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Pai solo

a filha do meu vizinho

Copyright © 2021 by Cris Barbosa


Edição Digital

Capa e Diagramação Digital

Revisão e Preparação de Texto: Ebervânia Maria

Todos os direitos reservados a Cris Barbosa 2021.


Publicado de forma independente por Cris Barbosa pela Amazon.
Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens, lugares e acontecimentos descritos são
produtos da imaginação da autora. Qualquer semelhança com nomes, datas e
acontecimentos reais é mera coincidência.
É proibido o armazenamento e/ou a reprodução de qualquer parte dessa obra, através
de quaisquer meios — tangível ou intangível — sem o consentimento por escrito do
autor.
Criado no Brasil.
SUMÁRIO
Sinopse
Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Capítulo 32
Capítulo 33
Capítulo 34
Epílogo
Agradecimentos
Sobre a Autora
Contatos
Nota da autora
Apesar das cobranças de seu pai para que se dedique mais à empresa da
família, o playboy Gabriel Montenegro Bittencourt só quer saber de curtir a vida e se
divertir com várias mulheres nas inúmeras “festas de arromba” que faz em sua casa. Até
que uma linda garotinha é deixada em sua porta, com uma carta afirmando que ela é sua
filha, que a mãe está indo embora da cidade e que, talvez, não volte nunca mais.
Sem saber o que fazer com a criança e sentindo sua vida virar de cabeça para
baixo, Gabriel pede a ajuda de Anna Ayala, sua vizinha e diretora de marketing da
empresa de seu pai. No início ela se nega, pois os dois não se dão muito bem devido as
farras que ele faz e que não a deixam descansar e nem dormir direito, motivo de
constantes brigas entre eles. Porém, ela cai de amores pela encantadora Belinha, logo
acaba cedendo e concordando em ajudá-lo até que encontre uma babá para a menina.
O que Gabriel fará com relação a essa possível paternidade? Belinha será
mesmo sua filha? E se for, ele assumirá sua condição de pai solo? Que fim terá essa
história? Será que essa linda criança conseguirá fazer com que ele e Anna se entendam
e superem suas diferenças?
Gabriel...

Assim que cheguei em casa naquele dia, após o trabalho, há três anos, ansioso
para ver Tábata, uma modelo lindíssima e minha namorada há algum tempo, eu não
esperava achar em cima da mesa de centro da sala um recado seu dizendo que havia ido
embora.
Aprendi com meus pais a importância da família e que um homem de bem deve
alcançar metas para dar o mínimo de conforto as pessoas que ama, independentemente
de fortuna acumulada ou posição social; e o mais importante: que sempre deveríamos
amar e zelar por aqueles de nosso sangue, ou que escolhíamos para passar o resto de
nossas vidas juntos. E foi isso que fiz assim que me formei em economia, passando a
trabalhar na empresa da minha família para poder me casar com Tábata o mais rápido
possível e construir nosso futuro. Na época, eu era um homem apaixonado, bem
diferente do que sou hoje.
Não acreditei quando li as poucas palavras escritas para mim. Ela me disse que
nosso namoro havia se tornado algo chato e monótono, que eu não era mais o cara
animado e festeiro de antes, que sentia falta das farras que fazíamos na minha época de
faculdade e que eu só trabalhava, pensava e falava em um futuro promissor para nós
dois.
Mas, não é isso que toda mulher deveria querer e esperar do homem que
amava?
Ela se despediu dizendo que não aguentava mais e, por isso, estava indo embora
de vez da minha vida e que, se dependesse dela, eu não a veria nunca mais. Destruindo
nesse momento todos os meus sonhos e o que eu acreditava ser um relacionamento.
Foi aí que, revoltado, dei uma grande guinada em minha vida e me tornei o
playboy farrista que sou hoje. Continuo sendo o diretor financeiro da M.B. Papel e
Celulose, a empresa da minha família, cujo nome é composto pelas iniciais dos
sobrenomes de meu pai e minha mãe, Montenegro Bittencourt, e eles, em especial meu
pai, tem a satisfação de dizer que construíram seu império do zero.
Não costumo cumprir horários, sempre chego atrasado e, às vezes, perco as
reuniões. Usar terno? Nem pensar! É claro que isso sempre acaba me criando alguns
problemas e atritos com o meu velho, que sempre me cobra mais empenho e dedicação.
Entretanto, essa foi a vida que escolhi para mim. No início, eu era ainda muito jovem,
tinha 23 anos, e, como sempre tive tudo o que quis, não soube lidar com a rejeição.
Coloquei em minha cabeça que daquela forma eu jamais perderia um novo amor, porém,
depois acabei me acostumando e gostando da vida que estava levando e hoje faço isso
com o intuito de não me prender a ninguém. Minha mãe, que é formada em psicologia,
diz que eu tenho medo de me apaixonar e me machucar de novo. Talvez ela tenha razão,
mas isso eu não assumo nem para ela, nem para ninguém.
Hoje não lamento mais o fato de Tábata ter ido embora e o nosso
relacionamento não ter dado certo. Tenho várias mulheres à mercê de mim: disponíveis
onde, quando e a hora que eu decidir. Faço festas badaladas e bem frequentadas,
inclusive por famosos, em minha casa. O que, por vezes, deixa minha vizinha de cabelo
em pé e a faz ter discussões icônicas comigo. Confesso que me divirto muito vendo-a
tão irritada. Acho que ela é uma das poucas mulheres do condomínio que não peguei
ainda. Ela é linda, mas chata pra caralho, além de trabalhar na empresa do meu pai, o
que me renderia grandes problemas.
Acho que também é o tipo de mulher para se namorar, casar e constituir família.
E se tem algo que não desejo no momento e acho que nunca vou querer, é um
relacionamento sério com alguém. Eu amo minha vida atual e não me vejo em outra.
Gabriel...

Saí da reunião de acionistas da M.B. Papel e Celulose, a qual, como sempre,


cheguei atrasado, e fui direto para a sala do meu pai, que se retirou pisando fundo
segundos antes de mim, mas não sem antes me dizer que precisava ter uma conversa
séria comigo.
— Doutor Gabriel, em que posso ajudá-lo? — Dona Elizabeth, secretária do
meu velho de longa data, perguntou solícita.
— Ele está sozinho? Disse que quer falar comigo e estou aqui para levar mais
um sermão do senhor Roger Bittencourt. — Brinquei e ela sorriu de volta.
Já era do conhecimento de todos na empresa, e até fora dela, o
descontentamento de meu pai comigo desde que resolvi mudar de vida. Sempre
implicando com meus atrasos constantes, minhas roupas e do meu pouco interesse pelos
negócios da empresa.
— Vou avisá-lo que o senhor chegou. — Pegou o telefone já discando o ramal
do meu velho, que mandou que eu entrasse imediatamente. — Prepare-se que hoje ele
não está em um bom dia — alertou-me dando uma piscadela.
Comecei a rir. Girando nos calcanhares lhe dei as costas e caminhei em direção
a sala do todo poderoso e meu genitor.
— Pai? — chamei por seu nome e ele se virou em minha direção.
— Gabriel! — Soltou o ar pelo nariz. — O que você está fazendo com sua vida,
meu filho?
— Nós já conversamos sobre isso diversas vezes. Estou bem e feliz dessa
maneira, não pretendo mudar.
— Sabia que você é o único herdeiro disso tudo?
— Eu sei. Você sempre faz questão de me lembrar disso, doutor Roger.
— Então não acha que deveria levar seu cargo aqui na empresa mais a sério? —
repreendeu-me com severidade. — Olha só suas roupas... — Desdenhou do meu velho
jeans, camiseta branca e tênis. — Não poderia ter vindo de terno como os demais
acionistas? Sem falar no atraso de vinte minutos. Gabriel, você, além de meu sucessor
na M.B., também é o diretor financeiro dessa empresa. Não pode continuar levando
tudo na brincadeira desse jeito.
— Pai, o senhor está longe de se aposentar e independentemente dos meus
atrasos e a roupa que visto, venho cumprindo com todas as obrigações referentes ao
meu cargo. — Bufei. — Na verdade, também tenho outras coisas com que me ocupar.
— Como as inúmeras festas em sua casa?
— Droga! Aposto que aquela abelhinha de ferrão afiado veio fazer fofoca da
minha vida pessoal de novo.
Estava cansado da minha vizinha e diretora de marketing da M.B., a qual eu, às
vezes, nem me lembrava direito o nome, se meter em minha vida. Ela devia era cuidar
de si. Sempre que tinha uma festa em minha casa, confesso que quase todos os dias,
acabávamos discutindo e ela levava a minha noite de farra quentinha para os ouvidos de
meu pai.
— Isso não tem nada a ver com Anna. Acho até que ela desistiu de reclamar. —
Suspirou fundo. — Sabia que sua mãe está cada dia mais desapontada com você?
— Pô, pai! Falar da dona Cora é covardia. — Arquejei.
Desde criança eu e minha mãe tínhamos uma ligação muito forte. Em tudo que eu
fazia, ela sempre depositava confiança e esperança em mim. A última coisa que queria
na minha vida era deixá-la decepcionada e tinha consciência de que isso vinha
acontecendo com uma certa frequência, desde que resolvi mudar meu estilo de vida.
— Você precisa criar juízo, filho. Ou melhor, encontrar o seu, que perdeu desde
que Tábata fez aquilo com você.
— Pai, na hora certa eu vou assumir meu lugar, por enquanto não há necessidade
disso. O senhor está vendendo saúde e não pretende se aposentar tão cedo. Deixe-me
aproveitar minha vida do meu jeito. No momento correto vou estar preparado. —
Ofeguei.
— As coisas não são tão simples assim, Gabriel. E você sabe disso. O CEO e
proprietário de uma empresa precisa entender o funcionamento dela nos mínimos
detalhes e você tem sido muito relapso quanto a isso.
— Tudo está indo bem com a empresa, ela está cada vez mais próspera. Eu
tenho cumprido com os deveres da minha função, apesar de tudo. O que mais o senhor
quer de mim?
— Que você seja um exemplo.
— Eu não tenho filhos, não preciso ser um exemplo para ninguém. — Arqueei
as sobrancelhas.
— Gabriel, um homem de bem não precisa ser só um exemplo para seus
dependentes e sim para toda a sociedade em que vive.
— Eu sou um homem de bem. As pessoas não têm nada a ver com a vida que
levo e as farras que faço. O que elas querem de mim, afinal, para se meterem tanto em
minha vida?
— Que você siga os passos de seu pai e se torne um homem honrado e
respeitado, assim como ele.
— Pois eu me sinto muito bem como estou e não pretendo mudar isso tão cedo.
Eu amo a vida que levo.
— Sabe do que você precisa, filho? Casar e ter filhos.
— Nem fodendo, pai! — Ele me repreendeu com o olhar por causa do palavrão
proferido. — Desculpa, saiu sem querer.
— Pois eu acho que isso te faria muito bem. Era tudo o que você queria e
sonhava até aquela maluca te abandonar e usar como desculpa o fato de você trabalhar
demais.
— Fala sério, doutor Roger!
— Você não pode continuar nessa vida promíscua, Gabriel.
— Por que não? É assim que eu gosto de viver!
— Como sua mãe bem disse várias vezes: porque se trata de uma fuga. Você tem
medo de se apaixonar e ser ferido mais uma vez. Não quer passar pela dor de ser
abandonado de novo. Então fica dizendo que ama sua vida de farra e não vai deixá-la
nunca.
— Pai...
— Tábata era uma destrambelhada, filho. Qual mulher não sonha em encontrar
um príncipe encantado, um homem trabalhador, honesto e que pense em construir um
futuro ao seu lado? Aquela moça não é normal, deve faltar alguns parafusos nela.
— O senhor sabe que eu não gosto de falar sobre isso. Esse é um assunto só
meu. Eu sou o único que sei e conheço a dor pela qual passei.
— Nem todas as mulheres são iguais a sua ex, sabia? Escute o que eu digo,
case-se com uma boa moça, tenha filhos com ela e volte a ser o rapaz responsável que
foi no início da carreira. Você só tem a ganhar com isso.
— Ficou louco, velho? Eu não vou me casar jamais, me tornei um solteiro
convicto.
— Isso te faria muito bem, eu garanto.
— Não. — Balancei a cabeça. — Sem chance. Não pretendo me casar e muito
menos ter filhos.
Não fazia parte dos meus planos de vida me prender a uma mulher. Se eu podia
ter várias, até ao mesmo tempo, na hora e dia que eu quisesse, por que iria me prender a
apenas uma? Para depois ela se cansar de mim por ser tão certinho e me abandonar
como Tábata fez?
— Então, quer dizer que o legado dos Montenegro Bittencourt acabará em você?
— Olhou-me de soslaio. — Sim, porque eu e sua mão não podemos ter mais filhos e
você se recusa a nos dar netos.
— Pai, me dizer essas coisas não está ajudando muito.
— Dizem que um pouco de chantagem emocional costuma funcionar.
— Quer saber? Eu vou nessa. Tenho alguns papéis para assinar, depois volto
para casa para planejar minha festa de hoje à noite.
— Está fugindo de novo, Gabriel?
— Se o senhor acha isso.
— Ouça a voz da experiência, filho. Eu sei o que estou te dizendo. —
Acrescentou. — Promete, pelo menos, pensar no assunto?
— Tchau, pai. — Virei-me de costas e deixei sua sala. Eu não queria mais
continuar aquela conversa que não nos levaria a lugar algum.
Anna...

— Pensando na morte da bezerra? — Laís, minha tia, chamou minha atenção me


tirando da minha bolha de pensamentos.
— Oi! — respondi sem graça ao ter sido pega no flagra, observando sua filha,
minha prima Suelen e Rafael, seu atual namorado, que, por obra do destino é meu ex,
namorando no jardim da frente da casa da minha avó, em mais uma reunião de família.
As coisas entre nós sempre foram assim. Aquela típica briga de família: a
bonita versus a inteligente. No meu caso, eu era a segunda opção, pelo menos na
opinião dos meus parentes. Não que ser loira dos olhos azuis e de boa aparência me
tornasse feia, mas a outra era o tipo rata de academia e frequentadora assídua de salões
de beleza e isso fazia com que chamasse bem mais atenção do que eu.
Se fosse só isso até que estava tudo bem, o ruim é que ela sempre tomava meus
namorados, desde a adolescência.
E se empenhava muito para isso.
Sempre teve uma inveja sórdida de mim, alimentada sem pudores por sua mãe, e
que não faço ideia de como e nem por que começou. Talvez seja pelo fato de eu ter me
tornado órfã de pai e mãe aos oito anos de idade e ter sido criada desde então por
minha avó, Eugênia, me tornando assim a neta preferida.
— Se ver essas coisas te incomodam ou deixam triste, você deveria deixar de
vir as reuniões de família. — Ela parecia se divertir com suas palavras dissimuladas.
— E parar de trazer seus namorados aqui. Você sabe que Suelen chama muito mais
atenção do que você e ganha todos.
— Não vir ver minha avó e deixar o caminho livre para você e sua filhinha a
explorarem, não é mesmo, titia!?
— Laís, deixe Anna em paz! — Ouço a voz de minha avó, dona Eugenia, a
repreendendo.
— Eu não disse nada demais, mãe. Só estou sendo sincera. — A mulher
continuou destilando seu veneno. Juro que se ela não fosse minha tia e eu não tivesse
sido tão bem-criada por dona Eugênia, aprendendo a respeitar os mais velhos, daria uns
bons tapas nela.
Ao que me consta, minha tia também travava a mesma disputa com minha mãe
quando eram mais jovens. Só que com elas era o contrário, quem ganhava a atenção dos
garotos era minha genitora, mas diferente de Suelen nunca foi capaz de tomar os
namorados da irmã. Entretanto, mesmo não tendo a atenção dela, eles acabavam se
separando da outra por não aguentarem sua amargura. Dizem até que Laís era
apaixonada pelo meu pai, porém ele nunca se interessou por ela, que se sentia, de certa
forma, vingada por sua filha fazer isso comigo e por isso alimentava nossa disputa.
— Deixa, vó — falei meio a contragosto, tentando demonstrar indiferença. —
Eu já estou acostumada com a falta de filtro dela.
— Tem certeza de que não se incomoda mesmo? — perguntou com afronta.
— Sim. Na verdade, acho que essa disputa que Suelen trava comigo é, no
mínimo, infantil e já não me atinge mais. — Garanti, mas ela não parece acreditar
muito.
— Quer dizer que então você não se importa por todos os seus namorados te
trocarem pela minha filha? — inquiriu, fingindo interesse.
— Não. — Menti, descaradamente, porque bem lá no fundo isso é algo que me
incomoda muito.
— Desse jeito, se continuar trazendo seus namorados aqui, Suelen, com sua
beleza descomunal, vai te roubar todos eles e você vai acabar morrendo solteira. Não
tem desejo de se casar e ter filhos? — Especulou, me deixando incomodada.
— No momento adequado a pessoa certa vai surgir. — Simulei um sorriso e
tento mudar de assunto. — E a senhora, parou de comer doces escondidos, não é
mesmo, vozinha?
Minha avó já tem mais de setenta anos e tem diabetes. A doença está controlada
e ela costuma tomar os remédios direitinho, mas de vez em quando faz arte e come doce
escondido, chegando até a deixá-los no guarda-roupas para não descobrirmos.
— De vez em quando. Um docinho não faz mal a ninguém, minha filha —
justificou-se com um olhar de dar pena.
— Ai ai ai, dona Eugênia. — Brinquei com ela.
— Espero que essa pessoa certa apareça logo para você, Anna. — Engasguei ao
ver minha tia voltar ao assunto anterior sem qualquer cerimônia. — Mas acho melhor
você não trazê-lo aqui. Os homens sempre preferem beleza à inteligência.
— Quê? — indaguei, incrédula.
— Eu estou me solidarizando contigo. — Ela disse, com olhar de pena — Sei
bem como é ser a inteligente da família e não a mais bonita. Passei por isso. Minha
sorte é que Thais caiu de amores por Alfredo e se casou logo. Senão eu teria morrido
solteira, como parece que vai acontecer com você.
— Olha, tia Laís, caso a senhora não saiba, eu não estou à procura de um
marido — falei bruscamente — Com a minha inteligência eu consegui o emprego dos
meus sonhos, com um salário maravilhoso, e com ele posso me sustentar sozinha. Não
preciso de um namorado para ser feliz e viver a vida que quero e sonho. Não necessito,
como certas mulheres bonitas — disse, fazendo alusão a Suelen —, que se quer
terminaram seus estudos, de homem para me sustentar. Sou uma mulher empoderada e a
frente do meu tempo. Nem tudo se resume a namoro ou relacionamento.
— Quanta ignorância! — Fingiu estar ofendida — Não está mais aqui quem
falou. Eu só queria ajudar.
— Dispenso a sua ajuda! Desculpa, vó, mas já vou embora para a minha casa.
Essa reunião de família já deu no que tinha que dar. Eu passo aqui durante a semana
para te ver mais uma vez. — Abracei-a e beijei sua testa com carinho. — Passar bem,
tia Laís! — Estreitei os olhos e saí da sala, batendo a porta na cara dela.
Anna...

Em definitivo, aquele não era o meu dia. Além de ter que aguentar as asneiras e
indiretas da minha tia Laís, assim que entrei na rua da minha casa, que ficava em um
condomínio de luxo, logo vi que meu vizinho insuportável estava dando outra festa.
Meu deus, será que esse homem não se cansa dessas festas quase todos os
dias?
Há três meses, depois de poupar grande parte do salário, que ganhei como
diretora de marketing da M.B. Papel e Celulose, realizei o sonho da minha casa
própria. Minha primeira aspiração alcançada foi meu carro alguns meses antes, um
Renault Captur Intense, e depois comecei a guardar para a moradia. Queria muito ter
um canto para chamar de meu e que tivesse a minha cara, além de não suportar mais
morar no mesmo teto da minha prima ladra de namorados. Meu desejo era trazer minha
avó comigo, entretanto ela alegou que não podia deixar minha tia e Suelen sozinhas,
pois ambas moravam na casa dela desde que a primeira ficou viúva.
Eu só não esperava me tornar vizinha de um playboy mimado, que vivia na farra
e fazia festas quase todos os dias perturbando o meu sossego. A bagunça só não rolava
quando ele saía de casa à noite para “caça de mulheres”, ou o festim acontecia na
residência de alguma outra pessoa, mas ele sempre voltava acompanhado. Pensei várias
vezes em vender o local onde morava e comprar outro em lugar mais tranquilo, porém
sua audácia, petulância e insistência em me provocar mexeram com a minha vaidade e
resolvi comprar essa briga. Jamais daria a ele o gostinho de achar que havia vencido a
guerra.
O pior é que o mulherengo, farrista e intragável que morava ao lado da minha
casa era ninguém mais, ninguém menos que o filho do meu patrão, o herdeiro da
empresa em que eu trabalhava. Um cara muito irresponsável, que só queria saber de
badernar, cada dia estava com uma mulher diferente, às vezes até mais de uma, sempre
chegava atrasado no trabalho e eu arrisco dizer que só ocupava o cargo de diretor
financeiro porque seu pai era o todo poderoso da MB papel e celulose.
Chamar a polícia para o filho do chefe e correr o risco de perder meu emprego
não estava nos meus planos. No começo até tentei tirar proveito dessa situação e
reclamar dele para o meu patrão, ver se assim ele parava com as festas ininterruptas,
mas foi tudo em vão. Acabei desistindo e hoje o enfrento no tête-à-tête. Nossas
discussões chegam a ser memoráveis, em especial quando saio do sério e dou uma de
louca.
Já era tarde da noite, meio da madrugada, e a festa continuava a todo vapor. Os
convidados do meu vizinho começaram a invadir a varanda e o terreno em volta da
minha casa para transar, usar drogas e algumas coisinhas a mais. E eu continuava sem
conseguir dormir por mais uma noite. Lembrei-me que daí a três dias começariam
minhas férias e, enfim, eu poderia ter meu merecido descanso, pois poderia, pelo
menos, dormir durante o dia, já que a noite o cara da casa ao lado não estava
colaborando e nem disposto a deixar. Entretanto, essa informação não foi suficiente
para me segurar e, irritada, saí de casa pronta para a carnificina, disposta a tudo para
acabar logo com aquela balburdia.
Passei pela porta da casa dele, que estava aberta para que seus convidados
pudessem transitar à vontade pelo local, e caminhei firme em sua direção, desejando
que ele fosse direto para o inferno.
Quem diabos ele achava que era para que seus amigos invadissem meu
espaço? Já não bastava perturbar o meu sossego?
— Dá para você tirar os seus convidados do terreno e da varanda da minha
casa? — Ele olhou para baixo, na verdade bem para baixo, já que era bem mais alto do
que eu, para me encarar com uma expressão de quem não estava entendendo nada.
— O que você disse? Por que está no meio da minha festa vestida desse jeito,
abelhinha? A festa não é do pijama.
Só então me dei conta de como estava vestida. Eu estava deitada, tentando
dormir quando minha varanda foi invadida por uma fulana que mais parecia uma gata no
cio, miando alucinada a cada estocada que recebia. Foi então que percebi o terreno da
minha casa sendo invadido pelos frequentadores da festa do meu vizinho. Fiquei tão
irritada com a situação, que me levantei e nem lembrei de trocar de roupa antes de
invadir sua festa. Sorte que não estava usando nenhuma das minhas camisolas mais
sensuais e sim em discreto pijama composto por short e camiseta regata.
— Não pedi sua opinião sobre o que eu estou trajando. O meu traje é mais
bonito do que muitas roupas das suas convidadas oferecidas. E antes que eu perca as
estribeiras e te dê uns tapas, acho bom você tirar seus amigos da minha varanda e do
terreno que pertence à minha casa ou vou esquecer que você é o filho do meu patrão e
vou chamar a polícia. — Após dar o meu recado em alto e bom som para todos os
presentes ouvirem, dei as costas e saí.
— Você pode se vestir como quiser. Aliás, seu pijama é lindo e me deixou cheio
de tesão. Mas não é de bom tom ir à festa dos outros com roupa de dormir, abelhinha.
Eu já estava quase deixando sua casa quando ele resolveu fazer mais aquela
provocação, me tirando do sério.
— Eu já falei para você parar de me chamar desse apelido ridículo. Eu tenho
nome, sabia?
— E não é isso que você é? Uma abelhinha do ferrão afiado sempre pronta e
disposta a me ferroar?
— Quer saber? Eu não vou mais discutir com você. O meu recado está dado. Se
não quer que eu o denuncie a polícia e resolva o problema a minha maneira, melhor
fazer o que eu mandei. — Ameacei.
— Nossa, que medo de você!
— Não brinque comigo, Gabriel Montenegro Bittencourt. Você não sabe do que
eu sou capaz. Até agora tenho evitado um confronto direto por respeito ao seu pai, que
me é um homem incrível. Entretanto, se eu perder as estribeiras contigo para valer, nada
vai me segurar, mesmo que isso me custe o emprego e cargo dos meus sonhos — falei
tentando não demonstrar fraqueza, nem deixar transparecer que aqueles eram os meus
maiores medos e que só por isso ainda não tinha tomado nenhuma providência a
respeito. — O que seus convidados estão fazendo é invasão de privacidade e
domicílio, além do uso de algumas “coisinhas ilícitas”. — Fiz sinal de aspas no ar. —
Se não quer ficar enrascado com as autoridades, melhor tirá-los de lá e acabar logo
com essa algazarra e me deixar dormir em paz.
— Você está mesmo falando sério?
— Seríssimo, vizinho! Eu não tenho paciência para joguinhos e você já deveria
ter descoberto isso nesses três meses, desde que me mudei para cá.
— Quem é essa mulher, Biel? — Uma loira deslumbrante, daquelas de capa de
revista, indagou ao se aproximar e segurar em seu braço.
— A minha vizinha chata. — Ironizou.
Todos na sala me olharam, medindo forças contra mim.
— Muito prazer, eu sou a vizinha chata, louca e empata-foda e farra de todos
vocês. — Levantei o olhar, deixando claro que não estava nem aí para a opinião que
tinham a meu respeito. — Nos vemos amanhã na empresa, querido vizinho.
Saí de lá sem dizer mais nada, deixando todos de boca aberta.
Meu ataque de loucura acabou surtindo efeito. Pela janela da minha sala pude
ver o pomposo Gabriel Montenegro Bittencourt reunir todos os seus convidados na sala
e acabar com a festa. Aos poucos todos foram se despedindo e batendo em debandada.
Só não vi a loira, que havia conversado com ele na sala, ir embora; com certeza eles
iriam passar a noite juntos.
O que me importa? Que faça bom proveito.
Estava se achando a última bolacha do pacote e seria descartada na manhã
seguinte, como todas as outras. Isso era típico daquele playboy idiota e engomadinho,
cada dia uma mulher diferente. Pelo menos agora eu poderia dormir em paz.
Anna...

Por volta das seis horas da manhã, em plena segunda-feira, antes de ir trabalhar,
abri a porta da minha casa e, irritada, fui limpar a bagunça que os vândalos, que
estavam na casa do meu vizinho na noite anterior, haviam deixado em minha varanda.
Tinha de tudo um pouco: camisinhas, bitucas de cigarro, latas de cerveja, entre outras
coisas.
Quem diabos eles achavam que eram para, além de perturbar minha paz,
deixar toda aquela bagunça no meu quintal?
Irritada, comecei a jogar tudo para o lado dele. E se ele viesse me encher o
saco, iria chutar sua bunda para aprender a nunca mais torrar minha paciência e me tirar
do sério. Eu já havia chegado ao meu limite e suas provocações não estavam ajudando
muito. Uma hora eu explodiria de vez e ele teria o que estava procurando e sem direito
a reclamar de nada.
Gabriel Montenegro Bittencourt era um homem lindo, o sonho de consumo de
dez entre dez mulheres, aquele tipo que molha calcinhas só de olhar: alto, corpo
definido, sorriso perfeito e cativante, cabelos e olhos castanhos, mas se achava o
máximo e acreditava que todas as pessoas deveriam se curvar diante dele e estender um
tapete vermelho para que ele passasse. Suas atitudes eram levianas e egocêntricas,
assim como a sua mania de se achar irresistível. E, para minha falta de sorte, era meu
vizinho. Eu não estava disposta a renunciar à casa dos meus sonhos, mas para que isso
não acontecesse, teria que arrumar um jeito de colocá-lo na linha. Como? Ainda não
sabia.
A vontade que eu tinha era de chutar suas bolas com tanta força que o deixaria
vendo estrelas. Seria um prazer vê-lo sofrer, se estrebuchando de dor. Continuei
jogando toda a sujeira de seus convidados no terreno se sua casa, fazendo questão de
fazer bastante barulho. Queria acordá-lo na marra e contemplar sua cara quando visse o
que eu estava fazendo.
— Bom dia, vizinho. — Cumprimentei-o formalmente, assim que abriu a porta
de sua casa e veio em minha direção.
— Que merda, abelhinha! De novo, não. O que você pensa que está fazendo? —
Aproximou-se irritado ao ver o lixo que eu estava jogando no seu terreno.
— Quantas vezes vou precisar dizer para parar de me chamar desse apelido
ridículo? E eu estou apenas devolvendo o lixo para o dono dele. — Sorri com ironia.
— Pelo jeito, além da vizinha chata, maluca e empata-foda, agora você também
se tornou vingativa. Resolveu sujar toda a área da minha casa só porque tem inveja e
não suporta a minha vida livre e feliz?
— Faz-me rir. — Gargalhei. — Que motivos eu teria para ter inveja de alguém
como você? Um cara que só sabe usar as mulheres e ainda vive como se fosse um
garoto irresponsável de quinze anos.
Em um piscar de olhos, Gabriel já estava quase no meu quintal, vindo em minha
direção, pisando duro, pronto para tirar satisfações, quando fiz uma careta observando
a loira, que não vi ir embora de sua casa ontem, sair pela porta de sua residência e
revirei meus olhos com a constatação de que estava certa e eles tinham passado a noite
juntos de fato. Ele parou onde estava e gargalhou ao notar minha reação. De repente, foi
a vez de uma morena sair lá de dentro e logo em seguida uma ruiva.
— Três? — perguntei, irritada, mais para mim mesma do que para ele. Na
verdade, foi mais um pensamento que não deveria ter saído em voz alta.
— Não vai me dizer que você achou mesmo que tinha acabado com a minha
noite e empatado de vez a minha foda?! — Olhou-me de forma estranha. — A ceninha
que você fez foi até melhor para mim porque pude fazer uma festinha particular e
extravasar a raiva que você me fez passar. E, se quer saber a verdade, foi a melhor
coisa que fiz. As três são demais e foi muito excitante observá-las se pegando entre si.
Em certo momento, até me peguei pensando que se estivesse aqui, você iria gostar de
participar da nossa orgia.
Nervosa com sua audácia, lancei com força a pá que estava segurando na sua
direção. Pegou no seu braço e o vi empertigar-se de dor. Acertei em cheio.
Quem ele pensava que era para falar daquela maneira comigo, como se eu
fosse uma qualquer?
— Que isso, abelhinha? Não sabe brincar, não brinca, garota.
— Experimente insinuar algo do tipo de novo para ver o que eu faço com você.
Eu te capo sem dó, seu idiota. — Ele semicerrou os olhos, como sempre costumava
fazer quando o ameaçava daquela maneira. — Agora se me der licença, vou entrar e me
arrumar porque as nove horas teremos reunião na empresa e, ao contrário de você, o
senhor irresponsável, que faz isso sempre, e tenho certeza de que fará hoje de novo, não
quero me atrasar. — Encarando-o, joguei o último saco de lixo para o lado da casa dele
e saí plena, andando em direção a entrada de minha.
— Hoje se eu me atrasar, abelhinha, a culpa será sua e terei prazer em contar
isso para o meu pai. Dessa vez vou ser eu que vou te entregar e, ao contrário de mim,
que sou filho do dono da M.B., você poderá ser despedida por isso. — Ouvi-o gritar e
me ameaçar assim que adentrei em minha sala e fingindo não o ouvir, bati a porta na sua
cara.
Bingo! Eu sabia que falar aquilo iria afetá-lo em cheio. Gabriel Montenegro
Bittencourt era o tipo de homem que não aguentava ter a verdade jogada em sua cara
daquela maneira. Mais uma vez eu havia conseguido desconcertar e deixar sem
palavras o playboy irresponsável que morava na casa ao lado da minha, fazendo-o ficar
sem palavras. Ele agiu como um adolescente, fazendo ameaças infundadas.
Nossa discussão e o fato de eu ter-lhe devolvido o seu lixo, perto de tudo o que
ele costumava fazer, com certeza, não seria justa causa para me fazer perder o emprego,
mesmo partindo do filho do dono da empresa. O doutor Roger era um homem justo e já
estava cansado da insensatez do filho.
Gabriel...

Depois da briga com minha vizinha e da reunião estressante de segunda-feira


para analisar planilhas da empresa, resolvi tirar um tempo para descansar e não fui a
M.B. pelo restante da semana. Deleguei poderes ao meu assistente, Almir, e fiquei em
casa me divertindo nas festas dadas nas moradias de meus amigos. Resolvi dar um
tempo das festas em minha residência.
Vai que a louca da abelhinha resolve cumprir suas ameaças.
Entretanto, continuo trazendo mulheres para transar. A cara dela ao ver cada dia
uma beldade diferente deixando a minha casa é impagável. Continuo me divertindo
muito com isso.
Essa noite será o aniversário da minha mãe, a linda e elegante Cora Montenegro
Bittencourt. Para variar, me encontrarei com meu pai e tenho certeza de que ele vai ler
um sermão enorme para mim, por conta da minha ausência e o não cumprimento das
minhas funções. Para me preparar melhor, me concentrar e enfrentar a fera, resolvi
relaxar ouvindo uma boa música. Coloquei meus fones de ouvido bluetooth, escolhi
uma playlist e me deitei em um dos confortáveis sofás da minha sala. A campainha soou
e ouvi barulho de pneus de carro cantando em minha porta. Assustado, fui ver o que
estava acontecendo.
— Papai! Papai! — Ao abrir a porta me deparei com uma linda garotinha de
cabelos loiros, com os bracinhos estendidos em minha direção.
— Hei! Quem é você, menininha? — Tirei meus fones de ouvido e me abaixei
para ficar da sua altura.
— Belinha, papai! — Colocou a mão no meu rosto e entortou o pescocinho para
o lado.
— Deve estar havendo algum engano, lindinha. Eu não tenho uma filha, mas
posso te ajudar a encontrar o seu pai. Como ele se chama?
— Gabiel. — Fez uma caretinha linda. — Vochê é o papai de Belinha.
— Isso é uma brincadeira? — Levantei-me e gritei ao léu. — Se for, é de muito
mau gosto e quem estiver fazendo isso já pode sair do seu esconderijo. Não estou vendo
graça nenhuma nisso.
— Papai, não gota de Belinha. — A criança começou a chorar sem parar.
— O quê? — Abaixei-me mais uma vez, sem saber o que fazer diante daquelas
lágrimas, e a peguei no colo. — Não é isso, fofinha. O tio Gabriel gosta de você, sim.
Mas ele não é seu papai porque ele não tem filhos.
Ela suspirou e se recompôs. Coloquei-a no chão, cruzei meus braços na frente
do peito, esperei que ela se acalmasse ainda mais e parasse de vez de chorar.
— Num é tio Gabiel. — Gesticulou com as mãozinhas, fazendo uma pausa
dramática que deu um tom encantador a cena. — É papai Gabiel.
— Olha, vamos fazer o seguinte: me diz o nome do seu pai e da sua mãe que eu
te ajudo a procurá-los.
— Tatata e Gabiel, uai. — falou indignada, fazendo gestos com a mão.
— Como? — questionei-a mais uma vez sem entender direito o que ela tentava
me dizer.
Pelo jeito o nome do pai dela era o mesmo que o meu, talvez por isso ela
estivesse fazendo confusão, e o da mãe talvez fosse Renata ou algo parecido. A
garotinha encantadora a minha frente deve ter se perdido e ao procurar por seu
progenitor deve ter dito que o nome dele é Gabriel e algum vizinho de mente brilhante
deve ter falado para ela bater a minha porta. Não duvido nada que seja a abelhinha
querendo me ferroar com mais uma das suas peças. Foi então que ela andou até uma
pequena mala de roupas em um canto da minha varanda, que eu ainda não tinha notado
ali, e pegou um bilhete e me entregou.

“Querido Gabriel,
Desculpe-me ter sumido por 3 anos.
Muita coisa aconteceu nesse tempo.
Entre elas Maria Isabel, nossa filha.
Estou indo embora do país para um trabalho internacional e não terei mais
como cuidar dela.
Está na hora de você assumir suas obrigações e direitos de pai.
Não sei se volto e nem quando.
Cuide bem dela.
Com carinho,
Tábata.”

Encarei a garotinha que esticava aos bracinhos em minha direção. Vi-me sem
reação, mas senti algo tocar dentro de mim com a cena. Fiquei com raiva e indignado
com a filha da puta da minha ex por abandonar aquela criança na minha porta após sair
da minha vida sem maiores explicações, deixando apenas um bilhete.
Peguei a criança pela mão, coloquei-a dentro do meu carro e segui até a entrada
principal do condomínio a procura de Tábata, que parecia ter evaporado ou
desaparecido como fumaça. Os guardas da guarita me encaram espantados e
confirmaram a história da menininha. Havia sido aquela maldita que tinha deixado a
garota na minha porta mesmo. Voltei para a minha casa com a menininha, indignado,
perdido e sem saber o que fazer.
Parecia que tudo ao meu redor estava girando e que eu havia ingressado em uma
outra dimensão. Uma garotinha abandonada, sozinha, chorando, na minha porta....
Peguei-a no colo e coloquei para dentro junto com sua pequena mala cor de rosa
e me joguei no sofá, sem reação, apenas observando a pequena criatura que também me
observava, porém bem assustada, com enormes olhos castanhos. Uma lágrima perdida
escorreu pelo seu pequeno e delicado rosto e senti como se uma faca estivesse sendo
fincada em meu coração.
Levantei-me, andei até ela, sentando-me ao seu lado e acariciei seus cabelos
claros, sentindo a suavidade e maciez. Aos poucos nós dois fomos nos acalmando.
Respirei fundo várias vezes, enquanto Belinha me encarava com devoção. Pensei em
chamar a polícia, depois mudei de ideia e pensei que talvez fosse melhor fazer primeiro
o exame de DNA.
Será que ela era mesmo minha filha?
Olhando melhor pude perceber alguns traços e trejeitos muito parecidos com os
meus, mas poderia ser coisa da minha cabeça.
E se ela for mesmo minha? O que eu vou fazer?
Inclinei a cabeça para o lado, observando-a com mais atenção. Resolvi que o
melhor seria fazer primeiro o exame de DNA só para me certificar. Independentemente
do resultado, sendo positivo ou não, talvez fosse melhor eu entregar aquela doce e
assustada garotinha para adoção, já que eu não tinha a menor condição e muito menos a
intenção de ser pai naquele momento.
Esfreguei as mãos no rosto me sentindo perdido. Lembrei-me do fatídico dia em
que Tábata me abandonou e de como eu desejei ter morrido a passar por aquilo tudo.
Levantei-me de súbito com as lembranças, sentindo muita raiva de mim mesmo. Eu não
queria a responsabilidade de me tornar pai. Ter uma família estava fora de cogitação.
Como minha vizinha mesmo vivia repetindo, eu era um playboy irresponsável sem
qualquer condição de dar um lar aquela linda e encantadora criança.
Pedi licença a ela, que continuava me observando assustada, sem nada dizer e
fui até o banheiro jogar um pouco de água em meu rosto. Encarei-me no espelho e o meu
reflexo não se parecia em nada com o de um homem que seria um bom pai. Eu não
estava preparado para aquilo.
Voltei para a sala e após sentar-me novamente, a garotinha se aproximou de mim
com seu jeitinho faceiro, subiu em meu colo e rodeou seus braços no meu pescoço,
abraçando-me e derrubando todas as minhas barreiras erguidas. Abri a boca para falar
alguma coisa e pedir para que se afastasse, mas ela se aconchegou um pouco mais,
distribuindo pequenos beijos estalados pela minha face. E eu fiquei ali com ela em
meus braços, me sentindo perdido.
Pressionei meus dentes com força tentando aplacar a frustração. Minha vontade
era sair atrás de Tábata até encontrá-la e devolver o pequeno pacote que deixou em
minha porta, mas como fazer isso se eu não sabia onde ela estava e nem para onde tinha
ido.
O que eu faço agora, meu Deus?
Gabriel...

