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Copyright © 2021 ALBA LUCCAS

Capa: Gabriela Ferreira


Revisão: Leticia Tagliatelli
Diagramação: April Kroes

Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens,


lugares e acontecimentos descritos são produtos da
imaginação da autora. Qualquer semelhança com
nomes, datas e acontecimentos reais é mera
coincidência.

Todos os direitos reservados.

É proibido o armazenamento e/ou a reprodução de


qualquer parte dessa obra, através de quaisquer meios
(tangível ou intangível) sem o consentimento escrito da
autora. A violação dos direitos autorais é crime
estabelecido na lei nº. 9.610/98 e punido pelo artigo 184
do Código Penal.2018.
Sumário
Sinopse
Epígrafe
Playlist
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Epílogo
Agradecimentos
Melissa sabia que iria falecer e que o marido ficaria sozinho, completamente
sozinho, pois ela era sua única família.
Seu marido tinha poucos amigos e foi quando ela tomou uma decisão muito
difícil, mas necessária.
Ela não poderia contar ao marido que não concordaria com algo assim.
Nunca.
Jamais mesmo.
Ela contratou sem que Oliver soubesse uma barriga de aluguel para dar a ele
o que ela não poderia mais dar. Não apenas um herdeiro para o império que
o sobrenome Giordano traz, mas um filho a quem amar.
Quando Melissa conheceu a gentil professora de jardim de infância, Isis,
soube que tomou a decisão certa.
Oliver Giordano não entendeu quando uma moça com um bebê recém-
nascido no colo chegou em sua empresa com uma carta detalhada de sua
esposa lhe contando o que ela planejou para o futuro dele.
Primeiro ele não acreditou depois ficou em choque, mas ao ver o bebê tudo
mudou.
O sofrimento diário de Oliver, de se levantar todos os dias para uma vida
vazia, muda de repente.
Algo que ele nunca imaginou ser possível acontece, Oliver teria uma família
novamente.
Mas a criança precisa de uma mãe e até nisso, Melissa pensou.
Agora Oliver Giordano está de casamento “quase” marcado com a futura
mãe de seu bebê e ela nem sabe disso.
Tudo que Oliver sabe é que seu filho e Ísis trouxeram luz e amor para vida
solitária e vazia.
O CEO bilionário se surpreende ao perceber como aos poucos aquela doce
e linda jovem ganha espaço em sua vida e o atrai de um jeito que o
perturba demais, mas ela o aceitaria como marido?

E ele seria capaz de fazê-la feliz?


A coisa mais importante que você irá aprender é
amar e ser amado em troca.
Moulin Rouge
SPOTIFY
OLIVER

Hoje é um dia relativamente exaustivo na sede da minha empresa em


Florianópolis. Quando consigo sair da sala de reuniões e me ver livre dos
acionistas, volto para minha sala. Felícia, minha assistente, me informa que
tem uma videoconferência com parceiros de negócios no exterior
aguardando por mim.
Ser o CEO de uma multinacional como o Grupo Giordano S.A. tende a
ser enervante a maior parte do tempo, mas inegavelmente foi onde encontrei
forças para enfrentar, ou fugir da minha dor, do meu luto.
Mas agora, depois das 19 horas, ainda tenho aquela sensação de que o
ponto alto do meu dia ainda está por vir, então permaneço em meu escritório
sentado, apenas esperando.
Toda ansiedade começa a me consumir por não saber o que vai
acontecer.
Comando a empresa que carrega o título de maior produtora de soja do
Brasil e sou conhecido por ser excepcionalmente bom no que faço. Sempre
consigo isolar um problema e pensar de forma racional, mesmo que tudo ao
meu redor seja um caos. Eu nunca perco o controle, nunca me precipito e
muito menos transpareço como estou me sentindo.
Me formei em Administração de Empresas, me especializei em
agronegócio e me sinto preparado para tudo, menos para isso.
Mal consegui dar o nó na gravata enquanto me vestia esta manhã, o que
é incomum para mim. Na verdade, percebi que perdi a habilidade de fazer
coisas simples após uma noite maldormida.
Estou me reencontrando aos poucos.
Acordar e sentir que não estou no lugar certo, quando estou dentro da
minha própria casa é confuso, mas não é a localização, é a ausência dela que
faz com que a casa que construí para formar uma família ter perdido seu
propósito.
Contudo, afundado no trabalho, sinto tudo se encaixar outra vez. As
horas que passo aqui me fazem esquecer o que me aguarda quando voltar
para casa. No trabalho, eu sei exatamente o que fazer e aqui eu nunca hesitei.
É como se eu vivesse duas vidas: uma aqui neste arranha-céu de cinquenta
andares e outra quando entro em minha casa, em meu quarto e, mais uma vez,
percebo que ela não está lá.
Eu me considero um homem calmo, objetivo e sempre tenho tudo sob
controle, ou pensava que tinha, pelo menos.
Até perder a Melissa.
Hoje, é o meu aniversário, tinha até um jantar para ir que acabei
cancelando com meu melhor amigo por conta desta reunião. Mas já que se
trata da minha falecida esposa, eu largaria tudo e pela primeira vez desde
que ela faleceu há dois anos, não estou pensando na saudade e nos momentos
felizes em que passamos juntos, ou em como ela era especial por ser minha
única família.
Eu sempre agradecia por ter Melissa na minha vida, mas exatamente
agora, me pergunto o que ela aprontou antes de partir.
Vou explicar melhor.
Uma semana atrás, uma advogada chamada Anete Sulivan entrou em
contato comigo alegando ter sido contratada pela minha esposa antes falecer,
solicitando que eu arrumasse na minha agenda um horário para marcar uma
reunião com uma tal de Isis Mancini, justamente hoje, no meu aniversário.
Meu Deus, quem é Isis Mancini?
Pesquisei seu nome na internet e não encontrei nada. Ao menos eu sei
que se trata de uma pessoa desconhecida.
Mas, ah, Melissa... O que você aprontou, meu amor?
Já é noite quando acabo ficando sozinho no escritório.
Daqui vejo a ponte Hercílio Luz começar a se iluminar conforme o céu
em tons de rosa, azul e roxo vão dando espaço ao breu noturno. Está ficando
cada vez mais perto do horário que combinamos, mas, surpreendentemente,
alguém bate à minha porta e já sei que se trata dela que está quinze minutos
adiantada.
Limpo a garganta e me ajeito na poltrona.
— Entre — ordeno em alto bom tom.
Finjo estar distraído o suficiente com algo em minha agenda aberta em
uma página aleatória, mas não consigo me aguentar quando a porta é aberta e
a primeira pessoa que identifico – a julgar pela postura rígida, uma pasta
escura debaixo dos braços e vestes formais de advogada –, é Anete, e então
outra mulher entra em seguida, é uma jovem linda demais para não ser
admirada demoradamente. Porém, ela segura um amontoado de manta azul-
claro. Demoro para entender o motivo dela estar segurando um pano, até
perceber algo se mexendo sutilmente e logo depois soltando um sonzinho
agudo e preguiçoso.
Um bebê.
Levanto e cumprimento primeiro Anete, mas sem conseguir tirar os
olhos da mulher atrás dela que parece consideravelmente assustada comigo,
além de cansada. Mas nada disso anula a sua beleza.
— Boa noite, senhor Giordano, obrigada por nos conceder seu
precioso tempo — diz a advogada, em seu terno cinza alinhado e então,
indicando a moça. — Esta é Isis Mancini, a mulher que mencionei. E nós
duas estamos aqui atendendo um dos últimos pedidos da sua falecida esposa,
Melissa.
Apenas a cumprimento com um menear de cabeça e aguardo por mais
esclarecimentos, ainda sem entender do que se trata tudo isso.
— Boa noite, senhor Oliver — se dirige a mim com certa hesitação,
um pouco tímida também, eu diria. — É um prazer conhecê-lo.
— Igualmente. — Fico a encarando por tempo demais, a ponto de
fazê-la desviar o olhar de volta para o bebê em seu colo. Balanço a cabeça e
olho de volta para a advogada, tentando assumir a dianteira. — Perdão, mas
o que tudo isso significa?
As duas mulheres se entreolham, Isis começa a aninhar o bebê que
parece ter despertado agora e é ela quem dá o primeiro passo.
— Eu conheci a sua esposa alguns anos atrás, senhor Oliver. Fui
considerada uma doadora compatível de medula óssea para ela. Não sei
como, mas a Melissa deu um jeito de me encontrar, apesar do sigilo em que
são mantidas essas informações. Ela queria me agradecer pessoalmente,
disse que precisava saber quem eu era e ... Eu gostei dela de cara. Ela era
gentil e tão fácil de se afeiçoar. Era sincera e autêntica em tudo que fazia, o
que só me fez ter certeza da importância da doação na vida de quem recebe a
notícia que enfim encontraram um doador. Ela me disse que queria ser minha
amiga, apesar de nunca termos nos vistos antes e eu senti que nos
tornaríamos boas amigas.
Amigas?
Tento puxar na minha memória se algum dia Melissa falou sobre ela,
mas não me vem nada, ao mesmo tempo que não quero verbalizar isso para
acabar a deixando desconfortável. Prefiro deixá-la continuar o que tem a me
dizer, é por isso que está aqui.
— Pouco tempo depois de conhecê-la, meu pai sofreu um acidente de
carro e quase morreu por isso — revela com a voz embargada devido a
lembrança, porém, logo um sorriso gentil surge em sua boca.
Posso ver como o sorriso dela é bonito, mas afasto este pensamento
inadequado imediatamente e foco no que ela ainda tem a dizer.
— Melissa foi me visitar, não me encontrou em casa e soube que
estava em um hospital público com meu pai. Não havia leito para ele e o
deixaram em uma cama junto com vários outros pacientes na mesma
situação. Ele ficou três dias no corredor mesmo, mas quando a Melissa me
achou... Ela foi tão generosa e ... Quando eu dei por mim, ele estava sendo
transferido de helicóptero do hospital de Blumenau para o melhor hospital
daqui de Florianópolis. Eu disse que não tínhamos como pagar por tudo
aquilo e ela me disse... — Faz uma pausa e sorri como se lembrasse
exatamente daquele momento: — Ela disse, “sua amiga tem como pagar,
então só se preocupe em estar com seu pai agora.” Ela literalmente salvou
a vida do meu pai, foi o que o médico disse.
“Um dia a mais sem os cuidados que a gravidade de seus ferimentos
exigia, eu o teria perdido. Quando chegamos o levaram direto à UTI.
“Estou contando tudo isso, senhor Oliver para que entenda que nada do
que eu faça na vida será suficiente para demostrar a minha gratidão. Eu
nunca poderia retribuir Melissa pelo que ela fez.
“Meu pai é tudo que eu tenho e eu faria qualquer coisa por sua esposa.
Faria o que fosse necessário pra expressar quão grata eu sou.”
Sua voz fica embargada e ela esconde os olhos marejados, piscando
rapidamente algumas vezes.
— Qualquer coisa.
Aceno entendendo aquela história porque era do feitio de Melissa
ajudar as pessoas ao seu redor. Ela era assim, generosa e autêntica.
Melissa e Domenico, seu irmão e meu melhor amigo, tem essa natureza
de se importar em cuidar dos outros como se fossem seus. Porém, não
entendi ainda aonde Isis queria chegar com toda essa explicação.
Cruzo os dedos e apoio os cotovelos na minha mesa:
— Imagino que essa coisa que disse que faria seja o motivo de você
estar aqui. — Cruzo os braços ao observar a situação.
Percebo Isis franzir o nariz como se o que falei a tivesse desagradado
de algum modo.
— Bem, não é uma coisa — me corrige ajeitando o bebê em seus
braços que está chupando agora um dedo.
Ele é tão novinho, deve ter um mês, creio eu.
— Mas, Melissa tinha um medo e um desejo. O medo dela era de que
o senhor ficasse sozinho depois que ela partisse, pois ela era a única pessoa
a quem poderia chamar de família. E o maior desejo de Melissa era ser mãe,
ter um bebê com o senhor e aumentar a família. Mas sabemos o que
aconteceu, então...
Eu vejo sinceridade no seu olhar triste, ninguém seria capaz de
dissimular dor assim. Essa moça conheceu minha esposa, se afeiçoou a ela e
foi recíproco pelo que parece. A morte de Melissa a perturba ainda também,
a ponto de emocioná-la e sinto certa cumplicidade nessa dor compartilhada
com esta estranha, mas isso não me impede de racionalizar tudo que estou
ouvindo. Esta mulher é uma completa desconhecida para mim, e Melissa
falou da nossa vida para ela, falou de mim.
No meu rosto deve estar estampada uma interrogação nesse momento.
Respirando fundo, Isis parece reunir forças para continuar.
— Melissa quis ter um bebê seu. Sei que vai ser complicado entender
isso agora, mas, sua esposa conseguiu — conclui a moça receosa esperando
pela minha reação.
Mas não tenho reação nenhuma, fico paralisado, pisco algumas vezes e
não entendendo como eu poderia ter tido um filho com Melissa.
Nada disso faz sentido, ainda mais depois que ela havia iniciado o
tratamento de radioterapia e quimioterapia.
Continuo sem reação e palavras como oportunista e golpe soam como
alarmes em minha cabeça, mas não as verbalizo.
Isis aconchega o bebê em seus braços mais um pouco, caminha em
minha direção, dando a volta na grande mesa de madeira maciça, e agora
posso vê-lo bem. Por uma fração de segundos e mesmo sendo tão novinho,
me vejo nele.
“Não, não tem como”, penso.
— Este é Oliver Matteo Giordano Filho — revela pausadamente, para
que eu pudesse absorver bem cada palavra. — Seu filho e de Melissa.
Olho para o bebê, que parece com os olhinhos bem curiosos olhando
tudo à sua volta, ao mesmo tempo que parece só ouvir a nossa conversa. É
quando esboço um sorriso e me inquieto completamente confuso.
— Não, deve haver um engano. Isso é impossível! — E é com o
coração na mão que ressalto: — Melissa e eu não tivemos um filho e, mesmo
que tivéssemos um, ele não seria tão pequeno assim.
— Acontece que Melissa planejou tudo antes de partir — a advogada
diz com firmeza.
Ainda acho graça da situação.
— Como Melissa teria feito isso? Como posso ter certeza de que
vocês...
— É natural que desconfie, senhor Giordano. Algo assim é difícil de
se conceber e é natural que considere que pode estar sendo vítima de um
golpe.
A advogada leu meus pensamentos e percebo a mudança na postura
corporal de Isis. Seu sorriso se apagou e ela não conseguiu disfarçar que
estava ofendida.
— É que nada disso faz sentido algum... — confesso, passando os
dedos por meu cabelo.
— Chama-se barriga solidária, senhor Giordano. Mas você deve
conhecer melhor como fertilização in vitro. Cada vez mais comum entre
casais que não podem ter filhos, mas que tentam outros métodos para usufruir
da maternidade — Anete explica.
Porra!
Automaticamente sinto o suor escorrer por minhas costas por debaixo
da camisa social, embora o ar-condicionado esteja em agradáveis 21 graus.
Afrouxo até mesmo minha gravata para aliviar a sensação de sufocamento.
— O seu material genético estava disponível no banco da clínica
especializada. E é importante enfatizar que na inseminação também foram
usados os óvulos de Melissa retirados antes do tratamento para combater o
segundo tumor começar.
— Melissa nunca falou nada sobre isso. Nunca! — rebato — Por que
ela me esconderia algo assim?
— Quando sua esposa me procurou, ela foi categórica ao afirmar que
o senhor não concordaria com seus termos e que somente no dia do seu
aniversário de 36 anos deveríamos apresentar seu filho e contar tudo que ela
planejou. Era o que ela queria, senhor Giordano, ela queria que tivesse uma
família. As exatas palavras dela foram: "Oliver precisa ter alguém para
amar, seu coração é cheio de amor, embora ele nem saiba disso. Eu o
conheço melhor que ele mesmo." — afirma Anete e meu coração acelera.
Aquelas foram as últimas palavras de Melissa para mim, “Você
precisa de alguém para amar, seu coração é cheio de amor, Oliver. Eu sei
disso melhor do que ninguém." Logo depois ela se foi e a mão que estava
em meu rosto, caiu sem vida sobre a cama do hospital.
Melissa nunca me escondeu nada, então por que esconderia algo tão
relevante como um filho?
Olho da advogada para a moça com a pele em tom de caramelo parada
com o bebê em silêncio a poucos metros de mim agora. Vejo compreensão
em seu olhar agora. Ela não parece se sentir mais insultada, mas permanece
em silêncio agora com seus olhos fixos em mim.
Isso estranhamente me traz algum conforto agora.
Ela parece entender o conflito interno que estou enfrentando e nem sei
o que pensar.
— Eu não posso aceitar que esta criança é meu filho e que Melissa fez
tudo isso em segredo apenas... Apenas baseado no que acabaram de me
dizer. Eu sou um homem pragmático e preciso de provas.
— Obviamente, senhor Giordano. Eu orientei juridicamente sua esposa
para que todo o processo legal fosse devidamente formalizado. — Anete
retira de dentro da sua pasta escura um amontoado de papéis.
O silêncio que paira no meu escritório é tenso. Não sei bem o que
estou sentindo, mas sei que tanto eu, quanto Isis estamos nervosos o
suficiente para gerar uma tensão entre nós dois.
— Estes documentos informam os termos assinados por Melissa e Isis
na época. — Estende os papéis em minha direção.
Quando ergo minha mão para pegar, me surpreendo com o peso do meu
braço e a forma como tremo.
— O senhor pode ler tudo com calma, não estamos com pressa.
Também, pode apresentar ao seu advogado para que ele aprecie a
legitimidade de tudo.
— Certo. — Indico as poltronas para elas. — Fiquem à vontade.
— Obrigada. Venha, querida.
Fico vendo Anete conduzir Isis até uma das poltronas, próxima a
janela. Ela parece ser tão jovem, tão doce e preocupada em analisar cada
reação minha.
Quando elas estão acomodadas, leio os termos assinados por Melissa,
há dois anos. Ao ver pela data, foi bem antes do seu câncer se agravar e ela
descobrir que seria terminal, antes do nosso mundo desabar. O pior é que a
assinatura pertencia de fato a ela, mas hoje em dia é muito fácil falsificar
assinaturas. Ainda não me sinto convencido.
Leio os mesmos termos que Isis precisou ler e assinar também.
Ela é a mãe, quem se ofereceu para ser barriga de aluguel do meu filho
com Melissa.
Levanto meus olhos dos papéis em direção a ela.
— Então esse foi o jeito que você conseguiu demonstrar sua gratidão
pelo que Melissa fez ao seu pai? — pergunto curioso.
— Sim, e eu teria feito muito mais — responde com determinação com
os olhos escuros que parem ser tão misteriosos.
Assinto bastante surpreso por sua nobreza para com Melissa.
Imagino que foram boas amigas mesmo na época, e talvez agora faça
sentido o motivo de não a ter conhecido naquele tempo. Observo mais um
pouco o papel, e a data me faz surgir uma nova pergunta:
— Dois anos... Faz dois anos que isso aconteceu. — Sacudo o papel.
— Pra falar a verdade, já vai fazer quase três, pois foi bem antes da Melissa
começar a definhar. — Meus braços despencam, mas seguro os papéis com
força. — Por que só agora?
Ela dá um sorrisinho tímido, tão genuíno que parte do meu nervosismo
se esvanece. É como se eu a conhecesse há tempos, e se Melissa confiou
nela, significa que eu não tenho o que temer.
— Bem, se considerar que a gestação durou nove meses, não foi algo
que decidi fazer agora — explica. — Além do mais, precisei de toda uma
preparação antes, até mesmo como passar por sessões com psicólogo... Bem,
Oli é seu filho e de Melissa, e em algum momento ele será todo seu.
Isso parece desestabilizá-la um pouco.
— Mas você criou vínculo com o bebê — suponho.
— Irei cumprir com o acordo que fiz com Melissa de lhe entregar seu
filho, senhor Oliver, mas foi inevitável não amar este bebê.
Dou uma rápida conferida nos termos.
— Bem, aqui não diz nada sobre você nunca mais ver o bebê.
— A Isis entende que a criança não é dela, senhor Oliver e assinou um
contrato abdicando de qualquer direito com relação ao bebê. É isso que o
está preocupando agora? — a advogada pergunta desconfiada.
— Estou sendo honesto e sensato, apenas isso — me defendo, me
sentindo ofendido.
A observo atentamente pela primeira vez, Anete é alta, branca e tem o
cabelo com o corte Chanel preto, que dá a ela associado a este terninho
elegante, uma postura rígida e inflexível. Diferente de Isis, que deve ter
aproximadamente 1,60 m. de altura e cabelo castanho parcialmente preso em
uma trança lateral. Ela tem a pele morena, em um tom caramelo e uma
aparência delicada, mas eu também vejo força em seus olhos quando nossos
olhares se encontram como agora. Ela parece ter pouco mais de 20 anos de
idade e tem os olhos meigos.
Confesso que gosto disso.
A advogada mantém sua postura extremamente rígida se colocando
entre Isis e eu.
— Melissa escreveu duas cartas, senhor Giordano. Há uma carta que
ela deixou destinada ao senhor e está logo atrás do último documento.
Me coloco de pé, rapidamente folheio os papéis e encontro ali,
grudado ao papel maior, um envelope médio e de tom terroso. Quando o
pego, esqueço rapidamente dos outros e tiro cuidadosamente o papel de
dentro do envelope que supostamente Melissa deixou para mim com meu
coração acelerar só de pensar em ter algo deixado por ela.
Hoje em dia lido melhor com isso, mas se é uma coisa dela para mim,
eu fico sem chão.
Pego o papel como se fosse se destruir em frangalhos entre meus
dedos e há um cheiro bem suave de perfume que reconheceria em qualquer
lugar, perfume da minha esposa.
A fragrância é fraca, mas eu consigo senti-la de imediato, o que me faz
acreditar que o envelope ficou muito tempo ali naquela pasta sem ser tocado,
e agora já me sinto quase convencido.
Mas não termina por aí.
Assim que abro, percebo várias linhas contendo a caligrafia de
Melissa, é como se ela estivesse me dando um “oi” depois de dois anos da
sua ausência.
Me escoro à mesa para não cair, pois minhas pernas parecem duas
gelatinas.
É difícil ler a primeira linha, quero ficar relendo até torná-la real em
sua voz, porque é algo que me faz ter a certeza de que foi ela quem escreveu
aquela carta.
"Oliver, meu bem, se está lendo esta carta, é porque o dia finalmente
chegou. Então, olá, é muito bom falar com você depois de tanto tempo,
mesmo que através de palavras escritas. Mas tenho certeza de que irá
reconhecer a minha letra garranchuda, como você sempre a chamou, e que
irá dar ouvidos com carinho ao que preciso te contar agora.
Imagino que esteja assustado, eu também fiquei quando tomei essa
decisão, mas por favor, não desista antes de ler tudo. (Eu sei que vai, você
é curioso).
Mas amor, lembra da vez em que conversamos pela primeira vez
sobre fertilização in vitro, pensando em algum imprevisto futuro?
Na época, sua preocupação foi de algo te acontecer que te impedisse
de ser pai, já que nosso sonho era nos tornarmos pais e sempre
tentávamos, mas só depois descobrimos o motivo de não conseguir
engravidar. Acho que nenhum de nós dois esperava que o imprevisto fosse
tão “punk” assim, não é?
E depois do segundo tumor, quando soube que seria diferente do
primeiro e que eu não tinha muito tempo, tomei essa decisão por mim e por
você.
E sim, fiz sem que você soubesse por que estava com medo de você
não concordar.
Eu temia que se o bebê nascesse logo após minha partida, que o luto
te impediria de amar nosso bebê e o faria esquecer nosso filho.
Achei que seria melhor esperar tempo o suficiente até que você
estivesse bem.
Você sempre foi um homem forte, então imaginei que lidaria com
tudo isso de um jeito prático.
É assim que a Isis entra na nossa vida...
É provável que a esta altura já saiba quem ela é, mas a princípio
não soube.
Isis Mancini foi a minha escolha para gerar esse bebê.
Lembra da primeira vez que enfrentei o câncer na medula e tive uma
doadora?
Ela é a minha salvadora.
Não sei explicar por que eu precisava conhecê-la, mas eu precisava.
Algo dentro de mim me fez mover céus e terra para encontrar a pessoa que
salvou minha vida e eu a encontrei. E ela é pessoa mais transparente que
já conheci.
Isis não consegue esconder as emoções, ela é sensível, verdadeira e
doce. Nos tornamos amigas, como eu sabia em meu coração que seríamos,
porque ela é o tipo de pessoa que não sabe o quanto é admirável e que faz
o bem só porque é o certo a se fazer.
Eu não tive a ideia assim que a encontrei, tive a ideia depois que o
meu oncologista nos contou que meu tumor no pâncreas era muito mais
agressivo que o anterior e que, infelizmente, seria terminal.
Talvez eu já estivesse pensando na questão e já estivesse sentindo
que as coisas ficariam bem mais difíceis pra mim.
Não pude contar a você, porque sei que tentaria me fazer mudar de
ideia. Tentaria me poupar de qualquer esforço, como sempre fez por me
amar e me proteger. Por isso, omiti até agora.
Entenda, Oliver, de certa forma, eu não tomei essa decisão sozinha.
Você sempre pensou na possibilidade de fazermos uma fertilização in vitro,
só que aconteceu de um jeito diferente e estou presente, de certa forma.
Anete, a advogada que contratei especificamente para essa tarefa,
deve ter te explicado como tudo aconteceu.
O Oli é NOSSO filho. Mas te peço que veja Isis como a mãe dele
também, pois a companhia dela será crucial no crescimento do nosso bebê
e para você.
Isso mesmo, Oliver...
Você vai precisar de Isis tanto quanto eu precisei, vai levá-la para
sua casa e mantê-la por perto durante quatro meses.
Tenho um último pedido a te fazer...
Respira fundo e não pense, "Ficou maluca, Melissa?".
Quero que você se case com Isis.
Eu sei, não esperava por essa, né?
Mas eu a conheci, sei que ela tem o coração do tamanho do mundo e
nisso vocês são muito parecidos.
Ela pode parecer frágil, mas essa moça é uma guerreira desde que
nasceu. Eu sei que não posso pedir para que se apaixone por ela, mas peço
que não feche seu coração para o amor. Eu sei que ela poderá te fazer
muito feliz, se você permitir que ela faça.
Eu a conheci e sabe que nunca exagero, então tente conhecê-la e
baixe a guarda para que ela te conheça também. Sei que parece absurdo
demais pedir isso, mas eu conheço você. Está na hora de pensar em abrir
seu coração outra vez, igual o abriu para mim. No entanto, a decisão é sua
e sempre será sua.
E, se eu estiver pedindo muito, desconsidere e depois que nosso filho
completar quatro meses a deixe seguir com sua vida, mas vocês precisam
antes de tudo, passar por este processo, Oliver.
Lembra que você sempre me dizia o quanto queria ser pai?
Este é o momento perfeito para começar a ser um.
Você nunca foi de desistir dos seus sonhos, então não será agora que
irá desistir desse.
Esse bebê é o meu presente para você.
Eu te amo.
Feliz aniversário, meu bem.
De sua eterna amiga, Melissa."
Acho que meu coração dá umas mil piruetas e começo a respirar com
dificuldade.
Havia tanto a ser ressaltado nesta carta, mas só consigo pensar em
uma, me apaixonar por Isis?
É tão estranho que um pedido destes surja assim, sem avisos prévios.
Eu nem conheço essa mulher, mas aqui está ela, sentada diante de mim com
um bebê no colo que é meu filho.
Eu sei agora que é real porque não tem como eu estar sendo enganado,
há muitas peças que se encaixam e corroboram para que isso realmente tenha
acontecido.
— Tudo bem, senhor Giordano? — pergunta a advogada. — O senhor
está pálido e parece que vai desmaiar.
Estou transpirando, passo a mão na minha testa e a sinto fria.
— Estou bem... Eu só... — Solto um suspiro pesado e dou um sorriso
bobo. — É Melissa, minha esposa. Ela realmente escreveu isso e ele é
realmente meu filho.
Olho para o bebê agora que esse fato me cobre como um manto.
— Ele é meu presente de aniversário — ressalto quase em um
sussurro.
A minha surpresa exacerbada faz os lábios de Isis se repuxarem em
graça.
— Sim, ele é — diz sorrindo parecendo aliviada.
Largo os papéis na mesa e me aproximo, ficando agachado de frente
para os dois. Ele é tão pequeno e acabou dormindo nos braços de Isis que
parecem o lugar mais confortável no mundo todo.
Meu filho...
Eu tenho um filho e graças a Melissa que planejou tudo, como
sempre sendo tão perfeita e cuidadosa nos mínimos detalhes.
— Nossa — digo fascinado. — Eu sempre quis ser pai e Melissa teve
tanto cuidado em providenciar isso.
— Ela me disse que o senhor não o rejeitaria, apesar de que seria uma
informação difícil de processar — alega me olhando nos olhos e sinto algo
estremecer dentro de mim.
Talvez seja já uma afeição natural por essa mulher que carregou meu
filho por nove meses e o colocou no mundo com muita garra.
— Eu jamais faria uma coisa dessas — convenço. — Sim, eu ainda
estou muito confuso e surpreso, mas recebo de coração.
O sorriso dela se abre, revelando dentes brancos e alinhados,
contrastando perfeitamente com o tom da sua pele.
— Melissa me disse que o senhor será um ótimo pai e acredito nela.
Dá pra ver isso em seus olhos — comenta, mas logo depois parece
arrependida com o que disse, como se revelasse que estava olhando muito
para mim, mais do que o necessário.
— O procedimento agora é fazer o exame de DNA apenas para que
não reste nenhuma dúvida. Mas Isis e o bebê estão morando em Blumenau.
Enquanto ela estiver de licença maternidade e amamentando concordou em
se mudar temporariamente para que seu filho conviva com o pai. Espaço
naquela mansão é o que não falta, mas Isis disse que pode ficar com Oliver
na casa dela e o senhor o visitaria sempre que quisesse até o período
contratual terminar.
— Anete tem razão, eu moro em Blumenau, fica longe daqui, mas a
minha casa é...
— Não — interrompo e me aproximo mais ainda. — Anete tem razão,
espaço é o que não falta na minha casa. Oli vai precisar de você nesses
primeiros meses, então as portas da minha casa estarão abertas para você,
Isis.
Um sorriso amplo se desenha nos lábios de Isis.
— O que foi?
— O senhor o chamou de Oli.
Dou um sorriso sem jeito.
— Imagino que chamá-lo de Oliver também tenha sido uma ideia de
Melissa.
— Ela amava o seu nome, Oliver Matteo.
Enfio as mãos nos bolsos, enquanto observo ainda sem acreditar meu
filho se espreguiçar no colo de Isis e me inclino só para acariciar sua
bochecha rosadinha.
Meu Deus, como Melissa teria o amado.
Eu já o amo, e não faz nem meia hora que sei da sua existência.
— Ainda não acabou — Anete lembra mais a si do que a mim.
Ela remexe mais um pouco em sua pasta e tira de lá outro envelope
exatamente igual ao que eu havia pegado minutos atrás. No entanto, ela o
direciona a Isis.
— Isto é para você.
— Pra mim?
Pela surpresa que demonstra, dá para perceber que ela não esperava
algo do tipo.
Isis pega o envelope com cuidado.
— Fique com você. Melissa deu ordens que o abrisse somente daqui
quatro meses.
Igual ao tempo que ela pediu que eu mantivesse Isis em minha casa,
para que eu me apaixonasse por ela.
Será que estava pedindo a mesma coisa a ela?
Mas por que só daqui quatro meses?
— Eu sou a pessoa mais curiosa do mundo — Isis revela apertando os
olhos.
— Posso mantê-la muito distraída nesses quatro meses quando estiver
em minha casa — digo sem muito alarde, mas depois percebo o poder das
minhas palavras quando Isis arrega seus olhos bonitos. — Oli e eu,
manteremos você distraída — completo, mas ela ainda parece bastante
envergonhada.
Céus, o que se passou na mente dela?
Preciso engolir a curiosidade, pois também sou muito.
— Bom, só não abra. Se até agora respeitamos as decisões de
Melissa, não será agora que iremos faltar com ética — Anete avisa com todo
seu profissionalismo.
— Tudo bem, eu consigo — Isis responde.
— Certo, o que acontecerá agora? Você quer voltar para Blumenau,
avisar seu pai e pegar o resto das suas coisas, ou ir direto para a casa de
Oliver? — Anete pergunta a Isis que aperta mais uma vez os olhos pensando,
parece uma mania dela fazer isso.
— Posso ligar pro meu pai e depois pegar mais roupas para mim e
para o Oli.
— Não se preocupe com isso, podemos providenciar roupas pra vocês
daqui — tranquilizo.
— Ele pode comprar uma loja, se quiser — Anete branda.
— Bem, não é esse tipo de pensamento que Oli deve fermentar por
saber que tem um pai rico — Isis diz como uma mãe sábia, e isso aquece
meu coração porque é exatamente o tipo de pensamento que prezo.
— Então é isso. O menino está em boas mãos. Vocês vão conseguir,
Melissa acreditava nos dois e que fariam esse arranjo dar certo. Ela tinha
certeza que daria.
Anete é aquele tipo de pessoa autoconfiante demais, beirando o
irritante.
— Lembre-se, Isis. A sua exigência contratual você já cumpriu, se
mudar de ideia quanto a permanecer na mansão do senhor Giordano e seguir
adiante nos próximos meses ou se você se sentir desconfortável com essa
situação, poderá voltar para Blumenau assim que quiser. Você e o pequeno
Oli ficarão juntos até ele completar quatro meses, mas garanto que não
faltará nada a vocês.
Isis acena positivamente.
— Melissa confiava em você. Vai dar certo.
Não sei se Anete estava falando aquilo mais para Isis ou para mim.
— Feliz aniversário, senhor Giordano — Anete me parabeniza
formalmente antes de se despedir e ir embora.
Agradeço e a vejo partir, me deixando a sós com Isis e meu filho.
Sei que estou sorrindo feito um bobo, que apesar da surpresa, do susto
e a sensação de que uma nova janela se abriu em minha vida, consigo sorrir
e me sentir transbordar de felicidade por um sonho realizado. Um sonho que
achei ser incapaz de alcançá-lo quando perdi Melissa. Mas agora ela dá um
jeito de "ressurgir" e me deixar sonhar mais uma vez, só que agora de um
jeito mais real. Não importa como, ou com quem, tem um pouco de nós. Tem
nosso sonho, e agora tem Isis, que também estava nos planos dela.
Não sei se irei conseguir cumprir com esta parte, mas já sei que Isis
tem todo meu carinho e respeito, simplesmente por ter concebido meu filho.
Por ela ter sido incrível com Melissa e permitir que esse nosso antigo sonho
ganhasse vida, literalmente.
Eu nunca esquecerei Melissa, mas ela me deu a oportunidade de
recomeçar, sem mudar os sonhos.
Oli é meu sonho e o melhor presente de aniversário que já ganhei na
vida.
OLIVER

Quando cheguei ao trabalho, era apenas um homem de negócios e


minha única preocupação era manter o Grupo Giordano S.A. líder de
mercado no agronegócio de soja no Brasil, mas isso, claro, bem antes de
descobrir que sou pai.
Parece que pulei algum momento importante, um processo padrão que
possibilitaria isso tudo acontecer. Ninguém se torna pai do dia para a noite,
muito menos sem o toque primordial, mas aqui estou eu, ajudando meu filho
com a mulher que o gerou, a entrar no meu carro porque os levarei para casa.
Como explicar isso?
Quer dizer, não devo satisfação da minha vida a ninguém, mas até
ontem eu era um cara solteiro chato e exigente para qualquer tipo de
relacionamento. As minhas únicas companhias frequentes eram meus amigos,
que apesar de poucos, são leais. Seria fácil dizer que isso tudo foi coisa de
Melissa, que era sempre tão bem programada para tudo, mas não é simples
de aceitar.
Mesmo assim, estou estupidamente entusiasmado. Parece que
descobrir a existência de Oli deu uma inflada no meu coração há tempos
murcho e sem graça, e talvez um pouco desesperado. Melissa tinha razão
quando disse a Isis naquele tempo que eu não tinha família, e que por isso
vínhamos tentando aumentar a nossa, mas não houve êxito algum.
Quando fiquei viúvo, algo dentro de mim disse que eu morreria
sozinho, e juro por Deus, que já estava aceitando esse destino cruel.
Mas agora eu tenho uma família. Tenho um bebê, na verdade, mas
Melissa me deu permissão para tentar um novo amor e com Isis, a mesma
mulher que gerou Oli.
Quando entro no carro, passo o cinto de segurança, olho para ela e
lanço um sorriso tranquilizador.
Coitada, talvez ela esteja mais nervosa do que eu.
Conheci Isis há algumas horas, mas o completo desconhecido e
assustador aqui sou eu. Não quero que ela continue com esse medo.
— Isis, tudo bem? — pergunto com cautela quando percebo a
respiração dela anormal.
Nem ligo o carro ainda.
Anete ficou de levar as coisas dos dois lá para casa no outro dia, mas
Isis ainda pode abrir a porta do carro, sair com Oli, pegar um táxi ou chamar
um Uber para voltar para Blumenau e desistir. Fico apavorado com essa
ideia, só de pensar no pouco tempo que mal pude aproveitar meu filho.
Ela me lança um sorriso forçado e aninha Oli melhor em seu peito
enquanto Anete instala o bebê conforto no banco de trás.
Céus, preciso aprender como colocar um!
Mas Isis insistiu que o levaria no colo.
— Eu sei que isso é novidade pra você, mas acredite, também é pra
mim. — Balança a cabeça como quisesse afastar o medo. — Mas eu prometi
a Melissa que faria as coisas do jeito que decidisse. Eu sabia que você,
como pai de Oli, não deixaria que ele continuasse longe.
— Não posso deixá-la longe também, ele precisa de você. É por isso
que estamos fazendo isso — resumo.
Na verdade, estou a levando para casa como parte do plano de
Melissa em me fazer me apaixonar de novo.
— Eu entendo... Entendo mesmo.
Não sei se isso é possível.
Ligo o carro, saio do prédio onde fica meu escritório e dirijo até
minha casa. Durante o caminho penso que Isis parece ser daquele tipo de
mulher que é muito fácil se apaixonar. Não a conheço muito, mas só seu
cheiro já é inebriante, quase uma carícia doce.
Porra!
Nem lembro da última vez em que uma mulher sentou neste banco.
Faz dez meses?
Não sei.
Mas foi por uma aventura tão casual que nem lembro o nome da mulher
e no fim não deu em nada porque não consegui chegar as vias de fato.
Imagino que Isis mal faça ideia deste detalhe, de eu precisar me
apaixonar por ela para manter esta família unida, para que Oli cresça de
certa forma, com uma mãe por perto. Mas só de pensar que eu poderia me
envolver com ela fico nervoso.
O meu status e aparência não parecem surtir o mesmo efeito que causo
nas outras mulheres, nela.
— Faz tempo que não venho a Florianópolis — Isis comentou olhando
pela janela a cidade charmosa.
— Como você e Melissa se encontravam? — pergunto curioso.
— Eu fazia questão de vir vê-la nos finais de semana, quando não
estava trabalhando — diz com um sorriso genuíno, dava para perceber que
relatar isso despertava lembranças boas. — Nos encontrávamos no Mercado
porque amava ficar provando os doces, e eu nem sempre conseguia provar
tudo.
— Com certeza Melissa era uma boa companhia para isso — digo
lembrando também o quão minha falecida esposa amava comer.
Isis concorda sorridente, mas então um peso triste recai muito rápido.
— Eu não venho aqui há três anos. Deixei de vim quando Melissa
começou o tratamento, ela não queria que você acabasse me descobrindo, ou
então estragaria a surpresa.
— Vocês fizeram tudo direitinho — comento extremamente surpreso
com a perspicácia das duas.
Olho rapidamente pelo rabo do olho só para ter certeza de que Isis
sorriu novamente, orgulhosa por ter agido conforme Melissa sonhou.
Moro em um condomínio residencial perto do trabalho, mas com o
trânsito que pegamos chegamos em 30 minutos. Percebo que Isis fica até sem
fôlego conforme vamos avançando pela rua que a cada quarteirão exibe
mansões incrivelmente belas. Mesmo sendo um homem sozinho, gosto de
morar em uma casa grande; dá para acomodar os amigos no final de semana,
é legal e não é tão solitário.
A minha mansão fica especificamente na alameda principal, ela tem
um jardim incrível e quando a comprei, gostei por causa do seu estilo
moderno e da garagem ampla com dez vagas, localizada no subterrâneo.
Tive muitos momentos felizes com Melissa na nossa casa, mas não
tivemos tempo de aproveitá-la bem.
Quando entramos na garagem, Isis hesita ao ver mais quatro carros e
duas motos. Ela parece mais assustada do que fascinada.
Começo a me perguntar se isso não soa muito exagerado para ela; não
sei da sua condição financeira, mas a julgar pelas roupas simples e o
comportamento acanhado, suponho que Isis seja apenas uma garota normal e
que veio de um lugar humilde.
Estaciono o carro em uma das vagas voltando a deixar a coleção
completa e então ajudo Isis a sair também. Oli está com os olhinhos bem
abertos, parece até que não quer perder nenhum detalhe do seu novo lar.
— Obrigada — Isis diz quando a ajudo a sair.
Me prontifico a pegar as bolsas dos dois que são pequenas. Isis
realmente não esperava que eu fosse chamá-los para ficar, talvez nem eu
esperava fazer isso, mas foi o que Melissa desejou.
— Venha, deve estar cansada da viagem e de ficar carregando Oli —
comento.
— Ele é levinho, deveria experimentar — sugere aninhando o bebê
que já não estava mais com aquela manta em volta dele.
— Ah, não, obrigado, tenho medo de sei lá... Deixá-lo cair ou pegá-lo
de um jeito estranho.
Isis acha graça.
Reparo que é linda a forma como suas bochechas ficam salientes
quando abre um sorriso.
Ela anda de forma graciosa, nem parece que teve um bebê.
— Você se acostuma com o tempo. A prática leva à perfeição —
ressalta.
— Então você já tem experiência o suficiente? — Abro a porta
pequena da garagem que dá para o corredor iluminado e todo branco ao lado
da cozinha.
— Sim e não — revela não sabendo se fala ou se admira o interior da
casa onde passará os próximos quatro meses. — Eu sou professora do
jardim de infância, então sou acostumada a ter que lidar com crianças, mas
já peguei muitos bebês no colo, então, sim, tenho experiência.
— Isso explica.
Professora...
Isis é professora de criancinhas, por isso seu jeito doce, meigo, leve e
facilmente sorridente. De qualquer forma, estava certo sobre trazê-la
subitamente para meu mundo e tudo isso parecer arrogante demais.
Ouço conversas vindo da cozinha e quando espio pela porta aberta,
encontro as cinco mulheres responsáveis por manter a casa impecável e sua
administração em dia.
— Siga em frente, me espere próximo a escada — peço a Isis que não
hesita e segue o caminho enquanto entro na cozinha.
Tereza, que é a nossa cozinheira de excelência, é a primeira a me
notar.
— Aí está ele!
Quando as outras quatro se viraram para mim, tão confusas quanto
surpresas, sorrio para elas. Todas estão aqui desde a época de Melissa.
— Mas o senhor não iria para um jantar com os amigos? — pergunta a
senhora Matilde, minha governanta.
— Sim, mas houve um imprevisto, precisei cancelar o jantar e voltar
mais cedo pra casa — explico, mal fazendo ideia da reação delas diante de
Isis e Oli.
Como nenhuma delas sabiam da minha reunião hoje com a advogada e
Isis, não disse a elas que na verdade o jantar já estava cancelado há dias.
— Ah, senhor Giordano! — protesta Tereza, como sempre a mais alto-
astral do grupo. — Chegou muito cedo pro nosso gosto!
Fico olhando de uma para a outra, e antes que eu pergunte o motivo de
toda aquela revolta e expressões de susto, sinto um cheiro doce envolvendo
a cozinha.
Um cheiro familiar, até.
— Torta de limão — desvendo.
— Sim, íamos deixar na geladeira para você — Matilde explica. —
Mas já que está aqui e cancelou o jantar, podemos cantar parabéns todos
juntos!
Elas ficam animadas.
— Que bolsas são estas, senhor Giordano? — Emma, uma das três
jovens arrumadeiras, acabou observando as duas bolsas penduradas em meu
ombro direito. Depois disso, as outras também notam.
Gisele, a arrumadeira mais nova e que se tornou tia recentemente, se
aproxima com os olhos estreitos para observar melhor.
— Isto é uma bolsa de bebê? — pergunta despertando mais ainda o
interesse das outras.
Apenas balanço a cabeça em afirmação, o que faz o grupo de mulheres
ficarem tão surpresas.
Isis está me esperando, não devo demorar muito.
— Quero apresentá-las a uma pessoa. Na verdade, duas pessoas.
— Senhor Giordano, do que se trata? — Tereza pergunta desconfiada.
Eu falei que seria difícil de explicar, a começar por essas mulheres
que estão comigo há muito tempo e que adoravam Melissa. Mesmo assim
elas me seguem até o vestíbulo, perto da escada, onde Isis está com Oli que
quer levantar a cabeça de tão curioso.
Atrás de mim, os cochichos começam.
Isis parece um pouco intimidada também com o grupo de mulheres,
mas é preciso acontecer esta apresentação, além de que tenho certeza que
elas iriam adorar ajudar.
— Meninas, esta é Isis, ela vai passar um tempinho aqui conosco,
então espero que possam ajudá-la a se sentir em casa.
— Olá. — Isis acena e as meninas também, farejando como se
tentassem descobrir algo a respeito da moça nova.
— E esse, é o pequeno Oli, meu filho.
Arquejos e olhos arregalados são as primeiras reações a serem
notadas, e ninguém consegue dizer nada pelos próximos seis segundos.
— Eu sei, de surpresa assim é muito difícil de assimilar a novidade,
mas um dia eu tentarei explicar melhor.
Matilde é a primeira a dar um passo em direção a Isis e acariciar o
cabelo ralinho e escuro de Oli. Ela sorri para o bebê, mas quando olha para
Isis, não sabe ao certo o que fazer. No entanto, se afasta como se Isis fosse
tóxica.
Não sei o que elas pensam a respeito disso, mas certamente devo
ignorar e ter foco em fazer as coisas exatamente como Melissa planejou.
— É um bebê muito bonito — Matilde diz, um pouco séria, mas gentil.
— Você é a mãe? — Há um pouco de desapontamento em sua voz.
Isis congela.
Não cheguei a me perguntar se ela se considerava de fato mãe de Oli e
vê-la não conseguir dizer nada, só mostra que nem ela sabe a resposta.
Apoio a minha mão atrás do seu ombro para tranquilizá-la.
— Isis está cansada. Irei levá-los até a suíte mais próxima a minha e
deixá-los descansando.
Quando começo a conduzir Isis para o andar de cima, viro para as
meninas que ainda estão chocadas demais, e aviso:
— Vamos deixar os parabéns para um outro momento.
Aqui em casa há ao todo nove quartos e pode parecer mentira, mas às
vezes até falta espaço. Não sou muito de dar festas, mas quando me reúno
com os amigos, prefiro que eles durmam aqui a ter que voltar para casa
dirigindo bêbados. Além de que, em casos como de hoje, quando as meninas
decidem dormir por aqui, já tem quartos suficiente disponíveis.
Matilde é a única que mora na mansão por ser governanta.
Assim que paro na porta da suíte em que Isis irá ficar, ela me detém.
— Não precisa se incomodar com a gente. Vá cantar seus parabéns —
pede como se aquilo fosse necessário.
— Não quero incomodar o bebê com barulho.
— Mas não irá — diz com um sorriso reconfortante e me olha como se
eu fosse um bobo. — Estamos aqui em cima e não é como se tivesse gente
demais para o barulho ser tão alto a ponto de realmente incomodar.
Isis tem razão, não iria incomodar mesmo.
A partir do momento que ela se trancasse no quarto, os sons lá de
baixo seriam abafados. No entanto, não consigo me afastar, a minha
prioridade é ter certeza de que Isis e Oli estão bem acomodados e caramba,
Domenico.
Eu preciso conversar com Domenico!
Além do mais, se fosse para cantar parabéns, queria que meu
primogênito estivesse presente. Por agora, acho melhor Isis colocá-lo em
uma cama confortável e dar uma folga para os braços e coluna dela.
— É perfeito — diz quando entra no quarto e pergunto se está bom.
Deixo as bolsas sobre a cama enorme, mas Isis ainda não soltou Oli.
Talvez ela precise de privacidade, e é o que parece quando fica me olhando
por tempo demais.
— Vou deixá-la à vontade agora, mas, qualquer coisa é só chamar. O
meu quarto fica logo ao lado.
— Muito obrigada, senhor Giordano.
Não digo nada porque sinto que não estou fazendo um favor, e sim, a
minha obrigação. Eu tenho um dever com Oli e Isis, e irei cumprir,
independente do que aconteça daqui quatro meses.
Então apenas sorrio e a deixo com a sua privacidade.

Já faz uns 30 minutos que mandei mensagem de texto para Domenico


vir na minha casa o mais rápido que pudesse. Para a minha surpresa ele nem
hesitou, parecia até que já esperava pelo meu contato, enquanto eu esperava
que ele nem sequer fosse aparecer na mesma noite, já que hoje também é seu
aniversário, o de Lorenzo, chefe de engenharia agrônoma do meu negócio e
Nicolo, advogado do Grupo Giordano.
Todos somos grandes amigos.
Sim, nós quatro fazemos aniversário no mesmo dia e tradicionalmente,
iríamos nos reunir e curtir pra caramba de um jeito casual. Mas aí aconteceu
de me tornar pai, e nada mais justo que dar essa informação de primeira mão
a Domenico, que é irmão de Melissa e vivia nos cobrando um sobrinho.
Fico esperando Domenico na sala de estar, até que vejo seu carro
chegar.
Quando passei pelo quarto onde Isis está com Oli, supus que os dois já
estivessem dormindo, pois não ouvi barulho algum.
Mas também, quando Domenico aparece na sala de estar, já são dez e
meia da noite.
O tempo passou muito rápido desde que descobri minha paternidade.
E para a minha surpresa, e raiva, o canalha já chega com uma cara de
animação, além de desconfiança genuína.
— E então, cadê ele?
— Ele quem? — pergunto de cara fechada, já presumindo o que iria
acontecer.
— O bebê — diz como se não fosse óbvio. — Você não é o novo
papai do pedaço?
Ficamos ali, afastados um do outro, mas ao mesmo tempo que as
coisas ficam claras para mim, gostaria muito de poder avançar no pescoço
dele.
“Domenico sabe”, penso.
— Melissa contou pra você? — quase rosno de tão irritado.
— Cara, eu sou o irmão dela e ela estava precisando de um apoio
familiar naquele tempo. — Dá de ombros. — O pré-natal da Isis foi todinho
comigo, e foi eu quem realizou o parto.
— Caralho! — praguejo indignado. — O que mais você está
escondendo de mim, porra?
Ele apenas dá um sorriso entediado e enfia as mãos nos bolsos,
caminhando para um pouco mais perto de mim, porém, me afasto.
Juro que quero socar a cara deste idiota.
— Assim como Isis teve que manter tudo confidencial, eu também
precisei. Caramba eu sou pediatra, é lógico que Melissa iria confiar em
mim. Foi comigo que ela tirou todas as dúvidas sobre o procedimento in
vitro.
Respiro fundo porque faz sentido, é injusto me alterar com Domenico
deste jeito, mas, porra, ele é meu melhor amigo e eterno cunhado, poderia ter
me falado a faísca de qualquer coisa a respeito disso.
Me escoro em uma das poltronas e cruzo os braços, é quando não
recuo assim que ele tenta se aproximar mais uma vez.
— Eles já foram dormir? — pergunta com cautela e curiosidade.
— Acho que já faz uma hora, não ouvi mais o Oli.
Ele balança a cabeça em reprovação.
— Sinceramente, eu disse a Melissa que ele poderia se chamar André,
ou qualquer coisa que não fosse seu nome.
— Não enche, esse momento é todo meu finalmente. Nada mais justo
do que ele ter esse nome — respaldo.
— Mas e agora, o que vai acontecer mesmo?
— Isis vai ficar aqui por mais quatro meses — revelo. — Por mim
poderia até ficar mais, Oli depende muito dela e não quero meu filho longe
de mim.
— Bem, isso é simples, case-se com ela — diz sério, com aqueles
olhos azuis tão observador.
— Claro, muito simples. Casar é como ir à padaria — ironizo.
Lembro da proposta de Melissa e isso ele não parece saber, apenas eu.
Mas é engraçado que isso pareça ser a coisa mais lógica. Até esqueço um
pouco da chateação e sorrio para Domenico.
— A casa vai estar à disposição dela o tempo que for. Só quero que
fique com o meu filho perto de mim.
— E eu vou acompanhar a saúde dele de perto, afinal é meu sobrinho
— diz orgulhoso.
Acho que fico olhando de um jeito estranho, pois ele logo rebate:
— Os ovários da Melissa foram inseminados em Isis, tem um pouco da
minha irmã nisso também, sabia?
— Tem tudo dela, Domenico — corrijo. — Melissa conseguiu realizar
um sonho meu, um sonho nosso. Eu senti a presença dela quando a ficha caiu
de que aquele bebê é meu. Senti que podia tentar ser feliz de novo e voltar a
pensar numa família enorme.
Dizer isso o faz olhar na direção do andar superior, onde ele sabe que
ficam os quartos.
— Talvez devesse tentar. Você não se envolve com ninguém há tempos,
seria como unir o útil ao agradável.
— Não vou brincar com os sentimentos de ninguém. É jogo sujo se
envolver sem se apaixonar — comento seriamente.
Os meus amigos não levam muito a sério esse lance de compromisso,
eles amam a vida "desapegada" que tem.
— Tá me dizendo que não se apaixonaria por uma belezinha daquela?
— pergunta maliciosamente se referindo a Isis.
Algo retorce dentro de mim e afio meus olhos em sua direção.
— Ela deu à luz ao meu filho, mais respeito, seu idiota.
Domenico gargalha e avança na minha direção para me abraçar com
força.
— Ah, feliz aniversário, seu otário! — Se empolga ao bagunçar meu
cabelo. — O primeiro papai do nosso quarteto!
— Parabéns pra você também, seu grande canalha que esconde as
coisas de mim.
Domenico fica para conversar mais um pouco, diz que os meninos não
ficaram chateados por eu ter cancelado a nossa tradição de aniversário, mas
que esperavam saber logo do que se tratava essa coisa tão importante que eu
não podia adiar.
E se Domenico já estava feliz, imagine Lorenzo e Nicolo.

No meio da noite, sou surpreendido por um som incomum na minha


casa, um choro agudo de bebê.
Levanto da cama e saio do meu quarto para ficar parado de frente para
a porta do quarto de Isis enquanto Oli chora. Dou leve batidas na porta, pois
começo a ficar preocupado com o choro que não cessa.
Um entre faz com que eu gire a maçaneta e empurre a porta, para
entrar no quarto iluminado apenas pelo abajur.
Encontro Isis em pé próximo a janela, com Oli em seu colo, o
aninhando enquanto canta, Hey Jude, dos Beatles para niná-lo, tão
docemente e bem afinada, mostrando ter uma voz linda. Assim que me
aproximo, ela se vira e me olha quase espantada, o que a faz parar
subitamente de cantar.
— Não pare, estava lindo... — digo, mas percebo o olhar dela abaixar
para meu tronco e, mesmo sob a luz fraca, percebo seu rosto corar.
O friozinho que sinto na minha pele me lembra de que entrei ali sem
camisa, apenas de calça moletom. Me sinto constrangido por ter invadido
sua privacidade assim, talvez ela não esteja tão acostumada a caras como eu.
Modéstia à parte, ralo todo dia pra manter o corpo em forma, e tenho duas
tatuagens, uma no ombro esquerdo e outra na costela direita.
— Eu ouvi o choro dele, achei melhor vir ver se estava tudo bem —
digo na tentativa de justificar o fato de ter aparecido daquele jeito.
Não queria me exibir para ela.
— Desculpa se acordamos você — lamenta.
— Na verdade, não consigo dormir. Confesso que isso tudo não sai da
minha cabeça e, caramba, quero fazer tanta coisa com ele, mas preciso ter
calma porque Oli é tão pequeno.
Isis sorri e olha para o bebê que está mais calmo.
Observo muito rápido que ela está vestida em seu conjunto de seda
amarelinho para dormir e exibe pernas lindas. Isis é uma garota normal, mas
tudo nela parece irradiar de um jeito diferente, que me deixa mais tranquilo.
— Posso segurá-lo? — pergunto quando ela me pega a olhando. —
Seria minha primeira vez.
— Claro!
Com muita cautela, Isis me passa Oli.
Meu Deus, que sensação incrível!
Estou tão bobo e feliz por segurar aquele serzinho em meus braços.
Meu filho...
Sangue do meu sangue...
Presente que minha eterna Melissa deixou para mim antes mesmo de
partir para um lugar melhor.
Fico emocionado, mas não sou de chorar na frente de outras pessoas.
No entanto, se Isis olhar com jeito, irá perceber que estou me tremendo e
muito arrepiado.
É uma sensação muito forte, que transborda amor.
Me sento numa cadeira perto da cama para embalá-lo e Isis fica de
frente para nós. Oli está quase pegando no sono, é quando ela volta a
terminar de cantar a música que eu havia interrompido ao chegar. Não sei o
que me acalma mais, se é Oli dormindo em meus braços, ou Isis cantando
lindamente, bem baixinho.
Não demora muito até que o pequeno Oli esteja adormecendo de novo,
só que agora em meus braços. Ficar o admirando deste ângulo agora é bem
diferente e muitas questões me surgem.
— Será que eu consigo? — pergunto quase em um sussurro, mas Isis
me escuta.
— Melissa me contou algumas coisas a seu respeito — confessa
esperando minha reação, mas fico apenas prestando atenção. — Uma delas,
que a fez ter certeza de que você amaria Oli, que você não é apenas um CEO
implacável, mas também o homem mais afetuoso que ela já conheceu na
vida. E que por isso se sairia muito bem sendo pai.
Sorrio me sentindo reconfortado.
É de fato a coisa típica que Melissa me diria, pois ela sempre me
lembrava isso quando possível.
O meu cargo nunca definiria quem eu realmente sou, por dentro.
— Você não ficou com medo? — pergunto a ela. — Em ficar grávida
sendo que você não está com ninguém?
Isis dá um suspiro, deixando a entender que já estava exausta em ter
que lidar com esse tipo de pensamento.
— Sempre haverá julgamentos. O meu pai está vivo, mas Melissa... Eu
tinha que fazer isso por ela. Graças a sua esposa, meu pai me viu me formar
em pedagogia e ficar grávida.
— O que ele achou disso tudo?
— Ele acha que o cara não quis assumir, e que agora estou na casa de
uma amiga. Oli está muito novinho e eu mal saí do puerpério, então ele está
bastante preocupado.
— Com razão. Mas você está em boas mãos aqui, Isis. Não deixarei
faltar nada a vocês, nem conforto ou atenção. — Isso é uma promessa.
— Mas e as suas funcionárias? — pergunta Isis meio tristinha. —
Tenho quase certeza de que elas não gostaram de mim.
— Elas só estão surpresas demais, para não dizer outra coisa. Eu não
estou ou estava envolvido com ninguém para que um filho tão novinho
surgisse assim.
— Vai ser difícil de explicar — ressalta.
— Bom, pelo menos Domenico já sabe. Quer dizer, já sabia.
Isis dá um sorriso sem jeito e esconde uma mecha do seu cabelo
ondulado atrás da orelha.
— Pois é, ele também fazia parte do complô. Mas foi ótimo em tudo.
— Assim que termina a frase, Isis solta um bocejo. — Desculpa, mas você
vai aprender que cuidar de um bebê é muito cansativo — brinca, mas sei que
não mentiu também.
— Será uma honra — digo e tento me levantar com Oli no colo, mas
fica impossível, pois sou desajeitado.
— O que você está fazendo? — Levanta também se inclinando na
minha direção, com as mãos prontas para aparar Oli a qualquer momento.
— Ele dormiu e você precisa descansar.
Forço o corpo mais um pouco para cima e para frente. Levanto meu
rosto para dizer a Isis que iria para meu quarto, mas algo inesperado
acontece, nossos lábios se roçam, a ponto de sentir seu hálito quente e os
seus lábios macios. Nos afastamos tão rápido, mas a corrente elétrica que
transpassa por meu corpo naquele milésimo de segundo me deixa gelado e
travado.
Quase nos beijamos!
— Me desculpa — diz inquieta.
— Não, tudo bem. Não levo jeito com isso ainda, mas tenho que
praticar — tento explicar, mas pareço um idiota, deixando transparecer que
fiquei tocado sim pelo simples roçar dos nossos lábios.
Deixo Oli no meio da cama.
— Amanhã mesmo providenciarei um berço e tudo o que for
necessário — aviso.
— Ele dorme a maior parte do tempo comigo na cama.
— Mas faço questão. Aqui pode ser logo em breve o quarto oficial
dele.
Vejo os olhos de Isis brilharem e fico calado esperando que ela
pergunte onde será o dela, e eu direi, "Você vai dormir comigo, no meu
quarto e na minha cama", mas puta merda, não quero parecer um tarado e
assustá-la.
Uma sensação primitiva faz com que eu me afaste rapidamente, não
quero que ela me veja de algum jeito ficando calcinante, porque Isis já
parece ser boa demais, além de muito cheirosa. E se eu descobrir que ela
tem um beijo gostoso, por Deus, que não seja tarde demais.
OLIVER

Não foi um sonho.


Achei por um momento que, assim que eu descesse para tomar café da
manhã seria como definitivamente voltar para a realidade e pensar no que
aquela vontade tão forte e reprimida de ser pai, volta a me causar depois de
tanto tempo. No entanto, antes mesmo de eu chegar à mesa farta, encontro
Isis sentada com Oli em seu colo, enquanto ela termina uma torrada e o
segura com o outro braço.
Parece desconfortável...
Antes que ela perceba minha presença, dou uma rápida conferida ao
redor.
Onde diabos está Matilde?
— Bom dia — cumprimento tocando gentilmente seu ombro direito, e
então acaricio os cabelinhos ralinhos de Oli. — Como dormiu?
— Ah, oi. Bom dia, senhor Oliver. — Ela se atrapalha toda com a
torrada e tenta disfarçar os farelos acumulados no canto da boca...
Da sua boca linda.
— Dormi bem, mas espero que não tenhamos incomodado ninguém
durante a noite.
— Tudo tranquilo, Isis. Não se preocupe, é muito gratificante tê-los em
casa. E este é o novo lar de Oli, também. Não ache que ele está sendo um
martírio.
— É só que, às primeiras noites é bem difícil mesmo de se adaptar —
argumenta receosa, enquanto olho para seus olhos castanhos e gentis.
— Mas eu irei — ressalto e estico os braços. — Me dê um pouco o
bebê, você precisa comer direito.
— Tem certeza? — indaga atônita.
“Quase nos beijamos...”
A porra do meu descuido em não saber pegar um bebezinho, quase faz
com que Isis e eu tocássemos nossos lábios na noite passada.
E puta merda!
Nem foi a droga de um beijo, mal senti o toque da boca dela, mas foi o
suficiente pra eu passar a noite toda me perguntando como teria
sido “se” tivesse tocado.
Como teria sido “se” eu tivesse afundado minha língua naquela boca
tão convidativa.
— Senhor Oliver? — chama e balanço a cabeça, dispensando aqueles
pensamentos ousados que eu nem conseguia conter estando a poucos
centímetros de distância dela.
— Hã? O que? — Fico igual a um bobo.
Isso a faz achar graça.
— Estava dizendo que já terminei meu café da manhã, não precisa se
preocupar.
Pisco ainda tentando me recompor e acabo olhando para a mesa, como
uma distração do seu olhar doce e a procura de uma prova de que esteja
falando a verdade.
Isis está na minha casa, não faz nem 24 horas, e isso a faz não se sentir
confortável ainda, então é possível que ela venha recusar muita coisa para
não parecer um fardo. Só que eu preciso tirar isso da cabeça dela, preciso
mesmo.
Mas ela está dizendo a verdade.
O prato com farelos da torrada, a casca de uma banana e o pote de
requeijão aberto revelam que Isis esteve se alimentando bem e sozinha.
— Matilde já falou com você esta manhã ou uma das minhas
funcionárias? — pergunto enquanto sento do outro lado.
Isis demora a responder, balbuciando enquanto pensa em uma desculpa
para me dar.
Não gosto disso, porque percebi muita coisa quando a trouxe na noite
passada; aquela indiferença por parte das minhas funcionárias fez com que
algo ficasse amargo dentro de mim.
Faço uma nota mental de que preciso conversar com elas em algum
momento, mas não agora.
— Eu desci e a mesa já estava posta, senhor. Achei que quanto mais
silenciosa eu for, melhor — confessa e paro o que estou fazendo para olhá-
la.
— Silenciosa? — sibilo.
Ela ajeita Oli em seu colo e levanta, o embalando em seus braços.
Hoje Isis está com o cabelo preso em um coque e de vestido florido
em tom azul e branco, caindo lindamente em seu corpo.
Caramba!
Esta mulher não precisa de esforço algum para ficar bonita, até mesmo
após acordar e nitidamente com o rosto ainda exausto, ela tem a coragem de
jogar na minha cara a sua beleza natural.
— Não quero incomodar, o senhor e nem as pessoas que trabalham
aqui na sua casa. Elas não estão aqui para me servir.
Engulo seco.
“Não”, é a primeira coisa que penso rugindo.
Levanto tão rápido que ela se espanta, contorno a mesa de vidro que
fica um cômodo antes da cozinha, é um ambiente todo lustroso com quadros
bonitos, móveis modernos, espelhos e lustre de cristal.
Isso tudo deve intimidá-la, mas é tão irrelevante que me deixa um
pouco zangado.
Por instinto, seguro gentilmente em seus braços para que isso a faça
sentir o máximo de segurança.
Se Isis acha que eu tenho poder, então quero que ela sinta confiança
exatamente no que irei dizê-la:
— Você é a minha convidada. Tinha a confiança de Melissa, deu à luz
a Oli e agora está aqui como alguém da minha confiança. Você é a... —
Estremeço antes de falar e aperto um pouco meus dedos entorno dela.
“Mãe”.
Ela é a mãe de Oli também, mas porque é tão difícil de verbalizar
isso, porra?!
— Escute, é normal isso que você está sentindo. — Afrouxo meus
dedos e me afasto sem muita pressa.
Não sou explosivo, sei como lidar com situações extremas, mas, porra,
eu quero tanto que Isis entenda que ela é bem-vinda. Não sei, de repente eu
tenho medo...
Medo de ficar sozinho de novo...
Medo de perder Oli...
Medo de perder esta parte de Melissa que restou com vida, e não
posso deixar nada disso escapar de jeito nenhum!
— Eu quero que se sinta em casa — ressalto afrouxando as rédeas
enquanto volto para a cadeira e ao olhá-la, Isis dá um sorriso doce de canto.
Eu não sento, fico mexido demais com aquele sorriso, mas preciso
disfarçar o poder do feitiço desta garota sobre mim e digo:
— Conheço pessoas que, no seu lugar, se aproveitariam da situação.
— Não é essa a minha intenção mesmo, senhor Oliver! — respalda
afoita e sorrio para acalmá-la. — Este é justamente meu medo.
— Eu sei disso, Isis. Sei que não é o seu caso. Fica tranquila. Eu
quero você aqui comigo e com Oli. — Nem percebo o que acabei de sugerir,
somente quando os olhos dela ficam arregalados.
Por que diabos fico dando essas mancadas com ela?
— Se você quiser ficar, é lógico.
— Ficarei enquanto Oli precisar de mim, senhor — diz como se fosse
óbvio e acho graça a quão vermelha acabou ficando por debaixo da sua pele
marrom-claro.
Dou uma mordida na maçã vermelha que pego da fruteira e encaro a
mulher diante de mim, isso a faz pestanejar os cílios fartos e desviar o olhar
tímido.
Caralho, eu não estou me reconhecendo nas últimas horas convivendo
com ela. Isis é tão doce, mas ao mesmo tempo, algo me diz que ela se
esforça para esconder um lado selvagem dentro de si.
Não sei por que tenho esta nítida impressão que ela é mais do que os
olhos podem ver.
Não posso negar que estou doido para conhecê-la melhor e pensar nela
à noite tem tido um efeito inesperado em mim, tanto que precisei recorrer à
alguns banhos frios e aqui em Floripa um banho frio significa que pode
quase congelar sua alma no inverno.
Pigarreio interrompendo o rumo dos meus pensamentos mesmo antes
que isso fique fora do meu controle.
— Então, espero que esteja pronta para hoje — ressalto e ela me olha
surpresa.
— O que faremos hoje?
Sorrio e faço suspense, mas tenho certeza de que ela irá gostar.
Antes que eu finalmente diga, Matilde entra na sala de refeição.
— Bom dia, senhor Oliver — diz sorridente, mas assim que vê Isis,
precisa fazer um esforço para mantê-lo.
Merda!
— Ah, bom dia, senhorita Mancini.
— Bom dia, e por favor, me chame apenas de Isis — pede com
educação e um sorriso mais fácil que o de Matilde.
Quando dou um gole em meu café, ele desce mais amargo do que
normal, então lembro de algo que vem me incomodando com frequência.
— Inclusive, Isis, quero que passe a me chamar de Oliver, e
não senhor Oliver, entendido?
Não espero ter que dar explicação para isso, mas ela concorda confusa
e Matilde fica surpresa o suficiente.
Eu tenho mais funcionários do que amigos, então há mais pessoas me
chamando de senhor, do que pelo meu nome. Somente meus amigos me
tratam de um jeito tão informal e quero que Isis faça isso também.
Imagino que isso faz com que Matilde se pergunte o que essa jovem
mulher significa na minha vida a ponto de dar a ela tamanha intimidade.
Bem, o fato dela ter meu filho nos braços já deveria ser resposta o
suficiente, mas é mais complexo do que imaginei. Então para explicar às
funcionárias da minha casa, precisarei ser cirúrgico com as palavras.
Faço uma nota mental de ter uma reunião com todas elas.
— O senhor não vai trabalhar hoje? — Matilde pergunta confusa, ao
ver minhas roupas casuais que basicamente é jeans, polo e tênis. Um Oliver
completamente diferente dos ternos alinhados que costumo usar durante a
semana.
— Não, mas darei uma passada rápida no escritório só para acertar
algumas coisas com a Felícia — explico.
— Entendi. — A governanta se volta para Isis. — Você precisa de
alguma coisa? — pergunta um pouco hesitante.
Isis comprime os lábios sem saber o que dizer. Talvez ela estivesse
precisando, ou talvez quisesse mostrar que está aberta a receber ajuda, mas
como ela está perdida, eu intervenho.
— Mande uma das arrumadeiras para o quarto dela.
— Eu já arrumei tudo, senhor Oliver. Não será necessário — afirma.
Apoio os cotovelos sobre a mesa e entrelaço os dedos assumindo uma
postura menos satisfeita que momentos atrás ao perguntar sem me preocupar
em ser suave:
— Como é?
Isis olha de mim para Matilde e então para mim de novo.
A jovem professora dá de ombros ao afirmar:
— Eu arrumei o quarto onde dormi, foi isso. Algum problema nisso?
— pergunta com uma incredulidade genuína.
Tensiono a mandíbula só para não ter que soltar um palavrão na frente
delas.
— Eu tenho três funcionárias para este tipo de serviço, Emma, Gisele
e a Lucy. Tereza toma conta da cozinha e Matilde supervisiona tudo na casa,
então não quero que você faça este tipo de tarefas de agora em diante. Você é
minha convidada e já faz muito cuidando incansavelmente do Oli.
— Se eu posso arrumar a cama onde dormi, irei arrumá-la.
Vejo Matilde franzir a testa e arquear uma sobrancelha em direção a
Isis. Imagino que ela esteja pensando algo como, "então ela tem opinião
própria".
Porra!
Agora consigo entender por que Melissa gostou tanto de Isis. Embora
ela seja meiga e reservada, quando desafiada revela um lado inesperado. E
agora confesso que estou impressionado por presenciar este comportamento
imprevisto vindo dela.
Não estou numa mesa tratando de negócios, no entanto, mantenho
minha expressão impassível em sua direção como se estivesse. Tenho um
acordo formal com Isis que envolve meu filho e preciso deixar
claro meus termos, sem ser autoritário para que ela não sinta a necessidade
de ir embora antes do tempo que Melissa nos deu.
— Eu só quero que você fique à disposição para dar atenção ao Oli.
— Mas eu já faço isso, senhor Oliver. Arrumei o quarto enquanto ele
dormia — devolve seu argumento. — Eu não cresci com empregadas
arrumando a minha cama, então sei muito bem como fazer.
— Mas eu prefiro que não o faça. Esta é minha casa e eu dito as
normas aqui.
Isis franze os olhos na minha direção.
Reconheço que fui um idiota, mas caralho...
Que mulher difícil, meu Deus!
— Eu sei que esta é sua casa, mas sou o que sou aqui ou em qualquer
outro lugar e não pretendo mudar, senhor Oliver.
— Porque é tão difícil fazer você entender aonde eu quero chegar.
— Na verdade, eu já entendi, senhor Oliver. Mas quero que entenda
que é da minha natureza fazer eu mesma essas coisas, porque eu sempre fiz.
O senhor não disse que quer que eu me sinta confortável e à vontade na sua
casa? Permita que eu, ao menos, arrume a cama onde durmo.
Engulo em seco, porque ela tem razão.
Droga, ela tem tanta razão que não sei onde enfiar a porra da minha
cara!
Embora eu tenha a trazido para meu mundo, não posso simplesmente
obrigá-la a aceitá-lo.
A realidade de Isis é totalmente diferente da minha e certas limitações
que eu queira impor podem parecer absurdas para ela. Então, assinto com a
cabeça concordando em silêncio em deixá-la à vontade, fazendo aquilo que
já é acostumada a fazer.
Inferno!
Só quero mantê-la livre de qualquer outra tarefa que não seja
totalmente voltada para Oli e garantir tanto a ele quanto a Isis o melhor que
posso oferecer.
— Se é assim que prefere — digo e dou de ombros.
Mal toco no café da manhã, me levanto com as mãos no bolso e de
novo me aproximo dela.
Não sei se esteve cogitando em voltar para Blumenau, mas ela
pensa muito em uma resposta.
— Sim, é como prefiro. Agradeço por entender minha perspectiva,
senhor Oliver.
Não consigo evitar.
— Por que precisou pensar demais? Por acaso estava pensando em ir
embora? — pergunto desconfiado, mas parece que foi o mesmo que apontar
uma faca para ela, já que recua e segura Oli com mais firmeza.
— Não! Não, senhor Oliver. Isso não passou pela minha cabeça. Eu
quero ficar com Oli o máximo que eu puder — diz o aninhando em seu peito.
— Só peço que compreenda que eu não vou mudar para agradá-lo. Eu sei
bem quem eu sou, senhor.
— Nem eu quero que faça isso, Isis. Valorizo que as pessoas sejam
sinceras comigo, independente de como eu possa reagir. Se eu extrapolar o
limite, me diga. E, a propósito, você está me chamando de senhor Oliver de
novo.
Ela dá um sorriso mais relaxado agora, o que me faz sorrir também.
— Desculpa, é mais forte do que eu. Vai ser difícil me acostumar.
Oli se remexe no colo dela e abre os olhos com urgência, todo curioso.
Ele faz uns barulhinhos fofos pedindo atenção, parece até que quer falar, mas
talvez esteja procurando por peito.
— Acordamos você, né, garotão? Desculpa o seu pai. Ainda estou
pegando o jeito — converso com ele sorrindo e Oli segura meu dedo
aquecendo meu peito com o gesto tão simples.
Passo com suavidade a minha mão sobre a cabeça dele.
— Pronto para ir às compras com o papai?
— Como assim? — Isis pergunta de um jeito engraçado, mas acho que
Oli teria feito a mesma coisa, se falasse.
— Além do berço, é bom que você tenha uma lista de enxoval com
você — respondo sorrindo.
Dispenso o motorista e escolho o SUV preto para sair para as compras
com Oli e Isis. Pretendo levar os dois a uma ou duas lojas de bebê, ou
quantas outras ela julgar necessário.
O dia será longo, e de acordo com os meus planos, irá terminar no
escritório quando eu der uma rápida passada por lá. Enquanto isso, tento
deixar Isis confortável e tento conhecê-la melhor enquanto estamos a
caminho de algumas lojas de referência que pedi a Felícia ainda esta manhã.
Ela enviou uma lista completa dez minutos depois.
Para qualquer um que veja nós três juntos, sei que parecemos uma
família feliz e me confesso que estou gostando desta nova fase da minha
vida.
Eu sou pai agora e isso é incrível.
Quase não usamos o carrinho de bebê porque adoro ficar com o Oli
nos braços. Ele tem o cheirinho de bebê que encanta todo mundo e sentir seu
corpinho perto de mim me faz bem de uma forma que eu jamais imaginei ser
possível.
Adoro como, às vezes, ele olha para mim com profundidade, como se
soubesse quem eu sou e que eu já o amo mais do que tudo na vida.
Eu quero ser o melhor pai possível para ele, mas nem sei por onde
começar. Acho que este aprendizado vai ser algo que Oli e a vida vão me
ensinar aos poucos, no dia a dia. Não posso ignorar que Isis estar comigo me
faz me sentir mais confiante também.
A companhia dos dois pareceu preencher um vazio do qual já estava
habituado, mas que também transformava meu mundo em preto e branco.
Nos últimos anos eu me habituei a ser um homem solitário.
Amigos?
Só tinha tempo para eles em raros finais de semana.
Festas?
Só ia a qualquer evento social se não tivesse alternativa e me
restringia as da empresa ou de algum parceiro de negócios, mas sempre
participava muito contra a minha vontade.
Mulheres?
Nunca admirei uma tanto quanto Melissa e não queria dar espaço a
ninguém na minha vida simplesmente porque não me sentia pronto ainda.
Sexo?
É ridículo ter que admitir, mas fique só na punheta desde que perdi
minha mulher. Era com ela que eu fantasiava quando meu corpo exigia por
este tipo de alívio. Mas depois me sentia pior do que antes, porque eu sabia
que quem eu tinha perdido jamais voltaria para mim.
O que nós tínhamos eu duvidava que sentiria novamente por outra
mulher. Então para que me enganar e dar esperanças vazias para alguém.
Talvez devesse começar a contratar garotas de programas.
Sei lá...
Eu sei que não poderia ficar na mão assim pra sempre.
Um homem de 36 anos não pode se aliviar indefinidamente apenas
com a ajuda da mão. Ainda mais agora que eu tenho no quarto ao lado do
meu, uma linda jovem como Isis dormindo a poucos metros de mim.
Eu sei que não deveria pensar nela dessa forma, mas essa é a verdade.
Isis é incrivelmente linda e é a única mulher que despertou em mim
algo que não fosse apenas simpatia por um bom tempo, mas só em cogitar
que podemos ter algo como a Melissa queria que acontecesse é muito difícil.
Me relacionar com alguém não é mais tão simples quanto se parece. E
um homem de negócios como eu nem sequer tem tempo para pensar em algo
que seja relativamente depravado o suficiente para me deixar com o pau
duro ou que venha a me dar de fato tesão.
Até ontem....
Até aquele quase beijo que trocamos...
Não sei explicar, mas há algo extremamente sexy em saber que aquela
mulher concebeu o meu filho. Algo que me torna conectado a ela,
mesmo que seja difícil de admitir, mas o simples fato de nunca ter
acontecido nenhum toque entre nós dois, me faz sentir uma lacuna entre nós
dois; uma atmosfera densa e perturbadora.
Depois desses anos, conviver de novo com uma mulher desta maneira
também é novidade pra mim.
— Já conversou com o seu pai? — pergunto deixando esses
pensamentos incoerentes de lado, quando paramos no primeiro sinal
vermelho.
— Mandei mensagem e ele está morrendo de saudade, querendo nos
ver. — Indica Oli com a cabeça depois revela devagar e com humor: — O
meu pai sempre gostou de crianças, mas acho que ele não acreditou muito
que eu estava na casa de uma amiga. Acho que ele pensa que estou de bem
com o pai do bebê.
— Isso não deixa de ser verdade — digo rindo e ela também ri.
De repente nossos risos estão preenchendo meu carro que antes só
presenciava ligações mal-humoradas e o som do rádio.
— Mas ele pensa em algo românico. Ainda não sei como contar tudo
isso a ele, mas vou achar uma maneira um dia — diz olhando para Oli com
devoção, mantendo o sorriso.
Algo dentro de mim me impulsiona a dizer o que digo em seguida:
— Eu posso e quero cuidar tanto de você quanto do Oli, Isis. Eu sei
que é cedo para te dizer isso, mas se quiser ficar conosco sempre será bem-
vinda. Você o ama e ele é louco por você. Qualquer um pode ver isso. Mas a
decisão é sua. Está bem?
— Significa muito para mim, senhor Oliver. Obrigada — diz me
olhando brevemente pelo retrovisor interno do carro e nossos olhares se
cruzam novamente.
Sinto algo intenso e inexplicável só com esse simples olhar. Ela está
com os olhos marejados e isso mexe comigo profundamente. Ela é o tipo de
pessoa que todo mundo quer ter por perto e tem o olhar mais gentil e doce
que eu já vi em muito tempo.
A vejo desviar o olhar, como sempre costuma fazer e volta sua atenção
para Oli.
O sinal volta a ficar verde e preciso manter minha atenção na avenida.
Mas queria mesmo continuar observando, no entanto, me contento em ouvi-la
conversar com meu filho sobre o berço lindo que vamos comprar para ele.
Linda, inteligente e sensível.
Talvez Melissa não tenha escolhido Isis apenas porque ela seria uma
excelente barriga de aluguel, mas porque ela sabia que Isis poderia me
deixar igual a um bobo, fascinado por sua ingenuidade e doçura tão
incomuns nas mulheres que circulam na alta sociedade e que se aproximam
de mim como abelhas no mel, sempre que sou forçado a aparecer em um
evento público.
Buzinas eufóricas logo atrás ressoam me tirando daqueles pensamentos
e percebo que continuei com o carro parado mesmo depois do sinal verde.
Volto a dirigir, ignorando os possíveis xingamentos que devem rolar a
solta logo atrás de nós.
Imagino que ela deva ter a mesma necessidade de querer me conhecer
melhor, mas não é sobre mim que a moça de cabelo longo, morena, resolve
falar:
— Eu deixei muita coisa em Blumenau, sabe? Estou de licença
maternidade no meu emprego na escola, tenho alguns bons amigos e meu pai.
Mesmo que eu passe tempo suficiente aqui, por livre e espontânea vontade,
eu tenho uma vida lá. O senhor entende?
— Voltar sem o Oli não seria pior? — pergunto cautelosamente e a
vejo fechar os olhos como se só a ideia a fizesse sofrer.
— Eu poderia explicar a eles o que aconteceu, mas... Não quero falar
sobre isso.
Balanço a cabeça em compreensão.
Falar sobre este assunto parece ser mais difícil do que eu imaginava.
Isis sabe que assinou um contrato, mas algo no coração dela parece ser mais
forte que páginas e um monte de palavras com assinaturas, que no final não
fazem sentido nenhum para ela. Ela ama meu filho e isso para mim basta
também.
“Ah, Melissa...
Olha a confusão em que nos meteu, meu bem!”
Consigo olhar para ela quando o fluxo de carros melhora em uma rua.
De repente aquela Isis entusiasmada e leve dá espaço a uma Isis preocupada
e cabisbaixa; confesso que me sinto horrível por isso.
— Daremos um jeito. — É o que eu a digo.
Porque eu sempre consigo dar um jeito.
Não importa o tamanho da dificuldade, sempre consigo passar por
cima do obstáculo e Melissa sempre soube qual seria a complicação desse
problema, por isso ela me deu uma escolha e me mostrou um caminho.
Agora estou prestes a tomar a decisão de segui-lo.
OLIVER

"Que família linda!"


É o que Isis e eu ouvimos quando entramos em duas lojas diferentes
para comprar o enxoval de Oli. Somos tratados em todas as lojas como se
fôssemos uma família de verdade e nenhum de nós dois corrige a impressão
das vendedoras, que vem nos receber sempre que entramos em uma nova
loja, até porque não precisamos ficar dando justificava para qualquer um que
Oli é fruto de uma fertilização in vitro.
Compro tudo o que ele precisa, desde berço a poltrona de balanço
para Isis amamentá-lo com mais conforto.
Deixo, na verdade, quase tudo nas mãos dela.
Entrego meu cartão e dou carta branca para que ela compre tudo que
quiser. Sorrio ao notar que além de bom gosto, Isis tem bom senso e não é de
ostentar e gastar com algo que não julgue importante, por mais que as
vendedoras tentem empurrar um milhão de itens com nomes que eu nunca
ouvi falar.
Eu nem sabia o que diabos era um mijão e muito menos que há uma
vasta opção de coisas que se pode comprar para um bebê. E sendo bem
sincero, não pensei duas vezes antes de pegar uma bola de espumas que se
desfaz quando colocada na banheira com água.
Eu quero ver a reação do meu filho ao tomar banho na bananeirinha
com aquilo.
Compro vários brinquedos apropriados para a sua idade e vejo Isis
rindo do meu lado consumista.
“Ah, porra!”
Dinheiro foi feito para se gastar com quem a gente ama, não é?
Com coisas que nos façam bem, então por que não?
E fraldas, comprei fardos de fraldas porque bebês usam muitas e Oli
não é uma exceção.
Peço a Isis para me ensinar tudo o que for necessário, trocar fraldas,
colocar para arrotar, fazer dormir e dar banho.
Anos atrás, logo quando decidi que queria ser pai, não era porque
queria aumentar a família, mas porque seria presente em tudo, diferente do
meu próprio pai que quase nunca estava em casa e só se preocupava com o
trabalho.
Eu faria cada momento que eu pudesse passar ao lado de Oli valer a
pena.
Agora eu tenho a chance perfeita de ser um bom pai e vou fazer meu
melhor por Oli sempre.
Somos informados que em algumas horas, as compras serão entregues
em casa, mas aviso Matilde de que assine a entrega por nós, caso eu não
chegue a tempo.
Como eu havia dito mais cedo, preciso passar no escritório.
— Tem certeza que quer que a gente suba com você? — Isis pergunta
assim que fecho a porta do carro atrás dela, já com Oli no colo.
— Não vou deixá-los no carro.
— Posso ficar em outro lugar e...
— Não, Isis. Quero vocês dois comigo e de qualquer forma não vamos
demorar — a interrompo e aperto o envelope com os papéis que a advogada
Anete deixou em minhas mãos ainda ontem antes de partir.
— O senhor é muito mandão, às vezes, senhor Oliver — diz me
olhando de rabo de olho.
— Eu sei que sou, é um vício do trabalho. Não me entenda mal, mas
quero vocês por perto. É importante para mim, está bem?
— Tudo bem. Você vai ficar me devendo — profere em provocação e
sorrio, porque ela nem percebeu que me chamou de você.
Ela mal faz ideia quão linda fica quando relaxa e sorri deste jeito,
muito menos o efeito que causa em mim.
— Eu odeio arrogância, Isis. Mas às vezes acontece naturalmente, ela
acaba vindo junto com o poder.
— Isso te torna amado ou temido?
Dou de ombros.
— Me faz ser respeitado. Me esforço para ser justo em tudo o que
faço, mas liderar exige que eu saiba separar as coisas e ser firme quando
necessário.
Começamos a andar em direção ao prédio que se estende ao céu, todo
espelhado.
— A fundação do meu empreendimento certamente são as pessoas que
trabalham para mim lá embaixo. Eu os respeito e eles me respeitam também.
Ofereço remunerações bem acima do mercado, mas cobro excelência dos
meus empregados.
Isis me olha com admiração.
— Então eles devem amar o chefe deles — supõe.
— Não sei. Eu não fomento ações que possam prejudicar meus
subordinados. Uma política de reconhecimento do mérito, aliada a um
ambiente de trabalho saudável e com chances de crescimento profissional é
por razões óbvias muito mais produtivo. Mas como o CEO da Giordano S.A.
preciso tomar decisões difíceis que também vem com o cargo e, às vezes, a
firmeza pode soar como arrogância. As pessoas odeiam arrogância, então
devo ser odiado, também. Mas comando a empresa segundo os valores que
sigo na minha vida, respeitando minha consciência. Me esforço para ser
patrão ético.
— Ah. Eu imagino que não deve ser fácil ser o senhor...
Devo tê-la intimidado, de alguma forma, pois ela voltou a me tratar
com formalidade outra vez.
Quando nos aproximamos da entrada da sede da minha empresa, a vejo
prender o fôlego ao olhar em volta. Isis permanece silenciosa, desde que
somos cumprimentados por todos aos passarmos pela recepção atraindo
olhares curiosos, até chegarmos ao 50º andar onde fica meu escritório.
Também não julgo a curiosidade de todos vendo a cena incomum do CEO da
empresa, chegando acompanhado de uma moça com um bebê no colo. Além
de que não costumo usar roupas casuais, como jeans para vir a Giordano.
Os sussurros seriam inevitáveis, mas nada disso me afeta.
Eu não dou a mínima.
Minhas únicas preocupações são Isis e meu filho. Se ela pensa que
estou incomodado em aparecer publicamente ao lado dela que carrega meu
filho, mostrarei que não poderia estar mais enganada.
Quando enfim chegamos ao meu escritório, passo direto pelas salas de
vidro fumê claro, destinadas a reuniões com acionistas e investidores que
compõem um designer de interior iluminado e moderno, contrastando com
alguns detalhes rústicos.
Vejo Felícia a caminho da sua mesa, mas ela se detém assim que me
vê. Minha secretária está comigo há sete anos, ela está meio ruiva e meio
morena, usa óculos de grau desproporcionais ao tamanho do seu rosto e vive
com o cabelo preso em um coque perfeitamente alinhado. Mas o que mais
gosto em Felícia e o que realmente importa é que ela é extremamente
eficiente e discreta.
— Senhor Oliver, bom dia — cumprimenta e dá uma olhada em Isis,
muito rápida, mas o suficiente para fazer sua avaliação.
Conheço Felícia há anos, como eu disse.
— Bom dia, Felícia. Quais as questões relevantes para hoje?
Ela olha de relance para Isis, não sabendo se seria uma boa ter aquela
conversa com a mulher estranha ao meu lado. Mas como não interfiro em
nada, diz:
— Estamos com os parceiros atualizados. Chegou a nova remessa de
máquinas americanas e elas serão colocadas em teste ainda hoje. Os e-mails
foram checados e há algumas vídeo chamadas agendadas para hoje.
— Desmarque — determino ao ver a lista de parceiros de negócios
que envolvem as vídeo conferências.
Não havia nada urgente que não pudesse esperar.
Felícia parece surpresa e sem fala por alguns segundos.
— Na verdade, desmarque tudo para os próximos dias. Vou trabalhar
em home office, talvez eu apareça para algumas reuniões que minha presença
seja sumariamente necessária, mas por um tempo vou comandar tudo de
casa.
Felícia fica atordoada, mas também não questiona.
A minha palavra é sempre a primeira e última.
— Eles estão aqui? — pergunto já sabendo o que me espera do outro
lado, dentro do meu escritório.
— Sim, senhor.
— Ótimo. Deixe-me apresentar a você... Esta é Isis e o bebê é o meu
filho Oli. Leve os dois para a sala anexa a minha e proporcione a eles o
máximo de conforto possível.
— Perfeitamente, senhor. Muito prazer, senhora Isis — diz ainda
assimilando a palavra filho pela cara de espanto que contempla o bebê em
meu colo, mas logo assume o tom profissional que sempre valorizei em
Felícia.
— Pode me chamar apenas de Isis — responde um pouco insegura.
Felícia sorri e se prepara acompanhar Isis e meu filho até a outra sala.
Só levaram poucos segundos para Felícia aceitar a novidade e lidar com ela
conforme eu esperava.
A minha atenção volta para a morena.
— Fique à vontade, não irei demorar. É uma reunião bem rápida.
— Ok. Irei esperá-lo — responde sem resistir muito.
— Por aqui, Isis.
Logo minha assistente se afasta conduzindo Isis e Oli com gentileza e
toda deferência que meu herdeiro merece.
Felícia mostra a ela o caminho e somente quando Isis não está mais no
meu campo de visão, é que decido entrar no meu escritório.
Ainda na noite passada, mandei mensagem para o meu pequeno grupo
de amigos. Três, na verdade, e nada mais.
Domenico aquele cretino já sabia, mas eu precisava avisar a Lorenzo e
Nicolo pessoalmente sobre tudo o que aconteceu e mudou o rumo da minha
vida mais uma vez. Eles ficaram me notificando a noite inteira, querendo que
eu adiantasse o motivo daquela reunião entre nós quatro, tanto que precisei
desligar o celular para ter um pouco de paz.
E agora, quando entro no meu escritório, encontro os três dispersos,
conversando sobre o que parece ser sobre as máquinas que chegaram para o
teste de uma nova tecnologia agrícola.
Domenico está sentado em uma poltrona, relaxado. O cretino tem
inegavelmente os olhos de Melissa, o mesmo tom diferente de verde, e isso
associado à beleza dos genes da família o torna irresistível para as
mulheres.
Nunca para muito tempo com uma namorada, mas é o que tem a
personalidade mais próxima a minha, eu diria.
Lorenzo se encontra na janela, observando a vista de Florianópolis lá
embaixo. Ele é engenheiro agrônomo e chefe de produção, tem o cabelo
castanho da cor dos olhos, nunca tira a barba e é o mais quieto e observador
de nós quatro.
E Nicolo está na minha cadeira, como se fosse o rei, ele é advogado
tanto da empresa quanto meu pessoal, e se acha o príncipe da Disney por ser
loiro dos olhos azuis, extremamente galanteador. Um canalha de marca maior
quando o assunto é mulher, tanto que adora uma competição com Domenico
nesse quesito.
— Feliz aniversário atrasado, seus cretinos — pronuncio assim que
fecho a porta atrás de mim.
— Vai se foder, Oliver! — Nicolo pragueja. — Que porra foi essa de
sumir no dia do nosso aniversário, caralho?
Fecho os olhos e respiro, ciente do sermão que provavelmente ele
tinha na ponta da língua. Nos conhecemos desde o ensino médio, e o que nos
tornou ainda mais próximos naquela época, foi o fato dos nossos pais nunca
terem tempo para dedicar aos filhos, além de que fazemos aniversário no
mesmo dia. E ontem fizemos 36 anos.
Lembro que Melissa me dizia que a nossa amizade era um presente do
universo, que uma coincidência dessas, era para ser levada a sério.
Hoje, somos como irmãos.
Eles até dias atrás eram toda a família que eu tinha, após a morte de
Melissa.
— Eu falei que ele tinha uma boa justificativa — Domenico me
defende, mas só porque ele já sabe.
— Vai aumentar nosso salário? — Lorenzo brinca, enfiando as mãos
nos bolsos da calça.
— Não é nada que se refira a vocês — respondo rindo da piada.
— Este suspense é uma merda, cara — Nicolo se indigna mais uma
vez. — Que porra estamos fazendo aqui? Estou começando a ficar
preocupado. O idiota do Dom não quis contar do que se trata de jeito
nenhum.
Olho para meu cunhado e ele pisca para mim em um gesto de
cumplicidade.
— Pois é. As novas máquinas chegaram hoje e deveriam ser colocadas
em teste ainda nesta tarde, mas precisei estar aqui e a viagem é longa até o
Paraná — Lorenzo enfatiza.
— É, eu sei. — Passo a mão no meu cabelo o escovando para trás.
Ensaiei tanto para este momento, que agora nem sei por onde começar.
— Você está tenso demais, Oliver. Se meteu em um problema bem
grande, não foi? Fala de uma vez! — Nicolo, como meu advogado e meu
amigo, pergunta preocupado.
— Depende, se você considera isso um problema ou não — Domenico
dispara achando graça.
— Espera, por que esse canalha soube primeiro do que nós? Ele
sempre disse que era o seu melhor amigo e agora eu vejo que isso tem um
fundo de verdade — Nicolo provoca.
— Se você abrir a boca, enfio esse caralho na sua goela. — Mostro a
ele o envelope.
Nicolo fica estático, já sabendo que irei precisar da sua ajuda,
enquanto todos ficam em silêncio.
Lorenzo por sua vez, só aguarda a notícia, mas sua testa franzida
mostra que ele está preocupado também.
Aproveito a oportunidade para explicar de uma vez por todas.
— Domenico soube antes por que Melissa contou a ele, foi cúmplice
dela e do que ela fez. Não tem favoritismo nenhum da minha parte. Parou
essa palhaçada, somos melhores amigos e ponto final. Os quatro e ponto.
— Melissa? — Lorenzo indaga pálido, sem entender nada.
Respiro fundo, pois parece ser o momento perfeito.
— Melissa me deixou um filho. Isso significa logicamente que agora
eu sou pai.
Estáticos.
Meus dois amigos ficam paralisados quando essa informação chega até
eles, mas Nicolo é o primeiro a questionar.
— Explica direito esta porra. Como isso é possível?
— A Melissa nunca esteve grávida. Eu não lembro, por mais que eu
fique mais tempo no Paraná que aqui... Uma gravidez... — Lorenzo reflete
quieto no seu canto, assustado, eu diria.
Balanço então o envelope e largo na mesa diante de Nicolo.
— Barriga de aluguel. Ela planejou tudo bem antes dos tratamentos
começarem.
Nicolo tira os papéis que estendo a ele com rapidez, mas lê tudo com
calma, com um Lorenzo bem curioso em seu encalço. A carta não está ali,
resolvi deixá-la guardada só para mim porque afinal, é algo íntimo demais.
Apenas entre Melissa e eu.
A única pessoa que eu consideraria deixar ler a carta no futuro seria
Isis.
Eles ficam uns 20 minutos ali lendo e relendo tudo, até que Lorenzo é
o primeiro a "aceitar".
O meu coração está galopando com tanta força que estou suando frio.
— Eu lembro da época que você disse que estavam tentando ter um
filho, mas não imaginava que Melissa fosse fazer algo assim, irmão.
— A minha irmã sabia o que estava fazendo — Domenico verbaliza na
defensiva. — Ela não fez tudo isso pra ferrar com a vida do Oliver.
— Parece que ela sabia mesmo o que estava fazendo — Nicolo repete
quase a mesma coisa.
— É o que eu estou falando — Dom corrobora.
— Então não é um golpe? — pergunta o loiro.
— Definitivamente não é. Eu acompanhei tudo de perto, desde a
inseminação até o parto do bebê — Domenico explica para que não restasse
nenhuma dúvida.
— Mas faremos um exame de DNA por questões legais unicamente —
ressalto, inquieto ainda pela reação completa deles.
— Esses documentos estão legalmente em ordem — Nicolo afirma e
entrega as folhas de volta para o envelope. — Onde eles estão, a mãe e o
bebê?
— Na sala ao lado. Irei apresentar vocês aos dois assim que der. Isis
ainda está tentando se ajustar às mudanças que vieram com a nova vida.
— E vocês vão se casar? — pergunta o loiro na maior calmaria.
— O que? Não! Não! De onde tirou essa ideia?
Será que é a coisa mais óbvia a fazer, a ponto de Nicolo pensar do
mesmo jeito que Melissa?
Ele assume aquela pose de advogado sério sentado na minha poltrona.
— Seria menos doloroso para os dois, embora ela tenha assinado a
cessão de direitos sobre o bebê quando ele tiver quatro meses e deixá-lo sob
sua responsabilidade e custódia integral. Mas você sabe que não precisa ser
bem assim, não é? Melissa deixou outro documento? Alguma coisa mais
pessoal?
Porra, o filho da puta é bom mesmo!
Não posso dar mais detalhes sobre a carta, pelo menos não tudo de
uma vez.
— Ela quer que eu me aproxime de Isis.
— Então é isso — conclui espalmando as mãos na mesa. — Além de
ter te deixado com um filho, Melissa decidiu acabar de vez com a sua
viuvez.
— Olha como fala da minha irmã, Nicolo! Porra! — Domenico
pragueja, defendendo Melissa.
— MAS FOI ISSO MESMO QUE ACONTECEU! — eles gritam de
um jeito que comecei a temer que Isis pudesse ouvir.
Ela não está tão longe daqui, por mais que as paredes sejam à prova
de som, me preocupo.
— Me diz, Oliver, como é a sensação de ter tido um filho, sem ter
trepado pra isso?
— É como quando você diz que fodeu três mulheres numa só foda, mas
sabemos que é um puto de um mentiroso — rebato raivoso, fazendo-o rir
alto.
Lorenzo solta um suspiro pesado e contorna a mesa para se aproximar
de mim. Seu rosto está complacente.
Tem muita coisa que eles vão demorar para entender, eu sei, também
estou tendo a mesma dificuldade, mas tem sido mais rápido do que eu
esperava.
— Bem, se é isso, então meus parabéns — diz dando de ombro,
sorrindo amplamente ao me parabenizar e me dar um abraço apertado, de
pura cumplicidade. — Vou estar aqui pra qualquer coisa, menos trocar
fraldas. Essa coisa não é comigo, irmão.
Logo depois Nicolo faz o mesmo, mas ao invés de vir me abraçar, ele
para no meio da sala, olha para Domenico e Lorenzo, e então para mim. Com
as mãos fechadas em punho, ele os ergue para cima.
— SOMOS TITIOS! — urra fazendo com que os outros dois o imite.
— E você, seu canalha, tá muito ferrado.
Ele me abraça se jogando sobre mim e me faz rir.
Admito que estava tenso com este momento.
— É, obrigado pelo apoio, depois de tudo que veio antes — ironizo.
Tenho pena de Oli. Por parte, sei que ele vai crescer tendo este bando
de idiotas como tios, mas por outro lado, sei que ele ganhou uma família
incrível. Os laços são mais importantes que o sangue, e isso me faz ter a
certeza de que num piscar de olhos, a minha família já era grande o
suficiente para caber todo tipo de amor e afeto e nada disso irá lhe faltar.
OLIVER

Os dias se transformam em semanas e eu mal me dou conta disso.


