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COPYRIGHT © 2022 DANIELLE VIEGAS MARTINS E ALBA
LUCCAS
 
 
Capa: Bernaliel
Revisão: Mariana Rocha
Diagramação: Imaginare Editorial – April Kroes
 
Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens, lugares e acontecimentos
descritos são produtos da imaginação da autora. Qualquer semelhança com
nomes, datas e acontecimentos reais é mera coincidência.
___________________________________
O CEO QUE NÃO PODIA SER PAI
1ª Edição - 2022
Brasil
___________________________________
Todos os direitos reservados.
 
São proibidos o armazenamento e / ou a reprodução de qualquer parte dessa
obra, através de quaisquer meios ─ tangível ou intangível ─ sem o
consentimento escrito da autora.
 
A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na lei nº. 9.610/98 e
punido pelo artigo 184 do Código Penal.
 
autoradaniviegastess91@gmail.com
 

autoraalbaluccas@gmail.com
 
 
 
Sumário
Playlist
Epígrafe
Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Bônus
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“Amar é ter um pássaro pousado no dedo. Quem tem um
pássaro pousado no dedo sabe que, a qualquer momento, ele pode voar.”

Rubem Alves.
 
 
 
 
 
 
 
 

SIGA A AUTORA DANIELLE VIEGAS

SIGA A AUTORA ALBA DE LUCCAS


 

 
CINCO ANOS ATRÁS.
 

Contos de fadas.

Toda menina que conheço na minha cidade deve acreditar neles. Vou

deixar uma margem de 1% nessa conta para não ser injusta com quem não
acredita e com as meninas que, assim como eu, não sabe o que achar deles.

Enquanto ouço Beyoncé cantar uma das músicas que mais amo, If I Were a

Boy, e concluo um dos meus desenhos, reflito sobre o amor.


Não estou dizendo que não acredito no amor, com certeza acredito

que ele existe, pois vi acontecer. Um amor unilateral ou recíproco até que a

morte os separe, mas vi acontecer.

Eu não acredito nessa magia e fantasia que dá um ar de esperança a

quem pensa que um príncipe encantado rico, do nada, aparecerá em uma


cidade do interior que foi esquecida pelo sol e se apaixonará à primeira

vista por uma menina pobre. Isso não existe, nem faz parte da essência

humana se apaixonar sem esperar nada em troca, apenas se doar.

Ouço a porta da frente abrir. Não confio em usar os dois fones no

ouvido e me desligar do mundo quando estou em terreno hostil. A porta


batendo e o som da chave na mesa de entrada são o meu sinal para pular

pela primeira saída de emergência. Tiro meu casaco, guardo meu caderno

de desenhos e pego minha bolsa, uma pequena para não me preocupar com

o celular. Silenciosamente, reviso meu look da noite: uma minissaia jeans

preta, uma regata vermelha com um decote bem-feito e uma bota de cano

médio marrom.

Sons de passos na escada, última chamada para uma noite em paz.


Saio pela janela do meu quarto e faço o caminho que já sei decorado. Se

estivesse no escuro total, faria o caminho sem errar uma única vez, isso

mostra que é mais comum eu sair de casa pela janela do que pela porta da

frente. Estranho, mas é a minha realidade.


Estou perto de completar 18 anos e o meu pesadelo vai acabar,

finalmente. Estereótipos são outra coisa que não sou fã. Tenho certa mania

de misturar um pouco os assuntos, raciocínio rápido demais, talvez seja por

isso que sou tão boa com números e tecnologia. Não gosto de estereótipos

porque sempre tentam me encaixar em um: alguns dizem que sou a gostosa

da escola que gosta de um drama, outros juram que sou apenas uma rebelde
que vai acabar em uma sarjeta da vida com drogas no braço e tem ainda

quem ache que sou uma nerd tentando ser descolada.

Eu não me limito, mas eu nunca seria uma princesa de conto de fadas,

disso tenho certeza e não é pessimismo, é apenas a realidade. O real é a

única coisa que tenho de concreto, tudo ao meu redor é apenas um mundo

de terror, onde eu sou a protagonista, aquela mais atormentada por todos e

que precisa sorrir para não parecer louca. Princesa, nunca serei, mas minha

história se encaixa perfeitamente na da gata borralheira, tirando os felizes

para sempre. Uma menina presa eternamente, com as asas cortadas para não

voar.
Por ser realista, só acredito naquilo que vejo acontecer e, graças ao

meu pai, posso acreditar que o amor existe e é possível que eu, um dia, me

apaixone por alguém. Se tinha alguém que nasceu para inspirar todos ao

redor, foi o Sr. Charlie Harrison, vulgo meu pai. Eu cresci com as histórias

de um tenente da Marinha que, quando estava em terra, fazia questão de


passar cada minuto com a família. O jeito que ele contava suas aventuras

me fazia desejar devorar o mundo. A forma com que ele demonstrava o

quanto me amava me fazia a pessoa mais sortuda do mundo. E,


principalmente, a forma como ele olhava a minha mãe, Florence Harrison,

me fazia sonhar em ter um olhar daqueles um dia para mim.

Mesmo que o sentimento e o olhar parecessem algo unilateral, minha

mãe ainda sorria na época. Dona Florence nunca foi uma mãe admirável e,

no fundo, ela me culpava por tê-la feito dona de casa, em vez de cantora,

carreira que abriu mão para cuidar de mim. Eu era muito nova para

entender os problemas da vida real, ainda.

Como toda gata borralheira, a Cinderela perde a sorte e sua vida

inteira desmorona aos seus pés. No meu aniversário de dez anos, meu pai

conseguiu uma folga para passar o dia comigo, trazia consigo um panda de

pelúcia que comprou na base da Marinha no Japão. Meu presente e eterna

lembrança. Se eu soubesse naquele dia o que sei hoje, preferia que ele

nunca tivesse voltado, mas isso que é engraçado na vida real, ela é uma

montanha-russa desgraçada. Um motorista bêbado passou direto em um

sinal vermelho e levou o meu pai, deixando o panda como meu único

companheiro de aventuras.

Acendi um cigarro no frio congelante de Minnesota, fazia 12 °C essa


noite. Assim que saí de casa, coloquei o meu casaco, mas estava
congelando mesmo assim, acho que a saia foi uma péssima ideia. A

nicotina costuma me acalmar, mas já fiz uma promessa para mim mesma

que vou encontrar algo que me faça parar. Não sei por que estou tão

emotiva essa noite, mas as lembranças aparecem sem permissão enquanto

caminho para a casa de Chloe, só ela para inventar uma festa em plena

quarta.

Depois que meu pai morreu e deixou uma gorda pensão para minha

mãe, ela me viu como um empecilho fácil de largar. Me deixava sempre na

casa de uma amiga e saía para fazer shows, jogar com as amigas e namorar

por aí. Depois de seis meses viúva, comecei a conhecer alguns dos seus
namorados, mas eram casos rápidos, até que um deles veio para ficar e, de

longe, foi a pior escolha que ela fez na vida. Para mim, não para ela.

Dona Florence me largou no mundo e sempre repetia:

“Eu te dou um teto e comida, garota. Isso já é mais que o suficiente, agora

sirva o Ares e suma da minha frente”.

Assim como Cinderela, trabalhei para os dois desde os meus 12 anos

e percebi que apenas eu poderia fazer algo melhor na minha vida e eu seria

a responsável pelo meu presente e futuro. Usei as aventuras do meu pai

como combustível e enfiei a cara nos estudos, tirei as melhores notas todos

os anos e fiz o meu máximo para evitar problemas, até conversava com o

Char, nome do meu panda, toda noite. E, novamente como a personagem


que divide a história comigo, nem sempre é possível ficar fora do radar.

Existiam dias em que minha mãe saía sem avisar, e eu ficava com o Ares.

Assim como o Deus da Guerra, ele era explosivo e agressivo, e só esperava

um motivo para me bater até deixar a marca. Ainda bem que vivo em um

lugar frio para usar mangas compridas sempre, sorte a minha.

Outra coisa que aprendi com a vida real, usar o sarcasmo ajudava um

pouco a aliviar as dores do coração. Havia me inscrito em três

universidades, mas a que eu queria era a Florida Tech (Instituto de

Tecnologia da Flórida). Eles tinham a melhor grade curricular de todas no

curso de Engenharia de Software e era bastante concorrida, eu precisava de

uma bolsa de estudos para conseguir estudar lá, já que a minha querida mãe

me alimentava a contragosto. As respostas viriam para o meu e-mail,

mesmo buscando uma bolsa de estudos, eu precisava de um pouco de grana

para me sustentar, e fazia isso escondido, Deus me livre se eles descobrem

que ganho dinheiro.

Apaguei o cigarro na calçada da Chloe e entrei. Todos estavam

escondidos do frio, mas o som estava nas alturas e não tinha uma pessoa

sem um copo na mão. Entrei, procurando a dona da casa sumida e a


encontrei jogando com alguns amigos, seu namorado estava por perto

também. Eu sentiria saudades desse clima e deles, foram minha alegria e

salvação em tempos complicados e nem sabiam disso. Uma pena que eu


seguiria sem ninguém daqui. Eles foram feitos para morar no interior,

conhecer um cara ou uma menina daqui e se casarem até os 20 anos,

formarem uma família e nunca mais sair da bolha, eu gritava por dentro

para estourar qualquer coisa que me impedisse de voar.

— Lila! Você chegou! Pensei que não vinha mais. — Meu apelido

desde pequena. Chloe veio correndo e pulou nos meus braços, já estava um

pouco alta.

— Ei, mulher! Vamos soltar um pouquinho esse copo e tomar um


gole de água?

— Nada disso, hoje estou comemorando. Recebi minha carta da


Universidade de Minnesota e vou estudar com o Callister lá. Tem coisa

mais romântica que isso? — Eu conseguia pensar em milhares de outras


coisas, mas cada um escolhe sua vida. — E não é porque você não bebe que

vai cortar minha vibe. — Sim, eu detesto bebida e tenho um motivo para
isso. Meu amado padrasto, de forma irônica, lógico.

— Não acredito! Parabéns, Chloe. Muito feliz pelos dois! — Acenei


para o Callister, e ele agradeceu com um aceno. Se a carta dela chegou, é

provável que a minha tenha chegado também. Amanhã, preciso olhar


minhas correspondências.
— Obrigada, amiga. E você? Recebeu a sua?
— Olho amanhã, saí rápido de casa para não me atrasar mais. Vou lá
fora olhar quem mais está aqui e depois volto.

— Certo, mas não some, hein! Precisamos tirar uma foto juntas para
guardar de lembrança. — Sorri com a Chloe, uma das primeiras pessoas em

anos a se importar realmente comigo. Concordei com o seu pedido e fui


olhar o jardim, me escondi por lá por um bom tempo e fumei mais um

cigarro, eu preciso parar urgentemente com esse vício. Olhei a hora e já


estava perto da minha mãe voltar, ela sempre conferia meu quarto quando
chegava. Procurei a Chloe, mas já estava apagada no sofá depois de tanta

bebida. A câmera polaroid estava na sua mão, peguei a câmera e tirei uma
foto de nós duas; atrás, coloquei nosso nome, a data e deixei um recado:

“Para depois não falar que não tem nada para lembrar de mim. Te amo.”
Me despedi de algumas pessoas, era provável que seria uma das

nossas últimas despedidas, e voltei para casa. Sempre fui pobre, e isso
nunca me incomodou, mas, olhando a casa da Chloe, que tinha a família

com o melhor poder aquisitivo da cidade, me perguntava se os ricos não


eram mais felizes, se conto de fadas não era feito para pessoas ricas serem

felizes. Chloe tinha uma família incrível e era feliz, ia se casar com um bom
rapaz e viver feliz para sempre. Se um dia isso acontecer comigo, eu não

serei a mulher que depende, meu conto de fadas será bem diferente.
Entrei em casa pelo mesmo lugar que saí, a minha janela. Troquei de
roupa e coloquei meu pijama, conversei um pouco com Char e fui dormir;

amanhã, algo bom me esperava.


Hoje, algo ruim aconteceria.

Nunca pensei que acordaria com o gosto do meu sangue na boca, nem
tive tempo de raciocinar direito. Quando minha visão finalmente se

encontrou, olhei à minha volta e vi o meu quarto, ao lado da minha cama,


tinha uma pessoa que cambaleava e berrava algo que entendi depois de

muito grito e sacudidas. Meu padrasto, bêbado, gritava, falando que me


chamou várias vezes para servir uma cerveja para ele, e eu, a empregada

burra, não fiz o que devia, por isso fui acertada com uma garrafa na minha
testa, cortando meu supercílio.

Ele já tinha me batido várias vezes, mas essa foi a primeira vez que eu
senti medo de morrer de verdade. A garrafa que ele jogou, depois de bater

em mim, tinha se quebrado e eu só pensava que o próximo passo dele era


pegar o caco de vidro e me cortar.
— Vai limpar a bagunça da sala, sua vagabunda. Só quer viver uma

vida boa e fazer nada? Vai logo, antes que eu te bata. — Você já me bateu,
seu idiota!

— Sai do meu quarto, já falei que aqui é zona proibida. Eu estava


dormindo, idiota, por isso não te ouvi.
— E a puta ainda me responde. Eu só não te mato por causa da tua

mãe, mas eu posso fazer certo estrago que te faça se lembrar disso para
nunca mais me responder. — O medo te faz reagir e fazer coisas que,

normalmente, não faria. Antes que a mão dele descesse em mim, peguei um
caco de vidro e usei para me defender. Ele desceu a mão direto no vidro e

começou a gritar de dor, foi andando para trás, até chocar com o meu
espelho e desmaiar. Eu achei que aquele seria o meu fim, quando ele
acordasse, iria me matar de tanto me bater.

Desesperada, coloquei algumas roupas na bolsa, peguei alguns


casacos, meus documentos e saí pela janela. Corri como se um assassino

estivesse atrás de mim, nunca olhei para trás. Fui direto para o meu
trabalho, tinha uma sala que eu tinha a chave e podia dormir lá até

completar meus 18 anos, faltavam apenas três dias, tão pouco. Não dormi,
imaginando que ele me encontraria aqui, ouvia a voz dele ou sentia o fedor

do seu perfume, tudo por causa da minha imaginação amedrontada. Tirei


Char da bolsa e o abracei como a manta da invisibilidade de Harry Potter,

como uma proteção contra todos os perigos e contra toda a maldade. E


chorei.

No outro dia, atualizei meu e-mail a cada dez minutos. As respostas


foram chegando ao longo do dia e, ao final dele, eu tinha três e-mails de

universidades. Uma delas me rejeitou e duas me aceitaram, mas só uma me


importava, e eu passei nela, minha coragem voltou. Dormi no trabalho

durante a semana e dei a desculpa de que minha casa estava em reforma por
conta de um vazamento. Meu chefe não fazia muitas perguntas, tanto que

viu meu olho roxo e nada comentou, apenas concordou.


Fui ao caixa eletrônico e saquei todo o dinheiro da conta de Dona

Florence. Ela não sabia que eu tinha o cartão do papai, esse seria meu
presente de despedida para ela. Não pude falar com mais ninguém, tinha

que aproveitar o possível medo dela que, provavelmente, viu todo o sangue
na minha cama, e fugir para bem longe.

Nesse conto de fadas, a Cinderela não depende de um príncipe para


salvá-la. A protagonista se salva sozinha e, caso a vida coloque um príncipe

na sua vida, ela vai se apaixonar se ele for tão real quanto ela.
Sem magia, sem fantasias. Apenas a realidade, nua e crua...

5 ANOS ATRÁS
 

Contos de fadas.
— Joey, me ajuda a colocar o Alec naquela maca. — Me senti sendo
carregado, mas a dor era tanta que eu não tinha noção do que acontecia.

— Traz o soro, preparem a sala de cirurgia 04. — Ouvi uma voz


estranha ao longe. — Sr. Donovan, está me ouvindo? Não durma, aguente
firme que vamos te ajudar. — Uma luz forte atingiu meus olhos e um

homem falava comigo.


Se minha vida fosse uma história de fantasia, eu começaria no cargo

de príncipe encantado, mas não teria papel nenhum no final da história.


Afinal, nenhum felizes para sempre conta com um príncipe como eu. Bem,

apesar de tudo, não posso culpar a Abigail, o nosso até que a morte nos
separe foi interrompido pelo destino, que tinha outros planos.

— Alec, por favor, meu amor, aguenta. Eu te amo, não desiste, estou
aqui com você. — A voz da Abigail estava diferente, parecia que ela estava

chorando. Tentei levantar a mão, mas tudo parecia tão pesado e eu só tinha
vontade de dormir.

— Alec, não se preocupe, vamos tentar ao máximo te ajudar. — Uma


máscara foi colocada no meu rosto e apaguei completamente. Algo terrível

tinha acontecido, eu só não imaginava que seria ainda pior.


Minha vida pode ser chamada de fácil pela maioria das pessoas. Meus

pais, William e Stacey Donovan, criaram três filhos com tudo que poderiam
dar: dinheiro, brinquedos, melhores escolas, grandes festas e tudo o que se
pode imaginar da vida de pessoas ricas. Sempre fui bem ciente que tudo ao
meu redor é por causa do dinheiro, mas que os verdadeiros laços de

confiança estão na amizade e apenas o amor que temos um pelo outro é o


mais puro e verdadeiro.

Meus pais nos deram tudo, mas nos criaram com os pés no chão e nos
mostraram que nosso futuro poderia ser incrível ou não, só dependeria de

nós. Além da lição, nos deram o maior exemplo: como um casamento deve
ser. Eles nos mostram todos os dias o quanto se amam e foi esse exemplo

que elevou a nossa expectativa da pessoa que ocuparia os nossos corações.


Meu irmão mais velho, e melhor amigo, Carson Donovan, foi o

primeiro a conhecer esse tipo de sentimento. Uma história comum de


paixão de colégio; Phoebe, com 16 anos, e Carson, com 17 anos, que teve

uma guinada quando Phoebe descobriu estar grávida e ainda de trigêmeos,


para deixar tudo ainda melhor, mas o amor falou mais alto e tiveram uma
linda história de amor com a adição de um quarto filho, uma menina dessa
vez. Foram felizes até a história ser injustamente interrompida.

Meu segundo irmão, o caçula da família, Michael Donovan, tem sua


própria maneira de ver a vida, uma maneira que nem sempre transita pelas
vias legais, o que irritou bastante os meus pais a ponto de o deserdarem.
Tentei ajudá-lo, mas é uma situação que ele mesmo precisa se ajudar

primeiro.
— Ei, Alec. Está aí? Pode me ouvir? Desculpa demorar para vir aqui,
mas foi o único momento que todos saíram de perto. Volta para cá, mano.

Você nunca desiste de nada, não vai ser agora que vai começar né? — Abrir
os olhos exigia muito mais do que eu podia fazer, mas a voz parecia do
Michael. Fazia tempo que ele não aparecia, será que estou sonhando?
— Só assim para você aparecer, Michael. Faz tempo que não
responde às minhas mensagens.

— Carson, vim ver o Alec, mas já vou embora.


— Você podia pelo menos dizer um oi para o papai e a mamãe.
— Só se o inferno congelasse. Cuida dele, Carson, vai precisar de
todo o apoio que puder quando acordar. — Caí novamente no sono.

Minha mente foi direto ao momento em que começou minha história


de amor. Sempre tive uma veia para os negócios e, quando terminei a
faculdade de Economia, fiz uma pós em Administração de Empresas, o que
me ajudou a decolar na minha carreira. Aos 22 anos, após a minha

formatura, meus pais me deram minha herança e falaram que agora eu


caminharia com os meus próprios pés. Eu sei que, se pedisse ajuda, eles não
negariam, mas isso era mais um aviso que a partir de agora eu sou
realmente um adulto, um menino que cresceu e vai em busca do seu próprio

império, e foi o que eu fiz.


Como empresário, acredito que se deve investir em várias áreas; se
uma está em queda, a outra área compensa. Por isso, investi minha herança

em um conglomerado de negócios: shopping, casas de espetáculos e


entretenimentos no geral (boates, pubs, shows, ...). Minha personalidade
fechada e implacável me fez investir fundo e conseguir o que eu desejasse.
No mundo dos negócios, me consideram um CEO implacável. Entre os

meus funcionários, sou conhecido por premiar e reconhecer o esforço e a


dedicação que fazem, todos os dias, mas também sabem que sou justo e
punitivo com aqueles que não trabalham como deveriam. Os ensinamentos
dos meus pais me fizeram transmitir confiança com responsabilidade.

Esse caminho me levou a ter sorte no jogo e no amor. Aos 27 anos,


fui uma noite em uma das minhas boates e vi a mulher mais linda do
mundo. Ela estava em pé, conversando com amigos, usando um vestido
tubete que não deixava muito espaço para imaginação. Corpo fenomenal e
todo trabalhado nas curvas, uma pele branca que parecia uma pétala de

rosa, cabelo loiro que batia nos ombros e um sorriso de encantar qualquer
pessoa.
Lembro que, no momento em que a vi, meu coração acelerou e só
sentia que eu precisava conhecer aquela mulher de qualquer jeito, esta foi a

primeira vez em muito tempo que me senti vulnerável e com medo de não
conseguir o que desejo. Me aproximei dela e a chamei para dançar, ela
rejeitou umas três vezes, mas não desisti e, graças a Deus, que não desisti.

Uma linda história de amor teve início e fomos felizes por cinco anos.
Abigail, com uma personalidade carismática e alegre, era uma atriz em
ascensão de 23 anos, que me fazia ser um homem sorridente e mais
relaxado. É difícil descrever como a nossa felicidade se parecia.
Nunca imaginei que desfilaria em tapetes vermelhos de Hollywood,

que teria minha vida em tabloides e seríamos os queridinhos do momento.


Tudo era perfeito, minha empresa só melhorava e eu já buscava outro ramo
para investir. A carreira da Abbie decolou ainda mais e não se tinha espaço
para tristeza entre nós, raramente brigávamos, tínhamos uma vida corrida

demais. Pensando agora em nós, acho que fomos negligentes com nossa
vida a dois, algo que meus pais sempre alertaram: o “nós” deve vir antes do
“eu”.
Eu amava a nossa sintonia e mostrava de todas as formas que podia o

quanto eu a amava. Acordar ao seu lado era um presente para mim, ela era o
meu ponto fraco e minha armadura. Ela conhecia quem era Alec Donovan
fora da posição de CEO, e eu conhecia a delicada Abbie por trás da atriz
forte e sorridente que era. Eu queria protegê-la a de todo o mal que existe

no mundo, mesmo sabendo que era impossível, mas, pelo menos, faria de
tudo para que eu nunca a magoasse. Eu preservaria o seu sorriso e sua
felicidade. Assim pensei que faria.
— Nosso primeiro aniversário de casados, a festa foi incrível e você

estava belíssima. — Ela encheu duas taças de vinho e se juntou a mim,


sentando-se em frente à lareira.
— Você também estava muito sexy, imponente e orgulhoso. Eu me
senti uma rainha, como você sempre me faz sentir. — Brindamos o

momento.
— O que será que a vida nos reserva daqui a cinco anos?
— Eu me imagino grávida do nosso primeiro filho, dando uma pausa
na carreira para focar em nós. Você, exatamente como está agora, a

proteção vai ser maior, com certeza. Será um ótimo pai, Alec.
— E você, a mãe mais linda e amorosa de todas. Te amo demais,
Abbie. Meu mundo ganhou um nome no momento em que aceitou dançar
comigo naquela noite. Meu raio de sol.
— Esse raio de sol aqui ama tentar fazer filhos, que tal agora? O que

me diz de fecharmos a noite com muito prazer a dois? — perguntou, tirando


o vestido e ficando totalmente pelada na minha frente. Sempre perdia o
fôlego com aquela visão.
— Nem precisa pedir duas vezes, ma belle.

Um simples dia, um simples momento, algo que levou minutos para


acontecer e destruiu toda uma vida. Como em todo aniversário de
casamento, fomos comemorar com estilo, dessa vez em nosso novo iate.
Chamei toda a família para se divertir um pouco, meus pais foram e meus

sobrinhos também. Lembro de cada momento daquele dia como se estivesse


em câmera lenta. Estávamos passando próximo de uma ilha deserta, o iate
em uma velocidade lenta e a música no ar. Pedi para a Abbie ter cuidado
com a bebida, ela estava muito animada nesse dia e, no outro, teria um

ensaio fotográfico.
— Relaxa, Alec. Estou cuidando da quantidade de álcool aqui, temos
que nos divertir e aproveitar muito que hoje é o nosso dia. Cinco anos,
baby, meia década juntos e felizes, difícil de imaginar isso, mas somos

felizes, sim.
Ela saiu sorrindo e esvoaçando o vestido no ar. Sorri e virei as costas
para conversar um pouco com o Carson. Foi preciso só esse momento de
descuido e a próxima coisa que ouvi foi o grito da Abbie e um barulho de

algo caindo no mar. O ar sumiu do meu peito e corri para ver o que
aconteceu, ela caiu e estava sendo puxada pela hélice, pois seu vestido ficou
preso. Carson correu para mandar parar o iate, e eu corri para salvá-la. Não
pensei duas vezes e me joguei no mar.

— Alec, me ajuda, por favor. Estou presa e não consigo me afastar da


hélice. — Ela estava assustada e chorando de desespero.
— Calma, meu amor. Carson foi pedir para desligarem, não solta o
apoio do barco, vou ver se consigo te soltar. — Desesperado, mergulhei e
encontrei o vestido, mas ela já estava no limite e algo poderia acontecer.
Enfrentei meu pior medo naquele dia, minha vida estava prestes a ter uma
mudança dolorosa e eu tentei impedir de qualquer forma, tolamente.
Comecei a puxar o tecido com toda a força que tinha, meu sobrinho

Chandler pulou na água para ajudar, então, pedi uma faca ou algo cortante
para soltar o tecido. Ele subiu para buscar, e eu mergulhei novamente, tudo
aconteceu em segundos. Preocupado com a Abbie, não percebi o quão perto
eu estava da hélice, que já mostrava sinais de redução de velocidade

lentamente. Soltei a Abbie e a hélice passou na minha coxa, perto da minha


virilha, causando um corte profundo na perna e quase levando o meu pênis
junto. Não o perdi, mas faltou um bem pouco para isso.
Assim que a hélice me cortou, comecei a sangrar bastante. Abbie se
desesperou e começou a tentar me levar para cima, mas eu era pesado para

ela. Comecei a perder os sentidos e só me lembro de ver meus sobrinhos e


meu irmão me puxando para cima.
— Abbie..., está bem? — tentei saber se aquele sangue era dela. Acho
que algo aconteceu comigo também, algo sério.

— Estou aqui, Alec. Fica comigo, meu amor, a ajuda está chegando.
— Coloquei a mão em seu rosto e sujei aquela pétala branca de vermelho-
sangue. Minha visão escureceu. Eu apaguei.
Abri os olhos e vi a Abbie ao meu lado. Desorientado, tentei chamá-
la, mas não encontrei minha voz. Balancei um pouco a mão e consegui a
atenção dela.
— Alec, meu amor, bem-vindo de volta. Estava preocupada, você não

acordava, achei que algo pior tinha acontecido — falou em um tom de


choramingo.
— Abbie..., o que aconteceu? — Eu tinha uma vaga lembrança das
coisas e das pessoas.

— É melhor esperar o médico aparecer, ele explica tudo. O


importante é que você está bem e vamos passar por isso. — Não entendi o
que ela estava insinuando. Eu sentia minhas pernas, a coxa doía, mas não
tive nenhum outro problema.

O médico apareceu e fez um check-up normal.


— Você me deu um baita susto, Alec. — Dr. Richard sempre cuidou
da nossa família. — Perdeu muito sangue, por isso demorou a acordar.
Apesar de ter algumas sequelas futuras, você vai ficar bem.

— Sequela... de quê? — Ele olhou para Abbie, que fez um sinal de


que não falou nada.
— Certo, preciso que mantenha a calma. O acidente com a hélice
cortou a sua coxa muito perto da virilha, atingindo o seu pênis e parte dos
seus testículos. Não o decepou, mas um nervo importante foi danificado no
processo, fizemos de tudo, mas agora só o tempo pode restaurar o nervo. —
Respirei fundo e tentei mexer meu corpo, que logo reclamou por completo.
Não queria parecer desesperado, mas era algo que eu não poderia imaginar.

Ser impotente nunca deveria acontecer comigo.


— Quer dizer que... eu não posso... não consigo...? — tentei falar,
mas cansava demais. Dr. Richard fez uma cara de pena que foi a pior que eu
recebi, mas não foi a última.
— Meu querido, sinto muito em dizer, mas provavelmente você está

impotente. Alec, o nervo danificado era muito importante para o


funcionamento do seu órgão genital, por isso não sabemos se ele voltará a
funcionar normalmente. Apenas o tempo dirá.
— Me diga... que essa era a má notícia. — Ele não olhou com uma

cara de quem diria algo animador.


— Tenho mais uma notícia ruim, Alec. Além da provável impotência,
você ficou estéril durante o acidente. Quando os testículos foram atingidos,
você perdeu um deles e o outro foi comprometido. — Do meu lado, a Abbie

prendeu o choro, como quem já tivesse chorado tudo o que podia por causa
disso. Eu estava vivendo um verdadeiro inferno. — Vou deixá-los a sós.
Percebi, pela primeira vez, que quebraria uma promessa que fiz a ela.
Abbie sonhava em engravidar e ser mãe, mas agora eu não poderia realizar

o seu sonho. A minha promessa de nunca a machucar perdeu totalmente o


efeito, foi quebrada. Não tive coragem de olhar para ela. Olhei para o teto
do hospital, frustrado era pouco para o que eu sentia, uma lágrima escorreu
dos meus olhos.

— Não, Alec, nada disso. Vamos dar um jeito, o médico disse que o
tempo pode melhorar tudo, então vamos esperar. Nós vamos passar por isso
juntos. — Ela sorriu para mim e foi verdadeiro, ela reavivou minha chama
para tentar algo, correr atrás por nós. Essa força de vontade não duraria

muito, somos humanos, afinal.


Tentamos de tudo: médicos, terapias, xamãs, fui em tudo o que era
preciso para tentar um jeito e, a cada vez que entrava em nossa casa,
percebia que esta deixava de ser nossa. Abbie me acompanhou nos dois

primeiros anos, mas cansou de tentar, começou a aceitar a derrota e esse


problema nos afastou cada vez mais. Eu não desisti, nossos aniversários de
casamento continuaram, só não tinham a mesma alegria de antes.
— Obrigado a todos por comparecerem a nossa festa. Estamos muito

felizes, Abbie precisou se recolher mais cedo, mas agradeço por nós dois.
Aproveitem a festa. — Mais um discurso nosso que faço sozinho. Esses
anos foram pesados para o nosso casamento e Abbie estava tentando, eu sei
que estava, e meu amor por ela só cresceu. Fui ao nosso quarto e a encontrei
dançando, sozinha, com uma taça de champanhe na mão. Love in the Dark
de Adele tocava ao fundo e aquela música parecia uma confissão, algo que
Abbie gostaria de me dizer, e não podia.
 
 
This is never ending, we have been here before

But I can't stay this time 'cause I don't love you anymore
Please, stay where you are
Don't come any closer
Don't try to change my mind

I'm being cruel to be kind


 

Isso nunca tem fim, nós já passamos por isso antes


Mas eu não posso ficar dessa vez, porque eu não te amo mais
Por favor, fique onde você está
Não chegue mais perto

Não tente me fazer mudar de ideia


Eu estou sendo insensível para ser boa
 
 
— Abbie, meu amor, você está bem? Que tal dormir um pouco? —
Tentei tirar a taça da sua mão, e ela não deixou.
— Alec, não te ouvi entrar. Dança aqui comigo, aproveita a música.

— Ela já tinha passado dos limites com o álcool, algo que se tornou
comum. Acho que o abuso da substância a confortou durante todo esse
tempo, e isso me doía a cada dia que a olhava e não encontrava mais aquele

sorriso espontâneo. Eu sentia a nossa felicidade escapar pelos meus dedos, e


eu era o culpado. — Alec, que tal beber um pouco comigo e esquentarmos
um pouco as coisas?
— Eu acho que não vou conseguir o que você quer, mas posso te

ajudar. Garanto que consigo proeza com os meus dedos. — Comecei a subir
o seu vestido, mas parei no momento em que senti que ela chorava. —
Abbie, o que está sentindo? Seja sincera comigo, você sabe que eu só quero
te ver feliz e nada mais. — A levei até a cama para se sentar e conversar.
 
I can't love you in the dark

It feels like we're oceans apart


There is so much space between us
Maybe we're already defeated
Yeah, yeah, yeah, yeah, yeah, yeah

Everything changed me
Não posso te amar no escuro
Parece que estamos tão distantes
Há tanto espaço entre nós

Talvez já tenhamos sido vencidos


Sim, sim, sim, sim, sim, sim
 
 
 

— Alec, eu te amo tanto e queria ser forte para renunciar ao que fosse

necessário para continuarmos juntos. Juro que pensei que seríamos felizes
para sempre, mas eu não consigo. — Ela chorava, e eu sentia a dor de cada
lágrima daquelas caindo, sabia que algo ali era definitivo. — Tudo o que
podia fazer eu fiz foi querendo apagar aquele dia da minha mente, voltar no

tempo e te ouvir sobre a bebida. Se eu não tivesse caído, não chegaríamos a


esse ponto. É tudo minha culpa, e não sei como consertar isso.
— Não diga isso, meu amor. — A abracei. — Sabe que não te culpo
por nada. Você é a melhor coisa que aconteceu na minha vida e estamos
buscando melhorar, já tivemos um pequeno avanço no que nada existia.

Não deixarei que isso fique entre nós, vamos arrumar um jeito. — Ela olhou
no fundo dos meus olhos.
 
You have given me something that I can't live without
You mustn't underestimate that when you are in doubt

But I don't want to carry on like everything is fine


The longer we ignore it all, the more that we will fight
Please, don't fall apart
I can't face your breaking heart
I'm trying to be brave

Stop asking me to stay


Você me deu algo sem o que eu não consigo viver
Você não deve subestimar quando estiver em dúvida
Mas não quero continuar como se estivesse tudo bem

Quanto mais ignorarmos isso, mais brigaremos


Por favor, não fique triste

Não sei lidar com o seu sofrimento

Eu estou tentando ser corajosa


Pare de me pedir para ficar

 
 
— Não consigo mais, Alec. Para mim, chega. Você estará em meu

coração, mas eu não posso renunciar aos meus sonhos, preciso deles. Me
desculpa, por favor. — Eu precisava ser forte por nós dois e a abracei

novamente, dessa vez me despedindo do grande amor da minha vida. Eu a


prendi em um relacionamento sem perceber, achei que seria possível

vivermos e fingirmos que isso não existia. Quão tolo eu fui, acabei a

magoando muito mais e, por isso, eu merecia esse castigo.


— Abbie, meu amor, sua felicidade sempre esteve acima da minha.

Você é o meu raio de sol, e preciso que esse raio brilhe todos os dias para

que eu seja feliz. Sou muito agradecido por ter passado por tanta coisa ao
meu lado, por estar firme e ser minha fortaleza nos momentos mais escuros,

mas chegou a hora desse raio de sol voar e brilhar em outros lugares. Não

se preocupe, cuidarei de tudo o que for necessário. Por hoje, vamos apenas
nos deitar um pouco e descansar aqui mesmo.

Ela adormeceu enquanto chorava, a bebida ajudou um pouco. Quanto


a mim, deixei as lágrimas rolarem silenciosamente enquanto percebi que

perdi a única coisa que coloria o meu mundo. Essa foi a última vez em que

chorei, a última vez que me permiti ser frágil e vulnerável. Meu mundo se
tornou preto e branco, e os negócios, minha única fortaleza.

Nosso divórcio correu em sigilo total. A mídia nunca soube o motivo


da separação e terminamos de forma amigável, com uma pensão generosa

que fiz questão de dar a ela. Abbie foi meu amor de verdade e tenho certeza

de que eu fui o dela. Às vezes, aprendemos que, por mais amor que exista,
renunciar a pessoa que ama também é uma prova de amor e foi isso que eu

fiz, sem fazer grandes alvoroços. A dei a liberdade para ser feliz com quem

pudesse realizar seu sonho.


Abbie voltou a usar seu nome de solteira, Abigail Donovan voltou a

ser Abigail Davis, e seguiu sua vida longe de mim. Me joguei no trabalho e
entendi quando dizem “sorte no jogo, azar no amor”. Imerso na única coisa

que era minha constante e nunca me abandonou, cresci meus investimentos


e entrei no ramo de sistemas de segurança patrimonial. A área da tecnologia
me tornou bilionário e, aos 33 anos, entrei na lista da FORBES.

No início, minha família tentou me fazer casar novamente, mas não

queria mais nada de romance na minha vida. Não tinha motivo, ninguém
iria querer um homem impotente e estéril, melhor deixar meu segredo

comigo e seguir fazendo o que faço de melhor: dinheiro.

Não existe papel para mim em um conto de fadas.


Há quem acredite que pessoas muito ricas são plenamente felizes, e

que não há problema que o dinheiro delas não resolva. Eu sou a prova que
isso não é verdade.
 

 
DIAS ATUAIS...
 

Acordei às 5h30 para minha corrida matinal e, meia hora depois, já

estava em casa. Não poderia demorar muito, o trabalho me aguardava.

Tomei uma ducha e me arrumei rapidamente para ter tempo de tomar um


café relaxadamente.

Final de semestre chegando e meus alunos do 2° ano do ensino médio

estavam ansiosos pelo baile que antecede à festa de formatura do último

ano, afinal, eles seriam os próximos a encerrar o ciclo do ensino médio e


ganhar as asas para o mundo que os espera. Depois que me formei, não

consegui trabalho na minha área. Tentei enviar o meu currículo para várias

empresas, mas, por ser inexperiente no mercado, fui rejeitada. Mesmo

assim, nunca desisti, apenas coloquei em prática o plano B enquanto o

principal não acontece.


Ensinar era algo que nunca cogitei até que a oportunidade apareceu e

me vi apaixonada pela profissão de professora, ainda mais quando pude

colocar um pouco da minha carreira em prática com eles. Meus alunos

trabalharam arduamente e amararam cada processo do nosso projeto anual.

Apresentaram, recentemente, um jogo que desenvolveram sozinhos, e isso


me encheu de orgulho. Estou muito feliz pelos meus alunos aprenderem

bastante e com muita dedicação. Uma das pequenas coisas que fazem o meu

dia valer a pena.

Sentei-me na varanda e saboreei meu café quentinho com duas

colheres de creme e um cubo de açúcar, sempre gostei de bebidas doces.

Toda essa atmosfera de formatura me fez voltar alguns anos atrás,

mergulhei fundo na memória e fui atraída pelo último ano da universidade,


meu e da Piper, minha melhor amiga. Acho até interessante nos chamarmos

de melhores amigas, pois somos como a água e o vinho e, na universidade,

essa diferença era ainda maior. O típico caso da nerd e da garota popular,

mas essas não eram inimigas, eram como unha e carne.


Lembro-me de tudo com uma grande felicidade e uma grande

pergunta ao destino: Como a Piper conseguia conciliar todas as festas com

os estudos? Este sempre será um mistério para todos. Uma festa só era

considerada boa quando a Piper estava presente, e ela ia a quase todas as

festas da universidade. Já eu era a que chamam de “rata de biblioteca”,

vivia enfiada em livros e programando no meu computador. Precisava me


formar com as melhores notas para chamar atenção das grandes empresas,

era minha única alternativa para mudar o rumo da minha vida.

Uma coisa que apenas eu sabia: a Piper poderia ser festeira, mas era

tão empenhada na sua carreira quanto era nas festas. Enquanto eu fazia

faculdade de Engenharia de Software, a Piper era musicista e estudava a

fundo o seu violino, na verdade, ele era praticamente uma extensão do seu

corpo. Ela tocava dia e noite, e eu não me importava, pois amava ouvi-la 

tocar tão lindamente, embalava os meus estudos e, muitas vezes, o meu

sono.

Acordei nostálgica hoje, acho que era a semana. Esta e a próxima


seriam umas das mais difíceis no ano para mim, como sempre era. Fui

acordada dos meus devaneios pelo toque do meu celular, entrei e o

encontrei em cima do balcão da cozinha; na tela, tinha o nome de alguém

que eu estava esperando ansiosamente a ligação.

— Alô?
— Bom dia, Srta. Harrison. Aqui é a Sônia, da Building Corporation,

entrei em contato para falar sobre a sua entrevista conosco.

— Bom dia, Sra. Sônia. Estava esperando sua ligação.


— Receio que não tenha boas notícias de imediato. A vaga foi

preenchida por outra pessoa, mas não se preocupe, pois o seu currículo está

em nossa base de dados e, assim que aparecer outra vaga compatível com o

seu perfil, entraremos em contato. — Um balde de água fria e nem são 8h

da manhã ainda.

— Ah, entendo. Mesmo assim, agradeço por entrar em contato. Tenha

um bom dia. — Desliguei o celular e o joguei longe, no sofá. Ele quicou,

mas não caiu no chão. Soltei um grito de frustração.

Respirei fundo e contive algumas lágrimas frustradas. Eu não podia

me entregar e deixar esses sentimentos vencerem. Precisava manter o foco,

era a única coisa que me fazia seguir em frente.

— Outro não para a minha coleção, mas eu só preciso de uma chance,

uma única chance para provar do que sou capaz — repeti essa frase na

mente até me acalmar e pensar racionalmente.

A vida não facilitava, mas eu tentava ser otimista. Era isso que o

papai gostaria, era isso que ele me ensinava, e eu fazia questão de colocar

em prática, todos os dias, mesmo sendo algo doloroso. Eu acreditava nele e


sempre acreditaria. Fui ao banheiro e lavei o rosto para melhorar o ânimo,

peguei minhas coisas e fui trabalhar. Ainda era metade da semana.

Com um sorriso no rosto, dei 11 aulas no dia. Cansativo, mas a

cafeína era o meu maior apoio. Foram oito aulas em sala de aula e três aulas

particulares, precisava compensar as aulas de sexta. Era Dia de Ação de

Graças e Piper me convidou para jantar com sua família, como moravam do

outro lado da cidade, precisei tirar metade do dia seguinte de folga para

chegar a tempo.

Cheguei em casa exausta. Joguei minha bolsa no sofá e tirei meus

sapatos, precisava relaxar. Coloquei uma música na vitrola, amava o som da


música quando a agulha roçava no disco de vinil. Esse foi um dos hábitos

que adquiri dividindo o quarto com uma musicista. A música rapidamente

ganhou o ambiente, Beethoven era divino. Coloquei uma taça de vinho

branco para acompanhar a música, era uma quarta-feira ainda, mas eu

merecia depois desse dia.

— É isso, Lila. O dia já acabou e amanhã virá mais outro, mais uma

chance de conseguir o emprego que deseja. Tudo é possível, basta acreditar

e fazer valer a pena. — Beijei o colar do meu pai que eu carregava sempre

comigo e fui me deitar. Amanhã seria mais um dia corrido.

A quinta seria meu último dia de aula na semana e eu precisava da

tarde livre para o meu skincare, manicure, pedicure e tudo que fosse preciso
para jogar fora essa cara de cansada e chegar deslumbrante na casa dos

Donovan.

O Dia de Ação de Graças seria nesta sexta, o famoso feriado em que

se reúne a família para agradecermos por todo o ano que passou. Bem, eu

não tinha minha família original para agradecer, mas tinha a família que me

recebeu de braços abertos, os Donovan. Passei todos os anos da

universidade com a Piper e sempre ouvia as histórias dos seus irmãos

trigêmeos, da sua família enorme e morria de vontade de  conhecê-los,

saber como é uma família de verdade. Um dia, ela me levou para um

almoço de domingo e nunca mais os larguei,  foi e sempre será a melhor

experiência da minha vida.

Saí do banho e meu celular vibrou com uma mensagem. Eram 7h da

manhã, quem poderia me mandar uma mensagem a essa hora? Abri e era da

Piper, me lembrando do jantar.

“Não se esqueça do nosso jantar de Ação de Graças com toda a família

Donovan. Te amo mais do que todas as estrelas do céu.”

Sorri com aquela mensagem boba. A Piper tornou-se  minha melhor

amiga, mas ela era a irmã que eu nunca tive e a família da qual fui privada
pelo destino. Adorava falar que me amava mais do que as estrelas, somente

porque me apaixonei por astronomia na universidade e nunca mais larguei


os mistérios do infinito das estrelas. Uma paixão aleatória, mas que me

desafiava e, por isso, eu amava ainda mais.

Respondi a sua mensagem:

“Lógico que não me esqueceria disso! Tudo certo, agora me deixa 

trabalhar. Te amo mais do que a imensidão de sons do Universo.”

Tranquei o meu passado no dia em que fugi da minha cidade e entrei

na universidade. Nunca mais voltei e ninguém sabia o que aconteceu,

apenas a Piper sabia que meu pai morreu no dia do meu aniversário e que
eu não tinha contato com a minha família, eu costumava dizer que minha

mãe devia ter morrido também, para que ela não a procurasse. Seria com
toda a boa intenção do mundo, mas eu preferia que ninguém tivesse acesso

a esse lado sombrio da minha vida.


Semana que vem, será o meu aniversário e, na data de hoje, porém,

cinco anos atrás, foi uma das últimas noites felizes que tivemos. Geralmente
ligava para a Dona Florence para saber se ainda vive, não sei por que fazia

isso, mas fazia. Peguei o telefone e liguei para o número de sempre.


Chamou três vezes até ela atender.

— Alô? — disse, desconfiada, sinal de que não salvou meu número


até hoje.
— Bom dia, Dona Florence. Sou eu, a Lila.
— Ah, é você — respondeu num tom de “tanto faz”. — O que você
quer garota? Se for dinheiro, não tenho nada.

— Não quero o seu dinheiro, só queria desejar um feliz Dia de Ação


de Graças.

— Agora não quer, mas me lembro que me deixou sem nada um


tempo atrás. Se era só isso, então vou desligar, estou cheia de trabalho para

fazer. — Ao fundo, ouvi a dona do salão de beleza em que  ela trabalha.


“É aquela sua filha ingrata, Florence? A ladra que fugiu de casa? Não sei
por que ainda atende a chamada dessa ingrata.”

O sangue subiu à cabeça, mas antes que falasse algo, Dona Florence
respondeu, para minha surpresa.

“Deixa de ser uma velha enxerida e vai arrumar o que fazer, Johanne. Fui
eu que pari, então só eu posso xingar essa garota.”

Não era bem uma declaração de amor, mas ela me defendendo em


algum momento era um milagre. Eu levaria isso como uma vitória, um

pequeno avanço na nossa longa história.


— Vou desligar, bom feriado por aí também, seja lá o que esteja

fazendo. — E simplesmente desligou o telefone. Bem, não poderia esperar


muita coisa dela também. Terminei de me arrumar e fui direto para a escola,

precisava terminar o turno no horário certo para não me atrasar.


Cheguei meia hora antes das minhas aulas da tarde. Organizei o
material e estava terminando de organizar minha mesa quando o diretor,

Joaquim Moore, entrou na sala dos professores, e eu estava sozinha, para o


meu azar. Acho que hoje será um daqueles dias em que o mundo testa

minha paciência. Ele veio em minha direção todo sorridente. Sentei-me na


cadeira e acelerei o processo para sair logo dali.

— Bom dia, Srta. Harrison. Já tem programação para amanhã, Dia de


Ação de Graças?

— Bom dia, Sr. Moore. Tenho, sim, preciso terminar as aulas de hoje
para poder, amanhã cedo, pegar a estrada para um jantar em família.

— Vai apresentar o namorado à família? — Ele estava inventando um


assunto pessoal para entrar na minha vida de todo jeito, e eu não podia não

responder, ele era meu chefe.


— Não tenho namorado, mas quem sabe um dia. Agora preciso ir,

minhas aulas... — Não consegui me levantar, ele me prendeu na cadeira, e


eu já sabia o que ia acontecer.
— Calma, Camilla. Não se preocupe com as aulas, vamos conversar

mais um pouco. — Ele colocou a mão na minha perna. — Gosto das nossas
conversas. — Na mesma hora, empurrei a mão dele para longe e fiquei

furiosa. Estava cansada de sofrer esse assédio todas as vezes. Registrei


queixa, denunciei de todas as formas, mas parece que alguém sempre limpa

a barra para ele. Para mim, chega.


— Sr. Moore, nunca mais coloque a mão em mim sem a minha

permissão, coisa que você nunca terá. Isso é assédio e, apesar de ter algum
benfeitor sem escrúpulos que sempre limpa sua barra, saiba que eu não

aceitarei mais isso calada. O senhor pode ser o meu chefe, mas isso não lhe
dá direito de achar que pode fazer o que quer. Olhe para a sua cara e pense
bem no papel que está se colocando nessa idade.

Ele ficou extremamente furioso quando falei da sua idade, acho que
era um tema sensível, até mais sensível do que o acusar de assédio.

— Se quer jogar dessa forma, Srta. Harrison, então vamos jogar assim
— disse ele com o rosto vermelho de raiva. — Aproveite o seu feriado

amanhã, segunda-feira, você vai desejar não ter trabalho.


— Como assim? Você está me ameaçando porque não o deixei tocar

no meu corpo? Agora, além de assédio, temos ameaça e chantagem.


— Eu sou o seu chefe, não é mesmo? Vamos ver em que palavra

acreditam. — Ele saiu da sala e me deixou com um misto de sentimentos


que não sei colocar em palavras. A vontade era de destruir a escola inteira,

tijolo por tijolo e enterrá-lo nela. Lágrimas rolaram pelo meu rosto, este não
era o futuro que eu esperava. Não vou mentir, mesmo tentando ser otimista,

tinha dias que eu só queria sumir ou matar alguém, metaforicamente.


O sinal de início das aulas tocou. Rapidamente, limpei o meu rosto e

segui para a minha sala. Antes de entrar, endireitei o meu corpo, treinei um
sorriso no rosto e fiz de tudo para irradiar felicidade. Meus alunos não

tinham culpa de nada. Terminei todas as minhas aulas e recarreguei um


pouco das minhas energias. Eles sempre me alegravam.

Voltei para a sala de professores e estava arrumando minhas coisas,


pelo menos amanhã eu não veria aquele velho horrível. Eu queria botar um

fim naquilo e fazê-lo pagar, mas não sabia por onde começar. Pensei: “O
que meu pai faria?”. Gostava de me perguntar isso e, na mesma hora, me

veio a lembrança do meu aniversário de dez anos, quando  ele conseguiu


uma folga, não sei como.

Eu não aceitaria isso, não ficaria de braços cruzados e sendo


chantageada por um velho tarado. Escrevi uma mensagem em um papel,

peguei minhas coisas e fui embora, não sem antes colocar a mensagem na
porta do diretor. Chamei meu Uber e fui para casa, tinha deixado o meu
carro na revisão. Assim que entrei no carro e segui viagem, uma mensagem

chegou no meu celular junto de uma foto da porta do diretor.


“Isso foi você quem escreveu, Camilla Harrison?”

Era o velho tarado. A mensagem dizia:


“Coloca uma maçã na boca e vire um porco de uma vez, pelo menos será

bem aproveitado na ceia de Ação de Graças. Eu vou aproveitar a minha.”


Eu sorri quando vi a imagem, era engraçada.
“Foi sim! Espero que aproveite seu feriado e encha seu rabo de comida

sozinho, seu velho idiota.”


Ele não gostou muito da mensagem.
“Nunca mais pise o pé nessa escola. Você está demitida.”

Senti um friozinho na barriga? Senti muito mais que isso, a minha


ansiedade tomando conta e eu duvidando se fiz certo ou errado, mas eu

sabia que isso aconteceria. Prometi a mim mesma, cinco anos atrás, que
nunca mais deixaria ninguém ditar ordens na minha vida pessoal. Eu faria o

melhor para mim, apenas eu.


Não sei como será depois que eu voltar a minha rotina normal e sem

emprego, mas foi o melhor a se fazer. Hoje eu dormiria tranquila, sem culpa
ou preocupação. Amanhã será um dia incrível com a minha amiga e a sua

família, e eu mereço ser feliz um pouco.


Na sexta-feira, saí de casa depois do almoço para chegar sem pressa e

poder falar com todos com calma, a família era grande. Ao chegar na
imensa mansão dos Donovan, um manobrista se ofereceu para estacionar o

meu carro e fui direto para a entrada. Conheço esse lugar como a palma da
minha mão, mas sempre me admiro com o tamanho e com a beleza da

propriedade da família. A governanta, Sra. Coleman, já me aguardava na


entrada.
— Boa noite, Lila. Seja bem-vinda de volta, querida. — Ela me deu
um abraço apertado, faço parte da família, e Piper fez questão disso.

— Boa noite, Sra. Coleman. Como está?


— Estou perfeitamente bem, só chateada porque sempre me chama

pelo sobrenome. É Maria para você, entendeu?


— Sim, senhora. Pode deixar, Maria, tentarei lembrar. Todos estão aí?

— A grande maioria sim, só falta um dos tios da Piper, mas daqui a


pouco chega. — Nunca conheci os seus tios. Um, eu sei que ela tinha pouco

contato, mas o outro, todas as vezes que vim, tinha problemas com os
negócios, era um homem bastante ocupado ou que foge da família. Não

consigo julgar.
Fui para a sala e encontrei todos juntos, em uma algazarra total. Piper

me viu e correu para me abraçar.


— Amiga, finalmente chegou. Já estava preocupada.
— Desculpa, tive alguns problemas no trabalho.
— Você vai me contar isso agora. Foi aquele velho nojento, não foi?

— Eu tinha mandado mensagem para ela, contando que fui demitida, e ela
sabia do assédio que eu passava. Quando eu ia começar a falar, dois dos
trigêmeos apareceram com o cabelo penteado e usando os mesmos suéteres,
eles estavam exatamente iguais. Lembro que esse suéter foi presente da avó

deles, o que me fez também lembrar que faltava um dos trigêmeos.


— Boa noite, Lila. Quero ver você descobrir quem de nós é o
Chandler e quem é o Joey. — Eles sempre brincavam comigo dessa forma,

fingindo que era o outro e pregando peças em mim. Eu adorava.


— Boa noite, pessoal. Antes de eu tentar adivinhar, onde está o
terceiro trigêmeo, o Ross? Nem me olhem com essa cara, porque,
dificilmente, o Ross viria me pregar uma peça dessas.
— Onde mais ele poderia estar? No quarto, estudando e lendo

milhares de livros. Agora, sua vez.


— Vejamos. Dessa vez está difícil, mas talvez eu pense em algo.
Nossa, está um calor aqui dentro, acho que vou abrir a minha blusa. Um
botão só não fará diferença. — Na mesma hora, o Joey não resistiu e olhou

babando para o meu decote, ele era o mulherengo dos dois, e o Chandler era
mais ranzinza. — Resolvido. Olá, Joey!
— Você é muito fácil de enganar, Joey. Era só prestar atenção no
rosto dela, no papel de parede, qualquer coisa. Será possível que não resiste

a uma mulher?
— Desculpe, mano. É impossível resistir a Lila, ela é linda demais.
Dói em mim que ela seja território proibido.
— E vai ser para o resto da vida, agora sumam os dois, pois preciso

conversar com a Lila. — Piper, sempre protetora comigo, dispensou os


dois. — Agora, me conta o que aconteceu.
Narrei toda a história com o diretor e como acabei demitida. Disse
que não me arrependia, mas estava preocupada com as contas.

— Lila, você sabe que eu posso te ajudar no que precisar!


— Nada disso, Piper. Quero crescer com as minhas próprias pernas e
acho chato pedir dinheiro a amigos, parece até que sou interesseira. Sua
família sempre cuidou muito bem de mim e quero que continuemos dessa

forma. Não se preocupe, darei um jeito. Prometo. — Ela me olhou como se


não acreditasse no que falei. Nem eu mesma acreditava, mas era o certo a se
fazer.
Carson Donovan, pai de Piper e dos trigêmeos e cônsul da Austrália

nos EUA, entrou na sala para chamar a família para o jantar, mas não sem
antes me cumprimentar.
— Boa noite, Lila. Que prazer tê-la conosco mais uma vez. Como
você está? — Piper quis falar a verdade, mas dei um olhar para ela não falar
nada.

— Boa noite, Sr. Carson. Agradeço o convite desse ano, é sempre um


prazer estar com vocês. Eu estou bem, apenas na correria de sempre. Aos
poucos, as coisas vão se encaixando.
— Muito bom saber disso, Lila. Eu acho a carreira do ensino uma das

mais valiosas. Minha família é toda australiana, como você bem sabe, mas
tento ensinar aos meus filhos as culturas e os idiomas dos lugares que
visitamos. Não existe limite para o conhecimento, não é verdade? Espero

que continue ao lado da Piper, a instigando a crescer sempre mais.


