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Título original: A Filha Secreta do CEO

Copyright © 2022 Bruna Catein.

Todos os direitos reservados.


Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida em
qualquer meio ou forma – impresso, digital ou audiovisual – sem o
consentimento por escrito da autora.

1ª edição, julho de 2022. Rio de Janeiro.

Revisão: Camila Brinck.


Capa: A. E. Gabriel.
Diagramação: Bruna Catein.
Imagens: Adobe Stock.
AVISO:

Este livro não é recomendado para


menores de 18 anos.
É um romance adulto. Contém cenas
de sexo explícito, alcoolismo e palavras de
baixo calão.
SUMÁRIO:

SINOPSE
PRÓLOGO
CAPÍTULO 1
CAPÍTULO 2
CAPÍTULO 3
CAPÍTULO 4
CAPÍTULO 5
CAPÍTULO 6
CAPÍTULO 7
CAPÍTULO 8
CAPÍTULO 9
CAPÍTULO 10
CAPÍTULO 11
CAPÍTULO 12
CAPÍTULO 13
CAPÍTULO 14
CAPÍTULO 15
CAPÍTULO 16
CAPÍTULO 17
CAPÍTULO 18
CAPÍTULO 19
CAPÍTULO 20
CAPÍTULO 21
CAPÍTULO 22
CAPÍTULO 23
CAPÍTULO 24
CAPÍTULO 25
CAPÍTULO 26
CAPÍTULO 27
CAPÍTULO 28
CAPÍTULO 29
CAPÍTULO 30
CAPÍTULO 31
CAPÍTULO 32
CAPÍTULO 33
CAPÍTULO 34
CAPÍTULO 35
CAPÍTULO 36
CAPÍTULO 37
CAPÍTULO 38
CAPÍTULO 39
CAPÍTULO 40
EPÍLOGO
SINOPSE
Jenny é mãe solteira e está acostumada a se virar sozinha para
criar Lorie, a sua filha de apenas 6 anos. Tudo estava indo bem até
que a lanchonete onde Jenny trabalhava fechou as portas.
Desesperada para conseguir algum sustento, a mulher envia
currículos por toda Nova York até que finalmente recebe uma
proposta da Lancaster Enterprises. Ao chegar lá, descobre que a
vaga disponível era para secretária do CEO da empresa. Ela aceita
sem pensar duas vezes, mas logo descobre que a vida lhe pregou
uma peça: o homem para quem Jenny iria trabalhar era ninguém
mais, ninguém menos que o pai de Lorie.
Jenny e Bruce se conheceram em uma noite de bebedeira que
acabou na cama. No dia seguinte, ambos seguiram com suas vidas
e mal se importaram em pedir o número de telefone um do outro. O
que nenhum dos dois imaginava era que aquele sexo sem
compromisso daria um fruto para a vida inteira. Ao contrário de
Bruce, Jenny nunca esqueceu a noite em que a filha foi concebida e
quando ela reencontra o homem, a paixão que ela nutriu,
inconscientemente por tanto tempo vem à tona.
Será que Jenny vai conseguir trabalhar com o CEO gostoso sem se
deixar abalar pelas emoções? Por quanto tempo ela vai guardar
esse segredo?
Dedicatória:
Para a Bruna de 2013 que começou a escrever
apenas por hobby e não fazia ideia que
chegaria tão longe. Nós conseguimos!
Obrigada por não desistir do nosso sonho♥
PRÓLOGO

Minha pele estava completamente suada enquanto eu


rebolava em cima do homem que conheci no bar. Meus dedos
afundavam em seus ombros musculosos à medida que eu movia o
quadril com mais velocidade, deixando que seu membro farto e
rígido preenchesse cada centímetro do meu interior
.
O pequeno quarto de motel estava escuro e apenas alguns
feixes de luz entravam através da persiana na janela. O único
barulho que havia no local era o som dos nossos gemidos e
respirações ofegantes. No ar, pairava um excitante cheiro de suor
misturado ao perfume de marca que o sujeito usava. Bruce... acho
que esse é o nome dele. Minha mente estava uma bagunça e eu me
recusava a processar os acontecimentos recentes.
A lembrança de quando surpreendi o meu ex-namorado na
cama com a vizinha atormentava a minha sanidade e rasgava o
meu coração. Depois do flagra, saí para beber e resolvi transar com
o primeiro cara bonito que cruzou o meu caminho. Eu sabia que
essa não era uma maneira muito digna de superar uma traição
recente, mas cada um tinha o seu jeito de lidar com a dor.
Eu precisava admitir que a transa para esquecer o idiota que
me fez sofrer saiu melhor que o esperado. Quando Bruce me deitou
na cama e a sua boca tocou o meu corpo, toda a minha dor
emocional foi embora. Eu não sentia mais o coração pesado ou a
necessidade de matar o meu ex. Agora, eu só conseguia gemer e
arquear os meus seios na direção do homem à minha frente para
que ele pudesse beijá-los.
— Porra... você é a mulher mais gostosa que eu já comi. —
Ele enterrou o rosto entre os meus seios e deslizou a língua quente
e úmida em minha pele suada.
Meu corpo estava em êxtase enquanto as mãos de Bruce
exploravam as minhas curvas, sua boca brincava com os meus
seios e o seu pau mergulhava cada vez mais fundo no meu corpo.
Todas essas sensações maravilhosas me faziam pensar em
começar de novo. Posso ir para outro lugar, começar uma vida
nova, arranjar um emprego novo... Eu posso ser feliz outra vez.
Apeguei-me aquele pensamento de esperança até onde a
minha sanidade permitiu e deixei que o meu corpo fosse levado pelo
ritmo de Bruce. Para um bêbado, até que ele sabe bem o que está
fazendo. Suas investidas ficaram mais intensas e eu literalmente
comecei a quicar em seu colo — precisei me segurar com mais
força em seus braços para que eu não me movesse muito e nossos
corpos se separassem durante o processo. Eu estava tão perto do
fim, não podíamos parar agora.
Bruce mordiscou o meu mamilo esquerdo e eu gritei. Meus
músculos internos se apertaram ao redor do seu membro e então eu
fui consumida pela força do orgasmo. Afundei minhas unhas nos
ombros musculosos do homem e eu soube que ele também
alcançou o ápice quando senti o seu gozo quente jorrar em meu
interior. Havia tanta quantidade que logo começou a escorrer pela
parte interna da minha coxa.
Ambos ofegamos, exaustos, e deitamos lado a lado na cama
para recuperar o fôlego. Fechei os olhos por alguns minutos e
aproveitei aquele breve momento de paz. Há muito tempo eu não
tinha um orgasmo. Meu ex-namorado, Gustav, era um bunda mole
que só pensava em seu benefício próprio. Perdi a conta das vezes
em que ele gozou e mal se preocupou se eu também tinha chegado
ao fim. Um estranho que conheci há algumas horas teve mais
consideração pelo meu prazer do que o homem que esteve ao meu
lado nos últimos 2 anos. Bom... o meu ex que se foda!Espero que a
vizinha vadia passe pela mesma frustração na cama que eu.
Enquanto eu estava perdida em pensamentos, senti Bruce
levantar da cama. Voltando à realidade, abri os olhos e me deparei
com ele se vestindo para sair. Meu coração se apertou e eu soube
que estava na hora de dizer adeus.
— Tenho que pegar um voo para Los Angeles daqui há
algumas horas — ele se explicou, ao fechar o zíper da sua calça
jeans.
Assenti e me sentei na cama. Apoiei minhas costas na
cabeceira sem me preocupar em puxar o lençol para cobrir o meu
corpo nu. Bruce já viu tudo que tinha para ver mesmo...
Provavelmente, eu passaria a noite aqui nesse quarto. Não
queria voltar para casa e correr o risco de encontrar Gustav por lá.
Eu fui bem clara quando disse que o queria fora do meu
apartamento, mas não se passou tempo o suficiente para que ele
tirasse todas as suas coisas. Esperarei alguns dias e depois eu
volto... tenho trabalho e dinheiro no banco, então consigo me virar
— mesmo que eu tenha que dormir nesse motel por algumas noites.
— Adorei te conhecer, Jenny — Bruce confessou, enquanto
vestia a sua jaqueta de couro por cima da camiseta branca.
Ele foi até o espelho que estava posicionado sobre uma
cômoda velha perto da porta e penteou seu cabelo preto com o
auxílio dos dedos, tentando deixá-lo o menos bagunçado possível.
Bruce aparentava ser alguns anos mais velho que eu, mas o jeito
que ele se vestia entregava que ainda estava na casa dos vinte.
Mesmo com a barba por fazer, ele ainda tinha uma aparência jovial.
— Também gostei de te conhecer, Bruce. — Direcionei-lhe
um sorriso fraco.
O homem abriu a porta e hesitou em sair. Com um
movimento rápido, ele se virou e veio na direção da cama onde eu
estava sentada. Perdi o fôlego quando Bruce se inclinou e depositou
um selinho em meus lábios.
— Adeus, docinho. — Ele me deu uma piscadela e caminhou
para fora do quarto, fechando a porta atrás de si.
Passei o resto da noite acordada, pensando naquele beijo de
despedida e no fato de que jamais veria Bruce outra vez. Sequer
trocamos os nossos números de telefone e eu não fazia ideia de
qual era o sobrenome do sujeito.
Foi apenas uma transa rápida para relaxar e eu já consegui o
que queria: acalmar os meus nervos. Agora, tenho que esquecer
Bruce e seguir em frente.

Dois meses depois...


— Um caralho que eu vou seguir em frente! — gritei,
enquanto olhava para o teste de gravidez com o resultado positivo
na minha mão.
O banheiro da rodoviária estava lotado e uma fila de
mulheres esperava para usar a cabine imunda onde eu me
encontrava, mas eu não conseguia me importar com elas lá fora.
Não conseguia me importar com nada além do teste que estava nas
minhas mãos.
Fiquei em pânico com a realidade que se desenhou diante
dos meus olhos: eu estou grávida. Grávida de um homem
completamente desconhecido com quem eu transei em um
momento de carência. Um homem que eu jamais veria novamente e
que provavelmente fugiria se eu o procurasse para dizer o que
aconteceu.
Que merda passou pela minha cabeça? Transar com um
desconhecido sem usar proteção? Eu estava bêbada demais para
pensar com coerência naquele dia, mas isso ainda não justificava a
minha irresponsabilidade. Sinceramente, acho que tive sorte de ficar
apenas grávida... Eu podia ter contraídoherpes ou algum outro tipo
de doença venérea.
Sempre quis ser mãe, mas isso aconteceu na pior hora
possível. Eu estava de mudança para Nova York onde começaria
uma vida nova e feliz, longe da Filadélfia e do meu ex. Acabei
vendendo o meu antigo apartamento, pois cada canto daquele
cubículo me lembrava dos anos que morei ali com Gustav. Sequer
me dei ao trabalho de procurar um emprego, usei o dinheiro da
venda para comprar um apartamento no Bronx e o resto eu decidi
que deixaria nas mãos de Deus.
— Você morreu aí dentro? — Uma mulher bateu na porta da
minha cabine. — Anda logo, o meu ônibus já vai sair!
Com uma inquietação que me rasgava o peito, olhei
novamente o teste de gravidez para ter certeza de que não vi
errado. Duas riscas... significa positivo.
Suspirei pesadamente e joguei a embalagem no cesto de lixo
— que já estava transbordando com tanto papel higiênico usado.
Franzi o nariz e então abri a porta da cabine do banheiro. A mulher
que me esperava do lado de fora me lançou um olhar zangado que
decidi ignorar. Eu tinha que correr e pegar o ônibus que me levaria
para Nova York.
Enquanto eu esperava na fila de embarque, uma lágrima
desceu do meu olho e eu respirei fundo, lutando para não chorar em
público. A minha vida mudou tanto nos últimos meses. Agora, eu
estava sozinha no mundo, carregando uma criança em meu ventre
que nunca conheceria o pai. Eu sabia que os desafios de ser uma
mãe solo não seriam fáceis, mas eu tinha certeza que faria de tudo
para criar o meu futuro filho ou filha do melhor jeito possível.
Assim que o motorista do ônibus abriu a porta para que os
passageiros entrassem, eu subi a bordo e me acomodei em um
banco ao lado da janela. Fiquei perdida em pensamentos enquanto
tentava imaginar que tipo de surpresas o futuro reservava.
Levei um susto quando uma garota de cabelos castanhos e
aparência cansada se sentou ao meu lado. Sua enorme bolsa de
viagens bateu no meu rosto enquanto ela tentava se organizar no
assento e eu a encarei, inevitavelmente.
— Desculpe. — Ela me direcionou um sorriso sem graça. —
Não havia espaço para a minha bolsa no compartimento de carga
do ônibus.
Apenas assenti e lhe devolvi um sorriso para mostrar que eu
compreendia. A pobrezinha parecia desesperada, ela olhava pela
janela a todo momento, como se temesse alguma coisa.
— Será que vai demorar muito para o motorista partir? —
perguntou, receosa.
Dei de ombros e olhei pela janela. A última pessoa da fila
embarcou e a porta foi fechada. Pouco tempo depois o ônibus
começou a andar. A garota ao meu lado suspirou, aliviada, e relaxou
visivelmente no assento.
— Está fugindo de alguma coisa? — as palavras escaparam
da minha boca antes que eu pudesse contê-las.
Ela pareceu hesitante por alguns segundos e então assentiu.
— Meu padrasto... ele é controlador e me odeia. Infelizmente,
a minha mãe finge que não percebe isso e quando vou me queixar
diz que estou apenas fazendo drama. — A garota enrugou as
mangas do casaco e eu franzi o cenho ao ver um hematoma em seu
antebraço direito. — Nem me obrigue a mostrar como estão as
minhas pernas.
— Eu sinto muito — falei, com uma careta de desconforto. Eu
sentia pena da menina.
— Não foi a primeira vez que isso aconteceu, mas garanto
que será a última — ela suspirou. — E tudo porque eu perguntei se
podia fazer uma tatuagem.
— Ele te bateu por causa disso? — indaguei, incrédula.
A garota assentiu.
— Quantos anos você tem?
— Dezesseis — respondeu, e olhou para a janela
novamente.
— Mesmo que você vá para Nova York, nada impedirá a sua
mãe e o seu padrasto de irem até você...
— Sinceramente, eu espero que aqueles dois me esqueçam.
— Ela deu de ombros. — Fugi de casa com dinheiro suficiente
apenas para comprar uma passagem de ônibus. De qualquer forma,
não terei nem mesmo um endereço onde eles possam me procurar.
A propósito, me chamo Brittany.
— Sou Jenny. — Sorri amigavelmente e apertei a mão da
garota. — Tenho 21 e também pretendo começar de novo em Nova
York.
Brittany me devolveu o sorriso e olhou para a janela lá fora.
— Nesse caso, Jenny, espero que tenhamos um bom
recomeço — comentou, distraída.
Assenti e observei uma última vez o pôr do sol da cidade
onde eu nasci. Lembrei da minha infância difícil nos lares adotivos.
Fui abandonada na porta de um orfanato quando eu era apenas um
bebezinho, nunca conheci os meus pais biológicos e, honestamente,
não fazia questão de conhecê-los.
Completamente perdida em pensamentos, repousei a mão
em meu ventre e o acariciei sobre o tecido da blusa de algodão que
eu usava. Naquele momento, um sentimento de esperança me
invadiu. Quando eu chegar no meu novo lar, encontrarei um
emprego para sustentar a mim e ao meu bebê. Nós dois seremos
felizes e eu darei a essa criança tudo que eu não tive.
CAPÍTULO 1

Era início da noite. O ar engordurado da lanchonete cheirava


a cigarro e café mal passado. Quando o último cliente saiu, eu corri
para limpar o chão enquanto Brittany mexia na caixa registradora
para fazer o balanço do dia.
Seis anos se passaram desde que nos mudamos para Nova
York, Brittany e eu dividíamos o apartamento e as despesas desde
então. Durante o primeiro mês na cidade, conseguimos emprego na
lanchonete do senhor Chang — um chinês de setenta anos que era
o nosso vizinho de porta — e tivemos renda o suficiente para comer
e pagar as contas, até agora.
Um nó se formava em meu estômago sempre que eu
lembrava que esse era o nosso último dia de trabalho. A lanchonete
localizada em Chinatown fecharia as portas, pois o senhor Chang
decidiu que estava na hora de se aposentar. Ele queria viver seus
últimos anos sem o estresse do trabalho, então vendeu o
estabelecimento decrépito para uma imobiliária que iria demolir a
loja e construir uma academia de artes. Eu estava feliz por ele
conseguir o descanso merecido, mas isso significava que Brittany e
eu ficaríamos sem emprego. E nós precisávamos de dinheiro para
pagar as contas.
Desde que fomos avisadas sobre o fechamento da
lanchonete, começamos a deixar currículos em qualquer lugar que
estivesse contratando. Infelizmente, não tínhamos um diploma de
faculdade — o que diminuía as nossas opções no mercado de
trabalho. Sei que Brittany tinha seus motivos para estar aflita, mas a
minha preocupação era muito maior, afinal, havia outra pessoa que
dependia de mim para sobreviver: a minha filha, Lorie.
Pensar no bem estar e no conforto de Lorie era o que me
motivava a levantar da cama todas as manhãs e dar o meu melhor.
Eu me sentia extremamente culpada por mão poder estar o tempo
todo ao lado dela, mas ao menos eu conseguia fazer a alegria da
garotinha lhe presenteando com tudo que ela pedia em suas
cartinhas para o papai Noel.
Ser mãe solo não era uma tarefa fácil, mas acho que eu
estava conseguindo me virar muito bem. Durante o dia, Lorie ficava
sob os cuidados de Rebeca, uma adolescente carismática que
também era nossa vizinha. Eu sempre pagava a garota no final do
mês pelo serviço de babá, mas eu não poderia mais fazer isso
agora que ficaria desempregada. Ao menos, terei tempo de sobra
para ficar com a minha filha. Fiquei perdida em pensamentos
enquanto terminava de passar o esfregão no piso de lajota.
A porta de acesso para a cozinha da lanchonete se abriu e o
senhor Chang saiu de lá com uma pasta na mão. Limpei uma gota
de suor que escorria em minha testa e observei enquanto o idoso
caminhava vagarosamente até um dos banquinhos que estava em
frente ao balcão. Ele se acomodou ali e abriu a pasta azul, tirando
dali alguns papéis.
— Preciso falar com vocês duas — disse o senhor Chang,
com o seu sotaque chinês de sempre.
— Estamos ouvindo. — Brittany fechou a caixa registradora e
se aproximou dele.
Deixei o esfregão encostado na parede e caminhei até o
balcão, parando ao lado da minha amiga que parecia tão cansada
quanto eu.
— A empresa que comprou a lanchonete começará a
demolição ainda essa semana — explicou. — Então, certifiquem-se
de levar todas as suas coisas embora. Provavelmente, essa é a
última vez que pisaremos aqui. — Ele gesticulou para o ambiente ao
nosso redor.
— Nunca pensei que diria isso, mas vou sentir saudade de
pegar o metrô todos os dias na volta para casa — Brittany
confessou com os olhos marejados, e retirou o avental encardido
que usava sobre a roupa de garçonete.
— Não temos nada aqui, senhor Chang. A não ser as
lembranças — murmurei, distraída. — Espero que eu consiga um
emprego novo. Entreguei currículos em tantos lugares que nem me
lembro para quais vagas me candidatei.
O idoso me direcionou um sorriso compreensivo.
— Tenho certeza que encontrarão alguma coisa. Vocês são
jovens e tem muitas oportunidades pela frente.
— Obrigada, senhor Chang. Espero que o senhor fique bem.
— Sequei uma lágrima que escorreu do meu olho, era difícil me
despedir do lugar que me ajudou a colocar comida na mesa por
tanto tempo.
— Fico triste em saber que o senhor vai embora. — Brittany
encolheu os ombros. — Tem mesmo que voltar para a China?
O senhor Chang relutou em responder, mas assentiu.
— Vocês encontrarão os seus caminhos. — Ele tentou nos
confortar com aquelas palavras. — Vocês duas ainda tem muito o
que viver, sei que serão felizes.
Assenti e lhe direcionei um sorriso fraco. O senhor Chang
tinha um jeito sábio de falar. Muitas vezes, as suas palavras
tocavam no fundo da minha alma.
Passamos os próximos minutos observando a lanchonete em
silêncio até que decidimos que era a hora de voltar para as nossas
casas. O senhor Chang assinou o nosso último cheque de
pagamento e então nos dispensou com lágrimas e abraços.
Brittany e eu pegamos o metrô de volta para o Bronx e
ficamos em silêncio durante todo o trajeto. Acho que ambas
estávamos tentando digerir que aquela era a última vez que
fazíamosaquele caminho de volta para casa. Quando chegamos ao
nosso prédio, já passava das 20h30. Senti-me culpada por saber
que naquele horário Lorie já tinha jantado e, em breve, iria dormir.
Ao entrar no apartamento encontrei a TV ligada e as duas
meninas no sofá. Rebeca sorriu e acenou para mim, em seguida,
Lorie se levantou e correu de maneira desengonçada para me
abraçar. Abaixei-me e a peguei no colo com um pouco de
dificuldade. Minha garotinha ficava maior a cada dia e, no fundo, eu
tinha medo que ela crescesse rápido demais. Eu queria estar
presente o tempo inteiro e aproveitar cada segundo da sua infância,
mas se eu fizesse isso não teríamos o que comer.
— Senti saudade, mamãe — Lorie me cumprimentou com a
sua voz extremamente fofa, e enterrou o rosto na curva do meu
pescoço.
Brittany sorriu e pegou a minha bolsa para que eu pudesse
segurar melhor a menina que estava em meu colo.
— Também senti saudade, meu amor. — Acariciei seu cabelo
que estava preso com marias-chiquinhas.
— Bom, acho que vou para casa. Voltarei amanhã. —
Rebeca se aproximou de mim com um sorriso para se despedir.
Sorri para ela, mas logo me lembrei que não teria como pagar
a garota por mais tempo.
— Rebeca, eu sinto muito dizer isso, mas não posso mais te
pagar. — Suspirei. — A lanchonete do senhor Chang fechou as
portas definitivamente. Teremos que dar um tempo no seu serviço
de babá.
A adolescente de cabelos cacheados me direcionou um olhar
compreensivo e assentiu.
— Sem problemas, assim eu tenho mais tempo de estudar
para as provas da semana que vem. — Ela acariciou o bracinho de
Lorie que estava ao redor do meu ombro.
— Obrigada por tudo. — Sorri, agradecida.
Rebeca se despediu de mim com um aceno e saiu pela porta.
Brittany deixou o corpo relaxar no sofá e tirou o tênis
encardido que usava. Ela massageou os pés por alguns instantes e
me encarou.
— A princesinha adormeceu. — Apontou para a menina em
meus braços.
Eu devia ter percebido que Lorie estava dormindo, ela nunca
ficava tanto tempo em silêncio. Desde que aprendeu a falar, estava
sempre questionando tudo ao seu redor e discutindo com as
pessoas. Ela era uma garotinha irritada e mandona —
completamente diferente de mim. Como toda criança, Lorie tinha
seus momentos de birra, mas na maioria das vezes era um docinho.
Eu a amava mais que tudo e estava sempre dividida entre trabalhar
para lhe dar coisas boas ou ficar em casa acompanhando o seu
crescimento.
— Coloque ela na cama, você trabalhou o dia todo. Deve
estar cansada para carregá-la no colo por muito tempo.
— Acho que eu devia passar mais tempo com a minha filha.
— Dei um beijo no rosto de Lorie e ela mal se mexeu durante o
processo. — Me sinto tão culpada, Brittany... Não quero que ela
tenha uma mãe ausente, sei o quanto isso é ruim.
— Você é uma ótima mãe, Jenny — minha amiga tentou me
consolar. — Se mata de trabalhar todos os dias para não deixar que
as coisas faltem para a sua filha. Lorie tem apenas cinco anos, mas
é esperta o bastante para entender o sacrifício que você faz por ela.
Assenti, um pouco pensativa. Brittany tinha razão, mas eu
temia que Lorie crescesse ressentida comigo de alguma forma.
Decidida a deixar aquele pensamento angustiante de lado,
caminhei para o quarto onde eu dormia com a minha filha e a deitei
na cama de casal que dividíamos. A garotinha suspirou e abriu os
olhos, sonolenta. Direcionei-lhe um sorriso terno e deitei ao seu
lado, deixando minha mão acariciar a sua bochecha gorducha. Ela
sorriu para mim e adormeceu novamente.
Às vezes, eu me pegava olhando para Lorie e tentando listar
que traços ela herdou do pai. Eu sabia que o cabelo loiro escuro
veio de mim, já os olhos azuis e nariz arrebitado certamente faziam
parte da genética de Bruce. Eu ainda sonhava com ele algumas
vezes. Por mais que eu tentasse esquecê-lo, o homem sempre
vinha em meu pensamento. Era inevitável. O perfume que ele usava
na noite que o conheci ficou gravado em minha memória assim
como as sensações que ele me fez sentir.
Tentei conhecer outros caras depois que me mudei para
Nova York. Muitos até demonstravam interesse em mim, mas
quando descobriam que eu tinha uma filha, começavam a se afastar
— certamente, não queriam assumir uma responsabilidade que não
os pertencia. Com o passar do tempo, comecei a aceitar que talvez
fosse melhor assim. Eu estou feliz com a companhia de Lorie e
Brittany, então por que estragar isso envolvendo um homem
desconhecido em nossas vidas? Depois de muitas decepções
amorosas, decidi que viveria apenas para a minha filha e que a
minha missão de agora em diante seria fazê-la feliz. Não
precisávamos de mais ninguém, pois sempre teríamos uma à outra.
CAPÍTULO 2

Fazia duas semanas que Brittany e eu ficamos


desempregadas. O dinheiro que tínhamos em nosso fundo de
emergência nos garantia alguns meses de contas pagas e comida
racionalizada, mas não poderíamos viver assim para sempre.
A única coisa que me deixava feliz era que eu podia estar
mais próxima de Lorie nesse período.Tive a sorte de estar em casa
para acompanhar o seu primeiro dentinho cair e até deixei cinco
dólares embaixo do seu travesseiro. Honestamente, eu temia que
não tivesse dinheiro para dar por todos os dentes de leite que ela
fosse perder.
Era uma manhã nublada de segunda-feira. Eu tinha acabado
de chegar em casa depois de colocar Lorie no ônibus que a levaria
para a escolinha. Brittany e eu nos sentamos em frente à TV para
assistir um programa de reformas — estávamos começando a ficar
viciadas nessas coisas. Todos os dias tínhamos a mesma rotina:
acordar, comer, assistir TV e voltar para a cama.
Fiquei tão entretida com o programa que assistíamos que
quase pulei do sofá quando o meu celular tocou. Quando peguei o
telefone que estava na mesa de centro, percebi que era um número
privado.
— Alô? — atendi, em um tom formal.
— Jenny Spencer? — perguntou, a voz feminina do outro
lado.
— Sim, sou eu mesma. Em que posso ajudar?
— A senhora foi selecionada para uma entrevista de emprego
em nossa empesa.
— O quê?! — Meu grito de surpresa fez com que Brittany me
encarasse com olhos arregalados. Ao perceber que me exaltei,
pigarreei e tentei retomar o controle da voz antes que a minha
chance de contratação fosse por água abaixo. — Perdão, a senhora
dizia que eu fui selecionada, certo? — falei, com um tom mais sério.
— Exato, Srta. Spencer. Por favor, compareça em nossa
sede antes das onze horas — a mulher prosseguiu normalmente
com o seu discurso. — Enviamos o endereço para o seu e-mail. Não
se atrase.
— Certo, obrigada.
Desliguei o telefone e encarei Brittany. Seus olhos brilhavam
com empolgação e curiosidade.
— Você recebeu uma proposta de emprego? — minha amiga
indagou, animada.
Assenti com emoção e ela bateu palmas. A camiseta larga
que Brittany usava deixava à mostra a grande tatuagem de rosas
que ela fez em seu braço direito assim que nos mudamos para cá.
— Preciso comparecer à uma entrevista primeiro. Tenho que
chegar antes das onze.
— São quase dez horas da manhã! — ela exclamou. — Vá
se arrumar!
— C-certo...
Levantei do sofá, desesperada, e corri até o quarto para
procurar alguma roupa apresentável que passasse um ar de
responsabilidade. Encontrei um terninho lavanda no fundo do meu
armário e rapidamente o vesti. Eu devia parecer apresentável, então
prendi meu cabelo em um coque para trás e coloquei meus óculos
de leitura para o caso de eu precisar assinar algum contrato. Passei
um pouco de corretivo para esconder as olheiras causadas pelas
noites mal dormidas, peguei minha bolsa de ombro preta e saí do
apartamento às pressas.
Segui o endereço que me enviaram e fui parar no centro de
Manhattan, em frente a um enorme prédio de vidro fumê. Na
fachada estava escrito “Lancasther Enterprises” em letras
espelhadas que passavam um ar moderno e luxuoso para o local.
Era o mesmo nome que estava no e-mail que recebi, então tive
certeza que cheguei ao meu destino. Será que eu realmente tenho
chance de conseguir um emprego aqui? Respirando fundo, adotei
uma postura elegante e entrei no prédio.
O interior da construção era tão luxuoso quanto o exterior.
Homens engravatados e mulheres de salto e roupas sociais
caminhavam por todos os lados, alguns com celulares nos ouvidos,
outros com maletas nas mãos... todos pareciam extremamente
ocupados com os seus afazeres. Por um instante, me senti uma
formiguinha perto de toda aquela gente.
Olhei para o relógio digital que havia em uma parede e vi que
eram 10:55h. Corri até a recepção onde havia uma loira de meia
idade falando ao telefone. Ela desligou no instante que eu me
aproximei.
— Em que posso ajudá-la? — perguntou de maneira formal.
Percebi que era a mesma voz que falou comigo por telefone.
— Sou Jenny Spencer, estou aqui para a entrevista —
respondi, enquanto apoiava minha bolsa no balcão e puxava de lá a
minha identidade para mostrá-la à mulher.
A recepcionista observou o documento por alguns segundos
e então me devolveu.
— Vá até a sala do RH, fica no 15º andar. — Ela apontou
para o elevador que havia no saguão. — Um dos nossos
representantes irá entrevistá-la. Boa sorte, Srta. Spencer.
— Obrigada. — Direcionei-lhe um pequeno sorriso e segui o
meu destino.
Às 10:59h eu estava no andar da entrevista. Coloquei meu
melhor sorriso no rosto e bati na porta onde estava sinalizado
“Gestão de RH”. A porta se abriu quase imediatamente e uma
senhora baixinha de cabelo encaracolado me convidou para entrar
Sentei-me na cadeira diante da mesa de vidro e ela se
acomodou do outro lado. Aguardei alguns instantes enquanto a
senhora folheava alguns papéis e respirei fundo quando ela me
encarou.
— Srta. Spencer, estou vendo aqui que trabalhou por seis
anos em uma lanchonete em Chinatown, certo?
Concordei com a cabeça.
— Que função você ocupava lá?
— Bom, eu era do tipo faz-tudo — confessei. — Servia as
mesas, limpava o chão, ajudava no preparo das comidas de vez em
quando...
— Tem alguma experiência com organização de agenda e
contratos?
— Mais ou menos. — Encolhi os ombros. — Mas eu aprendo
rápido — completei, com um sorriso amarelo.
A senhora assentiu e olhou para os papeis.
— Nossa empresa é sócia da imobiliária que comprou a
lanchonete. O Sr. Lancasther achou interessante realocar os
funcionários para que não ficassem sem trabalho, mas pelo que vi
aqui só havia você e uma outra mulher — ela comentou, com os
olhos fixos no papel que estava em suas mãos. — Só temos uma
vaga disponível, no entanto, e como a senhora já trabalhou como
recepcionista em um escritório na Filadélfia, decidimos dar
prioridade ao seu currículo.
Arqueei as sobrancelhas. Era um pouco assustador saber
que a empresa pesquisou tanta coisa sobre mim. Já fui
recepcionista em um escritório de advocacia no passado, mas
acabei largando o emprego quando decidi que me mudaria para
Nova York.
— O cargo é para secretária do nosso CEO, o Sr. Lancasther.
Ele é um homem muito exigente, então a senhora precisará ter o
máximo de comprometimento e organização.
Definitivamente, eu não podia recusar essa oferta. Seria um
cargo mais elevado que exigiria mais responsabilidades, mas eu
teria um salário melhor que me permitiria dar mais conforto à minha
filha. Eu sou uma mulher inteligente, consigo organizar agendas e
marcar reuniões. Farei isso pela Lorie.
— Eu agradeço a oportunidade. — Respirei fundo e
prossegui. — Seria um prazer trabalhar aqui.
A senhora do RH assentiu.
— Bom, então seja bem vinda à Lancasther Enterprises, Srta.
Spencer. — Ela apertou a minha mão. — Temos algumas
formalidades para resolver e te darei alguns contratos para assinar,
mas você poderá começar o trabalho logo em seguida.
— Certo. — Sorri e aguardei pacientemente que a senhora
preparasse os papéis para eu assinar. Isso foi rápido! Espero que
minhas tarefas aqui na empresa sejam tão fáceis quanto essa
contratação.
Depois de meia hora preenchendo papeladas finalmente saí
da sala do RH. Consegui alguns minutos e liguei para Brittany
avisando que fui contratada. Pedi que ela buscasse a Lorie na
escola quando chegasse o horário da saída e então desliguei o
telefone para me concentrar em meu novo emprego.
Fui guiada por uma funcionária até a cobertura, onde seria o
meu local de trabalho. Muito chique, Jenny... De uma lanchonete
para um escritório no último andar de uma investidora internacional.
Parece que a vida finalmente resolveu sorrir para mim.
Quando as portas do elevador se abriram, me vi em um
corredor largo e extenso com uma única porta de vidro fosco no
final. Em frente à essa porta havia um balcão de atendimento
parecido com o da recepção do primeiro andar, porém estava vazio.
A funcionária gesticulou para que eu me sentasse na cadeira atrás
do balcão e eu percebi que ali seria a minha área de trabalho. Era
bem melhor que o ambiente engordurado da lanchonete. Ao menos,
não terei mais que me preocupar com um cabelo oleoso e cheirando
à gordura no fim do dia.
— Fique à vontade, Srta. Spencer. — A mulher que me
acompanhava apontou para o balcão. — Tire um tempo para
conhecer sua bancada de trabalho, vou notificar o Sr. Lancasther
que a nova secretária dele já está aqui.
Assenti e puxei a cadeira estofada para me sentar atrás do
balcão. Havia um notebook com alguns programas já configurados
para uso empresarial, um telefone fixo com um bloquinho de post-its
amarelos ao seu lado e um porta-canetas com a logo da empresa.
Olhei o ambiente ao meu redor e percebi que a única
distração para os meus olhos seria uma samambaia artificial que
estava em um vaso na parede direita do corredor. Não havia
nenhuma janela por perto, apenas a porta de vidro fosco atrás de
mim e o elevador vários metros à minha frente.
Suspirei, entediada, e comecei a organizar as coisas para
que tudo estivesse ao meu alcance quando eu precisasse. Enfileirei
as canetas na mesa por ordem de tamanho enquanto esperava pela
chegada do tal Sr. Lancasther e até mudei o plano de fundo do
Notebook. Estava pensando em ligar para Brittany e checar se tudo
estava bem quando senti no ar um cheiro familiar de perfume caro.
Uma mão grande e masculina se estendeu em meu campo de visão
e eu a apertei sem pensar duas vezes, mas fiquei hesitante em
erguer meu olhar.
— Sou o seu novo chefe. — Senti um frio no estômago
quando ouvi aquela frase, sua voz grave era estranhamente familiar
e causou arrepios em meu corpo inteiro. — Me chamo Bruce
Lancasther — completou.
Involuntariamente, o meu olhar subiu até o rosto do Sr.
Lancasther e tudo dentro de mim congelou. Não acredito!
Por um segundo, tive certeza que vi o mundo ao meu redor
girar, capotar e pegar fogo. O homem que estava na minha frente
era o mesmo com quem eu transei para afogar as mágoas na
Filadélfia seis anos atrás. Puta que pariu... o meu novo chefeé o pai
perdido da minha filha!
CAPÍTULO 3

Meus olhos ainda não acreditavam no que viam. Entre tantas


pessoas nesse mundo o meu chefe tinha que ser o Bruce? O
homem que eu jurei esquecer há seis anos, o pai da minha filha, o
protagonista dos meus sonhos molhados? Não... É simplesmente
inacreditável!
Quando me disseram que eu seria secretária do CEO da
empresa, eu imaginei que o meu chefe seria um homem baixinho,
com mais de cinquenta anos e algumas entradas no cabelo. Jamais
pensei que ele fosse esse pedaço de mal caminho que estava
diante de mim — novinho, bonito, alto e com o mesmo olhar
molhador de calcinhas que tinha seis anos atrás. Mas que merda!
Fiquei um bom tempo perdida em um turbilhão de
pensamentos enquanto olhava boquiaberta para o homem diante de
mim. Bruce usava o mesmo corte executivo em seu cabelo preto,
ainda mantinha a barba por fazer e seus olhos azuis não perderam
o brilho intenso que me seduziu de maneira tão tentadora na
primeira vez que o vi.
O filho da mãe continuava diabolicamente lindo. Eu, por outro
lado, sentia que não estava mais nos meus melhores anos. Na
época que o conheci eu estava ruiva e exageradamente maquiada.
Fazia um tempo que eu voltei a usar a cor natural do meu cabelo e,
devido à correria que se instalou em minha vida após a
maternidade, acabei deixando de lado alguns cuidados estéticos —
às vezes, eu sequer passava uma base antes sair na rua.
Céus, espero que ele não me reconheça! Ajeitei os óculos em
meu rosto e tentei manter a calma.
— Você é a Jenny, não é? — ele perguntou, e eu quase caí
da cadeira.
— Como sabe o meu nome? — disparei, aflita. Ele me
reconheceu?
— É o que diz no seu currículo. Jenny Spencer. — Ele ergueu
uma sobrancelha com ironia, em seguida suspirou. — Suponho que
esteja nervosa com o seu primeiro dia aqui, mas tenho muito
trabalho a fazer. Preciso que você me atualize sobre os horários de
reuniões, marque visitas e me encaminhe os contratos que a
empresa fechou na semana passada. Pode fazer isso?
— Claro, eu aprendo com o tempo. — Tentei parecer
confiante, mas por dentro eu estava surtando. Bom, ao menos ele
não me reconheceu... ainda.
— Eu preciso disso para hoje, Srta. Spencer. — O homem
puxou a sua mão do meu aperto e só então eu percebi que ainda a
segurava. — Estarei na minha sala. Você tem até o meio dia para
me passar os horários das reuniões que preciso comparecer hoje à
tarde.
— Mas são 11:45h — comentei, ao ver a hora no
computador.
— Eu sei. — Ele me deu as costas e entrou na porta alta de
vidro fosco, me deixando sozinha com os meus pensamentos.
O cheiro do seu perfume, no entanto, continuou ali pairando
ao meu redor. Inspirei o ar profundamente e senti meu coração doer.
É o mesmo perfume que ele estava usando na noite em que o
conheci. Deitei a cabeça na mesa e gemi com desconforto. Isso não
pode estar acontecendo... Que merda!

Revirei os arquivos do computador atrás da agenda do meu


chefe. Por sorte, a antiga secretária a deixou em uma pasta na área
de documentos. Rapidamente, anotei os horários das reuniões que
estavam marcadas para o dia e me levantei para entregar o papel
com as informações ao pai da Lorie... não... ao Sr. Lancasther.
Porra!
Eu ainda não conseguia acreditar no que estava
acontecendo. Meu coração batia tão forte que eu podia ouvir o som
das palpitações ecoando em meu ouvido. Nunca imaginei que um
dia eu poderia reencontrar o pai da minha filha — quem dirá
trabalhar para ele. Eu não estava preparada para essa situação.
Tinha receio de chegar perto do homem novamente e ele acabar me
reconhecendo, mas não havia para onde fugir. Ou eu fazia o meu
trabalho como se nada estivesse acontecendo ou voltava para casa
e ficava sentada naquele sofá vendo as contas se acumularem.
A realidade era difícil, mas eu tinha que aceitá-la: eu
precisava de dinheiro e não podia me dar ao luxo de pedir demissão
no meu primeiro dia de serviço. O mais lógico a se fazer seria
erguer a cabeça e enfrentar essa situação de frente. Tudo ficará
bem, se Bruce não me reconhecer. Se ele descobrisse sobre o
nosso passado eu me sentiria totalmente constrangida e não
conseguiria trabalhar normalmente. Seria melhor manter isso em
segredo e guardado a sete chaves, até segundo plano.
Respirando fundo, ajeitei os óculos em meu rosto e bati na
porta de vidro fosco.
— Entre — Bruce pediu.
Tentei parecer confiante e tranquila ao abrir a porta — eu não
podia exibir nenhum comportamento suspeito.
A sala dele era tão grande quanto pensei que seria. A parede
principal era feita de vidro e proporcionava uma linda vista dos
arranha-céus de Manhattan. De um lado da sala havia um sofá de
couro preto e do outro uma mesa de madeira nobre e polida. Bruce
estava sentado atrás dela, em uma cadeira de couro reclinável. Ele
me encarava com uma expressão séria, seus cotovelos estavam
sobre a mesa e as mãos apoiadas no queixo.
Engoli em seco e caminhei na direção do homem, fazendo o
possível para evitar contato visual.
— Aqui estão os horários das suas reuniões. — Estendi o
papel para ele.
— Obrigado, Srta. Spencer — respondeu de maneira formal.
Quando a sua mão roçou na minha para pegar as anotações,
o meu corpo inteiro se arrepiou. Estar perto de Bruce novamente me
deixava inquieta, preocupada e agora estranhamente excitada. Pare
já com isso!
Ordenei ao meu corpo para que ele se acalmasse, mas não
tive muito êxito. Em poucos segundos a minha mente ficou inundada
com as lembranças eróticas do que Bruce e eu fizemos seis anos
atrás naquele quarto de motel. Pelo visto, trabalhar aqui será um
dos maiores desafios da minha vida. Ah, querida Lorie, o que eu não
faço por você...
— Se não precisar de mais nada, Sr. Lancasther, eu voltarei
para a minha área de trabalho. — Forcei-me a manter minha
postura profissional e fiz menção para sair.
— Um minuto. — Bruce gesticulou para que eu ficasse no
lugar.
— P-posso ajudar em mais alguma coisa? — gaguejei. Senti
meu rosto corar quando percebi que ele me analisava de cima a
baixo com o cenho franzido.
— Me responda uma pergunta, Srta. Spencer... Por acaso já
nos encontramos em algum lugar?
Minhas mãos começaram a suar frio. Precisei de todo o meu
esforço para negar com a cabeça e lhe direcionar um olhar confuso.
— Creio que não, Sr. Lancasther. Nunca o vi em toda a minha
vida — menti, descaradamente.
O homem ficou pensativo, mas assentiu.
— Tenho a estranha sensação de que já nos conhecemos —
ele divagou. — Talvez seja apenas impressão.
Dei um sorriso amarelo, sem saber como fugir daquele
assunto. Felizmente, fui salva quando o celular do homem começou
a tocar. Ele olhou para a tela e suspirou.
— Preciso atender essa ligação. — Bruce apontou para a
porta. — Pode voltar ao trabalho. Me envie por e-mail os arquivos
de todos os contratos que a empresa fechou na semana passada e
confirme a minha presença nas reuniões desta tarde.
— Sim, senhor.
Suspirei aliviada quando dei as costas para o homem e saí
da sala. Eu estava a cinco passos de surtar, mas estava fazendo o
possível para permanecer calma até o fim do expediente. Se
passaram seis anos, ele mal se lembra de mim e provavelmente
nunca irá lembrar. Se Bruce tivesse que me reconhecer, acho que
isso teria acontecido nos primeiros segundos em que me viu.
Eu devia estar aliviada por saber que eu poderia trabalhar em
paz e oferecer mais conforto para Lorie, mas no fundo eu me sentia
magoada por Bruce ter se esquecido daquela noite e de mim. Todo
esse tempo não houve um dia sequer que eu não pensasse nele. A
todo momento o homem estava em minha mente — e ouso admitir
que até mesmo em meu coração —, mas para Bruce, com certeza,
foi apenas uma transa qualquer, algo que homens como ele estão
acostumados e a ter.
Sei que não fui a primeira e nem a última mulher que ele
comeu e foi embora logo em seguida sem deixar qualquer tipo de
contato.
Com muito esforço me concentrei no trabalho pelo resto do
dia e fiz o possível para tirar qualquer pensamento sobre Bruce da
minha cabeça.
Era 17:45h da tarde, faltava 15 minutos para o meu
expediente chegar ao fim. Eu estava terminando de enviar os
contratos para o e-mail do meu chefe quando ouvi o elevador. Meus
olhos seguiram à direção do som e eu vi uma mulher bem vestida
com cabelos negros minuciosamente escovados chegando ao
andar. Fiquei imóvel enquanto a observava se aproximar da minha
área de trabalho, seus olhos azuis me fitavam de uma maneira tão
estranha que foi impossível não me sentir intimidada.
— O Bruce está na sala? — Sem esperar a minha resposta,
ela bateu na porta de vidro fosco.
— O Sr. Lancasther saiu para uma reunião às 17h e ainda
não retornou — expliquei, com uma leve inquietação.
A mulher fez uma cara de desgosto e assentiu. Se afastando
da porta, ela parou ao lado do balcão onde eu trabalhava e me
encarou de cima a baixo.
— Então você é a nova secretária dele?
— Sim. Me chamo Jenny Spencer. — Estendi a mão para
cumprimentá-la, tentando parecer amigável.
— Não perguntei o seu nome. — Ela cruzou os braços diante
do peito e me lançou um olhar debochado.
Meu rosto corou com vergonha e eu desejei me esconder
embaixo da mesa até que a mulher fosse embora. Pelo visto, ela é a
típica rica arrogante que se sente superior aos outros e pensa que
tem o direito de pisar nos menos favorecidos.
Sem saber como reagir, fiquei em silêncio, encarando a tela
do computador. Eu queria peitar a vadia e responder à altura, mas
sempre que eu estava prestes a iniciar uma discussão com alguém
o meu cérebro congelava e todas as palavras sumiam da minha
mente. Brittany dizia que eu precisava aprender a não levar
desaforo para casa, mas eu simplesmente não conseguia. Preferia
ignorar uma discussão e ter paz pelo resto do dia ao invés de iniciar
uma briga que só me renderia estresse. Até Lorie era mais irritada
que eu.
— Você não vai durar muito nesse cargo... nenhuma das
outras secretárias durou. — A infeliz sorriu feito uma víbora e se
virou, caminhando de volta até o elevador.
Observei a sujeita ir embora e respirei aliviada quando as
portas do elevador se fecharam. Por um momento desejei que os
cabos se rompessem e a vadia fizesse uma descida direta até o
inferno. A ideia me fez rir, mas logo me concentrei em terminar o
meu trabalho. Eu estava louca para chegar em casa e contar para
Brittany sobre o dia tenso que vivenciei.
Os minutos seguintes passaram voando e eu terminei o meu
trabalho rapidamente. Enquanto eu arrumava a minha bolsa e me
preparava para sair, ouvi o som do elevador parando no andar.
Estremeci pensando que poderia ser a mulher arrogante que voltou
para me fazer mais insultos, mas fiquei aliviada ao ver Bruce
caminhando pelo corredor. Meus olhos encontraram os seus e ele
me cumprimentou com um aceno de cabeça.
— Está indo embora, Srta. Spencer? — indagou, ao parar em
frente à minha mesa.
— Sim, já terminei o trabalho de hoje. — Encaixei a alça da
bolsa em meu ombro.
— Os contratos foram enviados para o meu e-mail?
— Sim, todos eles.
Bruce me analisou por alguns segundos e concordou.
— Perfeito. Esteja aqui amanhã às 8h e não se atrase.
Assenti para o homem e, tomando coragem, me despedi:
— Boa noite, Sr. Lancasther. — Sem esperar uma resposta,
caminhei em direção ao elevador e deixei Bruce para trás.
Ao chegar no meu apartamento, fechei a porta e deixei o meu
corpo escorregar para o chão. Eu estava cansada — fisicamente e
mentalmente. Brittany percebeu a minha presença e saiu do meu
quarto para me receber, ela usava pantufas brancas e um pijama
rosa de mangas compridas.
— Acabei de colocar a Lorie para dormir. Como foi o seu
primeiro dia de trabalho? — Ela franziu o cenho ao me ver sentada
no chão.
Estressada, soltei o meu coque e retirei os óculos que
precisei usar o dia inteiro.
— Eu encontrei o pai da Lorie — disparei, enquanto encarava
o teto do apartamento.
— O quê?! — Brittany se ajoelhou ao meu lado e virou o meu
rosto para que eu olhasse para ela. — Do que está falando, Jenny?
— Como sabe, eu fui contratada para ser a secretária do
CEO da empresa. — Respirei fundo, me preparando para o que viria
a seguir. — Acontece que esse meu novo chefe é o Bruce, o homem
com quem eu transei antes de deixar a Filadélfia... o pai da Lorie!
Brittany arqueou as sobrancelhas e me encarou boquiaberta.
— Caralho! Ele te reconheceu? Você contou que ficou
grávida e teve uma filha? — Minha amiga mal se importou em
disfarçar a curiosidade enquanto me atingia com as perguntas.
Neguei e encostei a cabeça na porta, me recordando do
longo dia que eu tive.
— Passei o dia inteiro usando os meus óculos de leitura
como disfarce. Acho que isso ajudou um pouco. Ainda bem que
mudei a cor do meu cabelo dois anos atrás, eu não saberia como
reagir se Bruce me reconhecesse. — Suspirei, aflita. — Porra, ele é
o meu chefe!
— Mas também é o pai da sua filha. É melhor tomar
cuidado... mais cedo ou mais tarde ele pode acabar te
reconhecendo.
— Não se eu usar isso. — Mostrei a ela os meus óculos de
leitura.
— Não pode usar os óculos como disfarce pelo resto da sua
vida, Jenny!
— Diz isso para o Clark Kent — respondi, com ironia. — Se
ele pode, eu também posso.
Minha amiga revirou os olhos e suspirou.
— Jenny, talvez a vida esteja lhe dando uma oportunidade.
Acho que você devia contar para ele o que aconteceu...
Lancei um olhar irritado para minha amiga.
— Eu não posso contar sobre a Lorie! — exaltei-me. — Bruce
é presidente de uma investidora que fatura bilhões todos os meses.
Como acha que ele iria reagir se a nova funcionária o
surpreendesse dizendo que tem uma filha e que ele é o pai? —
Brittany encolheu os ombros, enquanto refletia sobre o que eu disse.
— Não conheço nada sobre a personalidade dele, mas posso
afirmar que o homem pensaria que eu estou interessada nos seus
bens.
— Eu entendo o seu ponto de vista, mas acho que você não
pode impedir que Lorie conheça o pai... — minha amiga
argumentou, um pouco hesitante. — Ela está crescendo e ficando
mais esperta a cada dia. Daqui a alguns anos não vai mais acreditar
na cegonha e vai querer a verdade.
— Eu sei, Brittany. — Massageei as minhas têmporas e
deixei um suspiro escapar. — Mas honestamente, tudo que eu
quero nesse momento é trabalhar em paz e trazer dinheiro para
casa. Esse cargo paga bem, talvez eu até consiga colocar Lorie na
escolinha de ballet que ela tanto quer.
— Você está uma pilha de nervos e esse foi apenas o seu
primeiro dia na empresa. Tenho medo de como ficará depois de uma
semana ou um mês... Não importa se o emprego paga bem, não
vale a pena continuar no cargo se ele afeta a sua sanidade.
— Não foi o emprego que afetou a minha sanidade, foi o
Bruce! — confessei. — E também a vadia de olhos azuis que se
acha superior aos funcionários...
Brittany ficou confusa, então resolvi explicar detalhadamente
sobre o meu dia de trabalho para que ela entendesse tudo o que
aconteceu. Depois que a nossa conversa acabou, decidi seguir em
frente e continuar exercendo a minha função na empresa.
Eu não era próxima de Bruce para simplesmente lembrá-lo
da nossa noite de sexo e dizer que ela resultou em outra vida. Se
um dia eu sentir algum tipo de confiançano meu chefeeu contarei a
verdade para ele, mas se eu perceber que ele é tão ruim e
mesquinho quanto a mulher que me insultou na empresa, então eu
prefiro que Lorie jamais conheça o pai. Talvez fosse egoísmo da
minha parte, mas eu não queria que a minha filha chegasse perto
daquele tipo de gente ou corresse o risco de ser humilhada por eles.
CAPÍTULO 4

Quatro semanas se passaram desde que comecei a trabalhar


na Lancasther Enterprises. Para o meu alívio, Bruce não direcionava
muita atenção a mim, então eu conseguia me concentrar no trabalho
e exercer a minha função de secretária tranquilamente.
O nosso relacionamento era extremamente formal. Ele me
cumprimentava no início do dia — assim como fazia com os outros
funcionários — e me desejava uma boa volta para casa no fim do
meu expediente. A maior parte da nossa comunicação era feita por
e-mail — o que era um alívio, pois eu ainda me sentia inquieta
quando estava perto dele.
Com o passar dos dias descobri que Bruce era bem próximo
da vadia de olhos azuis que insistia em rebaixar os funcionários
sempre que surgia a oportunidade. Valery Cooper, esse era o nome
da desgraçada. Todos os dias ela desfilava pela empresa em cima
de um salto agulha como se fosse a dona de tudo aquilo e, para
piorar, vivia atrás de Bruce como um cachorrinho desesperado por
atenção.
Eram duas horas da tarde, eu estava concentrada em
organizar a pasta de documentos que me foi entregue quando o
meu celular tocou. Ajeitei meus óculos e franzi o cenho ao ver que
era uma ligação de Brittany. Fiquei preocupada que algo pudesse
ter acontecido com Lorie, então atendi rapidamente.
— Está tudo bem? — perguntei, com inquietação.
— Jenny! Eu fui chamada para uma entrevista de emprego!
— minha amiga exclamou. Ela parecia absurdamente feliz.
— Parabéns, Brittany. — Sorri, embora ela não pudesse ver.
— Só há um problema: preciso comparecer no local ainda
hoje e não tenho com quem deixar a Lorie. Ela não teve aula hoje,
foi dia do conselho de classe.
— Tente a Rebecca — sugeri.
— Já bati na porta dela, mas não tem ninguém em casa. —
Brittany suspirou, entristecida. — Olha, terei que deixar a Lorie com
você, na empresa.
— O quê?! — Levantei-me da cadeira involuntariamente. —
Não pode... eu nunca vi crianças aqui e o Bruce...
— Tarde demais. Já estamos na frente do prédio. Você pode
descer para pegar a sua filhinha?
— Sua vaca — rosnei, me sentindo irritada.
Brittany gargalhou do outro lado da linha.
Desliguei a chamada e me afastei da mesa, caminhando em
passos apressados até o elevador. Eu precisava chegar ao térreo o
mais rápido possível.
— Devia ter me avisado com antecedência... — resmunguei,
ao me aproximar de Brittany e Lorie. Elas estavam sentadas em um
banquinho próximo à recepção. — Eu tenho uma pilha de
documentos para organizar e entregar para Bruce até o fim do dia...
— Eu vou me comportar, mamãe. — Lorie se levantou de
onde estava e me deu um abraço. Acariciei o cabelo da menina e
encarei a minha amiga que havia acabado de se posicionar na
minha frente.
— Conversei com Lorie, ela prometeu que ficará quietinha. —
Brittany me entregou uma pequena mochila rosa. — Coloquei aí
dentro algumas coisas para ela se distrair enquanto você faz o seu
trabalho.
— Certo. — Suspirei e pendurei uma alça da mochila em meu
ombro. — Quando você estará de volta?
— Não tenho certeza. Se eu passar na entrevista, acho que
começarei a trabalhar ainda hoje.
— Ligue para avisar o que aconteceu.
— Está bem. Me desejem sorte. — Ela acenou e se virou,
caminhando em direção à saída da empresa.
— Boa sorte! — Lorie e eu falamos em uníssono.
No instante em que Brittany atravessou a enorme porta de
vido, segurei a mão da minha filha e caminhei em direção ao
elevador para levá-la até o meu andar de trabalho. Lorie já me
acompanhou algumas vezes quando eu trabalhava na lanchonete
do senhor Chang e ele nunca se importou, mas agora as coisas
eram diferentes. Eu estava trabalhando em uma empresa grande e
séria, não sei se os filhos dos funcionários eram bem vindos aqui
sem algum motivo aparente. Só espero que isso não me traga
problemas...

Para a minha sorte, tudo correu bem. Consegui trabalhar


tranquilamente, enquanto Lorie desenhava em silêncio sentada no
tapete que havia no corredor. Bruce não dava as caras na empresa
desde que saiu para um almoço com investidores no fim da manhã.
Como não havia mais nenhum compromisso em sua agenda para o
dia, eu presumi que não o veria até o fim do meu expediente. É
melhor assim... Não sei o que eu faria se Bruce ficassecara a cara
com Lorie.
Da minha mesa de trabalho eu podia ver Lorie alguns metros
à minha frente, bebendo suco de uva em sua garrafinha e
desenhando corações com um giz de cera rosa. Haviam alguns
papéis espalhados ao redor da menina, mas eu recolheria tudo
antes de sair.
Com um pequeno sorriso, desviei o olhar para longe da
minha filha e encarei a tela do computador, fiquei conferindo os e-
mails da empresa até que ouvi o barulho do elevador chegando ao
andar. Cada pelo do meu corpo se arrepiou e eu engoli em seco.
Bruce Lancasther voltou.
Ergui o olhar para o corredor à minha frente e o meu coração
encheu de angústia. Bruce estava na companhia de Valery e os dois
caminhavam com os olhos fixos na garotinha que brincava no
tapete. Apesar de Bruce e eu possuirmos um relacionamento
estritamente profissional, vê-lo perto daquela mulher me deixava
terrivelmente incomodada.
— O que é isso? Abriram uma creche nesse andar? —
resmungou a vadia de olhos azuis.
— Srta. Spencer? — Bruce olhou diretamente para mim. —
Quem é essa criança e o que ela está fazendo aqui?
Merda. Merda. Merda!
— Ah... ela... é a minha filha, Sr. Lancasther — gaguejei, me
sentindo terrivelmente insegura. O meu pior pesadelo estava se
tornando realidade. Bruce e Lorie se encontraram... Droga!
— Não pode trazer a sua filha para o trabalho quando bem
entender — o meu chefe me repreendeu, com um tom sério.
Um sorriso debochado se formou na boca de Valery.
— Você precisa deixar os seus problemas em casa, aqui é
um ambiente sério e profissional. Não pode haver pirralhos correndo
pela empresa. — Valery olhou com repulsa para a garotinha que
estava à sua frente.
Levantei-me da cadeira para ir até a minha filha, mas
congelei no lugar quando Lorie ficou de pé e cruzou os braços
diante do peito.
— Não falem assim com a minha mãe! — ela gritou, com a
voz zangada.
— Cale a boca, coisinha. Os adultos estão conversando... —
a vadia de olhos azuis debochou.
— Não me chame de coisinha, eu tenho nome! — Em um
piscar de olhos, Lorie abriu a tampa da sua garrafinha e jogou o
restante do suco de uva na saia de Valery. Ela gritou e sacudiu o
tecido cinza que agora estava com uma enorme mancha roxa. Ah
não!
— Você vai pagar por isso, sua pirralha! — Valery gritou com
tanta raiva que Lorie deu alguns passos para trás.
— Não fale assim com ela, é apenas uma criança — Bruce
interferiu, colocando a mão no ombro da mulher ao seu lado.
Após respirar fundo por alguns segundos, Valery me encarou
de um jeito furioso e apontou o dedo indicador na minha direção.
— Vou fazer com que descontem do seu salário o valor da
limpeza dessa saia. Você está acabada, secretariazinha! — Depois
da ameaça, a mulher virou e caminhou apressadamente até o
elevador. Não consegui piscar até que as portas se fecharam e ela
desapareceu do meu campo de visão.
Encolhi os ombros, incapaz de acreditar no que estava
acontecendo. Eu seria demitida com apenas um mês de trabalho!
Espero que Brittany passe na entrevista, porque sustentar a casa
será função dela a partir de hoje.
— Como eu estava dizendo, Srta. Spencer, não pode trazer
os seus filhos para a empresa — Bruce voltou a me repreender.
— Ei, você não pode falar assim com a minha mãe! Quer que
eu suje a sua roupa também? — Lorie ameaçou Bruce com a
garrafinha.
Eu me sentia terrivelmente envergonhada. Queria ir até lá
para controlar aquela criança, mas as minhas pernas simplesmente
não obedeciam ao comando do meu cérebro. Ver a minha filha
frente a frente com o homem que era o seu pai me deixou mais aflita
do que a possibilidade de eu estar à beira da demissão.
Depois de um tempo observando a garotinha, Bruce riu e se
abaixou no tapete para falar com ela.
— E quem seria você? — indagou.
— Sou Lorie — a menina respondeu, um pouco tímida.
— Eu me chamo Bruce. — Ele apertou a mão da garotinha,
sem ter a mínima noção de quem ela realmente era. — O que fez
com a Srta. Cooper foi muito errado...
— Eu sei, me desculpe. — Lorie encolheu os ombros. — Eu
só queria defender a minha mãe.
Senti vontade de me esconder em baixo da mesa quando o
olhar do homem se voltou até mim.
— De quem ela herdou esse temperamento explosivo? —
Bruce me perguntou, enquanto se colocava de pé. — Sei que não
foi de você que é calma, centrada e, arrisco dizer, um pouco
insegura.
Engoli em seco. Fiquei tão aflita com a pergunta que respondi
com a primeira coisa que me veio na cabeça:
— Não sei, talvez do pai... — Senti vontade de me bater
quando ouvi aquelas palavras saírem da minha boca.
— Mas eu não tenho pai. — Lorie me encarou com uma
expressão confusa. — A senhora disse que a cegonha me deixou
na sua porta e...
— E ela deixou... — interrompi a garotinha, antes que ela
dissesse mais alguma coisa.
Bruce encarou Lorie com uma expressão indecifrável e
acariciou brevemente a cabeça da menina. Segundos depois ele
veio na minha direção e parou ao meu lado, me lançando um olhar
sério.
— Você cuida dela sozinha? — sussurrou, de modo que
apenas eu pudesse ouvir.
— Ah... sim. — Franzi o cenho, confusa com aquela
pergunta.
— Entendo.
Bruce observou a pilha de documentos que havia na minha
mesa e depois caminhou até Lorie, que estava bebendo o que
sobrou do seu suco de uva. Fiquei surpresa quando ele se abaixou
para falar com a garotinha de maneira amigável.
— Lorie, vamos deixar a sua mãe trabalhar em paz, está
bem? Quer conhecer a empresa? Tem um aquário gigante no
décimo andar...
— Eu quero! — minha filha exclamou, animada.
Bruce sorriu para Lorie e, em seguida, me olhou em busca de
aprovação. Assenti para o homem, involuntariamente, indicando que
estava tudo bem ele levar a menina para dar um passeio até que eu
terminasse o meu trabalho. Na verdade, foi algo gentil da sua parte,
mas também foi inesperado.
Fiquei boquiaberta quando Lorie segurou a mão de Bruce
sem ao menos olhar na minha direção e os dois caminharam até o
elevador.
Nunca pensei que veria a minha filha ao lado do pai. Eu
estava incrédula, feliz e também sentia uma pontada de culpa. Eles
mal sabiam do laço profundo que os unia e eu era a única
responsável por guardar esse segredo. No entanto, eu não podia
baixar a guarda. Perdi o controle das coisas por um dia e Lorie saiu
para passear pela empresa com o pai, além de causar um bom
motivo para a minha demissão. Isso nunca mais pode acontecer!
CAPÍTULO 5

Recolhi os papéis de desenho que Lorie deixou espalhados


pelo chão, guardando-os em sua mochila rosa, e me forcei a voltar
ao trabalho. Passei a próxima meia hora tentando me concentrar na
organização dos documentos empilhados sobre a minha mesa, mas
a verdade era que eu mal conseguia pensar com coerência para
colocar os nomes em ordem alfabética. Não podia negar que estava
preocupada com Bruce e Lorie que até agora não voltaram. Eu
estava pensando seriamente em ir atrás deles quando o elevador
apitou, indicando que alguém chegou no andar.
Quando as portas da caixa de metal se abriram, eu fiquei
surpresa ao ver Brittany entrando no corredor, ela estava
boquiaberta enquanto admirava cada centímetro do lugar. Assim
que os seus olhos pousaram em mim, ela me direcionou um sorriso
desanimado e se aproximou da minha área de trabalho.
— Bem vinda — a cumprimentei. — Como foi a entrevista?
Brittany suspirou e colocou sua bolsa marrom de couro
falsificado sobre o meu balcão.
— Eu não consegui o emprego. — Encolheu os ombros,
parecendo cansada.
— Sinto muito. — Afaguei a sua mão de maneira terna.
— Eu respondi todas as perguntas da forma mais profissional
possível e no final disseram que iriam analisar o meu currículo
novamente e me ligariam em até um mês. — Ela se apoiou no
balcão. — É claro que eles não irão me ligar, só não quiseram
admitir na minha cara que eu não me encaixava na vaga. Que
droga, Jenny, eu não sirvo nem para fritar hamburguer.
— Devia enviar o seu currículo para o RH aqui da empresa —
sugeri. — Se alguma vaga ficar disponível, acho que iriam te
contratar...
— É a décima vez que você me fala isso, mas eu não
consigo me acostumar com esse ambiente empresarial. — Brittany
encarou os contratos que estavam sobre a minha mesa de trabalho.
— Tantos papéis e responsabilidades com finanças... — Ela
balançou a cabeça negativamente. — Isso não é para mim, amiga.
— Brittany, você precisa começar de algum lugar.
— Prefiro estar desempregada do que trabalhando em algo
que não gosto — ela disparou. — De qualquer forma, me desculpe
por aparecer mais cedo e deixar a Lorie com você sem perguntar.
Eu fiquei animada e estava quase certa de que conseguiria o
emprego.
— Não se desculpe por isso, Lorie é minha filha. Eu tenho
que arcar com essa responsabilidade — a tranquilizei.
— Não tem que estar sozinha o tempo todo, Jenny.
Combinamos que eu cuidaria dela enquanto você trabalha e esse é
o meu compromisso agora. Vou levar a garotinha para casa. —
Brittany olhou ao seu redor e, em seguida, me encarou. — Onde ela
está? Foi ao banheiro?
Suspirei e passei a mão em meu cabelo que estava
começando a ficar bagunçado pelo estresse. Aproveitei o momento
para tirar os meus óculos e dar um pouco de descanso para os
meus olhos enquanto Bruce não voltava.
— Lorie foi conhecer a empresa... com o pai dela — soltei de
uma vez. Eu precisava desabafar sobre o assunto ou teria um
colapso nervoso a qualquer momento.
Brittany assentiu, mas arregalou os olhos no instante em que
o seu cérebro processou a informação.
— O quê? Acho que ouvi errado... — Ela pigarreou. — Você
disse que Lorie foi conhecer a empresa com...
— O pai dela — completei, enquanto encarava a minha
amiga. — Bruce a levou para que eu pudesse terminar o meu
trabalho.
Brittany ficou boquiaberta.
— Antes que você pergunte, ele não faz ideia de quem a
Lorie realmente é — expliquei. — Na verdade, ela fez uma bagunça
mais cedo, jogou suco de uva na roupa da Valery e eu pensei que
estava no olho da rua.
— Valery Cooper? A vadia de olhos azuis? — perguntou, com
um semblante divertido.
— Ela mesmo — respondi, com um pequeno sorriso.
— Me lembre de pagar um sorvete para Lorie depois, tenho
certeza que a infeliz realmente mereceu. — Brittany me direcionou
uma piscadela.
Nossa conversa foi interrompida pelo som do elevador.
Quando as portas se abriram, vi o inconfundível terno preto que
Bruce usava e ao seu lado estava uma garotinha loira de olhos
azuis.
— Eles voltaram — sussurrei.
Brittany arregalou os olhos e se virou abruptamente na
direção do elevador. Aproveitei o momento para colocar os meus
óculos e voltar ao disfarce da secretária tímida que Bruce nunca viu
na vida.
Quando pai e filha entraram no corredor, notei que o homem
segurava a mão da garotinha de maneira protetora enquanto ela
saltitava ao seu lado carregando uma casquinha de chocolate.
— Mamãe, o tio Bruce me comprou um sorvete! — Lorie
informou, animada, assim que me viu.
— Que bom, filha — comentei com um sorriso.
Bruce parou há alguns metros de distância da minha mesa e
só então soltou a garotinha, que correu para abraçar a minha amiga.
— Tia Brittany, a senhora voltou! — Ela apontou a casquinha
de chocolate na direção da mulher que estava à sua frente. — Quer
sorvete?
— Não, obrigada. — Brittany direcionou um sorriso amarelo
para a garotinha e observou Bruce de cima a baixo sem ao menos
se preocupar em disfarçar a curiosidade.
Ao perceber que estava sendo observado, o homem se
afastou um pouco e encarou os papéis em cima da minha mesa.
— Pensei que já teria terminado os contratos à essa altura,
Srta. Spencer. — Ele cruzou os braços ao redor do peito.
Encolhi os ombros e senti o meu rosto esquentar. A verdade
era que não consegui organizar nada desde que Bruce saiu com
Lorie para explorar a empresa.
— Acho que eu acabei tirando a concentração dela —
Brittany interveio, ao perceber que eu não diria nada. — Estou aqui
para levar Lorie para casa.
Bruce encarou a minha amiga por alguns segundos e
assentiu.
— Vamos andando? — Brittany segurou a mão de Lorie e
pendurou a sua bolsa marrom no ombro. — Conversamos em casa,
Jenny.
Quando Brittany tirou a mochila de Lorie de cima do balcão,
ela me lançou um olhar malicioso e eu revirei os olhos. Tinha
certeza que quando eu chegasse em nosso apartamento eu seria
bombardeada por uma série de perguntas sobre Bruce, afinal, essa
era a primeira vez que Brittany o via.
— Até mais tarde. — Acenei para a minha amiga. — Mamãe
te ama, Lorie — despedi-me da minha filha, que acenou de volta
para mim.
— Tchau, tio Bruce! — Lorie acenou para o homem de terno
que estava parado ao lado da mesa. Ele sorriu brevemente e
acenou para a garotinha.
Fiquei calada enquanto olhava as duas se afastarem.
Quando elas entraram no elevador, percebi que estava sozinha com
Bruce e comecei a me sentir nervosa, provavelmente havia muita
coisa para explicar.
— Sr. Lancasther, eu...
— Preciso desses contratos com urgência — ele me
interrompeu, seu olhar vagava entre os documentos e o meu rosto.
Depois de alguns segundos me encarando, Bruce suspirou e
passou a mão pelo cabelo, bagunçando levemente o seu corte
executivo que sempre estava impecável. — Estarei esperando na
minha sala. Não demore, Jenny... por favor.
Sem me dar oportunidade para dizer qualquer coisa, Bruce
entrou na porta de vidro que ficava ao lado do meu balcão de
trabalho e a deixou entreaberta.
A sua reação foi absurdamente estranha. Pensei que o
homem iria gritar porque passei o dia ao lado daqueles papéis e não
terminei de organizar nem a metade, mas ele foi educado ao falar
comigo, me chamou pelo primeiro nome e ainda pediu por favor.
Talvez, passar um tempo com Lorie amaciou o coração de pedra
que o homem aparentava ter.

Depois de vários minutos perdida em pensamentos e


lembranças do passado, tomei vergonha na cara e mergulhei no
trabalho. Já estava de noite quando coloquei o último contrato na
pilha. Agora, todos os nomes dos clientes estavam organizados por
ordem alfabética e prontos para serem armazenados no arquivo da
empresa.
Com um suspiro, me levantei da cadeira estofada onde
passei a tarde inteira sentada, ajeitei os óculos e peguei a pilha de
papéis que devia pesar pelo menos 5kg. Por sorte, a porta da sala
de Bruce ainda estava entreaberta, então eu apenas a empurrei
com o quadril para que o meu corpo pudesse passar. Quando entrei
na sala, vi o homem em pé de frente para a grande janela de vidro
admirando a linda vista noturna da cidade.
— Aqui estão os contratos, Sr. Lancasther — anunciei, me
inclinando para colocar os papeis sobre a sua mesa.
Quando voltei a olhar para o homem, percebi que ele estava
me encarando e senti as minhas bochechas corarem.
— Obrigado, Jenny. Posso te chamar assim?
— P-pode — gaguejei, envergonhada. Negar algo para o
meu chefenão é uma opção, principalmente depois da bagunça que
a Lorie fez.
Ele me direcionou um sorriso amigável que retribuí
involuntariamente.
Fiquei parada ao lado da mesa pensando no que dizer.
Cruzei os braços diante do peito para disfarçar a minha insegurança
e decidi me aproximar da janela de vidro onde Bruce estava.
— Sr. Lancasther, eu gostaria de pedir desculpas pelo caos
que a minha filha causou mais cedo. Minha amiga cuida de Lorie
enquanto eu trabalho, mas hoje houve um imprevisto e ela deixou a
menina aqui na empresa sem me consultar... Prometo que isso não
vai se repetir. — Parei a alguns centímetros de distância do homem
e o encarei. — Por favor, não me demita.
Bruce assentiu e me deu um tapinha no ombro — o que me
pegou completamente de surpresa.
— Não se preocupe, imprevistos acontecem — foi tudo que
ele se limitou a dizer e me direcionou um sorriso compreensivo.
Fiquei surpresa com a resposta dele, mas me senti aliviada
por saber que o meu emprego não corria perigo.
— Obrigada por entender — deixei escapar.
Bruce assentiu e olhou para a janela.
— É uma linda vista, não? — tentou mudar de assunto.
Pisquei um pouco distraída e encarei a paisagem. Diante do
nosso campo de visão estendiam-se as luzes dos arranha-céus que
se espalhavam por toda Manhattan, ao longe eu até podia ver a
iluminada ponte do Brooklyn com o trânsito que era comum naquele
início de noite. A cidade era linda quando vista de cima, até me
esqueci do caos que reinava lá embaixo com tantas pessoas
voltando para casa ao mesmo tempo.
— É sim — admiti, com os olhos fixos no topo iluminado do
Empire State. Estávamos há vários quilômetros do edifício, mas o
seu tamanho fazia parecer que ele estava há apenas algumas ruas
de distância da empresa.
— Sua filha é uma garotinha muito esperta — comentou, com
uma certa admiração. — Quantos anos ela tem?
Engoli em seco ao ouvir aquela pergunta. Não sei se eu me
sentia à vontade para conversar com ele sobre Lorie.
— Cinco — respondi, um pouco hesitante.
— Não deve ser fácil criá-la sozinha. — Ele voltou o olhar
para mim. — Crianças nessa idade fazem perguntas demais,
principalmente quando começam a frequentar a escola. É difícil ver
que todos os seus amigos tem um pai e você não.
Franzi o cenho com aquele comentário. Ele parecia ser
estranhamente pessoal, como se Bruce entendesse perfeitamente a
situação.
— Lorie sabe que não tem um pai. Fiz questão que ela
entendesse desde pequena que famílias não precisam ser
compostas por pai e mãe para serem completas. — Cruzei os
braços diante do peito, me sentindo um pouco insegura. — Há
crianças que são criadas pelos avós ou apenas pela mãe e são
felizes...
Fui incapaz de conter as lembranças do passado que vieram
em minha mente. Recordei-me dos lares adotivos onde morei e de
como eu fui infeliz na maioria deles. Só soube o que era o amor de
uma família aos 14 anos, quando fui adotada por um casal de meia
idade que não podia ter filhos. Eles foram os meus tutores até que
alcancei a maioridade e se tornaram o mais próximo que já tive de
um pai e uma mãe. Infelizmente, os dois faleceram de uma doença
terminal alguns anos antes de eu deixar a Filadélfia. A perda deles
acabou comigo a ponto de eu iniciar um relacionamento apenas
para não me sentir sozinha. Foi assim que me envolvi com Gustav
— um sujeito preguiçoso e narcisista que teve a cara de pau de me
trair dentro do meu próprio apartamento.
— Isso é a mais pura verdade — Bruce comentou, me
trazendo de volta ao presente. Seus olhos estavam vidrados na
paisagem à nossa frente e ele parecia perdido em pensamentos. —
Crianças não precisam de uma família completa para serem felizes,
elas precisam de amor.
Assenti, em concordância com o que ele disse. Lorie não
tinha um quarto cheio de brinquedos caros ou um pai para carregá-
la nos ombros, mas recebia amor materno o suficiente para dar e
vender. Eu podia afirmar que a minha filha era feliz mesmo com o
pouco que tinha.
— A propósito, obrigada por cuidar da Lorie, apesar da
bagunça que ela fez — sussurrei, aproveitando a oportunidade. —
Acho que ela gostou do senhor.
— Sua filha foi a primeira criança que me achou tolerável. —
Ele sorriu ironicamente. — Não levo jeito com os baixinhos. Na
verdade, fico aliviado em não ter filhos para cuidar.
Meu sangue gelou naquele momento e uma lágrima escapou
dos meus olhos. A enxuguei discretamente e voltei a encarar a
paisagem noturna através da janela. Depois do que ouvi, fui
perfeitamente capaz de entender que Bruce não ficaria feliz em
saber que era pai. Acho que ele sequer seria amigável com Lorie se
eu dissesse que a garotinha era sua filha.
O peso da angústia apertou o meu coração. Foi realizador vê-
lo interagindo com a Lorie uma vez e foi bom saber que ela se
simpatizou com o pai, mas eu não podia permitir que Bruce
descobrisse a verdade. Caso contrário, ele poderia ser rude com a
filha se a visse novamente e eu não queria que Lorie ficasse
magoada. Não queria que ela sofresse uma decepção assim.
— Está ficando tarde, é melhor você ir para a casa. — Bruce
se afastou da janela, caminhando em direção à mesa onde deixei a
pilha de papéis.
— Certo — concordei e respirei fundo, tentando me
recompor. — Boa noite, Sr. Lancasther.
— Boa noite, Jenny. Nos vemos amanhã.
Bruce me deu um breve aceno com a cabeça e começou a
organizar as coisas que estavam na sua mesa. Aproveitei o
momento e saí da sala em passos apressados antes que as minhas
pernas vacilassem na frente do homem.
CAPÍTULO 6

— O Bruce deixou bem claro que não quer ser pai! —


exclamei, em meio às lágrimas que desciam pelo meu rosto.
Minha cabeça repousava no colo de Brittany enquanto ela
tentava me consolar no sofá da sala.
— Shh... chore mais baixo ou vai acordar a Lorie. — Ela
acariciou o meu cabelo.
— Não acredito que estou tão abalada por causa disso... —
Funguei o nariz. — Eu jurei que esqueceria aquele homem, Brittany,
mas agora estou chorando porque provavelmente ele nunca irá
assumir a filha.
— Eu não a culpo, Jenny. Se eu ficasse com um cara igual ao
Bruce, eu também não o esqueceria — ela divagou. — Quando
você me contava histórias sobre ele eu pensava que era um bêbado
qualquer desses que você encontra caído pelos becos, eu não
imaginei que o homem seria tão...
— Você não está ajudando, Brittany!
— Desculpe, eu estou emocionada! Acabei de descobrir que
o pai da Lorie é um bilionário gostoso pra cacete... com todo o
respeito, Jenny. — Ela fez uma pausa. — Não pense que estou de
olho no seu homem.
— Ele não é o meu homem — resmunguei, entre soluços.
— Mas você queria que fosse...
Estalei a língua.
— Não disfarça, eu vi como você estava olhando para ele —
me provocou.
— O quê?! — Levantei a cabeça com tanta rapidez que a
minha visão escureceu por alguns segundos. — Do que você está
falando? É muito perceptível o jeito que eu encaro o Bruce? Pelo
amor de Deus, responda!
Brittany riu e deu de ombros.
— Quem te conhece sabe que você olha com segundas
intenções para o sujeito — comentou, de maneira divertida.
Suspirei e deitei a cabeça em seu colo novamente.
— No dia em que Lorie nasceu, você me disse que não se
importava com o pai dela e que vocês duas seguiriam em frente
sem a ajuda dele. — Brittany voltou a acariciar o meu cabelo. —
Agora você está em prantos por causa de uma frase que ele disse?
Qual foi, Jenny... Bruce não disse que odeia crianças, ele disse que
estava aliviado por não ter filhos.
— Tanto faz! Acho que Bruce não ficará feliz se descobrir que
tem uma filha — choraminguei, enquanto sentia o meu desespero
retornar. — O que mais me assusta é que em apenas um dia as
coisas fugiram do meu controle e os dois acabaram se conhecendo.
Tenho medo do que pode acontecer se Lorie for para a empresa
uma segunda vez.
— Bom, talvez ela jogue mais suco na roupa cara da vadia de
olhos azuis — brincou. — Você e eu somos as únicas pessoas que
sabem desse segredo. Não precisa se preocupar, Bruce não irá
descobrir que tem uma filha a menos que você conte a ele.
Fiquei em silêncio enquanto refletia sobre as palavras da
minha amiga. Eu sabia que ela tinha razão, a única pessoa que
poderia contar para Bruce sobre a paternidade de Lorie seria eu,
então não havia motivo para me preocupar. No entanto, eu me
sentia decepcionada com o que ele havia dito sobre não ter filhos.
Confesso que senti uma certa esperança quando o vi ao lado de
Lorie. O jeito amigável que ele lidou com ela me fez divagar sobre
um dia lhe contar a verdade, mas depois da nossa conversa, no final
do meu expediente, a minha esperança de que ele pudesse ser um
bom pai foi por água abaixo.
Eu estava tão cansada e aflita que acabei adormecendo no
colo de Brittany e só acordei algumas horas depois quando ela
resmungou que queria ir para a cama. Me levantei do sofá, um
pouco tonta pelo sono, e fui para o meu quarto.
Lorie dormia pacificamente no canto da cama que estava
encostada na parede. Com um bocejo, me deitei ao lado dela e
puxei um pouco do cobertor para mim. A garotinha se remexeu no
colchão e abriu os olhinhos.
— Que bom que chegou em casa, mamãe. — Ela rolou na
cama até ficar perto de mim.
— Senti saudade, querida. — A abracei com força e depositei
um beijo no topo da sua cabeça. — Me desculpe por não passar
tanto tempo com você... — sussurrei, sentindo uma enorme culpa.
Minha garotinha estava crescendo tão rápido. Eu daria tudo
para estar ao seu lado 24 horas por dia, acompanhando cada fase
da sua vida, mas se eu fizesse isso não teríamos o que comer.
— O seu novo trabalho é legal, mamãe — Lorie balbuciou,
completamente alheia às minhas preocupações. — Não gostei
daquela mulher malvada, mas o tio Bruce é bonzinho...
— Shh, está na hora de dormir. — Fiz sinal para que ela
ficasse quietinha. Vê-la falando sobre o pai me deixou aflita outra
vez.
— Vou pedir à tia Brittany para me levar ao seu trabalho
amanhã — apesar da sua voz cheia de sono, pude perceber a
empolgação que ela sentia com a ideia de visitar a empresa outra
vez.
— Não, filha... a empresa não é lugar para crianças.
— Por favor, mamãe, me leve para o trabalho amanhã... Eu
quero ganhar outro sorvete de chocolate e ver os peixinhos
coloridos na parede de vidro.
— Filha, eu...
— Por favor — ela insistiu, com os olhinhos marejados.
Suspirei, me sentindo impaciente pela situação em que me
encontrava. Eu não queria prometer nada para Lorie, já que não
poderia levá-la para o trabalho amanhã, então decidi que fazê-la
dormir seria o caminho menos arriscado. Permanecendo em
silêncio, acariciei a cabeça da menina até que ela pegasse no sono.
Fiquei um tempo acordada, fazendo o possível para deixar
Bruce longe dos meus pensamentos. Depois do dia agitado que tive
eu não queria aquele o homem vagando pelos meus sonhos —
como geralmente acontecia. Eu sonhava com Bruce todas as noites.
Às vezes, revivia flashbacks do momento quente que tivemos há
seis anos e, quando a minha imaginação permitia, imaginava
situações novas e intensas que eu sabia que jamais iriam acontecer.
No fundo — bem lá no fundo — isso me deixava imensamente
frustrada.

