora e foi criada.
Andamos muito mais do que me foi recomendado pela médica e
gastamos muito também. Acho que nunca comprei tanta roupa na minha
vida. Experimentei de tudo e comprei a maioria, tudo por influência da Eda.
Se fosse por mim, eu compraria apenas o essencial do essencial, mas ela fez
questão de ligar para o Mohammed e perguntar quanto ele estava liberando
para as compras. Ele simplesmente disse que não tinha um valor fixo e eu
poderia gastar o quanto quisesse.
Me apavorei, com toda a certeza. Eu não queria gastar rios de
dinheiro, mas a Eda não deu muito ouvido a essa parte e gastei o quádruplo
do que pretendia gastar.
— Onde vou guardar todas essas roupas? — pergunto, ao ver a
quantidade de sacolas que temos.
— Isso é o de menos. Tenho certeza de que o Mohammed vai te
surpreender com um closet maravilhoso!
— Você é maluca, Eda!
— Essa é a minha melhor característica, Samia! Vem, ainda falta
uma loja para irmos! — Ela segura minha mão e começa a me puxar pelo
shopping.
— O que falta comprar? Já compramos de tudo!
— Tem uma coisa que ainda não compramos! — diz, com um
sorriso de rosto.
Após andarmos um pouco, paramos em frente a uma loja de roupas
para bebê.
— Eda...
— Eu sei que ainda tem muito tempo até você começar a montar o
enxoval do bebê e que ainda nem sabe qual o sexo dele, mas eu queria ser a
primeira a te presentear.
Meus olhos se enchem de lágrimas e não consigo controlá-las; elas
começam a escorrer pelo meu rosto.
— Ei, não chora! — diz e se aproxima de mim, secando minhas
lágrimas.
— Nem eu sei por que estou chorando.
— Dizem que as mulheres na gravidez acabam se tornando mais
sensíveis e choronas, deve ser isso.
— Com certeza, é isso — falo e respiro fundo.
A verdade é que o medo do futuro começou a tomar conta de mim.
Como posso estar mentido para essas pessoas, fazendo-as acreditar que esse
filho realmente é do Mohammed?
Como vou conseguir sumir daqui a um ano, se todas essas pessoas
estarão apegadas ao meu filho?
— Está melhor, Samia? — Eda me tira do mar de pensamento em
que eu estava me afogando e eu apenas assinto, fazendo-a sorrir. — Então
vem, vou ser a primeira pessoa a presentear meu sobrinho!
Ela me leva para dentro da loja e eu me sinto meio tonta por estar
em um lugar repleto de roupas e coisas para o bebê.
— O que acha que devo dar a ele? — pergunta.
— Quer que eu escolha?
— Você é a mãe.
— Para ser sincera, ainda não pensei em nada. Por que você mesma
não escolhe algo e me surpreende? — pergunto.
Ela assente e vira, começando a mexer nas inúmeras roupas que tem
aqui. Me sento em um puff e fico observando enquanto a Eda escolhe o
presente. Ela, com toda a certeza, vai ser uma ótima amiga aqui e com toda
a certeza vai ser uma excelente tia, mas para um sobrinho que seja
realmente dela.
Solto um suspiro e coloco a mão sobre meu ventre.
— Em que situação nós fomos nos meter, não é meu filho? Em que
situação fomos nos meter...
— Achei! — ela grita e eu me levanto para me aproximar dela e
começo a rir quando ela me mostra um macacão na cor branca com uma
frase bem sugestiva na roupinha.
Não mexa comigo, minha tia é louca e ela vai dar um soco no meio
da cara.
— Meu Deus, Eda! — digo, rindo.
— Eu amei, vai ser perfeito, tanto se for menina quanto se for
menina! Vou levar!
Ela não me espera dizer mais nada, apenas caminha em direção ao
caixa e realiza o pagamento. Ela volta com a sacola e me entrega sorrindo.
— O primeiro presente desse bebê, que eu tenho certeza de que vai
ser muito mimado por mim!
Seguro a sacola de suas mãos.
— Obrigada, Eda. De verdade!
— Não precisa me agradecer. Pode anotar o que estou dizendo: esse
bebê vai ser muito amado por mim.
— Eu sei que vai.
O celular dela toca e ela me solta para atender.
— Sim? Já terminamos. Sei onde fica. Estamos indo. Até mais.
Ela encerra e me olha.
— Quem era?
— Mohammed. Ele vai nos encontrar em um restaurante para o
almoço. Vamos?
— Vamos. Todo esse exercício me deu fome.
Ela sorri e passa o braço pelo meu. Seguimos para fora da loja, com
o segurança dela atrás de nós enquanto caminhamos em direção ao
restaurante indicado pelo Mohammed.
Mohammed
Ergo o pulso para conferir a hora e olho novamente para a entrada
do restaurante, esperando a Samia aparecer com a Eda, mas nenhum sinal
delas.
— Se acalme, Mohammed, elas devem estar chegando — Mason
diz, focado no celular.
— Elas já deveriam ter chegado, estamos no mesmo shopping —
comento.
— Acho que você se esqueceu de que a Samia está grávida e não
pode correr. E se bem conheço a Eda, ela deve ter feito a Samia comprar
mil e uma coisas.
Sorrio com a colocação dele, isso é um fato. A Eda não se dá por
satisfeita enquanto não compra tudo que acha extremamente necessário para
se viver. No instante em que recebi a ligação dela perguntando o quanto elas
poderiam gastar nas compras com a Samia, soube que seria uma pequena
fortuna.
Volto a encarar a porta e solto um suspiro aliviado ao ver as duas
entrando no restaurante.
— Chegaram — aviso e me levanto. Meu amigo faz o mesmo e
percebo que a cada dia que se passa ele se torna mais indiferente à minha
irmã.
— Desculpem a demora, paramos em um lugar que não estava em
nossos planos — Eda diz, animada e vem me dar um beijo. Ela lança um
olhar para o Mason e sorri. — Como vai, Mason?
— Bem, Eda, e você?
— Bem também — fala e volta a sorrir.
Samia para ao meu lado e viro o rosto em sua direção, no mesmo
instante em que ela eleva a cabeça para me encarar.
— Você está bem? — pergunto em um sussurro e ela assente, dando
um meio sorriso.
— Apenas com fome, acho que andei demais.
— Deveria ter parado um pouco. Não faz bem para o bebê que você
ande tanto assim — falo.
— Ele está bem, não se preocupe.
— Tão lindos vocês dois! — Desviamos nosso olhar para minha
irmã, que sorri como se estivesse assistindo a algum filme de romance.
— Espero que não tenha estourado meu cartão de crédito, Eda —
falo, enquanto puxo a cadeira para a Samia se sentar.
— Como se esse cartão tivesse algum tipo de limite — murmura e
se senta ao lado do Mason, que olha rapidamente para ela. — Vocês não
imaginam o tanto de coisas que compramos hoje! Comprei até um presente
para o meu sobrinho!
Olho para a Samia, que sorri enquanto balança a cabeça em
negação. Logo em seguida, ela se vira para mim.
— Deveria ter me contado que a Eda já sabia da gravidez — fala,
mas apesar do seu tom leve, sei que ela não gostou nem um pouco.
— Eu acabei me esquecendo, me desculpe — falo, sustentando seu
olhar por alguns segundos, até ela desviar.
— Sem brigas, gente. Eu fico tão feliz por essa gravidez! Vai ser
uma alegria para a família! Eu quero muito que seja uma menina.
Precisamos de um pouco de alegria feminina em nossas vidas. O que você
quer que o bebê seja, Mohammed? — A pergunta da Eda me pega
desprevenido.
— Como?
— Quer que seja menino ou menina? — pergunta, e eu pisco
algumas vezes e então encaro a Samia.
— O que importa é que venha com saúde, Eda — falo, após alguns
segundos.
— Pela sua expressão, parece que você quer que seja um menino.
Sempre foi sua preferência.
— Por que diz isso?
— Combina mais com você — Samia responde, e eu volto a encará-
la.
— Um filho homem?
— Sim, um filho homem.
—Olá, já escolheram o que vão pedir?
Somos interrompidos pelo garçom. Desvio os olhos da Samia e pego
o cardápio, já começando a fazer meu pedido.
— O que está achando de Istambul até agora, Samia? — Mason
pergunta, e eu agradeço mentalmente pela mudança de assunto.
— Só estou aqui há dois dias aqui, mas tudo que eu vi até agora é
fascinante.
— Já se adaptou ao turco?
— Ela conseguiu arranhar algumas palavras hoje! — Eda diz,
animada.
— Sério?
— Nada demais, Mason, apenas algumas frases curtas. Fiquei muito
tempo sem falar turco, é normal esquecer como funciona a língua.
— Mais algumas semanas e você vai conseguir falar fluentemente,
como se nunca tivesse saído daqui.
Samia sorri e eu dou um gole do meu vinho, me perguntando por
que inventei um contrato de casamento. Mas agora é tarde demais para
voltar atrás, tudo que eu posso fazer é cumprir com tudo que prometi. Volto
a olhar para Samia. Se ela não tivesse grávida, teria aceitado meu pedido
tão facilmente ou jamais teria cogitado propor um contrato para ela?
O garçom chega com nossas entradas e observo Samia comer. Para
ela parece ser a melhor iguaria do mundo.
— Uau!
— Uma delícia, não é? — Eda pergunta.
— Maravilhoso!
— Coma com esse molho branco, o sabor fica esplêndido!
— Não vai comer, Mohammed? — Mason pergunta e eu o encaro,
assentindo.
— Vou sim!
O almoço ocorre sem nenhuma conversa importante, apenas alguns
comentários da Eda, que faz questão de ressaltar a cada minuto a beleza da
Samia e que mal pode esperar para que eu veja as roupas que ela comprou.
— O almoço foi maravilhoso! — minha irmã diz e se vira para a
Samia. — Me diverti muito hoje, obrigada!
— Eu quem agradeço, de verdade, achei que ficaria entediada aqui,
mas pelo visto não.
— Sempre que se sentir entediada, basta me ligar!
— Pode deixar!
— Mohammed, nos vemos no fim de semana — diz e eu apenas
assinto, ainda preciso tratar disso com a Samia. Eda se vira para o Mason.
— Mason, foi bom almoçar com você.
— Digo o mesmo, Eda — fala, educadamente.
— Até mais.
Eda se afasta e percebo meu amigo acompanhando-a com o olhar.
— Tire o restante do dia de folga, Mason — falo.
— Como?
— Não preciso mais dos seus serviços hoje, pode ir para casa.
— Mas...
— Nos vemos amanhã.
Seguro a mão da Samia, pegando-a de surpresa, e a trago comigo.
— Você nem esperou que ele se despedisse — ela fala, confusa.
— Se ele for esperto o bastante, vai saber o que tem que fazer —
digo.
Samia corre alguns passos para ficar ao meu lado.
— Ele gosta da Eda, não é?
— Estava na cara, certo?
— Completamente! — Sorrio de lado e seguimos para o
estacionamento. — Mas não entendo, se ele gosta dela, por que não ficam
juntos?
Abro a porta do carro para ela, porém ela não entra imediatamente.
— Algumas coisas são mais difíceis do que aparentam. Às vezes
gostar não é o bastante para duas pessoas ficarem juntas.
— Deveria dizer isso a ele.
— Já disse, mas ele é cabeça dura e tem medo de enfrentar minha
família por causa dela.
— Ela enfrentaria seus pais por causa dele — comenta e eu assinto.
— Ela enfrentaria o mundo por causa dele — corrijo e seus olhos se
prendem aos meus.
— É isso que está fazendo? Mesmo que de mentira?
— O que?
— Enfrentando o mundo por minha causa?
É incrível a forma como meus olhos se prendem aos dela de uma
maneira quase que inquebrável. Sinto meu coração acelerar dentro do peito
e, com muito custo, consigo desviar o olhar.
— Tecnicamente, sim — respondo.
Samia não diz nada, mas vejo que ela olha para longe e seus lábios
esboçam um sorriso triste, então ela entra no carro.
— Podemos ir. — Sua voz sai em forma de sussurro.
Fecho a porta do carro e dou a volta. Dou a partida e deixamos o
estacionamento do shopping.
— Espero que ainda tenha um pouco de energia, precisamos ir a um
lugar — falo, assim que paramos no primeiro semáforo.
— Que lugar?
— Logo você vai saber — falo.
**
— Meu Deus! — Samia diz ao descer do carro e ver o tamanho do
prédio. — Onde estamos?
— Esse é um dos apartamentos que o Mason selecionou para
olharmos.
— Olha o tamanho desse prédio, Mohammed! — diz e me encara.
— Os apartamentos aqui devem ser caríssimos!
— Não me importo, quero a sua segurança e que você se sinta
confortável.
— Você já gastou horrores com roupas, não precisa de mais nada...
— Precisa. — A interrompo. — Está no contrato.
— Não precisa seguir o contrato a risca, sinto que estou te sugando.
Olha tudo que está fazendo. Eu não tenho nada a te oferecer.
— Você aceitou entrar no ninho de cobras comigo, Samia. Aceitou
sair de Nova Iorque e fingir estar apaixonada por mim. Aceitou se casar
com um homem que mal conhece. O mínimo que posso fazer por você é
deixá-la confortável.
Ela volta a olhar para o prédio e assente por fim.
— Vem, vamos conhecer o apartamento — falo.
Mason já havia marcado com a dona do imóvel, então quando
entramos no prédio, ela já estava esperando por nós.
— É um prazer conhecê-los — diz, nos cumprimentamos.
— O prazer é nosso — falo.
— Vamos subir, então? Acredito que posso ir falando no elevador.
Assinto e seguimos para o elevador. A dona do apartamento disse
que ele está vazio há cerca de um mês e que seria um prazer alugá-lo para
nós dois.
— Espero que gostem, fiquem à vontade — diz e abre a porta do
apartamento.
— Meu Deus! — Samia exclama ao ver a sala.
Deixo que ela entre primeiro. Por incrível que pareça, não consigo
tirar os olhos dela. Suas reações me fazem sorrir.
— Podem me perguntar qualquer coisa — a dona diz e eu apenas
assinto, mas continuo prestando atenção na Samia, que começa a olhar cada
detalhe do apartamento, completamente fascinada pelo local.
— Esse apartamento é enorme! — ela diz e me encara.
— Temos três quartos, além da suíte principal, duas salas, cozinha,
área de jantar e varanda.
— É praticamente uma casa!
Estou começando a acreditar que a admiração da Samia é o que
mais me deixa fascinado por ela. Sua espontaneidade e transparência fazem
tudo nela ser admirável.
— Querem conhecer os quartos? — a mulher pergunta e eu assinto.
— Por aqui!
Ela nos guia até o quarto principal, e vejo a Samia arregalar os
olhos.
— O que achou? — pergunto para a Samia.
— Não tenho palavras — sussurra.
O quarto realmente é enorme e muito bem decorado. Tem o
banheiro, que conta com uma banheira e um closet gigante. Samia parece
uma criança conhecendo algo pela primeira vez. Em todos os cômodos da
casa, a expressão dela denotava espanto e admiração.
— Uau! — diz, quando paramos na varanda.
A vista nos mostra Istambul praticamente inteira, e se durante o dia
ela já tem uma vista espetacular, imagino como deve ser durante a noite.
— O que acha?
— Esse apartamento é incrível, estou sem palavras.
— Quer morar aqui?
Ela se vira em minha direção.
— Está maluco? Deve custar uma fortuna morar aqui.
— Quero sua segurança e conforto, Samia, e aqui teremos os dois.
— Não acha que está exagerando um pouco?
— Não, não acho.
— Mohammed, não faz sentido. Me sinto como se estivesse
extorquindo você.
— Vamos nos casar — falo.
— Não é um casamento de verdade — sussurra e seus olhos
parecem suplicar por alguma coisa.
Dou um passo em sua direção.
— Não importa, para todas as outras pessoas é um casamento de
verdade.
— Está tornando as coisas mais complicadas, Mohammed.
Ela desvia o olhar do meu.
— Não, não estou. Olhe para mim, Samia.
Ela volta a me encarar.
— Para todos que estão ao nosso redor, estou enfrentando o mundo
para ter você ao meu lado.
— É uma fraude — ela sussurra.
— Pode ser, mas será a fraude mais bem feita de toda a história.
— Por quê?
— Porque, para que todos acreditem, nós mesmos devemos duvidar
se estamos seguindo o contrato ou nossos corações.
Samia
O Mohammed alugou aquele apartamento, mesmo eu tendo falado
inúmeras vezes que não precisava se preocupar com isso, que um lugar
menor também atenderia todas as nossas necessidades, mas parece que não
adiantou muito. Ele fechou o contrato com a dona do local e vamos nos
mudar para lá na próxima semana.
Mas não é apenas isso que tem tirado meu sono nos últimos dias.
Mohammed comunicou que hoje, sábado, terá um jantar na casa de seus
pais, e isso me preocupa muito, pois é onde serei apresentada oficialmente
como sua noiva.
A Eda passou os últimos dias tentando me animar e dizendo que eu
precisava ter pensamentos positivos, pois o jantar poderia ser totalmente o
oposto do que eu estava imaginando. Mas é impossível pensar assim,
principalmente depois da recepção nada amigável que o pai do Mohammed
fez no aeroporto.
Mesmo com a Eda tendo comprado vários vestidos para mim, nesse
momento parece que nenhum está à altura suficiente para esse jantar. Já
olhei todas as roupas, todos os vestidos, e não encontrei absolutamente nada
que me agrade.
— Não é possível que nenhum vestido combine com a ocasião.
— Nenhum parece ser bom o suficiente — falo e me jogo na cama,
suspirando.
— Aquele preto?
— A manga é de alcinha.
— O roxo?
— Colado demais.
— E o vermelho?
— Sexy demais.
— O amarelo?
— Apagado demais.
— Céus, Samia! Você não consegue encontrar nada?
— Deveria ter me contado sobre esse jantar antes. Talvez assim a
gente tivesse comprado algo que fosse adequado para a ocasião!
— Todas as roupas são adequadas. A questão é que você está
nervosa para esse jantar e acredita que nada vai ser adequado o bastante.
Solto um suspiro. Ela tem razão. Parece que nada é bom o
suficiente.
— Por que não usa o vestido azul?
— O azul?
— Sim, já que todos os outros você colocou algum defeito, então o
azul está livre e eu o acho uma graça.
Me levanto da cama e vou até o guarda-roupa. Pego o vestido e
coloco diante do meu corpo em frente ao espelho. Ela tem razão. Esse vai
ser perfeito para a ocasião.
— Acho que vai ser ele! — digo.
— Perfeito! Mal posso esperar para te ver vestida nele!
— Mando foto quando estiver pronta.
— Não! Quero ver pessoalmente! — fala e eu assinto, mesmo que
ela não possa ver.
— Ok!
— Mas vai logo se arrumar! Você está praticamente atrasada!
— Verdade! Até daqui a pouco!
Encerro a chamada e jogo o celular na cama. Volto a olhar para o
vestido pelo reflexo do espelho e solto um suspiro. Vai ser esse mesmo!
Rapidamente, eu troco de roupa e o visto. Ele é feito de um tecido maleável,
tem mangas cumpridas e um pouco bufantes. A gola dele é alta e tem um
detalhe de um botão bem no meio. A parte do busto é meio franzida e tem
uma faixa em volta da cintura, o que deixa a silhueta bem marcada. A saia
cai de maneira esvoaçante e chega até os tornozelos.
É um modelo lindo e extremamente elegante.
Opto por usar o cabelo preso em um coque um pouco despojado,
deixo algumas mechas soltas para dar um charme e opto por usar um brinco
um pouco maior para chamar atenção.
Para a maquiagem, dou preferência a algo mais voltado para o
natural, então hidrato a pele, passo uma base, corretivo, pó e blush, um
rímel nos olhos e faço um pequeno esfumado na linha d’água. Para os
lábios, um batom mais voltado para o rosa queimado.
Passo um perfume, coloco mais dois anéis e escolho um salto fino
com tiras, na cor prata.
Me olho no espelho e tento dar o meu melhor sorriso, mas parece
que não está funcionado, já que eu estou completamente tensa. Hoje nada
pode dar errado, eu preciso convencer a família dele de que somos
perdidamente apaixonados um pelo outro.
Uma batida na porta chama minha atenção e eu me viro no instante
em que ela se abre e o Mohammed entra no quarto. Ele paralisa no instante
em que me vê.
Seus olhos me inspecionam de cima a baixo, duas vezes, e eu ele
abre a boca para tentar falar algo, mas não consegue. Noto que ele pisca
algumas vezes e desvia o olhar.
Engulo em seco e passo a palma das mãos no vestido. Não consigo
entender por que esse olhar me causou uma sensação de frio na barriga
extremamente diferente do que estou acostumada a sentir.
Parecia até ser algo bom.
— O que acha? — pergunto quando o vejo colocar o relógio no
pulso e não dizer nada.
Ele se vira em minha direção novamente.
— Você está deslumbrante, Samia — diz.
— Está falando sério?
— Lembra do que eu te disse no começo?
— O quê?
— Todos os meus elogios para vocês sempre serão verdadeiros.
Abaixo a cabeça e esboço um meio sorriso.
— Estou nervosa.
— Eu sei que sim, mas confie em mim, vai dar tudo certo.
— Eu confio em você — falo, erguendo a cabeça para encará-lo. —
Mas não sei o que seus pais são capazes de fazer só para saber se estamos
juntos de verdade ou não.
— Se você confia em mim, vai saber que eu não vou deixar que eles
façam nada que possa te prejudicar.
— Promete?
Mohammed estende a mão para mim e eu pouso a minha em cima
da dele.
— É uma promessa, Samia. — Ele se inclina, deposita um beijo no
dorso da minha mão e eu engulo em seco, sentindo uma sensação estranha
tomar conta do meu corpo.
Ele se levanta e olha para o quarto.
— Está pronta?
— Sim.
— Onde está o seu casaco?
— Aqui! — falo, indo até poltrona e pegando o sobretudo preto.
Mohammed caminha até mim e pega o casaco da minha mão. Ele se
posiciona atrás de mim e me auxilia a vesti-lo. Me viro para ele, que está
assentindo.
— Agora você está pronta.
— Obrigada.
Mohammed me estende o braço pra mim e eu o seguro. Saímos do
quarto em seguida.
Não posso deixar de mencionar que ele também está extremamente
elegante, parecendo um lorde. Não tenho dúvidas de que ele esteja usando
um traje completo por baixo do sobretudo preto que está vestido. Acho que
a Eda não entendeu o meu desespero por roupa quando liguei mais cedo,
mas a questão é que o Mohammed se veste perfeitamente bem e, como sua
noiva, não posso deixar a desejar, especialmente em um jantar para a
família dele.
Eu posso não ter o mesmo padrão de vestimenta que o Mohammed,
mas tenho capacidade para alcançá-lo e isso é um fato.
**
O caminho para a casa dos pais do Mohammed levou mais de trinta
minutos. Ele dispensou o Mason e veio dirigindo. Confesso que estar ao
lado dele, mesmo no silêncio, estava me deixando mais preparada para o
que está por vir.
Entramos em uma casa que mais parece um palácio, de tão linda que
é. Abaixo a janela do carro e observo a decoração do lado de fora: postes de
luz, árvores, jardins e, sim, um chafariz bem na entrada da casa.
Mohammed estaciona o carro em frente a uma escadaria enorme e
desce. Ele dá a volta no carro e abre a porta para mim. Apoio minha mão na
dele e desço em seguida. Ouço o barulho da porta se fechando, mas não
olho para trás, apenas encaro a escadaria que nos separa da entrada
principal.
— Nervosa? — pergunta ele, sussurrando, e eu assinto.
— Não sinto minhas pernas, parece que vão perder as forças a
qualquer instante.
— Se apoie em mim e tudo dará certo.
Ouço o barulho do carro sendo ligado e viro o pescoço para trás,
vendo o veículo sendo levado.
— Como...
— Não se preocupe, eles estão apenas levando-o para a garagem.
— Certo!
— Mohammed, Samia! Vocês chegaram! — Eda aparece no topo da
escada e desce rapidamente em nossa direção.
Ela me abraça assim que vê.
— Como você está linda! — diz e se afasta.
— Graças ao seu conselho — falo e ela nega.
— Você tem uma beleza peculiar, Samia, chama a atenção por onde
passa, seu rosto é inesquecível. — Sorrio com seu elogio e ela se vira para o
irmão. — Trate de colocar um sorriso nesse rosto! Você está vindo
apresentar sua noiva e está com a cara fechada assim?
— Como se eu não soubesse o verdadeiro motivo desse jantar. Se eu
pudesse, pouparia a Samia de tudo isso.
— Eu sei que sim, mas seria pior. — Ela se vira em minha direção.
— Não se preocupe, vai dar tudo certo.
— É meio difícil de acreditar com vocês falando dessa maneira —
falo e solto um suspiro.
— Cunhadinha, se você conseguir conquistar a dona Erin, terá o
maior apoio dentro da família.
— E se eu não conseguir? — Começos a subir as escadas.
— Impossível isso acontecer, não se preocupe. — Ouço ela suspirar
e não se isso me anima ou me apavora. — Se preparem, vamos entrar na
cova dos leões.
Conforme subimos, meus olhos começam a ver a entrada da casa de
fato, mas não é isso que chama a minha atenção, e sim, o fato de eu
começar a ver os pés de uma mulher parada à porta. Quando ela entra de
vez em meu campo de visão, fico admirada. Ela é simplesmente
maravilhosa, parece uma pintura desenhada à mão pelo melhor pintor que já
existiu. Na foto que o Mohammed me mostrou, eu constatei que era linda,
mas pessoalmente ela consegue ser muito mais linda ainda.
Seus cabelos estão soltos, e ela veste um conjunto social que vai até
o joelho. Seu rosto está sério e com a expressão fechada, mas isso não tira
sua beleza. Pelo contrário, tudo isso me faz questionar se ela realmente é
real.
— Mãe — Mohammed diz.
— Mohammed, Eda — fala o nome dos filhos, olhando-os e, por
fim seu olhar pousa sobre mim. — E você deve ser a Samia.
— Senhora. — Abaixo a cabeça em sinal de reverencia e ouço o
barulho de seus sapatos se aproximando de mim.
Ergo a cabeça para encará-la e me deparo com olhos extremamente
verdes. Engulo em seco quando noto que ela faz uma inspeção em mim.
Sinto Mohammed apertar minha mão, como se me dissesse que está tudo
bem.
— Muito bem, Samia — ela me lança um meio sorriso. — Vamos
entrar, está frio aqui fora. Temos muito o que conversar.
Ela se vira e segue para a entrada. Olho para o Mohammed e, em
seguida, para a Eda.
— O que foi isso? — questiono, sentindo meu coração querer sair
pela boca.
— Primeira fase da inspeção e, aparentemente, você passou. Vamos
ver o restante — Eda diz, já seguindo a mãe.
Me viro para o Mohammed.
— Vai dar tudo certo, girassol — diz.
— Pensei que fosse me chamar pelo apelido apenas na presença dos
outros — falo.
— Precisamos agir como um casal — sussurra e aproxima o rosto
do meu. — Apenas por essa noite vamos esquecer que estamos presos a um
contrato e agir como um casal de verdade. Será muito mais natural assim.
Encaro seus olhos por alguns segundos e apenas assinto.
Nos viramos em direção a entrada e seguimos o caminho que a Eda
e a Senhora Erin tomaram.
Um casal normal...
Será que vamos conseguir?
Samia
É impossível esconder minha expressão de espanto assim que entro
na casa da família do Mohammed. Pela entrada da mansão, já tive uma
pequena prévia de que a família dele tem muito dinheiro, mas nada se
compara a entrar na propriamente dita.
— Surpresa? — sussurra em meu ouvido e eu pisco.
— Tentando absorver tudo que estou vendo, mas parece ser
impossível.
— Eu deveria ter dito que a casa é um pouco excêntrica.
— Casa? Excêntrica? — digo. — Sinto como se estivesse em um
castelo, prestes a ter um encontro com o rei e a rainha.
Ouço ele dar um sorriso e me viro em sua direção.
— Nervosa?
— Dá para perceber?
Mohammed ergue uma mão, não sei dizer se o gesto é voluntário ou
não, mas sei que meu corpo inteiro se arrepia quando seus dedos tocam
delicadamente a pele do meu rosto.
— Um pouco — responde.
Parecendo perceber o que está fazendo, ele abaixa a mão e eu desvio
o olhar do dele. Continuamos a entrar na casa e sinto a mão do Mohammed
em minhas costas, me guiando pela casa.
— Vocês estão aqui — minha mãe diz, nos encontrando no meio do
caminho.
— Mãe — Mohammed cumprimenta a senhora, que apenas assente,
mas seu olhar está totalmente fixado em mim. Ele se vira em minha direção.
— Samia, esta é minha mãe Erin. Mãe, esta é a Samia, minha futura esposa.
— Senhora Erin, como vai?
— Mohammed, seu pai está no escritório. Eu vou mostrar a casa
para a Samia.
— Mãe...
— Me obedeça — diz, ainda me encarando.
Desvio os olhos para ele, que me encara. Mesmo não dizendo
nenhuma palavra, sei que ele está pedindo para eu manter o papel e ficar
calma. Assinto quase imperceptivelmente e ele volta a encarar a mãe.
— Estou indo.
Ele me olha novamente e nos deixa a sós.
— Me acompanhe, Samia — diz, passando por mim.
Solto um suspiro e me viro para seguir minha futura sogra. Eu não
faço ideia de onde estamos indo. A casa parece ser algum tipo de labirinto.
Preciso me lembrar de agradecer ao Mohammed depois por nos fazer morar
em um apartamento. Com toda a certeza, eu iria me perder muito aqui.
Erin abre duas portas enormes e preciso conter um grito de surpresa
quando entramos em uma biblioteca enorme. Sinto os olhos da matriarca
em mim, mas minha fascinação está totalmente na biblioteca.
— Gostou? — Me viro para ela e confirmo, dando-lhe um sorriso.
— É incrível!
Ela aponta para o sofá e eu me sento à sua frente.
— Então você é a mulher que mexeu com o coração do meu filho —
diz.
— Não era minha intenção causar nenhum problema — falo e olho
para minhas mãos entrelaçadas. — Quando nos demos conta, era
impossível voltar atrás.
— Você sabe muito bem que o Mohammed tem um compromisso de
casamento com outra família super influente aqui em Istambul, certo?
— Eu sei.
— Por que quer se casar com ele?
— Como?
A pergunta me pega desprevenida e eu a encaro.
— Por que quer se casar com meu filho? Me dê a resposta sincera,
Samia.
Eu hesito por alguns instantes, tentando pensar no que falar, mas
nada vem à minha mente. Então decido ser o mais sincera que eu posso,
dentro do que combinamos contar.
— O Mohammed apareceu na minha vida de uma maneira
completamente imprevisível. No início, eu pensei que não era nada, mas
com o passar do tempo, foi se tornando algo mais do que eu poderia
imaginar. Em todas as vezes que estivemos juntos, ele foi tão sincero e leal
comigo que foi impossível não me apaixonar por ele. Pela maneira como
ele cuida de mim, a forma que ele me deixa bem e livre. Ele é melhor do
que eu imaginei, e me apaixonar por ele foi como um sonho se tornando
realidade.
Abaixo os olhos no instante em que termino de falar, passo a língua
nos lábios e espero a Dona Erin responder algo, mas nada acontece. Volto a
encará-la, e ela parece refletir em tudo que eu disse. Por fim, ela coloca um
envelope em cima da mesa.
— Abra — diz.
Lentamente, eu estico a mão e pego o envelope, abrindo-o com
cuidado. Meus olhos se arregalam quando vejo um cheque preenchido com
um valor extremamente alto, mais alto até que o contrato que Mohammed e
eu firmamos.
— O que...
— Meu marido mandou que eu entregasse isso a você, para te fazer
desistir do casamento e não entrar em contato com o Mohammed nunca
mais.
Minhas mãos começam a tremer, e meus olhos se enchem de
lágrimas. Não consigo entender o motivo das lágrimas. Se eu pegar esse
dinheiro, eu posso quebrar o contrato, pagar a multa e ainda ficar com
dinheiro. Poderia ir para bem longe, abrir alguma coisa e criar o meu filho
sozinha.
Mas por que essa ideia me parece ser completamente absurda? Por
que sinto que estaria traindo o Mohammed se eu aceitar esse dinheiro?
— Não quero que entenda mal, Samia...
— Eu suspeitei que isso aconteceria — falo, interrompendo-a e seco
uma lágrima que escorre pelo meu rosto. — Você tem uma família muito
rica, propor essa quantia de dinheiro não deve ser nada para vocês, mas já
pararam pra pensar que talvez existam coisas mais valiosas do que o
dinheiro?
— Samia...
— E não estou falando apenas do amor entre um homem e uma
mulher, que claramente não é algo que vocês se importam, mas estou
falando da família. Vocês firmaram um contrato de casamento para o filho
de vocês quando ele tinha menos de cinco anos. Ele não tinha ideia de quem
ele era naquela época, mas já tinha uma noiva. O dinheiro pode comprar
empresas, deixas pessoas mais ricas, realizar sonhos materiais..., mas nunca
vai comprar uma família de verdade, nunca vai comprar amor, sinceridade,
gratidão ou felicidade. Eu estou com o seu filho, dona Erin, porque eu o
amo e nenhum dinheiro vai me fazer ficar longe dele.
Eu coloco o cheque de volta dentro do envelope e o deixo em cima
da mesa novamente. Erin me encara de uma maneira diferente e assente,
sorrindo de lado.
— Acho que você foi a melhor escolha que meu filho fez na vida.
— Como?
— Nunca fui a favor desse casamento do Mohammed — diz e se
levanta, começando a caminhar pela biblioteca. — Mas eu não tenho
autoridade para tomar decisões, muito menos propor algo. Sempre me
perguntei o que aconteceria se o Mohammed se apaixonasse algum dia e
quisesse dar um fim nesse contrato de casamento. Acho que eu não estava
pronta para hoje.
— Senhora...
— Você fez exatamente o que eu queria que você fizesse, Samia.
Ela se senta ao meu lado e segura minha mão.
— Fiz?
— Você me provou que está com meu filho pelo que sente por ele e
não pelo dinheiro que ele tem. Se fosse outra pessoa, não pensaria duas
vezes ao ver o valor nesse cheque e terminaria tudo. Como mãe, eu só
quero que você faça meu filho feliz, que dê amor e uma família de verdade.
É tudo que eu te peço, Samia. Consegue me prometer isso?
Estou tão chocada com suas palavras que não consigo responder de
imediato. Pisco algumas vezes e tento elaborar algo coerente, mas nada
parece ser bom o suficiente.
— Então, isso quer que a senhora vai aceitar o meu casamento com
o Mohammed?
Ela sorri e assente, amorosamente.
— Se você me prometer que vai fazê-lo feliz...
— Eu... — Engulo em seco. Meu coração está disparado contra meu
peito e eu sorrio, ainda sem acreditar em tudo que ouvi. — Eu prometo,
Dona Erin.
Ela sorri verdadeira e eu faço o mesmo.
— Obrigada, Samia. Agora eu sei que meu filho tem uma pessoa em
quem pode confiar de olhos fechados.
Mohammed
A todo o instante eu olho para a entrada da sala, esperando que
minha mãe e a Samia voltem. Já se passaram mais de trinta minutos desde
que elas saíram para conversar e até agora não voltaram.
— Parece nervoso, Mohammed — meu pai diz.
— Eu só espero que vocês não tenham aprontado nada para cima da
Samia. Se eu descobrir...
— Talvez a melhor solução seja aceitar o contrato com a Ayla.
— Eu não vou me casar com a Ayla — repito, pela décima vez.
— Engraçado como você acha que tem autonomia para decidir algo
sobre a sua vida.
— E não tenho? Tenho mais de trinta anos, posso muito bem tomar
minhas próprias decisões.
— Você se tornou um moleque...
— Aí vêm elas! — Eda diz, rapidamente.
Me coloco de pé, mas não caminho até a Samia, porque
simplesmente vejo minha mãe e ela sorrindo uma para a outra.
— Vocês demoraram — minha irmã fala, se aproximando delas.
— Fui mostrar algumas coisas para a Samia — minha mãe fala,
dessa vez com o semblante completamente diferente do momento em que
chegamos.
Coloco as mãos no bolso da calça e caminho até minha noiva.
— Está bem? — pergunto, e ela sorri para mim, assentindo.
Meu coração reage ao seu sorriso de uma maneira que nunca reagiu
antes. Sinto-o bater mais rápido à medida que encaro seus olhos.
— Está tudo bem — ela responde.
Estendo a mão para ela, que a segura, e a puxo para colocá-la na
frente do meu pai.
— Pai, essa é a Sâmia, minha noiva.
Osman Yilmaz encara minha noiva de cima a baixo, seu rosto não
demonstra nenhuma reação, mas eu o conheço e sei que ele não vai se dar
por satisfeito até que eu desista desse casamento.
— Então é você a mulher por quem meu filho diz estar apaixonado e
está disposto a romper um contrato milionário?
— Querido... — Minha mãe para ao lado dele, sorrindo docemente,
mas ele continua encarando a Samia.
— Não se preocupe, Erin — ele diz, seco e rude. — Não vou fazer
nada com a noiva do nosso filho. Eu apenas quero ver quanto tempo eles
vão continuar achando que a vida é um conto de fadas. Eu darei um mês
para que os dois caiam na real e percebam que estão cometendo a maior
burrada da vida deles.
Ergue o copo com uísque e toma todo de uma vez, deixando a sala
em seguida.
Seguro a mão da Samia, que me encara preocupada, mas apenas
tento tranquilizá-la com os olhos.
— Seu pai vai demorar para aceitar a situação — minha mãe diz.
— Eu já esperava essa reação dele — comento.
— Não quero que essa noite termine com um clima tenso, vamos