—   Lila sempre me surpreende. Eu sempre fui a festeira, e ela, a
estudiosa da faculdade, mas consegui me formar. Até dei algumas aulas,
ontem, a uma turma de iniciantes no curso de música. Arranharam bastante
o violino até meus ouvidos doerem, mas foi divertido.

— Estou impressionada, dando aulas. Você nunca gostou disso.


Parabéns pela evolução.
— Não se tem muito o que fazer quando se é filha de um cônsul.
— Lá vem a minha filha reclamona. — Sr. Carson abraçou a Piper e

saiu com ela, implicando um pouco e ambos sorrindo. Imagino que seria
assim com o meu pai, se ele estivesse vivo. — Agora vamos para a mesa
que estou faminto. Lila, você poderia chamar o Ross no quarto? Você o
entende melhor do que ninguém.

— Pode deixar, Sr. Carson. Vou lá agora. — Subi as escadas e fui


direto ao quarto do Ross. Andar por ali é tão instintivo que parece que eu
também moro na casa. Bati na porta duas vezes e ouvi um grito lá de
dentro.

— Eu não estou a fim das suas brincadeiras, Joey. Já falei mil vezes
isso. — Abri a porta devagarzinho.
— E se, ao invés do Joey, quem estiver batendo na porta for a sua

companheira de casa de Hogwarts? Aceita a minha entrada? — Ele se virou


na mesma hora com um sorriso enorme no rosto. Unir a beleza dos
trigêmeos com aquele sorriso era fatal para as mulheres. Eu já estava
imune, mas não poderia deixar de apreciar a beleza.

— Lila! Desculpe, achei que eram os meus irmãos. Entre, venha ver a
minha mais nova aquisição literária. — Entrei no quarto e fui direto para a
sua mesa, ele se levantou para me dar um abraço carinhoso.
Entre mim e o Ross, surgiu um vínculo tão forte e praticamente

instantâneo. Acredito que ele seria a minha Piper na versão masculina.


Sempre carinhoso comigo e preocupado em saber como eu estou, ele me fez
sentir como seria ter um irmão, da mesma forma que a Piper me fez sentir.
Nos abraçamos e, vi em sua mesa, um livro enorme que, poderia afirmar
com toda a certeza, tem mais de 500 páginas e mais de duas décadas de

existência, pelo tamanho e desgaste do título. — Alguém anda lendo alguns


romances mesclados com tragédias.
— Depois daquele livro de Shakespeare que você me emprestou,
confesso que fiquei interessado em gêneros parecidos. São mais do que

aqueles romances melosos, histórias reais e sofrimentos também.


— “Para todos os males, há dois remédios: o tempo e o silêncio.”
Ross me olhou sem entender, acho que não chegou nessa parte.
— É uma frase desse livro que ficou gravada na minha mente. Tenho

muitas outras, mas gosto dessa porque é a pura verdade.


— Interessante. — Ele anotou algo. — Depois me manda as outras
que gostou.
— Mando, sim, mas sem sua mania de analisar as pessoas, viu, Dr.

Psicanálise. — Ele soltou um sorriso e concordou, fechando o caderno.


Provavelmente iria me analisar às escondidas. — Seu pai pediu para te
chamar, a ceia vai começar.
— Certo, daqui a pouco eu desço. Vou só organizar algumas coisas.

— Não se atrase. — Saí do seu quarto e fui direto para a mesa. Ross
apareceu logo depois, deixando um beijo no meu rosto. Sentamo-nos todos
e uma cadeira estava vazia ao meu lado.
— Agora que estão todos acomodados, posso dar um aviso. O tio de

vocês não poderá comparecer hoje, ele sente muito pela falta. Teve uma
urgência em um dos seus negócios, mas virá nos visitar no domingo. Pediu
que eu falasse a vocês que gostaria muito de estar presente nesse momento,
mas foi algo inadiável e urgente. — Estou com fome, vamos seguir com as

preces? — Sorri com aquele final do Sr. Carson. — Vou deixar os trigêmeos
começarem.
Os três agradeceram o ano que passou e tudo que alcançaram.
Falaram que gostariam que a mãe estivesse presente, mesmo agora ainda
sentem falta, e que sabem que ela está cuidando de todos lá de cima.
Piper agradeceu a irmã que faz parte da sua vida, amo a forma como
ela me coloca em tudo. Agradeceu pela música que completa sua alma e
pela saúde e energia que tem para aproveitar todas as festas do ano, típico

dela. No final, agradeceu à família que tanto a ama.


Quando chegou a minha vez, não soube direito pelo que agradecer.
Deu um branco na minha mente, tudo o que tinha era essa família incrível,
que me acolheu em todos os momentos. Depois disso, as palavras saíram.

— Eu agradeço por vocês me adotarem na família. Tornaram-se os


meus maiores amigos e ainda ganhei uma irmã maravilhosa. Agradeço por
minha vida, por ter saúde para viver e aproveitar os dias. Agradeço pelos
bons e maus momentos, foram eles que me moldaram e me fizeram quem
sou hoje, afinal, somos um acúmulo de nossas experiências. — Tive

algumas experiências ruins na faculdade, uma delas envolve a área amorosa


e um nome repulsivo, Gary, que prefiro nunca mais lembrar, mas ele
também me fez abrir os olhos para os homens que tentam enganar. — Vou
acrescentar um desejo no meio do meu agradecimento: que as pessoas

possam ser mais verdadeiras e falar a verdade, sem ilusões. Acho que isso
seria uma forma de agradecer à outra pessoa por ouvir o que tem a dizer. É
isso.
— Obrigado, Lila, pelo seu agradecimento e obrigado, meninos. Eu
agradeço por ter o privilégio de estar rodeado por mentes pensadoras,
instigantes e que possuem a sede do conhecimento. Agradeço pelo talento
de cada um, mas, principalmente, pelo grande ser humano que são. Sim, a

mãe de vocês deve estar muito feliz e chorando de emoção nesse momento,
se bem a conheço. Por fim, agradeço a união dessa linda família, por
podermos contar uns com os outros, por valorizar pequenos momentos
como esse e dar valor ao nome família. Agora, vamos comer antes que eu

desmaie de fome.
Todos sorriram com o final dos agradecimentos e começaram a se
servir. Tudo delicioso, eu comia de tudo e ainda levava para casa por
insistência da Maria.

— A noite foi maravilhosamente agradável, obrigada novamente pelo


convite, Sr. Carson.
— Eu que agradeço a companhia, Lila. Tem certeza de que não quer
que a levem em casa? Não seria trabalho algum e me deixaria mais

tranquilo.
— Por favor, não se preocupe. Eu já pedi um Uber e chega em cinco
minutos. E eu prometo ligar assim que chegar em casa — Piper e os gêmeos
também insistiram, mas eu bati o pé. Estava tarde. Não queria incomodá-
los, mas admito que adorava esse zelo que eles têm comigo. Me fazia sentir
acolhida e parte da vida deles. O que me dava essa sensação de
pertencimento que eu nunca tive antes.
Me despedi de todos, e a Piper me levou até a porta, para esperar o

carro de aplicativo que chamei.


— Lila, quase me esqueci. Amanhã será a inauguração do novo clube
perto da praia. Será uma festa superbadalada, alto nível com pessoas super
conhecidas, terá a presença da mídia em peso e estamos oficialmente
convidadas. Você vai, e não quero ouvir um não.

— Piper, acabei de te dizer que estou desempregada.


— E, por isso, precisa de animação na vida. Vamos, não custa nada e
ainda vai me fazer companhia. Você vai me deixar sozinha em um covil de
leões loucos para ter um pedacinho da sua melhor amiga?

— Deixa de drama. Você sabe muito bem se virar, é capaz de


transformar todos em seus escravos. Olha, eu vou, mas não ficarei muito
tempo lá. Estou realmente cansada e preciso pensar no que farei da minha
vida.

— Combinado. Fico o tempo que quiser e tente dormir hoje, ok? Não
existe problema na vida que não tenha solução. Você trabalha com números
e sabe disso. — Meu carro chegou, e Piper me deu um abraço de despedida.
No caminho todo de volta para casa, só conseguia pensar no que fazer

agora e se eu fiz certo. Agora não tem como voltar atrás. É só olhar para
frente, Lila. Tentei me animar um pouco, estava exausta. O carro me deixou
na porta e, assim que entrei em casa, tirei toda a roupa, ficando só de
lingerie. Liguei pra Piper pra avisar que cheguei sã e salva, conforme

prometi.
O dia estava terrivelmente quente, e eu nunca me dei bem com ondas
de calor. Morei a vida toda em Minnesota, uma cidade com um frio
congelante, é difícil se acostumar com o extremo.

Tive uma série de pesadelos com o meu passado, meu padrasto e tudo
o que passei. Acabei madrugando no sábado, não consegui dormir bem e
agora não adiantava mais rolar na cama. Fui fazer o meu café e aproveitei
para ver as correspondências. Era sábado, então deve ter chegado alguma

conta ontem. Cheguei na caixa de correios e tinha alguns envelopes, a


grande maioria era propaganda e um deles era o mais importante.
Meu coração deu uma leve descompensada e minha ansiedade atingiu
níveis desesperadores. Nem pensei duas vezes, subi correndo e passei pela

Sra. Laura, uma das moradoras do condomínio que sempre falava comigo
muito gentil e fiquei com peso na consciência por não falar direito com ela,
mas isso era mais importante do que tudo.
Entrei em casa, joguei o sapato e a bolsa em um canto e coloquei esse
único envelope em cima da mesa. O olhava como se fosse uma bomba

prestes a explodir, estava louca para saber o que tinha ali, ninguém manda
carta se não for algo importante, mas também estava com receio de ser mais
um não, dessa vez um não educado por carta. A solução para resolver

qualquer problema sempre será a cafeína.


Preparei minha xícara de café, com duas colheres de creme e um cubo
de açúcar, até na hora do desespero essa ordem era importante. Eu não
estava pronta para mais um não, mas notícia ruim é igual a band-aid: você
precisa arrancar de uma vez só. Tomei um gole da minha bebida e abri o

envelope, já esperando a mensagem de sempre, e não era isso que estava


escrito ali.
Olá, Srta. Harrison,
Venho, através desta, informá-la que, após análise de todos os

currículos e entrevistas, temos o prazer de anunciar que você foi aprovada


em nosso processo seletivo. Parabéns!
Agradecemos o seu empenho e esperamos a sua presença na nossa
sede na segunda-feira, dia 28 de novembro, às 08h. Seja bem-vinda à nossa

empresa.
Atenciosamente, Secret Digital Security.
— EU PASSEI! FINALMENTE MEU DIA CHEGOU! — gritei isso
para os quatro cantos do mundo.
 

Voltei a dormir um pouco, acordei no sábado e percebi que, pela


primeira vez, eu estava totalmente relaxada. Não estava preocupada com a

escola, em ter que encontrar aquele velho asqueroso na segunda ou

qualquer outra coisa que pudesse tirar o meu sossego no fim de semana. Eu
sentia falta dos meus alunos e tentaria me despedir deles, mas hoje eu era

uma futura desenvolvedora de softwares que tem um emprego em sua área,

e isso era a melhor coisa que aconteceu comigo nos últimos tempos.

Um sorriso tomou o meu rosto, junto de um sentimento de desejo

realizado. Abracei o Char bem apertado e agradeci ao meu pai por me


apoiar sempre, mesmo de longe. Foram seus ensinamentos que não me

fizeram desistir. Respirei fundo e me levantei da cama, eram 10h da manhã

e queria aproveitar esse dia ao máximo, para que essa sensação me

marcasse por muito tempo.

Preparei o meu café com a minha receita favorita, a de todos os dias.


Me permiti passar o dia de pijama, sentei-me no sofá com o café na mão e

liguei a TV em algum programa aleatório. Olhei meu celular e fiquei presa

em alguns vídeos de gatinhos, já havia pensado em ter um pet, mas, com a

minha rotina tão pesada, fiquei com pena de deixá-lo sozinho por tanto

tempo e não ter tempo para lhe dar atenção.


Enquanto passava pelo Instagram, um anúncio apareceu para mim.

Era sobre a inauguração do Club Miami Beach que a Piper me convidou,

com presença obrigatória, hoje. Me lembrei que ainda não contei sobre a

novidade a ela. Na mesma hora, escrevi uma mensagem para a minha

amiga.

“Bom dia! Como está a animação para hoje?

Tenho uma novidade para te contar, e você não vai nem acreditar.”
Esperei um pouco, e ela me respondeu uns 30 minutos depois.

“Bom dia para quem parece que foi atropelada ontem à noite. Estou

acabada, dormi a noite toda e parece que não dormi nada.


Não me fale nada! Quero descobrir lá na festa para comemorarmos com

estilo, então. Deixa só eu descansar mais um pouco para me livrar dessa

dor de cabeça e mais tarde estaremos prontas para arrasar. Xero.”

Será que ela pegou um resfriado? Estranho, estava tão bem ontem.

Espero que não seja nada. Enquanto ela descansava, aproveitei a tarde para

passear com a minha bicicleta e parar um pouco no parque para relaxar.


Adoro esses programas tranquilos, pois conseguem me desacelerar e fazem

bem.

Voltei para casa algumas horas depois e vi que precisava dar um jeito

no meu cabelo, todo amassado e assanhado pelo programa do dia. Piper

sempre me dizia na universidade: “Lila, você sabe que teve uma boa noite

de cama, seja dormindo ou transando quando acorda e o seu cabelo está

totalmente fora do lugar, e esta é a maior das satisfações femininas.”

Não sei quanto à parte do sexo, não tive experiências nessa área, mas

quanto a dormir, posso garantir que é a mais pura verdade. Levantei-me do

sofá, sacudi a preguiça para longe e mergulhei em roupas, sapatos e


maquiagens. Faltavam algumas horas, mas eu queria fazer um skincare

antes e relaxar um pouco.

Me olhei no espelho e fazia tempo que não via essa Lila, toda

exuberante e arrumada para sair. Gostei do que vi. Coloquei um vestido

prateado com um tecido leve, que se molda ao corpo, e um decote que


acentua o par de seios que a natureza me deu. Uma coisa eu tinha certeza,

nasci com um corpo de dar inveja e, com tanta correria do dia a dia, eu me

esquecia disso, às vezes. Minha pele morena contrastava bem com a cor
prata. Para completar o look da noite, escolhi deixar o cabelo solto e usar

um batom vermelho para realçar meus lábios, a sandália de salto completou

o pacote, e eu estava radiante.

Marquei com a Piper de encontrá-la na frente do clube às 23h. Antes

de sair, mandei uma mensagem, avisando que estava a caminho, mas ela

não me respondeu. Devia estar se arrumando. Chamei o Uber e, quando

cheguei na boate, ainda não tinha mensagem da Piper. Já estava

preocupada, mas desci do carro e a esperei no estacionamento. Meia hora

de atraso e resolvi ligar para ela, todos tinham começado a entrar, e eu não

conhecia ninguém, estava cogitando voltar para casa quando alguém

atendeu o celular dela.

— Alô? Piper? Você está a caminho?

— Lila, boa noite, aqui é a Maria. Receio que a Piper não conseguirá

encontrá-la hoje.

— Aconteceu alguma coisa com ela, Maria? — A preocupação bateu

com tudo em mim.

— Ela passou o dia com dor de cabeça e febre, não melhorou em


momento nenhum e chamamos o médico. Piper está com catapora. Ainda
não sabemos onde ela pegou, mas, como é uma doença contagiosa, ela

precisa ficar de repouso e isolada.

— Nossa, catapora é horrível, eu já tive e foi uma agonia. Diga a ela

para não se preocupar comigo, sei que deve estar abalada por hoje. Avisa

que mandei focar em ficar melhor e que vou visitá-la amanhã, como já

peguei, não corro perigo.

— Pode deixar que aviso sim, Lila. Cuidado por aí e aproveite sua

noite. — Maria desligou para cuidar da Piper, e eu fiquei no

estacionamento, sem saber direito o que fazer.

A decisão mais provável era voltar para casa, eu não conhecia


ninguém ali. Enquanto guardava meu celular e decidia minha vida, uma voz

me chamou, uma voz que só tinha ouvido na universidade e esperava não

ouvir nunca mais.

— Olha quem temos aqui. Boa noite, Lila, há quanto tempo. — Olhei

para trás e o vi. Gary.

Como eu falei, tive poucas experiências na área do romance e, na

época em que estudava, eu ainda era virgem. Talvez pela pouca experiência

no romance e zero no sexo, eu tenha me interessado por um dos jogadores

do time de rugby, o Gary. A nossa conversa era leve e divertida, ele me

mostrava outro lado da vida, me contando suas viagens e experiências. Era


gentil e não perdia uma oportunidade de estar comigo. Bem, era o que eu

achava.

A maioria das pessoas que me rodeavam não tinha nada que alguém

pudesse ter interesse e, por isso, nunca pensei que algo assim pudesse

acontecer. Fui ingênua demais, e a Piper tentou me alertar para não confiar

facilmente. Confiei. Depois de dois meses saindo com ele, cogitei em

perder minha virgindade, achava que ele era a pessoa certa, ainda bem que

não fui por esse caminho.

Fui em um dos jogos do Gary, pensei em fazer uma surpresa para ele

e fui em direção ao vestiário. Quando estava perto de entrar, ouvi alguém

falar o meu nome e parei para ouvir, era o Gary falando com os amigos do

time.

— Ela está comendo na minha mão. Uma nerd virgem é fácil de

enganar, ela jura que estou apaixonado por ela. Coitada, nunca eu me

apaixonaria por uma pobretona como ela, mas existem alguns sacrifícios

necessários para se atingir o que quer. Em breve, poderei ter mais acesso a

Piper e aí, sim, vou conquistá-la de qualquer forma.

— E como você vai dar em cima da Piper se ainda está com a amiga
dela? — algum amigo dele perguntou.

— Fácil: eu tiro a virgindade da pobretona, e ela fica de quatro por

mim, definitivamente. Resolvo dois problemas de uma vez, estou há um


tempo sem transar e ela aparenta ser limpinha e gostosa, tiro meu atraso e

conquisto a Piper. Está no papo. — Todos riram da minha cara, eu era a

garota ingênua e fácil de se ganhar.

Depois do meu padrasto, Gary foi o monstro que mais me humilhou

na vida. Voltei para o dormitório correndo, antes que desabasse no campus.

Entrei com tudo no quarto e comecei a chorar na cama, Piper estava

praticando e se assustou quando me viu assim.

— Lila, o que aconteceu? O que o Gary fez com você? — Ela estava
desconfiada dele fazia tempo, eu deveria ter acreditado. Contei tudo a ela

enquanto chorava toda a minha mágoa e tristeza. Piper ficou vermelha de


raiva e não deixou isso barato.

— Fique aqui, vou resolver isso de uma vez.


— Piper, o que você vai fazer? — Ela não me respondeu, apenas saiu.

Soube depois que ela foi até o jogo e humilhou o Gary na frente de todos.
Falou que ele não valia o tempo dela e que nunca daria uma chance a um

babaca como ele, que pensa que o pau é mais valioso que o caráter e que o
dinheiro compra tudo, dispensando-o por tratar mal sua melhor amiga.

Depois disso, nunca mais vi Gary.


Até hoje.
Me virei com um olhar receoso, eu estava sozinha e não tinha como

fugir rápido com aquela roupa.


— Boa noite, Gary. Eu já estava indo embora, mas espero que se
divirta. — Tentei sair de perto, mas ele segurou o meu braço. O alerta soou

na minha cabeça.
— Calma, gatinha, onde pensa que vai? Começamos a conversar

agora. — Claramente estava bêbado, senti o cheiro do álcool de longe. —


Lembra que você adorava conversar comigo? Agora tenho diversas

histórias para te contar, mas antes, me diga, onde está sua amiga Piper?
— Ela está me esperando lá dentro, vim fazer uma ligação e vou
entrar agora. — Tentei me soltar, mas sua mão estava apertando o meu

braço com força. — Pode me soltar, por favor? Meu braço está começando
a doer.

— Falando de dor, gatinha? — Ele se aproximou e falou bem perto do


meu rosto. — Logo você, que me deu uma das maiores dores da minha

vida, a humilhação. — Foi então que me prendeu contra o carro.


— Gary, me solta. Você está fora de si.

— Nada disso, eu sei o que estou fazendo e o que quero agora é


aproveitar o seu corpo, como deveria ter feito alguns anos atrás. Colocar a

mão nesse seu traseiro gostoso, você tem um belo corpo, gatinha.
Ninguém aparecia no estacionamento ou parecia notar que havia um

problema. Estávamos um pouco afastados da entrada, eu deveria ter ido


direto para lá.
— Vamos começar por um beijo nessa sua boca deliciosa, depois
quero senti-la no meu pau. — Eu estava quase chorando de desespero, não

sabia mais o que fazer. Tentei bater nele, espernear e me soltar, mas ele era
muito forte. Quando estava quase desistindo, uma voz veio de trás do Gary.

— Este é um péssimo jeito de começar a inauguração de uma boate.


Você pode largar a moça, por gentileza? — Alguém ouviu minhas preces.

O projeto para desenvolvimento do novo produto está me dando mais


trabalho do que imaginei. Faltam ideias novas, pensar fora da caixa, criar

um produto que mude algo, que inove e não apenas mais um lançado.
Confesso que achava que o Hackathon, uma maratona de programação onde

as empresas encontram novos talentos, uma grande perda de tempo, mas


vejo que podem sair pessoas promissoras.

Consegui algumas novas adições para o time, mas ainda faltam


algumas outras pessoas. Na próxima semana, veremos se quem escolhemos

no evento e quem contratamos vão realmente ajudar em algo. Olhei para o


relógio e era 22h.
— Droga, me esqueci completamente da inauguração do clube. Perdi

a hora entre o trabalho e as reuniões. — Levantei-me e fui até uma porta


oculta que escondia um pequeno closet. Eram roupas de emergência para

situações como esta. Troquei o meu terno do dia por um smoking, dei um
jeito no meu cabelo e segui para a inauguração.

Eu perdi, ontem, o jantar de Ação de Graças com a minha família por


causa desse projeto. Fiquei triste com isso, a família é o meu pilar de
sustentação e esse jantar era bem importante. Hoje, Carson me disse que

Piper está com catapora, mas como pegamos quando éramos crianças, então
não corremos risco. Amanhã não teria desculpa, eu apareceria lá e levaria

algo para Piper.


Depois de tudo o que aconteceu comigo e com Abbie, eles me

ajudaram a manter o foco em algo, a não me deixar consumir pela tristeza.


O laço mais verdadeiro que existe, para mim, é o que liga toda a minha

família. São eles que me mantêm com o pé no chão, e isso não vai mudar
entre nós.

Cheguei ao clube às 23h40. Não estava atrasado, normalmente a noite


só começava, de verdade, depois da meia-noite. A ideia era entrar, sorrir um

pouco para algumas pessoas, agradecer a presença, fazer um discurso


simples e fugir para casa, precisava dormir. Estava dirigindo o meu Jaguar,

fazia tempo que não o tirava da garagem. Costumava deixar meus carros no
estacionamento da empresa, já que eu passava mais tempo lá do que em

casa.
Assim que cheguei, antes de sair do carro, vi um casal que parecia

brigar, mas o cara estava fora do seu juízo normal, porque parecia prender a
garota contra um carro, e ela estava com um olhar de desespero.

— Este é um dos motivos pelo qual odeio o álcool, deixa pessoas


escrotas mais afoitas — falei para mim mesmo antes de sair, eu não poderia

deixar as coisas daquele jeito e seguir como se nada tivesse acontecido.


Saí do Jaguar e comecei, de uma forma gentil, não queria ser gentil,

mas preferia dar a chance ao cara de pensar bem no que estava fazendo:
— Este é um péssimo jeito de começar a inauguração de uma boate.

Você pode largar a moça, por gentileza? — Os dois me olharam, ele, com
cara de surpresa, e ela, com cara de alívio.

— Cara, na boa, se manda e não empata a foda dos outros.


— Acho que, para uma foda existir, as duas pessoas precisam
concordar, e a moça não parece estar concordando. Largue-a antes que

cometa um erro ainda maior.


Ele a largou, mas cometeu um erro ainda maior. Virou para mim com

toda a confiança que tinha e tentou me acertar um soco no rosto. Poucas


vezes na minha vida fiz uso de violência. Sempre fui de buscar alternativas,

o que não significa que não sabia me defender se o confronto físico fosse
inevitável. Desde muito cedo, meu pai colocou eu e meus irmãos para
praticarmos boxe. Eu comecei aos 12 anos. Segundo ele, não era para

começarmos brigas, mas, sim, para sabermos nos defender caso fosse
necessário e se esgotarem outras opções. Desviei do soco e encaixei um jab
na guarda baixa do cara. Era até difícil lutar com ele, estava claramente em

desvantagem por estar bêbado, mas não tinha pena pelo que fez à moça.
Foi quando, subitamente, dois caras, que deveriam ser amigos dele,

apareceram e me cercaram. Três contra um nunca seria uma luta justa e


levei alguns socos, mas consegui lidar bem com a situação e nocauteei um

dos amigos dele, enquanto ele e o outro estavam bem machucados. Os


seguranças perceberam a movimentação, que já chamava a atenção de

algumas pessoas, e correram para separar a briga. Eles me reconheceram


assim que me viram.

— Senhor?
— Aquele covarde estava tentando fazer mal a essa moça. — Apontei

o cara que jazia no chão, gemendo de dor e nocauteado, e depois para os


dois cretinos que vieram protegê-lo. — E esses outros dois estavam com

ele. Onde vocês estavam que não viram isso? Coloquem mais seguranças
nessa área do estacionamento e mais iluminação também. Todo esse breu

pode favorecer os assaltos aqui também.


— Sim, senhor. Precisa de ajuda com algo?
— Não, apenas expulsem os três e não os permita colocar os pés
nessa boate novamente. — Os seguranças os levaram e chamaram a polícia

para resolver o problema. Eu estava com o lábio cortado e uma mancha


vermelha no outro, ficaria roxa provavelmente. Minha mão era a que mais

doía, machuquei bastante, brigando com os três.


Procurei imediatamente a moça e a vi encolhida. Ela estava no chão,

em estado de choque, parecendo tão frágil e assustada que me recriminei


mentalmente por não ter priorizado saber como ela estava antes de falar

com meus seguranças. Me aproximei devagar para não a assustar e tentei


conversar.

— Boa noite, meu nome é Alec. Você é uma convidada aqui? Veio
com alguém? — Ela sussurrou alguma coisa difícil de decifrar. Insisti sem

tocá-la. Ela tremia e achei mais prudente tentar acalmá-la primeiro, antes de
ampará-la e ajudá-la a se pôr de pé: — Moça, você quer entrar para se
limpar no banheiro e tomar um pouco de água, se acalmar um pouco? —
Ela voltou o olhar para mim e, pela primeira vez, vi um olhar que parecia

enxergar dentro de mim, como se quisesse muito mais que fazer sentido das
minhas palavras, ela queria descobrir minhas intenções.
E, ao mesmo tempo em que eu vi uma resistência, uma força naquele
olhar, também vi uma dor tão poderosa naqueles olhos castanhos que

pareciam que guardavam uma criança ali, perdida e com medo de algo do
mundo. O medo não parecia ser de agora apenas, mas parecia ter sido
desperto novamente depois de um tempo adormecido. Foi confuso me sentir

tão conectado à mensagem silenciosa desses olhos. Sentir algo tão intenso,
algo diferente por essa menina que era uma completa desconhecida era
estranho pra mim. Retomo o controle, me libertando desse fluxo de
pensamentos. Enfim, preciso me concentrar e me preocupar com o estado
dela.

Estendi a mão para ajudá-la a se levantar e esperei. Ela parecia ter


dúvidas se me daria um voto de confiança ou não. E eu não podia culpá-la
depois do que aconteceu. Por fim, ela me deu o benefício da dúvida e
aceitou a minha mão. Seus dedos estavam frios, mas eu estranhamente

gostei da sensação de ter aquela mão delicada e macia quase sendo engolida
pela minha mão tão maior. A ajudei a se levantar do chão e a conduzi, sem
soltar sua mão, para a área reservada do clube, onde somente alguns poucos
funcionários e eu temos acesso.

— Como você se chama? — puxo assunto, numa tentativa de distrair


sua mente daquele momento ruim que sofreu.
— Lila Harrison, senhor. — Já ouvi em algum lugar.
— Não precisa me chamar de senhor, acredito que as circunstâncias

em que nos conhecemos quebraram toda a formalidade — falei de forma


descontraída e a olhei pelo canto dos olhos. Não adiantou muito.
Chegamos ao meu escritório, eu mostro o banheiro onde poderia se
recompor e ela apenas agradece e entra silenciosamente, mas ouço o

barulho da chave trancando pelo lado de dentro. O que é mais do que


compreensível, dadas as circunstâncias.
Enquanto ela está lá dentro, eu vou até o frigobar para pegar um
refrigerante para ela. Não sou muito fã de bebidas tão açucaradas, mas ela

precisa de um pouco de açúcar para se acalmar. Minutos depois, a ouço sair


do banheiro e aponto uma poltrona para que ela se sentasse enquanto coloco
o refrigerante em um copo.
— Quer que eu ligue para alguém para buscá-la ou quer que alguém

te leve em casa? O que ficar melhor para você. — Me virei com um copo, e
ela ainda estava em pé, no meio do meu escritório, parada.
É a primeira vez que noto o quanto ela é verdadeiramente muito
bonita e com um corpo espetacular. Me recrimino novamente. Como posso
pensar algo assim nesse momento. Ainda mais de uma moça que deve ter a

mesma idade da minha sobrinha.


— Não precisa, não tenho ninguém para ligar — fala e logo em
seguida parece ter se arrependido de ter dito algo pessoal a um estranho.
Como alguém tão jovem como ela não tem ninguém?

— Entendi, achei que aquele era o seu namorado e que era uma briga
de casal.
— Não. Ele é só um babaca que conheci na faculdade e que, com o

passar do tempo, conseguiu piorar. Gary estava frustrado porque não


conseguiu o que queria de mim naquela época e viu que não conseguiria
espontaneamente nada de mim agora também. Odeio o álcool, ele muda as
pessoas.
— Parece que temos isso em comum. Sei bem como algumas pessoas

podem tomar decisões ruins sob o efeito do álcool. Mas o que aconteceu
com você? Veio para cá sozinha?
— Na verdade, eu tinha acabado de chegar no estacionamento e
estava ligando para a minha amiga. Descobri que ela não viria e estava indo

para casa quando ele me encontrou.


— Parece que hoje não é seu dia — falei, brincando.
— Meu dia até que começou muito bem, mas esse desfecho que não
foi dos melhores — disse, nitidamente sem graça e sem me olhar nos olhos.

— Não precisa ter pena de mim, são coisas que acontecem na vida,
infelizmente.
— Não sinto pena de você, Lila. Acredito que as pessoas mais fortes
são aquelas que conseguem se virar sozinha nesse mundo complicado. —

Ela me olhou com surpresa, como se fosse raro alguém falar isso para ela.
Olhei para o seu rosto, um ar angelical e tão calmo. Um olhar que me
prendeu, pela primeira vez depois de tanto tempo.
— Acho que deve ter enfrentado alguma situação em que sentiram

compaixão pelo senhor para entender tão bem o quão ruim esse tipo de
olhar é.
Algo em minha expressão deve ter mudado porque ela, de imediato,
ficou tensa e insegura.

— Quer dizer... Me desculpe, eu não devia ter... Eu nem o conheço.


Não sei por que disse isso.
Ela se mostrava novamente arrependida de ter sido tão sincera, mas,
depois de me recuperar da forma como aquelas palavras me agitaram, da

forma como ela conseguiu me ler com tanta facilidade, tentei tranquilizá-la.
— Está tudo bem, Lila. Não se preocupe. Você está certa, afinal.
Digamos que tive essa experiência. — O olhar da Abbie ao descobrir que
eu realmente estava impotente e estéril veio à minha mente. Foi ali que
percebi que meu casamento perfeito começava a ruir.

— Eu agradeço muito, Sr. Alec, pela ajuda e por cuidar de mim. Você
tem muitos machucados no rosto, vou pegar um kit de primeiros socorros
que vi no banheiro.
— Lila, não precis... — Ela não me deixou terminar e foi buscar o kit.

— Sente-se aqui e deixe-me ver o estrago.


— Lila, sério, não precisa disso. Eu estou bem. E eu insisto que me
chame apenas de Alec.
Ela assentiu com a cabeça, mas, ao olhar para minha mão direita

quando passei no queixo dolorido, ela levou as próprias mãos à boca, com a
expressão extremamente culpada.
— Meu Deus, olhe sua mão! Vamos começar com ela. — Eu falava,
mas ela não parecia me ouvir. Peguei suas mãos e a fiz olhar para mim.

— Lila, não precisa, de verdade. — No momento em que falei, senti


suas mãos tremendo e seus olhos estavam cheios de água.
— Por favor, Sr. Ale... Alec — se corrigiu. — Me deixe retribuir o
que fez por mim quando podia simplesmente ter ignorado e não ter se

envolvido em um problema que não era seu. Por favor, me deixe te ajudar.
  Aquele olhar, aquele pedido, aquela voz. Não sei descrever o que
senti exatamente, mas tudo aquilo me fez soltar sua mão e deixá-la fazer o
que quisesse.

Ela começou a limpar os meus ferimentos com uma delicadeza, como


se tivesse prática nisso. Fechei os olhos e senti seu toque suave e macio,
suas mãos roçando na minha pele, o cheiro do seu perfume floral que me
lembrava da estufa de flores que minha mãe cuidava, fui envolvido por ela.

Uma sensação desconhecida tomou meu corpo, algo que não vivencio há
muitos anos, algo que nunca mais pensei que vivenciaria.
Abri os olhos e vi os detalhes do seu rosto, o seu olhar preocupado,
seus lábios volumosos, sua pele de ébano, aquela mulher provocou uma
descarga elétrica nas minhas terminações nervosas e, por um curto espaço
de tempo, pensei ter sentido o meu membro reagir. Deve ter sido impressão
minha, mas aquilo me fez reagir, não pude me conter e levantei a mão para
tocar em seu rosto.

Eu toquei sua pele negra, ela reagiu como se tivesse ficado confusa,
mas permitiu o toque. Eu a olhava encantado por sua beleza, à medida que
acariciava seu rosto, senti sua respiração acelerar. Seu peito subia e descia
com o batimento cardíaco acelerado e foi uma missão manter o olhar longe

dos seus seios. Nesse momento, percebi o rumo que as coisas tomaram e
como aquilo poderia parecer para ela, que acabou de se traumatizar por
causa de um cara.
Realmente, não sei como ela conseguiu mexer tanto comigo. Há anos
eu não permito uma mulher se aproximar tanto, alguém cuidar de mim

dessa maneira. Lila não precisou se insinuar para mim, apelar para minha
libido sexual, caso eu tivesse alguma, para despertar sentimentos e
sensações em mim. Desconfortável e confuso com tudo, tento me distrair
com outros assuntos e pensar que ela deve ter a idade da Piper.

Ela parece estar mais calma agora, perto de terminar de tratar todos os
meus ferimentos. Ao final, uma reação que me surpreendeu. Lila acaricia
meu rosto, como se tivesse se despedindo ou agradecendo por algo. Aquela
carícia fez acelerar o meu coração, parecia que estava batendo pela primeira
vez de verdade, depois de muito tempo...
— Terminei — falou quase em um sussurro. Uma voz calma e
delicada, que seduz naturalmente. Demorou um tempo para desviar o olhar

do dela e, pelo jeito, ela também ficou mexida com tudo.


— Obrigada, Lila.
— Eu que agradeço por ter me salvado daqueles três idiotas cretinos.
Só Deus sabe o que aconteceria se não tivesse aparecido. Você tem uma

mancha de sangue na camisa, posso lavar e tentar tirar.


— Não precisa, tenho outra aqui. Só um minuto enquanto troco. —
Volto, abotoando a nova camisa, e ela está olhando em volta, como se
observasse agora o ambiente.

— Não seria melhor ir em uma emergência? Você se machucou feio e


brigou com três caras, pode ter feito algo pior.
— Não se preocupe, estou acostumado. Luto boxe desde os 12 anos.
— Coloquei um pequeno sorriso no rosto, se minha família me visse agora,

provavelmente diria que algo muito sério estava acontecendo, raramente


estou sorrindo para  algum estranho.
Essa mulher me intrigava. Foram cinco anos da minha vida sem
reação nenhuma do meu corpo, mas ela chegou com esse olhar inocente e
doce cuidando de mim e me despertou o que deixei no passado. Ela parecia
um anjo que caiu em minha vida. Perguntei algumas coisas sobre ela, sobre
o que fazia. Tentei descobrir mais do que o seu nome. Lila era bastante
reservada e me contou pouca coisa. Normal, as pessoas não costumam

contar sua vida para todos.


— Acho melhor eu ir embora, a noite já foi muito agitada e eu nem
entrei na boate.
— Você não chegou nem a entrar para conhecer? — Ela confirmou.
Peguei o cartão do clube e escrevi meu nome e meu número atrás. — Faço

questão que venha em outro momento e conheça o meu clube. Não quero
que fique com a impressão errada do lugar. Pode aparecer e mostrar o
cartão que será bem recebida ou pode me mandar uma mensagem que
libero sua entrada.

— Oh, meu Deus! — falou, colocando a mão na boca e mantendo um


olhar de surpresa.
— O que aconteceu? Algum problema?
— Só agora percebi que você é o dono daqui. Me desculpe, achei que

era o gerente. Sei que deve ser alguém importante, e eu agi de qualquer
jeito, mil desculpas.
— Nada disso, não se preocupe. Prefiro que as pessoas ajam
normalmente comigo, dinheiro não me faz melhor que ninguém. — Vi que

ela soltou um meio-sorriso, acho que gostou da minha resposta.


— Está certo. Muito obrigada por tudo, Alec. Espero que seus
ferimentos melhorem e que você não tenha um olho roxo amanhã. — Sorriu
novamente, meu coração acelerou. — Vou só chamar um Uber, acho que

alguém aceita corrida a essa hora para minha casa.


— Onde você mora?
— Eu moro no subúrbio, acho que é um lugar bem diferente do que
está acostumado. Não estou julgando, juro, apenas deduzi.

— Eu levo você em casa. É mais seguro do que entrar em um carro de


um estranho a essa hora. — Depois que falei, percebi a ironia da história, e
sorrimos.
— Ok, estou em uma situação parecida, mas você já me conhece há

algumas horas. — Ela me olhava como se decidisse se deveria aceitar ou


não, pesando a segurança com andar em um carro de um desconhecido. Por
fim, aceitou o meu pedido.
Passei o endereço para o meu motorista e a acompanhei até em casa.

Chegamos a um bairro simples, mas organizado. Paramos o carro em frente


ao seu condomínio e chegou a hora da despedida, algo curioso, pois eu me
vi sem querer dizer adeus.
— Boa noite, Lila. Espero que descanse bem e que o dia de amanhã
seja melhor que o de hoje.
— Mesmo tendo acontecido tudo aquilo, meu dia terminou bem,
porque conheci uma pessoa especial. Apesar das circunstâncias, eu gostei

muito de conhecer você, Alec. — Ela, então, me surpreendeu, veio até mim
e deixou um beijo em meu rosto como agradecimento por tudo. — Boa
noite para você também.
Desceu do carro e seguiu para casa, sem olhar para trás. Eu fiquei ali
um tempo, a vendo entrar no prédio e me peguei tocando o rosto bem no

lugar do seu beijo. Segui para casa com um sorriso no rosto e aquele anjo
em forma de mulher na mente. Ela não sairia tão fácil da minha cabeça.
Cheguei em casa e desci do carro, antes de entrar, olhei para a lua que,
sozinha, trazia luz para todas as sombras da noite. Minha mente comparou

instantaneamente.
— Apesar das circunstâncias, eu também gostei muito de conhecer
você, Lila.
 

Acordei repentinamente, com o coração acelerado e a respiração


ofegante. Senti meu corpo suado e a única coisa que pensava era que tudo

não passou de um pesadelo, graças a Deus. Levei um tempo para perceber

que estava no meu quarto, ainda desorientada  devido ao eu vivi enquanto


dormia. Olhei para a mesa de cabeceira e o relógio marcava 5h30 da manhã,

um horário terrível para se acordar em pleno domingo. Deitei-me

novamente na cama, a respiração já voltando ao normal, e senti os meus

braços doloridos. Observei melhor e percebi que o imbecil do Gary tinha


deixado marcas roxas no meu braço quando me apertou no estacionamento

da boate.

Precisaria repensar minha roupa de hoje, usar uma blusa de manga

longa que cobrisse as marcas. Eu ia passar o dia na casa dos Donovan,

cuidando da Piper, não queria que ela se preocupasse comigo. Ela ficaria
furiosa e isso a deixaria agitada, é melhor que tenha um bom descanso para

ficar bem logo.

— Já que estou acordada, vou aproveitar melhor o meu dia — falei

para dar coragem e me levantar da cama. Coloquei uma roupa de ginástica

confortável para andar de bike e me exercitar um pouco. Saí de casa às 6h


da manhã, o sol já estava começando a aquecer, mas o clima agradável era

irresistível. Fiz o caminho mais longo para pedalar bastante e tentar limpar

a mente.

O ritual de acordar cedo e pedalar ou caminhar até o parque e ter um

piquenique sozinha tornou-se minha rotina, seja para os dias calmos e

relaxantes, seja para os dias estressantes. Eu sempre fui a minha melhor

companhia, mas confesso que sentia falta de uma pessoa, de estar em um


relacionamento. Acho que essas coisas são normais e acontecem com o

tempo. Os sentimentos e os relacionamentos.

Eu gostava de morar no subúrbio. Pedalando agora, pelas ruas da

minha cidade, consigo perceber as pessoas abrindo seus negócios,


caminhando com a família e amigos, sorrindo. O inverno se aproxima e o

outono começa a se despedir, a temperatura já está entre 8 e 13 °C, o que,

para mim, é o paraíso. Saí de casa alguns minutos atrás e o meu humor já

melhorou bastante, embora ainda sinta aquele aperto no peito e a sensação

do ruim do que aconteceu.

Desci da minha bicicleta e caminhei um pouco com ela ao meu lado.


Cheguei em uma esquina, o cruzamento da Rua Castle com Lincoln

Avenue. Essa era a rua perfeita para o que sempre gostei de fazer quando

precisava de adrenalina no corpo, mesmo que, na última vez que eu fiz,

tenha sido na universidade. Ambos os casos foram por causa da raiva que

uma mesma pessoa me causou, Gary.

Olhei à minha volta e não se tinha trânsito, ainda. Os carros raramente

estavam passando, então precisava aproveitar o momento. Nunca contei o

que eu faço a ninguém, é algo um pouco perigoso e não quero que ninguém

se acidente, além de ser algo só meu. A rua era uma descida reta e, perto do

final, tinha uma área nivelada, o que era a minha deixa para assumir o
controle. Fui até o meio da pista, posicionei a bike e fechei os olhos

enquanto a embalei para frente. Quando vi que estava descendo, abri os

braços e apenas senti a adrenalina, o vento em meu rosto e a sensação de

não saber para onde se vai, o mistério de não se ter controle.


Isso era a melhor sensação do mundo para mim. A surpresa da vida,

onde você não controla as coisas, elas apenas acontecem.

Senti a área nivelada e abri os olhos, acionei os freios da bike. Foi aí


que o meu azar aconteceu. Eles até funcionaram, mas não aguentaram a

velocidade e a bike seguiu o final sem controle. Tive meus cinco minutos de

desespero até que consegui parar com o pé, não sem antes machucar o

calcanhar no pedal. Ainda bem que já estava quase parando, imagina se

tivesse um problema desses quando em alta velocidade? Eu precisava fazer

uma manutenção na minha bicicleta.

Algumas pessoas que passavam por ali me olharam preocupadas, mas

soltei um sorriso, e elas imaginaram que eu estava bem, seguiram suas

vidas e eu fui mancando para casa. Cheguei e me joguei no sofá para

recuperar meu fôlego, tinha pedalado para bem longe e não conseguia

voltar da mesma forma por conta do machucado. Tomei um pouco de água

e verifiquei o meu pé, não foi nada profundo, apenas uma pancada forte e

alguns arranhões.

Lembrete para mim mesma: ter mais cuidado na próxima vez.

Não seria por um arranhão que eu desistiria do meu hobby. Já me

sentia bem melhor. A adrenalina, o medo e o suspense me livraram

totalmente da sensação e do que me incomodava. Tomei um banho e limpei


o meu machucado. Fiz o meu café e, só em sentir o cheiro, sei que agora,

sim, meu dia começa perfeito.

Quem não gosta de café deveria repensar seus hábitos. Café é vida.

Agora que estava mais relaxada, sentei-me no sofá com a minha

caneca de Friends, presente dos trigêmeos, que tinha escrito “How you

doin’?” Frase emblemática da série, eles amavam me fazer lembrar sempre

dos três.

 Aproveitei o momento para trocar de bolsa, tirar as coisas da bolsa da

festa e passar para a que eu sairia hoje. Nessa troca, encontrei o cartão do

Alec e, automaticamente, o cheiro do seu perfume e o seu toque vieram à


minha mente, como se aquela sensação tivesse ficado registrada em minha

pele e no meu olfato.

Era inegável a sua beleza. Um homem de terno já ganha certa

elegância, mas  Alec exala uma imponência e uma elegância intrínsecas em

sua personalidade. A educação era visível em como se portava e na forma

de falar. Não sou fã de homens que aparecem no último momento para

salvar a donzela, como um príncipe no cavalo branco (no caso dele, um

Jaguar), mas não posso ser hipócrita e não agradecer ao destino por ele estar

no lugar certo e na hora certa.

Ele tinha uma pele branca, de quem não se expõe muito ao sol,

provavelmente vive no escritório. Olhos azuis, cabelo castanho-claros,


parecia ter 1,90 m de altura, pela minha dedução, com certeza era muito

alto. Quando cheguei perto para tratar seus ferimentos, percebi que seu

corpo completava o terno perfeitamente, não se tinha áreas folgadas, devia

ser feito sob medida. Suas mãos eram ásperas, o que destoou bastante do

porte de homem rico e elegante, acredito ser por causa do boxe que ele luta

desde jovem.

Às vezes me pergunto que superpoder é esse que nós, mulheres,

temos de fazer um raio-X completo de alguém só em olhar por algum

tempo, mas sempre fui assim, e amo isso. Sempre fugi dos famosos

“héteros tops”, aqueles que se acham machões gostosos e que todas as

mulheres devem cair aos seus pés e, quando vem com dinheiro, é ainda

pior.

À primeira vista, Alec se encaixaria totalmente nesse padrão, mas a

minha intuição não ligou o alarme de fuga em momento algum. Sua altura

não me intimidou e a vozinha dentro de mim insinuou que ele parece ter

uma boa índole, um homem de bom caráter e que somente queria saber se

eu estava bem e segura. Algo muito raro de acontecer, confiar assim em um

estranho. Minha mente retornou direto no momento em que nossos olhos se


encontraram e uma sensação de conforto e acolhimento me tomou, como se

eu pudesse ser eu mesma, sem julgamentos.


Fui puxada para a realidade com o toque do meu celular indicando

que uma mensagem chegou. Guardei o seu cartão em minha carteira e vi

que era Piper perguntando se eu iria hoje visitá-la, confirmando se o nosso

almoço estava de pé. Respondi confirmando e corri para me arrumar, pois já

estava atrasada. Levei 30 minutos para me arrumar e, dessa vez, iria de

carro, para facilitar a volta. Não poderia chegar muito tarde, amanhã

começava no novo trabalho e queria ter uma boa noite de sono para

despertar no melhor dia da minha vida.


Peguei um pouco de trânsito no caminho, mas consegui chegar antes

do meio-dia. Desci do carro e percebi que não conseguiria esconder bem o


machucado, dirigindo, forcei um pouco e agora doía bastante se colocasse o

pé inteiro no chão. Disfarcei o que eu pude e segui para a entrada, Maria


abriu a porta para mim e me deu aquele abraço gigante.

— Piper estava perguntando toda hora se você chegou. Está com peso
na consciência por não ter saído com você ontem.

— Ela sempre faz isso. Está descansando no quarto?


— Está, sim, pode subir— Olhei em volta, e não vi mais ninguém.

— Onde estão os outros?


— O Sr. Carson está no escritório e os meninos estão jogando lá por
cima. Acho que vai encontrá-los por lá também. — Agradeci e subi as

escadas. De cara, ouvi os gritos dos trigêmeos e fui logo falar com eles.
Estavam no quarto do Joey, jogando alguma coisa, mas a voz do Chandler
era a que mais se sobressaia.

— Por que, todas as vezes, você resolve pegar o caminho errado? A


gente joga isso há meses e sempre é a mesma coisa.

— Gosto de mudar o caminho. Esse negócio de fazer porque tem que


fazer é horrível.

— Isso é um jogo, Joey, não é a vida. Aqui, precisamos seguir o


caminho para passar de nível. — Eu cheguei mais perto da porta, e eles
estavam tão empolgados que nem me ouviram chegar. Fiquei observando

aquela cena com um sorriso no rosto, sempre foram assim a vida toda e isso
que era o melhor. Discutiam o tempo todo, mas matavam e morriam um

pelo outro. É o verdadeiro significado de família.


— Ainda bem que você chegou, não aguentava mais Piper estressada

no quarto. — Me assustei quando ouvi uma voz perto de mim. Me


aproximei tão entretida que não percebi o Ross sentado perto da porta e

lendo um livro. Só ele para ter uma concentração dessas junto dessa
gritaria.

— Ross, nem te vi aí. — O abracei e dei um beijo em seu rosto, não


sem antes bagunçar o seu cabelo, num cafuné carinhoso. — Vejo que ainda

está lendo aquele livro, o que está achando até agora?


— Confesso que não é nada do que pensei e a cada hora mudo de
ideia quanto aos personagens, o tipo de livro que eu gosto. Esse vai entrar

para a minha lista de favoritos se continuar assim até o final.


— Acredite, só melhora. — Os outros dois ouviram a minha voz e

tiraram a vista do jogo por um minuto.


— Lila! Não ouvimos você chegar.

— Impossível ouvirem com a empolgação de vocês nesse jogo.


— Senta-se aqui e toma o lugar do Joey, você deve ser melhor que ele

jogando. — Joey o empurrou e começaram a implicar um com o outro,


saudavelmente.

— Desculpem, meninos. Preciso ver a sua irmã, mas obrigada pelo


convite, depois jogo com vocês. — Me despedi do Ross e fui para o quarto

da Piper. Bati na porta e a ouvi  falando para entrar. Estava deitada na cama,
com uma cara emburrada, mas mudou totalmente quando me viu.

— Finalmente você chegou! Me salva desse martírio de vida, ficar


trancada em casa em pleno fim de semana é o inferno.
— Olá para você também, Srta. Catapora. Vejo que ela não atingiu

seu rosto, sortuda.


— Até a catapora sabe os seus limites, não se deve nunca atingir a

minha beleza. — Sorrimos um pouco. — E você? Como foi ontem? Me


desculpa, amiga. Juro que, se soubesse disso, teria cancelado antes que
fosse para a boate. Por que está de camisa de manga longa com esse sol?

Achei que gostasse de frio e a temperatura está confortável?


— Calma! Uma pergunta de cada vez. Tive vontade de vestir essa

blusa, fazia tempo que não usava e já estou no clima de inverno, minha
estação favorita. — Tudo para esconder dela as marcas de ontem. — E eu

entendo sobre ontem, você não tinha como saber. Só quero que descanse e
não se preocupe com nada.
— Cansei de descansar, me conta como foi ontem. Voltou para casa,

não, né?
— Com certeza, voltei. Você sabe que não gosto de ir para lugares

assim sozinha, mas, antes de voltar, conheci uma pessoa muito interessante.
— Contei a ela sobre o encontro que tive com Alec e que ele tinha se

machucado em algum lugar e o ajudei com os ferimentos. Tinha que


inventar algo para não levantar suspeitas, duvido que ela vá conhecê-lo.

— Você sabe quem é ele?


— Só descobri no final. Ele tinha me dito o nome, mas eu não sabia

que era dono da boate. O nome dele é Alec, sem sobrenomes. Me deu um
cartão para voltar outro dia e conhecer o lugar melhor, podemos ir juntas.

Percebi que o olhar da Piper mudou um pouco. Ela foi de curiosa para
espantada, como se não imaginasse que algo pudesse acontecer. Será que

ela achou estranho eu ter conhecido o dono do lugar?


— Piper, você conhece o Alec? Seu olhar mudou quando falei o nome

dele e que era o dono. Não vai me dizer que você e ele estão ficando? — Na
mesma hora, ela substituiu o olhar por um sorriso de disfarce.

— Nada disso, Deus me livre. Nem se preocupe, não temos nada, só


achei interessante como alguém tão calada e que foge de homens foi

conhecer justamente o dono do lugar. Engraçado o destino, não é? — Algo


estava estranho, devia ser coisa da minha cabeça. — Vamos almoçar? Estou

com um pouco de fome e tenho que aproveitar esses momentos.


Descemos e Maria chamou os meninos para o almoço, depois que

colocou a mesa. Todos apareceram e cumprimentei o Sr. Carson, que estava


com o telefone o tempo todo, acho que hoje era um dos dias em que o seu

trabalho estava complicado. Ele desligou e sentou-se à mesa.


— Lila, me desculpe por não falar com você quando chegou. Eu nem

a vi, na verdade. Hoje, o meu trabalho está complicado e estou tentando


segurar para ficar em casa cuidando da Piper, já que os meninos precisarão
sair hoje para resolver algumas coisas.

— Eu entendo essa correria, Sr. Carson. Não se preocupe. Se precisar


que eu fique aqui até que volte do trabalho, posso ficar.

— Agradeço bastante. Vamos comer antes que a fome da enferma


passe.
A comida da Maria estava deliciosa como sempre. Hoje seria sua
folga, mas ela ficou até o almoço para ajudar com Piper, pois a tinha

praticamente como filha. Depois de colocar a mesa, Maria se despediu e foi


embora, deixando comida na geladeira para o jantar.
— Achei que o tio viria almoçar hoje com a gente, papai. Aconteceu

algo?
— Ele me disse que se atrasaria. Acordou um pouco tarde depois de

ontem, mas virá sim, sabe como você é o xodó dele e ele está muito
preocupado com a sua doença. — Parece que ontem foi um dia corrido para

todo mundo, pelo que percebo.


Terminamos o almoço e estávamos comendo a sobremesa quando a

campainha tocou.
— Acho que o seu tio chegou. Vou atender a porta. — Sr. Carson se

levantou.
Piper me olhou na mesma hora com um sorriso no rosto. Conheço

aquele sorriso, ela estava aprontando algo. A olhei como se estivesse


perguntando o que aconteceu, e ela simplesmente continuou comendo a

sobremesa e sorrindo.
Uma voz ecoou pela sala, não uma voz qualquer, AQUELA voz. Na

mesma hora, olhei para a Piper e seu sorriso foi ainda maior, como se
dissesse que era isso que ela escondia.
Olhei para trás e foi justamente no mesmo momento em que ele
entrava na sala de jantar com um vinho na mão, com um sorriso lindo no

rosto enquanto conversava com o irmão e falava do vinho. Quando se virou


para a mesa e me viu, nossos olhares de espanto, surpresa e confusão se

encontraram. Nenhum dos dois esperava aquilo. Olhei novamente para a


Piper, ela sabia o tempo todo que o tio era o dono da boate, e não me disse

nada. Seu olhar e seu sorriso permaneciam, como se fosse uma criança
aprontando algo. Saboreando sua sobremesa, ela simplesmente soltou.

— Engraçado o destino, não é?


 

Acordei e não tive noção de que horas eram.


Depois que deixei Lila em casa, voltei para o Club Miami Beach,

precisava fazer o meu discurso de inauguração ainda, mesmo que tenha


sentido, o caminho todo de volta, uma imensa vontade de passar a noite
toda com ela, apenas conversando e sentindo o seu toque.
Confesso que isso me assustou um pouco. Fazia tempo que não sentia

nada assim por uma mulher, muito menos por alguém que acabei de
conhecer e que aparentava ser muito nova, acredito que na faixa da minha
sobrinha, a Piper.

Encostei na cabeceira da cama, ainda deitado, e o cheiro dela estava


preso em meu corpo. Tive um sonho extremamente vívido, como se ela
tivesse vindo aqui para casa, tomado um vinho e passado a noite comigo, e
não me refiro a deitar na cama e dormir. Olhei para o meu braço, só em
lembrar da gente transando no meu sonho, do seu toque e do seu cheiro,

meu corpo se arrepiava.


