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J.M.

SOLLO
TODOS OS DIREITOS RESERVADOS

Copyright© JULIANA MARTINS

Este e-book é uma obra de ficção. Embora possa ser feita


referência a eventos históricos reais ou locais existentes,
os nomes, personagens, lugares e incidentes são o
produto da imaginação da autora ou são usados de forma
fictícia, e qualquer semelhança com pessoas reais, vivas
ou mortas, estabelecimentos comerciais, eventos, ou
localidades é mera coincidência.
SUMÁRIO

CAPÍTULO UM

CAPÍTULO DOIS

CAPÍTULO TRÊS

CAPÍTULO QUATRO

CAPÍTULO CINCO

CAPÍTULO SEIS

CAPÍTULO SETE

CAPÍTULO OITO

CAPÍTULO NOVE

CAPÍTULO DEZ

CAPÍTULO ONZE

CAPÍTULO DOZE

CAPÍTULO TREZE

CAPÍTULO QUATORZE

CAPÍTULO QUINZE

CAPÍTULO DEZESSEIS

CAPÍTULO DEZESSETE

CAPÍTULO DEZOITO
CAPÍTULO DEZENOVE

CAPÍTULO VINTE

CAPÍTULO VINTE E UM

CAPÍTULO VINTE E DOIS

CAPÍTULO VINTE E TRÊS

CAPÍTULO VINTE E QUATRO

EPÍLOGO
CAPÍTULO UM

Você os matou...

Você os matou...

Você os matou...

A imagem do carro caindo penhasco abaixo, e eu

assistindo à cena através do vidro turvo, cujos para-brisas


tentavam limpar inutilmente, era algo que me

acompanhava há cinco anos. Quase todas as noites,


aquele pesadelo era a minha maior companhia. Com

exceção de que, ao acordar, eu não sentia o alívio pelo fato

de não se tratar da minha realidade. Pelo contrário... a


cama vazia era prova suficiente de que a morte de duas

pessoas tão importantes na vida não era uma ilusão.

Eu fui o causador daquela morte. A culpa era minha

e de mais ninguém.

Sempre soube que era um filho da puta controlador,


e eu lutava dia após dia para não sufocar Taís com meu

temperamento. Ela nunca foi uma submissa, de jeito

nenhum, e isso era o que eu mais amava em sua

personalidade, embora fosse um fetiche meu na cama que


minha esposa nunca fora capaz de atender.

Talvez, naquele dia, eu devesse ter deixado a merda

da minha mania de controle assumir e tê-la trancado em

casa para impedir que não fosse embora. Muito menos que

levasse nosso filho junto.

Ou talvez eu não devesse tê-los seguido, jurando

que os estaria protegendo. Que a melhor escolha era


tentar trazê-la de volta para casa.
Taís não era mais feliz. Ela nunca quis o casamento.
A gravidez a levou a concordar com nossa união, mas era

jovem demais. Eu a convenci e nada nunca me deixaria tão

arrependido novamente.

Ser pai era o meu sonho. Ainda era, na verdade. Eu

não esperava ter um filho para perdê-lo menos de um ano

depois.

Ele teria seis àquela altura. Estaria correndo de um


lado para o outro naquela festa, exatamente como a

menininha linda, de vestido rosa, cujos pais já tinham

repreendido mais de uma vez.

Eu odiava festas como aquela, onde tudo o que

reinava era a hipocrisia. Onde as pessoas olhavam para

mim como se eu estivesse observando cada uma delas


para anotar qualquer pequeno deslize na minha lista de

futuras demissões. Sendo assim, um sopro de frescor

como aquele, o som da risada de uma criança, seu jeitinho

sapeca... tudo isso quase me fazia sorrir.


Quase.

A garotinha era, provavelmente, filha de um dos


meus funcionários. Eu não saberia dizer com certeza,

porque não era exatamente atento às suas vidas pessoais.

O que realmente importava, para mim, eram seus


desempenhos dentro do escritório.

Antes eu costumava ser um pouco mais sociável –


mas só um pouco –, depois da morte de Taís, eu

literalmente me fechei para o mundo. No escritório, eu era


conhecido como o Homem de Ferro; tão controlador

quanto na minha vida pessoal. As pessoas não sabiam que


aquela informação era passada a mim, mas, infelizmente
para elas, a única pessoa que tinha algum acesso a mim

era a minha secretária, e ela me contava isso aos risos. Eu


não achava tanta graça no apelido, embora sua gargalhada

fosse adorável.

Aliás, ela estava na festa. Bem bonita – que era o


que eu podia ver de longe. Um vestido preto simples, não
muito diferente dos que ela usava para trabalhar, mas, sem

dúvidas, novo.

Um dos únicos amigos que eu tinha, que era o


diretor comercial da Sodemberg – a empresa da qual eu

era o dono e que era do ramo de turismo náutico – sempre


me dizia que eu morria de tesão por Diana, a tal secretária.
Esta era a palavra vulgar que ele usava, embora eu não

pudesse negar que a moça me causava certo... interesse.

Era bem mais jovem do que eu, provavelmente uma


diferença de uns treze anos, e eu poderia jurar que era

mais inocente do que aparentava. Trabalhava comigo há


dois anos e nunca ouvi histórias de que estava namorando

ninguém, jamais dera confiança para as diversas cantadas


que recebia na empresa e tinha um jeito meigo, que era o
que mais me mantinha afastado.

Claro que o fato de ela ser minha secretária também

contava para que eu não me aproximasse com segundas


intenções, mas, infelizmente, eu era sombrio demais para
me intrometer na vida de alguém que exalava tanta luz. Eu
iria destruí-la, assim como fiz com minha falecida esposa.

Só que, ao me ver sozinho – embora isso não fosse


uma novidade –, veio ficar perto de mim, com um sorriso.

Ninguém mais tinha coragem de fazer isso. Para ser


sincero, nunca dei abertura para ela também, mas Diana

era uma moça insistente.

— Boa noite, chefe. A Kelly é uma gracinha, não é?

Voltei meus olhos para ela, confuso.

— Quem?

— A Kelly. Filhinha da Monique, do RH. Tem quatro


aninhos. Superesperta, fala pelos cotovelos e é doida para

ter um cachorro, mas a mãe não quer.

Dei um gole no meu uísque. Pretendia que fosse o


único da noite, porque não queria ficar embriagado na festa

de confraternização da minha própria empresa. O


aniversário da Sodemberg acontecia em Outubro, e no
mês seguinte tanto eu quanto Diana tiraríamos férias. Por
mais incrível que pudesse parecer, ela não estava muito
animada com isso. Mas na minha ausência, não havia

motivos para que ela permanecesse na empresa.

— Aparentemente você sabe tudo sobre ela.

O sorriso em seu rosto se alargou, e eu pude ver as

covinhas que formavam buracos enormes no seu rosto.

Seus olhos azuis acinzentados tinham um tom peculiar


também, e ela parecia uma boneca. Completamente

diferente de Taís, que era bonita de um jeito mais óbvio:

loira estilo Barbie, bronzeada, com algumas intervenções

cirúrgicas muito discretas. Era difícil ver Diana com quilos


de maquiagem no rosto, e ela era naturalmente linda.

— Está me chamando de fofoqueira, senhor?

Havia algo de muito sensual na forma como ela

proferia aquela palavra, embora nem imaginasse os meus

fetiches. E eu sabia que era de uma forma brincalhona,


porque era a única pessoa a quem eu tinha dado algum
tipo de liberdade para não me chamar assim, mas em

alguns momentos ainda insistia.

— Não. Só não sabia que você gostava de crianças.

— Não sabe que eu tenho um irmão de dez anos?

Praticamente o criei depois que nossos pais morreram.

Eu sabia por alto. Realmente não gostava de me

envolver na vida pessoal dos meus funcionários. Não

gostava de exercer minha compaixão por eles ou acabaria


perdoando falhas e deixando de demiti-los quando

necessário. Eu era o Homem de Ferro, afinal. Não era?

Se ela achava que eu ia fazer alguma pergunta


sobre a criança ou sobre como era sua vida sendo quase

mãe, mesmo tendo apenas vinte e dois anos, não era

exatamente o meu tipo.

— A menina, de fato, é engraçadinha — respondi,

finalmente, sem nenhuma emoção no meu rosto.


Diana olhou para mim como se eu fosse um

alienígena.

— Engraçadinha? Pelo amor de Deus, Nicolas

Sodemberg. A menina é uma princesa. Mas ok... vou


considerar isso como um elogio e tanto, vindo de você.

Seria o mesmo que dizer que ela é maravilhosa.

Meu rosto continuou impassível, e eu poderia

pensar em uma coisa ou duas para dizer a ela e

demonstrar que eu sabia fazer elogios, mas preferi ficar


quieto.

Para a minha sorte, fomos interrompidos

exatamente pela garotinha da qual estávamos falando,

porque, correndo e olhando para trás, sem nenhum senso


de direção, ela veio bater direto nas minhas pernas e

poderia ter caído para trás se eu não fosse rápido o

suficiente para me inclinar e segurá-la.

Seus olhinhos castanhos se arregalaram ao olharem


para os meus, como se tivesse acabado de ver um lobo
mau. Eu já conseguia imaginar o tipo de coisa que seus

pais lhe diziam sobre mim.

— Você se machucou? — perguntei, segurando


seus bracinhos, e ela visivelmente estava morrendo de

medo de mim, tanto que apenas balançou a cabeça em

negativa, respondendo.

Ouvi a risadinha de Diana, e ela pegou a garotinha


no colo, com o jeitinho de quem sabia o que estava

fazendo.

Então eu fiquei meio perdido olhando para as duas,

percebendo que a garotinha ia se acalmando aos poucos


no colo de Diana, até chegar ao ponto de começar a rir,

jogando a cabecinha para trás. Minha secretária tinha um

jeito e tanto com crianças, e ela parecia adorá-las.

Era hipnotizante e chegava a me dar uma dor no


coração por pensar que meu filho deveria estar vivo. Ele

mereceria ser tratado por alguém daquela forma, embora

eu pudesse jurar que Taís nunca seria uma mãe


exatamente carinhosa. A gravidez fora um erro para ela,

algo que iria lhe roubar a juventude e estragar o seu corpo

– embora ela tivesse acesso a todo o tipo de procedimento

estético e abusava deles –, então eu não conseguiria


imaginar uma cena como aquela.

Mas ali estava, à minha frente, uma mulher doce e

gentil, linda e completamente devotada a uma garotinha

que não era nem sua.

Com uma piscadinha brincalhona para mim, ela


levou a garotinha para longe, em seu colo, provavelmente

para devolvê-la ao seu pai. Segui Diana com os olhos,

observando cada um de seus passos. Ao olhar para Flávio,


meu diretor comercial, eu o vi erguendo seu copo para

mim, com um olhar malicioso.

Eu sabia o que estava passando por sua cabeça,

mas pior era saber o que estava passando pela minha. Um

milhão de coisas nas quais eu não deveria pensar.


CAPÍTULO DOIS

Eu não fazia o tipo de garota que frequentava festas

ou se divertia constantemente. Tendo que cuidar de um


irmão de dez anos, minhas noites de sexta normalmente se
resumiam a Netflix, enquanto eu o ouvia gritar ao cometer

algum erro no videogame que comprei com muito esforço


no Natal passado.

João Pedro era um bom menino, e eu não tinha

muito que reclamar. A gente se dava bem, com todas as


exceções que são comuns a duas pessoas de idades tão

diferentes e que têm uma relação quase de mãe e filho. Eu

precisava impor meus limites, mas o fazia com todo amor


possível. E ele entendia. Compreendia perfeitamente

minha luta diária para torná-lo um homem bom.

Eu teria declinado o convite, mas era uma festa da

empresa. Gostava muito de meus colegas, mas nunca

participava de nada, e sabia que isso fazia alguma


diferença. Tinha conseguido um bom emprego, em uma

ótima empresa, e poderia até tentar crescer lá dentro, com

um pouco de sorte, já que não tinha faculdade. Por mais


que todos criticassem meu chefe, o poderoso Nicolas

Sodemberg, chamando-o de tirano, carrasco e de mil

outras coisas, não tinha nada contra ele. Era profissional,


respeitoso, competente, esforçado e... bem... mais bonito

do que eu deveria ter reparado.

Nisso a mulherada do escritório era unânime. Todas

tinham um tesão absurdo nele, mas o cara era uma

muralha intransponível. Sempre sisudo, sempre calado,

não dando abertura para ninguém. Nem mesmo para mim,

com quem ele conversava uma vez na vida e outra na

morte – na maioria das vezes sobre trabalho.


Não consegui não sorrir pensando na forma como
ele tratou a garotinha, apesar de visivelmente ser

desajeitado com crianças. Tal atitude demonstrava um lado

de sua personalidade que eu ainda não conhecia, e eu não

poderia negar que, somado a tudo que eu sabia sobre ele,

me deixava um pouco mais mexida.

Ok... a verdade era que eu tinha um crush em

Nicolas. Mais do que apenas o tesão que as outras


mulheres sentiam, porque ele era um cara incrivelmente

sexy e bonito, eu sentia uma dor em seus olhos, algo muito

pesado, que me faria querer desvendá-lo. Era misterioso,

além de todo o resto, e isso me intrigava. Em todo o tempo

em que trabalhávamos juntos, fui aprendendo a alimentar

uma admiração por ele, embora fosse algo completamente


platônico. Nicolas Sodemberg jamais se interessaria por

sua mera secretária.

Mas isso não vinha ao caso. Era hora de tirar os

saltos altos, tomar um banho e me enfiar sob as cobertas.

O dia seguinte seria um sábado, e eu poderia dormir até


um pouco mais tarde, se João permitisse. Meninos de dez

anos podiam ser muito barulhentos quando queriam.

Abri a porta do apartamento onde eu morava, já

descalça, e acendi a luz assim que entrei. Eu tinha

contratado uma pessoa para ficar algumas horas com


João, porque, por mais que ele insistisse que era um
carinha crescido e que poderia se cuidar sozinho, eu não

queria dar mole.

— Kátia? — chamei pela babá, esperando que


àquela hora João já estivesse dormindo.

Ela não atendeu ao chamado e supus que pudesse

ter tirado um cochilo. Não me importaria em nada se


dormisse ali, mas sabia que ela também tinha um filho, até
menor que João, e por mais que seu marido fosse

superparceiro, acordar em casa e tomar café com a família


era sempre sua prioridade. Como já era tarde, eu planejava

pagar um Uber para que voltasse em segurança.


Parti para o quarto de João, encontrando a porta

fechada. Abri bem devagar, não querendo acordar ninguém


de supetão, mas estranhei que o cômodo estivesse vazio.

Nem mesmo na cama, onde a criança deveria estar, havia


alguém.

— João? — chamei baixinho e decidi acender a luz.

No momento em que fiz isso, senti meu corpo sendo


agarrado por trás e minha boca coberta por uma mão

enorme. O homem que me segurava era forte o suficiente


para me tirar do chão – não que eu fosse de um tamanho

muito considerável – e me arrastar para a sala, jogando-me


no sofá.

Havia uma arma em sua mão, e ele não estava


sozinho. Outros dois homens tinham se posicionado

próximos à porta, provavelmente para que eu não fugisse.


No momento em que meus olhos bateram no safado que

me segurara, eu o reconheci.

Tratava-se de Leonardo Vilar, pai do meu irmão.


João Pedro não era filho legítimo dos meus pais;
fora adotado quando muito pequenininho, depois que sua
mãe, amiga da minha, falecera de câncer. Seu pai nunca

quis saber dele. Era um bandidinho meia-boca, que


trabalhava para gente poderosa do tráfico. No início até

ficamos com medo de nos envolvermos com esse tipo de


gente, mas o garotinho lindo que meu irmão fora nos
conquistou. Por sorte nunca tivemos problema, mas

aparentemente aquela paz havia terminado.

— O que está fazendo aqui? Onde está meu irmão?


E a Kátia? — perguntei, sentindo minha voz tremer. Não

queria e não podia fraquejar, mas o susto acabou levando


o melhor de mim.

— A babá está bem. Um amigo meu a levou em


casa, em segurança. Depois levou meu filho para onde ele

deve ficar. Comigo.

Aquele era o meu maior pesadelo; que aquele filho


da mãe levasse meu irmão de mim. Ele já tinha ameaçado,

mas nunca pensei que chegaria o momento em que, de


fato, eu precisaria enfrentar a situação, porque Leonardo
nunca quis saber do garoto de verdade.

Eu nem tinha o que dizer. Por mais que ele fosse o


pai biológico da criança, não deveria ter direito algum sobre

ele, porque nunca lhe dera absolutamente nada. Além do


mais, jamais ofereceria o ambiente que eu lhe

proporcionava, por mais que fosse muito jovem, solteira e

pobre.

Tomada pela raiva, sem nem pensar no que fazia,

voei em cima do idiota, tendo a estúpida ideia de agredi-lo.

Dei-lhe um tapa na cara e teria repetido o gesto se seus

dois capangas não tivessem voado na minha direção e me


agarrado pelos braços, arrastando-me de volta para o local

onde fui sentada anteriormente.

— Você não vai tirar o meu irmão de mim. Nem o

quer! Por que está fazendo isso? — gritei.

Leonardo ainda estava com a mão no rosto, irritado


pela retaliação. Eu sabia que meu tapa não tinha lhe
causado muito mais do que uma pequena ardência, mas a

audácia seria levada em consideração.

— Quem você pensa que é, vadia? Eu devia te dar


uma lição, sabia? — Ao dizer isso, levantou-se e veio na

minha direção. Olhou-me de cima a baixo, e eu me remexi

na cadeira, mas rapidamente os dois homens me


seguraram, me imobilizando, deixando-me apavorada. —

Tenho a chave da sua casa. Posso entrar a hora que

quiser... pense nisso e fique esperta. Se trocar a fechadura,


o garotão é quem vai pagar por isso.

Não adiantava nem perguntar ao desgraçado se ele

teria coragem de machucar seu próprio filho, porque ele

era o demônio em pessoa, não sentia compaixão por

ninguém.

— Já perguntei: o que você quer para nos deixar em


paz? — novamente soei como uma covarde. Queria

defender meu irmão e proteger a mim mesma, mas sabia

que não conseguiria ir muito longe, já que morria de medo


daquele homem.
— Dinheiro.

Quase ri da cara dele. Se tivesse um pouco mais de

coragem, teria feito isso.

— Eu não tenho nada. Como pode vir pedir algo

assim a mim? — indignei-me.

— Você, não, mas seu chefe é um dos homens mais


ricos do país.

— E o que isso tem a ver? Eu sou só a secretária.

Um sorriso malicioso surgiu em seu rosto. O filho da

puta já fora bonito um dia, mas o rosto estava mais magro,

encovado, com uma barba rala e falhada, além de haver


duas cicatrizes que se destacavam em sua testa,

provavelmente de alguma briga.

— Uma garota bonita como você pode conseguir

muitas coisas com um cara. — Ele levou a mão ao meu


rosto, pretendendo tocá-lo, mas eu o virei, tentando me

desvencilhar. — Não só com esse rostinho e esse


corpinho, mas deve ter acesso a algum cofre, a cheques, a

informações que podem ser úteis. Nada que uma


chantagem não funcione.

— Eu não sou uma prostituta e nem uma ladra!

— Mas ama o seu irmãozinho, não ama? — Contraí

meus maxilares, odiando ter que responder, mas não

podendo negar. Por isso assenti, cheia de raiva. — Então


vai ter que fazer o que mandarmos. Eu quero cem mil.

Cheguei a ficar zonza. Ele só podia estar louco.

— Eu nunca vou conseguir esse valor.

— Dá teu jeito. Pode pagar parcelado, gatinha, mas

o meu filho só volta para cá quando eu tiver o dinheiro

todo. Estou fodido, precisando. Se não pagar, vou pro


saco.

Eu queria gritar que não era problema meu, que ele

poderia muito bem ser jogado em uma vala que não faria
falta nenhuma para a sociedade, mas não podia cometer

essa imprudência e colocar João em risco.

— E não se esqueça de que se demorar muito mais,

podemos voltar aqui para cobrar de outras formas.

Vi que estava pronto para tocar meu seio, mas levou

um tapa, porque eu ainda precisava impor alguns limites.


Ele gargalhou, divertido, e fez um sinal para os capangas –

ou seus amigos, sócios, sei lá –, indo embora, finalmente.

Eu até poderia me sentir aliviada, se não fosse o

fato de que meu irmão estava nas mãos daqueles


bandidos. Não dava nem para tentar levar em

consideração o detalhe de que João era filho de Leonardo,

porque eu não poderia acreditar que isso seria um


parâmetro de segurança para o menino. Quando tinha

dinheiro envolvido, muitas coisas podiam acontecer.

Não era apenas o pai dele que era perigoso, mas as

pessoas que o rondavam. Se estava devendo alguém, meu


irmão se tornava um alvo. Qualquer um poderia usá-lo, feri-

lo ou até matá-lo se seu pai não pagasse.

E tudo o que eu conseguia pensar era que a


segurança do meu menino dependia de mim. Só que não

fazia ideia de como iria conseguir aquele dinheiro. Não

mesmo.
CAPÍTULO TRÊS

Eu não era um cara com uma grande preferência

por cervejas, mas precisava admitir que a cerveja


artesanal, preparada pelo irmão de Flávio, o Francisco, era
da melhor qualidade. A noite estava na temperatura ideal

para isso, e o gole desceu bem gelado pela minha


garganta, uma delícia.

Parecia que o universo estava me jogando a

inocência da infância na cara, porque enquanto eu


conversava com meus dois amigos, as crianças de

Francisco corriam de um lado para o outro, fazendo uma

adorável bagunça pela casa considerável onde ele morava.


Meu olhar estava perdido neles, e eu poderia jurar que
alguém seria capaz de julgar meu interesse nos pequenos

de forma errada, se não fossem duas pessoas que me


conheciam bem.

O garotinho era meu alvo maior, porque ele tinha

uns seis anos, exatamente a idade que meu filho teria


àquela altura. A menina tinha uns três, e ele era todo

protetor com ela, como se sua missão fosse cuidar da

irmãzinha menor. O ensaio de um sorriso surgiu no meu


rosto, imaginando como teria sido se a mulher com quem

me casei fosse um pouco diferente.

Eu não estava julgando Taís. Algumas mulheres

simplesmente não tinham nascido para serem mães, e isso

era direito delas. Minha falecida esposa nunca pensou em


abortar e nem em abandonar o filho, só não queria aquela

vida sendo tão jovem. Casamento, família, o peso da

maternidade, embora tivesse tudo ao seu alcance para ter

todo o conforto que meu dinheiro poderia oferecer.

Bem, do dinheiro ela gostava...


Ainda assim, gostava de imaginar que poderia, no
futuro, haver uma menininha também. Um casalzinho como

aquele de Francisco...

Mas, talvez, eu também não merecesse ser pai.

Talvez aquelas crianças, meu filho, inclusive, não

devessem ter um pai como eu: controlador, com algum

toque de possessividade, amargurado.

Exatamente por isso, eu evitava que um


pensamento que volta e meia surgia na minha cabeça se

manifestasse com mais força. Porque no momento em que

decidisse, eu iria querer ir até o fim.

— E essa cara de bunda, Nick? — Flávio, sempre o

mais sem noção, perguntou. Levou um tapa no peito do

irmão, que obviamente tinha um pouco mais de senso. —


Ei, porra! O que foi? — Foram alguns instantes de silêncio.

Eu me mantive impassível, mas Francisco fez algumas

expressões bem características, dando a entender que

Flávio tinha feito alguma merda, e meu amigo


aparentemente compreendeu. — Ih, parceiro... foi mal.

Nem me toquei.

— Não tem problema — respondi com uma voz

grave, dando um gole na cerveja que subitamente se

tornou mais amarga do que antes.

— Claro que tem. Você ainda sente falta dele, não


é?

Francisco revirou os olhos.

— O que você acha, imbecil. Sei que não tem filhos,

mas eu não consigo nem imaginar o que faria se perdesse


um deles.

É, era exatamente isso. Antes de ser pai eu também

não imaginava o tamanho do amor que é possível sentir


por alguém. Depois que Júnior nasceu, toda vez que
olhava para ele, meus instintos protetores exacerbados se

manifestavam, deixando-me insano só de pensar em tê-lo


tirado de mim. Jurei que isso nunca aconteceria, porque eu

poderia dar um jeito de protegê-lo.


Só que não se pode controlar a morte.

Aquela conversa estava ficando um pouco pesada

para mim, então dei uma golada no resto da cerveja e a


coloquei sobre uma mesa, levantando-me.

— Estou cansado. Hora de ir para casa.

Meus amigos protestaram, Francisco reclamou com

Flávio, e até a esposa do dono da casa veio lamentar pela


minha partida, ao mesmo tempo que reunia as duas
crianças para me darem tchau.

E eles vieram graciosamente, com toda educação.


O garotinho apertou minha mão todo sério, mas a

menininha me deu um abraço e um beijo no rosto, como se


me conhecesse há muito tempo. Carinhosa, doce e linda.

Uma princesinha.

Saí da casa com o coração apertado no peito, mas


tentando com todo o meu esforço não demonstrar
absolutamente nada. Mesmo dentro de um carro, sozinho,

eu não queria ver a minha imagem, no espelho retrovisor, e


permitir que ela me levasse novamente àqueles caminhos
tortuosos.

Cheguei, parando diante do enorme portão de ferro


do meu condomínio de luxo. Os seguranças o abriram para

mim, ao verem a placa do meu belíssimo Jaguar F-Pace


SVR, e eu entrei, partindo para a minha casa – a última do

condomínio e também a maior.

Estacionei, entrei e não fui recepcionado por

ninguém. Eu tinha muitos funcionários, e dois deles


pernoitavam na minha casa: minha governanta e meu

motorista. Eles eram mãe e filho, e eu confiava plenamente


nos dois. Só que naquela noite não usei os serviços de

Carlos, porque eu gostava de dirigir. Também havia dois


seguranças contratados por mim, que ficavam ao redor da
casa, mas estes eram sempre diferentes, tanto que eu mal

sabia seus nomes. Sua escala ficava a cargo da empresa


que trabalhava para mim.

Fui direto para o meu quarto, tomei um banho e me

joguei na cama. Talvez fosse uma boa ideia tentar dormir


logo, por mais que fosse cedo e sábado, mas teimei em
pegar meu notebook. Minha cabeça estava agitada demais
para conseguir relaxar, só que eu poderia ter feito qualquer

coisa. Absolutamente qualquer coisa, mas escolhi


exatamente a que não deveria ter feito.

Havia uma pasta no meu notebook com um título:

PESQUISAS. Quando a abri, deparei-me com várias

matérias sobre “cessão temporária de útero”, que era o


nome mais metido à besta. Para mim poderia ser chamado

de “barriga de aluguel”.

Não era algo legalizado no Brasil, a não ser que se

tratasse de uma parente minha se voluntariando para o


processo. Caso contrário, eu precisaria de uma autorização

na justiça, o que provavelmente seria negado, levando em

consideração que eu era um homem saudável, que poderia


tentar ter um filho pelos meios convencionais. E eu não

tinha parentes. Nenhuma irmã que pudesse me ajudar.

Com o dinheiro que tinha, dificilmente alguém

toparia ajudar um completo desconhecido, ainda mais que


eu não era exatamente amigável, a troco de um abraço e

eterna gratidão. Eu teria que partir para algo menos...


correto. Isso, é claro, se fosse adiante com aquela ideia.

Fiquei mais algumas horas olhando para toda

aquela merda, até que me irritei e larguei tudo de lado.

Estava mais do que claro que não me levaria a nada, mas


também não conseguiria dormir.

Não era nem meia-noite ainda, e eu estava rolando

na cama, inquieto, como se houvesse pulgas sobre ela e

não um lençol caríssimo, 100% algodão egípcio, de 300


fios. Chegava a ser ridículo.

Pegando o celular, tomei a decisão que sempre

tomava quando aquele tipo de coisa acontecia: liguei para

a agência que me atendia naqueles momentos, da qual eu

era praticamente cliente VIP.

— Boa noite, aqui é Nicolas Sodemberg.

— Boa noite, senhor. O de sempre?


— Sim. Estarei no local de sempre também, daqui a

quarenta minutos.

— Perfeito. Temos muito prazer em atendê-lo.

Levantando-me da cama, vesti uma roupa e peguei

uma mala, que sempre ficava pronta e organizada para


aquelas ocasiões. Saí de casa, aproveitando que não havia

mais ninguém zanzando por ali – embora meus

funcionários já estivessem acostumados aos meus

rompantes noturnos – e parti para o motel de sempre, na


esperança de que a menina já estivesse pronta.

Eu nem sabia seus nomes, mas confiava na

empresa que fazia a intermediação. Elas eram sempre

bonitas e conheciam meus fetiches. Eram preparadas para


isso. Alguém sempre as acompanhava, para prepará-las

para mim, porque eu pagava caro o suficiente.

Quando cheguei, a moça já estava atada à cama,

punhos e tornozelos, com uma venda nos olhos e se


contorceu ao me ouvir chegar.
Não era a primeira vez que me enviavam aquela.

Ruiva, com um corpo esbelto e torneado, e vivia com os


lábios vermelhos. Gemia como uma gatinha e respondia

muito bem a tudo que eu fazia com ela.

Seria divertido.

Ao menos por algumas horas, eu esqueceria toda a

merda que me rondava e poderia extravasar. Era


exatamente a minha intenção.
CAPÍTULO QUATRO

Na segunda-feira, eu cheguei à empresa um pouco

mais tarde do que o normal, porque não havia nada


marcado para a manhã. Normalmente eu chegava e
encontrava a mesa de Diana vazia, embora ela fosse

extremamente pontual. Naquele dia, ela já estava sentada,


concentrada em modificar algo na minha agenda no nosso

calendário compartilhado, e aparentemente se assustou

quando lhe dei bom dia.

Quando voltou os belos olhos azuis na minha

direção, percebi que não fora apenas um espanto normal

de quem está distraída e ouve uma voz do nada. A menina


parecia apavorada.
— Perdão. Bom dia, senhor.

Não houve o tom de brincadeira ou a descontração


de sempre. Diana estava tensa.

Deveria não me preocupar, fingir que não tinha

percebido, simplesmente entrar na minha sala e não dar


bola. Eu era apenas o chefe, não a conhecia direito, a

mulher poderia ter inúmeros problemas que nunca seriam

da minha conta.

Só que Diana era sempre uma fonte de alegria para


mim. Ela sempre sorria quando eu chegava e parecia

tolerar muito melhor a minha presença, enquanto todos os

outros apenas me aceitavam porque precisavam fazer isso.

Não conseguia fechar os olhos ao vê-la visivelmente mal.

— Aconteceu alguma coisa? Você não parece muito

bem hoje.

Diana respirou fundo, visivelmente desconfortável.


Já devia imaginar que ela não sairia se abrindo assim para

mim, e eu precisava respeitar.


— Não. Só não acordei passando muito bem.

Não parecia verdade, mas não podia contradizê-la.

— Precisa ir ao médico? Posso te dispensar.

— Não é nada. Só alguma coisa que eu comi. —

Abriu um sorriso forçado. — Vou ficar bem.

Sem querer insistir, balancei a cabeça, assentindo e

parti para a minha sala. Não seria uma boa ideia

permanecer ali. Levando em consideração meu

temperamento, acabaria sendo incisivo demais com a

moça, e ela poderia se sentir ainda mais incomodada.

Minha manhã foi tranquila, com apenas algumas

tarefas que adiantei sem nenhuma dificuldade, e tive até

tempo de sair para almoçar com Flávio, que era sempre

minha companhia quando não ficava muito enrolado.

Partimos para um restaurante do qual gostávamos

muito, próximo à empresa, e escolhemos uma mesa mais

afastada, embora ele estivesse bastante cheio. Apesar de


não ser um artista, meu rosto era conhecido, e eu odiava

que alguma fofoca com o meu nome fosse veiculada.


