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Capa: MAYJO

Revisão: Luana Xavier


Diagramação digital: MAYJO
Título original: DEPOIS DO DIVÓRCIO
1ª Edição 2022

Esta é uma obra de ficção. Seu intuito é entreter as pessoas. Nomes,


personagens, lugares e acontecimentos descritos são produtos da
imaginação da autora. Qualquer semelhança com nomes, datas e
acontecimentos reais é mera coincidência.

Todos os direitos reservados

Esta obra segue as regras da Nova Ortografia da Língua Portuguesa.


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reprodução de qualquer parte dessa obra, através de quaisquer meios —
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Criado no Brasil.
A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na lei n°. 9.610/98 e
punido pelo artigo 184 do Código Penal.

COPYRIGHT © 2022 MAYJO


NOTA AUTORA

Olá leitoras!

Espero que a história do Christian e da Haven ganhe o coração de vocês, assim como fiquei
feliz em dá vida a história desses dois. Este é o terceiro livro da quadrilogia irresistível e pode ser
lido separadamente, mas pode conter spoilers dos anteriores: A Noiva Substituta do CEO e O Desejo
Entre Nós. Cada livro um casal com histórias independentes.
História pode conter gatilhos emocionais.

Boa leitura,
MAYJO
INDÍCE
NOTA AUTORA
INDÍCE
SINOPSE
PRÓLOGO
CAPÍTULO 01
CAPÍTULO 02
CAPÍTULO 03
CAPÍTULO 04
CAPÍTULO 05
CAPÍTULO 06
CAPÍTULO 07
CAPÍTULO 08
CAPÍTULO 09
CAPÍTULO 10
CAPÍTULO 11
CAPÍTULO 12
CAPÍTULO 13
CAPÍTULO 14
CAPÍTULO 15
CAPÍTULO 16
CAPÍTULO 17
CAPÍTULO 18
CAPÍTULO 19
CAPÍTULO 20
CAPÍTULO 21
CAPÍTULO 22
CAPÍTULO 23
CAPÍTULO 24
CAPÍTULO 25
CAPÍTULO 26
CAPÍTULO 27
CAPÍTULO 28
CAPÍTULO 29
CAPÍTULO 30
CAPÍTULO 31
CAPÍTULO 32
CAPÍTULO 33
EPÍLOGO
LIVROS ANTERIORES
OUTROS LIVROS DA AUTORA
REDE SOCIAIS DA AUTORA
SINOPSE

Atenção: Pode conter gatilhos.

Quando Christian e Haven se casaram, acharam que teriam o seu


“felizes para sempre e além”. O amor deles era algo que parecia
indestrutível, mas logo eles se viram diante de dilemas que levaram a um
divórcio onde ambos se acusavam mutuamente.
Agora divorciados, eles ainda permanecem ligados pelo amor, mágoa,
ciúmes e uma relação conturbada e mal resolvida.
O destino quer testar os dois de uma maneira que Haven não está
preparada para enfrentar. Uma gravidez inesperada fará esses dois se
acertarem de vez ou acabará os separando para sempre.
Entre o amor e uma relação conturbada, os dois precisarão enfrentar
essa nova etapa de suas vidas.
Escolhas terão que ser feitas para o amor permanecer…
PRÓLOGO

10 anos de idade...

— Qual o seu problema? — A boca da mamãe fede a álcool quando


ela grita comigo. Ela praticamente cospe saliva no meu rosto quando puxa
meu rabo de cavalo que ela está refazendo, e meu pescoço doí quando é
forçado para trás. A dor corta meu couro cabeludo e meus punhos cerram
enquanto ela penteia com força suficiente para a minha cabeça queimar
onde ela passa a escova de cabelo, e talvez um dia eu fique sem cabelo
também. — Tem hora que você faz as coisas de propósito para que eu te
machuque. Quando chegarmos ao hotel, irei te ensinar a não foder comigo.
Eu faço tudo por você e só recebo ingratidão. Estou investindo no seu
futuro, um que eu não tive porque fui estúpida e tive você, e agora recebo
como pagamento uma fedelha que só me decepciona!
Eu, sem querer, desmanchei o penteado elaborado que ela tinha
passado um tempão fazendo no meu cabelo para o concurso de hoje.
E agora teria de ir com um rabo de cavalo, que é a única coisa que vai
dar para fazer a tempo. Por isso ela estava furiosa, já era para eu estar com
as outras meninas.
Contenho as lágrimas e as engulo, porque se eu chorar e borrar o quilo
de maquiagem que tem no meu rosto de dez anos, ela não vai esperar
chegarmos ao hotel para “foder comigo”, palavras dela, não minhas.
Tenho vontade de não entrar lá, e eu poderia fazer isso. Minha coluna
parece que vai se dobrar, de tão nervosa que estou. Quando ela bebe, a
mínima coisa, como deixar um fio de cabelo fora do lugar, é motivo para
ela enlouquecer, mas na maior parte do dia são só xingamentos e acusações
de que eu nasci para atrapalhar sua vida.
Com meu coração batendo acelerado e as pernas bambas em cima do
sapato de salto de cinco centímetros, troto atrás dela pelos corredores do
local do concurso. Já estão chamando as concorrentes.
— Vou te matar, filha do demônio, se arruinar isso. Eu juro — diz
mamãe em um sussurro gritado. Ela só está tentando falar baixo para que as
outras mães não ouçam.
Um dia ela foi pega me dando um tapa por errar na hora da
apresentação de talentos. Eu tocava piano muito bem, mas nesse dia ela me
flagrou comendo o seu chocolate que estava no frigobar do nosso quarto do
hotel. Eu quase nunca podia sequer olhar para eles, e não resisti. Ela bateu
na minha mão e machucou meu dedo, então na hora de tocar eu não
conseguia acertar as notas por causa da dor e acabei em terceiro lugar.
Quando saí do palco, ela me deu um tapa bem na hora em que outra mãe
estava passando e viu a cena toda. Ela xingou mamãe e ameaçou denunciá-
la por maus-tratos.
Isso não é nada. Um tapa? Ela faz isso todo dia. São as surras que eu
temo.
Quando chegamos, já é quase a minha vez de entrar.
Por causa de minhas pernas tremendo e dos saltos mais altos que o
normal, mesmo que ela tenha me feito treinar por horas exaustivas, eu caio
na passarela. Tombo feio, e acho que torço meu tornozelo, porque a dor é
agonizante. Lágrimas caem, e no final sou desclassificada. Eu não faço de
propósito, mas ela sabe como me enlouquecer com suas ameaças,
imaginando o que ela faria. Só em pensar no que está por vir, eu tremo.
— É apenas uma pequena torção, dois dias de repouso e deve melhorar
— diz o médico que me atente.
— É claro, doutor. — Mamãe me olha, e seus olhos dizem outra coisa.
O silêncio no táxi para o hotel onde estamos é mais agonizante do que se
ela estivesse gritando, mas ela não vai dizer nada até estarmos sozinhas.
Eu não me importo com mais nada que ela faça. Tem hora que penso
que a odeio.
Quando entramos no quarto do hotel, eu quase pulando em um pé só,
temo que venha a sofrer um ataque cardíaco aos dez anos. A ansiedade de
não saber o que ela vai fazer é enervante.
Esse seria meu castigo: ficar isolada em casa durante um bom tempo.
Eu nunca entendi por que ela me odiava, se era minha mãe. Quando
ela entra direto para o banheiro e escuto a água correndo, sei que a noite
não ia ser boa para mim. É apenas mais um dia “normal” na minha curta
existência.
Eu só quero saber uma forma de fazer tudo parar, a loucura e o
controle sobre tudo: os concursos, os trabalhos exaustivos, as surras de
toalha para que não tivesse marcas que atrapalhassem o meu trabalho como
modelo. Meu forte, como ela dizia, era a fotografia. Eu fotografava muito
bem, era baixa comparada às outras modelos, mas eu tinha um rosto e
cabelo que as marcas adoravam, para meu horror. Eu odiava a minha vida.
Fecho meus olhos e apenas rezo para quem estivesse me ouvindo,
jurando que eu nunca iria querer ser mãe.
Nunca!
As mães são todas más?
Eu não imaginei que o fato de ter ido ao hospital, por causa de uma
pequena torção, fosse a desculpa que ela usaria para explicar aos outros por
que eu estava sem sair de casa.
Nove anos depois...

É meu aniversário de dezenove anos e a comemoração de um ano da


minha liberdade. Faz um ano que eu consegui me libertar legalmente e
viver por conta própria. Esse ano não foi fácil, mas estava caminhando para
melhorar.
Eu tenho novos contratos chegando, e com isso a minha vida não é
mais tão difícil financeiramente. Ela estava usufruindo de tudo que ganhou
comigo, em todos os trabalhos que fiz desde que tinha um ano de idade. Eu
saí com nada de casa, mas estou construindo minha independência aos
poucos, e isso é motivo para comemoração.
Só que eu não tenho com quem comemorar hoje. Eu também estudo, a
maior parte em casa, para ainda ter o meu diploma do ensino médio, porque
estava atrasada. O colégio já conhece o meu esquema de estudo fora do
comum desde que eu ainda morava com a mamãe.
No próximo ano eu entraria em alguma faculdade, mas uma coisa de
cada vez, eu ainda tenho as provas finais do ensino médio para terminar.
Visto uma saia curta preta e um top branco com um ombro de fora, e…
— Haven? — Lolita, uma das modelos, me chama, e eu saio dos meus
pensamentos caóticos. Quando olho para ela em expectativa, ela continua:
— Quer ir a uma festa? Shay disse que fomos convidadas para uma festa de
um time de futebol.
Shay e Lolita são inseparáveis, e nós geralmente éramos colocadas em
alguns trabalhos juntas. Não somos amigas, mas elas tentavam me incluir,
muitas vezes me convidando para festas, mas eu sempre recusava.
Não porque não quisesse ir, mas porque eu não podia, tinha
responsabilidades em meu minúsculo estúdio, onde eu morava, como as
aulas que tinha de assistir para cumprir o calendário escolar, além do fato de
que nessas festas rolam muitas drogas e álcool, e eu odeio o cheiro de
álcool. Mas hoje eu poderia deixar tudo de lado e ir com elas. Até mesmo
cortar minha aversão à bebida e tomar algo.
— Qual time? — Eu não sou muito ligada em times de futebol nem em
jogadores. Eles não são a minha praia, mas, ainda assim, conhecia alguns
times, eu não seria americana, se não conhecesse futebol americano.
— Ai, não sei, só fiquei sabendo que eles estão dando uma festa em
uma boate, porque ganharam algum jogo ou algo assim — diz ela, dando de
ombros. — E nem quero saber, mas preciso de uma bebida de graça hoje, e
quem sabe não consigo um anel de um desses jogadores podres de ricos.
Hum, essa é uma das razões de não ter muitas amigas nesse meio,
algumas meninas sempre têm em mente que encontrar um marido rico será
a realização das vidas delas. Eu, por outro lado, não desejo nada disso. Não
quero ninguém na minha vida depois de viver em um “cativeiro” desde que
nasci. Viver presa a alguém está fora da cartilha para mim. Eu nunca vou
querer marido ou filhos, nunca.
— Tudo bem — digo, por fim. — Estou dentro!
— Assim que se fala, garota! — Ela engancha o braço no meu e
praticamente me arrasta para onde todos estão. Pensei que seria apenas ela e
Shay, mas tem mais gente, umas cinco garotas modelos que eu conheço de
vista e dois modelos homens estão no grupo. Todos entramos em táxis, e eu
fico desconfiada que nem entrarei na festa, pois nem vestida para uma eu
estava.
Mas isso não foi um problema. Quando chegamos, o guarda da porta
libera a entrada do nosso grupo depois que um dos modelos cochicha algo
em seu ouvido, e eu franzo a testa, totalmente desconfiada. Acho que minha
natureza é assim, eu não tenho confiança em ninguém e tudo me parece
suspeito. Mas hoje eu aceitaria qualquer desculpa que me tirasse do meu
solitário estúdio.
O som e as luzes dentro da boate são insuportáveis, e eu certamente
não estava acostumada a isso. Eu só tinha ido uma vez a um lugar como
esse, e nem estava assim tão cheio de gente nem de homens enormes por
toda parte. As garotas se dispersaram, e cinco minutos depois eu não vejo
mais nenhumas delas no meio de tanta gente. Há um grupo de caras que
acredito serem os jogadores.
Eles são os mais barulhentos. Tiro meus olhos deles e olho para o bar,
repleto de pessoas ao redor pedindo bebidas. Eu deveria tomar alguma coisa
e me divertir, mas estou travada no lugar.
O arrependimento por ter vindo é enorme agora. A caminho do bar,
avisto Lolita no colo de um dos jogadores enormes. Ela está rindo do que
ele está dizendo para ela e, quando ele a beija, eu desvio o olhar. Eu sou
uma merda de uma virgem de dezenove anos que nem sequer tinha beijado
alguém. Eu sou uma aberração da natureza.
“Se você ficar gorda igual uma vaca, fedelha, nunca vai encontrar
alguém que queira sua bunda cheia de celulite e flácida, então não coma
essas besteiras escondido. Se eu pegar mais dessas porcarias aqui, eu vou
te dar uma surra até quebrar seus ossos. Esqueceu da última vez, menina
estúpida?”
Balanço minha cabeça para dissipar a memória, mas essa voz está tão
enraizada na minha cabeça, que tem hora que eu não sei se minha ou dela.
Levanto meus olhos para observar o lugar, e eles caem em uma pessoa em
particular. Ele é enorme, como um dos jogadores, só que ele parece mais
velho que os caras barulhentos.
Ele também está vestido de modo diferente, com uma camisa branca
de botão com mangas arregaçadas até os antebraços musculosos, e isso é
bem sexy. A camisa está ensacada em uma calça social escura, não saberia
dizer a cor. Uma mão está no bolso da calça e na outra ele segura um copo
de uísque talvez.
Daqui vejo que suas mãos são elegantes e ele tem um relógio no pulso
que deve custar uma fortuna, mas é impossível ver a marca de onde eu
estou. No entanto, esse cara exala poder e dinheiro, com certeza. Ao lado
dele, uma mulher está praticamente o comendo com os olhos, e eu nem
posso falar mal dela, pois estou fazendo o mesmo.
Ela diz algo, e ele sorri, e algo se mexe dentro de mim quando observo
seu rosto lindo ficar ainda mais lindo com um sorriso sexy de dentes
brancos e perfeitos.
Deus, ele é a personificação de um deus grego! Reviro os olhos com o
pensamento tão incomum para mim.
Fico hipnotizada por seu sorriso, e não percebo que estou sendo
esquisita, parada aqui no meio de uma pista lotada de gente dançando,
bebendo e quase transando em público. Tanto que o cara está me olhando
agora. Meu coração pula no meu peito quando os seus olhos azuis intensos
se conectam com os meus, e minha respiração falha nos meus pulmões.
Desvio o olhar e caminho para o bar. Eu preciso de uma bebida urgente!
Talvez hoje seja o dia que vou iniciar a minha vida de alcoólatra. Me
imprenso no balcão e tento chamar a atenção do bartender, mas minha voz
se perde no barulho dos outros clientes que estão gritando por suas bebidas.
Bufo, frustrada, quando o cara atrás do bar nem olha na minha direção.
— Idiota! — resmungo, furiosa.
— Você só precisa ser mais incisiva. — Uma voz diz atrás de mim, e
eu não preciso me virar para saber a quem ela pertence. Meu corpo está
tinindo com a proximidade do corpo dele atrás de mim, e quando ele se
aproxima mais, seu peito tocando as minhas costas quando se inclina para
chamar a atenção do bartender, sinto minhas pernas bombearem, meus
joelhos enfraquecerem, e eu engulo em seco.
Eu sinto que esse cara seria um problema para mim. O bartender vem
para o nosso lado, parando à nossa frente, causando protesto dos clientes
que ele abandonou do outro lado.
— Christian! O que vai querer?
— Sirva o que esta linda moça desejar — Ele joga notas de dólares no
balcão, o cara as pega e depois olha para mim. Eu não tenho a mínima ideia
do que pedir.
— E aí, moça, o que vai ser?
— Hum, acho que um refrigerante — peço, desconfortável, porque eu
não consigo pedir uma bebida se nem tenho idade para isso.
Uma risada abafada vem de trás, e me viro para encará-lo. Ele
realmente estava muito perto, e tenho de levantar a cabeça para encontrar
seus olhos.
— Olha, eu agradeço por chamar o bartender, mas não preciso que
pague a minha bebida! — digo, orgulhosa.
Ele ignora meu protesto.
— Sou Christian Davis. — Ele estende a mão para mim, e a aceito sem
nem pensar no que estou fazendo. Ele tem um magnetismo sobre mim que é
como se algo nos ligasse, como fios invisíveis. Fico deslumbrada por sua
beleza e imaginando como seria a sensação dessas mãos enormes correndo
pelo meu corpo nu, e exalo quando sinto a excitação correr mais para a
minha calcinha. Quando não falo nada, ele continua: — Você não vai dizer
seu nome, linda?
— Haven Collins — anuncio, por fim. A voz é estranha até para mim
mesma. Eu estava tardiamente sendo a adolescente deslumbrada. Tantas
restrições me transformaram em uma retardada quando se trata de flerte e
paquera. Eu não sei nada disso além das coisas que leio a respeito nos
livros. Livros que só comecei a ler um ano atrás, antes disso, eles eram
coisas supérfluas que nada me acrescentariam.
— É um prazer, Haven Collins. — Sua voz é macia e sedutora, e ele
leva minha mão aos lábios, beijando o dorso e me causando tremores
incontáveis no corpo. Devo estar recebendo uma carga sensorial, já que eu
nunca tive essa sensação com nenhum homem. Não que não tenha havido
interesse dos homens em mim. Eu sei que sou uma mulher bonita, afinal já
ganhei inúmeros concursos de beleza no passado, mas Christian Davis é
especial. Meu corpo parece conhecê-lo e reage involuntariamente à sua
presença.
— Sua bebida, moça! — O grito do bartender me tira do transe, e puxo
minha mão da dele e me viro para pegar a bebida.
— Obrigada — agradeço, mas ele já está indo servir outra pessoa. Me
viro novamente para Christian, e ele está me olhando. Aponto para o meu
refrigerante. — Obrigada por isso.
— Você não parece acostumada com esses lugares — deduz ele
corretamente, eu não sou. — Por que não vem sentar comigo e me falar
mais de você, Haven Collins?
Olho ao redor, à procura da mulher com a qual ele estava falando
momentos atrás, no entanto, não a vejo em lugar nenhum.
— Eu acho que não seria uma boa ideia, estou com amigos… —
começo a declinar o convite, correndo os olhos para encontrar algumas das
modelos que vieram comigo, e ele sorri quando franzo a testa e percebo que
não há ninguém conhecido por perto. Sabia que era uma péssima ideia vir a
essa festa. Eu não era de festas, de qualquer maneira.
— Eu não vou te fazer mal — Christian garante.
— Assim disse o serial killer, antes de decapitar a vítima — digo com
um meio sorriso nervoso. Eu não tinha medo dele, mas eu temia minha
reação visceral a ele, isso eu temia.
Ele gargalha, jogando a cabeça para trás, e fico fascinada novamente
com ele. Deus, ele é tão lindo!
Minha baba deve está correndo no meu queixo.
— Venha, sente-se, Haven. Não vou te levar para nenhum lugar escuro
e beijar esses lábios pecadores até você estar implorando por mais.
Suas palavras, junto com a sua mão na base das minhas costas
enquanto ele me guia, têm o poder de me deixar ofegante e tremendo como
uma vara verde. Excitação como nunca senti encharca minha calcinha, e eu
aperto as pernas uma na outra para tirar essa sensação esquisita entre as
minhas coxas. Mesmo que ele tenha dito que não me levaria a um canto
escuro, ele me leva para uma escada que não tinha visto antes, e uns caras
enormes, que estão no topo da escada, dão passagem para nós. Christian me
leva a uma das mesas que estão dispostas em uma parte de um mezanino, de
onde vê-se toda parte inferior da boate, e nos sentamos em um estofado de
couro preto e macio.
Estou constrangida com ele. Ter a atenção de um homem que deve ser
mais velho que eu, o quê? Uns cinco ou seis anos? Ele parece tão
sofisticado. O que ele iria querer com uma virgem, de qualquer maneira?
Se eu fosse ousada, acabaria com minha virgindade hoje, pelo menos a
da boca. Era tão vergonhoso nunca ter beijado. Me distraio dos meus
pensamentos quando uma garçonete, vestida com um top minúsculo e um
short tão pequeno quanto, serve uma bebida para Christian. Outra bebida
azul é colocada na mesa à nossa frente.
— Se você estiver disposta a abandonar o refrigerante — diz ele
quando me vê olhando a bebida.
— Você nem me perguntou o que eu queria e se tinha idade para beber
— digo, sugando o canudo distraidamente.
— Tenho a impressão de que você nem saberia o que pedi. Agora, se
tem idade? Hum, você tem?
— Não.
— E quantos anos tem, Haven?
Penso em mentir e dizer que tenho vinte e um, mas eu odiava mentiras,
geralmente sou brutalmente sincera.
— Dezenove. Na verdade, estou completando hoje — revelo, dando de
ombro.
Ele estende a mão e agarra a minha, nossos dedos se entrelaçando com
uma naturalidade que me deixa completamente tomada. A ponta do dedo
indicador dele toca meu queixo, levantando-o para que eu pudesse olhá-lo
nos olhos.
— Você é linda pra caralho, Haven — fala, sua voz rouca, e meus
olhos caem em sua boca perfeita, desejando que ele me beijasse. — Não me
olhe assim, Bruxinha, ou vai acabar tendo mais do que está disposta a ter.
Seu polegar sobe e traça meu lábio inferior, e um desejo insano de
estender a língua e degustar sua pele me faz gemer. Sinto meu rosto ficar
quente e provavelmente pareço uma beterraba agora. Meus cabelos nem me
ajudam, eles já são avermelhados. Eu nunca tive esse tipo de desejo antes,
sempre fui a careta da turma, não tive chance de desenvolver meu lado
sensual. A repressão de minha mãe era opressora demais para eu ter
namorinhos quando cheguei na idade para isso. Agora estou louca para
experimentar com esse estranho que me fascinou desde que o olhei mais
cedo.
Christian se inclinou para mim e prendi minha respiração, achando que
finalmente vou perder o BV de um jeito fora da existência, mas ele beija
minha testa, sussurrando:
— Feliz aniversário, minha Bruxinha.
Ele se afasta, e frustração me consome, e ele deve ter visto isso em
meu rosto, porque tem um sorriso de gato que comeu o canário nos lábios.
Ele é tão bonito e grande.
— Experimente — ordena ele, apontando a bebida. Balanço minha
cabeça, negando.
— Eu nunca tomei álcool, e só de sentir o cheiro me deixa enjoada —
confesso. Eu odeio o cheiro porque me lembrava coisas ruins, e eu só quero
esquecer o passado. Christian chama a garçonete de volta e a manda levar a
bebida dizendo algo para ela, que assente, muito solícita. Estou muito
entretida com ele para sequer ouvir o que disse.
— Você dança, Haven? Ou essa é outra das coisas que não gosta? —
pergunta ele, recostando o corpo enorme no sofá.
— Eu gosto de dançar — digo. A curiosidade vence e pergunto: —
Você é um jogador de futebol?
— Não mais, deixei tem um tempo. — Levanta o braço e leva o copo à
boca. Eu acompanho com meus olhos seus movimentos elegantes. — Eu
agora só invisto, não há mais jogo para mim.
— Por que não? — pergunto, interessada.
— Lesão — diz simplesmente, e a garçonete volta com outra bebida,
agora uma taça tulipa com um líquido rosa dentro.
— Champanhe rosé doce, o mais suave que a casa tem, acho que nem
vai sentir que tem álcool — diz ele quando ficamos a sós novamente. —
Experimente! É seu aniversário, linda.
Olho a bebida, e depois de colocar meu refrigerante ao lado da taça, eu
pego a tulipa e cheiro. Hmm, não é desagradável, tem cheiro de frutas
vermelhas e as bolhas pinicam meu nariz, me fazendo rir. Dou um pequeno
gole e lambo meus lábios. Não é ruim, até que eu gosto.
— Então? — pergunta Christian, me olhando com um daqueles
sorrisos matadores dele, e dou um segundo gole e sorrio para ele também.
— Bem, não é ruim — digo, rindo.
— Isso, garota! — diz ele, animado, e bate seu copo na minha taça. —
Feliz aniversário, menina!
— Obrigada — digo timidamente. Ele levanta e estende a mão para
mim.
— Venha, agora é a vez da dança. — Ele me puxa para si, e bato em
seu peito sem nenhum controle das minhas pernas. Caramba, eu pareço uma
potranca que acabou de nascer e nem se sustenta em suas pernas. Ele não
me leva para a pista lá embaixo, ficamos no mezanino. Ele enlaça minha
cintura, e não me faço de rogada, meus braços vão para seu pescoço, e a
música lenta que começa a tocar nos embala. Sinto seu cheiro invadir
minhas narinas e me aproximo mais dele, tentando sorver mais desse cheiro
requintado e gostoso. Fecho meus olhos, me deixando levar, apenas hoje,
digo a mim mesma.
Eu posso ser uma jovem normal apenas hoje.
— Você acredita em destino, Haven? — A voz de Christian me faz
abrir os olhos e encarar as íris azuis intensas. Nego com a cabeça. — Eu
acredito, sabe por quê? Hoje não era para eu estar aqui. Eu estive no Brasil
com meu melhor amigo Rafael, e nós estamos planejando nos mudar para lá
— conta ele, e nem disfarçamos mais que não estamos dançando, estamos
balançando juntos, alheios à música tocando no ambiente. — Então tinha
essa festa, e mesmo sem querer, algo me impelia para vir. Mal cheguei em
casa e vim comemorar com os caras. Um dos meus amigos, do time que eu
costumava jogar no passado, está lá embaixo, e eu queria confraternizar
com ele. Além de ele estar no time do qual também sou um sócio, nós
estamos nos playoff, e os caras estão comemorando como se tivessem
ganhando o super bowl.
— E o que o destino tem a ver com isso tudo?
— Deixe-me chegar lá, Bruxinha — diz, rindo. — O destino me trouxe
aqui apenas porque eu tinha de conhecer a mulher da minha vida.
— Oh! — Meu coração troveja no meu peito. Ele está falando de mim
ou da outra? Aquela mulher com quem ele estava falando mais cedo? —
Hmm. — É a única coisa que consigo falar. Eu sou péssima no traquejo
social.
— Eu digo que você me jogou um feitiço, e você só franze esse
rostinho lindo de mau humor? — diz, divertido, e faço cara feia por ele
estar rindo de mim. — Estou falando de você, bruxa.
— Eu… — Eu tenho um negócio entalando minha garganta,
impedindo-me de falar. — Você nem me conhece.
— Eu não preciso de mais tempo para saber o óbvio, Haven Collins.
— Ele acaricia minha bochecha, e meu desejo é de perseguir o caminho de
seus dedos na minha pele, que anseia por mais dele. Nossos olhos se
prendem um no outro, e eu sei, naquele momento, que minha boca não
sentirá falta de ser beijada, pois quando os olhos dele caem para os meus
lábios, eu quero tanto isso que dói.
Fecho meus olhos, esperando e esperando, e quando acho que me
enganei, sinto o toque de seu polegar na minha boca. Ele esfrega para lá e
para cá, e eu suspiro, desejando sua língua.
— Eu vou te beijar, minha Bruxinha… — diz ele antes de encostar
seus lábios nos meus. Com zero experiência na arte de beijar, eu apenas
sigo sua deixa, e quando acho que ele vai aprofundar o beijo, ele para. Oh,
isso era tudo? Abro meus olhos, decepcionada. — Esse é seu primeiro
beijo.
Nem é uma pergunta, mas eu aceno, constrangimento me deixando
quente por toda parte.
— Perfeita — sussurra ele antes de voltar e encostar sua boca na
minha, e dessa vez eu sou realmente beijada. Sua língua invade minha boca,
ele suga minha língua e me invade, e minha calcinha ganha mais líquido,
ficando encharcada, e eu gemo quando me desfaço em seu corpo duro. Ele
beija como se quisesse me engolir, me devorar inteira. Eu tento imitar seus
gestos e me agarro a ele como se estivesse em uma tempestade e ele fosse
meu abrigo, minha âncora.
Foi ali que me apaixonei pelo homem que seria meu primeiro e único
em tudo, até que não mais existíssemos neste mundo.
Ou foi o que pensei...
CAPÍTULO 01

Rio de Janeiro, 2019

Hoje tinha sido um dia caótico na empresa. Rafael esteve mais


distante esses dias por causa das merdas que ele andava aprontando com a
família Pontes, e como CFO da Lamartine Investment, estou praticamente
no comando enquanto ele está em lua de mel, que foi abreviada por causa
da súbita doença do velho Pontes. Hoje tive várias reuniões com os
diretores financeiro da empresa.
Suspiro, frustrado.
Deveria tirar umas férias também, quando fiz isso? Acho que na minha
própria lua de mel, anos atrás. Meu amigo estava em uma falsa lua de mel,
e teve tudo abreviado por causa do patriarca Pontes, aquele sacana gostava
de foder com Rafael.
Meu melhor amigo estava em uma espiral de loucura para se vingar de
Pontes, mesmo que meu conselho, como diretor financeiro, o alertasse de
que era um maldito risco investir em uma empresa que você planejava
destruir. Ele teimou e investiu milhões na Pontes. Vai entender essa porra.
Mas mesmo com algumas ressalvas, eu entendo meu melhor amigo.
Ele quer pôr um ponto final no seu passado, e só fazendo o velhote pagar
ele terá um pouco de paz. Contudo, ele não vai ficar satisfeito quando se
vingar e tudo acabar, afinal, é como diz o ditado: sair em busca de vingança
é como cavar duas covas. Poderia ser uma cova metafórica, pois com
certeza algo morria dentro de nós no processo.
Paro o carro na minha vaga no prédio e suspiro, cansado. Geralmente
eu fico na empresa até mais tarde, mas estou querendo relaxar. Queria que
hoje fosse o dia que eu e Rafael saíamos para tomar nossa bebida habitual
da semana, era um ritual desde que deixei minha vida esportiva. Hoje nem
parece que sofri uma lesão no ligamento da minha coxa, mas para o esporte,
na época, foi fator determinante e como um maldito banho de água fria
quando o time me dispensou, porque eu estava sempre lesionando o mesmo
ligamento por não deixar sarar direito. Seis meses era o tempo que meu
fisioterapeuta disse que eu tinha que esperar para ter uma cura real, mesmo
com todo tratamento que estava fazendo.
Nessa época, Rafael me ofereceu um cargo e perguntou se eu não tinha
interesse em fazer algo além de jogar futebol americano. Ele sabia do meu
interesse em finanças e sobre os investimentos que eu fazia com o dinheiro
que ganhei no esporte, dos quais tinha de retorno alguns milhões. Nós dois
tínhamos bastante em comum.
Eu poderia ter a minha própria empresa, como Rafael, mas eu me
mantinha como um sócio minoritário silencioso na Lamartine. Com meu
cargo de CFO e meus outros investimentos, principalmente nas sociedades
com clubes de futebol americano, que eu mantinha desde antes de deixar o
futebol, eu já poderia viver sem fazer nada até morrer. Mesmo meu divórcio
levando alguns milhões, isso não me abalou. Haven não queria nada
demais, mas eu dei mais do que o advogado dela pediu, afinal, ela foi a
mulher que eu amei além da porra dessa vida.
Que amo, seria o termo mais correto, afinal nosso casamento acabou,
mas ela ainda é uma sombra que não sai do meu lado. Mesmo que fosse
para me atormentar e foder literalmente tudo.
Maldita mulher infernal.
Ela surge na minha mente, e meu foco não sai mais dela. Ela é como
uma supercola do caralho. Ela deve ter jogado alguma maldição vudu em
mim, aquela bruxa, pois só assim podia entender nossa ligação.
Eu conheço casais que viviam em casamentos “perfeitos” que tinham
menos química do que nós dois, que já tínhamos um ano de divórcio. E
sempre estamos um em cima do outro quando nos vemos. Haven é a mulher
mais bonita que eu já vi na minha vida. A primeira vez que a vi, ela era um
pouco diferente do que é hoje. Era mais magra e parecia que estava
passando fome, mas hoje? Ela é gostosa pra caralho, os anos só fizeram
bem a ela desde que parou de trabalhar como modelo. Tenho ela gravada na
minha mente: cabelos longos, ondulados e avermelhados como o pôr-do-
sol, olhos azuis, que eram como se fosse de outro mundo, nariz pequeno e
arrebitado. Ela tinha um rosto de boneca e um corpo feito para me deixar
doido e viciado.
Quando a vi naquele dia em uma festa, totalmente deslocada, todos os
instintos protetores que havia em mim se acenderam e eu me vi indo até ela.
Ela nem era como as mulheres que eu costumava pegar, era uma menina de
dezenove anos, de algum jeito ainda inocente de muitas coisas e
completamente desiludida em outras. Ela era uma menina. A minha menina,
a minha mulher, a única para mim desde o primeiro olhar, e depois? Não
éramos mais nada…
Não porque deixei de amá-la; porra, não, mas ela quis ir embora e eu
deixei. Eu tinha prometido a ela, no altar, que nunca iria lhe impor nada
para ela. Que ela só teria meu amor, que as vontades dela seriam acatadas
sempre. Então assinei o divórcio.
Enquanto abro a porta, escuto os sons das patas de Husky correndo
pela casa, e sinto sua alegria ao sentir meu cheiro através da porta. Ele sabe
a hora que eu chego, e podia estar onde estivesse, ele viria correndo para
me receber na porta todos os dias. Abro a porta, e ele pula, feliz, quando me
abaixo para receber seu abraço canino. Ele tem sido meu companheiro
desde que ela foi embora, que nos abandonou. Bom, eu também tenho
minha culpa, mas esse carinha tem sido minha âncora, que me manteve
firme, mesmo quando eu vi minha vida bem estruturada desmoronar. E a
dor tinha sido tão profunda que por um momento eu quis acabar com tudo,
mas Husky foi meu suporte, e é tudo que tenho agora.
— E aí, amigão, você se comportou bem na ausência do papai?
Seu latido em resposta me faz rir e coçar suas orelhas.
— Seu papai precisa de uma bebida, garoto.
Depois de mais algumas lambidas e latidos, ele dispara para a sala,
como se estivesse me dizendo para segui-lo.
— Já vou, garoto.
— Senhor Chris, que bom que chegou. — Glória, a senhora de pouco
mais de cinquenta anos que cuida da minha casa e de Husky, enquanto
trabalho, vem quase correndo para o hall de entrada. — Já estava quase
ligando para o senhor vir para casa.
— Está tudo bem? — pergunto, afrouxando minha gravata e já
caminhando para a sala. Paro em choque quando vejo quem está sentada na
minha sala com uma taça de champanhe entre os dedos. Meu champanhe,
por sinal, um que eu comprei ano passado e custou uma pequena fortuna.
Meu cachorro está agora deitado no sofá e com a cabeça no colo dela,
recebendo um maldito cafuné da última mulher que eu queria ver hoje.
— O que faz aqui, Bruxa? — rosno em sua direção, e penso que meus
pensamentos sobre ela devem ter invocado sua presença na minha casa.
Jesus!
— Ah, querido, que feio rosnar para sua esposa. — Ela sorri
inocentemente, e dou meu olhar mais mortal, o que só faz seu sorriso ficar
mais largo
— Ex-esposa. — Dou outro resmungo que sai igual ao rosnado do meu
suposto melhor amigo, que está ressonando no colo dela. Haven, mais
conhecida por meu tormento e carma na terra, leva a taça aos lábios
sensuais, e mesmo a odiando ela tem um efeito sobre mim que nenhuma
mulher tem, e ela não faz nada além de existir, enquanto as outras tentam de
tudo e o efeito é zero. — O que você quer?
Coloco as mãos nos bolsos e a encaro com firmeza.
— Tão resmungão…
— Haven, eu não estou com paciência para seus jogos.
— Bem, apesar da sua falta de jeito, querido, eu ainda tenho
consideração por você e quis te avisar que a minha advogada vai ligar para
o seu advogado amanhã.
— Se não notou, Haven, já estamos divorciados e não temos mais
assuntos pendentes — interrompo-a, impaciente.
— Acho que não — diz ela e olha para baixo, seus dedos alisando os
pelos macios de Hushy. — Você tem algo que pertence a nós dois, mas
apenas você tem direito sobre ele, e eu renunciei a isso sem questionar
antes, mas agora quero meus direitos também.
De que porra ela está falando?
— Lembra que dei mais a você do que sua própria advogada pediu,
Haven? O que quer agora, minhas bolas em uma bandeja de prata para o seu
café da manhã?
Ela ri, e seus olhos descem para minha virilha e ela morde aqueles
malditos lábios de rubi.
— Hmm, já tive suas bolas e seu pau no café da manhã muitas vezes,
você não lembra? — Merda, claro que eu lembro, e o meu maldito pau
também, porque sinto o traidor levantar a cabeça em atenção à menção dele
nesta conversa. — Eu amo isso, mas não é o que quero, querido marido.
— Haven…
— Quero a guarda compartilhada de Husky — Ela solta a bomba e eu
congelo. Primeiro sinto o gelo da raiva filtrando meu sangue, e depois o
calor escaldante da fúria.
— Você o quê? — Minha voz sai fria, baixa e sem nenhum traço de
emoção. — Você o quê? — repito, porque custo a acreditar que essa maldita
mulher tem a audácia de vir aqui e exigir ficar com meu cachorro.
— Eu disse que quero que compartilhe o Husky, Christian. É meu
direito ficar com ele enquanto você está por aí, transando com meio mundo!
— Ela não grita ou faz escândalo como as outras mulheres, não. Ela sempre
ficava lá, como uma dama composta, enquanto eu esperneava ao redor
como um touro louco.
Ela tinha sido a menina de concursos de beleza treinada por sua mãe a
nunca sair desse personagem tranquilo, como se nada a abalasse. A única
coisa que deixa minha ex-mulher descomposta é quando ela está debaixo de
mim ou em cima, tanto faz; é a única hora que ela abandona esse ar de
distante e toda refinada. Seus cabelos ruivos têm essa tonalidade exuberante
que me fascinou desde a primeira vez que a vi.
A única coisa que eu pensava depois, que a conheci, era que ela seria
minha e que eu faria qualquer coisa parar ter aquela beldade cheia de curvas
para mim. E eu consegui, mas agora éramos dois oponentes em um ringue
metafórico, onde havia apenas guerra travada entre nós.
Nos odiávamos? Talvez ódio fosse o que nós dois gostaríamos de
sentir, vivíamos dizendo isso um para o outro, mais vezes do que se pode
contar, mas nós dois sabemos que é o oposto disso. Apenas ficarmos juntos
não é uma opção. Isso estava nos destruindo antes, e com certeza acabaria
de nos destruir se continuássemos assim.
Mas agora, talvez eu a odiasse de verdade. Ela está louca se acha que
renunciarei ao meu cachorro. O dito-cujo está muito satisfeito junto dela, o
traidor.
— Pode ter o que quiser, Haven, mas isso não. — Consigo dizer
através dos meus dentes cerrados. — Está fazendo isso por quê? Me odeia
tanto assim?
— Ele é tanto seu quanto meu, Christian. — Ela se inclina e deposita a
taça na mesinha à sua frente e depois se levanta, calma e composta. Ela vem
na minha direção e para bem na minha frente, seu corpo a um fio de cabelo
do meu. Os olhos azuis gelo hipnotizantes nos meus. — Eu preciso dele
também, sabia? Eu sinto falta dele.
— Já faz um ano que nos separamos, e agora que sentiu a falta do MEU
CACHORRO?
— Eu sempre venho para cá, quase todos os dias, e o levo para passear
—revela ela. — Glória nunca disse porque eu pedi que não falasse para
você nada disso, pois sabia que faria um escândalo.
— Você é inacreditável, Haven. E eu não faço escândalos. — Ela está
tão perto que eu posso ver as sardas em seu nariz, aquelas que eu contei
tantas vezes e pelas quais corri minha língua, as que formavam um conjunto
com as de acima de seus seios e ombros. Ela é de uma beleza natural que
sempre me cativou e amarrou pelas bolas, mas já bastava! Nós dois
precisamos dar um basta nisso. Dou um passo para trás, para que eu não
faça algo estúpido igual das outras vezes que ela me irritou, como jogá-la
em cima do ombro, levá-la para o meu quarto e fodê-la até que toda a raiva
saísse dos nossos corpos. Isso se chegássemos ao quarto. Essa vazão
poderia acontecer em qualquer superfície plana que encontrássemos. —
Você pode tentar, Haven, mas esse é um maldito tiro no pé.
— Não tenha tanta certeza, sabe que nunca perco, marido.
Ela sabe que me chamar assim é como riscar um maldito fósforo na
gasolina. Ela faz isso de propósito, sabendo onde isso vai terminar.
Hoje, não.
A atração sexual entre nós é algo vivo; não sabíamos nos libertar dela.
Não era por falta de tentar com outras mulheres, eu estava entrando para os
livros dos recordes de encontros infrutíferos. Se as mulheres não fossem tão
orgulhosas, elas já teriam começado a falar que eu nunca levava uma para a
cama. Nas vezes que Haven não atrapalhou meus encontros, eu fazia de
tudo para levar a mulher para casa sem uma porra de um beijo. Para Rafael,
eu sou um puto em série, mas ele não sabe que eu apenas levo as mulheres
para jantar e não passava disso. Eu tentava, mas Haven ainda é uma
entidade viva no encontro, mesmo sem estar por perto, e em muitas das
vezes ela estava presente e atrapalhando minha noite.
— Melhor você ir embora, Haven. — Caminho para me servir uma
bebida porque estou prestes a cometer um assassinato, porra.
Maldita mulher ardilosa.
— Claro que vou, não porque você mandou, nem nada disso. Aliás,
essa casa é tão sua quanto minha, querido — diz ela, a voz suave e
provocante, claro que esse apartamento não era em nada nosso, ela ficou
com nossa casa. — Mas tenho um encontro quente daqui a — ela olha a
hora no relógio Cartier em seu pulso delicado — três horas.
Sinto a garrafa praticamente quebrando no aperto da minha mão. O
pensamento dela em um encontro é como jogar sal na ferida aberta. Somos
tão fodidos.
Mas eu também poderia acabar com a noite dela, e já fiz isso muitas
vezes.
— Ótimo — digo com uma careta e um gosto amargo na boca. Desejar
boa sorte em seu encontro é como fel na porra da minha língua. O ciúme
corre dos dois lados, tanto do meu quanto do dela. Somos como cachorros
brigando por um osso velho, mas nenhum dos dois cede. Pensar em outro
homem com ela é como ácido queimando através de mim. Um ano depois
do divórcio, e ainda não consigo me libertar dessa mulher. Ódio e amor
podem coexistir dentro de nós pela mesma pessoa? Talvez não ódio, porque
eu não odeio Haven, apenas sinto uma mágoa profunda. — Tenha uma noite
feliz e desista de tentar roubar meu cachorro.
— Terei, e não vou roubar esse amorzinho — diz ela, acariciando
Husky. — Vamos compartilhar.
Ela sorri, e meu coração falha uma batida. Isso nunca fica velho,
mesmo com a mágoa infernal que veio com o fim de nosso casamento, eu
ainda quero a maldita mulher como nenhuma outra, mas já tínhamos
atravessado essa ponte, não funcionávamos como casal, não depois de tudo
o que nos acusamos mutuamente quando nosso casamento acabou.
— Você sabe o caminho da rua — bufo e caminho para fora da sala,
para meu quarto. Eu sabia que ela poderia vir atrás e começar uma
discussão sem sentido, porque dei as costas para ela, mas não me importo,
estou cansado, preciso de um banho e tentar falar com meu advogado para
perguntar por que diabos não estou sabendo desse pedido de Haven,
deixando-a me pegar de surpresa com essa merda.
— Tchau, amor — ela grita, e bato a porta do quarto com mais força
que o necessário, escutando sua risada maligna. Mulher diabólica, nasceu
para me atormentar.
CAPÍTULO 02