jantar, não somos obrigados a esperar pelo pai de vocês. Vamos?
— Vamos! — Eda responde animada e segue minha mãe em direção
à cozinha.
Samia começa a segui-las, mas para ao ver que não estou andando e
que nossas mãos continuam unidas.
Ela se aproxima de mim e me encara.
— Está tudo bem?
— O que conversou com minha mãe? — pergunto, e ela olha para
os lados.
— Depois eu te conto.
— Samia...
— Não se preocupe, Mohammed, não aconteceu nada demais.
— E eu posso confiar em você?
Ela sorri e assente, então começa a me puxar.
— Deve confiar, afinal de contas, nós vamos nos casar.
Não consigo conter o sorriso, e ela também não. Me dou por
vencido e a sigo em direção a sala de jantar.
Meu pai pode não apoiar esse casamento ainda, mas ter o apoio da
minha mãe vai ser extremamente importante.
Mohammed
Acho que posso considerar esse jantar um sucesso. Meu pai não
apareceu, mas só de ver que minha mãe aceitou e se encantou com a Samia,
fico extremamente aliviado. Sinto que parte do acordo foi feito.
— E esse sorriso no rosto? — Olho para minha irmã, que está
sorrindo de orelha a orelha.
— Que sorriso? — pergunto e tomo o restante do meu uísque.
— Esse que você não consegue esconder ao ver nossa mãe e a
Samia conversando.
— Confesso que pensei que a dona Erin não fosse aceitá-la — digo,
olhando as duas de longe.
— Por um momento, esse pensamento também se passou pela
minha cabeça, mas o que quer que as duas tenham conversado naquela
biblioteca foi o suficiente para a Samia ter a aprovação da dona Erin.
— Falta apenas meu pai — comento.
— Ele vai ser mais complicado — diz com um suspiro. — Mas
acredito que a Samia vai conseguir conquistá-lo. Se ela conseguiu chegar
no seu coração, no do nosso pai vai ser moleza.
— O que quis dizer com isso? — pergunto, encarando-a e erguendo
uma sobrancelha.
— Nada, senhor Coração de Gelo, absolutamente nada!
Ela sorri e vai em direção à nossa mãe e à Samia, que estão rindo
como se fossem velhas amigas. Sirvo-me de mais uma dose de uísque e fico
observando as três juntas, principalmente a Samia. Enquanto ela conversa,
me pergunto se estou fazendo a coisa certa ao colocá-la dentro da minha
família dessa maneira.
Balanço a cabeça e bebo meu uísque. Não estou fazendo nada de
errado, afinal de contas, casamentos se desfazem o tempo inteiro e amores
acabam de uma hora para outra. Nós dois seriamos apenas mais uma
fatalidade desse destino cruel.
**
Desvio o olhar da estrada e encaro Samia, que está concentrada
mexendo no celular.
— O que você e minha mãe conversaram? — pergunto. Segundos
depois, ela me encara e eu volto a encarar a rua.
— Nada demais.
— Não pode ter sido nada demais, vocês ficaram uns trinta minutos
na biblioteca.
— Sua mãe é uma mulher de bom coração.
Encaro a Samia e, em seguida, volto a prestar atenção no trânsito.
— O que quer dizer?
— Ela foi me testar — fala e acaba sorrindo.
— Te testar?
— Hum...
— Como assim?
— Ela me entregou um envelope com um cheque com o dobro do
valor do nosso contrato.
Paro o carro no semáforo e viro em sua direção.
— Você poderia ter aceitado — falo.
— Sim, poderia... — Ela parece divagar. — Confesso que fiquei
tentada. Com esse dinheiro eu poderia pagar o valor da quebra do nosso
contrato, poderia ir embora, começar a minha vida em um novo lugar, abrir
um negócio e cuidar do meu filho.
— Por que não aceitou?
A encaro, seus olhos se prendem aos meus.
— Não sei, também estou me perguntando isso. Por que não aceitei?
Seria mais fácil, mas, parando para pensar, acho que dinheiro nenhum no
mundo compensaria o sorriso que sua mãe me deu quando eu disse que não
iria sair da sua vida por nada.
Por um instante, tudo pareceu sumir e eu só consigo enxergar a
Samia, seus olhos, sua beleza, a verdade que ela carrega consigo. Meu
coração sacode dentro do meu peito e eu aperto o volante com força.
Mas o que diabos é isso?
Uma buzina chama minha atenção e eu olho pra frente, vendo que o
semáforo já abriu. Saio com o carro, mas a frase que a Samia disse continua
ecoando na minha mente.
“... dinheiro nenhum no mundo compensaria o sorriso que sua mãe
me deu quando eu disse que eu não iria sair da sua vida por nada.”
Foco, Mohammed, você precisa ter foco. É só a droga de um
contrato, apenas isso.
Samia
Nós nos mudamos hoje para nosso apartamento. Confesso que já
estava acostumando com a rotina do hotel, mas também estava com
saudade de ir até a cozinha, preparar algo e comer, sem precisar sair para
jantar ou almoçar no restaurante do hotel. Mesmo que eles servissem a
comida no quarto, ainda assim, sentia falta de entrar em uma cozinha e
preparar minha própria refeição.
Eu não vejo o Mohammed desde ontem. Ele saiu cedo e não vi a
hora que voltou para o hotel, muito menos a hora em que saiu hoje de
manhã. Isso me faz questionar se ele dormiu em casa.
Solto um suspiro e balanço a cabeça. Alguma coisa deve ter
acontecido, simples assim.
— Está tudo pronto, Samia? — Mason pergunta.
— Está sim, acredito que não me esqueci de nada — falo, olhando
em volta.
— Não se preocupe, se tiver esquecido algo, a recepção vai ligar.
Assinto e sorrio para ele, mas logo solto um suspiro ao ver a
quantidade de malas que são minhas. Graças às compras que fiz com a Eda,
estou com incríveis nove malas para levar para o apartamento.
— Às vezes a Eda exagera um pouco — ele comenta, vendo meu
olhar.
— Estou percebendo isso — murmuro.
— Vamos, o pessoal vai se encarregar de levar as malas.
Pego minha bolsa de mão e minha bolsa normal, seguimos em
direção ao elevador. Mason aperta o botão do térreo e se posiciona ao meu
lado.
— Mason, posso perguntar uma coisa?
— Claro, senhora.
— O Mohammed...
— Ele teve alguns assuntos administrativos para tratar, por esse
motivo não veio acompanhá-la até o apartamento.
— Ele costuma trabalhar até nos fins de semana? — pergunto e ele
me encara.
— O Mohammed não está acostumado a ter alguém esperando por
ele em casa, Samia. Ele pode levar um tempo para se acostumar com isso.
— Quem disse que eu fiquei esperando por ele?
— Não ficou?
— Não, nem um pouco. Apenas fiz uma pergunta porque achei
estranho — falo e ele assente, mas consigo perceber o sorriso no canto de
seus lábios.
— Vou avisar que você esperou por ele.
— Não precisa avisar nada! — falo no instante que as portas se
abrem. Saio do elevador e o Mason corre para me alcançar.
— Perdão, senhora — diz e eu paro, assentindo.
— Me desculpe também, eu não deveria ter perdido a cabeça —
falo.
— Por aqui.
Ele me guia até o carro, abre a porta de trás para mim e eu entro. Ele
dá a volta e senta no banco do motorista. Instantes depois, estamos
percorrendo as ruas de Istambul.
— Posso fazer mais uma pergunta?
— Claro, senhora.
— Qual é a sua relação com a Eda?
Noto que ele fica tenso. No dia que fomos almoçar, percebi que os
dois tinham uma relação um pouco diferente. Percebi também alguns
olhares entre eles, mas não tive oportunidade de perguntar nada, pelo menos
até agora.
— Nenhuma, ela é apenas irmã do meu chefe — diz, sério.
— Tem certeza? Eu percebi alguns olhares e...
— Senhora, nossa relação é apenas essa. Ela é a irmã do meu chefe,
mais nada.
Assinto e me encosto no banco. Agora tenho mais certeza de que o
homem de quem a Eda estava falando é o Mason.
O restante do caminho fazemos em silêncio. Chegamos ao prédio e
o Mason não me dirigiu nenhuma palavra, então apenas o segui. Quando
chegamos ao andar do apartamento, ele abriu a porta para mim e me deu
passagem para entrar.
— Está em casa, senhora. Se precisar de qualquer coisa, pode me
ligar.
Assinto e me viro para ele.
— Sabe quando o Mohammed vai vir?
— Procurarei saber, com licença.
Ele se vira, mas eu o chamo novamente.
— Mason!
— Sim? — responde, sem olhar para trás.
— Desculpe pelas perguntas no carro.
— Sem problemas, se a senhora me der licença agora.
— Claro.
Mason deixa o apartamento e eu giro em volta do meu próprio eixo
para olhar o local. É impossível não sorrir agora, afinal de contas,
finalmente estou em um lugar que posso chamar de casa.
**
As malas chegaram por volta das 10h. Depois disso, fui fazer algo
para comer e optei por uma salada. Fiz um pouco a mais para o caso do
Mohammed aparecer, mas não foi o caso. Esperei por uma mensagem dele,
mas nada. Fui organizar minhas roupas no closet e consegui colocar metade
no lugar, mas resolvi deitar um pouco, pois já estava cansada e acabei
pegando no sono.
Acordo assustada. O barulho do celular tocando me desperta
completamente. Coloco uma mão na cabeça e olho para a janela, vendo que
já está à noite. A gravidez tem me deixado mais sonolenta que o normal. O
silêncio na casa me faz notar que o Mohammed não chegou ainda.
Me coloco de pé e vou para o banheiro tomar um banho. Quando
termino vejo que são mais de 20h. Solto um suspiro e vou para a sala. Pego
o livro que estava lendo e decido me sentar na varanda para ler um pouco.
A vista daqui é magnífica. Fico cerca de uns dez minutos olhando
para a cidade, vendo as luzes se acendendo e a noite tomando conta da
cidade.
Abro o livro na página marcada e começo a ler, mas paro quando
ouço o barulho da porta se abrindo. Me levanto imediatamente e dou de
cara com Mohammed. Seus cabelos estão meios bagunçados e ele está
segurando o terno, parando ao me ver.
— Samia... — diz.
— Pensei que não fosse voltar para casa hoje de novo.
Ele olha para os lados, fecha a porta e joga o terno no sofá em
seguida.
— Me desculpe — diz, e eu faço um gesto de negação com a
cabeça.
— Não precisa se desculpar. Não é sua obrigação. Apenas fiquei
preocupada e...
— Eu sei que ficou esperando por mim ontem. Eu não tenho
costume de ter alguém em casa comigo.
— Não precisa fazer algo que não queira. Como disse, fiquei apenas
preocupada. Pensei que poderia ter acontecido algo e...
— Nós vamos nos casar. Devo dar satisfações para você.
— Nosso casamento é um contrato. Não precisa disso.
— Eu quero fazer isso.
O encaro. Meu coração parece querer saltar para fora da minha
boca. Passo a língua nos lábios e desvio os olhos dele.
— Não quero ser um impedimento na sua vida, Mohammed. Não
precisamos fingir quando estamos sozinhos.
— Eu não estou fingindo.
Um arrepio percorre minha coluna.
— Não quero que você se importe — falo, e ele dá um passo em
minha direção.
— Eu quero me importar.
— Somos estranhos um para o outro — falo, e ele dá mais um passo
em minha direção.
— Não quero ser um estranho para você.
— Somos de mundos diferentes.
Mais um passo.
— Isso não importa.
Ergo os olhos e ele está a alguns centímetros de distância de mim.
Minhas mãos estão suadas e minha boca está seca. Minha respiração está
acelerada e meu coração parece fazer um buraco em meu peito.
— Nosso contrato é falso — sussurro, como último recurso. Não sei
para que eu disse isso, mas pareceu o certo.
Os olhos de Mohammed descem para minha boca e
involuntariamente eu passo a língua nos lábios.
— Que se dane o contrato — sussurra.
Mohammed fecha o espaço entre nós dois e me beija. Sou pega de
surpresa e ele se afasta, notando que fiquei paralisada.
— Samia...
— Que se dane o contrato — falo, segurando sua camisa e o
puxando para mim. Nossos lábios se moldam um ao outro e suas mãos
seguram firme em minha cintura.
Acho que posso considerar esse beijo o meu maior ato de loucura
durante toda a minha vida.
Samia
Suas mãos apertam minha cintura com força. Subo as mãos para o
seu pescoço e ele aprofunda o beijo. Sua língua busca a minha como se
fosse um pote de água em meio ao deserto. Dou passo para trás e ele me
acompanha. Passos os dedos entre os fios de seus cabelos e sua barba
arranha a pele do meu rosto. Mohammed diminui a intensidade do beijo,
morde meu lábio inferior, me dá mais alguns selinhos e se afasta de mim.
Permaneço de olhos fechados por alguns segundos. Assim que os
abro novamente, vejo que ele está me encarando. Me afasto dele e olho para
o lado, desviando os olhos dos seus.
Meus lábios ainda formigam e tenho a impressão de quem nem sinto
mais coração batendo, de tão rápido que ele está.
— Mohammed...
— Isso foi um erro, Samia — diz, se afastando de mim. — Isso não
deveria ter acontecido.
— Mohammed...
— Não vai se repetir, eu prometo.
Então ele se vira e vai embora. Caio sentada no sofá e fico
encarando a porta recém-fechada. O que acabou de acontecer? Meu Deus!
Passo as mãos nos cabelos e, em seguida toco meus lábios, fechando
os olhos. Solto um suspiro e me coloco de pé depois de alguns minutos.
Não posso ficar pensando nisso, eu preciso esquecer esse beijo. Vai ser
melhor assim.
**
Está sendo impossível esquecer esse maldito beijo. Todas as vezes
que eu fecho os olhos, ele vem à minha mente. Se eu me distrair por alguns
minutos, estarei pensando nele. Tem uma semana que esse maldito beijo
aconteceu e tudo parece ter desandado por completo.
O Mohammed parece ter ficado mais distante do que nunca. Ele mal
para em casa, sai de manhã cedo, faz todas as refeições fora e chega em
casa tarde da noite. Confesso que isso está me incomodando mais do que
deveria.
Termino de tomar meu café e olho o pulso para conferir a hora. Hoje
tenho uma consulta marcada e estou ansiosa para conhecer a médica que vai
cuidar de mim durante a gestação.
O interfone toca e eu me levanto para atender.
— Sim? Pode mandar subir, obrigada!
Coloco o telefone no gancho e vou até o quarto organizar minhas
coisas. Confiro meus documentos mais uma vez e pego a pasta onde estão
todos os exames que fiz em Nova Iorque. Guardo tudo na bolsa e saio do
quarto. Quando chego na sala, o Mason já está me esperando.
— Bom dia, Samia. Como você está?
— Estou bem, um pouco ansiosa, mas bem. E você?
— Bem, obrigado por perguntar. Tomou café?
— Apenas um café. Hoje meu estômago amanheceu um pouco
embrulhado, então não quero correr o risco de comer algo e não conseguir
segurar.
— Sabe que não teria problema, não é? Precisa se alimentar
corretamente.
— Eu sei, eu sei, mas prefiro assim.
Ele assente e ergue o pulso.
— Vamos?
— Vamos.
**
Minha vontade é perguntar para o Mason onde está o Mohammed,
mas me seguro o máximo para não fazer isso. Afinal de contas, se ele
quisesse entrar em contato comigo, teria mandado mensagem ou pelo
menos faria questão de estar em casa no horário em que estou acordada.
Olho para a janela do carro enquanto seguimos para a clínica e fico
me perguntando até quando esse clima vai permanecer entre nós dois,
porque eu já não estou aguentando mais.
Solto um suspiro um pouco mais alto e acabo chamando a atenção
do Mason.
— Está tudo bem? — O vejo me encarar pelo reflexo do retrovisor e
assinto, dando um sorriso de lado.
— Claro, por que não estaria?
— Você parece mais distraída.
— Ainda estou tentando me acostumar com algumas coisas,
acredito que logo estarei normal de novo.
Mason não me responde nada e eu volto a encarar a janela. Em
parte, eu não estou mentido. Tem sido difícil me adaptar à minha nova casa.
Quando eu morava em Nova Iorque, eu já conhecia todos os lugares, já
estava acostumada a morar sozinha, a sair por todos os cantos. Eu tinha
meus amigos, meu trabalho... aqui eu não tenho nada disso. Parece que
quanto mais tempo eu passo em casa, mais devagar o tempo passa.
Tenho conversado com a Eda por mensagem, mas ela não está em
Istambul. Precisou fazer uma viagem de última hora e só volta no fim de
semana. Ou seja, estou completamente sozinha, já que nem o meu “noivo”
está ficando em casa.
— Você não está com uma cara de quem está bem, Samia — Mason
insiste.
— Sinto falta da minha vida em Nova Iorque — falo e abaixo o
rosto, olhando para minhas mãos. — Lá eu tinha meus amigos, meu
trabalho, os lugares que eu gostava de ir. Aqui eu não conheço nada e nem
ninguém. Tenho me sentido um pouco presa.
— Sabe que você pode sair para qualquer lugar, não é?
— Claro que sei, só não é a mesma coisa.
— Vou falar para o Mohammed passar a ficar mais tempo em casa.
Ele tem estado mais no escritório do que com você...
— Não precisa! — Me aproximo do banco do motorista, e ele vira
para me encarar.
— Está tudo bem entre vocês dois? — pergunta, desconfiado.
— Claro que está! Por que não estaria? — pergunto.
— Vocês dois tem agido muito estranhamente essa semana, apenas
isso — diz, como se soubesse de algo.
— Acho que deve ser impressão sua!
Volto a me encostar no banco e olho para a janela. Odeio ser
completamente expressiva a ponto das pessoas perceberem que tem algo de
errado comigo.
Decido ficar o restante do caminho calada antes que eu fale algo que
não seja apropriado.
**
— Seus exames estão excelentes, Samia, seu bebê está saudável e
você também!
Sorrio e respiro aliviada.
— Graças a Deus, fiquei com medo de ter algum problema.
— Se continuar seguindo as orientações à risca, terá uma gravidez
super saudável.
— Sério?
— Com toda a certeza, querida!
Pouso a mão na minha barriga e a encaro.
— Eu queria saber se eu estou liberada para trabalhar — pergunto.
— Bom, agora não há nada que impeça isso, desde que não seja um
trabalho que exija um grande esforço físico.
— Não, não! Eu só não consigo ficar o dia inteiro dentro de casa
sem fazer absolutamente nada.
— Eu entendo bem...
— Me mudei para Istambul há pouco tempo, não tenho nada em
mente, ficar dentro de casa ociosa não é para mim.
A médica sorri e concorda.
— Está liberada para realizar trabalhos leves e fazer exercícios
físicos. Se sentir algum desconforto ou dor, pode me procurar
imediatamente. — Assinto, concordando. — Quer marcar a sexagem fetal?
— Já? — pergunto, surpresa.
— Você está com onze semanas, já podemos tentar descobrir se vai
ser menino ou menina.
Mordo o lábio, pensativa, mas por fim aceito marcar o exame. É
bom que já começo a montar todo o enxoval.
— Maravilha! — a médica diz, animada!
Após marcar o exame, deixo o consultório e entro no carro.
— Como foi? — Mason pergunta, já ligando ocarro.
— Tudo ótimo, o bebê está saudável e eu também.
— Fico feliz com isso, Samia! Acredito que o Mohammed também
vai ficar feliz quando souber que está tudo bem.
Abaixo a cabeça e mexo nos dedos.
— Acho que sim. — Percebo que ele me encara pelo retrovisor, mas
não diz mais nada. — Mason, preciso da sua ajuda para uma coisa.
— Se estiver ao meu alcance, será um prazer te ajudar.
— Eu acredito que possa sim.
Mohammed
— Ela quer o que? — pergunto, erguendo os olhos para o Mason.
— Exatamente o que você ouviu, ela quer trabalhar.
— Ela não vai trabalhar.
— Por que não? A médica liberou.
— Mas eu não liberei. Ela é minha futura esposa, não precisa mais
trabalhar! Será que é tão complicado entender isso?
— Será que você consegue entender o lado dela? — questiona e eu
o encaro.
— Como?
— Você a trouxe de Nova Iorque. Lá ela tinha amigos, ela tinha um
emprego e conhecia tudo. Aqui ela não conhece nada, não trabalha, está
grávida e sozinha. Acha que ela está bem?
— Ela assinou um contrato milionário, Mason. Acha que ela precisa
trabalhar?
— Nem tudo é por dinheiro, Mohammed. Pense nisso. — Engulo
em seco e desvio os olhos dele. — Mas eu realmente queria entender o que
está acontecendo — diz, me encarando estranhamente.
— O que está acontecendo?
— Vocês dois estão estranhos, mais estranhos que o normal. Além
disso, você parece morar nessa sala enquanto sua noiva está sozinha em um
apartamento gigante. Acha mesmo que ela não tem o direito de conhecer
novos lugares e lidar com pessoas?
— Eu acho que você está vendo coisa demais — digo, desviando o
olhar do dele.
— Certo, certo... Pode até ser que seja coisa da minha cabeça, mas
cuidado. Se seu pai souber que você está deixado sua noiva sozinha desse
jeito, ele pode acabar pensando que vocês brigaram.
— Já entendi, Mason. Agora, se você puder... — Aponto para a
porta e meu amigo sorri, deixando o ambiente em seguida.
Passo uma mão no cabelo e respiro fundo. Tudo que eu queria era
agir normalmente, mas aquele maldito beijo não sai da minha cabeça. Por
mais que eu tente apagá-lo da minha memória, não consigo. A cada instante
que passa, eu reproduzo a cena em minha mente.
Não vou negar, tenho fugido da Samia desde que tudo aconteceu.
Estou sendo um covarde por não encarar a situação de frente e sei que isso
não é correto a se fazer. Mas também não sei que direção seguir. Afinal de
contas, esse beijo não estava nos planos para acontecer. Sei que o Mason
tem razão, preciso ficar mais tempo com a Samia e não dar espaço para
pensarem que nós dois brigamos. E eu irei fazer isso hoje.
**
Olho para o relógio e vejo que é quase meia-noite. Entro no
elevador e aperto o botão do meu andar. O plano era chegar mais cedo, mas
infelizmente acabei tendo uma reunião que durou mais do que o esperado,
já que os fusos eram completamente diferentes.
Saio o elevador e já destranco a porta do apartamento. Entro e paro
na porta ao ver a Samia dormindo na poltrona com um livro apoiado no
braço dela. Coloco minhas coisas em cima do sofá e me aproximo dela.
Ergo uma mão e toco seu rosto delicadamente.
— Por que não foi pra cama, Samia? — pergunto, mesmo sabendo
que ela não vai responder.
Com todo o cuidado para não acordá-la, eu a pego no colo e
caminho em direção ao quarto dela. A porta já estava aberta e isso facilitou
o processo. Coloco-a na cama, ajeito sua cabeça no travesseiro e a cubro,
mas não saio do quarto. Pelo contrário, eu me sento na cama e fico olhando
para ela, dormindo serenamente.
— O que faço com você, Samia? — pergunto.
Samia se mexe e eu paraliso quando sua mão segura a minha e ela
me puxa para mais perto. Acabo sorrindo e lentamente puxo minha mão da
dela. Ela murmura algumas palavras desconexas e eu me levanto.
— Prometo que estarei aqui amanhã no café, Samia — falo.
Fecho a porta do quarto e vou para o meu. Me sento na cama e
começo a desabotoar a camisa. Eu preciso marcar a data do casamento o
mais rápido possível, mas antes, eu preciso conversar seriamente com a
Samia.
Samia
Abro os olhos e me sento imediatamente, notando que estou na
cama.
— Mohammed, você... — Não termino de concluir a frase, me
levanto e deixo o quarto.
Conforme sigo para a sala, vejo que ainda é de madrugada. Desço as
escadas e paro no último degrau. Mohammed está sentado no sofá,
mexendo no notebook e anotando algo em uma agenda.
Engulo em seco e começo a me virar para subir as escadas, tentando
ser o mais silenciosa possível.
— São 2h da manhã, precisa de algo?
Meu pé para no ar antes que eu possa subir o próximo degrau.
Lentamente viro o rosto em sua direção e o vejo me encarando.
— Mohammed, não sabia que estava aí. Não queria atrapalhar —
falo, já desviando o olhar e voltando a subir.
— Quando cheguei você estava dormindo na poltrona.
Volto a olhar para ele.
— Devo ter pegado no sono e não percebi. Obrigada por me levar
até a cama. Boa noite.
— Samia.
Ele me chama e eu ouço seus passos se aproximando de mim. Me
viro em sua direção e meu coração acelera uma batida quando vejo ele subir
os degraus que nos separam.
Não tem como negar que Mohammed é um homem que tem uma
presença assustadora, e isso me faz perder o ar por alguns segundos.
— Queria pedir desculpas por aquele dia — fala.
— Que dia? — falo, sem entender.
— O dia em que te beijei.
Seus olhos estão presos aos meus e não existe a menor chance de eu
conseguir desviar deles.
— Não precisa pedir desculpas, Mohammed. Nós somos adultos e
temos consciência do que fizemos.
— Sinto muito por ter sumido nos últimos dias. Eu tive vários
compromissos e...
— Não precisa me explicar. Eu entendo.
— Samia...
— Mohammed, eu vim para cá já sabendo que você tem sua vida,
que você tem suas prioridades. Eu não estou esperando que você largue
suas obrigações e fique comigo.
— Eu sei que não, mas também não estou agindo como deveria.
— Isso nos torna ainda mais estranhos porque mal nos conhecemos
— falo.
— Eu prometo, Samia, que vou fazer o meu melhor para você não
se sentir sozinha.
— O Mason falou algo pra você?
— O Mason é o tipo de pessoa que faz alertas conscientes e espera
que eu tome alguma atitude.
Assinto e abaixo a cabeça.
— Eu entendo — sussurro e sorrio para ele. — Eu vou me deitar.
Boa noite Mohammed.
— Boa noite, Samia. Durma bem.
Me viro e termino de subir as escadas. Entro no quarto, fecho a
porta e me encosto nela.
— Samia, Samia, acho melhor você começar a separar as coisas.
Vocês têm um contrato. Tudo que está acontecendo é por causa desse
contrato. Apenas isso.
**
Termino de fazer minha maquiagem e saio do banheiro. Pego meu
celular e vejo que são mais de 8 da manhã. Saio do quarto e sigo para o
andar de baixo. Assim que desço as escadas, paro de andar ao ver que
Mohammed está deixando a sala de jantar.
— Bom dia, Samia.
— Mohammed, bom dia. O que faz aqui a essa hora? — pergunto.
— Estou esperando você para tomarmos café.
Me aproximo dele e fico sem saber como responder. Olho ao redor e
minha visão captura a mesa de café.
— Você fez tudo isso? — Desvio o olhar dele e sigo para a sala de
jantar.
— Estaria mentindo se dissesse que sim, apenas organizei a mesa,
comprei o restante.
Sorrio e me viro para ele.
— Obrigada.
— Não precisa agradecer, vamos apenas comer.
Assinto e ele puxa a cadeira para que eu me sente, faço isso e ele se
senta na minha frente.
— Uma delícia — falo, já comendo um pedaço de pão doce. Ele me
serve um copo de suco. — Obrigada.
— Essa semana vamos procurar alguém para ficar responsável pela
limpeza da casa — fala.
— Não precisa, eu dou conta de tudo sozinha — explico.
— Nem pensar, eu prefiro contratar alguém.
— Já estamos gastando tanto...
— Não me importo, vai ser bom pra você ter alguém para te fazer
companhia também.
Tomo um gole do meu suco e o encaro.
— O Mason falou com você?
— Sobre?
— Trabalho.
Mohammed suspira e me encara.
— Acha que realmente precisa trabalhar?
— Mohammed, está cada vez mais difícil ficar aqui o dia inteiro
sem fazer nada, eu sinto falta de trabalhar! Além disso, a médica me
liberou.
— Como foi a consulta ontem? — A pergunta me pega de surpresa.
— Como?
— A consulta, está tudo bem com o bebê?
Pouso a mão no meu ventre e assinto.
— Mais do que bem, a médica disse que eu vou ter uma gestação
muito saudável.
— Eu fico feliz com isso.
Ficamos em silêncio por alguns minutos, apenas comendo, e fico
pensando no que falar para convencê-lo a me deixar trabalhar. Não vou
procurar nada que seja pesado ou que vá prejudicar a gravidez.
O barulho da cadeira me assusta e eu encaro o Mohammed.
— Sairemos em quinze minutos — diz, se afastando.
— Sairemos para onde? — pergunto, virando-me na direção que ele
está indo.
— Você não queria trabalhar? Então, hoje vou te levar para o
trabalho.
— Está falando sério?
Ele se vira e volta a me encarar, assente e eu sorrio.
— Ah! Meu Deus! Mohammed, você é o melhor! — falo, já indo na
sua direção e o abraçando.
Isso o pega de surpresa, me afasto ao perceber o que fiz e sorrio.
— Obrigada!
Subo as escadas antes dele e entro no meu quarto. O abraço foi uma
reação natural. Afinal de contas, fiquei extremamente feliz por ele estar me
dando uma oportunidade de trabalho.
Pego meu celular e digito uma mensagem para a Lisa e o Luke.
Estou com saudades dos meus amigos e quero muito falar com eles.
Organizo minhas coisas dentro bolsa e deixo o quarto ao mesmo
tempo em que Mohammed deixa o dele.
— Está pronta?
— Sim!
Ele aponta na direção das escadas e eu lidero o caminho. Estou
ansiosa para saber o que eu vou fazer, não importa o que seja, mas só de
saber que vou fazer algo já fico extremamente feliz.
**
Mohammed estaciona o carro em frente a um prédio extremamente
alto.
— O que...
— Estamos na sede do hotel Yilmaz — responde à minha pergunta
antes mesmo que eu faça.
— Todo esse prédio faz parte do setor administrativo? — pergunto,
chocada.
— Boa parte dele.
A porta do meu lado se abre e eu desço, agradecendo ao porteiro do
prédio.
— Bom dia, senhor Mohammed — cumprimenta.
— Bom dia, pode guardar meu carro.
— Sim, senhor.
Mohammed se posiciona ao meu lado. Quando ficamos sozinhos,
sinto seus olhos em mim.
— Algo errado? — questiono.
— Nada, mas quero alertá-la: a maioria dos funcionários do hotel
sabe que tenho um compromisso firmado com a Ayla. Porém todos sabem
que eu trouxe uma mulher de Nova Iorque para se casar comigo e que estou
completamente apaixonado por ela. Hoje eles vão descobrir que essa
mulher é você.
— Não se preocupe — falo e ergo a mão para tirar uma pluminha
que tinha na gravata dele. — Farei o meu melhor papel de mulher
apaixonada.
Sua mão segura a minha e a abaixa, entrelaçando nossos dedos em
seguida.
— Sei que vai.
Ele toma a direção para entrar no hotel e eu o sigo, sendo puxada
por ele.
Acontece exatamente o que ele disse; as pessoas começam a nos
olhar e a cochichar enquanto passamos. Minha mão fica gelada, mas sinto a
mão de Mohammed apertar a minha.
Entramos no elevador e dou graças a Deus por ser apenas nós dois
ali.
— Pensei que não fossem parar de cochichar — falo.
— Isso é novidade para todos, afinal de contas, ninguém acreditava
que eu realmente iria arrumar uma noiva.
— Isso porque você é um homem mulherengo que não quer
compromisso? — Se um olhar matasse, eu estaria morta agora mesmo.
Aperto os lábios e tento não rir. — É brincadeira — digo, por fim.
— Quero te deixar a par de todo o processo administrativo do hotel,
assim você pode escolher com o que trabalhar.
— Vai me deixar na administração? — pergunto, me virando para
ele.
— Achou que eu fosse te colocar como camareira?
— Bem...
— Por Deus, Samia!
— Desculpe, força do hábito.
Antes que ele possa falar algo, as portas se abrem e deixamos o
elevador. Sigo atrás do Mohammed, vendo-o cumprimentar as pessoas.
— Senhor Yilmaz! — Uma mulher extremamente elegante vem ao
nosso encontro.
— Sim?
— O senhor tem uma visita em sua sala.
— Eu disse que não queria receber visitas.
— Nós não conseguimos impedir e... — tenta falar.
— Quem é?
— Ayla.
Mohammed se vira em minha direção, mas não fala nada, apenas
segue em frente. Encaro a mulher, que parece desesperada, e resolvo seguir
o Mohammed.
Vejo ele abrir completamente a porta da sala e ficar parado. Paro
atrás dele e seguro em sua cintura levemente, e ele abre espaço para que eu
fique ao lado dele. Então eu a vejo.
Uma mulher linda, de cabelos cor de mel, olhos azuis e que parece
ser extremamente fria. Seus lábios se curvam em um sorriso que não chega
em seus olhos quando me vê.
Ela dá dois passos em nossa direção e para.
— Você deve ser a Samia — diz, me encarando, e então me estende
a mão. — Prazer, sou Ayla, a noiva do Mohammed.
Mohammed
Samia encara a mão estendida da Ayla. A tensão na porta da minha
sala parece que vai explodir a qualquer momento.
— O que você está fazendo aqui, Ayla? — pergunto, erguendo uma
sobrancelha para ela, porém seu olhar continua preso na Samia.
— Pensei que você fosse pelo menos ter a decência de me procurar
quando voltasse para Istambul, mas eu estava enganada. Até uma noiva
você arrumou enquanto estava fora.
— Esse assunto não é para ser discutido aqui, Ayla.
— Não? E quando seria discutido então? — Ela me encara. —
Quando você já estivesse casado com essa aí?
— Acho que se você fosse alguém importante, o Mohammed teria
ido falar com você assim que chegamos em Istambul — Samia diz,
chamando a atenção dela.
— Como é?
— Exatamente o que você ouviu. Se fosse importante, ele teria te
procurado, mas ele não fez.
— Você deve estar achando que esse seu noivado com ele tem muita
relevância, não é?
— Tem mais que o seu. — As respostas que a Samia dá são rápidas
e cortantes, como se estivesse esperando por esse encontro.
— Você realmente está achando que esse casamento vai acontecer?
Está realmente pensando que a família do Mohammed vai aceitar qualquer
uma na família? Espero que esteja pronta para cair do cavalo.
— Existe uma grande diferença entre ser a noiva escolhida pelo
noivo e ser a noiva escolhida pela família do noivo. Mesmo se o
Mohammed e eu não tivéssemos nos conhecido... — Samia olha para Ayla
de cima e baixo e depois a encara com desdém —, ele nunca se casaria com
uma mulher como você.
— Como é...
— Chega, Ayla! — falo, entrando na frente da Samia quando Ayla
tenta partir para cima dela.
— Chega? — Ela me encara. — Está mesmo disposto a romper um
acordo que foi feito com nossa família por causa de uma paixãozinha de
verão?
— Eu te disse antes de ir embora de Istambul que não me casaria
com você, independente da presença da Samia na minha vida ou não.
— É impossível que você tenha se apaixonado por ela, ninguém se
apaixona tão rápido assim!
— Eu não te devo satisfações da minha vida, Ayla. O acordo pode
ter sido feito pelos nossos pais, mas desde que adquiri consciência e
maturidade sobre o que é um casamento, sempre fui contra, e você sabe
disso.
— E eu disse que nós vamos nos casar, pode ter certeza de que isso
vai acontecer. — Ela desvia o olhar para a Samia e deixa a sala, batendo o
ombro no meu ao passar por mim.
Olho para trás e vejo que boa parte dos funcionários parou para ver
o que estava acontecendo. Assim que me veem, eles voltam rapidamente
para seus afazeres. Apoio a mão nas costas da Samia, que apenas me encara
e entra na sala.
Fecho a porta e a levo em direção ao sofá.
— Eu não imaginava que a Ayla estivesse aqui — falo.
— Na verdade, eu já esperava esbarrar com ela uma hora ou outra.
— Esperava? — Arqueio uma sobrancelha para ela.
— Com base no que você me contou e no que já ouvi, acredito que
até tenha demorado a acontecer, já que tem algumas semanas que estamos
em Istambul.
— De fato — comento em um suspiro. — Espero que você não
tenha se assustado.
Samia ri e balança a cabeça em negação.
— Acho que precisa de um pouco mais para que eu me assuste com
o que ela diz — confessa, e eu assinto.
— Tem uma coisa que precisamos conversar — falo, mudando de
assunto.
— O que?
— Precisamos marcar a data do casamento, precisa ser o mais
rápido possível. Então, estava pensando em algo mais simples, se você não
se importar, é claro.
— Na situação em que estamos, eu não tenho muito direito de
escolha — fala, e eu abaixo a cabeça. Em determinados momentos, me
sinto mal por ter proposto um casamento de contrato para a Samia. Afinal
de contas, tudo que vamos viver não passa de uma mentira com prazo de
validade. — Me diga a sua ideia.
— Por causa do bebê, pensei que pudesse ser algo básico.
— Eu acho uma excelente ideia, de verdade. Eu iria propor isso
mesmo, algo mais simples, que não vamos precisar dispor de muito
dinheiro e nem de pessoas para fazer.
— Vamos ver uma data mais próxima e realizar esse casamento
logo, antes que meu pai ou a Ayla façam algo.
— Não consigo imaginar que eles possam tentar fazer algo contra
nós dois.
— A partir do momento que a ganância entra na vida das pessoas,
temos a tendência de ignorar tudo que acontece ao nosso redor e deixar de
nos preocupar com a nossa família. Tudo que fazemos é procurar
possibilidade de nos tornar ainda mais ricos e bem-sucedidos.
— É como uma doença — murmura, e eu confirmo.