— O que você fez comigo, Lila? — Um sorriso tomou conta dos
meus lábios. Estava perdido em pensamentos quando ouvi o toque do meu
celular. Joguei as cobertas para longe e peguei o controle da Alexa, minha

casa inteira era controlada por ela. Uma das comodidades da tecnologia
com a certeza de que tudo era seguro, graças à minha empresa. Eu precisava
ser o meu primeiro cliente para testar todas as novidades.
A cortina abriu e um sol forte entrou pelas frestas da janela. Estranho,

tão cedo e o sol tão forte, será que era uma onda de calor? Nos fins de
semana, sempre costumava desligar o relógio e deixar o celular na sala,
para ter uma boa noite de sono sem interrupções, mas não costumo acordar
tarde porque o meu sono é agitado ou perturbado por certos pesadelos do

meu passado.
Fui até a sala e ainda vi a tela acesa, segundos antes da ligação cair.
Não acreditei quando vi a hora, já passava do meio-dia e tinha várias

chamadas do Carson e dos meninos. Corri para me arrumar, coloquei uma


roupa leve e esportiva, e deixei a cafeteira cuidando do meu café. Tomei
uma ducha rápida, me vesti e coloquei o café em um copo para viagem.
Café preto, com notas sensoriais de maracujá e caramelo, sem adição

de açúcar ou qualquer outro adoçante. Achava um pecado quem enchia o


café com essas coisas. Para mim, essa bebida precisava ser saboreada em
cada detalhe. Peguei um vinho em minha adega, seria meu presente de
desculpas pelo atraso, e saí de casa. Meu motorista já estava à minha

espera.
— Boa tarde, Fernando. Me desculpe por lhe fazer esperar tanto.
— Boa tarde, Sr. Donovan. Cheguei eram 9h da manhã e não lhe vi,
estranhei porque o senhor sempre é pontual, mas, como não desmarcou o
compromisso, resolvi esperar. Está tudo bem?

— Está sim. Eu perdi a hora como não acontecia há tempos. —


Fernando ligou o carro e seguimos caminho enquanto conversávamos. Ele
estava comigo desde o meu casamento com Abbie, passou a fazer parte da
família também e era uma das pessoas que eu tinha um grande apreço. Ele

tinha 62 anos e sempre procurava cuidar de mim e da minha saúde. Um dos


poucos que conhecia toda a minha história e em quem eu confiava.
— Eu imaginei que algo assim pudesse acontecer. Saímos da boate

um pouco tarde, depois de um dia cansativo que você teve, o corpo pediu o
descanso merecido. Tente relaxar um pouco hoje, divirta-se com a família.
— Pode deixar que vou tentar, sim. Aumenta um pouco mais a rádio,
por favor, quero ouvir as notícias das oscilações do mercado. — Fernando
sorriu e subiu o volume.

— O homem sai da empresa, mas o empresário não sai do homem. —


Sorri com aquela afirmação enquanto tomava o meu café. Era verdade, eu
vivia para o trabalho e ele tornou-se minha esposa, por assim dizer. Mesmo
que  certa morena ainda me intrigue e não saia dos meus pensamentos.

Cheguei na mansão às 13h horas. Todos deveriam ter almoçado já,


preciso ter um pouco mais de atenção com a minha família. Perdi o jantar
de Ação de Graças e agora o almoço de domingo, vou priorizar mais isso.
Agora que a boate foi inaugurada, as coisas voltariam para o seu eixo. A

paz de sempre.
Algo me dizia que a vida tinha outros planos.
Toquei a campainha, e  Carson veio até atender a porta, acho que era
a folga da Maria.

— Achei que não viria hoje. Estava preparando o meu discurso de


irmão revoltado, pronto para tirar o seu nome da linhagem da família. —
Nós dois sorrimos enquanto eu o puxava para um abraço. Sempre fomos

assim, brincalhões um com o outro.


— Desculpe-me, mano. Ontem foi muito agitado e não costumo
colocar despertador nos fins de semana, até porque acordo normalmente,
mas hoje foi uma grande exceção. Nem sei quando foi que eu perdi a hora.

— Então está perdoado. Uma boa noite de sono sempre deve ser
apreciada. Você comeu alguma coisa? Maria deixou comida pronta, basta
descongelar.
— Comi nada ainda, mas trouxe um vinho para compensar a minha

mancada.
— Então vai para a mesa que as meninas estão lá, vou levar o vinho
para a cozinha. — Meninas? Achei que seria apenas a família hoje. Deve
ser alguma amiga da Piper.
No exato momento em que eu entrei na sala de jantar, o perfume que

me perseguiu nos sonhos ganhou vida. Achei que estava imaginando coisas,
mas não era a minha imaginação. Eu ainda estava com o vinho em mãos
quando ela se virou com um olhar de espanto, surpresa e confusão, o
mesmo olhar que o meu. Eu nunca imaginei que reencontraria Lila, muito

menos na casa da minha própria família.


Do mesmo jeito que ela me olhou, ela se virou rapidamente para 
Piper, que soltou um sorriso por algum motivo. Não entendi nada, olhei
para  Carson, que via algo no telefone.

— Carson, quem é a moça na sala?


— Ah, me esqueci que vocês ainda não se conhecem, nem sei como
nunca se viram, Lila sempre está por aqui desde que  Piper foi para a
universidade. Acabou tornando-se da família. Deixa-me te apresentar. —

Carson passou por mim e foi direto para perto da Lila. — Lila, esse é o tio
da Piper, Alec Donovan. É o que viria para o jantar de Ação de Graças e
teve uma emergência.
Estávamos agora em um impasse. Ou fingíamos que nunca tínhamos

nos visto ou falávamos que nos conhecemos na boate. Eu escolheria a


primeira opção, mas fiquei receoso de magoá-la de alguma forma agindo
assim, ela foi mais rápida.
— Boa tarde, Sr. Donovan. Meu nome é Camilla Harrison, mas todos

me chamam de Lila. Prazer em lhe conhecer. — Ela estendeu a mão para


mim e agiu como se me visse pela primeira vez.
— Boa tarde, Srta. Harrison. É um prazer lhe conhecer. — Ficamos
olhando um para o outro, apreciando essa feliz coincidência, mas percebi

que precisávamos agir normalmente para ninguém desconfiar. Larguei sua


mão e comecei a conversar com o Carson enquanto seguíamos para a
cozinha.
Desde o momento em que a vi, meu coração acelerou e até agora
ainda batia rapidamente. Essa mulher possui uma chama que me consumia
com o seu olhar, e eu ficava hipnotizado por essa sensação, embora ela não
pareça se dar conta disso. Da sua beleza e do seu poder.

Elas trouxeram os pratos da mesa, e Lila começou a lavar tudo,


ouvindo os protestos da Piper.
— Piper, eu vou lavar. Você está doente e devia estar de cama agora.
— Eu só vou aceitar porque estou me sentindo fraca mesmo. — Piper

puxou uma cadeira e se sentou. — Depois que terminar aí, vamos lá para o
quarto, vou deitar-me um pouco.
Eu tentava disfarçar e a olhava pelo canto do olho ou quando alguém
não estava vendo, ela parecia concentrada na função de lavar pratos e
evitava o meu olhar a qualquer custo. Se fosse qualquer outra mulher, eu

não insistiria e seguiria minha vida, como sempre, mas a Lila, eu não
deixaria escapar. Precisava entender tudo o que ela me causava, o que me
fazia sentir.
Carson teve uma chamada que precisou atender e seguiu para o

escritório. Piper e Lila subiram para o quarto, e eu fui comer algo. Os


trigêmeos desceram pouco tempo depois e me cumprimentaram,
conversamos um pouco e eu os observei lembrando de como eram
pequenos, agora estão crescidos, cada um com o seu trabalho e sua vida.
Carson ia e vinha do escritório, devia estar resolvendo alguma bronca do
trabalho.
Saboreei meu vinho e meu almoço enquanto as horas passavam. Os
trigêmeos, no fim da tarde, desceram e disseram que precisavam ir embora

para resolver algumas coisas. Não vi mais a Lila durante a tarde, acho que
ficou cuidando da Piper, catapora é horrível em qualquer idade.
Eram 18h  quando o Carson interrompeu nossa conversa para mais
um telefonema, pedindo desculpas em silêncio. Depois disso, voltou do

escritório vestido com o terno e com a maleta na mão.


— Vai a algum lugar?
— Infelizmente, hoje é a minha emergência de trabalho. Um amigo
senador está com problemas, tentei ajudar pelo telefone, mas não teve jeito.

Precisarei encontrá-lo.
— Se precisar de alguém para ficar com  Piper, posso passar a noite
aqui com ela.
— Nossa, nem tenho como te agradecer, Alec. Vou me despedir da

minha filha. — Ele subiu e, pouco tempo depois, desceu com  Lila. Acho
que ela iria embora também.
— Piper estava apagada por conta dos remédios, não gostaria de
deixar minha filha assim, mas agradeço bastante aos dois por ficarem para
cuidar dela. — Meu cérebro levou uns três segundos para processar a
informação, foi o tempo  que o Carson abria a porta.
— Calma, espera. Como assim os dois?

— Lila se ofereceu para ficar e cuidar da Piper antes que eu falasse


algo, achei muito boa a ideia. Assim, ninguém fica sobrecarregado e podem
intercalar os turnos. Qualquer coisa, me liguem. Lila, fique à vontade, você
conhece tudo. Mano, espero que, na próxima, tenhamos mais tempo para
conversar. Boa noite, gente, e agradeço novamente.

Carson saiu e deixou duas pessoas congeladas, olhando para a porta.


 

Olhei para a Lila, e ela tinha o mesmo olhar de incredulidade, resolvi

puxar o assunto.

— Então seremos apenas nós dois, durante toda a noite. — Ela saiu
do transe rapidamente.

— Sim, verdade, mas não se preocupe comigo. Vou ficar no quarto da

Piper.
— Eu vou ficar por aqui, se precisar de algo, só chamar. — Ela

assentiu e subiu. Duas horas depois, Lila não saía da minha cabeça. Abri o
vinho e estava na minha segunda taça, mas o cheiro das uvas não conseguiu

apagar o seu perfume. Resolvi ver como as duas estavam.

Subi a escada e estava tudo no mais perfeito silêncio. Bati duas vezes

na porta e entrei. Piper estava deitada e dormindo, os remédios a apagaram

totalmente. Ouvi um barulho de água do banheiro, era  Lila. Em cima de


uma cadeira, vi um caderno de desenhos, estranhei porque  Piper não

desenha. Correndo o risco de estar fuçando a vida alheia, abri o caderno e

minha curiosidade me consumiu.

Ela tinha talento. Inúmeros desenhos de lugares, pessoas e

constelações. Fui folheando até que um deles me prendeu a atenção, era um


esboço de uma pessoa que se parecia muito comigo. A ouvi abrindo a porta

e coloquei o caderno no lugar. Ela saiu do banheiro e ficou surpresa ao me

ver. Fez um sinal para que saíssemos do quarto.

— Precisa de algo, Sr. Donovan?

— Não, Lila. Apenas vim ver como estavam e não precisa me chamar

de senhor, lembra? — Não sei se foi impressão, mas ela pareceu enrubescer

um pouco com a menção do nosso encontro.


— Sim, me desculpe, Alec.

— Bem, vejo que a minha sobrinha está dormindo no momento. Que

tal conversarmos um pouco e entendermos essa reviravolta da vida? —


Senti que ela tinha dúvidas, olhou para o quarto como se pensasse duas

vezes e, por fim, assentiu.

— Você chegou a ver os meninos saírem? Estavam jogando

videogame tão animados. —  puxou assunto, um bom começo.

— Sim, se despediram de mim na saída. Lá fora, eles parecem tão

adultos e sérios, cada um em sua área, mas parece que essa porta tem a
magia de Peter Pan. Basta que entrem nessa casa e se transformam em

crianças que implicam uma com a outra. Me lembra muito como eu era com

os meus irmãos. — A nostalgia me atingiu em cheio e soltei um sorriso, me

lembrando das brincadeiras entre o Carson, o Michael e eu.

— Incrível isso, não é? Sempre os vejo brincando tanto. Percebo,

então, que isso é de família, entrar pela porta e voltar no tempo.

— Pois é, queria que fosse assim sempre. Infelizmente, só

percebemos que um momento é perfeito depois que ele passa. — Do

mesmo jeito que a nostalgia me fazia sorrir, me fazia também sentir  certa

tristeza por não poder ter mais todos juntos.


— Gosto bastante de todos, me acolheram como alguém da família e

isso, para alguns, é muita coisa.

— Sua família é de onde, Lila? — perguntei enquanto íamos para a

cozinha. Precisava jantar alguma coisa para não deixar o vinho subir à

cabeça. Já sentia o corpo esquentar e não sabia se era o vinho ou  Lila.
— Minnesota. Eu fiquei por lá até passar na universidade e depois

segui a vida.

— Entendi. Tem contato com eles? — Senti que era um assunto um


pouco delicado, porque ela suspirou um pouco para falar.

— Um pouco. Quer jantar? Maria sempre deixa algo, vou descongelar

para a gente e para a Piper. — Ela tentou fugir do assunto e, na pressa para

se movimentar, se desequilibrou. Eu a segurei a tempo, mas, quando segurei

seu braço, a vi fazendo uma careta de dor. Não entendi na hora até me

lembrar de ontem. A levantei e subi a manga da sua blusa, a marca roxa na

forma de dedos me fez trincar os dentes. Se tinha algo que eu mais odiava

na vida, eram homens covardes, e aquele cara do estacionamento foi um

deles. Lila puxou o braço e cobriu com a manga.

— Isso foi de ontem, não foi? E, se estou certo, você está usando uma

blusa de manga comprida nesse calor para esconder da Piper. Você tem algo

com aquele cara?

— Deus me livre. Ele é um idiota que eu e  Piper conhecemos na

universidade e que acha que pode fazer o que quiser com quem bem

entende, porque se esconde atrás do dinheiro do pai para passar por cima

das pessoas. Por favor, não conte nada a Piper, ela está doente e ficaria

furiosa se soubesse disso. Se culparia ainda mais por não ter ido.
— Então era ela que você iria encontrar. Pelo jeito, íamos nos

conhecer de qualquer forma. — Sorri com a constatação, e ela abriu um dos

sorrisos mais delicados e inocentes que eu já vi. A tensão sexual entre nós

pairou no ar, do mesmo jeito que aconteceu na boate. Não vou mentir,

minha vontade era de agarrá-la ali mesmo e testar até onde meu corpo

respondia, mas não podia fazer isso. Eu queria apenas sexo, queria que o

meu membro reagisse, somente isso.

Depois de um tempo, ela começou a descongelar e preparar as coisas.

Conversamos um pouco e trocamos olhares, tentávamos nos manter

distantes, mas parecia que um ímã nos atraia. Sentamo-nos na mesa de


jantar e  ofereci vinho a ela, que prontamente me disse que não bebia, como

se o álcool fosse um veneno.

— Não bebe porque não gosta ou por outros motivos? — Sempre fui

curioso.

— Outros motivos. Nunca parei para saborear, mas o álcool não me

traz boas recordações.

— Então, vamos fazer o seguinte: Te convido a ir a minha casa para

jantarmos, lá vou te apresentar a bebidas que valem a pena saborear, não

para embriagar, saborear.

— Não sei, Alec. Vamos deixar o mundo decidir. — Eu sentia que ela

tinha medo de misturar as coisas e magoar alguém da família. Pelo respeito


que tinha por nós. Eu fiquei feliz por ver toda a cumplicidade e cuidado

dela com  Piper. Quando terminou de preparar a comida, subiu para levar

uma sopa para a amiga,  gostava de saber que minha sobrinha tinha alguém

assim do lado dela, mas não iria desistir de jeito nenhum.

— Você tem compromisso amanhã? Posso te deixar onde precisa

estar.

— Amanhã começo em um emprego novo e preciso estar cedo na

empresa, mas tenho que passar em casa antes para trocar de roupa. Se puder

me deixar em casa, eu agradeço. De lá, pego o meu carro e vou para o

trabalho. Pode ser?

— Com certeza. Se precisar de carona também, só avisar. Fernando,

meu motorista, pode te esperar lá enquanto se arruma.

— Não, basta me deixar em casa, já é muita gentileza sua. Agora me

fale, como foi a inauguração da boate?

— Para mim, já se transformou em algo normal. Já inaugurei algumas

e é quase um protocolo, precisaria de outros olhos para me dizer o que acha

das coisas.

— Se o convite para visitar a boate estiver de pé, te digo o que achei


quando visitar — Lila falou e, logo depois, percebeu que marcou algo para

continuar o contato. Soltei um sorriso de satisfação, ela também queria me

ver.
— Ótimo, me avisa quando for. Peço para deixarem tudo pronto e te

apresentarem o lugar. — Ela assentiu. Terminamos de jantar e seguimos

para a sala. Conversamos um pouco mais sobre a universidade, sobre como

foi dividir o quarto com a Piper e sobre a diferença de clima de Minnesota

para a Flórida.

— Nossa! Até hoje não me acostumei totalmente. Quando começa o

calor, fico louca. O meu maior problema são as ondas de calor, lembro que

quase desmaiei na última. Nem sei como vocês aguentam tudo isso. — A
conversa era tão leve e normal que eu ficaria ali a noite toda.

— É costume. Eu não me daria bem em um lugar tão frio assim. Já


viajei para muitos lugares frios, mas voltei correndo assim que pude. — O

relógio apitou, avisando que era meia-noite.


— Adorei nossa conversa, Alec, mas preciso dormir para acordar

cedo amanhã.
— Também gostei bastante da nossa conversa. — Me aproximei mais

dela e peguei sua mão. — Lila, geralmente não costumo ser tão direto e
falar certas coisas, mas, com você, senti uma conexão diferente, como se

pudéssemos conversar naturalmente. Gostei muito de te conhecer e te achei


incrível. Sei que é bem mais nova que eu e não quero te desrespeitar de
forma alguma, mas quero jantar com você na minha casa para 

continuarmos a conversar de forma tão leve assim.


Seu olhar tinha dúvidas. Levantei a mão e toquei em seu rosto da
mesma forma que fez no meu, ela fechou os olhos assim que minha mão a

tocou. Sua pele parecia veludo ao meu toque e aquela era a resposta que eu
queria.

— Você também deve ter percebido que existe uma atração entre nós
dois, não adianta negar, somos adultos. Sinto que você tem receio por eu ser

um Donovan.
— Não é por ser um Donovan, mas amo muito essa família, carrego
todos em meu coração e não gostaria que as minhas ações magoassem a

todos.
— Então faremos assim: você aceita o convite para jantar comigo e

finge que sou apenas o Alec da boate, aquele que conheceu antes de ser um
Donovan. O que acha?

Ela me olhava fixamente, e eu me perdia nas profundezas desse olhar.


— Certo, Alec. Podemos jantar juntos se você prometer que não vai

passar nenhum limite. Estou te dando um voto de confiança por causa de


todos e por não ser hipócrita e negar que senti atração por você, mas é

somente por isso. — Uma vitória, finalmente.


— Eu agradeço. — Levantamos do sofá e nos abraçamos, quando me

afastei um pouco, vi que nossas bocas ficaram próximas e eu poderia beijá-


la ali mesmo, sem nenhum pudor, mas queria ganhar sua confiança. Me
aproximei do seu ouvido e sussurrei. — Boa noite, Lila. Até amanhã.

E me afastei. Juro que, quando nos abraçamos, senti uma reação do


meu membro, como se ele quisesse ficar ereto, e isso era o combustível que

eu precisava. Eu não vou deixar você fugir, Lila.


No outro dia,  Fernando a deixou em casa e entregou o meu endereço

com o dia e a hora do nosso jantar. Seria no próximo fim de semana.


Depois, ele voltou e me levou para a empresa, hoje seria o dia em que a

nova equipe de desenvolvedores começaria. Eu precisava desse trabalho


pronto, de algo inovador, e estava confiando nos novos talentos. Meu lado

empresário assumiu.
Tomei o meu café olhando a vista da minha sala. De lá, eu conseguia

ver toda a minha operação. Algumas pessoas amam paisagens, eu amo ver o
que eu construí. A secretária interfonou e avisou que a nova equipe me

aguardava. Ajeitei a gravata e desci para cumprimentá-los. Não precisei ir


muito longe. Na escada, vi aquele cabelo preto, liso e comprido, aquela pele
de ébano e aquele sorriso que eu decorei da noite anterior.

— Não pode ser! — Fiquei parado na metade da escada, imaginando


se o destino acordou e resolveu tirar o tédio mexendo com a minha vida.

 
 

Me despedi do Fernando e entrei em casa normalmente, mas, por

dentro, o meu coração estava acelerado, palpitando com as lembranças da


noite de ontem. Conto nos dedos de uma única mão minhas experiências

com o sexo oposto, e Alec conseguiu abalar minhas estruturas sem fazer
absolutamente nada, apenas sendo ele mesmo.

No momento em que pegou minha mão, tive que me segurar para não
deixar as emoções me denunciarem. Nos dias de hoje, é praticamente

impossível uma mulher, perto de fazer 23 anos, ser virgem, e isso é algo que
não me preocupa, prefiro esperar que alguém verdadeiro apareça para
ganhar meu coração, alguém que me desperte aquele fogo que a Piper tanto

me fala.
Nunca levei em conta que essa pessoa poderia ser um Donovan.

— Lila, coloca a cabeça no lugar! Você acabou de conhecê-lo e tenho


certeza de que um homem desses não espera uma mulher virgem. Espera

alguém com experiência suficiente para o enlouquecer na cama.


Meu celular vibrou com uma mensagem do Ross.

“Boa sorte no novo trabalho! Você é supertalentosa e merece ter o seu


talento reconhecido. Vai dar tudo certo, estamos torcendo por você. Quebre
a perna.

P.S.: Como eu te conheço, sei que deve estar se perguntando como sei
disso. Foi a Piper quem contou para a gente.”

Sorri com aquela mensagem. Ross sempre sabe como melhorar o meu
humor. Respirei fundo e foquei no hoje, o meu grande dia. Olhei para o

relógio e já estava um pouco atrasada, o trânsito era terrível a essa hora.


Corri para me arrumar, coloquei uma roupa social, não sabia qual era o tipo

de vestimenta, tomei meu café e segui para a empresa. Estacionei o carro


próximo do prédio e fui direto para a recepção.

— Bom dia, sou uma funcionária nova aqui e estou um pouco


perdida. Pode me ajudar? Devo encontrar a equipe nova de

desenvolvimento de software.
— Bom dia, senhorita. Preciso dos seus documentos para liberar seu

acesso. Suas credenciais devem estar prontas com o seu supervisor. Possui
carro?
— Tenho, sim, estacionei aqui perto.

— A partir de amanhã, pode entrar no estacionamento da empresa, o


seu crachá liberará o acesso. Pode seguir para o 8º andar, Srta. Harrison.

Seja bem-vinda à Secret Digital Security. — Agradeci à recepcionista e


segui para o elevador. Não vou mentir, estava ansiosa e com medo do que

me esperava.
Depois de anos sem conseguir trabalho na área, me questionei se
realmente ainda sabia fazer o meu trabalho. Espantei esse medo para longe

e tentei controlar a ansiedade, precisava mostrar que tenho talento suficiente


para estar aqui. O elevador abriu as portas e fui tomada por um grande
burburinho, no centro da operação, tinha em torno de 20 pessoas

conversando em pé, como se esperassem por algo.


Fiquei sem saber o que fazer, perdida entre aquelas pessoas. Enquanto

eu observava todos, alguém falou atrás de mim.


— Observar as pessoas é um vício que também tenho. — Tomei um

susto e vi que tinha um rapaz atrás de mim, superestiloso,  destoando de


todos ao redor de uma forma positiva.

— Eu não estava observando, na verdade. Acabei de chegar, e não


soube para onde ir.

— Não precisa se preocupar, bonequinha. Somos duas mulheres


lindas e observadoras, também não consigo me misturar tão facilmente. Sou

o Rodrick, mas me chamam de Roddie, menos formal. E você? —


perguntou estendendo a mão para mim, apertei sua mão e me apresentei.

— Sou a Camilla, mas me chamam de Lila. Prazer em te conhecer e


gostei da roupa.

— Para ser uma pop star, só me falta o dinheiro e a fama, o bom


gosto, já tenho. — Ele olhou por cima do meu ombro. — Acabei de
encontrar mais uma ovelhinha perdida, espera aqui.
Roddie saiu e foi direto até uma moça que tentava conversar com

algumas pessoas e parecia deslocada. Ele falou algo com ela e a arrastou
para onde estávamos.

— Lila, essa é a Fernanda. Pronto, agora temos o trio perfeito. —


Sorri com o jeito do Roddie e me apresentei para a Fernanda, que falou um

pouco sobre ela.


— Prazer, Lila, e muito obrigada, Roddie. Confesso que estava meio

perdida ali, sou de Montana e não tenho muita experiência na cidade


grande. — Ainda bem que o Roddie foi atrás dela, a coitada sofreria no

meio dessa selva de pedra.


Conversamos um pouco, esperando o dono da empresa fazer o

discurso de boas-vindas. Eu estava de costas para o palco que montaram


para o discurso, por isso fui pega de surpresa. Roddie foi o primeiro que
falou.
— Se aquele é o nosso chefe, eu queria ser a sua secretária para colar

nele sem piedade. Que gato maravilhoso. — Sorri e, antes de me virar, a


voz chegou primeiro. Achei que era um delírio meu, com o meu desejo
tomando conta dos meus sentidos.
— Sejam bem-vindos ao nosso Programa de Talentos. — Me arrepie

com a voz e com a pessoa que eu vi à minha frente. — Esta é a primeira vez
que a Secret contrata profissionais com pouca ou nenhuma experiência, mas
vejo isso como algo positivo. Queremos ideias novas e pessoas que pensem

fora da caixa e se sobressaiam. Temos um software que precisa ser lançado


e quero muito que vocês me mostrem o seu talento. Temos 25 pessoas no
programa, mas nem todos ficarão até o final, portanto, deem o seu melhor.
Vou chamar algumas pessoas, escolhidas aleatoriamente, para falar comigo
e me contar um pouco sobre o que esperam e o que pensam. A todos, desejo

um ótimo trabalho e que sejam bem-vindos.


— Não pode ser. — Ele falou tudo sem olhar um minuto para mim.
Não sei se me ignorava ou se realmente não me viu.
— Aconteceu algo, Lila? — Voltei ao mundo real com a pergunta da

Fernanda.
— Fiquei preocupada com o que ele disse, alguns serão demitidos
com o tempo, com base em seu desenvolvimento no programa.
— Sim, mas sinto que seremos estrelas, algo me diz isso. Vamos

programar e mostrar para o que viemos. — Roddie, sempre empolgado,


saiu andando até o supervisor.
Fui atrás dele com a Fernanda, chegamos e ele já estava animado,
buscando nossos lugares e fazendo questão que ficássemos juntos.

Enquanto isso, minha cabeça não parava de pensar no Alec. Meu olhar o
seguiu, saindo do palco e, por um minuto, tive a impressão de que ele olhou
para mim.

— Vocês três ficarão nas três mesas aqui à direita. Quem é Camilla
Harrison?
— Sou eu.
— O Sr. Donovan te espera na sala dele, você foi uma das escolhidas.

Vocês dois podem seguir para a mesa, lá terão o acesso ao sistema. —


Parecia que quanto mais eu tentasse fugir dele, algo nos atraía. Roddie falou
para eu aumentar meu decote e arrasar, eu estava atordoada. A secretária do
Alec me levou até sua sala, bati duas vezes, e ele me pediu que entrasse.

— Parece que o destino realmente quer que a gente se encontre, Lila.


Bom dia. — Aquele perfume que invade o ambiente, aquele olhar
penetrante e aquele sorriso, o maldito sorriso dos Donovan. Eu estava
perdida. — Pode se sentar, prometo que não vou morder.
Acordei do meu transe, envergonhada. Segui para a cadeira à sua

frente. Naquela posição, Alec parecia alguém sério, com um porte


imponente, e eu sentia que, cada vez mais, minha vontade era estar perto
dele.
— Dessa vez, o destino não teve culpa. Eu te vi assim que cheguei

naquela sala e fingi que não te conhecia para que não ficasse constrangida
ou alguém entendesse errado. Não quero que julguem o seu talento pela
nossa proximidade. — Então, era a primeira opção, fui ignorada

propositalmente.
— Não se preocupe, Alec. Farei o máximo para que ninguém saiba
sobre nós, sobre minha relação com os Donovan. — Ele me olhava curioso
com algo e, depois da minha resposta, um sorriso sensual ganhou os seus
lábios.

— Ainda bem que disse isso, porque vou precisar conversar com você
depois do trabalho. Posso ir até sua casa? Saio daqui umas 21h. — Não sei
como explicar, com Alec, me sentia como se eu caísse na toca de Alice,
perdida, e ele fosse o meu coelho, em quem eu devia me agarrar e achar o

meu caminho, mas também o Chapeleiro Maluco, com uma personalidade


linda que me enlouquecia.
— Como? — Não entendi a necessidade de conversarmos hoje.
— Tenho uma proposta para você e gostaria que conversássemos

hoje. Iria esperar até o fim de semana, mas, com os acontecimentos atuais,
preciso adiantar o nosso encontro. Prometo que é algo interessante para
ambos e mantenho o que disse, não passarei dos limites.
— Se for como combinamos, aceito. — Aquele sorriso novamente,

senti meu corpo arrepiar e algo lá embaixo responder, me deixando


molhada. Meu Deus! Se eu fico assim somente com um sorriso, imagina
com algo mais?!
— Agora que acertamos tudo, pode ir. Boa sorte e seja bem-vinda,

espero que goste de trabalhar aqui. — Gostaria de falar que só por vê-lo
todo dia, já estava adorando, mas apenas agradeci e saí da sala o mais
rápido que pude.
O dia passou rapidamente. Mergulhei no trabalho e comecei a estudar

o código do software, o que foi criado até o momento. Não era algo difícil,
só complicado. Continuar o código de outro programador era desafiador,
mas nada que eu não pudesse entender. Quem me avisou que já eram 18h
foi Roddie, se deixasse, eu seguiria trabalhando.

Levantei-me, me estiquei um pouco, fui direto para o meu carro e


cheguei em casa às 20h, por causa do engarrafamento que acontece nesse
horário. Meu carro já estava velhinho e, ainda bem, não me deixou na mão
ainda, embora me desse alguns sustos.
Precisava organizar um pouco a casa para quando Alec chegasse.

Corri com algumas coisas e deixei tudo apresentável, tomei um banho e


troquei de roupa. Alec chegou quando eu estava preparando um café para
mim; depois do dia de hoje, precisava da cafeína para ficar mais alerta. Abri
a porta, e ele estava ali, encostado na soleira da porta, sem a gravata e com

o cabelo bagunçado. Não sei que poder era esse, mas sempre me causava
uma reação que não senti por ninguém.
— Oi, Alec. Entra, não repara na bagunça, a vida está um pouco

corrida. Quer um pouco de café?


— Aceito. Minha mente tem estado mais agitada que o normal,
ultimamente — falou olhando para mim, seria uma indireta?
— Quer açúcar ou adoçante?

— Eu tomo café puro, sem nada para adoçar. — Olhei para ele e
soltei um sorriso. — O que foi?
— Se visse como preparo o meu, certeza de que teria um infarto. —
Levei nossas canecas até o sofá. Tomamos um pouco de café e resolvi puxar

o assunto. — Então, qual é a proposta tão urgente?


— Antes de falar, quero que saiba que, a partir de agora, o que eu
falar ficará apenas entre nós, independente da sua resposta. Essa proposta
não pode chegar aos ouvidos de ninguém, principalmente de alguém da

família. Combinado? — Assenti, com um misto de curiosidade e


preocupação. — Você é livre para aceitar ou não, sem se preocupar comigo.
Acima de tudo, quero que continuemos amigos, gosto bastante das nossas
conversas e acredito que você será uma excelente programadora. A

proposta precisa de certa introdução para que compreenda os motivos que


me levaram até aqui. Vou te contar algo pessoal que nunca falei para
ninguém, nem os meus irmãos sabem disso. Há cinco anos, sofri um
acidente no meu iate. Minha ex-esposa, Abigail, caiu do nosso barco e pulei
para salvá-la. Sua roupa ficou presa na hélice do iate e, ao ajudá-la, me
aproximei demais da hélice e não percebi.
— Nossa, sinto muito, Alec. — Ele tentou soltar um sorriso, mas
senti que algo triste viria.

– A hélice cortou minha virilha e, por questão de centímetros, não me


decapou. Me custou a fertilidade, me tornou impotente e a minha família
acha que tudo foi temporário, que hoje voltei à vida normal. Preferi
esconder deles esse detalhe, não queria receber olhares de pena. De lá para

cá, me casei com o meu trabalho e nunca mais tive atração por nenhuma
mulher. Abbie seguiu sua vida, tornou-se uma grande amiga minha, e eu
aceitei o meu destino alguns anos atrás.
Eu não soube o que dizer. Como imaginar que um homem tão bonito
e imponente desses sofresse com impotência. Nenhum homem fica bem

com essa situação, eu acho. Tive uma vontade enorme de abraçá-lo.


— Porém, naquele dia da boate, você me despertou algo que pensei
nunca mais sentir. Eu me senti atraído por você, Lila. Algo ali me despertou
a vontade de te ter comigo e fiquei perdido em um primeiro momento, mas

os outros encontros e coincidências me levaram a acreditar, mesmo que por


um minuto, que o destino talvez estivesse dando um sinal. Não posso te
prometer sexo ardente devido a minha situação, mas posso garantir que
consigo te dar muito prazer e te satisfazer de outras formas. Te proponho
que tenhamos algo só nosso, o seu prazer já me deixará satisfeito. Não
procuro um relacionamento, caso você conheça outra pessoa durante esse
tempo, pode ser sincera e cancelamos nossa proposta. Você segue sua vida,
e eu, a minha. Nada afetará o seu cargo na minha empresa, não misturo

negócios com prazer, pode ficar tranquila. O que me diz? Aceita minha
proposta?
Eu estava sem palavras. Ele terminou de falar, e eu estava com a boca
aberta e a caneca de café frio na mão. Nunca imaginei que receberia tantas

informações em uma noite só, mas também era algo que cabia
perfeitamente no que eu precisava no momento. Eu era virgem e não estava
pronta para perder a virgindade ainda, mas tinha uma louca atração pelo
Alec, essa proposta parecia ter sido feita para mim, mesmo sem ele saber.

— Te assustei? Peço desculpas, talvez tenha falado sobre isso como


um empresário tentando fechar um contrato e possa ter soado um pouco
frio. Se quiser pensar, basta...
— Não!

— Calma, Lila. Falei rápido demais.


— Quer dizer, você não me assustou. Somente estava digerindo tudo
o que me disse, foi muita coisa de uma vez.
— Espero também que não se sinta ofendida. Não lhe propus baseado
em algo do seu caráter ou porque lhe julguei de alguma forma. Foi sincera a
proposta.
— Entendo e não esperava menos que isso do Alec gentil que conheci
na boate. — Soltei um sorriso para aliviar o momento. — Alec, estou

disposta a aceitar o que me propõe. Como lhe falei, não vou ser hipócrita e
falar que não me senti atraída por você. Te acho muito bonito e atraente e
acho que as condições da proposta são exatamente o que eu preciso no
momento. Saiba que não vou lhe cobrar atenção ou ciúmes, não sou assim.
Muito menos vou fazer algo que lhe comprometa, se quiser, podemos

assinar um contrato de confidencialidade.


— Não precisa, Lila. Só em você ser parte da minha família,
praticamente, já confio no seu caráter. Piper sempre foi boa em julgar as
pessoas. Então acho que temos um acordo, certo?

— Temos sim. — Eu estendi a mão para selarmos o contrato verbal e


fui surpreendida por ele. Esperava que apertasse minha mão, em vez disso,
Alec virou a palma da minha mão e beijou a parte de cima, como os nobres
cumprimentavam as damas antigamente. Fiquei sem resposta frente àquele

gesto, só em sentir o seu toque o meu corpo reagiu completamente.


Se minha pele fosse como a da Piper, com certeza eu estaria corada,
com as bochechas vermelhas e entregando tudo o que estou sentindo agora.
Ainda bem que não é. — Pensei aliviada.
Ele se levantou, e eu o acompanhei, pensei que já ia embora, por isso
peguei nossos copos vazios. Me enganei, sua intenção não era ir embora,
ele pegou a caneca da minha mão, colocou a dele e a minha na mesa de

centro e se aproximou de mim lentamente. Eu fiquei imóvel, surpresa.


— O nosso encontro está marcado no sábado, às 20h, na minha casa
— Alec falou de uma forma sensual e predatória, e eu apenas consegui fixar
o olhar nele, enquanto minha amiga lá embaixo estava toda molhada.

Colocou o meu cabelo atrás da orelha e desceu o dedo pelo meu pescoço.
— Lá, conversaremos um pouco sobre nós dois, com mais calma. — Sua
boca se aproximou da minha e ele deixou selinhos nos meus lábios
enquanto me observava com os olhos bem abertos. Eu estava com um

pouco de vergonha, mas a vontade de pular nele era maior. Eu me segurei


com todas as minhas forças.
— Sei que você deve estar igual a mim, nesse momento, Lila. Louca
para que continuemos isso, mas... — ele falou enquanto sua mão desceu e

roçou o bico do meu seio. Soltei um gemido baixo, e ele, um sorriso


discreto. — ... garanto que a espera será recompensada.
Alec me abraçou e disse no meu ouvido um “até logo” sussurrado.
Saiu pela porta de casa ainda me olhando, entrou no carro e seguiu viagem.
Eu fiquei parada, no meio da sala, ainda sem entender direito o que

aconteceu, com um misto de tesão, vergonha e desejo.


— Acho que concordei em dividir a cama com um diabo muito sexy.
Algo me dizia que essa semana seria torturante.
 

Cheguei em casa e fui direto para uma ducha. Estava cansado do dia,

mas sentia um calor no corpo desde que toquei a Lila e que a beijei. Eram

apenas selinhos e provocações, mas isso já me fazia sentir diferente. Ela era
a primeira mulher, depois da Abbie, que mexia comigo daquele jeito, e eu

precisava entender o motivo. Não a deixaria escapar, pois a desejava ao

meu lado.
Tive um sono tranquilo, porém, Lila estava presente em todos os

momentos dele. Acordei às 5h da manhã, antes mesmo do despertador, e


senti as áreas baixas um pouco mais quentes que o normal. Tive a

impressão de sentir uma contração em meu membro, mas deve ter sido algo

involuntário, acho difícil minha impotência se resolver sozinha, depois de

tanto tempo.

Me arrumei para o trabalho, tomei o meu café e segui para a empresa.


Hoje ainda era terça-feira, nosso encontro apenas aconteceria no sábado.

Tinha bastante tempo para planejar as coisas, queria que fosse algo perfeito

para ela e, ao mesmo tempo, desejava que a semana corresse rapidamente

para encontrá-la na minha casa o mais rápido possível. Uma mensagem

aleatória chegou em meu celular e me recordei na hora.


— Droga, esqueci de pegar o número dela!

— Falou algo, senhor? — Fernando perguntou depois da minha

irritação.

— Nada, Fernando. Foi algo pessoal. — Ele pareceu não entender

nada, mas seguiu dirigindo. Lembrei que todos dão números de telefone

quando entram na empresa, precisava da ficha da Lila.

Cheguei no escritório às 6h da manhã, somente os funcionários


principais estavam presentes, toda a equipe chegava apenas às 8h da manhã.

Aproveitei o momento.

— Érica, venha aqui, por favor. — Minha secretária entrou no

escritório.
— Bom dia, Sr. Donovan. Em que posso ajudá-lo?

— Preciso das fichas das pessoas escolhidas para falar comigo ontem,

quero observá-las de perto.

— Certo, senhor. Irei buscá-las. — Ela saiu e retornou logo depois

com todas as fichas que pedi. Depois que voltou para sua mesa, ignorei

todas as outras e peguei o número da Lila. Seria uma espécie de invasão de


privacidade, mas gostaria de falar com ela. Mandei uma mensagem na

mesma hora.

Bom dia, Lila, quem fala é o Alec. Espero que não se importe, peguei

seu número com o RH, eles não perceberam. Só queria te desejar um bom

trabalho hoje.

  Ela demorou um pouco a responder, até que começou a aparecer

digitando na tela.

Bom dia, Alec. Fiquei surpresa com a sua mensagem, obrigada pelos

votos de bom trabalho. Ansiosa para começar a programar. Bom trabalho

para você também.


Estas pequenas coisas não costumavam me arrancar sorrisos, mas Lila

estava mudando pequenos detalhes em mim e ainda não sabia o porquê. Por

isso, precisava dela por perto.

Com o software em desenvolvimento e a equipe nova, a semana

passou rapidamente. Diversas reuniões me envolveram e fiquei mergulhado


em trabalho. Carson me chamou para tomar um drink na quinta-feira e não

pude negar, raramente tínhamos tempo para conversar.

— Alec, que bom te ver. Esperava que cancelasse nosso encontro,


soube que está bem corrido no trabalho.

— Sim, esse novo software está tomando todo o meu tempo, mas até

que a equipe nova tem trazido grandes ideias. — Eu não ia falar, mas

pareceria ainda mais suspeito. — Sabe quem está trabalhando conosco? Lila

Harrison, a amiga da Piper.

— Sério? Que coincidência, por essa não esperava. Por isso a Piper

tem reclamado que a Lila está ocupada a semana toda. Aquela menina é de

ouro, pela sua personalidade, dará o melhor de si.

— Ela tem se empenhado bastante, mas você não acha estranho não

sabermos nada da vida dela? — Eu pesquisei um pouco sobre a Lila durante

a semana, e não encontrei muita coisa sobre a família, talvez Carson saiba

de algo.

— Eu até achei estranho no início, mas parece que é um assunto

delicado. Como  Lila nunca causou nenhum problema e foi uma ótima

influência para Piper, não vi problema. O aniversário dela é amanhã,

sempre sei porque Piper transforma tudo em um evento, do jeito dela. — Eu

sei como é a minha sobrinha com festas. — Esse ano, nem sei o que vão
fazer. — Ele continuou conversando e, na minha mente, fixou a data do

aniversário da Lila.

— O aniversário dela é esse sábado e ela não disse nada? Então vai

comemorar comigo? — Carson estava distraído, pedindo a conta, e não

ouviu o meu pensamento em voz alta. Tive a ideia de preparar algo especial.

Acho que seria um bom começo para a nossa proposta.

Dormi pouco durante a semana, ansiosa com o trabalho, tentando

mostrar as minhas habilidades o máximo possível e ainda com o Alec em

minha mente. Depois da sua mensagem, tentei ser o mais imparcial

possível, mas meu coração acelerou forte. Eu não poderia ceder às

emoções, logo agora que encontrei o emprego que sempre quis, precisava

deixar tudo de lado e focar no meu futuro.

— Terra para Lila! Menina, você está perdida em pensamentos.


Fiquei curioso. — Roddie não perdia nada.

— Estou tentando dar o meu máximo, apenas. É a primeira

oportunidade que tenho de trabalhar na área e quero que tenham motivos


para me manter aqui.

— Nem me fala, Lila. Quando disseram que nem todos ficarão, morri

de medo. Não quero voltar para Montana. — Eu entendia perfeitamente

Fernanda. Também não gostaria de voltar para Minnesota depois de

fracassar na minha área.

— Calma, meninas. Vamos arrasar, vocês vão ver, e tenho certeza de

que vamos nos destacar. Pensem positivo para atrair energia positiva. Estou

usando o método para atrair aquele chefe gato que temos. — Fiquei

nervosa, na mesma hora, com a menção do Alec. Tudo que me vinha à

cabeça era que o encontro já era amanhã, e eu precisava agir como uma

mulher que entendia um pouco de sexo, mesmo sem nenhuma experiência.

Cheguei em casa, na sexta-feira, acabada. Apaguei no sofá mesmo e

amanheci toda dolorida por causa disso. Olhei para o celular e já eram 9h da

manhã, tinha diversas mensagens e ligações perdidas.

— Meu Deus! Não acredito que esqueci! — A semana foi tão corrida

e atarefada que esqueci completamente do meu aniversário. O despertador

não tocou, acordei mais tarde que o normal. Ross e Piper já tinham me

enviado várias mensagens de aniversário, Piper ligou umas três vezes e


deveria estar quase batendo na minha casa. Liguei de volta para ela.

— Até que enfim, aniversariante. Achei que estava me ignorando.

FELIZ ANIVERSÁRIO! E aí, qual será a boa de hoje? — Lembrei-me do


meu encontro com o Alec. Acho que precisava desmarcar com ele, veria

isso daqui a pouco.

— Ainda não sei, amiga. Vou me organizar e te aviso.

— Estou esperando, hein! Não pense em me evitar. Calma que tem

alguém que quer falar com você também. — Ross pegou o telefone.

— E aí, minha cara mana. Feliz aniversário! Hoje é o seu dia, não

invente de ouvir o que Piper quer, escolha você mesmo, entendeu? Quero te

ver muito feliz e esbanjando sorrisos. Comprei um presente para você, um


livro que sei que vai gostar. Desejo toda felicidade do mundo, sabe que te

amo.
— Obrigada, Ross. Você é o melhor irmão que a vida poderia me dar.

Agradeço muito e estou ansiosa pelo livro. — Era impossível ficar triste
com tanto carinho dessa família. Eles foram e sempre serão minha base em

tempos conturbados. — Vou desligar agora, mas manda um beijo para a


Piper. — Desliguei o telefone e fui olhar se tinha mais alguma mensagem.

Tinha uma do Alec. Ele sabia do meu aniversário? Resolvi ler.


“Bom dia, Lila. Desculpe lhe incomodar logo cedo, mas gostaria de lhe

desejar um feliz aniversário. Soube pelo Carson ontem, espero que não se
incomode com essa mensagem. Gostaria que fosse comemorar com a Piper
e os seus amigos na minha boate, prometo que os deixarei se divertir à

vontade. Ah! Enviei um presente para você, espero que goste.”


Não imaginei que o Alec saberia do meu aniversário por estar sempre
ocupado, mas deveria ter pensado que alguém da família falaria algo.

Comemorar na boate seria uma boa ideia, Piper adoraria, com certeza e eu
me divertiria um pouco. Acho que vou chamar Roddie e Fernanda também.

Aproveitei para mandar mensagem para os dois antes que esquecesse,


e eles toparam de cara. Falei com a Piper, e ela foi puro entusiasmo, fazia

tempo que tentava se redimir pela falta da última vez, mesmo que não
tivesse nenhuma culpa.
Com tudo pronto, só me restava uma preocupação: que presente era

esse que o Alec me mandou? Como não tinha nenhuma pista, preferi deixar
de lado para a minha ansiedade não tomar conta do dia. À tarde, alguém

tocou a campainha e era um entregador com uma caixa enorme. Assinei o


recebimento e imaginei que fosse o tal presente. Abri a caixa e vi algo

enrolado em papel de seda e um cartão por cima.


“Lila,

Sinto-me honrado em estar presente no dia do seu aniversário. Como


presente, comprei algo que espero que goste. Me inspirei no nosso primeiro

encontro, na boate, e na sua personalidade. Existe algo dentro de você


louco para ganhar o mundo e merece ter a atenção devida.

Nosso encontro não foi adiado. Na boate, lhe passarei as informações.”


Retirei o papel de seda e lá estava um dos mais belos vestidos que já
tinha visto. Era vermelho, com um decote incrível e um rasgo na perna

esquerda que sensualizava o conjunto. Fiquei de boca aberta com aquela


peça, com certeza não foi barata, era de alguma grife.

Piper reconheceria de cara que era caro, mas eu inventaria uma


desculpa. Eu já lhe tinha pedido que não mencionasse que era sobrinha do

Alec para que meus colegas não fizessem nenhuma conexão, mas não
queria que ela soubesse que ando recebendo presentes do tio.

Eu entraria naquele vestido essa noite.


Me arrumei toda antes de vestir a peça, coloquei uma lingerie branca

e separei um par de sandálias de salto alto pretas. O vestido ficou perfeito


em meu corpo, vestiu como uma luva, uma seda tocando a minha pele. Eu

me sentia uma princesa, muito gata, pronta para o baile. Chamei o Uber e
fui para a boate, me encontraria com todos lá.

Desci do carro e tive lembranças daquele estacionamento, tentei não


ficar muito tempo ali para não me sentir mal com as recordações. Na
entrada, dei o cartão que o Alec me deu no dia que o conheci e,

imediatamente, liberaram a minha entrada e avisaram que a minha mesa


estava à minha espera. Eu não acreditei quando cheguei e todos estavam em

um espaço reservado, no primeiro piso da boate. Do mezanino, se via todo


o salão.
— A aniversariante chegou! Lila, minha amiga, que vestido arrasador

é esse?! Adorei! — Ela me abraçou, desejando feliz aniversário. Roddie e


Fernanda também já estavam lá, avisei para procurarem a Piper quando

chegassem.
— Gata, você sabe como causar uma entrada. Garanto que os boys

dessa boate não vão tirar o olho de você.


— Feliz aniversário, Lila. Obrigada por nos convidar. — Fernanda
sempre tímida e educada.

— Gente, obrigada por terem vindo. Vamos nos divertir hoje. —


Bebemos e dançamos por umas duas horas até que aquela voz chegou por

trás de mim.
— Boa noite, pessoal. Estão se divertindo? — Meu corpo respondeu

na mesma hora.
— Não acredito! Você convidou o nosso chefe para o seu aniversário,

Lila? — Roddie chocado, já imaginando o que não deve. Antes que eu


respondesse, Alec falou:

— Não foi isso, me desculpem simplesmente aparecer. A boate é um


dos meus negócios e reconheci vocês, por isso vim cumprimentá-los. Quero

que se divirtam bastante.


— Mas, se quiser ficar aqui com a gente, não tem problema nenhum.

Posso te ajudar a socializar. — Roddie não perdia uma chance de lançar um


flerte, mas  Alec era gato mesmo. Eu era a primeira que não podia jogar

pedra no telhado dos outros.


— Sua boate é incrível, Sr. Donovan. Adorei tudo aqui e tenho

certeza de que a Lila vai curtir o aniversário — Fernanda elogiou o


ambiente.

— Espero que a aniversariante aproveite bastante e quem sabe o que a


noite aguarda, não é mesmo? Feliz aniversário, Lila. Espero que se divirta.

— Ele me deu a mão para que apertasse e me passou, secretamente, um


pedaço de papel. Esperei que todos se distraíssem e o li.

“Me encontre na minha sala. Fale com o segurança, ele está à sua espera.
Avise a todos que precisará sair mais cedo, mas que podem ficar à

vontade.”
Pensei, duas vezes, se realmente deveria fazer isso, enrolar a Piper

não seria tão fácil, mas eu estava muito curiosa para essa noite e era o meu
aniversário, eu merecia. Procurei a Piper, e ela já estava dançando com
algum boy, avisei a todos que precisaria sair e fui direto para o segurança,

que me acompanhou até a sala.


Alec estava em sua mesa, tomando um drink enquanto analisava

alguns documentos. Bati na porta para chamar sua atenção.


— Pode entrar, Lila. Espero que tenha aproveitado, gostou do

presente?
— Sua boate é maravilhosa e o presente foi incrível. Obrigada por
tudo, não precisava.

— Imagina, uma peça dessas precisa ser vestida por alguém à altura.
— Seus olhos penetrantes tiravam o vestido apenas com o olhar, e eu sentia
um calor subindo, uma vontade de estar com ele. Não sei de onde vinha

tudo isso.
— Vamos, o jantar nos espera. — Saímos pela entrada secreta, que

dava no estacionamento, e seguimos para a sua casa. Eu estava um pouco


nervosa com tudo, mas meu desejo pelo Alec era maior.

A casa do Alec não era uma mansão, mas era enorme. Apesar disso,
era aconchegante. A lareira estava acesa e uma mesa para dois aguardava

no meio da sala.
— Separei um jantar para nós dois, para comemorar o seu aniversário.

Garanto que vai gostar das escolhas. — Eu não imaginava esse lado dele,
mas gostei. A comida estava incrível e conversamos sobre o trabalho e

sobre a vida. Ele sabia me deixar leve e tranquila, a ansiedade se foi e deu
lugar a uma conversa descontraída.

Terminamos de jantar e ele me mostrou sua adega, me oferecendo um


vinho.

— Desculpe, Alec, eu não bebo.


— Sim, lembro que me disse antes, na mansão. Apenas prove o sabor
dessa uva, prometo que é apenas isso. — Nunca gostei de bebida, mas

resolvi apreciar o que ele me oferecia. Apenas encostei o líquido em meus


lábios e o sabor era irresistível. Senti que uma gota ficou no canto da minha

boca e, antes que eu limpasse,  Alec veio até mim e beijou meus lábios,
levando a gota com ele.

— Esse vinho não merece ser desperdiçado, não acha? — Meu


coração acelerou pelo beijo e pela proximidade. Assenti, pois não tinha

palavras, fui pega de surpresa.


— Acredito que devemos ir para um lugar mais reservado. Vem

comigo. — Ele pegou minha mão e, delicadamente, me levou até o seu


quarto. Fechou a porta e me encontrou no meio do ambiente. — Hoje é o

seu dia, Lila e o meu presente será te dar prazer. Se precisar que eu pare em
qualquer momento, basta falar, mas espero que não precise. A partir de
agora, você é minha.
Aquela frase mexeu comigo em tantos níveis que nem sei descrever.

Era algo primitivo e possessivo, eu sentia sua imponência e estava pronta


para ele. Foi até minhas costas e abriu o zíper do vestido, deixando-o cair
aos meus pés, e eu fiquei apenas com a calcinha branca que vestia.
— Vejo que tem bom gosto para lingeries. Embora belas e sedutoras,

prefiro o seu corpo sem elas. — E, então, ele me beijou.


Sim, ele tomou os meus lábios lentamente, um por um, e depois me
deu um dos beijos mais ardentes que já tive em minha vida. Ele sabia

trabalhar bem com a boca, isso era certeza. Alec se afastou e me observou
sem fôlego, perdida em desejo. Ele começou a descer sua mão pelos meus
seios, à medida que me levava até a cama. Tirou minha sandália e me
deixou com a lingerie.
Alec massageou os bicos dos meus seios, cada um teve seu tempo, e

eu gemia baixinho, tentando me controlar, enquanto minhas mãos


apertavam os lençóis com tanto prazer. Ele parou apenas para tirar a camisa
e a calça, restando apenas a cueca boxer.
Era a primeira vez que eu estava com um homem dessa forma e não

sei se é por falta de experiência, mas Alec era perfeito para a minha
primeira vez nisso. Ele tinha um toque, um cuidado com cada parte do meu
corpo, extraindo o máximo de prazer de cada lugar, cada instante.
Ele sugou os meus bicos com a boca, me enlouquecendo. Eu joguei a

cabeça para trás, louca de desejo, e tínhamos acabado de começar. Os seios


são um dos pontos mais erógenos de uma mulher, um dos lugares que
podem levar a um orgasmo somente estimulando a área e, do jeito que ele
brincava com os meus bicos, não demoraria muito para mim.

Era difícil encontrar palavras, minha voz saía como um gemido.


Minhas pernas se contorciam com o calor que eu sentia na minha área
úmida. Quando estava perto de gozar, Alec abandonou meus seios e
começou a traçar uma trajetória pela minha barriga até as partes de baixo.

Enquanto descia, o seu olhar e seu sorriso tinham um jeito safado,


como quem ama cada gemido e estímulo que meu corpo responde. Nesse
momento, ele me tinha na palma da sua mão, só não pensei que teria ainda
mais, sua pele roçando na minha, seus dedos cobrindo cada milímetro do

meu corpo, estimulando cada parte da forma certa.


Ele foi descendo com a boca, beijando cada parte da minha barriga
até chegar na lingerie. Foi nesse momento que tive um pouco de vergonha,
mas o desejo era tão maior que ela que não consegui resistir. Eu estava

entregue. Minha calcinha foi desejada e admirada, mas não por muito
tempo. Logo saiu do caminho para dar lugar ao que ele queria, à visão total
do que minhas pernas escondiam.
Ele olhava o meu corpo completamente nu com uma intensidade e
uma luxúria que me faziam me sentir desejada e com muito tesão. Amei

esse olhar e queria mais, porém, Alec tinha outros planos. Pensei que ele se
jogaria de vez, que acabaria com isso que eu sentia, que me fazia o desejar
por completo.
Ele saboreou cada pedaço da minha coxa, beijando a pele até chegar à

virilha, muito perto do que me enlouquecia. Brincou com a língua nas


partes mais sensíveis e me fez gemer novamente, dessa vez mais forte.
Novamente, o sorriso safado na sua cara entregava o quanto gostava do meu

som, da minha resposta a ele.