Apenas no dia seguinte consigo falar com meu advogado sobre o


pedido da Bruxa para ter a guarda de Husky compartilhada, e ele confirma
que ela pode ganhar, já que alegou sofrimento emocional com a separação.
Estou fumegando de raiva. Só por cima do meu cadáver que ela irá tirar
meu cachorro de mim.
— É melhor você descobrir uma forma de fazer essa merda não dar em
nada, Gonçalo, porque não vou compartilhar nada — digo para ele,
desligando o telefone sem me despedir.
Porra!
Devia contratar Domênico para resolver isso, ele sim ia tirar até a
calcinha de Haven depois que terminasse com ela.
Merda! Má expressão de pensamento. Só de pensar na calcinha da
Bruxa e no nome de outro homem na mesma frase já faz meu sangue rugir,
pronto para o ataque.
Aperto a ponte de meu nariz na tentativa de fazer a raiva por Haven se
dissipar, mas só faz com que algo dentro de mim entre em ebulição quando
penso nela.
Depois de mais de uma hora tentando trabalhar, me levanto e saio da
minha sala.
— Senhor Davis? — Salma, minha assistente, desliga o telefone e se
levanta atrás de sua mesa. — Soube que o senhor Pontes acordou?
Como diabos ela sabe disso, está além de mim. Eu nem sabia disso
ainda. Rafael deve estar salivando para acabar com o velho. Eu estava
mesmo querendo deixá-lo resolver as suas merdas.
— Obrigado, Salma, vou almoçar — aviso tranquilamente, já a
caminho do elevador.
— Mas, senhor, o senhor tem uma reunião com o setor jurídico no
almoço! — Ela corre atrás de mim.
— Remarque. — Estou precisando sair ou explodiria, ou iria à casa de
Haven e…
— Mas, senhor, eles não podem…
— Salma, faça o que digo, estou saindo e não voltarei mais —
interrompo-a, e ela assente, já dando meia-volta e indo cancelar a reunião,
provavelmente. Não me importo com o que ela vai fazer.
Vou para o restaurante habitual, e mesmo sem reserva, sou colocado
em uma mesa. O garçom me cumprimenta e vem com minha bebida de
sempre. Não é hora de beber, mas não vou voltar mais ao escritório.
— Veio cedo, senhor Davis — diz ele, depositando o copo à minha
frente.
— Obrigado, Carlos — agradeço, tomando um generoso gole. — Sim,
estava precisando de uma pausa.
— Quando quiser que sirva é só chamar. — Ele meneia a cabeça e me
deixa sozinho. Tomo outro gole do uísque e olho ao redor. O restaurante
está enchendo rapidamente, e lembro de ligar para Rafael.
— Chris! — diz ele do outro lado.
— Soube que o velho não partiu dessa para melhor ainda. — Vou
direto ao ponto da minha ligação.
— Acho que, no fim, vou ter a minha chance, afinal de contas. Estou
no hospital agora, eu poderia entrar lá no quarto dele e fazê-lo ter outro
ataque cardíaco. — Certamente ele não está falando por falar, ele está cego
de raiva pela família Pontes desde que o conheço.
— Você deveria deixar isso quieto, Rafael, correr atrás de vingança
nunca acaba bem — digo, tentando colocar um pouco de juízo nele, mas
sabendo que é inútil qualquer conselho, eu já havia tentando e nunca surtira
efeito.
— Christian, não posso deixar para lá, o maldito matou a minha mãe.
É preconceituoso e um maldito esnobe, ele tem de pagar por ter iludido a
mamãe — diz ele com um tom raivoso que eu conheço bem.
— Eu sei, cara, mas quem vai pagar pelos erros dele não será só ele.
Toda a família, que não tem nada a ver, vai sofrer as consequências —
pondero. — E a sua esposa? Ela é inocente, Rafael, e talvez ela queira estar
com outra pessoa. Esse casamento foi um erro.
Ele faz uma pausa do outro lado, e suspiro, sabendo que não vou ter
sucesso na conversa.
Duas mulheres se sentam na mesa ao lado da minha. Elas trocam
olhares depois de me avaliarem, e tenho vontade de rir. Eu não tenho
dificuldade de chamar a atenção de mulheres, e o meu sotaque americano,
que eu tinha feito de tudo para perder, mas que ainda persistia, é mais um
chamariz para as mulheres aqui no Brasil. Aprendi português desde que fiz
amizade com Rafael na adolescência. Eu achava a língua fascinante e
complicada pra porra, mas hoje eu falo igual a um brasileiro. Haven fala
ainda com mais sotaque americano que eu, mas geralmente nós dois
falamos inglês quando estamos a sós…
— Você anda preocupado demais com minha mulher, Christian — diz,
aborrecido, tirando meus pensamentos de Haven. Jesus, a mulher é como
uma droga viciante, e ela vem do nada aos meus pensamentos. — Dela eu
me encarrego, não meta a merda do seu nariz.
— Você que sabe, não falarei mais nada — prometo, sabendo que
nunca vou cumprir com a palavra. Ele é um irmão para mim e nunca o
deixaria na merda sem ajudar com alguma coisa. Mudo de assunto,
compreendendo que ele vai continuar argumentando. — Teremos nossa
cerveja hoje?
— Claro. — Ele faz uma pausa novamente. — Chris, sei que você se
preocupa comigo, mas sobre Abner, deixe quieto.
— Já esqueci esse assunto — digo e sorrio para as mulheres que agora
estão abertamente olhando para mim. — Senhora? — digo para uma
morena sensual que me come com os olhos. Volto minha atenção a Rafael e
digo: — Tem uma gostosa querendo minha atenção na mesa ao lado, cara.
Por mais que ame você, irmão, as mulheres sempre vêm primeiro.
Digo isso apenas para deixá-lo exasperado, e ele cai na minha
provocação.
— Você é a porra de um cachorro no cio. Sua ex-mulher pode acabar
com sua raça qualquer hora dessas.
À menção da bruxa, meu humor azeda e esqueço as mulheres ao lado.
— Não me fale dessa megera louca. Acredita que ela quer meu
cachorro? — comento, furioso. Provavelmente as mulheres estão escutando
minha conversa e já estão fugindo para o outro lado do planeta. Haven, até
quando não estava presente, bagunçava minha vida. Porra de mulher!
— Seu cachorro, seu pau, você… posso continuar? — diz ele, rindo
como sempre que reclamo de Haven para ele.
— Foda-se! Ela quer dividir a custódia do MEU cachorro, a filha da
puta. — Fúria assassina me toma, e quero me levantar e ir até ela e
estrangular aquele maldito pescoço elegante, e depois fodê-la até a raiva
sair do meu sistema.
Rafael diz que vai desligar e se despede com um: — Vejo você mais
tarde.
Olho o telefone, incrédulo. O filho da puta nem me deixou falar! Ora,
eu nem tinha falado tanto assim de Haven. Posso nem reclamar mais com
meu melhor amigo? Com quem reclamaria?
Tenho de conseguir um novo melhor amigo. O filho da puta só pensa
na mulher dele agora, uma mulher com quem ele nem queria se casar.
Mas a culpa é da Bruxa, por me deixar igual um idiota choramingando
com meu amigo. Devia nascer em mim bolas novas. Feitas de aço, assim
aquela megera não teria vez.
Depois de baixar o celular para a mesa, faço sinal para o garçom servir
meu almoço, ou iria me levantar e ir até a casa daquela megera dos
infernos.
Meu celular toca com uma mensagem, e sorrio quando vejo quem é.
Débora.
Ótimo, a morena que convidei para jantar outro dia mandou
mensagem, perguntando se ainda mantenho o convite de pé. Ela é uma
executiva da Pontes, empresa da família de Aurora, na qual estamos
investindo por causa da vingança de Rafael, e ela faz parte do time de
finanças. E como CFO da Lamartine, eu tenho de ir às reuniões. Eu a
conheci lá e a convidei para jantar já tem um bom tempo. E agora ela
parece interessada.
Respondo a mensagem, dizendo que deveríamos jantar essa semana.
Ela aceita imediatamente.
Depois de trocar algumas mensagens, dou atenção ao meu almoço.
Contudo, meus pensamentos não param. Essa será mais uma tentativa de
tirar Haven de dentro de mim. Quando eu conseguir ir até o fim em um
desses encontros, certamente estarei no caminho certo de acabar de vez com
nosso chove e não molha.
CAPÍTULO 03

Fitei-o através do salão do restaurante, com vontade de ir até lá e


tirar o sorriso bonito daquele rosto perfeito dele. Com minha boca, é claro,
bem na frente da sirigaita que ele está jantando.
Cafajeste, aposto que ele acha que vai ter uma noite incrível com ela.
Enganados, eles dois. Eu conheço meu marido, ou melhor, ex-marido.
Estávamos divorciados há um ano e ainda não cortamos a corda que nos
une, como diz meus amigos Elana e Kleber.
Saio do restaurante, entro no táxi, e em vez de dar meu endereço, dou
o do prédio de Christian. Se ele fosse levar aquela sirigaita para casa, teria
uma bela surpresa. Ou ele a levaria para a casa dela? O pensamento me
deixa doente, mas ele a levaria para o próprio apartamento, pois já tinha
feito isso antes, e eu estava lá, esperando o bandido para atrapalhar a sua
noite. A mulher ficou tão furiosa que o estapeou antes de ir embora,
xingando-o de sacana por trair a sua esposa.
Eu rira da situação até ele se virar para mim, tão furioso que corri para
a cozinha e fiquei lá com a governanta até ele se acalmar. Eu ainda ria da
coisa toda, mas agora ele tinha mais cautela antes de levar as sirigaitas para
casa.
Enquanto o carro corta as ruas, meus pensamentos vão para a nossa
situação caótica.
Eu conheci Christian fazia há quase seis anos, uma festa em uma boate
de um time de futebol americano, e eu sabia que tinha encontrado o amor
que seria para o resto da minha vida. Só que quando estamos apaixonados
pensamos que tudo vai ser lindo, mas a vida acontece e tudo desmorona.
Sou eu quem tem a maior parte da culpa por nosso casamento ter
fracassado. Christian tinha sua parcela, mas eu não fui a esposa que ele
achou que eu seria. Eu fui a maior culpada pelo fim e me odeio por isso,
como o odeio por sair com todo rabo de saia, mas eu não ia deixá-lo
continuar, não hoje.
Quando o táxi me deixa no prédio dele corro para dentro, porque um
serzinho que amo me espera lá com todo amor do mundo para mim.
— Ei, amorzinho. — Fico de joelhos, e Husky me recebe com
lambidas molhadas. — Meu menino sentiu falta da mamãe? Sentiu?
Ele late como se concordasse, e passo os braços em volta dele. Eu amo
essa coisinha linda. Ele está todo cheiroso do seu xampu caro que Christian
faz questão de comprar para seu filho de quatro patas.
— Dona Haven! — Glória, a governanta da casa de Christian, aparece.
Nossa governanta, que ele roubou para si. Um dia irei suborná-la e levá-la
comigo de volta para casa. — Não sabia que viria hoje.
— Resolvi de última hora. Tudo bem? — pergunto, me levantando e
sorrindo para ela. Ela é uma flor. Eu gosto dela cuidando da casa, e Husky e
de Christian, motivo pelo qual ainda não a roubei dele.
— Dona Haven, o senhor Christian me pediu para trocar as fechaduras
da casa — diz ela, pesarosa. Ela é minha fã, quer dizer, ela gostaria que eu e
Christian voltássemos, é a nossa maior torcedora. Sempre me acolhendo
aqui, mesmo contra as ordens de seu chefe de me manter fora de sua casa.
Apesar do desejo dela de nos ver juntos, estamos longe disso. A hora de nos
acertar já passou.
— Você pode trocar e gastar o dinheiro do seu chefe em vão — sorrio.
— Ou pode economizar esse dinheiro e dar para um abrigo de animais,
porque vou ter essa outra chave de todo jeito, eu sempre consigo.
Não é a primeira vez que ele troca a fechadura. Na primeira vez que
empatei sua foda, ele estava tão furioso que quando cheguei, dois dias
depois para ver Husky, a porta não abria. Claro, consegui a minha própria
cópia meia hora depois que Gloria abriu a porta para mim.
— Senhora, vai me fazer perder o emprego, e eu preciso dele — diz
ela, mas é com uma voz amorosa que faz algo quente dentro de mim ganhar
vida. — Deviam se acertar.
— Nem em sonho — digo para ela, sabendo sua resposta habitual, eu
dizia isso sempre. — Se ele a demitir, darei um emprego para você melhor
que esse.
— Eu gosto daqui, dona Haven. — Ela sorri, amorosa. — A senhora
quer algo para comer? Deve estar com fome.
Mulher sábia. Eu estou sempre querendo comer. Ela e Cléo, minha
diarista que também é uma querida, só vivem querendo que eu encha os
ossos de carne.
Eu adoro as iguarias de Glória.
— Agora que você falou, estou mesmo. Estava em um restaurante e
não comi, acredita? — Eu estava mais interessada no que o chefe dela
estava fazendo, mas não digo isso em voz alta. — O que tem aí?
— Venha, eu fiz o jantar, mas sei que o senhor Chris não vai comer
tudo, ou não vai comer nada, ele não ligou para avisar. — Claro que ele não
ligou, estava ocupado com a lambisgoia. Não digo nada a ela e a sigo para a
cozinha ampla e moderna, toda em pedra preta e inox por toda parte.
Husky trota atrás de nós e deita-se aos meus pés quando me sento na
banqueta da cozinha e aguardo Gloria me trazer as suas delícias. A mulher
sabe fazer comida como ninguém. Sou americana, e a comida brasileira,
apesar dos anos que moro aqui, ainda é como novidade. Ela odeia nosso
jeito americano, o meu e o de Chris. Ela faz de tudo para nos tornar
brasileiros.
— Você não pensa em voltar para casa? — Gloria pergunta de onde ela
mexe os pratos.
— Aqui é a minha casa agora, Glória, não tenho vontade de voltar para
Nova Iorque, ou Chicago. Não para morar.
Eu adotei o Brasil como minha casa, talvez porque Christian estava
aqui agora. Rafael tinha feito do Brasil a sede de sua empresa e Christian
estava com ele. Eu não quero ir a outro lugar, eu nem sinto saudade de
nada. Eu não tenho amigos lá.
Tem a minha mãe, mas eu não sou mais próxima dela. Quando eu
escapei de suas garras, jurei que nunca mais voltaria. Eu ligo uma vez por
mês e falo com ela, e isso é o máximo que eu poderia dar a ela agora.
Talvez um dia eu a perdoasse completamente, mas ainda não consegui
evoluir tanto.
Ela coloca um prato na minha frente, e gemo quando vejo o que é.
— Você é perfeita, Glória. Sabe que amo camarão com esse molho que
você sabe fazer como ninguém. — Dou uma garfada no camarão ao molho
branco cremoso que tem o toque da Glória, e que nunca comi em lugar
nenhum, servido com arroz branco. Perfeito.
Husky levanta a cabeça do meu pé, suas orelhas se levantam, atentas, e
eu olho para ele.
— Que foi, filho? Você concorda que esse é o melhor jantar do
mundo?
Ele grunhe e deita a cabeça no meu pé novamente.
— Vou servir um vinho também — Glória diz, rindo, quando continuo
a gemer como uma louca. Ela faz uma moqueca de camarão divina também,
e eu devia roubá-la de Christian, assim teria toda comida gostosa do mundo
feita especialmente para mim. Ele certamente me processaria por esse ato
criminoso, roubo de governanta.
Grito para que ela me escute da adega:
— Você um dia será minha, Glória!
— Só sobre o meu cadáver! — A voz de Christian é como um chicote
atrás de mim, e Husky levanta a cabeça onde fingia dormir no meu pé e
corre para ele, latindo alegremente. Droga, ele entrou e eu nem escutei.
Nem Husky, pelo visto. Eu não me mexo nem me viro para olhar meu ex-
marido. Ele fala com Husky e depois aparece na minha frente. Olho ao
redor, procurando a mulher que estava com ele no restaurante, mas
felizmente parece que ele chegou sozinho. Poxa, eu adoraria chutar a
megera para fora com um pé em sua bunda de silicone.
— Que porra você faz aqui novamente, bruxa? Você não tem casa?
— Olá para você também, Christian — digo, mordendo um camarão
suculento, e seus olhos caem para a minha boca. Eu faço um show com o
garfo, escorregando-o pelos lábios devagar, e os olhos dele brilham, só não
sei se de raiva ou luxúria. — Você está com fome?
— Dona Haven, com quem está falan… — Glória estaca quando vê
seu chefe parado na cozinha e com cara de poucos amigos. — Senhor
Chris!
— Glória, adoraria tomar esse vinho — digo, lembrando à coitada da
mulher que ela tem uma garrafa entre os dedos que eu vejo a hora cair, já
que ela congelou no lugar. — Obrigada, querida.
Eu não gosto de vinho, mas eu tomaria um pouco apenas para
perturbar Christian.
— Claro! — Ela corre para pegar a taça. Ela deve estar surtando agora
que seu chefe nos pegou no flagra. Sorrio com o pensamento de estar o
incomodando.
— Sirva uma taça para o senhor Davis também, Glória — digo, toda
benevolente, e pisco provocadora para o meu ex-marido, que bufa de
exasperação.
— Obrigado por autorizar a minha governanta a me servir do meu
vinho, Haven — diz ele sarcasticamente, mordendo as palavras.
— De nada, sou uma pessoa gentil. — Para deixá-lo ainda mais
furioso, aponto para um banco. — Sente-se, está me deixando nervosa em
pé aí. Tome um vinho comigo.
— Haven… — interrompe-me, e fúria sai dele em ondas. — Termine a
porra do vinho e vá embora. Ou vou chutar a sua bunda intrometida eu
mesmo.
Ele não espera minha resposta e sai da cozinha como uma tempestade.
— Dramático… — digo baixinho.
Husky não sabe para onde ir. Não sabe se fica ou se vai com ele. Ele
choraminga na porta com olhos tristes. Tenho vontade de chorar também,
Husky.
— Pode ir, querido — digo para ele. — Você passou o dia longe do
papai, hein?
Ele late como se entendesse e sai correndo atrás de Christian. Quando
volto minha atenção para Glória, ela está me olhando com pena, e odeio
isso.
Sorrio como se não fosse nada e tomo um gole do vinho que ela me
serviu.
— Obrigada pelo jantar — falo para ela.
— Aproveite, amanhã posso não ter um emprego, nunca o vi tão
furioso. — Ela começa a recolher os pratos sujos.
— Ele não está bravo com você, apenas comigo — tranquilizo-a.
Christian podia ser muita coisa, mas ele não é um homem injusto, não
descontaria sua raiva em alguém mais frágil. Ele só está puto porque eu
estava ali, invadindo sua casa mais uma vez. Ele também gosta de
atrapalhar minha vida. Para não deixar Glória com nenhuma dúvida e ter
uma noite de sono tranquila, eu digo: — De qualquer maneira, vou falar
com ele, fique tranquila.
— Isso não me ajuda muito — diz ela, e eu sorrio. Possivelmente ela
tenha razão. Termino de beber o vinho e vou até ela e a abraço.
— Boa noite, querida — digo e vou ao encontro de Christian.
Glória era nossa governanta quando ainda éramos casados e veio com
ele quando nos separamos, por causa de Husky. O cachorro sofreu com
nossa separação porque, apesar de Christian achar que é o único dono dele,
ele foi uma escolha que fizemos mais dele do que minha, claro, mas ainda
participei dessa escolha. Da tentativa de substituir uma coisa por outra que
não deu certo. Mesmo que brincasse sobre roubar Glória dele, eu nunca
faria isso, pois ela cuida dos dois.
Eu? Eu continuaria sozinha como sempre fui. Por um período, tive o
mundo e a lua aos meus pés, tudo junto. Christian me deu tudo isso, e
depois eu não tinha nada, fiquei sozinha e com um coração partido, ainda
apaixonada pelo meu ex de um jeito que não conseguia me desapegar. Eu
sou patética.
Eu não sabia como seguir em frente quando ainda o amo tanto, ao
ponto de meu coração se partir cada vez que o vejo tentando seguir em
frente com outra pessoa. Nosso relacionamento se tornou tóxico, eu tenho
total noção disso, e tem hora que me enoja de uma forma que eu passava
semanas sem vê-lo.
Depois a doença, porque isso não parece amor, me faz correr para vê-
lo, tocá-lo, senti-lo dentro de mim como se precisasse de uma dose dele
para me sentir viva novamente. E ele certamente sente algo parecido,
porque é como se nem precisássemos de palavras para dizer um ao outro o
que queríamos. Apenas rasgávamos as nossas roupas e extravasávamos
tudo.
O apartamento dele é um duplex luxuoso. Eu gosto daqui, mas ainda
prefiro nossa casa antiga. Nós dois a compramos e decoramos do nosso
jeito. Ele preferiu sair, e eu ainda moro lá. A casa é grande e solitária,
decerto seja por isso que venho tanto aqui. Apesar de tudo, ainda quero me
sentir junto a ele. Elana me falava que eu não amo mais Christian, que o
que sinto por ele é uma dependência emocional por estar longe do meu país
de nascimento.
Ela nunca se apaixonou. Não sabe o que é sentir como se alguém fosse
detentor do ar que você respira.
Vou direto para sua suíte, sei que ele está lá. Abro a porta e paro. Ele
está saindo do banheiro, completamente nu, uma toalha na mão enquanto
esfrega a cabeça, seu pau pendurado entre as pernas. Mesmo que estivesse
relaxado, ainda é grosso e avantajado. Mordo o lábio inferior enquanto
meus olhos comem cada centímetro dele. Deve ser meu suspiro deliciado
que o faz afastar a toalha da cabeça.
— Deus, Haven! — Ele enrola a toalha na cintura, para minha
decepção. É sempre delicioso vê-lo nu. Christian é um deus esculpido em
músculos definidos. Ele é alto e largo. Ex-jogador de futebol americano
sexy que me encantou completamente anos atrás e continua me encantando
até hoje. Ele é o meu Tom Brady pessoal. — O que ainda faz aqui, Bruxa?
Disse para ir embora.
— Você disse, não foi? — Fecho a porta do quarto atrás de mim e
caminho lentamente em sua direção. — E desde quando sou uma menina
obediente?
— Estou cansado, Haven — diz, e paro bem à sua frente, seus olhos
azuis como o céu parecem aquecer meu corpo. — O que você quer?
— Hmm — sussurro. — Só vim falar para você que a Glória não tem
culpa por eu ter invadido a sua casa.
— Eu não a culpo, sei que ela não pode controlar você. — Seus olhos
intensos estão em mim.
— Não, ela não pode. — Mordo os lábios, e meus próprios olhos se
fixam em sua boca masculina e sexy, depois descem para seu peitoral
esculpido, seu abdome definido, até chegar no nó da toalha em sua cintura,
onde o caminho feliz do V é interrompido, e o meu desejo de correr a
língua ali é insano.
— Haven…?
— O quê? — digo, sem prestar muita atenção. Estou entretida,
confesso.
— Precisamos parar com isso e continuar nossas vidas! — diz ele, e a
névoa de luxúria se dissipa do meu cérebro. Ele sempre diz isso, sobre
seguirmos em frente, e eu só posso concordar com ele, mas ainda sou
ciumenta demais para largar a mão. Eu odeio isso? Sim, com certeza, mas é
incontrolável.
— Como estava fazendo hoje, seguindo em frente, com aquele
ordinária lá? — Eu não tenho o direito de cobrar isso dele, não somos mais
nada um para o outro, nem mesmo amigos. Estamos mais para dois
gladiadores.
— Estava me seguindo de novo? — Sua irritação vem, imediata. —
Quando vamos parar com isso, Haven? Você nunca para?
— E você para?
— Eu não invado sua casa, nem quero roubar seu cachorro apenas por
capricho! — vocifera ele.
— Estou apenas pegando de volta, porque você o tomou desde o
começo.
— Hoje não é um bom dia, Haven, apenas vá embora! — Ele caminha
para seu closet e sai de lá vestindo uma calça de pijama de seda azul, que
tem um caimento sexy em seu quadril, marcando seu pau. Os anos passam,
e a magia que ele diz que eu joguei nele funciona em ambas as partes, ao
que parece, porque estou completamente enfeitiçada por seu pau meio duro
dentro daquela calça sexy. Gemo quando um desejo cru percorre meu
corpo.
Capítulo 04

Devo estar pagando toda a porra dos pecados de outras vidas.


Caramba, a mulher não tem casa? Ela vive mais na minha casa do que na
que deixei para ela, depois do divórcio. Ela se sente dona da minha casa
ainda, puta que pariu.
— Husky, se eu cometer assassinato, vá me visitar na cadeia, garoto —
digo para ele, que está deitado no tapete do meu quarto, me observando
com ar de reprimenda enquanto tiro minhas roupas para tomar um banho
bem merecido. Ele coloca as patas em cima do focinho, escondendo os
olhos como se estivesse com vergonha de minhas palavras. — Não fique
todo melindroso, seu traidor. — Ele grunhe como se discordasse de mim. —
Você, pela primeira vez, não veio me receber na porta. É, garoto, você está
se debandando para o lado dela.
Ele dá um latido curto e coloca o focinho em cima das patas cruzadas,
me olhando.
Caminho para o banheiro, imaginando se ela teria ido embora quando
eu terminasse meu banho. Saio do banheiro minutos depois, secando o
cabelo, quando escuto o suspiro que não vem do meu cachorro deitado no
tapete, e sim de uma humana que não tem nenhum limite quando se trata da
minha privacidade.
— Deus, Haven! — Enrolo a toalha na cintura, me perguntando por
que não acabamos com isso definitivamente. Mas simplesmente não
conseguíamos, talvez estivéssemos doentes ou alguma coisa nesse sentido,
pois eu não posso me imaginar em um mundo sem ela, mesmo que muitas
das vezes eu odiasse as atitudes que ela tomava apenas com o intuito de me
irritar. Ainda assim, causaria uma dor no meu peito tirá-la da minha vida
completamente. Deixando meus pensamentos de lado, vocifero: — O que
ainda faz aqui? Disse para ir embora.
Ela fala qualquer coisa que não atino muito sobre o que seja, e eu
respondo sem prestar atenção ao que estou dizendo. Estou olhando-a
caminhar na minha direção com esse andar sexy que me mantém refém dela
desde que nos conhecemos. Haven é perfeita pra caralho, linda. Ela deixou
as passarelas, e o corpo dela mudou nesses anos. Ela abandonou a rigidez
das dietas exigidas dela e agora é mais uma Jessica Rabbit, com cintura fina
e curvas perfeitas que foram e ainda são a minha perdição. Esses lábios
suculentos, cheios, causam sério risco ao meu cérebro. Ela tem esse olhar
quando para bem na minha frente, e a minha vontade é jogá-la na cama e
foder até a loucura, mas estou cansado hoje para ter mais uma discussão
com ela.

Saio do closet vestindo uma calça de pijama, e Haven ainda está lá.
Deus! Hoje não é um bom dia para ela estar aqui. Como o otário que sou,
marquei mais um encontro fracassado. A noite poderia ter terminado
comigo dentro de outra mulher, uma que me fizesse tirar Haven de dentro
de mim, é claro. O encontro terminou comigo e com a minha ex na minha
casa. De novo.
Porra!
Caminho para fora do quarto e a deixo lá. Ela não facilita,
conseguindo, com um olhar, me comer da cabeça aos pés. Hoje não,
querida, sem pau para você.
Coloco uma dose de bebida e tomo um gole bem necessário quando
Glória aparece na sala. Ela parece desconfortável, decerto acha que vou
despedi-la por deixar minha ex-mulher entrar na minha casa e ainda tratá-la
como se ainda fosse a dona dela. Elas duas gostam uma da outra, e tentar
mudar isso não é possível. Se eu pudesse admitir sem me sentir um idiota,
eu admitiria com gosto que Haven tenha em Glória uma amiga ou até uma
figura materna, ela precisa disso. A mãe de Haven está muito longe de ser
uma mãe amorosa.
— Vai precisar de mim, senhor Chris?
— Vá descansar, Glória!
— Olhe, senhor Chris, eu peço desculpas…
— Está tudo bem, não precisa se preocupar com nada, e seu emprego
não está ameaçado.
— Obrigada, senhor. Tenha uma boa-noite. — Ela se vira para sair,
mas para. — Boa noite, dona Haven.
— Boa noite, Glória.
Espero-a ir embora, me viro para Haven e a vejo pegar sua bolsa. Eu
volto os olhos para a janela com vista para a cidade lá embaixo, olhar ela
era tentador, mesmo que eu estivesse com raiva.
— Estou indo embora — anuncia ela.
— Ótimo — digo sem olhar para ela, porque eu poderia terminar essa
noite com ela gemendo meu nome. — E devolva a chave da minha casa,
Haven.
— Não tenho a chave da sua casa, apenas toco a campainha, como
todo mundo. — Eu não acredito nela. Vejo, através do reflexo no vidro da
janela, quando ela caminha para perto de mim, e sinto seu toque nas minhas
costas nuas. Meu corpo todo enrijece.
— Boa noite, Christian — diz ela e beija meu ombro. Maldição de
mulher!
Ela se afasta em direção à porta, e eu fecho meus olhos na tentativa de
deixá-la ir embora sem interferir, mas me vejo virando-me para ela.
— Como vai para casa? — Se tem uma coisa que Haven não gosta é
de dirigir, ela fica apavorada no trânsito, e eu não gosto de ela indo para
casa sozinha. Diabos, eu nem deveria me importar, mas eu ainda me
importo com o que acontece com ela, mesmo com as nossas diferenças.
— Vou chamar um táxi diz — ela da porta.
— E onde vai esperar o táxi? Na rua? Qual a pressa em ir embora sem
primeiro chamar o táxi? — Deus, essa mulher!
— Seu prédio tem mais segurança que um banco, Christian. Não vou
ser abduzida se ficar esperando lá embaixo.
— Me dê um minuto e vou te levar — digo, soltando o copo e
caminhando para o quarto para colocar uma roupa decente.
— Não precisa, Christian. E você estava bebendo!
— Um gole de álcool não me deixa bêbado, Haven, e eu vou te levar e
fim de conversa.
— Controlador! — Escuto seu resmungo e me pego sorrindo. Porra,
mesmo irritado com ela, ainda me faz rir.
Depois de vestir uma calça de moletom e uma camisa, pego as chaves
do carro e a guia de Husky, porque sei que ele vai nos seguir. Ele está junto
de Haven, seu rabo balançando feliz enquanto ela fala com ele com voz de
bebê.
— Vamos lá, garoto. — Coloco a guia nele e vamos para o elevador.
— Não fique escutando essa vozinha ridícula todo feliz, seja um macho
alfa, cara.
Haven ri.
— Diga ao seu papai que você ama quando a mamãe fala com você
assim, Husky — diz ela para ele.
Entramos no carro minutos mais tarde, e Husky vem ficar entre os
bancos ao nosso lado para receber os carinhos de Haven em suas orelhas.
— Sabe que não precisa fazer isso, não é? — diz ela para mim.
— Não poderia dormir em paz sem saber que chegou bem em casa,
Haven — digo para ela. — Não importa em que pé estamos um com o
outro.
— Uma mensagem de texto resolveria. — Ela teima, e tenho vontade
de calar a boca dela com a minha, mas me contenho, não podemos voltar
aos velhos hábitos. Bem, é o que vivo dizendo a mim mesmo o tempo todo.
O trânsito é leve a essa hora e não demora muito para chegarmos à
casa de Haven, a nossa antiga casa. Eu não sei por que ela não a vende e vai
morar em um local menor. Eu não poderia morar aqui com todas as
memórias de nós dois, de como fomos felizes e também de que fora o local
onde acabamos infelizes.
Desço, e Husky late para que eu abra a porta para ele também. Eu não
posso negar que ele ama Haven e talvez eu estivesse sendo egoísta por não
querer dividi-lo com ela.
Às vezes eu acho que ficar com Husky foi uma forma de punir Haven
por suas escolhas. Por ela desistir de nós.
— Obrigada por me trazer — diz ela na porta de entrada, tirando-me
de minhas conjecturas. Ela se abaixa e beija Husky. — Você, lindinho, se
comporte.
Ela levanta e me encara, e ela tem os olhos marejados. Tenho vontade
de fechar a distância entre nós e puxá-la para meus braços, a vontade é tão
obsessiva que me causa uma dor física, mas eu me mantenho firme, nossos
olhos presos um no outro, a eletricidade entre nós dois ainda tão intensa que
é insuportável. Vejo a mesma vontade refletida nas íris azul-glaciais, e meu
controle está por um fio quando ela abre a porta e entra, deixando a mim e
ao meu cachorro ali fora. O choramingo de Husky poderia muito bem
representar o meu próprio, se eu fosse um cachorro.
— Vamos lá, garoto, vamos voltar para casa, apenas eu e você.
Quando pego o caminho de volta para casa, penso que poderia ter sido
diferente. Haven pediu o divórcio para me deixar livre, mas isso nunca
aconteceu, o tempo estava passando e nossas vidas estavam mais
entrelaçadas do que nunca. Eu não me sinto livre.
Mas foi ela quem terminou, ela quis isso, e eu não poderia obrigar uma
mulher a me querer, nunca faria isso.
CAPÍTULO 05

Alguns dias depois…

— Podemos tomar uma bebida hoje? — pergunto para Rafael


enquanto entro em sua sala e me jogo na cadeira à sua frente. — Você
precisa relaxar, meu amigo. Aurora vai aparecer quando estiver pronta, se
fosse você daria um tempo.
— Já tenho compromisso essa noite — diz ele, olhando para a tela do
seu computador sem nem mesmo olhar para mim. Bastardo, deve estar
planejando algo malévolo para sua esposa sumida.
— Com quem?
— Não é da sua conta — ele, enfim, levanta os olhos para mim. Desde
quando ele não fala com quem vai jantar ou alguma merda nesse sentido?
— Ora, ora, será que Aurora é coisa do passado? — brinco com um
sorriso nos lábios. Eu sei que ele está apaixonado pela mulher, estou apenas
querendo deixá-lo furioso.
— Não fale asneira, Davis!
— Então me diga com quem irá jantar hoje, Don Juan.
— Haven.
— O que disse? — Minha voz sai baixa e letal. Ele não disse Haven,
disse?
— Eu vou jantar com Haven. Você conhece a Haven, Davis? — Ele
sorri com malícia.
— Por que diabos você quer jantar com a minha mulher, porra?! —
Me levanto tão rápido que a cadeira cai para trás. Bato a mão na mesa à
minha frente e o encaro, pronto para socar sua cara e quebrar seus malditos
ossos.
— Christian, se acalme, caralho — fala ele calmamente, sem nem se
mover.
— Rafael, se você está pensando em sair com a minha mulher…
— Corta essa merda, Christian, sabe que Haven é o mesmo que um
macho para mim. Eu apenas preciso conversar com ela.
— Rafael… — Minha voz não passa de um rosnado.
— Deveria espancar você apenas por pensar que eu iria jantar com a
sua mulher com interesse romântico nela.
— E por que diabos é esse jantar?
— Só preciso falar com ela, e não é muito da sua conta. Até onde sei,
meu amigo, ela é uma mulher livre, em um país livre. Segura a porra da sua
onda.
— Não brinque comigo, porra!
— Sabe que eu sei o quanto vocês dois são irracionais um com o outro
e estou tentando ajudar a colocar um pouco de juízo em você e nela. — Ele
cospe as palavras para mim. — Já cansei de falar para vocês voltarem, e
como você diz que foi ela a colocar um fim, irei falar com ela.
— Não se meta nisso, Rafael. — Volto a me sentar, ainda bufando de
raiva.
— Deveriam se acertar. — Ele suspira. — Vocês dois me cansam pra
caralho.
Levanto-me e me encaminho à porta.
— Cancele esse jantar.
— Sem chance!
Saio de sua sala e vou para a minha com meu celular na mão e envio
uma mensagem para Haven.
Christian: “Desmarque esse jantar com Rafael.”
Não demora muito para ela responder.
Haven: “Por que diabos eu faria isso?”
Porque eu não a quero perto de homem nenhum, nem do meu melhor
amigo, caramba. Mas eu não posso dizer isso a ela, eu não tenho o direito,
pois janto com outras mulheres o tempo todo, mesmo que nunca rolasse
sexo depois, porque eu sou um merda encoleirado. Meu ser neandertal não
pode imaginá-la com outro cara, mesmo que fosse Rafael tentando bancar o
casamenteiro.
Christian: “Se eu pedisse que não fosse?”
Haven: “Você já fez isso, e minha resposta é não, Christian.”
O resto do meu dia foi numa merda de mau humor.
Bem, se ela iria nesse jantar, eu poderia muito bem ir ao mesmo
restaurante também.
Estou saindo da empresa, depois de uma reunião infernal, pronto para
impedir Haven de jantar com Rafael, quando meu telefone toca e vejo o
nome da minha mãe. Tento ser breve, mas as conversas com os meus pais
são longas e cansativas. No último ano não fui visitá-los, tinha viajado no
dia que assinei o divórcio e precisei deixar o Brasil. Queria ficar o mais
distante possível de Haven, e quando cheguei lá na casa deles, estava um
caco. Desde então Haven virou a inimiga número um deles. Mesmo eu
dizendo que ela não era a única culpada de nossa separação.
— Você tem de se casar novamente, Christian — diz mamãe em um
dado momento da conversa da qual nem presto atenção. Tenho vontade de
revirar os olhos. É enervante. Ela estava nessa campanha desde que assinei
o meu divórcio.
— Talvez eu case — digo para ela parar de falar, tenho de desligar. —
Mamãe, eu tenho um jantar para ir.
— Oh, com uma mulher?
— Bem, talvez. — Se eu roubasse Haven nesse jantar. Eu odiava
enganar minha
mãe assim, mas ele estava em uma corrida por netos.
— Me ligue amanhã, quero saber se você vai me dar um neto em
breve.
— Tchau, mãe. — Desligo o mais rápido que posso. Outro assunto que
foi a maior razão de passar um ano evitando meus pais.
Filhos.
Talvez eles nunca fossem ter netos.
CAPÍTULO 06

Sento-me no restaurante com Rafael, e ele parece distraído. Ele


tinha me ligado, dizendo que desejava conversar comigo, mas eu não sei o
que ele poderia querer conversar. Investir no meu negócio?
Meu celular vibra e olho para baixo com um suspiro.
Christian: “Não tente me atingir através do meu melhor amigo,
Haven, ou vou acabar com ele e posso levar você junto”
Antes que jogue o celular de volta na bolsa, outra mensagem chega.
Christian estava pirando com esse encontro meu com Rafael, e eu não sei o
que ele está pensando que vai acontecer para estar enlouquecendo com isso.
Ele acha que posso dar em cima de seu amigo? Bem que eu poderia fazê-lo
pagar por ser um babaca, mas sei que tudo tem limite, e nós já estávamos
mais do que além do limite na nossa loucura.
Christian: “Qualquer coisa me ligue, já que teimou e foi a esse nefasto
jantar”
Quem fala nefasto?
Esqueço meu celular e me concentro em Rafael, que está paralisado há
um momento. Eu olho atenta para o que ele está olhando fixo do outro lado
do restaurante.
— Algum problema, Rafael? — pergunto, preocupada.
— Você me dá licença por um minuto? — pergunta ele, mas não
levanta de imediato, talvez esperando que eu responda. Ele é tão estranho,
mas eu gosto dele como um amigo que Christian tinha na mais alta estima
quando nos casamos, e eu o considero um amigo também, mas depois do
divórcio com Christian é claro que ele ficou do lado do melhor amigo.
Olho o restaurante, e enfim vejo a razão de suas esquisitices. Aurora, a
esposa dele, está sentada com mais duas mulheres em uma mesa um pouco
distante da nossa. Ah, ele estava em apuros. Eu soube assim que conseguir
ver os rostos delas. Estavam fuzilando a mim e a ele com os olhos.
Tenho vontade de rir do quanto ele vai ter problemas. Mais do que ele
já tem, pelo que eu soube, com esse casamento arranjado deles. Estive
muito próxima de Christian quando ele discutia com Rafael sobre a bagunça
que se tornou o arranjo entre a Pontes e a Lamartine.
— Não esqueça que foi você que me convidou para esse encontro, e
fique sabendo que seu amigo está pirando, achando que você está a fim de
me pegar — digo e pego o cardápio. Estou morrendo de fome.
— Tenho amor ao meu… — Ele faz um gesto discreto em direção à
virilha. — Para pensar ou olhar para você de outra forma que não seja como
a mulher do meu melhor amigo.
Ex-mulher, eu quero dizer, mas ainda me considero mulher dele, no
fundo. Eu vivo esquecendo que sou a ex. Merda!
— Ótimo, também acho você uma graça — ironizo, levantando uma
sobrancelha para ele. — Se não se importa, vou pedir meu jantar. — Depois
aponto para a mesa de sua esposa. — Você pode ir falar com a sua mulher.
Ele caminha para onde está Aurora, e eles têm uma pequena discussão.
Aproveito e chamo o garçom e peço meu jantar. Eu que não vou esperá-lo
terminar uma briga de casal enquanto fico com fome aqui. Pouco depois,
ele volta com cara de poucos amigos.
— A conversa não foi boa? — pergunto com cuidado, vendo que ele
está meio louco e não tira os olhos da mulher.
— Você já pediu? — pergunta, fazendo sinal para o garçom, que corre
para a nossa mesa, e ele faz o pedido.
Aperto minha boca quando penso em falar. Eu sou terrível em
relacionamentos, se o meu com Christian fosse um parâmetro, mas se eu
tenho alguma experiência é em relacionamentos fracassados, por isso digo a
ele:
— Sabe, Rafael… — Olho para ele, pensando no que ele pode fazer
diferente de Christian e eu. — Eu e Christian nos magoamos muito e
continuamos nos magoando, porque ainda estamos um na vida do outro,
mesmo de forma distorcida. Não deixe isso acontecer com vocês, se a ama,
não faça como nós.
Ele me olha, tirando os olhos da mesa de sua esposa.
— Vocês deveriam se sentar e resolver os seus problemas — diz em
tom de reprimenda, e sei que ele está tentando ajudar. Sabia que esse jantar
não seria para socializar comigo, era porque ele estava preocupado com seu
amigo. Ultimamente estamos sempre um na garganta do outro. — Você é
uma mulher incrível, só é louca quando se trata de Christian — diz,
benevolente.
— Eu e Christian temos muita coisa entre nós que você não entende.
— Eu não quero saber, mas deviam conversar como dois adultos, para
variar — diz ele, e na próxima meia hora fala e fala sobre a nossa eterna
infantilidade de não querer assumir que ainda nos amamos e que
deveríamos começar a frequentar a terapia de ex-casais. Que Christian está
em um nível de estresse acima do normal, que eu deveria parar de tentar
obter a guarda compartilhada de Husky e que isso está afetando Christian
ainda mais.
Eu escuto e tenho de concordar com ele em algumas partes,
principalmente sobre a terapia.
— A noite está boa para vocês? — Ah, não. Christian se senta em uma
cadeira na nossa mesa, e ele está furioso.
—Perfeita até agora — digo, e Rafael geme.
— Sério, Chris?
— Vim salvar você das garras da megera do mal — diz ele para Rafael
com deboche, me olhando com diversão. — Deveria me agradecer.
— Você é o único do mal aqui — rebato, quase mostrando meu dedo
do meio para ele. Dou a ele meu olhar mais mortal, e ele ri.
— A única maldade que quero fazer, você sabe bem qual é, querida ex-
esposa.
— Se eu deixar você chegar perto, mas nem com uma vara de três
metros. — Praticamente rosno para ele. Ele acha que pode me dizer com
quem sair.
Arrogante.
— Oh, pode ser com uma mais curta? — sugere, malicioso. — Você
ladra, mas a mordida é tão fraquinha.
— Sua vara não é lá muito habilidosa… — devolvo.
— Jesus! Já chega, fiquem os dois aí. A minha noite está mais que
encerrada por hoje — Rafael explode.
Ele se levanta e se vira com um sorriso benevolente para o amigo.
— Já que você não teve controle para não atrapalhar o jantar, pague
por ele. — Ele vai embora sem nem esperar a resposta de Christian.
Seguro meu sorriso, e Christian me olha enviesado.
— Não vou pagar jantar nenhum, não usufruí de nada. — Ele me olha
como se eu tivesse de pagar a conta.
— Você está falindo?
— Com você querendo tomar cada centavo meu, provavelmente não
vou demorar a falir.
Como ele é dramático.
— Só pedi Husky, e, falando nisso, minha advogada me disse que vou
conseguir — informo para ele. Pedir a guarda de Husky não é um capricho.
Ele nunca iria entender, eu sinto falta dele realmente.
— Haven, eu juro que…
— Por que veio? Estava jantando com Rafael, e não é nada de mais,
ele apenas quer que nos acertemos.
— Acho que ele deveria meter o nariz em seu próprio casamento —
rebate.
— Ele disse que você anda muito estressado. — Bebo um gole da água
do meu copo, observando-o por cima da borda.
— E de quem é a culpa? — devolve como se tudo fosse culpa minha, e
talvez fosse, eu permitia que nossas vidas continuassem entrelaçadas. Eu
deveria voltar para os Estados Unidos e deixar tudo para trás, mas eu não
quero voltar, simples assim. Eu poderia gerir o meu negócio em qualquer
lugar, mas o pensamento de nunca mais ver esse homem me faz mal.
— Está dizendo que sou eu? Nem estamos mais juntos, Christian!
— Isso nunca te impediu de ser um pé no meu maldito saco.
— Tudo bem, vou te deixar em paz — digo com um sorriso.
— Só acredito vendo. Meu sonho é acordar um dia e… Haven? Quem
é essa bruxa? Puff, sumiu. — Ele me olha com um sorriso debochado e
malicioso. Seus olhos descem para meu decote e a língua corre por seus
lábios.
Estreito meus olhos para ele. Safado!
Nós dois éramos terríveis, com mentiras nos lábios e desejo nos olhos.
Éramos assim.
— Verá.
Ficamos nos olhando como dois oponentes, e quando seus olhos caem
na minha boca, eu sei que mais uma vez vamos ir por caminhos que não
deveríamos…
— Vou levar você em casa — diz ele, levantando-se, a voz rouca e
cheia de pecado não dito. — Vou pagar a conta, não estou a fim de esperar
que venham.
Ele vai pagar a conta, e eu continuo terminando a minha sobremesa
com a maior calma do mundo. Não demora muito, e ele aparece ao meu
lado de novo.
— Vamos! — Ele pega minha bolsa e me segura pelo braço, me
ajudando a ficar de pé.
— Tão delicado! — Tiro meu braço de sua mão e sigo na sua frente.
Ele parece bufar um palavrão, e eu sorrio enquanto caminho mais
sensualmente para a apreciação dele. — Sabe que posso chamar um táxi,
não é? Não precisa me levar, não quero você por perto, me causa urticária
— falo quando paramos na frente do restaurante, esperando o manobrista
trazer o carro.
— Só cale a boca, Haven — diz ele, abrindo a porta do carro quando
ele chega. — Ou eu farei você calar com algo mais útil.
— Seu pau? Querido, se seu sonho é colocar esse seu pau perto de
mim, continue sonhando.
Eu sou tão mentirosa, nem faz tanto tempo assim desde que nós dois
andamos fazendo o que não devíamos. Desde que nos divorciamos, fizemos
sexo várias vezes. A mais recente foi uns três meses atrás, e tudo indicava
que não seria a última. O desejo é uma constante quando nós dois estamos
próximos, ainda mais se começássemos a discutir, isso quase sempre
terminava comigo debaixo dele. — Se vai me levar, ande logo.
— Um dia ainda serei preso por assassinato — diz ele.
— Somos dois. E não me mande calar a boca como se eu fosse Husky,
seu imbecil!
Ele liga o rádio do carro, e eu dou um sorriso, entendendo que ele me
quer calada.
Idiota.
Mas a música tocando me faz relaxar, e encosto no banco e olho pela
janela, vendo as ruas passarem. Por que tínhamos que complicar tudo?
Por que eu não podia ser diferente? Por que minha teimosia nos levou
até aqui? Outra música começa, e meus olhos ardem. Eu sinto minha
garganta doer quando prendo dentro de mim o turbilhão de emoções que me
invade.