Tentava ser sempre o máximo discreto possível, mas nem

sempre conseguia. Era o preço que o poder nos cobrava, e


eu precisava aceitá-lo.

A conversa com meu amigo começou como


qualquer outra. Primeiro falamos algumas coisas sobre

trabalho. A empresa ia de vento em popa, principalmente


porque a ideia de um cruzeiro de luxo por preços

razoavelmente acessíveis se tornava cada vez mais


atraente, principalmente para pessoas de mais idade, e

nós tínhamos algumas viagens especialmente voltadas


para idosos, com atividades mais calmas, um piano bar,
jogos mais atraentes para eles... tudo pensado pela equipe

de turismo com cuidado e respeito.

Estávamos com alguns projetos novos, mas Flávio


não demorou a perceber que eu estava um pouco

disperso. Eu não conseguia tirar minha pesquisa de


sábado à noite – e de metade de domingo – da cabeça. A
cada hora que passava, me sentia mais tentado a
realmente começar a fomentar a ideia de maneira mais

embasada.

— Nick, você anda meio estranho esses dias. Que


bicho te mordeu? Tem alguma coisa na sua cabeça que

você possa compartilhar? — Flávio perguntou, e eu queria


muito responder que não. Queria muito fazer aquele
assunto morrer e simplesmente pular para outro, que fosse

um pouco mais confortável, mas eu precisava desabafar


com alguém.

Não havia muitas pessoas no mundo em quem eu

confiasse, então Flávio era a melhor opção.

— Eu quero ser pai — a afirmação foi feita com uma


certeza tão ferrenha que poderia ter assustado até mesmo
a mim.

E até assustou, de fato. Mas Flávio, por sua vez,


ficou completamente confuso, com o cenho franzido,

olhando para mim como se eu fosse um Alien. Não que a


próxima coisa que eu tinha a dizer fosse muito menos
surpreendente.

— Ando pesquisando coisas sobre barriga de


aluguel.

A informação foi chocante o suficiente para que ele

engasgasse com a bebida que tinha acabado de levar à


boca. Sua tosse começou a chamar a atenção das
pessoas ao redor, e eu fiquei um pouco constrangido, mas

talvez a culpa fosse minha. Não se dava aquele tipo de


notícia daquele jeito.

— Você tem noção de que isso é ilegal? — ele falou

baixinho, inclinado para a frente, olhando para mim ainda


daquele jeito, como se eu fosse completamente louco.

Talvez eu fosse.

— Por isso que não pretendo sair alardeando por aí


— falei, de forma enfática e nada gentil.
— Mas de onde veio isso, cara? Você é rico, tem
boa aparência, poderia conhecer alguém legal, se envolver
e...

— Não! — respondi com veemência outra vez. —

Não tenho interesse de me envolver com ninguém. E não


quero uma mãe para um filho. Quero apenas a criança.

— Porra, Nick! Você teve uma experiência ruim. Não

quer dizer que vai acontecer de novo.

— Também não quer dizer que eu estou livre ou que


criei anticorpos. Não é uma doença. São pessoas. Pessoas

são imprevisíveis.

— Uma criança também. Não vai poder controlar o

universo para seu filho ser do jeito que você quer que seja.

— Mas meu filho eu vou amar de forma


incondicional, disso eu não tenho dúvidas. Além do mais,

quem sabe eu não posso ajudar também uma mulher que

precise? Uma boa quantia em dinheiro, uma proposta


irrecusável.
Desconfiado como sempre, tive uma estranha

sensação e comecei a olhar ao meu redor, não deixando


de reparar que a mulher ao meu lado havia colocado o

celular na beirada de sua mesa, o mais próximo possível

da minha.

Poderia ser apenas uma coincidência, mas a forma


como ela estava agindo não me deixava muitas dúvidas.

Prestava atenção na minha conversa e roía o canto das

unhas como se estivesse fazendo algo de muito errado.

Levantei-me e me aproximei, ajeitando a gravata


para tentar controlar meus impulsos.

— Com licença, senhora... está gravando a minha

conversa? — tentei não colocar um tom acusatório na

minha voz, mas foi impossível.

A expressão dela foi toda a resposta que eu


precisava.

— É uma acusação grave! — ela tentou, mas meus

olhos se dirigiram para o enorme crachá pendurado em


seu pescoço e percebi que ela trabalhava em um veículo

de péssima reputação. Um daqueles sites de fofoca que

sempre inventavam as coisas mais absurdas das pessoas


ou tiravam frases de contexto.

Resumindo: era a pior pessoa do mundo para

aparecer ali, naquele momento, e para ouvir a conversa.

— Estou pedindo com educação, senhora; se está

gravando a conversa, apague o áudio ou vou chamar a

polícia.

Provavelmente percebendo a minha reação, e


levando em consideração que eu era um cliente que o local

não queria perder, o gerente começou a se aproximar,

observando o caso.

— Algum problema, senhor?

Expliquei toda a situação, e a mulher começou a

ficar muito desconfortável. Minha vontade era pegar seu

celular e jogar no chão, com toda a minha força, porque

era inaceitável que a privacidade de alguém fosse invadida


daquela forma, especialmente alguém que não queria, de

jeito nenhum, ser exposto.

— Você realmente tem a fama que merece, Sr.


Sodemberg! — a mulher falou em um tom de voz alterado.

— É o Homem de Ferro, acha que pode controlar tudo e

todos à sua volta.

— Não. Só quero controlar a minha vida. E não


quero que ela seja exposta dessa forma, sem minha

autorização — praticamente rosnei. O que aquela porra

daquela mulher tinha na cabeça?

Sem a menor cerimônia, ela pegou o celular e me


entregou, com a tela já liberada por sua digital.

— Se quiser, pode apagar.

Ergui uma sobrancelha, ainda desconfiado, mas ela

insistiu com um gesto, e eu ouvi o áudio o mais baixo

possível, constatando que minha conversa com Flávio


estava, de fato, toda registrada ali.
Olhei para ela, com uma expressão de repreensão,

e ela não parecia nem um pouco constrangida. Era um

absurdo.

No final das contas, eu consegui apagar a gravação

que ela tinha feito, mas não poderia privá-la de dizer o que
quisesse. Sabia que encontraria o meu nome muito em

breve em alguma notícia sensacionalista.

Não tinha comido, mas não queria continuar naquele

estabelecimento. Irado, voltei-me para o gerente e falei por


entredentes:

— Pode cancelar o meu pedido, não vou mais

almoçar aqui.

O restaurante não tinha a menor culpa, mas naquele

momento eu estava com raiva do mundo inteiro. Talvez, se


o assunto fosse diferente não me deixasse tão

incomodado, só que era algo muito particular, que eu

esperava que fosse mantido em segredo entre mim e meu


único amigo leal.
Sem contar que se tratava de algo que poderia ser

considerado um crime. Ou seja... péssimo momento.


Péssima escolha.

Era por isso que eu guardava tantos pensamentos

para mim mesmo, e aparentemente era melhor continuar

assim.
CAPÍTULO CINCO

Era um absurdo me sentir como uma fugitiva, sendo

que a bandida nem era eu. Só que desde que Leonardo


falou que estava levando uma cópia da minha chave e que
se a fechadura fosse modificada ele machucaria meu

irmão, fiquei apavorada só de pensar em entrar naquele


apartamento.

E não só por isso... não se passou um único minuto

sem que eu pensasse em João. Como ele estaria sendo


tratado? Será que ficava assustado? Estaria comendo?

Dormindo?

Tinham se passado dias desde que fora levado, e


eu me sentia um zumbi andando de um lado para o outro,
desesperada com meus próprios pensamentos e pulando a

cada ligação, mesmo quando nem era para o meu celular.

Eu ligava para Leonardo de hora em hora. Insistia

ao ponto de ser chata, porque queria vencê-lo pelo

cansaço. Se me deixasse apenas falar com meu irmão,


saber que estava bem, não me deixaria tranquila, mas um

pouco mais aliviada.

— Di, larga esse celular! Não vai adiantar, o cara

está fazendo de propósito. — Minha melhor amiga, Ana


Maria, foi se aproximando, trazendo duas canecas de chá.

Estava fumegando, cheiroso, e, embora eu preferisse café,

já estava agitada demais.

— É um filho da puta! — gritei, como se fizesse

alguma diferença.

Ana Carolina, irmã gêmea de Ana Maria, surgiu com

seu chá também, jogando-se ao nosso lado. Ela era


casada, não morava ali, mas o marido trabalhava

embarcado – inclusive em um dos navios de Nicolas, tendo


me indicado para a função de secretária dele quando viu o
anúncio –, então, como também nos dávamos bem, ela

decidiu passar algumas noites conosco para me dar uma

força.

— Ele pediu quanto mesmo? — Carol perguntou,

bebericando seu chá. Era camomila. Perfeito para tentar

me acalmar, embora, provavelmente, nem um

benzodiazepínico conseguisse a proeza.

— Cem mil. Cem mil! O que ele acha que eu sou?

Ainda teve coragem de dizer que eu deveria tentar

chantagear meu patrão com alguma coisa ou roubar.

— Roubar Nicolas Sodemberg? O Homem de

Ferro? — Carol exclamou, com os olhos arregalados. —

Ele certamente não conhece o seu chefe — falou com


ironia.

— Com certeza, não. Embora eu não o ache assim


tão tirano quanto as pessoas falam — comentei, meio que

sem perceber o que estava fazendo. Minha cabeça parecia


um mar de pensamentos desconexos, então não seria de

se surpreender que eu acabasse cometendo alguns


deslizes em matéria de assunto.

— Claro que não acha. Você tem um crush nele —

Ana Maria me zoou, como sempre fazia.

— Não tenho, não. Nem poderia ter. O cara nunca


olharia para mim.

— E por que não? Di, você é uma gostosa! Pelo


amor de Deus. Com essa carinha de boneca, covinha,

olhinho verde, esse cabelão castanho. O cara deve babar


em você.

Quase ri do que Ana Maria estava falando, mas me


sobressaltei, antes de deixar que continuasse a falar,

porque meu celular começou a tocar.

Por pouco o aparelho não caiu no chão, pelo total

desespero com que comecei a mexer nele, e até demorei a


encontrar o botão para atender à chamada.
Poderia ser qualquer coisa, até mesmo uma ligação

de telemarketing inconveniente, mas logo reconheci a voz


de João do outro lado da linha.

— Diana! — ele exclamou, parecendo tão aflito

quanto eu.

— Oi, maninho! Meu maninho, meu amor... como


você está? — Nem me importei, só comecei a chorar como
louca ao ouvir a voz do meu garotinho. — Como eles estão

te tratando? Te machucaram?

— Não, mas eu não posso sair do quarto. A porta


está trancada.

Meu Deus, eles estavam mantendo uma criança em


cativeiro. O quão cruel era isso?

— Quero voltar para casa, Didi. Quero muito. —

João era um menino forte. Até mesmo quando menorzinho


não costumava chorar por quase nada. Se caía, apenas se
levantava e seguia brincando. Mas naquele momento, eu

me despedacei ouvindo sua voz embargada. — Estou com


medo. Não gosto dessas pessoas. Não gosto do meu pai
— falou bem baixinho, embora eu imaginasse que não
estava sozinho. Não o teriam deixado ligar para mim sem

supervisão. Temi que aquele comentário lhe rendesse


alguma retaliação.

— Fique firme, querido. Vou dar um jeito de tirar

você daí.

— Mas eles pediram muito dinheiro. A gente não

tem isso.

Era triste que meu menino fosse tão maduro para a


idade. Com dez anos ele sabia o quanto eu ralava para nos

dar uma vida razoavelmente boa. João tinha uma alma


infantil para muitas coisas, ainda gostava de brincar, de

jogar bola com os meninos do prédio, mas quando se


tratava de conversar sério, ele vestia a carapuça de
homenzinho da casa.

— Mas eu vou dar um jeito. Você vai voltar para


casa — afirmei com toda a minha convicção, embora não
soubesse exatamente como iria resolver aquele problema.

Então outra voz surgiu na linha, mais adulta, mais


sarcástica e nojenta.

— Já falou com seu irmãozinho, garota. Vai parar de


encher o saco agora?

— Só quando ele estiver comigo, em segurança —


respondi por entre dentes.

— Ele é meu filho. Papai vai cuidar do garotão aqui.

— Não sei o que aquele desgraçado fez, mas João grunhiu

do outro lado da linha. — Ele está bem. Mas se você


demorar muito, não posso prometer que outras pessoas

não vão se aproveitar da situação. Estou devendo a gente

barra pesada.

— E coloca o seu filho na linha de fogo. Como


pode?

— Na vida, gatinha, é cada um por si. A gente vai se

falando. Espero não demorar para receber notícias suas.


A ligação foi encerrada, e eu fiquei alguns instantes

olhando para o telefone. Era quase difícil acreditar que


tudo aquilo estava acontecendo comigo. Devia ser um

pesadelo, com certeza. Algo que iria desaparecer se eu

apenas abrisse os olhos.

Mas não era. Era a minha realidade.

Senti uma mão delicada no meu ombro, tentando


me confortar. Do outro lado, braços finos me envolveram, e

eu percebi que eram minhas amigas, minhas duplas de

Anas que estavam sempre do meu lado em todos os


momentos. O que eu faria sem aquelas gêmeas

maravilhosas?

Chorei no ombro das duas, em silêncio, até que Ana

Carolina se afastou para conversar com o marido, na

horinha em que sempre faziam isso, quando ele estava


fora de casa. Fiquei vendo televisão com Ana Maria, até

que a outra chegou, trazendo o celular na mão,

sssssuperagitada.
— Di! Olha isso que o Francisco me mandou! — ela

estava falando do marido.

Entregou-me o celular, e eu me deparei com a foto

de Nicolas em meio ao que parecia uma matéria de um


daqueles sites bem escrotos de fofocas. Fiquei

imediatamente curiosa, especialmente por causa da

manchete: “MILIONÁRIO COGITA HIPÓTESE DE

BARRIGA DE ALUGUEL PARA SE TORNAR PAI”.

Olhei para minhas duas amigas, e elas se sentaram


ao meu redor para que todas pudéssemos ler a notícia,

que dizia:

O milionário Nicolas Sodemberg, conhecido como

Homem de Ferro no meio dos negócios, aparentemente


está com dificuldades para encontrar uma mulher que

aguente o seu temperamento. E olha que ele foi

considerado um dos empresários mais sexies do ano

passado, a nível internacional!


Em uma conversa casual, Sodemberg foi flagrado

fazendo confissões a um amigo, revelando o desejo de ser


pai, cogitando até mesmo a prática ilegal da barriga de

aluguel para conseguir realizar o sonho.

Tínhamos áudios comprovando nossa notícia

bombástica, mas infelizmente o mencionado os apagou do


celular da nossa repórter, sob ameaças de processo. Mas

não vamos nos calar. Não à censura!

— Mas que raio de reportagem é essa? E desde

quando tem censura em fofoca de baixa qualidade? — Ana


Maria comentou, e eu concordava plenamente com ela. —

Será que é verdade? Você que conhece ele melhor, Di...

sabe de algo?

— Não estou sabendo de nada, mas não é como se


fôssemos amigos.

— E acho que a gente nem tem que ficar

comentando sobre isso. — Carol arrancou o celular da


minha mão. — Se ele ficou tão puto com a jornalista é

porque não quer que fiquem falando.

Carol sempre foi a mais certinha de nós, era bem

típico dela fazer aquele tipo de coisa. Ana Maria sempre

revirava os olhos, como aconteceu naquele momento.

— Para com isso. Não vamos denunciar o cara à


polícia. Só vamos comentar entre nós. — Aninha se voltou

para mim, com os olhos curiosos: — Agora, vamos ser

sinceras... ele vai pagar um dinheirão para a mulher que


topar.

— Mas será que é verdade mesmo? — ainda

duvidei. — Eu sei que ele perdeu um filho há alguns anos,

mas não é possível que ele precise recorrer a essas


coisas. O cara deve ter uma fila de mulheres a fim dele.

— Só que não é simples sair confiando em alguém

para ser mãe de seu filho, especialmente ele sendo rico

como é. Qualquer golpista poderia acabar com a vida dele.


Uma coisa mais formal poderia ser mais a praia dele — até

mesmo Carol, que não queria entrar na fofoca, cogitou.

— Continuo pensando: se for verdade, imagina a


quantidade de dinheiro que ele não vai oferecer?

É, eu estava começando a pensar nisso também. Se

Nicolas queria tanto ser pai, ao ponto de pensar em uma

ideia tão louca, será que estaria disposto a pagar mais de


cem mil por isso? Talvez até mais...

Será que pagaria no ato da assinatura do contrato?

Como funcionaria?

— Di, o que está passando pela sua cabeça? —

Carol perguntou, mas meu olhar aparentemente me


denunciou, porque ela logo tirou suas conclusões, levando

uma das mãos à boca. — Não, mulher. Pelo amor de

Deus... você não está pensando em se oferecer para ser


barriga de aluguel de um milionário!

Não respondi, e Ana Maria também se mostrou

surpresa, mas sua reação foi um pouco diferente.


— Seria uma solução para o seu problema. Talvez,
negociando, ele te desse uma parte logo e...

— Ana Maria, para com isso! — Carol interrompeu a

irmã. — Você sempre foi doida, mas agora pirou de vez. A

gente está falando de uma gravidez! A Diana teria que


carregar um bebê nove meses e depois não ter contato

nenhum com a criança, porque obviamente é isso que esse

cara quer! Acho que mulher virgem nem pode ser


inseminada!

Minha cabeça já estava girando com pensamentos,

possibilidades e com aquelas duas nos meus ombros como

se fossem o anjinho e o diabinho.

— Meninas, foi só uma ideia que veio e foi embora.

É absurdo, eu nunca poderia levar adiante — falei, sem


convicção nenhuma. — Só que estou cansada e trabalho
amanhã. Tudo bem se eu for deitar?

O que mais elas poderiam dizer?


Dei um beijo em cada uma delas e parti para o
quarto de hóspedes de Ana Maria. Carol também estava
dormindo lá, na bicama, mas fiquei sozinha por um tempo,

o que foi uma bênção e uma maldição ao mesmo tempo.

Eu sabia que aquela maldita ideia não iria sair da


minha cabeça. De fato era absurdo, mas o que eu não faria
pelo meu irmão? Meu coração poderia se partir, eu poderia

vender a minha alma, mas salvar João era minha


prioridade naquele momento. Mesmo que me
arrependesse depois.
CAPÍTULO SEIS

Uma batida na porta, muito suave, me fez erguer os

olhos do notebook, onde estava terminando de responder


um e-mail do setor de marketing da empresa.

— Entre — avisei, mesmo imaginando de quem se

tratava. Era ridículo, mas, naquele tempo de convivência,


eu já conseguia reconhecer até mesmo a forma como ela

batia na minha porta.

Ela o fez, e eu me empertiguei na cadeira, tentando


não pensar no quanto ela estava especialmente bonita

naquela manhã, com um vestido em um tom de verde que

combinava com seus olhos. Os cabelos longos e


ondulados estavam soltos, e eu cheguei a respirar fundo,
pensando em coisas que não deveria pensar. Era

totalmente impróprio que eu desejasse ter minha própria


secretária amarrada na minha cama, gemendo o meu

nome e sendo fodida com toda a força.

Porra, tive que respirar fundo mais uma vez antes


que ela percebesse.

— Podemos conversar? É um assunto delicado... —

Diana parecia nervosa, e eu assenti, apontando a cadeira

para ela, começando a ficar curioso.

Para a minha surpresa, ela não se sentou. Na

verdade, começou a andar de um lado para o outro,

esfregando uma mão na outra, mexendo nos cabelos logo

em seguida. Seus saltos batiam no piso da minha sala, e

eu começava a ficar incomodado.

— Está me deixando tonto — falei, muito sério.

— Perdão. Não quero te fazer perder tempo.


— Não é o caso. Só estou aflito com seu
comportamento. Está querendo pedir demissão?

— Não! — ela respondeu rápido demais, chegando

a alterar o tom da voz. — Não é isso, por favor. De forma

alguma. Só que eu queria pedir que não fique chateado

com o que vou dizer... Eu juro que não leio sites de fofocas,

foi uma amiga que encontrou. Como era sobre você...

Remexi-me mais uma vez na cadeira, já sabendo


aonde aquela conversa iria nos levar.

— Se for o que estou pensando... — quase rosnei, e

ela se sobressaltou.

— Eu sabia que você ia ficar puto! Sabia! — falou

baixinho, quase como se estivesse falando consigo

mesma. — Não era a minha intenção. É só que... estive

pensando; nem tomei a decisão ainda, na verdade... —

Diana nunca soou tão confusa. Desde que a vi, na


segunda-feira, parecendo tão tensa e estranha, aquela

imagem não saiu da minha cabeça. Naquele momento


decidi que realmente havia algo de errado. — Só queria

saber se é verdade.

— Queria saber se o quê é verdade? — Eu entendi,

mas preferia que ela falasse, porque não podia acusar sem

fundamento.

Ela apoiou uma das mãos na minha mesa,


parecendo se dar por vencida. Suspirou, derrotada, e eu
continuei imóvel, apenas observando-a, muito sério.

— Se está mesmo em busca de uma barriga de

aluguel.

Engoli em seco. A repercussão da notícia foi menor

do que o esperado, mas a imprensa me encheu o saco nos


últimos dias. A matéria saíra na segunda à noite, logo

depois do incidente no restaurante, e já estávamos na


sexta. Sem dúvidas Diana tinha passado dias pensando
para fazer aquela pergunta.

— Acredito que isto não seja da sua conta.


— Claro que não é. Não sei onde eu estava com a

cabeça ao pensar em uma coisa assim... Me desculpa.

Diana estava prestes a sair da minha sala, mas eu


levantei e consegui segurar seu braço, pouco acima do

cotovelo, impedindo-a de sair. Eu nem saberia dizer se em


nosso tempo juntos de trabalho eu a tinha tocado alguma
vez. Provavelmente sim, sem querer, em pequenos

esbarrões, mas era diferente.

A forma como se voltou para mim, como seus olhos


se perderam nos meus, parecendo confusos pelo meu

gesto... sua pele parecia queimar sob a palma da minha


mão. Era inebriante.

— No que você estava pensando? — demonstrei


um pouco mais de emoção ao perguntar, porque fiquei

realmente curioso.

Ela estaria pensando em se voluntariar? Se eu

dissesse que era verdade, será que não poderia estar


gravando e tentando vender a notícia para um portal
daqueles ridículos, que pagariam uma quantia indecente
para conseguirem uma evidência como aquela?

Mas se fosse verdade...

Bem, eu estava apenas especulando. Talvez Diana


fosse apenas uma fofoqueira, como muitas outras.

— Nada, senhor. Eu só cometi um erro e...

Ela tentou sair novamente, mas continuei a segurá-


la. Era uma reação involuntária, porque não queria me

sentir no direito de mantê-la ali dentro, só que meus


instintos me obrigavam a compreender melhor o que
estava acontecendo. Por que aquela garota estava

pensando sobre o que foi dito na maldita matéria sobre


mim?

— Fale, Diana! — Queria que soasse como um

pedido, não como uma ordem, mas eu não sabia como


gerenciar aquele tipo de coisa.
Eu a vi engolir em seco, e sua expressão de
inocência quase me matou.

— Foi uma ideia estúpida. Eu estou precisando de


dinheiro. Muito dinheiro. Pensei que poderia... Bem...

pensei em me oferecer, mas...

— Em se oferecer para ter um filho meu?

Pela forma como reagiu à minha pergunta, sem

dúvidas era a sua ideia. Mas o que poderia ser tão

necessário para Diana a ponto de ela topar algo tão


absurdo? Ela era uma moça jovem, por que iria querer que

sua primeira gravidez fosse como uma barriga de aluguel?

Diana se preparou para dizer alguma coisa, mas

pareceu desistir, praticamente murchando, deixando seus


ombros delicados caírem.

— Foi uma loucura, eu sei. É que é uma situação

séria. Muito séria. Tem a ver com o meu irmão.


O irmão dela era apenas uma criança, até onde eu

sabia. Poderia ser uma invenção, mas a expressão de


sofrimento em seu rosto bonito não deixava dúvidas de que

estava sendo sincera.

— Séria a ponto de você aceitar assinar um contrato

para nunca ter contato com um bebê que será gerado no


seu ventre?

Ela estremeceu sob minha mão, que ainda a

segurava. Vi seus olhos marejarem e me senti um idiota

por tratá-la daquela maneira, mas se levasse em


consideração o quão jovem era, sem dúvidas poderia estar

cometendo um erro, algo que eu não podia permitir. Se

fechasse contrato com alguma mulher para gerar o meu

filho, seria a coisa mais séria que faria na vida. Eu não


poderia confiar em uma menina sem saber perfeitamente

quais eram seus motivos.

Diana tentou se soltar da minha mão, e eu ainda

não permiti. Por algum motivo, por mais que achasse


completamente louco que estivesse se oferecendo, dadas
as condições, não conseguia me desvencilhar da ideia de

que, se fosse real a sua proposta, ter alguém em quem eu

confiava – ou quase – e conhecia poderia ser uma opção


muito melhor do que uma desconhecida.

Ou não... Tudo teria que ser analisado com muito

cuidado.

— Sério a ponto de eu estar disposta a qualquer

coisa que tiver que fazer.

Nunca vi tanta determinação em olhos tão

inocentes. Os lábios fartos de Diana se contraíram quase


com raiva, embora eu suspeitasse que não era de mim. Do

destino, do universo, de alguém, eu não saberia dizer. Só

que ela nunca pareceu tão tentadora.

E eu me sentia um cafajeste ao pensar nisso

enquanto uma lágrima deslizava por seu rosto.

— O que aconteceu?
Ela finalmente fez um movimento com um pouco de

mais intensidade, e eu decidi soltá-la, porque já estava


abusando. Diana deu alguns passos para trás, afastando-

se de mim como se eu fosse contagioso.

— Não posso contar. Mas se estou falando que é

sério a esse ponto é porque é sério. Se for verdade o que a


jornalista escreveu, estou disposta a discutir os termos,

verificar o contrato e negociar. Porque é isso, não é? Um

negócio.

Com a cabeça erguida, ela se mostrava altiva,

quase provocadora, e por um momento esqueci que eu era


seu chefe. Naquele momento éramos apenas um homem e

uma mulher, cada um com seus interesses.

— Sim. São negócios.

Falei da boca para fora, embora não deixasse de ser


verdade. Só que eu não queria magoá-la da forma como

ela pareceu ficar.


Assentindo, Diana começou a sair da minha sala.

Daquela vez não a segurei, mas em um impulso, chamei

seu nome. Ao se virar para mim, ponderei se deveria falar

ou não, mas assim como ela, também poderia analisar a


proposta.

— O que acha de jantarmos juntos esta noite? Na

minha casa, sem a possibilidade de jornalistas ao nosso

redor. Podemos... negociar — houve uma entonação cheia


de significado na palavra, que eu queria que Diana

percebesse e compreendesse.

— Como o senhor quiser.

Ela também não deixou barato, o que me causou

um intenso revirar de estômago, aumentando o desejo de


antes.

Aquele seria o negócio mais estranho que eu

fecharia, se é que isso aconteceria de fato. Mas, fosse

como fosse, fiquei observando Diana saindo da sala,


caminhando até sua mesa e se sentando, parecendo

extremamente nervosa, voltando a chorar.

O que diabos estava acontecendo com aquela


garota para ela estar tão nervosa e para se oferecer para

algo que certamente iria mudar sua vida para sempre?

Antes de aceitar qualquer coisa, eu precisava descobrir.


CAPÍTULO SETE

O banco do carro era extremamente macio e

cheirava a couro puro, mas ainda assim eu não conseguia


me sentir confortável. Já tinha me remexido um milhão de
vezes, mas ainda não tinha conseguido encontrar uma

posição, nem mesmo para uma viagem curta, da empresa


até a casa de Nicolas.

Já era extremamente fora de lógica eu estar prestes

a ser convidada a entrar na casa do meu chefe, mas, mais


do que isso, toda a ideia da conversa que teríamos era

suficiente para que tivesse vontade de tirar o cinto de

segurança, abrir aquela porta e saltar, mesmo com o carro


em movimento.
— Você está bem? — Nicolas perguntou em meio

ao silêncio, e eu cheguei a me sobressaltar. — Parece um


leão enjaulado e inquieto.

Eu poderia mentir, mas se íamos começar uma

relação de negócios, a sinceridade precisaria ser o ponto


principal.

— Não. Estou nervosa. Mas antes que pergunte,

não quero desistir. Quero, pelo menos, conversar e

entender.

— Justo — ele respondeu, sempre muito sério, e eu

não saberia dizer se preferia que continuasse daquele jeito

ou que tentasse amenizar o clima. Só que isso seria pedir

demais a Nicolas. Ele não era esse tipo de homem.

Continuamos seguindo para sua casa e nos vimos

diante de seu condomínio. Entramos e partimos para a sua

propriedade.

Não que eu imaginasse algo diferente, mas era uma

mansão opulenta. Era digna de um cenário de filme.


Tentava imaginar se não seria extremamente solitário lá
dentro, sendo ele um homem sem família. Rapidamente

me enchi de compaixão, embora não devesse.

Nicolas me conduziu para dentro de sua casa, e nós

fomos recebidos por alguns funcionários, que,

aparentemente, já tinham sido avisados de que teriam

visita. As pessoas foram educadas comigo, e nos

indicaram a sala de jantar, que já estava preparada.

Não consegui ignorar a mão de Nicolas nas minhas

costas, mesmo que o toque fosse extremamente inocente.

Como um cavalheiro, ele puxou a cadeira para mim,

e eu me acomodei. Tudo foi feito de maneira

extremamente formal, com a comida sendo servida em

uma louça muito bonita, e eu me senti completamente


deslocada. Não era meu ambiente natural. Por mais que

meus pais tivessem me educado para agir em qualquer

situação, que tivesse estudo e que conseguisse manter a

etiqueta, aquela não era eu. É claro que ninguém se

incomoda com o luxo, mas os padrões de Nicolas para a


futura mãe de seu filho, por mais que eu não fosse agir

como tal, poderiam ser mais altos.

— Podemos começar a conversar? Estou um pouco

aflita — soltei, mesmo que ainda estivesse constrangida

pelas minhas próprias reações. Queria fazer a mulher


segura, pronta para entrar em um negócio que beneficiaria
ambas as partes, mas assim como eu não me encaixava

no mundo de Nicolas, também não podia mudar minha


personalidade insegura.

— Será como você quiser. O que quer saber

primeiro?

— Era verdade? A história de que você cogitou uma


barriga de aluguel?

— Usou a palavra certa: cogitei. Estou cogitando na


verdade. Não é uma decisão cem por cento tomada, mas é
uma que tem cada vez mais me parecido a correta para

mim.
— Por quê? — eu sabia que era um abuso, mas

decidi tentar. Quando Nicolas hesitou, prossegui: — Se


vamos entrar em um negócio juntos, preciso saber onde

estou me enfiando. Quais são suas motivações... O que


acontece se mudar de ideia no processo?

— Não vou mudar! — ele falou por entredentes,


quase rosnando. — O que pensa que sou? Um

irresponsável? Que vou te largar grávida de um filho meu?

— Não penso que é um irresponsável, mas qualquer


coisa pode acontecer. E se você se interessar por alguma

mulher que não concorde com seu método?

— Ninguém vai saber do meu método! — ele


novamente usou de desdém, como se não concordasse
com a palavra que usei. — Se formos levar isso adiante,

como eu já te conheço, talvez seja melhor inventarmos que


eu te engravidei por acaso.