Eu estava na minha mesa, aproveitando o momento de


descanso que eu tinha depois do almoço. Em poucos minutos eu
precisaria voltar à rotina entediante de anotar recados e organizar
documentos para o meu chefe, então enviei uma mensagem para
Brittany perguntando como estavam as coisas no apartamento.
Hoje, pela manhã, precisei sair antes da Lorie acordar. Fazia
alguns dias desde que ela esteve aqui na empresa e a garotinha
ainda pedia incessantemente que eu a trouxesse para o trabalho.
Ontem à noite ela me disse que estava com saudade de Bruce e
aquilo quase partiu o meu coração. Como Lorie se apegou tanto ao
homem se o viu apenas uma vez? Será que o laço entre pai e filhaé
tão forte assim, ou esse interesse todo é apenas para ganhar mais
sorvete de chocolate?
Enquanto eu olhava para a tela do celular aguardando a
resposta de Brittany, ouvi o som do elevador indicando que alguém
chegou ao andar. Ergui meus olhos e um nó se formou na minha
garganta quando vi Valery Cooper caminhando na minha direção.
Em poucos segundos ela chegou até a minha mesa e me entregou
um recibo.
— Aqui está a conta da lavanderia. — Valery me lançou um
sorriso esnobe e cruzou os braços diante do peito que parecia
siliconado.
Franzi o cenho e peguei o papel para olhar mais de perto.
— 600 dólares?! — gritei, incrédula. — Para tirar uma
mancha de suco de uva?
— Era uma saia cara, Srta. Spencer. Pensou que a remoção
da mancha poderia ser feita com sabão barato e água? — Ela
encarou o blazer azul que eu usava. — Você devia estar ciente que
não usamos o mesmo tipo de roupa. Provavelmente, as suas foram
compradas em algum brechó da caridade.
Respirei fundo para conter a raiva que surgiu dentro de mim,
e lhe direcionei um sorriso falso. Apesar da dificuldade, eu precisava
ser educada com ela. Às vezes eu temia que Valery pudesse
convencer Bruce a me demitir até por espirrar perto dela, então eu
me esforçava para tratá-la com educação — embora ela não
merecesse nem um pouco.
— Farei com que o valor seja descontado do seu pagamento
no fim do mês — ela continuou.
— Mas... — gaguejei, e encarei o papel novamente para ter
certeza de que li certo. — Vai tirar uma boa parte do meu salário!
— Isso é problema seu. — A vadia deu de ombros.
Era nítido no olhar da mulher que ela estava feliz ao ver o
meu desespero. Eu podia chorar e tentar negociar um
parcelamento, mas o meu orgulho me impedia de implorar qualquer
coisa para aquela sujeita. Valery sentia prazer em rebaixar quem
estava abaixo do seu nível social e eu jamais daria esse gostinho
para ela.
— Considere a dívida paga — falei, com os dentes quase
cerrados.
A mulher me lançou um olhar convencido e ficou parada em
frente à porta da sala de Bruce, como um cachorrinho esperando o
dono chegar em casa.
Franzi o cenho e suspirei ao perceber que Valery não iria
embora. A presença dela no ambiente me incomodava de um jeito
inexplicável. Tentei fazer o meu trabalho, mas simplesmente não
consegui encontrar o foco. Quando ergui o meu olhar na direção da
sujeita, a surpreendi me encarando com o nariz franzido. Ao ver que
foi pega, ela farejou o ar por alguns segundos e logo fez uma careta.
— Suponho que esse cheiro de colônia barata esteja vindo
de você. — Valery tirou da bolsa um vidro minúsculo de perfume e
espirrou ao seu redor. Comecei a tossir devido à intensidade do
aroma e ela riu com deboche. — Pobre Jenny, o seu corpo não está
acostumado com produtos de qualidade. Honestamente, quase sinto
pena da garotinha que estava aqui no outro dia. A pobrezinha deve
ser infestada de piolhos e outras coisas...
Antes que eu pudesse me conter meus punhos se fecharam
e eu levantei da cadeira. Ao perceber que me irritei, Valery deu
alguns passos para trás e me encarou com surpresa.
— Escuta aqui, sua piranha, você pode falar de mim o quanto
quiser, mas nunca ofenda a minha filha! — me exaltei.
Valery franziu o cenho diante da minha reação. Me aproximei
um pouco mais e levantei o punho fechado na altura do seu nariz.
Um ódio repentino e incontrolável queimava dentro de mim. Nunca
senti nada parecido antes.
— O que está acontecendo aqui? — Bruce abriu a porta da
sua sala repentinamente.
Apressei-me em ajeitar a minha postura e coloquei as mãos
atrás do corpo antes que o homem percebesse que algo estava
errado.
— Ah, Bruce! — Ela levou a mão até o coração e fingiu estar
assustada. — Essa mulher estava me ameaçando. Fico feliz que
tenha aparecido antes que ela pudesse me matar. Você precisa
rever as pessoas com quem trabalha.
— Acha que a Jenny iria te matar? — O homem na porta riu e
me encarou de cima a baixo. — Ela é calma como um ratinho.
Senti-me insignificante ao ouvir aquele comentário, mas no
fundo estava agradecida por Bruce não ter caído na conversa de
Valery.
— Você não faz ideia do que esse povo é capaz. — A vadia
me encarou com desprezo.
— E você faz? — ele indagou, com uma sobrancelha erguida.
Valery pensou por alguns segundos e deu de ombros.
— Não é difícil adivinhar. Eles cresceram sem modos ou
qualquer noção de etiqueta. — Ela me encarou com o cenho
franzido. — Jenny me ameaçou apenas porque entreguei a conta da
lavanderia.
— Eu te ameacei porque você insultou a minha filha! — gritei.
Ao perceber o quão alta a minha voz saiu, tapei a boca com as
mãos.
Bruce cruzou os braços e Valery deu alguns passos para trás.
— Viu? Ela está louca! — A vadia gesticulou na minha
direção.
Franzi o cenho, completamente irritada com aquilo. Era
verdade que saí do sério, mas foi culpa da vadia de olhos azuis que
insultou a minha filhinha. Isso alterou completamente o meu humor.
Depois de me encarar por alguns segundos, Bruce suspirou.
— Vamos conversar na minha sala, Jenny. — Ele fez sinal
para que eu entrasse.
Encolhi os ombros e me esgueirei pela porta de vidro. O
espaço que havia era pouco e foi impossível não esbarrar o meu
corpo em Bruce quando passei por ele. Minha pele inteira se
arrepiou com um simples roçar do meu quadril em sua coxa e eu
respirei fundo, tentando não perder o foco da situação.
Virei-me para a porta a tempo de ver Valery tentando entrar e
sendo impedida por Bruce que colocou um braço para fechar o seu
caminho. A mulher franziu o cenho.
— Preciso conversar com ela a sós — meu chefe disse, com
um tom sério que me fez engolir em seco.
— Mas eu também tenho coisas para tratar com você —
Valery interveio.
— Suas coisas podem esperar. — E então, ele fechou a porta
na cara da vadia.
O meu queixo caiu e eu reprimi uma risada ao ouvir ela
resmungar do lado de fora. Eu não sabia o que Bruce queria
comigo, mas fiquei feliz ao ver que ele deu prioridade para os meus
assuntos e jogou a mulher inconveniente para escanteio.
Dando as costas para a porta, Bruce caminhou até a sua
mesa de trabalho e fez sinal para que eu o seguisse. Observei que
em cima do móvel havia uma embalagem de comida japonesa e
uma lata de refrigerante aberta — provavelmente, ele deixou a
refeição de lado para ver o que estava acontecendo do lado de fora
da sua sala.
— Sente-se — o homem pediu, enquanto se acomodava em
sua habitual cadeira de couro.
— Obrigada. — Puxei a cadeira estofada que havia de frente
para a mesa e me sentei.
Bruce pegou a embalagem de comida japonesa e começou a
comer tranquilamente com o auxílio de hashis. Fiquei um pouco
surpresa com a habilidade que ele tinha para usar aqueles palitinhos
— era notório que o homem estava acostumado a comer aquele tipo
de comida. Já tentei usar hashis uma vez para comer um yakisoba,
mas não tive sucesso.
Um tempo se passou e eu comecei a me sentir inquieta com
o silêncio que pairava entre nós. Não é possível que Bruce me
chamou aqui apenas para vê-lo comer. Eu estava prestes a
perguntar o que ele queria comigo quando o homem finalmente
abriu a boca:
— Eu ouvi parte da discussão — confessou, ao deixar a
embalagem já vazia sobre a mesa.
Fiz uma careta e encolhi os ombros involuntariamente. Eu
não sabia o que dizer. Com certeza, Bruce me ouviu gritar com
Valery e estava pensando que eu era uma mulher volátil e histérica.
— Não ligue para os insultos da Valery. — Ele baixou o tom
da sua voz para um sussurro. — Eu diria que ela não tem um
caráter muito admirável.
Arqueei as sobrancelhas. Bruce realmente está a meu favor?
Talvez, ele não seja tão próximo de Valery quanto eu achei que
seria. Estranhamente, aquele pensamento me trouxe um enorme
conforto interno. A possibilidade de Bruce não ter um caso com
aquela mulher me deixou mais feliz do que eu gostaria de admitir.
Ok, talvez eu sinta algo por ele depois de tanto tempo... talvez.
— Obrigada por ficar do meu lado, Bru... Sr. Lancasther —
deixei o agradecimento escapar.
— Não quero que meus funcionários sofram injustiças. — Ele
bebeu o último gole do refrigerante e suspirou ao deixar a latinha
vazia sobre a mesa. — E quando estivermos sozinhos, você pode
me chamar de Bruce.
Concordei, um pouco envergonhada.
— Aproveitando que está aqui, eu gostaria de avisar uma
coisa... — mudou de assunto. — Tenho uma conferência de
empresários em Seattle na quarta-feira. Haverá reuniões, palestras
e um jantar beneficente. Preciso que vá comigo para monitorar os
horários da minha agenda e não deixar que eu perca os
compromissos.
— Mas Seattle fica um pouco longe daqui — observei.
— Eu sei. — Bruce concordou com a cabeça. — É por isso
que ficaremos hospedados em um hotel enquanto o evento durar.
Não será por muito tempo, na sexta à tarde voltaremos para Nova
York.
Mantive-me calada para processar o assunto. Eu terei que
viajar com Bruce?
— Haverá outras pessoas da empresa Lancasther nessa
conferência, certo? — perguntei, um pouco receosa.
Para o meu desespero, Bruce negou com a cabeça.
— Há apenas duas vagas para cada empresa. Normalmente
são para o CEO e um acompanhante — explicou. — Estou te
levando porque precisarei ficar ciente dos horários das palestras
importantes, então preciso que você tenha em mãos o cronograma
de todo o evento.
Encolhi os ombros e fiquei em silêncio por alguns segundos
enquanto tentava digerir o fato de que eu iria para outro estado, há
milhas de distância da minha casa, na companhia do meu chefe.
Será apenas uma viagem de negócios. Tentei manter a calma, mas
foi em vão. O simples pensamento de que eu passaria mais tempo
ao lado de Bruce me enchia de pânico, mas também me causava
uma grande euforia.
— Você parece tensa, Jenny — ele comentou, enquanto
analisava o meu rosto. — Não gostou do convite?
Precisei de todo o meu esforço para dar um sorriso forçado.
— É claro que eu gostei — apressei-me em responder. —
Apenas fiquei... surpresa. Pode contar com a minha presença —
concordei em voz baixa. Como se eu tivesse outra escolha...
Depois de um tempo em silêncio, ele assentiu e a sua boca
se curvou em um meio sorriso que deixaria qualquer mulher de
calcinha molhada — e eu não era uma exceção. Por fora eu estava
calma, mas por dentro o meu corpo ardia com o desejo reprimido.
Cada vez que eu chegava perto de Bruce eu revivia as lembranças
da noite que passamos juntos e ansiava que ela se repetisse algum
dia. No entanto, mesmo que eu odiasse, precisava admitir a
verdade: talvez, ele nunca se lembre de quem eu sou.
— Está gostando de trabalhar aqui, Jenny? — Bruce mudou
o assunto da conversa e me pegou totalmente de surpresa.
Ergui meu olhar até o homem do outro lado da mesa e
apenas assenti em resposta. Minha instabilidade interior era tanta
que eu não tinha certeza se seria capaz de pronunciar uma única
palavra.
— Você está aqui há pouco tempo, mas arrisco dizer que é
uma das melhores assistentes que eu já tive — comentou, com um
tom de aprovação. — Não faz perguntas desnecessárias, não fica
no meu caminho e o mais importante: não fica se jogando em cima
de mim.
Arqueei uma sobrancelha. Será que ele teve problemas com
as outras secretárias? Bruce é um cara bonito, não duvido que uma
ou outra funcionária já tenha dado em cima dele.
— Como está a Lorie? — indagou, repentinamente. — Tem
feito muita bagunça?
Meus olhos se arregalaram com a mudança no rumo da
conversa e eu me vi na obrigação de falar alguma coisa. Admito que
fiquei feliz por Bruce estar perguntando pela menina.
— A Lorie está bem — respondi, com insegurança. — Ela é
uma boa aluna na escolinha e quer aprender ballet.
Bruce cruzou os braços e pensou por alguns instantes.
— Matricule ela nas aulas — sugeriu. — Incentive Lorie
desde cedo a explorar todas as suas habilidades e quando ela
crescer, vai saber o que quer da vida.
— Obrigada pelo conselho. Farei isso, assim que possível —
concordei, um pouco envergonhada.
Eu não queria admitir, mas agora que uma boa parte do meu
salário do mês seria cortada por causa da dívida da lavanderia que
Valery me fez pagar eu provavelmente não teria condições de
bancar aulas de ballet para a Lorie no momento. Quem sabe no
próximo mês, se as coisas melhorarem...
Quando parei de divagar, percebi Bruce me encarando de um
jeito tão intenso que me deixou sem fôlego. Fiquei tão mexida que
fui incapaz de quebrar a nossa troca de olhares e sustentei aquele
flerte silencioso com o meu chefe o máximo que pude. Me perdi no
olhar de Bruce e arrisco dizer que ele também se perdeu no meu.
Foi inevitável.
Um alarme de celular tocou e eu pisquei, fazendo um grande
esforço para voltar à realidade. Meu rosto queimava com vergonha
e eu direcionei um sorriso tímidopara o meu chefe. Quando a minha
atenção se fixou em seu rosto, fiquei surpresa ao ver que ele ainda
estava perdido em pensamentos — embora o alarme do seu celular
tocasse incessantemente. Aquele som indicava que Bruce tinha
uma reunião para ir daqui a dez minutos.
Voltando ao meu cargo de secretária, me vi na obrigação de
avisar o óbvio para o meu chefe, pois era nítido que os seus
pensamentos estavam em outro planeta.
— Sr. Lancasther? Está me ouvindo? — Acenei com a mão
na frente dos seus olhos. — O senhor tem uma reunião daqui a
pouco.
O homem piscou e respirou fundo antes de retomar à sua
postura habitual.
— Obrigado, Jenny. — Ele se levantou da cadeira e eu
percebi que estava na hora de sair dali.
— Vou trabalhar agora, Sr. Lancasther. — Levantei-me
também e caminhei até a saída.
Antes que os meus dedos tocassem na maçaneta da porta, a
mão pesada de Bruce pousou em meu ombro e me manteve no
lugar.
— Jenny — ele me chamou, em um tom mais sério.
Respirei fundo e olhei para trás. Bruce estava há poucos
centímetros de distância do meu corpo e isso fez o meu coração
acelerar. Se eu der um passo para trás o meu bumbum irá roçar
exatamente na sua virilha. Me senti tentada a executar aquela ideia,
mas logo me recompus — com certeza eu seria demitida por dar em
cima do meu chefe.
— Sim, Sr. Lancasther? — Direcionei-lhe um sorriso
amigável, apesar do meu conflito interno.
— Quero que me chame de Bruce. — Aquela frase parecia
mais uma ordem do que um pedido.
Engoli em seco e apenas assenti em concordância. Bruce
estava tão perto de mim que o cheiro inebriante do seu perfume
caro e amadeirado preenchia o ar ao meu redor. Cada vez que eu
inspirava, um flashback da noite em que transamos vinha em minha
mente e fazia a minha boceta doer.
— Fale — exigiu, de maneira autoritária.
Franzi o cenho diante daquele comportamento, mas decidi
que não questionaria o meu chefe.
— Bruce — minha voz saiu como um sussurro enquanto eu
olhava no fundo dos seus olhos. Minha boceta doeu outra vez e eu
cruzei as pernas discretamente, tentando ignorar a umidade que
senti em minha calcinha. Que coisa, Jenny, se recomponha!
— Ótimo. — Seu rosto ganhou uma expressão satisfeita e ele
sorriu de um jeito arrebatador. — Hora de voltar ao trabalho, Jenny.
Não se esqueça que temos um compromisso na quarta. Traga a sua
mala para a empresa e iremos direto até o aeroporto.
Ele saiu de trás do meu corpo e abriu a porta, fazendo um
gesto para que eu passasse na sua frente. Obriguei minhas pernas
a funcionarem, embora eu ainda estivesse em choque pela
proximidade que fiquei de Bruce.
Aquela maldita troca de olhares que tivemos minutos atrás...
ela foi a culpada pela instabilidade emocional em que eu me
encontrava agora. Me pergunto se Bruce também ficou agindo
estranho pelo mesmo motivo. Desde que comecei a trabalhar aqui
eu nunca o vi assim. Ele nunca chegou tão perto de mim, nunca
exigiu que eu o chamasse pelo seu primeiro nome. O que será que
deu nele?
CAPÍTULO 7

O resto do dia correu bem. Valery não voltou para me


assombrar e não houve nenhum imprevisto ou qualquer outra coisa
que me tirasse do sério. Anotei apenas dois recados durante a tarde
e não tive mais nenhuma tarefa desde então.
O dia estava tão calmo na empresa que acabei cochilando
em minha mesa de trabalho. Eu estava à beira do sono profundo
quando uma mão pesada tocou o meu ombro. Me forcei a abrir os
olhos e levantei a cabeça entre um bocejo e outro. Quando a minha
visão ficou nítida vi Bruce parado na minha frente com uma
expressão divertida no rosto.
— Você caiu no sono — comentou, enquanto me analisava
com curiosidade.
— D-desculpe, Sr. Lancasther. — Encolhi os ombros,
envergonhada por ter sido pega tirando um cochilo no trabalho.
— Precisamos conversar, Jenny. Venha. — Ele abriu a porta
da sua sala e parou no batente, esperando por mim.
Reprimi um bocejo e me levantei da cadeira. Estranhamente,
eu não estava com medo de levar uma bronca por causa da soneca.
Bruce já teve a oportunidade de puxar a minha orelha por coisas
mais graves e ele não o fez — não seria agora que a minha
demissão viria.
Fiquei de pé e atravessei a porta de vidro que levava para a
sala do meu chefe. Ao olhar para a grande janela que ficava na
parede principal, percebi que estávamos no fim da tarde. Engoli em
seco e parei ao lado da mesa dele. Eu estava apreensiva para saber
qual seria o assunto da nossa conversa.
Quando me virei para encarar Bruce o vi fechando a porta e a
trancando logo em seguida. Franzi o cenho com aquele
comportamento incomum. Eu não me lembrava que tinha uma
tranca nessa porta, mas, seja como for, parece que essa conversa
será extremamente confidencial.
Com uma postura confiante, ele caminhou até mim e parou a
poucos centímetros de distância — se eu estendesse o meu braço,
poderia facilmente bagunçar o seu cabelo impecável. Bruce ficou
em silêncio enquanto me encarava dos pés à cabeça e então um
sorriso torto se formou em seus lábios. Ele cruzou os braços e
respirou fundo, antes de falar:
— Depois de tanto pensar, eu finalmente me lembrei —
começou, em um tom levemente convencido. — Eu sei de onde te
conheço, Jenny.
Aquela frase me fez arregalar os olhos mais do que eu pensei
ser possível. Antes que eu tivesse tempo de reagir, ele prosseguiu:
— Você é a garota com quem eu transei quando estava de
passagem pela Filadélfia há uns oito anos atrás...
— Foram seis — corrigi involuntariamente.
— Então era você mesma... — O sorriso de Bruce se alargou.
Não tive coragem de responder, eu estava tão
envergonhada... Minhas bochechas queimavam, minhas mãos
tremiam e o idiota do meu coração resolveu acelerar como se eu
tivesse acabado de correr uma maratona. Merda... isso não pode
estar acontecendo! Sinceramente, pensei que o meu disfarce dos
óculos duraria mais tempo. Como terei coragem de encarar o meu
chefe agora que ele se lembrou da nossa aventura romântica?
Enquanto eu surtava em silêncio, Bruce se aproximou ainda
mais. Eu estava tão desconsertada que não tive coragem de
encará-lo nos olhos e fitei o chão por um bom tempo.
Engoli em seco quando vi os seus pés calçados com um
sapato social preto de bico fino encostarem na ponta do meu
scarpin de veludo falsificado. Sua mão tocou o meu queixo e ergueu
o meu rosto até nossos olhos se encontrarem. Meu corpo inteiro se
arrepiou. Bruce estava tão perto de mim que eu podia sentir o calor
da sua respiração roçando em minha bochecha.
— Preciso confessar uma coisa, Jenny. Nesse tempo que se
passou... eu não consegui tirar você da minha cabeça.
Fiquei em choque. Minha mente não conseguia acreditar no
que acabei de ouvir. Bruce pensou em mim esse tempo todo?
— V-você também não foi capaz de esquecer aquela noite?
— gaguejei.
Bruce ficou em silêncio e apenas sorriu de um jeito
arrebatador. Meu coração martelava freneticamente no peito e
minhas pernas começaram a bambear. Precisei escorar o meu
bumbum na mesa que havia atrás de mim para não cair no chão.
— Você está constantemente nos meus sonhos — admitiu.
— A Jenny do passado está.
— Não... — Bruce balançou a cabeça negativamente. — Eu
fantasiava com a Jenny de seis anos atrás, até que você começou a
trabalhar aqui. Desde então você a substituiu. Foi estranho no
começo, mas agora eu percebi o porquê: vocês são a mesma
pessoa.
Eu não conseguia entender como as coisas aconteceram tão
rápido e nem o que fez Bruce perceber que eu era a garota de seis
anos atrás. A única informação que permaneceu na minha mente foi
que ele estava fantasiando comigo todo esse tempo. Assim como
eu, ele não esqueceu aquela noite. Pensar nisso me deixou feliz e
eu não fui capaz de conter o sorriso que curvou a minha boca.
Bruce tem sonhos eróticos comigo?
— Eu... eu não sei o que dizer. — Tentei encontrar uma
explicação, embora fosse desnecessária. O que há para ser
explicado? Bruce descobriu quem eu sou, ele se lembrou do que
fizemos e ainda confessou que tem sonhado comigo todos esses
anos. Não havia nada que eu pudesse dizer que o faria esquecer o
que aconteceu, então resolvi pular a explicação e abordar o tópico
que viria a seguir. — O que vai fazer agora? O meu trabalho será
afetado por causa disso?
Bruce inclinou o rosto para mais perto do meu e colou a testa
na minha. Meu corpo inteiro estremeceu com a excitação que senti
ao ter aquele homem tão perto de mim após seis anos de distância.
— Não se preocupe, o seu trabalho jamais será afetado
porque você transou comigo — sussurrou, sua boca estava
perigosamente perto da minha. — Quanto ao que farei agora... isso
só depende de você.
— O que quer dizer com isso?
Em resposta, Bruce me empurrou para mais perto da mesa
até que eu estivesse sentada na madeira e colocou seu corpo entre
os meus joelhos. Ele deixou suas mãos descansarem nas minhas
coxas e as acariciou discretamente sobre o tecido da saia que eu
usava.
— Seja sincera, Jenny. O que gostaria de fazer agora que
nos reencontramos? — questionou, com um sorriso malicioso. O
olhar de Bruce carregava uma dúzia de segundas intenções.
Quando vi novamente o seu sorriso cafajeste que me
conquistou à primeira vista, foi impossível não pensar em repetir o
que aconteceu entre nós naquela noite. Ele parece inclinado a fazer
isso e preciso confessar que eu também adoraria sentir nossos
corpos unidos outra vez. Passei tanto tempo desejando esse
homem...
Tomando coragem, estendi minha mão até tocar o seu rosto e
acariciei o seu maxilar coberto pela barba por fazer. Bruce fechou os
olhos e suspirou com aquele pequeno contato.
— Eu quero outra vez... — sussurrei aquela frase, esperando
que ele entendesse perfeitamente o que eu quis dizer.
— Tem certeza? — Ele abriu os olhos.
Assenti sem pensar duas vezes. Sim, eu quero isso.
Bruce sorriu e baixou o olhar até a minha saia. Suas mãos
que ainda repousavam em minha coxa começaram a deslizar o
tecido preto para cima e eu engoli em seco quando a minha calcinha
lilás foi revelada. Antes que eu pudesse ficar envergonhada, Bruce
encaixou o quadril entre as minhas pernas e selou nossos lábios
com um beijo intenso. Quase perdi o ar quando a sua língua me
invadiu, saboreando e tomando posse de cada centímetro da minha
boca.
Em busca de equilíbrio, passei meus braços ao redor do seu
pescoço e entrelacei minhas pernas no seu quadril. Bruce segurou
as minhas costas e com um movimento rápido me puxou para mais
perto, colando a sua virilha na minha. Ofeguei ao sentir a sua
ereção e me esfreguei deliberadamente contra aquele volume.
Bruce gemeu e apertou a minha bunda com força, me arrancando
um profundo suspiro.
— Jenny, querida, você não faz ideia do quanto eu sonhei
com isso — confessou, ao afastar nossos lábios.
Ele tirou o meu blazer e a camiseta branca que eu usava.
Quando meu sutiã ficou exposto Bruce abriu o fecho frontal da
minha peça íntima e o ar gelado do ar-condicionado da sala fez
meus mamilos se arrepiarem. Senti frio no início, mas fui tomada
pelas chamas quando a boca dele cobriu a ponta do meu seio
esquerdo e começou a me lamber. Sua língua fazia massagem em
minha pele sensível, alternando entre um mamilo e o outro. Meu
chefe me chupava e mordiscava suavemente, me fazendo arquear
as costas para que meus seios ficassem mais perto do seu rosto.
— Bruce! — gemi, quando ele me chupou com mais força.
— Não faça barulho, ainda tem alguns funcionários na
empresa — murmurou, afastando a boca da minha pele.
— Eu devia estar indo embora — comentei, ofegante.
Bruce me lançou um olhar intenso e balançou a cabeça
negativamente.
— Você só vai sair daqui quando eu acabar, Jenny.
Suas mãos desceram até o cós da calça e ele abriu o
primeiro botão, em seguida, deslizou o zíper para baixo e eu pude
ver o tecido branco da sua cueca. Mordi os lábios quando Bruce
colocou o seu membro duro para fora. Era tão grande quanto eu me
lembrava...
Bruce tirou uma camisinha do bolso de trás da calça e a
colocou em poucos segundos. Meu ventre se apertou e eu senti a
minha boceta pulsar com desejo. Eu estava ansiosa pelo que viria a
seguir.
Como se soubesse exatamente que eu precisava senti-lo,
Bruce empurrou a minha calcinha para o lado e deslizou seu dedo
indicador ao longo da minha intimidade molhada. Ofeguei quando
ele tocou o meu clitóris e isso arrancou um sorriso satisfeito do seu
rosto.
— Está gostando, Jenny? — indagou, enquanto estimulava o
meu ponto mais sensível.
Eu estava prestes a gozar quando ele afastou o dedo e sorriu
lascivamente. Antes que eu pudesse protestar, Bruce acomodou a
ponta do seu pau na minha entrada e eu suspirei ao senti-lo depois
de tanto tempo. Suas mãos empurraram o meu corpo para que eu
me deitasse de costas na mesa e assim que eu o fiz, ele me
penetrou com uma única investida. Mordi meu lábio inferior para
conter o grito de prazer que ameaçou escapar da minha garganta.
Como é bom tê-lo de volta em meu corpo.
Bruce segurou minha cintura em um aperto firme e começou
a se mover, ficando mais rápido e mais forte à cada investida. Em
poucos segundos o homem estava arfando intensamente enquanto
me fodia em sua mesa de trabalho. Suor escorria por suas têmporas
e o seu cabelo — que antes estava penteado — agora se
encontrava desgrenhado, com alguns fios colados em sua testa
suada.
Eu gemia o seu nome, gritava e implorava para que ele não
parasse e Bruce prontamente obedecia ao meu pedido.
— Senti falta disso — murmurei, entre um gemido e outro.
— Eu senti falta de você.
Ele se inclinou sobre o meu corpo até que a sua boca
tocasse o meu seio esquerdo. Deslizando a língua ao redor do meu
mamilo, ele o mordiscou e logo em seguida chupou com força.
— Bruce! — gritei, e fui consumida pela intensidade do
orgasmo que me atingiu.
— Jenny — pronunciou o meu nome quase como um
rosnado.
— Bruce — devolvi, com um gemido ofegante.
— Jenny... — Ele arfou e deu uma última investida antes de
deixar o seu corpo cair sobre o meu.
Fechei os olhos e me permiti relaxar por alguns segundos. Eu
estava quase adormecendo quando Bruce pronunciou o meu nome
outra vez e seus dedos tocaram a minha bochecha delicadamente.
— Jenny — chamou, a sua voz parecia inexplicavelmente
distante. — Jenny...
Sorri involuntariamente e segurei a mão que acariciava o meu
rosto. Depositando um beijo em sua palma, tateei com os lábios até
encontrar o seu dedo indicador e então o chupei. Ouvi o que
pareceu a mistura de um suspiro com um gemido e senti a pulsação
em minha intimidade retornar — mal parecia que acabei de ter um
orgasmo.
— O que acha de uma segunda rodada, Bruce? — perguntei
em um tom malicioso, eu ainda segurava o dedo do homem na
entrada da minha boca.
Bruce não respondeu, apenas deslizou o dedo pelo meu lábio
inferior e colocou metade dele na minha boca. Aceitando o convite,
o chupei novamente até que ouvi outro gemido. Sorri comigo
mesma e abri os olhos para encará-lo, mas o que vi diante de mim
fez o meu mundo ruir.
No meu campo de visão estava um Bruce perfumado, com
cabelo penteado e terno passado — ele não parecia nem de longe
com uma pessoa que acabou de transar.
Não precisei de muito esforço para ligar os pontos e perceber
que tudo aquilo não passou de um sonho. Um misto de tristeza e
alívio me invadiu. Eu adoraria que aquele momento de prazer
realmente tivesse acontecido, no entanto, me senti aliviada por
saber que o meu disfarce de secretária estava intacto.
Fiquei perdida em pensamentos refletindo sobre o meu sonho
até que senti um dedo sair da minha boca, foi quando voltei à
realidade e percebi o que estava fazendo. Acabei de chupar o dedo
do meu chefe em um gesto obsceno e dessa vez não foi um
sonho... porra! Será que os gemidos que ouvi também foram reais?
Eu estava mortalmente envergonhada pela minha atitude e
não tive coragem de encarar o rosto de Bruce para ver a sua
reação, então desviei a minha visão para qualquer outra parte do
seu corpo. Quase soltei um grito quando o meu olhar desceu até a
sua cintura e eu vi o inconfundível volume no interior da sua calça.
Ele ficouexcitado com o que eu fiz?Precisou de todo o meu esforço
para conter o sorriso que queria aparecer em meus lábios. Saber
que Bruce teve uma reação daquelas com o meu toque fez a minha
vergonha diminuir consideravelmente.
— Jenny, você... você dormiu — sua voz soou um tanto
vacilante.
Respirei fundo e encarei o rosto do meu chefe antes que ele
percebesse onde o meu olhar estava concentrado.
— Desculpe... eu não percebi. — Reprimi um bocejo e sorri,
me forçando a agir como se nada tivesse acontecido.
— Todo mundo já foi embora — comentou, com uma certa
insegurança. Era evidente que Bruce estava tentando manter a
compostura depois do que eu fiz.
— Eu dormi tanto assim? — perguntei, enquanto esfregava
os olhos.
— São dez e meia da noite.
— O quê?! — Levantei-me da cadeira com um salto e peguei
o celular que estava na minha bolsa. Haviam 20 ligações perdidas
de Brittany e um número incontável de mensagens perguntando
onde eu estava. Droga!
Suspirei desanimada e digitei o número da minha amiga.
Antes de completar a ligação, a tela do meu celular apagou
indicando que estava sem bateria. Acho melhor eu me apressar
para chegar em casa.
— Obrigada por me acordar, Sr. Lancasther — murmurei,
enquanto colocava a bolsa no ombro.
— Ah... sem problemas, Jenny — respondeu, aflito, e
afrouxou o nó da sua gravata azul marinho.
Fazendo o possível para esquecer os recentes
acontecimentos, dei um pequeno sorriso de despedida para Bruce,
me virei e segui em direção ao elevador. Espero que eu consiga
chegar em casa antes que a Brittany chame a polícia.
CAPÍTULO 8

— Porra! — praguejei, ao entrar na minha sala.


O que Jenny fez me tirou completamente do sério. O que ela
estava pensando ao chupar o meu dedo daquele jeito? Precisei de
muito esforço para não pular em cima dela e a foder bem ali, em sua
mesa de trabalho.
Eu sabia que não era certo me envolver com os funcionários
e essa era uma regra que eu fazia questão de seguir. Tive muitas
assistentes desde que assumi a empresa do meu pai, há alguns
anos, e não importava o que elas fizessem para chamar a minha
atenção, eu nunca cedia — mesmo que algumas fossem gostosas
pra cacete. Sempre fiz o possível para manter o profissionalismo.
Para ser honesto, o comportamento de Jenny me pegou
completamente de surpresa. Ela era uma mulher tímida, nunca
pensei que poderia fazer algo lascivo para mim. Eu tinha
consciência que ela estava sonhando quando fez aquilo, mas a
ouvir gemer durante o cochilo me fez imaginar o tipo de sonho que
Jenny estava tendo. Achei graça no começo, mas a situação mudou
quando ouvi o meu nome sair da sua boca... a danadinha estava
fantasiando comigo. É isso, ou ela conhecia outro cara chamado
Bruce. Bom, não importa com quem ela estava sonhando, tentei
acordá-la gentilmente e ela me presenteou com aquela provocação
que me deixou de pau duro.
Fiz todo o possível para ignorar o tesão que eu sentia e
comecei a guardar as coisas para que eu pudesse ir embora. Para o
meu desespero — e excitação — eu não consegui tirar Jenny da
minha cabeça nem por um segundo. Ela era uma mulher bonita, eu
precisava admitir. Havia algo em sua aparência e jeito de se portar
que me passava a impressão de que eu já a conheci antes. Talvez
fosse uma das alunas da faculdade que frequentei por uma
semana?
Quando virei herdeiro da Lancasther Enterprises o meu pai
me obrigou a fazer um curso superior, até pagou uma faculdade
cara, mas acabei trancando o curso e viajei pelo paíscom o dinheiro
que ele me enviava mensalmente. Não era algo do qual eu me
orgulhava, mas eu era jovem e imprudente na época. Ainda sentia
um peso no peito por saber que ele faleceu sem descobrir que eu
não me graduei e apenas gastei o dinheiro dele com bebidas e
mulheres. No entanto, reviravoltas da vida fizeram com que eu me
tornasse um homem sério. Agora, era minha obrigação cuidar do
patrimônio que me foi confiado.
Fiquei preso em memórias do passado, enquanto vasculhava
a mesa e guardava qualquer tipo de papel importante dentro da
minha pasta. A sala estava escura, não me dei ao trabalho de
acender a luz, pois sairia dali em breve. Pensei por um momento
que eu deveria ir para casa e tentar dormir, mas eu sabia que ficar
sozinho com os meus pensamentos na cobertura grande onde eu
morava seria tortura.
Talvez, visitar um clube de strip seja uma boa ideia. Respirei
fundo e tentei mandar aquele pensamento para longe. Eu não era
mais um moleque de 20 anos que podia sair por aí fazendo o que
bem entendia, tinha minhas responsabilidades agora... Tentei
encontrar o foco, mas, porra, eu estava há semanas atolado no
trabalho me esforçando para ser um bom lídere mal tinha tempo de
sair para me divertir. Talvez, uma rápida visita ao clube me ajudaria
a limpar a mente e aliviar o tesão que a minha secretária me
provocou. Eu não podia comandar uma empresa se estivesse
surtando, precisava relaxar.
Depois de refletir uma segunda vez, fechei a minha pasta e
saí apressadamente da sala. Entrei no elevador e apertei o botão
para ir até a garagem da empresa onde o meu carro estava, um
Cadillac CT4 preto que comprei no início do ano. Minha respiração
estava acelerada devido à impaciência. Eu só conseguia pensar em
dirigir até o clube de strip mais próximo, chamar uma dançarina para
a minha mesa e depois de alguns minutos de conversa levá-la para
algum quarto de hotel onde eu encerraria a noite.
Tudo correu bem pelos próximos minutos. Encontrei o meu
carro com facilidade na vaga reservada do estacionamento, entrei
nele e dirigi em direção ao subúrbio da cidade. Eram 23h e quase
não havia trânsito devido ao baixo número de veículosque estavam
circulando naquele horário. Meu GPS avisou que eu estava há 2km
de distância do clube mais próximo e me recomendou um atalho
que peguei sem hesitar. A ereção que ganhei quando Jenny chupou
o meu dedo ainda estava presente e eu mal podia esperar para me
livrar dela.
Precisava admitir, no fundo, eu queria que Jenny fosse a
mulher que eu levaria para a cama essa noite — nada mais justo,
afinal, foi ela que me deixou de pau duro —, mas a mulher era a
minha secretária e a regra número um que eu fazia questão de
seguir na empresa era: jamais transe com uma pessoa do trabalho.
Se as coisas acabassem mal isso geraria escândalos
desnecessários que poderiam acabar com a minha boa imagem na
mídia.
— Você está há 100 metros do seu destino — avisou a voz
robotizada do GPS.
Suspirei com alívio e olhei para a calçada do lado direito à
procura do estabelecimento. A rua estava deserta, a não ser por
uma mulher de porte médio que caminhava com insegurança alguns
metros à frente. Franzi o cenho ao vê-la. Nenhum louco andaria
sozinho por aqui à essa hora da noite — a não ser que quisesse ser
assaltado.
Ao notar a aproximação do meu carro a mulher adquiriu uma
postura tensa e começou a caminhar mais depressa, ela olhou para
trás por um breve segundo e eu pisei no freio automaticamente. É a
Jenny!
— Porra, o que ela está fazendo em um lugar como esse a
essa hora da noite? — pensei alto.
Fiquei com o carro parado, enquanto observava a mulher
caminhando depressa pela calçada de concreto. A noite estava fria
e ela segurava a frente do seu blazer para se proteger do vento.
Não posso deixá-la andando por aqui sozinha. Antes que eu
pudesse me arrepender, dei a partida com o carro e dirigi, reduzindo
a velocidade quando a alcancei.
— Quer carona? — perguntei, ao abaixar o vidro para que ela
pudesse me ouvir.
Jenny congelou no lugar e levou a mão até o peito com o
susto. Achei graça da situação, mas mantive uma postura séria
assim que ela encarou o meu rosto.
— Sr. Lancasther?! — Ela ficou surpresa e parou de andar.
— Bruce — a corrigi, e parei o carro. Estranhamente, eu
gostava de ouvir Jenny me chamando pelo meu primeiro nome. —
O que está fazendo em um lugar como esse? — Fui incapaz de
esconder a preocupação em minha voz.
— Bom, eu estou voltando para casa — respondeu, e olhou
ao seu redor. — Perdi o ônibus e não sei quando o próximo virá.
De repente a minha noitada no clube perdeu a importância
quando vi Jenny me encarando com os seus adoráveis olhos
esverdeados por trás dos óculos que ela usava. Novamente, fui
atingido pela estranha sensação de que eu já a conhecia e sem
pensar duas vezes, estiquei o braço e abri a porta do carona para
que ela pudesse entrar. Eu seria incapaz de deixá-la sozinha nessa
noite fria e deserta.
— Entre, Jenny — pedi, com um tom amigável. — Vou te
levar para casa.
— O-o quê? — Ela ficou incrédula. — Mas... por quê?
Fiquei em silêncio e olhei para a frente. Ao longe, eu podia
ver as luzes em vermelho neon indicando a entrada do clube de
strip que seria o meu destino da noite antes de eu decidir que a
segurança de Jenny era mais importante que a minha satisfação. Eu
não sabia o porquê de eu decidir que a levaria para casa, apenas
senti uma inexplicável vontade de protegê-la, de garantir que ela
estivesse segura.
— Não vou te deixar andando nesse frio a essa hora da noite
— foi tudo que consegui responder. — Entre no carro, Jenny — pedi
outra vez.
Ela pensou um pouco, olhou ao seu redor e então concordou.
Fiquei aliviado quando ela sentou no banco do carona. Jenny
apoiou a bolsa em seu colo e, em seguida, afivelou o cinto de
segurança.
— Obrigada — ela suspirou. — Pode me deixar na entrada
do Bronx? Se não for muito trabalho...
— Bronx? — Ergui minhas sobrancelhas. — Estava indo a pé
de Manhattan até o Bronx? São mais de três horas de caminhada.
Jenny negou com a cabeça.
— Eu planejava pegar o metrô. — Ela encolheu os ombros.
— Me deixe na estação, se quiser.
— O metrô de Nova York é tão perigoso quanto as ruas
nesse horário — respondi, com uma certa inquietação. — Me passe
o endereço, vou te deixar na porta de casa.
— N-não precisa — gaguejou.
— Jenny, eu insisto.
Ergui meu olhar até o seu rosto. A luz interna do carro me
permitiu notar que as suas bochechas estavam ruborizadas e eu fui
incapaz de conter o sorriso que se formou em minha boca. Jenny
estava envergonhada e eu achei aquela reação inexplicavelmente
fofa.
— Esquina da Van Nest com a Hunt Avenue — respondeu,
em voz baixa. Seus olhos encontraram os meus por alguns
segundos e aquilo provocou um calor estranho no meu peito.
Respirei fundo, tentando voltar à realidade e tracei a nova rota no
GPS.
— Chegaremos lá em 30 minutos — respondi, e dei partida
no carro.
Jenny assentiu e se recostou no banco do carona para
observar a paisagem pela janela.
Quando passei em frente ao clube de strip, sequer me dei ao
trabalho de olhar para lá. Agora, eu tinha algo mais importante para
fazer: levar Jenny em segurança até a sua casa.

Vinte minutos se passaram. Jenny ficou em silêncio o tempo


inteiro e eu estava me sentindo tão inquieto que não consegui iniciar
nenhuma conversa durante a viagem, havia muita coisa na minha
cabeça.
Enquanto eu dirigia, vasculhava todas as lembranças que eu
tinha do meu passado para ver se eu encontrava Jenny em algum
flashback. Eu estava quase certo de que a conheci antes de ela
trabalhar na empresa. Enquanto eu refletia, me lembrei de quando a
encontrei em seu primeiro dia de trabalho, a forma que ela me
olhou... foi como se estivesse diante de um fantasma.
Porra, ela me conhece de algum lugar e não quer dizer.
Deduzi, enquanto esperava no sinal vermelho. Se nos conhecemos
antes, por que eu não me lembro? Jenny tem um jeito tímido e
adorável de se portar que cativa qualquer um que a conhece. Como
eu posso ter esquecido de uma mulher como ela? A não ser que...
eu estivesse bêbado. Porra, eu dificilmente me lembro de uma
noitada! Eu só espero que Jenny não seja uma das mulheres com
quem transei e saí durante a madrugada sem me despedir.
Fiquei tão assombrado pelos meus pensamentos que não
percebi quando o sinal abriu. Voltei à realidade quando Jenny
sacudiu o meu braço e apontou para a luz verde na minha frente.
— Está dormindo? O sinal abriu há muito tempo —
perguntou, em um tom preocupado.
— Obrigado por avisar — respondi, ainda distraído.
Jenny suspirou entristecida e eu olhei em sua direção.
— O que houve?
— Já é tarde, o senhor deve estar com sono e eu o fiz dirigir
até um bairro da periferia que, provavelmente, fica há uns 30 km da
sua casa — ela se culpou.
— Em primeiro lugar: eu não estou com sono e você não me
obrigou a vir aqui, estou fazendo isso porque eu quis... e também
porque eu me preocupo com a sua segurança. — Minha visão se
desviava entre Jenny e a estrada à frente. — E em segundo lugar:
não me chame de senhor, isso me faz sentir como se eu tivesse uns
50 anos. Ainda tenho 28, não tente me envelhecer antes do tempo.
Jenny fez um esforço, mas não conseguiu disfarçar o sorriso
que a atingiu quando ouviu o meu comentário.
— Me chame de Bruce — prossegui. — Já pedi isso antes e
continuarei pedindo até que você o faça.
— Mas as pessoas na empresa podem estranhar...
— Não interessa — deixei escapar. — Chame pelo meu
nome toda vez que quiser se dirigir a mim, os outros funcionários
não têm nada a ver com isso, deixe que pensem o que quiserem.
— Eu apenas tento manter o profissionalismo.
— Chupar o meu dedo daquele jeito obsceno não foi nem um
pouco profissional — rebati, sem pensar.
Jenny arquejou e se encolheu no banco, suas bochechas
ficaram vermelhas e eu sorri ao perceber que o meu comentário a
afetou. Eu gostei de provocá-la.
— Por falar em coisas obscenas, Jenny, com quem você
estava sonhando? — perguntei, em um tom divertido.
Ela ergueu as sobrancelhas.
— Ah... com ninguém — mentiu.
Reprimi uma risada. Eu tinha 90% de certeza que Jenny
estava sonhando comigo e ao ver o rubor em seu rosto aumentar
depois da minha pergunta tive a confirmação de que as minhas
suspeitas estavam certas. Pensei em dizer alguma coisa sarcástica,
mas fui interrompido pelo som do GPS avisando que chegamos ao
nosso destino. Estacionei o carro.
— Droga, eu não acredito... — Jenny resmungou, enquanto
retirava o cinto de segurança e olhava para a calçada do outro lado
da rua.
Seguindo o seu olhar, vi um grupo de cinco pessoas
conversando na calçada, entre elas reconheci a mulher de cabelo
castanho e braço tatuado que apareceu na empresa há alguns dias
e ao lado dela estava a inconfundível silhueta de Lorie, a adorável
filha de Jenny, que usava um pijama rosa de frio e estava
visivelmente sonolenta. Eu não era um grande fã de crianças, mas
tinha que confessar que a garotinha me conquistou com o seu
temperamento irritado e brincalhão. O suco de uva que ela
derramou na saia de Valery? Porra, aquilo foi impagável. Reprimi
um sorriso ao me lembrar da cena.
— Obrigada por me trazer em casa, Bruce — Jenny
agradeceu, enquanto abria a porta do carro. — E... bom... desculpe
por chupar o seu dedo. — O rosto dela corou.
Dei uma pequena risada e assenti. Bem que eu gostaria que
ela fizesse aquilo de novo. Ainda lembrava dos seus lábios macios
no meu dedo, da sua língua roçando na ponta dele. Porra... nesse
momento eu faria de tudo para sentir aquela boca gostosa no meu
pau. Respirei fundo e lutei para me controlar. Jenny não podia
perceber o estado em que eu me encontrava, seria constrangedor.
Quando Jenny saiu do carro, a sua amiga e Lorie
atravessaram a rua correndo para abraçá-la enquanto o grupo de
pessoas na calçada se dispersou. Depois que o abraço terminou, a
mulher de braço tatuado deu um soco no ombro de Jenny e se
inclinou para espiar dentro do carro — obviamente, queria saber
quem trouxe a sua amiga para casa.
Quando a mulher me viu sentado no banco do motorista, ela
arquejou como se estivesse vendo algum astro de Hollywood e
levou as mãos até a boca. Lorie não perdeu tempo e também espiou
pela janela. Ao me ver ali, a garotinha abriu um sorriso e gritou:
— Tio Bruce!
— Oi, Lorie. — Acenei para ela, com um sorriso amigável.
— Senti saudade. — Ela se pendurou na janela do carro com
empolgação, nem parecia a garotinha sonolenta que vi quando
estacionei.
Sem pensar duas vezes abri a porta e decidi cumprimentá-la
de perto. Lorie abriu seus bracinhos para mim e eu me abaixei para
abraçá-la. Involuntariamente, a levantei do chão por um curto
período de tempo e ela deu uma gargalhada, parecendo se divertir.
— Faz de novo, tio Bruce! — ela pediu, quando a coloquei de
pé na calçada. Lorie parecia extremamente feliz apenas porque a
levantei por alguns segundos.
— Ninguém nunca te pegou no colo, baixinha? — perguntei,
com uma certa curiosidade.
A garotinha encolheu os ombros e balançou a cabeça
negativamente.
— Não mais... a mamãe e a tia Brittany dizem que eu estou
ficando muito pesada — respondeu, um pouco cabisbaixa.
Naquele momento, o meu peito se apertou e eu me recordei
do que Jenny disse sobre Lorie nunca ter conhecido o pai. É claro
que ela não tem ninguém para pegá-la no colo ou carregá-la nas
costas. Desde o primeiro minuto que a vi eu senti uma inexplicável
conexão com aquela garotinha. Provavelmente, isso se devia ao
fato de que também cresci com um pai ausente e sei como ela devia
se sentir em algumas situações. Porra, o que passa na cabeça de
um filho da puta que tem coragem de fazer um filho e sumir no
mundo?
Comovido com a situação, me inclinei e peguei Lorie no colo.
Ela sorriu e gargalhou quando dei uma volta, fazendo ela girar junto
comigo. Um sorriso involuntário curvou a minha boca. Ver a alegria
daquela garotinha, de alguma maneira, me fez o homem mais feliz
do mundo nos poucos segundos que aquele momento durou.
Quando me abaixei para colocar Lorie no chão, meus olhos
pousaram em Jenny que ainda estava ao lado da sua amiga. As
duas me encaravam com um sorriso estranho e eu me senti
inquieto. Por que elas estão me olhando assim?
— Obrigada, tio Bruce — Lorie agradeceu, enquanto me
mostrava um sorriso com um dente faltando.
— De nada, baixinha. — Acariciei brevemente o topo da sua
cabeça. Um sentimento protetor tomou conta de mim naquele
instante e eu fiquei indignado que Lorie não tivesse um pai para a
amparar ou brincar com ela.
— Vamos entrar. Você tem aula amanhã cedo. — A amiga de
Jenny veio até Lorie e segurou a sua mão.
— Tio Bruce, quando o senhor vai voltar aqui de novo? — a
garotinha perguntou, me analisando com seus olhinhos curiosos.
Sem saber o que responder, encarei Jenny na esperança de
que ela tivesse alguma resposta, mas ela também parecia sem
palavras. Eu não queria dizer à garotinha que não voltaria mais ali,
no entanto, também não queria me convidar para ir à casa de Jenny
sem ser chamado. Após refletir por um tempo, sorri amigavelmente
e falei:
— Bom, eu virei sempre que a sua mãe me convidar.
— Eba! — a baixinha comemorou.
Jenny se aproximou de mim e eu notei que ela havia tirado o
seu blazer, ficando apenas com a camiseta branca que usava por
baixo — a qual lhe proporcionava um belo decote. Respirei fundo e
desviei o meu olhar para longe, eu não precisava desse tipo de
tentação outra vez.
— Obrigada por me trazer em casa. — Jenny me direcionou
um sorriso tímido que fez o meu peito estremecer.
— Não me agradeça. — Antes que eu pudesse me conter,
estendi o braço e afaguei o seu ombro exposto. Tocar aquela região
da pele de Jenny me trouxe uma estranha sensação de déjà vu.
— Bom... acho melhor eu entrar. — Ela ficou um pouco
inquieta após o meu toque e eu me perguntei se não havia
exagerado na aproximação. — Boa noite, Bruce. Nos vemos
amanhã.
Um sorriso vacilante cruzou o meu rosto.
— Até amanhã — respondi.
Precisei de muito esforço mental para fazer as minhas pernas
darem meia volta e caminharem até o carro. Trazer Jenny até em
casa e ver Lorie outra vez me trouxe uma sensação de paz e
realização. Desistir de ir naquele clube foi a melhor coisa que eu fiz.
CAPÍTULO 9

Brittany passou o resto da noite me enchendo de perguntas


sobre o motivo do meu atraso. Ela não deixou passar o fato de que
Bruce me trouxe em casa com um carro que devia custar o dobro do
nosso apartamento e também mencionou como ele pareceu feliz ao
reencontrar Lorie. Na verdade, esse pequeno detalhe foi algo que
também não deixei de notar. Meu coração se aqueceu e meus olhos
lacrimejaram quando vi o homem arrancando risadas da garotinha
durante aquela pequena brincadeira. Se Bruce soubesse quem ela
é... divaguei, enquanto encarava o meu reflexo no espelho do
banheiro feminino da empresa.
O dia da minha viagem para Seattle chegou. Antes de eu sair,
Brittany fez vários comentários imorais por saber que eu estaria
sozinha com Bruce nos próximos dias. Ela até brincou sobre essa
ser a oportunidade perfeita para nos conhecermos melhor e eu não
pude discordar. Bruce e eu seríamos forçados a interagir durante
essa viagem, o que me proporcionaria uma chance de conhecer um
pouco mais sobre ele. Céus, espero que eu sobreviva a isso.
Com as mãos trêmulas pela ansiedade, ajeitei meus óculos e
passei um gloss de cereja nos lábios apenas para dar um pouco de
vida ao meu rosto cansado. Eu mal consegui dormir direito nas
últimas noites, ficava me revirando na cama, recordando sobre a
vergonha que passei na segunda-feira. Bruce me chamando para a
sua sala e flertando comigo?Fala sério!
Eu devia ter adivinhado que era apenas um sonho ao invés
de continuar com aquele delírio e acabar chupando o dedo dele na
vida real. Agora, eu precisaria usar todo o meu autocontrole para
agir naturalmente durante essa viagem. Deus me livre ter outro
delírio e acabar fazendo algo comprometedor com o meu chefe...
Deus me livre, mas quem me dera!
Depois de conferir a minha aparência pela décima vez, saído
banheiro e segui em direção à garagem onde Bruce me esperava.
Eu me sentia empolgada, afinal, um seminário de empresas seria
uma nova experiência para mim. No entanto, saber que eu estaria
rodeada de pessoas ricas e influentes pelos próximos 2 dias me
deixava aflita. E é claro que eu também preferia não pensar no fato
de que eu seria obrigada a passar esse tempo inteiro seguindo
Bruce por todos os lugares.
Entrei no elevador e aguardei até que ele chegasse na
garagem do subsolo. Quando as portas de metal se abriram me vi
em um local fechado com luzes e pinturas no chão demarcando as
vagas dos veículos.
Engolindo em seco, saí para a garagem. Eu me sentia
completamente perdida, não fazia ideia em que setor devia procurar
pelo carro de Bruce. Caminhei por alguns metros, arrastando a
minha mala de rodinhas atrás de mim, até que ouvi uma buzina e
olhei para o lado. Em uma vaga reservada estava o carro preto e
luxuoso de Bruce. A porta do veículo se abriu imediatamente e o
meu chefe saiu de lá. Notei que ele estava sem o paletó do terno
preto que costumava usar e a sua gravata também estava ausente.
— Me dê a bagagem — ele pediu, enquanto caminhava até a
traseira do carro e abria o porta-malas.
Aproximei-me de Bruce e lhe entreguei a minha mala. Ele a
segurou com apenas um braço e a colocou dentro do carro sem
fazer muito esforço. Por mais que eu odiasse admitir, achei
absurdamente sexy o jeito que a sua blusa branca de botões se
moldava em seu braço musculoso, deixando evidente que o seu
porte atlético não mudou com o passar dos anos.
— Vamos andando. — Bruce fechou o porta-malas e
caminhou até a frente do carro, abrindo a porta do carona para mim.
Fiquei corada com aquele pequeno gesto de cavalheirismo e
entrei no veículo. Tive muitos encontros desde que me mudei para
Nova York e em todos eles ninguém, jamais, abriu a porta do carro
para mim.
Enquanto eu afivelava o cinto Bruce sentou no banco do
motorista e deu partida no veículo. Em pouco tempo saímos da
empresa e estávamos nas avenidas de Manhattan — que estavam
surpreendentemente tranquilas naquele iníciode manhã. Chegamos
ao aeroporto de LaGuardia meia hora depois. Fiquei confusa
quando Bruce levou o carro para a direção oposta do
estacionamento e estacionou dentro de um pequeno hangar vazio.
Assim que o motor do carro desligou, um jovem com roupa de piloto
veio até nós e abriu o porta-malas para pegar a bagagem.
— Não vamos para o saguão comprar as passagens? —
questionei, enquanto me soltava do cinto de segurança.
Bruce negou com a cabeça e saiu do carro antes que eu
pudesse fazer mais perguntas. Ele veio até o lado do carona e abriu
a porta para mim outra vez.
— Obrigada — agradeci involuntariamente, ao descer do
veículo.
Ele sorriu brevemente e caminhou para fora do hangar. Ao
sair de lá, notei que na pista de pouso havia um jatinho particular
com a escada aberta. Na porta da aeronave estava uma aeromoça
olhando fixamente na minha direção.
— Estamos prontos para o voo, Sr. Lancasther — o piloto
avisou.
Bruce assentiu e olhou na minha direção.
— Vamos decolar, Jenny. — Ele colocou a mão atrás das
minhas costas e me guiou em direção ao jato.
Caminhamos lado a lado pela pista até chegarmos na escada
que levava para o interior da aeronave. Bruce gesticulou que eu
fosse na frente e obedeci sem hesitar. Meu coração martelava no
peito a cada degrau que eu subia e parecia cada vez mais difícil
respirar, aquela era a minha primeira vez dentro de um avião e eu
não fazia ideia do que esperar.
— Bem-vinda — a aeromoça me cumprimentou, com um
sorriso forçado. — Quem seria você?
— Jenny — apresentei-me, com um pouco de receio. — Sou
a secretária do Bruce.
— Ele deixa você chamá-lo pelo primeiro nome? —
perguntou, um pouco surpresa.
— Sim — respondi, com um pequeno sorriso. Oh... será que
falei demais? Parece que Bruce não dá esse pequeno privilégio a
todos os seus funcionários.
A mulher franziu o cenho discretamente.
— Fique à vontade. — Gesticulou para o interior do jatinho e
seu olhar se desviou para Bruce, que estava atrás de mim. — Bem-
vindo, Sr. Lancasther! — Sua boca volumosa se abriu em um sorriso
de orelha a orelha quando viu o homem. — É um prazer tê-lo de
volta. Kevin e eu cuidamos muito bem da sua aeronave. — Ela
estendeu a mão e o cumprimentou com uma empolgação fora do
comum.
Fechei a cara e me dirigi para uma das poltronas de couro
que havia perto da janela. Eu realmente não estava a fim de ver
aquela sujeita flertando com o Bruce. Será que era assim com todas
as secretárias que vieram antes de mim? E será que ele
correspondia ao flerte delas?
Me sentindo irritada com aqueles pensamentos, cruzei os
braços diante do peito e encarei o aeroporto pela janela quadrada
que havia ao lado da minha poltrona. Eu sabia muito bem que
estava com ciúme e isso me perturbava ainda mais. Bruce e eu não
tínhamos nada, ele era um homem rico e adulto — com certeza
tinha um número incontável de mulheres espalhadas pelo país que
fariam de tudo para ficar com ele — e eu era apenas uma secretária
com quem Bruce convivia semanalmente por necessidade do
trabalho.
— Você parece tensa — meu chefe comentou, com um
suspiro.
Virei o rosto em sua direção e o vi se acomodando na
poltrona à minha frente. Há vários assentos disponíveis, por que
Bruce resolveu sentar há um metro de distância de mim?
— Aconteceu alguma coisa? — ele insistiu. Droga, eu não
estou com ânimo para conversar.
Respirei fundo e balancei a cabeça negativamente.
— Estou nervosa — disfarcei. — É a minha primeira vez
dentro de um avião.
Bruce pareceu surpreso com o que ouviu. Ele colocou seu
cotovelo sobre a mesa retrátil que havia no braço da sua poltrona e
apoiou o queixo no punho.
— Enquanto trabalhar para mim, voos como esse serão
frequentes.
— Não sei se quero viajar frequentemente para longe de
casa. — Encolhi os ombros.
— Por causa da Lorie? — Bruce adivinhou.
Concordei com uma certa insegurança. Foi difícilme despedir
de Lorie pela manhã. Saber que eu ficaria 2 dias longe dela partia o
meu coração e eu não queria ficar ausente por mais tempo.
— Você a deixou sob os cuidados de quem para vir nessa
viagem? — indagou, com interesse.
— Com a Brittany — respondi. — É uma amiga com quem eu
divido o apartamento. Foi ela quem trouxe a Lorie para a empresa
naquele dia.
Bruce assentiu. Naquele instante, o homem com roupa de
piloto entrou e nos cumprimentou com um aceno.
— Vou iniciar a decolagem, Sr. Lancasther — ele avisou, e
logo desapareceu pela porta que levava para a cabine da frente.
— Apertem os cintos — pediu a aeromoça, enquanto fechava
a porta do jato.
Não pude deixar de notar a expressão descontente da mulher
quando ela percebeu que Bruce se sentou tão perto de mim. Decidi
ignorá-la e voltei a minha atenção para o homem que estava à
minha frente.
— O que terei que fazer quando chegarmos lá? — perguntei,
enquanto colocava o cinto que havia na minha poltrona.
— Primeiro, fique ciente dos horários. Na recepção do hotel
terá folhetos sobre a conferência, pegue um deles e anote os
horários das reuniões e seminários — explicou. — Você não irá
participar das reuniões, ficará responsável apenas por manter a
minha agenda em ordem e garantir que eu não me atrase para os
compromissos.
Concordei, enquanto fazia uma nota mental para não
esquecer das instruções. Parece que os próximos dias seriam
corridos o suficiente para que eu ocupasse todas as lacunas da
minha mente com trabalho — o que seria perfeito, assim eu não
ficaria pensando no meu passado com o Bruce.
— É a sua primeira vez nesse tipo de evento, então não
tenha vergonha de tirar qualquer dúvida comigo — ele prosseguiu.
— Para facilitar as coisas, esteja por perto o tempo inteiro. Assim
não haverá risco de você se perder em um lugar desconhecido.
— Como quiser, Bruce.
O avião deu um solavanco e logo começou a se mover.
Segurei no braço da poltrona com força e fechei os olhos quando
percebi que havíamos decolado. Era desesperador pensar que se
ocorresse alguma falha no sistema da aeronave não haveria nada
no chão para amortecer a nossa queda. Estávamos à mercê da
sorte e da competência do piloto — que parecia jovem demais para
ter muitos anos de experiência em voo — isso me causou um certo
pânico.
Minutos após a decolagem, o avião balançou e um pequeno
grito escapou da minha garganta. Ouvi uma risada abafada à minha
frente e me forcei a abrir os olhos. Deparei-me com Bruce me
encarando com uma expressão divertida.
— P-por que está rindo? — gaguejei, com receio. — O avião
está balançando.
— Foi apenas uma turbulência, Jenny — ele tentou me
tranquilizar. — É melhor se acostumar, porque essa não será a
última. São 5 horas de voo até Seattle.
— 5 horas? — Fiquei incrédula.
Olhei para a janela e me arrependi profundamente. Pude ver
Nova York ficando minúscula, enquanto o avião não parava de subir
rumo ao céu azul. Essa é uma péssima hora para ficar com medo
de altura. Fui capaz de ouvir meus batimentos cardíacos e minhas
mãos começaram a suar.
— Está tudo bem, Jenny? — Bruce me encarou com os olhos
arregalados. — Você está pálida e...
Minha visão escureceu antes que o homem terminasse de
falar e, de repente, não tive consciência de mais nada.
CAPÍTULO 10

Ela desmaiou... Deduzi, ao ver a cabeça de Jenny tombar


para o lado e seus olhos se fecharem. Porra, não imaginei que isso
poderia acontecer!
Retirei o cinto que me prendia na poltrona e olhei ao meu
redor à procura de Kourtney — a comissária de bordo que
trabalhava para a empresa desde que meu pai era vivo. Ela não
estava por perto, então a chamei com um grito e levantei do meu
assento para socorrer Jenny.
Assim que me aproximei da minha secretária inconsciente,
soltei o seu cinto e conferi o pulso para garantir que estava tudo
bem. Com cuidado, retirei ela da poltrona e a deitei no sofá que
havia nos fundos da aeronave.
— Me chamou, Sr. Lancasther? — Kourtney apareceu na
cabine. Seus olhos passaram por mim e logo se fixaram na moça
desacordada. — Ah... o que aconteceu?
— Ela desmaiou! — respondi, em um tom preocupado.
Kourtney sorriu discretamente ao me ouvir dizer aquilo.
Franzi o cenho com raiva. Como ela pode ficar feliz em uma
situação dessas? Eu com certeza não deixarei isso passar.
— Qual é o motivo da graça? — perguntei, rispidamente.
— Nenhum... — A mulher encolheu os ombros e pareceu
surpresa por eu perceber a sua pequena mudança de humor. — Eu
apenas...
Bufei com raiva e passei a mão em meu cabelo. Kourtney
não me ajudaria em nada — muito pelo contrário.
— Suma da minha frente. — Gesticulei para a aeromoça, que
assentiu e desapareceu do meu campo de visão.
Kourtney, aquela desgraçada, ficou feliz ao ver Jenny
desmaiada. Honestamente, não me admiro que esse tipo de gente
estivesse trabalhando para o meu pai. Mais tarde, eu lidaria com
ela. Eu tinha coisas mais importantes para fazer agora como, por
exemplo, acordar a minha secretária desmaiada.
Ver Jenny naquele estado estava me deixando aflito, precisei
me concentrar para respirar fundo e não perder a calma. Enquanto
eu pensava no que fazer, retirei os óculos que ela usava
frequentemente e deitei a sua cabeça em uma almofada. Passei os
próximos segundos observando o rosto da mulher com um intenso
fascínio. A sensação de que eu a conheci no passado ficou maior e
isso me deixou ainda mais inquieto.
Infelizmente, eu não sabia de nada que pudesse fazer para
Jenny acordar mais rápido. Depois de um tempo pensando, sacudi a
sua mão e comecei a chamá-la pelo nome.
— Jenny? Acorde — insisti, mas a mulher permaneceu
imóvel.
Desesperado para fazê-la reagir, dei um pequeno tapa em
seu rosto e sacudi os seus ombros enquanto a chamava
novamente. Para o meu alívio, Jenny se moveu e balbuciou
algumas coisas incompreensíveis. Seus olhos começaram a se
mexer freneticamente no interior das pálpebras e ela agarrou a
minha mão com força.
— Vamos morrer... — ela resmungou, ao abrir os olhos.
— Morrer? — indaguei, com uma certa diversão. — Fique
calma, isso não vai acontecer.
Como se a vida quisesse me pregar uma peça, o jato
balançou com outra turbulência. Jenny gritou e me abraçou em um
gesto involuntário.
— O avião vai cair! — A mulher parecia desesperada
enquanto apertava a gola da minha blusa.
— Foi apenas uma turbulência, Jenny. — Na tentativa de
tranquilizá-la, afaguei as suas costas de maneira terna e ela
suspirou enquanto enterrava o rosto em meu ombro.
— Não quero que a Lorie fique órfã — choramingou, com
desespero.
— Você não vai morrer. — Apertei a mulher em meus braços,
torcendo para que ela se sentisse mais segura.
Jenny respirou fundo e se aninhou em meu abraço, como se
fosse o lugar mais confortável do mundo. Me senti estranhamente
realizado enquanto segurava aquela mulher contra o meu corpo e,
antes que eu pudesse perceber, um sorriso vacilante nasceu em
meus lábios. Ela estava tão perto de mim que eu podia sentir o seu
perfume delicado de baunilha.
Mais uma vez, fui tomado por uma estranha sensação de
déjà vu e não pensei duas vezes antes de afundar o meu nariz em
seu cabelo. Quando inspirei o aroma de Jenny, o meu corpo inteiro
foi tomado por um calor quase surreal. O que está acontecendo
comigo?
— Chefe? — Kevin Thompson, o meu piloto, chamou.
Virei o rosto para a entrada da cabine e o surpreendi me
encarando com uma expressão de surpresa.
— Ah... desculpe, eu... eu não queria atrapalhar. V-vou deixar
vocês a sós... — ele gaguejou, e fez menção para sair.
Naquele momento, percebi a situação comprometedora em
que a minha secretária e eu nos encontrávamos. Precisei de muito
esforço para me desvencilhar do abraço de Jenny e me levantar do
sofá onde estávamos.
— O que houve, Kevin? — perguntei, antes que o piloto
saísse da sala. Ele era alguns anos mais jovem que eu e sabia
como ser inconveniente algumas vezes.
— O trânsito aéreo está livre — começou. — Chegaremos
em Seattle bem mais cedo que o esperado.
Concordei com alívio e virei o rosto na direção de Jenny que
estava sentada no sofá com uma expressão atordoada.
— Ouviu isso? Em breve estaremos em terra firme outra vez
— tentei confortá-la.
A mulher me encarou por um tempo e logo virou o rosto na
direção de Kevin.
— Se você está aqui... então, quem está pilotando a
aeronave? — perguntou, deixando evidente o seu receio.
— Ninguém. — Kevin sorriu e se sentou em uma das
poltronas que havia perto da porta.
O rosto de Jenny foi tomado pelo pânico.
— O avião está no piloto automático — respondi, antes que a
minha secretária desmaiasse novamente. — É o primeiro voo dela,
Kevin. Ela ficou com medo e desmaiou, por isso eu estava a
abraçando quando você entrou na cabine — me expliquei para o
piloto. Eu não queria que ele ou qualquer outra pessoa pensasse
que eu era do tipo de empresário que transava com a secretária
gostosa.
— Sem problemas, o senhor não precisa se justificar para
mim — Kevin respondeu, com tranquilidade. — Vou descansar
alguns minutos e então voltarei para minha cabine.
Concordei e olhei para Jenny no momento em que ela
tateava o seu rosto.
— Bruce... onde estão os meus óculos? — perguntou, com a
voz trêmula.
— Aqui. — Tirei o acessório de dentro do bolso da minha
calça e o coloquei gentilmente no rosto dela.
— V-você o tirou de mim? — indagou, com descrença.
— Sim, quando você desmaiou.
Jenny pareceu em choque por alguns segundos. Ela ficou me
encarando com espanto, até que respirou fundo e perguntou:
— Está tudo certo?
— Por que não estaria? — Franzi o cenho diante da sua
reação confusa.
Ela ficou em silêncio e balançou a cabeça negativamente.
— Não é nada... eu estou apenas com a cabeça cheia —
confessou.
— Posso pedir um favor?
A mulher concordou com um pouco de hesitação.
— Fique longe da janela. Você me assustou enquanto estava
inconsciente. Não quero que desmaie outra vez.
— Eu sempre tive medo de altura, mas honestamente, nunca
pensei que eu poderia desmaiar se entrasse em um avião. — Jenny
parecia envergonhada.
Afaguei o seu ombro em um gesto amigável e sorri.
— Precisa perder esse medo porque você fará muitos voos
comigo. Talvez, eu deva contratar uma equipe de paramédicos para
lhe prestar os primeiros socorros caso isso aconteça novamente.
Jenny me olhou como se eu tivesse acabado de dizer a coisa
mais absurda do mundo.
— É apenas um desmaio, Bruce, não precisa fazer tanto
alarde. — Ela gesticulou para si mesma. — Eu estou bem agora.
Fiquei em silêncio, pois decidi que não valia a pena iniciar
uma discussão por causa daquilo. Jenny pode não se importar com
a sua saúde, mas eu me importo... talvez, até mais do que eu
deveria.