The summer sun went down on


O sol de verão se pôs sobre
Our love long ago
Nosso amor há muito tempo
But in my heart I feel the same
Mas no meu peito eu sinto o mesmo
Old afterglow
Brilho antigo

A love so beautiful
Um amor tão lindo
In every way
Em todos os sentidos
A love so beautiful
Um amor tão lindo
We let it slip away
O deixamos escapar

— Chegamos. — A voz de Christian me traz de volta à realidade, e


vejo que estamos na frente da minha casa. Desço e ele me imita, me
acompanhando até a porta como o cavalheiro que é.
— Obrigada por me trazer. — Eu estou com as emoções à flor da pele,
não tenho mais forças para discutir nada com ele. Abro a porta e me viro
para olhá-lo a alguns passos de mim. A música também mexeu com ele?
Porque era como se o cantor estivesse falando de nós, de nossa história, do
amor que deixamos escapar porque não soubemos lidar com as
adversidades que a vida nos impôs.
A culpa me ataca com uma força tão grande que me dobro, e antes que
eu desmorone, Christian caminha para perto de mim e agarra a minha nuca
antes de sua boca encostar na minha. Eu não penso, eu apenas ajo e retribuo
com todo fogo que queima em minhas veias por esse homem. Sua boca
perfeita devora a minha e me faz sentir flutuando, como se o ar voltasse aos
meus pulmões com seu toque. Seu beijo é faminto e exigente e tudo que um
beijo deveria ser. Ele sempre me beijou como se fosse o último beijo que
me daria, e é perfeito assim. Ele me faz sentir viva, talvez por isso sempre
estamos repetindo os mesmos erros. Porque estarmos aqui nos beijando é
um erro, um dos grandes, mas ele me faz sentir coisas que nenhum homem
jamais fará, e eu não me importo com isso.
Eu fiz uma promessa quando nos divorciamos, de que nunca me
casaria novamente e, mesmo se eu seguisse em frente, não sei se deixaria de
amar Christian. Ele me empurra para dentro e me leva para a sala, nossas
bocas nunca se deixando. Deixo cair a bolsa e me agarro a ele com força,
colando-me nele, e a única coisa que consigo pensar é em seu pau duro
pressionado contra mim. Eu o quero dentro de mim. O desejo é tão intenso
que me consome viva.
Agarro o seu cinto com um desespero que é quase animalesco e o abro,
seguindo para sua calça, e enrolo meus dedos em torno de seu pau. É duro,
longo do jeito que amo, e eu o quero mais do que jamais quis qualquer
coisa.
Nossas roupas voam em todas as direções, e não há muitas
preliminares, ele só me joga no sofá e entra em mim como se disso
dependesse as nossas vidas.
— Oh, Christian… — gemo com um desespero que me abala. — Por
favor.
Ele não diz nada, apenas me olha nos olhos quando quase se retira
todo e volta a entrar forte, duro. Ele faz isso lento e ainda olhando dentro
dos meus olhos. E repete até o ritmo acelerar, e tudo que escuto é o som de
nossas carnes se batendo na sala silenciosa, além dos gemidos que nós dois
estamos emitindo.
O orgasmo vem rápido e sem aviso, e grito quando gozo por todo seu
pau. O meu prazer desencadeia o dele, e ele rosna quando se esvazia dentro
de mim, me marcando.
— Porra, Haven! — A voz gutural de Christian rosna atrás de mim
quando ele bate no fundo da minha boceta por trás. Até chegar aqui no
quarto já estávamos na terceira rodada. Estou de quatro na cama, e ele me
fode com raiva, como se quisesse marcar-me com sua invasão.
O som de outro tapa na minha carne ecoa por todo quarto quando ele
bate com a mão e aperta minha bunda, que está pegando fogo onde ele tem
batido repetidamente, arrancando gemidos de minha garganta. — Você é
minha, bruxa. Diga que me pertence!
— Sim — gemo, porque amo quando ele me chama assim na cama. Eu
sou dele e sempre fui, mas eu tenho a certeza de que também ele é meu e só
meu.
— Sim o quê, Bruxa?
— Sim, Christian, sou sua — digo, sem fôlego. — Me fode mais forte!
Ele faz tão bem. Jogo a cabeça para trás, e ele agarra meus cabelos em
um punho enquanto soca fundo dentro do calor escorregadio que pinga por
ele, e só para ele. O som de nossos corpos e nossos gemidos estão
reverberando no quarto. Esse não é o quarto principal, eu não durmo lá
desde que ele foi embora e jurei que nunca o ocuparia novamente, não sem
ele.
É tão louco.
O orgasmo me rasga sem aviso mais uma vez, e Christian aumenta as
estocas, indo tão forte que o sinto profundamente.
— Eu quero te tirar de dentro de mim, porra! — ele diz, me puxando,
encostando minhas costas em seu peitoral duro, sua mão agora envolvendo
a minha garganta e a sua cabeça enterrada no meu pescoço. — Quero te
arrancar… extirpar de mim seu cheiro, seu gosto, sua voz, você toda, mas
eu não consigo… Eu te odeio tanto por isso. — Sua voz é animalesca,
gutural e visceral, e a verdade que há nela me rasga de uma maneira que
não estou preparada. Mesmo dizendo que me odeia, ele não para de me
comer duramente, seu pau maltratando minha boceta dolorida, mas, assim
como ele, eu não posso parar de querê-lo dentro de mim.
Entretanto, as suas palavras caem em solo fértil, e sinto como se
estivesse cometendo erros atrás de erros com meu ex-marido. Exemplo
disso é agora.
Nós dois devorando um ao outro como se não existisse ninguém mais
no mundo.
— Eu também de odeio. O odeio tanto… tanto.
Capítulo 07

— O senhor MacCall e a esposa vieram de Austin para uma


reunião, eles querem que você desenhe uma joia para o nascimento da neta
deles. Querem algo exclusivo. Marquei um jantar, e você deve se encontrar
com eles lá. Sete e trinta — Elana diz enquanto olha minha agenda. —
Como sempre, esse contato é apenas para vocês socializarem, uma reunião
sobre o design acontecerá amanhã, às dez da manhã no hotel.
Quando deixei de modelar, eu fui fazer o que realmente nasci para
fazer: desenhar joias personalizadas, peças exclusivas que os clientes
desejavam. Nada era repetido, por isso eu sempre jantava, almoçava, ia a
um encontro apenas para socializar com a pessoa e conversar, e disso eu
tirava minhas inspirações. Era o meu louco meu método, mas era o que
funcionava para mim, e eu não podia reclamar das minhas finanças, é claro.
Quando saí das passarelas, eu comecei a trabalhar com algumas
marcas de luxo, mas não durei muito, pois tinha os recursos para abrir o
meu ateliê, e Christian era um marido generoso e me ajudou a fazer o meu
trabalho conhecido. Ser casada com ele e usar as minhas próprias criações
nas festas, onde só havia a elite endinheirada, também ajudou muito. As
mulheres viam as peças e queriam saber quem era o designer, e assim, de
boca em boca, em lugares mais exclusivos, tornei-me conhecida no meio. A
pessoa não teria uma joia igual, eu aceitava poucos trabalhos e dava a elas
exclusividade.
Olho a hora: passa das três da tarde. Eu deveria ir para casa e tentar
ficar decente para o jantar, mas ainda tenho de ir à oficina, para dar uma
olhada no trabalho do meu artesão. Eu o chamo assim, Anton não se
importava. Ele tem em torno de sessenta anos e é um mestre na arte de
lapidar.
— E Kleber? Quando ele volta? — Meu outro amigo é o meu
comprador de pedras, e tanto ele quanto Elana são minhas duas mãos, a
direita e a esquerda, e o meu ourives e lapidário Anton os meus dois pés.
Estaria perdida sem eles.
Eu amo trabalhar com Anton, ele é um profissional de primeira
grandeza, e se não fosse o trabalho impecável de lapidação dele, eu não
teria o mesmo sucesso com as minhas criações. Mas eu tenho a melhor
equipe. E não pego qualquer trabalho, eu escolho os clientes a dedo, porque
custa caro ter uma pessoa única e trabalhando exclusivamente em algo para
você, e nem todo mundo pode pagar por isso.
— Ele teve de adiar a volta — diz Elana, respondendo minha pergunta.
Kleber estava viajando para conseguir Turmalina Paraíba para um
trabalho que teria de ser executado em breve, pois nosso fornecedor anterior
estava sempre atrasando. Agora Kleber precisava encontrar um novo, e por
isso fez uma viagem para onde a pedra é originária.
— O que houve?
— Ele disse que tinha de ficar mais um dia ou dois. Não explicou
exatamente por que, mas disse que o fornecedor tinha um preço além do
valor de mercado e precisava negociar, algo do tipo.
— Hmm…
— Vou te deixar — diz ela, se levantando. — Faz dias que não saímos,
a última vez foi antes de Kleber viajar, deveríamos marcar algo.
— Vamos, sim — digo, pegando meu celular e indo em direção à
oficina onde Anton deve estar trabalhando. — Precisando dançar um pouco.
Elana ri, pois eu sou terrível dançando as músicas brasileiras, mesmo
que já morasse aqui há mais de três anos.
— Garota, você precisa praticar mais — diz ela, parando na porta,
rindo e balançando a cabeça. — Sábado seria um ótimo dia, assim ganharia
um gingado nesse quadril.
— Ei, eu sou boa com meu quadril — protesto.
— Não é não, garota. Estou te dizendo, precisa de umas aulas
intensivas.
— Devia me elogiar, sou sua chefe!
— Minha chefe, mas não dança nada, garota.
— Eu sei dançar valsa e sei dançar… hmm… um monte de estilos!
Ela gargalha.
— Se você diz, me prove no sábado — diz ela, saindo e falando por
cima do ombro: — E vamos de samba no pé, gringa!
Eu não sei sambar, ela sabe disso, a malvada. Mas eu amo Elana,
Kleber e Anton como uma família. Eles são meus funcionários, mas eu não
tenho tantos amigos aqui, afinal.

Chego ao restaurante às sete e vinte e cinco e sou encaminhada para a


mesa do senhor MacCall, que ainda não chegou. Sento à mesa, pedindo
uma água para mim enquanto espero. Minutos depois, verifico as horas e
percebo que ele está atrasado meia hora. O garçom vem e pergunta se vou
pedir, e digo que estou esperando alguém. Será que confundi o horário?
Elana disse às sete e trinta.
Haven: “Qual a hora que você disse que seria o jantar?”
Elana: “Sete e trinta, por quê? Se atrasou?”
Haven: “Eu não, mas o casal MacCall, sim. Ainda estou aqui
esperando.”
Estou prestes a mandar outra mensagem para ela entrar em contato
com eles e remarcar, quando escuto uma comemoração algumas mesas
adiante. É Christian e seus amigos. Rafael e a esposa, que até ontem
estavam separados. Acho que ele seguiu meu conselho, afinal.
Tem outras pessoas ao redor da mesa e estão fazendo um brinde, todos
rindo e felizes. Conheço quase todos, não por conviver com eles, mas estou
perto de Christian o suficiente para saber quem é quem. Lanie, a melhor
amiga de Aurora, e a outra moça mais jovem é Bianca, ela é irmã de Aurora
com o noivo, ou namorado, não sei ao certo. Lucca alguma coisa e outro
homem, e esse eu não sei quem é.
Christian fala algo, e todos riem com ele. Não tenho ideia do que estão
comemorando e sinto-me melancólica por não fazer mais parte de nada
assim. Ele não me inclui mais nos convites para sair com seus amigos.
Estivemos fodendo ontem e ele nem disse nada sobre alguma comemoração
com Rafael.
Merda, Haven!
Você não é mais esposa dele, nem amiga dele. Por que diabos ele te
convidaria para uma comemoração junto com os amigos dele?
Fico olhando para a mesa deles, e algo pesa no meu peito como
chumbo. Meus olhos ardem e quero correr daqui e fugir para longe. Eu
odiava quando desejava ainda fazer parte da vida do meu ex. Que droga
chata!
— Senhora Davis? — Uma voz de homem me faz tirar os olhos da
mesa deles e eu dirijo minha atenção ao homem em torno de quarenta e
cinco anos, bem-afeiçoado, parado ao lado da minha mesa.
— Senhor MacCall? — pergunto, me levantando e estendendo a mão.
Olho ao redor, procurando sua esposa, mas não tem nenhuma mulher
acompanhando-o.
— Desculpe-me o atraso, mas não pude ligar e desmarcar. — Ele
aperta minha mão e aponta para que eu sente, depois senta-se ele mesmo à
minha frente. — Deve estar se perguntando onde está a minha mulher. Ela
estava se sentindo indisposta e ficou no quarto do hotel, e só participará
amanhã da reunião. Sei que devia ter desmarcado o jantar, já que a ideia é
que você nos conheça antes, mas ela fez questão que eu viesse. Ela odeia
que eu fique por perto ao ter uma crise de enxaqueca, perguntando se ela
está bem a cada cinco minutos.
— Oh, tudo bem. Espero que ela esteja bem.
— Um médico veio vê-la, e até amanhã ela ficará bem com a
medicação.
— Tudo bem você voltar para ela — digo.
— Tenho de jantar, e já que estou aqui, vamos fazer isso. Melhor que
jantar sozinho. — Ele faz o sinal para o garçom e fazemos nosso pedido, e
enquanto é providenciado, aproveito para me ausentar.
— Você me dá licença um minuto? Tenho de ir ao toalete.
— Claro. — Ele se levanta, puxando minha cadeira
cavalheirescamente, e eu caminho para o toalete depois de agradecer. Passo
perto da mesa onde Christian está e vejo que as mulheres sumiram, apenas
os homens estão discutindo seja lá o que for. Olhos azuis prendem os meus,
mas eu passo direto sem falar. Hoje não estou a fim de ter um embate com
ele. Se fizesse isso, eu teria uma merda de uma crise de choro, e eu não
choro.
Abro a porta do banheiro, e as três mulheres que estavam na mesa com
Christian me olham como se eu fosse algum alienígena que pousou o disco
voador lá fora e veio usar o banheiro. Dou o melhor olhar irônico para
combinar com as minhas palavras.
— Deveriam segurar seus queixos, podem deslocar a mandíbula —
falo com ironia e completo: — Para as interessadas, eu sou Haven Davis. É
um prazer, senhoras.
Passo por elas e entro em uma cabine, escutando as vozes delas lá fora.
— Ela não era o encontro de Rafael? — Uma diz, e acho que é a amiga
de Aurora. — Aqui tem onde esconder um corpo?
Tenho vontade de rir, e me pergunto por que diabos elas desejam me
matar, nunca fiz nada para elas. Eu posso ter a fama da megera louca que
meu ex-marido gosta de falar, mas eu não faço mal a uma mosca. Para elas
saberem que estava escutando, digo:
— Meu corpo é bem comprido para esconder, pensem em algo
enquanto ainda estou aqui fazendo meu xixi e escutando vocês — zombo de
dentro da cabine. Uma delas dá uma risada divertida, e acho que essa é
Aurora.
— Rafael disse que ela é a mulher de Christian — fala Aurora, baixo.
Ah, é por isso que estavam planejando minha morte. Elas achavam que
ontem à noite eu estava em um encontro romântico com Rafael? Mas não é
isso que meu cérebro registra, e como estou com raiva de Christian, por que
ainda nem sei, falo:
— Não sou nada daquele idiota — resmungo e abro a porta da cabine e
vou até a pia para lavar minhas mãos. — Ele só gosta de pensar que ainda é
meu dono.
— Explique isso aí, dona. — Lanie cruza os braços em uma pose que
ela pode achar que a faz parecer durona, mas não coloca muito medo em
mim, não, e imita a voz de algum doido de hospício: — Comece a falar
ou… corpos aparecerão no rio.
— Lanie! — diz Aurora em um tom constrangido, e escondo meu
sorriso. Sua ameaça é hilária.
— O quê? Ora, não posso interpretar o bandido? Fazíamos isso quando
éramos mais jovens. — Sorrio. Gosto delas. Eu deveria tentar ser amigas
delas, eu precisava de mais amigos.
— Não somos mais tão jovens assim. Somos adultas, se contenha —
Aurora ralha com ela, mas tem um sorriso nos lábios também. Pego meu
batom vermelho e começo a retocar. Aurora vem em minha direção. — Sou
Aurora. — Estende a mão para mim. Aperto sua mão estendida. — A dona
Corleone é a Lanie e essa é minha irmã Bianca — apresenta as outras. Elas
acenam à menção de seus nomes.
— Eu sei quem são vocês — falo, e termino de retocar o batom e o
jogo na pequena bolsa. Começo a ir para a saída, e elas me seguem para
fora também.
— Respondendo à sua pergunta, Lanie, eu e Christian somos
divorciados — digo. Tornou-se um hábito esclarecer às pessoas o nosso
status, às vezes fica confuso até para mim. Hoje ele não está nas minhas
boas graças.
— Hmm, sei… — Lanie diz, estreitando os olhos para mim. —
Quando divorciados se agridem verbalmente, é porque aí tem coisa.
— Por que você não se junta a nós? — Aurora convida cordialmente.
Eu a vejo tentando me introduzir em seu grupo, e a acho fofa por isso. Eu
deveria convidá-la para almoçar qualquer dia desses. Mas não posso deixar
o senhor MacCall, além do fato de que talvez Christian não fosse gostar que
eu me juntasse à mesa dos seus amigos. Ele teve oportunidade de me
convidar, estava dentro de mim horas atrás, o filho da puta. Estúpido.
— Christian teria uma síncope se eu aceitasse — digo a ela, segurando
seu braço, nos parando no corredor. — Rafael é um homem complicado,
mas eu posso afirmar que ele ama você. Ontem ele quase desmaiou quando
a viu aqui. — Rio das minhas palavras, mas elas são mais do que
verdadeiras, ele a ama, está muito claro para mim, e se eles não veem isso,
alguém tem de dizer em suas caras. — E ele estava dando conselhos sobre
Chris e eu, então ele foi picado pelo amor, posso dizer.
— Obrigada por dizer isso. — Ela sorri, amável.
— Eu gosto de você — digo e caminho para a mesa onde o senhor
MacCall está me esperando. Nosso jantar já tinha sido servido.
Acho que demorei mais no toalete do que imaginei. E não estou com a
mínima vontade de comer. Eu também não estou com cabeça para os
negócios. Eu deveria ser mais profissional, mas hoje não vai ser esse dia.
Amanhã eu compensaria.
— Senhor MacCall, podemos continuar nossa reunião amanhã? Eu não
estou me sentindo muito bem. — Eu minto, porque não quero ofender os
MacCalls.
— Claro. Sim, eu apenas terminarei meu jantar e vou ver como minha
esposa está. — Ele sorri, educado, e aceno com um sorriso também. Estou
prestes a me sentar, quando alguém para ao lado da mesa.
— Posso dar uma palavrinha com você? — Oh, não! Lá vamos nós.
Pego minha bolsa calmamente, sem olhar o troglodita, e estendo minha mão
para o senhor MacCall.
— Espero que ela esteja bem até amanhã, vai ser um prazer me reunir
com vocês — respondo seu comentário anterior, ele aperta minha mão e se
despede. Me viro, enfim, para Christian, que estava vermelho e furioso.
— O que você quer? — Coloco minha bolsa no ombro e caminho para
fora do restaurante, deixando como opção para ele me seguir ou não.
— Haven, não brinque comigo, porra!
Olho ao redor, atrás de um táxi. Eu odiava não gostar de dirigir, são
nessas horas que desejava ter um carro e não ter de parar e esperar.
— Hoje não, Christian, por favor. — Eu não sei por que estou sentindo
esse desconforto dentro de mim.
Eu não me importava se ele estava junto de seus amigos e não me
incluía, que ele não se importasse comigo tanto assim. Se eu deixei tudo e o
segui aqui para o Brasil e, desde que nos separamos, ele não se perguntou se
eu tinha amigos aqui?
Eu estou me enganando em dizer que não dou a mínima; eu me
importo, e muito. Só é doloroso admitir.
Eu poderia voltar para meu próprio país? Claro que sim, só que lá eu
também não tinha amigos íntimos, minha vida anterior não me permitiu
construir amizades. As viagens constantes e todas as regras que tinha de
cumprir não me deixavam com tempo ou disposição para construir algo
como amizade verdadeira.
— Só quero ir para casa, volte para seus amigos.
A amargura na minha voz é nova. Estou com ciúme de seus amigos?
Odeio esse pensamento mesquinho, pois não tenho o direito de exigir
nada dele, somos um ex-casal, caramba, nada mais.
Ele pega meu braço e me puxa em sua direção. Tento esconder meu
rosto dele, mas Christian, sendo Christian, não deixa nada passar, então ele
levanta meu queixo entre seus dedos, e meus olhos colidem com os dele.
Eu não sei o que ele vê em meus olhos, porque seu rosto vira uma
máscara fria e seus olhos azuis se tornam gélidos, algo que sempre associei
quando ele está furioso.
— O que está acontecendo? Aquele imbecil lá fez alguma coisa com
você? Porque se ele fez, vou destruir a vida desse filho da puta, Haven!
— Como se você se importasse comigo, Christian — digo e me afasto
dando um passo para trás. Hoje não quero ter mais uma discussão com ele.
É desgastante.
— Como é? Como se não me importasse? Sério, Haven? — diz ele
entredentes, zangado.
— Volte lá para dentro, Christian, só quero ir para casa. — Faço sinal
para um táxi, mas ele me impede.
— Vou te levar.
— Sério, Christian, não preciso de nenhuma babá.
Ele faz sinal para o manobrista, e minutos depois estou entrando em
seu carro.
— O que seus amigos vão pensar de você indo embora sem nem se
despedir?
— Deixe que eu me preocupo com isso — resmunga.
O carro corta as ruas rumo à minha casa, e não falamos muito, mas as
ondas de fúria dele vindo em minha direção era palpável.
Não aguentando mais, me viro para ele:
— Se é tão difícil para você me levar em casa, por que se ofereceu?
Não pedi a você, Christian.
— Assim terei certeza de que dormiu em casa hoje!
— Como é?
— Quem era aquele cara? Um novo namorado?
— Ninguém que seja da sua conta?
— Quem é ele, Haven?
— Ninguém que seja da sua conta, Christian, eu não fico pedindo a
identidade de suas putas.
Ele bate o punho no volante.
— Não, você não pede, você invade minha casa e acaba com qualquer
chance que eu tenha de seguir em frente!
O quê? Ele está de brincadeira.
— Talvez seja melhor me deixar em qualquer lugar e voltar para seus
amigos e continuar sua comemoração, em vez de estar todo zangado aqui
comigo.
— Estou furioso por sua causa — ele ladra, colérico.
— Ótimo, motivo mais que suficiente para voltar lá e continuar a sua
noite.
— Vou te levar, Bruxa, e ter certeza de que vai ficar em casa.
Não respondo, porque iria bater na cabeça dele com algo pesado e
causar um acidente.
Meia hora depois, ele para o carro na frente da minha casa, e ficamos
lá sem nenhum dos dois se mexer do lugar.
Depois do que parece uma eternidade, me viro para ele.
— Estou cansada disso — digo, meus olhos ardendo, essa maldita
vontade de chorar persistente que não me deixa. — Devemos parar de nos
magoar, sabe. Devo seguir minha vida e você a sua.
— Não quando você procura motivos para me atingir.
— E o que eu fiz?
— Sabia que eu estaria hoje no restaurante, comemorando com meu
melhor amigo que vai ter um filho, e quis ir lá me fazer lembrar, debochar
do que me negou, do que nos negou, e ainda levou a porra de um encontro.
E você tem a cara de pau de dizer que quer seguir em frente depois disso?
— O quê? Do que está falando? Eu nem imaginava que estaria lá. Você
estava me fodendo horas atrás e não me disse nada, como acha que vou
saber dessas coisas, Christian? E nem sei do que diabos está falando.
— Você sabe do que estou falando, Haven — ele rosna. Seus dedos
apertam o volante até suas juntas ficarem brancas. E lembro da parte do
bebê.
— Eles vão ter um bebê? — Meu coração bate descompassado no meu
peito, minha voz não passa de um sussurro.
— Sim, eles vão, e você de alguma forma ficou sabendo e arranjou um
encontro para estar lá e me fazer lembrar… — Um nó doloroso se constrói
dentro de mim quando detecto a mágoa e dor na voz dele. Não quero ir por
esse caminho com ele agora, não posso, não hoje. Mas ele achar que eu
sabia e quis ofuscar a comemoração de seus amigos como se tivesse algum
poder para isso?
— Eu não sabia disso! — Tento abrir a porta do carro e sair, mas ele
me para com a mão no meu braço. — Me solta, Christian!
— Fique longe de mim, Haven!
— Você que está me segurando, Christian — digo, tirando meu braço
de sua mão com um puxão mais forte e saindo do carro. Eu não me
despeço, apenas caminho para a porta da frente, mas escuto a porta do carro
bater, e sei que ele não foi embora ainda. Paro na porta e tento abri-la, mas a
minha mão está trêmula, não sei se de raiva ou de outra coisa. Deve ser
raiva, porque ele é a porra de um homem contraditório.
— Dê-me isso — diz ele, parando ao meu lado, tentando pegar as
chaves das minhas mãos, mas eu não as dou facilmente para ele, e ele luta
para tirá-las dos meus dedos e abre a porta. — Tão teimosa.
— E você vá embora, Christian, por favor — digo, entrando e tentando
fechar a porta, mas ele já está entrando também. — Olha, essa noite não
está sendo como planejado, então…
— Planejava terminar a noite com aquele imbecil lá do restaurante? —
Acabo encostada na parede e ele me prendendo lá. Por que as coisas com
meu ex sempre terminam comigo debaixo dele? Ou em cima? Droga.
— O senhor MacCall é apenas um cliente, e ele é casado, seu idiota!
— digo, suprimindo a vontade de dar uns tapas nele. — Nem faz cinco
minutos que queria que eu ficasse longe de você, então dê o fora.
— Talvez eu tenha mudado de ideia. — Ele segura minha nuca e me
puxa para ele. — Talvez meu pau tenha outras ideias.
— Você pensa muito com seu pau, ultimamente — digo com amargura
das vezes que o vi em encontros nesses últimos tempos. Isso está me
deixando doente do estômago, literalmente. — Melhor ir embora. Não
posso ficar perto de você hoje.
Embora as palavras saiam da minha boca como se fossem verdade, que
não o quero perto de mim, eu sinto-me completamente viva quando
Christian está por perto. Tê-lo por perto me faz guerrear com sentimentos
dúbios.
É um sentimento que começa com uma dor que explode como chamas
quentes dentro de mim, que me deixa com essa sensação crua, visceral,
profunda, e que não importa o quão errado eu ache estarmos nessa gangorra
de relação, ainda assim eu continuo sem me importar com nada, porque o
quero tanto para mim que nada mais importa.
O que sinto por Christian me deixa fraca e forte ao mesmo tempo, e
não sei o que fazer com tanto sentimento.
Talvez, no final, eu seja apenas fraca demais, carente de afeto, e me
joguei de cabeça em uma relação que desde o início eu sabia que não ia
muito adiante, não com minhas convicções.
CAPÍTULO 08

Ela está diferente, nervosa, e Haven não é assim. Algo a


desequilibrou essa noite, e não vou embora sem saber o que foi. Se íamos
terminar na cama, isso era outra história.
Tem hora que penso que realmente odeio Haven, no entanto, sempre
tenho essa sensação de euforia, de querer beijá-la até nossos lábios
latejarem. Sinto-me queimar se eu não a tocar como quero, como se nossas
almas se desejassem tanto que queriam se fundir uma na outra.
— Eu não quero ir — digo com a voz baixa e beijo aquele ponto atrás
de sua orelha que é um ponto sensível dela. Baixo o tom de voz e sussurro
em seu ouvido: — Me diga para ficar, bruxa…
Eu preciso dela, sempre precisava. A mulher maldita me desiquilibra
de tal forma que fico irracional e agindo feito um troglodita.
— Christian… — A voz dela sai doce e suave. Meu pau dói nas
restrições de minha calça, pois escutá-la falar comigo assim é como a porra
de um afrodisíaco. — Estamos tão errados, devemos parar.
— Estamos, mas estamos nisso juntos, como sempre —digo,
lambendo o ponto doce em seu pescoço. Ela quer resistir, eu posso sentir,
mas eu sou trapaceiro quando se trata de dar prazer a ela. Sei o que ela quer
antes de ela pensar sobre isso. Desço a alça do vestido que ela usa e
desnudo um seio inchado e suculento. Esfrego a ponta em riste com meu
polegar, a unha picando o bico duro, e ela treme. Provo o bruto em minha
língua e minha Bruxinha malvada se contorce, suas mãos agarram meus
cabelos e me atraem para ela, e minha boca praticamente engole seu seio
perfeito. Eu amo o corpo de Haven, tudo nela para mim é perfeito, e talvez
por isso outra mulher não me atraia como ela, porque simplesmente não é
ela.
Chupo seu mamilo com gosto e sem pressa, deixando as sensações
tomarem conta dela. Eu gosto de foder Haven com força, mas eu gostava de
saboreá-la devagar também, degustá-la como a fina iguaria que ela é para
mim. Perfeita pra caralho.
Nunca houve um momento, desde que conheci Haven, em que não a
estivesse desejando com cada molécula do meu corpo. Nunca de uma forma
normal, era mais como um vício que tinha de ser saciado. Sempre a desejei
com tanta avidez que me assustava, e quando a perdi, eu não soube querer
outra coisa.
Abandono seu seio e me ajoelho diante dela. Minha língua desce por
seu ventre e a afundo em seu umbigo, o vestido se acumulando em sua
cintura, mas o desço totalmente até o chão, deixando-a apenas em sua
calcinha e salto.
Corro a língua pelo osso pélvico, e ela exala.
— Christian, preciso que seja mais rápido… — diz ela, a respiração
entrecortada me dizendo que está além de excitada. Mas não tenho pressa,
eu quero as coxas de Haven abertas, sua boceta pingando para mim,
gozando na minha língua. Quero ouvi-la gritar meu nome enquanto a fodo
de mil maneiras diferentes.
Agora que a tenho nua na minha frente, volto a ficar em pé e a carrego
para a sala, a nossa antiga sala onde a fodi tantas vezes no passado. Será
bom lembrar a ela a quem pertence.
Coloco-a no sofá, meio sentada, e desço de joelhos em sua frente, com
suas pernas abertas para mim. Fico em pé e tiro minhas roupas, enquanto
ela me olha, seu olhar cheio de luxúria. Ela tenta tirar a calcinha, mas paro-
a.
— Deixe isso — ordeno, e ela volta a se inclinar no encosto.
— Então se apresse, Christian, preciso de você. — Claro que ela
precisa, ela pode gritar mil vezes que não me quer, mas, no fim, o desejo
fala por nós dois. Somos viciados nisso.
— Por que a pressa, Bruxinha? — pergunto e me inclino sobre ela,
cada mão do lado de sua cabeça. Inclino-me e beijo-a profunda e
docemente, mas quando ela tenta me agarrar, saio do alcance do seu toque.
Volto a ficar de joelhos entre suas pernas, pego um dos seus pés e tiro o
salto, depois beijo a curva sensual de seu pé delicado, e ela geme. — Eu
amo degustar você devagar.
— Eu não quero devagar, Christian, quero você me fodendo forte e
duro — pede ela, seu corpo se contorcendo. Ela sabe que não posso lhe
negar nada, com a fome que sempre me acompanha quando se trata dela,
mas eu não vou me apressar hoje.
Empurro-a até deitá-la no sofá e subo em cima de seu corpo, meu pau
alinhado com o calor fumegante de sua boceta deliciosa, e luto contra a
vontade de entrar nela forte e rápido e dar o que ela quer, mas eu não quero
apressado. Balanço o corpo para cima e para baixo, em um vai e vem lento
e torturante, esfregando meu pau contra sua boceta, e ela geme,
desesperada, seus quadris subindo para aumentar o contato, mas seguro-a
no lugar, e raiva e frustração brilham em seus olhos azuis elétricos e claros
que sempre me hipnotizaram. Eles se assemelhavam aos olhos azuis lupinos
de Husky.
— Tão ansiosa, minha gatinha — sussurro e volto a torturar nós dois,
meus lábios em sua orelha. Sua garganta fica exposta quando ela se arqueia,
querendo, desejando meu pau dentro dela. Mordo sua orelha e lambo para
amenizar a picada de dor, e seu gemido lânguido é um lamento doloroso. —
Eu vou te foder tão bem, Bruxinha…
— Eu preciso que você me toque, me possua, Christian… — sussurra
ela entre respirações entrecortadas e treme quando meu pau esfrega no feixe
de nervos que está duro e saliente, pulsando por meu toque. Estou por um
fio, mas eu a quero desesperada por mim. Ela está quente, macia e suave,
tão molhada e escorregadia de sua excitação que, porra, estou perdendo o
controle de mim e quase cedo e a fodo sem nenhum cuidado. Mas eu a
quero gozando assim apenas porque eu posso fazê-la gozar com o mínimo
de toque.
— Christian, não aguento… pare de brincar… — Ela se perde nas
palavras quando meu pau bate em seu clitóris mais uma vez, e vejo quando
o controle dela se desfaz e ela começa a tremer debaixo de mim, as ondas
de seu orgasmo tragando-a para as sensações. — Oh, deus, sim, Christian.
Ela é a perfeição quando goza assim lindamente. Desço minha mão e
mergulho meus dedos no calor escaldante de sua boceta, meu polegar
resvala na protuberância do clitóris e encontro aquele lugar dentro dela e
estimulo os dois lugares ao mesmo tempo. Haven se desfaz completamente.
Ela apenas arqueja, tomada com mais um orgasmo delirante, mas eu ainda a
quero completamente entregue a mim.
Desço por seu corpo e abro suas pernas para minha apreciação, e
minha língua traça a evidência de seu prazer. Eu não resisto à tentação de o
tomar em minha boca. Sugo seu clitóris já sensível, e ela tenta me afastar
com um gemido delicioso de protesto.
— É demais…
Eu não paro, seguro-a firme, e ela não foge do meu ataque. Alternando
entre chupadas e lambidas perversas, ataco o broto inchado, fazendo-a
balbuciar sem sentido.
— Christian, por favor… — Seus dedos nos meus cabelos são
dolorosos, mas eu recebo a dor, porque só faz com que eu me empanturre
dela todinha.
— Por favor o quê, Bruxinha? Por favor me foda com seu pau ou por
favor me coma como um manjar dos deuses?
— Idiota perverso — ela choraminga, e rio, dando uma trégua porque
eu quero entrar em seu calor. Levanto e a beijo suavemente, porém firme,
enquanto alinho meu eixo duro e empurro em seu calor molhado. — Não
pare…
— Nem se eu quisesse, gatinha. — Mordo seu lábio inferior e
impulsiono em estocadas lentas e firmes, e prazer corre por minhas veias
quando levanto suas pernas e descanso-as em meus ombros e vou para
frente, minhas mãos em cada lado de sua cabeça. Começo a estocar mais
rápido e mais duro, o prazer deslizando por minha coluna e indo direto para
minhas bolas. Porra, eu não vou durar tanto quando eu gostaria, Haven é
como uma droga, uma vez sentida, tomada, você é um viciado sem
controle. Sua boceta é a porra do céu. Bombeio mais forte, como uma
britadeira, estoco em seu calor apertado e me derramo dentro de sua boceta.
Ela me segue, outro orgasmo tomando-a quando ela sente o calor do meu
esperma no fundo de sua boceta sensível.
CAPÍTULO 09

Christian não vai ficar, ele se veste enquanto o assisto. Visto um


roupão de banho e o observo abotoar a camisa branca, seus olhos em mim
também. Aquele sentimento que tive no restaurante, mais cedo, me
preenche novamente e sinto-me um pouco descartável, sem valor para ele.
Eu não sei por que me sinto assim, como se Christian não me quisesse na
sua vida real, e fôssemos ficar assim o tempo todo, brigando, fodendo
depois e não vivendo nossas vidas com outras pessoas. Eu deveria dar um
basta.
Isso é como um mantra na minha cabeça, mas me vejo cometendo os
mesmos erros continuamente.
— O que você tem? — A voz dele me arrasta dos meus pensamentos,
e o vejo na minha frente.
— Nada.
— Tem esse olhar esquisito no rosto, Haven, e eu te conheço o
suficiente para saber que não anda bem.
— Só pensando.
— Em quê?
— Em nós, Christian. No quanto estamos nos destruindo. — Abaixo
minha cabeça, porque não aguento olhar para ele. Eu me odiava por ceder
ao desejo, mesmo que Christian seja o homem que prometi amar até a
morte. Mas às vezes amor não é suficiente, e eu sou a problemática da
relação.
— Sei que precisamos seguir em frente, Haven. Eu tento, você sabe,
mas não estamos nos destruindo. Estamos em uma relação fora do comum.
— Ele se senta à minha frente e pega minha mão.
— Você tenta — digo com rancor de vê-lo levando uma legião de
mulheres para jantar e sair, e ainda assim o aceitava. O que isso fazia de
mim? — Eu deveria tentar fazer o mesmo, e nem isso faço.
— Haven…
— Hoje eu percebi que você me excluiu de suas amizades — digo,
meus olhos ardendo pelo sentimento de rejeição pesado dentro de mim. —
Percebi que ainda quero que você me inclua, e sei que você não me deve
isso, mas meu coração não entende. Odeio ser a ex insuportável e pegajosa.
Eu odeio isso.
Afasto-me de seu toque, pois estou com raiva de mim mesma por
ainda desejar coisas dele, como se ainda fôssemos um casal. Não é
saudável, é, eu sei tudo isso, mas continuo voltando e voltando.
A dependência emocional que sinto por esse homem é absurda,
beirando o doentio.
— Se você é uma ex pegajosa, eu sou o quê? Hum? Um ex chiclete
que não suporta saber nem que seu cliente jante com você? Nós dois
estamos nessa gangorra, Haven, e não sabemos como sair dela ainda. Acha
que não quero? Eu tento sair e conhecer outras pessoas, e quando você não
atrapalha, eu mesmo não consigo ir em frente com nenhuma mulher.
— Quer que acredite que não dorme com nenhuma delas?
— Você acreditaria se eu dissesse que não durmo? Que não passam de
jantares? Eu vou com toda intenção de que seja mais, mas elas nunca
conseguem me fazer esquecer você por um segundo, então se vamos falar
de ex pegajosos, posso sair na frente. — Ele estende a mão e tira uma mexa
de cabelo do meu rosto. — Você acreditaria em mim, Haven?
— Não sei — digo com sinceridade. Eu vivi esses últimos tempos
odiando-o por sair com essas mulheres. Seus olhos azuis perdem o brilho, e
ele assente, como se eu o magoasse por não acreditar que ele nunca foi além
com elas. — Desde o divórcio você transou com alguém?
— Você transou? — ele devolve, me fazendo estreitar os olhos para
ele. Conheço essa tática do atacar quando se sente atacado.
— Não. — Isso não é nenhum segredo.
— Melhor eu ir. — Ele se levanta sem me responder, mas talvez isso já
respondesse, não é? — Você vai ficar bem?
— Pode ir, Christian, estou acostumada a fica bem sozinha. — Porra!
Por que pareço tão carente? Está parecendo que sou uma coitada, e eu sou
tudo, menos uma coitadinha. Só ando desejando o impossível.
Que Christian acorde um dia e me deseje sem culpa ou expectativas.
— Você quer que eu me sinta culpado?
— Sim — digo rindo, mas o sorriso sai meio forçado. — Estou
brincando, senhor Davis, pode ir tranquilo.
— Não precisa me acompanhar até a porta — diz ele quando me
levanto e o sigo. Eu precisava pegar algo para beber, estava com a garganta
seca.
— Eu tenho de ir lá embaixo. — Mesmo que precise ir à cozinha pegar
algo para beber, eu o acompanho até a porta. Ele para lá antes de abrir. Ele
segura meu rosto em suas mãos e beija meus lábios suavemente, nossas
línguas entrelaçadas, e gemo quando o beijo se torna um acasalar de língua
frenética.
— Christian…?
— Tudo bem, estou indo. — Ele se afasta um pouco, porém, para e me
olha fixamente. — Você é a mulher mais linda em quem eu já coloquei os
olhos, Haven, e nenhuma se compara a você. E mesmo que não acredite em
mim, depois que te conheci, nunca toquei em outra mulher além de um
toque educado — fala ele, me olhando nos olhos, e vejo que fala sério. —
Eu nunca transei aleatoriamente por aí, mesmo que tivesse desejado fazer
isso e te esquecer, mas não consegui.
Eu não sei o que dizer a ele agora, e ele apenas encosta a testa na
minha e ficamos parados na porta fechada, apenas sentindo um ao outro.
Eu o amo e não desejo que ele vá embora, mas nós dois sabemos que
ele irá partir, de qualquer maneira. Ele nunca dorme aqui, ele vem e sai no
meio da noite.
Será que cometemos um erro ao nos divorciar? Eu tentei dar uma
oportunidade a ele, mas ele não segue em frente, e eu tampouco. Só
trocamos os motivos de nos machucarmos.
Volto para a cozinha com os pensamentos no passado.
CAPÍTULO 10

Passado…

— O quê? — grito, excitada.