— Ah, ótimo! — Cruzei os braços contra o peito,


indignada. — Eu vou ser a comidinha do chefe!
Nicolas franziu o cenho para mim, em uma
expressão que costumava colocar medo em muitos dos
seus funcionários. Assustou-me um pouco também, mas

precisava me recompor. Eu queria algo dele, mas ele


também queria algo de mim.

— Não vou deixar que pensem isso de você. Além

do mais, se topar, creio que seria uma boa ideia se eu te


demitisse. Vai receber todos os seus direitos, é claro!

— Mas vou ficar sem emprego! — aquilo me


desesperou. — Como te disse, preciso de dinheiro para

proteger meu irmão, mas depois que me der os cem mil,


vou continuar sem nada. Não terei como nos sustentar.

Estando grávida, como vou encontrar outro emprego?

— Cem mil? — Nicolas ficou surpreso, e eu percebi


que tinha falado demais.

Abaixei a cabeça, percebendo que não tinha comido


quase nada. Não estava nem com fome, para ser sincera.

— É a quantia que preciso.


— O que, afinal, aconteceu com o seu irmão? É algo
de saúde? — ele parecia verdadeiramente interessado e
preocupado, o que causou uma coceirinha gentil no meu

coração.

— Pode se dizer que sim — era uma resposta


quase verdadeira. Se eu não conseguisse o dinheiro, João

ficaria em perigo, então, de fato, era uma situação de vida

ou morte.

— Mas em que momento eu disse que ia te pagar

cem mil?

Sim, provavelmente eu estava completamente

enganada. Cem mil era muito dinheiro. Por que acreditei

que conseguiria tudo de uma vez, tão facilmente? Mas


estávamos falando de uma gravidez. Tudo, não só no meu

corpo, mas nos meus hormônios e na minha vida iria

mudar. Por mais que eu não fosse me tornar uma mãe de


verdade, aquele bebê, de alguma forma, faria parte de

mim, eu nunca o esqueceria. Mexeria com meu


psicológico, sem dúvidas, então achei que o esforço valeria

pelo menos a salvação do meu irmão.

Sem saber o que responder e me sentindo


constrangida por supor tantas coisas, simplesmente levei o

copo à boca, bebendo um gole do vinho, esperando que o

álcool começasse a fazer efeito rapidamente.

— A minha ideia inicial é dois milhões de reais. Mas


estava disposto a negociar o valor, caso você achasse

pouco.

Imediatamente me engasguei.

Dois milhões de reais? E eu ainda poderia pedir


mais, se achasse necessário? Meu Deus, eu nem saberia

qual seria a sensação de ter tanto dinheiro na minha conta.

— O quê? Mas isso é muito dinheiro! — exclamei,

quase em surto.

— Estamos falando de um filho, Diana. É o meu

sonho há muito tempo. Eu sou milionário, posso pagar


muito mais do que isso. Um bebê, para mim, vale muito

mais do que isso.

Minha mente estava tão zonza, tão fora de órbita,

que a primeira coisa que pensei, por mais absurdo que


pudesse parecer, era que a última coisa que eu imaginava

quando olhava para Nicolas era a imagem de um pai. Mas

era o que ele queria, não? Quem seria eu para negar a um

homem tão rico o direito de realizar um sonho?

— Além do mais, eu não te deixaria desempregada.


Tenho conhecidos no meio dos negócios que me devem

favores e que com certeza aceitariam uma secretária com

boas referências. — Assenti, quase engolindo em seco


pela forma direta e reta com que ele estava falando. — E

eu também terei uma condição. Durante a gravidez, é

inegociável que você venha morar comigo.

— Oi? Mas... por quê? — novamente me senti

chocada. Aquela história estava começando a caminhar de


uma forma muito estranha.
— Porque aqui há conforto, você terá assistência

vinte e quatro horas por dia, tanto minha, quando eu estiver


em casa quanto dos meus funcionários e seguranças. Não

sabemos se a gravidez será tranquila, se você vai precisar

de algo. Quero que esteja segura.

Eu sabia que ele estava falando por puro interesse,


mas para uma pessoa que se virava sozinha há cinco

anos, era um gatilho pensar que alguém estaria cuidando

de mim, para variar.

— E meu irmão?

Só faltou Nicolas revirar os olhos de tão incomodado


que ficou com a minha pergunta.

— Acredito que tenhamos bastante espaço aqui. É

claro que seu irmão poderia vir também.

Resumindo: eu ganharia dois milhões de reais, teria

um emprego garantido depois e ainda moraria em uma


mansão, onde eu estaria segura das loucuras de Leonardo.
O preço era alto? Sim. Eu teria que gerar um bebê, vê-lo

crescer dentro de mim, senti-lo, e ele não seria meu.

Será que eu iria suportar algo assim? Como seria a

hora de entregá-lo, logo depois do parto? Será que Nicolas

me deixaria vê-lo, nem que fosse uma única vez? E será


que seria melhor fazer isso ou simplesmente não formar

uma imagem na minha cabeça?

Senti minhas mãos começarem a tremer, o que não

era para menos. Levantei-me, sem pensar muito no que


estava fazendo, e percebi que minhas pernas também

estavam bambas, quando dei alguns passos, ao ponto de

eu precisar me apoiar na mesa para não cair.

Nicolas também se colocou de pé em alguns


segundos e me segurou.

— Você está bem?

— Só um pouco nervosa. Foi uma conversa...

intensa.
— Sim, para mim também.

Balancei a cabeça, meio desnorteada ainda.

— Acho que nós dois precisamos pensar — falei,

sentindo minha voz sair como um sussurro.

— Sim, precisamos. Mas também podemos


encontrar outra forma de eu te ajudar. Posso emprestar o

dinheiro e...

Ergui a cabeça, e então percebi o quanto estávamos

próximos. Se Nicolas se inclinasse um pouco, já que era


bem mais alto do que eu, seus lábios tocariam os meus.

Isso deixou meus olhos pesados, e eu me surpreendi com

o desejo que me acometeu.

Nicolas era, de fato, lindo. Seus cabelos loiros em


um tom acobreado, eram lisos, e caíam em seus olhos,

mas não o fazendo parecer um membro de uma boy band,

mas mais bagunçados, e a barba, embora não muito


densa, dava um ar mais maduro ao seu rosto. Ela era do

mesmo tom dos cabelos, o que lhe proporcionava um ar


muito pessoal. Os olhos eram verdes- escuros, sempre
intensos, misteriosos e com um leve toque de amargura

que sempre me deixou muito curiosa. Sem contar a altura

imponente e os ombros muito largos. Era um homem e


tanto.

Ainda assim, conheci outros homens bonitos, mas

nenhum deles nunca chamou a minha atenção como meu

chefe. Havia uma aura dominadora nele que eu nunca


entendi, mas que sempre teve um apelo em mim.

— Como você iria cobrar? Eu demoraria anos para

te pagar com meu salário. — A forma como o olhei dava a

entender que eu estava falando de pagamento com sexo.

E de onde eu tirei aquela ideia? Provavelmente da


conversa absurda com Leonardo.

Mas será que eu estaria preparada para me


entregar a alguém por dinheiro? Mesmo que fosse um

homem que eu desejava tanto?


Antes que eu pudesse responder, soltei-me de suas
mãos e me afastei. Minha cabeça não estava funcionando
direito, obviamente.

— É melhor eu ir — afirmei, mas querendo ficar. Por

algum motivo...

Colocando as mãos nos bolsos, Nicolas pareceu um


pouco incomodado, talvez até decepcionado, mas eu não
queria pensar sobre isso.

— Sim, é melhor.

Então eu fui. Nicolas chamou um táxi para mim, e eu


segui todo o caminho com a mente lotada de
pensamentos.

Teria muitas, muitas coisas a pensar a partir dali.


CAPÍTULO OITO

Os dias estavam passando mais depressa do que

eu gostaria. A cada um deles, eu fazia mais uma ligação


para Leonardo, na esperança de que permitisse que eu
conversasse com João, só que nunca me atendia. Tentei

de números diferentes, mas ele parecia adivinhar ou então


só eu possuía aquele seu celular, não era possível.

O final de semana voou, e na segunda-feira eu mal

conseguia olhar para Nicolas. Quando me deu bom dia, eu


apenas balancei a cabeça, tentando fingir que estava muito

concentrada em um documento que tinha em mãos, mas a

verdade era que não conseguiria, de forma alguma, olhar


em seus olhos depois da conversa que tivemos na sexta-
feira à noite. Não somente a minha oferta para ser sua

barriga de aluguel, mas o clima que rolou depois, quando


insinuei que o pagamento por seu empréstimo poderia ser

em sexo.

Eu era virgem, pelo amor de Deus! Por que achei


que valeria tanto dinheiro para um homem que poderia ter

a mulher que quisesse com um estalar de dedos?

Naquela tarde, Nicolas recebeu a presença de um

advogado em sua sala, e o homem demorou umas três


horas ou mais lá. Eu conseguia vê-los pela parede de

vidro, e não consegui deixar de perceber que meu chefe

olhou para mim mais de uma vez. Poderia não ter nada a

ver, mas será que estariam falando sobre o possível


contrato sobre o qual conversamos?

Isso me deixou nervosa mais uma vez, a ponto de

não conseguir me concentrar durante todo o resto da tarde.

Eu sempre gostei do meu trabalho. O ambiente da

empresa era bom, as tarefas eram tranquilas e por mais


que todo mundo tivesse me colocado um baita medo a
respeito de Nicolas, sempre nos demos bem. Pela primeira

vez, desde que comecei a trabalhar na Sodemberg, estava

desesperada para encerrar o expediente. Queria ir para

casa, descansar e tirar da cabeça que tudo ficaria estranho

a partir daquele momento. E isso porque não tínhamos

assinado contrato nenhum.

Só que pouco antes das seis – o horário que eu saía


da empresa –, meu telefone tocou, e eu corri para o

banheiro, para atender. Tratava-se finalmente de Leonardo,

e eu jurei que me permitiria falar com João. Jurei que teria

notícias, que ouviria a vozinha que me era tão amada.

Eu não apenas estava preocupada com meu irmão

– embora isso, com certeza, fosse a pior parte –, mas a


saudade que sentia era quase dolorosa.

— Caralho, gatinha, você é muito chata. Parece até

que está querendo que eu te coma. Nem as meninas com

quem eu saio me ligam tantas vezes... — ele falou em tom


de zombaria, e eu poderia matá-lo por levar aquela

situação de uma forma tão ridícula.

— Acredito que você não tenha sequestrado o irmão

de nenhuma delas.

— Não sequestrei ninguém. Legalmente o garoto é

meu filho. Seus pais nunca adotaram o moleque de


verdade.

Infelizmente ele estava certo. No registro, João era


filho daquele desgraçado.

— Eu só quero falar com ele... Por favor. — Odiava


implorar, mas faria o que fosse preciso.

Até mesmo as ideias mais absurdas...

— Não estou perto do garoto. Estou na sua casa,

gatinha. Te esperando para termos uma conversa. Quero


que me conte como andam suas tentativas para conseguir
o dinheiro. Até agora não me deu notícias animadoras.
— V-você está na... na minha c-casa? — gaguejei e

estremeci.

— Aqui mesmo. No seu quartinho. Aliás, você tem


uma carinha muito de mocinha para quem guarda umas

lingeries tão bonitas. Tem uma vermelha aqui que só de


pensar em você nela, meu pau já ficou duro.

Quase gritei só de pensar naquelas mãos imundas


tocando as minhas coisas. Mas fiquei ainda mais

apavorada ao imaginar que ele deveria estar me vigiando,


porque eu tinha retornado no domingo anterior, uma vez

que Ana Carolina voltara para casa, para ficar com o


marido, e que Ana Maria precisara viajar a trabalho.

Devolvi a chave para ela e não tinha para onde ir.

Como iria ter coragem de voltar para lá?

Encerrei a ligação e desliguei o telefone em um


impulso, em uma reação quase automática, por mais que

quisesse ainda ter certeza de que não conseguiria falar


com João. Queria negociar, tentar pedir que falasse com
um de seus capangas para permitirem que o menino me
ligasse, mas, naquele momento, eu só consegui deixar
meu corpo escorregar, apoiado na parede do banheiro da

empresa e me sentar no chão.

Levei as duas mãos à cabeça, tentando entender


como minha vida tinha virado aquela completa bagunça.

Nem vi o tempo passar e quando saí do banheiro, a


empresa parecia bem mais vazia. Algumas salas já

estavam com as luzes apagadas, e eu fui andando até


minha mesa, enquanto checava a hora: já passava das

oito. Tinha ficado trancada no banheiro por mais de duas


horas, chorando. Como nem me olhei no espelho, não

reparei na minha aparência, mas poderia jurar que meus


olhos estavam inchados e vermelhos.

Liguei meu celular e comecei a checar se Leonardo


deixara alguma mensagem. Será que eu sofreria alguma

retaliação por não deixá-lo falar? Por desligar na cara


dele?
Ainda estava pensando nisso quando esbarrei em
algo. Ou alguém. Grande o suficiente para me fazer
cambalear e quase cair. Um braço forte se enganchou na

minha cintura, meio que por instinto, e eu vi o rosto de


Nicolas novamente muito próximo do meu.

Ele me segurava com firmeza, e eu sabia que

estava olhando para os meus olhos.

— Estava chorando? — a pergunta pareceu


surpreender a ele também.

Era impressionante que nos últimos dias Nicolas

tivesse me tocado mais vezes do que em todo o tempo que

nos conhecíamos e trabalhávamos juntos.

Não consegui responder, apenas engoli em seco.

— Você está gelada e tremendo, o que aconteceu?


— ele insistiu, e sua preocupação, que parecia tão

genuína, me comoveu a ponto de eu desabar.


Eu estava tão cansada, tão no limite, que

simplesmente enterrei minha cabeça em seu peito e


comecei a chorar de soluçar. Senti que Nicolas demorou a

corresponder, chegando a soltar a cintura que segurava,

mas o peso confortador de sua mão grande e firme nas


minhas costas quase me proporcionou o alívio de que eu

precisava.

O zumbido no meu ouvido aumentou a ponto de eu

jurar que perderia os sentidos, então Nicolas praticamente


me carregou até sua sala, amparando-me o tempo todo e

me colocando sentada em seu sofá de couro. Havia um

pequeno frigobar em um canto, e ele pegou uma garrafinha

de água, já aberta, colocando-a na minha mão.

Levei-a à boca e dei uma enorme golada, e era o


que eu realmente estava precisando.

— Diana, o que houve? — ele perguntou com mais

firmeza, e eu olhei em seus olhos, apavorada em contar

toda a verdade. Nicolas era poderoso demais, e homens


como ele tinham a tendência de achar que eram capazes
de tudo no mundo se apenas arregaçassem as mangas ou

contratassem quem pudesse fazer isso.

Só que era a vida do meu irmão em jogo. Ele nem

conhecia o menino e muito menos Leonardo, o que era


capaz de fazer. Se algo desse errado, Nicolas não se

esforçaria tanto para salvar a criança. Nós não tínhamos

relevância para ele.

Ou ao menos era o que eu pensava.

Fosse como fosse, eu podia contar alguma coisa.

— Meu irmão é adotado, sabe? — falei e funguei um


pouco, tentando fazer com que minha voz soasse menos

chorosa. — O pai dele está vivo e tem alguma ligação com

o tráfico. Está devendo a alguém perigoso. Precisa do


dinheiro ou pode sobrar para o João. Não posso chamar a

polícia ou pode ser pior.

Não contei a parte de que estávamos sendo

ameaçados, porque era algo mais difícil para mim. Pensar

no meu irmão em perigo, naquele momento, me deixaria


ainda mais apavorada, e eu já tinha me entregado demais

aos meus sentimentos.

Nicolas assentiu, parecendo pensativo.

— É por isso que está disposta a gerar o meu filho?

Por que será que o termo barriga de aluguel me


deixava menos desconfortável do que quando ele colocava

as coisas daquela forma? Quando dizia meu filho, me dava

a sensação de que iríamos fazer um bebê juntos, da


maneira convencional.

E eu ainda não entendia o que sentia a respeito

daquela ideia. Talvez fosse inexperiente demais até para

lidar com o meu próprio corpo e meus impulsos.

— Sim. É por isso. Eu faria qualquer coisa pelo meu


irmão. Assim como você faria qualquer coisa para ter um

filho.

De certa forma, nós tínhamos o que o outro

precisava. Não era assim que funcionava uma


negociação? Por que a nossa seria diferente de qualquer

outra? Assinaríamos um contrato, apertaríamos as mãos e

cada um de nós faria a sua parte. A minha, sem dúvidas,

era um pouco complicada, mas além de salvar meu irmão,


eu ainda realizaria o sonho de uma pessoa. Não seria

recompensador?

Foi com isso em mente que fui para a casa de Ana

Carolina, depois de ligar para ela. Mesmo com Francisco


por lá, minha amiga me ofereceu abrigo, e Nicolas me deu

carona.

Prestes a descer do carro, dei uma olhada no meu

chefe, que, como sempre, parecia muito sério, muito


solene.

— Eu já tomei minha decisão, Diana. Pense com

carinho. Podemos dar outro jeito também. Trabalho com

uma boa empresa de segurança que...

— Não. Dar o dinheiro para ele é a melhor saída.


Quando eu estiver com o meu irmão em segurança, posso
acionar a polícia ou algo assim. Mas com João tão

vulnerável, não quero arriscar.

— Compreendo.

Ainda bem que ele compreendia. Cumprimentando-


nos, eu saltei do carro e entrei no prédio da minha amiga,

sob o olhar vigilante de Nicolas.

Era um saco não poder voltar para a minha casa,

para as minhas coisas, e precisei pegar uma roupa


emprestada de Carol para ficar mais à vontade.

Precisando me abrir com alguém, contei para ela

toda a história, já que ela sabia muito bem sobre a barriga

de aluguel, só não sabia ainda que eu e Nicolas tínhamos


conversado sobre isso.

— Di... eu acho que você não está pesando as

coisas direito. Você é virgem, não pode ser inseminada. Já

conversamos sobre isso! — Carol já tinha trabalhado em


uma clínica médica, e por mais que não trabalhassem com

inseminação, ela poderia ter a informação, não?


— Você tem certeza?

— Absoluta. Se você está certa de que esta é a

melhor opção, vai ter que conversar com seu chefe. E...

bem... perder a virgindade.

Uau. Uma coisa que eu tinha guardado por tanto

tempo, enquanto todas as minhas amigas descobriam sua


sexualidade ao meu redor, teria que ser “sacrificada”.

Percebendo minha relutância, Carol, pegou minha

mão.

— Amiga, não é grande coisa. Você ainda pode


achar um cara legal para fazer. Francisco tem uns amigos

e...

— E sair oferecendo assim para eles? Do nada? —


Eu estava nervosa, e era perceptível no meu tom de voz.

— Não é tão simples, Carol.

— Eu sei que não, mas seja como for, você precisa


conversar com Nicolas. Ele já pode estar colocando as
esperanças em você e com certeza vai ser um balde de
água fria.

Sem dúvidas seria. E com que cara eu iria contar ao


meu chefe, com quem eu não tinha exatamente uma

intimidade, que nunca tinha feito sexo na vida?

Bem, eu precisava começar a entender que dali em


diante, se realmente levássemos a sério e déssemos
continuidade ao nosso plano, nada seria igual entre mim e

Nicolas Sodemberg. Absolutamente nada.


CAPÍTULO NOVE

Eu tinha chegado em casa há pouco mais de dez

minutos, depois de levar Diana na dela. Arrancava a


gravata do colarinho, ansioso por um banho, quando vi
meu celular tocar.

— Senhor? — Era ela. A voz doce e suave entrou


pelos meus ouvidos me causando uma reação totalmente

inesperada.

Diana só me chamava de senhor às vezes. Já tinha


lhe dado permissão para me chamar pelo nome e me tratar

por você, mas nem sempre era atendido. Sempre que fazia

isso, que usava a maneira mais formal, meu lado


dominador aflorava, e eu só imaginava como seria tê-la

falando aquela palavra quando estivéssemos na cama...

Quando...

Por que diabos eu estava pensando assim? Não era

quando. Não era nem se. Não iria acontecer.

— Aconteceu alguma coisa? — perguntei,


preocupado, jogando a gravata sobre a cama e abrindo

alguns botões da minha camisa.

— Olha... antes de qualquer decisão que eu possa

tomar, acabei de me deparar com um imprevisto. — Ela


parecia ainda mais nervosa. Andava muito assim nos

últimos dias, e não era para menos, levando em

consideração a situação em que estava. Sempre a vi como

uma garota cheia de vida, divertida e com aquele ar de

doçura que me derretia, mas ela havia mudado, e eu

poderia matar quem tirara aquela luz que ela carregava


nos olhos.

— Que tipo de imprevisto?


A linha ficou quase silenciosa, e eu poderia jurar que
a ligação tinha caído se não estivesse ouvindo a respiração

de Diana do outro lado. Percebi que estava hesitando,

então lhe concedi o tempo que precisava.

— Li algumas coisas na internet sobre inseminação

artificial e fiquei sabendo que... — Mais uma hesitação. —

Não são possíveis de serem feitas em mulheres virgens.

Demorei um pouco para captar o quê ela estava


falando, mas quando compreendi, o ar ficou preso no meu

pulmão.

Diana era virgem. Inocente, como seus olhares

sempre me alertaram.

Puta que pariu...

Comecei a andar de um lado para o outro do quarto,

sentindo-me novamente como um pervertido por pensar

que isso só a tornava ainda mais excitante para mim.

Pura... imaculada. Intocada.


— Nicolas? — chamou, provavelmente porque eu

tinha ficado tempo demais calado. — Você ainda está aí?

— Estou. Acho que vamos precisar pensar sobre

isso, não vamos? — Eu nem sabia o que dizer. O que

deveria perguntar: se ela estava disposta a perder a


virgindade para ser inseminada? Que coisa de mau gosto.
Aonde iríamos chegar com tudo aquilo? — Talvez

precisemos descartar a hipótese, e eu te ajudo de outro


jeito.

— Não, Nicolas. Eu continuo interessada na

proposta.

O que ela queria dizer com aquilo?

— Precisamos conversar pessoalmente. — Dei uma

olhada no meu relógio de pulso. — Ainda não são nem dez


horas. Não tenho reuniões marcadas para amanhã de
manhã. Posso te buscar? — Foi uma ideia de impulso.

Uma ideia meio louca, mas, de alguma forma, eu precisava


vê-la. Queria ter aquela conversa cara a cara, olhando em

seus olhos.

Era muita coisa para absorver, e eu imaginava que


nada estava muito mais fácil para ela.

— Vai ficar um pouco tarde depois, não vai? Para eu

voltar e...

— Pode passar a noite aqui. Tenho alguns quartos


de hóspedes na casa. Provavelmente a conversa vai ser
bem longa.

Diana ficou em silêncio do outro lado da linha


novamente, ponderando. Ela estava dando um passo de

cada vez, o que me deixava um pouco mais seguro.


Aquele tipo de decisão não podia ser tomada na

impulsividade.

— Não sei se é certo... você é meu chefe.

— Se assinarmos o contrato que estamos


negociando, acho que esse conceito de chefe e funcionária
vai cair por terra, não acha? — tentei falar com o meu tom
de voz mais gentil, para não parecer impaciente.

Mais alguns instantes de silêncio.

— Sim, você está certo. Tudo bem, vou me aprontar.


Só colocar uma roupa de Carol emprestada. Pode vir.

— Ok.

Desligamos, e eu entrei no chuveiro rapidamente,


tomando um banho bem rápido e saindo de casa.

Passei no endereço para onde levei Diana horas

atrás, e ela entrou no carro calada, permanecendo assim o


resto do caminho inteiro, embora eu sentisse seu
nervosismo em cada movimento, até mesmo em sua

respiração.

Chegamos à minha casa mais uma vez, mas,


daquela, não havia jantar nos esperando. Meus

funcionários já tinham encerrado seu expediente, e eu não


iria acordar ninguém. A melhor opção para aquela
conversa era ficarmos sozinhos. Sendo assim, levei-a ao
meu escritório, conduzindo-a e fechando a porta assim que
entramos.

Quando me coloquei diante dela, que ainda estava

de pé, eu a senti extremamente nervosa. Observei quando


colocou uma mecha de cabelo atrás da orelha, como se

não tivesse muito o que fazer com as mãos.

— Por que não se senta?

— Acho que prefiro ficar em pé.

Foi meio que instintivo olhá-la de cima a baixo,


principalmente porque o vestido que colocara era mais

ousado do que os que normalmente usava. Claro que eu

só a encontrava no trabalho, e aquela era uma roupa


emprestada de uma amiga, então poderia ser explicável o

decote um pouco mais profundo e o fato de ser um vestido

que delineava suas curvas, mas era difícil não perguntar a

mim mesmo se havia escolhido propositalmente, sabendo


que eu a desejava.
Será que era tão óbvio assim, aliás?

Ela era linda. Desde que Taís falecera, não senti

desejo por uma mulher específica. Normalmente me


contentava com as garotas por quem pagava,

principalmente porque a agência que as enviava as

preparava para mim. Do jeito que eu gostava. Mas o quão


delicioso não seria moldar uma mulher completamente

inexperiente e inocente, ensiná-la a sentir prazer; vê-la

descobrir tantas coisas novas que eu poderia lhe mostrar?

Porra, se eu já desejava Diana antes, naquele


momento eu faria qualquer coisa para tê-la na minha cama.

Então uma ideia surgiu...

— Peço que deixemos a vergonha de lado por

alguns instantes. Sei que pode ser constrangedor o que

vamos conversar, mas é necessário. — Ela assentiu. Não


parecia muito convicta, mas não havia alternativa. — Está

mesmo disposta a continuar? Mesmo sabendo o que é

necessário fazer?
Ela suspirou, mas parecia resignada.

— Estou. Contanto que a gente negocie e você

adiante a parte que preciso para proteger o meu irmão —

seu jeitinho determinado era apenas mais um incentivo à


forma como eu a queria.

— Sem problemas. — Cruzei os braços contra o

peito. Eu estava usando uma camisa de algodão, branca, e

não pude deixar de perceber que Diana olhou para os

meus braços, contraídos, segurando o ar.

Bom sinal. Ela também tinha algum tipo de atração


por mim.

Meus pensamentos continuaram a correr pela minha

mente, formando novas ideias. Cada uma delas me


deixava com mais e mais água na boca.

— Você tem alguém em mente?

— Para quê?

— Para perder a virgindade, já que é o que decidiu.


A conversa era, de fato, muito estranha, mas eu

queria saber antes de lhe fazer a proposta.

Diana abaixou a cabeça, envergonhada.

— Não. Ainda não.

— Então me deixe ser o primeiro.

Ela ergueu os olhos para mim, surpresos, quase

arregalados, e não disse nada por alguns instantes. Ergui a

cabeça, observando-a com atenção, sem tirar os olhos dos


dela. Queria que entendesse que era uma proposta real,

que eu não estava falando da boca para fora. Só que achei

necessário acrescentar algumas coisas:

— Que fique bem claro que não estou querendo te

comprar. Vou pagar pelo bebê que será gerado e não para
ter você na minha cama. — Vi quando estremeceu, o que

novamente era bom. — Também não quero que o meu filho

seja gerado de forma convencional. Não estou em busca


de uma mãe para ele — mais uma vez tentei soar gentil,
porque o tema não era dos mais fáceis. Não era para ser

uma grosseria, apenas uma constatação.

— Entendo.

— Você é uma mulher muito bonita, Diana, e eu não

posso negar que te desejo. — Ela se surpreendeu pela

milésima vez nos últimos tempos. Não era possível que


não soubesse o quanto era linda. Mesmo assim, prossegui:

— Além disso, gosto de você como pessoa e não quero

que caia nas mãos de um homem que pode não te dar o


que você merece em uma primeira vez.

— E você pode?

Ela estava mesmo me desafiando?

Puta que pariu, aquela garota ia me enlouquecer...

Dei um passo à frente. Mais um. Mais outro, até que

ficamos muito próximos. Ela prendeu o ar, e eu estiquei a


mão, tirando uma mecha de cabelo de seu olho.
— Posso. Mas não quero que seja mecânico. Quero

te seduzir. Quero que me deseje também. Que deseje que


eu seja o seu primeiro.

Seus lábios rosados se entreabriram, deixando

escapar o ar que prendera anteriormente. Senti a quentura

de sua respiração contra o meu rosto e desejei beijá-la.


Tanto que chegava a ser doloroso.

— Não sei se é necessário... — respondeu,

insegura.

— Talvez não seja, mas acredite em mim... você vai

gostar. — Ela continuava acuada, mas não a sentia

assustada. Estava um pouco desconcertada, o que era


bom. Ela parecia estar interessada em descobrir como

seria. E eu estava mais do que interessado em demonstrar.

— Eu tenho uma ilha, em Angra. Particular. Seremos só


nós. Me dê uma semana.

— Meu irmão... ele...


— Podemos deixá-lo aqui. Tenho pessoas que
podem cuidar muito bem dele. A casa é protegida, quase

uma fortaleza. Tenho um motorista que pode levá-lo à

escola e a qualquer outra atividade que faça. Como eu


disse, aceito te dar o dinheiro que precisa para que o pai

pague a dívida e ele fique seguro.

Diana se afastou um pouco, aproximando-se da

minha mesa, onde apoiou uma das mãos, levando a outra


à cabeça. Coloquei as minhas nos bolsos da calça jeans

que usava, observando-a. Nunca fora muito diferente, mas

algo nela passara a me chamar mais e mais atenção, a

ponto de que não conseguia parar de admirá-la e imaginar


um milhão de coisas que gostaria de fazer se me desse a
oportunidade.

Quando olhou para mim, corada, no auge de sua

inocência, jurei que iria explodir de tesão, mas me


controlei.

— Tudo bem. Aceito. Vamos fazer como você está

propondo.
Fui até ela e estendi a mão. Quando me tocou e
aceitou o cumprimento, algo me disse que já tinha feito
milhares de acordos durante a minha vida, mas nenhum

seria como aquele. Em vários sentidos.


CAPÍTULO DEZ

Assinei minha demissão dias depois, o que

surpreendeu a todos. Foi uma das coisas mais dolorosas


que fiz, mas talvez a assinatura do dia seguinte, firmada no
escritório da casa de Nicolas, com seu advogado particular

como testemunha, tivesse sido a mais tensa de todas.

O contrato era bem reto e direto. Tudo o que

conversamos estava ali, menos a parte sobre a minha

virgindade, o que eu agradeci mentalmente. Não queria


que nosso acordo mais recente, sobre ele ser meu

primeiro, ficasse registrado para a posteridade. Seria algo

entre nós.
E eu poderia ser maluca, mas a ideia de meu

primeiro homem ser Nicolas Sodemberg me deixava mais


tensa do que a história da barriga de aluguel. Mas isso

provavelmente também teria sua hora de me atormentar,

era uma coisa de cada vez.

Não era Nicolas em si. Era o que ele representava.

Se fosse um cara qualquer, que eu conheci em uma balada

e me atraiu, tudo bem... seria estranho, porque nunca foi


um plano me entregar pela primeira vez desta forma, mas

o cara era o meu chefe!

Ou melhor... não era mais, mas minha demissão não

mudava em nada as coisas.

Além de ter o fato de nossa relação ser de patrão e

funcionária ainda havia algo que era muito mais assustador


para mim. Ele me atraía em um nível completamente

desconhecido. Um toque, um olhar, sua proximidade... a

aura de poder que ele emanava, o jeito dominador como

falava, sua aparência...


Deus... ele poderia me destruir se quisesse. A
impressão que eu tinha era que ia sair daquela viagem, à

maldita ilha para onde iria me levar, completamente

envolvida, e ele não seria meu. Tudo o que queria era

“resolver um problema” para dar continuidade aos seus

planos.

No momento em que assinei o contrato,

concordando em ser barriga de aluguel para Nicolas,


também concordei em pertencer a ele por uma, duas, três

noites... quanto tempo me quisesse. Concordei em

entregar-lhe minha virgindade, porque estava incluso no

pacote. Eu não poderia ser inseminada sendo virgem,

então ele teria a honra...