Depois que o meu pânico se dispersou, Bruce pediu que o


almoço fosse servido. A aeromoça entrou na cabine com uma cara
feia e colocou a refeição sobre as mesas que saíamdos braços das
nossas poltronas. O prato principal foi salmão ao molho de espinafre
— algo que eu nunca comi antes, mas confesso que gostei do
sabor.
Enquanto comíamos, Bruce fez a gentileza de fechar todas
as cortinas da aeronave e pediu que eu fizesse um esforço para
esquecer onde estávamos. Ele até ligou a TV de 50 polegadas que
havia em uma das paredes do jato e passamos as próximas 3 horas
reprisando alguns episódios de Full House — que eu descobri ser a
sua série preferida.
Embora eu ainda estivesse aflita por estar em uma aeronave,
também me sentia feliz porque Bruce fez o possível para deixar o
voo confortável para mim. Durante as 4 horas que passamos juntos
a caminho de Seattle, eu pude conhecer um pouco mais sobre o
homem para quem eu trabalhava. Ele adorava jogar cartas e assistir
séries dos anos 90, pois dizia que essas coisas o lembravam da sua
adolescência em Detroit — cidade onde ele cresceu na companhia
da mãe. Não tive coragem de perguntar muita coisa. Estava curiosa
para saber sobre cada detalhe da sua vida, mas não queria parecer
inconveniente. Então, deixei que o homem falasse por conta própria,
pois notei que ele sempre contava algo pessoal quando surgia uma
brecha no assunto.
Passava das 15h quando ouvi uma voz soar no alto-falante
da aeronave. Era o piloto pedindo que colocássemos o cinto de
segurança, porque em breve iríamospousar. Um frio inundou o meu
estômago quando o avião começou a se inclinar para baixo, minhas
mãos ficaram trêmulas e eu comecei a lutar para controlar a
respiração.
— Relaxe, Jenny. — Bruce segurou uma das minhas mãos,
me pegando de surpresa. — Nós já vamos pousar. É
completamente normal a aeronave fazer esse tipo de movimento. —
Seus polegares acariciaram o dorso da minha mão, enquanto ele
me olhava nos olhos.
Respirei fundo e assenti, tentando manter a calma. Meu
medo diminuiu consideravelmente após as palavras tranquilizadoras
de Bruce. Ele parecia mais atencioso e preocupado comigo desde
que eu acordei do meu desmaio. À essa altura, eu só conseguia
pensar no calor que senti quando estava envolvida em seu abraço
protetor, sequer me importei com o fato de que ele me viu sem
óculos — aparentemente, Bruce não se lembraria de mim mesmo
que eu estivesse sem o meu disfarce de Clark Kent.
Por um milagre, consegui ficar calma enquanto a aeronave
fazia o seu pouso, mas no instante em que a aeromoça abriu a porta
para que pudéssemos desembarcar, eu retirei o cinto e corri para
fora do avião sem ao menos olhar para trás.
Enquanto eu respirava, aliviada por estar em terra firme, ouvi
uma breve discussão há alguns metros de distância. Virei meu rosto
na direção do falatório e vi Bruce gritando com a aeromoça ao lado
do jato, enquanto o piloto do avião assistia. O que será que
aconteceu? Perguntei-me, tentando entender o que o meu chefe
dizia.
Não tive coragem de ir até lá, apenas fiquei parada sentindo
o chão de asfalto da pista de pouso sob os meus pés, e assisti a
mulher levando bronca. Quando Bruce finalmente terminou de falar,
a aeromoça encolheu os ombros e foi para longe, me lançando um
olhar zangado enquanto se afastava. Meu chefe suspirou e passou
a mão pelo cabelo, então voltou para o interior do jato. Naquele
momento, Kevin, o piloto, veio na minha direção e antes que eu
pudesse me conter as palavras saíram da minha boca:
— O que aconteceu? — indaguei, com curiosidade.
O homem que aparentava ter pouco mais de 25 anos tirou o
quepe de piloto que usava e suspirou.
— Bruce demitiu a Kourtney — respondeu, um pouco
surpreso. — Eu não entendi muito bem o motivo, mas parece que
teve a ver com você.
— Comigo? — fiquei incrédula. — Por que Bruce demitiria a
mulher por minha causa?
Kevin deu de ombros e olhou na direção do jato. Bruce ainda
não havia retornado.
— Na minha sincera opinião, acho que o Sr. Lancasther
cansou de ser paquerado por ela — comentou, em um tom baixo. —
Ao que tudo indica, ele já tem um interesse amoroso.
— Bruce tem um interesse amoroso?! — Arregalei os olhos.
— Mas... quem é?
O piloto não respondeu, apenas franziu o cenho com a minha
pergunta e deu uma risada abafada.
Um carro preto, de quatro portas, parou no canto da pista e
buzinou. Kevin aproveitou a deixa para sair de perto de mim e eu o
xinguei mentalmente. Como ele pode soltar que Bruce tem um
interesse amoroso e depois ir embora como se nada tivesse
acontecido? Eu preciso saber mais sobre isso.
— Sr. Lancasther, o carro está aqui — Kevin gritou, enquanto
se aproximava da aeronave.
Segundos depois Bruce saiu do jato e veio na minha direção
com um olhar intenso que fez as minhas pernas bambearem.
— Vamos para o carro, Jenny. — Ele colocou a mão nas
minhas costas e me levou até o veículo.
Não dei oportunidade para que o homem abrisse a porta para
mim, apenas me enfiei no banco traseiro sem ao menos disfarçar a
minha cara de desgosto. Eu não devia estar tão chocada. Um
homem rico e bonito como Bruce com certeza tinha namorada. Fui
uma tola por não ter considerado essa possibilidade antes.
— Aconteceu alguma coisa? — meu chefe perguntou, ao se
acomodar ao meu lado no banco.
Engoli em seco, já não conseguia conter aquela inquietação
dentro de mim.
— Sua namorada não fica incomodada com você viajando
pelo paíscom a sua secretária? — questionei antes que eu pudesse
me arrepender.
Minha única intensão era colocar um fim nessa história de
uma vez por todas. Se Bruce realmente tem um interesse amoroso,
eu preciso saber. Não quero ficarbabando em cima de um homem
comprometido... por mais gostoso que ele seja.
Bruce franziu o cenho como se estivesse completamente
perdido com a minha pergunta.
— De onde você tirou isso? Eu não tenho namorada, Jenny.
— Talvez... namorado? — tentei novamente.
— Nenhum dos dois — respondeu, em um tom divertido. —
Eu não estou comprometido.
— Está solteiro, então — concluí.
O homem concordou com a cabeça.
Confesso que me senti aliviada com aquilo, mas a pulga
ainda permanecia em minha orelha. As palavras de Kevin deviam
ter algum tipo de fundamento, afinal, o piloto parecia trabalhar com o
Bruce há bastante tempo, ele devia conhecer seu chefe muito bem.
— E você, Jenny? — Bruce perguntou, quebrando o silêncio
momentâneo que pairou no interior do veículo.
— O que tem eu?
— Está comprometida? — Ele se mexeu no banco,
parecendo um pouco desconfortável. — Existe algum candidato
para ser o padrasto da Lorie?
Minha boca se abriu discretamente quando ouvi aquilo.
Comecei a me perguntar sobre o porquê Bruce estava sondando
aquele assunto delicado. Bom, se ele me respondeu de maneira
sincera, o mínimo que posso fazer é ser honesta também.
— Não estou comprometida, se é isso que quer saber. —
Arqueei uma sobrancelha.
Meu chefe assentiu e desviou o olhar para a paisagem lá fora
quando o carro começou a andar.
Fiquei um pouco insegura depois daquela conversa e decidi
permanecer calada. Assim como Bruce, passei o resto da viagem
observando o cenário através da janela do carro e não disse uma
única palavra até chegarmos ao hotel. Espero que eu sobreviva a
esses 2 dias na companhia intensa e arrebatadora do meu chefe.
CAPÍTULO 11

Assim que chegamos ao hotel fomos até a recepção para


confirmar a reserva que a empresa havia feito. Aproveitei o
momento e me informei com a recepcionista sobre todas as
palestras e reuniões que aconteceriam nos dias que estaríamos ali.
Logo em seguida, recebemos as chaves e fomos para os nossos
quartos que ficavam um ao lado do outro.
Meia hora após a nossa chegada, Bruce teve que participar
de uma palestra de boas-vindas que abriria a conferência.
Enquanto o meu chefe estava em um salão grande com uma
centena de homens engravatados, procurei um sofá confortável no
saguão do hotel e me sentei ali para anotar todos os horários dos
compromissos que Bruce teria. Eu não queria deixar nada a desejar
na minha primeira viagem de negócios, então programei o alarme
do meu celular para me lembrar sobre as reuniões com vinte
minutos de antecedência assim, eu teria tempo de ir até Bruce e
informá-lo sobre o seu próximo compromisso.
O hotel em que ficamos era chique e luxuoso, não precisei
procurar sobre ele na internet para deduzir que era cinco estrelas —
afinal de contas, uma conferência com empresários ricos jamais
seria feita em uma hospedaria na beira da estrada.
A maioria das pessoas que transitava pelo saguão eram
homens trajados em ternos que deviam custar mais que o meu
guarda-roupa inteiro. À medida que o tempo foi avançando, também
comecei a notar algumas mulheres com um ar esnobe desfilando
por ali. Eu me sentia uma mera formiguinha com o meu terninho
azul-royal de segunda mão. Não vi nenhuma outra secretária
perdida com o cabelo bagunçado carregando um bloquinho de notas
com avisos para dar ao seu chefe, eu era a única pessoa ali que
ocupava um cargo inferior na pirâmide empresarial. Por que Bruce
me trouxe para esse mar de tubarões?
Passei o resto da tarde sentada no sofá do saguão com uma
almofada no colo, olhando tediosamente para a porta fechada da
sala onde Bruce estava. Eram 18h quando ela finalmente se abriu e
um mar de homens engravatados saiu dali. Curiosamente, a maioria
parecia ter mais de 40 anos, Bruce era o único empresário jovem do
grupo. Assim que ele saiu da sala, seus olhos varreram o ambiente
e logo pousaram em mim, ele me direcionou um pequeno sorriso e
veio em minha direção.
— Qual será o meu próximo compromisso, Jenny? — Ele
sentou ao meu lado no sofá.
— Às 18:30h terá uma palestra sobre planos de investimento
no salão do 2° andar — respondi, enquanto folheava as anotações
que fiz no meu bloquinho. — E às 20h será um coquetel de
recepção aos convidados.
Bruce concordou com a cabeça e olhou para o ambiente ao
nosso redor.
— Você ficou sentada aqui desde que eu entrei na sala? —
Ele parecia surpreso.
— Sim. Preciso estar por perto para avisá-lo sobre os
horários.
— Está fazendo um ótimo trabalho, Jenny. A partir de agora,
você também será a minha porta-voz durante o evento. Se alguém
quiser falar comigo enquanto eu estiver aqui, terá que falar primeiro
com você.
— Tudo bem — concordei, um pouco insegura pela nova
tarefa que me foi confiada. — Acho que consigo dar conta de duas
coisas ao mesmo tempo.
Bruce me deu uma piscadela e afagou o meu ombro.
— Vou comer alguma coisa e me preparar para a palestra
das 18:30h. — Ele se levantou do sofá. — Me empresta o seu bloco
de anotações?
— Claro. — Entreguei ao meu chefe o pequeno amontoado
de folhas.
Ele tirou uma caneta chique do bolso do paletó e anotou algo
na última folha do bloco.
— Fique com o resto da noite de folga. Vá para o seu quarto
descansar e me ligue quando faltar 30 minutos para o compromisso
das 20h. — Bruce me devolveu o bloco de anotações e eu percebi
que ele havia anotado um número de telefone.
— Esse número é seu? — perguntei, tentando disfarçar o
interesse em minha voz.
Meu chefe assentiu e guardou a caneta de volta no bolso.
Não conseguia acreditar que eu finalmente tinha o contato de
Bruce. Se eu tivesse esse número seis anos atrás, isso poderia ter
mudado completamente a minha vida e a da Lorie. Eu poderia ter
ligado para dizer que estava grávida e se Bruce realmente fosse o
bom homem, que está aparentando ser, acho que ele não teria
fugido da responsabilidade. Lorie teria crescido com um pai e as
coisas estariam bem melhores para ela...
— Você se sairá bem, Jenny — Bruce me tirou do devaneio.
Concordei, um pouco distraída.
Depois de me afagar o meu ombro outra vez, meu chefe se
afastou e foi em direção à cantina do hotel. Mais cedo, quando
chegamos, Bruce disse que eu tinha liberdade para pedir serviço de
quarto e até pegar coisas do frigobar. Então, decidi que iria para o
meu quarto, tomaria um banho de espumas, pediria o jantar e faria
uma chamada de vídeo para falar com a minha filhinha. Nunca
dormi fora de casa desde que Lorie nasceu, espero que ela esteja
bem.
Tudo correu bem no primeiro dia de conferência. Tive uma
ótima noite de sono na enorme cama que havia em meu quarto de
hotel e agora estava pronta para mais um dia de trabalho.
Na esperança de parecer um pouco mais apresentável no
meio de todas aquelas pessoas refinadas, vesti a melhor peça de
roupa que eu havia colocado na mala: um vestido social midi na cor
preta que terminava na altura dos meus joelhos. Calcei sapatilhas
confortáveis imaginando que seguiria Bruce por todos os lados do
hotel, prendi meu cabelo em um rabo de cavalo, passei uma leve
maquiagem para o dia e, por último, coloquei meus óculos de
leitura. Eu finalmente estou pronta para encarar aquela gente bem
vestida.
Após dar uma última olhada no espelho do banheiro, peguei
o meu bloco de anotações, uma caneta e saí do quarto para ir à
procura do meu chefe. Bati na sua porta, mas ele não respondeu,
então tomei coragem e decidi ligar para o seu telefone. Aguardei
alguns minutos na linha até que alguém atendeu:
— Jenny? — Era Bruce e ele parecia estar em um lugar
movimentado, haviam várias vozes ao fundo.
— Olá — falei, um pouco sem jeito. Está claro que ele salvou
o meu número ontem depois que eu liguei para lembrá-lo sobre o
último evento da noite. — Estou em frente a porta do seu quarto,
preciso encontrá-lo para passar os compromissos do dia.
— Estou te esperando na cantina do hotel. Venha depressa.
— Certo. — Desliguei o telefone e corri em direção ao
elevador.
Quando cheguei na cantina, me deparei com um lugar
abarrotado de pessoas. Haviam poucas mesas disponíveis para se
sentar e precisei analisar cada rosto na multidão até encontrar
Bruce. Para o meu profundo desgosto havia uma mulher bem
vestida, com um longo cabelo cacheado e cintura de violão, a
poucos centímetros do meu chefe.
Bruce, no entanto, não parecia se importar muito com o que a
mulher estava dizendo. Seus olhos vasculharam a multidão até que
ele me encontrou. Franzi o cenho quando ele apontou na minha
direção e falou algo para a mulher, que fez uma careta e me
encarou de cima a baixo. O que está acontecendo? Segundos
depois, a lambisgoia se afastou de Bruce e veio até mim com um
olhar relutante.
— Você é a representante do Bruce Lancasther? — indagou,
deixando evidente o tédio em sua voz.
Assenti confusa e olhei para o meu chefe que parecia ter se
esquecido da mulher e agora se concentrava unicamente em
colocar muffins em seu prato de comida.
— Tentei falar com o bonitão, mas ele disse que qualquer
recado devia ser enviado através de você — ela revirou os olhos —,
de qualquer forma, preciso que avise algo para ele. — A mulher
abriu a sua bolsa carteira da Chanel e tirou dali um cartão de visita.
— Diga ao Bruce que ele está mais do que convidado para uma
reunião privada na minha suíte hoje à noite. — Ela me entregou o
cartão e saiu da cantina.
Fiquei boquiaberta com a ousadia da mulher e uma raiva
incomum surgiu em meu peito. Antes que eu me desse conta, tinha
rasgado o cartão de visita em vários pedaços e os joguei no chão.
Eu perco o meu emprego, mas não vou contar para o Bruce que ele
recebeu um convite para transar, nem morta!
Quando ergui o olhar na direção do meu chefe, me
surpreendi com o homem me encarando fixamente. Ele estava ao
lado de uma mesa cheia de aperitivos e acenou para que eu me
aproximasse. Não tive outra escolha a não ser caminhar em sua
direção. Espero que ele não tenha me visto rasgando o papel ou
terei coisas para explicar...
— Já tomou café da manhã? — Bruce perguntou, quando
parei ao seu lado.
— Ainda não. — Encolhi os ombros e ouvi a minha barriga
roncar.
O homem sorriu e me encarou de cima a baixo. Em sua mão
direita ele segurava um prato de ovos com bacon e alguns muffins
de chocolate no canto.
— Precisa comer, Jenny. — Ele gesticulou em direção ao
bufê. — Vá pegar o seu café da manhã enquanto eu procuro a
nossa mesa.
Antes que eu pudesse responder, Bruce me deu as costas e
caminhou em direção às mesas onde havia uma porção de pessoas
comendo. Decidi seguir o meu rumo e pegar algo para encher o
estômago, pois eu sabia que teríamos um longo dia pela frente.
O bufê do hotel era bem diversificado. Haviam comidas
chiques que eu mal sabia pronunciar o nome, mas também haviam
vários pratos tradicionais que eu estava acostumada a comer no dia
a dia. Assim como Bruce, decidi que comeria ovos com bacon e
peguei alguns waffles para acompanhar.
Quando retornei para a área de refeição, encontrei o meu
chefe sentado em uma mesa reservada com duas cadeiras. Ao me
aproximar dos assentos, percebi que nossos nomes — Bruce
Lancasther e Jenny Spencer — estavam escritos na placa de
reserva.
— Por um momento eu pensei que comeríamos em pé —
admiti, ao me sentar na cadeira que estava de frente para Bruce.
— O hotel reservou as mesas para os convidados — ele
respondeu, enquanto bebia um gole do que parecia ser café em
uma caneca de porcelana.
— Pensei que eu estava aqui como assistente. Nunca
imaginei que eu também seria considerada uma convidada. —
Peguei o garfo que estava sobre a mesa e comecei a comer o meu
café da manhã.
— Você é minha convidada, Jenny — Bruce ergueu um bule
prateado e colocou café na caneca de porcelana vazia que estava
ao lado do meu prato.
Um sorriso envergonhado surgiu em meus lábios e eu tentei
disfarçar olhando para a TV que estava há alguns metros de
distância da mesa. Um jogo de futebol americano estava sendo
transmitido ao vivo naquela manhã — Dallas Cowboys e New York
Giants. Eu não entendia muito sobre o esporte, mas sabia que a
torcida de ambos os times era grande, então aquele jogo devia ser
extremamente importante para a temporada.
— Gosta de esportes, Jenny? — Bruce quis saber,
certamente notou que eu estava com os olhos fixos na TV.
— Não muito — admiti.
— Fui quarterback durante o ensino médio.
Minha atenção voltou para o homem e eu o encarei com a
sobrancelha erguida.
— Sério? — indaguei, com uma certa incredulidade.
Era difícil imaginar Bruce com um uniforme de futebol
americano, mas eu precisava admitir que ele tinha porte físico para
isso.
— Até ganhei uma bolsa na Universidade de Michigan — se
gabou. — Uma pena que não consegui aproveitar a oportunidade.
— O que aconteceu? — perguntei sem pensar.
Bruce suspirou e bebeu mais um pouco de café. Ele pareceu
hesitante em responder, mas logo começou a falar:
— Minha mãe foi diagnosticada com câncer — sua voz
ganhou um tom soturno. — Desisti da vaga para cuidar dela.
Fiquei sem reação naquele momento. Jamais pensei que
descobriria algo tão pessoal a respeito de Bruce.
— Mas a sua mãe está bem? Ela se recuperou?
O homem ficou em silêncio por alguns segundos, encarou o
seu prato de comida e balançou a cabeça negativamente.
— Minha mãe faleceu quatro meses depois... — Ele respirou
fundo. — Não tivemos condições de pagar o tratamento.
— Bruce, eu sinto muito. — Segurei a sua mão, na tentativa
de oferecer algum conforto. Será que ele não era rico nessa época?
— Obrigado, Jenny. — Bruce ergueu o olhar para mim e
sorriu pesadamente.
— Desculpe por tocar em um assunto tão delicado...
— Está tudo bem, você não sabia.
A mão livre de Bruce pousou sobre a minha e a afagou de
maneira reconfortante. Nossos olhares se encontraram durante
aquele breve momento e eu quase perdi o fôlego.
— Como foi a sua adolescência, Jenny? Você era líder de
torcida? Fazia parte do clube de xadrez? — ele mudou de assunto.
Certamente, ainda era difícil falar sobre a perda de sua mãe. —
Aposto que era a mais inteligente da turma.
Encolhi os ombros e desviei o olhar para longe, foi inevitável
não lembrar da minha infância triste naquele orfanato da Filadélfia.
Eu não gostava de tocar nesse assunto, mas me senti na obrigação
de o compartilhar com Bruce, já que ele também me contou sobre
uma parte delicada do seu passado.
— Não tive um começo muito bom. — Fitei o meu chefe
novamente. — Fui deixada na porta de um orfanato quando eu era
recém-nascida. Cresci em lares adotivos, sendo maltratada pelos
tutores que prometiam cuidar de mim... as coisas só melhoraram
quando cheguei nos meus 15 anos e fui adotada por um casal de
meia-idade que não podia ter filhos. Eles cuidaram de mim por
alguns anos, mas vieram a falecer pouco tempo depois que alcancei
a maioridade. — Senti um peso no peito pela recordação dolorosa.
— Os dois eram fumantes e acabaram desenvolvendo câncer no
pulmão.
— Jenny, eu não fazia ideia. — Bruce estava boquiaberto
com o meu relato. — Nunca pensei que você tivesse passado por
tanta coisa. — Sua mão voltou a acariciar a minha e o seu rosto
ganhou uma expressão sombria. — Eu odeio isso... adultos
irresponsáveis que colocam crianças no mundo e depois as
abandonam. Como o pai da Lorie, que sequer liga para ela.
Fiquei em silêncio, sem saber como reagir ao que Bruce
havia dito. Seu olhar foi tomado pelo ódio quando ele mencionou o
pai de Lorie e eu comecei a me sentir culpada. Eu sabia da verdade,
mas ainda assim preferia manter segredo para evitar um possível
desentendimento. Estamos começando a nos entender agora. Não
posso simplesmente jogar na conversa que ele é o pai da minha
filha.Bruce não iria acreditar em mim e eu teria muita dor de cabeça
até conseguir provar a sua paternidade.
Naquele instante, o alarme do meu celular tocou. Precisei
soltar a mão de Bruce para pegar o aparelho que deixei guardado
no interior do meu sutiã. Percebi um certo interesse do homem
enquanto eu enfiava a mão dentro do vestido e tirava o celular de lá.
Quando olhei a tela do smartphone, li a notificação do
despertador que dizia: “palestra sobre medidas socioambientais”.
Rapidamente, desliguei o alarme e peguei o meu bloco de notas
para conferir o horário do evento.
— Ah... você tem uma palestra daqui a vinte minutos no salão
do 15° andar — avisei.
O homem apenas assentiu e terminou de beber o café da sua
caneca de porcelana.
— Obrigado, Jenny. — Ele se levantou da cadeira e ajeitou o
paletó do seu terno preto.
Percebi que era hora de trabalhar e também me levantei do
assento. Fiquei um pouco triste por não ter comido todo o café da
manhã, pois o meu estômago ainda protestava com fome.
— Termine a sua refeição, Jenny. — Bruce gesticulou para
que eu me sentasse novamente. — Me encontre na entrada do
salão quando a reunião acabar.
Concordei imediatamente e sorri com gratidão para o meu
chefe. Ele semicerrou os olhos por um breve segundo e seu olhar
azulado ganhou um brilho intenso, diferente do que eu estava
acostumada a ver. Meu coração acelerou enquanto eu me sentava
na cadeira. Por que Bruce está me encarando assim?
No instante em que voltei a saborear a minha refeição, ele se
despediu com um aceno e saiu da cantina. Não podia negar que
fiquei mexida com o jeito que Bruce me olhou antes de ir embora.
Parecia que ele tinha um milhão de coisas para dizer, mas tudo o
que conseguiu foi me lançar aquele olhar arrebatador e enigmático.
Tentei abandonar aqueles pensamentos incertos enquanto
terminava a minha refeição, eu precisava me concentrar no trabalho
e não podia ser distraída por uma mente cheia de perguntas logo
nas primeiras horas do dia.
Depois de muito esforço, consegui fazer o profissionalismo se
sobressair em meio aos questionamentos e incertezas que eu tinha
a respeito de Bruce. Foquei em exercer o cargo que me foi dado e
passei o resto do dia avisando ao meu chefe sobre os seus
compromissos e garantindo que ele não se atrasasse. Depois da
última reunião, ele me liberou e disse que iria descansar antes do
último compromisso, então fui para o meu quarto e tirei um pequeno
cochilo.

Acordei às 18h com o despertador do celular avisando sobre


o jantar de encerramento da conferência. Desliguei o alarme com
um bocejo e liguei para Bruce na intenção de avisá-lo sobre o último
compromisso da agenda.
— O número discado está desligado ou fora da área de
cobertura — a voz do correio eletrônico avisou.
Praguejei mentalmente e desliguei a chamada. Talvez, Bruce
deixou o celular desligado para dormir ou sabe-se lá o que ele
decidiu fazer em seu momento de descanso. Involuntariamente, me
recordei da mulher que veio falar comigo pela manhã e que estava
evidentemente interessada no meu chefe. Senti um incômodo no
peito e me levantei da cama tão rápido que a minha visão escureceu
por alguns segundos. Preciso encontrar o Bruce...
Caminhei em passos apressados até a porta. Quando saí do
corredor, me ocorreu que o homem poderia estar descansando em
seu quarto. Respirei fundo e decidi ir até lá, torcendo para encontrá-
lo sozinho.
Depois de hesitar por alguns segundos, bati na porta de
Bruce e fiquei aliviada ao ouvir sua voz.
— Eu não pedi serviço de quarto — resmungou.
— Sou eu — falei de imediato, o nervosismo queimando em
meu peito.
— Jenny?! — Ele pareceu surpreso. — Por favor, entre. A
porta está destrancada.
Respirei fundo e girei a maçaneta fria. Abri a porta apenas o
suficiente para que o meu corpo mediano pudesse passar e, em
seguida, a fechei. Fiquei boquiaberta ao me deparar com Bruce sem
camisa diante de uma cama repleta de roupas espalhadas — até
mesmo o terno que ele usou mais cedo estava jogado de qualquer
maneira sobre o lençol.
— Foi bom você aparecer. — Ele mal olhou na minha
direção, parecia perdido em pensamentos enquanto encarava as
peças de roupa que estavam na sua frente. — Preciso da sua
opinião...
— Estou aqui para ajudá-lo — balbuciei, enquanto encarava
o seu abdômen definido.
Bruce não mudou nada com o passar dos anos. Ele
continuava forte, com o tanquinho esculpido e os braços
musculosos. Com certeza ele malha em seu tempo livre. Senti uma
umidade familiar na calcinha quando me lembrei da sensação
maravilhosa que era estar em seus braços, sentindo a sua pele
roçar na minha. Céus... preciso manter o foco!
— Qual camisa você acha que eu devo usar no jantar de hoje
à noite? — Bruce ergueu na minha direção duas camisas sociais de
mangas longas; uma branca e a outra azul clara.
Com um pouco de relutância, desviei o olhar para longe do
seu corpo e me concentrei nas peças de roupa.
— A azul. — Apontei para a camisa que estava em sua mão
direita.
Bruce ponderou sobre a minha opinião e jogou a camisa
branca na cama.
— Tem certeza? — Ele ergueu uma sobrancelha enquanto
encarava a peça que eu escolhi.
— Tenho. Você fica ainda mais bonito de azul. — Arquejei e
tapei a minha boca ao perceber o que eu havia dito, mas era tarde
demais.
— Você acha que eu sou bonito? — Bruce perguntou, com
um sorriso irônico. Merda!
Incapaz de disfarçar a minha inquietação, olhei para ambos
os lados do quarto, enquanto pensava em um jeito de reverter o
meu comentário vergonhoso.
— B-bom... eu... eu acho que todos os homens ficam bonitos
de terno — gaguejei, mas ele não acreditou naquela desculpa.
Seu sorriso aumentou e ele me encarou de cima a baixo sem
ao menos disfarçar.
— Também acho você bonita — comentou, com um tom
malicioso.
Não precisei olhar no espelho para saber que o meu rosto
estava mais vermelho que um tomate. Tudo que consegui fazer foi
direcionar um sorriso tímido para Bruce, que ainda me encarava
fixamente.
— Quando começará a se arrumar para o jantar? — indagou,
sem desviar os olhos para longe do meu corpo.
— Que jantar? — Cruzei os braços, involuntariamente.
O olhar de Bruce, finalmente, subiu até o meu rosto e ele
franziu o cenho, parecendo confuso.
— O jantar de encerramento da conferência.
— Ah, esse jantar... — tentei me recompor. — Bom, eu não
irei.
O homem ficou sério em questão de segundos e se
aproximou de mim, parando a poucos centímetros de distância.
— Como assim você não vai? — Ele ainda segurava a blusa
azul que estava pendurada em um cabide de madeira do hotel.
Encolhi os ombros e me senti ainda mais envergonhada. Eu
preferia que Bruce voltasse a me comer com os olhos do que admitir
a verdade sobre o porquê eu não iria naquele jantar. Honestamente,
eu pensei que fosse apenas para os empresários — assim como as
palestras e reuniões que aconteceram —, mas agora que eu entendi
que a minha presença seria permitida, comecei a me preocupar com
outra questão: eu não trouxe nenhuma roupa chique o suficiente
para um evento desse porte. Na verdade, eu sequer tenho algo no
meu guarda-roupas que se encaixe nesse padrão.
— Jenny? Por que você não vai? — ele insistiu. — Sua
cadeira já está reservada e...
— Bom, quando arrumei a minha mala eu não imaginei que
participaria de um jantar formal, portanto, não tenho nada para vestir
— disparei. — Vou ficar no meu quarto e falar com a Lorie pelo resto
da noite. Estou com saudade dela.
Bruce ficou em silêncio e assentiu.
Decidi que era hora de sair dali antes que ele tentasse me
fazer mudar de ideia, eu me sentiria ainda pior se precisasse
recusar o convite uma segunda vez.
— Vou deixar que termine de se arrumar. — Virei-me em
direção à porta. — Tenha um ótimo jantar, Bruce.
Após dar uma última olhada no homem sem camisa que me
encarava com uma expressão indecifrável no rosto, abri a porta e
forcei minhas pernas a caminharem para fora do quarto. Eu até
podia fazer um esforço de comparecer no evento, mas não queria
ser a única ali usando um terninho social como se estivesse em um
dia de trabalho no escritório. Pior que isso seria ver as mulheres
ricas e poderosas, com seus corpos enrolados em vestidos caros,
se jogando em cima de Bruce e não poder fazernada a respeito. Eu
era uma simples secretária e, por mais doloroso que fosse,
precisava ficar em meu devido lugar.
CAPÍTULO 12

Faltavam 10 minutos para as 19h e eu permanecia deitada


em minha cama, encarando o teto de gesso desde que falei com
Bruce. Há alguns minutos, Brittany me mandou uma mensagem
avisando que levaria Lorie para comer cachorro quente, portanto, a
minha filha não estava em casa para que eu pudesse ligar para ela.
Eu estava perdida e não tinha ideia do que poderia fazer pelo resto
da noite.
Sem que eu me desse conta, comecei a pensar em Bruce e
um flashback de tudo que aconteceu nas últimas semanas passou
pela minha cabeça. Eu diria que estamos nos dando bem até o
momento e espero que as coisas continuem assim. Bruce tem sido
um chefe legal e demonstrou preocupação comigo inúmeras vezes.
Talvez, eu estivesse ficando louca, mas precisava admitir que
estava começando a notar um certo interesse de Bruce na minha
pessoa. Espero que não seja apenas coisa da minha cabeça, mas o
jeito que ele me olhou quando entrei no seu quarto mais cedo... eu
conheço o olhar de um homem quando ele deseja alguém. Bruce
me encarou do mesmo jeito que um lobo faminto encara uma ovelha
que se perdeu do rebanho.
Fui tirada do meu devaneio quando alguém bateu na porta do
meu quarto. Suspirei e fiz um esforço para me levantar da cama.
— Já estou indo — respondi, enquanto atravessava o quarto
e fechava o roupão felpudo que o hotel forneceu.
Quando abri a porta, me surpreendi ao ver Kevin, o piloto do
jato de Bruce, parado no corredor com uma enorme caixa de
presente nas mãos.
— Srta. Spencer — ele me cumprimentou.
— Por favor, Kevin, me chame apenas de Jenny — falei, com
os olhos fixos no pacote. — Posso ajudar em alguma coisa?
— Fico feliz por se lembrar do meu nome... Jenny — O jovem
me direcionou um sorriso tímido. Eu apostaria que esse era o
primeiro emprego dele. — Bom, me pediram para entregar isso a
você. — Ele estendeu as mãos para me dar a caixa de presente.
— Mas... eu não estou esperando nenhuma encomenda. —
Franzi o cenho, estranhando a situação. — Sabe o que tem aí
dentro?
Kevin balançou a cabeça negativamente.
— Só estou cumprindo ordens. — Ele estendeu os braços na
minha direção mais uma vez, insistindo que eu pegasse o pacote.
Suspirei, me dando por vencida, e peguei a caixa das suas
mãos. Apesar do tamanho, ela não estava muito pesada.
— Obrigada, Kevin — agradeci, enquanto analisava o objeto
feito de papelão lilás.
O homem sorriu em resposta.
— Eu tenho que ir agora. — Ele olhou ao seu redor. — Nos
vemos amanhã no aeroporto.
— Está bem. — Direcionei-lhe um sorriso amigável e fechei a
porta do quarto.
Com a ansiedade martelando no peito, coloquei a caixa sobre
a cama e tirei a sua tampa rapidamente. Em seu interior havia algo
enrolado em um papel celofane dourado e em cima dessa
embalagem estava um bilhete. Franzindo o cenho, peguei o
pequeno pedaço de papel perfumado e li o que estava escrito:

“Estou enviando um pequeno presente para você.


Use-o no jantar desta noite.
Te espero no saguão do hotel às 20h.”

— Não acredito... — comentei, enquanto deixava o bilhete de


lado e começava a abrir o embrulho. Não havia nenhuma pista do
remetente no recado que li, mas eu tinha certeza de quem me
enviou aquele pacote.
No instante em que me livrei do papel de embrulho dourado,
meus olhos pousaram em um tecido vermelho que estava dobrado
em várias camadas. Puxei o pano para fora da caixa e arquejei
quando ele se desdobrou em um vestido longo com alças
cravejadas de pedras brilhantes. Porra, Bruce!
Apesar da minha surpresa, um sorriso curvou a minha boca e
o meu coração martelou no peito. Incapaz de conter a euforia que
crescia dentro de mim, tirei o meu roupão confortável e deslizei o
meu corpo para dentro do vestido. Ele se encaixou perfeitamente,
quase parecia feito sob medida.
Corri para a frente do espelho e a minha autoestima se
elevou assim que encarei o meu reflexo. Eu estava linda. O vestido
possuía um decote ousado e um formato sereia que valorizou as
curvas do meu corpo, realçando cada ponto essencial. As alças com
brilhantes trouxeram um lindo destaque para o meu busto, me
deixando com uma aparência chique e sexy ao mesmo tempo.
Eu não acreditava em contos de fadas, mas nesse momento
eu me sentia a própria Cinderela. Kevin podia ser a minha fada
madrinha, já que ele trouxe o vestido, e Bruce... bom, é claro que
ele seria o príncipe.
Depois de me admirar no espelho por longos minutos, voltei
até a caixa de presente e encontrei uma sandália de salto preta do
tamanho exato dos meus pés. Tentei não pensar o tanto que Bruce
gastou naquele “pequeno presente”, afinal, eu não queria estragar a
felicidade do momento. Vou pensar em valores depois que o jantar
acabar. Agora, eu preciso dar um jeito no meu cabelo bagunçado e
fazer uma maquiagem digna desse traje de gala.
Meia hora depois, eu estava pronta e fabulosa. Prendi meu
cabelo em um coque deixando algumas mechas caírem ao redor do
meu rosto, tirei os óculos — já que Bruce não me reconheceu
quando me viu sem ele — e fiz uma maquiagem para noite com a
ajuda de um tutorial que vi na internet. Graças às sandálias de salto,
ganhei alguns centímetrosde altura e agora eu até parecia uma das
mulheres ricas que ficavam transitando pelo hotel.
Após dar uma última conferida no visual, guardei o celular
dentro da minha bolsa carteira preta e saí do quarto, indo em
direção ao elevador.
Quando cheguei ao térreo, me deparei com algumas dezenas
de pessoas em trajes finos e pela primeira vez não me senti
deslocada. Com o meu vestido luxuoso eu passava facilmente a
impressão que tinha tanto dinheiro quanto aquelas mulheres de
narizes empinados e peitos artificiais.
Alguns homens de terno me encaravam boquiabertos quando
entrei no saguão e entre eles estava Bruce, com o seu terno preto
de gala e a blusa azul que eu escolhi mais cedo. Ele conversava
com outros empresários, mas se calou no instante em que seus
olhos pousaram em mim.
Sem saber o que eu devia fazer, lhe direcionei um sorriso
tímido e caminhei em sua direção me esforçando ao máximo para
manter a postura confiante. Eu não podia tropeçar ou encolher os
ombros quando todos os olhares do lugar estavam voltados para
mim. Vou interpretar a mulher confiantee sedutora pelo menos uma
vez na vida.
— Boa noite, cavalheiros — cumprimentei os dois homens de
meia idade que estavam ao lado do meu chefe.
Ambos acenaram com a cabeça em resposta e eu voltei
minha atenção para o único homem que me importava naquele
lugar.
— Bruce — cumprimentei-o com um sorriso e estendi a mão
para que ele a beijasse. Céus, isso não é um baile do século XVIII,
Jenny! Os homens de hoje em dia não agem como os mocinhos dos
romances de época...
Meu chefe apenas segurou a minha mão estendida e me
encarou de cima a baixo. Ele estava boquiaberto com o meu visual.
Espero não ter exagerado na sombra ou no batom vermelho.
— J-Jenny — Bruce gaguejou. — Eu... eu não tenho palavras
para descrever o quanto você está linda.
Fiquei sem ar naquele momento e senti as minhas bochechas
corarem.
Bruce me direcionou um sorriso que balançou o meu coração
e me estendeu o seu braço esquerdo, como um personagem de
filmes antigos. Coloquei minha mão ao redor do seu bíceps e
ficamos lado a lado, nos entreolhando por alguns segundos.
— Vamos andando? — ele perguntou, evitando que o silêncio
pairasse entre nós.
Concordei com a cabeça e Bruce virou o rosto na direção dos
homens com quem ele conversava antes da minha chegada. Os
dois sujeitos ainda me encaravam boquiabertos.
— Se me dão licença, nós temos um jantar para ir — ele se
despediu dos empresários.
Os homens assentiram e voltaram a conversar entre si. Não
tive tempo de ouvir o assunto, pois Bruce caminhou para fora do
saguão e me levou junto com ele.
Pegamos o elevador para o salão da cobertura, onde seria
realizado o jantar. Mesmo quando entramos na caixa de metal,
minha mão permaneceu entrelaçada ao braço do meu chefe e,
sinceramente, eu não queria me afastar dali. Pela primeira vez, em
muito tempo, eu me sentia segura e confiante, portanto, decidi que
aproveitaria esse momento enquanto ele durasse.
— Gostou do vestido, Jenny? — Bruce puxou assunto
enquanto esperávamos que o elevador chegasse ao último andar do
hotel.
Olhei para a minha roupa e dei um pequeno sorriso.
— Gostar é pouco... eu adorei — admiti, empolgada. —
Obrigada pelo presente, Bruce.
— Eu sabia que ficaria perfeito. — Seu olhar passeou pelo
meu corpo e ele me direcionou um sorriso torto. — Você fica ainda
mais bonita de vermelho.
Fiquei feliz com o elogio e pela primeira vez não me senti
envergonhada. Era bom ouvir Bruce me elogiando, isso fazia com
que eu me sentisse importante aos olhos dele.
O elevador apitou, indicando que chegamos no andar onde a
confraternização estava sendo realizada. No instante em que
saímos da caixa de metal, as pessoas que estavam no salão
viraram seus rostos em nossa direção e ficaram distraídasenquanto
nos observavam. Algo me dizia que os olhares não eram para o
meu chefe e que toda aquela atenção desnecessária estava em
mim.
— Todo mundo está nos encarando — sussurrei, de modo
que apenas Bruce pudesse me ouvir.
— Provavelmente estão curiosos — respondeu, com um tom
divertido. — Ninguém sabe quem é você e esse vestido... — Ele
assoviou. — Talvez, eu devesse ter escolhido algo mais discreto.
— Eu gostei do vestido exatamente como ele é — opinei.
— Também gostei dele — Bruce concordou com o meu
comentário. — O que eu não gosto é de todos esses olhares em
cima de você.
Eu não soube o que responder naquele momento. Bruce está
com ciúmes de mim?
— Vamos nos sentar, Jenny. — Ele me guiou pelo salão
abarrotado de pessoas até a área onde estavam as mesas.
No meio do caminho fomos cercados por um homem de meia
idade usando um terno cinza elegante. Ele me encarou de cima a
baixo e logo voltou sua atenção para Bruce.
— Eu não sabia que você estava comprometido, Lancasther
— o empresário comentou.
Engasguei com a minha própria saliva. O sujeito acha que
somos um casal? Ah, queria eu!
— Não estou comprometido, Rogers — Bruce pareceu um
pouco envergonhado ao responder. — Ela é minha secretária.
Confesso que fiquei um pouco deprimida com a verdade.
O empresário de cabelos grisalhos me encarou por um tempo
e depois direcionou um sorriso malicioso para Bruce.
— Secretárias, hein? — Ele deu alguns tapinhas no ombro do
meu chefe. — Tal pai, tal filho.
Bruce ficou irritado e afastou a mão do homem para longe do
seu ombro.
— Não sou como o meu pai — respondeu em um tom sério, e
voltou a caminhar pelo salão, me levando com ele.
Quando chegamos à mesa de dois lugares que estava
reservada com os nossos nomes, Bruce pareceu relaxar e eu
finalmente soltei a mão que segurava o seu braço. Sem dizer
nenhuma palavra, ele puxou a cadeira e gesticulou para que eu me
sentasse. Sorri e me acomodei no assento.
Fiquei em silêncio, enquanto esperava meu chefe se sentar
na minha frente. Ele bebeu um gole da água que estava em uma
das taças na mesa e suspirou.
— Está irritado por que o homem pensou que fôssemos um
casal? — perguntei sem pensar.
Bruce me encarou e balançou a cabeça negativamente.
— Não tem nada a ver com você, Jenny — respondeu, após
refletir por um tempo. — O problema é com o meu pai. Ele era um
canalha.
— Compreendo. — Eu não fazia ideia do que mais poderia
dizer diante daquele comentário.
Pelo que fui capaz de perceber até o momento, Bruce parecia
odiar o pai e eu tinha certeza que o motivo do seu mal humor foi ser
comparado com o mesmo, pelo empresário que nos cercou minutos
atrás.
Sem saber o que dizer, bebi um pouco de água e olhei o
ambiente ao meu redor. Uma suave música clássica tocava ao
fundo e todo o salão estava repleto de pessoas bem vestidas
tagarelando entre si. Bruce e eu éramos uma das poucas pessoas
que estavam sentadas, mas pelo que eu pude concluir, ele não
parecia muito animado para conversar com os outros ao seu redor.
— Já provou comida gourmet? — Bruce perguntou depois de
um tempo, quebrando o silêncio que havia entre nós.
— Não. Nunca comi — confessei. — Comidas gourmet são
caras demais para mim.
— Bom, então hoje será a sua primeira vez. — Ele me
direcionou um pequeno sorriso.
— E por falar em coisas caras... — Olhei brevemente para o
meu vestido e encolhi os ombros. — Prometo que vou compensar o
dinheiro que você gastou nessa roupa. Talvez eu pague parcelado,
já que tenho a dívida da lavanderia para quitar, mas...
— Nem pense nisso, Jenny — Bruce me interrompeu. —
Esse vestido é um presente meu para você e não aceitarei
devoluções de qualquer tipo. — Ele bebeu mais um pouco de água
e suspirou. — E sobre a conta da lavanderia que Valery está
empurrando para cima de você... não precisa pagar. Ela está
fazendo isso apenas para inflar o próprio ego.
— Não quero ter mais problemas do que já tenho. Vou pagar
essa dívida e viver em paz.
— É injusto — ele rebateu. — Sei o quanto 600 dólares
podem fazer falta no final do mês, principalmente para uma mãe
solteira.
— Antes de eu conseguir esse emprego eu ganhava apenas
800 dólares — deixei escapar. — Lorie e eu iremos sobreviver.
Bruce arqueou uma sobrancelha, como se estivesse
completamente chocado com a minha revelação. Ele estava prestes
a falar alguma coisa quando dois garçons se aproximaram da nossa
mesa — um trazia a comida em uma bandeja de aço e o outro uma
garrafa de vinho.
Assim que os pratos foram colocados sobre a mesa, franzi o
cenho tentando identificar que tipo de alimento era aquele. Parecia
peixe com alguma variedade de molho branco, mas eu não tinha
muita certeza.
— Ah... o que é isso? — Apontei para o prato, quando os
garçons se afastaram.
— Atum ao molho de limão — Bruce explicou tranquilamente,
e apontou para a tigela com arroz que estava ao lado. — E aqui
temos arroz com aspargos.
Franzi o cenho e peguei com o garfo um pedaço do peixe.
Bruce me encarou com curiosidade enquanto eu experimentava a
comida.
— O que achou? — ele quis saber.
Mastiguei o peixe, analisei o sabor do molho e então engoli.
— Não é ruim. — Bebi um pouco do vinho tinto que foi
servido. — Mas ainda prefiro o bom e velho cachorro quente.
Bruce sorriu e começou a comer.
Coloquei um pouco de arroz no meu prato e saboreei aquela
refeição chique. Comer em um lugar como esse fez com que eu me
sentisse parte da alta sociedade. Preciso admitir que essa está
sendo uma das melhores noites da minha vida.
Quando terminei de jantar, limpei a boca com um guardanapo
e observei Bruce, enquanto ele terminava a sua refeição. Aproveitei
o momento para beber mais três taças de vinho e me arrependi
quando comecei a me sentir tonta.
— Eu estive pensando sobre o que você disse agora a pouco
— Bruce puxou assunto depois de um longo tempo em silêncio e
tomou um gole de vinho. — Aquilo era verdade? Você e Lorie já
viveram com apenas 800 dólares por mês?
Encolhi os ombros diante daquela pergunta, mas concordei
com a cabeça. Era exatamente isso que eu recebia mensalmente
quando trabalhava na lanchonete do senhor Chang. As coisas só
não ficavam tão complicadas porque Brittany e eu dividíamos as
despesas na hora de pagar as contas.
Bruce pareceu chocado com aquela informação.
— Nunca pensou em pedir ajuda ao pai de Lorie? Pelo
menos, nas despesas da menina? — perguntou diretamente.
— É complicado... — Suspirei e me remexi no assento.
Meu chefe comeu o último pedaço do peixe e limpou a boca
com o guardanapo de cetim que estava sobre a mesa.
— Jenny, eu posso fazer uma pergunta pessoal? — Agora
que Bruce havia terminado de comer ele me encarava fixamente.
Vendo-me em um beco sem saída, afirmei com a cabeça
para que o homem prosseguisse com o assunto. Espero não me
arrepender.
— Por acaso você não sabe quem é o pai da Lorie? — A voz
levemente arrastada de Bruce entregava que ele estava começando
a ficar embriagado, obviamente, uma consequência das 5 taças de
vinho que tomou. — Eu notei que você tem um pouco de resistência
quando fala sobre o assunto. Ele não te tratava bem, ou... você não
sabe onde ele está?
Encolhi os ombros e suspirei. Embora estivesse com medo
de dizer algo comprometedor, decidi contar parte da verdade.
Talvez, isso tire um pouco do peso que sinto em meus ombros
desde que comecei a trabalhar na empresa.
— A Lorie foi... um acidente. — Fiz o possível para dosar as
palavras enquanto elas saíamda minha boca. — Conheci o cara em
um bar, fiquei com ele por uma noite e depois foi cada um para o
seu lado. Um mês depois eu descobri que estava grávida. Eu não
tinha qualquer informação sobre o sujeito para ir atrás dele, então,
decidi tocar a vida sozinha. Me mudei para Nova York e gastei todo
o dinheiro que eu tinha em um apartamento no Bronx.
— Onde você morava antes de vir para cá?
— Filadélfia — respondi, automaticamente.
Depois que as palavras saíram, senti vontade de dar um
chute na minha bunda por aquele deslize. Espero que Bruce não se
lembre daquela noite, porque se ele ligar os pontos, a casa cai!
Bruce assentiu ao ouvir a minha resposta e bebeu o restante
de vinho que sobrou em sua taça.
— Então o cara nem sabe que tem uma filha? — Ele arqueou
as sobrancelhas.
Neguei com a cabeça e suspirei, tentando manter a calma.
Não consigo acreditar no assunto que eu me meti!
— Já pensou em procurá-lo? — sugeriu. — Acho que ele
devia saber sobre a Lorie. Seria bom para ela ter contato com o pai
durante a infância.
Esfreguei minhas têmporas por um instante e então tive uma
ideia louca. Esse assunto me deixou inquieta, mas também me
rendeu uma oportunidade única: eu poderia perguntar para Bruce o
que ele achava da situação e não levantaria qualquer suspeita.
— Não é tão simples. Pelo que eu conheço do sujeito, acho
que ele iria surtar — comecei com o plano. — Você que é homem,
como reagiria se uma mulher aparecesse na sua vida dizendo que
ficou grávida seis anos atrás e que você é o pai da criança?
— Você tem razão, Jenny... o cara vai surtar. — Ele reprimiu
uma risada e bebeu mais vinho.
Encolhi os ombros diante daquele comentário.
— É isso que você faria? — perguntei, com a voz um pouco
mais séria.
Bruce ficou pensativo por um tempo.
— Honestamente? Sim, eu entraria em pânico. — Ele se
recostou na cadeira e afrouxou a gravata.
Minha boca secou e eu não soube o que dizer em seguida.
Ok, Bruce vai surtar se eu contar a verdade para ele. Céus, por que
as coisas na minha vida são tão complicadas?
— Imagino o quão difícil deve ser para vocês duas —
quebrou o silêncio. — Cresci sem pai, Jenny, isso é uma coisa que
eu não desejo a ninguém. Por isso me sinto sensibilizado com a
Lorie, eu entendo o que ela está passando.
A confissão do homem me deixou surpresa.
CAPÍTULO 13

Eu estava sem palavras. Não conseguia imaginar que Bruce


já foi uma criança com um pai ausente. Pensei que ele tivesse vindo
de uma famíliarica, mas parece que eu me enganei completamente.
Ele não me deu muitas informações sobre o seu passado, mas foi o
suficiente para eu entender que ele nem sempre teve uma vida de
privilégios.
Enquanto eu pensava comigo mesma, ouvi um telefone tocar.
Bruce olhou para a tela do seu celular, revirou os olhos e recusou a
chamada.
— Quem era? — intrometi-me.
— Valery — respondeu entediado, e bebeu mais vinho. — Ela
está me enchendo porque eu não a trouxe para a conferência.
Precisei desligar o telefone durante a tarde para ter um pouco de
paz.
— Vocês dois tem algum tipo de... lance? — perguntei, me
sentindo estranhamente corajosa. Com certeza o álcool já estava
provocando alterações na minha personalidade.
— O quê? Eu e a Valery? Não! — Bruce fez uma careta,
parecendo enojado. A reação dele diante da minha pergunta me
trouxe um profundo alívio. — Aquela mulher é louca e
inconveniente.
— Se acha que ela é louca e inconveniente, por que não a
demite? — Sorri e tomei mais um gole de vinho.
Bruce arqueou as sobrancelhas e deu uma gargalhada
quando me ouviu dizer aquilo.
— Confesso que eu adoraria, mas não posso demitir a Valery
— respondeu com diversão.
Suspirei, me sentindo irritada, e bati os punhos na mesa.
Ok... o álcool realmente está alterando a minha personalidade.
— Você é o dono da empresa, Bruce! — falei, com a voz
estridente. — Se tem vontade, basta ir até a vadia e dizer que ela
está no olho da rua. Por que isso é tão complicado?
— Porque essa vadia é minha irmã — confessou, com um
suspiro.
Meu queixo caiu. Eu simplesmente não sabia como reagir.
Valery é irmã de Bruce? Porra! Isso explica porque ela vive no
encalço dele lá na empresa. E eu pensando que os dois tinham
algum tipo de relacionamento íntimo...
— Ah... desculpe, eu não quis ofendê-la. — Tentei me redimir
depois que a ficha caiu. Melhor parar de beber antes que eu fale
outra coisa da qual me arrependa. Fiz um pequeno esforço e deixei
a minha taça de lado.
Bruce me direcionou um sorriso simpático e balançou as
mãos.
— Sem problemas, eu também xingo a Valery algumas vezes
— admitiu. — E por mais que eu sinta muita vontade, não posso
demiti-la. Parte da empresa também pertence a ela.
— Eu jamais desconfiei que houvesse algum tipo de
parentesco entre vocês — comentei, me sentindo atordoada pela
recente descoberta. — O sobrenome dela é diferente do seu.
Minhas bochechas estavam queimando depois da tremenda
gafe que eu cometi. Céus! Parando para pensar, Bruce e Valery
tinham sim algumas semelhanças físicas que eu nunca levei em
consideração como, por exemplo, os olhos azuis e o cabelo preto.
Por que não cogitei isso antes?
— Somos filhos de mães diferentes — Bruce esclareceu,
enquanto enchia a sua taça com mais vinho. Ele fez um pequeno
gesto, perguntando se eu gostaria de beber mais um pouco e eu
recusei. Quero permanecer o mais sóbria possível pelo resto da
noite. — Valery é três anos mais nova que eu. Ela cresceu na
mansão que o meu pai tinha, enquanto eu precisava sobreviver na
periferia de Detroit com a minha mãe doente e endividada.
Senti um peso no peito ao ouvir aquela história e não fui
capaz de conter a minha curiosidade.
— Como você foi parar em Detroit enquanto a Valery crescia
em um berço de ouro?
Bruce suspirou e bebeu metade da taça de vinho em um só
gole. Franzi o cenho ao observar aquilo.
— Minha mãe começou a trabalhar na empresa como
assistente do meu pai, os dois tiveram um caso por meses até que
ela engravidou. Quando a minha mãe procurou o chefe para contar
que estava esperando um filho, ele a demitiu, disse que a criança
era de outro homem e mandou ela desaparecer. O desgraçado não
queria assumir o filho da secretária. — Havia um certo rancor na sua
voz. — Pelo que eu soube, meu pai se casou com a mãe de Valery
algum tempo depois que eu nasci.
Fiquei horrorizada com aquele relato. Eu não conseguia
acreditar que o pai de Bruce tinha sido tão canalha.
— Depois dessa humilhação, a minha mãe decidiu ir embora
de Nova York. Ela pegou um empréstimo e comprou uma casa
simples em um bairro pobre de Detroit onde ela tinha alguns
conhecidos. — Ele bebeu mais vinho e encheu a taça até a última
gota que havia na garrafa. — Foi na adolescência que eu descobri
toda a história sobre o porquê eu tinha um pai ausente. Minha mãe
até conseguiu um teste de DNA, mas nunca teve coragem de enviar
para o homem. Quando ela adoeceu e eu não consegui dinheiro
para pagar o tratamento, tomei uma decisão desesperada e gastei
minhas economias em uma passagem para Nova York. — Ele
esfregou o maxilar e suspirou, entristecido pelas lembranças
daquele tempo difícil. — Decidi ir atrás do meu pai e confrontá-lo.
Ele era rico e eu não me importaria de implorar para que
encontrasse um médico capaz de salvar a vida da minha mãe.
Engoli a vergonha, fui até a empresa e pedi para falar com o dono,
Victor Lancasther. É óbvio que a recepcionista não me deixou subir,
então eu mostrei a ela o teste de DNA. Não demorou cinco minutos
até o meu pai aparecer e me chamar para conversar.
— Ele te mandou embora? — perguntei, impaciente para
saber o resto da história.
Bruce balançou a cabeça negativamente e prosseguiu.
— Pelo contrário, ele me tratou estranhamente bem. O
homem me apresentou à empresa e disse que tudo aquilo seria meu
um dia. Antes que eu pudesse pensar direito no assunto, eu recebi
uma ligação do hospital dizendo que o quadro da minha mãe piorou
e que ela tinha poucas horas de vida. O meu mundo desabou
naquele momento. — Bruce fez uma pausa para beber mais vinho.
— Quando o meu pai ouviu aquilo, entrou comigo naquele jato
particular e voamos de volta para Detroit. Aquela noite foi a última
vez que eu a vi com vida e a última coisa que ela me disse foi para
assumir o que era meu por direito. Meu pai também estava lá
quando ela partiu e eu voltei para Nova York com ele depois do
enterro.
— Foi nessa época que o seu pai começou a te preparar para
assumir a empresa? — tentei entender.
Bruce concordou com o que eu disse.
— Ele me matriculou em uma universidade cara em Los
Angeles, mas eu sequer aparecia nas aulas. — Um sorriso distante
surgiu em seu rosto. — Tive alguns anos de farra e rebeldia como
se eu fosse um playboyzinho mimado, mas depois que o meu pai
também adoeceu, precisei colocar a mão na consciência. Por mais
que eu o odiasse, pelo o que ele fez com a minha mãe, eu precisava
honrar o último desejo dela. Minha mãe não gostaria que eu me
afundasse na sarjeta, então aceitei que o Victor Lancasther me
reconhecesse como herdeiro da fortuna. Foi quando eu descobri
que também tinha uma irmã. — Ele bebeu mais um gole de vinho.
— Não nos demos bem no início, mas aprendemos a nos tolerar
com o passar dos anos. Sei que a Valery me odeia secretamente
porque antes de eu chegar ela era a única herdeira. Quando o meu
pai faleceu, me deixou com a maior parte da empresa e metade dos
seus bens, mas Valery ficou com a mansão onde ele morava.
— Você foi muito forte, Bruce. — Toquei a sua mão de
maneira hesitante. Eu me sentia completamente abalada pela
história que ouvi.
— Nós dois fomos, Jenny. Passamos por muita coisa, mas
continuamos aqui, firmes. — Ele colocou sua mão direita sobre a
minha. — Eu faria um brinde agora, mas a bebida acabou. — Bruce
olhou ao seu redor. — Acho que vou pedir outra garrafa.
— Não. — Segurei a sua mão antes que ele se levantasse da
cadeira e fosse atrás de algum garçom. — Já bebemos demais hoje.
Seria melhor que fôssemos para a cama, você não acha? Teremos
que acordar cedo amanhã para guardar as nossas coisas e voltar
para Nova York.
Meu chefe pensou por alguns instantes, depois sorriu
maliciosamente e se levantou da cadeira.
— Acho que entendi o que você quis dizer. — Ele pegou a
minha mão e me puxou suavemente para fora do assento. — Vamos
para o quarto, Jenny.
Bruce caminhou apressadamente pelo salão, me levando
junto com ele. Estava um pouco difícil me equilibrar nas sandálias
de salto estando levemente bêbada, então precisei me apoiar um
pouco mais em meu chefe.
Paramos em frente ao elevador e Bruce apertou o botão
inúmeras vezes para chamá-lo até o andar.
— O elevador não vai subir mais rápido se você apertar isso
várias vezes seguidas — brinquei. — Está com tanta pressa para ir
dormir?
— Não vamos dormir, Jenny. — Ele me abraçou pela cintura,
me puxando para perto do seu corpo.
Dei um grito de surpresa e espalmei as mãos em seu peito
para manter uma certa distância.
— Que merda é essa, Bruce?! — exclamei, depois da
aproximação repentina.
— Sugeriu que fossemos para a cama, lembra? — comentou,
com um sorriso malicioso. — Olha, eu prometi a mim mesmo que
jamais transaria com alguma funcionária da empresa, mas para
você eu vou abrir uma exceção.
— O-o quê? — fiquei incrédula. — Você acha que eu quero...
— Minha fala foi interrompida pelo toque do meu celular. Suspirei,
aborrecida, e abri a minha bolsa.
Enquanto eu procurava pelo aparelho, Bruce esticou o braço
e acariciou a minha bochecha. Meu corpo inteiro se arrepiou com o
toque. Merda, eu não acredito que isso realmente está acontecendo.
Quando finalmente tirei o telefone da bolsa, vi na tela uma chamada
de vídeo de Brittany. Eu preciso atender, pode ser alguma
emergência relacionada à Lorie.
Com um suspiro, dei um tapa na mão de Bruce para afastá-la
do meu rosto e fiz sinal para que ele ficasse em silêncio, enquanto
lhe mostrava a tela do celular. O homem embriagado encostou na
parede e assentiu, com uma expressão divertida no rosto.
— Olá — respondi, assim que atendi à chamada.
Do outro lado da tela vi minha amiga sentada no sofá da sala
com Lorie em seu colo. A garotinha tomou o celular da mão da
minha amiga e fez uma careta para mim.
— Onde você está, mamãe? — ela exigiu saber. — A tia
Brittany disse que você não vai voltar para casa hoje também.
— Sua mãe está viajando, Lorie — ouvi a voz de Brittany a
uma curta distância.
Naquele momento, o elevador chegou e eu entrei nele. Bruce
veio logo atrás de mim e apertou o botão para o andar dos nossos
quartos.
— Está viajando e não me levou, mamãe? — Pela tela do
aparelho eu vi os olhos da garotinha ficarem marejados.
— Shh... não fique triste comigo, Lorie. Eu expliquei antes de
sair que seria uma viagem à trabalho — tentei tranquilizá-la.
— Você está usando um vestido de princesa para trabalhar?
— Ela deixou o mau-humor de lado e seus olhos brilharam com
curiosidade enquanto ela observava a parte superior do meu vestido
que estava à mostra na tela.
— Vestido de princesa? Me deixe ver... — Brittany tomou o
celular de Lorie e arquejou quando me viu. — Que merda
aconteceu, Jenny? Onde você arrumou esse vestido de grife?
Assaltou a loja?
— Fui eu que comprei — Bruce se intrometeu, e se
posicionou atrás de mim para ficar visível durante a chamada.
Brittany me encarou com descrença.
— É a voz do tio Bruce? — Lorie apareceu na tela outra vez e
sorriu ao ver o homem que estava atrás de mim. — Oi, tio Bruce! —
Ela acenou com alegria.
— Oi, baixinha! — O homem retribuiu o aceno com uma
empolgação fora do normal e eu revirei os olhos.
— Ele está bêbado? — Brittany perguntou, sem rodeios.
Antes que eu pudesse responder, Bruce me interrompeu
novamente.
— Eu bebi uma ou duas taças de vinho — comentou,
enquanto contava nos dedos.
— Foram seis — corrigi, com impaciência.
— Você também bebeu, Jenny — ele retrucou.
— Espera, os dois estão bêbados? — minha amiga quis
saber, sua voz ganhou um tom mais autoritário. — Porra, não quero
imaginar onde isso vai parar...
— Não xingue na frente da criança — Bruce resmungou, a
voz arrastada pelo álcool.
Achei graça do comentário e fui incapaz de controlar a minha
risada. Brittany suspirou e revirou os olhos.
— Lorie, se despeça da sua mãe, está na hora de desligar.
Minha filha fez um beicinho quando ouviu aquilo.
— Estou com saudade, mamãe — choramingou.
— Também estou com saudade, filha. — Tentei me recompor
quando lágrimas ameaçaram cair dos meus olhos. — Prometo que
estarei em casa amanhã.
Lorie ficou feliz ao ouvir aquilo e concordou imediatamente.
— Está bem. — Ela sorriu. — Boa noite, mamãe.
— Boa noite, minha princesinha. — Mandei um beijo para a
tela do celular.
— Boa noite, Lorie — Bruce entrou na conversa outra vez.
A garotinha acenou para ele.
— Boa noite, tio Bruce! — Lorie se despediu antes de Brittany
pegar o celular.
— Você vai ter que me explicar muita coisa amanhã, Jenny
Spencer. Só vai entrar no apartamento depois que eu souber de
tudo que aconteceu nessa conferência.
— Tudo bem — concordei com diversão. Eu sabia que
Brittany estava preocupada e só queria me proteger depois de tudo
que passei. — Te vejo amanhã. — Acenei para ela.
— Não faça nada que possa se arrepender. — Brittany
desligou, sem me dar tempo para formular uma resposta.
— Sua amiga é sempre tão brava? — Bruce questionou,
divertido.
Dei de ombros em resposta.
O homem sorriu maliciosamente e deixou seu olhar passear
pelo meu corpo, se demorando na altura do decote.
— Jenny, você está uma gata nesse vestido — me elogiou,
sem se importar em esconder o interesse.
— Eu sei — respondi de imediato.
— Eu queria ter coragem para te elogiar assim todos os dias.
— Está dizendo isso porque quer me levar para cama. —
Direcionei lhe um olhar cético, deixando claro que eu não cairia
naquela conversa. Cometi um deslize no passado e o resultado foi
Lorie. É melhor eu parar por aqui, não tenho dinheiro para sustentar
outra criança.
Para o meu alívio, o elevador chegou no andar e eu saí dele
rapidamente.
— Estou dizendo isso porque é a verdade. — Bruce segurou
a minha mão para não deixar que eu andasse à sua frente.
Caminhamos em silêncio e ele só voltou a falar quando paramos em
frente aos nossos quartos. — Jenny, eu queria ter coragem para te
dizer todos os dias o quanto você é linda, mesmo quando chega
atrasada na empresa com olheiras e o cabelo despenteado.
Um sorriso ameaçou curvar a minha boca, mas eu não
permiti. Me mantive séria e fiquei de frente para Bruce, apoiando as
costas na porta do seu quarto para dar um descanso aos meus pés,
aquele salto estava me matando.
— Se me acha bonita todos os dias, o que te impede de
falar? — tentei refutar o seu argumento.
— Eu sou um covarde, Jenny. — Bruce colocou as mãos ao
redor do meu rosto e suspirou. — Não tenho coragem de dizer tudo
o que penso quando estou sóbrio, mas quando eu bebo, não sou
capaz de filtrar as verdades que saem da minha boca. — Ele
acariciou a minha bochecha com o polegar e olhou no fundo dos
meus olhos. — E uma dessas verdades é que eu estou a noite
inteira com uma puta vontade de te beijar.
Arqueei as sobrancelhas, não consegui disfarçar a surpresa
que senti com aquela declaração. Bruce não parecia estar mentindo,
ele realmente queria me beijar, isso me assustava e excitava na
mesma medida.
— Jenny... eu posso te beijar? — Nossa, o álcool realmente
muda a cabeça das pessoas.
— Bruce, você não tem ideia do que está fazendo, não acho
que... — Antes que eu terminasse a frase, o homem enterrou seu
rosto na curva do meu pescoço e inspirou profundamente o meu
cheiro. Todo o meu corpo se incendiou com aquele gesto, eu não
consegui conter o gemido que saiu da minha garganta.
— Deixa eu te beijar, Jenny, eu quero fazer isso há tanto
tempo... — murmurou em tom de súplica, sua boca estava a
milímetros da minha pele.
— Eu não sei... — relutei em nome do meu orgulho, no
entanto, o meu coração martelava com ansiedade, implorando que
eu aceitasse a oferta dele.
— Eu beijo bem. — Ele correu o nariz pelo meu pescoço até
o ouvido, sua boca mordiscou o lóbulo da minha orelha e eu me
contorci com a sensação prazerosa. — Prometo que vou te deixar
molhadinha — sussurrou ao pé do meu ouvido e aproximou ainda
mais o seu corpo do meu.
Não fui capaz de formular nenhum argumento para debater,
minha respiração ficou acelerada com a proximidade dos nossos
corpos e tudo que eu consegui fazer foi sustentar o olhar de Bruce
quando ele voltou a me encarar. Se ele quer tanto me beijar, então
não vai hesitar se tiver a chance.
Mantive-me imóvel, apenas fiquei encarando o homem no
fundo dos seus intensos olhos azuis. Ele deu um meio sorriso e
começou a aproximar seu rosto do meu. Quando Bruce estava perto
o suficiente, fechei os olhos e esperei, ansiosa para sentir a sua
boca depois de tantos anos sonhando acordada, meu coração
estava acelerado e borboletas voavam em meu estômago como se
eu fosse uma adolescente. Sua mão quente e acolhedora acariciou
a minha bochecha e então, o beijo veio.
Suspirei profundamente, me deleitando na sensação de ter a
sua boca colada na minha e deixei minhas mãos tocarem o seu
peito. Bruce mordiscou o meu lábio inferior e nossas línguas se
encontraram. Em poucos segundos, o beijo se tornou feroz e
avassalador, aquecendo e transbordando o meu corpo com a mais
pura luxúria. Nossas línguas se entrelaçavam com avidez enquanto
ele me pressionava contra a porta do quarto, eu estava a ponto de
perder o fôlego, mas essa era a última coisa que me importava.
As mãos de Bruce apertaram a minha cintura com firmeza e
ele roçou a virilha em minha coxa. Ofeguei ao sentir a sua ereção e
o homem gemeu contra a minha boca. A cada segundo que
passava o seu beijo ficava mais necessitado e terrivelmente
perigoso, não sei se eu conseguiria parar se ele continuasse
movendo a língua daquela maneira.
O tempo passou e eu permaneci totalmente entregue àquele
homem, alheia a qualquer outra coisa que acontecia ao nosso redor
— quase me esqueci de onde estávamos e até mesmo quem eu
era. Só voltei à realidade quando Bruce retirou uma das mãos do
meu quadril e a colocou sobre a maçaneta da porta.
— Quer conhecer a minha cama, docinho? — perguntou, ao
afastar sua boca da minha.
Um pouco atordoada, encarei o homem e pisquei, forçando o
meu cérebro a pensar. Porra, como eu queria dizer sim, mas então o
que aconteceria depois? Bruce estava bêbado, eu tinha certeza que
se ele acordasse amanhã e me encontrasse na sua cama levaria o
maior susto da vida. Se Bruce e eu tivermos alguma chance juntos,
quero que as coisas aconteçam enquanto estivermos sóbrios.
Depois de pensar e me odiar por desperdiçar aquela
oportunidade, empurrei Bruce para longe e me afastei da porta.
— A-acho melhor não apressar as coisas — gaguejei, me
arrependendo por dizer aquilo em voz alta. — Vá dormir, Bruce,
você está bêbado...
— Não gostou do beijo? — Ele ficou surpreso e confuso.
Senti um peso no peito. Eu não apenas gostei do beijo, como
também fiquei com a calcinha encharcada de excitação pelo
momento.
— Eu gostei... — respondi, tentando encontrar as palavras
certas —, mas acho melhor encerrarmos a noite por aqui antes de
fazermos algo do qual poderemos nos arrepender.
Bruce refletiu por alguns instantes, mas acabou concordando.
— Você tem razão, não vamos apressar as coisas. — Ele deu
um sorriso que eu não estava esperando. — Mas assim que eu
entrar no quarto, Jenny, prometo que vou te homenagear até cair no
sono. — Bruce fez um gesto obsceno com a mão e eu senti o meu
rosto corar.
Em um movimento involuntário, abri a porta e empurrei o
homem para dentro do quarto. Bruce cambaleou até sumir do meu
campo de visão e, em seguida, ouvi o som de algo pesado caindo.
Não tive coragem de entrar no quarto para checar se estava tudo
bem, apenas fechei a porta e me encostei na parede do corredor.
Espero que Bruce não se lembre de nada quando acordar de
manhã.
CAPÍTULO 14

Acordei sentindo algo frio e duro embaixo do meu rosto. Não


demorou muito até eu perceber que me encontrava deitado no chão
do meu quarto em uma posição extremamente desconfortável.
Além das dores que percorriam o meu corpo, minha cabeça
parecia estar prestes a explodir. Eu não fazia ideia do que tinha
acontecido ou do porquê eu estava caído no chão. Em minha
mente, haviam pequenos flashbacks de um sonho confuso onde eu
estava beijando uma mulher idêntica à Jenny.
Já havia amanhecido e a luz do sol que entrava pela janela
fez meus olhos arderem. Minha cabeça latejou ainda mais quando
tentei me levantar. Porra, é óbvio que estou de ressaca. Fechei os
olhos e rolei até ficar deitado de costas.
Fiquei em silêncio enquanto esperava aquele mal-estar
passar e tentava me lembrar da noite de ontem. Tudo que eu me
recordava era de estar com Jenny na mesa de jantar conversando
sobre o seu passado. Depois disso, tudo ficou escuro e então veio
parte de um sonho em que eu a beijava — era tão real que eu
quase podia sentir o calor da sua boca macia contra a minha. Que
merda aconteceu ontem à noite?
Passei mais um tempo deitado e estava quase pegando no
sono quando o meu celular tocou. A sensibilidade na minha cabeça
fez a música parecer extremamente alta. Ainda com os olhos
fechados, tateei a minha calça até encontrar o bolso onde guardei o
telefone. Sem me dar ao trabalho de olhar quem estava ligando,
deslizei o dedo para aceitar a ligação.
— Quem é? — resmunguei, com a voz arrastada.
— Bruce! Eu juro que vou te matar quando você voltar para
Nova York! — Valery gritou de um jeito escandaloso, do outro lado
da linha.
Franzi o cenho e afastei o celular do ouvido para minimizar o
volume da sua voz.
— Eu sei que você não me levou para a conferência por
causa daquela secretariazinha! — ela berrou. — Não acredito que
você está comendo ela! Que merda, Bruce... eu sabia que você era
idiota, mas não a esse ponto!
— Do que você está falando? — foi tudo que eu consegui
dizer, a dor em minha cabeça aumentava a cada palavra que eu
pronunciava.
— Ah... eu sabia... — Valery resmungou. — Agora vai se
fazer de desentendido. Olha, Bruce, você vai falir a empresa!
— O quê? — Não importava o quanto eu tentasse, não
entendia o contexto daquela conversa. — Por que acha que eu vou
falir a empresa?
Ela bufou, irritada, e desligou a ligação.
— Caralho... — Joguei o celular de lado e massageei as
minhas têmporas. Preciso levantar e tomar alguma coisa para aliviar
a ressaca. Algo me diz que eu terei um longo dia pela frente.
Respirei fundo e depois de muito esforço consegui ficar de
pé. Mantive o meu braço esquerdo apoiado na parede enquanto
caminhava até o banheiro, pois eu me sentia inexplicavelmente
tonto. Ao chegar no cômodo, parei em frente à pia e levei um susto
ao encarar o meu reflexo no espelho. Havia um grande inchaço no
lado direito da minha testa e um pequeno corte com sangue seco
naquela área. O que aconteceu ontem?
Agora eu sabia que o motivo da minha dor de cabeça não era
totalmente culpa da ressaca, alguma coisa me atingiu em cheio na
testa. Além dos analgésicos para controlar a dor eu também
precisaria de uma bolsa de gelo — e, talvez, de uma consulta
médica. Porra, preciso parar de beber.