— Você aceita se casar comigo? — Christian pergunta, de joelhos na
frente de um restaurante lotado, me pedindo em casamento com o maior
diamante já visto pelo homem em um aro de outro branco. — Seja minha
para sempre, Bruxinha.
Eu amava quando ele me chamava de sua Bruxinha. Ele dizia que eu o
enfeiticei igual a uma bruxa desde aquele dia na boate, no meu aniversário
de dezenove anos. Onde tomei champanhe rosé pela primeira vez, onde fui
beijada pela primeira vez também. E quando ganhei o primeiro orgasmo
dado por outra pessoa que não fosse eu mesma. Christian entrou na minha
vida como um furacão, me revirando do avesso e me fazendo só dele. Mas
ele não sabe sobre as minhas convicções ainda, eu nunca disse a ele que
nunca iria me casar ou ter filhos. Estávamos juntos há seis meses, e mesmo
que eu tivesse contado meu passado todo para ele, deixei de fora a minha
promessa de nunca me casar, e nunca gerar nem colocar um filho no
mundo.
Eu me recusava, e nem o amor de Christian poderia mudar isso dentro
de mim. Eu sentia calafrios só de pensar em ser mãe. Não. Como eu
poderia dizer outra coisa, a não ser um enorme e imenso:
— Eu não posso.
— O quê? Amor, o que está dizendo?
— Sente-se, por favor — peço, as lágrimas caindo. — Eu te amo mais
que minha vida, Christian, mas não quero casar. Podemos ficar assim até
você desejar se casar com outra pessoa e ter filhos com ela. Eu te disse
muita coisa, mas nunca te disse que eu decidi nunca ter filhos.
— Haven…
— Olha, quando escolhemos alguém para casar, para dividir nossas
vidas, é porque escolhemos essa pessoa para ter filhos juntos, criar uma
família, e eu não desejo filhos, Christian. Eu sei que você vai dizer que não
me forçará a tê-los, porque conheço você, mas eu sei que um dia você vai
querer e vai tentar me fazer mudar de ideia, contudo, eu não vou, amor.
Então, por favor…
— Eu não me importo. Só case comigo, Bruxa. Não haverá outra
mulher além de você. Eu sei que sua mãe é uma miserável, no entanto, você
não é igual a ela. — Ele agarra minha mão e coloca o anel em meu dedo.
Ele cabe perfeitamente e leva mais lágrimas aos meus olhos. — Case
comigo, amor.
— Christian… — imploro, meu coração querendo e minha razão
colocando freios.
— Shhh, vai ser perfeito, você e eu para sempre.
Ele parecia tão confiante, e eu tão cheia de amor, que não pude negar
e, meses depois, estamos casados e felizes. Casei-me no meu aniversário de
vinte anos, Cristian tinha vinte e cinco.
Foram os anos mais felizes da minha vida. Eu era amada e amava
Christian como se ele fosse meu ar. Éramos como duas metades de um todo,
inseparáveis. A mudança para o Brasil aconteceu, e eu abandonei a
carreira de modelo e investi na carreira de design de joias, iniciei um
negócio lucrativo e tinha um homem lindo, fiel e que me amava, até que ele
começou a desejar…
Desejar que tivéssemos um filho.
Eu sabia que ele achava que me mudaria. Eu o amava tanto que doía,
mas não podia fazer isso comigo mesma.
E isso foi o começo do fim.
Hoje é sábado e eu estou sendo “sequestrada” pelos meus dois amigos
para irmos a algum lugar para dançar, como Elana tinha me prometido.
— Tem certeza de que esse lugar é bom? — Estou quase gritando para
Kleber e Elana, que caminham na minha frente na boate. Eles dizem que
essa foi inaugurada recentemente e cada dia da semana exibem tipos de
músicas diferente. Hoje, segundo ela, é a noite do samba. Para meu horror,
Elana se juntou com Kleber, que enfim tinha voltado de viagem, e agora os
dois estavam em uma missão para me deixar “craque no samba”. Céus! Eu
não tinha o gingado brasileiro para isso.
— Claro que vai ser legal, não seja medrosa, senhora Davis — Elana
grita de volta. O lugar não é muito parecido com o estilo de boate com o
qual estava acostumada nos EUA, era mais como um bar com um palco,
onde uma banda se apresentava — nesse caso, uma banda tocando samba
—, com uma pista de dança aos lados e mesas espalhadas por toda parte,
apenas tinha esse ar mais luxuoso que um bar normal. As cadeiras são de
couro na cor vinho escuro e arredondas, ao redor das mesas também
redondas. Há um bar lotado de pessoas em volta, mas garçonetes serviam as
mesas também. É meio estranho esse lugar.
— Isso não parece uma boate! E tem muita gente! — Eu pareço muito
fresca agora, mas o lugar tem gente demais
— Vamos lá, é a semana de inauguração, Haven, todo mundo quer vir
conferir — Kleber diz. — Vou tentar encontrar uma mesa.
Ficamos paradas perto do bar, mas Elana vai até lá e sigo atrás dela.
Ela consegue se espremer entre as pessoas e grita um pedido. Eu ainda
preferiria estar em um restaurante, saboreando uma boa comida, do que
neste caos. O lugar tem uma energia enervante, como se todos mal
estivessem se contendo.
— Aqui! — Elana empurra um copo em minhas mãos, e olho para a
caipirinha sem saber o que fazer com ela. Eu mal bebia um rosé, e ela sabe
disso. Por que diabos ela pegou isso? É forte demais, e dou um golinho
apenas para não fazer desfeita. Kleber aparece, informando que conseguiu
uma mesa, um milagre nesse tanto de gente esperando para se sentar. Tem
gente em pé na rua. Mas parece comum, de qualquer maneira, as pessoas
ficarem na rua conversando, bebendo.
Nos sentamos à mesa e me sinto bem melhor.
— Daqui a pouco a banda atração principal vai se apresentar. —
Kleber diz. Ele está sentado do meu lado e joga o braço por cima do meu
ombro. Ele tem esse hábito, e quem não gostava disso era Christian. Na
verdade, Christian não gostava de Kleber nem que ele estivesse a cem
metros de mim. Bobo.
— Você e eu vamos dançar mais tarde. Quero te deixar com um molejo
nesse quadril que fará uma passista da Sapucaí ter inveja.
Oh, como ele é debochado.
Mesmo que não fosse uma boa ideia eu ir dançar, ainda pretendia me
divertir e ficar um pouco longe de Christian e das lembranças de nós que
me deixavam um tanto doente. Desde aquela noite que o encontrei com seus
amigos, nós vínhamos ficando um na casa do outro com muita frequência, e
eu hoje precisava fugir.
Mas, como sempre, onde eu estivesse, Christian estaria nos meus
pensamentos.
CAPÍTULO 11

Alguns meses depois

Acordo com uma mal-estar, aquele sentimento que me toma toda


vez que durmo na casa de Christian, mas hoje esse mal-estar é físico, como
se eu tivesse bebido na noite anterior até cair. Eu não bebia, o que eu
tomava de bebida alcoólica, no máximo, era um champanhe rosé
indulgente, e talvez ontem tenha acompanhado Christian. Levanto-me e
corro para o banheiro e paro, Christian está no box tomando banho.
Não tenho lugar para timidez, e eu não me importo de mostrar meu
pior para Christian, ele já me conhece mais que qualquer pessoa no mundo,
e eu não tenho frescura que ele me veja vomitando.
Não sai nada do meu estômago, mas a ânsia persiste e me sinto suando
frio. Acho que estou gripada. Pelo amor de Deus! Eu tenho um trabalho
para fazer hoje, tenho prazos para cumprir e estou me sentindo péssima.
— O que você tem?
— Bom dia para você também — resmungo e me levanto para escovar
meus dentes. Vejo-o no reflexo do espelho, enrolando a toalha na cintura.
— Eu bebi ontem?
— Você não bebe, Haven — diz ele, vindo para o meu lado na pia. Ele
me olha, e enxáguo minha boca e me viro para ele.
— Estou me sentindo com ressaca.
— Nunca vi você com uma. — Ele tem razão, nunca bebi para ficar de
ressaca, eu mal bebo meu rosé de qualquer maneira. Não, desde a primeira
vez que bebi muito, porque achava que ninguém podia controlar minha
vida, e peguei uma garrafa de champanhe, igual àquela que Christian tinha
me feito experimentar quando nos conhecemos, em uma comemoração de
um desfile, a levei para casa e tomei tudo em uma noite. No outro dia, perdi
uma sessão de fotos e outros compromissos, e prometi que nunca mais
beberia tanto, o que cumpri até hoje, e ainda tinha Christian rindo de mim,
porque fiquei pela primeira vez bêbada feito um gambá aos dezenove anos
e mandado mensagens sacanas para ele, que na época estava aqui no Brasil,
até cair de sono.
Mas agora estou quase sentindo os mesmos sintomas daquela vez.
— Christian, por isso mesmo que não bebo, não gosto de fazer algo
que me deixa mal depois. Qual o sentido de beber para no outro dia parecer
que o mundo é uma merda e você tem vontade de morrer?
Corro para fora do banheiro e vou me vestir. Preciso ir para casa,
preciso de um banho e de me vestir para a reunião daqui a…
Olho as horas e gemo. É cedo demais, deve ser por isso que estou mal,
nem são seis horas ainda. Caramba, aonde Christian iria tão cedo?
Estou vestindo minha roupa quando sinto minha visão escurecer e
rapidamente voltar ao foco. Outra onda de enjoo vem junto com suor frio, e
eu caminho para a cama e me deito. Droga.
— Você está bem? — Escuto Christian perguntar.
— Só vou ficar aqui uns minutinhos.
— Você precisa que eu chame um médico? — Christian pergunta, se
inclinando acima de mim e tocando a minha testa. — Não tem febre.
— Claro que não, devo estar bêbada de sono. Nem são seis horas
ainda, Christian, pelo amor de Deus. — Cubro minha cabeça para que ele
vá embora, e escuto sua risada.
— O tempo passa e algumas pessoas continuam as mesmas — diz ele,
porque conhece meu humor quando acordo cedo demais. Eu nem funciono
direito até que tivesse o meu mocha doce e cremoso… interrompo o
pensamento quando só pensar em beber a coisa me dá calafrios.
— Aonde vai tão cedo? — Fecho meus olhos para dissipar o enjoo.
— Sabe que eu trabalho, não é? —fala ele com o tom sarcástico que
me dá vontade de socar seus dentes
— Nem são seis ainda — repito com mais ênfase, e ele ri.
— Mas meu dia não começa às oito, Haven. Sabe que gosto de dar
uma caminhada com Husky, depois tenho academia, e só depois vou para o
escritório.
— Tá bom, pode ir começar seu lindo dia e me deixe — resmungo
debaixo das cobertas. — E quem toma banho antes de ir para a academia?
— Você sabe que está na minha casa, não é, intrusa? — diz ele,
divertido.
— Não me deixe furiosa, Christian.
— Deus me livre de alguma catástrofe dessa acontecer — ele brinca.
Um latido soa na porta do quarto, e ele se dirige para atender Husky.
Husky deve estar tão bravo de ter dormido do lado de fora do quarto, mas é
estranho fazer sexo com o seu cachorro olhando, credo!
— Durma mais um pouco, vou sair com ele. — Escuto a porta do
quarto bater quando ele vai embora.
A próxima coisa que vejo, quando abro meus olhos, é Christian se
inclinando acima de mim, vestido com seu terno elegante e que o deixava
sexy demais. Eu amo vê-lo em um terno sob medida. Deixava minha libido
um tanto eriçada.
— Você não tem um trabalho esperando? — Olho o relógio, e são sete
e meia. Droga.
Pulo da cama e tudo roda, fazendo Christian me segurar antes que eu
caia de cara no chão.
— Cuidado!
— Obrigada, acho que levantei rápido demais.
— Você acha? Vá devagar, vai acabar se machucando. — Ele me solta,
e começo a vestir minha roupa, a vertigem me deixando mais lenta. Hoje
estava sendo a manhã mais bizarra.
Cinco minutos depois, saio do quarto de Christian e Husky corre para
mim.
— Ei, meu garoto! Desculpe deixar você ontem à noite fora do quarto,
mas mamãe e papai estavam tendo uma conversa de adultos e crianças não
podiam participar, entende, baby? — Abaixo-me e dou minha sessão de
carinho nele antes de levantar-me e caminhar para a porta. Eu preciso estar
no trabalho às nove horas e tenho de correr.
— Posso de te dar uma carona? — A voz de Christian me para a
caminho da saída. Ele ainda está aqui, pensei que ele já havia saído.
— Vou tirar você do seu caminho, Christian — digo.
— Glória fez seu café da manhã — diz ele, e a ideia de comer algo me
faz querer voltar para o banheiro correndo.
— Estou bem, só preciso me apressar, tenho uma reunião às nove —
digo e tento engolir o mal-estar que ainda faz meu estômago revirar.
— Então vamos, te dou uma carona. — Ele aponta a saída, e eu o sigo.
— Você parece verde.
— Ah, obrigada, você é muito gentil em apontar isso — digo, batendo
em seu braço. — Tem certeza de que não bebi nada ontem?
— Não lembra o que fizemos ontem? — Sua voz é maliciosa, e fico
vermelha. Depois de anos casada com esse homem ele ainda me faz corar.
— Lembrar, eu lembro, mas se bebi para ficar me sentindo mal hoje,
provavelmente devo ter bebido demais. — Eu lembrava de ter jantado com
ele e de ter tomado apenas uma pequena taça de champanhe, que é a única
coisa que eu tolero. Uma taça não me deixava bêbada. — Ou estou ficando
gripada.
— Então deveria cancelar seus compromissos de hoje e ficar na cama.
Não tente fazer mais do que pode, Bruxa.
Reviro meus olhos para ele.

Ele me deixa em casa e, antes que eu saia do carro, segura meu braço.
— Prefere que espere você?
— Não, eu chamarei um táxi como todo dia, Christian. — Dou a ele
meu sorriso mais charmoso.
— Tudo bem. — Ele me solta e abro a porta, mas ele me para
novamente. — Ontem à noite eu me diverti muito, Haven. É bom quando
nós dois não estamos tentando nos matar.
— Eu também me diverti. — E era verdade, sem brigas por um dia e
noite inteiros? Era o céu. — Eu queria dizer que, independente do resultado
da guarda de Husky, eu não quero ficar brigando tanto. Eu estou ficando
cansada, sabe.
Nos próximos dias teríamos uma reunião com nossos advogados para
tentar um acordo sobre eu ganhar a guarda compartilhada de Husky.
Christian estava levando mais ou menos de boa, ainda furioso quando o
assunto surgia, mas eu não sei se ele ficará muito feliz se eu ganhasse
alguns dias da semana com Husky.
Mesmo com todos os recursos que o advogado dele utilizou, eu
poderia ter direito e acesso ao nosso cachorro, afinal, ainda estávamos
casados quando pegamos o filhote.
— Tudo bem. — Ele me olha fixamente, e quando ele me puxa e beija
minha boca suavemente, eu penso que nem tudo está perdido. Ele pode
estar furioso comigo por causa de Husky, mas ele ainda é guiado por essa
atração que nos une, ou amor, como queira chamar.
— Tenho de ir — digo baixinho contra seus lábios.
Corro para dentro antes de persuadi-lo a me fazer companhia no
banho.
Estava mais que atrasada para a reunião dessa manhã.

Surpreendentemente, estou me integrando em uma amizade com


Aurora e estou me divertido muito com ela, Bianca e Lanie. Lanie só tem o
latido forte, mas é uma gatinha dócil. Nos últimos meses almocei e saí à
noite com elas. Aurora está prestes a ter o bebê e sua barriga estava enorme.
Hoje, no entanto, estou sentada apenas com Aurora no almoço. Nos
encontramos por acaso quando saí da reunião com um cliente, que foi bem
ao lado dos escritórios da Pontes, e acabei entrando e convidando Aurora
para almoçar por puro impulso. Ela estava sempre me convidando e era a
minha vez de ser a que dava um passo para a nossa amizade fluir. Eu gosto
muito dela.
— Você não pensa em voltar para os Estados Unidos? —pergunta ela,
comendo uma porção de sua salada.
Eu a convidei para esse almoço, mas o meu enjoo persistia desde a
manhã e ainda me faz apenas empurrar minha comida para lá e para cá. Eu
devo estar com gripe mesmo.
— Todo mundo me pergunta isso — digo rindo.
— Oh, me desculpe, não quis ser mal-educada. — Ela toca minha mão
por cima da mesa. — Não sei se moraria longe de minha família. Talvez, se
eu e Rafael fôssemos morar lá nos Estados Unidos, onde ele morava antes,
eu mudasse de opinião, pois o amo muito, mas deixar tudo para trás é bem
difícil. Acho que eu ainda sou a menina do papai.
Sorrio de seu comentário. Ela é tudo, menos uma menina mimada. E a
presidente de uma empresa milionária.
— Claro que não é! Você é incrível, Aurora — digo com sinceridade.
— Mas você tem um amor por sua família muito bonito, sabe? E você tem
uma família, já eu…
— Oh! Você não tem família?
— Tenho apenas minha mãe e nunca conheci meu pai — digo
enquanto empurro minha comida quase intocada no prato. — E sem irmãos.
— Mas tem sua mãe. Ela não vem te visitar?
— Não. — Meu “não” sai mais amargo do que eu pretendia.
— Não queria ser invasiva — ela se desculpa, e suavizo meu tom.
— Ela e eu não somos próximas, mas é minha culpa — digo, e não sei,
apenas deixo sair. — Eu que pedi que ela não viesse.
— Entendo.
— Talvez se pergunte por que isso, mas eu precisava passar um tempo
longe dela — continuo. — Ela foi miss Texas quando muito jovem, mas
nunca ganhou um Miss USA ou qualquer outro título depois. Porque ela
engravidou de mim em um desses eventos. Caso de uma noite, acho, nem
ela sabe. Quando nasci, ela projetou todo os seus sonhos em mim, porque
não podia mais conciliar a carreira cuidando de um bebê sozinha.
“Desde que nasci, ela me colocou em todos os concursos de beleza que
podia, até os de festas beneficentes. Comerciais de tv e tudo que ela
pudesse. Os concursos de beleza eram os piores, isso durou anos e anos,
conosco rodando todo o país. Qualquer concurso que fosse, eu estava lá
inscrita, e mesmo que eu odiasse participar, tinha a questão das exigências
dos concursos que ela seguia à risca e além.
“Eu não tinha amigas, eu não podia comer um doce, nenhum tipo de
besteira, e depois vieram os desfiles, quando ela me colocou para desfilar
através de uma agência.”
Tomo um gole da minha água, e as palavras não param.
— Além das participações em concursos, tinha os desfiles. Eu não tive
uma infância normal, eu nem sei o que é normal. Eu, muitas vezes, a odiava
por me obrigar com a sua rigidez em tudo. Sem sair da linha uma única vez.
“Hora de dormir, acordar, tomar banho, comer. Tudo programado
como um treinamento militar rigoroso. Adoecer era proibido, e mesmo que
estivesse doente, ela me entupia de remédios e me fazia seguir a agenda
daquele dia.”
— Sinto muito — fala ela.
— Eu tinha quinze anos quando me recusei a participar de um dos
muitos concursos de beleza que ela me inscreveu. Foi a primeira vez que fiz
isso e me custou alguns hematomas no rosto e um mês de castigo, saindo do
quarto apenas para ir a desfiles, onde a maquiagem cobria as evidências do
que estava por baixo. O castigo era completo: sem direito a celular, sem tv,
sem computador, apenas eu e minha rebeldia, para ser analisada e pensada,
livros e lições. — Dou um sorrio insípido com a lembrança muito viva dos
anos que minha mãe me tratava como uma extensão do que ela sonhou para
ela e do que queria ter vivido, mas a gravidez não permitiu. — As aulas eu
já mal as frequentava, e ela exigia que estudasse em casa ou onde estivesse
para compensar as faltas no colégio. Foi um suplício acompanhar as minhas
turmas ao longo dos anos de escola. Terminei o ensino médio super
atrasada.
Nem sei por que hoje estou contando isso a Aurora.
— Quando fiz dezoito anos, ela queria que eu me candidatasse a Miss,
eu me recusei e ela me disse que eu escolhesse, ou eu iria obedecer ou
poderia esquecê-la, então saí de sua casa. Eu não tive dúvidas sobre ficar e
continuar todo abuso sobre beleza, alimentação, hora de dormir, acordar, ser
a boneca manipulável. Era como estar em serviço militar, mas pior. Só
quem já viveu com uma pessoa obcecada, perfeccionista e perturbada sabe
como é um inferno na terra. Eu escolhi partir. Eu não tinha dinheiro, todo
dinheiro que ganhei modelando até os dezoito anos ficou com ela.
— E onde foi morar?
— Fui fazer a coisa que mais odiava, modelar, mas nos meus termos e
não fazendo desfiles intermináveis. Fui fotografar ou fazer desfiles apenas
em Nova Iorque, onde fui morar, porque eu queria terminar o colégio e
tentar a faculdade, mas eu precisava comer.
“Os primeiros meses não foram bons, eu pegava pouco trabalho e nem
tão bons, porque ela fez de tudo para que eu não conseguisse trabalho. Seu
conhecimento com o pessoal da moda e as agências me impedia de
conseguir trabalho, mas aqueles que ela esnobou no passado e que não
gostavam dela me deram uma chance. E o resto é história, mas eu jurei que
nunca me casaria e nunca colocaria um filho no mundo.”
— Por quê?
— Por que eu faria isso? Eu não desejo que uma criança seja usada
como um fantoche de outra pessoa. No dia que saí da casa da minha mãe,
eu jurei e não mudei de ideia até hoje. — Olho minha comida fria no prato.
— Pode parece bobo para algumas pessoas, mas eu não quero e nunca vou
querer.
— Mas você se casou — ela atesta e me olha com curiosidade. —
Christian também não queria filhos?
Meus lábios esticam e fecho meus olhos quando sinto meu corpo doer
da tensão em mim, e Aurora trata de pedir desculpas quando vê meu
desconforto. — Desculpe, isso não é da minha conta, Haven.
— Ele sabia que eu o amava, mas filhos não faziam parte do nosso
sonho americano, sabe? Teríamos um ao outro e apenas isso. Ele disse que
não importava nada, a não ser me ter como sua esposa, e eu acreditei e nos
casamos. — Meus olhos encontram os seus do outro lado da mesa. — Mas
os seres humanos, eles mudam de ideia. Ele mudou.
— Oh…
— E eu não. Ele pensou que eu mudaria de ideia, que era porque eu
não conhecia o amor, e que eu mudaria de ideia por ele, mas eu não mudei
— repito, meus olhos queimando, minha garganta se fechando. — E, no
fim, nosso casamento não aguentou. Ou melhor, eu pedi o divórcio porque
eu não poderia privar Christian de um dia ser pai. Ele merece isso. Eu vou
continuar sendo egoísta e sozinha. No dia que ele se casar novamente, eu
não sei…
— Haven… vocês ainda gostam um do outro. — Ela se levanta e vem
ficar ao meu lado. — Vocês não poderiam adotar?
— Não é que eu não quero um filho meu, mas filhos, em geral. Não
quero ser como minha mãe, não quero correr o risco de ser igual a ela com
filho de sangue ou adotado, não importa, eu não posso. Eu não tenho nada a
oferecer a um bebê, apenas genes ruins — digo com uma dor que me rasga.
— Eu vi alguma coisa sobre mães narcisistas, e não sei se é o caso, mas eu
não posso ariscar e ser uma pessoa como ela.
— Tudo bem, você não é obrigada a nada, Haven. E mais importante,
você não é ela, você seria uma mãe incrível, tenho certeza, sabe por quê?
Você sentiu na pele, sabe como não deve tratar seu filho. Eu olho para você
e vejo claramente que não é uma pessoa má. Mas repito que não é obrigada
a nada.
— Você está errada, sou má e egoísta. — Meus olhos transbordam e
respiro fundo, tentando pegar meu controle de volta.
— Todo ser humano é egoísta, Haven. Quem disser que não, é
mentiroso. A diferença é que alguns são egocêntricos ao extremo.
— Mas eu casei e amo Christian. Faria qualquer coisa por ele, tirando
isso. Eu sei que sou egoísta, mas é mais forte esse sentimento que me
impede de dar o que ele quer. Eu não posso.
— Você não precisa se justificar, sabe? — Ela se senta ao meu lado e
segura minha mão nas suas.
— Isso me faz um monstro, não é?
— Por quê? É uma questão só sua. Cada um tem seus problemas,
Haven, não se ache pior que ninguém porque não pode fazer algo que para
outra pessoa pode ser simples. — Ela me olha firme. — Ou porque elas
achem que você tem de ser de um determinado jeito.
— Toda mulher nasce com instinto materno, casam e têm seus filhos
com os homens que elas amam, e não consigo fazer isso. Eu desisti do
homem que eu amo porque sou incapaz de mudar de ideia. Eu me odeio às
vezes, e são muitas vezes, quando vejo o quanto eu desisti por ser assim.
— Você já tentou terapia?
— Não, eu não quero fazer porque eu poderia mudar de ideia, e não
quero mudar.
— Entendo.
— Entende como sou uma pessoa horrível? — Eu precisava ir embora.
Olho ao redor, atrás do garçom, e faço sinal para que traga a conta. — Eu
preciso ir.
— Tudo bem. Mas se quiser me ligar e conversar, estou aqui como
uma amiga e não vou julgar suas escolhas, querida.
Olho sua barriga, que já começou a aparecer, e penso no quanto
irônico é eu abrindo a minha alma sobre não querer filho com uma grávida.
Pior que nunca falei assim com ninguém. Apenas Christian conhece toda a
minha infância e adolescência e sabe dessa minha decisão. Eu nunca
escondi dele quem eu sou, nem o que eu quero, mas ele é humano, assim
como eu, e acabamos nos odiando, ainda que nos amando.
Só que eu não o odeio. Eu só o quero, e somente ele, mas não podemos
ter tudo que queremos.
CAPÍTULO 12

Vou para minha sala assim que chego depois do almoço, quando
abri minha alma para Aurora, e estou me sentindo meio letárgica, mas como
se estivesse mais leve por ter conversado com alguém sobre isso. Eu nunca
falei com um psicólogo sobre minhas questões. Talvez eu devesse. Era
como se me negasse a falar com um profissional porque ele iria me dizer
umas verdades, que sou fraca e egoísta, uma pessoa fria, sem coração, que
preferiu perder o homem que amava por não saber lidar com questões com
a própria mãe.
Eu não contei para Aurora sobre as surras das quais eu nunca tinha
hematomas. Cada ato de rebeldia, ou simplesmente porque ela estava de
mau humor, ou porque não fiquei em primeiro lugar, ou porque me
machuquei em um concurso, podia ser qualquer coisa. Ela pegava uma
toalha, encharcava de água e a usava para cada espancamento. Ela sabia que
seria suspeito eu aparecer em um desfile ou uma sessão de fotos com meu
corpo marcado, mas não tinha dia certo para ela me estapear,
principalmente quando eu esquecia de ficar perfeita, mostrar-me menos que
linda era um sacrilégio.
Acordar e tomar o desjejum sem estar perfeita? Se não fosse a primeira
nos concursos? “Oh, não, Haven, você não fez direito. Você não sorriu
como te ensinei, você não fez isso ou aquilo como disse para você fazer…”
Não precisava chegar em casa para a sentença vir, no banheiro do hotel era
onde eu já recebia meu castigo por não ser a melhor, a primeira. Por ser
apenas uma criança. Eu nunca soube ser uma criança normal, e fui tudo que
desejei ser, tantas e tantas vezes.
O lápis que estou usando para rabiscar um design de uma joia para um
cliente quebra a ponta, e percebo que estou riscando com força demais.
Baixo minha cabeça nos braços e respiro forte por uns minutos.
Dentro.
Fora.
Dentro.
Fora.
Só preciso respirar fundo.
Dentro.
Fora.
— Haven? — A voz e o toque me balançando me acordam, e quase
pulo da cadeira. — Oh, desculpe, assustei você? Estava dormindo.
Droga, eu dormi na minha mesa? Devo ter cochilado e não ter notado,
estava mentalmente exausta. Elana está parada na minha frente, me olhado
abismada, eu nunca fiz algo vagamente parecido antes.
— Você está bem? — Ela se aproxima, preocupada com meu silêncio.
— Chamei você várias vezes e não acordou, mas eu tenho de ir.
— Estou me sentindo cansada, e devo ter cochilado. — Levanto-me e
aliso minha roupa. — Acho que vou pegar um café para continuar esse
desenho. E você, vai para onde?
— Haven, já são seis horas. — Ela me olha espantada. — Você dormiu
a tarde toda, eu vim aqui e você estava dormindo, então eu a deixei, e isso
faz umas duas horas.
— Oh, merda! Eu…
— A noite foi longa, hein? — ela graceja. — Eu tenho um encontro e
já estou atrasada.
— Por que não foi embora? Ou me chamou mais cedo?
— Parecia precisar disso, anda muito estranha ultimamente. — Ela
sorri. — Bem, vai ficar ou vai sair?
— Vou levar esse trabalho para casa — digo, recolhendo meus
materiais de trabalho e os enfiando na bolsa. — Devo ter algumas ideias
legais em casa.
— Ótimo, essa cliente é além de exigente — assegura ela. — Mas
você é a melhor designer de joias que já vi.
— Você é uma bajuladora, Elana. — Sorrindo, caminho para fora da
sala e entro na parte da frente da joalheria, que está fechada, apenas os
seguranças estão lá, e eles só iriam embora depois que eu saísse.
O sistema de segurança é monitorado por uma empresa e há sempre
dois seguranças na loja. O local é formado na parte da frente com a
joalheria, onde eu coloco peças minhas em exposição, e atrás fica minha
sala, as salas de Elana e Kleber e, ao fundo, a oficina onde Anton trabalha.
A segurança aqui é reforçada, nunca tive um problema de roubo, graças a
Deus por isso.
Aceno para os dois homens da segurança e saímos.
— Quer uma carona? — Elana oferece.
A joalheria e minha casa ficam no Leblon e eu conseguiria pegar um
táxi, não demoraria para chegar em casa, e ela tinha um encontro.
— Elana, pelo amor de Deus, vá para o seu encontro — digo,
dispensando-a. — Vou chamar um táxi.
— Eu levo você para casa. — A voz vem de trás e volto-me para
encontrar Christian parado lá. — Elana!
— Olá, Christian. Como vai?
— Bem. — Ele volta sua atenção para mim. — Podemos?
— Hmm, claro. — Caminhamos para o estacionamento, e Elana se
despede entrando em seu carro enquanto Christian me guia para o dele. —
Você não tem nada melhor para fazer do que ser meu motorista?
— Só precisava saber como estava. Fiquei preocupado o dia todo, e
não me disse se tinha melhorado do mal-estar de mais cedo. E depois das
inúmeras ligações, que foram todas para a caixa postal, tive de vir.
— Oh! Eu não sabia que teria de te manter informado — digo,
caçando uma provocação. Era mais fácil quando estávamos brigando, assim
eu não sentia como se ainda estivéssemos juntos.
— Mandei algumas mensagens, fiz ligações e não respondeu, Haven.
Fiquei preocupado — profere, abrindo a porta do carro para mim. — Por
que não respondeu?
— Hmm. — Olho para ele, sorrindo. — Acreditaria se eu falasse que
estava dormindo?
— Não. — Ele fecha a porta e dá a volta para o seu lado, sentando-se
ao volante e ligando o carro em seguida.
— Pois é, mas eu estava. Inacreditável, hein? — pergunto, me virando
para olhá-lo — Eu dormi na minha mesa, a coisa mais fora do comum para
mim. Talvez eu esteja mesmo doente. Será que é alguma virose?
— Ou apenas degastei você ontem à noite — graceja, e balanço minha
cabeça, descrente.
— Você se acha, não é? Se lembro bem, eu que deixei você sem
fôlego.
Ele ri, e eu me pego rindo também, pois era uma mentira eu deixá-lo
sem ar.
Mas dormir durante o dia é algo bem inusitado, principalmente quando
estava em um projeto.
Eu sempre sou focada e, se deixasse, eu nem veria o tempo passar
quando eu estava trabalhando em uma joia. Colocar a emoção de cada
cliente na peça é algo que me fascina.
— Mas dormir durante o dia é bem esquisito — reitero.
— Que exemplo de chefe, hein? — ele brinca.
— Elana é mais chefe que eu — admito sem nenhuma vergonha,
quando eu sou apenas a parte criativa. Sem ela eu estaria perdida.
— Você quer jantar? Podemos parar em algum lugar — ele oferece
gentilmente, e fico tocada com seu cuidado.
Christian é assim, mesmo não estando mais juntos, ele sempre se
preocupava com a minha alimentação e tudo mais, mesmo que no final
estejamos brigando feito cão e gato. Ele sabe que na minha infância e
adolescência fui privada de ter desses prazeres básicos.
— Glória não fez seu jantar? Eu não estou com fome.
— Deve se cuidar mais, Haven. — Ele aponta o dedo, tocando minha
covinha. Isso por si já causa sérios arrepios de desejo. Ele é como uma
droga para mim, sempre foi, e eu o magoei com minhas questões pessoais.
Eu não abri mão por amor a ele, como era esperado que eu fizesse.
Quando nós amamos uma pessoa, é esperado que renunciemos a tudo
por ela. Se não tudo, tudo que estiver ao nosso alcance, que abdiquemos de
nós mesmos para fazer essa outra pessoa feliz, e quando eu não pude fazer
isso por Christian na questão de filhos, eu acreditei que não o amava o
suficiente e pedi o divórcio.
Eu o amei desde que coloquei os olhos nele, quando tinha dezenove
anos, e achei que faria qualquer coisa por ele, mas, no final, não fiz nada
disso. A bem da verdade, eu o fiz sofrer, e deixar que alguém lá fora faça o
que não fiz me dói além de qualquer razão. Seria egoísta de minha parte
privá-lo de uma família.
Percebo que minha cabeça está a mil por hora, e só de pensar em
comida me dá arrepios, e não no bom sentido.
— Simplesmente não estou com vontade de comer. Só em pensar, me
sinto enjoada. — É surpreendente ficar enjoada com comida. Eu amo
comer, os anos de restrições me fizeram apreciar a comida como uma das
coisas mais maravilhosas, e eu amo poder comer sem todas as exigências da
profissão de modelo as quais minha mãe me submetia. Agora eu tenho
curvas que meu ex-marido ama.
— Vamos jantar — insiste ele, e nos leva a um restaurante onde eu
nem toco na comida, e saímos rapidamente de lá, porque eu estava
reclamando o tempo todo do cheiro. Eu não voltaria a um restaurante tão
cedo.
Quando saímos do restaurante, estou levando a única coisa que me deu
vontade de tomar, e eu nem gostava daquilo. Um milk-shake de morango.
CAPÍTULO 13

Cléo, a faxineira que vinha duas vezes na semana limpar a casa


enorme onde moro, está na minha cozinha. Além de organizar a casa, ela
faz as compras de mercado. Ela não é uma exímia cozinheira como a
Glória, mas no dia da semana que ela vem, sempre faz meu café da manhã.
Só que hoje o cheiro está me matando. Enjoo sobe com força, me forçando
a entrar no lavabo do andar de baixo e tentar vomitar. O termo é tentar,
porque não sai nada, não tem nada na minha barriga. O mal-estar é grande.
O que ela colocou no pó do café?
Jesus!
Isso fede e me causa náusea horríveis. Eu precisava sair de casa
urgente, ou vomitaria as minhas entranhas, pois não comi desde que
Christian me trouxe para casa ontem. Ele tinha me levado para jantar e
quase não comi, belisquei, apenas,
Não sentia fome, apenas o cheiro dos alimentos me dava ânsia, e a
única coisa que eu desejava ingerir era um milkshake de morango, e eu nem
gostava daquilo. Qual adulto normal desejaria tomar um milkshake de
morango em um jantar em um dos restaurantes mais chiques da cidade? Tão
infantil.
Saio do banheiro e luto para ir falar com Cléo. Ela tem uns trinta e
cinco anos, é baixinha e tem mais curvas que se poderia contar. Eu sou
americana e fora do padrão americano, eu poderia muito bem me passar por
uma brasileira no quesito bunda, mas peitos? Nem tanto. Visto um quarenta
e dois, estourando, mas Cléo é toda bunda e peitos e uma cintura que
poderia causar inveja, e ela amava isso, dizendo que eu deveria comer mais
para encher meus ossos de carne para ficar igual a ela. Ela dizia que eu
nunca iria namorar um brasileiro se continuasse “seca como um varapau”.
Quase rio das lembranças de suas palavras, mas o enjoo me freia.
— Bom dia, dona Haven! — fala Cléo, toda alegre, quando entro na
cozinha. — Pensei que a senhora já tinha ido, não costuma demorar tanto
para sair.
A mulher poderia rivalizar com o sol, de tanto brilho e alegria. Eu amo
morar no Brasil por causa disso, a alegria das pessoas, mesmo quando elas
não têm nenhuma razão para sorrir, mas ainda fazem de suas derrotas
motivo de riso. Mas agora eu poderia matá-la. Jesus, ela quer me matar com
esse café.
Ainda tampando o nariz com minha mão, digo com voz abafada:
— Você trocou a marca do café?
— Não. Por que a senhora está tampando a boca? — ela pergunta,
curiosa. — Não me diga que inventou de preencher os lábios e deu tudo
errado e agora está parecendo aquela mulher lá, sei lá o que Versace. Vi no
TikTok outro dia…
Ela estava se referindo provavelmente a Donatella Versace, que é
famosa pela mudança de visual por causa das inúmeras plásticas ao longo
do tempo.
Apesar de tudo, caio na risada. Ela é impossível. Tiro minha mão do
nariz e franzo a testa para o cheiro desagradável no ar.
— Não, eu não estou igual à Donatella, mas esse café está fedendo,
Cléo — digo, apontando a cafeteira.
— Oh, mas esse é o café que sempre compro. — Ela me olha
esquisito. — Está enjoada? Por causa do cheiro?
— Só em sentir isso me embrulha o estômago. — Começo a sair da
cozinha, e ela me segue. — Só entrei aqui para te cumprimentar e já estou
indo.
— Eu não quero dizer nada com isso, mas quando uma mulher começa
a enjoar assim é só uma coisa. Mas como a senhora diz que não tem
namorado… — diz ela, e eu paro para olhá-la.
Não estou prestando muito atenção ao que ela tagarela, mas pergunto:
— Do que está falando?
— Oh, nada, não — ela desconversa. — Eu aconselharia a ir a um
médico.
Claro que iria, eu não sou de adoecer fácil.
— Talvez eu vá. — Paro na porta. — Esqueci de chamar um táxi.
Droga.
Pego meu telefone na bolsa e abro o aplicativo para chamar um carro.
A pior coisa em não gostar de dirigir é o transtorno de pedir carro o tempo
todo. Deveria contratar um motorista e mandar a conta para Christian
apenas para ele ficar irritado. E no fim ele pagaria.
Sorrio. É muito bom deixá-lo maluco.
Depois de me despedir de Cléo, vou trabalhar. Mal toquei no projeto
que trouxe para casa, o que ontem dormi em cima. À noite eu fiz a mesma
coisa. Eu dormi por cima do notebook e do bloco de desenhos

— Bom dia, chefe — cumprimenta Elana quando passo para minha


sala.
— Bom dia. Você pode segurar tudo por um tempo? Eu preciso
terminar aquele desenho, não consegui nem terminar metade dele em casa.
— O que está havendo, você está perdendo a mão?
— O que não me falta é inspiração, mas ando dormindo em cima do
projeto o tempo todo. — Lembrando das palavras de Cléo, digo: — Pode
marcar um médico para mim? Por favor.
— Qual especialidade?
— Um clínico geral está bem. Não sei o que é isso, só sinto um
cansaço enorme — digo. — O mais rápido que puder. Hoje, se possível.
— Claro, aviso você.
Vou para minha sala e deixo minha pasta na mesa, caminho pelo
corredor que leva ao fundo e abro a porta da oficina.
— Oi, Anton! — Ele está com óculos de proteção e avental, sentado
em uma mesa trabalhando em algum design. Ele tinha dois ajudantes com
ele, caso fosse necessário.
— Dona Haven, bom dia!
— Você precisa de mim?
— Por enquanto, não.
— Ok.
Volto e tento trabalhar durante toda a manhã, sendo interrompida
apenas por Elana, ao avisar que terei médico a uma hora da tarde.
— Você precisa de algo mais? — ela pergunta.
— Sim, um milkshake de morango. — Dou a ela meu melhor sorriso.
— Jura? Uma hora dessas? São dez da manhã, Haven, e virou criança
agora?
A liberdade dessa mulher! Sorrio para ela.
— É a única coisa que tenho vontade de tomar, e nem tomei meu
mocha hoje — digo, fazendo beicinho.
— Americanos esquisitos! — ela resmunga, me fazendo rir mais, e sai
da sala.