— A ganância é a pior doença que o ser humano pode adquirir,


Samia.
— Eu sei...
Desvio o olhar do dela e me coloco de pé.
— Vamos, vou te mostrar como funciona a gerência do hotel.
Estendo a mão para ela, que hesita um pouco antes de segurá-la. A
ajudo a se colocar de pé e indico o caminho para deixarmos minha sala.
**
— Fiquei sabendo que a Ayla veio aqui e encontrou com a Samia —
diz Mason.
— Sim — respondo, ainda analisando um contrato que preciso
assinar.
— Ouvi dizer que a Samia enfrentou a Ayla.
— Sim.
— Também ouvi comentários de que a Ayla jurou que vocês dois
nunca se casariam.
— Sim. — Viro a folha e continuo minha leitura, ignorando a
presença dele.
— Todos estão encantados com a Samia, com a forma como ela lida
com os funcionários...
— Sim, sim...
— Você parece estar cada vez mais apaixonado por ela.
— Sim... — Paro para analisar o que ele disse e o encaro.
Mason tem um sorriso nos lábios e não o esconde de mim.
— Está escrito nos seus olhos, Mohammed.
— O que?
— Que está apaixonado por ela.
— Não estou apaixonado por ela — falo, deixando o documento em
cima da mesa e me levantando.
— Não?
— Não, você está confundindo as coisas.
— Espero que você não esteja confundindo as coisas, meu amigo,
porque se em algum momento você perceber que ela é a mulher da sua vida
e não contar a ela por orgulho, você cometerá o maior erro da sua vida.
— Lembra do que eu te disse no início de tudo? — pergunto.
— O que?
— Que eu jamais me apaixonaria por ela.
Mason me encara por alguns segundos e assente, sorrindo de lado.
— Se você diz...
— Não se preocupe, Mason, que da minha vida amorosa cuido eu.
Volto a pegar o documento para ler, mas fica difícil voltar a me
concentrar. Eu não vou me apaixonar pela Samia, tenho isso muito bem
definido, as chances de isso acontecer são praticamente nulas.
É claro que preciso desenvolver um bom relacionamento com ela,
afinal, as pessoas precisam acreditar que estamos juntos, mas me apaixonar
por ela... não, isso nunca vai acontecer.
Samia

Eu amei conhecer como realmente funciona o hotel. Cada detalhe é


super importante para o desenvolvimento, funcionamento e boa gestão do
local. Na época que eu estava com o Liam, ele não se empenhava nem
metade do que as pessoas fazem aqui. Para ele, tanto fazia o que
acontecesse com o hotel, contando que ele estivesse com alguma
funcionária ou desviando dinheiro.
De todas as coisas que eu olhei e de tudo que o Mohammed me
falou, uma das coisas que mais chamou a atenção, com toda a certeza, foi a
área do marketing da empresa. Nunca pensei que iria gostar de ver as
pessoas fazendo vídeos para redes sociais como forma de atrair clientes
para o hotel. Fora todo o custo, estudo, análise de mercado e tendências que
precisam ser seguidas para que se tenha uma boa propaganda.
Sento no sofá e fico olhando para o nada, apenas pensando.
Dificilmente o Mohammed vai me deixar ficar no setor de marketing.
Afinal de contas, é preciso ter experiência e ser formado na área, algo que
eu realmente não sou.
Solto um suspiro e pego meu celular. Sorrio quando ele começa a
tocar, mostrando uma chamada de vídeo com o nome da Lisa.
— Não acredito que finalmente consegui falar com você! — Sorrio
para a tela do telefone.
— Eu é que não acredito que finalmente você me ligou! Que amiga
desnaturada você é, Lisa!
— Eu não iria atrapalhar o início da sua nova vida de casada...
— Não estou casada.
— Mas vai casar!
Solto um suspiro.
— Sim, vou me casar.
— Se arrependendo agora?
— Eu não diria que estou me arrependendo sabe. Mas parece que
quanto mais chega a hora, mais verdade isso se torna.
— E você está preocupada por que está com medo de se apaixonar
por ele?
— Eu não vou me apaixonar por ele — falo.
— Como pode ter tanta certeza disso?
— Porque não vai acontecer, Lisa. Meu coração está fechado e não
vai se abrir tão facilmente para ele. Pode ter certeza disso.
Minha amiga me encara pela tela do celular, como se não
acreditasse em nada do que eu disse, mas não insiste no assunto.
— Como estão as coisas por aí? — Mudo de assunto.
— Chato sem você, como sempre.
— E você e o Luke, como estão?
— Estamos bem.
— Estão juntos?
— Claro que não, e você sabe disso.
— Não, não sei disso e você sabe. Tudo que eu sei é que você é
apaixonada por ele e não tem coragem de se declarar.
— E nem vou. Pra sua informação, minha paixonite já passou.
Estou em outra. — Franzo o cenho para a tela do celular e ela revira os
olhos. — Estou falando sério!
— Acredito em você — falo, sorrindo.
— Que tal me mostrar sua casa nova por vídeo? Você mandou fotos,
mas não é a mesma coisa! — Foge do assunto e eu apenas assinto, me
coloco de pé e troco a câmera pela traseira.
— Vamos lá, então!
Samia
Termino de passar um chá e me sento no sofá. Ligo a televisão e
estou pronta para começar a assistir alguma coisa, mas o interfone toca,
fazendo-me franzir o cenho.
Quem pode ser?
Me levanto e atendo.
— Alô?
— Dona Samia, bom dia! Tudo bem?
— Bom dia. Tudo sim e você?
— Ótimo, obrigada por perguntar! A Dona Erin está aqui no saguão
e pedindo permissão para entrar.
Arregalo os olhos.
— Podia ter liberado a entrada, sem problema nenhum! — falo, já
nervosa.
— Eu iria liberar, mas ela pediu que eu interfonasse.
— Pode deixá-la subir! Obrigada!
— De nada, dona Sâmia! Tenha um bom dia!
Coloco o telefone no gancho e respiro fundo. Eu não esperava que
ela fosse me visitar sem a presença do Mohammed. Pego meu celular e
mando uma mensagem para ele.
Eu: Sua mãe está aqui. O porteiro acabou de interfonar para que
eu liberasse a entrada dela.
A resposta vem imediatamente.
Mohammed: Não se preocupe, minha mãe não vai fazer nada com
você. É normal dela querer conhecer você.
Eu: Eu sei, só estou nervosa com essa aparição repentina dela.
Estou com um pouco de medo de falar algo que não deveria.
Mohammed: Eu confio em você, Samia. Sei que não vai fazer nada
que possa nos prejudicar. O mais importante é ser você mesma. Minha mãe
é um amor de pessoa.
Eu: Eu percebi naquele dia do jantar. — A campainha toca e eu
olho para a porta. — Preciso ir, ela chegou.
Mohammed: Vai dar certo!
Deixo o celular em cima da mesinha e vou abrir a porta para minha
sogra.
— Sâmia! — diz ao me ver e vem me abraçar.
— Dona Erin, como a senhora está? — falo, tentando não me sentir
estranha ao abraçá-la.
— Estou ótima. Espero que não esteja atrapalhando!
— Não está, não! Só fiquei surpresa com sua visita! Entre!
Dou espaço para ela, que deixa a bolsa em cima da pequena mesa
que deixamos na entrada. Erin observa cada detalhe do apartamento e se
vira para mim, sorrindo.
— Está gostando de Istambul? — pergunta.
— Claro, é bem diferente de tudo que eu já vi ou visitei. É um lugar
encantador.
— Verdade. Já visitei vários países também e nenhum deles se
iguala à beleza de Istambul!
Sorrio e nos sentamos no sofá.
— Aceita alguma coisa? Água? Café? Chá?
— Não, não querida! Na verdade, eu vim aqui para te fazer um
convite.
— Convite? Que convite?
— Aceita almoçar na minha casa?
— Almoço?
— Sim! Acho que será uma boa para nós duas conhecermos melhor.
Além disso, precisamos começar a organizar os preparativos do casamento.
O Mohammed me disse que não quer perder tempo e quer se casar o mais
rápido possível.
— Sim, isso é verdade — afirmo, abaixando a cabeça.
— O que me diz?
Assinto e sorrio para ela.
— Eu aceito!
— Perfeito! Vamos lá?
— Só vou trocar de roupa e podemos ir.
— Certo! Estou te esperando.
Deixo minha sogra - sim, é estranho falar “minha” e “sogra” na
mesma frase - na sala e subo para meu quarto. Abro o closet e procuro
alguma roupa folgada para vestir, minha barriga tem começado a aparecer e
não é bom dar sinais.
Coloco um vestido mais folgado, porém com um cumprimento
abaixo do joelho. Pego uma jaqueta jeans, um par de tênis e minha bolsa.
Deixo meus cabelos soltos e desço as escadas rapidamente.
— Prontinho — digo, quando chego a sala.
— Perfeito!
Nos dirigimos para a porta e deixamos meu apartamento.
**
A viagem até a casa da Erin é feita em silêncio, até porque não sei o
que falar em uma situação dessas. Não consigo elaborar nenhum assunto
que tenha bastante relevância para ser desenvolvido em um diálogo.
Enquanto o carro percorre as ruas de Istambul, fico estralando os
dedos, para conter a ansiedade que me domina por ir a um almoço onde o
Mohammed não estaria presente.
— Quando o Mohammed contou que tinha se apaixonado, iria se
casar e tinha trazido uma mulher de Nova Iorque, fiquei imaginando como
você seria.
— Espero não ter decepcionado sua imaginação — falo.
— Na verdade, você superou aquilo que eu tinha imaginado.
— Sério?
— Com certeza! Tudo que aconteceu no jantar naquele dia me fez
perceber que você é a mulher certa para o Mohammed.
— Eu espero não te decepcionar.
— Sei que não vai.
Não respondo, porque sei que quando eu me divorciar do
Mohammed ela vai perceber que eu não era a mulher certa para ele. Nunca
fui.
**
Chegamos à mansão Yilmaz e devo dizer que ela é muito mais
bonita durante a noite e, claro, todo o jogo de iluminação contribui para
esse meu pensamento. Durante o dia ela tem o seu charme de casa antiga e
tradicional.
Descemos do carro e eu sigo a Erin até a enorme escadaria.
— Meu sonho é acabar com essas escadas — diz, enquanto
subimos.
— É um bom exercício — falo.
— Verdade, mas para quem já tem certa idade como eu, acaba se
cansando mais que o necessário.
Assim que chegamos ao fim da escada entramos na casa, agora
procuro observar mais os detalhes com atenção.
— Não me lembro se falei no jantar, mas essa casa é linda.
— Eu também acho. Ela é um patrimônio da família Yilmaz e será
sua daqui uns anos.
— Não sei se me acostumaria com uma casa desse tamanho.
— Eu também pensava isso. Morei um tempo em um apartamento
também. Depois que me casei com o Osman, tivemos que nos mudar para
cá. Levei alguns meses para conseguir me adaptar a toda a rotina da casa.
— A Eda está em casa? — pergunto quando nos sentamos no sofá.
— Está sim, no quarto dela. Deve estar trabalhando. Ela passa o dia
inteiro naquele quarto.
Sorrio com sua fala.
— Ela sabe que eu estou aqui?
— Não, não avisei para ela. Irei fazer isso agora mesmo. Fique à
vontade, Sâmia.
— Obrigada!
Erin me deixa sozinha e eu vou observar algumas pinturas que estão
expostas na parede. Eu não entendo nada sobre pinturas, nem conheço esses
artistas famosos, mas devo dizer que essa é uma pintura extremamente
interessante.
— Então você está aqui.
Olho para trás imediatamente, assustada com a voz grave.
— Senhor Osman — falo, abaixando a cabeça para ela.
— Não esperava sua visita aqui — diz calmo, e se senta no sofá.
— A Dona Erin me convidou para um almoço.
— A Erin sempre foi extremamente cortês e educada com todos.
Não me admira que ela queira conhecer você melhor.
Não sei o que dizer a seguir, desvio os olhos dele e abaixo a cabeça.
Meu coração está acelerado e tento ao máximo não transparecer que estou
nervosa em sua presença.
— Você é extremamente linda, Samia — diz, mais próximo de mim.
— Obrigada — agradeço rapidamente, ainda sem encará-lo. —
Acho que compreendo um pouco porque o Mohammed quer se casar com
você o mais rápido possível.
— Seu filho é um homem com excelentes qualidades — falo e ergo
os olhos para ele. — Quando o conheci, não imaginava que ele fosse o
herdeiro de um império. Quando me apaixonei por ele, não imaginava que
teria que voltar para a Turquia porque ele morava aqui.
— Você é bem ousada em alguns momentos. — Arqueia uma
sobrancelha para mim.
— Eu sei que, para o senhor, eu estou com seu filho apenas por
causa do dinheiro, mas não é verdade. Eu estaria com ele até mesmo se ele
fosse algum funcionário que recebesse apenas o essencial para viver.
Osman da um sorriso de lado e se afasta de mim.
— Muito bonito o seu discurso, senhorita Samia. Uma pena que o
amor não eleva o nome de uma empresa como a nossa, muito menos traz
prestígio e aumenta a fortuna da família. Apenas fique ciente de que eu
nunca vou aceitar esse casamento. Eu vou separá-los, não importa o que eu
precise fazer para que isso aconteça.
Ele me dá as costas e se afasta.
Solto o ar que nem percebi estar prendendo e me apoio na parede.
Fecho os olhos, a tontura começando a tomar conta do meu corpo. Minha
visão embaça por alguns instantes e respiro fundo, tentando me recompor.
Um enjôo toma conta do meu estômago e tudo que eu comi no café da
manhã ameaça sair.
— Samia! Meu Deus, está tudo bem?
— Um banheiro, rápido! — peço, sem saber se conseguirei segurar
a tempo.
Dona Erin me leva para o banheiro mais próximo e, assim que
chego no vaso, vomito tudo.
— Meu Deus! — Ouço ela murmurar enquanto coloco tudo para
fora.
Quando já não tem nada em meu estômago, me coloco de pé, dou
descarga e vou lavar a boca. Aproveito e jogo uma água no rosto, apenas
me recompor.
— Você está bem, Samia? O que aconteceu? Você comeu algo
vencido?
Vejo preocupação em seus olhos e mordo o lábio inferior. Contar
que estou grávida pode ser um tiro no pé, porém quanto mais o Mohammed
e eu escondermos essa gravidez, pior será no futuro.
— Dona Erin, eu tenho uma coisa para te contar — falo.
— Pode falar, querida.
— Eu estou grávida.
Samia
Dona Erin se senta no sofá e me encara. Não consigo descrever se
ela está feliz, triste, chocada ou incrédula. Seus olhos piscam várias vezes e
eu me pergunto se fiz bem em contar que estava grávida.
— Dona Erin...
— Eu não consigo acreditar... — murmura. — É por isso que o
Mohammed quer se casar tão rápido? Por causa da gravidez?
— Bem, sim, afinal de contas...
— Nada disso! — fala, se colocando de pé. — Onde já se viu? Se
casar às pressas, com uma cerimônia simples... Não, nada disso! Vamos
esperar o bebê nascer!
— Como? — pergunto, espantada.
— Vamos esperar a criança nascer. Teremos mais tempo para
organizar um casamento como você merece e você terá a oportunidade de
se casar com o bebê nos braços.
— A senhora não está com raiva? Chocada?
— Chocada eu estou, confesso que não esperava uma gravidez.
Acredito que o Mohammed sempre tenha sido um homem responsável, mas
também acredito que quando se ama verdadeiramente uma pessoa,
tomamos atitudes que nem percebemos no início.
Fico sem palavras diante da postura dela e abaixo a cabeça. Meu
Deus, o que ela vai pensar quando descobrir que esse bebê não é do
Mohammed?
— Samia... — Segura minhas mãos e eu ergo o olhar para ela. —
Não se preocupe com nada, eu vou cuidar de você como se fosse minha
filha. Estou feliz porque vou ter um neto, parece até um sonho.
— Obrigada, dona Erin — falo, sentindo meus olhos se encherem de
lágrimas.
— Não precisa agradecer, eu estou fazendo isso de coração! Você e
meu filho me deram uma enorme alegria agora. Você não imagina o quanto
estou feliz com isso!
Me puxa para um abraço e eu fecho os olhos, sentindo o gosto
salgado das lágrimas. Que Deus queira que ela jamais descubra que esse
filho não é do Mohammed e que nosso casamento não é de verdade. Eu
jamais iria suportar ver essa mulher magoada por causa da nossa mentira.
**
Eda segura minha mão e sorri para mim, como se me desse força.
Ouço passos se aproximando da sala e viro a cabeça na direção da entrada,
vendo Mohammed entrar rapidamente. Seu olhar pousa em mim
imediatamente, ele se abaixa na minha frente e segura meu rosto com
delicadeza, olhando para mim para saber se estou bem.
— Você está bem? Está realmente bem? — pergunta, preocupado e
eu assinto, com um sorriso casto nos lábios.
— Estou bem, foi apenas um enjôo normal.
— Enjôos não são normais, nós vamos ao médico...
— Mohammed, enjôos são normais sim! — Dona Erin diz e ele se
vira para a mãe, que está trazendo uma tigela de salada de frutas e me
entrega.
— Pode ser alguma coisa que ela comeu e não fez bem e...
— Querido, eu tive você e sua irmã. Enjoos são normais na fase
inicial da gravidez, não surte tanto!
Ele me encara e eu tento tranquilizá-lo com o olhar. Antes que Erin
conseguisse telefonar para ele, pedindo que ele fosse a casa dela, eu mandei
uma mensagem explicando tudo que tinha acontecido, especialmente para
que ele não ficasse com raiva de mim por ter contado sobre a gravidez.
— Não me assuste mais assim — ele diz, virando-se para mim.
— Vou tentar — falo.
— Agora, Mohammed — Erin diz, se aproximando do filho e dando
um tapa no braço dele. — Que história é essa de esconder de esconder a
gravidez?
— Mãe...
— Nada de “mãe”! Quero saber por que não contou que ela estava
grávida!
— Não achei que fosse apropriado, afinal de contas, não somos
casados. Algumas coisas no Ocidente são diferentes do Oriente.
— Eu sei disso, acha que nasci ontem? — Ela se senta no sofá e
solta um suspiro. — Eu estou feliz por essa gravidez, sei que sua
preocupação é com o que as pessoas vão falar, mas você é tão independente
que não achei que fosse se importar com isso.
— Não diz respeito só a mim, mãe. Também diz a respeito à Sâmia
— explica.
— O Mohammed tem um ponto, mãe — Eda entra na conversa e
aperta minha mão, sorrindo em seguida. — Mesmo que a Sâmia tenha sido
criada em Nova Iorque e tenha um pensamento mais ocidental, as pessoas
daqui não pensam igual a eles.
Vejo dona Erin respirar fundo e assentir.
— Está bem, está bem. Vocês me convenceram, mas ainda assim, eu
proponho que o casamento seja realizado quando o bebê nascer. Vocês
podem dizer que se casaram no civil e deixaram para realizar a festa apenas
depois que o bebê nascesse — sugere.
Mohammed me encara. Seu olhar pede minha opinião a respeito e
eu não sei o que dizer. Afinal de contas, logo após o nascimento do bebê,
nosso contrato estaria findando. Casar, para logo depois separar, não faria
sentido.
— Eu acho uma excelente ideia. Vocês podem dizer que são
casados. Ninguém vai exigir a certidão de casamento de vocês. Além do
mais, o herdeiro da família Yilmaz precisa de um casamento à altura do
sobrenome que ele carrega.
— Então, por mim, está aceito — Mohammed diz e eu o encaro. —
Tudo bem para você, querida?
Pisco algumas vezes, assimilando o que ele disse, mas logo
concordo, tentando entender onde ele quer chegar.
— Perfeito! Teremos bastante tempo para organizar o maior
casamento que nossa família já fez! — Erin diz, e eu tento sorrir, mas não
consigo. Apenas abaixo o olhar e começo a comer o que ela me entregou.
Espero do fundo do meu coração que Mohammed tenha uma ideia
muito boa para evitar esse casamento.
**
O caminho de volta para o apartamento é feito em silêncio. Fico
olhando pela janela, apenas presa na caixa do nada, pensando em tudo e
nada ao mesmo tempo.
— Você está calada — ele diz.
— Estou tentando entender qual é o seu plano — falo, virando-me
em sua direção. — Você concordou em nos casarmos após o nascimento do
bebê, mas estará faltando poucos meses para o fim do nosso contrato. Não
faz sentido.
— Será simples. Nós vamos escolher o mês que coincida com o fim
do acordo. Assim, podemos simular uma separação e terminar tudo. Não
precisaremos nos casar.
— É uma boa ideia... — comento.
— Será melhor assim. Dessa forma, você não precisará dizer que é
divorciada.
— Isso não seria um problema para mim — informo.
— Eu sei que não. Vocês ocidentais veem isso como algo normal,
mas nós enxergamos o casamento como uma aliança eterna. Será melhor se
não nos casarmos mesmo.
Assinto, concordando com seu pensamento. Volto a olhar para a
janela.
— Espero que não tenha ficado com raiva por eu ter revelado sobre
a gravidez — digo, após alguns segundos.
— Uma hora ou outra isso seria revelado, afinal de contas, sua
barriga está começando a crescer.
— Você percebeu? — Olho para ele, surpresa. Mohammed me
encara rapidamente e noto um pequeno sorriso em seus lábios.
— Claro que percebi.
É tudo que ele responde. Fico olhando para ele por mais alguns
segundos, mas logo desvio o olhar. Só não consigo conter o sorriso em
meus lábios.
Maldito coração, que acelera por tão pouco!
**
Faz dois dias que a família do Mohammed descobriu que ele será
pai, e desde então não tem parado de chegar presentes aqui em casa. A sala
de descanso está lotada de presentes e bilhetinhos desejando parabéns pelo
casamento e pelo bebê que está a caminho.
Visto uma calça folgada, uma camiseta mais folgada também e
prendo meu cabelo em um rabo de cavalo. Calço um tênis e pego minha
garrafa com água. Ontem decidi começar a caminhar no fim da tarde. Me
exercitar vai fazer bem para o bebê e vai me ajudar a distrair a mente, já que
agora estou me sentindo extremamente sufocada com a família do
Mohammed me ligando, mandando mensagens e querendo saber sobre o
bebê.
Sigo para o elevador e aperto o botão do térreo. Assim que saio,
ouço alguém me chamando.
— Dona Samia! — Olho para trás e vejo o porteiro.
— Oi! Boa tarde!
— Chegaram mais algumas encomendas para a senhora — diz, e eu
faço de tudo para não fazer uma careta.
— Pode deixar tudo aí, irei pedir para o Mohammed pegar quando
chegar — aviso.
— Pode deixar, senhora! Uma ótima caminhada!
— Obrigada!
Me viro e solto um suspiro.
Meu Deus, é tão sufocante! Tenho certeza de que meu bebê não vai
usar nem a metade desses presentes! O pior é que as pessoas ainda não
sabem nem se é menino ou menina, imagina quando souberem?
Continuo andando enquanto tento não pensar nisso. Quanto mais
penso, mais cansada eu fico.
Dou duas voltas em torno do meu prédio e paro tomar um gole de
água. Já estou sentindo minhas pernas pedirem para eu parar, mas minha
meta é aumentar uma volta todos os dias e ainda falta uma volta para
completar o percurso.
— Quem diria que eu te encontraria aqui!
Ergo o olhar para frente, dando de cara com a Ayla. Engulo de seco
e observo as roupas elegantes e caras que ela está usando, enquanto minha
mente faz uma comparação com as minhas, compradas em um brechó
conhecido de Nova Iorque.
Com toda a certeza, ela é a mulher que deveria estar ao lado de
Mohammed. Afinal de contas, ela é elegante, inteligente, refinada e tem o
que o patriarca da família Yilmaz quer: dinheiro.
— Ayla — falo seu nome sem medo e ela sorri de lado, se
aproximando de mim.
— Eu nunca iria imaginar que a futura esposa do Mohammed fosse
aparecer na rua tão mal arrumada. — Seu tom de voz é de puro deboche.
— Estou apenas caminhando, se você não percebeu — falo,
pausadamente.
— Percebi... — Ayla dá a volta em torno de mim e para na minha
frente. — Sabe de uma coisa, Sâmia?
— O quê?
— Você pode ter o dinheiro que for, pode se casar com o homem
mais rico que existir, mas você nunca vai tirar esse ar de pobre que você
tem. Você nunca será uma mulher à altura de carregar o sobrenome Yilmaz.
— E você tem? — pergunto, em um tom de desafio.
— Eu nasci para carregar esse sobrenome, querida.
Sorrio de lado e dou um passo em sua direção.
— Então vai ter que nascer de novo, porque eu já carrego esse
sobrenome — falo e ergo a mão direita para ela, onde ela pode ver a aliança
de casamento. Seus olhos se arregalam.
— O que isso quer dizer?
— Mohammed e eu nos casamos há alguns dias — falo e abaixo
minha mão. — Você não pode fazer mais nada.
Ela começa a rir, mesmo não tendo um traço de humor em seus
olhos.
— Impossível!
— Não mesmo, esqueça esse noivado que existe apenas na sua
cabeça e deixe a mim e ao meu marido em paz — aviso, sussurrando.
Desvio dela e começo a andar, mas sua mão segura meu braço e eu
viro o rosto em sua direção.
— Esse jogo só vai acabar quando eu desistir de jogar. Você pode ter
se casado com ele, mas pode ter a certeza de que eu vou acabar com seu
casamento, ou não me chamo Ayla Şahin.
Ela me solta e segue seu caminho. Fico olhando até que ela suma do
meu campo de visão e respiro fundo. Acho melhor ir para casa, não sei por
que, mas tenho certeza de que ela não vai deixar isso barato.
Mohammed
Abro a porta do apartamento e franzo o cenho ao encontrar tudo
escuro. Acendo as luzes da sala e deixo minhas coisas no sofá. Tiro o terno,
o colete e desfaço o nó da gravata. Abro os primeiros botões da camisa e do
pulso. Sigo para a cozinha, abrindo a geladeira para me servir de um copo
de suco.
Ouço a porta da sala se abrindo e vejo a Samia entrando no
apartamento. Deixo o copo em cima da mesa e me apoio no balcão,
cruzando os braços.
— Onde você estava? — pergunto. Samia ergue a cabeça assustada
e me encara com os olhos arregalados.
— Fui caminhar. A médica disse que era bom para o bebê —
responde, entrando na cozinha e indo beber água.
— Aconteceu alguma coisa?
— Por que você acha que aconteceu algo?
Solto um suspiro. Os seguranças que eu contratei para estarem
alertas a cada passo que a Samia desse me informaram que ela encontrou
com a Ayla hoje. Minha vontade foi de ligar imediatamente para a Samia e
perguntar o que tinha acontecido, mas não quero que ela saiba que coloquei
dois seguranças para cuidarem dela.
— Apenas perguntei. Você não costuma chegar tão tarde em casa —
falo.
Samia olha para a janela.
— Acho que perdi um pouco da hora caminhando — diz, e coloca
uma mão na cabeça.
— Está sentindo alguma coisa? Enjôo? Tontura? — Me aproximo
dela e seguro seu braço.
Samia me encara, os olhos castanhos me prendendo. Suas pálpebras
se movimentam lentamente e ela desvia o olhar do meu.
— Estou bem, é apenas cansaço. Vou tomar um banho e procurar
algo para comer.
— Que tal se eu cozinhar para você? — pergunto, e ela sorri de
lado.
— Você cozinha?
— Está de brincadeira? É um dos meus melhores talentos!
Ela sorri abertamente.
— Isso eu terei que ver.
— Está duvidando das minhas habilidades?
— Eu? Jamais! — diz, em tom de deboche.
— Samia...
Dou dois passos em sua direção e ela desvia de mim, sorrindo.
— Vou tomar um banho enquanto você prepara algo! — diz, a voz
já longe da cozinha.
Não consigo conter o sorriso que brota em meus lábios, e mais uma
vez a pergunta sobre o que está acontecendo entre nós dois brota na minha
mente. Balanço a cabeça em negação e decido começar a preparar o nosso
jantar.