Apesar da dor que eu sentia em praticamente todo o meu


corpo, consegui tomar banho, trocar de roupa e fazer as malas.
Depois que todas as minhas coisas estavam organizadas, chamei o
carregador do hotel para que ele levasse a bagagem até o carro.
Quando parei em frente ao quarto de Jenny, bati algumas
vezes na porta antes que ela me atendesse. A mulher não ficou
surpresa ao ver a minha testa ferida e manteve uma expressão
culpada no rosto durante todo o caminho até o aeroporto. Comecei
a desconfiar que Jenny sabia algo sobre o que aconteceu na noite
anterior e quando entramos no jato, não hesitei em sanar a minha
dúvida.
— Jenny? — chamei a sua atenção, enquanto me
acomodava na poltrona à sua frente. — Eu não me lembro de nada
que aconteceu ontem à noite depois do jantar... você sabe de
alguma coisa? Poderia me contar?
A mulher arregalou os olhos, parecendo surpresa com a
minha pergunta.
— Ah... claro... — ela gaguejou e, em seguida, curvou a boca
em um sorriso desesperado. — Depois do jantar, você se despediu
de mim e foi dormir.
— Tem certeza? — pressionei.
Ela assentiu e rapidamente desviou seu olhar para longe do
meu. Franzi o cenho diante daquela reação. Jenny está mentindo.
Enquanto eu pensava em um jeito de fazer a minha
secretária falar a verdade, Kevin entrou na aeronave usando o seu
habitual traje de piloto. Ele veio na minha direção, trazendo uma
revista embaixo do braço. Seus olhos pousaram na minha testa,
obviamente, estranhando o ferimento, mas logo se fixaram no meu
rosto.
— Parabéns, chefe. — Ele apertou a minha mão e sorriu, em
seguida, voltou sua atenção para Jenny. — Minhas sinceras
felicidades.
— O que deu em você? — perguntei, estranhando o
comportamento incomum do homem.
— Não posso desejar felicidades ao casal? — Kevin olhou
para Jenny e eu.
— Que casal? — fiquei confuso.
— Você sabe do que eu estou falando, Sr. Lancasther. — Ele
me deu uma piscadela. — Não precisam mais manter segredo,
agora todo mundo sabe que vocês estão juntos.
— Não estamos juntos! — Jenny se alarmou.
— É claro que estão. — O piloto sorriu, parecendo
extremamente convencido do que dizia.
Kevin puxou a revista que trazia embaixo do braço e virou a
capa na minha direção. Meus olhos quase saltaram das órbitas
quando a minha visão focou naquele pedaço de papel. Na primeira
página estava uma foto de Jenny e eu aos beijos em frente à porta
do meu quarto e em letras chamativas estava escrito: “Dono da
empresa Lancasther é flagrado em momento quente com uma
mulher misteriosa”. Meu sangue gelou naquele momento e eu
simplesmente não soube como reagir. Então, não foi um sonho... o
beijo que dei em Jenny foi real. Porra, aquilo aconteceu de verdade.
— Me deixe ver! — Jenny exigiu que o piloto lhe mostrasse a
revista.
Quando ele virou o papel na direção dela, o rosto da mulher
ficou branco como se ela estivesse vendo um fantasma. Seus olhos
encontraram os meus e só então percebi o quanto Jenny estava
desesperada.
— Kevin, nos deixe a sós — pedi, sem tirar os olhos da
mulher que estava sentada à minha frente.
O piloto concordou sem questionar.
— Certo, eu vou preparar a decolagem. Apertem os cintos.
Fiquei em silêncio enquanto esperava Kevin sair da cabine.
Eu não conseguia acreditar que beijei a minha secretária. Não que
fosse algo ruim, Jenny era uma mulher bonita e confesso que
estava começando a sentir um certo interesse por ela, mas o que
me levou a romper as minhas reservas e beijá-la?
Nesse momento, tudo que eu queria era entender como esse
beijo aconteceu e eu tinha certeza absoluta que Jenny possuía as
respostas para todas as minhas perguntas — como por exemplo,
por que acordei caído no chão do meu quarto com um inchaço na
testa.
— Jenny, preciso que me conte exatamente o que aconteceu
ontem à noite — comecei, com um tom calmo. — Estamos na
primeira página de uma revista de fofoca, então não minta outra vez.
— Você não lembra de nada? — ela perguntou, seu rosto
corado indicava que estava envergonhada.
Balancei a cabeça negativamente e suspirei.
— Sei que eu estava bêbado — admiti. — Quando ultrapasso
o meu limite de álcool eu não me lembro do que fiz. É como se
acontecesse um apagão na minha mente.
Jenny pareceu entender e aproveitou o momento para
colocar o cinto de segurança do avião. Fiz o mesmo, enquanto
aguardava que ela iniciasse o seu relato.
— Você bebeu muito vinho durante o jantar — começou, um
pouco hesitante. — Depois de um tempo, eu sugeri que fôssemos
dormir e você pensou que eu estava te convidando para a minha
cama.
Fiquei em silêncio enquanto refletia sobre o que ouvi. Não
conseguia me lembrar de nada e comecei a me preocupar que eu
pudesse ter prejudicado Jenny de alguma maneira. Talvez, esse
corte na testa tenha sido causado por ela em uma tentativa de se
defender?
— Jenny, eu.... eu te machuquei? Fiz algo que você não
gostou? — perguntei, incapaz de manter aquela dúvida dentro de
mim. Se eu a prejudiquei de alguma maneira, jamais irei me
perdoar.
Para o meu alívio a mulher negou com a cabeça
rapidamente.
— Você não fez nada que me deixasse desconfortável,
Bruce.
— Tem certeza? — insisti. — Até o beijo?
Ela ficou calada, como se estivesse receosa em responder.
— Você queria me beijar? — perguntei, após o seu silêncio.
Jenny encolheu os ombros e o rubor em suas bochechas
aumentou. Com muito esforço, ela me olhou nos olhos e assentiu.
— Bruce, eu te beijei por livre e espontânea vontade —
confessou.
Fiquei incrédulo com a revelação. Jenny quis me beijar?
Ótimo, isso tira o peso da minha consciência..., mas também me
traz uma grande culpa por não lembrar exatamente daquele
momento.
— Então... foi você que me beijou? — tentei entender.
Jenny encolheu os ombros.
— Você disse que queria me beijar... e eu deixei — contou
em voz baixa.
Um sorriso curvou a minha boca naquele momento. Jenny
deixou que eu a beijasse... Porra, eu queria estar sóbrio na hora
para me lembrar perfeitamente desse momento. Se bem que eu não
teria coragem para fazer isso se não fosse o incentivo do álcool.
— O que mais aconteceu? — exigi saber. — Apenas nos
beijamos, certo?
— Depois de um tempo, você parou de me beijar e perguntou
se eu queria conhecer a sua cama. — Jenny desviou o olhar para
longe. — Então eu disse para irmos com calma. Ao contrário de
você, eu não estava tão bêbada. Consegui raciocinar um pouco e
imaginei o susto que você levaria quando acordasse de manhã e me
encontrasse na sua cama.
Me permiti imaginar a situação. Se eu acordasse e
encontrasse Jenny ao meu lado, certamente, eu ficaria confuso me
perguntando como aquilo aconteceu, mas acho que não entraria em
pânico e a expulsaria do meu quarto. Na verdade, acho que eu
encontraria algum pretexto para ficar mais tempo com ela.
— Como eu consegui esse ferimento? — Apontei para o lado
da minha testa que estava lesionado.
Jenny voltou o olhar até mim e respirou fundo, como se
estivesse criando coragem para falar.
— Eu te mandei para o quarto, você concordou, mas antes
de entrar fez um comentário obsceno que me deixou sem reação. —
Ela suspirou. — Acabei ficando envergonhada e te empurrei para
dentro do cômodo. Acho que você caiu e bateu a cabeça em algum
lugar por causa disso. Eu não tive coragem de abrir a porta e
checar...
— Então isso foi culpa sua? — Estranhamente não fiquei
surpreso.
Jenny franziu o cenho.
— Não! Foi você que me provocou — ela tentou se defender.
— É mesmo? O que eu disse para te deixar tão
envergonhada a ponto de não entrar no quarto para me socorrer? —
Eu estava curioso para saber de cada detalhe.
— Você insinuou que ia bater uma punheta pensando em
mim antes de dormir — ela disparou, mas em seguida pareceu
arrependida. — Céus, não acredito que eu disse isso em voz alta —
sussurrou para si mesma.
— Não seria a primeira vez que eu faria isso — confessei,
com um leve sorriso malicioso.
Jenny arregalou os olhos e cruzou as pernas, tentando mudar
a sua postura no assento, embora o cinto limitasse os seus
movimentos.
— N-não pode estar falando sério — gaguejou,
completamente envergonhada. — Eu... eu sou a sua secretária.
— Estou brincando — tentei tranquilizá-la, embora, não fosse
verdade.
Confesso que já fiz certas coisas pensando em Jenny. Ela foi
a única funcionária que me fez esquecer da regra estúpida que eu
impus a mim mesmo: Jamais devo me envolver intimamente com
alguma trabalhadora ou sócia da empresa. Por Jenny, eu quebraria
essa promessa sem pensar duas vezes. Parecia uma coisa boba,
mas eu estava fantasiando com aquela mulher desde que ela
chupou o meu dedo dias atrás. Uma grande parte de mim desejava
que ela fizesse isso com outra parte do meu corpo.
Depois do meu comentário, a mulher relaxou visivelmente.
Ela me direcionou um sorriso tímido e encarou a minha testa.
— Vou fazer um curativo em você. — Jenny retirou o cinto de
segurança ao perceber que o avião já havia se estabilizado no ar e
se levantou da poltrona. — Deve haver um kit de primeiros socorros
por aqui, não?
— Não precisa se preocupar — relutei.
— Você bateu com a cabeça porque eu te empurrei. Cuidar
do seu ferimento é o mínimo que posso fazer.
Depois de refletir por alguns segundos, acabei concordando
com a ideia.
— Tem uma maleta com remédios e curativos no banheiro. —
Apontei para a porta que ficava nos fundos do avião.
Ela assentiu e foi até o local.
Permiti-me observar o balanço do seu quadril enquanto ela
se afastava. Jenny tinha um corpo que arrancaria suspiros de
qualquer homem que colocasse os olhos em cima dela e por um
momento, desejei ser capaz de segurar aquele quadril arredondado
em minhas mãos. Talvez dar um tapa ou dois naquela bunda
empinada... porra. O pensamento fez o meu pau endurecer e eu
precisei puxar a mesa retrátil que havia no braço da poltrona para
que Jenny não percebesse nada de incomum quando retornasse.
Ela era tímida e eu sabia que a situação a deixaria desconfortável.
Não demorou muito até a minha secretária retornar trazendo
uma maleta branca em suas mãos. Ela a colocou sobre a mesa
retrátil, no braço da minha poltrona e tirou de lá um frasco de
antisséptico. Jenny me encarou enquanto umedecia o algodão no
remédio para limpar a ferida.
— O que faremos agora, Bruce? — questionou, com o olhar
perdido.
— Nada — respondi de imediato. — Em uma semana a mídia
irá esquecer que isso aconteceu.
— Mas as pessoas não... — Jenny suspirou e pressionou o
algodão no ferimento em minha testa. Estremeci com a ardência
que senti na região. — À essa altura, todos na empresa já devem ter
visto a matéria.
— As pessoas da empresa são ocupadas demais para
ficarem acompanhando manchetes de fofoca — debati. Exceto
Valery, que provavelmente já sabia do ocorrido. Isso explica a
ligação furiosa que ela me fez pela manhã. — Confie em mim,
Jenny. As pessoas irão esquecer.
A mulher assentiu e colocou o algodão sujo de sangue sobre
a mesa. Seus olhos estavam fixos na maleta de primeiros socorros
e era evidente que ela estava envergonhada. Observei em silêncio
quando Jenny abriu a caixa de curativos, pegou um e o fixou em
meu ferimento sem fazer contato visual comigo.
— Há algo te incomodando — comentei, sem pensar.
Jenny se afastou rapidamente e fechou a maleta, uma vez
que já havia terminado de cuidar do machucado em minha testa.
— Estou preocupada — confessou, com relutância. — Não
quero que o meu trabalho seja comprometido por esse momento de
deslize...
Franzi o cenho ao entender o que Jenny quis dizer. Ela
estava receosa que, de alguma maneira, o nosso beijo pudesse
acarretar em algum desentendimento no trabalho.
— A sua carreira jamais será afetada por causa disso — a
tranquilizei.
— Não vai me demitir? — indagou, receosa.
— Acha que eu te demitiria só por que você me beijou? —
Dei uma risada.
— Você dizendo dessa forma até faz parecer que foi uma
coisa normal eu ter beijado o meu chefe. — Ela encolheu os
ombros. — Kourtney fez menos que isso e você a demitiu...
— Com ela foi diferente — deixei escapar. Há tempos eu
estava atrás de um pretexto para demiti-la e o deboche quando
Jenny desmaiou foi a gota d’água.
Kourtney era a antiga comissária de bordo do meu pai e eu
soube desde a primeira vez que entrei nesse jato que os dois tinham
um caso. Quando o meu pai faleceu, Kourtney passou a me
direcionar uma atenção mais do que profissional — o que me deixou
extremamente desconfortável. Antes do dinheiro, eu conseguia
mulheres usando apenas o meu charme. Dizia o que elas queriam
ouvir na hora certa e quase sempre ganhava um número de telefone
e uma foda gostosa. Mas depois que herdei a fortuna era difícil
encontrar alguém que não se aproximasse de mim com interesse no
meu patrimônio. Ser rico tem lá as suas vantagens, mas em
contrapartida você nunca sabe em quem pode confiar
.
— Jenny, eu não vou te demitir — assegurei, depois passar
de um tempo em silêncio. — Não estou com raiva porque você me
beijou, na verdade, achei isso... interessante.
— Interessante? — Ela arqueou uma sobrancelha.
Eu apenas concordei. Ainda não tinha coragem de dizer o
que eu realmente pensava: que eu gostei de saber que Jenny me
beijou, que isso demonstrou que ela também sentia interesse por
mim e que, no fundo, eu desejava que o beijo acontecesse
novamente — é claro que desta vez eu queria estar sóbrio para
aproveitar o momento do jeito certo e me lembrar de cada detalhe.
— Você gostou do beijo, Jenny? — perguntei, antes que eu
pudesse me arrepender.
A mulher arregalou os olhos e suas bochechas coraram outra
vez. Não consegui conter o sorriso que curvou a minha boca com a
reação tímida de Jenny.
— Eu... eu gostei... — admitiu, em voz baixa.
Naquele instante, tive um flash de memória onde eu estava
com o rosto enterrado no pescoço de Jenny.
Minhas mãos seguravam a sua cintura com firmezaenquanto
eu me deleitava no aroma doce de baunilha que emanava da sua
pele.
— Deixa eu te beijar, Jenny. Eu quero fazer isso há tanto
tempo... — implorei, com a boca roçando em seu pescoço.
— E-eu não sei... — gaguejou, com a voz trêmula.
— Eu beijo bem... — Deslizei meu nariz em seu pescoço,
inspirando o seu cheiro gostoso que me deixava terrivelmente
excitado.
Subindo um pouco mais a boca, mordi o lóbulo da sua orelha
e Jenny se contorceu contra o meu corpo, soltando um pequeno
suspiro. Sorri comigo mesmo ao perceber que o meu plano de
sedução estava funcionando.
— Prometo que vou te deixar molhadinha... — provoquei com
malícia,na tentativa de fazê-la abandonar todas as suas reservas e
se entregar para mim.
Ergui meu rosto para fitar a expressão da mulher e me
surpreendi com ela me encarando de volta. Em seus olhos
esverdeados estava nítido o desejo que ela sentia por mim. Jenny
queria aquele beijo tanto quanto eu.
Criando coragem, me aproximei com um leve sorriso de
satisfação que cresceu no momento em que a mulher fechou os
olhos. Contemplei a sua expressão por alguns segundos e me
permiti tocar levemente a sua bochecha. A pele dela era tão macia
que me fez avançar para a sua boca no mesmo instante. Fui
envolvido pelo calor dos seus lábios acolhedores e o meu pau
pulsou em resposta quando nossas línguas se encontraram. Não
consegui conter o impulso de jogá-la contra a porta e prender o seu
corpo com o meu.
Aprofundei aquele beijo o máximo que pude e mesmo assim
nenhuma distância parecia capaz de conter a necessidade que eu
sentia de ter aquela mulher perto de mim. Jenny estava comigo,
envolvida no aperto dos meus braços e eu a queria ainda mais,
desejava que cada centímetro do meu corpo estivesse tocando o
dela.
Meu peito explodia com uma necessidade inexplicável que eu
jamais senti por ninguém em toda a minha vida e, por um momento,
me arrependi por não a ter beijado antes. De onde veio todo esse
sentimento? Eu não fazia ideia. Tudo que me importava agora era
ter Jenny em meus braços pelo resto da noite — e, talvez, da vida.
Porra, eu quero que essa mulher seja minha...
Voltei à realidade ao sentir um leve tapa em meu ombro.
Percebi que Jenny já havia guardado a maleta de primeiros socorros
e agora estava se preparando para sentar em sua poltrona. Tentei
parecer calmo, apesar dos sentimentos que aquela memória
despertou em mim. De onde veio esse desejo tão intenso?
— Então, vamos ignorar qualquer comentário da mídia sobre
o assunto e esperar até que esqueçam desse beijo? — Jenny quis
saber.
Suspirei, ao refletir sobre a situação. Minha mente estava
uma bagunça e eu só queria um tempo para esclarecer o que eu
sentia sobre isso tudo. No entanto, ter a mídia inteira espalhando
que o empresário solteiro mais cobiçado do país estava
supostamente namorando não ajudaria em nada o meu momento de
reflexão. Melhor não fazer nada por enquanto... Sei que daqui um
tempo essa situação vai passar.
— Isso, Jenny. Ficaremos em silêncio até que essa matéria
seja esquecida — confirmei. — Não se preocupe, quando
chegarmos na empresa tenho certeza que estará tudo bem.
Ela assentiu e depois de alguns segundos em silêncio, se
levantou da poltrona.
— Não está mais com medo de altura, Jenny?
Minha única intenção era puxar conversa para tentar
amenizar aquele clima estranho que surgiu entre nós depois do que
saiu na revista, mas comecei a me perguntar se não foi um erro
tocar no assunto da altura. Já entendi que Jenny tinha medo de voar
e, talvez, com tudo o que aconteceu ela apenas tivesse se
esquecido que estávamos a vários pés de altitude. Lembra-la do seu
medo não foi uma atitude muito inteligente da minha parte.
— Sinceramente, eu estou tão atordoada com aquela foto
que não consigo me preocupar com outra coisa no momento. — Ela
suspirou enquanto massageava as têmporas. — Vou tentar assistir
alguma coisa para me distrair, talvez tomar um calmante... só quero
ficar sozinha agora.
Jenny deu meia volta e se afastou, caminhando para os
fundos da aeronave.
Permaneci sentado na minha poltrona e decidi que
aproveitaria aquele tempo sozinho para refletir sobre o que
aconteceu. Eu precisava organizar a minha cabeça depois daquele
beijo e, principalmente, entender o que estava sentindo em meu
coração.
CAPÍTULO 15

Passava das 14h quando Bruce parou o carro em sua vaga


reservada no estacionamento da empresa. Ele disse que iria conferir
se tudo correu bem durante a nossa ausência e então eu poderia ir
para casa.
Meu rosto queimava com vergonha toda vez que eu me
recordava do que estava acontecendo. Bruce e eu saímos na
primeira página de uma revista de fofocas e eu não conseguia olhar
para ele sem sentir vontade de me esconder em algum lugar.
Para a minha sorte, o homem foi totalmente compreensivo
com a situação e não ficou com raiva quando descobriu que nos
beijamos na noite anterior — algo que me pegou totalmente de
surpresa. Na verdade, Bruce parecia satisfeito enquanto
conversávamos sobre o assunto e não parecia arrependido do que
fez. Será que as coisas que ele me disse quando estava bêbado
eram verdade? Ele realmente sente vontade de me elogiar todos os
dias? Bruce tem algum tipo de interesse romântico em mim?
Fiquei perdida em pensamentos enquanto acompanhava o
meu chefe para o interior da empresa. No instante em que
passamos pela recepção do primeiro andar, praticamente todas as
pessoas que estavam ali fixaram a sua atenção em Bruce e em
mim. Não foi difícil imaginar o motivo dos olhares e eu comecei a me
sentir terrivelmente envergonhada.
Os anos que passei dedicando a minha vida ao trabalho e a
criação da minha filha me transformaram em uma mulher tímidaque
não se sentia à vontade em ser o centro das atenções. Ter a minha
foto na capa de uma revista quase causou uma pane no meu
cérebro. Tudo que eu mais queria naquele momento era me
esconder embaixo da minha cama e não sair de lá nunca mais.
Seja forte, Jenny. Bruce não está irritado com o beijo e isso é
tudo que importa no momento. Tentei manter o foco, enquanto
atravessava o saguão da empresa em direção ao elevador, mas as
minhas pernas travaram quando vi duas mulheres cochichando
enquanto me encaravam com um olhar mal-humorado.
— Continue andando, Jenny — Bruce sussurrou no meu
ouvido, e eu estremeci com a surpresa. Sua mão pousou em minhas
costas e me encorajou a seguir em frente.
Respirando fundo, me esforcei para chegar até o elevador
enquanto o homem caminhava ao meu lado, sem tirar sua mão de
mim. Agradeci mentalmente por esse pequeno apoio, mas só
respirei aliviada quando entramos no elevador e as portas se
fecharam, nos deixando sozinhos naquela caixa de metal.
— Ignore essas pessoas — Bruce disse, ao apertar o botão
que levava até a cobertura. — Só estão com inveja de você.
— Inveja de mim? — Um sorriso irônico e desesperado
curvou a minha boca.
Meu chefe assentiu, com uma expressão divertida no rosto.
— Duvido muito... — deixei escapar.
Inveja era a última coisa que devia estar passando pela
cabeça daquelas pessoas. Provavelmente, estavam pensando que
eu era uma oportunista e estava com Bruce para conseguir dinheiro
fácil.
— Estão com inveja porque você me beijou. — Cruzou os
braços diante do peito. — Sei que metade das mulheres dessa
empresa faria de tudo para estar no seu lugar...
— Não acho que você seja tão interessante assim. — O
encarei de cima a baixo, tentando reprimir um riso de diversão. Às
vezes, eu só queria ter metade da autoestima desse homem.
— É mesmo, Jenny? — Ele se recostou na parede do
elevador em que estava o espelho e arqueou uma sobrancelha. —
Se não me acha interessante, por que deixou que eu te beijasse
ontem?
Meu rosto começou a queimar com a pergunta, mas eu decidi
que não deixaria Bruce me intimidar. Se ele quer me provocar, então
eu vou pagar com a mesma moeda.
— Porque você pediu — respondi, fazendo o máximo para
soar confiante.
— Poderia ter dito não... — rebateu.
— Se eu soubesse o que aconteceria no dia seguinte, com
certeza, eu teria negado.
Cruzei os braços e encarei o painel que indicava em qual
andar estávamos. Ainda no 39°. Sempre me perguntei o porquê da
Lancasther Enterprises ter 50 andares. Uma investidora que financia
projetos de outras empresas podia trabalhar facilmente com 2 ou 3
andares. Ao menos, é o que eu acho.
Nunca desejei chegar tão rápido à cobertura para não
precisar ficar sozinha nessa caixa de metal com Bruce. Por alguma
razão absurda, essa conversa sobre beijo fez com que o meu
cérebro só conseguisse pensar nas cenas dos romances clichês
onde o casal começava a se beijar dentro de um elevador. Isso
nunca vai acontecer, Jenny. É melhor voltar à realidade!
— Você se arrepende do beijo? — Bruce me pegou de
surpresa com aquela pergunta.
Antes que eu pudesse me conter, minha cabeça balançou
negativamente em resposta.
Bruce reprimiu uma risada e quando ergui o rosto em sua
direção, nossos olhares se encontraram.
— Eu sabia que você tinha gostado — se gabou. — Eu beijo
bem.
Fiquei aflita pelo rumo que a conversa estava tomando. Para
a minha salvação, o elevador parou na cobertura e as portas se
abriram. Aproveitei a oportunidade para sair dali em passos
apressados e não dei continuidade ao assunto.
Quando cheguei no corredor praguejei ao ver Valery — que
eu descobri ser a irmã de Bruce — andando de um lado para o outro
em frente à minha mesa de trabalho. Por um momento, pensei em
voltar para o elevador e me trancar ali com o meu chefe. Acho que
prefiro continuar a conversa sobre o beijo da noite passada do que
enfrentara vadia de olhos azuis. Que merda, não acredito que ela é
tia da Lorie!
Infelizmente, não demorou muito até a mulher perceber a
nossa presença. Ela me encarou com um olhar zangado, mas a sua
atenção se fixou em Bruce, que vinha logo atrás de mim.
— Inacreditável... — ela resmungou, e veio de encontro ao
irmão, passando por mim como se eu fosse um mero inseto. —
Você está comendo a sua secretária e agora o país inteiro sabe
disso!
— Eu não estou comendo ninguém — Bruce rosnou para a
irmã, que cruzou os braços de maneira defensiva.
Fiquei sem ação naquele momento e apenas observei
enquanto os dois discutiam. Valery acha que Bruce e eu estamos
juntos? Quem me dera...
— Não? A Gossip Million diz o contrário... Vocês saíram na
capa! — a mulher se exaltou. — Nem eu estive na capa dessa
revista e a sua secretariazinha conseguiu isso do dia para a noite.
Suspirei, irritada, mas não tive coragem de me intrometer no
assunto.
— Está mais preocupada com a aparição da Jenny na mídia
do que com a matéria, não está? — Bruce questionou, ironicamente.
— Eu estou preocupada com a empresa! Você vai se
envolver com essa mulher e ela vai sugar todo o seu dinheiro...
— O que você disse? — as palavras me escaparam. Fiquei
tão inconformada com a acusação que não consegui me conter.
— Foi o que você ouviu. — A vadia de olhos azuis me
encarou de cima a baixo com um olhar de desprezo.
Bruce suspirou, entediado, e afagou o meu ombro na
tentativa de me confortar.
— Vá para casa, Jenny. Deixe que eu resolvo essa situação
— pediu, com a voz calma. — Eu ligo se precisar de alguma coisa.
Depois de alguns segundos em silêncio, eu apenas assenti e
caminhei para longe dos dois, voltando para o elevador.
O comentário de Valery não me surpreendeu nem um pouco,
era exatamente isso que eu esperava que as pessoas pensassem
depois que vi a matéria. Agora, eu seria conhecida como uma
oportunista que estava transando com um bilionário para usufruir do
luxo que eu jamais poderia pagar com um salário normal. Mais uma
vez, a vida está me mostrando que o mundo é um lugar injusto e
cruel.
Fiz o possível para manter a cabeça erguida enquanto eu
caminhava pela empresa. Praticamente todos os funcionários me
encaravam — alguns com olhares curiosos e outros não faziam o
menor esforço para disfarçar a expressão de raiva.
Acabei deixando uma lágrima escapar quando saí do prédio.
Retirei meus óculos e enxuguei o os olhos discretamente, para
evitar que mais lágrimas caíssem. O tempo em Manhattan estava
nublado e um vento frio soprava pela calçada. Guardei os óculos na
minha bolsa e segurei com força a frente do meu blazer para conter
um pouco do frio. Quando me virei para caminhar em direção ao
ponto de ônibus, levei um susto ao dar de cara com um grupo de
cinco repórteres. Eles me encararam por alguns segundos e então
um alvoroço começou:
— É ela! — um homem de sobretudo cinza gritou.
O grupo me cercou imediatamente, impedindo que eu
seguisse o meu caminho pela calçada. Duas jornalistas apontaram
um microfone na minha direção, enquanto um homem de meia
idade mirou uma câmera para mim. Pisquei, tentando entender o
motivo de tudo aquilo.
— Senhorita, qual é o seu nome? — perguntou, uma repórter
de cabelo avermelhado.
— É verdade que está namorando Bruce Lancasther, o
empresário mais cobiçado do país? — outro repórter se intrometeu.
— O quê?! — gritei, assustada. — Não... eu...
— Vocês foram flagrados em um momento íntimo no Hotel
Royalty ontem à noite.
— Momento íntimo? — Arregalei os olhos com a
desinformação do sujeito. — Foi apenas um beijo!
— Então você confirma o ocorrido? — indagou, o homem de
sobretudo.
Não demorou muito até que os repórteres alvoroçados me
fizessem uma série de perguntas descoordenadas que eu sequer fui
capaz de entender. Obrigando minhas pernas a funcionarem, dei
meia volta e corri para longe do grupo o mais rápido que eu pude.
— Senhorita! — uma das repórteres gritou. — Aonde está
indo?
— Me deixem em paz! — gritei de volta, sem me dar ao
trabalho de olhar a minha retaguarda.
Sempre odiei o fato das calçadas de Manhattan viverem
cheias de pedestres ou turistas curiosos, mas naquele momento, a
abundância de pessoas foi a minha salvação. Sem pensar duas
vezes me embrenhei no meio da multidão esperando que ela me
ajudasse a despistar os repórteres. Por sorte, eu havia calçado
sapatilhas pela manhã — odiaria ter que correr por Nova York com o
scarpin que eu normalmente usava no trabalho.
Corri por alguns quarteirões, até que avistei um ônibus
parado no ponto esperando os passageiros desembarcarem. Gritei
o mais alto que pude para que o motorista me esperasse e usei o
resto do meu fôlego para ir até o veículo.
— Obrigada — agradeci ao motorista enquanto subia no
ônibus. Minha voz estava completamente ofegante depois de correr
três quarteirões para despistar aqueles abutres da mídia. Por sorte,
acho que ninguém me seguiu até aqui.
Entreguei o dinheiro da passagem e caminhei para me sentar
em um dos assentos disponíveis. Assim que me acomodei, abri a
minha bolsa e coloquei os óculos novamente, com receio de ser
reconhecida por algum leitor daquela revista de fofoca.
Suspirei e encostei a cabeça no vidro da janela. Eu estava
uma pilha de nervos. Não consegui dormir pois fiquei a madrugada
inteira pensando no beijo de Bruce e me arrependendo
amargamente de não ter aceitado o convite para ir até o seu quarto,
terminar a noite em seus lençóis. Se eu soubesse que teria essa dor
de cabeça no dia seguinte... céus!
Era difícil de processar os últimos acontecimentos. A minha
foto estava na primeira página de uma revista que eu nunca ouvi
falar, fui perseguida por repórteres e todos na empresa estavam
pensando que eu era uma vadia oportunista. Bruce era o único que
não estava me julgando e até parecia se divertir com a situação do
beijo, mas isso não mudava o fato de que eu estava na mira dos
repórteres. Só espero que Lorie não seja afetada por isso.
CAPÍTULO 16

Quando desci do ônibus, andei algumas quadras até chegar


na rua onde eu morava. Era um lugar tranquilo e a maioria dos
moradores eram aposentados ou casais de meia idade cujos filhos
já saíram de casa — Lorie era uma das poucas crianças que
morava no quarteirão.
Perdi-me em pensamentos enquanto subia a escada que
levava até o edifíciode 5 andares onde eu morava. Estava prestes a
abrir a porta quando uma mão tocou o meu ombro, me assustando.
Virei abruptamente e arquejei ao dar de cara com a repórter de
cabelo avermelhado que me cercou em Manhattan. Caralho, como
ela me seguiu até aqui? Esse povo não desiste?
— O que você quer? — perguntei, deixando evidente o mau
humor em minha voz.
— Poderia responder algumas perguntas para a nossa
revista? Prometo que será rápido. — A mulher puxou um celular do
bolso e apontou o microfone do aparelho na minha direção. — O
que a pretendente de Bruce Lancasther faz em um bairro da
periferia?
Franzi o cenho com aquela pergunta e girei a maçaneta,
entrando rapidamente no prédio. Quando eu estava prestes a fechar
a porta, a repórter a segurou pelo lado de fora.
— Você mora aqui? — indagou, com certa incredulidade.
— Me deixe em paz ou eu juro que chamo a polícia! —
ameacei.
A mulher se afastou rapidamente e eu bati a porta na cara
dela. Esse é de longe o dia mais estressante da minha vida!
Depois de me recuperar, subi as escadas do prédio
residencial em direção ao terceiro andar, onde ficava o meu
apartamento. Quando abri a porta, Brittany veio até mim e eu a
cumprimentei rapidamente com um abraço. Sem dizer nenhuma
palavra, larguei a minha bolsa em um canto qualquer do
apartamento e deixei o meu corpo cansado cair no sofá.
— O que houve com você? Pensei que chegaria mais cedo
— Brittany me questionou, confusa. — Um cara veio aqui na hora do
almoço e entregou a sua mala. Inclusive, eu reparei que o vestido
caro estava guardado lá dentro.
— Bruce me deu de presente — resmunguei, em um tom
cansado. — Lorie está na escola?
— Está. — Brittany me lançou um olhar acusatório e se
sentou ao meu lado no sofá, colocando uma almofada no colo. —
Mas e você? Vai me contar o que aconteceu ontem à noite?
Suspirei. Eu estava exausta, então decidi que não faria
rodeios.
— Bruce insistiu que eu fosse no jantar de encerramento da
conferência. Eu disse que não tinha roupa para o evento e meia
hora depois me trouxeram aquele vestido. Eu fiquei empolgada com
o presente e aceitei sem pensar duas vezes.
— Então ele decidiu bancar o homem bonzinho com você? —
Minha amigar arqueou as sobrancelhas de um jeito irônico.
— Sabe que ele tem sido bom comigo nos últimos dias. —
Encostei a cabeça no sofá.
— Talvez, bom até demais... — sussurrou, distraída. — E por
que tenho a impressão de que isso não foi tudo o que aconteceu?
Encolhi os ombros, enquanto reunia coragem para contar o
que viria a seguir. Brittany tinha uma ótima intuição e quase sempre
percebia o que eu estava sentindo sem que eu precisasse dizer
muita coisa.
— Quando o jantar acabou, Bruce estava completamente
bêbado...
— Eu percebi isso na chamada de vídeo — ela me cortou,
com um tom desconfiado na voz. — Jenny, aconteceu alguma coisa
entre vocês?
Brittany era boa em adivinhar as coisas, eu não tinha para
onde fugir.
— Bruce e eu nos beijamos.
— Beijo de língua?! — perguntou, incrédula.
Assenti, um pouco relutante.
Brittany gritou como se fosse uma adolescente escandalosa
em uma festa do pijama.
— Não acredito! Você beijou o Bruce! — Ela se empolgou e
me jogou a almofada que segurava. — E o que aconteceu depois?
Vocês transaram? Me conta tudo, Jenny! — Brittany sacudiu os
meus ombros, sedenta por qualquer informação adicional.
Reprimi uma risada. De alguma forma, a reação da minha
amiga fez com que eu me sentisse melhor depois de tudo que
aconteceu mais cedo.
— Bruce perguntou se eu queria conhecer a cama dele, mas
eu acabei recusando — confessei, com um leve arrependimento.
— Mas espera... o Bruce só fez isso por que estava bêbado,
não foi?
— Sim, ele não se lembrou de nada no dia seguinte — fiz
uma pausa e engoli em seco — até ver uma foto nossa na capa de
uma revista de fofoca.
Brittany franziu o cenho.
— Como assim revista de fofoca? — Ela estava confusa.
Respirei fundo e abracei a almofada que Brittany me jogou
minutos atrás.
— Provavelmente, algum jornalista que estava cobrindo a
conferência tirou uma foto quando Bruce e eu estávamos nos
beijando — deduzi. — Quase desmaiei quando vi a matéria hoje de
manhã, Brittany. Estão achando que sou a namorada dele e
enquanto eu voltava para casa fui perseguida por um bando de
repórteres. Um deles me seguiu até aqui, mas ameacei chamar a
polícia e a mulher foi embora.
Brittany me encarava de volta com uma expressão assustada
no rosto. Ela ficou em silêncio pelo que me pareceram minutos,
então gritou novamente e se levantou do sofá. Observei enquanto a
minha amiga andava de um lado para o outro na pequena sala do
apartamento e murmurava coisas para si. Pelo visto, terei trabalho
em acalmá-la.
Depois de muita conversa e algumas xícaras de chá,
finalmente consegui fazer com que Brittany voltasse ao seu estado
natural. No entanto, ela passou o fim de semana inteiro com receio
que repórteres pudessem invadir o nosso apartamento. Eu sabia
que eles não poderiam fazer isso, mas também não deixei de me
preocupar.
Bruce não deu notíciasdesde que saída empresa na sexta à
tarde e após os últimos acontecimentos, não tive coragem de ligar
para ele. Eu ainda sentia vergonha por causa do beijo, afinal, o
homem era o meu chefe, ele assinava a minha folha de pagamento
no fim do mês. Eu não sabia como devia me comportar perto dele
durante essa nova semana de trabalho. Talvez, agir como se nada
tivesse acontecido seja a melhor forma de enfrentar essa situação.
Na segunda de manhã, tomei café rapidamente e saíde casa
acompanhada de Lorie. A levei até o ponto onde passava o ônibus
escolar e fiquei ao seu lado até a chegada do veículo.Normalmente,
era Brittany quem fazia esse trabalho, eu sempre me esforçava para
chegar cedo na empresa, mas hoje eu faria o possível para adiar a
minha chegada naquele lugar. Pensar em todas aquelas pessoas
me encarando com olhares acusadores só me deixava ainda mais
aflita. Eu não tinha nenhum amigo lá dentro para defender a minha
imagem, então eu estava sozinha nessa luta.
Quando o ônibus escolar chegou, dei um beijo carinhoso na
minha filha e a ajudei a subir no veículo. Esse era o primeiro ano
dela na escola e eu sabia que daqui para frente as coisas seriam
cada vez mais complicadas. O tempo estava passando depressa,
Lorie estava crescendo rápido e isso me afligia. Às vezes, eu
tentava não pensar que daqui a pouco ela seria adolescente e
começariam os bailes de escola, a fase rebelde, os problemas com
garotos... eu não queria vê-la sofrer.
Durante o caminho para o trabalho, não pude evitar em
pensar como eu estaria daqui há dez anos. Será que Brittany e eu
ainda dividiríamos o apartamento? Eu ainda seria a secretária de
Bruce? Ainda carregaria o fardo de manter em segredo que ele é o
pai da Lorie? Suspirei quando desci do ônibus. Eu estava há uma
quadra da empresa, com um milhão de perguntas na mente e
nenhuma resposta.
Caminhei aflita em direção ao prédio espelhado de 50
andares, sentindo o vento frio da manhã bater em meu rosto. O ar
estava carregado com o cheiro de combustível dos carros que
passavam na rua e cada passo que eu dava ficava mais difícil de
respirar — não por causa da poluição, mas sim devido à ansiedade
que eu sentia para ver como as coisas se desenvolveram durante o
fim de semana.
Talvez já tenham esquecido o que aconteceu. Tentei pensar
de maneira positiva, enquanto passava em frente à uma banca de
jornais. Olhei de relance para a área onde estavam as revistas e o
meu peito inteiro se apertou. Havia outra foto de Bruce e eu na capa
de uma revista chamada “Gossip Million” e desta vez, estávamos
sentados na mesa de jantar. Droga, a mídiaestava de olho na gente
desde que entramos no salão!
Em um ato involuntário, chamei o jornaleiro e pedi um
exemplar daquela maldita revista. Por mais que eu estivesse tensa,
queria saber o tipo de coisa que estavam dizendo sobre mim.
Enquanto eu caminhava pela calçada, abri a página da
matéria e comecei a ler. Embaixo da nossa foto no jantar havia um
título chamativo dizendo: “Suposta namorada de Bruce Lancasther
mora em um bairro pobre na periferia de Nova York.”
— Porra! — xinguei em voz alta, sem me importar com os
pedestres ao meu redor. Os desgraçados pegaram uma única
informação sobre mim e fizeram uma matéria completa!
Não tive coragem de ler o resto. Coloquei a revista embaixo
do braço e caminhei em passos largos até a empresa. Agora que
descobriam onde eu morava seria apenas uma questão de tempo
até começarem a monitorar toda a minha rotina. Nem quero pensar
no que acontecerá se descobrirem que eu tenho uma filha. Eu
precisava resolver essa situação e tirar a mídia da minha cola. Vou
falar com Bruce... Os boatos sobre o nosso beijo precisam acabar
.
Entrei na empresa fazendo o possívelpara ignorar os olhares
que os funcionários me direcionavam. Fui até o elevador e apertei
com força o botão do último andar, levou alguns minutos até que eu
chegasse na cobertura.
Ao ver que o lugar estava vazio, corri até a porta da sala de
Bruce e bati, desejando que ele estivesse ali.
— Quem é? — perguntou, em um tom entediado.
— Sou eu... — respondi, totalmente apreensiva. — Posso
entrar?
Em poucos segundos, a porta se abriu e eu dei de cara com
Bruce vestindo o seu habitual terno preto e gravata azul-marinho. O
cheiro do seu perfume caro invadiu as minhas narinas no instante
em que inspirei o ar e eu me concentrei para manter o foco.
Peguei a revista que eu trazia embaixo do braço e a
entreguei para ele. O homem franziu o cenho ao ver o que estava
na capa.
— Entre, Jenny. — Ele abriu espaço para que eu pudesse
passar e fechou a porta logo em seguida.
Bruce sentou no sofá de couro que ficava em um canto da
sala e eu me acomodei ao lado dele, minhas mãos tremiam pelo
nervosismo do momento.
— Como descobriram onde você mora? — perguntou de
imediato.
Suspirei e contei a ele toda a história sobre os repórteres que
me perseguiram quando saí da empresa na sexta-feira passada,
não deixando de mencionar a mulher que me seguiu até a porta de
casa. O homem ficou em silêncio após ouvir o meu relato, ele
parecia tenso e perdido em pensamentos.
— O que faremos, Bruce? — o pressionei para que dissesse
alguma coisa. — Não quero ser perseguida pela mídia,você precisa
negar que estamos juntos...
— Não vão acreditar — ele descartou a minha ideia
rapidamente. — Dizer que não estamos juntos enquanto dezenas de
fotos provam o contrário deixaria a mídiacada vez mais sedenta por
respostas.
— Então o que vamos fazer? — perguntei, aflita. Meu cérebro
cansado não conseguia pensar em nada.
O homem ao meu lado analisou a matéria da revista por um
tempo e então se recostou no sofá.
— Tive uma ideia, mas não sei se você vai gostar. — Ele
jogou a revista na mesa de centro que havia em frente ao sofá.
— Faço qualquer coisa para dar um fim nessa perseguição —
admiti. — Não quero essa gente se metendo na minha vida.
Bruce me encarou e um leve sorriso curvou a sua boca.
— Vamos assumir o relacionamento, Jenny.
— O quê?! — interrompi, sentindo o pânico crescer dentro de
mim. — Mas nós não temos um relacionamento!
— Eu sei. Seria apenas fachada. — Ele suspirou. — Não
estaremos juntos de verdade, apenas na frente das câmeras.
Cruzei os braços diante do peito e lancei um olhar incrédulo
para o homem. Assumir um relacionamento — mesmo que fosse de
mentira — deixaria a mídia ainda mais alvoroçada.
— Não consigo entender como isso nos ajudará a sair do
radar dos repórteres — resmunguei.
— Jenny, os abutres da mídia querem fofoca para espalhar.
Se assumirmos que estamos juntos, eles não terão mais nenhuma
especulação sobre a gente que possa atrair o interesse do público
— concluiu, em um tom confiante. — É claro que o primeiro dia após
a declaração será estressante, mas depois a notícia ficará
ultrapassada e perderão o interesse. Eu sei como essa gente de
revista trabalha, garanto que em uma semana estaremos livres.
Suspirei, enquanto tentava processar aquela ideia. Assumir
um namoro falso com o Bruce? Quando pensei em falar com ele
para resolver essa situação eu jamais pensei que o homem poderia
vir com essa ideia absurda.
— Não há outra solução? — perguntei, esperançosa. — Um
namoro de mentira seria horrível.
Eu estava solteira há muito tempo. Desde que Gustav
aprontou comigo seis anos atrás eu não tive confiança para entrar
em um relacionamento sério novamente. Os poucos homens que
não fugiam quando descobriam que eu tinha uma filha acabavam se
afastando por eu ser muito fechada e não me abrir completamente
na questão sentimental. A verdade era que eu tinha medo de
entregar o meu coração e tê-lo quebrado outra vez.
Um namoro de mentira não me traria ilusões desnecessárias,
afinal, eu entraria na relação sabendo que ela não teria futuro, mas
não sei se eu estava disposta a ter esse tipo de coisa com o Bruce.
Quando eu pensava sobre ele eu o queria por inteiro, desejava que
ele estivesse presente em todos os momentos da minha vida e não
apenas por alguns dias. Queria que ficássemos juntos de verdade e
não por um acordo falso. Confessoque eu fiqueidecepcionada com
a situação.
— Deixar essa história sem explicação vai manter a mídia no
nosso pé, Jenny. Eles não vão desistir até descobrirem o que
aconteceu.
Fiquei em silêncio e desviei meu olhar para longe, enquanto
pensava sobre o assunto. Fingir um namoro com Bruce seria
loucura, mas depois de ouvir os seus argumentos, comecei a pensar
que aquela era a única forma de escapar do problema em que me
meti naquela noite. Bruce parece acostumado a lidar com essa
gente da mídia, ele deve saber o que está fazendo.
— Bom, se não existe outra saída... — concordei, ainda
relutante.
— Não há — ele me garantiu.
Virei meu olhar em sua direção e o surpreendi com um
sorriso no rosto que desapareceu logo em seguida.
— Está bem. — Encolhi os ombros e suspirei. — Eu
concordo com essa ideia absurda. Vamos fingir que estamos em um
relacionamento e quando a poeira baixar...
— Terminamos tudo — completou, olhando nos meus olhos.
Suas palavras me causaram um aperto no peito e eu soube
naquele momento que entrei em uma área extremamente perigosa
para o meu coração. Em situações de trabalho normal, Bruce já me
deixa afetada com um simples olhar. Mesmo sabendo que será um
namoro fictício, acho que será impossível não sair magoada.
Ouvi o inconfundível som da porta se abrindo e avistei Valery
entrando na sala. Ela não escondeu a expressão de desgosto
quando notou a minha presença e eu lhe devolvi o mesmo olhar
azedo.
— Eu não sabia que estava acompanhado, Bruce. — Ela
parou à nossa frente e cruzou os braços enquanto me encarava. —
Aproveitando que você está aqui... a sua conta com a lavanderia já
foi quitada?
— A Jenny não vai pagar nada — Bruce interveio, com uma
voz autoritária. — Deixe-a em paz e não toque nesse assunto outra
vez.
Valery franziu o cenho com a resposta do irmão e antes que
ela pudesse dizer qualquer coisa, Bruce segurou a minha mão e se
levantou do sofá. Não tive outra escolha a não ser ficar de pé ao
lado dele.
— Se me der licença, minha namorada e eu temos coisas
para resolver. — Bruce me puxou para longe da mulher.
Fiquei boquiaberta com o que ouvi e não fui capaz de dizer
nada enquanto o homem me guiava para fora da sua sala e deixava
Valery para trás.
Em um piscar de olhos, estávamos no primeiro andar da
empresa. Bruce caminhou até a saída e chamou um grupo de
repórteres que estavam de prontidão na calçada. Não eram os
mesmos que me perseguiram, mas pareciam tão obstinados e
sedentos por informação quanto os outros.
— Vocês, venham aqui! — ele gritou. — Eu tenho uma
declaração para fazer.
— Bruce, o que está fazendo? — perguntei, receosa.
Os repórteres se alvoroçaram e correram em nossa direção,
um deles começou a tirar fotos com uma câmera. Tentei me afastar,
mas Bruce segurou a minha mão com força e me manteve no lugar.
— Dance conforme a música, Jenny — ele sussurrou em
meu ouvido e, em seguida, sorriu para o homem com a câmera.
— O que gostaria de dizer, Sr. Lancasther? — indagou um
repórter de óculos que segurava um bloco de anotações.
Bruce limpou a garganta e me encarou por alguns segundos
antes de olhar para a câmera que estava apontada em nossa
direção.
— Essa mulher linda que está ao meu lado é Jenny Spencer.
— Ele soltou a minha mão e passou o braço ao redor da minha
cintura, para evitar que eu saísse do seu lado. — O que estão
dizendo é verdade. Nós estamos namorando.
Meu coração quase saiu pela boca e eu olhei para o meu
chefe, incapaz de esconder a surpresa que eu sentia naquele
momento. Quando ele disse que assumiríamos um namoro, jamais
pensei que seria desse jeito!
Enquanto eu estava em choque, Bruce me encarou de volta e
sorriu. O aperto do seu braço ao redor da minha cintura ficou mais
forte e antes que eu tivesse tempo de reagir, ele me beijou. Fechei
os olhos por reflexo e o meu corpo inteiro ficou dormente quando
senti a sua língua roçando nos meus lábios.
Um falatório ao nosso redor começou e eu ouvi cliques de
câmeras tirando fotos sem cessar. Bruce tentou aprofundar o beijo
uma e outra vez, pressionando a língua na abertura da minha boca.
Até tentei separar os lábios para recebê-lo, mas o meu cérebro não
executou o comando, o pânico que eu sentia por aparecer em frente
às câmeras daquele jeito era maior que qualquer outro sentimento.
Ao perceber que eu não iria ceder, Bruce deu uma leve
mordida no meu lábio inferior e afastou seu rosto do meu. Fiquei
completamente atordoada depois daquilo.
Apesar do alvoroço que eu via com os olhos, tudo que eu
conseguia ouvir eram os batimentos do meu coração acelerado. Eu
sentia uma carga elétrica correndo por todo o meu corpo como se
tivesse sido atingida por um raio, minhas mãos tremiam, a sensação
dos lábios quentes e macios de Bruce ainda permaneciam nos
meus e a única coisa que me sustentava em pé era o seu braço que
ainda estava ao redor da minha cintura. Minhas pernas estavam tão
firmes quanto gelatina. Se Bruce me soltasse, eu iria desfalecer bem
ali no meio-fio.
CAPÍTULO 17

Depois do alvoroço com a imprensa, Bruce me levou para a


sua sala e me sentou no sofá de couro ao perceber que eu ainda
estava em choque. Sem conseguir expressar nenhuma reação,
fiquei encarando a mesa de centro que estava diante de mim
enquanto esperava o meu corpo se acalmar.
Eu estava atordoada, não só pelo beijo, mas também pelo
alvoroço de inúmeras pessoas desconhecidas tirando fotos e
gritando uma enxurrada de perguntas para mim. Bruce podia estar
acostumado com a mídia em cima dele 24 horas por dia, mas eu
não. A última coisa que eu queria nesse momento era um bando de
repórteres me seguindo o tempo inteiro e, apesar do que o meu
chefe garantiu, acho que assumir esse relacionamento não faria a
mídia se esquecer de nós dois. A reação dos repórteres me fez
sentir como se Bruce tivesse tentado apagar fogo com gasolina.
— Faz uma hora que você está tremendo, Jenny — Bruce
chamou a minha atenção, ao me entregar um copo d’água.
Olhei na direção do homem e engoli em seco, sem saber
como reagir. Estendi minhas mãos trêmulas para pegar o copo e
precisei de muito esforço para segurá-lo com firmeza.
— Não imaginei que ficaria tão apavorada. — Ele se
acomodou ao me lado no sofá. — Desculpe.
Encolhi os ombros e bebi um gole d’água. Por causa da
minha tremedeira acabei derramando um pouco do líquido gelado
na minha blusa, o que me fez estremecer ainda mais.
— Está estressada e apavorada... e a culpa disso é minha. —
Bruce suspirou e retirou o copo das minhas mãos. — Você não está
em condições de trabalhar hoje, Jenny.
— A-ainda posso fazer o meu trabalho — gaguejei, enquanto
respirava fundo. Eu não quero ter um dia de serviço descontado.
— Não vou obrigá-la a trabalhar nesse estado. — Seu olhar
encontrou o meu e eu não consegui desviar a atenção para longe.
Encarar aqueles intensos e profundos olhos azuis sempre me
deixava sem fôlego. — Vá para casa e descanse, passe um tempo
com a Lorie... tente esquecer do que aconteceu nessa manhã.
— Acho que será impossívelesquecer — balbuciei, distraída.
Bruce deu uma risada abafada e afagou as minhas costas.
Seu toque provocou um arrepio por todo o meu corpo.
— Me desculpe, Jenny. Se eu soubesse que você ficaria
desse jeito eu não teria te beijado — confessou. — Só quis parecer
convincente, imaginei que um beijo deixaria os repórteres
satisfeitos.
— Do meu ponto de vista, acho que ficaram ainda mais
alvoroçados. Não sei se será o suficiente para que nos deixem em
paz.
— Bom, terá que servir. — Bruce levantou do sofá e tirou o
celular do bolso. — Vou chamar um táxi para você não correr o risco
de ser seguida até em casa outra vez.
— Não posso pagar um táxi daqui até o Bronx. — Encolhi os
ombros.
— Em algum momento eu disse que você iria pagar? — Ele
arqueou uma sobrancelha e desviou sua atenção para a tela do
telefone.
— Bruce, eu não posso aceitar. Você já não deixou que eu
pagasse a conta da lavanderia e...
— Jenny, se continuar falando eu vou levar você para a
calçada da empresa e te dar outro beijo na frente dos repórteres —
ameaçou, enquanto digitava no celular.
Minha boca se fechou automaticamente e eu suspirei irritada,
admitindo a derrota. Eu não me sentia muito à vontade com Bruce
pagando as minhas despesas, não queria que ele achasse que eu
estava acomodada, mas o homem me deixou em uma saia justa.
Confesso que eu adoraria beijá-lo novamente, mas não na frente
dos repórteres.
— O taxi chegará em cinco minutos — anunciou, e colocou o
celular sobre a mesa de centro.
— Bruce, não precisa fazer isso. Como ficará a sua agenda
se você me dispensar? — tentei convencê-lo a mudar de ideia.
— Eu consigo me virar sozinho por um dia. — Ele cruzou os
braços diante do peito e me encarou com uma expressão
indecifrável. — Jenny, mais uma vez eu peço desculpas se te deixei
desconfortável com o beijo. Não foi a minha intenção.
— Não se preocupe, está tudo bem. — Encolhi os ombros,
um pouco envergonhada com o assunto.
Bruce assentiu e, para o meu alívio, não levou a conversa
sobre o beijo a diante.
— Vamos descendo, a carruagem amarela que te levará para
casa deve chegar em breve. — Ele gesticulou para que eu me
levantasse do sofá. — Vou levá-la até a portaria para garantir que
nenhum abutre da mídia te perturbe.
Concordei com a cabeça e me coloquei de pé. Apesar do
tempo que passou, eu ainda sentia as minhas pernas trêmulas.
— Obrigada, Bruce — deixei escapar.
Um sorriso sincero curvou os lábios do homem e ele
estendeu o braço para me oferecer apoio. Acabei aceitando sem
pensar duas vezes e deixei que ele me levasse até a saída da
empresa.
Graças ao táxi que Bruce chamou, consegui chegar em casa
sem ser incomodada por nenhum repórter. Meu estado de humor
teve uma melhora significativa desde que saí da empresa e quando
entrei no meu apartamento, minhas mãos já haviam parado de
tremer.
Encontrei Brittany debruçada sobre a mesa da cozinha
mexendo no notebook de segunda mão que comprou no ano
passado.
— Estou em casa — anunciei, enquanto deixava a minha
bolsa em cima do sofá.
Brittany levou um susto ao ouvir a minha voz.
— Jenny? — Ela virou o rosto na minha direção, obviamente
surpresa. — O que faz aqui uma hora dessas? Não me diga que foi
demitida...
— Não! — apressei-me em responder. — Aconteceram
algumas coisas que abalaram o meu humor e Bruce deixou que eu
viesse para casa mais cedo.
Minha amiga assentiu e voltou a encarar a tela do notebook.
— E por falar no Bruce, eu estava lendo algumas coisas
sobre ele antes de você chegar — comentou, com um sorriso. —
Sabia que ele foi eleito por uma revista como o empresário mais
bonito do país durante quatro anos consecutivos?
— Está brincando... — Aproximei-me da mesa.
Ela deu uma risada e logo explicou:
— Existe uma revista chamada Gossip Million. Ela conta
fofoca sobre o pessoal da alta sociedade e tem uma coluna que
mapeia todos os empresários bonitos e solteiros do país.— Brittany
virou o notebook na minha direção para que eu pudesse
acompanhar a pesquisa. — Bruce ganhou o prêmio de empresário
mais gostoso desde que assumiu a empresa do pai há quatro anos.
— É a mesma revista que está espalhando coisas sobre nós
dois — comentei, ao me recordar do nome que vi na capa da
manchete.
— Não estou surpresa, percebi que Bruce é o queridinho
dessa revista. — Ela revirou os olhos. — Todo exemplar tem uma
matéria sobre ele. Até se o cara pega uma gripe o assunto sai na
primeira página...
— Espero que você esteja sendo irônica — comentei, em um
tom brincalhão.
Brittany digitou algumas informações no navegador e logo
apareceu uma matéria do ano passado.
— Bruce Lancasther é mais uma vítima da epidemia de gripe
desse inverno — li em voz alta, incapaz de acreditar na matéria
irrelevante que saiu na primeira página.
— Estou dizendo... o cara tem a vida inteira monitorada por
essa revista, Jenny.
Minha amiga mudou de página no navegador e a próxima
matéria que apareceu fez o meu peito se apertar com ciúme. Bruce
estava saindo de um clube noturno, visivelmente bêbado e
segurando a mão de uma mulher que usava um biquini minúsculo e
brilhante. Suspirei, irritada, e fechei a tela do notebook.
— Acho que eu não devia ter deixado você ver essa matéria
— Brittany se sentiu culpada.
— Bruce tem uma vida agitada — resmunguei, não me
importando em disfarçar a raiva na minha voz. — Queria ter
descoberto sobre essa revista antes de beijá-lo na semana
passada...
— Aquela era uma matéria do ano passado, Jenny. — Minha
amiga tentou me acalmar, afagando o meu braço. — Nas poucas
vezes que vi Bruce pessoalmente ele me pareceu um homem sério
e responsável... as pessoas mudam.
— Acho que ninguém consegue mudar tanto assim em um
ano.
— Isso não é verdade. — Brittany me encarou com um olhar
acusador. — Quando te conheci naquele ônibus a caminho de Nova
York você era uma jovem impulsiva e imprudente que estava grávida
de um estranho que conheceu no bar. Nove meses depois você se
tornou a mulher mais responsável que já conheci na vida.
Encolhi os ombros ao me lembrar daquela época. Brittany
tinha razão, eu mudei muito em um curto período de tempo, mas os
acontecimentos me obrigaram a isso. Até onde sei, Bruce não tem
nenhuma responsabilidade além da empresa e embora ele me
passe a imagem de um homem sério, quem pode garantir que em
seus momentos de lazer ele não corre para algum clube de strip e
sai com as dançarinas?
Céus, Lorie pode ter uma penca de irmãos espalhados pelo
país! O pensamento me fez estremecer e eu tentei afastar aquela
paranoia da minha cabeça. Pensar nessas coisas me deixará ainda
mais nervosa e não foi por isso que voltei para casa. Preciso
descansar.
— Jenny, você não me contou o que te fez voltar para casa
cedo — Brittany chamou a minha atenção.
Suspirei, me sentindo mentalmente exausta. Depois de
pensar por um tempo, resumi os últimos acontecimentos para a
minha amiga, mencionando até mesmo quando Bruce me beijou na
calçada para o mundo inteiro ver.
— Ele é louco! — Brittany exclamou, ao terminar de ouvir o
meu relato. — Assumir um relacionamento será um escândalo ainda
maior, considerando a quantidade de leitores que essa revista tem.
— Toda essa situação já é um escândalo, Brittany. — Puxei
uma cadeira da mesa de quatro lugares e me sentei. — Acho que
não tem como piorar.
— Espero que saiba onde está se metendo — comentou, em
um tom acusador. — Vou fazer o almoço... e você pode ficar aí
olhando para o nada, torcendo que os repórteres encontrem outro
bilionário gostoso para perseguir. Porque só assim para essa revista
esquecer que Bruce Lancasther arranjou uma namorada!
CAPÍTULO 18

Depois do almoço, Brittany e eu passamos o resto da tarde


assistindo TV e comendo sorvete de morango. O episódio da novela
que acompanhávamos estava quase terminando quando o alarme
do celular da minha amiga tocou.
— Está na hora de buscar a Lorie na escola. O ônibus não
passa por aqui durante a tarde. — Brittany tentou se levantar do
sofá, mas eu a impedi.
— Eu vou. — Coloquei-me de pé. — Faz tempo que não faço
isso.
— Como quiser. — Ela concordou sem pensar duas vezes e
voltou a encarar a tela da TV. — Acho que a Lorie gostará de ver a
mãe na porta da escola para variar. E eu vou gostar de ficar aqui
assistindo a novela para descobrir se o Fernando Miguel realmente
traiu a Maria Roberta.
Dei um pequeno sorriso e fui até o meu quarto para pegar a
minha bolsa.
— Se eu fosse você, vestiria uma roupa bem discreta. Talvez,
um boné e óculos escuros — minha amiga gritou, ainda sentada no
sofá da sala. — Não pode arriscar que alguém te reconheça
enquanto está com a Lorie.
Suspirei, enquanto olhava para o meu reflexo cansado
espelho da penteadeira vintage que comprei na promoção de um
brechó. Brittany tem razão, não será nada bom se os repórteres
descobrirem que tenho uma filha ou se resolverem me seguir até em
casa novamente.
Vasculhei o meu armário atrás de alguma roupa discreta o
suficiente para vestir e escolhi uma legging cinza com um moletom
preto de zíper. Aproveitando o conselho da minha amiga, também
prendi o meu cabelo para trás, coloquei meus óculos escuros e um
boné de baseball dos Yankees.
Depois de pronta, dei uma olhada no espelho para conferir o
disfarce. Espero que não me reconheçam. Fui até o cabideiro atrás
da porta onde deixei a minha bolsa de trabalho pendurada. Tirei de
lá a minha carteira e a guardei no bolso do moletom junto com o
meu celular. Quando saí do quarto, Brittany deu risada ao ver a
minha aparência.
— Será que a Lorie vai te reconhecer? — perguntou, em um
tom divertido. — Você está parecendo uma atriz famosa que sai
disfarçada para despistar os paparazzis.
— Se Lorie souber quem eu sou, então essa combinação de
roupa ridícula não teve serventia alguma — admiti. — Até logo,
Brittany.
Minha amiga acenou em resposta.
Abri a porta e saí do apartamento. Quando cheguei na
calçada, arquejei ao ver o carro de Bruce estacionado do outro lado
da rua.
Me aproximei cautelosamente, tentando enxergar se era o
meu chefe que estava atrás do volante, mas os vidros das janelas
eram tão escuros que eu só podia ver o meu próprio reflexo.
Eu estava há alguns centímetros de distância do veículo
quando a porta se abriu, me fazendo dar um salto para trás. Não
fiquei surpresa ao ver Bruce sair de dentro do carro. Ele estava sem
a gravata e o paletó do seu terno estava pendurado no banco do
carona.
— Jenny é você? — Ele me lançou um olhar confuso.
— Bruce — respondi, com a voz aguda. — O que está
fazendo aqui?
— Precisamos fingir que estamos namorando — ele parecia
um pouco envergonhado enquanto falava. — Achei que seria bom
se aparecêssemos juntos algumas vezes.
— Não vou te beijar em público de novo — respondi,
involuntariamente.
Bruce encolheu os ombros um tanto culpado.
— Me desculpe, eu não vou fazer aquilo de novo — me olhou
nos olhos — a não ser que você peça.
Decidi ignorar aquele comentário e olhei ao meu redor,
esperando que nenhum vizinho me visse de conversa com o dono
do carro mais luxuoso que já esteve estacionado naquele
quarteirão.
— Por que está vestida assim? Vai assaltar alguma loja? —
zombou.
— Estou indo buscar a Lorie na escola. — Bufei com
irritação. — Não queria que algum repórter me reconhecesse.
Bruce deu risada e concordou com a cabeça. Ele se afastou,
indo até o outro lado do carro, e abriu a porta do carona.
— Entre. — Gesticulou para que eu me aproximasse. — Vou
buscar a Lorie com você. Apenas me diga onde fica a escola.
Relutei por alguns segundos, mas acabei entrando no carro.
Acho que estar em um veículo vai chamar menos atenção do que
andar seis quarteirões a pé com esse disfarce ridículo que Brittany
me convenceu a usar.
Uma vez que eu já estava acomodada no banco do carona,
Bruce foi até o seu lado e se sentou atrás do volante, colocando o
cinto de segurança logo em seguida. Programei o endereço da
escola no GPS, enquanto Bruce girava a chave e dava a partida no
veículo.
Depois que saímos da minha rua decidi retirar os óculos e o
boné, afinal, não havia porquê me disfarçar estando dentro de um
carro fechado.
— Aproveite a infância da Lorie enquanto há tempo — ele
tentou puxar assunto. — Daqui há uns anos, ela vai odiar até
mesmo que você a busque na escola.
Encolhi os ombros, me sentindo um pouco deprimida ao
pensar naquilo.
— Às vezes, acho que não tenho sido uma mãe muito
presente — deixei escapar. — Passo o dia no trabalho e quando
chego em casa mal tenho tempo de contar uma história para ela
dormir.
Bruce me lançou um olhar compreensivo.
— Se acha que ela ficará com raiva disso quando crescer,
está enganada — ele tentou me tranquilizar. — Quando tiver a idade
certa, Lorie irá entender o sacrifícioque você fez para criá-la. Se ela
resolver guardar mágoa de alguém, tenho certeza que será do pai
que nunca esteve presente.
Engoli em seco ao ouvir aquilo. Bruce não tinha ideia do que
estava dizendo.
— Ah... como estão as coisas na empresa? — tentei mudar o
foco da conversa. — Parece que você também saiu mais cedo hoje.
— Não consegui me concentrar no trabalho depois que você
foi embora — confessou, ao parar o carro no sinal vermelho. —
Então eu cancelei todas as minhas reuniões e decidi ir para casa.
As vantagens de ser o CEO... imagino se um simples
funcionárioconseguiria escapar das reuniões do dia apenas porque
não estava a fim de trabalhar.
— Mas você não está em casa agora — observei, com ironia.
— Fiz um desvio no meio do caminho — ele respondeu
quando o sinal abriu, e o carro voltou a andar. — Queria ver se você
estava bem depois do que aconteceu de manhã.
— Podia ter me ligado. Você tem o meu número salvo agora.
— Prefiro falar com você pessoalmente — admitiu, e
estacionou o carro logo em seguida. Só então me dei conta que já
havíamos chegado na escola.
— Obrigada pela carona. — Fiz menção para descer do
carro, mas ele segurou o meu pulso antes que eu abrisse a porta.
— Carona? — Ele ergueu uma sobrancelha. — Jenny
estamos passeando.
— Passeando? — Reprimi uma risada, me sentindo tensa. —
Eu disse que viria buscar a minha filha na escola.
— Eu sei. — Bruce soltou o meu pulso e saiu do carro.
Observei quando o homem atravessou até o outro lado do
veículo e abriu a porta do carona para que eu pudesse descer.
— Vamos buscar a baixinha e depois daremos um passeio —
ele explicou, enquanto eu saía para a calçada.
— Bruce, não quero que os repórteres vejam a minha filha —
o repreendi.
— Está vendo algum repórter por aqui? — Ele olhou ao
nosso redor e sem esperar a minha resposta, caminhou pela
calçada em direção à escola.
Suspirei tentando aliviar a tensão que eu sentia e segui Bruce
em passos apressados. Quando nos aproximamos do pátio externo
da escola, avistamos Lorie brincando em uma gangorra no
parquinho, na companhia de outras crianças.
— Por que está fazendo isso, Bruce? — questionei, enquanto
caminhávamos na direção da garotinha. — Só precisamos fingir
nosso namoro em frente às câmeras. Não tem motivos para você
me seguir até aqui.
— Quero garantir que você esteja bem — confessou, quando
paramos de andar. — A sua reação de manhã me assustou de
verdade.
— Já disse que eu estou bem. — Respirei fundo. — Não
quero que se sinta na obrigação de ficar andando atrás de mim
como se fôssemos um casal de verdade.
Bruce cruzou os braços diante do peito e virou o rosto na
minha direção.
— Eu não sinto isso — declarou, com um pouco de desdém.
— Então por que está aqui? — Arqueei minha sobrancelha
de maneira acusadora.
O homem hesitou em responder e desviou seu olhar para
longe, ficando perdido em pensamentos. Naquele instante, ouvi
Lorie gritar.
— Mamãe! — ela exclamou, enquanto saía da gangorra.
Sorri e ela correu na minha direção arrastando de maneira
desengonçada a sua mochila de rodinhas. Me abaixei para abraçá-
la e dei um beijo afetuoso em sua testa. Não demorou muito até que
ela notasse a presença de Bruce.
Minha filha me largou em um piscar de olhos e estendeu os
braços na direção do homem. Ele sorriu, um pouco envergonhado, e
a pegou no colo aproveitando a oportunidade para girá-la no ar
algumas vezes. Lorie gargalhou e o meu coração se aqueceu com a
cena. Quem sabe, ele pode ser um bom pai para ela no fim das
contas?
Fiquei tão distraída observando Bruce e Lorie que não
percebi quando as outras crianças do parquinho se aproximaram.
Fomos cercados por dois meninos e três meninas, todos
aparentavam ter a mesma idade que a minha filha e, obviamente,
também estavam ali esperando que os responsáveis fossem buscá-
los.
— Lorie, esse é o seu pai? — perguntou, um garotinho
asiático.
Ao ouvir aquilo, Bruce rapidamente colocou a menina no
chão e esticou a sua blusa que ficou amarrotada. Era nítido que o
homem não sabia como reagir diante daquela pergunta.
— Não, ele é o meu tio Bruce — Lorie respondeu, com um
sorriso no rosto. — Eu não tenho pai.
— Isso é mentira — proferiu, uma garotinha. — Todas as
crianças tem um pai.
Minha filha ficou em silêncio, sem saber o que dizer em
resposta. Olhei de soslaio para Bruce e percebi que ele também
estava me encarando. Decidi que era hora de sair dali antes que
aquela conversa ficasse ainda mais delicada.
— Lorie, se despeça dos seus amiguinhos. — Segurei a mão
da minha filha. — Estamos indo embora.
— Mas eu quero brincar no parquinho. — A menina olhou
para os brinquedos com um beicinho de choro.
— O tio Bruce vai nos levar para um passeio no carro dele —
tentei convencê-la a mudar de ideia.
Os olhos de Lorie brilharam ao ouvir aquilo e ela rapidamente
acenou na direção dos coleguinhas.
Bruce deu risada e caminhou na direção do carro que estava
estacionado há alguns metros de distância, Lorie soltou a minha
mão e correu até que alcançou o pai. Suspirei, ao perceber que
havia sido deixada para trás com uma mochila de rodinhas para
arrastar até onde os dois estavam.
Em poucos minutos, estávamos todos acomodados no
interior do veículo. Lorie sentou no banco de trás, e estava
brincando com o botão na porta que levantava o vidro da janela.
Quando Bruce deu a partida no carro, a garotinha focou a sua
atenção nas luzes que se acenderam no painel da frente. Eu sabia
muito bem o porquê dela estar tão empolgada: essa era a primeira
vez que Lorie andava em um carro que não fosse um táxi. Brittany e
eu não tínhamos muitos conhecidos para nos oferecer carona e na
maioria das vezes usávamos o transporte público para andar pela
cidade.
— Mamãe, por que eu não tenho um pai? — Lorie perguntou,
repentinamente.
Meu coração ficou acelerado e eu virei o rosto para encarar a
garotinha no banco de trás. Ela estava sentada no meio do assento,
presa ao cinto de segurança e balançando os pezinhos no ar, pois
suas pernas eram curtas demais para que eles tocassem no chão.
Tentei ignorar a presença de Bruce ao meu lado enquanto
pensava na resposta mais simples que eu poderia dar a ela.
— Lorie, eu já te contei a história de como você chegou na
minha vida — comecei, um pouco envergonhada por Bruce estar
ouvindo aquela conversa. — A mamãe estava triste e sozinha, então
a cegonha me trouxe você como companhia para que eu me
sentisse feliz.
— Mas isso não explica porque eu não tenho um pai... — a
garotinha refutou. Lorie podia ter apenas cinco anos, mas sabia ser
observadora quando o assunto era do seu interesse.
— A cegonha só traz crianças para os adultos que estão
casados, mas no meu caso ela abriu uma exceção. Por isso você
não tem um pai e as outras crianças sim.
A menina ficou pensativa por um tempo e eu virei o rosto
para a frente, na esperança de que as perguntas sessassem.
— Lorie, você já entrou na escolinha de ballet? — Bruce
perguntou, me direcionando um olhar cúmplice.
— Obrigada — sussurrei, para o homem. Me senti aliviada
por ele ter mudado o tema da conversa propositalmente.
— Ainda não — Lorie respondeu à pergunta de Bruce. —
Minha mãe diz que vai me levar lá, mas ela sempre mente.
Minhas bochechas coraram ao ouvir aquilo e eu olhei para
Bruce, que possuía um semblante divertido no rosto.
— Não estou mentindo, Lorie. Eu vou te matricular nas aulas
de ballet — defendi-me.
A verdade é que eu estava tentando ganhar tempo para
juntar dinheiro. Matrículas em academias de ballet custavam caro,
principalmente em Nova York. Eu não teria que pagar apenas pelas
aulas, mas também pelo uniforme e pelas roupas das
apresentações. Eram muitos gastos e Brittany ainda não conseguiu
um emprego para ajudar nas despesas da casa. Por esse motivo,
eu não podia sair esbanjando o meu salário, precisava economizar.
— Podemos fazer a matrícula agora — Bruce comentou, e
guiou o carro para avenida que ia em direção a Manhattan.
— Eba! — Lorie comemorou, no banco de trás.
Revirei os olhos e me recostei no assento. Com dois votos a
favor de que eu matriculasse a criança na escolinha de ballet não
havia muita coisa que eu pudesse fazer. Fiquei em dúvida se eu
agradecia Bruce por me salvar daquela conversa sobre paternidade
ou se eu o xingava por me fazer gastar um dinheiro que eu não
tinha.
CAPÍTULO 19

Meu peito se apertou com desespero no instante em que


Bruce estacionou o carro em frente à uma academia de ballet na
área nobre de Manhattan.
Encarei a fachada chique do prédio e comecei a suar frio.
Quando eu disse que iria matricular Lorie em aulas de ballet eu
estava pensando na escolinha do bairro. Eu não precisava pedir
nenhuma informação para saber que a matrícula nessa academia
jamais caberia no meu orçamento.
— Bruce, não sei se tenho condições de pagar por algo
assim — sussurrei para o homem ao meu lado, me sentindo um
pouco envergonhada por admitir a verdade.
— Fique tranquila, Jenny. — Foi tudo que ele me disse antes
de descer do carro e abrir a porta traseira para ajudar Lorie a sair.
Revirei os olhos e desci do veículo, completamente
apreensiva sobre o que Bruce pretendia fazer.
Caminhamos em silêncio até a academia, enquanto eu
segurava a mão da minha filha. Quando entramos no prédio, nos
vimos em uma pequena sala que mais parecia uma recepção.
Haviam algumas cadeiras vazias do lado esquerdo, um balcão de
informações na área central e à direita uma porta de vidro fosco com
um enorme decalque de bailarina.
Dei uma bela olhada no ambiente e fomos até o balcão onde
uma mulher de meia idade trabalhava. Ao notar a nossa presença
ela nos cumprimentou com um sorriso amigável.
— Boa tarde. Em que posso ajudá-los? — a mulher
perguntou.
— Minha filha quer aprender ballet — comecei, ao perceber
que Bruce não falaria no meu lugar. — Estamos aqui para conhecer
a academia.
A recepcionista assentiu e saiu de trás do balcão.
— É essa mocinha aqui? — indagou, enquanto encarava
Lorie.
Concordei com a cabeça e encorajei que minha filha se
apresentasse.
— Eu sou a Lorie. — Ela ficou acanhada e segurou a minha
mão com um pouco mais de força.
— Olá, Lorie. É um prazer conhecê-la. — A mulher sorriu,
amigavelmente. — Sou Amélie Klein a nova gerente daqui. Você
quer se tornar uma bailarina?
Lorie assentiu e deu um sorriso tímido.
— Se não for muito incômodo, gostaríamos de conhecer as
instalações da academia, Srta. Klein — Bruce finalmente entrou na
conversa. — Assim saberemos se Lorie gostará do lugar.
Amélie concordou imediatamente e pegou uma prancheta
que estava sobre o balcão de atendimento. Ela foi até a porta de
vidro fosco que havia ali e a abriu.
— Me sigam, por favor. — Gesticulou para que a
acompanhássemos.
Segurei a mão de Lorie e fui em direção a mulher, ciente de
que Bruce estava bem atrás de mim.
Passamos a próxima meia hora fazendo um passeio turístico
no interior da academia. Visitamos salas espelhadas onde crianças
começavam a aprender os primeiros passos de dança, já em outras
alas adolescentes e jovens adultos também aprendiam ballet e
executavam movimentos que pareciam ainda mais complexos.
Lorie ficou encantada durante o passeio e eu podia ver seus
olhinhos brilharem com fascinação cada vez que entrávamos em
uma sala de aula ou encontrávamos alguma bailarina pelos
corredores. Bruce parecia tão satisfeito com o ambiente quanto eu,
mas diferente dele eu carregava a imensa preocupação de não
poder pagar para que Lorie estudasse em um lugar como esse.
Quando voltamos à recepção, Amélie, a gerente da
academia, se posicionou atrás do balcão e me direcionou um
sorriso.
— O que acharam do lugar? — perguntou, com expectativa.
— Eu adorei! — Lorie estava visivelmente empolgada.
Bruce sorriu com o entusiasmo da garotinha e me lançou um
olhar divertido.
— Lorie gostou daqui e eu também — o homem respondeu.
— É um ótimo lugar — admiti. — Gostaria que a minha filha
estudasse ballet aqui...
— Perfeito. — Amélie sorriu. — Então vamos discutir sobre
os valores. — A mulher rapidamente me entregou um folheto
informativo. Ah não! Chegamos na parte que eu tanto temia.
Tentei não desmaiar quando vi o valor cobrado pela matrícula
e pelos materiais que forneciam naquela academia — como
collants, saias, meias-calças e sapatilhas. Levaria dois meses do
meu salário para que eu pudesse pagar uma única mensalidade.
Por mais que eu tivesse adorado o lugar, eu jamais poderia pagar
para que Lorie fizesse aulas em uma academia tão cara quanto
essa.
Encolhi os ombros e devolvi o panfleto para Amélie.
— Será que... vocês não fazem um desconto para alunos
novos? — perguntei, com um sorriso amarelo.
A mulher pareceu relutante e balançou a cabeça
negativamente.
— Lamento, mas esse é o nosso valor promocional — ela
respondeu.
Olhei de soslaio para Bruce e o surpreendi me encarando.
Encolhi os ombros e suspirei, voltando a atenção para a minha filha.
Partia o meu coração ter que negar algo para ela, mas infelizmente
eu não tinha outra saída.
— Com licença — Bruce chamou a atenção de Amélie. —
Você é nova nesta academia, então vou presumir que não saiba
quem eu sou.
A mulher o encarou com um olhar confuso e balançou a
cabeça negativamente.
— Sinto muito, acho que não o conheço — Amélie
respondeu.
Aparentemente, eu não sou a única pessoa de Nova York
que não acompanha aquela revista de fofocas.
Bruce apertou a mão da mulher em um cumprimento breve.
— Sou Bruce Lancasther — se apresentou —, o dono da
Lancasther Enterprises.
Amélie arquejou levemente ao ouvir aquilo.
— É-é um prazer conhecê-lo, Sr. Lancasther — ela gaguejou.
— Eu não sabia...
A recepcionista me encarou por alguns segundos e então seu
olhar vagou entre Lorie e Bruce.
— Me deem um minuto... eu vou pegar os papéis para a
matrícula. — Ela rapidamente abriu uma gaveta que havia em seu
balcão, tirou alguns papéis de lá e me entregou o que parecia ser
um contrato.
— Assine aqui, por favor. — Ela indicou a linha no final da
folha.
— Mas o valor da mensalidade... — hesitei.
— A mensalidade não será cobrada — Amélie me
interrompeu. — Apenas o valor dos materiais.
— M-mesmo assim é muito caro — gaguejei, ainda tentando
entender o que aconteceu.
— Eu vou pagar — Bruce respondeu, me pegando
completamente de surpresa.
Franzi o cenho e voltei minha atenção para ele a tempo de
vê-lo assinando um cheque e o entregando para a gerente da
academia. Ela sorriu para o homem e voltou seu olhar até mim.
— Está tudo certo. Assine o contrato e Lorie começa na
próxima segunda — Amélie instruiu. — Vou lá dentro buscar os
materiais... eu não demoro.
A mulher deu as costas e desapareceu pela porta de vidro
fosco, me deixando sozinha com Lorie e Bruce.
— Por que está fazendo isso? — perguntei, incrédula com o
que havia acontecido. — Você acabou de pagar pelo material da
Lorie!
— Eu sei — o homem respondeu com uma imensa
tranquilidade, e caminhou para se sentar em uma das cadeiras de
espera. Lorie o seguiu e se acomodou no assento ao lado do pai.
Fiquei aflita, tentando entender a situação. Bruce apenas se
apresentou para a gerente e ela desistiu de cobrar a mensalidade,
depois ele assinou um cheque sem pensar duas vezes e pagou o
material da Lorie. O que esse homem está fazendo?
Suspirei, irritada, e me aproximei de onde Lorie e Bruce
estavam. Por sorte, éramos os únicos naquela sala de espera.
— O que foi aquilo? — perguntei para o homem, outra vez. —
Por que a gerente desistiu de cobrar a mensalidade?
— Minha empresa é uma das patrocinadoras que mantém
essa academia de pé — Bruce respondeu, com um suspiro. — Eu
tenho alguns benefícios por aqui e decidi usá-los para te ajudar.
— Eu não precisava de ajuda, Bruce — deixei o meu orgulho
falar mais alto.
Eu não queria que ele se sentisse na obrigação de me ajudar
só porque fingíamos ter um namoro. Honestamente, eu me sentia
envergonhada com essa possibilidade.
— Precisava sim. — Ele me lançou um olhar cético que
decidi ignorar.
— E por que você pagou o material da Lorie? — bufei.
— Porque você não tinha dinheiro.
— Não preciso da sua caridade — deixei escapar. — Não se
sinta na obrigação de pagar as minhas despesas por causa do
nosso namo... — Fechei a minha boca ao perceber que Lorie
prestava atenção na conversa.
— Sou um investidor. Estou apenas investindo no futuro da
menina.
Fiquei sem palavras naquele momento. Bruce não tinha a
mínima noção que era o pai da Lorie, mas ainda assim se
preocupava com ela como uma verdadeira figura paterna faria.
Estou começando a perceber que ele é um homem bom e altruísta...
talvez, eu esteja cometendo um grande erro escondendo a verdade.
Uma parte de mim queria contar ao Bruce que ele era pai da
garotinha que estava sentada ao seu lado, mas outra parte — a
maior parte do meu subconsciente — ainda tinha medo que a
revelação o afastasse. Estávamos começando a ter uma amizade,
ele estava se entrosando com a Lorie... E se eu contar que ele é pai
e isso estragar tudo? Não consigo arriscar. Não dá!
— Mamãe, você está chorando — Lorie parecia preocupada.
— O quê? — Levei minhas mãos até o rosto e só então
percebi que ele estava molhado.
Respirei fundo e virei de costas para eles, tentando retomar a
calma. Minha cabeça estava um caos por causa dos sentimentos
que aquela situação me provocou.
Posso não ter coragem para dizer a verdade no momento,
mas acho que consigo deixar o orgulho de lado pelo bem da minha
filha. Eu paguei as despesas dela nos últimos cinco anos, que mal
faria permitir que Bruce bancasse alguns privilégios para a Lorie?
Mesmo que ele não saiba que ela é filha dele, a intenção de ajudar
é o que conta.
Enquanto eu refletia em silêncio, Amélie voltou trazendo uma
caixa de sapatos e uma grande sacola rosa. Sequei minhas
lágrimas antes que ela percebesse que eu estive chorando e fui até
o balcão para falar com a mulher.
— Está tudo aqui. — Ela me entregou os materiais. — Já
assinou o contrato?
Neguei com a cabeça e peguei a caneta que estava em cima
do balcão. Dei uma breve lida no contrato e antes que eu pudesse
me arrepender, assinei a última linha. Agora não tem mais volta.
— Muito obrigada. — Amélie me lançou um sorriso amigável
e guardou o contrato em uma pasta azul. — Será um prazer ter
Lorie como aluna. Sei que com esforço e dedicação ela se tornará
uma excelente bailarina.
Olhei para a minha filha e percebi que ela e Bruce ainda me
encaravam com olhares preocupados. Sorri para Lorie na tentativa
de fazer parecer que estava tudo bem, mas o homem ao seu lado
foi quem retribuiu o sorriso. Senti minhas bochechas corarem e
desviei meu olhar de volta para Amélie.
— Lorie começa na segunda? — tirei uma última dúvida.
— Sim. Segunda-feira, às cinco da tarde — ela confirmou.
Concordei em silêncio. Eu ainda estaria trabalhando nesse
horário, mas acho que Brittany não se importaria em levar Lorie para
as aulas de ballet. Talvez, eu devesse dar uma compensação a ela
por cuidar da minha filha — do mesmo jeito que eu fazia com
Rebecca, a antiga babá. Eu sabia que a minha amiga também tinha
os seus gastos pessoais e que um pouco de dinheiro seria muito
bom para ela, que ainda estava desempregada. Preciso me lembrar
de discutir isso com Brittany quando chegar em casa...
Despedi-me da mulher e fui até Lorie e Bruce para avisar que
já podíamos ir embora. Lorie acenou para Amélie e segurou a minha
mão para que saíssemos da academia.
Ao chegar do lado de fora, percebi com espanto que o sol já
estava se pondo. Droga... Brittany deve estar completamente
preocupada! Tenho que avisar a ela o que aconteceu. Parando de
andar por alguns segundos, tirei o celular do bolso do meu casaco e
escrevi uma mensagem para a minha amiga. Pedi para ela não se
preocupar, pois Lorie e eu estávamos com Bruce e prometi que
explicaria tudo quando voltasse para casa.
Com um pequeno suspiro, guardei o celular de volta no bolso
e caminhei na direção de Bruce que já estava parado ao lado do seu
carro.
— Você se acalmou rápido — ele comentou, enquanto eu me
aproximava. — O que te fez mudar de ideia?
Parei alguns centímetros à sua frente e ergui meu rosto para
encará-lo nos olhos.
— Quero que Lorie tenha a vida que eu não pude ter —
confessei.
— Também quero o mesmo, Jenny. — Bruce tirou da minha
mão a sacola e a caixa de sapato. — Vou guardar isso para você.
Ele pegou a chave do carro e apertou o botão para
destrancar o veículo, em seguida, foi até o porta-malas. Sem saber
o que responder, fiquei em silêncio e abri a porta de trás para que
Lorie pudesse entrar.
Quando ela estava devidamente acomodada e presa ao cinto
de segurança, fechei a porta e fui até o banco do carona, me
sentando ali. Segundos depois, Bruce entrou no veículo e encaixou
a chave na ignição, fazendo o painel acender.
— Para onde vamos agora? — perguntei, quando o motor do
carro ligou.
— Não sei — Bruce admitiu. — Para onde você quer ir,
Lorie?
— Parque de diversões! — a garotinha exclamou, com
alegria.
Suspirei, tentando manter a calma.
Apesar de eu me sentir tensa, não relutei quando o homem
obedeceu a vontade da filha e dirigiu rumo ao centro da cidade.
Bom, parece que vamos para o parque de diversões...
CAPÍTULO 20

Já estava de noite quando Bruce parou o carro no


estacionamento do parque de diversões. Tirei o celular do bolso
para conferir minhas mensagens e vi que Brittany havia me enviado
como resposta vários emoticons sobre família e carinhas
apaixonadas. Revirei os olhos e desci do carro.
Bruce já estava do lado de fora ajudando Lorie a sair do
veículo. A garotinha ficou completamente empolgada ao ver as
atrações e luzes que brilhavam no local. Segurei a mão da minha
filha antes que ela decidisse correr para longe e caminhamos em
direção aos brinquedos.
Como era de se esperar, Bruce pagou a entrada para a filha e
insistiu em pagar a minha também. Ficamos impedidos de ir em
alguns brinquedos, já que Lorie não tinha altura para a montanha-
russa ou qualquer outra coisa mais radical. Passamos as próximas
duas horas girando em xícaras, andando no trenzinho infantil e
voando nos aviões que não subiam mais que um metro acima do
chão — tudo isso para fazer Lorie feliz.
— Tio Bruce, eu quero o urso rosa! — a garotinha insistiu,
quando passamos em frente a uma barraca de tiro ao alvo.
— Vou tentar pegar para você, baixinha. — Ele parou na
barraca e pediu quatro fichas para jogar.
— Quanto maior o número que você acertar, maior será o
prêmio — instruiu o vendedor, enquanto enchia uma espingarda de
pressão com quatro rolhas de madeira. Ele entregou a arma para
Bruce e lhe desejou boa sorte.
— O urso rosa! — Lorie reforçou.
Bruce sorriu para a garotinha e pousou o olhar em mim antes
de voltar sua atenção para o alvo que estava na sua frente. Ele
fechou um dos olhos e atirou, mas a rolha atingiu o número zero.
Lorie fez um som de decepção e apertou a minha mão. O homem
atirou mais duas vezes seguidas e o máximo que conseguiu foi
acertar o número três.
— Última chance — anunciou o vendedor.
Suspirei um pouco decepcionada. No fundo, eu sabia que
Bruce não seria capaz de conseguir o prêmio, estava claro que ele
não era um perito em tiro ao alvo.
— Tio Bruce... — Lorie choramingou, chamando a atenção do
homem.
— Eu sei, o urso rosa — ele interrompeu a garotinha.
Respirando fundo, Bruce fechou um dos olhos, mirou e atirou
novamente. A rolha atingiu o número dez que estava bem no centro
do alvo.
— Parabéns, o senhor conseguiu a maior pontuação — disse
o vendedor.
Bati palmas involuntariamente. Lorie deu um gritinho de
emoção e correu para abraçar Bruce, enquanto ele sorria vitorioso.
— Aqui está o urso rosa. — O homem da barraca entregou o
brinquedo para Lorie, que o segurou de maneira desajeitada já que
o animal de pelúcia era quase do tamanho dela.
— Obrigada, tio Bruce! — Lorie soou extremamente feliz,
enquanto abraçava o seu novo brinquedo.
Bruce afagou a cabeça da garotinha e me lançou um sorriso
contente que eu retribuí, deixando claro a minha gratidão.
Depois da vitória na barraca de tiro, Bruce comprou três
cachorros-quentes que comemos enquanto esperávamos na fila da
roda gigante. Confesso que eu estava um pouco aflita para andar
naquele brinquedo — afinal, eu tinha medo de altura. Hesitei em
entrar na cabine, mas senti um toque acolhedor em minhas costas
me encorajando a entrar no brinquedo. Acabei me acomodando ao
lado de Lorie e Bruce sentou no banco à nossa frente na companhia
do urso rosa — ele estava carregando aquilo para todos os lados
desde que Lorie se cansou de segurá-lo devido ao tamanho
exagerado do brinquedo.
Quando a roda começou a girar respirei fundo e segurei a
mão da minha filha com força. Fiquei encarando os meus pés para
não ver a altura em que estávamos — eu não queria ficar ainda
mais desesperada. Meu coração palpitava com nervosismo e eu
comecei a suar frio quando a nossa cabine balançou com o vento
daquela noite de outono.
— Está com medo, Jenny? — Bruce perguntou, com um tom
divertido.
Engoli em seco e balancei a cabeça negativamente.
— Está sim — Lorie me contrariou. — Mamãe tem medo de
altura.
— Sim, eu percebi isso uns dias atrás...
— E-eu não tenho medo de altura — gaguejei. — Tenho
medo de cair.
— É a mesma coisa — Bruce disse, e Lorie deu uma risada.
Naquele instante a cabine onde estávamos chacoalhou mais
que o normal e eu gritei, me agarrando com força ao banco. Lorie
gargalhou outra vez com o meu comportamento e eu senti a mão
calorosa de Bruce envolvendo a minha. Foi quando percebi que o
homem tinha saído de seu assento para se acomodar no espaço
livre que havia ao meu lado esquerdo — provavelmente, foi isso que
causou o movimento da cabine.
— Não tenha medo, Jenny. — Bruce passou um braço ao
redor do meu ombro. — Nada de ruim vai acontecer. — Ele segurou
o meu queixo para que eu erguesse o olhar até ele. — Confie em
mim e respire fundo.
Fiquei um pouco atordoada pela proximidade que os nossos
rostos estavam, mas acabei assentindo e fiz o que ele disse.
Respirei fundo uma e outra vez, e logo senti o meu coração
de acalmar.
— Agora olhe ao seu redor... está perdendo uma linda vista
da cidade — Bruce me encorajou, com a voz mais calma do mundo.
Respirei fundo enquanto reunia coragem para fazer o que ele
me pediu. Eu preciso vencer esse medo mesmo que seja apenas
por alguns minutos.
Hesitei algumas vezes, mas logo desviei meu olhar para
longe do rosto de Bruce e o fixei nas luzes da cidade que brilhavam
na paisagem. Bruce tinha razão, eu estava perdendo uma linda
vista. Em meu campo de visão estava o Central Park, ao longe
haviam vários arranha-céus com o topo iluminado e o céu noturno
acima de nós brilhava com estrelas e uma lua crescente.
— É lindo... — deixei escapar, distraída.
— É sim — Bruce concordou.
Percebi que a sua boca estava perigosamente próxima do
meu ouvido. Minha pele inteira se arrepiou com a sensação e eu
voltei a encarar o homem que estava ao meu lado. Nossos narizes
quase se chocaram quando fiz aquilo e ele deu uma risada abafada,
afastando o seu rosto do meu por alguns centímetros.
— Está mais calma agora, Jenny?
Assenti, sem ser capaz de pronunciar uma única palavra.
— Ótimo. — Bruce usou o braço que ainda estava ao redor
do meu ombro para me puxar para mais perto dele.
Sem saber como reagir, me recostei no homem e o encarei
em silêncio pelo resto do passeio. Quase me esqueci que Lorie
estava ao meu lado e confesso que só me lembrei da garotinha
quando descemos do brinquedo e ela cruzou o meu campo de
visão. Droga, que tipo de mãe eu me tornei? Esqueci a minha
própria filhadepois de uma troca de olhares com um homem intenso
e bonito — que, por coincidência, é o pai dela.
— Estamos fechando em vinte minutos — avisou, um
funcionário do parque.
— Melhor irmos embora — opinei.
— Eu queria ir ao carrossel outra vez. — Lorie murchou os
olhinhos e parou na minha frente.
Olhei para Bruce e ele me direcionou um sorriso relutante,
enquanto carregava o urso cor de rosa nos braços.
— Acho que ainda podemos ir em outro brinquedo — ele
concordou com a filha.
Lorie ficou visivelmente empolgada e correu até o carrossel.
— Obrigada por isso — falei quando Bruce e eu paramos em
frente ao brinquedo. — Lorie não ia no parque de diversões há
muito tempo.
— Confesso que eu também — ele admitiu, enquanto
observava Lorie subir em um cavalinho no carrossel com a ajuda de
um funcionário do parque. Ambos não tínhamos mais tamanho para
andar naquele brinquedo, então teríamos que esperar até que ela
saísse de lá.
— Não estou surpresa, um homem como você tem outros
meios de se divertir — comentei, com uma certa ironia na voz.
— Na verdade, eu mal tenho tempo para diversões. Desde
que assumi a empresa, a minha vida tem se resumido a reuniões,
contratos e...
— Clubes de strip-tease — deixei escapar, mal-humorada.
Cobri minha boca com as mãos, mas era tarde demais.
— O que disse? — Bruce me encarou com uma sobrancelha
erguida.
— Nada... esqueça isso, por favor — tentei consertar a
situação. Minhas mãos começaram a suar frio.
O homem ao meu lado suspirou e o seu rosto ganhou uma
expressão arrependida.
— Foi há muito tempo, não sou mais esse tipo de homem. Eu
mudei muito desde que... — ele se conteve.
Fiquei alguns segundos em silêncio esperando que Bruce
terminasse a frase, mas aquilo não aconteceu.
— Desde que...? — tentei encorajá-lo a falar, mas ele apenas
balançou a cabeça negativamente.
— Nada. Apenas esqueça o que eu disse.
Fiquei um pouco decepcionada. Eu podia ver no olhar de
Bruce que ele não me contaria o que estava pensando não
importava o quanto eu insistisse.
— Jenny, me desculpe se eu fiz você se sentir desconfortável
quando paguei pelo material da Lorie na academia de ballet. —
Bruce cruzou os braços diante do peito. Tive um pouco de
dificuldade para me concentrar na seriedade do assunto, tendo em
vista que ele segurava um grande urso de pelúcia em sua mão
direita. — Sei que eu não tenho responsabilidade com a Lorie,
mas... de alguma forma eu sinto o contrário. Talvez, seja porque eu
entenda o que é crescer sem um pai.
Fiquei em silêncio e lancei um olhar compreensivo para o
homem que estava na minha frente. Ele se sentia ligado à Lorie e,
talvez, fosse por causa do laço sanguíneo que os unia. Mesmo que
Bruce não tivesse consciência da sua paternidade, algo em seu
interior sabia disso e o fazia se importar com a garotinha da maneira
que apenas um pai faria.
— Sinceramente, eu paguei o material de ballet para a Lorie
porque senti que devia dar a ela a chance de ter um bom futuro —
ele prosseguiu. — Não tive nenhuma oportunidade durante a
infância e só tenho uma vida boa hoje porque o meu pai bilionário
resolveu me reconhecer como filho. Cá entre nós, eu acho que as
chances do pai da Lorie aparecer montado em uma pilha de dinheiro
e nomeá-la como herdeira de uma empresa multinacional são
mínimas.
Uma risada me escapou quando ouvi aquilo e eu fingi ter me
engasgado para disfarçar. Bruce ficou confuso com a minha reação,
mas me deu alguns tapinhas nas costas achando que iria me ajudar.
Depois que retomei o fôlego, ele me direcionou um sorriso amigável.
— Jenny, você não precisa fazer tudo sozinha. — Seus olhos
encontraram os meus enquanto ele falava. — Saiba que pode me
pedir ajuda quando precisar. Não pense que estou fazendo isso
porque tenho pena de você, eu sei que é uma mulher forte, mas
também sei que todo mundo precisa de uma mão amiga de vez em
quando.
— Por que tenho a impressão de que você não diria isso para
qualquer funcionário da empresa?
— Esqueça que você é minha funcionária. — Ele segurou o
ursinho com o outro braço, deixando a sua mão direita livre, e então
afagou o meu ombro. — Eu te considero uma amiga, Jenny.
Honestamente, você é uma das poucas pessoas em quem confio.
Fiquei sem palavras depois do que ouvi. Tudo que consegui
fazer foi sorrir e deixar que algumas lágrimas de felicidade
escapassem pelos meus olhos. Nunca pensei que ouviria Bruce
dizendo uma coisa dessas.
— Ei, não chore. — Senti dedos quentes limpando as
lágrimas que rolavam pelas minhas bochechas e logo fui envolvida
por um abraço apertado. — Caramba, Jenny, você é muito
sentimental... — Bruce comentou, com a voz divertida.
Em um momento de fraqueza, enterrei o rosto no peito dele e
inspirei profundamente o cheiro de perfume caro que estava
impregnado em sua blusa. Fechei os olhos e fiquei aproveitando o
toque do homem, me permitindo descansar na calmaria dos seus
braços, até que senti alguém puxando o tecido da minha calça
legging.
— Ei, eu estou aqui! — Lorie resmungou, chamando a nossa
atenção. — Vocês não estão me ouvindo?
Bruce me soltou do seu abraço e eu senti o meu rosto corar.
— Está na hora de ir, Lorie. — Forcei-me a desviar o olhar na
direção da minha filha.
Naquele instante, uma família de três pessoas passou por
nós e eu percebi o jeito entristecido que Lorie olhou para o garotinho
que andava nas costas do pai, enquanto a mãe caminhava ao lado
de ambos. De alguma forma, a tristeza da minha filha também me
atingiu e eu virei meu rosto para outra direção, mas acabei me
deparando com Bruce, que, aparentemente, também percebeu a
situação. Ele hesitou por alguns instantes e então caminhou até
Lorie, parando na frente dela. Observei com lágrimas nos olhos
enquanto Bruce se abaixava e virava as costas na direção da filha.
— Sobe aí, baixinha — ele pediu.
Lorie entendeu o que ele iria fazer e abriu um largo sorriso
antes de se pendurar nas costas de Bruce, passando os braços ao
redor do pescoço dele.
— Jenny, será que você pode levar o ursinho? — O homem
estendeu o bicho de pelúcia na minha direção.
Não hesitei em ir até Bruce e pegar o brinquedo para que ele
pudesse carregar Lorie em segurança. A felicidade que eu sentia
em meu peito era indescritível.