Na verdade, gostaria muito de ter mais tempo para dar conta de tudo o
que tenho de fazer. Não houve grandes dificuldades em transferir minha
rotina de trabalho para o escritório de casa, só levei algum tempo para me
habituar a essa mudança repentina.
Por dois anos, o meu trabalho e a empresa foram minha âncora, a
minha válvula de escape e remédio para lidar com o luto. Era mais fácil
estar enfrentando coisas do trabalho pesado ao reger toda uma empresa, do
que estar em casa e me sentir sufocado e torturado pela falta que Melissa me
fazia.
Agora sinto que estou conseguindo aceitar melhor a ausência dela e o
fato de que não a terei de volta.
É inegável o quanto ainda sinto a falta de Melissa, mas agora com Oli
em casa, tenho a sensação de que ela está presente aqui de alguma forma. Ele
é o maior presente que ela já me deu e sorriu ao pensar que mesmo do céu
ela deixou um pedaço seu para eu cuidar e amar.
Mas isso não significa que está sendo fácil.
Oli é um bebê tranquilo, mas como todo bebê é indefeso e requer
cuidados permanentemente. Como todo bebê, meu filho acorda várias vezes
a noite e é até engraçado como alguém tão pequeno consegue sujar tantas
fraldas em uma única noite. Mas considerando que quando ele não está
fazendo isso está mamando, é até compreensível.
O elo dele com Isis é forte demais.
Ela sabe, não sei como, mas ela sabe diferenciar quando o choro é de
forme, de sono que ele pode estar sentindo, se está molhado e até se é por
calor ou frio. Toda vez que ela o pega no colo, ela sempre o embala com
uma canção dos Beatles.
Eu já me acostumei a ouvir sua voz suave e melodiosa cantando e
entendo por que meu filho se acalma quase de imediato quando ela canta. Eu
mesmo me sinto afetado sempre que ela faz isso. É incrível como a voz
dessa moça exerce esse poder sobre mim e meu filho.
Às vezes, percebo que ela mal consegue comer direito ou ter tempo de
tomar um banho. Eu a ajudo da melhor forma que posso, mas Isis tem um
instinto maternal de uma leoa que faz com que ela não sinta tanta necessidade
em se priorizar. Por isso, não seria justo eu reclamar das noites maldormidas
ou de como o processo para fazer Oli se acalmar quando ela não está por
perto, é cansativo.
Isis ganhou meu respeito e admiração por toda dedicação e amor que
demonstra por Oli. Ela nunca se queixa de cansaço, por mais que eu veja
suas olheiras. Parece em estado de graça e fica ainda mais bonita quando
sorri daquele jeito para meu filho.
Vê-la conversando e sorrindo para ele assim, sempre me faz sorrir até
eu parar de sorrir por me dar conta que estou fazendo isso enquanto admiro
aquela jovem mulher que é quase uma desconhecida, além de ser hóspede na
minha casa.
Pelo menos, no momento é o que ela é.
Contudo, eu sabia que todas essas mudanças não se alinhariam
naturalmente. Eu me descobri pai literalmente da noite para o dia e Isis teve
a vida dela alterada para sempre também. Algo que me incomoda é perceber
que nessas duas semanas desde que ela se mudou para minha casa, Isis não
se sente à vontade em tomar a iniciativa para fazer quase nada aqui dentro.
Ela ainda se sente desconfortável, prefere me chamar de senhor Oliver a
Oliver e acorda cedo demais mesmo que tenha dormido pouco na noite
anterior.
Sei que é para não dar uma má impressão para minhas funcionárias da
mansão, mas já disse que se ela precisar de ajuda, eu posso contratar uma
babá. Isis foi categoricamente contra essa possibilidade e tive que respeitar
sua decisão.
Ela não quer abdicar do tempo que ainda tem com Oli por nada.
Fico feliz em demonstrar que ela pode contar com minha ajuda sempre.
Eu às vezes tomo meu filho do seu colo e peço que ela volte a dormir que eu
ficarei com ele.
Acho que são as únicas vezes que a vejo relaxar de verdade é quando
sabe que Oli está comigo e está seguro.
Ela quer sempre se mostrar útil e isso não é necessário, mas tento me
colocar em sua posição, com tantas coisas novas acontecendo em sua vida e
aceito a maioria de suas reservas.
Um dia desses a peguei lavando pratos e fiquei puto da vida, porque
era nítido o seu cansaço. Mas não posso esquecer que ela deixou claro que
se esforçaria para se sentir em casa, exatamente do jeito que quero. Por isso
preciso ficar engolindo essas coisas calado, mas não significa também que
eu não vá achar algum jeito de reclamar a respeito no futuro.
Porém não seria honesto dizer que não consigo notar os avanços de
Isis em se adaptar ao "novo lar". Dias atrás, eu tive uma prova disso,
passava de uma da manhã, quando ouvi Oli chorar. A princípio fiquei no meu
quarto apenas esperando, caso notasse que Isis precisava de ajuda, mas logo
percebi que não era um choro comum. Conviver com Isis me fez aprender a
conhecer o choro do pequeno Oli e aquele era um tipo novo.
Sim, um choro de dor.
“Oli está sentindo alguma dor.”
Pulo tão rápido para fora da cama, que não ligo de estar saindo do meu
quarto apenas de bermuda samba-canção. Tem feito muito frio nos últimos
dias, mas à noite quando estou sozinho no meu quarto, gosto de estar
relaxado, então quanto menos pano, melhor. Sei que da última vez deixei Isis
vermelha por causa disso, mas tem situações em que não dá pra pensar com
racionalidade.
E quando eu entro no quarto dela, Isis está tão preocupada com Oli que
nem liga pra única peça de roupa que estou vestindo. A encontro no canto, o
embalando em seu colo e provavelmente cantando alguma música dos
Beatles que é abafada pelo choro insistente de Oli.
— O que ele tem? — pergunto me aproximando, sentindo meu coração
ficar apertado quando vejo sua expressão de dor.
Porra, certeza que deve estar doendo mais nele do que em mim, mas
dói só de olhar. Nunca achei que fosse sentir meu peito ficar tão apertado
como agora.
— Não sei. Já tentei de tudo e ele não ficou calmo.
Isis precisa gritar por cima do choro para que eu possa ouvi-la.
Penso em Domenico imediatamente.
— Vamos levá-lo ao médico ou então ligar para Domenico, ele saberá
o que fazer.
— No meio da madrugada? Não seria melhor irmos a uma
emergência?
— Ele não se importa, confia em mim.
Volto para meu quarto só para pegar meu celular e ligar para ele. Sim,
definitivamente está tarde para ligações, mas Domenico sabe que só
emergências são feitas a esta hora, e por isso, ele não hesitaria. Conheço os
amigos que tenho, e fico mais certo disso ainda quando no terceiro toque,
Domenico atende.
— Cara, Oli não para de chorar, Isis não sabe mais o que fazer.
— O abdômen dele está distendido?
— Sim, um pouco eu acho.
— Chega mais perto dele, quero ouvir o choro — Domenico pede com
a voz pesada de sono, mas completamente desperta.
Volto para o quarto, vejo Isis está tentando acalmá-lo na sacada,
mostrando a ele a paisagem, mas ele não está nem aí. Estico meu braço em
direção a Oli, com o celular bem perto da sua choradeira e Isis fica olhando
confusa.
Coloco a ligação em viva-voz.
— Ele está com cólica — conclui com firmeza.
— Ah, e você descobriu isso pelo choro dele? — indago sarcástico.
— Se ele estiver inquieto, franzindo a testa, com um choro agudo e
prolongado como esse, com o rosto vermelho e abdômen distendido, na
maioria das vezes, é cólica, seu idiota.
Talvez eu seja mesmo, pois sem precisar ver o bebê, Domenico
reconheceu as reações.
— Domenico acha que é cólica, Isis.
— É claro, faz sentido.
Isis parece se culpar por não ter pensado nisso como se aquela
descoberta fosse a coisa mais óbvia do mundo, mas para mim não era.
— Coloca no viva-voz para Isis me ouvir, Oliver — Domenico pede e
fico surpreso com a naturalidade com que ele a tratou.
Idiota, eles se conhecem a meses!
Ele fez o pré-natal e o parto dela e eu sempre me esqueço disso.
— Ele já teve cólica antes?
— Não, é a primeira vez — revela angustiada.
— Ótimo, quero que faça o seguinte, massageie a barriguinha dele
depois faça massagem esticando e encolhendo as perninhas dele. Após
alguns minutos, tente também colocar algo aquecido sobre a barriga dele,
uma compressa ou bolsa de água morna talvez, mas até mesmo o calor do seu
abdômen já ajuda. Muitas coisas podem levar o bebê a sentir cólica e é
extremamente normal.
— E se persistir? — pergunto aflito.
— Não se preocupe. Dependendo do tempo que ele está sentindo o
desconforto, irá passar em breve — assegura.
— Beleza, então. Obrigado mesmo, Dom.
— Ah, tudo bem. Nada que uma trepada com a minha linda namorada
não resolva.
Ao fundo, ouço o estalo de um tapa e um gritinho de protesto vindo de
Júlia, a noiva de Domenico. A minha única reação é olhar para Isis que
arqueia as sobrancelhas em surpresa, mas logo entra para o quarto.
Tiro a ligação do viva-voz.
— Você é um desgraçado mesmo! — digo entredentes para que Isis
não ouça.
— Esqueci que a Isis estava ouvindo. Foi mal! — diz achando graça.
— Vai por mim, muito em breve serão vocês dois trepando pra aliviar a
tensão. E não vai demorar muito.
— Vá se foder, Domenico. Meu filho está com dor, a única coisa que
eu quero agora é que ele fique bem.
— Mas e depois que ele ficar bem?
A pergunta fica pairando no ar e o filho da puta ri, sabendo que me
fisgou.
Desligo na cara do imbecil.
Encontro Isis deitada na cama, fazendo exatamente o que Domenico
aconselhou, ficando barriga contra barriga, os dois de blusa levantada.
Sobre ela Oli ainda esperneia, mas seu choro parece que cessará a qualquer
hora. Atrás de mim, fecho as portas da sacada e as cortinas, o quarto fica
iluminado apenas pela luminária de ursinho de Oli, no criado-mudo.
— Será que funciona? — pergunto contornando a cama para me sentar
do outro lado vazio e ficar mais perto dos dois.
— Vamos tentar. Qualquer coisa conto a você mais tarde se deu certo
ou não.
Recuo incrédulo.
— Eu não vou sair daqui até Oli ficar melhor. — Para provar que eu
não estou blefando, me deito ao lado dela.
Isis parece um pouco confusa, mas sorri.
— Qualquer coisa, o coloque sobre meu abdômen. Ou funciona só com
mães?
— Talvez fosse melhor o senhor se vestir antes — explica apontando
para o meu tronco largo e vira passando a se concentrar no Oli.
— Te incomoda me ver assim, Isis? — pergunto sem conseguir conter
o tom malicioso em minha voz, mas logo me recriminado por ela poder
julgar minha atitude invasiva e inapropriada, afinal mal nos conhecemos.
— Não é nada disso. E-eu só acho que como hoje está fazendo sete
graus, e andar pela casa apenas de samba-canção não é uma b-boa ideia —
argumenta sem olhar par mim novamente, mas pela forma como gagueja sinto
que ela está tensa.
Percebo que eu gosto disso e sorrio.
Gosto dela me enfrentar, isso mostra que ela sabe se defender quando
necessário. Isis simplesmente esquece quem eu sou, toda vez que eu tento dar
um de esperto para cima dela. Mas não me importo, eu gostaria muito que
ela pudesse me tratar deste jeito 24 horas por dia.
Isis parece tão delicada e frágil na maioria das vezes que a chama que
vejo brilhar em seus olhos como agora, me fazendo pensar em porque ela
esconde esse seu lado mais impetuoso.
— Você não está muito vestida também — rebato avaliando o seu baby
doll de seda cor de rosa.
Ela ri e consigo me distrair por cinco segundos do choro de Oli.
Isis tem um sorriso lindo!
Não digo isso só porque seus dentes são perfeitos e os seus lábios
parecem extremamente macios, digo isso porque o som da sua risada parece
uma doce canção e ela sorri com os olhos, além de deixar as maçãs do rosto
salientes. Meu coração até afaga, mas não fico olhando esse detalhe por
muito tempo, senão ela percebe.
Acaricio as costinhas de Oli sobre ela, que sobe e desce no ritmo da
respiração controlada dela.
Será que a ocasião em si não a deixa tensa?
Digo, esse momento entre nós dois, não a afeta como afeta a mim?
Porque, porra, perco todos meus sentidos quando estou perto de Isis
deste jeito, numa cama e na claridade baixa?
Nem lembro quando foi a última vez em que estive com uma mulher na
cama assim.
De qualquer forma, isso me leva a pensamentos que me rodeiam há
dias e que nunca tenho coragem de verbalizá-los porque fico achando que
ela irá me censurar, mas como estamos ali, esperando Oli melhorar, não vejo
oportunidade melhor para matar a minha curiosidade.
— Como era a sua vida antes de Oli?
Ela dá de ombros.
— Ah, pacata o suficiente para isso ser a coisa mais radical que eu já
fiz na vida — alega sem muita empolgação. — Mas não significa que tive
uma vida relativamente parada... — prolonga, pensando se diria mais do
que isso ou não. Pelo visto, ela não se sente segura o suficiente para contar
mais da sua história. — Eu sempre fui na minha, nada de muito interessante
pra contar, até agora — finaliza sorrindo.
— Isso fez com que as pessoas julgassem muito você? — questiono
apontando para Oli e para a barriga dela que um dia já foi enorme quando
ele estava ali dentro.
— Mesmo em pleno século XXI, a sociedade ainda não vê com bons
olhos uma jovem grávida e sem marido — reflete. — Ouvi comentários
como "Tadinha, foi abandonada", e outros mais cruéis como "Bem-feito,
quem mandou abrir as pernas!". Muitos nem disfarçavam, outros falavam
quando achavam que eu não estava ouvindo, mas isso não me afetou. De
verdade.
“Eu fui criada por um pai solteiro, depois que a esposa do meu pai o
abandonou e ele fez um ótimo trabalho. Eu conseguiria também criar o Oli
sozinha, não que seja o caso, mas as pessoas tendem a serem bem maldosas
quando assumem o papel de juízes da vida alheia.”
— Sinto muito por ter passado por tudo isso. Certamente eu teria
estado ao seu lado se soubesse da sua gestação desde o início — afirmo com
meu sangue esquentando só de imaginar os maus bocados que Isis precisou
passar sozinha.
— Tudo bem, não foi culpa sua. Eu sempre estive ciente dos
pormenores, Oliver.
— Isso afetou a sua vida amorosa também? — Chego ao ponto que
quero e olho para ela com cautela.
A respiração de Isis fica irregular, percebo pela forma como Oli sobe
e desce sobre ela. Assisto sua língua lamber o lábio inferior e mordê-lo
sutilmente por fim.
Porra!
Ela me olha nitidamente surpresa pela pergunta, mas a forma
genuinamente sexy que expressou isso foi como me picar com uma ponta de
alfinete.
— Essa nunca foi a questão — responde vagarosamente.
— Quantos namorados você teve? Pode me dizer? — pergunto sério e
curioso.
Ela pisca atordoada pelo meu súbito interesse, imagino eu.
— Um, eu só tive um namorado e ele era meu amigo de infância.
Isso me pega de surpresa, mas confesso já esperar algo do tipo. Isis
não parece mesmo do tipo que se envolve com todos, e por alguma razão,
fico animado e surpreso ao mesmo tempo.
— Porra! Isis, você deve ser tão inexperiente...
— Inexperiente? — me interrompe de supetão. — Inexperiente com o
que?
Pisco e me aprumo em meio aos travesseiros.
— Com tudo... Com a vida...
— Não, com a vida certamente, não — me interrompe de novo e me
irrito, afunilando a conversa para ver aonde iria seu ímpeto.
— Com homens... Com sexo, com atração. Você tem 22 anos, é só
uma menina.
— É isso o que você pensa de mim? — pergunta engolindo seco e
tensa.
— Talvez eu prefira pensar isso de você — alego me dando conta do
quão rouca a minha voz tinha ficado.
— E posso saber por quê? — pergunta estreitando os olhos na minha
direção.
“Olha ela me enfrentando de novo...
Eu quero conhecê-la melhor.
Quero saber o que se passa em sua cabecinha e agora que eu
comecei vou fundo nisso.”
— Nada, é só o que eu acho — digo dando de ombros, banalizando a
conversa para que ela não pareça mais inapropriada do que já está.
Não quero que ela me veja como um depravado.
— Eu sou um homem de 36 anos e tenho um filho com uma mocinha de
22 anos. O que você acha disso, Isis? — Quando dou por mim percebo que
fiz uma pergunta que me arrependo.
Ela fica me olhando por um tempo em silêncio. Tanto que só então
percebo que Oli parou de chorar, e adormeceu de tanto que chorou. Acho
que escolhi mal minhas palavras quando a ouço dizer:
— Acho que você deveria sair da minha cama.
A observo se retrair e eu fiz por merecer isso sendo inconveniente.
— Me desculpa se soei invasivo ou rude, não era essa a minha
intenção. Eu vou voltar para o meu quarto agora que o Oli parou de chorar.
— Demonstro me sentir culpado enquanto acaricio o cabelo ralinho de Oli e
em aproximo para dar um beijo na testa do meu filho.
Isis dá um suspiro de alívio como se temesse que fosse tocá-la.
— Domenico é mesmo um bom pediatra — se restringe a dizer.
Me arrasto para fora da cama, querendo ficar e minha consciência
desmente que não é só por Oli que quero permanecer naquela cama. Vou para
longe, como se estivesse estabelecendo uma linha invisível entre nós dois,
causando angústia e qualquer outra coisa difícil de interpretar agora.
— Boa noite.
— Boa noite, Oliver.
Deixo o quarto de Isis sentindo meu corpo ainda inebriado pelo
perfume doce desta menina. A minha mente pede para ir, mas meu corpo quer
ficar.
Fecho a porta e o ar parece ficar mais respirável ali no corredor,
porque eu mal havia percebido antes o quanto eu prendia a respiração
estando ao lado dela.
Agi feito um idiota arrogante e inconveniente, eu diria. Mas a verdade
é que fiquei tão à vontade na presença de Isis esta noite, que não percebi que
estava relaxado a ponto de agir como um cara normal que mantém uma
conversa normal.
Naquele momento, estava agindo como um homem que quer entender
como a mente daquela linda mulher que teve um filho meu funciona.
Porra, como essa menina me afeta tanto?
Como Melissa poderia prever que algo assim poderia acontecer?
O que ela me disse naquela carta foi um pedido, no mínimo, incomum,
mas Melissa parecia me conhecer melhor do que eu mesmo e ela parecia
saber de alguma forma que Isis era o tipo de mulher que poderia perfurar a
armadura em volta do meu coração.
Vou dormir me sentindo um idiota por ter assustado Isis e ido além do
que eu mesmo considerava correto nessas circunstâncias.
O que ela estaria pensando de mim agora?

Dois meses depois...

No final da semana, Isis me dá um susto enorme, isso porque ela saiu


sem me avisar. Na verdade, ela não disse nada a ninguém, muito menos
pediu que Jorge a levasse seja-lá-aonde.
O celular dela?
Nada, nem chama.
Está desligado.
A advogada Anete?
Nada sabe também, ela desconhece o paradeiro de Isis.
E como se não fosse o suficiente, ela levou Oli, motivo suficiente para
eu quase ter entrado em pânico, mas não aconteceu porque havia muitas
coisas deles ali; então decidi excluir o pensamento de que ela havia
simplesmente desistido e decidido voltar para Blumenau com meu filho.
Todo esse alvoroço foi por volta das cinco horas da tarde, quando
voltei de uma tarde exaustiva na empresa devido uma reunião de emergência.
E na hora do jantar, nada dela dar sinal de vida.
Começo a me perguntar se foi uma má ideia deixar que Isis fizesse as
coisas sem que eu estivesse em seu encalço, mas, porra, não quero parecer
possessivo. Ela tem a liberdade dela, e sem dúvida se eu a questionar se
sentirá incomodada.
Mas fico preocupado, isso é inevitável.
Por ela e pelo bebê.
Está frio lá fora, já anoiteceu, talvez ela nem conheça Florianópolis
direito e com nenhum meio de comunicação só piora as coisas.
Não consigo sair da sala, onde tenho uma vista da entrada da casa.
Fico irritado porque Isis é teimosa às vezes. Já lhe expliquei tanto que
tudo ali torna a maternidade dela um privilégio, mas ela insiste em se abster
de muita coisa.
Caralho, qual a dificuldade em pedir para Jorge levá-la a tal canto?
É isso que eu não entendo.
Ela faz tudo ali parecer difícil e errado. Faz com que meus esforços
para a manter bem, sejam irrelevantes.
Mal dormi na noite passada, e não teve nada a ver com Oli, mas com
um bando de irresponsáveis na logística da empresa que atrasou uma
exportação milionária. Lorenzo me mandou uma mensagem irado, porque foi
justamente a produção que foi promissora ao usar as novas máquinas com
tecnologia americana. E então, ainda pela manhã, convoquei uma reunião
para contornar o prejuízo.
Porra!
Isso tudo se somou e me deixou um caos.
De qualquer jeito, encontrei conforto no bar da minha casa, adjacente à
escada, um pouco escondido até.
Fico contando as horas e até os minutos.
Uma hora se passa e já tomei uns três copos de uísque, é um recorde
para alguém que não bebia uísque há sei lá...
Três meses.
— Acalme-se, senhor Oliver. Logo ela estará aí — Matilde tenta
apaziguar quando vem retirar meu jantar intocado.
— Da próxima vez que a ver saindo, não hesite em perguntar aonde ela
vai! — ordeno rispidamente, fazendo o líquido âmbar rodopiar dentro do
copo.
— Sim, senhor.
— Eu falo sério, Matilde.
Ela me olha séria e um pouco espantada. Nenhuma das minhas
funcionárias sabem a história toda, imagino que ainda seja confuso Isis estar
ali com um filho meu, mas nenhuma delas ousa me perguntar, e eu ainda não
estou no clima para explicar. Muito menos agora.
— Eu sei, senhor. Licença.
A governanta pega a bandeja e se retira, me deixando sozinho,
afundando em pensamentos e álcool.
Estou em nervos, os meus pés não param quietos e a minha barba
começa a me incomodar; sinais básicos de que estou estressado e talvez um
pouco alto.
Casualmente, assim que Matilde some, a porta da frente é aberta e não
preciso de muito para perceber que é Isis, ao julgar pelos passos da sua
sandália ecoando no chão de mármore. Sentado no tamborete, inclino meu
corpo para trás para que ela possa ver onde estou e entender o convite para
se aproximar.
Talvez eu devesse relevar.
Ela está ali, toda bonita, bem arrumada e Oli também. Parecem
seguros, bem e que estiveram curtindo um tempinho juntos.
Quando ela percebe que estou sério, chateado, e bebendo, ela deixa
Oli no carrinho de bebê. Vejo-o acordado e espertinho. Meu filho está
evoluindo muito nesses últimos dias que num piscar de olhos, ele já ri das
coisas bobas que fazemos a ele.
Isis se aproxima com cautela, mas confiante.
Não sou um bêbado imundo, mas também não fico bebendo com
frequência então talvez isso seja uma surpresa mesmo.
— Você está bebendo? — Faz uma pergunta retórica.
— Talvez eu esteja. — Dou de ombros, com os cotovelos sobre o
balcão e evitando contato com aqueles olhos castanhos e tentadores.
— E você está comemorando alguma coisa?
“Comemorando.”
Isso soa tão tragicamente engraçado que não consigo evitar o riso de
desdém.
— Hoje o dia foi horrível — confesso.
— Ah, lamento.
— Um erro aconteceu na logística e perdemos alguns dígitos. Mas
nada que não possa ser recuperado com mais esforços. Além de que, eu
passei as últimas três horas igual um idiota morrendo de preocupação por
você ter saído com Oli.
Isis fica sem reação, mas ela não demora muito para se defender,
assumindo uma postura mais rígida.
— Eu avisei que iria sair — respalda.
— Para mim que não foi, muito menos para Matilde ou para Jorge. —
Finalmente me viro para ela e me rendo a sua imagem de moça sensível. —
Você sabia que tem um motorista à sua disposição, não sabia?
Ela parece ficar surpresa.
— Um moto... — Isis fecha os olhos e os aperta, tentando organizar o
pensamento. — Como assim? Eu avisei a Matilde que iria encontrar meu pai
que veio até Florianópolis para me ver. E, aquele homem é o motorista? Eu o
vi, mas não sabia que estava à minha disposição.
— Tudo está à sua disposição nesta casa, Isis! — exclamo, fazendo-a
ficar surpresa. — Eu fico literalmente dizendo a você que, se for o caso de
você subir nas minhas costas para querer voltar para Blumenau, eu carrego
você! Eu estou à sua disposição, e tudo o que eu recebo é essa ingratidão.
A expressão dela fica exageradamente espantada.
— O senhor não tem o direito de usar este tom e falar assim comigo, e
não relevo o fato de você estar possivelmente bêbado. O meu celular
descarregou e fiquei essas últimas horas com o meu pai. Será que vai querer
controlar minhas saídas?
— Eu não controlo a sua vida! — arfo ofendido. — Eu estou tentando
deixá-la um pouco melhor, mas você quer insistir em ser a garota humilde
que veio de Blumenau.
— Porque eu ainda sou essa garota — diz levantando o queixo para
mim, corajosamente.
— E é isso o que eu gosto em você, inferno! — confesso com
desgosto.
Odeio o fato das palavras ficarem fáceis quando estou sob efeito do
álcool.
— Não que você seja teimosa e dispense tudo, mas sim, que você não
sinta necessidade de nada disso. Você é você mesma e porra, isso é foda!
A deixo confusa que o seu rosto se contorce como se tivesse provado
algo azedo.
— E-eu não entendo — profere. — Você está ou não está com raiva de
mim?
— As duas coisas, Isis. — Levanto e fico de frente para ela, revelando
os 30 centímetros a mais. — Mas eu já estou entendendo a merda que tá
acontecendo aqui e você não tem culpa disso.
Reflito.
Ah, foda-se, não estou tão bêbado a ponto de não saber raciocinar o
óbvio. Matilde não avisou Isis sobre o motorista, assim como não me disse
que Isis tinha saído ao encontro do pai.
Eu só não entendo que porra ela ganha com isso.
— Então, por favor, não me trate assim novamente. Isso não é justo
comigo. E se sua preocupação foi eu ter levado o Oli, fique tranquilo que eu
jamais tentaria tirá-lo do senhor. Eu concordei com tudo isso, tive o Oli por
minha amiga. Pretendo honrar minha promessa à memória de Melissa. —
Cruza os braços e fica me encarando sem desviar o olhar dessa vez.
Porra, ela é tão baixinha e meiga que mal consigo acreditar nesta pose
de brava.
Me aproximo mais só para ter a real dimensão do quanto ela é mignon
de perto; o topo de sua cabeça alcança a altura do meu peito, sinto a
respiração de Isis bater quase no meu abdômen e acho graça.
— O senhor está cheirando a uísque. Ficou neste estado por medo de
eu não voltar com seu filho? Quanto bebeu, senhor Oliver?
“Não importa, o único cheiro bom aqui é o seu”, penso mais me
mantenho afastado.
Algo me diz que tocá-la seria como tocar em brasa, e o meu corpo
todo reagiria, como fogo e gasolina.
Não tenho o direito de tocá-la assim...
Jamais faria isso.
— Senhor Oliver, precisa tomar um banho e dormir um pouco. Quando
acordar conversaremos sobre isso, mas quero que saiba que não pretendo
afastar seu filho. Não me julgue e me condene sem me conhecer. É tudo que
eu estou pedindo.
Vejo aquele lindo solhos castanhos me olhando como se pedisse um
voto de confiança e isso me faz sentir um aperto no peito.
Eu confio nela, é claro que confio.
— Ok, quer saber de uma coisa? — sibilo e ela fica me ouvindo,
pacientemente. — Eu não estou condenando você. Estou condenando a mim
mesmo, porque porra, eu me preocupo tanto com você e com o Oli. Quero
vocês bem e antes eu não tinha nada a perder, mas hoje parece que tenho
tudo de novo nas minhas mãos. E caramba, Isis, eu juro que eu pediria você
em casamento só para fazê-la ficar.
Os olhos dela ficam arregalados com aquela revelação.
— O que? O senhor não sabe o que está dizendo... É o efeito do álcool
em seu...
— Não estou. Talvez eu esteja agindo feito um idiota, mas quero que
saiba que eu nunca vou tirar um filho dos braços de uma mãe. Oli é mais seu
do que meu, e eu tenho medo de perder vocês dois agora que os tenho na
minha vida. Por isso eu fiquei apavorado e bebi, Isis.
— Senhor Oliver... — A voz dela soa baixinha, desacreditada.
— Foi um dia estressante e não quero descontar em você, mas gosto de
pensar em mim como um cara pragmático. Então prefiro contar logo o que
está acontecendo e resolver isso, a ter que ficar escondendo a verdade de
você.
— Escondendo? Como assim? O que o senhor não está me contando?
— Eu vou dizer. Prometo que vou dizer, mas antes me responda
sinceramente, Isis. O que você acha de mim?
Volto a tocar naquela tecla de dias atrás, de quando Oli estava com
cólicas e acabei descobrindo que Isis teve apenas um homem em sua vida.
Fiquei curioso sobre diversas coisas a seu respeito depois disso.
A respiração dela muda e seu corpo fica tenso. Ela está tremendo, mas
não de medo, conforme vou avançando para mais perto dela, a deixando sem
escapatória.
— E-eu... Co-como assim? O que senhor quer que eu diga?
Isis está tão nervosa que quando a encurralo na parede, sinto seu corpo
todo estremecer diante do meu.
Minhas mãos vão automaticamente em sua cintura.
Ela fica rígida com o toque e sua respiração se torna ofegante.
— Diga o que está sentindo, o que acha de mim.
— O senhor está bêbado. — Joga na minha cara mais uma vez e eu sei
que estou.
— Isis, eu bebi, mas não a ponto de não saber o que estou fazendo. Irei
me lembrar de toda essa conversa amanhã.
— Está arrependido de ter me trazido para sua casa, é isso? Porque se
for, eu posso partir. Eu vou entender se preferir que eu vá embora.
A pergunta dela me parece um tanto desapontada.
— Não quero que vá embora. Talvez se eu tivesse tido a chance de
tomar mais duas doses, teria feito o que tanto quero fazer.
— E o que o senhor quer fa-fazer? — pergunta tão tímida, mas sem
desviar os olhos dos meus, como se aquilo exigisse toda a sua coragem por
estar tão ansiosa por minha resposta.
Sorrio de um jeito safado e roço a ponta do meu nariz no dela,
inalando seu doce fôlego. Eu podia quase ouvir seu coração galopar com
toda aquela proximidade e as chamas ressurgindo.
— Eu quero te beijar mais do que qualquer coisa no mundo agora.
— Senhor Oliver, P-por favor... Eu n-não acho que isso seja uma boa
ideia.
Vejo Isis inclinar a cabeça para baixo, fugindo do meu olhar e eu
pergunto:
— Mas você não quer, é isso? Há uma diferença entre não achar uma
boa ideia e não querer. Sabe disso, não sabe?
Quando ela gagueja desse jeito, consegue ficar ainda mais fascinante
para mim e o pior é que ela nem percebe o quanto é encantadora.
Ela assente sem jeito com a cabeça.
— Eu quero muito beijar você, mas não vou fazer isso sem seu
consentimento. Se quiser que eu pare, eu paro e nunca mais tento nada. Tem a
minha palavra — consigo dizer mesmo desejando ardentemente que ela não
me rejeite.
Eu nem entendo como em tão pouco tempo, esta menina me enfeitiçou
desse jeito.
— Eu e o senhor pertencemos a mundos diferentes... — É tudo que ela
se limita a dizer.
— Mas não foi isso que eu perguntei, Isis. Eu perguntei se você quer
que eu te beije tanto quanto eu quero te beijar agora?
Ela enfim volta a olhar para mim e vem ao meu encontro fazendo seus
lábios roçarem nos meus, o que me surpreende de um jeito maravilhoso. Foi
como se agisse por impulso, mas eu adorei quando senti meus dedos
apertarem sua cintura fina e depois meus braços a envolveram de tal forma a
deixá-la apenas com as pontas dos pés tocando o chão. A puxo para mais
junto do meu corpo para que ela sinta o que faz comigo. Minha ereção bate
em sua barriga e ela geme baixinho.
Arfo dentro da sua boca, mas não a beijo e ela também resiste.
Lembro do que aconteceu, que quando passou por aquela porta, eu
estava chateado com ela, e bastou vê-la aqui comigo de novo que tudo
passou.
Fácil assim.
Então, não.
Droga, o que você está fazendo, Oliver?
Controle-se, ela merece mais do que isso.
Hoje não.
Além disso, minha consciência me diz que Isis precisa sentir a agonia
que senti. Isso tem uma lógica confusa na minha cabeça, mas que se explica
pela necessidade incoerente de tão intensa que senti em tê-la por perto.
Só agora entendo o que estou sentindo por ela.
E com isso, a solto tão inesperadamente que se não fosse pela parede
atrás dela, acho que teria desabado. Isis fica confusa e perdida e me sinto
mal por fazê-la se sentir desse jeito, mas preciso ter certeza que ela não está
cedendo apenas porque a seduzi.
Eu preciso saber que ela me quer.
É importante ter esse tipo de certeza para o que agora vejo como uma
chance de um futuro para nós dois.
— Você tem razão. Não pode ser desse jeito. — Respiro fundo e ajeito
o meu cabelo. — Acho que eu estou bêbado.
— Mas...
— Não quero estar assim perto de Oli, então, é melhor eu subir e
tomar o banho que você sugeriu.
— Eu fiz algo... errado?
— Não, princesa. Pelo contrário, eu só não quero que se lembre da
primeira vez que eu te beijar comigo estando semiembriagado. Amanhã
podemos conversar sobre nós dois, isso se você concordar.
Ela apruma a coluna e confirma com a cabeça.
— B-boa noite, Oliver. — Enfim diz.
Meu nome em seus lábios me faz sorrir e em resposta ela sorri um
pouco acanhada.
— Boa noite, Isis.
Passo por Oli e beijo meu menino que está sorrindo brincando com o
móbile, alheio a tudo que aconteceu aqui.
Eu me sinto um babaca por atiçar uma faísca que acabou virando
labaredas dentro da minha calça e depois eu mesmo joguei um balde de água
fria.
Não sei, mas, apesar de tudo, subi a escada sentindo que fiz o que era
certo.
Isis não é esse tipo de garota que busca apenas diversão, eu sei disso e
não quero apenas isso com ela, agora que a conheço um pouco mais. Ela
precisa me conhecer também e saber quem eu sou antes de nos envolvermos.
Temos Oli, preciso pensar no que é melhor para ele e não posso deixar
que minha ereção tome as decisões por mim.
De agora em diante serei mais honesto com ela sobre como me sinto.
Descobri que a única maneira de deixar Isis completamente rendida, não é
com palavras, mas com atitudes.
ISIS

Perdi as contas de quantas vezes já fui chamada


de louca ou irresponsável.
Já perdi as contas de quantas vezes me pararam só para saber, "Mas
onde está o pai?"
Já perdi as contas de quantos olhares de reprovação eu recebi só por
carregar um filho estando solteira, "sozinha", como eles costumam jogar na
cara. E para ser bem honesta, eu nunca achei que estivesse sozinha, muito
pelo contrário. Se eu soubesse que terminaria sozinha, não teria dado início
a esta jornada, além de que Melissa jamais teria planejado tudo isso sabendo
que no fim, daria errado.
— Confie em mim, Isis. Eu sei o que estou fazendo, asseguro que
você não irá se arrepender — Melissa me dizia toda vez que nos
encontrávamos. — Conheço Oliver de olhos fechados, ele vai ficar ao seu
lado!
Por mais que as pessoas me vejam como uma garota boba e ingênua,
alego ser mais do que os olhos podem ver.
Numa circunstância normal, não importaria o tanto de palavras
otimistas e seguras que Melissa me dissesse, eu não confiaria nela. Contudo,
temos uma história, um laço e ela fez algo por mim que eu não sabia como
agradecer. Mas aí a proposta veio na hora certa, pois Melissa me encontrou
super disposta a ajudá-la, assim como ela ajudou meu pai também.
Eu pontuo com facilidade, que aquele dia, foi o pior dia da minha
vida.
Lembro muito bem porque dentro de três meses seria minha formatura,
e naquele dia eu havia me encontrado com a turma de Pedagogia para
fazermos o ensaio fotográfico externo de formandos.
Fazia muito calor em Blumenau e meu pai ainda trabalhava como
taxista. Ele iria me buscar assim que as fotos na Vila Germânica acabassem.
Mas ele nunca chegou a me buscar, porque havia se envolvido em um grave
acidente no meio do caminho.
Ainda me lembro de como foi sentir toda minha vida se reduzir aquele
único momento. Lembro de não conseguir chorar porque estava em pânico
demais, sofrendo antecipadamente pela ideia de perdê-lo.
Acho que alguém me enfiou num carro qualquer e me levou até o
hospital onde ele estava, mas o que me lembro daquele dia são fragmentos,
porque o trauma foi de fato grande. Porém, no exato momento em que soube
do ocorrido, Melissa não hesitou em ajudá-lo; tirou meu pai de uma maca
fria do corredor de um hospital público sem leito, e conseguiu transferi-
lo, com a ajuda de um helicóptero, para um hospital privado, que eu nem
conseguia imaginar como poderia pagar.
Mas Melissa foi como um anjo em nossas vidas, e crucial em tudo
para que meu pai tivesse um bom atendimento e recuperação.
Eu nem conseguia olhar na cara dela de tão envergonhada que me
sentia em alguns momentos, por saber que ela gastou tanto e que se
prontificou em ajudar sem haver pedidos recorrentes às circunstâncias.
— Entenda, Isis, que o mesmo sentimento que você está sentindo
agora, eu também senti e ainda sinto quando descobri que foi você a me
doar medula óssea — ela me assegurou quando meu pai pegou alta e veio
nos visitar no mesmo dia. — Nada do que eu faça será o suficiente para
demonstrar quão grata sou por você salvar a minha vida.
Frequentemente tenho essas lembranças dela. Sempre lembro de
Melissa com um sorriso genuíno, daqueles olhos verdes marejados, porque
ela se emocionava toda vez que falava sobre o câncer que teve. Mas quase
nunca mencionava sua vida pessoal, talvez não quisesse que eu tivesse tanta
intimidade antes da sua proposta surgir.
Vivíamos distantes, mas sempre mantivemos contato, então certo dia
recebi uma ligação sua querendo me encontrar. Ela viria até Blumenau, não
queria correr o risco de atrapalhar meu trabalho integral no meio de uma
semana. Sem contar que queria ser discreta.
Fiquei apavorada, não por não saber do que se tratava aquele
encontro, mas devido a voz de Melissa. Percebi que ela estava triste,
assustada e desesperada. E a sua tentativa de não me fazer notar isso, foi
tudo em vão.
Aí descobri sobre seu câncer no pâncreas, e que muito em breve ela
começaria as sessões de quimioterapia e radioterapia porque sua situação já
estava avançada demais, e as suas esperanças eram poucas.
Naquele dia, eu fui quebrada.
Estava amando nosso início de amizade, era como se a conhecesse há
anos. Mas Melissa não queria saber de choradeira ou tristeza, ela tinha
planos para o futuro, mesmo que duvidasse muito em não estar nele, havia
algo que precisava fazer antes de todos os tratamentos começarem.
— Você aceita ter um filho de Oliver, meu marido?
Eu já recebi muitas propostas inusitadas nessa vida, mesmo tendo
apenas 22 anos. Mas quando se nasce com poucas oportunidades, é cada
coisa que a gente vê que soa como loucura.
Eu achei que Melissa estivesse ficando louca ou sendo exagerada, mas
não falei nada disso até que ela me explicasse tudo e contasse suas ideias,
seus termos e que tudo seria judicialmente acompanhado para não haver
erros ou confusão.
A tarefa não era simples, receber uma inseminação de seus óvulos
inseminados pelo sêmen do seu marido. Engravidar, me manter discreta e em
total sigilo até o aniversário de 36 anos de Oliver. E então, como
ele jamais nos negaria, palavras dela, eu me hospedaria em sua casa por
quatro meses depois deixaria definitivamente a vida deles.
Sem mais e sem menos.
Durante o processo de inseminação artificial, da gestação, do parto e
pós-parto, eu receberia auxílio exclusivo de Domenico, seu irmão que já
estava por dentro dos pormenores por ser pediatra e de sua total confiança.
A advogada Anete Sulivan ia ficar à frente de todos os termos legais, e
seria a minha guia para que eu recebesse todo tratamento de qualidade
necessário. Mas ninguém, em hipótese alguma, poderia saber do nosso
acordo, e muito menos quem era o pai.
Por Deus, juro que foi um choque.
Eu deixei claro que faria tudo o que ela quisesse, como símbolo da
minha gratidão pelo que fez pelo meu pai, mas precisei de tempo, não muito,
pois Melissa já tinha pouco.
Só que a minha resposta já não é nenhuma surpresa.
Eu não consegui dizer "não" a ela.
Poxa, eu amo crianças, e nunca tive uma vida amorosa satisfatória, o
que me faz pensar que eu poderia passar dos 30 sem ter me tornado mãe, ou
que eu poderia acabar grávida em um relacionamento frustrante.
Pode ser estranho, mas eu tinha mais motivos para aceitar, do que
para não aceitar.
Melissa ficou extremamente feliz com o meu sim. Foi quando eu soube
que tomei uma das melhores decisões da minha vida.
— Fique ciente, Isis. Apesar de tudo, o bebê será nosso. Ele é meu,
ele é seu e de Oliver.
Acho que essas foram uma das últimas palavras de Melissa que ouvi.
Pois não muito tempo depois, ela faleceu, deixando a vida um pouco sem
sentido, mas me fazendo ter a certeza de que eu havia feito a escolha certa.
E agora estou aqui, passando os últimos dias e ainda me resta mais um
mês, na mansão de um dos empresários mais ricos do país, que é conhecido
por ser um CEO implacável, jovem e lindo.
Tenho seu filho e herdeiro em meus braços, e dou ao bebê carinho e
amor.
Filho de Melissa, meu filho também.
A gestação foi um processo fácil, que eu soube tirar de letra mesmo
com todos os julgamentos, mas não ligo.
Posso afirmar com segurança que agora tenho vivenciado o desafio
real. Não digo da minha nova vida de mãe, pois eu me preparei mesmo para
este momento, mas sim, porque a minha cabeça fica um turbilhão e o meu
coração fica pequenininho toda vez que lembro de que daqui um mês, terei
de entregar definitivamente o pequeno Oli nas mãos do pai e voltar para
Blumenau.
Oliver diz que eu posso ficar o tempo que for, mas é tão fácil para ele
falar; eu até que ficaria, não há força maior que Oli para que eu ficasse, mas
não seria o correto. Não posso falhar com Melissa.
Ela não me pediu para ficar na vida de Oliver, o seu eterno marido.
“Não, isso não.”
E agora estou tão confusa sobre como isso pode estar sendo tão
hipócrita da minha parte, quando duas noites atrás, deixei com que Oliver me
prendesse na parede e tocasse em mim. Deixei que ele erguesse meu corpo
na direção da sua ereção comprida e dura, que ao tocar em mim, foi como
chamas se acendendo por um período que pareceu durar uma eternidade.
Meus lábios roçaram nos dele, e ele gemeu dentro da minha boca sem me dar
um mísero beijo. Eu arquejei implorando por mais quando subitamente, ele
me afastou e usou uma conversa fiada para me torturar ou simplesmente não
ir à diante.
Ok, talvez ele estivesse bebendo e o álcool justificasse as suas ações,
mas era visível que Oliver não estava nem perto de estar bêbado, e sim,
levemente encorajado a falar e fazer aquelas coisas comigo, como uma
promessa de que ele ainda terminaria aquilo.
Fico cogitando que, se depois do ocorrido, ele ficou se sentindo mal
ou enojado com si mesmo. Porque ainda que as minhas pernas estivessem
molengas, meu coração batendo na boca e o ponto mais baixo do meu corpo
queimando como brasa por aquele momento rápido, mas significativamente
cheio de tensão, me vi pensando em Melissa. Em como podíamos estar a
traindo, ou em como era errado aquele tipo de contato; não havia nada no
nosso contrato que permitisse tal aproximação entre nós dois.
Oliver e eu deveríamos cuidar de Oli, e nada mais!
Ele passou algumas semanas no home office, justamente na semana
seguinte após o ocorrido, Oliver voltou a frequentar seu escritório e me
pergunto se isso é porque ele está tentando me evitar.
Sei que não fiz nada de errado, mas tem algo em que está o deixando
confuso e aflito.
Quando está em casa, conversamos sobre Oli. Tento ultrapassar essa
linha porque achei que estávamos indo bem até aquela noite, e quero que ele
perceba que está tudo bem, que não há nada a temer.
— Era você hoje de manhã no quarto? — tento perguntar em um tom
amigável enquanto jantamos juntos.
Oliver faz questão desses momentos serem em companhia e especiais.
Ele me observa atentamente e pisca inexpressivamente.
— Desculpa, achei que já estavam acordados, mas pelo visto só Oli
tinha acordado — explica enquanto limpa o canto da boca com um
guardanapo.
Precisei me concentrar para não olhar por tempo demais para sua boca
rosada, ou de como gostei da sensação da sua barba roçando meu rosto
enquanto ele tentava me enlouquecer.
— Peguei o Oli e o levei para tomar um ar puro matinal no jardim, aí
deixei de novo no berço.
Sorrio em aprovação e admiração.
Melissa estava certa sobre Oliver ser um ótimo pai. Ele está presente
em tudo, dá o máximo em tudo que faz referente a Oli e tem prazer em
mostrar como pode aprender rápido, inclusive com bebês.
— Mas você não fez só isso — ressalto com o sorriso bobo ainda no
rosto. Paro a colher com um pedaço de almôndega caseira perto da boca
antes de revelar com as bochechas quentes de vergonha. — Acho que devo
agradecer por ter colocado o cobertor em mim.
Oliver pisca surpreso, mas também não nega aquele acontecimento.
— É, eu cobri você. Estava frio e você descoberta daquele jeito... —
Solta um suspiro e então um sorriso vitorioso. — De nada.
Tomo um gole do meu suco de laranja e apoio o copo de volta sobre a
mesa.
— Às vezes eu acordo de madrugada para dar leite ao Oli, e volto
para cama tão exausta que me esqueço dessas coisas — explico.
Oliver toma uma expressão pensativa e, sem muita certeza em suas
palavras, sugere:
— Poderíamos passar a dividir o mesmo quarto.
O suco que engoli tenta voltar e olho para ele com tanta surpresa que
Oliver rapidamente se justifica.
— Assim quando Oli acordasse com fome, eu poderia dar a ele
alguma mamadeira, ou qualquer outro tipo de auxílio.
— E-eu... — gaguejo, nem sei o que pensar com esta proposta.
— Você não quer receber ajuda de uma babá. Eu no meu quarto quando
estou dormindo, me abstenho de muitos sons, e sinceramente? Suas olheiras
expõem as noites maldormidas.
— Mas você já ajuda o suficiente... — tento intervir, mas ele me olha
abismado.
— Eu não ajudo, faço o que é a minha obrigação como pai. Só que às
vezes ainda tenho a sensação de não estar fazendo o suficiente. Quando eu
olho para você... — Perde as palavras e bate sutilmente o punho na mesa. —
Porra, o que é o cargo de um CEO perto das funções de uma mãe?
Sorrio sem jeito pelo elogio sutil.
— Talvez eu soubesse lidar com a Giordano S.A — comento
divertidamente com a ideia e ele relaxa na cadeira, me avaliando de um jeito
que me fez lembrar dos seus dedos me tocando, do seu cheiro e do seu hálito
me invadindo.
“Controle-se, Isis.
No jantar, não!”
— Ser CEO não é um trabalho fácil, Isis. Assim como ser mãe também
não é, mas aposto que você está pronta para lidar com tudo melhor do que
eu.
Dou uma risadinha desacreditada.
— Não sou tão experiente quanto você — comento genuinamente, mas
Oliver arqueia as sobrancelhas em surpresa afetada.
— Está dizendo que sou velho, senhorita Mancini? — pergunta com
um semblante afiado e uma voz ameaçadoramente sensual.
— Ah, nã-não! Por Deus, senhor Oliver! Não foi isso o que eu quis
dizer! — exaspero inquieta na cadeira e ele se inclina de volta para a mesa,
exibindo um sorriso charmoso de canto.
— Tudo bem, então o que você quis dizer? Me conte, gosto de ouvir
você falar.
Pisco atordoada, não conseguindo decifrar a sua intenção com essa
conversa. Oscilei um pouco nas palavras que ainda não se formaram, mas de
qualquer forma, não irei hesitar e muito menos desviar de suas intimidações.
Oliver pode ser extremamente intimidador com aquele seu porte físico, rosto
lindo e a alta posição na sociedade que me deixa acanhada, mas ele não é
melhor que eu; ninguém é melhor que ninguém, e por isso eu não o temo.
Aprumo meus ombros e dou uma leve tossida, ao meu lado no bebê
conforto, Oli acompanha toda a conversa, mas seus dedos parecem mais
interessantes.
— Talvez eu tenha me referido a idade, sim. Pela lógica, eu tenho 22
anos, enquanto você tem 36 anos. Não tenho nenhum problema quanto isso,
mas vivi muito e quase nada, ao mesmo tempo. Você sabe lidar com pessoas
melhor do que eu, por isso tem uma legião de funcionários
trabalhando para você. — Dou um sorriso bobo na hora de falar sobre mim.
— Eu sou apenas uma professora de jardim de infância, Oliver. Amo
crianças e há vários fatores que eu nem gostaria de pontuar agora, mas que
tornam as nossas vidas bem distintas uma da outra.
Tenho um passado triste, mas aprendi a lidar com ele e toda a dor
causada. Não acho que seria relevante demais contá-lo a Oliver, não estou
aqui para fazê-lo ouvir os meus problemas.
Ele por vez, solta um suspiro convalescente e então estreita seus olhos
de forma pensativa.
— É, você tem razão — afirma. — Mas você não é apenas uma
professora de jardim de infância. Acredito que você tem muita coisa a
mostrar ainda.
Sorrio, descontraída.
— É, talvez eu tenha. Mas no momento eu tenho que mostrar que tenho
um bom lado maternal.
— Isso já está bem explícito — comenta e logo em seguida dá uma
colherada em sua comida, enquanto aquela sua afirmação acalenta meu
interior e ele mastiga e mastiga.
Há elogios que são discretos e simplesmente reconfortantes.
Um pouco depois, ele pergunta:
— E o seu lado cortês?
O meu franzir de testa foi o suficiente para que ele explicasse logo em
seguida:
— Oli faz três meses neste sábado, estive pensando em apresentá-lo
formalmente aos meus amigos.
Meu estômago dá um solavanco frio, contorcendo minhas entranhas.
Fico estática, piscando apenas os olhos enquanto Oliver estuda rapidamente
a minha reação.
— Mas eu deixei claro a eles que faria isso quando você estivesse
pronta.
— Eu? — Minha voz sai rouca. — Mas, por que eu?
A minha surpresa é genuína, isso não faz sentido, até porque Oliver
não é obrigado a me introduzir em seus círculos de amizade, como se eu
fizesse parte de sua vida. Estou aqui por Oli, e para ajudar Oliver também
com a nova rotina de pai.
— Porque você é a mãe de Oli — profere com confiança. — Você deu
a vida ao meu filho, é você quem está cuidando dele incansavelmente. O
amor de mãe é todo seu. Recebi você de braços abertos por ser quem você é,
então no mínimo, as pessoas que me cercam, devem também.
Não consigo disfarçar a confusão diante de suas palavras, ou em como
o meu coração bate forte e a minha cabeça vibra por ter sido reconhecida de
tal forma. Confesso que esse sempre foi o meu medo, de que eu não pudesse
me denominar como a mãe de Oli, mas agora com as palavras convictas de
Oliver, não devo me importunar por sentir que não tenho esse direito de ser a
mãe do meu filho. É como se ele tivesse me dado autorização para ser o que
eu fui desde o início, e que nenhum papel judicial determinaria o meu laço
com o pequeno Oli daqui uns meses.
De repente quero chorar de felicidade e de alívio, por finalmente
afastar aqueles fantasmas.
— Estamos juntos nessa, Isis. — Avança sua mão grande para segurar
a minha.
Fico envergonhada quando ele percebe que estou tremendo e suando,
mas não comenta.
— Quero você ao meu lado, ao lado de Oli. Então eles precisam
conhecê-la, saber quem é a mulher forte por trás deste menino saudável e
incrível.
É tarde demais para eu tentar impedir algumas lágrimas de escorrerem,
por isso, tento disfarçar sorrindo, e com a outra mão que não recebe calor e
conforto de Oliver, enxugo algumas lágrimas quentes.
— Obrigada, Oliver. Você não sabe o quanto me deixou feliz agora.
Mas não precisa me inserir na sua vida assim. Não vai ser algo fácil para os
seus amigos processarem.
— Eles vão ter que aceitar. — Determina com convicção e dá um forte
aperto em minha mão antes de puxar o seu braço de volta. — É como eu
disse e já expliquei mil vezes: por mim, você pode ficar o tempo que for, e
se eles quiserem passar por aquela porta, terão que aceitar que você está
aqui. Se quiserem aceitar Oli, vão ter que aceitar também que você é a mãe
dele.
Engulo seco.
Não me sinto confortável com essa ideia e tenho medo do que posso
enfrentar vindo dos amigos de Oliver, mas eu cresci ouvindo tanta coisa, que
honestamente, talvez saiba tirar de letra alguma situação desagradável.
— Mas fica tranquila, conheço os amigos que tenho. São como irmãos
para mim.
Fico confusa.
— Então qual é o problema de não aceitar?
Oliver reflete por alguns segundos, parece haver um empecilho
referente a situação.
— Algumas pessoas simplesmente não aceitam o que não lhes convém.
É mais fácil julgar do que aceitar.
— Eu deveria me preocupar com alguém? — pergunto curiosa e
atenta.
Os olhos de Oliver ficam vítreos.
O que ele sabe, que eu não sei?
— Eu tomarei providências para que não, Isis — me assegura.
Por uma razão nítida, meu pensamento me leva para os cômodos além
daquele onde estamos fazendo a nossa refeição.
“Matilde.”
Eu nego afirmar isso, mas tenho minha teoria e acho que a governanta
de Oliver me odeia. Tenho medo até de pensar na opinião que ela formou
sobre mim, mas certamente, não é nada bom. Tento entender o seu lado, uma
mulher estranha invade a casa do seu chefe, e traz junto um bebê que afirma
ser filho dele. Matilde conheceu Melissa, e deve achar que isso é algum tipo
de traição, ou golpe. Oliver ainda não conversou com ela e com nenhuma de
suas outras funcionárias; talvez ele nem tenha se preocupado ainda com isso.
Mas depois do que disse, duvido muito que continuará postergando este
assunto.
De qualquer forma, solto um suspiro convencido, preciso dar uma
trégua a Oliver.
Ainda não esqueci da preocupação que dei a ele quando fui encontrar
meu pai.
— Tudo bem, eu posso tentar — digo por fim.
Oliver dá um sorriso largo e seus olhos verdes brilham.
— Obrigado, Isis.
Eu também estava muito grata. Acho que esse foi até então, o momento
em que mais nos entendemos.
O jantar acontece mais rápido do que eu esperava.
Mais cedo desci com Oli no colo para tirá-lo um pouco do quarto e
sentir o entardecer colada a ele. Foi quando acabei presenciando toda a
agitação de Matilde e as outras funcionárias para deixarem tudo bem
apresentável.
Vi rosas vermelhas e brancas dentro de jarros lustrosos e louças caras
junto de adornos chiques. Tereza preparava algo caprichado lá na cozinha,
ninguém ousava lhe tirar a concentração, mas juro ter sentido o aroma de
camarão, aspargos e salsinha. Isso me deu água na boca, e me fez ansiar de
verdade pelo momento do jantar.
Eu já estava ansiosa, mas a fome acabou dando um toque especial. E
só por causa disso, as horas pareciam nunca passar.
Mas quando liguei para Muriel, minha prima e melhor amiga, parece
que o tempo correu.
— Quem diria, Isis indo jantar com pessoas da alta sociedade —
zomba com aquele seu deboche casual quando a informei o que aconteceria
daqui umas horas.
— Cala boca! — exclamo e ela ri do outro lado da linha. — Se você
quer saber, a comida está cheirando muito bem!
— Isis, você não dispensa nem pedra. É sério! — enfatiza. — Sabe,
quando você estava grávida eu realmente tive medo que você, sei lá, nutrisse
um tipo de desejo estranho e acabasse bebendo diesel.
Sorrio, mas sempre me contendo para não acordar Oli.
— Graças a Deus isso nunca aconteceu! — digo aliviada, embora eu
tenha comido pimenta com sorvete quando estava com oito meses de
gestação. O meu estômago embrulha só de lembrar, mas na época foi bom;
deve ter sido.
— Aí, mas você tinha muitos gases — comenta.
— Ok, Muriel. Acho que já deu.
— Relaxa. Eu sou sua prima e melhor amiga, pode confiar esse tipo de
informação a mim. Elas nunca chegarão ao senhor Bonitão.
— O que? — indago aos risos.
Céus, eu não ria tanto desde que me "mudei" pra cá.
— O pai do Oli! Ele é um gato, puta merda! Como você não pula
naquele pescoço e não tira a roupa dele?
Na minha cabeça, reformulo a pergunta.
“E quem disse que não tive essas duas vontades, e um pouco mais?”
Balanço a cabeça afastando os pensamentos depravados.
Não é para isso que estou aqui.
— Eu disse a você, Muriel, temos um acordo. Quer dizer, Melissa e eu
fizemos um acordo. Não posso me envolver com ele.
— Mas quer? — Há malícia em sua voz.
Ela me conhece tão bem!
Depois do meu pai, Muriel foi a única pessoa do meu círculo de
conhecidos/amizade/família que esteve o todo tempo ao meu lado. Ela
aceitou quando eu contei que minha gravidez não era um caso comum de
abandono, e que na hora certa, eu contaria tudo. E parece que o mistério
permeando a gravidez a deixou mais aliviada do que a possibilidade de que
eu poderia ter ficado grávida e deixada de escanteio por um cara qualquer.
Contei tudo a ela na mesma noite em que me mudei para cá e foi um
surto. Até hoje ela não acredita, diz que estou vivendo em um filme e que
acabarei me casando com Oliver. Mas ela é muito avoada e fica imaginando
essas situações nada a ver.
Nem sequer há chances de Oliver se apaixonar por mim.
— Muriel, desse jeito vou acabar encerrando a ligação — ameaço.
— Não, por favor! — exaspera. — Isis, estou com saudade. Quando
vamos nos ver? O titio Juliano falou que vocês se encontraram aí em
Floripa. Se eu soubesse, teria ido junto com ele!
Sento na beira da cama e observo Oli descansando para mais tarde.
Ele já está arrumado.
— Em breve, Muriel. Também estou com saudade, então daremos um
jeito desse encontro acontecer logo, logo. Ok?
— Ok. Só não me enrola!
Fico imaginando aqueles grandes olhos azuis dela mirarem em mim em
alerta.
— Você tem um bebê para cuidar? Acho que não — justifico em minha
defesa.
— Você é a senhorita cancela tudo. Marca uma coisa, mas muda de
ideia em cima da hora, e fica dando desculpas para não ir.
Ela me conhece de verdade.
— Bem, acho que agora eu tenho uma desculpa melhor e bem real —
afirmo olhando com carinho para Oli.
— Que saúde do cheirinho dele também — choraminga do outro lado
da ligação. — É sério, Isis. Preciso ver vocês.
— Acredite, Muriel. Eu preciso mais ainda — afirmo com o coração
apertado.
Sinto saudade de casa, muito mesmo, mas estou aprendendo lidar com
essa nova vida e as novidades que ela tem me proporcionado.
Em algum momento, voltarei para Blumenau e para aqueles que
conheço.
Olho para o relógio na cabeceira da cama e falta ainda quase uma hora
e meia para os amigos de Oliver começarem a chegar.
Desde que tive o Oli, aprendi que tomar banhos adiantados ou
enquanto o bebê dorme, é a melhor estratégia a se fazer. Então com pesar no
coração, alego a Muriel:
— Eu preciso ir. Tenho que aproveitar que o Oli está dormindo e
tomar um banho.
— Já pensou você se arrumar toda e se tornar o banquete principal de
Oliver Giordano? — pergunta maliciosamente.
“Já, imaginei naquela mesma noite em que ele quase me beijou no
seu minibar.”
Tive muitos pensamentos impuros com ele na verdade, mas eu me
detive antes que o meu corpo implorasse por um auto alívio.
Mas respondo:
— Acho que ele vai comer coisa melhor — brinco e arranco uma
risada de Muriel. — Falo com você em breve.
— Nos veremos em breve — me corrige, dando uma promessa de que
teríamos de nos encontrar em breve.
E quando vou para o meu banho, já fico planejando como isso irá
acontecer, desse jeito não penso muito no jantar e na forma como serei
recebida pelos amigos de Oliver.

Alguém deixou um vestido delicadamente depositado sobre a minha


cama enquanto eu tomava banho. Na verdade, Oliver o deixou ali, pois
acompanhado da peça havia um bilhete com as seguintes palavras:
"Vi e lembrei de você.
Ficará extremamente linda.
É um presente meu para você usar nesta noite e encantar a todos.
Oliver.”
Dou um sorriso bobo e releio pelo menos três vezes aquele bilhete,
delicadamente escrito e com letras cursivas, para um homem viril, até que
Oliver tem uma caligrafia muito suave.
Mas aí isso vira o de menos, quando analiso melhor o lindo vestido
que o fez lembrar de mim. Ele é midi, da cor azul e com um movimento
delicado nas bordas. Seu tecido é de duas camadas: a parte interna é o forro
azul, que serve como tela para os bordados floridos do outro tecido que dá
toda uma riqueza de detalhes para o vestido. A alça é fina, e sustenta o
decote romântico que cairá perfeitamente em meus seios. O cinto grosso da
mesma textura do vestido marcará a minha cintura, e os sapatos de boneca de
cor cinza estão ali no pé da cama para compor o look.
Poxa, Oliver pensou em cada detalhe!
Há até mesmo brincos e um anel.
Será que ficou tão óbvio assim que eu não tinha uma superprodução
em mente para hoje?
Quer dizer, não trouxe nada além de minhas roupas casuais. Eu não
imaginaria que teria de participar de algo tão formal, a ponto dele me deixar
um presente desses. Mas também, com aquela organização toda lá embaixo,
é porque o jantar vai além das minhas expectativas.
Espero ao mínimo, não cometer nenhum erro bobo.
Me visto e Oli ainda dorme quando decido descer.
Sou pontual, mas ao que parece, os convidados de Oliver ainda não
chegaram. Já ele está ali, no mezanino já o vejo lá embaixo mexendo no
celular que rouba toda a sua concentração.
Desço os degraus com cuidado, mas tenho medo de escorregar de tão
fascinada que fico o admirando.
Muriel não blefa quando vangloria a beleza de Oliver.
Ele está de jeans, mas o sapato é social e lustroso, e a blusa azul
marinho também, com as mangas arregaçadas até os cotovelos. O seu cabelo
ainda está meio úmido, e parece que deu uma aparada na barba. Seu cheiro
másculo e amadeirado preenche toda a casa e me invade.
Ele é lindo e irresistível.
Seus músculos parecem apertados demais naquela blusa, e a sua barba
é uma carícia que quero muito sentir.
Ele percebe minha presença quando já estou perto do último degrau.
Sorrio, boba, mas é o seu olhar de espanto que quase me faz tropeçar. Oliver
fica pálido e parece que viu até mesmo um fantasma.
Ele está tudo, menos maravilhado em me ver com o vestido que deixou
para mim.
OLIVER

A minha cabeça ficou um bom tempo enevoada com a cena.


Merda!
Estou sem reação, embora aqui dentro meu coração tenha acelerado de
um jeito incomum e meu corpo estremecido como se eu tivesse visto um
fantasma. No entanto, por parte, é o que era.
Isis está usando o vestido, favorito, de Melissa, calça os sapatos dela
e usa algumas joias também. Percebo isso conforme ela vai se aproximando,
já pálida pela minha reação inesperada.
Não queria ter que deixá-la sem jeito, mas é inevitável.
Tento manter a postura, mas penso rápido, “como isso poderia ter
acontecido?”
Dois anos e ainda não tive coragem o suficiente para me desapegar das
coisas dela. Simplesmente não consigo, é como se eu estivesse a apagando
de vez da minha vida e tendo as coisas de Melissa ainda ali, é como se ela
estivesse aqui comigo. Seu cheiro ainda está em tudo e talvez possa ser o
que me manteve em um estado estável todo esse tempo além do trabalho
duro.
Poderia ser uma tortura, mas eu tinha a constante sensação de que em
algum momento, ela voltaria para casa.
Mas aquele vestido azul...
Como Isis poderia tê-lo pegado?
Quer dizer, ela precisaria ter passado pelo meu quarto e entrado
no closet de Melissa. Vasculhado bem as infinitas peças de roupa para ter
encontrado exatamente aquele bendito vestido.
Agora me vem muitas lembranças da minha esposa com ele, no
entanto, devo confessar que o caimento em Isis ficou tão diferenciado, que se
eu me atentar mais aos detalhes do tecido em seu corpo, consigo distrair
minha cabeça para longe da saudade que me arrebata neste momento.
Quando ela se aproxima de mim, sorrio para dar a ela mais segurança
e afastar esses fantasmas.
Tento imaginar Melissa me repreendendo para que eu seja mais gentil.
— Você está linda — ressalto engolindo em seco.
E é verdade.
Porra, a pele morena dela fica simplesmente perfeita com qualquer
cor; o azul lhe cai tão bem quanto o amarelo que já a vi usar antes. E os seus
seios cabem perfeitamente naquele decote. Toda sua silhueta fica bem
acentuada debaixo daquele vestido, exibindo o corpo de uma moça normal.
O seu cabelo está solto, o que é raro pois está sempre traçado ou preso
em um coque, mas hoje ela exibe madeixas longas, onduladas castanho-
claros. Dá para perceber que a única maquiagem que Isis usou, foi para
preencher os cílios e a boca, agora pintada de vermelho.
Ela está fatal, lindamente sexy de um jeito sutil, e nem deve imaginar
isso.
— Obrigada, você disse que eu ficaria mesmo — comenta e não
consigo evitar a interrogação estampada no meu rosto.
Isis percebe.
— Disse?
— O bilhete...
Sorrio nervoso.
— Do que você está falando?
Isso a fez piscar tão confusa quanto eu.
— O vestido. Não foi você que o deixou sobre a minha cama com um
bilhete? — pergunta cautelosamente.
“Não!”
Enfio o celular no bolso da minha calça e solto um suspiro. Não sei
que diabos está acontecendo, mas não é uma boa hora para resolver este
assunto. Em outro momento, eu irei, e sei exatamente quem procurar.
— De fato, eu só fiquei um pouco desligado agora, desculpa —
contorno aquela conversa e volto a ficar mais relaxado quando o meu
emocional é estabilizado pelo racional. — Mas você está linda de verdade,
Isis. Ficou esplêndido em você.
Ela sorri de um jeito tímido e toda feliz.
Eu realmente não devo abrir a porra da boca esta noite, Isis não pode
saber que esse vestido pertenceu a Melissa.
— Obrigada, você também tem um ótimo gosto — afirma indicando o
vestido. — Deve ser fácil para você presentear alguém — analisa e dou de
ombros.
— Na verdade, costumo contratar alguém para isso. Felícia, é quem
fica encarregada, às vezes. Eu não tenho tempo para ficar procurando
presentes.
— Este aqui foi ela quem escolheu também?
Dou uma rápida avaliada.
O tal vestido foi escolhido por Melissa enquanto passeávamos por
uma ruela em Roma, de mãos dadas e extremamente apaixonados. Ela viu na
vitrine, gostou e pediu a minha opinião. Eu achei lindo também e por isso ela
comprou.
Logo então ele havia se tornado um vestido especial, porque foi o item
que ela mais amou ter trazido da Itália.
— Oliver? — A sua voz doce me puxa de volta. — Tudo bem? Você
parece tão distante.
Coço a testa e me recrimino internamente por estar tão afetado. Não é
um bom momento para ser preenchido por lembranças que ainda apertam
meu peito, e não é o momento para deixar Isis desconfortável. Eu disse a ela
que seria legal, de que não precisaria se preocupar com nada porque tenho
tudo sob controle, mas pelo visto algumas coisas estão a me contrariar.
“Matilde.”
Dos meus funcionários que trabalham aqui, Tereza e Jorge são os
únicos a não entrarem no closet de Melissa. Mas Matilde é quem tem carta
branca para mexer nas coisas da minha esposa, apenas para mudar de lugar
se for preciso e deixar tudo arrumado e cheiroso. E parece que hoje ela foi
exagerada e muito desrespeitosa.
Dou dois passos na direção de Isis e escondo a mecha do seu cabelo
atrás da orelha direita, em um gesto carinhoso que a pega de surpresa, mas
também não a faz recuar. Seu cheiro é bom, e me faz lembrar da noite em que
ficamos tão perto. Depois daquela cena, fui dormir com o seu cheiro.
Literalmente me recusei a tomar banho, a não ter a presença dela
comigo na cama, mesmo que meus pensamentos estivessem em Melissa, me
culpando pelo feito, escolhi ficar com Isis perto de mim durante a noite toda.
— Sim, tudo bem. Mas para você eu faço questão de escolher eu
mesmo. Espero muito em breve descobrir todos seus gostos — enfatizo
voltando ao normal.
— Sorte a sua que o meu aniversário está longe — comenta
genuinamente.
— Eu não espero datas comemorativas para presentear alguém
especial, Isis — digo tão voluntariamente que pego nós dois de surpresa,
mas não me arrependo. Na verdade, até gosto da reação dela.
Caramba, ela fica sem jeito com tanta facilidade, mas também não dá
trégua. É consistente em tudo.
Pigarreio, enfio as mãos nos bolsos da calça e lembro da mensagem
que li há poucos minutos no meu celular.
— Meus amigos acabaram de chegar no condomínio. Está pronta?
Estudo cada reação dela: assustada, nervosa e entusiasmada.
Isis está pronta, a ideia do jantar parece animá-la, mas são as pessoas
que a deixam insegura.
— Sim, eu estou.
Vejo determinação em sua postura e fala.
“Ótimo!”
Me anima o fato de saber que ela quer tentar.
— E Oli?
— Dormindo feito um anjo, mas não vai demorar até que acorde.
— Ok. Ele é o oficial anfitrião da noite. Terá que fazer sala, querendo
ou não.
Ela acha graça do meu tom autoritário, como se eu estivesse lidando
com um filho adolescente antissocial. Mas não nego que já me peguei tendo
esses pensamentos do futuro, e Isis está sempre neles.
Consequentemente, a campainha toca e exponho meu antebraço para
que Isis conforte a sua mão ali. Me surpreendo quando ela o agarra forte
aceitando sem rodeios. Juntos, vamos para a outra extremidade da sala onde
tem conjuntos de sofás confortáveis e de design moderno num tom cinza.
Nenhum de nós dois sentamos, até porque quando Matilde abre a
enorme porta da frente, a primeira coisa que vejo é Nicolo saltando para
dentro de casa com a mão entrelaçada na de Sofia, sua namorada, mas que
parece a cópia perfeita dele, loira, olhos azuis e pinta de modelo, ainda mais
por ter quase a sua altura. Os dois estão juntos há dois anos, e o filho da mãe
fica enrolando a namorada que sonha em se casar. Mas Nicolo admite que já
cuidou de muitos casos de divórcios que está levemente traumatizado.
Logo depois surge Lorenzo e Bruna, sua noiva. Ela está se formando
em medicina, e tem um espírito aventureiro igual ao meu amigo. Tem o
cabelo castanho que bate na cintura, os olhos são escuros, mas naturalmente
receptivos. É fácil se entrosar com ela e com Júlia, a noiva de Domenico.
Uma mulher de cabelo escuro e olhos azuis, ela é a mais baixinha, tem
sardas e um tom de conversa que flui, fazendo o próximo se sentir muito
acomodado à sua presença. Deve ser por isso que ela e Melissa se davam
tão bem.
Eles chegam e os olhos já estão em Isis, que aperta mais ainda seus
dedos antes de me soltar para receber os convidados. Ela não para de sorrir,
deve estar otimista quanto a eles, o que é bom.
Nicolo é o primeiro a vir nos cumprimentar.
— Este jantar nos livrou de mais um dia de fast food, não é, amor? —
pergunta à Sofia que faz cara de nojo.
Nicolo pode ser uma boa pinta com todos aqueles músculos, mas
quando ele está atolado em trabalho, nenhuma comida saudável o convence;
é um hábito muito estranho.
— Eu teria dado um jeito de cozinhar alguma coisa. Chega de comer
McDonald's, gatinho — a loira diz com uma voz manhosa.
Devo ressaltar que dentre os três casais, Nicolo e Sofia são os que
mais demonstram afeto em público como dois adolescentes.
— Ah, é? E o que você teria feito? — a pergunta deixa Sofia sem
saída e ele acha graça.
Sabemos que a loira não sabe fritar um ovo, é a típica patricinha que
tem tudo mastigado. Nicolo então deixa o assunto de lado e olha para Isis
para perguntar com sutileza estendendo a mão para cumprimentá-la.
— Então você é a mãe de Oli? É um prazer conhecer você.
“Mãe.”
Fico surpreso por ele já usar este termo para se referir a Isis, e
percebo que ela também se anima.
— Não se assuste de início com este idiota — Lorenzo diz tomando
frente também. — Ele pode ser um pé no saco, às vezes.
— Amor! — Bruna repreende. — Concordamos em não causar uma
má impressão.
— Você está assustada, Isis? — Dom pergunta com Júlia ao seu lado,
nitidamente nervosa, mas com um olhar carinhoso.
Sei bem o que ela está sentindo, é estranho ver uma outra mulher ali,
porém, só de pensar que foi Melissa quem a escolheu, que foi ela que salvou
a vida da minha esposa no primeiro tumor, o peito já se enche de gratidão.
— Não, tudo tranquilo — assegura um pouco acanhada.
— Bem, Isis. Estes são Lorenzo e Nicolo, e suas respectivas mulheres,
Bruna e Sofia. Domenico você já conhece, mas esta é Júlia, a noiva dele.
— É um prazer conhecer todos vocês — diz tímida, mas encorajadora.
Isis sabe enfrentar seus medos, e é isso o que gosto nela.
— Fiquem à vontade, logo em breve o jantar será servido —
aconselho e convido Isis para sentar ao meu lado.
A imagem que tenho agora me faz tremer a espinha. Faz tanto tempo
que não nos reunimos assim em casal; digo, eles sempre me visitam, mas
desde que Melissa se foi, o time ficou incompleto, e eu estava sempre
sozinho, sobrando. Bem, eu ainda estou sozinho, mas a presença de Isis me
faz sentir o contrário.
A atmosfera entre nós me faz querer pousar minha mão em sua costa
exposta, mas graças a Deus meus convidados são suficientemente tagarelas.
— Soube que voltou para o escritório esta semana — Lorenzo
comenta.
— É verdade. Depois daquele problema de logística que tivemos,
precisei passar um tempo no escritório, tendo reuniões com os acionistas —
explico num tom sério.
Por parte, isso é verdade. Mas admito que ir para o escritório foi uma
forma que encontrei de contornar meus instintos primitivos por Isis.
Eu sei o que Melissa pediu e se eu tivesse ido adiante, tenho certeza
de que estaria a um passo de realizar a sua vontade deixada na carta, mas
porra, preciso ser racional. Dar em cima de uma mulher que conheci há
quatro semanas não era do meu feitio, ainda mais quando me tornei viúvo.
Mas não consigo manter as coisas controladas quando estou com Isis.
E sei que isso acontece, principalmente, porque Melissa me deu carta
branca.
— Ah, não! Vocês vão querer falar de trabalho agora? — Bruna
reclama.
— É verdade. Vim pelo seu filho, Oliver. Onde ele está? — Sofia
pergunta animada.
Isis e eu nos entreolhamos.
— Ele está lá em cima, dormindo — responde e Sofia faz uma cara de
horrorizada.
— Mas, sozinho?! Coitado!
— Quando estamos aqui embaixo, trazemos a babá eletrônica. Mas às
vezes nem precisa, Oli choram muito alto.
— Aí, nem me diga! — Revira os olhos. — Acho que eu não
aguentaria uma noite!
— E como está sendo a vida de mãe, Isis? — Júlia pergunta curiosa,
me fazendo agradecer silenciosamente pela sua sutileza de se dirigir às
pessoas, diferente da escandalosa da Sofia que parece esnobar e ser
indiferente com tudo.
Todos os olhos vão em direção a ela. Não é como se ela não estivesse
acostumada a atenção, Isis é professora e precisa ser firme com pais que
possuem personalidades diferentes.
Sinto seu desconforto, no entanto, a sua vontade de se sair bem é
maior.
— Bem. Eu me preparei para isso por muito tempo, então estou
sabendo lidar. Mas é claro que há momentos em que parece que não vou
saber segurar a barra.
— Deu sorte grande, porque meu amigão aqui é duro na queda e não
vai te deixar sozinha nessa. — Nicolo empurra meu ombro e olho para ele
incrédulo.
— Claro que não! — enfatizo.
— Espera, se Melissa já havia contatado o Dom para essa missão, por
que você nunca soube? — Sofia perguntou a Júlia.
Isis me lança um olhar sugestivo e fácil de ser interpretado. Balanço
apenas a cabeça para assegurá-la o que aquela troca de olhares entre nós
dois significava, "Sim, elas já sabem".
Isis parece dar um suspiro de alívio, porque pelo menos não
precisamos abordar este assunto sensível, mas de grande significância.
Porém, Sofia parece tentada a saber de tudo.
— Porque eu não tenho nada a ver com toda a situação — Júlia
esclarece como se fosse o óbvio. — Dom pode ser meu noivo, mas ele é
ético em tudo o que faz.
— Bem, não foi fácil esconder todo esse tempo — Dom ressalta. —
Estive animado desde a fertilização in vitro, mas de certa forma era triste,
então eu precisava cumprir com a minha palavra.
— Vocês eram tão próximas assim? — Bruna pergunta a Isis.
Aparentemente, as mulheres ali tinham mais dúvidas do que os
homens.
Bem, eles realmente não pareciam ligar para todo esse processo, o
fato de saberem que eu tenho um filho já basta. Mas a curiosidade feminina
está aguçada nesta noite, eu só espero que isso de alguma forma não afete
Isis. Ela é sensível e muito expressiva.
— Ficamos amigas depois que ela descobriu que eu doei medula óssea
para ela — resume.
Nicolo inclina para frente exacerbado.
— Peraí, então quer dizer que, graças a você, Melissa venceu o
primeiro tumor?
Solto um suspiro contido.
Estamos falando sobre o que eu exatamente queria evitar. Amo
Melissa e temos uma história triste e bela ao mesmo tempo, mas odeio que a
luta dela contra o câncer seja abordada de um jeito tão banal, embora eles
nem estejam percebendo isso.
— Fomos essenciais uma na vida da outra. — Isis usa apenas estas
palavras, nem ela gostaria de ir mais a fundo.
— Nossa, que loucura! — Sofia diz e reflete rapidamente. — Acho
que eu não faria algo do tipo. Não sei, tem que confiar muito na pessoa.
A garganta de Isis oscila com aquele comentário, mas ela dá um
sorriso muxoxo.
— Pois é. E Melissa teve sorte, pois eu sou de confiança — diz
determinada.
Nicolo solta um assobio.
— E é mesmo! — ressalta meu amigo advogado. — Isso tudo leva um
monte de papelada e termos, o fato dela ter chegado até aqui e cumprido com
todos eles, só mostra que Isis de fato é de confiança e muito disciplinada nas
coisas que faz.
— E uma excelente mãe, também. — Finalmente abro a boca, usando
um tom mais grave e alto.
Porra, esta é minha casa e não vou deixar que ninguém intimide Isis,
mesmo que ela esteja lidando com tudo isso de um jeito muito elegante.
— Onde Melissa estiver, sei que está orgulhosa por tudo ter dado
certo.
— Uma boa mãe, então deve ser uma boa esposa — Dom comenta
baixinho, querendo e não, ao mesmo tempo, ser ouvido.
Me pergunto se ele sabia sobre o detalhe de eu acabar apaixonado por
Isis em quatro meses. De qualquer forma, ficamos num silêncio
constrangedor.
— Sabe, eu também penso a mesma coisa — é a vez de Nicolo falar.
Olho para Isis que observa tudo ainda muito centrada, vez ou outra
lembrando a si mesma de manter a postura ereta, o que é engraçado, pois ela
tem o costume de sentar de mau jeito.
— Com certeza fará alguém muito feliz — digo por fim, encarando
aqueles olhos castanhos que me olham disfarçadamente.
Melissa gostaria que esse alguém fosse eu. Não sei se eu conseguiria e
do jeito que tenho hesitado toda vez que parece a oportunidade perfeita para
tentar, talvez eu nunca consiga, mesmo.
Mas não estou acostumado a perder. Não desse jeito e pensar em Isis
com outro cara faz minhas entranhas se encolherem. Preciso tomar uma
atitude a partir desta noite, mesmo que seja repentino.

Nos reunimos na mesa para jantar assim que Tereza e Matilde liberam
os pratos principais. Isis fica ao meu lado o tempo todo, Lorenzo e Bruna
sentam logo à minha esquerda, enquanto Domenico e Júlia a nossa frente, e
Nicolo com Sofia ao lado deles.
A comida parece animar nossos ânimos, logo esqueço da conversa que
quase botou em pauta a época difícil que foi Melissa enfrentando o câncer, e
conforme vamos comendo e conversando, Isis vai ficando mais à vontade,
para o meu grande alívio. Ou talvez seja o vinho branco que tomamos para
combinar com os frutos do mar e queijos macios ali disponíveis.
— É sério! — ela exaspera quando Lorenzo não acredita que dou
banho em Oli. — Juro que essas mãos são muito delicadas na hora de dar
banho em Oli.
“É, elas podem ser boas para muitas coisas, Isis.”
— O que mais ele faz? — Júlia se inclina curiosa, todos eles estavam.
— Tudo. Oliver é um pai presente em todos os afazeres, e não digo
isso só porque ele está aqui do meu lado.
As meninas riem disso.
Isis tem se mostrado divertida e eu adoro isso.
— Na verdade, ainda é difícil acreditar que Oliver seja pai —
Lorenzo comenta. — Foi o que ele sempre quis, mas estamos bem mais
acostumados ao homem implacável que comanda todo um império do
agronegócio, sendo evasivo e um chato.
— Agora ele está aí, trocando fraldas e sendo sujo por você sabe o
quê — Dom ressalta este segundo ponto na minha direção; ele está por
dentro dos últimos problemas de refluxo que Oli teve.
— Eu posso ser um cara normal, seus idiotas — me defendo.
— Ah, não. Eu sou uma garota normal, Oliver. — Isis enfatiza.
— O que você fazia mesmo em Blumenau, Isis? — Bruna pergunta.
— Na verdade, eu ainda trabalho como professora de jardim de
infância, só estou afastada por causa da licença maternidade.
Sofia se engasga com o vinho.
— Você é professora de jardim de infância? — pergunta abismada e
rindo desdenhosa logo em seguida.
— Algum problema? — Isis a desafia.
A namorada de Nicolo dá de ombros.
— Não, problema nenhum. Mas achei que os padrões de Oliver
fossem bem altos — debocha.
Me preparei para dar uma resposta, mas é Isis quem toma frente,
apertando a minha coxa inesperadamente por debaixo da mesa. Um toque
para me conter, mas que me deixa louco. Ela fica tão determinada a revidar,
que mal percebe o quão aquilo foi tentador e quente.
— É uma pena que eu tenha 1,60 metros então — Isis rebate de um
jeito divertido, além de mostrar que não se abalou pelo comentário de Sofia.
Ao seu lado, eu deixo uma gargalhada sair do fundo da minha garganta.
Essa mulher é demais!
Meus amigos e as meninas também riem da resposta de Isis, eles a
adoram.
— Desculpa, querida, mas se você é tão baixinha assim, então você
está sim nos padrões de Oliver Giordano — Nicolo comenta.
Isis estreita os olhos em sua direção e balança a cabeça negativamente.
— Por que estamos falando disso, mesmo? — pergunta.
— É, eu também quero saber — revelo curioso, mas confesso estar
gostando, faz parecer que Isis e eu já tivéssemos algo, e que já tenho meio
caminho andado para cumprir com o que Melissa me pediu.
Passo um braço por cima do encosto de Isis, mas queria mesmo era
estar com o braço envolta dela, acariciando seu ombro, fazendo sua pele se
arrepiar numa promessa caliente do que eu queria fazer, enlouquecê-la.
— Vocês são os pais de Oli, então me digam o que está faltando —
Bruna diz como se aquilo fosse uma charada.
A verdade é que eu já sei o que significa, Melissa me deu a resposta
antes que todos pensassem a respeito.
— Por falar em Oli — Domenico comenta e ao fundo, a babá
eletrônica não revela um choro, mais sim, barulhinhos despertos.
Isis levanta no exato segundo, mas Dom a impede.
— Tudo bem, eu vou lá. Fiquem e divirtam-se, vocês merecem.
Não o contrariamos, até porque Domenico quase não tem tempo com o
sobrinho. Mas ele sobe, e uma expectativa fica pairando sobre nós. Eu, mais
especificamente, fico ansioso por este momento.
Sempre sonhei com o dia em que eu apresentaria todo orgulhoso um
filho meu aos meus amigos, que alegraria nossos encontros. Por um tempo,
achei que isso não aconteceria mais, até Isis surgir com Oli.
E quando Dom começa a descer a escada, suspiros preenchem o
cômodo, além de sorrisos bobos. O meu eterno cunhado vem mostrando Oli
como se ele estivesse no alto de um pedestal. Isis e eu sorrimos orgulhosos.
“Melissa está sempre certa”, penso.
E ela acertou que seria possível eu ser feliz mais uma vez, partindo do
ponto onde eu descobrisse que tenho um filho.
Isis e eu decidimos deixar aquele momento todo para Oli, onde é
paparicado por pessoas que eu sei que terão amor e afeto o suficiente para
ele.
— Que coisa mais preciosa — Júlia diz fascinada.
Daria tudo para ver o que se passa na mente dela agora. Como uma
grande amiga de Melissa, talvez Júlia estivesse pensando em como Oli seria
amado profundamente pela minha falecida esposa.
— Meu Deus, ele é a cara do Oliver. Faltou só a barba — Lorenzo
comenta.
— Não acho — Sofia contraria. — Sei lá, para mim bebês são todos
iguais.
— Olha esse nariz! — Bruna protesta. — Como você não pode achá-
lo parecido com Oliver?
— Bem, ele tem a boca de Isis — digo, o tanto que já observei aqueles
lábios, tenho propriedade para falar isso.
Percebo que em um movimento involuntário que ela morde seu lábio
inferior, e como todos estão distraídos com Oli, aproveito para deixar que o
meu polegar contorne a curva do seu ombro e desça sutilmente pela sua
lombar.
Ela estremece, e me olha surpresa demais, porém, não assustada a
ponto de me fazer recuar.
Sorrio e ela retribui.
Estou animado para saber onde isso vai terminar. E por isso, desejo
que este jantar termine o mais rápido possível.
Todos já conheceram Oli, mesmo.
Mas parece que a situação não está a meu favor. Com Oli desperto e
no meio de pessoas novas que só sabem paparicá-lo, a noite parece que não
vai terminar nunca.
Depois do jantar, voltamos para os sofás de novo, e as meninas ficam
sobre o tapete confortável com Oli, brincando e brincando. Risadas
preenchem a minha casa, que há anos parecia tão vazia desde que Melissa se
foi. E pela primeira vez, parece que tudo voltou a ganhar cor.
— É muito bom te ver feliz de novo, cara — Domenico diz quando o
chamei para ir até a adega comigo e pegar mais vinho para as meninas.
Nós, homens, estávamos bebendo uísque.
— Fazia um tempão que eu não via você gargalhando ou sendo
tão... Você.
Dou a ele um sorriso afetado enquanto abro a porta de vidro da adega
que fica ao lado do bar.
— Melissa estava certa sobre o bebê. Ele está fazendo toda diferença.
— E a Isis? Vocês parecem estar se dando bem.
Finjo estar procurando o vinho, que já encontrei, mas fico ali
enrolando para ganhar tempo com a conversa.
— Gosto dela. É como se o espírito de Melissa estivesse aqui, mas de
um jeito diferente.
— Que bom que pensa desse jeito. É importante que vocês criem um
laço, justamente para dar a família que Oli merece. Ou a família que você
sonhou em ter um dia.
— Oli está em boas mãos, Dom. Ele aqui é tudo o que eu precisava.
Você sabe, ser pai é algo que eu sempre quis depois de ter encontrado a
mulher e o emprego dos meus sonhos.
Ele assente e então pego o vinho, achando que tínhamos acabado ali.
No entanto, Dom muda o peso dos pés e cruza os braços, sua expressão
agora é um tanto reflexiva.
— Lembro que quando Melissa estava acertando tudo ainda e
precisando da minha ajuda, ela falava muito sobre a possibilidade de você e
Isis terminarem juntos.
Aperto o gargalo da garrafa com força para que ela não deslize da
minha mão.
— Ela dizia que seria a melhor coisa a acontecer — ressalta, mas
então me observa com cautela e solta um suspiro exausto. — E
sinceramente? Até três meses atrás eu duvidava muito que isso fosse
possível, você vivia para o trabalho, sempre tão astuto e sério em tudo o que
faz. Mas nesta noite, eu me surpreendi muito, Oliver.
Franzo o cenho profundamente para ele.
— Eu não sabia que estava sendo estudado — exclamo surpreso.
Dom dá de ombros e caminhamos de volta para a sala, sem muita
pressa.
— A gente percebe a diferença. Você está mais relaxado, mais
sorridente e tem esse brilho nos seus olhos toda vez que a Isis diz alguma
coisa.
Acho graça, essa é nova.
— Brilho nos olhos, é? — repito, mas logo fico sério quando reflito
melhor sobre o que isso significa, e penso alto: — Ela é demais! Não sei se
é porque eu tive pouco contato com outras mães, mas tudo o que Isis faz pelo
Oli me fascina. E ela é tão inteligente e gentil, mas que adora me enfrentar
mesmo quando estou sendo um insuportável.
— E se Melissa estiver certa? Talvez vocês devessem ficar juntos.
Olho para ele incrédulo.
Não é a primeira vez que um dos meus amigos toca neste assunto. Mas
Domenico alarga um sorriso e dou palmadinhas em meu ombro.
— Relaxa, cara. Sei que deve ser difícil para você precisar abrir este
coração solitário de novo.
Quando chegamos à sala, meus olhos batem automaticamente em Isis.
Ela já tirou os sapatos, tudo para ficar mais confortável enquanto brinca com
Oli sobre o tapete. Embora eu tenha concordado, meus sentimentos sempre
estiveram dispostos a tentar, mas o tempo nunca foi meu aliado.
Eu sabia que deveria tentar por mim, por Melissa. Deixá-la "ir", seria
algo que ela aprovaria, mas o luto é um processo de adaptação lento para
aqueles que amaram com toda sua vida.
Quando Melissa se foi, levou muito de mim.
Mas dois anos, foi o tempo que ela cogitou ser o suficiente; embora eu
não soubesse quando eu deveria começar a tentar. Melissa deixou claro que
a partir de agora, seria um bom momento.