A honra... que ironia!

Assim que o advogado saiu da sala, tentei fingir que

não estava tão nervosa quanto estava, respirando fundo e

lutando para recuperar meu discernimento. Só que Nicolas

não parecia querer perder tempo.


— Agora temos que dar o próximo passo. — Tirou o

celular do bolso. — Pode me passar o telefone do pai do


menino?

Aquilo me surpreendeu imensamente.

— V-você vai ligar para ele? Você?

— Estou tomando a responsabilidade a partir de


agora. Infelizmente há homens que só respeitam uma

ordem masculina. Não vou cometer uma loucura, fique


tranquila.

— Mas por quê? Por que está tomando a


responsabilidade para si? Não entendo.

Nicolas ergueu os olhos para mim, e eles estavam

semicerrados, intensos. Nunca pareceu tão predador


quanto antes. Isso mexia comigo.

— Porque você será a mãe do meu filho. É meu


dever te proteger e te proporcionar um ambiente seguro,

sem estresse.
É meu dever te proteger – que mulher não

estremece ouvindo algo assim? Eu poderia ser muito boba,


estar me deixando levar mais fácil do que seria certo, mas

era impossível permanecer imune.

Exatamente como solicitado, passei o telefone de


Leonardo para ele, e Nicolas, de fato, telefonou, usando o
meu aparelho. Jurei que o filho da mãe não iria atender,

mas sua voz soou do outro lado da linha, no viva-voz,


fazendo-me estremecer.

— Ah, a vadiazinha lembrou que eu existo, né? —

aquele tom cínico e irritante foi ouvido, praticamente


ecoando por todo o escritório de Nicolas.

— Boa tarde, Leonardo. Quem fala aqui é Nicolas


Sodemberg. — Estremeci pelo poder e comando que

Nicolas demonstrava. O homem do outro lado da linha


ficou em silêncio por algum tempo.

— O S-sodemberg em p-pessoa? — o filho da mãe


gaguejou! De fato, Nicolas estava certo. Alguns homens só
respeitavam algo quando era outro de sua espécie que
assumia o controle.

— Sim, estou ligando para avisar que estou no


comando da situação a partir de agora. Não vai mais ligar

para a Srta. Moraes; o que precisar falar, será comigo. Vou


te passar meu telefone pessoal.

— Eu... bem... sim, senhor.

— O dinheiro que lhe foi solicitado será depositado


na sua conta ainda hoje, mas quero o menino sendo

entregue no endereço que vou lhe repassar até as quatro


da tarde. Se isso não acontecer, vou cancelar a

transferência e acionar alguns contatos. Acredito que


imagine que não preciso envolver a polícia na situação

para resolvê-la.

Precisei respirar fundo, porque tudo o que estava

acontecendo só servia para confundir mais e mais a minha


cabeça. Só para me deixar mais confusa a respeito
daquele homem.
Lançou um olhar para mim ao terminar de falar, e
ele não parecia estar pedindo aprovação. Estava apenas
me olhando, buscando minhas reações.

Leonardo não respondeu, mas Nicolas não era do

tipo que ficava esperando.

— Estamos entendidos? Quero uma resposta,

Leonardo... — ele praticamente rosnou, não deixando

dúvidas a respeito de sua impaciência.

— Sim, senhor, claro. Vou levar o menino.

— Ótimo. E espero que seja a última vez. Estou


sendo benevolente, Leonardo, mas não costumo fazer

caridade dessa forma, doando meu dinheiro para quem

não merece. O menino é seu filho e passará a ser


protegido por mim. Da próxima vez que se aproximar dele,

é melhor ter cuidado. — Nicolas fez uma pausa e

acrescentou: — E se chamar Diana novamente de vadia, é

comigo, pessoalmente, que vai ter que se entender.


Então ele desligou, começando a digitar algumas

coisas – provavelmente as mensagens que prometeu


enviar para Leonardo – e devolveu o celular para mim.

Como se não tivesse acabado de “resolver” um

enorme problema para mim, Nicolas simplesmente deu a

volta na sua mesa, sentando-se em sua cadeira e


começando a conversar com alguém que eu poderia jurar

que era seu gerente no banco, já que começou a falar

sobre transferência alta e a dar algumas ordens. Nisso,


aliás, ele era muito bom.

Foi uma questão de horas até que um carro chegou,

deixando meu irmão na casa de Nicolas. Alguns

seguranças nos rodearam, como se pudesse haver alguma

tentativa de retaliação, mas eu nem queria olhar para nada


disso, só queria abraçar meu garoto, olhar para ele, ver se

estava intacto.

Parecia ter emagrecido um pouco, o que não era

para menos, já que passara quase um mês fora de casa.


Agarrou-se a mim, como se fosse um menino pequeno,

embora tivéssemos quase o mesmo tamanho.

— Senti tanto a sua falta, querido... tanta. — Beijei

seu rosto em vários lugares, o que o fez sorrir; aquele


sorriso muito branco, que contrastava com sua linda pele

negra, e que era sua característica mais marcante.

— Eu também, Didi, eu também.

Ainda estava abraçada ao meu irmão quando voltei

meus olhos para Nicolas, que nos observava. Sem que

João visse, murmurei um “obrigada”, e ele apenas


balançou a cabeça e saiu de perto, sem nenhum alarde,

sempre muito sério, austero.

Jantamos todos juntos, e João me contou toda a sua


rotina no lugar onde estava. Por mais que Leonardo nem

seus homens tivessem machucado o garoto, ele passara

por constante tensão, em meio a tiroteios na favela,

invasão de polícia e ameaças. Estremeci a cada história


contada, e Nicolas permaneceu em silêncio, apenas
ouvindo, mas conseguia distinguir algumas de suas

reações, e ele obviamente estava indignado.

À noite, fomos guiados aos quartos de hóspedes por


uma senhora muito simpática e educada. Eu ficaria no

mesmo em que fiquei no outro dia, quando dormi na casa

de Nicolas, mas o de João já estava preparado também.


Tinha levado nossas bagagens para lá, com a ajuda de

alguns dos seguranças, e quando a porta se fechou,

deixando eu e meu irmão sozinhos, preparei-me para as

perguntas, porque sabia que elas surgiriam.

João olhou ao redor, caminhando pelo quarto, e eu


compreendi que estava tentando encontrar uma forma de

começar o assunto.

— Por que estamos aqui, Didi? Aquele cara é o seu

chefe, não é?

Como eu poderia explicar para ele?

— Sim, ele é — menti. — Só que eu combinei de

fazer um trabalho a mais, acompanhá-lo em uma viagem, e


ele me ajudou com você. Inclusive liberou para ficarmos

aqui por um tempo, para seu pai não nos perturbar.

João não era bobo. Ele tinha dez anos e

infelizmente sabia mais da vida do que deveria.

Provavelmente ouvira muitas coisas naqueles dias que


passara com o pai, até mesmo sobre mim, e eu não queria

enganá-lo, embora não quisesse que pensasse mal de sua

irmã, que eu sabia que ele tinha como um modelo.

— Seja o que for que está disposta a fazer por mim,


Di, não se sacrifique. Eu me viro. Você é minha irmã,

também tenho que cuidar de você.

Meu coração se encheu de amor, e meus olhos, de

lágrimas. Aproximei-me dele mais uma vez e o abracei,


encostando sua cabeça no meu peito.

— Vai ficar tudo bem, querido. Nicolas é bom para

mim. Ele não está me obrigando a nada — joguei,

tratando-o como um adulto, que era o que ele merecia. —


Não estou sendo comprada, ok?
— Você jura? — Ele se afastou um pouco, olhando

nos meus olhos.

O que dizer a ele? Eu me sentia comprada, mas de


outras formas. A ideia de tirar minha virgindade não me

dava essa sensação, porque Nicolas estava levando a

coisa de uma forma bem diferente. Ele poderia ter


oferecido dinheiro por isso também, mas estava disposto a

me seduzir e me convencer. No final das contas, se eu não

quisesse que fosse com ele, seria uma escolha minha. Eu

só precisava estar disponível para a barriga de aluguel


depois.

Ou seja... não era nada parecido com uma

chantagem. Eram negócios. Eu já tinha o meu irmão de

volta; Nicolas cumprira sua parte no acordo e até fizera


mais do que o combinado. Era a minha hora de retribuir.
CAPÍTULO ONZE

No banco traseiro do carro de Nicolas, nós dois

estávamos em completo silêncio. Um daqueles vidros


separava nosso assento da frente do veículo, onde estava
o motorista, aparentemente para nos dar privacidade, mas

a verdade era que nem seria necessário. Eu não conseguia


encontrar um assunto que pudesse ser puxado com ele,

que não tivesse a ver com as milhares de dúvidas que

tinha a respeito de como seria aquela viagem.

Sabia nosso destino, mas não imaginava o que iria

acontecer naquela ilha.

Ou melhor... sabia. Não na prática, é claro, mas eu


iria perder a virgindade. Um homem experiente, poderoso e
muito sexy seria o meu primeiro, mas não fazia ideia de

como as coisas aconteceriam.

Será que seria naquela mesma noite? Será que iria

apenas transar comigo uma única vez ou mais de uma?

Será que seria delicado ou não se importaria caso me


machucasse?

Eu não conseguia parar de me fazer um milhão de

perguntas, e obviamente Nicolas percebia meu

desconforto.

A viagem de carro foi longa, até Angra, e o motorista

nos deixou em um porto. Nicolas combinou com ele,

pedindo que ficasse na cidade, por perto, para o caso de

precisarmos, e ele estaria à nossa disposição.

Atravessamos o píer, e ele me ajudou a entrar em

uma lancha enorme, na qual foram colocadas também

nossas bagagens, levadas por um carregador, que já


parecia saber tudo o que precisava fazer.
Quando fomos deixados sozinhos, outra dúvida me
surgiu:

— Quem vai pilotar? — perguntei, curiosa e

confusa.

Colocando óculos escuros e sorrindo de canto,

Nicolas pareceu orgulhoso ao responder:

— Eu.

Então, afastou-se, assumindo o timão, preparando

tudo e dando partida, mal me dando tempo de processar a

ideia.

Foi impossível não olhar para ele, com os cabelos

dourados ao sol e ao vento, todo de branco – uma camisa

de botão, com alguns deles abertos, e um jeans no mesmo

tom –, os óculos de aviador, as pernas longas abertas e as

mãos firmes no timão. Ele era a típica imagem do

milionário sexy, e eu pertenceria a ele muito em breve.


— Estamos sozinhos agora, Diana. Vamos ficar

assim por alguns dias daqui para a frente, e acho que seria
bom que colocasse para fora o que está te perturbando,

antes que cheguemos à ilha. Temos umas duas horas pela


frente, então será melhor do que ficarmos em silêncio. Eu
também tenho algumas coisas a dizer — como sempre em

um tom decidido, ele afirmou.

Eu não poderia negar que estava, de fato, cheia de


caraminholas na cabeça e não seria justo, nem com ele e

nem comigo, que ficasse calada ou fingisse algo diferente.

Respirei fundo, portanto, e me sentei perto dele,


decidida a ser clara e colocar tudo em pratos limpos.

— Não sei muito bem por onde começar... — fui


sincera.

— Ok. O que acha de fazer a primeira pergunta que


vem à sua cabeça? Seja lá o que for que deixar sair,

provavelmente é o que está te deixando mais preocupada.

Sim, eu podia fazer isso.


— Você vai me machucar? — saiu em um tom mais

inocente do que eu queria, o que evidenciava toda a minha


inexperiência. Nicolas, pelo que pude perceber, não

esperava que aquela fosse a minha pergunta, porque sua


reação foi muito espontânea. Ele deixou os ombros largos

caírem, e eu percebi que seu tom de voz se tornou mais


gentil e suave:

— É provável que possa doer, mas vou fazer com


que seja bom pra você. Vou tomar cuidado.

Assenti, tentando ficar mais tranquila com isso.

— Vai acontecer esta noite?

Daquela vez ele riu.

— Algo vai acontecer esta noite, Diana, sem


dúvidas, mas não o sexo em si. Tem algumas outras coisas

que gostaria de fazer com você antes. — Aquilo me fez


estremecer. — Sei que é virgem, mas quão inexperiente
você é? Já foi tocada por algum rapaz? Já teve um

orgasmo?
Ele estava sendo bem direito e foi quase impossível
não corar diante da forma tão natural com que falava.

— Não. Sou completamente inexperiente. Só fui


beijada até hoje. — Ele ergueu uma sobrancelha, e eu

pude vê-la se arquear por sobre os óculos. — Na boca, no


caso — completei com pressa, o que novamente o fez rir.

— Não tem graça! — indignei-me.

— Não estou achando graça. É que você é rara,

Diana. Acho que sou um homem de sorte por estar me


dando a chance de ser o primeiro. — Abaixei a cabeça,

ainda mais constrangida, mas Nicolas não parecia


satisfeito com a conversa: — Como disse, eu também

tenho algumas coisas a falar. Na verdade, eu deveria ter te


contado antes de virmos para cá, mas não é uma
imposição. Se não topar, pode ser sincera e nós

continuaremos da forma... convencional.

A ênfase que ele colocou na palavra me preocupou.

— Como assim?
Nicolas hesitou, voltando seus olhos para o
horizonte, enquanto pilotava.

— Eu tenho alguns fetiches... Sou adepto de


algumas práticas, e eu gostaria muito de experimentar

algumas coisas com você. Sei que é virgem e inexperiente


e não pretendo pegar pesado, mas sei que posso te

preparar melhor para o sexo e te estimular.

— Coisas como no 50 tons de cinza?

Ele novamente sorriu.

— Sim, mas não foi o livro que me incentivou a isso.


Nem o li.

— Foi o quê, então?

Ele olhou para mim, e por mais que eu não pudesse

ver seus olhos, por trás dos óculos, podia imaginar o olhar

intenso que estava me dirigindo.

— O prazer. Tudo o que pretendo fazer com você,


Diana, será muito prazeroso. Isso eu posso te afirmar. Para
mim e para você.

Uau. Era muito para absorver. Muito para

compreender, especialmente em uma conversa. Até dias


atrás Nicolas era apenas o meu chefe. Naquele momento

ele era meu provável amante. Meu Christian Gray pessoal.

E como eu poderia negar que fiquei excitada lendo aquele


diabo daquele livro? Como seria na realidade?

— E você vai usar o quê? Algemas, chicotes,

vendas...? — joguei o cabelo para o lado e tentei parecer

casual, mas provavelmente estava na minha cara o quão


desconfortável me sentia.

— Sem chicotes. Mas todo o resto, sim.

Senti uma pressão no meio das minhas pernas, e

meu estômago se revirou. O que estava acontecendo? Por

que aquela perspectiva me deixava tão ansiosa? Cheguei


a engolir em seco e comecei a suar, esperando que fosse

por causa do sol que batia sobre nossas cabeças, embora

um vento confortável estivesse nos tocando.


Chegamos à ilha no tempo estimado por Nicolas, e

ele me ajudou a saltar da lancha. Pegou nossas malas e as

levou para a casa, porque não fomos recebidos por


ninguém. O que era de se esperar, já que ele afirmara que

ficaríamos completamente sozinhos.

O lugar era lindo, uma perfeita casa de veraneio,

com direito a rede, praia particular, um pequeno heliporto,

um píer, além de todo o conforto e modernidades da casa


de um homem muito rico. O cheiro de maresia impregnava

todo o ambiente, e eu respirei bem fundo, sentindo-o, de

olhos fechados, parada no meio da sala. Era possível ouvir


o som das ondas de cada canto da propriedade, e eu jurei

que estava em um sonho.

O quarto que Nicolas designou para mim era

confortável, espaçoso, tinha seu próprio banheiro e uma

vista lindíssima para o mar imenso. A cama era king size,


os lençóis eram muito brancos, e eu poderia jurar que eram

macios e que estavam muito limpos. Tudo parecia

impecável.
— Temos três quartos neste andar, além de mais um

banheiro e um escritório. Talvez eu precise usá-lo durante


esses dias, caso apareça algo urgente da empresa.

— Claro. E o que tem no outro quarto?

Nicolas ficou muito sério, aproximando-se de mim.

Meu primeiro instinto foi recuar, embora não fosse o que eu

queria. Eu só estava ainda um pouco confusa.

Ele não desistiu, levou a mão ao meu rosto, sob o


meu queixo e me puxou um pouco para si, com delicadeza.

Seus lábios se encostaram nos meus, demorando-se

algum tempo, mas sem invadir minha boca com sua língua.
Era um beijo doce, suave. E o mais louco era pensar que,

a partir daquele momento, ele tinha o direito de fazer

aquilo. Tínhamos um acordo. E isso incluía beijos e todo o

resto a partir do momento em que chegássemos naquela


ilha.

— O outro quarto é para nós. Vai ficar trancado

durante o dia, mas o ocuparemos às noites.


Ok, entendido.

— Dormiremos lá também? — Eu queria saber se

ele iria me descartar depois do sexo ou se acordaríamos

juntos, ao menos durante aqueles dias. Não poderia exigir

nada, mas precisava me preparar.

— Se ficarmos com sono, sim. Mas podemos decidir


depois... — Nicolas se afastou, indo em direção à porta. —

Vou te deixar à vontade. Pode tomar um banho, se quiser,

trocar de roupa. Há alguns presentes para você dentro do


armário, gostaria que aceitasse. Te espero para jantar, às

sete.

Não foi um convite. Foi uma imposição.

Mas, ok... eu já sabia que seria daquela forma, não

sabia?

Curiosa, assim que ele saiu, fechando a porta, parti

em direção ao armário, abrindo-o e encontrando algumas

coisas, de fato. Uma delas era um vestido pendurado. Não

era nada extravagante, mas um lindo longo, florido, com


fundo claro, frente única. Perfeito para um jantar

despretensioso em uma casa de praia.

Havia algumas sacolas de papel também, e eu


peguei todas de uma vez, levando-as para cama. Dentro

delas – que eram sete – havia caixas. Cada uma delas, ao

serem abertas, revelaram um conjunto de lingeries


diferente. Cada uma com uma cor, todas de renda, muito

lindas. Caras também, sem dúvidas. Era um sinal de que

Nicolas sabia muito bem o que queria de mim. Ele queria

que eu as usasse, uma por dia, o que me fazia imaginar


que tinha seus planos. E eu precisava segui-los.

Mas, novamente... por que será que eu estava tão

animada e excitada para saber o que o poderoso Homem

de Ferro tinha de cartas na manga?


CAPÍTULO DOZE

Ela descia as escadas, com a saia aberta do vestido

brincando ao redor de suas pernas, e eu soube, no


momento em que a vi, que não conseguiria me segurar
naquela noite, para tentar parecer menos afobado. Diana

tinha prendido um lado do cabelo com uma presilha bonita


e deixado o resto caído em seus ombros, cacheando nas

pontas, deixando um dos lados de seu pescoço exposto, e

eu respirei fundo, contendo a vontade lambê-la inteira,


começando bem por ali.

Parando diante de mim, que a esperava em frente

às escadas, deu uma voltinha ao seu redor, tentando com


muito esforço parecer que estava descontraída, quando
era mais do que óbvio que todo o seu corpo pequeno

parecia tensionado. Nem ousei tocá-la, seria melhor deixá-


la um pouco mais à vontade.

— Você está linda. Como sempre — elogiei, sem

que ela nem precisasse falar nada, nem perguntar.

Na teoria, eu não precisava conquistá-la, porque ela

seria minha de uma forma ou de outra, mas queria que

ficasse satisfeita com isso; que se entregasse porque não

poderia suportar não fazê-lo.

— Obrigada. Você está bonito também. — Ela

parecia sincera, e eu não era um homem inseguro.

Sabia que era atraente, acima da média, e, mais

ainda, que minha condição financeira elevava meu status

em muitos sentidos. E eu não estava falando que as

mulheres eram interesseiras, mas o poder nos deixava

mais confiantes, elegantes, e tudo isso contava.

Com apenas um aceno de cabeça, conduzi Diana

até a sala de jantar, onde tudo já estava servido.


— Você preparou a comida? — ela perguntou,
surpresa, enquanto puxava a cadeira ao lado daquela onde

eu ia me sentar, agindo como um cavalheiro.

— Só a carne. A salada russa foi deixada aqui por

uma cozinheira. Ela preparou alguns pratos, principalmente

guarnições, e os armazenou para nós. Vou precisar apenas

preparar proteínas.

— Eu sei cozinhar. Posso fazer algumas coisas


também.

— A intenção aqui é te seduzir, então vamos fazer

as coisas da forma certa. — Dei uma piscadinha para ela,

porque a primeira intenção, na verdade, era deixá-la um

pouco menos tensa.

Para isso, eu a servi, abri um vinho e tentei puxar

assunto. Não pretendia passar de uma taça, nem eu e nem

ela, porque não queria nenhum de nós bêbados. Muito


menos Diana. Queria que estivesse consciente de tudo que

iria acontecer, de cada passo que avançaríamos.


Ela provou a comida e soltou um gemido, aprovando

o bife que preparei, e eu me remexi na cadeira,


absorvendo o som, tentando não focar apenas nisso.

Gostava da companhia dela, não só pelo fato de que


morria de tesão pela garota.

— Você ficou chateada por precisar ser demitida da


Sodemberg? — perguntei, e ela esperou um pouco para

responder, porque ainda mastigando, mas usou o


guardanapo de pano para limpar os cantos da boca e falou,

finalmente:

— Um pouco. Gostava de trabalhar lá.

— Mesmo para o Homem de Ferro? — Ergui uma


sobrancelha, tomando um gole do vinho em seguida.

Diana riu.

— Mesmo para o Homem de Ferro. Você não é tão

mau assim.

— Ah, não? Bom saber.


— É rígido, severo e sabe fazer uma carranca como

ninguém quando está irritado, mas nunca foi desrespeitoso


comigo e sempre foi gentil. Nem todos os chefes são

assim.

Aquilo me comoveu. Era uma garota extremamente


jovem, mas sabia enxergar além das superfícies.

— Vi meu pai trabalhar muitos anos para um chefe


que, além de não valorizá-lo como profissional, sempre o

diminuía. Pedi que o denunciasse por assédio moral, mas


não teve coragem. Trabalhou no mesmo lugar por trinta

anos, desde que tinha dezesseis.

— O que ele fazia?

— Começou como Office-boy, mas foi aprendendo a

profissão e virou corretor de imóveis. Era uma profissão


bem instável. Tinha meses que ficávamos muito bem e em
outros passávamos algumas dificuldades. Além disso, ele

morreu sem deixar uma aposentadoria.

— Sua mãe morreu também, não é?


— Sim, os dois em um acidente. Só me restou o
João. Minha mãe pediu que, não importava o que
acontecesse, eu deveria cuidar dele se ela faltasse um dia.

Parecia que estava adivinhando.

Lá estava a explicação da devoção de Diana para


com o garoto. A forma como ela parecia disposta a

qualquer coisa para protegê-lo, como uma leoa.

— E você tem feito um ótimo trabalho. Ele é um

garoto de sorte.

— Você acha? Parece que só tenho dado bola fora.


O que poderia ter acontecido com ele, enquanto estava

com o pai? Não tem noção do quão desesperada fiquei.

— Acho que tenho um pouco de noção. — Claro

que tinha. Era só ver o tipo de coisa que ela estava


disposta a fazer.

Por um momento comecei a pensar que o menino


realmente tinha alguma sorte. Muita, na verdade. O que

uma pessoa não daria para ter alguém capaz de


absolutamente tudo para seu bem estar? O que eu não
daria para ter alguém que se importasse daquela forma
comigo?

Mas não vinha ao caso. Ela seria minha, de alguma

maneira ao menos.

Com a minha resposta, Diana deu uma pequena

golada no vinho. Aparentemente não estava muito ansiosa

por ficar bêbada, mas também não parecia estar com muita
fome. Passou a remexer a salada, com uma expressão

cabisbaixa, provavelmente preocupada que não estivesse

fazendo um bom trabalho com o irmão.

Eu não poderia convencê-la do contrário, porque

não era muito bom nisso, mas pretendia aliviar um pouco o


clima. Seria necessário para o que eu tinha em mente já

para aquela noite.

— Me conte alguma coisa. Algo que ninguém ou

pouca gente sabe.

— Sobre mim?
— Sim... sobre você.

Diana pareceu surpresa, abrindo os lábios rosados,

sem nenhum batom, deixando escapar um murmúrio tão


inocente que eu me sentia um canalha por estar tão

desesperado para devorá-la.

Mesmo assim, pensou um pouco e abriu um sorriso.

— Eu tenho uma tatuagem.

Ergui uma sobrancelha, realmente intrigado.

— Eu nunca a vi.

— Não é em um lugar chamativo. Fiz pouco depois


que meus pais morreram. Como eu ainda não era maior de

idade, fomos morar com uma tia, mas ela não era

exatamente legal. Tive uma fase um pouco rebelde, mas


acabei me ajeitando depois.

— O que é o desenho? — Por que será que a

imagem de Diana tatuada também contribuía para a minha

excitação? Provavelmente tinha a ver com toda a aura de


sedução que nos rondava, mas eu poderia jurar que

qualquer coisa que ela fizesse iria me deixar mais

fascinado ainda.

— Uma cereja. Bem pequena.

Porra, ela realmente queria me matar.

— Alguma explicação para isso?

Diana deu de ombros.

— É bem bobo, mas em frente à casa dos meus

pais tinha uma cerejeira. Eu amava colher as frutas com a

minha mãe e fazer geleia. Ela era doceira. Ainda me

lembro do gosto e do cheiro, da textura de quando a gente


espalhava pelo bolo... — Ela suspirou. — Era uma delícia.

— Não é uma explicação boba. Mas estou curioso

para saber onde fica — minha voz soou um pouco mais

rouca, cheia de desejo.

— Você vai vê-la em breve... Não é? — novamente


o jeitinho inocente.
Daquela vez, não consegui resistir. Coloquei uma

das mãos sob a cadeira na qual ela estava sentada e a


arrastei até mim, fazendo-a sobressaltar-se. Com minha

mão possessiva na sua nuca, puxei-a para um beijo.

Queria que fosse como o anterior, só um contato

para que fosse se acostumando comigo, mas não consegui


resistir. Da primeira vez eu me afastei antes que as coisas

ficassem mais intensas, mas a sensação de seus lábios

macios contra os meus foi muito mais inebriante.

Embolando mechas de cabelo na mão, mergulhei a

língua contra a dela, massageando-a devagar, explorando


todos os contornos de sua boca e as texturas. Diana tinha

gostos variados, misturando a comida, e bebida e algo que

deveria pertencer inteiramente a ela.

Se eu não tivesse tantas coisas em mente, eu


simplesmente a puxaria para o meu colo e começaria a

tocá-la em todas as partes, porque minhas mãos estavam

completamente insaciáveis.
Pensando nisso, antes que me apressasse demais,

afastei-me, deliciando-me com a visão de seus olhos

fechados e de seu peito subindo e descendo, ofegante,

como se tivesse gostado do beijo.

— Você está pronta, Diana? Estou ansioso para


começar a brincar com você.

Ela ficou em silêncio por alguns instantes, mas não

tirei os olhos dela, só quando assentiu, ainda um pouco

insegura, mas supus que fosse normal. O beijo a deixara


corada, arfando, e eu queria fazer muito mais.

Levantei-me da cadeira e peguei uma máscara

daquelas de dormir que deixei próxima a nós. Uma preta,

com alguma renda ao redor e duas fitas que precisavam


ser amarradas atrás da cabeça, e eu esperava que Diana

tivesse seguido as instruções que deixei dentro das caixas

das lingeries que escolhi para ela, informando a ordem de

uso. Era apenas uma brincadeira, uma forma de


demonstrar meu lado mais dominador, mas eu adoraria vê-

la acatando minhas ordens, dando vazão ao meu fetiche.


Coloquei-me atrás dela e dei um nó na venda,

sentindo-a arfar mais uma vez, com mais profundidade.


Levei as mãos aos seus ombros, massageando-os,

primeiro testando.

— Posso tocar em você? — sussurrei, e ela mais

uma vez respondeu com um aceno de cabeça.

Deixei minhas mãos descerem pelo seu colo, até


chegarem aos seios firmes, mas pesados. Ela era cheia de

curvas, e eu queria beijar cada uma delas. Mas naquele

momento rocei as unhas em seus mamilos, e eles

rapidamente se eriçaram. Brinquei mais um pouco, através


do tecido de seu vestido, e a ouvi gemer baixinho.

Então a tirei da cadeira, o que a fez se agarrar em

meus ombros, levemente confusa.

— O que vai fazer? — perguntou, em uma voz muito


baixa.

— Te levar para o quarto. Alguma objeção?


— Não, mas é que eu nunca fui carregada no colo.
Não depois de adulta.

— Acostume-se. É parte da brincadeira...

Diana ficou calada, deixando-se ser levada, e eu

subi as escadas com ela nos braços, abrindo a porta do

quarto, que estava entreaberta, com o pé, fechando-a do


mesmo jeito.

Aquela noite seria bastante longa. Assim eu

esperava.
CAPÍTULO TREZE

Eu sentia meu corpo estremecer pouco depois de

ser deitada na cama. Ergui as mãos para tirar a venda,


mas Nicolas as segurou, e sua voz atingiu um tom de
comando ainda mais profundo:

— Não ouse.

Ok, eu não ousaria.

Esperei algum tempo e ouvi alguns sons de

correntes, o que estranhamente fez o centro do meu corpo


pulsar e o meu estômago se revirar. Eu sabia exatamente o

que ele iria fazer, na teoria, mas na prática as coisas eram

diferentes.
Ou melhor... não fazia ideia de como ele iria usar

aquele tipo de jogo sexual comigo. Como me estimularia.


Será que eu, de fato, sentiria prazer?

Seu próximo passo foi tirar a minha roupa. Por

baixo, escolhi a lingerie da primeira caixa, porque decidi


seguir suas instruções e entrar realmente na brincadeira.

Era um conjunto preto, de renda, com uma liga bem

sensual. O sutiã era tomara que caia, combinando


perfeitamente com o vestido frente única.

— Linda. Vamos deixar você assim, por enquanto.

Nicolas pegou uma das minhas mãos e deu um

beijo nela, erguendo-a. O som de corrente novamente

chegou aos meus ouvidos e algo, aparentemente de couro,

foi fechado ao redor do meu punho. O mesmo foi feito com


o outro. Quando ele encerrou, eu estava com os dois

braços muito esticados, presos ao que deveriam ser

colunas de ferro de uma cama enorme.


Arfei, testando as restrições, percebendo que eu
podia fazer poucos movimentos.

Quando Nicolas prendeu também os meus

tornozelos, deixando-me como um xis na cama, foi que eu

percebi que estava completamente à sua mercê, mas isso

não me assustava, apenas me deixava ansiosa.

Foram alguns instantes de total inércia, onde fiquei

apenas aguardando qual seria o próximo passo, até que


não aguentei. Precisava saber o que estava acontecendo.

— Nicolas? — chamei, com a voz um pouco mais

frágil do que gostaria.

— Calma. Estou observando você. É uma visão e

tanto.

Engoli em seco, imaginando o quão intenso não

deveria estar o seu olhar e o quão vulnerável eu estava,

não apenas por estar presa, mas por estar quase nua. Era

a primeira vez que um homem via meu corpo daquela


forma, embora fosse quase estar de biquíni. Mas a

exposição era completamente diferente.

Senti os dedos de Nicolas passeando por um ponto

muito específico da minha pele, abaixando um dos lados

da minha calcinha e seguindo o contorno do que eu sabia


ser a minha tatuagem. Ela ficava abaixo da minha cintura,
na direção da virilha, no lado direito. Fora uma amiga das

meninas que fizera; uma tatuadora bem talentosa, que me


cobrou super baratinho na época.