Com Belinha, minha suposta filha, nos braços subi e desci os degraus da entrada
da casa de Anna várias vezes. Talvez seja melhor desistir, mas ao mesmo tempo não
tenho a quem recorrer, então volto a subi-los. Tenho que ir ao aniversário da minha mãe
e não posso, do nada, chegar lá com a garotinha no meu colo e dizer que é minha filha.
Primeiro, preciso me certificar através do exame de DNA. Vai que tudo não passa de
uma piada de mau gosto de Tábata.
— Vamos lá, Gabriel, coragem! — sussurrei com meus botões sendo observado
por Maria Isabel. — O pior que pode acontecer é ela dizer não e se negar a ajudar. Se
isso ocorrer você ainda pode tentar argumentar e, em último caso, tem a opção de
implorar. Sinceramente, espero não ter que chegar a esse estremo. Torço para que a
mulher seja emotiva e caia de amores pelas caras e bocas encantadoras que a criança
faz.
Ainda estou criando coragem, quando a porta se abre e seus enormes olhos azuis
me fitam desconfiados.
— Posso saber o que você está fazendo há um tempão na porta da minha casa,
subindo e descendo esses degraus? — perguntou rudemente. — Quem é essa criança?
— Apressou-se em dizer, estranhando a cena a sua frente.
Por que eu resolvi insistir nisso? O que estou fazendo aqui se sei que ela me
odeia e, com certeza, não vai querer me ajudar?
— Na verdade, eu... nós, queremos falar com você — falei apontando para
Belinha, que sorriu para a mulher a nossa frente. — Precisamos de um favor seu.
— Um favor? — Percebi surpresa em seu olhar.
— Isso mesmo. Preciso que você fique com a filha do meu amigo essa noite...
— Menti, afinal ela não precisava saber que a garotinha era minha possível filha.
— Está de brincadeira comigo, não é mesmo? — Interrompeu-me, com um tom
debochado. — Eu nem conheço seu amigo. Por que faria um favor a ele?
— Não. Estou falando sério. É só até eu voltar do aniversário da minha mãe, aí
eu venho aqui e a pego com você.
— Não! — Foi direta e começou a fechar a porta.
— Por favor, me deixe, ao menos, te explicara situação — implorei, me
sentindo humilhado. Pelo jeito eu teria que abrir o jogo sobre a suspeita de paternidade
para convencê-la a me ajudar.
— Eu acho bom você ter um bom motivo para estar me incomodando nas minhas
férias ou vou colocá-lo daqui para fora aos chutes — ameaçou.
Ela abriu espaço para nós e entramos em sua casa. Observei e admirei a
decoração de muito bom gosto, enquanto, sem se alterar, ela me olhava com
curiosidade.
— Anna, eu preciso mesmo da sua ajuda. — Senti-me meio estupido repetindo
aquilo.
Ela se sentou em uma poltrona confortável e me convidou para me abancar no
sofá de dois lugares a sua frente. Acomodei-me ainda com minha suposta filha em meu
colo, aconchegando-a em minhas pernas e fiz um carinho em sua cabecinha.
— Aceita um café? — Ofereceu com educação.
Percebi que ela nos encara com curiosidade e prestando bastante atenção a cena
que se desenrolava entre mim e Belinha. Parecia não acreditar no que via. Qual o
problema? Eu não posso gostar de crianças?
— Claro! — respondi sincero, tentando ganhar tempo e achar uma maneira de
convencê-la a ficar com a criança e contar a verdade sem causar muito impacto.
Anna saiu da sala para buscar o que me ofereceu e eu fiquei de boca aberta
admirando seu rebolado dentro do minúsculo short que estava usando. Tinha que
admitir, apesar de chata, ela era muito linda e gostosa. Alguns minutos depois, minha
vizinha retornou, entregou-me uma xícara e voltou para seu lugar com outra.
— Obrigado. — Agradeci e tomei um longo gole do líquido que estava
delicioso. — Então — Criei coragem e comecei a falar, disposto a contar toda a
verdade. —, como te disse no início, eu preciso de um favor seu. — Prossegui com
minha fala. — Belinha é minha filha.
— Oi, tia beinha! — A garotinha enfim se manifestou, sorrindo e acenando a
mãozinha. Chamando-a pelo apelido que ela detesta e que eu caí na bobeira de falar
para a minha filha na tentativa de fazê-la aceitar ficar na companhia de Anna.
Minha vizinha se engasgou com o café e começou a tossir sem parar.
— Você está bem? — Bati em suas costas, enquanto ela levantava os braços
para o alto, tentando conter a tosse.
— Como eu posso estar bem depois dessa bomba, que me contou!? — Foi
efusiva.
— Entendeu agora por que preciso que você fique com ela para eu ir ao
aniversário da minha mãe? Ela foi deixada hoje na porta de casa com um bilhete. —
Olhei para o teto pensando no que dizer. — Posso te contar os detalhes com mais tempo
depois, se quiser. Sei que já tivemos muitos desentendimentos e você tem todo o direito
de ter raiva de mim, mas não posso chegar à casa dos meus pais com essa criança e do
nada dizer que é minha filha.
— E por que, não? Tenho certeza de que sua mãe vai adorar saber que é avó de
uma linda garotinha.
— Não é tão simples assim, Anna. Antes tenho que ter certeza da paternidade e
de que isso não é uma brincadeira de mau gosto que está sendo feita comigo.
— Nada feito. — Sacudiu a cabeça enfaticamente. — Resolva você os seus
problemas. Peça ajuda as suas amigas, frequentadoras das suas festas.
— Tia beinha não gota de Belinha. — A garotinha começou a chorar e por
instinto Anna estendeu os braços para ela, que se jogou em seu colo.
— Não, meu amor, a tia Anna gosta de você; ela não se dá bem com o seu pai, é
diferente. — Acariciou o cabelinho da menina, que logo se acalmou.
— Ótimo, vou deixar vocês duas sozinhas para que se entendam. — Falei e, me
aproveitando da situação, resolvi jogar um pouco sujo para conseguir o que eu queria e
fui saindo da sua casa. — Eu preciso ir, já estou atrasado.
— Gabriel Montenegro Bittencourt, volta aqui agora. — Ela saiu gritando atrás
de mim. — Eu não disse que ficaria com a menina. A filha é sua e você tem que ser
responsável pelos seus atos. Volta aqui agora.
— Eu prometo que volto logo e a busco — gritei — Depois faço o que você
quiser, Anna. Até te pago se for preciso. — Entrei no meu carro e dei partida antes que
ela me alcançasse. — Você vai gostar dela, é uma criança muito boazinha. Vão se dar
bem.
— Droga, Gabriel! — Bateu um dos pés com força no chão, irritada, mas
desistiu de brigar ao ver que não conseguiria me alcançar e devolver a criança. — Se
não vier buscá-la eu juro que arranco suas bolas com uma faca de serrinha para ser bem
lento e dolorido — bradou a ameaça e eu, mais que depressa, arranquei com o carro,
para não dar sorte ao azar.
Anna...

Maldito! Quem ele achava que era para fazer isso comigo?
Onde já se viu, se aproveitar do fato de eu estar consolando uma criança para
fugir dessa maneira. Na primeira oportunidade eu vou afrontá-lo e falarei poucas e boas
em sua cara. Só espero que ele cumpra com a palavra e volte para buscar a garotinha.
Se não voltar, é mais um motivo para eu sair do sério.
E agora, meu Deus, o que eu faço?
Nem acredito que ele conseguiu arruinar um dia das minhas férias. Eu estava
preparada para assistir alguns filmes na Netflix até tarde. Nem isso posso fazer mais,
porque, com certeza, eles não terão classificação etária para alguém tão jovem.
— Acho que agora somos só nós duas, lindinha — falei meio sem saber o que
fazer sozinha com a menina em meus braços.
— Nossa! — A garotinha me encarou nos olhos e acariciou os meus cabelos. —
Tia beinha é tão monita. Vochê é namolada do meu papai? — perguntou curiosa.
Ela me olhou de cima a baixo, como se estivesse me analisando e depois sorriu
com seus poucos dentinhos minúsculos, evidenciando uma covinha na bochecha, como a
do pai. Ela é tão linda que parece aquelas crianças de comerciais de TV. Suas feições
são muito parecidas com Gabriel. Ele está falando em fazer exame de DNA, mas acho
que nem precisava. Ela é uma cópia dele em miniatura, só que com os cabelos mais
claros.
— Não, eu sou só a vizinha. — Baguncei o seu cabelo com a mão. — E eu
gostaria que me chamasse de tia Anna, esse é o meu nome.
— Tá bom, tia Naninha. — Encarou-me sem graça por não conseguir falar meu
nome no diminutivo do jeito certo e eu sorri, tranquilizando-a. Antes Naninha do que
beinha. Isso me lembrou que eu precisava ter uma conversa muito séria com o pai
daquela criança. Como ele ousa contar o apelido ridículo que me deu para ela?
— Vamos entrar? — disse, incomodada com seu olhar que não parava de me
avaliar. — Gosta de achocolatado? Posso fazer um para você.
— Eu quelo — assentiu com a cabecinha. — Tia Naninha é tãooooo boazinha.
A mamãe Tátata é bava, guita muito comigo. — falou baixinho. — O papai Gabiel
também é bonzinho, não gotou de ver Belinha chorá e fez carinho. Você é amiguinha
dele?
— Não muito. — Evitei dar muitos detalhes. Afinal, como dizer a uma criança
que eu odeio o pai dela e tudo o que penso a seu respeito? Vi quando seus olhinhos
brilharam. — Você se parece muito com ele, sabia?
— Então, eu sou muito bonita, poiquê o papai é lindão — sussurrou e eu
assenti. Não tinha como negar a beleza dele. Se não fosse tão insuportável e
irresponsável, seria o meu sonho de consumo. — Você num qué namolá com ele?
— Acredite em mim, Belinha, essa não é uma boa ideia. — Fiz uma careta,
descontente.
Como eu não tinha uma mamadeira na minha casa e o pai relapso não trouxe
nenhum pertence da criança para que eu pudesse usar, coloquei o achocolatado que bati
no liquidificador em um copo de acrílico, peguei um canudo em uma das gavetas do
meu armário da cozinha, ainda bem que tenho alguns que às vezes uso para tomar algum
drink ou refrigerante, e o coloquei na boca da criança, que sorveu o líquido
rapidamente. Pelo jeito estava com fome. Eu não me admiraria se o pai dela tivesse
esquecido de alimentá-la. Aliás, acho bem provável que isso tenha acontecido.
Depois levei-a até o sofá da sala e liguei a televisão em um canal infantil
qualquer. Ainda bem que pago assinatura de um pacote de canais fechados que tem
alguns para crianças. Ela se deitou entre as almofadas, eu fiz o mesmo ao seu lado, que
começou a enrolar mechas do meu cabelo no dedinho e logo pegou no sono.

Olhei mais uma vez para o relógio. Droga! Estava ficando tarde. Que parte do
que disse sobre não aparecer para buscar a criança Gabriel não entendeu? Tenho
certeza de que fui bastante enfática quando eu disse que arrancaria suas bolas com uma
faca de serrinha, de forma lenta e dolorida.
Olhei pela janela e nada. Voltei para o sofá e me deitei de novo. Resolvi assistir
mais um filme para ver se o tempo passava mais rápido. Já que Belinha havia dormido,
não vi mal nenhum em seguir com os meus planos anteriores. Acabei adormecendo
também, mas acordei assustada com sons de vozes e portas de carro batendo. Fui até a
janela da sala e vi Gabriel chegando em casa acompanhado da mesma loira da última
festa e fiquei puta.
Com cuidado para não a acordar, afinal a menina era muito boazinha e não tinha
culpa dos absurdos que o pai fazia, peguei Belinha no colo e saí de casa a passos
firmes, indo em direção a residência vizinha da minha.
— Está atrasado, Gabriel Montenegro Bittencourt. Sua filha até cansou de
esperar e adormeceu no meu sofá. — Coloquei a menina em seus braços.
— Anna, eu ia buscá-la assim que Rayssa fosse embora. Eu juro! — disse, meio
sem graça.
— Ótimo! Poupei o seu trabalho de ter que ir até minha casa para pegá-la. —
Ele me olhou parecendo irritado.
— Espere aí, você disse filha? — A loira afinal resolveu se pronunciar. —
Gabriel é pai dessa criança?
— Ele não te contou, querida? — falei baixo para evitar despertar a criança. —
Ele descobriu isso hoje. Evitou contar direito os detalhes, mas parece que a mãe da
garotinha a deixou de presente para ele. E veja só que maravilha, ela fará companhia
para vocês dois a noite inteira. — Fui irônica e a cara que ela fez foi impagável.
— Acho melhor eu ir embora. Nos falamos em uma próxima oportunidade,
Gabriel. — A perua foi logo se esquivando ao perceber que não ia conseguir o que
queria e ainda teria que ajudá-lo a cuidar da criança.
— Espere um momento, Rayssa — argumentou. — Você está a pé, veio de
carona comigo. Vou levá-la para casa. Tenho certeza de que Anna não se importará de
ficar um pouco mais com Maria Isabel.
— Me importo, sim. — Crispei os lábios. — O combinado era eu ficar com ela
até você chegar do aniversário da sua mãe. Agora a responsabilidade é sua. Toma que o
filho é seu!
Se ele achava que ia me fazer de boba mais uma vez, estava muito enganado.
— Não se preocupe, Biel. Eu chamo um motorista de aplicativo lá da portaria.
Tchau. — A patricinha foi saindo rápido e de fininho.
Aproveitei sua partida para ir embora também. Movi minhas pernas em direção
a minha casa, enquanto ele me observava contrariado.
— Isso é covardia, sabia, abelhinha? Eu não ia deixar a menina a noite inteira
com você. Só queria me distrair um pouco antes de pegá-la. Acho que mereço depois de
tudo o que passei — sibilou. — E não precisava sair por aí contando a torto e a direito
sobre a Belinha. Talvez ela nem seja filha minha. — Aumentou o tom de voz à medida
que eu ia me afastando.
— Eu não contei para todo mundo, só para a sua amiguinha — respondi,
virando-me de novo em sua direção. — E a quem você quer enganar? Já olhou direito
para essa criança? Ela é a tua cara. E se eu fosse você, parava de gritar, porque ela
pode despertar e terá que passar a noite inteira acordado tentando fazê-la dormir de
novo — falei com ironia.
Ele anuiu, reconhecendo que eu tinha razão quanto a isso. Entrei em casa e
fechei a porta sem olhar para trás, me sentindo vitoriosa. Aquele homem me dava nos
nervos.
Anna...

Olhei para a tela do meu celular que estava na minha mesa de cabeceira. Droga!
Quatro horas da manhã? Quem estaria socando a porta da minha casa e apertando a
campainha naquele momento? Será que havia acontecido algo com minha avó? Acho
difícil, pois havíamos conversado mais cedo e estava tudo bem. E se fosse algo com
ela, seria o meu telefone a tocar com insistência, devido à distância de nossas casas.
Levantei-me irritada... Meu Deus! A minha vontade era dar uns tapas em quem
estava fazendo aquele alarde todo. E com bastante força, para aprender a não
importunar as pessoas na alta madrugada. Com certeza, a pessoa não entendia nada
sobre a lei do silêncio. Novas batidas violentas soaram, mas quem estava lá fora deve
ter ouvido o barulho dos meus passos, pois se apressou em parar.
Estava pronta para xingar e dizer poucas e boas quando me deparei com um
Gabriel desesperado e impaciente.
— Boa noite. — Cumprimentou-me de maneira formal e se escorou no batente
da porta, respirando com dificuldade.
— Não vá me dizer que não conseguiu dormir por causa da nossa discussão
mais cedo e resolveu vir me acordar para brigar. Não suporto ser despertada dessa
maneira, sabia? Se soubesse que era você, nem teria atendido.
Foi então que notei que ele parecia muito nervoso. Estava só de camiseta e
cueca boxer. Devia ter acontecido algo muito grave para estar a minha porta àquela
hora e vestido daquela maneira. Lembrei-me de Belinha e entrei em pânico. O que
aquele irresponsável poderia ter deixado acontecer com a garotinha?
— O que foi que aconteceu? Belinha está bem? — questionei.
Coloquei a cabeça para fora, procurei pela criança, mas não a encontrei. Foi
então que ouvi seu choro estridente ao longe.
— Por que ela está chorando? O que você fez? — Apontei o dedo para o seu
peito, revirando os olhos.
— Porra, abelhinha, não fala assim. Eu já estou me sentindo o pior pai do
mundo — falou, tomando fôlego.
— Então, o que aconteceu para ela estar aos berros e você colocando a porta da
minha casa abaixo desse jeito?
Gabriel arregalou os olhos, engoliu em seco e, mesmo assim, não conseguiu
disfarçar suas feições assustadas.
— Eu não sei. Estávamos os dois dormindo tranquilos, quando ela acordou e
começou a chorar — respondeu baixo. — perguntei por que ela estava chorando e
Belinha só respondeu que queria tetê. Eu vou lá saber o que é isso? Preciso da sua
ajuda para descobrir.
— É a maneira como algumas crianças pedem por mamadeira, Gabriel. Você só
precisa dar leite para ela.
— Ah, não, merda! — Se moveu de forma irritada pela minha varanda. — Justo
leite? Eu não tenho isso em casa.
— Você está brincando comigo, não é mesmo? — Quebrei os segundos de
silêncio que se instalaram entre nós. — Como pode ter uma criança em casa e não ter
leite?
Aproximei-me dele e vi quando sua mandíbula vibrou de descontentamento.
— Olha, abelhinha, eu descobri que sou pai há poucas horas, ok? Se é que ela é
minha filha de verdade. Maria Isabel chegou em minha casa de surpresa essa tarde, a
noite eu fui ao aniversário da minha mãe e você me devolveu a criança de supetão, já
dormindo. Eu não tive tempo de me preparar e pensar nessas coisas práticas. Agora a
minha filha está se esgoelando na casa ao lado e nós aqui jogando conversa fora. Dá
para me ajudar e me ensinar como faz ela parar de chorar, por favor? — indagou.
— Vou, sim. Mas por ela, não por você. Para sua sorte, eu tenho leite em casa.
Vou pegar um litro e encontro vocês dois em minutos na sua casa — sibilei.

— Obrigado por ajudar! — Agradeceu meu vizinho após eu ensiná-lo a fazer


mamadeira, como dá-la a Belinha e depois colocá-la para dormir de novo. — Eu não
sei como não pensei no leite antes — murmurou.
— Agora você aprendeu e com o tempo vai se acostumar. — Pisquei para ele,
tentando amenizar sua culpa.
Já estava me levantando para ir embora e ver se conseguia voltar a dormir,
quando Gabriel segurou em meu braço e me entregou um papel que estava no bolso da
calça que vestiu assim que cheguei a sua casa.
— O que é isso? — questionei e ele me encarou sério.
— Ela foi deixada aqui com esse bilhete.
— Uauuu, quanta frieza! — Li o papel mais uma vez para me certificar que
havia entendido direito. — Não me admira Belinha ter me dito que a mãe era brava e
sempre brigava com ela. Pelo jeito, a mulher não está muito aí para a filha. Não sabe
nem se vai voltar.
— Eu custo acreditar nisso também. Ainda acho que é uma brincadeira de mau
gosto que fizeram comigo. Por isso, amanhã mesmo vou a um laboratório e farei o
exame de DNA — falou, pegando o papel de volta da minha mão.
— Você acha mesmo isso? Que ela não é sua filha? — indaguei, sem julgá-lo.
Devia estar sendo mesmo muito difícil para ele ser pego de surpresa daquela maneira.
— Ela é a sua cara, fora alguns trejeitos idênticos aos seus.
— Ela é loira, o meu cabelo é escuro. Isso pode significar alguma coisa.
— Diante das evidências, acho que isso só quer dizer que a mãe dela era loira.
— Ele me olhou, derrotado. — Você, pelo menos, sabe quem é a mãe dela?
— Tábata é uma antiga namorada e, sim, ela é loira — afirmou.
— Namorada? — Me encarou com um sorriso de canto de boca.
— Qual o problema?
— Só fiquei surpresa por saber que o playboy irresponsável e mais cobiçado da
cidade teve um relacionamento.
— Para você ver o quanto me conhece pouco para me julgar da forma que faz,
abelhinha — comentou, guardando o bilhete de volta no bolso.
— E se ela for mesmo sua filha, o que você pretende fazer? — Queria uma
resposta para as várias teorias mirabolantes que minha cabeça estava criando.
— Na verdade, estou pensando em entregar Belinha para adoção. — Foi sincero
e meu coração se partiu em mil pedaços.
— Você não pode fazer isso. — Quando vi, eu já estava me metendo na vida
dele.
— Olha só para mim, abelhinha. Acha mesmo que eu tenho condições de ser
pai, de criar um filho? — questionou-me com sinceridade. — Você mesma vive me
chamando playboy irresponsável, nem leite eu tinha em casa para alimentá-la.
— Com o tempo você aprende e se acostuma. — Tentei argumentar. — Olha,
Gabriel, meus pais morreram quando eu era bem pequenininha. Talvez eu tivesse a
idade de Belinha e sei o quanto é duro crescer sem eles por perto. Eu acho que por mais
irresponsável que meu pai fosse, mesmo assim eu ia querer tê-lo ao meu lado para me
ajudar em certas ocasiões, nem que fosse só dando apoio. — Foi aí que me ocorreu
algo que poderia ajudá-lo. — Aliás, você sabe quantos anos ela tem? Pelas
características físicas, uns dois anos, talvez? Fazer os cálculos, pode te ajudar a
desvendar a questão da paternidade.
— Se for olhar para esse lado, eu diria que ela é mesmo minha. Faz três anos
que eu e Tábata nos separamos e ela não estava grávida ou não havia descoberto ainda,
entretanto se tirarmos os nove meses de gestação, se tivéssemos um filho ele teria em
torno de dois anos, talvez um pouco mais — acrescentou.
— Antes de tomar essa decisão precipitada, você não acha que deveria procurar
pela mãe da criança, conversar e resolver o que fazer? — repliquei. — No mundo
digital em que vivemos, você pode tentar encontrá-la pelas redes sociais.
— E você pensa que eu não tentei? — contestou. — Foi a primeira coisa que
fiz, mas, pelo jeito, ela apagou todas elas. Visto que é uma modelo relativamente
famosa e está iniciando carreira internacional, é a única explicação que encontrei. Não
consegui encontrar nada. Tábata desapareceu como fumaça.
— Ainda acho que você deveria pensar um pouco sobre essa história de adoção
— rebati. — Belinha é uma criança maravilhosa, passou um bom tempo comigo e não
chorou por nada. Só agora, e por fome.
— Se eu desistisse, você me ajudaria a cuidar dela? — interpelou com
seriedade.
— Aí já está querendo demais, caro vizinho. O problema é seu e você deve
resolvê-lo sozinho. — Completei. — Além do que, eu trabalho e tenho minhas
obrigações.
— Está vendo só, abelhinha? É fácil julgar minha decisão quando nem você está
disposta a me ajudar.
Aquele maldito apelido de novo. Perdi as contas de quantas vezes ele me
chamou assim. Isso não está funcionando bem. Gabriel está conseguindo me tirar do
sério. Estava a ponto de estourar com ele.
— Pede ajuda para alguma das suas “amiguinhas”. — Fiz sinal de aspas no ar.
— Tenho certeza de que a tal de Rayssa vai adorar te ajudar. Vocês podem brincar de
papai, mamãe e filhinha.
— Você acha mesmo que eu tenho condições de entregar a minha filha nas mãos
de mulheres como elas? Não que eu seja machista e ache que elas não servem para
casar, ser mãe ou criar minha filha, porque eu não sou assim e nem tenho esse tipo de
pensamento retrógrado. Mas porque são tão livres e despreocupadas quanto eu. Adoram
curtir a vida sem nada que lhes prendam — concluiu. — Eu preciso de alguém séria,
comprometida e que entenda, pelo menos um pouco, de crianças, abelhinha. Sem
chances de pedir ajuda a uma delas.
— Dá para parar de me chamar por esse apelido irritante? — Estourei de vez.
Eu sabia que isso ia acontecer. — Você já o repetiu umas trezentas vezes desde que
apareceu desesperado em minha porta — ralhei com ele. — E quer saber, vou embora
para a minha casa. Não tenho nada a ver com sua vida e seus problemas. Acho até que
já me envolvi demais. — Caminhei em direção a porta. — É ridículo você pensar que
posso te ajudar a cuidar de Belinha. Nós não conseguimos ter nenhuma conversa
civilizada sem acabar em discussão. Ainda acho que as frequentadoras da sua casa são
a melhor opção, pelo menos vocês se dão bem. — Soltei o ar pela boca e concluí. —
Pode ficar com o leite que eu trouxe, vai precisar dele assim que ela acordar pela
manhã.
Falei tudo de uma só vez e fui saindo da sua casa. Imagina só, eu ajudando meu
vizinho insuportável a criar a filha dele. Nem pensar! Ia ser demais para mim.
Brigaríamos o tempo inteiro e isso não seria saudável para a criança. E quando ele
desse festas? Com certeza ia querer deixar a garotinha comigo. Teimo em dizer que é
isso que ele quer, alguém que cuide da menina enquanto ele se esbalda nas orgias. Essa
pessoa não serei eu. De jeito nenhum!
— Isso, vai embora mesmo, abelhinha. — Ainda me provocou com a alcunha
uma última vez. — Ferroa com força e me deixa aqui sozinho com a bomba que caiu no
meu colo. Bem providencial da sua parte — gritou da sua varanda, enquanto eu
caminhava a passos largos até a minha casa. — Covarde! Que bela amiga você é.
De onde ele havia tirado isso? Nós dois... amigos. Só mesmo na cabeça
deturpada dele.
Gabriel...

Minha cabeça está rodando e, de verdade, não sei o que fazer. A quem estou
querendo enganar? Está na cara que a garotinha loira que foi deixada em minha porta é
minha filha com Tábata. Só não entendo o porquê de ela não ter me procurado antes
para contar sobre a criança e ter resolvido deixá-la comigo agora, tanto tempo depois, e
de forma tão tempestuosa. Tenho que confessar que não me agrada a ideia de entregar
Belinha para adoção. Meu coração e minha consciência estão pesados.
Mas como posso criar essa criança sozinho?
Não tem outro jeito e me vejo tentando me convencer, de todas as formas
possíveis que vai ser melhor para ela.
A minha vizinha parece ser uma mulher tão centrada, cheguei a cogitar a
possibilidade de pedir a sua ajuda para criar Belinha, mas ouvi um sonoro não.
Desesperado, assisti Anna ir embora para a sua casa após se negar a me ajudar. Mas me
recusei a ir atrás dela, seria humilhação demais. Não sou homem de me rastejar por
nada nesse mundo. Se não quer me ajudar, tudo bem, eu dou outro jeito e o único que me
resta é aquele que está me deixando pesaroso.
Voltei para dentro da minha residência remoendo tudo o que ela me disse. Não
tinha muito o que se fazer, havia voltado à estaca a zero e a única solução que eu
conseguia enxergar era a de entregar a garotinha para adoção. Claro que primeiro faria
o exame de DNA e depois com o resultado em mãos eu tomaria as medidas cabíveis
para tal ato.
Acordei na manhã seguinte, ou melhor me levantei da cama, porque não
consegui pregar os olhos, e fui direto para a cozinha preparar o tal tetê da minha filha,
antes que ela acordasse e começasse o show de horrores, se esgoelando por um pouco
de leite.
Fui atraído pelo toque da campainha, seguida de leves batidas em minha porta.
De imediato, senti uma sensação de alívio. Pensei na possibilidade de ser a pessoa que
resolveu fazer aquela brincadeira de mau gosto comigo, estar voltando para pegar a
menina e assim minha vida voltaria ao normal e o pesadelo acabaria. Ao abri-la, me
deparei com os olhos azuis de Anna Ayala, minha vizinha e diretora de marketing da
empresa de meu pai.
— Eu topo.
— O quê?
— Te ajudar a cuidar de Belinha.
— Está falando sério? Vai me auxiliar com a menina?
Eu não estava nem acreditando. Na minha cabeça eu já cogitava que após
morrer eu iria para o inferno por abandonar minha filha para adoção, sem ao menos
tentar criá-la.
— Por Belinha. — Fez questão de deixar claro. — Mas eu tenho algumas
condições.
— Tenho até medo de ouvi-las, abelhinha — sibilei.
— Uma delas é exatamente essa, que você pare de me chamar desse apelido
ridículo.
— Não sei qual o seu problema com ele. Eu acho tão fofo. — Tentei dissuadi-la
da ideia. Na real, eu gostava de chamá-la assim. No início era só para provocá-la, mas
no fim acabei achando que o apelido lhe caía muito bem. Tinha tudo a ver. — Juro que
nunca te intitulei assim por maldade. É um apelido carinhoso. Acho fofo como você
reage quando te chamo assim.
Ela ponderou, porém logo voltou atrás. Percebi pelo seu jeito que era melhor
não insistir ou logo iniciaria uma nova discussão.
— Se quer minha ajuda, precisamos de um acordo. — Adotou uma postura
sincera. — Vamos fazer uma trégua em nossos desentendimentos para que todos
saiamos felizes nessa equação. Por isso, nada de apelido para que não haja nenhum
contratempo. Eu, realmente, odeio essa alcunha.
Ela arqueou uma das sobrancelhas e percebi que vinha mais coisa por aí. Seria
ingenuidade minha achar que sua única condição seria a questão da maneira com que eu
me referia a ela.
— E quais as outras condições, Anna? — Dei ênfase ao seu nome e coloquei a
mão no queixo, observando-a intensamente.
— Eu te ajudo a cuidar de Belinha durante esse mês que estou de férias, até que
você consiga uma babá, para ter quem fique com ela depois que eu voltar a trabalhar.
— Abri e fechei a boca com uma sensação estranha. Com certeza, vinha coisa dura por
aí. — Em troca, além da questão do apelido, você se compromete a não fazer mais
festas.
— Só isso? — Sendo sarcástico, abri os meus braços, quantificando a extensão
de seu pedido.
— Não, ainda tem mais.
— E quais seriam as outras exigências da “madame”? — Abri aspas, sendo
irônico.
— Só estou prezando pela sua filha, se não quer, tudo bem. Eu vou embora e
você finge que nunca estive aqui.
— Tá legal! — Levantei minha mão em rendição. — Continue.
— Você também irá se comprometer em assumir de vez e sem ressalvas o seu
cargo na M.B., para que Belinha possa ter orgulho do pai que tem. Irá trabalhar todos os
dias, cumprir os horários, sem atrasos e de terno e gravata. — Senti-me asfixiado só de
pensar, mas preferi não dizer nada. Na hora certa tentaria uma negociação. — E vai me
prometer pensar melhor, mesmo que as coisas estejam difíceis e complicadas, nessa
história de mandar sua filha para adoção.
— Podemos negociar? — propus. — Já que é da sua vontade, de agora em
diante só a chamarei de Anna, não vejo motivos para alterar essa regra, já que é bem
simples e não implica em nenhuma mudança em minha vida. — Ela sorriu vitoriosa. —
Quanto as festas em minha casa: por quem me tomas, Anna? Não sou louco de fazer
minha filha conviver com algo promíscuo do tipo. Já o cargo da empresa, não vai ser
fácil, me sinto claustrofóbico só de pensar, mas prometo tentar, além de querer que
Maria Isabel, se for de verdade minha filha, sinta orgulho de mim, acho que meus pais
também ficarão felizes com essa iniciativa.
— E quanto a tantas mulheres entrando e saindo da sua casa? — indagou,
curiosa. — Acho que não deveria mais trazê-las aqui.
— O quê? Não pensei nisso. Podemos negociar essa? — Fui direto ao assunto.
— Se não vou poder fazer sexo, você também não. A menos que abramos para
encontros, onde um fica com Belinha enquanto o outro sai. E assim podemos criar uma
escala. O que acha? Quanto a me ajudar só até eu encontrar uma babá, quero que mesmo
depois que isso aconteça você continue me ajudando nos dias de folga dela e a noite,
depois que ela for embora e nos finais de semana. Como vou estar em casa não acho
necessário ter uma pessoa estranha aqui dentro. E por fim, prometo sim pensar melhor
sobre a adoção, desde que você continue me ajudando como prometeu. — Sustento o
seu olhar com o meu. — Então, o que me diz?
— Acho que posso conviver com isso, desde que os encontros se resumam a
duas vezes ao mês. Ou eu vou levar desvantagem e ter que ficar muito mais com Belinha
do que você — concluiu. — O que eu não acho justo, já que é o pai. Não sou do tipo
que sai com todo mundo ou qualquer um. Diferentemente de você, é claro. Aceito
continuar te ajudando mesmo após encontrar uma babá, com ressalvas desde já aos
domingos, que é o dia de eu visitar e ficar um pouco com minha avó.
— Vai me deixar sozinho com a menina aos domingos? — indaguei assustado.
— Todos eles?
— É pegar ou largar. — Desafiou-me.
— Eu pego — assenti.
— Fechado, então? — indagou e estendeu a mão em minha direção.
— Combinado.
Mal sabia eu que aquele estranho acordo mudaria minha vida em todos os
sentidos e para melhor.
Gabriel...

Depois da conversa que tive com Anna, onde ela se propôs a me ajudar com
Maria Isabel, apesar de ter imposto um monte de condições, confesso que consegui me
sentir mais calmo e confiante. Até que as coisas que ela sugeriu, não foram tão ruins
assim ou difíceis de cumprir.
De qualquer forma, com uma criança em casa, seria complicado e imprudente
continuar levando uma vida desregrada como era a minha até então. Usar terno e
gravata iria me incomodar muito, mas não era nada com o qual eu não pudesse conviver
e me acostumar, afinal, num passado não muito distante, era assim que eu me trajava
para trabalhar.
Prometi pensar melhor sobre caso de não entregar a bela garotinha para adoção,
mesmo sem ter certeza de que conseguiria honrar com minha palavra. Se ela não fosse
minha filha, o que eu já estava convencido de que seria difícil acontecer, eu faria isso
sim. Com certeza, seria o melhor para ela. Talvez até mesmo se eu fosse o seu pai,
fosse o mais recomendado. A verdade é que eu estava com muito medo dessa história
toda.
O que mais me desagradou, foi ter que parar de apelidá-la de abelhinha. Na
real, eu gostava de chamá-la daquela maneira. Achava que o apelido se encaixava com
perfeição e adorava a sua reação. Conseguia ficar ainda mais bonita do que já era.
Não se enganem que isso significa algo especial para mim ou que eu a ache
linda a ponto de pensar em um relacionamento. De jeito nenhum! Deus que me livre de
me envolver com uma mulher brava e mandona daquela!
Assim que Anna deixou a minha casa, se comprometendo a ir comigo e Belinha
ao laboratório para, enfim, fazermos o exame de DNA, ouvi o choro da minha filha no
quarto, que pelo jeito já estava de novo com fome. Dei a mamadeira para ela e, após
ela insistir muito, acabei cedendo e deixei que escolhesse as próprias roupas,
auxiliando-a apenas a se vestir e rezando para não ser criticado ou chamado de pai
relapso.
Não fazia a mínima ideia de como vestir uma criança. Tive também que
exercitar minha paciência e ajudá-la a escovar os próprios dentinhos. Ao final, fiz uma
anotação mental para perguntar a Anna se eu havia feito certo, pois não quero que minha
filha entre para as estatísticas cruéis dos desdentados, apesar dos seus ainda serem
poucos e decíduos, os populares dentes de leite.
Lembro-me de certa vez, há uns 3 anos mais ou menos, ter lido em uma coluna
de saúde de um jornal, uma matéria escrita por um renomado cirurgião-dentista que
dizia que o Brasil é um país de desdentados. Que triste realidade, meu Deus! Isso me
chocou tanto, que cheguei a guardar na memória os números assustadores que li.
O estudo feito por ele dizia que trinta e nove milhões de brasileiros usavam
algum tipo de prótese dentária e que um em cada cinco deles tinham entre vinte e cinco
e quarenta e quatro anos. Dezesseis milhões não tinham nenhum dente na boca e que
mais de quarenta por cento deles eram idosos acima dos 60 anos. Para trinta e dois por
cento dos entrevistados, a perda dos dentes os impedia de levar uma vida saudável e
ativa. Deles, cinquenta e dois por cento disseram que sem os dentes ficaram com a
aparência pior, vinte e um por cento que a condição lhes impediu de fazer novos
amigos, trinta e oito por cento que se sentiam inseguros em festas e eventos sociais e
quarenta e um por cento relataram ter dificuldades de pronunciar algumas palavras.[1]
Isso me fez lembrar também que, se Belinha fosse minha filha de verdade e eu
fosse ficar com ela, teria que levá-la a um dentista e procurar saber como estava a sua
saúde bucal, assim como a um médico pediatra também. Não dava para ser relapso e
ignorar certas coisas, principalmente aquelas relacionadas a sua saúde.
Será que eu daria conta? Conseguiria ser um bom pai?
Esses pensamentos rondavam a minha cabeça e me deixavam muito inseguro,
pois nem eu mesmo conseguia acreditar nisso.
Sempre ouvi dizer que pais quando saiam com seus filhos levavam uma mala
pronta com todas as coisas que a criança poderia precisar, como não fazia ideia do que
fosse, peguei sua mala completa, aquela mesma com a qual ela havia sido deixada na
porta da minha casa, joguei lá dentro uma mamadeira e coloquei no porta-malas do meu
carro, um luxuoso Lamborghini Aventador preto. Retirei o carro garagem, parei em
frente à casa de Anna e, após buzinar, aguardei que ela entrasse no veículo para
seguirmos em direção ao laboratório.
Não consegui dizer nada além de um sussurrado “oi”. Eu estava muito tenso com
a situação, a minha vizinha pareceu perceber isso e como se entendesse o meu lado, não
tentou puxar assunto, apenas sorriu para mim em sinal de cumplicidade e entrou no
banco de trás, pegando Belinha, que ainda não tinha uma cadeirinha por eu não ter tido
tempo de comprar, no colo, prendendo as duas juntas no cinto de segurança.
Meu Deus, mal havia começado o processo de ser pai e já estava sendo
inconsequente com minha filha! Precisava comprar uma cadeirinha urgente, mas
primeiro precisava do resultado do maldito exame que estávamos indo realizar e me
decidir o que fazer com a criança.
Encarei as duas pelo retrovisor, a bela loira de olhos azuis, de vestido tubinho
preto, extremamente elegante, e a linda garotinha de vestido rosa, amassado por ter
permanecido por muito tempo dentro da mala, uma tiara da mesma cor com um laço
enorme e meio sonolenta. Bem que meus amigos e primos casados e com filhos sempre
me disseram que passear de carro era um santo remédio para as crianças dormirem. Foi
então que me dei conta da sensação de paz e lugar comum que se apossou de meu
coração, como se o que estava acontecendo ali fosse a coisa mais certa desse mundo.
Confesso que me senti incomodado com a profundidade desses sentimentos e sensações.

Já no laboratório fomos informados e orientados de como funcionaria o


processo da coleta do material e de que forma seria realizado o exame. Era bem
simples, um pouco de nosso sangue seria retirado com o auxílio de uma seringa, a
sequência de nossos DNAs comparados e a partir da semelhança ou não entre os nossos
genes, descobriríamos se eu era o pai biológico de Belinha e acabaríamos com aquela
dúvida angustiante. O resultado teria precisão de 99,99% e sairia entre duas a três
semanas. Pedi com jeitinho e ele se propôs a entregá-lo no menor tempo.
Porém minhas esperanças de acabar com aquela agonia o mais rápido possível
quase se esvaíram quando o médico descobriu que Anna não era a mãe biológica da
criança e que estava apenas me acompanhando como uma boa amiga. Segundo ele,
como meu nome não estava na certidão de nascimento de Maria Isabel e com a ausência
da genitora, o exame não poderia ser realizado, a não ser que ela tivesse deixado uma
autorização formal assinada.[2]
Sem desistir de saber a verdade e querendo dar um fim definitivo nas minhas
dúvidas, se é que eu realmente as tinha, expliquei os fatos ao médico geneticista que nos
atendeu, mostrando inclusive o bilhete deixado por Tábata. Ele se mostrou um pouco
reticente no início, mas como não há como negar nada aos influentes Montenegro
Bittencourt, acabou cedendo. Mas não sem antes eu lhe pagar uma quantia a mais em
dinheiro para convencê-lo.
Eu não gostava muito de usar da força e poder do meu sobrenome, evitava ao
máximo agir daquela maneira, mas naquele caso foi imprescindível. Eu queria me livrar
daquela dúvida urgente.
— Bem, senhor Gabriel, sua amostra já foi coletada — comunicou-me o
médico, complacente. — Agora é a vez dessa linda mocinha aqui.
— Eu não. Tem agula, moço — Belinha falou, chorosa.
— Pode ficar tranquila, não vai doer nada. É só uma picadinha de formiguinha.
— O médico passou as mãos pelos cabelos da minha suposta filha.
— Tia Naninha, ele é muito malvado. Qué dá jeção em Belinha — gritou,
manhosa e com lágrimas nos olhos encarou minha vizinha. — Mudida de fomiguinha
tamém dói.
Eu, Anna e o médico rimos da sua reação e me aproximei dela, me abaixando na
sua frente e captando toda a sua atenção.
— Poxa vida, filha! — Foi estranho chamá-la assim, com tanta certeza de ser
seu pai. — O doutor Roberto só está tentando fazer o trabalho dele. O papai já fez e não
doeu nada. Mas vamos fazer um trato: se em você doer, nós vamos tomar um sorvete
assim que sairmos daqui. O que acha da ideia?
Maria Isabel avaliou de forma reticente, como se estivesse ponderando sobre o
que eu disse. Em seguida fez um muxoxo e estendeu o bracinho para o médico, não
muito segura do que estava fazendo. Percebendo isso, Anna se aproximou dela,
beijando o topo de sua cabeça e segurando a mãozinha de seu braço livre.
— Meu amor, esse negócio aqui — Apontou para a seringa na mão do médico
— é muito importante para você e para o seu pai, entendeu? Vai servir para vocês
virarem papai e filhinha de verdade.
— Tá vendo só, garotinha? Sua tia sabe das coisas. Se doer só um pouquinho,
espero que não fique com raiva de mim. — O médico brincou tentando distrai-la e ela
deu um de seus sorrisos tímidos e encantadores. — Já acabei. Viu como foi rapidinho?
Belinha acenou afirmativa com a cabecinha, parecendo mais segura e confiante.
Agradeci ao médico, impressionado com a presteza de seu atendimento e peguei minha
suposta filha no colo.
— E então, doeu? — O tom aveludado da voz de Anna, fez meu coração bater
eufórico. Preciso ter uma conversa séria com ele, lembrar que está fechado para
sentimentos e relacionamentos.
Afinal, não queremos sofrer de novo, não é mesmo, coração?
— Muitão, tia Naninha. Vô tê qui tomá dois soivetes pa sará. — Ora, ora...
muito espertinha essa garota.
— É mesmo? — Anna gargalhou, passando a mão em seus cabelos, e depois
voltou-se em minha direção, me provocando. — Assim o papai vai se atrasar de novo
para o trabalho.
— Eu pensei que devido ao exame de DNA, nosso acordo poderia ficar em
aberto hoje. — Passei o peso de Belinha para o meu outro braço. — Não dormi muito
bem essa noite por causa da ansiedade, e confesso que estou muito cansado.
— Vou abrir essa exceção só por hoje. De amanhã, não passa. Ou o nosso
acordo acaba. — Garantiu com uma piscadela, enquanto saímos do laboratório e
caminhávamos em direção ao meu carro.
Conhecendo minha vizinha como eu bem conhecia, tinha certeza de que ela
cumpriria essa ameaça se eu não me tornasse o homem responsável que ela esperava
que eu fosse. Acho que o molde usado para fazer essa mulher foi jogado fora. Nunca vi
alguém bonita como ela ser tão brava e mal-humorada.
Anna...

Enquanto caminhávamos em direção ao carro, aproveitei para observar Gabriel.