O caminho de volta foi tranquilo. Lorie ficou o tempo inteiro


calada enquanto observava as luzes da cidade pela janela — o que
me deu a oportunidade para conversar com Bruce sem nenhuma
interrupção. Ele me contou que antes de conhecer o pai trabalhou
como entregador de pizza durante a adolescência para ajudar nas
despesas de casa e eu aproveitei o momento para falar como era o
meu antigo emprego na lanchonete.
Ele também me contou coisas sobre a sua antiga vida com a
mãe, quando ele morava na periferia de Detroit. Nunca pensei que
nos daríamos tão bem durante uma conversa e a cada minuto que
passava eu me sentia inexplicavelmente mais próxima de Bruce.
Talvez fosse apenas impressão, mas acho que ele também pensava
o mesmo sobre mim.
Quando Bruce estacionou o carro em frente ao prédio onde
eu morava, me senti um pouco triste por precisar terminar a nossa
conversa.
— Obrigada pela noite, Bruce. — Tirei o cinto de segurança e
abri a porta. — E por tudo que fez pela Lorie hoje.
— Não seja por isso. — Ele me deu uma piscadela. — Você
vai trabalhar amanhã?
Uma pequena aflição surgiu em meu peito. Pensar em todas
as pessoas que eu teria que enfrentar na empresa me deixava sem
ânimo algum de voltar para aquele lugar, no entanto, saber que
Bruce estaria lá comigo fez com que eu me sentisse um pouco mais
confiante para enfrentar a realidade.
— Sim, eu vou — confirmei com um suspiro. — Preciso
colocar comida na mesa.
Bruce me direcionou um sorriso e assentiu.
— Vamos, Lorie — chamei, enquanto saía do carro.
Lorie não respondeu.
— Ela dormiu. — Bruce olhou para o banco traseiro com a
ajuda do retrovisor.
Olhei para o banco de trás e vi Lorie adormecida com a
cabeça encostada na janela.
— Preciso acordar ela. Não vou conseguir carregá-la três
lances de escada.
Bruce desceu do carro e em poucos segundos ele estava ao
meu lado na calçada.
— Não se preocupe, eu a levo até lá em cima. — Antes que
eu pudesse impedir, o homem abriu a porta de trás e
cuidadosamente tirou Lorie do cinto de segurança.
A garotinha abriu os olhos quando Bruce a pegou nos braços,
mas logo adormeceu e encostou a cabeça no ombro do pai com um
profundo suspiro sonolento. Sorri com a cena e guiei o homem para
dentro do prédio.
— Brittany? Chegamos — anunciei, enquanto segurava a
porta do apartamento para que Bruce pudesse passar com Lorie
nos braços. Ela ainda estava adormecida e não moveu um músculo
sequer desde que a tiramos do banco do carro.
— Até que enfim! — Brittany gritou de dentro do seu quarto.
— Como foi o passeio em família com o bilionário gostoso?
Pigarreei desconcertada.
Bruce parou de andar quando ouviu o comentário da minha
amiga e eu percebi um leve traço de rubor em seu rosto —
provavelmente, estava tão envergonhado quanto eu.
— Ei, por que você não me respondeu? — Brittany saiu do
quarto e arquejou ao ver que Bruce estava na sala.
Lancei um olhar repreensivo para a minha amiga esperando
que ela não fizesse mais nenhuma piadinha naquele momento.
Brittany pareceu entender e ficou parada no lugar, sem saber como
reagir com aquela visita inesperada em nosso apartamento.
— Ah... onde fica o quarto da Lorie? — Bruce perguntou,
ignorando o que estava acontecendo.
Respirei fundo e corri para abrir a porta que ficava bem ao
lado do quarto de Brittany. Ao entrar no cômodo, apertei o
interruptor para ligar a luz e praguejei quando vi que deixei algumas
roupas sobre a cama antes de sair de casa. Empurrei a pilha para o
lado e um sutiã bege caiu no chão, próximo aos pés de Bruce. Por
sorte, ele estava distraído demais observando os outros cantos do
quarto para prestar atenção na minha roupa íntima.
— Lorie não tem um quarto só para ela? — perguntou,
enquanto olhava ao seu redor.
— Não... nós dividimos a mesma cama. — Encolhi os
ombros, me sentindo envergonhada por mostrar aquela parte da
minha vida para o homem.
Bruce ficou pensativo, em seguida, colocou Lorie sobre o
colchão e afofou o travesseiro para que ela ficasse confortável.
Aproveitei o momento para puxar o cobertor e garantir que a
garotinha ficaria aquecida.
— Jenny, posso fazer uma pergunta inconveniente? —
indagou com a voz baixa para que Lorie não acordasse.
— Pode — respondi, já me arrependendo.
— O que você faz quando quer receber certos tipos de visita
aqui?
— De que visita você está falando, Bruce? — Fiquei confusa.
— Você sabe. — Ele me lançou um sorriso malicioso. —
Quando quer ter um encontro mais íntimo com alguém...
Engasguei ao entender o que Bruce queria dizer e ele abafou
uma risada. Levei alguns segundos para me recompor e apesar de
estar envergonhada com aquela pergunta, resolvi ser sincera.
— Eu não saio com ninguém há muito tempo — confessei. —
Mas quando acontece, eu não trago ninguém aqui para o
apartamento. É uma regra que Brittany e eu estabelecemos: não
trazer nenhum estranho para cá.
— Então eu sou o primeiro homem que entra no seu quarto?
Concordei involuntariamente e um sorriso satisfeito curvou a
sua boca.
— O que foi? — Ergui uma sobrancelha, estranhando a
reação dele.
— Não é nada. — Bruce ficou sério de uma hora para a
outra. — Eu preciso ir, Jenny. Está ficando tarde e imagino que você
queira descansar.
— Tudo bem. — Encolhi os ombros, sem conseguir disfarçar
a decepção que me atingiu por ter que me despedir de Bruce. — Eu
acompanho você até a porta.
Ele concordou e saímos do quarto.
Quando passamos pela sala, Brittany estava sentada no sofá
com uma almofada no colo. Os olhos da minha amiga vagaram
entre Bruce e eu, mas decidi ignorá-la para me despedir do homem
corretamente.
— Te vejo amanhã na empresa? — perguntou quando
estávamos do lado de fora do apartamento. Já passava da meia
noite e o corredor daquele andar estava completamente vazio,
éramos os únicos ali.
— Sim... nos vemos amanhã. — Direcionei lhe um sorriso e o
abracei sabendo que me arrependeria mais tarde se não fizesse
aquilo.
Bruce afagou as minhas costas e eu tive quase certeza de
que ele inspirou o aroma do meu cabelo. Fiz o mesmo e respirei
fundo, com o nariz enterrado em seu peito.
— Boa noite, Jenny. — Quando ele me soltou e caminhou em
direção às escadas, foi como se uma parte do meu coração tivesse
sido arrancada.
— Boa noite, Bruce — sussurrei, enquanto observava o
homem se afastar.
Depois que ele desapareceu do meu campo de visão entrei
no apartamento e comecei a me preparar mentalmente para contar
à Brittany tudo que aconteceu nas últimas horas. Será uma noite
longa...
CAPÍTULO 21

Na manhã seguinte, acordei com um par de olheiras enormes


— consequência de uma noite mal dormida e das horas que passei
contando à Brittany tudo que havia acontecido durante o meu
“passeio em família”.
Depois da conversa minha amiga ficou claramente a favor
que eu dissesse para Bruce que Lorie era sua filha. Ela afirmou que
era nítida a ligação que o homem sentia com a garotinha e tinha
quase certeza de que ele não iria correr para longe ao descobrir a
verdade. No entanto, eu permanecia receosa.
Com as coisas que estavam acontecendo ultimamente eu
não achava que seria uma boa ideia contar que Bruce tinha uma
filha — se alguém descobrisse a notícia sairia na primeira página
daquela revista de fofoca e eu não queria que os repórteres
começassem a perseguir Lorie.
A incerteza que eu sentia sobre o assunto me manteve
acordada a noite inteira. Quando o cansaço falou mais alto que a
preocupação, eu fechei os olhos por alguns minutos e logo o
despertador tocou, indicando que estava na hora de levantar e
encarar mais um dia de trabalho.
Ao abrir os olhos me deparei com Lorie dormindo ao meu
lado. Ela chupava o seu polegar e estava agarrada ao ursinho de
pelúcia que Bruce conseguiu no parque. Com um sorriso beijei
delicadamente a sua testa e acariciei o seu cabelo bagunçado.
— Eu te amo, Lorie — murmurei baixinho para que ela não
acordasse.
Após alguns minutos de relutância me levantei da cama e fui
até o armário. Escolhi um conjuntinho azul que era composto por um
blazer de botões e uma saia justa que terminava na altura dos
joelhos. Peguei uma calcinha, um sutiã e a minha habitual regata
branca, que eu usava por baixo do blazer, e corri para o banheiro.
Depois de tomar banho e escovar os dentes, penteei meu
cabelo e resolvi deixá-lo solto sobre os ombros. Passei um leve
batom vermelho e pela primeira vez desde que comecei a trabalhar
naquela empresa, decidi que não usaria os meus óculos de leitura.
Passei bons minutos dentro daquele banheiro tentando deixar a
minha aparência o mais apresentável possível. Eu sabia que ao
chegar na empresa receberia mais atenção do que eu realmente
desejava, então precisava estar com a autoestima em dia.
Ao terminar a minha maquiagem, saí do banheiro e fui até a
cozinha onde me deparei com Brittany sentada na pequena mesa
de quatro cadeiras que ficava próxima ao fogão. Ela mexia no
notebook enquanto bebia café em uma caneca de porcelana
amarela. Seu rosto carregava uma expressão preocupada que eu
não deixei de notar.
— Bom dia — cumprimentei-a, enquanto me aproximava do
fogão para pegar um pouco de café.
— Olá, Jenny. — Ela me direcionou um olhar receoso.
— O que aconteceu? — indaguei preocupada. Brittany era
uma pessoa carismática que sempre procurava um jeito de fazer as
pessoas ao seu redor sorrirem. Quando ela ficava séria, era sinal
que algo ruim havia acontecido.
Minha amiga não respondeu à pergunta, apenas suspirou e
arrastou uma cadeira para que eu me sentasse ao seu lado.
Rapidamente, coloquei um pouco de café em uma caneca rosa e
me acomodei no assento, como ela pediu.
— Sei que tenho pouco tempo antes de ir para o trabalho. —
Beberiquei um pouco do café, tomado cuidado para que o meu
batom não saísse.— Mas adoraria saber o que está te perturbando,
Brittany.
— Olha, eu confesso que comecei a seguir aquela revista
para o caso de aparecer algum outro bilionário solteiro por quem eu
poderia me interessar — começou, de maneira hesitante. — Mas
hoje de manhã, enquanto eu navegava pelo site deles, eu vi isso
aqui... — Ela virou o notebook na minha direção.
No instante em que meus olhos se fixaram na tela, vi uma
foto de Bruce carregando Lorie nas costas enquanto eu caminhava
ao lado de ambos segurando um ursinho cor-de-rosa. O ar escapou
dos meus pulmões e eu precisei de muito esforço para não cair da
cadeira com o choque daquele momento. Quem foi o desgraçado
que tirou aquela foto sem que ao menos percebêssemos?
Como se a imagem não fosse chamativa o suficiente, o texto
da legenda ainda fazia perguntas sensacionalistas sobre quem
poderia ser a garotinha que Bruce carregava nas costas.
— Porra, Brittany, a casa caiu!
Entrei em pânico e deixei de lado a minha caneca de café.
Meu nervosismo era tanto que nada passava pela minha garganta.
O que eu mais temia aconteceu: os repórteres encontraram Lorie.
— Se a foto te deixou nesse estado acho melhor que não
veja os comentários. — Minha amiga rapidamente fechou a tela do
notebook.
Perdi o ar novamente e uma leve tontura me atingiu.
— O que estão dizendo nos comentários, Brittany? — exigi
saber, o pânico estava cada vez mais evidente em minha voz.
Ela hesitou por um tempo e então me encarou com um olhar
aflito.
— Tem gente achando a Lorie parecida com o Bruce. Estão
teorizando que talvez vocês pudessem ter um relacionamento há
mais tempo.
— Não pode ser. — Fiquei ainda mais preocupada. — Eu
preciso tomar alguma atitude. Se Bruce descobrir sobre a
paternidade através de uma matéria nessa revista as minhas
chances de fazê-lo ter um bom relacionamento com a Lorie estarão
acabadas!
— O que você tem em mente? — Brittany indagou, com
curiosidade. — Vai contar a verdade de uma vez?
— Eu... eu... — Cogitei aquela ideia por um momento, mas só
consegui sentir medo. Medo de perder Bruce, dele se afastar de
Lorie e eu. — Porra, não tenho coragem para contar, Brittany. Não
estou pronta!
— Você nunca estará pronta para contar — ela retrucou com
um tom aborrecido. — Precisa fazer alguma coisa antes que os
repórteres descubram onde a Lorie estuda.
— Não se preocupe, eu vou pensar em algo. — Quando me
coloquei de pé, minhas pernas vacilaram, estavam trêmulas pelo
nervosismo da situação. — Você arruma a Lorie para a escola?
— Como sempre. — Minha amiga deu de ombros. — Agora
também estou encarregada de levá-la para as aulas de ballet
naquele bairro chique. Talvez eu conheça um bilionário gostoso por
lá.
Revirei os olhos com o comentário e um pequeno sorriso
curvou a minha boca, apesar do nervosismo que eu sentia. Durante
a minha conversa com Brittany, na noite anterior, consegui que ela
aceitasse uma pequena remuneração por estar sendo babá da Lorie
nos últimos meses. 50 dólares por semana não seria uma quantia
muito grande, mas era o máximo que eu podia pagar com o meu
salário de secretária e assim ela teria algum dinheiro enquanto não
encontrasse nenhuma oportunidade de emprego.
— Odeio ter que dizer isso, mas eu estou indo para a
empresa. — Afaguei o braço da minha amiga como um sinal de
despedida.
— Boa sorte lá... você vai precisar. — Brittany sorriu de
maneira apreensiva.
Não consegui terminar de beber o meu café, então coloquei a
caneca sobre a pia e peguei a minha bolsa que estava pendurada
em um cabideiro na sala.
Quando saí do apartamento, peguei o celular e liguei para
Bruce, mas ele não atendeu. Ainda que eu odiasse admitir, eu
queria ouvir a voz dele — isso acalmaria a minha mente e me daria
ânimo para enfrentar a situação. Continuei tentando entrar contato
com o meu chefe durante todo o caminho até a empresa, mas,
infelizmente, todas as ligações caíram na caixa postal.
O tempo que eu passei em espera com o celular no ouvido
também me deu oportunidade para pensar. A solução que encontrei
para fazer com que aquela revista de fofocas ficasse longe da Lorie
seria quase tão difícil quanto contar toda a verdade para Bruce. O
único jeito de manter os repórteres fora da minha vida privada seria
voar abaixo do radar, deixar de sair para lugares com acesso
público e evitar a companhia de Bruce por um tempo. Eu teria que
me afastar dele e isso partia o meu coração.

Ao chegar na empresa ignorei os olhares curiosos dos outros


funcionários e caminhei apressadamente até a sala de Bruce. Minha
mente estava tão atordoada que eu mal me dei ao trabalho de bater,
apenas abri a porta e entrei.
A luz do dia que entrava pela grande janela de vidro
iluminava todo o cômodo e causava uma atmosfera revigorante no
local. Dei uma breve olhada pela sala e logo encontrei o meu chefe,
sentado atrás da sua mesa, assinando uma pilha de contratos.
— Bruce? — chamei, enquanto me aproximava.
Ao ouvir minha voz o homem ergueu seu olhar até mim e
sorriu.
— Jenny, estou feliz que veio trabalhar. — Ele se levantou da
cadeira e se aproximou de onde eu estava.
Sem saber como reagir, fiquei parada no lugar e fui
surpreendida quando Bruce me puxou para um abraço rápido.
Aquela aproximação repentina me tirou o fôlego por um instante,
mas logo me recompus. Eu precisava manter o foco e falar sobre a
minha decisão.
— Eu tentei te ligar, mas você não atendeu — iniciei o
assunto.
— Sinto muito. — Ele me direcionou um sorriso culpado. —
Deixei meu celular desligado porque Valery não parava de ligar
depois que publicaram uma nova matéria sobre nós.
— Então... sobre a matéria...
— Imagino que esteja irritada por causa disso — Bruce me
interrompeu. — Não ligue para o que estão dizendo. As pessoas
gostam de fazer especulações infundadas. Dizer que Lorie é minha
filha só por causa dos olhos azuis? — Ele riu, de um jeito nervoso.
— 10% da população mundial tem olhos azuis... isso não quer dizer
nada.
Engoli em seco. Parece que Bruce já estava ciente dos
boatos sobre parecermos uma famíliade longa data e, para a minha
surpresa, ele simplesmente ignorou tudo isso. Talvez, ele não tenha
do que desconfiar porque acha que nunca tivemos nada no
passado. Me pergunto se o homem reagiria do mesmo jeito se
soubesse da nossa noite na Filadélfia.
— Fingir um namoro para despistar a mídia foi loucura —
falei, antes que a minha coragem desaparecesse. — Eles não nos
deixaram em paz e até envolveram a minha filha no assunto!
— Eu avisei que os primeiros dias seriam complicados —
tentou se defender. — Espere mais um pouco e tudo ficará bem... os
repórteres se esquecerão de nós em alguns dias.
— Não se continuarmos aparecendo em todo lugar —
disparei. — Bruce, eu não quero passar a minha vida inteira fugindo
das câmeras. Pelo meu bem e pela Lorie, essa coisa de namoro
falso precisa acabar!
O homem desviou seu olhar para a janela, onde era possível
enxergar uma quantidade infinita de arranha-céus no horizonte. Ele
parece chateado.
Me senti culpada, não queria que a recente conexão entre
Bruce e eu fosse afetada pela minha atitude, mas era tarde demais.
Já expressei a minha opinião e agora teria que aguentar as
consequências.
— Se for para o seu bem, deixaremos de nos encontrar fora
dessa empresa — ele quebrou o silêncio, mas seu olhar
permaneceu fixo na paisagem lá fora. — Mas fazer um comunicado
sobre o término agora deixaria os repórteres mais alvoroçados.
— Bom, acho que as coisas já ficarão melhores se não
aparecermos juntos em locais públicos novamente.
Meu chefe concordou em silêncio com o que eu disse. Senti
com um peso no peito ao ver que Bruce estava incomodado com a
ideia de me ver apenas na empresa. Honestamente, eu achei que
ele ficariaaliviado ao saber que eu queria desistir desse namoro de
mentira. Parece que me enganei...
Depois de um longo tempo calado, Bruce voltou seu olhar até
mim e suspirou.
— Temos muito trabalho a fazer, Jenny — mudou de assunto,
o tom frio da sua voz me pegou de surpresa. — Vou enviar para o
seu e-mail todos os contratos que fechei na semana passada, quero
que os imprima, organize por ondem alfabética e os guarde no
arquivo da empresa.
— Como quiser — respondi, um tanto cabisbaixa. — E
obrigada por entender a minha situação, Bruce.
Ele apenas gesticulou sutilmente na direção da porta,
indicando que eu podia sair da sala.
Passei o resto do dia organizando uma pilha de contratos e
fazendo o possívelpara não pensar na conversa que tive com Bruce
pela manhã. Ele compreendeu o que eu sentia e mesmo que a
situação o deixasse visivelmente abalado, concordou em deixar de
me encontrar para que os repórteres se afastassem de mim.
No fim do dia, Bruce passou pela minha mesa de trabalho e
me cumprimentou normalmente, o que me fez pensar que talvez ele
tivesse superado a conversa e estivesse empenhado em manter a
nossa amizade profissional. Esse não é o relacionamento que eu
gostaria de ter com ele, mas terá que bastar, por enquanto.
CAPÍTULO 22

Inferno. Essa era a única definição que eu conseguia dar


para as duas semanas que passaram. Já estávamos na sexta-feira
e Jenny ainda não me procurou para dizer que poderíamos voltar a
sair. Mesmo com o meu subconsciente me alertando que talvez ela
nunca fizesse isso, eu permanecia com o pensamento positivo de
que a minha secretária voltaria atrás em seu pedido —
principalmente agora que aquela revista idiota estava há seis dias
sem postar qualquer coisa sobre nós.
Mantínhamos um relacionamento profissional dentro da
empresa e em momento algum eu deixei de ser atencioso com
Jenny. No entanto, à medida que os dias passavam eu ficava
receoso que ela pudesse exigir o meu comunicado à imprensa
avisando sobre o nosso término.
Eu estava relutante em dizer que terminamos. Não apenas
porque eu sabia que isso traria a atenção dos repórteres para nós
outra vez, mas também porque eu não queria admitir que perdi uma
mulher como a Jenny. Mesmo que fosse apenas um namoro de
mentira, o meu peito doía por ficar longe dela.
Antes desse namoro falso começar eu já me sentia atraído
por Jenny de uma forma que eu não conseguia explicar. No início,
relutei contra a atração porque ela era minha funcionária, mas
depois que a beijei decidi esquecer essa merda toda e tentar
entender o que eu verdadeiramente sentia. Não posso me envolver
com a minha secretária apenas porque eu tenho uma queda por ela.
Se eu for tomar alguma iniciativa nessa situação eu terei que ter
certeza de que os meus sentimentos por Jenny não são
passageiros.
Enquanto eu me perdia em pensamentos, sentado no
confortável sofá de couro da minha sala, a porta se abriu. Ergui meu
olhar com uma certa expectativa de que fosse Jenny, mas me
decepcionei ao ver Valery entrando. Revirei os olhos. Meus ouvidos
doíam com o barulho que o seu salto alto fazia cada vez que ela
dava um passo à frente.
— Bruce, preciso te fazer uma pergunta. — Valery parou
diante de mim.
— Seja rápida — resmunguei, sem disfarçar o mau humor,
minha cabeça estava cheia demais para conversar.
— Você realmente está namorando aquela secretariazinha?
— indagou, em um tom cético. — Apesar do que saiu na revista,
vocês não agem como um casal...
Preferi ficar em silêncio ao invés de respondê-la de forma
rude e iniciar uma discussão, mas para a minha tristeza, minha irmã
estava disposta a brigar.
— Olha, sei que não devo me intrometer, mas se você não
quer nada com a gata borralheira, acho que seria melhor dar um fim
nesse relacionamento. — Ela colocou as mãos na cintura. — Eu não
gosto daquela mulher, mas também não acho certo que você fique
iludindo a coitadinha...
— Já acabou, Valery?! — me exaltei. Eu realmente não
estava disposto a ouvir aquilo. — Se não tem nada de útil para dizer
então sai da minha sala.
Levantei do sofá e apontei para a porta, esperando que ela
entendesse que não era bem vinda. Pude ver que a minha reação
deixou Valery assustada, mas não me importei. Ela deu alguns
passos para trás e olhou ao seu redor.
— Na verdade, eu preciso verificar algumas coisas no seu e-
mail para o setor financeiro — ela respondeu, hesitante.
— Faça o que tem que fazer, mas não me incomode metendo
o seu nariz na minha vida pessoal.
— Às vezes esqueço que sou a sua irmã. — Valery franziu o
cenho com uma expressão amargurada. — Você me trata como se
eu fosse uma simples funcionária.
— Está errada, eu não trato meus funcionários dessa
maneira. — Cruzei os braços diante do peito e lhe direcionei um
sorriso irônico. — Meu comportamento mal-humorado é exclusivo
para você.
Valery bufou com o que eu disse e virou as costas,
caminhando em passos largos até a minha mesa.
Incapaz de permanecer no mesmo ambiente que aquela
riquinha mimada, saí da sala e deixei Valery sozinha com o seu
drama. Se ela pretendia me convencer a terminar com Jenny, não
iria conseguir.
Fiquei aliviado quando fechei a porta e saí para o corredor.
Embora eu não quisesse dar atenção à Valery, as coisas que ela me
disse não saíam da minha cabeça. Minha irmã achava que Jenny e
eu não estávamos juntos porque não via nenhum afeto entre nós
nas últimas semanas e eu tinha certeza que ela não era a única a
pensar desse jeito. Se os boatos continuassem, seria apenas uma
questão de tempo até que os repórteres voltassem a nos perseguir.
Eu preciso acabar com esses rumores antes que eles se espalhem
pela empresa.
Um sorriso curvou a minha boca quando vi Jenny trabalhando
em sua mesa. Seu cabelo loiro estava solto, ela usava uma blusa
branca de botões e uma saia preta executiva que terminava um
pouco acima dos joelhos. A mulher parecia perdida em
pensamentos e mordiscava a alça dos óculos de leitura enquanto
olhava atentamente para a tela do computador.
Uma ideia surgiu em minha cabeça naquele momento e eu
não hesitei em colocá-la em prática. Caminhei até a mesa de
trabalho da minha secretária e me debrucei ali, ficando de frente
para a mulher que não saía dos meus pensamentos.
— Jenny, aconteceu uma coisa — falei, na expectativa de
chamar a sua atenção.
Ela deixou de olhar para o computador e me encarou com
uma expressão preocupada.
— O que houve? — perguntou receosa.
— Valery está começando a desconfiar que não existe nada
entre nós. Se ela pensa isso, tenho certeza que os outros
funcionários também estão comentando.
Jenny suspirou e se recostou na cadeira. Ela ficou pensativa
por um instante.
— Talvez esteja na hora de dizer que terminamos — sugeriu.
Um nó se formou em minha garganta e eu neguei com a
cabeça, deixando claro que eu descartava aquela ideia.
— Faz pouco tempo que a mídia deixou de nos perseguir. Se
anunciarmos um término agora, voltaremos a ser o foco das
manchetes — tentei convencê-la a mudar seus pensamentos. —
Precisamos manter essa relação por mais algum tempo.
Engoli em seco e estudei a sua reação. Eu me sentia
extremamente nervoso com aquela conversa.
— O que faremos, então? — ela suspirou, se dando por
vencida.
Naquele instante, a maçaneta da minha porta girou e eu
aproximei o meu rosto de Jenny rapidamente.
— Me beija — sussurrei, antes que pudesse me arrepender.
— O-o quê? — Jenny arregalou os olhos.
— Valery está vindo. Precisamos fazê-la pensar que temos
um relacionamento.
Jenny ficou um pouco nervosa, mas concordou em silêncio e
se inclinou para frente. Quando seu nariz tocou o meu, ela fechou
os olhos e aguardou. É a minha vez de agir. Um sorriso vacilante
curvou a minha boca. Saber o que viria a seguir me deixou ansioso
e levemente excitado.
No instante em que a porta se abriu, envolvi o rosto de Jenny
com as mãos e a beijei. Um arrepio percorreu todo o meu corpo
quando ela suspirou contra a minha boca e eu a encorajei a abrir os
lábios para que a minha língua pudesse passar. Precisamos ser
convincentes.
Para a minha surpresa, Jenny não se opôs à minha
aproximação e abriu sua boca para mim. Quando nossas línguasse
encontraram, puxei o rosto dela para mais perto e amaldiçoei que
houvesse uma mesa entre nós. Se não fosse aquele móvel estúpido
eu a teria em meus braços e poderia sentir o seu corpo colado ao
meu.
Ela deixou um gemido escapar quando a minha língua se
moveu com mais pressão e aquele pequeno som foi o suficiente
para fazer o meu pau endurecer. Agora eu estava acabado. Ouso
afirmar que, dentre todas as mulheres com quem fiquei, Jenny
possui o melhor beijo. O jeito que ela move a língua, seus suspiros
de prazer, o modo com que ela puxa a minha gravata para me
manter por perto... Porra, tudo isso está me enlouquecendo!
Eu estava cada vez mais próximo de perder o controle e tinha
certeza que Jenny também se sentia da mesma forma. Estava claro
que ela tinha sentimentos por mim desde muito antes de fingirmos
esse namoro e a única razão para ela ter me afastado foi porque
ficou preocupada com a privacidade da filha. Não posso culpá-la,
mas também não quero que ela se afaste de mim outra vez.
— Eca! — reclamou Valery, de uma forma escandalosa.
Rapidamente, Jenny cessou o beijo e afastou seu rosto para
trás. Uma sensação de vazio surgiu em meu peito.
Lancei um olhar irritado para Valery e não fiquei surpreso ao
notar que ela estava descontente com a cena que viu.
Minha irmã não falou mais nada. Ela apenas bufou com
irritação e caminhou em direção ao elevador. Meu plano funcionou.
Seria impossívelValery achar que Jenny e eu não estávamos juntos
depois dessa cena.
Olhei para Jenny e percebi que ela estava de cabeça baixa
na mesa.
— Está tudo bem? — perguntei, torcendo para que ela
dissesse alguma coisa.
Depois de alguns segundos em silêncio, Jenny ergueu seu
olhar até mim e assentiu. Seu rosto estava tão vermelho quanto um
tomate.
— Estou apenas tentando recuperar o fôlego — confessou
em voz baixa.
— Foi um beijo e tanto...
Ela apenas sorriu e desviou seu olhar para longe.
Não tive coragem de deixar o assunto morrer, então decidi
provocá-la um pouco mais.
— Você beija bem, Jenny — elogiei, sem disfarçar a
admiração.
— Você também — deixou escapar, e logo tapou a boca com
uma das mãos.
Dei risada, mas fiquei em silêncio quando Jenny começou a
guardar algumas coisas dentro da sua bolsa preta.
— O que está fazendo?
— Meu expediente chegou ao fim cinco minutos atrás — se
explicou. — Estou indo para casa.
Sem saber como reagir, fiquei parado a observando colocar a
bolsa no ombro e se levantar da cadeira.
— Tenha um ótimo final de semana, Bruce. — Jenny
começou a se afastar da mesa.
Segurei o seu pulso, impedindo que ela fosse em direção ao
elevador.
— Espere um minuto — pedi. — Também estou indo embora.
Vou pegar as chaves do carro e descemos juntos.
Jenny relutou por um tempo, mas acabou concordando.
— Tudo bem, eu espero aqui — falou com a voz tímida.
Soltei o seu pulso e caminhei apressadamente até a minha
sala para pegar a chaves. Depois desse beijo, eu não permitirei que
Jenny se afaste de mim outra vez.
CAPÍTULO 23

Meu coração estava acelerado e minhas pernas tremiam feito


gelatina enquanto eu esperava por Bruce no corredor. Não sei
quantos minutos se passaram desde o nosso beijo, mas eu ainda
estava abalada com o acontecimento.
Se a intenção era apenas fingir, poderíamoster encenado um
beijo falso como fazem nos filmes, mas quando senti nossas bocas
se encontrarem confesso que eu perdi o controle. Assim como
Bruce, eu abandonei todas as minhas ressalvas e aproveitei o
momento, pois eu senti que aquele não era um beijo vazio. Havia
desejo, luxúria e, arrisco dizer, paixão.
— Podemos ir — Bruce me chamou enquanto fechava a
porta da sua sala e saía para o corredor. Notei que ele trazia o seu
paletó em uma das mãos e o nó da sua gravata havia sido
afrouxado.
Ao perceber que eu estava o encarando, Bruce sorriu para
mim e gesticulou que eu o seguisse. Caminhei atrás dele em
silêncio e deixei que ele apertasse o botão para chamar o elevador.
Quando a caixa de metal chegou ao andar entrei nela com as
pernas trêmulas e logo me recostei na parede metálica que ficava
ao lado dos botões.
Bruce apertou o botão da garagem e as portas se fecharam
quase instantaneamente. Franzi o cenho e apertei o botão que
parava o elevador.
— Eu vou embora de ônibus — protestei. — O que eu falei
sobre sermos vistos juntos?
— Os repórteres deixaram de nos perseguir — ele refutou. —
Vou te levar em casa hoje e não quero ouvir protestos.
Sem esperar pela minha resposta Bruce apertou novamente
o botão da garagem e o elevador voltou a se mover. Me dando por
vencida, suspirei e encarei o homem com um olhar zangado. Ele
apenas cruzou os braços e me lançou um sorriso vitorioso.
— Alguém já disse que você fica fofa quando está com raiva?
— me provocou. — Se pretendia me assustar com esse olhar, não
funcionou.
Bufei em resposta. Eu estava prestes a iniciar uma discussão
quando a luz do elevador se apagou e um solavanco me fez perder
o equilíbrio e cair no chão.
— Bruce! — eu gritei em desespero, o elevador havia parado
de se mover.
— Jenny? Você está bem? — ele perguntou em um tom
preocupado. Sua voz vinha da minha esquerda, mas quando olhei
na direção não consegui enxergar nada. O lugar estava
completamente escuro.
— O-o que aconteceu? — gaguejei, tentando segurar o
choro.
O pensamento de que eu estava presa em uma caixa de
metal no último andar de um dos prédios mais altos de Manhattan
me fez entrar em pânico. E se o elevador cair? Estremeci com o
pensamento. Despencar 50 andares até o chão seria uma forma
terrível de morrer.
— Jenny... Você caiu? — A mão de Bruce tocou a minha
cabeça e eu não hesitei em segurá-la.
Aproveitando o apoio que aquele braço forte me oferecia,
fiquei de pé e tateei o que estava na minha frente. Não fiquei
surpresa ao sentir um peitoral firme e definido sob o tecido da
camisa de botões que Bruce vestia.
Distraída com a sensação calmante que aquele corpo
emanava, explorei um pouco mais a região até que senti a sua
gravata, por onde meus dedos subiram até chegarem em seu
pescoço. Hesitei por alguns segundos, mas decidi apoiar a minha
mão em sua nuca. Afinal de contas, eu preciso de um local para me
equilibrar caso o elevador volte a se mover de repente.
— Está tudo bem, Jenny? — A voz de Bruce soou um tanto
vacilante. — Você sente alguma dor?
— Eu estou com medo — admiti. — Por que o elevador
parou? Nós... nós vamos morrer?
Ouvi sua risada baixa próxima ao meu ouvido.
— Fique calma. Nós não vamos morrer, Jenny. — Sua mão
afagou as minhas costas, na tentativa de me tranquilizar.
Em um ato involuntário, me aconcheguei ao corpo de Bruce e
repousei minha cabeça em seu peito. Pude sentir o seu coração
batendo de forma acelerada e tive dúvidas se ele estava daquele
jeito porque ficamos presos ou se o motivo era a minha proximidade
— eu estava abraçada ao homem como se a minha vida
dependesse daquilo.
— Parece que foi apenas uma falha elétrica — explicou, em
um tom contido. — Se acalme, eu vou ligar para a companhia de
energia.
A tela do seu celular acendeu e eu fui capaz de ver o rosto de
Bruce enquanto ele mexia no aparelho. A luz não iluminava muita
coisa, mas era possível enxergar o quão próximos estávamos um do
outro. Estranhamente, não me senti envergonhada e me aninhei
ainda mais ao corpo do homem.
Acho que agora tudo ficará bem. Bruce vai ligar para a
companhia de energia e conseguiremos sair do elevador sem
nenhum problema.
— Jenny? — Ele me encarou com o cenho franzido. —
Temos um problema...
— Qual?
— Não tem sinal de telefone aqui.
O quê?! O pânico tomou conta de mim.
— Precisamos pedir ajuda! — Afastei-me de Bruce e comecei
a vasculhar a minha bolsa, sem me dar ao trabalho de tirá-la do meu
ombro.
— O que está procurando?
— Meu telefone — respondi. — Talvez ele tenha sinal...
— Boa sorte. — O homem ligou a lanterna do celular e eu
agradeci mentalmente por aquilo. Embora a luz fosse fraca, agora
era possível enxergar todo o elevador.
Depois de alguns segundos vasculhando a minha bolsa,
finalmente encontrei o meu telefone. Desbloqueei a tela de maneira
apressada, mas fui tomada pelo desespero quando vi que ele
também estava sem sinal.
Completamente desapontada, me recostei na parede do
elevador e notei Bruce me encarando da parede oposta. Ele colocou
o celular no chão para iluminar o ambiente e se aproximou de mim.
— Deixa eu adivinhar: também está sem sinal — constatou
por conta própria ao se posicionar na minha frente.
Assenti, com uma expressão preocupada no rosto.
— Fique calma, quando a energia for restaurada poderemos
sair daqui. — Bruce repousou a mão em meu ombro e me acariciou.
Naquele momento, uma ideia surgiu em minha mente e,
embora fosse estúpida, senti que eu devia compartilhá-la —
qualquer tentativa de sair daqui seria válida.
— E se abríssemos aquela tampa? — Apontei para a saída
de ar que ficava no teto do elevador. — Podemos sair por ali e
encontrar um caminho até as escadas... eu vi isso uma vez, em um
filme.
Bruce me encarou com um olhar irônico.
— Não estamos em um filme de ação, Jenny. — Ele riu. — E
eu também não acho que seja uma boa ideia sair com você pelo
túnel do elevador considerando que estamos a mais de 150 metros
do chão. Você tem medo de altura, esqueceu?
Suspirei e concordei com a cabeça. Foi uma ideia idiota, mas
pelo menos eu tentei ajudar.
— Quanto tempo acha que levará para consertarem a rede
elétrica? — perguntei, aflita.
Eu queria sair daquela caixa de metal o mais rápido possível,
principalmente depois de Bruce me lembrar que estávamos
pendurados há mais de cem metros do chão.
— Talvez leve alguns minutos ou... algumas horas. Não tenho
certeza. — Ele deu de ombros e colocou uma mecha da minha
franja atrás da orelha.
Olhei para o meu reflexo no espelho da parede central do
elevador e fiquei envergonhada ao ver que o meu cabelo estava
completamente despenteado. Da próxima vez, venho com ele preso.
E, a partir de hoje, só usarei as escadas, mesmo que precise subir
50 andares! Qualquer coisa para não ficar presa dentro de um
elevador que está pendurado a mais de cem metros de altura.
Enquanto eu refletia, meu coração palpitou e eu comecei a ter
dificuldade para respirar.
— Acho... acho que estou começando a entrar em pânico
outra vez... — balbuciei, aflita. Meu olhar encontrou o de Bruce e eu
solucei, já podia sentir as lágrimas descendo pela minha bochecha.
— Ei, não chore. — Ele enxugou o meu rosto com os
polegares e me direcionou um olhar tranquilizador. — Ficaremos
aqui por pouco tempo e você não está sozinha. Não entre em
pânico, ok?
— Não sei se consigo — admiti, com a voz trêmula. — Não
há nada que eu possa fazer que me distraia a ponto de eu esquecer
onde estou.
Após pensar por alguns segundos, Bruce envolveu o meu
rosto com as mãos e acariciou minhas bochechas. Um sorriso
malicioso curvou a sua boca e ele me olhou nos olhos.
— Acho que eu tive uma ideia, docinho — sussurrou, e,
então, me beijou.
Suas mãos seguraram a minha cintura com firmeza e eu
deixei um gemido escapar quando Bruce me empurrou contra a
parede metálica do elevador. Sua língua macia separou os meus
lábios e seguiu caminho até o interior da minha boca.
Sem pensar duas vezes retribuío beijo de uma forma intensa
e necessitada. O gosto de Bruce era único, me provocava uma
sensação doce e completamente erótica toda vez que eu o sentia. A
chama que se acendeu dentro de mim afastou qualquer
pensamento de medo que eu pudesse sentir e eu até me esqueci de
onde estava, tudo que eu queria fazer era beijar aquele homem até
que nós dois ficássemos sem fôlego.
Meu cérebro alertava para que eu me afastasse de Bruce,
mas o meu coração almejava que eu permanecesse ali, em seus
braços, aproveitando cada toque e caríciaque me seria oferecido. E
foi exatamente o que eu fiz. Me agarrei com força ao homem e
deixei que ele me beijasse o quanto quisesse.
Suas mãos percorriam o meu quadril e cintura, mas eu
estava ciente que Bruce queria explorar outras áreas do meu corpo.
Decidida a encorajar que ele fosse em frente, aproveitei uma
brecha durante o beijo e mordi o seu lábio da maneira mais
provocante que consegui. Bruce gemeu e pressionou a virilha contra
o meu quadril. Perdi o fôlego quando senti o volume duro da sua
ereção.
Bruce afastou seu rosto para retomar o fôlego e aproveitou o
momento para me encarar. Seu dedo indicador traçou o contorno
dos meus lábios inchados e eu sorri maliciosamente. Ele passou um
tempo acariciando a minha boca, seus olhos azuis exibiam um brilho
intenso e cheio de desejo.
Fiquei em um estado de êxtase enquanto observava o
homem que estava diante de mim. A nossa proximidade me deixou
dopada, eu não conseguia pensar com coerência alguma enquanto
Bruce acariciava a minha boca de um jeito completamente erótico.
A essa altura, a minha calcinha já estava inundada e quando
o seu dedo indicador roçou a abertura entre os meus lábios eu abri
a boca e lambi a ponta dele. Bruce suspirou e pressionou o corpo
contra o meu com mais força, seu membro roçou em meu quadril e
a minha intimidade pulsou em resposta.
— Se soubesse o que eu quero fazer com você neste
momento. — Ele empurrou seu dedo para o interior da minha boca,
o deslizando suavemente contra a minha língua.
A provocação de Bruce fez o meu ventre se apertar. Seja lá o
que ele estiver pensando, eu quero que coloque em prática.
— Só vou saber se me mostrar. — O desafiei com um olhar
atrevido e chupei brevemente o seu dedo antes que ele o retirasse
da minha boca.
— Já que insiste...
Ele afastou suas mãos de mim e desafivelou seu cinto de
maneira apressada. Em poucos segundos eu ouvi o acessório de
couro cair no chão. Bruce fez contato visual comigo quando deslizou
o zíper da sua calça para baixo e o meu coração palpitou. Foi
impossível não imaginar inúmeras possibilidades para o que ele
tinha em mente. Será que vamos transar nesse elevador? Um
estado de euforia tomou conta de mim quando pensei naquilo e
desejei desesperadamente que eu estivesse certa.
Bruce sorriu com malícia e se inclinou para beijar o meu
pescoço. Sua boca espalhou uma trilha de beijos até a minha orelha
e eu suspirei com o arrepio gostoso que se espalhou pela região.
— Fique de joelhos, docinho — sussurrou, ao pé do meu
ouvido.
Bruce mordiscou o meu pescoço e então se afastou para
olhar em meus olhos.
Fiquei surpresa com o pedido e o encarei para ter certeza
que ele estava falando sério. Não consegui enxergar nada além de
luxúria e um profundo desejo em seu olhar.
Sem que eu me desse conta, minhas pernas obedeceram ao
comando dele e eu me ajoelhei, ficando entre Bruce e a parede
metálica do elevador. Sua virilha estava na altura exata do meu
campo de visão e, apesar da luz fraca da lanterna do celular, eu
pude enxergar perfeitamente o volume do seu pau sob o tecido da
calça preta.
— Você chupou o meu dedo, Jenny — Bruce colocou a mão
direita no interior da sua calça — agora, quero que chupe outra
coisa...
Sem hesitar, ele puxou seu membro para fora e eu arquejei
quando entendi o que queria que eu fizesse. Senti um frio na barriga
e minha intimidade pulsou com desejo, ignorando completamente a
voz da razão.
Tomando coragem, segurei o músculo rígido que estava
diante de mim e ofeguei excitada. Ele era grande, firme e
deliciosamente quente. Do jeito que eu me lembrava. Comecei a
acariciá-lo timidamente e ouvi Bruce suspirar cada vez que a minha
mão subia e descia ao longo da sua base. Ele quer que eu o chupe.
Lembrei a mim mesma.
Decidida a realizar o desejo do meu chefe, inclinei o meu
rosto até que estivesse perto o suficiente e deixei que a minha
língua tocasse a cabeça do seu pau. Bruce gemeu e apoiou as
mãos na parede atrás de mim.
Ele inclinou o quadril para frente, deixando claro que havia
mais do seu corpo para ser explorado. Entendendo o que Bruce
queria abocanhei seu pau com vontade, colocando em minha boca
o máximo que eu pude. No instante em que ele tocou a minha
garganta, recuei um pouco e comecei a chupá-lo, permitindo que a
minha língua explorasse cada centímetro que estava ao meu
alcance.
Passei os próximos minutos chupando e lambendo o membro
de Bruce como se fosse o doce mais delicioso que eu já provei. Em
um certo ponto, ele apoiou as mãos ao redor da minha cabeça e
passou a guiar os movimentos, me levando para frente e para trás
como bem entendesse.
Suas investidas estavam lentas, mas à medida que o tempo
passou, ficaram fortes e desesperadas. Comecei a perder o
equilíbrio e precisei me apoiar na parede para não cair. O meu
cérebro ficou entorpecido pelo momento e as minhas partes íntimas
doíam com o desejo não atendido. Eu preciso sentir esse homem
dentro de mim o mais rápido possível.
Bruce empurrou o quadril ao meu encontro tantas vezes que
eu mal pude contar. Comecei a me perguntar se aquele homem não
gozaria nunca, até que o primeiro jato quente atingiu a minha
garganta. Logo em seguida, veio outro... e mais outro. Bruce ofegou
e parou de se mover, as mãos que seguravam a minha cabeça
suavizaram o aperto e ele finalmente saiu da minha boca.
Aproveitando o momento de descanso, me sentei no chão e
fiz o possível para retomar o fôlego enquanto engolia o restante de
sêmen que estava na minha língua. Bruce acariciou a minha
bochecha de um jeito terno e eu ergui meu olhar até ele. Ver aquele
homem parado diante de mim com o membro ainda rígido,para fora
da calça, me fez soltar um pequeno gemido de necessidade.
— Por favor, me diga que ainda não acabamos — falei,
ofegante.
Bruce sorriu com malícia e me ajudou a ficar de pé.
— Isso é apenas o começo, docinho — murmurou e afundou
o rosto em meu pescoço. Gemi quando a sua língua deslizou em
minha pele eu empurrei o meu corpo para mais perto dele.
Suas mãos apressadas desabotoaram a blusa que eu usava
e em poucos segundos ela estava aberta, deixando à mostra o meu
sutiã preto de renda. Bruce afastou o rosto da minha pele e quando
ergui o olhar na sua direção percebi que ele me observava com
fascínio. Minhas bochechas coraram com a atenção que eu estava
recebendo — fazia muito tempo que um homem não me olhava
daquele jeito.
Sem dizer nenhuma palavra, ele abriu o fecho frontal do meu
sutiã e em um piscar de olhos os meus seios ficaram expostos.
Respirei fundo, tentando conter a ansiedade que eu sentia naquele
momento. Estou prestes a ficar completamente nua na frente do
meu chefe. Sinceramente, eu não devia estar tão nervosa assim
considerando que eu acabei de fazer um boquete nele.
— Você é linda, Jenny. — Ele enterrou o rosto entre os meus
seios e lambeu cada centímetro de pele que havia ali. Soltei um
gemido quando a sua boca envolveu o meu mamilo esquerdo, a
língua de Bruce brincou com ele enquanto a sua mão massageava o
meu seio direito.
Não consegui fazer nada além de me contorcer e deixar
gemidos irregulares escaparem. O homem parecia extremamente
satisfeito com a minha reação. Cada vez que eu demonstrava estar
sentindo prazer ele sorria contra a minha pele e me provocava ainda
mais. Minha boceta doía de excitação e, sem que eu me desse
conta, comecei a me esfregar em uma das suas pernas. Bruce
notou a minha iniciativa e usou sua mão livre para dobrar a saia que
eu usava até que ela ficasse presa à minha cintura.
Quando ele finalmente afastou o rosto dos meus seios, olhei
para baixo e o meu coração acelerou ao ver que a minha calcinha
vermelha estava exposta. Bruce se ajoelhou na minha frente,
segurou em ambos os lados da minha peça íntima e a puxou para
baixo até que chegasse ao chão. Chutei o tecido para o lado quando
ele caiu aos meus pés e só então me dei conta de que ainda usava
o meu scarpin de veludo preto.
Eu estava prestes a tirar meus sapatos quando Bruce afastou
as minhas pernas e lambeu exatamente onde o meu clitóris estava.
O gemido que me escapou foi tão alto que qualquer pessoa que
ainda estivesse naquele prédio saberia que estávamos dentro do
elevador. Satisfeito com a minha reação, ele começou a me
provocar com a boca, lambendo e sugando o meu ponto sensível
sem fazer uma única pausa.
A cada segundo que passava estava mais difícil permanecer
de pé, então eu apoiei as mãos no ombro de Bruce para não perder
o equilíbrio. Ele passou um braço ao redor do meu quadril para
impedir que eu me afastasse e manteve o rosto enterrado entre as
minhas pernas. Um dos seus dedos tocou a minha entrada e eu
senti quando Bruce abriu um sorriso. Repentinamente, ele deixou de
me lamber e ficou de pé.
Colocando as mãos na minha cintura, Bruce me virou,
fazendo com que eu ficasse de costas para ele e com os seios
colados na parede do elevador. Pude sentir a sua respiração quente
em minha pele quando ele se aproximou e mordiscou o lóbulo da
minha orelha. Um arrepio gostoso se espalhou por todo o meu
corpo.
— Quero fazer isso com você há tanto tempo — sussurrou,
próximo ao meu ouvido. — Sinto tanta necessidade que até dói... —
Enquanto falava, Bruce encaixou seu membro na minha entrada e
eu suspirei.
— O que está esperando? — o encorajei a prosseguir.
Quando inclinei meu quadril para trás Bruce o segurou com
firmeza e se enterrou em mim com um único movimento. Ofeguei e
me apertei ao redor do seu pau, o que arrancou um gemido rouco
do homem.
Ele começou a se mover em estocadas firmes que me
pressionavam cada vez mais contra a parede metálica, onde eu
estava apoiada. Minhas pernas já não me sustentavam de pé e eu
precisei me segurar na barra de apoio que havia na minha frente
para não perder o equilíbrio.
Depois de um tempo, suas mãos deixaram o meu quadril e
agarraram os meus seios com força. Eu gemi e ele aumentou a
velocidade das investidas, fazendo com que nossos corpos se
movessem no mesmo ritmo intenso.
Bruce ofegava de um jeito excitante cada vez que empurrava
o seu pau ao meu encontro. Os únicos sons que saíam da minha
boca eram gemidos histéricos e descompassados. Sentir aquele
homem deslizando em meu interior e atingindo o ponto mais
profundo do meu corpo, enquanto seus dedos provocavam os meus
mamilos, estava me levando à loucura.
— Jenny, você é a mulher mais gostosa que eu já comi —
rosnou, ao pé do meu ouvido.
Não pude deixar de sorrir ao lembrar que Bruce disse a
mesma coisa quando transamos pela primeira vez, seis anos atrás.
Involuntariamente, comecei a me questionar se ele não dizia isso
para todas as mulheres com quem ficava. Um terrível desconforto
atingiu o meu peito, mas logo foi dispersado quando senti o pau de
Bruce tocar o fundo do meu canal. Eu gritei e ele chupou o meu
pescoço com força o suficiente para deixar uma marca no local.
Minha pele estava suada, fios de cabelo estavam grudados
no meu rosto e o meu coração estava tão acelerado que quase fazia
o meu peito vibrar. Bruce continuou movendo o seu quadril
avidamente até que cheguei ao fim. Eu gritei e estremeci enquanto
deixava um orgasmo intenso me consumir. Quando Bruce também
atingiu a sua libertação, ele ofegou e apertou os meus seios outra
vez. Seu corpo inteiro ficou tenso e eu logo senti o calor do seu
gozo se espalhar em meu interior.
Não saímos de nossa posição, mas ficamos em silêncio por
um longo tempo enquanto recuperávamos o fôlego e eu tentava
encontrar um pouco de lucidez. Quando nossas respirações
finalmente voltaram ao normal, Bruce falou:
— Não consigo acreditar que realmente fizemos isso — sua
voz estava cansada, mas carregava um tom de diversão.
— Foi bom — admiti, enquanto sorria.
— Bom? Isso é tudo?
— Esperava que eu fizesse uma lista de elogios? — brinquei.
— Jenny, você gritou feito uma louca. Pensei que teria mais
coisas para dizer.
Reprimi uma risada e suspirei. Eu estava completamente
abalada pelo que acabamos de fazer e, para ser sincera, muitas
coisas que eu sentia naquele momento não podiam ser ditas em voz
alta. Como o meu chefe reagiria se eu dissesse que estou
apaixonada por ele? Não posso arriscar esse momento falandoalgo
sem pensar.
Enquanto eu estava perdida em pensamentos, Bruce soltou
os meus seios e se afastou lentamente. Apenas quando senti o seu
membro deslizar para fora do meu corpo foi que me dei conta de
que não usamos nenhum tipo de proteção. Merda! De novo não!
CAPÍTULO 24

— Bruce! — gritei, me virando para encará-lo.


Ele guardou seu membro na calça e me encarou assustado
com a minha repentina mudança de comportamento.
— O que houve? — indagou, enquanto o seu olhar passeava
pelas partes do meu corpo que estavam à mostra.
Agora que o prazer passou, me senti um pouco
envergonhada por estar praticamente nua diante do meu chefe,
então comecei a ajeitar as minhas roupas. Deslizei minha saia até
que ela voltasse para o seu comprimento original, guardei os meus
seios dentro do sutiã e comecei a abotoar minha blusa.
Bruce me encarava com o cenho franzido e parecia
decepcionado por eu estar cobrindo o que ele estava admirando.
— Nós transamos sem proteção... — comecei, minhas mãos
trêmulas e suadas tentavam abotoar a minha blusa. — Eu não estou
tomando nenhuma pílula e você... bom, você gozou dentro de mim.
— E daí? — Um pequeno sorriso curvou a sua boca.
Suspirei aborrecida. Ele está brincando comigo, não está?
— Você não estudou biologia? — me exaltei. — O que
acontece quando um homem ejacula dentro de uma mulher?
Bruce deixou uma risada escapar e se recostou na parede ao
lado. Ele parecia extremamente calmo e eu não conseguia entender
o porquê.
— Para alguém que me disse que não queria ter filhos, você
está tranquilo demais. — A tensão do momento começava a me
dominar. Não quero imaginar a dor de cabeça que eu vou ter se
engravidar desse homem pela segunda vez!
— Não entre em pânico, Jenny. Eu fiz vasectomia há quatro
anos, não posso ter filhos.
— Ah... — esse foi o único som que saiu da minha boca.
Fiquei sem palavras enquanto o meu cérebro tentava
processar o que acabei de descobrir. Parece que Bruce realmente
não quer crianças em sua vida.
— É sério, você não tem com o que se preocupar — Bruce
reforçou, percebendo que eu ainda estava tensa. — Faço exames
regularmente, está tudo em ordem com a minha saúde e também
não existe nenhum risco da minha cirurgia se reverter.
Eu suspirei e esfreguei minhas têmporas. Não sabia o que
responder, estava atordoada demais com aquela revelação. Para
tentar disfarçar, peguei a bolsa que deixei cair quando Bruce
começou a me beijar e a coloquei no ombro. O encarei pelo canto
do olho e percebi que ele também aproveitou o momento para catar
as suas coisas que estavam jogadas no chão. Bruce pegou o cinto,
seu paletó e, por último, o celular que estava nos fornecendo luz.
— São 20h30 — comentou, ao ligar a tela do smartphone.
Eu apenas assenti e me recostei na mesma parede que usei
como apoio durante o momento íntimo que tive com o meu chefe.
Saber que Bruce fez vasectomia não me deixou chateada,
afinal, o corpo era dele. Não estávamos juntos na época e eu não
tinha direito algum de opinar em nada, mas eu me sentia
extremamente confusa com aquela informação. Se ele fez essa
cirurgia foi porque tinha certeza de que não queria ter filhos de
maneira alguma. Me pergunto como o homem se sentirá quando
descobrir sobre a Lorie...
Passei os próximos minutos me martirizando em
pensamentos e agradeci mentalmente por Bruce ter se mantido em
silêncio. Talvez, ele ainda estivesse processando o que aconteceu
entre nós. Eu não podia me esquecer que, para ele, essa foi a
primeira vez que transamos.
Mesmo com Bruce me garantindo que não havia nenhum
risco de eu engravidar, decidi que iria tomar uma pílula do dia
seguinte apenas por precaução. Já estava sendo difícil ter coragem
de contar ao Bruce que ele era pai de uma criança, imagine se eu
tivesse que dizer que ele seria pai de duas crianças. Além disso, eu
também estava mais do que satisfeita apenas com a Lorie. Não sei
se eu queria passar novamente pela responsabilidade de ter um
recém-nascido sob os meus cuidados.
Repentinamente, as luzes do elevador se acenderam e eu
me desequilibrei quando a estrutura de metal voltou a se mover.
Olhei para Bruce e dei um gritinho de felicidade ao perceber
que a energia foi restaurada. O homem sorriu e me deu uma boa
olhada de cima a baixo. Notei que o seu cabelo estava bagunçado,
sua blusa branca de botões estava amarrotada e algumas gotas de
suor ainda escorriam por suas têmporas.
Com um pouco de dificuldade desviei meu olhar para longe
de Bruce e encarei o espelho do elevador. Levei um susto quando vi
o meu reflexo. A minha roupa estava tão amassada que parecia ter
sido mastigada por um boi e eu preferia não comentar sobre o meu
cabelo. Como vou explicar isso para a Brittany quando eu chegar
em casa?
— Até que enfim estamos na garagem — Bruce comentou
com ironia, quando as portas se abriram no subsolo da empresa.
Segurei a alça da minha bolsa e comecei a me perguntar se
eu realmente deveria sair daquele elevador. Não seria melhor pegar
um ônibus e ir para casa sozinha? Minha cabeça estava
completamente tumultuada e eu não tinha certeza se conseguiria
passar a próxima meia hora dentro de um carro com Bruce depois
do que aconteceu entre nós. Inevitavelmente, comecei a me
perguntar como ficaríamos agora, se esse namoro de mentira se
tornaria verdadeiro ou se o sexo no elevador não significou nada.
— Venha, Jenny. — Bruce segurou a minha mão ao perceber
que eu estava hesitante e caminhou comigo para fora do elevador.
— Eu não mudei de ideia sobre levar você para casa.
Não abri a boca para falar uma palavra sequer durante toda a
viagem até o Bronx. Fiquei calada, como uma múmia, e Bruce até
ligou o rádio em um rock dos anos 80 para se distrair enquanto
dirigia. Quando ele estacionou em frente ao meu prédio desci do
veículo imediatamente sem ter coragem de encarar o meu chefe nos
olhos.
Fechei a porta do carro com delicadeza — apesar do
nervosismo que eu sentia — e caminhei em passos largos pela
calçada em direção ao prédio onde eu morava. Eu estava prestes a
girar a maçaneta da porta para entrar quando ouvi um assovio.
Olhei para trás e vi Bruce se aproximando de mim. Engoli em seco e
tentei manter a calma.
— O que aconteceu, Jenny? — indagou com um olhar
confuso. — Você está estranha...
— Não devíamos ter feito aquilo — respondi com aflição.
— Por quê? O que te fez pensar assim? — ele tentou
entender.
— Você é o meu chefe...
— Bom, eu também não devia transar com a minha
secretária, mas aconteceu — disparou. — Não podemos mudar
isso.
Fechei meus olhos e apoiei as costas na parede de alvenaria
do prédio. Bruce tinha razão, não podíamos mudar o que já
aconteceu. Acho que agora eu tinha que me preocupar com o que
poderia acontecer daqui para frente.
— Eu... eu vou ser demitida?
— Demitida? Por que transou comigo? — Bruce franziu o
cenho e negou imediatamente. — Não se preocupe. Nada vai mudar
entre nós. — Sua mão calorosa afagou meu ombro de um jeito
reconfortante e eu me senti estranhamente mais aliviada.
Enquanto eu tentava me acalmar em silêncio, Bruce abriu a
maçaneta da porta e me guiou para dentro do prédio. Não consegui
impedi-lo de me seguir até o meu apartamento. Quando dei por
mim, Brittany já tinha atendido a porta e agora olhava com espanto
para nós dois.
— Onde você estava?! — Minha amiga me encarou de cima
a baixo com a preocupação estampada no olhar. — Sabia que esse
foi o maior apagão dos últimos anos? Ficamos sem energia por 2
horas! 2 horas, Jenny! Estava começando a achar que você tinha...
— Brittany se conteve e virou o rosto na direção de Lorie, que
estava sentada no sofá assistindo desenhos na TV.
— Houve um contratempo — Bruce interveio, enquanto me
lançava um olhar malicioso.
— Ah... é... um contratempo. — Dei um sorriso amarelo na
direção da minha amiga.
Brittany apenas revirou os olhos e abriu espaço para que eu
entrasse no apartamento.
Quando atravessei a porta recebi um tapa na bunda. Arquejei
e virei o rosto na direção de Bruce. Não acredito nisso!
— Foi ela. — O homem apontou para a minha amiga ao
perceber meu olhar acusador.
Respirei aliviada.
— É claro que fui eu... quem mais poderia ser? — Brittany se
entregou. — Afinal, por qual motivo o seu chefe te daria um tapa na
bunda, Jenny?
Encolhi os ombros e minhas bochechas coraram. Bruce
reprimiu uma risada e acenou na minha direção.
— Eu preciso ir — se despediu, com a voz divertida. — Vejo
você na segunda, Jenny.
— A-até — gaguejei, enquanto acenava para o homem.
Quando Bruce desapareceu no corredor, Brittany fechou a
porta e me encarou de um jeito estranho.
Embora fosse difícil, fiz o possível para agir normalmente.
Pendurei minha bolsa no cabideiro ao lado da porta e fui até o sofá
para cumprimentar Lorie com um beijo. Quando a menininha
percebeu a minha presença ela sorriu e me abraçou sem se
importar com a minha aparência desleixada.
Passei a próxima meia hora assistindo desenhos com Lorie,
até que ela pegou no sono. Fiquei aliviada por Brittany ter me dado
espaço e não ter feito nenhuma pergunta sobre o meu visual
bagunçado.
Sempre que eu pensava no que fiz com o meu chefe eu me
sentia totalmente apreensiva, não sabia o que esperar daqui para
frente. Bruce me garantiu que nada mudaria entre nós e essa parte
estava começando a me angustiar. Será que ele quis dizer que a
nossa transa no elevador não significou nada?
Enquanto eu estava perdida em pensamentos Brittany se
aproximou do sofá dizendo que me ajudaria a colocar Lorie na
cama. Concordei imediatamente e peguei a garotinha nos braços,
com a ajuda da minha amiga. Lorie estava ficando pesada e eu já
não conseguia levantá-la sem ter uma segunda pessoa para me
auxiliar, caso eu perdesse o equilíbrio. Por um instante, desejei que
Bruce estivesse aqui para carregá-la. Ele é forte e consegue segurar
a filha no colo sem qualquer dificuldade. Pensar nele fez o meu
coração se apertar.
Coloquei Lorie na cama e a cobri com o cobertor. Quando me
virei para sair do quarto, dei de cara com Brittany parada no batente
da porta. Ela me encarava com uma sobrancelha arqueada e um
olhar malicioso.
— O que foi? — perguntei, fazendo o possível para
permanecer calma.
Minha amiga apenas deu de ombros e seus olhos me
analisaram de cima a baixo.
— Bom, já que não tem nada a dizer então eu vou tomar
banho. — Corri para o banheiro na primeira oportunidade que tive.
Não me dei ao trabalho de olhar para trás e conferir se Brittany me
seguia, eu apenas queria ficar sozinha para pensar.
Engolindo o choro, que ameaçava cair, encostei a porta e
coloquei a banheira para encher. Fui até a pia, lavei meu rosto com
água gelada e comecei a me despir. Ao retirar minha saia, quase
tive um treco quando percebi que uma peça de roupa íntima estava
faltando.
— Onde está a minha calcinha? — deixei escapar, com um
profundo desespero. — Porra, será que a esqueci no elevador?
Passei as mãos pelo cabelo e entrei na banheira. Só posso
torcer para que ninguém a encontre.
— Por que você acha que esqueceu a calcinha em um
elevador? — Brittany se enfiou dentro do banheiro na velocidade de
um raio. — Isso tem a ver com você ter chegado em casa toda
descabelada? Que merda aconteceu com você durante o apagão?
Senti a aflição tomar conta do meu corpo. Não havia para
onde fugir. Por mais que eu não quisesse recordar do meu momento
íntimo com Bruce, eu precisava contar a verdade para a minha
amiga. Talvez, ela possa me ajudar a entender melhor como eu me
sinto...
Dando-me por vencida, recostei na banheira e afundei o meu
corpo na espuma deixando apenas o meu rosto à mostra.
— Quando as luzes se apagaram, Bruce e eu estávamos no
elevador da empresa — comecei, já me sentindo envergonhada. —
Ficamos presos lá dentro.
— Jenny, o que vocês fizeram? — Brittany ficou com uma
expressão séria no rosto e se sentou no chão ao lado da banheira.
— Nós... nós transamos. — Prendi a respiração
instintivamente, parte de mim não acreditava que eu tinha dito aquilo
em voz alta.
Como já era de se esperar, Brittany entrou em pânico.
— Puta que pariu, Jenny! — Ela pegou um punhado de
espuma e jogou no meu rosto, por sorte, o sabão não acertou os
meus olhos. — Você transou com o Bruce? Outra vez?
— Shh... Cala a boca! — Dei um tapa em sua mão quando
ela tentou me jogar mais espuma. — O prédio inteiro vai ouvir.
— Deixe que ouçam! — retrucou, aborrecida. — Sabe, eu
nem estou tão surpresa assim, acho que no fundo eu sabia que isso
iria acontecer. Você sempre comete o mesmo erro duas vezes. —
Brittany ficou pensativa e então franziu o cenho. — Pelo menos me
diz que dessa vez usaram camisinha.
Engoli em seco e não consegui disfarçar a minha cara de
culpa.
— Caralho... — Brittany esfregou as têmporas. — Você é
louca, Jenny!
— Vou tomar uma pílulado dia seguinte, mas não preciso me
preocupar. Bruce disse que fez vasectomia, ele não pode mais
engravidar ninguém.
O olhar preocupado da minha amiga se transformou em
surpresa.
— Porra, ele realmente levou a sério essa coisa de não
querer ter filhos — refletiu.
Concordei silenciosamente.
Ficamos caladas por um tempo até que senti as lágrimas
arderem em meus olhos. Por mais que eu não quisesse admitir, eu
me sentia mais atraída por Bruce depois do que aconteceu naquele
elevador. Tudo que eu mais desejava era que pudéssemos ser um
casal de verdade, eu queria ter coragem para contar sobre Lorie,
queria que fizéssemos caminhadas ao entardecer de mãos dadas,
que tivéssemos mais passeios em família como aquela noite em que
fomos ao parque de diversões... Eu quero tantas coisas, mas
infelizmente não sei se posso ter.
Sem que eu me desse conta, lágrimas começaram a escorrer
pelo meu rosto e soluços escaparam da minha garganta. Pela
primeira vez em muito tempo, eu estava desmoronando novamente.
Quando saí da Filadélfia jurei que isso nunca mais aconteceria e
que eu seguiria a minha vida sem me apegar a qualquer outro idiota,
mas a situação com Bruce saiu do meu controle. Agora era tarde, eu
já estava envolvida demais, apaixonada demais...
— Queria que o meu relacionamento com ele fosse real e
não uma merda inventada para enganar a mídia — deixei escapar
entre soluços. — Agora não consigo saber se o que aconteceu no
elevador significou alguma coisa ou não. Eu sou uma tola, Brittany!
Minha amiga ficou abalada com o meu estado e me puxou
para um abraço sem se importar se eu estava nua e cheia de
espuma. Com uma expressão triste, ela apenas me consolou e
afagou a minha cabeça enquanto eu chorava histericamente em seu
ombro. Não acredito que depois de seis anos eu estou chorando por
um homem outra vez.
CAPÍTULO 25