Um homem que eu acabei de conhecer, mas tinha o poder de
esquadrinhar o meu corpo melhor do que eu. Depois que percebeu que
arrancou o máximo que podia de mim nas pernas e que um líquido
lubrificante  saía pela minha abertura, ele já não se aguentava e foi para a

próxima parte mais erógena do corpo de uma mulher: o clítoris.


Começou a mesclar beijos com sugadas em meu clítoris, descendo
cada vez mais até encontrar minha entrada e voltar para o clítoris
novamente. Eu mesma comecei a mover o corpo no ritmo da sua língua, aos

poucos, fui acelerando instintivamente, eu sentia que algo viria e estava


quase chegando.
Agarrei o cabelo do Alec para que não parasse, ele entendeu e
segurou o meu quadril, mantendo o ritmo. Aos poucos, fui tomada, meu

clítoris palpitava, meu corpo esquentou, meu coração acelerou, finalmente o


auge do momento chegou. Eu não me aguentei e gozei, gemi alto demais,
mas não me contive. Foi impossível segurar ainda mais aquilo, depois de
tudo o que o Alec fez comigo.

Foi lento, minucioso, detalhista, a melhor tortura que uma pessoa


pode ter na vida. Terminei com a respiração ofegante, coração ainda
acelerado e um sorriso gigante no rosto. Estava leve, relaxada e com um

pouco de sono ou preguiça, mas me sentia muito bem.


— Uau!
— Calma, ainda não acabei. — Eu não acreditei quando ele disse
isso. Nem me deu tempo de raciocinar.

Ele continuou, brincou com a minha entrada lubrificada enquanto


lambia o meu clítoris, o que me fez ir a loucura novamente. Colocou dois
dedos na minha abertura, e eu gemi, não consegui segurar. Alec fez alguns
movimentos com o dedo por dentro e por fora, me enlouquecendo, mas

ainda viria muito mais.


Abocanhou tudo o que eu tinha lá embaixo, sem enrolação. Eu gemi
alto, tentei abafar um pouco, pensava que não conseguiria gozar novamente
em tão pouco tempo, mas o meu corpo não concordava comigo. Sua língua
passeava por toda a minha parte íntima, não achei que eu fosse ter tanto

prazer, tanto tesão por uma pessoa.


Eu não queria que acabasse, mas não conseguiria segurar por muito
tempo. Me sentia cansada fisicamente, estava em uma grande contradição:
queria gozar e, também, não queria que tudo aquilo acabasse. Não aguentei.

Alguns minutos e eu gozei novamente, ainda mais forte. Enquanto eu


tentava recuperar meu fôlego, vi  Alec limpando a boca e sorrindo, feliz por
tudo o que fez. Ele se deitou ao meu lado e me observou recuperar o fôlego.
— Uau!

— Acho que isso significa que gostou. — Apenas sorri, não tinha
fôlego para falar ainda.
— Você é uma obra de arte. Uma deusa de ébano, e o seu gosto é
doce e ardente. — Balancei a cabeça positivamente. — O vestido estava

fantástico, mas tenho que dizer que essa lingerie que você usou estava
incrível e seu gosto é maravilhoso.
Tive um pouco de vergonha. Ele era bem sincero.
— Ainda estou recuperando o fôlego, mas quero lhe elogiar, você

sabe como fazer as coisas. — Ele sorriu e me beijou.


Eu fiquei deitada na cama, do jeito que ele me deixou, sem acreditar
que aquele homem maravilhoso não só me desejava, como fazia um sexo
oral divino. Perdão, Deus, mas não tenho uma palavra melhor. Todo aquele

prazer e orgasmos me deram um baita sono, mas eu não sabia se podia


dormir ali. Fechei os olhos por alguns minutos, somente para recuperar o
fôlego, e apaguei.
Acordei de madrugada com um lençol me cobrindo e Alec dormindo

ao meu lado. Voltei a dormir e sonhei que ele estava  transando comigo.
 

Acordei sem o despertador.


Ainda estava sonolenta, mas algo parecia fora do lugar. Era como se

aquele não fosse meu quarto. De uma vez, as informações chegaram ao meu

cérebro e eu me levantei rapidamente, tão rápido que senti uma leve queda
de pressão. Levei a mão à cabeça para tentar evitar uma dor de cabeça e

percebi que eu estava completamente nua, somente um lençol me cobria.

Imediatamente, me cobri com o lençol de novo e olhei ao redor, à

procura do Alec. Tive uma leve recordação de vê-lo dormindo ao meu lado,

mas a cama agora estava vazia. Tentei ouvir algum barulho da suíte do
quarto, mas apenas a luz estava acesa, funcionando como uma espécie de

luminária para um ambiente mergulhado na mais perfeita escuridão.

O que era bastante contraditório, já que olhei meu celular e eram 10h

da manhã.

— Se eu dormisse em um quarto assim, seria difícil acordar todos os


dias para trabalhar. — Deixei minha voz fluir, já que estava sozinha no

quarto. Ouvi um som de alerta do meu celular, era a minha bateria avisando

que estava descarregada e desligando na minha cara. — Não, não, não! —

Vim com uma bolsa minúscula e deixei o carregador em casa.

Teria que dar um jeito de pedir um Uber.


Respirei fundo e pensei em uma coisa: era a minha primeira vez

acordando depois de uma noite com um homem, não acho que seja legal

sair fugida da casa dele. Ainda mais se você tem encontros sexuais com

esse homem. Levantei-me da cama e tomei uma ducha, vesti a roupa de

ontem mesmo e arrumei o meu cabelo da melhor forma que eu pude.

Procurei meu salto alto e o encontrei embaixo da cama, confesso que

nem lembro quando foi que tirei e se fui eu quem tirei isso. Flashes da boca
do Alec em mim se enfiam na memória, o arrepio vem e um sorriso escapa

pelos meus lábios, porque é impossível não estar satisfeita.

— Não é porque são 10h da manhã que uma mulher não pode usar

um vestido chique e um salto alto. — Eu, tentando me convencer que não


parecia alguém voltando da boate depois que amanheceu, parecendo que

voltei aos 18 anos. — O que vale é a sua confiança.

Desci as escadas, tentando ser alguém calmo e elegante e quase sem

nervosismo de encontrar o cara que te levou à loucura para um café da

manhã. Os pensamentos estão um pouco acelerados, pelo visto. Me

concentrei na arquitetura da casa e nas fotos do Alec sorrindo, ao que


pareciam, eram viagens, e ele estava muito feliz. Acho que ainda não tinha

visto um sorriso de tanta felicidade dele.

— Bom dia, Lila. Dormiu bem? — Estava tão distraída com as fotos

que nem o vi se aproximar. A vergonha veio, mas disfarcei para não parecer

uma virgem perdida. Sei que eu sou, mas ele não precisa saber disso agora.

— Bom dia, Alec. Dormi, sim, não tem como não relaxar naquele

quarto.

— Realmente, é impossível não relaxar depois de tanto empenho

naquele ambiente —  falou com segundas intenções, me seduzindo e

causando um choque pelo meu corpo, mas o meu estômago foi mais rápido.
— Venha à cozinha, o café está servido. — Ele saiu com um sorriso

safado no rosto.

Na cozinha, havia uma mesa com 12 cadeiras e parte dela estava com

diversos alimentos servidos, uma variedade que eu nunca teria tempo de


preparar em casa todas as manhãs, no curto espaço entre acordar — comer

— trabalhar.

— Algumas coisas apenas aqueci, minha empregada deixou tudo


pronto, mas eu fiz os ovos e as panquecas. Avisando para que saiba onde

vai se meter, caso escolha provar esse desafio. — Eu ainda estava tensa e

com vergonha de tudo que aconteceu ontem, mas Alec agia com tanta

tranquilidade que nem parecia que tínhamos dormido juntos. Lembrando

agora, Piper agia da mesma forma. Acho que você fica assim depois que se

acostuma a dividir a cama com alguém.

Tudo isso que pensei, uma mulher experiente não faria e, talvez, eu

esteja sendo egoísta em mentir, esconder dele o fato de que sou virgem. Um

silêncio tomou conta da mesa, Alec lia o jornal, mas parecia com os

pensamentos distantes, pois não saía da mesma página há um bom tempo.

— Alec, me empresta seu celular? — Ele me olhou sem entender. —

O meu descarregou total e deixei o carregador em casa. — Tirei o celular da

bolsa, mostrando que estava apagado.

Ele, então, me deu o seu aparelho. Fui direto no cronômetro e

coloquei 5 minutos. Ele me olhava curioso para saber o que eu faria com

isso.

— Vamos brincar de um jogo que eu considero revelador e educativo.


— Ele fez uma careta. — Calma, não é infantil e garanto que você vai
gostar. — Alec ainda tinha dúvidas, mas aceitou testar.

— Esse jogo se chama “cinco minutos no inferno”.

— Não parece um jogo divertido.

— Depende do seu momento e ponto de vista. As regras são as

seguintes:
Durante cinco minutos, você deverá responder às perguntas
da outra pessoa somente com a verdade;
Tudo o que for dito durante o jogo, fica entre os jogadores;
Se algum dos jogadores, por livre e espontânea vontade,
decidir contar algo secreto, poderá fazê-lo quando chegar a
sua vez, e
Se for comprovada, em algum momento, que alguma das
respostas era mentira, o jogador mentiroso precisará atender
a um pedido do jogador verdadeiro, sem questionamentos.
— E aí, o que acha?

— Esse jogo é uma forma das pessoas matarem a curiosidade e

confessarem coisas, sabendo que ninguém poderá falar nada.


— Exatamente, mas também é divertido, porque você pode perguntar

qualquer coisa e, pela honra de quem joga, será tida como verdade.

— Vou dar uma chance.

— Certo, eu começo. — Ativei o cronômetro. — Há quanto tempo

está solteiro?
— Cinco anos,  Abbie foi minha última mulher. — Eu já sabia, mas

quis ter a confirmação absoluta. — Agora minha vez: você já usou

brinquedos sexuais, anais e vaginais?

Virei um pimentão e quase entrei embaixo da mesa de vergonha, mas

tentei fingir que estava acostumada com aquilo, porém, falhei terrivelmente.

Alec soltou um sorriso safado e já imagino que vai propor algo em nossas

brincadeiras.

— Não, nunca usei brinquedos e nada que seja parecido. Ontem foi a

minha primeira vez em um sexo oral. — O rosto dele mudou de safado para

curioso, sabia que isso iria chamar a sua atenção. Eu não conseguiria falar

diretamente para ele que era virgem, mas, com o jogo, eu era obrigada por

regras. — Minha vez: por que eu?

Ele parou e me observou por um tempo, não sei o que buscava, acho

que pensava no que responder. Eu precisava ter certeza se toda a história

não foi pura enrolação.

— Naquele dia em que nos conhecemos, meu corpo reagiu ao seu

toque. Eu estive com várias mulheres que fizeram muito mais do que me

fez naquele dia e nada funcionou. Em apenas alguns minutos, o seu toque
formigou minha pele e me fez sentir um leve choque no meu amigo aqui de

baixo. Me pergunto se realmente senti, mas, depois da segunda vez, tive

certeza de que precisava ir além.


Ele realmente foi sincero o tempo todo.

— Agora que você confirmou toda a história que eu te contei antes e

sabe que sou sincero sempre, vamos à pergunta que não quer calar: você já

teve alguma experiência sexual na vida, Lila?

— Não, Alec. Eu sou virgem. — Ele continuou me encarando, sua

feição não demonstrava se isso era bom ou ruim, sua pupila dilatou um

pouco, mas foi apenas isso. Nos encarávamos como se nossa vida

dependesse disso até que o sinal do fim do cronômetro me assustou e cortou


nossa conexão.

Alec simplesmente voltou ao jornal e, com o seu sorriso safado, falou:


— Interessante! Termine o seu café da manhã, te encontro no meu

escritório, é fácil de achar. — Ele se levantou da cadeira e seguiu para o


corredor, eu continuei onde estava, acredito que ele tenha gostado da

informação.
 

Fui para o meu escritório, fechei a porta e me sentei em minha

cadeira. Olhei pelas janelas que cobriam a parede de cima a baixo e o


movimento dos jardineiros e funcionários que cuidavam do quintal
acontecia em minha frente como um filme mudo, pois nada se via ou ouvia

de fora para dentro da minha sala.


Apesar disso, aquela deusa de ébano não saia da minha cabeça.

Acordei e fui para a ducha, ela estava dormindo tão tranquilamente


que poderia passar um tempo apenas observando. Seu gosto delicioso em

minha boca ainda fazia morada e, de lá, eu não queria que saísse. Preparei o
café da manhã pensando, pela primeira vez, em um ser humano estranho
que dividiu a cama comigo. Não em minha família ou algum amigo, em

uma mulher, depois de cinco anos.


Achei que seria estranho, mas, com  Lila, era... confortável.

— Alec, você só deve ter sentido falta de uma mulher ao seu lado e
agora esse desejo voltou a acontecer.

Eu poderia falar o que quisesse para enganar a mim mesmo, mas algo
lá no fundo me dizia que não era apenas isso. A peça que faltava foi quando

ela me disse que era virgem. Com qualquer outra mulher, eu apenas a
mandaria para casa e cancelaria qualquer coisa, mas eu estou desejando

apresentar todos os tipos de desejos, posições e prazeres sexuais que eu sei.


Quero que ela goze para mim e isso está despertando coisas que achei que

nunca mais sentiria.


— Será que o Ross estava certo? — Ouvi uma batida na porta e era a
Lila.

— Pode entrar, estava te esperando. — Lila ainda vestia a roupa que


eu escolhi e estava de salto alto, sem perder a elegância. — Se preferir,

pode tirar a sandália e ficar mais à vontade.


— Não, obrigada. Estou bem assim, na próxima, venho dirigindo para

trazer uma muda de roupa no carro —  falou espontaneamente e, logo


depois, arregalou os olhos, como se tivesse dito algo errado ou antecipado

demais. As reações dela eram tão naturais que eu não tinha percebido o
quanto senti falta disso.

— Não se preocupe, vamos resolver isso depois. Agora, quero que


venha até aqui onde estou. — Levantei-me da cadeira e estendi minha mão

para que se aproximasse. Tive uma ideia magnífica para começar bem o dia.
Coloquei Lila de frente para mim e, olhando para a janela, para os

jardineiros,  fiquei atrás dela. Fui descendo o zíper do seu vestido enquanto
falava.
— Quero que confie em mim, certo? — Ela travou um pouco quando

percebeu o que eu ia fazer. — Esse vidro e a acústica da sala foram feitos


para ninguém de fora saber o que acontece aqui dentro. — Ela relaxou um

pouco.
— Então, todos lá fora veem apenas um vidro que reflete?
— Isso, eles não têm noção do que está aqui. — Deixei que o vestido

caísse e seu corpo ficasse apenas com a lingerie. Comecei a acariciar os


bicos do seu seio, ela jogou a cabeça para trás, apoiando no meu ombro. —

Deixe seu corpo sentir prazer, aproveite o momento e a possibilidade de


uma aventura.

Ela se entregou e seus gemidos foram altos, segurei seu corpo que já
estava tomado pelo prazer. Desci minha mão pela sua calcinha e a afastei
um pouco, massageei seu clítoris enquanto acariciava os bicos, agora duros

como uma pedra. Minha pele já passava do formigamento para o calor


ardente, podia ser impotente, mas a vontade de comê-la existia.

— Segura, você não vai gozar agora. Vem aqui. — Soltei o seu corpo
e agarrei sua mão. Sentei-me na minha cadeira e fiz sinal que se

aproximasse. — Sente-se em cima da mesa, na ponta, virada para mim.


Lila fez uma cara de quem não entendia, ela realmente era ingênua.

Sorri.
Eu gostava disso. Depois que ela se sentou, continuei com as

instruções.
— Você irá apoiar um pé em cada braço da cadeira, me dando livre

passagem para o caminho da felicidade aqui.


— Alec, vou ficar totalmente... exposta?!
— Você vai gostar, apenas faça, prometo. — Apesar da vergonha

claramente estampada, ela fez, e que visão eu tive! A claridade iluminava


tudo, e eu podia ver toda aquela beleza exposta para mim.

— Abra os olhos, Lila. Quero que você olhe para frente e pense no
que está acontecendo aqui. Aproveite e se liberte.

Comecei a acariciar seus pontos erógenos com os dedos, mas não


demorou muito para que abocanhasse aquele lugar. Seu gosto era incrível e

sabia que teria pouco tempo, aquela posição era muito estimulante. Me
deliciei com cada parte do seu órgão de prazer até que ele se desfez,  Lila

gemeu para mim e gozou e eu fiquei satisfeito. Senti novamente um sinal


vindo lá de baixo.

— Não é possível — disse baixinho para que ela não ouvisse. Acho
que vou refazer alguns exames, testar se algo voltou.

— Alec, meu Deus. Assim você me mata, nossa... Nem sei o que
dizer.
— Você sem palavras já é tudo o que eu preciso. Agora preciso

terminar nosso encontro, tenho alguns papéis e outras coisas da empresa


para resolver — fui falando e dando suas roupas.

Não entendi o olhar da Lila, parecia que ela via outro homem em sua
frente, ela não tinha me dado esse olhar ainda.

— Está tudo bem?


— Está, tudo na mais perfeita ordem. Apenas me empreste seu celular
para chamar um Uber, por favor. — Ela estava vestida e zangada com algo.

— Fernando pode te levar...


— Não, obrigada. Prefiro um Uber. — Dei meu celular a ela, que
pediu o carro.

— Boa tarde, Alec. Até amanhã, no trabalho. Obrigada por.. —  falou,


fazendo um gesto como se agradecesse por tudo — ... você sabe. — E saiu

do meu escritório para esperar o carro lá fora.


Pouco tempo depois, Fernando me avisou que a Lila foi embora e eu

fiquei sem entender direito que raiva foi essa que a causei. Preciso
conversar com alguém.

Cheguei em casa ainda furiosa por tudo o que eu senti quando o Alec
me deu a roupa e agiu tão friamente. Bati a porta da entrada com uma força

que deve ter estrondado do outro lado da rua. Coloquei meu celular para
carregar, me deitei no sofá e larguei o salto alto no chão,  observando o teto

da sala e pensando nesse fim de semana.


Como é possível que o mesmo homem pode me levar do céu ao
inferno em alguns minutos?! Respirei fundo e tentei me acalmar, fechei os

olhos e só vinha a imagem do Alec com olhar safado, sua satisfação em me


dar prazer, seu cheiro e seu toque.

— Inferno, esse homem está dentro de mim mesmo sem nem ter
triscado a entrada! — Fui até a cozinha e tomei um copo de água. — Lila,

você é adulta e sabe como as coisas são. Precisa ser mais racional do que
emocional — repeti isso várias vezes até me acalmar um pouco para pensar

em tudo o que aconteceu e encontrar o motivo que levou o Alec a agir


daquela forma, me tratando  como se eu fosse uma estranha.

Pensando bem, ele não me prometeu relacionamento ou carinho em


momento algum, sempre foi claro nas suas intenções: me dar prazer e

termos uma relação puramente sexual. Talvez por isso ele tenha agido
daquela forma, e eu, totalmente inexperiente, esperei algo mais.
— É isso! A partir de hoje, vou agir exatamente da mesma forma que
ele agir comigo. Não tem forma melhor de aprender sobre isso observando

quem sabe e está acostumado com o que faz. — Um sorriso tomou os meus
lábios. Sempre adorei desafios e esse era um que a vida me deu. Alec vai
conhecer uma Lila que, mesmo virgem, sabe como tratar um homem. Não
era uma guerra, mas eu precisava transformar em uma para que não me

apegasse, feito uma menina apaixonada.


Meu celular vibrou, me tirando dos meus devaneios. Era a Piper,
mandando uma mensagem, querendo saber se cheguei bem em casa e se me

diverti no meu aniversário. Ela sempre foi tão preocupada com o meu bem-
estar, impossível ter uma amiga melhor do que ela, ou melhor, uma irmã.
Pensando na Piper, uma ideia veio à mente: quem melhor para me
ajudar a melhorar nas relações casuais do que a rainha fugitiva. Era assim
que a Piper ficou conhecida na universidade, todos os homens com quem

dormiu nunca a via no outro dia, ela sempre ia embora depois que pegavam
no sono e já estava em outra no dia seguinte.
Eu só precisaria ter cuidado para não soltar nada que a fizesse
conectar ao Alec, afinal,  Piper sempre foi ligada nas coisas. Seria o meu

ficante secreto. Mandei uma mensagem para ela, pedindo para nos
encontrarmos no café aqui perto, ela aceitou rapidamente, deveria estar
entediada em casa. Domingos sempre eram os piores dias para uma festeira.
Troquei de roupa e joguei o vestido que o Alec me deu no cesto de

roupa suja, junto da lingerie. Depois de limpo, iria morar dentro da minha
gaveta por um bom tempo para não me lembrar dele.
Era impossível não lembrar.
Coloquei um short jeans e uma camiseta com uma rasteirinha e saí

para o encontro com a Piper. Demorei um pouco para estacionar,


geralmente aquela área da cidade ficava lotada aos domingos, com as
famílias aproveitando a folga. Quando entrei na cafeteria, ela já estava
sentada e tomando um café, será que demorei tanto assim?

Fui direto fazer o meu pedido, o de sempre: cappuccino com pedaços


de chocolate e bordas de doce de leite, o mais doce possível. Cheguei na
mesa, e ela nem percebeu.
— Eu demorei tanto assim para chegar? Você já fez até o seu pedido.

— Boa tarde para você também, senhorita aniversariante fujona. É


bom que tenha uma boa desculpa para sumir daquele jeito, depois que eu
preparei tudo para você. Nem sopramos as velinhas. — Ok, me senti
culpada.

— Desculpa, Piper! Juro que não fiz por mal, mas foi algo que eu não
poderia negar. Estou saindo com uma pessoa. — Na mesma hora, ela se
endireitou na cadeira, largou a cara emburrada e focou toda sua atenção em
mim.
— Mentira! Quem é? Como se conheceram? De onde veio? Quero

saber tudo sobre ele, exatamente tudo. Pode falar.


— Bem, é uma pessoa do meu trabalho, mas você sabe que é o meu
primeiro lance com alguém do sexo oposto, então, vamos manter segredo,
por enquanto. Quando eu resolver falar, você será a primeira a saber,

prometo.
— De tudo que você falou, a palavra “lance” fixou na mente e não

lembro dela no seu vocabulário. Como assim um lance? — Agora vem a


parte difícil, enrolar.
— Como não quero ir direto para os finalmentes, fiz um acordo com
ele de apenas nos divertirmos enquanto nos conhecemos. Ele é um pouco
reservado também, nesse começo, estamos conhecendo os nossos corpos,

digamos assim. — Nossa, que vergonha falar algo assim em pleno café,
com famílias por todo lado. Me escondi, tomando meu café.
— Quer dizer que vocês estão só no sexo oral, por enquanto? — Eu
quase cuspi parte do meu café nela. Piper fala isso com tanta naturalidade

que não sei como faz.


— Não precisa espalhar para o café todo, amiga. E, sim, é isso. Só
que eu preciso tirar uma dúvida contigo: fizemos um acordo que teríamos
uma relação sexual, sem namoricos ou romances. Porém, hoje, depois que...

você sabe... — ela concordou com a cabeça, ansiosa pelo resto da história
— ele simplesmente me deu a roupa e falou que precisava encerrar nosso
encontro porque tinha um compromisso do trabalho. Parecia outra pessoa
falando, o que você acha?

Contei essa parte da história, porque duvido que o Alec saia contando
por aí o que aconteceu, muito menos para a família.
— Ele trabalha bem? — Fiz uma cara de que não entendi. — No

contexto geral da noite de vocês, ele soube o que fazer e você gostou?
— Com certeza, ele soube o que fazer e foi maravilhoso.
— Então se joga, amiga. Homens agem assim quando a relação é
apenas sexual, provavelmente ele tinha algo do trabalho para resolver e

precisou encerrar a ficada de vocês. Por que perguntou?


— Sei lá, me senti estranha.
— Usada?
— Acho que seria essa a palavra.

— Amiga, hoje não existe a palavra “usada” quando você também


teve prazer. Caso fosse algo ruim,  ele tivesse sido escroto com você, ou 
acontecido algo que você não queria, aí, sim, estaria errado. Agora, se você
gozou e foi feliz, levanta a mão para o céu e agradece, porque não é todo
homem que sabe fazer um bom sexo oral. Eu sei o quanto sofri nesses anos.

Não segurei o sorriso e gargalhei com o que a Piper disse. Ela estava
certa, eu precisava aproveitar esse momento, não é todo dia que encontro
um homem disposto a ter apenas sexo oral e não ligar para a minha
virgindade ou falta de experiência. Somente ela sabia me deixar mais leve,

brindamos com o café e fofocamos um pouco mais até o fim daquela tarde.
Amanhã voltaria ao trabalho e, confesso, fazia tempo que eu não
ficava ansiosa para uma segunda-feira. Fazer o que se ama é maravilhoso.
No outro dia, cheguei na empresa às 7h da manhã. Preferia chegar

mais cedo para evitar o trânsito e poder tomar um café com mais calma. No
elevador, aproveitei para ver as atualizações da minha área. Notícias,
eventos e tudo que poderia agregar conhecimento. Saí do elevador olhando
o celular e não prestei atenção na parede de músculos à minha frente.

Trombei e caí feio, meu celular voou longe.


— Me desculpe, eu sou muito distraída, saí do elevador e não prestei
atenção — falei enquanto procurava o celular, mas uma mão o tinha pegado
e estava mostrando para mim. Levantei o olhar e vi a última pessoa que eu

queria ver  agora: Alec Donovan.


— Bom dia, Srta. Harrison. Está tudo bem? Se machucou? — Ele
estava com a mão estendida, esperando que eu a tomasse para que me
ajudasse a levantar. Um cavalheiro no trabalho. Me apoiei em sua mão, não

queria um clima estranho logo agora.


— Bom dia, Sr. Donovan. Agradeço por ter pegado o meu celular e
não se preocupe, estou bem. Sou meio desastrada às vezes.
— O importante é estar bem. Bom trabalho hoje. — Ele se virou para

continuar a conversar com um dos supervisores, e eu segui para a minha


mesa, como uma boa profissional que sou. Aquela simples vitória, em
seguir sem me preocupar, era o que eu precisava para começar bem o meu
dia.
Sentei-me na minha mesa com um sorriso no rosto e fui ligando meu
PC para começar o trabalho, mas nada passa pelo Roddie.
— Bom dia, garota que foge do próprio aniversário. Pelo seu sorriso,
o fim de semana deve ter sido de abalar as estruturas, ou melhor, as pernas.

— Roddie, assim você vai deixar a Lila sem graça. Bom dia, Lila,
você está bem? Vi que caiu na entrada, esbarrando no nosso chefe.
— Estou bem, sim, Fernanda. E o meu fim de semana foi
maravilhoso, Roddie, mas sem comentários. Se divertiram na boate?

— Com certeza, ainda saí com um boy magnífico de lá.


— Eu nunca tinha ido em uma boate tão grande como aquela. Temos
algumas em Montana, mas, como a cidade é pequena, não tem nada daquele
tamanho. Eu adorei. Obrigada pelo convite, Lila.
— Por que vocês chegaram tão cedo hoje? Achei que só eu chegaria.

— Gosto de mostrar produção nos primeiros dias, ainda mais quando


estão nos avaliando a todo momento.
— Normalmente, gosto de chegar cedo nos lugares, mas estou com o
Roddie, essa coisa de nos observarem como em um reality show me deixa

nervosa, morro de medo de ser demitida e ter que voltar para casa.
— Calma, a gente vai conseguir. Basta focar no trabalho e um ajudar
o outro.
O dia correu normalmente. Nós três focados no trabalho, tentando
fazer o melhor o mais rápido que podíamos. O café nunca foi tão meu
amigo como agora. Apesar da loucura e da correria, eu gostei bastante da
empresa e da forma de trabalho, mas algo me incomodava. Sentia como se

alguém estivesse me observando algumas vezes, olhei em volta, e não tinha


ninguém, estranho.
Tomei o meu café e conversei com alguns rapazes que trabalhavam
no mesmo software que eu. Trocamos algumas ideias e até que me diverti

um pouco.
Quando terminei de conversar e voltei para minha mesa, a sensação
era ainda maior. Talvez tivesse tomado café demais. Bem, vamos programar
que a vida não está ganha.

Só por curiosidade olhei para a sala do Alec. Ele tinha uma vista para
toda a operação. No momento em que olhei, a cortina se fechou.
Será que  ele estava me observando?
Não sei. Um sorriso ganhou meu rosto.

Ele estava me observando!?


 

Já fazia horas que eu tentava me concentrar no trabalho.

Horas que a tarde começava a se despedir e dar lugar à noite.

Horas que a Lila se foi, e eu não consigo entender o que a fez se sentir
tão zangada. Isso pode ser algo simples de se resolver, com uma conversa

amanhã ou uma ligação, mas me importa porque algo assim pode passar a

mensagem errada para ela, dando a entender que estou preocupado e


criando vínculos fora da parte sexual.
Eu apenas precisava encontrar algo que me fizesse esquecer o

assunto.

Meu celular emitiu o som de lembrete. Eu tinha colocado para não

esquecer de marcar o meu check-up com o dr. Richard, o único que me

atende desde o acidente. Mandei uma mensagem para ele, explicando o que
eu precisava e, alguns minutos depois, recebo a sua ligação. Até estranhei

que estivesse me ligando em um domingo.

— Boa noite, dr. Richard. Aconteceu algo?

— Boa noite, meu caro Alec. Eu que pergunto, estranhei a mensagem

que recebi com você me pedindo exames antes do tempo. Normalmente eu


tenho que te lembrar deles. Algo mudou?

— Bem, ainda não tenho certeza se é algo que devemos levar em

conta, mas tive certas reações, pequenas e muito rápidas, mas ainda não sei

se foi algo da minha mente ou se foi verdade. Por isso solicitei os exames,

quem sabe, não é?

— Você fez certo em solicitar os exames, não faz mal ter certeza.

Gosto de saber que ainda continua tendo esperança na sua melhora, Alec.
— Eu nunca desisti, doutor. Só não gosto de alimentar expectativas

que podem ser destruídas facilmente, vamos por etapas.

— Ok, amanhã dou entrada nas solicitações e você pode ir na terça-

feira para fazer os exames. Bom domingo, meu rapaz. — Dr. Richard
desligou o telefone, e fiquei pensativo. Na época, havia a possibilidade do

meu problema estar conectado ao meu psicológico. Nunca acreditei nisso,

mesmo tendo o Ross como um ótimo psicanalista, mas será que chegou a

hora de eu dar uma chance? Essa reação me fez pensar se o meu orgulho

não estaria impedindo uma possível solução.

Mandei uma mensagem para Ross, marcando uma consulta na sexta-


feira. Até lá, eu teria os resultados dos meus exames e poderia mostrá-los a

Ross também. Como esperado de alguém tão reservado quanto ele, apenas

me respondeu que deixaria o horário da tarde livre e que me aguardava.

Sem perguntas ou espanto por finalmente eu estar me consultando.

— Lila, talvez você já esteja mexendo com minha vida — falei em

voz alta, mas eu fazia questão de acreditar que não era possível uma mulher

causar algo apenas com o toque.

Sem expectativas.

Cheguei às 6h da manhã na empresa. Fui dormir tarde entre trabalhos

e pensamentos e ainda tive o sono conturbado. Perdi a hora hoje e deixei


para tomar café por aqui mesmo. Assim que cheguei, pedi à minha

secretária que preparasse um café para mim, ela sempre chegava às 6 da

manhã para me acompanhar. Li os jornais mais importantes e, às 7 horas,

precisava estar presente em uma reunião com os diretores dos

departamentos para a pauta da semana.


O tempo passou rápido e desci para o elevador, todos já estavam à

minha espera. Conversando sobre assuntos aleatórios enquanto aguardava a

chegada do elevador, não esperava levar uma trombada nas costas. Alguém
não me viu e foi direto ao chão depois que bateu em mim. Lutando boxe

durante tantos anos, é costume ter uma base sólida e mais firme. Olhei para

o chão e lá estava a culpada pelo meu domingo pensativo e noite

maldormida.

Ela ainda estava desorientada da queda e procurava algo. Vi o seu

celular ali perto e peguei para ajudá-la. Coloquei na sua frente e só aí

levantou a cabeça e me viu, mas parece que não era o que ela queria ter

feito. Seu rosto demonstrava chateação e indiferença, e eu quem causei

aquilo ao que parece.

— Bom dia, Srta. Harrison. Está tudo bem? Se machucou? — Me

preocupei com a queda dela, pois foi algo dolorido de se ver. Ela respondeu

de forma profissional, sem resquícios dos nossos encontros no fim de

semana. — O importante é estar bem. Bom trabalho hoje. — Virei para os

funcionários que me esperavam e segui para o elevador depois que ela

seguiu para sua mesa. Agi normalmente também, afinal, era exatamente

isso que eu esperava quando propus tudo a Lila, mas preciso admitir que

senti uma pontinha de algo que não sei explicar quando ela me tratou como
qualquer pessoa. Talvez tenha sido o meu ego ferido.
As portas do elevador se fecharam e consegui vê-la falando e sorrindo

com os amigos.

Sorri.

Essa mulher tinha o poder de enlouquecer um homem, mas não seria

tão fácil assim me enlouquecer. O dia foi corrido, com algumas reuniões

marcadas e outras urgentes. O nosso software era complexo e precisava de

uma união de equipes, coordenar bem todo o projeto para que se encaixasse

no final, e era tarefa complicada, por isso eu precisava de relatórios

constantes de tudo o que acontecia.

Depois do almoço, voltei para o escritório e, enquanto atendia uma


ligação, fui para a fachada de vidro que dava vista para a produção. Sem

perceber, a estava procurando entre os funcionários, foi algo tão instintivo

que só percebi quando a encontrei. Ela estava tomando um café e fazendo

uma pausa ao que parece. Saí daquela vista para não me deixar levar por

pensamentos.

Algum tempo depois, voltei para aquela vista, tomando um café, e ela

agora estava conversando com um grupo de rapazes da equipe, estavam

sorrindo por causa de algo. A Lila era uma nerd com um corpo fenomenal e

parecia saber disso, pois sempre valorizava seus pontos fortes com um bom

decote, além disso, sua pele de ébano era delicada e macia de se tocar. Eu

era homem e, somente ao vê-la na primeira vez, meu desejo foi despertado.
Esses homens estavam babando em cima dela e parecia que ela não se

importava.

O que é isso?

Ciúmes? Duvido, deve ser mais algo de posse, o meu ego não deve ter

se recuperado ainda. Não acredito que ainda saiba o que é se apaixonar.

Fui direto sentar-me na minha cadeira, precisava ocupar a mente com

trabalho para não me deixar levar pelas coisas. Eu fui claro dizendo que não

queria relacionamentos e que ela estava livre, precisava me conter e seguir

como eu propus. Lila era virgem, e eu era mais velho que ela, um

relacionamento não cabia entre nós.

Resolvi combinar o nosso encontro de fim de semana, assim, não

ficaria com nada na cabeça agora. Mandei uma mensagem para ela.

“Lila, podemos nos ver amanhã? Às 19h na minha casa.”

Precisava não parecer impositivo. Ela também tinha a própria vida

além de mim. Uma mensagem chegou como resposta.

“Desculpe, Alec. Só poderei ir no fim de semana, estou focada na

programação do sistema. Estou totalmente absorvida pelo projeto e sem

tempo.”
Por um lado, foi uma sensação esquisita ser rejeitado. Já fui algumas

vezes, mas fazia tempo que não sentia isso. Por outro lado, eu admirava

Lila Harrison, ela se empenhava no que fazia e, mesmo sendo inexperiente,


estava dando tudo de si para mostrar o que tem. Ela não parecia desistir de

algo, quando traçava sua meta, ia até o fim. Isso me lembrava um pouco de

mim mesmo.

Confirmei o fim de semana, sábado, no mesmo horário.

— Pronto, Alec. Agora você precisa se concentrar na sua vida, pois

projeto importante em jogo — falei para mim mesmo e foi o que eu fiz.

Na terça, fiz os meus exames e voltei para o escritório, me reunindo

com patrocinadores e a equipe de marketing. Fui até o fabricante que


receberia o nosso código e alinhei algumas coisas. Ficaram de nos enviar

mais informações por e-mail.


Na quarta-feira, uma bomba tinha sido lançada na nossa produção, e

eu descobriria assim que chegasse na empresa. Minha secretária me


informou que precisava falar algo urgente para mim, então, a chamei na

minha sala.
— Bom dia, Érica. O que pode estar pegando fogo às 6h da manhã?

— Bom dia, Sr. Donovan. Me desculpe, mas é algo sério. O


fabricante enviou as novas especificações e, após as últimas atualizações,

precisarão do código em outra linguagem de programação, diferente da


nossa atualmente.
— Não acredito, só avisaram isso agora? O quanto isso vai custar à

nossa produção?
— Ainda preciso me reunir com a equipe de planejamento, mas
acredito que vai ser necessário um bom tempo. Precisaríamos pensar em um

plano B para não afetar o geral.


— Essa nova linguagem, os nossos programadores sabem trabalhar

com ela, certo?


— Pelas informações, sim.

— Vamos fazer o seguinte: a partir de hoje, tudo será programado na


nova linguagem. Montaremos uma equipe com os dez melhores
programadores que temos, aqueles que mais se destacaram no relatório que

sai hoje. Eles irão recodificar o que já foi feito, passando para a nova
linguagem.

— Vou buscar o relatório para separar os dez melhores e para


podermos resolver isso ainda pela manhã.

— Obrigado, Érica. Assim que a equipe de planejamento for


informada, peça prioridade nesse novo calendário. Quero saber quanto

tempo teremos de prejuízo. Vou falar com o fabricante também sobre isso.
— Ela saiu do escritório. Nem eram 7h da manhã ainda e já apaguei um

foco de incêndio, mas ainda tinha outros para resolver. Hoje precisarei de
café.

Todos os preparativos foram feitos, Érica separou a lista dos melhores


da equipe, e eu conversei com o planejamento. Às 10h30 da manhã, me
informaram que seriam necessários algo em torno de 8 a 12 dias para a
recodificação e teríamos um atraso de um mês no cronograma final. Eu não

esperava tanto tempo, mas essas coisas são demoradas pelo cuidado que
exigem com o código, não tinha muito o que fazer.

À tarde, interrompi a produção para um aviso que mudaria algumas


coisas, esperando que não complicasse tudo. Principalmente para uma das

pessoas do ranking. Todos se organizaram ao redor da escada que levava


para a minha sala, eu estava uns degraus acima para ver a produção

completa.
— Boa tarde, pessoal. Tenho algumas notícias que precisarão da

compreensão de todos. Hoje pela manhã, o fabricante informou que o


produto passou por uma atualização e teremos que mudar a linguagem de

programação do nosso software. — Na mesma hora, ouvi um som de


desânimo de todos. Sei como é complicado mudar um projeto em

andamento. — Calma, pessoal. Temos um plano B para isso: separamos os


dez programadores que tiveram o melhor desempenho na última semana,
eles serão responsáveis por recodificar o que programamos até agora, o

restante de vocês passará a programar agora na nova linguagem. Assim,


diminuímos o prejuízo. — Todos pareceram concordar com o plano.

— Quem serão os dez programadores? — um funcionário perguntou.


— Estou com a lista aqui na mão, quando eu chamar um nome, se

dirija até a sala de reuniões. Lá, passarei mais informações sobre como
iremos proceder. — Comecei a ler os nomes e as pessoas foram saindo. —

Rodrick. — Um dos amigos da Lila foi chamado. As meninas o


parabenizaram, que seguiu. — Camilla — em seguida, a chamei, que foi

parabenizada pela amiga. O melhor desse relatório ser feito e eu nem ter
noção é que ela pode ter a certeza do seu talento, sem duvidar que eu mexi
algum pauzinho para isso. Estava orgulhoso por ela.

Por último, chamei a Fernanda, ela foi o nome quem fechou os dez
melhores. Deixei o restante com o supervisor, que iria falar como seguiria o

plano com eles, e segui para a sala de Reuniões. Todos estavam empolgados
e felizes por estarem naquela lista, mas eu não podia alimentar tanta

felicidade.
— Parabenizo todos por estarem nesta lista, mas não pensem que isso

é algo muito positivo. Em contrapartida, vou estar bem mais perto de vocês,
exigir muito mais de todos. Temos dez dias para recodificar tudo. — Eu

usei um meio-termo do tempo que me deram. — Nesses dez dias, vamos


analisar o seu desempenho e é possível que alguns de vocês sejam

desligados da empresa, a depender do seu desenvolvimento no período do


programa. Tudo dependerá do que vão me entregar nesse período. A

empresa fornecerá a alimentação que quiserem e quando quiserem e


transporte de ida e volta. Irão trabalhar de 7h da manhã até 10h da noite,

inclusive no fim de semana. Todos irão receber hora extra por tudo que
passar do horário comercial.

Todos permaneciam calados, me observando com um olhar de


espanto, como se sentissem agora o peso de estarem aqui, nesta sala.

— Lógico, vocês não são obrigados a continuarem aqui. Podem voltar


para a outra equipe, e eu chamarei o próximo da lista. Porém, para todos

que sobreviverem a esse tempo, receberão um bônus salarial ao final do


projeto no valor de 30% do seu rendimento anual. — Eu tive medo de que

todos recuassem para a zona de conforto, por isso fui direto em um ponto de
difícil recusa. Era um valor considerável e tive a resposta que esperava.

Todos aceitaram estar na equipe.


Sorri de satisfação. Agora eu tinha a equipe dos sonhos dessa

empresa, eles estavam em processo, sendo moldados, mas evoluíam


rapidamente.
— Tudo começará a partir de amanhã. Podem voltar para casa e

organizar os seus horários, às 6h da manhã, um carro estará à sua espera.


Boa tarde, pessoal.

Levantei-me e segui para o corredor. Érica veio atrás de mim.


— Sr. Donovan, o senhor esqueceu de falar do Hackathon.
— Não, Érica, foi proposital. Não posso despejar tudo de uma vez
neles, causaria somente ansiedade e preocupação. Primeiro eles precisam

vencer esse desafio, os melhores ganharão o próximo, vencer o Hackathon.


Ao final dos dez dias, os aviso. — Qualquer outra pessoa poderia
considerar isso uma sobrecarga de trabalho. Eu acredito que uma equipe

evolui com pressão e desafios, e eles iriam evoluir muito ainda.


Esta era uma oportunidade de ouro, e não poderia deixar passar. Um

Hackathon especializado em segurança digital, vencer seria um baita


portfólio para a empresa e para os programadores. Quando se trata de

negócios, sou implacável. Aqui não é o paraíso; minha empresa, meu


dinheiro, minhas regras, e eu mostraria a todos o quanto somos bons.

Meu encontro estava oficialmente cancelado.


Na quarta-feira, todos chegaram cedo e foram direto para a nova sala

que foi preparada. Eles estariam separados da outra turma, precisavam


entender como desenvolveram antes e passar tudo para a nova linguagem.

Trabalharam focados, não paravam para almoço, comiam enquanto


codificavam, eles realmente tinham sede de poder, de mostrar o que tem.

Meu telefone toca, e é o dr. Richard.


— Boa tarde, dr. Richard. Imagino que tenha os resultados do exame?

— Boa tarde, Alec. Sim, tenho e devo lamentar que nada mudou em
você. Tudo continua exatamente como antes.
— Nem uma pequena diferença?
— Bem, uma pequena veia parece ter se restabelecido, mas nada que

faça você sentir algo como descreveu. Vamos continuar procurando. — Ele
sabia que eu tinha desanimado.

— Certo, me mande esses resultados por e-mail. Quero dar uma


olhada. — Ele assentiu e desligou. Pouco tempo depois, todos chegaram no

e-mail e encaminhei diretamente para o Ross, informando que esse foi o


check-up mais recente. Não sei se o Ross conseguirá me ajudar em algo,

mas agora estou curioso com o que senti.


O dia terminou e já tivemos a primeira desistência da equipe. Um

programador não teve atenção e apagou cinco linhas de código, e a equipe


precisou perder duas horas para entender o que tinha ali e reprogramar.

Seria necessário virar a noite para reprogramar o que foi perdido. Eles
pareciam ter percebido que o programa não era brincadeira. O que
aumentou o foco, mas também a tensão.
Eu me permiti observar a Lila esperar o elevador. Da minha sala, não

conseguia ver muito do seu semblante, mas pela sua postura parecia estar
cansada, exausta do dia. Meu primeiro instinto foi abraçá-la e cuidar da sua
saúde, a razão e a emoção gladiavam dentro de mim, mas a razão ganhava
no momento. Lila entrou no elevador, e eu segui para a minha mesa.

Precisava manter a distância profissional, para não confundir as coisas.


A sexta-feira chegou e, quando o turno acabasse, talvez mais uma
pessoa desistisse, foi assim quando estudei em meus cursos, a grande

maioria não suportava a pressão. Eu não me orgulhava de toda essa tensão,


mas eu precisava de excelência.
Adiantei toda a minha agenda da tarde e fiz o que precisava, depois
segui para o consultório do Ross. Ficava em um dos prédios empresariais
do centro da cidade, não muito longe da minha empresa. O elevador abriu

direto na recepção do seu consultório, ele era dono do andar inteiro e a


decoração do lugar sempre era a mais calma possível, o tratamento
começava assim que você entrava.
Avisei a recepcionista que tinha horário marcado, e ela disse que eu

poderia entrar no consultório, o meu sobrinho já me esperava. Entrei e ele


estava absorto em um caderno, acredito que era onde anotava as sessões dos
pacientes.
— Pelo jeito, vou ser mais uma folha em seu caderno, Ross. É melhor

separar um só para mim, a história é longa. — Ele sorriu com a minha


entrada.
— Boa tarde, tio Alec. Pode deixar que terá espaço suficiente aqui.
Pode se sentar e se acomodar. — Ele veio até mim alguns minutos depois.

— Bem, vi seus exames e realmente não se tem nada de diferente ali. Seu
quadro continua de impotência, mesmo seu corpo estando em perfeito
estado.

— Eu juro que senti algo de diferente, essa sensação é nova, mas não
sei explicar. Recorri à única alternativa que nunca dei chance, você.
— Eu acredito, fortemente, que é algo psicológico. Vou fazer algumas
perguntas do seu passado, é importante para definir algumas coisas que

podem interferir com o seu presente. Como era a sua relação com Abbie
antes do acidente?
— Nossa agenda era apertada, mas sempre dávamos um jeito de estar
juntos. Eu a amava mais do que tudo, ela era o meu mundo. — Me deixei

levar pela nostalgia e me lembrei de quando eu fui feliz. Fazia tempo.


— E como foi depois? — Meu rosto se fechou. — Me desculpe, sei
que deve ser difícil voltar a certas memórias, mas é preciso encará-las.
— Depois? Depois não existia mais a Abbie, apenas uma casca do
que ela foi um dia. Eu a fiz muito mal, arranquei sonhos que um dia ela teve

comigo, eu fui o culpado pela sua frustração. Não mereço ser feliz depois
de tanto mal que causei. — Uma dor no peito veio junto das lembranças.
Aquela noite em que ela chorou em meus braços. Ainda doem em mim as
palavras.

— O que aconteceu, antes de você sentir o que sentiu?


— Estou saindo com uma pessoa, algo meramente sexual. — Mesmo

sendo algo sigiloso, preferi não mencionar o nome da Lila para não termos
uma situação constrangedora aqui. — Na primeira vez que a conheci, ela
tocou o meu rosto e isso gerou algo diferente. Foi a primeira vez que senti
como se meu pênis reagisse, mas foi rápido.
— Aconteceram quantas vezes?

— Duas. Na segunda, foi quando estávamos juntos e a excitação dela


e o prazer que a proporcionei me fizeram sentir novamente o meu pênis
querendo ficar ereto, durou um pouco mais, só que ainda foi fraco.
Formigamento, não tenho forma melhor de descrever.

Ross anotou algumas coisas no caderno, quis saber o que era, mas ele
nunca revelaria.
— Vou ser bem sincero, o que você tem não se resolve com uma
consulta apenas. Precisará de um tratamento para nos aprofundarmos nessas

dores, lembranças de cinco anos atrás que ainda doem ao serem revividas.
Você está preso ao passado, no mínimo, e isso gera consequências no
presente e no futuro. Nosso corpo reage muito ao que a gente pensa. A
história da Abbie já me mostra uma possibilidade: sua mente pensa que

você não merece mais ser feliz por toda a dor que a causou, e você é o
culpado de tudo. Por pensar assim, a impotência torna-se um “castigo” da
mente a você mesmo. Entretanto, você não pode ter sido o culpado de tudo

e nem ela, já que o que aconteceu foi um acidente, entende?


— Confesso que é algo a se pensar. — Ele tinha um ponto no que
falou.
— Isso que falei vai levar um tempo para se burlar, digamos assim.

Um tempo para que sua mente entenda isso que falei, que seja
reprogramada. Até lá, indico que não evite o que sente por essa pessoa que
está agora. Se ela foi a única que causou essa reação e se te faz bem,
mergulhe de cabeça. Quem sabe ela não é a solução?

Saí do Ross e tive que admitir que eu deveria ter vindo antes. Ter
deixado de lado a ideia de que resolveria tudo com o tempo e sozinho. Ele
levantou questões interessantes, por isso agendei minha segunda consulta
assim que saí de lá, mas ainda não estava pronto para me entregar
completamente de novo.

Quanto a Lila, não poderia fazer o que ele me pediu. Isso seria me
abrir para outra pessoa, e não estou preparado e, para ser sincero, nem sei se
quero. O que eu venho sentindo por ela nada mais é do que carência, o
corpo relembrou como era ter um toque feminino e reage dessa forma.

Voltei ao escritório, precisava terminar algumas coisas do dia e que


atrasaram um pouco. Trabalhei direto até 2h da manhã, parando apenas para
comer algo e tirar uma pequena pausa. Meus olhos estavam cansados de

tanto tempo na frente do computador.


— Acho que é melhor encerrar por hoje. — Levantei-me e preparei
um drink para mim, uísque seria a bebida da vez, somente para relaxar um
pouco. Bebi enquanto algumas lembranças antigas aproveitavam a conversa

de hoje para ganhar vida na minha mente. Abbie dançando, seu sorriso, o
dia em que casamos... Hoje eu só permitiria as melhores.
Andei em volta da minha sala enquanto terminava meu drink para ir
embora. Parei por um breve instante para contemplar aquele ambiente e o

que ele representava, o que eu construí em todos aqueles anos. Pensei em


como os meus negócios se tornaram o centro do meu mundo e me ajudaram
a seguir em frente depois de tudo. E eu realmente me sentia orgulhoso da
pessoa que sou, que me tornei.

De repente, algo me chamou à atenção. Observei um pontinho verde


em uma mesa, tão encolhido que quase passava despercebido. Tentei focar
um pouco mais e percebi que era Lila.
— Ela ainda está aqui a essa hora?

Desci a escada sem fazer barulho para não a assustar. Me aproximei e


percebi que ela estava em um sono profundo. Tinha olheiras em seu rosto e
estava com uma aparência de quem não dormia bem há dias. Ela estava
dando tudo de si.
— Você realmente me surpreende, garota. — Sorri com a visão de
uma mulher que não se deixava abater pelo cansaço até completar o desafio.
Eu já a tinha como vencedora.
Menti para mim mesmo. Eu gostaria de poder me abrir com alguém,

com a Lila, mas não vejo como eu acrescentaria coisas boas em sua vida.
Sou um homem amargurado por um acidente do passado, ela é uma virgem
que merece ter o máximo de experiências na vida, eu não poderei lhe
proporcionar isso.

— Quando eu passei a me importar tanto com você? — Perguntei pra


mim mesmo. Tirei uma mecha de cabelo do seu rosto e coloquei atrás da
sua orelha. Ela se mexeu um pouco. Eu precisava mandá-la para casa, mas
somente acordá-la e falar para descansar não me pareceu suficiente. Nossa
relação era de chefe-funcionária, mas eu decidi flexibilizar um pouco as

coisas.
Fiz um café e trouxe comigo alguns cubos de açúcar e sachês de
creme para ela escolher. Voltei à sua mesa e toquei gentilmente em seu
ombro, Lila demorou um pouco para despertar, mas, quando acordou, quase

derrubou o café, assustada.


— Alec... Sr. Donovan, desculpe. Perdi a hora, encostei um pouco
para descansar os olhos e peguei no sono. Já vou indo para casa. — Ela
começou a arrumar suas coisas, toda agitada. Eu coloquei minha mão sobre
a sua para lhe acalmar.
— Lila, fiz um café para você. Não sei exatamente como gosta...
Ela olhou para mim sem entender. Parecia realmente surpresa com

meu gesto, mas o sorriso doce e tímido que ela destinou a mim foi a melhor
das recompensas.
— Ah! Não precisava mesmo, Sr. Donovan. Que gentileza... — ela
disse aceitando a bebida — Um café quentinho com duas colheres de creme

e um cubo de açúcar. — Ela respondeu e olhei para ela sem entender. — É


assim que preparo o meu café, sempre gostei das bebidas mais doces.
— Nossa, somos o oposto nessa questão, então. — Sorri, o clima
ficou mais leve. — Tome o café primeiro, com calma, e então o motorista

irá levá-la embora. Não se preocupe, você não dormiu durante o expediente.
— Ela sorriu e agradeceu enquanto tomava o café que fiz. — Como anda o
trabalho? Está conseguindo acompanhar o ritmo da nova equipe?
— Está bem puxado, na verdade, mas amo um desafio. Acho que por

isso me tornei uma programadora, sempre existirão desafios para


solucionar. Preciso de mais tempo de estudo para compensar a falta de
experiência, mas chego lá. — Essa positividade dela era contagiante. A
observei por um tempo, perdido em pensamentos. — Olha, acho que vou
precisar cancelar o nosso encontro nesse fim de semana por causa do
trabalho. Podemos jogar para a próxima semana? — O encontro! Eu pensei
em cancelar e esqueci de avisar a ela.
— Claro, sei que está bem cansativo o ritmo. Eu ia te avisar isso, ia

cancelar, mas com a correria acabou passando despercebido. — Levantei-


me para arrumar as minhas coisas e ir embora. Me virei, mas antes
precisava falar uma coisa. — Continue com o bom trabalho. Os relatórios
são feitos e eu só recebo os resultados, portanto, você chegou nessa equipe
porque merece. Eu não apoio favoritismo, nem facilito pra ninguém, porque

acredito em trabalho duro. Fique ciente disso.


— Eu não esperaria menos do que isso, Sr. Donovan.
Horas depois, peguei o elevador sorrindo. Desci com as minhas
coisas, e ela já tinha ido embora.

— Na próxima vez que estivermos juntos e eu puder tocá-la, garota,


se prepare.
Pensei nela nua.
O formigamento voltou.
 

O fim de semana passou e recebi relatórios do andamento do projeto.

Ao que parece, as coisas acabariam antes do esperado, a equipe está

acelerada com a nova linguagem, conseguiram dominar rapidamente. Dessa


vez, acertaram a mão nas contratações, cabeças inexperientes também têm

muito que oferecer. Basta apenas uma chance e voam.

Isso me lembra bastante quando comecei. O nome da minha família e


minha parte na herança ajudaram bastante, mas precisei passar pelo estigma

de comparação e redução de talento, no meu caso. Por ter algumas coisas


consideradas difíceis para a maioria de forma fácil, as pessoas achavam que

eu não tinha conteúdo.

Graças à minha visão e à minha pouca idade, tive tempo para

aprender com os erros e aprimorar a tática empresarial, me favorecendo

com uma boa visão de mercado. Ir aonde ninguém foi ainda, dar chance a
quem todos rejeitam por pré-julgamento.

Infelizmente, algumas pessoas ficaram pelo caminho.

Eles não tinham o que eu procurava, mas isso não os tornou ruins no

que fazem, saíram com cartas de recomendações e até indicações para

outras empresas. A cada dia, quando eu recebia a análise de


desenvolvimento e descobria que não era ela a pessoa que sairia, tinha um

pequeno alívio.

Algo que ainda não entendia.

Nunca duvidei do seu talento, mas tinha medo de que algo a levasse

para longe dos meus olhos. Estranha sensação.

Boa, mas ruim ao mesmo tempo.