O jantar foi um sucesso.


Todo mundo amou Oli, como eu já esperava, e Isis se deu tão bem que
antes mesmo dos convidados estarem indo embora, já havia planos de um
outro encontro, e ela tinha que estar presente, bem como as meninas
exigiram. Me parece justo, acho que eu não conseguiria ir a qualquer outro
evento sem Isis perto de mim.
Se eu falhar com ela, falharei com o meu filho também.
Subimos antes mesmo da meia-noite. Precisamos respeitar o horário
de sono de Oli, ainda que ele esteja no calor de toda aquela interação de
mais cedo. Quando o coloco no berço que montei assim que entregaram, ele
fica balançando as perninhas e bracinhos incansavelmente, como se
estivesse pedalando uma bicicleta imaginária.
Isis acha graça.
O vestido de Melissa nela já não me importuna mais. Na verdade, me
adaptei muito fácil com ela o usando. Roupas são para serem usadas, e Isis
parece a pessoa perfeita para aquele vestido, que um dia já foi esplêndido
em sua antiga dona.
— Parece que não há músicas do Beatles que o faça dormir agora —
Isis comenta do outro lado do berço. — Olha como ele está agitado! Pelo
menos gostou da noite que você organizou para ele.
Seguro o cercadinho do berço quando olho para ela.
— E você? — pergunto atraindo seu olhar. — Espero que tenha
gostado tanto quanto ele.
— Seus amigos são engraçados. Eles não são tão sérios quanto
imaginei que fossem — confessa com um sorriso bobo conforme avalia. —
E as meninas... Bem, por um momento tive a impressão de que eu estava
tomando o lugar de Melissa, por conta de alguns comentários.
Reviro os olhos, mas fico feliz por Isis ser honesta comigo.
— Melissa é Melissa, e você é você — enfatizo. — As duas são
pessoas completamente diferentes. Uma cumpriu com a sua missão, e agora é
a sua vez de cumprir com a sua.
Ela pisca sem jeito.
— Bem, não era disso exatamente que eu estava falando — salienta
acanhada. — Mas é melhor deixar pra lá.
— Não, agora me conte — insisto.
Isis me observa atentamente e então se afasta do berço, indo em
direção à janela com suas persianas abertas e ela se encolheu em seus
próprios braços enquanto olha a vista do jardim.
— Talvez exista uma conotação amorosa entre nós dois por sermos os
pais de Oli. Isso ficou muito explícito nesta noite — revela com a voz baixa,
me fazendo arfar pela ousadia que eu não tive de proferir aquilo. — Mas
devemos deixar claro que não existe nada disso. Temos um acordo a cumprir
por causa da Melissa. Não podemos levar para o lado pessoal algo que
deveria ser levado a sério por conta dos termos.
Vou me aproximando dela com meus pensamentos disparando contra as
suas palavras. Isis está certa, eu a entendo, mas ela não sabe o que havia na
carta de Melissa, e há algo que eu acredito mais do que termos legais.
Sinto a sua pele eriçar quando sente a minha presença logo atrás de si.
Nosso reflexo no vidro revela seu rosto tenso comigo ali perto.
— Eu tô pouco me fodendo pra esses termos, Isis. Entendo o seu lado,
mas você não pode querer controlar tudo. E se acontecer se nesse tempo de
um acabar gostando do outro?
— Você pensa nesta possibilidade? — pergunta surpresa.
— Responda a minha pergunta, primeiro — insisto com a voz
carregada e rouca.
Ela respira fundo e vira para mim. Percebo a sua garganta oscilar
quando ela encara a minha boca.
— Se acontecer, aconteceu. Mas não acho que deveríamos pensar
desta forma, é errado com a Melissa.
Percebo que sua respiração fica mais pesada conforme diz.
Sorrio.
Porra, ela não sabe nem da metade do que Melissa realmente deseja
para nós.
— Agora é a sua vez de responder a minha — diz arqueando a
sobrancelha, duvidando muito que eu dissesse algo que realmente a
surpreendesse.
Dou de ombros.
— Talvez eu pense nisso com mais frequência do que eu gostaria —
brinco com um cacho do seu cabelo que pende na frente do seu rosto. — Não
vou mentir, você me deixa fascinado. E se eu não estivesse tão quebrado por
dentro, talvez eu tivesse avançado quando tive a oportunidade pra isso.
Meu polegar desce fazendo o contorno do seu rosto e Isis prende o ar.
— Mas se você acha que as coisas não devem ser assim, então tudo
bem, não vou fazer nada do que você não queira.
— Ok. Eu entendo, senhor Oliver.
Percebo algo que me faz sorrir.
— Você só me chama desse jeito formal quando está nervosa. — Puxo
meus dedos de volta, e ela parece voltar à realidade.
— Eu estou — confessa sem rodeios.
— Tudo bem, não vou mais incomodá-la.
Me afasto, ciente de que mais uma vez invadi seu espaço, a deixando
desse jeito. Olho para dentro do berço e Oli está mais quieto, então, para a
cama onde ela dorme e uma lembrança me invade:
— Bem, senhorita Mancini. Então saiba que ainda pretendo dividir o
quarto com você e facilitar as coisas durante a noite.
— Você disse que não faria nada que eu não quisesse — respalda
ainda parada no mesmo lugar. — E eu acho que não quero isso.
Quando já estou na porta do seu quarto, respondo:
— Bem, há uma exceção para isso. E eu não aceito não como resposta.
— Sorrio e abro a porta. — Boa noite.
Ela assente.
— Boa noite, Oliver.
Preciso ser consistente com muitas coisas ainda, e uma delas é sobre o
que eu acho que seria melhor para Isis. Ela precisa descansar, acordar várias
vezes a noite não tem ajudado em nada, e é essa intenção que tenho. No
entanto, preciso ser franco, talvez as coisas fujam um pouco do controle
quando estivermos dividindo o mesmo quarto. E é aí que a ação entra.
Melissa sabia.
Para conquistar Isis, não precisei ser um grande canalha, mas sim, um
bom provocador, deixar seus desejos desinibidos quando ela menos
esperasse. Talvez essa fosse minha arma de sedução, e eu estava pronto para
usá-lo com Isis.
OLIVER

No outro dia não consigo agir como se nada tivesse acontecido. Na


verdade, muita coisa aconteceu, mas havia entre elas uma especial que me
deixou perturbado a noite inteira.
Reagi de uma forma que consegui conter a noite toda sem que afetasse
Isis, obtive sucesso quanto a isso. Sinto que a nossa relação tem ficado cada
vez melhor e que posso cumprir com o segundo desejo de Melissa. No
entanto, eu não estava preparado para aquilo.
Ver Isis com as coisas da minha falecida esposa foi demais para mim,
tenho certeza de que não foi culpa dela, e que havia dedo da pessoa menos
improvável, porém, com a única disponibilidade para fazer tamanha
brincadeira sem graça.
Brincadeira, não.
Não havia nenhuma criança ali além de Oli, somos todos adultos,
então estava mais para uma alfinetada, e eu estive por muito tempo
postergando este momento, mas acordei no outro dia certo do que deveria
ser feito.
Sou o patrão aqui e aquilo foi de longe uma falta de respeito comigo
e com Melissa; uma forma de enganar Isis, fazer com que ela sujasse sua
imagem e fosse constrangida na frente de todos, mas não deu muito certo.
Ela estava tão incrível que acabou se tornando o menor dos meus
incômodos. Na verdade, depois que aceitei, achei que ela não podia estar
mais linda com aquele vestido azul. Mas nem por isso eu deveria deixar de
fazer o que tinha que ser feito.
Reúno na área do churrasco que fica adjacente à cozinha, os
funcionários que trabalham na mansão. Aos domingos, os que querem vêm
trabalhar e ficam até meio-dia, é claro que eles ganham adicional por isso.
Para minha sorte, todos estão ali, as três arrumadeiras, a cozinheira, o
motorista e Matilde, a governanta.
Todos, exceto Matilde, estavam tensos o suficiente com aquela
reunião. Afinal de contas, o que poderia ser de tão importante, a ponto de eu
ter que marcar tão cedo e de um jeito tão autoritário esta reunião em plena
manhã de um domingo?
Primeiro, eu queria aproveitar que Isis ainda estava lá em cima com
Oli, e segundo, as coisas vão começar a ficar em ordem. Eu não gosto de
nada bagunçado ou pela metade.
— Muito bem, já que todos estão aqui eu vou esclarecer logo as coisas
e deixar algumas ordens que eu quero que sigam arduamente, pois é muito
importante para mim e isso será uma parte do trabalho de vocês a partir de
agora — digo sério, como se eu estivesse lidando com uma mesa de
acionistas ferozes; não é nada igual, mas queria que eles sentissem o quão
relevante isso é.
Arregaço mais as mangas da minha blusa e cruzo os braços para
começar.
— Bem antes de falecer, Melissa escolheu Isis para carregar um filho
meu através da fertilização in vitro, que seria fruto do nosso sonho de nos
tornamos mãe e pai. Isis está aqui não só como a minha convidada que está
cumprindo com os termos combinados com Melissa, mas está aqui como a
mãe de Oli, também. Ela é a mãe do meu filho e exijo respeito.
Este último, tenho o prazer de enfatizar encarando Matilde, que engole
em seco por perceber que a sua tentativa de me deixar irritado com Isis não
deu certo. Reparo também que a explicação melhor os deixaram sem fôlego,
mas foi preciso disfarçar, uma vez que eu não havia terminado.
— Melissa a escolheu, então ela é como uma extensão da família nesta
casa, e irá ficar o tempo que quiser. Então, exijo que a tratem com respeito e
deem a ela todo conforto que podemos oferecer. Ela está focada nos
cuidados de Oli, e por isso, não quero que se preocupe com tarefas bobas,
embora ela seja muito teimosa. — Quase fujo da marra de chefe inflexível
quando ressalto este detalhe de Isis que me dói nos nervos, mas eu supero.
— Tudo isso será necessário até que Isis venha a se sentir confortável
definitivamente, que ela encare este lugar como um novo lar, pois é da minha
intenção fazê-la ficar de vez.
Uns acenam em concordância, eles não podem recusar uma ordem
minha, terão que fazer o que estou pedindo mesmo que os meios ainda não
sejam claros o suficiente, ao ver pela cara das arrumadeiras. Mas Matilde
não disfarça a incredulidade, ela está tão surpresa e confusa, que se atreve a
questionar.
— Desculpa, senhor Oliver, então isso significa que o senhor pretende
assumi-la em breve? Tipo como a sua mulher?
Não respondo de imediato, apenas meneio a cabeça e ela reformula a
pergunta de um jeito mais direto e hesitante.
— O s-senhor pretende se casar de novo, então?
“Sim”, os meus pensamentos gritam e porra, nem sei por que isso é
algo que eu deveria esconder. É claro que não irei pedir Isis em casamento
antes de sentir qualquer coisa por ela, mas se for para fazê-la ficar, não
quero apenas me "amigar"; não quero um relacionamento onde darei a ela o
benefício da dúvida.
Isis merece, assim como toda mulher, um casamento cheio de amor.
Isso, é claro, se tudo for correspondido.
— Não quero colocar outra mulher nesta casa que não seja Isis. E sim,
se for o caso dela se tornar para mim mais do que a mãe de Oli, eu não
hesitaria em pedi-la em casamento — afirmo sentindo meus pulmões
arderem, eu não sabia que seria mais difícil falar do que pensar nesta
possibilidade, isso porque cogitar um casamento com Isis, de me apaixonar
mais uma vez, faz todo meu ser aquecer de um jeito como se eu estivesse
descobrindo tudo pela primeira vez.
Suspiros e silêncio rebatem minha palavra, mas um grunhido familiar e
agudo entona da cozinha.
Oli.
Só tenho tempo de virar e ver Isis paralisada, com os olhos tão vítreos
que quase noto meu reflexo neles. De alguma forma, ela não se intimida.
Troca o peso dos pés, acena levemente com a cabeça e então cumprimenta a
todos.
— Bom dia — diz firmemente e os funcionários a correspondem com
educação.
No entanto, para mim, os olhos de Isis estão duros, quase em
chateação. Aí ela vira e vai embora. Nem penso duas vezes antes de segui-
la, porque já sei que a assustei o suficiente.
Porra, eu também estou assustado!
Mas ela ainda não sabe o que eu sei, e talvez não queira o que eu tanto
quero: fazer com que a nossa relação fique firme, a ponto de que jamais
iremos cogitar ficarmos longe do nosso filho.
Ao menos os funcionários já estão avisados. Agora Matilde não irá
mais me aprontar uma daquela, e os olhares na direção da Isis serão menos
maldosos. Então subo a escada atrás de Isis bem mais tranquilo do que mais
cedo, quando acordei um trapo.
Nunca vou entender por que procrastinei tanto aquele assunto, mas
agora está tudo bem.
A encontro em seu quarto, deixando Oli dentro do berço. Ela já
esperava que eu fosse segui-la e entrar ali igual a um foguete, mas eu não
esperava que Isis fosse virar para mim com tanta veemência, expressões
duras e um olhar iluminado por algo que até então eu não havia presenciado.
Ela estava realmente chateada.
— Que conversa é essa, Oliver? Você nunca mencionou aquelas coisas
pra mim.
No entanto, embora visivelmente estivesse irritada, a sua voz mostra o
contrário, ela é sensível e suas emoções sempre expressam mais do que
gostaria.
— Eu só queria esperar o momento certo.
Por alguma razão, falei como se estivesse com o rabo entre as pernas,
eu não queria que aquela situação acabasse mal interpretada.
— E então eu seria a última a saber?
Fico estático e ela avança um passo, parecendo até mesmo ter crescido
alguns centímetros. Olho para os seus pés só para ver que ela está descalça.
— Esses planos não são só seus a partir do momento em que sou
envolvida neles, Oliver. Eu quero fazer isso dar certo tanto quanto você!
"Isso" que ela diz, fica implícito. Pode significar muitas coisas e
quase nada, mas tudo indica que ou se trata de Oli ou de mim, mas Isis está
certa. Não tem por que ficar escondendo dela algo que pode nos ajudar com
Oli também, a mantê-lo sempre junto da gente.
Então explano as coisas de vez.
— Você está certa, ok? Tem toda razão. Mas eu precisava ter essa
conversa com meus funcionários, não deveria ter adiado tanto, aliás... —
começo a falar calmo, para ela encontrar algum tipo de tranquilidade em
mim também. — E por alguma razão, o assunto veio à tona. Eu não cogitaria
algo do tipo sem contatar você antes, mas é real, Isis.
Agora eu também avanço. Já estou mais confiante e sinto que ela não
irá de alguma forma, me comer vivo por isso.
— Quero que você more aqui comigo. Vamos prolongar os quatro
meses para um ano. É uma boa forma de manter Oli perto de nós dois.
Ela pisca e suas bochechas ganham um tom rosado.
— E essa história de ca-casamento?
Meu coração pega no tranco e vai embora, sem freio, não consigo
parar e fazê-lo ficar controlado. Mas não posso ficar abalado pelas reações
do meu corpo, preciso esclarecer as coisas com Isis e o momento perfeito
é agora!
— Também foi sério. — Observo os olhos castanhos de Isis se
arregalarem. — Por que eu não pediria uma mulher, a qual eu admiro a força
e generosidade por ter feito tudo isso até aqui?
Isis dá uma risada desdenhosa, mas logo fica séria quando responde:
— Porque casamentos não são contratos banais — respalda.
— Eu sei disso, Isis. Por isso quero prolongar a sua estadia aqui em
casa, porque se você estiver de acordo, poderemos começar a dar passos
que corroborem para que tudo der certo.
Seus olhos franziram profundamente.
— Mas você pelo menos sente alguma coisa por mim? — Cruza os
braços na defensiva.
Hoje seu cabelo está preso em um coque, mas sempre há uma mecha
pendendo na frente de seu rosto, e é ela que eu gosto de enroscar no meu
dedo indicador, acariciar e então, colocá-la atrás da sua orelha em um gesto
afetivo. Faço isso no exato segundo, antes de dizer:
— Eu não sou de blefar, Isis. — Acaricio seu rosto com o dorso da
minha mão e meu âmago estremece quando ele fecha os olhos saboreando
aquilo. — Cada toque, cada palavra... Eu sinto uma atração por você desde
que chegou com Oli. Mas é claro que isso não é e nunca será o suficiente
para eu colocar um anel em seu dedo, mas estou disposto a ir mais a fundo.
Conforme vou confessando, sinto a sua pele esquentar e um arrepio
percorrer o seu corpo. Gosto muito da forma como ela reage a mim, mas não
tocarei neste detalhe agora, decido guardá-lo só para mim.
— Não sente que está forçando isso entre nós por causa de Oli? —
pergunta e automaticamente puxo minha mão de volta.
Eu temia que desse essa impressão, mas não estava a fim de desistir.
Eu nunca desisto.
— Você sente que é forçado? Eu não me aproximei tanto de uma
mulher desde Melissa, vamos começar por aí. Acha que eu poderia me
manter imparcial, quanto a uma mulher como você ficar perambulando pela
minha casa com meu filho nos braços, sendo incrível na maior parte do
tempo e eu não sentir nada?
Ela respira fundo.
Não consigo identificar por qual motivo, mas Isis mantem seus olhos
fixos nos meus e parece segurar firme na hora de também ser sincera.
— Já que é pra jogar um jogo limpo, então vamos lá — diz com tanta
determinação que me surpreendo. — Eu também me sinto atraída por você,
Oliver. Não vou negar. Você mais do que um bom pai, é um homem incrível,
com mais qualidades do que defeitos. Me sinto segura com você, e se não
fosse pelos termos que assinei, ficaria tranquilamente mais do que quatro
meses, sem que isso pesasse na minha consciência.
É como tirar toneladas das minhas costas.
Isis se sente atraída por mim já é um ótimo passo. Se trabalharmos
bem nisso, poderemos nos entender bem melhor daqui para frente. Mas ainda
há algo que preciso ressaltar.
— Esqueça os quatro meses, Isis. Temos Nicolo e Anete, dois
excelentes advogados para lhe assegurar que após o tempo limite do
contrato, não há problema algum em firmamos um acordo. Só entre nós dois.
Ela balança a cabeça.
— Tudo bem. Mas darei uma resposta assim que eu me decidir melhor
sobre tudo isso. Preciso pensar bem. Mas desde já eu agradeço por você ser
bom e digno, permitindo que eu não fique tão longe de Oli.
— Por que você não o chama de filho? — pergunta abruptamente,
quando ela mal termina de falar. — Eu falei que você é a mãe de Oli. Então
não precisa se preocupar em chamá-lo de filho. — Seguro seus ombros com
meus dedos firmes sobre aquela rigidez. — Não se acanhe, Isis. Oli
é seu filho.
Ela se emociona ao mesmo tempo que o sorriso se expande em seus
lábios. Ali está a personificação da sua gratidão, na forma que a lágrima
escorre contida pela sua face, e em como os olhos também brilham em
felicidade. Ela se inclina sobre o berço e deposita um beijo na bochecha
gorda de Oli.
— Meu filho — enfatiza, inalando o cheirinho de bebê dele.
Ela quase se demora ali, mas quando volta a lembrar da minha
presença, volta a ficar ereta de novo.
— Obrigada, Oliver. Isso significa muito para mim.
Aceno.
— É o justo com vocês dois. Além do mais, é o que Melissa gostaria.
Ela jamais privaria Oli de viver com sua mãe, é por isso que acho muito
importante tentarmos prolongar os quatro meses — insisto. — E caso não dê
certo, iremos compartilhar a guarda, ok?
Percebo o coração de Isis se encher
— Ok. Obrigada, Oliver, de verdade. Mas, eu preciso pensar — diz
limpando as lágrimas com o dorso da mão, antes que eu não conseguisse
resistir à tentação de fazer eu mesmo aquilo. — Se for o caso de passar mais
tempo aqui em Florianópolis, precisarei pedir demissão do meu emprego em
Blumenau.
— Ótimo! — exclamo otimista e a expressão de incredulidade nela foi
inevitável. — Você sabia que a Giordano S.A oferece uma creche para os
funcionários? Se for de seu interesse, pode trabalhar lá. Não quero de jeito
nenhum tirar a sua independência e o que você mais ama fazer, Isis. Além do
mais, você poderia levar Oli quando ele estivesse maiorzinho.
Seus olhos estreitam em minha direção, completamente desconfiada.
— Parece até que você andou planejando tudo minuciosamente —
acusa e dou apenas de ombros, enfiando as mãos nos bolsos da calça.
— Eu estaria mentindo se dissesse que não. Mas eu juro que a creche
foi uma pura coincidência — ressalto, lembrando infelizmente da forma
como Sofia tentou menosprezar o trabalho de Isis. Porém, a mãe do meu filho
soube sair daquela situação fazendo com que os demais gostassem mais
ainda dela.
Na tentativa de não perder o foco, lembro de outro ponto que eu queria
muito conversar com Isis desde o dia em que ela saiu com o pai e eu fiquei
desesperado aqui sem ter notícias suas.
— Estive pensando sobre o seu pai também.
— Ah, esteve? — Levanta as sobrancelhas em surpresa; mais uma
surpresa, na verdade.
— Sim, e por mais que você ligue para ele todos os dias, e que a sua
prima esteja o fazendo companhia como você bem me informou... Acho que
está mais do que na hora de sermos apresentados formalmente. Além de que,
ele precisa ver Oli, a saudade deve ser grande para ambas as partes.
Quando mal termino de falar, uma comoção tão forte envolve Isis que a
sua primeira reação é se jogar em mim, envolvendo seus braços ao redor do
meu pescoço com força. Instintivamente, espalho a mão esquerda nas suas
costas e deixo que a outra mão acaricie seu cabelo.
— Eu nem acredito que meu pai vai conhecer você! — Fungou no meu
pescoço.
Dentro de mim, foi como ter me dado uma alfinetada. Isis nunca me
contou de um jeito mais transparente, mas ela também nunca me escondeu o
quanto foi julgada por ter surgido grávida mesmo estando solteira. E uma das
pessoas que mais se envolvia nessa questão, mesmo tendo aceitado a
gestação dela, foi o pai e a prima. Então imagino o alívio que seja para ela
ter que fazer isso.
Me sinto mais encorajado ainda a tornar este momento real.
— Vá, pegue seu telefone e ligue agora para ele. Diga que vamos
visitá-lo no dia seguinte — exijo, mas sem coragem alguma de afastá-la
daquele abraço que se manteve.
— Na segunda? — Isis se afasta incrédula, para a minha angústia de
quem queria só se afundar no corpinho dela.
— Não quero ter que precisar adiar mais um dia. Eu falei, Isis, estou
disposto a fazer dar certo.
Ela dá um sorriso largo.
— Tudo bem — diz se afastando para ir atrás do seu celular.
Naquele momento percebo então que da última vez em que se
encontrou com ele, ela não contou sobre minha pessoa. Ela deve ter sofrido
mais algum tipo de outra pressão a respeito do pai de Oli, e agora podendo
finalmente esclarecer as coisas a ele, talvez Isis acabe por sentir mais
segurança em estar aqui comigo.
Quando ela volta, já está com o contato do seu pai na tela do celular,
prontificado para a ligação.
Isis me olha cheia de expectativa.
— Quer que eu coloque no viva-voz?
— Irei me arrepender se eu disser que sim? — pergunto fazendo com
que ela sorria.
— O meu pai é um homem das antigas, mas muito mente aberta, ama
ter novos conhecimentos. Para ele, a felicidade daqueles que ama devem
estar em primeiro lugar — explica e começo a me sentir mais aliviado.
— Então tá, vou confiar — alego.
Seria horrível ouvir o pai de Isis me detonar do outro lado da linha
por razões injustas; ele mal me conhece, mas também compreendo seu lado.
Então seja lá o que ele diga, não será o momento certo para eu interferir ou
me ofender.
— Qual o nome dele?
— Daniel.
Logo do outro da linha, Daniel atende a ligação e Isis fica de um jeito
empolgado que eu nunca vi antes.
— Oi, pai!
Mal tenho tempo de contar a ela que Daniel também era o nome do
meu pai.
— Oi, meu amor. Não esperava que fosse ligar tão cedo em pleno
domingo. Tudo bem com você e o meu netinho? — pergunta preocupado.
Ele chama Oli de netinho.
Céus, como eu poderia tirar isso deles?
Estou mais determinado ainda em fazer dessas peças um conjunto
ordenado.
— Sim, pai. Nós estamos bem, e quanto ao senhor?
Ele resmunga.
— Com saudade. Muriel irá vir para cá depois, mas será mais um
domingo solitário sem vocês aqui.
A sua voz é nitidamente triste e Isis me olha como se estivéssemos
pensando a mesma coisa.
Senhor Daniel irá gostar muito da proposta.
— Bem, então vamos tratar de resolver isso logo amanhã. Eu estou
com o pai de Oli, e ele quer te conhecer.
— O pai de... Espere, então não foi o Boto?
Isis me olha envergonhada e tapo a boca para conter a risada.
Eu não esperava que ele fosse usar uma referência da lenda regional
do Norte do país, mas soou engraçado, e já fico ansioso para conhecer o
Daniel.
— Não, pai. O senhor sabe que não. Escute, nós iremos te ver, tudo
bem?
Ele se exaspera.
— Se vocês irão vir, então terei de fazer um churrasco. Os vizinhos
não vão entender nada, mas um churrasco em plena segunda-feira não faz mal
a ninguém, não é mesmo?
— Não, pai. Vai ser bom.
— É claro que vai. Eu só quero me encontrar com este sujeito e ter
uma conversa muito séria com ele — afirma de um jeito autoritário.
— O senhor irá. Logo, logo. — Ela me olhou como se eu estivesse me
firmando deste aviso. — Preciso desligar, tenho que resolver algumas coisas
por aqui ainda.
— Me ligue mais tarde, se der. E coloque Oli para falar comigo. —
Ela ri, sabendo que o máximo que acontecerá é ele ouvir uns grunhidos
vindo do bebê.
— Tudo bem, eu amo você — diz com tanto carinho que achei que
fosse se quebrar.
Por um momento, sinto que estou sobrando, é por essa razão que Isis
decide encerrar a ligação mais rápido do que o normal.
— Eu também, minha filha. Esperarei os três amanhã, muito ansioso.
Então a ligação se encerra, e ela larga o celular na beira da cama.
— Feito. Viu? Não foi tão ruim, e amanhã não será pior.
Franzo o rosto como se eu tivesse provado algo azedo.
— Não sei, parecia que ele irá comer minhas entranhas guisadas.
Isis explode numa risada.
— Oli e eu defenderemos você.
Com este rostinho de anjo, não duvido.
Mas algo me chama atenção quando ela coça a testa. Seu dedo do meio
está inchado e avermelhado bem na falange, o puxo com delicadeza enquanto
estudo o local que parece inflamado.
— O que aconteceu?
— Ah, é só uma farpa que entrou ontem à noite. Não me pergunte
como, mas uma hora melhora — diz sem tanto interesse.
Isis tenta puxar sua mão, mas a puxei de volta.
— É sério. Eu dou um jeito com uma agulha ou outra coisa.
— Deixa de ser teimosa — pontuo, levando a ponta do seu dedo até a
minha boca, para a sua surpresa, que a ajudou a se manter calada.
Saber que eu a deixo atraída e que eu sinto atração por ela faz daquele
momento o menos ingênuo possível.
Fecho os olhos para me concentrar melhor na ponta da farpa que meus
lábios quentes tateiam, mas meus pensamentos ficam me levando para uma
cena completamente depravada, onde só consigo imaginar Isis montando em
mim enquanto me deixa chupar seu dedo gostoso, apertando com força sua
cintura deliciosa que me faz ter sonhos loucos com ela.
Quando encontro a ponta da farpa e abro meus olhos, Isis está
petrificada, respirando o ar pela boca e com os olhos vítreos na minha
direção. Puxo a farpa, e o meu pau lateja, porque não consigo deixar de
pensar em putaria enquanto a toco e fico olhando aquele rostinho que
poderia estar se contorcendo de prazer, neste exato segundo.
Mas é só a ponta de uma farpa e já foi o suficiente para ocasionar isso
tudo.
Jogo a ponta no chão, e massageio sua mão delicadamente, sem tirar
por uma fração de segundo os meus olhos dela.
— Pronto. Doeu? — pergunto com a voz carregada de luxúria.
Ela balança a cabeça primeiro.
— Não — diz com a voz rouca.
Porra!
Pelo visto eu não fui o único que ficou afetada com esse momento.
Uma farpa já foi o suficiente para causar tanto prazer entre nós dois, fico
ansioso para o momento onde irei levar isso a um outro patamar, se ela me
permitir, é claro.
— Ótimo. Você ainda não tomou café da manhã, Matilde já deve ter
posto a mesa. — Me apresso. — Irei tomar um banho e já, já, eu desço para
fazê-la companhia — digo enquanto vou me afastando.
— Ok, vejo você depois.
Deixo o quarto de Isis e corro para o meu que fica logo ao lado. Fujo
antes mesmo que ela possa ver, porque está cada vez mais difícil conseguir
me controlar, e o fato de eu ter tirado uma farpa do seu dedo e não ter
conseguido controlar os meus pensamentos e o meu corpo, dizem muito
sobre isso.
Avanço para o banheiro e tiro a minha roupa de dormir, na noite
passada fez tanto frio, que dormi de calça moletom e suéter, envolvido em
dois cobertores, mas ao tempo todo pensando no calor de Isis, em como
seria estar agarrado a ela naquele friozinho.
Ainda está um pouco frio, mas não ajusto a água para morna ou quente.
A deixo fria e quando entro debaixo, sinto como navalhas cortando minha
pele.
“Eu preciso afastar este pensamento.”
Preciso antes que eu não consiga resistir ao meu corpo e o que ele
pede. Mas aquela cena que mentalizei de Isis é insistente, não quer me
deixar. E por isso, nem a água fria ajuda. O meu pau está duro como estaca,
latejando e implorando por alívio.
É inevitável não o tocar.
Meus dedos envolvem meu membro duro e quente. Aperto com força e
congelo em looping infinito a imagem que vislumbrei de Isis cavalgando
sobre mim, com aquele seu dedinho machucado na minha boca. Fico
massageando sem nenhum carinho, uso a brutalidade porque também me
puno por isso. Sei que não é certo, mas também não é errado.
“Eu preciso disso, é a minha natureza.
Ela se sente atraída por mim e eu por ela.”
Meu corpo todo fica rígido.
Daqui ninguém ouvirá meus gemidos que estão mais para rugidos,
então eu me permito fazer isso de um jeito livre.
Fico batendo uma como sempre faço, mas agora, é mais intenso.
Porra, acho que nunca bati uma punheta tão boa quanto essa.
— Caralho! — praguejo quando tudo o que eu queria, era estar
fodendo Isis e ouvindo os seus gemidos ao invés do meu e da água fria que
cai do chuveiro.
Finalmente, quando meu pau incha na minha mão, sinto aquela energia
me domar e deixar todo meu corpo em completa agonia até que o alívio seja
imediato, mas longo. Vejo o meu sêmen brilhar na parede, como um
vislumbre do que tem sido essa minha vida solitária.
É horrível se você sucumbir apenas a punheta.
E espero muito que Isis esteja apta a mudar isso em mim.
OLIVER

O meu alívio não durou muito tempo.


Eu afirmei que ajudaria Isis melhor com os cuidados de Oli, e para
isso, precisaríamos passar a dividir o mesmo quarto.
Foi um dilema, onde eu não sabia se eu me mudaria para o quarto
deles, ou eles que se mudariam para o meu, mas no fim acabou que eu decidi
por me mudar. Ficou combinado de que eu ficaria apenas para dormir e
como a cama dela é uma king size, eu acreditei que não seria um grande
problema.
Confesso que fui um tolo.
É claro que seria uma tarefa difícil!
Eu sabia que não seria uma mudança fácil, mas naquela noite, quando
eu me deitei de um lado e ela do outro, com apenas um metro de distância
nos separando, eu soube que seria difícil. Talvez a novidade da coisa ainda
fosse um aliado quanto a nos manter afastados, mas isso não resolveria por
muito tempo.
Havia uma atmosfera tensa pairando no ar, um pouco constrangedora,
para falar a verdade, mas deu para aguentar até que Oli começou a mostrar
os primeiros trabalhos que me daria pela madrugada.
— Não precisa, deixa que eu vou — digo a Isis quando ela se
sobressalta no primeiro choro de Oli.
Mesmo dormindo, uma parte dela se mantém alerta. Mas quando pego
Oli no braço e ela vê que está tudo bem, que agora tem alguém para cuidar
dele durante à noite além da sua proteção materna.
Isis volta a dormir feito um anjo e então percebo enquanto embala meu
filho, que Isis precisava muito daquilo.
Então não foi uma má ideia dividir o mesmo quarto. E eu continuaria
até que ela me expulsasse de lá.
No entanto, sabíamos que uma grande parte daquela tensão se dava ao
fato de que encontraríamos o Daniel esta manhã.
Acordamos bem cedo, pois seria uma viagem de três horas e meia até
Blumenau. Fui para meu quarto me trocar e dei privacidade à Isis, então
depois desci para avisar Matilde que não se preocupasse com o almoço
daquele dia, e que eu sairia com Isis e Oli, sem horário para voltar, mas
muito provável que estaríamos em casa a tempo para o jantar.
Agora estamos mais do que na metade da viagem. Oli começou a
dormir em seu bebê conforto quando pegamos a estrada, e Isis estava tão
animada quanto eu estava nervoso.
— Trinta e seis anos e eu estou morrendo de nervoso porque vou
conhecer o pai da mãe do meu filho — alarmo em dado momento, fazendo
Isis sorrir.
— Ele não vai botar você pra correr, Oliver. — Ela me assegura
sentada ao meu lado.
Dispensei Jorge, queria que fosse um momento mais família, sem
contar que fazia tempo que eu não pegava estrada deste jeito.
— Não vou correr, vou encará-lo. Sei como conquistar pessoas, faz
parte do meu trabalho.
— Mas meu pai está longe de ser um acordo de negócios. Você vai
lidar com um senhor comum e que faria de tudo para proteger a filha que ama
— me avisa.
— Como você não quer que eu fique nervoso quando me diz uma coisa
dessas?
Percebo que Isis ri de quase tudo o que eu digo. Mesmo que não seja
engraçado ou tenha sido com essa finalidade, ela demonstra que se sente bem
ao meu lado, e eu fico me sentindo ótimo por isso.
Quando chegamos em Blumenau, Isis é quem fica ansiosa e nervosa.
Parece que a qualquer momento ela irá saltar do carro e beijar o chão de
tanta saudade que sente do lugar. Mas se agarra aos detalhes para quando
voltar para Florianópolis, lembrar de tudo com mais carinho.
O GPS me ajuda chegar à casa do pai dela, lugar onde vive, ou vivia.
É uma típica casa alemã, no estilo enxaimel, onde as paredes são montadas
com vigas em direções diferentes, com tijolinhos em sua base e janelas
modestas.
Um lar.
Simples, mas aconchegante ao ver de primeira.
Quando estaciono o carro, do outro lado do cercadinho que delimita a
casa, o Daniel já nos espera.
Isis não se demora ao sair do carro e ir ao seu encontro. Me apresso
para tirar Oli do bebê conforto, mas consigo assistir a imagem de pai e filha,
transbordando amor e saudade.
Em meus braços, Oli se agita, ele acordou desde que chegamos no
município.
— Pai, quero que você conheça alguém.
Ouço Isis dizer, e acho que é um bom momento para eu contornar o
carro e dar as caras.
— Este é Oliver, o pai do Oli que o senhor tanto queria conhecer.
Me aproximo com meu filho no colo.
Juro que não estou usando como artifício para Daniel não pular em
meu pescoço, mas seguro o corpo do meu filho com firmeza quando encaro
aqueles olhos sérios que me julgam debaixo da armação dos óculos de grau.
Ele já tem o cabelo branco se sobressaindo aos poucos fios escuros, não
parece se importar com a velhice, embora não deva ter mais que uns 56
anos.
Estendo a minha mão, pois preciso ser o homem confiante de costume.
— Olá, senhor Daniel. É um prazer conhecê-lo — digo sorridente, mas
ele continua sério e me encara por mais tempo.
Por um momento eu tenho quase certeza de que ele irá pular no meu
pescoço, mas permaneço impassível.
É uma briga de dois lobos, mas ele não é tão feroz quanto pensei, pois
estica o braço e me cumprimenta.
— Eu achei que esse dia nunca chegaria — murmura. — Mas não
deveria ter demorado tanto, rapaz.
— Será que podemos conversar sobre isso lá dentro? — Isis propõe
entre nós dois. — Está frio demais aqui fora e não queremos que Oli pegue
um resfriado, não é?
Ele olha para filha chocado.
— Com certeza, não. Entrem. — Cede espaço e então caminha até a
porta com dificuldade.
Isis me contou sobre o acidente, por conta disso, ele manca até hoje e
sempre usa uma bengala para se locomover melhor. Ela me pediu para não
tocar no assunto, pois Daniel fica muito triste com o fato de não poder mais
trabalhar depois que o acidente lhe deixou sequelas, o fazendo viver da
aposentadoria.
Sinto compaixão por ele, pois eu também ficaria triste se descobrisse
que jamais poderia voltar a fazer o que eu amo, ainda mais tão novo; e Isis
me assegurou que o volante sempre foi a paixão de Daniel.
A casa é tão modesta dentro quanto fora. A sala tem um par de sofá
confortável, com a TV ligada, posicionada no centro de uma estante repleta
de fotos de família e amigos. O chão está limpo e os móveis com os objetos
de decoração estão polidos; me pergunto se ele paga alguém para fazer as
tarefas que imagino eu, antes executadas por Isis.
— Venham, sentem-se e me dê aqui o meu netinho — pede assim que
está posicionado no que parece ser sua poltrona favorita.
O trono do rei.
Coloco Oli em seu colo e ele exibe os dentes ao sorrir, com os olhos
brilhando na direção do meu filho.
— Oh, Oliverzinho, que saudade o vovô tava!
Fico meio perdido, mas Isis me guia para me sentar ao seu lado
esquerdo. Quando faço isso, percebo que a casa tem cheiro de café puro,
como se Daniel fosse um grande fã da bebida e acabasse de fazer. Ele
admira o neto como se fosse uma joia rara, e algo dentro de mim aquece com
a cena.
É uma pena que os meus pais não estejam vivos, eles também iriam
gostar muito de Oli.
— Como cresceu! Já tem tanto cabelinho e sorri com tanta facilidade.
Igual você, minha filha.
— Ele fez três meses há dois dias, pai. — Ela olha radiante, do filho
para o pai e para mim.
Isis está feliz.
— Então é um ótimo dia para comemorar na casa do vovô — diz
ajeitando Oli em seu colo, que brinca com a manga da própria roupinha de
frio.
Daniel nos olha, voltando a ficar sério.
— Mas não é por esse motivo que estamos reunidos aqui hoje, não é?
Isis e eu nos entreolhamos.
Ela apruma a postura e dá início ao assunto.
— Não, pai. Vim trazer o pai de Oli para conhecê-lo e explicar toda a
situação.
— O que pode ser mais explicativo do que o fato de que ele nunca deu
sinal de vida, nem mesmo quando você estava gestante? — expurga o
assunto de forma direta, rasgando uma ferida que tento ignorar.
Ao meu lado, Isis sente que fico tenso, pois sua mão encontra a minha
e aperta, para me dar sustento. Eu aceito de bom agrado e aproveito para
fazer um gesto de carinho com o meu polegar.
— Pai, peço que ouça o Oliver sem ficar na defensiva, por favor. Ele
não sabia que eu estava grávida porquê... Bem, o senhor vai precisar ser
bem mente aberta agora — ressalta levantando o suspense, e continua: —
Mas Oli é fruto de uma fertilização in vitro. Eu fui barriga de aluguel da
esposa dele, que faleceu. Melissa, lembra dela?
Daniel fica estático, mas franze o cenho profundamente.
— Melissa? — repete chocado. — A Melissa que você salvou, e
que me salvou?
Isis balança a cabeça, afirmando e então explica tudo. Desde o acordo
que fizeram, da sua preparação para a fertilização, explica também como foi
o processo e como nos conhecemos há um mês.
Ele fica em silêncio do início ao fim, ouvindo tudo com bastante
atenção.
Alguns pontos o espantam, como o fato de que Isis assinou um termo
onde ela ficaria cuidando de Oli por quatro meses, então o deixaria sob
minha custódia. Ele me olha como se eu fosse um monstro que irá tirar deles
o que possuem de mais precioso, é nessa hora que decido finalmente abrir a
boca.
— Mas os termos já não estão mais em discussão, senhor Daniel —
afirmo mantendo meu olhar ao dele, como dois animais tentando marcar
território. — Isis terá a guarda de Oli compartilhada, e eu a convidei para
passar mais um ano em minha casa e ficar mais perto do filho dela.
— Um ano?! Mas, isso é muito tempo.
— É melhor do que quatro meses, pai — Isis o assegura deste detalhe.
— Mas e o seu trabalho?
— A minha empresa oferece uma creche para os filhos dos meus
funcionários, senhor Daniel. Isis pode trabalhar lá, se quiser — respondo no
lugar dela.
Ele me olha desconfiado.
— Por que está mudando os termos? — pergunta.
— É o que Melissa gostaria, afinal. Oli precisa de uma mãe presente,
e Isis é a mãe dele. — enfatizo bem este ponto. — Ela pode ter limitado o
tempo nos termos, mas também não tinha como saber se eu cederia ou não,
embora eu sinta que ela sabia que eu não tiraria Oli de Isis assim.
— Certo. — Ele se remexe em sua poltrona e se inclina um pouco
mais para frente. — Não é o seu dever fazer isso, mas fico feliz que seja
bondoso e digno a ponto de aceitar que a mãe de Oli é Isis. Irá poupar muito
sofrimento, rapaz.
— Somos uma família, senhor Daniel. — Ergo a mão de Isis que está
entrelaçada a minha e deposito um beijo cuidadoso no dorso da sua mão.
Ele avalia o gesto.
Não preciso dizer que pretendo me casar com a sua filha, não agora,
ou que sentimos atração um pelo outro. Mas este gesto, já deixa nas
entrelinhas que Isis e eu temos um relacionamento bom.
— Só não a magoe, é tudo o que peço. Blumenau pode ser do lado de
Floripa, mas, para um pai que faria tudo pela sua menina, não existe
distância que o impeça de quebrar a cara de quem quer que seja.
Não me sinto ameaçado, mas inspirado.
Espero ser um pai tão altruísta quanto Daniel.
Ele se estica e me estende a mão que aperto sem entender, até ele
dizer:
— Bem-vindo à família, rapaz.
— Obrigado — respondo sorrindo, só percebendo agora que estou me
sentindo aliviado por ter sido aceito, e contente por ter ganhado uma família
de forma despretensiosa.
Melissa sabia que se as coisas fossem feitas da forma correta, eu não
só ganharia a minha própria família, mas receberia mais aceitação do que eu
poderia imaginar. E ser aceito na família de Isis sem que eu faça muitos
esforços além do meu dever como pai e de um homem que busca amar e ser
amado de novo, é tudo o que eu poderia sonhar para essa nova fase da minha
vida.
Daniel fica tão à vontade com a minha presença, que poucas horas
depois já estamos conversando sobre futebol, quando um programa de
esportes que passa na TV começa a anunciar os classificados do Brasileirão.
Descubro que ele torce para o Fluminense, pois nasceu e cresceu no
Rio de Janeiro, mas se mudou ainda jovem para Blumenau, o que explica o
sotaque sulista que o fez perder o sotaque carioca.
Isis está amamentando Oli, enquanto ficamos conversando mais um
pouco. Mas como o almoço está perto, precisamos nos apressar para
preparar o famoso churrasco de Daniel no quintal dele, onde fica a
churrasqueira. Ele fica surpreso quando tomo a dianteira no tempero da
carne e assumo a churrasqueira logo em seguida; o fato de ter dito a ele que
sou o CEO da Giordano S.A, talvez o tenha feito pensar que não faço essas
coisas básicas por ter funcionários para tudo, mas gosto de assumir as
rédeas de coisas simples, como dirigir ou fazer um churrasco.
Um pouco depois, Muriel aparece.
Reconheço porque ela e Isis não conseguem conter os gritinhos e
Daniel avisar que era a sua sobrinha. Eu ainda não a conhecia, mas sabia da
sua existência porque Isis também vive falando dela.
Não demora muito para eu conhecer a moça que esteve do lado de Isis
em toda gestação.
Muriel tem olhos grandes de um tom azul acinzentado, seu cabelo é de
um vermelho cobre e longo, passando da cintura. Ela é mais alta que Isis, e
tem a pele clara. Ao julgar pelas suas vestes, enquanto Isis é romântica com
os seus vestidos, Muriel é despojada com o jeans detonado e a blusa
do AC/DC.
— Oi, Oliver.
Ela não me chama de senhor, e não usa um tom muito amigável
comigo, o que significa que talvez a prima me dê mais trabalho que o pai de
Isis.
— Finalmente o conheci.
— Digo o mesmo, Isis sempre fala de você. — Não me intimido com
ela, já enfrentei coisas bem piores.
— É claro que fala. Eu sou a prima e melhor amiga dela — diz num
tom indiferente.
— Muriel, será que podemos conversar um pouquinho? — Isis já foi a
puxando de volta para dentro da casa.
Daniel e eu nos entreolhamos.
— Ela já sabia? — Daniel pergunta se referindo a sobrinha.
— Isis deve ter contado em algum momento.
— Então talvez ela te odeie por outro motivo — comenta dando de
ombros, fazendo com que o olhe abismado. — Não se preocupe, Isis vai
conversar com ela.
Viro a carne, pensando que talvez seja isso mesmo.
Assim como Daniel teve os seus motivos, Muriel deve ter os dela.
Mas os diálogos são importantes, e Isis irá mudar a concepção dela. Ao
menos é o que eu penso quando elas demoram dentro da casa.
Quando a comida fica pronta, as duas ainda estão enfurnadas no
quarto, peço licença a Daniel e então vou chamá-las para o almoço.
A casa de Daniel é de um piso, mas com tantas portas que chegam a
confundir. Por isso, ando devagar pelo corredor, para ouvir qualquer som
suspeito e abrir a porta certa. Não foi por mal, mas quando me aproximo da
porta em que as vozes soam, escuto a conversa das duas que acaba me
interessando muito.
— E você aceitou isso? — Muriel pergunta abismada.
Isis deve ter contado sobre estarmos dividindo a mesma cama, ou
sobre o prazo que resolvi estender.
— Eu não consegui dizer "não" — Isis afirma, ainda sem me ajudar a
entender a conversa. — Eu confio tanto nele, que se me pedisse para saltar
de um avião e me dissesse que eu iria aprender a voar, eu saltaria.
Me pego sorrindo.
— Aí, meu Deus, Isis. Você está apaixonada! — Muriel exaspera e eu
fico surpreso.
“Será?”
Fico esperando ansiosamente pela resposta de Isis, esquecendo o quão
feio é o que estou fazendo no momento.
— É possível se apaixonar em três meses? — Isis retruca com outra
pergunta, me deixando frustrado por não ouvir o que eu queria. — Paixão é
totalmente diferente de atração, porque Oliver é GG. Gato e gostoso,
impossível de resistir.
Porra, então é isso?
Isis me acha gostoso, isso significa que nem mesmo seus pensamentos
a meu respeito andaram quietos. Mordo o lábio, gostaria muito de ouvi-la
falar baixinho no meu ouvido que sou gostoso...
“Ahg, eu, com certeza, iria pirar!”
— Às vezes não é questão de tempo, e sim, da pessoa certa — Muriel
reflete sabiamente.
— Você tem razão.
— É claro que eu tenho! Mas pense com calma. Vocês dois parecem
aquele fetiche de histórias românticas, onde o CEO se interessa pela
mocinha tímida e romântica. Mas segura a onda, Isis. — Faz um suspense. —
Ele pode te magoar.
Silêncio.
Não sei o que está acontecendo, mas parece uma boa hora para bater
na porta, então Isis conclui:
— Confia em mim, Muriel. É a única solução que encontramos no
momento.
Recuo.
Não quero outra solução senão essa, e me preocupa que Isis esteja
aberta a outras opções. Espero que nenhuma delas seja onde acabe voltando
para Blumenau com Oli, mas se esse for o seu desejo, eu devo aceitar.
Começo a ter medo onde aquela conversa pode parar e decido bater na
porta com três toques. É Muriel que abre, deixando apenas uma fenda com o
seu rosto à mostra.
— Pois não?
— O almoço está pronto. — Tento parecer tranquilo e que não acabei
de ouvir uma parte importante da conversa delas.
— Ótimo! Eu estava morrendo de fome — Isis revela trazendo Oli em
seus braços. — Mas que bom que temos homens nesta casa que amam estar
na cozinha!
Deixo as duas irem na frente, não quero que fique explícito demais que
estou sem jeito por ter acabado de dar um de futriqueiro e ter ouvido a
conversa das duas. Mas não adianta muita coisa, pois durante o almoço
Muriel não me dá trégua. Seus olhos são sempre de desconfiança para cima
de mim, e as perguntas que me faz na maioria das vezes são sobre os meus
planos com Isis e Oli, e o que espero do futuro.
Fico cansado daquilo, de como estou sendo julgado e me esforçando
para não dizer ou fazer qualquer bobagem, porque quero sim causar uma boa
impressão.
Por essa razão, tomo uma decisão que tomei sem consultar Isis
primeiro, inclusive a pego de surpresa.
— Neste final de semana, venham nos visitar em Florianópolis. O meu
motorista vem buscar vocês. Será um prazer apresentar meus amigos, já que
de família só tenho Isis e Oli.
Isis sorri, parecendo ficar boba toda vez que digo que ela é a minha
família. Mas Muriel parece espantada, e a forma como me referi a prima
como um membro da minha família, parece fazê-la afrouxar as rédeas, pois
passa a sorrir mais e a expressão fica menos dura.
— É uma ótima ideia! — Isis suspira
— Logo pela manhã mandarei Jorge vir buscá-los, estejam prontos.
Estou com a bola desta vez.
Daniel e Muriel estão mais conformados comigo. Perceberam que não
sou um homem qualquer, mas um homem de respeito e que deve ser levado a
sério.
O meu nervosismo de mais cedo era apenas um reflexo do meu medo
de não ser aceito, mas agora me sinto seguro, ainda mais por perceber que eu
sendo eu mesmo, é sempre a melhor opção; mesmo que isso possa
desagradar algumas pessoas.
O que felizmente não foi o caso.
O nosso dia na casa do pai de Isis é extremamente agradável. Parece
até que nos conhecemos há tempos, mas deve ser porque tiramos aquele
momento justamente para nos conhecermos melhor, e é o que acontece.
Descubro que a paixão de Isis pelos Beatles de fato vem por influência
do pai, e que o irmão dele influenciou Muriel a gostar de AC/DC. Uma
família do rock, o que me deixa muito empolgado, porque é um dos meus
gêneros favoritos e com certeza farei Oli ouvir muito das minhas bandas
favoritas
Muriel é professora de inglês particular, e como eu imaginei, é ela
quem faz as coisas para Daniel, como varrer e limpar os móveis. Por alguma
razão, ninguém fala da mãe de Isis, e curioso, também não encontro nenhuma
foto dela em meio a tantas ali na sala. Não toco no assunto, deve ter algum
motivo importante para ela ser esquecida de tal forma, ou eles,
simplesmente, não têm nenhuma.
O dia passa voando.
Embora eu tenha conhecido aquelas pessoas há pouco tempo, é
doloroso nos despedir, e por isso mal consigo imaginar o que Isis ou um
deles estejam sentindo com isso também.
— Mal vejo a hora de sábado chegar para poder revê-los de novo,
filha — Daniel diz enquanto funga no topo da cabeça de Isis que lhe dá um
abraço apertado antes de partir.
— Eu também, pai... Eu também.

Já a noite estamos em casa e tão cansados que tudo o que queremos é


um banho e dormir. Mas o banho é essencial depois daquele dia agitado.
Então a deixo ir primeiro com Oli, porque o dia ainda não terminou
para mim. Preciso fazer uma ligação importante que eu tinha que fazer mais
cedo, porém, não foi tão priorizado quanto o momento família. Mas agora
que tenho este tempo, deixo o quarto e vagueio pela casa, indo em direção à
biblioteca enquanto procuro o contato certo.
Melissa era louca por livros, além de uma leitora voraz, o que ela
mais gostava de fazer era colecionar várias edições, como do Harry Potter,
por exemplo. Ela tinha a edição inglesa, italiana e a brasileira. E assim
seguia um padrão de edição com as outras obras que ela se interessava por
ler. E quando planejamos essa mansão, uma das primeiras coisas que
ressaltamos ao arquiteto é que queríamos muito bem planejada uma
biblioteca.
E ele conseguiu.
Ela passava a maior parte do tempo ali dentro. E por razões óbvias
aquele cômodo passou a ser um fantasma para mim, mas agora eu sentia que
podia transitar por ali sem muito problema. No entanto, o lugar já parece
ocupado, pois vozes femininas soam dali nitidamente. Já ouvi muita
conversa alheia por hoje, mas essa eu não consigo evitar.
— Agora a vagabunda tá dividindo a mesma cama com o patrão. É só
questão de tempo até que ela mude de vez para o quarto dele.
Reconheço a voz de Emma e fico paralisado.
— Se ela não conseguir, deve ser muito trouxa por não aguentar um
partidão daquele na cama — Gisele completa.
— Mas ela é! — Tereza diz, até ela está na roda. — Aquela cara de
sonsa dela, de cachorro que caiu na mudança me dói nos nervos. E ela sabe
que não gostamos dela porque nem sequer damos bom dia quando ela não
está com o senhor Oliver.
Céus!
Não sei por que continuo ouvindo essas coisas, mas meu sangue está
fervendo de ódio.
A verdade sempre dói.
Ainda mais sabendo que nenhuma das minhas funcionárias cumpriram
com a minha ordem de respeitar Isis.
— Ela nunca irá se igualar a Melissa, que era uma mulher fina, de
classe e que veio de uma família tradicional daqui de Floripa. Diferente
desse bicho do mato, com cara de indigente que jamais irá se igualar a nossa
patroa — Lucy diz.
Meu estômago dá um nó.
Não consigo mais suportar uma palavra vindo delas, declarando
tamanha difamação de Isis, sem motivo algum aparente.
Não vou simplesmente sair dali e fingir que não ouvi aquilo, para mim,
foi a gota d´àgua.
Estou farto de ver a forma como Isis é maltratada pelas minhas
funcionárias, tudo bem debaixo do meu nariz e eu incapaz de tomar uma
atitude tão drástica quanto a que eu irei tomar agora.
Apareço na soleira da porta, Tereza é a primeira a me ver e o seu
rosto fica pálido. As outras três também se espantam, com tamanho horror
estampando a face.
Mas eu estou calmo.
Estou estranhamente calmo, embora a raiva tivesse me consumido
segundos atrás, era como se a minha frieza demonstrasse que me cansei disso
tudo.
— Estão demitidas! — Sou direto.
— Senhor O-oliver, nos des... — Tereza tenta, mas eu explodo.
— ESTÃO DEMITIDAS, PORRA! — Aponto o meu dedo duro e
trêmulo na direção de cada uma. — Você, você, você e você. As quatro para
fora da minha casa, AGORA!
Aponto a direção da rua, e o choro delas são como cacofonias para os
meus ouvidos.
— É tarde demais para lamentações. Se vocês fossem no mínimo
respeitosas e obedecessem a porra das minhas ordens, isso jamais estaria
acontecendo. Mas me surpreendo pelo fato de algo simples e tão natural
como respeito, não faça parte da educação de vocês — cuspo as palavras,
olhando para elas com tamanha decepção e nojo.
Porra!
Como elas podiam ser tão ruins a este ponto?
Matilde aparece logo em seguida, assustada e espero que Isis não
tenha ouvido nada lá de cima.
Basta um olhar para a governanta entender o que acabou de acontecer,
o que significa que elas devem fazer isso com mais frequência do que eu
esperava.
— Matilde, não fizemos por mal. — Lucy chega a soluçar, e eu acho
graça da cara de pau.
Não sei por que continuo ali.
A minha ordem foi clara, mas a governanta surge bem na minha frente,
implorando.
— Senhor Oliver, por favor, tenha piedade. Todas elas são mães como
Isis, tem seus filhos para alimentar, e a Tereza trabalha para o senhor a mais
de dez anos! — diz cirurgicamente, mas isso me deixa mais indignado ainda.
— Não me venha com essa história agora, Matilde. — Olho dela para
as quatro. — Estou muito decepcionado, jamais imaginei que todas três
fossem tão sem caráter a ponto de falar mal de alguém pelas costas e que
nem pode se defender. E o fato de estarem trabalhando para mim há tanto
tempo, é o que me dói mais ainda.
Olhares se abaixam, nem mesmo Matilde pode lutar contra isso.
— Agora faz todo sentido porque Isis passa tanto tempo trancada
naquele quarto com Oli. Quando os dois são os que têm mais direito de
transitar por esta casa — digo a mim mesmo em voz alta.
— O senhor está nervoso. Não pode tomar tamanha decisão
precipitada assim. — Matilde tenta mais uma vez.
— Estou nervoso porra nenhuma. Não tente encontrar desculpas em
mim para livrar a barra delas. — Aponto o dedo para o chão enquanto
concluo com rigidez: — Esta é a minha casa e sob meu teto quero apenas
pessoas que sejam da minha confiança!
Matilde desta vez não insiste, melhor não combater com este meu lado.
Até porque ela já fez merda demais, tanto que fez com que Isis usasse o
vestido de Melissa. Mais um "piu", e ela estará na rua também.
— Não as mandarei embora por justa causa, mas peço que saiam da
minha casa, agora — digo com mais calma, e nem preciso apontar o caminho
da saída.
Elas começam a aceitar que não voltarei atrás mesmo que derramem
litros e litros de lágrimas ou que gastem suas salivas com desculpas baratas.
Mesmo assim, quando Tereza e Emma saem, Lucy ainda tenta,
chorando copiosamente, chamar a minha atenção, mas a ignoro.
Não porque posso ceder, mas evito olhá-la porque não quero sentir
mais nojo.
— Peço desculpas de verdade, senhor Oliver. Estamos erradas, mas
também merecemos uma segunda chance de tentar. Por favor, pense com
carinho. Boa noite — conclui fungando.
Ela passa por mim e de repente quero chutar alguma coisa. Porque é
incrivelmente dissimulado a forma como elas conseguem agir como se não
tivessem falado nada daquilo minutos atrás, chegando a se vitimizar, quando
a vítima disso tudo na verdade é a pobre da Isis.
Pelo menos o silêncio é melhor do que aquele coro de choro que
ensurdece meus ouvidos, mas Matilde continua. Talvez eu devesse conversar
com ela também para que ela não venha fazer tamanha besteira, até porque
agora só me resta ela e Jorge. Principalmente quando ela ressalta:
— Tereza ainda estava concluindo o jantar, e vai levar tempo até que
eu encontre novos funcionários.
— Não tem problema, vou encomendar comida de algum restaurante
até que você encontre as substitutas corretas, e que não fique se metendo na
minha vida que estou tentando reconstruir. Apenas isso — digo cansado, e é
tudo.
Esqueço a ligação importante que eu precisava fazer, a fome e que até
então o dia estava muito perfeito para ser real. Me dói, logicamente, que
boas profissionais como aquelas três tenham que ir embora, mas não admito
mesmo que um tipo de coisa tão baixa aconteça bem debaixo do meu nariz.
Então volto para o quarto, entristecido, querendo dar carinho a Isis,
que tanto lutou pelo conforto nesta casa quando meus próprios funcionários
foram um grande empecilho para este processo.
Chego e ela está cantando Beatles para Oli. Fico parado ali ouvindo o
doce som da sua voz enquanto canta Blackbird; agora entendo Oli, em como
ouvi-la pode ser um deleite.
Ao menos, pela calmaria de ambos, os meus gritos lá embaixo não
chegaram até aqui, o que significa que não estive gritando o suficiente, para
o meu alívio. Acabo permanecendo ali por mais tempo do que eu gostaria,
pois percebo a perfeição que Isis é. Mesmo que ela esteja com seu baby
doll, agradeço a Deus por essa mulher existir. O tecido de cetim marca tão
bem as suas curvas, que consigo ver a marca da sua calcinha exibindo seu
quadril largo, e um pouco mais acima, enxergo a saliência de seus seios
rígidos e bem firmes.
Porra!
Nada melhor que uma foda para acalmar os nervos, e encontrar Isis
daquele jeito não ajuda em nada.
Eu só queria chupar e morder seus seios, puxar aquela calcinha com os
meus dentes e me perder no meio de suas pernas para provar seu sabor,
fazendo com que ela gemesse tão alto, que espantaria a porra das
funcionárias incomodadas.
Eu só queria Isis.
E é incrível pois, ao mesmo tempo que eu tenho, também não a tenho.
Isso é uma tortura.
— Tudo bem? — pergunta me tirando dos devaneios obscenos.
— Sim — minto, mas me recomponho. — Eu só preciso de um banho
— digo enquanto avanço para dentro do quarto, sentindo seu cheiro
delicioso de canela conforme vou para dentro do banheiro.
Eu poderia estar indo ao meu, mas trouxe algumas coisas minhas para
cá também, para não ter que ir até o meu quarto e fazer as coisas que tinha de
fazer.
Me tranco, abro o chuveiro, mas não tomo banho.
Preciso me aliviar outra vez.
ISIS

Eu não esperava que toda essa experiência fosse ficar tão intensa, a
partir do momento que precisei dividir a cama com Oliver.
Quando ele confessou se sentir atraído por mim, foi tão surreal que por
um momento achei que, se eu dissesse a verdade, talvez eu caísse na real e
finalmente percebesse as coisas que estavam acontecendo bem debaixo do
meu nariz.
É claro que um tempo depois, já a noite quando ele dormiu ao meu
lado, só então me dei conta da proporção que nossas palavras tiveram.
No silêncio da noite, aquela declaração era a única coisa gritante entre
nós dois, nos esmagando como uma massa densa de puro prazer.
Era possível sentir, sim.
Sou jovem, mas não tola.
Sinto que Oliver está se segurando ao extremo, percebo as suas
escapadas para o banheiro onde toma um banho demorado, homens são
homens, e eles se tocam.
Eu não tenho tido muita chance.
Na verdade, nunca tive muito sucesso com isso, e me preocupo. Me
preocupo porque talvez não atenda todas as expectativas de Oliver. Ele tinha
razão quando disse certa vez, que eu sou apenas uma menina e com falta de
experiência
Mas posso culpar o meu antigo relacionamento desastroso.
Eu nem sabia o que estava fazendo da minha vida naquela época, eu só
queria estar com alguém. E para completar, quando fomos visitar meu pai em
Blumenau, Muriel veio com a história de que estou apaixonada.
“Calma, aí!”
É bem provável que eu acabe apaixonada mesmo, mas não nesse
pouco tempo, não quando Oliver e eu temos muitos assuntos técnicos a
resolver, como a mudança dele para o nosso quarto, por exemplo.
Sério, é difícil pensar nas coisas que sinto quando aquele homem está
deitado ao meu lado e tudo o que eu quero é colocar a cabeça no seu peito e
no mínimo, passar a noite toda sentindo seu cheiro incrível.
Pelo menos Oliver veste o conjunto de pijama agora que dorme junto
comigo, até ele sabe que é muita tentação para resistir.
A minha sanidade agradece.
E felizmente, há mais motivos para comemorar do que reclamar. Nem
sei por onde começar, mas Oliver tem mesmo se esforçado em fazer cada dia
perfeito, começando por aí.
Ele me dá a liberdade de me dirigir como a mãe de Oli, além de podê-
lo chamar de filho.
Confesso que quando ninguém estava vendo, eu desabava em choro. Só
Deus sabe o quanto fiquei deprimida por pensar que eu nunca poderia
chamar Oli de filho, ou dizer que eu sou a mãe dele. Mas Oliver deu carta
branca e eu não poderia ir contra isso.
Outra coisa que aconteceu que era bom demais para ser verdade, foi a
nossa visita ao meu pai, onde revelamos toda a verdade por trás da minha
gestação e do fato de Oliver nunca ter dado as caras.
Meu pai é das antigas, foi um pouco difícil para ele entender, mas não
impossível; logo Oliver e ele já estavam superamigos, conversando sobre
tudo.
Agora iremos recebê-lo neste final de semana.
Querem mesmo me matar do coração, porque mal consigo conter a
ansiedade e entusiasmo para esse dia. Pelo menos aquela segunda havia sido
tão agitada, que a segunda noite com Oliver e eu dividindo a cama não foi
tão tensa assim; talvez porque ele tenha demorado para vir para a cama...
Não sei, mas ele parecia tenso demais.
Alguma coisa havia acontecido e o chateou.
Coincidentemente, ou não, em plena terça-feira não encontro nenhuma
das funcionárias de Oliver perambulando pela casa. O que não faz diferença
nenhuma para mim, pois elas nunca me trataram com respeito e educação,
sempre reviraram os olhos para mim e faziam uma cara de nojo. Elas nunca
cogitaram esconder o quanto me odeiam e por alguma razão, elas não estão
aqui nesta manhã.
Quando chego para tomar café da manhã, não resisto em perguntar a
Oliver, que dá uma mordida em seu sanduíche natural, o finalizando.
— Oi, bom dia. Onde estão as suas funcionárias? — Sento de frente
para ele, do outro lado da mesa.
— Bom dia. Elas foram dispensadas — revela com naturalidade, mas
não consigo evitar a surpresa.
— O que houve?
Oliver solta um suspiro, parece muito estressado para um dia que
acabou de começar.
— Eu explico mais tarde, quando sairmos para jantar.
— Sair para jantar?
“Meu Deus, é um encontro”, penso.
— Acho que precisamos disso, não é? Só nós dois — pergunta ao se
levantar, tentando ao máximo não transparecer demais alguma coisa que eu
não deveria notar.
— É, acho que sim.
Ele contorna a mesa e deposita um beijo no topo da minha cabeça.
— Estou realmente ocupado hoje, Isis. Mas qualquer coisa não hesite
em me ligar, você e Oli são prioridades para mim — discursa enquanto veste
seu paletó.
— Tudo bem.
Ah, como meu coração fica quentinho com essas declarações dele.
Preciso fazer muito esforço para não sorrir feito uma boba ou ruborizar. Mas
Oliver está tão atarefado mesmo, que ele mal tem tempo de olhar para trás
quando recebe uma ligação e sai às pressas.
Não sei por que, mas acho isso tão sexy.
Nunca fui ou gostei de pessoas acomodadas, é por isso que me irrito
quando sou impedida de fazer coisas simples.
Odeio ser relaxada, ainda mais sabendo que terei o dia todo livre.
Pelo menos antes, quando Oliver estava de home office, eu conseguia
me manter ocupada o dia todo. Oliver sempre encontrava alguma coisa para
fazermos com Oli, mas desde que voltou a ir para o escritório, tem sido
solitário, e acho até mesmo que o nosso filho tem notado isso.
“Nosso filho.”
É tão estranho, mas fico muito feliz em ter ganhado a liberdade de
falar estas palavras, “Oli é o meu filho e eu sou a mãe dele.”

Lá pela tardinha, recebemos a visita de Domenico.


Ele vem para fazer a consulta de rotina com Oli, que ele trata o tempo
todo como seu sobrinho, e não me incomoda, mas sou cautelosa em me
referir ao bebê de forma mais maternal e apegada, talvez ele encare isso
diferente de Oliver. Parece que o problema de Oli com o refluxo deu uma
melhorada e Domenico faz algumas observações que me atento com bastante
cautela.
A sua consulta é rápida, dando até mesmo tempo de acontecer um
convite inesperado.
— Você quer ir ao zoológico com Oli e eu?
Repito a pergunta para que ele me corrija, caso eu tivesse escutado
errado.
— Isso mesmo. Quase não tenho tempo com meu sobrinho, e dei a
ideia a Oliver que achou ótimo — Domenico explica enquanto brinca com
Oli. — Mas não se sinta pressionada, é só uma ideia.
Reviro os olhos.
Estou acostumada com a presença de Domenico e talvez passar mais
tempo com ele me lembre da época da minha gestação. Ele me acompanhava
até nas aulas de ioga e nas compras da minha alimentação, tudo para garantir
uma gravidez e parto saudável.
— Deixa de papo furado, falando deste jeito parece até que nos
conhecemos agora — protesto e ele sorri. — É claro que eu aceito ir ao
zoológico com você. Vai ser interessante para Oli conhecer os animais.
— Ótimo! Se arrumem, que farei uma ligação bem rápida.
Eu já me sinto arrumada com o meu vestido verde, mas coloco um
cardigã cor creme por cima, solto o cabelo e então me atento a Oli. O filho
tem que estar bem mais apresentável do que a mãe, afinal é ele quem
chamará à atenção das pessoas. E para sair com Oli, existe toda uma
operação, arrumar a bolsa dele e não esquecer de nada que vai dentro dela.
O bebê conforto ainda está no SUV de Oliver que usamos para ir até
Blumenau, Dom fica com a tarefa de tirá-lo de lá e ajustar em seu carro.
Até o carrinho de bebê vai em seu porta-malas, isso porque iremos ao
Parque Municipal do Córrego Grande, e como nunca fui lá, Dom me garante
que irei agradecê-lo por ter pensado em levar o carrinho.
Quando estamos a caminho, ele percebe que Oli adora andar de carro,
e fica saboreando a sensação que é levar um bebê para passear em seu carro.
Me pergunto se Domenico pensa em ser pai; um homem tão amável com as
crianças e que adora o seu trabalho.
Oli iria amar um priminho para crescer junto com ele
— E então, como vai a adaptação? — pergunta logo que saímos do
condomínio quando ele para de ficar bobo devido as coisas fofas que Oli faz
no banco de trás.
— Vai bem, estamos num ótimo progresso. Todo dia Oliver e eu nos
conhecemos mais um pouco.
— Ele é tudo mesmo o que Melissa garantiu a você? — pergunta
desconfiado e acho graça.
— Bem, ele nunca demonstrou não ser nada do que ela me prometeu
— revelo e ele arqueia as sobrancelhas em surpresa. — Na verdade, ele tem
se superado, Domenico. Oliver tem sido tão incrível que às vezes me vejo na
obrigação de compensá-lo de alguma forma.
— Ter dado a ele um filho não foi o suficiente? — Fica incrédulo.
— Eu sei, mas acabo me cobrando de qualquer jeito.
— E você já pensou em alguma coisa?
Nego com a cabeça.
— Não. Oliver tem tudo e todos à sua disposição. Tipo, até para
comprar presentes ele contrata alguém para fazer no lugar dele.
A risada do cunhado de Oliver demonstra que até ele acha um tanto
absurdo, que chega a ser engraçado.
— Você o conhece melhor, o que eu poderia fazer?
Domenico demonstra primeiro uma expressão muito sugestiva, mas me
nego a acreditar que ele esteja pensando em algo mais depravado. No fim, o
pediatra dá de ombros e se acomoda mais um pouco no banco confortável do
seu Audi.
— Em breve você o conhecerá melhor do que eu.
— Por que diz isso?
Ele dá de ombros.
— Não acho que Oliver vai deixar você ir embora tão cedo, ou que
você muito menos irá querer ir, por causa de Oli. É por isso que ambos
sentem essa necessidade de agradar um ao outro constantemente — explica.
— E você nem convive com a gente — ressalto por ele ter sido tão
observador. — Oliver contou alguma coisa a você?
— Ele deveria ter me contado? — rebate desconfiado e desvio minha
atenção.
Não sei se devo falar agora.
— Provavelmente — instigo.
— Então me conte.
Respiro fundo, pois Domenico merece saber, eu confio nele.
— Oliver me chamou para morarmos juntos por mais um ano e
compartilhar a guarda de Oli. — Deixo de lado a parte do casamento, não
sei como ele poderia reagir.
— Isso é bom, Isis. Muito bom, de verdade! — vocifera entusiasmado
batendo com os dedos no volante do seu carro grande e cheiroso. — Eu sei
que você teve todo acompanhamento psicológico, mas sempre pensei
constantemente em você.
— Então é normal a mulher que faz a barriga de aluguel, se apegar ao
bebê?
— Depende da situação. No seu caso, você precisou ficar com Oli
porque a mãe dele não está mais presente.
Percebo que é difícil para ele falar sobre isso, mesmo que nas
entrelinhas, mas mencionar a morte de Melissa ainda é doloroso. No entanto,
Dom continua:
— Isso fez com que o laço entre vocês dois ficasse mais forte ainda.
Você sabe que é a única mãe para Oli, a única capaz de dar a ele o amor que
merece.
Ele tem razão.
— Oliver percebeu isso, e então, fez o correto a se fazer.
— Melissa me disse uma vez que ele tomaria as decisões justas —
relembro, mesmo sabendo que poderia ser doído. Mas ao invés disso, Dom
sorri.
— Ela sempre estava certa — lembra com carinho.
As certezas que Melissa tinha sobre o papel de Oli, foi o seu maior
legado antes de partir. Toda essa comoção em torno do que estamos vivendo
não é apenas uma forma de lidar com as responsabilidades, mas sim, com
pessoas que amamos até depois da morte.
Chegamos ao zoológico, e com muita sorte, o dia está nublado, mas
agradável. O sol parece uma gota no céu, que indica promessa de chuva para
mais tarde, no entanto, está bom o suficiente. Dom abre o carrinho de Oli, e
então o coloco ali dentro e avançamos para dentro do zoológico, que na
verdade é um parque, mas com muitas atrações naturais, incluindo os
animais que vivem ali.
Logo na entrada do Parque Municipal, uma silhueta familiar acena
para nós. Aquele cabelo brilhante como ouro, a pele bronzeada e o sorriso
exageradamente branco, revela um Nicolo na expectativa. Como sempre bem
engomadinho em suas vestes sociais de advogado, mas em suas mãos, um
embrulho grande e colorido chama atenção entrando em contraste com seu
figurino profissional.
— Oliver me contou que vocês estariam aqui — diz na direção de
Domenico, mas logo me cumprimenta. — Olá, Isis, é sempre um prazer
reencontrá-la.
— Igualmente — digo, embora tenhamos nos conhecido apenas há três
dias e Sofia, a sua namorada, foi tão insensível em algumas ocasiões, mas
relevei.
— Trouxe uma coisinha para Oli, espero que goste.
Ele me passa o embrulho e sinto que é um pouco pesado.
Fico animada para abrir e os dois homens perto de mim também ficam
na expectativa para ver principalmente a minha reação. Assim que me
desfaço daquele monte de papel e laços, se revela um instrumento musical,
com as cores primárias em lâminas de madeira, junto com uma pequena
baqueta.
— Um xilofone? — Domenico indaga. — Você trouxe um xilofone
para um bebê de três meses?
— Sabe qual é o seu problema, Dom? Você não é um visionário.
— É por isso que sou pediatra — respalda com calma o irmão de
Melissa.
— Exato! — O loiro aponta. — Quando Oli já estiver grandinho o
suficiente, ele vai pegar essa belezura e tocar o terror na casa inteira. Mas o
alvo mesmo, é Oliver.
— Então você comprou o instrumento só para irritar Oliver? —
pergunto arqueando uma sobrancelha.
— Comprei o instrumento para aguçar o dom musical de Oli, mas sei
que a parte de irritar Oliver será um bônus.
— Talvez ele mate você antes — Domenico assegura.
— Oliver não será tão canalha assim!
— Você já está sendo um.
Intercepto aquela discussão.
Não me incomoda, mas gostei do presente de Nicolo e não vejo mal
algum.
— Ok. Obrigada pelo presente, Nicolo. — Pego o xilofone e o coloco
ao lado de Oli, que rapidamente encontra a baqueta e se interessa pelo item.
— Tenho certeza de que ele irá amar.
De fato, começo a vislumbrar Oli fazendo barulho pela casa com o
instrumento, mas principalmente, admirando os sons novos que descobrirá.
Então os dois amigos de Oliver, e tios declamados de Oli, começam a
paparicar o bebê dentro do carrinho que começo a empurrar na direção de
um lago onde famílias se juntam para assistir os peixes. Mas são os macacos
que agitam os arredores, saltando de um galho para o outro, causando chuva
de folhas acima de nós.
Os dois parecem distraídos com tudo, principalmente, em querer
mostrar a Oli, que ainda está fascinado com a baqueta. Não quero ter que
tocar no assunto, mas fico me perguntando se Oliver já os avisou sobre o
almoço de sábado onde meu pai será apresentado a eles formalmente,
firmando mais ainda aquele laço.
Deixo que ele curta apenas o momento, nem sempre eles têm tempo de
virem até aqui e ficarem brincando com Oli. Lorenzo, por exemplo, vive
indo para o Paraná para acompanhar a colheita de perto.
Mas não dura muito tempo até que Nicolo comece a puxar assunto.
— Então, Isis. Pelo visto Oliver esticou o tempo, não foi?
— Ele achou que seria o melhor — digo vagamente.
— Mas e todos aqueles termos assinados onde você entrou em acordos
minuciosos com Melissa?
Olho para ele sugestivamente. Não sei onde quer chegar, mas aquelas
perguntas não me soam como algo intencional.
— Oliver pediu para desconsiderar. Além do mais, quer compartilhar
a guarda de Oli.
O loiro arqueia as sobrancelhas e olha surpreso de mim para Dom.
— E o filho da mãe não me avisou nada! Será que não confia mais no
advogado e amigo que tem?
Domenico e eu nos entreolhamos.
— Acho que estamos levando a coisa toda para o lado mais humano e
natural de lidar com a situação, sem termos contratuais — afirmo e ele me
olha de esguelha.
— Isso pode ser uma armadilha para ele futuramente.
Paro subitamente de empurrar o carrinho, e acho que ouço Domenico
soltar um suspiro exausto.
— Você acha que eu estou armando para cima do Oliver? — pergunto
quase com notório escárnio.
— Não estou insinuando nada, Isis — respalda categoricamente. —
Mas toda essa história começou com termos e acordos, quanto mais seguir
nessa linha, melhor para ambas as partes. A guarda compartilhada é um bom
exemplo.
— Oliver e eu não queremos que as coisas andem assim. Estamos
deixando fluir.
— Até cada um de vocês se apaixonarem e ele pedi-la em casamento,
aí toda essa questão judicial será a de menos?
A naturalidade com que ele faz essas perguntas me deixa mais
desestabilizada do que gostaria; mas não por medo, e sim, porque soavam
como um absurdo, e ao mesmo tempo, reais.
— Oliver e eu não estamos apaixonados! — ressalto tão afobada que
os dois acham graça, como se eu tivesse dado alguma pista de que estou
mentindo.
Mas essa questão me irrita, pois Muriel está sempre batendo nesta
mesma tecla.
— Talvez estejam quase lá — o advogado provoca, lançando um
sorriso ao amigo que continua calado.
Domenico parece querer ir contra o loiro, mas não há muita coisa a se
fazer.
“Dos quatro, Nicolo é o que mais não ‘presta’”, foi o que Oliver me
disse certa vez.
— Pelo menos a mesma cama já estão dividindo.
Olho abismada para ele que agora gargalha e Domenico me olha
chocado, com os braços cruzados.
— Isso é verdade? — pergunta o pediatra, agora mais impassível do
que nunca.
— É claro que é, cara! Matilde me explicou o que aconteceu ontem,
querendo saber que tipo de providência as antigas funcionárias de Oliver
poderiam tomar caso ele não suspendesse a demissão delas
— O que Oliver e eu temos a ver com a demissão delas? O que
aconteceu ontem?
Esqueço completamente o outro assunto, Nicolo havia começado outro
bem melhor.
— Não cabe a mim dizer. Mas será que você não sabe, mesmo? — Ele
me lança um olhar de desconfiança tão profundo que quase me feri.
Domenico se coloca entre nós dois, antes que eu entenda as suas
intenções.
— Isso não é um tribunal, Nicolo. Pega leve. — Dom se vira para
mim. — Ignora Nicolo, ele tem essa mania chata.
— Sou advogado do Oliver, é o meu direito questionar.
Então era isso?
Saio do escudo que é Domenico, só para encarar Nicolo firmemente.
— Está suspeitando de mim?
Ele sorri de um jeito malicioso, mas se posiciona de outra forma:
— Não, Isis. Me desculpa, Dom tem razão. É só uma mania chata de
advogado, e o seu caso é excepcionalmente incrível. Nunca trabalhei com
algo do tipo.
Estreito meus olhos em desconfiança.
“Mentiroso!”
Nicolo ainda não vê a verdade em mim, e usa de seus artifícios
profissionais para arrancar alguma coisa suspeita.
— Temos o exame de DNA para comprovar a paternidade — me
defendo.
— Isis, eu estava lá. Fiz todo o procedimento — diz Domenico.
— Eu sei, Dom. Mas era só você como testemunha, além da Anete.
Então talvez eu tenha que lidar com essas coisas, mesmo com o teste de
paternidade.
Volto a empurrar o carrinho de Oli, com mais força e saio em
disparada pelo caminho de ladrilhos, os deixando para trás.
Nicolo corre para me alcançar.
— Desculpa, Isis. Não queria ter soado insensível.
Respiro fundo e lembro das funcionárias que Oliver
despediu, por minha causa.
— Por que Oliver precisou demitir as funcionárias por minha causa?
— insisto mais uma vez.
— Algo como falta de caráter e respeito dentro do recinto de trabalho
— Dom explica após nos alcançar também.
Pelo visto, eu era a única a não ficar sabendo daquilo, até então.
— O que elas fizeram? — pergunto sentindo aquela curiosidade se
afunilar.
Os dois amigos trocam olhares.
— Vamos supor que a situação seja difícil para algumas pessoas
aceitarem — Nicolo diz.
— Apenas Oliver tem o direito de aceitar, não ligo para o resto —
digo com uma fúria determinada que não sei de onde eu tirei.
Desde quando agradar apenas Oliver tem sido uma prioridade para
mim?
— Você tem razão, mas essas coisas infelizmente acontecem. —
Domenico cruza os braços, um tanto afetado também pela situação.
No seu caso, Melissa deve sempre vir à mente. Em como ela ficaria
decepcionada por descobrir que seus planos não agradaram a todos, por
exemplo.
— Vocês aceitam? — pergunto um pouco receosa.
Talvez Nicolo e Lorenzo fiquem com um pé atrás, mas dos três, Dom
sempre será o que vai me entender melhor.
— Nós estamos com Oliver no que ele escolher — enfatiza Dom. — E
se ele escolher você, nós iremos escolhê-la também.
Talvez não fosse isso o que eu esperava ouvir, mas é melhor do que
algo oposto, então sorrio para Dom.
É tão fácil ver nele um pouco de Melissa, se não fosse por ela ter sido
três anos mais nova, diria até que seria a sua irmã gêmea.
— Obrigada, Dom.
Eu sempre soube que não precisava da aprovação de ninguém, mas
aquilo era importante.
Se Oliver quisesse mesmo que eu convivesse com ele, teria que fazer
muita gente me engolir.
Oliver me escolheu e ele irá enfrentar qualquer um que se opor a isso,
não por eu ser a mãe do seu filho, mas porque ele me escolheu.
Sou a mulher que ele tem deixado nas entrelinhas que irá se privilegiar
de conhecer o seu coração melhor e seus esforços não têm sido tão em vão
assim, além de que não há nada mais que o irrite tanto, do que descobrir que
posso ser muito subestimada por, como me disseram certa vez, não ser a sua
altura.
Tenho mais certeza disso quando descubro sobre a demissão das
outras funcionárias. É tão óbvio o motivo, que chega a ser de fato,
decepcionante. Eu tentei mesmo me aproximar, mas não deu muito certo. Se
dependesse delas, eu jamais seria bem-vinda naquela casa.
Mas Oliver mostrou quem segura a coleira e deu suas ordens finais.

Matilde me chama para conversar assim que volto do passeio, que foi
mais rápido do que eu esperava.
Falta poucas horas até que Oliver chegue, então está só nós quatro na
mansão, Matilde, Jorge, Oli e eu. É estranho que a mansão fique sem as
outras funcionárias, pois ela fica, de fato, vazia.
— Acho que você já percebeu que as funcionárias foram dispensadas
— diz evitando “o senhorita”, que costuma usar apenas na presença de
Oliver para causar uma boa impressão. — O senhor Oliver não pensou duas
vezes quando ele as flagrou sendo desleais a ele, ao não cumprirem o
combinado, onde todos deveriam oferecer um bom tratamento a você.
Pisco diversas vezes, pois mal sei o que falar.
Matilde continua ao perceber que estou visivelmente chocada com
tudo aquilo.
— Embora tenham agido com maledicência, aquelas mulheres são
mães de família, e os serviços que ofereciam a Oliver sempre ajudaram a
darem uma vida melhor para as suas crianças. Eu poderia ter freado todos
esses comentários antes que se tornassem uma bola de neve e acontecesse o
que aconteceu, mas...
A interrompo.
— Mas a senhora me considerava uma intrusa, usurpando o lugar de
Melissa, não é mesmo? Sei que nutria um enorme carinho por ela, assim
como eu. A Melissa se mostrou minha amiga de um jeito que mais ninguém
fez antes, eu jamais tentaria substituí-la, mas eu mereço respeito como
qualquer pessoa e é só o que eu peço. Sei que não posso pedir que gostem de
mim, mas viver em um ambiente em que se é detestada não é fácil. Apenas
respeito é o que eu peço.
A governanta parece surpresa com as minhas palavras, pois como eu
disse, ninguém está pronto quando o rostinho bonito e meigo, se torna um
furacão. E para defender a minha dignidade, sei exatamente onde enfiar as
minhas garras.
— Por que me procurou, Matilde? — pergunto quando ela continua em
silêncio. — Vir atrás de mim nunca foi uma opção para você.
Ela tenta disfarçar o incômodo mantendo a postura rígida, mas logo me
responde:
— Preciso que você converse com o senhor Oliver e o convença a
mudar de ideia.
— Então você precisa da minha ajuda? — recapitulo o que ela quis
dizer, porque seu orgulho não a deixava confessar isso.
— Isso, mas apenas se puder. Sei que ser alvo de fofocas e reprovação
podem impedi-la de querer fazer isso. Ninguém poderá censurá-la e...
Não quero ouvir essas desculpas agora, como se ela de fato se
importasse com o que eu sinto.
— Eu conversarei com ele no jantar hoje à noite. Vou fazer o melhor
que eu posso, mas não sei se meu pedido poderá reverter a situação, dona
Matilde. Acho que pode estar superestimando o quanto minha opinião é
importante para o senhor Oliver.
Ela concorda.
— Agradeço, senhorita Isis, mas acredite em mim, não estou
superestimando seu poder de persuasão. Talvez só você não tenha percebido
isso ainda. Eu conheço o senhor Oliver há quinze anos e nunca o vi defender
ninguém como vi na noite passada.
Fico séria, pois preciso manter a postura de inabalável quando ela
consegue tocar num ponto que me tira o fôlego.
“Oliver jamais defendeu alguém como ele me defende.”
Por que estou vibrando e gritando com isso internamente, mesmo?
Só sei que preciso sair do campo de visão dela para refletir sobre isso
melhor, pois já me bastava Muriel no meu pé dizendo o quão apaixonada por
Oliver eu estou.
E sinceramente?
Se continuar desse jeito, talvez nem demore.
Mas são sentimentos mistos.
Não sou nenhuma irreverente e impassível, e o que Matilde diz me
toca profundamente, por isso sei que eu deveria tentar alguma coisa, que ao
menos Oliver não as desamparem, ou que desse uma segunda chance. Mas
também não sei se eu aguentaria conviver sob o mesmo teto com pessoas que
eu sei que não me suportam.
Essa situação precisa ser resolvida, ou ao menos ser pensada com
mais calma. Sinto que devo isso, mesmo que tenham perdido o emprego
indiretamente por minha causa. Pelo menos Matilde me deu a segurança de
que Oliver confia em mim, e o quanto pode fazer as minhas vontades.
Sendo isso ou não, terei que tentar.