**
Aprendi a cozinha desde cedo, afinal, sempre gostei de ficar sozinho
e de preparar minhas próprias coisas. Não cozinho mais por falta de tempo
mesmo, mas é algo que gosto de fazer quando quero pensar e espairecer a
mente.
Analisando tudo que temos nos armários, decido fazer um macarrão
pra nós. Acredito que a Sâmia deva estar com saudades de uma comida
mais ocidental.
Uma vez tive a oportunidade de aprender uma receita de um
macarrão um pouco diferente do convencional com um chef italiano de
grande prestígio. Apesar de não me lembrar com exatidão da maneira que
ele preparou o prato, acho que consigo reproduzir pelo menos o molho que
ele fez.
Depois de colocar o macarrão para cozinhar e cortar todos os
ingredientes necessários começo a fazer o molho.
— Que cheiro bom!
Olho para trás e sorrio ao ver a Samia entrando na cozinha. Ela está
usando uma calça de moletom e uma camiseta. Desço um pouco os olhos e
sorrio ao perceber que sua barriga está um pouco maior.
— O sabor está mil vezes melhor que o cheiro! — falo e ela sorri,
sentando-se na cadeira.
Termino de montar o prato sob sua supervisão e organizo a mesa,
colocando dois pratos e duas taças. Coloco a travessa com o macarrão na
mesa e observo Sâmia fechar os olhos ao apreciar o cheiro da comida.
— Uau! Se o cheiro está tão convidativo, imagina o sabor! — fala
ao abrir os olhos.
— Agora você acredita nos meus dotes culinários? — pergunto,
servindo suco para nós dois.
— Só darei esse veredito após comer — diz, e eu sorrio.
Sirvo ela primeiro e a observo enquanto ela enrola o macarrão no
garfo e o leva até a boca. Enquanto mastiga, Samia fecha os olhos e uma
expressão de satisfação toma conta de seu rosto.
— Então? — pergunto, esperançoso.
— Perfeito! Meu Deus! — diz, comendo mais, e eu sorrio,
começando a me servir.
— Eu sabia que você iria gostar.
— Acho que nunca comi um macarrão tão gostoso em toda a minha
vida. O que é esse molho?
— Segredo do chefe — falo e pisco um olho para ela.
— Meu Deus, agora você vai se achar pelo resto da vida — fala.
— Existe algum problema em você me elogiar? — Arqueio uma
sobrancelha.
— Pense comigo, Mohammed, você já é rico, inteligente, herdeiro
de uma rede de hotéis mundialmente conhecida, bonito, fala não sei quantos
idiomas...
— Você me acha bonito? — pergunto, interrompendo-a.
— Como?
— Você me acha bonito? — repito a pergunta e ela me encara,
piscando algumas vezes.
— Eu disse isso?
— Sim, você disse.
— Não me lembro. — Samia se faz de desentendida.
— Claro que não se lembra.
— Está vendo por que não pode receber um elogio? Seu ego infla!
— Mas se tudo que você diz é verdade, por que não posso achar isso
bom?
— Vamos comer, Mohammed!
Sorrio e volto a comer com ela.
O que diabos essa mulher tem que consegue me fazer sorrir em
diversos momentos do meu dia?
Terminamos de jantar e a Samia se levanta, tirando as coisas de
cima da mesa.
— O que está fazendo? — pergunto.
— Você cozinhou, eu vou lavar.
— Nada disso! — Me levanto e tiro a louça de suas mãos.
— Por que não?
— Você está grávida! — falo o óbvio e ela revira os olhos.
— Grávida, não doente! Posso muito bem fazer as coisas.
— Samia, pode deixar que eu cuido das louças...
— Nada disso!
Ela se aproxima da pia e eu vou atrás dela, prendendo-a entre meus
braços.
— O que você... — Ela se vira em minha direção, o que nos deixa a
centímetros de distância.
Observo Samia engolir em seco, e eu faço o mesmo. Lentamente,
ergo a mão direita e tiro uma mecha de cabelo está em seu rosto, colocando-
a atrás da orelha. Sinto seu corpo estremecer com meu toque, e meu coração
acelera por causa isso.
— O que está fazendo? — Sua voz sai como um sussurro.
— Não faço à mínima ideia, mas parece que meu corpo ganha
vontade própria quando estou perto de você.
— Não podemos fazer isso... — Ela abaixa o olhar, e eu desço a
mão até seu queixo, erguendo-o em seguida.
Seus olhos encaram os meus e, por um instante, me perco neles.
— Acho que posso me arrepender do próximo passo — sussurro,
descendo os olhos para seus lábios.
— Não faça nada do que possa se arrepender depois — pede.
Ergo os olhos para os dela e não consigo mais me controlar. Seguro
seu rosto entre minhas mãos e tomo seus lábios em um beijo urgente. Samia
imediatamente corresponde, suas mãos sobem pelos meus braços, indo para
os meus ombros e, em seguida, para meu pescoço. Desço as mãos para sua
cintura e puxo seu corpo para perto do meu.
Samia solta um gemido rouco em minha boca, e eu aperto sua
cintura, aprofundando ainda mais nosso beijo. Nossas línguas parecem
insaciáveis uma pela outra, nossos lábios foram feitos um para outro, e eu
nasci para ter essa mulher em meus braços. Essa é a única constatação que
vem à minha cabeça enquanto a beijo.
Ergo seu corpo e a coloco sentada no balcão da pia. Suas pernas se
abrem, e eu fico entre elas.
Diminuo a velocidade do beijo e mordo seu lábio inferior, chupo sua
língua e desço beijos pelo seu queixo, até chegar em seu pescoço. Sua
respiração acelera, e suas mãos me apertam.
— Mohammed... — sussurra meu nome, e eu ergo o rosto para olhá-
la. Seus lábios estão vermelhos e inchados.
— Samia... — Seu nome parece ser afrodisíaco. Fecho os olhos e
aperto sua cintura, trazendo-a para mais perto de mim.
A vejo fechar os olhos e respirar fundo.
— Não podemos... — ela sussurra, e eu afundo meu rosto em seu
pescoço, aspirando seu cheiro e me perdendo nela.
— O que nos impede? — falo em seu ouvido.
— Tudo. Nós prometemos que isso seria apenas um acordo...
Beijo a pele do seu pescoço, esfregando minha barba na pele
sensível.
— Que se dane o contrato, o acordo. Eu preciso de você nesse
momento, Sâmia... — Olho dentro de seus olhos, e ela me encara
completamente perdida. Consigo ver a batalha interna que está sendo
travada dentro dela.
— Mohammed, deixe-me pensar. Eu não quero fazer nada que vá
me deixar arrependida depois, e você também não deve fazer isso.
— Acha que eu vou me arrepender?
— Acho que você está tomando uma atitude movida pelo desejo.
Fecho os olhos e respiro fundo, assentindo. Me afasto dela e ela
desce do balcão.
— Você tem o tempo que quiser para pensar — falo e ela assente,
mas não diz nada, apenas passa por mim.
Em um reflexo seguro seu braço, e ela me encara.
— O que foi?
— Não quero que pense que seja apenas pelo desejo.
Solto seu braço e saio da cozinha, subindo para o meu quarto em
seguida. Assim que entro e fecho a porta, me controlo para não voltar e
beijá-la novamente.
Essa noite será vencida à base de um banho gelado e trabalho.
Samia
— Como é? — Lisa grita do outro lado da linha.
— Lisa, fala baixo! — peço, desesperada.
— Falar baixo depois de você me contar tudo isso? Impossível! —
Fecho os olhos e solto um som de lamento. — Por que essa cara?
— Não era para isso estar acontecendo!
— Eu sei que não, mas aconteceu, e aí? Vai fugir dele até o
contrato terminar?
— Eu tenho medo, Lisa!
— Medo de que?
— Lisa, você não faz ideia de como as coisas são aqui. O
Mohammed é praticamente endeusado. Ele é referência em todo o país, a
família dele é uma das mais ricas de Istambul, você acha mesma que ele
quer algo comigo?
— Ele não é Liam, amiga.
— Eu sei que não, mas se eu me envolver com ele, a queda vai ser
mil vezes maior. Nosso relacionamento é baseado em um acordo
milionário!
— Acho que vocês não contavam que poderiam se interessar um
pelo outro — analisa.
— Eu já me sinto mal por estar mentido para a família dele, agora
me envolver com ele, isso ultrapassa todos os limites que foram colocados.
— Acho que você deveria dar uma chance — fala.
— Como?
— Dá uma chance, amiga. Você não disse para ele que iria pensar
por que tem medo de fazer algo e se arrepender depois?
— Sim.
— E se você se arrepender de não ter ficado com ele? Vocês moram
juntos, a cada dia que se passa vai ser mais difícil resistir ao desejo que
sentem um pelo outro.
Mordo o lábio inferior e solto uma espécie de grunhido.
— E se não der certo?
— Se não der certo, bola pra frente. Quando esse contrato acabar,
você pega seu bebê, suas coisas e finge que ele nunca existiu na sua vida.
— Eu preciso...
— Pensar, eu sei. Mas cuidado para não pensar demais e esquecer
que a vida também precisa ser vivida.
Assinto para ela. A campainha do apartamento toca e eu desvio o
olhar do celular.
— Preciso atender. Depois nos falamos.
— Me ligue depois de tomar uma decisão! Beijos, te amo.
— Também te amo. Beijos.
Encerro a chamada e me levanto do sofá. Abro a porta da sala e
sorrio ao ver a Eda.
— Eda, não esperava você aqui! — falo, abraçando-a.
— Estava passando aqui perto e resolvi fazer uma visitinha.
Minha cunhada entra no meu apartamento.
— Quer comer algo?
— Não, não! Vim apenas ver como você está!
— Estou bem e você?
— Bem — ela hesita um pouco ao responder eu franzo o cenho.
— Tem certeza?
Eda solta um suspiro e se joga no meu sofá.
— Eu queria que existisse algum remédio que me fizesse esquecer
alguém — murmura.
Se esse remédio existisse, eu seria a primeira pessoa a comprá-lo.
— O que houve?
— Você sabe que eu gosto do Mason, certo?
— Sempre suspeitei, mas não quis perguntar.
— Pois é. Eu sou apaixonada por aquele idiota desde que ele
começou a trabalhar para o Mohammed.
— E ele?
— É aí que está o problema! — diz, com raiva. — Ele diz que não
gosta de mim, mas suas atitudes são completamente contraditórias!
— Já tiveram algo?
— Já, mas ele terminou comigo porque disse que não seria bom
misturar as coisas. E que eu estava confundindo os sentimentos e...

Eda aperta uma almofada no rosto e solta um grito, me fazendo rir.


— Não tem graça, Samia! — diz, apontando para mim, e eu ergo as
mãos.
— Não falei nada.
— Me ajuda, Samia! — pede, descendo do sofá e se abaixando ao
meu lado.
— Ajudar como?
— Preciso fazer aquele cabeça dura admitir que está apaixonado por
mim.
— Não é melhor simplesmente perguntar para ele?
— Ele vai negar com todas as forças. É mais fácil tirar uma
confissão sem que ele perceba que é uma confissão.
Solto um suspiro, tentando pensar em como fazer isso, mas
nenhuma ideia vem na minha cabeça.
— E se você pedir ajuda ao Mohammed?
— Não sei se daria certo. Meu irmão é meio careta com essas
coisas... Como foi ouvir um “eu te amo” vindo dele pela primeira vez?
— “Eu te amo”?
— Sim!
Desvio o olhar do dela e foco na parede branca.
— Foi inexplicável! Afinal de contas, eu não esperava.
— Foi antes ou depois dele descobrir a gravidez?
— Antes — minto, porque isso não foi algo que combinados. Afinal
de contas, a gente nunca imaginou que alguém perguntaria quando ele disse
o primeiro “eu te amo”. Até porque não teve o primeiro.
— Vocês dois são tão lindos juntos e apaixonados! A maneira que
ele te olha e cuida de você... Nunca imaginei que eu veria meu irmão desse
jeito.
— Algumas coisas mudam — sussurro, sem saber o que falar.
— E como mudam... — Ela se coloca de pé e sorri para mim. —
Não se preocupe comigo, foi apenas um desabafo.
— Sabe que se precisar da minha ajuda para algo é só me chamar,
certo?
— Claro que eu sei, e digo o mesmo! Você vai ao jantar? — Muda
de assunto.
— Provavelmente sim, mas não tenho certeza ainda.
O Mohammed me enviou uma mensagem avisando de um jantar
importante que ocorrerá hoje e disse que seria de suma importância que
participássemos, mas que entenderia se eu não quisesse ir.
— Todos os acionistas da empresa estão esperando vocês nesse
jantar, ainda mais depois que a notícia do casamento de vocês saiu.
— Imagino que sim.
Desde quando Mohammed decidiu espalhar a notícia de que
estamos casados, para que ninguém estranhe a minha gravidez, não param
de sair notícias sobre a identidade da esposa misteriosa do herdeiro Yilmaz.
No caso, eu.
— Se você for, basta me mandar uma mensagem que eu ajudo com
o look.
— Pode deixar, farei isso!
— Preciso ir. Foi bom conversar com você.
Ela me dá dois beijinhos no rosto e eu a levo até a porta. Quando
fico sozinha, solto um suspiro.
Afinal de contas, devo ou não ir nesse jantar?
**
Termino de secar meu cabelo e me encaro no espelho. Estou usando
um macacão preto, o modelo dele é bem solto no corpo e não marca muito a
barriga. Por cima, vou usar um casaco mais grosso na cor preta também.
Minha maquiagem está leve e optei por deixar o cabelo solto mesmo. Pego
meu salto na cor nude e calço, minha bolsa e estou pronta.
Decidi ir nesse jantar apenas para que as especulações sobre o
casamento com o Mohammed acabem.
Ouço uma batida na porta do quarto.
— Pode entrar — falo e ergo a cabeça assim que vejo o Mohammed.
Não importa o que aconteça ou quantas vezes eu o veja arrumado,
parece que sempre é a primeira vez. Afinal de contas, ele parece ficar ainda
mais lindo vestido dessa maneira.
— O que acha? — pergunta.
E eu sorrio de lado.
— Está super elegante.
Mohammed sorri de lado e me ajeito.
— E eu?
Seus olhos percorrem meu corpo de cima a baixo e eu sinto um
arrepio em minha pele.
— Impressionante como consegue estar ainda mais linda.
Não consigo evitar o sorriso que nasce em meus lábios.
— Acho que já podemos ir — falo.
Mohammed estende o braço em minha direção e eu aceito.
Deixamos o quarto em completo silêncio e assim seguimos o caminho
inteiro até o espaço onde o jantar vai ocorrer.
**
Mohammed para o carro em frente à entrada e eu me assusto com a
quantidade de fotógrafos que tem ali.
— Não se preocupe, basta ignorá-los — Mohammed diz e eu
assinto.
— Não imaginei que fossem tantos.
— Eles parecem urubus atrás de carne, mas não vão fazer nada com
você. Estarei do seu lado o tempo inteiro.
O encaro e faço que sim com a cabeça.
Mohammed desce e eu espero ele dar a volta no veículo, ele abre a
porta para mim e eu seguro sua mão para conseguir descer do carro.
No exato momento em que piso meu pé na calçada, milhares de
flashs são disparados em nossa direção. Ouço a porta ser fechada e
Mohammed segura minha cintura, me apoiando.
— Apenas me siga — diz, em meu ouvido.
Começamos a andar pelo corredor que leva até a entrada do salão,
sendo acompanhados por seguranças e pelos milhares de flashes disparados
pelos fotógrafos.
Assim que entramos no saguão, respiro fundo ao ver que isso
acabou.
— Viu? Nem foi tão ruim!
— Como consegue viver assim? — pergunto e ele dá de ombros.
— Já me acostumei, hoje não me afeta mais.
— Seu nome está sendo mencionado em todos os sites de fofoca do
mundo e você não liga?
— Uma hora ou outra isso iria acontecer, Samia. Estou mais
preocupado com você do que comigo.
Mordo o lábio inferior e concordo. Ele passou a vida inteira tendo
holofotes sobre seu nome, eu nunca tive isso. É claro que ele já estaria
acostumado com tudo isso.
— Vem, vamos entrar.
Ele segura minha mão e seguimos para dentro do salão.
Sempre imaginei que esses eventos fossem chatos e cansativos, não
me surpreendi ao constatar que é verdade. Todas as pessoas estão
interessadas apenas em ter um minuto de conversa com a família do
Mohammed. A exceção de hoje é que todos querem me ver e conversar
comigo.
Minha sorte é que o Mohammed está dizendo que não falo turco
muito bem, o que tem evitado as pessoas de conversarem comigo.
— Me sinto uma atração turística — sussurro para a Eda, que tenta
segurar o riso, mas não consegue.
Isso faz com que o Osman me olhe de cara feia. Eda contou que o
pai já sabe sobre minha gravidez, mas não comenta nada. Confesso que
tenho medo do que ele pode fazer, a última coisa que eu quero é envolver
meu filho em jogos políticos.
— Daqui uns dias as pessoas se acostumam com o fato de você ser a
esposa do Mohammed.
— Espero que sim — falo, em um suspiro.
— Lá vem ele.
Olho na direção que ele vem e sorrio ao ver que ele traz uma taça de
suco para mim.
— Obrigada — agradeço quando ele me entrega e ele pisca para
mim, se sentando ao meu lado.
— Mohammed, o Mason entrou em contato com você sobre a
Capadócia? — Erin pergunta.
— Sim, sim. Preciso averiguar algumas coisas antes de falar se irei
ou não. Além do mais, não quero deixar Samia sozinha.
Sinto meu rosto esquentar e viro-me em sua direção.
— Não se preocupe comigo...
— Se o problema é deixar a Samia sozinha, apenas a leve com você.
Minha cabeça vira na direção da dona Erin e eu pisco algumas
vezes.
— Me levar?
— Vai ser bom para você também, sair um pouco dos holofotes.
Tenho certeza de que você vai amar conhecer a Capadócia!
— O que você acha? — Mohammed pergunta e eu me viro para
encará-lo.
— Não quero te atrapalhar — falo.
— Você nunca me atrapalhar, e minha mãe tem razão, vai ser bom
para você.
— Se vocês insistem... Nós vamos para a Capadócia.
Mohammed sorri para mim e eu sinto um frio na minha barriga,
como se fossem milhares de borboletas levantando voo. Tomo mais um gole
do meu suco e penso se foi uma boa ideia aceitar ir nessa viagem. Afinal,
preciso dar uma resposta para Mohammed e essa viagem pode ser definida
apenas pela minha resposta.
Samia
Uma semana foi tempo suficiente para que toda a viagem para a
Capadócia fosse preparada. Mohammed e Mason cuidaram de tudo:
passagens, hospedagens e eu fiquei apenas observando os dois discutirem
tudo sem me perguntar nada.
Nos últimos dias também explodiu os comentários sobre nosso
casamento, principalmente depois da aparição na festa. Tem fotos nossas
espalhadas pelas redes sociais, revistas e sites de fofoca, muitos deles
elogiando e dizendo que formávamos um casal lindo, outros lançados vários
questionamentos. Até a Ayla foi incluída no meio de algumas postagens.
Li algumas coisas nos primeiros dias, mas o Mohamed aconselhou
que eu não ficasse presa a isso e ele tem toda a razão, pois li coisas bastante
absurdas a respeito do nosso relacionamento.
— Você parece preocupada — Eda diz, se sentando e assoprando
sua xícara de café.
— Impressão sua — falo.
— Será mesmo?
Eda me encara de uma maneira tão profunda que eu baixo os olhos e
pego meu capuccino nas mãos.
— Apenas preocupação com a viagem — falo.
— Por que está preocupada com a viagem? A Capadócia é incrível!
Um dos lugares mais lindos e diferentes que eu já tive a oportunidade de
conhecer.
— Eu andei pesquisando algumas coisas mesmo. É incrível!
— O Mohammed deve te levar para andar de balão — diz, animada.
— Por que acha isso?
— Porque você é praticamente esposa dele, e é considerado um dos
passeios mais românticos que existe ali!
— Talvez isso não aconteça — falo.
— Por que não? Às vezes eu vejo que você tem dúvida sobre os
sentimentos do Mohammed!
— Que mulher não teria, Eda? — falo, sendo um pouco sincera. —
Olha o seu irmão, o status que ele tem. Ele poderia ter qualquer mulher,
mas ele me escolheu. Eu não tenho nada. Não tenho status, não tenho
dinheiro, perdi minha família e...
Mordo o lábio inferior. Ainda não consigo acreditar em tudo que
tem acontecido nos últimos dias, principalmente em relação ao Mohammed
e a mim. Quem iria imaginar que algum dia ele fosse pedir para que eu
ficasse com ele, esquecendo que temos um contrato em jogo?
Estou mais confusa a cada dia que se passa e com essa viagem
parece que terei que dar uma resposta o mais breve possível para ele.
— Samia, a gente vê pelo jeito que o Mohammed te olha, pela
forma que ele cuida de você, que ele fala de você. Meu irmão nunca se
apaixonou na vida e mesmo que ele tivesse carinho por alguma outra
mulher, ele nunca tratou ninguém assim. Meu irmão está definitivamente
completamente apaixonado por você.
**
Olho mais uma vez para ter certeza de que não estou me esquecendo
de nada. Estou levando uma mala grande e uma pequena, além de uma
bolsa com meus documentos e itens pessoais. Pego meu celular e confiro a
hora. Precisamos ir para o aeroporto agora.
— Está tudo pronto?
Olho na direção da porta e vejo Mohammed parado. Assinto e ele
entra no quarto, pega a mala grande e a pequena.
— O Mason já está esperando a gente — diz e se vira.
Espero ele sair do quarto e solto o ar. Nos últimos dias ele tem
falado apenas o necessário comigo. Não sei o motivo dele estar agindo
assim. Na verdade, eu sei, mas não quero que seja isso.
Deixo o quarto e decido pensar nisso depois. Eu sei que precisamos
conversar, mas o medo de me machucar está falando mais alto do que
qualquer coisa.
Entramos no carro e Mohammed fica mexendo no celular. Eu fico
olhando para a janela, mas sinto o olhar do Mason sobre nós dois, como se
ele soubesse que está acontecendo algo.
O trajeto até o aeroporto é feito tranquilamente e em silêncio.
Mason nos auxilia com as malas e se despede de nós.
— Se precisarem de algo, basta ligar — diz.
— Não se preocupe, Mason. Vai dar tudo certo — Mohammed diz.
Com isso, ele se vira e começa a andar. Solto um suspiro e encaro o Mason,
tentando sorrir em seguida.
— Precisam conversar — ele diz, e eu viro o rosto para olhar o
Mohammed andar pelo aeroporto.
— Por que diz isso? — Me viro para ele novamente.
— Algumas questões só são resolvidas na base da conversa, Samia.
Além disso, está na cara que o que era pra ser apenas uma mentira tem se
tornado verdade.
— Eu tenho medo.
— Eu te entendo, mas se deixarmos o medo nos paralisar, não
vamos viver o sentimento mais lindo que o ser humano tem a capacidade de
sentir.
— Deveria ouvir seu próprio conselho, Mason. Afinal de contas, a
felicidade pode estar bem próxima de você. Você só precisa admitir.
Ele assente.
— Boa viagem, Samia.
— Obrigada.
Me viro e sigo atrás do Mohammed.
Capadócia, aí vamos nós.