— Isto aqui é uma das coisas mais sexies que eu já

vi. Vou te chamar de Cerejinha. Posso?

— S-sim... Pode.

— Ótimo.

Afastando minha calcinha para o lado, senti o dedo


de Nicolas passear pela fenda, despreocupadamente,

movendo-o para cima e para baixo, brincando, sentindo.


Eu não sabia o que esperar. Não fazia ideia do que ele

pretendia, mas meu corpo se retesou inteiro quando senti


aquele mesmo dedo penetrar minha fenda bem fundo.

Girou-o de um lado para o outro, movimentando-o dentro


de mim, como se estivesse testando.

— Quero que me diga qual é o ponto onde sente

mais prazer, ok?

— Ok — respondi em um sussurro, que foi logo


sucedido por um gemido, porque algo que ele fez foi bom
demais. A ponta de seu dedo encontrou algo que me fez

ver estrelas.

— Ah, acho que encontramos.

Aquele era o tal ponto G? Bem, se fosse, eu já

conseguia entender, ao menos um pouco, por que algumas


mulheres falavam sobre ele com tanto entusiasmo.

Nicolas usou e abusou de sua descoberta,

estocando o dedo sem tirá-lo totalmente de dentro de mim,


atingindo aquele ponto em cheio, brincando, deixando-me
gemer conforme ia modificando o ritmo. Logo outro dedo

de outra mão encontrou meu clitóris, massageando-o entre


um polegar e um indicador, e eu me remexi na cama, o
máximo que conseguia, tentando...

Bem, eu não sabia o que estava tentando fazer. Só


que precisava de algo. As restrições tornavam tudo quase

como uma tortura, mas de um jeito incrivelmente bom.


Deixá-lo no total controle do meu corpo era insanamente

erótico e prazeroso.

Nicolas permaneceu usando seus dedos em mim,

até que comecei a estremecer um pouco. Meu corpo inteiro


se contraiu, e eu senti que algo estava por vir.

— Você já teve um orgasmo, Cerejinha?

O apelido soou doce demais, mesmo em seu tom de


voz rouco e pesado de luxúria. Aparentemente tudo o que

estava fazendo comigo também provocava uma reação


nele.

— N-não — mais uma vez minha voz soou mais


trêmula do que o normal, e eu estava tão arfante que me

perguntava se Nicolas conseguiria compreender.


— Bom saber... — ele falou com um jeito
provocador, e eu jurei que conheceria um orgasmo naquele
momento, mas tudo o que senti foi algo muito, muito

gelado entre as minhas pernas.

Parecia... gelo.

Contorci-me na cama, sentindo o choque de

temperaturas. Eu estava pelando, e o objeto pingava

gelado, derramando-se por toda a minha fenda.

— Vamos esfriar as coisas um pouquinho — ao


dizer isso, ele simplesmente abriu o fecho frontal do sutiã,

deixando meus seios expostos, mas não fez nada com eles

O quê? Era sério? Eu não estava entendendo...

Meus sentidos estavam mais aguçados, então ouvi

Nicolas se movimentando pelo quarto e até saindo dele,


deixando-me naquele estado. Comecei a respirar mais

fundo, um pouco confusa, tentando puxar mais uma vez as

restrições, mas era impossível se mexer.


A expectativa era uma arma muito poderosa,

principalmente no sexo, até onde eu podia perceber.

Quase me sobressaltei quando senti a mesma coisa


gelada que me tocara entre as pernas encostar em um dos

meus mamilos, enquanto o outro era literalmente sugado

por uma boca cálida e faminta.

Se quando ele tocou levemente nos meus seios


mais cedo a sensação já foi deliciosa, daquela vez eu

quase pirei. Nunca imaginei que os bicos dos meus seios,

que sempre estiveram ali, pudessem ser tão sensíveis.

Nicolas continuou usando a boca, descendo-a pelo


meu corpo, mas o que eu jurava que era um gelo

continuava se derretendo nos meus mamilos. Os dois,

daquela vez. Eu não fazia ideia do que ele tinha feito,

porque suas mãos também desciam pelo meu corpo, mas


a sensação muito fria permanecia no mesmo lugar.

Então foi quando eu gritei, ao sentir sua boca entre

as minhas pernas, chupando-me com a mesma


intensidade com que devorara meus seios minutos antes.

— Meu Deus, Nicolas! Meu Deus! — Nem sabia se

era justo usar o nome de Deus naquele momento, muito

menos com o tipo de coisa que estávamos fazendo e com


a minha voz soando como gemidos desesperados.

Eu ia explodir. Cacos de Diana se espalhariam pelo

quarto se aquele homem não parasse de fazer o que

estava fazendo. Ao mesmo tempo eu o mataria se parasse.

Não demorou muito para que a sensação anterior

retornasse. O pré-orgasmo. Algo que convulsionava dentro


de mim, anunciando a colisão.

Só que tive o mesmo tratamento de antes: senti o

gelo resfriar o calor que emanava do meu corpo, esfriando


tudo.

— O que você está fazendo? — soltei, mais

desesperada do que queria.

— Você não vai gozar esta noite, Cerejinha.


— Como não? Não vamos fazer sexo?

— Não esta noite. Vou te preparar o suficiente para

você praticamente implorar e para que quando eu entrar


em você, esteja tão desesperada por isso que vá te

machucar o mínimo.

Senti Nicolas pairando acima de mim e sua boca

tomou a minha em um beijo. Sua língua me invadiu como


na vez anterior, e ele ofegava, respirando profundamente,

parecendo tão desesperado de desejo quanto eu.

Ele beijava bem, e eu sentia o meu gosto em sua

boca. Era incrivelmente afrodisíaco.

Durante o beijo, senti novamente seu dedo me


penetrando e estocando naquele ponto que Nicolas já tinha

aprendido que era o que me fazia enlouquecer.

— Você vai continuar? — perguntei, e assim que

consegui terminar de formular a pergunta, mais uma


investida me fez gemer alto.
— Claro. Temos algumas horas pela frente ainda.

Meu Deus... Horas?

Era uma tortura.

Mas a mais deliciosa que eu já tinha provado.


CAPÍTULO QUATORZE

Acordei na minha própria cama – se é que eu

poderia chamar assim, sendo que aquela casa não era


minha –, sem nem saber como tinha ido parar lá. Em
algum momento, depois que Nicolas se deu por satisfeito

de toda a tortura, acabei adormecendo, mas não em seus


braços. Apenas apaguei sobre a cama, depois de ele me

soltar, exausta e com o centro do meu corpo latejando.

Mesmo cansada, eu só queria mais. Queria um alivio que


eu desconhecia.

A cama era extremamente confortável, então eu me

concedi mais alguns instantes deitada, alongando-me,


sentindo aquele cheiro perfeito da praia do lado de fora da
janela, que foi o que me fez levantar. Havia uma sacada no

meu quarto, e eu fiz questão de ir até ela e dar uma olhada


na vista incrível que me fora proporcionada.

Esperava me contentar com o mar e com o céu azul,

a areia e a ideia de passar um dia delicioso ali, mas o


homem sem camisa, usando apenas uma bermuda, que

corria pela areia, exercitando-se, também não era nada

mal de se olhar.

No dia anterior, por causa da venda e de todo o


resto, não tive oportunidade de apreciar o corpo de Nicolas

como ele merecia ser apreciado. Apesar de muito alto e de

ombros largos, ele não fazia o tipo exagerado. Era

musculoso, sarado, com barriga cheia de gominhos, mas


tudo na medida certa. Poderia ser confundido com um

atleta sexy, embora ficasse tão bem daquele jeito quanto

com um terno bem-cortado.

Se levasse em consideração o tipo de coisa que ele

era capaz de fazer na cama, eu poderia jurar que qualquer

mulher que o tivesse consigo seria muito, muito bem-


servida. Um dia alguém não apenas lhe despertaria desejo,
mas também conquistaria seu coração. E, com certeza,

essa pessoa não seria eu.

Mas nem era o que eu queria. Precisávamos um do

outro e tudo o que restaria seria uma experiência

prazerosa para os dois. Meu irmão a salvo para mim; um

bebê para ele. Todos sairiam felizes.

Entrei no chuveiro com a água bem gelada,


tentando acalmar meu corpo com as lembranças do dia

anterior. Eu poderia me masturbar, para aliviar meu desejo,

mas queria aproveitar a experiência que Nicolas estava me

proporcionando por completo. Se ele dissera que tudo

aquilo teria boas consequências para mim na minha

primeira vez, precisava acreditar. Ele era o cara com


experiência no assunto.

Vesti um biquíni, nem me importei com uma saída

de praia e desci. Havia uma mesa posta, com algumas

coisas que eu poderia comer, mas fui direto à praia,


ansiosa para saber como nos comportaríamos dali em

diante, depois da noite que passamos.

Mas Nicolas me surpreendeu ao ir parando de correr

aos poucos, assim que me viu, contemplando-me de cima

a baixo, com aquela olhada intensa que me deixava de


pernas bambas. Foi impossível não sentir meu corpo
responder da forma mais visceral possível, especialmente

quando se colocou à minha frente, sem dizer nada,


pegando-me pela nuca e me puxando para um beijo.

Logo sua outra mão foi parar na minha cintura,

apertando-me como se não conseguisse se conter de


forma alguma. O toque era possessivo, dominador, e eu
me sentia completamente rendida. Como era possível? Em

uma única noite, Nicolas me transformara completamente,


como se eu fosse uma massinha modelável, e ele

estivesse manipulando a minha forma. Com mais alguns


dias, ao fim daquela semana eu seria uma completa

devassa.
— Bom dia, Cerejinha. Como passou a noite? — Por

que diabos tudo o que ele falava parecia soar sexy e


malicioso?

— Bem. Dormi como um anjo.

— Fico feliz em saber. Estou com calor, o que acha

de um banho de mar agora de manhã e depois vamos dar


um passeio de lancha.

— Parece ótimo — respondi, ainda me sentindo um


pouco desconcertada com a forma como as coisas

estavam mudando entre nós. Ainda me sentia com um pé


atrás, um pouco relutante, mas Nicolas estava se

empenhando.

Surpreendendo-me como tinha feito na noite

anterior, pegou-me no colo, arrancando um gritinho de


surpresa da minha garganta, e me levou para o mar.

Claro que sua intenção não era apenas que eu


tomasse banho, porque me beijou, beijou e beijou, fazendo

sua mão passear por todo o meu corpo, inclusive dentro do


meu biquíni, estimulando e me deixando cada vez mais
sensível.

Ainda não me deixou gozar. Aquele filho da mãe...

Almoçamos na casa, uma salada leve e saborosa,


bem temperada, e saímos na lancha, mas eu nem sabia

qual era nosso destino.

Mais uma vez precisei apreciar o homem ao meu


lado, com os cabelos claros ao vento, pilotando como um
profissional. Daquela vez estava sem camisa, e a forma

como ele simplesmente parecia amar o mar me deixou


curiosa.

— Quando aprendeu a pilotar assim? — indaguei,


querendo saber mais sobre ele. Trabalhávamos juntos há

algum tempo, mas pouco sabia de sua vida pessoal, além


do óbvio.

— Foi logo depois que fiquei viúvo. Precisei


encontrar um hobby. Comprei esta ilha e ela passou a ser
meu refúgio por algum tempo. Em quase todos os finais de
semana e feriados eu vinha para cá.

Fiquei me perguntando se seria muito estranho


perguntar para ele sobre a falecida esposa e o filho, mas

se não perguntasse, não seria muito insensível da minha


parte?

Para a minha sorte, foi Nicolas quem mudou de

assunto, apontando para um ponto de terra logo à nossa


frente.

— Ali. Aquele é o nosso destino.

Levei uma das mãos ao rosto, cobrindo os olhos

para enxergar, mas não consegui ver muito. Conforme nos

fomos aproximando, percebi que se tratava também de


uma ilha particular, menos chique do que a dele.

Fomos recebidos por um casal de meia-idade, e a

mulher abraçou Nicolas, dando-lhe dois beijinhos no rosto.

Claramente era uma senhora mais humilde, e eu olhei ao


redor, vendo algumas crianças e outras pessoas, todas
muito parecidas, com descendência indígena. A mulher

passou o braço pela minha cintura, puxando-me e


elogiando a minha beleza. Dei uma olhada de soslaio para

Nicolas, tentando entender o que ele tinha falado para

aquela gente e qual era a ligação deles com aquele


homem tão poderoso.

Fomos levados a uma área montada em um enorme

quintal, me apresentaram a todos, e eu fui ficando cada

vez mais curiosa, até o primeiro momento em que fui


deixada sozinha com Nicolas, aproveitando para perguntar:

— Quem são essas pessoas?

— Dora e Pedro são as pessoas que olham a casa

para mim quando estou fora. Me foram recomendados pelo

antigo dono. Ela deixou as comidas preparadas, e eu

posso garantir que o que faz, fresco, é muito melhor.


Foram companhias maravilhosas quando precisei e eu os

considero meus amigos. O Homem de Ferro não tem

muitos, mas os que tenho, guardo como preciosidades.


Olhei ao redor, e eu podia perceber que eram

pessoas que tinham muito amor para dar. Uma das

crianças veio correndo, e eu vi Nicolas pegar o menino no


colo, começando a conversar e perguntar da escola.

Deveria ter uns seis, sete anos, com um cabelinho tão liso

e caindo nos olhos que mais parecia que tinham usado

uma tigela para fazerem o molde.

Também conseguia perceber que Nicolas não era


exatamente terno ou brincalhão, mas tratava o menino com

o máximo de carinho que conseguia demonstrar,

chamando-o de Nuno, enquanto era chamado de “tio”.


Sorri diante da cena, e eu também fui apresentada à

criança como uma amiga.

Isso me decepcionou um pouco, mas o que eu

estava esperando? Ser chamada de namorada? Nós não

éramos nada disso. Teríamos uma semana muito caliente


naquela ilha, pelo que eu já podia ver, mas nada mais do

que isso. Depois haveria um bebê na história, mas cada

um seguiria sua vida.


Quando o pequeno Nuno saiu do colo de Nicolas,

correndo para perto das outras crianças, continuei


colocando minha curiosidade para fora:

— Por que me trouxe aqui?

Com as mãos na cintura, Nicolas observava a

turminha animada, com um sorriso de canto, os olhos

brilhando. Ele seria, de fato, um ótimo pai – um


pensamento que não deixou de passar pela minha cabeça.

Assim que fiz a pergunta, ele voltou os olhos verdes

para mim.

— Porque são pessoas especiais para mim. Queria

que os conhecesse. — Simples, como se fosse muito


óbvio.

Então Nicolas se afastou, aproximando-se de Pedro,

e me deixou alguns instantes sozinha e cheia de dúvidas.

Por que ele queria que eu os conhecesse?

Seria eu, também, especial de alguma forma?


Ainda o estava observando quando senti uma mão

no meu ombro. Virei-me para a pessoa e vi Dora, com um

enorme sorriso no rosto. Seus olhos pequenos, de índia,

estavam apertadinhos, criando rugas ao lado dos olhos. Os


cabelos lisos e com fios braços, deviam ter sido muito

negros um dia. Ela era muito bonita.

— O garoto finge que tem um coração de pedra,

mas ele tem muito amor naquele corpanzil bonito — ela


falou baixinho, de um jeito divertido.

— Nicolas? — precisei confirmar, embora a

descrição não fosse assim tão difícil de associar.

— Sim. Ajuda demais a nossa família. Ele deu um

barco de presente pro Pedro quando o dele quebrou.


Ficamos desesperados, porque a pescaria é o nosso maior

sustento. Mandamos muita coisa para Angra e as cidades

vizinhas.

Não consegui não voltar novamente o olhar para o


homem mencionado. Nunca duvidei que ele era melhor do
que demonstrava, mas imaginava que havia muitas

camadas, muitas nuances que eu desconhecia. E


provavelmente a maioria das pessoas também.

— Você é a primeira mulher que ele traz aqui. Vai

parecer um clichê daqueles de filmes, mas é a verdade.

Ele sofreu com a morte da esposa e do filho mais ainda, se


acha culpado.

— Somos só amigos.

Ela riu, como se soubesse de um milhão de coisas

que eu não sabia.

— Não olho para os meus amigos do jeito como

vocês se olham. Espero que descubram logo e não percam


tempo.

A mulher se afastou de mim, deixando aquele ar

misterioso, de sabedoria quase maternal.

Ela não podia estar certa. Eu e Nicolas, para ser

sincera, não éramos nem amigos. Nossa relação era uma


parceria estritamente profissional.

Eu não podia e nem queria me iludir. Senão poderia

acabar com um coração partido.


CAPÍTULO QUINZE

Nicolas estabeleceu uma espécie de rotina para os

nossos dias: de manhã fazíamos passeios de lancha, e ele


me mostrava tudo o que havia de bonito nos arredores de
onde estávamos. E eram muitas, muitas coisas. À noite,

nós nos perdíamos no quarto, como na primeira vez.

Foram três noites assim. Jantávamos, conversando

e nos conhecendo melhor, e eu acabava em sua cama,

vendada, com punhos e tornozelos presos, totalmente à


sua mercê. Lá, ele fazia o diabo comigo. Cada dia algo

diferente. Cada dia ele parecia aprender um jeito novo de

me tocar e torturar.
Nunca me deixava gozar, o que era frustrante e

excitante ao mesmo tempo. Meus pensamentos estavam


completamente voltados para aquilo, mal conseguia dormir

de tanta expectativa. Só que eu tinha a impressão de que

Nicolas também estava ficando cada vez mais


desesperado. Uma vez eu o ouvi, em seu banheiro,

grunhindo e gemendo, provavelmente se masturbando.

Havia algo de muito excitante em ouvi-lo se tocar,


com a água caindo, enquanto pensava em mim. Isso só

contribuiu para aumentar meu desejo.

Era nosso quinto dia na ilha, e lá fomos nós, para

nosso passeio de lancha. Normalmente, quando isso

acontecia, Nicolas sempre parecia brincalhão, leve, porque


navegar era algo que gostava muito de fazer. Sorria mais,

conversávamos muito, e eu ia conhecendo o homem por

trás da lenda do Homem de Ferro que criaram na empresa.

Passara a me chamar de Cerejinha constantemente, e eu

comecei a me apegar ao apelido.


Naquela manhã, porém, ele parecia sério demais,
calado demais. Fiquei um pouco preocupada, mas também

conseguia sentir uma energia de tensão sexual muito forte.

Na noite passada, ele parecera mais ofegante ao me tocar,

mais desesperado ao me beijar. Suas mãos vieram mais

ávidas ao me tocar, e eu senti que algo estava diferente.

Surpreendi-me, porém, quando ele parou a lancha

em alto mar, no meio do nada. Só havia água ao nosso


redor, alguns resquícios de terra ao longe, mas

conseguíamos ver bem pouco delas.

Eu sempre ficava sentada do seu lado, observando-

o e curtindo o trajeto, conversando, mas estava parada,

calada e dançando conforme a música. Cheguei a me

sobressaltar quando Nicolas parou na minha frente,


arrancando os óculos escuros que cobriam seus olhos,

jogando-os de qualquer jeito no chão e vindo até mim,

agarrando meu braço e me colocando de pé. Jurei que

tinha feito algo de errado, mas quando ele simplesmente

me beijou, da forma mais animalesca possível, entendi que

ele não estava puto. Estava cheio de tesão.


Com um braço ao redor da minha cintura, ele

literalmente me tirou do chão e me levou até a parte


coberta da lancha, onde havia uma pequena sala de estar

– se é que poderia ser chamado assim. Posicionou-me em


um ponto específico, fazendo tudo sério demais,
arrancando minha saída de praia e o biquíni, com puxões

violentos. Ele estava ofegante, em sua melhor forma de


dominador.

Tirou algo metálico dos bolsos da calça, e eu vi que

se tratava de um par de algemas. Havia uma barra de ferro


logo acima da minha cabeça, algo que fazia parte da

lancha mesmo, e ele obviamente pretendia usá-la para me


torturar um pouco mais.

Comecei a ficar em alta expectativa, enquanto


Nicolas prendia meus braços esticados para cima, então se

afastou um pouco, pegando mais alguns apetrechos, que


ele usou para prender meus tornozelos em dois ganchos

da parede. Eu não fazia ideia do motivo da existência deles


ali, mas me perguntava com quantas mulheres já tinha
usado aquela lancha para fazer aquele tipo de coisa.
Péssimo momento para pensar em algo assim.

Daquela vez ele não me vendou, mas eu percebia

que as coisas seriam diferentes, porque eu me sentia mais


vulnerável estando de pé, sem conseguir me mexer,

totalmente nua.

Nicolas pegou mais uma coisa no bolso e prendeu-a


nos meus mamilos. Foi um pouco doloroso no início, mas
nada insuportável. Rapidamente compreendi qual era o

papel daquele pequeno artefato, quando senti meus meios


ficando mais e mais sensíveis.

— Sem vendas hoje? — questionei, já ofegante.

— Hoje quero que veja tudo que vou fazer com


você.

Ok, eu iria ver, então.

Nicolas agachou-se e começou a beijar as partes

expostas do meu corpo. Passou as mãos suavemente


pelos seios, bem próximo à parte dos bicos que estavam
presos, e eu gemi bem alto. Agarrou a carne da minha
bunda, com força, encostando-se em mim, deixando-me
perceber sua ereção já evidente por trás do tecido da

calça.

— Maldita seja você, garota linda. Olha como me


deixa? Por que estou tão louco, como nunca estive antes?

— Nicolas falava por entre os dentes, parecendo com


raiva.

Então levou a mão entre minhas pernas e começou


a me masturbar com dois dedos, com força, como se

quisesse me punir, mas de uma forma que só me excitava


ainda mais, enquanto me deliciava com um beijo perfeito,

lento e sensual.

Meu Deus, eu ainda era virgem e já tinha


experimentado tantas formas diferentes e inusitadas de
receber prazer. Como era possível?

Agarrando meus dedos às correntes da algema,


tentei me manter firme em alguma coisa, porque minhas
pernas, bem abertas, começavam a falhar. Mais ainda
quando Nicolas se agachou, levando a boca à minha
intimidade e me chupando daquele jeito que eu poderia

jurar que só ele era capaz de fazer.

Nicolas parecia um pouco fora de controle. Para um


homem que era sempre comedido e sempre estava em

domínio de cada uma das suas ações, era estranho vê-lo

tão selvagem.

Ele subiu a boca por todo o meu corpo e retornou à

minha boceta, com ainda mais voracidade. Eu podia jurar

que meus gemidos podiam ser ouvidos em todas as ilhas

ao redor. Mais ainda quando Nicolas soltou meus pés,


ajoelhou-se e apoiou minhas pernas em seus ombros

largos, mantendo-me suspensa, voltando a fazer um sexo

oral desesperador, que foi me fazendo sentir o desejo se


avolumando e o orgasmo chegando. Depois de tantas

noites sendo docemente torturada, jurei que ele pararia e

me deixaria na vontade, mas não foi o que aconteceu. Ele

me permitiu gozar.
E eu poderia dizer que meu primeiro orgasmo

simplesmente me levou à loucura. Eu gritei tão alto e senti


meu corpo convulsionar que se não estivesse presa e se

Nicolas não estivesse me segurando, eu teria tombado

para trás. O alívio foi tão intenso que eu poderia ter perdido
a consciência ali. Mas não foi o que aconteceu. Eu estava

completamente lúcida, entendendo-me e conhecendo-me,

pela primeira vez.

Nicolas me colocou no chão gentilmente,


levantando-se, e eu olhei para ele:

— Quero fazer o mesmo com você... — pedi, quase

suplicante, porque não era justo que eu experimentasse

aquela sensação, e Nicolas ficasse na vontade.

Sem dizer nada, ele soltou um dos meus punhos,

voltando a prendê-lo, mas me deixando com as mãos


algemadas nas costas.

— Então se ajoelhe — comandou, e eu fiz o que

mandou.
Nicolas tirou a calça, e eu levei a boca ao seu

membro, ereto. Eu não sabia muito o que fazer, na

verdade, mas acreditei que fosse algo instintivo. Chupei-o


e o lambi, tentando imitar alguns de seus movimentos em

mim, embora fossem completamente diferentes.

O primeiro gemido, masculino e gutural, que ele

soltou me incentivou mais ainda.

Levei-o inteiro na boca, devorando-o, deliciando-me,

e jurei que Nicolas ia gozar; já estava até me preparando


para isso, mas ele agarrou meus braços e me colocou de

pé, sentando-me no banco, vestindo sua calça e indo de

volta para o convés.

O que estava acontecendo? O que eu tinha feito de


errado? Por que estávamos voltando para a ilha?

Quando atracamos, ele deixou a lancha no lugar de

sempre e voltou para mim, jogando um cobertor sobre o

meu corpo nu e abrindo as algemas. Pegou-me no colo e


começou a me carregar. Eu não compreendia

absolutamente nada, mas deixei que continuássemos.

Passamos pelo píer e fomos para casa. Subimos as


escadas, e ele partiu para o seu quarto, deitando-me na

cama. Abriu o cobertor e começou a tirar a própria roupa,

arrancando a camisa, jogando-a longe, e abaixando-se


para me beijar.

Por entre os beijos, sussurrou:

— Eu queria esperar mais, Cerejinha, mas você está

acabando comigo.

— Eu também quero... — falei arfante, sentindo sua

boca passear por meu pescoço, meu colo, meus seios, e


vários outros pedaços de pele.

Senti a ponta de seu pau na minha entrada, e me

preparei. Eu estava tão, mas tão molhada, que ele deslizou

facilmente, até o ponto que eu comecei a sentir dor.

— Posso parar se você quiser...


— Não! — exclamei. — Não pare... não pare...

Então ele não parou. Nicolas soltou um grunhido e

fechou os olhos bem apertados quando eu me contraí um

pouco de dor. Rapidamente entendi que aquele meu

movimento era prazeroso para ele, o que eu pretendia


repetir.

A dor durou algum tempo, foi intensa, mas o que

veio depois compensou tudo. Eu sabia que toda a

preparação à qual Nicolas me submeteu era responsável


por tudo parecer mais fácil e incrível.

Sim, a minha primeira vez estava sendo incrível.

Com um homem incrível. Era só o que eu conseguia

pensar.

Ele estocou devagar e teve o cuidado de me olhar


nos olhos enquanto fazia isso, preocupado com minhas

expressões. Fiz algumas caretas, porque alguns

movimentos ainda eram dolorosos, mas aos poucos fui me


acostumando.
Cada vez mais. Até mesmo quando Nicolas investiu

com mais força.

Até mesmo quando ele gozou. Dentro de mim.

Por um momento tive um pouco de medo disso, mas


depois lembrei que a intenção daquele acordo era, de fato,

me engravidar. Então relaxei e aproveitei a situação.

— Nem sempre acontece na primeira vez... Prometo

compensar em... — Nicolas começou a falar, mas levei um


dedo em sua boca.

— Eu gozei antes. E foi maravilhoso.

Nicolas sorriu, encantador.

— Foi para mim também. Não pretendo parar em

uma única vez nesta noite.

Nem eu...

Então nós assistimos o anoitecer da janela enquanto

Nicolas me ensinava várias formas diferentes de fazer


sexo. E em nenhuma delas usou seus fetiches comigo.
Aquela noite, eu quase senti que fizemos amor.

Quase.
CAPÍTULO DEZESSEIS

Não era para ser daquela forma. E eu costumava

gostar de coisas que caminhavam dentro do planejado.

Não era para olhar nos olhos inocentes de Diana


enquanto a possuía. Não era para ter me sentido tão

envolvido na forma como se rendeu a mim, como se


entregou, muito menos para tirar sua virgindade naquele

momento. Deveria ser a última coisa de todo o passeio, de

toda aquela nossa jornada. Eu a estava preparando,


ajudando-a a conhecer seus próprios gostos, e isso era tão

delicioso quanto fazer uma mulher gozar.

Só que eu não esperava ficar tão desesperado por


ela. Normalmente tinha um enorme controle sobre meus
próprios desejos, mas, daquela vez, tudo foi por água

abaixo. Quando a vi, ajoelhada aos meus pés, tão decidida


a também me dar prazer, foi minha ruína.

E naquele momento, ela dormia nos meus braços.

Voltei meus olhos para ela e senti algo remexer meu


coração, quase o apertando no peito. Diana respirava

serena, com os lábios entreabertos. Os cabelos castanhos

e ondulados estavam espalhados sobre o meu braço, e

eles cheiravam a xampu e um pouco a mar também, já que


estávamos indo à praia todos os dias. Havia uma marca

sensual de biquíni em seus ombros, e um dos seios estava

exposto, o que fazia meu corpo reagir novamente.

Precisava me afastar um pouco antes que as coisas

se tornassem mais trágicas. Não era prudente desenvolver


algum tipo de ternura pela mulher que geraria o meu filho.

Se isso acontecesse, eu poderia fraquejar e permitir que

tivesse algum contato com a criança, e esta não era a ideia

inicial. Não fora para isso que assinamos um contrato.


Talvez fosse tarde demais, não é? Seduzi-la e ir
para a cama com esta mesma mulher fora uma escolha

minha, e eu deveria ter imaginado que seria errado. Só que

a tentação foi grande demais.

Pensando em me preservar, delicadamente tirei-a

de cima de mim e a ajeitei na cama, esforçando-me para

não acordá-la. Então me levantei, vesti a calça que estava

jogada no chão e desci.

Parti direto para a varanda da casa, sentando-me no

sofá de vime e contemplando a noite à minha frente, além

do mar. Sempre gostei da quietude que as ondas

proporcionavam, como se o som que faziam funcionasse

como uma canção de ninar.

Fechei os olhos, respirando profundamente,


concentrando-me em não pensar em Diana.

Só que exatamente esse esforço para não pensar


nela foi o que começou a prendê-la na minha cabeça.
Havia muitas coisas nela que me deixavam

encantado e fascinado. A forma como sorria, o som de sua


risada e a força que demonstrava, principalmente quando

tinha a ver com o irmão. Era o tipo de mulher que, um dia,


um homem de muita sorte teria a oportunidade de chamá-
la de sua.

Remexendo-me na cadeira, enquanto pensava em

Diana com outro cara, uma onda de ciúme se instalou bem


no meu estômago como um soco.

Eu fui seu primeiro homem. O primeiro que a

ensinou o que era prazer. O primeiro que a fez gritar,


gemer e gozar. O primeiro que a tocou mais intimamente.
Isso ninguém ia me tirar. Mas de que adiantava se não

seria o último? Ou... ao menos... se não pudesse fazê-lo


mais vezes, por quanto tempo fosse bom e conveniente

para nós dois?

Para... sempre?

Ah, merda! No que diabos eu estava pensando?


Continuei tentando afastar os pensamentos, mas

logo ouvi o som de passos e vi a forma delicada de Diana


vindo em minha direção. Tinha vestido uma das minhas

camisas, que parecia enorme em seu corpo pequeno, e


isso também me proporcionou uma sensação de posse.

Como se aquele pequeno detalhe fosse suficiente para


marcá-la como minha.

O que era ridículo.

— Sei que você deve estar querendo um momento


sozinho, e eu juro que não vou atrapalhar, só queria saber

se está tudo bem. Se aconteceu alguma coisa... — falou


com sua voz doce e gentil.

Por que ela não podia simplesmente se mostrar


insuportável e pegajosa? Ou fazer uma grosseria? Seria

tão mais simples. Mas, não, a mulher era um poço de


doçura.

— Está tudo bem, sim — respondi mais sério do que


deveria, e ela percebeu, com certeza acreditando que era
algo com ela.

E não estava errada. De fato, ela era o problema.

Mas de uma forma completamente diferente.

— Ah, que bom. Então vou para o meu quarto. Boa


noite. Até amanhã...

Diana já ia se afastando, e eu comecei a sentir um

desejo absurdo de ter sua companhia. Deveria me


controlar, mas simplesmente não conseguia.