Não consegui tirar Jenny da cabeça durante todo o caminho


de volta até Manhattan. Estacionei o carro na garagem subterrânea
do edifício em que eu morava, desci do veículo e fui até o elevador
principal tentando ignorar o aperto da ereção que ganhei ao
recordar dos últimos acontecimentos. Pensei que transar com Jenny
saciaria o desejo inexplicável que eu sentia por ela, mas parece que
só serviu para me deixar ainda mais excitado.
Quando entrei no elevador, apertei o botão da cobertura e as
portas se fecharam. Me recostei na parede metálica e fechei os
olhos, tentando esquecer de onde estava. A partir de hoje eu jamais
conseguiria entrar em um elevador sem me lembrar do que Jenny e
eu fizemos.
Uma grande parte de mim ainda não acreditava no que
aconteceu. Transei com a minha secretária no elevador da empresa
e eu não estava nem um pouco arrependido, pelo contrário, eu
queria mais. Queria enterrar o meu pau naquela boceta gostosa
outra vez, queria ouvir ela gemer e se esfregar no meu corpo até
alcançar o orgasmo. Eu quero Jenny para mim.
Cerrei os punhos em uma tentativa falha de conter o desejo
que eu sentia. Minha única vontade no momento era voltar até o
Bronx e beijá-la. Eu queria ter Jenny em meus braços, queria sentir
o calor do seu corpo perto do meu... queria fazer tantas coisas com
ela, mas infelizmente eu não podia. Não estávamos em um
relacionamento para que eu batesse em sua porta tarde da noite
dizendo que queria transar outra vez. Quando foi que as coisas
saíramtanto do controle? Ah, sim... foiquando enchi a cara naquela
conferência em Seattle.
Apesar de tudo, eu não conseguia me arrepender nem um
pouco do que fiz. Minhas atitudes com Jenny até podiam ter
passado longe do profissionalismo, mas se eu pudesse voltar no
tempo eu faria tudo de novo.
Voltei à realidade quando o elevador apitou indicando que
chegou na cobertura. Assim que as portas se abriram, tentei
empurrar para o fundo da mente qualquer tipo de pensamento sobre
as últimas horas e saí do elevador.
A única porta que havia no andar era a do meu apartamento.
Ela era alta, feita de vidro espelhado e ficava no fim do corredor.
Caminhei até lá em passos apressados, enquanto tirava a chave do
bolso da minha calça, eu mal podia esperar para tomar um banho
gelado e me deitar na cama para esquecer o cansaço do dia.
Depois de entrar no apartamento, tranquei a porta e liguei o
alarme usando o painel de segurança que ficava no hall de entrada.
Caminhei vagarosamente até a ampla sala de estar que possuía
uma parede inteira de vidro com vista para a cidade. Quando me
mudei para cá lembro que fiquei boquiaberto com a paisagem —
afinal, eu era apenas um jovem que cresceu em Detroit —, mas
agora, olhar a paisagem noturna de Nova York nem me
surpreendida tanto assim. Comecei a achar o cenário monótono
com o passar do tempo.
Deixei meu paletó sobre o sofá de couro que ficava no centro
da sala e fui em direção ao meu quarto enquanto desfazia o nó da
gravata. Não importa quanto tempo passe, eu ainda prefiro andar
por aí de jeans e jaqueta de couro. Odiava usar terno e gravata, só
fazia isso no trabalho porque o ambiente empresarial exigia que eu
fosse o mais profissional possível.
Sorri com ironia ao me lembrar da falta de profissionalismo
que tive com a minha secretária mais cedo. Mas isso não fazia
diferença agora. Tudo que me importava era que Jenny gostou de
ser fodida por mim, caso contrário, ela não teria gritado de prazer
quando estávamos presos naquela maldita caixa de metal.
Uma vez que eu já estava dentro do quarto, desabotoei
minha blusa rapidamente e joguei o tecido amarrotado sobre a
cama. Antes de tirar a calça, lembrei que havia guardado algo muito
importante no bolso da frente. Reprimindo um sorriso, puxei para
fora a calcinha vermelha que Jenny usava mais cedo. Confesso que
quando eu vi o tecido delicado no chão do elevador eu não pensei
duas vezes e resolvi guardá-lo para mim. Issoé outra coisa da qual
eu não me arrependo nem um pouco. Pelo menos, eu tenho algo
para me lembrar do cheiro dela.
Por impulso, levei o tecido até a altura do nariz e inspirei
profundamente. O cheiro daquela boceta gostosa fez o meu pau
doer com necessidade, ele ainda estava duro e parecia ficar mais
sensível a cada minuto que passava. Porra, Jenny, o que você fez
comigo? Guardei a calcinha na gaveta da minha mesa de cabeceira
e fui em direção ao banheiro, abaixando o zíper da calça.
Enquanto tomava banho, não consegui me conter e cedi à
tentação. Bati punheta duas vezes seguidas pensando na minha
secretária e em como eu me senti quando estava dentro dela.
Quando saí do chuveiro, vesti uma calça preta de moletom que eu
usava para dormir e caminhei de volta para o quarto. Estava tão
cansado que caí no sono segundos depois de deitar na cama.
Era noite e eu estava andando pela calçada vazia em
Harrowgate, Filadelfia. Entrei no primeiro bar que encontrei e fui até
o balcão com um único objetivo em mente: encher a cara. Eu havia
acabado de decidir que largaria a faculdadee não pretendia contar
nada para o meu pai. O desgraçado esteve ausente por anos e
agora que a minha mãe morreu ele queria aliviar a consciência me
fornecendoapoio financeiroe pagando um curso que eu não tenho
a mínima vontade de fazer . Lamento, mas não vai rolar...
— O que vai querer, amigo? — o barista perguntou, como se
já me conhecesse há muito tempo.
— Alguma coisa forte. — Suspirei, enquanto me sentava no
único assento disponível que havia em frente ao balcão.
À minha direita havia uma parede de alvenaria com alguns
cartazes rasgados e à esquerda estava uma ruiva que virava na
boca uma dose de whisky. Em sua parte do balcão haviam inúmeros
copos vazios o que me fez constatar que a mulher também foi ali
para encher a cara.
— Me traz outra rodada, Todd! — a ruiva gritou para o
homem do bar, que assentiu e retornou com uma garrafa e dois
copos de vidro.
O barman colocou um copo diante de mim e o encheu até a
metade com um líquido marrom. Ele fez o mesmo com a mulher,
mas em seguida a encarou de um jeito preocupado.
— Melhor ir com calma, senão o seu fígadovai morrer hoje
mesmo — o homem calvo alertou, preocupado. Pelo visto, ele e a
ruiva já se conheciam.
A mulher apenas deu de ombros e mandou a dose de bebida
para dentro com um único gole.
— Outra! — ela exigiu.
O homem do bar apenas revirou os olhos e serviu mais
bebida. Quando o sujeito se afastou, peguei o meu copo e bebi o
whisky depressa tentando ignorar a ardência que senti quando o
líquidopassou pela minha garganta. Fiz uma careta e acenei para o
barista, pedindo outra dose. Ele veio e encheu o meu copo sem
hesitar.
Depois da quinta dose, minha visão começou a ficar
embaralhada. Respirei fundo e quando o barman veio perguntar se
eu queria que ele enchesse o copo novamente eu neguei com a
cabeça — embora eu gostasse de encher a cara para esquecer dos
problemas, a minha tolerância ao álcool era muito baixa.
— Você é fraco — zombou a ruiva que estava sentada ao
meu lado. Ao contrário de mim, ela parecia estar perfeitamentebem,
o que me deixou um pouco envergonhado, já que ela havia bebido 6
doses a mais que eu.
— E o seu fíg
ado deve estar pedindo socorro — respondi à
provocação.
— O meu e o de todo mundo nesse bar. — Ela olhou ao seu
redor. — Mesmo assim, todos parecem estar mais dispostos que
você. 5 doses e já está tombando para o lado...
— Não estou tombando para o lado.
Apoiei-me no balcão e tentei fazer com que a minha visão
focasseno rosto da ruiva — que estava completamente embaçado,
assim como o resto do ambiente. Confesso que eu realmente estava
derrotado com apenas 5 doses de whisky, mas não queria deixar
que uma desconhecida tirasse sarro da minha cara.
— Aposto que nem consegue ficarde pé — ela me desafiou
com um tom divertido na voz.
Decidido a mostrar que a ruiva estava enganada ao meu
respeito, reuni todo o equilíbrio que eu tinha e me coloquei de pé. A
mulher arquejou.
— Nossa... você é alto — balbuciou com surpresa. — Não
percebi isso quando chegou aqui.
— Bom, eu consigo ficar de pé. — Um sorriso convencido
curvou a minha boca e eu decidi me gabar um pouco mais. —
Porém, não sei se posso dizer o mesmo sobre você.
— É claro que eu consigo. — A ruiva se levantou do banco,
firmando os dois pés no chão.
Ela tentou caminhar até mim, mas acabou se
desequilibrando. Em um ato impulsivo, segurei a mulher pela cintura
antes que ela caísse no chão e a puxei para perto do meu corpo.
Seus seios se chocaram contra o meu tórax e suas mãos seguraram
meus braços enquanto ela tentava se equilibrar.
Fiz o possível para fingir que não fiquei afetado com a nossa
aproximação — afinal de contas, eu bebi e não estava pensando
direito —, mas parece que a ereção no meio das minhas pernas me
entregou. Eu senti quando a coxa da ruiva roçou no meu pau e ela
arquejou com surpresa.
— Parece que alguém ficou animadinho — brincou.
Comecei a pensar em um milhão de desculpas para dar à
mulher quando a sua mão deslizou sorrateiramente entre os nossos
corpos. Fiquei paralisado quando seus dedos desceram pelo meu
abdômen, se esgueiraram para dentro do cós da minha calça e
tocaram a minha ereção.
— Me diz uma coisa, bonitinho... — Ela me envolveu em um
aperto firme e eu suspirei. — Acha que consegue transar depois de
beber 5 doses de whisky? Ou é fraco demais?
— Bom, eu consigo ficarde pé sem precisar me segurar em
um completo estranho — respondi, com um sorriso malicioso. No
fundo, eu já sabia onde aquela conversa iria parar.
— Qual é o seu nome? — indagou, sem tirar as mãos do meu
pau.
— B-bruce — gaguejei, enquanto olhava em volta, torcendo
para que ninguém estivesse nos encarando. Por sorte, as pessoas
ao nosso redor estavam bêbadas demais para perceberem que
tinha uma ruiva com a mão dentro da minha calça. — E você, como
se chama?
— Jenny. — Sua voz saiu em um tom completamente erótico
e o aperto ao redor do meu pau aumentou. — Sabe, tem um motel
de beira de estrada aqui perto. Nós podíamos alugar um quarto lá
e... não sei, talvez brincar um pouquinho.
— Tem certeza disso? — Embora eu estivesse ansioso para
aceitar a oferta da mulher, eu não queria que ela se arrependesse
de algo, depois que o efeito do álcool passasse.
Jenny concordou e retirou suas mãos de mim com relutância.
— Vou pagar a minha conta e você paga a sua. Depois,
vamos descobrir o quão disposto você ficacom 5 doses de whisky.
— Ela lutou para se equilibrar sozinha e depois de alguns segundos
finalmente conseguiu.
Observei a ruiva por um tempo e quando a minha visão se
estabilizou, eu pude enxergar o seu rosto com clareza. Arquejei ao
notar que além de possuir o mesmo nome, a mulher também era
idêntica à minha secretária — exceto pela cor do cabelo, que na
verdade parecia ser tingido. Foi quando percebi que aquilo não era
um sonho qualquer, estava mais para uma lembrança — uma
lembrança de algo que aconteceu há muito tempo. Porra!
CAPÍTULO 26

— Eu sei que vai doer, mas infelizmente é a melhor solução


— Brittany comentou, enquanto bebia café em sua caneca de
porcelana.
Era sábado de manhã e estávamos sentadas na mesa da
cozinha tomando café da manhã. Lorie ainda não tinha acordado,
então aproveitamos para conversar sobre a crise de choro que eu
tive ontem à noite. Fiquei até a madrugada dentro daquela banheira,
deixando minhas lágrimas fluírem enquanto minha amiga tentava
me confortar como podia.
— Eu não sei — relutei em aceitar aquela ideia. Brittany
queria que eu ligasse para Bruce e terminasse o nosso namoro de
mentira.
— Confie em mim, Jenny. Se Bruce sentir algo por você, ele
não vai deixar que esse término aconteça.
Mordi um pedaço da torrada que estava no meu prato e me
forcei a engolir. Nada passava pela minha garganta desde ontem à
noite.
Por mais que uma parte de mim se recusasse a aceitar,
Brittany estava certa, eu não podia continuar nessa situação
angustiante. Estar perto de Bruce me deixava feliz, mas quando ele
se afastava e eu começava a me lembrar que o que tínhamos não
passava de uma mentira, eu não conseguia manter a sanidade.
— Está bem — concordei com a minha amiga e bebi um
pouco de café. — Vou dizer ao Bruce que não quero mais esse
namoro de mentira. — Levantei da cadeira com um olhar decidido.
— E eu não vou esperar até segunda, vou ligar agora.
— Agora? — Brittany arqueou uma sobrancelha. — É sábado
e 08:30h da manhã, o riquinho ainda deve estar dormindo.
— Sinceramente, eu não ligo.
Dando meia volta, fui até o meu quarto para pegar o celular
tomando cuidado para não acordar Lorie — que dormia abraçada ao
seu ursinho de pelúcia rosa.
Uma lágrima desceu pela minha bochecha quando ponderei
as minhas opções. Havia a possibilidade de Bruce não falar mais
comigo depois dessa ligação e se manter distante — isso afetaria
Lorie tanto quanto eu. Ou, como Brittany disse, talvez o meu término
seja o incentivo que ele precise para vir atrás de mim e começar
algo de verdade. Bom... não posso perder as esperanças.
Tentei manter o pensamento positivo enquanto pegava o
celular que estava em cima da minha penteadeira. Fui até a sala
para que a ligação não acordasse a minha filha, me sentei no sofá e
depois de respirar fundo várias vezes, liguei para Bruce. Meu
coração quase parou de bater quando o homem atendeu o telefone.
— Jenny? — Ele bocejou do outro lado da linha, sua voz
rouca deixava evidente que o homem acabou de acordar.
— B-bom dia — falei, com a voz trêmula.
— Eu sonhei com você, sabia?
— Sonhou? — Fui pega de surpresa. — E como foi o sonho?
— Nós precisamos conversar — respondeu, com um suspiro
cansado.
— Sim... precisamos mesmo — disparei, em um tom
levemente irritado. Decidi que não deixaria Bruce passar na minha
frente naquela conversa e desviar o meu foco, então fui direto ao
ponto. — Eu estou ligando para acabar com essa situação entre
nós. Já chega!
— Do que está falando?
Suspirei, e puxei uma almofada para o meu colo. Agora que
comecei o assunto preciso ir até o fim...
— Bruce, eu não aguento mais viver essa mentira — admiti,
tentando conter as lágrimas que ardiam em meus olhos. — Isso está
acabando comigo. Não dá... eu não quero mais!
— Espera — julgando pelo tom de voz, Bruce parecia
confuso — você está terminando comigo?
Antes que eu pudesse responder as lágrimas desceram pelo
meu rosto. O que estamos terminando exatamente? Uma farsa?
Pelo canto do olho pude ver Brittany me encarando, ainda
sentada na mesa da cozinha. Ela me direcionou um sorriso
encorajador para que eu não desistisse. Contive um soluço que veio
com o choro e respirei fundo, tentando encontrar concentração para
dar a resposta.
— Sim. Eu estou terminando o nosso namoro de mentira! —
Funguei o nariz involuntariamente e torci para que ele não
percebesse que eu estava chorando.
— Jenny — Bruce suspirou do outro lado da linha —, por
favor, não faça isso. Eu...
Antes que eu pudesse voltar atrás na minha palavra, afastei o
telefone do ouvido e desliguei a chamada sem me dar ao trabalho
de ouvir o que Bruce tinha a dizer. Minha coragem desapareceu tão
rápido quanto surgiu e um grande arrependimento pesou em meu
peito.
Ainda eram 8:40h da manhã e eu já estava despedaçada por
dentro, não conseguia respirar e meu coração doía com uma
angústia sufocante. Levei minhas mãos ao rosto e chorei
silenciosamente até que senti Brittany me abraçar.
— Vai ficar tudo bem, Jenny, o Bruce vai voltar — ela me
acalmou, enquanto afagava a minha cabeça. — E se não voltar,
então ele terá perdido a mulher mais gostosa de Nova York.
Embora eu estivesse destruída por dentro, me senti
agradecida por ter um ombro para chorar. Brittany sempre se
manteve mais forte que eu na maioria das situações de desespero,
já perdi a conta do número de vezes em que caí e ela sempre
estava lá para me levantar. Acho que jamais poderei compensar a
minha amiga por tudo que ela fez por mim...
Enquanto eu enfrentava a minha crise de choro, Brittany
desligou meu celular e me manteve afastada dele pelo resto do dia.
Passamos o sábado de pijama, sentadas no sofá da sala, comendo
sorvete e assistindo desenhos animados ao lado de Lorie. Foi um
dia tedioso, do qual eu tinha certeza que não gostaria de me lembrar
daqui a 10 anos, mas apesar da tristeza que afligia o meu coração,
me senti grata por estar na companhia das duas pessoas que eu
mais amava no mundo.
Quando a noite chegou nenhuma de nós queria cozinhar,
então Brittany resolveu pedir uma pizza. Lorie descansava a cabeça
em meu colo enquanto eu enrolava uma mecha do seu cabelo loiro
escuro em meu dedo. Embora eu não tivesse dito nada, minha
filhinha parecia sentir que eu estava deprimida. Ela não saiu de
perto de mim desde que acordou e me dava abraços reconfortantes
sempre que podia. O amor que eu recebia da minha pequena fazia
com que eu me sentisse melhor por um instante, mas não demorava
muito até que o meu peito voltasse a doer com angústia por causa
de Bruce.
A falta de pensamentos positivos me deixou sonolenta e eu
estava quase adormecendo antes mesmo da pizza chegar.
Completamente sem esperanças, deixei minha cabeça se apoiar no
encosto do sofá e fechei meus olhos, na tentativa de descansar a
mente por um tempo. Estava prestes a cair no sono quando a
campainha tocou.
— Eu pego a pizza — Brittany disse, em um tom preguiçoso.
Abri meus olhos a tempo de ver minha amiga se levantando
do sofá e pegando o dinheiro que estava sobre a estante da sala.
— Não vai se trocar antes de atender? — Brittany usava
apenas uma camisola lilás de algodão que terminava no meio das
coxas.
— São nove da noite — ela retrucou, enquanto caminhava
em direção à porta. — Qualquer entregador de pizza, que trabalhe
nesse horário, está acostumado a ver mulheres de pijama.
Olhei para a roupa que eu usava e me encolhi no sofá.
Brittany até podia estar sexy com a sua camisola, mas eu usava
uma calça de moletom azul e uma blusa branca de algodão com
mangas tão grandes que cobriam as minhas mãos.
Suspirei com desânimo e voltei minha atenção para Lorie que
ainda estava com a cabeça em meu colo, seus olhinhos estavam
vidrados no desenho do Tom & Jerry que passava na TV. Fiquei
brincando com o cabelo da menina, enrolando uma pequena mecha
em meu dedo, até que ouvi a voz da minha amiga.
— Está trabalhando como entregador de pizza agora? — ela
perguntou, com ironia.
— Eu... estou aqui para ver a Jenny. Ela está em casa? —
Era a voz de Bruce.
Meu sangue gelou e eu virei o rosto na direção da porta sem
pensar duas vezes. Meu chefe estava do lado de fora do
apartamento, vestindo uma calça jeans e jaqueta de couro — como
no dia em que nos conhecemos. Também não deixei passar
despercebido a caixa de chocolate que ele trazia em uma das mãos.
Não acredito! Bruce está aqui por mim, exatamente como a minha
amiga disse que ele faria.
— Serve aquela ali? — Brittany apontou na minha direção e
me lançou um olhar convencido.
— É essa mesma — Bruce respondeu com uma leve
diversão na voz, enquanto colocava seus olhos em mim.
Senti-me um pouco envergonhada pela minha aparência. Eu
estava de pijama, com grandes olheiras e meu cabelo solto se
encontrava completamente despenteado.
Enquanto eu reunia coragem para enfrentar aquela situação,
Lorie levantou a cabeça do meu colo e olhou na direção da porta.
— Tio Bruce! — Minha garotinha sorriu de um jeito animado e
desceu do sofá.
Sem saber como reagir, apenas fiquei observando enquanto
o homem se ajoelhava no chão para abraçar a filha.
— Jenny, você vai vir até aqui ou eu terei que te arrastar? —
Brittany chamou a minha atenção.
Fiz uma careta, me sentindo completamente apreensiva, e
forcei minhas pernas a se levantarem do sofá. Quando cheguei na
porta, Bruce parou de abraçar Lorie e ficou de pé. O homem sorriu
de um jeito hesitante quando me viu na frente dele.
— Vem, Lorie, vamos terminar de assistir Tom & Jerry. —
Brittany segurou a mão da garotinha e a levou em direção o sofá.
Estava claro que ela fez aquilo para dar privacidade à minha
conversa com Bruce.
— Passei o dia inteiro tentando te ligar, mas todas as
chamadas caíram na caixa postal.
— Meu celular estava desligado — mantive um tom sério na
voz. — O que está fazendo aqui?
— Bom... eu vim devolver isso. — Ele colocou a mão no
bolso interno da jaqueta e tirou de lá a minha calcinha vermelha.
Arquejei enquanto sentia minhas bochechas queimarem.
Estava com ele esse tempo todo? Rapidamente tirei o tecido
delicado das suas mãos e o escondi embaixo do meu casaco de
algodão.
— S-só veio aqui por causa disso? — questionei,
envergonhada.
Não consegui evitar de olhar para a caixa de bombons que
Bruce trazia consigo. Seus lábios se curvaram em um meio sorriso e
ele balançou a cabeça negativamente.
— Também estou aqui porque quero conversar com você —
respondeu sem rodeios.
— C-claro... vamos conversar. — Tentei ficar calma, embora
a ansiedade estivesse me deixando sem ar.
Será que Bruce vai tentar me convencer a voltar com esse
namoro de mentira? Ou ele pretende iniciar algo sério, depois do
surto que eu tive pela manhã?
— Então venha, Jenny, vamos conversar como dois adultos.
— Bruce segurou a minha mão e entrou no apartamento.
Quando passamos pela sala, notei que Brittany nos encarava
com uma sobrancelha erguida e um pequeno sorriso na boca. Lorie
estava deitada no sofá com a cabeça apoiada no colo da minha
amiga e estava tão distraída com o desenho que mal olhou na
nossa direção.
— Ei? — Bruce chamou a atenção de Brittany. — A baixinha
vai dormir com você essa noite.
Minha amiga franziu o cenho, confusa.
Sem esperar por uma resposta da parte dela, Bruce me levou
para o meu quarto e trancou a porta assim que entramos no
cômodo. Puta que pariu!
CAPÍTULO 27

— O que está fazendo?! — A surpresa estava nítida em


minha voz, meu coração ficou acelerado e eu não conseguia pensar
em mais nada além do fato de que eu estava sozinha com Bruce, no
meu quarto e de porta trancada.
— Quero conversar com você sem interrupções — ele
respondeu calmamente, enquanto colocava a caixa de bombons na
mesa de cabeceira que havia ao lado da minha cama.
— Estou ouvindo — deixei escapar, com um certo
nervosismo.
Aproveitando o momento, puxei a calcinha que escondi na
manga do casaco e a coloquei no cesto de roupas que ficava perto
da porta.
Bruce caminhou até parar na minha frente e me olhou nos
olhos por um longo tempo.
— Jenny, me desculpe por te convencer a ficar naquele
relacionamento falso — começou. — Honestamente, eu estava
mantendo aquela mentira porque era a única forma de me
aproximar de você já que eu não tinha coragem para te dizer a
verdade...
— Que verdade, Bruce?
O homem desviou seus olhos para o chão, suspirou, e
encarou o meu rosto novamente.
— Que eu queria ter você por perto o tempo inteiro. — Ele
engoliu em seco.
— Mas eu já fico perto de você... sou a sua secretária.
— Eu não quero te ter por perto como uma simples
secretária. Não é o bastante. — Seus olhos encontraram os meus.
— Quero te ter como a minha mulher.
Perdi o fôlego naquele instante.
— O-o quê? — gaguejei, minhas mãos começaram a ficar
trêmulas.
— Eu estou apaixonado por você, Jenny.
Oh, céus...
Fiquei alguns segundos em silêncio, processando as
informações que recebi. Eu não tinha dúvidas que Bruce estava
sendo sincero quanto ao que sentia, mas ouvir da sua boca que ele
estava apaixonado por mim parecia irreal. Talvez seja porque nunca
acreditei que esse momento iria acontecer... Todas as vezes que eu
pensava no quanto estava apaixonada por Bruce, eu só conseguia
me lembrar que ele era o meu chefe e eu a sua secretária, meu lado
racional dizia que era um amor impossível. Bom, mas parece que a
vida decidiu me surpreender outra vez.
— E então...? — perguntou, ansioso. — Não vai dizer nada?
Respirei fundo para ganhar coragem.
— Eu também estou apaixonada por você, Bruce —
confessei, e senti que um peso havia sido retirado das minhas
costas. — Estou apaixonada há muito tempo.
O sorriso dele se alargou.
— Ainda bem que sente o mesmo por mim, porque eu quero
ficar com você de forma séria. Quero que o nosso relacionamento
seja de verdade a partir de agora.
Sorri comigo mesma ao ouvir aquilo. Ainda não consigo
acreditar...
— Bruce, eu... eu nem sei o que dizer. — Apesar do meu
nervosismo interno, havia felicidade em minha voz.
— Diga que ficará comigo,
Eu estava prestes a concordar quando me lembrei que eu
não estava sozinha, eu tinha uma filha — que também pertencia ao
Bruce, mas ele ainda não sabia desse detalhe. Talvez, esse
relacionamento sério seja o incentivo que eu precise para ganhar
coragem e contar a verdade sobre o seu parentesco com a Lorie.
Bruce vai passar a conviver comigo, ele ficará mais perto da
garotinha, vai se acostumar com a presença dela e, quando a
verdade vier, talvez ele não se assuste tanto. Eu espero...
— Eu tenho a Lorie. Ficar comigo significa que ela também
fará parte da sua vida — o alertei. — Você entende isso?
— Eu sei. — Ele concordou com a cabeça. — Estou ciente
que Lorie vem junto no pacote, caso eu queira ter um
relacionamento com você. Acredite, eu pensei muito sobre isso nas
últimas horas.
— Mas você disse que não queria crianças na sua vida. Até
fez vasectomia para não ter filhos...
— Não sou um grande fã de crianças, eu admito..., mas da
Lorie eu gosto. Não sei explicar o porquê, mas a baixinha ganhou
um cantinho especial no meu coração desde o dia que jogou suco
de uva na saia da Valery.
Reprimi uma risada ao me lembrar do acontecimento. Talvez
eu devesse contar a verdade para ele... Será que consigo fazerisso
agora? Será que ele não vai se assustar e ir embora? Bom, primeiro
eu teria que explicar que Bruce e eu já nos conhecíamosantes da
empresa... Céus, e se ele não gostar de saber que a garotinha é
filha dele? E se ele sair por aquela porta e não voltar mais? Estou
com medo!
Antes que eu pudesse tomar uma decisão, Bruce segurou
minhas mãos e seu olhar encontrou o meu.
— Fiquei sozinho por muito tempo. Não quero continuar
solteiro agora que finalmente encontrei alguém que faz o meu
coração bater mais forte. — Ele me puxou para perto e envolveu
seus braços ao redor da minha cintura para evitar que eu
escapasse. — Por favor, Jenny, fique comigo.
Um grande sorriso curvou a minha boca e eu fui envolvida
pelo calor do momento. Bruce quer que sejamos um casal de
verdade? Essa é uma proposta que eu com certeza não vou
recusar.
Com o coração aquecido pelas palavras que eu acabei de
ouvir, concordei com a cabeça e deixei meus braços descansarem
ao redor do seu pescoço. Ao receber minha resposta silenciosa,
Bruce sorriu e aproximou seu rosto do meu.
— Estamos juntos agora, docinho. — Ele me beijou.
Quando seus lábios tocaram os meus, quase perdi o
equilíbrio— eu teria desabado no chão se Bruce não estivesse com
o aperto firme em minha cintura. Sentir sua boca se movendo contra
a minha enquanto sua línguapedia passagem, ávida para explorar o
meu interior, me deixou em chamas. Essas chamas se alastraram
rapidamente pelo meu corpo e em questão de segundos eu pude
sentir o calor em minha intimidade, que já pulsava com desejo.
Sem conseguir me conter, levei as mãos até a jaqueta de
Bruce e a deslizei para fora do seu corpo. O homem sessou o nosso
beijo para se livrar da camisa branca que vestia e quando seu tórax
ficou a mostra eu não consegui disfarçar o desejo em meu olhar.
Percebendo que eu o admirava, Bruce me direcionou um
sorriso malicioso e colou sua boca na minha outra vez. Nos
beijamos intensamente, enquanto suas mãos habilidosas
passeavam por cada parte do meu corpo, explorando e apertando
cada curva.
Estar nos braços do homem com quem fantasiei nos últimos
anos era maravilhoso, surreal, quase divino. Me senti tão à vontade
na presença de Bruce que nem me importei quando ele tirou a blusa
do meu pijama e meus seios foram expostos. Bruce me encarou
com desejo e luxúria, seu olhar fez com que eu me sentisse a
mulher mais sexy do mundo.
Soltei um grande suspiro quando seus dedos começaram a
estimular os meus mamilos. Bruce inclinou seu rosto até o meu
pescoço e deslizou lentamente a sua língua pelo local. Gemi e
empurrei meu corpo para mais perto dele, me agarrando em seus
braços musculosos. Era bom saber que de agora em diante, nós
estaríamos juntos de verdade. Eu poderia aproveitar a sensação de
ter Bruce ao meu lado sempre que quisesse, sem me importar com
as consequências que isso traria para a minha vida privada, afinal
de contas, o nosso namoro não era mais de mentira.
Bruce me pegou no colo e caminhou em direção a cama. Ele
me deitou no colchão e plantou um beijo em minha barriga que me
fez sentir cócegas. Encostei a cabeça no travesseiro e fiz o possível
para ignorar o urso rosa de pelúcia que estava ao meu lado. Desviei
meu olhar para Bruce e observei enquanto ele tirava a calça jeans e
a jogava em algum canto do quarto. Mordi os lábios ao vê-lo na
minha frente usando apenas uma cueca boxer preta que marcava
perfeitamente o volume da sua ereção. O homem estava prestes a
subir na cama quando alguém bateu na porta do quarto.
— Jenny? — a voz de Brittany parecia um tanto cautelosa. —
Desculpe interromper o que quer que vocês estejam fazendo aí
dentro, mas a pizza chegou.
— Pediram pizza? — Bruce indagou com um sorriso e
caminhou apressadamente até a porta.
Por um instante achei que o homem atenderia a minha amiga
usando apenas aquela cueca, mas relaxei quando ele abriu a porta
apenas o suficiente para que o seu rosto pudesse espiar o lado de
fora do quarto.
— Ei? Traga a caixa aqui — pediu.
— Meu nome é Brittany — minha amiga resmungou,
entediada. Eu não podia vê-la já que Bruce não abriu muito a porta,
mas conseguia imaginar que ela não estava muito feliz por ser
chamada apenas de “ei”.
— Pegue uma fatia porque eu vou trazer a caixa aqui para
dentro — ele falou, ainda com o rosto para o lado de fora do quarto.
Um tempo depois, Bruce colocou o braço para fora da porta e
pegou uma caixa quadrada de pizza. Meu estômago roncou quando
o cheiro de muçarela invadiu o quarto e eu me sentei na cama, já
esperando pela refeição.
Após trancar a porta, meu chefe colocou a caixa na minha
frente e se sentou na beira do colchão. Havia apenas metade da
pizza, então concluí que Brittany pegou fatias para ela e Lorie
comerem. Parte de mim estava triste porque nossas preliminares
foram interrompidas, mas o meu estômago ficou imensamente feliz
por fazermos aquela pausa para a refeição.
— Eu vou comer a pizza e depois você — Bruce pegou uma
fatia repleta de muçarela.
— Não jantou antes de sair de casa? — Aproveitei o
momento para pegar uma fatia também. Embora meus seios
estivessem de fora, eu me sentia totalmente à vontade na presença
do homem.
— Na verdade, eu não consegui comer hoje — confessou,
enquanto mordia a pizza. — Sua ligação pela manhã me fez perder
o apetite pelo resto do dia.
Encolhi os ombros, mas não fiquei arrependida de fazer
aquela ligação. Foi por causa dela que Bruce teve atitude para vir
até aqui e confessar seus sentimentos por mim.
— Bom, agora você pode encher a barriga — respondi e
mordi a minha fatia.
O homem concordou silenciosamente enquanto mastigava.
Depois de um tempo, ele engoliu e me olhou nos olhos se
preparando para dizer alguma coisa.
— Eu quero falar sobre o sonho que tive com você na noite
passada. — O tom sério em sua voz me pegou de surpresa.
— Por acaso foi um sonho erótico? — brinquei, enquanto
pegava outra fatia na caixa.
Bruce ficou pensativo e me direcionou um pequeno sorriso.
— Mais ou menos... — refletiu. — Estava mais para uma
lembrança.
— Lembrança?
Ele concordou e terminou de mastigar antes de prosseguir
com a história.
— Eu me lembrei de quando te conheci pela primeira vez. Foi
em um bar, você estava ruiva e bêbada.
Abri a boca para falar, mas não saiu nenhum som. Bruce
lembrou de quando nos conhecemos naquele bar da Filadélfia?
Caralho! De repente, perdi a fome e coloquei minha fatia mordida de
volta na caixa. Engoli o que eu mastigava e respirei fundo. Eu não
estava preparada para essa conversa.
— E... você se lembrou de tudo sobre aquela noite? —
perguntei com a voz vacilante.
Bruce refletiu por alguns segundos e balançou a cabeça
negativamente.
— Eu tenho amnésia alcóolica, caso não tenha percebido.
Tudo o que sei é que começamos a flertar e você me convidou para
ir até um motel de beira de estrada. Lembro de algumas coisas que
fizemos na cama, mas não de tudo.
Assenti silenciosamente. Confesso que fiquei um pouco
cabisbaixa por ele não se lembrar perfeitamente da nossa primeira
vez.
— Por que escondeu isso de mim, Jenny? — Seus olhos
encontraram os meus. Bruce não estava irritado, apenas confuso. —
Por que não me disse que já nos conhecemos antes?
— Bom, eu não sabia como dizer ao meu chefe que já transei
com ele no passado — resolvi ser sincera. — Fiquei com vergonha
de falar sobre isso com você. Imagine só se quando eu te encontrei
lá trabalho eu dissesse: oi, chefinho, você não deve se lembrar de
mim, mas a gente transou há alguns anos.
Bruce gargalhou.
— Eu sempre desconfiei que te conhecia de algum lugar. —
Ele colocou a caixa de pizza na mesa de cabeceira, ao lado da
caixa de bombons. — Eu entendo que tenha ficado acanhada — o
olhar de Bruce percorreu o meu corpo e se fixou nos meus seios
expostos —, mas terá que superar essa vergonha de transar com o
seu chefe, porque temos um relacionamento de verdade agora.
Ele se inclinou e plantou um beijo delicado em meus lábios
enquanto suas mãos empurravam o meu corpo para trás. Me deitei
no colchão novamente e Bruce afastou sua boca da minha, ele
pegou o urso de Lorie, que estava ao lado do meu travesseiro, e o
colocou no chão. Seus olhos azuis me analisaram com um brilho
malicioso que fez o meu ventre se aquecer com desejo.
— Eu vou te comer essa noite, Jenny... — Bruce segurou o
cós da minha calça de moletom. — E na noite seguinte... — Ele
puxou a calça para fora do meu corpo, me deixando nua sobre a
cama. — E na outra... — Suas palavras cessaram quando ele
enterrou o rosto entre as minhas pernas e a sua línguadeslizou pela
minha intimidade. Suspirei de prazer e apertei o lençol que estava
abaixo de mim.
Os lábios de Bruce envolveram o meu clitóris e ele começou
a me chupar suavemente, sem pressa, se deleitando com o meu
gosto. Sua língua pincelando na minha entrada vez ou outra estava
me fazendo enlouquecer. Acho que nunca recebi um oral tão
gostoso na vida.
Empurrei meu quadril para mais perto da sua boca e enterrei
meus dedos em seu cabelo preto, bagunçando os fios que estavam
perfeitamente penteados até alguns segundos atrás. Tomada pelo
prazer, fechei os olhos e me concentrei na língua que deslizava
loucamente pelas minhas dobras. Eu estava tão perto do fim, já
podia sentir meu orgasmo chegando.
Bruce continuou me lambendo, beijando e chupando até que
fui tomada por uma intensa sensação de êxtase. Meu corpo inteiro
estremeceu e eu gozei contra a boca dele enquanto gemia o seu
nome.
Bruce saboreou a umidade que veio com o meu orgasmo,
lambendo e sugando cada gota que saía do meu corpo. Quando se
deu por satisfeito, ergueu seu rosto e me encarou com um profundo
desejo no olhar.
— Eu estou viciado em você, docinho — murmurou com a
voz rouca e se colocou de joelhos na cama.
Ainda ofegante pelo orgasmo que acabei de ter, observei
quando Bruce retirou sua cueca de maneira apressada e o seu
membro ficou livre. Seus olhos encontraram os meus e ele me
direcionou um sorriso malicioso. Instintivamente, abri minhas pernas
fazendo um convite para que o homem me preenchesse.
Ao entender o que eu queria, Bruce segurou seu pau e o
encaixou na minha entrada. Ele inclinou seu corpo sobre o meu,
apoiando seus braços ao redor da minha cabeça e empurrou o
quadril para frente, enterrando-se em mim. Meu coração
transbordou com uma mistura de paixão e alegria. Depois de tudo
que aconteceu, estar nos braços de Bruce, como a sua mulher, fez
com que eu me sentisse realizada.
O olhar de Bruce encontrou o meu e ele começou a mover o
quadril para frente e para trás. Seu membro duro entrava e saía do
meu corpo, deslizando com facilidade em minha boceta molhada.
Entrelacei as pernas na sua cintura e logo entramos no mesmo
ritmo, deixando que nossos corpos se comunicassem através do
prazer.
Bruce saíade maneira suave e entrava com força o suficiente
para fazer a cama balançar. Sua pele suada roçava na minha toda
vez que ele flexionava o corpo ao meu encontro, seus gemidos
roucos e ofegantes ao pé do meu ouvido me deixavam mais
excitada a cada segundo que passava.
Levei minhas mãos até suas costas e acariciei cada músculo
quente que havia ali. Quando ele me penetrou com mais força eu
arquejei e cravei minhas unhas em sua pele. Bruce gemeu um
pouco mais alto e aumentou a intensidade das investidas. Revirei os
olhos de prazer enquanto sentia o seu pau deslizando rapidamente
em meu interior, preenchendo cada centímetro do meu canal
apertado.
Cada vez que Bruce me penetrava eu me agarrava a ele com
mais força, arrastando minhas unhas por sua pele, em uma tentativa
desesperada de aplacar a onda de luxúria que me dominava.
Meu desejo por aquele homem ficava maior à medida que o
tempo passava. Cada investida, cada respiração ofegante ao pé do
meu ouvido me deixava mais apaixonada. Não me importava se era
cedo demais para isso, eu desejava tê-lo perto de mim pelo resto da
vida, queria me deitar com ele todas as noites, queria que ele me
fizesse sentir essas sensações maravilhosas todos os dias.
— Diga que é minha mulher — exigiu ofegante, enquanto
seguia com estocadas mais duras. — Diga que só eu posso entrar
nessa boceta gostosa a partir de hoje.
Seu rosto estava a poucos centímetros do meu e seus olhos
me encaravam de maneira intensa. Eu me sentia em transe,
hipnotizada por aquele homem, estava à mercê dele e do seu corpo
e, honestamente, me sentia feliz com isso.
— Sou toda sua, Bruce! — eu gemi com necessidade. —
Diga que é meu também...
Bruce me deu um selinho e aumentou a força das investidas.
Minhas unhas afundaram em suas costas e eu fui tomada por outro
orgasmo, tive que morder minha boca para impedir o gemido alto
que quase escapou da minha garganta.
— Eu sou seu, Jenny — respondeu com a voz ofegante, seus
músculos ficaram tensos. — Sou todinho seu... — Bruce ofegou e
saiu do meu corpo com um movimento rápido, seu membro ficou
sobre a minha virilha e eu senti o calor do seu gozo se espalhar em
minha pele. Quando terminou, ele rolou para o lado na cama e me
puxou para perto, fazendo com que eu descansasse a cabeça em
seu peito suado.
Ficamos em silêncio por um tempo, esperando que nossas
respirações voltassem ao normal. Bruce acariciava o meu cabelo
tranquilamente e quando ergui meu rosto para observá-lo, notei que
um sorriso curvava a sua boca, ele parecia perdido em
pensamentos e demorou até perceber que eu o encarava. Quando
seus olhos azuis encontraram os meus seu sorriso convencido
aumentou.
— Minhas costas estão ardendo, com certeza estarei com
marcas de arranhões amanhã.
Reprimi uma risada, pensar que minhas unhas marcaram o
corpo de Bruce me deixava, inexplicavelmente, satisfeita.
— Ótimo, assim todos saberão que você tem dona —
respondi, sem disfarçar meu sorriso orgulhoso.
— Já pensavam que eu tinha uma dona — refletiu. — Fico
feliz que agora seja de verdade.
Concordei em silêncio e depositei um beijo no tórax de Bruce,
seu músculo estremeceu quando minha boca o tocou.
— Quase esqueci, eu te trouxe chocolate. — Bruce esticou o
braço para pegar os bombons que estavam sobre a mesinha, ao
lado da cama, quando abriu a caixa, eu percebi que os doces
tinham o formato de pequenos corações. Ele pegou um bombom e
colocou na minha boca, suspirei com o sabor delicioso do chocolate
ao leite.
— Obrigada — respondi, depois de engolir.
Bruce me deu mais alguns bombons e eu me senti uma
princesa mimada por receber chocolate na boca. Quando fiquei
satisfeita, ele colocou a caixa de volta na mesa de cabeceira e
reprimiu um bocejo.
— Eu estou exausto, docinho. Se importa se eu cochilar
alguns minutos?
Neguei com a cabeça.
— Também quero dormir — admiti. — Não consegui
descansar na noite passada.
Bruce concordou e seus braços descansaram ao redor do
meu corpo, como se quisesse garantir que eu não sairia dali até que
ele acordasse.
Sorri comigo mesma e fechei os olhos, me permitindo
descansar enquanto era embalada pelo ritmo suave da respiração
do meu novo namorado. Não percebi em que ponto dormi, mas
consegui ter a melhor noite de sono da minha vida. Eu me sentia em
paz e relaxada, pois agora estava onde sempre desejei estar: nos
braços do homem que sempre amei.
CAPÍTULO 28

Senti Bruce se remexendo ao meu lado e abri os olhos a


tempo de vê-lo se levantar da cama. Assim como eu, ele ainda
estava nu e parecia sonolento.
A leve claridade que entrava pela janela, coberta com uma
persiana bege, me fez perceber que já havia amanhecido. Reprimi
um bocejo e me sentei no colchão, trazendo o cobertor até a altura
dos meus seios.
Fiquei em silêncio, observando Bruce vestir sua cueca e
depois a calça jeans. Aquilo me fez lembrar da primeira noite que
passamos juntos na Filadélfia e de como ele saiu do quarto minutos
depois de gozar. Pelo menos, dessa vez, ele esperou até
amanhecer. Refleti, com uma certa ironia.
Ao ver que eu já estava acordada, Bruce me direcionou um
sorriso alegre e subiu o zíper da calça.
— Vai embora? — questionei.
Ele negou com a cabeça. Me senti aliviada.
— Estou indo tomar banho. Pode voltar a dormir se quiser,
prometo que ainda estarei aqui quando você acordar. — Bruce me
deu uma piscadela e saiu do quarto, deixando a porta entreaberta.
Reprimi um bocejo e deixei meu corpo cair para trás até que
senti um travesseiro macio sob a minha cabeça. Virei para o lado
onde Bruce dormiu e me aninhei no cobertor. Sorri ao perceber que
o cheiro dele ficou gravado na roupa de cama. Fechei os olhos e me
permiti adormecer novamente, enquanto me deleitava no aroma de
perfume caro e suor que estava em meu cobertor.
Dormi tranquilamente pelos próximos minutos até que senti
minha barriga roncar, um cheiro irresistível de bacon e ovos mexidos
com manteiga inundava o quarto. Deixando a fome falar mais alto,
levantei da cama, me enrolei em um roupão cor-de-rosa que estava
no meu armário e caminhei para fora do cômodo.
Ao sair do quarto, segui o cheiro de comida até a cozinha.
Fiquei surpresa quando vi Bruce na frente do fogão mexendo ovos
em uma frigideira, seu cabelo estava molhado e despenteado e ele
estava sem camisa, usando apenas a calça jeans de ontem. Suas
costas estavam à mostra e eu notei as marcas que as minhas unhas
deixaram em sua pele na noite anterior. Havia uma série de
arranhões avermelhados em linhas irregulares que iam desde seus
ombros até a área lombar. Me pergunto se ele notou os arranhões
que fiz em suas costas ou se estava completamente alheio à
situação.
Fiquei um tempo parada na entrada do cômodo enquanto
pensava em como iniciar uma conversa.
— Bela obra de arte, Jenny — Brittany comentou com ironia,
enquanto se posicionava ao meu lado. Ela já estava vestida para o
dia com uma calça legging cinza e uma camisa preta dos Ramones.
Seus olhos se mantinham fixos nos arranhões vermelhos nas costas
de Bruce.
Encolhi os ombros me sentindo envergonhada.
— Parece que a noite foi boa — ela prosseguiu com a
brincadeira e finalmente me encarou. — Vocês estão juntos agora?
— Estamos — confirmei, sem esconder meu sorriso. —
Bruce percebeu que não podia viver sem mim graças àquela ligação
que você me encorajou a fazer. Você é um anjo na minha vida,
Brittany.
Minha amiga sorriu ao ouvir aquilo.
— Você também foi um anjo quando eu precisei, Jenny. Se
não fosse por você, eu provavelmente estaria trabalhando em um
daqueles clubes que o Bruce frequentava.
Revirei os olhos e decidi ignorar a piadinha da minha amiga.
— E se não fosse por você eu não conseguiria trabalhar —
admiti. — Obrigada por cuidar da Lorie.
Brittany deu de ombros e sorriu.
— Está bem, não vamos discutir para ver quem é a amiga
mais presente. Você sabe que sou eu. — Ela bateu na minha bunda
e eu pulei.
Nossa brincadeira chamou a atenção de Bruce que virou o
rosto em nossa direção e acenou com a espátula que usava para
mexer o café da manhã.
— Bom dia, docinho — ele me cumprimentou, com um
sorriso.
— Já ganhou um apelido fofo? — Brittany bagunçou ainda
mais o meu cabelo despenteado.
Esquivei-me do seu toque enquanto reprimia uma risada.
— Vai procurar alguma coisa para fazer! — retruquei,
sentindo minhas bochechas corarem.
— Eu bem que gostaria. — Brittany entrou na cozinha e se
sentou na mesa de quatro cadeiras que havia ali. — Mas é domingo
de manhã e eu estou desempregada. Não tenho nada para fazer.
— Está desempregada? — Bruce entrou na conversa,
enquanto apagava o fogo.
— Desde que fecharam a lanchonete em que Jenny e eu
trabalhávamos — ela se explicou.
Criei coragem e entrei na cozinha, me sentando na cadeira
ao lado de Brittany. Bruce colocou a frigideira em um descanso de
panela que estava sobre a mesa e minha boca salivou ao ver ovos
mexidos com bacon. Confesso que eu estava animada para provar
aquela refeição. Não imaginei que ele sabia cozinhar.
Brittany e eu ficamos em silêncio enquanto observávamos o
homem preparar o café da manhã. Ele colocou três pratos e três
copos de vidro sobre a mesa e, em seguida, trouxe uma caixa de
suco de laranja que estava na geladeira.
Bruce colocou suco nos copos e sentou na cadeira que
estava à minha frente, ele pegou um prato para si e o encheu com
ovos mexidos. Brittany e eu fizemos o mesmo e quando dei a
primeira garfada nos ovos minha boca salivou. Eu nunca tinha
provado uma refeição tão gostosa em toda a minha vida.
— Onde aprendeu a cozinhar assim? — perguntei, enquanto
bebericava um pouco de suco.
— Com a minha mãe — Bruce respondeu, orgulhoso.
Às vezes me esqueço que esse homem já foi pobre como eu
e nem sempre teve empregadas para cozinhar o seu café da
manhã.
— Está uma delícia — Brittany elogiou, com a boca cheia. —
Quando me pediu para mostrar onde ficavam os ingredientes para
cozinhar eu não imaginei que você faria essa comida divina.
— Obrigado — agradeceu, com um sorriso convencido.
Bruce gostava de ter seu ego acariciado. — Brittany, você disse que
está desempregada, por acaso está precisando de um emprego?
— Claro que estou! — respondeu com animação e me
encarou. — Mas por enquanto a minha prioridade é cuidar da Lorie
para que Jenny possa trabalhar.
— Eu tenho uma vaga, se estiver interessada...
— Não, obrigada... eu odeio escritórios. Quero um emprego
que me dê liberdade durante o expediente.
— Você não vai trabalhar em um escritório — Bruce
esclareceu, em um tom divertido. — Na verdade, estou precisando
de uma comissária de bordo para o meu jato. Você não teria que
trabalhar todos os dias e ainda poderia cuidar da Lorie quando
quisesse.
— Isso seria perfeito! — Minha amiga bateu palmas,
animada.
Eu fiquei feliz com a oportunidade que Brittany recebeu.
— O emprego é seu, se quiser — Bruce continuou. — Não
quero contratar pessoas estranhas para me acompanhar durante os
voos... já tive muita dor de cabeça.
— Eu adoraria aceitar, mas nunca fiz um curso de aeromoça.
— Não importa. Na próxima semana faremos uma pequena
viagem até um estado vizinho onde estou financiando a construção
de um centro recreativo para crianças carentes. Se você se sair bem
durante o voo, está contratada.
Brittany sorriu de um jeito radiante e concordou com a
cabeça, mas logo ficou pensativa e me encarou.
— Jenny, se eu for, quem irá cuidar de Lorie? — ela se
preocupou. — Rebecca não está mais disponível durante a tarde.
Encolhi os ombros e tentei pensar em uma solução. Eu não
queria deixar a minha filha sob os cuidados de uma pessoa
desconhecida, mas também não podia fazer Brittany perder aquela
oportunidade de emprego.
— Lorie pode ir com a gente. — A sugestão de Bruce me
pegou de surpresa. — Enquanto estivermos fora, supervisionando a
construção, ela pode ficar com a Brittany.
— Está falando sério? — Ergui uma sobrancelha. — Vai
mesmo deixar a sua funcionária levar a filha de cinco anos para uma
viagem de negócios?
— Você não é minha funcionária, Jenny, é minha namorada
— ele me corrigiu. — A partir de agora darei a você certos
privilégios, é melhor se acostumar com isso.
— Não pode me mimar apenas porque estamos namorando.
— Posso sim — Bruce teimou e direcionou um sorriso
malicioso. — Eu sei que você quer ser mimada.
Reprimi um sorriso e acabei concordando. Seria bom ter
Lorie por perto nessa viagem, a pobrezinha já sofreu bastante com a
minha ida para Seattle.
Brittany levantou da mesa assim que terminou seu café da
manhã, seus olhos possuíam um brilho esperançoso.
— Vou assistir algumas videoaulas de preparação até o dia
do voo — ela se explicou. — Muito obrigada pela oportunidade,
Bruce.
— Não há de que.
— Boa sorte — desejei, e bebi mais suco de laranja.
Brittany colocou seu prato e copo dentro da lavadora de
louças e saiu da cozinha, me deixando a sós com o meu novo
namorado.
— E para onde iremos viajar, Bruce? — perguntei, curiosa.
— Filadélfia — respondeu, ao dar uma garfada nos ovos
mexidos.
Meu estômago congelou e eu arregalei os olhos. Filadélfia?
Sério? Não importa o quanto eu tente fugir do passado, ele sempre
volta para me assombrar.
CAPÍTULO 29

Embora eu tenha ficado apreensiva com a viagem, os


primeiros dias da semana correram bem. Agora que Bruce e eu
estávamos, oficialmente, juntos, eu não me importava de andar pela
empresa de mãos dadas com ele e passei a não ligar para os
comentários desagradáveis que alguns funcionários ainda faziam
sobre eu estar de olho na fortuna do meu chefe — eu sabia que
Bruce não se importava com essas coisas e para mim isso bastava.
Mesmo que eu quisesse, eu não podia fazer o tempo parar. O
dia da viagem para a Filadélfia chegou e eu permanecia em um
conflito interno. Minha cabeça estava cheia. Na próxima sexta-feira
seria o aniversário de seis anos de Lorie e eu ainda não resolvi nada
sobre a festinha, não conseguia ter cabeça para pensar em nada
divertido, já que estava preocupada demais com essa visita à minha
terra natal.
Meu coração estava apertado quando saí de casa e
permaneceu do mesmo jeito quando Lorie, Brittany e eu descemos
de um táxi no aeroporto e caminhamos em direção ao hangar onde
estava o jato da empresa. Eram 08:30h da manhã, o clima em
Manhattan estava nublado e frio, meu cabelo solto balançava com o
vento que parecia ficar cada vez mais forte.
Quando entramos no hangar, avistei Bruce com seu terno
preto e gravata cinza. Ele estava em frente ao jato e encarava o
celular com um olhar irritado. Será que aconteceu alguma coisa?
Curiosa para descobrir o que afligia o homem, me aproximei
rapidamente e acenei quando o seu rosto virou na minha direção.
— Olá, docinho. — Bruce sorriu com a minha presença e
guardou o celular no bolso da calça. Ele me abraçou com força e
plantou um beijo delicado em meus lábios. — Como foi a viagem até
aqui?
— Boa — respondi, com um sorriso vacilante.
Precisava admitir que ficar perto de Bruce estava me
deixando cada vez mais afetada. Bastava eu receber um abraço ou
um beijo dele que eu ficava com um sorriso bobo no rosto pelo resto
do dia. Controle-se, Jenny. Essa é uma viagem de negócios, seja
mais profissional!
— Olá, baixinha. — Bruce cumprimentou Lorie com um “toca
aqui” e a garotinha sorriu. — Trouxe mais um passageiro? —
Apontou para o ursinho de pelúcia que a garotinha carregava.
— Sim! — ela respondeu, animada. — Hoje ele vai andar de
avião pela primeira vez e eu também.
— Espero que não desmaie igual a sua mãe — brincou. —
Ela ficou com medo do avião cair.
— Minha mãe é medrosa às vezes. Sou mais corajosa que
ela.
Bruce reprimiu uma risada ao ver que não fiquei feliz com o
comentário da minha filha. Era verdade que eu tinha medo de
algumas coisas, mas eu ficava envergonhada quando espalhavam
as minhas fraquezas por aí.
— B-Bruce — Brittany gaguejou, enquanto se aproximava do
seu novo chefe. — Eu começo hoje, certo?
Ele assentiu.
— Deixei um uniforme para você no banheiro do jato, vista-o
antes de decolarmos — instruiu.
Minha amiga concordou e levantou a sua pequena mala
enquanto subia os degraus da escada de embarque — ela não
estava levando muita coisa, já que ficaríamos apenas um dia na
Filadélfia. Eu estava feliz porque Brittany conseguiu aquele emprego
e torcia para que ela se saísse bem no seu primeiro dia. Afinal,
trabalhar para Bruce Lancasther era uma grande oportunidade.
— Está animada para retornar à Filadélfia? — Bruce chamou
a minha atenção. — Você me disse que não vai lá desde que se
mudou para Nova York.
Sem saber o que responder, apenas dei de ombros. Eu não
sabia ao certo o que pensar dessa viagem. Ela me trará lembranças
dolorosas ou apenas nostalgia por rever o lugar onde cresci?
Enquanto eu refletia em silêncio, o celular de Bruce apitou,
indicando que ele recebeu uma mensagem. O homem retirou o
aparelho do bolso e checou a tela por alguns segundos, ele franziu
o cenho e suspirou, parecendo aflito.
— Vamos entrar, Jenny. — Bruce levantou a minha mala e
começou a subir os degraus da rampa de embarque. Segurei a mão
de Lorie e caminhamos para dentro do jatinho sem dizer uma única
palavra.
Quando estávamos no interior da aeronave, acomodei Lorie
em uma das duas poltronas do lado direito e me apressei em
afivelar o seu cinto. A garotinha acomodou o ursinho rosa em seu
colo e eu sorri ao perceber que a pelúcia grande cobriu o seu rosto.
— Quer que eu coloque o seu ursinho na outra poltrona? —
perguntei, enquanto fechava a cortina da janela.
— Não, ele vai ficar comigo — Lorie teimou.
Resolvi que não iria discutir com a garotinha e me sentei na
poltrona ao seu lado.
Enquanto Bruce guardava a minha mala no compartimento
para bagagem, Brittany surgiu no corredor usando um uniforme
vermelho de aeromoça. Seu cabelo castanho estava preso em um
rabo de cavalo e ela sorria de uma maneira radiante ao caminhar na
minha direção.
— Você está linda — elogiei, quando ela parou ao lado da
minha poltrona. — Não se preocupe, tudo vai correr bem no seu
primeiro dia.
— Espero que esteja certa, Jenny. — Brittany suspirou.
A porta da cabine de controle se abriu e Kevin saiu de lá
usando o seu uniforme de piloto. Seus olhos estavam fixos em
Bruce — que ainda tentava enfiar a minha mala no compartimento
de carga que ficava no teto do jato.
— Sr. Lancasther, você me disse para decolar
imediatamente, mas preciso de alguns minutos para preparar a
aeronave. Não é assim que as coisas funcionam...
— Precisamos decolar agora — Bruce insistiu, enquanto
estudava o melhor ângulo para guardar a mala.
Reprimi uma risada ao perceber que ele estava com
dificuldades para realizar aquela simples tarefa. Eu estava quase
oferecendo ajuda quando Kevin suspirou e voltou sua atenção para
mim.
— Olá, Jenny — o piloto me cumprimentou com um sorriso
amigável. — Que bom que ainda está trabalhando com o Sr.
Mandão. — Ele olhou brevemente para Bruce. — Você é a
secretária que mais durou nesse cargo.
— Imagino o porquê — Brittany deixou escapar, com uma
certa ironia.
Encarei minha amiga com um olhar irritado, mas ela decidiu
me ignorar e concentrou sua atenção no piloto. Seu comentário
chamou a atenção de Kevin e ele voltou seu olhar para Brittany. Ele
a encarou por um tempo e arregalou os olhos discretamente.
— Oh... acho que ainda não fomos apresentados. —
Estendeu sua mão para cumprimentá-la. — Eu sou Kevin
Thompson, piloto das empresas Lancasther.
Minha amiga arqueou uma sobrancelha e apertou a mão do
homem.
— Eu sou Brittany Jones — se apresentou. — Ah... sou a
nova comissária de bordo.
— Será um prazer ter você voando no meu jato, Brittany. —
Ele sorriu.
Talvez eu estivesse sendo paranoica, mas Kevin soou um
tanto malicioso quando disse aquilo. Voando no meu jato? Issome
parece muito com uma cantada de piloto. Quando vi as bochechas
de Brittany coradas eu percebi que ela também pensou o mesmo
que eu.
— Você está bonita, tia Brittany — Lorie comentou, com seu
rosto ainda escondido pelo ursinho que estava em seu colo.
— Quem é o urso falante? — Kevin mudou para um tom
brincalhão.
Empurrei a pelúcia para o lado para que ele pudesse ver a
garotinha.
— Essa é Lorie, a minha filha — apresentei.
O piloto pareceu um pouco surpreso com o que eu disse. Ele
encarou Lorie por alguns segundos e, em seguida, acenou para ela.
— Oi, Lorie. Eu sou o Kevin — a cumprimentou, com um tom
amigável.
— Olá, tio Kevin. — Ela acenou em resposta.
O homem acenou de volta e logo ficou pensativo.
— Aconteceu alguma coisa? — indaguei.
Kevin deu de ombros e balançou a cabeça negativamente.
— Estou com a impressão de que conheço a Lorie de algum
lugar. Os olhos dela são estranhamente familiares. — Ele pensou
um pouco. — Ah! Ela é a garotinha da revista que estava com você
e o Bruce no parque de diversões.
Quase me engasguei ao ouvir aquilo e encarei Brittany de um
jeito desesperado. Kevin é leitor da Gossip Million, se ele vir Lorie e
Bruce lado a lado eu não terei para onde escapar! Em um momento
de desespero, empurrei o ursinho para que ele voltasse a ficar na
frente do rosto da minha filha e dei um sorriso sem graça.
Ao perceber que eu estava nervosa, Brittany resolveu me
salvar desviando a atenção do piloto para ela.
— Kevin, você parece ser um cara legal. — Minha amiga
tocou o ombro dele enquanto falava. — Como trabalha aqui há mais
tempo, será que poderia me mostrar as... ah... as funcionalidades da
aeronave?
— Funcionalidades da aeronave? — O homem franziu o
cenho, deixando claro que estava confuso. — Por acaso isso é um
código para alguma coisa mais... adulta?
Reprimi uma risada ao ver que Brittany ficou vermelha outra
vez.
— Kevin, a pobrezinha começou hoje — Bruce se intrometeu
na conversa, enquanto se aproximava de nós. — Seja mais
profissional e não faça nenhuma brincadeira que a deixe
desconfortável.
— Claro... Desculpe. — Ele sorriu amigavelmente para
Brittany e fiquei surpresa quando ela retribuiu o gesto.
— Agora se apresse, temos que decolar antes que ela
chegue. — Bruce sentou na poltrona que estava de frente para a
minha e afrouxou levemente sua gravata.
— Como quiser, chefe. — Kevin assentiu de maneira
apressada, embora não parecesse muito contente com a ordem que
recebeu. — Venha, Brittany, o nosso trabalho vai começar.
Ele caminhou em direção à cabine do piloto, enquanto
gesticulava para que minha amiga o acompanhasse. Brittany ficou
perdida, mas o seguiu sem questionar.
— Ela quem? — indaguei, sem conseguir me conter.
Bruce me lançou um olhar cauteloso e quando parecia
prestes a responder minha pergunta, vi pelo canto do olho uma
mulher entrar na aeronave e fechar a porta de um jeito atrapalhado.
Virei o rosto até ela e fiz uma careta ao perceber que era Valery. Ela
usava um vestido vinho que parecia custar o olho da cara e
carregava uma bolsa de mão prateada. Seu cabelo preto estava
solto e seu rosto exibia quilos de maquiagem.
— Não pretendia me esperar? — ela reclamou.
Bruce suspirou e seus olhos azuis encontraram os meus.
Naquele instante eu soube que Valery era o motivo dele estar
inquieto e tão apressado para decolar.
— Estamos atrasados — ele mentiu, sem se dar ao trabalho
de olhar para a irmã. — E eu já falei que não existe necessidade de
você vir nessa viagem.
— Mas é claro que existe — insistiu.
Ignorando o fato de que Bruce não a queria por perto, Valery
se sentou na poltrona ao lado dele, ficando de frente para Lorie —
que ainda estava escondida pelo seu ursinho. Prefiromanter minha
filhaassim, a última coisa que preciso é dessa mulher percebendo a
semelhança que existe entre Bruce e a filha.
— Me diz, por que você iria querer supervisionar as obras de
um centro recreativo para crianças carentes? — Bruce a questionou.
— Também sou dona de uma parte da empresa — Valery
respondeu, enquanto afivelava o cinto de segurança da poltrona.
Uma vez que já estava acomodada no assento, ela abriu a sua
bolsa de mão e tirou de lá um pequeno espelho e um batom.
— Você só tem 30% das ações.
— Ainda é uma boa parte. — A mulher deu de ombros e
começou a retocar o seu batom vermelho.
Bruce e eu ficamos em silêncio e nos entreolhamos algumas
vezes. Eu não fazia ideia do que dizer para ele naquela situação e
também não queria abrir a boca e fazer com que Valery se
lembrasse de mim. Melhor permanecer nesse estado em que ela
finge que eu não existo.
Nesse meio tempo, Kevin avisou pelo alto-falante que já
estávamos decolando e instruiu que permanecêssemos em nossos
assentos até segunda ordem.
Eu já estava começando a pensar que a vadia de olhos azuis
sequer percebeu a minha presença quando ela guardou seu batom
na bolsa e olhou na minha direção. Sua boca se curvou em um
pequeno sorriso debochado e eu respirei fundo, contando até dez
mentalmente, para tentar me acalmar.
— Se vai andar com o meu irmão devia melhorar a qualidade
das roupas que você usa. — Ela olhou para o meu sobretudo cinza.
— Essa coisa está totalmente fora de moda.
— Valery, por favor — Bruce a repreendeu, com um tom
sério. — Se ficar com as suas gracinhas eu te jogo para fora desse
avião.
— Mas... nós já decolamos — Valery disse, atordoada,
enquanto espiava através da cortina na janela.
— Eu sei — o homem respondeu friamente.
Reprimi uma risada ao imaginar Valery sendo arremessada
para fora do jato e despencando em queda livre até o chão. Ok...
melhor parar com isso.
Valery pareceu um tanto sem graça depois do que Bruce
falou, acho que ela finalmente percebeu que não era bem vinda
aqui. Eu quase sinto pena... quase. Sem saber como reagir após ser
esnobada, a mulher olhou para cada canto da aeronave, incluindo o
chão, o teto e o urso rosa que estava na poltrona à sua frente. Ela
franziu o cenho e encarou a pelúcia por alguns segundos.
— Por que esse bicho está sentado na poltrona? Por que
estão levando isso para a Filadélfia?
— Não fale assim com o meu ursinho! — Lorie resmungou
com o rosto escondido atrás da pelúcia e chutou a canela de Valery.
A mulher arquejou e levou as mãos até o osso, massageando
para tentar aliviar a dor. Bruce fez tanto esforço para segurar o riso
que seu rosto ficou vermelho. Embora eu quisesse parabenizar
Lorie pelo feito, precisei fazer o papel de mãe responsável e ensinar
bons modos para a minha filha.
— Lorie, isso não se faz! — a repreendi levemente, e tirei o
ursinho da frente do seu rosto para que ela pudesse me ver. —
Peça desculpas para a vadi... Valery.
A menininha franziu o cenho, embirrada, e encarou a mulher
que estava à sua frente.
— Sua pirralha — Valery praguejou, enquanto massageava a
canela.
Se Lorie pretendia pedir desculpas, ela mudou de ideia. O
rosto da minha filha ficou zangado e antes que eu pudesse fazer
alguma coisa, Lorie chutou Valery novamente no mesmo lugar.
— Ah! — A mulher encolheu suas pernas para baixo da
poltrona o máximo que pôde. — Pare com isso!
— Não! — Lorie teimou.
O olhar furioso de Valery se voltou para mim.
— Controle a sua filha, secretariazinha... Ah! — Um urso de
pelúcia foi arremessado no rosto dela.
Valery jogou a pelúcia no chão e ajeitou o cabelo.
Bruce começou a gargalhar ao ver que a maquiagem da irmã
havia sido borrada e eu cobri a boca para não deixar meu riso sair.
Eu sabia que devia repreender Lorie por aquelas atitudes, mas não
podia negar que gostei de ver a vadia de olhos azuis ser
importunada por uma criança de 5 anos.
Enquanto Valery resmungava, Lorie sorria e Bruce
gargalhava, Brittany saiu da cabine de controle e veio em nossa
direção. Ela franziu o cenho ao ver que a irmã de Bruce estava ali,
mas decidiu ignorá-la e adotou uma postura profissional.
— Já podem retirar os cintos — minha amiga instruiu. — Tem
bebidas no frigobar e uma TV nos fundos da aeronave se quiserem
passar o tempo. Também posso ir até a cozinha e preparar alguma
refeição se quiserem...
— Obrigado, Brittany — Bruce agradeceu, ofegante pela crise
de riso. Ele desafivelou o cinto que o prendia na poltrona e eu
resolvi fazer o mesmo.
— Bom... vão querer alguma coisa? — Brittany perguntou
com hesitação. Embora estivesse insegura, ela estava se
esforçando para fazer um bom trabalho.
— Uma bolsa de gelo — Valery resmungou e encarou Lorie
com um olhar irritado. — É para a minha canela.
Minha amiga franziu o cenho com o pedido inesperado, mas
assentiu.
— Tia Brittany, eu quero um suco de uva — Lorie pediu com
a voz mais doce do mundo enquanto sorria para Valery.
A irmã de Bruce arregalou os olhos e a sua expressão
zangada mudou para assustada.
— Certo, eu não demoro. — Brittany se virou e caminhou
pelo corredor, entrando em uma porta que ficava um pouco antes do
banheiro.
— Está bem! Eu desisto! — Valery exasperou-se. — Vamos
fazer uma trégua. Não quero que o meu vestido da Gucci seja
manchado.
Lorie franziu o cenho e ponderou sobre a proposta.
— O que eu ganho com isso? — a garotinha negociou.
Fiquei boquiaberta com a esperteza da minha filha. Jamais
pensei que Lorie seria capaz de importunar Valery a ponto de fazer
a mulher levantar bandeira branca. Acho que grande parte da sua
personalidade foi herdada do pai.
— Te dou qualquer coisa! — a vadia de olhos azuis
respondeu no calor do momento, suas mãos ainda estavam sobre a
sua canela.
Bruce assistia à cena com diversão estampada no rosto.
— Quero que pegue o meu ursinho do chão.
Valery suspirou, mas acabou cedendo. Em um movimento
rápido, a mulher se levantou da cadeira e pegou o urso que estava
caído no corredor.
— Pronto. — Valery colocou a pelúcia no colo de Lorie e se
sentou na poltrona logo em seguida.
— Agora, faça as pazes com a minha mãe — a garotinha
prosseguiu.
Franzi o cenho e olhei para Valery, que também me encarava
de um jeito hesitante. Longos segundos se passaram até que ela
decidiu abrir a boca.
— Desculpe — a mulher disparou, parecendo uma criança
embirrada.
— Agora se abracem — Lorie exigiu.
A irmã de Bruce hesitou, mas levantou da poltrona e veio até
mim. Suspirei, entediada, e me coloquei de pé para receber o
abraço daquela víbora.Minha filha estava fazendo comigo o mesmo
que eu fazia quando ela se envolvia em uma briga com seus
amiguinhos da escola. “Peça desculpas e se abracem.” Era o que
eu sempre dizia, mas agora que a situação era inversa eu me
arrependia de ter ensinado isso a ela.
— Vamos acabar logo com isso — resmunguei, quando a
mulher se aproximou de mim.
Valery e eu nos abraçamos levemente e logo nos afastamos.
Quando olhei para Bruce, notei que outra vez ele estava se
segurando para não rir da situação.
Valery e eu voltamos para os nossos assentos, mas Lorie
prosseguiu com as exigências.
— Agora você vai abraçar o meu ursinho e pedir desculpas
para ele também.
— Ah, não... Isso já é sacanagem! — A mulher abriu sua
bolsa apressadamente e tirou de lá duas notas de 100 dólares. —
Pegue isso e me deixe em paz. — Ela entregou o dinheiro para
Lorie, que aceitou com os olhinhos brilhando.
— Mamãe, eu estou rica! — Lorie me mostrou as notas. —
Vou comprar um caminhão de doces!
Encarei Valery com um olhar irritado, deixando claro que eu
reprovava a sua atitude. Antes que eu pudesse pensar em uma
solução para aquilo, Bruce levantou da poltrona e foi até Lorie. Ele
me entregou o urso de pelúcia que estava no colo dela e tirou o
cinto da garotinha.
— Vamos assistir TV, Lorie. — Bruce ajudou sua filha a ficar
de pé. — Devia vir também, Jenny.
Concordei imediatamente e levantei da poltrona, deixando o
ursinho de Lorie sentado em meu lugar. Valery resolveu permanecer
onde estava, massageando a sua canela avermelhada que com
certeza ficaria roxa nas próximas horas.
Apesar de eu não estar feliz com a presença da irmã de
Bruce naquela viagem, me senti um pouco aliviada por saber que as
coisas entre nós provavelmente ficariam menos tensas a partir de
agora. Acho que Valery vai parar de pegar no meu pé... ela não vai
querer ser atormentada por Lorie outra vez.