**
O voo durou menos de uma hora e meia, bem mais rápido do que
imaginei que seria. Mohammed continuou sem trocar uma palavra comigo.
Confesso que estou começando a ficar incomodada com isso.
Pegamos um táxi e seguimos para o hotel em que ficaremos
hospedados. Sim, é um hotel da rede que Yilmaz. É exatamente por isso que
viemos para cá. Mohammed tem alguns negócios para tratar aqui sobre o
hotel.
Desde que conheci o Mohammed ele tem falado mais em inglês,
mas desde que chegamos aqui ele praticamente só tem falado em turco. Ele
conversou em turco com o motorista do táxi, com a recepcionista do hotel e
com algumas pessoas que ele encontrou pelo caminho.
Pelo tempo que estou aqui na Turquia, eu também já deveria estar
falando, mas não pratiquei o suficiente. Então consigo entender apenas
algumas palavras, mas não consigo falar nada.
Entramos no quarto e eu tiro o sobretudo que estou usando.
Mohammed tira o terno e se senta no sofá, já começando a mexer no tablet.
Solto um suspiro alto e ele me encara.
— O que foi?
— Você está me ignorando há dias.
— Impressão sua — diz, voltando a olhar para o tablet.
— Impressão minha? Você não tem nem olhado pra mim nos
últimos dias! Aconteceu alguma coisa? Eu fiz algo que desagradou você?
Mohammed coloca o tablet em cima do sofá e fica de pé.
— Você acha que é fácil para mim?
— O que não é fácil?
— Você acha que é fácil ficar perto de você e fingir que ainda estou
agindo sobre a influência de um maldito contrato?
— Você quem propôs o contrato! — grito.
— Porque eu não imaginava que fosse me apaixonar por você,
droga! — ele diz e eu fico paralisada por alguns segundos.
Meu coração acelera dentro o meu peito e eu abro a boca para tentar
falar algo, mas nada sai. A voz dele ecoa na minha mente o tempo todo. Seu
olhar está preso em mim, esperando uma resposta para o que ele acabou de
dizer, mas eu não consigo verbalizar nada nesse momento.
— É por isso que eu não queria falar nada — ele diz, sentando-se
novamente. — Porque eu sabia que você ficaria calada.
— Eu não sei o que dizer — sussurro.
— É tão simples, basta dizer sim ou não. Essa espera tem me
matado, Samia. Eu tenho ficado louco, porque, ao mesmo tempo em que
para a sociedade você seja minha, nós dois sabemos que isso não é verdade.
— Você não consegue pensar no meu lado também? Do medo que
eu sinto...
— Medo de quê? — Ele se levanta e vem em minha direção.
— De me machucar, de você se cansar de mim, de ver que não
passou apenas de uma aventura, de que...
— Hey! — Ele segura meu rosto entre suas mãos. — Isso nunca vai
acontecer.
— Como pode me garantir isso? — pergunto.
— Eu nunca brincaria com seus sentimentos, Samia. Eu não teria
essa capacidade. Você se tornou a pessoa mais importante para mim nos
últimos dias. Eu seria um louco se pensasse em machucasse você. Tudo que
eu mais desejo agora é saber se esses sentimentos são recíprocos, ou se
estou sozinho nessa.
Encaro seus olhos. Meu coração está batendo fortemente contra meu
peito e a ansiedade pela minha própria resposta toma conta de mim, me
deixando com um frio na barriga, como se eu estivesse prestes a pular de
um lugar muito alto.
— Você não está sozinho — sussurro. — Talvez eu esteja me
apaixonando por você e não tenha coragem de admitir.
— Você está falando sério? — ele pergunta e eu assinto.
— Acho que nunca falei tão sério em toda a minha vida.
Mohammed encosta a testa na minha. Fecho os olhos e sinto meu
corpo relaxar aos poucos.
— O que você acabou de dizer muda completamente o curso das
coisas.
— Eu sei.
— Está mesmo disposta a tornar tudo isso verdade?
Abro os olhos, encarando os dele.
— E o contrato?
— Que se dane o contrato. Eu não quero viver a minha vida, viver a
nossa vida em torno dele.
Sorrio diante disso e ele sorri junto.
— Isso é loucura — sussurro.
— A maior loucura que já cometi na minha vida, mas não vou me
arrepender.
— Como sabe?
— Você está comigo, Samia. Com você eu não tenho motivos para
me arrepender de nada.
Ergo os pés e fecho o espaço entre nós, o beijando e pegando-o de
surpresa. Mohammed solta meu rosto e segura minha cintura, me puxando
para si e me beijando de volta. Nossos lábios entram em uma sincronia
perfeita. Levo minhas mãos até seu pescoço e acaricio sua nuca.
Mohammed se afasta e me dá mais um selinho, depois outro, e
outro, e outro, e eu sorrio.
— Eu te prometo, Samia, que eu nunca vou deixar você se
arrepender de ter escolhido ficar comigo.
— Eu acredito em você, Mohammed.
Ele sorri e volta a me beijar.
É a partir desse momento, nosso relacionamento, que era uma
mentira, se torna a melhor verdade de nossas vidas.
Samia
A experiência de ver um local com os próprios olhos e de ver uma
fotografia é completamente diferente. A Capadócia é ainda mais
deslumbrante vista pessoalmente. Apesar de ter um clima meio seco, tem
suas peculiaridades. Afinal de contas, a formação da cidade é o resultado de
erupções vulcânicas e erosões, então ela possui várias cavernas - tanto
naturais quanto artificiais -, e vários museus que contam a história da região
e a importância dela para estudiosos.
Li em certo documentário que a paisagem lembra muito o solo
lunar, por causa de todas as interferências climáticas pelas quais ela passou.
Mohammed segura minha mão e me ajuda a subir alguns degraus
para chegarmos ao restaurante onde vamos almoçar. Algumas das cavernas
da região são habitáveis e servem como ponto turístico, e é onde optamos
por almoçar hoje.
— O que você quer comer? — pergunta, enquanto olho o cardápio e
eu apenas passo os olhos nas opções de comida.
— Não sei. Não gostei muito dos nomes dos alimentos daqui —
sussurro e o vejo sorrir.
— São um pouco diferentes, mas garanto que são uma delícia.
— Me sugira um, então — falo e ele assente.
Mohammed chama o garçom e faz o pedido, falando em turco.
— Ainda não consegui me acostumar com a língua daqui — falo
quando ficamos sozinhos.
— Você não está treinando a fala, por isso — explica e eu assinto.
— Ainda prefiro ficar no inglês.
Mohammed sorri e fica brincando com minha mão.
— O que vocês pretendem fazer aqui? — pergunto.
— Queremos ampliar a área do hotel. Não é algo fácil. Construir
aqui já não foi fácil, ampliar então...
— Por que querem ampliar?
— Capadócia é uma região extremamente turística e recebe em
torno de 25 milhões de turistas por ano.
Arregalo os olhos.
— Tudo isso?
— Sim, tudo isso. Com a expansão do hotel, poderíamos ganhar
ainda mais. Por isso, preciso avaliar todos os prós e contras antes de dizer
se vale a pena ou não.
— Entendi...
Nossas bebidas chegam e agradecemos. Experimento o suco e sorrio
para Mohammed.
— Muito bom.
— Sabia que iria gostar.
Essa versão do Mohammed é completamente diferente de todas as
que eu já vi. É incrível ver como ele está diferente comigo. É impossível
não me sentir uma adolescente de 16 anos tendo experiências românticas
com seu primeiro namorado.
Nossa viagem tem duração de 15 dias, ou seja, tempo demais para
turistarmos pela região. Se antes eu não estava animada, por causa da
situação com o Mohammed, agora estou mais do que tudo! Pronta para
conhecer todos os lugares e fazer boas recordações daqui.
**
Após o nosso almoço, fomos andar um pouco. Comprei algumas
coisinhas, como roupas e alguns produtos de pele. Mohammed aproveitava
cada momento para tirar fotos minhas e me deixar sem graça.
Compramos algumas coisas dessas barraquinhas que ficam nas ruas
e ri muito do Mohammed experimentou uma espécie de doce apimentado.
Decidimos voltar para o hotel no fim da tarde. Afinal, estou cansada
e não posso me esforçar muito por causa do bebê e também por conta da
viagem. Só quero deitar na minha cama e dormir.
— Eu preciso responder alguns e-mails e confirmar algumas
reuniões para amanhã — Mohammed diz assim que entramos no quarto.
— Sem problemas. Vou tomar um banho antes de pedirmos o jantar.
Ele assente e caminha para a varanda, enquanto eu vou para o
banheiro. Assim que fecho a porta e me encaro no espelho, não consigo
esconder o sorriso que nasce em meus lábios.
Talvez eu possa estar cometendo a maior burrice da minha vida?
Sim, mas não quero ter arrependimentos lá na frente, como não ter dado
ouvido ao meu coração.
Tiro minhas roupas e entro direto debaixo do chuveiro. Deixo a água
morna cair sobre minha pele levando embora todo o cansaço, além de me
deixar mais relaxada.
Termino meu banho e visto um top e uma calça branca. Pego meu
creme e volto para o quarto.
— Mohammed? — chamo, mas ele não responde.
Olho na varanda e vejo que está vazia também. Dou de ombros e me
sento na cama. Ele deve ter ido resolver alguma coisa.
Passo creme na minha barriga e começo a massageá-la lentamente.
— Oi, meu filho! Hoje foi um dia bem cansativo para a mamãe.
Andamos bastante, mas acho que você gostou, porque não reclamou em
momento nenhum. Até das comidas você gostou.
Sorrio enquanto minha pele absorve o creme.
— A cada dia que passa, fico mais ansiosa para a sua chegada. Fico
imaginando se você é menininho ou menininha, mas independente do que
você for, eu vou te amar de qualquer forma. Quando voltarmos pra casa,
prometo já começar a cuidar do seu enxoval. Quero preparar um quartinho
lindo para você e estar pronta para te receber com todo amor e carinho que
você merece.
— Eu nunca pensei que uma cena assim seria tão linda.
Olho para trás e vejo o Mohammed. Sorrio para ele.
— Não ouvi você chegar.
— Não quis interromper você — fala ele.
Noto que ele olha para minha barriga.
— Quer chegar mais perto? — pergunto.
— Posso?
— Claro que pode!
Mohammed sobe na cama e me surpreendo quando ele se posiciona
atrás de mim, me deixando entre suas pernas.
— Posso segurar?
— Pode — respondendo em um sussurro e fecho os olhos quando
suas mãos se apoiam em minha barriga.
Solto uma respiração profunda quando ele começa a massagear a
região. Aproveito o momento e me encosto em seu peito, curtindo o
momento.
— Você estava conversando com ele? — pergunta, chocado.
— Estava. A médica disse que é bom para ele conhecer minha voz,
principalmente nesses momentos de autocuidado.
— Posso tentar?
— Claro.
— Como você o chama?
— De vários jeitos. Bebê, meu filho, apesar de não sabermos o sexo
ainda.
— Ok... — Sinto o Mohammed tomar uma respiração profunda e
voltar a massagear minha barriga. — Oi, meu filho...
Meus olhos se encheram de lágrimas no mesmo instante. Esse bebê
não é filho do Mohammed e vê-lo chamá-lo de meu filho me deixou
emocionada.
— Eu não sei direito o que falar — continua, me fazendo sorrir
agora. — Mas estou ansioso pela sua chegada. Eu estava um pouco ausente,
mas pode ter certeza de que vou vir conversar com você todos os dias e vou
cuidar muito bem da sua mãe enquanto você não chega. Eu posso não ser o
seu pai de verdade, mas serei o melhor pai que você vai ter. Eu te prometo.
Sinto as lágrimas escorrem pelo meu rosto e fecho os olhos. Eu
nunca pensei que durante a gravidez esse momento seria tão importante,
muito menos tão especial.
— Está chorando? — ele pergunta.
— Eu não estava preparada para isso — sussurro, ergo uma mão
para secar minhas lágrimas e paro no meio do caminho ao sentir um chute
na minha barriga.
— O que foi isso? — ele pergunta, pois suas mãos ainda estão
espalmadas na região do meu ventre.
— Um chute — sussurro, incrédula. — Ele chutou!
Começo a sorrir quando sinto mais outro.
— É a primeira vez que isso acontece? — pergunta, maravilhado, e
eu assinto.
— Sim! Meu Deus!
— Sabe de uma coisa, Samia?
— O quê?
— Estou descobrindo que você me deu o melhor presente que uma
pessoa poderia receber — fala, sorrindo, e eu mordo o lábio inferior,
sorrindo em seguida.
— Você está dando algo que eu jamais teria coragem de pedir —
falo.
— O quê?
— Um pai pro meu filho.
Viro o rosto para encará-lo e ele ergue uma mão para secar minhas
lágrimas.
— Eu vou ser o melhor pai que esse bebê poderia ter. Eu te prometo.
Assinto e ele se aproxima para beijar minha testa. Fecho os olhos e
solto um suspiro.
Quando descobri a gravidez pensei que passaria todos os momentos
sozinha, mas o destino colocou o Mohammed em minha vida de um forma
meio peculiar, mas que tem feito ele se tornar importante para mim e para
meu filho. Esse momento que fiz tantas vezes sozinha acabou de ganhar um
novo significado. A presença do Mohammed em minha vida ganhou um
novo significado. Como dizem por aí, pai não é quem faz, é quem cria.
**
— Samia... Samia... — Ouço uma voz me chamar de longe e franzo
o cenho, abrindo os olhos em seguida.
— O que foi? — pergunto, vendo Mohammed completamente
arrumado. — Aconteceu alguma coisa?
Já me sento na cama, preocupada.
— Não, não aconteceu nada. Quero te levar a um lugar.
Olho na direção da janela e volto a encará-lo.
— Que lugar é esse que precisamos ir de madrugada? — Estou
confusa e talvez seja o sono.
— É surpresa, mas prometo que você vai amar.
Assinto e me espreguiço, levantando em seguida. Me arrumo em
cerca de quinze minutos, prendo meu cabelo em um rabo de cavalo e visto
uma roupa mais confortável, junto com um sobretudo.
— Café? — pergunta, com uma xícara na mão.
— Obrigada!
Pego a xícara e tomo um gole, encarando-o.
— Para onde vamos?
— Surpresa — torna a dizer e eu reviro os olhos. — Vamos!
Ele entrelaça nossos dedos e seguimos para fora do quarto.
Ainda é de madrugada quando deixamos o hotel. Fiz questão de
olhar a hora quando passamos pela recepção e não eram nem cinco da
manhã. Me pergunto que lugar é esse que requer que estejamos lá de
madrugada.
Andamos de carro cerca de vinte minutos e, assim que Mohammed
para o carro, eu sei o que vamos fazer.
— Não acredito! — sussurro, vendo vários balões parados.
— Assistir o amanhecer na Capadócia é uma das experiências mais
lindas que se pode viver. Assistir de balão torna o momento inesquecível.
Me viro para ele e seguro seu rosto, me aproximando dele.
— Você é incrível, Mohammed! — falo e beijo seus lábios
rapidamente, fazendo-o sorrir.
Mohammed desce do carro e abre a porta para mim. O vento está
frio, mas acho que minha animação não está me deixando sentir frio. Sigo
Mohammed e o vejo conversar com um homem. Em seguida, ele me chama
com um sinal e eu vou até ele.
— Essa é a minha esposa, Samia.
— Como vai, senhora? — cumprimenta em inglês e eu sorrio.
— Vou bem, obrigada! E você?
— Muito bem! É a primeira vez que viaja de balão?
— Sim!
— Está nervosa?
— Um pouco!
— Não se preocupe, é super seguro. Vamos colocar o equipamento.
Ele me ajuda a vestir o equipamento e a subir no balão. Mohammed
vem em seguida.
Quando tudo está pronto, já vejo que o céu começa a ganhar cores
em tons laranja, o que indica que o sol está prestes a nascer. Mohammed
segura minha mão quando o balão começa a subir.
Os primeiros raios solares começam a despontar no céu quando já
estamos no alto e sim, é uma das visões mais lindas que eu já vi na minha
vida. Os braços do Mohammed passam em minha cintura e apoio o corpo
no dele, sorrindo em seguida.
— O que está achando? — pergunta, sussurrando.
— Perfeito — falo.
— Quero passar todos os meus amanheceres com você, Samia.
Me afasto dele e me viro em sua direção.
— Você tem certeza do que está dizendo?
— Absoluta! Eu não quero ficar longe de você por nenhum
momento. Tudo que eu quero é estar ao seu lado, assistindo todos os
nasceres do sol com você em meus braços.
Sorrio e as lágrimas caem dos meus olhos sem aviso prévio.
— Nós vamos assistir todos os amanheceres juntos.
Ele me beija.
Não tem para onde fugir, estou completamente apaixonada por esse
homem.
Mohammed
ALGUNS DIAS DEPOIS

É incrível como cada sorriso da Samia me conquista de uma


maneira única e espontânea. Cada vez que ela sorri, meu coração bate mais
rápido. Tenho vontade de sorrir junto e quero fazê-la sorrir mais vezes.
Será que é assim que um homem se sente quando está se
apaixonando? Como se a pessoa que está ao nosso lado fosse nossa vida
inteira e cada detalhe que a envolvesse teria que se tornar especial, por que
é para ela?
Nunca pensei que, em algum momento da minha vida, uma mulher
se tornaria tão importante para mim, mas isso aconteceu e devo dizer que
me sinto o cara mais sortudo do mundo em ter uma mulher como ela ao
meu lado.
— Senhor?
Acordo dos meus pensamentos e olho para a balconista.
— Sim?
— Já está tudo pronto. Vai precisar de mais alguma coisa?
Sorrio e nego.
— Apenas isso, muito obrigada!
Sigo na direção do elevador e pego meu celular. Já estamos há mais
de uma semana na Capadócia. Parece que o tempo resolveu passar mais
rápido nos últimos dias, sem contar que o trabalho parece ter se
multiplicado. Tudo o que eu queria era finalizar minhas obrigações e voltar
para o quarto do hotel para ver a Sâmia.
Visitamos cada canto da Capadócia e pode ter certeza de que vamos
voltar aqui em breve, mas será apenas a passeio. Nada de trazer trabalho
junto. Quero aproveitar todos os momentos com a Samia.
Abro a porta do quarto e sorrio ao ver a Samia deitada no sofá,
lendo um livro. Me aproximo lentamente e beijo seu rosto, pegando-a
desprevenida.
— Que susto! — fala e se senta, fechando o livro.
— Demorei?
— Nem percebi — fala, sorrindo.
— Um livro é mais interessante do que eu? — pergunto,
preocupado, e ela sorri dela.
— Com certeza!
— Como é, Samia? — Me levanto e ela cai na gargalhada.
— Brincadeirinha...
Franzo o cenho para ela, que fica de joelhos no sofá e me puxa para
perto pelo terno aberto.
— Senti sua falta hoje.
Ergo uma mão e acaricio seu rosto.
— Eu também senti, mas infelizmente não consegui sair a tempo
para poder te ver.
— Não tem problema, sei que você está aqui a trabalho.
— Prometo que vou trazer você aqui novamente, apenas para
passearmos, sem trabalho e nem nada.
— Eu vou amar.
Aproximo minha boca da dela e lhe dou um selinho, depois outro, e
outro, e outro. Samia sorri e eu a beijo de verdade, segurando sua cintura e
a puxando para mim.
Os beijos dela são como combustíveis diários, que me recarregam e
me deixam com mais vontade de estar com ela.
— Está pronta? — pergunto, entre os beijos.
— Com toda a certeza!
Ela me beija mais uma vez e se afasta, desce do sofá e pega sua
bolsa. Hoje ela está usando um vestido um pouco mais justo do que estou
acostumado a vê-la usando. O tecido se molda perfeitamente em seu corpo
e sua barriga está perfeitamente contornada.
— Gostou? — pergunta, sem graça.
Caminho em sua direção e me abaixo para ficar na altura de sua
barriga. Envolvo sua cintura com um braço e beijo sua barriga por cima do
tecido.
— Você está linda — falo, acariciando sua barriga. — E você,
campeão? Como está? — pergunto para o bebê.
— Como pode ter tanta certeza de que é um menino?
— Intuição de pai! — Me coloco de pé e beijo sua testa. — Vamos,
preciso te levar em um lugar.
Entrelaço nossas mãos e deixamos o quarto.
**
Hoje me programei para levar a Samia para jantar e ver o pôr do sol
ao mesmo tempo. O local para onde vamos agora é um dos melhores para
ver as estrelas e desfrutar de um bom jantar.
Eu realmente queria fazer algo diferente para ela, para tornar a
viagem ainda mais inesquecível.
— Estou realmente curiosa sobre o que você está aprontando —
Samia diz no instante em que coloco uma venda nos seus olhos e a guio
para o local onde vamos ficar.
— Eu sei que está, mas vai valer a pena.
— Poderia ao menos dizer o que vamos fazer — fala e eu sorrio.
— Acredite, Girassol, a surpresa fica mil vezes melhor quando você
não fala nada.
Continuo ajudando-a a subir os degraus e, assim que chegamos na
pequena varanda, viro ela de frente para o horizonte, mas não tiro a venda
de seu rosto.
— Chegamos? — pergunta e consigo sentir a ansiedade em sua voz.
— Chegamos. O que você está sentido agora?
— O sol em mim — responde.
— Gosta da sensação?
— Adoro!
— Você está pronta?
— Você vai me matar de ansiedade assim, Mohammed! — Sorrio
com sua reação e ergo as mãos para retirar sua venda. — Pronta?
— Mohammed...
Solto a venda e eu poderia ter uma câmera nesse momento apenas
para registrar sua reação. Seus olhos se arregalam e ela abre a boca em um
“o” perfeito, me fazendo sorrir.
— Gostou?
— Mohammed, isso é... isso é... Meu Deus, não tenho nem palavras
para descrever!
Passo os braços em volta da sua cintura, abraçando-a por trás e a
trago para perto de mim.
— Queria que nossa última noite aqui fosse inesquecível para você.
— Você tem tornado essa viagem inesquecível desde o momento em
que chegamos. Não precisava fazer mais nada.
— Precisava sim! Eu adoro ver esse sorriso em seu rosto.
— Acho que essa é a cena mais linda que eu já vi em toda minha
vida. Na verdade, acho que o nascer e o pôr do sol estão bem empatados.
Acaricio sua barriga e beijo seu pescoço.
— Nunca pensei que fosse realizar um antigo sonho infância —
falo.
— Que sonho?
— Trazer alguém aqui para assistir ao pôr do sol.
— Você tinha esse sonho?
— Um sonho de uma criança que não sabia muito sobre a vida. O
tempo foi passando e eu me esqueci completamente disso, mas você me fez
relembrar esse desejo.
Samia se vira em minha direção e coloca os braços em volta do meu
pescoço.
— Obrigada, Mohammed — fala e acaricia minha barba.
— Pelo que está me agradecendo?
— Porque você me deu esperança novamente. Agora eu acho que as
coisas podem dar certo para mim, que eu finalmente serei feliz de verdade.
— Eu te prometo, Samia. Eu vou fazer o possível e o impossível
para fazer de você a mulher mais feliz desse mundo.
Samia abre um sorriso e fica na ponta dos pés, seus lábios encostam
nos meus levemente, apenas fazendo cócegas. Sorrio com isso e beijo a
ponta do seu nariz.
— Mohammed, preciso te dizer uma coisa — sussurra e me olha
dentro dos olhos.
— Pode dizer.
Ela sorri ainda mais ao falar:
— Eu amo você.
Acho que em toda minha vida eu nunca abri um sorriso tão
verdadeiro como agora.
— Eu também amo você, Samia. Eu amo muito você.
Tomo seus lábios em um beijo e nesse beijo eu prometo a mim
mesmo que nunca vou me separar dessa mulher, pois se um dia isso
acontecer, ela vai levar com ela tudo que há de bom em mim.
**
ISTAMBUL