Todo bem-vestido com roupas de grife, que deviam ter custado os olhos da cara,
camiseta colada ao corpo marcando todos os músculos delineados de seu peitoral e
bíceps. Os cabelos castanhos escuros e lisos, desalinhados de uma forma sexy e uma
barba rala, que denunciava que não a fazia há alguns dias, casando-se perfeitamente
com o visual.
Seu porte era altivo e intimidador. O mais engraçado é que ele carregava
Belinha de forma displicente nos braços sem se importar se ela o sujaria ou coisa do
tipo. Ele seria um bom pai, na realidade, já estava começando a ser. Só não havia se
dado conta disso ainda.
Os dois pareciam se entender muito bem um com o outro. Percebi com
facilidade que eu não precisava estar ali. Ele podia dar conta de tudo sozinho, pelo
menos no que dizia respeito ao exame de DNA. Porém, por insegurança, havia pedido
para que os acompanhasse.
— Tia Naninha, aquele dotori é mentiroso. A moididinha da fomiguinha doeu.
— Belinha voltou ao assunto assim que entramos no carro e a acomodei em meu colo
para colocarmos o cinto de segurança. — Meu bacinho tá doendo. Vô ter que comê
muito soivete de chocoiate pa sará.
— Pode deixar comigo. Vou ter uma conversa séria com ele depois, para
aprender a nunca mais mentir para ninguém. — Sorri, apertando seu pequeno nariz. —
Ele não fará mais isso. Fique tranquila!
— Jura poi Deus? — indagou, espertinha.
— Juro! Ele não vai sair impune dessa. — Fiquei meio sem graça quando
percebi que Gabriel ainda não havia posto o carro em movimento porque estava nos
observando e acompanhando nossa conversa com cara de bobo. — Você vai ser uma
excelente mãe.
— Hã? Ah, sim, claro. Quando eu me casar, talvez eu seja — respondi,
envergonhada. — Ou não, nunca se sabe ao certo. Muitas mulheres quando se tornam
mães surpreendem, outras desapontam e há aquelas que correspondem às expectativas.
Tudo é muito relativo.
— Você não me parece o tipo que surpreende ou desaponta. — Deu partida no
carro e o colocou em movimento. — Olho para você e vejo uma mulher que tem tudo
planejado, certinho, para não cometer erros e que sempre corresponde às expectativas
das pessoas.
— Não sei por que você pensa isso de mim se nem me conhece direito —
retruquei. — Eu não sou tão certinha assim. Também erro e cometo enganos, só que com
menos frequência que você.
— Então estamos quites, Anna — rebateu. — Você também mal me conhece e
me julga um playboy irresponsável e filhinho de papai sem, ao menos, saber minha
história e se tenho motivos para eu ser assim.
— Papai, para de conveisá e vamo logo tomá soivete. — A garotinha nos
interrompeu, envolvendo meu pescoço com um dos bracinhos e fazendo o pedido a
Gabriel de forma manhosa.
Ainda bem que ela se intrometeu no assunto e colocou um fim naquele diálogo
deprimente. Conheço-me bem o bastante para saber que aquilo caminharia para uma
discussão acalorada entre nós dois. Aliás, era de se admirar que ainda não tivéssemos
brigado. Acho que estávamos nos segurando o máximo para cumprir o acordo de trégua
e cuidar da criança.
Será que eu conseguiria até o fim?
— Pode ficar sossegada, mocinha. — Respondeu com voz macia. — Tem uma
ótima sorveteria aqui perto e já estamos quase chegando lá.
— Obaaa! O meu e da tia Naninha é de chocoiate — gritou animada.
— O que é isso, Maria Isabel? — Gabriel a repreendeu. — Deixe Anna
escolher o sabor que preferir. Você não pode forçar as pessoas a gostarem do mesmo
que o seu.
— Uai, papai. Toda mocinha monita góta de soivete de chocoiate. A tia
Naninha é linda, deve gotá tamém — falou toda manhosa.
Chegamos à sorveteria, por sorte Gabriel achou um lugar para estacionar quase
em frente a ela. Seriam poucos passos até lá. Soltei o cinto de segurança e ele pegou a
garotinha do meu colo e, muito à vontade, caminhou ao meu lado até o local. Belinha foi
logo pedindo tudo o que queria e tinha direito para o seu sorvete. Escolheu desde a
cobertura até os confeitos que desejava. Enquanto seu pai a segurava nos braços, ela ia
dizendo e eu montando sua casquinha.
— E você? — Gabriel perguntou assim que nos sentamos em uma mesa na parte
de fora do estabelecimento para vermos o movimento da rua.
— Eu o quê? — disse, sem graça.
— Não vai escolher o sabor do seu sorvete?
— A tia Naninha tá com vegonha de comê na nossa flente, papai. — Belinha se
intromete na conversa.
— Obrigada! Mas durante a semana eu não costumo sair da minha dieta. — Dou
uma risadinha sem graça.
— Tá vendo só? Tudo certinho e planejado. — Usou um tom irônico.
— Gabriel! — Encarei e o repreendi.
— É só uma brincadeira, Anna.
— De muito mau gosto. É a segunda vez que você repete isso hoje — ralhei com
ele e desviei meu olhar para a rua. — A propósito, sei que temos um pacto para uma
trégua nas nossas brigas, mas se continuar me provocando assim, não respondo por mim
e posso jogar tudo para o alto.
— Tudo bem, não está mais aqui quem falou. — Nervosa, percebi que mesmo
cedendo, ele estava se divertindo às minhas custas. — Se não vai tomar sorvete, eu sim.
Com licença, que vou montar o meu.
Ele tinha o dom de me provocar com a maior facilidade do mundo. Eu odiava
quando alguém me julgava sem me conhecer direito. E meu vizinho estava fazendo isso
naquele momento. Cruzei meus braços irritada e voltei a olhar em outra direção. Ele
retornou para mesa e começou a conversar com Belinha. Os dois pareciam se dar muito
bem e apreciar a companhia um do outro, o que era muito bom para a relação deles.
Sem interagir com eles, me lembrei do que ele me disse dentro do carro e
distraída comecei a divagar a respeito.
Por que será que Gabriel vivia aquela vida de playboy? Quais seriam os
motivos que o levaram a fazer aquilo? Ele tinha tanto jeito com crianças, por que
fugia de relacionamentos e de construir uma família? Será que tinha algo a ver com
a mãe da garotinha a minha frente?
O tempo passou rápido demais, com os dois tagarelando sem parar na mesa.
Maria Isabel falava e Gabriel concordando a cobria de mimos e atenção. Confesso que
me senti uma planta ornamentando a mesa, como uma intrusa na vida e relacionamento
entre pai e filha, ouvindo-os conversar sobre vários assuntos aleatórios. Até mesmo
sobre desenhos animados, que ele parecia conhecer muito bem, o que me surpreendeu
bastante.
Depois de algum tempo, ele pagou a conta e caminhamos de volta até o seu
carro. A menina estava toda manhosa nos braços do pai, com a cabecinha deitada em
seu ombro. Fomos direto para casa, mas no caminho, Belinha, que parecia exausta,
adormeceu em meu colo. Mais calma, me enchi de coragem e resolvi puxar um assunto
que, para ele, parecia se meio delicado.
— Então, você tem motivos para ter uma vida desregrada e ser um playboy que
não quer saber de trabalhar? — Pude ver que minha pergunta o surpreendeu.
— É isso aí. — Manteve os olhos fixos no caminho à sua frente.
— Ah, e tem alguma coisa a ver com a mãe de Belinha? — indaguei, sem
rodeios.
— Em grande parte, sim. — Mordeu o lábio inferior. — Será que podemos
mudar o rumo dessa conversa?
— Claro, me desculpe.
— Me fala um pouco de você — disse num tom curioso. — Então, costuma ir à
casa da sua avó todos os domingos?
Fiquei meio sem graça com a sua pergunta. Era raro os homens com quem eu
saía me perguntarem algo tão corriqueiro.
Mas o que eu estava pensando, afinal? Aquilo ali não era um encontro.
Só estamos voltando de um exame de DNA. Não sei por que algo tão bobo
passou pela minha cabeça.
Concentre-se, Anna.
— Meus pais morreram quando eu era bem pequena e foi ela quem me criou —
respondi educadamente. — Vó Eugênia é a minha maior referência de família.
Gabriel tamborilou os dedos no volante com o semblante pensativo, com certeza
formulando a próxima pergunta.
— E por que não a trouxe para morar com você?
— É uma longa história. Depois de se separar do marido, minha tia Laís se
mudou para a casa da minha avó junto com minha prima, Suelen. As duas, meio que não
fazem nada na vida e vivem às custas de minha avó. Ela se sente responsável pelas
duas. — Nem sei dizer por que estava abrindo a minha vida com tanta facilidade para
ele, o cara mais insuportável e que eu mais odiava na face da terra. Mesmo assim
continuei. — Eu até convidei, porém ela não aceitou. Não teve coragem de abandonar
as duas à própria sorte. Eu vou vê-la todos os domingos desde então.
— E por que você não levou as três? A casa é grande. — Passou uma das mãos
pelo cabelo.
— É complicado — respondi, impaciente. — Não me leve a mal, mas agora sou
eu quem quero mudar o foco da conversa. Pode ser?
— Do que vamos falar, então?
— Do seu primeiro dia como pai, sua interação com Belinha — sugeri.
— Nem me fale disso! — Ele pareceu estar nervoso. — Estou com muito medo
disso tudo, de verdade. Em pânico. Ainda não me acostumei com a ideia. Não sei se
vou dar conta. Tenho receio de fazer tudo errado. De que algum mal aconteça a ela.
Tenho a ligeira impressão de que serei um péssimo pai.
O tom de sua voz mudou de nervoso para chateado e pude perceber que ele
parecia estar decepcionado consigo mesmo.
— Pois eu posso te garantir que você está se saindo muito bem no papel de pai
— falei com calma ao pararmos em um sinal. — Eu nem precisava ter ido junto. A
interação entre vocês foi perfeita.
— Não sei, Anna. — Pigarreou, me encarando. — Tenho muito medo de falhar
com ela.
— Isso não vai acontecer — afirmei com um meio sorriso. — Eu estou aqui
para ajudar, lembra?
— Digamos que a sua presença deixa tudo bem mais leve. — Voltou a atenção
para o caminho.
Fizemos o restante do percurso até o condomínio em silêncio. Quando lá
chegamos, Gabriel abriu a porta do carro, soltei o cinto de segurança que prendia a mim
e Belinha, ele a pegou no colo e a levou para dentro, me convidando a entrar.
— Bom, acho que eu já vou indo... — Comecei a falar assim que ele retornou à
sala, mas fui travada pelo seu olhar intenso.
Todo lindo e cheiroso, o homem mais insuportável e convencido que já conheci,
se aproximou de mim, sem desviar os olhos dos meus.
Meu pai do céu!
Estou sem reação. O que está acontecendo aqui? Será que ele vai me beijar?
Onde está aquela mulher brigona e chata que sempre discute com ele e bota um fim em
tudo quando eu mais preciso?
Com um gesto lento, ele colocou uma mecha do meu cabelo atrás da minha
orelha, me deixando imóvel. Eu nunca o havia visto assim de tão perto, nossa
proximidade era tanta que mal dava para passar uma folha de papel entre nós. Que ele
era lindo eu já sabia e não dava para negar, mas assim, com nossos corpos quase
colados, ele parecia ainda mais perfeito, cheiroso e gostoso.
— Pode ficar, se quiser — sussurrou e eu ofeguei. — Você se propôs a me
ajudar com Belinha, acho que concentrar tudo aqui em minha casa pode facilitar as
coisas para a gente.
Embriagada pelo seu perfume delicioso e me sentindo muito propensa a beijá-
lo, ainda encontrei forças para resistir. Meu juízo, que havia saído para dar uma
voltinha, enfim retornou e então, me afastei.
— Eu tenho algumas coisas para fazer em casa. Agora ela está dormindo e não
dará trabalho. Se ela acordar ou acontecer algo é só chamar. Estarei aqui ao lado —
falei tudo num rompante só e saí rumo à minha casa sem sequer olhar para trás.
Gabriel...

— Droga, Anna! Estou me sentindo um bunda mole vestido assim. — Ela riu,
enquanto eu falava.
— Você prometeu. Além do mais, faz parte do nosso acordo, lembra? — disse,
ajeitando a minha gravata.
Maldita hora em que fui aceitar suas condições. No início, achei que seria fácil
voltar a me trajar como um executivo, mas assim que coloquei aquela maldita gravata,
comecei a me sentir sufocado por ela.
— Olha, não vai ser tão ruim assim. Pensa pelo lado bom da coisa, quando sua
filha começar a entender, vai se sentir orgulhosa de ter um pai trabalhador, honesto,
cumpridor de suas obrigações. — Arqueou uma sobrancelha, balançando o indicador
em minha direção. — No futuro, você ainda vai me agradecer por isso.
— Tá legal! Você também vai ficar orgulhosa de mim? — Revelo, sem querer, a
minha curiosidade sobre ela.
Pensei também em como deixaria meu pai e minha mãe felizes com essa
mudança repentina. Eles vêm me cobrando isso há algum tempo e eu sempre me
negando com veemência. Agora com o surgimento de Belinha e o acordo com Anna, eu,
finalmente, iria realizar o grande desejo deles, voltar a ser aquele Gabriel responsável
e dedicado ao trabalho, à empresa e a profissão que eu um dia fui.
— Todos nós ficaremos, Gabriel. — Revirou os olhos. — Belinha, seus pais,
parentes, amigos, vizinhos e até eu.
Por que será que ela havia se colocado em último lugar na lista? E o que quis
dizer com “até eu”?
Pensei, porém, achei melhor deixar para lá. Vai que a resposta fosse algo que
iria me desagradar.
— Você sabe que meu pai não é bobo e vai desconfiar que existe algo de errado
acontecendo, não é mesmo? — Faço mais uma tentativa inútil de convencê-la a mudar
de ideia. — Será que não é melhor deixarmos para começar essa parte do acordo
depois que o resultado do exame sair? Vai que ela nem é minha filha.
— Não, porque eu não tenho dúvida nenhuma desse resultado. — Derrotado,
desviei meus olhos dos seus. — Por que você não aproveita e já conta toda a verdade
para o doutor Roger? Tenho certeza de que ele e dona Cora ficarão felizes com a
notícia de que são avós.
— Tá louca, Anna? — Riu mais uma vez, ajeitando agora o paletó do meu terno.
— Só vou contar quando tiver certeza e estiver com resultado do DNA em mãos.
— Ok, você é quem sabe! — Encarou-me com olhos expressivos.
— Sabe, eu estava pensando aqui, se combinamos de cuidar juntos de Maria
Isabel, não tem sentido eu ir trabalhar e te deixar sozinha aqui com ela — falei, me
aproximando um pouco mais e assistindo de camarote ela revirar os olhos. — Acho que
tem um furo em nosso acordo e precisamos renegociar as condições.
— Não seja babaca, Gabriel Montenegro Bittencourt. Estou por um triz de
discutir com você de novo e infringir mais uma vez a cláusula da nossa trégua. — Senti
o nó da minha gravata me incomodar de novo e mexi nele, enquanto ela continuava a
falar. — O que combinamos é que eu te ajudaria a cuidar da garotinha até o final das
minhas férias, ou que você contratasse uma babá. E é isso que vou fazer, estou de folga
e ficarei com ela o dia todo para que você trabalhe. Por falar nisso, é melhor você se
despedir da sua filha e sair, ou vai chegar atrasado.
Encostei no balcão da minha cozinha, pensativo. Tomado por uma vontade
enorme de jogar tudo para o alto. Voltei a me concentrar no que Anna havia dito e fui
até o quarto de Belinha, que já estava acordada com seus olhinhos enormes arregalados
e sorriu para mim de um jeito encantador. Eu já estava começando a me apegar aquela
garotinha, só não sabia se isso era bom ou ruim.
— Oi, filha. Bom dia! — Aproximei-me, beijei sua cabecinha e falei, tentando
mostrar animação. — O papai está indo trabalhar e a tia Anna vai ficar com você até eu
voltar.
Era estranho falar com ela daquela maneira, assumindo nossa condição de pai e
filha sem, ao menos, estar de posse do resultado do exame de DNA e ter certeza disso.
— Vô senti sodade de vochê, papai. — Levantou-se, ficando em pé na cama,
enlaçou o meu pescoço e me deu um beijo molhado e estalado na face.
— Também vou sentir saudades, mas prometo voltar logo.
— Você vai retornar ao final do expediente. — Anna apareceu como um
fantasma na porta e falou levando a mão na cintura. — Trato é trato. — Revirei os olhos
para ela.
— Claro que sim. — Inclinei-me para dar um último beijo em Belinha. — Mas
tenho certeza e esperança de que o tempo passará rápido.
— Ótimo! — Sorriu vitoriosa. — Agora vá ou vou achar que está procurando
um pretexto para se atrasar.
— Puta que pariu, Anna! Você é mesmo chave de cadeia. — Apressei-me em
dizer, passando por ela e indo em direção a saída.
— Tudo bem! — Acompanhou-me até a porta. — Se quiser, paramos tudo por
aqui e você cuida da garota sozinho. Aliás, você deveria moderar suas palavras chulas
na frente dela. Não é nada saudável para a criança ficar ouvindo seu pai falar
palavrões.
— Vá a merda! — Aproximo-me mais dela, puto da vida.
— Se você continuar irritado comigo e prosseguirmos discutindo, vai ser pior!
Conforme o nosso acordo, você terá que trabalhar todos os dias de forma responsável.
Agirá sempre assim? — Suspirei longamente, engolindo as palavras para não prolongar
aquela discussão.
— Deus que me proteja de você. — Tamborilei os dedos na porta. — Se
precisar de mim ou acontecer algo, me liga, que volto correndo para casa.
— Vai tranquilo, ficará tudo bem com nós duas.
Aproximou-se mais uma vez para ajeitar de novo minha gravata e nossos
olhares se cruzaram. Aquela maldita atração que sinto por ela, em especial quando
estamos brigando, ressurge e a minha vontade é tomá-la em meus braços e tascar-lhe um
beijo de arrepiar seu corpo inteiro. Droga! Preciso sair com alguma das minhas
“amigas” para me aliviar ou isso aqui vai dar merda.
— Anna, Anna... — Forcei um afastamento, sem a mínima vontade. — Você está
brincando com fogo, abelhinha.
— Como assim?
— Até mais tarde! — Não respondi a sua pergunta, me afastando dela e saindo
de casa em direção ao meu carro.
— Não sei se você percebeu, mas acaba de infringir mais uma regra me
chamando por esse apelido ridículo — gritou e sua braveza, sem explicação, reflete em
meu pau, fazendo-o pulsar dentro das minhas calças.
O que está acontecendo comigo, meu Deus?
Só podia ser falta de sexo. Precisava dar um jeito naquilo urgente.

— Posso saber que milagre foi esse? — Meu pai entrou em minha sala sem ser
anunciado, fazendo sua voz ecoar por toda ela.
— Que susto pai. — Quase deixei cair o celular, que estava segurando enquanto
olhava uma foto que tirei de Belinha ontem na sorveteria, na qual Anna aparecia no
fundo.
— O que trouxe o meu filho pródigo à empresa no início do expediente de terno
e gravata? — falou, colocando as mãos nos bolsos.
Achei engraçada a reação dele diante de tudo. Não era isso que ele queria e me
cobrava há três anos? Ao invés de ficar feliz, parece apenas curioso e achando que
estou aprontando alguma coisa.
— Não é o que o senhor e minha mãe sempre quiseram e sonharam? — Franziu
o cenho, enquanto se sentava a minha frente. — Resolvi seguir o seu conselho. Estou de
volta ao modo homem responsável e de família. — Eu esperava estar sendo
convincente, não queria falar sobre Belinha ainda.
— Gabriel...
— Tudo bem, pai. Eu estou de volta.
— Você está me escondendo alguma coisa?
— Por que estaria?
— Porque conversamos há poucos dias e você não me pareceu muito disposto a
ceder.
— O senhor me pediu para pensar melhor a respeito. Foi o que fiz e resolvi
voltar.
— Você tem certeza de que é só isso? Não há nada mais por trás da sua
decisão? — questionou, deixando-me surpreso.
— Fique tranquilo, doutor Roger, está tudo sob controle. — Menti
descaradamente.
— Está seguro disso? — Balançou a cabeça em minha direção. — Você sabe,
meu filho, que se estiver acontecendo alguma coisa ou com algum problema, pode se
abrir comigo. Eu o ajudarei, independentemente de qualquer coisa.
— Pai, de boa! Não precisa se preocupar. Estou mesmo voltando por livre e
espontânea vontade. Porque eu quero isso.
— Está falando sério?
— É claro que sim.
— Ah, Gabriel! — Massageou as têmporas. — Por que eu tenho a ligeira
impressão de que está me escondendo algo?
— Tá legal, pai! — Cerrei os dentes. — Não tem como enganar o senhor
mesmo. Tem sim algo por trás da minha decisão de voltar.
— Suponho que você não irá me falar o que é.
— Por enquanto, não. — Adiantei-me em dizer. — Na hora certa, acredito que
dentro de doze dias, mais ou menos, o senhor e dona Cora serão os primeiros a saber.
Mas fique tranquilo que não é nada ilícito ou perigoso.
— Assim espero.
Ele não disse mais nada por alguns instantes. Achei que meu pai ficaria feliz ao
me ver retornar com responsabilidade ao meu cargo na empresa, mas, pelo jeito, eu
acabei o deixando preocupado.
— Tem alguma coisa a ver com Tábata? Não me diga que aquela irresponsável,
que quase acabou com a sua vida, retornou.
— Em parte tem a ver com ela, sim. Entretanto, minha ex noiva não voltou.
— Aposto que se arrependeu de abandonar um rapaz de família e trabalhador,
está querendo voltar e fez exigências. É isso, meu filho?
— Também não, pai! Francamente! Não acredito que o senhor ainda acha que eu
voltaria com ela depois de tudo o que me fez passar. Tábata faz parte do meu passado e
é lá que vai permanecer.
— Então, qual o problema? O que pode ter a ver com ela e não ser uma
reconciliação entre vocês.
— Doutor Roger, eu não quero falar sobre isso agora, por favor.
— E por que não?
— Estou esperando pela confirmação de algo. Assim que tiver, conto tudo para
vocês dois. Esse não é o melhor momento para se fazer isso. Mas já adianto que irão
gostar da novidade se ela se concretizar.
— Você sabe que a sua mãe vai ficar muito curiosa e ansiosa quando eu disser
isso.
— Tenho certeza de que o senhor saberá como controlar essa situação. Por hora,
espero que fiquem felizes com a minha volta.
— É claro que estou feliz, meu filho. — Meu pai se levantou, sorriu e abriu os
braços em minha direção. Repetindo o seu gesto, caminhei até ele e nos abraçamos. —
Seja bem-vindo de volta a M.B Papel e Celulose. Sua mãe também ficará radiante com
a novidade.
Minutos depois e sem mais me questionar, meu pai saiu de minha sala e pude
voltar ao trabalho, mas não sem antes olhar a foto das duas garotas lindas que me
esperavam em casa.
Anna...

Eu e Belinha passamos o dia inteiro juntas. Até que foi tranquilo, a garotinha era
muito boazinha e fofa. Já estava conquistando meu coração. Não sei dizer se era o fato
de a mãe tê-la deixado sem mais nem menos na porta do pai, que nem sabia da sua
existência, ou por notar que era extremamente carente de atenção e carinho. O fato é que
eu estava me afeiçoando muito a ela.
No final da tarde, Maria Isabel começou a ficar um pouco mais agitada. A
menina, que já era tagarela por natureza, agora também parecia que falava até pelos
cotovelos.
— Que tal tomar um banho e colocar uma roupa limpinha? — indaguei,
levando-a para o quarto em meu colo.
Ela concordou, tirei sua roupa e a levei ao banheiro enrolada na toalha. Voltei
aos seus aposentos e peguei um vestidinho de malha confortável.
— Vamos lavar tudo direitinho para ficar bem cheirosa.
— Vamos sim, tia Naninha. O papai tá pra chegá, né?
— Pelo horário, já deve estar quase chegando. Por quê?
— Ele vai gotá de me vê limpinha, espelando poi ele — respondeu, enquanto
eu esfregava seu corpo.
— Tenho certeza de que ele vai amar chegar em casa e te encontrar,
independentemente do banho. É muito bom termos alguém esperando por nós.
— Eu goto muito dele. O papai é lindão. Será que vai dar tempo dele assisti
desenho comigo?
— Acho que ele vai chegar cansado do trabalho, mas quem sabe mais tarde.
— Tá bom — respondeu meio desapontada.
— Não fique assim, minha querida. O papai te ama! É que as vezes nos
cansamos um pouco do trabalho e precisamos de um tempo para recuperar nossas
forças.
Finalizei logo o seu banho e a vesti, porém também fiquei toda molhada. Para
não a deixar sozinha, fiz uma coisa que eu não sabia se iria incomodar Gabriel. Fui até
seu quarto, peguei uma camiseta e short emprestados, que, por sinal, ficaram enormes
em mim. Fiz uma anotação mental de trazer uma muda de roupa na manhã seguinte, não
dava para ficar usando as dele, que, por sinal, tinha um cheiro maravilhoso.
— E aí, como foi? — perguntei assim que ele entrou pela porta da sala, onde eu
e Belinha o esperávamos, assistindo a um programa infantil na TV.
— Um pouco cansativo. Eu já havia me desacostumado a trabalhar por tanto
tempo. Mas correu tudo bem.
— Que bom! E o seu pai?
— Como eu previa, desconfiou que havia algo de errado. Acabei contando a ele
que existe sim, um motivo para eu voltar a M.B., porém não falei sobre Belinha ainda.
Prometi que na hora certa ele e minha mãe seriam os primeiros a saber a novidade.
Olhou-me de cima a baixo ao perceber que estava usando suas roupas e mordeu
o lábio inferior, me encarando com olhos penetrantes, que me fizeram tremer de
excitação.
Foco, Anna! Você sabe que esse cara não vale nada e não convém se sentir
envolvida por ele.
— Espero que não se importe. Eu dei banho em Belinha, acabei me molhando
toda e me esqueci de trazer roupa — justifiquei-me. — Eu não queria deixá-la sozinha e
acabei achando mais fácil colocar as suas ao invés de ir até a minha casa com ela.
— Sem problemas. — Olhou-me de cima a baixo de modo sacana, que até hoje,
com essa intensidade, só vi nele. — Fique à vontade para fazer o que quiser. Elas
ficaram bem em você.
Belinha, que havia tirado um cochilo no sofá enquanto esperava a chegada do
pai, despertou e, toda empolgada, ficou de pé no móvel, abrindo os bracinhos.
— Já chegô, papai? — Ele se aproximou e ela jogou os bracinhos em seu
pescoço.
— Sim, minha princesinha. Acabei de chegar. — Rodopiou com ela em seus
braços pela sala.
— Vamos assistir um desenho, agola?
— O papai está um pouco cansado, filha. — Acariciou com delicadeza a sua
cabecinha.
— Mas é aquele que vochê gota, paizinho. — Fez um bico e o encarou com
olhos pidões.
— Tá legal, mas vai ser um desenho só, ok? Depois vamos comer pizza. O que
acha?
— Obaaaa! — A garotinha gritou toda animada.
— Anna, você pode pedir uma pizza e refrigerante para jantarmos, por favor?
— perguntou enquanto os dois se acomodavam no sofá. — E fique para jantar com a
gente. Vai ser ótimo termos a sua companhia.
— Vou pedir, mas não se preocupe comigo, vou embora daqui a pouco, tenho
algumas coisas para fazer e resolver em casa — disse com voz vacilante.
— Ei, janta com a gente. — Sorriu amistoso. — Se for embora agora, vai ter
que fazer algo para comer ou pedir um fastfood. A pizza é grande para nós dois,
podemos dividi-la com você.
— Acho melhor eu ir. Não quero atrapalhar a interação de vocês. — Caminhei
em direção a um aparador, onde deixei minha bolsa desde a hora que cheguei. — Se
precisar de algo, estarei aqui do lado, é só chamar.
— Fica. — Gabriel já estava em pé na minha frente, segurando meu braço. —
Por favor.
— Não vou mesmo atrapalhar?
— Claro que não, Anna. Eu acabei de chegar do trabalho, cansado, quero
apenas ter um bom momento com você e minha filha. Contar as novidades. Não há nada
demais nisso.
— Talvez você tenha razão. Vou pedir a pizza e ficarei para o jantar. — Cedi.
— Posso resolver as coisas em casa mais tarde.
— Papai, vem! — A garotinha gritou do sofá. — Já vai começá.
— Estou indo, filha — falou, soltando o meu braço. — Não vai se juntar a nós?
— Vou só pedir a pizza e estou indo.

Nem vi a hora passar. Assistimos ao desenho com Belinha, a pizza chegou e


jantamos com alegria. Depois voltamos para a sala, conversamos de tudo um pouco e
demos muitas risadas. A garotinha enfim cedeu ao cansaço e adormeceu com a cabeça
no colo de Gabriel. Ele piscou para mim com cumplicidade, se levantou com ela nos
braços e caminhou em direção ao seu quarto. Quanto a mim, continuei sentada no sofá,
não seria de bom tom ir embora sem me despedir depois das horas agradáveis que
passamos juntos.
Enquanto ele não voltava, pensei e repensei várias vezes em como me sentia
bem e acolhida quando estava com os dois. Até parecíamos uma família, mas não era
real, a mãe de Belinha era outra pessoa. Confesso que aquilo começou a me incomodar
um pouco. O que será que aquela mulher representava para Gabriel? Se ela voltasse e o
procurasse, será que a perdoaria e ficariam juntos? Permaneci perdida nesses
pensamentos até que ele retornou.
— Bom, acho que está na minha hora também. É melhor eu ir embora. Já é tarde.
— Fica mais um pouco. — Segurou em minha mão. — Logo agora que eu ia te
contar como foi o meu dia e te agradecer.
— Agradecer? Pelo quê? Se for por ter ficado com Belinha, não precisa. Ela é
uma garotinha muito doce e não deu trabalho nenhum.
— Obrigada por me fazer voltar ao trabalho responsável. — Sorriu de lado. —
Detesto admitir que a minha vizinha chata, brigona e empata-foda tinha razão, mas
aquela empresa é o meu mundo, o meu trabalho e a minha vida. Só não sei dizer por que
demorei tanto tempo para admitir isso.
— Que bom que está feliz com o retorno. — Aproximei-me um pouco mais dele.
— Isso significa que não teremos que brigar todas as manhãs.
— Acho que sim.
— É melhor eu ir, então. Amanhã teremos um longo dia pela frente. Você na
empresa e eu com Belinha.
— Tudo bem. Vou te acompanhar até a porta.
Assim que ele a abriu para mim, me esqueci do degrau, pisei em falso e quase
caí no chão. Gabriel foi ágil em me segurar e foi aí que tudo aconteceu. Respirando com
dificuldade, assim como eu, ele olhou para baixo e nossos olhares se cruzaram. De
imediato, a tensão sexual ficou palpável entre nós. Com uma das mãos, ele me puxou
pela cintura, colando nossos corpos. Umedeceu os lábios e desceu sua boca até a
minha, provocando meu lábio inferior com a língua, fazendo com que eu a abrisse mais
e desse passagem para ele me beijar com vontade. Senti a maciez, o sabor gostoso e
sensações que eu não conseguia descrever.
Nossas línguas se entrelaçaram e gememos em uníssono. Gabriel apertou minha
cintura, pressionando ainda mais nossos corpos. Nem um de nós tentou refrear aquele
beijo. Passei as mãos pelos seus braços e cravei as unhas na sua pele, fazendo-o gemer.
Ele me pegou no colo, colocando-me sentada sobre a mureta da varanda da sua casa,
que, por sorte, estava meio escura porque havíamos esquecido de acender as luzes, e se
colocou entre as minhas pernas, que eu abri mais para que meu vizinho se encaixasse
melhor, e cruzei-as na sua cintura.
Sem se conter, se esfregou em mim e pude sentir o quanto seu pau estava duro e
prestes a explodir dentro da calça. Subiu devagar a minha blusa, tocando a minha pele,
me fazendo arrepiar. Retirou-a do meu corpo e mesmo eu estando ciente de onde
estávamos e de que alguém poderia nos ver, não consegui protestar.
Segurou um dos meus seios com a mão fechada e soltou um gemido gutural.
Parou de me beijar e desceu a boca pelo meu pescoço, sugando-o e arranhando minha
pele com sua barba por fazer. Mergulhou a língua no côncavo entre os meus peitos.
Meus dedos se enroscaram em seus cabelos e eu o puxei para mais perto de mim.
Passando as mãos pelas minhas costas, abriu o meu sutiã e gemeu mais uma vez.
— Porra, abelhinha, você é muito...
Foi só ouvir aquele maldito apelido para cair em mim e o encanto se findar.
Travei, parei de responder aos seus estímulos e o empurrei. Confuso, encarou meus
olhos e pela sua expressão acho que enxergou meu remorso, enquanto eu, mortificada,
vestia e abotoava o meu sutiã. Olhei mais uma vez, incrédula, para o volume em suas
calças, enquanto colocava a minha blusa. Tudo isso sem dizer uma só palavra, enquanto
ele me observava sem entender nada. Senti um desejo imenso me massacrar, mas me
contive.
— O que está pensando que eu sou? Droga! Isso não podia ter acontecido. —
Levei as mãos a boca, arrependida. — Eu não sou como as mulheres
descompromissadas que você costuma ficar.
— Por que não, Anna? — perguntou. — Somos duas pessoas adultas cedendo
ao desejo. Em momento algum te confundi com outra mulher. Tinha total noção de quem
era e que queria ficar com você.
Eu não disse mais nada e como uma adolescente, que acabou de perder a
virgindade e está com vergonha do que fez, corri em direção a minha casa. Graças a
Deus, Gabriel não tentou me impedir. Eu não podia ter deixado aquilo acontecer. Como
ficaria o nosso acordo a partir de agora?
Quando entrei em casa e bati a porta atrás de mim, senti a ardência do beijo em
meus lábios e percebi que queria mais. Olhei inconformada pela janela e o vi, olhando
confuso em direção a minha residência. Fui para meu quarto incomodada com as coisas
que eu havia sentido, tirei as roupas e fui tomar banho. Pensei na maciez da sua boca na
minha e em tudo o que poderíamos ter feito. Não resisti e me masturbei embaixo do
chuveiro. Nem precisou de muito tempo, em contrapartida ao que fizemos na sua
varanda, poucos segundos depois meu gemido de prazer ecoou pelo banheiro.
Eu não podia me apaixonar por Gabriel Montenegro Bittencourt, ele era um
playboy mulherengo, farrista e solteiro convicto. Ele só me usaria, assim como fazia
com todas as outras mulheres com quem ficava e depois me abandonaria. Eu não queria
mais isso para a minha vida, já me bastavam os inúmeros namorados que me deixaram e
fizeram sofrer para ficar com minha prima. Ele não era a pessoa certa para mim.
Precisava sair com alguém urgente, essa minha reação inusitada poderia muito bem ser
por falta de sexo. E, nesse caso, seria melhor para mim, pois eu descobriria que só
estava confundindo as coisas.
Eu estava odiando me sentir daquela maneira.
Gabriel...

Pela primeira vez, desde que dei uma guinada de cento e oitenta graus na minha
vida e me tornei um playboy e solteiro convicto, fui rejeitado por uma mulher, deixei o
nervosismo tomar conta de mim e fiquei sem reação. Não entendi nada do que havia
acontecido e foi difícil processar sua rejeição. Permaneci mais um tempo na varanda,
olhando incrédulo na direção da casa de Anna. Impaciente, coloquei as mãos nos bolsos
e resolvi entrar e, já que Maria Isabel estava dormindo, dar uma zapeada nas redes
sociais em busca de distração.
Quase não dormi a noite toda pensando no que houve entre nós. Foi uma atração
tão forte que não conseguimos controlar. Pelo menos, eu não. Ela, eu não poderia dizer
o mesmo, já que me repeliu com maestria e se quer deu explicações, correndo para casa
feito uma criança assustada. E nem tinha se dado ao trabalho de aparecer na manhã
seguinte. Como eu iria cumprir minha parte no acordo e ir trabalhar se ela também não
estava fazendo a dela de vir ficar com Belinha para que eu pudesse me encaminhar a
empresa?
— Papai, a tia Naninha não vem hoje? — Belinha me trouxe a vida real, me
tirando da minha bolha de pensamentos.
— Ela se chateou um pouco com o papai ontem à noite, depois que você dormiu
— respondi sem dar muitos detalhes. — Acho que ela está de mal de mim.
— Dá uma flor pá ela, papai. A mamãe sempe ficava de bem dos namolados
dela quando eles davam rosas pá ela.
Essa menina era um gênio, não era à toa que era minha filha. Claro! Eu iria até a
casa de Anna, com flores e pediria desculpas pela noite anterior. Diria a ela que, com
certeza, o que aconteceu era porque eu estava a muito tempo sem sexo. Tenho certeza de
que me entenderia, afinal estava passando pelo mesmo que eu. De uma hora para a
outra, nós dois tivemos que deixar nossa vida pessoal de lado para cuidar de Belinha.
Mas onde eu encontraria uma flor a essa hora do dia, ainda mais aqui no condomínio?
Não tinha outro jeito, teria que furtá-la do próprio jardim da minha vizinha. Atravessei
apressado a área entre a minha casa e a dela, furtei uma linda rosa vermelha e me
encaminhei para a sua porta.
Quando o “ding dong” da campainha soou, respirei aliviado ao ver Anna abrir a
porta para mim, depois de olhar pela janela da sala e ver que era eu. Afinal, ela poderia
ter me ignorado. Talvez não estivesse tão brava assim, a raiva inicial já tivesse
passado ou havia aberto a porta para me distratar, dizer que me odiava, não me
perdoaria jamais e que não me ajudaria mais. Vindo de Anna Ayala, minha vizinha chata
e brigona, eu poderia esperar qualquer coisa.
— Bom dia! — Cumprimentei com o meu melhor sorriso, entregando-lhe a rosa
vermelha que estava em minha mão.
— O que você quer? — Me encarou com um olhar questionador. — Sério que
você roubou uma rosa do meu jardim para me dar?
— É que a essa hora da manhã eu não fazia ideia de onde encontrar uma flor
para você. Achei que não se importaria, afinal trata-se de uma gentileza da minha parte.
— Obrigada. — Balançou a cabeça de um lado para o outro, inconformada. —
O que faz aqui tão cedo?
— Nós precisamos conversar sobre ontem à noite, Anna. — Encostei-me no
batente da porta. — E eu preciso saber se o nosso acordo ainda está de pé e se vai ficar
com Belinha para que eu possa ir trabalhar e cumprir minha parte no trato.
— Olha, Gabriel, acho que nosso acordo não foi uma boa ideia. Posso não ser a
pessoa certa para ajudá-lo. Além do que, acho que você está confundindo as coisas e...
— Por favor, Anna. Deixe-me me explicar. — Ela me encarou espantada. — Se
mesmo depois de me ouvir você resolver colocar um fim no nosso acordo, não vou
tentar forçá-la a nada. Prometo respeitar sua decisão. Mas primeiro me ouça. Eu vou
ser breve.
— Ok, entra. — Abriu um pouco mais a porta me dando passagem. — Quer um
café?
— Obrigado! Eu já tomei em casa.
— O que você tem para me dizer, afinal?
— Tá. Vou direto ao assunto, então. — Soltei o ar com pesar. — O que
aconteceu entre nós ontem à noite foi muito bom. — Ela me lançou um olhar severo de
repreensão. — Droga, Anna! Não precisa ficar brava assim. Somos adultos, eu não vou
mentir e dizer que não gostei. Você é uma mulher linda e gostosa, caralho.
— Se veio até a minha casa para me cantar e levar para cama, perdeu seu
tempo. Pode levantar seu traseiro gordo desse sofá, dar meia volta e ir embora.
— Você prometeu me ouvir e eu ainda não terminei de falar o que eu quero —
falei desanimado com o rumo da conversa.
Anna olhou para o chão e depois voltou a me encarar. No seu rosto uma
expressão que eu muito temia. Ela parecia estar muito tentada e decidida a colocar um
fim no nosso acordo e não mais me ajudar com a minha filha. Tudo isso por causa de um
único beijo. Tá legal que estávamos prestes a transar quando ela interrompeu nossa
deliciosa interação.
Mas será que era para tanto?
Eu havia sentido que ela tinha gostado tanto quanto eu. O que havia de mais em
dois adultos transarem por puro desejo?
— O fato é, Anna, que mesmo tendo gostado do que rolou entre nós ontem à
noite, e eu gostei muito, te peço desculpas pelo ocorrido. — Sorriu com sarcasmo. —
Te prometo que não vai acontecer de novo. Eu sou um homem adulto e minha vida
sexual era bem intensa até Maria Isabel aparecer em minha porta. É provável que meus
hormônios estejam explodindo e que eu esteja sentindo muita falta de sexo. Portanto,
não digo essas duas primeiras semanas porque tenho muito no que pensar e me habituar,
mas assim que sair o exame de DNA, vou procurar por alguma das meninas, mais
provável que por Rayssa, que já sabe de tudo, e marcar um encontro. Acho que isso vai
afastar o risco de que essas coisas aconteçam com a gente de novo.
— Um encontro? Com Rayssa? — inquiriu, olhando em meus olhos.
Era impressão minha ou ela estava com... ciúmes? Será? Impossível! Essa
mulher me odeia pelas inúmeras noites de sono que eu a fiz perder. Ou será que era só
um disfarce?
— Foi isso que combinamos, não foi? Um encontro a cada quinze dias? — Ela
piscou os olhos várias vezes e pigarreou.
— Claro! Foi isso mesmo, que cabeça a minha. — Seu olhar parecia confuso.
— Acho até que você devia fazer o mesmo, Anna. Você parecia estar curtindo o
momento tanto quanto eu — falei, me aproximando um pouco mais dela, que me
empurrou com brusquidão.
— Eu não tenho tantos contatinhos quanto você. Assim que voltar a trabalhar,
vou aceitar um convite que venho negando há algum tempo a alguém de lá. Também
estou desconfiada de que o que aconteceu possa ter sido causado por falta de sexo. —
Concluiu, parecendo um pouco desconfortável por estar falando sobre aquele assunto
comigo.
— Alguém da empresa... Jura? Posso saber quem é?
Quem diabos estava querendo sair com a minha abelhinha? Droga, Gabriel!
Ela não é sua e pelo jeito não faz a mínima questão de querer ser.
— Não é da sua conta, Gabriel. Minha vida pessoal não te diz respeito. —
Ergueu os braços, inconformada. — A única coisa que nos une é um trato que fizemos
até que eu volte a trabalhar e você consiga uma babá para a sua filha. O que me faz
lembrar que precisamos começar a procurar por uma.
— Só te lembrando de que você se comprometeu a continuar mesmo depois que
encontrarmos alguém para olhá-la, nos finais de semana e dias de folga da contratada.
Mas, então... Isso significa que você me perdoou e está me dando uma nova chance?
— Vamos esquecer o que aconteceu e tentar de novo... Por Belinha, não por
você. Eu já me afeiçoei muito a ela.
— Bom, acho que agora você pode dar o nó na minha gravata — Sorri de canto
de boca e entreguei o objeto que estava em meu bolso para ela — e depois ir até minha
casa ficar com minha filha para eu atender suas reivindicações e trabalhar.
— Até parece que você não está gostando de voltar a ser um homem
responsável. Me lembro muito bem do que me disse ontem. — Brincou enquanto
enlaçava o pedaço de tecido no meu pescoço. — Agora vá! Vou colocar a minha rosa
em um copo d’água e daqui a pouco estarei lá.
— Ah, Anna! — Encarei-a com profundidade. — Você sabe que pode acontecer
de novo se você quiser, não é mesmo.
— Gabriel! — Ralhou com severidade.
— Está bem, desculpa! Já não está mais aqui quem falou. — Garanti a ela,
sacudindo a cabeça para dispersar as lembranças. — É que meu cérebro não é uma
lousa que eu possa passar um apagador e acabar com tudo. Não vejo problema algum
em duas pessoas adultas fazerem sexo para saciar seus desejos e necessidades. É muito
difícil para mim pedir desculpa por algo que foi muito bom.
— Está vendo só, já começou de novo. Está na cara que esse acordo não vai dar
certo mais uma vez. — Se afastou abruptamente. — Você é um playboy libertino que só
pensa em sexo. Tenho certeza de que vai dar merda. É tão difícil assim entender que eu
não quero nada com você? Que eu te odeio e só estou nessa do teu lado pela sua filha.
— Ok! Não precisa pegar pesado e nem magoar. Eu vou te respeitar. Já prometi.
Pronto.
— Não sei, Gabriel. — Foi reticente.
— Anna, eu e Belinha precisamos da sua companhia. Ela sentiu sua falta hoje
pela manhã. — Caminhei em direção a porta e me voltei para encará-la. — Foi ideia
dela eu te trazer uma rosa para me perdoar. Nós nos afeiçoamos muito a você. Nem sei
como isso foi acontecer comigo, visto que até poucos dias atrás eu te odiava e só
fazíamos brigar, mas acho que a vida tem dessas coisas. — Sentou-se no sofá,
pensativa. — Coloca sua rosa na água e pegue suas coisas, nós te esperaremos lá em
casa.
Ela bufou antes que eu saísse, mas não lhe dei a chance de replicar. Virei as
costas e fui para a minha residência, de onde só saí depois dela chegar e me certificar
que estava tudo bem entre nós e que nosso acordo ainda estava de pé.
Gabriel...