Me encostei na cadeira do escritório. Estava cansado. Hoje era o


penúltimo dia da equipe, ao que tudo indicava, amanhã avançaríamos mais

uma etapa no projeto. Eram 11h da noite de uma terça-feira, e eu desejava

que fosse sexta. Queria descansar, tê-la em meus braços, sentir o seu gosto

novamente.
— Lila, você me deixou viciado.

Érica bateu na porta, avisando que iria embora. Avisou que amanhã,

às 10h da manhã, falaríamos com a equipe. O último relatório foi bastante

positivo. Restaram cinco pessoas, cinco talentos que poderiam nos render

ainda mais vitórias.

Me despedi dela e me aprontei para ir embora. Precisava estar bem


para amanhã, seria um grande dia.

No horário combinado, fui até a sala de reuniões. O cansaço era

evidente e a quantidade de latinhas de energéticos mostrava o quanto

tentaram ficar acordados.

— Bom dia, pessoal. Antes de qualquer coisa, gostaria de parabenizá-

los por terminar o projeto antes do esperado. Sei que deram o máximo que

podiam em um espaço de tempo tão curto e os admiro por isso. — Todos

aplaudiram o desempenho. — Sei que faltam apenas alguns ajustes finais,

mas analisei tudo o que precisava. A peneira foi um pouco tensa e foi

finalizada com a saída da última pessoa. Vocês foram os melhores,


trabalharam bem e merecem essa vitória. Por isso, tenho algo para informá-

los: por terem chegado até aqui, todos vocês têm um lugar na equipe que

representará a Secret Digital Security no Hackathon.

Não senti a animação que esperava, todos me olhavam como se não

tivessem mais energia para nada.


— Calma, não é para agora. O evento começará em uma semana,

perto da véspera de Natal. Todos podem descansar, hoje somente

terminarão o que falta e podem ir para casa. — Senti o alívio estampado no


rosto de todos. Uma das programadoras levantou a mão.

— Desculpe, Sr. Donovan, a participação é obrigatória?

— Não, vocês podem recusar e voltarão a trabalhar no código, como

estavam antes dessa troca de linguagem.

— Então eu prefiro ficar de fora, não aguento mais tanta tensão.

— Nenhum problema, pode falar com Érica e informar que não

deseja participar. Alguém mais gostaria de se pronunciar sobre isso, falar

algo? — Todos ficaram em silêncio. Lila me observava, mas seu olhar

estava distante, como se estivesse no piloto automático. — Acho melhor

que todos tenham folga pelo restante da semana. Somente quero vê-los

novamente na segunda-feira. Parabéns, novamente. — Saí da sala e ouvi

sorrisos e comemorações. Eles mereceram tudo. A pontinha de orgulho da

Lila estava cutucando meu coração.

— Sr. Donovan, você deseja que coloquemos alguém no lugar da

programadora que saiu?

— Não, Érica. Nesses eventos, uma equipe de três pessoas é o

mínimo e já temos o suficiente. Apenas cuide de dar a folga que merecem e


depositar o bônus que falei que daria a quem ficasse até o fim. — Ela

assentiu e foi para a sua sala.

O código foi concluído e conseguiram unir com o restante que estava

programado já na nova linguagem. As coisas estavam fluindo e talvez tudo

estivesse terminado antes de um mês. O cliente estava tranquilo porque

sabe que foi erro dele não avisar sobre a atualização, e eu fiz questão que

soubesse na reunião que tivemos.

Pelo jeito, eu não veria a Lila pelo restante da semana, remarcamos e

nos veríamos somente no sábado. Estava mais perto do que nunca. À noite,

quando estava tomando um copo de uísque na varanda do quarto, meu


celular avisou de uma notificação. Era uma mensagem da Lila.

“Obrigada pela chance de trabalhar na sua empresa e pela

bonificação. Vou ficar ainda melhor no Hackathon.”

Uma mensagem tão simples, mas que fez as batidas do meu coração,

por um segundo, errarem o compasso. Respondi:

“Não precisa agradecer, você já mostrou do que é capaz e sei que não

vai se contentar, vai ficar cada vez melhor. Faça bom uso do bônus e espero

nada menos que a vitória no evento.”

Gostaria de ter agradecido por ter entrado na minha vida, mas não sei

ainda o que sinto pela Lila. Acredito que seja apenas alguém que me fez

sentir uma reação que eu procurava há muito tempo e não queria gerar
expectativas de algo que não aconteceria, algo mais além do que temos

agora. Era isso. Deixei a mensagem assim.

Uma jogada arriscada que poderia fazer me arrepender depois.

Agora deixo com o tempo, mas nunca erro.

Para tudo se tem uma primeira vez.

A quinta passou rapidamente e a sexta-feira era o dia das minhas

consultas com o Ross. Seria a segunda consulta, mas já sentia diferença na

forma como olhava para certas lembranças. Apesar disso, não vi mudanças

nas reações do meu amiguinho impotente. O formigamento aparecia às

vezes quando pensava nela, mas era só isso.

Não sei se o Ross realmente estava me ajudando com a impotência,

mas estava me ajudando com a saúde mental, isso era inegável. Meu sono

estava menos agitado, algumas recordações boas que eu tinha me esquecido

voltaram à mente. Era como uma nuvem escura saindo e deixando a

claridade voltar a iluminar.

— Como você se sente hoje?

— Bem e isso é algo que raramente digo. Os meus pensamentos estão

melhorando, pouca coisa ainda, porque temos pouco tempo, mas sinto
algumas lembranças menos doloridas somente pela forma que passei a

pensar nelas.
— Muito bom, fico feliz que esteja sentindo melhoras. Vou pedir que,

para a próxima semana, escreva em um caderno como se sentiu durante o

dia. Mudanças de pensamento, de sentimento, tudo que fizer diferença.

— Vou tentar. Acho difícil lembrar de anotar tudo, mas vou tentar. —

Agendei a próxima consulta e fui para casa. Amanhã seria o dia em que

veria a Lila, finalmente. Precisava estar descansado, queria aproveitar o

máximo que podia dela. Estava ansioso e isso era totalmente evidente.

Uma mensagem da Lila chegou no meu celular. Ela tentava cancelar o


nosso encontro por achar que deveria descansar mais para o evento.

— Nada disso, deusa de ébano. Dessa vez você não vai escapar. —
Mandei uma mensagem explicando que ela iria relaxar muito mais aqui,

prometi que valeria a pena e pedi que confiasse em mim. Por fim, ela
aceitou, mas falou que, se ficasse com sono, voltaria para casa. — A última

coisa que você terá é sono aqui.


Pedi que a chef de cozinha que trabalha para mim preparasse um

jantar para duas pessoas e dispensei todos os funcionários no fim de


semana. A casa precisava de privacidade total para o que eu planejava.

Às 21h horas, a campainha tocou.


A batida descompassou.
Abri a porta, e Lila estava parada ali, de frente para mim em um

vestido leve, mas que marcava todos os lugares que eu desejava.


— Boa noite, Lila. Seja bem-vinda novamente. — Ela passou por
mim e o seu perfume ficou no ar.

Formigamento.
Nos sentamos para jantar e um vinho da minha adega acompanhava a

refeição. Lila tomou um pouco mais da taça dessa vez e parecia gostar,
ficou mais risonha e leve. Como nunca bebeu, um vinho desses poderia

deixá-la levemente embriagada, não me lembrei disso.


Ela começou a falar um pouco sobre a cidade, assunto que nunca
comentou.  Será que foi o vinho?

— Acho engraçado que, quando a conheci, percebi uma mulher com


uma personalidade forte, que não teve a vida fácil e precisou lutar pelo seu

espaço, mas também vejo uma mulher que não desiste da vida e que
acredita até o fim. Uma energia positiva, algo que parece totalmente o

oposto de alguém que parece ter tido alguns reveses da vida. Como
consegue não ser destroçada pelas frustrações? — A pergunta era

verdadeira, gostaria de ser uma pessoa assim.


— Isso é um dom passado do meu pai para mim. Ele era fantástico, o

pai perfeito, mas talvez sua alma fosse perfeita demais para andar entre nós,
mortais. Ou pelo menos é assim que gosto de acreditar. Meu pai morreu

quando eu completei dez anos. Ele era da Marinha, mas foi a terra quem o
matou.
— O que aconteceu?
— Foi atropelado por um motorista bêbado. — Seu olhar parecia

reviver um momento que a arrastava para baixo. — Depois disso, minha


mãe teve alguns relacionamentos errados e cresci me cuidando sozinha. Até

que eu me candidatei para as universidades e passei. Saí da cidade, estudei e


conheci a realidade da vida adulta até ter a chance na sua empresa. É isso.

Não tenho uma grande história.


— Não acredito nisso. Você tem uma história de uma pessoa que,

apesar de ter o seu chão roubado, fez de tudo para continuar em movimento.
— Seu jeito de falar me lembra um pouco meu pai. — Fiz uma careta,

não queria que ela me comparasse ao pai agora. A idade doeu um pouco.
— Calma, não é nada disso. — Ela sorriu. — Eu gosto disso em você.

Essa positividade que vê em mim é graças a ele. Sempre que eu estava em


um péssimo momento, pensava: “Como o Sr. Charles reagiria a isso?” e

seguia a vida. Ele sempre se levantava e tentava novamente.


— Parece ser um cara de bom caráter. Apesar de ter ficado pouco
com você, ajudou a criar uma personalidade incrível. — Ela me olhou,

sorrindo, como se agradecesse por isso.


— Acredita que achei que não entraria na sua empresa? Achei que

tinha feito uma péssima entrevista. A mulher do RH mal olhou para mim,
apenas fez algumas perguntas e as minhas respostas, ao que parece, não lhe
agradaram e encerrou a entrevista em cinco minutos, nem me deu chance de

falar direito. — Um dia, talvez, ela entenderia.


Levantei-me da cadeira e fui pegar o meu presente, chegou a hora de

encerrarmos esse assunto e partirmos para o que interessa. Dei a ela a caixa,
que ficou sem entender.

— Comprei para você. Troca de roupa no banheiro que fica aqui no


térreo, te espero lá fora. — Ela parecia olhar para a área da piscina e para o
relógio, como se pensasse que a água estava fria.

— Não precisa se preocupar, a piscina é aquecida. Estou esperando.


— Segui para a área externa, troquei o short e peguei o brinquedinho de

hoje. Uma bolinha de gel afrodisíaco para usar por fora e animar as coisas.
— Acho que você comprou um número menor que o meu. — A parte

de cima do biquíni cobriu apenas os mamilos e a de baixo ficou um fio


dental. Ela estava muito gostosa e comprei um número menor de propósito,

esse biquíni era para o meu olhar.


— Está perfeito. Vamos para a piscina. — Entrei primeiro, e ela

entrou depois de mim.


— Alec, onde estão seus funcionários? Dessa vez, estamos do lado de

fora.
— Dispensei todos, queria privacidade para nós dois aqui. — Me

aproximei da Lila e a beijei com toda a vontade reprimida nessas últimas


semanas. A beijei com desejo, com ardência, com vontade. Ela

correspondeu exatamente como eu queria.


Senti seus mamilos roçando na minha pele e já estavam intumescidos.

Pareciam duas sementes do prazer me chamando. Coloquei a parte de cima


do biquíni para o lado e abri espaço para que o seu peito ganhasse total

liberdade. Abocanhei um dos mamilos, e Lila gemeu sem medo, sua voz
gemendo dessa forma me enlouquecia.

Eu queria mais.
O formigamento voltou, mas eu não estava mais pensando nele ou em

quanto tempo ficaria, estava concentrado no corpo à minha frente, que se


contorcia de prazer com o meu toque. Eu a proporcionava isso. Enquanto

sugava seu mamilo, desci a mão até a sua abertura mergulhada na piscina.
Brinquei com o clítoris e coloquei dois dedos dentro do seu paraíso, ela

gemeu ainda mais. Tirei os dedos e ouvi uma nota de descontentamento dos
seus lábios.
— Você não vai gozar agora. Ainda tenho um presente para você.

Saí da piscina e fiz um gesto para que me acompanhasse. Fiz questão


de enxugá-la por completo e disse que se deitasse na cadeira da piscina. Era

uma cadeira de madeira forte, aguentaria bem o que eu queria.


Tirei o seu biquíni e a deixei totalmente nua, esse corpo me fazia

desejá-lo inúmeras vezes.


— Abra as pernas para mim, como fizemos na cadeira do escritório.
— Ela fez. Uma das coisas que adorava na Lila, ela confiava em mim e

fazia as coisas que eu pedia, sem questionar. Coloquei a bolinha de gel na


minha mão e tomei os seus lábios enquanto despejava o gel por sua vagina
deliciosa.

Eu, primeiro, a faria sentir uma calor gostoso e, depois, o frio de um


cubo de gelo. Como era comestível, eu poderia abocanhar a qualquer

momento e foi o que eu fiz. Deixei que ela estivesse no ponto de desejar
qualquer coisa e a sua cara falava isso.

— O que você quer, Lila? Fala para mim.


— Eu quero... quero... preciso que você me faça gozar. — Senti um

formigamento ainda mais forte dessa vez, será que...?


Desci e fiz um sexo oral delicioso nela. Suguei seu clítoris enquanto

introduzia dois dedos na sua entrada. Ela rebolava na minha mão, louca de
prazer. Subi para beijá-la e fui surpreendido por ela. Lila mudou de posição

e me colocou embaixo dela.


— Lila, eu não posso...

— Eu sei, me deixar testar uma coisa. — Ela começou a esfregar sua


boceta no meu pau e aquela visão, mesmo que eu não estivesse ereto ou

dentro dela, me fazia sentir como se estivesse acontecendo. Meu tesão


também estava nas alturas, como uma memória muscular.
Lila se esfregava com vontade. Aproveitei para segurar seus mamilos
e abocanhá-los. Ela teria prazer de duas formas, e isso não demorou muito

para fazê-la chegar no auge. Lila gozou e gemeu alto. Foi uma das melhores
sensações que eu já tive nesses últimos cinco anos.

Ela se deitou por cima de mim, e eu fiquei olhando as estrelas,


estavam lindas, por sinal.

— Lila, quer tal irmos lá para cima e continuarmos? — Ela não me


respondeu. — Lila, você ouviu? — Ela não falou, tive como resposta uma

respiração pesada como se ela estivesse dormindo.


Virei um pouco para olhar o seu rosto, e ela realmente dormiu em

cima de mim. Deve ter juntado o cansaço do trabalho com o vinho e toda
essa agitação de agora, suas energias esgotaram. Fiquei um pouco ali,

sentindo como seria tê-la dormindo em meus braços, não seria ruim estar
com ela todos os dias, mas não seria justo também.
Uma estrela cadente riscou o céu. Não sou supersticioso ou acredito
nessas coisas, mas com o Ross foi a mesma coisa, e percebi que estava

errado. Não custa tentar. Fiz um pedido que, se fosse possível, gostaria de
dar o máximo de prazer que a Lila poderia ter.
Levantei-me devagar da cadeira e a peguei no colo. A levei até o meu
quarto e a coloquei na cama, cobri com um dos lençóis e me deitei ao seu

lado. Queria aproveitar ao máximo tudo isso. Adormeci rapidamente.


Relaxei depois da Lila e sonhei conosco, com o dia em que nos conhecemos
mesclado com algumas cenas de prazer nossa.

 Acordei com alguns raios de luz no meu rosto que estavam passando
pelas frestas da cortina. O relógio de cabeceira marcava 8h da manhã. Virei
para o lado para dar bom dia à minha deusa de ébano.
A cama estava vazia.
Um bilhete estava em cima da mesa de cabeceira do seu lado.

“O homem é mortal por seus temores e imortal por seus desejos


(Pitágoras).
Você só pode ser luz ou sombra nessa vida, Alec. Escolha qual dos dois
você quer ser, mas não deixe o medo do passado lhe impedir de ser o que

deseja.”
Ela foi embora antes que eu acordasse.
Naquele dia, eu a mandei embora. Foi isso que a magoou. Dessa vez,
ela se foi antes que eu falasse algo.

Um vazio me assolou.
Não se tinha sorriso e não se tinha Lila.
— Droga, Alec. Como você deixou isso acontecer?
Minha razão estava perdendo a batalha contra a emoção.

Perdendo feio.
— Talvez seja melhor assim, ela com raiva e não se apegando a mim.
Melhor para quem?
 

Cheguei em casa, eram 7h da manhã.


Despertei às 6h horas da manhã, nua. Demorou um pouco para a
mente lembrar o que aconteceu. Eu apaguei depois de gozar. Não posso
negar que precisava disso, hoje estava relaxada e menos tensa, mas não

deveria ter apagado daquela forma. Não consegui segurar, o cansaço veio
com tudo.
Consegui sair antes que ele acordasse.
Prometi para mim mesma que ele nunca mais me mandaria embora,

como naquele dia. Acho que ele fez e não percebeu, mas quem sentiu a dor
fui eu. Eu sei o meu lugar e isso não iria se repetir. Por que, então, Alec
ainda dominava seus pensamentos?
Ele estava nos meus sonhos e na minha realidade. Em todo lugar que

olhava, o encontrava.
— Você não pode se apegar a ele, Lila. Pelo seu próprio bem, evite
isso.
Uma mensagem chegou e meu coração acelerou, mas era a Piper.

Parecia uma apaixonada, esperando ansiosa o amado. Eu, hein!


Piper queria sair, mas respondi avisando que estava cansada e
precisava recarregar as energias para o que viria no trabalho. Era isso, agora
era a vez de focar no Hackathon. Esse evento poderia alavancar ainda mais
minha carreira profissional e, quem sabe, conseguir trabalho em uma

empresa ainda melhor.


Depois de tudo que falei do meu pai a Alec, veio uma vontade de
ligar para minha mãe. Apesar de tudo, eu me sentia na obrigação de pelo
menos checar se estava tudo bem. Liguei para o número da minha mãe e

esperei que atendesse, mas a voz me fez gelar na mesma hora.


— Alô? Alô? Quem é o filho da puta ligando para a minha mulher,
hein! — Eu não consegui responder, eu não consegui desligar. Aquela voz
fez um frio correr pela minha espinha. Ouvi, de longe, a voz da minha mãe

brigando com ele por ter atendido e a ligação caiu. Minha mão estava
tremendo e minha respiração acelerou.
Respirei fundo, tentando me acalmar. Ele não sabe quem eu sou, não
viu o número, apenas atendeu. Logo depois recebi uma mensagem. Pediu

que eu não ligasse depois das 20h ou nos fins de semana, senão criaria
problemas entre ela e o meu padrasto.
Sempre foi assim, ela o colocava acima de mim.
Não sei por que ainda me importava com ela.

Na verdade, eu sei.
Meu pai sempre conversava comigo sobre suas aventuras, mas não
me iludia. Dizia sobre os perigos do mar e como o seu trabalho o colocava
em situações arriscadas. A realidade era essa e ele não gostava de fantasias

com coisas reais. Eu tinha oito anos quando ele me pediu isso.
— Lila, você pode me prometer uma coisa, meu anjo?
— Sim! Qualquer coisa, papai!
— Preciso que prometa e nunca se esqueça: se algum dia papai for

para uma viagem longa demais que não possa voltar, você promete cuidar
da sua mãe?
— Hum, prometo, papai, mas que viagem é essa? A morte? — Ele
sorriu.
— Sempre esperta a minha garota. Vocês duas são as mulheres da

minha vida e preciso que estejam juntas, não importa o que aconteça.
— Certo, papai. Eu prometo sempre cuidar da mamãe, não importa o
que aconteça.
— Promessa de dedinho. — Tínhamos a mania de usar um gesto

infantil em todas as nossas promessas. Algo que prometi há tantos anos,


quando ainda era uma criança e não fazia ideia do tamanho da minha
promessa ressoando nos meus ouvidos quando eu pensava em desistir da

mamãe.
Organizei minhas coisas e tirei um cochilo durante o dia.
Anoiteceu e aproveitei para observar o céu da minha varanda. Fazia
tempo que não parava para aproveitar o momento. Olhei para as estrelas.

— Pai, você faz questão que eu não me esqueça da promessa, não é?


Responsabilidade demais para uma menina de oito anos, Sr. Harrison— Ele
não sabia como a mamãe se comportaria depois de sua morte, não
imaginava tudo o que aconteceu.

Uma estrela cadente cortou o céu.


Fiz um pedido.
Quero ser feliz, me apaixonar e viver um grande amor.
Não poderia pedir o meu pai de volta, infelizmente. Então, a minha

felicidade era a minha missão agora.


— Fica de olho, pai. Você vai ver sua filha brilhar ainda mais, tenha
um pouco mais de paciência. Eu prometo.
Começou a semana de preparação para o Hackathon.

Meu time estava junto novamente.


— Bom dia, gente. Quem aí está pronto para arrebentar no
Hackathon. — Eu estava animada, era fato.
— Vejo que alguém recarregou as baterias. Vamos longe, meninas.
Acredito na gente — Roddie falou.
— Eu também acredito. Vamos pensar em fazer o nosso melhor, o
resto será consequência. — Fernanda fechou o trio, mas ainda faltava o

Pedro, o outro programador que ficou com a gente.


Alec apareceu com a Érica para passar informações sobre o evento.
— Bom dia, pessoal. Vim para falar algumas coisas importantes sobre
como vamos nos preparar e como funcionará o evento. Serão três dias de

maratona, onde vocês vão competir com todas as equipes, juntando pontos
com os desafios. Começará nesse fim de semana, de sexta a domingo e, na
segunda, eles divulgam o resultado. As cinco melhores equipes seguem
para a próxima etapa, que será a apresentação do protótipo. Teremos um
mês para produzi-lo e provar que funciona. Vou mandar o cronograma da

preparação para o computador de vocês. Alguma pergunta?


Ele estava totalmente normal. Não mandou mensagem, não comentou
sobre a minha saída. Eu também não falaria nada. Levantei a mão.
— Sim?

— Cadê o Pedro, o quarto integrante do grupo? — Senti uma


mudança nele, parecia ter ficado chateado pela menção ao Pedro.
— Ele pediu para se juntar à equipe do marketing. Disse que é muito
bom programando apresentações. Vocês serão a equipe principal, e ele
coordenará o marketing e a divulgação. Mais alguma dúvida? — Ninguém
esboçou nada. — Quero que sua prioridade seja o evento. Revejam os
anteriores e busquem os desafios já aplicados, treinem. Eu os acompanharei
de perto durante o evento, mas até lá deixo com vocês o foco e a

responsabilidade.
Senti a tensão e o peso da responsabilidade. Isso foi bom, tirou da
minha cabeça o meu padrasto e a minha mãe e me jogou na minha
realidade. Eu preciso ser ainda melhor para ganhar dos outros mais

experientes.
A semana passou voando.
Eu apenas tinha na mente o evento e repassei tudo o que precisava. O
despertador tocou às 6h da manhã.

Sexta-feira.
Início do Hackathon.
— Me observa, pai, que eu vou voar ainda mais alto.
 

Dez minutos.

Esse era o total de tempo que eu estava batendo a ponta da caneta na

minha mesa. Parecia pouco, mas, na minha mente, era uma eternidade,
porque deu tempo de eu pensar em muitas coisas.

A caneta fez um som estranho.

Deve ter quebrado depois de tantos cliques que eu forcei. Que saco,
odeio quando algo deixa minha mente assim, e é a primeira vez que

acontece no quesito amoroso. Levantei-me da cadeira e fui para a minha


vista, uma produção encoberta pelas sombras da noite. Todos já haviam ido

embora, menos eu.

Coloquei um copo de uísque de consolo para os meus pensamentos.

— A mulher sai da minha cama sem nem me esperar acordar, me

deixa uma frase de presente que mexe com os meus sentimentos e a


primeira coisa que fala, quando finalmente fala comigo, é perguntar pelo tal

de Pedro! — Virei o drink.

Sentei-me no sofá e puxei o nó da gravata para deixar o meu pescoço

respirar.

— Garota, você está mexendo demais com a minha mente. Nem eu


sei mais para onde estou indo. — Ainda bem que estava sozinho, palavras

ditas em voz alta são as que conseguem liberar o que está preso na cabeça e

no coração.

Me lembrei da minha história com a Abbie e, pensando bem, eu

nunca tive ciúmes desse nível com ela, esse tipo de irritação. Eu sei o

porquê. Com a Abbie, nossos objetivos eram praticamente o mesmo:

sucesso na vida pessoal e profissional. Éramos o casal e a futura família


perfeita, a vontade de vencer e querer sempre o melhor nos movia para

frente, sempre juntos.

Com a Lila é diferente. Não sei o que ela pensa, ela vive para

aproveitar o máximo da vida, não desiste nem quando as estatísticas estão


contra ela e aceita a derrota apenas como uma nova forma de aprender a

vencer depois.

Eu e a Abbie nunca aceitamos a derrota. Vencer sempre foi a nossa

única opção.

Analisando friamente, meu casamento com a Abbie pode ser

considerado um acordo de negócios, e os sentimentos são o bônus. Já minha


relação com a Lila seria como adquirir uma empresa que eu nunca saberia

ler os donos e nunca teria a certeza de que seria nossa, porque ela sempre

me surpreende.

Seria a primeira vez que eu perderia.

Me senti ainda mais frágil com essa confusão na minha cabeça. Lila

tem o poder de me apresentar algo que eu nunca experimentei, a derrota. A

decisão está com ela e, se ela falar que não quer ficar comigo, então serei

derrotado e não conseguirei mudar o resultado.

— QUE INFERNO! — Bati o copo com força na mesa e derrubei o

gelo que ainda tinha nele. As únicas duas mulheres que realmente
impactaram minha vida são como água e vinho, mas tenho que admitir que

tenho um tipo: mulheres de personalidade forte, que sabem o que querem e

vão atrás do que desejam. — Parabéns, Alec. Você mesmo se prendeu na

própria armadilha, não se brinca com fogo, meu caro. — Saí do escritório e

fui para casa. A semana passou comigo tentando, e fracassando, me perder


no trabalho e tirar a Lila da minha cabeça. Às vezes, a via saindo para o

elevador e esperava que descesse com os amigos, tentei me afastar de todas

as formas. Era o jeito mais seguro para preservar minha sanidade.


Até que o Grande Dia chegou.

Sexta-feira.

Início do Hackathon.

Dessa vez, eu iria apenas para observar, o show seria totalmente

deles. Resolvi acompanhar o primeiro dia para dar forças, mostrar que estou

com eles e acredito em todos. O olhar de tensão e medo no rosto de cada

um não me mostrava que estavam bem.

— Érica, por que estão assim?

— A sua presença aumentou um pouco a tensão deles, que já estava

nas alturas por conta do evento. Eles estão com medo de perder e

decepcionar quem os apoiou.

Não me dei conta disso. Eu nunca tive medo de desafios, sempre os

encarei e sabia que ganharia. Não pensei que eles poderiam se sentir piores

com a minha presença porque tentam agradar outra pessoa enquanto

precisam ganhar de quem é mais experiente. Pedi licença a Érica e fui até

eles.

— Pessoal, venham até aqui, por favor. — A equipe de marketing, o


“famoso” Pedro e o trio de programadores se juntaram.
— Quero que vocês só tenham uma coisa na mente aqui: se divertir.

— Todos olharam para mim como se estivesse louco. — Tensão e medo não

levam a canto nenhum, somente aumentam os erros e refletem uma péssima

equipe. Quando pensam em se divertir, o ambiente fica mais leve e vocês

conseguem ter a mente mais limpa. Portanto, quero que se divirtam.

Treinaram tudo o que podiam e se empenharam, chegou o momento de

fazer o que já sabem, ganhando ou perdendo. Programem!

Finalmente consegui colocar um sorriso no rosto deles e relaxaram

mais.

É verdade que eu não tinha expectativas muito altas, era o primeiro


evento dessa turma e muita gente experiente presente, mas sei que eram

bons e dariam o melhor aqui. Confio neles.

A equipe seguiu para a entrada do evento, onde pegariam as

credenciais e saberiam onde seria a sua mesa. Fui para a área VIP

disponível para os donos de empresas ficarem enquanto o evento ocorre. Vi

a equipe indo para uma área mais à esquerda do palco, o número deles

parecia ser 26.

— Esse número me parece familiar.

— Falou alguma coisa, Sr. Donovan? — Érica perguntou.

— Nada, Érica. Apenas estava resmungando algo. — Preciso me

lembrar de procurar depois, esse número parece uma lembrança forte.


Lila estava sorridente com os amigos, senti que estava feliz em chegar

aqui e se sentia bem trabalhando com isso. Acho que podemos chamar de

paixão o que ela sente por programação. Quando a vejo assim, sorrindo

naturalmente e tão feliz, tenho vontade de abraçá-la e protegê-la de

qualquer mal do mundo.

Sei que, se eu escolhesse esse caminho, estaria limitando a vida dela.

Estaria a condenando a viver com alguém como eu, que não poderá nunca

lhe proporcionar a experiência completa. Entretanto, outra parte minha

sempre pergunta o que Lila gostaria.

Será que ela acharia isso ruim mesmo?

Eu costumava ter uma mente limpa e decidida, mas desde que o

furacão chamado Lila entrou em minha vida, já não tenho certeza de mais

nada.

— Sr. Donovan, peguei com a produção as regras do Hackathon desse

ano. Serão 50 equipes no total e o primeiro desafio será uma espécie de

peneira para nivelar os talentos.

— Como está o nível das equipes? Muito nome de empresa

conhecida?
— Vi pelo menos dez empresas com nomes consolidados no mundo

de segurança digital e, entre o restante, tem algumas que vem se destacando

bastante.
— Então terão alguns problemas no caminho. — Chegou a hora, Lila,

me mostre do que é capaz. A equipe não bobeou com nada. O evento

começou explicando a todos e, quando o cronômetro iniciou, todos

começaram a decifrar.

Das 50 equipes que iniciaram, apenas 32 continuaram e, dentre elas, a

nossa estava presente. Eles passaram pela peneira. Comentei com Érica os

resultados e comemoramos a vitória da nossa equipe. Quando voltei o meu

olhar para eles, não sei o que aconteceu com a Lila.


Ela estava agora com o cabelo preso e parecia ter fogo nos olhos.

Seu foco estava totalmente voltado para a tela. Alguma coisa a irritou
bastante, pelo pouco que a conheço. Um olhar parecido com esse eu tive

quando ela saiu da minha casa no dia que a magoei, quem a irritou vai
ganhar o dobro da fúria dela.

Sorri.
O formigamento apareceu. Aquela garota tinha garra, vontade de

vencer e superar o desafio. Não parecia que iria facilitar para ninguém.
Percebi que o formigamento tinha ficado mais intenso e mais permanente,

só que nada estava rígido nas minhas calças.


Lila é a causa do formigamento e meu coração palpitou até doer, não
por causa do que eu senti no meu pau, mas porque algo me deu medo de
perdê-la. Por um segundo, eu queria pedir que ficasse, que nunca mais fosse
embora. Fui do sorriso ao medo.

Eu estava assustado.
Pela primeira vez na vida, eu estava indefeso, sem saber o que

escolher. Ficar com ela ou acabar tudo, ser egoísta ou ser covarde. Não
conseguiria continuar com isso por muito tempo. Levantei-me para ir

embora, agora teriam outro desafio que levaria mais tempo.


Fui para casa distraído, assombrado por pensamentos. Essa confusão
não me deixou trabalhar ou raciocinar nada. Eu fechava os olhos e aquele

olhar da Lila, intenso e ardente, não saía da minha cabeça.


Peguei no sono depois de muito tentar e tive um sonho erótico com

ela. Essa mulher dominou minha realidade, minha imaginação e estava no


caminho do meu coração. Eu tentava resistir e estava difícil. Acordei

assustado com algo que eu nunca mais pensaria presenciar.


Joguei o lençol para o lado.

Ereção espontânea.
Eu vi isso acontecer bem na minha frente, estava assim agora. Uma

lágrima rolou do meu olho esquerdo. Dizem ser o que está conectado ao
coração. Se for, veio pelo simples e principal motivo: Lila. Eu sabia que era

ela o real motivo do meu corpo voltar a reagir dessa forma. O que ela me
fazia sentir.
Levantei-me para ver se continuava por mais tempo, mas, em poucos
minutos, se foi.

— Por favor, meu Deus... Eu preciso voltar a ser um homem


completo — Me senti ridículo pedindo a Deus por algo assim, mas a ereção

não se sustentou mais. Porém, isso não me desanimou de forma alguma.


Agora eu tinha um motivo concreto para ir atrás da solução. Liguei para o

Ross e esqueci totalmente que eram 5h da manhã ainda. Ele atendeu com
uma voz de sono.

— Alô? Tio Alec? Aconteceu alguma coisa?


— Desculpa, Ross, esqueci do horário completamente. Quero que

você ouça o que eu vou falar agora como paciente, e não como tio.
— Um momento. — Ouvi o som dos lençóis se movendo e de um

caderno abrindo. — Pode falar, o que aconteceu?


— Eu acordei com uma ereção espontânea.

— Tem certeza disso? Como foi que aconteceu?


— Tenho certeza total. Acordei e, do nada, estava lá.
— Lembra-se com o que estava sonhando? — Essa pergunta era a

que eu deveria ter feito primeiro. Meu coração acelerou.


— Lembro.

— Pode descrever? — Eu sabia tudo o que aconteceu no sonho, tudo


o que senti com ela. Amor e Liberdade. Lá, nós pudemos ser duas pessoas
normais, sem dúvidas ou problemas que nos afastassem.

— Foi com ela, Ross. Foi com aquela garota. — Houve um silêncio
do outro lado da linha e o caderno se fechou.

— Vou lhe dar dois conselhos. O primeiro é como o seu médico: ao


que parece, essa garota é a chave para liberar o que prende a sua mente, lhe

devolvendo sua saúde sexual, portanto, pondere se vale a pena estar com ela
ou se prefere ficar como está, você que escolhe.
— E o outro conselho?

— O outro é como seu sobrinho: tio Alec, faça de tudo para não
perder essa garota, pois, claramente, está apaixonado por ela. Ela conseguiu

quebrar suas defesas e o fez recuperar aquilo que a medicina tinha dado
como perdida. Não seja burro ou orgulhoso, a vida é apenas uma para

desperdiçar com besteiras, não acha? — Eu fiquei calado. Ele estava certo,
mas eu que não queria aceitar. Apesar de saber a verdade, tinha medo de

como seria. — Vou voltar a dormir que tenho que estar cedo no consultório.
Bom dia, tio. — Ele desligou o telefone. Eu fiquei sentado na cama. A

balança pendia claramente para um lado, e eu ainda tremia em cima do


muro.

No segundo dia de evento, eu não pude ir até o local por causa do


trabalho. Estava evitando um pouco também, ainda mantendo distância. A

sensação da ereção novamente ainda estava registrada em meu corpo,


mesmo não acontecendo de novo. Sempre me perguntava se ela realmente

foi a chave para isso. Com certeza foi, não tinha como negar.
Minha cabeça, a que eu me orgulhava por sempre ser lógica e nunca

errar nas escolhas, ser decidida, a mente que me levou a não desistir de
Abbie e que me levou até a lista da FORBES, agora era vencida por uma

garota virgem e inexperiente, que fazia questão de bagunçar com meu


mundo.

Joguei a cabeça para trás na cadeira e deixei o sangue chegar à


cabeça.

— Eu vou enlouquecer de verdade, mas estou mais convencido que


perdi essa briga e não sei se é tão ruim assim. — Sorri. O telefone toca, e é

a minha secretária.
— Sim?

— Sr. Donovan, seu irmão, Carson Donovan, na linha 2, posso


transferir?
— Pode. — Ela transferiu, e ele já começou falando.

— Está livre hoje, Alec?


— O dia todo não, mas posso arrumar um horário.

— Me encontra no nosso bar, à noite. Faz tempo que não tomamos


um drink.

— Verdade. Combinado, a gente se vê lá.


Cheguei primeiro que o Carson e já estava no final do drink quando
ele chegou.

— Não me esperou? Estava com sede mesmo. — Ele fez o seu


pedido, e pedi outro para mim.
— Você que se atrasou. E aí, como andam as coisas?

— Sabe como é, conversas e mais conversas. — Me distraí com os


gelos no meu corpo vazio, e o Carson me observou. — Você conheceu

alguém, Alec?
Parei de brincar com os gelos. Será que o Ross soltou algo? Acho que

não, era muito profissional para fazer algo desse tipo. Vou continuar
fingindo que sei de nada.

— Por que você acha isso?


— Uma das primeiras coisas que aprendemos no meio diplomático é

ler as pessoas. Precisamos saber como está se sentindo, se são amigáveis ou


se estão abertas a conversar, por exemplo. Você sempre teve uma posição

mais tensa, firme e fechada que demonstrava claramente quando estava


interessado em algo e quando não estava. — Ele analisou tudo isso de mim?

Nunca pensei que teria essa habilidade. — Hoje, eu vejo um homem mais
sorridente, relaxado, mais aberto a uma conversa ou a se distrair com o gelo

do copo. Ainda está um pouco tenso, mas nota-se uma luz no fim do túnel
para você. — Eu sorri com aquele final.
Mudar tanta coisa assim, na minha vida, apenas com a presença de
alguém é algo que eu nunca perceberia e isso só aumentava a certeza de que

a Lila não poderia ir a canto nenhum, tinha que ficar comigo. Os nossos
drinks chegaram, e Carson aproveitou o seu.

— Acho que o motivo foi o fim de um projeto e uma meta que


batemos. A empresa vai bem e passei por alguns obstáculos, por isso estou

mais relaxado. — Ele me olhou como quem não comprou essa conversa.
— Bem, a escolha é sua em falar ou não a verdade, mas, se eu

pudesse lhe dar um conselho, seria: agarre bem isso que está lhe fazendo
mudar, não deixe que fuja ou desapareça. Essa coisa é a chave da sua

felicidade.
Continuamos a beber e a conversar sobre outras coisas, mas dali eu

saí com uma decisão tomada. Cansei de fugir e de ter medo de algo que
nem sei o resultado.
O terceiro e último dia do evento chegou.
Decisão do Hackathon.

 Depois do resultado, Lila ouviria minha confissão e deixaria em suas


mãos a decisão. Eu sairia daquele lugar com ela ou sem meu coração.
 

 
 

Hoje é o segundo dia do Hackathon.

Chegamos super tensos, não sei no que deu na cabeça do Alec para
vir no primeiro dia, mas todos ficamos ainda piores com ele aqui, parecia
que nos observava, se íamos fazer certo. Ainda bem que ele deu aquele
discurso para aliviar.

Apesar disso, fiz de tudo para ficar longe dele. Somente a sua
presença já me deixava distraída, eu precisava de foco, e minha equipe
também. Quando chegamos em nossa mesa, conversamos e a calma nos
atingiu. Respiramos fundo, a gente treinou o máximo que pode. Chegou a
hora.

Ao nosso redor, tinha algumas equipes e muitas agiam como se essa


não fosse a primeira vez. Tinham cara de experientes, sabiam o que faziam.
A pressão já começa na hora em que todos estão juntos. A organização
explicou como tudo aconteceria. 50 equipes competindo pelas cinco vagas

finais, concorrência de dez equipes por vaga.


— Já bati concorrência maior na universidade. Não vou desistir —
falei para mim mesma.
A primeira peneira foi complicada, não pegaram fácil em momento

nenhum. Pensei que talvez ficássemos ali mesmo, mas não desisti. Quem
nos salvou foi a Fernanda.
— Pessoal, eu acho que conheço esse código. Em Montana, passei

muito tempo decifrando códigos e lembro que passei por esse e eu


solucionei na época. Vou tentar falar a ideia geral e me lembrar dele, me
ajudem — ela falou como era e foi fazendo, em algumas coisas ajudamos e,
por fim, apareceu na tela:

“Desafio solucionado. Equipe 26 avança para a próxima fase!”


Gritamos como um bando de adolescentes passando no vestibular. Era
só o primeiro desafio, mas o fato de a gente continuar aumentava a vontade
de não perder. Aos poucos, as equipes foram sendo aprovadas ou

reprovadas e, no final, restaram apenas 32 equipes.


Olhei em volta e vi Alec sentado em uma das áreas vips com a Érica.
Conversavam sobre algo. Ele era lindo, tinha um porte de encantar qualquer
mulher, isso era fato, porém, eu não poderia deixar que me tratasse como
quisesse somente por causa da sua beleza.

Fui olhar algo na minha bolsa no momento do intervalo. Uma das


equipes próximas à nossa mesa resolveu passar e zombar de nós, por se
achar melhor. Péssima ideia.
— Vejo que a peneira dessa vez foi muito fácil, equipes inexperientes

passaram. Quero ver se passam da segunda fase, com uma menina do


interior e um carinha que se perdeu no estilo. — Roddie ficou revoltado,

ninguém poderia falar do seu jeito de se vestir, ele amava moda.


— Pessoal, vamos nos acalmar. É pura provocação.
— Vejo que a líder sabe das coisas, deve ter perdido tanto na vida que
sabe como lidar com quem vence.
— Eu não gasto saliva com quem não merece. Eu provo o meu valor

no que eu faço, geralmente cachorro que ladra não morde, vamos ver se
esse canil vai ladrar lá fora quando disser adeus ao evento. — Vi que ela
odiou minha resposta. Assim como eu, só poderia falar, mas o próximo
desafio seria questão de honra.

Prendi meu cabelo em um rabo-de-cavalo, coisa que eu fazia quando


estava irritada, e foquei minha atenção total no computador. O próximo
desafio estava para começar, e eu iria destroçar o ego desses que pensam
que podem menosprezar outros.

O segundo desafio seria construir um código que passasse pela


invasão de um hacker. Quem iria testar os códigos era um programador que
hackeou uma casa através da assistente virtual. Teríamos 20 horas para
produzir tudo e apenas uma chance de consertar algo no palco, caso

conseguisse dentro do tempo. Construí o código com tudo o que eu sabia,


Roddie me ajudou em algumas partes, e Fernanda, em outra.
Usei algumas coisas que aprendi no código do cliente que

trabalhamos, nada que colocasse em perigo o código, mas algumas


armadilhas. 18 horas e muitos energéticos depois, estávamos prontos para o
teste. Salvamos tudo e nos revezamos para descansar um pouco. O
cronômetro apitou e foi dada a largada, cada uma das equipes começou a

ser testada. Algumas foram hackeadas de primeira, outras demoraram um


pouco, e algumas passaram, mas o número das aprovadas era bem baixo até
o momento.
Chegou a nossa vez.

Subimos no palco. De um lado, o programador; do outro, a gente. Ele


começou a tentativa de invasão. Faltando 40 segundos para acabar o tempo,
o código foi hackeado. Meu peito apertou, o medo quis me tomar.
— Vocês têm 40 segundos para tentar consertar algo. Querem tentar?
— Eu ainda não desisti.

— Quero. — Sentei-me na cadeira, eu tinha visto o erro e não achei


que seria problema. Sei onde devo mexer. O cronômetro começou a correr,
e eu, a digitar, fiz o mais rápido que pude, quando terminei, faltava oito
segundos do meu tempo, era minha última tentativa. O hacker começou a

invasão do início e tentou e tentou, e dessa vez não passou.


— Parabéns, vocês passaram para o último desafio. — Eu estava em
choque ainda. Roddie gritou e me abraçou, me rodando no ar.
— Você conseguiu, Lila. Meu Deus, você nos salvou. Somos

finalistas.
Descemos do palco chorando de felicidade.
A equipe depois da nossa foi a que nos menosprezou. Perderam
rapidamente e não conseguiram ajeitar a tempo. Ela me olhou com ódio, eu

apenas tirei a vista e a deixei olhando para as nossas costas. Não valia a
pena. Soltei o cabelo.
Agora restavam apenas 12 equipes competindo pelas cinco vagas
finais. A etapa mais difícil seria agora.

Olhei em volta, e ele não estava lá.


Senti uma ponta de tristeza e solidão. Algo inesperado, achei que
estava bem sem ele, mas parece que meu coração não concorda comigo. No
celular, não tinha mensagem dele, só da Piper, que estava sempre

perguntando como estavam as coisas e se estávamos ganhando. Não tinha


melhor torcedora na minha vida.
Nos deram três horas de descanso.
O último desafio seria criar um aplicativo, com base em segurança

digital, que trouxesse algum benefício à sociedade.


Nesse momento, algo me veio à mente. O tema do que seria o
aplicativo, mas eu não decidiria sozinha. Contei a todos a ideia, e eles
toparam, agradeci muito por comprarem a ideia porque era algo que eu
queria falar há muito tempo. Dessa vez, Pedro se juntaria a nós, pois
precisaríamos de uma apresentação muito bem-feita.
A ansiedade não nos deixou descansar, partimos para programar
imediatamente. Foram horas e muita conversa, trabalho em equipe forte

para que tudo saísse bem em tão pouco tempo. Precisei fazer algumas
coisas ilegais, mas me desculparia com o evento depois.
Por fim, tínhamos o protótipo e a apresentação.
— Lila, você quem vai falar e apresentar o projeto no palco — Pedro

quem falou.
— Quê? — Sempre tive vergonha de público. — Gente, tenho
vergonha. Não sei falar em público assim, vou acabar destruindo tudo.
— Nada disso, confiamos em você. Não existe pessoa que saiba mais
sobre o protótipo e sobre o assunto. A ideia foi sua e é você quem vai

apresentar.
— Pessoal...
— Estamos nessa juntos. Se você errar, o erro é da equipe, e não seu.
Estamos nos divertindo, lembra? — Essa última frase me fez lembrar do

Alec e, instintivamente, olhei para cima. Ele estava lá, sentado e olhando
para mim. Sorriu.
— Certo.
Chegou a nossa vez. Subi ao palco muito nervosa.
— Boa... Boa tarde, pessoal. — Estava tremendo. Olhei para cima, e
Alec não estava mais sentado, ele estava em pé e fazia sinal para eu
apresentar olhando para ele. Tinha tirado o paletó, parecia estar ansioso. —
Quando falamos em assédio sexual, existem diversos dados, mas alguns são

ainda mais expressivos, o assédio feminino e suas porcentagens. — Como o


palco tinha um telão, Pedro programou dados aparecendo e diversas outras
imagens, liberando à medida que eu falava. A apresentação me empolgou.
— E se aproveitássemos os assistentes virtuais para fazerem mais do que

apenas ligar? A maioria dos assédios é complicada por exigir diversas


provas que a mulher não tem, porque sua atenção está voltada para sua
proteção. Eu os apresento o nosso aplicativo “Me proteja”. Você cria o seu
perfil com os seus dados, foto e registra sua voz e digital. Se uma mulher

for assediada, ela pode falar “Me Proteja” que o celular, com base no
reconhecimento de voz, ativará o gravador de voz e enviará seus dados para
a viatura de polícia mais próxima junto de seu local em tempo real. Além
disso, se conectará com as câmeras mais próximas para registrar o

assediador e o flagrante. Tudo isso será enviado para a viatura para que
tenham certeza de que é um caso real. Vou mostrar para vocês.
Falei a palavra-chave e, na mesma hora, o aplicativo mandou todos os
dados que falei para o celular do Roddie, junto das imagens das câmeras do
evento.
— Peço desculpas ao evento por ter hackeado as câmeras, foi só para
demonstrar e mandei para o celular do meu time por motivos óbvios. Não
queremos a polícia invadindo aqui. — Todos aplaudiram, entusiasmados,

mas o meu olhar foi direto para um aplauso que eu queria, o dele. E ele me
deu. Sorri, feliz por tudo o que fizemos. Se não ganhássemos, chegamos até
o fim.
Descemos do palco e o cansaço bateu forte.
— Lila, fica aqui descansando que vamos comer algo antes. Vou levar

as coisas para que durma à vontade.


— Obrigada, pessoal.
Eles saíram e até tentei assistir às outras apresentações, mas o sono
me tomou.

Sonhei com o Alec em um parque, comigo. Estávamos deitados em


uma toalha de piquenique, enquanto eu lia um livro em seu colo, ele estava
encostado em uma das árvores, cochilando.
Senti alguns dedos no meu cabelo, um cafuné carinhoso e gostoso.

Relaxei ainda mais, até perceber que o Alec do sonho não estava fazendo
cafuné. Quem estaria? Acordei um pouco assustada, meus olhos ganharam
foco e vi uma camisa do evento, depois vi quem era.
— Alec? O que está fazendo aqui?
— Calma, garota. Coloquei uma camisa do evento para ninguém
desconfiar que sou eu aqui e seus amigos estão comendo ainda. Pode
relaxar. — Deitei-me um pouco confusa, mas estava menos tensa e com

saudades dele. Ele não precisava saber essa última parte.


— Você foi muito bem na apresentação. Nem parecia que era a
primeira vez aqui.
— Eu estava tão tensa que pensei que nem conseguiria falar. — Sorri.

— O tema quem escolheu foi você, certo?


— Por que acha isso?
— Um palpite. Me lembrou o dia em que nos conhecemos, que é o
mesmo número da sua mesa, inclusive.

— Ah! Por isso era tão familiar.


— Essa doeu. Não esperava que se esqueceria daquele dia.
— Deixa de ser bobo, não me esqueci do dia, só estava com a cabeça
muito cheia de coisa para me lembrar da data. Você acha que a gente

ganha? — precisei perguntar, ele era mais experiente nessas coisas.


— Agora depende dos jurados, e isso é algo incerto, mas fizeram o
melhor e isso que importa. — Um silêncio ficou entre nós, ele ainda me
fazia cafuné.
— Lila, preciso falar uma coisa com você. — Ficou mais sério. Não

era coisa boa. Esperei e o meu silêncio foi a deixa para que continuasse
enquanto eu colocava o braço nos olhos para diminuir a luminosidade.
— O nosso acordo chegou ao fim.

Minha respiração parou.


Meu coração acelerou.
Senti na boca o amargor da derrota e era pior do que se eu perdesse
no evento.
 

Depois que todos desceram do palco, vi que saíram da área de

apresentação.

— Devem estar exaustos. Érica, vou procurar a equipe para saber


como foi o andamento do projeto.

— Sr. Donovan, se for desse jeito, de terno, a imprensa pode lhe

encontrar e fará diversas perguntas. Estão loucos por uma novidade.


— Verdade, tinha me esquecido como o circo se arma em dia de final.

— Olhei em volta, tinha que ter algum jeito de entrar sem ser percebido. Vi
dezenas de pontos vermelhos. Era isso! — Érica, preciso de uma camisa do

evento. Nesse mar de pontos vermelhos, pensarão que sou mais um apenas.

Ela concordou e conseguiu para mim uma das camisas da

organização. Vesti e me senti universitário novamente, a nostalgia bateu.

Fui à procura de todos, ou melhor, da Lila. Era ela quem eu queria


encontrar.

Rodei o evento e estava quase desistindo quando vi os outros saírem

de uma área mais afastada, em direção à lanchonete. Lila não estava junto,

então deveria ter ficado ali por perto. Procurei mais um pouco e a encontrei

em um local de descanso. Ela dormia, tão relaxada. Me aproximei e nem se


mexeu, devia estar acabada depois de toda aquela tensão.

Olhando para ela assim, dormindo tão tranquilamente, com um rosto

angelical, eu não imaginaria que foi aquela tigresa no palco.

Eu cheguei bem no fim da equipe que apresentou antes deles. Estava

sentado, somente esperando como seria, até que vi que Lila subiu no palco.

Isso despertou meu interesse, seria o momento de saber como ela se porta

na frente de tantas pessoas. Ainda não havia começado, mas a Lila parecia
estar com medo.

Tirei meu paletó e fui até o guarda-corpo do mezanino.

Sua mão, que estava com o microfone, tremia de nervosismo. Fiquei

preocupado não pelo dinheiro, mas por ela. Eu sei o quanto o medo de
palco pode acabar com uma carreira, com um projeto.

Ela falou algumas palavras e gaguejou.

Não pensei, apenas agi.

Fiz sinal para que apresentasse olhando para mim, dessa forma,

esqueceria tudo à sua volta. Já a vi ajudar diversas pessoas e, com ela, não

foi diferente. Assim que encontrou uma pessoa conhecida, soltou tudo o que
tinha dentro de si. Essa deusa de ébano brilhou e dominou o palco e a

apresentação.

Eu senti orgulho.

Orgulho dela como profissional e como pessoa. Acima de tudo, como

a pessoa que eu queria estar por perto.

Ela terminou a apresentação e olhou diretamente para mim, eu a

aplaudia e sorria. Fui enfeitiçado, encantado por essa garota. A garra e a

ousadia apenas completavam o quanto ela era incrível e não sei quando

comecei a admirá-la tanto.

— É, garota, estamos em um jogo perigoso com muita coisa a perder.


— Passei os dedos em seu cabelo, fazendo um cafuné e ela até relaxou

mais, até perceber que tinha alguém mexendo em seu cabelo. Acordou

assustada, e expliquei como estava lá e que ninguém nos viu.

Conversamos um pouco e achei incrível sua vontade de vencer, de

melhorar. Queria saber o que achei da apresentação e como foi tudo.


Eu estava perdido.

Inteligente, cativante, amorosa, delicada, guerreira... Tenho tantos

adjetivos que faria uma lista, mas um resumia tudo. Garota, minha garota.
Ou pelo menos é o que eu queria que fosse.

— Lila, preciso falar uma coisa com você. — Eu não falaria nada

agora, mas foi impossível segurar. — O nosso acordo chegou ao fim —

falei com um sorriso no rosto, pensando que seria uma ótima forma de falar

que eu quero mais. Ao que parece, calculei tudo errado. Sua feição mudou

de relaxada para assombrada, parecia que eu tinha falado que o seu

cachorro morreu. — Eu... — Ela me cortou.

— Como assim acabou? Como você me joga uma bomba dessas

agora?! Que injustiça, Alec. Eu sei que não era para sempre, mas não

precisava dessa indelicadeza. Deveria esperar, pelo menos, eu saber o

resultado do evento. E eu não quero que acabe.

— Mas...

— Não quero desculpas, Alec. Não acabou, não vem com essa.

Quando isso acabar, vamos conversar direito sobre o assunto, mas nada está

acabado até que os dois decidam por isso. Acha que pode simplesmente me

deixar assim...

— Lila...
— ... E eu aqui, pensando que meu único problema seria o resultado,

você me vem com essa. Olhe, não quero mais ouvir nada de você,

entendeu? — Se não vai ouvir, vai sentir. A puxei para um canto mais

escondido do evento e a peguei de surpresa. A encostei na parede e dei um

beijo com todo o tesão que eu tinha naquele momento.

Quando terminei, estávamos ofegantes, mas ela estava silenciosa e

surpresa, finalmente.

— Princesa, é difícil te fazer parar quando está com raiva.

— Eu...

— Eu nada, agora é a minha vez de falar e preciso ser rápido, seus


amigos já estão voltando. Eu falei que o acordo acabou, e não nós dois. Eu

quero mais, Lila. Quero mais de você, ainda não sei direito como vai ser,

mas quero mais. — Vi, ao longe, a equipe retornando. — Mais tarde nos

falamos, você estava incrível naquele palco. Parabéns.

Dei um selinho em seus lábios e saí antes que me vissem. Olhei para

trás e a vi ainda surpresa, sem entender direito o que aconteceu. A forma

que ela reagiu, brigando por nós, para ficarmos juntos, me dizia que ela

também queria mais. E quando minha garota deixou escapar um suspiro

frustrado sem perceber, querendo, como eu, muito mais que um selinho

agora, isso me deixou muito feliz, de verdade.

Voltei para o meu lugar, e Érica me esperava.


Não sei se ela viu ou desconfia de algo, mas ela trabalha há anos

comigo. Com certeza não falaria nada para ninguém, somente me julgaria

ou viria com os seus “conselhos”, reflexões que me faziam repensar em

diversas coisas que eu fazia. Às vezes ela era irritantemente racional e

observadora.

— Sr. Donovan, resolveu o que precisava? — Assenti. — Então

aconselho trocar a camisa pelo paletó, o evento anunciará o ganhador daqui

a pouco e o senhor deveria estar com a sua equipe, para que a mídia veja o

seu apoio aos funcionários.

Sempre racional.

Coloquei o paletó e, algum tempo depois, os organizadores se

dirigiram para o palco com a lista das cinco equipes vencedoras desta fase

do evento. Eu tinha pedido para Érica separar um champanhe para a

ocasião. Desci com a garrafa escondida, para não gerar expectativa.

Começaram a ler a lista, eles não ficaram entre os três primeiros,

agora só restavam duas vagas. Eu não lembrava há quanto tempo ficava tão

nervoso por alguém. Lila estava me fazendo sentir novamente diversas

emoções. A quarta equipe foi chamada, agora era só uma vaga. Tudo ou
nada.