Confesso que se dependesse de mim e da Samia, teríamos ficado


mais tempo na Capadócia, mas infelizmente alguns desejos não podem ser
realizados. Chegamos ao apartamento ontem à noite, completamente
exaustos. As únicas coisas que fizemos foi tomar um banho e dormir.
Hoje, quando saí de casa, a Samia ainda estava dormindo. Deixei
um bilhete ao lado dela da cama e vim para o escritório. Ainda tenho várias
coisas para fazer, principalmente agora que a festa de aniversário do hotel
está chegando. São muitas coisas para organizar e muitos detalhes para
decidir. Hoje ainda terei uma reunião com os chefes de cada equipe para
alinhar todos os gastos que teremos.
— Essa viagem parece ter sido muito boa — Mason diz ao me
analisar minuciosamente.
— Por que diz isso? — questiono, mexendo em alguns papeis.
— Seu rosto está diferente. — Ergo o olhar para ele.
— Impressão sua — falo.
— Será?
Ignoro sua última fala e continuo mexendo nos papeis.
— Já está tudo pronto para a reunião? — pergunto.
— Sim, sim. Estou apenas esperando...
A porta da minha sala se abre e ergo os olhos para ver a Eda
entrando como um furacão.
— Como foi a viagem? – É a primeira pergunta que ela faz.
— Foi a primeira pergunta que fiz a ele e não foi respondida —
Mason fala.
— Ele pode não ter respondido você, mas com certeza vai me
responder.
— Boa sorte!
— Será que dá para vocês dois pararem de brigar por um instante?
— peço.
— Será que você pode responder minha pergunta?
— Não.
Me coloco de pé e ajeito meu terno.
— Eu não consigo acreditar! Era para vocês dois estarem nas
nuvens depois dessa viagem! — Eda reclama. — Como você pode vir para
a empresa hoje e ainda mercar uma reunião?
— Do que você está falando, Eda? — pergunto, sem entender nada.
— Mohammed, eu não acredito que você se esqueceu!
— Do que eu me esqueci?
— É hoje que a Samia vai descobrir o sexo do bebê! — Ela ergue o
pulso para ver a hora. — Na verdade, ela já deve estar no consultório agora!
Paraliso no mesmo estante. Não é que eu tenha esquecido, eu
simplesmente não sabia que a Samia teria uma consulta hoje.
— Mason, cancela a reunião de hoje — aviso, já indo em direção a
porta.
— Mas você vai aonde? — Ouço ele perguntar.
— Vou descobrir o sexo do meu filho! — grito, já passando pela
porta.
Samia
Rolo o feed do Instagram enquanto espero a médica me chamar para
o ultrassom. Saí tão apressada de casa que me esqueci de trazer o kindle
dentro da bolsa. Por causa do cansaço da viagem, acabei dormindo mais do
que deveria e quase perdi a hora para vir à consulta. Minha sorte é que,
quando liguei para o Mason, ele se prontificou na hora a me trazer ao
consultório.
Eu iria pedir ao Mohammed para me trazer, mas quando acordei
pela manhã, ele já havia saído para trabalhar. Inclusive, acordei com um
bilhete dele ao lado da minha cama.
Solto um suspiro e olho para o aparelho de televisão que está preso
na parede. Está passando uma novela e algumas cenas me prendem a
atenção.
— Samia Aksoy!
Me coloco de pé assim que a médica me chama, sorrio para ela e
sigo para dentro da sala.
— Samia!
Paro no mesmo instante e olho para trás, vendo o Mohammed se
aproximar de mim a passos largos.
— Mohammed, o que fazer aqui? — pergunto, surpresa.
— Por que não me contou que hoje você iria descobrir o sexo do
bebê?
— Eu ia contar, mas você saiu cedo hoje e eu nem pensei que você
iria querer saber e...
— Samia, tudo que for relacionado a você e ao bebê é importante
para mim.
— Como sabia que eu estaria aqui hoje?
— A Eda comentou.
— Me desculpa por não ter falado — digo e ele nega, sorrindo em
seguida e segurando meu rosto.
— Só se lembre de sempre me avisar quando você tiver consultas.
Eu quero acompanhar tudo.
Sorrio e assinto. Mohammed beija minha testa e eu me viro em
direção a médica, que sorri para mim. Mohammed entrelaça os dedos com
os meus e sorrio para ele.
— Você deve ser o pai da criança — ela fala, sorrindo.
— Sim, sou eu — ele responde.
— Bom, então vamos entrar!
A médica da passagem para nós dois.
Troco de roupa e a doutora me ajuda a deitar na cama. Ela passa um
gel por toda a minha barriga e sorri ao pegar o aparelho do ultrassom.
— Ansiosos?
— Muito — falo.
— Já vamos conseguir ver hoje o que é? — Mohammed pergunta,
ansioso.
— Se o bebê cooperar, vamos sim!
O aparelho começa a ser passado na minha barriga e nós olhamos
atentamente para a televisão. Mohammed aperta minha mão conforme a
médica vai indicando os membros do bebê.
— Os bracinhos... A cabecinha... As perninhas... olha os pezinhos
aqui! Aqui, vamos conseguir ver e... — Ela nos encara sorrindo.
— Então, doutora? O que é? — Mohammed parece mais nervoso
que eu.
— Parabéns! Vocês estão esperando um lindo menino!
— Um menino? — pergunto, sorrindo.
— Um menino!
— Eu falei para você! Eu disse que seria um menino! —
Mohammed fica de pé e se inclina para me beijar. — Meu Deus, meu filho
vai ser um menino! Meu Deus!
Sorrio e sinto as lágrimas descerem pelo meu rosto.
— Um menino! — repito, sorrindo. — Um menino!
— Um menino, Girassol! Você vai ser a mãe de um lindo menino.
— Obrigada — falo e ele me encara, enxugando minhas lágrimas.
— Esse agradecimento é pelo quê? — pergunta. Seu polegar
acaricia meu rosto e eu sorrio.
— Por ser a pessoa que está comigo nesse momento.
— Eu estarei com você em todos os momentos, Samia. Sempre que
precisar.
Ele beija minha testa.
Hoje, quando me lembrei da consulta, me perguntei como seria a
experiência de saber o sexo do bebê sozinha. Até a alguns instantes, eu
pensei que estaria sozinha, mas assim que Mohammed chegou, todas essas
preocupações foram sanadas. Eu não poderia escolher uma pessoa melhor
para estar ao meu lado nesse momento.
Ele beija minha testa mais uma vez e acaricia minha barriga.
— Nosso filho — ele sussurra e eu assinto.
— Nosso filho — concordo.
**
Infelizmente, o Mohammed teve que voltar para a empresa logo
após o fim do exame e eu voltei para nosso apartamento. Abro a porta da
sala e paro no mesmo instante ao ver que o Senhor Osman está sentado no
sofá.
— Como...
— Não existe lugar que eu não consiga entrar, Samia — diz, em tom
sério.
Engulo em seco e deixo minha bolsa em cima do móvel da sala.
— O que senhor quer? O Mohammed está no escritório.
— Eu sei, por esse motivo vim aqui — fala e se coloca de pé.
Desvio o olhar do dele.
— Algum motivo especial?
— Até quando essa farsa vai durar?
— Como?
— Até quando vocês dois vão continuar com esse teatro?
— Não sei do que o senhor está falando.
Osman sorri de lado e dá dois passos em minha direção.
— Acha mesmo que eu não sei que esse relacionamento de vocês
dois não passa de uma mentira? E agora vocês arranjaram uma gravidez.
Resta-me perguntar se ela é de verdade ou não.
— Eu não vou aceitar que você venha dentro da minha casa e fale
assim comigo.
— Só porque você tem algum tipo de relacionamento com o
Mohammed você acha que pode falar comigo assim?
— Em nenhum momento eu desrespeitei o senhor. Só não acho que
seja justo o senhor vir atrás de mim com acusações falsas!
— Se você realmente está grávida, quem é o pai dessa criança?
Porque tenho absoluta certeza de que não é meu filho.
— O senhor só pode estar louco...
— Coloque uma coisa na sua cabeça, Samia. — Seu tom de voz se
torna baixo e sombrio. — Se a mídia descobrir que vocês nunca tiveram um
relacionamento de verdade, ou que essa gravidez seja uma mentira, ou que
esse filho não seja do Mohammed, não é para cima do meu filho que eles
vão, será para cima de você e eu vou garantir que eles acabem com a sua
vida de uma maneira que você nunca mais vai conseguir viver livremente
em qualquer canto do mundo para onde você for.
Eu não respondo nada, apenas olho para o homem a minha frente e
engulo em seco.
— Está me ameaçando? — pergunto, em um sussurro.
— Jamais! Apenas te alertado da realidade. Anote minhas palavras,
eu tenho o poder de transformar a sua vida em um inferno.
Ele se afasta de mim e joga um envelope em cima da mesa.
— Espero que você seja esperta o bastante para entender o meu
recado.
Ele deixa o apartamento em passos largos. Só consigo voltar a
respirar quando ouço a porta da sala sendo fechada. Me sento no sofá e
pego o envelope em minha mão, abro e tiro de lá um cheque com o dobro
do valor que a Dona Erin tinha me oferecido no começo.
Trato de guardar o cheque no envelope novamente e respiro fundo.
Mohammed não pode saber que o pai dele veio aqui hoje.
**
Termino de organizar as coisas do almoço e o interfone toca. Seco
as mãos no pano de prato e vou atender.
— Pode deixar ela subir. Obrigada!
Logo após o Osman ir embora, recebi uma mensagem da dona Erin
falando que ela queria almoçar comigo. Com isso, acordei do meu estupor e
decidi fazer algo para ela comer, com o tempero mais ocidental mesmo.
Preparei uma comida bem rápida, porém bastante apetitosa.
A campainha toca e eu vou receber a dona Erin.
— Samia, querida! Que saudades!
— Eu também estava!
Ela me abraça e me entrega uma sacola de papelão.
— O que é isso?
— Um presente para meu neto!
— O Mohammed já te contou!
— Mas é claro! Eu nem acredito que você está esperando um
menino!
— Gostou?
— Eu amei saber! — Ela me abraça novamente. Entramos no
apartamento e nos sentamos no sofá. — Abra! Eu estou ansiosa para saber
se você vai gostar!
Tiro de dentro da sacola um conjuntinho azul claro e abro, é um
macacão pequeno, com sapatinhos, luva e touca.
— Que lindo! Eu amei! — falo, emocionada.
— O Mohammed usou esse conjunto quando saiu da maternidade
comigo.
— Está falando sério? — A encaro de olhos arregalados.
— Sim! Eu guardei especialmente para que o filho dele usasse
também quando fosse o momento certo.
— Dona Erin...
— Sem o “dona”, por favor — pede, e eu engulo em seco.
— Erin, eu não sei se posso aceitar isso — falo e olho para o
presente.
— Você deve, Samia! Você trouxe ao Mohammed algo que nunca
pensei que fosse ver nele.
— O quê?
— Amor e cuidado, além de várias outras coisas. Você é responsável
pela felicidade do Mohammed. Você e esse bebê.
— Obrigada — falo. Ela senta ao meu lado e segura as minhas
mãos.
— Você ama meu filho? — Sua pergunta me pega desprevenida. —
E não estou falando de paixão, estou falado de amor de verdade, daqueles
que a gente se sente capaz de fazer tudo pela pessoa, sem ao menos pensar
nas consequências.
— Eu amo seu filho, Erin — afirmo. — Mais do que eu imaginei ser
possível.
— Então enfrente tudo por ele, seja o que for.
— Eu vou enfrentar, pode ter certeza.
Ela sorri para mim e vira o rosto em direção a cozinha.
— Eu não sei o que você preparou, mas está com um cheiro ótimo!
— Vem, vamos almoçar. Espero que a senhora goste!
— Tenho certeza de que vou amar!
Seguimos para a cozinha e durante o almoço não consegui deixar de
pensar em como uma mulher tão boa como a Erin terminou casada com o
Osman. Eles dois tem personalidades tão opostas! Enquanto um me quer
longe do filho a todo custo, ela quer que eu enfrente todos os desafios por
ele.
Nunca imaginei que pensaria isso, mas vale a pena correr qualquer
risco pelo Mohammed.
Mohammed

— Você parece sério — Samia diz, mas não respondo. — Aconteceu


alguma coisa na empresa? — continuo calado. — Mohammed, eu estou
falando com você!
— Eu estou ouvindo, Girassol! — falo, sorrindo.
— Então por que está me ignorando?
— Não estou te ignorando.
— Não? Tem certeza disso?
— Você é quem está apressada — falo e coloco uma mão em cima
do meu joelho.
— Estou falando com você desde que entramos no carro! Nem
contar onde estamos indo você contou!
— É surpresa.
— Você e suas surpresas! — murmura, e eu viro rapidamente para
ela.
— Você fica linda quando está contrariada. — Acredito que, nesse
momento, se um olhar matasse, eu estaria morto. — Estamos chegando,
Girassol.
— Não consigo nenhuma pista do que você está aprontando?
— Nenhuma.
Ouço-a respirar alto e sorrio de lado.
Tem duas semanas que descobrimos que nosso bebê será um menino
e, desde então, tenho corrido atrás de algumas coisas. Agora está
oficialmente pronto e eu mal posso esperar para ver a reação da Samia.
— Chegamos — aviso, já estacionando o carro.
— Que lugar é esse?
— Confia em mim — falo. Desço do carro e sigo para abrir a porta
para ela.
Samia olha a nossa volta e eu seguro em sua mão.
— Vamos.
Seguimos para dentro do escritório e, assim que a secretária me vê,
abre um sorriso.
— Senhor Mohammed! O senhor chegou!
— Sim, o Andrei está?
— Está te esperando. Pode seguir pelo corredor, segunda porta à
direita.
— Obrigada!
Sigo as instruções dadas por ela e bato na porta indicada.
— Pode entrar!
Abro a porta e o Andrei sorri ao me ver.
— Mohammed, meu grande amigo! — Ele se levanta e vem me
cumprimentar.
— Como vai, Andrei?
— Eu vou bem, mas você parece melhor do que eu! — fala e sorri
para a Samia.
— Andrei, está é minha esposa, Samia. Samia, este é um amigo da
época da faculdade, Andrei.
— Prazer em conhecê-lo — fala.
— O prazer é meu!
— O projeto está pronto? — pergunto e ele assente, sorrindo.
— Prontíssimo! Me acompanhem!
Seguimos o Andrei para outra a sala. Ele acende a luz a aponta para
uma maquete a nossa frente.
— Mohammed! — Samia sussurra, espantada ao ver sobre o que é a
maquete.
— O Andrei é arquiteto. Seu escritório é uma referência em vários
países, então pedi que ele preparasse uma amostra de como vai ficar o
quarto do nosso filho.
Samia se abaixa para olhar a maquete mais de perto.
— Tão detalhado... — sussurra.
— Nós buscamos trabalhar com todos os detalhes possíveis para que
nossos clientes tenham uma ideia exata de como o projeto vai ficar —
explica Andrei.
— Você gostou? — pergunto, preocupado.
Samia levanta-se e me encara.
— Se eu gostei? Mohammed, isso é muito mais do que eu tinha
imaginado, tudo isso... cada detalhe... — Ela olha de novo para a maquete.
— Eu não consigo definir com palavras tamanha perfeição.
Me aproximo dela e seguro seu rosto, secando as lágrimas com os
polegares.
— Nosso filho merece tudo isso.
— Você não tem noção de como eu estou feliz.
— Eu consigo ver isso pelo brilho dos seus olhos.
— Obrigada!
— Não precisa me agradecer. — Me abaixo e seguro sua barriga. —
Eu fiz tudo porque nosso filho merece o melhor, não é, garotão?
Sorrio ao ver que a barriga da Samia começa a se mexer.
— Esse menino que só mexe quando sua voz — Samia reclama,
mas sorri no final.
— É porque ele sabe que é o papai, falando, não é?
Beijo sua barriga e volto a ficar de pé, beijando sua testa em
seguida.
— Você gostou assim mesmo? Não quer fazer nenhuma alteração?
Ela se aproxima de mim e me abraça, beijando meu queixo.
— Está perfeito assim, meu amor.
**
Na volta para casa, seguro sua mão durante todo o caminho e não
consigo deixar de sorrir ao ver seu semblante de felicidade.
— Eu estou feliz porque você está feliz — digo.
— Você tem me surpreendido todos os dias — fala e me encara. —
Nunca imaginei que nosso contrato de relacionamento falso se tornaria tão
verdadeiro.
— Já falei para você não citar esse contrato — aviso.
— Eu sei, mas ele existe e isso não temos como negar.
— Não estou com você por causa do contrato, muito menos fiz tudo
isso por causa dele.
— Eu sei também e isso me deixa ainda mais apaixonada por você.
Às vezes tudo que está acontecendo parece um sonho. Tenho medo de
acordar em algum momento e ainda estar em Nova Iorque, no meu emprego
de camareira, descobrindo que estou grávida de um homem que não me
quer.
— Não estamos em um sonho, Samia. Eu e você somos reais,
nossos sentimentos são reais e mesmo que fosse um sonho, eu faria questão
de procurar a mulher que me deixou completamente apaixonado em um
sonho que parecia real.
— Você realmente me ama! Ainda é difícil lidar com isso.
— Eu amo você, Samia. Não vou deixar que você pense o contrário,
muito menos que duvide dos meus sentimentos. — Eu estaciono o carro e
me viro para ela, segurando seu rosto. — Você é a mulher da minha vida e
eu vou fazer de tudo por você.
— Eu também te amo — fala e se aproxima para me beijar.
Ela se afasta e solta um suspiro, mordendo o lábio inferior em
seguida.
— O que foi?
— Eu estava aqui pensando... O que acha de montarmos o quarto do
nosso filho onde você está dormindo atualmente?
Olho dentro dos seus olhos, procurando algum sinal de brincadeira,
mas não há nenhum.
— Está falando sério?
Ela assente e sorri.
— Acho que já está na hora de dormimos no mesmo quarto. Se
algum dia alguém chegar de surpresa e nos encontrar dormindo separados,
podem estranhar.
— Você tem razão, você tem razão... — sussurro.
— O que acha?
— Acho que podemos colocar essa ideia em prática hoje mesmo.
Samia sorri e me beija novamente.
— Amo você, Mohammed.
— Amo você, Samia!
Samia
4 MESES DEPOIS