Quando saio para ir ao médico, meu celular toca e vejo o número de


um telefone que eu conheço muito bem. Eu não tenho vontade de atender,
odeio receber ligações dela. Eu aperto em ignorar.
Mando uma mensagem para a minha advogada entrar em contato com
ela, para saber se algo de ruim aconteceu. Se não? Eu não quero conversa.
Deixo as questões sobre a minha mãe de lado e foco no aqui e agora.
Eu não andava bem.
CAPÍTULO 14

— Seu mal-estar é comum em seu estado — fala o médico,


rabiscando no prontuário à sua frente sem nem olhar para mim, como seu
eu fosse adivinhar do que ele estava falando.
De que estado ele está falando? Estou com alguma doença séria?
— Meu estado? — verbalizo cautelosamente, pois não compreendi.
Ele, por fim, levanta a cabeça e me olha.
— Está grávida, senhora Davis — comunica o doutor, calma e
tranquilamente, como se suas palavras não tivessem o poder de me
paralisar.
— O que disse? — Essa é minha voz esganiçada?
— Seus enjoos, a falta de apetite recente, a sonolência, tudo isso são
sintomas — declara o doutor sem perceber meu estado catatônico. — Vou
prescrever umas vitaminas e certamente deve procurar um obstetra para que
acompanhe a sua gestação adequadamente.
Minha gestação! O grito é apenas na minha cabeça, pois ainda estou
dura na cadeira.
Eu pulo por fim do assento, como se meu corpo tivesse uma mola, e o
médico se assusta com meu rompante.
— Impossível — disparo, incrédula. Eu uso a pílula religiosamente
para que isso nunca acontecesse. — Você nem fez um ultrassom. Deve ter
se enganado, doutor. Refaça isso!
É clara a urgência da minha voz.
— Eu não preciso de um exame de imagem para saber que está
gestante, a quantidade de HCG em seu exame de urina me garante que está.
— Não é possível, eu faço uso do meu contraceptivo religiosamente,
minha menstruação tem vindo... — Minha voz falha quando começo a
pensar sobre isso. Quando foi a última vez que desceu...?
— Senhora Davis, mesmo parecendo impossível, é possível, sim,
acontecer, é por isso que contraceptivos têm uma pequena margem de falha,
nada é infalível — ele me garante, voltando a rabiscar e me deixando
pirando em minha própria cabeça.
— Está errado… — sussurro para mim mesma, mas ele me olha como
se eu fosse louca.
— Não estou errado — assegura ele. — Aqui está a guia para o
ultrassom, assim toda a sua dúvida será sanada, senhora Davis.
Pego os papéis em piloto automático, apenas assentindo para o que ele
está dizendo. Eu não poderia saber nada do que foi dito no restante da
consulta. Saio da clínica como um zumbi e volto para a loja. Passo direto
para meu escritório na parte de trás e me tranco lá. Apenas me sento na
cadeira e fico olhando o vazio, sem enxergar nada.
Eu não acredito que isso aconteceu. É castigo por eu nunca ter
desejado e agora seria testada até as últimas consequências? O que farei?
Como vou encarar Christian?
Eu não poderia continuar com isso. Eu não desejo filhos, não quero
filhos, nunca. Por que, com tantas mulheres no mundo chorando todos os
dias para conceber, eu, que não quero nada disso para mim, acabo
engravidando? Por que as coisas tinham que ser reversas?
Meu celular toca dentro da minha bolsa, mas não me mexo. Ele
continua e continua a tocar. Quando ele para, cinco minutos depois há uma
batida na porta e a voz de Elana soa do outro lado: — Haven? Você está
bem? Christian ligou para saber se você vai se encontrar com os advogados
à tarde.
Praguejo baixinho. Eu esqueci completamente de que íamos nos
encontrar com nossos advogados para tentar um acordo sobre a guarda
compartilhada de Husky.
— Vocês têm uma reunião sobre um acordo da custódia do cachorro?
Respiro fundo e me levanto. Elana não precisava de mim sendo uma
esquisita trancada em minha sala. Caminho até a porta e a abro.
— Tudo bem, obrigada por avisar.
— Estou preocupada. Você está bem?
— Vou ficar. Apenas algumas coisas na cabeça que preciso colocar em
ordem — digo e penso que colocar em ordem não é bem o que devo fazer.
Estou sofrendo uma pane no cérebro, mas eu preciso me centrar, pois tenho
um trabalho a fazer.
— Você pode avisar a minha advogada que eu não estou muito bem?
— Estou sendo uma covarde? Estou, mas não poderia me sentar na frente
de Christian agora e não desmoronar feito um castelo de areia ao vento.
Estou uma bagunça e não sei se sou capaz de continuar a me manter no
controle se tivesse de olhar em seus olhos e fingir que estava tudo bem.
Ainda mais brigar com ele por Husky, porque, por mais que
estivéssemos transando como gatos no cio ultimamente, não estamos em
comum acordo sobre o meu pedido.
— Claro, se quiser falar sobre o que está te deixando assim
esquisitona, é só me chamar, ok? — Ela me olha com preocupação, mas eu
apenas assinto.
Ela vai embora, e volto a fechar a porta e me recolho no sofá do canto
da sala. Eu precisava tomar uma decisão. Mas antes eu teria que fazer um
ultrassom. Aquele médico charlatão não poderia ter tanta certeza sobre meu
estado.
Pego meu celular e pesquiso uma clínica onde possa fazer um exame
de imagem com urgência. Eu pagaria uma fortuna para ter esse resultado
hoje. Não demoro muito a achar uma clínica que me garantiu que realizaria
o ultrassom em pouco tempo.
Pego minha bolsa e saio novamente.
— Olha, estou saindo e talvez não volte hoje. Não estou me sentindo
bem, posso ter contraído uma virose, como o doutor disse — minto, pois eu
não quero todos sabendo de minha condição. Estava sobrecarregada demais
para compartilhar isso agora. Ou talvez nunca compartilhe.

Entro em casa no começo da noite, como se algo estivesse pesando os


meus membros. Paro na porta de entrada e só encontro o silêncio. A casa
estaria toda apagada, sem vida, se não fosse programada para acender as
luzes em determinada hora.
Jogo a bolsa no móvel do vestíbulo de entrada e caminho para a sala
onde me sento no sofá. Aqui a luz permanece apagada, e é onde fico
durante as horas seguintes. Eu devo ter adormecido, porque a próxima coisa
que vejo é a claridade do amanhecer surgindo pelas cortinas semiabertas.
Outra coisa que sinto é o mal-estar. Oh, céus!
Corro para o toalete mais perto e esvazio meu estômago, cuja única
coisa que continha era o resto do milkshake que tomei ontem, eu acho. Meu
estômago embrulha e me sento no chão, sentindo-me exausta e sebosa,
ainda com as roupas de ontem. Minha mão cai até o meu estômago e
lágrimas enchem meus olhos. O médico não estava errado.
Eu iria ter um bebê!
Aperto a mão contra minha barriga e não sei o que fazer. Eu sempre
sobrevivi a tudo que a vida jogou sobre mim, mas isso é algo que eu não
posso aguentar. Respiro fundo, me levanto do chão e sigo para meu quarto,
precisando de um banho bem merecido.
Eu sempre fui uma pessoa que deixei de chorar por minha vida de
merda há muito tempo. Desde os meus dezoito anos decidi viver por mim
mesma, aceitar o que a vida tinha de bom para me oferecer, e tive sorte.
Ganhei Christian e o amo desde que o conheci, e quando tive que abrir mão
dele por querer que ele fosse completo e feliz, eu me mantive forte. Mesmo
quando rasguei meu coração e o dele para que ele tivesse o que eu não
poderia dar, eu não desmoronei. No entanto, agora eu estou desmoronando.
Lágrimas quentes se misturam com a água, e o soluço se quebra no meu
peito.
Estou pirando.
Não sei quanto tempo passo no chuveiro, e quando saio, paro na frente
do espelho, meu corpo nu. Olho a mulher refletida nele, e não me
reconheço. Estou mais pálida do que o normal, e meu normal já é um
branco leitoso. Meus cabelos ruivos claros, ondulados e longos, estão agora
grudados na minha cabeça, meus olhos fundos e com enormes olheiras, mas
é a dor neles que me faz desviar o olhar, que vai para o meu ventre. Minha
mão cobre minha barriga, e nada ali indica que estou carregando um bebê, o
bebê de Christian. O médico disse que estou na décima terceira semana de
gestação e preciso começar o pré-natal.
Me enrolo em um roupão e vou para a cama, me deito lá, e sei que
hoje não irei ao trabalho. Eu não duvido que Elana ou Kleber viriam ver
como estou se eu não mandar notícia para eles, mas não me mexo. Eu nem
sei onde está meu celular e não me importo.
Fecho meus olhos, e não sei se são os hormônios que os fazem vazar
como bicas. E fico furiosa por estar sentindo esse remorso dentro de mim
do que eu planejo fazer, mas eu ainda preciso de tempo para colocar tudo
em perspectiva.
Christian vai me odiar para sempre…
CAPÍTULO 15

Passado...

— Estive pensando. — Levanto a cabeça do peito de Christian e olho


seu rosto lindo quando ele começa a falar.
— No quê?
— Você já parou para pensar sobre como seria o nosso filho?
Enrijeço.
Não, eu nunca pensei sobre isso porque, quando aceitei casar com ele,
eu já tinha desistido dessa parte. Mas por que ele estava falando disso
agora?
— Não. — Minha resposta é curta e sem inflexão. Eu tento me
levantar para longe dele, e Christian me segura.
— Nunca, nunca?
— Christian, por que está me perguntando isso?
— Eu penso muito nisso ultimamente, no quanto seria bonito algo que
nós dois concebemos.
Agora eu consigo me sentar longe dele, agarro o lençol e cubro meus
seios expostos. Seria estranho ter essa conversar com os peitos de fora.
Mas o meu marido não parece se importar com nudez, ele coloca as duas
mãos atrás da nuca e sorri, aquele sorriso que me deixa com as pernas
bambas. — Seria perfeito. Eu adoraria uma menina. E você?
Ele não percebe o que está fazendo comigo?
— Christian, eu não mudei de ideia sobre bebês. — Minha voz sai
apenas um sussurro dolorido, porque frustrar Christian me dói tanto.
Ele se senta, agora sério.
— Eu achei que quando você e eu estivéssemos casados, você mudaria
de ideia.
— Por isso aceitou tão facilmente minha decisão? Achou que estava
sendo apenas caprichosa, coisa de adolescente? Christian, eu disse que
nunca iria mudar de ideia.
— Nunca diga nunca, amor. — Ele acaricia minha bochecha. —
Podemos tentar? Talvez, quando você estiver grávida, mude sua percepção
das coisas, Bruxinha.
— Não, eu não quero tentar nada, Christian! — digo, incisiva.
Ele paralisa e me olha como se nunca tivesse me visto e, pela primeira
vez desde que o conheço, eu vejo nos olhos dele a decepção e a mágoa se
misturando à raiva.
Ele se levanta e começa a se vestir com gestos bruscos, e fico lá
paralisada de medo e angústia. Ele iria me deixar. Eu não suportaria se ele
me abandonasse, porque não fui capaz de ser uma mulher completa e de
verdade para ele.
— Christian…
— Isso é egoísmo, sabia? Nunca pensa em mim, em como me sinto?
— Eu penso todo dia. Penso no dia que vai acordar e realmente me
ver como alguém sujo e podre que não é capaz de ser completa para você.
Isso me consome a alma, Christian. — As palavras jorram dos meus lábios,
e estou tremendo muito. Chegou o dia que ele vai partir.
— Vou dar uma volta. — Ele sai do quarto, e o medo me deixa sem
ação até escutar o carro sair da garagem da casa e fazer um barulho
ensurdecedor de aceleração. Deito-me de volta na cama e choro como
nunca chorei na minha vida. Quando as surras de toalhas aconteciam na
minha infância e adolescência, eu me desligava de tudo e às vezes nem
sabia por que estava apanhando. Nem chorava, mas agora eu choro sem
controle até adormecer.
Acordo com alguém me tocando e acariciando meus cabelos.
— Haven… amor. — A voz de Christian me tira do estupor em que me
encontro, e abro meus olhos. Ele está sentado na beira da cama, e eu me
sento também, meu corpo dolorido como se tivesse levado uma surra, mas
foi apenas o mal jeito no qual adormeci. — Você me desculpa?
— Pelo que?
— Eu não reagi bem à sua recusa e saí feito um menino mimado.
Devia ter ficado e conversado como o adulto que sou, amor. Você me
perdoa?
— Claro que sim, Christian, eu amo você — digo com ternura e traço
suas sobrancelhas com meu polegar, minha palma na lateral de seu rosto
perfeito de traços aristocráticos e refinados, a mandíbula quadrada. Me
inclinando, beijo-o forte nos lábios, meu coração acalentado.
Nas semanas seguintes, voltamos à normalidade, e um dia Christian
entra com uma surpresa nos braços. A pequena bola de pelos choraminga,
e eu arregalo os olhos.
— Oh, você não fez isso! — grito, agarrando o cachorrinho dele.
— Se eu não posso ter um filho humano, terei um de quatro patas.
— Oh, Christian. — O brilho que senti com a novidade murcha
quando sinto a alfinetada.
— Vamos começar com um cachorro e, quando a mãe natureza agir,
você estará tento todos os meus bebês.
— Sinto que vou decepcionar você. — Aliso o pelo macio da coisinha
minúscula e linda. Ele tinha os olhos azuis de lobos, pelos brancos e
avermelhados — Qual o nome dele? Qual a raça?
— Vamos colocar um nome nele. E ele é um Husky Siberiano.
— Você é um lobinho lindo, não é, Husky? — falo com voz de bebê, e
Christian ri.
— Sério, Bruxa? Vai chamar ele de Husky?
— Ele parece um Husky, Christian. Dã! — digo, rindo horrores da
cara desesperada de Christian. Ele bate a palma na testa.
— Isso porque ele é um Husky Siberiano, Haven!
— Ele gostou, não gostou, Husky? — O pequeno malandro dá um
latidinho, e juro que ele aprova seu nome. — Viu, papai? Ele gosta.
— Jesus! Tanto trabalho para ter um cachorro chamado Rex e acabo
com um Husky — Christian reclama, mas ele vem e me abraça juntamente
com Husky entre nós. — Mas se isso te faz feliz, que seja essa falta de
criatividade, Husky.
— Te amo.
— Eu sei, e te amo mais que tudo nessa vida.
Ter um cachorro mudou nossas vidas, mas nos meses seguintes, com
Husky crescendo, eu sentia Christian cada vez mais pensativo,
principalmente quando nos sentávamos na grama e deixávamos Husky
correr ao redor. Seus olhos eram melancólicos enquanto acompanhava a
corrida solitária do cachorro.
—Você está bem? — pergunto um dia. Estamos em um piquenique no
jardim para deixar nosso pequeno monstrinho correndo e se sujando. —
Você parece triste. Pensativo.
— Não é nada — diz, mas a entonação de sua voz, que eu conheço tão
bem, só confirma o que ando notando.
— Somos uma dupla, amor. Se algo não está bem com você, eu preciso
saber.
— Eu não quero cobrar nada, Haven.
— Cobrar o quê? — Eu sabia o que viria a seguir, mas eu desejava
que fosse outra coisa que ele estava querendo cobrar.
— Eu achei que conseguiria, sabe? Faz três anos que casamos e você
nem fala no assunto, e isso às vezes me deixa pensativo.
E lá iríamos nós para o mesmo assunto.
— Você poderia tentar, sabe? Por mim?
— E vontade não conta?
— Claro que conta, porra, como pode perguntar isso?
— Não está parecendo. Eu já disse meus motivos e você ainda acha
que é bobagem.
— Nunca disse que era bobagem, Haven, não coloque palavras na
minha boca. Só acho que a desculpa é um pouco fora da casinha, pois você
tem consciência de que não será como a sua mãe. Você nunca faria mal aos
nossos filhos, Haven. Para com essa merda, porra.
Ele grita, se levantando e indo em direção a Husky, que parou de
cavar um buraco e estava nos olhando. Ele deve estar estranhando seus
donos brigando.
Até o dia que decidi pedir o divórcio, nós brigamos por quaisquer
bobagens. Éramos tudo um para o outro e depois não éramos mais.
Eu nunca vi Christian tão transtornado no dia que coloquei os papéis
do divórcio na sua frente e disse que renunciaria a ele e ao nosso amor
para que ele pudesse ter o que desejava. Christian sendo Christian, claro
que disse que preferiria mil vezes ter a mim do que um filho, mas eu sabia
que não era o caso. As cobranças nunca iriam parar.
— Você nem tentou, não é? Parece que, no fim, não existia nada para
tentar — disse ele no momento que eu ia saindo de casa com as malas. Eu
pensei que ele estivesse no trabalho, mas ele deveria estar dando uma volta
com Husky, porque os dois estavam parados no jardim quando desci para
entrar no táxi. — É tão fácil assim, Haven? — A voz dele continua, com
tanta dor que me dilacerou. Escondi minhas mãos nas costas para esconder
dele os tremores violentos. Eu não podia falar, apenas os olhei. Christian
apenas bufou um impropério e entrou na casa.
Se eu achei que minha infância foi a parte ruim da minha vida, era
porque eu não conhecia e não tinha ficado sem o amor do homem que
detinha a chave do meu coração. Renunciar a ele me dilacerou, cortei
minha alma ao meio quando assinamos nossos nomes naquelas linhas e
acabamos com nosso casamento.
Eu passei uma semana sem sair da cama, sem comer, sem tomar
banho, sem nada. Eu queria morrer. Pior de tudo, eu perdi meu marido e
nosso cachorro ficou com ele. Foi a exigência dele para assinar o divórcio,
e concordei, além do meu anel de noivado que ele disse que ficaria com ele.
E um ano depois, ainda estamos sem seguir em frente, ainda voltando um
para o outro e nos intoxicando, nos destruindo. Estava tão errada sobre
tudo.
Eu achei que estava fazendo a coisa certa. Dizem que quem ama
renuncia à sua própria felicidade pela felicidade da pessoa amada, e eu
tentei seguir essa regra idiota e deixei Christian achando que a felicidade
dele estava em outro lugar e não comigo, mas, no fim, não serviu de nada.
CAPÍTULO 16

Quando me levanto, quase ao meio-dia, e encontro meu celular e o


ligo, ele tem tantas mensagens de Elana e ligações de Christian que temo
que qualquer um dos dois irrompa pela porta a qualquer momento. Envio
mensagens para Elana, dizendo que tirei o dia de folga, pois estou gripada e
não quero ninguém pegando minha gripe.
Elana: “Estava preocupada com você, não faz mais isso.”
“No fim da tarde irei passar aí para te ver, não devia ficar sozinha.
Levarei uma sopa.”
Eu: “Não precisa, não estou com fome, mas já pedi algo.”
Minto e me sinto horrível. Eu não comi nada desde… nem lembro
quando foi a última vez que comi.
Elana: “Desculpe ligar para Christian. Ele estava preso em uma
reunião, mas disse que iria até aí quando conseguisse sair.”
Oh, não o quero aqui agora.
Eu: “Obrigada, querida. Até amanhã estarei bem.”
Minha próxima mensagem é para Christian, dizendo que estou bem e
que ele não precisa vir.
Depois de colocar o celular no balcão da cozinha, eu simplesmente
fico lá sentada, olhando o vazio e tentando colocar as ideias no lugar.
Eu preciso tomar uma decisão, mas antes eu tenho de contar para
Christian o que eu decidi fazer…

Por dois dias fiquei chafurdando em meu próprio dilema, nas minhas
convicções e em como minhas ações fazem de mim uma boa ou má pessoa.
Eu não quis ninguém por perto, alegando estar com uma gripe, mas garanti
que estava bem, só querendo ficar isolada para trabalhar em um design
inexistente.
Christian me bombardeou de mensagens, e eu pedi um tempo. Além de
Elana quase pirando com meu sumiço, todavia, eu precisava pensar e tomar
uma decisão.
E agora eu estava aqui na casa de Christian, prestes a ter um ataque
cardíaco. É tarde da noite, não sei a hora, devem ser umas dez ou onze
horas, não sei.
Parece que meu coração vai sair pela boca quando aperto o botão do
elevador. Eu deveria dar meia-volta e viajar para os Estados Unidos, ir a
uma clínica e acabar com tudo, mas algo me compelia a vir aqui e
compartilhar aquilo com Christian.
Ele já deve estar em casa, ou em mais um jantar idiota com mais uma
mulher, mas já faz um tempo que ele não sai com mais ninguém, tínhamos
mudado nossa dinâmica esses últimos tempos, temos ficado mais tempo
juntos, e era uma das razão de eu estar nessa situação, grávida. A verdade é
que nós dois temos transado como coelhos, e a consequência disso é o que
estou carregando no ventre. Maldito homem de esperma potente para um
anticoncepcional falhar.
Deus, por que agora? É tudo que me pergunto desde que aquele
médico disse a palavra grávida.
Por que isso aconteceu quando eu não queria? Nunca quis, e meu
casamento fracassou porque não pude mudar de ideia, e agora eu estou com
três meses de gestação. Eu achei que estivesse apenas com uma virose, e é
um bebê crescendo dentro de mim.
Sem conseguir me segurar, lágrimas correm por meu rosto, e eu só
quero parar com isso. Eu não chorava, e agora é a única coisa que sei fazer,
chorar como se algo dentro de mim estivesse se quebrando mais do já
estava quebrado.
Pela primeira vez, eu não abro a porta e invado; eu toco a campainha.
Eu sei que a essa hora Glória deve estar recolhida, então a conversa que
terei com Christian não terá testemunha.
— Jura? Você tocando a campainha? Que novidade é essa?
Levanto meu rosto para o olhar parado no limiar da porta, e mal o vejo
por causa das lágrimas.
— Haven… — Sua voz falha com o pânico. A próxima coisa que sei é
que ele está me pegando nos braços e levando-me para dentro. — O que
aconteceu, Haven? Diga-me.
Ele me leva para o sofá. e eu só choro sem saber como dizer para ele
que estou grávida de seu filho e que vou fazer depois. Quando estou na
frente dele, isso tem o poder de me desarmar de uma maneira que é quase
bizarra. Na minha cabeça eu tinha pensado em mil maneiras de argumentar
com ele.
Eu diria a ele que iria viajar e retirar o bebê. Era meu direito, não era?
Mas agora eu estou desmoronando. A dor de cortar fora de mim um pedaço
nosso, algo que fizemos juntos, não é fácil como eu achei que seria. Eu jurei
a mim mesma, muitas vezes no passado, que no dia que eu engravidasse eu
faria um aborto, e na minha cabeça isso seria fácil, pois me sentia tão certa
das minhas convicções. E agora eu estou sentindo como se fosse a bruxa má
que ele me acusava de ser em nossas brigas.
Por que eu simplesmente não fui direto, sem avisá-lo disso? Ele nunca
saberia, mas aqui estava eu.
— Você está me matando aqui, Haven. Por favor, me diga o que está
acontecendo — pede Christian, angustiado e, sem saber como iniciar a
conversa, eu falo a primeira coisa que vem à minha mente.
— Eu não posso… — Minha voz sai em um balbucio descontrolado,
inseguro, e não sou assim. Agora tudo me deixa fraca, e odeio me sentir
sem controle da minha própria vida. A minha vida inteira foi sobre ser
manipulada e abusada de maneiras que eu não quero nunca mais sentir.
Christian se agacha na minha frente, onde estou sentada, segurando
minhas mãos pequenas nas suas grandes e quentes. As minhas mãos estão
frias como as de um cadáver, e quero levantar-me e fugir daqui e apagar de
sua memória que estive aqui para arrancar o seu coração do peito e esmagá-
lo debaixo do meu salto.
— Sabe que pode me dizer qualquer coisa, querida. Não importa que
tenha cometido um assassinato. — Ele tira as lágrimas do meu rosto com
seus polegares e segura meu rosto em suas mãos. — Eu vou esconder o
corpo para você, se for isso que você me pedir.
Eu sei que ele está tentando fazer algum tipo de graça, mas também sei
que ele está falando mortalmente sério. Por isso sempre íamos orbitar ao
redor um do outro, porque somos um time, mesmo que desajustado.
— Aconteceu uma coisa — começo, fechando os olhos e buscando
forças para continuar falando. — Deve ter sido em umas daquelas tantas
vezes que fizemos sexo. É claro que deve ter sido quando fizemos sexo. O
que estou dizendo é que é claro que foi fazendo sexo sem proteção, porque
eu tomo minha pílula sempre e…
— Do que está falando, Haven?
Ele corta meu balbuciar sem sentido e olho para ele e despejo:— Estou
grávida, Christian.
Ele paralisa à minha frente, nenhum músculo se mexe no que parece
uma eternidade, e estou com medo de que ele tenha tido um mal súbito, e
toco seu rosto. — Diga algo, por favor.
Ele fica em pé tão de repente que vou para trás. Christian começa a
andar de um lado para o outro como um louco, suas mãos no cabelo, que já
está uma bagunça, apontando para todos os lados, as mechas loiro-escuras
com as marcas de dedos frenéticos.
— Você está grávida. — Ele para, me olhando como se eu tivesse duas
cabeças ou fosse a Medusa.
— Aparentemente sim, mas…
Ele vem para mim novamente, me faz levantar e me abraça com tanta
força que sinto minha respiração falhar.
— Puta que pariu, Haven! Foda-se! — ele pragueja e me afasta um
pouco de seu corpo duro e segura meu rosto entre as mãos. — Porra, amor!
— Ele me beija sem deixar que eu fale. Eu sabia que ele ia surtar de
felicidade, mas também sei que vai me odiar quando eu terminar de falar o
que vim dizer. Eu sou um monstro, e ele irá me odiar para sempre. Ele
enche meu rosto de beijos, e sua felicidade está me matando.
— Christian…?
— Podemos nos casar novamente. Podemos fazer isso amanhã, se eu
conseguir fazer Domênico mexer uns pauzinhos…
— Christian?!
— O quê? É muito rápido? Quer outro casamento na igreja? Ou
podemos apenas ir a Vegas e resolver isso.
— Eu não posso.
— Não quer casar? Eu entendo, já fizemos isso antes e pode ser muito
para você, ainda mais quando foi por isso que nos separamos… Quer dizer,
por você não cogitar a ideia de um bebê nosso…
Algo clica em meio à sua torrente de palavras.
— Você não pode o quê? — A luz que havia em seus olhos azuis vai se
apagando quando ele toma ciência do que eu posso dizer a seguir.
— Você sabe que não quero ser mãe, Christian — digo, um nó na
garganta, lágrimas jorrando como uma maldita cachoeira. — Eu quero
interromper a gravidez.
As palavras saem como chumbo de minha boca e, enquanto as digo, eu
vejo que poderia muito bem ter atirado em Christian com um canhão.
Ele recua como se eu tivesse batido nele.
Eu nunca tinha visto esse olhar de nojo em seu rosto como agora.
Quero pegar minhas palavras de volta, mas não posso.
— Como pode…? — Sua voz sai rouca, emoções de todo tipo
transformando suas feições. — Eu quero meu filho, Haven!
— Por favor, Christian.
— Por favor, Christian? Por favor, Christian? — ele berra, se afastando
de mim como se eu fosse uma maldita leprosa. — Não vai fazer isso, eu
juro, Haven…
— Eu tomei uma decisão, Christian.
— Se fizer isso conosco, com nosso filho, eu não sei o que farei,
Haven — rosna com tanta fúria que me choca. — Eu não sei o que vou
fazer se matar nosso filho.
— Eu…
— Quem é você, porra?! — Ele caminha para trás. — Eu preciso de ar,
esse aqui está me intoxicando.
— Não saia assim, amor…
— Não me chame de amor — rosna novamente —, ou não me
responsabilizo por mim. Estou a ponto de…
Ele para, me olhando com tanta raiva em seus olhos azuis que me
encolho como se atingida por uma tonelada de concreto. Ele nunca me
olhou assim antes. Se antes ele dizia que me odiava quando discutíamos e
eu não acreditava, agora, nesse momento, eu acredito que ele realmente me
odeia.
— Como pode o rejeitar assim? — pergunta com nojo e meu soluço
me quebra mais como se estivesse me despeçando.
Ele sai, e fico sentada em sua sala. Husky vem e sobe no sofá e se
deita em meu colo. Ele choraminga, e isso faz a cachoeira de lágrimas
aumentar.
Eu destruí o resto de amor que Christian poderia ainda sentir por mim.
Eu deveria me levantar e sair, mas não faço nada disso. Eu abraço Husky, o
único ser no planeta que não me julga agora.
— Por favor, amorzinho, me diz, o que devo fazer?
Mas ele não pode me dar a resposta.
CAPÍTULO 17

Pego o carro e dirijo sem rumo por uma boa meia hora, raiva
borbulhando por dentro. Eu nunca tive raiva de verdade de Haven. Quando
ela pediu o divórcio, acabando com o que restava do nosso casamento, eu
não a odiei. Eu não podia, mas estou sentindo agora um ódio tão grande que
minhas mãos estão doendo em volta do volante. Como ela pôde? Como ela
pôde pensar, cogitar, dar fim a algo que criamos juntos? Como ela pôde
pensar em destruir isso?
Esmurro o volante e grito de frustração.
Eu nunca fui um homem que chorava, eu era o brincalhão, de bom
humor, e muitas vezes era o cara frio que tomava as decisões em uma
empresa que dependia de minha frieza, mas nesse momento meus olhos
ardem, as lágrimas se acumulando.
Paro em um bar antes que eu cause um acidente e entro. Eu preciso
beber algo forte, ou vou acabar chorando feito um bebê. Eu preciso me
distanciar dos meus sentimentos.
Sento-me à mesa, e o garçom se aproxima e peço uma garrafa de
conhaque. Sem pensar muito, ou enlouqueceria, eu encho o copo e o
entorno como se fosse água. A única coisa que quero é entorpecer tudo por
dentro e não sentir nada.
Pego meu celular e ligo para meu melhor amigo. Eu não quero ficar
sozinho, ou faria algo estúpido.
— É melhor você ter uma razão muito boa para me ligar agora,
Christian. — A voz de Rafael é cortante, e ele deve estar fodendo sua
esposa muito feliz. Eu não consigo falar, o nó raivoso é do tamanho de uma
melancia, e não consigo concatenar uma ideia. — Christian?
Eu bebo o resto do copo que estava pela metade e engulo o conhaque
que já nem queima mais quando desce limpo por minha garganta.
— Christian? Cara, aconteceu alguma coisa? — A voz de Rafael agora
soa preocupada. Olho ao redor, tentando ver qual o nome do bar que estou.
Aceno para o garçom para ele vir à minha mesa.
— Estou em um bar. — Minha voz sai com muito esforço. O garçom
se aproxima da minha mesa. — Qual o endereço desse lugar?
Ele fala o nome do lugar do qual eu não sabia e o endereço, que repito
para Rafael. — Você pode vir aqui?
— Chris, o que está fazendo aí? — pergunta ele, e escuto a voz de
Aurora ao fundo, e peço desculpas a ela mentalmente por tirar seu marido
da cama no meio da noite.
— Eu preciso… — Fecho meus olhos com força. — Conversar.
— Tudo bem, chego em breve.
Desligo o celular e volto a encher meu copo.
Não vejo o tempo passar, e a próxima coisa que vejo é Rafael
sentando-se à minha frente.
— Ei, vá devagar com essa garrafa! — Ele afasta meu elixir
entorpecente, e tento pegá-la de volta.
— Dê-me isso aqui. — Minhas palavras são arrastadas, e não consigo
alcançar a garrafa dele.
— Você me tirou da cama para vir ao outro lado da cidade para
conversar no meio da noite, e não vai conseguir se estiver bêbado como um
gambá, filho da puta! — vocifera ele, bravo. — O que diabos aconteceu
com você? Está querendo ter um coma alcoólico?
— Eu não me importaria — manifesto, minha voz embolada. — Eu a
odeio, porra!
— Eu não acredito, isso é por causa de sua ex-mulher? Sério,
Christian? Me tirou da cama no meio da noite, quando minha mulher pode
ter o bebê a qualquer momento, para vir aqui ouvir você reclamar de
Haven?
Ele está certo em estar bravo, eu sou um bosta que não sei o que fazer
com minha ex-mulher.
— Vamos lá, vou te levar para casa — declara ele, se levantando, mas
eu o impeço com minhas próximas palavras.
— Haven vai abortar meu filho! — Minha voz sai em um grunhido.
Haven podia ter um tesão do caralho por meu pau, mas ela não me ama,
nunca amou, e ela está provando isso agora. — Ela está grávida.
— O quê? — Rafael volta a sentar-se e parece estupefato.
— Ela nunca me amou e agora está provando isso mais que nunca.
— Por que ela faria isso?
— Ela não quer filhos, tipo, nunca — exprimo, desolado. — Nosso
casamento acabou por causa disso, e agora, definitivamente, ela sairá da
minha vida. Eu a quero longe de mim, porra!
Bato na mesa com o punho fechado, e Rafael coloca a mão no meu
braço, me parando de destruir a mesa.
— Se acalme, Christian!
— Como posso, irmão? — Olho para ele, o cara que é mais que um
irmão para mim, e devo estar uma merda. Estou igual a uma mulherzinha,
choramingando. — Isso está me destruindo.
— Por que não conversam? Se ela não quer o filho e você quer, não
tem nenhum direito? Ela pode te dar o bebê quando nascer — ele raciocina,
— Ela já decidiu, e não posso obrigar ela a nada. Eu não poderia.
— A convença de que vale a pena, vocês dois fazem tudo, menos
conversar, puta que pariu!
— Quando casei com ela, ela me disse que eu teria que me contentar
apenas com ela, que ela nunca iria querer ter filhos. Ela, de início, nem
queria casar comigo, ela rejeitou meu pedido, dizendo que nunca casaria
com homem nenhum, porque ela não poderia lhe dar um filho no futuro. Eu
estava apaixonado, louco por ela, e simplesmente concordei, e no fundo eu
dizia a mim mesmo: o amor que sinto por ela irá fazer com que ela mude de
ideia. — As palavras jorram como ácido dos meus lábios. — Eu, tolo,
acreditei que o amor a faria mudar de ideia, e tentei, ao longo do tempo,
colocar a sementinha na cabeça de Haven, mas o passado dela sempre foi
mais forte. A raiva que ela carrega dentro de si é maior que o amor que ela
sentia por mim.
— Isso é triste, cara. — Rafael bate no meu ombro. — E onde está ela
agora?
— Não sei, eu apenas precisava sair. Se ficasse mais um minuto na
mesma sala que ela, eu não sei o que teria feito — revelo, envergonhado de
que eu tenha perdido o controle assim. — Ela ficou no meu apartamento.
Por tudo que sei, ela já deve estar a caminho de alguma clínica clandestina
para tirar o nosso filho.
— Você quer ir para minha casa, ficar lá o resto da noite, e amanhã
voltar para casa e tentar convencê-la? Você a conquistou da primeira vez,
Christian.
— Esse assunto é como a criptonita do nosso casamento.
— Por que ela não quer filhos, afinal? Pensei que toda mulher quisesse
isso, que fosse tudo o que elas pensam quando encontram o cara com quem
querem se casar.
— A mãe de Haven fodeu com a cabeça dela, irmão. Ela, desde que
era um bebê, foi usada pela mãe como um fantoche para suprir a frustração
de não ter conseguido ser a modelo ou a Miss que ela tanto desejava, por
causa da gravidez acidental que foi Haven. — Olho o fundo do meu copo e
faço sinal para Rafael enchê-lo, já que ele confiscou minha garrafa. — Você
lembra quando a conheci? Ela era completamente inocente com homens.
Ela tinha dezenove anos e nunca tinha nem beijado, porque nunca foi
permitido que ela tivesse uma infância normal e muito menos uma
adolescência normal. Eu fui o único homem dela em tudo.
Rafael fica calado, me deixando tentar justificar as atitudes de Haven.
Porra, eu compreendia sua decisão, mas nunca realmente aceitei como
sendo definitiva. Eu tinha esperanças de que um dia eu conseguisse fazê-la
ver o quão linda ela era, e que seria uma mãe perfeita, e até nisso eu falhei
miseravelmente.
— Eu falhei com ela, com meu casamento, e estou falhando com meu
filho, irmão. — Raiva pura me queima, e quero socar a porra do mundo ao
redor.
— Nada disso é culpa sua, Christian. Haven só precisa de tempo para
aceitar, talvez.
— Você não a viu, a determinação dela de tirar o meu filho.
— Vamos lá, vou te levar para casa e não vai beber mais hoje. Chega!
CAPÍTULO 18

— Dona Haven? — A voz de Glória é baixa e cautelosa, e abro os


olhos para encontrá-la debruçada na minha direção. — Bom dia.
Levanto, desorientada, e percebo que não fui embora e estou ainda
deitada no sofá de Christian, com Husky ainda enrolado comigo, e já é de
manhã. Deus, eu estou quase matando o cachorro em cima dele, do jeito
que estava.
— Bom dia, Glória. — Afago Husky, que está agora muito esperto me
olhando, e apesar de sentir que o peso do mundo está sobre mim, ainda
tenho vontade de sorrir com o pensamento de Husky estar pensando com
esse olhar dele: Será que essa chorona vai me encharcar de lágrimas de
novo?
— A senhora dormiu aí? — Glória pergunta, espantada. — Oh, que
pergunta a minha, pelo jeito dormiu mesmo, e esse menino deve ter
adorado, hein? —diz ela para Husky.
— Você viu Christian? — pergunto, cautelosa.
— Acho que ele não está aqui, essa hora ele já teria levantado e ido
passear com Husky. — Ela me olha. — Desculpe me intrometer, mas vocês
brigaram de novo?
Um nó se forma na minha garganta, de preocupação com Christian
agora. Ele não voltou? Será que aconteceu alguma coisa? Não sei se é a
agitação dentro de mim que me faz levantar e correr para o banheiro, mas
eu não chego lá. O chão cede debaixo de mim e tudo escurece.
A próxima coisa que vejo é o rosto de uma desconhecida acima de
mim. Estou em um hospital?
— A senhora acordou — diz a mulher. — Sou a enfermeira Meire, a
senhora desmaiou e o socorro a trouxe para o hospital.
— O quê… — Minha voz está áspera e rouca.
Tem um cateter ligado à minha mão e meus olhos sobem para a bolsa
de soro.
— Está desidratada, e na condição que está é bem natural ter desmaios.
— Ela verifica minha pressão arterial. — Quando foi a última vez que se
alimentou?
— Eu não lembro… — Ontem eu não comi nada o dia todo, e no dia
anterior eu mal tinha tocado no milkshake que Elana comprou para mim.
— Deveria se cuidar mais, mãe, você precisará de forças para levar
esse pequeno até os nove meses. — Ela sorri, benevolente. — E se está se
perguntando se está tudo bem com ele, sim, ele está perfeito. — Ela faz
uma pausa. — Você quer comer alguma coisa? Para ser sincera, eu já pedi
comida para você e não quero saber de recusa, mãe. Deve se alimentar.
De todas as palavras que ela disse, eu registrei apenas a que dizia que o
bebê estava bem, e não compreendi, diante do que eu desejei fazer, a onda
de alívio por saber que tudo estava bem com ele, o que era bem
contraditório.
Eu estava parando de rejeitá-lo?
Antes que eu diga alguma coisa, a porta se abre e Glória entra com ar
preocupado.
— A senhora acordou, dona Haven. Oh, minha nossa Senhora, a
senhora quase me matou de susto, e quando soube que estava grávida quase
morri de vez. — Ela vem para perto da cama. — O senhor Christian está
vindo, ele dormiu na casa do senhor Rafael e estava com o celular
descarregado, mas quando ele chegou em casa disseram a ele que estava
aqui. Ele me ligou agorinha mesmo, ele está meio doido.
Ela jorra as palavras, e a enfermeira ri.
— Obrigada, Glória — digo quase em um sussurro.
— A senhora está bem mesmo?
— A senhora Haven aqui só está desidratada e precisando se cuidar
mais, ou pode adoecer de verdade — a enfermeira ralha.
— Estou tão feliz pela senhora e pelo senhor Christian — Glória
exclama, toda feliz, e não digo nada sobre interromper a gravidez, não
quero tirar esse sorriso dela. Ela se vira para a enfermeira. — Não se
preocupe, enfermeira, vamos cuidar dela.
Eu não mereço o carinho dela.
— Vou providenciar o seu café da manhã — a enfermeira diz para
mim, já a caminho da porta, que se abre e Christian aparece no limiar. Ele
está todo desgrenhado, e nunca o vi assim, com os olhos vermelhos e a
roupa abarrotada. Eu fiz isso com ele.
Seus olhos encontram os meus, e engulo em seco. A enfermeira dá
passagem para ele entrar, e Glória corre para fora do quarto, nos deixando a
sós. Ele se aproxima da cama devagar.
Sem dizer uma palavra, ele pega a minha mão que está livre do cateter
e entrelaça nossos dedos.
— Você está bem? — Sua voz está rouca, grossa e preocupada. Os
olhos dele caem para meu ventre, que está coberto por um lençol do
hospital, e depois voltam para meu rosto. As emoções em seu rosto me
quebram em pequenos pedaços.
— Acho que sim — balbucio.
— O que aconteceu? O bebê…? — Ele para, talvez sem saber como
perguntar. Isso é tão triste. Seu primeiro filho deveria ser motivo de festa
para ele e a mulher com quem ele escolheu tê-los, em vez disso, a vida me
levou para ele. Uma sem coração.
— Acho que fiquei muito tempo sem me alimentar e… — digo e
desvio meus olhos dele quando falo: — O bebê, ele está bem.
Christian acena com a cabeça, o rosto taciturno e as feições fechadas.
O silêncio é ensurdecedor, e não aguentando mais, digo:
— Eu sinto muito.
— Você confia em mim, Haven? — Christian pergunta.
— Sabe que sim.
— Sabe que nunca mentiria para você, não é?
— Eu sei. — A única vez que não acreditei muito nele foi quando ele
disse que não dormiu com as mulheres com quem saiu nesse ano que
estamos divorciados, mas depois que ele me olhou nos olhos e me garantiu
que nunca levou nenhuma mulher para a cama, eu acreditei nele, e acreditei
também quando ele disse que tinha toda intenção de dormir com elas para
me esquecer.
— Você confiaria em mim para cuidar de você e do nosso filho? Você
confiaria em mim para garantir que será a melhor mãe do mundo para esse
serzinho aqui dentro? — Ele espalma a mão no meu ventre e acaricia minha
barriga com tanto amor que desabo a chorar como uma criança. Soluços
altos me cortam, e ele se curva, me tomando em seus braços.
— Christian…
— Por favor, não acabe com o que criamos juntos, minha Bruxinha —
diz ele, a voz abafada nos meus cabelos, o que só me faz chorar mais. —
Shhh, vai ficar tudo bem, eu vou cuidar dos dois, eu juro, Haven. Se até ter
o bebê você não o quiser, o desejar, pode deixá-lo comigo e irei cuidar dele
longe de você, se assim for seu desejo.
Não consigo falar, e apenas as lágrimas me tomam mais forte, mas eu
me agarro a ele como a uma boia salva-vidas. Ficamos lá até meus soluços
diminuírem e cessarem, mas ainda fico grudada nele. Uma batida na porta e
a voz da enfermeira ainda não me fazem me afastar dele.
— Seu café da manhã, Haven. — Escuto-a dizer, mas não tiro minha
cara do peito de Christian. — Está tudo bem?
— Sim — responde Christian para ela.
— Ela tem de comer, ficar muito tempo sem se alimentar não faz bem
nem para ela nem para o bebê — continua. — Vou deixa vocês. Quando o
soro acabar, certamente o médico te mandará para casa.
— Obrigado — diz Christian.
Quando escuto a porta bater na saída da enfermeira, Christian me
afasta dele e aponta para a bandeja.
— Coma, Haven. — É um comando, e reviro os olhos para seus
modos de macho alfa. — Ou a farei engolir cada pedaço.
— Você estava todo fofo faz nem meio minuto — reclamo. Limpando
as lágrimas dos meus olhos, encaro a bandeja, e nada nela me agrada. —
Posso ter um milk-shake?
— Milk-shake é bebida de criança e não um alimento de uma grávida
— diz como se entendesse tudo sobre gravidez de uma hora para outra.
— Mas é a única coisa que como que fica dentro, Christian —
argumento.
— Tente, se não conseguir comer, conseguirei todo os milk-shakes
dessa cidade para você. — Ele está mortalmente sério, e eu não gosto dele
assim, todo frio. Nem parece o homem de cinco minutos atrás.
— Você é tão teimoso!
— Só quero que fique bem.
Ele traz a bandeja para mim, e me sento mais confortável. A bandeja
tem frutas, iogurte, suco e torradas. Pego o iogurte e a colher, talvez esse
fique no meu estômago. Christian se senta na beirada da cama e me olha
intensamente, sem dizer nada. É enervante.
— Estou comendo — digo, exasperada, quando não aguento mais ele
me encarando. — Você está esquisito, me olhando sem dizer nada.
Ele não tem oportunidade para responder, porque Glória volta ao
quarto.
— Senhor Christian, já que está aqui com a dona Haven, eu vou voltar
para casa. — Ela vem e para ao pé da cama. — Oh, vejo que parece bem
melhor.
— Obrigado, Glória — fala Christian, se voltando para ela. — Você
pode ir, sim. Husky deve estar louco sozinho, depois de toda a confusão.
— Ele ficou reclamando quando saímos. Tadinho, deve ter ficado
preocupado com a dona Haven. — Ela acaricia meu pé. — Você se cuide,
menina, esse bebê precisa de você agora. Tem de se cuidar, porque você é a
única que pode cuidar dele como ninguém jamais cuidará. Filhos são uma
benção, verá que agora os dois vão se acertar de vez — ela fala como se
soubesse o que eu estava planejando fazer. Será que Christian disse a ela?
Olho para ele de relance, e ele está me olhando atentamente. — Será uma
mãe maravilhosa, se já é uma mãe de pet incrível, imagina de um bebê de
verdade. Mal posso esperar.
Quando ela sai depois de se despedir, ela deixa para trás um silêncio de
cortar de faca de tão denso.
As palavras dela me tocam. E sem que tome ciência, minha mão cobre
minha barriga. Eu seria tudo isso mesmo? Ou seria um ser monstruoso para
ele?
Você está sendo um monstro em nem o deixar nascer, diz uma voz
dentro de mim, e tremo.
— Tudo bem? — Christian pergunta, tocando meu braço.
— Não sei. — Estou sendo brutalmente honesta, eu não sei se estou
bem.
— Coma mais um pouco. — Ele coloca pedaços de frutas cortadas em
cubinhos perto da minha boca e levanta as sobrancelhas inquisitivamente
para mim. Reviro meus olhos e abro a boca, comendo a fruta.
— Você é tão mandão!
— Não viu nada.
— Claro que vi, convivo há anos com você.
— Não parece. — Ele tira uma mexa de cabelo do meu rosto e resvala
os dedos na minha bochecha.
— Você contou para ela sobre eu não querer filhos? — questiono antes
que ele empurre mais fruta na minha boca.
— Claro que não, Haven, mas ela está conosco há anos, deve ter
escutado isso em algumas de nossas discussões.
— Não acredito que ela tenha escutado, nunca ficamos berrando isso
para o mundo.
— Então pergunte para ela, mulher! — diz ele, exasperado.
Ficamos em silêncio novamente.
— Nós vamos ficar assim? Tensos um com o outro de agora em
diante?
— Só se você quiser, Haven. Estou disposto a tudo para que fique
bem.
Assinto e empurro a bandeja de comida para ele.
— Chega.
— Tome o suco.
— Dispenso. Se eu tomar isso, provavelmente irei colocar tudo para
fora. Melhor garantir o que entrou.
— Tudo bem — diz, resignado.
— Você não precisava vir, sabe? Devo ter tirado você do seu trabalho
hoje.
— Nem sei por que estou escutando isso. Mesmo que não sejamos
casados, Haven, ainda me sinto assim. Além do fato de que está carregando
meu filho, porra!
Não digo nada, e ele se senta ao lado da minha cama, e por incrível
que pareça, o sono vem. Têm sido dois dias sem dormir e sem comer, deve
ser por isso que adormeço com Christian velando meu sono.
E saber que ele está ali me deixa mais tranquila, e essa sensação de
segurança, que tinha desaparecido desde que me descobri grávida, começa a
voltar.
Ele não me deixaria sozinha, não é?
CAPÍTULO 19