— Diana? — chamei, e ela parou, girando o corpo,


olhando para mim. — Fique.

Aquilo pareceu deixá-la surpresa ao ponto de


continuar olhando para mim, parada, confusa. Então

assentiu e voltou, aproximando-se, preparando-se para


sentar próxima, mas não perto demais. O que era uma boa

escolha, sem dúvidas, para nós dois. Mas, mais uma vez,
agi contra minha razão, pegando sua mão e fazendo-a cair
no meu colo.
Diana arfou, pela ação inesperada, mas logo
relaxou, e eu a encostei no meu peito, enquanto nós dois
observávamos o mar à nossa frente.

— Eu deveria odiar o mar, sabe? — desabafei,

como não tinha feito com nenhuma pessoa até aquele


momento. — O carro onde meu filho estava caiu de um

desfiladeiro direto na água. Eu teria pulado atrás dele, para

tentar salvá-lo, mas me seguraram. Havia pessoas


passando na hora.

— Ainda bem que fizeram isso, porque você teria

morrido e não conseguiria salvá-los. — Ela colocou a frase

no plural. Obviamente eu queria ter salvado Taís também.

Porra, eu daria tudo por isso, mas se tivesse que ser


uma escolha, que Deus me perdoasse, porque eu

escolheria Júnior.

— Sei que não. — Suspirei, cansado, pensando em

quantas vezes já tinha pensado naquela situação.


— Ainda sente muito a falta dela? Desculpa

perguntar, é que...

— Não tem problema. A verdade é que eu queria


muito que ela estivesse viva, mas não sei se o casamento

teria durado até hoje. Nunca foi um casamento feliz. Eu a

amava, mas não era exatamente correspondido.

— Não?

— Não. Taís sentia atração por mim, engravidou e


eu lhe propus casamento. O acordo era conveniente para

ela, porque sou rico. Só que enjoou rápido. Me senti

descartável muito rápido. Minha própria esposa não era


apaixonada por mim.

— Então ela era louca... — Fixei meus olhos em

Diana, que rapidamente se constrangeu com sua própria

resposta, abaixando a cabeça.

Coloquei a mão sob seu queixo, erguendo-o e


fazendo-a olhar para mim também. Só que eu não sabia o

que poderia dizer.


Ela mordeu o lábio inferior, e eu não consegui não

focar em sua boca, muito menos imitá-la e mordê-la

também, com delicadeza, o que nos levou a um beijo.


Nada demorado ou aprofundado, eu só precisava daquele

contato. Precisava senti-la.

— Tem falado com o seu irmão? — perguntei,

ajeitando-a no meu colo depois do beijo. — Ele está bem lá

em casa?

O sorriso que Diana abriu poderia cativar o mundo


inteiro.

— Mais do que bem. Acho que o estão mimando de

mais. Mas ele é um garoto ótimo. Nunca tive oportunidade

de lhe dar tudo o que merece, então fico feliz que esteja
recebendo um pouco de conforto.

Aquilo se revirou mais uma vez dentro de mim. A

forma como ela falava do irmão me dava a entender que

seria uma ótima mãe um dia. Não era a primeira vez que
eu tinha tal percepção, mas a cada vez que a ouvia falando

do irmão, isso aumentava.

Eu quase podia vê-la segurando o meu bebê e me


ajudando a cuidar dele.

Só que era ridículo. Era uma menina de vinte e dois

anos. Estava aceitando engravidar como barriga de aluguel

porque era leal e capaz de tudo por quem amava. Não iria
perder sua juventude topando criar um bebê. O que eu

precisava era resolver a questão da inseminação, abrigá-

la, protegê-la e...

Merda! Como seria quando a visse grávida? Quando


sentisse meu bebê crescendo dentro dela? Foi a decisão

mais impulsiva da minha vida. Eu deveria ter pensado

melhor e escolhido uma mulher aleatória e desconhecida.

Ao menos não deveria ter me envolvido sexualmente e


muito menos emocionalmente. Só que era tarde, e eu não

podia mais negligenciar.


Diana começou a falar um pouco do irmão, me

contando coisas sobre ele e seus falecidos pais. A

conversa foi evoluindo, e ela era natural. Toda a tensão

que houvera no início, de quando começamos aquele


acordo tão estranho, foi dissipada, e nós parecíamos um

pouco mais íntimos. O sexo ajudava nisso, sem dúvida,

mas eu também passei a conhecer mais a mulher por trás


do corpo que me atraía.

E sua alma passou a me atrair também.

Ficamos horas conversando, até que nos calamos

por um tempo, e ela adormeceu no meu colo. Seus olhos já

estavam pesados há algum tempo, e eu soube, desde o


início que era uma questão de tempo até que pegasse no

sono.

Suspirei, observando-a e novamente me

maravilhando com o quanto parecia doce, vulnerável e

linda. Afastei uma mecha de cabelo de seus olhos, com


cuidado, e ela nem se mexeu.
Poderia acordá-la, para irmos nos deitar, mas só me

levantei com ela nos braços e a levei daquele jeito para


seu quarto.

Deixando-a na cama, ainda usando a minha camisa,

eu a cobri, dando mais uma observada no rosto sereno e

voltei para o meu quarto. Não consegui não perceber a


mancha de sangue sobre o lençol branco, evidenciando a

inocência da mulher que, de certa forma, era minha, mas

só até aqueles dias terminarem.

Arranquei o lençol da cama, sentindo-me frustrado

pelos meus pensamentos, e o joguei no chão, decidindo


dormir na cama nua. Era o que me restava. Ou eu poderia

ir dormir com Diana.

Essa opção se tornou muito atraente. Atraente

demais. E isso era perigoso, portanto decidi que não era


uma boa. Eu já estava cometendo muitos erros. Não era

hora de cometer mais um e acabarmos os dois

machucados quando a realidade batesse à nossa porta.


CAPÍTULO DEZESSETE

Nossos últimos momentos naquela ilha passaram

rápido demais. Tão rápido que no momento em que


entramos naquela lancha, para encontrarmos o motorista
que nos levaria de volta ao Rio, eu quase implorei a

Nicolas para que ficássemos mais um pouco. Era como se


eu não conseguisse segurar o suficiente dos momentos

para guardá-los na minha memória. Como se eu tivesse

deixado passar alguma coisa, e isso fosse inconcebível.

Nicolas também se mostrava um pouco estranho.

Calado, sério, como se tivéssemos voltado à estaca zero e

todos os dias de carinho e descontração tivessem ficado


para trás.
Dora e Pedro vieram se despedir de nós, e eu

abracei cada um deles com ternura, mesmo sem conhecê-


los tão bem, porque sabia que eram boas pessoas.

Já estávamos no carro, no banco de trás, quando

Nicolas finalmente se manifestou:

— Vamos para a minha casa, tudo bem? Seu irmão

está lá e acho que temos algumas coisas para resolver

daqui em diante.

Assenti, tentando controlar minha vontade de chorar.

Seria daquele jeito, então. O amante apaixonado e


terno daria lugar de volta ao famoso Homem de Ferro, e

tudo o que vivemos fora uma ilusão.

Mas o que eu esperava também? Nicolas

conseguira o que queria. Tirara minha virgindade para que

eu pudesse ser inseminada com seu filho. Soube, desde o

início, que seria assim. O que eu esperava? Que me


pedisse em casamento? Talvez eu fosse mesmo muito

ingênua.
Partimos, então, para a sua mansão, e eu dei um
abraço enorme em João, que também parecia estar

morrendo de saudade. Almoçamos todos juntos, e meu

garoto não parava de falar de todas as coisas legais que

fez em sua estadia na casa de Nicolas.

Este, por sua vez, lidava muito bem com meu irmão,

rindo e se interessando pelo que falava, tratando-o como

um adulto. Era mais uma prova de que era bom com


crianças, embora não fizesse o tipo “tio fofo”.

Aliás, precisei segurar uma risada ao pensar nesse

termo, e os dois olharam para mim, confusos, embora eu

não tivesse explicado.

Fomos levados para nossa casa naquela tarde, para

descansarmos e pegarmos nossas coisas, mas um dos


seguranças nos acompanhou. As coisas estavam

tranquilas, aparentemente, e Nicolas prometeu que se

certificaria de ficar de olho em Leonardo, mas eu ainda

sentia medo. Especialmente se ele descobrisse a

quantidade de dinheiro que eu iria ganhar em breve.


De acordo com Nicolas, ele daria metade do valor –

que seriam os dois milhões, já que ele não descontaria o


dinheiro gasto para resgatar João – assim que eu fosse

inseminada e tudo desse certo, e o resto, assim que


tivesse o bebê nos braços.

Minha ideia era sair do Rio. Ir para o mais longe


possível, recomeçar, abrir um negócio, talvez... investir. Se

eu pudesse escapar de Leonardo já seria uma bênção,


mas provavelmente minha fuga tinha um motivo maior:

Nicolas e o bebê.

Como não pensar naquele serzinho como sendo


meu também, se lhe daria morada por nove meses? Não
importava que o óvulo seria de outra mulher. Ele seria uma

parte de mim. Só que eu não poderia tê-lo. Foi o que


assinei em um contrato.

Nicolas também prometeu que me arrumaria um

emprego, não prometeu? Passaríamos alguns meses


morando juntos, então, naquele espaço de tempo eu o
sugaria ao máximo para que me ajudasse a pensar em
algo que eu pudesse desenvolver, com o dinheiro que

ganharia, e que se tornasse uma profissão. Esperava que


ele me ajudasse.

Falando em trabalho, conforme o prometido, ele

conseguiu que um de seus amigos, que tinha uma agência


de publicidade enorme me contratasse como freelancer
para alimentar as mídias sociais deles. Não era um

trabalho difícil, e era muito interessante, porque eu tinha


total controle sob o blog da marca, e eles me deram

liberdade para falar de assuntos que eu quisesse, não


apenas dentro da publicidade, mas até mesmo de

acontecimentos gerais, como um pequeno jornal


informativo, e eu adorei a tentativa de ser jornalista.

Enquanto isso, eu e Nicolas íamos nos acertando a


respeito da inseminação. Pesquisamos juntos a clínica

onde seria feita, conversamos com a responsável que iria


nos auxiliar o tempo todo, e ela nos aconselhou que eu

fizesse alguns exames.


Apesar de tudo, Nicolas foi um bom parceiro nessa
fase, acompanhando-me em tudo, participando e se
informando. Ele poderia simplesmente pedir que um

segurança me seguisse por toda parte, mas foi incansável


na parceria.

Naquele dia, pela manhã, Carlos, o motorista de

Nicolas foi me buscar, passando na escola de João para


deixá-lo, e eu fui para a mansão. Íamos juntos pegar os
exames e levá-los para a médica, que iria nos dar um

laudo a respeito das minhas condições para ser fecundada.

Para ser muito sincera, não acordei muito bem


naquela manhã. Provavelmente tinha a ver com o

nervosismo. E se eu não estivesse apta a gerar um bebê?


E se houvesse algo de errado comigo?

Esses pensamentos me deixavam completamente


nauseada e até um pouco tonta, tanto que, ao me ver,

Nicolas chegou a ficar surpreso.

— Ei, você está bem? Parece pálida...


Estávamos no hall de entrada, onde eu fiquei
esperando-o para que saíssemos de uma vez, sem
demora. Eu poderia ter ficado no carro, mas, apesar de

tonta, me sentia muito inquieta. Sem dúvidas o nervosismo


estava tirando o melhor de mim.

Não consegui responder a Nicolas, porque precisei

me apoiar em um aparador quando uma onda de tontura

veio forte. Ele se aproximou um pouco mais, colocando-se


ao meu lado e encostando em mim.

— Está gelada. Diana, o que houve? — parecia

genuinamente preocupado, e isso me fez desmoronar mais

ainda.

Girei o corpo para ele, agarrando sua camisa em um


rompante de desespero e encostei a cabeça no seu peito.

— Não sei, acho que vou desmaiar...

Não me lembro muito do que aconteceu depois, só

que despertei com os movimentos bruscos de Nicolas me


levando para o carro com pressa. Carlos o ajudou a me
colocar no banco, e eu o ouvi dizer para seguirmos para o

hospital.

Eu não estava passando assim tão mal para ser


levada para a emergência, mas talvez minha aparência

estivesse pior do que eu imaginava.

Também não seria necessário Nicolas me carregar

no colo para dentro do hospital, porque eu já estava


consciente, mas ele nem perguntou, apenas fez.

Mas quando ouvi o que ele disse quando chegamos

lá... provavelmente deveria ser prova suficiente de que eu

não estava muito bem.

— Minha mulher está passando mal. Ela desmaiou

e... — Não ouvi mais nada do que ele disse, porque

obviamente tinha entendido algo errado.

Nicolas não poderia ter me chamado de “minha

mulher”. Ou talvez fora apenas uma encenação para o


hospital, para permitirem que entrasse comigo, o que fazia

bem mais sentido.


Parei de pensar nisso e fui colocada sobre uma

maca, no consultório de uma médica, como se realmente

estivesse muito doente.

Esta era bem jovem, sorridente, e me examinou,


medindo minha pressão, auscultando meu coração,

checando meus sinais vitais.

— Diana seu nome, não é? Seu marido me disse.

Ele parecia bem preocupado — falou, porque Nicolas ficou

do lado de fora.

— Ele não é meu marido — respondi baixinho, meio


zonza ainda.

— Ah, sim, perdão. Bem, seja como for, Diana, seus

sinais vitais estão normais. Sua pressão caiu um


pouquinho, mas imagino que possa ser algo passageiro.

Seja como for, vou te encaminhar para fazer um exame de

sangue.

— Eu fiz um há uns dois dias. Mas não estou com o

resultado. No site da clínica deve ter.


— Ótimo! Você sabe a senha? — Respondi que sim.

— Se puder me passar...

Dei todas as informações para ela, e a médica


começou a checar meus exames. Um deles a fez sorrir.

— Ah, temos uma explicação para o desmaio.

Parabéns, mamãe. Espero que seja uma boa notícia.

O quê?

— C-como assim? Mamãe?

Ela se levantou da cadeira e veio até mim.

— Você está grávida, querida. — Ela me ajudou a


me levantar da maca, e eu me aproximei de seu notebook.

Lá estava um Beta HCG, que eu nem me lembrava de ter

feito, com a palavra POSITIVO parecendo piscar em

negrito.

E ela ficou guardada na minha cabeça até que

reencontrei Nicolas, que me esperava do lado de fora.


— E então? O que foi? Você está bem?

Suspirei, respirando fundo.

— Podemos ir para a sua casa?

— Temos horário na clínica, mas podemos

desmarcar, se você quiser.

— Não precisamos ir à clínica, mas temos que

conversar — eu falei muito séria, sem encará-lo.

Nicolas levou a mão ao meu rosto, erguendo-o e me


fazendo olhá-lo nos olhos.

— Como assim não precisamos ir à clínica? O que

está acontecendo?

— Fique calmo, Nicolas, não desisti de te dar um

filho. Só que... precisamos conversar.

— Não é nisso que estou pensando, Diana! — ele


se exaltou a ponto de algumas pessoas que passavam por
nós ficarem surpresas e olharem em nossa direção. —

Estou preocupado com você.

Era quase fofo, se eu não soubesse que as coisas


tinham potencial para irem por água abaixo muito rápido.

— Só vamos para a sua casa, ok?

Dando-se por vencido, Nicolas assentiu, e nós

partimos.

Como eu iria lhe contar? E qual seria a sua reação?


CAPÍTULO DEZOITO

Paciência não era exatamente um dom que eu

possuía. Então, passar o caminho inteiro para casa em


silêncio, ao lado de uma Diana visivelmente nervosa
depois de passar alguns minutos dentro de um consultório

médico, poderia me fazer explodir de ansiedade.

Tentei segurar o meu temperamento ao máximo,

porque fosse o que fosse que ela tinha era muito mais

importante e relevante do que a minha mania de controle.

Só que assim que chegamos em casa, e ela foi se

esgueirando para o meu escritório, precisei agarrar seu

braço, no meio do caminho, virando-a para mim, porque já


não aguentava mais.
— Porra, Diana! Fala logo comigo. Não precisamos

de toda essa formalidade. Estamos na minha casa,


sozinhos. Os funcionários não vão nos ouvir. O que houve?

Você está doente?

Ela pareceu hesitar, e talvez eu realmente tivesse


sido enfático demais, só que não estava preparado para a

notícia.

— Não precisamos mais fazer uma inseminação,

Nicolas. Estou grávida.

Talvez meu autocontrole fosse algo bom para mim,

no final das contas, porque se não fosse isso, eu

certamente teria caído para trás.

A primeira impressão que tive foi de que se tratava

de algo irreal. Uma pegadinha, uma mentira ou um sonho.

Não conseguia me obrigar a pensar: “nossa, que merda, as

coisas saíram como fora do planejado”, mas a primeira


coisa que surgiu na minha cabeça foi: “caralho, eu vou

mesmo ser pai”.


Algo que sonhei por tantos anos estava, de fato,
acontecendo. Claro que no momento em que Diana

concordou em se tornar minha barriga de aluguel, aceitei

aquilo como verdade e me preparei para o momento em

que a notícia seria dada; em que eu finalmente ouviria as

palavras: a inseminação deu certo.

Porque seria assim que deveria acontecer. Fora

assim que planejei. E as coisas normalmente aconteciam


de forma organizada na minha vida. Com controle. Com

metas, planilhas, datas marcadas e... meu Deus!

Levei ambas as mãos à cabeça e me virei de costas

para Diana, querendo evitar que visse o quão

descontrolado eu estava.

— Você não vai dizer nada? — a voz de Diana soou


meio distante, quase como se estivéssemos debaixo

d’água. Meu coração acelerava no peito, e eu comecei a

me perguntar se era jovem demais para sofrer um infarto

fulminante.
— Eu... eu não sei o que dizer — respondi, porque

precisava falar alguma coisa, mas nem sabia direito o que


pensar.

— Não sabe? Como assim não sabe? Não era o

que você queria?

Girei meu corpo e olhei para ela, vendo-a com o


cenho franzido. Podia imaginar como se sentia, mas eu
não estava conseguindo pensar. Não conseguia organizar

minhas ideias para explicar qualquer coisa com


discernimento e não parecer um verdadeiro babaca.

— Sim, eu queria, mas não assim.

Foi uma resposta de merda. A pior que eu poderia


ter encontrado, tanto que vi na expressão de Diana o

quanto ela odiou o que eu disse. Sua seriedade – que o


assunto realmente pedia – transformou-se em asco.

— Se não queria, devia ter pensado antes de


transar comigo sem camisinha. Mais de uma vez, aliás. —

Foi como um tapa na cara, porque ela estava certa.


Estava tão envolvido no momento que nem pensei

em algo que nunca esqueci. Usamos camisinha em


algumas vezes, mas, em outras, o frenesi era tanto que

simplesmente me via dentro de Diana sem pensar em mais


nada. O que eu queria? Ela era uma mulher jovem,

saudável... Uma gravidez não podia ser algo tão


impossível.

Tanto que acontecera.

— Eu estou confuso. As coisas estão... confusas.


Não sei o que dizer. Você precisa entender que é uma

notícia que atordoaria qualquer um.

— Não um homem que estava disposto a contratar


uma barriga de aluguel para ser pai. Agora você vai ser —
ela estava furiosa. E não era para menos. — Precisamos

conversar. Não acho que seja assunto para um corredor.

Bem, se ela queria ir para o escritório obviamente

sua intenção era falar de negócios. Empertiguei minhas


costas, em uma posição altiva. Minha cabeça estava
interpretando as coisas de uma maneira, e eu quase
poderia jurar que era o certo, mas nem parei para refletir.

— Precisamos falar sobre o contrato, não é? Como


as coisas mudaram, você pode estar achando que não vou

te pagar, mas eu vou. Podemos renegociar os termos e...

Eu pretendia continuar falando, mas o tapa me


pegou em cheio. Fechei os olhos, sentindo o rosto arder,
começando a pensar que eu deveria ter falado algo pior do

que imaginei para Diana, que era sempre doce e calma,


responder daquela forma.

— Você acha que eu vou negociar o meu filho?

Porque agora ele é meu também. Vai ter o meu sangue,


parte do meu DNA. Não estarei gerando o filho de outra

mulher — cuspiu as palavras com ódio.

— Eu sei que é diferente, Diana, por isso estou tão

atordoado. Não era para ser assim. Meus planos eram que
essa criança não tivesse uma mãe, fosse só minha —
tentei explicar de uma forma gentil, mas cada palavra que
eu dizia parecia ofendê-la ainda mais.

— Nem sempre as coisas correm como o planejado.

— Para mim, sim! — alterei o tom de voz, mas


imediatamente me arrependi, especialmente porque ela se
sobressaltou e deu um passo para trás.

Então deu mais um e mais um, afastando-se como

se eu fosse contagioso.

— Não posso mudar o que aconteceu, Nicolas. Se

você não quiser esse bebê, vou ter que me virar sozinha.
Tenho me virado bem com o meu irmão, aliás. Mas não

quero dinheiro nenhum seu. Se não quiser ser pai dessa

criança, como tem que ser, não vai ser financiador


também.

Fiquei tão surpreso com sua fala que cheguei a ficar

boquiaberto. Nunca foi a minha intenção deixá-la pensando

daquela forma, mas tudo parecia sair completamente


errado da minha boca.
— Diana, não é isso. Não é isso mesmo. Eu só não

estava preparado para que as coisas acontecessem assim.


Ainda não sei o que fazer.

— Mas aconteceram. E enquanto você não souber o

que fazer — ela usou de desdém para falar a expressão

—, acho melhor eu te deixar pensar.

Diana deu as costas para mim e simplesmente


começou a se afastar, caminhando. Ia saindo da minha

casa. Eu a vi passar pela porta, que foi aberta para que ela

passasse.

Queria gritar para que não a deixassem ir, que não


permitissem que saísse daquela forma, pensando que eu

não queria o filho que estava em sua barriga. Porque eu

queria. Ele fora concebido de uma maneira diferente do

que planejei, mas... porra!

Eu seria pai. Havia um bebê a caminho, e ele seria

meu.
Não somente meu, mas de uma mulher incrível

também.

Eu não precisava me casar com ela. As coisas não

precisavam se repetir como acontecera com Taís.

Mas tudo era tão similar. Fora uma concepção não


planejada – ao menos daquela forma – e a grávida em

questão era, outra vez, jovem demais. Eu não queria ter

mais um filho, colocar uma criança no mundo, sabendo que

tinha uma mãe, mas esta mulher rejeitá-lo ou não lhe dar
atenção.

Então as imagens de Diana com o irmão surgiram

na minha mente.

Ela não era igual a Taís. E se eu não fosse atrás


dela naquele minuto, talvez não conseguisse consertar as

coisas.

Saí correndo como um louco, quase esbarrando no

segurança que estava na porta da casa, indo atrás dela

pelo condomínio. Quando a alcancei, segurei-a e a girei


para mim. Não me importava com quem estava olhando –

se é que estavam mesmo –, só queria que percebesse que


eu não era indiferente.

— Volte. Precisamos conversar. Não vou rejeitar o

bebê e...

— E eu não quero o seu dinheiro! — ela me

interrompeu, elevando a voz. Estava com os olhos


marejados e vermelhos, e isso me destruiu. Ela não

merecia.

— Diana, não estou querendo falar de dinheiro.

Precisamos falar sobre...

— O quê? Termos de contrato? Vai querer que eu te


dê meu bebê e não tenha direitos de mãe sobre ele?

— Dá pra parar de me interromper? — ordenei, mas

ela tentou se desvencilhar das minhas mãos.

— Não, porque não quero te ouvir. Quero ir embora,

não quero olhar para você agora. Também estou atordoada


com a notícia, mas mais ainda com como se comportou,

como se fosse absurdo. Como se ter um filho comigo fosse

algo horrível.

— Eu nunca disse isso.

— Não importa o que você disse. Eu só quero ir

embora.

Ela se debateu novamente, chegando a conseguir

se soltar e se afastar. Só que eu me lembrava muito bem

de como tinha sido minha última briga daquela forma e

quais tinham sido as consequências. Não poderia permitir


que se afastasse sem que conversássemos.

— Não vai, não! — Deixei meu lado controlador

assumir e novamente a alcancei, dando uma de homem

das cavernas, jogando Diana no meu ombro e começando


a levá-la para casa, mesmo sem sua permissão.

— O que diabos está fazendo, Nicolas? Me ponha

no chão! — ela gritou, e eu vi os olhos de todos se

voltando para nós, mas continuei sem me importar.


Diana foi o caminho todo esperneando, mas

chegamos em casa. Subi as escadas com ela pendurada


no meu ombro, e entrei no meu quarto, fechando a porta e

colocando-a no chão.

— Seu louco! Isso foi ridículo! — Deu um empurrão

no meu peito, então segurei seus punhos.

— Tenho vontade de te amarrar e te amordaçar para


que me deixe falar, garota! Mas agora vai me ouvir: eu não

estou disposto a renegar o meu filho. E nem você. Não foi

como o planejado, e eu fiquei um pouco fora de mim, mas

é assim que vai ser. Seremos pais. Não terei um filho


sozinho. Não vou te eliminar do jogo, mas vamos ter que

fazer isso juntos.

Ela pareceu aquiescer, então eu soltei seus punhos.

Diana deu um passo para trás, com o cenho franzido.

— Só que algumas coisas vão ter que ser da minha

maneira, Diana. Outras serão da sua, é claro. Mas

combinamos que a partir do momento em que estivesse


grávida você viria morar aqui, e isso não vai mudar —
afirmei com veemência.

— As coisas mudaram...

— Claro que mudaram. É um filho seu também,

então imagino que vá ter mais zelo ainda por ele.

— Ou ela... — Mais uma vez fui interrompido, mas

eu a vi com a mão na barriga, e sua voz soou tão doce,


apesar de ainda demonstrar certa confusão, que eu

novamente me derreti.

Era perigoso lidar com aquela menina, porque ela


tinha algum poder sobre mim. Um que eu ainda

desconhecia, mas que já me fazia compreender que não


poderia lutar batalhas com ela e sair vencedor em todas.

Isso ainda era muito novo no meu universo e me dava um


pouco de medo.

— Sim. Ou ela — disse e suspirei. Dei mais um


passo para a frente, para evitar a distância que ela

impusera entre nós novamente. — Com toda a questão do


pai do seu irmão, você precisa pensar nessa criança. João
gostou daqui, e eu acho que vocês dois ficarão mais
seguros. E confortáveis. Quero uma gravidez tranquila para

você.

Ela ponderou, e eu fiquei feliz por isso. Sabia que


ainda estava tão desconcertada quanto eu, mas esperava
que, juntos, conseguíssemos encontrar um caminho no

meio daquela loucura toda.

— Ok, Nicolas. Por esse bebê, eu topo. Vou ficar


aqui.

Ótimo. Era um começo.


CAPÍTULO DEZENOVE

Às vezes eu olhava ao meu redor e me perguntava

o que diabos estava acontecendo com a minha vida. Em


pouquíssimo tempo fui de secretária virgem de um CEO a
futura mãe de seu filho, morando em sua casa, desfrutando

de um luxo que nunca me foi permitido. Mas o pior de tudo


era o quanto eu desejava estar em sua cama novamente.

Fazia dois meses que estávamos morando sob o

mesmo teto, e por mais que não nos falássemos tanto, que
mal nos encontrássemos, porque meu trabalho tinha

aumentado e porque Nicolas passava boa parte do dia no

escritório, sua presença era sempre sentida.


Ele era uma presença, na verdade. Não apenas por

todo o poder que emanava, mas porque sempre que


estava por perto, meu coração acelerava. Ao todo, fazia

quatro meses que não nos tocávamos, e aquela semana,

na ilha, nunca saía da minha cabeça. E tudo se tornava


pior quando lançava olhares para mim tão intensos que

eram quase suficientes para que eu perdesse todo o ar.

Além de tudo, era sempre muito atencioso comigo,


mas eu sempre acreditava que tinha a ver com a gravidez.

Ele queria que seu filho – sim, era um menino – nascesse

saudável, então era de seu interesse que eu fosse bem-


cuidada. Só que eu não poderia dizer a mesma coisa em

relação ao meu irmão. Os dois se davam tão bem que isso


também mexia com a minha cabeça.

Nicolas se soltava um pouco mais com João. Meu

irmão era um menino maravilhoso, empático e divertido, e

eu conseguia até ouvir a risada daquele homem tão sério

quando estavam juntos.


Nicolas ensinara meu irmão a jogar xadrez, então os
dois passavam muito tempo no quintal da casa fazendo

isso. Todas as vezes que João ganhava eu suspeitava que

fora marmelada, mas de qualquer forma era algo que me

enternecia.

Naquela manhã de domingo, por exemplo, estava

muito calor, e os dois estavam lá fora. Passava um pouco

das dez, e João estava fazendo alguma lição com a ajuda


de seu novo amigo. Meu irmão, aliás, não sabia ainda da

gravidez, mas nunca fez perguntas do porquê de

morarmos com meu antigo chefe. Não era bobo e com

certeza imaginava que havia algo entre nós, embora quase

não ficássemos juntos.

Estava tomando coragem para contar para João, e


em nossas conversas Nicolas sempre me incentivava a

resolver logo essa pendência, porque ele tinha o direito de

saber que seria tio e porque em breve minha barriga

começaria a aparecer. Já havia alguns indícios, quase um

ovinho próximo ao meu umbigo, mas não era algo tão


perceptível por baixo das roupas. Só que não seria assim

para sempre.

Vi a governanta de Nicolas com uma jarra de suco,

pronta para levar para eles, e peguei-a, dizendo que eu

mesma poderia levar. Ela agradeceu com um sorriso, que


foi retribuído.

Queria me aproximar dos dois de alguma forma,


mas tinha me tornado um pouco orgulhosa. Talvez fossem

os hormônios da gravidez, alguma carência, mas não


importava. Queria fazer parte do momento, especialmente

quando ouvi os dois rindo, então usei da desculpa mais


esfarrapada possível.

Assim que levei o suco, João me agradeceu, todo


feliz, mas Nicolas me olhou com aquele seu jeito

questionador e intenso, provavelmente se perguntando o


que diabos eu estava fazendo no lugar da governanta.

Problema era dele, teria que me engolir.


— O que você está aprendendo hoje, João? —

inclinei-me um pouco, para olhar para o caderno,


colocando as mãos atrás das costas.

Tinha me posicionado no vão entre as cadeiras

onde cada um estava sentado, inclinando-me de forma


provocativa, deixando meu decote quase na cara de
Nicolas. Era a atitude mais infantil possível da minha parte,

mas – novamente – os hormônios da gravidez pareciam


estar mexendo comigo, porque me sentia não somente

carente, mas também cheia de desejo.

Claro que os olhos de Nicolas se voltaram


exatamente para o local que eu queria que fossem.

— Matemática. Nicolas é bom nisso.

Voltei meus olhos para o mencionado, com leve


desdém, uma sobrancelha arqueada, mas o vi continuar
sério como sempre, embora houvesse uma leve expressão

divertida em seu rosto, mas também provocadora.


— Ah, que bom, porque eu sou péssima. Acho
que... — Eu ia continuar falando, mas me empertiguei um
pouco e acabei cambaleando. Não saberia dizer se pisei

em falso ou se escorreguei, porque nem tive tempo para


perceber, mas ainda bem que o reflexo de Nicolas era bom

o suficiente para agarrar meu braço e me manter de pé.

Em segundos ele também se levantou e passou um


braço ao redor da minha cintura, enlaçando-me com uma
pegada que me fez estremecer.

— Obrigada, eu me desequilibrei — não havia

necessidade de explicar, mas obviamente saiu sem que eu


pensasse.

— Percebi. Precisa tomar mais cuidado! — ele

exclamou, parecendo irritado. Ou talvez preocupado, mas


em um nível bem elevado. — E se você caísse? Poderia
machucar o bebê — ele soltou, aparentemente sem querer.