Me mexo em cima da cama e solto um suspiro alto ao sentir o Ravi


chutando.
— O que foi? — Mohammed pergunta, me abraçando de lado.
— Seu filho já está acordado — sussurro, sonolenta.
— Estou te falando, ele vai ser um excelente jogado de futebol!
— Ele poderia parar de confundir minha barriga com uma bola.
Mohammed sorri e beija meu pescoço.
— Está com dor?
— Está suportável, mas confesso que aguentar uma barriga desse
tamanho tem seus contras.
Estou com 35 semanas, praticamente nove meses de gravidez e,
desde então, as coisas têm se tornado um pouco complicadas por aqui. O
Ravi parece achar minha barriga cada vez menor e os chutes têm
aumentado consideravelmente.
— Logo nosso menino vai nascer.
— Mal vejo a hora disso acontecer.
— Vou preparar nosso café da manhã — diz e me dá mais beijo.
— Tá bom. Eu vou já descer.
Sinto Mohammed se levantar e volto a fechar os olhos, sorrindo.
Eu não tenho palavras para descrever como tem sido os últimos
meses. Parece que fui transportada para um conto de fadas. Mohammed é
um verdadeiro príncipe comigo e tudo que ele se propõe a fazer comigo ou
pelo nosso filho me deixa nas nuvens.
Nosso filho.
O ditado que diz que pai é quem cria e não quem faz é muito real,
porque ele tem sido um pai nota dez e nosso bebê nem nasceu ainda. Isso
para mim, como mãe, é sem explicação, porque eu vejo o relato de outras
mães dizendo que é muito difícil criar um bebê sozinha, sem nenhuma rede
de apoio ou com um pai presente. O Mohammed tem sido mais que
presente e eu tenho me apaixonado ainda mais por ele apenas por esses
pequenos detalhes.
Sinto o cheiro do café chegar ao quarto e me sento na cama, pronta
para levantar. Vou direto para o banheiro, amarro meu cabelo em um coque
alto, escovo meus dentes e lavo o rosto. Me encaro pelo espelho e fico de
lado, sorrindo ao ver o tamanho da barriga.
— É Ravi, mamãe não vê a hora de você nascer! — sussurro.
Deixo o banheiro e vou para a cozinha.
— Já levantou? — Mohammed pergunta ao me ver.
— Senti o cheiro do café lá do quarto.
Me sento à mesa e ele coloca uma porção de frutas cortadas com
iogurte natural.
— Seu café. — O encaro e franzo o cenho. — A senhorita sabe que
não pode tomar café puro, não é? Ordens da nutricionista.
Um dos maiores problemas ultimamente, é que meu estômago não
tem aceitado certos tipos de alimentos, e o café foi um deles. Tivemos que
consultar uma nutricionista, que prescreveu uma dieta balanceada, ideal
para mim e para o bebê. Às vezes sou um pouco teimosa e tomo um gole de
café escondida. Arrependo-me amargamente depois, mas na hora nem
penso nisso.
Pego uma colher e coloco uma porção na boca.
— Satisfeito?
— Perfeito, Girassol! — beija meu rosto. — Vai sair mesmo com a
Eda hoje? — pergunto.
— Vou sim! Estamos marcando desde a semana passada.
— Ainda não acho uma boa ideia você sair por aí com uma barriga
desse tamanho.
— A médica disse que caminhadas são excelentes — rebato.
— Está bom? — pergunta ao apontar para a salada de frutas e eu
assinto.
— Uma delícia.
O celular do Mohammed começa a tocar e ele pega o aparelho para
atender. Presto atenção na sua ligação.
— Alô? Sim, é ele. Como é? Tem certeza disso? Certo, certo, estou
indo aí o mais rápido possível.
Ele encerra a ligação e me encara.
— O que aconteceu? — pergunto.
— O prédio onde fica a administração do hotel foi assaltado. Eles
estão relatando que várias empresas tiveram documentos roubados.
Mohammed
Chego ao escritório o mais rápido que posso. Assim que saio do
elevador, Mason vem em minha direção.
— Mohammed!
— O que aconteceu exatamente? — pergunto.
— Vários setores foram revirados, arquivos foram mexidos, cofres
explodidos e alguns funcionários foram feitos reféns — diz.
— Mexeram em algo aqui? — pergunto.
— Sua sala — responde, e eu me viro para ver se eles levaram algo.
Assim que entro na sala vejo que está tudo de cabeça para baixo.
Folhas e documentos estão espalhados por todo o canto. Olho para a lateral
e vejo que o cofre está aberto. Me aproximo e pego algumas pastas que
estão ali dentro, conferindo uma a uma.
— Levaram algo? — ele pergunta.
Olho novamente, apenas confirmar, e encaro meu amigo.
— O meu contrato de casamento com a Samia — sussurro, e ele
arregala os olhos.
— Tem certeza de que não está aí?
— Absoluta. — Encaro o Mason e, em seguida, a bagunça da sala.
— No nosso setor, mais alguma sala ficou nesse estado?
— Não.
— No andar das outras empresas?
— As salas dos presidentes foram reviradas também — informa.
— Algum sinal das câmeras de segurança?
— A energia elétrica foi cortada durante a operação e as câmeras de
segurança também.
Me sento no sofá e respiro fundo.
— Isso não foi um simples assaltado — murmuro.
— Como pode ter tanta certeza?
— Existem documentos muito mais importantes e valiosos dentro
desse cofre. Por que se preocupar com um simples contrato de casamento?
— Acha que assaltar o prédio inteiro foi apenas para tirar o foco do
que estavam atrás?
— Tenho quase certeza disso.
— Tem alguém em mente?
Eu tenho várias pessoas, mas as principais são a Ayla e meu pai.
Desde que os seguranças me reportaram que viram a Ayla conversando com
a Samia meses atrás, nunca mais tive notícias dela, nem de sua família, o
que me fez pensar que talvez eles tenham aceitado o rompimento do
noivado, mas ela não deixa de ser uma das minhas suspeitas.
E meu pai, bom, ele nunca aceitou a Samia e deixa isso claro em
todo almoço ou janta em que estamos presentes. Ele não acredita que meu
relacionamento com ela seja real.
Não importa em que mãos esse contrato esteja, eu só sei que, se as
informações contidas ali vazarem, as coisas não ficarão nem um pouco
boas.
— O que você pretende fazer? — Mason pergunta.
— Preciso pensar. Tenho certeza de que quem está por trás desse
assalto vai entrar em contato para falar sobre esse contrato.
— Vai contar para a Samia?
— Ela precisa saber — digo e me coloco de pé. — Você está
responsável por organizar tudo isso. Se a polícia perguntar se dei falta de
algo, diga que não.
— Pode deixar.
**
Assim que entro no apartamento Samia se coloca de pé e vem em
minha direção.
— Estava preocupada. Mandei várias mensagens e você não
retornou. É muito ruim?
Seguro suas mãos e puxo para sentarmos no sofá.
— Eles reviraram toda a minha sala, explodiram o cofre e...
— Alguém se machucou?
— Ninguém ficou ferido, não se preocupe.
— Do que eles estavam atrás?
— A única coisa que dei falta foi nosso contrato de casamento.
Samia arregala os olhos.
— Mohammed...
— Calma, não vai acontecer nada.
— Como não? Alguém assaltou um prédio inteiro atrás de um
contrato de casamento?
— É o que parece.
— O que vamos fazer?
— Vou esperar a pessoa que está por trás disso entrar em contato.
— E se não entrar? Podemos acordar amanhã com as notícias
dizendo que nosso relacionamento é falso, que você não é o pai do Ravi,
que...
— Calma, meu amor! — Mohammed segura meus ombros e, em
seguida, suas mãos sobem para meu rosto. — Eu sei que é apavorante, mas
não acredito que vão colocar isso no ar sem antes negociarem.
— E qual será a negociação?
— Do menor dos problemas, uma grande quantidade em dinheiro.
— E dos maiores?
— Pedindo que eu me separe de você para que as notícias não sejam
vazadas.
Samia abaixa o olhar e aperta as mãos, um sinal claro de
nervosismo.
— O que você...
— Eu não vou me separar de você — afirmo.
— Mas...
— Não me importa qual tipo de ameaça seja feita, eu não vou me
render.
— Mohammed...
— Samia, começamos com uma mentira, mas hoje ela não é mais e
nós dois sabemos disso. Eu não me importo com o que as pessoas vão
pensar, eu só quero estar com você. Não importa o que aconteça, você é a
minha prioridade. Você e o Ravi.
Ela me abraça.
— Estou com medo.
— Eu estou aqui e vou proteger vocês dois, não importa o que
aconteça.
Acaricio suas costas, tentando acalmá-la, sentido seu coração bater
acelerado contra meu peito.
— Vai ficar tudo bem, Girassol — sussurro em seu ouvido.
— Confio em você, Mohammed.
**
— Como a Samia está? — Mason pergunta.
— Ela dormiu. Tive que dar um calmante para ela.
Meu amigo me encara e sorri de lado.
— E pensar que no início você disse que jamais se apaixonaria por
ela!
Solto um suspiro e não consigo conter um sorriso.
— Foi inevitável. Quando me dei conta já estava mais do que
envolvido. Ela é tudo que eu preciso, Mason. Na verdade, mais do que eu
preciso. Ela trouxe cor aos meus dias, alegria à minha rotina e leveza pra
minha vida. Só o fato de poder dormir e acordar todos os dias ao seu lado
me faz o homem mais feliz do mundo.
— O amor nos faz pensar diferente, agir diferente.
— Diz isso por causa da Eda?
— Digo isso por sua causa. Você tem uma mania de trazer minha
história com a Eda à tona em toda a oportunidade que tem!!
— Por que você está sendo burro de não aproveitar a oportunidade
que a vida está te dando.
— E qual é a oportunidade?
— De ficar com ela. Em todo esse tempo nenhuma mulher te
chamou a atenção como a Eda chamou. Acha mesmo que outra mulher vai
ocupar um espaço no seu coração?
— Eu acho que existem histórias de amor que não feitas para serem
vividas.
— Se fosse pela Eda, vocês dois já estavam casados — murmuro.
— Se as coisas fossem apenas pela ótica da Eda, nós já teríamos até
nos divorciados, Mohammed.
— Por que não aceita que é apaixonado por ela?
— Mas isso eu já aceitei, eu sou irrevogavelmente apaixonado pela
Eda, Mohammed. Não existe nada nesse mundo que seja capaz de mudar
esse sentimento.
— E o que te impede de ficar com ela?
— O fato de ela achar que tudo pode ocorrer da forma que ela quer.
Eu não sou uma marionete que pode ser comandada por ela, Mohammed, e
ela ainda não entendeu isso.
Infelizmente minha irmã tem um sério problema. Ela acha que as
coisas devem ser feitas da maneira que ela quer, na hora que ela quer, e a
vida não funciona assim. Sei que ela tem sentimentos pelo Mason, mas
enquanto ela não mudar essa atitude dela de querer controlar a todos e que
as coisas se resolvam com um passe de mágica, ela vai perder uma pessoa
maravilhosa para sua vida.
— Mas mudando de assunto — Mason diz. — Tem alguém em
mente?
— Sabe que eu tenho.
— Não me respondeu mais cedo.
— Não posso sair acusando sem provas. Se eu acusar qualquer um
dos dois, eles podem usar isso contra mim.
— Você tem um ponto. O que pretende fazer?
— Esperar! Se a empresa foi invadida apenas com o intuito de
roubarem esses documentos, mais cedo ou mais tarde alguém vai entrar em
contato comigo.
Mason assente e eu respiro fundo. Não posso perder a cabeça agora.
Perder a cabeça e agir sem pensar pode colocar tudo abaixo, e ainda fazer a
Samia correr perigo.
**
A semana passou arrastada. Parece que a qualquer momento alguém
entraria pela porta do meu escritório ou eu acordaria em alguma manhã com
uma multidão de repórteres no prédio querendo saber sobre o contrato de
casamento.
— Você precisa comer um pouco — falo, entregando uma tigela
com iogurte e granola.
— Estou sem fome.
Noto que seu olhar está perdido e me sento ao seu lado, puxando-a
para mim.
— O que tem te deixado incomodada? — pergunto.
— Toda essa situação do contrato ter sido roubado. Tenho medo do
que pode acontecer.
Acaricio sua cabeça.
— Nós somos adultos, Samia. Não devemos nada a ninguém. Eu sei
que você está com medo, mas eu não vou deixar nada acontecer com você.
Samia se afasta e me encara sorrindo.
— Quando foi que você se tornou tão apaixonado?
Sorrio e acaricio seu rosto, colocando uma mecha de cabelo atrás da
sua orelha.
— Eu não sei, só tenho certeza de que você é a mulher da minha
vida, e que só o pensamento de perder você, de imaginar que você não vai
estar na minha vida faz meu coração se sentir angustiado. Eu amo você,
Samia, não imaginei que fosse acontecer, mas aconteceu e amar você é a
melhor escolha que eu já fiz.
— Eu também te amo, Mohammed. Muito, muito!
Ela se aproxima de mim e me abraça. Aperto seu corpo contra meus
braços e ela solta um suspiro alto. Samia se afasta e eu beijo sua testa.
— Amo você, Girassol.
Ela sorri e me dá um selinho, se aconchegando ainda mais em mim.
Ficamos assim até ela começar a pegar no sono. Com todo o
cuidado eu a deito no sofá e vou até a cozinha. Pego meu celular e vejo que
tem uma mensagem de um número desconhecido.
Eu tenho tudo que preciso para acabar com esse seu casamento de
fachada. Se você realmente tem algum sentimento por essa mulher que vive
com você, mande-a embora. Caso o contrário, todos vão saber que tudo
que existe entre vocês é apenas um contrato e que esse filho que ela está
esperando não é seu coisa nenhuma.
Tento ligar para o número que mandou a mensagem, mas cai direto
na caixa postal.
Respiro fundo e apoio as mãos no balcão. Eu vou descobrir quem
pegou esse contrato ou não me chamo Mohammed Yilmaz.
Samia
— Você e o Mohammed estão mais estranhos do que o normal.
Aconteceu alguma coisa? — Eda pergunta.
— Por que acha isso?
— Não sei, desde que a sede do hotel foi invadida, tenho sentido
vocês diferentes.
Isso é um fato. O roubo do documento que comprova que
Mohammed e eu temos um contrato de casamento, e que o Ravi não é filho
dele, tem me deixado apavorada.
Eu sei que ele tem feito de tudo para me deixar tranquila, mas não é
tão simples quanto parece.
— O Mohammed está ocupado com a festa de aniversário do hotel e
eu com o nascimento do Ravi, Eda. Não tem nada de estranho nisso.
— Eu nem acredito que falta pouco tempo pro Ravi nascer! — diz, e
eu agradeço mentalmente pela mudança de assunto.
— Nem eu. — Acaricio minha barriga e sorrio. — Às vezes parece
que esse bebê é um sonho.
— Essa criança vai trazer luz para a família, Samia, você vai ver.
Imagine como meu pai vai ficar quando conhecer pessoalmente o mais
novo herdeiro do império Yilmaz?
Sorrio, sem graça. Eu tenho absoluta certeza de que não vai ser uma
criança que vai fazer o senhor Osman mudar de ideia em relação ao meu
relacionamento com o Mohammed. Eu não sou a Ayla, e apenas esse fato é
o suficiente para meu sogro não aprovar meu casamento com o filho dele.
— Você está bem otimista em relação a isso — falo.
— Temos que ser otimistas em algumas áreas de nossas vidas.
Como está a preparação do seu vestido para o aniversário do hotel?
— Só estou indo porque é um evento importante para o Mohammed,
mas você não imagina como está sendo difícil ajustar o vestido —
murmuro.
Infelizmente, tive que encomendar um vestido para esse evento, pois
não estava encontrando nenhum que combinasse com a grandiosidade do
evento e que ao mesmo tempo servisse em mim. Carregar uma barriga de
quase nove meses tem suas desvantagens.
— Tenho certeza de que está lindo. Uma pena que você não me
deixou nem ver o modelo!
— Você vai ver no dia, como todo mundo!
— Você está ficando igual o Mohammed!
— Sou praticamente casada com ele, Eda. O que você esperava?
Minha cunhada revira os olhos e se levanta.
— Vou ao banheiro rapidinho!
Assinto e me concentro em terminar de tomar meu sorvete.
— Ora, ora... Que satisfação te encontrar aqui, Samia...
Ergo os olhos e prendo a respiração ao ver o Liam na minha frente.
Olho para os lados, mas ele ergue o dedo indicador, me mandando fazer
silêncio.
— Você não perde tempo mesmo, não é? O golpe da barriga não deu
certo comigo e você foi imediatamente atrás de quem tinha mais dinheiro.
— O que você está fazendo aqui?
— Eu? Absolutamente nada, estou apenas passando. Não imaginei
que fosse te encontrar.
— Está mentido — sussurro.
Ele sorri de lado, um sorriso que não alcança seus olhos. Engulo em
seco quando se apoia na mesa.
— Sua vida está muito boa, não é mesmo? Você tem um acordo
milionário apenas para fingir ser a esposa de um magnata turco e, em troca,
ele ainda vai assumir esse bebê. O golpe da barriga que você deu vai além
de todos que eu já conheci.
— Você não sabe do que está falando...
— Eu não sei? Você é quem não sabe onde se meteu, Samia. Acha
mesmo que pessoas poderosas como o Mohammed são capazes de amar
pobres reles mortais como você? Acha mesmo que você vai ter uma vida
com ele quando a data do fim do contrato chegar? Você não passa de uma
vadia que está tentando se dar bem na vida. Imagine quando todos
descobrirem a verdade...
— O que você quer Liam? — pergunto, sentindo meu corpo tremer
de ódio. Meu coração está acelerado e estou fazendo um esforço sobre
humano para não deixar uma lágrima cair.
— Suma — diz.
— Como?
— Suma da vida do Mohammed sem deixar rastros se você não quer
ser exposta como a mulher que aplicou o golpe da barriga em um dos
principais herdeiros da Turquia, apenas suma.
— Você está com a Ayla, não é?
Seu sorriso o entrega. Liam se encosta na cadeira.
— Sabe como é! Por sua causa fui demitido, por sua causa nenhum
hotel me contrata mais e por sua causa estou sendo acusado de roubo.
Achou mesmo que eu iria deixar barato?
— Eu não tenho culpa se você não tem um pingo de caráter.
— De que vale o caráter, se seu lindo rostinho pode estampar
amanhã todos os sites de fofocas como a mulher que obrigou o Mohammed
a assumir um filho que não era dele?
— Samia, está tudo bem?
Eda se aproxima e Liam sorri. Viro o rosto para o lado oposto,
tentando controlar minhas emoções novamente.
— Foi um prazer te rever, Samia. Pense no que eu disse. — Ele se
levanta e deixa a mesa.
— Quem é ele?
— Um ex-colega de Nova Iorque.
— Colega? Tem certeza?
— Sim.
— O que ele queria?
— Apenas me parabenizar pela gravidez. — Abaixo o olhar e me
coloco de pé em seguida. — Podemos ir? Não estou me sentindo bem.
— Claro, claro!
Sigo para fora da sorveteria e aguardo Eda fazer o pagamento. Olho
para o lado e vejo Liam me encarando. Um arrepio sobe pelas minhas
costas e eu respiro fundo.
É claro que uma hora isso ia acontecer. Se realmente foi a Ayla
quem roubou o contrato de casamento da sala do Mohammed, certeza ela
iria atrás do pai verdadeiro do Ravi.
— Vamos? — Eda pergunta, se aproximando.
— Vamos.
Seguimos para a saída do shopping e eu respiro fundo, tentando
manter meus pensamentos alinhados, pois eu não posso simplesmente me
deixar intimidar assim.
**
Me mexo na cama pela décima vez, me sento e vejo que o
Mohammed ainda está dormindo. Com cuidado, eu me coloco de pé e sigo
para fora do quarto. Minha mente está inquieta desde o encontro com o
Liam hoje cedo; não consigo parar de pensar no que ele me disse.
Sigo para a varanda e sento-me na cadeira, alisando minha barriga e
olhando para o céu estrelado.
— Meu filho, o que devo fazer? Sinto-me em uma sinuca de bico.
Por mais que confie no Mohammed, como ficará a reputação dele se a
notícia de que você não é filho dele vier à tona?
Deveria contar ao Mohammed o que está acontecendo, seria o certo
a se fazer, mas não quero deixá-lo ainda mais preocupado.
O Mohammed foi um achado na minha vida, nunca iria me imaginar
ao lado de um homem como ele. Ele já fez tanto por mim, já se arriscou
tanto para que eu estivesse aqui com ele! Preciso ser forte por ele agora,
preciso mostrar que consigo resolver essa situação sozinha, sem precisar
que ele intervenha em alguma coisa.
— Posso saber o que você está fazendo aqui a essa hora?
Giro o pescoço em direção à voz e sorrio ao ver o Mohammed de pé
ao lado da porta.
— Perdi o sono e vim ver as estrelas.
— Por que não me chamou?
— Porque você estava dormindo, não quis atrapalhar o seu sono.
— Você nunca me atrapalha em nada.
Sorrio para ele, que se senta ao meu lado e pousa a mão em minha
barriga.
— Como ele está?
— Acredito que bem ansioso para conhecer o mundo aqui fora —
falo, sorrindo.
— E eu fico contando os dias para conhecê-lo.
Sinto o Ravi se mexer dentro de mim e sorrio.
— Incrível, ele só se mexe quando ouve sua voz.
— E eu adoro isso. — Me aconchego no peito dele e solto um
suspiro.— Samia?
— Sim?
— Quando essa festa passar, quando o Ravi nascer e quando
estivermos livres do contrato, você aceita se casar comigo?
Me viro em sua direção, meus olhos estão arregalados e ele me
encara carinhosamente.
— Está falando sério?
— Nunca falei tão sério em toda a minha vida. Meu maior sonho
hoje é ver você entrando na igreja vestida de branco, prestes a se tornar
minha esposa.
— Quem diria lá no início, que você um dia pensaria isso?
— Não temos o poder de mandar no coração. Quando me dei conta,
já estava completamente apaixonado por você.
Seguro seu rosto e fico alisando sua barba, sorrindo em seguida.
— Você tem toda a razão. Não temos como mandar no coração,
porque eu também jamais me imaginaria dizendo sim para um pedido de
casamento seu.
— Então sua resposta é sim?
Sorrio do seu entusiasmo e assinto, sorrindo também.
— Mil vezes sim!
Mohammed me beija e me abraça em seguida.
Solto um suspiro e abro os olhos. Agora, mais do que nunca, eu
preciso resolver essa situação com o Liam.
Samia
O dia da grande festa de aniversário do hotel chegou. Desde ontem,
o Mohammed tem estado uma pilha de nervos, não só por conta da festa em
si, mas também por causa de todos os últimos acontecimentos. Não sei por
que, mas sinto que ele está escondendo algo que eu não sei.
Termino de fechar o par de brincos e me encaro no espelho. Tenho
que confessar que o estilista desse vestido acertou de primeira. A peça ficou
exatamente como eu queria e tinha imaginado. Optamos por usar a cor
terracota no vestido. Ele é longo e possui uma saia bem rodada. A marcação
dele fica logo abaixo dos seios, o que faz com que minha barriga fique em
evidência. Ele tem mangas que formam uma espécie de capa, caindo por
cima dos ombros e descendo até o final do vestido.
Nos pés, estou usando uma sapatilha baixa, pois meus pés não
aguentam ficar em cima de saltos.
A porta do quarto se abre e eu me viro na direção dela. Mohammed
para de andar no meio do caminho e me encara. Ele está tentando fazer o nó
da gravata, mas as pontas do tecido caem de suas mãos. Sorrio com sua
reação, sigo em sua direção e começo a ajeitar a gravata para ele.
— O que foi? — pergunto.
— Você está linda — fala, me encarando.
— Gostou do vestido?
— Ele é apenas um mero detalhe comparado a toda a obra de arte.
— Está muito galanteador, Mohammed.
— Se eu não elogiar minha futura esposa, outras pessoas o farão,
então preciso marcar presença.
Termino de fazer o nó da sua gravata e ele segura minha mão,
beijando o dorso.
— Está encantadora.
— Você também está muito lindo.
Mohammed sempre está elegante, mas devo admitir que tem dias
em que ele se supera, como é o caso de hoje. Ele está usando um conjunto
completo, tudo na cor preta, sua barba está perfeitamente feita e o cabelo
impecavelmente penteado para trás.
— Você está lindo.
Ele se aproxima e beija minha testa, minha bochecha, a ponta do
meu nariz e em seguida meus lábios.
— Vamos? Não quero me atrasar.
Assinto e sorrio.
— Vamos.
Mohammed me oferece o braço e eu aceito. Essa noite eu preciso
mais do que nunca fazer o papel da esposa perfeita, afinal de contas os
olhos de Istambul estão todos focados em nós nesse momento.
**
O salão de festas está lotado, a entrada então nem se fala. Acho que
em toda a minha vida, eu nunca tinha visto tantos fotógrafos e repórteres
juntos. Mohammed me guiou em todos os momentos. Posamos para
algumas fotos e seguimos para dentro do salão.
Várias pessoas param para nos cumprimentar, desejam felicidades
em nosso casamento, parabéns para o hotel e um bom parto para mim, já
que o Ravi pode nascer a qualquer momento.
— Meus pais estão ali. — Ele aponta para a mesa reserva.
Eda sorri assim que me vê e vem em nossa direção.
— Meu Deus, Samia! Você superou todas as minhas expectativas!
Você está maravilhosa!
— Obrigada, Eda! Fico muito feliz que tenha gostado!
— Que sorte do Mohammed por ter uma mulher como você ao lado
dele.
— Devo concordar com isso — ele diz, ao meu lado, e eu sorrio.
— Vem, vamos nos sentar.
Ela indica uma cadeira para mim, mas antes me viro para
cumprimentar minha sogra.
— Erin.
— Samia, você está magnífica!
— Obrigada!
— E como está o meu neto? — pergunta, colocando a mão na minha
barriga.
— Cada vez mais ansioso para estar do lado de fora.
— E nós estamos ansiosos para conhecê-lo logo! — diz ela.
— Senhor Osman — cumprimento meu sogro, mas ele apenas me
encara e volta a beber seu champanhe. Abaixo a cabeça e me sento entre a
Erin e a Eda.
— Não se preocupe com o Osman, logo ele vai aceitar você.
— Já se passou muito tempo e ele ainda não me aceitou. Não tenho
certeza se em algum momento ele vai mudar de ideia.
— Vai sim, você vai ver — Erin diz e eu sorrio.
Não é um assunto que eu queira falar sobre ele agora. Sorrio ao ver
o Mohammed vir em minha direção com uma taça de suco.
— Obrigada — agradeço assim que ele me entrega.
— Se precisar de algo, ou quiser comer alguma coisa, basta me
chamar — pede.
— Não se preocupe comigo, vá cumprimentar seus convidados, eu
vou ficar bem.
— O que ela está fazendo aqui? — Ouço Eda dizer.
Começo a ouvir burburinhos das pessoas e o Mohammed se vira na
direção em que as pessoas estão olhando. Dou um passo para ficar ao lado
dele e vejo o motivo de todo o cochicho.
Ayla está andando pelo salão, sorrindo e cumprimentando as
pessoas, mas ela não está sozinha. Sinto minha garganta fechar quando vejo
quem está ao lado dela.
Liam sorri para algumas pessoas, mas seu olhar logo se fixa em
mim. Aperto o braço do Mohammed e sinto-o estremecer. Ele sabe quem é
o Liam, assim como sabe o que significa ele estar junto com Ayla.
— Ayla, você veio! — Osman se levanta para cumprimentar a
mulher.
— Eu jamais recusaria um convite seu — diz. Seu sorriso é tão falso
que me enoja. Ela se vira em nossa direção. — Mohammed, como vai?
Ele não responde, apenas encara os dois. Me atrevo a olhar para os
lados e vejo que o olhar de todos está focado em nós.
— O que está fazendo aqui? — ele pergunta, com o tom de voz
grave e baixo.
— Seu pai me convidou, seria uma ofensa recusar o convite. — Ela
sorri e me encara. — Samia, você está com uma barriga linda! Espero muito
que seu filho venha com saúde.
Ela está me provocando e eu sei disso. Engulo em seco e mordo o
lábio inferior para não responder nada.
— Deixa eu apresentar para vocês, esse é o Liam. — Aponta para
ele. — Nos conhecemos em Nova Iorque, em uma das viagens que fiz. Nos
tornamos amigos e agora estamos juntos.
— Fico imensamente feliz por você ter encontrado alguém, Ayla —
Erin diz, sorrindo friamente para ela.
— Dona Erin, é como dizem por aí, nunca sabemos em que lugar do
mundo vamos encontrar o amor, não é mesmo, Samia? — pergunta, se
virando para mim.
— Não, não sabemos. — É tudo que eu respondo.
— Acho melhor nos acomodarmos — Erin fala. — A abertura
oficial do evento já vai começar.
— Com licença — Liam diz e me encara, sorrindo de lado.
Quando eles já estão longe o suficiente, Mohammed se vira para
mim.
— Você está bem? — pergunta em um sussurro e eu nego. Parece
que eu vou desmaiar a qualquer instante. — Vem comigo.
Ele segura minha mão e me tira dali, mesmo com a dona Erin
falando com ele e sendo completamente ignorada. Vamos em direção a um
corredor que tem a entrada restrita e seguimos até entrar em uma sala.
Mohammed me coloca sentada no sofá e vai em direção ao filtro.
Ele enche um copo com água e me serve.
— É muita coincidência eles estarem juntos, não acredito que seja o
caso — ele diz.
— Tenho quase certeza que não é. Eu encontrei o Liam uns dias
atrás — revelo. Mohammed me encara.
— Como?
— No dia em que saí com a Eda, nós estávamos na soverteria e ele
se aproximou quando ela foi ao banheiro. Ele me disse que se eu não
largasse você, todos iriam saber que ele é o pai do Ravi, que estou dando o
golpe da barriga e que...
— Ei! — Ele se ajoelha na minha frente e segura minha mão. — Por
que não me contou antes?
— Fiquei com medo, com medo de que acontecesse algo. Eu não
queria te deixar mais preocupado, não queria colocar mais um problema em
suas mãos e...
— E você planejava fazer o quê? Ir embora? Me abandonar?
Sinto meus olhos se encherem de lágrimas e nego.
— Não, jamais! Eu pensaria em outra coisa, mas eu nunca
abandonaria você.
Mohammed segura meu rosto e encosta a testa na minha.
— Ele te ameaçou? — Assinto e abro os olhos.
— Eu tenho plena certeza de que ele está envolvido no roubo à
administração do hotel, ele sabe sobre o contrato, ele sabe que o filho é dele
e...
— Você confia em mim, Samia?
Sua pergunta me pega desprevenida.
— Claro que eu confio.
Ele se afasta e passa o polegar delicadamente embaixo do meu olho.
— Então não se preocupe. Se a Ayla ou o Liam estão pensando que
vão sair por cima nessa história, eles estão completamente enganados.
— O que você vai fazer?
— Na hora certa você vai ver. O que mais me deixa preocupado é
saber se você está bem.
— Eu estou bem, vou ficar bem.
— Eu te prometo, Samia, que depois desta noite, nossas vidas vão
mudar para melhor.
Ele beija minha testa demoradamente. Fecho os olhos e seguro seus
braços. Eu não sei o que ele vai fazer, mas confio nesse homem com toda a
minha força e tenho certeza de que ele vai resolver toda essa situação.
**
Assim que voltamos para o salão, me sento ao lado da Eda enquanto
o Mohammed vai para o palco dizer as primeiras palavras sobre o
aniversário do hotel. Minha cunhada se aproxima de mim.
— Você este bem? Te achei um pouco pálida mais cedo — fala,
preocupada.
— Estou sim, acredito que os últimos meses da gravidez a gente
passa por alguns sustos — sussurro de volta.
— Se meu sobrinho inventar de nascer hoje, eu vou fazer um
alvoroço! Com certeza vai ser o melhor dia da minha vida!
Ela coloca a mão na minha barriga e eu cubro a mão dela com a
minha, sorrindo em seguida.
— Você não vai ter essa sorte agora, o Ravi está bem quietinho aqui
dentro. Já basta todo o trabalho que tivemos com a decoração do evento. Se
o Ravi nascer agora, será um caos.
— Um caos bem-vindo, diga-se de passagem — minha sogra
acrescenta e eu sorrio para elas.
Essas duas mulheres entraram com tudo na minha vida e sou grata
pela vida delas, pela amizade e por terem me permitido fazer parte da
família, como uma filha mesmo, por que é assim que me sinto perto delas.
— Boa noite a todos!
Nossa atenção se volta para o palco. Mohammed já está posicionado
e encara a todos seriamente.
— Como vocês sabem, a festa hoje é para comemorar o aniversário
do hotel, que há tantos anos presta serviços, buscando proporcionar ao
cliente uma experiência única e inesquecível. Apesar de ser um evento
extremamente importante para todos os funcionários, acionistas e gestores
do hotel, não é sobre isso que eu quero falar hoje.
Os cochichos começam a rolar soltos.
— O que esse moleque vai aprontar hoje? — Ouço Osman dizer.
— Samia, você sabe o que ele vai fazer? — Erin me pergunta e eu
nego, engolindo em seco, sentido meu coração bater mais rápido.
— Hoje, eu quero compartilhar com vocês um pouco da minha
história e de como eu conheci a mulher da minha vida.
Mohammed
Os flashs são disparados a cada segundo e eu tenho plena noção do
que vai acontecer daqui pra frente, mas essa é a melhor solução a se tomar
diante de tudo o que está acontecendo.
— Como a maioria de vocês deve saber, meu pai orquestrou meu
casamento com a família da Ayla desde que éramos pequenos. Nenhum de
nós dois entendia nada sobre o que estava acontecendo, mas sabíamos
plenamente que teríamos que nos casar no futuro. Afinal de contas, quanto
mais dinheiro, status e poder, melhor, não é?
As pessoas se olham e tentam entender onde quero chegar. Desvio
meu olhar para onde a Samia está sentada e consigo notar o quão nervosa
ela está. Vejo que ela segura a mão da Eda com força. Eu queria poder
largar tudo agora e ir até ela, mas ainda não é o momento.
— Conforme o tempo foi passando, fui percebendo que não queria
me casar de jeito nenhum, seja por dinheiro ou por amor. Mas tinha um
contrato, o qual eu tentei encerrar de todas as formas. No entanto, a família
da Ayla e a própria Ayla não queriam. Ela queria se casar comigo de
qualquer jeito, mesmo eu tendo dito com todas as letras que jamais me
casaria com ela. Então, eu decidi fazer uma viagem pelas filiais dos hotéis
que estão espalhados pelo mundo. Quanto mais se aproximava a data da
minha volta, mas eu pensava em como fazer para cancelar um casamento
que não deveria ter sido nem marcado.
“Depois de pensar em diversas maneiras de cancelar o casamento, a
que me pareceu mais plausível foi aparecer com uma mulher que eu amasse
de verdade. Mas o que eu iria fazer? Eu não conhecia ninguém, não gostava
de ninguém e nem tinha pretensão de gostar. Foi nesse momento que a
Samia entrou na minha vida. Eu precisava de uma mulher que fingisse estar
completamente apaixonada por mim e ela precisava de dinheiro para
continuar sobrevivendo e cuidar do filho que ela estava esperando.”
Os burburinhos aumentam e os flashs disparam a cada milésimo de
segundo. Tiro o microfone do pedestal e começo a andar pelo palco.
— Era o plano perfeito, nós dois fingiríamos que estávamos
apaixonados, iríamos nos casar, eu a ajudaria com todas as despesas do
bebê e depois de um ano iríamos nos separar. Só que nem eu mesmo
poderia prever que conviver com ela todos os dias, que conhecê-la melhor
faria com que eu me apaixonasse completamente por ela.
Meus olhos focam nela e eu desço do palco, caminhando em sua
direção.
— Eu tentei negar para mim mesmo que estava apaixonado por ela,
tentei colocar dentro da minha cabeça que tudo que tínhamos era um mero
contrato, mas não consegui. Meu coração já pertencia completamente a ela.
O filho que ela está esperando pode até não ser meu, mas o pai verdadeiro
da criança disse que ela deveria abortar o bebê e só quem entende o que é
ser pai sabe que isso é um absurdo. Eu posso não ser o pai de sangue do
Ravi, mas eu amo esse bebê com todas as minhas forças e mal posso
esperar a hora de tê-lo aqui comigo.
Estendo a mão para ela, que a segura. Ela está trêmula, mas
consegue se colocar de pé.
— Samia Aksoy, você tem o todo o meu coração e sabe disso. Sei
que no início eu posso não ter sido o homem que você imaginou, mas
durantes os últimos meses eu tenho tentado o meu máximo para ser o
homem que você merece. Eu não me importo se nosso relacionamento
começou por causa de um contrato, não me importo com o que as pessoas
vão dizer depois de descobrirem a verdade, não me importo com o que a
mídia vai especular. O mais importante agora é você ter a certeza de que eu
te amo e de que por você eu vou mover céus e terra. Eu faço o impossível
apenas para te fazer feliz. Você é a mulher da minha vida e é com você que
eu quero passar o resto dos meus dias. Você aceita?
Samia sorri para mim em meios as lágrimas e dá um passo em
minha direção.
— É tudo que eu mais quero!
Deixo o microfone cair no chão, o que causa um barulho agonizante,
mas não me importo. Avanço em direção a Samia, seguro seu rosto e a beijo
apaixonadamente.
De tudo o que já vive na minha vida, do que já vi e ouvi, a Samia é a
minha única certeza. Ela é a mulher da minha vida, mãe dos meus filhos e a
minha futura esposa.
— Eu sempre soube que esse relacionamento era uma fachada. —
Ouço meu pai dizer e me viro em sua direção, protegendo a Samia com meu
corpo. — Acha mesmo que depois desse teatro todo, as pessoas vão
acreditar que você está apaixonado por ela?
— Não fiz isso para saber se as pessoas vão acreditar ou não. Eu fiz
isso para colocar toda a história a limpo, antes que isso chegasse às mãos da
mídia de outra maneira.
Meu pai ri e fica de pé. Ele caminha em minha direção, seu
semblante é fechado e sinto a mão da Samia em meu braço, me dando força
e apoio.
— Quem garante que ela não vai te largar depois que esse bebê
nascer? Quem garante que você não vai sofrer o golpe da barriga? Ou que
simplesmente que ela não vai pegar todo o seu dinheiro e sumir no mundo,
te deixando com esse bebê que nem filho seu é?
— Você...
— Existe algo que todas as pessoas deveriam ter e se chama caráter
— diz Samia, posicionando-se na minha frente. — Eu posso não ter
dinheiro, posso ter perdido os meus pais cedo, posso ter engravidado por
acreditar em um homem que só queria brincar comigo, posso ter aprendido
a trabalhar duro desde sempre para me sustentar, mas eu não sou uma
pessoa mau-caráter. Eu nunca enganei ninguém, nunca roubei ou fingi ser
algo que eu não era. Posso ter assinado um contrato com Mohammed, no
início eu posso ter fingido estar apaixonada por ele, mas isso não significa
que o sentimento não tenha se tornado real.
“Eu tentei até mentir para mim mesma, dizendo que estava criando
uma fantasia na minha cabeça, que estava vendo coisas onde não tinha, mas
não era. Eu me apaixonei pelo Mohammed e isso não tem nada a ver com
dinheiro. Se hoje ele decidisse que largar tudo e começaria do zero, eu iria
com ele. Dinheiro nenhum compra amor, família, paz, carinho. Eu amo
Mohammed, amo como ele cuida de mim, como ele cuida do meu filho
como se fosse dele, e pode ter certeza de que eu jamais faria nada para
prejudicá-lo.”
— Seu discurso chega a ser comovente. — Dessa vez quem fala
algo é a Ayla. Viro o rosto na direção dela e ergo uma sobrancelha ao ver o
Liam posicionado logo atrás. — Esse homem que está ao meu lado é o pai
do filho da Samia.
Os cochichos aumentam. Olho para os lados e, em seguida, volto a
encarar a Ayla.
— Liam, por que você não conta a sua versão da história?
— Eu era apaixonado pela Samia — ele começa. — Fazia de tudo
por ela. Ela era camareira no hotel e eu era o gerente. Tivemos um caso e eu
estava completamente rendido. Mas eu não sabia que, por causa dela, eu
perderia o meu emprego e ainda por cima teria que responder a crimes de
abuso entre funcionário e patrão. Ela veio com essa mesma história de
gravidez, mas as pessoas já haviam me alertado sobre ela, que ela era falsa,
cínica e estava esperando apenas o momento certo para dar o golpe da
barriga.
“Eu não caí, pois quando ela veio me contar que estava grávida, eu
já havia descoberto sua verdadeira face, quem ela era de verdade. Então ela
decidiu contar suas mentiras para o Mohammed e, infelizmente, ele
acreditou. A Samia adulterou todos os livros caixas do hotel e eu fui
demitido, acusado de roubo e uso inapropriado das dependências do hotel.”
Sinto a Samia se apoiar em mim e encaro o Liam, tentando entender
de onde ele tirou toda essa história.
— Essa mulher tentou me enganar e, quando viu que não daria
certo, ela foi logo no alvo mais forte e ele, todo ingênuo, caiu como um
patinho na lábia dessa golpista.
Olho para os lados. Vejo que minha mãe e Eda estão juntas e eu não
consigo ler o que elas estão pensando.
— Mohammed... — Ayla se aproxima de mim. — Eu sei que você
está enfeitiçado por essa mulher, mas ainda dá tempo de você acordar para
vida, ainda dá tempo de ver que ela não presta, que ela só quer o seu
dinheiro. Eu não me importo se não nos casarmos, mas eu não quero que
você seja enganado por uma mulher sem escrúpulos que não mede esforços
para ter o que quer.
— Como...
Samia tenta ir para cima da Ayla, mas eu não deixo.
— Ela vai te largar, roubar todo o seu dinheiro. Como você pode ser
tão ingênuo?
— Como você pode se prestar a esse papel? Essa humilhação toda?
Acha mesmo que, se eu deixar a Samia, vou ficar com você? Será que você
nunca entendeu que eu nunca quis nada com você, absolutamente nada?
Você, Ayla, me dá nojo, porque uma mulher de verdade jamais se prestaria
ao papel que você está fazendo. É o auge da humilhação, todo esse teatro
que você armou para tentar dar a volta por cima.
Uma lágrima escorre pelo seu rosto e ela rapidamente a seca. Olha
em volta, observa que todos estão assistindo o que está acontecendo e, com
toda a certeza, está sendo transmitido ao vivo em todos os lugares.
— Você acha que eu estou me humilhando? — sussurra. — Eu só
queria que você me amasse. Eu sempre estive ao seu lado, eu sempre ali se
você precisasse, mas você nunca precisou. O que ela tem que eu não tenho?
O que ela fez que eu não fiz? Por que ela e não eu?!
Ela grita e começa a chorar. Solto um suspiro, a cena que ela está
fazendo é digna de pena.
— Não mandamos no coração, Ayla. — É tudo que eu respondo.
Passo os braços em volta dos ombros da Samia e me viro para o
restante dos convidados.
— Vocês podem acreditar no que quiserem, eu não me importo com
o que vai sair nos jornais amanhã, nem o que estão pensando. Eu não me
importo com nada, tudo que eu quero é viver uma vida tranquila com a
mulher que eu amo, independente de hotel ou não, de dinheiro ou não. Eu
não preciso de nada disso para ser feliz. A única coisa que eu preciso é da
minha mulher ao meu lado.
Com a Samia ao meu lado, caminhamos em direção a saída lateral.
— Eu não vou deixar isso barato!
Ouço o grito da Ayla e me viro no exato momento em que ela
aponta uma arma para a Samia. Os gritos começam no mesmo instante e
tudo parece acontecer em câmera lenta.
Samia se vira para a Ayla e arregala os olhos ao ver a arma em sua
direção.
O som do disparo ecoa alto e eu não penso duas vezes antes de
entrar na frente dela.
— Mohammed! — ela grita no instante que sinto uma dor aguda
atingir meu peito.
Perco as forças e ela me ampara, dou dois passos para trás e caio no
chão, com a cabeça em seu colo. Minha visão fica turva e sinto uma tontura
imediata.
— Mohammed! Mohammed, fala comigo, por favor! Mohammed!
Pisco, vendo seu rosto embaçar. O desespero em sua voz é nítido e
eu ergo a mão para tocar seu rosto.
— Samia...
— Eles já chamaram a ambulância. Você vai ficar bem, você vai
ficar bem...
Ela segura minha mão com força.
— Eu amo...
— Xiuuu! Não se esforce... por favor...
— Amo você... — termino de falar.
Minha visão fica completamente escura. Não sinto mais dor e a
última coisa que eu escuto é a mulher da minha vida gritar o meu nome em
desespero e angústia.
— MOHAMMED, NÃO!
Samia
Tudo parece acontecer em câmera lenta. Por um instante, eu paro de
ouvir completamente o que está acontecendo ao meu redor, e tudo que meus
olhos conseguem focar é no homem desmaiado a minha frente. Ergo as
mãos, vendo ambas sujas de sangue, e meu coração acelera de uma maneira
dolorosa.
— Mohammed... — sussurro seu nome e volto a encará-lo. —
Mohammed! Mohammed!
— Samia, Samia! — Ouço a voz da Eda me chamar, mas eu não
consigo reagir. Tudo que vem à minha mente é o fato de Mohammed estar
deitado em meu colo após ter levado um tiro no peito.
Sinto uma dor no pé da barriga e solto um gemido.
— Samia, olha para mim! — Eda segura meu rosto e eu a encaro. —
O resgate já está aqui, vai ficar tudo bem!
Minha respiração acelera e eu sinto outra pontada na barriga. Fecho
os olhos, fazendo uma careta de dor.
— O que você está sentido? O que está acontecendo?
— Acho que o bebê vai nascer — sussurro, sentido mais dor.
— Meu Deus! Mason! Mason! — Eda grita, olhando para os lados.
O socorro chega nesse momento e rapidamente colocam
Mohammed em uma maca. Eu observo ele ser levado às pressas.
— Eu preciso ir com ele — sussurro, tentando me levantar, mas a
Eda me faz ficar quieta.
— Você precisa ir para o hospital para dar a luz ao Ravi!
— Mas o Mohammed!
— Eu vou com ele, cuide de você primeiro! — Erin diz, aparecendo
ao meu lado.
Seus olhos estão cheios de lágrimas e eu não consigo evitar as
minhas próprias. Começo a chorar copiosamente.
— Me perdoe — peço, abaixando a cabeça. — Eu não queria que
nada disso acontecesse. Eu não iria imaginar que ele fosse entrar na frente
e...
— Está tudo bem, Samia! — Ela se abaixa e segura minha mão. —
Meu filho nunca confiou em pessoas erradas. Eu acredito em tudo que ele
disse, assim como acredito em você e no amor que disseram sentir um pelo
outro. Além do mais, se fosse tudo mentira, ele não teria entrado na frente
daquela bala.
— Mãe, vai logo — Eda pede, aflita. Erin assente e aperta minha
mão antes de seguir os paramédicos.
— Samia, você está bem? — Mason vem correndo em minha
direção e eu faço outra careta.
— Acho que o Ravi vai nascer — falo e ele assente, sorrindo.
— Vou levar você para o hospital.
Eles me ajudam a ficar de pé e nesse momento eu sinto o líquido
escorrer pelas minhas pernas. Olho para a Eda, que me encara e sorri.
— Meu sobrinho está vindo ao mundo, Samia. Você precisa ser forte
por ele, pelo Mohammed e por você!
**
— Está pronta, Samia?
— Nem um pouco — respondo, angustiada. Estou completamente
preocupada com o Mohammed, mas também quero que o parto ocorra de
maneira segura.
— Sei que está preocupada, mas preciso que você relaxe agora e
confie em mim. Vamos trazer esse menino ao mundo e depois você vai ter
notícias do seu marido.
Assinto e olho para as luzes que ficam logo acima de mim.
— Pronta?
— Pronta.
— Pode fazer força — ela diz e eu faço.
As contrações aumentaram muito na última hora e eu cheguei na
maternidade com quase 10 centímetros de dilatação.
— Força, Samia!
Eu empurro meu corpo para frente, projetando-o para fora.
— Aiii! — grito, sentido uma dor que parece que vai rasgar tudo
dentro de mim.
— Mas um pouco, Samia! Ele já está vindo!
Projeto o corpo para frente novamente, soltando outro grito, sentido
o suor escorrer pelo meu rosto.
— Isso, mamãe! Eu já consigo vê-lo, só mais um pouco. Eu sei que
você consegue, Samia! Seu filho está pronto para vir ao mundo, você está
ansiosa para conhecê-lo, seu marido também. Você não pode desistir agora!
— Não consigo — sussurro, esgotada.
— Consegue, você é mãe, Samia. Uma mãe consegue tudo pelo seu
filho.
Pisco mais algumas vezes e, reunindo minhas últimas energias, faço
mais força. Minhas costas caem na cama no instante em que um choro
preenche a sala.
Começo a sorrir, sentindo as lágrimas escorrerem pelo meu rosto.
A médica aparece ao meu lado e me entrega o bebê. Com cuidado,
eu pego meu filho no colo e sorrio ao vê-lo chorar.
— Bem-vindo, Ravi! — sussurro, tocando o narizinho dele com o
meu. — Bem-vindo, meu filho.
**
Ouço uma batida na porta e ergo o olhar para ela.
— Pode entrar!
Eda coloca apenas a cabeça para dentro do quarto e sorri assim que
me vê, entrando em seguida. Sorrio quando vejo vários balões nas cores
cinza e azuis, e um com o nome “Ravi” escrito.
— Vim visitar meu sobrinho preferido — diz, e eu sorrio.
— Ele é o seu único sobrinho, Eda!
— Exatamente, e espero que seja o único por um tempo! Imagina
como vai ser ter que me dividir em duas?
Eda deixa as coisas no sofá e se aproxima de mim, sorrindo.
— Que bebê mais lindo! Meu Deus!
— Eu sou suspeita para falar. — Sorrio.
— Posso?
— Claro!
Com cuidado, Eda pega o Ravi no colo. Ele começa a resmungar um
pouco, mas logo fica quietinho novamente.
— Incrível como até o resmungar é igual do Mohammed —
murmura, e eu sorrio tristemente, abaixando os olhos para minhas mãos.
— Você sabe que ele...
— Não importa quem é o doador de esperma, Samia — ela diz, me
encarando. — Esse filho é do Mohammed. Pai não é quem faz, pai é quem
cria, quem está ao seu lado em todos os momentos e te dá apoio. O
Mohammed fez isso.
— Queria que ele estivesse aqui — falo e começo a chorar.
— Logo ele vai estar, fé em Deus.
Já se passaram dois dias desde que tudo aconteceu. Dois dias que eu
não consigo dormir, comer ou fazer qualquer outra coisa que não seja
pensar no Mohammed. Ele está fora de perigo, mas continua internado na
UTI. A bala foi retirada, assim como vestígios do projétil, mas temos que
aguardar ele acordar, assim como o resultado dos exames que foram
pedidos.
— Ele vai ficar feliz quando souber que o Ravi nasceu — falo.
— Não vai existir homem mais feliz no mundo do que ele, Samia,
você vai ver!
Sorrio e seco minhas lágrimas.
— Obrigada por acreditar em mim, Eda.
— Eu sempre desconfiei do relacionamento entre você e o
Mohammed, mas também vi como vocês dois se tratavam. O Mohammed
não é assim com as mulheres, você era a exceção dele, sempre foi. E
quando vi que vocês dois estavam completamente apaixonados, me dei
conta de que o amor pode superar qualquer obstáculo e nascer de onde
menos esperamos.
Abaixo os olhos e respiro fundo.
— Ser apaixonada pelo Mohammed é um privilégio que eu não
imaginava ter, mas aconteceu e eu sou grata por ter o amor dele.
Outra batida na porta.
— Pode entrar — falo.
A porta se abre e o Mason entra. Seu olhar para na Eda com o bebê
nos braços e eu percebo que isso desconcerta um pouco da sua postura
impenetrável.
— Samia, como você está? — diz após se recompor e caminhar em
minha direção.
— Estou bem, ansiosa para sair desse hospital.
— Acredito que receba alta ainda hoje.
— Sério mesmo? Graças a Deus!
— Como ele está? — pergunta.
— Bem, ele é um menino forte e saudável — falo, sorrindo.
Ravi se remexe no colo da Eda e começa a chorar. Ela rapidamente
me entrega o bebê e eu começo a niná-lo, o que faz com que ele se acalme.
— Como está o Mohammed? — pergunto par ele.
— Não houve alterações, temos que aguardar.
Solto um suspiro e assinto.
— Vamos esperar o papai ficar bem, Ravi! Logo, logo ele vai vir
para brincar com você — sussurro.
— Tem uma pessoa que veio te ver — Mason diz.
— Quem?
Olho para a porta e vejo a dona Erin parada.
— Vou deixar vocês duas a sós. Vamos Eda?
— Vamos.
Os dois saem do quarto e Erin entra, parando onde a filha estava.
— Posso? — pergunta, e eu assinto. Ela pega o bebê e começa niná-
lo com carinho. — Ele é lindo.
— Sim, ele é.
Ela fica um tempo calada, apenas brincando com ele, e eu fico
tentando começar um assunto, mas simplesmente não consigo.
— Eu acredito em você, Samia — ela diz, me pegando de surpresa.
— Como?
— Eu acredito em tudo que você e o Mohammed disseram naquela
noite, acredito no amor que sentem um pelo outro, até porque vi esse amor
nascer e crescer. Eu sempre desconfiei que houvesse algo de errado nesse
relacionamento. Eu conheço meu filho, ele não me engana tão facilmente.
Te ofereci dinheiro porque se você fosse apenas uma mulher atrás de
dinheiro fácil, você aceitaria facilmente, mas você não é. Você recusou e
continuou ao lado do Mohammed, em uma atuação que virou verdade.
— Eu não queria mentir para nenhum de vocês.
— Eu sei que não. O Mohammed às vezes age sem pensar.
Felizmente de tudo isso ele tirou uma coisa valiosíssima: uma família, uma
mulher que ele ama verdadeiramente.
— Sinto muito por ter causado toda essa confusão.
— Não é sua culpa. Algumas mulheres estão acostumadas a se
humilharem por um pouco de atenção. A Ayla sempre soube que o
Mohammed não iria se casar com ela. Tudo que aconteceu foi ato das
escolhas dela, e ela vai pagar por isso.
Mason me contou que a Ayla foi presa, sua casa foi revistada e
foram encontrados todos os arquivos roubados da ala administrativa do
hotel. Liam, por sua vez, tentou fugir, mas a polícia o prendeu como
cúmplice do assalto e por estar ilegalmente dentro do país. Ele será
deportado para cumprir a pena em Nova Iorque.
— Obrigada por acreditar em mim — falo e a Erin sorri.
— Como eu não poderia acreditar na mulher que fez o meu filho ter
um brilho diferente no olhar desde o primeiro instante?
Erin me entrega o Ravi e beija minha testa.
— Mal posso esperar a hora que tudo isso passar para finalmente
vivermos como uma família normal, Samia.
— Eu também, Erin, eu também.
Samia
Termino de trocar a frauda no Ravi e o coloco de volta no berço. Ele
já está sonolento e eu sorrio ao ver que ele começa a dormir. Voltamos para
casa ontem no fim da tarde e nada melhor do que estar em casa. Para tudo
ficar completo, falta apenas o Mohammed aqui.
Ele está no hospital e ainda não acordou. Eu não entendo muito bem
o que aconteceu depois que ele levou o tiro, mas sei que sua sobrevivência
foi um milagre. A bala não acertou nenhum órgão vital, mas ainda assim
acertou um local considerado perigoso. Foram mais de quatro horas de
cirurgia para retirar a bala e os vestígios de projétil que a bala deixou.
Tudo que tenho pedido a Deus é que ele acorde logo e se recupere
da melhor forma possível.
Vejo que o Ravi dormiu e deixo o quarto. Vou para a sala e sorrio ao
ver a Eda ali. Ela tem sido um grande apoio para mim nesses últimos dias.
Mesmo preocupada com o irmão, ela sempre me liga e vem me ajudar com
o Ravi. Não tenho palavras suficientes para agradecer a ela e ao Mason por
me darem tanto apoio como agora.
— Ele dormiu?
— Sim.
— Como você está?
— Na medida do possível bem. Estaria melhor se eu conseguisse
ver o Mohammed. Me sinto mal por não ter ido ao hospital até agora.
— Você está de resguardo, tem um bebê recém-nascido para cuidar,
é claro que o Mohammed vai entender quando acordar.
— Mal vejo a hora disso acontecer, sinto tanta falta dele!
— Todos nós conseguimos perceber através dos seus olhos.
Sorrio tristemente e encaro a janela que dá para a varanda. Foram
tantos acontecimentos nos últimos dias que só quero saber de descansar e
cuidar do meu filho. Não quero saber de notícias, de boatos. Tudo que eu
mais quero agora é paz. Apenas isso.
Por mais que eu queira ir até o hospital ver o Mohammed, sei que a
Eda tem razão. É melhor eu ficar em casa, cuidando do Ravi e me
recuperando de tudo que aconteceu, longe das redes sociais e do olhar da
mídia, que está desesperada por alguma notícia sobre a recuperação do
Mohammed. Ontem, quando saí do hospital, a entrada estava lotada de
fotógrafos. Foi uma luta para conseguir entrar no carro.
Mason me aconselhou a evitar as redes sociais por alguns dias, pelo
menos até tudo ao nosso redor esfriar. Mas claro que ele falou isso depois
que fui olhar sobre o que estavam falando. Eram tantas notícias que eu
fiquei confusa, desde sites me acusando de aplicar o golpe da barriga até
sites que colocaram a nossa história como um possível roteiro para
Hollywood. Desde então, tenho evitado qualquer contato com a internet.
Todas as notícias que recebo devo ao Mason e à Eda.
— O que acha de eu preparar um lanche para nós duas? — Eda
pergunta, já se levantando.
— Pode deixar que eu preparo, Eda. Não precisa se preocupar.
— Nada disso! Eu quero preparar algo para minha cunhada comer,
posso?
Acabo sorrindo, mas assinto logo em seguida. Acompanho Eda até a
cozinha e fico observando enquanto ela se movimenta pela cozinha,
fazendo nosso lanche.
— O Mohammed tem sorte de ter você na vida dele — ela fala de
repente.
— Como?
— Ele tem sorte de ter você, Samia. Você mudou completamente o
meu irmão. Pode ter começado com uma mentira, um contrato, vocês
prometendo que não se apaixonaram um pelo outro, mas no fim termina
com vocês dois construindo uma linda família, uma família de verdade.
Sorrio para ela e assinto.
— Concordo plenamente com você — falo.
O celular dela começa a tocar.
— Alô? Sério? — Eda me encara com uma expressão feliz.
— O que foi?
— O Mohammed acordou!
**
Eu saí do apartamento como uma louca, depois de ter arrumado as
coisas do Ravi, para poder levá-lo no hospital comigo. Eda achou uma
loucura que eu fosse ao hospital agora, mas eu preciso ver o Mohammed, eu
preciso saber como ele está. Apesar do Mason não concordar com a ideia,
ele topou me ajudar. Vai ser bem rápido, eu vou entrar por outra entrada,
com chapéu e óculos escuros, e a Eda e o Mason vão ficar no carro com o
Ravi.
Eu só preciso saber como o Mohammed está. Preciso vê-lo com
meus próprios olhos para ter certeza de que ele está realmente bem e que
vai voltar logo para nós.
— Está pronta? — Mason pergunta assim que estaciona o carro.
— Sim.
— A enfermeira vai te encontrar logo na entrada e te levar até o
quarto em que ele está.
Assinto e me preparo para descer do carro. Meus passos em direção
a entrada são rápidos. Eu estou usando um chapéu, óculos escuros, tênis,
calça de moletom e blusa de frio. Tudo isso apenas para passar
despercebida entre as outras pessoas.
Entro no hospital e olho para os lados. Logo vejo uma enfermeira
andando de um lado para o outro com um celular na mão. Sigo em sua
direção e ela me vê.
— Estava te esperando. Vem comigo.
Assinto e sigo a mulher rapidamente. Entramos no elevador e eu
permaneço com a cabeça abaixada enquanto fazemos o percurso até o andar
de cima. As portas se abrem e eu continuo a segui-la até ela parar em frente
a uma porta e apontar para ela.
— Pode ficar à vontade — diz, com um sorriso no rosto.
— Obrigada!
Abro a porta do quarto e entro lentamente. Sorrio ao vê-lo deitado.
Seus olhos estão fechados e ele parece dormir. Começo a chorar
imediatamente, sentindo meu coração bater mais forte.
Durante toda a minha vida, nunca senti tanto medo de perder
alguém como eu senti naquela noite.
Foi desesperador ver todo aquele sangue e vê-lo desmaiar em meus
braços. Se eu perder esse homem, não sei o que vai ser da minha vida.
— Espero que esteja chorando de felicidade por eu estar vivo.
Abro os olhos e o vejo acordado e sorrindo.
— Mohammed! — Caminho em sua direção e o abraço
cuidadosamente. — Meu Deus, você está bem! Meu Deus!
Não consigo controlar minhas lágrimas, tudo que eu consigo fazer
agora é chorar, mas pelo menos são lágrimas de alegria, porque sei que ele
está bem e logo vai poderá ir para casa.
— Shiuuu, Girassol. Eu estou aqui, está tudo bem.
— Eu senti tanto medo — falo e ergo os olhos para ele, acarinho seu
rosto com uma mão. — Eu pensei que fosse te perder naquela noite, eu
pensei que nunca mais fosse te ver.
— Eu estou bem, Girassol. Eu é que não suportaria ver você
sangrando na minha frente depois de levar um tiro.
— Não deveria ter feito aquilo, não deveria ter entrado na minha
frente!
— Impossível, Samia. Será que você ainda não entendeu?
— Não entendi o quê?
— Que eu amo você.
— Mas por me amar você precisa levar um tiro por mim?
— Girassol, por você, eu levo quantos tiros forem necessários.
— Não fala isso, não quero que você se arrisque por minha causa.
Me promete que não vai cometer uma loucura dessas de novo?!
Mohammed segura a mão que está em seu rosto e a desce até seus
lábios, beijando delicadamente.
— Eu prometo, meu amor.
— Eu te amo — sussurro, olhando em seus olhos, e ele sorri.
— Eu também te amo, muito.
Aproximo os lábios dos dele e lhe dou um selinho.
— Deveria ter trago o Ravi. Estou ansioso para conhecer meu filho.
Sorrio para ele.
— Você vai conhecê-lo assim que sair do hospital.
— Mal posso esperar para sair daqui e ir para nossa casa, com nosso
filho, para viver a nossa vida.
— Mal posso esperar por isso também.
Me aproximo e beijo sua testa.
Parece um sonho ele ter sobrevivido àquela bala, mas só consigo
pensar que seja Deus nos abençoando e nos ajudando a viver juntos como
uma família de verdade.
E estou contando os dias para os inícios das nossas vidas, nossas
vidas de verdade, sem mentiras, contratos ou sem tentar convencer ninguém
do que sentimos, porque isso só diz respeito a nós dois.
**
1 SEMANA DEPOIS