— O quinto e último colocado é a equipe de número 26. — Todos

gritamos. Sim! Eu gritei. A equipe chorava sem acreditar que tinha


conseguido. Eu abri a garrafa e joguei em cima de todos, parabenizei um a

um até chegar na Lila. A abracei firme e murmurei em seu ouvido.

— Lila, eu disse que o acordo acabou porque quero que esteja livre,

sem nenhuma amarra comigo, para que decida de acordo com o que sente e

deseja. Eu quero mais, quero estar com você de verdade. Não sei ainda

como seria isso, mas o acordo não basta para mim. Agora você quem diz: o

que você deseja, Lila?

A soltei e me afastei um pouco para ninguém desconfiar.


Lila me olhava surpresa. Ela sorriu, acho que poderia ser um sim, mas

eu sabia que essa resposta só viria depois de todo aquele tumulto.


Chamaram as equipes para o palco, tiraram foto e entregaram os prêmios.

Além de avançar para a próxima fase, a mais importante, eles ganharam um


prêmio em dinheiro, cerca de 2.000 dólares para cada.

Estava feliz por todos.


Novatos, aqueles que ninguém no mercado quer dar uma chance. Eles

provaram que uma chance pode ser a diferença entre ganhar e perder.
Chamaram a capitã da equipe para uma entrevista, e ela falou bem,

estava nervosa, mas soube como disfarçar. Me virei para ir embora, estava
um pouco mais afastado quando ouvi chamarem meu nome. Me virei e lá
estava ela, correndo até mim.
— Você me pegou de surpresa com aquela declaração depois de me
dar um tremendo susto, por isso não respondi na hora. E nem vou comentar

sobre aquele beijo. — Estava ofegante da corrida


— Você não me ouvia, precisei de medidas drásticas. — Sorrimos.

— Eu acho... — Seu celular tocou, e ela atendeu, pediu só um minuto


de espera, mas algo mudou.

Quando se convive e observa uma pessoa, se nota a mudança no olhar


e na forma de agir, se nota quando algo está estranho ou ruim, e isso
acontecia bem na minha frente. Não sei quem ligou, mas algo na Lila

apagou o seu brilho e deu lugar a um olhar não apenas assustado, realmente
com medo. Ela desligou ainda olhando para a tela.

— Aconteceu alguma coisa, Lila? — Nada. — Lila? — Tentei tocar o


seu braço, ela se afastou e me olhou com algo que ainda não tinha visto em

seus olhos, ausência de brilho.


— Alec, eu acho que preciso de tempo para te dar uma resposta.

— Quem te ligou? Você mudou, Lila. Quer voltar comigo para casa?
— Não importa quem me ligou. Olha, vou voltar para a equipe,

comemorar nossa vitória e depois vou para a minha casa. Estou exausta
depois desses dias no evento. Nos falamos em breve.

Eu nem consegui conversar com ela, simplesmente foi embora. Disse


que ia comemorar com a equipe, mas estava apenas fingindo estar bem,
essa não era a Lila que conheço.
— Sr. Donovan, deseja ficar um pouco mais?

— Não, Érica. Vamos embora. — Ela foi chamar o carro, e eu fui


andando até a saída. Olhei para trás e vi o seu olhar, perdido na multidão.

Definitivamente foi aquela ligação, mas e se ela resolver não querer mais?
Eu sabia que tinha esse risco, mas nunca cogitei. Agora, sinto que fui

rejeitado, mesmo que ainda não tenha tido minha resposta, e essa possível
rejeição dói, aperta o meu peito. Eu não quero que seja verdade.

— Vou dar espaço, garota, mas não esqueça que estou aqui — falei,
na esperança de que o vento levasse as palavras até ela.

As pessoas costumam levar a vida toda para ter aquele momento.


Quando uma única coisa tem poder de mudar a sua vida.

O poder de decidir o seu destino.


De te jogar no inferno ou no paraíso.

No meu caso, esses momentos costumam ser frequentes e para onde


me jogam também.
No inferno.

Às vezes, sinto que, por mais que eu tente, minha sina é sofrer sem
nunca ser feliz de verdade.

No dia do meu aniversário, perdi meu pai. A poucos dias para eu ir


para a universidade, precisei fugir de casa para nunca mais voltar.

Quando ganho o reconhecimento do meu trabalho, uma ligação


acontece.
Eu estava tão feliz, tão deslumbrada com tudo o que eu sempre quis

que esqueci totalmente da exposição que o evento traz. Fiz uma entrevista,
falei o meu nome e apareci na mídia. Apenas bastou isso.

Meu telefone tocou e nem vi que número era, pronta para desligar o
mais rápido possível e dar a notícia ao Alec, falar que também queria mais

de nós, mesmo sem saber como seria o futuro. Tanta coisa para dizer.
Uma única voz.

— Acho que devo te parabenizar, vadia. Vejo que está muito bem de
vida, apareceu até na TV. — Estava petrificada. Ele me achou. — Vou ligar

daqui a 30 minutos, dê um jeito de falar comigo. — Desligou o telefone.


Alec, à minha frente, notou como mudei. Claro, eu fui do céu ao

inferno em dois segundos. Precisei engolir tudo o que eu ia falar, dei uma
desculpa qualquer. O magoei. Não tinha outro jeito, não posso envolvê-lo

nos meus problemas.


Fiquei um pouco com a equipe, enquanto Alec ia embora. Um aperto

no meu peito ficou, provavelmente o perderia, mas não adiantava começar


algo que eu não conseguiria manter. Eu precisava pensar em mim agora.

Aquele número me ligou novamente.


Fui para um lugar mais reservado e atendi.

— O que você fez com minha mãe? Ela não te daria o celular assim.
— Calma, vadia. Sua mãe está viva, apenas mostrei quem manda

aqui. Ela escondia esse celular o tempo todo. Quando vi sua cara sorridente
na TV, arranquei dela o celular e dei uma surra, uma pequena lição nela.

Agora vamos ao que interessa, quero o dinheiro que você ganhou.


— É o quê? Eu não te devo nada.

— Tem certeza? Aquela garrafa deixou cicatriz.


— Não adianta vir com chantagens, eu não vou dar dinheiro nenhum.

Você não vai me encontrar novamente, essa foi a primeira e a última vez.
— Duvido muito. Eu vou te achar e, quando chegar aí, não vai ter
para onde fugir. Vai engolir todo esse orgulho nojento que tem e eu vou me

deliciar com o seu corpo, pode apostar que vou. Me aguarde.


Desliguei o celular.

Sei que ele não tinha como me rastrear, mas desliguei por medo do
que suas palavras poderiam me causar. O que já tinha causado.
Me despedi da equipe e fui direto para casa. O sono tinha passado,
agora o que restava era um puro instinto primitivo de fuga. Entrei, tranquei

a porta e comecei a empacotar tudo o que podia, fiz isso no automático por
uns 40 minutos até que as lágrimas surgiram.
Uma atrás da outra, uma cascata de lágrimas caiu, e eu desabei no

chão.
O cansaço misturado com o medo pesou de vez, e eu senti o meu chão

ser arrancado de mim novamente, como naquele dia em que meu pai se foi.
Piper, Alec, os meninos, a equipe, o meu trabalho, tudo que lutei para

conseguir e que a vida me trouxe iria embora.


Eu não poderia colocar ninguém em risco por causa daquele crápula.

Não conseguiria ver ninguém sofrer por minha causa. Minha mãe me
preocupava, mas ele era escolha dela, e não minha. Chorei no chão até cair

no sono, a exaustão foi maior do que a dor que eu sentia no momento.


Acordei desnorteada, ouvindo batidas na porta da frente. Já era noite, devia

ter dormido por um bom tempo, tinha chegado em casa à tarde.


Batidas na porta, mais forte.

Ele me achou? Impossível.


As batidas continuaram. Peguei um quadro pesado que eu tinha e

levei comigo, não cederia em uma briga sem antes lutar e causar um
estrago. Abri uma fresta da porta para ver quem estava ali, para o meu
alívio, era Piper. Para o meu desespero, era Piper.

Ela não podia ver como eu estava ou como a casa estava; com certeza
exigiria respostas. Ela se virou bem na hora que eu ia fechar a porta

escondida.
— Hey, ganhadora. Vamos comemorar? — Ela começou sorridente,

mas percebeu que algo estava errado.


— Lila, por que sua porta está fechada desse jeito? E essa cara de

medo? O que aconteceu com você?


— Nada, Piper. Não estou me sentindo bem, acho melhor que você

volte amanhã.
— Camilla Harrison, se não abrir esta porta, eu vou quebrar sua

janela e entrar por ela. Garanto que não vou sair daqui. — Eu não podia
duvidar, ela faria isso com toda a certeza. Abri a porta, a deixei entrar e
sentei-me no sofá.
Piper entrou, fechou a porta e acendeu a luz. Ela viu uma casa

revirada, diversas coisas empacotadas e eu, com os olhos inchados de tanto


chorar. Com certeza não era a visão de ganhadora que ela esperava.
— Agora você vai me contar o que aconteceu.
— Piper, eu não posso contar muita coisa.
— Tem a ver com o seu passado, não é? — Como ela chegou nessa
conclusão?

— Como você sabe?


— Desde que nos conhecemos, você nunca falou da sua família, Lila.
Só sei mais do seu pai, do resto, não sei de nada. E sei tudo o que você já
enfrentou na sua vida, mas nada a fez querer fugir ou empacotar as coisas
na calada da noite.

— Na verdade, empacotei à tarde e peguei no sono até você chegar.


— Então é por isso que te liguei várias vezes e deu desligado.
— Acho que descarregou, e eu não vi.
— Não muda de assunto. Me conta pelo menos o que consegue

contar. Se matou alguém, a gente resolve de alguma forma. Deve ter


merecido. — Só ela para me fazer sorrir nesse momento.
— Não matei ninguém, Piper. É um pouco complicado, tem uma
pessoa do meu passado que é muito perigosa. Eu fugi da minha cidade por

causa dessa pessoa e passei esses anos sem que ninguém soubesse onde
estou, mas hoje ela descobriu e me ligou.
— É algum ex-namorado?
— Não, não é. Não vou falar quem é, não adianta, mas eu não posso

ficar aqui, perto de vocês. Se essa pessoa descobrir a sua família, ela poderá
fazer algum mal contra vocês. Eu não vou me perdoar se os colocar em
perigo.

— Lila, não existe a minha família, é a nossa família. Tenho certeza


de que todos eles te protegeriam e odiariam te ver sumir assim. Tire da
cabeça essa história de fuga. Eu vou te proteger, você não está mais
sozinha. — Piper me abraça, e era tudo o que faltava para que desabasse de

novo.
Chorei copiosamente em seus braços e coloquei para fora toda a dor
do meu peito, tudo o que aquele imprestável me fez sentir ao me ameaçar.
Eu estava em uma crise de nervos, não conseguia me acalmar. Piper

percebeu e ligou para Ross, pedindo uma receita de calmantes para uma
amiga, não falou que era para mim para não gerar perguntas.
— Vou na farmácia comprar o seu remédio. Não sai daí.
— Piper... apaga a luz, por favor. Me sinto mais segura no escuro. —
Vi o seu olhar de preocupação e pena. Eu sabia que estava em um estado

lamentável e que ela não fez isso para me diminuir, realmente estava
preocupada comigo. Ao sair, apagou a luz e me deixou ali, na sala, com a
escuridão à minha volta.
Eu não saía da cama para nada. Apenas ligava o celular para ver

alguma mensagem e desligava novamente, com medo de ele me ligar. Piper


quem cuidou de mim, trazia comida e me fazia comer alguma coisa, mesmo

que pouco. Ela tentou me fazer tomar banho, mas não conseguiu.
Para mim, o único lugar seguro era a cama, embaixo das cobertas.
Como uma garotinha amedrontada com os monstros do armário, ali fiquei
vendo o dia virar noite e virar dia de novo.
Meus sintomas pioraram. Qualquer barulho, eu pensava que poderia

ser um invasor. Comecei a ficar paranoica e a vontade de fugir veio com


tudo. Piper voltou e me encontrou empacotando roupas, panelas e tudo o
que via pela frente.
— Lila, você não vai a canto nenhum. Já te falei isso, deixa essas

coisas aí que eu organizo depois.


— Piper... Preciso... Não sei... Não posso ficar... — Estava
desorientada. A semana começaria, e eu não estava em condições de
trabalhar. Preocupada comigo, ela ligou novamente para Ross e pediu algo

mais forte e um atestado, teve que falar que era para mim por conta do
nome que ia no documento e ele quis falar comigo na mesma hora.
— Lila, é o Ross. O que está acontecendo? Sabe me dizer o que está
sentindo?

— Ross, por favor, me ajuda. — Comecei a chorar. — Estou com


uma dor no peito, um aperto, um medo que me persegue. Não consigo
dormir, tenho medo de pisar na rua. Quero fugir, quero me esconder. Estou

perdida.
— Calma, você está com um ataque de pânico, ao que parece. Passa
para a Piper, por favor. — Passei o telefone. Ele falou algo para ela, que
concordou.

— Pronto, Lila. Ross me passou um atestado de uma semana e um


remédio melhor, ele disse que, se você não melhorar, ele vai vir aqui te
analisar. Viu? Todos querem te ajudar, agora vamos comer algo, você
precisa para tomar o remédio.

Tentei comer, mas nada tinha gosto.


Comi metade de um sanduíche e fui me deitar. Já era quarta-feira, e
eu, na mesma rotina. No meu celular, diversas ligações e mensagens do
Alec, mas eu não tinha coragem para responder.
Lembro-me da felicidade que senti quando ele disse que queria mais.

Agora, é apenas uma vaga lembrança, não consigo reproduzir o calor que
senti no peito, o coração acelerado. Tudo isso parece apenas algo que se
perdeu no passado. Quando a Piper chegava, eu não me levantava da cama
mais. Estava fraca por comer tão pouco, mas fingia estar bem para não a

preocupar.
Dormi e sonhei com os braços do Alec me abraçando, me envolvendo
e protegendo. Sonhei com o seu sorriso e isso me devolveu um pouco
daquela felicidade. Acordei, e nada daquilo era real. Piper não viria hoje,

precisava resolver alguns compromissos. Com certeza, devo ter atrapalhado


sua rotina.
Me abracei com Char, meu companheiro de sempre. Um pedacinho
do meu pai.

— Char, como vamos sair dessa? — Enfiei o meu rosto, encharcando


a pelúcia com as lágrimas. — Pai, por favor, me ajuda.
Batidas na porta.
Não era a Piper, ela estava com a cópia da chave.

Mais batidas, com mais intensidade.


Me levantei da cama e fui me apoiando pelo caminho. Realmente
estava com as pernas fracas. Acho que desidratada também.
Bateram mais forte.

Medo? Estava aterrorizada.


Forças? Já não tinha mais. Cansada demais para reagir.
Abri a porta.
Com as mãos encostadas na soleira da porta, sem gravata, camisa

aberta e cabelo despenteado, a visão de um homem que fica lindo de


qualquer jeito, bem ali na minha frente. Ele me olhou e seu olhar tinha dor e
preocupação. Nunca pensei que o veria assim.
— Nunca mais fuja desse jeito de mim, entendeu? — Não era uma
ordem, era uma súplica. — Por favor, nunca mais faça isso.
Uma lágrima desceu dos seus olhos.
Eu não estava mais sozinha.

Desabei nos braços do príncipe que era tão real quanto a mim.
 

O dia seguinte ao final do Hackathon não foi dos piores.

Depois que a Lila saiu daquela forma, sem dar uma resposta a tudo o

que eu falei, voltei para casa pensativo e desanimado.


Sentia o peso da derrota, como se a falta de resposta já fosse uma, e

eu não queria ver a verdade. Respirei fundo durante todo o caminho e

repassei o que aconteceu. Ela veio até mim, correndo e sorrindo, estava bem
até que atendeu aquela ligação.
O problema estava na pessoa do outro lado da linha, e eu não fazia a

mínima ideia de quem era. Aquela pessoa a amedrontou em um nível que

foi incapaz não perceber a mudança em seu rosto. Depois disso, Lila

desconversou e se afastou completamente de mim.

— Por que eu não sinto que era isso que ela queria? — falei alto,
Fernando já estava acostumado. Cheguei em casa, tirei o paletó e dispensei

o motorista. Não tinha vontade de ir para canto nenhum hoje. Tomei uma

ducha, coloquei uma roupa confortável e fui ver algo na TV.

Não importava o que eu fizesse,  Lila não saía da minha cabeça.

— O que aconteceu com você, garota?


Olhei para o celular e, em um impulso, comecei a digitar uma

mensagem que apaguei logo em seguida. Precisava respeitar o tempo dela,

ela disse que pensaria no que eu falei, agora era dar tempo ao tempo.

Eu odeio isso.

Os dias passaram e nenhuma mensagem dela.

O fim de semana se foi e a segunda-feira chegou. Pelo menos, a veria

no trabalho.
Engano meu.

À tarde, perguntei a Érica como estava a equipe, e ela me informou

que  Lila não pôde vir, que colocou um atestado de uma semana.
— UMA SEMANA?!— Minha voz saiu mais alta do que eu

esperava, e  Érica me olhou desconfiada. — Me desculpe, Érica. Eu não

esperava que a capitã da equipe ficasse fora por uma semana, as próximas

etapas se aproximam e preciso dela aqui.

— Se o problema for esse, não se preocupe, Sr. Donovan. Chequei o

calendário e, devido aos feriados de fim de ano, o evento só retornará na


última semana de janeiro.

— Ah, entendi. Que bom então, fico mais aliviado. — Aliviado coisa

nenhuma.

— Posso ajudar em algo mais? — Pode! Arrastar  Lila para cá

imediatamente para que eu saiba o que está acontecendo.

— Não, por enquanto é só. — Érica saiu, e eu fiquei ainda mais

pensativo.

Será que ela estava me evitando? Acho difícil ela inventar uma

doença de tanto tempo assim só para me evitar. Isso não era coisa da Lila.

Resolvi mandar uma mensagem perguntando se estava bem, mas nem


chegou no seu celular. Deve estar desligado. Liguei só para confirmar e

estava desligado mesmo.

— Era só o que me faltava, não conseguir tirar uma mulher da

cabeça! — grunhi de irritação e errei a altura da voz novamente. Érica me

interfonou, perguntando se tinha algum problema. Pedi que marcasse uma


viagem até o fabricante do produto que receberia o nosso código, estávamos

na fase final e queria saber se tudo estava certo.

Mentira.
Eu queria uma forma de fugir de tudo isso que me faz lembrar da falta

que eu sinto de uma pessoa que nem sei o que realmente é para mim. Na

verdade, não sei se estou fugindo da realidade ou se realmente não sei de

nada, mas sinto no meu peito uma falta tremenda dela.

Viajei e conferi toda a produção, que estava nos últimos momentos.

Jantei, conversei, sorri, mas nada tinha o mesmo gosto de antes.

Com a Lila, as coisas passaram a ser mais divertidas, passei a

aproveitar o que me rodeia. Sem ela, voltei a ser como antes, e aquela

versão antiga já não mais me agradava.

Continuei tentando contato, ligando e mandando mensagens, mas

nada era respondido. Cogitei  perguntar a Piper ou a Ross, que são os mais

próximos dela, mas daria muito na cara que tem algo entre a gente, e não

queria isso.

— Que saco, viver no anonimato é pior do que se parece.

Os dias  passaram e a minha rotina se repetia, dia após dia. Uma

rotina monótona e sem graça que envolvia:

TRABALHO
CASA
HORAS SEM SONO

SONO INQUIETO

TRABALHO NOVAMENTE

Lila, realmente, sumiu do trabalho.

Ainda tive esperança de que ela voltasse antes da semana acabar, mas

não pareceu que isso aconteceria.

Em um ímpeto, por medo da rejeição, tentei me masturbar com

algumas fotos de mulheres gatas e sensuais. Tentei por algum tempo até

perceber que nada ajudaria, ou seja, sem a Lila, meu querido amigo não

subiria para ninguém. Apesar disso, o que mais me doía era a falta que
sentia dela.

Essa falta estava me arrasando e eu não ia aguentar por muito mais

tempo.

Na sexta-feira, liguei para Piper. Dessa vez, tinha razão, seria uma

semana sem contato com a funcionária e sem saber o que aconteceu.

— Oi, tio! Boa noite. Está tudo bem?

— Boa noite, Piper. Está, sim, por que não estaria? — Desconfiado

demais.

— Sei lá, às vezes você me liga quando não consegue falar com meu

pai, achei que tinha acontecido algo. Em que posso te ajudar?


— Gostaria de saber da Lila. Soube que ela colocou um atestado de

uma semana no trabalho, e ela não parece ser alguém que some assim, só se

for algo sério. Você sabe se aconteceu algo? — Isso! Mantenha o

profissionalismo.

— Bem... Ela está bem, tio... Na medida do possível...

— O que aconteceu, Piper? — Quase perdi a linha agora. — Estou

preocupado porque ela é a capitã do time.

— Talvez não seja uma boa hora para ela ter tanta responsabilidade.

Bem, não sei, de verdade, não sei de nada. Ela só está passando por um

momento, mas logo estará melhor, juro. Não se preocupe, estou cuidando

dela.

— Tem certeza, Piper? Eu posso ir e...

— Não! Digo, não precisa. Semana que vem ela volta a trabalhar,

tenho certeza. Obrigada pela preocupação, mas tenho que desligar agora.

Beijos.

Piper fugiu da ligação como o diabo foge da cruz. Lila não estava

bem.

Todos os meus sentidos de urgência ficaram ligados, a vontade era de


ir até a casa dela agora, mas eu precisava me acalmar. Fui direto para casa e

pedi para o Fernando ficar em prontidão.

Tomei um drink e tentei esfriar a cabeça.


Nem tinha tirado o paletó ainda, só a gravata e abri um pouco a

camisa para respirar.

— Por que você não me ligou, garota? O que diabos está acontecendo

com você?

Por mais que eu quisesse, não posso passar por cima das pessoas e

invadir suas vidas como eu quero. Tomei outro drink e já coloquei um

terceiro. Ajudava minha mente a funcionar.

Enquanto pensava na Lila, lembrei de algo que  Ross me disse:


“Ela conseguiu quebrar suas defesas, o fez recuperar aquilo que a

medicina tinha dado como perdida. Não seja burro ou orgulhoso, a vida é
apenas uma para desperdiçar com besteiras, não acha?”

— Merda, aquele moleque tem razão, mas eu estou em uma posição


extremamente complicada. Preciso ter certeza  dos meus próximos passos.

— Foi aí que a voz do Carson me quebrou de vez:


“...agarre bem isso que está lhe fazendo mudar, não deixe que fuja ou

desapareça. Essa coisa é a chave da sua felicidade.”


Desde o acidente, eu fiquei muito cauteloso com tudo o que faço. Não

me deixei me entregar totalmente a nada, apenas caminhava onde era


seguro e deixava para arriscar nos negócios, no campo onde eu sabia como
ganhar.
Com isso, a vida estava passando, e eu poderia perder a única pessoa
que trouxe luz na minha vida depois de cinco anos. Não posso ter medo de

arriscar com a minha felicidade.


Terminei o drink e saí de casa. Fernando estava no carro, à minha

espera.
— Fernando, vamos para a casa da Lila.

— Senhor, tem certeza de que quer ir a essa hora?


— Certeza, não tenho, mas preciso arriscar. Vamos logo antes que eu
desista. — Fernando não devia ter entendido nada, mas nos levou até a casa

dela.
Quando chegamos na frente da casa, tudo estava escuro, como se não

tivesse ninguém, mas eu não desistiria agora. Mandei mensagem e liguei,


mas não obtive resposta.

— Fernando, eu vou tocar a campainha. Caso eu entre na casa, você


pode ir embora, certo? — Não tinha certeza se iria funcionar, mas vamos lá.

Saí do carro e fui direto para a sua porta, estava levemente


embriagado.

Toquei a campainha uma, duas, três vezes. Sem resposta.


Bati na porta e voltei a tocar a campainha, ela deveria estar em casa.

Seu carro estava na garagem e, se estava mesmo doente, não sairia.


Encostei-me na soleira da porta e continuei tocando até que ela abriu. Lila
abriu a porta.

— Nunca mais fuja desse jeito de mim, entendeu? — Não era uma
ordem, era uma súplica. — Por favor, nunca mais faça isso.

Lancei de uma vez sem olhar melhor para ela.


Não tive reação.

Na minha frente, tinha a Lila, mas não era ela totalmente.


Agora, ela estava mais magra, com feições de quem não dorme

direito. Ela chorava e estava apoiada em algum lugar. Estava fraca? Sem eu
esperar, Lila veio para os meus braços, e eu a segurei. Não tinha forças.

— Calma, garota. Estou aqui, vamos te colocar no sofá. — Fechei a


porta, e Fernando se foi. Enquanto isso, Lila estava sentada no sofá,

chorando sem parar. Sentei-me ao seu lado sem saber bem o que fazer. A
abracei, e ela se deitou em mim.

— Me desculpe, Alec. Me perdoa, por favor. — Aquilo me pegou de


surpresa.
— Perdoar pelo que Lila? Você está doente, ao que parece. Não é

culpa sua, se eu soubesse, teria vindo mais rápido te ver. Achei que estava
me evitando por causa da resposta. Eu que devo pedir desculpas. O que

você tem?
— É mais fácil perguntar o que eu não tenho, nesse momento. Tenho

medo da rua, medo de sair de casa, não tenho forças para nada, quero morar
na cama, não tenho vontade de viver. — Aquilo me pegou desprevenido.

Como alguém vai de tão sorridente para a depressão em tão pouco tempo?
A não ser...

— Lila, você estava segurando toda essa dor esse tempo todo?
Escondendo das pessoas?
— Eu não podia e nem posso colocar vocês em perigo. Não posso

trazer os meus problemas para quem sempre esteve por mim. Não posso,
Alec. — Pelo jeito, a história era mais profunda. Olhei ao redor e tudo

estava empacotado. Empacotado?


— Você ia fugir, Lila? — Ela parece que viu as caixas pela primeira

vez. Olhou por um tempo, como quem olha para aquilo que mais te causa
dor. Um olhar vazio.

— Eu preciso ir para longe de todos que amo. A única forma de não


me encontrarem é fugindo. Eu fui idiota, acreditei que estava segura e entrei

nos holofotes quando deveria viver nos bastidores. Agora não sei como
dizer adeus à minha vida aqui.

Adeus??!! Calma, nada de adeus. Vamos respirar fundo e pensar.


— Lila, vamos por partes. Primeiro, você precisa de um banho e de

arrumar as coisas por aqui. Vou preparar a banheira para você, me espera
aqui? — Ela se deitou no sofá e concordou.

Fui até o banheiro e ajustei a água para uma temperatura morna.


Voltei para a sala, e ela estava deitada com o olhar preso no vazio.

— Ei, minha deusa de ébano. — Aquilo pareceu chamar sua atenção.


— Vem comigo.

A ajudei a se levantar e a levei até a banheira. Tirei sua roupa, e ela


entrou na água, sentou-se na banheira, e eu fiquei ao seu lado. Arregacei as

mangas da camisa e lavei o seu cabelo. Esse pequeno cuidado parecia um


ótimo remédio para ela, que já mostrava sinais de um sorriso.

Enquanto dava um banho na Lila, tentei me lembrar da última vez que


fiz algo parecido. Nem quando Abbie estava mal pude fazer algo assim. Ela

não permitia, achava que coisas desse tipo podiam acabar com o lado sexy
da coisa.

Estando aqui, com a Lila totalmente pelada na minha frente, não acho
isso, até penso que aumenta a vontade e o desejo. São momentos distintos
com experiências distintas. Esse cuidado aumenta meus sentimentos por

essa mulher incrível que está com medo de alguém, e eu pretendo levar esse
medo para bem longe. Dela, quero sempre o sorriso no seu rosto e o amor

em seu olhar.
Terminamos o banho, e ela saiu enrolada na toalha. Pedi que

esperasse sentada em uma cadeira enquanto eu trocava os lençóis da cama.


Ela me disse onde ficavam os limpos e fiz todo o processo. Depois coloquei
um pijama nela, e ela se deitou novamente.

Próximo passo: comida.


Pedi do restaurante que eu mais gosto um prato para mim e algo leve
e nutritivo para ela. Muito tempo sem comer, o estômago deve estar fraco.

Depois do pedido, voltei para a cama, e ela estava agarrada com um urso de
pelúcia gigante, meio gasto do tempo.

— Quem é esse?
— Esse é o Char, em homenagem ao meu pai. Era o presente que ele

comprou para me dar, mas morreu antes disso. — Não era bem esse assunto
pesado que eu queria começar.

— Desculpe, não queria tocar em algo doloroso.


— Não se preocupe, gosto de me lembrar dele.

— Lila, eu preciso que você me fale o que está acontecendo. — Ela


voltou àquele olhar pensativo e encarou a janela.

— Não sei se consigo fazer isso com vocês. — Peguei em sua mão.
— Tudo o que eu te disse no evento é verdade. Quero mais, quero

estar em sua vida e, se isso faz parte da sua história, quero saber. Não
precisa temer por mim, Lila. Eu sei me cuidar. Agora, me fala, por favor. —

Ela respirou fundo e começou a contar tudo.


Então, ela falou sobre a morte do seu pai, o impacto que teve em sua
mãe e sobre o seu padrasto, o culpado de tudo isso. Contou como fugiu de

lá e nunca mais voltou, que morre de medo ainda hoje e, graças à entrevista
do Hackathon, ele a achou, exigindo dinheiro e dizendo que vem atrás dela.

No final do relato, Lila tremia e chorava, e eu tremia de raiva.


Como pode um homem levantar a mão para uma mulher, como pode

se achar certo com essa covardia. Eu estava fervilhando de ódio, mas


precisava deixar isso para depois, minha prioridade agora era ela.

— Lila, preste bastante atenção no que vou te dizer. Eu não estou de


passagem, eu quero ficar ao seu lado até quando você não quiser mais, e

espero que isso demore muito. — Ela sorriu. — Não sei sua resposta quanto
ao que falei, mas posso garantir que vou te proteger, mesmo que escolha ser

apenas uma amiga. Você é importante para mim e prometo não deixar nada
disso te afetar novamente. Você confia em mim?
— Confio. — Ela sorriu de novo.
— Então pronto, não precisa fugir. — A campainha tocou, e ela ficou

em alerta. — É a comida que pedi. Vou lá atender. — Antes que eu saísse


do quarto, ouvi sua voz.
— Eu também quero mais... Quero mais com você e não quero te
largar nem tão cedo... — Não esperava ouvir isso agora, mas fiquei feliz.
Olhei para ela com um sorriso e segui para a porta, para pegar nossa
comida.

Voltei com tudo para comermos na sala, mas o seu olhar assustado
não parecia querer comer por lá.
— Quer comer no quarto? — Ela assentiu.
— Desculpa, sei que deveríamos comer lá, mas me sinto mais segura
comendo aqui no quarto. Como se o escuro pudesse me proteger de algo.

— Eu não me importo, mudar um pouco de lugar é divertido. Só vou


mudar uma coisa: agora você não precisa do escuro para se proteger, eu
estou aqui e prometo que vou fazer de tudo para que fique bem. — Ela
sorriu e se encostou em mim. Fiz um cafuné nela, bagunçando o seu cabelo,

e ela achou bastante divertido. Se eu fizesse isso na Abbie, a gente iria


brigar.
— Deixa eu tomar os meus remédios.
— Remédios?

— Falei com o Ross, foi ele quem deu o atestado. — Deveria ter lido
o nome do médico, pouparia tempo. — Estou passando por uma crise de
pânico, mas vou ver melhor o que tenho, só não sei se consigo ficar com
ele. Não tenho dinheiro para o tratamento.

— Pode marcar e falar com a Érica. Na empresa, temos um programa


de saúde mental. Estamos no computador durante todo o tempo e virando
noites, isso não faz bem a longo prazo. Acho que você pode melhorar muito
com ele, Ross é um baita profissional que vem me ajudando também. Você

sabe que tudo isso requer tratamento e cuidado, certo? Pois, não desaparece
da noite para o dia e precisa de atenção.
— Sei, na verdade, tentei fazer tratamento por um tempo, mas nem
sempre a vida ajuda, seja pela rotina, seja pelo financeiro. Me conta, você

está em tratamento para quê?


— Depois eu te conto. Agora vamos comer antes que a comida esfrie
e te deixo escolher um filme para assistirmos. Pode ser meloso, dessa vez
eu deixo. — Ela se animou ainda mais. Pequenas coisas, pequenos detalhes.

Isso, eu nunca tive com a Abbie.


Apesar de ela ser maravilhosa, tínhamos um casamento adulto até
demais. Com a Lila, eu sinto o que eu via do Carson com sua esposa, uma
cumplicidade e alegria enormes.
Lila se alimentou bem e tomou os remédios. Ela escolheu um filme de

romance, De repente é amor, e nos deitamos juntos na cama. Dessa vez


como um casal de namorados, ela deitada em meu ombro enquanto assistia
a tudo. Depois de alguns minutos de filme, percebi que sua respiração
mudou. Ela pegou no sono.

— Devia estar cansada e com fome, né, garota? Durma bem, eu estou
aqui. — Esse momento foi ainda mais especial do que qualquer viagem
para o exterior ou jantar em um restaurante chique. Esse momento era algo

que eu sempre quis, um momento normal, como um casal simples, com


alegrias simples e uma felicidade que não se rouba, apenas se sente.
Estava entre um cochilo e outro quando ouço a frase do filme:
“Se você não está disposto a parecer um idiota, não merece se apaixonar.”
Verdade, e não é parecer um idiota de uma forma negativa, é parecer

um idiota que não liga para coisas simples ou que volta a ser criança. Isso é
se apaixonar e, pela Lila, eu viraria esse idiota. Peguei no sono, não lembro
que horas eram, mas acordei antes da Lila.
Meu relógio biológico era pontual. Às 5h da manhã estava de pé, com

a roupa de ontem ainda e cheirando a uísque. Aproveitei para tomar uma


ducha, vestiria a mesma roupa, mas estaria mais limpo.
Precisava preparar um café da manhã para nós dois e não podia sair
com a roupa desse jeito. Fui à geladeira e encontrei alguns ovos e material

suficiente para algumas panquecas. Enquanto cozinhava, ouvi passos atrás


de mim, olhei de relance e vi Lila com cara de quem acabou de acordar e
com cabelos despenteados. Sorri.
— Bom dia, garota! Dormiu bem?

— Acho que fazia tempo que não dormia tão bem. Apaguei ontem no
filme. — Servi um prato para ela e um para mim.
— Agora que descansou, está pronta para amanhã? — Ela parou com

o garfo no caminho da boca, como se não fizesse noção de que dia era.
— Lila, você se perdeu nos dias?
— Juro que estou tentando lembrar, e não consigo. Estamos no
sábado, certo?

— Sim e que dia é hoje?


— Hoje é... Oh, meu Deus! Amanhã é véspera de Natal! Eu nunca
lembraria, me perdi totalmente no tempo.
— Lila...

— MEU DEUS! Os meninos! Como está a equipe? Os deixei uma


semana na mão, bem agora que estamos na fase mais difícil. — Peguei as
suas mãos e fui até ela. A abracei e tentei acalmá-la.
— Lila, respira. Você precisa se acalmar. Está tudo bem, a equipe está
trabalhando no protótipo e todos sabem que estava doente. Agora vamos

focar, daqui para frente, na sua recuperação e no café da manhã, certo?


— Tudo bem, eu preciso me acalmar mesmo. Amanhã, aproveite
bastante a festa...
— Nada disso. Você vai para a festa também, todos estão te

esperando e vai ser entre a família, não terá convidados. É bom para sair um
pouco de casa e se acostumar com a vida lá fora. E nem venha me dizer
não. — Ela sorriu.
— Certo, chefe. Pode deixar que vou sim.

— Muito bem, agora come tudo para melhorar mais rápido. —


Continuamos comendo e conversando sobre frivolidades. Estar ao lado da
Lila era tão natural, parecia que nos conhecíamos há anos. Eu não tinha
mais receios ou pudores, na verdade, só uma coisa ainda continuava me

assombrando, mas tinha fé de que tudo se resolveria.


Liguei para o Fernando e ficamos esperando no sofá. Decidi contar
para ela.
— Lila, preciso te falar uma coisa. Desde que nos conhecemos, tenho

uma evolução quanto à minha impotência. No começo, pensei que era coisa
da minha cabeça, mas, depois do tratamento com o Ross e da sua presença,
já tenho ereções espontâneas, aquelas que acontecem quando a gente
acorda, e isso nunca mais tinha acontecido. E isso significa que estou

evoluindo e acho que posso ir ainda mais longe.


— Não acredito! Alec, isso é incrível! Você vai voltar a ter o que
tinha antes, estou muito feliz por você e, se for possível, quero ajudar ainda
mais na sua evolução.

— Era exatamente isso que eu queria ouvir, porque quero desbravar


tudo isso com você. Cada novo momento, quero dividir com você. Como eu
te disse, ainda não sei que nome dar ao que eu sinto, mas sei que te quero
por perto.
A beijei. Nada sexy ou sensual. Um beijo romântico, acolhedor,
apaixonado.
Fernando chegou e buzinou. Eu me despedi e entrei no carro. No
caminho para casa, a sensação era de falta. Queria mais tempo com ela,

queria mais do seu cheiro e do seu abraço. Meu coração ainda estava
acelerado. Eu, realmente, estava apaixonado.
— Até onde você vai me levar, garota? — Garota virou o meu apelido
para ela. Algo que me faz lembrar do dia em que nos conhecemos e isso é o

suficiente. Aquele dia foi o mais especial de todos.


A ceia de Natal da família Donovan era especial. Gostávamos de
manter tradições, tomar drinks natalinos e decorar a casa por completo.
Como Lila ficou fora toda a semana, não viu a preparação de sempre. Isso
era algo que foi passado de geração em geração para toda a nossa família. O

espírito natalino.
À noite, Lila chegou e ficou deslumbrada com tudo. Eu fiquei
deslumbrado com ela, linda em um vestido verde com detalhes em branco.
— Lila, ainda bem que você veio, amiga. O que seria do meu Natal

sem você?
— Piper, obrigada pela ajuda nessa semana. Tudo está magnífico.
— Até parece que é a primeira vez que você vem aqui, vem falar com
todo mundo.
Piper arrastou Lila por toda a mansão, cumprimentando toda a
família. Ross aproveitou para conversar com ela e, provavelmente,
perguntar sobre sua melhora e tratamento. Eu já havia adiantado para ele
sobre as consultas da Lila. Agora, mais do que nunca, ela precisaria de

ajuda.
Piper disse a todos que Lila teve exaustão e ficou doente por isso.
Eu mantive a mentira na empresa também, não poderia explicar que
sabia o motivo da doença dela. A ceia foi servida com um grande jantar,

dessa vez pelas mãos de mais algumas pessoas. Tudo estava uma delícia e
Lila comia normalmente, estava mais tranquilo vendo-a saudável e feliz.
Depois de abrir os presentes e da Lila ganhar alguns suéteres e
cachecóis, a chamei para subir e conhecer um lugar que poucas pessoas

conheciam. O meu antigo quarto.


Minha mãe deixou tudo intocado, como se fosse um verdadeiro túnel
do tempo. Eu amava a sensação de entrar ali, parecia que uma versão
criança minha surgia naquela porta e ganhava vida em todo lugar.

— Esse é o quarto que eu tinha até ir para a universidade. Minha mãe


não mexeu em nada.
— Alec, você era colecionador de carros e livros clássicos? E ainda é
fã dos Cavaleiros do Zodíaco? — Tinha todos os bonecos. — Nossa, que
inveja. Eu tentei colecionar todos, mas não consegui encontrar.
— Confesso que ter dinheiro ajudou muito a encontrar todos. Entre as
coleções, você pode escolher um dos bonecos, qualquer um, será o seu
presente de Natal.

— Hum, então preciso escolher bem. — Ela olhou por todos os


bonecos, bastante concentrada, e eu não tinha vergonha em falar da minha
infância. Eu até estava gostando de tudo. — Essa aqui, parece um anjo.
Gostei!
— Essa é da coleção de Digimon. Já estava velhinho, mas gostei

bastante do desenho. Essa é Angewomon.


— Eu não vou lembrar do nome, Alec. Você é um verdadeiro nerd por
baixo dessa capa de homem descolado.
— Os nerds são os melhores. — Rimos e brincamos até que a Lila se

desequilibrou e caiu na minha cama. Tentei ajudá-la, e ela me puxou para


mais perto.
— Shhhh— Ela fez sinal para fazer silêncio, bem na hora em que
uma das responsáveis pela arrumação da casa apareceu. Ela olhou e não nos

viu no canto da cama, escondida por uma parede. Fechou a porta e seguiu.
Sorrimos, igual a um casal adolescente escondido dos pais. — Queria
agradecer por tudo o que você fez por mim, na minha casa. Me ajudou
quando eu mais precisei. — Tirei uma mecha de cabelo do seu rosto e

coloquei na orelha.
— Não precisa agradecer, acho que foi ainda mais satisfatório para
mim. Fico feliz em te ver feliz, garota. Vou proteger esse sorriso como
puder. — Passei o dedo por seus lábios e tive uma imensa vontade de beijá-

los. Olhei para Lila, e ela esperava o mesmo.


Beijei lentamente, provando o sabor dos seus lábios e fui
intensificando à medida que a minha vontade e desejo aumentaram.
Estávamos no meu quarto de criança, com todos lá embaixo, mas eu não me

importei. Pela primeira vez, apenas pensei em estar com ela, nada mais me
preocupou.
Apalpei seus seios por cima do vestido, os bicos já estavam duros,
ansiosos pelo meu toque. Desci a mão para passar por baixo do vestido e

chegar na sua zona erógena. Quando passei a mão por cima da lingerie, Lila
soltou um gemido que mexeu comigo. Senti o meu pênis começar a
endurecer.
Deixei os seus seios expostos pelo decote e livres para que minha

boca alcançasse. Suguei os seus seios e mais um gemido, agora meu pênis
estava totalmente ereto, e Lila sentiu ao se aproximar de mim.
— Alec, seu... está funcionando?
— Não sei, mas ele nunca ficou assim por muito tempo.
— Faz um tempo que eu quero te dizer isso e não sei como. Alec,

estou pronta para o próximo nível, se você também estiver, claro.


— Qual nível, Lila? — Ela estava um pouco envergonhada em falar
sobre isso, mas tive que perguntar para ter certeza se entendi direito.

— Quero perder minha virgindade com você — ela falou de uma vez,
e isso me pegou de surpresa. — Sei que você vai conseguir evoluir ainda
mais e já me decidi.
  A beijei intensamente, com todo o meu desejo à flor da pele nesse
momento. Ouvir tanta cumplicidade de alguém que nem sabe o que esperar

do futuro, alguém que me aceita assim como estou agora, foi uma das
melhores sensações dos últimos tempos. Ela queria um momento tão
especial comigo.
Antes que eu pudesse falar algo, Lila tirou sua calcinha.

— Lila, você vai fazer isso agora? Não sei ainda se vai funcionar.
— Não tem problema, podemos ver o que conseguimos. Como se
fosse a primeira vez dos dois. — Eu não tinha pensado nisso. Depois desse
tempo sem nada sexual, seria como a primeira vez. Me deixei levar.

Lila abriu minha calça, mesmo envergonhada, eu sentia que o seu


desejo era maior. Quando ela subiu em mim, algo deu errado. Não sei se foi
muita expectativa ou se me senti pressionado pelo ambiente, mas eu broxei.
Ela ficou sem entender e olhou para mim, como se me perguntasse o que

houve.
— Também não sei. — Ela saiu de cima de mim. — Me desculpe,
Lila. Eu sei que você queria, mas ainda estou no caminho. Droga, não

queria que isso acontecesse bem agora. Prometo que...


— Não! — Ela foi bem mandona agora. — Nada de se desculpar,
Alec. Não quero que se arrependa dessa nossa tentativa, quero que pense na
evolução que nos fez chegar a tentar tudo isso. É normal acontecer com

pessoas que não passaram pelo que você passou, então, não seja tão duro
consigo mesmo.
Meu lado adolescente pensou em diversas frases que colocasse o duro
no meio. Só Lila para fazer eu me divertir justo agora.

— Vamos pensar pelo lado positivo, ele está funcionando, só precisa


de tempo.
— Verdade, não vamos estragar nossa noite. Vamos... — Lila pegou
as minhas mãos como fiz com as dela.

— Eu que insisti nisso. Quero que tire da sua cabeça que é algo ruim,
isso é um bom sinal, porque já ficou mais tempo. Na próxima, vai ser ainda
melhor. E eu vou esperar você. — Não pude me conter, sorri com esse final.
— Correndo o risco de parecer um adolescente, estou feliz por passar
tudo isso com você. — Ela sorriu e me beijou. Ao lado da Lila, eu baixava

todas as minhas guardas. Tudo o que poderia me assustar ou afastar, estava


longe de nós, aqui eu era puramente minha essência. Livre para voar, mas o

desejo era de ficar ao seu lado.


Saímos do quarto e fingimos que estávamos conversando à luz das
estrelas, na varanda. Meus olhos não conseguiam desviar do olhar dela.
Meu mundo se resumiu a um só coração, eu apenas não tinha notado isso,
ainda.

A última semana do ano começou com a nomeação da Lila como


capitã oficial do time. Todos adoraram sua apresentação e fizeram questão
disso. O protótipo já estava em preparação. Tentamos nos ver ao máximo na
empresa, sem que notassem.

Nesse fim de semana, teria a festa de Ano-Novo da empresa. Sempre


era uma grande festa com clientes e funcionários, todos juntos. Os convites
foram enviados antes do Natal, então todos já deram as suas respostas.
Mandei uma mensagem para a Lila, perguntando se ela iria à festa. Ela

respondeu que sim e que, dessa vez, ela daria o presente para mim.
Fiquei curioso, mas a fiz esperar da outra vez, então seria justo e
esperaria. Não disse que era uma tarefa fácil.
Toda a minha família estaria presente na festa, então estaríamos

juntos à distância, como sempre. No final do expediente do último dia de


trabalho, uma caixinha me esperava. Dentro dela, um cartão:
“’Renda-se, como eu me rendi. Mergulhe no que você não conhece como eu

mergulhei. Não se preocupe em entender, viver ultrapassa qualquer


entendimento.”
(Clarice Lispector)
Use ambos para combinar comigo. Juntos, mesmo distante.

Dentro da caixa, uma gravata e um lenço de bolso em branco e


dourado. No dia da festa, esperei ansiosamente por ela. Minha família

chegou e estava conversando com todos quando ouço alguém perto falar:

“Quem é aquela que chegou?” Me virei imediatamente e encontrou a mais


bela das deusas.

Lila estava em um vestido branco com listras douradas, que prendia

no pescoço e deixava as costas nuas. O vestido ia até os seus pés. Seu


cabelo estava preso em um coque com algumas mechas soltas, deixando o

seu pescoço delicioso à vista. Essa festa seria uma penitência.


Não podia ir até ela, apenas esperar que chegasse à nossa roda de

família.

— Lila, que espetáculo. Você sabe fazer uma entrada! Desse jeito, vai
começar o ano com um boy novo, hein! — Nada de boy novo. Odeio esse

sigilo.
— Boa noite, pessoal. Piper, não começa com isso de boy novo, esse

negócio é mais a tua vibe.


— Você quem sabe, tem uns gatinhos que adorariam te conhecer. —

Vou deserdar essa sobrinha.

— Vou ficar por aqui, por enquanto. Depois andamos um pouco. —


Piper concordou, e Lila ficou ao meu lado.

— Vejo que, dessa vez, foi você quem me surpreendeu com bom
gosto em vestidos.

— Precisava apenas de um incentivo. — Ela sorriu para mim.

— Louco para tirá-lo mais tarde. Só esperando virar o ano para te


roubar daqui.

— Ansiosa por este roubo, Sr. Donovan.


— Você está linda, Lila, de verdade. Não precisaria estar com você

para saber que é a mulher mais linda desse lugar.

Quando eu estava pronto para mergulhar, algo me segura na


superfície.

O destino não sabe ser justo.

— Boa noite, Alec. Não pensei que te encontraria aqui, em uma festa.
Vejo que o CEO sabe se divertir também.

Essa era a voz que eu nunca pensei que ouviria novamente.


A voz que ficou no meu passado.

A que desperta todos os meus gatilhos.

A voz que um dia eu amei.


Abbie.
 

Respiração pesada.

Respira fundo, Alec. Vai ficar tudo bem.

Não consigo fingir que aquela voz não me abala.


Depois daquela noite, no Natal, ainda não me recuperei da tentativa

falha em finalmente me sentir um homem por completo. Eu estava tão perto

e tudo deu errado. Com a ferida ainda aberta, o destino vem e joga sal nela.
Abbie era tudo o que eu menos queria agora.
Olhei para a Lila, que me olhava de uma forma estranha, como se

tentasse entender o que estava acontecendo. Claro, ela nunca tinha visto

uma foto da Abbie antes e não faz a mínima ideia de quem ela seja. Me

virei e segurei o ar.

Abbie está maravilhosa.


O tempo não foi cruel com ela, foi um perfeito amigo que refinou

ainda mais sua beleza. Como sempre, ela usava uma roupa que realçava

todas as suas curvas, expondo a beleza que a vida lhe deu. Se tivesse uma

peça de teatro, ela seria a perfeita Afrodite.

Nesse curto espaço de tempo, a minha mente pensou em tudo de bom


que vivemos, mas também me lembrou dos momentos ruins, alguns deles

guardados secretamente entre nós dois. Isso me trouxe à realidade.

— Boa noite, Abigail. Você sabe que sempre gostei de me divertir,

embora tenha estado focado no trabalho ultimamente. Hoje é um dia de

comemoração. E você? Veio como acompanhante de alguém? — Eu não a

convidei e não lembro de ter alguma relação entre o seu trabalho e a minha

empresa, afinal, a festa era fechada.


— Nossa, o Phil sempre se esquece das coisas, achei que ele tinha te

avisado. Eu serei a garota propaganda dos produtos que vocês estão

trabalhando. — Era só o que me faltava. Trabalhar lado a lado com a Abbie


nunca foi algo bom, temos personalidades dominantes e sempre acabava em

briga.

— Realmente, estou descobrindo agora sobre isso.

— Ah, relaxa, Alec. Sei que a gente nunca se deu bem no trabalho,

era a única coisa que não éramos bons juntos, mas garanto que, dessa vez,

vai funcionar — ela falou aquilo para provocar. Abbie sempre foi
observadora e não sei se notou algo entre mim e a Lila, mas ela estava

jogando para pescar ciúmes.

— Bem, hoje não é o momento de falar em trabalho. Espero que se

divirta na festa e tenha um ótimo Ano-Novo. — Me virei para falar com

Lila, mas Abbie se aproximou do meu ouvido sem eu notar. Aquele

perfume me trazia muitas recordações.

— Pode deixar, Alec. Acho que esse novo ano tem espaço para nós

dois, nossa história não teve um ponto-final, lembra? Sabe onde me

encontrar. — Se afastou, passando a língua nos lábios. Uma coisa é certa:

ela sabia como seduzir.


Sorri, me lembrando de como éramos juntos e, na mesma hora, me

lembrei da Lila. Ela estava com Piper, me observando, e parecia não estar

gostando de nada do que viu.

 
 

Abigail? Onde ouvi esse nome?

Não sei quem ela é, mas parecia ter alguma história com Alec.

Era um mulherão de parar qualquer trânsito. Tinha elegância e sabia

se vestir muito bem. Estava claro que ela se jogava para Alec de todas as
formas, o que não gostei foi de ver sua reação.

Alec mudou completamente quando ouviu a voz dela.

Ele estava sorridente e se divertindo como nunca, agora era

novamente aquele cara fechado, sério e que parecia estar firmando algum

negócio. A perfeita visão de um CEO. Foi ela que despertou isso nele?

Os dois conversavam e, pelo barulho, eu não conseguia entender

muita coisa. Só percebi que estava encarando quando Piper chegou perto de

mim.

— Lila, daqui a pouco vai fazer uma leitura labial de tanto que encara

os dois — falou, brincando.

— Desculpa, amiga. Só fiquei curiosa para me lembrar de onde ouvi

esse nome, Abigail. Ela é bonita.

— Não se engane, ela é a vaidade em pessoa. Pode ser quem ela

quiser para conquistar o que deseja, nesse momento, ela deseja o tio Alec
novamente. — Novamente?

— Como assim “novamente”?

— Os dois foram casados, ela foi a primeira e única mulher com

quem o tio Alec se casou. Durante uma das comemorações de aniversário

de casamento, ela caiu da lancha e tio Alec pulou para salvá-la, a donzela

em perigo. Graças a isso, bem, podemos dizer que ele ficou com algumas

sequelas.

Me arrepiei na mesma hora.

Era ela. A mulher que ele falou. Aquela com quem tudo deu errado

depois do acidente.
— Houve certo problema sobre ter filhos. Como tio Alec não poderia

ter, então ela não aguentou e foi embora. Posso estar exagerando um pouco,

até porque ela ficou por um bom tempo, mas somente a família sabia quem

a Abbie era.

— Como assim? Se eu estiver sendo intrometida, pode falar. —

Estava muito curiosa com tudo, mas não tinha certeza até onde poderia

perguntar.

— Tio Alec sempre jogou para ganhar, tanto nos negócios, quanto na

vida, e foi assim que ele ganhou o coração da Abbie. Os dois eram sedentos

por vitória, ele, para expandir os seus negócios, e ela, para ser a melhor

atriz e desfilar com o melhor empresário. Portanto, a peteca de ambos


nunca poderia cair. Não é um relacionamento saudável e todos à sua volta

notavam, mas ambos eram felizes.

— Então estavam juntos por negócios, e não por amor?

— Acredito que existia amor misturado em tudo, ela era apaixonada

por ele, mas o tio Alec amava Abbie muito mais, era notável. Quando tudo

aconteceu e se separaram, ele ficou arrasado e se escondeu do mundo.

Viveu para o trabalho. O resto, você sabe.

— Ele não parece abalado em vê-la de novo.

— Isso é o que você acha. Por dentro, ele usa todas as suas forças

para manter a compostura. A sua mão está fechada com força de verdade.

— Eu não tinha percebido isso. Abigail chegou perto do ouvido dele para

falar algo, e eu fechei a cara, foi automático e não consegui esconder.

— Ela adora causar ciúmes em todos ao redor, gosta de se destacar e

ser a única estrela da noite. Deve estar com ciúmes do tio conversando com

você, que está um arraso nesse vestido. — Disfarcei um pouco com um

meio-sorriso, mas estava com muita raiva da situação.

— Ela se casou depois?

— Que eu saiba, não. De vez em quando, aparece em algumas


revistas de fofoca, mas não teve casamento e nem filho. Ela sempre desejou

ser mãe, mas até agora não aconteceu. Toda essa cena é tentando chamar a

atenção dele, acha que não tem ninguém porque ainda a ama. — Apertei a
taça na minha mão. Ele tem alguém, sim, queria muito poder jogar isso na

cara dela.

Nunca senti tanto ciúmes, tanta raiva de alguém assim.

Alec volta a olhar para mim e vê a minha feição, ciúmes. Ele tenta se

aproximar para falar algo, mas Piper é mais rápida. Será que ela percebeu

algo entre a gente?

— Tio, vou com a Lila na varanda olhar alguns gatinhos. Depois a

gente se encontra. — Ela saiu me puxando.


— Piper, não quero ver ninguém agora.

— Não precisa, só fica do meu lado que já ajuda a atrair ainda mais
gatinhos dessa festa. — Relaxei um pouco, ela realmente estava

paquerando. Fui até a varanda e a vista das estrelas estava maravilhosa. A


contagem regressiva se aproximava, quando faltavam cinco segundos para a

virada do ano, senti alguém se aproximando de mim por trás.


— Lila, você é a única que eu quero, que eu preciso. Feliz Ano-Novo.

— Os fogos explodiram no céu, dando cor àquela imensa escuridão. Assim


era Alec na minha vida, mas até quando? Eu não me sentia mais segura.

Assim que todos começaram a se cumprimentar, Abigail voltou e se


jogou nos braços do Alec. Eu, definitivamente, odiava aquela mulher.
Me afastei um pouco e mandei uma mensagem para Piper, avisando

que estava indo embora por causa de uma dor de cabeça. Era mentira, eu
não conseguiria ver aquela cena durante toda a noite.
Fui até o banheiro para usar o espelho e me acalmar um pouco.

Mandei mensagem para Roddie, para Fernanda e uma para minha mãe, não
sei se ela veria. Ajeitei alguns fios do meu cabelo e saí para o

estacionamento. Enquanto procurava a chave do carro, uma voz falou


comigo.

— Já vai embora? Achei que você era mais resistente. — Abigail


fumava um cigarro enquanto olhava para o céu.
— Desculpa, não entendi.