— Ei! O quê? — João indagou, e tanto eu quanto


Nicolas olhamos para ele. Ótimo! Bela forma de o meu
irmão descobrir que eu estava grávida do meu ex-chefe. —
Você está grávida?

Nicolas tirou o braço do meu redor, afastando-se,


parecendo um pouco envergonhado. Tarde demais para

isso, a merda já fora feita.

— Sim, João. Sua irmã está grávida — Nicolas

tomou a responsabilidade de contar para si. Colocou as

mãos nos bolsos, focando totalmente no meu irmão. Eu


conhecia aquele jeito, porque trabalhei com ele por algum

tempo e sabia que aquela expressão séria e focada era a

que usava para tratar de negócios.

— Vocês estão namorando? — Era o pensamento

lógico de uma criança, então eu me apressei para


responder.

— Não, querido. Somos amigos. Mas aconteceu.

Meu irmão pareceu um pouco confuso, o que não

era para menos.


— Sei que você era meio que o homem da casa,

João, mas juro que não vou negligenciar sua irmã de forma
alguma. Muito menos o bebê.

João ficou assentindo, olhando para mim e para

Nicolas, como se estivesse assistindo a uma partida de

tênis. Fiquei com medo que ele se ressentisse por não


saber ainda, ou por qualquer outra coisa, mas meu irmão

abriu um sorrisão e me puxou para um abraço.

— Eu vou ser tio! — falou, emocionado. Então

também puxou Nicolas para si, e eu vi aquele homem


enorme ficando completamente sem graça pela atitude de

um garotinho. Só que ele acabou acatando o abraço e me

olhando por cima do ombro, quase como se fôssemos

cúmplices. — Acho que deveríamos comemorar.

No final das contas, combinamos de fazermos um


jantar em casa mesmo, elegante, porque ainda não

queríamos sair. Nicolas não era famoso, mas tinha um

rosto que chamava atenção de jornalistas de fofocas, e


nenhum de nós queria dar margem para comentários.
Subi para o meu quarto um pouco depois, pronta

para descansar um pouco, já que a gravidez me deixava

muito cansada, e quando me levantei, algumas horinhas


depois, trabalhei, mesmo sendo domingo, e decidi me

arrumar.

Tomei um banho, estava prestes a colocar uma

lingerie qualquer, mas decidi escolher uma daquelas com

as quais ele me presenteou na ilha. Não que fosse


acontecer algo entre nós, mas queria estar com algo bonito

e que me lembrava de dias bons e de prazer.

Escolhi uma em tom bordô, que combinou

perfeitamente com a cor dos meus cabelos, e já estava


pronta para colocar o vestido, mas passei diante do

espelho e parei, olhando para a barriga.

Não que não tivesse feito isso antes, porque todos

os dias eu olhava para ela e a acariciava, cada dia mais

me acostumando com a ideia de que em breve seria mãe.


Só que, naquele dia, em especial – talvez porque João

descobrira e porque finalmente alguém além dos médicos


e de Nicolas soubera do bebê –, a coisa se tornara mais

real.

Acariciei com cuidado o meu filho, sonhando com o


dia em que ele iria mexer e dar o ar de sua graça. Estava

com os olhos baixos, praticamente focados no meu

umbigo, e só me dei conta que Nicolas havia aparecido


quando suas mãos grandes pousaram nos meus ombros.

Perdi o ar, olhando para o espelho e vendo-o atrás

de mim, de terno, elegante como sempre, com os cabelos

penteados e os olhos pesados; aquele olhar que me

seduzia sem nenhum esforço.

— Posso? — sua voz sussurrada indagou, e eu vi

seus braços ao redor da minha cintura, as mãos próximas

à barriga.

— Sim, pode. — Era o filho dele, afinal. Ele podia


tocá-lo.

Pela primeira vez em quatro meses, Nicolas

acariciou minha barriga. A minha carência me fez fechar os


olhos e apreciar a ternura como se fosse para mim.

— Eu não deveria ter entrado aqui sem a sua

permissão, mas a porta estava aberta. Quando vi você

assim, tocando a barriga, foi uma das coisas mais bonitas

que já testemunhei.

Queria muito não ser tocada por essas palavras,


fingir que não era importante ser admirada daquela forma,

mas me emocionei.

— Você é uma das coisas mais bonitas que eu já vi,

Cerejinha.

Ah, Deus... o que diabos ele estava fazendo? Por

que estava usando aquela droga de apelido? Quando suas

mãos começaram a passear pela minha cintura, descendo

para meus quadris, e sua respiração quente tocou meu


ouvido, porque sua boca estava próxima demais, eu arfei,

já me sentindo molhada por tão pouco.

Ele tocou a tatuagem e a desenhou com a ponta do

dedo, contornando-a, e sua boca tocou de leve a minha


orelha. Os pequenos detalhes me faziam estremecer.

— Eu queria resistir. Lutei contra, Diana, mas não

posso. Quero você.

— E como vai ser depois? — perguntei, porque era


importante. Eu não apenas sentia tesão por ele. Havia um

sentimento envolvido.

— Depois nós decidimos. Podemos...

Resposta errada.

Afastei-me em um pulo, colocando-me de frente


para ele e agarrando o robe que estava pendurado num

cabideiro. Rapidamente me cobri, porque não queria lhe

dar o direito de olhar para o meu corpo exposto.

— Não. Assim eu não quero. Tem uma criança em

jogo agora. Não quero arriscar nada.

Ele abaixou a cabeça, parecendo magoado, mas


não poderia me deixar levar por nada daquilo. Nicolas era

um homem feito e não uma criança. Era dono de suas


escolhas e se estava decidindo que queria apenas o meu
corpo, precisaria sofrer as consequências.

Eu não me entregaria para ele. Não quando não

sabia o que iria acontecer.

— Te encontro lá embaixo — foi tudo o que ele disse

antes de sair e fechar a porta.

Droga! Por que eu era tão vulnerável a ele?

Ainda bem que João estaria conosco naquela noite,

porque eu já estava tentada o suficiente para, no final das

contas, acabar não resistindo.


CAPÍTULO VINTE

Desci as escadas bem devagar, porque tinha

colocado salto alto, e o som dele de encontro ao piso deve


ter chamado a atenção de Nicolas, porque o vi vindo em
minha direção, caminhando daquele jeito elegante e sexy,

com as mãos nos bolsos, mas uma logo me foi estendida


quando cheguei aos últimos degraus.

— Desci escadas sozinha nos últimos vinte e dois

anos, não preciso de ajuda — foi uma brincadeira, tanto


que me esforcei para abrir um sorriso o mais sincero

possível. Nicolas entendeu.

— Estou tentando ser cavalheiro, apenas aceite.


Dei de ombros, segurando sua mão e deixando que

me guiasse até a sala de jantar.

— Tenho uma notícia ruim e uma boa.

— Comece com a ruim, por favor.

Nicolas puxou a cadeira, novamente com

cavalheirismo, e eu me acomodei. Ele fez o mesmo,


colocando-se ao meu lado.

— João decidiu que não quer vir. Fui chamá-lo mais


cedo, e ele me disse que queria deixar o momento para

nós dois.

Ergui uma sobrancelha, surpresa.

— Você e meu irmão entraram em algum complô?

Nicolas riu. Ele parecia solto e relaxado, como ficara

na ilha, naqueles dias maravilhosos que passamos, e eu

temi que, sozinhos, em um jantar quase romântico, toda a

minha resistência a ele fosse por água abaixo,


especialmente depois do que acontecera no meu quarto,
minutos atrás.

— Seria uma boa ideia, e eu me orgulharia muito

dela, mas, não. Parece que o garoto quer nos juntar.

João me conhecia melhor do que ninguém. Ele

certamente sabia que eu nutria um sentimento por Nicolas;

acompanhara aqueles últimos meses, desde que

retornamos da viagem, e eu talvez não tivesse escondido


tão bem assim o quanto me incomodava o fato de que não

estávamos juntos. De que nem sequer tínhamos tentado.

No momento em que pisamos no Rio, parecemos duas

pessoas diferentes, e isso ainda me magoava, por mais

que não tivesse direito de tal, já que sempre soube o que

aconteceria.

Mas eu não podia nutrir esperanças. Sem dúvidas

Nicolas queria o que fora buscar no meu quarto, quando

me vira de lingerie.
E eu também queria. Talvez devesse me deixar

levar, só por mais uma noite.

Começamos a nos servir e, como sempre, a comida

estava deliciosa. Os funcionários da casa de Nicolas eram

extremamente competentes em todos os sentidos, e já que


a notícia fora dada ao meu irmão, eles passaram a saber
também que haveria um pequeno patrãozinho muito em

breve, o que os deixou radiantes.

Um bebê sempre trazia alegria. Pensando nisso,


levei minha mão à barriga, pensativa.

Nicolas tocou meu braço, chamando a minha

atenção.

— Você está bem? Sentindo alguma coisa? —

preocupou-se.

— Não. Seu bebê está bem, fique tranquilo — tentei

usar de um pouco de ironia, mas mantendo a leveza. Claro


que havia um toque de mágoa, mas não queria que se

sobressaísse naquela noite.


— Minha preocupação não é só o bebê, Diana. Eu

me importo com você. Muito.

Engoli em seco, respirei fundo e tentei não me


concentrar na forma como me olhava, porque era sempre a

minha perdição.

Remexi-me na cadeira, tentando abrir um sorriso, e


dei mais uma garfada, gemendo de prazer quando a
comida explodiu na minha boca em uma confusão de

sabores e temperos bem escolhidos.

— Está maravilhoso — gemi novamente, e eu senti


Nicolas também se remexer ao meu lado. Ele não comeu,

apenas ficou me olhando. Ótimo, ponto para mim. — O que


foi? Fiz algo errado?

— Não, mas se continuar gemendo assim, vou ser


obrigado a te colocar em cima desta mesa e te fazer gozar
na minha boca.

Ok, Nicolas estava no modo sem filtro. Eu tinha

duas escolhas. Ou entrar na brincadeira e provocá-lo


também, ou cortar para que não se repetisse e tivéssemos
um jantar tranquilo e amigável.

Muito provavelmente a segunda opção era a mais


segura, só que eu precisava levar em consideração que

poderia ser uma escolha mais definitiva. Se eu recuasse


naquele ponto, Nicolas não iria mais tentar.

E o que eu queria?

Em um futuro mais distante? Não fazia ideia. Mas


naquele momento? Merda, eu estava desesperada de

tesão.

— E se você continuar a falar essas coisas, não vou

querer continuar a jantar — usei minha voz mais


provocadora e maliciosa, não deixando nenhum tipo de

dúvida.

Nicolas obviamente ficou surpreso, mas ele era


muito melhor disfarçando do que eu.
— Não precisamos terminar de jantar. Eu prefiro
muito mais devorar você.

Ok, seria um jogo. Era excitante e ao mesmo tempo


me deixava confusa sobre ser o certo ou errado a fazer,

mas tentei empurrar minha consciência para o lado, com


todas as vozes que falavam na minha cabeça, alertando do

perigo.

Eu queria o perigo.

— Como? — Apoiei a cabeça na mão, olhando para


ele fixamente, em seus olhos, completamente focada. Se

minhas mãos estavam tremendo um pouco, queria

esconder ao máximo.

Nicolas se aproximou, juntando um pouco mais


nossas cadeiras para sussurrar no meu ouvido:

— Te fodendo tão forte que vou ter que te

amordaçar para a casa inteira não ouvir seus gritos.


Não tive tempo de responder nada, porque Nicolas

levou a mão à minha nuca e me puxou para um beijo. Não


um daqueles gentis e suaves, mas um violento, selvagem,

animalesco.

Com o outro braço, ele me puxou, colocando-me

sentada em seu colo, montada, apertando-me contra si


como se eu fosse necessária para sua existência. Sua

força contra a minha delicadeza. Sua barba roçando na

minha pele suave. Seu peito musculoso esmagando meus


seios, que estavam ainda mais sensíveis por causa da

gravidez.

O beijo não era um simples beijo. Era um prelúdio

de muito mais, e eu sabia que qualquer pessoa que nos

olhasse perceberia isso.

— Não estamos sozinhos em casa, Nicolas... —


falei, sentindo-me ofegante, ouvindo minha voz sair frágil.

— Estamos, sim. Carlos e Maria levaram João para

um passeio. Aluguei um apartamento de frente para a praia


para ele ficar.

— Então foi, sim, um complô.

— Não exatamente. A ideia foi dele. Ele só pediu

menos conforto, e eu proporcionei algo mais.

Ao dizer isso, Nicolas se levantou da cadeira,

levando-me consigo, com as pernas entrelaçadas em sua


cintura, ainda me beijando, mas parou de fazer isso ao

subir as escadas, provavelmente tomando todo o cuidado

ao me carregar, afinal, eu estava gerando seu bebê.

Chegamos ao seu quarto, e eu me dei conta de que


nunca tínhamos feito amor ali. O que não fazia muita

diferença, mas para tudo tinha sua primeira vez.

Fui colocada no chão, e ele tirou minha roupa em

um frenesi desesperado. Fiz o mesmo com a dele, e nos


vimos nus, um de frente para o outro.

Paramos por alguns instantes, tocando um ao outro

com cuidado – minhas mãos passeando por seu peito, e


quando as dele fizeram o mesmo com os meus, girando

meus mamilos entre seus dedos, eu inclinei a cabeça para


trás.

Ainda estimulando meus seios, ele agarrou meu

cabelo, mantendo-me arqueada, e voltando aos meus

lábios, beijando-os quase ao ponto de eu senti-los


doloridos.

Após se fartar dos meus lábios, fui deitada na cama,

mas de barriga para baixo, de bruços, o que era novo.

Fiquei parada enquanto ele pegava seus apetrechos e

depois, enquanto me prendia, com braços e pernas bem


esticados.

— Quero saber que limites posso cruzar. Prometo

não te machucar, mas não pretendo fazer nada que você

não queira. Tem alguma coisa à qual diria não? — O


cuidado que ele sempre tinha de pedir minha permissão

para tudo me comovia. Era dominador na cama, gostava

de algum tipo de submissão, mas não tomava o que não


podia tomar.
Exatamente por isso eu sempre queria lhe dar

permissão para tudo.

— Não. Pode fazer o que quiser.

Isso arrancou uma respiração mais profunda de sua

garganta e o fez dar um tapinha na minha bunda. Nada

doloroso, apenas estalado, que me fez arfar.

Ele saiu de cima da cama e entrou em um campo de

visão que eu não conseguia alcançar daquela posição em

que estava. Quando voltou, logo senti seu dedo penetrar

minha boceta, indo fundo, do jeito que eu gostava. Usei a


cama para conter meus gemidos, enterrando a cabeça

bem fundo no colchão, chegando a morder o lençol de tão

desesperadoramente deliciosa que era a sensação.

Enquanto me masturbava, ele usava a boca para


morder partes do meu corpo que estavam expostas,

principalmente a minha bunda, que era pela qual ele

parecia ter mais tesão.


Também mordeu as laterais da minha coxa,

chupando a carne, bem próximo ao local onde seu dedo


trabalhava, entrando e saindo, deixando-me mais e mais

molhada.

Surpreendi-me quando senti algo gelado sendo

passado na outra fenda, a de trás, o que me fez


estremecer.

— Não precisamos fazer o que você não quiser.

Gostaria de te mostrar outras formas de prazer, mas vamos

pegar leve. Aos poucos.

Hesitei um pouco, mas eu já sabia que Nicolas era

experiente, que iria saber o que fazer para que eu gostasse


de tudo que me apresentaria, até mesmo de coisas que

nunca imaginei. Quem diria que eu sentiria prazer em me

ver totalmente à mercê de alguém, dominada do jeito que


estava?

— Já disse, pode fazer o que quiser.


Ele voltou, então, a me lubrificar, e enquanto seu
dedo continuava estocando, ele colocou algo na parte de

trás, mas não era seu pau.

— O que é isso? — perguntei, porque não

conseguia ver. A sensação era estranha, e eu me sentia


muito preenchida, mas não de um jeito ruim. Havia um

pouco de dor, mas algo me dizia que eu seria bem

compensada.

— Um vibrador.

Ah, meu Deus...

Ok, ok... eu ia confiar. A ideia era excitante.

Nicolas posicionou o objeto onde queria e o deixou


lá.

— Está doendo?

— Um pouco, mas eu quero.


Sim, eu queria muito. Estava curiosa, excitada e
desejando conhecer tudo que fosse possível daquele
mundo que ainda era tão novo para mim.

O troço começou a vibrar dentro de mim,

provavelmente porque Nicolas o ligou, e ele me penetrou


com dois dedos, estocando com ainda mais força.

Ainda bem que a casa estava vazia, porque o grito


demorado que eu dei seria o suficiente para me

envergonhar para o resto da vida.

Eu queria me mexer, arquear o corpo, estremecer,


qualquer coisa, mas não podia. A dor tinha ido embora por
completo, e eu podia jurar que nunca tinha sentido nada

sequer parecido, embora o próprio Nicolas já tivesse me


dado prazer de várias formas diferentes.

Estava prestes a gozar – e ele já conhecia meus

sinais –, e não permitiu que fosse daquela maneira.


Tirando os dedos de dentro de mim, mas mantendo o
vibrador, ele soltou meus tornozelos e me posicionou para
que eu ficasse de joelhos na cama, empinada, o suficiente
para que conseguisse me penetrar, daquela vez com seu
pau.

Era como ter duas pessoas me fodendo, uma por

trás e uma pela frente. Era insano.

Nicolas não tinha piedade e investia com força,


ainda estimulando meu clitóris, massageando-o e

brincando com ele. Eu poderia jurar que ia desmaiar de


prazer, mas me contentei em gozar intensamente, gritando
e gemendo como nunca antes.

— Você é deliciosa, Cerejinha. Sou louco por você.

Como nunca fui por nenhuma outra mulher.

Depois de um orgasmo ouvir algo assim era para


deixar qualquer uma completamente zonza.

Ele desligou o vibrador, tirando-o de dentro de mim.

Então me soltou rapidamente, saindo de dentro e me girou


na cama, me penetrando novamente e voltando a estocar,
mas com olhos nos olhos.
Continuava forte, frenético, mas houve uma conexão
mais profunda. Algo de almas. Tanto que Nicolas levou a

mão à minha barriga, acariciando-a, venerando-a.

Quando chegou ao orgasmo, derramando-se dentro


de mim, eu soube: estávamos os dois perdidos. Rendidos.
Eu pertencia a ele, e esperava que Nicolas me pertencesse

também.
CAPÍTULO VINTE E UM

De fato, algo mudou entre nós depois daquela noite.

Nicolas passou a se esgueirar para o meu quarto todos os


dias, ou me chamava para o dele, e nós fazíamos sexo
loucamente, do jeito que ele gostava – e que eu também

passei a apreciar –, de outras formas mais românticas e


calmas também, e as coisas começaram a dar certo.

Passávamos mais tempo juntos do que antes, tanto

sozinhos quanto na companhia de João. Naquela noite,


estávamos os três na sala de estar, assistindo a um filme, e

meu irmão deitara a cabeça no meu colo, enquanto eu

acariciava seus cabelos encaracolados, fazendo um cafuné


que eu sabia que ele adorava desde muito pequeno.
Só que algo se remexeu dentro de mim. Eu poderia

ter confundido com um revirar de estômago, mas se


parecia demais com um chute para ser ignorado.

João também notou, tanto que se levantou de um

pulo.

— Foi ele? — indagou, animado.

Levei ambas as mãos à barriga. Eu tinha passado

um pouquinho dos cinco meses, e ela se tornava mais

perceptível a cada dia. Eu também sentia mais fome, mais


calor; meus sentimentos eram mais latentes – tanto os

bons quanto os ruins –, e eu amava aquele bebezinho

cada vez mais.

Nicolas também se empertigou, compreendendo o

que havia acontecido.

— O bebê mexeu? — Ainda não tínhamos escolhido

um nome para o menino, então o chamávamos de bebê


mesmo. Assenti, respondendo à sua pergunta, começando

a me emocionar.
Delicadamente, Nicolas colocou sua mão próxima
às minhas, mas nosso bebê estava mais parado. Ele ia

desistir, mas fiz um sinal para que não se afastasse, então

esperamos. João também estava ansioso, também me

tocando, na expectativa.

Os três em silêncio, e eu quase pedia para que meu

filho desse outro sinal de vida. Queria tanto senti-lo outra

vez. Ter mais um sinal de que estava ali, dentro de mim,


embora as ultrassonografias que fazia fossem prova

suficiente.

Foi uma espera de alguns minutos, mas mais

parecia uma eternidade. Só que valeu a pena. Quando

meu garotinho novamente chutou, como se quisesse avisar

a todos ao redor que estava vivo, saudável e ansioso para


dar o ar de sua graça no mundo, não pude me conter.

Meus olhos se encheram de lágrimas e, para a

minha surpresa, quando olhei para Nicolas, os dele

estavam do mesmo jeito.


— Nosso filho... — foi o que ele sussurrou. Era a

primeira vez que usava o pronome nosso para se referir ao


bebê, e não poderia ter acontecido em um momento mais

significativo.

Colocou sua mão sobre a minha, apertando-a com


carinho e inclinando-se para me dar um beijo. Também era
a primeira vez que demonstrávamos afeto daquela forma

perto de João, e eu sabia que isso queria dizer que as


coisas tinham potencial para ficarem mais oficiais, já que

tínhamos testemunha. Imaginava que todas as pessoas da


casa já sabiam de minha relação com Nicolas, não apenas

porque eu estava grávida dele, mas pela forma como nos


olhávamos e como a tensão entre nós sempre parecia
palpável.

No entanto, naquele momento era diferente. Claro

que sempre desejaríamos um ao outro, que uma química


absurda existia entre nós, mas havia outras coisas

pairando no ar. Havia amor.


Eu ainda não sabia se o amava. Provavelmente

Nicolas pensava da mesma forma. Mas estava apaixonada


pelo pai do meu filho. Aquele maníaco por controle,

conhecido como Homem de Ferro na empresa, tinha me


conquistado, mostrando outras nuances que muito poucas

pessoas conheciam.

Esperava que ele também estivesse apaixonado por

mim.

— Meu sobrinho mexeu! — João exclamou todo


feliz, e encostou seu ouvido na minha barriga, tentando

ouvir mais.

Sem demora, o bebê novamente se remexeu dentro


de mim, como se quisesse participar do momento.

Nicolas abriu um sorriso enorme, e João me


abraçou, passando seus bracinhos magros pela minha
cintura, como se quisesse dar um gesto de carinho para o

bebê.
Um sentimento muito poderoso se apossou de mim,
e eu pensei que aquela era a minha família. De alguma
maneira, era assim que eu via aqueles três homens.

Nicolas, João e meu pequeno bebê.

Aquela sensação foi só crescendo mais e mais


dentro de mim, porque nos dias seguintes eu e Nicolas

parecemos nos aproximar. Não era apenas o sexo que nos


unia, mas noites de longas conversas e manhãs
preguiçosas na cama. Ele me dava um beijo de bom dia,

levava o café na cama às vezes – principalmente nos finais


de semana – e me mimava sempre que possível.

Quando tomamos um banho de piscina com João,

em um dia ensolarado, Nicolas me manteve perto o tempo


todo, me acomodando em seus braços e tomando todo o
cuidado com cada passo que eu dava.

Quando minha gravidez completou seis meses,

Nicolas me presenteou com um belíssimo colar, e eu


cheguei a arfar ao ver a peça dentro da caixinha, reluzindo

a ponto de quase ofuscar minha visão. Era todo coberto de


diamantes, mas discreto, e quando ele colocou no meu
pescoço e me virou para o espelho do meu quarto, para
que eu pudesse vê-lo, fiquei maravilhada.

— Preciso ir a um jantar amanhã, com um

importante parceiro de negócios que chegou ao Brasil.


Gostaria que me acompanhasse e que o usasse.

Virei para ficar de frente para ele, um pouco

confusa.

— Mas eu?

— E por que não?

— Porque eu não sou nada sua... O que vão pensar.

Nicolas colocou as duas mãos nos meus braços,

olhando fundo nos meus olhos.

— Quero que vá como minha mulher — sua

afirmação soou tão veemente, tão segura, que eu senti

meu coração acelerar.


Como mulher dele? O que isso queria dizer? Talvez

eu fosse ingênua demais para compreender ou não


quisesse criar falsas esperanças, mas achei melhor não

perguntar.

Topei acompanhá-lo, e Nicolas me pediu que

comprasse um vestido novo, já que muitas das minhas


roupas não cabiam mais por causa da barriga que não

parava de crescer. Ele insistiu que queria pagar, mas não

concordei. Estava ganhando um salário legal, trabalhando


para o amigo dele, e amando cada vez mais o trabalho.

Minha nova meta era que assim que o bebê nascesse e

crescesse um pouquinho, eu queria tentar fazer uma

faculdade de Jornalismo, mesmo que à distância.

Bem, mas isso era um plano para depois.

Comprei um belo vestido e me senti muito bonita.


Somente minha barriga tinha crescido com a gravidez, e eu

consegui encontrar um modelo que valorizou as curvas

novas que ganhei sem me fazer parecer um balão.


No momento em que me viu com ele, senti os olhos

de Nicolas brilhando.

— Você é a imagem da perfeição — ele comentou,

beijando a minha mão com toda a elegância.

— Mesmo com uma melancia na barriga? — Era um


exagero. Não tinha completado nem seis meses ainda, e

por ser bem magrinha havia apenas uma protuberância

saliente ao redor do meu umbigo, mas já imaginava como

ficaria quando chegasse ao final daquela jornada.

— Mais linda ainda.

Que bom que ele achava.

Partimos para o restaurante e encontramos o casal

em questão. Eram de meia idade, muito bonitos, e eu me

juntei à mulher, falando com ela em inglês. O assunto,


claro, era o futuro bebê que ia chegar. Ela tinha dois filhos,

então me contou muitas histórias de quando eram

pequenos, embora seu mais velho já tivesse a minha

idade.
Foi uma conversa gostosa, e eu senti olhares gentis

de Nicolas para mim o tempo todo. Ele não estava ali para
fechar nenhum negócio, mas para reafirmar uma amizade

que fora consequência de uma parceria de muitos anos –

ao menos fora o que me dissera no caminho até o


restaurante, com Carlos na direção –, que começara com

seu pai. Nicolas era um herdeiro, sim, mas a verdade era

que trabalhara e trabalhava muito duro para manter o

negócio do pai prosperando.

Apesar de ricos, o casal era muito simpático e


divertido, e eu consegui dar umas boas risadas. A verdade

era que o Sr. Brown – nossa companhia daquela noite –

sabia contar ótimas piadas, e quando eu soltei uma


discreta gargalhada, senti a mão de Nicolas por baixo da

mesa, pegando a minha e entrelaçando nossos dedos.

Olhei para ele com alguma surpresa e mais ainda

quando levou nossas mãos para cima da mesa, sem


nenhuma vergonha de demonstrar que estávamos, de fato,

juntos.
Finalmente entendi o que ele queria dizer com

“minha mulher”. Era o que aquele casal pensava. Teríamos

um filho. Éramos um casal.

Não importava como tínhamos começado. O que

importava era o que aconteceria conosco a partir daquele


momento. Qual seria o nosso futuro...

Despedimo-nos do casal quando já passava de

meia-noite e fomos pegar o carro com o valete. Nicolas

abriu a porta para mim, e eu entrei, sendo seguida por ele.

— Boa noite, senhor, senhora — Carlos


cumprimentou, sem a simpatia de sempre, o que eu

estranhei, mas preferi não pensar nisso, porque ele

provavelmente estava com algum problema pessoal que


não era da minha conta.

— Boa noite, Carlos — Nicolas respondeu, e nós

nem olhamos direito para o motorista, porque Nicolas

fechou a divisória e me puxou para seus braços,


surpreendendo-me com um beijo. Não faríamos nada ali,
no carro, porque nenhum de nós dois gostava de plateia,

mas foi um contato mais intenso do que eu esperava.

— Sua mulher, hein? — perguntei, erguendo uma


sobrancelha, provocadora.

— Minha. Você é minha, Cerejinha. Somente minha.

Ah, meu Deus... com ele falando daquele jeito, seria

impossível negar. Muito menos quando tomou minha boca

novamente, e nós iniciamos um beijo que parecia infinito e


que eu não queria, de forma alguma, que encerrasse.

Nós nos afastamos por alguns instantes,

provavelmente para respirarmos e nos controlarmos, e eu

vi Nicolas me olhando por sobre o ombro, com uma


expressão surpresa.

— Onde diabos nós estamos?

Assim que ele falou, também olhei para a janela e

também vi que o caminho não era o da casa de Nicolas.

— Eu não sei. Não sei... — comecei a ficar nervosa.


Nicolas abriu a divisória, e nós nos surpreendemos
porque Carlos não estava sozinho. O rosto de Leonardo

surgiu à minha vista, com uma arma na mão. Lá estava a

explicação do porquê de ele ter falado comigo tão


estranho.

— O que é isso? Que merda é essa? — Nicolas

vociferou, colocando-se à minha frente, como um escudo.

Agarrei seu braço com uma das mãos, enquanto com a


outra segurava a minha barriga, meio que de forma

automática e instintiva.

Ficamos mais perdidos ainda quando percebemos

que o carro parou, em um local bem deserto. Não fazia

ideia de para onde estávamos indo.

As portas destravaram automaticamente, e dois


homens as abriram. Nicolas ainda tentou lutar para me
defender, mas foi inevitável. Senti um pano cobrir o meu

nariz e boca, enquanto me debatia e via que estavam


fazendo o mesmo com o homem ao meu lado.
Não consegui resistir e me entreguei, sem fazer
ideia do que Leonardo iria nos causar, mas temendo
principalmente pelo meu bebê.
CAPÍTULO VINTE E DOIS

Fui despertando devagar, me sentindo totalmente

desorientado. Vi tudo girar na primeira tentativa de me


levantar, mas voltei à posição inicial e fechei os olhos,
levando uma das mãos à cabeça. Durante este processo,

minhas memórias foram retornando aos poucos.

Lembrava-me do beijo em Diana e de como ela

fizera a noite ser ainda mais incrível, só reafirmando o que

eu já sabia: que eu estava apaixonado por ela. Tinha


planos de dizer isso naquela noite, enquanto fazíamos

amor, sem fetiches, sem nada além de nós dois, nossos

corpos e nossos sentimentos, mas rapidamente minha


cabeça me levou à sequência da cena.
Houve uma emboscada. Tínhamos sido pegos nela.

Respirei fundo mais algumas vezes e tentei


novamente me levantar, colocando-me sentado. Fui

acometido por uma tontura mais leve, então esperei, ainda

de olhos fechados.

Só que tudo isso foi por água abaixo quando meus

sentidos começaram a retornar, e eu me dei conta que

estava sentindo cheiro de maresia, e onde quer que

estivéssemos, o local estava balançando.

Em um rompante de desespero, abri meus olhos,

ignorando que ainda estava zonzo, e vi que nós estávamos

em alto-mar. Na minha lancha.

Eu estava deitado no chão da parte de dentro e

havia alguém ao meu lado: Carlos.

Apressei-me em checar a pulsação dele, respirando

aliviado por ver que estava vivo, mas ainda completamente


desacordado.
— Carlos! Carlos! — Dei alguns tapinhas em seu
rosto, porque precisava de um aliado naquela história, não

importava o que estava acontecendo.

Só que desisti de tentar reanimá-lo quando um grito

abafado de mulher chamou a minha atenção.

Era Diana.

Cambaleei um pouco ao me colocar de pé, mas fui

caminhando em direção ao som e a vi, sendo levada por


um brutamonte até a beirada da lancha, com punhos e

tornozelos amarrados, uma mordaça na boca e os olhos

arregalados e assustados. A barriga de quase seis meses

se destacava, mas nenhum dos dois homens que nos

mantinha como reféns parecia se preocupar ou se importar

com seu estado, tanto que Leonardo apontava uma arma


para a cabeça dela.