Caminhei de um lado para o outro na sala, enquanto Anna conversava e se


despedia de Belinha. Só agora me dei conta de que hoje é domingo e pelo nosso trato,
dia dela visitar a avó. Será a primeira vez em que ficarei sozinho com a minha suposta
filha e estou em pânico.
Desde nossa última e esclarecedora conversa sobre o que aconteceu com a gente
naquela noite, ela vem me evitando um pouco. Não ficava mais para o jantar. Eu
chegava, ela se despedia e ia embora. Pela manhã, aparecia no horário que tinha que
sair para empresa, apenas me ajudava com a gravata, que eu já me lembrara muito bem
como dar o nó, mas fingia que não, só para tê-la próxima a mim por alguns segundos.
Apenas no sábado Anna ficou mais tempo na minha presença porque não era dia de
trabalho, mas permaneceu meio distante. O pior é que, por mais que eu tentasse, não
conseguia esquecer daquele momento.
— Não fique triste assim, minha querida. — Abaixou, ficando de cócoras,
encarando a garotinha a sua frente. — É um dia só e a tia Anna precisa ver a vovó dela.
— Pomete que vai voltá pra Belinha?
— Claro que sim, meu amor. — Segurou com carinho na pequena mãozinha da
criança. — Eu moro aqui do lado. Lembra?
— Tá bom, mas vê se não demola.
— Você vai mesmo deixar nós dois sozinhos? — falei com minha voz
embargada pelo medo.
Ela se levantou e olhou em minha direção com o semblante sério.
— Faz parte do nosso acordo, Gabriel. — Repreendeu-me. — Desde o início
você sabia que os meus domingos eram da minha avó.
— Eu não sei se estou preparado para ficar sozinho com ela, Anna — retruquei,
me abaixando ao lado da garotinha.
— É claro que está, Gabriel. — Tombou a cabeça para o lado, analisando nós
dois juntos.
— E se algo der errado? Ela pode chorar, se machucar, ter febre... — Sem
segurar minha língua, falei de todos os meus medos e receios de uma só vez.
— Tenha paciência, Gabriel! Você é adulto e pai dela, se dão bem, não há o que
dar errado. Nunca pensei que fosse se mostrar tão inseguro com uma coisa tão simples.
É só você ficar atento a ela e suas necessidades. Eu tenho ficado todos os dias na sua
companhia e nada de mal se sucedeu até agora. Por que seria diferente com você? —
disse travessado, insatisfeita com o rumo da conversa.
— Então, tá! Se é você quem está dizendo. — Dei de ombros e peguei Maria
Isabel no colo.
— Eu já vou indo. — Olhou de soslaio, me analisando com a garotinha nos
braços. — Vejo vocês amanhã.
— Ok! — respondi a contragosto.
Acompanhei-a até a porta com o nariz franzido, ponderando a maneira nada
amistosa com que zombou dos meus medos. Crianças são seres frágeis e sou um pai de
primeira viagem, porém não preciso ser um expert para saber que com essas minúsculas
criaturinhas as coisas acontecem por um triz. Já vi e ouvi muitas histórias por aí.

Surpreendi-me ao fim do dia, quando cheguei à conclusão de que não me saí tão
mal quanto imaginava. Assim que Anna saiu, pesquisei na internet, “atrações desse final
de semana para crianças de dois anos”, e descobri que havia sido lançado um filme
baseado em um desenho animado que Belinha amava assistir na TV e levei-a para ver
no cinema do shopping que ficava próximo ao condomínio. Depois fomos a área de
recreação, onde minha filha se esbaldou em vários brinquedos e, por último, a praça de
alimentação, onde comeu um sanduíche, acompanhado de refrigerante, batata frita e do
seu amado sorvete de chocolate.
Cheguei em casa exausto, carregando nos braços uma Belinha adormecida de
tão cansada e algumas sacolas com coisas que acabei comprando para mim e para ela.
Fechei a porta com dificuldade, deixei as compras sobre a mesa e caminhei até o seu
quarto, colocando-a sobre a cama.
Gastei algum tempo admirando seu lindo rostinho. O canto de sua boca estava
um pouco sujo, mas achei melhor não acordá-la, pois estava dormindo pesado. Mais
tarde eu lhe daria um banho. Foi aí que minha ficha caiu, sou um homem e vou dar
banho em uma menina.
Será que isso era certo?
Se ela fosse minha filha, acho que tudo bem. Tenho amigos que dão banhos em
suas garotas.
Mas e se não fosse?
Será que eu me sentiria mal por isso depois?
A quem você está querendo enganar, Gabriel? Ainda não se tocou do quanto
ela se parece com você? É óbvio que é sua filha.
A voz da minha consciência me alertou mais uma vez.
Saí do quarto dela, encostando a porta atrás de mim, deixando apenas uma fresta
entreaberta para que não sentisse medo caso acordasse e estivesse tudo escuro. Fui para
a sala, esticando meus músculos o mais que podia, pois estava cansado demais e com
algumas dores na nuca por ter carregado Belinha nos braços.
Lembrei-me que eu ainda tinha que verificar alguns documentos da empresa, que
cabiam ao meu cargo em específico e que seriam analisados em uma reunião de
diretoria na manhã seguinte. Quem diria, até alguns dias atrás, eu delegaria essa função
ao meu assistente, que seria quem participaria e falaria a respeito, já que eu,
provavelmente, chegaria atrasado. Acho que podia chamar essa mudança em minha vida
de “Efeito Anna” ou “Efeito Abelhinha”. Confesso que eu preferia a segunda opção.
Sorri sozinho imaginando sua cara de brava ao saber disso.
Achei melhor tomar um banho quente e relaxante primeiro. Depois de algumas
horas sentado à mesa, analisando papéis e fazendo alguns cálculos, me dei conta de que
Maria Isabel não havia acordado para se banhar. Mas eu é que não iria despertá-la, vai
que acordasse manhosa ou com a corda toda, querendo brincar ou assistir desenhos. Eu
precisava descansar e dormir bem para o trabalho do dia seguinte.
Já era noite quando ouvi a porta de um carro batendo do lado de fora.
Aproximei-me da janela ao lado da minha sala e vi que era Anna chegando. Parecia
feliz, pois cantarolava uma música, com certeza a que devia estar tocando no rádio
quando chegou. Estampava um sorriso lindo nos lábios. Seu domingo devia ter sido
bom e prazeroso.
Não veio ver como estávamos e entrou direto em sua casa. Senti uma pontada de
decepção com sua atitude. Porém, não tinha problema, amanhã, ela, com certeza, viria
e, sem dúvida alguma, me repreenderia por não ter dado banho em minha filha. Assim,
começaríamos uma nova discussão, tentando nos conter por conta da trégua do nosso
acordo. Eu adorava ver Anna brava. Isso instigava ainda mais o meu desejo, aquele que
há alguns dias ela estava me obrigando a refrear.
Gabriel...

Alguns dias se passaram e descobri o inevitável, Belinha era mesmo minha


filha. Tábata mais uma vez havia conseguido virar meu mundo de ponta cabeça. Eu só
não conseguia entender o que ela queria me entregando a menina daquela maneira. Se
descobriu que estava grávida após me abandonar, por que não me procurou antes?
Mesmo que não ficássemos juntos, eu a ajudaria nas responsabilidades com a criança.
Algo não se encaixava nessa história toda e eu não conseguia imaginar o que era.
Sentado dentro do meu carro, voltei a olhar o resultado do exame de DNA em
minhas mãos. Eu havia sido comunicado pelo laboratório que ele tinha ficado pronto e
passei para pegá-lo logo pela manhã, antes de ir para a empresa. Anna me pediu para
ligar assim que soubesse o veredito, mas me faltava coragem. No fundo, mesmo
percebendo o quão parecida comigo ela era, não só fisicamente, mas em alguns trejeitos
também, eu ainda tinha esperança de que desse negativo.
Apesar das promessas que fiz a minha vizinha, eu precisava pensar e dar um
rumo a minha vida e na da minha pequena herdeira também. Continuava achando que
não estava preparado para ser pai, por mais que as coisas estivessem dando certo.
Estava feliz por ter voltado a assumir meu cargo na empresa, mas o medo tomou conta
de mim e eu já não tinha mais certeza se era isso que eu queria para minha vida. Ela era
tão mais fácil antes, quando eu era só um playboy irresponsável.
Era estranho descobrir que eu havia me tornado pai sendo que nem vi minha ex
grávida, nem acompanhei sua gestação.
Por que ela nunca me pediu pelo reconhecimento de paternidade?
Poderia ter levado muita vantagem nisso. Seria a mãe da herdeira de uma das
maiores fortunas da cidade, quiçá do país. E a principal de todas as minhas dúvidas
era: por que havia abandonado a criança na minha porta? O que ela pretendia com isso
depois de tanto tempo me deixando na ignorância de sua existência?
Será que meu pai tinha razão? Tábata teria por algum motivo se arrependido de
ter me deixado e agora estaria usando a criança para se aproximar e me convencer a
voltar? Não seria mais fácil ter reaparecido junto com a garota? Se fosse isso, ela
estava muito enganada. Eu já não a amava mais e nem a queria em minha vida. Não
existia mais chance para nós dois.
De repente, fui tomado pelo súbito medo de me apegar demais a Belinha e
depois ela voltar e levar a minha garotinha para longe de mim. Eu não suportaria isso.
Seria melhor me afastar dela antes que eu me apegasse ainda mais. Se é que isso era
possível. A verdade é que eu estava em pânico com a ideia de ser pai, eu não me
achava capaz nem bom o bastante para isso, e cada vez que eu pensava mais nisso, meu
medo aumentava.
Coloquei meu carro em movimento. A minha decisão estava tomada e eu sabia
com exatidão para onde ir e o que fazer. Seria o melhor para minha filha. Um dia ela
me agradeceria por isso.
Depois eu iria trabalhar e mais tarde, com tudo definido, quando voltasse para
casa contaria tudo a Anna, que havia tentado me ligar várias vezes, me obrigando a
ignorá-la com sucesso. Se contasse antes, ela daria um jeito de me demover da minha
decisão.

— Você chegou mais cedo. Segundo o nosso trato não devia estar na empresa?
— Anna me repreendeu assim que entrei pela porta da sala e foi logo me enchendo de
perguntas. — Por que não atendeu as minhas ligações? Aconteceu alguma coisa?
— Anna, nós precisamos conversar. — Aproximei-me alguns passos, encarando
minha filha que jogava os bracinhos em minha direção querendo colo, alheia a tudo.
— O exame deu negativo? — Aproximou-se, passando a criança para os meus
braços.
— Na-não — gaguejei, tentando disfarçar meu nervosismo.
— O que está acontecendo, Gabriel? — Bufou contrariada, com certeza já
prevendo o que eu iria dizer.
Ela era esperta e inteligente, devia estar desconfiada do que estava por vir.
Chacoalhei minha cabeça para mudar a direção dos meus pensamentos e não ceder,
voltando atrás na minha decisão que já estava tomada. O que eu havia feito era o melhor
para a minha filha, eu tinha absoluta certeza disso.
— Como nós imaginávamos, Maria Isabel é mesmo minha filha. — Coloquei a
criança no chão e pedi que fosse assistir TV, com a promessa de me juntar a ela depois.
— Eu pensei bem, nos prós e contras, e passei no orfanato “Cantinho do céu”,
conversei com os responsáveis e resolvi entregar Belinha para adoção. Ela vai ficar lá
com eles até que encontrem uma nova família para ela.
— Não acredito que vai fazer isso. — Piscou várias vezes e se empertigou. —
Você me prometeu.
— Eu prometi pensar melhor no assunto, Anna. E foi o que eu fiz.
— Você pensou em você, isso sim. Em momento algum pensou na sua filha.
Peguei em seu braço, praticamente a arrastei até a varanda e fechei a porta, para
que a garotinha não escutasse a nossa conversa, que, pelo jeito, não seria nada
amistosa.
— Olha bem para mim, Anna. Como você mesma vive dizendo, eu sou um
playboy farrista e mulherengo. — Admiti, mesmo sabendo que eu poderia e já estava
mudando. — Estou sentindo falta da minha velha vida e de sexo, ao ponto de querer
transar com a vizinha que me odeia. — Apontei em sua direção. — Até quando você
acha que vou aguentar isso? Seria justo expor minha filha a viver nesse ambiente que
estou acostumado? Porque é isso que vai acontecer. — Ela postou-se a minha frente,
tentando manter a compostura. — Eu não me sinto preparado para ser pai, isso me
assusta. Estou em pânico, que só piorou desde que tive a confirmação da paternidade.
Não dá para mim. Me desculpe!
— Mas estava indo tão bem, Gabriel. Até passaram um dia inteiro juntos sem a
minha presença. Deu tudo certo. — Tentou argumentar. — Acredite em mim. Você vai
ser um pai maravilhoso. Tem o maior jeito com crianças. Sua filha te ama. Estão
apegados um ao outro. Não há motivo para dar errado. Se o problema é precisar de
sexo, eu fico com ela todas as noites para você ir a suas festas e orgias.
— Já está resolvido, Anna. Eu assinei os papéis e dona Carmem, tutora do
abrigo, deve estar para chegar. Hoje mesmo ela leva Belinha para seu novo lar. —
Engoli em seco.
— Hoje? — Soltou o ar com força. — Então, só me resta ir para a minha casa.
Deu-me as costas e foi caminhando em direção a sua residência, sem olhar para
trás.
— Então é assim, Anna Ayala. No momento que eu mais preciso você vai me
abandonar? — gritei, enquanto ela se afastava. — Muito bem, abelhinha, parabéns para
você por fugir das suas responsabilidades.
— Minhas responsabilidades, Gabriel Montenegro Bittencourt? — Voltou-se
para mim com fúria e abriu os braços, bem no meio do jardim. — O maior responsável
por tudo o que está acontecendo é você, inclusive pela criança que está alheia a isso
tudo assistindo televisão na sala da sua casa. Eu não vou ser conivente com a maior
burrada que está fazendo na sua vida. Eu cresci sem meus pais, que faleceram quando
eu era ainda muito pequena, e sei muito bem o que é para uma criança crescer assim.
Mesmo que me pai fosse o pior filho da puta que existisse, o que graças a Deus, ele não
foi, eu preferia ter ele perto de mim do que ter enfrentado a vida sem ele. Mesmo com
minha avó ao meu lado.
Descontrolada, subiu as escadas de sua varanda e bateu à porta na minha cara.
— A tia naninha tá bava, papai?
Assim que entrei, encontrei Belinha assustada, encolhida no canto do sofá.
Havíamos nos exaltados no final de nossa conversa, fazendo-a se transformar em uma
fervorosa discussão que acabou assustando a criança.
— Os adultos as vezes brigam, meu amor. — Aproximei-me acariciando seus
cabelos loiros e finos, sentindo a maciez. — Agora vamos lá para o seu quarto que o
papai precisa arrumar suas malas.
— Nós vamo viajá, papai?
— Depois eu te explico tudo, minha linda. — Peguei-a no colo e segurei firme
em meus braços, sentindo um nó se formar em minha garganta.
Anna...

Entrei nervosa em casa. Irada, na verdade, ou seja lá o que for. A verdade é que
qualquer adjetivo existente na face da terra e que se referisse a alguém com muita raiva,
seria pouco para descrever como eu me sentia.
Eu já estava desconfiada de que algo estranho estava acontecendo com Gabriel
desde que ele começou a ignorar minhas ligações, mas não imaginava que ele fosse
chegar a tanto, nem que tomaria uma decisão tão drástica. Ele havia prometido pensar
melhor sobre entregar Belinha a adoção. Sei que, talvez, eu tenha subestimado sua
facilidade em fazer burradas e escolher caminhos errados, mas os dois estavam se
dando tão bem nos últimos dias, que pensei que ele poderia até já ter se esquecido
daquela besteira.
Depois da nossa discussão turbulenta, eu só conseguia andar de um lado para o
outro da sala de minha casa, quase abrindo um buraco no chão. Fiquei indignada com o
que ele me disse sobre eu estar fugindo das minhas responsabilidades, quando quem
estava fazendo isso era ele. Sempre fui muito responsável, por diversas vezes até
careta, por me dedicar tanto aos estudos e ao trabalho. A filha não era minha e os
encargos sobre ela eram únicos e exclusivos dele.
Ouvi barulho de porta de carro batendo do lado de fora e com o coração
batendo na boca, deixei o orgulho de lado e saí para a varanda da minha casa. Vi
quando uma senhora muito distinta e bem-vestida tocou a campainha da residência de
Gabriel, a porta foi aberta e ela entrou.
Eu queria ser uma mosquinha para saber o que estava acontecendo lá dentro.
Continuava sem conseguir acreditar que aquele playboy irresponsável teria mesmo
coragem de entregar Belinha para aquela mulher. Muito nervosa e estralando os dedos
das mãos, aguardei um tempo, rezando para que ele desistisse daquela infeliz ideia.
Assisti de camarote a tal dona Carmem, que Gabriel havia me falado o nome
quando discutimos, sair de dentro da casa com Belinha em prantos no seu colo. A
garotinha gritava por seu pai e estendia os bracinhos como se pedisse socorro. Meu
vizinho veio logo atrás com as malas. Minha vontade era de ir até lá e arrancar a
criança dos braços daquela mulher horrenda, que já não me parecia mais tão distinta
como à primeira vista.
Respirei fundo e me agarrei a um pilar da varanda. Como se percebesse a minha
presença, ele olhou na direção em que eu estava e pude ver seu semblante desesperado.
Fiquei incomodada com suas feições, mas não consegui ir até lá. Eu me sentia travada e
impotente diante de tal situação.
Foi quando ele me surpreendeu, colocou as malas de novo para dentro de casa,
caminhou em direção as duas, tomou Belinha em seus braços. Não me contive, engoli
meu orgulho e fui até eles. Os olhos de Gabriel brilhavam com a intensidade de quem
estava sofrendo muito com tudo.
— Mas o senhor já assinou os papéis...
— Esqueça essa papelada toda. — Manteve a sua postura, pegando o que estava
na mão da senhora e rasgou tudo. — Eu não quero mais entregar minha filha para
adoção. O lugar dela é aqui comigo.
Se tinha algo que me atraía nos homens era o fato de serem protetores. Tenho
que confessar que ver meu vizinho tomar sua filha nos braços, abraçando-a forte e
trazê-la de volta para casa, protegendo-a daquela mulher horrorosa, despertou um certo
desejo em mim, fazendo o meu rosto esquentar e o meu sexo formigar.
Assim que eles entraram na varanda, me juntei a eles em um abraço triplo,
desesperado e repleto de lágrimas.
— Está tudo bem, minha princesa. O papai está aqui e não vai deixar ninguém
levar você embora. — Ele a abraçou apertado e falou com voz mansa ao seu ouvido,
tentando acalmá-la.
— A tia Anna também está aqui para te proteger, meu amor. — Assegurei-a da
minha presença.
Dona Carmem, resmungando palavras desconexas, que mais pareciam
palavrões, entrou em seu carro e foi embora. Adentramos todos para o interior da casa,
ainda envolvidos em um único abraço.

Já dentro de casa, me afastei um pouco deles e fui pegar água com açúcar para
ambos, que choravam copiosamente abraçados no sofá da sala. Gabriel só saiu de perto
da filha depois que ela adormeceu e ele a levou para a cama. Quando voltou, parecia
absorto em seus próprios demônios. Sentou-se no sofá transparecendo nervosismo.
Parecia estar muito transtornado.
— Gabriel, você está bem? — Coloquei uma de minhas mãos em seu braço.
Com a mão do braço livre ele cobriu a minha e começou a desabafar.
— Foi horrível, Anna. Quando aquela senhora entrou aqui dentro de casa e eu
falei a Maria Isabel que ela iria embora com dona Carmem, meu coração se
despedaçou. Ela começou a chorar desesperada, subiu no meu colo e não queria me
soltar de jeito nenhum. A mulher usou de força para pegá-la, deixou até marca no
bracinho dela. E Belinha não parava de gritar por mim, jogando os bracinhos em minha
direção, foi ficando vermelha, os lábios arroxeando. Me deu um desespero tão grande.
Olhei bem dentro dos seus olhos castanhos escuros, me perdendo na escuridão
deles. Mostrando a ele que eu estava ali por ele... Por eles. Não pelo vizinho
insuportável, playboy e irresponsável, mas pelo homem que ele estava se tornando
desde que Belinha surgiu em sua vida.
— Não fica assim. O pior já passou. Procure se acalmar. — Sentei-me ao seu
lado no sofá. — Tem algo que eu possa fazer por você? — perguntei e ele balançou a
cabeça negando.
— Será que ela vai me odiar pelo que eu fiz hoje, Anna? — indagou e eu
coloquei minha mão livre sobre a dele, apertando-a com carinho, em demonstração de
apoio.
Tocá-lo daquela forma, despertou sensações inesperadas em mim.
— Claro que não. As crianças têm o coração puro. Amanhã ela vai acordar te
amando ainda mais.
— Quando ela foi deixada aqui na minha porta, eu achei que fosse uma grande
brincadeira de mau gosto de algum amigo meu. Depois quando vi a carta de Tábata,
desejei com todas as forças que fosse mentira e por isso fiz o exame de DNA. — Fitei
seus olhos e permaneci quieta, apenas o escutando. — Quando notei nossa semelhança,
eu fiquei com muito medo. Dentro de mim comecei a negar o inegável e alimentei uma
falsa esperança de o exame dar negativo. Quando vi o resultado hoje em minhas mãos,
entrei em pânico e surtei. — Olhou para mim e eu apenas balancei a cabeça para que
continuasse. Desabafar faria bem para ele. — Aí eu comecei a pensar um monte de
absurdos, alimentar os monstros que se formavam na minha cabeça e tomei a decisão
mais errada da minha vida. — Tracei círculos suaves com meu polegar em sua mão. —
Eu estou tão apegado a ela, Anna. Como uma criaturinha tão pequena pode fazer a gente
sentir um amor tão grande?
— Ela é apaixonante, não é mesmo? — Apertei sua mão com delicadeza. —
Vocês vão superar isso juntos. Tem se mostrado um pai maravilhoso, Gabriel. Só não se
deu conta disso ainda. Sei que não é fácil para um cara jovem, descobrir de repente que
é pai e ter que abdicar da sua vida, da liberdade que goza. Mas para tudo tem um jeito.
Vocês têm a mim e aos seus pais para ajudar. Podemos achar maneiras de conciliar as
suas necessidades com a paternidade. Tudo é questão de se conversar e organizar.
De repente, o clima começou a ficar meio estranho entre nós e eu me apressei
em me esquivar.
— Bom, acho melhor eu ir. — Desviei o meu olhar do dele. — Amanhã bem
cedo eu volto para ver como estão as coisas entre vocês e ficar com Belinha para que
possa ir trabalhar.
— Dorme aqui comigo, hoje... para me fazer companhia. Sem nenhum cunho
sexual, eu prometo. — Seu pedido mais se parecia com uma súplica.
— Ok! — Ele me olhou de um jeito assustado, estranhando por eu ter
concordado. — Mas antes eu preciso trancar a porta da minha casa, que deixei só
encostada, ou vou acabar sendo assaltada.
Voltei algum tempo depois de me certificar que estava tudo bem em minha
residência, que ninguém a havia invadido, pegar meu pijama, uma troca de roupa para o
dia seguinte e itens para a minha higiene pessoal e banho. Fui direto para o seu quarto e
quando abri a porta, senti um frio na boca do estômago, tipo aquela sensação de
borboletas batendo asas, Gabriel já estava deitado na sua cama, só de short, sem
camisa, lendo alguma coisa no celular, com uma pose bem sexy.
— Vamos dormir nós dois na cama? — indaguei, meio sem graça.
— Se quiser posso dormir no chão ou no sofá. Mas confesso que será um pouco
desconfortável para mim. O segundo é pequeno para a minha altura e o primeiro bem
duro.
— Não, por mim tudo bem, desde que cumpra sua promessa. — Cruzou os
dedos indicadores e levou aos lábios, beijando-os. Exatamente do jeito com que eu
fazia quando criança para prometer algo a outra pessoa.
Revirei os olhos, indo em direção ao banheiro para tomar um banho e me trocar.
Acabei tendo que usar a toalha dele, pois me esqueci de pedir uma outra emprestada.
Quando voltei, me dirigi ao meu lado na cama, afofei o travesseiro e me deitei ao seu
lado.
— Boa noite, Gabriel.
— Boa noite, Anna — respondeu, virando-se na minha direção.
Adormeci pouco tempo depois, exausta pelos acontecimentos do dia e envolta
pelo seu cheiro que estava por toda parte naquele quarto, inclusive no meu travesseiro,
sentindo-o bem próximo a mim.
Anna...

Depois daquele dia horrível tudo voltou ao normal na casa de Gabriel. Como eu
havia imaginado, Belinha não o odiou por conta do que fez, muito pelo contrário, estava
cada vez mais apegada a ele. Meu vizinho também parecia ter aprendido a lição. Estava
se dedicando com afinco a ser um bom pai. Dava para perceber que ainda tinha medos e
receios, mas já não falava mais naquela besteira de entregar a garotinha para adoção.
Quanto a mim e ele, tudo estava indo bem na medida do possível. Como havia
prometido, nossa noite juntos foi tranquila e sem qualquer cunho sexual. Enfim, acho
que havia compreendido que eu não queria me envolver com ele e resolveu respeitar
minha vontade e decisão. Na manhã seguinte ele me agradeceu muito por ter ficado ao
seu lado e um dos seus piores momentos. Nos dias seguintes à rotina de antes voltou a
imperar entre nós, apesar de parecermos estar mais cúmplices e unidos do que antes,
pelo bem de Belinha.
— Calma, já estou indo — gritei para a pessoa que tocava a campainha da
minha casa com insistência. — Oi! São vocês — falei surpresa ao abrir a porta.
— Simum. — Gabriel e Belinha, gritaram animados em uníssono. — Viemos te
fazer uma surpresa.
— Uma surpresa? — indaguei, curiosa.
— Vamos com você passar o domingo na casa da sua avó, com a sua família.
— Ah, não sei se é uma boa ideia. Minha avó é um amorzinho, mas minha tia
Laís e Suelen nem tanto.
— Mais um motivo para irmos, você terá mais companhias agradáveis para
alegrar o seu dia. Estamos tão animados, não vai cortar o nosso barato, não é mesmo,
Anna?
— Tia Naninha, tia Naninha... é muito feio itagá a suipesa dos zoto. — A
garotinha apontou o dedinho indicador em minha direção, como se estivesse me
repreendendo.
Não resisti a fofura da cena e acabei rindo.
— Sendo assim, está bem, então. Vocês podem ir comigo. — Acabei não
conseguindo negar aquilo a ela e concordei com que fossem.
Por sugestão de Gabriel, acabamos indo no carro dele, já que a cadeirinha que
comprou para transportar Belinha já estava instalada lá. Os vizinhos de vó Eugênia
piraram ao ver um luxuoso Lamborghini Aventador parando na frente da casa dela.
Assim que descemos, algumas pessoas da rua, nos encaram com curiosidade,
principalmente pelo fato de eu estar chegando acompanhada de um homem com uma
criança nos braços.
— Anna, minha querida, que bom que já chegou. — Minha avó caminhou
animada em nossa direção, com seus longos cabelos grisalhos presos em um coque.
— Oi, vozinha! Como está? — Sorri, inquieta.
Assisti de camarote a dona Eugênia medir Gabriel dos pés à cabeça e percebi
um sorriso sutil despontar na boca dele.
— Bom dia, minha senhora. Como vai? Sou Gabriel, vizinho e amigo de Anna.
— Bom dia, sou Eugênia, avó dela. — Os dois se cumprimentam
amistosamente. — Seja bem-vindo, rapaz.
— Obrigado. Sua neta tem me ajudado a cuidar da minha filha.
— E suponho que essa garotinha no seu colo seja ela. — Vovó ergueu os pés
para observá-la melhor, já que Gabriel era bem mais alto.
— Sô, sim, vó Gênia. Meu nome é Belinha e eu tenho dois anos. — Mostrou a
idade com dois dedinhos gorduchos.
— Que coisa mais linda. — Minha avó gargalhou. — E sua esposa, não veio
com vocês? — questionou, interessada.
— É uma longa história, dona Eugênia. Na verdade, não sou casado e a mãe de
Maria Isabel é um assunto meio delicado. Digamos que ela desistiu de criar a menina,
deixando-a comigo.
— Ah, eu te entendo. Muito triste isso.
— Bom, vó, já que se conheceram, podemos entrar?
— Claro, filha, que cabeça a minha. Entre e fiquem à vontade.
— Onde estão tia Laís, Rafael e Suelen? — Fiz cara de tédio adentrando a casa.
— Está de namorado novo, Anna? — Como que por encanto, minha tia se
materializou na sala. — Suelen vai adorar conhecê-lo.
— Laís! — Vó Eugênia ralhou com a filha.
— Gabriel é só um amigo, titia querida. — Mostrei a língua assim que ela se
virou de costas para mim na intenção de chamar a filha e o namorado, meu ex, que
estavam no vasto quintal de terra.
— Que interessante essa amizade. — Voltou a me provocar. — Anna nunca foi
de trazer amigos aqui antes.
— Sempre tem uma primeira vez — falei, incomodada.
— Olha só, Suelen. O bonitão amigo da sua prima. — Puxou a filha pela mão,
separando-a de Rafael, e quase a jogou em cima de Gabriel.
Já ia começar o show de horrores da minha prima dando em cima do meu
vizinho. Com certeza achavam que eu estava mentindo e que ele, na verdade, era meu
namorado. Pobre, Rafael! Em breve seria dispensado sem dó nem piedade para ser
trocado por Gabriel. Mas dessa vez, elas não conseguiriam me atingir, pois ele não era
nada meu. Nem amigos éramos, estávamos apenas em uma trégua por Belinha.
— Ei, eu estou aqui. — Meu ex retrucou do outro lado da cozinha.
— Não se preocupe, Rafael. — Foi a minha vez de provocar. — Quando ela
descobrir que ele não é meu namorado, vai perder o interesse.
— Ou não. — Minha prima disse com ar de quem estava desconfiada e tentava
decifrar algo.
— Suelen, chega de provocações. — Minha avó deu um fim rápido na conversa.
— Cumprimentem a garotinha, que por sinal é filha de Gabriel, e vamos para o quintal
saborear um delicioso churrasco, acompanhado de uma cerveja bem gelada.
Encarei minha prima, que não tirava os olhos do meu vizinho, com uma
sobrancelha erguida. Pelo jeito ela estava mesmo disposta a dar em cima de Gabriel e
mudar de namorado, mesmo ele não sendo nada meu. Também, pudera, o homem era
lindo, cheiroso, sexy, educado e rico. Não é à toa que conquistava tantos corações.
Seria até bom que ele transasse com ela e, quando estivesse certa de que o havia
conquistado, o playboy irresponsável lhe desse um pé na bunda, assim como faz com a
maioria, ou a transformasse só em um contatinho, como faz com algumas.
— Me desculpe pelo que aconteceu na cozinha, Gabriel, e, se possível, ignore
os comentários e investidas nada discretos da Suelen. Ela deve estar pensando que
temos alguma coisa um com o outro; o passatempo preferido dela e roubar meus
namorados. Agora, fique à vontade, que vou ajudar minha avó a preparar o vinagrete.
— Misericórdia, ele é lindo, priminha. — Suelen me abordou com mais
provocações. — Sabe que vai perde-lo essa tarde, não é mesmo?
— Fique à vontade. — Soltei com escárnio.
— Então, você tem ajudado ele com a criança? — Minha avó puxou assunto
assim que minha prima saiu de cena. — Esse não é o vizinho que você odeia?
— Ele mesmo, vó. — Tombei a cabeça para o lado observando a interação dele
com Belinha ser interrompida por minha prima, que se insinuava e tocava em seu peito,
despertando um certo ciúme inesperado em mim. — A mãe dela a abandonou na porta
da casa dele com um bilhete, revelando a paternidade. Ele ficou muito atordoado. A
princípio, eu não pretendia ajudá-lo porque o odeio, mas fiquei com dó da criança,
acabamos fazendo uma trégua em nossas brigas e cá estamos.
— Tem certeza de que você o odeia mesmo?
— Que pergunta boba, vó. A senhora, melhor do que ninguém, sabe de tudo o
que passei na mão dele. O cara é um playboy irresponsável, que só quer saber de
festas. Não respeita os vizinhos e, como só eu tenho coragem de enfrentar o poderoso
herdeiro dos Montenegro Bittencourt, travamos uma guerra continua.
Olhei na direção deles e meus olhos se cruzaram com os de Gabriel. Meio sem
jeito, coloquei uma mecha do meu cabelo atrás da orelha, enquanto sentia um arrepio
percorrer todo o meu corpo e aquecê-lo.
— Eu não sabia que duas pessoas que se odeiam, trocavam esse tipo de olhar.
— Que olhar?
— Esse, que vocês estão trocando agora.
Só então me dei conta que estávamos nos encarando e disfarcei, desviando os
olhos.
— Deixe que eu termine tudo aqui e vá defender e cuidar do que é seu, Anna.
Esse homem não está nada interessado em sua prima. — Empurrou-me em direção a
Gabriel e Belinha.
— Mas, vó...
— Não discuta comigo, menina. — Fez sinal com a mão para que eu me
afastasse. — Vá e faça o que estou mandando.
Meio sem jeito me aproximei deles, mesmo minha prima estando junto. Belinha
correu em minha direção e me abraçou
— Senta ati, tia Naninha. — Bateu a mãozinha no banco ao lado do seu pai. —
O papai ali, tia Naninha ati e Belinha no meioooo. — Comemorou, escalando nossos
corpos e nos enchendo de beijos.
— E a tia Suelen, menina bonita? Posso sentar-me do outro lado do papai?
— Nãooo. Vochê é feia, chata e boba. Fica de pé.
— Maria Isabel...
Gabriel tentou ralhar com a filha, mas vendo que eu não me contive e soltei uma
gargalhada, não resistiu e começou a rir também. Acompanhamos aos risos minha prima
se afastar pisando fundo.
— Então quer dizer que sua prima rouba todos os seus namorados?
— Pois é. Na nossa família existe aquela antiga rixa “a bonita versus a
inteligente”. — Fiz sinal com as mãos apontado primeiro ela e depois a mim.
— Entãoooo... O babaca que está assistindo de longe a namorada dar em cima
de mim, é seu ex.
— Acertou em cheio.
— Você merece coisa muito melhor, Anna. — Caçoou de Rafael. — Mas é sério
que na sua família eles acham Suelen mais bonita que você? — indagou, incrédulo. —
De onde eles tiraram isso?
— Fala sério, Gabriel! É só olhar para ela e depois para mim.
— Eu te acho mais bonita do que ela. — Fixou os olhos nos meus. — Bonita,
inteligente, sensível... — Foi a vez de ele colocar uma mecha do meu cabelo atrás da
minha orelha. — Ela pode ter um corpo bonito e ser gostosa, mas sua indiscrição, falta
de tato e vergonha na cara, a tornam muito feia. — Umedeceu os lábios, encarando a
minha boca. — Eu escolheria você mil vezes se fosse preciso.
Sem fôlego com a intensidade do seu olhar e de suas palavras, recuei alguns
centímetros. Belinha nos observava atenta, com um sorriso encantador nos lábios. Não
sabia dizer o que acontecia entre nós, quando estávamos assim tão próximos. Só
entendia que era algo que não podia ser negado ou refreado.
O restante do dia, continuei junto aos dois. Minha avó se juntou a nós e
conversamos sobre vários assuntos aleatórios. Demos muitas risadas. Em contrapartida,
minha tia e prima nos observavam de longe, com cara de poucos amigos, e Rafael,
emburrado com a namorada, passou a tarde na churrasqueira. Foi um domingo
maravilhoso.
À noite, já deitada na minha cama, me lembrei das coisas que vovó me falou e
de como me senti bem e amparada ao lado de Gabriel e Belinha. Do olhar do meu
vizinho quando me disse coisas bonitas, das sensações que despertou e sempre
despertava em mim.
Será que a espertinha da vó Eugênia tinha razão em tudo o que disse?
Gabriel...

— Quem era? — Anna perguntou assim que desliguei o telefone e comecei a


andar nervoso de um lado para o outro. — Quer dizer, você parece preocupado.
Aconteceu alguma coisa?
— Era... — Limpei a garganta, me sentindo constrangido. — Era Rayssa.
— Ah! — Mexeu no cabelo, sem graça. — E o que ela queria? Posso saber ou é
algo pessoal entre vocês? Me desculpe se estiver sendo muito invasiva.
— Vai ter uma festa na casa de Rodolfo, hoje, e como eu havia entrado em
contato para marcarmos algo, ela ligou para me convidar.
— Entendo. E você vai?
— Bom, como você sabe e conversamos outro dia, eu estou precisando ir a
um... Encontro... errrr... Você sabe... Preciso transar. — Era estranho ter que falar
daquelas coisas com ela. — Dá para ficar com Belinha essa noite para mim?
— Claro! Eu disse que ficaria. Sem problemas.
Era impressão minha ou ela estava desapontada?
O que aquela mulher queria, afinal?
Dizia em alto e bom som que não queria nada comigo, se afastava sempre que eu
tentava uma aproximação e agora estava enciumada. Seria tão mais fácil se ela cedesse
e ficasse comigo. Assim eu não teria que sair e deixá-la sozinha com Belinha, além de
matar esse desejo que me consumia. Eu ansiava ardentemente por transar com Anna e
tenho certeza de que ela não se arrependeria em ceder, porém ela preferia o caminho
mais difícil.
— Está bem, então. Eu vou tomar banho e me arrumar.
Meia hora depois já estava pronto. Optei por uma calça jeans, camiseta branca,
um blazer azul marinho por cima e nos pés, um tênis básico. Passei o meu melhor
perfume importado, apenas bati meus cabelos, deixando-o displicentes e ao me olhar no
espelho gostei do resultado. Apesar de que, por incrível que pareça, eu não estava nem
um pouco animado. Era como se algo não se encaixasse, não estivesse no lugar certo.
— Eu já vou indo.
Anna não se conteve e me analisou de cima a baixo de forma descarada e de
boca aberta. Percebi de imediato o quanto eu a havia afetado naquele momento. Quando
percebeu que estava dando bandeira, tentou disfarçar, mas já era tarde.
Ah, abelhinha!
Minha vontade era dizer a ela que se me pedisse, eu nem sairia de casa e
passaria a noite inteira me perdendo em seu corpo gotoso.
— Ok! — Foi só o que disse.
— Eu não vou passar a noite fora. Volto assim que puder. — Por que diabos eu
estava dando tantas satisfações a ela? — Se acontecer alguma coisa, é só me ligar que
eu largo tudo lá e venho correndo.
— Vai tranquilo, nós duas vamos ficar bem. — Me assegurou. — Se caso
adormecer, me acorde assim que chegar para eu ir para minha casa.
— Ok! Boa noite, Anna.
— Divirta-se! — Sua voz era só um sussurro.