Apesar dos problemas que tivemos com Valery, o resto do


voo correu bem. Chegamos no Aeroporto Internacional da Filadélfia
aproximadamente uma hora e meia depois que saímos de
Manhattan e eu me senti aliviada por não ter desmaiado ou ficado
tonta em nenhum momento.
Valery passou a viagem inteira calada, sentada em sua
poltrona e com uma compressa de gelo em sua canela. Assim que
pousamos, ela pegou um táxi direto para o hotel 5 estrelas mais
próximo e não a vimos desde então.
Deixei Lorie no jatinho sob os cuidados de Brittany que
estava pegando dicas de trabalho com Kevin, e acompanhei Bruce
até a construção que ele iria supervisionar. Parece que a minha
amiga e o piloto da Lancasther Enterprises estão se dando bem...
isso foi inusitado.
Segui Bruce até uma vaga reservada no estacionamento do
aeroporto, onde estava um Audi A4 cinza que ele havia alugado
para transitar pela Filadélfia. Entramos no veículo e seguimos pela
via principal em direção a Kensington. Cerca de 20 minutos depois
chegamos em um extenso canteiro de obras. Bruce estacionou na
entrada do terreno e desceu do carro, fazendo sinal para que eu o
acompanhasse.
A construção ainda estava na fase inicial. No terreno de areia
batida haviam apenas fundações e colunas de concreto que seriam
a base para aquele futuro centro recreativo. Em meu campo de
visão haviam pilhas de madeira e tijolos, uma máquina de misturar
cimento, fios enrolados e alguns operários trabalhando. Os homens
vestiam calça cinza, blusa azul e um capacete de segurança.
— Docinho, observe o local e me avise se encontrar alguma
irregularidade — Bruce pediu, enquanto olhava ao nosso redor. —
Eu vou falar com o empreiteiro.
Franzi o cenho quando meu namorado se afastou sem ao
menos esperar pela minha resposta. Por acaso eu tenho cara de
quem sabe identificarirregularidades em construções civis? Sem ter
outra alternativa peguei meu bloco de anotações dentro da bolsa e
comecei a andar pelo terreno. Vou fazeruma lista de qualquer coisa
que possa parecer estranha em uma construção.
Enquanto eu caminhava olhando para os meus pés com
medo de tropeçar em alguma coisa, ouvi um assovio à minha
esquerda.
— Jenny? É você mesma? — indagou uma voz masculina
que era estranhamente familiar.
Parei de andar e ergui o rosto na direção da voz. Ao ver
quem me chamava senti o ar sair dos meus pulmões e cerrei os
punhos com raiva.
— Gustav — cuspi o nome para fora da minha boca.
O desgraçado do meu ex-namorado estava diante de mim,
usando um uniforme de operário e um capacete de segurança
branco. Gustav me encarava com um olhar animado — até parecia
que ele se esqueceu do que fez comigo. Por sorte, eu segui em
frente e consegui um homem muito melhor com quem tive uma filha.
Apesar dos anos que se passaram, desde a última vez que o
vi, eu ainda pude sentir o rancor queimar no fundo da minha alma.
Posso ter superado o que esse filho da puta me fez, mas nunca irei
perdoá-lo.
Em um gesto defensivo, cruzei os braços e encarei Gustav de
cima a baixo. Ele aparentava ser muito mais velho do que realmente
era e ganhou uma barriga proeminente que com certeza tinha a ver
com a cerveja.
— O que está fazendo aqui? — mantive uma certa
indiferença na voz.
O homem olhou ao seu redor e depois voltou sua atenção
para mim.
— Bom, eu trabalho para a construtora — respondeu sem
hesitar. — Estamos construindo um centro recreativo em nome de
um empresário rico que provavelmente só quer sair bem nas
notícias.
Fiquei irritada. Gustav não tinha a mínima noção do que
estava falando. Ele sempre teve uma visão fechada sobre a elite e
achava que todos eram pessoas arrogantes que só se importavam
em lucrar. Depois que conheci Bruce eu descobri que existiam
algumas exceções e que nem todos os ricos eram egoístas e
metidos. Valery é assim, mas Bruce não...
— E o que você está fazendo aqui, Jenny?
Engoli em seco pensando no que responder. Depois de
alguns minutos, decidi esfregar a verdade na cara do meu ex.
— Estou supervisionando a obra — me gabei. — Por acaso,
eu sou a secretária e namorada do empresário rico que está
financiando a construção.
Gustav me encarou de cima a baixo e deu uma risada cética.
— Não acredito que veio até aqui para me contar mentiras e
me fazer acreditar que está melhor de situação que eu — debochou.
— Na melhor das hipóteses você deve trabalhar como garçonete em
algum bar de esquina.
Bufei com irritação ao ver o velho Gustav narcisista e
debochado entrando em cena. Não acredito que já namorei essa
coisa. Eu não podia deixá-lo pensar que eu estava na pior, isso
apenas aumentaria o ego dele.
— Você não acompanha as notícias? — disparei. —
Anunciaram o meu namoro com Bruce Lancasther em todas as
manchetes.
— Não fico acompanhando sites de fofoca adolescente, eu
cresci e tenho mais o que fazer. — Ele cruzou os braços. — Devia
fazer o mesmo, Jenny. Você sempre esteve com a cabeça nas
nuvens, por isso eu te larguei. Cresça de uma vez e pare de
espalhar mentiras por aí... você não é namorada desse tal de Bruce
Lancasther.
— Ah, ela é sim — Bruce respondeu, em um tom quase
ameaçador.
Tudo dentro de mim tremeu. Levei um susto ao ouvir sua voz
e por um instante pensei que o meu coração fosse saltar pela boca.
Me pergunto o quanto ele ouviu dessa conversa...
CAPÍTULO 30

— Como pode ver, Sr. Lancasther, estamos terminando as


fundações — o empreiteiro explicou. — Começaremos a erguer as
paredes, provavelmente, na semana que vem...
Eu apenas concordava em silêncio com tudo que o homem
na minha frente dizia. As obras estavam avançadas e não havia
nada com o que me preocupar — exceto com a minha namorada.
Meus olhos estavam fixos em Jenny, que foi parada por um dos
operários e estava visivelmente inquieta e desconfortável. Eu não
sabia quem ele era ou o que queria, mas meus pensamentos não
conseguiam se calar. Todas as vozes da minha cabeça me diziam
para ir até lá e tirar aquele idiota de perto da minha mulher.
Relutei por alguns minutos, pois não queria que Jenny
pensasse que eu era um sujeito arrogante e possessivo, mas
quando vi o desgraçado a encarando de cima a baixo eu não
consegui me conter. Deixei o empreiteiro falando sozinho e caminhei
em passos largos até o operário que estava importunando Jenny. O
sangue pulsava em minha cabeça e à medida que eu me
aproximava, comecei a ouvir as vozes dos dois. Eles pareciam estar
discutindo. Talvez Jenny conheça o sujeito. Preciso lembrar que ela
já morou aqui na Filadélfia.
— ... você sempre esteve com a cabeça nas nuvens, por isso
eu te larguei. — Quando ouvi o homem dizer aquilo para Jenny, o
meu coração parou. Então eles tiveram um relacionamento? —
Cresça de uma vez e pare de espalhar mentiras por aí...você não é
namorada desse tal de Bruce Lancasther.
— Ah, ela é sim — disparei, enquanto me aproximava.
Jenny me encarou assustada e o homem ficou boquiaberto
enquanto me analisava de cima a baixo.
— Olá, Bruce — ela me cumprimentou, um pouco
envergonhada.
Em um gesto possessivo, coloquei um braço ao redor da
cintura dela e rocei meus dedos em sua bochecha. Não ligo se
esses dois já tiveram algo, Jenny está comigo agora e eu não vou
deixar esse sujeito andar no meu território.
Por mais que eu tentasse evitar o pensamento, ver aquele
operário com Jenny me fez levantar uma questão inevitável: Será
que esse homem é o pai da Lorie? Olhei para o sujeito de cima a
baixo tantas vezes que ele começou a ficar desconfortável. O cara
não se parecia em nada com a baixinha. O cabelo que estava a
mostra dos lados de seu capacete possuía um tom castanho
avermelhado e seus olhos eram cinzas, os traços de seu rosto
também não se assemelhavam nem de longe com os de Lorie. Ele
não é o pai dela.
— Está tudo bem, Jenny? — Meus olhos se desviavam entre
ela e o outro homem.
— C-claro, Bruce — ela gaguejou em resposta. — Nós já
terminamos de conversar.
— Ótimo, porque eu já resolvi o que eu tinha para resolver.
Vamos embora, docinho.
Comecei a puxá-la sutilmente para longe do operário e me
senti aliviado quando ela não relutou. Eu queria sair dali e ir para
algum canto tranquilo com Jenny. Já que estávamos na Filadélfia,
eu gostaria de relembrar a noite em que nos conhecemos. Não me
lembro exatamente da data, mas eu conhecia o bar em que
estávamos. Se a minha lembrança, em forma de sonho, não me
pregou uma peça, o lugar fica a poucos quilômetros daqui.
Caminhamos em silêncio até a saída do canteiro de obras e
em momento algum eu tirei minha mão da cintura da minha
namorada. Enquanto eu me afastava, olhei sobre o ombro algumas
vezes para ver se o homem com quem Jenny conversava ainda
estava por lá. Ele tinha voltado ao trabalho e agora tentava
desembolar um longo pedaço de fio. Decidi esquecer o sujeito e
deixar aquela história para trás. Ele não parecia ser perigoso para o
meu relacionamento, então não havia com o que me preocupar.
Enquanto eu dirigia em direção a Harrowgate, Jenny
conversava com Brittany ao telefone. Ela não fazia ideia de para
onde eu estava a levando, apenas informei que daríamos um
passeio naquele fim de tarde. Se eu estivesse sozinho, teria feito
essa viagem na metade de um dia e estaria de volta na empresa
antes do anoitecer, mas agora as coisas são diferentes. Eu tenho
uma namorada e quero passar um tempo com ela.
Não sei dizer o que aconteceu comigo. Há alguns meses eu
lutava para não me apegar a nenhuma funcionária da empresa e
agora eu estava de joelhos pela minha secretária. O jeito que Jenny
se aproximou de mim foi diferente de todas as outras mulheres com
quem eu já fiquei. Ela me passava uma sensação de paz e
felicidade que eu nunca experimentei na vida. Estar com Jenny era
como voltar para casa depois de um longo período fora, com ela eu
me sentia confortável para tirar a máscara de empresário autoritário
e ser quem eu realmente era. Pela primeira vez em muito tempo, eu
me sentia amado.
— Brittany disse que tem tudo sob controle — Jenny
comentou, ao desligar a tela do celular. — Lorie está se
comportando bem, então acho que você e eu teremos algumas
horas sozinhos.
— Perfeito. — Lancei um sorriso malicioso para ela e
estacionei o carro em uma vaga disponível que havia na calçada.
Do outro lado da rua estava o bar em que Jenny e eu nos
conhecemos. Meu coração palpitou quando desci do carro e o
nervosismo que se instalou na boca do meu estômago me fez sentir
como se eu fosse um adolescente levando uma garota para sair
pela primeira vez.
Quando abri a porta para a minha namorada descer do
veículo, percebi em seus olhos esverdeados que ela estava tão
nervosa quanto eu.
— Ah... o que estamos fazendo aqui? — Jenny indagou,
enquanto saíado carro. Ela se posicionou ao meu lado na calçada e
colocou sua bolsa no ombro.
— Eu pensei em relembrar a noite em que nos conhecemos.
Segurei a mão dela e caminhamos em direção ao bar. Jenny
me acompanhou, mas seus passos ficavam cada vez mais
hesitantes à medida que nos aproximávamos do estabelecimento.
— Há algo errado? — perguntei, quando paramos em frente
à porta de vidro do lugar.
Minha namorada suspirou, inquieta. Seus olhos vagavam
entre o bar e eu. Fiquei sem saber o que fazer naquele momento.
Será que ela não quer estar aqui?
— Podemos ir embora se você quiser...
— Não — ela me interrompeu. — Eu só estou um pouco
surpresa. Não imaginei que se lembraria desse bar, você deve ter
visitado tantos...
— Eu me lembrei desse bar quando o vi em meu sonho. —
Abri a porta para ela e esperei que entrasse. — Mas confesso que
não me lembro da data em que você e eu nos conhecemos.
Jenny reprimiu uma risada e entrou no estabelecimento.
Caminhamos de mãos dadas até o balcão onde estava um
barman de meia idade com cabelos grisalhos — não era o mesmo
homem que servia bebida em meu sonho. A decoração do bar
permaneceu a mesma, apesar dos anos que se passaram. Estar
aqui mais uma vez me trouxe um sentimento de nostalgia.
— 3 de fevereiro de 2016 — Jenny sussurrou, ao se sentar
no banquinho que estava de frente para o balcão.
— O que disse? — Acomodei-me no assento ao seu lado.
— Foi quando nos conhecemos.
Encolhi os ombros, me sentindo culpado. Ela lembrava até da
data em que nos encontramos pela primeira vez e eu me esqueci de
tudo quando voltei à sobriedade naquela madrugada.
— Nunca pensei que voltaria aqui — ela divagou. — Tanta
coisa mudou naquela noite...
— Como o quê?
— Bom, foi quando eu decidi ir embora da cidade e
recomeçar a vida em outro lugar — respondeu, enquanto analisava
o cardápio de bebidas.
— Me pergunto o que fez você tomar essa atitude.
Jenny suspirou e colocou uma mexa do seu cabelo atrás da
orelha. Ela parecia aflita com alguma coisa.
— Eu tinha acabado de terminar um relacionamento —
confessou. — Sabe aquele cara com quem eu estava conversando
na construção? Ele foi meu namorado por dois anos. — Jenny
encolheu os ombros. — Um dia eu cheguei em casa mais cedo e
peguei o desgraçado com a vizinha, na minha cama.
Fechei meus punhos com força quando ouvi aquilo. Pensar
em Jenny passando por esse tipo de coisa me deixou furioso e eu
precisei de todo o meu autocontrole para manter a calma e deixar
que ela terminasse o relato.
— Brigamos e eu o expulsei da minha casa — Jenny
prosseguiu. — Enquanto o Gustav guardava as coisas dele eu
resolvi sair para esfriar a cabeça... caminhei por alguns quarteirões
até que passei na frente desse bar. Não pensei duas vezes e entrei
para encher a cara. Eu só queria esquecer o que tinha acontecido.
— Filho da puta! — Bati no balcão e não me importei que o
meu movimento atraiu alguns olhares curiosos. Naquele momento,
eu só conseguia pensar em voltar até aquele canteiro de obras e
socar o infeliz.
— Shh... relaxa, Bruce. — Jenny afagou o meu braço, na
tentativa de me tranquilizar. — Isso foi há muito tempo.
— Esse sujeito não é o pai da Lorie, é?
Jenny franziu o cenho e balançou a cabeça negativamente.
— Céus, não! — Ela fez uma careta de desconforto. — Nos
últimos meses do nosso relacionamento o Gustav sempre inventava
alguma desculpa para não transar comigo. Tenho certeza absoluta
que Lorie não é filha daquele imbecil.
Concordei com a cabeça e um alívioinexplicável tomou conta
do meu peito. Eu odiaria que a baixinha tivesse um pai tão escroto
como aquele homem.
— Ei? Traga duas doses de whisky! — Jenny pediu ao
barman.
Em poucos segundos, o homem trouxe dois copos de shot e
os colocou sobre o balcão à nossa frente. Ele os encheu por igual e,
em seguida, se afastou para atender os demais clientes.
— Mas e você, Bruce? — ela chamou a minha atenção,
enquanto passava seu dedo na beirada do pequeno copo de vidro.
— O que te trouxe para o bar naquela noite?
Após pensar por alguns segundos, comecei a me recordar de
acontecimentos que antecederam a data do nosso primeiro
encontro.
— A minha história é uma merda — admiti. — Na época, eu
havia acabado de entrar na faculdade por livre e espontânea
pressão do meu pai. Como eu te expliquei há um tempo, eu não
queria fazer o curso, então peguei o dinheiro e fiquei passeando de
estado em estado, enquanto o velho pensava que eu estava
estudando. — Suspirei, envergonhado. — No dia em que nos
conhecemos eu estava de passagem pela Filadélfia. Não teve
nenhum motivo especial para que eu entrasse nesse bar, apenas
estava ficando tarde e eu queria encher a cara.
Hoje eu não me orgulhava tanto dessa história, mas também
não me arrependia do que fiz. A minha fase de rebeldia me rendeu
bons anos de farra e também garantiu que eu conhecesse Jenny —
embora eu só tivesse me lembrado do nosso primeiro encontro
recentemente.
— Então, foi assim que os nossos caminhos se cruzaram
naquela noite fria de quarta-feira — Jenny concluiu, distraidamente.
Deixei uma risada escapar. Confesso que eu estava
admirado pela boa memória da minha namorada.
— Como consegue se lembrar detalhadamente sobre aquela
noite? Estava bêbada, talvez até mais que eu.
Jenny suspirou e bebeu seu shot de whisky de uma só vez.
— Eu nunca esqueci aquela noite, Bruce — confessou,
olhando no fundo dos meus olhos. — Nesses seis anos que se
passaram você nunca saiu da minha cabeça.
Embora o medo de ficar bêbado fosse grande, criei coragem
e bebi o whisky que estava em meu copo. O líquidodesceu ardendo
pela minha garganta e queimou ao chegar no estômago, mas essa
sensação intensa não se comparou ao que as palavras de Jenny me
fizeram sentir. Ela disse que nunca se esqueceu de mim, que eu
estive em sua mente por todos esses anos. Pensar nisso fez o meu
coração palpitar de um jeito que pareceu estar prestes a sair pela
boca. Um calor intenso brotou em meu peito e em questão de
segundos a minha pele começou a suar, como se estivéssemos
passando por uma onda de calor.
— Gostaria de voltar lá? — perguntei de maneira impulsiva.
Jenny franziu o cenho, confusa.
— Voltar onde?
— No lugar em que transamos pela primeira vez — sugeri. —
Você lembra onde fica?
Ela pensou por alguns segundos, em seguida, se levantou do
banquinho em que estava sentada e sorriu para mim.
— Então vamos, antes que você tome outra dose de whisky e
comece a sofrer de amnésia alcoólica. — Jenny segurou o meu
braço e me puxou para fora do assento.
Tirei da minha carteira uma nota de 10 dólares e a deixei
sobre o balcão para pagar as bebidas. Sorri maliciosamente para
Jenny e ela entrelaçou suas mãos em meu braço, me levando para
fora do bar de maneira apressada.
CAPÍTULO 31

Quando entrei no pequeno quarto de iluminação baixa, uma


sensação familiar tomou conta de mim. Eu não me lembrava de
nada daquele lugar e mesmo assim sentia uma estranha nostalgia.
— Passaram seis anos e eles sequer mudaram a decoração
— Jenny comentou, ao trancar a porta. Ela tirou seu sobretudo cinza
e o colocou em um gancho na parede junto com a sua bolsa de
ombro.
Aproveitei o momento para me livrar do paletó do meu terno e
desfazer o nó da minha gravata. Enquanto eu fazia isso, analisei
cada canto do quarto na esperança de conseguir alguma lembrança
nova da noite em que estive aqui pela primeira vez.
Era um cômodo pequeno. Havia apenas uma cama de casal
forrada com um lençol branco, uma TV pregada na parede e uma
pequena janela quadrada que estava coberta por uma persiana
cinza. Ao lado da porta do banheiro havia uma mesa com duas
cadeiras e uma cômoda para guardar roupas. A única luz vinha do
abajur que estava sobre a mesa de cabeceira, no lado esquerdo da
cama.
Porra, não acredito que eu trouxe Jenny para cá ao invés de
pagar por um hotel 5 estrelas com o cartão do meu pai, como eu
normalmente fazia. Eu devia estar muito bêbado naquela noite...
Enquanto eu me perdia em pensamentos, Jenny se
posicionou na minha frente e começou a desabotoar minha camisa
branca. Deixei que ela tirasse aquela peça do meu corpo e, então, a
puxei pela cintura. Seus seios se chocaram contra o meu tórax e ela
segurou o meu braço em uma tentativa de se equilibrar. Sua boca
se curvou em um sorriso quando nossos olhares se encontraram.
Eu pude notar que ela estava ansiosa para reviver aquela noite e
me senti profundamente culpado por não lembrar de nada.
Com o peito pesado, acariciei ternamente o rosto de Jenny e
coloquei uma mecha de cabelo atrás da sua orelha.
— Me desculpe por não conseguir lembrar de tudo que
aconteceu naquela noite — sussurrei em um tom culpado.
Jenny sorriu e entrelaçou as mãos ao redor do meu pescoço.
— Não se preocupe com o que passou. Sei que faremos
novas lembranças juntos, Bruce.
Ela ficou na ponta dos pés e me deu um breve selinho. Não
consegui me conter e segurei o rosto de Jenny para evitar que a sua
boca se afastasse da minha. Em questão de segundos, o nosso
beijo delicado se tornou ardente e intenso.
Empurrei Jenny na direção da cama e começamos a nos
despir de maneira apressada, fazendo o possível para que nossas
bocas não se separassem durante o processo. Quando não havia
mais roupas nos atrapalhando, levei minhas mãos até as coxas de
Jenny e a levantei, encaixando as suas pernas ao redor da minha
cintura. Seus seios roçavam contra o meu tórax enquanto nossas
línguas se entrelaçavam avidamente. A necessidade de possuí-la
fazia o meu peito arder com um desejo que ficava mais difícil de
controlar a cada segundo que passava.
Incapaz de adiar a nossa transa por mais tempo, me sentei
na cama e encaixei Jenny em meu colo. Sua boceta quente e
molhada roçou contra a minha ereção e eu gemi, ansioso para estar
dentro dela o mais rápido possível.
Ela separou nossas bocas e levantou seu quadril para que eu
me encaixasse em sua entrada. Nossos olhares se encontraram e
Jenny se sentou sobre o meu pau, acomodando cada centímetrono
interior do seu corpo. Suspirei enquanto aproveitava a sensação
reconfortante que eu sentia toda vez que estava dentro dela.
Sem aviso prévio, Jenny apoiou suas mãos em meus braços
e começou a se mover, balançando o quadril para frente e para trás.
Ofeguei e tentei ajudá-la com algumas investidas, mas no fim, deixei
que ela guiasse os movimentos.
As bochechas de Jenny estavam coradas enquanto ela
gemia e rebolava em cima de mim. Vê-la daquele jeito fez o meu
corpo se encher de desejo e a pressão em meu pau aumentou. Eu
estava perto de gozar, mas não faria aquilo antes dela.
Voltei minha atenção para os seus seios — que balançavam
em meu campo de visão — e não consegui resistir à vontade de
enterrar o rosto entre eles. Inspirei profundamente, me deliciando
com o cheiro da pele quente e suada de Jenny. Minhas mãos
deslizaram por suas costas até segurarem a curva do seu quadril
arredondado, dei um tapa em sua bunda e mordisquei um dos seus
mamilos. Minha namorada gritou e se apertou contra mim, seu
corpo estremeceu e eu vi o êxtase tomar conta do seu olhar quando
ela atingiu o orgasmo. Sorri com satisfação e lhe dei outro tapa.
Seria extremamente satisfatóriover a pele daquela bunda empinada
suja com a minha porra...
— Quero gozar na sua bunda, docinho... — pedi, excitado.
— Não! — gemeu, e contraiu sua boceta para me manter
dentro dela. Aquele aperto quase me levou ao limite. — Quero que
goze dentro de mim, como fez naquela noite! — Jenny implorou e
seguiu movimentando o quadril para frente e para trás, me fazendo
deslizar em seu canal deliciosamente apertado.
Ela afundou as unhas em meu braço e foi atingida por outro
orgasmo. Senti-la se apertando ao meu redor outra vez afastou
qualquer vestígio de sanidade que havia em minha mente. Abracei
Jenny com força até que cada milímetro do seu corpo estivesse
colado ao meu e deixei que a minha libertação inundasse a boceta
dela. Ofeguei enquanto nossos corpos suados estremeciam em um
só ritmo, aproveitando o êxtase intenso que nos invadiu.
Ficamos um bom tempo em silêncio, esperando que nossas
respirações voltassem ao normal. Jenny ainda estava em meu colo,
com a cabeça enterrada na curva do meu pescoço e me abraçava
como se a vida dela dependesse disso. Fechei os olhos, me
sentindo completamente em paz por tê-la comigo.
Por alguns segundos, me lembrei do que acabamos de fazer.
Lembrei de como Jenny me levou à loucura com o balanço do seu
quadril, de como ela gozou afundando as unhas em meu braço
desesperadamente pedindo que eu a acompanhasse em seu
clímax, que eu me terminasse dentro dela exatamente como fiz na
primeira vez em que transamos... Espera, eu gozei dentro dela
naquela noite? Mas eu ainda não tinha feito a cirurgia, ainda era
capaz de engravidar alguém...
Inconscientemente, liguei a data do nosso primeiro encontro
com o dia em que Lorie faria aniversário. Jenny me disse que a
baixinha faz aniversário dia 10 de novembro. Meu peito congelou. 9
meses. Não... Não pode ser... Caralho!
A possibilidade de eu ser o pai de Lorie jamais passou pela
minha cabeça antes. Na época que aquela maldita revista publicou
uma manchete com essa suspeita, eu não sabia que Jenny e eu
tínhamos nos encontrado no passado, então sequer me dei ao
trabalho de desconfiar de alguma coisa. E se eu for o pai da Lorie?
Porra! Puta que pariu!
— Bruce? — Jenny ergueu seu rosto e me encarou. — Por
que ficou tenso de repente?
Ainda perdido em pensamentos, toquei o rosto dela e
acariciei sua bochecha distraidamente. Nossos olhares se
encontraram e embora o meu coração estivesse amortecido pelo
nosso momento romântico, a minha mente só conseguia pensar em
uma única coisa.
— Jenny, eu gozei dentro de você naquela noite? Não
estávamos usando camisinha? — indaguei, com um leve desespero
na voz.
Ela deixou suas mãos descansarem ao redor do meu
pescoço e negou com a cabeça, respondendo silenciosamente à
minha pergunta.
— Mas você estava tomando pílula ou algo assim, não
estava? — Meu peito se apertou com preocupação.
Ao ouvir minha pergunta, Jenny arregalou os olhos e eu
percebi que ela ficou assustada. Sua respiração — que tinha
acabado de voltar ao normal — ficou acelerada novamente e suas
mãos que descansavam ao redor do meu pescoço começaram a
suar frio. A reação que ela teve quando levantei aquela questão fez
o meu pânico crescer.
— Jenny... — insisti, meu tom de voz estava mais
desesperado do que pretendia. — Você estava usando algum
anticoncepcional, não estava?
Ela hesitou antes de responder, seu rosto carregava uma
expressão aflita.
— Com tudo que tinha acontecido, acabei esquecendo de
tomar a pílula. Quando percebi eu... — Jenny se conteve e mordeu
o lábio inferior, evitando que sua boca soltasse mais palavras.
— O que houve? — Toquei a sua boca macia para que ela
deixasse de morder seus lábios e prosseguisse com o relato. — Me
fale o que aconteceu... por favor.
Minha namorada engoliu em seco e eu fiquei surpreso ao ver
uma lágrima escorrer pelo seu rosto.
— Quando percebi, eu... eu estava grávida da Lorie —
murmurou.
O ar faltou em meus pulmões. Não... talvez, seja uma
brincadeira. Olhei nos olhos de Jenny para ter certeza que ela
estava me pregando uma peça, mas só vi lágrimas saíremde lá. Ela
levou suas mãos à boca para conter um soluço que saiu em meio ao
choro e puxou o ar com força, deixando claro que estava com
dificuldade para respirar. Caralho, Jenny não parece estar mentindo.
Meu coração estava tão acelerado que eu podia ouvir os
batimentos martelando em minha cabeça. Eu não sabia como reagir.
Porra... isso não pode ser real.
— Está falando sério? — questionei com a voz trêmula. —
Jenny... eu sou o pai da Lorie?
Quando eu disse aquelas palavras em voz alta eu não
acreditei. Parecia mentira, uma coisa inventada. Mas analisando o
que havia acontecido entre nós, eu sabia que as chances de ser
verdade eram praticamente de 99%. Como pude ser tão burro? Eu
sou o pai da baixinha? Esse tempo todo eu tinha uma filha e ela
estava bem na minha frente. Porra... Como não percebi isso antes?
— Ela é minha filha? — insisti.
Jenny fechou os olhos e respirou fundo.
— Desculpe... eu queria ter contado antes, mas não
consegui — sussurrou, em um tom arrependido. Quase parecia que
a mulher estava confessando um crime.
A verdade começou a pesar em meu peito e minha
respiração ficou descompassada. Ao notar o meu estado de pânico,
Jenny saiu do meu colo e só então eu percebi que estava dentro
dela esse tempo inteiro. A mulher ficou de pé na minha frente e me
encarou com um olhar aflito.
— V-você está bem? — gaguejou, enquanto cruzava os
braços diante do peito para cobrir um pouco da sua nudez.

— Por que não me contou? — Foi tudo que eu consegui


dizer.
Jenny ficou em silêncio por um tempo, respirando fundo e
tentando impedir que mais lágrimas caíssem dos seus olhos, mas
não teve sucesso. Eu estava em choque, não sabia o que fazer.
Uma sensação de ansiedade se instalou na boca do meu estômago
e não saiu mais de lá, estava difícil pensar com coerência. Minhas
mãos tremiam e eu suava frio.
— Quando descobri que estava grávida eu não sabia como
te procurar. Você sequer me deixou um número de telefone... tive
que me virar sozinha — explicou em meio ao choro. Lágrimas
incessantes saíam dos seus olhos e seu rosto estava vermelho. —
Acabei te encontrando seis anos depois, quando já estava
convencida de que nunca mais iria te ver.
— Na empresa? — tentei entender.
Ela assentiu e começou a andar de um lado para o outro.
— Quando cheguei para a entrevista de emprego eu não
imaginava que a empresa era sua. — Enquanto falava, Jenny
chorava e soluçava sem parar. — Não tive coragem de contar... eu
não queria que você pensasse que eu estava dando um golpe para
arrancar dinheiro de você ou algo assim.
— Porra — deixei escapar, atordoado com a revelação.
— Perdi ainda mais a coragem de contar quando descobri
que você não queria ter filhos. — Ela fungou o nariz. — Você e a
Lorie estavam se dando tão bem... eu não queria que isso fosse
arruinado caso você descobrisse a verdade. Fiquei com medo que
você a tratasse mal.
— Há quanto tempo sabe que sou o pai?
Jenny parou de andar e virou seu rosto na minha direção. Ela
respirou fundo e limpou as lágrimas que molhavam suas bochechas.
— Eu sempre soube, Bruce. Você foi o único homem com
quem eu fiquei naquela época. — Jenny respirou fundo novamente,
se esforçando para conter o choro. — Por isso eu nunca te esqueci.
Toda vez que eu olhava para a Lorie eu me lembrava de você. Todo
dia, toda noite... isso acabava comigo.
Incapaz de se conter, ela levou suas mãos ao rosto e voltou a
chorar. Jenny estava desesperada — talvez não tanto quanto eu,
mas ainda assim ela precisava de algum conforto. Apesar da
revelação chocante que recebi, meus sentimentos não mudaram. Eu
ainda estava apaixonado por Jenny e vê-la chorar daquele jeito na
minha frente fez com que eu ignorasse o meu próprio sofrimento e
me levantasse da cama para consolá-la.
Com o coração apertado, puxei Jenny para um abraço e
deixei que ela enterrasse a cabeça em meu peito. Uma culpa
gigantesca se abateu sobre mim e, pela primeira vez em muito
tempo, senti vontade de chorar. Esse tempo todo eu tinha uma filha
precisando de cuidados e não estava presente para ela...
— Você vai embora? Vai nos deixar como fez naquela noite?
— Jenny murmurou, enquanto se afastava do meu abraço. Suas
mãos socaram o meu ombro, para descontar a aflição. — Porra, eu
não quero que você vá, Bruce! Não quero... não quero!
Meu coração doeu ao ver minha namorada naquele estado.
Puxei-a de volta para perto de mim e a prendi em um abraço ainda
mais forte. Afaguei o cabelo dela com ternura e percebi o quanto eu
me sentia bem com Jenny em meus braços. Eu não quero que isso
mude, não vou abandoná-la.
— Eu não vou a lugar nenhum, Jenny — tentei tranquilizá-la.
— Eu te amo e não vou te abandonar.
Jenny soluçou e ergueu seu rosto para me encarar. Nossos
olhares se encontraram e ela me direcionou um sorriso fraco.
— Você... me ama? — perguntou, em meio aos soluços.
Sorri para ela e concordei em silêncio. Eu nunca disse "eu te
amo" para alguém além da minha falecida mãe, mas agora que falei
isso para Jenny eu me sentia, inexplicavelmente, feliz e realizado.
— Também te amo, Bruce — ela sussurrou emocionada, e
voltou a me abraçar.
Ficamos em silêncio, unidos naquele abraço, até que percebi
que o seu choro havia cessado e eu senti Jenny bocejar
discretamente com seu rosto enterrado na curva do meu pescoço.
Um sorriso irônico curvou a minha boca quando pensei que eu
provavelmente não conseguiria dormir essa noite, havia muito o que
pensar e refletir agora que descobri sobre Lorie.
Eu não me sentia irritado por saber que tinha uma criança
sob a minha responsabilidade — eu até podia estar desesperado
por não saber nada sobre cuidados infantis, mas irritado não. Para
ser sincero, no fundo eu estava aliviado porque já criei um vínculo
com a garotinha. Talvez, assim, as coisas fiquem mais fáceis.
Honestamente, se eu pudesse escolher uma criança no
mundo para ser minha, com certeza, eu escolheria a Lorie. Ela foi a
única com quem simpatizei e me pergunto se desde o início isso já
não tinha a ver com o laço que nós dois compartilhávamos sem
saber.
Enquanto eu me perdia em pensamentos, Jenny bocejou
novamente e eu decidi levá-la para a cama. Peguei a mulher nos
braços e a coloquei gentilmente sobre o colchão. Me acomodei ao
seu lado e a puxei para perto de mim, permitindo que ela
descansasse a cabeça em meu peito. Peguei o cobertor que estava
dobrado na beira da cama e o puxei até cobrir suas costas para
garantir que ela ficaria aquecida pelo resto da noite.
— Você ainda estará aqui de manhã? — perguntou,
sonolenta. Havia um leve tom de desconfiança em sua voz e eu não
pude culpá-la.
Entrelacei meus braços ao redor do seu corpo e recostei
minha cabeça no travesseiro.
— Não se preocupe, docinho... eu não vou abandonar você e
a baixinha de novo — prometi.
Jenny concordou silenciosamente e quando sua respiração
ficou suave eu concluí que ela tinha caído no sono.
Não consegui ficar chateado com ela por esconder a
verdade, mas desejei que tivesse me contado há mais tempo.
Sempre que eu perguntava sobre o pai de Lorie, Jenny se
esquivava do assunto. Eu devia ter percebido que tinha algo errado,
devia ter ligado os pontos há mais tempo, mas fiquei tão imerso no
romance com a minha secretária que sequer me importei em
desconfiar que ela tinha uma filha que várias pessoas disseram ser
parecida comigo.
Bom, não adianta ficar remoendo o passado. Infelizme nte,
não posso recuperar os primeiros anos que perdi da vida da minha
filha, mas posso começar a ser presente a partir de agora.
Um dos motivos pelo qual eu decidi que não teria filhos era
porque eu não queria ser igual ao canalha do meu pai em nada. Eu
tive um péssimo exemplo paterno, não sabia como cuidar de uma
criança e não queria ser responsável por colocar alguém no mundo
para sofrer. Mas, caralho, olha só onde eu vim parar. Por ironia do
destino eu tinha uma filha que precisou de mim nos últimos anos e
eu não estava lá. Puta que pariu.
A vida me colocou em uma saia justa e eu não tinha para
onde correr. Se eu fugisse dessa responsabilidade estaria sendo
igual ao meu pai — e eu preferia morrer do que me igualar aquele
homem. Precisava aceitar o fato de que Lorie era minha filha e tinha
que me esforçar para ser o melhor pai do mundo para aquela
garotinha. Eu não fazia ideia de por onde devia começar, mas ter a
intenção de ser participativo na infância dela já era alguma coisa.
CAPÍTULO 32

Acordei com um raio de sol batendo no meu rosto. Reprimi


um bocejo e deixei meu corpo se esticar na cama. Quando minhas
mãos tocaram a pele quente do homem que dormia ao meu lado, eu
me encolhi. Cobri meu rosto com o edredom ao lembrar que na
noite anterior eu contei para Bruce toda a verdade sobre ele ser o
pai da Lorie.
Eu estava assustada com o que seria do nosso
relacionamento daqui para frente, no entanto, não podia negar que
me senti aliviada por me livrar do fardo que carreguei por tanto
tempo.
— Já acordou, docinho? — Bruce perguntou, com a voz
sonolenta.
Fiquei em silêncio, sem saber o que devia responder, até que
senti uma mão se esgueirar pela minha cintura. Ela se manteve ali,
acariciando a minha pele de maneira terna e suave. Não resisti e
acabei deixando um suspiro escapar. O toque dele é tão bom...
Criando coragem, coloquei o meu rosto para fora do edredom
e encarei o homem que estava ao meu lado. A luz do sol que
entrava pela janela batia em seu rosto e dava ainda mais brilho aos
seus profundos olhos azuis. Assim como eu, Bruce estava sem
roupas desde a noite passada. O cobertor estava na altura do seu
abdômen e o formato nítido da sua ereção um pouco abaixo da
cintura deixou claro que ele não estava usando nem mesmo uma
cueca. Acho que eu teria colocado a mão ali se não estivesse tão
aflita pela conversa que tivemos na noite passada.
Bruce prometeu que não me abandonaria e eu queria
desesperadamente acreditar nisso, mas uma parte de mim ainda
temia que ele não gostasse da responsabilidade e resolvesse nos
deixar. Droga, preciso parar de pensar desse jeito! Se Bruce
quisesse me deixar, ele teria feito isso enquanto eu dormia.
— O que houve, Jenny? — perguntou, com um tom de
preocupação. Obviamente, percebeu o meu nervosismo.
— Estamos bem? — disparei, sem hesitar.
— Por que não estaríamos? — Bruce franziu o cenho e me
olhou nos olhos.
Dei de ombros e suspirei.
— Bom, eu não sei como ficarão as coisas entre nós agora
que você descobriu sobre a Lorie.
Um meio sorriso curvou a boca de Bruce e a sua mão tocou o
meu queixo.
— Nada mudará entre nós, docinho — ele me garantiu. —
Estou apaixonado por você e não te deixarei sozinha. Não pense
nem por um instante que vou te abandonar.
— E quanto à Lorie? Está tudo bem com essa coisa de
paternidade? — questionei, completamente insegura. — Se não
acreditou em mim e quiser fazer um exame de DNA eu vou
entender.
— DNA? — Bruce parecia incrédulo. — Se eu fizesse isso
então significaria que não acredito na sua palavra. — Ele suspirou e
se sentou na cama, apoiando as costas na cabeceira estofada. —
Vou me esforçar para ser um bom pai, embora eu não tenha ideia
do que devo fazer... você sabe que eu não tive um bom exemplo.
Sentei-me no colchão e puxei o cobertor até a altura dos
meus seios para que eles não ficassem à mostra.
— Isso quer dizer que vai continuar sendo gentil com a Lorie?
Ele assentiu.
— Eu já convivo com a baixinha há um tempo... — Um
sorriso curvou a sua boca. — Pensei muito durante a madrugada e
acho que não será difíciltratá-la como filha. Já me acostumei com a
presença dela.
Sorri para Bruce, sentindo um grande alívio no peito. É bom
saber que tudo acabou bem. Tomei coragem e me inclinei para
beijá-lo delicadamente. Nossas bocas se encontraram por alguns
segundos, mas eu logo me afastei — havia mais coisas que eu
queria dizer.
— Obrigada por decidir ficar conosco — sussurrei.
— Você não tem que me agradecer. — Ele balançou a
cabeça negativamente, seu olhar parecia culpado. — Na verdade,
eu te devo desculpas por não estar presente desde que Lorie
nasceu.
— Está tudo bem... você não sabia. — Acariciei o seu rosto.
Sua barba por fazer espetou levemente a minha mão, mas não me
importei, eu gostava da sensação.
Bruce suspirou com o meu toque.
— Prometo que vou recuperar esse tempo perdido, Jenny. E
se eu não for um bom pai para a baixinha, você pode me dar uma
surra.
Reprimi uma risada e concordei, embora eu não tivesse
nenhuma intenção de bater em Bruce caso ele não se saísse bem
como pai nos primeiros dias. Eu sabia que o coitado precisaria de
um tempo para se adaptar.
Levei um susto quando o meu celular começou a tocar, ele
ainda estava dentro da bolsa que pendurei no gancho ao lado da
porta. Talvez, seja Brittany. O pensamento me fez levantar da cama
rapidamente e ir até onde estava a minha bolsa. Acabei não me
importando com o fato de que estava nua, afinal, não havia nada
que Bruce já não tivesse visto em meu corpo.
Quando peguei o aparelho, não fiquei surpresa ao ver o
nome da minha amiga na ligação. Aceitei a chamada e coloquei o
celular no ouvido. Quando me virei para retornar até a cama,
percebi que Bruce encarava o meu corpo de cima a baixo e mal se
importava em disfarçar o desejo em seu olhar.
— Jenny? — Brittany falou do outro lado da linha. — O Kevin
quer saber que horas iremos decolar.
— Bom dia para você também — respondi, em um tom
brincalhão. — Bruce, que horas será a decolagem?
— Meio-dia. — Ele arqueou uma sobrancelha, parecendo
surpreso com a pergunta.
Passei o recado para Brittany e resolvi perguntar se ela tinha
notícias da minha filha.
— Como a Lorie está? Ela se comportou direitinho?
— Sim. Ela, Kevin e eu jogamos banco imobiliário até tarde
ontem à noite. Depois que a sua filhinha pegou no sono eu a
coloquei para dormir no sofá aqui do jato.
— Pensei que vocês iriam para o hotel que a empresa
reservou. — Sentei-me na beira da cama, tentando ignorar o fato de
que Bruce me comia com os olhos.
— Bom... os planos mudaram. — Ela ficou envergonhada de
repente. — Mas e você? O que ficou fazendo com o Bruce até tarde
da noite?
— Acho que você pode imaginar — respondi, com malícia na
voz.
— Eu vou tomar um banho agora. — Bruce empurrou o
cobertor para longe. Ele se levantou da cama e eu arquejei ao ver o
seu magnífico corpo nu. — Quer me acompanhar, docinho?
— Estou em uma ligação. — Senti-me mal por ter que
recusar o convite, pois eu iria adorar tomar um banho com o meu
namorado de corpo esculpido.
— Ah... poder ir. — Brittany deu risada do outro lado da linha.
— Vai aproveitar o seu bilionário gostoso.
— Docinho, eu vou deixar a porta aberta. — Bruce caminhou
tranquilamente para o banheiro e eu fiquei admirando o seu
bumbum empinado até ele desaparecer do meu campo de visão.
Suspirei e voltei a falar com a minha amiga.
— Podemos conversar quando eu voltar para a aeronave? —
Comecei a me sentir inquieta por causa da excitação que crescia
dentro de mim.
— Claro, conversamos quando você chegar aqui — ela
concordou. — Acho que está rolando um clima entre o Kevin e eu.
Reprimi uma risada ao ouvir aquilo.
— O Kevin é um cara legal. — Desejei que a minha
observação a incentivasse de alguma maneira. — E a propósito, eu
contei a verdade para o Bruce.
Brittany ficou em silêncio por alguns segundos.
— Que verdade, Jenny?
— Que ele é o pai da Lorie...
— O quê?! — ela exclamou, assustada.
— Jenny? Você vem? — Bruce me chamou do banheiro.
— Eu tenho que ir... — despedi-me de Brittany.
— Ei, você não pode tomar banho agora! Quero que me
conte o que aconteceu... como ele reagiu à notícia?
— Contarei tudo pessoalmente. — Sorri ao perceber a
inquietação da minha amiga. — Bruce está me chamando para
tomar banho com ele, então está óbvio que ele não reagiu de um
jeito negativo.
— Jenny, eu preciso saber! Você não pode jogar uma fofoca
dessas e sair correndo...
— Até mais tarde, Brittany. — Mandei um beijo pelo telefone
e desliguei a ligação.
Minha amiga com certeza estava surtando, mas decidi que
iria compensá-la com a fofoca completa durante o nosso voo de
volta para Nova York. Por enquanto, a única coisa que eu queria era
entrar em baixo de um chuveiro de água quente com Bruce e sentir
a sua pele molhada roçando a minha...

Ficar um tempo no chuveiro nos rendeu alguns minutos de


atraso. No fim, nem precisei da bagagem que eu trouxe para a
viagem, já que não fui para o hotel de 5 estrelas em que foram feitas
as reservas.
Depois que saí do banho acabei vestindo a mesma roupa que
usei ontem quando saí com Bruce para supervisionar as obras. Eu
não esperava que iríamos para um bar e depois para um motel
velho na beira de uma rodovia, onde pessoas de baixa renda
costumavam se hospedar quando estavam de passagem pela
cidade.
Muitas coisas inesperadas aconteceram nessa visita à
Filadélfia. Reencontrei o meu ex-namorado mala, saí para beber
com Bruce no bar em que nos conhecemos e no fim da noite, depois
de uma bela sentada, acabei confessando que ele era o pai da
Lorie.
Eu sabia que as coisas seriam diferentes de agora em diante,
e mesmo que Bruce não quisesse admitir, eu podia sentir que ele
estava apreensivo enquanto voltávamos de carro para o aeroporto.
Talvez esteja se preparando mentalmente para encontrar a filha,
agora que sabe a verdade.
Passava das 11:30h quando chegamos no hangar onde
estava o jato das empresas Lancasther. A rampa de embarque já
estava na porta da aeronave, então caminhamos até lá
imediatamente.
Antes que eu começasse a subir as escadas, Bruce parou de
andar e segurou a minha mão. Quando encarei o homem nos olhos,
percebi que ele estava aflito.
— O que houve? — preocupei-me.
Bruce suspirou e recostou seu corpo no corrimão da escada
que levava para dentro do jato.
— Estou nervoso — admitiu. — Não sei como agir perto da
Lorie.
— Tente tratá-la como sempre tratou. Acho que já é um bom
começo.
— Devo dizer que sou o pai dela?
Engoli em seco ao ouvir aquela pergunta. O que eu
respondo? Ainda não pensei em como contar à Lorie que ela tem
um pai e que ele é o tio Bruce. Também não quero que o homem se
sinta pressionado a fazer algo que não queira...
— Se achar que está pronto para lidar com a verdade, então
conte. — Dei de ombros. — Mas se não estiver, espere até que
tenha certeza.
Bruce concordou com o que eu disse e me direcionou um
sorriso agradecido.
— Obrigado por me entender. — Ele entrelaçou sua mão na
minha. — Está na hora de ver a baixinha.
Subimos a rampa de embarque e entramos na aeronave.
Passei os olhos pelo lugar e avistei Lorie sentada no sofá assistindo
desenho animado na TV retrátil que saía de um compartimento no
canto da parede. Ao lado dela, estava o seu inseparável urso de
pelúcia rosa.
Encarei Bruce e percebi que ele estava com os olhos fixos na
garotinha, parecendo incerto sobre o que devia fazer.
— Vá falar com ela — incentivei. — Dê bom dia ou algo
assim...
Bruce assentiu e caminhou até a filha em passos hesitantes.
Me sentei em uma das poltronas que ficavam perto da porta do jato
e decidi observar de longe.
— Bom dia, Lorie — Bruce disse, parando ao lado do sofá.
A garotinha deixou de olhar para a TV e encarou o pai.
— Olá, tio Bruce. — Ela sorriu.
O homem retribuiu o sorriso e passou um tempo observando
a filha, sem dizer uma única palavra. Ele parecia perdido em
pensamentos — acho que ainda estava processando as
informações que recebeu e tentando aceitá-las da melhor maneira
possível.
— Por que está assim, tio Bruce? — Lorie estranhou o
comportamento dele.
Bruce apenas deu de ombros e sorriu para ela outra vez.
— Lorie, eu posso te pedir um abraço?
A garotinha franziu o cenho, mas se levantou do sofá e
esticou os bracinhos na direção do pai. Bruce deixou uma risada
escapar e se inclinou para abraçá-la. Ele passou seus braços ao
redor da garotinha e a pegou no colo. Uma lágrima escapou dos
meus olhos e eu sorri, orgulhosa da cena que estava vendo diante
de mim.
— Jenny! — Brittany me chamou, enquanto saía da cabine
do piloto e andava na minha direção. Kevin veio logo atrás. — Você
contou mesmo?
— Sim, contei — respondi de imediato.
— Caralho... — Brittany murmurou ao perceber que Bruce
estava com a Lorie no colo.
— Contou o quê? — Kevin se intrometeu no assunto.
— Que a Lorie é filha do Bruce — minha amiga soltou.
Senti vontade de chutá-la, mas isso não faria o piloto
esquecer o que ouviu.
Kevin arquejou e seus olhos se desviaram na direção de
Bruce.
— Agora eu sei porque achei a garotinha familiar quando a vi.
— O piloto ficou boquiaberto enquanto encarava o seu chefe. —
Não foi apenas porque eu a vi na revista.
— Por favor, não espalhe isso por aí — pedi, na tentativa de
concertar o que Brittany havia feito. Eu não conseguia acreditar que
em menos de 24 horas ela ficou próxima o suficiente de Kevin para
lhe contar o maior segredo da minha vida.
Após encarar Bruce por mais alguns segundos, o piloto virou
seu rosto para mim e cruzou os braços diante do peito.
— Não é possível... como isso aconteceu? — ele me
questionou, completamente chocado.
Antes que eu pudesse responder, Brittany abafou uma risada
e cutucou o ombro do rapaz.
— Você não teve aulas de biologia na escola? — ela brincou.
— Como acha que eles dois tiveram uma filha?
— Não foi isso que eu quis dizer... — Kevin tentou se
explicar.
— Bruce e eu nos conhecemos há alguns anos, antes dele
assumir a empresa do pai — resumi brevemente a situação.
Kevin compreendeu a minha história e eu fiquei grata por ele
não querer bancar o enxerido pedindo mais detalhes sobre o
assunto.
— Dá para notar que a Lorie é filha do Sr. Lancasther. — O
piloto encarava Bruce, que ainda estava com a garotinha no colo. —
Os dois se parecem muito...
— O quê?! — Valery arquejou ao entrar no avião, ela estava
boquiaberta. — Que brincadeira é essa?
Fechei os olhos e desejei que aquilo fosse apenas um
pesadelo, mas infelizmente quando os abri outra vez a irmã de
Bruce ainda estava lá, encarando todos nós com uma expressão
assustada no rosto. Merda!
CAPÍTULO 33

— Bruce? — Valery encarou o irmão, indignada. — Vai deixar


que falem esse absurdo sobre você?
Bruce voltou sua atenção para a mulher, Lorie ainda estava
no colo dele e parecia não querer sair dali.
— Não é um absurdo, Valery. Eu realmente sou o pai da
Lorie.
Valery arquejou de maneira teatral e levou as mãos ao peito.
Antes que qualquer um de nós pudesse segurá-la, ela caiu no chão
e bateu a cara no carpete que forrava o piso da aeronave.
— Merda — Bruce resmungou e colocou Lorie no chão. Ele
foi até a irmã e a virou de barriga para cima.
Ficamos observando enquanto o homem tentava acordar
Valery dando alguns tapas em seu rosto, mas ela não reagiu a
nenhum deles. Bruce acabou desistindo e pegou a mulher nos
braços, a levando para os fundos da aeronave. Ele a deitou no sofá
e colocou um cinto de segurança ao redor do corpo dela.
— Prepare a decolagem, Kevin — Bruce ordenou, enquanto
voltava para perto de nós.
O piloto assentiu e caminhou até a cabine de controle,
deixando a conversa para outra hora.
— Será que ela está bem? — fingi estar preocupada.
Bruce sorriu ironicamente e pegou Lorie outra vez para
acomodá-la na poltrona que estava ao meu lado. Ele colocou o cinto
na filha e, em seguida, me encarou.
— Valery adora um drama — comentou com indiferença. —
Daqui a pouco ela acorda.
— A tia Valery é burra por acreditar nessa brincadeira. —
Lorie gargalhou. — Eu não tenho pai.
Fiquei sem saber como reagir diante daquilo. Falei por tanto
tempo para Lorie que éramos apenas nós duas e que seria assim
para sempre que agora eu não fazia ideia do que dizer para fazer a
garotinha pensar diferente. Seria uma tarefa difícil fazer Lorie
entender que tinha um pai quando ela não estava acostumada com
isso.
Enquanto eu me perdia em pensamentos, Bruce se inclinou
para beijar a minha bochecha e aproveitou o momento para
sussurrar no meu ouvido:
— Precisamos entrar em um acordo sobre como daremos a
notícia para a baixinha.
— Acho que essa será a parte difícil — respondi, com um
sorriso amarelo. — Por que não aproveita esse tempo para se
aproximar mais da Lorie? Eu tenho que contar as novidades para
Brittany antes que ela me mate.
Bruce concordou silenciosamente e eu me levantei da
poltrona.
Brittany ainda estava parada ao lado do meu assento,
esperando que eu começasse o meu relato. Com Lorie por perto eu
não podia contar o que aconteceu na noite anterior, então decidi me
afastar de onde a garotinha estava. Minha amiga e eu fomos para
os assentos que ficavam mais distantes e nos sentamos ali.
Brittany me fez contar detalhadamente todos os
acontecimentos do dia anterior — incluindo o meu encontro
desconfortável com Gustav no canteiro de obras. Quando cheguei
na parte em que Bruce descobria que era o pai da Lorie, minha
amiga gritou como uma adolescente escandalosa e eu precisei de
muito esforço para fazê-la se acalmar.
Quando terminei o meu relato, Bruce ainda estava sentado
ao lado de Lorie e parecia imerso em uma conversa animada com a
garotinha. Valery já tinha acordado do seu desmaio e resolveu ficar
sentada nos fundos do avião, segurando uma compressa de gelo
sobre o galo que se formou em sua testa.
— A vadia de olhos azuis já sabe — Brittany comentou,
enquanto olhava para Valery. — É melhor tomar cuidado com quem
receberá essa notícia. Se a revista de fofocas souber sobre o
parentesco entre Lorie e Bruce, vocês três voltarão a ser assunto na
primeira página.
— Tem razão... no momento não é uma boa ideia espalhar
por aí que Lorie é filha do Bruce — concordei com a minha amiga.
— Você não devia ter contado para o Kevin... tenho certeza que ele
é leitor da Gossip Million.
— O Kevin é confiável — ela defendeu o homem.
— Como sabe disso, se o conhece há apenas um dia? —
Arqueei uma sobrancelha.
Um leve rubor apareceu nas bochechas de Brittany.
— Bom... Kevin e eu conversamos muito de ontem para hoje.
Ficamos aqui com a Lorie enquanto você e o Bruce davam os seus
pulinhos pela cidade. Tivemos muito tempo para conhecer um ao
outro.
— Está gostando dele? — provoquei, com um sorriso
malicioso.
Minha amiga arregalou os olhos e se levantou da poltrona.
— Eu disse que estava rolando um clima... não falei nada
sobre estar me apaixonando pelo piloto gostoso — tentou disfarçar.
— Bom... eu vou servir o almoço.
— Claro. Conversamos depois — avisei.
Brittany fez uma careta e se afastou, caminhando em direção
à porta que levava para a minúscula cozinha do jato.
Antes de voltar para perto de Lorie e Bruce, resolvi ir ao
banheiro. Me levantei de onde estava e caminhei pelo corredor até a
porta que ficava nos fundos do avião. Quando passei por Valery,
sentada no sofá, eu pude sentir o olhar da mulher cravado em mim,
mas não tive coragem de encará-la de volta. Nem quero imaginar o
que ela tem para me dizer agora que sabe que Lorie é filha de
Bruce.
Fiquei enrolando no banheiro por alguns minutos, torcendo
para que quando eu saísse de lá a vadia de olhos azuis já não
estivesse mais no maldito sofá — eu não queria passar por ela de
novo. Infelizmente, acabei abandonando a ideia quando temi que a
minha demora no banheiro pudesse fazer Bruce pensar que eu
estava tendo alguma emergência sanitária. Ainda não estamos em
um nível avançado no nosso relacionamento para que ele saiba o
que estou fazendo no banheiro...
Engolindo em seco, criei coragem e abri a porta. Tentei
caminhar em passos silenciosos, torcendo para não chamar a
atenção de Valery, mas não adiantou.
— É verdade? — Minhas pernas congelaram quando ouvi a
voz da mulher.
Uma grande parte de mim queria ignorá-la, mas eu sabia que
evitar a tempestade só me causaria mais problemas no futuro.
Hesitei por alguns segundos, mas no fim acabei me virando
na direção de Valery. Ela pressionava a bolsa de gelo no galo em
sua testa e me encarava com uma certa preocupação. Direcionei lhe
um olhar amigável que era tão falso quanto uma nota de 30 dólares
e comecei a falar.
— Sim... Bruce e eu tivemos um caso há alguns anos e Lorie
foi o resultado — admiti.
— Então, vocês se conheceram antes dele assumir a
empresa?
Eu apenas concordei, silenciosamente.
— Não acredito que sou tia daquela bagunceira — Valery
bufou.
Estava óbvio que a vadia de olhos azuis não ficou feliz com a
notícia, mas me senti aliviada por ela não ter iniciado uma
discussão. Quando percebi que Valery não diria mais nada, resolvi
sair dali antes que o nosso pequeno momento de trégua acabasse.
Caminhei em silêncio pelo corredor do jato e enquanto eu me
aproximava dos assentos em que Lorie e Bruce estavam eu pude
ouvir as suas vozes discutindo. Ao que parece, Brittany já havia
servido o almoço para os dois.
— Eu não quero legumes — Lorie resmungou, com uma voz
enjoada.
Parei ao lado das poltronas no momento exato em que Bruce
tirava uma couve-flor do seu prato e a empurrava na direção da
filha.
— Coma baixinha — ele pediu, com gentileza.
— Não. — Lorie fez uma careta e tapou a boca com as mãos.
Bruce suspirou e olhou para a refeição da filha. Em seu prato
haviam tirinhas de frango empanado e purê de batata.
— Isso que está comendo não é saudável. Você precisa de
uma refeição com vitaminas. — O homem gesticulou para o prato
dele onde tinha peixe assado e salada.
Reprimi uma risada, era impossível não achar graça da
situação. Bruce estava tentando incentivar sua filha a comer
legumes, mas, infelizmente, ele não sabia tanto sobre ela. Lorie
odiava qualquer coisa verde em seu prato. Por muito tempo tentei
convencê-la a comer salada, mas ela nunca cedeu. No fim, seu
pediatra acabou receitando vitaminas para complementar a
alimentação.
— Mamãe, o tio Bruce está chato! — Lorie reclamou, assim
que percebeu a minha presença.
— Só quero que ela tenha uma alimentação saudável —
Bruce tentou se defender. — Estou tentando ser responsável. Eu
não sei como isso funciona.
Com a intenção de confortá-lo, me aproximei da sua poltrona
e acariciei o seu rosto.
— Não se cobre tanto, Bruce. Está fazendo uma ótima
tentativa. — Depositei um beijo demorado em sua bochecha e
sussurrei em seu ouvido para que apenas ele pudesse ouvir. —
Você será um bom pai para a Lorie, tenho certeza disso...
Naquele momento, Brittany trouxe o meu prato de comida.
Me sentei na poltrona que ficava de frente para o assento de Bruce
e saboreamos a refeição juntos. Ele acabou deixando Lorie em paz
e parou de insistir que ela comesse legumes depois que eu contei
que a sua alimentação já estava sendo supervisionada pelo
pediatra.
Bruce tinha muito o que aprender sobre a filha e eu sabia que
aquele processo exigiria um certo tempo. Ele chegou na vida da
garotinha agora e iria demorar até que entendesse as suas manias
e birras. No momento, eu só conseguia me importar com o fato de
que Bruce não fugiu e resolveu encarar essa responsabilidade ao
meu lado.
Assim que chegamos em Nova York, desembarcamos do jato
e ficamos ao lado da aeronave aguardando que o motorista da
empresa trouxesse o carro de Bruce para que ele nos levasse até
em casa.
Bruce estava ao meu lado e segurava Lorie no colo enquanto
eu cuidava do ursinho de pelúcia rosa. Brittany também estava
conosco, aguardando a sua carona para casa. Ela ficou mais do que
contente depois de saber que conseguiu um cargo permanente
como comissária de bordo. Agora, minha amiga estaria presente em
todas as viagens que fizéssemos e eu me sentiria em casa ao tê-la
por perto durante os voos.
Fiquei tão distraída observando um avião que havia acabado
de decolar na pista ao lado que não percebi quando Kevin se
aproximou de nós. Ele cumprimentou Brittany com um abraço e
apertou a mão de Lorie.
— Espero ver vocês em breve — falou, olhando para as
duas. — Quero ter a minha revanche no banco imobiliário.
— Tio Kevin, o senhor virá na minha festinha de aniversário?
— Lorie perguntou, sem mais nem menos.
O homem ficou surpreso com o convite, mas concordou.
— É só mandar o endereço. — Ele sorriu para a garotinha e
encarou Brittany logo em seguida. — Você vai na festa também? —
indagou, com um certo interesse.
Brittany assentiu e um leve rubor apareceu em suas
bochechas. Tossi para disfarçar a minha risada. Parece que
realmente está rolando um clima entre os dois...
Apesar da situação divertida, uma pequena preocupação me
atingiu: Lorie estava convidando muita gente para a sua festinha de
seis anos e eu estava começando a duvidar se caberiam tantas
pessoas no meu minúsculo apartamento. Ela chamou seus
amiguinhos da escola e das aulas de ballet, também viriam algumas
professoras, Bruce e agora o Kevin. Acho que um bolo e uma
garrafa de refrigerante não darão conta do recado.
Enquanto eu me preocupava com o aniversário de Lorie que
aconteceria na próxima sexta-feira, Brittany e Kevin se afastaram de
nós, deixando claro que queriam ter uma conversa privada. Valery
desceu do jato logo em seguida e eu fechei a cara. Notei que a
mulher tirou o celular de dentro da bolsa e começou a mexer no
aparelho apenas para não olhar em nossa direção.
— Você pode vir também, se prometer que irá se comportar
— Lorie disse, olhando para a tia.
Deus do céu... A vadia de olhos azuis não!
Valery desviou sua atenção para a garotinha e franziu o
cenho.
— Do que está falando? — perguntou confusa.
Cutuquei discretamente a perna da minha filha, esperando
que ela entendesse que devia ficar em silêncio, mas não adiantou.
— Da minha festinha de aniversário. Eu vou fazer seis anos.
— Ela levantou as mãos e mostrou seis dedos para a mulher.
Valery pareceu surpresa ao perceber que foi convidada e eu
notei que ela encarou Bruce por um tempo, como se esperasse que
o homem dissesse alguma coisa. No entanto, ele ficou em silêncio e
não demonstrou nenhuma reação.
— Vou checar na minha agenda. — A mulher deu um sorriso
forçado para a sobrinha.
Aproveitando a deixa para encerrar a conversa, Valery olhou
novamente para a tela do celular e caminhou em direção ao
estacionamento do aeroporto.
Suspirei para aliviar a tensão que se acumulou em meu peito.
Eu não queria Valery perambulando pela minha casa. Já posso
imaginar ela fazendo comentários negativos sobre a minha escolha
de decoração dos cômodos e tentando me rebaixar em toda
oportunidade que surgir. Tenho problemas demais para lidar, como,
por exemplo: tentar colocar mais de cem pessoas no meu
apartamento.
— Dê um tempo à minha irmã — Bruce pediu, ao perceber o
meu nervosismo. — Ela acabou de descobrir que é tia da garotinha
que a deixou de canela roxa.
— Não é apenas por causa de Valery que estou assim —
confessei. — Estou preocupada que não vá caber tanta gente no
meu apartamento. Lorie chamou vários amiguinhos e com eles
também virão os pais...
Bruce sorriu ao compreender o que se passava pela minha
cabeça.
— Não se preocupe, eu vou cuidar disso. — Ele olhou para
Lorie, que estava distraída demais com os aviões do aeroporto para
prestar atenção na conversa. — Vou dar a ela a melhor festa de
aniversário que uma criança pode ter.
Sorri ao ouvir aquilo e uma lágrima de felicidade escapou
pelo canto do meu olho. Lorie nunca teve mais que uma faixa de
balões e um bolo simples em seu aniversário. Por mais que eu
quisesse dar tudo do bom para a minha filha eu nunca tive dinheiro
para fazer algo muito grande, mas esse ano as coisas seriam
diferentes.
— Por acaso você sabe organizar uma festa infantil, Bruce?
— questionei, com uma leve incredulidade.
— Não, mas conheço pessoas que sabem. — Ele sorriu e eu
percebi um estranho brilho malicioso em seu olhar. — Faremos a
festa em um salão e depois você pode vir comigo para o meu
apartamento.
Fiquei curiosa com aquele convite. Nunca estive no
apartamento de Bruce, mas eu tinha certeza que era um lugar caro
e chique.
— Tudo bem — aceitei a proposta.
Senti minhas bochechas corarem quando imaginei que Bruce
arranjaria um motivo para me levar até o seu quarto depois da festa.
Se o conheço bem, ele provavelmente me deitará em sua cama e
tentará me convencer a passar a noite por lá. Não posso negar que
a ideia me agrada...
CAPÍTULO 34

Bruce não estava brincando quando disse que daria para


Lorie a melhor festa de aniversário que uma criança poderia ter. No
espaço amplo do salão de eventos luxuoso, que foi alugado para a
festa, haviam inúmeras atrações como: shows de mágica, palhaços
fazendo animais de balões, uma equipe que fazia pinturas no rosto
das crianças e até mesmo um playground com direito à piscina de
bolinhas e castelinho inflável.
Eu me sentia a mãe mais realizada do mundo. Nunca
imaginei que poderia dar uma festa daquele tamanho para a minha
garotinha, parecia um sonho. Honestamente, eu ainda não
conseguia acreditar que Bruce realmente fez aquilo por Lorie. Ele
passou a semana inteira desmarcando reuniões importantes apenas
para dar total assistência à equipe de organização da festa.
— Precisamos contar para ela — Bruce murmurou ao meu
lado.
Ele parecia distraído enquanto assistia Lorie brincar na
piscina de bolinhas. Estávamos há pelo menos meia-hora parados
perto do playground, observando a nossa filha e tentando pensar na
melhor maneira de contar que o tio Bruce na verdade era o seu pai.
O salto agulha de 12cm que eu usava estava começando a
incomodar os meus pés, mas eu teria que aguentar até o fim da
festa. O sapato fazia conjunto com o lindo macacão preto de
lantejoulas que Bruce insistiu em comprar para que eu usasse na
ocasião de hoje. Eu me sentia deslumbrante naquela peça de roupa
cara — embora achasse que o seu decote era um tanto exagerado
para se usar em uma festa infantil.
Ao contrário de mim, Bruce estava à vontade com a sua
camisa cinza de botões e calça preta social. Fiquei chocada que
mesmo ele se vestindo de maneira simples as mulheres ainda lhe
direcionavam olhares devassos — confesso que eu estava
começando a ficar incomodada com o jeito que algumas mães na
festa olhavam para ele. Sempre que eu tinha a oportunidade, dava
um abraço ou um beijo cálido em seus lábios para deixar claro que o
bonitão já estava comprometido.
Bruce, no entanto, parecia tão apreensivo que sequer notava
a disputa que eu travava silenciosamente com qualquer mulher que
o encarava por mais de 5 segundos. Eu sabia que ele estava assim
por causa da Lorie. Há dias Bruce queria contar que era o pai dela,
mas não conseguia reunir coragem para se sentar com a criança e
dizer a verdade. Preciso ajudá-lo.
— Vamos fazer isso depois da festa — decidi, enquanto
entrelaçava minha mão na dele para lhe passar confiança. —
Quando os convidados forem embora, chamaremos Lorie para
conversar e diremos que você é o pai dela.
Bruce me encarou com o olhar perdido. Ele engoliu em seco
e concordou em silêncio.
— Vai dar tudo certo. — Aproveitando a oportunidade,
depositei um beijo delicado em sua boca.
Bruce deixou suas mãos descansarem em minha cintura e
entreabriu os lábios suavemente, fazendo um convite silencioso
para que eu o beijasse de uma forma mais intensa. Hesitei por
alguns segundos devido ao local em que estávamos, mas no fim
acabei cedendo e deixei que sua língua encontrasse a minha.
— Bruce, isso aqui é uma festa infantil e não um daqueles
clubes que você costumava frequentar! — ouvi a inconfundível voz
afinada de Valery ao nosso lado. Merda. Não acredito que ela veio!
Suspirei com um profundo desgosto e afastei meu rosto de
Bruce. Fiz um breve contato visual com Valery e notei que ela usava
um vestido pink que modelava o seu corpo e terminava na altura
dos joelhos. Por mais que eu não fosse com a cara da vadia de
olhos azuis, precisava admitir que ela estava bonita.
— V-valery? — Bruce gaguejou, envergonhado com o
comentário da irmã.
Por sorte, eu já não sentia ciúme quando pensava no que ele
fez em seu passado. Bruce mostrou que não é mais aquele homem
irresponsável e essa é a única parte que me importa.
— O que está fazendo aqui? — indaguei, surpresa com a
presença da mulher.
Valery torceu o nariz quando ouviu a minha pergunta.
— Se eu soubesse que me receberiam dessa forma eu não
teria aparecido.
— Só estamos surpresos com a sua presença — Bruce
tentou amenizar a situação.
— Bom... apesar de tudo, a garota é minha sobrinha — ela
admitiu, relutante, e encarou o irmão. — E espero que seja a única.
Bruce ficou inseguro ao ouvir aquilo e por um instante me
preocupei que ele pudesse ter mais filhos perdidos pelo país.
— Enfim, eu trouxe uma casa de bonecas... espero que ela
goste. — Valery olhou para o ambiente ao seu redor e avistou Lorie
brincando na piscina de bolinhas. — Vou até lá dar os parabéns.
A mulher acenou brevemente para o irmão, mas não se deu
ao trabalho de se despedir de mim. Pelo visto, eu ainda era invisível
para ela, mas isso não me importava. Contanto que Valery trate a
minha filha com gentileza, eu ficarei satisfeita.
Bruce e eu ficamos em silêncio, observando a vadia de olhos
azuis caminhar até o playground onde Lorie brincava na companhia
de outras crianças. A mulher acenou para a garotinha e conversou
com ela por um tempo. Quando se despediu, deu um breve abraço
na sobrinha e se afastou, indo em direção à saída do salão de
festas.
— Parece que ela só veio aqui para dizer oi e deixar o
presente — comentei com ironia.
— Valery passou a semana inteira tentando me convencer a
fazer um teste de DNA. — Bruce colocou uma mão ao redor da
minha cintura. — Ela não está convencida de que a baixinha é
minha filha e acha que você está tentando me dar algum tipo de
golpe.
Fiquei tensa ao ouvir aquilo, mas no fundo não estava
surpresa por Valery desconfiar de mim. Honestamente, eu já
esperava que isso fosse acontecer.
— Não se preocupe, é apenas uma paranoia dela. Eu confio
em você, docinho — ele voltou com o assunto. — Eu não tinha nada
e então fiquei rico. Fui um dos poucos empresários que conheceu
os dois lados da moeda e, graças a isso, sei identificar uma pessoa
oportunista.
— Então você não acha que eu estou querendo te dar um
golpe do baú ou algo do tipo? — brinquei.
— Não há um motivo sequer para que eu desconfie de você,
Jenny. Sem contar que a Lorie parece demais comigo. — Ele sorriu.
— Ainda sinto vontade de me bater por não ter percebido a
semelhança antes.
— Talvez, você só não quisesse ver. — Dei de ombros. —
Quando aparecemos na capa daquela maldita revista, milhares de
pessoas começaram a teorizar que Lorie era sua filha e você
simplesmente resolveu ignorar esses comentários.
— Isso porque eu ainda não sabia que tínhamos nos
envolvido no passado — admitiu. — Se eu soubesse, com certeza
eu teria pensado na possibilidade da menina ser minha.
Concordei, silenciosamente, e comecei a refletir sobre o que
aconteceu nos últimos meses. Confesso que senti um grande
arrependimento por não ter contado com mais antecedência que
tínhamos uma filha, mas logo entendi que tudo aconteceu no tempo
certo. Bruce poderia ter reagido de maneira totalmente diferente
caso descobrisse que era pai de uma garotinha que ele nem
conhecia direito. Ao menos, os dois criaram um vínculo antes da
verdade vir à tona e isso amenizou a situação.
Depois de passarmos mais alguns minutos observando a
Lorie, Bruce e eu decidimos nos sentar na mesa, que estava
reservada para nós, no centro do salão. De onde estávamos,
podíamos ver Kevin e Brittany, que estavam sentados em uma mesa
de duas cadeiras não muito distantes dali. Os dois conversavam
alegremente, enquanto comiam os doces e aperitivos que estavam
sendo servidos. Sorri ao perceber que realmente parecia estar
rolando uma química entre a minha amiga e o piloto de Bruce.
Espero que isso resulte em uma coisa boa...

A noite passou rápido e logo a festa chegou ao fim. Como


Lorie e eu iríamos para a casa de Bruce, Brittany acabou aceitando
uma carona de Kevin, que se comprometeu em levá-la em
segurança até o nosso apartamento.
Passava das 23h quando o último convidado deixou o salão e
a equipe de limpeza começou a desfazer a decoração do lugar.
Lorie insistiu em ficar no castelinho inflável para aproveitar cada
segundo no brinquedo enquanto o playground não era desmontado.
— Chegou a hora, Bruce — comentei, enquanto observava a
minha filha se divertir no brinquedo.
Não havia ninguém ali que pudesse interferir no que seria a
conversa mais importante das nossas vidas. Esse é o momento.
— Está bem. — Bruce respirou fundo e entrelaçou sua mão
na minha. — Vamos falar com a baixinha.
Assenti e caminhamos em direção ao brinquedo inflável,
onde Lorie pulava alegremente sem se importar que não houvesse
mais nenhuma criança ali para brincar com ela.
— Filha? — chamei, ao parar na porta do brinquedo.
Lorie parou de pular e olhou em nossa direção.
— Precisamos conversar, baixinha — Bruce completou, com
um leve tom de nervosismo em sua voz.
A menina se aproximou de nós e sentou no degrau inflável
que ficava na porta do castelinho. Seus olhinhos azuis como os do
pai ganharam um brilho de confusão e ela encolheu os ombros.
— Eu fiz alguma coisa? — Lorie parecia preocupada.
— Você não, baixinha, mas sua mãe e eu sim... — O homem
sentou ao lado da filha no degrau. — Precisamos te contar uma
coisa.
Bruce me direcionou um olhar hesitante, como se estivesse
esperando que eu assumisse as rédeas da conversa. Devíamos ter
ensaiado antes de dar essa notícia para a menina.
— Lorie... eu quero te pedir desculpas. — Sentei-me do outro
lado do degrau, deixando que a garotinha ficasse entre Bruce e eu.
Ela nos encarava com um misto de confusão e curiosidade. —
Todos esses anos eu disse que você não tinha um pai, mas era
mentira. Aconteceram algumas coisas e ele precisou se afastar. Não
pensei que eu o veria outra vez...
Lorie franziu o cenho, tentado entender o que eu dizia. Ao
perceber que a garotinha não estava entendendo muito bem as
minhas palavras, Bruce decidiu intervir:
— Você tem um pai, Lorie. Ele esteve ausente nos últimos
anos, mas agora as coisas irão mudar.
— Eu tenho um pai? — Ela arregalou os olhos. — Assim
como as outras crianças?
Bruce assentiu, enquanto sorria para a garotinha.
— E quem ele é, tio Bruce? — Lorie começou a ficar
empolgada com a notícia. — Quem é o meu pai?
O homem suspirou, hesitando por alguns segundos. Seus
olhos encontraram os meus e eu percebi com espanto que ele
estava lacrimejando. Céus, não acredito que esse momento está
acontecendo.
Após criar coragem, Bruce voltou seu olhar para a filha e
sorriu.
— Sou eu, Lorie... — A voz dele oscilou com a emoção do
momento. — Eu sou o seu pai.
Lorie ficou boquiaberta, mas permaneceu em silêncio, como
se não acreditasse no que acabou de ouvir. Bruce aproveitou o
momento para abraçá-la e, embora a nossa filha estivesse confusa,
ela retribuiu o abraço do pai.
Solucei e deixei que algumas lágrimas de felicidade
escapassem dos meus olhos. Pouco me importava em borrar a
maquiagem, a cena que eu estava vendo diante de mim fez o meu
coração transbordar de alegria e satisfação.
Afaguei as costas da garotinha por um tempo, até que ela se
afastou do abraço e me encarou com um brilho curioso no olhar.
— Mamãe, o tio Bruce é meu pai? — Lorie apontou para o
homem que estava ao seu lado.
— É sim, filha — concordei, com um sorriso emocionado.
— Baixinha, será que eu posso te pedir uma coisa?
Lorie voltou seu olhar para o pai. Ela ficou um pouco
hesitante, mas concordou com a cabeça.
— A partir de hoje, não me chame mais de tio Bruce. Quero
que me chame de pai.
— Pai? — Lorie repetiu a palavra, como se estivesse a
testando.
Bruce assentiu e lhe direcionou um sorriso amigável. Mais
lágrimas desceram dos meus olhos naquele momento e eu precisei
enxugá-las com minhas próprias mãos.
— Vamos, baixinha... tente me chamar assim — ele a
encorajou.
Lorie pensou por alguns segundos.
— Pai — ela disse, enquanto o encarava.
— Isso. — Bruce sorriu de um jeito orgulhoso e eu vi uma
lágrima escorrer pelo seu rosto. — Eu sou o seu pai, baixinha.
Ele a abraçou outra vez e afagou as costas da filha de
maneira terna. Não consegui me conter e me juntei aos dois,
entrelaçando meus braços ao redor deles o máximo que consegui.
— O que um pai faz? — a garotinha quis saber.
Bruce deu uma risada e nos afastamos do abraço para
observar a nossa filhinha.
— Honestamente, Lorie, eu não faço ideia — o homem
confessou, com a voz divertida. — Mas podemos aprender juntos.
Lorie sorriu e concordou com a ideia, seus olhinhos brilhavam
com alegria e empolgação.
— Vamos brincar no castelinho, pai! — Ela segurou na mão
dele e tentou puxá-lo para dentro do brinquedo inflável.
Bruce não hesitou. Com um movimento rápido, ele se
levantou de onde estava sentado e seguiu a garotinha para dentro
do castelinho.
— Vem também, Jenny — ouvi ele me chamar.
Reprimi um sorriso, mas não recusei o convite. Com um
grande alívio, retirei o salto que estava matando os meus pés,
desde o início da festa, e entrei no brinquedo descalça.
Mal consegui andar pela superfície inflável sem perder o
equilíbrio e cair. Bruce e Lorie chegaram na minha frente e já
estavam pulando fazendo com que a estrutura do brinquedo se
movesse para cima e para baixo. Os dois riam enquanto
observavam as minhas tentativas frustradas para ficar de pé.
Acabei decidindo ficar no chão e comecei a gargalhar junto
com eles — não só pela situação em que eu me encontrava, mas
também pela alegria daquele momento. Bruce, Lorie e eu
estávamos tendo o nosso primeiro momento como uma família e eu
nunca me senti tão feliz em toda a minha vida. Meu sonho
impossível se tornou realidade.
Ficamos brincando no interior daquele castelinho inflável até
que a equipe começou a desmontar o playground. Lorie ficou triste,
mas logo se animou quando Bruce disse que a carregaria nas
costas até o estacionamento.
CAPÍTULO 35

Durante o caminho até a área nobre de Manhattan, onde


ficava localizada a cobertura em que Bruce morava, Lorie acabou
adormecendo no banco de trás do carro. Ela estava tão cansada
pelas horas de brincadeira naquela festa que mal se mexeu quando
o pai a pegou nos braços e entrou no elevador.
Não demorou muito até chegarmos no último andar do
prédio. Bruce me deu as chaves para que eu abrisse a porta, já que
ele estava com a filha nos braços e quando eu entrei no
apartamento fiquei boquiaberta com o tamanho do lugar.
Era uma cobertura ampla e espaçosa, com uma grande
janela de vidro que fornecia uma vista incrível da cidade. Logo na
entrada, havia uma grande sala de estar com um sofá de couro
reclinável e uma TV tão grande que mais parecia uma tela de
cinema. À esquerda, estava uma passagem aberta que dava acesso
para uma cozinha embutida com bancadas de mármore preto e
eletrodomésticos inox.
Na grande parede que ficava à direita da sala de estar,
haviam três portas de madeira feitas com um design elegante.
Concluí que elas deviam levar para os quartos e banheiro. A
decoração daquele apartamento passava um estilo luxuoso e ao
mesmo tempo industrial — estava claro que um homem rico morava
ali sozinho.
Enquanto eu estava distraída observando o lugar, Bruce
caminhou até as três portas e abriu a do canto esquerdo. Eu o segui
e me deparei com um luxuoso quarto de hóspedes, decorado em
tons de pêssego e branco. Ele deitou Lorie na cama espaçosa,
acomodou a cabeça da menina no travesseiro e a cobriu com um
edredom branco para garantir que ela ficasse aquecida durante a
noite. Sorri com aquela cena. Nunca pensei que veria Bruce
colocando a nossa filha para dormir.
Aproximei-me da cama com o coração transbordando de
alegria e beijei a bochecha de Lorie. A garotinha suspirou e abriu os
olhos lentamente.
— Boa noite, mamãe — murmurou, com a voz cheia de sono.
— Boa noite, querida. — Eu sorri para ela.
Pegando-me de surpresa, Bruce se inclinou e depositou um
beijo na testa da garotinha.
— Boa noite, Lorie — sussurrou, com a voz terna.
— Boa noite, papai — Lorie respondeu, e então fechou os
olhos para dormir outra vez.
Bruce respirou fundo e se afastou da cama. Ele levou uma
mão até a boca e me direcionou um olhar emocionado.
— Ela me chamou de papai, Jenny — sussurrou com a voz
vacilante. — Porra, ela me chamou de papai...
Sorri para ele ao perceber o quão emocionado Bruce ficou
com aquela situação. Me afastei da cama e fui até ele para consolá-
lo.
— Isso não foi demais para você, foi? — sondei, enquanto
afagava o seu braço.
Bruce ergueu seu rosto para mim e eu senti um frio na
barriga quando percebi um brilho molhado em sua pele, ele estava
chorando. Bruce Lancasther está chorando. Caramba!
— Nunca pensei que me sentiria o homem mais feliz do
mundo porque uma criança me chamou de papai — admitiu, com
um sorriso no rosto.
Deixei uma risada escapar e Bruce pressionou o dedo
indicador na minha boca para que eu ficasse em silêncio.
— Vai acordar a baixinha — ele me alertou, com um
sussurro. — Vamos conversar em outro cômodo.
Concordei silenciosamente e Bruce afastou seu dedo de mim.
Ele usou as mãos para secar qualquer vestígio de lágrima em seu
rosto e me guiou para fora do quarto, fechando a porta no instante
em que saímos de lá.
— Lorie não é do tipo de criança que tem medo de dormir
sozinha, é? — Bruce perguntou, com uma sombra de preocupação.
— Ela só pega no sono se alguém estiver por perto — refleti.
— Mas depois que adormece, Lorie não percebe a nossa ausência.
Dificilmente ela acorda durante a noite.
Bruce me direcionou um sorriso satisfeito e segurou a minha
mão.
— Ótimo, porque essa noite eu quero você na minha cama.
— Ele me levou até a porta que ficava à direita e a abriu, revelando
um quarto com decoração escura e masculina.
Assim que entrei no cômodo, Bruce trancou a porta e me
direcionou um olhar malicioso. Meu ventre se apertou com excitação
e eu sorri, imaginando as coisas que ele faria comigo agora que
estávamos a sós.
Dei uma breve olhada no lugar e fiquei boquiaberta ao
perceber que o seu quarto também possuía uma janela que ia do
chão ao teto, com vista para a cidade. Ao lado daquela parede de
vidro estava uma cama grande com um lençol azul marinho e dois
travesseiros pretos. Imagino como deve ser magníficodormir e
acordar com essa vista...
Enquanto eu me perdia na paisagem noturna dos edifícios
iluminados, senti o zíper nas costas do meu macacão ser deslizado
para baixo e arquejei. Quando Bruce se posicionou na minha frente
eu percebi que ele já tinha se livrado da camisa e dos sapatos,
ficando apenas com a calça preta que usou durante a festa.
Suas mãos seguraram as alças do meu macacão e a
puxaram para baixo, deslizando o tecido preto de lantejoulas em
direção às minhas pernas. Em poucos segundos, a peça de roupa
foi tirada do meu corpo e eu fiquei apenas com uma calcinha preta
de renda. Meus seios ficaram à mostra e minha pele se arrepiou
quando senti um pouco de frio.
Sem me encarar por muito tempo, Bruce se ajoelhou no chão
à minha frente e tocou o meu tornozelo. Sua mão começou a subir
em direção à coxa, fazendo questão de acariciar cada centímetrode
pele que estivesse em seu caminho. Suspirei quando ele começou a
depositar beijos suaves ao longo da minha outra perna. Seus lábios
foram subindo em um ritmo tentador e despreocupado, até que
alcançaram a minha virilha.
Bruce sorriu e segurou a frente da minha calcinha com
ambas as mãos. Quando ele as separou em um movimento rápido,
o tecido delicado se rasgou em duas partes que logo se
desprenderam do meu corpo. Fiquei encarando a renda preta caída
no chão do quarto até que Bruce depositou um beijo demorado em
minha intimidade. Sua mão apertou a minha bunda e deu um tapa
em minha nádega esquerda. Gemi com a ardência excitante que
ficou no local e me apoiei em seus ombros.
Deixando minhas partes íntimasde lado, sua boca subiu para
a minha barriga e depois brincou com os meus seios, sugando e
mordiscando cada mamilo. Quando se deu por satisfeito, Bruce
começou a beijar o meu pescoço, passou para o maxilar e parou a
centímetros dos meus lábios. Seu olhar encontrou o meu e ele
sorriu com satisfação ao ver o quanto eu estava excitada e
ofegante.
— Você é a mulher mais linda e gostosa do mundo, Jenny —
sua voz estava cheia de desejo. — Eu te amo. E amo também a
família que você me deu.
Meu coração palpitou quando ouvi aquilo e eu senti meus
olhos arderem com as lágrimas de felicidade que queriam sair.
Bruce colocou uma mão ao redor da minha cintura e com a
outra segurou a minha nuca com firmeza. Sem qualquer aviso
prévio, ele puxou o meu corpo para perto do seu e me beijou com
necessidade, esfregando sua língua contra a minha de maneira
intensa e enlouquecedora.
Deixando meus braços descansarem ao redor do seu
pescoço, eu me entreguei aquele beijo, permitindo que Bruce
guiasse cada movimento das nossas bocas e línguas. Depois de
tudo que passei nos últimos anos, agora eu só queria me perder
naquele homem intenso e maravilhoso com quem eu tive uma filha.
Bruce me deitou suavemente na cama e interrompeu o nosso
beijo para ficar de pé e retirar a calça que ainda vestia. Aproveitei o
momento de pausa para retomar o fôlego e apoiei os cotovelos no
colchão para observar o meu namorado enquanto ele se despia. O
homem deslizou a calça e a cueca para baixo e o seu membro ficou
livre.
Mordi os lábios quando encarei o delicioso músculo rígido
que Bruce ostentava no meio das pernas. Lembrei das sensações
que ele me provocava cada vez que estava deslizando dentro de
mim e senti minha boceta doer com desejo.
Bruce percebeu que eu o observava com malícia e me
direcionou um sorriso travesso enquanto caminhava até a cama.
Abri minhas pernas para que ele se acomodasse entre elas e assim
que o homem se deitou sobre mim, nossas bocas se encontraram
novamente.
Bruce inclinou o quadril para frente e esfregou seu membro
em minha intimidade. O calor excitante que emanava da sua pele
me fez soltar um gemido que foi abafado pelo nosso beijo. Em um
movimento repentino, o homem rolou para o lado, ficando de costas
no colchão, e eu fui parar em cima dele. Seus braços me
mantiveram pressionada contra o seu peito quando ele separou
nossas bocas para que pudesse falar:
— Fique por cima, docinho — sussurrou, ofegante, enquanto
apoiava a cabeça no travesseiro. — Quero você cavalgando no meu
pau até gozar.
Não consegui dizer nada, apenas assenti e encarei o meu
chefe. Seus olhos azuis estavam repletos de luxúria e desejo, sua
respiração estava acelerada e sua pele já começava a suar.
Sem conseguir conter a excitação que crescia em meu peito,
levantei o quadril e Bruce encaixou seu membro em minha boceta.
Nossos olhares se encontraram e eu comecei a me sentar sobre
ele, ofegando ao sentir a ponta do seu pau pressionar a minha
entrada e abrir caminho lentamente até o interior do meu canal.
Apoiei minhas mãos em seu peito e fixei meus joelhos no
colchão para dar estabilidade aos movimentos que eu faria. Meus
olhos não se desviaram dos seus nem por um minuto e eu senti que
naquele momento, não apenas os nossos corpos se conectavam,
mas também as nossas almas.
No instante em que comecei a me mover, um gemido rouco
escapou de Bruce e ele segurou em ambos os lados da minha
bunda deixando que suas mãos apertassem a minha carne macia.
Ele passou a me ajudar com algumas investidas enquanto eu
rebolava em cima dele, friccionando o meu clitóris na sua virilha.
À medida que o tempo passava, meus movimentos ficavam
mais rápidos e necessitados. Bruce começou a dar tapas em minha
bunda cada vez que eu movia o quadril ao seu encontro e eu
confesso que estava gostando daquilo.
Gemidos ofegantes começaram a escapar da minha garganta
e eu cravei minhas unhas no tórax musculoso do homem que estava
abaixo de mim. Bruce ofegou quando eu fiz aquilo e impulsionou o
quadril ao meu encontro com força. Seu movimento provocou uma
intensa onda de prazer que se espalhou por todo o meu corpo.
Lancei minha cabeça para trás enquanto gemia e me
apertava ao redor do pau em que eu estava sentada, aproveitando o
meu orgasmo. Bruce deu outro tapa em minha bunda e também
chegou ao fim. Senti quando o calor da sua libertação preencheu o
meu interior e logo começou a escorrer pela parte interna das
minhas coxas.
Voltei meu olhar para Bruce e percebi que ele me encarava
com um sorriso satisfeito no rosto. Estávamos suados e ofegantes,
mas imensamente felizes. Eu me sentia leve e livre agora que não
haviam mais segredos entre nós. Finalmente, Bruce sabe que é pai
da Lorie e Lorie sabe que é filha dele. Parece que tudo acabou
bem...
— Docinho? — Bruce me chamou, com a voz ainda cansada.
— Quero que você e a baixinha venham morar comigo.
Meus olhos se arregalaram quando ouvi aquele pedido e ele
sorriu com a minha reação. Era uma proposta muito boa... tão boa
que mal parecia ser verdade. Talvez, ele só esteja falando isso no
calor do momento. E se começarmos a nos desentender quando
estivermos morando sob o mesmo teto? Estamos juntos há apenas
um mês...
— Bruce... eu não quero apressar as coisas — murmurei,
insegura.
— Já temos uma filha, não dá para apressar mais que isso —
observou, com uma certa diversão.
Refleti por alguns segundos e precisei concordar com o que
ele disse. Acho que ter uma filha é um dos níveis mais avançados
que um relacionamento pode atingir.
— Mas se eu viesse para cá, o que aconteceria com o meu
apartamento no Bronx? — ponderei. — Não quero vendê-lo.
— Você pode deixá-lo com a Brittany, ou então alugá-lo.
Quando Bruce mencionou minha fiel amiga, o meu coração
pesou. Desde que me mudei para Nova York eu nunca fiquei longe
dela, moramos juntas há seis anos e tenho certeza que ela também
sentiria falta de me ter por perto o tempo todo.
— Nunca fiquei longe da Brittany. Eu sentiria falta dela...
— Mas você não vai deixar de vê-la. — Ele acariciou minha
bochecha com uma das mãos, enquanto a outra permanecia na
curva do meu quadril. — Aqui você teria mais conforto e a baixinha
teria um quarto só para ela e seus brinquedos.
Fiquei em silêncio enquanto pensava. Bruce tinha razão. Se
eu me mudasse para cá com Lorie, ela teria mais conforto e espaço
para crescer. Chegaria um momento em que Lorie iria querer ter um
quarto só para ela e eu não poderia lhe dar isso se continuássemos
morando naquele apartamento minúsculo no Bronx.
Eu estava inclinada a aceitar a proposta de Bruce, mas
também não queria deixar Brittany sozinha naquele apartamento
sem um aviso prévio. Terei que discutir isso com ela, antes de tomar
qualquer decisão.
— Vou pensar na sua oferta — respondi, depois de um
tempo.
— Não tem o que pensar. Venha morar comigo. — Bruce
sorriu maliciosamente e a mão que estava no meu quadril deu um
tapa em minha bunda. Soltei um leve gritinho.
— Preciso conversar com a Brittany antes — expliquei.
O sorriso de Bruce diminuiu um pouco, mas não se apagou.
Ele pareceu entender o meu ponto de vista e concordou de um jeito
compreensivo.
— Como quiser, Jenny Spencer. — Bruce sentou na cama e
beijou a minha boca. Eu ainda permanecia encaixada em seu colo e
o movimento que ele fez com o corpo me provocou um gemido
quando senti seu membro se mexer dentro de mim. — Se quer se
fazer de difícil, tudo bem..., mas saiba que as portas da minha casa
estão abertas para vocês.
— Obrigada, Bruce — sussurrei, e deixei minhas mãos se
apoiarem em seu pescoço.
Ele segurou o meu rosto e me puxou para perto até que
nossas bocas se encontraram novamente. Tomados pelo desejo que
sentíamos um pelo outro, mergulhamos em um beijo profundo, que
se arrastou até as primeiras horas da madrugada e nos rendeu
outra rodada de toques e gemidos.
CAPÍTULO 36

Eu me sentia o homem mais feliz do mundo enquanto mexias


os ovos com bacon que seriam servidos no café da manhã.
Sentadas na bancada da minha cozinha estavam Jenny e Lorie. As
duas me encaravam com olhares ansiosos, esperando que eu
terminasse de preparar a refeição.
Nunca pensei que ser pai me deixaria com tanto bom humor.
A notícia de que Lorie era minha filha preencheu um vazio em meu
coração, que eu nem sabia que estava lá. Agora, tudo que passava
pela minha cabeça era que eu tinha que ser a melhor pessoa do
mundo para aquela garotinha. Darei a ela tudo que o meu pai não
me deu durante a minha infância. Vou buscá-la na escola, enchê-la
de presentes caros no Natal e educá-la da melhor forma possível.
Quando apaguei o fogo, segurei na alça da frigideira e a levei
até a bancada onde as garotas, mais importantes da minha vida,
estavam. Coloquei um pouco de ovos com bacon no prato de cada
uma e depois me sentei ao lado de Lorie.
— Eu jurava que você tinha uma equipe de cozinheiros para
preparar o café da manhã — Jenny comentou, com um sorriso.
Coloquei o que sobrou dos ovos em um prato e comecei a
comer.
— Já tive empregados uma vez, mas não deu muito certo —
admiti. — Não consegui me acostumar com todas aquelas pessoas
andando pelo apartamento e fazendo as tarefas por mim.
— Então você faz tudo sozinho? — Jenny ergueu uma
sobrancelha, surpresa. — Cozinha, lava as roupas e até limpa esse
apartamento gigante?
Assenti enquanto terminava de mastigar.
— Minha mãe trabalhava o dia inteiro e quando chegava em
casa ainda tinha que lavar a louça ou fazer o jantar — comentei. —
Depois que atingi uma certa idade, resolvi aprender algumas tarefas
domésticas para ajudá-la.
— Você foi um ótimo filho. — Jenny sorriu, orgulhosa, e
segurou a minha mão.
Lorie estava entre nós e ainda não tinha tocado nos seus
ovos mexidos. Somente depois de observá-la por um tempo foi que
percebi que a garotinha estava tendo dificuldade para usar o garfo.
— Quer que eu pegue uma colher? — ofereci.
Ela ergueu seus olhinhos para mim e assentiu com a cabeça.
De onde eu estava sentado, estiquei o braço e peguei uma
colher de sopa que estava no porta-talheres em cima da bancada.
Entreguei o talher para a garotinha e ela começou a comer.
— Sua comida é melhor que a da minha mãe — Lorie
comentou, enquanto mastigava.
As bochechas de Jenny ficaram vermelhas e eu segurei uma
risada. Eu não me importo se ela não é boa na cozinha, existem
outras coisas que Jenny sabe fazer muito bem, principalmente com
a boca...
— Esse é o nosso primeiro café da manhã em família —
Jenny comentou, envergonhada. Ficou claro que ela estava
tentando mudar de assunto.
— O primeiro de muitos — garanti.
Jenny concordou e afagou levemente a cabeça da nossa
filha.
Perdi-me em pensamentos ao observar as duas. Jamais
imaginei que viveria esse momento algum dia, que eu teria uma
mulher e uma filha... É engraçado como tudo pode mudar de uma
hora para outra.
Passei os próximos minutos em silêncio, observando a minha
nova família, até que ouvi meu celular tocar. Olhei para a tela do
aparelho e suspirei ao ver que era uma ligação de Valery. Relutei,
mas no final acabei atendendo.
— Fale — murmurei, enquanto encostava o celular no ouvido.
— Bruce... olá. — Minha irmã parecia envergonhada do outro
lado da linha. — Por acaso já viu as notícias?
— Não — respondi de imediato. Era sábado de manhã e eu
sequer me dei ao trabalho de mexer no celular, fiquei preparando o
café da manhã desde que acordei. — Aconteceu alguma coisa que
eu deva saber?
— Acabei de ver uma matéria da Gossip Million sobre a festa
da Lorie. — Valery fez uma pausa. — Estão dizendo que ela é a sua
nova protegida, que você a adotou como filha quando começou a
namorar com a Jenny. O autor da matéria também deixou
subtendido que esse é um relacionamento por interesse e nas redes
sociais não se fala em outra coisa.
Esfreguei minhas têmporas e suspirei. Porra, quando eu
penso que o pesadelo acabou...
— O que houve? — Jenny indagou, ao perceber a minha
inquietação.
— Parece que a festa da Lorie já é assunto nas manchetes
— respondi brevemente. Se ela soubesse de todos os detalhes
ficaria aflita.
O rosto da minha namorada ganhou uma expressão
preocupada e ela encarou a filha. Me senti mal naquele instante. Eu
sabia que Jenny se preocupava com a privacidade de Lorie e não
queria que a garotinha fosse perseguida por repórteres na porta da
escola. Preciso fazer alguma coisa.
— Obrigado por contar, Valery — agradeci à minha irmã, que
ainda estava do outro lado da linha.
— Só achei que você devia saber — ela tentou se justificar.
— Vou desligar agora.
A ligação foi encerrada e um sorriso involuntário curvou a
minha boca. Mesmo que Valery não quisesse admitir, ela estava
começando a considerar Lorie como sobrinha e até se preocupava
com a garotinha. Uma prova disso foi ela ter aparecido na festa
ontem à noite e agora essa ligação. Por mais irritante que a minha
irmã pudesse ser, eu precisava parabenizá-la por estar tentando ser
tia.
— Bruce, eu não quero os repórteres em cima da Lorie —
Jenny comentou, apreensiva.
— Não se preocupe, eu vou resolver isso — prometi, e
comecei a penar em inúmeras formas de cortar aquele mal pela raiz.