— Seus filhos da puta! Soltem ela! — rosnei como


um animal, querendo me aproximar, mas o brutamonte veio

na minha direção, colocando-se na frente.


Nem pensei, apenas preparei um soco e o acertei,

bem no rosto. Ele era um armário, mas tínhamos alturas


similares, e eu não era um paspalho em matéria de briga.

Sabia me defender e não me importaria nem um pouco em


dar umas belas porradas em um sujeito que estava
ameaçando minha mulher e meu filho.

Ele se desorientou por alguns instantes, mas logo

revidou, e eu cambaleei, principalmente porque ainda não


estava no meu estado normal. Ouvi Diana gritando, por

trás da mordaça, provavelmente preocupada comigo, mas


não demorei a me preparar e retomar o controle.

Minha raiva certamente era maior do que a técnica


ou a força dele, porque parti para cima, enchendo-o de

porradas na cara, nem lhe dando tempo para se defender.


Levei mais um soco no estômago, mais por reflexo dele do

que por qualquer outra coisa, mas com o sangue quente


nem deixei que me abalasse.

Minha intenção era, mais do que dar uma boa lição


naquele capanga idiota, verificar se mais pessoas
surgiriam para ajudá-lo. Só que, aparentemente, só havia o

tal do Leonardo e aquele babaca ali. Então... eu teria que


dar conta dele.

Pensando nisso, usei toda a minha força nos

próximos golpes. Alguns ele defendeu, mas outros o


acertaram, e ele acabou caindo no chão, e eu peguei a
primeira coisa que vi à frente, pesada, usando para bater

na cabeça dele.

— E não é que o playboyzinho é bom de briga? —


Ouvi o filho da puta do Leonardo falar, sem deixar de

apontar a arma para Diana, que estava apavorada.

Meus olhos se voltaram imediatamente para ela,


tentando verificar se estava com algum ferimento. Só que
até mesmo o nervosismo era suficiente para que causasse

algum problema ao bebê. E isso me deixava igualmente


assustado.

— O que você quer, seu filho da puta? — continuei


vociferando, ofegante pela briga.
— A mesma coisa que eu queria antes. Dinheiro. Só
que um pouco mais desta vez, já que tem um herdeiro dos
Sodemberg a caminho.

Ele colocou a mão na barriga de Diana, e ela

estremeceu.

— Não toca nela! — alterei-me, desejando voar


naquele miserável, mas me contendo, porque, por mais
que eu soubesse que ele não atiraria nela, se a estava

usando como barganha para extrair dinheiro de mim, eu


não poderia garantir nada. Se ficasse nervoso e puxasse o

gatilho sem querer...

Porra, eu não queria nem pensar.

— Ok, ok! Não vou tocar no seu bem tão precioso.

Mas é isso... vocês estão aqui, no meio do nada, e eu


posso matar os dois, mais o motorista, sem esforço. Se

jogá-los no mar, vão demorar um bom tempo para


encontrá-los, nem vão desconfiar de mim.

— Quanto quer?
— Um milhão. E ainda estou sendo bonzinho.

Soltei uma risada de desdém.

— Você só pode ser muito burro. Como acha que eu

vou conseguir um milhão agora, no meio do nada, à noite?

A expressão do homem ficou um pouco confusa.

Talvez estivesse drogado e agindo da forma mais impulsiva


possível, com ajuda de pessoas completamente burras,

que não pensaram por ele. Só que, naquele momento, tudo

o que eu queria era que fosse um pouco mais inteligente e


que eu tivesse condições de lhe dar o dinheiro que pedia.

Pagaria qualquer coisa para ter Diana e meu filho em

segurança.

— É melhor você dar um jeito... Eu preciso do


dinheiro agora.

— Eu não ando com um milhão de reais na carteira.

Não consigo sacar nem metade disso, sem um contato

com o banco, especialmente no meio do mar. — Abri os


braços para mostrar onde estávamos e senti o relógio

balançar no meu punho.

Claro que não custava o valor que ele estava me


pedindo, mas era uma relíquia, presente do meu pai.

— Olha... o que eu tenho aqui comigo, agora, é este

relógio. Foi uma herança de família. Se for vendida para a

pessoa certa, pode valer até trezentos mil.

Vi que seus olhos se arregalaram, interessados.

— Mas até eu achar essa pessoa certa...

— Tenho o contato de algumas pessoas no celular,

que já me fizeram propostas por ele. Pode até procurar na

Internet, o que estou dizendo é real.

E era mesmo. Tanto que fui tirando a peça, ainda


focado em Diana, temendo que ele pudesse fazer qualquer

coisa que a machucasse. O que eu precisava era ganhar

tempo.
Tirei o relógio e o deixei sobre uma mesinha, então

pensei em mais uma coisa.

— A lancha! Ela custa muito mais do que você está

pedindo. Um milhão e meio sem dúvidas. Se nos deixar em


qualquer lugar, com o meu celular, para pedirmos ajuda,

você pode levá-la e fugir para onde quiser. Quando vendê-

la...

— Não! — ele exclamou. — Eu não sei pilotar essa

merda. Como vou fazer para fugir? — Só que Leonardo


estava interessado. Eu podia perceber isso.

Então precisava pensar com a razão.

— Posso te levar. Para qualquer lugar. Contanto que

deixe Diana a salvo onde eu te disser para ir.

Ela se remexeu, murmurando algo por trás da


mordaça e chegou a se desequilibrar. Leonardo a segurou

pelo tecido do vestido, puxando-a antes que caísse no mar,

e eu perdi completamente a sanidade vendo a cena. Fora

questão de um segundo. Diana teria despencado na água.


Toda a minha razão se derreteu dentro do cérebro e

minha vontade era pular sobre o filho da puta que nos


ameaçava e enchê-lo de porradas como tinha feito com o

outro, que seguia desacordado.

— Porra, garota! Você é minha mina de ouro. Não

posso te deixar cair! — Leonardo soltou uma gargalhada,


mas ele também estava muito nervoso. — Mas vamos

voltar aos negócios, playboy. Não sei se é uma boa esse

negócio de relógio e lancha. Qual garantia eu tenho de que

vou conseguir vender rápido?

— É pegar ou largar — tentei continuar mantendo a


voz firme, embora me sentisse completamente abalado.

Qualquer movimento mais brusco, e minha mulher cairia no

mar.

Se isso acontecesse, será que eu conseguiria salvá-


la? Ela estava amarrada, não poderia nadar. Estava

escuro, era noite... porra! Aquilo poderia terminar muito,

muito mal.
Olhando ao meu redor, percebi que estávamos na

direção da ilha onde Pedro e Dora moravam. Com certeza

Carlos fora pilotando a lancha, porque ele tirara brevê

depois de começar a trabalhar comigo, e ele sabia


exatamente o caminho. Leonardo, sem dúvidas, não tinha

noção de que colocara seu plano nas mãos de um

funcionário que era extremamente leal a mim. Só esperava


que também estivesse bem.

Tínhamos uma chance se eu conseguisse nos levar

até lá. Pedro e seus filhos e cunhados sem dúvidas nos

ajudariam, especialmente porque um deles tinha porte de

armas e fora marinheiro, tendo se aposentado por um


problema sério na coluna.

Tínhamos, inclusive, um sinal. Eu era um milionário,

famoso e, assim como Leonardo, muitas pessoas

gananciosas poderiam se aproveitar para tentar me


chantagear ou até colocar minha vida em risco por

dinheiro. Por ser um maníaco por controle, nunca

negligenciei este detalhe.


Como muitas vezes eu ficava sozinho na ilha, tendo

apenas a lancha como meio para me locomover,


combinamos uma forma de comunicação. Fosse por

mensagem, por telefonema, fosse ao vivo. Era uma

palavra, um sinal que poderia salvar a minha vida. E,

naquele momento, a de Diana e do meu filho também.

O problema era que eu não tinha a intenção de

colocar mais ninguém em perigo, muito menos pessoas

que eram tão caras para mim. Uma família decente, com

crianças. Só de pensar no pequeno Nuno sendo


ameaçado, era como imaginar alguém apontando uma

arma para o meu próprio filho no futuro.

Ainda assim, era a nossa salvação.

Olhando para Diana, tentei fazer um sinal para que

compreendesse que eu tinha um plano. Arquitetado de


última hora, nada elaborado, caótico, e eu poderia jurar

que alguém acabaria saindo machucado. Só que eu não

tinha escolha.
— Antes de mais nada, posso checar se Carlos está
vivo?

Leonardo pensou por um tempo, mas assentiu.

— Toma! — Jogou um par de algemas para mim. —

Prende ele naquela barra de ferro ali. — Apontou para o

local em questão, e eu fiz o que me pediu, mas também


encenei um verdadeiro teatro, fingindo que tentava fazer

Carlos despertar, mesmo depois de algemado, enquanto

buscava seu celular no bolso – já que o meu não estava


comigo.

Para minha sorte, os babacas deixaram Carlos com

o dele. Peguei-o discretamente e guardei no meu bolso.

— Agora chega, Playboy. Tira logo a gente daqui.

Vou ficar com sua mulherzinha até chegarmos onde você


pretende ir. E sem surpresas, ou ela morre.

Eu precisava ser cauteloso. Muito cauteloso.


Virei-me para Diana e lancei-lhe mais um olhar para
que compreendesse que eu ia tentar nos salvar, e ela
pareceu relaxar um pouco, embora fosse impossível fazê-

lo por completo.

Coloquei-me de frente para o leme, tentando me


posicionar da melhor forma possível para usar o celular.
Percebendo que eu ia fazer algo, Diana começou a

reclamar, se remexer, chamando a atenção de Leonardo, e


isso foi suficiente para que eu conseguisse encontrar o
celular de Pedro na agenda de Carlos e lhe telefonar,

deixando chamar.

— Essa mulher não fica quieta! Porra, vai acabar


caindo! — Olhei na direção deles e vi que tirou Diana da
beira da lancha e a colocou sentada no chão. Menos mal.

Pedro atendeu o telefone, mas na hora que ia falar

com ele, Leonardo olhou para mim.

— Cascavel! — gritei, porque era a palavra de


segurança, e eu sabia que ele entenderia. — Cascavel! —
repeti e encerrei a ligação, jogando o celular no chão e
chutando-o para fora da vista de Leonardo.

— O que diabos você está falando?

— É o nome da ilha para onde vamos. É um


costume marítimo falarmos o nome de nosso destino

assim. Faz com que o trajeto seja tranquilo — menti,


inventando uma história qualquer.

Leonardo pareceu confuso, mas assentiu.

— Ok, você deve saber o que faz. Cascavel, então!

Sim, eu sabia o que estava fazendo.

Ou achava que sim...


CAPÍTULO VINTE E TRÊS

Um vento frio veio em minha direção, atingindo meu

rosto, assim como também levou uma mecha a cobrir meu


olho direito, e eu não podia sequer retirá-la, porque minhas
mãos estavam presas nas costas.

Olhava para Nicolas, e ele parecia concentrado no


nosso caminho à frente, que mais parecia uma imensidão

de escuridão. Sua postura tensa, demonstrando sua raiva,

fazia-me lembrar dos dias de nossos passeios em que


olhei para ele daquela forma, quase do mesmo ângulo,

mas em uma situação completamente diferente.

Ele não retribuía meus olhares, então não conseguia


compreender o que se passava por sua cabeça, embora
pudesse jurar que tinha um plano. Assustada, não

conseguia ficar inquieta, tanto que vi o momento em que


Carlos começou a despertar. Eu o vi puxar a algema,

dando-se conta de que estava preso. Trocamos olhares, e

ele parecia estar constrangido, como se fosse


responsabilidade sua que estivéssemos naquela situação.

— Tá demorando muito, Sodemberg! — Leonardo

falou, mantendo-se em alerta. Não tirava aquela porcaria


de arma de perto de mim, e eu não duvidava que fosse

atirar se achasse necessário.

Eu temia pelo meu bebê. Qualquer coisa que

pudesse fazer para protegê-lo, eu faria. Só que não me

restava muita escolha.

— Espero que não esteja armando nada contra


mim. Eu não vou deixar a garota viva. Vou estourar os

miolos dela. E teu filho também vai para o espaço. Ou para

o mar, né?
Como era possível que não tivesse piedade nem de
um bebê? Do meu bebê?

— Você vai conseguir fugir como quer e ainda vai

ficar com mais dinheiro do que queria antes — Nicolas

falava por entredentes, e eu podia sentir seu humor se

deteriorando. Ele era um homem extremamente

controlado, mas sabia que todo homem tinha um limite. Vi

o que conseguiu fazer com o capanga, que ainda estava


apagado – aliás –, então ele podia ser violento quando

queria. E até que ponto essa violência não explodiria e

colocaria tudo a perder?

Ainda assim, Nicolas continuou. Não parou de

pilotar a lancha, seguindo no que parecia ser uma direção

conhecida e estratégica. Leonardo estava muito


desesperado, sem dúvidas, para não perceber que estava

mexendo com alguém esperto e inteligente.

Eu precisava confiar em Nicolas. Ele iria nos

proteger.
Tentei me remexer um pouco, para observar para

onde estávamos indo, e então eu reconheci o pedaço de


terra que vi. Era a ilha de Pedro e Dora. Aquelas pessoas

tão maravilhosas que nos receberam tão bem.

Nicolas tinha a sua própria ilha, é claro, mas se me


deixasse lá, mesmo com Carlos – se fosse a sua ideia,
embora eu acreditasse que tinha planos de matar o pobre

do nosso motorista – seria muito mais difícil pedir ajuda.

Comecei a ficar um pouco mais esperançosa,


embora ainda não conseguisse sentir um completo alívio.

Sentia como se a noite fosse nos engolir a qualquer


momento, e o mar parecia me assustar àquela hora da
noite, como se estivesse agindo como cúmplice de

Leonardo, embora a natureza não tivesse nenhuma culpa


da maldade e da loucura humana.

No caminho para lá, o capanga de Leonardo

despertou, com o rosto todo ferido, o que contribuiu ainda


mais para o meu medo.
Atracamos na ilha, e Nicolas veio na minha direção,

mas Leonardo se colocou entre nós.

— A gente vai deixar a vadiazinha amarrada assim


na praia. Ela e o motorista. Se derem sorte de alguém

encontrar, beleza. Se não...

— Não foi o que combinamos! — Nicolas exclamou,


embora eu soubesse que não teria problema. As boas
pessoas que conhecíamos acabariam nos ajudando. Ele

estava interpretando, sem dúvidas.

— Foda-se o que combinamos. Ela vai estar segura.


Quando chegarmos em um lugar que eu considere seguro,

pode chamar a polícia. É uma mulher forte, vai sobreviver.


Não serão mais do que algumas horas. — Novamente
percebi que Nicolas iria explodir de ódio, mas continuou no

controle. — Vamos, solta o rapazote ali, mas algeme as


mãos dele para trás.

Nicolas fez o que lhe ordenaram, e Leonardo fez um


sinal para seu capanga, que veio até mim, pronto para me
tirar do chão, mas antes que pudesse fazer isso, houve
uma reação.

Vi Nicolas aproveitando uma oportunidade para


partir para cima de Leonardo, conseguindo desarmá-lo, e

eu vi mais duas pessoas entrando na lancha, sendo que


uma delas estava armada.

Tentei respirar aliviada, mas percebi que Leonardo


não soltara o revólver, e eles ainda estavam engalfinhados.

Um rapaz mais jovem, ao qual eu fui apresentada no dia


em que visitamos a ilha, mas do qual não lembrava o

nome, lidava com o capanga, e o outro, um pouco mais


velho, com seus quarenta anos, chegou armado,

aproximando-se de Nicolas e de Leonardo.

— Se afaste dele! — gritou o homem, apontando


seu revólver, e nós ouvimos um tiro.

Desesperei-me, porque sabia que tinha vindo da


arma de Leonardo; qualquer um dos dois poderia ter sido
acertado. Gritei o nome de Nicolas por trás da mordaça,
mas o som saiu abafado.

Foram os instantes mais longos da minha vida.


Segundos desesperadores em que eu simplesmente me

dei conta de que não era apenas apaixonada por Nicolas.


Eu o amava.

Amava o pai do meu filho, amava o homem que ele

era, sua coragem, o jeito com que tratava a mim e ao meu


irmão. Amava o fato de estar tentando nos proteger a todo

custo e, mais ainda, amava até mesmo seus defeitos.

Nenhum deles me fazia pensar duas vezes. Eu o queria

seguro, queria estar em casa ao seu lado, abraçados,


ouvindo nosso bebê mexer. Não era possível que depois

de tê-lo encontrado, de termos passado por tantas coisas,

ele seria tirado de mim.

Fechei os olhos em um ato de covardia e ouvi o som


de algo caindo no mar. Alguém despencando, talvez.
Abafei um gemido de desespero e queria muito abrir

os olhos para confirmar o que tinha acontecido, mas morria


de medo de ver o que não queria ver.

Senti mãos me tocando, alguém tirando a minha

mordaça, mas eu estava tremendo dos pés à cabeça. Não

era só mais o frio, embora este também estivesse


contando para a reação, mas era o desespero.

— Cerejinha, calma. Abra os olhos. Sou eu — a voz

suave de Nicolas penetrou meus ouvidos como uma

canção de ninar. No momento em que ouvi o apelido já


comecei a me acalmar, mas ao fim de sua fala, consegui

respirar fundo.

Abri os olhos, como ele pediu, e vi Nicolas intacto, à

minha frente, começando a me desamarrar.

— Sou eu, meu amor. O tiro pegou em Leonardo.


Ele caiu no mar. Estou bem. Estamos bem. — Assim que

eu estava completamente solta, ele levou a mão à minha

barriga, como se estivesse tentando se comunicar com


nosso bebê, para saber se ele também estava bem. —

Como você está?

— Assustada. Mas bem — nem sei como consegui

lhe responder alguma coisa, mas minha voz soou frágil


como uma corda bamba.

Nicolas me puxou para seus braços, sussurrando

um “ainda bem”, e assim que me aninhei em seu peito e

que ele colocou seu paletó nos meus ombros, para

amenizar meu frio – porque obviamente percebera que eu


estava tremendo –, comecei a chorar.

Era a adrenalina finalmente se dissipando, dando

vazão para o pânico.

— Calma, amor, vamos cuidar de você.

Nicolas me ergueu em seus braços, e eu continuei


com a cabeça enterrada em seu peito, chorando, por tudo

o que poderia ter acontecido. Por meu bebê, que nem

havia nascido, mas que correra tanto perigo.


Eu não havia pegado meu menino nos braços ainda,

porque havia um pequeno caminho até que isso


acontecesse. Três meses de espera, que eu sabia que se

tornariam uma eternidade. Mas com ele na barriga, eu já

me sentia mãe. Já sabia que iria amá-lo com todo o meu


coração, protegê-lo e que ele se tornaria o centro do meu

mundo. Fora concebido da forma mais louca possível, mas

estava ali. Tinha que ser meu. E se eu ainda tinha alguma

dúvida de que daria minha vida por ele, naquela noite ela
desapareceu por completo. Eu temi mais por minha

segurança por causa dele. Assim como temi pela de seu

pai, não só porque o amava, mas porque queria que nosso


filho o conhecesse, que tivesse a sorte de tê-lo.

Nicolas foi me levando pela ilha, até a casa já

familiar de Pedro e Dora, onde algumas pessoas nos

aguardavam. A mulher nos indicou um quarto, para onde

fui carregada, e todos me cercaram, enchendo-me de


cuidados e de amor.

Nicolas beijou o topo da minha cabeça, ainda

parecendo agir no modo automático, avisando que iria


precisar se juntar aos outros para resolver as pendências.

Eu sabia quais eram. O capanga e o corpo de Leonardo. A

polícia precisava ser acionada.

Quando ele passou pela porta, senti novamente a

mão maternal de Dora no meu ombro, enquanto a outra se


posicionava sob o meu queixo, obrigando-me a olhá-la.

— Está tudo bem, querida. Vai ficar tudo bem.

Sim, era nisso que eu precisava focar. Não

importava quantas pessoas repetissem, eu tinha que

colocar aquela certeza na minha cabeça. Estávamos


seguros. Nada mais iria nos importunar.
CAPÍTULO VINTE E QUATRO

OITO MESES DEPOIS

Eu faria absolutamente qualquer coisa por eles, era


o que meu pensamento gritava enquanto eu observava a
cena de Diana amamentando o pequeno Joaquim, nosso

lindo bebezinho.

Ela estava sentada em uma cadeira de balanço,

movimentando-se para frente e para trás, embalando a

criança, que olhava para ela como se fosse a coisa mais


preciosa da face da terra.

E, bem, nosso filho não era bobo, porque Diana era

isso e muito mais.


Todas as vezes que via os dois daquele jeito, em

toda a cumplicidade que somente mãe e filho podiam


compartilhar, eu me perguntava como tive coragem de

pensar que poderia ter um bebê sem uma mãe. Que uma

barriga de aluguel seria suficiente?

Quantos momentos como aquele eu não perderia?

Mas é claro que as coisas só eram tão especiais

porque eu tinha encontrado a mulher certa. Por mais que

nosso relacionamento fosse recente, Diana provava, cada


dia mais e mais, que era perfeita para mim. Ela

compreendia meu jeito mais fechado, sem questionar e

sem reclamar, respeitava meus momentos, era uma

excelente companheira e... na cama... nós continuávamos


a nos entender muito bem.

Claro que depois de tudo o que aconteceu, esperei

seu tempo para retomar meus fetiches, especialmente

porque fora mantida como refém, mas estávamos

retomando nossa vida sexual normalmente, conforme os

desejos dela.
E minha mulher continuava insaciável, assim como
eu era por ela.

Mas naquele momento eu só conseguia pensar em

ternura ao olhá-la com meu filho, cantando baixinho.

Ao se dar conta da minha presença ali, ergueu os

olhos e abriu um sorriso. Apesar de tudo, ela ainda

mantinha aquele ar de inocência que me conquistara

desde o início, desde quando era apenas a minha


secretária.

— Há quanto tempo está aí? — indagou, com os

olhos brilhando. Era sempre assim que ficavam quando

olhava para mim. Isso me fazia sentir como se eu fosse a

porra do dono do mundo.

Possuía uma das empresas de turismo marítimo

mais lucrativas do mundo, mas nada elevava minha

autoestima como o amor da minha garota.

— O suficiente para ficar hipnotizado com a cena.


O sorriso de Diana se alargou, e ela se voltou para

Joaquim, usando um tom de voz suave e doce:

— Olha quem chegou, filho. O papai.

Eu nunca iria me acostumar com aquilo; a forma


meiga com que ela se referia a mim para nosso filho. Tinha

vivido a experiência de ser pai uma vez, mas por pouco


tempo, e precisava me controlar muito para não sufocar
Joaquim e sua mãe com minha proteção, mas a verdade

era que estava tentando aprender a viver um momento de


cada vez e a valorizar cada um deles. Diana estava me

ensinando isso.

Tirei o bebê de seus braços, sentindo-o tão pequeno


e indefeso nos meus, que, aparentemente, era perceptível.

— Eu falo isso há cinco meses, Nicolas. Ele não vai


se desfazer nas suas mãos.

Não consegui conter um sorriso, porque ela, de fato,


repetia aquilo quase que diariamente. Eu me sentia tenso,
com meus músculos contraídos, toda vez que Joaquim era

acomodado daquela forma em meus braços.

Ele se remexeu, e eu vi um sorrisinho se abrir em


sua boquinha rosada e pequena, como se me ver o

deixasse feliz. Soltou um sonzinho delicioso também,


quase uma risada, e eu suspirei, derretendo-me.

— O Homem de Ferro perde toda a pose com o


filho, não é mesmo? — Diana comentou, enquanto se

levantava, ajeitava o decote e colocava-se ao meu lado,


passando a mão na cabeça de nosso filhinho, penteando

seu cabelinho dourado como o meu.

— E com você também. — Inclinei-me para beijá-la,


e ela retribuiu com a ternura de sempre.

— O pessoal já chegou?

— Estão chegando. João é um ótimo anfitrião e está


lá, nos representando.
Tínhamos convidado nossos amigos, com a
desculpa de que era um jantar para que vissem Joaquim,
mas eu tinha outros planos.

— Seja como for, eu preciso me arrumar — Diana

afirmou, se afastando um pouco, pegando o que tinha


deixado sobre a cadeirinha de balanço

— Não precisa. Está linda como sempre. Mas se


quiser, posso ir levando Joaquim lá embaixo.

— Você é muito lisonjeiro, então, sim. Se puder ir

entretendo as pessoas.

— Joaquim vai fazer esse trabalho. Ele é fofinho o

suficiente para isso. Você sabe que eu não sou o melhor


com pessoas.

Um sorriso de canto, quase cínico, surgiu no rosto

de Diana.

— Isso é o que você pensa.


Com isso ela saiu da minha frente, entrando na suíte
para tomar um banho, então eu fui cumprir o meu papel,
descendo e encontrando as pessoas.

Quando cheguei lá embaixo, todos já tinham

chegado: Francisco e sua esposa, Flávio, as duas Anas e


até Pedro e Dora – somente eles, porque era difícil

locomover a família toda de uma vez só, mas eu daria um

jeito de todos ficarem a par de tudo o que iria acontecer.

Obviamente Joaquim se tornou a atração do evento,

fazendo suas gracinhas, e eu tinha certeza de que ele seria

um conquistador quando mais velho. Eu e Diana teríamos

muito trabalho para dar conta.

Meu bebê passou de mão em mão, e Maria serviu


algumas bebidas para nós, enquanto Diana não descia.

Quando chegou, porém, minha atenção foi praticamente

toda tragada para ela, o que me causou um cutucão de


Flávio, com o comentário:
— Para quem não ia se apaixonar, você parece bem

fascinado.

Ele mal sabia o quanto.

Ela recebeu os convidados, e eu sentia como se

brilhasse no meio de todas as pessoas. Seus sorrisos, a

forma como tratava a todos, como fazia seu papel de mãe

em meio aos amigos, como parecia se deleitar de orgulho


de nosso bebê, contando sobre cada pequena conquista

que ele fazia a cada dia.

Não que eu tivesse qualquer dúvida, mas eu parecia

olhar para ela e ter mais certeza ainda do que estava


prestes a fazer.

Maria veio avisar que o jantar estava pronto, prestes

a nos guiar para a sala de jantar, mas ergui uma das mãos

e pedi:

— Vocês podem esperar um pouco? — Todos


pararam, se voltando para mim, confusos.
Joaquim estava no colo de Ana Maria, e eu

aproveitei isso para estender a mão para Diana. Um pouco

surpresa, ela aceitou, permitindo que a puxasse para mim.

Beijei sua mão, e eu fiquei um pouco intimidado pela


plateia, mas sabia que era necessário, porque eu queria

que Diana entendesse que eu não queria mais conter

meus sentimentos. Queria que todos soubessem que

nossa união não se tratava apenas de um relacionamento


de conveniência, que era real. Ao menos com nossos

amigos.

Tirei uma caixinha de dentro do bolso da calça e me

ajoelhei. Ouvi uma exclamação ininteligível vinda das


mulheres, especialmente Diana, que levou uma das mãos

à boca, com os olhos arregalados.

— Nicolas! — Ela ofegou, e eu gostei do fato de tê-

la surpreendido.

— Você sabe o quanto eu não acreditava que as


coisas poderiam dar certo de uma forma que não fosse
aquela que delineei para mim, não sabe, Cerejinha? — Vi

os olhos de Diana marejarem. Vê-la chorar não era algo


que me agradasse, mas daquela vez era por uma boa

causa. — Passamos por maus bocados e sei que ainda

vamos passar por muitas coisas... — Claro que eu


esperava que não fosse mais nada tão sério quanto

Leonardo – cujo corpo fora encontrado, aliás –, mas

imaginava que a vida de um casal tinha seus percalços.

Queria ultrapassar todas as barreiras com ela. — Mas sei


que teremos força para vencer e nos mantermos firmes em

todas as tempestades.

— Sim. Eu também sei.

— Que bom. — Sorri, ainda me sentindo um pouco

constrangido por causa de toda a cena, mas tentando me


acostumar. Aquela mulher merecia tudo de mim. — Porque

eu realmente espero que você decida passar o resto de

sua vida comigo. — Abri a caixinha, revelando o anel, com


uma bela pedra de diamantes. — Aceita se casar comigo?
— Claro que sim! — Ela nem hesitou, então eu

coloquei o anel em seu dedo, levantei-me e a tomei nos

braços, erguendo-a do chão e girando-a, comemorando a

vitória.

Nossos amigos começaram a bater palmas, e eu a


beijei, depois de colocá-la sobre seus próprios pés

novamente. Inclinando-me, sussurrei em seu ouvido:

— Eu te amo. — Era a primeira vez que dizia isso.

Mesmo depois de tantas coisas, depois de ter mais do que


certeza a respeito do que sentia, privei-me de usar as

palavras, porque elas ainda eram muito difíceis para mim.

Usei-as com Taís, e nem sabia se era verdade.

Naquele momento, tendo completa certeza do que eu


sentia por Diana, comecei a perceber que meus

sentimentos pela minha falecida esposa eram sinceros,

mas não tão intensos quanto pensei anteriormente.

Obriguei-me a tentar amá-la e falhei, porque não era para


ser. Ela também não retribuía, e talvez se tivéssemos sido

menos teimosos, tanto ela quanto Júnior estariam vivos.


Mas não era hora de pensar nisso. Eu amava Diana,

queria que ela soubesse disso, então olhei em seus olhos,


vendo-os ainda mais marejados.

— Eu também te amo. Ah, Nick... queria tanto falar

logo isso. Parecia que estava prestes a explodir.

— Por que não disse antes? — Esquecendo

completamente que tínhamos plateia, levei a mão ao seu


rosto e o acariciei com as costas dos dedos.

— Porque tinha medo de ser precipitado, de você se

assustar... Não sei. Só estou feliz que agora está tudo

esclarecido.

Peguei a mão dela e beijei o anel.

— Sim, tudo esclarecido. E eu espero que a gente


nunca mais deixe de falar o que sente um para o outro. É

uma promessa que te faço, aqui e agora.

— Nunca mais — ela respondeu, sorrindo

amplamente. — Eu te amo — repetiu, e a frase nunca soou


tão bonita.

— Eu também te amo, Cerejinha.

Puxei-a para outro beijo, em meio às palmas de

nossos amigos. Todos eles eram testemunhas de um amor

que eu sabia que iria durar para sempre.


EPÍLOGO

“MILIONÁRIO QUE PENSAVA EM BARRIGA DE ALUGUEL


ANUNCIA A GRAVIDEZ DE SEU TERCEIRO FILHO”.

Como vocês bem sabem, passamos a evitar falar sobre Nicolas


Sodemberg, desde o episódio com nossa antiga repórter, em

que ela foi censurada e ameaçada pelo milionário. Ainda assim,


gostamos de boas notícias e precisamos falar sobre este casal,
que se tornou o queridinho da alta sociedade brasileira.

Nicolas e Diana Sodemberg, que já são pais do fofo Joaquim e


da adorável Mariana, anunciaram à imprensa que serão pais
novamente. De acordo com seus assessores, já foi confirmado

o sexo do bebê, que será um menino, mas ainda não há


novidades sobre nomes. Ou seja, a poderosa família

Sodemberg está crescendo.

Apesar de nossas ressalvas com o Homem de Ferro – que

parece ter derretido um pouco depois que sua linda senhora

entrou em sua vida –, desejamos muitas felicidades à sua


família e saúde aos seus belos filhos. E, claro, ainda mais

poder, porque o homem é um Midas e não para de enriquecer.

Qualquer novidade sobre os Sodemberg, traremos em primeira

mão aqui para vocês!

FIM

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