Oliver me deixa um vestido novo sobre a cama, está até com a etiqueta
da loja ainda. Ele quer que eu saiba que foi um presente e que acabou de
comprar.
A peça é tão bonita, com ótimo gosto, que me pergunto se foi ele
mesmo que escolheu, ou se contratou alguém para isso.
Mas devo lembrar de suas palavras, seria uma honra para ele escolher
a dedo presentes para mim. Oliver ama presentear alguém importante,
pessoas que gosta. Isso pode significar tanta coisa, mas ele quer que eu
esteja excepcionalmente bela esta noite.
O vestido é na cor vinho, de cetim e plissado. Tão elegante, sensual e
romântico, o que só fertiliza a minha imaginação sobre aquilo ser um
encontro. Preciso me arrumar cedo, antes mesmo da babá chegar. Já deixei
tudo pronto para Oli, e devo lembrá-la de todas as coisas que não pode
hesitar em fazer, mas perco o sentido de tudo quando estou descendo para o
vestíbulo da mansão.
No meio do caminho, no pé da escada, a minha espera está Oliver, tão
lindo e exuberante.
Acho que não posso com sua magnitude masculina, mas é exatamente
ela que me atrai até ele.
Desço degrau por degrau, até estar de frente para ele, com os olhos
vidrados nos dele, porque se eu vacilar por um segundo e olhar para baixo,
perco tudo.
Ele naquela roupa social, com o chamativo relógio de ouro brilhando
em seu pulso, o cheiro instigante da sua loção pós-barba e do cabelo negro
escovado.
Aí, nem sei o que pensar!
Estou tão sem palavras quanto ele, mas Oliver tem mais autocontrole,
e por isso, sorri.
— Eu nunca vi olhos tão expressivos quanto os seus, Isis Mancini —
declara com a voz aveludada, que desliza por dentro de mim.
— Não sei o que eles podem estar expressando, senhor Oliver. —
Tento devolver no mesmo tom, mas soou apenas como uma garota submissa,
o esperando me dar algo.
Ele pega a minha mão direita e deposita um beijo ali.
— Eles estão querendo a mesma coisa que eu.
Arfo.
Não parece ser nenhuma surpresa, mas é surreal que este homem esteja
de fato, jogando charme para mim.
— Então me diga o que você quer — ordeno e ele sorri de lado.
Atrás de Oliver, Matilde abre a porta e uma mulher quase da idade
dela chega, maravilhada demais com a mansão.
É a babá.
— Espero não ter que contá-la, mas sim, mostrá-la.
Aquilo soa como a promessa de algo irresistível.
Nos encaminhamos em direção a porta da garagem, mas não sem
falarmos com a babá primeiro.
Passo todas as informações a ela, Oli ficou dormindo e em algumas
horas acordará com fome e querendo brincar.
Oliver pede para ela e ninguém ali hesitar em ligar, caso alguma coisa
aconteça.
É o nosso primeiro vale night desde que Oli nasceu.
É a primeira vez que saímos e não o levamos. A sua ausência é notória
e quase como uma lacuna nos primeiros minutos, mas Oliver foi esperto. Ele
escolhe o seu Porsche cinza, onde nunca andou comigo ou com Oli; o carro é
elegante e luxuoso, mas com apenas dois lugares, e se mostra uma
verdadeira máquina potente quando desliza rápido pelas ruas de
Florianópolis. É tão intimidador, mas tudo aquilo me deixa excitada, não vou
negar.
Começo a querer o peso da mão de Oli sobre a minha coxa, deslizando
para baixo cada vez mais até encontrar minha intimidade, que queima por
ele.
Ah, Deus!
Tento me concentrar com a música que toca na rádio, mas até isso
parece fazer parte de um plano maquiavélico para me deixar tão lasciva.
Fico muito envergonhada quando Oliver percebe algo de errado
comigo, e deixa para perguntar quando paramos no segundo sinal vermelho.
— Você está bem? Parece inquieta.
Pisco e balbucio enquanto penso numa resposta decente.
— Não estou acostumada a carros tão velozes. — É uma meia
verdade.
— Mas está curtindo? — Seu polegar acaricia sutilmente a ponta do
meu queixo, e olho profundamente para ele. — Você parece tensa — comenta
baixando agora os seus dedos em direção ao meu ombro, o massageando.
— Faz tempo que não saio assim com alguém, principalmente alguém
como você.
— Como eu? — repete se inclinando para mais perto, embora o
interior do carro fosse tão estreito, que estivéssemos perto um do outro o
suficiente. — O que tem um cara como eu, Isis?
Respiro fundo.
Meu nome em sua boca soa tão sensual, que meu corpo não aguenta.
— Ah, você sabe... Rico, alguns anos mais velho...
Eu não ia dizer o resto, porém, Oliver me deixa sem chão ao
completar:
— Porque eu sou GG? Gato e gostoso... Impossível de resistir? —
sibila aquelas palavras tão familiares para mim, e que ao ver pelo seu rosto,
ele sabia que eu sabia de onde elas haviam saído.
Meu pai do céu!
— Você... Você estava ouvindo a minha conversa com Muriel! —
exaspero e ele acha graça.
— Talvez algumas partes, como essa — confessa sem medo e fico com
vontade de enterrar a minha cara em algum lugar. Ele percebe isso, pois tenta
me confortar: — Não se preocupa, eu gostei.
Sorrio desdenhosa.
— É claro que gostou. Quem não gostaria de ser um GG?
Céus!
Eu mataria as minhas amigas do ensino médio por ter me ensinado essa
sigla safada!
— Você é uma GG? — pergunta e fico em silêncio, tempo suficiente
para o sinal voltar a ficar verde.
Oliver volta a dirigir, sem ainda ter a minha resposta.
Fico acanhada, acho que nunca fui de fato explorada como mulher.
Meu antigo namorado era um banana, nem sexo oral em mim ele gostava de
fazer.
Meu Deus, como Oliver riria de mim ao saber disso!
Ou talvez, ele sentisse tanta pena que resolvesse me dar as melhores
experiências.
Será que ele faria mesmo isso?
Às vezes o acho tão longe da minha realidade, que todas as coisas que
me diz parece um monte de ilusão.
Quando chegamos ao restaurante francês que ele me leva na área nobre
da cidade e me ajuda a sair do carro, Oliver diz baixinho:
— Eu acho que você é uma gata. Mas seria muito imprudente chamá-la
de gostosa, se nunca a provei antes.
Em meio a noite fria, arfo e minha espinha se enrijece.
Um tempo atrás, eu não entenderia o motivo de suas palavras, mas
logo depois que confessamos sentir atração um pelo outro, foi a abertura
suficiente para este tipo de conversa e não estou incomodada. Na verdade,
até gosto.
— Achei que não precisava ser no sentido literal da palavra.
— Eu gosto de tirar prova de tudo que qualifico, Isis.
Aceno.
Droga, o que eu poderia falar?
— Ah, parece justo. — É horrível o que digo, mas é o melhor que
consigo.
Talvez as palavras de Oliver reflitam muito no lugar em que ele me
leva, pois o restaurante é cinco estrelas, e ele já havia reservado uma mesa
para nós dois, no melhor lugar possível.
O ambiente é chique, muito refinado e toda a decoração faz parecer
que estamos com um pezinho na França. Para dar mais credibilidade,
o sommelier tem sotaque francês, e parece conhecer Oliver, que pede o
melhor vinho do restaurante.
Tento fingir costume, mas é difícil.
Nunca estive em um lugar tão chique quanto este. Todo mundo ali
parece ter uma vida perfeita, e nem se importa em gastar tanto num prato só.
Oliver tenta me relaxar quanto a isto e pede para eu curtir. É o que
faço, até porque ele tenta me distrair de todas as formas até que eu me sinta à
vontade, e eu sempre admirei os seus esforços. Mas depois da segunda taça
e da entrada com bolinhos de carne e pães assados com ervas, já até esqueço
do lugar.
A presença de Oliver faz tudo parecer único e perfeito, e é nisso que
eu me agarro.
Conversamos sobre tudo.
Descubro que ele e os amigos estudaram juntos em um internato
italiano, e que Oliver assumiu a Giordano S.A quando tinha apenas 29 anos.
Foi um desafio em tanto para ele.
Seu primeiro emprego foi na mecânica de um tio distante, só para
saber como era a área administrativa. Foi aí que ele percebeu que era
melhor liderar do que ser subordinado.
Melissa foi a sua melhor amiga, antes de ser a sua namorada e futura
mulher.
Por alguma razão, é mais interessante ouvir sua história de vida do que
falar da minha. Acho algo excepcionalmente dramático para ter que abordar
num jantar como esse.
Claro que ter perdido os pais e a mulher não é nada convencional, mas
não quero ter que mudar o ritmo da conversa para as coisas chatas que
aconteceram na minha vida. Por isso, mudo o rumo para algo curioso e que
interessa a nós dois.
— Fiquei sabendo o que aconteceu com as funcionárias, Matilde me
contou.
— Ela foi bem rápida, não esperava que fosse atrás de você —
argumenta após um longo gole em seu vinho.
— Eu também não. Mas que bom que foi — alego e ele me olha de um
jeito especulativo. — Aquelas mulheres precisam do trabalho, Oliver. Elas
têm família para criar e estão há tanto tempo trabalhando para você...
Ele me interrompe logo em seguida.
— Deveriam ter pensado nisso antes de se comportarem daquela
maneira. Imagino que seja Matilde a implantar essas ideias na sua cabeça,
não é?
— Não preciso de pessoas me influenciando para tomar as minhas
próprias decisões — me mantenho firme e ele me escuta. — Se eu resolvi
tocar neste assunto com você, é porque concordo com ela. Você deveria
reconsiderar e chamá-las de volta.
Oliver me avalia cautelosamente.
Sei o que ele está pensando.
Ele se encosta na cadeira e torna a sua expressão impassível diante da
minha firmeza.
— Está certa desta decisão, mesmo sabendo que elas foram demitidas
porque foram flagradas falando coisas horríveis de você? — Ele parece
impaciente, mas a sua pergunta tinha um propósito além da resposta óbvia.
— Não sou eu quem tomo decisões aqui, eu não sou a chefe. Mas tenho
princípios, Oliver, e são os mesmos que levo para a sala de aula. Eu não sou
melhor que ninguém, e ninguém é melhor que eu, mas eu sempre estenderei a
mão aos que necessitam — friso com determinação aguçada.
O CEO implacável não fala nada pelos próximos segundos, parece
pensar com afinco em minhas palavras e me pergunto se Matilde tinha razão,
afinal.
Quanto poder de persuasão eu tenho sobre Oliver?
Será que estou num nível de prioridade tão grande, que ele prefere
considerar a minha palavra, do que a dele?
Sou puxada desses pensamentos quando ele chega a uma conclusão.
Oliver volta a se inclinar para mais perto da mesa, diminuindo a
distância entre nós.
— Eu não esperava por isso, Isis. Ao mesmo tempo que não entendo,
acho uma bela atitude sua, e que me faz admirá-la mais ainda. Pode ter
certeza que irei pensar melhor no assunto — declara e me sinto aliviada,
dando até mesmo um sorriso triunfante.
— Obrigada, isso significa muito para mim — ressalto.
E significa mesmo.
Elas poderiam estar falando de mim e foram demitidas por isso. Entrei
ali subitamente, embora eu não entendesse os xingamentos, entendia a
confusão e incompreensão que lhes rondavam. Por isso, acredito que elas
merecem uma segunda chance.
Mas Oliver não facilita as coisas.
— Porém... — ressalta mais sério e acho que podia ser algo grave. —
Quero dormir abraçado a você hoje à noite.
— O que? — pergunto de imediato, expressando o meu espanto.
— Você está linda demais, tem uma personalidade incrível e vai ser
horrível para mim ter que me deitar na mesma cama que você esta noite e
não poder dormir, nem sequer, sentindo o seu cheiro — declara com ternura.
O meu sangue congela.
Por essa eu não esperava!
Eu podia esperar qualquer reação de Oliver, menos essa, onde ele se
mostra mais atraído por mim, mal podendo retrair suas vontades, as
transformando em barganhas que não poderia negar pelo simples fato de ser
tão tentadora.
— O que você me diz?
Eu queria dizer que para isso, não precisava ter acordo nenhum.
Eu dormiria abraçada a ele, sem me propor nada em troca.
Mas, putz!
Como isso poderia exatamente terminar?
As coisas ficaram bem quentes a caminho do restaurante, nada seria
diferente de volta para a mansão. Talvez a tensão fosse o dobro, agora, pois
fico imaginando seus braços envolta de mim.
— Ok, Oliver Giordano. Você pode dormir agarradinho comigo hoje.
Não recuo e isso o deixa feliz.
Mas confesso que também fico.

Não sei quais eram as intenções de Oliver ao dormir agarrado comigo.


Talvez ele me levasse para o seu quarto, em algum momento, ou talvez ele
estivesse tão carente, que só queria uma conchinha para dormir, mesmo. No
entanto, não saberei até onde aquela aproximação poderia nos levar.
Um imprevisto fofo e chorão tomou toda a nossa atenção naquela noite,
e no que se estenderia por mais dias da semana.
Descobrimos que o refluxo acontecia devido Oli ter intolerância à
lactose, no começo mudei toda minha alimentação, mas não deu muito certo e
tivemos que passar a dar uma fórmula e fazê-lo pegar a mamadeira ao invés
do peito não foi nada fácil. Oliver demonstra ser bastante atencioso ao fazer
as obrigações simples de pai. Mas nada me dá mais orgulho quando ele
lembra que estou cansada e me diz que está tudo bem, que ele vai cuidar do
bebê, porque é a hora dele.
Isso me faz ter certeza de que Melissa não falhou em suas decisões.
ISIS

Eu queria poder filmar a reação do meu pai e de Muriel quando eles


passaram pela enorme porta da entrada da mansão de Oliver. Fico parada no
pé da escada para recebê-los, ao lado de uma mesinha redonda de madeira
que compõe a decoração do vestíbulo.
Um dia antes, Oliver me levou a uma floricultura, pediu para que eu
escolhesse as flores para pôr nos jarros que dão um charme a sua casa, pois
as que tinham já estavam murchas.
Descobri que ele nunca havia feito isso antes, e queria que eu desse
meu toque a sua casa.
Era um convite simples, que normalmente seria considerado banal.
Mas eu sabia o que ele estava fazendo; entendi mesmo as intenções de
Oliver, que queria que eu deixasse a sua mansão um pouco mais com a minha
cara, assim poderíamos conviver em harmonia.
Fazer daquele lugar um lar outra vez.
Escolhi girassóis, pois eles abrem quando há luz, e queria trazer essa
mensagem para o lar de Oliver. A luz que Oli trouxe para sua vida voltou a
iluminar tudo ao seu redor.
Matilde mostra ao meu pai e Muriel o caminho, mas eles já me viram,
só estão abobalhados demais com cada detalhe, da parede de pé duplo onde
pende um lustre de vidro soprado, aos móveis que parecem terem sidos
tirados daquelas revistas de arquitetura e designer de interiores. Meu pai
sempre foi um homem muito simples, nunca ligou para o luxo, e acho que
deve estar um pouco assustado com a realidade em que me encontro agora.
Muriel parece viajar, isso é no mínimo o que sempre sonhamos,
mesmo que o nosso salário não cubra nem um dos jarros.
— Puxa, eu sabia que o senhor Oliver era rico, mas não tão rico assim
— papai enfatiza assim que se aproxima, dispensando os cumprimentos
formais para começo de conversa.
— É o mínimo que se pode esperar de um cara que saiu na Forbes
como um dos mais ricos do país — Muriel comenta, tocando o encosto de
um sofá.
— Isso é sério? — pergunto surpresa.
Muriel me lança um olhar entediante.
— Você está praticamente casada com o cara, deveria saber. Não faz
muito tempo, se bem me lembro.
— Não estamos casados — ressalto com veemência ruborizada.
Não gosto de mencionar os planos de Oliver a ninguém, mas todo
mundo parece pensar a mesma coisa que ele, tanto que fico me perguntando
se é a coisa mais certa a se fazer, de verdade.
Papai me abraça mesmo assim, sorridente e vibrante.
— Que bom revê-la, minha Isis. Como estão as coisas?
— Vão bem, pai. E com o senhor? — Seguro seus cotovelos enquanto
suas mãos repousam em meus braços.
— Ah, tem sido melhor agora que as coisas estão mais claras, e que
estou a vendo com mais frequência. Onde está o meu querido netinho? —
Seus olhos brilham só de mencionar o bebê, que já está um bebezão.
— Está lá atrás com o pai e os convidados dele.
Muriel faz uma careta.
— Mais gente chique e chata para lidar? — pergunta.
— Cuidado, Muriel. Você pode acabar mordendo a língua.
— Ah, vai defendê-los agora? — pergunta cruzando os braços em
indiferença, me olhando dos pés a cabeça em reprovação. — Veja só, já está
até se vestindo como eles.
Cruzo os braços.
Não há nada de diferente em minha roupa, exceto pela minha saída de
banho parecer a coisa mais cara que já vesti até agora, e temo que seja
mesmo. Oliver chega com esses presentes para mim, e eu não consigo dizer
não, porque gosto e sei que ele fica feliz quando aceito de bom agrado.
No início pareceu errado, mas agora eu gosto.
Eu entendo o motivo de Muriel estar assim, mas ao mesmo tempo
parece desnecessário demais.
— Vem cá, qual o seu problema?
— Eu que pergunto, o que você não está me contando, Isis? — O seu
tom autoritário muda para algo mais magoado e me acanho.
O meu pai fica ali entre nós duas, observando toda discussão. Percebo
que desde a nossa visita a eles em Blumenau, falei bem pouco com Muriel, e
a privei de muita coisa que aconteceu, principalmente, comigo.
Houve umas mudanças e alguns reconhecimentos que eu ainda não
acreditava, mas que talvez com a ajuda dela fosse possível.
— A gente conversa sobre isso outra hora. Venham, vamos conhecer o
pessoal — convido os dois para a área externa onde os outros estão, e eles
não hesitam, apesar de tudo.
Passamos por Matilde que anda mais reclusa, embora tenha aprendido
a me tratar como gente desde que as outras funcionárias foram suspensas.
Ainda não tenho muitas notícias sobre elas, Oliver está à frente de toda a
situação, mas por ora, ele precisou contratar substitutas temporárias.
Todos estão na área da churrasqueira, onde nada mais é do que uma
segunda cozinha mais intimista e descolada, exatamente para receber os
amigos num sábado à tarde.
Os meninos estão achando graça de alguma coisa que Nicolo está
tentando explicar, mas Lorenzo e Dom já estão tirando sarro da sua cara,
enquanto as meninas estão paparicando Oli, que está uma gracinha de sunga
e chapeuzinho, tanto que elas já tiraram intermináveis fotos dele.
Oliver está no comando da churrasqueira, mas abre um sorriso assim
que nos vê se aproximando.
Está um dia relativamente quente em Florianópolis, a previsão para os
próximos dias é de chuva, então resolvemos aproveitar a piscina.
Oliver está só de bermuda, exibindo a bela barriga e as tatuagens que
envolvem o seu braço, marcas de uma adolescência rebelde quando deixou o
internato na Itália. Tenho tentado não olhar demais e ficar contando os
gominhos da sua barriga sarada, principalmente depois que Júlia me flagrou
e deu uma risadinha, mas é difícil.
Oliver é muita tentação, principalmente quando ele chega perto, como
agora.
— Aí estão eles, senhor Daniel e Muriel — cumprimenta os dois. — É
um prazer recebê-los em minha casa.
— O senhor está sendo modesto. Casa, é o que eu tenho em Blumenau,
isso aqui é um castelo, senhor Oliver! — papai declara chocado.
— Por favor, me chame apenas de Oliver — pede baixinho e meu pai
acena. — Ah, estes são os meus amigos.
Oliver apresenta um por um, ressaltando a profissão dos meninos e
suas respectivas noivas.
Lembro que quando Jorge ligou avisando que estavam chegando,
Oliver pediu aos amigos que pegassem leve e não causasse uma má
impressão ao meu pai, pois ele queria demonstrar que tanto Isis quanto Oli
estavam em boas mãos.
— Espero que se sintam à vontade — O CEO ressalta com cautela,
para que eles saibam que é de coração.
— Ninguém avisou que seria um almoço na piscina — Muriel sussurra
no meu ouvido, mas Oliver ouve e ri.
Olho para as suas vestes casuais, calça jeans, botas e uma jaqueta de
couro sobre a blusa branca.
— Foi uma decisão de última hora, mas vamos lá em cima, posso te
emprestar um biquíni. — A pego pela mão e a minha prima não hesita, pois
sabe que será o momento perfeito para conversarmos.
Deixo papai com Oliver e os amigos dele.
Papai é um homem desinibido socialmente, na época em que ainda era
taxista, os passageiros o amavam pelo simples fato dele ser extremamente
carismático. E felizmente, não era algo que ele limitava somente na área de
trabalho; papai sempre se deu bem com todo mundo, e agora não seria
diferente.
Antes de entrar, dou uma rápida olhada por cima do ombro só para me
certificar disso, e acabo o vendo já com Oli nos braços enquanto as meninas
se encantam por ele ser um senhor tão entusiasmado com o neto, mesmo
depois de toda história envolvendo a fertilização e Oliver.
Guio Muriel pela casa como se cada cômodo dali fosse meu, mas não
tem como não se acostumar quando já estou aqui há muito tempo. Mesmo
assim, Oliver ainda dorme no meu quarto, e nesses últimos dias ele tem sido
extremamente necessário ao mostrar seu desempenho como pai, por termos
que lidar com Oli e a seus enjoos de bebê por causa do desmame do peito.
Domenico nos assegurou de que é normal, e o que nos restas é ter paciência
até ele se acostumar a mamadeira.
Levo Muriel para o closet, onde já deixei umas peças de roupas
organizadas ali e ela não deixa de reparar nisso.
— Caramba, você já até marcou território no lugar.
Viro para ela quando alcanço a gaveta onde tem as peças de biquíni.
— Oliver achou que era melhor assim, já que vou ficar por mais tempo
— digo e com um leve empurrão, a gaveta abre sutilmente, deslizando para
fora.
— Mais tempo? — repete e cruza os braços na defensiva. — Isis, o
que aconteceu com os quatro meses? Eu não sabia que isso ia durar tanto
tempo assim!
— Um ano, provavelmente — corrijo e ela engata a dizer algo, mas
sou mais rápida: — É tudo pelo Oli, Muriel. Esse foi o nosso acordo.
— E a sua vida em Blumenau? Seu emprego, seus amigos, sua
família...
— Eu sei. — Respiro fundo. — Mas vocês têm que respeitar e
compreender a minha situação também. É por isso que você está agindo de
um jeito tão estranho?
Muriel dá o braço a torcer e perde seu posto de inabalável.
— Sempre foi só nós duas, crescemos juntas quando tudo parecia que
ia dar errado para isso acontecer. E de repente você vai para longe, começa
a adotar uma vida diferente e conhecer pessoas diferentes. Floripa é longe
pra caramba de Blumenau, Isis. E tanto eu quanto o tio Daniel precisamos de
você, ainda mais agora que tem o Oli.
Me afasto da gaveta para me aproximar dela e reconhecer o que está
acontecendo. Não quero ser insensível e desconsiderar a nossa história
juntas. Tanto Muriel quanto eu, fomos negligenciadas pelas nossas próprias
mães, crescemos tendo a única certeza de que a nossa amizade seria
inquebrável, e agora, estou me ausentando de um jeito que nunca fiz antes.
— Oliver já entrou nos termos legais sobre compartilhar a guarda de
Oli comigo, e quando o meu tempo aqui se exceder, voltarei para Blumenau
— tento assegurar, mas algo em mim se retrai com a ideia de voltar, e isso
fica visível.
— Nem você acredita nisso, não é? Porque está apaixonada por ele —
enfatiza mais uma vez.
Eu sempre contrariei Muriel sobre isso, sempre. Mas está na hora de
ser mulher grande e assumir as coisas que sinto.
Não posso esconder por mais tempo, quando já está no modo de olhar
e de falar, o que já era esperado.
— Sim, Muriel. Você tem razão. Estou mesmo considerando aceitar a
proposta dele e ficar por mais tempo porque, como não se apaixonar por um
cara como ele? Eu estou aqui todos os dias e conheci a melhor versão dele.
— Faço uma espécie de declaração, o que a deixa surpresa. — Não posso
mais negar os fatos, estou apaixonada pelo pai do meu filho.
Talvez Muriel não estivesse esperando que eu finalmente admitisse
isso.
— Mas e ele? — pergunta.
— Não tem como saber essas coisas sem perguntar, amiga. Mas ele já
confessou estar atraído por mim, e agora que dividimos a cama, tem sido um
desafio constante!
Ela continua desconfiada e me agarro em seus braços, exibindo um
sorriso confiante que não a compra logo de início.
— Relaxa, tudo vai dar certo! Já está dando. O mais importante é que
não perderemos contato com Oli. Imagina o quão horrível isso seria?
Isso a faz se render.
— Não quero imaginar nada disso, Isis. Sei muito bem o que passamos
com nossas mães, não quero que Oli tenha o mesmo destino — argumenta. —
E eu também me preocupo de verdade com você.
— Eu sei. É por isso que além de ser minha prima, é a minha melhor
amiga. — Afago seus braços e então uno nossos corpos para um abraço
apertado.
— Não importa a distância, se ele quebrar o seu coração, venho de
Blumenau pra te ajudar a catar os caquinhos.
— Espero que isso nunca aconteça — digo estremecendo e me afasto.
— Mas as coisas têm sido boas até agora. Viu os amigos dele? Nem são tão
ruins assim, me aceitaram muito bem, juro que não são aquela gente chique e
chata das novelas.
Muriel começa a rir.
Nem a pau que eu irei falar a ela sobre as funcionárias que foram
suspensas por terem sido flagradas falando de mim pelos cotovelos. Ela já
tem problemas demais de confiança com Oliver e a sua trupe.
— É uma pena os três estarem comprometidos, são gatinhos demais —
choraminga e estapeio seu ombro.
— Você não perde uma, não é? Venha, vamos escolher um biquíni pra
você. Eles nos esperam lá embaixo.
Acabamos passando mais tempo do que gostaríamos escolhendo
biquínis, ao ponto de Matilde vir nos procurar.
Acontece que Muriel não consegue acreditar que finalmente tenho
tantos biquínis assim, mas Oli adora passar tempo na piscina, foi quando dei
o braço a torcer e resolvi ter mais opções de roupa de banho. E é por isso
que agora ela usa um lindo maiô azul turquesa.
Fico aliviada que ao descermos, Muriel fica mais relaxada e se
entrosa com os amigos de Oliver. Só que agora ela olha tudo com outros
olhos, por saber que estou apaixonada por Oliver e ele, atraído por mim; é
como se cada envolvimento nosso fosse a oportunidade perfeita para ela
estudar cada reação nossa, e por isso, vez ou outra, pego Muriel me olhando
chocada, como se houvesse faíscas entre Oliver e eu.
Mas acho que não sei lidar com outra coisa, a não ser em como meu
pai tem se dado super bem com Oliver. Eles não se desgrudam, estão sempre
juntos, principalmente com o bebê.
— ... É incrível como funciona mesmo!
Pego o fim da conversa de Oliver com meu pai, embasbacado.
— Eu usava muito isso com ela, por isso não é nenhuma surpresa que
Isis saiba, pelo menos, as melhores músicas dos Beatles, que são quase
todas — papai justifica.
— Não, é alguma coisa na voz dela — Oliver retrai. — Eu já tentei, e
foi horrível! Só fez com que ele chorasse mais ainda!
Lembro do ocorrido e começo a rir. Aconteceu quando Oliver me
deixou dormindo para cuidar de Oli, que havia acordado no meio da noite.
Eu não estava com o sono tão pesado, por isso não dormi de imediato, então
ouvi a tentativa sem êxito de Oliver em tentar acalmar o nosso filho, ao
cantar a música do Beatles. Mas como ele disse, foi horrível. Até eu queria
que ele parasse, mas foi muito fofo e lembro com carinho.
É engraçado olhar tudo por essa lente, faz a vida parecer leve e feliz.
Principalmente quando os vejo assim, juntos.
Os três homens da minha vida.
O final de semana foi incrível e criamos mais laços ainda.
Tudo havia sido uma maravilha.
Papai e Muriel voltaram para Blumenau e as coisas pareceram mais
tranquilas agora que ambos estão a par de tudo. Mas na segunda as coisas
ficaram um pouco chatas, e me vi numa situação em que constantemente me
vejo, desde que coloquei meus pés aqui.
Não sei se isso acontece porque os amigos de Oliver
são superprotetores com ele, ou as pessoas que não sabem me aceitar com
facilidade.
Mas Oliver se atrasou, pegou trânsito na volta para casa e Lorenzo
havia chegado mais cedo para se encontrar com ele e discutirem sobre uma
viagem ao Paraná, onde Oliver visitaria a colheita. Foi o que o engenheiro
agronômico me contou quando sentou em um dos sofás confortáveis.
— Acho que vou esperar, já estou aqui mesmo. E o meu voo vai ser
daqui cinco horas, é o tempo que Oliver chegar e o trânsito maluco ficar
melhor.
— Quantas vezes você volta para Florianópolis? — pergunto curiosa,
sabendo que dentre os quatro, Lorenzo é o que não para.
— Não tem uma definição, mas venho conforme o trabalho exige. Por
exemplo, vim para o almoço que Oliver deu e hoje volto para o Paraná, mas
talvez eu volte pra cá de novo no final de semana. É muito relativo.
— Parece cansativo.
Matilde pede licença com uma bandeja onde traz café, a pedido de
Lorenzo. Eu também pedi uma xícara para poder acompanhá-lo enquanto
faço sala, e para esquentar um pouco, já que o dia hoje está frio e bastante
chuvoso.
Agradecemos o serviço dela e voltamos a ficar a sós.
— Já estou acostumado, e é uma vida que eu gosto. A Bruna também
não para. Gostamos dessa vida agitada — explica mencionando a noiva.
— E essa agitação não atrapalha? — Fico curiosa, pois apesar de dar
prioridade para nós, sei que a vida de Oliver também é bastante agitada.
— Sim, e não. Mas reconhecemos nossas responsabilidades. —
Assopra o conteúdo da xícara que está fumegante e então exibe um sorrisinho
sagaz. — Além do mais, somos só nós dois por enquanto, não temos um
bebê.
— O que quer dizer com isso?
Meneio a cabeça, observando a sua colocação e a sua aparência
menos intimidante que os outros amigos dele.
Lorenzo é o mais quieto, e isso reflete em sua beleza; um homem
centrado e que exala educação. Nicolo pode ter a aparência de um príncipe,
mas é Lorenzo quem se comporta como um, com todo aquele seu
cavalheirismo.
Dos quatro, ele também é o único a ter olhos castanho-escuros.
— Bebês podem ser um atraso, no geral. Veja só Oliver, ele era tão
centrado no trabalho, e quando descobriu Oli, é só o que ele reconhece
agora.
— Mas, era o sonho dele ser pai — defendo Oliver.
— Sim, e por isso está mais preparado para essa missão do que
Nicolo e eu, por exemplo. Dom é um pediatra, saberia tirar de letra também.
— Ah. — Balanço a cabeça, mas ainda não sei o que pensar disso.
Fico me perguntando se os amigos de Oliver acham que Oli tem sido
um empecilho para a sua vida profissional.
Lorenzo parece perceber a minha indiferença e sorri sem jeito.
— Por favor, Isis. Não me interprete mal, mas mesmo que a vida seja
de Oliver, se ela muda, nós precisamos mudar juntos. Trabalhamos para ele,
sabemos como essa roda gira.
— É claro, eu entendo, Lorenzo. E sempre foi do nosso conhecimento
que essa nova rotina seria trabalhosa para ele se adaptar, até porque Oliver é
um pai que se entrega de corpo e alma.
— Oliver sempre é bom nas coisas que faz — o amigo ressalta com
orgulho e finalmente dá um gole em seu café. — Mas e você?
— O que tem eu? — Arregalo os olhos, acho que não estou pronta
para outro interrogatório, não como o de Nicolo.
— Você tem levado uma vida muito boa aqui. Aposto que não sente
falta do trabalho.
Fico ereta e esboço um sorriso.
— Na verdade, sinto muita falta. Trabalhar com crianças têm sido a
minha rotina há tanto tempo que eu sinto falta de toda agitação. É o que eu
amo fazer.
— Então deve estar preparada para ir embora, não é? — A sua
pergunta é bastante otimista e até parece uma provocação, como se fosse a
melhor coisa a acontecer ali, quando eu finalmente juntar minhas coisas e
voltar para Blumenau.
Engulo em seco.
Mais uma vez, as suspeitas de oportunismo estão ali. Mesmo que
sutilmente, mas elas estão.
É horrível ser associada a algo do tipo, só porque sou uma mulher
simples e que entrei na vida de Oliver já mudando muita coisa,
principalmente ele.
— Eu vim sabendo que teria que voltar, mas talvez seja mais difícil do
que eu esperava — revelo e me abstenho de dizer a verdade, como quando
me abstive de dizer a Nicolo. Eles são amigos de Oliver, então ele que dê
satisfação. — Tem sido uma experiência incrível. Oli é sem dúvida uma das
melhores coisas que já me aconteceu. E Oliver também é muito legal,
Melissa disse que nos daríamos bem, mesmo.
Lorenzo estreita profundamente os olhos castanhos e apoia a xícara
sobre o pires na mesa de centro.
— Você se apegou ao bebê, mesmo sabendo que iriam se separar? —
pergunta confuso. — Como aceitou, se sabia que seria difícil?
— Eu não sabia — respaldo, sentindo o gosto do café ficar mais
amargo ainda. — Eu só queria fazer qualquer coisa que fosse suficiente para
Melissa, que demonstrasse a minha gratidão por ela ter ajudado a salvar a
vida do meu pai.
— Uau! — exaspera arqueando as sobrancelhas. — Você é muito
corajosa, Isis.
— É o que dizem, mas na verdade sempre querem dizer que sou
maluca.
— Uma corajosa maluca — completa e rimos.
Mas estou rindo para ser educada, porque cada questionamento de
Lorenzo me fere. Achei que tinha ficado claro quando Oliver deu o jantar e
contou tudo o que havia acontecido, e eu sei que houve outros momentos em
que ele precisou ser mais cirúrgico com esse assunto. Mas tanto Nicolo
quanto Lorenzo não confiam em mim o suficiente.
Não quero tirar a razão deles, mas me deixa cabisbaixa mesmo assim.
Significa que todos os esforços de Oliver para fazer com que eu seja
introduzida no seu meio social dele, não estão sendo o suficiente.
Não é como se seus amigos deixassem evidente, mas tanto Nicolo
quanto Lorenzo não se diferem muito das funcionárias que tanto suspeitam de
mim.
Desde muito nova eu lido com rejeição, então não é nada diferente.
Lorenzo mostra ser, por fim, um homem calado. Completamente na
dele, mas que levou aquela conversa à diante por conta das suas suspeitas.
Ele passou a maior parte do tempo no celular, fez algumas ligações em que
explicava que estava na casa de Oliver, e falou sobre a visita dele à
plantação.
A chuva não dava trégua, e quando Oliver chega, parece que o celular
de Lorenzo deixa de existir. O amigo o cumprimenta e Oliver fica me
observando, então sorrio para afastar qualquer resquício de que estive mal
depois da minha conversa com Lorenzo.
Tento esconder que, mesmo com seus esforços, Nicolo e Lorenzo
ainda suspeitam de mim.
— Como está você? — pergunta para mim, deixando Lorenzo em
segundo plano.
A distância entre nós dois é mínima, e sinto que ele quer fazer algum
contato físico comigo. Lorenzo fica nos olhando e isso me deixa
desconfortável.
O que estaria se passando na cabeça dele?
Será que ele acha que estou tentando seduzir seu amigo?
Que uso dessa faceta para atraí-lo, quando na verdade sou uma megera
interesseira?
Meu estômago embrulha só de pensar.
“Não sou nada disso.”
— Estou bem, e você?
— Estou um pouco cansado. O trânsito da cidade é simplesmente
ridículo. — Afunda os dedos no cabelo em claro sinal de irritação.
— Nada que um banho e tempinho com Oli não resolva — proponho e
ele sorri em aprovação, sabe do que estou falando.
Oli é o melhor remédio antiestresse.
— Sei bem. Mas tenho que conversar com esse cara antes que ele me
culpe por perder o seu voo.
— Eu jamais faria algo do tipo — Lorenzo comenta ofendido.
Oliver lança a ele um olhar sugestivo e entendo que o meu tempo ali já
deu.
— Vou lá em cima ver se Oli ainda está descansando um pouco.
— Ok. Logo irei subir também. — Se inclina e deposita um beijo na
minha bochecha.
O roçar da sua barba contra a minha pele me deixa arrepiada e um
pouco tonta, mas tento não demonstrar muito o efeito que isso tem sobre
mim. Viro rapidamente, saboreando a sensação da sua boca em contato com
a minha pele, de como seus dedos seguram a minha cintura e na demora que
ele faz propositalmente para me dar um único beijo.
Subo a escada, tentando não cair e paro na entrada do corredor para
tomar o fôlego de volta.
Algum dia, ainda irei sentir seus lábios contra os meus. Nem que seja
por um beijo roubado.

Como prometido, Oliver sobe para nos encontrar logo depois que
Lorenzo vai embora. Ele me avisa que precisará viajar para o Paraná logo,
por conta de negócios, mas também não fala mais do que isso, nem por
quanto tempo irá ficar.
Como ele já está estressado demais, acho que é justo deixá-lo curtir o
filho, que está alegre com a presença do pai. Eles brincam com o xilofone
que Nicolo deu, fazendo toda a sua intenção maléfica ir pelo ralo. Oliver já
está até pensando em comprar uma mini bateria também.
No jantar, conversamos mais sobre como foi o nosso dia. Eu como
sempre, só dedico meu tempo a Oli, e isso faz com que Oliver tenha uma
ideia, mas que ele não me conta até que estejamos de fato, disponíveis para
isso. Também nem nos apressamos, é tão bom ver Oli em sua cadeirinha de
balanço brincando com o móbile que faz barulho conforme ele aperta. Nós
dois conseguimos achar a coisa mais engraçada do mundo, principalmente
porque Oli fica frustrado muito rápido.
Não consigo entender como Lorenzo disse que bebês podem ser um
atraso, de um jeito ruim.
Bem, no início filhos podem ser uma coisa complicada, mas é fofo e
uma companhia que vale à pena. Digo isso baseado nas coisas incríveis que
tenho vivido com Oli, aprendo tanta coisa com ele.
Uma delas, é que quando ele dorme, o momento de ócio é a coisa mais
deliciosa que pode existir. Principalmente quando se é convidada para
assistir um filme com o homem que você tanto deseja.
— Você tem uma sala de cinema em casa? — pergunto quando Oliver
me conduz para uma área da casa onde nunca estive antes.
— Bem, você vai descobrir que não é uma sala de cinema de verdade,
mas pedi para deixarem o mais próximo de uma.
— Eu não duvido de que conseguiram — comento.
E realmente, Oliver tem uma sala de cinema na sua casa.
O cômodo é imenso, com três fileiras de sofás grandes que dão
facilmente para ser usados como camas. Todo o ambiente é revestido com
paredes acústicas, meia-luz e um telão enorme na parede que vai do chão ao
teto.
Oliver liga o ar-condicionado e me convida para sentar ao seu lado no
sofá da segunda fileira.
— Eu não sabia da existência dessa sala — revelo ao me sentar, ainda
maravilhada.
— Não tem graça alguma usá-la quando se é um homem sozinho.
— Mas você tem amigos para fazer companhia a você numa sessão —
desdenho.
Oliver revira os olhos e me puxa junto com ele para mais perto do
encosto, nos deixando quase deitados. Ele passa o braço por mim quando
liga o telão.
— Acontece que não é legal assistir um filme com um bando de
marmanjo. Eles trariam, no mínimo, suas mulheres, e eu acabaria sozinho.
Então eu prefiro a sua companhia do que a deles — dispara de uma forma
engraçada que me fez rir.
— E como você sabe que sou uma boa companhia para assistir um
filme? — pergunto baixinho, como se estivesse lhe contando um segredo.
Oliver me olha desacreditado.
— E se eu for a pessoa que dorme durante o filme?
Ele desaba.
— Ah, não, Isis.
Gargalho, pois a cara que Oliver faz é impagável.
— Estou só fazendo uma suposição.
Ele fica me avaliando, como se quisesse encontrar algum vestígio de
mentira na minha fala, mas ele toma outra atitude.
— Quer saber? Você escolhe o filme. — Deixa o controle na minha
mão. — Assim, você irá escolher algo que seja tão legal para você e não irá
dormir.
Olho para o controle e então para ele. Parece uma decisão inteligente,
mas agora as posições mudam.
— E se você dormir porque acabei escolhendo um filme chato? —
pergunto.
— Eu confio no seu gosto.
— Mesmo que eu escolha um filme romântico dos anos 2000? Tipo,
Um Amor Para Recordar?
Oliver me olha como se eu tivesse falado uma baboseira.
— Não apela, Isis.
— Você deixou o poder em minhas mãos. — Balanço o controle e uso
a chantagem. — É isso ou então acabo dormindo.
Seus olhos piscam lentamente, pensando no assunto. Mordo os lábios
em diversão, porque isso está sendo bem divertido. Percebo que Oliver deu
uma encarada nos meus dentes que apertam a minha boca e ele fica
hipnotizado.
— Ok. Então coloque alguma coisa romântica, com uma pitada de
safadeza pra deixar as coisas mais interessantes — ronrona, tirando
sutilmente de cima do meu ombro uma mecha do meu cabelo e quase fico
sem ar.
Quase não resisto ao seu pedido, mas penso duas vezes antes de
aceitar a sua ideia. Não quero acabar me vendo constrangida ao lado de
Oliver por causa de alguma cena muito erótica. Sei que nós dois
acabaríamos sem jeito, ou desejando muito fazer no mínimo algo parecido.
Não quero me entregar tanto, a ponto de não saber o que Oliver sente por
mim.
Às vezes temo que Muriel tenha razão, a última coisa que preciso é ser
magoada, e principalmente, por Oliver.
Então, coloco um filme romântico, estilo água com açúcar, mas Oliver
gosta, principalmente quando me mostro uma comentarista empolgante até a
metade do filme, quando pego no sono.
Oliver vai me comer viva, eu sei que vai!
Ou no mínimo desistirá de assistir filmes comigo porque dormi na
metade do primeiro filme que eu tanto aleguei ser muuuito legal. Mas não
resisti.
Eu só não lembro da parte que vim para a cama, o que me faz chegar à
conclusão de que ele me trouxe para cá em seus braços, igual a uma donzela
adormecida.
“Nossa!”
Nem consigo imaginar isso.
E depois, o que houve?
Ah, nada demais.
Ainda estou de roupa e completamente enroscada nele, o que me
assusta, embora seja algo quase comum, desde que ele pediu para dormir
abraçado comigo. Mas me pego com a cabeça em seu peito, que sobe e
desce tranquilamente. O seu coração bate cheio de paz, e isso me transmite
uma sensação muito boa, que preciso fechar os olhos e apreciar; sentir o
cheiro do seu perfume amadeirado e ouvir a sua calma respiração, bem
próxima a minha.
Noto, logo depois, que ele tem uma das mãos coladas à minha cintura,
com os dedos enterrados ali sobre o pano, querendo alcançar a minha pele.
Eu gostaria muito que fosse o caso.
Quando começo a juntar todos os detalhes, fico encarando por tempo
demais a sua boca perfeita, o calor entre minhas pernas pulsa de uma forma
totalmente diferente, e meu coração acelera.
Oliver é lindo, um homem dos sonhos, e mesmo aqui bem pertinho de
mim, é horrível não poder passar meus dedos em seu cabelo, acariciar sua
barba, fungar a curva do seu pescoço ou então beijar a boca sensual.
A sensação do seu corpo colado ao meu é tão instigante, que me pego
arqueando um pouco mais a minha perna direita que está sobre a dele. Vou
subindo, desejando passá-la para o outro lado e montar nele para sentir sua
ereção matinal. Mas me contenho.
Paro antes mesmo que eu comece a esfregar nele aquele fogo e o
acorde, com a imagem de uma tarada roçando nele enquanto dorme
serenamente.
Mas não sou de pedra.
Toda tentação contida, vem com um deslize, e como já estou perto o
bastante, apenas forço meus lábios para a frente, encontrando os seus que
são macios e quentes.
“Por Deus, que maluca que eu sou!
Isso é tão errado!”
Ele bem que poderia ter cedido, enterraria a minha língua ali e só
Deus sabe onde terminaríamos.
Putz, com Oli dormindo no berço ao lado é meio complicado.
Me levanto pedindo aos deuses para que ele não lembre nada e apenas
desejo um bom banho gelado para apagar todo fogo que me consome.
Até que ponto serei incendiada?
OLIVER

O tempo passa depressa....


O que Melissa propôs tanto para Isis quanto para mim, já não
importam mais quando nós dois chegamos a um novo acordo.
Isis e eu dividiremos a guarda de Oli, mas por ora, ela permanecerá
por mais oito meses. Talvez esse seja o tempo perfeito para aquilo que
Melissa tanto desejou existir entre a mãe de Oli e eu, mesmo assim, faço o
possível.
Como por exemplo, a convenci de levá-la até o seu, agora, antigo
emprego. Isis nem hesitou, ela estava triste e feliz ao mesmo tempo, por
fatores óbvios que graças a Deus ela não escondia mais de mim.
Na verdade, ela tem se aberto cada vez mais, expondo seu coração e a
sua alma de um jeito que me faça admirá-la mais ainda. Preciso fazer isso
em breve, mostrar que confio nela; porém, não confio muito nas minhas
emoções. Sou um homem forte e a última coisa que me fez chorar foi a morte
de Melissa, honestamente falando, eu odiaria ter que narrar todo meu
passado e desatar a armadura forte que me mantém como um homem
impassível.
Mas não me concentro nisso, Isis está nervosa e este momento é só
dela.
Ela bem que tentou deixar os pormenores resolvidos com a diretora, e
ir em um final de semana somente para assinar o papel da demissão, mas a
diretora da escolinha achou que aquilo não seria o suficiente.
"As crianças amam você. Elas vão sentir muita falta da Tia Isis'',
foram essas palavras que a mulher usou com Isis que veio me contar um dia
antes de eu propor levá-la até Blumenau e se despedir das crianças.
É claro que a nossa ida até ali também seria proveitosa para Daniel,
que veria a filha e o neto, que precisou vir conosco. Isis disse que qualquer
oportunidade de vir para sua terra natal, não hesitaria em trazer Oli, para o
avô ver.
— Acho que nunca a vi tão inquieta assim — comento quando já
estamos chegando ao município e a sua ansiedade aumenta.
Gosto de dirigir com Isis ao meu lado, curtir o momento só entre nós
dois. Mas hoje pedi que Jorge viesse dirigindo. Eu queria estar ao lado dela,
para ela, neste momento de decisão.
— A minha demissão seria menos dramática se a diretora não tivesse
dado essa ideia de eu me despedir das crianças — explica brincando com as
unhas curtas.
— Então por que concordou? — pergunto sem maldade, mas Isis pisca
sem reação em minha direção.
Ela se ajeita no banco e acho que vai me ignorar, mas de repente, lá
está ela abrindo o seu coração.
— Bom, acontece que Oli não foi a primeira criança para quem eu
cantei. Todo dia, antes das aulas começarem, eu cantava com meus alunos.
Era como se aquilo fosse nos ajudar a aguentar as próximas horas com bom
humor.
— Quem canta, seus males espantam — parafraseio o famoso ditado.
— Isso. E funcionava muito, assim como com Oli. — Reflete mais um
pouco, então conclui: — É por isso que aceitei. Todo amor e paciência que
sinto por Oli, foi algo que construí muito antes, quando me formei em
pedagogia e depois dei a minha primeira aula.
— Você ama muito o que faz, não é? — pergunto orgulhoso,
principalmente quando vejo o brilho dos seus olhos refletirem no seu
sorriso.
— Demais, Oliver.
Seguro a mão dela que está ali, livre e então deposito um beijo.
— Vai dar tudo certo. Você vai gostar também da creche da empresa
— asseguro a ela.
Devo lembrar que ela confiou bastante na oportunidade que receberia
em minha empresa. Além do mais, Isis não hesitou em sair da zona de
conforto.
Apesar de toda aparência angelical, ela gosta de se aventurar e adoro
isso nela.
Quando chegamos à instituição onde trabalha, há um pequeno
alvoroço. Isso porque o carro e Jorge, que sai para abrir a porta para nós,
chamam bastante atenção, e pessoas ali na entrada da escola não entendem o
que aquilo significa, tanto que ficam olhando com curiosidade exacerbada.
Isso deixa Isis um pouco desconfortável, mas eu já estou acostumado
com os holofotes. Além de que precisei passar primeiro no escritório e estou
usando um terno sob medida. Não era a minha intenção, mas eu sabia que
chamaria atenção, e é o que acontece, pois as mães e professoras ficam
olhando descaradamente.
Elas não ligam se estou com Oli no meu colo e Isis ao meu lado.
Alguma coisa chama atenção mais do que a cena toda. Bom, talvez
fosse a cena, mas sei bem o que deve estar se passando por aquelas mentes.
“Esse não é o cara que perdeu toda família, assumiu a empresa e
perdeu a mulher não muito tempo depois?”
É fácil saber que se trata disso, pois a minha vida se resume a essas
tragédias que marcaram o sobrenome Giordano em Santa Catarina e aos
arredores do Sul do país.
— Bom dia, meninas. Vim ver a diretora Roberta e as crianças — Isis
se pronuncia assim que alcança a entrada.
Aquele aglomerado de mulheres fica olhando, mal sabendo o que falar.
Uma até tenta, mas gagueja:
— E-ela... Está... Lá dentro... Na-na sua antiga sala... Esperando por
você. —Sorri envergonhada para mim, ao perceber o erro. — Ah, e bo-bom
dia. — Escondeu uma mecha escura do cabelo, tímida.
Isis me olha de lado e franze a testa enquanto dou de ombros. Talvez
ela me culpe depois por todo alvoroço.
Entramos e sigo Isis. Ela conhece o lugar como a palma da sua mão, e
segue em passos firmes.
A escolinha é toda colorida, com muitos desenhos de paisagens
bonitas e crianças sorridentes.
A antiga sala dela fica no segundo corredor e quando chegamos a porta
é aberta. Isis já é agraciada com um bando de crianças organizadas, que
começam a cantar Anunciação, numa versão mais calma, que parece um
sonho. Já a ouvi cantar essa para Oli também, mas é aqui que ela se
emociona, e afunda o rosto nas palmas das mãos para não ter que expor
todas as suas emoções.
É bonitinho, admito. Mas fico só pensando quando for a vez de Oli ir
para a escolinha. Ainda está muito longe, mas com certeza nos encherá de
orgulho e será um momento tão emocionante quanto agora.
— Meus amores! — diz quando eles terminam a música.
Isis se abaixa com os braços abertos e aquela onda de crianças com
sentimentos confusos sobre a ocasião, avançam em cima dela para um
abraço coletivo. Ela quase vai ao chão, mas me posiciono atrás dela para
que isso não aconteça enquanto Oli fica olhando tudo aquilo com muita
curiosidade.
— Olá, senhor Oliver, é um prazer conhecê-lo. — A diretora vem ao
meu encontro e estende a sua mão para um cumprimento que logo
correspondo.
— Olá, diretora. É um prazer conhecê-la também, e que bom que
pensou neste momento. Acho que Isis iria precisar disso antes de mudar de
instituição.
A mulher de cabelo curto e loiro abre um sorriso ao olhar toda a cena
que acontece logo ali.
— Pois é. Isis é muito querida por todos, das crianças as colegas de
trabalho, então nada melhor do que encontrá-la antes de começar uma nova
jornada.
— É claro.
Percebo que, antes mesmo de Oli, a vida de Isis já era boa. Não sei da
sua história, mas só aqui, parece que ela já tinha amor o suficiente para
colher. Isso faz com que eu tenha um pouco de pressão, pois terei de duplicar
tudo o que Isis sentia aqui.
Espero que ela goste do novo trabalho na Giordano S.A.,
principalmente, que ela goste tanto de estar comigo que não cogite em voltar,
ainda mais agora, que tem a custódia legal de Oli.
Isis se dá por vencida e senta no chão limpo com as outras crianças em
volta, umas até brigam para sentar no seu colo, mas ela escolhe a menor de
todas, que tem o cabelo preso com várias fivelas coloridas.
Ela começa a cantar uma das músicas que ama cantar para Oli se
acalmar, e pelo visto, ele não é o único que fica encantado. Testemunho um
bando de crianças que há pouco segundos fizeram um alvoroço em cima
dela, e agora, parecem hipnotizados pela doce voz da mulher.
Eu entendo, entendo mesmo. Pois até Oli e eu ficamos observando tudo
enquanto ela cria um momento de paz para seus alunos uma última vez.
Isis está chorando, ela já chega ao refrão da música com o rosto
molhado de lágrimas, mas a sua voz não vacila nunca, ela domina a arte de
cantar. A única coisa que poderei fazer, é lhe consolar da melhor maneira
possível, e fico pensando em algo que a deixe feliz.
Quando a cantoria acaba, ela limpa as lágrimas e declara:
— Amo muito vocês e espero ver todos em breve. Quero mais um
abraço.
Outra vez eles levantam e avançam para cima dela. Não vejo mais Isis,
que é camuflada por um monte de corpinhos agitados e emocionados.
Parece que Isis não quer deixar aquela parte da sua vida para trás,
embora sempre esteja na sua história. Ela prolonga a despedida, tem uma
certa dificuldade em se desapegar. Chega até mesmo a mostrar Oli para os
seus alunos.
— Era ele que tava morando dentro da sua barriga, tia Isis? — uma
garotinha pergunta e é impossível não sorrir.
— Esse que é o seu marido, tia Isis? — um garotinho pergunta parado
no meu pé, de braços cruzados com um semblante irritado.
Isis apenas me olha, afinal não temos um rótulo além de pais de Oli.
Mas o garotinho revela irritado para ela:
— Eu disse para a senhora esperar eu crescer que ia me casar com
você!
Nós dois ficamos surpresos pela chateação do garoto.
Isis não parece incomodada, parece ser normal que um garotinho se
apaixone pela sua professora de jardim infância.
Mas, porra, como não se apaixonar por ela?
Me agacho para ficar da sua altura, Oli vê o chão mais perto e fica
entusiasmado.
— Parece que a concorrência é forte, grandão — comento e isso o
deixa mais emburrado ainda.
Droga, talvez eu seja horrível para essas coisas, mas não desisto.
— Se eu me casar com ela, prometo cuidar muito bem dela para você.
Ele afrouxa um pouco a cara de durão, mas ainda não parece confiar
muito em mim.
— Então não são casados?
— Ainda não. Mas quem sabe um dia, já temos um filho juntos. —
Mostro Oli para ele.
— E você vai cuidar dela pra mim, até que eu seja bem grande e
conquiste o coração dela? — pergunta com afinco.
Mas que garotinho paquerador!
Deste tamanho e já quer me roubar a mulher que tanto quero!
Bem, talvez eu esteja a roubando dele, pois cheguei depois. Mas, puta
merda, ele é só uma criança. Até que ele realmente cresça, nem lembrará
mais desses sentimentos. É por isso que estou dando essa moral, porque se
fosse um garoto maior, bem, talvez eu o mandasse a merda.
— Sim, eu prometo que cuidarei dela — murmuro, observando a sua
reação sair de irritado, para algo esperançoso.
Ele relaxa até mesmo os braços e sorri.
— Bem, se você for cuidar dela pra mim, então é bom mesmo que se
casem!
Sorrio pelo voto de confiança.
— Pode deixar. — Fecho meus dedos em punhos, ele faz o mesmo e
então batemos em acordo.
Bem, além de Melissa, agora tenho mais uma pessoa para quem estou
devendo pedir a mão de Isis em casamento. Imagina a cara dela quando
souber disso.
Um pouco depois, já é hora de partir.
Chegamos no fim do turno matutino, então as crianças têm que ir pra
casa, assim como nós. Isis agradece toda a equipe da escolinha que lhe
acolheram e foram seus amigos durante aquela caminhada. Ninguém ousou
perguntar sobre a sua vida pessoal, talvez estivessem acanhadas por causa
da minha presença, mas se ela estivesse sozinha, duvido muito que teriam
deixado passar em branco todo interrogatório.
Deixamos a escolinha e peço para que Jorge nos leve até a casa do
Daniel, para uma rápida passada.
Dali até a casa do pai de Isis, leva uns dez minutos, e ela mantém o
bum humor e as emoções à flor da pele. Acaricio o seu cabelo, e ela
aproveita o toque para se aconchegar mais ainda a mim.
Isis solta uma respiração profunda e pesada, e me preocupo.
— Tudo bem? — pergunto.
— Sim. Estou triste que não vou ver mais as crianças, mas, isso não é
ruim. Vai passar. Foi a melhor decisão que tomei para a minha família.
Meu coração dá um leve tropeço e pego com leveza em seu queixo
para que ela olhe para mim.
— "Nossa família", é a primeira vez que se refere a nós assim — digo
com um sorriso que só tem se tornado cada vez mais frequente. — Obrigado,
querida. Gostei muito de ouvir.
As bochechas dela ficam rosadas.
— E é a primeira vez que você me chama de "querida" — rebate
sorridente. — E eu gostei muito de ouvir também.
Beijo o topo da cabeça dela e repouso minha bochecha ali.
Esta é a minha família, não importa os rótulos ou como começamos.
Todos os caminhos que estamos seguindo, nos levam para sermos uma
família unida e feliz.

O clima de animosidade foi superado na mansão. As funcionárias


substitutas foram embora quando readmiti as outras que deveriam ser
eternamente gratas a Isis e sua complacência, assim como Matilde que
implorou pela sua intercessão.
A volta foi um tanto estranha, mesmo que o perdão tenha prevalecido,
não esqueceremos o ocorrido e elas sabem disso.
Mas agora o recado finalmente parece ter sido levado a sério.
Pelos dias que seguiram, Isis é tratada como realmente deveria ter sido
desde o início. Toda noite, antes de dormirmos, pergunto a ela como tem
sido a convivência com as funcionárias.
— Matilde tem me ajudado bastante com Oli e ela vive falando sobre
como ele parece com Melissa, agora que tá bem crescidinho. E Oli gosta
dela, por incrível que pareça.
Sorrio desdenhoso.
— Ela não é uma pessoa má. Trabalhava para os meus pais, e agora
trabalha para mim. Matilde tem um legado na minha família, e sei que posso
confiar nela de olhos fechados — acrescento.
Eu sei que ela também não gostou de Isis de início, mas foi um modo
de defesa. Se eu tivesse flagrado Matilde falando mal de Isis também, teria
sido uma decisão muito difícil, mas não seria injusto com as outras. Todas
receberiam a mesma punição pelo mau-caráter no local de trabalho.
Mas Isis me mantém tranquilo, se ela que foi a vítima, age como se não
importasse com nada daquilo, decido que a melhor coisa a se fazer é seguir
seus passos, até porque temos Oli para nos preocupar a maior parte do
tempo, ele está crescendo e descobrindo novas habilidades.

Três meses depois...

Me junto com Isis no final de semana para decidirmos tornar a casa


mais segura possível para Oli, até porque com o tempo voando, ele já está
engatinhando.
Todos os objetos perigosos que poderão estar ao seu alcance, foram
retirados. E agora, cá estamos nós dois, instalando travas de segurança e
portas limitadoras no acesso a escada.
Deixamos Oli no quarto dormindo para fazermos o serviço bem-feito,
sem nenhuma distração. Entramos a noite fazendo aquilo, sentado no chão, e
confesso que demoro propositalmente, porque adoro a companhia de Isis e
em como ela acha graça porque não entendo o manual de instruções daquela
coisa.
— Você deveria pagar alguém para fazer isso, Oliver Giordano! —
provoca.
— Eu sou capaz de fazer coisas que você nem imagina, Isis Mancini.
Até mesmo como montar essa coisa complicada.
Ela olhou para as peças das travas e ri mais ainda.
— São só cercadinhos, Oliver! — Quase se engasga enquanto ri.
— Muitas coisas nessa vida parecem ser simples, até testar a sua
capacidade de realizá-las — digo olhando as imagens demonstrativas no
manual de instruções.
— Nossa, que profundo! — Faz uma careta, engatinha na minha
direção e pega o manual das minhas mãos. — Talvez mulheres sejam
melhores em fazer aquilo que os homens não conseguem.
Olho para ela com provocação.
— Definitivamente. — Olho para os cercadinhos, os que Isis já
conseguiu montar e sem ajuda do manual. — Você está indo bem, sabe? Não
precisava ter me tirado a única coisa que mantinha a minha dignidade, agora
eu pareço um bobo sem o manual.
— Você é um dramático. — Me acusa, mas sempre em tom divertido.
— Sou um simples homem. — Arqueio os ombros. — Coisas banais
como um manual de instruções me irritam.
— Eu nunca achei que você fosse um homem de sete cabeças. Você é
um cara normal pra mim, Oliver. Mas a sua vida...
Ela não completa, talvez esteja pensando numa forma menos
indelicada de tocar neste assunto.
— A sua história de vida, e o homem que você se tornou por causa
dela, com certeza o tornam um homem especial.
Pisco e contenho o sorriso bobo, mas não consigo me conter no olhar.
Com Isis me sinto aquele jovem idiota que amava expressar seus
sentimentos. Me sinto, de certa forma, confortável com isso, ainda mais de
frente para ela agora, agindo como duas pessoas normais com suas vidas
apaziguadas pelo destino que adora fazer gracinhas.
Me encosto na parede e cruzo os braços, a olhando com atenção
enquanto tenta disfarçar a timidez que lhe cobriu por ter revelado aquilo.
— E o que fez de você uma mulher forte? — pergunto curioso. —
Porque você é mais do que um rostinho bonito e pura sensibilidade, Isis.
Acho que nunca conheci alguém tão forte e determinada igual a você. Você
parece um anjo de guerra.
Ela sorri com a minha comparação, mas é o que eu acho.
Isis parece um anjo, lhe faltando apenas as asas brancas. No entanto,
ela me surpreende muito, quando demonstra ser uma mulher valente e firme
em tudo o que faz, pensa e decide.
— Bem, talvez você não saiba, mas eu sou adotada — revela e meu
queixo cai sem reação melhor.
— Porra, como é? — Fico tão estupefato que ela acha engraçado a
minha confusão exagerada.
— Isso mesmo. A minha mãe biológica faleceu quando eu era ainda
uma bebezinha. Ela teve câncer e morreu por falta de doador de medula
óssea. Por isso resolvi doar a cada seis meses — diz com tranquilidade de
olhos baixo.
Eu não conseguia ver os sentimentos que lhe transpassava naquele
momento.
— Mas, o meu pai, que era irmão dela, me adotou, e a mulher dele na
época se declarou como a minha mãe adotiva, mas, sei lá... — Dá de ombros
e levanta o olhar opaco e acomodado, aquela história já não lhe afetava tanto
quanto antes. — Por alguma razão ela se arrependeu, e então meu pai pediu
divórcio porque ele amava mais a mim do que ela. Desde então sempre
fomos só nós dois.
— Nossa... — digo abismado.
Nunca poderia imaginar que Isis passou por essa negligência desde
muito cedo; por isso que a rejeição que ela presenciou desde que chegou
aqui, não foi muito diferente do que ela vivenciou quando criança.
— O mais engraçado, pra não dizer trágico, é que Muriel é filha da
irmã da ex-mulher do meu pai. Daniel e Alonso são os únicos irmãos da
minha mãe, e eles conheceram as duas irmãs numa noitada. Aí aconteceu
tudo isso, e a mãe da Muriel ficou ressentida. O meu tio também era louco
para ser pai de uma menina, e aconteceu que ele deu tanto amor para Muriel,
que a própria mãe dela supriu muito ciúme.
Pisco atordoado.
Que diabos!
Eu não esperava conhecer uma história tão doida quanto essa.
— Então Muriel também cresceu sendo negligenciada pela própria
mãe? — pergunto curioso e ela assente. — Nossa. Ok, você ganhou. Estou
realmente abismado com a história de vocês.
— Não é uma competição, seu bobo! — Atira o papel do manual de
instruções e o deixo de lado.
Seu sorriso morre logo em seguida, a deixando mais séria do que
antes.
— Mas eu sei que a minha não chega nem perto da sua. Eu não queria,
mas naquele dia na escola, ouvi comentários a respeito. Tipo, todo mundo
sabe, eu acho.
Dou um sorriso fraco.
— O Sul todo deve saber. — Admito, sendo dilacerado pelas temíveis
lembranças que sempre me acompanharão. — Quando uma gangue invade a
sua casa e, além de levar tudo o que tinha no cofre ainda mata a sua família a
sangue frio, certamente vai ser uma história que todos irão lembrar.
Isis contrai o semblante, estremecendo.
“Ela lembra.”
Era nova demais, mas com certeza deve lembrar ao menos, das fotos
horríveis que circularam na internet e nos tabloides naquela época.
— Com certeza devem lembrar também porque você foi o único a
permanecer vivo — ressalta como se aquilo fosse um milagre.
Mas meu coração bate lentamente e meu sangue congela. Desvio meus
olhos de Isis, para que ela não encontre a escuridão que me atormentou por
tanto tempo, não quero assustá-la.
— Não é algo do qual me orgulho, querida — revelo com a voz
carregada de punição. — Eu me salvei porque não estava em casa naquela
noite, estava badalando, gastando dinheiro com bebidas e mulheres. Eu tinha
24 anos, ainda morava com os meus pais porque assim teria menos
responsabilidades. Era um cretino de primeira! — rosno a última frase com
nojo de mim mesmo.
Aperto meus dedos uns contra os outros, para conter aquela raiva que
senti por tanto tempo de mim mesmo.
— Fui forçado a lidar com as responsabilidades que um dia seriam
minhas, mas não daquela forma. Com sangue exposto, um crime brutal que
me deixou órfão das únicas pessoas que me amavam. — Estremeço só de
falar.
Isis percebe a minha perturbação e avança na minha direção,
completamente afetada pela minha terrível história de vida.
— Eu me casei com Melissa anos depois, quando entendemos que não
vivíamos um sem o outro, mas a empresa veio a ser completamente minha
aos 29 anos, quando eu aparentava ter responsabilidade o suficiente para
isso. Quando eu parecia psicologicamente e emocionalmente pronto para
exercer o cargo de CEO.
Respiro fundo.
Puta merda!
Como chegamos a esse assunto lúgubre mesmo?
Estávamos tão animados, e agora, Isis me olha com uma cara triste, e
tem lágrimas se acumulando em seus olhos. De repente me acho um idiota
por tê-la perturbado com os meus problemas.
No entanto, inesperadamente, ela afaga os meus braços, fazendo
carinho.
— Você não está mais sozinho, Oliver — Isis pronuncia com desvelo.
A sua voz acaricia dentro de mim, bem fundo, atingindo meus pontos
vitais.
— Eu sei, tenho Oli e você aqui comigo — digo com o coração
batendo na garganta, mas não parece a coisa mais inteligente a se dizer
quando Isis franze a testa, incrédula. — Desculpa, não foi isso o que eu quis
dizer. Não quero pressioná-la ou muito menos usá-la como tapa buraco. Mas
é real, Isis. Vocês dois tem sido a única razão pra eu voltar pra casa todos os
dias.
Isis sorri, instintivamente, sem eu perceber, ela aninha meu rosto na
palma de sua mão, e o seu polegar limpa carinhosamente uma lágrima que
não consegui conter e se acumulou ali, no canto do meu olho.
— Eu sei... Eu sei... — sussurra.
Meu coração está explodindo e o meu corpo tremendo. Ela está tão
próxima que o seu cheiro e a sua presença bem perto me deixam louco, tanto
que estou respirando com dificuldade.
Puxo e solto o ar pela boca entreaberta. Beijo sua mão só para eu não
ter que avançar em seus lábios sem que isso pareça errado e impulsivo.
Isis inclina seu rosto para frente, encostando sua testa com a minha,
respirando freneticamente, a ponto de sentir seu hálito me preencher.
Acho que ela quer.
Na verdade, tenho certeza disso quando seus dedos apertam meu rosto,
cheios de vontade contida.
Seguro sua cabeça por trás e avanço os poucos centímetros que restam
para que os nossos lábios fiquem colados. Beijo com urgência a boca de
Isis, reivindicando para mim como sempre quis.
Não consigo disfarçar a necessidade que tenho sentido por ela, afundo
meus dedos em seu cabelo e aperto a sua cintura. Sinto seus lábios macios e
deliciosos, tomando-a para mim com força.
Isis é tão gostosa, tão irresistível, que meu pau já latejava por ela e
meu corpo todo sente um tesão fodido por seu beijo extasiante. Para
completar, ela senta no meu colo, montando em mim e aprofundando o nosso
beijo, porque nem ela consegue resistir ao que estamos fazendo.
Invado minha língua, e ela chupa, depois brinca me provocando com
um beijo muito depravado. Aperto as suas coxas e deixo um gemido escapar
dentro da sua boca enquanto lhe aperto e a esfrego contra o meu membro
duro feito uma barraca de ferro.
— Você é tão deliciosa — digo com seus lábios ainda ali. — Não
sabe a porra do controle que precisei ter esse tempo todo, Isis. Mas eu
gostaria muito de poder tocá-la todas as noites.
Roubo outro beijo e ela arfa, arqueando o pescoço, dando uma visão
melhor e passagem para eu descer meus lábios ali.
É um convite.
Roço minha barba pela lateral do seu pescoço, ela estremece e aperta
seus dedos em meus ombros, inclinando seu bumbum mais ainda na minha
direção. Minhas mãos passeiam por sua coluna, pelas costelas dela e o
contorno dos seus seios. A minha língua lambe a sua pele sensível ali do
pescoço. Isis sobe seus dedos e agarra meu cabelo com vontade.
Ela geme alto e perco tudo ali.
A minha mão avança em seu seio tão instintivamente num aperto, que
ela se assusta e eu recuo.
— Desculpa.
Estraguei tudo!
Mas Isis tem os olhos brilhando em prazer, e ela parece um animal
faminto montada em mim, com as suas unhas arranhando o meu pescoço. Ela
nem deve estar se dando conta disso, porque sua única reação é pegar a
minha mão grande e colocá-la ali de novo.
— Você pode me tocar, Oliver — diz e entendo o sinal verde.
Fico apertando seus seios antes mesmo de voltar a beijá-la. Sentindo a
maciez, contendo a vontade de arrancar a blusa branca e chupar e morder
seus mamilos ali mesmo.
O meu pau lateja só com a ideia.
— Vamos sair daqui — digo com dificuldade, subindo com ela ainda
no meu colo, pois não consigo largar a boca de Isis.
Juntos, aos tropeços, seguimos para o quarto enquanto aperto o seu
bumbum gostoso e grudo seu corpo contra a minha rigidez. Tropeçamos
quando a cama nos limita, caio sobre ela, que grita aos risos, e isso desperta
Oli, que se remexe no berço.
Droga!
Por isso dizem que bebês são empata foda?
Bom, é verdade!
Mas nós dois começamos a rir da situação.
— Isso parece um sinal — Isis comenta com a respiração
descontrolada e a boca vermelha de tanto que a minha barba a arranhou.
Meus dedos grandes tocam mais uma vez seu seio e ela morde o lábio
inferior, se deliciando com o toque.
— Eu não quero que Oli assista a nós dois e temos que viajar amanhã
cedo.
— Temos?
— Eu não iria para o Paraná sem você e o Oli. — Dou a ela um
sorriso convencido, e percebo que a conversa a anima. Aproximo minha
boca da dela em provocação. — Mas você está em dívida comigo, Isis... E
irei cobrar.
Os olhos dela brilham, já ansiando por esse momento que precisamos
adiar mais uma vez.
— Você acha que consegue? — Desafia com um olhar sensual.
Olho para o cós do seu short e brinco ali com o meu polegar, querendo
afundar naquela área ainda intocada por mim.
— Querida, eu estou há tempos dormindo na mesma cama que você. O
que seria mais uma noite?
— Mas agora você está mais perto do que nunca — murmurou, talvez
não sabendo como saberia lidar com aquilo.
— Posso ser muito paciente, querida. — Insinuo um beijo, mas me
levanto e Isis choraminga.
Dou a ela um sorriso perverso e vou tomar um banho de água fria. Eu
poderia tê-la convidado, mas quero trepar com Isis de um jeito que ela grite
muito e que não vá se arrepender, nem se constranger disso no outro dia.
Estou disposto a fazer tudo o que eu quero com ela e juro pela minha vida,
que não irei poupar uma gota de tudo o que senti até agora.
OLIVER

Levo minha família para o Paraná, quero que Isis conheça a nossa
fazenda e tenha mais conhecimento da minha vida profissional, e Oli conheça
de perto os animais que ele tanto tem em miniaturas na sua coleção de
brinquedos. Recentemente, ele tem se mostrado muito interessado em
pintinhos, então fico muito empolgado para mostrar ao meu filho os que
temos lá na granja.
Nos encontramos com Domenico e Nicolo no aeroporto, Júlia e Sofia
vão junto, e carregam com elas malas da Louis Vuitton, o que acho um
exagero.
Nós só vamos passar o final de semana numa fazenda, porra, e não na
semana de moda em Paris. De qualquer forma, detenho este pensamento, pois
minha única preocupação é proporcionar a Isis e Oli uma ótima viagem.
— Não é a minha primeira vez viajando, mas é a primeira vez de
jatinho — comenta quando Jorge estaciona o SUV ao lado do meu jatinho
particular, que Lorenzo e eu tanto usamos para essas viagens curtas.
— Eu quero que você tenha muitas primeiras vezes comigo, querida.
— Pego a sua mão e beijo os dedos.
Isis sorri, e há entre nós dois aquela promessa deixada na noite
passada.
Eu não esqueci...
Na verdade, jamais esquecerei, pois foi a partir daquele ponto que
demos partidas em muita coisa.
Ainda deitados, não me contive e a beijei mais e mais, no silêncio da
noite, no escuro do quarto e debaixo das cobertas. Eu enfiei a minha mão
debaixo da blusa dela, fiquei tocando seu seio e brincando com o seu
mamilo duro. Quase a fiz implorar para eu chupá-los, mas dei a Isis o
benefício da dúvida, ela aprenderia a ser paciente.
Mas cada suspiro, cada olhar que me dá e conforme fixa em meus
lábios, sei que ela está me desejando, querendo acabar aquilo que
começamos na noite passada.
Bem, eu também quero muito. Mas já decidi que não quero trepar com
ela enquanto minha consciência sabe que Oli está ali perto ou que
simplesmente não estamos sozinhos.
O tempo que passamos dentro do jatinho é regado a champanhe e
conversas sobre como foi a semana de todos ali. Mas prefiro não beber nada
e acompanhar Isis, que também prefere ficar sem colocar uma gota de álcool
na boca.
Seu senso de responsabilidade é incrível, Isis nunca bebe quando Oli
está com a gente, ele precisa estar dormindo e bem alimentado, então é
quando ela arrisca uma ou três taças de vinho quando possível.
Além do mais, ela fica tão encantada com as paisagens lá embaixo,
que prefiro ficar admirando tudo junto com ela. Oli também parece fascinado
com as cores vivas dos campos, e o céu azulzinho que se estende no
horizonte.
Desde que Isis disse somos uma família, o mundo ganhou cores vivas e
bonitas para mim. Ter contado a ela na noite passada um pouco da minha
história não me deixou mal pelas próximas horas, porque eu tinha uma
felicidade a agarrar, e uma meta a bater.
Gosto de como fico tranquilo ao lado deles dois, em como eles me
transmitem tanta paz.
Mas paz é a última coisa que tenho quando estamos acompanhados de
Sofia e Júlia. Aquelas mulheres são duas najas, que adoram causar boa
impressão, mas pelas costas sei que devem ser tão horríveis quanto já flagrei
as funcionárias lá de casa. Tenho provas o suficiente pela forma como olham
para Isis, a esnobando.
Houve uma época em que gostei delas, que eram minhas amigas, mas
depois que Melissa faleceu eu fiquei chato e recluso, vi algumas coisas que
não gostei, e desde então, temos nos estranhado.
A gente nunca sabe quem é nosso amigo de verdade, e Isis está feliz
por achar que as meninas a aceitaram, mas duvido muito disso.
Principalmente quando Júlia faz comentários desnecessários sobre coisas do
passado.
— Melissa amava champanhe. Esta hora ela estaria animando a todos
nós! Lembra quando ela dormia no seu colo, Oliver? Ou então como
ficava hoooras te beijando até parecer muito meloso?! Era a coisa mais fofa!
Engulo em seco, nitidamente desconfortável.
O que ela ganha remexendo nas coisas do passado?
Certamente, nada além de prazer em perceber Isis incomodada.
Não tenho nada contra essas lembranças, até gosto. Mas estou tentando
algo com Isis, estou a introduzindo na minha vida no seu tempo e até ontem à
noite nos beijamos loucamente com uma promessa de sexo para a próxima
vez em que ficarmos. A última coisa que nós dois precisamos, é de alguém
lembrando da Melissa e a nossa vida íntima.
Mas não deixo isso me abalar, mantenho a rigidez e não mudo a
expressão impassível.
— Lembro, sim. Lembro de tanta coisa, que não preciso que outras
pessoas fiquem lembrando — digo seco.
Nicolo assobia, detectando as farpas e diz:
— Você poderia ter vivido sem essa.
Júlia revira os olhos e balança o champanhe dentro da taça.
— Que chato! Eu só gosto de relembrar momentos da Melissa com a
gente! — justifica.
Quando estou pronto para dizer que na verdade ela é uma insensível e
que só está tentando prejudicar a porra da minha relação com Isis, Dom, seu
noivo, se intromete:
— Acontece, meu amor, que Melissa se foi. E ela deu a Oliver uma
chance de seguir a vida dele sem achar que ela o culparia por isso. E você
falando deste jeito não está ajudando em nada — explica solenemente, dando
espaço a um silêncio tenso, que deixou vermelha as bochechas sardentas da
Júlia.
Ela estreita aqueles olhos azuis como o fundo do mar e estuda Isis e
eu.
— Vocês dois... Estão tendo um... Caso? — a última palavra soa quase
como escárnio.
Sofia quase se engasga com o champanhe e fica olhando horrorizada,
esperando por uma resposta.
Ao meu lado, Isis fica estática, mas não dá o braço a torcer. Ela, que
foi negligenciada pela mãe adotiva quando mais nova, não ligaria para
aquelas duas sem noção.
— Temos um filho juntos — exalto o óbvio.
— Achei que o filho fosse seu e de Melissa — Sofia indaga
desafiadora.
Nicolo solta um forte suspiro sentado ao lado da namorada, do outro
lado do jatinho.
— A minha irmã não está mais entre nós. Seria do agrado dela que Oli
tivesse uma mãe para cuidar dele — Dom responde por mim.
— Então quer dizer que, além de barriga de aluguel, você será mãe ou
esposa de aluguel? — Júlia pergunta a Isis em tom de deboche e foi a gota.
Bato o punho com força sobre o braço do banco e todos me olham com
surpresa exacerbada.
— VOCÊS VIRARAM FISCAIS DA MINHA VIDA AGORA,
PORRA?! — grito indignado. — Será que vocês não têm coisas mais
interessantes a fazer?!
As mulheres piscam, e Nicolo se remexe em seu banco, totalmente
alheio aquela discussão.
— Estamos dentro de um jatinho a 20 mil pés, e nem perto de chegar,
então sugiro que façam mesmo outra coisa além de discutir, senão vou ter
que me jogar desse avião — Nicolo diz em tom entediado, colocando os
óculos de sol, dando um longo gole da sua bebida.
Ao menos foi o suficiente para chamar à atenção de Sofia, que não
gostou nadinha da ideia dele. Irei lembrar de agradecer a ele quando
chegarmos à fazenda.
Meus amigos e eu temos um senso muito protetor um com o outro, e,
mesmo se tratando de nossas mulheres, se percebemos algo de errado e que
esteja acontecendo de forma injusta e desnecessária, não largamos a
irmandade.
Tanto Sofia, quanto Júlia e Bruna, mal compreendem isso.
Aperto a mão de Isis e olho para ela a fim de encontrar algum vestígio
de incômodo com aquela situação, mas ela sorri. Fico feliz que ela banalize
aquela conversa, mesmo com toda a sua força, ela não é de pedra e temo que
em algum momento, ela resolva se revoltar contra tudo isso.
— Você não está querendo fazer o mesmo que Nicolo, não é? —
pergunto a ela fazendo graça da situação.
Se os outros a irritam, a minha missão é fazê-la ficar relaxada
Isis ri.
— Se tiver paraquedas, eu pulo.
— Não posso julgá-la. Desculpa por você ter que passar por isso —
digo de fato mal.
— Tudo bem, Oliver. Não é você quem me deve desculpas, e apesar
de eu não ser quem elas queriam que eu fosse, confio em mim mesma —
sussurra.
Seguro a sua mão e beijo o dorso, com os olhos sempre colados nos
dela.
— Essa é a minha garota — murmuro sorrindo.
“Minha querida...
Minha garota.”
Eu não ousaria falar essas palavras se ela não tivesse dito que sou a
família dela agora. Sinto propriedade para declarar tal coisa, para tocá-la,
para demonstrar minha afeição por ela e as coisas que sinto.
Finalmente estou progredindo, me reerguendo da forma como todos
queriam, mas só não esperavam que fosse com uma professora de 22 anos,
que veio de Blumenau.
Confesso que isso me excita.
Isis está fora da caixinha de padrões, mas de repente, ela se tornou
o meu padrão. Algo só meu, que só encantaria a mim e a ninguém mais. Com
ela, sinto que estou numa zona de conforto, e para quem passou muito tempo
na tormenta, finalmente mereço essa paz.
Quando chegamos ao Paraná, aterrissamos em Guarapuava e tivemos
que viajar mais um pouco de carro até chegar na fazenda.
Somente Isis e eu viemos em um carro diferente dos outros casais, por
causa de Oli, que vinha no bebê conforto no banco de trás. Nenhum dos
outros casais quis vir exprimidos ali, mas foi melhor assim, poupei Isis mais
um pouco daquelas duas, e ganhamos mais privacidade.
Quando pegamos a estrada rumo a fazenda, aproveito para atiçar
aquela chama entre nós dois. O rádio está ligado e tocando uma música
legal, então aproveito a oportunidade perfeita, ainda mais com as suas lindas
pernas expostas devido seu vestido; e a forma como elas estão inquietas, me
faz pensar que ela também quer aquilo.
A minha mão direita repousa sobre a sua perna macia e acaricio à
área, com calma e com um pouco mais de rigidez, fazendo com que ela afaste
um pouco mais as pernas em puro impulso. Aperto e a excito, desço até o
joelho, e juro que quase a ouço choramingar por eu ter ido para tão longe do
que realmente "incomoda".
Olho de esguelha para Isis, que me olha com uma cara de pidona e
sorrio de um jeito perverso.
— Qual o problema, minha querida? — pergunto me fazendo de idiota.
— Você sabe — protesta, também se fazendo de difícil. — Mas aposto
que nenhum de nós dois irá terminar feliz deste jeito.
Verdade.
A minha vontade mesmo é encostar numa área baldia dessas, deitar
Isis no banco de trás, mergulhar entre suas pernas e provar até a sua última
gota. Se estivéssemos só nós dois, certeza que faria isso, mas o único
momento que temos é o agora, e se eu não fizer nada, posso me arrepender
depois, pois agora ela quer.
Nenhum de nós dois tem força suficiente para esconder isso.
Ela segura minha mão, me detendo.
— É melhor parar, se não vamos terminar — pede.
— Nem uma gracinha? — pergunto subindo meus dedos e ela não
interfere, a deixando com a respiração já pesada.
Meus dedos sobem e sobem delicadamente com minhas falanges como
brasas sobre a sua pele fria que se eriça em prazer. Subo a barra do seu
delicado vestido conforme vou passando do limite, passeando pela parte
interna da sua coxa, sentindo o seu calor cada vez mais próximo.
Isis pressiona seu tronco para baixo e prende um gemido.
— Mal vejo a hora de você se libertar desses gemidos que tanto
prende nessa boca gostosa — trovejo excitado, com o meu pau pressionando
sob o jeans.
— Oliver... — choraminga e sinto-a quente.
Puta merda!
A ponta do meu dedo circula pelo tecido que cobre sua bocetinha e
Isis estremece. Faço o contorno da sua fenda, da protuberância que sinto ali,
por debaixo da sua calcinha.
Ondulo meus dedos e ela fica inquieta, sentindo o prazer ondular
dentro dela com mais agressividade.
Mordo o lábio, pois preciso me concentrar na porra da estrada.
Merda, eu só queria estar beijando a boca deliciosa dela!
Mas Isis tem razão, agora que comecei, é pior para terminar.
Quando vejo os limites da fazenda surgindo, recuo e ela protesta.
— O que houve?
Aponto com o queixo em direção às cercas branquinhas que começam
a delimitar um campo verde e bem cuidado.
— Chegamos. — Olho para ela e para a beira do seu vestido que
ocasionalmente levantei. — Cuido disso mais tarde.
Suas mãos são ágeis na hora de ajeitar a beira do vestido, ela
aproveita para arrumar outras coisas que mal toquei, mas que
consequentemente trazem uma aparência ardente de si, como as bochechas
extremamente ruborizadas, por exemplo, e o prazer estampando em seus
olhos vítreos.
Sei como é isso, também preciso conter a minha ereção e a calça jeans
não ajuda em nada.
Graças aos céus, terei muita distração quando descer na fazenda, mas
estarei o tempo todo pensando naquela saliência macia debaixo da calcinha
de Isis, e em como seria gostoso mordê-la e chupá-la.