Ela está calada. Não me disse nem que sim, nem que não sobre
minha proposta de ter o bebê e depois o deixar comigo, se assim ela
almejasse.
Levo-a para meu apartamento no fim da tarde, depois que o médico a
liberou com recomendações de que ela deve se alimentar e beber bastante
água. E cuidar de ir a um obstetra para cuidar do pré-natal do bebê, mas a
dúvida é: ela vai aceitar? Quanto tempo eu teria até ela fugir e fazer um
aborto? No momento, eu não confio nela.
— Christian, eu não acho que devo ficar aqui — reclama ela quando
estaciono o carro na garagem. — Não sou sua reponsabilidade, já sou bem
grandinha.
— Tão responsável que não soube dizer ao médico qual foi a última
vez que se alimentou? — Viro-me para ela. — Ficará aqui, e Glória ficará
de olho em você quando eu não estiver por perto, bruxa. Eu não vou estar
muito longe.
— Por que tenho a impressão de que estou entrando em uma prisão?
— Não está presa, bruxa, apenas não quero você sozinha quando não
faz nada para se cuidar.
— Foram apenas dois dias sem me alimentar, Christian, não um mês
— esbraveja, abrindo a porta do carro para descer, mas a seguro no lugar.
— Eu disse que ia cuidar de você e do nosso bebê, não disse? — Seus
lábios se abrem, e ela me olha com esses olhos azuis translúcidos que
causam um furor quente dentro de mim. Meu pau engrossa apenas pela
intensidade com que ela me examina. Tento pensar em algo ruim, porque
nem é hora de ter uma ereção, mas o pensamento dela grávida do meu filho
e a visão desses olhos lindos me deixam fora de mim.
Depois que me acalmei e me deitei no quarto de hóspedes de Rafael,
eu cheguei à conclusão de que, no fundo, Haven não queria interromper a
gravidez, ela só tem essa ideia plantada por ela mesma na cabeça de nunca
querer ter filhos. Se fosse algo que ela não se importasse, se ela fosse esse
ser humano que não se importava com nosso filho, ela teria abortado sem
me dizer, e eu nunca saberia, mas ela veio sabendo que eu me oporia e a
impediria de ir até o fim.
Encontrá-la chorando na minha porta significava um pedido de ajuda,
dizendo que se importava. Ela veio até mim, e eu saí como um louco
querendo me intoxicar de álcool até entrar em coma. Eu só precisava ser
paciente e saber levar Haven.
No passado, estava tão concentrado em mim mesmo, querendo que ela
cedesse para construirmos a nossa família, que a deixei saber o quanto me
sentia desapontado, o que só a fez me pedir o divórcio porque achava que
era o que eu queria, e eu, orgulhoso pra caralho, deixei-me levar. Eu ia
recuperar Haven e, por tabela, nosso filho. Eu a farei mudar de ideia,
contudo, não tenho tanto tempo.
— Mas eu…
— Sem discussão, vamos subir — a interrompo, um pouco duro.
Minha bruxa de cabelo de fogo às vezes gosta de receber ordens minhas. —
Está decidido, você fica ou eu vou ficar com você. Não há meio termo,
bruxa!
— Odeio você!
Ela desce sem esperar que eu a ajude a descer. Corro e a guio para o
elevador e a puxo para meu peito. Não darei espaço para ela recuar, irei
marcar pesado até eu tê-la completa para mim.
Eu nunca tive Haven cem por cento. Tolo, achei que tinha, e quando
ela pediu o divórcio, foi uma declaração que eu só possuía parte dela.
— Sabe que esse ódio todo é amor, não é? — pergunto, com a boca
encostada em sua orelha. Se ela acha que eu vou ser um imbecil com ela, eu
ia matar Haven de gentileza, porra.
— Se você diz — resmunga, mal-humorada.
Seguro forte sua nuca e empurro sua cabeça para trás, expondo esse
pescoço lindo, e deslizo a língua embaixo de sua orelha, mordendo forte e
fazendo-a reclamar da dor. Alivio o desconforto com a língua. Arrepios se
alastram por sua pele, e ela choraminga, expondo mais para meu ataque.
— Diga que você não quer, porra! Diga-me qualquer mentira que você
me deseja contar hoje, bruxa, mas eu não vou acreditar em nada que você
falar, porque eu tenho certeza de que se eu verificar agora, essa boceta
apertada estará pingando por minha língua, meus dedos, meu pau…
— Christian… — ela choraminga.
O elevador chega ao destino, e Haven está meio mole em meus braços.
Linda mentirosa. Praticamente a carrego para dentro, pena que ela está
fragilizada, ou teríamos uma festa hoje.
Minha raiva por essa mulher, não dura muito.
Glória espera com Husky na porta. Meu menino quase nos derruba no
chão com a festa, o rabo parece que vai sair do corpo de tanto ser abanado
freneticamente. Haven o enche de beijos, e vejo Husky praticamente rindo,
se cachorro sorrisse. Ele late como se desse boas-vindas a ela.
— Ele esteve ansioso o dia todo — Glória diz, rindo da festa canina.
— Bem-vinda de volta, dona Haven.
— Glória, não exagere, parece até que estou voltando dos mortos, e
não de um desmaio.
— Não brinque com isso, dona Haven, atrai azar ficar falando coisas
ruins.
Enquanto elas falam chamo Husky, que tem a língua de fora esperando
por minha atenção.
— Ei, garoto! Venha cá. — Ajoelho-me, e ele pula em mim,
lambendo-me todo. — Ei, vamos com calma.
Ao mesmo tempo que dou atenção ao meu garoto, vejo Haven
caminhar para a sala com Glória em seus calcanhares.
— Preparei um jantar leve para você. Como sei que está enjoando
comida, fiz uma sopinha bem leve e, claro, vou preparar todos os milk-
shakes que esse bebê desejar. — Glória sai vomitando as palavras, e vejo
Haven travar.
— Eu não quero nada, Glória, obrigada. Estou bem. Na verdade, me
sinto ótima.
— Que ótima notícia. Posso servir o jantar?
— Só vou tomar um banho, Glória — diz Haven — Serei rápida.
Ela sobe as escadas, e fico olhando-a desaparecer, indo em direção ao
meu quarto.
— Você pegou as roupas dela? — pergunto para Glória, que ainda está
de pé esperando minha dispensa.
— Sim, fiz uma mala e as trouxe.
— Em vinte minutos sirva o jantar, dona Haven descerá em breve —
digo, já começando a subir as escadas atrás de Haven.
— Não seja tão duro com ela — diz ela, e não me dou o trabalho de
responder.
Entro no meu quarto e a encontro no meio do aposento. Ela está
apenas com uma calcinha e as mãos nos quadris, me olhando com fogo nos
olhos.
— Você invadiu minha casa? — Me distraio de seu rompante, porque
estou muito absorto em seus peitos perfeitamente lindos em exibição. Meus
olhos caem para a sua barriga, onde se abriga o meu filho, e desço para a
junção de suas coxas, que a calcinha transparente preta não deixa muito
para a imaginação. — Olhos aqui em cima, marujo!
— É claro, comandante! — Minha boca se abre em um sorriso
malicioso quando volto meu olhar lento e sensual para seu rosto. — O que
estava dizendo?
— Sério que invadiu minha casa?
— Ainda é nossa casa, mesmo que esteja em seu nome, sempre foi a
nossa casa. E, respondendo à sua pergunta, não a invadi. — Não estava
mentindo, porque Glória fez isso.
— E como uma mala cheia de roupas minhas apareceu bem aqui?
— Oh, isso. — Faço-me de desentendido.
— Sim, isso! Só vim para cá por essa noite, Christian, amanhã volto
para casa.
— Veremos. — Caminho até ela e seguro seu rosto nas minhas mãos.
— Tome um banho, porque Glória irá servir o jantar em vinte minutos.
Beijo seus lábios duramente, e ela ofega, mas empurro seu corpo
tentador para o banheiro. A deixo lá e vou ao quarto de hóspedes tomar um
banho também. Eu não iria arriscar tomar banho junto com ela, pois corria o
risco de fodê-la além da razão no chuveiro, e ela perderia o jantar. Ela e
meu filho precisam que eu pense com a cabeça de cima neste momento.
Depois do jantar, nos sentamos na sala enquanto Haven verifica seu
telefone com as mensagens de trabalho perdidas de hoje. Tento argumentar,
mas ela é tão teimosa. Tenho vontade de jogá-la nos ombros e levá-la para a
cama, para que descanse.
Em um dado momento, ela fica rígida. Husky levanta a cabeça,
parecendo sentir que Haven não está bem.
— Está tudo bem?
— Só algumas mensagens de spam. — Tenho vontade de pegar o
celular e saber quem foi o imbecil que a irritou.
— Não deveria estar preocupada com o celular a essa hora, deveria ir
descansar.
— Passei o dia na cama, Christian, não estou cansada.
— Assiste um filme comigo? — convido, tentando distrair sua atenção
do que a esteja incomodando. — Ou vai me mostrar quem está aborrecendo
você?
— É apenas uma mensagem da minha mãe — ela revela, e minha
mandíbula trava, rígida. Que momento para aquela mulher enviar
mensagens ofensivas para Haven.
Se Haven estiver cogitando desistir de interromper a gravidez, essa
mulher pode acabar com minhas esperanças, ela é completamente tóxica
quando se trata de Haven. Eu acredito que ela odeia Haven de verdade. Eu
nunca conheci a mulher, e nem quero, mas se ela se intrometer na vida de
Haven, juro que ela vai ter uma visita minha, porra!
Tiro o aparelho de seus dedos e o jogo longe.
— Chega de celular por hoje!
— Sério, Christian? Vai ser esse homem chato se eu ficar aqui?
— Está se aborrecendo, e quero você calminha.
— Está tão cuidadoso por causa do seu filho, não de mim.
— Nosso filho. Geramos ele, Haven.
— E não sei disso?
— Que bom que sabe. Então, o que sua mãe quer agora? O timing dela
é perfeito, hein?
— Aparentemente, ela só quer saber como estou, e, com isso, vem
todas as reclamações do quanto sou uma filha ingrata, que nunca a agradeci
por todos os sacrifícios que ela fez por mim desde que vim ao mundo.
— Não deixe sua mãe influenciar você mais do que ela fez a vida toda,
Haven. — Seguro seu rosto entre minhas palmas. — Ou juro que você terá
de ir me visitar na prisão por assassinato, e nem estou brincando.
E não estava brincando mesmo. Eu a mataria sem pestanejar por
magoar Haven mais do que já magoara. Maldita mulher.
— Não diga besteira, Christian.
— Venha aqui e esqueça essa mulher. Venha assistir algo comigo.
— Sabe que prefiro fazer outras coisas.
— Fique quieta, mulher!
Ela ri, e fico contente também, mas meu coração está pesado como
toneladas de jumbo. O relógio não para.
Beijo sua têmpora e a abraço contra meu peito.
— Christian?
— O quê, bruxa?
— Você é a única pessoa no mundo para mim, depois de Husky.
— Como você me lisonjeia, bruxa. Husky sempre em primeiro lugar.
— Falando nisso, como foi a reunião com nossos advogados? — Ela
pergunta, tínhamos uma reunião e ela não compareceu e acabou sendo
cancelada.
— Não teve.
— Eu vou desistir da ação — diz ela, e isso me faz olhar seu rosto.
Ela está de cenho franzido e tensa.
— Estive pensando que não é justo tirar ele de você.
— Você não iria tirar. Eu também estive pensando muito e cheguei à
conclusão de que você deveria ficar com ele por um ou dois dias na semana.
— Eu entendo que não queira compartilhar, e se você deixar, eu posso
vir pegá-lo às vezes.
Tenho vontade de dizer a ela que talvez ela não tenha que pegar Husky,
que ele estaria junto dela todos os dias. Eu só preciso manter Haven por
perto até ela voltar ao seu juízo perfeito.
— Assista, bruxa!
— Filme chato…
— É o Lobo de Wall Street! — Eu gosto desse filme, porra.
— Chato. Coloque algo romântico
No fim ela ganhou, e eu estou assistindo mais uma vez uma comédia
romântica sozinho, porque ela não demorou muito para fechar os olhos e
desmaiar no meu peito. Somos um monte no sofá, nós dois e Husky
enroscado junto a nós. Eu poderia me acostumar com isso de novo.
Haven tinha tanto poder nas mãos. Ela tem o poder de acabar comigo
de uma maneira que nem fazia a mínima ideia.

Desligo a televisão e, devagar, para não a acordar, saio de debaixo


dela, depois a pego nos braços e caminho para o quarto.
Husky trota atrás de nós dois e corre para a sua cama assim que abro a
porta do quarto.
— Boa noite, garoto — sussurro para ele, que me olha atentamente, a
cabeça em cima das patas.
Deito Haven na cama e retiro o roupão atoalhado que ela tinha vestido
depois do banho. Depois de cobri-la, tiro minhas próprias roupas e me deito
ao lado dela. Estendo minha mão e a coloco em sua barriga plana. Haven
odeia academia, ela vai poucas vezes se exercitar. Claro que quando
estávamos casados eu a fazia se exercitar comigo, mas ela poderia passar
uma vida sem entrar em uma academia que seria sempre assim, sem uma
grama de gordura a mais. Agora ela nem parecia que estava levando meu
bebê ali. Sem conseguir me conter, levanto-me e beijo sua barriga.
— Papai vai cuidar de você, anjo — digo baixinho. — Vou cuidar de
você e da mamãe. Ela não quer te fazer mal, ela só está apenas assustada.
Solto pequenos beijos, subindo para seus seios, que estão com os
mamilos duros, e sorrio. Acho que minha Bruxinha não está dormindo,
afinal. Passo a língua por um botão duro, depois pelo outro, e ela suspira.
Abocanho um mamilo e sugo forte dentro da minha boca, mordendo de leve
a carne tenra. Os dedos de Haven vêm para os meus cabelos, segurando
minha nuca, e ela arqueia as costas para mais.
— Christian… — choraminga quando abandono meu deleite a
contragosto e subo em direção à boca suculenta dela e a beijo
profundamente. Coloco meu corpo sobre o dela e coloco no beijo todos os
sentimentos que carrego por essa mulher e por nosso bebê agora. Ataco sua
boca, chupando sua língua com voracidade, e seus dedos me apertam, me
puxando para mais perto.
— Você quer mais, amor?
— Sabe que sempre quero seu pau, Christian. — Ela geme, e olho seu
rosto lindo. É tão bonita e tão quebrada, minha Bruxa. A casca que ela
mostra ao mundo é forte e imbatível, e apesar de conhecer como ela é por
trás dessa armadura, por vezes eu esqueço como Haven é frágil.
Desço meus lábios ao longo de seu corpo, e como sua boceta
gananciosa. Reverencio seu corpo com minha boca e depois com meu pau,
tão lento e suave que a tenho se contorcendo debaixo de mim, gemendo por
mais.
— Não pare, Christian… — Ela ergue seus quadris para me tomar
mais, e dou a ela tudo de mim, enquanto bato dentro de sua boceta
deliciosa. — Dê-me mais, mais… preciso de você.
Beijo-a forte e asperamente, beijo-a como se fosse meu último suspiro
na terra e ela fosse meu ar.
— Você é minha, Bruxa má. Diga que é minha! — Prendo suas mãos
acima da cabeça com uma mão e agarro sua garganta, levantando seu rosto,
e pairo sobre ela, dominando, tomando o que eu quero dela, de corpo. Eu
nem deveria estar fodendo-a assim, mas eu sempre perco o controle sobre
mim quando se trata de Haven. — Diga, Bruxa!
— Sou sua, apenas sua, Christian… — geme, enlouquecida.
— Isso mesmo, é minha e só minha — rosno e tomo-a mais forte,
furiosamente.
CAPÍTULO 20

— Tia Leticia, como está? — Prendo meu celular entre a orelha e o


ombro e seguro as caixas com livros e coisas para bebês que comprei e
estou trazendo para casa. Irei encher essa casa com toda tralha de bebês até
Haven só pensar em ter todos os bebês que eu conseguir colocar dentro
dela.
— Meu filho, estou bem. — Letícia é tia de Rafael e mora ainda em
Orlando. Ela o criou depois que sua mãe morreu. E eu e ele crescemos ao
redor dessa mulher incrível, mas ultimamente Rafael não tem ligado tanto
para ela. — Rafael está com você? Esse menino quase não me liga mais
desde que começou essa loucura de vingança. Coloque algum juízo nele,
Chris.
— Eu tento! Mas sabe como é quando ele coloca algo na cabeça, e a
vida dele toda foi sobre vingança. Mas agora ele tem uma mulher grávida
que dará à luz a qualquer momento.
— Queria estar aí! — diz ela, pesarosa.
— Você quer vir?
— Eu não vou para o Brasil há tantos anos, filho.
— Se você quiser, mandarei o avião da empresa trazer você — digo e
quase solto um palavrão quando luto com o botão do elevador. — Faremos
uma surpresa para Rafael, e conhecerá seu sobrinho-neto.
— Talvez Rafael não me queira aí, pois não concordo com suas
decisões.
— Tia Leticia, Rafael mudou, ele deve estar pensando em uma forma
de te ligar e pedir perdão por ser um idiota.
— Vou fazer as malas!
O elevador para na cobertura.
— Isso aí. Ligo para você com todas as informações sobre seu voo. —
Coloco as caixas em cima do aparador na entrada e seguro o celular.
— Deus te abençoe, menino. Amo você, querido.
— Amo você também!
Ela desliga e coloco o celular no bolso, e me viro para encontrar
Haven em pé, de braços cruzados e olhos soltando chispas de fogo para
mim.
— Quem você ama, senhor Davis? — Ela quase rosna para mim.
— Ei, você!
— Quem era ao telefone?
— Uma mulher — provoco. — Onde está Husky? — Ele não veio me
encontrar.
— Gloria foi dar uma volta com ele. Quase fui, mas ainda bem que
fiquei — diz, batendo o pé no chão, impaciente. — É melhor você me dizer
com quem… O que são todas essas coisas?
— Presentes para nosso filho. — Seus olhos se arregalam e ela
inconscientemente dá um passo para frente. — Vamos levar para sala. Estou
pensando em reformar um dos quartos para ele — digo, fazendo-a esquecer
da ligação. — Segure essas.
— Não dou um passo até você dizer a quem declarava amor ao
telefone.
— Você nem é ciumenta, Haven!
— Estou te avisando, Christian!
— Estou provocando você, mulher — digo, por fim. — Tia Leticia
deve vir para cá. Deve estar fazendo as malas agora.
— Oh! Você fala que ama alguém no telefone, só posso pensar
bobagens.
— Louca!
— O que comprou? — ela pergunta, curiosa, quando nos sentamos na
sala.
— Verá.
— Christian, antes que abra todas essas coisas, eu preciso te dizer algo.
— O quê? — Meu coração bambeia no peito. Espero que não seja
nada a ver com aborto.
— Vou voltar para o trabalho amanhã. Tenho compromissos, e não
tenho férias planejadas para agora.
— Ah, isso!
— Sim, isso. Você só me manterá aqui amarrada.
— Na cama? — pergunto, malicioso, e recebo um olhar furioso.
— A única coisa amarrada na cama vai ser suas bolas!
Finjo estremecer.
— Aí você pegou pesado, mulher!
Ela ri. É tão bom vê-la sem todo aquele choro acontecendo, eu odeio
vê-la chorando como esteve dias atrás. Eu deveria marcar um psiquiatra
para ela, mas Haven não gosta deles, e eu sempre fazia seus gostos.
— Estou de férias com você — argumento.
Eu não saí muito do lado dela nos últimos dias e tentei fazê-la não ir
trabalhar ou trabalhar daqui. Ela só ficava enjoada na parte da manhã, e o
estresse que a fez desmaiar estava mais controlado. Eu sabia que não ia
segurá-la em casa por muito tempo, ela tinha compromissos e Elana e
Kleber, o idiota que trabalhava com ela, estavam vindo todos os dias. Eu só
precisava que ela relaxasse e não ficasse muito longe de mim, e assim não
colocaria ideias negativas na cabeça.
— Você sabe que não estou doente, não é?
— Descanso, Haven. Não é preciso estar doente para descansar por
uma semana.
— Mas é preciso programar. E tenho compromisso com meus clientes.
Vou amanhã, ok? E não me venha com suas demandas. Anda tão mandão.
— E desde quando você me obedece?
— Estou fazendo isso agora, não estou? — Apesar de toda implicância
por eu não a deixar ir trabalhar, usando de todo meus argumentos, ela
acatou meu pedido. Contudo, eu via que ela não estava totalmente de
acordo em prosseguir com a gravidez. Ela estava no processo lento de
aceitação, mas só se passaram alguns dias. Eu só preciso de mais alguns
dias mostrando que pode ser algo maravilhoso.
— Tudo bem, mas eu não gosto da ideia.
— Não ficarei o dia todo, prometo. E prometo comer também.
— Hum, não confio muito em você tomando apenas milk-shake. Tem
de ir a um nutricionista.
— Você vai ficar assim por nove meses inteiros? — Ela cruza os
braços, carrancuda.
Sorrio de orelha a orelha quando beijo seus lábios. Ela nem percebe
que está aceitando a gravidez.
— Sim, nove meses inteiros mimando você — digo, uma emoção sem
igual correndo por mim. Ela é uma megera, mas é a minha megera. —
Bruxa! Não seja má.
— Argh! — Ela estende a mão. — Me mostre o que tem nesse monte
de caixa.
Abro as caixas com livros sobre gravidez, e ela folheia rapidamente
cada um.
— Por que tanto livro? — Ela pega o A Maternidade e o encontro com
a própria sombra e o examina rapidamente.
— Informação nunca é demais! — Coloco o famoso exemplar de O
que esperar quando você está esperando no coloco dela.
— Exagerado. Vou ler esse primeiro — diz para o livro que acabei de
colocar em seu colo.
— Aqui, abra essa. — Dou a ela uma caixa pequena azul com laço.
Ela balança a caixa antes de puxar o laço, revelando um sapatinho
branco, minúsculo e fofo. Quero que essas coisas despertem seus instintos
maternos.
Ela admira a coisinha na palma da mão por tanto tempo que me deixa
apreensivo.
— Oh! É tão minúsculo, Christian! — diz ela, a voz rouca e
embargada, e simplesmente desaba a chorar, me chocando. Oh, merda!
— Ei, querida. — Tiro todas as coisas que estão entre nós, a pego em
meus braços e carrego-a para longe e subo para meu quarto. Deito-me na
cama com ela, e ela chora silenciosamente enquanto aliso seus cabelos de
fogo entre meus dedos até o choro passar. — O que é isso? Tudo bem, não
gostou das coisas?
— Eu não sei o que deu em mim — balbucia, mas claro que ela sabe.
— As coisas têm sido tão intensas nos últimos dias que é… demais.
Afasto-me dela, me apoio nos cotovelos e pairo acima dela, olhando-a.
Suas mãos estão juntas no peito, e entre seus dedos estão os sapatinhos.
Cubro suas mãos com a minha.
— Tudo bem chorar, querida. Vamos devagar.
— Eu sou tão fraca, que me irrita.
— Você é linda — digo, abaixando e atacando seus lábios carnudos e
deliciosos com beijos escaldantes. Estava pronto para desfrutar de mais
dela, quando os latidos de Husky vêm da porta fechada.
Oh, ele voltou. Abro a porta para ele, e ele corre para cima da cama em
festa, como se tivesse passado uma eternidade longe. Ele lambe Haven até
ela reclamar de sua baba.
Quando ele se aquieta, deita a cabeça na barriga dela como se soubesse
que tem algo precioso lá dentro.
— Você sabe que vai ganhar um irmão, Husky? — Ele late e enfia o
focinho mais na barriga de Haven, como se estivesse dizendo que já sabia
disso. — Isso mesmo, garoto, espero que seja o melhor amigo dele.
O fugando de Haven volta.
CAPÍTULO 21

Dias depois…

Aurora teve o bebê, e eu não fui ao hospital, deixei para fazer uma
visita quando ela estivesse em casa. Minha rotina tem sido intensa essa
semana, Christian só desgrudou de mim para ir ao hospital visitá-los, afinal,
Rafael é o melhor amigo dele, e Christian também fez uma surpresa para o
amigo, trazendo sua tia dos EUA para visitar e conhecer o sobrinho-neto.
Christian desliga o carro na frente da casa, e o espero descer e abrir a
porta. O homem tem sido um chiclete desde que desmaiei na semana
passada. Ele tirou a semana de folga do trabalho e me paparica o dia todo.
Ele conseguiu o obstetra de Aurora para mim, e eu iria à primeira
consulta amanhã. Eu sabia que o tempo de interromper a gravidez estava
ficando mais curto, mas eu não tive coragem de ir até o fim. Na verdade, eu
não pensei nisso em nenhum momento dessa semana. Christian estava me
bombardeando com coisas de bebê o tempo todo, e eu me peguei
imaginando se seria uma menina ou menino, coisa que não tinha me
permitido pensar até que me vi fazendo isso. Eu ainda tinha uma resistência
de aceitação da gravidez que era mais forte que eu.
Rafael nos recebe na porta.
— Fico feliz que esteja aqui, Haven — diz quando caminhamos para a
sala, onde Aurora está sentada com o bebê no colo.
— Haven! Venha ver meu bebê! — Aurora chama, e caminho para
perto dela. Eu tinha zero contato com bebês, talvez tenha sido meu
inconsciente que me fez sempre ficar longe deles, e agora me sentia como
se me faltasse ar. Asfixia provocada por bebês existe?
Fico a uma boa distância, mas Aurora acena para me aproximar mais,
e me sento no sofá mais perto dela, mas ainda distante.
— Ele não morde — graceja ela. — Venha aqui e veja como ele é
lindo.
A contragosto, sento-me bem ao lado dela e olho o pacote em seus
braços, e um rosto rosado e rechonchudo espreita de lá.
— Tome aqui, eu não me importo que o segure. — Ela enfia o bebê em
meu colo, e o pego como se fosse uma bomba-relógio prestes a explodir,
mas o seguro com medo de que ele caia. Eu nunca segurei um bebê na
minha vida. Olho para baixo, e uma boquinha rosa mexe como se estivesse
chupando algo invisível. Ele tem cabelos pretos lisinhos e seus olhos estão
fechados, mas ele realmente é o bebê mais lindo que já vi. Bem, ele é o
único que vi de tão perto assim, de qualquer maneira.
— Quando descobrimos que estamos carregando um bebê dentro de
nós, é a coisa mais assustadora que uma mulher pode sentir — Aurora diz
ao meu lado, e não tiro meus olhos dele. — Quando soube que estava
grávida, separada de Rafael, fiquei sem saber qual atitude tomar, mas no dia
que vi seu coração batendo no ultrassom, eu não coube em mim de tanta
felicidade. Quando ouvir o coração do seu bebê, Haven, sentirá que é a
mulher mais invencível do mundo, sentirá que você é como uma
supermulher, que nada nesse mundo pode chegar para machucar o seu bebê
sem que você vire uma leoa para defendê-lo.
Sinto meus olhos ardendo, e quero entregar seu filho, levantar-me e
correr pela porta da frente e ficar longe de tudo isso. Christian deve ter
combinado com Aurora para ela me dizer essas coisas para me comover,
mas ele nem percebe que é o único que está me tocando, que me faz desejar
saber se estou carregando uma menina ou menino; ele é o único que está me
fazendo ver que sou capaz de mudar de ideia, quando antes nada me tirava
do meu objetivo. Que é o único que me faz vacilar e desejar ser uma mulher
diferente, mudar e ser melhor do que a mulher que me pôs no mundo.
Estou prestes a entregar o pacotinho fofo para Aurora, quando o bebê
abre os olhos e seu rosto enruga como se algo o incomodasse, e ele se estica
com um resmungo. Se contorce e ameaça um choro, se seu rostinho
vermelho for uma indicação.
— Você acordou, bebê? — falo sem nem perceber, a minha voz sai
baixinha para não o assustar. — Sou a tia Haven. Prazer em conhecer você,
homenzinho…
Ele para de se contorcer e presta atenção em minha voz, mas não
demora muito e seu rostinho fica novamente vermelho, e agora solta um
miado como um gatinho recém-nascido, mas isso começa a crescer e o
choro é forte agora.
Jesus! Os pulmões dele são potentes.
Meus olhos assustados se levantam para Aurora, que tem um sorriso
enorme no rosto. Ela estende os braços e pega o pequeno gritador neles.
— Ele acorda assim, faminto pelo tetê da mamãe.
— Garoto esperto! — Esse é Rafael se aproximando. Ele se inclina
para sua família e acaricia seu filho e esposa com amor. A cena é tão
singela.
Meus olhos vão para Christian, o encontrando com os olhos fixos em
mim. Dou a ele um sorriso de lábios apertados, e ganho de volta um sorriso
de parar meu coração.
É tão nítida a diferença entre nós dois apenas com essa troca. Enquanto
me contenho, Christian parece entregar tudo dele.
— Vamos tomar uma bebida, irmão. — Rafael convida Christian, e os
dois desaparecem dentro da casa, nos deixando sozinhas.
Aurora se senta confortável, e ali mesmo ela começa a amamentar seu
bebê. Assisto, fascinada, ela ajeitar o filho no colo e abrir a blusa e começar
a amamentar. O pequeno gritador agora faz um barulho satisfeito quando
agarra o peito da mãe. Sorrio com a cena tão íntima entre mãe e filho, ele
parece tão faminto. Sinto-me quente como se tivesse fogo na minha pele,
deve ser o constrangimento por estar vendo os seios de Aurora.
— Eu não sei a quem esse menino puxou, tão guloso. — Ela me
encara, o amor por seu filho brilhando em seu rosto. — Vai ver quando seu
bebê nascer, nada é tão gratificante que ficar assim, mesmo com uma dor
infernal no peito ferido, mas vale cada dorzinha.
— Não sei nada sobre bebês — comento, minha voz insegura, e quero
me bater por me transformar nessa criatura frágil quando o assunto é filhos.
Eu posso fazer qualquer coisa no mundo, mas os bebês metem um medo
terrível dentro mim. — Eu…
— Você acha que as mães de primeira viagem sabem alguma coisa?
Querida, os instintos te ensinam. Eu não tenho ideia de tantas coisas ainda,
estou aprendendo a cada hora do dia. — Ela volta seus olhos para o bebê.
— A única certeza que tenho é que o amor por ele é maior que minha vida
todinha.
— Você já deve estar sabendo que estou grávida — balbucio, sem
jeito. — Também te contei que não queria nenhum bebê. Tem sido difícil os
últimos dias, eu odeio decepcionar Christian sendo egoísta e…
— Haven, eu sei que te conheço tem pouco tempo, mas pelo que
conheço de você, não será perfeita, porque ninguém está acima de cometer
erros, mas de uma coisa tenho certeza: seu filho terá muito amor, tanto seu
como de Christian. E ele não terá uma infância como a que você teve.
Ela parece tão certa, e agradeço por ela não me julgar.
— Você é uma boa mulher, Aurora. Fico muito feliz de ter sua
amizade.
— Sempre será bem-vinda aqui, sabe disso, não é? Vamos marcar um
almoço aqui quando eu voltar a ser gente, porque agora eu só sou mãe desse
rebento aqui. — O bebê para de mamar, e ela o coloca no ombro e começa a
dar batidinhas em suas costas minúsculas.
— Obrigada pela indicação do obstetra, eu não sabia nem por onde
começar com um — agradeço. — Amanhã irei à primeira consulta.
— Ele é maravilhoso, vai gostar dele.
Os homens voltam para a sala, e o assunto da gravidez é esquecido.
Christian se senta ao meu lado, e todos começamos a conversar.
A tarde passa rápido, e quando me despeço de Aurora, dou-lhe um
abraço e agradeço pelas palavras.
— Você deveria confiar mais em si mesma! — ela diz quando devolve
meu abraço.

— Você foi ótima lá — Christian diz quando já estamos no carro e


seguindo para casa. — Eu sabia que seria forte, Haven, porque sua
fragilidade te torna forte.
— Bem contraditório isso, não?
— Não é não, às vezes só achamos que somos fracos, mas mesmo com
as questões que você tem para lidar, isso te deixar mais forte, porque está
lutando com isso o tempo todo. Lutando para aceitar mudanças, fazer
escolhas, e até agora só mostra que é a mulher mais linda em quem já pus
os olhos, e estou falando por dentro e por fora.
— Não me conhece por dentro. Sou uma pessoa…
— Incrivelmente linda. E eu te conheço por dentro — ele me
interrompe, e sorrio.
— Achei que fosse surtar ao pegar o bebê — digo e viro minha cabeça
para olhar seu perfil. — Eu estou surtando na maior parte dessa semana.
— Eu vou cuidar de você, querida. — Ele estende a mão com a palma
para cima, e pego-a. Ele beija o dorso da minha mão e coloca em sua coxa
nossos dedos entrelaçados.
CAPÍTULO 22

— Acha que saberemos o sexo, doutor? — Christian pergunta ao


obstetra indicado por Aurora. Eu estou tão apreensiva que meu corpo treme
todo.
— Não acredito que seja possível, está entrando na décima quarta
semana. Daqui a duas semanas ou três, sim. — Ele se levanta e me guia
para a mesa de exames. — Mas tem um coração batendo muito forte por
aqui.
Eu já tinha ouvido o coração do bebê dias antes, mas eu não lembrava,
estava tão perturbada naquele dia que era impossível lembrar quaisquer
coisas. Christian beija minha testa quando se senta ao meu lado, e agarro
seus dedos nos meus. Eu não poderia fazer isso sem ele.
— Vamos lá, então. — O doutor senta-se e espirra um gel frio na
minha barriga, que tem apenas uma minúscula saliência. Eu não me sinto
grávida. Nem tenho barriga.
— É normal não ter barriga, doutor? — pergunto.
— Ainda está nas primeiras semanas e terá tempo para
desenvolvimento, mas não é incomum na primeira gravidez.
— Entendo.
— Acontece, geralmente nos primeiros filhos, a mãe formar uma
barriga pequena, mas não se preocupe que, quando você perceber, já nem
aguentará ficar de pé por quinze minutos seguidos — ele graceja. — Mas a
partir da décima sexta semana as coisas começam a pegar um pique e você
verá a barriga começar a crescer rápido. Ou não. Como disse, é seu
primeiro filho.
— É claro.
— Se estiver em algum tipo de dieta restritiva ou exercício extenuante,
eu recomendo que modere os exercícios e procure um especialista para
obter uma alimentação equilibrada.
— Eu não sinto muita vontade de comer, apenas milk-shake me parece
apetitoso. Ultimamente virou minha comida favorita, e nem gostava. —
Essa gravidez trouxe tantas mudanças para minha vida recentemente que é
meio bizarro.
O médico começa a passar o aparelho de ultrassom e dou a Christian
um sorriso. Ele está atento à tela, mas sente que o observo e me dá esse
sorriso que me faz cada dia mais apaixonada.
Um barulho molhado começa a ser ouvido, e volto meus olhos para a
tela.
— O bebê de vocês está indo muito bem — diz o médico, e minha
respiração fica curta quando encaro a tela. Sinto os dedos de Christian
apertarem os meus, mas não tiro meus olhos do aparelho. — O coração está
forte e não parece que tem nada de errado. Escutam esse som? É seu bebê
dizendo que está aqui e que em breve estará com seus papais. — Suas
palavras fazem as lágrimas se acumularem nos meus olhos, e Christian me
aperta mais forte. Quero levantar e correr, mas o médico está falando e tento
focar nele. — Ele parece muito bem, mas vamos acompanhar o
desenvolvimento. — Ele aperta teclas e mais teclas. — Apesar de achar sua
barriga muito pequena, o desenvolvimento está dentro do esperado. Daqui a
um mês podemos fazer outra ultrassom e descobrir se é menino ou menina.
Uma menina?
Lágrimas quentes descem, pois não consigo mais segurá-las dentro de
mim. Eu seria uma mãe horrível, tenho certeza. Eu não posso…
Mas quando o pensamento de nunca mais escutar esse batimento
cardíaco surge em mim, eu sinto como se meu coração estivesse sendo
estilhaçado, esmagado. Uma onda de proteção que nunca senti vem com
força, e soluços me cortam.
Eu sou pior que a minha mãe.
Ela, pelo menos, não cogitou me abortar, mesmo que depois que nasci
ela nunca tenha sido uma mãe de verdade. Já eu? Fiz pior, eu quis acabar
com meu próprio bebê antes de ele nascer.
Culpa. Eu sou um ser humano tão ruim… Por isso que ela me odiava
tanto, ela sabia que eu seria ruim como estou sendo agora…
Começo a hiperventilar, e o médico para com a ultrassom e tenta me
fazer voltar ao meu estado normal, mas estou além disso. Pânico puro me
faz perder minha respiração e não consigo atinar onde estou agora nem o
que o médico está me dizendo.
— Haven?
Eu não posso respirar, uma dor me faz levar minha mão ao peito.
— Haven? Amor, fale comigo… Estou aqui, está tudo bem… —
Braços me envolvem, e a voz de Christian está como se ele estivesse muito
longe de mim. — Respire comigo, amor…
Não tenho ideia de quanto tempo ele fala comigo em um tom baixo,
até eu conseguir respirar outra vez normalmente. Eu sou patética.
Eu fico calada até a consulta terminar, é como se estivesse letárgica,
meu corpo pesado. Era para ser um dia especial hoje, se eu fosse uma
grávida normal, mas, como em tudo na minha vida, eu faço tudo errado.
CAPÍTULO 23

Com a culpa me corroendo, sigo Christian para fora da clínica e me


sento no banco do carro, calada. A mão de Christian nunca deixou a minha,
e ele me olha atentamente o tempo todo como se eu fosse quebrar.
Talvez eu estivesse além do reparo. Eu não o merecia de qualquer
maneira.
— Eu planejava te levar para um almoço — ele comenta quando já
estamos no trânsito. — Não sei se é uma boa ideia ir agora.
— Você me odeia, Christian? — Minha voz sai tão baixa. A rejeição
sempre foi uma constante na minha vida. E se ele me rejeitasse, eu morreria
de desgosto.
— Como posso odiar você, Bruxa? — diz ele. — Seu feitiço de amor
foi eterno.
Eu não estava no clima para brincadeira agora.
— Estou falando sério, Christian. É uma pergunta legítima, porque eu
sou um completo desastre agora. Como não poderia ter raiva de mim? —
Meu emocional está em frangalhos e incontrolável. Christian está sendo um
gentleman comigo, com toda bagunça que me tornei desde que eu descobri
o bebê.
— Se você mais uma vez falar que é qualquer coisa menos que a
mulher mais linda desse planeta, eu vou te dar umas boas palmadas,
mulher! — ele rosna para mim entredentes. — E olhe para mim. Está me
vendo rindo, porra? Você nunca mais repita merdas como essas.
— Eu…
— Pare! Ou vou parar esse carro e arrancar a pele de seu traseiro com
a palma da minha mão.
— Você agora virou Christian Grey? — pergunto, mais calma. Eu
nunca fui tão insegura, não desde que virei uma adulta e assumi as rédeas
da minha vida.
— Não sou a porra de Christian Grey nenhum, nem sei quem é esse
otário, mas se ele deu umas boas palmadas na mulher cabeça-dura dele por
falar bobagens sobre ela mesma, se colocando sempre como o pior ser
humano, eu já considero o cara uma lenda, e quero ser amigo desse infeliz!
— Ah, Christian, só você para me fazer rir. — Sorrio de seu discurso,
mas não sei se ele está contra Grey ou a favor.
— A ideia é essa, tirar você desse lugar aí, um que não suporto ver
você ficar.
Sem responder, olho para fora da janela.
— Podemos almoçar onde planejava — digo, tentando desanuviar todo
drama.
— Podemos ir para casa e jantar à noite em um lugar especial de sua
escolha.
— Tudo bem, prefiro a comida da Glória a qualquer outra, mesmo.
— E não sei disso? Desde que nos divorciamos, não tem um dia que
não encontre você na minha cozinha, comendo meu jantar, meu café da
manhã, meu almoço, que a minha cozinheira faz apenas para seu chefe, no
caso, eu!
— Que dramático.
— Vou mandar mensagem para ela preparar sua comida favorita. —
Paramos em um sinal, e ele pega o celular para enviar a mensagem.
Quando ele solta o celular, eu digo:
— Obrigada por ser tão paciente.
— É minha mulher, Haven. Vou estar sempre aqui.
— Sabe, às vezes eu desejo mesmo que uma dor dilacere meu coração.
Eu desejo que você não tivesse encontrado uma mulher defeituosa, cheia de
problemas emocionais. Já teria tido uma família como sua mãe deseja para
você.
— Não diga bobagem.
— É só um pensamento, que você merecia uma mulher sem tanta
merda na cabeça — digo. — Você acha que vou ser capaz de amar nosso
bebê?
— Sem sombra de dúvida. Pode ser uma megera má, mas ninguém foi
capaz de tirar de dentro de você essa emoção, Haven, e não gosto de escutar
esse tipo de coisa. — Ele retruca, furioso.
Eu fico calada depois da explosão dele.