Desde que o meu nome começou a ser citado naquela


maldita revista eu sabia quem era a responsável por trás daquilo. No
início não me importei, afinal, cada vez que eu saía na primeira
página isso trazia mais fama para a empresa. Mas agora, a situação
era diferente... não estavam falando só de mim, estavam falando
sobre a minha filha e manchando a imagem de Jenny, sugerindo
que ela só estava comigo por interesse. Eu preciso colocar um fim
nessa perseguição.
Estacionei o carro em frente ao prédio da editora. Deixei
Jenny e Lorie em casa e agora estava sozinho para resolver uma
parte do meu passado que ainda me assombrava.
Ao descer do carro, coloquei meus óculos de sol, estilo
aviador, e ajeitei a barra da minha jaqueta de couro. Não era meu
dia de trabalho e eu não estava a fim de colocar um terno apenas
para tirar satisfação com a editora chefe da revista.
Tranquei a porta do veículoe caminhei até o prédio com uma
postura confiante. Ao chegar na recepção, tirei os óculos para que o
recepcionista pudesse me reconhecer e apoiei um braço no balcão.
— Avise à Laura que eu quero conversar com ela. —
Direcionei um olhar sério para o jovem estagiário que tomava conta
da recepção.
Ele ficou boquiaberto e me encarou de cima a baixo,
certamente não esperava que eu pudesse aparecer ali. Depois de
alguns segundos em silêncio, o estagiário colocou o telefone no
ouvido e apertou um botão.
— Chefe, o Bruce Lancasther está aqui... e parece que está
com raiva. — Ele ajeitou seus óculos quadrado e ficou em silêncio
enquanto ouvia a pessoa do outro lado da linha falar.
Suspirei com impaciência e observei o ambiente ao meu
redor. Haviam muitos jovens atarefados, correndo de um lado para o
outro com anotações nas mãos e discutindo ideias — certamente,
todos eram estagiários.
— Ah... Sr. Lancasther? — o estagiário da recepção me
chamou.
Voltei meu olhar para ele.
— O senhor pode subir. A sala dela é...
— Eu sei onde fica a sala dela — resmunguei, e fui em
direção ao elevador.
A única vez que estive aqui foi há quatro anos e, para o meu
desgosto, eu ainda me lembrava perfeitamente da ocasião. Eu tinha
acabado de ser nomeado como o novo CEO da Lancasther
Enterprises e não demorou muito até Laura Saito — a editora chefe
de uma revista de fofocas — entrar em contato comigo, me
convidando para uma breve entrevista sobre a minha vida.
Era a primeira vez que eu iria aparecer na mídia e fiquei
empolgado. Aceitei o convite sem pensar duas vezes e vim
pessoalmente até o escritório dela. Respondi as perguntas
rapidamente, mas o meu charme acabou fazendo com que Laura se
interessasse por outras coisas além da matéria que estava
escrevendo sobre mim. Eu, como o canalha que era naquela época,
acabei transando com a mulher em sua própria sala de trabalho —
algo que me arrependo totalmente de ter feito.
Para mim, foi apenas um momento de diversão, mas Laura
queria que nos envolvêssemos seriamente. Quando recusei a
oferta, ela começou a monitorar cada parte da minha vida, colocou
repórteres para me seguir e passou a publicar qualquer coisa ao
meu respeito — até mesmo as mais irrelevantes, como cor favorita
ou tipo sanguíneo.
Laura era uma louca obsessiva, mas eu fiz um esforço e a
ignorei, deixando que ela publicasse o que quisesse, mostrando que
isso não me afetaria em nada. Mas agora, ela tinha extrapolado. Eu
não me importaria se Laura inventasse mentiras e fizesse a minha
caveira para o mundo, mas uma vez que ela falou coisas ruins sobre
Jenny e se mostrou inclinada a perseguir minha filha atrás de
informações, eu decidi que precisava colocar um basta nessa
situação. Na verdade, me odeio por não ter tido a iniciativa de fazer
isso antes.
Quando o elevador chegou no andar, respirei fundo e
caminhei em passos firmes até a sala da louca. Estava prestes a
bater na porta quando percebi que ela estava aberta, então criei
coragem e entrei.
Laura estava atrás da sua mesa, me encarando com uma
expressão convencida no rosto. Em seu olhar de traços coreanos,
haviam pequenas rugas que já estavam lá desde a primeira vez em
que a vi. Não sei exatamente quantos anos essa mulher tem, mas
chuto que ela é pelo menos dez anos mais velha que eu.
— Olá, Bruce. — Laura, me cumprimentou com um sorriso
falso. — A que devo a sua visita? Por acaso quer ficar comigo outra
vez?
Mulher cínica... É claro que ela sabe o que estou fazendo
aqui.
— É melhor você parar de escrever essas matérias. — Bufei
irritado e bati as mãos em sua mesa.
Laura moveu seu rosto alguns centímetros para trás, mas
não se abalou com as minhas emoções turbulentas.
— Caso tenha se esquecido, eu disse que faria da sua vida
um inferno. — Arqueou uma sobrancelha. — Só estou cumprindo a
minha promessa.
— Inferno? Suas matérias me trouxeram fama — debochei.
— Se minhas matérias te beneficiam tanto, então por que
está pedindo que eu pare de escrevê-las? — sondou.
— Não ligo que escreva sobre mim, mas difamar as pessoas
que estão na minha vida? Isso já é demais!
— Está se referindo à Jenny ou essa raiva toda foi porque
escrevi sobre a garotinha misteriosa que tem aparecido com vocês?
— Ela cruzou os braços e um sorriso maquiavélico cruzou o seu
rosto.
Maldita! Ela está decidida a me perseguir apenas por
vingança pessoal.
— Já se passaram quatro anos, supere! — exaltei-me. — Se
quer saber, Laura, aquele foi o maior erro que eu já cometi na vida.
A mulher ficou em silêncio e pareceu abalada com as minhas
palavras.
— Há quatro anos eu te dei o meu coração, Bruce..., mas
você nem se importou com isso.
— Eu disse que não queria compromisso.
— Também disse isso para a Jenny? — ela rebateu.
Fiquei calado, sem saber o que poderia dizer para me
recuperar daquela situação.
— Para um homem que não quer compromisso você tem
saído muito com a sua secretária e a filha dela. — Laura ficou
pensativa por alguns instantes e, então, acrescentou: — A
propósito, essa garotinha se parece muito com vocês dois. Acho
que isso daria uma bela matéria na primeira página. Alguns leitores
também notaram a semelhança...
— Porra! Deixa a Lorie fora disso! — Bati na mesa
novamente.
Laura riu e se recostou na cadeira, como se estivesse
adorando a situação.
— Ela é sua filha, não é? — questionou, embora sua voz
estivesse carregada de certeza. — Se não fosse, você não se
importaria tanto.
Suspirei irritado e passei a mão pelo cabelo. Essa mulher não
vai ceder apenas com conversa... terei que jogar sujo.
— Laura, escuta com bastante atenção. — Inclinei-me sobre
a mesa, lhe direcionando um olhar ameaçador. — Se não deixar a
minha vida em paz e seguir com a sua, eu vou comprar essa
editora, demolir o prédio e quando você vier trabalhar na segunda-
feira não verá nada além de uma pilha de escombros. Aí sim, você
terá um bom motivo para me odiar.
— Não pode fazer isso. — O olhar da mulher ficou
preocupado. — Eu amo essa editora. É o trabalho da minha vida!
Fiz um grande esforço para conter o sorriso vitorioso que
ameaçou curvar a minha boca. Eu sabia que se jogasse essas
cartas na mesa Laura não iria hesitar em escolher a editora. A única
coisa que aquela mulher valorizava, mais do que a sua vingança,
era a sua vida profissional.
— É melhor você pensar bem — a pressionei. — Se publicar
alguma outra merda sobre a Jenny ou sobre aquela garotinha, eu
vou te enfiar tantos processos que nem se virar a dona dessa
editora você vai conseguir pagar!
Ao perceber que a mulher ficou intimidada, concluí que o meu
trabalho ali estava feito.
Convencido de que Laura não me daria mais dores de
cabeça, me afastei da mesa, coloquei os óculos escuros e saí da
sala para nunca mais voltar. Meu problema com essa revista está
resolvido. Agora, tenho que lidar com outras questões pessoais.
Enquanto eu caminhava até o elevador, coloquei a mão no
bolso da calça e peguei o celular. Eu precisava falar com a minha
advogada...
CAPÍTULO 37

Era segunda-feira e eu me sentia estranhamente confiante na


minha mesa de trabalho. Acho que o meu humor otimista se devia
ao fato de que a situação com a revista havia sido resolvida. Bruce
não me deu muitos detalhes de como lidou com o assunto, mas
garantiu que os repórteres enxeridos não iriam mais nos incomodar.
Estava perto da hora do almoço quando o elevador apitou,
indicando que alguém havia chegado no andar. Ergui meu olhar
para o corredor na esperança de que fosse Bruce voltando da sua
reunião com uma empreiteira, mas me deparei com Brittany e Lorie
quando as portas se abriram.
Levantei-me da cadeira imediatamente e fui ao encontro das
duas, estranhando a visita repentina.
— Mamãe! — Lorie correu até mim.
Abaixei-me no chão e abracei a minha filha, enquanto
lançava um olhar confuso para Brittany.
— O que estão fazendo aqui? Lorie devia estar na escola
essa hora. — Soltei a garotinha e fiquei de pé novamente.
— Bruce me ligou e pediu para trazer Lorie até a empresa,
disse que tinha assuntos importantes para resolver — ela se
explicou.
— Que assuntos?
— Não sei. Ele não me disse muita coisa. Só pediu que eu
buscasse Lorie na escola e a trouxesse para cá.
— Bruce está em reunião. — Suspirei. — Vamos esperar até
que ele volte.
Brittany concordou e se recostou na parede do corredor para
mexer no celular. Notei que ela sorria para a tela enquanto digitava.
— Quem é? — Ergui uma sobrancelha.
— Kevin. — Suas bochechas coraram e ela ergueu seu olhar
para mim. — Ele me chamou para sair essa noite.
— Aceite — sugeri sem pensar. Acho que os dois formariam
um belo casal.
— Ele me chamou para jantar e disse que depois poderíamos
assistir um filme na casa dele... — Brittany me lançou um olhar
malicioso e tapou os ouvidos de Lorie. — Mas está claro que não
iremos assistir filme nenhum. Isso é apenas um convite discreto
para transar.
— E você vai aceitar? — Reprimi uma risada.
Minha amiga hesitou em responder, mas o brilho em seu
olhar entregou que ela estava entusiasmada com a ideia.
— Olha, eu admito que estou louca para sair com aquele
piloto gostoso, mas também tenho medo — confessou. — Acho que
eu não quero ser apenas mais um caso para ele...
— O Kevin não é esse tipo de cara — Bruce disse, enquanto
se aproximava de nós.
Brittany arregalou os olhos e levou as mãos até o peito.
Também me assustei com a aparição repentina do homem — acho
que fiquei tão entretida pela conversa que não ouvi ele chegar.
— Papai! — Lorie ficou animada e ergueu os bracinhos para
que ele a pegasse no colo.
Bruce sorriu e levantou a filha do chão, a acomodando em
seu braço direito.
— Há quanto tempo está ouvindo a fofoca? — Brittany
questionou, depois de se recuperar do susto.
— Ouvi apenas o suficiente para entender que você quer sair
com o Kevin, mas está com medo de se magoar. — Bruce passou a
mão no topo da cabeça de Lorie, onde uma parte da sua maria-
chiquinha estava bagunçada. — O Kevin não é do tipo que fica com
as mulheres apenas por diversão. Se ele te chamou para sair é
porque realmente está interessado em você.
Brittany ficou pensativa por alguns segundos, mas logo
assentiu.
— É bom que esteja certo — Brittany provocou. — Ou farei
você pagar a minha terapia.
— Tecnicamente, eu pago a terapia de todos os meus
funcionários... a Lancasther Enterprises oferece plano de saúde.
— Até mesmo para a comissária de bordo? — ela sondou.
— Claro. — O olhar de Bruce vagou entre Lorie e Brittany. —
E isso me lembra que preciso acrescentar um bônus no seu salário
por cuidar da minha filha.
Minha amiga arquejou, mas não se opôs à ideia. Eu apenas
revirei os olhos, enquanto assistia a cena em silêncio. Há um mês,
Bruce também me disse que pagaria um bônus pelo meu excelente
desempenho no emprego e na semana passada 20 mil dólares
caíram na minha conta. Tentei lhe devolver a quantia, mas ele se
recusou a aceitar e ameaçou depositar o dobro no próximo mês.
— E por falar na baixinha... ela, Jenny e eu vamos resolver
uma coisa agora.
— Nós vamos? — Franzi o cenho, confusa. Acho que não fui
avisada sobre o que está acontecendo aqui.
— Obrigado por trazê-la, Brittany. Você já pode ir — Bruce a
liberou da sua função de babá.
— Vão precisar que eu cuide da Lorie mais tarde?
— Não. — Bruce olhou para a filha e depois para mim. —
Estou pensando em dar um passeio com as duas.
— Eba! — Lorie comemorou no colo do pai.
Brittany sorriu e concordou com a cabeça.
— Então acho que essa noite eu terei um encontro. — Ela
acenou para mim. — Depois te conto tudo, Jenny. Aproveite o
passeio em família.
— E você aproveite o piloto gostoso — brinquei.
As bochechas da minha amiga coraram e ela me mostrou o
dedo do meio antes de se virar e caminhar em direção ao elevador.
Eu não podia ficar mais feliz com o rumo que as nossas vidas
estavam tomando. Espero, de verdade, que Brittany e Kevin possam
se dar bem.
— Temos uma reunião para ir — Bruce disse, e caminhou em
direção à sua sala.
O segui até lá com um milhão de perguntas em mente.
Faltava apenas meia-hora para o almoço e não havia nenhuma
reunião marcada na agenda dele.
Quando cruzei a porta vi uma mulher esguia, de meia idade,
sentada em uma das cadeiras em frente à mesa de Bruce. Seu
cabelo castanho estava cortado na altura dos ombros, ela usava um
terninho cinza e vasculhava alguns papeis em sua maleta preta.
Quem é ela e como passou pela recepção sem que eu a visse?
— Jenny, esse é a Dra. Thompson, a minha advogada —
Bruce me apresentou.
— Prazer em conhecê-la. — Aproximei-me da mulher e
apertei a sua mão.
— Ela está aqui por um motivo muito importante. — Bruce foi
até o outro lado da mesa e se sentou em sua cadeira de couro,
Lorie ainda estava em seu colo.
— Essa é a sua filha? — a advogada perguntou. — Que
gracinha.
— É sim. — Bruce sorriu orgulhoso. — E essa é mãe dela. —
Apontou na minha direção.
Senti-me um pouco envergonhada quando o olhar da Dra.
Thompson se fixou em mim por alguns segundos. Sem saber o que
fazer, decidi ir até o outro lado da mesa e parei ao lado da cadeira
onde Bruce estava sentado.
— O que está acontecendo? — perguntei, tomada pela
curiosidade.
— A Dra. Thompson está aqui para reconhecer a minha
paternidade — Bruce explicou, sem rodeios. — Vou registrar Lorie
como minha filha e ela ganhará o meu sobrenome.
— Oh... — Fiquei boquiaberta, tentando processar aquela
informação.
Grande parte de mim não conseguia acreditar que Bruce
tomou essa grande iniciativa sozinho. Estava nítido que o homem
queria fazer pela Lorie o que seu pai nunca fez por ele e eu o
admirava por essa atitude.
— Srta. Spencer? — A advogada me entregou um papel e
uma caneta chique. — Assine na linha pontilhada.
Foquei minha atenção no papel até encontrar o lugar que ela
indicou e assinei sem hesitar. Eu não fazia ideia de como funcionava
esse procedimento, então resolvi seguir as instruções da advogada.
Quando terminei a assinatura, a Dra. Thompson pegou a
mesma folha e entregou para Bruce, que não hesitou em pegar sua
própria caneta, que estava sobre a mesa, e assinar no final do
documento. Lorie observou com curiosidade o papel que passava
de mão em mão até que a advogada o recolheu.
Ela analisou rapidamente, para checar se estava tudo certo e,
em seguida, apertou a mão de Bruce. Reprimi uma risada quando
Lorie também estendeu sua mãozinha para a Dra. Thompson e ela
a apertou.
— Agora, vocês são oficialmente pai e filha. — A advogada
sorriu amigavelmente para Bruce e depois apertou a minha mão.
— Obrigado, Dra. Thompson. — Bruce retribuiu o sorriso.
Com um breve aceno de cabeça, a advogada guardou o
papel dentro da maleta e a fechou.
— Entregarei a certidão de nascimento atualizada em uma
semana — explicou, ao se levantar da cadeira.
Bruce concordou e então a advogada caminhou para fora da
sala.
— O que era aquele papel? — Lorie questionou.
— Aquele papel comprova que você é a minha filha — Bruce
explicou, enquanto encarava a garotinha. — Somos uma família
agora, Lorie. Você, a mamãe e eu.
Sorri para os dois e o meu coração se aqueceu quando
ambos sorriram de volta. Naquele momento, percebi que estava
diante das pessoas que eu mais amava no mundo.
— Eu amo vocês — declarei, orgulhosa.
Dei um beijo na bochecha de Lorie e outro na boca de Bruce,
em seguida, os abracei. Os dois ainda estavam sentados na
cadeira, mas não me importei de fazer um pequeno esforço ao me
inclinar para baixo e passar meus braços ao redor de ambos.
— Também amamos você, Jenny — Bruce sussurrou, com a
boca próxima ao meu ouvido, e a minha pele inteira se arrepiou. —
Eu odeio atrapalhar esse momento, mas você poderia cancelar as
reuniões que tenho hoje à tarde? Quero levar vocês duas para
almoçar e depois podemos tomar sorvete.
— De chocolate! — Lorie se empolgou.
Afastei-me do abraço e os encarei com um sorriso. Como eu
poderia negar uma coisa dessas?
— Eu não demoro. — Afaguei a cabeça de Lorie em uma
pequena despedida e Bruce piscou para mim.
— Ficaremos aqui te esperando — ele garantiu.
Concordei silenciosamente e me virei em direção à saída da
sala. Enquanto eu caminhava até a porta, ouvi Lorie e Bruce
discutindo os planos que tinham para aquela tarde.
— Para onde vai querer ir depois do sorvete, baixinha?
— Parque de diversões! — Lorie exclamou.
— Outra vez? — Bruce deu uma breve risada.
— Sim! Quero ganhar mais um ursinho...
Sorri comigo mesma ao sair da sala. É bom ver os dois juntos
como pai e filha.
CAPÍTULO 38

Os dias que se passaram foram calmos e alegres. Sempre


que chegava ao fim do expediente na empresa, Bruce e eu íamos
até a escolinha de ballet para buscar Lorie no horário de saída e
fazíamospasseios em família. Normalmente, íamosaté o parque de
diversões ou ao cinema e nos dias em que Lorie se sentia
embirrada para sair, ficávamos em casa jogando jogos de tabuleiro
ou simplesmente assistindo TV.
Outra coisa que também deu certo foi o encontro de Brittany
com Kevin. Minha amiga só voltou para o apartamento na manhã
seguinte, com um sorriso idiota no rosto e uma história erótica para
contar. Eu estava feliz por ela.
Embora tudo estivesse correndo bem, ainda havia uma coisa
— ou melhor, uma pessoa — que me deixava nervosa: Valery. A
irmã de Bruce continuava me encarando com desgosto sempre que
nos encontrávamos, mas ao menos estava se esforçando para ser
gentil com Lorie e isso fazia com que eu não a odiasse
completamente.
Confesso que fiquei surpresa quando recebi um telefonema
da mulher em meu horário de almoço me pedindo para encontrá-la
em uma rua comercial no lado oeste de Manhattan. Tudo que ela
me disse foi que tinha um assunto urgente para tratar comigo.
Quando desci do táxi que me levou até o local, avistei Valery
me esperando de braços cruzados em frente à uma loja de roupa.
Revirei os olhos e caminhei até lá, desejando que a nossa conversa
fosse o mais breve possível.
— Estava começando a achar que você não viria — ela
resmungou, enquanto me encarava de cima a baixo, analisando a
roupa que eu vestia.
Por mais que o meu conjunto de blazer e saia vinho não
pudesse nem de longe ser comparado com o vestido tubinho preto
que a mulher usava, eu já não me sentia mais um zero à esquerda
quando Valery me lançava seus olhares de julgamento. Acabei me
acostumando com o jeito que a irmã de Bruce se comportava e
agora isso não me afetava mais. No fim das contas, ela não passa
de uma louca mimada.
— Por que estamos aqui? — fui direto ao assunto.
Valery suspirou e desviou seu olhar para a loja de roupas que
ficava atrás dela.
— Vamos fazer compras — respondeu com um certo tédio.
Franzi o cenho e encarei a mulher. Valery está me chamando
para fazer compras? Ela enlouqueceu? Compras são coisas que
amigas fazem juntas e nós duas estávamos longe de sermos ao
menos colegas.
— Espera, deixa eu ver se entendi... Você quer fazer
compras comigo? — Apontei para ela e depois para mim. — Por
quê?
— Porque eu queria te dar algumas dicas de moda... e
também porque eu não tinha nada melhor para fazer. — Valery
revirou os olhos, parecia que ela estava se arrependendo daquilo.
Ótimo. Talvez se eu tagarelar mais um pouco ela mude de ideia e vá
embora. Não estou a fim de fazer compras com essa mulher .
Respirei fundo e tentei reunir coragem para dizer a ela tudo
que eu queria.
— Eu não quero fazer compras com você, Valery, não somos
amigas. Se está se sentindo solitária, compre um hamster.
— Ah, eu devia saber que você reagiria assim! — A mulher
ajeitou a alça da bolsa de grife que estava em seu ombro. — Pensei
em fazer uma boa ação te trazendo aqui para comprar algumas
roupas e evitar que você pareça uma desleixada ao lado do meu
irmão, mas vocês pobres são sempre mal agradecidos.
— Por acaso eu te pedi alguma coisa?! — gritei indignada.
Por sorte, a calçada em que estávamos não era movimentada e não
havia muitos pedestres passando ao nosso redor. — Tenho pena do
Bruce por ele ter uma irmã egocêntrica e mesquinha igual a você.
Eu nunca te fiz nada, mas você vem me provocando desde a
primeira vez em que me viu na empresa. Eu já cansei, Valery! —
Cerrei os punhos, em uma tentativa de amenizar a raiva. — Cansei
dos seus comentários maldosos e da sua falta de compaixão com
os outros. Honestamente, acho que o mundo seria um lugar bem
melhor se você não estivesse nele!
Valery ficou em silêncio e eu vi uma sombra de tristeza em
seu olhar. Minhas palavras a atingiram mais do que eu esperava,
mas eu não me arrependi do que falei. Essa mulher vem tirando a
minha paz há meses, é justo que eu faça isso com ela ao menos
uma vez.
— Eu vou embora. — Ela respirou fundo e se virou para sair,
mas acabou trombando com um homem de boné e óculos escuros.
Ele a encarou por alguns segundos e então levou as mãos até a
cintura. Meu sangue gelou quando o sujeito puxou uma arma e
apontou na direção de Valery.
— Passa a bolsa! — o bandido ordenou, em um tom
ameaçador.
Valery arquejou e segurou a bolsa contra o seu corpo quando
o homem a puxou pela alça.
— Me solte! — Ela resistiu e tentou se livrar da mão do
bandido que puxava a bolsa. — Essa é uma edição limitada da
Chanel!
Eu fiquei em choque assistindo à cena. Meu cérebro não
conseguia pensar em nada para tirá-la daquela situação e, para ser
sincera, não acho que houvesse alguma coisa a ser feita.
Segundos passaram e Valery continuou travando uma
disputa com o bandido pela bolsa cara que carregava em seu
ombro. O homem ficou impaciente e o seu dedo apertou o gatilho.
Um som ensurdecedor, causado pelo disparo, ecoou pela rua
e fez meus ouvidos doerem. A mulher que antes lutava pela bolsa
parou de resistir e gritou. Seu corpo começou a cair para trás e o
bandido aproveitou o momento para pegar o acessório de marca
que tanto queria. Com a bolsa em mãos, ele deu meia volta e correu
pela calçada, desesperado para fugir da cena do crime.
Valery cambaleou, levando as mãos até a barriga e então se
virou na minha direção. Arquejei ao ver que uma grande quantidade
de sangue escapava por entre seus dedos e agora começava a
pingar na calçada.
— J-Jenny... — ela gaguejou, e suas pernas voltaram a
fraquejar. Seu corpo tombou para a frente e eu corri para segurá-la.
Precisei usar toda a minha força para não deixar que Valery caísse
no chão.
O choque e o medo pairavam em minha mente quando deitei
a mulher na calçada. Seu corpo estava amolecendo e ela começava
a perder a consciência. Meu cérebro em pânico não conseguia
processar que aquilo era real. Há um minuto nós discutíamos como
cão e gato e agora ela está desfalecendo no chão de concreto...
Merda!
Comecei a me arrepender das palavras que saíramda minha
boca durante a discussão. Quando falei que o mundo seria um lugar
melhor sem Valery, eu não queria que ela levasse um tiro.
A porta da loja em frente ao local em que estávamos se abriu
e uma vendedora saiu para checar o que aconteceu. Em poucos
segundos a mulher tirou um celular do bolso da calça e ligou para a
emergência. Pessoas que passavam do outro lado da rua também
correram até nós, curiosas para ver a tragédia que estava se
desenrolando no meio-fio.
Eu, por outro lado, não conseguia dizer ou fazer nada.
Apenas fiquei abaixada ao lado de Valery, dando tapas em seu rosto
para que ela não perdesse a consciência e mantivesse os olhos
abertos. Há alguns minutos, bater na irmã de Bruce me causaria um
grande alívio, mas agora, a cada tapa que eu dava tudo que eu
sentia era preocupação. A raiva que eu nutria por aquela mulher se
tornou insignificante agora que ela estava à beira da morte.

Assim que a ambulância estacionou em frente ao hospital,


uma equipe de médicos correu até o veículo. Os profissionais
colocaram um balão de oxigênio em Valery e arrastaram a maca em
que ela estava para a ala de emergência.
Fiquei na sala de espera, com um nó na garganta e torcendo
para receber notícias de que ela ficaria bem. Eu não era fã de
Valery, mas também não queria que a mulher morresse.
Enquanto eu caminhava de um lado para o outro na sala de
espera, liguei para Bruce e informei sobre o que havia acontecido. O
homem ficou desolado e garantiu que já estava a caminho do
hospital, no entanto passaram-se meia hora desde que fiz a ligação
e ele ainda não havia chegado. Estava prestes a ligar outra vez
quando uma médica de trinta e poucos anos apareceu para falar
comigo.
— Você está acompanhando a Valery Cooper, certo? — ela
checou.
— Sim... eu sou cunhada dela.
— Eu sei, conheço você da revista — a médica respondeu,
vagamente. — É a namorada do Bruce Lancasther.
— Isso — concordei, sentindo o meu rosto corar. — Já tem
alguma notícia sobre o estado dela?
A médica folheou o prontuário médico e assentiu. Meu peito
pesou ao notar que a sua expressão não estava muito contente.
— A Srta. Cooper precisa de uma transfusão de sangue, mas
infelizmente não temos o tipo sanguíneo dela aqui no hospital. Se
não encontrarmos um doador nas próximas horas... — Ela não
terminou a frase, mas me lançou um olhar preocupado e eu entendi
imediatamente o que significava. Valery pode morrer.
— Eu vou ligar para o Bruce — avisei, enquanto retirava o
celular da minha bolsa. — Ele pode doar o sangue...
— Não — ela me interrompeu. — Bruce não tem o mesmo
tipo sanguíneo da irmã.
Por um instante me perguntei como a médica conseguiu
aquela informação tão rápido.
— Como você sabe? Bruce já esteve aqui no hospital?
— Eu li na Gossip Million — confessou. — O sangue dele é A
negativo.
Eu não soube o que responder. Publicaram até o tipo
sanguíneo de Bruce? Pelo visto, a mulher diante de mim, é uma
leitora fiel daquela revista de fofocas.
— A Srta. Cooper tem algum familiar que more perto, além do
irmão?
— Não que eu saiba — admiti. — Qual é o tipo sanguíneo
dela?
— O negativo.
— Sério? O meu também — respondi, involuntariamente.
— Você fuma? Ingeriu alguma bebida alcóolica nas últimas
doze horas? Está grávida? — a médica disparou aquelas perguntas
de forma apressada.
— Ah... não, não e não — respondi, confusa.
— Então venha comigo. — A médica segurou a minha mão e
me puxou apressadamente em direção à uma porta dupla.
CAPÍTULO 39

Tive que doar uma bolsa de sangue para Valery. Quando me


sentei na cadeira estofada da sala de espera eu estava me sentindo
levemente tonta. Uma enfermeira me trouxe um pequeno sanduíche
de geleia e uma caixinha de suco para que eu recuperasse as
energias depois de ter 450ml de sangue retirados do meu corpo.
Quem diria que Valery precisaria de mim para salvar a vida dela? O
mundo não gira, ele capota...
Enquanto eu recuperava as minhas forças, Bruce entrou na
sala preocupado. Acenei para que viesse até mim e ele correu na
minha direção. Seu cabelo estava bagunçado e ele estava sem a
gravata.
— Jenny, tem alguma notícia da minha irmã? — perguntou
aflito, enquanto se sentava na cadeira ao meu lado. — Fiquei preso
no trânsito.
— Doei uma bolsa de sangue para ela. — Levantei o meu
braço para mostrar o algodão que estava no local em que fui furada.
— Você doou sangue para a Valery? — Ele ficou surpreso
quando ouviu aquilo.
— A vida dela estava em risco. — Dei de ombros. — Foi a
única saída.
Eu ainda estava preocupada e torcia para que tivéssemos
boas notícias. Há duas horas Valery foi levada para a sala de
cirurgia e desde então nenhum médico veio falar comigo. Espero
que ela sobreviva.
— Obrigado, Jenny. — Bruce me puxou para um abraço
apertado e eu afaguei suas costas para confortá-lo.
— Vamos torcer para que fique tudo bem...
— Quero saber exatamente o lugar em que vocês estavam.
— Ele se afastou do abraço e recostou-se na cadeira. — Vou
garantir que o filho da puta que fez isso apodreça atrás das grades.
Enquanto esperávamos por qualquer notícia, contei em
detalhes tudo que aconteceu mais cedo e precisei de muita
concentração para não entrar em pânico ao relembrar daquele
momento. Infelizmente, eu não tinha uma descrição muito boa do
bandido já que ele usava óculos de sol e boné, mas Bruce me
lembrou que ainda haviam as câmeras de segurança da rua e que,
provavelmente, alguma delas gravou a ação.
Quatro horas depois, a mesma médica que me fez doar
sangue para Valery apareceu na sala de espera. Ela cumprimentou
Bruce com um aceno e eu percebi que ela estava se segurando
para manter a postura profissional perto dele.
— Alguma notícia dela? — perguntei à mulher, que assentiu e
nos direcionou um sorriso.
— A Srta. Cooper saiu da sala de cirurgia há uma hora e foi
transferida para o quarto — explicou. — Por milímetros a bala não
atingiu o fígado, mas conseguimos retirá-la com sucesso. As coisas
teriam se complicado se não fosse pela sua doação, Jenny.
Um grande alívio me atingiu quando ouvi a notícia e não pude
deixar de sentir um certo orgulho pelo que eu fiz.
— Quando poderemos vê-la? — Bruce preguntou, inquieto.
— Agora mesmo, se prometerem que não irão estressá-la —
a médica respondeu. — O efeito do sedativo já passou e faz alguns
minutos que ela está acordada.
— Vamos então. — Bruce levantou da cadeira e segurou a
minha mão.
Seguimos a médica até a ala onde os pacientes ficavam
internados e entramos em um quarto particular. Valery estava
deitada na cama, com um tubo de oxigênio no nariz. Preso em seu
dedo estava um aparelho que monitorava a sua frequência cardíaca
e emitia bipes de acordo com os seus batimentos.
Ela deu um sorriso fraco ao ver que estávamos ali. Bruce
praticamente correu até a irmã e deu um beijo delicado em sua
testa. Confesso que achei a cena comovente, considerando que ele
e Valery não se davam muito bem na maioria das vezes em que
estavam juntos.
— Como está se sentindo? — Bruce quis saber.
— Como alguém que levou um tiro e acabou de sair da
cirurgia — a voz de Valery estava fraca e baixa, mas ainda podia ser
compreendida.
— A doutora disse para você não fazer esforço. Tente ficar
quieta nessa cama por alguns dias — ele pediu.
— Eu sei, ela já conversou comigo. — A irmã de Bruce correu
os olhos pelo quarto até me ver parada ao lado da porta. — Jenny, a
doutora me disse que perdi muito sangue e que eu não teria
resistido à cirurgia se não fosse pela sua doação... você salvou a
minha vida.
Eu não sabia dizer se Valery estava envergonhada ou se
foram os medicamentos que ela recebeu que lhe deixaram com uma
expressão de arrependimento no rosto. Nunca vi essa mulher com
um olhar tão humilde em todo esse tempo que a conheço.
— Vem cá. — Embora seus movimentos estivessem fracos,
Valery gesticulou com a mão para que eu me aproximasse da cama
em que ela estava.
Hesitei por alguns segundos, mas acabei criando coragem e
fui até lá. Quando parei ao lado de Bruce, ele entrelaçou o braço ao
redor da minha cintura, como se quisesse me oferecer um pouco
mais de conforto.
— Eu não fui justa com você — o tom arrependido de Valery
me pegou de surpresa. — Desculpe pelo jeito que agi desde que
nos conhecemos. Você não mentiu quando disse que eu era uma
pessoa egocêntrica e mesquinha. Eu não te culparia se tivesse me
deixado lá na calçada para morrer...
Era impossível acreditar no que acabei de ouvir. Valery está
arrependida e me pedindo desculpas? Ou ela está alucinando com o
efeitode algum remédio ou realmente está arrependida pelas coisas
que fez... Já ouvi casos de pessoas que mudaram completamente
de vida depois de quase terem partido dessa para melhor. Era
provável que isso também estivesse acontecendo com a vadia de
olhos azuis. Talvez eu deva dar a ela o benefícioda dúvida e lhe
oferecer uma chance para se redimir.
— Valery, você cresceu com uma visão muito limitada do
mundo... — Espero não me arrepender dessa decisão. — Eu te
perdoo. Nunca é tarde para mudar.
— Tentarei ser melhor de hoje em diante — ela prometeu. —
E quando eu receber alta, vou te levar para fazer compras... dessa
vez sem gracinhas.
— Não sei se vou poder pagar — confessei.
Depois de tudo que aconteceu, acho que eu devo uma tarde
de compras a ela.
— Pegue o cartão do Bruce — Valery sugeriu, naturalmente.
Encarei o homem que estava ao meu lado e ele apenas
sorriu. Bom, eu tenho um namorado bilionário que não sentirá a
menor falta no orçamento se eu fizer algumas comprinhas em lojas
de grife com o cartão dele. Acho que preciso deixar a vergonha e o
orgulho de lado e começar a aproveitar as oportunidades que a vida
me dá. Se Bruce quiser me emprestar o seu cartão, eu não irei
recusar.
— Como quiser... quando você estiver se sentindo melhor,
vamos sair para fazer compras — concordei com Valery.
Essa também poderia ser uma chance para socializarmos um
pouco. Valery era a única famíliaque Bruce tinha e eu precisava me
dar bem com ela. Vou até fazer um esforçoe parar de chamá-la de
vadia de olhos azuis.
— Agora que tudo está bem, tem outra coisa que preciso
confessar para vocês... — Ela nos direcionou um sorriso amarelo. —
Quando abracei Lorie na festa de aniversário, acabei pegando
alguns fios de cabelo dela e mandei para que um laboratório fizesse
um teste de DNA.
— Você o quê? — Bruce ficou surpreso, mas eu fiz sinal para
que ele ficasse em silêncio e deixasse a irmã falar.
— É algo que eu me arrependo agora — confessou. — Eu
não devia ter feito isso sem a permissão de vocês. — Ela fixou seu
olhar em Bruce. — Mas se quer saber, irmão, a Lorie realmente é
sua filha.
Bruce apenas concordou com a cabeça, não parecendo nem
um pouco surpreso com o que ouviu. Apesar de Valery ter a
coragem de fazer aquilo pelas nossas costas, agora havia algo além
da minha palavra para comprovar que Lorie realmente era filha de
Bruce. Acho que posso perdoá-la por isso também...
CAPÍTULO 40

Bruce contratou um grupo de investigadores para analisarem


o caso e, dois dias após Valery ser baleada, a equipe conseguiu
encontrar o atirador graças à câmera de segurança que havia perto
do local onde o assalto aconteceu. Assim que as imagens saíram, a
polícia conseguiu prender o bandido e ficamos aliviados ao saber
que ele não incomodaria mais ninguém por um longo tempo, já que
acabou sendo acusado de roubo e tentativa de assassinato.
Depois de 15 dias internada, Valery saiu do hospital e agora
se recupera no apartamento de Bruce. Ele acabou deixando que a
irmã ficasse por lá enquanto não estivesse bem para se virar
sozinha e até contratou uma enfermeira para cuidar dela. Brittany
nunca perdia a oportunidade de fazer piadinhas por ter uma
enfermeira andando pelo apartamento do meu namorado. Eu até
ficariaincomodada com a situação, se a mulher não tivesse 70 anos
e um bigode.
Se passou um mês desde que Bruce descobriu que é pai de
Lorie. Ele vinha se dedicando cada vez mais para agradar a
garotinha e ser presente na vida dela. Certo dia, eu o surpreendi em
sua sala lendo um livro sobre cuidados infantis e ele até instalou
uma cadeirinha para crianças no banco de trás do seu carro.
Bruce também continuava insistindo para que Lorie e eu nos
mudássemos para a cobertura dele. Eu estava louca para aceitar,
mas quando contei à Brittany sobre o convite que recebi, ela me
aconselhou a ter cuidado e disse que não achava muito prudente
que eu me mudasse para a casa dele nos primeiros meses de
namoro.
Bruce podia estar empolgado com a ideia de ter uma filha e
uma namorada, mas o que aconteceria quando estivéssemos
convivendo embaixo do mesmo teto? Será que ele se manteria o
homem perfeito ou o nosso relacionamento cairia na rotina e logo
estaria indo por água abaixo com o tédio do dia a dia? Eu não quero
que isso aconteça...
Era início de dezembro. Naquela noite aconteceria a primeira
apresentação de ballet da Lorie. Bruce e eu estávamos sentados na
primeira fila no teatro onde aconteceria o musical. Haviam muitos
pais orgulhosos ali, todos usando trajes finos e caros, deixando
evidente que possuíam uma posição social elevada.
Não fiquei surpresa ao saber que todos os pais e mães nesse
lugar eram ricos, afinal, quem mais poderia pagar uma academia de
ballet tão cara? Lorie não estaria fazendo aulas nessa companhia se
não fosse por Bruce, ele apresentou a nossa filha para um mundo
novo, cheio de oportunidades. Eu estava feliz por saber que a minha
princesinha jamais passaria pelas mesmas dificuldades que eu
passei.
Enquanto esperávamos a apresentação começar, Bruce me
olhou de um jeito terno e segurou a minha mão. Direcionei lhe um
sorriso sincero, deixando evidente a felicidade que eu sentia
naquele momento. Eu tinha plena consciência de que estava
radiante com o meu vestido longo cor de champanhe e a echarpe
que o acompanhava. Bruce também estava vestido formalmente,
com um terno cinza escuro e uma gravata preta. Posso dizer com
toda certeza que ele é o homem mais bonito desse teatro.
Bruce e eu ficamos perdidos no olhar um do outro até que as
cortinas se ergueram e as pessoas ao nosso redor começaram a
bater palmas. Voltamos nossa atenção para o palco e eu sorri
orgulhosa quando vi Lorie com a sua linda roupinha lilás de bailarina
dançando no meio das outras crianças. Todas as garotas no palco
tinham quase a mesma altura e também pareciam ter poucos anos
de diferença entre si. Acho que eles usam a idade como critério para
separar as turmas.
As meninas no palco dançavam perfeitamente, saltitando e
fazendo piruetas em uma coreografia ensaiada para acompanhar o
ritmo da música clássica que tocava ao fundo. Uma pequena
lágrima caiu do meu olho enquanto eu observava Lorie. Sem querer
me gabar, mas a minha filhinha é a bailarina mais fofa dessa
apresentação...
A dança durou alguns minutos e quando a música parou de
tocar as garotinhas se posicionaram lado a lado e acenaram para a
plateia. Uma salva de palmas começou e todos os pais se
colocaram de pé para aplaudir — inclusive Bruce e eu.
— Fizemos um ótimo trabalho, Jenny — Bruce sussurrou
próximo ao meu ouvido, enquanto aplaudíamos a apresentação.
Sorri e concordei em silêncio, meus olhos se enchiam de
lágrimas à medida que os aplausos continuavam. Eu me sentia a
mãe mais orgulhosa do mundo naquele momento.
— A garotinha de lilás é minha filha — Bruce se gabou com
um homem que estava sentado na cadeira de trás. Era nítido que
ele estava tão orgulhoso quanto eu.
Não aguentei a emoção do momento e permiti que algumas
lágrimas caíssem. Eu sabia que daqui para frente iria experimentar
muitos momentos que me fariam chorar de orgulho — como a
formatura da Lorie ou até mesmo outras apresentações de ballet —
e desejava que Bruce estivesse ao meu lado em cada uma dessas
etapas.
Quando saímos do teatro, a primeira neve de dezembro
estava começando a cair. As ruas de Nova York já ganhavam um
tom esbranquiçado e a decoração das luzes natalinas fazia aquela
noite fria parecer mágica.
Bruce enrolou Lorie no paletó do seu terno para que ela
ficasse aquecida e a colocou no banco de trás do seu Cadillac CT4
preto. Durante o caminho até o meu apartamento, a garotinha
acabou adormecendo e Bruce precisou carregá-la no colo quando
chegou o momento de subir as escadas do prédio antigo em que eu
morava com a minha melhor amiga.
Quando abri a porta para que Bruce pudesse entrar no
apartamento com Lorie em seus braços, me deparei com as
almofadas do sofá espalhadas pelo chão da sala e a mesinha de
centro totalmente desalinhada. Franzi o cenho, estranhando aquela
situação. Brittany não costumava bagunçar as coisas e estava tudo
perfeitamente arrumado quando eu saí.
— Brittany? — chamei pela minha amiga quando entrei no
apartamento.
Bruce veio logo atrás de mim e também ficou surpreso com a
bagunça que havia no lugar. Ele levou Lorie para dentro do meu
quarto para colocá-la na cama e eu aproveitei o momento para
analisar o ambiente com mais calma.
Depois de uma breve inspecionada, notei uma camisa polo
masculina que eu nunca vi em toda a minha vida pendurada no
braço do sofá e um pouco mais à frente, no chão, estava um par de
tênis esportivos.
— Brittany? Está em casa? — chamei outra vez. — Nós
chegamos.
De repente, a porta do seu quarto abriu e Brittany saiu do
cômodo completamente descabelada e ofegante. Sua camisola de
algodão estava amarrotada e parecia ter sido vestida às pressas.
Ela se recostou no batente da porta e me encarou com um sorriso
amarelo.
— Oi, Jenny. — Brittany fez uma pausa para respirar. — Eu
não pensei que voltariam tão cedo...
— Já são 23h30. — Ergui uma sobrancelha.
Brittany não disse nada, apenas encolheu os ombros e olhou
rapidamente para dentro do seu quarto. As luzes estavam apagadas
no interior do cômodo e o seu corpo na frente da porta impedia que
eu tivesse qualquer vislumbre do interior do local. Era óbvio que ela
não estava sozinha.
— Está com visita aí? — Apontei com o queixo para a porta
atrás dela, enquanto tentava reprimir o riso.
Antes que minha amiga pudesse responder, Kevin saiu do
quarto abotoando a sua calça jeans. Ele estava sem camisa e a pele
do seu tórax exibia um leve brilho de suor. Tentei não encarar muito,
mas precisava admitir que o piloto estava em boa forma.
Ao perceber que foi pega em flagrante, Brittany se aproximou
de mim e segurou as minhas mãos, me direcionando um olhar
comovente.
— Jenny, eu sei que você disse para não trazer homens aqui
para o apartamento, mas o Kevin é diferente — ela tentou se
explicar.
— Não estou brava com você — a tranquilizei.
Brittany suspirou, aliviada.
— Que bom, porque foi você que quebrou essa regra
primeiro trazendo o Bruce para cá.
— Eu ouvi o meu nome... — Bruce saiu do meu quarto e ficou
surpreso ao se deparar com Kevin e Brittany descabelados diante
de mim.
— Oi, chefe — Kevin disse, um pouco envergonhado.
Bruce o cumprimentou com um breve aceno de cabeça,
enquanto tentava reprimir uma risada.
— Bom, eu já estou de saída.— O piloto tentou caminhar até
o sofá onde estava a sua blusa, mas Brittany o impediu segurando o
seu braço.
— Ah não! — Minha amiga tentou puxar o homem para
dentro do quarto novamente. — Não vou deixar você ir embora sem
terminar o que começou, Kevin...
— Melhor deixarmos os dois a sós... — sugeri para Bruce,
que assentiu imediatamente.
— Concordo, docinho. Acho que eles precisam de uma casa
livre para ficarem sozinhos quando quiserem.
Brittany parou de puxar Kevin para prestar atenção na minha
conversa com Bruce.
— Você e a baixinha podiam vir morar comigo, deixe esse
apartamento com a Brittany — ele aproveitou a oportunidade para
me fazer o convite outra vez.
— Eu não sei, Bruce... — tentei enrolar na resposta. Eu não
queria dizer que estava com receio de ir morar com ele enquanto
éramos apenas namorado e namorada.
— Não sabe? — Bruce arqueou uma sobrancelha.
— Eu... não sei se conseguiria deixar a Brittany aqui sozinha.
— Embora eu estivesse tentando disfarçar, o que eu disse não
deixou de ser verdade. Eu sentirei falta da minha amiga caso me
mude daqui e sei que ela também sentirá falta de mim.
— Tem certeza? — Ele pegou algo no bolso frontal da calça e
me direcionou um sorriso torto. — Não se mudaria para a minha
cobertura nem se eu me ajoelhasse na sua frente — Bruce se
colocou de joelhos e estendeu uma caixa de veludo vermelha na
minha direção — e pedisse para você se casar comigo? — Ele abriu
a caixa vermelha, revelando um anel prateado com uma pedra
transparente que brilhava com o reflexo da luz acesa na sala.
Brittany e Kevin arquejaram atrás de mim e eu me dei conta
do que estava acontecendo. Não acredito!
— Estou carregando esse anel comigo há dias procurando a
oportunidade perfeita para fazer o pedido e acho que não existe
momento melhor do que esse... — Ele fez uma pausa, tomando
fôlego para prosseguir com o discurso. — Quero ter você e a
baixinha por perto o tempo inteiro. Prometo que serei o melhor pai
do mundo para a Lorie e o melhor marido do mundo para você.
Casa comigo, Jenny? — Bruce perguntou, com uma voz tão
apaixonante que fez as minhas pernas bambearem.
Oh, céus... isso realmente está acontecendo! Bruce
Lancasther quer que eu me case com ele!
— Aceita! — Brittany gritou, empolgada.
Olhei para a minha amiga e percebi que ela e Kevin nos
observavam com sorrisos animados no rosto. Acabei sorrindo
também e voltei minha atenção para Bruce, que aguardava
ansiosamente por uma resposta. Seus olhos azuis possuíam um
brilho esperançoso que afastou qualquer dúvida que pudesse surgir
em minha mente. Estamos namorando há dois meses, mas e daí?
Já temos uma filha! Até o dia do casamento, teremos ainda mais
tempo para nos conhecer.
— Sim! — exclamei, com a voz estridente.
Ao ouvir minha resposta, Bruce sorriu de um jeito radiante e
tirou o anel da caixa, o colocando em meu dedo anelar esquerdo. A
joia era pesada e eu não tive dúvidas que aquela pedra transparente
lapidada em formato de gota se tratava de um diamante.
Enquanto eu admirava o meu anel de noivado, Bruce beijou o
torso da minha mão e se colocou de pé. Em um movimento rápido,
ele me puxou pela cintura e me surpreendeu com um beijo
apaixonado. Uma das suas mãos se fixou no meu quadril e a outra
segurou a minha nuca, enquanto sua língua se entrelaçava à minha
de um jeito necessitado.
— Agora são vocês que precisam ficar sozinhos. — Brittany
deu uma pequena risada. — Boa noite...
Ouvi passos se afastando e, em seguida, veio o som de uma
porta sendo fechada. Não me dei ao trabalho de encerrar o beijo
para ver por onde os dois escapuliram — estava claro que
aproveitaram a oportunidade para seguir com as coisas que
estavam fazendo antes da nossa chegada.
Apesar da situação constrangedora em que encontrei Brittany
e Kevin, essa noite acabou se tornando especial por causa do meu
inesperado pedido de casamento. Com certeza, me lembrarei dessa
ocasião e desse beijo pelo resto da minha vida.

Quatro meses depois...


Meus olhos lacrimejavam enquanto eu encarava o meu
reflexo no espelho. Nunca pensei que me veria assim: usando um
lindo vestido de noiva com mangas longas de renda e uma saia
estilo princesa. Meu cabelo estava solto e enfeitado com uma tiara
prata que acompanhava o meu colar cravejado em diamantes. Não
vou chorar... não quero que meus olhos saiam vermelhos nas fotos.
Era 17 de abril e estávamos na primavera. A neve do inverno
já havia desaparecido e as árvores voltaram ao seu tom
esverdeado. Bruce alugou um lindo espaço aberto com grama
verde, próximo ao Central Park, para realizar a cerimônia.
Quando saí do trailer luxuoso que estava sendo usado como
camarim da noiva, fiquei encantada com a decoração do local.
Havia um caminho feito de pétalas vermelhas que levava até um
coreto na beira do lago onde Bruce me aguardava na companhia do
juiz de paz que realizaria o casamento.
Cadeiras brancas estavam organizadas em ambos os lados
do caminho de pétalas e cerca de cem convidados estavam
sentados ali. Confesso que eu não conhecia nem metade daquelas
pessoas, mas sei que a maioria eram investidores e amigos de
negócios de Bruce.
Enquanto eu observava toda aquela gente e reunia coragem
para caminhar até o altar, Brittany parou ao meu lado e me estendeu
o seu braço. Ela estava radiante com o seu vestido vinho de
madrinha e seu cabelo castanho que foi cacheado artificialmente
para a cerimônia.
— Não vou deixar que caminhe até o altar sozinha. — Ela
sorriu mais feliz do que nunca.
Presenteei Brittany com o meu apartamento no Bronx já que
Lorie e eu nos mudaríamos permanentemente para a cobertura de
Bruce depois do casamento. Eu sentiria saudade de morar com a
minha melhor amiga, mas sabia que ela não ficaria sozinha, pois no
mesmo dia em que fiquei noiva ela e Kevin assumiram um
relacionamento sério e agora estavam namorando.
— Eu te amo, Brittany. — Dei um longo abraço em minha
amiga. — Obrigada por estar sempre ao meu lado.
— Eu que agradeço por você estar sempre comigo, Jenny. —
Ela afagou as minhas costas e se afastou do abraço. — Passamos
por muita coisa juntas, mas conseguimos nos dar bem no final.
Sorri ao me lembrar da jornada que tivemos desde que
chegamos em Nova York. Enfrentamos dias difíceis,mas também
aconteceram muitas coisas boas.
— Pronta para caminhar até o seu bilionário gostoso? —
Brittany me estendeu seu braço tatuado e sorriu.
— Claro — respondi, um pouco apreensiva.
Ajeitei a saia do meu vestido e segurei o braço da minha
amiga.
Ao perceber que já estava na hora de entrar, Lorie se
posicionou na nossa frente. Ela estava com um lindo vestido de
babado branco e carregava uma almofada vermelha com as
alianças.
— Vá, Lorie — Brittany sussurrou, encorajando a menininha a
seguir em frente.
Como sempre, Lorie se mostrou mais corajosa que eu e não
hesitou em ir até o caminho de pétalas de rosas. Brittany e eu
seguimos a minha filha e no instante em que surgimos à vista dos
convidados, um casal de violinistas, que Bruce contratou como
músicos, começou a tocar uma linda versão de Perfect, do Ed
Sheeran.
À medida que eu me aproximava do altar, eu podia ouvir os
cliques da câmera do fotógrafo que estava registrando a cerimônia.
Fiquei aliviada por não ver nenhum repórter enxerido ali. Com
certeza, a mídia saberia do nosso casamento, mas quando isso
acontecesse, Bruce e eu já estaríamos bem longe aproveitando a
nossa lua de mel nas Maldivas. Lorie ficaria sob os cuidados de
Brittany e quando retornássemos da nossa viagem romântica,
levaríamos a nossa filhinha para uma viagem em família nos
parques em Orlando. Confesso que eu já estou me acostumando
com essa vida de luxo.
Meu coração ficava mais acelerado a cada passo que eu
dava em direção ao coreto em que Bruce estava. O meu futuro
marido vestia um smoking preto e carregava consigo um sorriso
orgulhoso no rosto. Ele está tão feliz quanto eu.
Quando o caminho de pétalas terminou, Lorie sorriu para o
pai e ele afagou a cabeça dela.
Brittany me deu um beijo na bochecha e entregou minha mão
para que Bruce pudesse segurar.
— Cuide bem das duas — ela exigiu, em um tom ameaçador.
Bruce concordou com um sorriso e depositou um beijo no
torso da minha mão.
Brittany se posicionou ao lado de Kevin, que estava de pé
atrás de Bruce, ocupando a sua posição de padrinho. Minha amiga
fez sinal para que Lorie se juntasse a eles e a garotinha obedeceu
sem questionar.
— Você está linda — Bruce sussurrou e beijou a minha testa.
Meu peito se aqueceu com aquele gesto de carinho.
Olhei brevemente para os convidados e avistei Valery
sentada na primeira fila com um leve sorriso no rosto. Depois do que
aconteceu, ela realmente estava se tornando uma pessoa melhor.
Quando se recuperou do ferimento por completo ela até me levou
para fazer compras como havia prometido e nós não discutimos
nenhuma vez durante o passeio. Não éramos melhores amigas,
mas agora nos respeitávamos e conseguíamos coexistir em
harmonia. Ela estava sendo uma boa tia para Lorie e eu não tinha
do que reclamar.
Quando o juiz de paz deu início à cerimônia, Bruce e eu
trocamos os nossos votos e colocamos as alianças de ouro. Os
convidados aplaudiram e o juiz anunciou que já podíamos nos
beijar. Meu marido sorriu e me presenteou com um beijo apaixonado
que fez o meu coração acelerar. Eu me sentia a mulher mais feliz e
realizada do mundo.
Bruce e eu nos casamos e eu sou oficialmente a Sra.
Lancasther. Juntos, temos uma filhinha adorável que nos traz
alegria e amor a cada dia que passa. Sei que seremos felizes daqui
para frente, até o último dia das nossas vidas.
EPÍLOGO

Dez anos se passaram desde que eu descobri que era pai.


Há dez anos eu estava mimando e cuidando impecavelmente da
minha garotinha ao lado de Jenny — minha esposa, mãe da minha
filha e amor da minha vida.
Todo esse tempo passou em um piscar de olhos e eu me
sentia desolado quando lembrava que Lorie sairia de casa no
próximo ano para estudar ballet na França. Às vezes eu queria
poder controlar o tempo e fazer com que minha filha fosse uma
criancinha para sempre, mas ela estava crescendo. Tinha acabado
de completar 16 anos e já estava me perguntando quando eu
poderia ensiná-la a dirigir, pois ela já estava na idade de tirar a
habilitação.
Eu não quero que Lorie cresça. Crescer significa que ela iria
se afastar e que começariam a aparecer garotos na minha casa —
como o fedelho que estava diante de mim na porta, usando um
terno largo e carregando um corsage em suas mãos trêmulas. Deus,
me dê paciência para isso!
— Ah... Eu vim buscar a Lorie para o baile de formatura — o
sujeitinho gaguejou.
O analisei de cima a baixo enquanto decidia se deixava ele
entrar ou não. O acompanhante da minha filha aparentava ser da
mesma idade que ela, possuía cabelos castanhos encaracolados e
seus olhos negros me encaravam como se eu fosse o homem mais
assustador que ele já viu na vida. Ótimo. É bom que tenha medo de
mim...
— Bruce? — Jenny me chamou da sala. — Quem está na
porta?
Passos se aproximaram de mim e antes que eu pudesse
expulsar o moleque, Jenny me empurrou para o lado.
— Olá. Você deve ser o Jason — Ela abriu um sorriso
radiante para o adolescente e tocou o ombro dele. — Por favor,
entre.
Jenny puxou o garoto para dentro e fechou a porta. Ainda
morávamos em minha cobertura na área nobre de Manhattan e
Lorie estudava em uma das melhores escolas da região. Mas só
porque o garoto morava por perto não queria dizer que ele era de
boa índole. Por experiência própria, eu sabia o que os moleques
dessa idade faziam nesses bailes e não estava nem um pouco feliz
por saber que um desses pervertidos sairia com a minha filha essa
noite.
— Sente-se, a Lorie já está vindo. — Jenny fez o garoto se
sentar no sofá e eu suspirei.
— É um prazer conhecê-los, Sr. e Sra. Lancasther. — O olhar
dele vagou entre Jenny e eu.
— Igualmente — minha amada esposa respondeu com um
sorriso.
Ela estava animada com o baile de formatura da Lorie e
passou a última semana tentando me convencer a ser menos duro
com o garoto que viesse para acompanhá-la. Disse que
precisávamos confiar na nossa filha e que por mais difícil que fosse
a ideia, não podíamos impedi-la de crescer. Eu confio na minha
garotinha, meu problema é com os outros que estão ao redor dela.
Fiquei contando até dez em pensamento repetidas vezes, até
que a porta do quarto de Lorie se abriu. Minha filha saiu de lá com
um vestido de baile rosa que ia até os joelhos e uma sandália de
salto prateada. Seu cabelo, da mesma cor que o da mãe, estava
escovado e solto sobre os ombros e ela havia feito uma maquiagem
para a noite com batom avermelhado. Minha baixinha — que já não
era mais tão baixinha assim — estava linda. Eu teria chorado se não
estivesse mantendo a pose de homem durão para assustar o
pervertido que estava na minha sala.
Quando olhei para Jason, percebi que ele encarava Lorie
boquiaberto e nem mesmo piscava. Revirei os olhos, tentando
conter o incômodo que senti em meu peito.
Jenny arquejou ao ver a filha e bateu palmas, empolgada. Ela
foi até Lorie e a abraçou.
— Você está linda, minha princesinha! — Jenny deu um beijo
no rosto dela.
Lorie pareceu um pouco envergonhada quando percebeu que
o seu acompanhante assistia à cena.
— Olá, Jason. — Minha filha acenou para o sujeito no sofá e
se aproximou dele.
Jason ficou de pé e estendeu o corsage na direção dela.
— Eu... eu trouxe isso para você — gaguejou.
— Obrigada. — Lorie sorriu e aceitou o presente.
— Posso colocar em você? — Jason se ofereceu.
Ela estendeu o braço na direção do garoto e ele encaixou a
pulseira de flor no pulso da minha filha.
— Ah, vocês são tão bonitinhos! — Jenny fez beicinho e
apontou o celular na direção dos dois. — Eu vou tirar uma foto para
guardar de lembrança.
Lorie e Jason se posicionaram lado a lado e eu cerrei os
punhos ao ver que o infeliz colocou o braço ao redor da cintura da
minha filha. Ele está brincando com o perigo.
Quando Jenny terminou de tirar a foto, cruzei os braços
diante do peito e adotei uma postura defensiva.
— Vou levar vocês até o baile e depois trarei de volta —
decidi.
Jenny franziu o cenho para mim, deixando claro que
reprovava a ideia.
— Não precisa, eu estou de carro — o acompanhante de
Lorie respondeu.
Porra, a situação só fica pior!
— Tenho certeza que o Jason vai cuidar bem da Lorie. —
Jenny lançou um sorriso para o garoto.
— Se tem amor à sua vida, Jason, você vai manter essas
mãos bem longe da minha filha — ameacei, enquanto os
acompanhava até a porta. — Voltem antes das 21h.
— Mas a coroação de rei e rainha será às 22h — Lorie
protestou, enquanto saía do apartamento.
— Então quero você aqui 22:15h — Cruzei os braços.
— Voltem na hora que o baile acabar — Jenny se opôs à
minha decisão, enquanto se colocava ao meu lado. Ela se inclinou e
aproximou a boca do meu ouvido para sussurrar algo que apenas
eu pudesse ouvir. — Bruce, quanto mais eles demorarem, mais
tempo teremos a sós.
Olhei de soslaio para a minha esposa. Ela me deu um tapa
discreto na bunda e então se afastou, caminhando em direção para
a sala de estar. Não importava o meu nível de preocupação, eu
nunca conseguia resistir às provocações de Jenny. Ela sempre me
faz ceder.
— Tudo bem — falei, com o maior esforço do mundo. —
Voltem quando o baile acabar. E você está linda, baixinha.
— Obrigada, pai. Te amo. — Lorie se despediu com um
aceno, enquanto caminhava ao lado de Jason para o elevador.
Porra, elevadores...
— Ei, vão pela escada! — gritei, para que pudessem me
ouvir.
— São 25 andares — Jason resmungou.
— O elevador está perigoso. Ainda não fizeram a
manutenção dos cabos esse mês — menti. — É mais seguro pela
escada.
Lorie e Jason reviraram os olhos, mas acabaram aceitando o
meu conselho. Fiquei aliviado quando os adolescentes deram meia
volta e caminharam até a porta que levava para a escada de
serviço.
Quando a minha filha e seu acompanhante desapareceram
do meu campo de visão, fechei a porta do apartamento e suspirei.
No fundo, eu sabia que esse era só o começo e que eu ainda teria
que aturar os pretendentes de Lorie por um longo tempo.
— Quando Lorie estiver na França você não vai poder
controlar os garotos que a levarão para sair — Jenny me lembrou,
enquanto se sentava no sofá de couro.
— Vou dar um jeito de trabalhar na empresa morando na
França — tentei contornar a situação. — Lorie não precisa ficar lá
sozinha.
— Bruce, precisamos deixar a nossa borboletinha voar. —
Ela suspirou. — E Lorie não vai estar sozinha, algumas amigas do
ballet estarão com ela também.
Meu coração ficou pesado e eu me sentei no sofá, ao lado da
minha linda esposa. Eu precisava aceitar que a nossa filha estava
crescendo, mas era difícil. Parte de mim ainda não conseguia
processar que os últimos anos passaram tão rápido.
O tempo foi gentil com Jenny e ela continuava do mesmo
jeito que a encontrei na empresa, mal haviam linhas de expressão
em seu rosto e eu desconfiava que isso era resultado dos cremes
caros que Valery aconselhava ela a comprar. Eu, por outro lado,
comecei a ganhar alguns fios grisalhos no último ano. Pensei em
pintá-los, mas Jenny disse que eles me deixaram ainda mais sexy,
então resolvi deixá-los ali.
— Está passando pela crise da meia-idade de novo, não
está? — Jenny questionou, ao perceber que eu estava calado.
Encolhi os ombros e assenti.
Passamos uma década juntos, minha esposa me conhecia
perfeitamente bem para saber tudo que se passava em minha
cabeça. Casar com ela foi a melhor decisão que eu já tomei.
Sempre nos entendíamose éramos compreensivos um com o outro.
Dificilmente entrávamos em uma discussão e quando isso
acontecia, eu era sempre o primeiro a pedir desculpas — não
aguentava passar muito tempo longe da mulher que eu amava.
— Quem vê você assim pensa que está no fim da sua vida —
ela brincou, roçando os seus dedos em meu maxilar. — São só 38
anos, homem.
Deixei um sorriso escapar e concordei silenciosamente. São
apenas 38 anos, ainda tenho muito para viver ao lado de Jenny e da
nossa filha.
— Vem cá. Vou fazer você se lembrar que ainda está tão
jovem quanto no dia em que nos conhecemos. — Jenny puxou o
meu rosto para perto e me beijou.
Nossas línguasse entrelaçaram e o meu coração se aqueceu
com a promessa de que ainda tínhamos muito o que viver. Não
importa quanto tempo passe, Jenny e eu ainda vamos nos amar
incondicionalmente e a chama do desejo que queima entre nós
jamais se apagará. Eu amo essa mulher com todo o meu coração.
Fim.
AVISO IMPORTANTE:

Quero anunciar aqui que em breve teremos a história da Brittany e


do Kevin! Então se você gostou dos personagens e tem interesse
para saber mais sobre esse casal fique de olho nas minhas redes
sociais para saber a data do lançamento. Já adianto que ele deve
chegar entre o final desse ano e começo de 2023. Por enquanto,
deixarei aqui a sinopse do livro para vocês terem um gostinho do
que está por vir:

“MEU QUERIDO PILOTO”


Sinopse:
A vida de Brittany não teve um começo fácil. Seu pai biológico
morreu quando ela tinha apenas dois anos de vida e não demorou
muito até a sua mãe arranjar um padrasto que era extremamente
autoritário e controlador. Aos dezesseis anos a menina fugiu de
casa com a intenção de começar uma vida nova em outro lugar e se
livrar do seu padrasto abusivo. Durante a sua nova jornada, ela
acaba encontrando Jenny, com quem constrói uma linda amizade e
passa a dividir um apartamento no Bronx. Brittany tinha aceitado
que a sua vida não seria das mais interessantes até que ela recebe
uma irrecusável proposta de emprego para trabalhar como
comissária de bordo no jato particular de um bilionário — que por
acaso era o pai da filha de Jenny. Em seu primeiro dia de trabalho,
Brittany conhece Kevin, o piloto da aeronave, que desde o primeiro
momento faz o seu coração bater de um jeito diferente. Com o
passar do tempo, os dois acabam se envolvendo romanticamente,
mas a vida que parecia boa começa a mudar quando o passado da
jovem volta para assombrá-la. Agora Brittany terá que ser forte para
lidar com os seus traumas enquanto tenta salvar a sua mãe de um
relacionamento abusivo e faz o possível para manter o seu
carismático namorado piloto por perto.

Será que depois de tanta luta, Brittany terá o seu tão sonhado
final feliz?
REDES SOCIAIS:

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ficar de olho nos próximos lançamentos:

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OUTROS LIVROS DA AUTORA:

Desejada por um CEO


Desire – A Ilha do Desejo (livro 1)
Desire – Um Selvagem na América (livro 2)
AGRADECIMENTOS:

Inicialmente, eu lancei A Filha Secreta do CEO lá no Wattpad, em


meados de setembro de 2021. O livro fez um baita sucesso na
plataforma desde os primeiros capítulos e eu preciso admitir que
não estava esperando por isso, fiquei muito orgulhosa. Foi minha
primeira história a alcançar um público grande e isso me deu a
motivação que eu precisava para acreditar no meu potencial e
seguir em frente com a escrita. Passei por vários perrengues
enquanto escrevia esse livro. Jenny, Bruce, Lorie, Brittany, Kevin e
até mesmo a Valery, serviram como válvula de escape enquanto eu
lidava com uma série de problemas pessoais. Houve momentos em
que eu pensei em desistir e largar tudo para o alto, mas lembrei do
público gigantesco que o livro conquistou e esses leitores
precisavam saber o final da história. Hoje eu me sinto muito grata
por ter seguido em frente, apesar dos problemas. Como eu já disse
algumas vezes por aí,escrever é uma terapia para mim, me ajuda a
organizar as ideias, a passar o tempo e me impede de surtar. A
Filha Secreta do CEO me ajudou a superar muita coisa difícil e,
principalmente, me mostrou que todas as fases ruins passam e que
sempre existe uma luz no fim do túnel. Nem sei de onde tirei força
para terminar essa história porque na época eu estava só o pó da
rabiola, mas hoje o meu sufoco passou e quase um ano depois eu
consegui lançar o livro na Amazon. Sei que tem muito mais sucesso
vindo pela frente!
Quero deixar um abraço para cada pessoa que leu esse livro, tanto
aqui na Amazon quanto lá no Wattpad. Vocês que leem e
acompanham os meus trabalhos são a minha força. E, mesmo que
eu não conheça todo mundo, saibam que vocês estarão sempre em
um cantinho do meu coração.
Muito obrigada por ter acompanhado a história da Jenny e do Bruce!
Espero de verdade que você tenha apreciado esse livro que eu
tanto amei escrever. Se esse for o primeiro livro meu que você está
lendo, eu te convido a conhecer os meus outros projetos que se
encontram aqui na Amazon. Tenho certeza que você vai gostar!
Um beijo e até a próxima história♥

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