Isis fica encantada com a fazenda que é tão grande, que mal podemos
ouvir a presença dos animais daqui. Mas quero poder mostrar para ela a
casa primeiro e Margarida, uma das mulheres que mais amo e admiro nessa
vida.
Pego Oli no colo porque estou muito empolgado para mostrar meu
filho, enquanto isso, Dom e Nicolo estão enrolados com Sofia e Júlia.
Conduzo Isis pela varanda enorme que contorna toda a casa, nos
levando à área da churrasqueira, onde tem uma mesa de café da manhã, e é
ali que Margarida está sentada, mais baixinha do que da última vez em que a
vi. Também, não é para menos, ela tem 70 anos, e se curvou mais com o
passar dos anos, mas sempre levou uma vida saudável na fazenda, e se
duvidar, a sua saúde é igual a de um cavalo.
Quando ela me vê abre um sorriso enorme, com todos os dentes ainda,
mas amarelados, ainda assim, um dos mais belos e radiantes que já vi.
Margarida faz questão de levantar e vir me abraçar.
Seu colo para mim também é lar, mas dificilmente o sinto, então tento
aproveitar ao máximo.
— Oliver! Meu querido, Oliver, como é bom vê-lo de novo!
Sua voz rasgada pelo tempo soa como nostalgia para mim e toca no
fundo do meu coração.
Oli tenta alcançar o cabelo branquinho dela, mas o detenho antes que
um dos cachos dela engate no dedinho enxerido do meu filho.
— Achei que ia brigar por eu ter sumido. — Lembro sabendo que
estava mais que sumido.
Ela fez um movimento com a mão, banalizando aquela conversa.
— Ah, deixa isso pra lá. Não quero ser uma velha chata agora,
deixarei para puxar a sua orelha em outro momento!
— Eu sei que vai.
Ela só disse isso porque não estava resistindo a curiosidade, eu
percebia seus olhinhos na direção de Oli.
— De quem é esse lindo bebê?
Viro Oli para que ela o veja melhor. Seu sorriso para ele é doce, mas
os olhos são curiosos iguais aos de Oli.
— Este é Oliver Matteo Giordano Filho.
O nome faz seus olhos ficarem espantados.
— Meu filho, dona Margarida.
A surpresa exacerbada dela arranca risadas das pessoas ao redor.
— Mas eu não sabia que você tinha se tornado pai, e muito menos que
estava casado! Cadê a sua mulher?
Nicolo surge e é mais ágil, dando um passo e puxando Isis que está no
canto, a trazendo pelo pulso, completamente tímida.
— Esta é Isis, a mulher de Oliver, dona Margarida — diz meu amigo,
empolgado em mostrar a novidade a senhora que fica mais surpresa ainda.
Minha mulher...
Isis fica surpresa também em ser apresentada daquela forma, mas não
protesta. Ao invés disso, se apresenta da forma mais verdadeira possível, do
mesmo jeitinho que costumava se direcionar aos seus alunos, com doçura.
— Olá, dona Margarida. É um prazer conhecê-la. Sou Isis, a mãe de
Oli.
— E a mulher do Oliver. — Não havia sido uma pergunta
Isis sorri para mim e dá de ombros.
Já explicamos algumas vezes a nossa situação para terceiros, mas dona
Margarida já está velha demais, ela não entenderia. Então, Isis, aceita
aquilo.
Ela nos olha alegremente.
— Fico muito feliz que o senhor Teimoso voltou a ter este sorriso
grande no rosto mais uma vez — comenta, me fazendo perceber o riso bobo
que eu tinha no rosto naquele momento, fazendo Nicolo e Dom rirem de mim.
— Humm, senhor Teimoso — Nicolo repete em provocação.
Sibilo silenciosamente para ele:
— Vá se foder!
Os dois idiotas riram mais ainda.
— E vocês dois? Já deixaram aquelas garotas? — pergunta para eles,
que ocasionalmente ficaram sérios e sem jeito.
O clima criado enquanto estávamos no jatinho ainda pairava sobre
nós.
— Por que, dona Margarida? Quer se candidatar? — Nicolo pergunta
com um ar sedutor.
Ela enruga o rosto mais ainda.
Margarida, por já ser idosa, não liga para outras opiniões. Se ela não
gosta de alguém, diz na lata. E meus amigos das vezes em que trouxeram suas
mulheres, só a deixou mais ranzinza ainda a respeito delas.
Me pergunto se ela irá gostar de Isis.
— Eu não tenho mais idade para essas coisas, menino. Tenho que
comandar as coisas por aqui, igual uma rainha!
Sorrio encantado com o seu jeito que, diferente do corpo, nunca se
curvou para o tempo. Margarida sempre foi tão amável e confiável, que
meus pais confiaram a casa da fazenda a ela e eu deixei como estava.
Me abaixo para beijar a sua bochecha enrugada e frágil.
— Sim, você é uma rainha — enfatizo.
Logo as meninas aparecem e Margarida pragueja, voltando a se sentar,
se recusando a cumprimentá-las.
— O que aconteceu com o estábulo que tinha aqui em cima? — Júlia
pergunta com Sofia em seu encalço.
— O senhor Oliver fez muitas mudanças na primavera passada — um
dos caseiros que está ali com dona Margarida responde. — Levamos tudo lá
pra baixo.
— Quer dizer que não vamos mais sentir o cheiro de estrume daqui?
— A pergunta de Sofia quase soou como um agradecimento.
— Se sentir falta, mando deixar um bocado ao lado da sua porta,
menina — dona Margarida diz aos risos e o caseiro acompanha.
A loira faz cara de nojo.
— Está faltando um, não está? — Margarida pergunta, ainda muito boa
de memória, claro.
— Lorenzo. — Domenico lembra. — Ele está vindo da colheita,
chegará em breve, mas a Bruna teve que ficar em Santa Catarina.
Margarida solta uma prece baixinha e Isis me olhou curiosa. Deste
jeito, talvez ela pense que só falta sobrar para ela. Então decido tirá-la dali
antes que Margarida comece a fazer um monte de perguntas constrangedoras
na frente do pessoal. Ela sempre me tratou como filho, então, tem um certo
poder sobre se envolver na minha vida.
— Irei mostrar a casa para Isis — aviso, já deixando a varanda e
passando pela porta dupla, com Oli animado em meu colo, tão curioso com o
novo lugar.
A casa da nossa fazenda é toda de paredes brancas, para contrastar
perfeitamente com as vigas de madeira escura que sustentam os telhados. O
chão também é de carvalho, fazendo uma junção perfeita ali com os móveis,
de uma decoração rústica. Há tapetes e muitos objetos de decoração
colorido, seguindo um contraste muito grande com a minha mansão de
Florianópolis.
Subimos a escada para o segundo andar, levo Isis para um dos
corredores e mostro a ela onde iremos dormir.
O quarto fica na parte sul da enorme casa, com enormes janelas
cobertas por cortinas claras, que dão uma vista bela para o lago onde os
patos ficam. O chão é de carvalho e as paredes, branquinhas. A cama é
grande e de dossel, há duas poltronas de frente para uma lareira que
acedemos quando estamos por aqui na friagem, um belo lustre ilumina todo o
cômodo, mas certamente, Isis deve estar com a atenção presa em um móvel
específico.
— Este berço já tinha aqui?
Deixo uma risada sagaz escapar.
— Achou que Oli ficaria entre nós dois durante a noite? — Me abaixo
para sussurrar em seu ouvido: — Eu não poderia dispensar o único momento
do dia em que posso estar totalmente agarrado a você.
Ela me dá aquele olhar desconfiado, toda vez que ajo feito um
convencido.
— Você sempre pensa em tudo, não é?
Me acho por causa disso.
— É uma das minhas qualidades — digo e ela revira os olhos,
entrando mais ainda no quarto.
— É lindo, eu moraria facilmente aqui. Gosto de fazenda — comenta
com os olhos atentos ao lago, onde mostra os primeiros resquícios dos
animais da fazenda.
— Já esteve em uma? — pergunto curioso, mudando Oli de braço,
pois aquele já estava ficando dormente.
— O pai de Muriel tem uma, lembra muito a minha infância. Ele tinha
um cavalo, algumas galinhas e um porquinho que chamávamos de Pink. Eu
amava o contato com os animais, mas ele precisou vendê-los para um outro
amigo que também tinha uma fazenda.
— Então você vai gostar muito de ver o que temos aqui. — Entrelaço
minha mão a de Isis e a arrasto para fora do quarto, como nunca me senti
animado antes.
Me empolgo para mostrar a ela os animais que temos aqui, desde o
pavão até o pônei. Oli também vai gostar muito.
É uma tradição chegarmos e irmos ver os animais antes de tudo,
porque é um bom horário e a maioria deles estão acordados. No entanto,
Nicolo e Domenico foram os únicos a aceitarem o convite, também tanto faz
que Sofia ou Júlia deixem de ir, é um favor que elas fazem.
Quando estamos descendo a fazenda, Nicolo pega Oli e o coloca sobre
seu cangote, pulando e correndo com ele pelo campo livre. Gargalhadas
gostosas vindo de Oli enchem o lugar de mais vida ainda, e de repente
aquilo vira uma competição, porque Dom pega o sobrinho e fica o jogando
para o ar.
Tanto Isis quanto eu ficamos preocupados, mesmo que a coisa toda
esteja sendo muito divertida para Oli.
— Cuidado com meu filho, seus idiotas — resmungo.
— Papai, senhor Teimoso, é um chato, não é, garotão? — Nicolo
zomba mais uma vez em conversa com Oli, o tomando dos braços de
Domenico.
— Sabe que ele vai te encher o saco agora com isso, não é? — Dom
pergunta.
— Ele que teste a minha paciência — alarmo.
Pelo menos depois disso os imbecis ficaram menos radicais quando
alcançamos os animais.
Mostro a Isis os cavalos, os pôneis. Ela quer alimentá-los e o caseiro
deixa, o que é um momento lindo, a ponto dela se emocionar.
Oli é apoiado sobre um dos pôneis e Dom imitou uma cena cômica de
filmes de faroeste.
Depois disso encontramos esporadicamente um pavão passeando com
todo o seu glamour e mais uma vez, Isis fica encantada.
Mostro a Oli os pintinhos, como vinha planejando, e ele balbucia o
que parece ser um “piu”, foi alguma coisa inaudível, que somente bebês
entendem, mas é uma alegria.
Faz tempo que não vinha para a fazenda e me sentia tão feliz. A última
vez que isso aconteceu, Melissa ainda estava viva.
Mas agora, é outra história.
Uma história escrita por ela e que está dando muito certo.
Passamos quase uma hora e meia ali, até um dos caseiros descer e nos
avisar que Margarida estava nos chamando para o almoço. Deixo Isis
ansiosa quando faço propaganda da comida da senhora, que com certeza, tem
mãos de fadas para toda coisa.
Aproveito ao máximo o tempo livre com a minha família, pois logo
depois, terei de descer novamente e encontrar Lorenzo, para visitar a
colheita.
O Sol e calor da tarde na fazenda me exauriu. Mal tive tempo para
jantar e eu só queria subir e descansar, para depois então, curtir um pouco
mais a nossa estadia ali na fazenda.
Isis nem hesitou em subir junto comigo.
Soube que ela e Margarida conversaram tanto pela parte da tarde, que
ela não aguentava mais forçar a mandíbula, embora isso tenha me dado
ideias interessantes.
Quando saio do banho e me jogo na cama, só de toalha e cabelo ainda
úmido, Isis me conta que Lorenzo apareceu para pegar Oli emprestado,
porque estava se sentindo de escanteio e não queria que Dom e Nicolo
fossem tão presentes quanto ele, e que qualquer coisa, pediria ajuda a
Margarida.
Ficamos sozinhos e isso me deu mais ideias ainda, tanto que conforme
vou pensando em algo, meu sorriso se alarga. Eu não queria provocar Isis,
mas ela também não parecia pensar em outra coisa.
Estico os braços atrás da cabeça, tonificando meus bíceps que ela fica
admirando encostada no dossel, com um sorriso divertido.
— Você não vai se cansar de tentar, não é?
— Não sei do que você está falando — minto, e mesmo sabendo disso,
Isis faz questão de falar.
— Você fica aí, se exibindo só porque sabe que é terrivelmente
atraente — me acusa em um tom predatório que indica que estamos
enfrentando um jogo de sedução que havíamos começado ainda em
Florianópolis.
— Acho que existe outra palavra para isso — murmuro pensando em
um adjetivo que já estava na ponta da língua. — Gostoso.
— Arrogante — rebate poderosamente, sem medo algum de mim.
Foda-se os modos e o ego inflado.
Conheço o homem que sou, e sou capaz de dar tanto prazer a Isis que
ela vai reconhecer minhas palavras quando estiver sobre ela. Quando isso
ferve dentro de mim, sento na beira da cama e a agarro pelo quadril,
puxando-a para mim que fica entre minhas pernas.
Isis solta um gritinho e se apoia em meus ombros.
Fico olhando para ela ali debaixo, como se eu fosse seu submisso, eu
daria tudo para me ajoelhar perante a ela e fazê-la rugir como a verdadeira
leoa que é enquanto provo seu gosto.
Sinto que por detrás desse rosto angelical, existe uma garota selvagem
louca para se libertar.
— O que você está fazendo? — pergunta quando entrelaço minhas
pernas ali, impedindo a sua escapatória.
— A única pessoa aqui e agora que vai dizer o quão eu sou gostoso,
será você.
— De que forma? — indaga retoricamente.
Mas já que ela quer me ouvir falar...
Minhas mãos descem para a curva do seu bumbum, sentindo a carne
macia por debaixo do shortinho de seda azul bebê que compõe o seu
conjuntinho de dormir. O toque faz com que ela fique estática.
— Vai dizer que sou gostoso quando você estiver montando em mim,
sentindo cada centímetro do meu pau dentro de você. — Levanto a barra da
sua blusa e esfrego a minha barba logo acima do seu umbigo, fazendo o seu
fôlego recuar. — Ou então, quando você estiver me chupando e engolindo
cada gota da minha porra, que vai te fazer descobrir que existe algo mais
doce que o mel.
Beijo o centro da sua barriga e ela recua a respiração, então passo a
língua e ela estremece, percorrendo para cima e mais cima, até sentir a curva
do seu seio e morder aquela área macia, finalmente, ouvindo Isis gemer
baixinho.
Meu pau lateja com aquilo, crescendo e crescendo.
Beijo, lambo e passo a minha barba em sua barriga, a provocando,
sentindo toda a sua pele eriçar com o meu toque.
As unhas dela cravadas em meus ombros demonstram que está
gostando. Quando olho para cima, encontro Isis de olhos fechados e boca
aberta, respirando ofegante e saboreando toda aquela sensação.
Porra, preciso sentir o gosto dela agora!
Giro o meu corpo e com ela enlaçada nas minhas pernas, acaba
deitada sobre a cama, perto demais da beirada, exatamente onde eu a quero.
Beijo a sua boca com urgência, respirando com dificuldade por causa
do prazer intenso.
— Abra as pernas, minha querida — ordeno e Isis me olha
profundamente, afastando as pernas lentamente, onde me encaixo melhor ali.
— Isso.
Volto a beijá-la, agora de um modo mais sensual e depravado,
chupando a sua língua e explorando cada canto da sua boca deliciosa. O
beijo toma uma proporção tão urgente, que de repente nossos dentes estão se
batendo e estou tocando seus seios com tanto desejo que ela solta um gemido
doloroso.
Mordo seu lábio e passo a minha barba pela linha da sua mandíbula.
Meu pau está pulsando como um segundo coração debaixo daquela
maldita toalha, principalmente quando suas mãos espalmam em minhas
costas e agarram na pele, mas me seguro e não a arranco facilmente.
— Me deixa fazer tudo com você — imploro entre seus lábios. — Me
deixa provar você.
Com apenas um aceno de cabeça, porque imagino que Isis mal consiga
falar, eu desço. Vou beijando o seu pescoço longo e lindo, a sua clavícula e
os seus seios quando abaixo sua blusa fininha.
Eles são tão lindos e cabem perfeitamente nas minhas mãos.
Passo a ponta da língua em seu mamilo esquerdo e ela geme em
aprovação, levantando o quadril cheia de prazer. Brinco naquela área,
enquanto meu dedo sintoniza o outro.
Depois, abocanho de uma vez só, igual a um animal faminto.
— Oliver, por favor — choraminga.
— Por favor o que? — Mal tiro a boca de seu seio para falar, quando
passo a chupar o outro lado.
Percebo que Isis fica retraída para dizer as palavras, então paro
abruptamente de brincar com aquele seio para olhá-la em cobrança.
— Por favor, o que, Isis? — insisto e a respiração dela dá uma
vacilada. Rodeio o bico do seio, estimulando o seu prazer. — Diga.
— Eu... por favor. — Aperta os olhos.
— Diga! — sibilo rispidamente e desço meu pau duro em sua
intimidade.
Roço meu pau para que ela sinta que eu estou louco de tesão, e que
tudo o que eu faria com ela, necessitaria do seu lado mais safado.
— Diga.
Isis solta um resmungo em protesto, e então fala as doces palavras que
eu mais queria ouvir:
— Chupa a porra da minha boceta! — diz tão ferozmente, que acho
que eu teria a minha cabeça decepada se eu não atendesse seu pedido.
Sorrio satisfeito, delirando de tesão.
— É a primeira vez que ouço você falar palavrão. Espero que essa sua
boquinha seja muito suja quando eu estiver te fodendo.
Então, começo a traçar um caminho com meus beijos pela barriga dela
e não poupo tempo não hora de tirar seu short de seda, com calcinha e tudo.
Já brinquei ali mais cedo, agora a quero todinha para mim,
completamente exposta.
Quando me posiciono de frente para as pernas de Isis, tenho a mais
bela visão do paraíso. A minha boca saliva e passo a língua nos lábios com
água na boca só de ver a sua fenda encharcada, mas não a tomo de imediato.
As minhas mãos acariciam a parte interna da sua coxa, e meus
polegares que estão apontados na direção da sua boceta massageiam à área,
a estimulando mais ainda. Brinco com seus lábios grandes e o barulho da sua
boceta molhada conforme vou mexendo mais ali, me excita pra caralho.
Não consigo aguentar mais um segundo e avanço.
No instante em que a minha língua quente toca aquela área, Isis arfa,
seu corpo todo fica tenso e ela geme. Geme de um jeito delicioso que faz
meu pau pulsar como nunca. Isso me estimula mais ainda a fazê-la sentir o
melhor, encosto minha língua fazendo um movimento lento de baixo para
cima. Faço isso outras vezes, a provocando, e ela segura meu cabelo com
força, querendo que eu faça mais rápido.
Solto uma risada gutural e seguro as suas coxas com firmeza.
— Calma, minha querida. Eu não vou esquecer de nenhum movimento
— asseguro.
Começo a lamber Isis com mais força e então, fodo a sua bocetinha
viscosa com a minha língua que começa a levá-la à loucura. Ela se espreme
toda sobre a cama, respira ofegante e geme, apertando o lençol da cama com
força. Quando chego no seu grelinho, mordisco a ponto de fazê-la estremecer
e apertar seus dedos em meu cabelo mais ainda.
A penetro lentamente com um dedo, sentindo seu interior macio e
quentinho. Quando coloco o segundo dedo, Isis exclama:
— Que gostoso, Oliver.
Sorrio vitorioso, sabendo que ela confessaria isso no exato momento
em que eu estivesse lhe chupando toda. Aumento as estocadas dos meus
dedos que deslizam facilmente em sua boceta encharcada e chupo com mais
vontade o seu grelo, roçando a minha barba ali vez ou outra.
— Goze pra mim, querida — peço com o meu pau já dolorido.
Só vou penetrá-la quando gozar na minha boca. Imploro mais uma vez,
literalmente de joelhos diante dela enquanto a chupo e fodo com os meus
dedos.
— Goze, goze, goze.
Sinto o seu interior macio se contrair de um jeito lancinante. E quando
eu mexo meus dedos freneticamente e sugo seu grelinho, os gemidos de Isis
vão se intensificando, ganhando mais vida, mas de um jeito sofrido. Ela
arqueia o tronco conforme goza em meus dedos que ainda se movimentam
dentro dela repetidas vezes.
— Ah, isso... — digo satisfeito, provando seu gozo que mela meus
dedos e encharca a minha barba. — Deliciosa, como já imaginava.
Fico olhando para ela que ainda está rendida àquela sensação
explosiva.
— Adoro chupar a sua bocetinha. Um dia ainda irei estimular você por
horas, sem penetração alguma. Só lambendo, mordendo e chupando, desde
seu grelo aceso à sua bocetinha apertada.
Levanto e ocasionalmente, deixo a toalha cair, revelando o meu pau
longo, apontando para cima pulsante.
Quando Isis o vê, ela fica fascinada, sentando em um único impulso.
— De quatro — ordeno.
— Você é muito mandão — protesta com os olhos cheios de luxúria.
— É por isso que sou um CEO implacável, minha querida. — Estico
minha mão para tocar carinhosamente em seu cabelo. — Agora, de quatro.
Ela não hesita e me obedece, pois também está ansiando muito por
aquilo. Quando fica de quatro, ela engatinha lindamente até mim, mordendo o
lábio inferior com força enquanto mantém seus olhos felinos fixos nos meus.
O mundo e tudo o que parecia fazer sentido, é reduzido aquele único
momento quando Isis pega no meu pau, mal conseguindo fechar seus dedos
ao redor dele. Ela fica fazendo movimentos de vai e vem, e quando um
líquido viscoso sai da ponta, ela coloca a língua para fora e o lambe.
Solto um gemido entredentes e ela dá um sorrisinho.
— De fato, você é muito gostoso — comenta e sorrimos.
Fico tão hipnotizado por ela, que nem me preparo quando Isis começa
a lamber o meu pau todinho, de cima para baixo, me provocando.
Preciso que ela me engula agora!
Ela percebe minha necessidade e é boazinha ao me colocar na sua
boca cuidadosamente. Parece que não vai caber e por um momento, parece
que vou rasgar a sua boquinha, mas ela é persistente, e o fato do meu pau ser
largo demais para a sua boca, parece deixá-la mais excitada.
Isis ajuda a deixá-lo mais molhado, e tenta mais uma vez, deslizando
com mais facilidade pelo meu pau, que contém seus gemidos na garganta.
Com uma mão me toca, procurando apoio para ajudá-la. Ela tira o meu
pau da boca e quando o abocanha de novo, desliza até o falo, me
surpreendendo.
Solto um gemido alto, jogando a cabeça para trás ao senti-la ir fundo.
— Caralho!
Ela volta e então repete o movimento mais uma vez.
Estou ficando louco!
Seguro a cabeça dela e movimento meu quadril, fodendo a sua boca
profunda que me engoliu todinho.
Quando olho melhor para ela, vejo que está lacrimejando porque estou
indo à fundo.
Quase gozo, mas me seguro, me afastando da sua boca.
— Em outro momento, irei gozar na sua boca gulosa, mas agora eu só
quero me despejar dentro de você — confesso e ela parece entender. —
Deite-se.
Queria poder fodê-la assim, de quatro, mas primeiro, preciso fazê-la
se acostumar a mim.
Isis me obedece e se deita na cama larga, com os lençóis bagunçados.
Avanço para cima dela, rastejando pela mulher que foi capaz de tirar todo o
meu atraso, me que fez ir a loucura nos últimos meses.
Faz tanto tempo que não desejo alguém como tenho a desejado agora, e
juro que irei fazer cada momento valer à pena.
— Como você vai fazer isso? — pergunta preocupada, já que o meu
pau entrou com muita dificuldade em sua boca.
Dou um beijo suave e passo meu polegar em seu lábio, observando o
quão lindo ele é.
— Irei ser cuidadoso, prometo — asseguro, embora eu quisesse muito
ir com força agora, mas não sou um brutamonte. — Não quero machucá-la.
— Tudo bem, eu confio em você — revela suavemente.
Algo lá no fundo do meu coração se rasga.
Ela é tão linda e boa, e está completamente disposta para mim. Fico
estático quando percebo que, além dos desejos carnais, algo também
prevalece maior que todo aquele desejo humano de fazê-la minha.
Quando dou por mim, já estou esfregando a ponta em sua entrada, e
Isis arfa com o toque modesto. Ela recua quando avanço pouca coisa e então,
paro.
Fico olhando preocupado, mas ela assente dando sinal verde para eu
continuar. Afundo mais um pouco a cabeça do meu pau na sua entrada, e
então volto, afundo de novo e volto.
Afundo e volto.
Fico repetindo esse movimento até que ela esteja se alargando para
mim. E conforme vou penetrando, vou sentindo a boceta de Isis se adaptando
ao meu tamanho. Quando entro até a metade, ela faz uma cara sôfrega e paro.
— Machuquei você?
Ela sorri.
— Não, tudo bem. É uma dor gostosa — admite.
Ok.
Eu já sabia que ela não tinha tanta experiência. Só teve um namorado,
e pelo jeito, ele era um pastelão, pois sinto que estou tirando a virgindade
dela. Mesmo depois de ter um filho, Isis continua apertada e cheia de libido.
Seu comentário parece ser a carta branca que eu precisava para
avançar com mais vontade, pois quando saio, entro e vou até o fim, fazendo
ela arquejar e soltar um grito que se transforma em gemidos cheios de
prazer. Me mantenho ali enquanto a beijo de língua, desesperadamente, com
luxúria e amor, desejo e paixão.
Tudo de uma vez só.
Me abaixo mais um pouco só para ter que chupar e lamber seu seio
mais uma vez, a deixando encharcada envolta de mim.
Quando ela faz um movimento com o quadril, entendo que está na hora
de entrar em ação. Começo a fodê-la com mais força, saio e entro
aumentando a velocidade, mas ainda sendo cuidadoso.
Ela é tão apertada, quentinha e macia, que quero ir fundo num ritmo
desesperador. Mas tenho controle.
Deste jeito está uma delícia.
Ela abraça meu pescoço e deito minha cabeça em seu peito, afundando
nela. Beijo seu pescoço, chupo e aproveito para inalar mais ainda o seu
cheiro maravilhoso.
Em um movimento preciso, giro o corpo de Isis, fazendo com que ela
fique de costas para mim, mostrando aquele seu bumbum lindo em formato
de coração. Fico apalpando, imaginando como seria uma loucura
inesquecível fodê-la por trás.
Isso faz o meu pau latejar mais ainda.
Um dia, espero que ela me dê isso como presente, mas agora, só quero
ir mais à fundo ainda em sua bocetinha.
Pego as duas mãos de Isis e a prendo em suas costas. Ela fica surpresa
por ter sido contida daquele jeito e me inclino até o seu ouvido.
— Segure firme.
— O que você...
Não a deixo terminar, pois a frase termina em um gemido gutural
quando a penetro profundamente nesta posição. Sinto seu interior se
contraindo, me apertando todo. Ela empina seu rabo lindo mais ainda pra
mim, sabendo que assim, eu iria fodê-la melhor.
Entro e saio freneticamente, sentindo sua boceta se render todinha pra
mim, me aceitando. Solto sua mão, seguro sua cintura para pegar um apoio
melhor, e estocar nela com mais vontade, porque eu não consigo me conter.
Deste jeito, eu gostaria de poder nos tornar um só, de tanto que quero
me afundar nela.
O ritmo fica tão forte, que sinto minhas bolas baterem em seu grelo, e
consequentemente, levá-la à loucura.
— Gostosa do caralho! — resmungo, mal reconhecendo a minha voz.
Aperto sua cintura mais ainda e os gemidos dela ficam mais nítidos.
— Aí, Oliver! Aí!
Ela vai gozar.
Sinto Isis se contrair todinha, enquanto goza no meu pau. Eu também
não me demoro, sinto aquela sensação explosiva dentro de mim, totalmente
inexplicável se estender até o meu pau ficar inchado, e se contrair em alívio
quando jorra tudo dentro dela.
Estou rugindo, despejando nela até a minha última gota.
Seu corpo se exauri e ela deita na cama, completamente exausta e
dopada de prazer.
Me deito ao seu lado e beijo a sua testa, o que a faz rir.
— Ainda é carinhoso depois de uma trepada louca dessa — comenta
sem fôlego.
— Eu tenho o melhor dos dois mundos.
— Bom para mim.
Sorrimos e a puxo para se aninhar a mim. Ela coloca sua cabeça sobre
o meu peito e envolve a sua perna sobre as minhas. Seus gemidos e o meu
nome soando com tanto prazer em sua boca ainda soam como músicas em
meus ouvidos.
Fico acariciando seu ombro, pois sou mesmo carinhoso quando não
estou fodendo loucamente.
— Você gostou? — pergunto ainda pensando em como o meu pau
quase atrapalhou aquilo tudo.
— Eu amei, já quero de novo — diz entre risinhos, fazendo círculos
com o seu dedo em minha barriga.
— Que bom, pois eu já estou pronto.
Mostro para Isis o meu pau que já está ereto de novo. Ela fica
deslumbrada, e dou de ombros.
O que posso fazer, se passei tanto tempo apelando à punheta?
Mas agora que a tenho, sei que nunca mais passarei por isso sozinho
de novo. Que bom que tenho Isis, para todos os efeitos.
Quando ela começa a descer em direção ao meu pau, fico certo de uma
coisa.
— Eu vou mesmo me casar com você.
Ela acha graça, mas não é uma piada.
Pela primeira vez, sei que pedir Isis em casamento é uma certeza, pois
vou querer isso para sempre.
Quando ela me chupa, não tenho nenhuma dúvida disso.
ISIS

Oli está evoluindo em um piscar de olhos.


Sinceramente, se eu não fosse uma mãe tão presente, me assustaria
com todo o desenvolvimento dele que deu um salto muito grande nos últimos
dias. Consequentemente, isso tem causado uma grande animação entre nós.
Quer dizer, além de Oliver e eu, os amigos dele tem se mostrado bastante
presentes em tudo, de forma amável e familiar.
Por exemplo, quando Oli está se apoiando nos móveis da sala na casa
da fazenda, os três estão ali, dando total apoio enquanto eu filmo a cena
porque estamos otimistas de que ele dará seus primeiros passinhos. Oliver
teve de descer algumas horas atrás quando um dos caseiros veio lhe chamar,
então eu decidi registrar o momento, porque caso aconteça, ele ficará todo
bobo por não perder.
Mas aí ele aparece na varanda, vejo pelas janelas, e não me aguento:
— OLIVER! CORRE AQUI! — grito e ele acelera o passo.
Assim que entra, chamo Oli de braços abertos, ele sorri e solta
gritinhos, arriscando a andar. Ele dá seus primeiros passinhos,
completamente ágil e habilidoso.
Conto cinco passos, antes dele cair em meus braços e eu levantar com
ele, comemorando a novidade do seu desenvolvimento.
Sinto Oliver se aproximar, e ele nos envolve em um abraço de urso,
tão apertado que solto um gritinho. Ocasionalmente, envolvido por alegria e
orgulho, ele me dá um beijo casto nos lábios, e eu abro a boca para deixá-lo
provar melhor dos meus lábios ainda inchados da noite passada, onde
transamos no chão do quarto e no banheiro. Ainda sinto o vazio que ele
deixou em mim, de certa forma, me preenchendo também com um incômodo
gostoso por conta do seu pau grande e grosso. É o segundo pênis que
conheço na vida, e com certeza é bem maior e mais grosso do que o primeiro
que eu conheci.
Oliver é delicioso, e agora a coisa toda entre nós dois subiu a um nível
que só de estar perto dele, já é razão suficiente pra eu ficar pensando nessas
coisas. Por isso que fecho meus olhos e o beijo, esquecendo do mundo e de
tudo que existe ao meu redor. Tomo seus lábios com carinho e ternura,
acariciando a sua barba que tanto me deu prazer também.
Uma tosse nos tira daquele torpor envolvente, e quando paramos
olhando em direção ao som, me deparo com Dom, Nicolo e Lorenzo
completamente surpresos, mas não espantados o suficiente.
Sinto meu rosto queimar de vergonha, mas mordo o lábio e olho para
Oliver. Ele parece normal demais diante da nossa intimidade recém-
construída, exposta deste jeito.
— Vocês já esperavam isso — comenta aos amigos.
Domenico cruza os braços e sorri sem jeito, olhando para o chão
quando reflete em voz alta:
— Bem, esperávamos um pronunciamento mais formal, mas acho que
assim está melhor, nos poupou de mais mistério.
Nicolo bufa.
— Mistério — esnoba sendo sarcástico. — Oh, meu Deus! Quem
poderia imaginar que esses dois estivessem ficando?!
— Dois idiotas — Lorenzo murmura, mas logo nos lançou um sorriso
malicioso. — Fiz uma ótima coisa então me tornando babá do Oli na noite
passada, não é?
Dom e Nicolo olham para o engenheiro e então para Oliver e eu.
— Claro, mandaremos um cartão de agradecimento no Natal — Oliver
rebate, não se retraindo aos comentários dos amigos.
— Bom, vocês podem aproveitar a festa junina para firmar o
relacionamento.
Olho incrédula para Oliver, que ainda me mantém em seus braços.
— Festa junina?
Pela cara que ele faz, parece que esqueceu de comentar comigo este
detalhe.
— Desculpa mesmo, querida. Esqueci de falar para você, inclusive, eu
tinha ido ver a fogueira. Eles já terminaram de montá-la.
Para tudo agora que Oliver fala, quando se refere a mim, ele
diz querida. E eu adoro, sinto que sou dele só por ele ser o único a se referir
assim a mim.
Não consigo nem me sentir irritada, mesmo que eu não faça ideia do
que usar para mais tarde.
— Acho que eu não tenho roupa adequada para a situação — digo
entregando Oli para o pai, enquanto tento pensar melhor em alguma coisa.
— As meninas vão ao shopping mais tarde, elas querem mesmo estar a
caráter. — Lorenzo diz — Por que não vai com elas?
Preciso pensar bem, sei que as meninas me detestam. Sofia e Júlia não
perdem tempo em me deixar desconfortável, com o pensamento de que sou
uma intrusa ou golpista. Os meninos já se livraram desse pensamento
retrógrado, mas elas ainda insistem. Somos pessoas completamente
diferentes, e sei que por eu ser simples demais, é o que mais as irritam.
No entanto, não tenho outra opção.
Sei que não é uma obrigação estar vestida a caráter, mas quero me
sentir bem e curtir a festa ao lado de Oliver.
Os quatro parecem esperar ansiosos pela minha resposta, além do
mais, eles sabem que não sou obrigada a querer me entrosar com elas depois
do que aconteceu, mas parece que eles esperam que eu dê outra chance.
Eles querem que aquilo dê certo, e ir ao shopping com as meninas
parece a desculpa perfeita para nos aproximarmos mais ainda.
Olho para Oliver, na tentativa de encontrar algum apoio ou resposta,
mas seu rosto é indecifrável.
A escolha está em minhas mãos.
Bem, eu não tenho medo delas. Não tenho medo de nenhuma delas e do
veneno que soltam, mas temo porque não quero ser motivo de mais intriga.
Diferente delas, eu tenho vergonha na cara, e seria horrível estragar a noite
de hoje.
O espírito de animosidade deveria prevalecer!
— Parece ser uma ótima ideia — alego, um pouco insegura, mas eles
sorriem aliviados por eu ter dado outra chance, mesmo sendo um alvo fácil
para elas.
— Eu vou dizer a Ju que você vai com elas. Parece que estão de saída
daqui a pouco — Dom avisa, já em saída.
— Eu também vou ali, já que serei o motorista de vocês — diz Nicolo,
seguindo o pediatra.
Lorenzo percebe que sobrou e cria uma desculpa.
— Vou ver se a Margarida cozinhou algumas espigas de milho.
Ele sai, deixando Oliver e eu finalmente a sós, com a constante
presença de Oli, que é deixado sobre o tapete logo em seguida, se erguendo
enquanto se apoia na mesinha de centro, arriscando passinhos até o sofá mais
próximo, de um jeito bem estratégico.
— Você não precisa fazer isso — Oliver comenta por fim, enquanto
admira o filho mostrando suas evoluções precoces. — Mas se for realmente
necessário, eu levo você nas melhores lojas.
Sorrio achando fofo a sua preocupação e o agarro pela blusa polo
verde escuro.
— Não seria uma má ideia. Eu juro que é o que eu mais queria, mas,
pelo menos parece que seus amigos estão loucos para que as meninas e eu
nos acertemos.
— Poderia começar com o simples passo delas pedindo desculpas a
você por terem sido tão cruéis.
Dou de ombros.
— Eu não me senti ofendida. Nunca dou às pessoas o que elas querem
quando a intenção é me atingir com golpe baixo. A única coisa que mais me
machucaria no momento, é ficar longe de Oli e de você.
Oliver pisca e então sorri aliviado.
Antes que ele faça qualquer coisa, dou um passo à diante e ajeito a
mecha rebelde do seu cabelo escuro que pende sobre a testa. Seus olhos
verdes brilham, e a sua boca rosada me encanta. Quero tanto voltar a beijá-
lo, mas fico o admirando de um jeito que eu não pude fazer antes. Agora eu
olho cada detalhe de Oliver sem o medo de ser flagrada, morrendo de
amores pela sua beleza viril e sensual.
— Não se preocupe, eu vou sobreviver — asseguro e ele toca meu
braço.
Um beijo puro é depositado na palma da minha mão.
— Eu nunca irei machucá-la — acrescenta cheio de tenacidade. — Vá
lá e compre a roupa mais bonita, porque eu quero dançar a noite toda com
você, me divertir e depois te foder tanto que vamos parecer uma segunda
fogueira!
Gargalho e ele me acompanha logo em seguida.
Amo este Oliver que solta as rédeas do CEO implacável e se entrega à
normalidade da vida, que é sorri à toa, sem medo de ser julgado.
— Obrigada pelo incentivo!
Dou um beijo nele e as suas mãos agarram logo a minha cintura quando
ele avança com a língua para dentro da minha boca. Seu hálito me deixa
tonta e a sua língua gostosa passeia por lugares que me deixam louca. Oliver
gosta de um beijo safado e ao mesmo tempo, carinhoso, e isso me pega
desprevenida em tantas situações.
Agora mesmo, eu gostaria que ele me deitasse sobre uma mesa e me
comesse com tanta força que eu despencaria no chão logo em seguida.
Sei que o tempo em que fiquei sem sexo me deixou acanhada, mas este
homem é fogo puro; um gostoso, que certamente vai me fazer virar uma
menina muito mal.

A ida para o centro da cidadizinha é uma tortura.


Isso porque Sofia e Júlia fazem questão de me ignorarem, não faço
disso um caso, mas é entediante. Nenhuma conversa delas sequer me dá
brecha suficiente para fazer um comentário relevante. Não sei qual o último
lançamento da Dolce & Gabbana, e nem qual é a blogueira que foi traída e
logo depois teve um caso com o ex da amante.
Nicolo fica calado a maior parte do tempo, tenta mudar de assunto e
puxar conversa comigo, mas as duas se superam, sempre falando mais alto
ou interrompendo qualquer início de diálogo que nós dois poderíamos ter.
Até mesmo Sofia que vai na frente ao lado do namorado, não perde uma com
Júlia que está sentada atrás comigo.
Ao menos quando chegamos ao shopping, elas parecem se dar conta da
minha presença ali, me chamando para andar ao lado delas enquanto Nicolo
nos acompanha pacientemente alguns metros atrás.
Sofia e Júlia mostram com entusiasmo algumas lojas para mim, umas
três, até Sofia fazer um comentário bastante impertinente:
— Acho que não faz diferença mostrar a você essas lojas, talvez
devêssemos levá-la a uma loja de departamento ou algum fast fashion.
— Qual o problema de ir em uma loja chique dessas? — pergunto com
os olhos estáticos em sua direção.
Sofia dá uma risadinha cruel.
— Acho que não está dentro do seu orçamento.
Júlia comprime os lábios para conter a risada debochada.
— Talvez eu surpreenda você. — Desafio entrando na última loja que
ela me apresentou a vitrine.
— Na verdade, não me surpreende que Oliver esteja te bancando —
murmura com desinteresse.
É claro que aquele seu comentário dá um nó no meu estômago, e que
minha garganta queima feito brasa por ter sido uma fala bastante
provocativa. Olho para Nicolo, só para ter certeza de que ele está longe o
suficiente para ela ter a audácia de fazer tais comentários.
Ele está ali, mas não larga do celular.
— Eu trabalho, sabia? — murmuro dando atenção para as roupas
quadriculadas de uma arara.
A loja está com uma coleção especial de festa junina, e por isso tem
muito xadrez ali, de todas as cores e modelos.
— E como você vai parcelar, se foi demitida? — insiste.
Merda, ela está mesmo tentando me humilhar, usando da curiosidade
para mascarar a sua perversidade.
Respiro fundo e mostro a ela um sorriso.
— Bem, eu me demiti. Vou trabalhar na creche da empresa do Oliver.
— E depois pegar tudo o que é dele? — supõe com os olhos
arregalados, como se a coisa toda fosse incrível demais ou chocante.
Mas me fere, e trinco os dentes para respondê-la com um olhar mortal:
— Escuta, Sofia. Eu não sei o que você pensa de mim, mas com
certeza não sou a mercenária que você pensa que eu sou. Só que também não
ligo, eu não ganho nada tendo ou não a aprovação de você e suas amigas.
Me afasto antes que ela diga alguma coisa, mas ao ver pela boca
aberta e a expressão petrificada, Sofia não tem argumentos o suficiente para
atirar contra mim, até porque tudo isso que ela está fazendo é sem
fundamento nenhum. Eu só quero comprar a droga da roupa e voltar para a
fazenda.
“Eu deveria ter escutado Oliver, deveria mesmo!”
Por mais que eu esteja mantendo a postura, estou fervilhando por
dentro. Odeio intrigas e discussões, ainda mais as desnecessárias. Nunca
precisei levantar a voz com ninguém, porque nunca tive esse tipo de estresse,
mas nos últimos meses, as coisas têm se superado.
Encontro um lindo vestido vermelho e preto quadriculado, com a saia
rodada, acetinado e com o decote ombro a ombro de mangas curtas e
bufantes.
É perfeito!
Vou para o provador e me dispo, ficando com as roupas íntimas. Pego
o vestido pronta para prová-lo, e a cortina do provador é brutalmente aberta
e fechada logo em seguida quando uma Sofia muito furiosa entra.
— Mentirosa, você diz que não liga, mas está igual uma desesperada
querendo a nossa aprovação! — Chega mostrando os dentes, rosnando, com
os olhos brilhando em raiva e a pele bronzeada se avermelhando conforme
ela me difama.
Quero chorar de raiva por essa perseguição sem fim, mas só consigo
gritar.
— SAI DAQUI, SOFIA!
— Você é ridícula, acha que tem algo de especial, mas nem mesmo o
fato de ter carregado o filho de Oli por nove meses reduz o fato de você ser
só uma professorinha pobretona!
Minha visão escurece e sinto que meu tímpano vai estourar como se
ela tivesse berrado tudo isso bem dentro do meu ouvido. Sinto meu sangue
correr ao contrário quando meu único lapso de reação é levantar a mão e dar
um tapa no seu rosto que estala e ela vira com exagero.
Sofia me olha chocada, tocando a face vermelha onde bati.
— VOCÊ ME DEU UM TAPA! — grita saindo da cabine, deixando a
cortina escancarada enquanto eu estou, apenas de calcinha e sutiã preto. —
Você me deu um tapa! — fica repetindo.
— E VOCÊ ME DESRESPEITOU! — grito de volta, sem sair da
cabine, mas vejo Júlia e Nicolo se aproximarem preocupados. — Estou
cansada de ser destratada desse jeito, estou cansada de gente achando que é
melhor que todo mundo! Você é tão podre por dentro que já cegou a si
mesma!
Assim que a loira percebe o namorado ali perto, corre para seus
braços dramaticamente.
— Meu bebezinho, ela me bateu! Olha! — Sofia expõe o lado do seu
rosto que eu dei o tapa.
A minha mão arde, mas não me arrependo.
Olho para Nicolo sem nenhum vitimismo, com a mesma fúria, sem
disfarçar nenhuma emoção que toma conta de mim naquele momento.
Mas ele sustenta um semblante de desprezo para a namorado que se
atira em seu lado explicando que eu bati nela.
O silêncio do advogado me deixa assustada.
Eu esperava que ele fosse gritar comigo também, que fosse defendê-la
e jogar em mim toda indiferença que já expressou sentir antes. Mas agora,
Nicolo surpreende a mim, e a namorada surtada também.
Ele a segura pelo braço enquanto olha para ela de um jeito beligerante,
a deixando sem reação pela forma inesperada que Nicolo lida com a
situação.
— Sofia, o que você acha que devo fazer quando você age
completamente sem a porra da noção?!
Ela pisca atônita.
As vendedoras e eu, ficamos olhando surpresas demais.
— Mas, Nico, bebezinho... — Tenta tocar nele, mas ele a agarra pelos
dois pulsos.
— Mas nada, Sofia! Eu ouvi o suficiente para tirar minhas conclusões
do tipo de pessoa que você é.
— Do tipo de pessoa que eu sou?! — repete. — Estamos juntos há
quase três anos, Nico!
— E eu não me permitia ver as coisas que estavam bem debaixo do
meu nariz — comenta visivelmente afetado por perceber finalmente o lado
podre da namorada.
— Você não sabe do que está falando. Deveria estar defendendo a
mim!
— Eu sempre defendo os inocentes, você sabe disso.
Sofia paralisa, completamente chocada com o fato do próprio
namorado não estar defendendo as suas maldades. Abraço meu corpo e não
sei por que ainda não corri pra trás daquela cortina ou porque não coloquei
um amontoado de roupas na minha frente, mas, para defender a minha
dignidade, as vestimentas são as últimas opções a se preocupar.
O advogado respira fundo e olha para mim, mas não demora muito,
apenas aconselha:
— Coloque uma roupa, compre o que você precisa e não tenha pressa.
— Pega Sofia pela mão com delicadeza, mas sem mais nenhum sentimento
arrebatador de paixão lhe iluminando o rosto. Então, emenda: — Sofia e eu
vamos ter uma conversa.
A loira hesita, olhando para ele de um jeito especulativo, enquanto
apenas decepção estampa o rosto galanteador de Nicolo. Ele não desiste, a
puxa para fora do provador, e Sofia vai em seu encalço, deixando Júlia sem
chão, mas já com os dedos ágeis na tela do celular, talvez esteja contando a
notícia a alguém.
Dom?
Bruna?
Oliver?
Lorenzo?
Não sei.
Será que eles têm um grupo de casal no WhatsApp?
Droga, Oliver nunca me contou nada, mas acho difícil.
De qualquer forma, sigo as ordens de Nicolo. Já expus meu corpo
demais aqui, e sem experimentar o vestido, já sei que é ele que eu vou levar.
No início, eu idealizava tanto evitar uma coisa do tipo, mas agora que é real,
a única coisa que pode fazer isso tudo não ter sido em vão, é comprar a
droga do vestido.
Fico irritada porque Sofia tem razão, parcelo o vestido, mas logo em
breve precisarei começar no novo emprego para pagar as minhas dívidas.
Oliver sempre se prontificou a querer me ajudar financeiramente, mas eu não
queria dar aquela ideia que Sofia tanto agarrava sobre mim. Já acho demais
quando ele chega com os presentes que compra para mim, então a última
coisa que eu gostaria é de andar por aí me exibindo com o seu cartão de
crédito.
Mesmo após todo escândalo, peço desculpas as funcionárias da loja e
me despeço. Não sei o que fazer ou para onde ir, mas escolho sentar no
banco ali na frente da loja e esperar.
Júlia passa por mim bufando, pegando outro caminho dentro do
shopping.
A olhada que ela me dá é fulminante, mas já mostrei que não tenho
medo.
Começo a cogitar em ligar para Oliver, explicar a ele o que aconteceu,
mas serei a responsável por acabar com o clima de festa.
Todos estarão se estranhando à noite.
Eu não deveria ter dado um tapa em Sofia, é claro que me arrependo,
sou contra violência, mas juro que não tive alternativas melhores e mais
súbitas do que levantar a minha mão.
Minutos e minutos se passam.
Devo mesmo ligar para Oliver e pegar o contato de Nicolo da próxima
vez. Isso se eu conseguir falar com ele, pois estou morrendo de vergonha.
Quando já estou abraçando essa ideia, ele surge e senta ao meu lado,
exausto e abatido. As pernas estão relaxadas e a postura ele mandou para
bem longe.
— Me desculpa por aquilo, Nicolo. Eu não queria causar toda essa
situação, mas foi mais forte do que eu — declaro sem ter forças para olhá-lo
nos olhos.
Ele solta um suspiro.
— Tudo bem, foi um jeito de se defender, não foi? É certo que havia
outras maneiras, mas são atitudes que dá para descartar. Além do mais, ela
que começou falando todas aquelas baboseiras — confessa.
Agora sim ele tem a minha atenção e olho curiosa para ele.
— Eu estava de olho no comportamento da Sofia já faz um tempo.
Quando você chegou, a coisa toda só piorou e aquilo que eu ouvi hoje... —
explica.
— Você ouviu tudo?
— Ouvi até mais do que eu poderia suportar. Fiquei extremamente
decepcionado, Isis, muito. O meu coração partiu, mas precisei fazer o que
era certo.
Meu sangue congela.
— O-o que vo-você fez? — gaguejo, com medo do que ele vai falar.
Nicolo solta um suspiro forte e me olha de um jeito melancólico. Seus
olhos azuis como a superfície do mar já não brilham tanto.
— Eu terminei com a Sofia. Foi isso o que eu fiz.

Algumas coisas são difíceis de entender, mesmo que as razões sejam


óbvias.
Eu ainda não acredito que Nicolo terminou com a namorada que estava
junto há três anos.
Ele pediu para eu pegar um Uber enquanto levaria Sofia para o
aeroporto, porque ela não suportaria ter que continuar mais uma noite na
casa sabendo que eu estaria sob o mesmo teto, e que ele a rejeitaria diante
de tamanha decepção que causou a ele.
Me surpreendo pelo fato deles não insistirem.
— Talvez eles conversem melhor em Florianópolis — Oliver comenta
de braços cruzados quando sento com ele e Domenico para explicar o
ocorrido.
Ele adotou uma expressão distante desde que expliquei o ocorrido.
— Nicolo fez o correto. E não falo isso só porque ele defendeu você
de forma justa, mas porque já estava na hora dele se libertar do
relacionamento tóxico.
— O que? — indago.
— Além de ser esnobe, Sofia é extremamente possessiva — Domenico
enfatiza, escorado próximo a janela da sacada. — Mas antes, você precisa
entender que Nicolo também não era flor que se cheirasse.
Pisco confusa, e Oliver se ajeita na poltrona ao meu lado, pronto para
me dar melhores explicações.
— Nicolo era um grande cafajeste. Nunca foi de relacionamentos
sérios, mas já quebrou muitos corações. Uma vez falamos que uma mulher
iria colocá-lo no eixo, e seria pior que ele. E, bem, descobrimos que a
galinhagem do Nicolo no fim não era lá no fundo o seu grande defeito,
porque ele acabou se apaixonando por alguém que até os dias de hoje, para
ser bem sincero, nunca entendemos como isso aconteceu — resume.
— Pode dizer que jogamos uma praga a ele, mas tudo o que você faz,
um dia volta pra você. E acho que assim como ele cegou muitas garotas no
passado com amor falso, Sofia o cegou com toda a beleza e charme dela,
mascarando sua podridão — Dom completa.
Fico mais surpresa do que eu gostaria, embora eu nunca imaginasse
que Sofia fosse na verdade, uma investida do universo e suas façanhas.
— Respeitamos Sofia, mas nunca gostamos dela por reconhecermos o
que Nicolo jamais foi capaz de perceber, até hoje — Oliver ressalta
esfregando as mãos no rosto e apoiando os cotovelos sobre os joelhos. —
Mas não se martirize tanto, Nicolo vai ficar bem.
Balanço a cabeça.
— Ele a amava — reflito.
— Ela também o ama, mas nunca lutou por isso. Somos uma família,
querida, e lutamos pelos nossos — Oliver comenta me consolando com a sua
mão no meu pescoço. — Sofia jamais entendeu isso.
As palavras dela me ridicularizando me atingem em cheio. Eu não
queria aquilo, mas aconteceu e Nicolo achou que seria um ponto de partida
importante para um novo ciclo da sua vida. Mas os amigos dele me
asseguram de todo jeito, o relacionamento deles já era algo arruinado, eles
só mantinham as aparências e tentavam de todo jeito se sentirem conectados.
Tenho a certeza de que hoje, Nicolo teve a comprovação de que a
energia deles já não é mais a mesma, e que Sofia não é quem ele achava ser.
E quando anoitece, não sei definir bem qual é a atmosfera do lugar. Há
tanta coisa acontecendo, que fica entre algo alegre e fúnebre. Mas tento me
divertir com os meus garotos, não posso deixar as coisas de mais cedo me
abalar, não sou a causadora daquilo quando foi Sofia quem procurou
confusão.
Pelo menos o meu vestido de festa junina ficou perfeito em mim. Oli
também está vestido de um jeito mais desengonçado, igual ao pai.
Dois caipiras.
A fogueira está linda com suas labaredas brilhantes e mostro para Oli,
que fica encantado.
Como algumas comidas típicas como canjica e caldo de cana, e então,
danço umas modas de viola que toca preenchendo a noite com alegria.
O local da festa é no campinho entre a fazenda e os estábulos. Há
várias luzinhas penduradas iluminando à noite, intercalando com as
bandeirolas coloridas que definem uma das festas mais gostosas do ano.
Danço com Oliver, que me beija e me abraça na frente de todo mundo.
Dom diz que estou bem-vestida, e que parece ter valido à pena todos
os esforços de hoje à tarde.
Mostro a língua pra ele num ato infantil, sua noiva revira os olhos e
ele dá um sacode nela. Me afasto encontrando Margarida, elogio toda
comida, e ela diz que devo comer mais porque estou "magrinha", do ponto de
vista dela, claro. E então, Oliver me puxa para dançar.
Os amigos de Oliver parecem me aprovar bem mais agora. Não estive
desesperada por isso, como Sofia afirmou mais cedo, mas sempre estive
preocupada para saber como seria conviver no mesmo ambiente com o meu
filho, sabendo que as pessoas que me cercariam com indiferença, seriam as
mesmas que cercariam a ele. Tive medo que esse sentimento chegasse até
Oli, mesmo sendo um bebê indefeso.
Sou tirada dos meus pensamentos quando Lorenzo me convida para
dançar uma música. Eu aceito de bom agrado, sorrindo, mas um pouco
receosa. Ainda não sei a opinião dele sobre o que aconteceu hoje mais cedo.
Lorenzo esteve mais cedo com Nicolo, eles conversaram bastante, então o
advogado deve estar em algum lugar aqui da festa.
— Faz tempo que não o vejo tão feliz — comenta olhando em direção
de Oliver, que está com Oli no colo enquanto conversa com Dom e mais dois
caseiros. — E graças a Oli e você.
Arregalo os olhos de surpresa.
Ouvir Lorenzo admitir isso me deixa muito chocada e aliviada, e ele
percebe a trégua que dá.
— Escuta, Isis. Me desculpa por ter ficado distante e um pouco
indiferente em relação a sua chegada. Mas depois do que Sofia fez a você...
— Ele não sabe quais palavras usar, está envergonhado, tentando me agradar
de algum jeito. — Saiba que meus amigos e eu fazemos tudo um pelo outro,
assim como faremos qualquer coisa por Oli e por você também.
Meu coração se aquece e meus olhos se enchem de lágrimas. Depois
daquela situação horrível de mais cedo, eu precisava mesmo ouvir alguma
coisa do tipo, e Lorenzo não faz ideia do quanto me deixa aliviada.
Respiro fundo.
— A opinião de vocês importa muito para Oliver, vocês são como
irmãos, são uma família. Então agora que pareço ter a afeição de vocês, as
coisas não parecem estranhas demais a ponto de me afastar dele. — Pisco e
algumas lágrimas caem. — Obrigada, Lorenzo.
Ele fica surpreso.
— Você está chorando, mesmo?
Afirmo, repouso minha cabeça em seu ombro e choro mais um pouco.
Das vezes que fui negligenciada, não tive a oportunidade de ouvir algo do
tipo, as palavras de puro arrependimento.
— Não tem o que agradecer, sabe. Eu só estou fazendo o que é certo.
Mesmo que eu esteja emocionada, me aperto ele. Eu achava mesmo
que ele me odiasse, ou me achasse uma interesseira ridícula. Tive muita
certeza que era isso, diante dos diálogos que tinha comigo. Mas agora ele
volta atrás e reconhece que não foi muito bom comigo.
— O que houve? — Oliver pergunta se aproximando com a testa
franzida
Me afasto de Lorenzo, mas sem muito alarme.
Não estávamos fazendo nada demais.
Quando Oliver percebe que estou chorando, ele fica paralisado, mas
esboço um sorriso calmante para ele.
— Está tudo bem. Lorenzo e eu estávamos tendo uma conversa e eu só
fiquei feliz — explico secando as lágrimas.
Oliver me olha de um jeito sugestivo.
— Querida, você não sabia que Lorenzo fica sem chão ao ver
mulheres chorando? Não maltrate mais ele.
Olho para Lorenzo, que sorri e diz um palavrão para o amigo.
— Agora, eu vou dançar com a mãe do meu filho — Oliver diz, me
tomando para si.
— Mas mal dançamos a música! — protesto.
A boca dele se aproxima do meu ouvido e sussurra:
— Querida, essa é a oportunidade perfeita para ficarmos juntinhos
agora.
Sorrio sem jeito, me sentindo queimar da ponta dos pés à cabeça.
Lorenzo percebe.
— Quer saber? Vão fazer o que vocês devem fazer — ordena com um
gesto de mão, sabendo o que o amigo gostaria de fazer naquele momento.
Oliver pisca para ele e me guia para longe da música, da fogueira e da
festa.
Me sinto jovem demais, apaixonada demais e com tesão demais.
As impressões digitais de Oliver ainda estão em mim depois da noite
anterior onde transamos pela primeira vez e foi de tirar o fôlego.
Gozei pela primeira vez, senti o que é um sexo de verdade, o que é ser
desejada e comida direito.
Foi incrível!
Se Oliver me dissesse que gostaria de fazer aquilo de novo agora, eu
não hesitaria. E como ele parece muito a fim, o deixo me levar.
No caminho, ele me diz que deixou Oli com Dom e a Margarida, que
estava dando milho para ele comer de grão em grão. Fico um pouco receosa
quando vejo que Oliver está me levando para uma parte escura da fazenda,
onde quase não podemos mais ouvir a música da festa.
Mas não demorou até eu perceber qual era o seu plano, o celeiro.
Um celeiro grande e vermelho, com vigas brancas e que
aparentemente, ainda não fora concluído. Oliver entra e deixa a porta
entreaberta para entrar a luz da lua ali.
Ele me guia pela escuridão do local com terra batida e alguns fenos
espalhados. Explica que aquele celeiro é um teste, antes que comece a
reforma nos outros.
O silêncio é preenchido pelo som dos nossos passos e do gritinho que
dou quando Oliver me gira em seus braços e me pega no colo, me deitando
em uma cama de feno com tamanha gentileza.
Sinto o material fofo e áspero debaixo de mim.
— Esta é a sua ideia? — pergunto a ele que engatinha em minha
direção.
— Você quer saber qual é a minha ideia, querida? — pergunta
sensualmente, dando um cheiro no meu pescoço e roçando a ponta do seu
nariz ali na pele sensível, fazendo gracinhas com a sua barba. — Primeiro,
vou beijá-la muito.
Ele cumpre com sua palavra.
Oliver me beija afundando sua língua dentro da minha boca,
explorando junto com a minha, instigando todo meu corpo e fazendo aquele
ponto lá embaixo se contorcer, com urgência e prazer. Morde e chupa meus
lábios, me fazendo gemer dentro da sua boca.
Agarro seu cabelo com força e inclino meu quadril para cima só para
sentir mais ainda seu pau sob o jeans roçando na minha barriga.
A mão esquerda dele se envolve em meu cabelo, puxando minha
cabeça para trás, tendo uma visão melhor do meu longo pescoço, onde ele
passa a língua, os dentes e a barba. Até o mais singelo toque da sua
respiração contra a minha pele faz o meu coração acelerar.
— Eu não consigo parar de pensar em você — admite enquanto passa
a língua pelo meu colo. — O seu cheiro... O seu gosto... O seu beijo. Porra,
tudo isso me enlouquece! Os seus seios, a sua bocetinha, esse seu gemido
gostoso e a sua boca suja.
— Eu não tenho a boca suja — ressalto.
Ele para de me beijar e de lamber para me olhar de um jeito bem
provocativo.
— Mas eu amei como você pediu pra mim... Como foi mesmo? — Se
faz de desentendido, até soltar as palavras: — Ah, chupar a porra da sua
boceta!
Dou risada ao ouvi-lo parafrasear a minha fala de ontem.
Ele sorri por perceber que fico acanhada e brinca com uma mecha do
meu cabelo.
— Não fique com vergonha, minha querida. Amo quando você diz
coisas safadas. Me diga, Isis, as coisas safadas que quer que eu faça com
você. Me diz, por que eu amo ouvir putaria vinda desta sua boquinha linda
— finalizou com um beijo casto, de tirar o fôlego, mas estimulando com a
sua língua para ativar o modo safada.
— Tem uma coisa — digo entre seus beijos. — Que eu quero que sua
boca faça muito.
— O que é, minha querida? — Se afasta com os olhos brilhando.
Engulo seco, morrendo de vergonha em como irei falar aquilo.
Mas, sinceramente?
A minha intimidade está úmida e sofrendo, meus seios estão doloridos
e pesados de tanto prazer, meu corpo todo sofre com apenas um toque de
Oliver. Então o que eu quero, é simples, mas que me dá muito prazer:
— Quero que você chupe e mame meus seios, olhando pra mim —
ordeno, e Oliver sorrir satisfeito com o pedido.
Ele não diz uma palavra, se faz de meu submisso quando ordeno e
apenas faz o que deve ser feito. Oliver abaixa o decote do meu vestido e
expõe meus seios beijados pela luz da Lua, até Oliver arfar admirado.
Deitado sobre mim e apoiando com cotovelos e joelhos, ele se inclina
para baixo e passa a ponta da língua no meu mamilo esquerdo, girando e
girando. Solto um gemido e a minha vagina se contrai em prazer, meus dedos
ficam se contorcendo dentro da botinha que calço, e meu corpo todo treme.
Ele repete o mesmo movimento no outro, contornando com a língua e
brincando com meu mamilo.
Até que fecha a sua boca entorno do seio e começa a me mamar e me
chupar, sempre me olhando.
Aquela troca de olhares mostra que aquilo vai além da carne.
Fico muito excitada com Oliver me olhando cheio de prazer enquanto
está abocanhando o meu seio e gemendo porque ele diz que ambos são
deliciosos. Seu polegar e indicador ficam brincando com o outro mamilo, e
sinto que posso ser capaz de gozar se ele continuar apenas desse jeito.
Mas Oliver é insaciável e ama brincar comigo.
— Vamos, abra as pernas — pede e obedeço. — Vou foder essa
bocetinha com meus dedos, tudo bem?
— Sim, faça isso.
O filho da mãe morde o bico do meu seio.
— Aí! Por que fez isso?
— Não fique com vergonha. O que você quer que eu faça? — pergunta
sempre falando com a boca próxima demais dos meus seios, e os olhos
estreitos em minha direção, mas curiosos.
Odeio ser tímida!
Ao mesmo tempo que quero dizer essas coisas, me retraio. Mas Oliver
me deixa assim, e eu preciso perder esse medo.
Ele gosta, e eu também, então não tem razão para não falar.
— Eu quero que você me foda com seus dedos grandes e gostosos,
agora! — digo ainda um pouco acanhada, mas isso parece deixá-lo louco.
Oliver dá um sorrisinho vitorioso.
— Agora mesmo, querida — sussurra.
Ele volta a se concentrar nos meus seios, mamando e chupando cada
um deles. Sinto a sua boca quente e molhada contra a minha pele, e isso me
excita muito, mas perco tudo quando sinto seus dedos atravessarem o limite
da minha calcinha e começar a brincar com o meu clitóris assim que o
encontra. Oliver o estimula com carinho, sem muita pressa, mas com
tenacidade.
Solto um gemido só de sentir a ponta do seu dedo brincar com aquela
área, até ele descer seu dedo pela minha entrada molhada. Isso faz com ele
solte um gemido quase animalesco.
— Toda encharcada para mim, que gostosa!
Suas palavras depravadas me deixam louca também, fazendo com que
eu abra minhas pernas ainda mais e ele tenha melhor acesso. Seu dedo
encharcado com a minha umidade volta para o meu clitóris agora mais
lubrificado, e desliza ali com facilidade, rodando e rodando, fazendo meu
corpo todo se contorcer diante dos estímulos.
— Caralho, que gostoso, Oliver! — pronuncio toda manhosa, o
deixando orgulhoso.
Mesmo que aquilo esteja muito bom, aquele seu dedo desliza para
dentro da minha fenda, e ele arfa.
— Quentinha e apertadinha — comenta conforme vai afundando seu
dedo em mim, e então, tira e afunda de novo.
Estou alucinada de prazer com aquele homem em cima de mim, me
chupando, lambendo meus seios, e agora me fodendo com os seus dedos
também, dentro de um celeiro com a porta apenas encostada, enquanto ali
perto acontece uma festa.
Isso tudo coopera para o meu prazer aumentar, então começo a rebolar
com seu dedo dentro de mim.
— Isso, minha querida. Rebola pra mim — murmura com os dentes
presos no bico do meu seio.
Sinto um segundo dedo me penetrar, e é quando ele aumenta a
velocidade daquela dupla que se afunda em mim. Aperto os dedos de Oliver
e ele engole o gemido, mas ele acelera o ritmo, fazendo com que um barulho
depravado rompesse o silêncio. É algo entre a palma da mão dele bater
contra a minha boceta e da minha umidade que só aumenta.
Mais uma vez, isso também me deixa louca.
— Goza pra mim, goza — pede, sabendo que estou ficando mais
quente e que meu interior está mudando conforme seus dedos vão me
penetrando.
Agarro seu cabelo e tenciono meu quadril para cima quando sinto o
momento chegar. Algo se alivia e então, explode dentro de mim. Estou
gemendo e gritando, conforme vou deixando tudo derramar em Oliver, que
agora acaricia o meu clitóris dolorido e sensível.
Aperto os olhos para sentir bem toda aquela sensação que eu não
conhecia antes, porque apenas Oliver foi capaz de me levar à tamanha
loucura.
Quando já estou relaxada e me recuperando do orgasmo, ele tira seus
dedos de dentro de mim e revela sob a luz pálida o quão encharcados eles
estão, e com o meu cheiro. Oliver leva a língua até eles, e lambe tudo.
— Isso é muito sexy — comento e ele sorri.
— E você é muito gostosa. Tenho propriedade pra dizer isso agora —
afirma, se inclinando para me dar um beijo. — Você gosta do seu sabor?
Ele enfia a língua e me beija profundamente, marcando bem a minha
boca com o meu gosto.
— Eu gosto do seu — murmuro e ele dá de ombros.
— Nós temos ótimos gostos.
Sorrio e então o beijo mais uma vez.
Apesar de tudo, a noite está sendo perfeita, mas olho para ele
preocupada com uma coisa:
— Será que gritei muito alto?
Oliver olha pela fresta deixada na porta do celeiro e ignora.
— Não sei, mas ainda há a chance de você gritar mais alto.
— Por quê? — Faço uma pergunta idiota, mas que ele aprova.
— Porque ainda vou comê-la bem aqui e com esse vestidinho bonito.
Não tire.
— Eu não vou.
Antes de Oliver abrir o seu zíper, eu já estou salivando e louca para
falar coisas obscenas para ele. E eu preciso dizer, preciso afirmar, agora
mais do que nunca, sei que estou apaixonada por esse homem.
ISIS

Quatro meses depois...

— Mamã.
Esta é a primeira palavra reconhecível que Oli sibila na mesa
enquanto tomamos o nosso café da manhã, já na mansão em Florianópolis.
Oliver e eu nos entreolhamos, e ficamos sem reação por tamanha
surpresa inesperada logo cedinho, mas choro porque a sua primeira
palavrinha foi para mim.
Depois começamos a sorrir feito dois bobos, brincando com ele,
fazendo caretas e dizendo coisas fofas ou sibilando outras palavras que
talvez ele pudesse repetir também, mesmo que de um jeito engraçado.
Não vai demorar muito até que ele faça um aninho, então o
desenvolvimento de Oli tem decolado nas últimas semanas.
Amo acompanhar tudo de pertinho, desde seus longos passos pela
casa, a forma como ele brinca com seus instrumentos musicais. O xilofone de
Nicolo tem sido muito utilizado nos últimos dias, e Oliver nem tem se
estressado; na verdade, ele ama.
São poucas coisas que Oli faz e irrita o pai, como não o deixar colocar
a fralda, por exemplo, porque fica balançando as perninhas exageradamente
e isso o deixa louco.
Confesso que é engraçado ver um bebê deixando um adulto como
Oliver, completamente irritado. Mas a maternidade e paternidade tem dessas
coisas, e às vezes, bem mais intenso.
O meu filho é um menino calmo, e por isso, a maternidade tem sido
uma experiência boa, recebo todo tipo de auxílio e isso me torna uma mãe
privilegiada, mas há momentos de pura tensão, onde preciso respirar fundo e
contar até três.
Amo o meu filho, mas às vezes ele me faz encontrar a paciência que eu
nem sabia que existia.
De qualquer forma, qualquer novidade que Oli faça, já é motivo o
suficiente para Oliver querer reunir todo mundo na mansão.
Ele não me conta, mas sei que meu pai o ajudou com a ideia, pois ele
foi a primeira pessoa para quem Oliver entrou em contato anunciando a festa
na piscina no final de semana, depois, os amigos.
Nicolo andou meio distante após o rompimento com Sofia, mas não
que ele esteja com raiva ou algo do tipo, Oliver me explicou que o advogado
está de certa forma, envergonhado por não ter notado tão cedo quão mau-
caráter a ex era. Ele sempre pede desculpas pela forma como Sofia me tratou
da última vez, mas eu já esqueci, no entanto, as feridas nele parecem
recentes ainda.
Felizmente, ele comparece no dia da festa na piscina. Traz até um
livrinho que toca os sons das vogais, já que espalhamos que Oli já fala
"mamã".
Eles ficam realmente empolgados com a ideia do bebê estar
crescendo.
Dom e Lorenzo já prometeram que assim que estiver andando com
excelência, o levará para as partidas de futebol com os amigos. É claro que
a ideia não me agrada nenhum pouco, pois Oli ainda é pequeno demais para
essas coisas.
Mas é Muriel que me detém na festa a maior parte do tempo.
Desta vez, ela trouxe o biquíni dela.
— Que coisa é essa de você e o CEO estarem trocando beijos e
olhares intensos na frente de todo mundo? — pergunta assim que sentamos na
beira da piscina.
Mordo o lábio e olho para ela de um jeito serelepe.
— Nós estamos juntos. Tipo, oficialmente.
Os olhos azuis acinzentados dela ficam arregalados.
— Mentira! E quando você pretendia me contar, sua cruel?! —
esbraveja descontando no meu ombro.
— Eu avisei. Na verdade, tentei avisar! — Reviro os olhos lembrando
de como foi contar a novidade para Muriel.
— Eu achei que estivesse tirando uma com a minha cara. Pelo tom da
conversa, achei mesmo que estivesse apenas tirando onda. — Sorri nervosa.
Droga, é verdade!
Estava tão empolgada e ansiosa, que tive uma crise de riso e Muriel
achou que estava bêbada e inventando coisas.
— Então vocês já...
— Se transamos?
Ela parece espantada.
— O fato de você falar essa palavra com naturalidade mostra que ele
corrompeu seu lado santo e agora você é uma safada. Uma professora
safada.
Gargalho e Muriel diz que os outros olham curiosos, mas nem ligo. Sei
que Oliver gosta da minha risada, ele diz que tanto eu quanto Oli,
preenchemos a sua casa de alegria. E deve ser verdade, porque ele está
sempre de bom humor.
— Eu só não tinha o estímulo que precisava. Mas com Oliver...
— Faz o tapado daquele seu ex-namorado parar no chinelo?
— Nem precisa de comparação, Muriel! — desdenho.
— Você está gostando? — pergunta com os olhos brilhando e um
sorriso malicioso.
Encontro Oliver jogando uma partida de dominó com os amigos e meu
pai. Eles não desgrudam dali, e a Júlia com a Bruna passam a maior parte do
tempo de lado, mexendo no celular. Oli está brincando no seu chiqueirinho,
do lado da mesa onde está rolando o jogo.
Solto um suspiro porque tudo parece perfeito demais, a forma como as
coisas fluem igual a um riacho calmo, o jeito que meu coração parece
tranquilo e a minha cabeça em paz...
Até o clima está perfeito!
Meu pai está aqui, a minha melhor amiga também. Tudo que eu mais
prezo está aqui comigo, então por mais que Muriel tenha perguntado sobre a
minha relação com Oliver, penso no geral.
— Sim, estou amando. Tem sido tão perfeito que tenho medo de
acordar e ser tudo um sonho.
Ela sorri para mim.
— Você merece, sabe. Todo mundo merece ser feliz, mas existem
algumas pessoas que... Caramba! Existem pessoas que passam por tanta
coisa que elas deveriam ter prioridade na fila da felicidade e estou quase
furando a fila.
Meu coração dá um solavanco.
Droga, a vida de Muriel também é complicada e ela precisa lidar com
algumas coisas bem desagradáveis ainda.
Eu costumo me sentir culpada por não estar perto dela todo dia e dar
apoio a ela. Mas dou um jeitinho, mesmo que seja por ligações
intermináveis.
— A sua vez está chegando, amiga. E espero que não demore muito.
Seja paciente como sempre foi, e independente de tudo, estarei aqui do seu
lado, lutando juntas para sermos cada dia mais felizes.
Ela acena e faz uma carinha triste, mas tenta disfarçar com aquela sua
cabeleira volumosa.
Escondo uma mecha atrás da orelha, olhando para ela com cuidado e
preocupada.
— Me prometa que vai me contar tudo! Que nem com a distância, você
não vai esquecer de mim.
— Não “crisa”, Isis.
Muriel usa uma das suas gírias e se recompõe com felicidade; isso é
uma habilidade que a gente adquire bem com o tempo, assim evita mais
perguntas chatas e não sei se devo ou não ficar chateada por me evitar.
— Vai ficar tudo bem, estou bem. Amo você e quero te ver feliz,
porque se você está, eu também estou.
— Eu também amo você, prima. — Abraço Muriel, que logo retribui
com outro apertado.
Essa é uma das incontáveis declarações que fazemos uma para a outra.
A nossa amizade nunca foi abalada. Depois da minha relação com o
meu pai, vinha essa nossa conexão de mulheres, primas e amigas. Sempre
contei com ela pra tudo, e mesmo agora que a minha vida parece uma
loucura, não é nada diferente, pois aqui está Muriel, vivenciando, senão, a
coisa mais incrível que já me aconteceu.
A gente toma banho na piscina e ela tira foto com a câmera do seu
celular. Ficamos de bobeira ali, curtindo o Sol e a música. Mas logo depois
lembro que está na hora de Oli vestir uma fralda, pois já passou tempo
demais apenas de sunga.
Saio da piscina e Muriel vem logo atrás de mim, mas procura fazer
outra coisa, enquanto eu pego Oli do chiqueirinho e o levo até o trocador que
Oliver colocou na varanda mais cedo.
Oli não gosta muito de fraldas, e por isso ele sempre aproveita da
situação para ficar inquieto. Seus gritinhos se sobressaem, chamando atenção
dos meninos.
Ouço a voz de Dom quando ele faz um comentário e corre na minha
direção assim que ele parece perder a partida do jogo.
Sou surpreendida por um beijo dele na minha bochecha, tão forte que
chega a estalar.
Não acho nada demais.
O conheço há bastante tempo, cuidou de mim quando eu estava
gestante e fez o parto, agora além de ser tio de Oli, virou um grande amigo
para mim.
— E aí, qual o problema? — pergunta observando a situação.
— Oli odeia fraldas. Ele realmente não deixa colocar.
— Você precisa distraí-lo. Tornar esse momento o mais divertido
possível também, mesmo que envolva cocô, às vezes, o que já é horrível —
explica.
Sorrio concordando com as palavras dele.
Mas, vai entender crianças?
Oli é igual ao pai, uma caixinha de surpresas.
— Assim? — pergunto e começo a fazer várias caretas para Oli, que
acha graça e estica as perninhas, quando acho o momento perfeito para vestir
a fralda nele.
— É, você é boa nisso — zomba e empurro seu ombro de leve.
Dom sorri, e se distancia indo para o banheiro.
Volto a me distrair com Oli, mas de canto observo uma movimentação
diferente e me viro. Vejo uma Júlia furiosa andando na minha direção, ela
esperou o noivo sair para entrar em cena. Acho que nunca vi seus olhos tão
azuis, e a forma como ela me olha e anda, revela que alguma coisa a irritou
muito.
Mas me preparo para seja-lá-qual-for a sua tacada. Já dei um tapa em
uma que me humilhou, não faria diferente outra vez.
— Primeiro o da Melissa, depois o Nicolo, vai querer tirar o Dom de
mim também?! — pergunta de forma rude, mas baixinho para que os outros
não pudessem ouvir.
— Do que você está falando? — Pego Oli no colo, só ele para evitar
que algo de pior aconteça neste momento.
Meu coração está batendo forte e o meu corpo começa a tremer todo;
odeio essa sensação.
“Por que essas garotas não me deixam em paz?!”
— Não se faça de sonsa! Você fica agindo feito uma tola, mas sei bem
que tipo de raça você é! — Seu tom é ameaçador e mostra os dentes como se
fosse me morder a qualquer instante.
Olho séria para ela e fico paralisada.
Não posso reagir, não posso fazer outro escândalo igual ao do
shopping porque não sei do que Domenico também seria capaz. Sem contar
que tem meu pai, Muriel e Oli, eu odiaria que eles presenciassem uma coisa
do tipo.
— Vamos! Cadê sua bravura? Bate em mim, do mesmo jeito que você
meteu a mão na cara da Sofia, sua sonsa falsa!
— E por que você está sussurrando? Está com medo? — pergunto no
mesmo tom, mas ela não se acanha.
— A diferença entre nós duas é que não preciso me segurar a macho
algum para ser bancada. Não sou uma fodida igual a você! — conclui com
um sorriso cruel nos lábios.
Eu podia jurar que nessa hora, eu ia gritar com ela. Mas meu sangue
parece subir para minha cabeça e o choro guardado chega a arder minhas
narinas, forçando as lágrimas a surgirem. Antes que eu cogite fazer qualquer
coisa, tenho tempo só de ver Júlia sendo puxada para dentro da mansão por
Matilde.
Não sei como, mas ninguém percebe o que está acontecendo bem ali
perto.
Quando Matilde arrasta Júlia pelo braço para dentro da sala de jantar,
eu as acompanho com Oli no braço.
A cena toda me deixa chocada.
No mesmo instante, Muriel vem descendo a escada e olha toda cena
assustada.
— Escuta, garotinha, é melhor você respeitar a dona da casa! —
Matilde diz com firmeza, mas Júlia acha graça.
— Não é como se você a amasse também. Você a odeia tanto quanto eu
— debocha, mas logo fica séria. — Ou você está tentando agradar “a dona
da casa” só pra garantir o seu maldito emprego? Já que as outras
funcionárias quase ficaram desempregadas por dizerem a verdade sobre essa
aí?
Olho para Muriel quando Júlia se refere a mim com desprezo. Ela
quase tropeça no degrau, mas desce fuzilando a noiva de Dom com os olhos.
— Você não merece saber de nada! — a governanta profere
rispidamente enquanto me defende.
— Me solta! — Júlia ordena quando Matilde dá outro sacode nela,
mas não a solta.
Ela toma uma decisão muito arriscada ao enfrentar a noiva de Dom
deste jeito, mas Matilde prefere me defender, mesmo que eu não precise de
alguém para isso porque eu sempre precisei me virar sozinha pra tudo. E eu
sei que a governanta nunca me amou, mas todas receberam uma segunda
chance, e cá está ela, colocando em prática o respeito que deveria ter sido
oferecido a mim desde o começo.
Matilde puxa Júlia mais um pouco para sibilar:
— Trate mais uma vez a senhorita Isis mal, que o senhor Domenico irá
descobrir quem de fato você é quando não tem ninguém olhando — ameaça e
então a solta.
Desta vez, Júlia não mostra as garras, foi um aviso sério, e ela tem
medo que possa ser real. Mas seu olhar para nós duas é fulminante, e ela sai
rosnando e batendo os pés, passando por mim igual um furacão.
Balanço Oli em meu colo, e fico olhando para Matilde atrás de uma
explicação. Mas ela sorri para mim e piscando atônita, devolvo o sorriso.
Acho que estamos bem, afinal.
— Obrigada, Matilde — digo suavemente.
— A senhorita não será mais tratada de forma injusta nesta casa —
explica, e o meu coração se aquece com aquela promessa.
Mas é Muriel que termina de descer a escada e vem na nossa direção
em disparada, sem tirar os olhos de mim, mas quando olha para Matilde, seu
semblante expressa desconfiança.
— Hora de você me explicar o que está acontecendo aqui! — diz para
mim.
Respiro fundo.
— É uma longa história.
— Tudo bem! Eu sou paciente. Vou sentar o meu rabo aqui e ouvir
tudo, Isis, porque você vai me contar tudo! — exaspera puxando uma
cadeira e sentando de braços cruzados igual uma criança emburrada.
Isso sim é ameaçador.
Esconder algo da sua melhor amiga é o mesmo que dizer que você não
confia nela. Mas se estive privando Muriel dessas informações até agora,
porque somente ela não havia aceitado a minha nova realidade, e confiava e
aceitava as novas pessoas que me cercam. Mas agora tenho minhas dúvidas.
— Me dê ele aqui, senhorita Isis. Farei o bebê dormir, não se
preocupe — Matilde diz pegando Oli dos meus braços e eu não hesito.
— Obrigada.
Dou um beijo suave na cabeça do meu filho e acompanho com os olhos
Matilde subir para o segundo andar, onde fará Oliver dormir agora no quarto
que é só dele.
Desde que voltamos do Paraná, Oliver implorou que eu fosse dormir
no seu quarto; eu não hesitei, mas também não era como se conseguíssemos
ficar por muito tempo longe de Oli, que continuava acordando de madrugada.
Olho para Muriel e ela faz cara de impaciente. Então, conto tudo a ela.
Conto de quando cheguei e as funcionárias de Oliver foram as
primeiras a me destratarem, sobre o jantar onde as mulheres dos amigos de
Oliver tentaram me humilhar de todo jeito, menciono que os próprios amigos
dele não acreditavam em mim, com exceção de Domenico. Sobre as
funcionárias que foram flagradas falando mal de mim, mas que com muito
choro fui convencida a fazer Oliver mudar de ideia. Revelo que me estranhei
com a namorada de Nicolo dentro de uma loja no Paraná, que dei um tapa na
cara dela e ele terminou com a loiraça.
Muriel ri, acha incrível, e então, explico a ela o recente
desentendimento entre Júlia e eu.
— Eu vou lá fora agora dar na cara dessa vadia! — Levanta, mas a
intercepto.
— Não vale a pena. Seria demais para o Dom também, deixa todos se
divertirem.
— Bom, você está se divertindo?
— Estou feliz que estejam aqui, curtindo com a gente. Nada mais além
disso importa — respaldo e Muriel revira os olhos.
— Isso é até a namorada do outro enfrentar você também? Espero que
ela venha agora enquanto estou aqui.
Olho surpresa para ela, desde o ensino médio que não vejo Muriel tão
brava assim. Ela percebe que acho até mesmo graça da sua postura, e se
explica:
— Odeio gente rica que se acha melhor do que os outros. Eu disse que
tinha algo aqui que não me cheirava bem.
— Você nunca disse isso — refuto.
— Bem, estou dizendo agora!
Não acho justo ela falar deste jeito, até porque os amigos de Oliver
são incríveis, e não merecem ser julgados pelo dedo podre para escolher
suas mulheres. Com isso, lembro de Lorenzo como exemplo.
— Talvez você devesse passar mais tempo conversando com Lorenzo,
ele é muito legal.
— E fazer com que a namorada dele também se mostre psicótica? Não,
obrigada.
— Não se a gente for pra lá e nos entrosar. — Enrosco meu braço ao
dela. — Vamos, eu fico perto de vocês, assim não parece que vocês estão
flertando.
Muriel avalia a minha proposta e então olha para fora através da porta
aberta. Lorenzo sai da mesa quando Dom e o meu pai começam a jogar
dominó.
— Ele bem que é gatinho — comenta e sorrio.
Puxo Muriel pelo braço, a fim de mostrar as pessoas certas a quem
deve confiar.

Eles se dão bem, como eu já havia premeditado.


Oliver senta ao meu lado, mas não comento nada sobre o ocorrido de
antes, não quero causar intrigas logo agora, mas ele me olha curioso quando
vê a minha prima e Lorenzo bastante envolvidos em uma conversa sobre
intercâmbio. Como professora de inglês, fazer intercâmbio ou viajar para
fora do país sempre foi o sonho dela, e Lorenzo conta as suas experiências
nos Estados Unidos e Canadá. Ela o ouve com atenção e admiração.
Ficamos ali até a tardezinha, quando todos já estão cansados o
suficiente, mas não prontos para irem embora, quando um assunto importante
entra em questão.
— E a festa de um ano? — Lorenzo pergunta.
Faz umas horas desde que Júlia foi embora com a desculpa de que
tinha coisas para fazer e Bruna foi em seu encalço. Mas não acho que o
engenheiro tenha sentido falta da namorada que passou a maior parte do
tempo mexendo no celular, agora ele tinha Muriel para conversar sobre
infinitas coisas.
Eu sei que é errado, até porque ele é comprometido, mas os dois
formariam um casal incrível.
Olho para Oliver que dá de ombros.
— Sinceramente? Ainda não pensamos em nada — confessa, deixando
Nicolo indignado.
— Como assim? O aniversário de um ano tem que acontecer! — o
advogado diz segurando a sua garrafa de cerveja, já meio alterado.
— E mesmo que não aconteça, Nico vem pra cá encher a cara —
Lorenzo enfatiza.
Não é algo que acho engraçado, embora Oliver e Dom tenham rido
sem jeito. Na verdade, me preocupa muito, pois com a decepção de Nicolo,
veio seu consolo com o álcool. Fiquei sabendo que ele precisa de pelo
menos dois copos de uísque por dia, e isso é preocupante, pois a dosagem
pode começar a aumentar. Não acho que ele esteja sofrendo de amor, e sim,
com si mesmo por ter aceitado todos os abusos de Sofia.
— Eu vou dar um jeito de comemorar, porra. É aniversário do meu
sobrinho! — Dom protesta.
— Bem, eu aceito o que vocês estiverem em mente — Oliver propõe
fazendo os olhos de Muriel brilharem.
— Então tipo, nós podemos organizar tudo? — ela pergunta.
— Sim, mas peguem leve. Sem exagero, por favor — digo aos três,
mas conversaremos melhor sobre isso ainda.
— Vocês são chatos! — Nicolo reclama se esticando na cadeira. —
Vamos contratar uma banda irada pra fazer um som ao vivo.
— Nico, é uma festa infantil — Dom protesta com o amigo que já
mostra estar de fato embriagado. — O máximo que iremos contratar, será
algum cover do Baby Shark.
— Só falta dizer que não vai ter álcool porque é "festa infantil". —
Faz aspas com os dedos e Lorenzo gargalha e fala:
— Cara, vai tomar banho.
Nicolo aponta o dedo na direção dele.
— É uma boa ideia!
O advogado se levanta e anda cambaleando até a piscina. Dom corre
para perto para evitar que algum acidente feio aconteça ali na borda, mas
Nicolo se joga na piscina e molha o pediatra que solta um palavrão e se joga
logo depois, jorrando mais água.
— Deixe que eu tome frente disso — Muriel diz para mim e Oliver,
que acena confiante.
— Esses três são idiotas, só você pra resolver tudo. Mas ficaremos
gratos se alguém de confiança nos guiar. Eu não sei mesmo como dar uma
festa — Oliver comenta.
Muriel abre um sorriso e pisca para mim.
— Não se preocupe, você está falando com a pessoa certa.
Disso eu tenho certeza e posso dar a Oliver a minha palavra de
confiança também. Muriel sempre tomou a frente das festas de aniversários
que dávamos, ela é muito criativa e adora decoração. Por isso, sei que a
ideia de deixá-la tomar a frente do aniversário de um ano de Oli, é a melhor
coisa a se fazer, até porque Oliver e eu quase não temos tempo para essas
coisas.
Preferimos nos curtir nos tempos livres.
Quando papai pede licença para tirar um cochilo, Muriel diz que vai
subir para ver Oli, e Lorenzo se oferece para ir junto. Oliver me dá um olhar
sugestivo dessa vez, e sorrio. Sei o que ele está pensando, e talvez seja
melhor mantermos essa ideia apenas na cabeça, mesmo.
Uma hora, a cena de mais cedo entre Júlia e eu virá à tona, e mais um
relacionamento pode estar comprometido.
Tenho até medo do que pode acontecer comigo e Oliver, que está tão
recente, mas ele me tira desse pessimismo, pega o meu medo e o agarra. Na
verdade, ele me agarra pela mão e me guia para dentro de casa.
Nicolo faz um comentário obsceno, mas não ligamos.
Hoje a casa está cheia, mesmo assim eu não consigo resistir.
Estou pulsando e em chamas.
Quero Oliver e ele entende isso só de me olhar nos olhos, só de tocar
a minha pele e perceber que eu entro em combustão com o suave toque dos
seus dedos. E o fato da casa estar lotada hoje, é o que me deixa mais
excitada ainda.
Mas ele me leva para o núcleo da casa. Uma das áreas mais afastadas
e silenciosas possíveis, longe de todo ruído, a biblioteca. Um cômodo perto
da sala de cinema e longe de todos os quartos.
Eu já tinha vindo aqui antes. Na verdade, amo pegar Oli e fazê-lo
dormir aqui, enquanto leio um dos diversos livros que pertenceu à Melissa.
Ele não me contou, mas descobri sozinha que este lugar foi construído para
ela.
Não era difícil de descobrir, basta ver que tudo no lugar remete a ela,
além do mais, Oliver não parece ser do tipo que coleciona as edições
inglesas de Orgulho e Preconceito.
Ainda assim, cá estamos nós.
Oliver me encosta em uma mesa de madeira com alguns livros em
cima e começa a me beijar loucamente. Sinto o gosto da cerveja, e isso me
excita.
Seus beijos são ardentes e fogosos, sem rumo. Ele quer fazer tanta
coisa comigo ao mesmo tempo, que se mostra um voraz. Mãos tocam a minha
pele exposta pelo biquíni vermelho que uso, aperta os meus seios,
massageiam as minhas coxas e deslizam pela minha lombar.
Quando ele começar a chupar o meu pescoço, sinto o meu ventre
queimar e implorar por ele.
Eu só quero que Oliver me coma, aqui e agora.
— Você fica tão gostosa de biquíni, sabia? — comenta com a voz
rasgada de prazer, fazendo minha pele eriçar.
— Eu quero você, Oliver — choramingo segurando seu pau por cima
do calção ainda úmido da piscina.
Ele arfa.
— Eu sou todo seu, querida — diz e aceito como uma permissão para
fazer o que tanto quero.
Estou com água na boca, quero sentir Oliver preencher a minha boca e
fodê-la. Ele nem sonha que eu esteja pensando em tais palavras, porque ama
quando sou boca suja no nosso momento mais íntimo, e desde a fazenda,
tenho só melhorado e treinado nisso.
Então me agacho e puxo a sua bermuda e a sunga. Seu pau pula para
fora, duro igual uma estaca, solto um gemido porque Oliver é lindo e gostoso
da cabeça aos pés.
Admito que quando o vi nu pela primeira vez, fiquei com medo pela
grossura. Achei que aquilo nunca caberia, mas se existia...
Bem, sempre há um jeito, e agora eu sei exatamente como fazer um
boquete incrível nele.
Passo a língua pela sua glande e brinco com a sua cabeça rosinha,
lambendo e arranhando com os dentes.
Ele ruge.
Olho para cima mantendo contato visual com ele, enquanto a minha
língua desliza por todo seu comprimento. Só por eu estar fazendo isso, me
sinto contrair de todo jeito.
Eu poderia simplesmente gozar só de ficar chupando o pau de Oliver.
— Eu já disse que você é delicioso? — pergunto e ele abre um sorriso
sacana.
— Eu adoraria ouvir.
Quando volto com a minha língua após lubrificar bem toda extensão
dele, vou engolindo o seu pau lentamente, acariciando com a minha língua e
fazendo uns barulhinhos depravados que ele ama.
Quando volto, digo:
— Você é delicioso, Oliver. — Afundo seu pau na minha boca de
novo, e então, volto: — Seu pau é lindo e muito gostoso. Todo dia eu quero
sentar nele, ser fodida por ele.
Engulo de novo e ele geme sôfrego, segurando atrás da minha cabeça
com força enquanto avanço e volto com mais pressa. Sinto o pau dele mexer
no fundo da minha garganta e eu lacrimejo.
Faço isso de novo e de novo, enquanto mexo meu quadril imaginando
como seria gostoso ao extremo enquanto ele estivesse me fodendo.
Não sinto mais vergonha. Ainda sou uma garota doce e sensível, mas
quando estou no meu momento íntimo com Oliver, afrouxou as rédeas e viro
uma putinha. Eu não sabia que sexo podia ser tão gostoso a tal ponto, não
sabia que existia uma louca sexual dentro de mim. E agora que conheço esse
meu lado, não consigo me desprender dele.
Quando ele já está todo encharcado e a minha boca toda melada,
imploro de joelhos para ele:
— Me come, Oliver. Me come com força.
Um sorriso viperino surge em seus lábios, e em resposta, ele me ergue
e me vira para a mesinha, me deitando de barriga sobre ela, sem nenhum
escrúpulo, nenhuma delicadeza. Meu bumbum fica empinado na direção dele.
Sinto a calcinha do meu biquíni ser abaixada, e então, a ponta da sua
cabeça dura esfregar na minha entrada.
Solto um gemido, pois só aquele toque quase me faz gozar.
Quando Oliver entra dentro de mim com tudo, perco os sentidos. Ele
sai e entra, com força, em estocadas lentas, mas firmes. Vou ao céu cada vez
que ele afunda dentro de mim, reviro os olhos e comprimo as sobrancelhas
cada vez que ele sai e entra, me abrindo toda, causando uma dor boa,
angustiante e lancinante.
— Mais rápido — imploro. — Mais rápido.
— Você está faminta hoje, não é? — Oliver sussurra no meu ouvido.
— Mas você vai ter o que quer, querida.
Oliver se ajusta melhor, abrindo as pernas mais ainda e segurando a
minha cintura com firmeza conforme eu me esparramo mais ainda sobre a
madeira fria e lisa. Quando ele entra com força e começa a estocar rápido,
minhas mãos agarram as laterais da mesa com tanta força que sinto que sou
capaz de arrancar uma lasca.
O meu fôlego se perde diante de tantos suspiros e gemidos. Cada vez
que ele alcança o limite do meu interior, solto um gemido sôfrego, mas
aperto o lábio com os dentes e lembro, “a casa está cheia, temos visitas,
devo ser uma garota sorrateira.” Mas esqueço de tudo isso só de sentir o
pau de Oliver dentro de mim, me preenchendo e deslizando com tanta
facilidade. Ele aumenta a velocidade, que não imaginava ser possível, mas
ele consegue. Suas mãos apoiam em meus ombros, sinto a madeira debaixo
da minha barriga apertar contra a pele e as bolas de Oliver batendo no meu
clitóris, me estimulando involuntariamente.
Um som obsceno preenche o ambiente e vem da minha boceta, da
minha umidade acariciando o pênis de Oliver. Ouço o som da nossa pele se
encontrando cada vez que a minha bunda bate na barriga dele.
É tão sexy e gostoso que não consigo me segurar.
Fico sem ar e meu coração marca passos trôpegos.
— Diga... — murmura com boca aberta sugando o ar toda vez que
afunda em mim. A respiração dele está pesada. — Diga, Isis, meu amor.
É um pedido claro para mim.
Oliver quer que eu diga alguma putaria, alguma coisa que nós dois
sabemos que nos levará ao clímax.
Ergo a minha cabeça, não sei se conseguirei dizer algo com ele me
penetrando deste jeito, mas tento.
— E-eu a-mo quando-o você goza dentro de mim! Ahh — pronuncio
com dificuldade, querendo gemer tanto ao invés de falar. Por isso Oliver
diminui um pouco a velocidade para que eu complete: — Amo quando sinto
você derramar quentinho dentro de mim. Amo sentir o seu sêmen me
encharcar e derramar na minha perna. Sentir que vou ficar com um pouco de
você dentro de mim pra sempre.
Oliver arfa e solta um palavrão.
— Segura. — É o único conselho que ele dá e eu obedeço.
Seguro as laterais da mesa com mais força ainda e Oliver apoia a
ponta dos seus polegares no vãozinho das minhas costas quando segura a
minha cintura com força. Então ele vem com tudo, me trata como uma pluma
levinha. Ele me fode igual um lobo selvagem faminto por mais e mais.
Ele vai fundo com tanta força, que a minha bunda dói toda vez que ele
entra em mim.
Oliver dá um tapa forte na minha bunda e eu arfo.
— Não grita, porra! — É um aviso.
“Não estamos sozinhos... Não estamos sozinhos.”
Isso me excita.
Podemos estar escondidos, longe de todos, mas meus gritos podem nos
dedurar. A mesa onde estou apoiada já faz barulho o suficiente, ela
estremece abaixo de mim, parecendo que vai ganhar vida.
Fico na ponta dos pés, perdendo meus sentidos. Oliver goza primeiro,
jorrando seu sêmen quentinho dentro de mim, mas ele não para. Seus
gemidos contidos, quase doloridos, me levam à loucura também, e gozo.
Prendo seu pênis e depois solto.
Tento cravar os dentes na madeira para conter os gritos, mas eles
ecoam pela biblioteca. Minhas pernas fraquejam assim que aquela sensação
explosiva passa e fica apenas os fragmentos dela.
Oliver me segura antes que eu vá ao chão. Fico mole em seus braços,
sorrindo feito uma boba, tentando controlar o fôlego conforme ele me leva
em seus braços até o sofá mais próximo. Ele se deita, e então me deita sobre
ele logo em seguida.
Estamos suados e exaustos, seu peito sobe e desce com urgência, e
ficamos ali, sentindo a respiração um do outro.
Fecho os olhos enquanto escuto seu coração agitado ir se acalmando.
Eu amo o fato dele estar batendo assim por mim...
Amo em como as mãos de Oliver repousam sobre o meu bumbum e
então ficam acariciando minhas costas.
Quando estou pensando nas coisas que amo nele, Oliver quebra o
silêncio:
— Quer se casar comigo?
Sorrio, mas ele não.
— Estou falando sério, Isis — repete, até coloca mais firmeza em sua
voz: — Você quer se casar comigo?
Levanto meu rosto do seu peito suado e olho para ele surpresa demais.
— O que? — pergunto baixinho bastante atônita.
Não tenho certeza se do que estou ouvindo é real.
Oliver então sorri, segura meu rosto com as duas mãos em formato de
concha e faz o pedido pela terceira vez, olhando nos meus olhos:
— Você quer casar comigo? Vou me ajoelhar diante de você e colocar
um anel em seu dedo, fazer de você a mulher mais feliz do mundo, porque é
isso o que você faz comigo.
Agora é o meu coração que bate tão forte que tenho medo de afastá-lo.
— Você quer se casar comigo, Isis Mancini?
Balanço a cabeça, sorrindo e chorando de felicidade, ainda mal
conseguindo acreditar.
— S-sim. Sim. Sim! — Encho Oliver de beijos, cada cantinho do seu
belo rosto. — Eu aceito me casar com você!
Ele abraça minha cintura e beija minha boca como um gesto para
oficializar essa união.
Um beijo calmo, mas cheio de necessidade e posse.
Ele é meu...
E eu sou dele.
É isso o que sentimos, mas agora iremos oficializar.
— Vamos contar no aniversário do nosso filho e fazer uma baita festa
— comenta.
Oliver já me disse não ser muito de festas, mas pela primeira vez, ele
parece louco para comemorar tudo o que acontece na sua vida.
— Não tenha pressa, eu já disse sim, mesmo — digo o tranquilizando
e os olhos verdes dele brilham.
— Eu amo você — declara me deixando estática.
É a primeira vez que ouço uma declaração amorosa tão genuína,
profunda e arrebatadora.
Oliver me ama e me quer como a sua mulher.
Em toda a minha vida bagunçada, jamais imaginei receber uma coisa
dessas.
Oliver me quer para sempre, porque ele me ama.
— Eu também amo você — confesso com o coração doendo, porque
amar profundamente dói, e nunca amei alguém como eu o amo.
Ele sorri, e é nessas horas que todos os problemas se esvanecem.
Eu só precisava de alguém que me amasse desse jeito, de corpo e
alma. E esse alguém agora é Oliver.
Naquela noite, fizemos amor pela primeira vez.
OLIVER

Dois meses depois....