— Cuidado, cuidado! — falo assim que o Mason ajuda o


Mohammed a entrar em casa.
Finalmente, ele recebeu alta. Nem acredito que ele está em casa
agora. Mason ajuda o Mohammed a se sentar no sofá e eu me sento ao lado
dele.
— Quer alguma coisa? Mais almofadas? Precisa de apoio para os
pés? Quer comer algo? Quer...
— Girassol, eu estou bem — fala, segurando minha mão.
— Tem certeza?
— Claro que eu tenho. Eu não poderia estar melhor agora. Eu tenho
tudo que preciso bem aqui! — Ele aperta minha mão e eu sorrio. — Estou
em casa e com você, não tem como estar melhor do que isso.
— Você está em casa, eu não consigo acreditar nisso, meu Deus!
Coloco a cabeça em seu ombro e ele passa o braço pelas minhas
costas, me puxando para si.
— Estou aqui, meu amor. Eu estou aqui.
— E tem alguém aqui bem ansioso para conhecer o papai.
Levanto a cabeça e sorrio ao ver a Eda trazendo o Ravi para a sala.
Mohammed ajeita a postura e sua irmã se senta ao seu lado.
— Meu filho...
Com todo o cuidado, Eda ajuda o Mohammed a segurar o Ravi. Ele
resmunga um pouquinho, mas logo para.
— Oi, Ravi. Aqui é o papai.
Imediatamente, Ravi abre os olhos, procurando o som da voz do pai.
Sorrio com isso e ele me encara.
— O papai está aqui, e eu prometo que sempre estarei.
Ravi mexe as mãozinhas e eu sorrio com isso, sentindo uma lágrima
escorrer pelo meu rosto.
Mohammed me encara e aproxima o rosto para beijar minha testa.
— Agora sim — ele sussurra.
— Agora sim?
— Nossa família está completa.
Sorrio e concordo com ele. Nossa família está completa.
Mohammed
1 MÊS DEPOIS

Hoje eu posso dizer que estou completamente recuperado. Confesso


que, por um instante, pensei que fosse morrer. Durante aquele mísero
segundo, pedi a Deus que me desse uma chance de viver com a mulher que
eu amo e com o filho que ela estava esperando.
Quando tudo era apenas escuridão, eu implorei que aquilo não fosse
a morte.
Quando acordei e percebi que estava no hospital, a primeira coisa
que fiz foi perguntar sobre a Samia. Só consegui respirar aliviado ao saber
que ela estava bem. Porém, ao saber que ela entrou em trabalho de parto
logo em seguida, me deixou preocupado. Se eu pudesse, teria saído do
hospital naquele mesmo dia apenas para dar apoio a ela.
— Já está pronto? — Samia entra no quarto e caminha em minha
direção. Ela ajeita minha gravata e passa a mão pelo meu terno.
— Gostou?
— Lindo como sempre.
— Se precisar de algo, basta me ligar — falo, e ela assente.
— Não se preocupe, o Ravi e eu vamos ficar bem.
Assinto e beijo sua testa.
Hoje eu vou voltar para a empresa. Aproveitei e tirei um período de
férias para aproveitar os primeiros dias de vida do Ravi, e foi a melhor coisa
que eu fiz. É incrível como um ser humano tão pequeno pode me fazer
sentir um amor tão grande como sinto por ele.
— Tem certeza de que vai ficar bem? — questiono pela décima vez.
— Claro que eu tenho, pode ir trabalhar tranquilo.
Acaricio seu rosto e ela fecha os olhos. Como pode uma mulher
carregar tanta beleza igual a ela? Como pode uma mulher ser tão linda,
amorosa, paciente e apaixonante como ela é?
— Então, eu já vou.
— Bom trabalho. Qualquer coisa, me liga.
— Você também.
A verdade é que eu não quero deixá-la, mesmo que seja por algumas
horas. Caminho em direção à porta, mas paro antes de sair do quarto e me
viro para ela novamente, que está sorrindo para mim.
Seu sorriso tem o poder de me desmontar por completo, é incrível
essa capacidade que ela tem. Avanço em sua direção, seguro seu rosto e
tomo sua boca em um beijo.
Nossos lábios se entreabrem e se completam durante o beijo, como
dois quebra-cabeças de encaixe perfeito. Me afasto dela apenas o suficiente
para que ela respire.
— Eu realmente não queria que você fosse, mas não podemos fazer
nada agora — fala e eu assinto, encostando minha testa na dela.
— Amo você, Samia.
— Eu também amo você, muito!
Ela me dá mais um selinho e se afasta. Dessa vez eu deixo o quarto
sem olhar para trás, porque tenho certeza de que se fizer isso não irei sair
dessa casa hoje.
**
Mesmo não querendo trabalhar, eu sei que a empresa precisa de
mim. Foi um pouco mais de um mês sem a minha presença, e apesar de
tudo caminhar sem mim, eu preciso resolver várias situações burocráticas.
— Animado para voltar ao trabalho? — Mason pergunta, enquanto
o elevador sobe até o andar da administração.
— Se eu pudesse escolher, estaria no meu apartamento com minha
mulher e meu filho — respondo.
— À noite você estará com eles.
— Assim eu espero.
As portas se abrem e eu sigo em direção à minha sala. Muitos
funcionários me param para cumprimentar e eu agradeço a todos pelo
trabalho desenvolvido no último mês.
— Mohammed, que bom que o senhor chegou! O Senhor Osman
está na sua sala te esperando — minha secretária diz assim que me vê.
— Certo.
— Mohammed... — Mason chama e eu me viro para ele.
— Não se preocupe, eu já esperava isso. Na verdade, acho que até
demorou.
Meu amigo assente e eu sigo para minha sala. Abro a porta e vejo
meu pai sentado no sofá, tomando um café. Entro e sigo para minha mesa.
— Voltando ao trabalho hoje?
— Sim.
— Acha que valeu a pena?
Eu sei ao que ele está se referindo.
— Sim, eu acho.
— Você cancelou uma sociedade que poderia dar certo para todos,
para se casar com uma mulher que está sendo acusada de dar o golpe da
barriga?
— Não, pai. Eu cancelei essa sociedade para ficar com a mulher que
eu amo. Mas o senhor não sabe o que é o amor, não sabe o que é se
apaixonar e ser capaz de enfrentar tudo pela mulher que ama. Um dia
cheguei a me perguntar se o senhor já amou a mamãe, mas a resposta que
eu vejo é que o senhor nunca soube o que é esse sentimento.
— Não fale sobre o que você não sabe, Mohammed.
— Não precisa ser um gênio, basta reparar bem. O senhor trata a
mamãe como um troféu e ela é uma mulher que merece amor e carinho,
mas o senhor não sabe o que é isso. Não te culpo, afinal, o senhor seguiu à
risca o que meu avô queria, mas eu não serei assim. Eu descobri o que é
amar e ser amado a tempo de cometer a maior burrada da minha vida.
— Você mentiu para todo mundo!
— E mentiria de novo se fosse para conhecê-la! — devolvo. — Eu
faria tudo de novo se fosse para me apaixonar por ela novamente! Se tem
uma coisa que eu não me arrependo nessa vida é de amar a Samia, pai. E eu
espero do fundo do meu coração que o senhor aceite isso.
Ele fica calado e logo se coloca de pé.
— Eu espero do fundo do meu coração, Mohammed, que você não
esteja errado sobre essa mulher.
Sorrio e me sento.
— Não se preocupe quanto a isso pai, a Samia nunca vai ser um erro
na minha vida.
Ele me olha por mais alguns instantes e então vai embora. Meu pai
pode falar o que ele quiser, mas eu nunca vou me separar da Samia. Ele
pode nunca aceitá-la como minha esposa, mas isso não vai interferir no meu
relacionamento com ela.
Nunca.

3 MESES DEPOIS

CAPADÓCIA

— Ainda não consigo acreditar que estamos aqui de novo — Samia


fala no instante em que descemos do avião.
— Dessa vez estamos exclusivamente de férias — falo para ela, lhe
dando um selinho.
Eu queria preparar uma viagem inesquecível para a Samia. Eu
realmente queria que fosse apenas nós dois, porém, por causa do Ravi, se
torna inviável isso. Minha solução foi trazer a babá dele conosco, assim eu
poderia curtir um pouco com a Samia enquanto ela cuidava do nosso filho.
A babá desce do avião e eu ajudo com o carrinho, enquanto a Samia
pega nosso menino no colo. Após tudo pronto, ela coloca o bebê no
carrinho e ele começa a sorrir para a gente.
— Quem é menino do papai? — pergunto para ele, que balança os
braços e as pernas em animação. — Com toda certeza ele vai ser jogador de
futebol.
— Amor, você queria ser jogador de futebol em algum momento e
acabou não tendo esse sonho realizado?
— Claro que não! — falo e lhe dou um selinho. — Mas ele tem
talento.
Não espero sua resposta, apenas empurro o carrinho para frente,
brincando com meu filho.
Zoe, a babá, vai ficar em um quarto separado com o Ravi, onde a
Samia já deixou tudo preparado para que ela possa ficar com ele. E um
quarto para nós dois.
Depois que o Ravi foi devidamente instalado no quarto dele, Samia
e eu vamos para o nosso, onde ela para logo na porta ao ver que há uma
entrada toda coberta por pétalas de rosas, junto com uma mesa de jantar à
luz de velas.
— Mohammed...
— Gostou?
— Eu amei, de verdade.
Ela se vira para mim e vejo seus olhos brilharem em lágrimas.
— Por que está chorando?
— Porque durante boa parte da minha vida, eu nunca imaginei que
fosse encontrar um amor igual ao seu, que fosse encontrar um homem como
você, que fosse ter uma família como a nossa e muito menos que fosse me
apaixonar perdidamente por você.
Seco suas lágrimas, passando os polegares embaixo dos seus olhos.
— Eu também não imaginava. Você mudou tudo, Samia, e tudo que
eu puder fazer para mostrar o quanto eu te amo, eu vou fazer.
Eu a beijo.
Há um ano, eu não tinha a menor definição do que era o amor. Hoje,
eu sei que por essa mulher, sou capaz de qualquer coisa. Amar ela é como
respirar, é como acordar em um dia ensolarado de verão, é sorrir sem
motivo, é sentir o coração acelerando apenas de olhar para ela, é dormir e
acordar pensando nela. Amá-la é viver o melhor da minha vida.
— Samia? — sussurro entre seus lábios.
— Sim?
— Você quer casar comigo?
Ela abre os olhos, me encarando seriamente.
— Você tem certeza da pergunta que está fazendo?
— Eu nunca tive tanta certeza em toda a minha vida. — Ela sorri e
eu sorrio junto. Ela me beija lentamente e logo se afasta.
— Eu aceito me casar com você, Mohammed. Quantas vezes você
quiser.
Passo os braços em volta de sua cintura e a ergo do chão, girando
com ela pelo quarto enquanto a encho de beijos. Os risos da Samia
preenchem o quarto e logo caímos em cima da cama, comigo por cima dela.
— Te amo — ela sussurra.
— Te amo.
Eu a beijo.
Ah, como eu amo essa mulher!
Samia
1 ANO DEPOIS

Sim, esperei um ano para meu casamento de fato acontecer. O


Mohammed me disse que esse casamento deveria ser o casamento dos meus
sonhos e, com isso, não medimos esforços para organizar cada detalhe do
jeito que nós dois merecemos.
— Você está parecendo uma princesa — Eda diz, sorrindo.
— Acho que eu nunca me senti tão linda em toda a minha vida —
falo.
— Você está maravilhosa — Erin diz.
— Estou nervosa também — falo.
— Aproveite seu dia, menina. O casamento é um dos dias mais
felizes e lindos na vida de uma noiva.
— Obrigada, Erin!
No último ano, meus laços com a Erin se estreitaram muito e eu a
considero praticamente como minha segunda mãe, uma mulher que está
pronta para me ajudar, auxiliar e cuidar de mim sempre que eu precisar.
Um verdadeiro exemplo a ser seguido.
— Está pronta, coração? — Luke pergunta ao entrar no quarto.
— Mais do que pronta!
Eu fiz questão de trazer meus dois amigos para me verem casar. O
Luke e a Lisa são o mais próximo que eu tenho de família em Nova Iorque,
tê-los aqui hoje é um presente para mim.
Lisa entra logo atrás e eu sorrio quando a vejo.
— Você está tão linda!
Ela vem me abraçar.
— Obrigada, amiga!
— Eu sabia que isso iria se tornar um lindo romance — fala ela.
— Você e sua cabeça de fanfiqueira.
— Deu certo! — Ela enxuga minhas lágrimas. — Não chore! Você
tem que sorrir hoje, você está se casando!
— Pode deixar!
A porta se abre novamente e Mason entra, sorrindo.
— Samia, você está pronta?
— Nunca estive tão pronta.
**
No instante que a marcha nupcial começa a tocar e eu vejo o
Mohammed me esperando no altar, é impossível não segurar as lágrimas,
assim como não consigo deixar de sorrir por nenhum momento.
Olha como o mundo é louco, quem diria que eu estaria me casando
com o homem que jurou nunca se apaixonar por mim?
Meu coração parece estar sofrendo algum tipo de parada cardíaca.
Ele está tão acelerado que não consigo senti-lo corretamente.
A cada passo que dou em direção a altar, parece que um filme se
passa na minha cabeça: a maneira como nos apaixonamos, cada cuidado,
cada beijo, cada toque, cada troca de olhar.
Puxo o ar profundamente quando ele começa a caminhar em minha
direção. Mohammed estende a mão para mim e eu coloco a minha na dele,
sorrindo em meios as lágrimas, e ele também.
Fecho os olhos quando ele beija minha testa. Terminamos de
caminhar até o altar de mãos dadas e durante toda a cerimônia eu não
consigo parar de olhar para ele, não consigo parar de sorrir ou chorar.
Parece que estou sonhado.
Mohammed se vira para mim e começa a colocar a aliança em meu
dedo.
— Eu prometo a você, Samia, ser fiel, te amar e te respeitar, por
todos os dias das nossas vidas.
Pego a aliança e começo a colocar em seu dedo.
— Eu prometo a você, Mohammed, ser fiel, te amar e te respeitar,
por todos os dias das nossas vidas.
— Eu vos declaro marido e mulher. O noivo pode beijar a noiva.
Mohammed se aproxima de mim e sorri.
— Está pronta para o melhor começo das nossas vidas?
— Eu nunca estive tão pronta.
Ele me beija e o som das palmas ecoa alto em meus ouvidos, mas
tudo que me importa agora é esse homem na minha frente.
— Olha, a mamãe e o papai tão se beijando!
Os convidados morrem de rir da fala do Ravi. Mohammed me solta
e chama o filho, que corre para o colo do pai. Nos olhamos e beijamos
nosso filho na bochecha ao mesmo tempo, arrancando mais palmas e
assovios dos convidados.
Eu tenho uma família, a melhor que eu poderia querer, e eu não
poderia estar mais feliz do que isso!

FIM
Quero agradecer primeira a Deus, por ter me sustentando até aqui e
por não ter me deixado desistir do meu sonho!
Quero agradecer a Ana Caroline, que sempre esteve ao meu lado,
desde o início, me apoiando e me ajudando, amiga esse lançamento não
estaria acontecendo se não fosse você, obrigada!
Amberly, obrigada por ter surtado comigo e com esse livro do início
ao fim.
Minhas leitoras queridas, obrigada por não desistirem de mim, vocês
são mais que especiais em minha vida, saibam disso!
Amo vocês e se preparem, vamos nos ver muito mais em 2023!

Quer saber mais sobre meus livros? Me siga no Instagram!

MEU INSTAGRAM

[1]
Deus em árabe

Você também pode gostar