— Obrigada, Glória! — digo, mais tarde, enquanto saboreio o almoço


que Glória fez. — Estava perfeito.
— Não foi nada, querida. — Glória para ao lado da mesa e percebo
que ela quer falar, mas seus olhos sempre vão de Christian para mim.
— Você que falar algo, Glória?
— Só queria saber se já sabe se terá uma menina ou um menino! Estou
tão feliz com a vinda desse pequeno!
— E por que estava receosa de perguntar? — indago, curiosa. Glória
sempre é muito aberta e sem muita formalidade.
— Oh, eu estava com receio de tocar em um assunto delicado — diz.
Olho para Christian, e ele mantém sua atenção no copo à sua frente.
Ele disse a ela para ser discreta com o assunto do bebê? Então ele acha que
vou pirar cada vez que eu escutar a palavra? Estou tentando não pirar, mas
ele não podia falar isso para ela.
— Está tudo bem, Glória, sempre pergunte o que quiser — digo. — E
não, não deu para saber se será menino ou menina.
— Deve estar muito novinho ainda.
— Isso. Bem, eu vou para o quarto descansar um pouco. — Levanto-
me e pergunto a ninguém em particular: — Afinal a semana é de descanso,
não é mesmo?
Vou para o quarto de Christian, furiosa, com Hushy trotando atrás de
mim.
— Aquele seu pai é um linguarudo, Hushy! — Em vez de ir para a
cama, vou até a sacada, onde tem chaise longues confortáveis, e me sento
em uma delas com Hushy ao meu lado. Acaricio seu pelo macio, e ele
coloca a cabeça em minha coxa. — Você é um garoto muito leal.
— Você está bem? — Christian aparece na porta. Ele está escorado no
umbral e com a mão no bolso da calça.
— Por que não eu estaria, Christian? Será porque você disse para
Glória os meus problemas com a gravidez? Será porque isso é um assunto
que mexe comigo, mas você disse para ela ser discreta e não fazer
perguntas, e vou fazer uma cena como a de mais cedo?
— Talvez como essa agora. E pare com seu chilique, estou sendo
cuidadoso porque me importo com você e com o que sente. Não quero que
tenha um ataque de pânico como mais cedo.
— Não foi por causa da gravidez em si, Christian, foi porque tomei
ciência do que estava planejando fazer e do quanto isso me torna pior que a
mamãe!
— Não se compare àquela mulher!
— Pelo menos ela não cogitou me abortar!
— Mas transformou sua vida em um inferno, e fez você crescer
acreditando que não pode ser feliz, Haven. E você vive se sabotando. Vive
cheia de “e se”. Precisa parar.
— Eu fui muito feliz quando te conheci. Até aquele momento, eu
nunca soube o que era ter um momento de felicidade. Talvez tenha tido uma
noção quando ganhei minha liberdade, mas depois eu estava tão sozinha,
lutando para sobreviver, que aquele momento fugaz desapareceu.
Ele caminha até mim e se senta ao meu lado, perto de Hushy.
— Eu continuo aqui, e o que sempre quis foi que fosse feliz.
— Eu sei, e eu também quero que seja, por isso pedi o divórcio,
Christian.
— E adiantou de alguma coisa? Isso não me deixou feliz — diz ele, os
dedos acariciando minha bochecha. — Ao contrário, apenas me deixou com
raiva, querendo, lutando para te tirar de dentro de mim.
— Eu sei — respondo, derrotada.
— Eu quero que tente abandonar o passado, Haven.
— Estou tentando, Christian. Por você, por nós. — É a verdade nua
para ele, estou desejando me tornar melhor, por mim mesma, por ele, por
nosso casamento.
É quando me dou conta. Não há mais casamento, vivemos tão juntos
que meu cérebro acha que somos casados ainda, só que não somos. Algo
dentro de mim murcha quando tomo ciência de que ele não voltou a me
pedir para me casar com ele novamente, depois daquele primeiro momento,
quando disse que estava grávida. Essa semana ele foi como um carrapato
grudado em mim, mas nem tocou no assunto.
Algo mais feio se constrói. Ele está colado em mim, porque acha que
não dá mais para confiar em mim com o seu filho. Era isso?
— O que é esse olhar? — pergunta ele, me analisando. Abaixo meus
olhos para ele não ver que a dor está lá, mas ele ergue meu queixo com as
pontas dos dedos.
Ele me olha intensamente, seus olhos azuis penetram nos meus, e
quero me afogar nesse mar azul que sempre me olhou como se eu fosse o
seu mundo inteiro, e saber que ele não confia mais em mim dói muito.
— Nada.
— Não quero que minta para mim, Haven. Apenas me diga o que
incomoda você, e vou fazer isso ir embora.
— Não é nada, já disse. Apenas pensando.
— Venha aqui. — Ele se acomoda e me atrai para seu peito, e me
recosto nele, suas mãos em minha barriga de forma protetora. Ele acaricia
para cima e para baixo, e fecho meus olhos, acolhendo seu carinho. Mesmo
que ele não confie em mim, ele ainda me ama, ainda que seja um
pouquinho. Viro minha cabeça para olhar para ele.
— Você acha que vai ser menina ou menino?
— O que for, será muito amado. Eu não me importo, e você?
— Eu… — Caramba, eu não sei dizer.
— Eu sei que ainda está aceitando tudo isso, Haven, não se cobre tanto
— diz ele, sua mão espalma o lado do meu rosto, o polegar acariciando
minha pele, e meus lábios se partem quando ele me olha intensamente.
Quando ele me beija, eu apenas retribuo com todo o amor que sinto por esse
homem lindo.
CAPÍTULO 24

Eu não sei onde escutei uma vez que, quando você conhece o amor
de verdade, ele te causa medo, te assusta, te deixa vulnerável de uma
maneira que te faz pensar que, mesmo que você esteja a ponto de correr,
ainda assim você quer ficar.
Nas semanas seguintes, eu volto à minha rotina de trabalho e de
aceitação de que vou ser mãe. Eu me pego muitas vezes parada,
completamente fora do ar, apenas com minha mão em volta da minha
barriga, tentando sentir o bebê lá dentro e pedindo perdão pela mãe que vou
ser, por pensar em desistir dele antes que ele pudesse vir ao mundo.
Eu me pegava chorando em muitas dessas vezes, e o sentimento de
proteção ia crescendo cada dia mais. O mero pensamento de nunca o
conhecer me abalava de tal forma que me desestruturava inteira.
Hoje eu estava, pela primeira vez, em frente a uma loja de artigos
infantis, e faz mais de quinze minutos que estou parada em frente a ela. A
vitrine tem uma variedade de coisas, e meu coração troveja dentro de mim
como uma banda marcial no feriado de quatro de julho.
Criando coragem, entro na loja, e uma vendedora logo chega perto e
pergunta o que estou procurando. Digo que só estou olhando. Quero apenas
olhar as coisas, não sei se iria levar algo.
Paro quando vejo uma roupinha rosa com branco, fofa, tão minúscula e
perfeita que sinto lágrimas nos olhos. Minha mão cai para a minha barriga,
e fico lá, parada por um tempo tão longo que a vendedora volta para perto.
— A senhora quer dar uma olhada nessa? É para recém-nascido… —
Ela fica especificando sobre a pequena peça e falando e falando…
— Eu vou levar essa — digo, interrompendo o fluxo de palavras da
vendedora.
— Tem outras cores…
— Essa.
— É claro, temos também um…
Deus! Ela é chata, eu só quero ficar sozinha e apenas olhar. São tantas
coisas sobre as quais nunca tive nem curiosidade, e percebo o quanto eu
mantive esse meu lado materno trancado dentro de mim, não deixando,
mesmo que inconscientemente, nada aflorar. Mas agora que estou
permitindo, está tudo vindo como um turbilhão para fora.
Saio meia hora depois da loja com minha primeira compra para o meu
bebê.
Meu bebê.
Meu bebê.
Meu bebê.
Recito na minha mente durante meu caminho de volta para o trabalho.
É um termo que novo demais para mim, e eu preciso me lembrar a todo
momento de que sou agora responsável por tudo que acontece com meu
filho.
E isso me apavora.
Olho a compra em minhas mãos e penso em ir ver Christian no
trabalho. Um sorriso se forma em meus lábios.
Quero mostrar para ele a minha primeira compra para o bebê. Ele
estava enchendo a casa com coisas, e eu não tinha participado disso ainda.
Talvez estivesse na hora de me empenhar mais, deixar o medo do
desconhecido de lado, porém, um passo de cada vez.
Acabo voltando para meu próprio escritório, e Elana levanta a cabeça
da tela do computador quando entro.
— Ei. — Ela vê a sacola e sorri amplamente. Eu criei coragem e falei
um pouco do meu passado para ela quando contei sobre a gravidez. Eu a
considerava uma amiga, e ela não me julgou por pensar apenas em mim
durante tanto tempo. — Ora, Haven, por que não me chamou para ir às
compras? Ah, roupinha de bebê é tão fofinha! Posso ver?
Oh! Eu quero mostrar primeiro para Christian.
— Essa é especial. Eu estou indo embora mais cedo hoje, pode ser?
Estou indo ao escritório de Christian — informo. — Sei que dará conta,
com Kleber, das coisas por aqui.
— Ah, tudo bem. Vai em frente, garota — diz. — Ah, mas amanhã tem
uma reunião logo pela manhã, não esqueça.
— Obrigada, Elana, sem você estaria frita. E não esquecerei.
— Só posso concordar com você sobre minha excelência.
Ainda tenho um sorriso nos lábios quando pego o táxi para o escritório
da Lamartine. Meu celular toca, e o pego com um sorriso, achando que é
Christian, mas meu sorriso desaparece quando vejo que não é local.
Minha advogada não teve êxito em falar com minha mãe durante todas
essas semanas, ela se recusa a falar com ela e insiste em me ligar.
— O que você quer? — Atendo para que ela me deixe em paz. Eu não
tinha nada com ela há anos. E nem gostaria de ter.
— Isso é jeito de falar com sua mãe? — Sua voz é reprovadora, como
eu estava acostumada a ouvir desde que me entendo por gente. — Por que
demorou tanto para falar comigo?
— E você nem recebeu a dica? — retruco. — Eu há muito tempo não
tenho nada para falar com você, mãe, então acho uma perda de tempo
conversarmos.
— A ingratidão ainda é um traço seu, pelo visto.
— O que você quer?
— Estou doente e preciso de ajuda com as despesas do hospital. Você
me deve isso, Haven, criei você sozinha, alimentei, vesti, dei um teto —
fala num tom de raiva como se eu fosse a culpada por ela estar doente,
quando nem sabia dessa doença, para começar.
— E todo dinheiro que você ganhou às minhas custas?
— Você acha que ganhava rios de dinheiro? Como é ingênua, Haven,
mal tenho sobrevivido.
— E acha que tenho dinheiro para te dar? Depois de tudo?
— Acha que não sei com quem se casou? E que não sei que você
mesma tem grana?
Então era isso. Ela, como sempre, iria me usar para ter seu próprio
dinheiro.
— Sempre pelo dinheiro… — digo com desgosto.
— Vai me dar ou não?
Será que era mesmo para pagar o hospital? Ela acha que vou lhe dar
dinheiro assim, sem verificar? Está enganada.
— Você é hilária. Nem se deu ao trabalho de perguntar como eu estou
— digo com raiva. — Por que eu iria pagar suas contas se nunca tive nada
de você, a não ser maus-tratos?
— Você inventou a maioria deles, Haven! Por que acha que nunca
tiraram você de mim? Acha que não sei que disse uma vez na escola que eu
batia em você? Mas nunca tiveram provas, sabe por quê? Sua imaginação
infantil inventava que eu não era uma boa mãe.
Minha imaginação? Ela agora estava me fazendo parecer louca? Deus,
ela não mudava, o tempo passava e ela continuava a mesma.
— Qual doença mesmo que você tem? — pergunto, optando por
ignorar suas palavras. — E por que não falou com minha advogada? Ela
tentou falar com você.
— A minha filha é você, e não vou falar com advogados idiotas.
Respiro fundo e percebo que estou tremendo. O táxi para na frente do
prédio da Lamartine Investiment. Pego o dinheiro e pago ao motorista, só
depois volto a falar.
— Tenho de desligar agora. Você receberá notícias minhas, se o que
diz for verdade.
Sem esperar que ela retruque, desligo e jogo o celular na bolsa.
Subo para o andar de Christian, e Salma, a assistente dele, arregala os
olhos quando me vê.
— Dona Haven! — diz ela com um sorriso caloroso, e eu retribuo.
Faz tempo que vim aqui. Salma é muito bonita, e logo que Christian e
eu nos divorciamos, passei uns dias desconfiada da mulher, mas logo vi que
ela não tinha interesse nele, ou o escondia muito bem.
Eu sou terrível quando se trata de sentir ciúme de Christian, e fiz dela
minha aliada. Sempre ligava para cá para “saber” como meu ex-marido
andava e onde ele iria jantar.
Que ele não descobrisse isso, ou a coitada poderia ser demitida por
passar informações para mim, mas chegou um momento que eu sabia que se
Christian quisesse outra mulher, nada o impediria,
— Christian está livre? — pergunto para ela.
— Ele está em reunião, mas terminará em breve — continua ela. —
Parabéns pelo bebê, o senhor Christian está muito feliz.
— Obrigada, Salma — agradeço com um sorriso. — E você, como
está? Sua filhinha está bem?
— Ela está bem. Crescendo muito rápido.
Ela é mãe de uma menina, e o pai não estava por perto, pelo pouco que
eu sabia.
Estava prestes a falar, quando vozes vêm pelo corredor e Christian
surge. Ele está acompanhado por uma mulher, e eu a reconheço. Só que,
diferente do outro dia, quando ela estava em um vestido de noite, ela está
vestida como uma executiva, de blazer e calça.
Ela é o oposto de mim na aparência, porém, muito bonita. Eles têm
sorrisos nos lábios enquanto discutem algo, e ela toca seu braço enquanto
fala. A temperatura do meu sangue sobe uns cem graus nas minhas veias.
Eu não sou de não gostar das pessoas apenas por vê-las, e não tinha muitas
rivalidades com outras mulheres, mas ela esteve em um encontro com meu
marido, quer dizer, ex-marido.
— Christian Davis! — digo, mordendo as palavras.
— Haven? — Seu sorriso só fica maior, e ele vem em minha direção.
Eu dou a ele um olhar mortal que é completamente ignorado. Ele enlaça
minha cintura e beija meus lábios como se estivéssemos ali sozinhos.
Argh!
Ele se afasta e me olha de cima a baixo, seus olhos na minha barriga.
Quero acertar a sacola na cabeça dele, mas freio o gesto.
— Não esperava você — diz, surpreso.
— Eu vejo — digo.
— Christian, foi um prazer, eu entro em contato com os novos
detalhes. — A mulher fala para ele, e quero saber de que diabos de detalhes
ela falaria com ele. Estreito meus olhos para ela, e a mulher nem parece me
notar.
Ele estava saindo com funcionárias? Porque eu lembrava muito bem
dessa, foi uma das últimas com quem ele jantou. Meus olhos são fendas e
enviam chispas de fogo na direção dela.
— É claro — diz ele, apertando a mão dela. — Até mais.
— Até mais.
Ela acena para todos e caminha para o elevador. Me viro para ele.
— Podemos falar na sua sala? — Minha voz sai como seda.
— É claro. — Ele se vira para Salma. — Segure as coisas por um
momento.
— Tem uma reunião com Rafael em meia hora.
— Tudo bem.
Caminho para a sala dele, e ele me segue. Quando adentramos, ele me
agarra e puxa minhas costas para seu peitoral duro, sua boca no meu
pescoço e seus braços envolvendo minha cintura, as palmas das mãos
envoltas na minha barriga.
— Amei a surpresa, minha linda bruxa! — Ele beija meu pescoço, e
isso quase me distrai.
Saio de seu abraço e viro para ele.
— Está saindo com funcionárias agora? Eu não sabia que esse aí
trabalhava para vocês!
— Quem? Débora?
— Esse é o nome dela? Vi você jantando com ela outro dia, e não me
diga que eram negócios, Christian!
Ele abre um sorriso perverso.
— Oh, você está ciumenta, ainda há esperança para você, bruxa! —
Ele me agarra novamente e me beija, e dessa vez eu beijo de volta apenas
para morder seus lábios. — Ai, porra, Haven!
— Você está saindo com a funcionária?
Ele lambe o lábio mordido e resmunga.
— Não que isso seja da sua conta, mas Débora é executiva da Pontes,
e não, não estou saindo com ela. Apenas jantamos uma vez, que não deu
muito certo, devo lembrar.
— Claro que é da minha conta!
— Não, não quando ela está aqui a trabalho e os assuntos da Lamartine
não dizem respeito a você.
— Mas você, sim — retruco.
— Haven, não estávamos em um relacionamento quando jantei com
ela.
— E quando deixamos de estar em um relacionamento, Christian?
— Haven. — Seu tom não dá margens para discursão, mas eu não
tinha acabado ainda. — Você veio por um motivo. O bebê está bem,
principalmente, você está bem?
— Sim.
— Você estava fazendo compras? — Ele aponta a sacola em minha
mão, e lembro por que vim aqui.
— Eu… — Parece tão bobo agora, vir até aqui no meio do dia e
atrapalhar seus compromissos para mostrar uma compra. Devia ter
guardado para a noite, quando estivesse na casa dele. — Eu… Bem, estava
passando em uma loja e… fiz uma compra.
— E veio me mostrar? — Ele parece se divertir do quanto estou sem
graça. Eu não ficava tímida com Christian tinha anos. Acho que apenas no
começo do nosso relacionamento eu fui tímida com ele.
— Parece bobo agora — digo, um pouco vermelha.
— Mostre-me — diz e me puxa para o canto, onde um sofá preto de
couro está posto em frente a uma mesa de centro e de duas poltronas
também de couro.
Dou a sacola com a roupa rosa que comprei, e ele sorri quando vê que
é algo de bebê.
— Você tem comprado tanta coisa para o bebê, e achei essa roupinha a
coisa mais fofa.
— Está me deixando feliz pra caralho, Haven — diz ele e segura meu
rosto com uma das mãos. — Feliz de ver você gostando da ideia de termos
um filho.
— Eu sei que não confia em mim com ele, Christian — digo,
colocando para fora o sentimento que tenho desde que voltei do hospital
naquele dia. — Tenho a impressão de que você acha que vou correr e fazer
um aborto quando não estiver olhando.
— Claro que não penso assim, Haven. De onde tirou isso? — Ele
coloca a sacola de lado e segura minhas mãos nas suas. — Eu, no começo,
realmente não conseguia confiar, mas você tem mudado isso. Eu sei agora
que não faria mal ao nosso bebê.
— Como tem certeza disso? — indago, desconfiada.
— Quem sairia e compraria presente para alguém de quem quer se
livrar? Eu sei que aceita nosso filho dentro de você agora.
— Eu tenho tantas dúvidas, Christian. Não posso fazer nada disso sem
você — admito.
— Estou aqui, já disse isso para você.
Eu sei que ele estaria.
CAPÍTULO 25

Semanas depois...

Hoje é o dia que vamos descobrir o sexo do nosso bebê, e a


ansiedade de Haven é visível enquanto estaciono o carro na clínica.
— Você está ansiosa demais, Haven. — Viro-me para ela e pego suas
mãos frias, esfregando e aquecendo as mãos delicadas entre as minhas. —
Se preocupa demais.
— Eu não posso controlar isso, Christian — lamenta ela, me olhando
com olhos assombrados.
Inclino-me, beijo seus lábios rapidamente e tiro fios de cabelo de seu
rosto, que está mais branco hoje que o normal.
— Eu sei, mas vamos fazer isso juntos — prometo, confiante, por mim
e por ela.
Ela assente.
Saímos do carro e caminhamos para dentro do consultório médico.
— Eu gostaria que fosse um menino, e você? — ela dispara como se
tivéssemos discutido o assunto antes.
— Você não quer um menino, sabe a cor da primeira roupa que
comprou? Era rosa, Haven, e definitivamente era uma roupinha de menina.
— Hmm — ela resmunga, e sorrio. — Isso não quer dizer nada.
— Seu subconsciente já decidiu e você nem notou — comento.
— Eu… — ela hesita. — É apenas um surto, não ligue.
— Claro que vou ligar, Haven.
Enquanto aguardamos a vez dela, olho ao redor, e a sala está repleta de
mulheres em vários estágios de gravidez, e de alguns homens como
acompanhantes. Uns estão meio verdes e outros com sorrisos ansiosos. Eu
devo estar em uma terceira categoria de pai. O que está mais ansioso que a
mãe que vai ter o bebê.
Quando o nome de Haven é chamado para a consulta preliminar, era
para eu ficar esperando como os outros pais na sala, mas Haven agarra
minha mão e me arrasta junto.
O doutor nos recebe e, depois da consulta e das perguntas de praxe
para Haven, ele a encaminha para a mesa de exames.
— Vocês estão animados para saber o sexo? — pergunta ele enquanto
mexe no equipamento.
— Sim!
— Não!
Eu e Haven falamos ao mesmo tempo, e o doutor ri.
— Vejo que há uma controvérsia — constata.
— Irão ter uma menina — o obstetra de Haven diz.
Meus olhos estão grudados na tela enquanto ele faz o exame e nos
conta o sexo do nosso bebê.
— Acabaram meus dias de paz na terra, duas mulheres para
consumirem meu juízo — falo com um sorriso enorme nos lábios e recebo
um tapa de Haven, que tem os olhos enormes, deitada na mesa de exames.
Ela tem lágrimas não derramadas neles.
Beijo seus lábios, a emoção tomando nós dois.
— Você está sendo incrível — digo, traçando sua face com meus
dedos.
CAPÍTULO 26

Quando voltamos da clínica, e depois de um banho, fico parada na


frente do espelho, nua, e observo minha barriga já mostrando um leve
inchaço. Fico de lado e passo a mão no contorno da pequena saliência. As
mudanças estão ficando bem visíveis agora. Antes eram apenas a
sonolência e os enjoos, e esses últimos ainda persistem, mas estão ficando
leves agora, só alguns cheiros que me causam náusea.
Eu nunca me imaginei assim, eu nunca nem cogitei a possibilidade de
um dia gerar um filho. Pedir o divórcio a Christian tinha me destroçado,
mesmo assim eu abri mão dele porque não queria mudar de opinião, e agora
estava aqui carregando um bebê.
E agora iria ser mãe de uma menininha.
Acaricio minha barriga e imagino como ela vai se parecer. Fecho meus
olhos, e uma garotinha parecida com Christian surge na minha mente, e
faço uma oração silenciosa para não ser como a minha mãe. Que eu a trate
com amor, não como alguém que veio atrapalhar e impedir meus sonhos de
se realizarem.
Eu nunca vou querer que minha filha olhe para mim e sinta medo ou
receio do que farei com ela às portas fechadas. Eu nunca vou querer que ela
sinta algo diferente de amor quando pensar em mim. O medo de falhar me
faz tremer e ter um surto de pânico algumas vezes.
— Está linda. — A voz de Christian vem por trás, me tirando dos
meus pensamentos, e depois seu reflexo aparece atrás de mim. Seus braços
me envolvem, e estou ficando acostumada com ele sempre me acolhendo
em seus braços, não importa o que é jogado entre nós.
Ele beija meus ombros, e viro a cabeça para beijá-lo. Seus lábios
tomam os meus e me viro, enlaçando meus braços por seu pescoço. Nosso
beijo se aprofunda, e ele começa a me empurrar para a cama, quando meu
celular começa a tocar na minha bolsa. Eu tento ignorar, mas ele não para.
— Ignore isso — diz Christian e me deita no colchão, seu peso vindo
por cima de mim. O toque insistente continua, e ele suspira quando sai de
cima de mim e vai pegar o aparelho. Ele olha a tela antes de me entregar e
franze a testa.
— Você ainda fala com sua mãe? — pergunta, espantado, pois minha
mãe não é uma pessoa bem quista por Christian. Ele não a quer por perto,
não desde que soube sobre a minha infância. Ele nunca quis conhecê-la e eu
nunca mais a tinha visto desde que saí de casa. Eu não desejo que ela seja
parte da minha vida.
— Dê-me aqui — peço para ele o aparelho que continua tocando em
sua mão. — Ela me ligou outro dia e falei com ela, mas não tenho atendido
suas ligações ultimamente.
Desde que ela me ligou para dizer que precisava de mim para quitar
dívidas médicas, eu pedi que minha advogada investigasse, e não parece
que ela está à beira da morte.
— Eu acho que esse não é o momento certo para sua mãe tentar se
aproximar — pondera Christian. O celular para de tocar por fim.
— Tudo bem. — O tranquilizo.
— Não está tudo bem. O que ela quer depois desse tempo todo?
Eu não sei se deveria envolvê-lo em mais um drama da minha vida,
mas eu nunca escondi muita coisa dele antes.
— Ela quer dinheiro, disse que precisa para despesas médicas — digo
com um suspiro, levantando e indo colocar uma roupa no closet de
Christian. Mamãe sempre quebrando o clima. Visto um conjunto de
moletom que pertence a ele e volto para o quarto. Christian ainda está
parado no meio do quarto onde o deixei. — Tudo bem?
— Vou resolver essa questão com sua mãe — declara. — Não quero
que se preocupe com ela.
— Christian… — começo e caminho até ficar de frente para ele. — Eu
prefiro que não tenha contato com ela, você é a única coisa minha que
mamãe não atingiu de alguma forma. Minha vida toda foi baseada no que
vivi quando estava com ela. Eu não quero que você tenha nenhum contato
com ela. Não suportaria que ela, de alguma forma, interferisse na nossa
relação.
— Você dá muito crédito para sua mãe, Haven — constata ele.
— Não dou, apenas não quero que ela manche nossa relação — digo,
ansiosa.
— Ela não tem esse poder todo que você acha que ela tem.
— Apenas não a quero em nossas vidas, Christian — digo e abraço sua
cintura. — Minha advogada já está lidando com isso.
— Hmm, não quero você chateada e isso afetando nossa filha.
— Não vai — garanto.
— Falando em nossa filha — comenta ele, me abraçando com força e
beijando meus lábios rapidamente. — Você que comprar uma nova casa?
— Por que fazer isso? — pergunto, espantada. Ele tem esse
apartamento enorme, além da nossa casa, quer dizer, eu a considero nossa
ainda.
— Quero que criemos nossa filha juntos. Haven, sei que estamos
divorciados, mas ainda assim quero ter minha filha ao meu lado todo dia. E
uma casa seria o ideal.
— Mas temos nossa casa ainda, Christian, por que teríamos outra?
— Quer que voltemos a morar juntos lá?
— E por que não? É nossa, sempre foi, apenas fiquei com ela.
Ele começa a rir.
— O que foi? — Bato levemente em seu ombro.
— Somos o casal mais maluco — diz, balançando a cabeça em
descrença. Ele me olha, e nossos olhos ficam presos um no outro, e nem
precisamos de palavras para expressar o quanto nos queremos e amamos.
Nós somos metades de um todo, e acho que nada vai poder separar nossas
vidas um dia, talvez apenas a morte. — Então vamos providenciar uma
mudança, Bruxa.
— Eu gosto disso — digo, traçando o contorno da sua mandíbula com
meus dedos. Eu não sei se um dia poderei viver sem esse homem. — O que
vamos fazer com o resto do dia?
— Eu vim dizer que tenho um encontro com Rafael, para nossa bebida
semanal, mas como hoje temos muito o que comemorar, achei que todos
devíamos ir tomar uma bebida. Menos você, é claro.
— Você quer que eu me encontre com seus amigos?
— E por que não? Outro dia era Rafael comemorando o nascimento do
filho dele, agora é minha vez.
Eu lembro disso, eu me senti excluída da vida de Christian naquele
dia, e foi algo que deixou um gosto amargo em mim, porque eu não tinha
direito, já que estava separada dele, mas o coração é teimoso quando se
trata de amor.
— Eu adoraria sair, faz tempo que não fazemos isso como um casal —
afirmo, deitando minha cabeça em seu peito. — E Christian?
— O quê?
— Voltando ao assunto da minha mãe, prometa que não vai interferir,
por favor.
— Se isso deixa você tranquila, eu prometo.
— Obrigada, querido.

Quando chegamos ao restaurante escolhido por Christian, todos já


estão esperando. Agora o acompanhante de Lanie é Domênico Garcia, ele é
advogado e amigo de Christian e Rafael. Já Bianca, a irmã de Aurora, está
sozinha ao lado da irmã, e além de Rafael e Aurora, estão meus próprios
amigos, Elana e Kleber. Dou um sorriso agradecido a Christian por ele
convidar meus amigos também. Bem, tecnicamente são meus funcionários,
mas eu os considero amigos. Depois de cumprimentar a todos, caminho
para o lugar vago na mesa para mim e Christian.
— Feliz que esteja aqui — digo para Elana quando me sento ao lado
dela e Christian senta-se do meu outro lado.
— Seu marido me convidou, e eu não perderia esse jantar — diz ela e
segura minha mão na sua. — Parabéns pela menina linda que está
carregando.
— Obrigada — agradeço com um sorriso. — Como foi esse convite
para Kleber? Christian sempre implica com ele.
— Ora, eu disse a Christian que Kleber teria de vir, ou você daria a ele
uma semana de castigo na casinha de Hushy — diz ela baixinho, me
fazendo rir.
— Haven, parabéns! — Aurora diz do outro lado da mesa.
Christian pede champanhe e propõe um brinde, e todos estão rindo e
brindando, e percebo que estou me sentindo mais leve do que há muito
tempo, mesmo que nos últimos tempos eu só tenha feito chorar e lamentar o
que a vida jogou sobre mim, mas percebo que, às vezes, o que pensamos
que é ruim para nós acaba sendo motivo de comemorarmos e sermos
felizes.

Os dias seguintes são de mudança. Eu e Christian estamos voltando a


morar juntos definitivamente, e tem sido dias intensos. Minha gravidez
avançando, a nova tentativa de vivermos juntos, trabalho, decoração do
quarto da bebê. Reservamos o quarto ao lado da suíte principal, que voltou
a ser usada agora que Christian está de volta.
— Por que diabos não usava mais a suíte? — pergunta Christian, de
onde está deitado na cama, as mãos cruzadas atrás da cabeça. Eu nunca
disse a ele por que eu deixei de dormir lá.
— Eu não queria dormir aqui sem você — digo, me aproximando da
cama do lado oposto. É nossa primeira noite na casa depois da decisão de
voltar para cá. — Eu sei que é bobagem, mas eu sabia que um dia, talvez,
nós pudéssemos nos acertar.
— Haven…
Hushy vem correndo e pula sobre a cama e começa a lamber Christian.
— Ei, garoto! Onde estava? Você está gostando de voltar para casa,
hein?
— Ele esteve explorando tudo. — Sorrio, pois parecia que Hushy
estava agradecendo a Christian por voltar. Ele parece tão feliz. — Ele deve
estar feliz por voltar.
— Eu entendo o sentimento, não é, meu garoto?
— Estava pensando em preparar um almoço para nossos amigos… —
sugiro. No jantar do outro dia me diverti muito com eles. É um círculo
íntimo, mas eu desejava expandir nossos laços de amizade.
— Ótima ideia, agora venha aqui — ele diz, estendendo a mão para
mim. Deitamos na cama, um de frente para o outro, e Hushy no meio. —
Esse bebê está muito satisfeito.
Hushy apenas cutuca a minha barriga com seu focinho, como ele
sempre faz quando estamos juntos. Aliso seu pelo com a mão e olho para
Christian.
— Acha que ele sente que tem um bebê? — pergunto.
— Ele sabe que vem uma irmãzinha para ele cuidar, não é, garoto?
Hushy late como se confirmando seu trabalho futuro. Eu amo esse
cachorro, e não sei por que imaginei um dia que não poderia amar um ser
humano que sairia de mim.
CAPÍTULO 27

A felicidade é realmente algo fugaz. Em um momento tudo está


correndo bem, e no outro você vê a felicidade se esvair. Eu estive em um
surto de felicidade desde que soube que ia ter um filho, e mesmo com toda
situação com Haven, eu estava em um estado constante de felicidade, maior
ainda desde que ela aceitou a gravidez.
Depois de receber a notícia de que iríamos ter uma filha, as coisas têm
sido aceleradas com a mudança de volta para a casa onde Haven e eu
passamos a maior parte de nossa vida de casados. Chegamos a um acordo
de que voltaríamos a morar na casa e lá criaríamos a nossa filha juntos. Um
arquiteto foi contratado e estava a todo vapor com as reformas no quarto ao
lado da suíte principal. O quarto da minha garotinha.
Olho a barriga de Haven começando a aparecer, e sorrio. Ela nunca
esteve tão linda, perfeita, e quero fodê-la a toda hora, mas tenho sido
moderado, tenho me contido para não ser rude e machucar ela e minha
filha. Se algo acontecer e Haven perder o bebê, eu perderia a cabeça.
— Você está hipnotizado — Rafael diz ao meu lado, eu tiro meus
olhos de Haven e olho ao redor do quintal.
Minha mudança de volta à casa onde fui feliz com Haven por anos
tinha acontecido há duas semanas, e hoje convidamos nossos amigos para
um churrasco. Era apenas uma forma de comunicar a todos que iríamos
voltar a ser um casal oficial, mesmo que não fôssemos mais casados, fato
que poderíamos mudar, mas eu estava receoso de pedir e Haven dizer não.
Eu teria de ir devagar com ela.
Tiro meus pensamentos dela e volto minha atenção aos convidados.
Não tínhamos tantos amigos íntimos. Mas os que eu e Haven mais
estimávamos estavam aqui.
Rafael e Aurora, Domênico e Lanie, que tinham recém-assumido seu
relacionamento, além da irmã de Aurora. Esta estava sozinha. Ainda não
sabia o que aconteceu com Lucca, com quem ela namorava quando estava
comprometida com Rafael — a história era meio louca —, mas ele não está
aqui hoje. Ela estava sentada, sozinha, os olhos perdidos.
Elana e Kleber, amigos de Haven, estão aqui também.
— Rafael, você nem devia falar sobre hipnose — Domênico resmunga
do outro lado. — Ninguém consegue mais tirar você de casa para tomar
uma bebida.
— Quando você tiver um filho, vai saber por que prefiro ficar com
minha mulher e com ele.
Meus olhos voltam para minha bruxa, que está rindo com seus amigos,
e posso entender Rafael. Eu não queria deixar Haven um minuto sozinha, e
nem era porque desconfiava que ela ia fugir e abortar, acho que já passamos
dessa fase, minha Bruxinha está indo bem com a gravidez, mesmo que ela
ainda tema pelo futuro como mãe.
Meus pais estavam para chegar de visita, eles estavam muito felizes
com a gravidez de Haven, minha mãe já tinha mudado da água para o vinho
com relação a ela. Sorrio quando penso na última conversa que tive com
ela, chamando Haven de “minha nora favorita”. Outro dia ela estava toda
queixosa sobre Haven não querer ter filhos. Vai entender as mães. Elas só
querem que você dê um punhado de netos para elas.
Nossa campainha toca, e Glória, que está comemorando conosco, corre
para atender. Não estamos esperando ninguém mais, não sei quem poderia
ser.
— Você deveria sair em uma viagem de reconciliação, Chris —
recomenda Rafael. Talvez ele tivesse razão, deveria levar Haven em um
mês de férias a um lugar exótico.
Vejo Glória voltando com uma mulher, e não preciso ter poderes
sobrenaturais para saber de quem se trata. Cabelos avermelhados e olhos
azuis, ela é uma versão mais velha da minha mulher.
O que diabos a mãe de Haven está fazendo aqui?
Fico em pé, e estou prestes a escoltar a mulher para fora antes que
Haven a veja, mas a mulher mais velha já está caminhando na direção dela,
que está branca igual uma folha de papel. Vou ao encontro de Haven, que
nesse momento parece prestes a desmaiar.
— Filha! — diz a mulher, chegando perto de Haven e tentando abraçá-
la.
Haven se encolhe como se temesse o que a mãe fosse fazer e recua.
Quando dá um passo para trás, ela tropeça nos próprios pés, e vejo quando
ela começa a cair. O grito de medo de Haven faz os pelos do meu corpo
arrepiarem. Ela teria caído de costas no chão, se eu não a tivesse pegado a
tempo sua mão que ela agitava no ar. Seguro-a nos braços, e ela está
tremendo.
— Tudo bem, você está bem — digo, murmurando em seus cabelos
enquanto a mantenho contra meu peito. Viro meus olhos para a recém-
chegada. — Quem a convidou para minha casa?
— Aqui também é a casa da minha filha, portanto, tenho direito de vir,
já que ela se recusa a falar comigo — responde com o tom de voz
reprovador.
Levo Haven para sentar-se em uma das cadeiras da piscina e me
agacho em sua frente, massageando sua barriga.
— Espere um minuto, que essa mulher vai ser colocada na rua em
pouco tempo — digo, furioso. — Como diabos ela sabe onde moramos?
— Tudo bem, eu só não queria seu abraço, eu que me atrapalhei.
— Você poderia ter perdido a bebê com a queda, Haven.
— Eu sei.
Elana se aproxima, e aproveito que ela está ao lado de Haven para ir
até a mãe dela.
— Venha comigo. — Pego seu braço e tento escoltá-la para fora, mas a
mulher resiste e se vira para Haven.
— Vai deixar esse homem me atacar, Haven? Você continua a mesma,
fiz tudo por você e ainda não me agradece! Durante anos nunca me
convidou para uma visita, nem procurou saber como sua mãe estava, e
quando eu dou o passo para nossa reconciliação sou tratada feito uma
criminosa?
— Você não foi convidada porque não quero você por perto — diz
Haven. Ela está tremendo com a súbita aparição da mulher.
— E eu preocupada com você! — vocifera, como se estivesse muito
preocupada com a filha.
Mesmo quem não conhece a história das duas, percebe que essa
lunática falava com falsa preocupação de Haven, e a arrogância de seu tom
estava me irritando.
— Sou Christian — digo para ela e aponto para dentro da casa. — Por
que não vem comigo? E me conta como chegou até aqui e o que deseja com
a visita inesperada? — Olho em seus olhos calculistas. — Posso ser muito
generoso, quando há colaboração.
Ela deve entender o que quero dizer, pois depois de olhar na direção de
Haven, por fim assente para mim. Levo-a para dentro da casa, e vejo Glória
pálida de preocupação quando passo por ela.
— Desculpe, senhor Christian, eu não sabia o que fazer — diz, e dou a
ela um aceno de cabeça tranquilizador enquanto levo a mãe de Haven para
meu escritório.
— Sente-se. — Aponto a cadeira para ela.
— Sou Madison Collins — diz ela, indo sentar-se. Eu queria me livrar
dela o quanto antes e ver como Haven estava.
— Não me importo como se chama, apenas diga-me quanto vale sua
falsa preocupação com sua filha, Madison, e vamos acabar com isso. —
Vou direto ao ponto da questão. Eu não gosto dessa mulher e não a quero
aqui perturbando o dia com nossos amigos e, principalmente, sua presença
não faz bem a Haven.
— Está me insultando!
— Será mesmo? Você disse a Haven que está doente, mas como isso é
verdade, se fez uma viagem dessas? De onde tirou o dinheiro, se pediu
dinheiro para ela para pagar despesas médicas?
— Você é americano, senhor Davis, não deve ter esquecido o quanto é
caro adoecer em nosso país — diz ela, e estou prestes a perguntar sobre a
questão da doença que ela alegou a Haven, quando a própria Haven irrompe
pela porta.
A senhora Collins se vira quando Haven entra.
— Ah, aí está a ingrata…
— Senhora Collins, eu sugiro que não insulte minha mulher na minha
casa, ou vou jogar a senhora na rua, literalmente — digo com fúria mal
contida. Ela é tóxica.
— Obrigada, Christian — diz Haven e vem para perto de mim, depois
se vira para sua mãe. — Eu resolvo isso aqui. Eu preciso fazer isso sozinha,
Christian.
— Ora, vejam só, você vai ter uma criança — Madison aponta
enquanto observa Haven. — Esperei que você fosse ser diferente de mim,
mas vejo que não. Talvez as Collins tenham a sina de serem perdedoras,
deixando homens e crianças estragarem suas carreiras. No fim somos
iguais, mesmo você tendo fugido, anos atrás.
Sinto Haven enrijecer ao meu lado.
— Não somos nada iguais, Madison — Haven diz, com raiva. — Eu
não sei o que veio buscar aqui, mas certamente não vai encontrar. Não devo
nada a você, acho que seria o contrário, se formos pensar sobre isso.
— É uma ingrata, se não fosse pelos sacrifícios que fiz por você, não
estaria bem hoje.
— Você fala de sacrifício agora, mas a única coisa que fez durante toda
minha vida foi tentar me transformar em uma versão melhorada sua, e com
isso veio todo o castigo, ou não lembra mais dessa parte?
— Você sempre foi muito fantasiosa, Haven. Sempre inventando
coisas.
— Quer dizer que inventei as vezes que me batia porque não fiz as
coisas do seu jeito, ou as vezes que não ganhava um concurso? — Haven
diz, seu corpo tremendo de raiva, e acabo puxando-a para mim. Isso não
faria bem a ela, mas eu sei que ela precisa dar um ponto final com a mãe.
Sei que ela pode se defender dessa mulher, que precisa fazer isso sem que
eu interfira e chute sua mãe porta afora.
— Eu não vim aqui para escutar essas coisas absurdas! — Madison
diz, ultrajada.
— E o que veio fazer? Não convidaria você para minha casa.
— Você não falava comigo e tive de dar um jeito de descobrir onde
mora, o que não é difícil, apenas contratei alguém para isso.
— Você tem dinheiro para viajar e contratar alguém para me espionar,
e não pode pagar suas supostas despesas médicas?
— Eu preciso que me arranje dinheiro — sua mãe diz.
— O quanto quer para desaparecer dessa casa e da vida de Haven? —
Não me contenho e pergunto.
— Christian! Não vamos dar nem um centavo a ela. Chega!
— Quinhentos mil dólares estaria bom para começar.
— Quinhentos mil e você não olha nem na nossa direção mais,
Madison, ou você pode sair como chegou, de mãos vazias.
— Eu não acho…
— Não daremos nada a você. Eu não devo nada a você, mãe. — Haven
se vira para mim. — Eu acredito que essa mulher não tem mais nada que
fazer aqui, eu percebo agora que ela não mudou em nada, então não tenho
interesse em ficar perto dela.
— Você escutou sua filha, faço questão de acompanhar você até a
saída.
— Haven, eu não tenho mais como me sustentar, tem de me ajudar! —
grita Madison, quase desesperada. — Eu gastei tudo que tinha para vir aqui
falar com você.
O que ela achou que iria acontecer? Chegaria aqui e seria recebida
com flores?
CAPÍTULO 28

Estou me sentindo doente.