O tema do aniversário de um ano de Oli é fazendinha. Muriel


caprichou em todos os detalhes, e tem tudo que nos possa lembrar a fazenda
do Paraná, neste quesito meus amigos ajudaram em tudo.
Tem alguns amigos de Isis vieram de Blumenau e poucos familiares
também, mas há mais adultos do que crianças, isso é fato. Ainda assim não
deixa de ser uma festa infantil.
Tem pula-pula e piscina de bolinhas, uma artista que pinta coisas fofas
no rosto das crianças e há bolhas de sabão flutuando e animando todo o
salão.
Oli não se cansa de brincar com as bolhas, mas ele curte tudo.
Ele está realmente aproveitando toda festa.
Tem um touro mecânico, mas isso foi ideia de Nicolo, e até que está
fazendo sucesso.
É engraçado, principalmente, quando ele assume controle do touro, e
simplesmente judia de quem é a pessoa corajosa a subir no brinquedo com
Nicolo no comando.
Isis vai só uma vez e cai de cara na arena inflável. Muriel conseguiu
filmar e diz que usará aquilo para fazer chantagem com a amiga.
Muriel é uma pessoa incrível, e nos tornamos muito próximos nesses
últimos dias. Sei que ela teve uma certa dificuldade para me aceitar e confiar
em mim, mas agora parece completamente confortável estando ao meu lado e
sabendo que Isis não parou em uma mão qualquer.
É uma noite incrível para se comemorar e nem parece que mais cedo,
na nossa casa, Isis teve uma crise emocional. Ela acordou chorando e eu a
aninhei em meu peito, a segurando firme em meus braços.
Eu não sabia o que estava acontecendo até ela se recompor e fungar
estando em meu colo.
Isis estava nostálgica.
O aniversário de um ano não só marca a primeira festa de Oli, como
também toda a trajetória de Isis como mãe.
Ela se lembrou de tudo, desde a fertilização in vitro até o parto. Ela
relembra também como foi planejar a gestação ao lado de Melissa, e como
foi difícil receber tantas críticas e ficar insegura sobre mim.
— Eu me sentia muito sozinha, mesmo rodeada pelo meu pai e pela
Muriel. Eu sentia que faltava algo.
E por uma razão óbvia, meu peito se apertou e me senti um merda.
Sei que tudo foi planejado para que eu soubesse só depois, mas não
estive presente durante a gestação, eu não vi Oli crescer dentro da barriga de
Isis e não segurei a mão dela no momento mais importante, que foi o parto.
Eu me sentia um lixo, em um patamar não muito diferente daqueles que
largam a mulher grávida, e eu odiaria ter que falar isso em voz alta para
fazê-la se sentir pior. Então guardei só para mim.
— Eu pensei tantas vezes em contatar você antes do tempo, mas
seria errado demais. Seria injusto com Melissa e as vontades dela.
Se ela tivesse feito isso, talvez eu reagisse com mais indiferença e
frieza. Não sei, mas ainda bem que não fez nada disso.
Embora eu me puna seriamente por ter sido ausente na gestação e no
parto, reconheço que o fato de estar aqui é importante para nós, que agora
somos uma família.
— Mas eu sabia que lá no fundo, o que estava faltando era você,
Oliver. Eu precisava de você perto de mim, que você soubesse que aquele
filho era seu, e eu queria tanto que ele escutasse a sua voz. — Isis
confessou aos soluços e a consolei mais ainda.
Isis estava devastada e me falou coisas que eu não sabia ainda, de
como foi o parto, o tempo que demorou e como foi para fazer Oli pegar seu
peito.
Ela não esconde que foi doloroso, mas apesar de tudo, fiquei feliz por
ela se expor para mim daquela maneira. Me senti mais próximo e mais
compreendido, porque afinal, eu também estou comemorando meu um ano
como pai.
Eu sou pai e isso é louco.
Há um ano eu ainda acho que isso não é real, mas é só lembrar das
incontáveis fraldas que já troquei, dos banhos e das mamadeiras que
preparei, das madrugadas que acordei e dos sonos que perdi.
Estou longe de ser incrível como Isis, mas me sinto orgulhoso por ter
conseguido ser pai e não foi a ausência de Melissa que me impediu isso.
Vendo toda a atmosfera feliz agora, sinto que ela está presente em tudo
de Oli. Isso só é real porque ela decidiu que seria...
Porque ela arquitetou tudo isso do seu jeitinho e estava certa.
Melissa sabia onde estava me metendo e que eu ficaria contente com
tudo.
Quando estamos cantando parabéns, Isis volta a se emocionar, mas ela
se contém. Oli está tão admirado com a vela que nem liga para aquela gente
batendo palma e cantando parabéns para ele.
Isis e eu assopramos a vela de um ano e aplausos explodem em
felicidade pela vida do nosso filho.
— DISCURSO! — Dom grita ali na linha de frente e lanço para ele um
olhar fulminante.
Pego as rédeas da situação enquanto Isis tenta conter um Oli curioso
em pegar a vela já apagada.
— Obrigado pela presença de todos. Cada um que está aqui é
importante em nossas vidas, e gostaríamos que Oli tenha essa mesma sorte
de caminhar ao lado de pessoas incríveis. Temos uma história muito boa,
mas não adianta contá-la agora por que ainda não teve um fim... — Estico a
mão para pegar a de Isis que logo me oferece a sua onde tem o anel de
diamante que dei para ela um dia antes.
Ela sorri quando beijo carinhosamente ali e revelo especificamente
para a minha noiva.
— A nossa história só está no começo, e por isso que eu a escolhi para
ser a minha mulher, porque quero que você, Isis Mancini, viva eternamente
comigo.
Arquejos de surpresa preenchem o salão, seguido de um silêncio.
— Ontem era a mãe do meu filho, hoje é minha noiva, e logo em breve
será a minha esposa e para sempre minha mulher — concluo a puxando para
meus braços.
— Somente sua — diz baixinho para que apenas eu ouça.
Então, a beijo, oficializando o nosso noivado. É quando gritos e
aplausos explodem.
Dois meses...
Ficamos dois meses escondendo que iríamos noivar, mas esperamos
para oficializar o pedido somente no aniversário de Oli, quando todos
estivessem reunidos e soubessem disso de uma vez só.
Agora é oficial.
Felicidade explode em meu peito.
Achava antes que jamais seria possível sentir tal coisa novamente, mas
é real, e ao mesmo tempo que estou feliz, me dá medo. Não quero que toda
minha felicidade seja reduzida a dias ruins, porque já aguentei muita coisa.
E agora, só quero aguentar a vida boa ao lado da minha família.
Cometi um erro muito grande, e vim perceber somente agora que tudo
está mil maravilhas.
Eu não entreguei a bendita carta que Melissa deixou para Isis depois
dos quatros primeiros meses e agora isso me atormenta.
Fico noites sem dormir pensando se eu deveria fazer isso ou não, mas
pelo visto, nem ela lembra.
Os quatro meses passaram e se se tornaram um ano, eu pedi Isis em
casamento, mas ela ainda nem sonha com o pedido que Melissa me fez, além
de que eu não faço ideia do conteúdo que existe naquela carta destinada a
ela.
“Porra!”
Tudo tinha que estar perfeito demais para ser verdade.
Me vejo inseguro.
Por meses evitei tocar no assunto até mesmo com meus amigos que
considero como irmãos, odiaria carregar aquele olhar de descrença sobre
meus sentimentos a respeito de Isis. Não a pedi em casamento porque estava
na droga de uma carta deixada pela pessoa que mais amei nessa vida, pedi
Isis em casamento porque a amo e estou completamente apaixonado por ela e
pela chance de ser feliz novamente que ela e meu filho estão me
proporcionando.
Isso tem me deixado louco e não é tão simples como parece. Meu
coração diz que as coisas devem ficar como estão, mas minha mente pesa
porque seria injusto, talvez se eu ainda não lembrasse seria mais fácil de
conviver, mas agora eu lembro, e sei que devo isso a Isis.
E quanto mais tempo passar, pior fica.
Não quero que as coisas fiquem ruins, então preciso conversar com
Isis e resolvermos essa questão de uma vez.
Fico à espera de Isis no meu escritório da mansão, faz um tempo que
ela saiu para caminhar com Oli no carrinho de bebê. Agora que está mais
familiarizada com o condomínio e o bairro onde moramos, ela se sente à
vontade para programar sua rotina melhor e hoje ela não foi trabalhar, coisa
que ela ainda faz questão e não quero tirar isso dela.
Sempre que pode, caminha com Oli e volta com muita disposição.
Isis depois de uns que ela chegou aqui em casa, me pediu para guardar
a carta que foi deixada para ela para não cair em tentação.
Será que ela chegou a ler?
Lembro que quando nos conhecemos, ela disse ser muito curiosa, mas
que conseguiria...
Tiro meu paletó e fico somente com a blusa social enfiada dentro da
calça, arregaço as mangas e afrouxo a gravata porque estava começando a
suar e me sentir sufocado. O relógio no meu pulso marca que ela está
demorando, ou eu que estou ansioso demais.
Isis me contou que sempre que podia, aumentava a rota, pois sentia
mais disposição para caminhar.
A porta abre e ela entra iluminando o meu mundo. Isis está suada, o
que deixa a sua pele morena mais brilhosa e sedutora. Ela veste um conjunto
de roupas de treino e como tirou o tênis, está só de meias.
Seu cabelo está preso, mas frouxo, indicando que ela deu algumas
corridas durante a caminhada.
Maravilhosa!
Vê-la assim me faz pensar em muitas coisas, principalmente em como
nem mesmo o aspecto de cansaço tira a sua beleza crua.
Tiro as mãos dos bolsos da calça e contorno a minha mesa para
alcançá-la.
— Matilde disse que você queria falar comigo.
Atravesso o escritório rústico, bem diferente do minimalista que tenho
no prédio da empresa e então a abraço enquanto ela hesita um pouco.
— Oliver, eu estou toda suada! — protesta aos risos.
— Eu não me importo.
Ela relaxa e cede ao meu abraço, percebendo algo de diferente em
mim.
— Aconteceu alguma coisa? — pergunta preocupada se afastando a
fim de ver a resposta em meu rosto, se eu mentisse, ela saberia.
Então me afasto também, coçando a cabeça e depois a barba recém-
aparada. Não consigo me desprender dela, ainda mais sabendo que Isis ama
quando os pelos roçam no interior das suas coxas.
— Não sei como começar esse assunto com você — comento
esporadicamente.
— Oliver, está tudo bem? Estou ficando preocupada.
Balanço a cabeça.
— Está tudo bem, sim. Mas receio que em breve não estará. Onde está
Oli?
Quando olho para Isis, ela está petrificada, me olhando assustada.
Estou exagerando e talvez ela nem pire com o que irá descobrir em breve.
— Ele está com a Matilde. Oliver, pelo amor de Deus, o que
aconteceu? — exaspera um pouco.
Me escoro na beira da mesa, cruzo os braços e respiro fundo. Já
enfrentei coisas piores, mas...
Tenho medo da reação de Isis.
— Você leu a carta que Melissa deixou para você antes de me
entregar? — pergunto e ela arregala os olhos.
— Meu Deus, a carta... E-eu esqueci completamente!
“Como eu já esperava.”
— Tudo bem, eu também esqueci — tranquilizo, farei muito isso
durante a nossa conversa. Olho de um jeito cuidadoso para ela. — Não quer
ler o que tem nela?
Percebo que Isis hesita. Nem ela quer ler o que tem lá dentro, mas a
curiosidade é tanta que ela acena para mim.
Abro minha gaveta pessoal que fica trancada em meu escritório e
entrego a ela, soltando o ar que eu prendia em meus pulmões.
A primeira parte já foi, agora vem talvez, a pior.
Seja lá o que tiver na carta, eu deveria dizer à Isis sobre o pedido que
Melissa fez na carta que li quando descobri a existência de Oli.
Com a carta em mãos ela logo abre e começa a ler.
“Meu Deus, ela tem que ser tão afobada?!”
— Quer que eu leia em voz alta? — pergunta olhando atentamente para
mim.
Mais um pouco e ela pode perceber que estou tremendo.
Bem, também estou curioso para saber o que Melissa deixou escrito
para ela.
— Sim — murmuro com a voz fraca e lembro de algo. — Mas eu peço
que você acredite no meu amor por você. Eu jamais achei que seria possível
amar alguém de novo, e agora tudo o que eu mais quero é fazer você e Oli
felizes, deixá-los protegidos comigo.
Isis me olha espantada, como se minhas palavras já tivessem revelado
o que vem por aí, se mantendo estável.
— Ok.
Isis tira a carta do envelope e então senta numa poltrona de frente para
mim. Seus olhos percorrem a carta, fazendo uma rápida análise, e então,
começa a ler lentamente as palavras de Melissa que esperaram tanto tempo
para serem lidas enquanto o meu coração galopa:
— Querida Isis, se você chegou até essa carta, é porque as coisas
deram certo, e eu espero mesmo que esteja tudo bem.
“Você passou por uma fase que sempre foi meu sonho desde que
encontrei o amor da minha vida. Ser mãe era tudo o que faltava para eu
me sentir completa. Mas como sabemos, nem sempre a vida acontece como
a gente planeja, e agora não estou mais presente para vivenciar esse
sonho. Deixo nas mãos de duas pessoas que eu sei que viveriam esse sonho
por mim e com muita vontade.
“Espero que Oliver esteja sendo um ótimo pai, e te tratando como
realmente merece. Não consigo imaginá-lo triste, então acho que a
paternidade será uma alegria para ele. Além do mais, ele e eu já
"conversamos".
“Desculpa fazê-la esperar tanto para ler essa carta, mas para
Oliver compreender primeiro, ele precisava saber que sou eu...
“Sempre fui eu por trás de tudo isso, e se ele me ama de verdade,
então está tudo bem.
“Mas está, não está?
Isis me olha como se esperasse uma resposta, mas estou tenso, e
espero a continuação.
"Eu sempre parei para pensar em como seria quando terminasse os
quatro meses e você deixasse Oli com o pai e então voltasse para a sua
vida. Ser barriga de aluguel tem várias formas de lidar, e não acho que a
sua experiência será diferente, não acho que você não sentirá nada pela
vida que você gerou.
“Estou querendo dizer que, se você não consegue fingir que Oli não
pertence a você, tudo bem, mas você é a mãe dele, a única que ele tem.
Tenho certeza que Oliver vai pensar em um jeito de vocês dividirem a
guarda, mas, talvez os quatro meses que você passará na companhia de
Oliver tenha outra função além de cuidar do bebê. Talvez o que eu diga
agora acabe soando muito artificial e louco, mas na carta que deixei para
Oliver, sugeri que dentre os quatro meses, ele a pedisse em casamento.
“Mas não um casamento arranjado, e sim, um casamento por amor.
Pedi para que ele só fizesse isso caso estivesse apaixonado, então que
pudesse olhar com mais carinho para você. Assim ninguém precisaria
dizer adeus, e Oli cresceria com uma família unida e feliz."
Isis balança a cabeça, tropeçando nas palavras enquanto lê aquela
parte. O meu estômago dá um nó, mas ela mal me olha e continua a leitura.
"Talvez ele já tenha pedido, talvez, não.
“Talvez você diga sim, ou acabe preferindo seguir a sua vida.
“Mas aqui vai um conselho de amiga: diga sim!
“Se Oliver a pedir em casamento, não hesite com receio do que as
pessoas irão pensar. Elas vão dizer que você está roubando o meu lugar,
vão diminui-la e fazê-la se sentir mal de qualquer jeito, mas Isis, a vida
continua.
“E eu conheço a sua história, conheço a pessoa maravilhosa que
você, e assim como Oliver, tudo o que você merece, é uma vida leve e feliz
ao lado de pessoas que jamais a rejeitarão.
“Posso estar falando coisas que talvez não faça sentido com o que
você está vivenciando no momento, mas se existir alguma coisa...
“Se existir alguma chance de vocês ficarem juntos e formar a família
que não consegui, não jogue a oportunidade fora.
“Estarei sempre com vocês e independente de qualquer coisa,
sempre serei grata por você ser a melhor amiga que já tive na vida e ter
realizado o meu sonho.
“Que a sua vida seja feliz e iluminada.
“Aqui é onde me despeço e deixo com vocês o vestígio de que um dia
eu existi.
“Com amor, Melissa."
Isis termina de ler a carta e faz uma pausa para cair no choro que
esteve prendendo durante a leitura. Me aproximo para consolá-la, mas ela se
levanta abruptamente e se afasta de mim, exatamente como eu temia.
Ela anda para o outro lado do escritório, com as mãos tampando o
rosto que expressa abalo. Meu coração só falta querer voar e meus joelhos
querem ceder ao chão.
Há uma grande chance de eu ter errado com Isis.
— Deixa eu ver se entendi... — diz de costas para mim e respira
fundo, se recompondo para poder iniciar aquela discussão. Então, quando
Isis se vira, seus olhos estão furiosos e ao mesmo tempo, magoados. — Você
só me pediu em casamento porque Melissa queria que fosse assim?
— Eu pedi você em casamento porque a amo! — exaspero avançando
dois passos em sua direção.
— Mas ela pediu que você se apaixonasse por mim também.
— Você não entendeu. Melissa não pediu para que eu me apaixonasse
por você, ninguém pode pedir a uma pessoa que se apaixone por ela —
refuto a distorção da ideia. — Melissa já imaginava que eu estaria sofrendo
por perdê-la e me abstendo de me envolver com outra pessoa de novo. O que
ela fez foi dizer que eu deveria amar alguém de novo, que eu deveria me
permitir me apaixonar por outra pessoa, e que essa pessoa poderia ser você,
a mãe do meu filho — explico com afinco.
Nessas horas não sou vencido por medo nenhum...
Mas o medo de perdê-la, acaba se transformando em forças para eu
defender o que senti e construímos até o fim.
Mas Isis ainda não está convencida.
Ela pisca, a ponta do nariz dela está vermelho e os olhos ainda
marejados.
— Como você sabe que as coisas que sente por mim, não foram
projetadas a partir do último desejo de Melissa? E se for apenas uma ilusão
que você criou porque ela disse que as coisas deveriam ser assim?
Agarro aquele fio invisível entre nós dois com mais força e me
aproximo dela. Isis não recua, então seguro o seu rosto e afirmo com mais
força:
— Para com isso! Você fala como se eu nunca tivesse me apaixonado
antes, como se eu nunca tivesse me casado com alguém que eu amava. Eu
conheço meus sentimentos melhor do que ninguém, Isis. Já sofri demais, já
fui feliz demais. Eu poderia muito bem reconhecer esses sentimentos quando
eles ainda estivessem nascendo em mim — declaro e solto um ruído quase
parecido com choro, mas não quero parecer que estou abusando da emoção.
— Meu coração bateu por você quando te vi cantando para Oli dormir. Eu
senti que havia uma coisa diferente, uma coisa especial, mas não faria nada
até ter certeza, e eu tive quando você saiu com Oli e demorou para voltar pra
casa. Eu fiquei desesperado, não queria acabar sozinho de novo, não queria
perder a chance de recomeçar. Mas eu também nunca te impediria de partir,
Isis. Porque a amo. — Pego a mão dela e encosto sobre meu peito, onde meu
coração bate forte.
Amar dói, e neste momento, só de cogitar que eu poderia perdê-la, ele
começa a se partir.
Acho que não suportaria outro coração partido.
— Sinta, Isis. Sinta meu coração — ordeno.
Ela fecha os olhos, sente, ouve e estremece com a energia que vem
dali, ressoando entre nós dois.
— É assim que eu me sinto só de pensar em te perder, o que nós
construímos e o que nós somos.
Ela choraminga e abre os olhos, para me encarar cheia de ternura.
— Eu amo você, e não precisei de incentivo nenhum, além da minha
coragem e vontade de me jogar de novo em uma paixão tão profunda. Você
foi ontem a mãe do meu filho, agora é a minha noiva, e será a minha mulher.
Só minha.
— Oliver... — murmura sem forças.
A minha vontade é de beijá-la, colocá-la contra a parede e fazer amor
com ela aqui mesmo. Mas não farei nada até Isis me aceitar, até ela
compreender tudo o que eu disse e parar de insistir na distorção que a carta
deixou sobre meus sentimentos em relação a ela.
— E-eu acredito em você — diz baixinho e meu coração dá uma
freada brusca. — Acredito mesmo, estou sendo sincera. E ainda que fosse
tudo planejado, acho que não conseguiria renegar você, porque o amo.
Também me apaixonei mais rápido do que eu gostaria, e largar tudo isso por
puro capricho seria extremamente doloroso. Eu sei que você jamais me
enganaria.
Era o que eu precisava ouvir para me sentir aliviado, e para avançar
em seus lábios quentes e inchados.
Beijo Isis com calma, mas com uma profunda necessidade. Um beijo
de posse, de aliança e promessa.
Seguro seu rosto com força, como se ela fosse fugir de mim e eu a
quisesse impedir, mas Isis não vai a lugar algum.
— Eu sou seu — reafirmo, só mais uma vez.
— E eu sou sua — enfatiza.
Colo as nossas testas.
Deu tudo certo...
Com muita dor e receio, mas terminou tudo bem.
Talvez Isis ainda pense mais sobre o que leu na carta, mas agora mais
do que nunca irei mostrar para ela que meus sentimentos são verdadeiros, e
não induzidos pelos planos da Melissa em me fazer um homem feliz mesmo
não estando mais aqui.
Não estou com raiva dela, tudo isso só está sendo possível porque ela
pensou meticulosamente em tudo. Mas acabou se tornando uma situação
embaraçosa, e eu gostaria muito que não tivesse toda essa ideia do
casamento, então faço um acordo com Isis de não mencionar nada a ninguém.
Porque se ela que é detentora de tudo o que eu sinto e todo o amor que
sente por mim, duvidou, não quero imaginar o que outras pessoas maldosas
poderiam pensar.
Meus amigos são do bem, mas...
Porra, eles já suspeitaram demais de Isis, não preciso que suspeitem
de mim agora também.
Isis e eu nos beijamos mais até aquela mini briga se tornar uma
reconciliação deliciosa. Faremos amor do jeito que imaginei, com ela presa
à parede.
Baixo sua legging, ela inclina o bumbum para mim e a penetro.
Estamos envolvidos em tantas emoções, que acabamos gozando rápido
demais, mas juntos.
É assim que eu gostaria de estar com ela, juntos em qualquer situação.
Amo a Isis.
Sou apaixonado por ela, porque meu coração se permitiu e a aceitou.
Eu me casarei com ela e ficará tudo bem.
É engraçado e até mesmo curioso pensar que tudo aconteceu
exatamente do jeito que Melissa previu que seria.
Ela realmente me conhecia como ninguém. Talvez, até melhor que eu
mesmo.
OLIVER

Vim para meu escritório hoje. Tive duas reuniões estressantes só pela
manhã e mais uma longa ligação estrangeira que fiz durante à tarde.
É sexta-feira, e como tivemos uma semana daquelas na empresa, meus
amigos estão loucos para aliviar a tensão demandada no trabalho e os
entendo.
Também quero muito relaxar, embora apenas a presença de Isis e Oli
seja o necessário para eu me sentir em paz.
Mas é coisa de homem.
A gente se encontra entre amigos num bar, toma umas e então fica
desabafando sobre os dias anteriores e as coisas bizarras que presenciamos.
No máximo, chegamos a mudar de assunto e falar sobre futebol ou os novos
filmes de uma franquia que gostamos que está prestes a lançar.
É isso o que a gente faz quando se reúne.
E honestamente, faz bastante tempo já que não faço mais isso. Não
tenho dúvida de que Isis entenderia. E quando Dom, Nicolo e Lorenzo se
reúnem em meu escritório para me esperar e sairmos todos juntos, embora
em carros diferentes, sinto que preciso ligar para a minha noiva e avisá-la
sobre meus planos.
Deixo os três conversando sobre a reunião de hoje que foi exaustiva
por conta de alguns acionistas exigentes. Vou para perto da janela que me dá
uma bela vista da ponte e logo para ela.
O celular de Isis chama até a ligação cair. Acho estranho, mas tento de
novo, e nada.
Já está anoitecendo, a caminhada dela durante o entardecer já deve ter
acabado. Ela deve estar em casa com nosso filho, ocupada demais para
atender o celular. Então ligo para o telefone de casa e Matilde atende no
terceiro toque.
— Oi, Matilde. Passe a ligação para o cômodo em que Isis estiver,
preciso falar com ela — peço coçando a testa com o polegar, algo me
incomoda, mas não dou a devida atenção.
Silêncio...
Ela parece perder a voz.
— M-mas a senhorita Isis ainda não voltou da caminhada — revela e
meu estômago dá um nó de preocupação.
— Como não voltou? — repito só para ter certeza.
— Achei até que ela estivesse com o senhor.
— Mas não está — digo rispidamente. — Ela não atende o celular.
Percebo que meus amigos se inquietam diante da minha reação.
— Posso procurar pela casa, talvez ela tenha chegado e ninguém
percebeu — sugere, e lá no fundo, sinto uma ponta de alívio.
Vai ver, foi isso mesmo.
— Ok, Matilde. Obrigado.
Desligo a ligação, mas fico olhando para a tela do celular um pouco
desorientado. Estou com uma sensação horrível que parece deixar em meu
peito um buraco.
Por que sinto que existe algo de errado?
Por que quero acreditar que Isis não voltou para casa com Oli?
Sinto uma mão apertar o meu ombro e me espanto. Não sei o quão eu
estava envolvido em pensamento e por quanto tempo fiquei em silêncio, mas
é Dom que toma a dianteira e vem saber o que tá acontecendo.
— Tem alguma coisa errada? — pergunta com os olhos azuis atentos.
— Isis e Oli não voltaram para casa — comento e parece que a minha
boca está dormente ou cheia de areia, tanto que mal sinto a pronúncia das
palavras.
— Será que ela não está na casa de alguma amiga? — Nicolo
pergunta.
— Isis ainda não tem amigas na cidade — digo em tom acusatório.
Júlia, Sofia e Bruna deveriam ser amigas de Isis, mas sei o que rola.
Mesmo que ela não me conte nada, sinto o quanto aquelas três as odeiam.
Tanto que Sofia foi afastada de vez do nosso círculo de amizade; se ela não
gostava e não respeitava a mãe do meu filho e minha mulher, ela não
respeitaria mais nenhum de nós.
Nunca pedi a Nicolo que pensasse com mais cuidado, ele fez algo que
deveria ter feito muito antes.
— Talvez ela tenha resolvido vir até a empresa e fazer uma surpresa a
você — Dom sugere.
— O celular dela está chamando. Não acho que apareceria aqui suada
e com roupa de exercícios, ainda mais que ela caminha empurrando Oli no
carrinho.
— Já escureceu. — Lorenzo lembra, fazendo a minha mente virar uma
confusão e meu coração galopar.
— E se ela foi para Blumenau ao invés de caminhar? — Dom supõe
mais uma vez, otimista de que nada grave havia acontecido.
Eu gostaria muito de estar sentindo isso, mas parece até que nada do
que eles digam será suficiente para tirar este peso mórbido do meu peito.
— Nada disso faz sentido — comento soltando um suspiro. — Preciso
voltar para casa e procurá-la.
— Tenta ligar mais uma vez — Lorenzo diz.
Sigo o seu conselho.
Vou caminhando em direção à porta enquanto busco pelas chamadas
recentes. Meus amigos se prontificaram logo atrás enquanto me seguem.
Quando estou a caminho de ligar de novo para Isis, um número desconhecido
pisca na tela do meu celular.
Paraliso olhando a tela e fico pensando se isso deveria ou não
significar alguma coisa.
Pouquíssimas pessoas têm o meu contato pessoal, e eu nunca recebi
uma ligação de um desconhecido antes. Mas meu polegar está tremendo e
pesando na direção da tela, porque não importa a merda da minha posição
social e exclusiva, se eu não atender agora e descobrir depois que se tratava
de Isis, não me perdoarei pelo deslize.
Então atendo, mas não digo uma palavra. Espero e existe apenas do
outro lado da linha uma respiração pesada e cansada. Por alguma razão
assustadora, fico arrepiado e amedrontado.
— Olá, senhor Oliver. Estava esperando pela hora em que trocaria
uma ideia com você — diz a voz masculina robotizada, sádica demais para o
meu desespero.
— Quem está falando? — pergunto com firmeza.
“Se for um trote, eu juro que…”
— Se eu disser, perde a graça.
Interrompe meus pensamentos e diz com uma voz cheia de animação
cruel:
— Mas tenho nomes a te dar e são dois... Isis e Oli. Você conhece, não
conhece?
Meu coração paralisa e meu corpo se estilhaça. Sinto que estou sendo
mutilado quando os nomes são proferidos de forma maliciosa.
Fico calado porque estou envolvido na merda de um pânico
devastador.
— Bem, pelo seu silêncio, vou considerar que sim. Mas o senhor já
deve ter notado que a sua mulher ainda não voltou para casa com o bebê. Eu
vi você ligando para ela, Oliver. Quase acordou o seu filho, precisei colocar
no silencioso e…
— DE QUE PORRA VOCÊ ESTÁ FALANDO, SEU MALUCO?! —
grito me afastando da porta com urgência, deixando meus amigos assustados.
— Eu queria começar de um jeito agradável, mas já vi que você gosta
das coisas difíceis — diz alterando a voz para algo mais frio e seco. — Mas
saiba que a porra do anel de noivado que a sua mulher tem em seu belo
dedo, não é o suficiente, mas vamos cuidar bem dele. Na verdade, estamos
cuidando muito bem dos dois, se é que você me entende.
Estava e não estava entendendo. A situação parecia ser feia de
qualquer modo, mas ainda não consegui decifrar o que aquilo poderia
significar ou talvez eu já soubesse, só não queria ter mais certeza ainda.
“Eu não queria que fosse real.”
— Droga! — pragueja do outro lado da linha, irritado com meu
choque. — Ouça bem, merda. Estamos com a droga da sua noiva e do seu
filho. E você tem a porra de duas escolhas, ou faz o resgate com as nossas
exigências, ou então pode dizer adeus para o seu grande final feliz!
A ligação é desligada e deixo meu celular cair no chão. Desabo na
poltrona mais próxima e levo as mãos à cabeça.
“Isso só pode ser a porra de um pesadelo!”
A minha boca está seca, me vejo num beco sem saída, e as paredes
desse beco vão se fechando cada vez mais, me impossibilitando de
conseguir respirar.
Vejo movimentos, mas não ouço nada além de um eco profundo
daquela voz mórbida e sádica tomando minha felicidade e paz para si.
Ele está com Isis e Oli.
“Eles estão.”
O tempo todo deixou claro não estar agindo sozinho.
A minha noiva e meu filho foram sequestrados.
Quando noticiei isso aos meus amigos, Lorenzo cambaleia.
— Puta merda!
— Co-como isso aconteceu? — Nicolo pergunta pálido e tão
congelado quanto eu.
Mal consigo respondê-lo.
O único que tem reação de imediato é Domenico.
— Temos que acionar a polícia. Ele falou alguma quantia? — pergunta
para mim, mas não consigo dizer nada, então me dá um sacolejo. — Reaja,
Oliver! Fala alguma coisa, porra!
Não consigo.
Sinto que estou sem voz, mas a minha cabeça está barulhenta, e só
consigo pensar, “Deus, não quero perder a minha família.”

Fui enfiado na porra de um pesadelo real.


Tem dois carros da polícia parados na frente da minha mansão,
homens fardados e agentes da polícia local. Além de lidar com o abismo que
me assola agora, preciso enfrentar lembranças do passado, de quando meus
pais foram assassinados durante o roubo. Tinha sirenes, polícia, muito
sangue e flashes.
Parece que a minha vida está fadada a esses destinos crônicos que me
tiram a paz e qualquer chance de viver feliz.
Primeiro meus pais, depois Melissa, e agora Isis e Oli...
Dois numa tacada só.
Mas eles estão bem, assim espero, e se for mesmo um sequestro, estou
determinado a dar tudo o que eu tenho para tê-los de volta e com segurança.
Domenico havia acionado a polícia para a minha casa, onde seria
melhor de explicar o ocorrido.
Mas não foi menos pior.
Chegar em casa e encontrar o vazio deixado por Isis e Oli, me deixa
apavorado, ainda mais por saber que eles não estão ali por conta de um
imprevisto qualquer. Por isso, o clima é lúgubre.
Precisei dispensar as funcionárias, mas elas não sairiam até que
fossem interrogadas.
Está uma confusão só na minha sala, tem as funcionárias, meus amigos,
a polícia e dois detetives que estão trabalhando a fundo em cada detalhe,
Paula e Matias.
Ela é uma mulher séria, cabelo acobreado curto e preso em coque,
estatura baixa com aqueles olhos escuros. Já ele é alto, magro, usa óculos e
parece até um estereótipo de quem fica horas na frente do computador
jogando, mas na verdade investiga desaparecimentos.
Quando chegaram, colocaram toda a equipe para interrogar os que
estavam ali presentes e Paula acha que devo me acalmar mais um pouco.
Quem diabos ficaria calmo ao receber uma ligação ameaçadora após
revelar que a sua família foi sequestrada?!
Tenho tentado, pois não posso ficar possesso.
Quando meus pais foram assassinados, eu disse que iria atrás dos
culpados, estava tão determinado a fazer isso, que o delegado achou melhor
me manter sob vigilância por uma semana. Ele achava que eu poderia ser
uma ameaça tanto para os outros quanto para mim.
Até hoje não prenderam os criminosos.
— Senhor Oliver? — Paula se aproxima de mim, com uma expressão
de complacência que deve ter adquirido com o passar dos anos naquela
profissão; mas ela intimida se você encarar por tempo demais aqueles orbes
de ônix, além de prestar atenção na sua voz grave. — Sinto muito por tudo o
que está acontecendo, vamos fazer de tudo para encontrar a sua família.
— O que já descobriram? — pergunto dispensando formalidades, com
a voz tão sombria que mal consigo reconhecer.
Ela solta um suspiro nada motivacional, mesmo com o seu otimismo.
— Pouca coisa. Mandamos uma equipe para as redondezas onde ela
costuma caminhar e eles foram averiguar nas câmeras de segurança mais
próximas, é possível que o resultado saia ainda de madrugada. É difícil que
o sequestro tenha sido no parque onde ela sempre caminha, por ser um local
público, teria testemunhas demais. Então há uma possibilidade deles terem
sido levados a caminho do parque, já que precisam atravessar duas quadras
para isso — explica metodicamente.
— A sua noiva vinha comentando alguma coisa nos últimos dias sobre
ser observada? Vocês irritaram alguém perigoso?
— Não — afirmo.
— Bom, se não há outras razões para isso acontecer, como acertos de
conta, por exemplo, eu aconselho o senhor a preparar seu bolso. Pessoas
ricas como o senhor chamam bastante atenção de criminosos dispostos a
fazer qualquer coisa por dinheiro. Eles pediram algum valor?
Nego com a cabeça.
— Não falaram nada. Apenas anunciaram o sequestro e disseram que
eu tinha duas escolhas... Eu não ligo pra quantidade, o que eles me pedirem,
eu dou! — exaspero, com a voz embargada de raiva e nervosismo.
Paula pisca para mim como se eu fosse um menino teimoso e falador.
— Mas não é só dar o dinheiro, senhor Oliver. Precisa haver uma
operação meticulosa por trás, principalmente com a questão do acordo, para
que a sua família saia viva e que a gente tenha tempo para pegar os
responsáveis.
— Eu não me importo com eles, desde que minha família esteja bem e
comigo!
Ela dá de ombros.
— Então sugiro que prepare outra quantia, porque não é difícil isso se
tornar um ciclo vicioso, se deixarmos os sequestradores livres. Precisamos
cuidar bem deste caso para que não aconteça outros no futuro.
— Mas não vai. Vou tê-los de volta e então reforçar a segurança de
Isis e do meu filho!
— Eu sei que vai. E enquanto isso, nós vamos fazendo o nosso
trabalho. Mas tudo depende também de uma outra ligação deles, por isso,
fique atento
Quando lembro de perguntar sobre rastrear a ligação, Matias se junta a
nós dois e dá a informação:
— Acabaram de ligar do laboratório, não conseguiram rastrear a
ligação, muito menos o celular de Isis.
Sou afundado a sete palmos do chão.
— Continuaremos a procurar alguma coisa — Paula diz e então se
volta para mim: — Não perca as esperanças, senhor Oliver. Se eles
estiverem desesperados por grana, irão ligar em breve.
Aceno para eles e então me afasto em direção ao minibar perto da
escada. É o único lugar da mansão onde não tem nenhum vestígio de Oli, mas
todo o resto me faz lembrar dele e me sinto pior, pequeno e impotente. Me
sirvo de um copo de uísque porque preciso distrair a dor do meu peito e da
minha cabeça. Não posso esquecer e fingir que não ligo, mas assim consigo
lidar melhor com este problema.
É como se o álcool me fizesse funcionar, porque se depender de tudo o
que estou sentindo, não digo uma palavra, de tão traumatizado que já estou
com essas merdas que me acometem.
Mas as coisas estão bem ruins...
Na primeira noite, não consigo comer nada e nem pregar os olhos, pois
fico o tempo todo colado ao celular.
Dom, Nicolo e Lorenzo resolveram passar a noite aqui, à espreita de
qualquer informação, pois estão tão apavorados quanto eu.
Eu parei de beber com medo do álcool redobrar meus sentidos,
preciso estar sóbrio para qualquer coisa, mas eles bebem vez ou outra,
vodca pura, só para sentir a sensação de queimação lhes tirar cinco segundos
de pura preocupação.
— Não vou sair daqui até ter notícias dos dois — Dom alega em dado
momento.
— Eu também não. Entrei em contato com outros investigadores que eu
conheço. Quanto mais gente trabalhando nisso, melhor — Nicolo diz.
— Mas a detetive disse que por enquanto, tudo depende de outra
ligação dos sequestradores — Lorenzo reafirma.
Isso fez com que ficássemos pensativos.
Só Deus sabe quando eles vão resolver ligar novamente, mas como
Paula me assegurou, eles estão desesperados por dinheiro, então o próximo
contato não irá demorar.
Ao menos é o que eu espero.
Olho para a tela do meu celular esperando um retorno dos detetives.
Avisei que ficaria a noite toda acordado, assim como eles enquanto
investigavam as poucas coisas que conseguiram recolher mais cedo.
Cada minuto que passa parece uma tortura e acho que nunca vivi a
noite mais longa da minha vida.
Tudo o que eu quero é chorar, mas não quero pensar no pior também.
Estou otimista de que terei a minha família de volta, e isso é o que me dá
forças.
Meu celular toca e o toque dele nunca esteve tão alto e chamativo.
É Paula.
— Trago algumas informações. — Ela é direta e faz meu coração
palpitar. — As câmeras de segurança registraram o momento do sequestro.
Isis estava passando na calçada com Oli quando uma van velha parou ao
lado deles e os puxaram para dentro do automóvel.
Fico tonto só de imaginar a cena e o desespero de Isis. Meu estômago
embrulha e não sei se suportarei aquela ligação até o final.
— Tentamos rastrear a placa da van, mas ela não existe. Buscamos por
radares de trânsito e conseguimos seguir uma bem parecida até a
autoestrada. Mandamos uma equipe até lá para fazer uma busca nos
arredores e bem, encontramos a van deixada em um campo baldio, mas ela já
era. Deram um jeito de tacar fogo pra sumir com qualquer vestígio de
identificação.
Sinto um desespero.
— O que? — A minha voz quase não sai.
Queimado...
Os sequestradores haviam ateado fogo no carro e…
— Não se preocupa, eles mudaram de carro justamente para nos
despistar.
Paula me tranquiliza, mas ainda não estou aliviado.
— Fora isso, não obtiveram nada que pudesse ser necessário?
Paula solta um suspiro forte e parece pensar em algo.
— Bem, se eles fizeram mesmo o que estou pensando, seguiram o
caminho da estrada pra cidadezinha aqui do lado.
Meu pensamento grita:
“VAI! VAI E ENCONTRE-OS VOCÊ MESMO.”
Mas Paula trabalha nisso há anos, e pelo meu silêncio sugestivo
conseguiu identificar o que está se passando comigo no momento.
— Eu aconselho você a não ir, senhor Oliver. Pode colocar em risco a
vida da sua família.
— Eu não disse que ia. — Mas pensei.
— Não, não disse. E sei que não vai. Qualquer coisa volto a falar com
o senhor. Boa noite. — Desliga a ligação.
Mas ainda seguro o celular como se fosse a minha vida.
Seja lá quem fez isso tudo, não é nenhum amador e vinha planejando
tudo muito bem nos últimos tempos. Me desespero em saber que minha
família e eu estávamos sendo observados de longe para sermos alvos de um
plano maligno desses.
Maldição!
É tudo o que isso parece ser...
Uma maldição.
Além do mais, não preciso ser nenhum gênio para saber que Paula
falou daquele jeito se baseando no meu histórico de herói impulsivo. Mas
espero que ela também não decida me manter trancado em casa por uma
semana, pois não vou sossegar até ter a notícia que preciso de Isis e Oli.

Na manhã seguinte, decido entrar em contato com o Daniel e Muriel.


Eu não queria deixá-los desesperados, mas era o certo a se fazer.
Primeiro avisei a Muriel, que entrou em pânico, mas pedi a ela que
fosse meticulosa com as palavras. O Daniel já é um senhor de idade, e não
queríamos que a situação terrível só piorasse com ele indo parar ao hospital
ou algo pior, que Deus o livrasse.
Mas assim que passaram as primeiras 24 horas do sequestro de Isis...
Nas 48 horas, eu já estava passando mal por não comer ou dormir
direito. Cheguei a desmaiar três vezes depois Dom me obrigou a comer
alguma coisa e me deu remédio para dormir.
Foi tão forte que quando acordei, havia chegado o terceiro dia desde o
sequestro de Isis e Oli, e o mais angustiante de tudo, foi que eles não haviam
encontrado nada que pudesse ajudar na busca.
Os jornais não falavam mais sobre outra coisa.
Matilde me contou que havia vários repórteres na entrada do
condomínio, e eu só queria que eles me deixassem em paz.
Três dias...
Três dias havia passado e não tinha nenhuma notícia dos dois. Meu
coração se apertava só de imaginar no medo que Isis deveria estar sentindo,
ou no desespero de Oli por sentir que aquela situação não era normal,
mesmo tendo apenas um ano de idade.
Talvez eles estivessem em um lugar escuro e abafado, dormindo no
chão e tendo a comida racionada…
“Ahg!”
Pensar nessas coisas é o que me mata por dentro, mas tínhamos que
seguir.
Depois que me recuperei dos dois dias que não dormi e não comi
nada, Paula e Matias aparecem em casa de novo, para recapitular as últimas
horas em que eu estive recuperando as energias para lidar com toda a
situação.
— Não conseguimos identificar o carro que eles usaram para sair da
autoestrada após atear fogo na van. Fomos até a cidadezinha próxima e não
encontramos nada suspeito. Procuramos por lugares abandonados em
Floripa, mas nada também — Paula narra o que aconteceu nos últimos três
dias.
Por um motivo, me zango.
— Tem alguma coisa que vocês conseguiram? — pergunto
rispidamente.
— Eles ligaram para você? — Matias pergunta sem alarde nenhum.
— Não. Mas me doparam, então eu não sei o que aconteceu nas
últimas 16 horas! — exaspero na direção de Dom, que está ali perto com os
braços cruzados.
Nicolo e Lorenzo também estão presentes, quer dizer, eles não vão
embora desde que todo pesadelo começou.
— Foi para o seu bem. Mas ficamos monitorando o seu celular, e
ainda assim ninguém ligou para você — Dom explica.
Vazia...
Era assim que estava a minha casa desde que Isis e Oli não voltaram
para ela. Um vazio sombrio e dilacerante, que gritava em meu ouvido todo
medo que me causava aquela situação. Era como se eu tivesse me afundado
mais uma vez naquela solidão que me assolou quando Melissa morreu. Só
que agora veio duplicado e era bem pior.
Sinto como se tivessem me enterrado vivo.
É sufocante e desesperador por não saber para qual direção correr.
E no terceiro dia, como obra do destino por estarmos principalmente
juntos, o meu celular toca e dou um pulo.
“Número desconhecido.”
Não preciso dizer nada para que os outros saibam quem é. Apenas
atendo a ligação e coloco no viva-voz. Assim todos saberão qual o grau da
situação, ou perceberão qualquer outro detalhe que eu não serei capaz de
perceber enquanto só consigo pensar em minha noiva e no meu filho.
— Olá, Oliver. Como tem sido seus dias? — pergunta a voz
robotizada, fazendo meu estômago virar.
“Filho da puta!”
— Quero saber da minha família. Me dê notícias sobre eles. Se você
encostar um dedo… Juro que irei te caçar no inferno! — ameaço sentindo
meu sangue ferver.
— E se você não fizer as coisas do jeito que eu quiser, mato o seu
filho e depois meto uma bala na cabeça da sua noivinha — rebate com um
riso sádico no final.
Engulo o grito e sinto meus olhos se encherem com aquela ameaça.
Ouvir a descrição do que poderia acontecer é o mesmo que tatuar a cena na
minha mente, e por isso me vejo atormentado pela descrição nauseante.
— Qual o seu preço? — pergunto.
— Hum, muito bem. Agora estamos falando a mesma língua. Isso tudo
é questão de negócios, Oliver Giordano. Você é um magnata do
empreendedorismo, não é? Então vamos falar de negócios. — A voz faz uma
pausa e então lança: — Quinze milhões, esse é o preço.
— Ok — digo com firmeza, assistindo os olhares atentos para a
conversa enquanto Matias grava tudo. — Dou a você essa quantia, só
devolva a minha família e não os machuque!
A voz bufa impaciente do outro lado da linha.
— O garoto e a mãe estão bem, e se você não fizer nenhuma besteira,
logo, logo eles estarão no conforto da mansão.
— Como vai ser?
— É o seguinte, sei que a polícia tá louca atrás da gente, então podem
ir tirando o cavalinho da chuva. Qualquer sinal da polícia disfarçada, eu
mando atirar, porque haverá uma pessoa com uma arma destravada e
apontada na cabeça dessa puta!
Olho para Paula e Matias, e ela faz um gesto com a mão de que devo
deixar rolar.
— Entendi. Nada de polícia.
— Há um parque de diversão no subúrbio da cidadezinha ao lado,
você vai saber qual é o local. É onde iremos fazer a troca. E quero que o seu
amiguinho, o Lorenzo, traga o valor do resgate.
Automaticamente olhamos para ele, que se mostra bastante surpreso.
— Por que ele? — Não consigo evitar a pergunta.
— É o mais centrado dos quatro. Não vou arriscar que você faça isso
e acabe bancando o espertalhão.
— Eu faria qualquer coisa pela minha família — ressalto.
A risada do outro lado é crua.
— Então faça o que estou dizendo. É simples.
— Me prove que eles estão bem! — insisto mais uma vez.
— Depois que pagar os 30 milhões em notas não marcadas e for
verificado que está tudo certo, vamos ligar para dizer onde deixamos Isis e
Oli. Não demore, senhor Oliver.
Mais uma vez a ligação é encerrada em um ímpeto doloroso.
Continuo sem provas de que a minha família está bem, mas não sei se
as palavras deles são suficientes para eu acreditar. Deixo meu celular de
lado e desabo em minhas mãos, não ligando se tem gente vendo.
Evito ao máximo expor minhas fraquezas; a minha família é a minha
fraqueza, e agora eles estão nas mãos de meliantes que estão determinados a
fazer qualquer maldade com eles.
Nessas horas o que mais quero, é justamente o colo de Isis.
Mas tenho amigos que estão aqui me apoiando, e Lorenzo é o primeiro
a se pronunciar:
— Eu farei como eles pediram!
Seguro a mão dele, desacreditado.
— Você vai se arriscar? — pergunto.
Os olhos castanhos de Lorenzo estão firmes e cheios de coragem.
— Somos uma família. E família merece correr os riscos.
Me levanto e dou um abraço nele cheio de gratidão. Acho que nunca
vou saber como de fato agradecê-lo, mas eu, em seu lugar, faria a mesma
coisa.
— Obrigado, irmão.
Paula se levanta e Matias encerra a gravação.
O rosto da detetive está inexpressivo, algo a incomoda.
— Nada de muito diferente dos sequestros que exigem desgaste. Mas
acho que obtivemos uma informação importante desta vez sobre os
meliantes.
— Qual? — pergunto.
— Mencionaram a personalidade do seu amigo com muita
propriedade. Isso significa que alguém do seu círculo de relacionamento está
envolvido.
É como sentir uma punhalada pelas costas.
Dom, Nicolo, Lorenzo e eu nos entreolhamos. Estamos pensando em
alguém provável que faria aquilo, mas ninguém vem à mente.
— Eles não querem a polícia.
— Não perto o suficiente, mas estaremos presentes no resgate. Vamos
planejar algo porque devemos capturá-los.
— Pode custar a vida da minha família! — exaspero.
— Vai querer mesmo arriscar a vida do seu amigo ao mandá-lo em um
lugar assim sem supervisão de nenhuma da polícia?! — Paula também perde
a paciência.
“Merda, ela tem razão!”
— Faremos nosso papel enquanto você providência a grana que eles
querem.
— Podemos escoltar você até o banco — Matias sugere.
— Ficarei grato.
Depois disso não enrolamos muito, temos a tarde toda para resolver
essa situação, e todos parecem focados demais, mergulhados na adrenalina
que aquilo nos traz conforme avançamos para o desfecho desta história, que
eu só espero que termine bem.
Quando entrego o saco de dinheiro nas mãos de Lorenzo, me pego
refletindo que confio demais nas pessoas que me cercam e uma delas me
traiu.
OLIVER

Estou indo com Paula e Matias para o parque de diversões na


cidadezinha ao lado, onde os sequestradores marcaram para pagarmos o
resgate de Isis e Oli.
Durante todo trajeto, sinto que meu coração foi arrancado do peito e
agora está em minhas mãos. Sinto meu corpo fraco devido os três dias sem
comer direito, dormir e ainda estar sobrecarregado com o estresse e pavor
do sequestro.
Ainda sinto meu rosto inchado por chorar feito um garotinho
desamparado mais cedo. Me encontro muito abalado, mas agora estou mais
determinado a nos tirar dessa de uma vez por todas.
Eu só queria que coisas ruins parassem de acontecer com aqueles que
eu amo o tempo todo.
Estou cansado da vida tentar me atingir, ferindo onde mais dói.
“É um dos homens mais ricos do país, senhor Oliver. Fica facilmente
na mira dos bandidos.”
Essas foram as palavras nada confortáveis da detetive Paula, porém,
reais.
Meus pais foram mortos por bandidos que também estavam há tempos
de olho na nossa fortuna, e dessa vez não foi diferente, exceto pelo detalhe
“tranquilizador” de que a minha família está bem e que nada irá acontecer a
eles, ao menos é o que eu espero.
Tenho pensado seriamente sobre como minha fortuna me torna um alvo
fácil, e como consequência a vida da minha família está constantemente em
perigo.
Não foi para isso que eu os escolhi, temo que Isis não tenha se
atentado a esse detalhe, e que acabe desistindo de mim quando perceber que
viver ao meu lado pode ser extremamente perigoso para a segurança dela e
de Oli.
Mas ela sempre foi tão forte.
Não consigo tirar da minha cabeça, que ela poderá me deixaria depois
desse acontecimento. Principalmente quando estou disposto a dar qualquer
coisa por eles, até mesmo a minha vida de sorte duvidosa.
Daniel e Muriel já estão na minha casa. Eles ficarão conosco pelos
próximos dias, primeiro porque ele não aceita mais ficar longe da filha e
Muriel está apavorada com tudo; segundo, porque acho que será melhor para
Isis ter a família por perto também.
Mal a pegamos e já tenho pensado no trauma que isso irá nos deixar.
Então quanto mais ela se sentir segura, rodeada de pessoas que ama e confia,
melhor.
— Aqui está perfeito, Matias — Paula diz ao colega de trabalho assim
que chegamos em frente ao parque de qualidade duvidosa. — Não podemos
nos aproximar tanto. Qualquer resquício da polícia pode tornar toda situação
bastante complicada.
— Mais do que já está? — indago friamente.
— Seja otimista, senhor Oliver — aconselha.
— Estou otimista de que irei pegar de volta minha família com vida,
então por favor, peça para sua equipe não fazer nada imprudente —
verbalizo meu medo atual.
— Eles já estão a par de toda situação. Há cinco carros com policiais
disfarçados flanqueando o parquinho, qualquer suspeita iremos seguir os
criminosos, ou capturar qualquer informação para caçá-los depois —
reafirma o plano bolado em pouco tempo, porque era o que tínhamos.
Me inquieto no banco de trás, ao lado de Lorenzo que tem o saco de
dinheiro no chão do carro, entre as pernas nervosas dele que não param. Há
um outro saco de dinheiro entre as minhas pernas, mas Lorenzo foi o
escolhido porque, “ele é o mais centrado”, palavras de um dos
sequestradores, que Paula e Matias juram ser do meu círculo de
relacionamento.
“Foi um deslize e tanto. Isso nos ajudará a pegar os bandidos,
senhor Oliver!”
A detetive comentou com um sorriso largo antes de sairmos de casa.
Ao mesmo tempo que estava feliz com essa informação, ficava
extremamente preocupado. Não só eu, mas meus amigos também estão
receosos de quem poderia ser o traidor que foi um informante crucial para o
esquema. Confio nos meus amigos de olhos fechados, são quase como
irmãos para mim. Percebo que não fui a única vítima, assim como Isis e Oli.
Domenico, Nicolo e Lorenzo, também estão na mira desses bandidos, e se
eles não forem capturados, só Deus sabe o que pode acontecer.
— Esse é o seu momento, rapaz — Paula diz a Lorenzo, que estava
com o pensamento distante.
Medo...
Meu amigo está tomado por medo, e consequentemente sinto uma
necessidade natural de tranquilizá-lo.
— Vai dar tudo certo, irmão. Logo saberemos quem são esses filhos da
puta!
O coitado está aterrorizado com a ideia de que aqueles bandidos o
conhecem.
Compreendo perfeitamente seu terror.
— Qualquer ação fora do combinado, a polícia entra em atividade.
Você está de colete e com uma escuta. Eles vão revistá-lo, mas não naquele
lugar — Matias enfatiza, tranquilizando Lorenzo e o lembrando da escuta
que colocaram no cós da cueca dele. Um aparelho tão pequeno que mesmo
que tateassem, não o sentiriam ali.
— Você precisa ir logo. Não é legal deixar esse tipo de gente
esperando — Paula aconselha de novo.
— Tudo bem, vou conseguir — Lorenzo diz determinado, mais para si
do que para nós. No entanto, pela voz vacilante e a palidez que lhe cobre
junto ao suor frio, talvez sua bravura esteja em jogo.
Lorenzo não é um homem covarde, mas esse tipo de situação sempre o
deixou nauseante. Ele detesta adrenalina exacerbada, odeia desafiar a morte
ao colocar a vida em perigo, e é por isso que odeia esquiar na neve, quando
vamos curtir as montanhas geladas na Argentina, ou saltar de paraquedas,
como fizemos há um ano. Ele ficou no avião o tempo todo.
Mas agora o cara cuidadoso que gosta de manter os pés no chão
carrega dois sacos em direção ao parque que ainda está fechado pelo
horário. Não há nenhum sinal de funcionários por aqui ainda.
Ele vai ficar cara a cara com os bandidos que sequestraram minha
família, ainda corre o risco dele ser ameaçado, e caso encontrem a escuta…
Porra, havia sido a maldita de uma opção!
Ele não foi obrigado!
Mas Lorenzo sabe que a família sempre vem em primeiro lugar,
mesmo não sendo de sangue, e ele faria isso por mim, pela Isis e pelo meu
filho.
Seja lá quem me traiu, ainda sei quem são os leais, os que se arriscam
a este ponto.
— Ele está entrando — Paula avisa pelo rádio para a equipe.
Em um desses carros, Domenico e Nicolo também observam tentando
ajudar, mas agora só consigo manter meus olhos em Lorenzo, que entra no
parque com os sacos contendo quinze milhões crus, em dinheiro vivo.
Quando ele some do meu campo de vista, fecho os olhos e faço uma
breve prece.
Nunca implorei tanto a Deus como tenho feito nesses últimos três dias.
Me sinto horrível, mas desesperado a ponto de me sentir envergonhado por
ter sido um homem nada devoto.
Quando perdi Melissa, deveria ter encontrado uma solução para ter
melhorado, e não ter ficado recluso, ganhando então a fama de mal-
humorado ou um homem robô que vivia apenas para o trabalho.
Hoje eu sei que não devo mais ser esse cara. Que a vida é linda, que
devo desacelerar e olhar o mundo através dos olhos de quem eu acho que
torna a existência bela e formidável.
Eu me culpo por não ter feito isso quando estava com Melissa, e serei
completamente arruinado quando perder a segunda chance que ganhei de
viver isso mais uma vez.
E agora, estou agarrando essa chance com a minha vida.
Há uma interferência no som quando o ponto de Paula que está
conectado à escuta de Lorenzo recebe ondas de frequência. Todo chiado se
transforma em uma conversa ríspida que ficamos ouvindo atentamente.
— Reviste o mauricinho — diz uma voz masculina, nada robotizada
por um aparelho. — Isso é um colete à prova de balas?
— Achei que eu deveria me equipar de alguma forma — Lorenzo diz
com uma voz firme.
Imagino o esforço que ele está fazendo para não pirar.
— Será que tem uma escuta, aí? — o bandido provoca mais uma vez.
— Se tivesse, eu não iria falar.
Me surpreendo pelas respostas de Lorenzo.
Em outras circunstâncias eu teria achado graça, mas agora fico apenas
preocupado.
Não sei se é uma boa ideia tirar graça com bandido, não é do feitio
dele, as piadas sempre vêm de Nicolo e isso parece surpreender até mesmo
o outro cara.
— Você não me parece nada centrado. Está bem abusado para o meu
gosto. Ver uma arma apontada na sua direção não te assusta? — Seu tom de
voz é ameaçador.
Meu coração bate tão forte que acho que vou vomitar.
— Se você atirar em mim, será mais uma dor de cabeça para lidar.
— Trouxe a polícia?
— Oliver está lá fora, me esperando sair com o paradeiro da família
dele. — Lorenzo dribla a pergunta de forma excepcional. — O dinheiro tá
aí, cara. Agora é só me dar a localização que eu vou embora.
Silêncio...
Um silêncio ensurdecedor se instala por dez segundos até que o
bandido parece impressionado.
— Porra, é dinheiro pra caralho!
— Tá tudo aí, os quinze milhões como vocês exatamente pediram.
Uma risada insana me deixa enojado.
— E tudo por causa daquela puta e daquele bebê chorão que encheu a
porra do nosso saco por três dias! — comenta com escárnio, fazendo minha
bile subir. — Vou te contar, eu precisei me segurar muito para não o forçar a
calar a boca, mas porra… Foda-se essa merda agora! Valeu a pena a
paciência que eu tive! — Ri.
Preciso abrir a porta do carro com urgência para colocar metade do
meu corpo para fora enquanto sinto que irei colocar as minhas entranhas para
fora.
“Maldito...
Maldito...
Maldito!”
Esse filho da puta ainda vai pagar por cada palavra que disse, por
cada pensamento que teve em fazer a minha família sofrer.
— Foi muito bom fazer negócios com você, senhor Oliver — o
bandido diz para mim e eu congelo, e pela razão óbvia, sinto que Lorenzo
também. Até que ele conclui: — Caso realmente tenha uma escuta e você
estiver aí me ouvindo. A sua família está na autoestrada para Floripa, em um
posto de gasolina abandonado. É melhor correr antes que outros
sequestradores apareçam.
Matias rapidamente tira o freio de mão e dá marcha ré no carro. Mas o
inesperado vem logo depois quando o bandido profere:
— Ah, uma coisinha pra você lembrar da gente e ter certeza de que
dará um jeito de correr para passar a informação ao seu amigo, caso não
tenha escuta alguma, mesmo.
Um estampido corta o ar, tão forte que escutamos daqui do carro.
Um tiro...
Até mesmo o grito de Lorenzo ecoa ao longe, sôfrego e dilacerante. A
detetive está dando uma ordem pelo rádio, mas não ouço nada, apenas o
barulho do disparo que parece ter feito morada em mim.
Meu corpo todo treme e minha reação de imediato é abrir a porta do
carro e sair para ajudá-lo, mas Paula me detém segurando o colarinho da
minha blusa.
— ELE DEU UM TIRO NO LORENZO, PORRA! — grito na direção
dela.
— E TEMOS A LOCALIZAÇÃO DE ONDE ESTÁ A SUA FAMÍLIA!
— ela gritou de volta. — O que você escolhe?
Rapidamente me recomponho, me sentindo mal ainda por não ter ido
atrás do meu amigo que agora se encontra baleado.
— Escuta, Oliver. Mandei uma equipe para resgatar Lorenzo, sem
contar que Nicolo e Dom acabaram de correr para socorrê-lo. Não acho que
atiraram para matar, mas Lorenzo será socorrido para evitar que o pior
aconteça.
Engulo em seco e concordo.
Não consigo tirar aquilo da cabeça.
A única coisa que pode me aliviar agora é reencontrar minha família e
descobrir que eles estão bem. Me jogo no banco de trás do carro que só
agora percebi estar em movimento, indo para longe rapidamente do parque e
daquela cidade, rumo à autoestrada.
Eles deixaram Isis e Oli em um posto de gasolina abandonado. Há
poucos deles, e se dermos sorte, espero encontrá-los no primeiro em que
pararmos.
E por Deus, eu só queria que aquele dia de terror acabasse o mais
breve possível!
Fico ansioso quando pegamos a estrada.
Minutos atrás, um dos policiais que integram a equipe de Paula entrou
em contato para dar dois avisos importantes:
1. Lorenzo está bem, mesmo com o colete a prova de bala, o
desgraçado do bandido teve o prazer de atirar no ombro dele,
mas Lorenzo foi levado ao hospital mais próximo e está sendo
atendido.
2. Dois carros disfarçados da polícia ainda conseguiram perseguir
o carro com os sequestradores. Houve troca de tiros, mas
ninguém saiu ferido.
Ninguém foi capturado, mas Paula parece contente o suficiente, pois
algumas balas acertaram a lataria do carro da polícia e eles irão analisar as
balas para identificá-las e descobrir quem pelas redondezas as comprou nos
últimos meses.
Confesso que é uma operação que me deixa impressionado.
Quando tudo isso acabar, não sei como serei capaz de agradecer por
toda ajuda e todo amparo que eles me deram. Mas agora temos que manter o
foco, o caso ainda não acabou.
Quando alcançamos o primeiro posto de gasolina desativado, conto
com a sorte. As lojas de conveniência estão fechadas, e outras, vazias. Mas
Paula e Matias entram sorrateiramente em uma lanchonete, com suas armas
destravadas e apontadas caso apareça qualquer surpresa inesperada.
Vou logo atrás deles.
O lugar todo está tomado por mofo e pichações, tem um cheiro muito
forte de urina e algum bicho podre em decomposição. Vespas gigantes
cobrem a metade da parede, zunindo tão alto em alerta que nos deixam
receosos quanto ao barulho. Mas elas sentem a nossa presença, e se agitam.
— Merda! — Paula pragueja assim que duas voam na sua direção. —
Tentem não se agitar ou então vamos ter que correr bem rápido.
Mesmo com o aviso, eu só sairia quando encontrasse a minha família.
Entramos mais ainda a lanchonete, para uma parte onde parecia ser um
restaurante de self-service.
As janelas estão quebradas e nessa parte é bem mais escuro que o
resto do ambiente. Há poças de água e muitas bitucas de cigarro suspeito,
provavelmente maconha. As pichações nas paredes remetem a simbologias
macabras que me deixam arrepiados. A atmosfera do lugar é horripilante, e
se eles estiverem mesmo aqui, Deus…
Que eles estejam aqui!
Matias vai na frente e passa por um balcão de serviço, que dá acesso a
cozinha. Ele vai na frente com seu modo furtivo e agilidade de andar
silenciosamente; as vespas nem o incomodam.
Quando Paula e eu estamos indo logo atrás dele com todo cuidado
para não agitar as vespas, Matias anuncia:
— Eles estão aqui!
A minha súbita vontade é de deixar meus joelhos despencarem no chão
imundo e chorar de alívio, mas acelero o passo, querendo vê-los.
Apenas isso importa e nada mais.
Avanço para dentro da cozinha, ignorando tudo ao meu redor. Acho
que minha visão escurece e o tempo paralisa quando encontro Isis sentada no
canto do chão da cozinha, ainda com a roupa de ginástica, completamente
encolhida, com um semblante derrotado e exaurido.
Meu coração dá um solavanco que dói tanto a ponto de eu achar que
ele será arrancado.
Em seus braços, Oli dorme, chupando o dedo, ele parece sereno, mas
também está envolto de roupas sujas e o cabelo bagunçadinho.
Eles foram sequestrados há três dias, mas parece que ficaram mais de
uma semana nessa situação. Me aproximo cuidadosamente, como se eles
fossem quebráveis. Agacho na altura de Isis, que tem marcas roxas e
profundas abaixo dos olhos assustados e ao mesmo tempo, desacreditados.
Seus lábios estão ressecados e ela não cheira muito bem.
Porra, estou completamente acabado!
Eu nunca poderia imaginar que o “estão bem’’ daqueles marginais,
fosse apenas uma ressalva por nada grave ter lhes acontecido. Mas dá para
ver que Isis está desnutrida e que toda energia e força que ela tinha, foi
usada para o nosso filho.
Os lábios dela estremecem e os olhos se enchem de lágrimas.
— O-Oliver? — pergunta completamente desacreditada.
Não suporto ver essa cena e não sentir uma enxurrada de emoções.
Mas alívio e ódio se sobressaem, de repente me vejo chorando, e nem sei
por qual razão.
Preciso me conter, não posso assustar Isis mais do que ela já está.
— Estou aqui, meu amor. Vocês estão a salvo e nada mais vai
acontecer com vocês — pronuncio tais palavras enquanto faço carinho em
sua pele macia, suada e quente.
Percebo que além de estar ardendo em febre, Isis está tremendo
bastante.
— Vou levá-los para casa, minha querida. Vocês vão para casa —
enfatizo mais uma vez.
Isis se entrega às emoções, chorando igual uma criança enquanto se
deita em meus braços.
Percebo as vermelhidões pelo seu corpo; principalmente braços e
pescoço, todas elas nitidamente sendo picadas de vespas. Perco o folego, e
algo primitivo dentro de mim estremece em raiva.
Isis precisa ser levada imediatamente para o hospital e ser medicada.
— Vai ficar tudo bem. — Beijo o topo da sua cabeça e faço carinho
em Oli, que ainda está adormecido.
Observo atentamente meu filho e não encontro nenhum sinal de picada
nele, para o meu alívio.
Fico embalando minha mulher em meu colo, mas não sei por onde
começar. Paula se aproxima e traz uma boa informação.
— Tem uma saída de emergência aqui perto, vamos sair por lá —
anuncia e olha por cima, identificando a ferroada. — Droga, isso parece
sério.
— Me ajuda aqui — peço e ela não hesita.
Paula pega Oli no colo e pela forma habilidosa com que faz isso,
suponho que tenha uma criança em casa também. Mas quando ela está com
meu filho, me prontifico a ajudar Isis, a pegando no colo com cuidado,
principalmente para não tocar na área inflamada do seu braço.
Mas dói em mim.
Ter Isis em meus braços quando estive me ruindo em pensamentos
ruins nos últimos três dias, me deixa abalado. Ainda assim preciso me
manter firme por eles, sempre.
Saímos daquele lugar de merda e levo Isis para o carro de Paula. A
deito no banco de trás, com a cabeça sobre minha perna. Faço questão de
pegar Oli, deixá-lo comigo enquanto voltamos para Florianópolis, com
destino a um hospital que desse total assistência a Isis.
Ela adormece em meu colo, mas Oli acorda e tem se mantido distraído
com a paisagem. Assim que ele me viu deu um sorriso reconfortante e os
olhos brilharam, parecia até que ele sabia que estava voltando para casa,
seguro.
— Amo você... Papai ama você — sussurro para ele que brinca com a
ponta do meu nariz.
Enfim, sinto que é aqui onde esse pesadelo termina.
Mas há muito o que se tratar ainda depois do susto, por isso, ligo para
Dom e peço para que avise Muriel e o Daniel sobre o resgate, além disso,
procuro saber novas informações sobre Lorenzo, que foi um herói.
— Ele está na sala de cirurgia. A bala acabou ficando alojada no
ombro... E ele perdeu muito sangue até chegar ao hospital mais próximo.
Mas os médicos dizem que ele vai ficar bem — explica com a voz exausta.
— Assim que terminarem, peça a transferência dele para o melhor
hospital de Florianópolis. Não hesite, Dom. Vou precisar que você veja Oli,
também.
— Eu sei, Oliver. Você está bem, cara?
Não lembro de quantas vezes ele me perguntou isso só hoje, eu sempre
tinha as mesmas respostas, “Não”, “Tá tudo uma merda”, mas agora é
diferente.
Deito minha cabeça no encosto do banco e solto um suspiro forte,
sentindo que eu podia relaxar até chegarmos ao hospital.
— Sim, estou bem. Obrigado por hoje, irmão.
Dom também solta um suspiro forte, de puro alívio.
— Família são para essas coisas — conclui.
Depois que isso tudo passar, vou precisar sentar com meus três amigos
e tomar aquele uísque que não conseguimos. Agora mais do que nunca
iremos precisar desse momento, nem que seja para afundar todas as
lembranças horríveis desses três dias.

Quando chegamos na cidade já é noite.


É fim de semana, então o movimento está fraco, o que torna a nossa
chegada ao hospital bem rápida.
Não me surpreendo ao me deparar com um grupo de repórteres na
entrada. Mas Paula pega acesso pelo estacionamento e então nos livramos
deles, que ficam na entrada do prédio. Antes mesmo de Matias estacionar o
carro, já tem uma maca aguardando Isis, que está muito debilitada.
Não largo Oli por nenhum segundo também.
Eles a levam para o nono andar, onde passará por exames e receberá
medicamentos. Fico no encalço dela o tempo todo, com medo de que escape
da minha vista mais uma vez. Contudo, preciso me manter centrado, Oli está
aqui comigo e tenho que dar um jeito de cuidar dele logo.
— Um dos polícias me ligou e me disse que o seu amigo já está sendo
transferido pra cá, de “helicóptero” — Paula comenta quando pegamos o
elevador. Ela enfatiza a última palavra para parecer um exagero, mas logo
conclui: — A bala foi retirada com sucesso e ele irá se recuperar aqui.
— Ótimo. Já foram separados quartos para eles?
Paula disfarçar o riso, mas percebo.
— Qual é a graça?
— Eu sou apenas uma detetive, senhor Oliver e não sua assistente
pessoal — comenta com sua opinião ácida.
Às vezes esqueço que ela tem uma personalidade tão forte que pode
ser facilmente interpretada como ignorância.
— Mas fica tranquilo, com certeza já tem gente se prontificando para
isso.
Ela olha de mim para Oli e então comenta:
— A ala pediátrica fica no décimo quinto andar. Não acha melhor
levá-lo até um médico também?
Aperto meu filho em meus braços, mas não com tanta força, só para
reivindicar o seu lugar, que é em meu colo.
— Dom fará isso. Ele deve estar vindo com Lorenzo no helicóptero —
ressalto.
— Ah, bom. Então acho que vocês agora estão em boas mãos.
Olho para ela de esguelha.
— Mas ainda não acabou, não é?
Paula me lança então um olhar capaz de fazer qualquer um se mijar nas
calças. Ela é intimidadora e leva a profissão bastante a sério. Mas a sua
rigidez parece ir além de uma armadura.
— Nós vamos caçar esses desgraçados por toda cidade, estado ou
país. Eu não entro em uma missão para perder, senhor Oliver — determina.
— Eu não duvido, detetive — rebato e ela mostra um sorriso quase
lunático.
O elevador para e a porta de metal se abre. Saio e então olho para os
dois que ainda permanecem no elevador.
— Vocês não vêm? — pergunto incrédulo.
— O seu pesadelo acabou, senhor Oliver, mas para nós ele só
começou. Temos muito trabalho a fazer, ainda. Mas Matias vai ficar. — Bate
no ombro do colega de trabalho e então ele sai do elevador logo em seguida.
— Isis pode ter informações valiosas sobre os sequestradores.
— Não acho bom importuná-la agora. Ela está cansada e ainda precisa
passar por uma série de exames — respaldo afoito.
— Matias é paciente. Ele irá esperar a sua noiva se recuperar. Ele
também continuará fazendo a segurança de vocês até eu voltar. Mas por
enquanto eu preciso mesmo ir atrás de mais coisas, senhor Oliver.
Balanço a cabeça, aceitando a mudança de planos. Acho que apesar de
tudo, gostei da companhia de Paula. Seu profissionalismo me faz sentir
seguro, mas Matias não é diferente, embora ele seja menos sociável.
Mas é melhor assim.
Não quero ficar de conversa com ninguém. Tenho uma família para
cuidar agora, e a minha única preocupação será mantê-la informada todos os
dias, o quanto eu os amo e não sei viver sem eles.
Encontro Daniel e Muriel esperando na recepção do andar onde Isis
será internada junto com Oli. Ela está sendo avaliada pelo médico, e quando
vejo a prima e o pai dela ali, sinto um alívio muito grande.
Percebo que os dois estão com a emoção a flor da pele,
principalmente quando percebem que estou com Oli em meus braços, tirando
um descanso.
— Como ela está? — a ruiva pergunta.
— Vai ficar bem. Isis foi picada por vespas, talvez ela precise ser
medicada para ter que reter todo veneno e a dor das picadas. Provavelmente
ela vai ter que ficar internada por uns dois dias pelo menos.
— E Oli? — Daniel pergunta tocando as costinhas do neto com
carinho.
— Precisa de um banho, roupas limpas...
— Está tudo aqui — Muriel me interrompeu mostrando a bolsa de Oli
que pedi para ela trazer para o hospital.
— Obrigado, Muriel. Preciso ir ver Isis e o que o médico irá dizer.
Em alguns minutos Dom estará aqui com Lorenzo, ele foi ferido.
Os olhos de Muriel arregalam em espanto e fica pálida.
— Ele vai ficar bem. Você trouxe a mamadeira também?
— Está tudo aí — responde de forma robótica.
A coitada está abalada demais com o susto que aquilo tudo causou.
— Ótimo. Muriel, vou precisar que você alimente Oli e depois dê um
banho nele. Irei avisar a Dom para te procurar quando chegar, porque é ele
que vai examinar meu filho.
— Tudo bem.
Deixo Oli em seus braços com todo cuidado, como se ele fosse
quebrável.
Não dá para ficar enrolando, então preciso ser direto e rápido. Mas
não consigo conter.
Olho para o Daniel e sinto uma pressão incomoda no meu peito. Toda
a situação pareceu envelhecê-lo uns 20 anos.
— Sinto muito por tudo isso, senhor Daniel.
Ele engole em seco e balança a cabeça.
Estou pronto para ouvir qualquer sermão, mas ao invés disso, ele diz:
— A culpa não é sua, Oliver. Você fez o que era certo e estou
orgulhoso de você. Eu só quero ver a minha filha — pede soando quase
como uma súplica.
— Entendo. Logo trarei notícias dela e vocês poderão vê-la.
— Obrigado, meu rapaz.
A situação toda era como um vaso quebrado, que agora eu teria de
juntar e colar todos os cacos.
ISIS

Lembranças frescas me atormentam igual a um pesadelo que não


consigo acordar. Mas estou de olhos bem abertos.
Desde o início, não fechei os olhos por muito tempo, com medo do que
poderia acontecer. Se eu olhar atentamente na lateral do meu pulso, vou
encontrar marcas dos beliscões que dei em mim mesma, tantas vezes,
desejando que tudo fosse apenas a droga de um pesadelo.
E então seria só abrir os olhos e a vida voltaria a ser boa e normal de
novo.
Acho que minha vida nunca foi normal, no entanto, acabei de passar
por uma experiência que faz da minha vida um calhamaço, e que o grande
momento em que finalmente fico em paz, está bem longe de chegar. Mas não
quero acreditar nisso; não quero ver a minha vida como uma verdadeira
história dramática, onde apenas o final dela será feliz.
“Não.”
O que aconteceu há três dias foi apenas um mal-entendido. Ter sido
sequestrada e ficado sob ameaça de homens perigosos, não resume uma vida
que eu levaria ao lado de Oliver, mas aquilo tudo veio ao caso por conta da
fortuna dele. Eles usaram a mim e Oli como a isca perfeita para conseguirem
o que queriam.
A culpa não é de Oliver, não é!
— Tá vendo o que dar querer ser alguém na vida de um milionário?
— um deles pergunta.
A pessoa tinha uma voz estranha, não sabia dizer se era homem ou
mulher, mas dentre todos, era o que mais me destratava.
— Você vai se arrepender por ter entrado na vida desse imbecil.
Era estranho...
Tão estranho.
Às vezes eu me sentia incomodada por algo familiar. Toda aquela
“conversa”, diálogos curtos e agressivos que tínhamos, sempre me faziam
sentir uma estranha sensação familiar. Estava apavorada demais para ter
reparado em tudo com mais atenção, deixei isso claro para o homem alto e
magro que me fazia perguntas, junto com a mulher de cabelo acobreado,
aparência rígida e intimidante o tempo todo, que se apresentaram como
Matias e Paula.
Oliver explicou que eles são os detetives que estão à frente da
investigação, agora, para encontrar o paradeiro dos bandidos.
— Qualquer coisa, Isis. Não importa se você acha inútil, pode ter
certeza que será necessário para a nossa investigação — Paula enfatiza isso
pela terceira vez, pois vem falando antes mesmo das perguntas começarem.
Lembro que acordei cem por cento consciente já na cama de um quarto
requintado do hospital para onde me trouxeram. A primeira coisa que
procurei quando abri meus olhos, foi Oli, e ele estava em uma caminha ao
lado da minha, dormindo tranquilamente, tomando soro na veia.
A cena do meu filho com o cateter na mãozinha pequena para poder
apoiar melhor o acesso venoso deixou meu coração em frangalhos.
Tão pequeno...
Tão frágil, mas com uma história intensa na bagagem para poder contar
futuramente.
Eu queria poder esticar o braço e tocá-lo, mas meu braço esquerdo
estava dolorido demais. Lembro das picadas infernais que as vespas me
deram quando fui deixada com Oli naquele posto de gasolina abandonado,
completamente imundo e perigoso com aquelas vespas do tamanho do meu
polegar.
Naquele lugar a única coisa que eu tinha noção, era do som dos carros,
mas não poderia saber com exatidão onde estava.
Fora isso, assim como Oli, eu também estava tomando soro na veia e
reagindo pesadamente à algum analgésico forte.
Mas eu o vi...
Vi quando Oliver se esgueirou para perto da minha cama,
completamente emocionado e sorridente, tentando manter a tranquilidade
para não me assustar.
Caramba, ainda conseguia ver o terror que foi para ele os três dias de
agonia, estampado bem em seus olhos verdes que estão opacos, sem brilho
algum.
Oliver segurou minha mão, a beijou, esfregou o dorso dela em sua
barba e me olhou com esmero.
Ele não disse nada pelos próximos minutos, apenas ficou me olhando,
como se quisesse me apreciar por repor cada minuto que ficamos separados
devido a agonia dos fatos.
Ele beijou de novo o dorso da minha mão e brincou com meus dedos,
sem tirar por nenhum momento seus olhos de mim.
— Eu amo você — revelou com a voz trêmula. — Fiquei com tanto
medo de perder vocês — choramingou, despencando em lágrimas, de
joelhos ao pé da minha cama. — Eu juro que nada disso irá acontecer de
novo. Por favor, não desista de mim.
O medo de Oliver persistia e mesmo me sentindo melhor, eu não
conseguia dizer muita coisa, mas por ele faço um esforço.
— Eu não vou desistir, Oliver. Amo tanto você, que sou capaz de
enfrentar qualquer tempestade ao seu lado.
Quando ele se inclinou para me dar um beijo suave, mas terno e cheio
de saudade. Um beijo salgado, pois as lágrimas grossas dele caem sobre
meus lábios, e me afogo nelas.
Queria tanto dar um beijo de tirar o fôlego, me jogar nos braços dele e
realmente matar a saudade. Mas naquele momento eu não conseguia fazer
muita coisa, precisava me recompor, tentar melhorar ao máximo.
Quis saber sobre o estado de saúde de Oli e Oliver me deu detalhes
sobre o bem-estar do nosso filho.
Graças a Deus nada de ruim havia acontecido a ele, porém, Oli
precisava tomar vitaminas além do soro.
Eu tinha tantas perguntas para fazer, porém, havia outras pessoas
querendo fazer tantas perguntas para mim. Ele não queria, mas era um
protocolo que fazia parte da investigação e da sua nova tomada de decisão
que tomará a respeito da nossa segurança.
Não pude hesitar.
Além do mais, eu gostaria de ver aqueles pilantras atrás das grades
tanto quanto essas pessoas e Oliver.
Por isso que esses dois estão aqui, sentados ao lado da minha cama
anotando de forma primitiva tudo o que eu digo.
— Eu não lembro de muita coisa. Já disse que a minha maior
preocupação era manter Oli bem e calado. Os sequestradores não gostavam
quando ele começava a chorar — explico com a voz ainda rouca e pesada.
— Nos conte mais uma vez como tudo aconteceu — Matias pede e dou
uma olhada para Oliver.
Não consigo interpretar muita coisa, mas sei que eles ficavam
repetindo as mesmas perguntas com o intuito que eu acabe dando outro
detalhe que deixei passar no meu outro relatório.
Então me atento o seu pedido.
— Estava voltando com Oli para casa, quando parou uma van ao nosso
lado e nos arrastou para dentro dela. Eles enfiaram um pano preto na minha
cabeça e tentavam ao máximo não falar. Acho que não queriam acabar dando
uma informação que poderia ser útil quando eu estivesse com a polícia como
agora.
— Sabe mais ou menos quantos eram? — Paula pergunta.
Dou de ombros.
— Acho que uns quatro. Não sei dizer. Eles nunca estavam juntos,
ficavam revezando entre si. Mas não era só um — alerto. — Eles vestiam
roupas escuras e largas o tempo todo, além de máscara preta. Também
falavam baixinho para eu não ouvir nada.
— Definitivamente não. E como era o lugar que mantiveram vocês
durante esses três dias?
Fecho os olhos e abaixo a cabeça. Não preciso divagar para longe e
relembrar do que vivi há pouco tempo, e que certamente me marcará muito
pelo resto da vida. Ao mesmo tempo que foi apavorante, sinto como se não
tivesse vivido nada daquilo, pois minha memória é curta.
Então começo a balançar a cabeça como se os detalhes fossem escapar
de algum lugar dali.
— Não sei identificar. Mas era um lugar normal. Talvez um
apartamento, não sei. Tinha um quarto escuro e quente que ficamos a maior
parte do tempo. Lembro melhor deles não me servindo comida o suficiente,
queriam que eu ficasse fraca.
A mulher balança a cabeça em afirmação.
— Sem problemas. Não se esforce muito e nem se martirize tanto
pelas poucas informações. É comum que a vítima sofra de estresse pós-
traumático, e isso afeta a memória da pessoa. Você não é uma exceção e
respeitamos isso — diz a detetive que apesar de toda postura autoritária,
transpassa a sensação de segurança certeira. Tanto ela quanto o outro. —
Você acha que poderia ter algum conhecido de vocês, ou só de Oliver,
envolvido no caso?
— O que? — Contraio o cenho tão intensamente que minha cabeça dói.
Paula pigarreia para poder explicar.
— Quando anunciaram o preço do resgate e as exigências, um deles,
que usava um alterador de voz, pediu que Lorenzo fizesse a entrega do
dinheiro, porque ele é o mais centrado… Bem, ou era.
Meu estômago dá um nó.
— Era? Como assim era? Lorenzo está bem? — Me vejo afoita.
A detetive dá de ombros.
— Ele levou um tiro, mas está se recuperando muito bem — diz com
uma naturalidade incomum.
Um tiro...
Lorenzo levou um tiro!
Escondo meu rosto nas mãos e ouço a voz de Oliver para me
reconfortar:
— Está tudo bem, meu amor. Lorenzo foi muito corajoso. Paula só
usou o termo no passado, porque Lorenzo nos surpreendeu muito ao enfrentar
aqueles bandidos.
— Eu diria que precipitado — Paula o corrige. — Mas, é. O cara
mandou bem. Ficamos orgulhosos pela bravura dele.
Pisco na direção de Oliver.
Sei que há muita coisa que não me contaram ainda por que estou de
‘’repouso’’, mas as perguntas martelam na minha cabeça.
— Quanto foi o resgate? — pergunto baixinho, me sentindo
incomodada.
— Isso não importa — Oliver diz exausto, sentando na beira da minha
cama e segurando meu tornozelo por cima do lençol que me cobre. — Mas
eu teria dado tudo, se fosse o necessário.
Estreito os olhos em sua direção.
— Quanto eles pediram? — Insisto mais uma vez.
— Quinze milhões — Paula age mais rápido ao ver que Oliver hesita.
Eu chego até mesmo engasgar, olhando para Oliver chocada.
— Quinze milhões?! — repito exasperada e ele faz um gesto com a
mão, desprezando a quantia.
— Se eles tivessem pedido tudo o que tem na minha conta, eu teria
dado a eles — reafirma. — Entenda, Isis. Você e o Oli são tudo na minha
vida!
Pisco, ciente disso.
Mas os meios que Oliver pode expressar isso me assusta um pouco.
Pelo jeito que fala, quinze milhões é pouco para ele, e como se não fosse o
suficiente, sinto como se Oli e eu tivéssemos nossos preços, e que
viveríamos à mercê dessa situação o tempo inteiro porque Oliver
simplesmente não faz questão.
Eu, no seu lugar, faria a mesma coisa, mas parece tão perigoso.
— Quinze milhões é muito dinheiro — respaldo devagar. — E se você
está disposto a pagar a quantia que for, e dar tudo o que tem, isso pode tornar
um ciclo vicioso. Quantas outras vezes as nossas vidas ficarão em risco?
Há um silêncio incômodo no ar depois disso, mas reflexivo.
Oliver me olha atentamente, como se este detalhe tivesse passado
despercebido; ele está tão focado em nos manter bem, e expressar seus
sentimentos a todo custo, que não tem pensado com clareza.
Percebo então, que o sequestrou afetou mais a ele do que a mim
mesma.
Paula tamborila os dedos no braço da poltrona onde está sentada e
releva.
— A senhorita tem razão. É por isso que estamos na cola dos
bandidos, tentando capturá-los e dar a eles o que realmente merecem.
Precisamos deixar nítido a outras quadrilhas, como essa, que eles podem até
executar a tarefa e conseguir o que querem, mas não irão muito longe porque
a polícia irá atrás deles... Até no inferno se for possível.
— Já conseguimos identificar as pessoas envolvidas com aquele tipo
de porte de arma, agora só precisamos nos aprofundar na investigação —
Matias complementa.
Balanço a cabeça em concordância, disfarçando o fato de ser inútil
nessas horas.
Por que não reparei melhor nos detalhes?
Estava na maior parte do tempo acordada e em alerta, mas somente
para Oli. Todas as minhas forças eu dediquei somente a ele.
— Isso me lembra de que precisamos ir — Paula ressalta ao se
levantar, ajustando o coldre pendurado em sua calça cargo escura. — Mas
estaremos à disposição. Qualquer coisa que lembrar, senhorita Mancini, não
hesite entrar em contato.
— Pode deixar.
— Obrigado mais uma vez, detetives. Vocês tem sido mesmo bastante
altruístas. — Oliver diz enquanto os acompanhavam até a porta.
— É o nosso trabalho. Além do mais, o caso tornou-se notícia
nacional, então temos que ter um desfecho para essa história e confortar os
outros civis, além de impulsionar o nosso trabalho, claro. Isso não irá
garantir um aumento no salário, mas pelo menos seremos reconhecidos —
ela brinca por fim.
— Se eu puder fazer qualquer coisa…
Ela dá um tapinha amigável no ombro dele e exibe um sorriso
desengonçado.
— Apenas fique com sua família. Tenha uma boa noite, senhor Oliver.
Oliver acena para os dois e então fecha a porta logo em seguida, se
voltando para mim. Ele senta na beira da cama e mexe no meu cabelo ainda
úmido do banho que ele me ajudou a tomar algumas horas atrás.
O semblante de Oliver ainda é pura preocupação, ele está sentido e
assustado.
Seguro sua mão e o deixo sentir meus dedos pousados contra a sua
mão grande e trêmula.
Céus, o que toda essa situação fez a este homem?
Quase não consigo reconhecê-lo.
— Eu queria tanto ver você sorrindo — comento baixinho. — Não
está feliz por estarmos aqui?
Ele arqueia as sobrancelhas como se tivesse sido ofendido.
— Palavras não conseguem descrever o quanto estou feliz, minha
querida. Mas você tem razão, eu não posso apenas agir como se estivesse
pronto para outro terror desses, porque não é pelo dinheiro, mas sim, pela
segurança de vocês. Você e Oli estão bem, mas Lorenzo…
Ele inala profundamente o ar e quando o solta, parece que dói.
Me inclino até ele e seguro o seu rosto.
— Foi horrível, Isis. Deveria ter sido eu.
Quando ele supõe isso, meu coração perde até o ritmo das batidas
quando as suas palavras ousam em me sufocar.
— Eu não suportaria saber que você foi machucado — confesso. —
Nunca se meta em algo tão imprudente assim!
Oliver me olha com aqueles olhos sofridos.
— Você não pode decidir as coisas que eu faria por amor, querida.
Não consigo duvidar, e choro por sentir um amor tão profundo igual ao
de Oliver.
— Eu fiquei tão feliz quando vi você. Achei que não nos veríamos
mais, que as coisas que começamos a construir…
— Shhhii… — ele me silencia com o seu indicador em meus lábios.
— Estamos aqui agora, juntos, e nada vai nos separar. E se separar, eu
sempre vou dar um jeito de encontrar você, Isis. Sempre.
Fungo perto da curva do seu pescoço, sentindo seu cheiro, lembrando
da textura boa da sua pele.
— Eu também, meu amor.
Abraço Oliver como eu não havia abraçado antes. Me envolvo nele
como se fosse a última vez, assim como seus braços se fecham ao meu redor,
com a força necessária para nos tornar um só.
Quando me afasto do seu ombro, procuro por seus lábios avidamente,
tão macios, aconchegantes e mornos.
Nosso primeiro beijo desde que fui resgatada; chupo seu lábio e ele
passa a língua nos meus, suavemente, contornando-o. Seus dedos seguram em
mim, desesperadamente, sem direção. É como se aquele toque fosse a
comprovação de que tudo isso é real...
De que o pesadelo acabou.
Depois sua mão afunda no meu cabelo molhado e puxa sutilmente o
couro cabeludo. Então seus beijos descem para a linha da minha mandíbula e
brincam na curva do meu pescoço, roçando a sua barba contra a minha pele
sensível.
Tive sonhos acordadas com a falta desse toque.
Oliver sobe só para voltar a me beijar na boca, me invadindo com a
sua língua cheia de necessidade em um beijo desesperado. A minha
respiração se encontra com a dele, mas não ousamos parar.
Dentes se encontram e narizes se enroscam.
Sinto meus lábios doloridos e inchados pelo atrito intenso que a sua
barba ocasiona em mim.
— Não quero perder isso. E se a vida tentar me arrancar, é bom que
ela tenha mais força do que eu, pois não vou soltar — diz cheio de
tenacidade e sorrio abobalhada.
— Confio na sua força, no seu amor — sibilo diante de seus lábios e o
beijo para selar este pacto. — Estando com você, não terei medo de nada.
Tenho três homens na minha vida, pelos quais eu lutaria bravamente,
os dois Oliver’s, e meu pai.
Meus Deus, meu pai, será que ele sabe o que aconteceu e se sabe será
que está bem?
Os três homens da minha vida, que amo de formas diferentes, mas na
mesma intensidade.
Os três foram a razão pela qual me mantive forte nos últimos três dias,
e continuarei seguindo com bravura, mesmo que as ameaças sejam reais.
Enquanto estivermos juntos, lutaremos, porque somos uma família.

Recebemos alta no outro dia.