— Gabriel Montenegro Bittencourt, pensei que nunca mais fosse ter o prazer de
sua presença em nossas festas e na minha cama. — Provocou-me Rayssa assim que
adentramos um dos quartos da casa de Rodolfo.
Retirei meu blazer e joguei em uma poltrona próxima a porta. Ela se aproximou
mais, me fazendo sentir o seu perfume pronto para me impregnar. Por algum motivo
doido, quase travei, mas me forcei a continuar.
Que se dane Anna!
Não queria ficar comigo, eu iria foder até meu pau pedir chega naquela noite.
Removi minha camiseta e puxei minha amiga pela cintura com brutalidade e colei
nossas bocas.
Esperei meu membro reagir e nada... N.A.D.A.
Que porra é essa que está acontecendo comigo?
Meu “amigo” nunca me deixou na mão antes. Só podia estar de brincadeira
comigo. Desci minhas mãos até sua bunda gostosa, apertei com força e... NADA.
Interrompi nosso beijo e a vi, ofegante, respirando com dificuldade e com a boca aberta
e inchada.
Não era aquela pessoa que eu queria ali comigo, a textura da pele era muito
diferente, o sabor do beijo estava longe daquele que eu desejava. Rayssa, que não
costumava usar calcinhas enroscou as pernas em minha cintura, me fazendo sentir o
contato da sua bocetinha com a pele do meu abdômen. Mas não era ela com quem eu
desejava foder. A mulher gemia alto, implorando para que eu continuasse.
Estava longe de ser gotoso como das outras vezes, mesmo assim me forcei a
continuar. Desci meus lábios beijando seu colo e depois sugando seus seios. Não teve
jeito, aquela não era a garota que eu queria e nada faria meu pau subir sem a vontade
dele. Pensei em Anna e foi a gota d’agua.
Maldito traidor!
Onde já se viu me deixar na mão assim.
O que estava se passando comigo, afinal?
— Porra, Rayssa! Me desculpe, é melhor eu ir para a minha casa. — Afastei-me
desnorteado.
— O que está acontecendo com você, Gabriel? — Segurou em meu braço. —
Vai me deixar assim, com esse tesão todo?
É claro que ela estava louca de desejo, eu sabia muito bem como atiçar uma
mulher. Mas, ao contrário, eu estava mais frio que gelo. Nem o contato da sua bocetinha
molhada na minha pele foi capaz de me acender. Sacudi a cabeça de um lado para o
outro, tentando entender os meus sentimentos turbulentos.
— Você sabe, Rayssa, eu acabei de descobrir que sou pai e minha cabeça ainda
está confusa. É muita coisa para processar. Quando eu estiver com tudo em ordem eu te
procuro de novo. — Menti de forma descarada, enquanto vestia a minha camiseta, para
não ter que mirar seus olhos.
— Tem a ver com a sua vizinha empata-foda, não é? — Deduziu ela. — No dia
que você me ligou para marcar um encontro me contou que ela estava te ajudando com a
fedelha. Notei algo de diferente na forma com que falava dela. Mulher nunca se engana
quando outra entra em cena.
— Tem. — Assumi. — E, por favor, se quer continuar sendo minha amiga,
nunca mais se refira a minha filha dessa maneira.
Peguei meu blazer, abri a porta do quarto e saí em disparada. Fui embora da
festa sem me despedir de ninguém.
Já era tarde quando cheguei em casa. Não encontrei Anna na sala, fui até o
quarto de Belinha e nada, nem minha filha estava lá. Entrei em desespero. Será que
havia acontecido alguma coisa? Entrei em meu quarto correndo para ver se eu
encontrava algum bilhete ou algo do tipo e foi então que vi a cena mais linda do mundo.
As duas dormindo espalhadas na minha cama.
Peguei Maria Isabel no colo, com o maior cuidado e a coloquei para dormir em
sua caminha. Voltei na intenção de acordar Anna, já que era isso que tínhamos
combinado, mas não tive coragem. Estava tarde, chovendo e frio lá fora. E depois de
tudo o que havia acontecido comigo naquela noite, eu precisava de um pouco da minha
abelhinha. Necessitava senti-la próxima a mim.
Sem pensar duas vezes, fiz algo que a muito tempo eu sonhava em fazer e saber
como seria com ela, entrei debaixo das cobertas com todo o cuidado do mundo para não
a despertar, a abracei de conchinha e adormeci com ela em meus braços.
Anna...

Acordei de um sono tranquilo e contínuo. Algo que era raro acontecer comigo.
Desde que meus pais faleceram, eu costumava sonhar com eles sempre. Mas não era
algo apaziguador como poderíamos esperar de sonhar com seus entes queridos, na
maioria das vezes eram pesadelos. Mesmo não estando presente no dia do acidente,
meu subconsciente teimava em recriar imagens de como eu imaginava que teria sido.
Sempre acordava assustada e de pernas bambas.
A única noite que me lembro de não ter passado por isso, foi a que eu dormi ao
lado de Gabriel, aquela em que ele quase entregou Belinha para adoção. E por falar
nele, senti seu cheiro impregnado em meu travesseiro, na verdade estava por toda parte.
Abri os olhos, não reconheci meu quarto, senti um braço em torno da minha cintura e só
então me dei conta que alguém havia dormido de conchinha comigo. Gritei, sentei-me
assustada na cama e me deparei com o meu vizinho ainda mais assombrado do que eu.
— Que porra é essa que está acontecendo aqui?
Seus olhos encontraram os meus, aparentando confusão.
— Quer me matar de susto, Anna?
— O que pensa que está fazenda? Eu não pedi para me acordar assim que
chegasse para eu ir embora? Por que está abraçado comigo de conchinha?
Fez-se um silêncio constrangedor entre nós por alguns segundos. Senti meu
estômago revirar enquanto aguardava a sua resposta.
— Quando eu cheguei vocês duas estavam dormindo gostoso. Coloquei Belinha
na cama dela e vim te chamar, mas estava frio e chovendo lá fora. Achei que não tinha
necessidade de te acordar, afinal já dormimos juntos na mesma cama uma vez. Não
imaginei que ficaria tão brava.
Imagens da noite anterior invadiram minhas lembranças. Belinha não queria
dormir sem que o pai a colocasse na cama. Consegui convencê-la a deitar no quarto
dele para sentir seu cheiro e sua presença. Recordo-me de ela ter dormido e só. Com
certeza, devo ter pegado no sono também, logo depois dela.
— Está ficando doido, Gabriel? — Levantei-me da cama e saí em direção a
porta de entrada da casa, com ele me seguindo. — Você transa com outra mulher e vem
dormir de conchinha comigo e acha normal. E, pelo jeito, ainda não quer que eu reaja a
esse disparate. — Balancei a cabeça e as mãos, puta da vida.
O que ele pensava que eu era, afinal?
— Não foi bem assim que as coisas aconteceram.
— Jura? Já sei! Você tomou banho antes de se deitar. Tipo: “lavou, tá novo”. —
Usei de todo o meu deboche ao dizer aquelas palavras.
— Olha, Anna, aconteceram algumas coisas que saíram do meu controle na
festa, as quais não quero e acho que não preciso dar detalhes para você. O fato é que eu
passei por alguns perrengues e eu precisava da sua companhia — falou, parecendo
estressado com algo e sem coerência nenhuma. — Eu não imaginei que ficaria tão
brava.
— Pois deveria!
Aquela situação estava me levando ao meu limite, meu sangue fervia de raiva.
Abri a porta da casa e saí caminhando a passos largos até a minha, com Gabriel no meu
encalço.
— Olha, Anna, eu sei que não quer ficar comigo. — Segurou em meu braço, me
parando e me virando em sua direção. — Até aí tudo bem. Estou tentando respeitar,
assim como prometi. Entretanto, eu queria saber como era dormir de conchinha com
você, se era gostoso, sentir seu cheiro perto de mim e se eu ia dormir bem.... Sei lá, um
monte de coisas.
— Espera aí, deixa eu ver se entendi direito. Você sai de casa para transar com
outra mulher e quando volta sente desejo de saber como é dormir de conchinha...
COMIGO? — indaguei, revoltada.
— O que eu posso fazer se eu desejo você desde aquela maldita noite em que
quase ficamos juntos? — Assumiu, derrotado. — Agora mesmo, vendo-a brava desse
jeito, estou louco para transar com você e sinto que isso só vai passar depois que eu
conseguir. Ou seja, NUNCA, já que você não quer.
— Você prometeu que não ia mais tocar nesse assunto e nem forçar a barra.
— E estou cumprindo a promessa... a um preço caro, mas estou. Me desculpe! O
que aconteceu essa noite, não ocorrerá mais. Eu queria saber como era e saciei minha
curiosidade e pronto. Fim.
— Não sei se isso vai dar certo. É a segunda vez que você me pede desculpas
por motivos parecidos e promete que não vai acontecer de novo. Quantas vezes mais
serão necessárias?
— Sabe, Anna, para um homem sexualmente ativo como eu, é muito difícil ter
que me controlar, mas é pior ainda ter que me desculpar por duas vezes e quantas outras
forem necessárias por algo que foi muito bom. — Encarou-me de forma profunda, me
fazendo perder-me nos seus olhos castanhos. — Eu preciso ver se Belinha acordou.
Tome o seu tempo, te esperaremos em casa. Só peço que não demore muito, pois tenho
que ir trabalhar.
Virou as costas e retornou para a casa, me deixando ali, perplexa e surpresa,
com o que ele acabara de me dizer, assumir e confessar... o seu desejo por mim.
Gabriel...

Meu coração estava acelerado só de imaginar a reação de meus pais quando


soubessem que eu tinha uma filha. Adiei ao máximo aquele momento, até que Anna, que
me perdoou pela segunda vez, me convenceu de que não dava mais para esperar, aquele
era o momento e eu precisava contar a verdade.
Eu não sei por que eu me sentia daquela maneira. É claro que eles ficariam
felizes em descobrir que eram avós e que aquele era o motivo para eu ter voltado a
empresa. Porém, eu ainda me sentia inseguro com o que estava acontecendo, era tudo
muito novo para mim. Eu estava me acostumando aos poucos.
Mas, enfim chegara o momento. Na sexta-feira, conversei com meu pai na
empresa e combinei um almoço na casa deles para hoje, sábado, já que aos domingos
Anna ia ver a avó e eu queria muito que ela estivesse ao meu lado naquele momento. É
claro que minha vizinha relutou de início, achava que eu deveria enfrentar isso sozinho,
mas no fim, acabei convencendo-a.
— Bom dia! Preparado para enfrentar seus pais? — Anna colocou as mãos na
cintura e perguntou com diversão, assim que entrou em minha casa.
— Tenho alguma outra escolha? — perguntei, entrando na brincadeira.
— Tia Naninha, tô munita pá conhecê o vovô e a vovó? — Belinha entrou na
sala com seu jeitinho encantador.
Trajava um vestidinho vermelho, cheio de babados, uma tiara com um laço da
mesma cor e sapatinhos brancos nos pés.
Muito fofa!
— Ah, Belinha, você é tão perfeita, meu amor. — Minha vizinha murmurou, se
abaixando e abraçando minha filha. — Tenho certeza de que seus avós vão adorar te
conhecer.
— Também acho, princesa. — Aproximei-me, sorridente. — Se até a tia Anna,
que é brava para cacete, se apaixonou por você, não tem como seus avós não fazerem o
mesmo. — Provoquei-a, com um sorriso de canto de boca. — Não é mesmo?
— Engraçadinho! — Resmungou, irritada, e soltou o ar com força.
Antes que ela me batesse ou começasse a discutir, peguei os pertences de minha
filha, que agora possuía uma bolsa, previamente organizada para sair, e fomos para o
meu carro.
Até que eu não estava me saindo nada mal como pai.
É claro que muita coisa quem me instruía a fazer ou comprar era Anna, mas
algumas outras, eu descobria pesquisando na internet e logo adquiria.
Dei a volta no carro, terminei de ajeitar as coisas de Maria Isabel no porta-
malas, enquanto a abelhinha – que ela não me ouça dizendo esse apelido – ajeitava
minha filha em sua cadeirinha. Ocupamos nossos lugares nos bancos da frente e
seguimos viagem como uma família de verdade. Foi engraçado pensar nisso e colocar
Anna no papel de minha esposa e mãe da minha filha.

— Não vamos entrar? — Anna indicou a porta, ao perceber que eu estava meio
sem reação dentro do meu carro, parado na porta da casa dos meus pais. — Eles devem
estar nos esperando.
— Claro. — Sorri, desconcertado. — Os meus pais.
— Fique tranquilo, vai dar tudo certo. Eles não têm motivos para te recriminar
ou não gostar de Belinha.
— Eu sei disso, mas é difícil não ficar ansioso.
— Para ser sincera, eu também estou um pouco.
Saímos do carro, peguei minha filha no colo, subimos a escadaria da entrada e
nos dirigimos a sala. Por instinto apertei minha filha nos braços, como se quisesse
protegê-la de alguma possível rejeição que, com certeza, não viria.
— Anna, você também por aqui, minha querida? — Meu pai, dobrou o jornal, se
levantou e veio até nós, estendendo a mão para ela com um largo sorriso.
— Como vai, doutor Roger? — respondeu, solícita.
— É um enorme prazer recebê-la em minha casa. Porém, confesso que é uma
grande surpresa vê-la aqui, ainda mais acompanhando meu filho. Achei que fosse
encontrá-la de novo só no final de suas férias.
— O prazer é meu em estar aqui. Na verdade, foi seu filho quem me pediu para
acompanhá-lo. Parece que ele tem algo importante a dizer para vocês.
— E quem é essa linda garotinha? — Foi a vez de minha mãe perguntar, após
adentrar a sala e cumprimentar minha vizinha. — Oi, tudo bem? Você é uma moça muito
bonita — falou manso, enquanto meu pai se aproximava um pouco mais e segurava na
mãozinha de Maria Isabel. — Se parece muito com... Gabriel. — Olhou em minha
direção, sustentando o olhar.
— Bigada, vovó Cola! — Sem jeito, puxou a mãozinha, escondendo atrás do
corpo.
— Gabriel! — falaram em uníssono e voltaram-se em minha direção.
— Oi. — Travei na hora de dizer algo e apenas os cumprimentei com timidez.
— Você tem algo para nos contar, filho? — inquiriu, dona Cora.
— Nós podemos nos sentar primeiro? — perguntei, alternando o olhar de um
para o outro.
— Claro, me desculpem! Fiquem à vontade. — Anna me encarou e sentou-se ao
meu lado, apertando minha mão em seguida, em sinal de apoio.
— Belinha é minha filha. — Revelei de uma só vez.
— E Anna é a mãe? — questionou meu pai.
— Não. Tábata deixou Maria Isabel na porta da minha casa há umas três
semanas atrás. Junto com um bilhete que dizia que ela era minha filha. — Comecei a
contar. — No princípio eu achei que fosse uma brincadeira de mau gosto de algum
amigo, mas logo percebi as semelhanças. Fiz o exame de DNA, que deu positivo. Anna
está me ajudando desde o início a cuidar dela. Tem me dado muito apoio e por isso está
aqui hoje.
Soltei tudo de uma só vez, ocultando a parte de que tentei entregá-la para
adoção. Tenho a ligeira impressão que se meus pais soubessem disso, me
repreenderiam com severidade.
— Uma neta, Gabriel. — Minha mãe se levantou e pegou minha filha em seus
braços. — Que alegria!
— Por que não nos contou antes, filho? — Meu pai também se aproximou das
duas e começou a fazer barulhos estranhos com a língua, fazendo a garotinha rir. —
Pelo menos uma coisa boa a destrambelhada da Tábata trouxe para sua vida.
— Ela é o motivo de eu ter voltado a empresa com responsabilidade, pai. —
Respirei fundo e continuei. — Como eu havia dito ao senhor, eu estava esperando por
uma confirmação, era o exame de DNA e ele só saiu semana passada. Achei melhor
esperar, porque no fundo eu ainda tinha a esperança de que desse negativo. Na verdade,
eu estava em pânico... ainda estou. Porém, me acostumando aos poucos.
— Ora, meu filho, venha cá. — Meu pai me puxou para um abraço quadruplo:
eu, ele, minha mãe e minha filha.
Antes de nos separarmos, puxei Anna, que se juntou a nós com certa relutância,
pela mão e a inclui aquele momento. Todos nós abraçados no meio da sala. Todas as
pessoas que me importavam estavam ali comigo e constatar isso, encheu meu coração
de paz.
— Bom, o almoço vai demorar um pouco para sair. Que tal se aproveitássemos
esse tempo para mostrarmos a casa para Anna e Belinha? Assim podemos conversar e
nos divertir um pouco mais. — Sugeriu minha mãe com a voz embargada de emoção.
Foi mais fácil do que imaginei. Eu já esperava por aquela reação amistosa dos
meus pais, que sempre me apoiaram muito, mas a verdade é que ainda estava muito
inseguro com tudo e, às vezes, criava certos monstros absurdos em minha cabeça.
Divertimo-nos muito durante o tour, infelizmente começou a chover e tivemos que
interromper antes de irmos até o jardim. Lembrei-me do quanto Anna gostava de rosas e
fiz uma anotação mental de levá-la até lá antes de irmos embora. Dentro de casa, minha
filha assistiu alguns desenhos sendo mimada pelos avós e conversamos amenidades.
Após nos alimentarmos, Belinha pegou no sono e meus pais estavam curtindo preguiça.
Aproveitei para ficar um pouco sozinho com Anna.
— Vem comigo? — Segurei em sua mão, sentindo a eletricidade percorrer todo
o meu corpo.
— Onde você vai me levar?
— Tem um jardim lindo nos fundos da casa que não deu tempo de minha mãe
incluir no tour por causa da chuva. Sei que você ama flores. Acho que vai gostar de
conhecer.
— Ah, tudo bem.
— Ótimo! — Com um sorriso estampado nos lábios, levei-a junto comigo.
Caminhamos na direção a parte de trás da casa, ainda de mãos dadas, descemos
para um local mais baixo do terreno, tomando muito cuidado para não escorregar, pois
as plantas que ornamentavam o caminho haviam sido regadas pela água da chuva e a
grama estava escorregadia.
— Aqui está. — Fiz sinal com as mãos.
— Nossa, é lindo! — Aproximou-se de uma roseira, sentindo o aroma das
flores.
— Obrigado, Anna! — Puxei-a pela cintura trazendo-a para perto de mim.
— Pelo quê? — Escorregou nas grama molhada, segurando em minha camisa
com medo de cair, nos aproximando ainda mais.
— Por tudo, desde o início. E por estar aqui comigo hoje.
O tempo parou naquele momento. Aproveitei que nossos rostos estavam tão
próximos e a encarei com desejo. Nossos peitos se moviam ofegantes, seguindo a
intensidade de nossas respirações. Meu Deus, ela estava correspondendo aos meus
sentimentos! Parecia querer me beijar tanto quanto eu desejava o mesmo. Olhei melhor
em seu rosto, só para constatar mais uma vez o quanto ela era linda. Curvei-me um
pouco e aproximei ainda mais os nossos lábios, com um desejo incomensurável de
enfiar minha língua em sua boca. Eu queria beijá-la com uma intensidade avassaladora.
— Acho melhor voltarmos, Belinha pode precisar de nós. — Empurrou-me,
afastou-se de repente, quebrando o encanto, e saiu caminhando em direção a casa.
— Anna! — Corri atrás dela.
— Vir aqui foi uma péssima ideia, Gabriel — disse, sem olhar para trás. — E
se não quer brigar comigo e ter que me pedir desculpas de novo, melhor fingirmos que
nada aconteceu.
Continuou andando e só parou quando entrou dentro de casa, se juntando aos
meus pais e Maria Isabel, que ainda dormia um sono tranquilo. Cheguei perto dela,
tentando tocá-la, porém Anna me repreendeu com o olhar. Suas ações não condiziam
com o que eu havia visto em suas feições quando estávamos quase nos beijando no
jardim. Eu conhecia bem as mulheres, tinha certeza de que ela queria aquele beijo tanto
quanto eu.
Êta, mulher difícil de entender e decifrar, meu Deus!
— Acho melhor irmos embora. Já está ficando tarde — falei desiludido.
— Mas vocês mal chegaram, filho.
— Voltamos em uma outra ocasião, mãe. Belinha tem toda uma rotina do qual já
é acostumada. Sair muito dela pode trazer problemas para mim e Anna. — Foi a
primeira desculpa esfarrapada que me veio à cabeça.
Eu estava chateado com a negativa de Anna. E se era para ela ficar daquele jeito
estranho comigo pelo resto do dia, eu preferia ir embora.
— Promete?
— Claro que sim, dona Cora. Não pretendo separar minha filha dos avós.
Despedimo-nos dos dois e seguimos para casa. O caminho foi todo feito em um
profundo silêncio, já que Maria Isabel ainda dormia e Anna não fazia muita questão de
falar comigo naquele momento. Quanto a mim, me perdi em pensamentos, tentando
decifrar o que passava na cabeça daquela mulher complicada, mas ao mesmo tempo
instigante, que estava do meu lado.
Anna...

Porcaria. Acordei na manhã seguinte passando muito mal. Vomitei até as tripas.
Deve ter sido alguma coisa que comi ontem. Só não sei se foi no almoço, ou se foi
aquela maldita lasanha vencida que estava no meu congelador há um tempão.
Quando chegamos da casa dos pais de Gabriel, fui direto para a minha. Estava
muito irritada e nervosa comigo mesma pela minha reação nos braços dele. Não era
para eu ter me sentido tão atraída daquele jeito por sua boca. Eu não queria me
apaixonar e nem me envolver por aquele playboy irresponsável, mas era justamente
isso que eu percebia que estava acontecendo.
Dessa vez eu não estava brava com ele, mas sim comigo mesma. O que era bem
pior. Na hora do jantar, me dei conta de que, na ânsia de fugir, eu havia esquecido
minha bolsa em seu carro. E eu não queria vê-lo. Precisava me manter distante para me
centrar e não cometer nenhuma loucura, ficando com ele, para depois ser abandonada na
rua da amargura.
Não teve outro jeito, sem ter como pedir comida pronta porque meu cartão de
crédito estava na bolsa e nem ter nada pronto em casa para esquentar no micro-ondas,
tive que comer uma lasanha, dessas de supermercado, que já vem prontas e é só levar
ao forno. Eu sempre tinha algo do tipo em casa para os dias que estava com preguiça de
cozinhar.
O único problema é que já fazia quase um mês que eu estava fazendo minhas
refeições na casa do meu vizinho, pois passava mais tempo lá do que aqui, cuidando de
Belinha. E a lasanha que se encontrava no meu congelador estava vencida há alguns
dias, uma semana para ser mais precisa. Entre encarar o olhar perturbador de Gabriel e
comer algo vencido, fui imprudente e escolhi a segunda opção. E hoje estou aqui,
passando muito mal.
Liguei para minha avó, expliquei o que estava acontecendo e que por isso não
iria a sua casa. Ela queria vir ficar comigo, mas a tranquilizei, dizendo que não
precisava, que era só uma indisposição e que logo eu estaria bem. Eu detestava dar
trabalho aos outros. Ledo engano. Liguei a televisão e me joguei no sofá, me sentindo
tonta e não conseguindo comer mais nada durante todo dia, o que só piorou ainda mais o
meu mal-estar.
No final da tarde ouvi a campainha de minha casa tocar com insistência. Em
seguida, meu vizinho começou a chamar pelo meu nome, Belinha se juntou a ele e eu
estava vendo a hora a vizinhança inteira vir também. Para evitar uma balburdia maior,
levantei-me do sofá, caminhando a passos lentos, quase me arrastando e abri a porta
para ele.
— Ei, Anna, o que é isso? — Segurou-me em seus braços, me impedindo de
cair e sua voz próxima ao meu ouvido, fez os pelos do meu braço arrepiarem.
Olhei para cima, tentando mirar seus olhos e ele me pegou no colo, levando-me
de volta ao sofá. Belinha se juntou a mim e ele puxou uma cadeira, sentando-se na
minha frente.
— O que você quer aqui? Domingo é meu dia de folga, sabia? — perguntei com
ironia.
— Domingo é dia de ir à sua avó, isso sim. Achei normal você não ter ido em
casa de manhã porque, para variar, estava nervosa comigo. Mas depois vi que não saiu
de casa o dia inteiro, fiquei preocupado. Juro que tentei não vir para não invadir sua
privacidade, mas minha ansiedade ficou grande que não consegui me segurar e resolvi
vir conferir se havia acontecido alguma coisa. E pelo jeito, acertei em estar aqui. Devia
ter vindo antes. O que você está sentindo?
— Não é nada demais. Acho que foi alguma coisa que eu comi — falei meio
mole.
— Deve ser o que você jantou, porque se fosse algo na comida da minha mãe,
todos nós estaríamos passando mal. O que você comeu, afinal?
— Eu... é... uma... uma lasanha vencida que estava no meu congelador. —
Gaguejei no início, até criar coragem de contar.
— Você está maluca, garota? Por que não me pediu ajuda? Nós vamos ao
médico, agora — falou, semicerrando os olhos.
Não contestei, estava cansada de me mostrar sempre inabalável e naquele
momento, eu estava precisando muito de alguém para cuidar de mim. Pegou-me no colo
e eu enlacei o seu pescoço, sentindo seus braços fortes me amparando.
— Vamos com o papai, Belinha — disse e a garotinha nos seguiu, assustada.
No hospital, descobrimos o que eu já sabia, eu estava com intoxicação
alimentar. O médico que me examinou disse que em dois ou três dias eu já estaria cem
por cento e na manhã seguinte, bem melhor. Ele receitou soro na veia com
medicamentos específicos, o que me segurou por mais tempo por lá. Gabriel e Belinha
ficaram ao meu lado em todo momento. Depois recebi alta e pudemos retornar para
casa, mas eu teria que continuar me tratando, tomando uma cápsula de carvão vegetal
por dois dias, bebendo muito líquido, fazendo repouso e alimentações leves.
Eu ainda me sentia fraca, meu vizinho ainda teve que me carregar até o carro e
assim que chegamos ao condomínio, me levou para dentro de sua casa, em seus braços
e me colocou em sua cama.
— Eu não quero ficar aqui, vou para a minha casa — falei e me levantei, ainda
vacilante.
Senti seus braços fortes me segurando pela cintura. Belinha o tempo todo nos
acompanhando de perto.
— De jeito nenhum eu vou te deixar sozinha lá. Vai ficar aqui com a gente e eu
vou cuidar de você.
— Eu não quero ficar na sua cama, ela tem seu cheiro. — Minha fala saiu meio
arrastada.
— Mais o chelo do papai é tão gotoso, tia Naninha. — A garotinha falou,
fazendo carinho em minha perna.
— Por isso mesmo. — Choraminguei e ele balançou a cabeça incrédulo.
— Vem, Belinha. Ela não quer ficar aqui, vamos levá-la para o sofá, meu amor.
Ele me deixou deitada na sala. Eu ainda me sentia muito fraca, mal conseguia
me manter sentada. Gabriel fez uma sopa para mim e me convenceu a dormir em sua
casa, pois queria estar por perto caso acontecesse algo. Eu não me achava em
condições de me opor, por isso acabei cedendo e adormeci no seu sofá.

Acordei no outro dia cheia de dores por ter dormido no sofá. Espreguicei-me e
quando abri os olhos, me deparei com um Gabriel, sentado no chão a minha frente. Vi
também que havia um lençol e um travesseiro sobre o tapete e ele estava com os
cabelos desalinhados, como se tivesse acabado de acordar.
— Você dormiu aí?
— Culpa sua, abelhinha. Não quis dormir na minha cama e eu não consegui ficar
lá, preocupado com você aqui sozinha. Aí deu nisso. Passei uma noite do cão nesse
chão duro e eu estou todo moído. E não adianta brigar comigo por causa do apelido,
depois de ontem, está em débito comigo.
— Eu também estou com dores. — Tentei endireitar o meu corpo todo dolorido.
— É bom para você aprender a não ser tão turrona. Onde já se viu, dispensar
uma cama confortável por causa do meu cheiro.
— Me desculpa por ontem? — Pedi envergonhada, ao me lembrar das coisas
que eu havia dito.
— Não tem do que se desculpar, Anna. Passar mal é algo que acontece. Só me
prometa que, por maior que seja a raiva que estiver de mim, nunca mais vai comer
coisas vencidas ou não me pedir ajuda.
— Prometo! — Cruzei os dedos nos lábios, beijando-os, do mesmo jeito que ele
havia feito para mim. — Eu não estava com raiva de você, era mais de mim. — Admiti.
— Juro que eu ainda vou aprender a te decifrar. — Sorriu torto, arqueando uma
sobrancelha. — Está bem? Se quiser, posso ligar na M.B. e dizer que não irei hoje e
ficar cuidando de você.
— Não precisa, eu estou bem. Pode ir trabalhar. — Garanti. — Cuidar de
Belinha não é muito cansativo. Vou colocar alguns desenhos e filminhos para
assistirmos juntas e assim consigo manter o repouso.
— Tem certeza disso? — assenti com a cabeça. — Então eu vou, mas se sentir
alguma coisa, me liga que eu venho na mesma hora. Sobrou sopa e eu guardei na
geladeira, acho melhor continuar com a alimentação leve. E não se esqueça de tomar o
remédio e beber bastante líquidos.
— Sim, senhor. — Bati continência para ele, fazendo-o rir.
Pouco tempo depois ele já estava pronto, se despediu de Belinha e de mim, com
um beijo roubado no canto da minha boca, me fazendo estremecer, e partiu para a
empresa. Eu precisava de um encontro urgente para tirar aquele homem gostoso da
minha cabeça.
Anna...

Na terça-feira eu já estava bem melhor da intoxicação alimentar. Não podia nem


lembrar de lasanha, que meu estômago revirava. Havia aprendido a lição: alimento
vencido nunca mais. Comecei até mesmo a prestar mais atenção na data de validade das
mercadorias que comprava no mercado. Confesso que antes do que aconteceu, eu era
meio relapsa com essas coisas.
Gabriel, depois que eu me neguei a dormir em sua cama por causa do seu
cheiro, não tentou nenhuma outra aproximação mais invasiva ou forçar a barra.
Entretanto, também não deixou de demonstrar seu interesse e desejo em transar comigo,
sempre que tinha chance me encarava fixamente com um sorriso sacana, de molhar
calcinhas, ou uma piscadela. Fora os beijos no canto da minha boca que ele roubava ao
se despedir na saída para o trabalho.
Quanto a mim, fala sério, gente. O cara era lindo e gostoso de morrer e eu não
sou de ferro. Podia não querer ter nada com ele e nem ser só uma transa casual a mais
em sua vida por achar que vou me machucar, porém não via nada demais em
corresponder a sua paquera. Ficava difícil resistir quando se tinha um homem bonito e
cheiroso como ele pegando pesado daquele jeito.
Mas enfim, aquela era a minha última semana de férias e precisávamos
encontrar uma babá para Belinha, mesmo que eu fosse continuar ajudando Gabriel,
tínhamos que encontrar alguém que ficasse com ela durante todo o dia, já que não estava
na escolinha ainda e nós dois sairíamos cedo e voltaríamos só no final da tarde.
Entramos em contato com uma agência de empregos, que ficou de nos enviar
algumas candidatas para entrevistarmos. Marcamos tudo para quinta-feira. Confesso
que bem em cima da hora, mas foi o que conseguimos fazer. Gabriel não foi trabalhar na
M.B. naquele dia, pois queria entrevistar, opinar e conhecer melhor quem seria a
pessoa que cuidaria de sua filha. Ele havia se tornado um pai protetor, o que eu achava
muito sexy, diga-se de passagem.
Nunca pensamos que seria tão difícil assim conseguir contratar alguém para o
serviço. Achamos que, por serem pessoas indicadas por uma agência, seriam mais
profissionais, entretanto, não foi o que encontramos em nosso caminho. A maioria das
candidatas eram jovens e ao ver quem era o pai da criança e ao reconhecer, acabavam
soltando algumas cantadas inimagináveis.
“Eu posso cuidar do pai e da filha se quiserem.”
“Podemos fazer um dia de experiência e eu mostro ao senhor tudo o que sei
fazer.”
“Garanto que não vai se arrepender por contratar os meus serviços. Eu sei fazer
coisas que o senhor nem imagina.”
“Que criança mais linda... Linda e irresistível como o pai.”
Essas foram só algumas. Sem contar que vinham seguidas de piscadelas,
sorrisos sedutores e até uma passada estratégica de língua pelos lábios. Não consegui
disfarçar meu descontentamento e uma pontinha de ciúmes. Acho que Gabriel percebeu
e estava adorando as xavecadas, pois a cada uma delas, mordia o lábio inferior e dava
uma risadinha, do tipo: Que culpa tenho eu se sou lindo e gostoso?
Claro que todas elas foram descartadas. Mesmo sendo um playboy mulherengo e
solteiro convicto, meu vizinho queria uma pessoa realmente capacitada para olhar por
sua filha e não uma mulher que estava mais interessada em trepar com ele do que cuidar
da criança.
— E agora? — perguntou, já exausto.
— Impossível que nessa cidade não haja uma profissional mais séria e que não
caia nos seus encantos — respondi, pensativa.
— Acho difícil, meu cheiro é irresistível. — Provocou.
— Convencido. — Joguei uma almofada do sofá em sua direção no exato
momento em que a campainha soou. — Tomara que dessa vez seja a pessoa que estamos
procurando.
— Deus te ouça, Anna! — Levantou-se, indo em direção a porta e eu o
acompanhei.
— Suelen? — indaguei, surpresa.
— Oi, priminha querida. — Passou por nós e foi adentrando a casa sem ser
convidada, passando a mão no peito de Gabriel e com um sorriso insinuante nos lábios.
— Posso saber o que você quer aqui? — Fui direto ao assunto.
— A vovó me falou que vocês estão procurando uma babá para essa
princesinha, já que não estou trabalhando, vim me candidatar a vaga. — Passou a mão
na cabecinha de Belinha, que estava sentada no tapete em frente à TV, assistindo
desenho, e sentou-se no sofá, cruzando as penar de um jeito provocante, como se tivesse
sido convidada.
— Só com uma correção. Você não está sem trabalhar e sim, nunca trabalhou.
— Isso é só um detalhe, Anna banana. — Chamou-me do apelido ridículo pelo
qual ela e mãe me chamavam desde criança, na intenção de me provocar. — Você já
conhecia o apelido de criança dela, Gabriel?
— Não, Suelen. Gabriel não conhecia esse apelido idiota e que nem pode ser
considerado de infância, já que só você e sua mãe me chamavam assim. — O cortei na
menor menção que fez em responder. — O fato é que estamos procurando uma
profissional com experiência, coisa que você não tem. Portanto, já está reprovada. Pode
dar meia volta e ir embora.
— Imagina! Não deve ser difícil cuidar de uma criança tão dócil e amável. E
ainda tem o ponto positivo de que já nos conhecemos e nos demos muito bem no
churrasco na casa da vovó.
— Que eu me lembre ela disse que você era feia, chata e boba e que deveria
ficar de pé.
Belinha não se conteve e, com cara de levada, colocou as mãozinhas sobre a
boca e começou a rir. Gabriel também não se segurou e escondendo o rosto com as
mãos, repetiu o gesto da filha.
— Biel, meu querido, vai deixar Anna me tratar desse jeito dentro da sua casa?
— Fez-se de vítima, usando de uma intimidade forçada e que não tinha.
— Suelen, eu sinto muito, mas Anna tem carta branca dentro da minha casa e na
escolha da profissional que vai cuidar de Maria Isabel. Se ela não te acha competente e
a altura, você foi reprovada na entrevista e deve se retirar — falou, tentando ser o mais
educado possível.
— Bom, nesse teste idiota de Anna, que não me interessa nem um pouco, eu fui
reprovada, mas e no seu? — Levantou-se indo em direção a ele, passando os braços
pelo seu pescoço e se insinuando toda. — Que tal se sairmos qualquer dia desses para
nos conhecermos melhor? Tenho certeza de que não irá se arrepender. Nesse quesito te
garanto que sou profissional e tenho muita experiência.
— Também não vai dar. — Esquivou-se de seu abraço e veio em minha direção.
— Eu prefiro as mulheres inteligentes. — Enlaçou meus ombros e deu um beijo casto
no canto da minha boca, me deixando sem reação.
— Você está brincando comigo, não é mesmo?
— Nunca falei tão sério na minha vida, Suelen. — Completou. — Nem todos os
homens gostam do seu tipo de mulher.
— Quer saber? Eu vou embora mesmo. Nunca fui tão maltratada e ultrajada
como hoje. Você nem é tão bonito assim. E nem adianta se arrepender quando descobrir
que Anna é uma chata de galochas, porque eu não dou segunda chance. Acaba de perder
a sua única oportunidade. — Foi falando ao mesmo tempo em que caminhava em
direção a saída, batendo a porta na nossa cara.
— Era só o que me faltava — falei indignada com a cena feita pela minha
prima.
— Anna banana, hein!? E você ainda acha ruim eu te chamar de abelhinha.
— Me poupe, Gabriel! — ralhei, irritada.
— Tia Naninha mananinha — disse Belinha, dando risada.
Mais essa agora.
Anna...

Eu e Gabriel já estávamos quase desistindo e dispostos a encontrar um maternal


ou creche para matricular Belinha, apesar de ainda acharmos ela muito novinha para
isso e também de estar com mais de um semestre de ano letivo, quando nossos
problemas acabaram. No dia seguinte, Dona Arlete bateu na porta da casa dele, também
enviada pela agência de empregos, depois de termos reclamado das pessoas que
mandaram para a entrevista.
Ela era uma senhora muito distinta e bondosa, por volta de uns quarenta e
poucos anos. Não perguntei a idade exata por hora para não ser indelicada. A garotinha
simpatizou com ela de cara, e logo caiu de amores. Não tive dúvidas de que seria a
pessoa ideal para o cargo, mesmo assim pedi para que retornasse no dia seguinte para
conversar com o pai da criança, já que aos sábados ele não trabalhava. Depois de um
longo bate-papo, ela saiu de lá empregada e pronta para começar no serviço na
segunda-feira pela manhã.
Confesso que foi estranho e doloroso deixar Belinha, ainda mais depois de
passarmos um mês juntas.
Mas o que fazer se o dever me chamava?
Conversei com a pequena e expliquei tudo direitinho, que entendeu sem
questionar e disse que ia ficar bonita para esperar a mim e ao pai. E assim se passou
uma semana.
— Anna, minha princesa, que bom que voltou ao trabalho. — Fui abordada na
cozinha da M.B. Papel e Celulose, enquanto fazia um lanche rápido, pelo chefe do
departamento de RH da empresa e meu fã assumido. — Senti sua falta.
— Como vai, Alfredo? — Cumprimentei-o com simpatia. — Como dizem por
aí, o bom filho a casa torna.
— E por falar em casa, gata, amanhã será aniversário da minha avó. Algo bem
simples, na residência dela. Não gostaria de me acompanhar para nos conhecermos
melhor? — Fez mais uma das suas inúmeras tentativas de sair comigo.
A minha resposta sempre era negativa, mas dessa vez era diferente, eu precisava
de um encontro para tirar Gabriel de vez da minha cabeça e parar de quase cair em
tentação diante do seu chame. Tinha que provar a mim mesma que aquela atração era
por pura falta de sexo, como também era para ele.
— Claro, eu adoraria.
— Que ótimo, gatinha manhosa! — Quê? Pensei comigo mesma. — Eu sabia
que mais cedo ou mais tarde você não resistiria. — Contou garganta. — Te pego na sua
casa às vinte.
— Ok!
Acho que isso não vai prestar.

— O quê? Você vai a um encontro amanhã com o Alfredo do RH? — Gabriel


indagou, incrédulo. — Ele é o cara mais chato da empresa, Anna. Não acredito que não
quer ficar comigo e vai perder um sábado da sua vida com ele.
— Pois eu o acho um cara muito educado e galante. Faz tempo que ele me
chama para sair e resolvi aceitar o convite. Qual o problema?
— Educado e galante? — Acrescentou. — Você se quer acha o cara bonito.
— E quem disse que não?
— Eu conheço as mulheres. Se achasse, seria a primeira coisa que teria dito.
— Falou o expert em mulheres! — Zombei da cara dele. — Nem todas nós
somos iguais, sabia?
— Pelo amor de Deus, abelhinha. Acabe com isso logo. Pegue o telefone,
invente uma desculpa qualquer e desmarque isso.
— Lá vem ele tentando me irritar com o maldito apelido ridículo. — Afrontei-o.
— Pois saiba que não vai conseguir. Amanhã é minha vez de ir a um encontro, estou
muito feliz com isso e não vou desmarcar nada.
— Achei que havíamos chegado em um consenso de que abelhinha é bem
melhor do que Anna Banana. — Concluiu. — Onde vocês vão afinal?
— Não é da sua conta. Não tenho que ficar te dando satisfações da minha vida.
Nós vamos sair e pronto. — Confrontei-o. — Agora, se me dá licença, Belinha já
dormiu e eu vou embora. Preciso de uma boa noite de sono para ficar bem linda amanhã
para o Alfredo.
Já fui logo saindo e fechando a porta atrás de mim, para não lhe dar o direito de
resposta ou de escarafunchar ainda mais a minha vida.

— Não é o máximo, gatinha? Fabiola é minha ex-mulher e beija o chão que eu


piso. Até hoje frequenta as festas da minha avó. Acho que ainda tem esperanças de me
reconquistar. — Continuou se gabando como se fosse a pessoa mais importante e
querida do mundo. — Às vezes me pergunto o que eu fiz para todos aqui me amarem
tanto. Eles me idolatram. Também pudera, eu sou o membro mais rico e bem-sucedido
da família.
Caralho, fora da empresa, ele conseguia ser mais chato e convencido do que
nela. Só sabia falar de si e se enaltecer. Será que ele não percebia que ninguém gostava
realmente dele e sim eram um bando de puxa-sacos de olho na sua grana? Já cansada de
ouvir tanta babaquice, comecei a brincar com a comida do meu prato, jogando com o
garfo para lá e para cá.
Enquanto isso, comecei a compará-lo com Gabriel e percebi que ele não teria
chance nenhuma de me fazer parar de desejar estar com meu vizinho playboy. Nem
mesmo tinha o charme que o outro exalava pelos poros. Ou aquele olhar sacana que por
vezes me deixava tonta. O seu perfume não me embriagava. Aquele encontro estava
sendo pura perda de tempo.
— Não está gostando da festa, princesa do Olimpo? — Mais um apelido
ridículo para a sua coleção.
Mil vezes ser chamada de abelhinha ou até mesmo de Anna banana. Pelo menos
são mais criativos.
— Como? — Fingi não entender sua pergunta.
Acho que ele percebeu a minha falta de interesse.
— Perguntei se não está gostando de estar aqui?
— Claro que sim. Me desculpe. Estava perdida em pensamentos. Não sei se
sabe, mas estou ajudando Gabriel, filho do doutor Roger, a cuidar da filhinha dele e
estou um pouco preocupada em deixa-lo sozinho com a garotinha. — Dei de ombros,
bebendo um gole de cerveja.
O que não era de todo uma mentira. Eu estava aflita em abandona-los, de
verdade. Não por achar que Gabriel não daria conta, ele estava se tornando um ótimo
pai e melhorando a olhos vistos a cada dia que passava, mas sim porque ela havia tido
um pouquinho de febre durante o dia e estava meio amuada quando fui me despedir.
Como se percebesse ou ouvisse as minhas apreensões e minha vontade de sumir
da frente de Alfredo e não voltar a vê-lo nunca mais, meu celular emitiu o som de
WhatsApp. De imediato, olhei para a tela e li uma mensagem bastante nervosa de
Gabriel, que me deixou deveras angustiada.
— Aconteceu alguma coisa, Rainha do deserto? — Puta que pariu, de onde ele
tirava essas coisas bizarras?
— É Gabriel. Belinha está com febre. Sinto muito, mas eu preciso ir embora.
Já fui logo chamando um motorista de aplicativo para sumir logo dali.
— Como assim, meu biscoitinho doce? — As coisas só pioravam. — Vai me
deixar sozinho no nosso primeiro encontro? Que deselegante! Me deixe pelo menos
levá-la em casa para o nosso beijo final. — Sugeriu.
— Primeiro e único, Alfredo. — Fui logo deixando bem claro para que não
insistisse mais. — Sim, eu irei embora agora mesmo. Belinha é muito importante para
mim. Me apeguei bastante a garotinha. — E ao pai dela também, pensei, mas não falei
em voz alta. — E não precisa se dar ao trabalho. Eu chamei um Uber, o carro estava
bem próximo aqui do local e já avisou que está chegando.
Levantei-me apressada da mesa e saí correndo em direção a saída. Vai que ele
vinha atrás para me cobrar um beijo de despedida.
Gabriel...