Ver minha mãe manchando minha casa é demais, eu quero gritar para
ela ir embora da minha vida para sempre. Eu preciso não sentir tanto
desgosto dela, pois isso só me faz mal, mas é maior que eu. O sentimento
de nunca ter sido amada por ela é horrível. Ela sempre me fez sentir um
lixo, e esse sentimento ainda existe dentro de mim.
— Então vou te fazer um favor, mãe, devolverei a quantia que gastou,
e nem um centavo a mais, mas antes eu preciso saber por que me odeia
tanto.
— Eu não odeio você, Haven. — Ela assegura, mas não acredito nela,
não depois de toda merda que aconteceu na minha infância.
— Suas ações, durante toda a minha vida até eu sair de casa, dizem o
contrário.
— Eu apenas queria que você fizesse algo diferente de mim — diz. —
Que tivesse uma vida completa, não a desperdiçasse com uma gravidez na
adolescência, como eu fiz.
— Isso não é desculpa para suas atitudes, mãe — digo tristemente. Eu
só quero que ela vá embora. Ela me faz mal.
Meu coração ainda estava batendo acelerado desde que a vi vindo em
minha direção com os braços estendidos.
Madison nunca me abraçou, e naquele momento, eu era aquela garota
que iria receber uma reprimenda por ser estúpida novamente, e minha
reação foi tentar fugir do seu ataque. E poderia ter machucado a bebê por
causa disso.
Isso é minha mãe, parece que ela só causa danos à minha vida. Em
alguns momentos, eu cogitei que se eu a visse novamente ela seria
diferente, que talvez o tempo e minha fuga de casa tivessem feito algo para
ela mudar, mas eu estava enganada, ela continuava a mesma. E eu não
quero que ela faça parte da minha vida, que tenha contato com minha filha.
Eu gostaria que ela fosse uma mãe amorosa, queria que minha filha
tivesse o amor de uma avó, mas acho que nunca vou poder ter isso dela. Ela
continua me culpando por seus fracassos, e isso nunca vai mudar.
— Eu quero que vá embora da minha casa. Terá suas despesas pagas,
mamãe, e só terá isso de mim — digo firme, mas ainda sinto um misto de
sentimentos dentro de mim que não me deixa ser cruel com ela, mesmo que
eu não lhe deva nada. — Onde está hospedada?
— Não estou em lugar nenhum, vim direto do aeroporto — diz, e me
questiono onde está a mala dela. — Eu poderia ficar aqui. Na verdade,
achei que deveria ficar aqui.
— Sinto muito, mas não é possível — respondo. — Vou pedir para
minha assistente conseguir um quarto de hotel para você, e ela também
resolverá a questão da sua volta.
— Haven, você tem de me ajudar!
— Então me conte a verdade, para que esse dinheiro?
— Eu já disse!
— Tudo bem. Elana vai levar você ao hotel e resolverá essa questão
financeira.
— Prefiro aceitar a oferta de seu homem — ela diz vulgarmente.
— O meu homem não tem nada a ver com você, mãe — corto com
raiva. Depois me viro para Christian. — Você pode chamar Elana?
— Deixe que resolvo isso, Haven, não quero você se preocupando à
toa. — Christian, como sempre, quer me proteger de tudo, mas esse
problema é meu.
— Christian, por favor…? — Eu quero um momento a sós com
Madison.
— Volto logo.
Ele sai, e minha mãe segue Christian com os olhos, depois vira-se para
mim.
— Você se deu bem na vida. Viu que meus conselhos para você não
ficar se enchendo de porcaria deram certo? Ficar uma mulher magra e sem
celulite foi bem útil para você.
Respiro fundo e olho para ela. Ela está diferente da mulher que foi um
dia, esses anos foram ruins com ela. Ela sempre foi uma mulher esguia, de
um rosto de beleza clássica; seus olhos azuis, que devo ter herdado, eram o
destaque em seu rosto. Agora ela, com essa fala preconceituoso, não devia
ter espelho em casa, pois está envelhecida e acima do peso, longe do corpo
de modelo que ostentava.
— Você é preconceituosa e mesquinha, e não tem um espelho em
casa? Onde foi parar seu corpo de modelo, dona Madison? — pergunto com
os dentes trincados de raiva.
— Estou desse jeito porque coloquei você nesse mundo, e você
também ficará assim. Já que está grávida, certamente ficará igual a mim,
filha querida.
— Sabe o que sempre desejei? Que eu tivesse uma mãe carinhosa,
amorosa, que em vez de querer me transformar em alguém que nem você
conseguiu ser, que em vez de me tratar como uma boneca de fantoche, me
tratasse como uma filha de verdade. Que em vez de me bater me desse um
abraço, apenas um, coisa que nunca fez — digo com a garganta tapada de
emoção mal contida. — Você não tem ideia do que tirou de mim, mãe.
Como apontou tão eloquentemente agora há pouco, sim, estou grávida, e
sabe a primeira coisa que pensei quando descobri? Que faria um aborto,
pois não queria ser mãe. O único modelo de mãe para mim tinha sido cruel
e desumano, e eu não queria isso para uma criança, eu não desejo que
minha filha tenha a vida que tive com uma mãe como você. E como bem
disse, somos iguais, mas não somos. Por sua causa eu desejei fazer mal a
ela. E não quero você por perto para passar o seu veneno para minha filha.
Portanto, vá embora e não volte mais. Sabe o que percebi agora? Que nunca
vou ser como você, eu nunca poderei ser como você.
— Você é tão patética, Haven…
— Já chega! — A voz de Christian vem da porta, e olho para ele
através das lágrimas não derramadas nos meus olhos. Elana está ao lado
dele, e seus olhos estão arregalados, seu olhar é de pena, mas quando ela
olha para mamãe, a raiva brilha neles.
— Senhora Collins, por que a senhora não me acompanha? Vou levá-la
a um hotel e providenciar seu retorno ao lugar de onde nem deveria ter
saído — diz Elana.
— Adeus, Madison! — despeço-me, e ela balança a cabeça, com
desgosto por todo seu rosto.
— Você sempre foi uma filha ingrata de qualquer maneira, e vejo que
também não mudou com o tempo — fala, depois se vira e caminha para a
porta com Elana em seu encalço.
Eu não a acompanho até a porta, em vez disso, volto para onde nossos
convidados estão esperando. Pior dia para uma visita inesperada. Antes de
sair, entro no lavabo, me curvo e jogo água no rosto. Uma pontada de dor
na minha barriga me faz me curvar mais. Levo a mão ao ventre, mas a dor
passa, e cinco minutos depois estou saindo para o jardim.
— Haven, estamos de saída — diz Aurora. — Meu bebê precisa de
silêncio para dormir e você deve estar querendo ficar sozinha com a visita
inesperada.
— Oh, vocês não deveriam ir, eu iria ficar melhor rodeada de pessoas
que são minhas amigas.
— Realmente precisamos ir.
— Desculpe todo drama.
— Normal, querida, qual família não tem um drama?
— Você é muito gentil, Aurora Lamartine — digo, abraçando-a.
— Eu sei — ela fala de brincadeira. — Depois marcaremos algo —
garante, e logo depois ela sai, e Bianca a segue, além de Lanie e Domênico,
restando apenas Kleber.
Sento-me com ele depois que todos saem, e ele agarra minha mão.
— Você está bem? Está meio pálida. — Quer saber, preocupado.
— Estou bem, desculpe por nosso encontro acabar mais cedo.
— Tudo bem. O importante é que está bem.
Pouco depois, apenas eu e Christian ficamos na beira da piscina,
assistindo Hushy correr pela grama.
— Você acha que ela vai embora? — pergunto para ele sobre Madison.
— Instruí Elana para providenciar isso. Aproveitei e liguei para Salma,
e ela vai providenciar uma transferência bancária para Madison ficar longe
de você.
— Christian, eu não queria que desse esse dinheiro a ela, sem saber se
é para ela jogar fora com algum vício e voltar atrás de mais. Não devia ter
dado.
— Está feito, não a quero por perto te perturbando.
— Ela não tem limites, Christian — digo, desalentada.
— Está feito.
CAPÍTULO 29

Nossos amigos acabam indo embora mais cedo, pois não tínhamos
mais clima para festejar. Madison Collins era o tipo de pessoa tão tóxica
que por onde passava deixava um rastro ruim.
Observo Haven no jantar que Glória, sentindo-se muito culpada por ter
deixado a mãe de Haven entrar, preparou para nós.
Haven esteve se contorcendo na cadeira e com a testa franzida desde
que nos sentamos para comer.
— Tudo bem? — pergunto quando a vejo fazer mais uma cara
incômoda.
— Um pouco de dor de cabeça e cólica — diz ela e leva a mão à
barriga. — Está incomodando um pouco, mas o doutor disse que às vezes
pode acontecer, que é normal.
— Devemos ligar para o médico?
— Eu não acho que seja nada de mais, Christian — assegura, mas o
tremor em sua voz é nítido. — Estou bem.
— Haven…
— Por que não tiramos umas férias? —pergunta ela, mudando de
assunto.
— Talvez. — Eu poderia fazer isso acontecer. Tirá-la um pouco dessa
tensão. — Para onde gostaria de ir?
— Qualquer lugar com sol está bom para mim.
— Vou providenciar uns dias de descanso então, Bruxinha.
Quando nos casamos, mesmo com a mudança para o Brasil prestes a
acontecer, viajamos por um mês pela Europa, e foi incrível. Eu poderia
passar um tempo com ela em alguns lugares aqui no Brasil. Ela não
conhece tantos lugares. E o que mais tem no Brasil é sol para minha linda
garota americana.
Depois do jantar, acabamos aconchegados na cama, para assistir a uma
reprise do último jogo dos Patriots que eu tinha perdido. Haven não é muito
fã, mas quando éramos casados ela sempre assistia comigo os jogos. Ela
estava voltando aos hábitos de antes sem nem perceber. Ela se contorce ao
meu lado com a testa franzida.
— Você parece incomodada, vou ligar para o médico…
— Christian, não está forte, é apenas um cólica suave, só isso — diz,
teimosa, e se aconchegando de novo em mim. Minhas mãos
automaticamente vão para sua barriga e acaricio o volume para cima e para
baixo, e ela suspira e murmura suavemente: — Isso é bom.
Beijo seu pescoço, deixando um caminho de beijos até sua boca, e
beijo-a forte. Nossas línguas se entrelaçam e o jogo é esquecido quando a
empurro no colchão e cubro seu corpo com o meu. Ela geme, e não é um
gemido de prazer, me fazendo lembrar que ela não está bem. Porra!
Saio de cima dela, me maldizendo pela falta de controle, e vejo seu
rosto contorcido de dor.
— O que foi? — pergunto, alarmado.
— Acho que… — Ela leva a mão ao baixo ventre. — Foi apenas uma
pontada de dor.
Ela não tinha acabado de dizer que estava tudo bem, que era apenas
uma leve cólica? Sem mais questionamento, pego meu celular e ligo para
seu médico enquanto visto uma roupa. Eu a levarei para o hospital.
Minha conversa com o obstetra é sucinta e informo o que está
acontecendo, e ele pede que leve Haven ao hospital apenas por precaução,
pois pode ser nada ou um princípio de aborto por causa de todo estresse que
ela passou hoje com a visita de sua mãe. Saio do closet com uma roupa para
ela e a encontro meio pálida na cama.
— O médico disse para irmos ao hospital — anuncio e dou a roupa
para ela vestir. — Vista-se.
Ela não discute, e isso é um indicador de que não está bem. Quando
ela vai trocar de roupa, tem uma mancha vermelha na roupa íntima, e ela
ofega quando a vê. Seus olhos estão arregalados quando encontram os
meus. Nos olhamos paralisados quando o entendimento do que pode
acontecer com a nossa bebê nos atinge.
— Christian… — ela chama, lágrimas enchendo seus olhos, e vou para
ela e a ajudo a se vestir o mais rápido que posso.
— Temos de ir, baby — digo com voz embargada. Ela estava perdendo
a nossa filha?
Fico angustiando até o hospital, pois não sei o que está acontecendo.
Quando Haven é atendida o médico de plantão diz que ela tem de ser
internada, porque está com a pressão arterial alta, e depois dos exames que
ela fez com urgência ele afirma que ela corre risco de perder a bebê, pois o
batimento cardíaco da minha filha está levemente acima do considerado. Se
Haven não fosse medicada logo, poderia…
O pensamento de perder minha filha me deixa arrasado, eu não posso
nem imaginar o quanto isso poderia ser doloroso. Nem a conheço ainda e já
a amo tanto, que se algo de ruim lhe acontecer, me devastaria.
Eu já estou devastado apenas em cogitar isso.
CAPÍTULO 30

Deveríamos ter cuidado com o que desejamos, pois pode ser que
quando isso se concretiza, não seja o que realmente queremos.
Olho para o rosto de Christian, e nunca o vi com o semblante
envelhecido como agora. Ele está com uma ruga entre os olhos e
angustiado. Meu próprio coração está apertado. O pequeno sangramento e a
pressão alta são sinais de alerta preocupantes, e eu corro o risco de abortar
nossa bebê. Fecho meus olhos, orando para que ela fique bem. O médico
estava bastante preocupado com minha pressão. Eu tinha de manter a
calma. Minha bebê era forte, ela iria ficar bem, mas eu teria de ficar
internada à noite ou até o pequeno sangramento parar e minha pressão
baixar. Eu não tinha tido problemas com pressão alta por toda minha vida.
Meu coração estava cheio de culpa, era culpa minha isso estar
acontecendo. Se eu perdesse nossa filha, meu relacionamento com Christian
não ficaria bem, isso iria destruir o que voltamos a construir, mesmo que
não fosse como antes, ainda assim estávamos tentando fazer
— Desculpe — digo para Christian quando ele segura minha mão que
está livre. Ele beija o dorso dos meus dedos, e seus olhos azuis, que tanto
amo, me fitam com tanto amor e dor misturados que meu peito aperta. —
Deve ser culpa minha, porque não fiquei feliz quando descobri sobre ela.
— Pare de falar besteira, Haven — Christian me repreende, mas eu
sinto dentro de mim a culpa me corroendo.
— Apenas sei, Christian, que se eu a perder vai ser culpa minha.
— A proíbo de falar assim. E não vai perder nossa filha, está me
escutando? A proíbo de falar isso.
A noite é longa, mas de manhã recebemos boas notícias depois da
visita do médico e do resultado de novos exames. A medicação que recebi
parou o processo do princípio de aborto e minha pressão arterial tinha
voltado ao normal, mas eu ainda ficaria o dia todo em observação. O alívio
era nítido no meu rosto e no de Christian.

A volta para casa do hospital foi sob recomendação de repouso


absoluto e monitoramento da minha pressão arterial. Eu estava muito feliz
que iria ficar tudo bem. Christian estava quase louco de cuidado. Jesus, esse
homem…
Ele me carregou escada acima nos braços, sob meus protestos, com
Glória e Hushy atrás de nós.
— Você escutou o médico — diz Christian quando o mando me
colocar no chão. — Repouso absoluto, Haven.
— Eu sei, mas andar pode!
— Hoje, não.
— Dona Haven, deve ter todo cuidado. — Glória corre e tira o
edredom da cama, e Christian me coloca no colchão. — Vou cuidar para
que tenha tudo que precise.
— Estou bem, só preciso de um banho para tirar o fedor de hospital e
de um jantar. Amo sua comida.
— Vou encher a banheira. — Ela corre para o banheiro sem esperar
resposta se quero tomar apenas uma ducha. Quando ela volta do banheiro,
para ao pé da cama. — Coloquei a banheira para encher, senhor Christian.
Agora irei preparar seu jantar enquanto toma banho, e o trarei daqui a
pouco.
— Jesus, Christian, vocês estão malucos? — Hushy pula na cama e
vem se deitar ao meu lado. — Oh, meu menino, você estava com saudade
da mamãe, querido?
Ele late, e sorrio, acariciando seu pelo macio.
Christian se senta ao meu lado e entrelaça nossos dedos.
— Vamos ficar bem, Bruxinha, vamos ficar bem — diz ele e me puxa
para um beijo. — Você e minha filha são tudo para mim.
— Eu sei, querido, eu sei, e você é tudo para nós duas.
— Você quase me matou de susto.
— Desculpe — peço, beijando sua mão que ainda está entrelaçada à
minha.

— Falei com meus pais — Christian diz mais tarde, quando estamos
deitados, sua mão acariciando minha barriga com uma reverência que me
deixa toda emocional. — Eles chegarão amanhã.
— Oh, achei que seria na próxima semana.
— Eles adiantaram quando souberam que você estava no hospital.
— Oh, Christian, apenas os preocupou.
— Falando em preocupação, sua mãe foi embora hoje.
CAPÍTULO 31

Quatro meses depois…

— Christian? — chamo de dentro do meu closet, e não tenho


resposta. — Christian?!
Espero-o vir, e nada. Deus!
Olho meu reflexo no espelho, estava vestindo um vestido vermelho
justo transpassado que mostrava minha barriga de quase oito meses. Daqui
a duas semanas eu completaria oito meses e estava enorme. Bem que o
médico disse que quando ela resolvesse crescer eu veria isso acontecer
muito rápido. Eu estava precisando de novas roupas, mas talvez fosse a
única mulher na terra que não era muito fã de compras. Eram exaustivas, e
o troca-troca de roupa me trazia lembranças das quais não gostava. Eu as
evitava ainda mais agora, aceitando ser mãe e cuidar da pequena dentro de
mim.
Eu amava passar horas conversando com a pequenina, eu queria que
ela soubesse o quanto eu a amava, que minhas dúvidas, meu medo e pavor
daquele momento de descoberta foram o pânico falando por mim, que seu
pai tinha sido minha rocha nesses meses todos. Christian tem sido tudo para
mim. Quando ela mexe e não me deixa dormir à noite, ele está lá comigo o
tempo todo. Como cogitei passar a vida sem ele? Como me divorciei desse
homem?
Eu o amo tanto que dói.
— Christian? — chamo novamente, e nada dele. Droga, eu não
consigo colocar meu próprio sapato, que vergonha. A sandália tinha que ser
afivelada, e para isso eu não conseguia me curvar, minha barriga ficava no
caminho.

Estamos indo à festa de Natal da Lamartine. Estou ansiosa para ver o


bebê de Aurora, ele está um bebê tão bonito. O pânico da primeira vez que
o peguei parece amenizar a cada vez que eu o pego nos braços.
O pensamento de que daqui a um mês eu irei segurar minha filha nos
braços pela primeira vez me enche de pânico absoluto. E se eu não
conseguisse? Christian tem ido comigo à terapia, a cada quinze dias, e isso
tem melhorado meus medos e inseguranças. O apoio de Christian tem sido
essencial para mim. Eu não sei onde estaria agora se não tivesse me
agarrado a ele desde que descobri sobre a bebê.
E onde diabos ele estava?
— Christian?
— Que foi, mulher? — ele graceja, entrando no closet. Ele está
vestindo um smoking preto e gravata borboleta, e um maldito tesão de
lindo. Poderia uma mulher ficar cada dia mais apaixonada por um homem?
— Você está ficando um velho surdo? — provoco.
— Sim, velho e rabugento.
— Você pode ajudar com minha sandália? — peço, mostrando-lhe as
benditas sandálias de tiras prateadas.
Depois de ele me ajudar a calçá-las, ele me abraça por trás e beija meu
pescoço, causando arrepios por minha pele.
— Você é linda.
— Obrigada, querido.
— Tenho um presente para você, e vai ficar lindo com esse vestido
Ele puxa uma caixa comprida de dentro do bolso e a abre para revelar
um colocar de diamantes, e esse não era meu design.
— Está comprando na concorrência?
Ele ri.
— Se pedisse que fizesse um presente para eu dar a você, nem teria
graça — ele diz. Toco a joia com admiração, e ele segura o colar entre os
dedos. — Deixe-me colocar, Bruxa — diz com carinho.
Tiro meus cabelos do caminho, e ele coloca a joia, que consiste em
uma corrente fina cravejada de brilhantes minúsculos e uma pedra maior de
um diamante em formato de coração.
— É lindo, obrigada! — digo, tocando a joia com a ponta dos dedos, e
a olho de perto através do espelho.
— Eu queria te dar isso em um jantar romântico ou em uma viagem a
um lugar exótico, mas acho que está na hora de ter isso de volta — diz ele
com pesar. Nossos planos de viagem foram cancelados por causa do susto
que levamos quando tive problemas com a minha pressão, que graças a
Deus não passou de um susto. Eu não tive mais problemas, mas meu
obstetra estava sempre monitorando para que na hora do parto não tivesse
complicações.
Saio dos meus pensamentos quando ele pega minha mão esquerda na
dele, e minha respiração me deixa. Ele coloca o meu anel de noivado no
meu dedo, aquele que ele fez questão de ficar quando nos divorciamos.
— Oh, meu anel! — grito, ofegante, felicidade irradiando por cada
poro meu.
— Sabe por que eu pedi esse anel para você como exigência do
divórcio?
— Nunca entendi, para ser sincera. Você queria me dar tanto dinheiro
no divórcio, mas pegou algo que era uma das coisas que eu mais amava, era
o símbolo do nosso amor.
Que eu não valorizei, devo deixar claro.
Além da inscrição que tinha nele, era uma devoção ao nosso amor. E
fiquei tão furiosa com ele por levar algo que eu amava.
— Eu fiquei com ele porque eu sabia que um dia eu o colocaria aqui
de volta, onde ele nunca deveria ter saído — declara, seu polegar
acariciando meu dedo junto com o anel. — Eu sabia que nunca mais iria me
casar novamente, mulher nenhuma era você. Quando falo que é uma bruxa,
nem é brincadeira, Haven. Quero criar nossos filhos junto com você.
— Christian…
— Não me diga não pela segunda vez em um pedido de casamento. —
Ele finge ficar bravo e me inclino para beijá-lo. Beijo-o, interrompendo
suas palavras, e quando ele assume o beijo, eu apenas me entrego ao
momento. Pena que tínhamos que sair, eu precisava dele para mais que um
beijo.
— Casa comigo? — diz quando nos separamos, ofegantes. Eu achei
que depois daquela recusa ele nunca mais fosse me pedir que me casasse
com ele de novo. Que iríamos viver juntos apenas.
— Por que demorou tanto a me pedir?
— Você não estava pronta para dizer sim, Haven.
— Eu sempre estive pronta, Christian — digo para ele. — E a resposta
sempre será sim, amor.
— Eu amo você, Bruxa — diz, segurando meu rosto entre suas mãos.
— Eu amo desde que te vi pela primeira vez.
CAPÍTULO 32

A dor é excruciante, e xingo Christian e seu super esperma


enquanto ando para lá e para cá no quarto de hospital.
— Respire, baby — diz ele, o meliante causador da minha agonia.
— Christian, você não me mande respirar, seu… Oh, Deus, isso dói —
digo, perdendo o fôlego com a próxima contração. estavam cada vez mais
perto uma da outra.
O médico entra no quarto e me faz deitar para mais um exame físico, e
estou a ponto de acertar sua cabeça também.
— Acredito que essa garotinha está pronta para vir ao mundo — diz
ele com um sorriso. Sou levada à sala de parto e agarro a mão de Christian.
— Não me deixe — digo para ele, e ele beija meus lábios secos.
— Nunca, amor. Estou bem aqui — promete, mas ele me deixa para se
preparar para a sala de parto, assim como as enfermeiras estão me
preparando para trazer minha bebê ao mundo. Elas conferem minha pressão
arterial a todo momento, por causa do susto anterior, e graças a Deus agora,
apesar do meu estado lamentável, ainda continua normal.
Quando escuto o grito irritado da minha filha e ela é colocada no meu
peito mais tarde, eu estou em prantos. Christian paira sobre nós duas e beija
minha testa, falando o quanto nos ama, e isso só me faz chorar mais. A
emoção toma conta de mim quando olho o rostinho rosado, meio arroxeado
e enrugado da minha filha, que está reclamando.
— Eu te amo, bebê — digo para ela, e sorrio entre lágrimas para
Christian. — Eu te amo tanto.
— Também te amo, amor — diz ele.
— O pediatra vai ver sua bebê agora, mamãe — diz uma enfermeira, e
leva minha garotinha reclamona com ela, e já sinto falta dela nos meus
braços. Enquanto eles a examinam, minha filha chora, e meu peito se aperta
com seus gritos agudos.
Depois Christian a pega em seus braços enormes, e o pacotinho
minúsculo se aquieta quando ele fala com ela. Deve reconhecer a voz do
papai, de tanto que ele conversou com ela durante a gravidez.
Minha Crystal.

Exausta não chega nem perto de como estou me sentindo, mas eu não
consigo dormir. Desde que fui transferida para um quarto e colocaram
minha bebê de volta em meus braços que não paro de admirá-la.
Como minha mãe me teve assim, desse mesmo jeito que seguro minha
filha agora, há tantos anos, e simplesmente decidiu que nunca me amaria?
Eu não entendo, mesmo com toda terapia que tenho feito. Principalmente
agora, quando olho a minha filha dormindo tão inocente.
— Olá! — A voz da mãe de Christian chama da porta. Seus pais estão
aqui no Brasil há mais de duas semanas, eles estavam tão loucos com a
chegada da neta que não resistiram e estão de visita desde então. Meu
relacionamento com Emma tinha voltado a ser melhor que antes, desde que
tinha me separado de Christian ela tinha ficado chateada comigo, mas
depois que ela descobriu minha gravidez, a mulher não cabia em si de tanto
contentamento. A conversa que tivemos, quando ela veio de visita logo
após eu ter saído do hospital, quando pensamos que íamos perder minha
filha, ajudou muito. Eu não tinha Madison na minha vida como desejei ter,
durante tanto tempo, mas a mãe de Christian estava sendo uma mãe para
mim, e eu estava feliz que ela estivesse aqui. — E minha neta?
— Oi, Emma. — digo baixinho para não assustar minha preciosidade,
e sorrio para minha sogra. — Ela é tão fofinha.
Ela vem e se senta na cadeira ao lado da cama, admirando a neta.
— Onde está Christian? — pergunto.
— Ele já está vindo — diz ela.
Ele tinha ido falar com todos nossos amigos que tinham vindo
conhecer nossa filha, e eu já estava sentindo sua falta.
— Ela é maravilhosa, obrigada por nos dar essa alegria, minha querida
— diz Emma, e ofereço para ela segurar Crystal. Quando ela pega sua neta
nos braços ela tem lágrimas nos olhos. — Ah, pequenina, como eu amo
você.
Ela fica balbuciando para Crystal, até que a porta se abre novamente e
meu marido entra. Sim, estamos casados novamente. Agora não tivemos um
casamento como o primeiro, foi apenas uma cerimônia minúscula com ele e
eu, apenas três dias depois que me pediu em casamento novamente. Era o
nosso momento sem ninguém. Já tivemos isso na primeira vez que nos
casamos, mas em breve daríamos uma festa, depois de me recuperar do
nascimento de nossa filha. A aliança no dedo da mão de Christian me deixa
toda ardente por esse homem. Ele beija minha testa quando se aproxima da
cama.
— Como está minha Bruxinha? — Ele alisa os cabelos da minha testa
com amor em seus olhos azuis.
— Melhor impossível — respondo, mas não é verdade, eu ficaria
melhor quando estivesse em casa com ele e nossa filha.
— Já disse que te amo hoje? — pergunta Christian.
— Umas cem vezes, isso o que consegui contar — digo, rindo, e sua
mãe ri também.
— Estou tão feliz que voltaram a ficar juntos e ainda trouxeram essa
linda menininha para nossas vidas — Emma diz. Christian pega nossa filha
da mãe e a embala nos braços. — Eu fui tão insensível quando você se
separou de Christian, que nunca pensei se tinha uma razão maior por trás
disso. Criar um filho não é fácil, minha querida, mas estamos todos aqui por
você.
— Eu sei, e agradeço por ter vocês — digo.
— Eu queria morar perto, ficar mais tempo, mas infelizmente
moramos tão distantes.
— Depois podemos conversar sobre isso, mamãe. Deixe Haven dormir
um pouco, ela está exausta, as horas de parto foram longas.
— É claro, que falta de tato de minha parte. — Ela se levanta e segura
minha mão na sua. — Descanse, querida.
Ela sai logo depois, prometendo me manter informada dos negócios na
joalheria.
CAPÍTULO 33

Ter os pais de Christian aqui na nossa casa e a ajuda de Glória


estava sendo bom para esse começo com Crystal em casa. Tem quatro
semanas que estamos de volta, e têm sido bem intensas as coisas por aqui.
Quando Christian estava no escritório eu me sentia mais segura com
Emma e Glória me rondando, como duas galinhas velhas ao redor dos
pintinhos. O pensamento de fazer algo errado com minha filha me
apavorava.
— Olá, mamãe! — Elana diz, entrando na sala de estar. Ela tem vindo
essa última semana para me inteirar das coisas no trabalho. — Oh, meu
Deus, não me canso de olhar essa fofurice. Tenho até vontade de ter uma.
— Deveria.
— Passo. Filhos estão longe de acontecer, por enquanto eu preciso
achar um marido ou um doador confiável para ser o pai da minha prole. —
Ela ri e se senta na minha frente.
— Tudo bem? — pergunto.
— Temo que vamos precisar de você cem por cento em uma nova
criação para um rico emergente, que quer presentear sua jovem mulher com
um conjunto fora do comum.
— Então me mostre o que ele quer.
Eu estava voltando a trabalhar, pois precisava dessa parte da minha
vida. Desenhar para mim era terapêutico e estar longe das minhas criações
era uma tortura, mas eu fazia todo trabalho apenas quando Crystal estava
dormindo. As horas com ela eram minha joia do dia, eu não as trocaria por
nada, mas quando ela dormia, principalmente durante o dia, para sambar na
nossa cara à noite, eu aproveitava e desenhava minhas criações.
Na próxima hora trabalhamos no conceito da nova joia encomendada
por um cliente, até minha filha reclamar para ter a sua próxima mamada.
— Bem, você deve ter o suficiente para trabalhar nela. Vou agora e
deixar você cuidar dessa menina fofa.
Enquanto alimento minha filha, eu penso como minha vida mudou
desde que ela surgiu. Tirando as incertezas do começo, eu nunca tinha sido
mais feliz. Madison não voltou mais, mas eu soube que ela estava envolvida
com jogos, e por isso queria dinheiro. Eu sabia que não era saúde. Caso
fosse, ela não teria feito tanto mistério, mas com ela você não tem muitas
surpresas. Esperava que ela não voltasse. Eu não precisava de alguém assim
na minha vida, mesmo que ela fosse minha mãe. Mas eu ainda queria que
ela melhorasse, deixasse de maltratar a si mesma e se desse bem na vida. Eu
não poderia desejar mal a ela, essa não era eu.

Olho Cristian segurando Crystal nos braços quando volto do banheiro


e paro na porta, admirando meus amores da minha vida todinha. Ele está no
meio da cama e Crystal na curva de seu braço. Hushy, o guardião da nossa
filha, deitado ao lado. Deus, eles eram fofos juntos.
Hushy não saía de perto de Crystal desde que ela chegou do hospital,
ele passou a minha gravidez todo amoroso com minha barriga, e agora
parece que sabe que ela saiu de lá e transferiu para ela todo amor que tinha
comigo. Sorrio com meu peito cheio de amor por esses três.
EPÍLOGO

Um ano depois

No aniversário de um ano de Crystal, reunimos os nossos amigos e


os pais de Christian para festejar com nossa menininha, que agora corre
trôpega junto com o filho de Rafael e Aurora e Hushy em seus encalços.
Um amor de se ver.
Meu pequeno cristal precioso, eu a amava tanto, que não cabia em
mim tanto amor.
Por ela e seu pai.
— Quando vocês duas terão os próximos? — Emma pergunta para
mim e Aurora, apontando para os nossos filhos, e arregalamos os olhos. Oh!
Ela estava empolgada, eu não sei se teríamos outros filhos. Eu estava
satisfeita com minha filha apenas. Eu e Christian não falamos disso ainda.
Talvez devêssemos ter essa conversa.
— Oh, eu não sei, talvez já esteja a caminho — diz Aurora, vermelha.
Viro-me para ela.
— Sério?
— Ainda não confirmei, mas tudo indica — confessa com um sorriso.
— Rafael e eu decidimos ter um segundo bebê e paramos o contraceptivo.
— Oh, isso é tão maravilho! — Emma bate palmas.
— Você só teve um filho, Emma — aponto, e vejo seu sorriso morrer,
e lamento minhas palavras quando vejo seus olhos nublarem. — Eu disse
uma besteira?
— Não, querida. Só lembrei que não demos irmão ao Christian porque
não pude mais ter filhos.
— Sinto muito.
— Foi há muito tempo, e nosso filho nos enche de alegria — ela
garante. — Agora ele me deu uma neta linda, e quem sabe um neto no
futuro?
— Ainda não falamos sobre termos mais filhos — digo.
— Vocês terão tempo.
Talvez, penso, olhando meu marido pegar nossa filha nos braços
quando ela corre para ele, que está vindo de dentro de casa juntamente com
seu melhor amigo.
Ele é dominado por nossa menina.

Mais tarde, depois que Crystal está dormindo, entro no quarto e


encontro Christian na cama, lendo.
— Oi!
Ele joga o livro de lado e estende a mão para mim, e vou para ele. O
beijo de esmagar a alma que ele me dá tira meu fôlego.
— Eu te amo, amor — digo, ofegante.
— Hmm — ele resmunga e desliza os lábios por meu pescoço. Tateio
o cume grosso de seu pau na boxer que ele veste sem nenhum pudor.
— Christian?
— O que foi, Bruxa?
— Sei que você vai dizer sim, mas queria saber mesmo assim —
começo. — Você pensa em ter outro filho?
Ele levanta a cabeça da curva do meu pescoço para me olhar.
— Haven, eu sei que ter um filho foi duro para você. Não forçarei um
segundo, pelo amor de Deus — diz, carrancudo.
— Mas e se eu quiser?
— Ah, aí podemos trabalhar nisso.
— Sim?
— Como agora mesmo… — diz ele, jogando-me de costas na cama e
vindo para cima de mim. — Estou duro esperando por você, Bruxa — rosna
e desce a boca, mordendo a lateral do meu pescoço, e gemo, descarada.
Nossa vida sexual tinha voltado melhor depois do intervalo do meu parto, a
fome por Christian ainda é sem tamanho, e a dele por mim é insaciável.
Estremeço quando ele morde meu pescoço, me fazendo gemer mais alto.
Sua mão desce por minha barriga, descendo para minha boceta coberta pelo
meu short de seda. — Estou louco para te comer, minha Bruxa, e colocar
mais um bebê dentro de você. Tem ideia do quanto quero você?
— Eu tenho, pois te quero igualmente, meu amor.
Ele volta a me beijar, e o desejo insano que sentimos sempre nos toma.
— Por favor... — imploro, carente. Estou tão molhada para ele agora
que um mero toque seu me faria gozar.
Seus olhos se fixam nos meus quando ele se apoia nos antebraços,
acima de mim, enjaulando minha cabeça entre eles, seus lábios roçando os
meus, me deixando ansiosa por seu toque.
— O que quer, Bruxa? — Sua voz rouca, cheia de desejo carnal, me
abala como sempre. Desejar Christian é um vício que aceito com vontade.
— Você dentro de mim, amor... — ofego, desejosa.
Ele lambe meus lábios eroticamente, e tento aprofundar o beijo,
mas ele continua a exploração pelo meu pescoço e colo, descendo sua
língua perversa por meus seios, que têm os bicos túrgidos e carentes de sua
boca. Ele abocanha um mamilo na boca, sugando forte e soltando.
— Perfeitos. — Sua voz é sensual e reverbera por cada célula do meu
corpo, como se um fio decapado levasse a eletricidade através de mim. Ele
amassa meus peitos lenta e eroticamente, fazendo-me arquear as costas,
necessitando mais do toque duro, áspero. — Sempre vai ser minha. Minha
Bruxa.
Ele desce por meu corpo, até fica entre minhas pernas, seu olhar
vidrado no centro de minhas coxas abertas para seu deleite.
— Tão molhada, porra. — Seus dedos me abrem mais, e seu toque na
minha boceta é demais para suportar quando belisca meu clitóris entre os
dedos. Ele não resiste e desce sobre mim, sua boca comendo-me com um
rosnado saindo de sua garganta quando ele suga o prazer de mim. Estou tão
sensível que gozo quase que imediatamente. Quando desço à terra,
Christian está entrando em mim sem dó, seu pau duro me invade até o talo,
e gemo sentindo sua invasão deliciosa. Arrepios deliciosos correm por mim
com a sensação dele dentro de mim.
— Você é tão gostoso... — digo para ele, ofegante. — Amo seu pau.
— Eu sei disso, bruxa... minha bruxa.
— Sim, Deus, sim, Christian... — digo, abraçando seus quadris com
minhas pernas.
Ele sai de mim e estoca com força, tão profundamente, estocadas
deliciosas e rudes que tiram meu fôlego. Aumenta a velocidade das
investidas, e não demora para nós dois estarmos galgando o cume do prazer,
e gememos juntos quando gozamos forte, seu gozo quente me invadindo.
Nossas bocas juntas, em um beijo áspero, nossas línguas entrelaças uma na
outra, tirando um do outro o prazer carnal, puro e simples. É tão gostoso
esse fogo entre nós. Talvez até que a morte nos separe as coisas sejam
assim... Perfeitas.
Éramos perfeitos juntos.
E quem sabe um segundo bebê viria por aí?
Eu estava mais que pronta.
— Eu te amo. — Ele diz no meu ouvido quando caímos na cama,
sôfregos. — Amar você tem sido minha razão de viver, minha pequena
bruxinha.
Sorrio do apelido velho, mas que ele ainda me atormenta com ele.
— Meu amor por você, Christian, é indestrutível — sussurro de volta.
LIVROS ANTERIORES

A NOIVA SUBSTITUTA DO CEO ( LIVRO 1)


O casamento mais rápido da história e agora estávamos trazendo um
bebê para a mistura?"

Aurora Pontes é a irmã da noiva, a pessoa responsável para dizer ao


noivo, no altar, que a noiva o abandonou. Mas o noivo tem novos planos e
Aurora acaba no altar ao lado dele.
Rafael Lamartine é o CEO da Lamartine Investment. Ele tem planos
para a família Pontes, que não serão frustrados porque uma das herdeiras o
abandonou no altar. Afinal, qualquer uma das irmãs Pontes serve pra casar,
pois ele não tem intenções de fazer esse casamento durar muito tempo.
Ou assim ele pensa.
Quando exige que Aurora substitua a noiva, ele acha que está no
controle, mas logo começa a desejar que o casamento dure mais do que
tinha planejado.
Mesmo sendo um casamento de conveniência, Aurora desconfia que
Rafael esconde segredos, que podem acabar com a chance do casamento
um dia dar certo e evoluir para algo mais que negócios.
Ele parece ser o salvador que vai ajudar os negócios da família, mas
ela está enganada...
O DESEJO ENTRE NÓS ( LIVRO 2)

“Ele é meu chefe e vivemos soltando farpas, mas ele é sexy demais
para eu me prender a esses detalhes. Porém não é só isso que está entre
nós...”.

Ele não pode tê-la.


Mas, mesmo assim, Domênico Garcia perde o controle e cede ao
desejo por sua nova contratada. Lanie Albuquerque mexe com seus
sentimentos e é impossível para ele resistir.
Ela não devia desejá- lo. Ele era seu chefe!
Mas Lanie deseja e está cada dia mais atraída por Domênico, o
advogado que ela sempre teve uma grande admiração. Apesar de, logo no
início, eles terem alguns conflitos a atração entre eles é forte demais para
ignorar.
O que era pra ser apenas uma noite, se torna mais, eles querem mais...
mas a vida oculta de Domênico permitirá que eles tenham os felizes para
sempre?
OUTROS LIVROS DA AUTORA
A ESPOSA ESQUECIDA DO CEO ( LIVRO
ÚNICO)

Clara ficou viúva pouco depois de se casar com o homem que ela
acreditava ser o amor de sua vida e isso quase a destruiu. A única força, que
fez ela se reerguer foi seu bebê que seu marido deixou ainda em seu ventre.
Os anos passam e ela ainda não superou sua perda. Até que no emprego
novo, Clara vê seu chão ruir novamente quando o CEO da empresa entra na
sala de reunião.
O que seu marido morto estava fazendo ali, muito vivo? E por que
agora, ele se chamava Enrico?
Enrico Monteiro acreditava estar preparado para tudo, mas ele estava
enganado, quando uma funcionária louca o confunde com seu marido
morto, ele não lhe dar muito crédito, mas isso o intriga. Por causa de um
acidente cinco anos antes ele perdeu a memória de um período de sua vida e
ele mantinha isso em segredo por causa de sua posição como CEO, no
entanto, não acreditava que ele fosse esse mesmo tal Michel que ela dizia
ser.
Seria possível ele ter se casado e não lembrava de sua esposa?
DOMINIC ( GUARDA-COSTA 5)

Depois de algumas situações que colocam Liz e seu filho Ravi em


perigo, ela contrata o serviço de uma empresa de segurança, mas não
esperava que o homem com quem teve um encontro de uma noite fosse o
enviado pela Marshall Security como seu novo guarda-costas. Agora é seu
coração que está com sérios problemas.
Dominic é irresistível.
Dominic Mancini deixou a posição de CEO na Mancini Holding por
um ano e foi trabalhar como guarda-costas na Marshall Security, mas em
seu último trabalho ele encontra a mulher que ficou em sua cabeça depois
de uma noite quente. Liz e seu filho Ravi precisam de proteção, e ele é o
cara certo para proteger os dois. Ela e o filho conquistam seu coração
rapidamente e não há nada que ele não faria para protegê-los.
As lembranças da noite que tiveram juntos e o desejo que ainda
sentem... Será difícil não misturar trabalho e prazer.
Ele quer ser profissional, mas Liz o deixa louco.
As linhas ficam borradas e ele não resiste.
Agora ele quer essa pequena família para ele.
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Table of Contents
NOTA AUTORA
INDÍCE
SINOPSE
PRÓLOGO
CAPÍTULO 01
CAPÍTULO 02
CAPÍTULO 03
Capítulo 04
CAPÍTULO 05
CAPÍTULO 06
Capítulo 07
CAPÍTULO 08
CAPÍTULO 09
CAPÍTULO 10
CAPÍTULO 11
CAPÍTULO 12
CAPÍTULO 13
CAPÍTULO 14
CAPÍTULO 15
CAPÍTULO 16
CAPÍTULO 17
CAPÍTULO 18
CAPÍTULO 19
CAPÍTULO 20
CAPÍTULO 21
CAPÍTULO 22
CAPÍTULO 23
CAPÍTULO 24
CAPÍTULO 25
CAPÍTULO 26
CAPÍTULO 27
CAPÍTULO 28
CAPÍTULO 29
CAPÍTULO 30
CAPÍTULO 31
CAPÍTULO 32
CAPÍTULO 33
EPÍLOGO
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