Deixamos o hospital com uma gama de repórteres cercando o carro à
procura de qualquer imagem nossa. Oliver me avisou que havia mais deles
acampando na frente do nosso condomínio desde que a notícia do sequestro
veio à tona.
É assustador.
Oliver não é só um CEO magnata do agronegócio, ele também é uma
celebridade.
A família Italiana Giordano é famosa pelo seu patrimônio avaliado em
milhões de euros, e por ter dado muita oportunidade de emprego para os
brasileiros quando chegaram ao país.
Com o crime brutal que acabou cercando a família, o nome de Oliver e
seu sobrenome acabou ficando bastante conhecido no país e ele acabou
virando uma celebridade.
Por isso tem toda essa algazarra de curiosos sobre a sua vida.
Não consigo imaginar como são as manchetes, ou como os repórteres
usam as palavras.
Devem dizer que a vida dele é um drama sem fim, ou que o dinheiro
acabou o amaldiçoando; qualquer coisa do tipo. Mas nada de bom deve vir,
pois Oliver além de detestar essa invasão de privacidade, parece bastante
raivoso com a forma insensível que eles disparam perguntas para ele quando
tem oportunidade.
Ainda bem que mal podemos ouvi-los agora.
Quando chegamos em casa, tudo aquilo vira um eco distante.
O motorista, Jorge, estaciona o carro no estacionamento subterrâneo.
Mesmo com Oli no colo, pois mal consegue desgrudar dele depois do
ocorrido, Oliver me ajuda a sair do carro.
As picadas que recebi das vespas já desinflamaram bastante, por isso
liberada para terminar minha recuperação em casa, junto com a minha
família.
Oliver disse que tinha uma surpresa me aguardando, e juro que não sei
que tipo de coisa ele poderia me dar, depois de ter salvado a minha vida.
Mas quando entramos em casa, encontro papai e Muriel na sala, mal
conseguindo conter a emoção. Apresso os passos só para me jogar nos
braços do meu pai…
Tão familiar e aconchegante.
A minha âncora.
— Eu achei… Ah, Deus… — papai choraminga enquanto me dá um
abraço apertado.
— Eu também, papai — digo aos soluços. — Mas está tudo bem
agora. Vamos ficar todos juntos!
Oliver me contou que meu pai e Muriel haviam saído de Blumenau
assim que foram informados sobre o que estava acontecendo. Papai ficou
desolado, tanto que foi preciso Oliver contratar uma enfermeira particular
para tomar conta dele, Muriel também ficou bastante apreensiva, queria estar
por perto para ajudar, mas Oliver disse que ela tomava calmante e acabava
dormindo demais.
Eles até foram no hospital quando fui resgatada, mas por estar
dormindo não os vi.
Abraço Muriel logo depois. Sinto seu corpo trêmulo, e os soluços que
saem da garganta dela parecem desenfreados, que mal consegue pronunciar
uma palavra. Quando se afasta, ela agarra seu cabelo ruivo e dá um sorriso
nervoso, mas de alívio.
— Que droga! Só você para me fazer chorar tanto! — resmunga.
— Estou bem, amiga. Nós estamos bem.
— Como eu queria matar aqueles desgraçados!
— É mesmo? Que tal entrar para a fila?
Uma voz familiar soa do outro lado da sala, onde não havia dado muita
atenção.
Encontro Lorenzo sentado, com o braço direito enrolado em uma
tipoia. Ele levanta quando me aproximo, e exibe um sorriso de aquecer o
coração.
Olho para ele como se estivesse vendo um milagre.
— Soube que você foi nosso herói — digo com o sorriso escancarado.
Lorenzo dá de ombros.
— Eu fiz o que estava ao meu alcance e não me arrependo.
— Sinto muito que isso tenha acontecido — digo com o coração na
mão. — Eu serei mais atenta.
Lorenzo parece pronto para protestar, mas é Oliver que se aproxima.
— Ei, a culpa não foi sua — adverte massageando meus ombros.
— Não consigo evitar este pensamento.
— Quais são as chances de você ter culpa nisso? — Muriel pergunta
em protesto também. — Eles sequestraram vocês. Não é algo que deva ser
evitado.
— Não sei nada que seja o suficiente para ajudar a polícia na
investigação — desabafo outra frustração minha.
Neste momento, papai se aproxima e percebo que seu rosto ainda está
vermelho pelo choro, mas parece mais contido agora que estamos em casa.
— Ah, minha filha, essas coisas a gente não tem controle. Agora você
e o pequeno Oli estão em segurança, então vamos cuidar de vocês, deixe que
os profissionais cuidem daqueles canalhas.
— O senhor Daniel tem razão. Aposto que você está cansada, e não há
nada melhor que a nossa cama para descansar — Oliver diz com um sorriso
genuíno.
— Ah, por favor! Nem comece com isso, estamos bem aqui, cara! —
Lorenzo diz indignado, insinuando que Oliver já está com segundas intenções
para cima de mim.
Sorrio para Oliver.
Não vou mentir, gostaria muito de fazer amor com ele, matar a saudade
e me esvaziar daquele medo somente quando fosse completamente
preenchida pelo amor do meu futuro marido. Mas minhas pálpebras já
pesam, o remédio faz efeito, o qual não consigo combater.
Oliver tem razão, nada seria tão bom agora quanto a nossa cama, no
entanto, sou tomada por outra curiosidade:
— Onde estão Dom e Nicolo?
— Foram descansar. Eles também ajudaram no que puderam, minha
querida.
Meu coração dá um solavanco, os mesmos homens que se mostraram
tão desconfiados em relação a mim quando cheguei, agora arriscaram suas
vidas para nos salvar.
Lorenzo parece ouvir meus pensamentos quando ressalta:
— Somos uma família, Isis. Nunca esqueça disso.
Concordo ciente disso porque Oliver já tinha me dito tantas vezes a
mesma coisa que cheguei a pensar que talvez ele estivesse sendo apenas
amigável demais, mas não existem provas melhor do que essa.
Olho para o meu pai e Muriel que também estão ali.
— Somos todos uma família — afirmo olhando para eles, os
incluindo.
O sorriso de Oliver parece aprovar isso, e sei que está de acordo.
Houve um tempo em que ele ficou bastante ausente da família quando
entrou para a escola interna na Itália, e depois, os perdeu para um trágico
fim. Isso fez Oliver descobrir que o amor e a família não precisavam ser
hereditários. E aqui estamos nós, sendo acolhidos em sua casa que por um
bom tempo conheceu apenas a solidão depois de Melissa.
Também passei um bom tempo achando que se eu não tinha minha mãe,
a minha família não estava completa. Mas estive errada todo esse tempo,
porque agora eu sei que meu pai e Muriel sempre foram suficiente, e agora,
nós crescemos, e podemos contar com outras pessoas maravilhosas.
Me despeço da minha família e subo com Oliver e nosso filho. Hoje
iremos dormir todos juntos na mesma cama, abraçados, sentindo a presença
um do outro e o privilégio de viver aquele momento, mesmo depois de tudo
o que aconteceu.
Tudo que aconteceu serviu apenas para nos unir ainda mais. Minha
única certeza era que não importava para onde eu fosse, desde um
esconderijo a um quarto de um hospital, com o meu estado de saúde bastante
duvidoso, eu teria minha família para poder contar.
ISIS

Uma semana após o ocorrido, a vida continua. Ou ao menos tentamos


continuar, mas várias mudanças foram feitas desde então.
Papai e Muriel vieram morar com a gente, não determinamos um
prazo, mas eles ficarão até que a poeira abaixe, pois qualquer um pode ser
um alvo fácil e a isca perfeita para outro sequestro.
Muriel vai transferir as aulas de inglês dela para a franquia da
multinacional que trabalha aqui em Floripa, Oliver vai mexer os pauzinhos
para que eles não hesitem em contratá-la. Ele tem bastante influência sobre
essas empresas, e isso a deixou mais segura ainda em se mudar.
Papai está amando morar aqui porque vai voltar a ficar perto da filha e
do neto, mas ao mesmo tempo, teme muito pela sua casinha. Precisamos
pedir para que o meu tio – que é o pai de Muriel –, fique de olho na casa,
vez ou outra.
Embora tudo essa mudança ter seu lado bom, papai ama Blumenau e
não deixaria a sua vida lá, resultado de anos de trabalho, para se mudar
subitamente para um novo lugar.
Ele disse que voltaria, em breve.
Outra mudança que ocorreu foi com a varredura das redes sociais.
Todos nós excluímos nossas contas antigas e caso fizéssemos uma nova, ela
teria que ser privada, assim teríamos um controle melhor sobre quem
observa as coisas que postamos. A única pessoa que não precisa se
preocupar com isso, é Oliver – ele não tem nenhuma rede social, acha uma
perda de tempo, igualmente meu pai, que não faz nenhuma questão.
Oliver e seus amigos estão fazendo também uma espécie de detox com
seus círculos de relacionamentos. Ainda não descobriram quem estava por
trás do sequestro, Paula e Matias ainda estão a todo vapor, mas o fato de
alguém conhecido estar envolvido, deixa os quatro desconfiados, sendo
Oliver, o mais neurótico.
Nicolo e Dom voltaram para seus respectivos trabalhos, enquanto
Lorenzo ainda está de atestado médico. Ele vai a fisioterapeuta todos os dias
para conseguir uma recuperação rápida, mas Oliver, o controlador, só vai
permitir que o amigo volte para o Paraná quando ver que ele está realmente
bem.
— Você fala como se entendesse alguma coisa — Lorenzo implica
emburrado quando Oliver toma aquela decisão.
— Eu sou seu chefe. Preciso que você esteja em condições excelentes,
não vou mandá-lo à colheita para correr o risco de voltar à estaca zero —
Oliver pronuncia inabalável.
— Eu só vou voltar à estaca zero se levar outro tiro. E o meu trabalho
nem é um trabalho braçal!
— Se vocês não calarem a boca, eu juro que dou um tiro no ombro dos
dois — Nicolo ameaça massageando as têmporas.
Muriel e eu ficamos rindo da cena.
— Você nem tem uma arma — Lorenzo ressalta.
— Obrigada por me lembrar de comprar uma — o loiro retruca.
Depois disso começou uma discussão sobre armas de fogo serem
ilegais no país, puxando na sequência assunto sobre política da qual Muriel
e eu nos vimos obrigadas a nos afastar.
Subimos para o quarto de Oli, nosso quarto no início, e que agora
pertence somente a ele. E lá está meu garotão, brincando no berço, querendo
passar sua perninha curta e gorda sobre o cercadinho que o protege. Fico
olhando aquela cena enquanto penso, “você não vai conseguir, mas em
breve, será impossível detê-lo.”
Preocupações rotineiras...
Oli se desenvolveu tão rápido que sofro constantemente medo das
novidades, pois o cuidado fica redobrado e fora do meu controle.
Tipo, duas noites atrás, ele caiu da cama porque tentou descer dela
sozinho, mas é alta demais; o tapete felpudo impediu que a queda fosse mais
dolorosa, mas ele chorou muito pelo susto.
Um choro sentido e de partir o coração.
Vendo a sua tentativa frustrante de sair sozinho do berço, Muriel o
pega e senta com ele no chão, sobre o tapete puxando a caixa de brinquedo
dele. Ela o distrai com um dinossauro de borracha e quando ele se vê
bastante interessado no brinquedo, sua atenção se volta para mim quando
comenta:
— Oliver parece traumatizado. — Seus grandes olhos azuis
acinzentados estão atentos.
Descruzo os braços e solto um forte suspiro, sentando na poltrona que
usamos para contar historinhas para Oli dormir.
— Ele sabe que as chances disso acontecer de novo são grandes, então
ele está sendo bastante cauteloso — digo e Muriel contrai o semblante como
se tivesse provado algo azedo.
— Colocar cinco seguranças à disposição e querer decidir a vida dos
outros não parece cautela, e sim, um senso de controle exagerado seguido de
trauma.
— E você analisou isso tudo agora?
— Você sabe que é verdade. Não estou alfinetando ou sendo chata,
sabe. Mas ele não pode continuar assim.
— Em breve ele esquece — afirmo, mas nem eu tenho total certeza
disso.
— Esquecer que ele esteve a um passo de perder a única coisa que o
faz feliz nessa vida? — Dá um sorriso muxoxo. — Me desculpe, amiga, mas
você vai ver essa situação se tornar mais sufocante ainda.
— Falando desse jeito parece até que você não respeita o que ele está
sentindo no momento.
Ela me olha abismada.
— É claro que respeito! Mas se ele continuar assim, o que aconteceu
será um fantasma a persegui-lo pelo resto da vida!
É verdade.
Muriel tem razão e balanço a minha cabeça em concordância.
— Vai, diga.
Olho incrédula para ela.
— Dizer o que?
— Não fique aí apenas balançando a cabeça de forma vaga. Diz logo
que tenho razão. — Sorri de forma bem sagaz.
— Você tem razão, Muriel! — Não hesito, mas logo acrescento: — Só
que tudo está muito recente, precisamos ser cuidadosos, querendo ou não. E
Oliver já tem um passado bem triste... Ele tem medo de perder a sua família
de novo.
Seus lábios se contorcem.
— Bem, ainda tem isso. Para você ver, né? Nenhuma vida é perfeita
— ressalta. — A pessoa pode nadar em dinheiro, mas sempre tem algo ruim
que lhe persegue, ou então, acaba faltando algo que dinheiro nenhum é capaz
de comprar.
— Deve ser por isso que existe gente que acha que estou com Oliver
por causa de dinheiro. Que de algum jeito, ele conseguiu comprar meu amor
— E não é verdade? — Muriel me olha de um jeito desprezível e em
resposta jogo uma almofada em sua direção.
— Cala a boca!
Ela me devolve a almofada de um jeito nada carinhoso.
— Sua boba! Eu sei que dinheiro nenhum seria capaz de te comprar
você. Lembra daquele fazendeiro dos olhos azuis que queria se casar com
você? Meu Deus, Isis! Fiquei tão irritada com você porque o dispensou.
Acho graça da história que Muriel tirou do fundo da uma gaveta
empoeirada da sua cabecinha.
— Ele se achava muito. E bem, talvez ele fosse muito gato, mas o
santo não bateu. E foi bom, porque não muito tempo depois conheci a
Melissa.
— Quando eu digo que as coisas sempre acontecem por uma razão,
todo mundo acha que estou sendo louca.
— Você não é louca — ressalto e então penso melhor: — Talvez só um
pouquinho. Mas se as pessoas te ouvissem, o mundo seria um lugar melhor.
As sobrancelhas grossas e ruivas dela se arquearam.
— Ah, é? Mesmo quando eu digo que você não vai aguentar o novo
protocolo de segurança do seu noivo nem por uma semana?
Bufo revirando os olhos e Muriel acha graça.
Esqueci de ressaltar essa outra mudança que ocorreu, Oliver não
queria que eu voltasse a trabalhar durante esse período de jeito nenhum,
justamente por ser algo perigoso e muito arriscado ainda.
Mas já faz mais de um ano que não trabalho!
A licença maternidade acabou e eu precisei me transferir para a creche
da empresa Giordano. Estava tudo certo para eu voltar, mas como Oli estava
tendo esses picos de desenvolvimento, achei melhor continuar em casa o
acompanhando.
Já estava tudo certo para começar a trabalhar na próxima semana, mas
o sequestro aconteceu e preciso ficar mais uma semana em casa.
Tenho muitos motivos para continuar trancafiada, mas não quero viver
com medo. Me julguei muito por não ter sido útil para a polícia, então a
última coisa que quero, é ser um fardo.
Oliver diria que todos estão aqui para me atender, que sou a patroa
deles também, mas por Deus!
Não acho que nada de ruim irá acontecer se eu estiver com dois
seguranças me seguindo toda vez que eu sair de casa.
Isso já é suficientemente enlouquecedor, mas vou tentar por ele.
Não quero fazê-lo se sentir culpado mais do que já sente.
Bato com as mãos nos joelhos, determinada.
— Eu vou me esforçar! — Me prontifico e Muriel sorri desacreditada.
— É sério!
— Eu sei, amiga. Mas conheço você... Uma mocinha centrada, mas que
adora ser livre. O tio Daniel sempre confiou em você por saber que não faria
nem uma besteira, então não está acostumada com pessoas lhe tratando feito
uma criança.
— Não acha que está sendo muito exagerada? — Olho para ela de um
jeito especulativo.
Muriel dá de ombros.
— Bom, talvez eu esteja mesmo. Vamos torcer então para que eu esteja
completamente errada.
Ficamos nos olhando por um tempo, acabamos de fazer uma aposta não
oficial, pelo menos é o que parece.
Me arrumo toda no closet que agora divido com Oliver. O lado
esquerdo é todo dele e o direito agora é meu.
Foi difícil para se ele se desfazer das coisas de Melissa, mas fizemos
um bazar e então, com todo o dinheiro arrecadado, doamos para uma
instituição que trata de pessoas com a mesma doença que levou a sua
falecida mulher. Mas é estranho o contraste que as minhas coisas deram ao
closet moderno. Tudo que se remetia a Melissa era sofisticado e de grife,
com uma paleta de cores bem definida, que se mesclavam entre tons neutros,
enquanto as minhas coisas possuem bastante estampas floridas, cores vivas e
acessórios descoladas que somente uma garota da minha idade usaria.
Não tenho nenhuma vontade de mudar o meu estilo só para ele se
encaixar melhor ao visual que compõe esse closet estrategicamente pensado
e até Oliver gostou.
Vesti um dos meus vestidos românticos e sapatos de boneca, elegante e
confortável. Vejo no reflexo do enorme espelho que o sorriso constante em
meu rosto não revela nada do terror vivido há duas semanas.
O brilho voltou aos meus olhos, tudo graça a nova rotina e a ansiedade
para conhecer as crianças me deixa bastante entusiasmada.
Oliver entra no closet e pelo espelho vejo que ele faz uma cara de
desapontamento.
— Achei que receberia um show particular de você vestindo cada
pecinha de roupa, lentamente.
— É mais do seu feitio tirá-las e com muita urgência — comento
sorrindo.
Ele se aproxima e me abraça por trás, fungando profundamente na
curva do meu pescoço enquanto me aperta mais ainda.
— É verdade — confessa com a voz abafada entre meu cabelo solto e
que cresceram bastante nos últimos meses.
Noto que Oliver ainda está apenas de cueca boxer.
— Mas você ainda não está pronto, meu bem.
— Não, não estou. Talvez hoje seja o seu dia de ter um show
particular meu.
Mordo o lábio e viro ficando de frente para ele, passando meus braços
por seu pescoço e deixando nossos lábios bem próximos.
— Você ama me atiçar, não é? Ainda mais quando estou naqueles dias.
Oliver faz um som nada agradável. Todo o estresse vivido devido o
sequestro fez com que a minha menstruação atrasasse quase uma semana, e
então ela veio, e Oliver ficou se martirizando por não termos aproveitado
quando era tempo. Mas ele foi respeitoso, sabia que ainda não estava pronta
depois do que aconteceu, só que agora…
Quando ele fica nu e entra para o banheiro me deixando para trás
apenas com a imagem da sua bunda, sei o que ele está fazendo. A minha
libido aumenta durante o período menstrual e ele sabe disso.
Duas noites atrás o masturbei debaixo do lençol, para aliviar a tensão
e ele dormir tranquilo. Oliver gozou na minha mão, e depois dormiu feito um
bebê. Mas eu fiquei me sentindo incompleta, queria aquilo também.
Na noite passada usei a desculpa de que a minha menstruação estava
bem pouca, e por isso, podíamos tentar algo e não seria muito nojento, ainda
mais se ele usasse camisinha. Mas Oliver não tem mais camisinhas, e eu
estava completamente desesperada para fazer amor e nada mais. Então
decidimos esperar eu melhorar, no final, sexo na menstruação ainda era um
tabu para nós dois.
Sento na poltrona chique que tem perto do balcão, que sustenta uma
vitrine com os relógios de Oliver e espero.
Sempre tem um jeito.
Assim que ele sai com a toalha envolta da cintura, me aproximo dele,
sem me importar com o seu corpo ainda molhado da chuveirada que tomou.
— Você não vai escapar de mim, senhor Oliver — sussurro com a
ponta do meu indicador deslizando suavemente pela linha invisível que traço
em seu abdômen.
Oliver solta um suspiro sôfrego com aquele toque.
— O que você vai fazer, Isis? — Seu tom de voz é vacilante e sorrio.
— Nos dar prazer, meu bem.
Uno meus lábios aos dele, já com a minha língua invadindo o
aconchego da sua boca. Enquanto nos beijamos, a minha mão trabalha lá
embaixo, deixo a toalha de Oliver cair e toco o seu pau já semiereto, mas
que sinto crescer rapidamente na minha mão.
Ele está geladinho.
Aprofundo o beijo, tornando-o mais gostoso e depravado. A minha
língua fica deslizando pela dele, ora se aprofundando na sua boca, e ora
brincando com a língua safada.
Quando Oliver está finalmente duro, começo a masturbá-lo, apertando
meus dedos envolta do seu pau, mesmo que eu não consiga fechá-los
completamente. Deslizo para cima e para baixo.
— É melhor você se apoiar em alguma coisa — aconselho e ele exibe
um sorrisinho galanteador.
Oliver se escora no balcão, é quando me agacho com as pernas bem
separadas uma da outra. Faço todo aquele processo para que eu consiga
chupá-lo.
Sinto seu cheiro de sabonete, bastante convidativo.
Passo minha língua de cima para baixo, e de baixo para cima,
lubrificando-o, deixando-o louco quando a ponta da minha língua brinca com
o líquido que sai da ponta da sua cabeça.
Dou beijos por toda extensão, estimulando-o mais e mais, e
provocando. Então começo a deslizá-lo para dentro da minha boca com uma
agressividade que faz Oliver urrar e gemer de prazer. Mantenho aquele ritmo
até o seu pau estar completamente molhado, que é quando eu consigo chupá-
lo sem nenhum incômodo.
Fazer oral em Oliver me enche de tesão, às vezes sinto que posso
gozar só de chupá-lo, mas nunca aconteceu, e como quero gozar também,
molho meu dedo do meio e o abaixo para encontrar o meu clitóris inchado e
sensível. Solto um gemido assim que a ponta do meu dedo começa a deslizar
em movimentos circulares naquele nervo, enquanto fico imaginando Oliver
me penetrar e me chupar.
— Era o que faltava! Você me mamando enquanto se toca... Aah! —
Oliver comenta seguido de um gemido profundo.
A mão dele vai para trás da minha cabeça, apoiando e me dando mais
impulso para ir até o falo. Me sinto tão molhada, mas não introduzo meu
dedo, apenas fico me tocando e tocando, revirando os olhos de prazer
enquanto chupo Oliver e me estímulo.
— Ouça o que vou dizer, Isis. Assim que possível, irei ir bem fundo
em você, preenchendo cada espaço seu. E vou chupar essa bocetinha até
você gritar.
E eu não duvido...
Nunca duvidei das palavras de Oliver.
Ouvir aquelas palavras e a sua voz rouca e sofrida por sentir tanto
prazer, me enche de tesão. Ele mexe o quadril, para frente e para trás,
fodendo a minha boca que já não se incomoda mais com a sua largura. Meus
olhos lacrimejam quando ele vai bem ao fundo e me engasga.
Tiro seu membro da minha boca para poder recuperar o fôlego, mas
continuo dando prazer enquanto fico passando a língua por todo seu
comprimento.
— Quero sua boquinha, vou gozar nela toda — Oliver sibila.
Volto a abocanhá-lo com mais urgência, minha outra mão livre aperta a
base dele, e sinto que Oliver vai explodir. Essa sensação faz algo dentro de
mim ficar mais intenso e ficar fora de controle. Quando estou gozando, meu
gemido é abafado por Oliver, que começa a preencher a minha boca com seu
sémen que jorra bem forte no fundo da minha garganta.
Ele é doce, bastante viscoso, forte e deslizante.
Engulo cada gota dele depois faço movimentos mais sutis e ele vai
tendo alguns espasmos enquanto derrama mais gotas.
Quando sinto que acabou de verdade, me levanto e minhas pernas
protestam. Oliver me segura a tempo de eu desabar. Ele está com um sorriso
de orelha a orelha, feliz pelo nosso momento.
Um dos vários que já colecionamos.
— Agora sim você pode terminar de se vestir, meu bem — pronuncio
como se nada tivesse acontecido com cara de inocência.
— Eu já disse que amo você? — diz depositando um beijo na minha
boca.
— Não na última meia hora — digo relembrando de que foi uma das
primeiras coisas que ele me disse assim que acordamos.
Oliver se declara todo dia e sinto que não serei capaz de me
desacostumar tão cedo de ser amada desse jeito.
— Bem, eu amo você. É a noiva mais gostosa e linda desse mundo
todinho, e eu daria a Lua para você — declara.
É impossível não dar um sorriso bobo.
— Eu também amo você, meu bem. — Sou mais romântica, e isso faz o
nosso outro beijo ser mais carinhoso.
Tenho vontade de passar a manhã toda assim com Oliver, mas
precisamos trabalhar.
— Preciso ir, senão meu chefe não vai gostar de que eu me atrase no
primeiro dia — comento pegando a minha bolsa e Oliver começa a se
arrumar.
— Querida, tenha certeza que você será chamada no escritório e irá
levar uma advertência bem grossa.
Gargalho alto e Oliver se sente orgulhoso.
Eu tenho o melhor chefe do mundo!
Deixamos Oli em mãos bem especiais, as do meu pai. Sei que com ele
não devo me preocupar, então vou com Oliver, quem é quem dirige, mas logo
atrás de nós, somos escoltados por uma outra SUV com quatro seguranças.
Embora toda minha empolgação para o trabalho, aquilo não é nada
comparado ao que eu estava acostumada em Blumenau.
Lá eu precisava pegar ônibus e sair bem cedo de casa se eu quisesse
chegar a tempo. Já chegava na escola bastante sobrecarregada, descabelada
e com a roupa amassada.
Agora, tudo é completamente diferente.
Quando chegamos no prédio e Jorge estaciona bem em frente, Oliver
não hesita em segurar a minha mão e entrar junto comigo no enorme prédio
que sede a parte administrativa do agronegócio de Oliver.
Assim que entramos no hall, já recebemos olhares e os murmurinhos
que se ouve rastejar por ali sobre nós dois, mas me sinto confiante.
Vão dizer que sou interesseira e dei o golpe do ano, mas não ligo.
Sinto que Oliver está feliz, e que vir para o trabalho não vai ser mais uma
forma de escapar de uma realidade que era sofrida.
Assim que entramos no elevador, seguidos por aqueles homens
enormes vestidos de preto, ele se oferece para me apresentar o andar da
creche, mas o detenho.
Oliver me olha incrédulo.
— Não quero que associem a minha imagem profissional a você. Já
acham que me aproveitei demais, não quero levar isso para o ambiente de
trabalho — tento explicar, mas sinto que não fui clara então fecho os olhos e
aperto-os, tentando encontrar uma forma de dizer sem soar grossa. — Quer
dizer, seria incrível você me mostrar tudo, mas não quero misturar as coisas.
Por favor, não entenda mal.
Oliver fica me encarando por alguns segundos, pisca meio atônito e
por fim, cede. Ele dá apenas um aceno de cabeça com um sorriso sem jeito,
quando o elevador para e soa assim que chegamos no andar em que ficarei
primeiro.
Ele sorri de um jeito reconfortante.
— Eu entendo perfeitamente, Isis, querida. Você já é uma menina
grande, vai saber se cuidar sozinha. — Lança uma piscadela.
Sorrio e saio, mas dois brutamontes daqueles me seguem, e então olho
com reprovação para Oliver antes que as portas do elevador se fechem por
completo.
Olho para os dois que mantém a visão reta, parecendo até mesmo seres
inanimados. Ambos são bastante intimidadores.
Penso em dizer algo, mas sei que não vai valer a pena, eles obedecem
a Oliver, afinal.
Sigo pelo andar inteiramente dedicada à creche.
A recepção é toda vibrante, devido as paredes coloridas, nada muito
diferente do meu antigo trabalho, com exceção de que este ambiente é mais
moderno e luxuoso. Imagino que a educação aqui também deva ser excelente.
A moça da recepção me atende com um sorriso contagiante, os lábios
estão pintados de rosa, e dão a ela um visual meio Barbie.
— Ah, então você é a noiva do senhor Oliver, a nova professora. Seja
bem-vinda a instituição Giordano.
Sorrio sem jeito.
— Só professora — corrijo e ela fica meio estática. — Professora
Isis, ou tia Isis, como as crianças preferirem. — Dou de ombros e sorrio.
Ela arqueia as sobrancelhas surpresa.
— Como quiser, senhorita Mancini. A sua sala é a três, turma C.
— O que aconteceu com a antiga professora? — pergunto curiosa.
— As turmas foram divididas para que a senhora fosse implementada
no time. Ao total, são cinco professoras e cada turma tem oito crianças,
assim fica até melhor a qualidade de ensino. Cada criança ganha a sua
devida atenção — explica de modo metódico e me surpreendo.
A princípio achei que fosse estilo berçário, onde os pais apenas
colocariam os seus filhos pequenos para não se preocuparem enquanto
estiveram trabalhando arduamente para Oliver. Mas as coisas aqui não
parecem funcionar assim. Como CEO, Oliver presa muito por resultados,
então é de suma importância que as crianças tenham uma base educacional
muito bem estruturada.
Isso enche meu peito de orgulho.
— As crianças já estão lá? — pergunto entusiasmada.
— Sim, elas já esperam por você — uma outra mulher diz no corredor
ao lado e ela se aproxima estendendo a mão para um cumprimento formal. —
Olá, senhorita Mancini. Eu me chamo Sabrina e sou a gestora da creche.
Estávamos ansiosas para sua chegada.
Aperto a sua mão.
Ela é morena, baixinha, mas tem olhos bastante expressivos e cabelo
cacheado. Pelo seu sotaque, eu diria que é carioca também.
— Pois é. Houve um contratempo. — Balanço a cabeça, afastando as
lembranças do sequestro. — Mas agora está tudo bem, então seguimos.
— É muito bom saber disso — diz, mas o que eu entendi foi, “Que
bom que tudo terminou bem, você não morreu e agora está aqui”.
Mas não acho algo ruim.
— Venha, é por aqui. — Me indica o caminho e então a acompanho,
mas antes lança um olhar sugestivo aos dois seguranças que me
acompanham.
— São meus seguranças. Depois do que aconteceu… — tento explicar,
mas ela me interrompe.
— Tudo bem, senhorita Mancini. Não precisa se incomodar contando a
história.
Que bom que ela pensa dessa maneira, pois não estou nenhum pouco a
fim de relembrar tudo, logo agora que estou tão animada.
— A essa hora as outras professoras já devem estar dando aula, mas
na hora do recreio irei apresentá-las.
— Ok.
Sabrina me leva até a sala onde irei dar aula, quando ela abre a porta,
crianças fardadas de azul e amarelo me recebem com gritinhos, sorrisos e
pulos, e meu coração fica quentinho e acolhido. Embora toda a animação,
eles ainda não parecem bastante confortáveis com a minha presença, e
demora até que a primeira criança venha me abraçar.
Logo depois que a gestora me apresenta às crianças, sou deixada para
trabalhar. As crianças se sentam e se mostram bastante disciplinadas, elas já
estão acostumadas ao ambiente, mas eu sou a novidade ali e por isso as
deixo acanhadas. Tento animá-las com tarefas bem dinâmicas. Usamos tintas
e massas de modelar, colamos e até cantamos.
Tento conhecer uma por uma.
Até que percebo que, na verdade, não sou eu que estou as deixando
intimidadas, e sim, os dois seguranças enormes que parecem dois
monumentos ali do lado da porta. Parece que quando percebo isso, uma das
meninas que se chama Isabela, vem falar baixinho no meu ouvido:
— Tia Isis, quem são esses homens? Eles dão medo na gente.
Solto um suspiro.
Eu já deveria ter imaginado!
Fico me sentindo uma boba por não ter percebido isso antes, mas os
tranquilizo:
— A titia Isis vai dar um jeito nisso, ok? — digo para ela que
concorda.
Me levanto e então caminho até a porta, não digo nada porque já sei
que eles irão me seguir. Saio e eles fazem exatamente isso. Dou alguns
passos pra longe da sala, onde as crianças não iriam me ouvir.
Subitamente eu paro e viro para os dois.
— Olha, eu sei que esse é o trabalho de vocês, mas por favor, vocês
poderiam ficar do lado de fora? As crianças estão assustadas — peço a eles
de forma educada.
Os dois piscam como se eu estivesse falando em outra língua.
— Vocês me entendem? Falam a minha língua? — pergunto quando
nenhum dos dois me respondem.
Então o primeiro que tem o cabelo estilo militar e parece uma
geladeira, se pronuncia.
— O senhor Oliver pediu para que ficássemos de olho em você em
qualquer situação — respalda.
— Até quando eu for ao banheiro? — Sorrio achando aquilo ridículo.
Eles não falam nada e me assusto.
— Espera, até quando eu for ao banheiro?!
— Não, senhora — o outro responde.
— Bem, pois eu exijo que não façam isso enquanto eu estiver
trabalhando. Não é nem por mim, mas pelas crianças.
— Acho que não podemos aceitar isso.
— O que? Mas são só crianças. Que mal elas farão a mim?
— São ordens, senhorita.
— E Oliver decidiu que vocês não deveriam aceitar ordens minhas?
— Não as ordens que atrapalhasse nosso serviço.
Resmungo bufando.
— Muito bem — digo e volto com passos firmes para a sala.
Quando entro, mostro rapidamente um sorrio para as crianças, vou até
minha mesa para pegar meu celular e volto de novo para fora.
Os dois seguranças parecem duas baratas tontas, sem saber me
acompanhar.
— Eu já volto, crianças — aviso antes de sair de novo.
De volta para o corredor, sigo em direção ao banheiro e percebo que
os dois ainda me seguem.
Fico furiosa.
— Parados! — exclamo ao me virar de supetão. — Nem pensem em
me seguir! Irei resolver isso agora mesmo!
Ando apressadamente até encontrar o banheiro, e já digito o número de
Oliver que precisei decorar assim que me mudei para Floripa. Quando
alcanço o banheiro feminino, olho para trás só para ter certeza de que
nenhum dos dois me acompanhou até ali e os vejo no início do corredor.
Entro no banheiro batendo os pés, com a ligação chamando. Fico de
frente para o espelho e ao mesmo tempo que estou bastante irritada, só fico
pensando em como Muriel estava certa. Logo no primeiro dia de trabalho o
protocolo de segurança de Oliver já me tirou do sério.
Ele atende de um jeito carinhoso, mas eu perco a cabeça:
— Oliver, isso é ridículo! Ridículo, entendeu?!
— Isis…
— Eu estou no meu ambiente de trabalho, será que dá para eu levar
uma vida normal pelas próximas cinco horas?
— Você já leva uma vida normal.
— Não com esses dois brutamontes me seguindo para cima e para
baixo! Eles me seguiriam até o banheiro, se eu não dissesse nada.
— Bem, eu não imaginei que eles levassem ao pé da letra quando eu
pedi para que vigiasse você até no banheiro.
A sua tranquilidade me irritava mais ainda.
Grunhi irritada.
— Eles estão assustando as crianças, Oliver! Isso é sério! Não quero
levar uma advertência no meu primeiro dia de trabalho!
Três segundos e então ele dá uma risadinha.
— Minha querida, você é a noiva do chefe. Faça o que quiser, que
você nunca será demitida.
— Não é sobre isso, Oliver! A minha profissão tem princípios e ética!
— A minha também.
— Pois não parece! Caso contrário você me entenderia.
Do outro lado da linha, Oliver bufa.
Imagino que ele está tentando recompor a paciência para não ter que
gritar comigo também. Eu admiro mesmo a sua paciência comigo, porque a
minha com ele sobre esse protocolo já se esgotou.
— Escute, Isis. Eu não posso simplesmente suspender os dois
seguranças, faz parte do protocolo, lembra? E você esteve de acordo.
— Estive de acordo porque achei que eu teria algum poder sobre eles.
Mas nem isso eu tenho. Como assim eles recebem apenas ordens suas?
— Porque eu sei que você é teimosa e iria querer dispensá-los para ter
mais privacidade. Só que é nessas horas que você precisa de segurança, Isis.
— Estou segura no meu trabalho. — Quando digo isso, Oliver fica em
silêncio, mas parece que outra coisa acontece além da ligação. — Oliver?
Ele não me responde.
— Oliver?
— Oi.
— O que aconteceu?
Mesmo conectados apenas pela ligação, sinto que ele fica apreensivo.
— É a Paula, ela está aqui.
— E trago notícias quentinhas! — vocifera perto o suficiente para que
eu pudesse ouvi-la. — Encontramos os suspeitos.
Meu coração acelera e seguro o peito para que ele não pule para fora.
— Vocês querem ouvir os nomes? — ela pergunta.
— Sim — respondo mesmo não sabendo se ela podia me ouvir.
Mas Oliver também afirma.
— Bom, como Isis havia dito, eles são uns quatro. Pedro, Tobias,
Rafael e Theodoro. Eles estavam agindo ativamente no sequestro. Foram os
que raptaram Isis e Oli.
Conforme ela falava, eu me sentia reviver aquele momento, lembrando
dos rostos cobertos por máscaras de pano preto.
— Pedro e Tobias agiram depois deixando Isis e Oli no posto de
gasolina. Os outros dois foram responsáveis por pegar a grana do resgate.
Rafael foi quem deu o tiro em Lorenzo.
— Mas não termina por aí — Matias, o parceiro dela acabou dizendo.
— Pois é. Ainda tem a cereja do bolo. — Há um tipo de empolgação
mórbida na voz de Paula por ter aquela informação com exclusividade. —
Havia uma quinta integrante. Era a que passava as informações e ajudou os
caras com o sequestro.
— Uma quinta? — Oliver pergunta. — Você diz então que a outra
pessoa é uma mulher?
— Isso mesmo. Sofia Alcantara. Esse nome soa familiar para vocês?
Meu coração é arrancado do peito, tanto que preciso me apoiar para
não despencar no chão. Mas estou tentando evitar o grito e o pavor que me
consome.
A ex-namorada do Nicolo ajudou a me sequestrar!
OLIVER

O sangue ferve em minhas veias.


Estou principalmente decepcionado e surpreso demais.
Sofia era a conhecida que estava por detrás do sequestro e depois
disso não consigo ouvir mais nada. Nem mesmo Isis, que estava na linha
comigo.
Acho que a ligação caiu, mas estou tão petrificado com aquela
informação, que apenas aperto os dedos envolta do celular, e a minha
vontade é de arremessá-lo em direção a parede, mas não faço isso.
Preciso conter as emoções, principalmente a raiva que me consome
neste exato momento. Paula tem ressaltado pontos importantes, mas a única
coisa que eu consigo pensar é: “Como diabos irei contar isso a Nicolo?”
Ele já estava mal o suficiente com o que aconteceu no Paraná, quando
flagrou Sofia humilhando Isis da forma mais baixa possível. Depois disso
ele descobriu mais podres dela e o seu desgosto só foi aumentando.
Coço a barba, pensativo.
— … Tudo bem para o senhor?
Olho confuso para Paula que aguarda minha resposta.
— O que? — Está difícil de me concentrar.
Ela solta um suspiro ao perceber que eu não estava conseguindo
manter o foco.
— Senhor Oliver, iremos fazer uma busca de apreensão dos
envolvidos. Já temos nomes e os endereços, mas estamos tendo dificuldade
em encontrar o paradeiro de Sofia. Na verdade, ela parece ter fugido com
Tobias. Precisamos do contato do seu amigo, que era ex-namorado dela, tudo
bem?
— Ele vai ficar arrasado — comento estático.
A detetive solta um suspiro pesado.
— Infelizmente não temos muito tempo. E precisamos que ele nos dê
informações sobre possíveis locais para onde ela iria.
Balanço a cabeça, mas não sei se concordo muito bem com isso.
Naquele instante, a porta do meu escritório abre e Isis passa por ela
igual a um furacão. Ela já estava bastante chateada comigo por causa dos
dois seguranças que estavam incomodando as crianças no seu trabalho, e
agora, ela sabe os nomes dos envolvidos no sequestro.
Não sei se agradeço ou não pelas respostas que vieram num bom
momento, porque não estou pronto para soltar a coleira, e Isis comeria as
minhas bolas guisadas se eu não a escutasse.
De qualquer forma, levanto da minha poltrona e contorno a mesa, por
onde ela vem e me encontra em um abraço apertado. Seu corpo está
tremendo e isso me preocupa.
— Você está bem? — pergunto analisando bem o seu belo rosto, que
se recuperou bem nos dias anteriores.
— Era a Sofia. Era ela esse tempo todo. Meu Deus, Oliver, agora tudo
faz todo sentido! — diz com a voz embargada.
Paula e Matias se aproximam ao ouvir.
— Como é? — a detetive pergunta com os braços cruzados. — O que
faz sentido, Isis?
Ela se afasta um pouco e pisca várias vezes, confusa ainda sobre algo
que nem ela sabia ao certo.
— Havia uma pessoa, dava para perceber que ela engrossava a voz de
propósito. E era a que justamente mais nos tratava mal.
— O que ela fazia com você? — pergunto com a voz sombria e rouca.
Ninguém além das vespas machucou Isis, ou Oli, mas os deixaram em
maus-tratos, sem comida, sem banho ou água o suficiente. Isso bastou para
que eles ficassem doentes, precisando se recuperar por dias em casa.
Não consigo aguentar a fúria que isso estimula dentro de mim.
— Ela dizia coisas horríveis sobre Oli e me julgava tanto — confessa
abraçando o próprio corpo que está magro, reflexo dos dias que foi mantida
em cativeiro. — Eu sentia que ela tinha vontade de avançar em mim, mas os
outros não deixavam.
— Filha da puta! — resmungo baixinho.
— Isis, por que não nos contou isso? — Paula usa um tom quase
impaciente com ela. — Teria sido útil em algum momento.
— Eu não tinha certeza. Às vezes passou pela minha cabeça que fosse
ela, porque o ódio era muito semelhante com a forma como ela me tratava,
mas eu também não podia culpar sem provas. Ia parecer algo pessoal, por
pura birra.
— Tudo isso a gente considera, senhorita Mancini — Matias diz
gentilmente. — Em algum momento as peças do quebra-cabeça iriam se
encaixar.
— Mas agora vocês conseguem prendê-la, não é? — pergunta com
olhos ávidos por uma afirmação.
No entanto, em resposta os dois detetives apenas me olham e tenho que
tomar uma decisão muito técnica e profissional agora. Enfio as mãos nos
bolsos da calça e explico a situação para Isis:
— Eles acham que Nicolo pode saber onde Sofia está se escondendo,
junto a um dos bandidos. Preciso falar com ele.
— Isso se eles já não tiverem fugido do estado! — Isis exclama.
— Não tem como — Paula ressaltou. — Nos aeroportos já tem o rosto
deles, e nas rodovias, equipes da polícia estão em operação. Mas ainda é
necessário, senhor Oliver.
Droga!
Estive tão faminto por esse momento, que agora ele parece
simplesmente errado demais. Não gosto da Sofia, e o que ela fez com
aqueles outros caras, não me fariam hesitar na hora de colocar todos atrás
das grades. Mas é por Nicolo que eu temo.
Ele é forte e inteligente suficiente para compreender toda a situação.
Porém, por três malditos anos ele amou e se iludiu por Sofia, que se passava
pela namorada perfeita, quando a sua podridão verdadeira era mantida em
sigilo.
Sei que ele desmoronou desde o último acontecimento no Paraná, que
ele tem tentado ignorar a forma súbita que a sua vida amorosa foi atingida, e
agora, não sei se estou pronto para dá-lo outro motivo de tanto desgosto.
Mas se eu não fizer nada, serão dois bandidos foragidos, com meu
dinheiro, se vangloriando por aí de como nos fizeram de trouxas por tanto
tempo.
Ver as coisas por essa lente me deixa determinado a cumprir de uma
vez com a ordem da detetive.
Uma hora, todos nós iremos superar isso.
Pego meu celular que está sobre a minha mesa e digito uma mensagem
rápida para Lorenzo depois guardo o celular no bolso e aviso aos dois
detetives:
— O escritório dele é logo no andar debaixo, já o avisei que faremos
uma visita a ele.
— Ótimo. É bom irmos logo, o tempo é nosso inimigo — Paula diz
enquanto sai com Matias.
Viro para Isis que parece um pouco assustada e desorientada. Apoio
minhas mãos em seus braços e esfrego para cima e para baixo a fim de
acalmá-la. Dou um suspiro forte e fecho os olhos, canalizando aquelas
perturbações que não vão embora.
— Eu achava que isso tudo já teria um fim — desabafo.
— Está bem perto de ter — ressalta, sempre tão otimista e forte.
Isis sempre expressa seu melhor lado, mas às vezes o seu próprio
corpo a entrega. Como agora, por exemplo, ao senti-la tremer, sei que não
está tão confiante quanto aparenta.
— Por favor, ao menos até esses canalhas e essa vadia estarem atrás
das grades, por favor, meu amor, deixe os seguranças fazerem o trabalho
deles — imploro.
Isis muda o peso dos pés e me olha com um pouco mais de rigidez, me
laçando. Às vezes não sei como ela consegue fazer isso, ir de um anjo para
um ser intimidador com faíscas nos olhos, mas de todo jeito, Isis me tem aos
seus pés.
— Eles ficarão no corredor. Não quero ninguém assustando as minhas
crianças — determina e eu assinto.
Não tinha mais o que combater, havia outra coisa mais importante a se
fazer e, desde que Isis não rejeitasse todo protocolo de segurança, eu já
estava aliviado.
— Tudo bem. Podemos conversar sobre isso quando estivermos em
casa — aviso e ela confirma.
Dou um beijo na sua boca, não tão demorado e molhado quanto eu
gostaria, mas um beijo de que tudo vai ficar bem e em outro momento iremos
ficar juntos de novo.
— Agora vou voltar para o trabalho — avisa me dando antes de sair
um forte abraço. — Vai dar tudo certo. Eu amo você — tranquiliza.
— Também amo você, minha querida.
Dou um sorriso a ela e juntos, de mãos dadas, saímos do meu
escritório. Pegamos o mesmo elevador, mas Paula, Matias e eu descemos
logo no andar debaixo. Dou uma última olhada por cima do ombro, antes da
porta de metal se fechar e Isis sair de vista, e suspiro profundamente.
Lá no fundo sei que estamos bem. Isis e Oli não precisam mais se
preocupar com nada, mas essas pendências a resolver são um grande pé no
saco, além de muito estressante.
Eu só espero que Nicolo use o seu senso de justiça como um bom
advogado que é, e lute para que quando Sofia for capturada, o advogado dela
seja tão inútil quanto ela foi nesses últimos três anos.

Deixo que Paula dê a informação a Nicolo, que ouve tudo atentamente


enquanto está sentado em sua poltrona. Mas como esperado, ele não reage de
um jeito muito agradável em relação a isso. A primeira reação de Nicolo é
bater o punho sobre a mesa de vidro e então, desfalecer sobre a poltrona que
reclina para trás com o peso dele. Seus dedos esfregam os olhos e então as
têmporas.
Ele está sendo contido por um combo de sentimentos que está tentando
controlar.
Nicolo, meu amigo loiro de olhos azuis com pinta de modelo, sempre
imbatível, bem-humorado e arrogante, destemido e com o coração intacto…
Não sei nesses últimos tempos. Mas, se tivesse alguma chance do seu
coração se partir, o momento perfeito seria agora.
— Eu sinto muito que o senhor tenha que passar por essa situação —
Paula diz quando percebe que ele está em choque ainda para poder lhe dar
qualquer resposta.
Ele dá um sorriso triste.
— Eu também, detetive — diz com a voz afetada. — Mas que se dane
essa vadia também!
Me surpreendo ter que ouvir Nicolo insultar Sofia dessa maneira. Os
sentimentos dele beira entre raiva, mágoa, decepção e rancor. Às vezes nem
acredito que um dia eles já se amaram, “se” ela realmente já o amou.
— Então vai nos ajudar com possíveis locais onde Sofia estaria se
escondendo? — pergunta Paula com as sobrancelhas arqueadas.
Meu amigo olha para ela em desdém, como se ela tivesse falado uma
loucura. Nicolo senta ereto, estica o corpo mais para cima da mesa e
exclama:
— Como acha que posso saber algo sobre ela? Sofia foi a minha
namorada por três anos, mas era uma grande mentirosa! Porra! Tudo o que eu
sabia sobre ela foi reduzido a nada!
— Talvez ela não tenha mentido sobre tudo — Matias ressalta, como
sempre bem centrado.
— Desculpa, não tenho como ajudá-los — Nicolo conclui, virando a
cara, nitidamente magoado.
Estou ao lado da porta quando ele diz isso. Descruzo os braços,
completamente surpreso por ver que ele não fez muita questão de ajudar, mas
não sou um canalha. Não vou agir igual a um louco indignado só porque ele
disse “não” aos detetives. Compreendo o lado de Nicolo, e acho que em seu
lugar também teria o mesmo sentimento.
Como achar que você poderia ajudar com alguma coisa, se tudo o que
você achava saber sobre a pessoa, não passava de uma fachada?
Mas tinha que haver alguma coisa...
Uma única coisa.
Me aproximo da mesa dele e espalmo minhas mãos sobre a superfície
de vidro. Mesmo que eles estivessem olhando a paisagem do lado de fora
pela enorme janela de vidro, eu o observo. Mesmo que tenha 36 anos, as
feições de menino de Nicolo sempre vão me lembrar aquele garoto que fugia
do internato para se aventurar nas ruelas do interior da Itália, onde ficava
nosso colégio.
As sobrancelhas e cílios eram tão loiros quanto o cabelo.
Um príncipe...
É assim que as pessoas costumam lhe chamar.
E agora tudo o que eu vejo é que esse príncipe foi magoado
profundamente, teve seu coração arrasado e está de toda forma tentando se
manter firme quando descobriu que a sua princesa fugiu com os marginais.
Conheço meus amigos melhor do que eu mesmo e Nicolo não está bem.
Porra!
Ninguém está bem, mas podemos melhorar.
Dou um suspiro e mantenho meu olhar nele.
— Nico, deve haver alguma coisa — digo com cautela. — Matias tem
razão. Nem tudo pode ter sido mentira.
Cinco segundos se passam quando ele decide me olhar, e vejo que
aqueles orbes azuis estão envolta de tons vermelhos que revelam o choro
contido de um emaranhado de emoções.
— Se quer saber, Oliver, qualquer coisa que eu diga a respeito dela
pode não servir pra merda nenhuma porque Sofia mentiu sobre tudo!
Principalmente sobre quem ela era.
— Mas, por que você diz que ela mentiu sobre tudo? — pergunto com
o cenho franzido.
Ele lança um olhar para Paula e Matias e então me olha de volta. É
quando dá o braço a torcer.
— Sofia dizia que era modelo e que não gostava de falar muito sobre a
família porque eles nunca apoiaram em nada. Ela não morava comigo, mas
sempre estava no meu apartamento. Quando eu terminei com ela, descobri
que Sofia nunca foi uma modelo profissional. Os ensaios que ela me
mostrava eram na verdade os que ela pagava. Eu não sei mesmo com o que
ela ganhava a vida.
— Roubos. — Paula mata a charada dando dois passos e deixando
uma papelada na frente de Nicolo. — Descobrimos que Sofia tinha uma ficha
criminal no interior do estado, mas o belo rosto dela já foi captado várias
vezes por câmeras de segurança, quando roubou pequenos estabelecimentos
por pequenas cidades ao redor do país.
Nicolo olha chocado para o envelope mórbido sobre a sua mesa, mas
não toca. Paula sabia que se ele visse com os próprios olhos, não duvidaria
de nada; mas lá no fundo ele sabe que isso tudo é verdade, e por isso fica
imóvel.
— Parece que só piora — desabafa.
— O que mais você sabia sobre aquela outra Sofia? — Paula pergunta
e ele dá de ombros.
— Estávamos juntos há três anos e ela tinha muita vontade de ficar
noiva, mas eu tinha um pé atrás porque sempre achei estranho o fato dela não
me apresentar ninguém da família. Até que um dia Sofia me contou sobre
uma tia que vivia no interior de Santa Catarina. Disse que me apresentaria a
essa tia quando eu a pedisse em casamento. — Para de falar e pisca três
vezes, como se estivesse lembrando de algo. Até que revela: — Eu já estava
escolhendo as alianças.
Puta merda!
Olho abismado para Nicolo.
Como ele não me contou nada?
Por que demorou tanto tempo para revelar isso?
Droga!
Talvez estivesse envergonhado demais para admitir isso.
Mas nós entreolhamos, como se entendêssemos que aquilo poderia ser
uma ótima pista.
— Senhor Nicolo, quais as chances disso ser verdade? — Paula
pergunta. — O que mais ela contou sobre essa tia?
Nicolo sustenta o olhar de Paula e sei que está considerando dar essa
informação.
É uma situação difícil, afinal ele a amou, e ela o traiu de tantas formas
que entregá-la às autoridades seria uma boa forma de dar o troco, ou então,
uma forma de se ver cortando laços eternamente com aquela que ele tanto
amou.
Por fim, ele toma uma decisão.
Nicolo se apruma em sua poltrona e exibe um olhar determinado. Não
consigo decifrar mais nada neles além de pura mágoa e frieza.
— Vou dar o endereço a vocês.
Finalmente ele coopera e não quero imaginar o quanto que ele
precisou lutar contra seus sentimentos para ajudar seu antigo amor ir parar
atrás das grades.
Nicolo cedeu com um semblante de repulsa. Nada daquilo o agradava,
mas era o certo a fazer, ele sabe que era.
Acompanho cada informação, e Matias já vai repassando para a
equipe mais próxima do local para interceptá-los a tempo.
Por fim, quando Nicolo dá os detalhes, os dois agentes se preparam
para se retirarem. Eles estão apressados, mas se mostram muito gratos diante
da ajuda dele.
Mais uma vez, sou pego por aquela sensação de alívio, de que mais
uma vez estamos a um passo de pôr um fim nessa história.
Acompanho os dois até a porta, mas não vou junto, muito menos
pretendo voltar para meu escritório agora, porque tenho que conversar com
Nicolo, de amigo para amigo.
Quando fecho a porta e está só nós dois em sua sala, ele levanta e solta
vários palavrões enquanto caminha até a janela. Ele bagunça o cabelo que
sempre vive impecavelmente bem escovado e afrouxa a gravata.
— Nunca me senti tão envergonhado em toda minha vida! — revela
rispidamente. — Eu não consigo nem olhar para sua cara.
— Você está exagerando, Nicolo.
— Exagerando o que, porra?! — Vira na minha direção, agora com um
jeito mais familiar.
Já vi o Nicolo estressado desse jeito antes, mas em momentos bem
raros.
— Há três anos eu venho colocando aquela mulher na sua casa, e na
casa do Dom e do Lorenzo. Ela participou de tantos momentos especiais e
vocês tentaram abrir meus olhos, mas eu nunca cedi!
— Você a amava, não seríamos loucos de querer lutar contra seus
sentimentos.
— Pois deveriam ter tentado! Caramba, ela atormentou a vida de Isis
duas vezes, e quase a matou! Ela tornou a sua vida uma bagunça nesses
últimos dias, mas pode ter certeza que a minha ela acabou a transformando
em um inferno!
— Mas a culpa não é sua. Não se martirize tanto quando você foi
verdadeiro e ela uma grande mentirosa. Quando agimos de boa-fé, não se
enxerga mesmo essas coisas.
— Você deveria estar furioso tanto quanto eu, por ter a levado para a
sua casa tantas vezes! — ressalta, apoiando as mãos no vidro.
Solto um suspiro forte.
— Mas, estou furioso, Nicolo. Só que a polícia está indo agora mesmo
atrás deles, e acho que agora que sabemos quem são os criminosos, será
mais fácil colocá-los atrás das grades. Estou otimista quanto a isso.
Vejo o reflexo dele no vidro e Nicolo dá um sorriso afetado.
— Nem acredito que cooperei para colocar a minha ex-namorada na
cadeia. — Reflete mais um tempo e verbaliza: — Eu sou um homem justo,
sempre lutei pelo que era certo. Mas agora… Eu hesitei, Oliver e tenho
vergonha disso. Sofia me traiu de tantas maneiras, mas o que eu sentia por
ela me fez pensar se era isso mesmo o que eu queria. Como se poupá-la de
ser presa me fizesse ganhar o seu amor de volta.
Ele pausa, sorri e então vira para mim.
— Mas é uma bobagem, porque nunca tive o amor dela.
Não sei o que fazer além de ficar calado, mas aceno para Nicolo,
ciente dessas coisas. Foi exatamente como eu imaginei e um pouco mais
intenso.
Por tanto tempo Nicolo foi um homem canalha, que odiava romances
ou se envolver por tempo prolongado. Aí ele conheceu Sofia e ela deu um
gelo nele, se fez de difícil e isso o conquistou. Apesar de nunca ter me
simpatizado com ela, eu sabia que ela o fazia feliz, por três anos ela o fez um
homem feliz, mas toda aquela felicidade desmoronou como um castelo de
cartas.
Mas não era o fim.
Agora eu precisava ser o amigo que ele foi para mim desde que
Melissa se foi. Me aproximo de Nicolo e o dou um abraço amigável e de
irmão.
Não somos apenas amigos, mas irmãos e ele sempre poderá contar
comigo.
Lembrei de algo que ele me dizia.
— A vida tem vários ciclos. Você mesmo me dizia isso. Quando
Melissa se foi, você disse que ela havia sido um ciclo que mostrou o que era
uma vida boa, e então, outro começaria. Acho que o seu ciclo com Sofia
chegou ao fim para em breve um ciclo melhor acontecer.
— E até lá eu sofro igual um condenado.
— Você acha que eu não sofri igual um condenado? — pergunto me
afastando e dessa vez ele sorri genuinamente.
— Um pouco pior, meu amigo.
— É verdade. Mas agora estou bem como nunca estive antes. Este
ciclo está me permitindo ser feliz mais do que eu já fui em outros ciclos.
— Essa coisa de ciclo não entra na minha cabeça agora. Sei que foi eu
quem começou, mas… — Bufa e afunda os dedos no cabelo dourado como
ouro. — Eu só quero me afundar num copo de uísque agora.
— Eu te entendo — digo balançando seu ombro. — Em breve nós
quatro iremos nos juntar e resolver isso.
— Por favor, que seja o mais breve — pede.
Sorrio para ele, sabendo que apesar de tudo, a verdadeira face de
Nicolo ainda espreita ali, não deixando a mágoa lhe tomar por completo,
nem o rancor.
Deixo Nicolo em seu escritório e peço para que volte para casa, para
que não venha trabalhar pelos próximos sete dias. Mas, quem estou querendo
enganar? Por dois anos levei o trabalho como válvula de escape e ir para o
escritório foi a única forma que encontrei para tirar a dor do meu coração.
Agora, não posso evitar que Nicolo encontre conforto no trabalho também,
mas espero que a sua recuperação seja mais rápida que a minha.

Conto a Isis o que aconteceu e ela não poderia estar mais triste por
Nicolo, e muito espantada por Sofia.
É uma droga que o seu primeiro dia de trabalho, a sua volta para a
vida comum, tenha sido de certa forma toda essa bagunça descontrolada.
Mas nada é mais gratificante do que no final do dia, sairmos juntos do
trabalho e voltarmos para casa colados, e então, encontrando o nosso filho
dando uma soneca em paz, no seu lar, um lugar cheio de amor para lhe dar.
No jantar, conto aos outros integrantes da casa que os sequestradores
foram identificados e que Sofia e Tobias estavam sendo caçados. Muriel e
Daniel ficaram chocados com a notícia, mas depois ela desdenhou,
afirmando que sabia que havia alguma coisa de errado com um de nós. Olho
para ela incrédulo, mas Isis pediu para eu relevar os surtos de Muriel, que
sempre anda desconfiada das pessoas.
Agora sei que não posso julgar esse seu lado, Muriel está certa. Irei
adotar este lado também, e sei que não serei o único.
Não posso imaginar o quão Nicolo se tornará exigente agora com seus
relacionamentos.
Mais tarde, quando Oli já está dormindo, Isis e eu vamos para cama e
continuamos conversando sobre as revelações de mais cedo. Estou deitado
só de cueca enquanto ela está deitada com os braços apoiados na minha
barriga, onde descansa a cabeça. Confesso que eu não gostaria estar de
papo, pois ela está vestindo um lindo baby doll branco e rendado.
Uma delicinha.
Só consigo pensar na minha língua deslizando pela pele morena dela,
tão macia e gostosa, traçando um caminho pecaminoso até o seu ventre,
descendo e descendo até chegar na sua…
— Ei! — Estala os dedos na minha frente. — Dá para manter o foco?
Dou um suspiro angustiante.
Porra, preciso muito foder!
— O que foi? — pergunto fazendo uma cara de frustrado por não estar
fazendo o que eu tanto quero agora.
— Estou falando sobre os seguranças. Falei para eles para não
entrarem na minha sala amanhã, mas acho que eles esperam por uma
autorização sua.
Balanço a cabeça.
Sei que me importo com a segurança da minha família, mas agora eu
não gostaria de estar falando sobre isso. Então apenas ressalto:
— Você é a minha noiva, eles também devem receber ordens suas.
Isis recua surpresa, com um semblante debochado, eu diria.
— Que bicho te mordeu, senhor Oliver?
— Na verdade, estou louco para ser mordido — sibilo roçando minha
barba pelo antebraço dela. — E para ser apertado. Querendo sentir aquele
negócio que você faz com a buceta. Assim... — Meus dedos engatam no
pulso dela e aperta e então solta, fazendo aquela compressão, mas não chega
nem perto do que eu realmente sinto quando Isis contrai a bucetinha dela com
o meu pau lá dentro.
Isis faz uma cara de espanto quando eu revelo isso.
— Descobri o seu segredo?
— Sim, que droga! Foi exatamente esse elemento que usei para te
enfeitiçar! — brinca. — Nem parece que foi hoje de manhã que eu te chupei
no closet.
— Eu adoraria retribuir o prazer, querida.
— Você quer tentar? Podemos ir para o chuveiro — sugere com os
olhos vítreos.
Eu sabia que Isis estava com tanto tesão nesses últimos dias.
— Pode ser, temos a banheira também. — Dou outra ideia.
Puxo Isis para cima, fazendo com que monte logo em seguida em cima
de mim. Ela senta propositalmente sobre o meu pau e arregala os olhos,
surpresa com a minha ereção tinindo na sua virilha.
Seu sorriso é de pura satisfação.
— Vem cá.
Minha mão engata na sua nuca e a puxo para mim, para poder alcançar
a sua boca onde enfio a minha língua. Ela geme logo em seguida, com prazer,
enquanto me aprofundo mais e mais naquele beijo, puxando-a para mim a fim
de torná-la uma parte minha.
Deixo que meus dedos desçam para seus seios e sintonize seus
mamilos rígidos e duros. Isso a leva à loucura. Ela fica ereta e começa a se
esfregar no meu pau, desejando sentar com tudo nele ali mesmo enquanto
estímulo seus seios e me inclino na direção deles, afastando o pedaço de
pano do decote, deixando-os para fora onde eu possa passar a língua e
chupá-los.
Sinto toda a sua pele arrepiar e ficar quente. Os gemidos dela são
como músicas para meus ouvidos, e seus dedos que afundam no meu couro
cabeludo e puxam para mais perto do seu seio faz com que o meu pau lateja
ardentemente.
Depois de um dia tenso, tudo o que eu mais quero é me afundar nela.
— Meu amor, não importa a situação, se eu puder fodê-la, eu irei —
sussurro em meio aos seus seios. Paro para olhá-la por um segundo. — Você
é a minha cura. E hoje eu preciso de você. Eu sempre vou precisar de você,
Isis.
— Ah, Oliver — sibila enquanto geme.
Agarro sua nunca a tensionando mais ainda em direção a minha ereção.
— Eu sou toda sua, você sabe que eu sou. E estarei pronta para você
em qualquer situação.
É uma carta branca.
Sem medo e nenhuma outra sensação além de prazer e amor
exacerbado, enfio minha mão por debaixo do vestidinho de Isis e meus
dedos ágeis trabalham afastando a calcinha fina dela para o lado. Quando
passo o dedo, a sua umidade me tira o fôlego, mas pode ter um outro
significado, por isso puxo o meu dedo de volta e olhamos ansiosos
Abro um sorriso quando vejo apenas um líquido viscoso e
transparente, que mela todo o meu dedo.
— Humm. Isso parece um bom sinal — comento.
Isis morde o lábio inferior dela, com uma cara serelepe para mim.
— Você está louca pra sentar no meu pau, né, meu amor?
— Estive esperando muito por esse momento — revela o que eu já
sabia.
Estamos com tanta pressa, que ela nem perde tempo tirando o baby-
doll e apenas coloca a calcinha de ladinho. Isis também se mostra cheia de
habilidade quando ela ergue o quadril e puxa a minha cueca para baixo,
fazendo o meu pau pular para fora, batendo em sua entrada.
Arfamos juntos com aquela provocação.
Sem escrúpulos, segura o meu pau e o roça na sua entrada melando
toda a cabeça com o seu líquido delicioso. Eu me estiro nos travesseiros e
fico me deliciando enquanto ela brinca, dando mais prazer ainda a nós dois.
Então, de olhos fechados, só sinto quando Isis senta em mim com vontade, de
um jeito nada cuidadoso. Ela sobe de novo, e desce, sobe e desce, fica
repetindo esse movimento até meu pau estar encharcado dela.
Quando sente que dá para deslizar melhor, Isis começa a cavalgar em
mim. Abro os olhos e tenho a visão do paraíso, a minha bela noiva de pele
morena e cabelo castanho e ondulado, corpo perfeito, simplesmente
cavalgando em mim com seus seios para fora, pulando enquanto ela me fode.
Seguro a sua cintura e aperto para dá-la mais estabilidade. O som que
preenche o quarto é de quando a buceta encharcada dela bate na minha
virilha, seguido do seu gemido de quando ela me afunda dentro de si.
— Aí, Oliver! Tá tã–tão gostoso! — choraminga.
— Eu sei, meu amor. Rebola para mim, querida. Rebola.
E ela obedece, senta e então remexe o seu quadril, finalizando com
aquela prensada que falei anteriormente.
Vou à loucura, seguro seu quadril com mais firmeza e a pressiono
contra mim.
— Seu grelinho tá gostando, tá? — pergunto, sabendo que meus pelos
ali embaixo acariciam aquela parte sua de um jeito bem especial.
Em resposta, Isis goza como um ser descontrolado. Seu gemido
bonitinho se torna um grito de pura agonia quando o seu orgasmo explode de
vez, e eu sinto tudo, me excitando e me levando a gozar logo em seguida.
Arqueio meu quadril só para ter que fazê-la sentir toda porra jorrando
bem fundo, e Isis arfa quando sente o calor lhe inundando. Depois disso, ela
despenca em meus peitos e ficamos caladinhos, recuperando o fôlego.
Passo os dedos em seu cabelo e então beijo a sua cabeça, me dando
conta de que essa é a primeira vez que fazemos amor desde o dia em que ela
foi sequestrada. Pensando nisso, e sentindo o meu coração dar um tranco, a
seguro em meus braços com força.
— Eu amo você. Obrigada por estar aqui — declaro, parecendo só
mais uma das minhas infinitas declarações.
Mas Isis sabe...
Ela sabe que isso significa que estou feliz por não ter terminado de um
jeito pior.
— Eu também amo você, meu amor.
Se a vida for mesmo feita de ciclos, não quero que este acabe nunca.
OLIVER

Sofia e Tobias foram presos.


Pela manhã do dia seguinte, assim que ligo a TV, uma das primeiras
notícias é sobre a captura dos envolvidos no sequestro.
Os três homens envolvidos não eram nada familiares para mim, no
entanto, eram jovens e seriam normalmente caras que eu contrataria para
trabalhar na minha empresa, a julgar pela boa pinta que apresentavam.
Mas não, são verdadeiros canalhas e que merecem estar atrás das
grades!
A tela mostra a cena dos outros dois chegando à prisão e meu corpo
fica tenso quando vejo Sofia. Ela ainda parece uma modelo, veste roupas
elegantes e seu cabelo está amarrado em uma trança, provavelmente para
disfarçar os dias que ficou sem lavá-lo. Seu rosto se mantém baixo o tempo
todo, ora para evitar os flashes e ora para esconder a cara envergonhada
também.
Os dois passam tão rápido da viatura para dentro da delegacia, que
mal tenho tempo de decifrar o resto, mas também não me importo.
Ela estudou toda a minha vida e a entregou de “bandeja” para os
bandidos. Achou que poderia se safar ao ostentar por aí com o meu dinheiro,
mas a polícia foi mais esperta, e agora seus dias serão de puro ócio, só que
dentro da prisão.
— Tão jovem e bonita — diz uma voz rouca logo atrás de mim.
Quando olho por cima do ombro, me deparo com o Daniel parado à
soleira da porta da sala de TV convencional que tem ali, um lugar menos
íntimo que a sala de cinema. Ele mantém o olhar na tela, e mesmo de óculos,
estreita os olhos para tentar enxergar melhor.
— Aliás, todos os envolvidos são jovens demais. Poderiam ter tido
uma vida brilhante pela frente, se não tivessem optado pela forma mais fácil
de ficarem ricos — comenta mais profundamente.
— Está aí faz tempo? — pergunto curioso.
Talvez eu tenha ficado tão vidrado com a notícia que mal me dei conta
de que não estava só.
— Não muito. Mas cheguei a tempo de ouvir que a polícia ainda vai se
aprofundar nas investigações porque foi encontrado mais coisas na casa de
um dos sequestradores.
Franzo o cenho e pisco confuso.
Fiquei tão pensativo ao ver o rosto deles, que simplesmente me
esqueci de ouvir toda a notícia.
— Desculpa, estou tão assombrado com isso tudo que a minha cabeça
facilmente perde a concentração — explico.
O Daniel dá um sorriso gentil e entra na sala.
— Vou ser sincero, meu genro. Não gostaria de estar na sua pele — diz
e geme um pouco ao se curvar para sentar no sofá, quando continua: — É
claro que sofri também, era a vida da minha filha e do meu netinho que
estava em perigo, mas agora que estão em casa, sei que estão bem. Só que
você é o patriarca da sua família, o nível de preocupação dobra porque você
está começando agora essa vida, e tem descoberto que não consegue mais
viver sem eles.
Coço a garganta para respondê-lo:
— É exatamente como me sinto. Talvez um pouco mais intenso, a
ponto de não conseguir explicar em palavras.
— Não tem problema não conseguir explicar. Tudo o que é bom
demais nessa vida, não tem explicação. A gente só sente e descobre que é
bom demais viver, então passa a valorizar momentos simples — diz
sabiamente e sorri tranquilo para ele.
Pisco algumas vezes e desvio a atenção para meus dedos entrelaçados.
Percebo uma coisa que me envergonha, mas expresso ao pai de Isis.
— Essa é a primeira vez que sentamos cara a cara, só nós dois. E eu
acho que ainda não tive tempo de agradecê-lo, de um jeito mais pessoal, por
ter me aceitado, por ter aceitado os meus amigos, a minha vida e a minha
casa. Eu sou grato, senhor Daniel, de verdade, por tudo o que o senhor fez
por mim ao tornar tudo isto possível.
Ele acena sutilmente e fixa o olhar em algum ponto da sala para
também dizer:
— Sabe, Oliver, tem coisas na vida que a gente não pode deixar
passar. — Reflete e então continua: — Você deve saber do passado da Isis.
Que a mãe dela morreu de câncer, e então, eu era casado e feliz com a minha
ex-mulher, mas ela não aceitou quando eu resolvi adotar minha sobrinha
como minha filha. Na verdade, ela se arrependeu. Então digamos que Isis
nasceu tendo esse gosto da rejeição. Eu diria que a vida a rejeitou por muito
tempo, mas ela nunca rejeitou as coisas que a vida lhe dava, mesmo que
fosse pouca coisa. Muriel e eu foi tudo o que ela sempre teve, e ela já
achava que era muito porque a amamos demais. Demais! Mas aí a vida
pareceu começar a dar opções a ela, e como sempre, Isis agarrou as
oportunidades. Ter uma família, sempre foi o sonho dela.
Olho para ele como se tivesse dito uma coisa brilhante. E era, pois Isis
nunca me contou isso. Conforme ele continua falando, vou ficando mais
fascinado ainda por minha noiva:
— Isis tinha o sonho de ter uma família porque ela queria que a
criança tivesse todo apoio maternal que ela não teve. Queria descobrir qual
era a verdadeira sensação de ser mãe, e dizia que nunca deixaria seu filho.
Sim, ela sempre soube que teria um menino — revela sorrindo com aquela
lembrança.
Eu também sorrio, porque lembro de Oli, nosso bem mais precioso.
— Além do mais, ela amava a nossa pequena família, mas sempre
considerou que ela deveria ser maior. Bem maior... E acho que ela conseguiu
— conclui fazendo um gesto com as mãos, indicando a casa e todos aqueles
que a tornaram de volta um lar.
Percebo um sonho em comum com Isis e não fico chateado por ela não
ter me contado antes, mas acho incrível como é uma coincidência. Daniel e
eu nos aproximamos mais do que eu esperava, mas ele nunca soube muito
sobre minha vida além do básico. Estar aqui sentado com ele antes de eu ir
trabalhar, é um momento raro, mas a chance perfeita para trocar
confidencialidades.
— A minha falecida esposa também achava que eu merecia uma
família bem grande. Ela queria muito me dar filhos, mas depois que se foi,
percebi que eu já tinha uma família que sempre esteve ao meu lado em todos
os momentos — digo, percebendo que mencionar Melissa não causa dor e
mais nenhum sofrimento, apenas gratidão por ela sempre ter pensado em
mim, e na conexão que tínhamos. — Isis e Oli são a minha família, Muriel e
o senhor são tudo para eles também, então saiba que são da minha família, e
que também lutarei por vocês.
O sorriso que ele abre é largo demais, mas ele maneia a cabeça
incrédulo.
— Sabe, Oliver. Eu já sou um homem de idade, já vivi muito e agora
eu só quero curtir a minha filha em seu momento mais feliz da sua vida ao
lado do meu netinho. Agradeço toda a consideração, saiba que é recíproco,
mas essa mudança repentina ainda me pega de surpresa.
— Sente saudade da sua casa em Blumenau? — pergunto tentando
decifrar a sua fala.
Ele afirma primeiro com a cabeça depois solta um suspiro. Retira os
óculos de armação preta e então começar a limpar as lentes com a barra da
sua blusa.
— Isis e Oli são a minha vida, mas a minha rotina está em Blumenau.
E nessa idade, eu já não vivo sem ela. Este lar é de vocês…
— A casa é da família — ressalto o interrompendo. — O senhor
mesmo ficou surpreso com a quantidade de quartos que a casa tem, então
todos podemos morar perfeitamente aqui. Todos juntos.
Ele sorri de novo, mas me olha como se eu fosse um bobo.
— Ah, meu jovem, não se trata apenas disso. — Quando termina de
limpar os óculos, o posiciona de volta no rosto e mais uma vez adota um
semblante reflexivo, mas de puro afeto. — Eu vi Isis crescer e evoluir como
ser humano. Acompanhei toda a sua transformação. É bem complicado ser
pai solteiro de uma menina, sabe? Muitas coisas a gente não entende, mas
corre atrás das informações para poder compreender o que se passa. E
mesmo ela tendo 22 anos, isso me faz perceber que está na hora de eu deixá-
la voar. Você entende?
Pisco ainda confuso, embora todas as suas palavras façam sentido.
Então indago:
— O senhor está querendo dizer com tudo isso que vai embora?
— Não agora, mas em algum momento pretendo voltar para a minha
rotina em Blumenau, e prometo visitá-los todos os finais de semana.
— Aconteceu alguma coisa que o senhor não gostou? — pergunto
receoso.
Ele dá um sorriso reconfortante e seu rosto se ilumina.
— Muito pelo contrário... Muita coisa me agradou e sei que Isis e Oli
estão em perfeitas mãos. E aquilo… — Aponta para a TV, se referindo ao
sequestro. — Foi apenas um susto, não é mesmo?
Concordo com a cabeça.
Foi um susto que não irá mais acontecer, pois serei mais cauteloso
sobre isso. Daniel se inclina para dar uma leve batida amigável em meu
ombro.
— Confio em você. Sempre imaginei que teria um genro gente boa e
consegui. Sorte a de Isis. Sei que vocês serão muito felizes! — completa e
sorrio.
— Obrigado, senhor Daniel. Isso é muito importante para mim —
revelo emocionado, sabendo que tudo está perfeito, seguindo seu percurso
natural.
— Venha cá, meu genro! — chama aos risos e me abraça.
Não consigo conter o sorriso de felicidade.
Ter uma boa relação com o pai de Isis é uma das melhores coisas que
eu poderia desejar, assim isso não seria um empecilho no nosso
relacionamento. Podemos contar um com o outro, e sei que isso deve causar
muito alívio nela também, porque não damos dor de cabeça.
Uma tossida interrompe aquele nosso momento familiar, olho para
cima e encontro Isis escorada no batente da porta, de braços cruzados e nos
olhando de um jeito especulativo.
Me afasto do Daniel, mas ela ainda comenta em um tom divertido:
— Querido, eu sei que o meu pai é incrível, e que você também é um
homem maravilhoso, mas se continuar assim vou ficar com ciúmes caso me
deixem de escanteio. Oli diria a mesma coisa, se falasse mais do que mamãe
e tetê.
Daniel e eu rimos de seu aviso e então me levanto desamassando o
tecido da minha blusa social.
— Se você quer saber, ele está começando a querer falar papai. — A
confronto nessa eterna batalha de quem Oli mais gosta. — E o seu pai e eu
sempre assistimos ao futebol e tomamos uísque, então somos bons amigos.
Ela estreita os olhos em desconfiança em minha direção.
— Sei. Ele já chamou você para assistir à novela das nove com ele?
— pergunta em um tom provocativo e lanço um olhar duvidoso para meu
sogro, que dá de ombros.
— Gosto dessas tramas. Isis gostava de assistir comigo — explica.
— Isso foi bem antes de eu me tornar mãe, pai.
— Bem, ainda é uma ótima programação! — diz em sua própria
defesa.
Sorrio para ele de um jeito sugestivo.
Certamente ele ainda não deve ter mencionado querer voltar para
Blumenau a ela, então entendo que passar mais tempo ao lado dele agora
será uma prioridade, até que ele de fato volte para a rotina, a qual não
consegue se ver longe.
— Podemos fazer isso hoje à noite, talvez — sugiro e Isis me olha
com uma surpresa exacerbada.
— Senhor Oliver Giordano, CEO de uma megaempresa agrônoma,
querendo assistir novela com meu pai? — Sua voz é de puro divertimento.
Eu amo fazê-la sorrir. Seu sorriso ilumina tudo ao redor,
principalmente meu coração e a minha alma. Coloco as mãos em seus
braços.
Hoje, ela está de calça jeans e uma blusa social listrada.
— Eu disse que somos bons amigos — ressalto mais uma vez,
piscando para ela.
— Tudo bem, isso é realmente bom. Talvez eu faça companhia a
vocês, desde que não se importem comigo corrigindo as tarefas dos meus
alunos.
— Deve ser muito difícil avaliar aquelas artes que nem Van Gogh
seria capaz de reproduzir — brinco e ela revira os olhos, me afastando.
— Eles com certeza sabem desenhar um sol melhor do que você! —
provoca.
— Isso é um desafio, minha querida?
Ela sorri de um jeito maléfico e meu sangue corre rápido. Então
maneia a cabeça e pensa no assunto.
— Talvez essa conversa esteja me dando ideias.
Sorrio, pensando em algo muito depravado, então beijo a boca dela,
mas não passa de um selinho quando uma tosse nos detém.
— Eu acho que vou para o meu turno de babá — meu sogro diz,
andando em direção à porta.
— Ele já se alimentou, papai. Está querendo brincar agora.
Meu sogro sorri.
— É um belo jeito de começar o dia! Tenham um bom trabalho, os
dois! — Acena para nós dois que correspondemos. — Até logo.
— Até! — falamos em uníssono.
Isis me olha e quando me inclino para beijá-la, se afasta e me puxa
pela mão.
— Estou atrasada! Não quero que meu chefe me mate! — vocifera
apressadamente.
Sigo minha noiva até o estacionamento, onde Jorge já nos espera no
SUV e os quatro seguranças no outro carro ao lado.
Quando estamos dentro do carro, encosto a minha boca em seu ouvido
e sussurro:
— Ele não vai matá-la, mas vai procurar maneiras bem cruéis de
torturá-la — anuncio relaxando minha mão sobre a coxa dela, bem perto da
sua virilha, roçando com a ponta dos meus dedos.
Ela arfa, mas engole o gemido quando Jorge entra no carro, então me
olha de um jeito assassino e sorrio. Ir para o trabalho com ela no banco de
trás é muito excitante. Fico fantasiando o dia em que iremos fazer amor no
carro, sonho com isso desde que fomos ao Paraná, e toquei na sua bucetinha
pela primeira vez.
Já até planejo como farei desse sonho uma realidade deliciosa

— O que significa exatamente isso? — Domenico pergunta um tempo


depois que entrou no meu escritório e me encontrou estudando os pequenos
potes de tintas, a tela e o pincel sobre a minha mesa.
— Dom, eu descobri que a minha futura esposa tem um espírito
bastante desafiador e provocativo. Ela só não sabe ainda o quão competitivo
eu posso ser — digo de um jeito que o deixa mais confuso ainda.
Domenico pisca e troca o peso dos pés, mas cruza os braços e mais
uma vez pergunta:
— Ok, acho que ainda não entendi, mas tem alguma coisa a ver com a
Isis.
Olho para ele e relevo o assunto.
Não sei como explicar a Dom que as minhas duvidosas habilidades
artísticas estão em jogo contra um time de crianças de cinco anos. E que Isis
entrou nessa para me fazer levar uma rasteira bem feia por ter debochado do
nível de habilidade dos alunos que ela já ama tanto.
Me aprumo na poltrona recompondo a postura profissional, embora
com meus amigos eu seja mais tranquilo quanto manter as aparências.
— Aconteceu alguma coisa? — pergunto atentamente.
Ele não se incomoda com a mudança repentina de assunto. Solta um
suspiro e dá de ombros.
— Nicolo não veio mesmo trabalhar. Estivemos juntos ontem, e ele tá
arrasado. Hoje pela manhã mandei mensagem e ele disse que está aliviado
com a prisão da Sofia.
Nego com a cabeça.
— Além de criminosa e ter mentido sobre um monte de coisa, ela o
traía com o cara com quem foi encontrada. Ele tem muito motivo para estar
arrasado, com certeza a prisão da Sofia não reduz nada do que Nicolo está
sentindo agora — comento me sentindo revoltado com aquela situação.
Domenico solta um palavrão para o alto, alcança uma das cadeiras
confortáveis disponíveis ali e se estira na sua favorita; uma grande de design
quadrado e de carmesim.
— Que tal um encontro de amigos hoje à noite? Enchendo a cara com
uísque até essa merda toda parecer apenas um eco? — sugere de um jeito
determinado a cumprir com isso.
Olho para Domenico de um jeito surpreso. Dos quatro, ele e Lorenzo
são os únicos que não bebem de forma exagerada até ficarem loucos, mas as
circunstâncias atuais pedem exatamente isso.
Hoje à noite parece meio complicado. Lembro de ter combinado de
assistir TV com Daniel, não acho que acabaríamos assistindo a novela, eu
tentaria convencê-lo a assistir algum filme de ação, mas seria interessante ter
Isis por perto enquanto ela corrige a tarefa dos alunos.
Mas sinto que isso terá de esperar, Nicolo precisa dos amigos, e
mesmo que ficar sozinho agora seja bom, também não é a melhor opção para
alguém que está tão bagunçado da cabeça. E puta merda, um bom uísque às
vezes é tudo o que a gente precisa.
Sei bem o que Domenico está propondo.
Quando Melissa faleceu, nos encontrávamos todo final de semana para
encher a cara. Dom e eu fazíamos isso nos dias da semana e ganhávamos
uma ressaca terrível, mas era também a única maneira de afogar toda
tristeza, todo luto.
O que não é muito diferente do que Nicolo está sentindo. Sofia morreu
para ele, o seu luto é pela namorada que nunca foi real, apesar de ter ficado
ao seu lado por três anos.
— Vamos fazer isso — apoio depois de um tempo pensando na
questão. — Vamos nos encontrar mais tarde e beber como não fazemos há
tempos. Mas também não posso exagerar, tenho Isis e Oli me esperando em
casa.
— Bem, então continuará sendo como não fazemos há tempos. Quando
foi seu último porre, mesmo?
— Dois dias antes de descobrir a existência da Isis e do Oli. —
Lembro muito bem, pois a experiência foi horrível no dia seguinte. — Até a
data do meu aniversário se tornou desprezível de se comemorar naquele
tempo.
— Eu deveria me sentir ofendido? — pergunta e sorri, já que nós
quatro fazemos aniversário no mesmo dia.
— A questão é que agora eu não bebo para afogar qualquer sentimento
deprimente que me atinja. Tenho maneiras mais saudáveis de lidar com
situações difíceis.
— Que bom para você. Mas o seu amigo está um caco, então vamos
fazer isso por ele.
— Certo — digo e pego o potinho de tinta amarela. Penso no que Isis
disse mais cedo, que eu não seria capaz de desenhar um Sol. — Talvez eu
comece a me aquecer agora com uma dose, quem sabe o álcool não instiga
meu lado artístico.
— Que diabos é isso, Oliver? — Dom pergunta mais uma vez,
nitidamente impaciente por eu estar tão intrigado com algo que nem ele
consegue decifrar.
— Essas coisas não parecem familiares para você? Tintas, uma tela e
um pincel? — desdenho.
Domenico dá um sorriso debochado.
— Não sabia que você tinha um lado aspirante a pintor.
— E não tenho, mas fui me exibir para Isis e agora tenho que lidar com
as consequências. Ela mandou isso pra cá, e sem recado nenhum, porque os
itens já diziam o suficiente.
Dom não diz nada, mas percebo que ele fica me encarando por tempo
demais, e com um sorriso débil no rosto que me deixa um pouco
desconfortável.
— O que foi? Você está me olhando com uma cara de apaixonado —
comento tirando sarro e ele balança a cabeça em reprovação.
— Primeiro, vá à merda antes que eu me esqueça, e segundo, porra,
olha só pra você! Um pai de família, noivo e que troca desafios bobos com a
futura mulher. — Bate com as mãos nos braços da cadeira e se levanta. —
Meses atrás você estava aí, usando essa mesa para lidar com o trabalho
exaustivo de comandar uma das empresas mais bem sucedidas do país, e
agora está a usando para tentar fazer um desenho bobo!
Pisco para ele, completamente inerte.
— Isso é ruim?
Domenico revira os olhos.
— Isso é um sinal de que você está levando finalmente a vida que
merece depois de tanta dor. Olha para você, reclamando de uma pintura que
mal sabe por onde começar, ao invés de receber ligações importantes dos
parceiros da empresa — sentencia e começamos a rir da situação.
— Isso é porque você ainda não viu como está o meu escritório de
casa — comento com um sorriso bobo só de lembrar. — Tem dinossauros de
borracha por todo chão e uns bichos de pelúcia. Ontem pisei em um pedaço
de Lego, foi uma morte lenta e dolorosa — brinco.
— Dispensou suas funcionárias outra vez? — pergunta em tom
sarcástico, mas nego.
— Faço questão que a casa tenha a identidade de Oli, e a forma como
as coisas dele trazem uma atmosfera completamente diferente à casa. Um
simples brinquedo dele, já ilumina a casa, preenche a minha vida.
— Isso é muito bonito. Talvez devesse pintar — sugere.
Olho para a tela e penso a respeito, então, para as tintas. Lembro que
as cores primárias ali são as mais presentes no mundo de Oli, e então,
imagino o universo dele todo naquela tela branca. Nenhum artista no mundo
seria capaz de captar a essência que dá felicidade e que explode no meu
peito toda vez que penso no meu filho. Com ele o mundo é um lugar melhor,
e apenas cores serão capazes de demonstrar isso.
Então tenho uma ideia e levanto rapidamente da minha cadeira.
— Preciso ir para casa, não posso deixar que Isis chegue antes de mim
— anuncio a Dom, que fica espantado pela minha repentina decisão.
— Aconteceu alguma coisa?
— Você é brilhante! Me deu a melhor ideia que eu poderia ter!
Domenico fica confuso e balbucia:
— De nada?
Empolgado, pego os materiais que Isis mandou para mim e guardo na
minha pasta. Me despeço da minha secretária, que não questiona o motivo da
minha saída mais cedo.
Mas, ninguém questiona o próprio chefe, e isso que é a porra boa de
ser seu próprio chefe; eu decido meus horários, se saio mais cedo ou não, e
se dou prioridade a outras coisas.
E o que tenho a fazer é muito importante.
A sala de casa está uma verdadeira bagunça, mas não ligo. O chão de
mármore está preenchido de tinta e alguns móveis não passaram em branco
de uns borrões coloridos.
Matilde se assustou, mas era impossível não resistir a animação de Oli
conforme ele via as cores em seus dedinhos, ou em como elas pintavam de
forma viva toda vez que ele afundava o dedinho em um dos potinhos e
passava em algum lugar que escolhia.
Essa não era exatamente a arte que eu queria entregar à Isis, mas faz
parte do projeto final.
Quando cheguei em casa, convoquei Muriel para me ajudar com
aquela tarefa e por sorte Oli estava acordado.
Deixamos meu filho só de fralda, coloquei a tela no chão brilhante,
com as quatro tintas, então com a ajuda do pincel, passei a tinta primeiro no
pezinho de Oli, e o posicionei sobre a tela, fiz com o outro pé, e assim com
as duas palmas das mãos também.
Já estava perfeito, mas Muriel achou que dava para melhorar. Então
deixamos o toque final com Oli, que banhava os dedos nas tintas, ora os
passava sobre a tela, ora passava nos móveis ou em mim e na sua tia.
Foi uma diversão para todos nós.
— Agora é preciso limpar cada rastro do que aconteceu aqui, ela não
pode suspeitar de nada. A princípio, vai achar que falhei com a tarefa, mas
mal sabe ela o que a espera — comento com Muriel enquanto pego a tela
com todo cuidado.
— Achei que fosse entregar hoje ainda — diz com um Oli sujo de tinta
no seu colo, para evitar que ele pintasse mais móveis.
Com sorte, por conta da tinta facilmente removível, nenhum rastro
ficaria por ali também.
— Não, não vou — digo olhando para a obra de Oli. — Mas você não
acha que não existe presente melhor do que esse?
Muriel arregala os olhos e de repente sabe do que estou falando.
O aniversário de Isis será neste final de semana, e ela não comentou
nada com a gente. Não disse nada sobre festa e nem bolo.
Muriel comentou que Isis é assim mesmo, não faz alarde algum quando
essa data está perto, mas que também nunca passou em branco.
Então, para variar, Muriel está por trás da festa surpresa de Isis que
acontecerá em breve. E neste dia, irei presenteá-la com uma obra feita por
Oli e eu, um registro eterno do início do nosso sonho de ter uma grande
família, se tornando realidade.
ISIS

É meu aniversário.
Não lembro de ter comentado isso com alguém, pois depois do
sequestro e como todos ainda estavam abalados com as consequências
daquilo, não sei se ficar em clima de festa seria algo educado da minha
parte.
Lorenzo está se recuperando do tiro ainda e Nicolo está mais
deprimido do que o normal, embora ele tente disfarçar de todas as formas, já
percebemos o quanto ele está sofrendo.
Oliver e eu já tivemos infinitas conversas sobre o que faríamos para
aliviar a situação dele, mas ao que tudo indica, somente o tempo será capaz
de curar a mágoa no peito do nosso amigo. E confesso que estou tão cansada
que mal consigo pensar na organização de uma festa.
Não consigo negar como voltar a trabalhar tem sido mais cansativo do
que eu esperava. Fico meio período na creche, mas quando chego em casa,
preciso me dedicar a vida de mãe. Não quero ficar ausente na vida de Oli,
acho importante a conexão que estamos criando agora que ele está
aprendendo tudo.
Muriel me convidou para passearmos no shopping. Não dispenso os
seguranças, mas peço para que eles nos deem privacidade para aquele
momento, pois desfrutamos de dias radiantes depois que os sequestradores
foram presos.
Como a captura aconteceu mais rápido do que esperava, Oliver
acabou afrouxando as rédeas em relação aos seguranças. Eles já não andam
me seguindo para cima e para baixo igual uma sombra, agora, eles fazem o
trabalho deles de forma mais sucinta, o que melhorou muito meu desempenho
no trabalho, já isso não me estressa mais e consigo manter o foco.
Muriel e eu paramos em um café para conversarmos e tomarmos um
frappuccino e comer um sanduíche, coisa simples. Mas para variar, como
uma boa amiga irritante que é, ela começa a zombar:
— Desculpa estar trazendo você a uma cafeteria do shopping no dia do
seu aniversário. Uma madame como você merece coisa requintada, mas eu
sou apenas uma professora de inglês, é o que posso pagar.
Balanço a cabeça a reprovando.
— Você é uma boba, sabia?
— É sério! Como competir com os quilos de joias que Oliver irá dar a
você hoje? Ou, sei lá, talvez uma Ferrari.
— Não acho que nenhuma das duas coisas combine comigo. Oliver me
conhece, sabe como me surpreender — respaldo.
— Bem, já é surpresa suficiente que ele não tenha organizado uma
baita festa para você ou não fui convidada?
Reviro os olhos e tomo um pouco da minha bebida, que revigora tudo
dentro de mim.
— Você sabe que não faço muita questão de fazer festas, Oliver sabe
disso também. Acho que não estamos em clima de comemoração, ainda.
— Como não? — exaspera arregalando os olhos. — Olha o que vocês
passaram! Deveria ser uma forma de celebrar a vida e as novas chances.
— É, você tem razão. Mas isso pode ficar para o casamento, já acho
perfeito estar aqui com você tomando uma bebida quente e gostosa. — Ergo
a caneca de vidro e ela faz o mesmo, então brindamos.
— Ao seu aniversário!
— Ao meu aniversário!
Damos um gole e Muriel comenta logo em seguida:
— Isso bem que poderia ser uma cerveja bem gelada.
— Talvez a gente tome alguns drinks hoje à noite. — Não resisto e ela
faz uma comemoração sútil. — Papai me ensinou a fazer caipirinha. Não que
ele seja fã, mas ele disse que o tempo livre o obrigou a aprender muitas
coisas novas.
— O tio Daniel está entediado, ele sente falta da casa dele. Quer dizer,
ele ama estar com o neto e tudo mais, mas a vida dele está em Blumenau.
— Eu sei. — Meus lábios se curvam, achei que ele se adaptaria por
estarmos todos juntos, mas não foi o caso. — Ele não me contou nada ainda,
mas percebo que está se sentindo incomodado já.
— Bem, você é um bom exemplo para isso. Foi se adaptando com o
tempo, quem sabe ele não se adapte daqui um mês.
— Papai ama aquela casa, Muriel, sente falta do irmão, das manhãs na
feira, das tardes de dominó e das noites na esquina do mercadinho do seu Zé
enquanto conversa com os amigos. E aqui… — Dou de ombros. — Bem,
você sabe. Quanto mais velho vai ficando, menos em casa ele quer ficar.
Ela solta um suspiro em compreensão.
Sabíamos que em algum momento meu pai começaria a sentir a
mudança lhe afligindo e não havia muita coisa que eu pudesse fazer. Mesmo
com tudo aparentemente seguro agora, Oliver não se sentiria bem em deixá-
lo passear no parque sem os seguranças, papai já deixou claro que não quer
ser seguido por dois homens enormes que parecem os Homens de Preto.
Como eu havia dito, ele gosta de ser um homem livre, ainda mais na idade
em que está.
— Você permitiria que ele voltasse para casa, se tocasse no assunto?
Me remexo na cadeira e penso um pouco a respeito.
— Ele já está em casa, Muriel. Oliver já explicou que aquele lar
também é de vocês…
Ela solta uma risada me interrompendo.
— Aí, Isis. Conta outra! Agradeço a gentileza pela hospitalidade de
cinco estrelas de vocês, mas putz! Não queremos atrapalhar.
— Vocês não estão atrapalhando — digo séria e ela me olha com uma
cara maliciosa.
— Eu sei disso. Na verdade, nós sabemos disso porque você é bem
escandalosa nas noites quentes com o seu noivo — revela me deixando
chocada.
Arregalo os olhos e tapo a boca com as mãos, me sentindo
completamente envergonhada. Meu rosto esquenta e não sei onde enfiar
minha cara.
— Por que você nunca me contou?! — quase grito.
— Porque você nunca perguntou! Além do mais, não estou aqui para
pontuar isso quando estou na casa de vocês. É o seu direito gemer igual uma
vaca louca.
Fecho os olhos e os aperto com força tentando não imaginar a situação,
mas pergunto:
— Quando você diz que “nós sabemos”.
— Se quero dizer que seu pai também ouve alguma coisa? — pergunta
em disparada. — Não é difícil, mas relaxa. Você já é uma adulta e tem um
filho, como acha que os bebês são feitos?
— Eu engravidei com a ajuda de fertilização in vitro, Muriel —
destaco.
— Droga, é verdade! — Dá um tapinha na testa pelo descuido. — Mas
vocês estão noivos, e não acho que guardou sua virgindade para depois do
casamento. Bem, tenho certeza que não — diz por fim, dando uma risada
especulativa.
Dou outro gole da minha bebida.
Caramba, talvez eu beba realmente uns drinks depois dessa.
— Vamos ter que ser mais discretos, até porque Oli vai crescer, e ele
não precisa ouvir essas coisas — ressalto esse ponto preocupada.
— Acho que isso é o drama universal de casal que tem filhos, não é?
Vocês vão se acostumar em algum momento. Menos eu. Fico me sentindo
muito mal todas as noites por ser solteira, e ouvir você e Oliver trepando
não ajuda em nada.
Cruzo os braços sobre a mesa redonda e olho para ela atentamente.
— Olha só quem fala. Antes de eu me envolver com alguém, você
tinha a vida sexual bem mais resolvida que a minha.
— Isso era em Blumenau! Aqui eu não conheço nenhum boy gostoso
além dos amigos do Oliver e que são todos comprometidos.
Arqueio uma sobrancelha.
— Um deles está solteiro — pontuo.
— E vai precisar de terapia — comenta e eu comprimo os lábios para
não cair nesse humor ácido. Ela ressalta: — E eu não gosto de me envolver
com homens problemáticos.
— A ex-namorada dele que era problemática — rebato sentindo uma
repulsa ao ter que lembrar dela.
— Você não vai me convencer a ficar com o Nicolo, Isis — alerta com
firmeza. — Talvez Lorenzo, ele é um bebezinho.
Olho para ela consternada.
Muriel e sua atração sexual por homens bem-comportados, que ela
conseguiria manter na coleira e ser a dominante da relação. Dizem que
ruivas são puro fogo, e bem, Muriel deixa isso bem claro quando está com
alguém. Fico imaginando como Lorenzo se comportaria nas mãos dela, igual
a um submisso; mas lembro de algo mais real:
— Ele tem namorada.
— Não precisa tacar a verdade bem na minha cara. Eu já sofro o
suficiente por não ter aquele bebê comigo — confessa choramingando.
— Muriel!
Começamos a rir naquele momento de pura descontração. Só então me
dou conta de que fazia um tempo em que não nos juntamos para conversar e
dar boas risadas, mesmo morando sob o mesmo teto e dentro daquela enorme
mansão, onde nos encontramos todos os dias.
Ela dá um longo gole do seu frappuccino, como se a bebida quente
fosse ajudá-la a colocar lá no fundo aquele assunto.
— Vai, me conta como foi a primeira semana de volta ao trabalho? —
pergunta curiosa e conto tudo a ela bastante empolgada.
— Não tem sido uma grande diferença da antiga instituição que eu
dava aula, mas confesso que a creche da empresa do Oliver segue um plano
pedagógico o qual não estou acostumada. Às vezes acho que as lições são
muito avançadas para as crianças, mas eu que sou ingênua, pois elas
acompanham tudo que repassado nas salas de aulas. A gestora Sabrina me
explicou que todo ano as crianças passam por uma semana de avaliação,
onde os professores ficam estudando atentamente o desempenho dos alunos e
então, na sala das professoras, é discutido o desenvolvimento cognitivo das
crianças e depois decidido o plano anual.
Em breve eu passarei por essa experiência, e confesso que estou
entusiasmada. No meu antigo trabalho tudo era muito bem-feito, mas como
tratava-se de um jardim de infância, alguns pais confundem facilmente com
berçário.
Conto a Muriel sobre o drama que passei com os seguranças e foi um
deleite para ela, que sempre soube que estava certa a respeito de eu não
aguentar toda aquela proteção exagerada. Conto também de como foi receber
a notícia de que Sofia estava envolvida no sequestro, como as pessoas na
empresa me olham por saber que fui sequestrada dias atrás e como isso deve
ter deixado Oliver louco. Já ouvi alguns comentários, algumas pessoas
realmente não se esforçam em serem discretas.
Fora isso, as coisas vão indo muito bem.
Então ficamos mais um tempinho na cafeteria. Depois passeamos mais
um pouco pelo shopping e eu ainda achei que seria legal pegar um
cineminha, mas Muriel deu para trás.
De repente ela acha melhor irmos para casa, pois não estava se
sentindo bem. Não hesitei, seria horrível se ela começasse a passar mal no
meio do shopping e eu conheço a minha prima muito bem, ela nunca fica
doente, e quando se sente mal, é para valer.
Jorge está dirigindo para Oliver hoje, então é um dos seguranças que
está no comando da SUV. Fico preocupada com Muriel durante todo o
percurso. Ela está bastante inquieta, parece nervosa, não está falando muito,
mas sempre olha no celular. Talvez contando os minutos para quando
chegarmos.
Por sorte, o trânsito está fluindo bem, então chegamos a tempo dela ter
qualquer piripaque.
O carro é estacionado dentro da garagem e descemos dele com pressa.
— Parece que você vai vomitar. Poderíamos ter parado em um
hospital no caminho para ver logo o que é isso — digo enquanto estamos a
caminho da porta da garagem que dá acesso para a mansão.
— Tudo bem, Isis. É só um mal-estar. — Abre a porta e entra no
corredor que dá acesso para a cozinha e a escada.
Ando bem perto dela, pois se desmaiar, irei segurá-la.
— Será que foi o frappuccino?
Muriel não responde. Até que um coro explode em comemoração
assim que passamos da escada:
— Surpresa!
Olho assustada, segurando o coração dentro do peito enquanto
assimilo tudo, mas sorrio assim que percebo a simples e elegante decoração
feita, tem até um bolo na mesa, com bastante calda.
Percebo que acabei de cair em uma encenação muito boa para
descobrir que recebi uma linda surpresa da minha família.
Quero matar Muriel, pois não desconfiei de nada desde o início.
Acreditei mesmo que ela estivesse passando mal, mas confesso que
decorrente dos acontecimentos anteriores, às vezes acho que a sorte não está
muito do nosso lado. Mas foi só um susto, uma encenação muito boa para
revelar algo completamente maravilhoso.
— Eu não acredito que vocês… — digo ainda consternada, mal
conseguindo terminar a frase. — Nossa! Eu caí direitinho!
Os amigos de Oliver estavam ali, inclusive Bruna e Júlia.
— Como você não fica esperando por festas surpresas no dia do seu
aniversário? — Muriel pergunta, ainda ao meu lado, como se isso fosse um
absurdo.
— Eu não sei… Eu só… É difícil de explicar.
Todo ano ao chegar no trabalho, sempre recebia uma comemoração,
mesmo sendo surpresa, eu já sabia que iria receber. Meus aniversários eram
sempre comemorados no sossego de casa, com Muriel, meu tio (pai dela),
meu pai e poucos amigos.
Eles sabiam que essa data sempre me deixava deprimida; lembrava da
minha falecida mãe, e da ex-mulher do meu pai também, que resolveu deixá-
lo a ter que ajudar a me criar junto com ele.
Mas agora é diferente.
O primeiro abraço acalorado que recebo é do meu pai, como todos os
anos. Ele é pragmático, mas já havia sido um pai babão mais cedo durante o
café da manhã, e por isso me solta bem rápido, a tempo de não deixar os
outros esperando por muito tempo.
Abraço Dom e a sua noiva. É a primeira vez que a vejo depois de tudo
o que aconteceu. Sofia era a sua amiga, e por isso fico me perguntando se ela
estaria decepcionada e assustada assim como Nicolo, ou se sabia de tudo e
só não contou nada por que amigos guardam segredos, mas isso a tornaria
uma cúmplice direta.
Júlia inclusive já demonstrou sua aversão por fim.
No entanto, quando a abraço, me surpreendo com o seu toque gentil.
Quase a sinto tremer, mas ela se contém para que este detalhe não a deixe tão
impotente, principalmente quando sussurra:
— Me desculpa por ter sido uma cretina com você. Jamais imaginei
que Sofia faria uma coisa dessas, fiquei com medo dela, e do que você
poderia achar de mim depois de tudo isso.
Me afasto do seu abraço um tanto surpresa, é inegável a forma
espantosa como devo estar a encarando, seus olhos são de um azul tão vivo,
que eu seria capaz de ver meu reflexo neles, mas também não é para pouco.
Não sei se devo confiar nessa mulher, que já ousou me dizer coisas
horríveis. A sua laia não é tão diferente da Sofia, mas talvez ela não seja
uma bandida, e esse é seu medo, que eu desconfie da sua integridade a ponto
de entregar, principalmente para Domenico, a falta de caráter dela.
Mas não sou esse tipo de mulher.
Além de que alguma coisa no rosto dela realmente diz que está
arrependida, com medo.
Preciso engolir o vestígio de orgulho, aquela vontade de fazê-la pagar
pela sua maldade com meu desprezo, mostrar como a lei do retorno funciona.
Mas nunca fui do tipo vingativa, e acho que todos já estamos quebrados,
procurando alguma forma de nos ajustar na vida.
Dou um sorriso muxoxo para ela, mas que é melhor do que um olhar de
indiferença.
— Seja gentil, Júlia. A gente não conhece a guerra que cada pessoa
enfrenta, muito menos as armas que elas usam. E você tem sorte de que eu
levantei bandeira branca há muito tempo — ressalto a tranquilizando,
embora que ainda com um tom ameaçador.
Júlia precisa saber que não sou nenhuma tola.
Quando ela pensar em me atacar de novo, mostrarei a ela as minhas
armas, que agora são tão poderosas quanto às delas, que nunca passaram de
palavras cruéis e puramente afiadas.
Mas agora estamos cientes.
Sei que terei uma a menos pegando no meu pé, e ela sabe que não serei
uma cretina a ponto de dedurar o que ela fez ao noivo. Vou confiar na sua
mudança.
Abraço Lorenzo, que ainda está usando a tipoia, mas que já parece
bem recuperado do trauma que foi levar um tiro. A namorada dele, Bruna,
não a vejo muito, ela está sempre de plantão no hospital em que trabalha,
então é raro a gente se encontrar, mas a mulher é um amor de pessoa e
quando nos encontramos, sei que ela é bem diferente de Sofia e Júlia.
Eu seria facilmente amiga dela se o tempo permitisse, mas Muriel
odiaria.
Matilde e as funcionárias vem me parabenizar também. Sou grata pela
evolução que tivemos e nos damos muito bem agora.
E tem Nicolo, que se aproxima de mim com as mãos enfiadas nos
bolsos da calça jeans, aparentemente ressentido por milhares de coisas, e a
culpa é uma delas:
— Acho que ainda não tive a oportunidade de conversar com você
sobre tudo que aconteceu — começa falando de um jeito lúgubre.
— Você não é obrigado a falar nada, Nico. Mas eu te entendo, de
verdade, e não o culpo por nada do que aconteceu — respaldo antes que ele
venha definhar na minha frente.
Percebo que ele faz um esforço para falar alguma coisa, e que seu
olhar é constantemente colado ao chão.
— Não, Isis. Eu preciso dizer algo, senão esse sentimento vai me
afundar na lama cada vez mais. E é seu aniversário, ao mesmo tempo que
não é o momento perfeito para isso, parece que é também. Quero que saiba
que estou pedindo perdão pela situação em que você foi metida graças a
Sofia, que eu deveria ter sido mais rígido com ela quando tive a
oportunidade, e que eu continuaria escolhendo você de novo e de novo ao
invés dela. Porque nós sempre protegemos a família.
Meneio a cabeça com o coração na mão, mais pela sua dor do que
pelas palavras, no geral.
Nicolo foi um dos amigos de Oliver que não acreditou em mim de
imediato e saber que ele escolheria meu lado por questões justas e de laços,
acaba por me deixar emocionada.
Preciso abraçá-lo para disfarçar a emoção arrebatadora e ele
corresponde na mesma intensidade.
— Obrigada, Nico. Você é como um irmão para mim.
Ele sorri com o que eu digo.
— Feliz aniversário, Isis. — Seu tom de voz muda, parecendo estar
em paz com si mesmo.
Me afasto dele e lanço uma piscada.
Tudo vai ficar bem, ele só precisa confiar, assim como eu também
confio.
Mas parece que o melhor abraço acaba ficando para o final.
Oliver e Oli me esperam quietinhos, perto da mesa onde tem doces e
salgados, tudo seguindo uma decoração rústica e feminina pelos tons roxos.
Abraço os dois e dou um beijo no meu noivo.
— Eu deveria ter suspeitado de algo quando percebi que você estava
tão inquieto ontem à noite sem conseguir dormir. Você não sofre de insônia
faz tempo!
Somente agora as peças se encaixavam quando digo isso.
— Mas você achou mesmo que eu não faria nada para você? Que nós
não faríamos?! — indaga exagerado e aproxima seu rosto mais do meu. —
Minha querida, é a primeira vez que comemoramos o seu aniversário, é um
momento importante para mim também, e as surpresas não acabaram.
— Não? — Recuo um passo e ele me olha de um jeito travesso.
Mas antes que ele faça qualquer outra revelação, Muriel me arrasta
para trás da mesa e Oliver não reclama por eu ter sido roubada daquele
nosso momento. Percebo que ela está segurando um isqueiro, o que significa
que iremos cantar os parabéns agora.
A vela é acesa, e faço questão de pegar Oli no colo, afinal tudo isso só
foi possível por causa dele. Um ser humano tão pequeno nos uniu daquela
forma, nos tornou uma família unificada, que zela mais pelos laços do que
pelo sangue propriamente dito.
Melissa deve estar feliz e o sorriso de Oliver é exatamente o reflexo
de todos os cuidados que ela tomou antes de partir.
Percebo que este é meu segundo aniversário sem me lamuriar pelo
passado dramático que tive. No meu último aniversário eu já tinha Oli em
minha vida, para me confortar e encontrar um sentido na minha existência,
lembro que eu agradeci por ele e agora faço o mesmo.
Quando a música acaba, minha família vibra e todos ficam na
expectativa de que devo apagar a velinha, mas faço primeiro um pedido e só
então apago a vela dos meus 23 anos.
Dou um beijo apertado na bochecha do meu filho, que está se achando
o centro do universo, e que toda aquela animação é para ele. Mas de fato,
cantamos parabéns fascinados com o brilho em seus olhos, o sorriso
inocente na sua boca e as mãozinhas agitadas batendo uma na outra de forma
desproporcional ao ritmo da música.
Nem percebo quando Oliver se aproxima com um embrulho amarelo,
minha cor favorita.
Sorrio instantaneamente com o que vejo.
— Nosso presente para você, não é, filho? — diz trocando Oli pelo
presente.
Pego o embrulho e ele apruma nosso filho em seu colo.
— Oli e eu fizemos especialmente para você.
— Os dois? — pergunto surpresa e muito curiosa.
Oliver balança a cabeça, e me vejo desesperada abrindo o embrulho,
mas tomando todo cuidado. Noto que é leve, que se trata de algo quadrado e
de porte médio.
Consigo tirar o embrulho e vejo a coisa mais fofa, genuína e bela que
poderia existir. Me derreto diante da arte que os dois fizeram para mim e
sinto que meu peito vai explodir de tanto amor com as impressões que Oli
fez de suas mãozinhas e dos pezinhos sobre uma tela branca. Há rabiscos
aleatórios que foram feitos para preencher ao redor daqueles quatro
elementos que se encontram bem no meio, marcado também por uma
tentativa de um coração feito com a pontinha de um dedo bem no topo.
Fico imaginando como foi uma diversão para os dois fazerem isso. E
como foi verdadeira a intenção de Oliver em me agradar.
Lembro quando ele mencionou certa vez que não costuma comprar
presentes, e que por mim ele faria isso, mas agora, ele mesmo produziu um
com o nosso filho.
— É muito lindo, meu amor. Estou muito encantada — digo com um
sorriso de orelha a orelha.
— Lembra que você deixou o material na minha mesa? — pergunta e
ele se delicia com a surpresa que me atinge. — Você achou que eu tinha
desistido do seu desafio, não é? Mas aí está, tive uma ajudinha do Oli, mas a
pintura foi feita.
— Ok. Você definitivamente ganhou! — declaro avançando em seus
lábios e depositando beijos castos em sua boca que não se desfazia do
sorriso. — Obrigada pelo presente. Amo você. Amo vocês! — digo com
uma certa ferocidade e beijo as bochechas de Oli também.
Uma luz forte dispara na nossa direção, um flash, olho na direção de
onde veio e encontro Muriel com a câmera do celular apontada na nossa
direção.
— Meu Deus, vocês são tão lindos quanto uma família do comercial
de manteiga — comenta fazendo a gente sorrir. — Vamos lá, Isis. Também
temos presentes para você, quero muitas fotos e comer bolo.
— Tudo bem, prima. — Solto os dois Oliver’s, mas não consigo largar
a pintura que ganhei.
Este é o melhor aniversário da minha vida!
Finalmente tenho a família que sempre quis, e estou cercada por amor.
Tanto que chega a transbordar e isso não é um problema para mim.
OLIVER