— Como foi o encontro? — indaguei, ao entrar no quarto da minha filha, onde


Anna estava aferindo sua febre com um termômetro digital.
— Estava ótimo até você me atrapalhar com sua mensagem exagerada, dizendo
que Belinha estava ardendo em febre.
Não me contive e sorri, sabendo que não era verdade. Fiquei inquieto depois
que minha vizinha saiu para o tal encontro.
Como ela podia me dispensar e sair com aquele idiota?
Comecei a imaginar coisas que eu não queria. Alfredo tocando, abraçando e
beijando a minha abelhinha.
Sem conseguir me controlar, aproveitei que minha filha havia tido febre durante
a tarde e mandei uma mensagem bem exagerada sobre o seu estado de saúde para minha
vizinha. Eu sabia que ela se preocuparia e viria correndo. E foi assim que dei um fim
naquele maldito encontro sem cabimento. Acho que jamais teria coragem de confessar
isso a ela.
— O que posso fazer se a temperatura baixou de repente? — Voltei a provocá-
la. — Aposto que o encontro estava horrível e eu te salvei. Vendo o meu rim se você
não via a hora de encontrar uma boa desculpa para vir embora. Depois dessa, está até
me devendo uma.
— Não sei do que está falando. — Fez sinal para que eu falasse mais baixo para
não acordar Maria Isabel e foi saindo do quarto. — Alfredo é uma companhia muito
agradável.
— Uauuu! — Olhei-a da cabeças aos pés. Quando ela chegou em casa estava
tão preocupada e afoita, que foi direto para o quarto da minha filha, não me dando nem
chance para admirá-la. — Tá gata, vizinha! Não acredito que você foi linda assim para
um encontro com aquele babaca. Posso saber onde ele te levou?
Eu não a havia visto pronta, ela tinha saído aqui de casa no final da tarde para
se arrumar para o tal encontro e avisado que não retornaria mais, só no dia seguinte.
Até pensei em dar uma desculpa e ir até lá dar uma “conferida no material”, mas não
quis dar aquele gostinho a ela. Anna estava mesmo linda com um vestido preto justo até
os joelhos, marcando todas as suas curvas e uma sandália vermelha de salto agulha bem
alto. Cabelos soltos, uma bolsa de mão, bijuterias discretas e uma maquiagem leve,
completavam o seu visual. Estava um verdadeiro tesão.
— Fomos ao aniversário da avó dele — falou baixo.
— Como é que é? — disse com cara de ultrajado. — O cara te chama para um
encontro e ao invés de te tratar como a rainha que você é, te levando em um lugar legal
e interessante, ele te leva no aniversário da vó?
— E o que isso tem de mais? — Caminhou até o sofá e sentou-se. — A família
dele é bem legal. — Emendou.
— Anna, você já teve um encontro de verdade? — Sentei-me ao seu lado. —
Tipo sair para jantar, uma conversa bacana e agradável, esticar a noite dançando, nem
ver a hora passar de tão prazeroso que é?
— Claro que sim. Eu já tive alguns namorados, sabia? — questionou,
demonstrando irritabilidade.
— Duvido! Se você achou normal o que aconteceu hoje é porque nunca teve um
de verdade. — Cutuquei. — Me deixa te levar a um encontro pra valer, Anna. —
Sugeri. — Podemos ir no próximo final de semana. A dona Arlete já se ofereceu para
ficar no período da noite caso precisássemos — falei, tentando sondar sua reação.
— Eu não quero ir a um encontro com você. Acho que já deixei isso bem claro.
— Sem conotação sexual, Anna. Como naquela noite que dormimos na mesma
cama. Só quero passar um bom tempo com você e que viva essa experiência. Toda
mulher merece ter um encontro de verdade, pelo menos, uma vez na vida; saber como é;
sentir as sensações...
— E o que você ganha com isso? — indagou parecendo confusa.
— O prazer da sua companhia, talvez. — Fui evasivo. — Poxa, abelhinha, deu
uma oportunidade para o cara mais chato da empresa. Não pode me negar esse convite.
Prometo que só vai acontecer aquilo que você quiser que aconteça.
— Você e suas promessas!
— Deixei de cumprir minha palavra em alguma delas? — questionei-a.
— Na verdade, não. — Concluiu.
— E, então? — perguntei com calma, para que ela não se sentisse pressionada.
— Ok, eu aceito o convite para o encontro — respondeu. — Mas vai ter que
cumprir com a sua palavra. Sem cunho sexual. Apenas como bons amigos passando um
tempo agradável juntos.
— Ótimo! — murmurei. — Assim será.
Fascinado, encarei Anna mais uma vez. Ela parecia relaxada e deslumbrante em
um macacão verde água e sandálias de salto nude. Ela estava linda e arrumada para
mim naquela noite e eu me sentia extasiado. Escolhi um restaurante mais simples, sabia
que ela ia preferir assim. Apesar de bem-educada e refinada, a abelhinha era uma
mulher simples e não se impressionava com lugares caros.
Fiquei um tempo prestando atenção em cada detalhe daquela mulher
maravilhosa sentada a minha frente na mesa. O batom vermelho nos lábios, que eu já
havia percebido que era a cor do cosmético que ela mais gostava, pois quase sempre
estava com ele. Os brincos e assessórios sutis. Sua pose de mulher inabalável, que eu
ficava doido para abalar. Eu gostava de tudo nela, mas percebi que já estava dando
muita bobeira, então resolvi parar de apenas observar e partir para a ação, iniciando
uma conversa.
— Você é a mulher mais incrível que já conheci, Anna — sussurrei, segurando a
sua mão sobre a mesa.
— Aposto que fala isso para todas as mulheres com quem sai — respondeu aos
risos.
— Talvez. — Deixei escapar. — Mas nenhuma delas chegava aos seus pés.
Aquele era o nosso primeiro encontro, de muitos outros que viriam, e eu queria
muito fazer valer a pena. Levá-la para jantar, dançar e, se tudo desse certo como eu
imaginava, no final eu lhe daria um delicioso beijo de deixá-la com as pernas bambas.
No fundo eu sabia que Anna também sentia uma forte atração por mim, apesar de negar
com todas as forças.
— Sempre imaginei que você não fosse muito adepto a encontros. Mesmo
porque sempre fazia festas em sua casa e acabava a noite na cama com alguma de suas
convidadas. As vezes até com mais de uma.
Seria engraçado ouvi-la questionando isso e eu até daria uma resposta
espirituosa se não estivesse tão nervoso e disposto a impressionar.
— Nos últimos tempos, não. Depois de Tábata, você é a primeira mulher com
quem saio para um encontro. — Fui sincero e ela sorriu de um jeito tímido. — Quer
dançar? — Propus, assim que começou a tocar um som ambiente.
— Aqui, no meio do restaurante?
— O que tem de mais?
Estendi a minha mão e ela aceitou com um sorriso empolgado. Começamos a
bailar no ritmo da música e as pessoas a nossa volta nos olhavam surpresas. Senti-me
tão feliz e completo naquele momento, nossos corpos se movimentando para lá e para
cá, seguindo o compasso da canção. Eu não conseguia enxergar mais nada a minha
volta, para mim só existia eu e Anna. Será que ela também estava se sentindo assim.
Como se pressentisse minha dúvida, ela sorriu e eu correspondi com o mesmo
entusiasmo. Era como se nós dois juntos fosse a coisa mais certa do mundo e tudo o
que eu mais queria para a minha vida. Colei ainda mais nossos corpos e continuamos
dançando até o final da música. E quando ela parou, ainda ficamos nos encarando por
um bom tempo. Tentei expressar a ela, pelo olhar, tudo o que aquela noite estava
representando para mim.
Como se despertasse de um encanto, Anna piscou os olhos algumas vezes e
então me chamou para pararmos de dançar. Voltamos para a nossa mesa, jantamos,
tomamos vinho, conversamos amenidades e demos muitas risadas juntos. Pena que o
tempo passou tão rápido; como o restaurante já ia fechar e nós éramos os únicos
retardatários, tive que levá-la embora, mesmo contra a minha vontade.
Estacionei o carro em frente à sua casa, mesmo ela dizendo que não precisava,
que poderia seguir a pé, já que éramos vizinhos, e que assim, eu não teria que fazer um
retorno desnecessário na rua. Mas eu fiz questão, queria fazer as coisas certas. Não
agiria como Alfredo e os outros namorados dela, que, de alguma forma, um dia a
deixaram voltar sozinha para o seu lar. Eu queria aproveitar cada minuto ao seu lado.
Desci do carro pedindo para que esperasse, fiz a gentileza de abrir a porta para
ela e a acompanhei até a entrada de sua residência.
— Gostou do nosso encontro? — perguntei, sorrindo.
— Foi uma noite muito agradável.
— Posso te beijar? — Pedi, não conseguindo controlar um sorriso safado. —
Quando é bom, o casal costuma se beijar no final. — Argumentei, puxando-a para mais
perto de mim. — Apenas um beijo, Anna, para selarmos o nosso encontro.
Nossas bocas se chocaram me deixando tonto, embriagado. Sem dúvida
nenhuma eu havia voltado a ser um idiota apaixonado. Tanto tempo lutando contra isso,
para depois cair de amores logo pela minha vizinha brigona. Uma mulher que eu dizia,
equivocadamente, que odiava e me fez passar tanta raiva em outros tempos, mas que
agora eu só fazia querer e desejar com todas as minhas forças.
Aquela era Anna... A minha Anna... Minha abelhinha.
Minha respiração ficou irregular e eu percebi naquela hora que eu estava muito
fodido. Se tivesse concurso para vem quem era o mais fodido, eu ganharia medalha de
ouro, talvez até um troféu. Não dava mais para negar e nem disfarçar, eu estava
perdidamente apaixonado pela mulher em meus braços e faria de tudo para provar isso
a ela e convencê-la do meu amor.
— Eu preciso ir agora, Anna. — Sem vontade, apartei nossos lábios. — Ou vou
quebrar a promessa que te fiz. — Dei-lhe um último beijo casto. — Boa noite! Sonhe
comigo e com nosso primeiro encontro.
Dei alguns passos de costas, ainda mantendo nosso contato visual. Depois virei-
me, caminhei até o meu carro e fui embora louco de desejo.
Anna...

No dia seguinte, pela manhã, as coisas voltaram ao normal. Como de costume


fui à casa da minha avó e passei o dia inteiro com ela. Na segunda-feira, devido ao fato
de já ter retornado ao trabalho, me encontrei com Gabriel só na empresa. Ele foi até
minha sala me pedir para dar o nó na sua gravata, como sempre fazia. Eu estava
desconfiada de que ele sabia muito bem como fazer aquilo, mas usava o pretexto para
continuar me procurando. Entretanto, eu até gostava quando fazia aquilo, era gostoso
receber o seu bom dia logo cedo.
— Bom dia, Anna! Dormiu bem? — Apertou minha mão, me fazendo encará-lo.
— Sonhou com o que eu sugeri?
Encarei seus olhos castanhos intensos e uma agitação bem comum nos últimos
tempos percorreu o meu corpo inteiro.
— Por que está me perguntando isso?
— Porque eu sonhei com você, abelhinha. E o sonho foi incrível, de verdade —
respondeu, com sinceridade no olhar, e eu nem me importei com o apelido. — Me deixa
te fazer feliz, Anna? Te provar o quanto te acho linda. Eu estou louco para te tocar e
sinto que você também quer o mesmo. Prometo que se não quiser mais, depois da nossa
primeira vez, vou respeitar sua decisão e não insistir mais.
— Não sei, Gabriel. Trabalhamos na mesma empresa e ainda tem Belinha, se as
coisas ficarem estranhas entre nós pode refletir nela. — Argumentei.
— Não tem por que as coisas mudarem entre nós. Somos adultos e sabemos
muito bem o que queremos. — Tentou mais uma vez me convencer. — Quanto a
empresa, ninguém precisa saber se você não quiser. Será nosso segredo de vida. Juro
pelo que você quiser.
— Acho melhor voltarmos ao trabalho, playboy. — Provoquei-o, tentando
mudar o assunto.
Eu precisava me proteger de mais uma decepção. Não aguentava mais ser
trocada pela minha prima. Havia jurado a mim mesma que não queria mais aquilo na
minha vida. Não que eu achasse que Gabriel fosse ficar com ela, pois ele parecia não
ter ido muito com a sua cara. Mas se não fosse Suelen, seria outra pessoa. Ele era
assim, o tipo de cara que não se prendia em relacionamentos e não era isso que eu
queria para mim.
— Ok, você quem sabe. — Deu de ombros e saiu da minha sala, me deixando
surpresa com sua rápida desistência.
— Já vai embora? — Gabriel perguntou, assim que me viu pegando minha
bolsa.
— Vou sim. Belinha já dormiu e tenho algumas coisas para fazer em casa. —
Virei-me de costas e caminhei até a porta.
Não tínhamos conversado mais nada depois que ele saiu da minha sala. Ouvi
seus passos atrás de mim e senti quando colocou a mão na minha cintura, me fazendo
sentir seu calor percorrer meu corpo inteiro, me virando em sua direção. Em questão de
segundos, seu corpo se colou ao meu, sua mão subiu até o meu rosto e seus dedos
acariciaram a minha face.
Suspirei. Gabriel gemeu e se aproximou ainda mais.
— Posso, pelo menos, te dar um beijo? Desculpa se eu estiver sendo muito
insistente — sussurrou no meu ouvido —, mas é que desde o nosso encontro está
ficando cada vez mais difícil de resistir.
Nossos olhares se cruzaram e se fixaram um no outro. Foi impossível impedir
que o desejo se aflorasse. Ele estava tão perto, seu corpo em contato com o meu.
— Eu também te quero, Gabriel. — Assumi sem ressalvas, enquanto ele mordia
de leve o meu lábio inferior. — Faça o que quiser de mim.
Segurou firme em minha cintura, pegando-me no colo. Enlacei minhas pernas na
sua cintura e ele caminhou até o seu quarto. Colocou-me sobre a cama, removeu minha
blusa e a jogou para bem longe de nós. Soltou um gemido gutural, que refletiu no meio
das minhas pernas, ao remover minha saia e calcinha ao mesmo tempo, admirando
minha nudez.
Desceu sua boca na minha em um beijo urgente e nada carinhoso, na verdade,
faminto pelos meus lábios. Afastou-se um pouco e removeu sua roupa com rapidez e
habilidade. Deitou-se sobre mim, nossos corpos rolaram sobre a cama e nossas línguas
se enroscaram desejosas.
Seus braços enlaçaram o meu corpo, fazendo-me sentir seus músculos fortes e
bem definidos. Entrelacei minhas mãos no seu pescoço, enquanto ele interrompeu
nossos beijos e desceu sua boca, fazendo uma trilha de beijos pelo meu ombro,
pescoço, colo e por último foi brincar com minha orelha.
Cravei minhas unhas nas suas costas e depois desci até encontrar sua bunda
gostosa. Eu me sentia consumida pelo desejo, que clamava para ser satisfeito. Minha
vontade é que ele me fizesse gozar com tanta força e intensidade ao ponto de eu gritar
seu nome até perder a voz.
Agarrei seu pau e o masturbei, fazendo-o perder a linha e soltar um gemido
visceral. Virei-me sobre ele e montei seu corpo. Segurei firme sua ereção e comecei a
descer minha língua em câmara lenta pelo seu peitoral, depois o abdômen, até chegar ao
seu membro e prová-lo, aprofundando em minha boca.
Seus dedos se enlaçaram com tanta força nos meus cabelos que senti os fios
protestarem. Chupei com força, pressão e vontade, aumentando o ritmo a cada gemido
que Gabriel soltava. Vê-lo sentir prazer ao toque da minha língua me deixou louca de
tesão. Eu já estava totalmente molhada e pronta para ele, que olhou para baixo, fazendo
com que nossos olhares se cruzassem.
— Puta que pariu, abelhinha! Esse é o melhor boquete que já recebi na minha
vida.
— Você prometeu não me chamar mais assim. — Acelerei ainda mais o ritmo
dos meus movimentos como forma de punição, fazendo-o entreabrir a boca e respirar
com dificuldade.
— Se soubesse o quanto me excita te chamar assim e te ver brava por causa
disso, não me pediria isso. Pelo menos, não durante o sexo.
Cansado de ser passivo, Gabriel girou nossos corpos, mudando nossas posições
e me prensando sobre a cama. Senti sua boca em meu mamilo, chupando, lambendo e
mordiscando com ânsia. Depois segurou firme em minha cintura e me presenteou com o
melhor sexo oral da minha existência, atingindo em cheio o ponto mais sensível entre as
minhas pernas. Castigou-me, passando a língua habilidosa e implacável várias vezes no
mesmo lugar, me deixando louca. Senti o orgasmo se formar em meu ventre e então
gozei voluptuosamente.
— Ai meu Deus, Gabriel! — Contorci-me por inteiro. — Que porra de língua
habilidosa é essa? Puta merda!
— Quem mandou me deixar na seca por tanto tempo, abelhinha? — Confesso
que dessa vez nem dei bola para o apelido. Se isso o excitava tanto, ao ponto de me dar
muito prazer, poderia me chamar por ele quantas vezes quisesse. — Eu estava maluco
para sentir o sabor da sua bocetinha deliciosa.
— Então, agora me fode gostoso, que eu estou louca para sentir você dentro de
mim — supliquei, ainda ofegante.
— Nem precisa pedir duas vezes. — Esticou o braço, pegando uma camisinha
dentro da gaveta da mesa de cabeceira ao lado de sua cama.
Vestiu e depois me puxou em sua direção com ferocidade, prensando nossas
bocas uma na outra. Estocou seu pau com força dentro de mim. Senti uma leve dor, que
foi rapidamente substituída pela sensação maravilhosa de ser preenchida por ele.
Nossos olhares se prenderam um no outro e ele sorriu como um predador.
Esperou que meu corpo se ajustasse ao seu e então começou a meter fundo, ao
ponto de eu sentir suas bolas batendo em minha bunda. Retirou-se inteiro de dentro de
mim e meteu fundo mais uma vez. Acelerou em seguida seus movimentos, segurando
firme em minha cintura para que eu não batesse minha cabeça no dossel e me
machucasse. Só se ouvia naquele quarto nossos gemidos e o barulho de nossos corpos
se chocando com urgência.
Gabriel me olhou fixamente e me beijou mais uma vez. Um beijo exigente, com
nossas línguas se enroscando uma na outra com uma ânsia atroz. Passei minhas pernas
pela sua cintura, permitindo que ele fosse mais fundo, alcançando o âmago do meu
prazer. Ele rosnou com selvageria, me deixando extasiada, com a sensação de ser
desejada como nunca.
Mudamos de posição mais uma vez, sem nos desencaixar e, ficando por cima, eu
o cavalguei. Subi e desci várias vezes, ouvindo o maravilhoso som dos nossos gemidos
tempestuosos se misturando ao choque de nossos corpos. Senti quando apertou minha
cintura e apoiei as mãos em seu peito para dar mais impulso e acelerar ainda mais o
ritmo em que eu me movia, me levando ao limite.
— Gabriel, eu vou...
Calou minha boca com um beijo, enquanto eu fechava meus dedos em seu peito,
de um jeito voraz que deixariam algumas marcas. Senti quando minha boceta se contraiu
e apertou o pau de Gabriel em meu interior, sentindo-o inchar dentro de mim e logo em
seguida bombear com força, enquanto o tempo parava e gozávamos juntos.
— Gabriel — Gemi seu nome com força.
— Porra, abelhinha, você é gostosa pra caralho! — Urrou. — Não sei se vou
conseguir te deixar em paz como prometi, caso não queira ficar comigo de novo.
Não encontrei forças para rebater suas palavras e também não queria pensar
nisso naquele momento. Estava esgotada física e sexualmente. Desabei em seu peito,
sentindo seus braços enlaçarem o meu corpo e adormeci logo em seguida.
Gabriel...

Acordei com a claridade da manhã entrando em meu quarto. Fiquei tão


empolgado de conseguir transar com Anna que acabei me esquecendo de puxar a cortina
e por isso estava despertando mais cedo que o normal.
Ela ainda dormia um sono tranquilo, com a cabeça apoiada em meu peito. Meu
pau se animou assim que viu sua linda bunda descoberta. Porém, eu não queria acordá-
la, desejava que descansasse mais e também não sabia qual seria sua reação ao me ver.
Então resolvi observá-la mais um pouco.
Queria aproveitar ao máximo cada instante da sua presença. Seu rosto tão lindo
e sereno, a pele rosada com algumas marcas, que eu havia deixado sem querer. Eu não
era o tipo de cara que marcava as mulheres com quem ficava para dizer que eram
minhas ou algo do tipo. Era raro isso acontecer, mas minha abelhinha era gostosa
demais e acho que acabei passando dos limites. Só espero que isso não seja mais um
motivo para ela brigar comigo.
O corpo dela era muito lindo. Perfeito! Cheio de curvas como eu gostava. Do
tipo que poderia deixar qualquer homem louco. Com certeza depois de vê-la em ação e
prová-la, eu não conseguiria cumprir minha promessa de não mais procurá-la, se caso
esse fosse a sua vontade. Muito pelo contrário, meu desejo só havia aumentado depois
de saber como era estar com ela.
Depois de algum tempo cultuando-a, levantei da cama com todo o cuidado do
mundo e fui ao banheiro, com a intenção de depois voltar a deitar e curtir mais a
deliciosa sensação de tê-la em meus braços. Droga! Eu estava muito ferrado.
— Bom dia! — falei animado assim que saí do banheiro.
Pelo jeito, a minha movimentação na cama a havia acordado. De nada adiantou
todo o meu zelo.
— Oi! — respondeu meio sem jeito.
Percebi logo que havia algo de errado.
— Ei, vem cá. — Aproximei-me, puxando-a pela mão, fazendo com que
sentasse ao meu lado na cama. — Está acontecendo alguma coisa? Tem algo te
incomodando?
— É que... — Retirou a mão da minha, cruzando-as no seu colo. — Eu não sei o
que fazer. Se devo ir embora, ou ficar. É complicado.
— Oh, Anna! Não prestou atenção em nada do que eu te disse ontem? — Dei um
beijo casto em seus lábios e acariciei os seus cabelos. — O que rolou aqui nesse quarto
foi muito mais especial do que eu imaginava. Eu não vou conseguir cumprir minha
promessa e deixar você ir. A não ser que você queira muito isso. Entretanto, eu vou
continuar correndo atrás de você e insistindo.
— Tem certeza disso? — inquiriu. — E você continua me chamando pelo
apelido. Não é porque transamos e foi muito bom que nosso acordo acabou e você pode
infringir minhas condições.
— Pensei que depois de ontem à noite, você tivesse entendido o quanto esse
apelido mexe comigo.
— Acho que podemos deixar ele restrito só para as horas de sexo.
— E quem foi que disse que não estou com vontade de transar com você agora?
— falei e a cena de nós dois juntos, fodendo gostoso mais uma vez, logo povoou a
minha cabeça, me fazendo ansiar por ela.
— Está louco? Belinha pode acordar. Nem sei como não acordou ontem à noite.
— Sorte nossa que ela tem o sono pesado. — Levantei-me e caminhei até a
porta, trancando-a. — Assim, ela não nos pega no flagra e podemos inventar uma
desculpa qualquer para os barulhos, caso ela acorde. Agora, vem cá.
Ela estava linda nua, com os cabelos desgrenhados e cara de que havia sido
bem fodida. E saber que eu era responsável por aquilo, mexeu com meus instintos.
Beijei-a com lascívia e logo em seguida desci minha boca por seus ombros, colo e
seios, dando atenção especial aos últimos. Deitei-a sobre a cama e levei meu dedo até
sua bocetinha apertada e constatei que estava tão excitada quanto eu, toda molhadinha.
— Porra, abelhinha, eu sabia que não ia me decepcionar.
Sem pensar duas vezes, me enfiei com tudo nela. Mordi seu ombro e imprensei
ainda mais nossos corpos. Anna soltou gemidos roucos e entrecortados que foram um
verdadeiro bálsamo para os meus ouvidos. Ela parecia ainda mais gostosa agora. Como
se isso fosse possível. Eu estava me viciando naquela mulher deliciosa.
A droga do despertador começou a tocar, mas eu o ignorei por completo, mesmo
sabendo que seu barulho poderia acordar Maria Isabel. E se isso acontecesse, ela viria
direto para o meu quarto como fazia todas as manhãs. Entretanto, aquela sensação de
perigo, fez o desejo correr furioso pelas minhas veias. Senti minhas bolas pesadas e
inchadas, mal me aguentando de tesão. Forcei-me ainda mais dentro dela.
Anna gemia com descontrole. Eram sons agressivos que saíam de sua boca e eu
não sabia dizer se eu a estava machucando, se era por medo, ou susto do toque do
despertador, ou por puro prazer mesmo. Preferi acreditar que era pela última opção,
pois conhecendo muito bem minha abelhinha, se fosse pelos outros motivos, ela daria
um jeito de interromper o nosso momento. Seus gemidos eram o melhor som que já ouvi
na minha vida.
Comprimi meus olhos e respirei fundo com as lembranças da noite anterior.
Puxei seu cabelo para que olhasse para mim e vi seus lindos olhos azuis nublados pelo
desejo. Anna era muito sexy e gostosa. Vi quando passou a língua nos lábios e esse
simples ato, refletiu direto no meu pau.
Desci minhas mãos até a sua bunda, apertando forte e abrindo- a ainda mais
para mim. Sentindo meu pau entrar mais profundo na sua boceta. Tornei a puxar seus
cabelos, cobrindo sua boca com um beijo lancinante. Senti meu corpo inteiro flutuar e
continuei bombeando nela, com nosso olhar preso um no outro.
— Goza no meu pau, abelhinha. Bem gostoso como fez ontem à noite. —
Provoquei-a e ela não se fez de rogada.
— Gabriellllllllllllll! — Sorri vitorioso.
Sem sair do seu interior, coloquei-a de quatro na beirada da cama para entrar
mais fundo e sentir sua boceta me massacrar. Apoiei minhas mãos em sua cintura e dei
uma última estocada, sentindo o espasmo do orgasmo correndo por minhas veias. Dei
mais algumas estocadas leves, bombeando devagar, saboreando a sensação.
Caralho! Definitivamente eu estava fodido com F maiúsculo.
Só então consegui desligar o despertador que não parava de tocar e voltei para
a cama, puxando Anna para os meus braços.
— Precisamos trabalhar — falou manhosa.
— Nós vamos, mas primeiro eu preciso te contar uma coisa. — Comecei. —
Lembra quando eu te disse que tinha motivos para levar minha antiga vida de playboy?
— Ela apenas assentiu com a cabeça. — Quando Tábata foi embora, ela sequer teve
coragem de falar comigo, deixou apenas um bilhete dizendo adeus e o motivo de estar
partindo. E pasme, era porque eu trabalhava demais e não aproveitava a vida. Eu era
um garoto de vinte e três anos, apaixonado e me revoltei. Resolvi que a partir daquele
momento eu não mais trabalharia como antes e só curtiria a vida. Me tornaria um
playboy e fecharia o meu coração para o amor, ninguém mais me faria sofrer de novo.
— Respirei fundo. — Aquele meu antigo modo de viver, foi uma espécie de proteção
que eu criei para mim mesmo. Pelo menos é o que minha mãe, que é psicóloga, disse
ser. E eu acredito que sim, era exatamente isso, apesar de nunca ter procurado nenhum
profissional especializado para fazer algum tipo de terapia. — Olhei bem dentro dos
seus olhos e sorri feliz. — Até você chegar, encontrar uma frestinha, ir se empurrando
ali, conseguir entrar e bagunçar toda a minha existência. E eu não estou falando só de
agora, não. Estou falando de três meses atrás, quando se mudou para cá e seu jeito
brigão e mandão começou a me tirar do sério e me instigar a querer decifrá-la. Desde
aquele momento, eu sabia que você era diferente, abelhinha. Por isso caçava briga com
você, no intuito de mantê-la o mais longe possível.
— Poxa, parece que a mãe de Belinha gosta de causar com bilhetes. Te deixa
com um, abandona a filha com outro. — Passou a mão pelo meu rosto, acariciando-me.
— Eu tenho que confessar que mesmo brigando, sempre te achei bonito e tive uma
quedinha por você. Na verdade, acho que era um tombo, daqueles bem grandes. —
Gargalhei. — O que me impedia de ceder era o meu passado amoroso. Sabe, eu já
estava cansada de meus namorados sempre me trocarem por outras pessoas, no caso
minha prima. E como você era um playboy e solteiro convicto eu achava que não ia
querer se relacionar com ninguém e que também me trocaria por outra pessoa. E eu não
queria mais isso para mim.
— Você não estava de todo errada, abelhinha. O Gabriel de um pouco mais de
um mês atrás, realmente, teria feito isso. Na verdade, ele continuaria brigando e
evitando você, por ter noção que era diferente e especial e que poderia terminar aqui,
onde estou agora, abrindo o meu coração e assumindo meus sentimentos.
— Acho que podemos dizer que Belinha foi a melhor coisa que aconteceu na
sua vida. Ela, apesar de tão pequenina, é a verdadeira razão da sua mudança. —
Concluiu.
— Coisa louca isso, não é mesmo? — Indaguei, impressionado. — Em um
primeiro momento eu entrei em pânico e até pensei em entregá-la para adoção. Hoje,
não consigo me ver sem ela.
— Eu fico muito feliz em saber disso, sabia? — Beijou meus lábios de forma
rápida. — Mas agora precisamos nos levantar, tomar banho, ver se nossa garotinha
acordou e nos arrumar para mais um dia de trabalho.
— Toma banho comigo? — Acariciei e apertei sua bunda, com um sorriso
sacana estampado nos lábios.
— Tomo. Mas teremos que ser rápidos, pois dona Arlete deve estra para chegar
e ainda preciso ir em casa colocar roupas limpas.
— O tempo de demora vai depender mais de você do que de mim, abelhinha. —
Segurei e mostrei para ela meu pau já duro como rocha.
Peguei-a no colo e a levei direto para debaixo do chuveiro. Eu estava muito
viciado nela. Acho que nada me faria me fartar dela e de seu corpo gostoso.

Para nossa sorte, Belinha não acordou nem com nossos barulhos e nem com o
despertador. Só saiu da cama depois que dona Arlete chegou e foi até o quarto vê-la. A
essa altura, eu e Anna já havíamos tomado banho juntos, o café da manhã e estávamos
prontos para nos despedirmos delas e irmos trabalhar.
Ela me pediu para não assumirmos nossa relação para as pessoas da empresa
ainda. Queria ir mais devagar, ver se daria certo primeiro. Eu não tinha dúvidas disso,
estava disposto e decidido a fazer dar. Confesso que não entendi muito o porquê de ela
pedir isso. Por mim sairia gritando aos quartos cantos que estava com ela e muito
apaixonado. Entretanto, achei melhor acatar e respeitar a sua decisão.
Na empresa, correu tudo às mil maravilhas, comigo dando algumas fugidas
estratégicas para a sua sala de vez em quando. Eu não queria ficar longe dela. Tinha
medo de que mudasse de ideia e voltasse atrás na sua decisão, não querendo ficar mais
comigo. Com a minha vizinha brigona tudo era possível. Ainda estava aprendendo e
desvendá-la e até isso acontecer por inteiro, acho que esse medo sempre rondaria a
minha cabeça.
Chegamos em casa no final da tarde. Após dispensarmos dona Arlete, pedimos
uma pizza e depois fomos assistir a um filme de super-heróis. Eu, Anna e Belinha, a
minha família dos sonhos.
Acordei no meio da noite com as duas mulheres da minha vida agarradas a mim,
uma de cada lado. Nem sei dizer em que momento adormecemos, só sei que eu não
consegui ver o final do filme. Acho que nem elas. Anna devia estar tão cansada quanto
eu depois de nossas transas matinais, e Maria Isabel costumava dormir cedo, não
aguentaria chegar até o fim.
Olhei emocionado para as duas e cheguei à conclusão, mais uma vez, que aquela
era a vida que eu queria para mim. Do meu lado esquerdo, minha abelhinha dormia com
a cabeça apoiada em meu peito, no exato lugar onde ficava o meu coração. Se estivesse
acordada, conseguiria ouvi-lo bater descompensado de alegria. Minha filha estava a
minha direita, agarrada em minha perna e com a cabecinha próxima a minha virilha.
Levantei-me com cuidado, levei Maria Isabel para o seu quarto e depois foi a
vez de Anna, que levei para a minha cama. Minha intenção não era acordá-la pois
estava num sono profundo. Apenas me deitei abraçado a ela e voltei a dormir. Deixaria
para me fartar dela e aplacar o meu desejo na manhã seguinte. Agora estávamos juntos,
não havia pressa. Tínhamos todo o tempo do mundo.
Anna...

— Onde a senhora pensa que vai? — Gabriel foi direto ao ponto ao me ver sair
do quarto de Belinha, após colocá-la para dormir e pegar minha bolsa para ir embora.
— Eu tenho uma casa, sabia? — respondi com um sorriso torto nos lábios.
— Por que não traz logo as suas coisas e se muda para cá? — Apoiou o
cotovelo sobre a mesa, me encarando. — Nós somos um casal e você passa mais tempo
aqui do que lá.
— Porque nós estamos começando um relacionamento, precisamos ter certeza
de que vai dar certo antes de tomarmos uma decisão tão importante, e também por que
gosto de ter meu canto. — Justifiquei-me. — Se brigarmos para onde eu vou?
Encarou-me, balançando a cabeça de um lado para o outro, inconformado.
Porém, não argumentou, com certeza evitando discutir comigo mais uma vez sobre
aquele assunto. Depois, me mediu de cima a baixo com um olhar de arrancar calcinhas,
percorrendo cada parte do meu corpo e eu devolvi o olhar na mesma medida,
aproveitando que estava sem camisa e eu poderia me deliciar com a visão, começando
no seu tronco, passei pelo abdômen e parei em seu sexo, percebendo que estava
excitado.
Meu namorado era um pervertido mesmo.
— É, depois de uma visão perfeita dessa, acho que minha casa terá que ficar
para outro dia mais uma vez.
Gabriel se apressou em me puxar pela mão, levando-me rapidamente para o
quarto. Assim que entramos e ele fechou a porta, pulei em seu colo, fazendo ele cair
sobre a cama, fazendo barulho.
— Xiu... Está querendo que Belinha acorde?
— E vai fazer o quê? Me amordaçar para não gemer ou gritar? — Provoquei,
colando em seguida nossas bocas uma na outra.
De repente, o desejo se tornou iminente, nos despimos um ao outro com
urgência. Gabriel me jogou na cama e cobriu meu corpo com o seu, colando nossas
bocas, me proporcionando sentir seu pau roçar em minha entrada, me fazendo salivar de
desejo. Parou de me beijar e ainda mantendo contato visual, inclinou o corpo para o
lado e pegou um preservativo na mesinha de cabeceira.
Vestiu a camisinha com rapidez, buscou pela minha boca mais uma vez e nos
envolvemos na luxuria de um beijo quente e muito envolvente. Posicionou o pau na
minha entrada e quando foi afundar gostoso...
— Papai... — Belinha chamou do seu quarto com voz sonolenta e um pouco
manhosa.
— Droga! Ela acordou.
— E agora? — Cobri o meu corpo com o lençol com medo de que a garotinha
entrasse e me visse nua na cama de seu pai.
Ela ainda não sabia que estávamos namorando. Na verdade, não havíamos
contado para ninguém ainda e estávamos procurando uma melhor maneira de dizer a
ela. Não sabíamos como iria reagir a isso por causa de sua mãe. E mesmo que
soubesse, não seria de bom tom e nem faria bem para a cabeça de uma criança de dois
anos pegar o pai e a namorada nus na cama. Acho que seria muita informação para
absorver.
— Eu vou ver o que está acontecendo e volto logo. — Vestiu a bermuda que
estava jogada em um canto no quarto. — Não se atreva a sair daqui e ir embora. —
Ameaçou-me em tom de brincadeira.
Respirei fundo com o banho de água fria que havíamos acabado de receber e o
aguardei. Algum tempo depois ele retornou e respirou fundo limpando os resquícios de
frustração do seu rosto. Seu membro não estava mais rígido como antes. Nem eu estava
com o mesmo fogo de algum tempo atrás.
— E então, como ela está? Voltou a dormir? — perguntei, ainda na cama, sem
roupas, embaixo do lençol.
— Não. Sinto muito! — disse, frustrado. — Ela teve um pesadelo com a mãe e
não está conseguindo pegar no sono. Quer vir dormir comigo. Acho que teremos que
adiar nossa diversão para outro dia. Falei a ela que vinha ajeitar tudo para passar a
noite ao meu lado e depois a buscaria no seu quarto. Isso deve dar tempo para que se
vista e se recomponha.
— Que pena! — Lamentei, descobrindo o meu corpo nu, começando a me
vestir. — Acho que vou para a minha casa, então. Retornarei ao meu plano original.
— Não quer ficar com a gente? Acho que Belinha vai gostar de ter a companhia
de nós dois.
— Prefiro ir. Eu tenho mesmo algumas coisas para fazer e resolver lá. —
Acariciei seu rosto dando-lhe um beijo casto. — A gente se vê amanhã.
— Vai ficar chateada comigo por causa disso? — indagou preocupado.
— De forma nenhuma. Eu entendo. Acredito que isso deva acontecer com todos
que tem crianças. — Assegurei. — Você acaba de ganhar mais pontos comigo
colocando sua filha em primeiro lugar. É isso que um bom e responsável pai faria.
— Você não existe, Anna Ayala. — Abraçou-me com carinho, beijando o topo
da minha cabeça. — Obrigado por ser tão compreensiva. Agora venha, vou te
acompanhar até a porta.
— Não tem o que agradecer. Eu já sabia que você tinha uma filha, não é como
se eu tivesse descoberto isso agora. E se estamos juntos hoje, é graças a ela. Foi
Belinha quem fez com que nos aproximássemos e nos conhecêssemos melhor.
— Sonha comigo e com o que ia acontecer no quarto. — Sugeriu, me abraçando
apertado, como se não quisesse me deixar ir.
— Pode deixar. Tenho certeza que será um sonho maravilhoso, amanhã te conto
ele com detalhes e a gente encena com perfeição.
Sem se controlar, Gabriel me puxou para junto de si e colou nossos lábios em
um beijo apaixonado. Ouvimos um barulho dentro da casa e olhamos para ver o que era
e nos deparamos com Belinha com a mãozinha na boca, dando risadinhas e apontando
com o dedinho para a gente.
— O papai e a tia Naninha tão namolandooooo!! Tia Naninha vai ser mamãe
nova de Belinhaaaa.
E voltou correndo para o quarto dando gritinhos eufóricos e nós nos
entreolhamos surpresos e sem saber o que fazer.
— Uma hora ela ia ter que saber. — Argumentou sorrindo. — Pelo menos a
reação foi boa.
Assenti com a cabeça, gargalhamos em uníssono e fui embora, rindo sozinha de
toda aquela situação inusitada que havíamos vivido naquela noite e que, com certeza,
viveríamos outras iguais.
Gabriel...