— Ah, garota. — Só Alec me chama assim! — Você realmente acha


que eu não perceberia que tem algo entre você e Alec. Se bem que não sei o

que estão fazendo, já que ele é impotente.


— Se você pensa assim dele, então por que está correndo atrás, como

uma cadelinha sem dono? — Se ela queria briga, ela teria.


— Hum, vejo que a gatinha tem garras. Entenda uma coisa: minha

história com Alec não terminou, foi pausada. O sentimento ainda está ali,
esperando que eu o acorde e, acredite, vou acordar. Não se consegue afastar

o passado quando ele não foi esquecido. — Ela me olhou nos olhos.
“É necessária a desgraça para provocar certas minas misteriosas ocultas

na inteligência humana; é precisa a pressão para fazer estourar a


pólvora.”
— O Conde de Monte Cristo — falou enquanto apagava o cigarro.
— Hum, vejo que a cadelinha é estudada. Eu posso ser uma gatinha

mansa ou uma leoa feroz, depende do nível de pressão e da desgraça à qual


sou submetida. Um aviso: tenha cuidado com o quanto pressiona, você pode

não gostar do final.


— Esse jogo é perigoso e sou mais experiente que você. Vou

pressionar tudo até o fim, e veremos quem sairá como vencedora. —


Abigail saiu com um olhar feroz e raivoso. Não esperava que eu a

respondesse.
Eu não estava muito diferente dela.

Cheguei em casa com o sangue fervendo.


— Quem essa idiota pensa que é? Acha que pode entrar e sair da vida

das pessoas e nada estar diferente? — Meus nervos estavam à flor da pele,
fiquei rodando na sala e pensando na nossa discussão até que meu celular

vibrou. Uma mensagem do Alec, perguntando onde eu estava.


Falei que estava em casa, e ele quis me encontrar aqui. Neguei. Era a
última pessoa quem eu queria ver agora. Disse que preferia ficar sozinha e

que estava com dor de cabeça, depois desliguei o celular. Ele não sairia da
sua festa com tantos clientes por lá.

Tomei uma ducha para esfriar a cabeça, mas aquela voz ainda estava
lá. O medo do meu padrasto aparecer foi ofuscado, pela primeira vez, pela
minha raiva por outra pessoa.

— Como alguém pode causar tanta raiva em apenas alguns minutos


de conversa?!

Decidi dormir um pouco para relaxar. Demorei a pegar no sono. Tive


pesadelos com aquela cadela dos infernos.

No outro dia, acordei empolgada.


Ainda tinha tudo o que aconteceu na mente, mas preferi pensar que
um novo ano começou repleto de novas metas, objetivos e conquistas.

Aproveitei o feriado para pedalar um pouco.


Liguei meu celular enquanto tomava o meu café e algumas

mensagens do Alec apareceram. Falava que sentiu minha falta, que queria
estar comigo e desejando melhoras. Quando ia colocar o celular no quarto,

ele me ligou.
— Lila?

— Oi, Alec.
— Você está melhor?

— Estou. Um café sempre ajuda a melhorar qualquer coisa.


— Verdade. Quer sair para algum lugar? Eu posso passar aí para te

pegar.
— Não estou muito no clima, vou tirar o dia para mim, pedalar um

pouco. — Ele respirou fundo, como se estivesse frustrado.


— Lila, você ficou com raiva de alguma coisa na festa? — Claro, seu

idiota. Qual mulher não ficaria vendo outra pulando em cima do cara com
quem ela está?!

— Apenas estranhei a forma da Abigail de agir, não esperava tudo


aquilo, mas Piper me contou o passado de vocês.

— Lila, o que eu falei para você foi sério. Não tem mais ninguém, só
você.

— Eu até estou tentando me concentrar nisso, mas fica difícil quando


você sabe que o passado foi apenas pausado. Eu vi sua cara quando a viu,

Alec. Algo mudou, você não agiu naturalmente.


— Claro, eu não a via fazia tempo.

— Você sabe do que estou falando, mas acho que não devemos
discutir sobre isso. É a sua vida, e não tenho o direito de cobrar nada, o

nosso relacionamento nem tem nome. Olha, preciso ir para aproveitar a


manhã. Nos vemos no trabalho. — Desliguei antes que ele pudesse falar
algo.

Eu parecia uma adolescente com ciúmes. Alec conseguiu derrubar


todas as minhas barreiras, e eu não percebi.

— Droga, Lila. Você tinha que se apaixonar por alguém assim? —


Apaixonar? Veio tão fácil na minha boca quando pensei no Alec, era esse o

nome do sentimento. Paixão. Eu precisava ter cuidado para não se


transformar em um amor unilateral. Demorei um pouco para sair de casa e,
quando abri a porta, tomei um susto.

— Alec? O que está fazendo aqui?


— Digamos que, pela última ligação, eu precisava me redimir com
você. Por isso, mesmo que já tenha tomado um café, eu trouxe outro. Café

quentinho com duas colheres de creme e um cubo de açúcar, acertei? — Ele


me impressionou.

— Você lembrou.
— Sou bastante observador com tudo que é importante pra mim.

— Um café não vai compensar nada. — Eu não cederia facilmente.


— Achei que isso aconteceria. Por isso, também trouxe a minha bike

e uma cesta de piquenique. Vamos pedalar até o parque e deitar na toalha de


piquenique, para aproveitar o dia. Gostou do programa?

— Por que você acha que eu curto esse tipo de programa?


— De tanto falar do parque e como gosta de passear, deduzi. Não será

fácil se livrar de mim, garota. Agora vamos que estou um pouco


enferrujado. Não pedalo há muito tempo.

Me dei por vencida e ele sorriu pra mim vitorioso.


Peguei minha bicicleta e saímos para uma volta no bairro. Senti que

algo estava emperrando, parei algumas vezes e não consegui ver o que era.
Precisava fazer uma manutenção nela, fazia tempo que estava parada. Alec
estava incrível. Nunca pensei que faria algo assim com ele.

Chegamos no parque, lanchamos alguns petiscos e nos deitamos na


toalha que ele trouxe. Ali, com ele, me trouxe de volta à curiosidade.

— Alec, o que realmente aconteceu entre você e a Abigail?


— Esse era um assunto que eu preferia evitar para o resto da vista. No

fundo, eu me sinto culpado por tudo. Abigail sempre foi de festejar a vida e,
às vezes, exagerava, ela sonhava em ter uma família e filhos, tudo que eu

não pude dar após o acidente. Nosso casamento foi esfriando, e ela se jogou
no álcool para aceitar viver se anulando.

— Mas a escolha foi dela, por que você se culpa?


— Eu deveria ter percebido antes.

— Você ainda sente algo por ela? — Ele hesitou, droga.


— Acho que devemos nos concentrar em nós dois agora, o que acha?
— Ele mudou de assunto, merda. O que me restava agora era esquecer e
viver a vida com ele até quando der. Era pura curtição, certo?

Ficamos de namorico na praça e voltamos pedalando para casa.


Tomamos uma ducha e voltei para o quarto de toalha, com o cabelo
molhado. Alec me comia com os olhos.
— Vejo que alguém está animado.
— Vem cá, desse jeitinho que está. — Fui até ele, que me deitou na
cama. Abriu a toalha para ver todo o meu corpo nu. Ele se deliciava com a

vista, e eu me sentia a mulher mais desejada de todas.


— Lila, você realmente quer perder a virgindade comigo?
— Quero, Alec, mas tem certeza de que está tudo bem agora? Eu
posso esperar.
— Não se preocupe comigo, eu desejo você há muito tempo e sonho

com esse dia, em que finalmente poderia estar dentro de você. Esse seu
corpo, sua pele, seus beijos, tudo isso me deixa louco. Eu te quero como
nunca quis ninguém, Lila. — Fiquei sem fôlego com toda essa declaração e
molhada também.

Uma troca de olhares foi suficiente. Alec me beijou, mas, dessa vez,
não foi sedento de prazer, foi um beijo lento e saboroso. Eu senti o seu
gosto de hortelã na boca, sua língua percorria os meus lábios e desceu para
os meus seios. Eu já estava louca por esse momento, por tê-lo comigo por

inteiro.
Alec sugou um dos meus seios e acariciou o outro, mas o seu foco
não era eles, era mais embaixo. Ele foi descendo, deixando um rastro com a
língua por onde passava. Quando chegou perto do meu ventre, senti um

arrepio gostoso, uma sensação de não querer parar.


Ele saboreou cada pedaço do meu corpo de forma detalhada, como se
tomasse nota para desenhar tudo depois. Desceu até o meu clítoris e brincou

com ele, me fazendo desejar que abocanhasse tudo e, quando menos


esperei, ele o sugou enquanto acariciava minha entrada.
Olhei para sua cueca e vi um volume formado. Ele estava ereto. Eu
precisava dele dentro de mim, sentia certa urgência, mas ele achava que

ainda não era a hora, apesar do meu olhar que implorava. Alec colocou dois
dedos na minha entrada e fez movimentos de vaivém. Depois tirou e
saboreou o meu gosto. Ele acariciou meu rosto com um ar de preocupação.
— Vamos devagar, certo? Isso pode doer um pouco, e não quero te

machucar mais do que o necessário, mas estou com você. — Já me


disseram que perder a virgindade doía, eu tinha esperança de que não
doesse tanto. Bastaram aquelas palavras para o meu medo começar a se
esvair.
Alec começou a colocar seu pênis dentro da minha abertura úmida e

ele deslizou facilmente, eu estava muito excitada. Ele entrou até o ponto em
que senti a primeira dor. Merda, isso dói mesmo.
Ele parou quando viu um gesto de dor. Ainda dentro de mim, me
encheu de beijos e carícias, para me relaxar um pouco mais. Sentia que

aquilo era sua forma de dizer que estava comigo, e eu queria muito o sentir 
ainda mais em mim. Pela primeira vez, ele me chamou de meu amor. Me
beijou, e eu relaxei, ainda doeu um pouco mais, só que agora eu estava

distraída.
Quando, finalmente, ele entrou por completo, a sensação que tive foi
de preenchimento. Então começou o movimento de vaivém, lento e, aos
poucos, mais ritmado. Seu olhar não desgrudava do meu, como se quisesse
captar qualquer dor ou sinal de prazer.

Comecei a me sentir bem, um formigamento foi subindo, a sensação


que eu tinha é de que iria explodir e precisava urgentemente explodir. No
momento em que eu cravei a unha no Alec, ele gemeu para mim. Gozamos
juntos e foi a melhor coisa do mundo. Ele se deitou por cima de mim e senti

lágrimas caindo em meu ombro.


— Alec, aconteceu alguma coisa? Está sentindo alguma coisa?
— Nunca pensei que sentiria isso novamente. Eu te fiz gozar, te fiz
feliz, Lila. Eu gozei também. — Ele chorava de felicidade. — Você está

bem? Está sentindo dor ou algo assim?


— Estou um pouco dolorida, mas nada que não dê para aguentar. O
mais importante é que eu gostei de tudo, amei fazer isso e já quero mais. —
Nós dois caímos na gargalhada.

— Calma, garota. Agora você precisa descansar, prometo que vamos


fazer muitas vezes ainda. — Eu sentia que algo ali tinha evoluído em nosso
relacionamento, sentia que Alec estava comigo, mas nem tudo é como a

gente sente. Tive vergonha de perguntar, mas a curiosidade foi maior.


— Alec, o que você sente por mim? Consegue descrever?
— Bem, não sei ao certo, mas acho que estou apaixonado. Acho que é
paixão o que sinto no momento. Por quê?

— Nada, achei diferente você me chamar de meu amor. — Ele se


levantou nos cotovelos para me olhar nos olhos.
— Meu amor.
— Alec, estou ficando com vergonha. — Coloquei a mão nos olhos, e

ele tirou as duas, dando um beijo em cada uma.


— Você, meu amor, chegou de fininho e conseguiu quebrar as
barreiras do meu coração. Então, sim, vou te chamar assim agora.
Eu sorri. Estava com vergonha, mas gostei muito de ser chamada
assim.

Alec saiu e foi no banheiro, eu fiquei ali, olhando para o teto do meu
quarto. Estava feliz, muito feliz com a forma que o meu ano começou.
O trabalho voltou, e eu comecei a ocupar minha mente com outras
coisas.

Ainda sentia o Alec dentro de mim e o desejava ainda mais.


Segui para o projeto, começaríamos a desenvolver o protótipo para a
apresentação da Fase II do evento. Essa nova etapa teria também 3 fases,
sendo a primeira uma apresentação com um modelo, a segunda fase seria

um teste para saber o potencial de funcionamento e a última fase seria o


teste real do produto.
Até o final de fevereiro, teríamos a decisão de quem seria financiado
pelas grandes empresas e teria o nome entre os vencedores do evento.

O que tirou qualquer felicidade de mim foi ver aquela idiota


desfilando até a sala do Alec. O que ela queria aqui?
— Uau! Quem é aquela mulher linda? — Fernanda perguntou.
— Você não conhece? Ela é uma atriz famosa. Começou jovem a

carreira e ainda trabalha na área até hoje. Parece que já foi casada com o
nosso chefe.
— Vamos nos concentrar no nosso trabalho, galera. — Estava irritada
demais para ouvir elogios e histórias sobre ela.

Depois de um tempo de trabalho, já estava focada e distraída de


qualquer outro assunto quando alguém bate à porta.
— Bom dia, pessoal, estou apresentando a operação para a Srta.
Davis. Ela será a nova garota propaganda do fabricante que receberá o

nosso código. — Alec fazia de tudo para não olhar para mim, e eu evitava a
Abigail como se fosse uma doença, mas parece que ela gosta de brincar
com o fogo.
Quando Alec já estava indo embora, ela voltou.
— Você não é aquela garota da festa de Ano-Novo? Espero que esteja
melhor. Alec me disse que teve que ir embora por conta de uma dor de
cabeça.
— Estou, sim, Srta. Davis. Obrigada pela preocupação. E espero que

tenha largado o cigarro, ele faz mal à saúde e à pele, uma pessoa tão bonita
quanto você com um vício assim. Desejo melhoras. — Abigail bufou de
raiva, e Alec estava surpreso, não sabia o que fazer. Roddie quem salvou a
cena.

— Lila, me ajuda aqui com o código. — Começamos a trabalhar


novamente, e ela se foi, irritada. Essa eu ganhei. Na minha pausa para o
almoço, fui ao banheiro e, na volta, encontrei o Roddie.
— Posso falar com você, Lila?
— Pode, claro. Aconteceu alguma coisa?

— Olha, não costumo me meter na vida das pessoas, mas sou bem
observador. Cuidado com você e o Alec, ali é briga de gente grande e
somos apenas funcionários. Não quero te ver magoada.
— Mas...

— Nem tente mentir para mim, eu percebi faz tempo que vocês dois
estão de rolo. Só cuidado, você é minha amiga e dou na cara dele se te
magoar. Nem gosto mais daquela perua. — Sorrimos. Era bom ter amigos
ao nosso lado.
Não gostei dessa história da Abigail ir à empresa, mas Alec me disse
que não teria outros motivos para isso. Fiquei um pouco mais tranquila, mas
com uma pulga atrás da orelha.
O mês correu rapidamente e chegamos na nossa primeira

apresentação. Fomos perfeitos e passamos para a segunda fase com louvor.


Minha vida estava perfeita.
Às vezes, eu tinha medo disso, minha mãe costumava dizer que
alegria demais atrai tristeza. Preferi ignorar e viver o momento.

Toda vez que pensava em comer alguma coisa, sentia um enjoo forte.
Acho que era a onda de calor que estava passando na Flórida, nunca me dei
bem com altas temperaturas.
Para a segunda fase, precisei da assinatura do Alec em alguns

documentos. Fui até sua sala, e  Érica não estava na mesa dela, achei que
estava com o Alec, na sala dele. Bati na porta e fui entrando sem perceber
quem estava lá.
— Alec, eu preciso... — Quando levantei a cabeça, os papéis caíram

no chão. Abigail estava beijando o Alec. Meu mundo escureceu e quase caí,
então, me apoiei na parede. Alec me viu e empurrou a Abigail, que limpou
o batom sorrindo.
— Vou indo, querido. Tenho muito trabalho, mais tarde nos falamos.
— Ela saiu da sala, e eu estava imóvel. Essa era a cena que eu nunca
imaginaria presenciar.
— Lila? Lila, me escuta. — Fui até a porta e fechei. Comecei a andar
de um lado para outro. — Ela fez isso de propósito, eu juro...

— E a tua língua na sua boca foi de propósito também?!— Ele calou


a boca. — Cinco minutos no inferno, Alec. Agora! O que você sente pela
Abigail? E não minta...
— Eu não sinto nada por ela, mas toda vez que estamos juntos, é
como se o passado voltasse.

— Foi você que a beijou?


— Foi ela quem me beijou, eu juro. Nunca faria isso com você.
— E por que correspondeu?
— Não sei, foi involuntário. Droga, Lila. O que custa acreditar em

mim?!
— Custa muito, Alec, principalmente depois do que vi aqui. Eu tento
baixar minha guarda, mas, quando baixo, essas coisas acontecem. Como
você quer que eu acredite?

— Eu broxei contigo e não fugi, droga. Eu fiquei e tentei de novo,


não foi?!
— Você me disse que isso não te afetou em nada.
— E você acreditou? Lógico que me afetou. Eu me senti colocado

contra a parede, me senti pressionado e revivi um terror que eu tinha medo,


broxar. Merda, Lila. Era para isso ser leve.
— Então vou deixar mais leve para você. Adeus, Alec.
Saí pela porta da sua sala enquanto ele vinha atrás de mim, me

chamando e pedindo para que eu ficasse. Não dei ouvidos. Peguei minhas
coisas e fui para o elevador, ainda cheguei a vê-lo descendo as escadas
quando as portas se fecharam. Cheguei em casa e ainda era de tarde. Eu
estava um turbilhão de emoções.

Meu celular tocava sem parar.


Eu não queria falar com ele. Não queria vê-lo, não queria mais nada.
Peguei a bike, precisava de adrenalina para me acalmar.
Contraditório, mas eficaz.

Fui até uma rua que eu sabia que não era movimentada, nem a essa
hora. Desci a ladeira de olhos fechados, como sempre faço. Senti a
liberdade tocando minhas costas, mas foi apenas por um breve momento.
A bicicleta fez um som estranho. Abri os olhos assustada. Lembrei

que não tinha feito a manutenção nela. Tentei frear e não consegui.
A última coisa que vi foi a árvore à minha frente.
Apaguei.
Alec.

 
 

Passei o dia ligando para o celular da Lila, mas sem resposta.


Eu deveria ter segurado a minha língua.
— Merda. — Joguei um vaso no chão.

Respirei fundo para me acalmar. Tudo culpa da Abigail, não sei para
que me deu aquele beijo. Nós não temos nada, nunca tivemos nada em
todos esses anos.
Ela fez de propósito.

Recebi uma mensagem no celular e achei que era ela, mas era o Ross
desmarcando nossa consulta da semana por motivos pessoais. Deve ter
acontecido algo, ele nunca desmarca nada. Voltei a pensar nela.
— Lila deve estar com raiva. Vou ligar para ela mais tarde. —

Anoiteceu e voltei a ligar para o celular dela, ainda sem resposta. Fui até
sua casa e tudo estava apagado. Será que ela foi embora?
Resolvi ligar para Piper para saber de algo.
Piper atendeu no primeiro toque e o que ela me disse roubou meu
chão.

Meu coração parou.


Lila.
 

Primeiro dia do ano.

Olhei para o relógio da minha cabeceira, eram 13h.


Levantei e uma dor de cabeça me atingiu em cheio.

— Acho que exagerei na bebida — recriminei a mim mesma, como se

precisasse ouvir minha própria voz para reconhecer o nível da

inconsequência do que fiz ontem. Estava um pouco rouca, o cigarro deve


ter feito um pouco de estrago.

Lila. Lembrei-me do cigarro e aquela garota veio à minha mente.


Saí da cama. Estava nua e isso já não me importava. Após os 30,

dizem que perdemos o pudor, acho que perdi um pouco antes, graças ao

cinema. Peguei um robe de seda que estava no chão e me vesti. O ar-

condicionado deixou o ambiente frio.

Parecia que os fogos de artifício de ontem estavam reunidos na minha


cabeça, estourando constantemente. Fui até o banheiro e tomei um remédio.

No espelho, o reflexo de alguém que se esqueceu de tirar a maquiagem, mas

que as marcas da idade não ficavam escondidas de forma alguma.

Parece que foi ontem que eu estava no auge da minha carreira, aos 23

anos.
Pensando bem, foi a época em que tudo realmente deu certo na minha

vida. Carreira em alta, o homem perfeito que encaixava comigo em todos os

sentidos e o mundo aos nossos pés. Naquela época, não tinha noção do que

o futuro me aguardava. Agora, alguns anos se passaram e a indústria do

cinema não perdoa facilmente o tempo, nem a idade.

Ao que parece, não sou mais apta para papéis de mulheres jovens

demais. Sou ótima para a tia solteira de alguém, para divulgar produtos de
idade e coisas afins.

— Droga, queria a maldita fórmula para parar o tempo.

Desci até a cozinha. Precisava fazer algo para comer, estava com o

estômago embrulhado da ressaca, precisava ser uma comida leve. Separei


algumas frutas e fiz uma salada de frutas com o iogurte da geladeira.

Odiava quando os empregados tiravam folga, é tão mais fácil pedir a

alguém para fazer isso.

Fui até a sala, perto das janelas, que tinha a vista de frente para a

piscina. A água oscilava com a brisa que tocava em sua superfície. Estava

entretida com a vista e não reparei os braços que me envolviam por trás.
— Vejo que minha tigresa está de pé.

— Vejo que você está bem empolgado e alguém também está de pé.

— Eu não me lembrava do nome dele. Apenas mais um que vi na festa e

aproveitei para fechar minha noite. Deve ter entre 22 e 25 anos, mais um

menino tentando virar homem.

— Estou apenas à sua espera. — Ele tentou tirar minha roupa, mas

não estava no clima. Me virei para ele, confesso que a visão era espetacular.

— Eu vou terminar de comer alguma coisa. Aproveita a piscina,

daqui a pouco chego lá também. — Ele me deu um beijo e seguiu sem

roupa mesmo.
Eu o observei de longe. Nesses últimos cinco anos em que estive

longe do Alec, tive inúmeros relacionamentos, mas nenhum deles foi bom o

bastante para superar ou ao menos se igualar a ele. Por isso, resolvi esperar

para ter um filho, queria que o pai fosse perfeito.


Não esperava que vê-lo novamente, depois de tantos anos, fosse

mexer comigo. Alec estava diferente, de alguma forma, não era mais aquele

homem durão e fechado no meio das pessoas. Ele estava mais relaxado e à
vontade, conversando com os funcionários como se fossem amigos.

Confraternizando com aquela pirralha.

Com certeza estavam juntos.

Uma mulher consegue sentir os ciúmes de outra, e eu senti o olhar

dela sobre nós, principalmente quando me aproximei dele. Estava cansada

de ser trocada por versões mais novas, mulheres mais novas, e ver o Alec

com a Lila me deu mais raiva do que ciúme. Eu sempre gostei de homens

com sede de poder, e isso não deixou  Alec.

— Ah, meu querido, você vai voltar para mim. De um jeito ou de

outro, você vai. — Fui para o quarto, troquei de roupa e fui para a minha

esteticista. Precisava resolver o problema dessas marcas de idade.

Quanto ao garoto que nem lembro o nome, o que estava na piscina,

deixei um recado na cozinha e algumas notas de dinheiro. Ele podia

aproveitar a casa o quanto quisesse, contanto que estivesse longe quando eu

voltasse. Deixei o horário e fui embora.

Depois da esteticista, resolvi dar um passeio no shopping a fim de

encontrar algo que queira comprar. Passando pelas lojas, vi exatamente a


pessoa que eu queria encontrar, mas não naquele lugar.
Na loja de lingerie, a mesma loja onde comprava as lingeries para

mim, estava Alec escolhendo peças para aquela pirralha, provavelmente.

Parece que ele está sozinho, preciso aproveitar o momento. Vejo meu

reflexo em uma das vitrines e me aproximo dele.

— Boa tarde, Alec. Vejo que não se esqueceu dessa loja. — Ele me

olhou com surpresa e depois insatisfação.

— Boa tarde, Abigail. Espero que tenha passado bem o Ano-Novo.

— Passei, sim, e acordei melhor ainda. Inclusive, estava me

lembrando da nossa conversa sobre a nossa história. Bons tempos tivemos,

não? Cada um no seu trabalho, mas juntos éramos imbatíveis.


— Desculpe, Abigail. Estou com um pouco de pressa. — Ele se

dirigiu ao caixa, mas eu não deixaria terminar assim.

— Vamos, Alec. Pelo menos me deixe pagar um café, conversar um

pouco, não custa nada. — Vi em seu olhar a indecisão, mas ele escolheu me

acompanhar, por fim.

Sentamo-nos em uma cafeteria ali perto e fizemos o pedido.

— Lembra que sempre saíamos para tomar um café e os paparazzis

não nos deixavam em paz? Fazíamos caretas engraçadas para deixar as

fotos ruins. Nossa, era muito divertido!

— Eu deixei de ser nostálgico há muito tempo e não gosto de

relembrar o passado como você. — Nosso café chegou, e ele tomou um


gole.

— Tivemos bons momentos, sei que nos amamos e nos divertimos

bastante. Vai dizer que não?

— Eu nunca disse que não. Eu te amei, Abbie, e sei que você também

me amou, mas aquele momento acabou. Somos outras pessoas agora e me

lembro bem o quanto gostava de se divertir, inclusive passou das contas na

festa de Ano-Novo. Vi que exagerou na bebida.

— Era Ano-Novo, Alec. Quando foi que você ficou tão careta? Deve

ter sido aquela garota, como é o nome mesmo? Lila.

— Eu falo por mim e sei que essa conversa entre nós acabou. Preciso

ir, tenho um compromisso. Te desejo um ótimo ano. — Alec simplesmente

se levantou e foi embora, me deixando para trás. Ele não desrespeitou nossa

história, fez pior, ele superou. Superar é a pior das coisas, porque significa

que não tem mais lugar para mim em seu coração.

— Eu vou cavar o meu lugar de volta, sei que vou. — Terminei o meu

café e segui para casa. — Espero que aquele menino já tenha ido embora,

estou sem paciência para conversas.

Depois de algumas semanas, meu agente me avisa que conseguiu um


trabalho para mim. Então, me liga para contar os detalhes.

— Me fala que é uma novela de amor ou um filme de ação com um

par romântico gato.


— Desculpe, Abigail. Já te falei que esses papéis não estão tão fáceis

para você ultimamente, mas consegui o papel de divulgação de um produto

que mexe com segurança digital. Você deve conhecer a empresa que está

fazendo o código, é do Alec Donovan. — O destino devia gostar muito de

mim, essa veio de bandeja.

— Pode falar que eu quero. — Desliguei o telefone, coloquei um

vestido casual e sexy e fui para a empresa do Alec. Sua secretária me

encaminhou até a sala dele.


— Pode nos deixar, Érica. Obrigado. Abigail, sente-se, por favor.

Quer alguma coisa?


— Não, estou bem.

— Em que posso te ajudar?


— O destino nos uniu novamente, Alec. O fabricante para quem você

está preparando o código me chamou para ser a garota propaganda do


produto. Vim conhecer um pouco da sua empresa durante o processo, achei

que seria interessante.


— Você achou que seria interessante ou mais uma oportunidade para

relembrar o passado?
— Nunca deixo de lembrar da gente, mas vim a trabalho mesmo.
Pode me mostrar o lugar.
— Vou mostrar por ser um bom anfitrião e acredito que não cabe
trazer coisas da vida pessoal para o trabalho, mas saiba que discordo da

necessidade de você estar aqui.


— Se quiser, posso ligar para o fabricante e perguntar se posso olhar

por aqui, o código e tudo mais.


— Não precisa disso, já falei que te acompanharia. Vamos.

Eu não queria ser tão incisiva com Alec, queria que ele me visse
como a mulher de antes. Linda e maravilhosa, que visse a oportunidade de
estarmos juntos novamente. Ele fez um tour pela produção comigo,

apresentando os setores, até que chegamos na área da pirralha. Pelo jeito,


ela era uma programadora.

— Você não é aquela garota da festa de Ano-Novo? Espero que esteja


melhor. Alec me disse que teve que ir embora por conta de uma dor de

cabeça.
— Estou, sim, Srta. Davis. Obrigada pela preocupação. E espero que

tenha largado o cigarro, ele faz mal à saúde e à pele, uma pessoa tão bonita
quanto você com um vício assim. Desejo melhoras. — Que ódio dessa

garota. Como ela fala essas coisas na frente do Alec e dos outros, isso vai
ter volta, e ela não vai gostar nem um pouco.

Dias depois, arrumei uma desculpa e voltei à empresa do Alec. Dessa


vez, seria a minha maior cartada. A secretária não estava na antessala, por
isso entrei de uma vez e o peguei de surpresa.
— Abigail, o que está fazendo aqui de novo? Você não pode

simplesmente ir entrando em meu escritório. Há muito tempo não tem mais


esse direito e já não há nada mais a ser dito.

— Alec, só me responde uma coisa: por que você se recusa a lembrar


de nós, da nossa história? O que aconteceu foi trágico, mas passou. Será

que você nunca mais querer me ver ou me ter por perto? — Ele parou um
pouco para pensar e se sentou para conversar comigo.

— Abbie, nós tivemos uma linda história de amor e guardo você no


meu coração, mas ela foi encerrada quando você me deixou. Você fez sua

escolha. Eu não poderia mais te um filho e você foi atrás de alguém que
poderia te dar a família que sempre quis.

— Eu não me importo mais, eu quero só você. Nós dois éramos


incríveis, Alec. Um casal apaixonado, tínhamos um casamento invejado e

de sucesso, quero você de volta.


— Você não se importa mais com a família que tanto queria? O
motivo do nosso divórcio não faz mais diferença? Abbie, espero que receba

isso da melhor forma, você sempre quis ter tudo e que todos soubessem que
tinha. Sei que, do seu modo, você me amou, mas gostava ainda mais dos

holofotes sobre nosso casamente e eu tentava ignorar isso porque essa


exposição pública te deixava feliz. Você sempre quis que os olhares se
voltassem pra você quando chegasse e, quando o  meu acidente apagou os

holofotes, pouca coisa restou. Eu te amei, você foi o meu mundo, hoje não é
mais, me desculpe.

— É aquela garota, não é? Você está saindo com ela. O que  fazem
juntos se o seu... Ela não vai aceitar uma relação sem ... — Vi que até hoje

ela não era capaz de enfrentar o que houve comigo, não conseguia nem
mencionar a minha impotência.
— Abigail, acredito que seja hora de ir embora.

— Me diz, o que ela tem que eu não tenho, Alec. Eu ainda sou jovem.
Sou bonita e cobiçada, tenho contatos e classe, o que ela tem?

— Você não é ela, apenas isso. Ela tem um coração enorme e muito
amor para dar, humildade, talento e uma garra de vencer maior que a de nós

dois. Acho que isso basta. — Fiquei em choque. Não esperava perder a
compostura, mas também não esperava uma resposta do Alec assim. Acho

que nem ele esperava, porque ficou surpreso com o que falou.
Ele se aproxima para me levar para a saída, mas ouço a voz dela.

Imediatamente, me jogo contra o Alec e o beijo. Ele não esperava isso, mas
correspondeu um pouco ao meu beijo, depois colocou a mão no meu braço

para me afastar, só que era tarde demais. Lila já tinha visto tudo o que eu
queria.
O caos estava instaurado, depois eu voltaria para juntar os cacos do

Alec, e ele me ouviria, como antes.


— Vou indo, querido. Tenho muito trabalho, mais tarde nos falamos.

— Fui embora e deixei o circo pegar fogo. Tinha uma gravação marcada
pelo meu agente, hoje ainda. Seria apenas uma participação especial,

infelizmente era uma cena gravada nos subúrbios. Não gostava de


frequentar esses lugares.

Aproveitei o resto da manhã e o começo da tarde no salão, ajeitando o


cabelo e as unhas. Almocei e segui para o set de gravação. Fizemos

algumas tomadas e, após algumas horas, uma sirene passou perto de nós.
Um dos funcionários estava comentando com o diretor.

— Parece que uma moça se acidentou aqui perto. Estava de bicicleta.


Bem, isso é o que acontece nos subúrbios. As pessoas andam de

bicicleta como se fosse carro e se acidentam por qualquer coisa. Aqui era
cheio de perigos, devia terminar logo isso para voltar para casa.
Tenho certeza de que, no final da semana, conseguirei o Alec para

mim novamente.
Meu único inimigo agora é o destino, realmente.
 

— Lila sofreu um acidente, tio. Estou aqui com ela, no hospital. —

Piper estava contendo o choro, o nervosismo era evidente na fala. — Acho

que é grave, tinha tanto sangue. O que eu faço?


Meu chão sumiu.

Meu coração parou.

Lila.
— Tio? Tio? Você está aí? — Não poderia entrar em choque agora.

Precisava reagir.
— Ela está em qual hospital? Me passa o endereço que vou até aí

agora. — Fui direto para o carro. Lila foi socorrida para o mesmo hospital

em que fiquei internado quando sofri o acidente.

Pensei em ligar para o Carson, mas não sabia ainda o estado em que

ela estava, melhor ter certeza antes. Todo o caminho eu só pensava que a
culpa era minha, que, se ela não tivesse saído da empresa daquele jeito, isso

não teria acontecido.

— Agora não adianta se culpar, seu idiota. — Cheguei no hospital

alguns minutos depois. Estacionei na primeira vaga que encontrei e corri

para a área de emergência. Piper estava andando de um lado para o outro,


com os olhos vermelhos, devia ter chorado.

— Piper, alguma novidade? — Ela correu e me abraçou, deixando as

lágrimas correrem de vez.

— Tio... Não sei o que fazer se algo acontecer com a Lila.

— Calma, vamos primeiro saber o que aconteceu, sem ideias

precipitadas. Vamos nos sentar aqui e você vai me contar o que sabe até

agora. — Eu precisava acalmá-la, mas, por dentro, estava um turbilhão de


emoções, a preocupação estava no ponto máximo.

— Disseram que ela sofreu um acidente descendo uma ladeira com a

bicicleta. As pessoas que estavam perto falaram que parece que a bicicleta
falhou e a jogou contra uma árvore. Ela bateu a cabeça e caiu desmaiada. —

Prendi a respiração. Meu Deus, o acidente foi feio.

— Certo... Ok... O médico falou que voltaria aqui?

— Ele disse que viria assim que tivesse o resultado preliminar de

alguns exames.

— Como você ficou sabendo do acidente? Eu tentei ligar para ela


algumas vezes, mas não atendeu. — Não estava mais preocupado com o

nosso segredo, só queria descobrir o que aconteceu e como a Lila estava.

— Eu sou um dos contatos de emergência dela, só soube porque me

ligaram. Eu nunca pensei que precisaria disso. Como uma coisa dessas foi

acontecer justo agora, ela estava tão feliz com o evento, por ter vencido e a

etapa. Aconteceu alguma coisa no trabalho, tio? — Eu não poderia falar que

foi a Abigail a culpada, porque teria que explicar o motivo da Lila ficar

chateada.

— Bem, aconteceram algumas divergências de opiniões, e a Lila saiu

irritada de lá. Por isso, tentei ligar para ela.


— Lila tem uma invenção absurda de achar que a adrenalina a faz

melhorar depois de algo ruim. Ela fez isso uma vez na universidade.

— O que ela faz exatamente?

— Ela pega a bike, vai até uma ladeira sem muito movimento e desce

com os olhos fechados. A adrenalina de não saber o que a espera. — Eu vou


matar essa garota quando ficar melhor. Que invenção é essa?

— Que coisa mais perigosa e desnecessária é essa?

— Sempre achei isso, mas ela nunca me ouvia. Deve ter sido isso que
aconteceu. — O telefone da Piper tocou. — Meu Deus, o Ross. Contei a ele

e desliguei o telefone na agonia, vou falar com ele, tio.

Piper saiu para atender o telefone e eu fiquei ali, na sala de espera,

junto de várias outras pessoas que esperavam notícias de seus familiares.

Na minha cabeça, milhões de pensamentos rodavam, mas um era constante:

a culpa foi minha.

— Familiares da Srta. Harrison? — Um médico apareceu, e eu me

apresentei como da família.

— Como ela está, doutor?

— Bem, Srta. Harrison quebrou duas costelas no lado esquerdo ao se

chocar com a árvore e, na queda, torceu o braço direito e teve uma

concussão leve. Ela teve sorte, poderia ter sido bem pior, com base na

gravidade do acidente. Ainda não temos os exames gerais, mas esses são os

principais pontos.

— Podemos vê-la?

— Daqui a alguns minutos, ela será transferida para um dos quartos,

mas  está desacordada ainda.


— Tem alguma previsão?
— Devido à concussão, espera-se que acorde entre 24 e 48 horas,

mais do que isso ficará por conta dela. Nos exames preliminares, não

apareceu nada que comprometesse a atividade cerebral.

— Obrigado, doutor. — Ele foi embora, e eu voltei à sala de espera

para encontrar a Piper.

— Tio, foi o médico? O que ele disse?

— Ele falou que ela tem uma concussão, duas costelas quebradas e

um braço torcido. Está desacordada por enquanto e, daqui a pouco,

podemos vê-la. Vamos precisar esperar de um a dois dias para que acorde.

— Eu não sei se fico aliviada ou ainda apreensiva por estar


desacordada.

— Acho que o pior já passou. Pode ficar tranquila, agora é esperar

que ela acorde.

Depois de alguns minutos, nos avisaram que ela já estava no quarto e

fomos ver como estava. Piper foi a primeira a chegar perto, e eu fiquei de

longe, apenas fingindo que a acompanhava.

— Tio, vou precisar sair agora, mas volto depois se for preciso.

— Não se preocupe. Ela é uma das minhas funcionárias e saiu em

horário de expediente, me sinto responsável. Vou ficar com ela aqui,

qualquer coisa te aviso.


— Muito obrigada, tio, de verdade. Lila é como uma irmã para mim e

eu a amo demais. Agora está tão machucada, precisa de todo o amor do

mundo. — Piper me deu um beijo no rosto e saiu. Amor? Não entendi, mas

fingi que estava tudo bem. Tinha contado uma baita mentira para conseguir

ficar aqui.

Me aproximei da sua cama, devagar, como se um movimento brusco

pudesse assustá-la. Na verdade, eu que estava com medo de ver como a Lila

realmente estava depois do acidente.

Ela parecia dormir. Frágil naquela cama, cheia de fios que

conectavam os seus sinais e outros que injetavam remédios e soro. Seu

rosto tinha marcas roxas do impacto, seu braço estava imobilizado. Não

conseguia ver a costela, mas, com certeza, estava com uma imensa mancha

roxa.

— Meu amor, o que você fez com você? Me desculpa, eu que sou o

culpado. Vou ficar do seu lado o tempo todo, não vou sair nem um minuto,

quero te ver acordar e falar comigo. Quero te ver bem.

Passei a noite ali mesmo. Não fui para casa, o hospital servia comida

para o acompanhante. Dormi na cadeira que ficava ali, no canto. Sonhei


com a Lila indo embora, se afastando de mim e, por mais que eu tentasse,

não conseguia alcançá-la de forma alguma.

Acordei e estava amanhecendo.


Uma enfermeira estava trocando os remédios.

— Bom dia, o senhor está bem? Parecia ter um sono conturbado.

— Bom dia. Alguns fantasmas vieram perturbar meu sono. Ela está

bem?

— A mesma coisa de ontem. Isso é um bom sinal, agora é esperar que

acorde. Sei que esse momento é doloroso para quem ama, mas acredite

nela.

— Eu acredito. — A enfermeira terminou e foi embora. Falei a


verdade, realmente acreditava na Lila, mas meu peito estava apertado.

Pela primeira vez, olhei ao redor do quarto. Ontem, estava muito


preocupado com ela que nem prestei atenção. A decoração não mudou nada

nesses últimos anos, ainda era a mesma de quando estive aqui. O aperto no
meu peito aumentou ao me lembrar de tudo que passei naqueles dias.

O dia em que descobri minha impotência, o dia em que minha vida


começou a desmoronar. Aquele lugar me deixava angustiado, nervoso,

queria fugir dali, para longe daquelas lembranças, mas hoje não era sobre
mim, era sobre a Lila. Eu precisava ser forte por ela.

Afastei o seu cabelo do rosto.


— Garota, volta para mim. Sei que fui um idiota, que te confundi e
não falei o que realmente sentia, mas agora eu sei o que sinto. Quando você

foi embora daquele jeito, fiquei desesperado. Eu me senti sozinho


novamente, como se meu mundo não girasse sem você por perto. Eu te
amo, Lila. Achei que nunca mais diria isso para ninguém, fugi desse

sentimento com medo de tudo que poderia acontecer, mas cansei. Eu te amo
e te quero ao meu lado. Por favor, acorda, volta para mim. Prometo que vai

ser diferente.
 Estava segurando a sua mão enquanto falava e só percebi que estava

chorando quando algumas lágrimas começaram a cair em cima das nossas


mãos. Começou aos poucos e, gradativamente, foram surgindo mais e mais
até que eu não tinha controle do choro. Ela era meu mundo, ela era meu

mundo de verdade.
— Então é ela, não é? — Olhei para o lado, assustado. — Ela é a

mulher que você disse que te fez se libertar das amarras da mente. — Ross
chegou, e eu nem percebi.

— Ross, você está enganado, eu...


— Eu já sabia, tio Alec. Eu tinha percebido ao ver os dois na ceia de

Natal. Não se preocupe, seu segredo está guardado pelo sigilo médico-
paciente. Como ela está? — Enxuguei minhas lágrimas e respirei fundo.

— Está bem, na medida do possível. Piper te contou o que ela teve?


— Falou. Ainda não se sabe quando vai acordar?

— Não, estamos esperando. Essa espera é a pior que existe.


— Verdade. Falando nisso, percebi que esse hospital é o mesmo que
você ficou quando sofreu o acidente.

— Estou impressionado por ter lembrado disso.


— Faz parte da minha profissão, tio. Lembrar-me de detalhes faz toda

a diferença. Como você está voltando para esse lugar?


— Não vou mentir, é angustiante. Me dei conta hoje de onde estou e

bateu um aperto no peito, lembrar-me daquele dia vai doer sempre. Acho
que podemos chamar do meu momento das trevas.

— Bem, isso vai sempre estar com você, não tem como fugir. O que
muda é a forma como lida com a lembrança, não deixe que ela tome as

rédeas, você sempre está no controle.


Ross se aproximou de Lila e fez um carinho no seu rosto.

— E aí, maninha. Vamos acordar? O susto já passou, agora já pode


abrir os olhos viu. Tem um cabeça dura aqui que está louco para te ver

acordar. Essa família te ama, e eu também. Estamos te esperando. — Ross


beijou sua testa e soltou um sorriso.
— Preciso ir embora, tenho uma consulta agora. Falando como

alguém que ama muito a Lila, e não seu médico, se você a magoar de
alguma forma, vou me acertar com você. Ela é uma menina de ouro, com

um coração gigante, e não um brinquedo. Cuidado. Fora isso, a ame com


tudo o que você puder e muito mais, ela merece.
Ele foi embora, e eu fiquei surpreso. Nunca tinha visto o Ross falar

dessa forma e defender alguém assim. Lila continuava dormindo.


O dia se passou e a noite chegou novamente. Lila continuava

dormindo, sem mudanças, e eu, com o coração apertado. Lembrei que ainda
não tinha ligado para o Carson, Piper deve ter falado algo, mas eu precisava

falar com ele. Disquei seu número e ele atendeu no segundo toque.
Um barulho de pessoas conversando no fundo.
— Carson? Está podendo falar?

— Alec, só um momento. — Acho que ele foi para algum lugar mais
reservado. — Pronto, ia te ligar. Piper me contou sobre a Lila, como ela

está?
— Está desacordada ainda, mas os médicos estão esperançosos.

Agora é esperar que acorde.


— E você, como está? — Ele também sabia? — Como chefe dela,

deve estar preocupado. Piper me disse que ela saiu durante o expediente, e
você se sente culpado.

— Verdade. Estou preocupado com ela. Não sei o que pensar, mano,
sinceramente. Só quero que ela acorde e fique bem. Preciso que ela acorde,

eu não aguento essa gangorra da minha vida, quando tudo parece ficar bem,
o destino me dá uma rasteira.
— Respira fundo e se acalma. Você sabe que sempre estive com você

e, mesmo longe, estou aí, em pensamento. Ela vai ficar bem. Só não vou no
hospital porque estou em um evento em outro país, assim que chegar, vou

até ela, com certeza vai estar acordada. — Alguém o chamou. — Vou indo,
mano, mas fica tranquilo que vai dar tudo certo, e qualquer coisa me liga.

Carson desligou o telefone.


Ele sempre foi a minha rocha, a pessoa que me apoiou e que esteve ao

meu lado nos bons e maus momentos. Também não teve muita sorte na
vida, ficou viúvo cedo com quatro filhos, mas seguiu com a vida e fez o

melhor na criação de todos eles. Todos os quatro são incríveis. Queria poder
ter essa alegria, ter um filho ou filha que eu pudesse criar e dar o meu

melhor. Não tive essa sorte.


Mais uma noite se passou e a manhã do segundo dia chegou.

A cada dia que o tempo que o médico deu passava, eu me


desesperava mais. Meu medo era que a Lila não acordasse, que ela
desistisse de voltar. À tarde, meu celular tocou, era Abigail. Rejeitei uma,

duas, três vezes. Na quarta vez, atendi.


— O que você quer, Abigail?

— Boa tarde para você também, Alec. Onde está? Vamos tomar um
café? Conversar um pouco sobre o que aconteceu no escritório.
— Abigail, por causa daquilo, Lila saiu da empresa e sofreu um
acidente. Agora está há dois dias desacordada, com costela quebrada, braço

torcido e uma concussão. Você acha mesmo que eu quero relembrar daquele
momento? — Silêncio.
— Alec... Eu... Como...

— Adeus, Abigail. — Desliguei o telefone. Não queria ouvir mais


nada dessa mulher. Precisava de um café, essa ligação da Abbie me tirou do

sério.
— Garota, segura as pontas que vou pegar um café. Já volto.

Dei um beijo em sua testa e tive a impressão de que vi seus olhos se


mexendo.

Deve ser impressão.


 

Sentia minha mente perdida.

Os pensamentos misturados.
Ouvi a voz do Alec ao longe e a mão dele tocando a minha.
Tentei acordar, mas o cansaço era ainda maior. Os olhos não abriam
facilmente. O corpo inteiro doía. Imediatamente, flashes se tornaram

lembranças e o meu acidente ficou nítido na mente. Droga.


Peguei no sono novamente e sonhei com o meu padrasto, como se eu

voltasse a viver com eles e passava por todas aquelas atrocidades que ele
fazia. Isso me deixou em desespero, despertei na mesma hora e ouvi apitos

em todo lugar, respiração pesada e coração acelerado.


Uma enfermeira entrou no meu quarto e tentou me acalmar.

— Camilla, você está no hospital. Respira fundo e se acalma, você


está em um ataque de pânico, calma. — Aos poucos, fui controlando a

respiração e os sinais voltando ao normal.


— O que aconteceu comigo? Por que tudo dói?

— Você sofreu um acidente, teve algumas lesões. Vou chamar o


médico, e ele vai te explicar melhor, espera um pouco. — Ela saiu. Olhei
para o lado e um paletó estava na cadeira. Será que era do Alec? Alguns
minutos depois, um médico entrou no quarto.

— Srta. Harrison, boa tarde. Sou o dr. Rafael, responsável pelo seu
caso. Você nos deu um baita susto, mas que bom que acordou. — Ele falou
das minhas lesões e dos cuidados que seriam necessários. — Graças a Deus
que o bebê está bem.

Bebê? Que bebê?


— Doutor, acho que o senhor se confundiu. Eu não estou grávida. —
Ele olhou novamente o prontuário.

— Acho que você ainda não sabia. Parabéns, você está grávida, cerca
de um mês de gravidez. Não tinha ideia? — Grávida? Alec era infértil.
Como assim?
— GRÁVIDA? — A última pessoa que eu queria que descobrisse
ouviu tudo.

— Mãe? O que está fazendo aqui?


— Como assim grávida, Lila?
— Doutor, obrigada pela atualização. — Ele saiu e nos deixou
sozinhas.

— Mãe, como você ficou sabendo onde eu estava e o que está


fazendo aqui?
— Eu ainda sou o seu contato de emergência. — Merda, coloquei a
Piper e me esqueci de tirar ela. — Quando ligaram, seu padrasto estava

dormindo e eu vi o celular. Atendi e vim direto para cá. Agora me conta,


que história é essa de grávida?
— Mãe, eu acabei de descobrir também e preciso... — Nem deu
tempo de pedir segredo e ouvi o copo cair no chão. Alec acabou de chegar.

— Não acredito! Graças a Deus você acordou, garota. Eu já estava


desesperado com essa demora e tinha que esperar eu sair para acordar!
Nossa, que alívio! — Ele foi me abraçando, acho que não viu minha mãe.
— Alec, essa é minha mãe. — Ele me soltou e olhou para o lado, sem

jeito.
— Me desculpe, fui levado pelo momento. Boa tarde, sou Alec
Donovan, o... chefe da Lila.
— Chefe? Ele...

— Mãe! Alec é apenas o meu chefe e sabe que sofri um acidente. —


Fiz uma careta para ela fechar a boca. — Alec, você pode me dar um
minuto para que eu fale com ela?
— Sim, claro. Vou buscar outro café e ligar para os outros. — Ele

saiu, e eu a olhei.
— É o seguinte: essa gravidez é segredo, acabei de descobrir e não sei
como vou fazer, então não fale nada, pelo amor de Deus.
— Certo, entendi. O filho é dele?
— É, ao que parece.

— Está saindo com mais de um?


— Lógico que não, mãe. Eu só não sabia que ele podia ter filhos, mas
enfim. A história morre aqui, depois vejo o que fazer.
— E você, como está?

— O corpo inteiro dói. Tenho algumas lesões e ainda tenho uma coisa
importante no trabalho. Preciso dar um jeito em tudo. Já que você sabe que
estou bem, agora pode ir embora.

— Nada disso! Meu neto está aí e você não parece ter condições de se
virar sozinha. Vou embora quando sentir que pode se virar.
— E o meu padrasto vai achar que está onde?
— Eu o larguei de vez. Cansei de tudo, agora vou viver a vida como
eu quero. — Eu não colocava muita fé, mas não iria questionar.

Alec voltou para o quarto e conversou algumas coisas do trabalho


com minha mãe e, algumas horas depois, todos chegaram. Piper, os
meninos e ainda o Sr. Carson, todos vieram me ver.
— Gente, vocês têm o trabalho de vocês, não precisavam ter vindo

até aqui.
— Precisava, sim, Lila. Deixa de coisa, você faria o mesmo por
qualquer um de nós. — Nunca me senti tão amada. É nos piores momentos
que você descobre quem te ama, mas eu sabia que os Donovan me amavam

tanto quanto os amo.


— Gente, essa é minha mãe, Florence. — Todos a cumprimentaram e
começaram a conversar e trazer alegria para o quarto. Durou alguns
minutos até que os expulsassem por excesso de barulho. Sorri.

— Pessoal, o médico me disse que ela terá alta amanhã à noite. Então
todos a visitem em casa — Alec falou.
Eles se despediram e foram embora. Pedi a Alec que fosse com minha

mãe até minha casa para buscar algumas mudas de roupa e itens que eu
precisava. Eles saíram e, minutos depois, uma mulher entrou no meu
quarto. Ela estava estranha, com óculos escuro e casaco, escondida de
alguém.

Quando tirou tudo, vi que era Abigail e entendi o quanto ela é pirada,
pelo visto.
— Olá, Lila.
— Abigail, você tem algum problema. O que está fazendo aqui? —

Ela parecia meio incerta, sem graça, não era aquela mulher imponente que
eu conheci.
— Alec me contou do seu acidente. Como está se sentindo?
— Agora, parece que fui atropelada, mas vou melhorar. Não se
preocupe. Pena que perdeu o Alec, ele acabou de sair. Se quiser esperar na

sala de espera, fique à vontade.


— Lila... Eu... Não sou muito boa com isso, mas me desculpe. Alec
me disse que foi culpa minha, que, depois daquela situação, você saiu da
empresa e sofreu o acidente. Eu nunca quis que algo assim acontecesse,

nunca desejei o mal de ninguém assim.


— Não foi sua culpa, Alec não tinha o direito de falar isso.
— Tinha, eu admito. Eu que forcei a situação e provoquei aquele

beijo. — Ela olhou ao redor. — Esse hospital não mudou nada.


— Como assim?
— Foi o mesmo hospital que o Alec ficou internado quando sofreu o
acidente, que você deve saber, não precisa fingir. — Depois de ter agido

daquela forma, discutindo com ele, ficava difícil mentir.


— Deve trazer péssimas recordações, então.
— Verdade, traz sim. Foi aqui que o nosso  casamento começou a
desmoronar. Eu sempre quis um filho e uma família, e isso já não nos

pertencia mais. Alec falou a verdade, a gente funcionava naquela época,


agora somos diferentes. A verdade, Lila, é que estava cansada de ser
trocada no meu trabalho por meninas mais novas. Quando vi o Alec, tive
vontade de reviver a melhor época da minha vida, quando eu era mais nova

e tinha alguém que me amava. Agi com tanta infantilidade por causa de
você, mais uma menina nova roubando algo  que eu considerava meu. Me
desculpe, de coração.
Depois de todo aquele relato, ficava difícil não perdoar uma pessoa

assim.
— Abigail...
— Pode me chamar de Abbie. — Muita intimidade, mas está certo.
— Abbie... não vou fingir que está tudo perdoado. Você beijou o
Alec. — E ele retribuiu. — E tentou claramente me fazer mal, mas posso
dizer que seu pedido de desculpas é um grande avanço. Me dê só um tempo
para digerir tudo.

— Eu entendo e agradeço por, pelo menos, me ouvir. Eu não vou me


meter no caminho de vocês, desejo tudo de melhor e que se recupere bem.
Boa noite, Lila. — Ela voltou a colocar seu disfarce e foi embora. Eu ainda
não sabia o que tinha acontecido aqui, mas fiquei feliz em saber que as

pessoas podem melhorar depois de errarem.


O dia amanheceu e acordei com um Donovan do lado da minha cama.
— Bom dia, Sr. Ross. Como fez para desaparecer com a minha mãe,
pode me ensinar, por favor? — Ele sorriu.
— Bom dia, Srta. Harrison. Contrabandeei um café do jeito que você

gosta, sei que a comida de hospital pode ser a causa da piora dos pacientes.
— Oh, meu Deus! O melhor presente de todos. Passa para cá. —
Lembrei-me da gravidez. — Quer dizer, acho melhor não. Estou tomando
alguns remédios que fazem mal com café. — Foi a negativa mais dolorosa

da minha vida.
— Por essa, eu não esperava, mas tudo bem. Quando eu cheguei, sua
mãe estava saindo para comer algo. Vim ver como você está.
— Estou bem, na medida do possível, minha mãe tem o poder de me
enlouquecer em segundos, mesmo me deixando preocupadíssima com ela.
— Ross se sentou na beira da cama e pegou a minha mão.
— Lila, você me conhece há anos. Lutei muito pelo meu doutorado

em Psicanálise, fiz intercâmbio em diversos países durante os meus estudos


e ainda fiz residência no hospital nº 01 na área, com o maior orientador do
mundo. Tudo isso me fez um excelente profissional, mas foi você quem me
fez olhar ainda mais com empatia para os meus pacientes e me mostrou que

cada história é uma nova história. Por isso, acho que deve dar uma chance e
ouvir o que sua mãe tem a dizer. Sei que traumas existem, mas somente a
ouça.
Ross me deu um beijo na testa e foi embora, deixando muita coisa

para pensar.
Os Donovan queriam que eu fosse para a mansão depois da alta, mas
minha mãe já havia deixado claro que ia colar em mim, por isso voltei para
casa. Também foi melhor por causa da gravidez, para não dar tanto na cara

a situação. Precisava pensar um pouco sobre o que faria.