— Tem certeza de que quer fazer isso? — Isis pergunta pela terceira
vez, desde que dei aquela ideia.
Ela está preocupada com o que aquilo pode desencadear em mim, mas
estou decidido e não quero voltar atrás. Até porque já estacionei o carro na
vaga em frente ao cemitério.
Saí da minha casa, dirigi até aqui, fiz Isis e Oli virem junto comigo
porque eu sentia que estava pronto para isso, além de que seria necessário.
Respiro fundo e olho para a minha noiva.
Acho que ela está mais ansiosa do que eu, então apanho a sua mão
direita e dou um beijo no dorso dela, exibindo logo em seguida um sorriso
tranquilo.
— Sim, eu tenho. Estou com vocês, nada poderá me abalar —
asseguro tanto a ela quanto a mim mesmo.
Dito isso, Isis sorri para mim.
Ela acredita na minha palavra e que juntos conseguimos encarar
qualquer situação.
— Tudo bem, então vamos. — Me estimula.
Saímos do carro e ajudo Oli com a cadeirinha, que agora é uma maior
devido seu crescimento nos últimos tempos. Bebê conforto nunca mais, aos
poucos, nosso menino vai crescendo e vamos desapegando de muitas coisas
que um dia o classificaram como um bebezinho. O que estamos prestes a
fazer agora me faz lembrar que eu poderia ter feito isso bem antes, me sinto
um pouco culpado, até, por ter prolongado mais do que deveria, mas talvez
agora seja o momento perfeito.
Porque agora parece que a situação de paz clama por essa “visita”.
Levo Oli no meu colo, embora ele já saiba andar tão bem quanto nós,
se duvidar. Esse detalhe o dá a segurança necessária para correr e explorar
vários lugares que visitamos, no entanto, cemitérios não é um dos lugares
mais adequados para deixar uma criança correr.
Há uma barraquinha de floricultura, então com a ajuda de Isis
compramos alguns ramos de flores. Rosas vermelhas e brancas, margaridas e
lírios. Oli pede incansavelmente uma delas, e Isis entrega a ele uma
margarida para que ele possa a admirar demoradamente.
Logo na entrada cumprimento o vigia que não disfarça a surpresa em
me ver ali. Não sou o cara carismático que conhece todo mundo em qualquer
lugar que vá, mas às vezes posso me tornar um rosto familiar, e deve ser
exatamente isso o que este senhor deve pensar ao me ver. Ele não diz nada,
mas sua expressão, sim; os olhos marcados pelo tempo, que já deve ter visto
de tudo, lembra do meu rosto de quando eu vinha mais vezes aqui do que eu
podia contar.
Sempre foi ele, nunca mudaram de vigia, e eu nunca tive a chance de
dizer pelo menos um oi.
Isis passa na minha frente, mas desacelero os passos a poucos metros
de distância do homem que me olha de um jeito especulativo, com o chapéu
surrado lhe fazendo sombra na face enrugada.
Seu dedo enrugado balança na minha direção.
— Eu lembro de você, rapaz — diz com a voz rouca.
Dou um sorriso solene, certo das minhas teorias.
— Eu também lembro do senhor — revelo e ele inesperadamente dá
um sorriso sutil.
— Você costumava vir muito por aqui. E de repente, não veio mais —
ressalta um fato que apenas nós dois parecíamos saber.
Balanço a cabeça em confirmação.
Dou uma olhada para Isis que havia parado no meio do caminho à
minha espera, mas também para observar a conversa.
— Eu tive muitos problemas a resolver. — Em partes, é verdade.
No entanto, lembro bem que deixei de vir ao cemitério simplesmente
quando me dei conta de que eu ficaria sozinho, e então, me afundei no
trabalho com a intenção de apagar ou amenizar toda dor que eu sentia
naquele tempo. E funcionou, mas também carreguei comigo um vazio que
parecia infinito.
Os olhos do vigia caem em Oli, curiosos, mas astutos.
— Trouxe companhia dessa vez.
— Sim, minha família. — Estendo o braço para Isis, que se aproxima
com um sorriso bastante hospitaleiro.
Definitivamente ela sabe lidar com as pessoas melhor do que eu.
— Olá! — Acena e o senhor sorri de um jeito mais cortês.
— Olá, minha jovem. — Retribui o cumprimento. — Sua família é
muito linda, rapaz.
— Obrigado — digo, começando a me apressar, tínhamos que
continuar: — Vamos fazer algumas visitas.
Quando estou pronto para continuar seguindo o caminho, o vigia me
para e então, olho para ele mais uma vez à espera do que irá dizer. Ele
franze o cenho, um pouco confuso, mas diz logo em seguida uma coisa
curiosa e que me pega desprevenido:
— Você sempre trouxe tempo ruim quando vinha ao cemitério. Todas
as vezes que você passava pelo portão, o tempo ameaçava chuva. Nunca uma
tempestade, mas uma garoa com neblinas. Quando isso acontecia, eu sabia
que você não estava bem — ressalta, fazendo o meu coração bater forte e um
frio assoprar na minha espinha, mas ele sorri. — Era visivelmente fácil de
saber, mas parece que você trazia junto com a sua tristeza profunda, o choro
dos céus.
Fico estático, assustado, para falar a verdade.
Muito assustado.
Porque nada do que ele diz é mentira, eu sempre trazia comigo um
casaco verde, e escondia a minha cabeça debaixo do capuz porque toda vez
que eu vinha ao cemitério estava caindo aquela chuva com gotas geladas que
ao atingir a pele, mais pareciam como pontas de dedos frios me tocando a
face.
Eu poderia dizer que era somente o clima doido, mas Florianópolis
sempre teve suas estações bem definidas, e eu costumava vir até mesmo nos
dias mais quentes dos verões.
O vigia sorri e então, inclina o rosto em direção ao céu.
— E veja só. Hoje o dia está perfeitamente lindo, a brisa está muito
boa, quase posso ouvir o vento falar comigo e sentir o Sol me beijar.
Droga, estou literalmente arrepiado da cabeça aos pés!
Olho até mesmo para Isis, à procura de qualquer reação semelhante à
minha e bem, ela me parece muito emocionada. Posso estar sendo cético
demais, mas há uma coisa que estou sendo muito lento para entender:
— O que o senhor quer dizer com isso? — pergunto a ele.
O vigia volta seu olhar para mim, como a inocência de uma criança.
— Não sei o que aconteceu na sua vida nesses últimos tempos, mas
com certeza você já não é mais o mesmo. Você não está vindo até o
cemitério para se lamuriar. Seja quem veio visitar hoje, você veio para
agradecer e expressar seu amor. Você está feliz agora, não está?
Ele pergunta olhando de mim para Oli, e então para Isis, como se eles
fossem a resposta para isso, mas que verbalizar ainda é algo necessário,
então correspondo:
— Sim. Estou muito feliz hoje em dia.
— Ótimo. Espero que faça uma boa visita — completa, sem nenhum
outro desejo além deste.
— Obrigado… — Olho para seu crachá no uniforme de vigia e lhe dou
um sorriso. — Senhor Montenegro.
Ele acena de volta para mim com um toque no seu chapéu e então volto
para o meu caminho com Isis ao meu lado, mas aquela sensação arrepiante
me persegue até que estejamos longe o suficiente.
Solto um suspiro pesado que pode significar muitas coisas. De
imediato, nenhum de nós dois falamos sobre aquilo, mas Isis é a primeira a
romper o silêncio.
— Não é engraçado como tudo tem um significado? Como no fim das
contas, nada é tão fugaz? — questiona brincando com as pétalas das
margaridas.
— Só sei que ainda estou arrepiado — comento e ela sorri.
— Eu também fiquei, mas não de medo. É uma coisa boa, sabe? Foi
um arrepio por saber que mesmo depois da morte, aqueles que a gente ama
continuam do outro lado, nos protegendo. Demorou um tempo até que eu
acreditasse que a minha mãe, no fim, deveria estar em algum lugar me
acompanhando.
— Acho que eu nunca tive essa sensação — revelo de um jeito frio.
— Mas ainda assim, aqui estava você quase sempre, pelo que o vigia
disse.
Dou de ombros e seguro Oli com mais firmeza.
— Eu achava que vir e conversar com eles faria com que eles
voltassem, sentissem pena de mim e acordassem do que eu acreditava ser
apenas um sono profundo. Quando a ficha caiu que eles realmente estavam
mortos, foi quando eu deixei de vir e me afundei no trabalho.
— Um dos estágios do luto é a negação — Isis diz. — Você sabe o que
é a morte, sabe que eles não irão se levantar como um milagre, mas quer com
todas as forças que isso aconteça, porque não acredita que a morte os levou
de você.
Balanço a cabeça concordando, engolindo em seco aquela angústia que
ameaçava subir quando há muito tempo eu já havia esquecido da sua
existência.
— Estive negando a mim mesmo os fatos por muito tempo — revelo
encarando meus pés, e então o caminho de ladrilhos e concreto.
Mesmo que eu não venha mais aqui com tanta frequência, ainda
conheço este lugar tão bem quanto eu gostaria.
Olho para o caminho que precisaremos serpentear até chegar às
lápides dos meus pais.
— Quando deixei de vir, ainda não aceitava o fim. Mas acho que hoje
posso deixá-los ficar livres de mim. Todo remorso que mantive por muito
tempo aqui comigo, estou pronto para deixar ir embora.
A mão de Isis me conforta e o seu sorriso se acende para mim. Não
tenho mais medo de encarar as lápides dos meus pais, por isso, traço o
caminho até eles.
O Sol esquenta a minha cabeça, mas está um clima agradável.
Conforme vou avançando, lembranças de um passado sombrio
enquanto sofria com tudo, vem à mente. Algumas vezes, aparecia bêbado, ou
então com algumas noites sem dormir. Eu deixava de ir ao trabalho, mas não
podia deixar de vir até o cemitério e visitar as lápides da minha família.
Levei uma vida boêmia e lúgubre por algum tempo. Não lembro exatamente
o período em que fiz do meu trabalho um poço de onde joguei toda angústia,
mas quando dei por mim, eu já estava envolvendo a empresa em tantos
projetos que normalmente não obteriam sucesso.
Mas aconteceu.
Todo o patrimônio só aumentou, bem como a minha fama de CEO
inabalável, seguido de um passado triste e que muitos me julgaram como
intimidador devido aos traumas.
E aqui estou eu, com minha família, agora parados em frente onde
meus pais foram enterrados e que foi por muito tempo, a minha primeira
decadência.
Suspiro forte, sentindo meu coração bater a mil por hora. Os nomes
familiares gravados ali na pedra de mármore sempre me deixaram abalado.
Mas agora…
— Quer que eu segure Oli para você? — Isis pergunta.
Olho para ela piscando, voltando à realidade.
— Estou bem. Por muito tempo fiz isso sozinho, acho que tudo bem ter
agora comigo uma companhia — explico e ela entende.
Pego um lírio e uma margarida com Isis.
Deposito o lírio na lápide do meu pai e a margarida na lápide da
minha mãe. Não sei do simbolismo de cada flor, mas faço com que cada um
tenha a sua. Fecho os olhos, e sem me incomodar com a presença de Isis, me
surpreendo em como ainda levo jeito para conversar com pessoas que não
estão mais fisicamente entre nós.
— Oi pai, oi mãe... Faz um tempo que não apareço por aqui, mas,
estive fazendo o que vocês sempre me disseram para fazer: Eu vivi a minha
vida de uma forma justa e com paixão, por um tempo achei que tinha perdido
de novo a chance de ser feliz, mas olha só… A vida é tão inesperada que me
deu a oportunidade de recomeçar tantas vezes que nem sei como retribuir o
favor.
Oli balbucia alguma coisa, os pezinhos dele dentro do sapato
sapateiam o chão inquietamente, louco para querer escapar dos meus braços
e correr pelo terreno.
— Estou de casamento marcado e tenho um filho. Este é Oli, neto de
vocês também. Ele é a grande razão de tudo fazer sentido de novo. — Sorrio
de um jeito deslumbrado, é incansável o papel de pai e por isso deixo isso
registrado. — Acho que eu nasci pra essa coisa de ser pai, mesmo. Vocês
sempre diziam que eu seria um pai bobo, e bem, vocês estavam certos. —
Pisco rapidamente e sinto que a brisa que bate é a resposta que eu tanto
gostaria de ouvir.
Puxo o ar, respirando mais coragem para finalmente me sentir liberto.
— Eu agi como um filho revoltado por muito tempo depois que vocês
foram tirados de mim. Mas agora sei lidar melhor com a situação. O vazio
foi preenchido pela forma como eu sempre desejei.
“Uma família...
“Agora, tenho a minha própria família e como vocês amariam
conhecê-los!
“Mas eu sei que, onde estiverem, estão acompanhando tudo. Espero
que sim.”
Me inclino para frente e toco sutilmente a pedra fria das lápides
escuras. Fecho os olhos e faço uma breve prece para os dois.
— Vocês continuam vivos para mim, sempre estarão bem no meu
coração — complemento com a voz embargada, mas não choro. — Eu amo
vocês. Sempre amarei. — Agarro Oli no meu colo, mas porque precisava
sentir algo puro e real que eu sabia que estava ali por mim também.
Isis me abraça quando eu me levanto, a sua respiração está
estabilizada e ela me transmite a calma que eu preciso, principalmente
quando seus polegares afagam gentilmente meu braço.
— Eu queria muito ter conhecido os dois um dia. Mesmo assim, minha
admiração e respeito por eles é real. Criaram espetacularmente bem o filho
deles — diz depositando um beijo no me braço e deita a cabeça ali,
concluindo: — Com certeza seus pais estão orgulhosos, meu amor. Você é o
melhor.
O sorriso é inevitável.
— Você é muito suspeita para falar disso, minha querida — admito.
— Mas eu sempre falo a verdade — ressalto dando de ombros. —
Estou orgulhosa de você também por estar conseguindo.
— Sim. — Aceno com a cabeça. — Estou conseguindo.
— Vamos continuar? — perguntou me fazendo voltar ao estado normal.
Ainda faltava mais um.
— Vamos.
Antes de deixarmos as lápides dos meus pais para trás, Isis deixa uma
rosa branca sobre cada uma das pedras e então me segue por um outro
caminho familiar que faço por ali.
Agora fico mais ansioso, não sei se é pelo fato de ser a minha perda
mais recente, mas todos eles me doem de forma igualável. Nenhum dói mais
do que o outro; no entanto, perdi meus pais primeiro.
De alguma forma, ter me apaixonado por Melissa naquela época e
encontrado uma forma de ser feliz ao seu lado, abafou todos os sentimentos
deprimentes que eu sentia em relação à perda dos meus pais.
Assim como Isis e Oli me fizeram superar a morte de Melissa, a minha
falecida esposa também teve um papel muito especial enquanto eu me
recuperava do luto. Melissa havia colorido o meu mundo de volta, dado
significado as coisas que eu já não me importava mais. Com ela, construí
sonhos, que agora foram realizados com Isis, porque ela fez tudo acontecer.
Melissa, ainda em vida, encontrou uma forma de estar presente mesmo
depois de ter partido. Ela se preparou...
Teve tempo, mas não muito, para fazer com que a sua passagem neste
mundo não tivesse sido uma coisa momentânea.
Meus pais não tiveram essa mesma oportunidade, a forma abrupta que
eles me foram tirados, nem sequer me deu tempo de me despedir e agradecer
por terem feito tanto por mim.
Eu fico ansioso para “reencontrar” Melissa, porque sinto como se
fosse revê-la depois de tanto tempo, e na minha cabeça, só a imagino
sorrindo daquele jeito serelepe. E não sei como começar aquela “conversa”,
porque sinto que Melissa está viva; embora ela realmente esteja de alguma
forma.
Quando Melissa faleceu, Domenico e a mãe fizeram questão de
enterrá-la ao lado do pai. É claro que eu compreendi, mas eu sempre
passava primeiro nela e então ia até a lápide dos meus pais. Eu odiava fazer
aquele percurso, mas também não conseguia resistir à vontade de visitar
cada um deles.
Assim que alcançamos a lápide de Melissa, o silêncio é quase
incômodo. Há um lírio ali, alguém deve ter passado mais cedo, talvez Dom e
a sua mãe, pois hoje faz quatro anos desde que Melissa se foi. Esse
pensamento faz tremer aquela linha tênue entre razões e emoções, mas fico
encarando o nome dela, é como se eu estivesse focalizando aqueles orbes
verdes que tanto me encantaram na época.
Meus joelhos cedem lentamente, e Oli senta no meu colo, como se ele
estivesse sentindo alguma coisa diferente, uma coisa especial ali. Fecho os
olhos e a mentalizo, me deixando levar pelas coisas que nunca disse a ela
além de “Volta pra mim”, em todas as vezes em que estive aqui.
— Hoje é um dia que eu gostaria que nunca tivesse acontecido. Dizem
que uns ciclos se fecham para iniciar outros, mas não gostaria que as coisas
tivessem terminado desse jeito. Por muito tempo eu achei que o mundo era
melhor com você, mas, acho que você era muito boa para este mundo e eu
confesso que ainda não entendo.
“Melissa, não entendo mesmo por que teve que terminar assim...
“Mas você tomou conta de tudo, não foi?
“Sabia que havia outra chance para mim, mas que tampouco eu teria
forças para tentar. Mas você tentou por mim e agora tudo o que eu tenho é
graças a você.”
Espalmo minha mão direita sobre a pedra lisa e fria.
— Se eu a visse agora, sabendo que teria a resposta, eu perguntaria o
porquê. Perguntaria como você bolou toda essa ideia, mas agora,
sinceramente, acho que prefiro não saber.
“Não quero uma explicação para isso, além da óbvia: de que você
sempre esteve certa sobre a vida e como ela pode ficar bela quando a gente
escolhe recomeçar, de dentro para fora.
“Foi assim que você me fez superar a minha primeira perda. E então,
me fez superar a sua partida, através de um recomeço.”
Olho para Oli, que parece estar entendendo cada palavra minha, mas
na verdade só está muito curioso e o balanço em meu colo, o fazendo sorrir.
— E que recomeço, não é? Olhe só para ele, o filho que você sempre
quis. O filho que você planejou tanto antes de partir. E ele é nosso. Meu, seu
e de Isis. Somos todos uma família, como você sempre desejou que
fôssemos. — Esboço um sorriso ao lembrar da sua carta informal,
implorando para que eu compreendesse toda a situação. — E caso seja de
seu agrado, Isis e eu estamos noivos. Você também conseguiu isso, mas, na
verdade, já estava até premeditado na sua cabecinha brilhante, não é? Você
sabia que eu me encantaria por ela, e tentou então unir o útil ao agradável.
Dom nunca soube lidar com essa sua genialidade — brinco.
Era assim que éramos, um casal extrovertido, que adorava irritar
Domenico porque ela sempre foi a filha exemplar. Mas éramos felizes.
Foi uma época boa da minha vida, e que sou grato por ter existido.
Isso deixa meu coração molenga, ao mesmo tempo que algo pesa no meu
peito e me vejo ser atingido por lembranças boas demais.
Estou chorando, mas evitando soluçar.
— Mas a verdade é que você era incrível demais, e eu senti muito a
sua falta. Ainda sinto, mas agora consigo suportar melhor porque eu
recomecei. Você mais uma vez me ajudou a superar meus fantasmas, e agora,
devo dizer obrigada e que sempre a amarei. Eu sempre… — Fungo o choro
e não consigo terminar de falar.
Isis me abraça e seguro sua mão para me reconfortar.
— Pa-pai — Oli diz claramente, meu choro se transforma em sorriso e
Isis fica embasbacada.
— Oliver! — ela exclama empolgada.
Oli fica entusiasmado quando percebe que aprovamos a nova palavra
que ele proferiu nitidamente, então, repete com mais tenacidade:
— Papai! — Sua voz aguda preenche o ambiente mórbido.
O abraço com mais força.
— É o papai, meu amor. — Isis o parabeniza enquanto tento me
recompor.
Recebo dela até mesmo um beijo na testa que depois diz para mim:
— Amamos você. Isso foi lindo. Melissa com certeza também está em
paz com tudo.
A minha noiva me tranquiliza e percebo que ela está emocionada
também.
Isis a conheceu, então ela deve estar sentindo alguma coisa também. E
inesperadamente, revela:
— Eu estava no enterro. — Olho para ela um tanto surpreso e Isis se
explica: — Estava e não estava. Fiquei num cantinho bem longe, escondida,
ninguém podia me ver. Mas Dom achou que não faria mal. Quer dizer,
Melissa e eu éramos amigas, então por que não? Eu já estava começando as
consultas psicológicas para lidar melhor com a barriga solidária.
Franzo o cenho ao puxar pela memória.
— Lembro que em um momento Lorenzo me alertou da imprensa no
local. Vimos um carro branco…
Isis sorri.
— Era o carro da advogada Anete. Foi ela que me trouxe, só para
garantir que eu não iria correr até você e contar tudo. Mas ser dedo duro
nunca foi a minha especialidade — argumenta por fim, tirando um riso meu.
Esfrego as mãos no meu rosto.
— Santo Deus! — Fecho os olhos, surpreso. — E você estava lá
aquele tempo todinho. Mas também nunca passou pela minha cabeça que
algo do tipo aconteceria comigo.
Limpo o rosto molhado pelas lágrimas, um pouco desconfortável por
deixar minhas emoções transparecem muito. Mas àquela altura, Isis já estava
acostumada a me ver chorar.
— Tem coisas que a gente só passa a notar quando elas começam a
fazer algum sentido — Isis refuta pensativa. — Não é comum aceitar ser
barriga de aluguel, mas, eu sempre senti que não terminaria ali. Eu sabia que
não era nada ético com os termos que assinei, mas…
— Você sabia que no fim, não seria algo tão frívolo a ponto de você
me deixar só com uma criança? — pergunto a olhando profundamente e Isis
me encara.
— Eu sabia que Melissa não deixaria o bebê sem uma mãe. Eu sabia
que ela iria fazer questão que eu estivesse presente, mas jamais pensei na
possibilidade dela querer nos unir. Na verdade, tive medo que isso
acontecesse, porque eu não queria que desse a impressão que o roubei dela.
Olho para a lápide de Melissa, e então suspiro.
— Com certeza não. Mas Melissa já tinha dado um jeito e foi mais
genuíno do que esperava.
Isis sorri.
Felizmente ela não acredita mais que meus sentimentos por ela foram
provenientes do último pedido de Melissa, que se consistia em nutrir
sentimentos por ela e pedi-la em casamento.
Agora, Isis sabe que sou capaz de fazer tudo por ela e Oli.
Ela concorda comigo e juntos observamos Oli deixar a margarida que
ele tanto se agarrava, sobre a lápide da sua outra mãe. Na verdade, ele havia
começado a brincar com a flor sobre a pedra, e então a deixou ali. Mas de
qualquer forma, foi algo natural e que devido às circunstâncias, pareceu uma
espécie de carinho deixado para Melissa.
Isis e eu aproveitamos para acomodar também as outras flores que
restava. Organizamos tudo, e percebo que as flores deixam a sua lápide mais
colorida.
— Eu sinto falta dela. Não gostaria que as coisas tivessem terminado
assim, mas também… — Faz uma pausa, porém a compreendo.
— Eu sei o que você quer dizer. Mas está tudo bem, querida. — Puxo
Isis para um abraço. — Não estamos fazendo nada de errado.
— Eu sei que não.
Solto um suspiro e então beijo o topo da sua cabeça.
— Obrigado por ter vindo comigo.
Isis caça as minhas mãos e entrelaça as delas às minhas.
— Eu sempre estarei com você em todas as situações, meu amor —
afirma olhando dentro dos meus olhos. — Não soltarei a sua mão, serei a sua
âncora.
É como ter o meu peito abraçado, porque ele relaxa e volta ao seu
estado normal.
Isis é incrível demais para ser verdade e não consigo mensurar o quão
sortudo eu sou por ter tido a chance de ter o amor de mulheres maravilhosas.
Recomeçar não é fácil, mas quando tem as pessoas certas para ajudar
no processo, é melhor ainda. Eu tenho Isis, porque bastou ela para que a
palavra “recomeçar” tivesse sentido outra vez.
OLIVER

Isis e eu decidimos nos casar na fazenda do Paraná. Além de ser um


lugar lindo, foi onde vivemos nossos primeiros momentos de amor juntos.
Tinha todo um contexto importante para nós, mas os convidados acreditam
que é por conta do belo pôr-do-sol, ou em como o verde irá se contrastar
lindamente com o estilo da decoração que confiei totalmente nos gostos de
Isis, que teve uma ajuda especial da prima e melhor amiga.
Nos reunimos e viemos para o Paraná uma semana antes do casamento.
Queríamos poder vivenciar cada dia antes do grande dia, como por
exemplo, andar a cavalo, fazer piquenique e ver o nascimento de um
bezerrinho.
Oli fica muito fascinado com os animais e Margarida nos disse que ele
será igual a mim, louco por animais, e não há como duvidar.
Uma noite antes do dia da cerimônia, fizemos uma fogueira do lado de
fora, assamos algumas carnes e bebi vinho com Isis.
Era a nossa despedida de solteiro, segundo Muriel, então
aproveitamos bastante.
Isis e eu secamos três garrafas de vinho juntos.
Em dado momento da noite, Oli entrou com o avô para dormir, foi
quando nós dois passamos a curtir de um jeito mais intenso. Isis e eu
dançamos e cantamos, e pouco tempo depois que todos estavam tão
desligados de nós, fugimos para algum canto e fizemos amor.
Não em um celeiro, como da última vez em que trepamos aqui na
fazenda, mas desta vez, levei Isis para perto do lago, cercado por árvores e
pedras. Ficamos ali deitados sobre uma rocha lisa, conversando e olhando
as estrelas, com uma garrafa de vinho que já tomávamos da boca dela. Isis
teve a brilhante ideia de beber deitada, foi quando ela deixou a bebida
derramar por todo seu busto, pescoço e metade do seu rosto estava molhado
de vinho também. Ela chegou a dizer que entrou no seu nariz e rimos muito
disso.
Foi o momento perfeito pra eu passar a língua por cada parte que havia
derramado vinho, lambendo e me embriagando da sua pele deliciosa, do seu
gosto.
Quando dei por mim, já estava chupando seus seios e ela tentando
gemer baixinho, curvando seu corpo cada vez que a minha língua a tirava do
eixo.
Naquela noite, como fazia calor, Isis vestia um short, precisei baixá-lo
e me banquetear dela mesmo assim, sugá-la toda até fazer implorar por mim.
E quando isso aconteceu, a penetrei lentamente sob as estrelas e a Lua, com
suas pernas entrelaçadas envolta do meu corpo que se movimentava
sutilmente sobre ela, enquanto olhava em seus olhos que brilhavam a ponto
de parecer um reflexo do céu noturno.
Mas eu sabia que aquele brilho nada mais era do que a felicidade lhe
estampando os olhos.
Nos últimos dias, eu percebi que nada poderia abalá-la, e era na
felicidade dela que eu encontrava a minha.
— Mal vejo a hora de dizer a todos que quero passar a vida inteira ao
seu lado — verbalizei essa vontade enquanto saia dela lentamente, com
minha cabeça enfiada na curva do seu pescoço, respirando o seu doce
aroma. Então entrei de novo e Isis arfou. — E se a eternidade existir, irei
amá-la até o infinito dela.
— Oliver… — me chamou com a voz carregada de prazer e emoção.
Quando ela mal conseguia formular uma frase porque estava ocupada
demais sentindo cada centímetro meu dentro dela, investi mais uma vez:
— Você já é a minha mulher. A minha vida toda, Isis — disse colando
minha testa com a dela. — A Lua e as estrelas já estão de testemunhas, que
eu a declaro minha mulher.
Isis chorou, mas não parei de fazer amor com ela, apenas voltando
aumentar o ritmo para dar exatamente o que ela merecia. Mas entre todas as
vezes em que fizemos amor, aquela foi a que mais teve a pura conexão, onde
nos entregamos nus ao luar, de corpo e alma. Com aquele sentimento
profundo me rasgando o peito deliciosamente.
Quando ela atingiu o clímax, foi como se uma estrela cadente tivesse
partido o céu e acendesse bem dentro de nós dois.
Gozei como um macho alfa, segurei o corpo de Isis contra mim a
reivindicando, e ela se jogou em meus braços, sentou em meu colo e
cavalgou sobre mim até eu ficar duro de novo e ela gozar outra vez, tirando o
melhor de mim pela segunda vez.
Ela foi como uma deusa da noite, cheia de tenacidade, prazer e amor
para me dar. Quando tínhamos finalmente acabado, ela agarra meu rosto para
que eu olhasse diretamente para ela ao declarar:
— E você, Oliver, é o meu marido. O homem que eu escolhi amar e
respeitar. Você é meu tudo, a razão disso ter sentido. Amo você... Amo
você... Amo você — repetiu enquanto me abraçava com força.
Naquela noite, entre só nós dois e a noite, Isis e eu nos declaramos
marido e mulher.
Deitei a cabeça em seu ombro e chorei em silêncio. Estava tão feliz
que podia sentir tocar tamanha energia que me rondava.
— Mal vejo a hora do dia amanhecer — comentou, fantasiando o
momento. — Estou morrendo de nervosismo, mas eu sei que a única coisa
que me dá forças, é saber que será você me esperando no altar.
— Você vai mesmo se entregar para mim?
— Eu já me entreguei, meu amor. Não há mais nada a temer, o meu sim
você sempre teve.
Jogo a minha cabeça para trás, sorrindo e querendo gritar até meus
pulmões arderem. É o tipo de coisa que não dá para guardar só para si, mas
também não tenho pretensão de compartilhar com todo mundo. Deixo que
apenas Isis veja isso. Quero que ela tenha noção o quanto me faz bem.
Beijo a boca dela, reivindicando a sua língua gostosa e a pegando com
vontade. Isis não conseguia se controlar em meus braços, eu a deixava
insaciável, porque logo depois disso ela se agachou e me chupou ali mesmo.
Nada a intimidava, nem mesmo o fato de estarmos fazendo tudo isso ao
ar livre, no laguinho da fazenda cercado por um bosque privado. A minha
presença a deixava assim, audaciosa e safada, mas logo iremos nos casar e
trepar em qualquer lugar parece ser um fetiche para esse novo status que
iremos obter.
Começando por agora.

Não fico de ressaca, mas acordei um pouco destruído. Mal dormi na


noite passada, ansioso com o festejo, só que a cama ao meu lado já estava
vazia, o que significava que Isis já havia saído para um preparo que levaria
o dia todo. Então só prolonguei mais um pouco o sono, para ter certeza de
que eu teria a energia necessária para mais tarde.
Ou ao menos tentei.
Poucos minutos depois, a porta do meu quarto é aberta abruptamente, e
uma barulheira me faz pular do sono. Tenho tempo de decifrar os intrusos,
antes de começar uma série de xingamentos: Domenico, Lorenzo e Nicolo.
Na soleira da porta, um tanto sem graça, Daniel segura Oli enquanto
observa meus amigos fazerem a maior algazarra.
— Que diabos é isso? — pergunto ainda molengo debaixo dos
cobertores, que acabo me agarrando ao me dar conta de que estou
completamente nu.
— É o dia do seu casamento, irmão! — Dom diz enquanto abre as
persianas com avidez.
— Não me diga!
— Demos tempo suficiente para você, mas você não apareceu, então
resolvemos fazer da nossa maneira! — Lorenzo exclamou.
Era um alívio vê-lo sem aquela maldita tipoia; ele estava tão novinho
em folha que nem parecia ter levado um tiro.
Mas também faz tanto tempo…
Droga, eu disse a mim mesmo que não lembraria dessas malditas
coisas hoje.
Especialmente hoje!
— Tenho horário marcado no altar. Fora isso, consigo vestir a minha
roupa em questão de dez minutos — reclamo, o que não foi uma boa ideia.
— Eu quase amanheci bebendo e é você quem acorda de ressaca?! —
Nicolo pragueja, se agarrando às cobertas. — Levanta daí! — ordena,
puxando a coberta que eu agarrava como se fosse a minha vida.
Não demorou muito para que ele sacasse isso.
— Ele está nu! — Nico ressalta para os outros, achando aquilo
divertido.
Lanço um olhar para Daniel que observa aquilo um tanto calado, mas
com uma diversão no olhar também. Ele gosta dos meus amigos, vez ou
outra, ele fica conversando por horas com eles.
— QUANTOS ANOS VOCÊ TEM?! — grito para o loiro que não
desiste.
— Idade o suficiente para querer aproveitar cada momento de hoje,
afinal, é o seu dia e da Isis também!
Não digo nada, mas continuo reivindicando a coberta.
— Para com essa merda — Dom banaliza enquanto empurra Nicolo
para longe, que pragueja por ter tido sua diversão interrompida. — Oliver,
na verdade, como bons amigos que se preocupam com você, viemos levá-lo
para atividades que pudessem distrair a sua mente.
— Isso mesmo — Lorenzo afirma. — Eu nunca me casei antes, mas sei
que o grande dia causa um frio na barriga.
Isso é verdade.
Acredito até mesmo que a minha vontade incessante de ficar na cama
pelas próximas horas, são para me manter um pouco mais distraído daquele
anseio pelo momento em que Isis seria oficialmente minha mulher.
Estava ansioso para muitas coisas, na verdade, ficava pensando até
mesmo na lua de mel que passaremos em Bali, coisa de uma semana.
Isis tem ficado preocupada por causa de Oli, mas Daniel e Muriel já a
tranquilizaram.
Como a cerimônia e festa seria ao ar livre, Margarida passou a semana
toda fazendo técnicas supersticiosas que segundo ela, trariam dias de sol,
pois temíamos que chovesse durante o casamento. Mas esperamos até o
verão porque tínhamos certeza de que chuva seria algo muito improvável.
Quando saio da cama com o cobertor preso na minha cintura e dou uma
conferida através da janela, descubro que o clima hoje está a nosso favor,
excepcionalmente admirável.
Mal consigo conter o sorriso de tanto otimismo e felicidade por tudo
estar dando certo.
Daniel nota isso de longe e comenta:
— É um ótimo presságio, não acha? O dia está lindo lá fora, isso
significa que teremos um casamento para entrar na memória!
Meu sorriso ganha mais vida.
Sinto cheiro de vinho em mim, talvez Isis e eu tenhamos secado outra
garrafa quando voltamos para o quarto.
Céus, só espero que ela esteja bem. Todavia, tento não lembrar dela
montando em mim enquanto tomava vinho, sentando no meu pau com tanta
vontade e sensualmente.
Sorrio por causa dessa lembrança, mas balanço a cabeça a fim de
enxotar a cena por conta do pai dela estar bem na minha frente.
— HOJE EU FAREI DA SUA FILHA A MULHER MAIS FELIZ DO
MUNDO, MEU SOGRO! — grito para ele.
— Só hoje, seu crápula? — Nicolo indaga.
— Hoje oficializarei minha mais nova missão na Terra, e eu irei
cumprir. Escrevam o que estou dizendo! — exclamo a caminho do banheiro.
— Eu não duvido, meu amigo — Lorenzo respalda.
— Puxa saco.
Ouço Nicolo protestar, mas não há embate naquele momento, o
advogado afrouxa as rédeas e muda o tom da voz.
— Mas parabéns por este momento, Oliver. Nos sentimos realizados
junto com você. Além do mais, do grupo, você é o que mais se casou até
agora.
— Não quero nem sonhar com essa lista crescendo. Estou pronto para
dar esse pódio a você.
Imagino Nicolo fazendo uma careta.
— Não, obrigado. Dessa vez eu passo. Talvez o Enzo?
— Você é um canalha, mesmo — Lorenzo rugi impaciente e Nico acha
divertido implicar com o pobre coitado.
Isso dá início a um bate-boca tão baixo que ouço Daniel pedir licença,
pois Oli está começando a repetir tudo o que falamos e precisamos ser
cautelosos para que a nova palavra em seu vocabulário não seja um
palavrão.
Isis iria nos matar, certamente.
Por fim, assim que visto roupas casuais, volta para o quarto onde os
ânimos já estão mais controlados.
— Me atualizem do que está acontecendo lá fora — peço enquanto
calço meus sapatos.
Domenico toma as rédeas.
— A empresa responsável pela organização do casamento já está a
todo vapor. Os seguranças chegaram, e alguns portais de notícias já foram
contidos do lado de fora, mas há informações de que eles estejam cercando o
local e poderão usar drones. Mas a equipe de segurança já está fiscalizando
isso. A banda que vai tocar já está a caminho também.
— Ótimo. Nenhum imprevisto surgiu, então podemos dar uma volta —
determino quando me apronto, mas pontuo: — Por favor, nada de extremo.
Tenho que voltar vivo para a minha futura mulher ainda. E por falar nela,
sabem onde está?
Lorenzo revira os olhos e bufa.
— Fazendo coisas de mulheres, não é óbvio? Minutos atrás Bruna me
enviou uma foto com papel alumínio na cabeça.
— Aquilo é uma touca térmica, seu idiota — Nicolo protesta.
— Bem, me desculpe se eu não tenho rituais narcisistas igual a você.
Mas Isis e as meninas estão se arrumando.
— Se cuidar não é ser narcisista, Enzo — Nico enfatiza mais uma vez
o apelido que Lorenzo não gosta, somente para implicar.
Olho para Dom, que também parece pensar o mesmo que eu: patéticos.
Aqueles dois amam discutir sobre coisas bestas, mas o mais
engraçado, é que isso só fortalece a amizade deles.
Mando uma mensagem para Isis, só para ter certeza de que ela está
bem, além do mais, não é muito indicado os noivos ficarem se falando muito
no dia do casamento, não sou o tipo de cara que acredita nessas crenças, mas
prefiro não arriscar.
Desço junto aos meus amigos rumo a área externa. Durante a manhã de
ontem, algumas lonas brancas e extensas, bem como toda uma estrutura de
metal foram erguidas para facilitar o trabalho da equipe de decoração hoje,
mas ainda assim, dou de cara com uma correria que a princípio parece uma
baita confusão.
Vejo um grupo de homens passando com jarros de flores que devem
pesar mais de cinco quilos. Outros ajustam as iluminações, e em outro canto,
debaixo de uma das enormes tendas, mesas redondas estão sendo
organizadas elegantemente.
Isis não queria algo exagerado, tentamos mirar em algo simples e
rústico, mas acabou que se tornou uma coisa grande demais.
E para falar a verdade, eu não me importo, pois me casar com Isis
deve ser algo grandioso, tão espetacular e inesquecível.
Parabenizo a equipe conforme vou atravessando a área onde vai ser a
cerimônia.
Em meu encalço, meus amigos me seguem e decidimos andar a cavalo.
Nada muito perigoso, mas que seria uma ótima forma de distrair aquela
ansiedade de ver Isis toda de branco.

ISIS

Essa é a parte da história onde a mocinha que encontrou seu príncipe


encantado e passou por maus bocados com ele, finalmente sobe ao altar e
sabe que a partir dali, terá uma vida incrível. Mas preciso ser honesta, não
quero que seja o final feliz, mas o começo feliz da nossa história.
Estou longe de ser uma princesa e Oliver está mais para um rei, então
não é uma típica história de conto de fadas.
Não mesmo.
Ainda estou tentando me habituar como a grande estrela deste dia.
Todas as atenções estão voltadas para mim, e vez ou outra isso me assusta.
Tem mulheres demais pegando no meu cabelo, e no meu corpo, me
remontando toda. Sinto como se eu fosse uma relaxada e como se eu nunca
tivesse ido a uma manicure, mas a verdade é que sou a noiva e recebo um
tratamento diferente.
E ok, talvez seja muito bom de verdade receber todos aqueles
cuidados.
Às vezes esqueço até mesmo que tenho um filho que aparece vez ou
outra querendo meu colo. Mas quando Oli aparece, é uma “folga” que ganho
daquele puxa aqui, alisa dali e veste e tira.
Papai e Oli são os únicos homens com permissão para entrar neste
lado da casa da fazenda que foi completamente adaptado para minha
preparação; e das meninas, que são minhas madrinhas.
Agora parece que estou vivendo uma vida plena por todo cuidado, mas
as escolhas que uma noiva precisa fazer é bem estressante.
Deveria ter sido fácil escolher as madrinhas, mas a verdade é que foi
um porre.
Eu não tinha tantas opções assim, e Oliver junto a cerimonialista
consideraram que seria interessante cada casal estar presente no momento.
Então Júlia era uma das minhas madrinhas, mas também, desde meu
aniversário não sinto que ela quer a minha cabeça numa bandeja. Está tudo
bem, mas espero futuramente não me arrepender das minhas escolhas.
A única pessoa atípica a essas escolhas, é Muriel. Ela detesta a ideia
de ter que entrar com Nicolo, afinal o acha insuportável e asqueroso, um
arrogante de primeira. Mas está feliz por mim e isso vale fazer qualquer
sacrifício para que este dia em especial, seja inesquecível.
Recebo uma mensagem de Oliver, ele acordou agora e irá dar um
passeio com os meninos. Respondo a sua mensagem, mas também sou vaga.
Ele já está familiarizado com a situação, tanto que consegue fazer
outras tarefas.
— Por favor, não pense em mudar de ideia em cima da hora — Muriel
comenta e olho assustada para ela.
— Meu Deus, prima! Por que acha que eu faria uma coisa dessas?
— Sei lá. Você fez uma cara agora…
Reviro os olhos e relaxo na poltrona confortável, pois tenho alguns
minutos até a equipe de maquiagem chegar.
— Esse é o segundo casamento do Oliver — pontuo. — Ele não está
tão ansioso, já está acostumado com a sensação de subir ao altar.
— Nossa! Você fala como se todo ano ele fizesse algo do tipo. Mas
acho que mesmo assim, é um tanto precipitado você pensar desse jeito. Você
não é ela, sabe?
Muriel se referia a Melissa, então olho para ela em silêncio, porque
estive evitando pensar nela hoje.
— Você deve despertar coisas diferentes no Oliver, não é a mesma
coisa quando ele se casou pela primeira vez, então, ele deve estar muito
ansioso, sim — refuta, me tranquilizando e acho o seu esforço fofo e gentil.
Lembro de como nos declaramos na noite passada, fazendo amor sob a
Lua.
— Não duvido dos sentimentos de Oliver por mim, amiga. Mas é a
primeira vez que eu faço isso, já ele, a segunda. Estou quase vomitando de
tão ansiosa que estou, mas e ele?
Muriel dá de ombros.
— Cada um lida de forma diferente com a ansiedade. Quem sabe ter
dado um passeio foi a forma que ele encontrou para distrair a mente? Por
que você não tenta fazer algo também?
Pisco pensativa e chego à conclusão que Muriel tem razão.
Desde que acordei, a única coisa que tenho feito é me roer de
ansiedade. Mal consegui tomar café da manhã direito.
Passei um bom tempo observando o local da cerimônia ser organizado
e pensei, “Meu Deus, isso não parece estar progredindo”.
Em dado momento, Domenico pediu para eu ficar dentro da casa
porque eles haviam avistado drones da imprensa que estava louca atrás de
qualquer manchete boa.
Foi aí que fiquei trancada neste quarto desde então e não fiz nada
produtivo que fosse suficiente para me manter distraída. Mas agora que
Muriel falou isso, me dou conta de algo que planejei, de um presente que
resolvi dar para Oliver quando ele se tornasse meu esposo.
Dou um sorriso e salto da poltrona.
— É isso! Eu preciso fazer uma coisa, Muriel. E você vai me ajudar!
Ela me olha desconfiada, mas não hesita.
Nós duas temos um tempo para preparar a surpresa que vinha
pensando para Oliver.
Um pouco depois, a equipe de maquiagem chega e então, as horas
seguintes são apenas para me preparar para o grande dia, que acontecerá em
poucas horas.
Oliver e eu escolhemos a tardezinha para nos casar, era o horário que
a fazenda recebia um espetáculo com o belo pôr-do-sol. Queríamos dar esse
show aos nossos convidados também, então era importante que nada se
atrasasse. Mas eu não me atrasaria, a não ser que eu começasse a ter uma
crise de pânico por mal saber como lidar com todos aqueles olhares na
minha direção. Contudo, eu precisava mais que tudo manter os pensamentos
positivos, era nisso que eu deveria focar.
E quando eu já estava arrumada, sozinha mais uma vez no quarto
pronta para descer a qualquer instante, suaves batidas na porta do quarto me
fazem companhia, como uma mão se estendendo para ajudar.
— Entre — ordeno de frente para o espelho, mal conseguindo
assimilar no que eu havia sido transformada.
Pelo reflexo do espelho vejo meu pai entrar, mas logo ele paralisa de
tão fascinado. Seu rosto se contrai cheio de emoções na primeira
oportunidade. E eu preciso me conter para não borrar a maquiagem, mas sei
o que me ver vestida de noiva representa para ele, pois também representa
tudo para mim.
— Meu Deus, você está a coisa mais linda! — Sua voz soa rouca e
embargada, nitidamente afetada pela emoção. — Eu queria tanto que Celine
estivesse aqui para vivenciar isso com a gente.
É como receber uma martelada no peito.
— Oh, meu pai…
— Mas não chora! Não chora! — Se afoba preocupado. — Não vim
aqui para fazê-la borrar a maquiagem, e sim, para levá-la ao altar. Mas estou
orgulhoso, muito mesmo. Vi você crescendo, realizando seus sonhos e agora
tendo a sua própria família. O que mais eu poderia desejar?
Quando papai se aproxima, passa a mão na saia do meu vestido e olha
admirado cada detalhe.
— Eu sei, mas é inevitável não pensar nessas coisas. Não pensar na
mamãe, ou em tudo o que aconteceu para estarmos aqui — digo tentando
dissecar todas aquelas coisas ruins que me aconteceram. — Mas fico feliz
que o senhor esteja orgulhoso de mim.
— É claro, minha princesa. É um momento bem reflexivo mesmo, eu
sei por que já passei por isso. Bem, eu não era a noiva, mas eu era um noivo
muito nervoso e cheio de amor pra dar — comenta sorrindo, e é impossível
não lembrar em como a sua ex-mulher havia escolhido ficar sozinha a ter que
viver com uma família ao seu lado quando ele não desistiu de me criar como
sua filha. — Mas diante de tantos pensamentos, você precisa ter certeza de
uma única coisa. — Aponta para o lado onde a cerimônia irá acontecer. —
Naquele altar existe um homem esperando pelo futuro dele. Isso o que você
está sentindo no coração, é a força que irá usar para andar até ele.
— Como sabe que vou precisar de um impulso para conseguir andar?
— Esboço um sorriso.
— O sentimento é mútuo. Mas acredite em mim, você irá conseguir o
impulso necessário na hora. Então, está pronta? — Ergue seu antebraço para
mim, cheio de expectativas.
Seguro em seu antebraço e alargo um sorriso otimista e com meu
coração batendo na boca.
— Estou como nunca estive antes — asseguro mais a mim do que a
ele.
Respiro fundo, pronta para me encontrar com Oliver.

OLIVER

A maior parte do tempo fico encarando o chão, porque sei que se me


deixar levar, não irei parar de olhar para onde Isis irá entrar, e talvez isso
cause alguma crise em mim antes mesmo dela chegar.
Já precisei engolir a emoção muitas vezes estando diante dos
convidados, mas o sorriso é constante, e minha felicidade escancarada tem
deixado terceiros bastante admirados e inspirados.
Dizem que casamentos encorajam os corações mais fechados a se
desabrochar, e isso parece ser verídico, pois o dia parece especialmente
romântico.
A música de fundo tocando, as cores claras da decoração, as flores
que compõem o ambiente, mas sei que dentre tantos fatores, meu coração
batendo vorazmente por Isis, é o que define tudo.
Ver meu filho andando, admirado com tudo, causa algo dentro de mim
que não sou capaz de definir, mas é tão bom que tenho medo de acordar e
perceber que tudo era apenas um sonho, porque ainda é difícil de acreditar
que a minha vida que estava definhando silenciosamente, se tornou
inesperadamente motivo para acreditar no amanhã.
Fico tão absorto em pensamentos, que nem percebo quando tudo muda,
os convidados levantam e a marcha nupcial começa a tocar, é quando vejo
Isis ao fundo. Essa cena faz meu coração galopar incansavelmente, meu
sorriso abrir e meus olhos expressar de forma intensa o que estou sentindo; é
por isso que eu sei que o amanhã será perfeito ao lado dela, e que estamos
certos disso.
A prova de que muitas conquistas podem acontecer ao contrário, em
seu tempo, mas elas irão acontecer.
Passei tantas noites sonhando com Isis vestida de branco. Até mesmo
quando acordado, eu ficava imaginando constantemente ela desfilando
vestida de noiva. Mas nada do que eu imaginei, me preparou para o que eu
observo caminhar lentamente em minha direção.
Acho que perco o fôlego e o sentido de tudo, de tão deslumbrante que
Isis está.
O vestido é de alças finas, ressaltando seus ombros sinuosos que tanto
adoro beijar e morder. O decote sútil traz toda a sensualidade que ela nem
precisa fazer esforço para conquistar, o caimento rendado é um pouco justo
ao seu corpo, mas ganha volume na calda. Seu cabelo está solto e cheio de
ondas e movimentos, e ao invés do véu, colocaram na cabeça dela uma
simples coroa de flores brancas, as mesmas que estão no buquê que ela
segura firmemente.
Isis além de ser a noiva mais linda, parece um tipo de divindade, tão
cheia de luz e beleza.
Todo aquele nervosismo que eu sentia se dissipa quando ela surge,
fazendo eu esquecer tudo ao meu redor.
Quando ela me alcança, Daniel que a acompanha todo emocionado,
acaba por segurar minha mão. Preciso desviar a atenção de Isis por uns
segundos quando ele avisa:
— Confio em você, sei que fará a minha menina muito feliz. Mas
continuo sendo o pai dela, aquele Daniel que você conheceu em Blumenau.
Ainda farei de tudo pela minha menina, então espero que faça isso direito,
rapaz.
— Não irei decepcioná-lo, senhor Daniel — digo firmemente.
— Estou otimista que não. Fico feliz por vocês dois, muito mesmo. —
Entrega a mão de Isis para mim. — Aqui está, tome conta da minha menina.
— O senhor sabe que irei fazer isso muito bem — asseguro.
Daniel assente, então se dirige para o lugar onde ficaria de olho em
Oli junto com Matilde.
A mão de Isis que ele me deu, levo até meus lábios e deposito ali um
beijo gentil. Mas queria mesmo era estar beijando seus lábios que estão
pincelados sutilmente por um batom vermelho.
— Minha nossa, você é a coisa mais linda que já vi na minha vida —
sibilo ainda hipnotizado.
— E você é o homem mais lindo e charmoso que já conheci! —
devolve, tocando gentilmente minha barba.
Sorrindo, Isis encosta a testa junto a minha e ouço suspiros vindo dos
convidados. Aperto firmemente a sua mão, me sentindo completo.
A cerimônia prossegue, e eu não consigo manter muito atenção em
outra coisa senão em Isis. Trocamos muitos olhares, às vezes me inclino para
dar um cheiro nela, e quando estamos atentos, inesperadamente recebemos a
visita de Oli que corre até nós dois, querendo atenção e muito manhoso.
Pego meu menino no colo e cochicho em seu ouvido:
— Mamãe e papai estão tratando de algo muito importante agora,
filhão. Mas prometo que em breve iremos até você.
Sei que ele não entendeu muita coisa, além de mamãe e papai, duas
coisas que realmente o interessa além da mamadeira. Mas Muriel precisa vir
buscá-lo, já que no momento, estávamos muito perto de trocar o voto de
casamento.
Oli não faz escândalo, gosta de estar com a prima de segundo grau, e
que na verdade, ele chama de tia.
Em meia hora, estou casado com Isis.
O anel de ouro reluz lindamente em seu dedo, mas não mais que seu
sorriso e os olhos. Beijo a sua boca demoradamente, mas também beijo seu
rosto e o canto do seu pescoço. Mal posso esperar para anoitecer, para nossa
noite de núpcias, que irei beijar seu corpo todo.
Passamos pela chuva de arroz quando nos retiramos dali e levo Isis
para outro lugar enquanto os convidados se deslocam para uma das tendas
onde o jantar será servido.
Um local foi preparado para nós dois descansar e curtir até que tudo
estivesse organizado para a nossa entrada. Há duas poltronas bonitas e
somos servidos com água e alguns petiscos. Mas não conseguimos dar
atenção as outras coisas, senão ao nosso novo status de relacionamento.
— Agora você está oficialmente ligado a mim — Isis comenta de um
jeito provocativo.
— Isso não me parece nada mal. Só consigo pensar no quão sortudo eu
sou por ser seu marido.
— Você não parece preocupado com nada, Oliver Giordano! Acho que
carreguei toda tensão do casamento sozinha nas costas — revela fingindo
estar emburrada.
Olho perplexo para ela.
— Nada disso. Só Deus sabe como meu coração estava parecendo
uma bomba prestes a explodir. Tudo só ficou tranquilo quando vi você. —
Solto um suspiro seguido de um palavrão só de lembrar. — Porra, você não
sabe o bem que me fez quando surgiu. A sua existência deveria ser crime,
porque tudo em você me deixa fascinado demais, me amarra e me tem em
seus pés.
— Acho que com isso eu posso fazer o que eu quiser com você —
pondera dizendo de uma forma sensual, traçando um caminho com a ponta do
seu dedo sobre a minha calça social.
— Você já quer brincar com fogo? — pergunto baixinho, embora
esteja só nós dois ali.
— No momento certo, meu amor. Mas até lá, vou atiçar você —
revela.
Sorrio para ela de um jeito divertido, me sentindo induzido pelo seu
charme.
— O que foi? — pergunta com seu jeito doce, contrastando
perfeitamente com a Isis ousada de poucos segundos atrás.
E é isso que sempre me fascinou nela.
— Estava aqui pensando em como sou sortudo por ter me casado com
essa mulher perfeita que é você. — Pego sua mão e beijo bem em cima do
anel que coloquei em seu dedo horas atrás. — E que mesmo depois de ter
vivido muita coisa, eu não gostaria de estar em outro lugar, senão aqui com
você, minha vida.
Isis pisca e sorri, completamente encantada.
Amo deixá-la assim e saber que minhas declarações são recebidas de
um jeito tão genuíno por ela.
— Devo dizer o mesmo. Às vezes sinto que estou dentro de um filme,
mas não quero que chegue os créditos finais, porque quero viver um eterno
felizes para sempre ao seu lado. Quero que dias como esse sejam comuns.
— Eu prometo que será assim, minha querida.
Envolvo Isis em meus braços, e a beijo de um jeito mais profundo.
Mas não tanto a ponto de borrar seu batom, ou de querer passar a língua
assim no seu rosto e beijar seu olho.
Caramba, quero fazer tantas coisas com ela que é impossível agora!
Mas de uma coisa ela tem certeza, iremos ficar nessas provocações,
até pegarmos fogo na nossa noite de núpcias.
A cerimonialista vem nos buscar poucos minutos depois. Ela diz que
já está tudo ok, e que podemos descer para a área do jantar que já está sendo
servido.
A empresa responsável pela decoração realmente caprichou em tudo.
A decoração está elegante e romântica, até lustres de vidro soprado pendem
dando um ar mais rústico ao ambiente, além de luxuoso. Uma mesa foi
separada para nós dois, onde conseguimos ter uma bela vista dos convidados
que se deleitam com o banquete que passamos quase duas semanas
escolhendo.
Nada muito escandaloso, e sim, pragmático, mas está uma delícia.
No fundo, a banda toca as músicas que Isis e eu mais gostávamos. Mas
percebo a ausência de músicas da sua banda favorita, e antes que eu comente
isso com ela, a minha amada mulher comenta:
— Tenho um presente para você — diz saindo logo em seguida.
Fico sem entender nada, mas observo ela andar lindamente, com seu
cabelo que cresceu bastante lhe batendo quase perto do traseiro.
Céus, preciso muito dessa mulher de um jeito que apenas eu posso ter!
Mas minha cabeça segue outro rumo quando a vejo conversando com a
banda, que para de tocar abruptamente assim que ela os alcança.
Fico ansioso, talvez, já imaginando o que ela irá fazer.
Como eu não sou o único a perceber Isis com a banda, ela atrai os
olhares de todo mundo, e então, assume o microfone e acho que vou surtar.
— Olá, todo mundo. Hoje está sendo um dia muito especial, e eu
agradeço muito a presença de todos. Mas hoje estamos celebrando
principalmente o amor, e como ele pode ser sempre bem-vindo, mesmo
depois de tantas dores. E quando você percebe que o amor pode ser o início
de uma jornada incrível, você o aceita sem medo de errar.
Isis enfatiza aquelas palavras olhando para os convidados, não sei se
estava servindo para todos, mas eu entendi que aquilo era um recado indireto
para mim. Até que mesmo longe, seus olhos encontram os meus, e sinto um
frio percorrer minha espinha e se instalar no meu coração.
— Oliver, meu amor. A nossa jornada tem sido incrível, obrigada por
me escolher. Tenho certeza que todos os dias iremos precisar do amor um do
outro. Te dedico essa canção.
Sorrio quando finalmente percebo o que ela irá fazer. Isis inicia All
You Need is Love, que segue as suaves notas de um piano. Fico hipnotizado,
e ao mesmo tempo maravilhado por ela finalmente dedicar uma música dos
Beatles para mim. Ela sempre cantou para Oli ficar tranquilo, e até hoje
funciona. Mas hoje, sou eu quem ganho uma música e ela é perfeita.
No entanto, a situação toda é uma novidade para ela também, e não
faço ideia da timidez que Isis está enfrentando para cantar na frente de todo
mundo. Mas é a sua forma de dizer que todos podem encontrar um amo, e
que não pode ser tão complicado.
Quando ela termina, a aplaudimos de pé e eu tenho mais certeza ainda
de que me casei com a mulher certa.
OLIVER

Oli está cantarolando no banco de trás do carro. Aos três anos de


idade, ele já sabe uma gama de músicas variadas que aprendeu com a mãe.
Ele canta somente as partes que lembra e faz questão de cantar alto, ainda
mais sabendo que no fim, Isis e eu vamos achar graça e parabenizá-lo por
ser um ótimo cantor.
Quando ele age como um bom garoto, geralmente Isis e eu o
incentivamos com aplausos e parabenizações, o que acontece sempre.
Nosso filho está na fase de querer ser dono do próprio nariz. Já não
usa mais fralda e geralmente sabe onde e a quem recorrer quando precisa de
algo.
Em alguns meses, Oli fará quatro anos, mas desde os sete meses ele
sempre demonstrou ser um garoto esperto em tudo.
Por isso, como hoje é o seu primeiro dia na escolinha, resolvemos
deixá-lo ao som de músicas infantis para ele poder chegar lá animado. Isis
não tem aguentado a emoção desde que nos juntamos para ir à papelaria
comprar o material escolar dele. Mas também não posso julgar o emocional
dela, os hormônios estão à flor da pele nos últimos oito meses.
E quando Oli canta bem alto, a ponto de estar gritando e não cantando,
eu o advirto:
— Nada de gritos, filhão.
Abaixo um pouco o som e ele aquieta no banco de trás. Dou uma
rápida olhada pelo retrovisor e vejo Oli sentado na cadeirinha, usando o
uniforme da escolinha, com o cabelo escuro e liso, semelhante ao meu. Na
verdade, ele é a minha cara, e conforme o tempo vai passando isso vai
ficando inegável.
— Senão a Isabella vai acordar, papai? — pergunta perfeitamente.
Oli se comporta igual um cavalheiro, embora Isis diga que ele é um
príncipe quando não está fazendo birra.
— Isso mesmo, filhão. E não queremos acordar a maninha, não é? —
automaticamente a minha mão pousa sobre a enorme barriga de Isis.
Sim, estamos grávidos e é uma menina.
Dois anos de casados e por muito tempo mantendo relações sem
precaução alguma, somente agora Isis veio engravidar.
Gosto de lembrar como foi a sensação de descobrir que eu seria pai
novamente, no Natal que foi na nossa casa, com todo mundo reunido, Isis me
presenteou com uma caixa pequena e retangular, lembro de como Nicolo
ficou caçoando de mim dizendo que eu tinha ganhado uma caneta, mas
quando abri o embrulho, lá estava.
— Um termômetro? — Daniel perguntou de forma ingênua.
Isso nos fez rir muito na hora, mas eu fiquei sério, porque li poucas
palavras no pequeno visor, mas um tanto objetivas.
Grávida.
4-6 semanas.
Olhei para Isis à procura de qualquer resposta da realidade daquilo, e
ela tinha um sorriso de orelha a orelha, e os olhos marejados de emoção.
— Isso é real? — pergunto quase baixo demais.
— Sim, meu amor — afirma balançando a cabeça, aos choros. — É
real.
Aperto o teste na minha mão e a abraço com muita força. Lembro de
ter olhado para meus amigos, a nossa pequena família, por cima do ombro
dela e verbalizar o que estava acontecendo:
— Ela está grávida. Vamos ter outro bebê.
Daí em diante, foi só comemoração. Isis explicou que a menstruação
havia atrasado e numa ida ao ginecologista, a médica solicitou um teste de
farmácia e o de sangue, ambos deram positivo. Ela andava até com o
resultado do exame na bolsa para nos mostrar.
Fiquei um tempão tentando digerir essa informação, olhava de um teste
para o outro, e então para a barriga de Isis que visivelmente não dava
nenhum indício de gestação ainda. Mas eu acariciava e olhava para aquela
área com bastante apreço.
Na verdade, demorou até que ela formasse um barrigão, pois até o
terceiro mês de gestação ela praticamente vomitava tudo o que comia. Isso
me deixava muito preocupado, mas Domenico receitou as vitaminas certas
para ajudar tanto ela quanto o bebê que ainda não sabíamos o sexo naquele
tempo. Somente no quinto mês que a barriga começou a crescer, e que
descobrimos que era uma menina.
Isis vibrou, Muriel também amou a notícia e o Daniel chorou, pois ele
queria muito uma netinha.
Estava feliz da vida, e de certa forma, aliviado por saber que desta vez
estava presente durante a gestação dela. Vi a minha filha crescer
praticamente na barriga de Isis, pois estava presente em todas as
ultrassonografias, conversava com ela desde o momento em que soube que
estava ali, e fazia massagem na barriga de Isis toda noite antes dela ir
dormir.
Não vou negar que precisei estudar formas de lidar com os hormônios
de Isis que oscilavam e às vezes me deixava louco!
Mas fora os desejos exótico por comida e em horários bastante
inconvenientes, as alterações de humor e o enjoou que ela pegou de mim por
duas semanas, e que me deixou muito preocupado, pois fiquei com medo de
perdê-la, mas Dom avisou que isso era normal acontecer e que passaria.
Preciso ressaltar o lado sexual dela que duplicou o anseio.
Isis não gostava de fazer amor, Isis gostava de foder. Ela literalmente
aproveitou o tempo em que seu barrigão não havia crescido, para justamente
trepar comigo de todas as formas. Fiz muitas pesquisas até aceitar que o
coito não afetaria o bebê em nada, que ele quando envolvido na bolsa
amniótica é mais seguro do que eu poderia imaginar. Mas ainda assim, eu ia
com calma. Isso a irritava, e Isis simplesmente desejava sexo anal.
Eu não conseguia negar aquilo, mas também não era como se
estivéssemos tentando esse novo caminho pela primeira vez.
Foi na nossa lua de mel que eu descobri que Isis era extremamente
deliciosa por trás também, e me surpreendi pelo fato dela gostar e ir à
loucura quando eu meto por trás. Acho que eu me apaixonei mais ainda por
ela, coisa que não sabia ser possível, porque acreditava já estar dando todo
amor possível para ela.
Enfim, é só uma nota de como as coisas ficaram entre nós desde o
nosso casamento.
Coisas que amo relembrar, porque tenho medo de esquecer.
Somos um casal feliz e realizado, temos nossa família que agora só vai
crescer, e eu não poderia estar mais contente com a forma que todo trajeto
até aqui tem sido feito.
Oli irá estudar na escolinha, que deixou de ser apenas uma creche, da
empresa, é o lugar que mais confio e mesmo depois de tanto tempo após o
sequestro, acho mais seguro continuar com o protocolo, mas de forma sútil.
Isis já está afastada do trabalho, mas sempre gosta de aparecer para falar
com as amigas que acabou fazendo no local. Agora que ela está grávida, os
detetives que continuam mantendo contato me aconselharam a ter cautela,
pois gestantes são alvos fáceis, e sinceramente não quero ver a minha família
envolvida em outra situação terrível como aquela.
Ainda mais com Isis à espera de outro bebê.
— Prometa para mamãe que você será um bom menino e irá obedecer
a tia Sabrina? — Isis conversava com Oli na entrada da escolinha.
— Prometo, mamãe — diz com a sua atenção voltada para as paredes
coloridas.
Isis já o trouxe outras vezes, mas toda vez que ele vem, é como se
fosse a primeira vez.
E bem, como aluno é sim a primeira vez.
— Muito bem. Cadê meu beijo e o meu abraço? — Isis pergunta.
Ele se joga nos braços dela, mas mantendo cuidado com a barriga.
Então beija Isis e a barriga dela, onde está a sua irmãzinha.
Oli recebeu a notícia muito bem. Quer dizer, ele era filho único, não
tinha muito contato com outras crianças e por isso Isis o trazia para o
trabalho às vezes. O ensinamos que ali dentro da barriga de Isis, está a sua
irmãzinha, que será a sua nova amiga e que eles logo, logo poderão brincar.
Ele adorou isso, e agora cuida mais da barriga de Isis, onde está a sua
irmã, do que dos seus dinossauros que tanto tem ciúmes.
— Bem, qualquer coisa eu aviso vocês. Podem ficar tranquilos, ele
será bem cuidado. — Sabrina, a gestora da escolinha, nos informa com um
sorriso débil para Oli, que encanta todos por onde passa.
— Sabemos que vai. Vocês fazem um excelente trabalho — respaldo
orgulhoso.
— É claro que fazemos — Isis diz enfatizando o elogio.
— Até mais, filhão! — Me despeço de Oli também, que segue para a
sala de aula sem hesitação nenhuma.
Pego Isis chorando.
— Ele nem sequer olhou para trás — comenta e sorrio.
— Mas com certeza ele vai sentir falta depois. Espere pelo relatório
da professora dele.
— Ah, mas eu vou esperar, sim — murmura secando as lágrimas,
tentando disfarçar a mãe coruja que é.
Dou um beijo na sua testa e seguro sua barriga dura, Isabella está
dormindo.
— Venha, vamos ver como está a nossa garotinha? — pergunto e os
olhos dela brilham em animação.
— Vamos!
Seguro a mão de Isis e saímos do prédio atraindo olhares. As pessoas
que trabalham ali já estão acostumadas a nós dois juntos. Mas a barriga de
Isis chama atenção por onde quer que ela passe.
É verdade que mulheres ficam radiantes quando grávidas e mesmo de
vestido bege e o cabelo preso com algumas mechas soltas, Isis está
incrivelmente linda.
Ela tem hora marcada para fazer a ultrassom, que embora não tenha
nada a ver com a profissão de Domenico, é ele quem acompanha tudo.
Nada muito diferente de quando ela estava esperando Oli, foi o que os
dois me contaram.
Não vou negar, sinto um pouco de ciúme e até mesmo excluído quando
percebo o quão Isis e Domenico se conhecem. Eu ainda não tinha parado
para perceber isso, e somente na primeira consulta, quando eles
conversaram com tanta propriedade da gestação, relembrando de quando ela
estava grávida pela primeira vez, sinto que estou sobrando. Mas também faz
parte do trabalho dele, não tenho do que reclamar e nem está no meu direito.
Na verdade, é até muito bom que eles se deem tão bem. Assim, Dom
nos auxilia sobre tudo, principalmente no parto que está previsto para daqui
um meses. Isis está louca para ter parto normal e humanizado de novo, só
que desta vez, em casa, com ajuda de doulas. Meu amigo me passou toda
informação necessária de como isso aconteceria, só para eu ficar a par da
situação, pois a escolha é toda de Isis. Ela acha melhor assim e eu confio
nela.
— Vamos precisar de você também.
Ele havia me informado, mostrando logo depois alguns exemplos de
como o pai entrava nesse momento tão importante para os dois.
Parecia ser muito doloroso só de olhar. Não sei se aguentaria ver Isis
sofrendo, mas não seria qualquer sofrimento, e sim, um tipo de sofrimento
para trazer nosso filho ao mundo e eu estaria ao lado dela a todo instante.
— Eu com certeza ficarei — determino confiante e ansioso para o
momento.
Domenico passa alguns exercícios que poderiam ser úteis para ajudar
na dilatação e na passagem do bebê, e quanto antes começarmos a fazê-lo,
melhor.
Sexo é uma boa também, mas isso ele disse que não entraria em
detalhes porque tinha certeza de que estávamos praticando metodicamente.
Isso, claro, deixou Isis ruborizada.
Nossa relação sexual é algo que gostamos de manter somente entre nós
dois, sem fazer comentários supérfluos a terceiros.
Isso tudo aconteceu na última vez em que fizemos uma consulta a Dom,
que é o pediatra. Mas agora Isis está indo fazer ultrassom e ele vai
acompanhar como sempre, para ver em tempo real como está o bebê.
Quando chegamos a clínica, Dom já está lá nos esperando. Às vezes
tenho a sensação de que ele conhece todo mundo que trabalha com medicina,
o que não é difícil ser de fato isso, pois ele é um pediatra renomado na
cidade e todo mundo da área da saúde o conhece por ser uma ótima
referência de profissionalismo.
— Chegou a gravidinha do ano — cumprimenta Isis com um abraço
gentil e beija o topo da cabeça dela.
Não me incomodo com o carinho que meus amigos dão à minha
mulher, principalmente agora que ela está grávida. Faz bem tanto para ela
quanto para a bebê.
— Como tá você e a Isa?
— Vamos bem. Ontem à noite ela estava bastante agitada, mas acho
que é porque eu comi muito bolo de chocolate. Matilde disse que bolo de
chocolate deixa os bebês agitados.
Dom faz uma cara de quem comeu algo azedo, e acrescenta:
— Bom, não há nenhuma comprovação científica sobre isso, mas na
verdade, chocolate em excesso pode reduzir o risco de pré-eclâmpsia, não
exagere nunca, Isis.
— Eu sei, seu bobo. — Dá um beliscão de leve no braço. — Não é a
minha primeira gestação, lembra?
— Isso não quer dizer que você foi uma gravidinha cem por cento
disciplinada também.
Dou um sorriso desdenhoso.
— Sou a pessoa mais confiável aqui para enfatizar a teimosia dessa
mulher — digo a deixando chocada com meu comentário, mas também não é
a primeira vez que falo sobre sua teimosia.
— Meu bem! — protesta.
— Talvez eu apanhe quando chegar em casa, mas às vezes Isis desce e
sobe aquela escada de casa sozinha.
— Porque eu não quero pedir para você ir até a cozinha às três da
manhã pegar iogurte de chocolate pra mim!
— Querida, eu já tive que ir atrás de sorvete de menta às quatro da
manhã. O que é ir até a cozinha de casa e pegar um iogurte?
Isis olha então desconfiada para Domenico. Ela sabe que está errada,
sabe que precisa controlar sua compulsividade por doces que a afeta
principalmente de madrugada. Mas Dom dá o braço a torcer, não sei se é do
seu estilo na hora de exercer a sua profissão, ou porque a carinha de vítima
de Isis funciona.
— Aconselho a vocês se mudarem para um daqueles quartos que tem
no primeiro andar. Isis vai precisar se movimentar, mas não é muito seguro
ficar subindo e descendo escada nesse período.
Assentimos para ele.
Faço uma nota mental para pedir uma organização apropriada para nós
dois no maior quarto de hóspedes que tem no primeiro andar da nossa casa.
— Vamos ver como está a Isabella? — sugere e não hesitamos em
segui-lo para dentro da clínica, em direção à sala de ultrassonografia
comandada por um conhecido dele.
Dom ultimamente vem tendo alguns problemas com a noiva, parece
que Júlia anda irritada com ele por não terem ido ainda marcar a data do
casamento deles.
Já faz um bom tempo que ficaram noivos, mas sei de uma coisa que
Júlia mal faz ideia, Domenico me confessou que procrastinou o “Grande
Dia” por conta da primeira gestação de Isis, ele queria o sobrinho por perto
quando se casasse, mas claro, depois do sequestro e do meu casamento com
Isis, ele decidiu esperar mais um pouco.
Ainda assim, está demorando de verdade para aqueles dois subirem no
altar, e Júlia não está gostando nada disso.
Mas ele consegue lidar com a situação, ao menos é o que aparenta.
Só não sei por quanto tempo aquilo irá se sustentar.
A sala é escura e aconchegante, está bem fria e tem um cheiro
proeminente do gel, item que eles usam para fazer também a transvaginal
logo no início da gravidez para ver se está tudo certo com o útero. Se não
tivesse acompanhado Isis desde as primeiras consultas, eu jamais saberia
disso. Mas ela está tão familiarizada quanto eu, pois mesmo de vestido, Isis
veio com uma calcinha de cintura alta, ideal para gestantes que vivem
usando vestidos, e ela não larga mão de tal peça de seu closet.
— Como será que está essa princesinha, hein? — O médico
responsável pelo ultrassom pergunta a Isis.
— Da última vez ela estava com as pernas cruzadinhas — comenta
sorrindo.
— Uma verdadeira dama, não acha?
Ele despeja o produto viscoso e transparente sobre a barriga dela e
Isis sorri dizendo que é geladinho. Com isso, ele posiciona o aparelho sobre
o gel e o visor na parede que antes estava com a tela toda escura, começa a
tomar formas, mesmo que ainda muito ruim de decifrar. Lembro de como foi
vê-la pela primeira vez, ainda parecia um grão de feijão, mas foi a coisa
mais emocionante que eu vi, principalmente quando ouvi o seu pequeno
coração bater. Foi a comprovação mais bela de que havia uma vida ali
dentro de Isis, pulsando, como resultado de uma das nossas noites de amor.
Isis e eu sempre tentamos supor em qual noite ela engravidou, mas fica
impossível de saber quando o sexo é constante.
O médico então mexe e mexe aquele aparelho, até que uma silhueta
surge em posição fetal. Meu sorriso é instantâneo. Lá está ela, a minha
menininha. Formada perfeitamente, seus dedinhos se movendo sutilmente.
— Está dormindo — Isis diz.
— Ela é muito dorminhoca? — O médico pergunta.
Isis e eu nos entreolhamos, e lembro de um detalhe que talvez possa
definir isso:
— Acho que ela gosta de trocar os horários. Geralmente dorme muito
de dia, e quando é noite, ela faz a festa. Mal deixa a mãe dormir.
Há noites em que a bebê fica dando pontapés na barriga de Isis, ela
bola de um lado para outro, simplesmente não para.
— Bem diferente do irmão — Isis ressalta. — Oli quase não se mexia
e eu ficava bem preocupada, aí Dom me assegurou que ele só era um bebê
preguiçoso.
— O passado nunca condiz com o presente — tenho que comentar, e
Isis sorri sabendo do que estou falando. — Oli age como uma criança normal
para a sua idade, mas ele ama brincar, então quietude não é a melhor palavra
para defini-lo.
— Talvez ele só tenha tido a quem puxar — Dom instiga, sentado do
outro lado da sala enquanto avaliava a ultrassom. — Você não era o mais
quieto quando criança também. Lembro das coisas que você aprontava e a
sua mãe adorava contar.
— Por que ninguém me conta essas coisas? — Isis o questiona.
— Posso contar outro dia — diz e é inevitável revirar os olhos ao
saber que Dom iria aproveitar para contar todas minhas artimanhas quando
mais novo.
— Ótimo! — refuta toda feliz.
Isis me ama, mas às vezes o fato de Oli ser uma miniatura minha a
deixa com ciúme. Ela torce para que Isabella seja uma miniatura dela, assim
ficamos quites, isso explica também a escolha do nome.
Ela queria algo que remetesse ao nome dela, mas sem ser muito
parecido.
Isabella.
Foi Muriel que deu a ideia, nós amamos de primeira e nem sequer
tivemos a chance de hesitar, até porque até então só havíamos pensado em
nomes que sentíamos não ter nada a ver com a nossa filha, até que surgiu
este.
Ouvimos o coração dela e o médico marca cada batida. Ele faz várias
capturas para entregar no ultrassom impressa, para que Dom consiga avaliar
tudo depois com mais calma. Finda o exame e está tudo certo com a Isabela
e Isis.
Aparentemente, a nossa única missão ali é nos preparar para o dia do
parto. Ainda falta um mês, mas já estamos ansiosos o suficiente.
— E quanto ao chá de bebê? — Dom pergunta quando saímos para o
estacionamento.
— Está meio que em cima da hora para planejar algo — Isis diz
contraindo os olhos quando uma nuvem sai da frente do sol, ofuscando tudo.
— Não parece que Muriel, Lorenzo e Nicolo acham isso. Se depender
deles, o chá de bebê acontece amanhã.
— Nada nos impede de fazer um jantar, encomendar um bolinho e
pronto — digo e Isis me olha meio descrente. — O que foi?
— Meu amor, você disse que o nosso casamento seria simples e no fim
foi quase um super evento — refuta.
— Não gosto de economizar quando o assunto é você ou meus filhos.
De qualquer modo, o que você acha da minha ideia? — pergunto instigado a
querer comemorar antes que a Isabella nasça. Se bem que ela poderia vir a
qualquer momento.
Isis solta um suspiro.
Ela gosta de ser discreta, mas sabe que há algumas coisas que não dá
para competir.
— Bem, se não for nada extravagante, podemos fazer neste fim de
semana — diz e sorrio para ela.
Isis não consegue negar muitas coisas, principalmente aos tios dos
nossos filhos.
Nicolo superou a decepção que sofreu com Sofia, desde então não o vi
mais em outro relacionamento sério, mas por outro lado tem mais amantes
diferentes agora do que tempos atrás.
Não sei se isso é bom ou ruim.
Ele podia estar infeliz, mas a notícia de que Isis e eu teríamos uma
garotinha o deixou muito contente. Bem como Lorenzo, que até então nunca
havia acompanhado uma gestação de perto, e ficou fascinado em acompanhar
o crescimento da Isa dentro de Isis.
Acho que ele está propicio a maternidade agora, mas Bruna não parece
muito à vontade, pois está no início de uma carreira brilhante na área da
medicina. Talvez ela deseje esperar mais um pouco, afinal ainda é nova.
Mas aprendi que muitas coisas podem mudar em um curto período.
O dia de ultrassom é a consulta que menos demora, bem diferente de
quando Domenico a examina, pois leva bastante tempo. Então quando
terminamos a consulta, nos despedimos de Domenico que será eternamente
meu cunhado.
Ele precisa atender outra paciente, então Isis e eu voltamos para casa
logo depois.
Assim que voltamos da lua de mel, Daniel voltou para Blumenau. Ele
disse que não queria atrapalhar nossa vida de casado, e que estava morrendo
e saudade da sua casinha. Não conseguimos fazê-lo mudar de ideia, mas
deixamos claro que as portas de casa sempre estarão abertas para ele.
E neste final de semana, ele vai aparecer para assistirmos todos juntos
a final do Brasileirão.
Será épico!
Muriel permanece aqui, só que agora ela conseguiu um outro trabalho
além do que ela já exercia como professora de inglês nos finais de semana.
Gosto dela, mesmo sabendo que no início ela não me aceitava muito bem.
Quando Matilde avisa que o almoço está pronto, me prontifico a
chamar Isis. Tem dias que não apareço no trabalho, fico comandando tudo
aqui de casa porque gosto de ficar atento também à minha mulher, além de
que tocar o seu barrigão é quase um vício.
A encontro no quarto de Isabella, que ficou pronto há duas semanas.
Ele é todo branco e lilás, ela não quis muito rosa. A decoração é um pouco
minimalista e rústica, a cara dela, mas que certamente combinará muito com
a Isa também.
Isis está absorta em pensamentos se embalando na cadeira quando dou
dois toques na porta que já está aberta.
— Vamos comer? — a chamo.
— Claro, só estou descansando meus pés um pouquinho.
— Estão inchados de novo? — pergunto entrando no quarto e olhando
para seus pés que de fato, estão um pouco inchados.
— É só eu andar um pouco mais da conta que eles ficam assim.
— Quer que eu providencie uma cadeira de rodas? — brinco, puxando
um pufe onde sento e apoio seus pés sobre minhas pernas.
— Não, seu engraçadinho. É que essa é a tendência, vai piorar agora
que estou no último mês.
— Então você terá mais um mês com esse pé bonitinho— provoco
sorrindo e Isis insinua me chutar.
Já vi pés realmente feios na minha vida e o de Isis estava longe de ser
um deles, mas eu sabia que ela não gostava muito deles então costumava
cutucar onde mais doía.
— O que veio fazer aqui? — pergunto olhando em volta.
Reparo que ela segura um dos ursinhos de coelho, que estava em uma
das prateleiras.
Isis solta um suspiro com tranquilidade.
— Eu gosto de vir aqui e imaginar o futuro, quando ela já estiver em
meus braços. E sei que não tem nada a ver, mas ela me faz lembrar de mim
mesma.
— Como não tem nada a ver? — pergunto com o cenho franzido. — É
a sua filha. Carne da sua carne e sangue do seu sangue.
— Eu sei, amor. Mas, na vida… Digo, ela lembra a minha mãe,
também. Em como deve ter sido para ela ficar na expectativa para a minha
chegada. Papai sempre me disse que minha mãe estava muito feliz e ficava
sonhando com o momento em que iria me encontrar. Eu mal havia entendido
o que era a vida quando ela se foi.
— Isabella nunca passará pela mesma coisa que você passou —
afirmo com o coração na mão, ciente de que Isis vinha enfrentando esses
flashes do passado nos últimos meses.
Isso me deixou entristecido, porque significava que ela ainda não
havia superado de certa forma. De qualquer forma, a compreendo, há certas
coisas que não conseguimos simplesmente apagar com uma borracha. A
gente simplesmente supera ou aprende lidar com formas mais racionais e
Isis, desde que descobriu a gravidez, sempre tem andado mais emocional.
Me estiro em seus pés, de joelhos, à altura da sua barriga. Ela me olha
com surpresa, mas não é nada diferente do que eu já não tenha feito antes.
Beijo a sua barriga, sinto minha filha mexer com a minha presença e sorrio
em resposta.
— Acordou, né, sua dorminhoca? — começo a conversar com ela. —
Espero que esteja tudo bem aí dentro, não precisa se apressar para chegar,
estamos preparando tudo para a sua entrada triunfal. Ou eu diria, saída?
Isis começa a rir.
Bom, papai já disse isso muitas vezes, mas acho que a mamãe ainda
não deu muita atenção, porque eu sempre falo que você é a minha princesa e
que a amo, mas desta vez eu vou falar um pouco mais, tudo bem?
Olho para cima e encontro Isis me encarando com expectativa. Olho
para ela como se eu estivesse olhando nos olhos da minha filha, porque eu
imagino que Isa terá os olhos castanhos da mãe, e então, declaro:
— Você terá uma mãe incrível. Uma mãe que sabe o verdadeiro
significado de amar, cuidar e preservar. Eu sei que a mamãe anda um pouco
insegura nesses últimos dias, mas prometo que vou lembrá-la todos os dias
de que será uma ótima mãe para você. Oli está aí de prova para isso. Você
ganhou na Mega Sena, minha garota!
Sinto os dedos delicados de Isis afagar em meu cabelo.
— Ela já ama você, mas sei que quando te olhar pela primeira vez, o
amor será mais forte ainda, e ela nunca irá soltar a sua mão. Ela nunca a
deixará sozinha, e será a sua melhor amiga, vai poder contar com ela para
tudo, não tenha medo. Eu sei disso muito bem, o seu irmão também sabe e
você muito em breve saberá. — Dou um beijo na barriga e me levanto
apoiado nos joelhos para ficar agora, à altura de Isis.
Isis dá um sorriso afetado e olho profundamente para ela, que está
afrouxando as rédeas.
— E você, minha querida mulher, nunca se esqueça de que é uma
excelente mãe. Isis é uma nova parte da história que será contada, nada do
que aconteceu no passado irá se repetir. Tenha certeza disso.
Ela sabe que isso é real, mas os hormônios…
Droga!
Mal vejo a hora da Isabella nascer e Isis saber que tudo ficará bem.
Que ela não terá o mesmo destino trágico que sua mãe, ou que Isabella não
será esnobada igual a mãe adotiva fez com ela.
Isis nunca a deixará.
— Eu amo você, e esse amor sempre irá nos unir. — Beijo sua boca
de um jeito terno, mas que soa como uma promessa.
Isso faz os olhos dela brilharem.
— Seremos sempre unidos — enfatiza agarrando minha mão. —
Também amo você, meu amor.
Com minha outra mão ainda na barriga de Isis, sinto Isabella ficar
agitada. Ela gosta disso, parece que aprova essa promessa. O que é ótimo,
pois não estou a fim de quebrá-la e com a nossa nova filha a caminho, este
laço só ficará mais forte ainda.
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A Deus, acima de tudo.
À minha amada família com quem eu sempre posso contar.
A todos as leitoras maravilhosas que apoiam minha escrita.
A Leticia Tagliatelli pelo trabalho sempre impecável de revisão.
À April Kroes da AK Diagramação por seu inestimável apoio em meu
início de carreira.

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