Tudo estava tranquilo naquela manhã de sábado. Anna continuava passando


mais tempo em minha casa do que na dela, mas era teimosa e cabeça dura o suficiente
para não se mudar de uma vez por todas para lá. Tentei convencê-la e argumentar várias
vezes e sempre acabávamos discutindo. Também, o que esperar de nós dois? Nos
conhecemos brigando e acho que por mais que nos esforçássemos, mesmo nos amando,
sempre discordaríamos de alguma coisa. Era da nossa natureza. E mesmo assim, ela era
perfeita para mim.
Observá-la sentada no tapete da sala brincando de lego com minha filha era
maravilhoso. Mas, de repente, fui tomado de um súbito medo de minha Belinha ser
retirada de mim. Apesar de não acreditar que Tábata voltaria, já tinham se passado
mais de dois meses que havia deixado a garotinha comigo e não havia dado nenhum
sinal de vida.
A campainha tocou, sacudi minha cabeça tentando afastar aqueles pensamentos e
fui atender.
— Bom dia, Gabriel! — Animada, a mulher loira a minha frente anunciou a sua
presença.
— Tábata? — Fiquei sem reação e ela adentrou minha casa sem ser convidada.
— O que está fazendo aqui?
Olhei aquela mulher e vi todos os meus medos se materializarem a minha frente.
Então não eram apenas pensamentos tolos e sim uma espécie de premonição do que
estava por vir.
— Olá, Gabriel! Eu vou bem sim, obrigada. E você? — Foi irônica. — Onde
está Maria Isabel?
— Confesso que estou um pouco surpreso com a sua visita.
— Aí está você, filhinha querida. — Ignorou-me e foi em direção a garotinha
assim que a avistou. — Não vai dar um abraço na mamãe?
— Belinha num qué a mamãe. Ela bate. Quelo papai e tia Naninha. — Minha
filha começou a chorar com desespero e grudou no pescoço de Anna, que, surpresa, não
sabia o que fazer.
Minha ex se aproximou um pouco mais, o que só piorou o desespero de Belinha,
fazendo-a se esquivar da mãe e correr em minha direção, pedindo colo.
— E você, quem é? — Analisou Anna dos pés à cabeça.
— Eu sou Anna, a viz...
— Ela é a minha namorada, Tábata. — Aproximei-me dela alguns passos,
mantendo uma certa cautela.
— Namorada? — falou com um certo desdém. — Achei que depois de mim
você não namorasse mais.
— Como pode ver, você se enganou. Entretanto, acho que isso não vem ao caso
no momento. Acho que precisamos conversar.
— Concordo, meu querido.
— Anna, por favor, pode nos dar licença e levar Belinha até o quarto? —
Percebi que ela também parecia apreensiva com a situação.
Porém nada disse, concordou comigo, pegou a garotinha, que estava se sentindo
mais segura em meus braços e por isso parou de chorar, e saiu da sala.
— Você parece surpreso com a minha volta.
— E não era para estar? Você abandona nossa filha com um bilhete enfadonho
na minha porta, onde diz que vai embora e nem sabe se vai voltar. Do nada reaparece
depois de quase dois meses e não quer que eu me sinta confuso?
— Eu te entendo, meu amor. — Aproximou-se, colocando a mão em meu peito.
— Essa era de verdade a minha intenção, mas eu pensei melhor e me arrependi. Não só
de abandonar ela como a você também. Agora estou aqui para recuperar o que é meu,
minha filha e o pai dela.
Baixei os olhos incrédulo com as sandices que estava dizendo. Retirei suas
mãos do meu peito e senti uma pontada dolorosa no meu coração. Não conseguia
entender como havia tido coragem de abandonar uma garota doce como Maria Isabel. E
que história era aquela de ter se arrependido de me deixar?
— Você só pode estar de brincadeira comigo, Tábata. Abandonou nós dois
deixando apenas um bilhete, escondeu minha filha de mim por dois anos, depois fez
com ela o mesmo que fez comigo e agora aparece assim: sem avisar e diz que quer nós
dois de volta? Só pode estar ficando maluca.
— Tente me entender, Biel. Sem vocês eu fiquei muito sozinha e depressiva.
Precisei até fazer terapia e descobri que o motivo é que amo os dois e só serei feliz de
verdade quando ficarmos, nós três, definitivamente juntos. — Ela me encarou, voltando
a se aproximar e acariciar meu rosto. — Estou tão feliz por ter voltado e ver que se
deram tão bem. Isso é maravilhoso! Agora só falta eu para completar a família dos
sonhos.
— Eu te conheço muito bem. Diga logo o que aconteceu e o que quer para nos
deixar em paz.
— O que eu quero? Eu, você e Maria Isabel juntos e felizes.
— Me poupe, Tábata! Não acredito nem um pouco em você. Fale logo o que
quer. — Fui direto ao ponto. — É dinheiro? Está metida em alguma encrenca? Acabe
logo com esse teatro. Eu te ajudo e você some como das outras vezes, nos deixando em
paz.
— Como pode pensar uma coisa dessa de mim? Eu sou a mulher que você ama,
a mãe da sua filha. Acha que não tenho um coração?
— Amei, Tábata. Não te amo mais. Como pôde ver, eu tenho uma outra pessoa
ao meu lado. Alguém que minha filha adora e não chora de medo e desespero quando
vê, como aconteceu no momento em que entrou nessa sala.
— Isso é coisa de criança. Fiquei muito temo longe e ela se desacostumou de
mim, só isso. Traga ela aqui na sala agora que eu quero vê-la e poderá observar o
quanto nos damos bem.
— Quer provar que ela mentiu todas as vezes em que teve pesadelos com você e
contou que era brava ou batia nela? — Fui sarcástico. — Me desculpe, mas crianças
são seres inocentes e não mentem.
— Eu sou a mãe dela. É o meu nome que está na sua certidão de nascimento.
Você não pode me negar isso. Quero ver minha filha, agora.
— Vou falar com ela. — Levantei-me do sofá, incomodado com a sua
imposição. — Mas ela vem só se quiser, do contrário não adianta insistir porque não
vou obrigar minha filha a nada.
— Nossa filha, meu querido. — Sorriu como provocação.

Assim que entrei no quarto, abracei Anna e Belinha e desabei em lágrimas.


Nunca fui de chorar, mas o meu medo era maior do que tudo naquele momento. Minhas
lágrimas escorriam pela minha face sem parar, me fazendo fungar.
— Procure se acalmar, Gabriel. Vai dar tudo certo, meu amor. — Percebi a voz
de Anna baixa e embargada pela emoção.
Depois de alguns segundos naquela posição, desfiz o nosso abraço e me sentei
na cama ao lado de Belinha, que logo subiu em meu colo e enlaçou o meu pescoço.
— Filha, a sua mãe quer te ver. Está te esperando lá na sala.
— Mas eu num quelo vê ela, papai.
— Ela é sua mãe biológica, Belinha. Tem esse direito e está cobrando isso.
— Vaca! — Anna soltou, sem conseguir se conter. — Além de tudo, ainda quer
fazer exigências.
— Eu disse a ela que você só iria se quisesse. Não vou te forçar a fazer isso,
meu anjo.
— Se eu fô lá ela vai embola, papai?
— Acredito que sim. Se você quiser, posso pedir isso a ela.
— O papai e a tia Naninha vai comigo?
Anna me olhou sem saber o que dizer e fazer. Apenas assenti com a cabeça para
que nos acompanhasse.
— Então, Belinha vai.
Assim que entramos na sala, Tábata levantou da poltrona em que estava sentada
e veio em nossa direção.
— Oi, Maria Isabel! — falou e minha filha agarrou na minha mão e de Anna.
— Oi! — respondeu, acanhada.
— Não vai dar um abraço na mamãe? — Agachou-se na frente da criança,
como se quisesse encorajá-la.
— Não quelo. — Agarrou minhas pernas.
— Vocês podem me fazer o favor de me deixar sozinha com a minha filha? —
questionou. — Estão atrapalhando a nossa interação.
— Nem pensar! — respondi no automático. — Se é o que ela quer, nós
ficaremos aqui. Filha, dá um abraço na sua mãe para ela ir embora, meu anjo. —
Sugeri, encarando-a.
— Então, tá...
Assisti minha filha soltar nossas mãos e dar passos vacilantes em direção a
Tábata. Minha vontade era expulsar aquela mulher da minha casa e proteger minha
garotinha. A mulher enlaçou o corpo da menina, que não correspondeu ao cumprimento.
As duas se encararam por alguns instantes, que mais pareceram uma eternidade.
— Você está muito linda, minha querida — falou com um sorriso forçado nos
lábios. — Uma moça.
— É poque o papai e a tia Naninha cuidam dileitinho de mim. — Maria Isabel
apontou em nossa direção.
— Claro. E você não sentiu saudade da mamãe? — indagou curiosa, arqueando
uma sobrancelha.
— Não. Eu gosto mais de molar na casa do papai. Ele não bate na Belinha. —
Olhou em minha direção, como se pedisse socorro.
— Deixa de ser mal-agradecida, garota. Eu cuidei muito bem de você por dois
anos.
— Poque vochê não faz outo neném? Aí pode ficá com ele e eu com o papai e
a tia Naninha. — Tábata a fulminou com o olhar.
— Acho que já foi o bastante. — Interrompi o interlúdio entre elas. — Anna,
você pode levar Belinha de volta para o quarto, por favor.
Percebi o semblante aliviado da minha namorada ao segurar na mãozinha da
nossa menina e retirá-la da sala.
— Vocês estão mimando muito essa menina. — Tábata falou, assim que ficamos
sozinhos na sala.
— Não venha me dizer como devo ou não criar a minha filha. — Ri das suas
palavras. — Você já fez o que queria, agora já pode ir embora.
— Ainda não terminei — disse determinada. — Eu voltei disposta a
recomeçarmos nossas vidas, mas pelo jeito você e Maria Isabel não estão dispostos a
colaborar. Só me resta ir atrás dos meus direitos. Vou entrar na justiça para reaver a
minha filha. Eu sou a mãe e o meu nome é o único que está na certidão de nascimento
dela, acho que isso me dá alguns direitos. Prepare-se para a guerra, Gabriel
Montenegro Bittencourt. Com a minha filha você não vai ficar — Proferiu ameaças
descabidas. — Só não vou a polícia agora e saio daqui com ela, porque estou em um
hotel e acho muito impessoal para uma criança.
— Eu estarei preparado, Tábata. — Apontei a porta da rua para ela. — Agora
pode sair da minha casa, por favor.
— Com prazer. — Empinou o nariz e saiu nervosa.
— Passar bem — gritei da entrada, enquanto ela pisava fundo no caminho até
seu carro. — E que vença o melhor.
Anna...

Mal entrei em minha casa e logo ouvi a campainha tocar. Era raro receber
visitas. Sempre era eu quem ia ver minha família, leia-se minha avó porque minha tia e
prima não dava para considerar como tal, aos domingos e também não tinha muitos
amigos, pelo menos, não do tipo que frequentavam a minha residência. Quem mais
costumava vir era Gabriel e Belinha, mas eu havia acabado de chegar de lá para
arrumar algumas coisas por aqui e os deixei assistindo desenho, portanto duvidava de
que fossem eles.
— Tábata, acho que errou de casa. — Provoquei. — A do Gabriel, onde sua
filha mora com o pai é ali ao lado.
Fingindo-se de desentendida ela forçou passagem e invadiu a minha residência.
— Isso é invasão de domicilio, sabia? É crime e posso chamar a polícia para te
tirar daqui a força, caso não saiba.
— Eu vou ser rápida, só tenho algumas coisinhas a dizer pra você.
— Que bom! Eu também tenho várias verdades para jogar na sua cara. Vai
querer encarar?
— Quem você pensa que é para falar desse jeito comigo? — respondeu arisca.
— Eu sou a atual namorada do seu ex. Aquela que tem mais consideração por
ele e pela sua filha do que você mesma. A mulher que viu um homem entrar em pânico,
mas mesmo assim mudar toda a sua vida por amor a uma garotinha, que foi abandonada
na porta da casa dele, sem que ele sequer fizesse ideia de que ela existia. Fui a primeira
a ouvir de Belinha que eu era boazinha porque a mãe dela era muito brava e batia nela.
Vi uma criança doce e especial ser totalmente carente porque era maltratada pela
mulher que devia cuidar e zelar por ela.
— Eu não sou obrigada a ouvir essas coisas. Vim aqui para falar e não para
ouvir desaforos. — Apontou o dedo em riste para mim.
— Eu só disse verdades. E tem mais para dizer. Quer que eu continue?
— Isso é ridículo! Não sei como Gabriel pode namorar uma mulherzinha baixa
como você. — Cruzou os braços.
— Ridículo é você invadir a minha casa para me provocar, aparecer do nada e
reivindicar o amor de um homem depois de tê-lo deixado por tanto tempo, se
explicando apenas com um bilhete, ter abandonado sua filha na porta dele da mesma
maneira e querê-la de volta. Aliás, o que você tem com bilhetes, afinal? É para causar?
Isso sim é ridículo!
— Você acha que vai se tornar mãe de Maria Isabel e esposa de Gabriel? Pois
saiba que eu não vou deixar. Eles são meus e eu voltei para reivindicar o meu lugar.
— Ora, Tábata, menos. Bem menos! — Adverti.
— Você não tinha nada que entrar na vida dos dois. Meu plano era perfeito. Eu
deixava a garotinha algum tempo com ele, que se apegaria a ela e depois eu voltava e
nos reconciliávamos. Eu não abandonei minha filha, eu a deixei com o pai para depois
retornar e reconstruir nossa família linda.
— Você é maluca, isso sim.
— Enfim, eu vim só para avisar, ou você sai da vida dos dois ou vai se ver
comigo. Não responderei pelos meus atos. — Ajeitou a bolsa no ombro.
— E o que vai fazer, me bater por acaso? — indaguei, curiosa.
— Se for preciso. Já viu nossa diferença de altura? — Ela era pouco mais que
um palmo maior que eu.
— Se eu fosse você, não faria isso, minha querida. — Usei de ironia. — Por
morar sozinha e ocupar um alto cargo na empresa do meu sogro, a M.B. Papel e
Celulose, fiz aula de defesa pessoal e nelas eu costumava treinar e bater em alguns
marmanjos bem maiores do que você.
— Não acredito nisso. Está falando da boca para fora.
— Arrisca para ver.
— Quer saber, meu recado está dado, “tia Naninha” — falou com desdém. — É
melhor ter cuidado comigo e fazer o que eu mandei.
— Eu não tenho medo de você, Tábata. Quem ladra não morde. E ninguém
manda em mim. — Encarei-a com determinação. — Agora, é melhor você sair da minha
casa. — Abri a porta e a empurrei com força para o lado de fora, fazendo-a virar o pé e
quase cair. — Antes que eu resolva realmente aplicar alguns golpes que aprendi em
você.
Bati a porta na sua cara e depois, pela janela, a observei caminhar mancado até
seu carro.
Eu hein, cada maluco que me aparece!
Gabriel...

Parecia que o que eu estava vivendo nos últimos dias era coisa de filme ou livro
de drama. Era inacreditável o que Tábata estava sendo capaz de fazer. Primeiro,
apareceu do nada na minha casa e disse que queria se reconciliar comigo e Maria
Isabel para formarmos uma família feliz. Depois foi até a casa de Anna e a ameaçou
com coisas absurdas. Nem parecia a mulher que um dia amei. E após ver que nada deu
certo, resolveu cumprir a pior de suas chantagens, entrou na justiça para reaver a guarda
de Belinha e separá-la de mim. O que mexeu muito comigo, pois eu já não conseguia
mais me ver sem minha filha e Anna ao meu lado.
Bem que eu já desconfiava que havia algo de estranho acontecendo para ela
resolver, do nada, deixar a criança comigo e me contar a verdade sobre a paternidade
depois de tanto tempo. Algo estava errado e eu precisava descobrir o que era. Sentia
que era essa coisa que me faria vencê-la no tribunal. Não me fiz de rogado e contratei
um detetive particular para segui-la e descobrir a veracidade por trás de todas as suas
ações, mas ele ainda não havia descoberto nada de significativo. E isso me preocupava
bastante.
— Não acredito que mesmo com você oferecendo ajuda, ela ainda vai manter
esse processo da guarda de Belinha.
Eu e Anna estávamos deitados na cama e ela massageava minhas costas, na
tentativa de me fazer relaxar. Enquanto isso eu contava a ela o resultado da conversa
que tive com Tábata pela manhã. Mesmo eu oferecendo auxilio para seja lá o que fosse
que tivesse acontecido, que ela estivesse precisando e que fez com que ela tomasse
aquela medida extrema, em troca de desistir do processo de guarda e deixar Maria
Isabel em definitivo comigo, ela havia resolvido que não voltaria atrás e que queria a
garotinha de volta. Só podia ser para me provocar.
— Ou ela tem um grande trunfo contra mim ou blefa muito bem.
— Depois das coisas que ela me falou lá em casa, acredito que a segunda
opção. O que ela poderia ter contra você?
— Não sei. Como ela mesma fez questão de me dizer hoje, meu passado de
playboy me condena, Anna. Ela pode usar dele para provar que eu não tenho condições
e nem moral para criar um filho, ainda mais sendo uma menina.
— Ei, o passado ficou para trás. Eu, seus pais, os funcionários da empresa e
seus amigos somos as provas vivas de que mudou para criar a sua filha. Você não é
mais aquela pessoa irresponsável. Se preciso for, podemos até depor a seu favor.
— Talvez você tenha razão, mas eu estou com muito medo de perder minha filha
para aquela doidivanas. Não vou me perdoar e nem suportar se isso ocorrer.
— Não vai acontecer. Você tem um bom advogado, um dos melhores do país. É
difícil ele perder uma causa. Quem sabe ela não te deu essa resposta da boca para fora
e depois pense melhor, mude de ideia e desista dessa loucura? Tudo pode acontecer.
Você ainda nem foi intimado. Está sofrendo por antecipação. Tábata pode estar fazendo
isso só para te torturar. — Acrescentou. — Venha cá! Você precisa é relaxar um pouco.
— Beijou o meu pescoço, fazendo um calor delicioso passear pelo meu corpo.
— Relaxar? — Virei minha cabeça e mordisquei o seu ombro. — Tem alguma
sugestão de como eu poderia fazer isso? — Dei o meu melhor sorriso sacana e em
seguida mordi o meu lábio inferior.
Selamos nossas bocas em um beijo intenso e caloroso, apertei-a em meus
braços e nos perdemos um no outro. Deslizei minha mão até a sua bunda firme,
pressionando-a contra a minha ereção, fazendo-a gemer. Aproveitei que nossos corpos
estavam colados e enfiei minhas mãos por baixo de sua camisola sexy, apalpando suas
cochas e brincando com sua calcinha minúscula. Anna soltou um gritinho agudo e
excitado.
— Que delica, abelhinha! — sussurrei no seu ouvido. — Essa sua bocetinha é a
minha perdição.
Trocamos uma mistura louca e bem-vinda de beijos quentes e carícias ousadas.
Levei minhas mãos até a barra de sua camisola e a retirei do seu corpo bem devagar.
Deslizei minhas mãos até chegar à calcinha, acariciando-a por cima da renda. Depois
apalpei mais uma vez a sua bunda gostosa e em seguida subi para os seios,
massageando, chupando e lambendo o biquinho. Distribuindo em seguida beijos
molhados pelo seu pescoço.
Então, comecei a descer, distribuindo beijocas pela sua barriga em direção a
pelve. Tirei a sua minúscula calcinha de forma lenta e torturante. Beijei sua boceta,
repetindo com mais fome e desejo. Brinquei com minha língua em seu clitóris,
deixando-a toda lambuzada, bem molhadinha para mim, enfiei dois dedos dentro dela e
comecei a fazer movimentos de vai e vem com eles, enquanto continuava chupando-a
cheio de vontade. Ela colocou a perna sobre o meu ombro, facilitando o meu acesso,
enquanto enfiava os dedos em meus cabelos, emaranhando-os.
— Goza para mim, abelhinha — falei rouco e ela choramingou.
— Ahhhhhh! — Gemeu alto, enquanto se desmanchava em minha boca.
Voltei a beijá-la sem pudor, fazendo com que sentisse o seu próprio gosto em
minha boca. Devorando-a sem reservas, chupando a língua e mordiscando os lábios.
Ela se afastou um pouco, removendo com destreza a minha cueca, única peça de roupa
que eu estava usando, já que estávamos prontos para dormir quando o desejo bateu.
Encostou-se em mim e rebolou no meu pau, acelerando os movimentos, me fazendo
gemer.
Abocanhei de novo os seus seios, mamando com vontade, alternando entre um e
outro, fazendo-a dizer palavras desconexas. Estiquei meu braço, peguei e, parando por
um breve instante, coloquei o preservativo, puxei-a em seguida pela cintura para mais
perto de mim, quase fundindo nossos corpos, penetrando-a com força, desferindo
estocadas potentes.
Nossos corpos se entrelaçaram em um ritmo extremamente erótico. Senti que eu
estava à beira de um colapso. Comecei a repetir seu nome várias vezes, sem me
controlar, como uma súplica. Senti que já estava pronta quando sua bocetinha me
apertou e, sem conseguir controlar meus espasmos, me derramei dentro dela, enquanto a
ouvia gritar pelo meu nome, como se estivesse caindo em um desfiladeiro, de tanto
prazer.
Só Anna mesmo para me acalmar em momentos como aquele. Tanta coisa
acontecendo em minha vida e me atormentando, a louca da minha ex querendo tomar
minha filha e mesmo assim eu conseguia encontrar a paz nos braços da minha abelhinha.
Anna...

Até então Gabriel e eu ainda não tínhamos assumido o nosso relacionamento. Só


Belinha sabia, mas não porque havíamos contado e sim porque nos pegou no flagra, nos
despedindo, aos beijos naquela noite que teve um pesadelo e quis dormir com o pai. Eu
ainda tinha minhas ressalvas sobre nós. Éramos bem diferentes e brigávamos o tempo
todo. Além do agravante do medo que eu ainda sentia de ser trocada de novo por outra
mulher. Minha cota de sofrimento por causa disso já havia sido suficiente.
Portanto, aos domingos, eu continuava indo a casa da minha avó sozinha. Havia
levado os dois comigo apenas uma vez e na época não éramos um casal ainda. Quando
cheguei, estranhei um carro estar parado em frente à sua casa. Quase nunca acontecia
isso. Estacionei um pouco mais para adiante e travei quando vi quem estava saindo de
dentro da casa e se despedindo com beijinhos da minha prima Suelen. Vocês não vã
acreditar também. Ninguém mais, ninguém menos que Tábata, a ex maluca de Gabriel.
Assim que me viram, a doida deu logo um jeito de ir embora, enquanto a outra, entrou
rapidinho.
— O que aquela mulher estava fazendo aqui com você, Suelen? — Apressei o
passo, alcançando-a e segurei em seu braço, antes que fugisse de mim.
— Ela é minha amiga — respondeu evasiva.
— Desde quando você é amiga de uma modelo famosa, esnobe e louca?
— Você acha que só você pode ter amigos ricos como Gabriel Montenegro
Bittencourt? Eu também posso ter os meus. — Afrontou-me.
— É justamente nessa ligação que você fez que está o problema. —
Acrescentei. — Tábata é ex de Gabriel, mãe de Belinha e está ou vai, não sabemos ao
certo, movendo uma ação para recuperar a guarda da menina e tirá-la dele.
— E o que eu tenho a ver com isso? — Fez-se de desentendida.
— É muito estranho que ela tenha se tornado sua amiga íntima, ao ponto de até
visitar em sua casa, minha priminha querida, que me persegue e odeia, em especial
depois de eu a ter colocado para correr da minha casa. Você não acha?
— Quer saber de uma verdade, Anna Banana? — Provocou-me. — Ela me
procurou para me chamar para ser testemunha ao lado dela nesse tal processo. Pediu
para que eu deponha contra você e Gabriel.
— Depor contra nós dois? Como assim?
— Isso mesmo, dizer ao juiz que vocês não têm capacidade nenhuma para criar
uma criança juntos. Que ele é um playboy irresponsável, farrista e mulherengo, que vive
fazendo festas e levando mulheres para transar com ele em casa e você uma péssima
influência para a menina por causa dos seus rompantes de raiva e descontrole, como
esse de agora, sempre partindo para briga e discussão. Além de bater e judiar da
garotinha, que vira e mexe aparece com hematomas, fruto dos beliscões escondidos que
dá nela. Essa última parte, é claro, servirá para coroar o sucesso da minha
interpretação, pois pretendo dizer com lágrimas nos olhos.
— Você não vai ter coragem de testemunhar a favor dela. Ou vai? — questionei,
incrédula.
— E por que não?
— Porque tudo o que acabou de me dizer é uma grande mentira. Gabriel mudou
muito depois do aparecimento da menina e não é mais esse homem. E por mais que eu
seja uma pessoa estourada, não nego, eu jamais faria algum mal para a garota. E essa
história dos beliscões é algo muito absurdo e só poderia vir da cabeça de duas loucas
como vocês.
— Sinto muito, priminha, mas eu já aceitei.
— Por acaso, você sabe que mentir para um juiz no tribunal, após fazer o
juramento, é crime?
— Bobagem! Eu e Tatá vamos ser tão convincentes em nossas interpretações,
que ninguém irá desconfiar de nada, nem mesmo o juiz.
— Tatá? Já estão tão íntimas assim?
— Ninguém mandou vocês me distratarem aquele dia na casa dele, querida. Me
mandando embora daquela maneira. Eu avisei que não ia ficar assim. Eu não aceito ser
trocada por você. Onde já se viu ele dizer que prefere mulheres inteligentes?! Pessoa
nenhuma pode preferir você a mim.
— Eu tenho dó de você, Suelen. É uma louca varrida, obcecada por mim. E nem
sei o porquê, se nunca te fiz nada de mal.
— Era para eu ser você, se a piranha da sua mãezinha não tivesse roubado o seu
pai da minha — gritou a plenos pulmões. — Euuuu – bateu o peito vária vezes – é que
era para ter sido a filha querida de Alfredo Ayala, criada com toda pompa,
circunstância e mimo. Ouvi minha mãe sofrer e me contar isso com detalhes a minha
vida inteira e jurei a mim mesma que nunca te daria paz.
— Não fala mal da minha mãe. — Apontei o dedo em riste na cara dela. —
Respeita a alma dela. Todos sabem que meu pai nunca gostou da tia Laís e sempre foi
apaixonado pela mamãe. Ele não trocou uma pela outra. Isso tudo é coisa da cabeça
doente de vocês.
— Thaís Ayala era piranha, galinha, vaca, puta...
Não respondi por mim e parti para cima dela, derrubando-a no chão e em
seguida golpeando seu rosto várias vezes com sucessivos tapas, enquanto ela só gritava.
Como podem ver, eu não estava blefando quando contei a Tábata que eu havia feito
aulas de defesa pessoal.
— O que está acontecendo aqui? Parem com isso as duas. AGORA. — Minha
avó gritou em alto e bom som, no exato momento em que senti o braço forte de Rafael
me tirando de cima da sua namorada.
— Essa maluca. — Apontei para Suelen enquanto enxugava minhas lágrimas. —
Vai se juntar a ex de Gabriel no tribunal e contar um monte de mentiras a nosso respeito
para que ela tome Belinha do pai. E ainda por cima xingou minha mãe, ofendendo a
memória dela.
— É mentira, vozinha. Essa maluca me agrediu sem motivos, só porque está
com medo do bonitão do vizinho dela trocá-la por mim. — Tentou virar o jogo a seu
favor.
— Eu ouvi toda a conversa da cozinha, Suelen. Só não intervi antes para ver até
onde iria com seus absurdos. — Vó Eugênia falou com autoridade e todos se calaram.
— Vou só te dizer uma coisa, se aceitar testemunhar contra Gabriel e Anna,
prejudicando-os de alguma forma, você e sua mamãe podem fazer as malas e sair em
definitivo da minha casa. Vou abandoná-las a própria conta e risco. — Continuou. — E
se quer saber da verdade, sua mãe é uma grande mentirosa. Alfredo sempre foi
apaixonado por Thaís e se teve alguém que agiu de forma errada nessa história, essa
pessoa foi Laís, que tentou de todas as maneiras tomar o namorado da irmã, mesmo
depois que se casaram.
— Nossa, mãe! Precisa ser tão radical assim? — Tia Laís tentou intervir em
favor delas. — Eu não tenho culpa...
— Pode parar, Laís. Não venha se fazer de vítima. — Vovó cortou-a sem
rodeios. — Vocês estão avisadas. Agora deixem Anna em paz e vamos almoçar.
— Desculpa, vó. — Pedi com sinceridade. — Mas não dá mais para continuar
aqui depois de tudo o que ouvi e descobri. Eu vou embora. Não sei quando conseguirei
voltar, mas te telefono para saber como está ou qualquer dia desses a busco para
passarmos algum tempo juntas.
Beijei seu rosto e fui embora para a casa de Gabriel, um lugar onde eu sabia que
encontraria apoio, alento e carinho.
Gabriel...

Meu coração estava disparado, minhas pernas bambas e as mãos geladas.


Enfim, havíamos sido intimados e estávamos no Fórum para a audiência que iria
determinar o destino de Belinha. Pensar em perdê-la me deixava sem chão, apesar do
meu advogado ter me garantido que a causa estava ganha, ainda mais depois do dossiê
sobre Tábata que o detetive que eu havia contratado havia entregue a ele. Mesmo assim,
eu não conseguia afastar o medo dos meus pensamentos.
Eu ainda não tinha consciência do conteúdo naqueles papéis, só sabia que
depois de muito procurar, Cláudio Avelange, havia descoberto o verdadeiro motivo
para Tábata estar fazendo aquilo tudo. Não deu tempo de conversarmos antes de irmos
ao Fórum, pois ele se atrasou montando o tal dossiê. Segundo ele, era muita coisa para
ser colocado. O cara era mesmo bom, após pegar o fio da meada, conseguiu desvendar
tudo e colocou suas habilidades em prática. Sei que tinha de tudo um pouco,
telefonemas e conversas gravadas através de um grampo colocado no celular dela e de
microfones instalados em lugares estratégicos e muitas fotos.
Confesso que eu estava curioso pelo depoimento dele, que seria uma de minhas
testemunhas, junto com Anna, Rayssa, que nem sei como, depois de tê-la deixado na
mão no nosso último encontro, se propôs a me ajudar, e Almir, meu assistente na M.B.
Belinha passou por uma avaliação psicopedagógica, que durou alguns dias, e
também foi ouvida. Um dos depoimentos mais importantes, porque segundo o doutor
Demóstenes Madureira, meu advogado, um dos melhores da área, nesse tipo de
processo a opinião da criança sempre é levada em consideração e tem um grande peso.
Isso me deixou muito aliviado, pois eu sabia que minha filha queria ficar comigo e
Anna. Repetiu isso várias vezes, inclusive na presença da mãe.
— Tudo bem? — sussurrei, abraçando Anna pelas costas. — Você parece ainda
mais nervosa do que eu. E olha que eu estou em pânico.
— Só um pouco preocupada com a hipótese de a doida da minha prima resolver
aparecer. — Levou a unha a boca.
— O que a sua avó disse a respeito? — perguntei, observando as testemunhas
que Tábata havia levado. Um bando de pessoas desconhecidas. Com certeza tão
dispostas a mentir quanto a prima de Anna.
— Só que não se falou mais desse assunto na casa dela e que achava que Suelen
não teria coragem de vir depois da sua ameaça, mas vindo daquela maluca, eu espero
tudo.
— Ainda está muito magoada com ela, não é mesmo? — Concluí. — Tem um
coração tão bom, não devia guardar rancor.
— Se você tivesse visto a maneira e o ódio com que se referiu a mim e aos
meus pais você entenderia.
— De qualquer forma, já está quase na hora e acho que ela não vem mesmo.
Entretanto, levando em consideração as caras das testemunhas da outra louca ali, tenho
a impressão que ouviremos muitas mentiras lá dentro.
— Vai dar tudo certo, meu amor. Vai sair daqui com a guarda definitiva da
Belinha, você vai ver.
— Sim. É isso que vai acontecer. — Envolvo-a em mais um abraço caloroso.
— Tábata Almeida e Gabriel Montenegro Bittencourt — Enfim, fomos
chamados.
Entro na sala com o coração pesado e as pernas bambas. Os primeiros a serem
ouvidos sou eu e a minha ex. Depois começam as testemunhas. Do lado dela ouvimos as
mentiras mais enfadonhas possíveis, do meu, tudo o que é dito é a mais pura verdade.
Até que chega a hora da última testemunha falar e para meu deleite é Claudio Avelange,
o detetive contratado por mim para descobrir toda a verdade sobre Tábata.
Qual não foi a minha surpresa quando ele contou que ela estava viciada em
drogas pesadas e havia perdido tudo o que tinha, até mesmo o que seus pais haviam
deixado como herança depois que faleceram em um acidente aéreo, inclusive o emprego
na agência de modelos e contratos com grandes empresas da moda. E esse era o
verdadeiro motivo para querer voltar comigo. Precisava de alguém com grana para
continuar sustentando o seu vício. Tudo isso minuciosamente comprovado pelas provas
que ele havia conseguido e estavam sendo apresentadas por meu advogado. Isso
explicava também o fato de ela estar agindo daquela maneira, sem noção nenhuma do
que estava fazendo e os maus tratos a Belinha.
Minha ex olhou para os lados constrangida a todo “Ohh” que era pronunciado
pelas pessoas presentes, a cada revelação que ele fazia. Até mesmo suas testemunhas
foram desmascaradas. Uma delas era uma “amiga” e, com certeza, alguma outra
viciada, assim como ela, para quem contou com detalhes o seu plano. Ela achava que
conseguindo me tirar a menina, eu não aguentaria, terminaria com Anna e voltaria para
ela, por isso, mesmo eu lhe oferecendo ajuda, ela não havia aceitado.
Segundo as suas próprias palavras: “Para que me contentar com o pouco que
ele está me oferecendo, se posso ter tudo”. A conversa das duas, havia sido gravada
com a ajuda de um microfone, colocado de forma estratégica em um bar onde elas
combinaram de se encontrar e que ele só descobriu porque o telefone de Tábata estava
grampeado.
A prima de Anna não apareceu, mas segundo o doutor Alberto ela não havia
sido arrolada como testemunha. Com certeza, com medo da avó cumprir a ameaça,
devia ter desistido antes de ser convocada. Porque, pelo o que ele me explicou também,
depois de ser intimada, uma pessoa não pode desistir ou deixar de ir à audiência.
Terminados todos os depoimentos, veio a sentença final. Ouvir o juiz dizer que
havíamos ganhado o processo, me fez chorar de alegria. Lágrimas corriam com
insistência pelo meu rosto. Enfim eu teria paz e poderia dormir tranquilo. A minha
garotinha ficaria comigo e ninguém mais poderia mudar isso. Cuidei logo de pedir ao
doutor Demóstenes que me orientasse em como fazer para colocar meu nome na
certidão de nascimento dela, algo que eu ainda não tinha feito e lhe dei carta branca
para providenciar toda a papelada necessária.
Abracei Anna e rodopiei com ela em meus braços pelos corredores do Fórum.
Estava transbordando de felicidade. Não tinha palavras para agradecer a todos que
estavam ali e se dispuseram a me ajudar, em especial o detetive Claudio Avelange.
Enfim, a verdade e o amor predominaram e venceram a maldade e a mentira.
Anna...

Saímos do Fórum, passamos em casa para pegar Belinha e dona Arlete, depois
buscamos a minha avó, que pela primeira vez deixou minha tia e prima sozinhas, tendo
que se virar com o almoço, e fomos comemorar.
Maria Isabel estava toda eufórica e radiante por saber que ficaria com o seu pai,
apesar de sua mãe ter adquirido o direito a visitas, mas não sem antes passar por um
tratamento adequado e só então, depois de se livrar do vício, poderia vê-la. Dadas as
consequências do que havíamos ouvido no depoimento de Claudio Avelange,
suspeitávamos de que aquilo não iria acontecer tão cedo.
Virei minha cabeça para o lado e contemplei o homem lindo que ali estava.
Lábios perfeitos e bem desenhados, barba por fazer e seus incríveis olhos castanhos
cobertos pelos óculos escuros modernos e estilosos. Pronto para arrasar corações,
perfeito como sempre!
E era todo meu.
Ele percebeu que eu o estava observando e voltou-se em minha direção,
prendendo nossos olhares um no outro e a velha tensão sexual, sempre presente entre
nós, se instalou de novo. Para me provocar, ele passou a língua pelos lábios, me
deixando desejosa de um beijo seu. Sorrimos um para o outro com cumplicidade.
Assim que chegamos ao shopping, passeamos um pouco pelas lojas. Belinha se
encantou por uma loja de brinquedos e bichinhos de pelúcia. Gabriel logo se
encarregou de levá-la até lá e presenteá-la com tudo o que ela queria. Ele não sabia e
nem conseguia dizer não aquela criaturinha encantadora que conquistou nossos
corações. Confesso que nem eu.
Passamos um bom tempo dentro da loja. Vovó e dona Arlete se deram bem e não
pararam de conversar. A maior parte do tempo rasgando elogios para Gabriel. Acho
que o pai tinha o mesmo super poder da filha: o de conquistar todos os que se
aproximavam. Até eu, que tinha muita raiva e não podia nem o vê-lo na minha frente,
acabei caindo de amores. Enquanto as elas batiam papo e meus dois amores compravam
brinquedos, me encostei em um canto e fiquei encantada observando a interação entre
pai e filha.
Saímos de lá, algum tempo depois. Gabriel seguiu pelos corredores com
Belinha no colo e de braços dados com minha avó. Enquanto eu e dona Arlete
caminhávamos logo atrás, conversando amenidades. Dali fomos para a praça de
alimentação e almoçamos em um dos restaurantes mais requisitados do local, onde
conversamos, demos muitas risadas e comemoramos muito. Depois, uma última
passagem na área de recreação para Belinha se divertir nos brinquedos apropriados a
sua idade e voltamos para casa.
Emocionei-me com a ideia de que agora eu tinha uma família de verdade e feliz.

— Sua avó podia ter dormido aqui no quarto de Belinha, ou na sua casa aí do
lado. — Gabriel me falou assim que entrei no quarto, após tomar um banho.
— Já foi um bom começo ela ter passado o dia inteiro fora passeando com a
gente. — Ponderei. — Ela não gosta de deixar aquelas duas muito tempo sozinhas na
casa dela. Acho que tem medo de que aprontem alguma coisa.
— Vai perder o melhor da festa. — Arqueou uma sobrancelha.
— Como assim? — indaguei curiosa.
— Anna Ayala. — Ajoelhou-se aos meus pés. — Já faz algum tempo que
comprei esse anel e estava esperando o melhor momento para presenteá-la. —Retirou
uma pequena caixa de veludo do bolso e a abriu. — E acho que ele chegou. — Meus
olhos começaram a se encher de lágrimas com a emoção. — Depois de tudo o que a
gente passou e viveu nos últimos tempos, desde que Belinha chegou a minha vida, acho
que merecemos um pouco de paz e... Eu só consigo me sentir assim quando estou com
você. — Sorri, embasbacada. — Você aceita, deixar de ser teimosa, se mudar em
definitivo para a minha casa, se tornar a mãe dos meus filhos, incluindo Belinha, e se
casar comigo? — Colocou o anel em meu dedo.
— Aceito!
Não falamos mais nada, nos olhamos com profundidade e colamos nossos lábios
em um beijo quente. Nossas línguas se entrelaçando uma na outra. Gemi quando ele
interrompeu o beijo e mordiscou o meu pescoço. Levou as mãos até as minhas costas e
me puxou para junto de si, colando nossos corpos, como se quisesse nos fundir, me
fazendo sentir sua ereção gloriosa.
Voltamos a nos beijar, enquanto nos despíamos. Gabriel deitou-me sobre cama,
com seu olhar sustentando o meu, e sorriu. Virou-me de costas e mordeu meu traseiro
com desejo, fazendo-me gemer alto. Começou a distribuir beijos e pequenas mordidas
por todo o meu corpo, primeiro as pernas, depois as nádegas, as costas.... Pressionou
seu corpo junto ao meu, encostando o pau em minha bunda, enquanto mordia o meu
pescoço. Arfei.
Colocou as mãos entre mim e o colchão, segurando meus seios, acariciando os
mamilos enquanto continuava mordendo meu dorso. Vi quando pegou uma camisinha na
mesa de cabeceira e a vestiu. Colocou um travesseiro embaixo da minha barriga,
empinando minha bunda.
Passou um dedo pela minha bocetinha, que àquela altura do campeonato já
estava muito molhada, mordeu mais uma vez a minha bunda e se posicionando entre as
minhas pernas, arremeteu fundo dentro de mim. Gritei quando intensificou seus
movimentos, tornando-os mais fortes e rápidos.
Mordeu em meu ombro, me fazendo sentir o orgasmo se formando dentro de
mim, enquanto eu o apertava com minha bocetinha. Gozei, com minha visão se tornando
turva e Gabriel veio logo em seguida, chamando por meu nome e diminuindo a
intensidade dos movimentos até que seu corpo desabou sobre o meu.
Depois, nos amamos mais uma vez, até fecharmos os olhos exaustos e cairmos
em um sono profundo um nos braços do outro.
Gabriel...

Nervoso, olhei mais uma vez em direção a porta da igreja e respirei fundo.
Minhas mãos estavam suadas. Ajeitei minha gravata que parecia querer me sufocar.
Porque será que Anna estava demorando tanto? Será que iria desistir?
— Calma, filho! Ela já vai chegar. — Como se previsse como eu estava me
sentindo, meu pai se aproximou tentando me acalmar. — As noivas sempre demoram.
Ela nem está tão atrasada assim, algumas costumam demorar muito mais.
— Por Deus, pai! — Grunhi. — Para mim parece que já se passou uma
eternidade.
Ele não se conteve e deu uma gargalhada. Agora até meu velho estava se
divertindo às minhas custas.
Eu me sentia muito exposto com todas aquelas pessoas me olhando. Não sei
onde estava com minha cabeça quando convenci Anna a deixar minha mãe organizar o
nosso casamento. Queríamos algo mais simples e restrito, nas mãos de dona Cora, se
tornou o acontecimento do ano. A maioria dos presentes, eu nem sabia quem eram.
A família da minha noiva estava quase toda presente. Dona Eugênia, seus tios e
tias do lado paterno e muitos primos. Apenas Laís e Suelen que não. Apesar de já tê-las
perdoado, porque minha futura esposa tinha um coração enorme, ela não queria
continuar a conviver com pessoas tão más e amargas como elas. Preferia manter
distância, no que eu concordava, sem sombra de dúvidas.
— Chega logo, abelhinha — sussurrei comigo mesmo.
Olhei mais uma vez em direção a porta e... NADA.
Estava começando a cogitar o fato de Anna ter se arrependido e fugido como
naquele antigo filme com Julia Roberts, “Noiva em fuga”. Até que as portas da igreja se
abriram e uma música suave começou a tocar.
Primeiro aconteceu a entrada dos padrinhos, que eu acompanhei sem qualquer
interesse, ansioso pela entrada das minhas garotas. Depois foi a vez de Belinha, que eu
acompanhei todo bobo, trazendo uma cesta com pétalas de rosa e sorrindo, vez ou outra
fazendo gracinhas para alguns convidados que conhecia, que, diga-se de passagem,
eram bem poucos.
E então... veio a marcha nupcial. Anna apareceu na porta e eu fiquei em choque,
assombrado com sua beleza e perfeição. Fiquei quieto, enquanto acompanhava
emocionado a sua entrada. Seu vestido era lindo, assim como ela, simples e tentador.
Senti meu sangue ferver. Fechei minhas mãos junto ao corpo, admirando-a ansioso.
Selei meus olhos e senti a felicidade me inundar. Ela entrou com passos lentos,
me torturando aos poucos. Assim que chegou ao pé do altar, respirei fundo e fui até ela.
— Você está linda, abelhinha.
— Obrigada, playboy. — Brincou, olhando intensamente nos meus olhos.
Eu não conseguia parar de olhar para ela e por isso não prestei atenção em uma
palavra sequer que o padre disse. Repeti os votos no automático. Com as mãos trêmulas
coloquei a aliança em seu dedo e ela repetiu o meu gesto.
— Eu os declaro, marido e mulher. Pode beijar a noiva.
Eu não via a hora dele dizer isso para poder tomá-la em meus braços e beijá-la
profundamente. E foi o que eu fiz com toda a força do meu coração.
— Papai... tia Naninha... Belinha tamém qué beijo.
Minha filha gritou, cutucando nossas pernas e todos os convidados riram em
uníssono da sua reação.
Peguei ela no colo e saímos os três juntos da igreja, do mesmo jeito que nossa
história tinha começado. Com a certeza de que seríamos muito felizes. Nós três e os
outros bebês que viriam, para sempre e contra o mundo.
A Deus, por mais um livro terminado e pela inspiração que não me falta.
Ao meu querido marido, José Carlos, a minha amada mãe, Durvalina, a toda
minha família, amigos e incentivadores.
A Amandda Bennett, minha assessora, por mais uma capa e diagramação
maravilhosas!
A Ebervânia Maria (Bebel), pela revisão impecável. Ficou tudo perfeito como
sempre.
A turma do grupo #DesafioMariSales pelo incentivo e força que sempre.
As minhas parceiras maravilhosas: booktubers, bookinstagramers, tiktokers e
toda a galera da divulgação, que estão sempre ao meu lado, me ajudando muito a
alcançar o sucesso que almejo.
Em especial, aos meus queridos e amados leitores, que me dão a certeza de
estra no caminho certo.
A vocês todo o meu carinho e respeito.
Obrigada e um beijo no coração de todos,
Cris Barbosa.
Cris Barbosa, esposa dedicada, escorpiana, 50 anos, cirurgiã dentista há 27.
Formada na Faculdade de Odontologia da Fundação Educacional de Barretos.
Nascida no dia 8 de novembro de 1971, em Ituverava, interior de São Paulo e,
hoje, reside em Ribeirão Preto, no mesmo estado.
Escrever é sua maior paixão!
Exerce sua profissão como responsável técnico em uma clínica odontológica e
escreve nas horas vagas, mas pretende muito em breve dedicar-se apenas aos livros.
Seu primeiro livro, “Uma Incontrolável Atração”, foi publicado em e-book
independente em 2016 e em físico em 2017, pela Editora Pandorga, lançado na Bienal
Internacional do Livro do Rio de Janeiro e foi contemplado como o "Melhor Romance
de 2017" no Prêmio Melhores do Ano Nerd/Literário, realizado pelo portal No Meu
Mundo.
"O Último golpe do amor" é o seu segundo romance, com e-book e livro físico
publicados pela Editora Pandorga em 2018, lançado na Bienal Internacional do Livro
de São Paulo e foi contemplado com os Prêmios: Brasil entre Palavras, na categoria
“Melhor Livro Hot de 2018” e Melhores do Ano 2018 No Meu Mundo, na categoria
“Melhor Romance”.
Autora também dos contos “O dia do meu casamento”, publicado na Antologia
do IV FLAL, “Não sei quando vou voltar”, publicado na Antologia A Flor da Pele do
Engenho das Palavras, “Você em mim”, publicado na Antologia Apaixone-se pela
Qualis Editora, lançada na bienal Internacional do Livro do Rio de Janeiro de 2019 e
que em breve se tornará um livro completo, que já foi escrito e aguarda apenas a
publicação pela editora, “Paixão em um click”, na Antologia Permita-se publicada
também pela Qualis Editora, e “Refém da vaidade”, na Antologia 7 Pecados do Sexo +
3, publicado pela Assessoria Artessa.
De repente namorados, é o seu primeiro conto publicado de forma independente
na Amazon, que gerou a ideia para o livro “As Aparências Enganam”, que conta a
história completa dos protagonistas Bernardo e Valentina e que se tornou uma série.
Antes de lançar o segundo livro da série, a autora lançou o romance “Perdendo
o medo de Amar” e a segunda edição do e-book de “O Último Golpe do Amor”.
Os Opostos se Atraem é o segundo livro da série “De Repente Namorados”,
conta a história de Haroldo e Melissa, melhores amigos de Bernardo e Valentina,
protagonistas do primeiro livro.
Quem Desdenha Quer Comprar é o último livro da série De Repente namorados
e conta a conturbada história de Márcio e Laura, melhor amigo e prima respectivamente
de Bernardo, protagonista do primeiro livro, que vivem um romance cercado de
preconceito por todos os lados.
A série De Repente Namorados virou um Box incrível contendo o conto que deu
origem a série e os três livros dela. Também publicado em e-book de forma
independente na Amazon.
“O bebê de um ‘EX’ solteiro convicto” é o seu oitavo livro publicado, ficou
mais de três meses no ranking dos cem mais vendidos e já teve quase dois milhões de
páginas lidas na Amazon. Tem os primeiros capítulos dele disponíveis no final desse
livro, caso você se interesse em lê-lo.
Seu nono livro, “O Viúvo e eu – Uma chance para recomeçar”, também entrou
para o ranking dos cem mais vendidos, alcançando a nona posição, lá permaneceu por
quase dois meses e teve mais de um milhão e meio de páginas lidas. Também com
degustação no final desse e-book.
“Apenas por conveniência?” foi o seu décimo e “Subitamente Grávida: Uma
noite com o CEO” o décimo primeiro e-book, publicados de forma independente na
Amazon.
Nesse meio tempo, publicou o e-book “A força da paixão pela Qualis Editora.
Ele faz parte da segunda etapa do primeiro concurso de antologias da editora e conta a
história completa do casal Marcelo e Sofia do conto “Você em mim”.
“Pai Solo: a filha do meu vizinho” é o seu décimo terceiro livro. Publicado em
e-book de forma independente na Amazon.

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Caro leitor,
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ele é muito importante para mim.
E não se esqueça de indicar a leitura para os seus amigos.
No final desse livro vocês vão encontrar as sinopses dos meus livros “O
viúvo e eu: Uma chance para recomeçar”, “O bebê de um ‘EX’ solteiro convicto”,
“Apenas por conveniência?”, além de alguns capítulos do meu lançamento anterior,
“Subitamente Grávida: Uma noite com o CEO”, que já teve mais de três milhões de
páginas lidas na Amazon, para vocês degustarem.
Aproveitem e divirtam-se com as leituras!

Beijos no coração,
Cris Barbosa.
Leia também:

Subitamente Gávida: Uma noite com o CEO


Isis Barros é uma jovem estudante de arquitetura, simples, esforçada e muito
romântica. Em uma noite de festa com os amigos numa boate ela se encanta por Daniel
LeBlanc, um jovem rico e sedutor, que está de partida para o exterior para cursar seu
MBA sem prazo de término e, só então, retornar ao Brasil para assumir os negócios da
família, se tornando o CEO da maior empresa do ramo hoteleiro do país.
Os dois tem uma noite de amor inesquecível. Entretanto o que ela não esperava era
engravidar daquele homem, que partiu na manhã seguinte deixando apenas um bilhete de
despedida.
Devido às circunstâncias e a algumas descobertas a respeito de Daniel,
desesperada e contando com o apoio de seus pais, ela resolve deixar a paternidade do
bebê em segredo. Mas Isis não imaginava que reencontraria aquele homem que havia
mexido tanto com ela e que ele faria as contas tão bem a ponto de desconfiar ser o pai
da criança.
E agora, o que fazer? Contar a verdade ou sustentar a mentira?
Isis

— Quem é ele? — perguntei a Carol, minha melhor amiga da faculdade, sem


desviar os olhos do lindo homem de cabelos castanhos e olhos pretos que me encarava
do camarote VIP da boate em que estávamos.
Sem explicação, me sentia muito atraída por ele, que me observava com atenção.
Seu sorriso era encantador e seu olhar muito sensual. Eu não conseguia desviar o meu
olhar do dele, que, de forma descontraída, bebia seu whisky enquanto flertava comigo.
— Daniel Leblanc, irmão da sua “querida amiga”, Vanessa — falou com desdém
ao se referir ao meu desafeto. — Hoje é o bota fora dele, parece que ele está voltando
para o exterior onde mora e estuda.
Não sei o porquê a irmã dele havia cismado comigo e se tornado minha inimiga
declarada. Que eu me lembre, nunca havia feito nada de mal a ela. Sua raiva desferida
contra mim era gratuita e sem sentido. Eu não conseguia entender o porquê uma garota
rica, filha de um grande empresário do ramo hoteleiro, nascida em berço de ouro,
poderia se incomodar tanto comigo, uma reles mortal sem eira, nem beira.
— Sabia. Algum defeito ele tinha que ter. — Olhei de novo em sua direção, sendo
pega em flagrante por ele, que me encarava despudoradamente.
Assim que nossos olhares se cruzaram, desviei o meu, envergonhada. Tenho que
admitir que ele parecia ser muito gostoso. Eu nunca havia me sentido tão atraída e
interessada assim por um homem. Sempre fui muito reservada para relacionamentos.
Ele era alto, imponente e muito lindo. Olhar penetrante e sorriso sexy. Mas era irmão de
Vanessa Leblanc, e ela, com certeza, ia fazer de tudo para atrapalhar.
— Então, antes que ela veja essa troca intensa de olhares entre vocês, vamos
comigo ao banheiro. Aproveita e tire esse cara da cabeça — Aconselhou-me Carol. —
Lembre-se que a corda sempre arrebenta para o lado mais fraco, que nesse caso é você.
Acompanhei minha amiga até o toalete feminino sem dizer mais nenhuma palavra
sobre o homem lindo que havia ganhado toda a minha atenção naquela noite. Tinha algo
nele que me atraía como um ímã e eu não sabia dizer o que era. Mas Carol tinha toda
razão ao me dizer para tirá-lo da cabeça. Eu era mesmo o lado mais fraco da corda e a
família dele, que com certeza não iria me aceitar muito bem, era o mais forte. Quem
sofreria as consequências de um envolvimento entre nós, seria eu.
Voltamos para perto da pista de dança e de soslaio olhei na direção do camarote e
o deus grego já não estava mais lá. Com certeza havia encontrado outra garota com
quem se divertir. Melhor assim.
— Procurando por alguém? — Ouvi uma voz muito sensual nas minhas costas e
pelo arrepio que percorreu todo o meu corpo, nem precisava olhar para trás para saber
quem era.
Virei-me em sua direção e senti o ar ficar preso em meus pulmões. Ele era ainda
mais perfeito de perto. Passou as mãos pelos cabelos curtos, castanhos escuros e,
mordendo o lábio inferior, me encarou com lascívia. Depois sorriu com seus dentes
extremamente brancos e perfeitos. Apesar de vestido dava para perceber que seu corpo
era malhado e bem trabalhado em músculos que marcavam sutilmente sua roupa
conforme ele se movia.
— Por que estaria? — respondi sua pergunta com outra, fazendo-o me dar mais um
de seus sorrisos largos.
— Prazer, Daniel Leblanc. — Estendeu a mão em minha direção.
— Muito prazer... — retribuí o cumprimento, sentindo pequenos choques percorrer
todo o meu corpo, se concentrando mais entre as minhas pernas. — Eu sou Isis Barros.
Ele me olhou de cima a baixo, me analisando, e eu fiz o mesmo com relação a ele.
— E então, por que veio falar comigo? — perguntei, me fingindo de desentendida
e com um certo ar de superioridade na tentativa de ele não perceber o quão abalada eu
estava com nossa proximidade.
— Porque a gente está se olhando e se desejando desde a hora em que nos vimos
pela primeira vez. — Foi direto, jogando limpo, e depois deu alguns passos em minha
direção, diminuindo a distância entre nós. — E porque eu quero te beijar — confessou.
— E por que eu te beijaria? — questionei atrevida.
— Para me conhecer melhor.
Enlaçou minha cintura com uma mão e com a outra me puxou pela nuca, colando
nossos corpos. Labaredas de desejo brilharam em seus olhos e me peguei desejando
que todo o resto nele fosse tão quente como aquele olhar arrebatador. E então, me
entreguei ao beijo mais gostoso e perfeito de toda a minha existência.
— Dança comigo? — perguntou, desfazendo nosso beijo e me pegando de
surpresa.
Não sei o porquê, mas achei que, após me beijar e conseguir o que queria, ele iria
embora a procura de alguma outra garota para ficar. Na maioria das vezes era assim que
acontecia.
— Claro! — respondi, meio sem reação, no exato momento em que o DJ começava
uma seleção de músicas românticas.
Caminhamos em direção a pista e quando olhei curiosa em direção ao camarote em
que estava a família dele, vi Vanessa com a mão na cintura e a boca aberta, deixando
bem claro que não havia gostado do que estava vendo.
Assim que chegamos lá, começou a tocar a música “Afterglow” de Ed Sheeran.
Com uma mão, Daniel segurou em minha cintura, me puxando para mais perto, e com a
outra entrelaçou nossos dedos. Ele começou a se movimentar, me conduzindo no ritmo
da música e sem desviar seus olhos dos meus. Não tinha como ser mais perfeito.
Dançamos por toda a pista. Daniel não me decepcionou, ele dançava muito bem e
me conduzia com facilidade. Estávamos tão colados que meus seios roçavam sua
camisa e sua ereção começou a ganhar forma.
— Isis, eu... — Afastou-se um pouco para olhar bem dentro dos meus olhos. —
Estou completamente enfeitiçado por você. Desde o primeiro momento em que te vi,
não paro de te desejar. Tudo o que mais quero é te provocar e possuir. Tê-la em minha
cama e te ver perder as roupas, a cabeça e a compostura. Te ouvir gemer e gritar meu
nome de tanto prazer. — Labaredas de desejo voltaram a inundar seus olhos. — Mas eu
preciso ser sincero com você. Estou indo embora do país amanhã. Estou partindo para a
Suíça terminar meu curso de MBA em hotelaria e só retorno depois que o terminar para
assumir os negócios da família.
— Tipo como um CEO? — indaguei com curiosidade.
— Exatamente como um CEO, Isis. Meu pai está doente e precisa se aposentar. Eu
sou o primogênito da família e devo substituí-lo no comando da empresa —
acrescentou.
— Poxa, eu nunca pensei que um dia fosse conhecer um CEO de verdade —
divaguei. — Até agora eu só conhecia aqueles dos romances que leio.
— Agora você me conhece. — Sorriu encabulado. — E então, o que me diz? Fica
comigo essa noite? — Me puxou para os seus braços, me beijou com sua boca gostosa e
eu retribuí com avidez.
Enlacei o seu pescoço com uma urgência incontrolável, enquanto ele me puxava,
nos afastando da pista de dança e me pressionando contra uma parede próxima a nós.
Ele devorava minha boca e subiu uma das mãos em direção a curva dos meus seios. Foi
quando me toquei de onde nos encontrávamos, o quanto estávamos expostos e resolvi
responder, antes que acabássemos transando ali mesmo.
— Fico — respondi afoita. — Mas preciso que você saiba que não costumo
transar na primeira vez. Para mim precisa ter envolvimento de ambas as partes. Mas
tem algo muito especial rolando entre a gente, você vai embora e eu acho que jamais me
perdoaria se deixasse essa oportunidade passar. Eu não consigo explicar o porquê, mas
você desperta uma fera dentro de mim.
— Não se preocupe com isso, Isis. — Acariciou meu rosto com o polegar. — Eu
sou um homem de trinta e três anos e não um garoto. Jamais te julgaria por ceder ao
desejo e se entregar a mim na noite em que nos conhecemos. — Respirou fundo. —
Para ser sincero, eu jamais te pediria isso se não estivesse indo embora. Eu teria mais
alguns encontros com você, te conheceria melhor e então aconteceria. Porém, não temos
tempo para isso e estamos doidos de tesão um pelo outro. — Engoliu em seco. —
Venha, vamos sair daqui agora. — Saiu me puxando em direção a porta.
— Mas já? — perguntei confusa e excitada.
— E por que esperar mais? — indagou sorrindo.
Já do lado de fora da boate, Daniel pediu ao manobrista que trouxesse seu carro,
um Ferrari SF90 Stradale de cor vermelha. Ele abriu a porta para mim e eu entrei.
Fiquei de boca aberta apreciando a máquina. Nunca em minha vida pensei que andaria
em um carro como aquele. Não que eu me importasse com esse tipo de coisa. Se eu
gostasse da pessoa de verdade, poderíamos andar a pé ou de transporte coletivo que da
mesma forma eu seria a mulher mais feliz do mundo.
— Girassóis? — Ele me olhou surpreso sem entender o que eu estava dizendo.
— Ah, sim. — Sorriu balançando a cabeça. — Era a minha festa de despedida que
estava rolando no camarote. Uma amiga da família me presenteou com esse arranjo.
Confesso que fiquei meio desconcertado em receber flores, mas enfim as aceitei e
coloquei dentro do carro para não ter que carregá-lo pela boate na frente de todos.
— Qual o problema de vocês homens em receber flores? — indaguei divertida. —
Elas têm significados, sabia? Os girassóis têm muitos. Mas, no seu caso, com certeza
ela te deu esse arranjo como desejo de boa sorte e fortuna na carreira de CEO que você
vai iniciar quando voltar.
—Temos aqui uma entendida em plantas? — Brincou, dando partida no carro e
saindo da frente da boate.
— Não em todas. — Sorri de volta. — Mas em girassóis, sim. São as minhas
preferidas, além de terem muito significados bons e positivos.
— Você é muito surpreendente, Isis. Alguém já te disse isso?
— Não que eu me lembre — respondi encabulada. — Para onde estamos indo?
— Para o meu apartamento. — Estendeu o braço e acariciou minha mão. — Isso te
incomoda? — Apenas neguei com a cabeça.
Mal chegamos ao apartamento de Daniel e fomos logo nos pegando na sala mesmo.
Não sei dizer o que estava acontecendo comigo, mas o fato é que aquele homem exercia
um magnetismo sem igual sobre mim e me deixava louca. Ele segurou firme em minha
cintura e, virando-me de costas, passou o nariz pelo meu pescoço como se quisesse
absorver o meu cheiro. Ali, na sua casa, em seus braços, eu tinha certeza de que jamais
o esqueceria. Ele havia me marcado para sempre, desde nosso primeiro olhar.
— Eu te quero tanto, Isis. Você me deixa tão louco, me acende de tal forma que me
sinto como se estivesse entrando em combustão — sussurrou, enquanto distribuía beijos
pelo meu pescoço.
De costas para ele, joguei minha cabeça para trás, me apoiando em seu ombro e
tomada por um tesão inexplicável, sussurrei palavras desconexas. Eu nunca havia
desejado alguém com tamanha intensidade e desespero. Daniel virou-me de frente para
ele e, mais uma vez, pude ver o desejo brilhando como labaredas em seus olhos.
Insanamente comecei a desabotoar sua camisa, estremecendo quando minhas mãos
tocavam a sua pele. Após removê-la por completo, o encarei com desejo. Sorrindo,
Daniel virou-me novamente de costas e pude sentir e ouvir o barulho do meu zíper se
abrindo e logo meu vestido estava no chão.
Levou-me até o sofá, onde sentei, abri as pernas e apoiei meus pés no móvel. Arfei
quando senti ele me tocar sobre o tecido fino e delicado da minha calcinha preta de
renda. Abaixou-se beijando e acariciando minhas coxas. Com a respiração
entrecortada, gemi e me deliciei.
Retirando minha calcinha, levou-a até o nariz inalando o aroma do meu sexo.
Depois, Daniel passou a língua por toda a minha extensão, me lambendo e fazendo
arquear. Alisou minhas coxas e levando o dedo indicador até a minha bocetinha
começou a brincar em minha entrada, enfiando-o e removendo devagar. Então abaixou-
se e levou a boca de encontro ao meu clitóris, lambendo com vontade. Enfiou sua língua
em mim sem piedade. Descontrolei-me e puxei seus cabelos enquanto ele enterrava um
dedo em mim e depois outro.
Com a outra mão ele acariciava meus seios, torcendo os mamilos entre os dedos.
Eles cabiam inteiros em suas mãos. Daniel capturou meu clitóris com os dentes,
trabalhando no meu ponto sensível, enquanto seu dedo continuava enterrado em mim.
Contraí-me por inteiro quando meu orgasmo me arrebatou com força.
Afastou-se depressa, tirando a calça com rapidez. Beijou-me de forma quente e
então me penetrou com um golpe só, pegando-me desprevenida. Minhas pupilas
dilataram, gemi e me contorci com ele enfiado em mim.
Apoiou uma das minhas pernas em seu ombro para entrar mais fundo. Meteu em
mim sem piedade. Nossos corpos se chocavam a cada estocada forte e rápida que ele
desferia. Levantei minha outra perna, apoiando em seu outro ombro para que ele se
enfiasse ainda mais dentro de mim.
Gemi descontrolada e senti meu abdômen se contrair. Daniel saiu de dentro de
mim e virou-me de costas, mordeu minha bunda que estava arrebitada em sua direção e
voltou a me penetrar. Com o dedo alcançou meu clitóris e fez movimentos de vai e vem,
enquanto suas estocadas se tornavam cada vez mais urgentes, fundas e rápidas. Gritei o
seu nome e me entreguei a mais um orgasmo sensacional. E então, ele também gozou,
totalmente fora de si, gritando, gemendo e xingando.

Acordei toda manhosa me espreguiçando na cama. Um sorriso bobo não saía dos
meus lábios. A nossa noite havia sido incrível. Depois de fazermos amor selvagem na
sala, Daniel me levou para o quarto e fui a loucura em seus braços, na sua cama. Nossa
química foi perfeita e o que aconteceu entre nós abalou todas as minhas estruturas.
Passei a mão ao meu lado na cama e me surpreendi ao perceber que eu estava sozinha
nela.
— Daniel? — chamei.
Sem resposta, me enrolei no lençol e saí a sua procura. Não o encontrei em parte
alguma. O silêncio e o vazio indicavam que eu estava sozinha no apartamento. Onde ele
teria ido? Voltando para o quarto, encontrei na mesa de cabeceira um bilhete junto com
o arranjo de girassóis que ele havia ganho na noite anterior. Eu havia saído do quarto
tão atordoada para procurá-lo que nem havia notado o sinal.

“Minha linda, querida e inesquecível, Isis,


Sou péssimo em despedidas por isso resolvi partir antes que você acordasse.
Quando você ler esse bilhete, com certeza, já vou estar bem longe, o meu
voo parte bem cedo.
Muito obrigado pela noite de amor incrível e quentíssima!
Você foi e é perfeita!
Você vai deixar... Já deixou saudades!
Você merecia flores compradas especialmente para você, porém como não houve
a possibilidade de eu fazer isso, te deixo o arranjo de girassóis, já que são as flores
de que mais gosta.
De qualquer forma seria uma judiação deixá-los morrer fechados em um
apartamento sem ninguém para olhá-los.
Cuide bem deles!
Sinto ter que partir justamente quando te conheci.
Até um dia!
Seu Daniel.

Ps: deixe a chave na portaria, o porteiro saberá o que fazer com ela.

Li e reli aquele bilhete várias vezes, depois tomei um banho, coloquei minha roupa
que estava gentilmente dobrada sobre o sofá. Peguei meus girassóis, o bilhete, minha
bolsa e fui embora. Mas antes de sair, dei uma última olhada no nosso ninho de amor.
“Será que algum dia ele vai voltar?” Pensei em voz alta, fechei a porta atrás de
mim e parti, já com saudades e um pouco decepcionada por ele ter ido embora sem se
despedir, porém sem nenhum arrependimento.
Mal sabia eu que aquela noite mudaria toda a minha vida.
Isis
Um mês depois...

Saí de casa bem cedo naquele dia. Antes de ir para a faculdade, passei em uma
farmácia. Havia algo me incomodando e me deixando maluca, a minha menstruação, que
era sempre tão regular, estava atrasada, há alguns dias eu vinha sentindo enjoos e
passando mal, sentia muito sono e minhas mamas estavam sensíveis. Eu precisava me
certificar de que estava mesmo enganada, para tirar aquela dúvida de vez da minha
vida.
Assim que cheguei à faculdade, chamei minha amiga Carol para que me
acompanhasse até o banheiro. Entramos juntas em um mesmo compartimento, eu queria
que ela estivesse comigo quando visse o resultado e precisávamos conversar a respeito.
— Meu Deus, isso não pode ser verdade. — Proferi incrédula, após reler pela
terceira vez as instruções contidas na caixa.
— Isis, você está bem? Diga logo de uma vez como foi o resultado.
Olhei para o palito em minha mão e li a caixa mais uma vez. Não tinha como errar,
as explicações eram bem simples e nítidas: (-) = negativo / (+) = positivo. E era
exatamente o sinal de + que aparecia em meu resultado.
— Aqui diz que estou grávida de Daniel Leblanc.
Vi minha amiga perder a fala e não conseguir me dizer mais nada a respeito por
alguns momentos. Meu Deus, como isso foi acontecer? Foi então que me lembrei que na
nossa única noite juntos estávamos tão afoitos e desejosos um do outro que Daniel não
havia usado preservativo e que eu não tomava pílula anticoncepcional, pois sofria
muito com os efeitos colaterais e não havia conseguido acertar em nenhuma. Foi então
que entrei em pânico.
— Eu preciso ir ao médico. Esses exames de farmácia não são cem por cento
confiáveis. Tenho que fazer o exame de sangue. Eu não posso ser tão azarada assim ao
ponto de engravidar na primeira e única transa que tive com o cara. Ou posso?
Já tendo voltado a si, Carol começou a tentar me acalmar, enquanto eu tentava
digerir melhor o que estava acontecendo comigo.
— Preciso marcar um horário com a doutora Aline e fazer o exame de sangue o
mais rápido possível.
— Faça isso. Eu irei com você, não vou te deixar sozinha nesse momento.
— Tem alguém aí? — perguntei de imediato ao ter ouvido barulho de passos do
lado de fora.
Abrimos a porta e não encontramos ninguém. Devia ser paranoia da minha cabeça.
Ou, pelo menos, eu esperava que fosse, o que eu menos precisava nesse momento era de
alguém ouvindo nossa conversa por trás da porta e sair espalhando por aí a notícia da
minha possível e quase certa gravidez.

— Posso saber qual o motivo da minha paciente mais aplicada solicitar um


atendimento de urgência? — Eu havia feito a secretária da minha ginecologista e
obstetra se virar e me marcar o mais rápido possível. Dois dias depois eu estava sendo
atendida.
Doutora Aline foi simpática e atenciosa comigo e eu lhe contei tudo o que estava
acontecendo. Sorrindo, ela me explicou que faria a solicitação de um exame através do
meu convenio médico e que eu deveria seguir as regras de praxe, ir até um laboratório
de exames clínicos e fazê-lo. Segundo ela, dentro de dois dias já deveria estar pronto.
Orientou-me a pedir que o resultado fosse enviado diretamente para o seu consultório.
Que assim que chegasse, ela avaliaria e se houvesse necessidade, marcaria o meu
retorno. Também me instruiu a não entrar em desespero, pois, caso eu estivesse grávida
de verdade, isso poderia prejudicar o meu bebê.
— Está tudo bem, amiga? — Carol me perguntou assim que deixamos o
consultório médico.
— Está sim — respondi sem mais delongas e enxuguei minhas lágrimas antes de
olhar para ela.
— O que vai fazer com Daniel Leblanc se estiver mesmo grávida dele?
— Não sei como, mas terei que dar um jeito de contar a ele. E se ele não acreditar
em mim, Carol? Se duvidar que o bebê é realmente dele? Achar que é de outra pessoa e
eu estou tentando dar o golpe da barriga nele? — Eu não estava preparada para ser
julgada e rejeitada por ele.
— Procure se acalmar, amiga. Lembre-se do que a médica falou sobre estar
carregando um ser vivo dentro de você e de poder fazer mal a ele. — Segurou minha
mão com carinho. — Vamos esperar o resultado do exame e daí você decide o que vai
fazer. Tenho certeza de que tudo dará certo e ficará bem.
Dois dias após sairmos de lá, a secretária da minha médica me ligou para
marcarmos o retorno, pois ela precisava me ver. Na hora eu já sabia que estava de fato
grávida. Como de praxe, se o resultado fosse negativo, ela pediria para que me ligasse
e dissesse que estava tudo bem, que eu poderia dormir tranquila. Esse era o critério
adotado por ela.
— Isis, minha querida, você acredita em destino, milagre ou algo do tipo? —
doutora Aline sorriu ao perguntar.
— Às vezes sim, outras não. Por quê?
— O seu exame deu positivo. Ao que tudo indica, pelo que me contou, você está
com cerca de quatro semanas e meia de gestação. Pelos meus cálculos, como é minha
paciente há anos e sei que sua menstruação sempre foi muito regular, você engravidou
fora do seu período fértil. — Surpresa com a revelação, levei minhas mãos a boca. —
Isso é quase impossível de acontecer, mas existe uma chance mínima se a relação
sexual acontecer antes da ovulação. E aconteceu com você. Se isso é milagre, destino,
sorte ou azar, só você poderá avaliar.
Pensativa, passei a mão pela minha barriga ainda seca, sem qualquer sinal de estar
carregando um bebê dentro de mim. Mas logo ela apareceria e eu teria que dar um jeito
de entrar em contato com a família de Daniel para contar a ele. Mesmo que para isso eu
tivesse que engolir Vanessa Leblanc e seus desmandos. Eu não queria privar meu filho
de ter e conviver com o pai.
Minha médica aproveitou para me dar algumas orientações básicas e
superimportantes sobre o que fazer ou não durante aquela etapa da minha gestação.
Pediu para que eu seguisse uma dieta nutritiva e equilibrada, investindo em verduras
frutas e legumes ricos em vitaminas do complexo B, cálcio, ferro, zinco, fibras e ácido
fólico. Orientou-me para que eu fizesse atividades físicas de baixo impacto como
caminhada, yoga e natação. Conversamos também sobre a minha imunização contra
doenças como rubéola e hepatite B, além dos cuidados com a toxoplasmose. Nada de
cigarros ou bebidas alcoólicas. O que não foi muito problema para mim, pois já não
fumava e bebia só socialmente. E por fim, me proibiu a automedicação. Sempre que
sentisse algo diferente, deveria procurar por ela para ser orientada sobre o que tomar.
Fizemos uma primeira ultrassonografia apenas para nos certificar de que estava
tudo bem com o bebê. Ele ainda não podia ser visto na imagem. A doutora Aline apenas
me mostrou uma pequena bolinha preta que seria o saco gestacional e me disse que
nessa fase a criança media de 0,36 a 1 mm e que por isso não conseguiríamos vê-la. A
próxima seria feita mais para frente, entre a décima primeira e décima quarta semanas,
quando aí já conseguiríamos identificá-lo melhor.
Fui cercada de tanto amor pela minha médica e minha amiga Carol, que não saiu
de perto de mim em nenhum momento, que saí de lá decidida a procurar pela família
Leblanc e pegar o contato de Daniel. Depois que eu contasse a ele e decidíssemos o que
iríamos fazer, então eu contaria aos meus pais. Mas uma coisa já era certa, eu teria
aquela criança de qualquer maneira. Eu já a amava e desejava mais do que um dia
desejei até seu próprio pai. E olha que não foi pouco. Senti um arrepio percorrer meu
corpo com algumas lembranças.
Isis

Havia se passado uma semana desde a confirmação da minha gravidez e eu ainda


não tinha encontrado coragem de procurar pela família de Daniel. A única forma de
conseguir contato com o pai do meu filho seria procurando pelos Leblanc e descobrindo
um número de telefone, ou qualquer outra maneira que pudéssemos conversar. O único
problema é que para isso eu teria que contar primeiro a eles sobre o meu estado e isso
me deixava um pouco preocupada e constrangida.
Porém, não dava para esperar mais, em breve minha barriga começaria aparecer e
todos ficariam sabendo de tudo. Eu não queria que meus pais descobrissem antes de eu
ter conversado com Daniel e termos nos acertado. Eles não mereciam isso! Já bastava o
fato de descobrirem que a filha deles, a quem tanto amavam e confiavam, havia se
deitado com um estranho apenas uma noite e engravidado dele, que havia partido no dia
seguinte sem dizer adeus e deixando apenas um bilhete de despedida.
Daquela tarde não iria passar. Carol se ofereceu para ir comigo, mas preferi
enfrentar as feras sozinha. Eu não podia ficar metendo-a em confusões o tempo todo.
Minha amiga também tinha seus problemas e precisava de espaço e tempo para resolvê-
los. Ela não poderia viver em função de mim, da minha vida e do meu filho para
sempre, apesar de eu desejar muito sempre tê-la ao meu lado, me dando todo o seu
apoio.
Não foi difícil descobrir o endereço dos pais de Daniel, bastou perguntar na
secretaria da faculdade alegando que Vanessa Leblanc havia esquecido seu laptop na
sala de aula e que precisaria dele para entregar um trabalho no dia seguinte e que se ela
soubesse que eu havia encontrado e eles não tinham me fornecido seu endereço, faria
um grande escândalo e, talvez, até pedisse transferência para outra universidade. Todos
conheciam bem os pitis dela e não quiseram arriscar perder uma das alunas mais
ilustres da instituição. Portanto, nem precisei de muito esforço para sair de lá com o
endereço em mãos.
Já na frente do condomínio de luxo, localizado no bairro do Morumbi, um dos
mais nobres da cidade de São Paulo, fui até a guarita e pedi para que anunciassem a
minha presença. Utilizei o nome de Carol, porque se Vanessa estivesse lá e soubesse
que era eu, talvez não me deixasse entrar, e pedi para que falassem que era uma grande
amiga de Daniel Leblanc que precisava conversar com alguém da família sobre algo
muito importante a respeito dele. Não sabia se essa história ia colar, mas precisava
fazer algo e, para a minha surpresa, liberaram a minha entrada.
Vanessa estava parada na porta e me olhava com ódio nos olhos. Meu coração
disparou, só de pensar que teria que contar para ela primeiro sobre a minha gravidez.
— Posso entrar?
— Não — respondeu seca e direta.
Eu estava muito decidida para deixá-la me barrar daquela maneira. Ignorei-a,
olhando-a de cima a baixo e dei alguns passos para dentro, forçando a minha entrada.
— Sabia que eu posso chamar a polícia? Isso que você está fazendo é invasão de
domicílio. — Olhou-me com desdém, como se eu fosse um lixo.
Fiquei em silêncio por um tempo, enquanto ela com a mão na cintura, batia um dos
pés no chão, na tentativa de me intimidar.
— Não precisa se dar ao trabalho, eu vou ser breve. Quando a polícia chegar, com
certeza, nem vou mais estar aqui. — Vanessa emudeceu. — Eu só preciso que você me
forneça o contato do seu irmão na Suíça. Eu tenho algo muito importante para dizer a
ele.
— Vai querer dar o golpe da barriga e dizer que essa criança que você está
esperando é dele? — Apontou para a minha barriga e eu, por instinto, levei minhas
mãos até ela em sinal de proteção.
— Era você que estava no banheiro no dia que eu fiz o exame de farmácia, não é
mesmo?
— Qual o problema? O banheiro da faculdade é público, qualquer aluno,
funcionário, ou visitante pode fazer uso dele quando quiser. Eu não cometi crime
nenhum, ao contrário de você que invadiu minha casa sem ser convidada.
— Quer saber? Isso não é da sua conta. — Virei e caminhei mais para o centro da
sala. — Sei que você tem algo contra mim que, sinceramente, não faço ideia do que
seja, por isso, com certeza, não irá me ajudar. Chame seus pais, eu quero falar
diretamente com eles.
— O que eu tenho contra você? O simples fato de você ser pobre, minha querida.
Eu odeio vocês bolsistas se misturando a nós da elite na faculdade. — Ironizou. — E
você ainda tem o desplante de querer se mostrar melhor e mais inteligente do que eu.
Sempre me afrontando nas perguntas dos professores, querendo ser a sabichona da
turma, quando na verdade você não é ninguém. — Meu queixo caiu no chão e voltou.
— Chega, Vanessa! — afrontei-a. — Vai chamar seus pais. Ou quer que eu saia
gritando por eles pela casa?
— Nem se atreva a colocá-los nessa história. Meu pai está muito doente e minha
mãe foi levá-lo ao médico. — Lembrei de Daniel contando que teria que assumir os
negócios da família por causa do estado de saúde do pai. — A última coisa que eles
precisam é saber das suas safadezas com meu irmão. Você tem razão quando diz que
não é da minha conta com quem Daniel fode ou não. Ele tem inúmeras mulheres
espalhadas por aí. Só que a partir do momento que uma qualquer, que não tem onde cair
morta, bate na porta da minha casa querendo dar o golpe da barriga nele, aí já passa a
ser.
Lágrimas brotaram nos meus olhos pela forma com que ela se referia a mim. Cada
ofensa era uma punhalada em minha alma, mas eu não me permiti chorar. Pelo menos
não na frente dela, eu não lhe daria aquele gostinho. Respirei fundo e engoli o choro.
— O Daniel merece saber que vai ser pai para decidirmos juntos o futuro dessa
criança. Eu estou aqui em consideração a pessoa maravilhosa que ele é.
— Para quê? Para te mandar fazer um aborto. Você acha que é a primeira mulher
que ele engravida? — Paralisei chocada e sem reação com as suas palavras. — Cada
vez que vem ao Brasil, pelo menos uma de vocês golpistas e pobretonas batem a nossa
porta. Já virou lugar comum. — Senti um surto de raiva me incendiar e quase explodi
de tanto ódio, mas me segurei. Queria ver até onde ela seria capaz de chegar. — Se
você insistir em ter essa criança, o máximo que ele vai fazer vai ser garantir o sustento
dela.
— Você está mentindo. O Daniel que eu conheci não é esse ser desprezível pelo
qual você está tentando fazê-lo passar — gritei com toda a força dos meus pulmões. —
Você é uma pessoa doente, mal-amada e infeliz, que só quer me fazer sofrer para o seu
próprio deleite. — Vanessa me olhava com desprezo. — Você se acha superior a todo
mundo, mas na verdade é a criatura mais baixa que eu já conheci em toda a minha vida.
— Não acredito que você acha que conhece bem o meu irmão só porque ele meteu
em você uma única noite. — Sorriu com sarcasmo. — O seu amado Daniel te contou
que é noivo e quando voltar para assumir os negócios da família irá se casar com ela?
— Me lembrei que ele me disse que havia ganho o arranjo de girassóis de uma amiga,
com certeza devia ser da noiva, por isso ficou meio sem graça por eu tê-lo visto. — Os
dois estão juntos há muito tempo. Ela é de família tradicional e quatrocentona como a
nossa. As duas famílias fazem muito gosto nesse casamento e tenho certeza de que ele
cumprirá com seu compromisso.
— Se ele tem uma noiva, onde estava ela naquela noite na boate? — confrontei-a.
— No camarote, onde ele também deveria estar se não houvesse uma vagabunda
dando mole para ele na pista de dança. — Seus olhos arregalados brilhavam vitoriosos.
— Ele falou para ela que passou mal com o whisky e precisou ir embora. Daniel tem o
dom de seduzir e enganar as mulheres. Mas ele a ama, irão se casar e serão muito
felizes. Aliás, eu acabei de ter uma grande ideia. Deborah descobriu que tem
endometriose, infelizmente teve que retirar os dois ovários e se tornou estéril. Uma
grande tristeza para os dois que sonhavam em ter vários filhos. Se você insistir em ter
esse bebê e contar para ele sobre a paternidade, com o nosso dinheiro e influencia não
será nada difícil ele te tomar essa criança e os dois criarem juntos o filho dele. Agora,
você tem duas opções, queridinha, ou interrompe essa gravidez ou te tomamos a
criança.
— Você está me ameaçando? — Mesmo com medo pelo meu filho, ainda a
enfrentei.
— Só depende de você, pobrinha. Agora vá embora da minha casa antes que eu
mande um dos nossos inúmeros empregados te expulsar a vassouradas. — Abriu a
porta. — Deborah, que bom que você chegou. Essa é a noiva de Daniel da qual lhe
falei.
— E você, quem é? — indagou a linda loira de olhos verdes e roupa grifada que
acabara de chegar.
— Alguém sem importância e que nem vale a pena saber quem é, minha querida.
— Me sentindo perdida e constrangida, saí pela porta, que ela logo fechou nas minhas
costas.
Fui embora muito abalada, nem tive forças para responder suas ameaças.
Descobrir as coisas que ela me falou sobre Daniel me tiraram o chão. Nem parecia ser
a mesma pessoa com quem estive na noite em que concebi meu filho. O pior de tudo foi
descobrir que ele era noivo e iria se casar em breve. Isso pelo menos eu sabia que não
era mentira de Vanessa, ou a loira teria desmentido ela assim que chegou.
Meu Deus, o que foi que eu fiz da minha vida?
— Você vai nascer, bebê, nem que seja para sermos nós dois contra o mundo. Eu
vou proteger você dessa gente horrível, custe o que custar. Eu te prometo! — sussurrei,
enquanto deixava o luxuoso condomínio, um lugar para onde eu não pretendia voltar
nunca mais.
Eu já amava o meu filho com todas as minhas forças e após aquela conversa
percebi que ele estava em perigo. Por tudo o que Vanessa me disse, eu sabia que ele
não seria bem-vindo naquela família. Entretanto, eu lutaria por ele até o fim. Daria a
minha vida, o meu sangue para protegê-lo. Mesmo que eu ainda pensasse no pai dele e
sonhasse com sua volta.
Outras obras:

Apenas
por conveniência?
Casar-se não estava nos planos de Gael Walker, vocalista de uma famosa banda de
rock. Ele só queria curtir a vida e usufruir dos benefícios de ser uma celebridade. Até
que se envolve em um grande escândalo que pode acabar com a sua carreira e a única
maneira de abafar tudo é se casando.
Não querendo renunciar à sua liberdade, juntamente com a sua equipe, resolve
optar por um falso casamento. Um contrato assinado por tempo determinado,
conveniente para ambas as partes, e tudo estaria resolvido.
O que ele não esperava é que a linda, ingênua, simples, doce e forte Helena Alves
iria infiltrar em seu coração, fazendo-o se sentir muito atraído por ela e questionar se
seu casamento deveria continuar sendo apenas por conveniência.

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Viúvo e
eu – Uma chance para recomeçar
Após a morte de sua esposa, Enzo Lopez, fechou seu coração para o amor e passou a se dedicar cem por cento
do seu tempo ao trabalho. Não sabendo lidar com a dor e o sofrimento de seu filho Pedro, de apenas sete anos, ele se
vê cada vez mais afastado dele e sem saber como mudar essa situação.
Rebecca Garcia, uma pacata professora, na tentativa de mudar de vida, se afastar de tudo o que um dia lhe fez
tanto mal e esquecer o seu passado, chega a pequena cidade para lecionar na escola primária.
Um primeiro encontro desastroso... Uma conversa mal interpretada... Uma fofoca maldosa... Uma discussão
acalorada... E está criada a confusão... Ou não.
Enzo e Rebecca conseguirão se entender?

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O bebê
de um ‘EX’ solteiro convicto
Após uma grande festa em seu apartamento, Nicholas Albertelli, multimilionário e
solteiro convicto, se vê envolvido por sua melhor amiga, a doce e linda Alicia
Albuquerque.
Embriagados, os dois tem uma noite de amor incrível regada a muita intimidade.
Mas o que eles não contavam, era com as consequências que viriam depois.

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[1]
Dados odontológicos coletados de uma pesquisa feita e publicada em 2018 no site agenciabrasil.ebc.com.br.

[2]
Dados sobre o exame de DNA coletados nos sites: blog.ramosmedicinadiagnostica.com.br, barela.com.br e
magscan.com.br

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