— Pronto, está confortável na cama?
— Estou, Alec. Obrigada pela ajuda com tudo.
— Não precisa agradecer. — Ele se sentou ao meu lado e pegou
minha mão. — Lila, eu preciso falar com você. Descobri o nome do que eu
sinto, é...
— Alec, antes que você fale, preciso pedir algo a você: depois
daquela situação que eu vi,  preciso pedir um tempo para pensar um pouco

nas coisas. Um tempo para colocar a mente no lugar, me recuperar e poder


ter certeza do que eu quero.
Ele pareceu triste, desanimou totalmente, mas tentou fingir que nada
aconteceu.
— Não tem problema, Lila. De quanto tempo você precisa?

— Me dê um mês. Um mês para pensar melhorar e ainda tem o


evento. Muita coisa para mim.
— Certo, vou te esperar. Um mês, eu espero, mas vou falar com você
sempre. Não vou pressionar, só não me afaste totalmente.

— Certo, Alec. Não pensei em te afastar. — Quero me aproximar, não


quero tempo, não quero ficar longe. Porém, eu precisava pensar no bebê
agora. Esse era o melhor caminho. Alec foi embora.
— Você tem certeza disso, Lila?

— Mãe, não começa.


— Tem que gostar de arriscar para pedir um tempo para o pai de um
bebê que você nem queria ter. O cara está caidinho de amores, é rico e vem
de uma boa família. Está esperando o quê, criatura?
— Ele é meu chefe, um dos cabeças da família que praticamente me
adotou, tio da minha melhor amiga, até o momento era infértil e o peguei
beijando a ex-mulher na sala dele. Será que esses motivos servem? — O

silêncio reinou entre nós duas.


— Sua vida parece uma novela mexicana. — Minha mãe e suas
conclusões.
 

Os dias passaram e transformaram-se em semanas.


Morar novamente com minha mãe, mesmo que seja por um curto

espaço de tempo, tornou-se uma provação para mim.

Ela tinha manias que me irritavam e continuava insistindo para que eu


falasse com o Alec, que o perdoasse, que ele devia estar comigo. Parece que

não entendeu nada do que eu disse antes.

— Mãe, pela milionésima vez, as coisas não são tão fáceis assim.

Preciso de tempo para saber o que eu sinto por ele e o que ele sente por

mim. Não quero ficar com alguém só por causa do filho.


— Besteira! A filha da Lourdes, lá da rua, carrega chifre até hoje e

ainda está com o marido. Acho que bebê de um cara que quer criar o filho é

bem melhor. Tanto homem fugindo da paternidade, e você que está

afastando o pai, não entendo mesmo.

E ela voltou para a cozinha, encerrando a conversa de vez. Foi fazer


comida caseira de verdade, segundo ela.

“O meu neto não vai viver de fast food desde a hora que foi concebido.”

Ela tinha um bom argumento? Tinha, mas nada na vida era tão fácil.

A cena do Alec e a Abigail se beijando ainda era forte na minha

mente. Por mais que ela tenha pedido desculpas e pareceu realmente
arrependida, ainda me doía tudo aquilo.

Ouvindo o som ligado na sala, minha mãe cantarolando e o cheiro de

comida caseira, a nostalgia bateu e fui transportada para a minha infância.

Não sabia que eu sentia tantas saudades até relembrar agora.

Repentinamente, do nada, o enjoo bateu. Corri para o banheiro e

coloquei todo o café da manhã para fora.

E essa nem era a pior parte. Eu não conseguia mais tomar café, nem o
descafeinado, porque o cheiro dele me enjoava na hora.

Admito, eu chorei.

Estou um poço de hormônios e descobrir que meu único

companheiro, o meu café, não poderia me acompanhar no momento mais


ansioso da minha vida foi o fim do mundo, praticamente.

Tirando essa parte, não posso reclamar de muita coisa.

Minha mãe ainda não entrou em detalhes sobre essa coisa de fugir do

meu padrasto, mas vem sendo de grande ajuda. Até chego a ter a sensação

de que ela quer me fazer um carinho, agir como uma mãe. Deve ser pura

sensação.
Mesmo tendo uma clara demonstração de que as pessoas mudam com

a Abigail me pedindo desculpas, acho que a minha relação com minha mãe

tinha se perdido há mais tempo do que se possa reparar. Meu telefone

vibrou, era a Piper me chamando para sair  um pouco.

Ninguém sabia da gravidez e tive sucesso em esconder pelo tempo

que passei escondida em casa, mas, em algum momento, voltaria a trabalhar

e teria que reencontrar as pessoas. Aceitei o convite.

— Mãe, vou sair. Vou me encontrar com uma amiga, qualquer coisa

me ligue. — Não sei se me ouviu, mas saí mesmo assim. Cheguei primeiro

na cafeteria e, minutos depois, Piper chegou.


— Lila! Que saudades, amiga. Como você está?

— As costelas ainda doem um pouco, mas agora só o braço que

precisa melhorar. Vou voltar ao trabalho amanhã. Estou ansiosa para saber

como as coisas estão, o protótipo e tudo mais.


— Não falou com a equipe? Eu pergunto, mas acho difícil que você

não perguntaria a ninguém do trabalho nada sobre isso, do jeito que está

louca por esse evento.


— Você me conhece, amiga. — Sorrimos. — Roddie me atualizou.

Eu só quero trabalhar, fazer algo, sair de casa. Não aguento mais ficar

trancada com minha mãe.

O garçom chegou e fizemos os nossos pedidos. Eu, automaticamente,

ia pedir o de sempre quando lembrei do cheiro e o enjoo veio na garganta.

— Eh... Me traz uma soda italiana de frutas vermelhas, por favor. —

Ele saiu e deixou uma Piper me encarando, desconfiada. Merda.

— O que foi?

— Camilla Harrison, em uma cafeteria, não pedindo café?

— Ah... Estou reduzindo a cafeína um pouco, depois do acidente,

achei melhor me cuidar com isso. — Péssima desculpa, péssima desculpa.

— Lila, te conheço há anos, sei quando mente. Você não faz contato

visual com quem fala e ainda age com muito nervosismo, por isso vamos

parar de rodeios e me contar o que está acontecendo? — As bebidas

chegaram na mesa e aquele silêncio ficou pairando no ar.

— Piper, é complicado. — Tomei um gole da soda.

— Eu já sei que você está saindo com o tio Alec, podemos passar essa
etapa da descoberta. — Me engasguei na hora com o líquido. Tossi muito,
uma junção do engasgo com o nervosismo.

— Como é que é?

— Vocês dois são péssimos em esconder as coisas. Já tinha notado

que ele mudava com você e, no Natal, foi a confirmação final, os vi

entrando no quarto e voltaram um bom tempo depois. Lila, não estou com

raiva, nem nada parecido. Até gostei de vocês juntos, tio Alec ficou mais

leve e mais feliz. Ele me confirmou o relacionamento quando soube do

acidente. Estava desolado, não saiu de perto da sua cama em momento

nenhum, até chorou com medo de te perder. — Eu não sabia que isso tinha

acontecido, que  Alec realmente ficou assim por mim.


— Eu pensei que  Alec ainda tinha sentimentos pela ex-esposa.

— Lila, quando algo acaba entre duas pessoas e o motivo não é falta

de amor ou qualquer outro que cause mágoa ou raiva, existem grandes

chances de sentimentos retornarem quando se reencontram, mesmo que

depois percebam que não é mais a mesma coisa. Abbie talvez tenha sentido

isso e sua insistência feito o Alec relembrar como eram juntos. O homem

que vi nesse hospital está completamente apaixonado por você, do tipo de

dar a vida pelo outro.

As palavras de Piper me tocaram.

Tenho pouca experiência em relacionamentos e essas nuances são

difíceis de compreender se você não vive algumas coisas. Talvez eu tenha


exagerado demais quando me irritei com aquele beijo, sem nem o ouvir,

mas o bebê já era diferente, envolvia muitas coisas no meio.

— Agora vamos para o elefante branco, o grande mistério que você

está escondendo. O que aconteceu, Lila?

— Estou grávida! — Eu e a Piper ficamos surpresas. Ela, pela notícia,

e eu, por ter sentido, pela primeira vez, que realmente estava grávida. Falar

em voz alta tem  certo poder em transformar as coisas em realidade. — Eu

vou ser mãe — falei para mim mesma, mas servia para a Piper também.

— Lila, quem é o pai?

— Alec. — Seus olhos se arregalaram ainda mais. Respirou fundo e

parecia que ia fazer uma das perguntas mais difíceis da sua vida.

— Lila, você é minha amiga e, por isso, estou inclinada a acreditar

em tudo o que fala, mas vou precisar questionar algumas coisas. Tio Alec é

impotente e infértil, como ele conseguiu transar com você e ter um filho?

— Eu entendo os questionamentos, amiga. Na verdade, até eu tenho

feito alguns deles, sem acreditar que isso aconteceu. Alec não é mais

impotente. Ele tem feito terapia e descobriu que a impotência era algo mais

psicológico do que físico. Agora a infertilidade me pegou totalmente


desprevenida. Não usamos camisinha no calor do momento, por achar que

não teria como algo acontecer. Eu, virgem; ele, infértil. Não sei como, mas

aconteceu.  Alec foi o único que saí na vida e estou grávida dele.
— Meu Deus! Que reviravolta maluca nessa história. E como ele

conseguiu esconder a animação com isso? Ele deve estar louco! — O

silêncio reinou novamente. — Ele não sabe, não é? Camilla Harrison, por

qual motivo você ainda não contou que o homem que enlouqueceria em

saber disso será pai?

— Piper, é complicado.

— Nem vem, nada de é complicado. Quero explicações. — Ela me

encarava, esperando que eu falasse, como se fosse minha única alternativa.


Naquele momento, era.

— Alec me disse que ainda não sabe ao certo o nome do que sente
por mim, mas que queria ficar perto,  comigo. Eu não quero que esse bebê

seja o motivo pelo qual ficamos juntos. Preciso ter certeza do que ele sente
por mim. Eu vou contar a ele, só não agora. Estou ganhando um pouco de

tempo para me entender e tudo isso também — falei, apontando para minha
barriga.

— Entendi. Tudo bem, pelo menos você foi verdadeira comigo.


Vamos para a parte II dos esclarecimentos. E a sua mãe? Você me disse que

não tinham uma boa relação, e ela está aqui, morando com você e cuidando
do neto. Como aconteceu isso?
— Segundo ela, largou o meu padrasto e veio para cá porque o

hospital ligou para ela, esqueci de tirá-la do meu contato de emergência.


Agora falou que vai ficar cuidando de mim até eu melhorar e só fala desse
neto e que eu preciso contar para o pai. Estamos nisso, fingindo que tudo

está normal.
— Eu posso ter feito muito mais coisas na vida do que você, amiga,

mas a sua vida ganha de disparada da minha no quesito montanha-russa.


Nunca vi tanta coisa acontecer com uma única pessoa em menos de um ano.

Bem, um brinde às melhores notícias. — Brindamos e tomamos nossas


bebidas.
— Isso quer dizer que eu vou virar tia, madrinha e prima de uma vez

só? Nossa, as coisas só melhoram.


— Bem, preciso voltar para casa. Tenho algumas coisas para

organizar para amanhã, mas segredo, Piper. Ninguém pode ficar sabendo
antes que eu converse com ele, entendeu?

— Pode deixar. Eu te levo em casa, com esse braço, você ia ter que
pegar um Uber e esperar. Preciso cuidar desse bebê agora.

— E eu?
— Você está grandinha o suficiente para se cuidar sozinha. — Sorri. 

Piper tinha o poder de deixar qualquer ambiente leve e de reduzir minha


ansiedade. Cheguei aqui super tensa e agora estou um pouco mais relaxada.

Principalmente com o que ela disse sobre o Alec.


— Obrigada, amiga. Obrigada por tudo que tem feito por mim nesses
anos. Por sempre estar presente, nos piores e nos melhores momentos. Não

sei o que faria sem você aqui, agora. — Uma lágrima ameaçou cair, e Piper
me abraçou repentinamente. Um abraço caloroso.

— Vou sempre estar aqui por você.


Voltei para casa com as energias renovadas.

— Mãe, vou voltar amanhã para o trabalho, mas fique à vontade. Só


não faça nada que me irrite depois, pelo amor de Deus.

— Parece até que eu sou a filha irresponsável, e você, a mãe. — Eu


quase disse que era assim mesmo, mas preferi não contrariar ninguém.

Precisava guardar minhas energias, amanhã encontraria todos e,


principalmente,  Alec.

Ele tem feito o máximo para não me sufocar. Tem enviado mensagens
e sempre se colocando à disposição para qualquer coisa.

Naquele dia, Alec me contaria o nome do sentimento que tem por


mim, mas o interrompi antes que as coisas ficassem ainda mais
complicadas. Pensando agora, gostaria de tê-lo deixado falar.

— Será que eu teria mudado de ideia? — Preferi focar no que virá.


Minha mãe estava dormindo no meu sofá, por enquanto. Ele era um sofá-

cama para visitas, algo que pensei que nunca usaria. Deitei-me e peguei no
sono rapidamente, essa coisa de gravidez drena toda a sua energia.
Acordei antes do sol raiar, enjoada como sempre.

Tentei comer algo, mas tudo era ruim. Pelo jeito, coisas doces me
deixavam muito enjoadas. Minha mãe acordou e me viu tentando cozinhar

algo.
— Bom dia, enxerida. Já disse que a cozinha é minha. Quer comer o

quê?
— Bom dia, percebi que coisas salgadas são melhores. Um sanduíche
vai bem. — Ela começou a preparar, e eu fui terminar de me arrumar.

— Quando vai no médico, fazer os exames de rotina?


— Eu fiz a maioria quando estava internada, volto em duas semanas

para o próximo. Acho que só no terceiro  poderei saber algo do sexo do


bebê.

— E quando vai contar ao pai?


— Isso de novo, mãe? Já disse que vai levar um tempo, preciso me

organizar.
— Lila, nós nunca estamos prontas para sermos mãe e nunca vamos

estar prontas para contar a alguém sobre isso, principalmente ao pai da


criança. Contar torna tudo mais real a cada pessoa que se fala. Quando

engravidei de você, tive medo de contar ao Charles, não por ele ser um
marido ruim, mas tive medo de atrapalhar a carreira dele. Quando contei,

ele chorou de felicidade e disse que eu era uma boba. Éramos felizes
naquela época. — Poucas vezes vi a Dona Florence se lembrar de algo do

passado com um sorriso no rosto, de forma tão nostálgica. Entendi o que ela
quis dizer.

— Farei o possível para contar o mais rápido que eu puder. Prometo.


Vou indo para não me atrasar. — Chamei o Uber, ainda estava com a tipoia

no braço, faltava pouco para tirar. No caminho, pensei no quanto senti falta
de uma figura paterna na minha vida, do quanto seria feliz por ter alguém

para chamar de pai, alguém que prestasse.


Cheguei no trabalho com várias indagações na mente.

Roddie e Fernanda me receberam com o maior entusiasmo do mundo.


Contaram as últimas novidades e me deixaram por dentro de tudo o que

faríamos nas próximas semanas. A segunda fase estava perto e tudo ia bem.
Fui até o Alec para avisar que retornei ao trabalho. Cumprimentei a Érica,

que falou que eu podia entrar.


Abri a porta e ver aquele lugar, depois daquele beijo, era algo
doloroso, não tinha como mentir.

— Bom dia, Lila. Tem certeza de que está bem para retornar? Se
precisar, pode tirar mais alguns dias.

— Bom dia, Alec. Tenho, sim, se eu ficar presa em casa com minha
mãe por mais tempo, vou à loucura. O protótipo também me espera, mesmo
sem um braço bom, posso acompanhar a programação e os detalhes. Você
está bem? — Ele me observou como se pensasse  como deveria responder.

— Eu... — Érica bateu à porta e entrou com duas xícaras de café.


Meu Deus! Coloquei a mão no nariz, tentando disfarçar, mas o enjoo
começou.

— Sr. Donovan, Lila, trouxe um pouco de café para vocês e dois


copos com água. — Tomei a água, tentando aliviar o enjoo.

— Obrigada, Érica, mas não quero café. — Os dois me olharam de


forma estranha, todo mundo sabia o quanto amava aquela bebida.

— Tem certeza de que está bem? Recusando café — Alec falou,


sorrindo, de forma descontraída. Já Érica me olhava como se analisasse

meu comportamento.
— Estou, sim... Desculpa, gente, mas lembrei que deixei algo na sala

e que preciso voltar agora. Bom dia e bom trabalho para vocês. — Saí o
mais rápido possível daquela sala e fui direto para o banheiro. Lá se foi o

café da manhã. Respirei fundo e saí do box, limpando a boca.


— Acho que você tem um segredo e sei qual é. — Érica me esperava

no banheiro.
— Érica? Eu só comi algo que me fez mal, não se preocupe. — Fui

lavar a mão e passei um pouco de água fria no pescoço, para aliviar o enjoo.
— Lila, não tente mentir para mim. Isso pode ter enganado o Alec,
mas eu tenho dois irmãos mais novos e vi a gravidez da minha mãe, sei

como é estar grávida. Você rejeitou algo que mais gosta, enjoando dessa
forma, e sei que está saindo com  Alec.

— Como sabe tudo isso? Calma, como assim sabe que estou saindo
com  Alec?

— Eu trabalho com o Sr. Donovan há anos e nunca o vi tão


interessado por uma funcionária, tão relaxado e leve como estava. Também

me lembro de como ficou devastado com o seu acidente. Olha, não estou
aqui para revelar o seu segredo, vim porque acho que toda mulher no seu

estado precisa do máximo de ajuda que puder, principalmente para


esconder. No que eu puder ajudar, pode contar comigo. Hoje, um dos

sobrinhos do Sr. Donovan, o Joey, vem visitá-lo. Sugiro que fique fora da
vista, ele trabalha no consulado e é ótimo em ler pessoas. — Érica foi
saindo.
— Obrigada pela ajuda.

— Sororidade serve para isso.


A porta fechou e mais uma pessoa descobriu meu segredo. Pelo
menos, eram amigas. Eu precisava contar a Alec, senão muitas pessoas
saberiam antes dele. Voltei ao trabalho e foquei na apresentação da segunda

fase. As semanas se passaram, apresentamos o protótipo e, apesar de


algumas falhas, passamos para a última e mais importante fase, a que diria
se realmente ganhamos.

Tínhamos uma concorrência forte. Eu precisava focar.


A gravidez estava mudando meu corpo, minha mente e meus
hormônios.
Sentia isso aos poucos, mas já não tinha a energia de antes, e isso me
preocupava. Não queria ter filho agora por causa da minha carreira, mas ter

um bebê do Alec me enchia de alegria, um sentimento único que me fazia


esquecer qualquer outra coisa.
Fiz o meu exame de rotina e o bebê estava crescendo bem. O médico
passou algumas vitaminas para ajudar com a energia e alguns remédios para

evitar o enjoo e ajudar a me alimentar melhor. Também tirei de vez a tipoia,


agora estava com mais liberdade. Estava saindo do hospital, fui depois do
trabalho, quando o meu celular tocou.
— Oi, Piper.

— E aí? Como foi o exame? Tudo certo com o meu sobrinho-


afilhado-primo?
— Você precisa escolher como vai chamá-lo, tudo isso vai
enlouquecer a criança. Está tudo certo, o médico me passou alguns

remédios para enjoo e vitaminas para a energia. Eu pensei que


conseguiríamos descobrir o sexo do bebê no próximo exame, mas ele disse
que vamos esperar mais um pouco.

— Lila, você precisa se alimentar bem e se cuidar. Precisa também


contar ao tio Alec sobre o bebê dele, sabe que quanto mais prolongar esse
assunto, é pior. Ross também vai ficar revoltado por não saber.
— Eu sei, Piper, mas vamos com calma.

— Certo, você quem sabe, mas se alimente bem. Quero que os dois
estejam saudáveis.
— Pode deixar. Vou indo, beijos.
Desliguei o telefone e fui direto para casa.

Minha mãe já tinha feito o jantar e evitou colocar algo doce no meio.
— O médico disse o quê? Os dois estão bem?
— Sim, as coisas estão caminhando bem. Ele passou alguns remédios,
e exame, só mês que vem.
— Normalmente, os enjoos vão embora no terceiro mês. Está mais

perto do que nunca. Preparei algumas coisas salgadas e leves, você precisa
comer direito para ter mais energia.
— Eu sei, eu sei. — Sentamo-nos para jantar e resolvi perguntar a ela
algo que estava na minha cabeça.

— Mãe, o meu padrasto não ligou mais? Não te procurou nem nada?
— Ele não tem muito para quem ligar e bloqueei o número dele no

meu celular.
— Sei que você está aqui para ajudar por causa do seu neto, mas por
que decidiu ficar com ele, sabendo tudo o que ele fazia comigo e com você?
— Ela parou de comer para refletir um pouco antes de falar.
— Isso vai ser uma história que vou te contar depois, mas posso falar

que ninguém é perfeito, Lila. As pessoas acham que, ao virar adulto, se


ganha a carteirinha de sabedoria e perfeição; se for mãe, é ainda mais
perfeita, e não é bem assim. Também aprendemos errando, a diferença é
que não se tem alguém para nos ajudar a levantar, na maioria das vezes. —

Esse foi um pensamento forte.


— Bem, esse fim de semana, quero sair para comprar algumas coisas
para o bebê. Vamos juntas adiantar o que puder e aproveitar que ainda não
tem um barrigão para carregar.

Terminei de jantar e ajudei a tirar a mesa. Fui para o meu quarto e


fiquei pensando no que ela disse. Será que fui muito injusta em julgá-la? Eu
era muito jovem e não tinha muita experiência de vida para entender as
coisas.

— A vida gosta de dar reviravoltas.


O fim de semana chegou e novamente acordei antes do sol raiar.
Acho que o bebê gosta de aproveitar bem o dia.
Caminhei um pouco no quarteirão, voltei e comi algo. Os remédios

ajudaram um pouco com o enjoo e já conseguia deixar alguma coisa no


estômago pela manhã. Tomei uma ducha e me preparei para sair com minha
mãe.
Enquanto ela tomava banho e se arrumava, a campainha tocou.

Abri a porta e ali estava ele.


Alec.
— Bom dia, Lila. Precisamos conversar.
— Bom dia, Alec. Vou sair com...

— Parabéns pela gravidez. — Ele apenas soltou e entrou em casa.


Sentou-se no sofá com as mãos na cabeça. Ele descobriu.
Chega de reviravoltas, vida!
 

Lila tinha todo o direito de me pedir um tempo.

Depois de tudo que passamos, depois daquele beijo da Abigail e do

seu acidente, impossível seguir normalmente com a vida.


O pior de tudo era eu ser obrigado a aceitar.

Raras vezes me vi em um beco sem saída, e agora estou em um deles.

Não tenho nem chance de pedir algo a ela, eu que errei. Não deveria ter me
deixado levar e ter aceitado de bom grado aquele beijo.

Não tinha como explicar uma situação assim.


“Lila, quando a beijei, me lembrei de todos os que vieram antes, de nossos

momentos e, por um mísero segundo, minha cabeça se sentiu em sua zona

de conforto.”

— Alec, idiota. Isso não se explica à mulher que você ia dizer que

ama. — Amor... Um sentimento novo para uma antiga palavra. Uma que
voltou depois de tantos anos. Eu realmente a amo, ela me faz falta, meu

mundo não é o mesmo sem a sua presença.

Preciso pensar positivo, ela não me disse que não queria mais me ver,

apenas me pediu um tempo. Preciso acreditar que nada foi perdido e tentar

fazer o máximo para me redimir. Agora é ocupar a mente e ajudar a equipe


com o que precisarem, uma pessoa a menos faz diferença e quero que ela

volte com tudo bem encaminhado.

Desse dia em diante, voltei a me jogar no trabalho. Passava horas e

ficava até tarde da noite entendendo o protótipo, ajudando a todos e

cuidando da minha empresa. Entre as atividades, mandava uma mensagem

para a Lila, mandava fotos de todos e do protótipo, a incentivava e fazia

tudo que um bom amigo podia fazer.


Eu era mais que isso.

Eu sei, mas todo bom relacionamento precisa de uma boa amizade.

Eu pensava dessa forma para não deixar a ansiedade tomar conta e

acabar metendo os pés pelas mãos. Precisava respeitar a sua decisão. Achei
que seria mais fácil do que realmente é.

Todos os dias eu voltava para casa e só encontrava uma grande

escuridão, um grande vazio. Ninguém estava ali para me esperar, ninguém

para me contar como foi seu dia e sorrirmos um pouco de tudo. Ninguém

para dividir comigo a cama e a vida.

Absolutamente ninguém.
Abri uma garrafa de vinho e fui com ela até a varanda. Sentei-me e

bebi na própria garrafa, eu já não me importava mais. Passei uma vida

tentando ser o melhor, tentando provar para o mundo que eu tenho valor.

Uma vida voltada para bens materiais e os últimos anos sem me importar

em viver, apenas em ganhar.

— O que isso trouxe, seu tolo? Nada! Ninguém te esperando, uma

vida vazia tomada pelo cinza, como um filme antigo que não tinha vida.

Quando a Lila apareceu, naquele primeiro dia em que a encontrei, um

pequeno ponto em meu coração sombrio ganhou cor. Algo pequeno, mas

que fez a maior diferença de todas. Aos poucos, ela foi criando mais pontos
coloridos que logo se transformaram em imagens completas. Ela era o meu

centro de atenção, o meu mundo. Com ela, dei valor a tudo que me rodeia e

voltei a ser leve e a experienciar a vida de verdade. Ela me mostrou que

posso ter os dois mundos.


— E agora ela me tirou um deles, me exilando no mundo cinza de

sempre.

Minhas lágrimas desceram pelo meu rosto, uma após a outra.


Continuei bebendo o vinho, deixei que as lágrimas lavassem toda a dor que

eu tive nesses últimos anos, a que eu tinha agora e a que terei se ela me

deixar. Tomei a garrafa de vinho inteira.

Deitei-me para dormir e tive um sono agitado, com pesadelos com a

Lila me deixando, fugindo para um lugar que eu não sabia como encontrá-

la. Os dias  passaram e o tormento só aumentou. No trabalho, eu era

impecável; para ela, mandava sempre mensagens animadas, nunca

perguntava até quando, que era a pergunta que rodava a minha mente.

À noite, quando voltava para casa, retirava a máscara de homem

impassível e deixava a tristeza tomar conta, assim como a angústia e a

ansiedade. Comecei a beber mais para acalmar os sonhos. Passei a dormir

menos por não consegui relaxar.

— E, então, como você se sente hoje? — A consulta do Ross, no dia

seguinte, só não foi desmarcada porque esqueci que teria.

— Sinceramente? Queria tocar fogo em tudo o que eu tenho e sumir

do mapa.

— Você está dormindo bem? Te vejo com um aspecto cansado.


— Bem? Se eu tivesse pelo menos dormindo, seria ótimo. Sou

tomado por pesadelos. A culpa do acidente me toma, me culpo

indiretamente por isso. O medo de perder a Lila me engole e não sei o que

fazer, porque errei feio. Essa dor no peito, a angústia e a ansiedade estão me

enlouquecendo, Ross. O pior de tudo é que tenho que fingir que estou bem.

— Vou te receitar alguns calmantes para ajudar com o sono. Sobre o

acidente, logicamente você não tem culpa, não se tem como controlar a

vida. Aconteceu, infelizmente. Sobre o restante, a Lila é uma pessoa de

coração bom, ela vai pensar em tudo e decidir o que é melhor para o

relacionamento, ela não apenas decidirá por causa de uma transgressão sua.
Eu refleti um pouco sobre isso.

— Preciso que faça alguns exames e que evite o álcool em excesso.

Ele te deixa ainda mais ansioso. Volte assim que tiver os resultados, não

precisa marcar.

Assenti e saí da sala do Ross.

Ele é sempre tão centrado. Evita ao máximo me chamar de tio para

que não se crie certa intimidade e, inconscientemente, me faça não contar

algo, mas também evita me chamar somente de Alec por respeito a mim.

Carson soube criar os filhos muito bem, todos são excelentes profissionais.

Entrei no carro e meu telefone vibrou.

— Oi, Carson.
— Está livre, Alec? Vamos tomar um drink na mansão? — Olhei o

relógio, eram 21h. Eu só iria para casa e remoer a minha vida mesmo.

— Vou indo para lá, então. Já estou no carro, chego lá primeiro. Até

lá. — Orientei Fernando para onde devia me levar e fechei os olhos por um

instante, tentando relaxar um pouco.

— Sr. Donovan, se me permite um comentário, nem tudo de ruim na

vida vem para destruir o que a gente sente e o que a gente vive. Às vezes,

um período de escuridão é necessário para que aprendamos um pouco mais

sobre o mundo e, para depois, dar mais valor a tudo o que nos rodeia e a

quem nos acompanha e nos ama.

Fernando sempre se preocupou comigo e tinha um bom olhar para as

coisas e pessoas.

— Obrigado, Fernando. Vou refletir sobre isso. — Fechei os olhos.

Gostei das palavras, senti uma pontinha de esperança em mim.

Paramos em frente à mansão e falei que esperasse Carson chegar,

depois estava liberado. Peguei minha chave, preferi abrir a porta dessa vez,

não estava muito com humor para falar com quem abrisse a porta. Entrei e

estava um silêncio, fui direto para a cozinha e peguei um copo de uísque.


Me servi no bar e, quando estava indo para a sala, ouvi a Piper descendo a

escada. Ia cumprimentá-la, mas ouvi o nome da Lila.

O que ela falou depois me deixou sem fôlego.


— Lila, você precisa se alimentar bem e se cuidar. Precisa contar ao

tio Alec sobre o bebê dele, sabe que quanto mais prolongar esse assunto, é

pior. Ross também vai ficar revoltado por não saber.

Lila... grávida... meu bebê... Que brincadeira de mau gosto era essa?

Não é possível. Fui embora o mais rápido que pude, precisava pensar

sozinho e não tinha ânimo para ninguém depois do que ouvi. Por sorte, pedi

que Fernando esperasse.

— Vamos, Fernando. Vamos embora.


— O Sr. Carson ainda não chegou, não vai esperar por ele?

— Depois vejo isso, tenho uma urgência para resolver em casa.


Cheguei em casa, e coloquei uma dose generosa de uísque, somente

algo forte colocaria minha mente no lugar.


— Grávida? Como assim? Eu sou infértil, não tem como isso ser

possível. Será que, depois de ver o meu beijo com a Abigail, Lila saiu com
alguém para descontar a raiva e engravidou?

Nem precisei pensar muito para saber o quanto essa ideia era ridícula.
Lila não era assim, ela não dormiria com qualquer um a troco de ciúmes.

Entornei minha bebida de uma vez e coloquei outra dose. Meu coração
acelerado, inquieto e ansioso e agora não poderia tomar o calmante, depois
de tanto álcool que eu bebi.

As horas foram passando e a madrugada se tornou dia.


Vi o sol nascer da minha varanda e ainda não tinha a resposta do que
aconteceu. Esperei a hora comercial e fui direto ao consultório do Ross.

Avisei a Érica que não iria ao trabalho hoje, não lembro quando foi que eu
faltei o trabalho.

A recepcionista se assustou com o meu estado.


Roupa de ontem, barba por fazer, olheiras e uma feição cansada. Não

estava no melhor dos meus dias.


— Ross já chegou?
— Já, sim, senhor, mas ele está se preparando ainda... — A deixei

falando sozinha e entrei no consultório.


— Bom dia, tio Alec, o que...

— Ela está grávida, Ross. Agora me diz como uma pessoa infértil
pode engravidar alguém? Isso é impossível, mas também era impossível

impotente ter ereção, e se for outro milagre? Como vou ter certeza?
— Tio... — Eu andava de um lado para o outro, tanta coisa a dizer, a

colocar para fora.


— Não tem como ela ter ficado com outra pessoa por causa do meu

beijo com a Abigail, isso não é a Lila, mas e se ela foi imatura e fez? Tem
noção que a pessoa que coloriu o meu mundo pode ter um filho de outro?

Mas algo dentro de mim diz que ela nunca faria isso. Eu sinto que ela não
faria. AAAAHHH... Como posso ter certeza do que é certo ou errado?
— Alec...
— E sabe o final dessa história? Para mim, tanto faz se for meu ou de

outro. Eu quero ficar com ela, Ross. Eu a quero em minha vida e posso criar
facilmente o filho de outra pessoa, criar como meu. Ela realizaria um dos

desejos que mais mantive oculto na minha vida: ser pai. E tenho que esperar
esse maldito tempo que ela pediu! INFERNO!

 Saí da sala do Ross na mesma velocidade com a qual entrei. O ouvi


chamar o meu nome inúmeras vezes, mas só queria sair dali.

— Fernando, me leva até o bar de sempre, o que me encontro com o


Carson.

— Certo, senhor. — Apesar de ter seguido o caminho, eu sentia o seu


olhar preocupado sobre mim. Não podia culpá-lo, estava um trapo. Minha

sorte era ser cliente VIP do bar e ter uma área privada. Mostrei o meu
cartão na entrada e fui direcionado para a minha área. Pedi uísque duplo.

Minha cabeça tinha tantos pensamentos, tudo emaranhado, que agora


eu nem sabia o que pensar. Estava um vazio recheado, se é que isso existe.
Fiquei lá por alguns minutos, sozinho.

— Ainda bem que já pedi o meu drink, vejo que começou sem mim.
— Tomei um susto. Era Carson. Como ele me achou e por que está aqui a

essa hora?
— Carson? O que está fazendo aqui, como me encontrou?
— Bom dia para você também, mano. Parece que você preocupou

bastante o Ross e ele me ligou pedindo para te encontrar. Imaginei que


estaria aqui, geralmente vem para relaxar.

— Você não tinha que viajar hoje?


— Deveria estar no avião agora mesmo, mas alguém resolveu beber

pela manhã — ele falou brincando, mas eu me senti culpado.


— Carson, pode viajar. Vai que ainda dá tempo, não quero te
atrapalhar.

— Alec, para mim, não há nada mais importante do que a família. Se


não existimos para ajudar uns aos outros, então para que serve esse laço?

Você é mais importante do que qualquer trabalho. — Eu não soube o que


falar. — Agora que esclarecemos tudo, me conte por que o meu irmão tão

certinho e viciado em trabalho está bebendo às 9h da manhã com cara de


quem nem dormiu. O que aconteceu?

Contei tudo a Carson.


Tudo de verdade. Desde o dia em que conheci a Lila, o nosso

contrato, nosso relacionamento, como vi que era algo mais e como percebi
que a amava. E, agora, como sei que vou ser pai. Ele ouviu calado, não

falou nada até que eu terminasse de relatar cada detalhe.


— Uau! Sobre você e a Lila, eu já sabia, estava muito na cara, mas

sobre o contrato e agora ser pai. Nossa! Essa, eu não esperava. — A família
toda sabia que eu e a Lila estávamos juntos?

— Carson, não sei o que fazer. Tenho medo de perguntar a ela quem é
o pai, perguntar sobre tudo isso e ela fugir de vez. Quero saber por que

escondeu de mim, por que não me disse nada e está carregando essa história
sozinha.

— Alec, uma gravidez não é algo simples, principalmente para uma


mulher. Normalmente, a mulher é invadida por hormônios, dúvidas,

problemas e mudanças radicais, porque o mundo não é fácil para uma


mulher com um filho. Ela deve estar assustada porque confiava que nada

disso aconteceria. Agora vou te fazer algumas perguntas e quero que me


responda com o que sente. Você acha que a Lila te traiu?

— Não.
— Se ela estiver grávida de outra pessoa, ficaria com ela mesmo

assim?
— Sim.
— Confia na Lila?

— Sim.
— A ama de verdade?

— Sim.
Respondi a todas sem hesitar. Era o que eu realmente sentia, tirando

toda a confusão que a ansiedade e a angústia me causavam.


— Então você já tem sua resposta. Ser pai não é fácil, você e a Lila
precisarão muito um do outro, ela muito mais de você. Só Deus sabe como

foi criar os trigêmeos com a Francine. Ela enlouqueceu na gravidez, uma


montanha-russa de emoções e depois privação de sono, correria, médico,
sem contar o sexo, que vira escasso.

— Nossa, se isso foi para me animar a ser pai, falhou miseravelmente.


— Desculpe, mas sou do grupo dos realistas. Se isso tudo que te falei

não importar se a Lila estiver com você, é o suficiente para começar, Alec.
— Você está certo, mano. Minha cabeça estava agitada, mas agora

consigo pensar bem melhor. Vou na Lila, ela vai me ouvir e dar uma chance
a nós dois. — Já ia levantando quando Carson segurou meu braço.

— Você vai depois que marcar uma consulta com o Ross e ele te
liberar. Se chegar assim, vai assustá-la e não passará segurança. Vamos com

calma, certo? — Soltei um meio-sorriso e me sentei.


— Mano, às vezes penso no que faria sem você por perto. Sempre

teve os melhores conselhos.


— Eu só queria que todos estivessem juntos, a trindade de irmãos.

Quem sabe um dia. — Lembrei-me de Michael e senti uma ponta de


saudades. Conversamos mais um pouco e fui para casa, precisava dormir.

Os calmantes que o Ross receitou foram incríveis, dormi em paz, mas pode
ter sido a conversa com o Carson também.
No outro dia, nos encontramos.
— Desculpe, Ross. Ontem, eu estava fora de mim.

— Eu lido com diversos pacientes e ter alguns fora de si não é


novidade, não se preocupe. Eu peço desculpas também por ter ligado para o

meu pai, sei que deveria ser algo entre nós, mas você saiu daqui de uma
forma que me preocupou bastante.

— Não se preocupe, eu entendo. Nunca me senti dessa forma, como


se algo dentro de mim criasse uma urgência, um medo.

— Você já deve ter ouvido falar de Síndrome do Pânico?


— Sim, claro.

— O termo clínico correto é Transtorno de Pânico. É desencadeado,


geralmente, por estresse extremo ou mudanças abruptas, entre diversos

outros motivos. No seu caso, gira em torno de medo, culpa e mudança. O


medo de perder algo que ama, a culpa por ser o possível motivo disso, a
mudança de uma vida solteira para uma vida a dois, que agora será a três.
Impotência e infertilidade, ambas foram destruídas e a vida te deu mais uma

opção. São alguns dos pontos que consigo ver, mas existem outros que
carregamos e não sabemos ainda.
— Eu nunca pensei que passaria por isso.
— Todos estamos suscetíveis às doenças de saúde mental. A nossa

rotina é estressante. Precisamos conversar e mudar um pouco como você


trabalha, a rotina, incluir descansos e lazer. Preciso que esteja comigo.
— Eu vou estar, Ross, mas primeiro preciso falar com a Lila.

— Amanhã. Hoje, vamos conversar e você vai refletir um pouco.


Lembre-se que a sua conversa definirá o seu futuro com ela. — Odiava
esperar, definitivamente odiava.
O dia passou entre a consulta com o Ross e o trabalho. Tomei o
remédio para conter a ansiedade em falar com a Lila de novo. Acordei cedo,

me troquei e fui direto para a casa dela. Era um sábado, espero que não
tenha saído para canto nenhum. Mesmo com toda a conversa e ter refletido
bastante, rodavam diversas perguntas em minha mente. Só queria conversar
e entender.

Vi Lila voltando para casa. De longe, parecia estar normal, a Lila de


sempre, nem parecia carregar algo tão precioso dentro de si. Esperei um
pouco, vê-la novamente fez meu coração acelerar, e eu queria estar calmo.
O medo também quis tomar lugar em minha mente, medo de ser rejeitado,

mas não podia ser controlado por eles.


Reunindo todas as minhas forças, saí do carro e toquei a campainha.
— Bom dia, Lila. Precisamos conversar.
— Bom dia, Alec. Vou sair com...

— Parabéns pela gravidez. — Nem esperei que me convidasse, entrei


na casa e me sentei no sofá com as mãos na cabeça. Imaginava que
estivesse bem mais calmo, mas fui tomado por todos os sentimentos e fiz a
pior entrada de todas. Merda.

— Lila, vamos naquela loja... — A mãe da Lila me viu e pareceu


desistir de falar. — Deixa, eu acho melhor ir sozinha, quero ver outras
coisas, e você vai querer voltar para casa. Bom dia, Sr. Donovan. Tchau,
Lila. — Ela saiu na mesma velocidade em que entrou na sala.

Lila parecia sem saber o que falar.


— Oferecer um café já é um bom começo.
— Infelizmente, perdi o dom de tomar café depois da gravidez.
Parece que o bebê resolveu me privar e causar enjoos com a bebida. — A

olhei nos olhos, ela falava meio sem jeito.


— Oh, desculpe! Me mostra o caminho que faço um para mim e tomo
à distância. — Ela mostrou onde ficavam as coisas e foi bom ficar longe
dela por enquanto, eu estava me segurando para não a abraçar. Fiz o meu
café e coloquei em uma caneca.

— Quando você soube da gravidez?


— No hospital. O médico me disse que tive sorte pelo bebê e descobri
tudo.
— Antes de pedir um tempo? Então foi por isso que decidiu se

afastar?
— Foi e não foi. Eu me preocupei em como você receberia a notícia

de que seria pai se achávamos que era infértil, não queria receber o olhar de
julgamento de você. Também precisava de tempo para entender tudo e
como ficaria minha vida a partir de agora.
— Confesso que tive um pouco de raiva quando vi que a Piper soube
antes de mim, mas hoje entendo que é algo complicado.

— Alec, eu...
— Lila, sei que temos um elefante branco no meio da conversa. Uma
pergunta que ambos não gostaríamos de fazer ou ter que explicar, então vou
só tirar o band-aid de uma vez e peço que me ouça depois, pode ser?

— Certo.
— Eu sou o pai? — perguntei, olhando diretamente para ela,
diretamente em seus olhos. Agarrei o balcão da mesa com força, com medo
da resposta.

— É seu, Alec. Sei que é difícil de acred... — Não dei tempo a ela,
apenas me aproximei o mais rápido que pude e dei-lhe um beijo. Um beijo
repleto de saudades, de amor e de esperança.
— Lila, naquele dia em que você me pediu um tempo, eu iria dizer o

nome do sentimento que tenho por você. Eu te amo, Lila. Te amo como
quem ama a própria vida, você virou meu mundo e é dona do ar que respiro.
Eu me sufoquei com medo de que me deixasse, que fosse embora. Quando
soube da gravidez, não vou ser hipócrita, pensei que você pudesse ter saído

com alguém por causa daquele beijo, mas logo a ideia se tornou impossível.
Eu confio totalmente em você, sei que nunca faria algo assim. E, mesmo
que tivesse acontecido algo, eu assumiria a criança, cuidaria dos dois,
porque você é o que mais importa para mim. — As lágrimas da Lila

desciam livremente.
— Alec...
— Só mais uma coisa: caso você decida não ficar comigo, queira
seguir sua vida, não se preocupe. Respeitarei sua decisão, só peço que me

deixe fazer parte desse momento. Me deixe te acompanhar como um amigo,


independentemente de qualquer coisa.
— Não! — Fui pego no susto, ela foi bem incisiva. — É impossível te
ter apenas como um amigo, Alec. Eu também te amo com todas as forças
do meu ser e agora você vai ser pai, seu filho ou filha está aqui. — Ela

pegou minha mão e colocou em sua barriga. Pela primeira vez, a sensação
me tomou. O sentimento de ser pai, de ter um pedaço de mim crescendo
dentro da Lila.
— Eu serei pai, nós seremos pais. — Minha lágrima começou a

descer, não tive vergonha, estava mais do que feliz. Lila me deu um
momento na vida que achei que tinha  perdido para sempre. A barriga dela
não estava diferente de antes, mas saber o que tinha ali mudava tudo.
 — Obrigado por tudo, meu amor. Obrigado por me dar isso.

— Se você quiser um teste de paternidade, podemos fazer.


— Não preciso de nada disso, acredito em você, sempre vou acreditar.
Somos uma família — falei, sorrindo, enquanto encostava minha testa na
dela. — Não quero esconder isso de mais ninguém. Quero contar para todo

mundo.
— Calma! Vamos devagar. Também quero contar, mas vamos esperar
um pouco, o exame para descobrir o sexo do bebê está perto. Podemos
contar quando soubermos. Tem o trabalho também, não quero preocupar a

equipe agora. Pode ser?


— Pode, sim, mas eu não quero ficar longe de você por muito tempo.
Nos beijamos, e minha sogra, outra palavra que pensei que não usaria
mais, entrou em casa.

— Agora que os pombinhos estão juntos e felizes novamente,


podemos ir à loja ver as coisas?
— Íamos em lojas de bebê para comprar algumas coisas. Você quer
ir?

— Com certeza, quero participar de todos os momentos.


Passamos o fim de semana juntos. Compramos algumas coisas nas
lojas e, no domingo, Lila passou o dia comigo. Assistimos a alguns
programas, comemos o que não enjoava a Lila e ela adormeceu nos meus
braços, na beira da piscina. Exatamente da mesma forma de antes, no dia
em que fiz um pedido à estrela cadente. Naquele dia, eu nunca imaginaria
tudo o que me esperava.
— O melhor presente do mundo. Obrigado, destino.

Voltamos ao trabalho.
Tentei fingir que estava tudo normal e que nada mudou, mas a
preocupação com ela era automática. De vez em quando procurava uma
razão para ver a equipe ou a observava da minha sala. Não queria que

percebessem, mas queria colocar ela e o bebê em um potinho e proteger de


tudo.
Lila continuou trabalhando normalmente, mesmo com o cansaço
excessivo e os enjoos, cada vez menos frequentes. Perto do dia de
apresentar a última fase do protótipo, o evento me ligou informando que

tiveram um problema com o local da apresentação e precisariam adiar por


duas semanas. Agradeci e desci rapidamente para contar à equipe.
— Pessoal, o evento acabou de me ligar. Adiaram a última fase para
daqui a duas semanas por conta de problemas técnicos, vocês terão mais

tempo. Podem trabalhar com mais atenção e mais relaxados. — Todos


comemoraram, felizes com o prazo estendido.
— Srta. Harrison, posso falar com você? Preciso passar algumas
informações gerais. — Ela assentiu e fomos para o meu escritório. Assim
que a porta fechou, a abracei.
— Alec, alguém pode nos ver.
— Não vai acontecer isso. Está feliz pelo prazo a mais? — Ela se
virou para mim e me deu um beijo na ponta do nariz.

— Com certeza, por que não estaria?


  — Acho que você esqueceu de algo. O exame é essa semana e
prometemos marcar com a família assim que soubéssemos do sexo do bebê,
algo que estou extremamente ansioso. Agora temos tempo, vou precisar

marcar com todos nesse domingo. Está preparada?


— Podemos adiar? Acho que devíamos pensar um pouco melhor.
— Nada disso, já passamos do tempo. — Ela fez uma careta de quem
não gostou, mas concordou. Liguei para todos, avisei que era algo

importante, assim, todos desmarcaram o que tinham para estarem presentes.


Fizemos o exame e pedimos para o médico não falar nada para nós
dois. Queríamos descobrir com a família.
Agora estava aqui.

Eu, a Lila e um bebê que tinha o sexo definido no papel em mãos.


A tensão estava clara.
Eu olhava para a porta da mansão ansioso. Peguei a mão da Lila, ela
estava gelada de preocupação. Respirei fundo.
— Essa é a sua família também. Não precisa se preocupar, estou aqui
com você.
Ela sorriu.

A minha princesa independente.


Que se salva sozinha, mas que escolhe viver ao lado de um príncipe
como eu.
— Vamos? — Entramos na mansão.
 
 

Era impossível não estar nervosa.


Eu tinha medo de que achassem que os traí.

Traí a confiança de quem me acolheu.

Apertei a mão do Alec mais forte quando cruzamos a porta. Ele me


olhou.

— Respira fundo e se acalma, vai dar tudo certo. — Para ele, é fácil

falar, não é ele quem está inundado de hormônios o enlouquecendo.

Piper correu para me abraçar.


— Amiga, já estava indo te buscar. E o... — ela ia perguntar do bebê,

mas parou quando olhou para todos que nos rodeavam — ... braço? Como

está o corpo? Se recuperou bem?

— Estou bem, Piper. Obrigada por toda a preocupação e ajuda. Olá,

pessoal. Vejo que todos estão aqui.


— Com certeza. Toda vez que algum membro convoca um almoço de

domingo urgente não tem nada que nos faça faltar — Carson falou com um

sorriso tão carinhoso que quase chorei. Inferno de hormônios.

— Vamos primeiro almoçar e depois conversamos, pode ser assim?

— Era difícil algo perder para comida nessa família. Todos comiam
normalmente, eu também estaria assim se não enjoasse ainda com algumas

comidas. Fora isso, o nervosismo tomava conta dos meus pensamentos.

Estava inquieta e só percebi quando a mão do Alec encostou em minha

coxa.

— Calma, garota. Come um pouco, toma um suco e relaxa. Também

estou nervoso, mas de nada adianta morrer de véspera. — Soltei um sorriso

escondido. Essa última expressão que ele usou, eu ouvia sempre que o meu
pai queria acalmar a minha mãe. Isso bastou para me deixar menos tensa.

Conversei um pouco com Piper e com Ross enquanto os outros terminavam

a refeição.

A sobremesa foi servida, e eu recusei.


Era uma sobremesa de café, juro que a vontade de chorar foi grande.

— Eu peço para a Maria fazer para você depois. — Meus olhos

estavam marejados. Inferno de hormônios. A paz só durou até o momento

em que Carson falou.

— Pronto, agora que todos estão felizes e saborearam a comida,

chegou a hora de saber o motivo desse almoço. Alec, o que aconteceu?


— Esse vai ser um assunto delicado, mas vou por etapas. O meu

problema causado pelo acidente foi revertido. Estou quase 100% inteiro. —

Todos o parabenizaram. Ross apenas aplaudiu e o parabenizou, porque já

sabia dessa parte, e Piper também. — Mas não é apenas isso.

— Estou curioso agora, mano. Tantas surpresas em um só dia, pode

contar.

— Eu e a Lila estamos namorando. — Um silêncio tomou o

ambiente, mas não foi levado muito à frente.

— Isso, eu já sabia — Carson respondeu, sorrindo.

– Nós dois também. — Piper e Ross completaram a lista de pessoas


que sabiam de nós dois.

— Como assim? Só a gente ficou de fora?

— Vocês que são lesados. Todo mundo percebeu só pelo jeito deles

agirem — Ross falou com os irmãos, emendando uma discussão amigável

entre eles.
— Meninos, ainda não acabei. Juro que só falta mais uma notícia.

— Essa, eu não tenho a mínima ideia do que seja.

— Nem a gente mesmo sabia, Carson. — Alec pegou o resultado do


exame e olhou, pensativo, antes de falar. — Eu vou ser pai. — Agora a sala

estava em um verdadeiro silêncio. A surpresa tomou conta do ambiente.

Deles, apenas a Piper e o Ross sabiam.

— Essa, nós dois sabíamos também — Ross disse para importunar os

irmãos, que ficaram revoltados por não saberem de nada, mas Carson levou

um baita choque.

— Quer dizer que você terá um filho, mano? Eu já estava

imensamente grato pelo seu quadro ter melhorado, mas ter um sobrinho seu

era algo que nunca imaginei que voltaria a sonhar.

Carson abraçou Alec por um longo tempo e acho que vi um pouco de

lágrimas nos olhos dos dois irmãos.

— Quantos meses?

— Cinco meses.

— Estou muito feliz por vocês, Lila. Não existe pessoa melhor para

cuidar do meu irmão e não existe homem mais honrado para cuidar de

quem tenho como filha.

Estava quase chorando também quando me lembrei do resultado do


exame.
— Calma que ainda tem o resultado do exame, vocês poderão

descobrir o sexo do bebê conosco. Recebemos o resultado e guardamos

para hoje.

— Estou me sentindo em um reality show, são informações e

surpresas a cada instante. Amando isso. Pode mandar, amiga. Preciso saber

quem será o meu sobrinho-primo-afilhado.

— Que tanta nomenclatura é essa, Piper?

— Me deixa, Ross. Fala, gente, estou nervosa. — Alec me passou o

papel, e eu abri. O importante era que o bebê estivesse bem, mas confesso

que uma menina seria algo que eu gostaria muito. Abri e minha mão foi à
boca, tentando conter o choro de felicidade. Passei o papel para o Alec, que

leu.

— Uma menina, vamos ter uma menina. — Ele me abraçou, lágrimas

caíram no meu ombro. Ambos estávamos chorando. Seu abraço tinha calor,

amor, desejo, cuidado, carinho.

— Eu não acredito que vou ser tia de uma boneca linda. Meu Deus,

vou enfeitar tanto essa garotinha.

— Tenham cuidado com o furacão Piper. Lembro até hoje o que ela

fazia com as bonecas. — A gargalhada foi geral. Todos nos

cumprimentaram e abraçaram, desejando tudo de melhor. Meu medo e

ansiedade de ser julgada e rejeitada se esvaíram por completo. Restou


apenas a felicidade em fazer parte dessa família. Com todos conversando

entre si, Alec me puxou para o lado, para o corredor.

— Alec, o que está fazendo?

— Precisava ficar a sós com você.

— Não podemos fazer nada aqui, está me ouvindo? Ainda penso

naquele dia em que estávamos escondidos.

— Apesar de gostar da ideia, vim para outra coisa. — Alec tirou uma

caixinha do bolso e começou a se ajoelhar. Entrei em pânico, ele ia me

pedir em casamento por causa da gravidez, e eu não queria que fosse assim.

Fiquei nervosa.

— Não!

— Como assim, não? Nem sabe o que tenho aqui.

— Sei, sim, e não podemos nos casar por conta da gravidez, não

quero que seja assim quando eu for me casar.

— Lila, meu amor, posso garantir que isso não é um pedido de

casamento. A amo demais, mas acho que precisamos de uma novidade por

vez.

— Oh, meu Deus! Me desculpe, estraguei a surpresa não foi? Sempre


sou assim, não deixei você falar e deduzi tudo. Não acredito que fiz isso. —

Um abraço me pegou por trás, um bem forte, que me passou segurança e

calma.
— Você está muito agitada, garota. Está cheia dos hormônios e

entrando em parafusos, realmente é difícil dizer quando você estará

equilibrada, mas posso te dizer que eu não vou a lugar nenhum. Não tem

hormônio que me afaste de vocês duas. — Ele deu um beijo no topo da

minha cabeça e foi para a minha frente. — Agora, voltando ao nosso

assunto, essa caixinha contém algo que é seu há um tempo. Acho que é uma

ótima comparação com você entrando no meu coração.

Ele abriu a caixinha e lá estava uma chave.


— Te dou uma cópia da chave da minha casa para que você apareça

sempre que quiser e fique o tempo que desejar. Também deixei espaço no
closet, para que deixe roupas por lá. Te quero cada vez mais perto, não

somente pela gravidez, mas para te conhecer muito mais do que conheço
agora.

— Alec... Eu...
— Não precisa pensar e, se não quiser, nem precisa usar. Apenas

aceite como um presente.


— Isso é uma das coisas mais incríveis que alguém já fez por mim

nesses últimos anos. Com certeza vou guardar, não prometo usar, mas
tentarei fazer uma surpresa às vezes. — Assim que o abracei, a campainha
tocou.
— A casa hoje está agitada. Deixa que eu atendo. — Joey quem abriu
a porta. Um silêncio permaneceu por um tempo. Ninguém cumprimentou a

visita ou falou quem era, até que a voz da Piper apareceu.


— Abbie, vá embora. Você não deveria estar aqui, dessa vez passou

dos limites. — Abigail chegou. Na ansiedade e depois com tudo


acontecendo, esqueci de avisar a todos sobre ela.

— Pessoal, ela é minha convidada.


— Quando você e a Abigail ficaram amigas? — Alec me perguntou,
como quem tenta entender a ex-mulher amiga da atual namorada, depois do

beijo que aconteceu.


— Uma longa história, mas quis a convidar para vir aqui hoje. Ainda

não somos amigas, mas estamos conversando e nos conhecendo mais.


Assim como você, Alec, a Abbie também sonhava com uma família. Com

tudo o que vocês passaram, queria dividir esse momento com ela também.
Ela está tentando. — Abigail entrou e ficou calada enquanto eu falava.

— Lila, eu posso ir embora e não atrapalhar vocês. Talvez seja


melhor...

— Não se preocupe. Se não for problema para todos, eu preferia que


ficasse. — Alec era quem olhava mais desconfiado, como se não aceitasse

bem essa minha ideia. Eu sei como é ser isolada, sei como é não ter
ninguém, eu entendo um pouco a Abbie. Estava cansada de tanta briga na
vida.

Os Donovan não costumavam acumular ódio das pessoas, então não


se opuseram à sua presença, e o dia estava completo. Sem mais novidades,

apenas uma grande família feliz. Abbie amou saber que seria uma menina e
já foi logo me perguntando sobre o nome, mas eu não tinha a menor ideia.

Conversamos bastante e ela me deu várias dicas sobre a gravidez.


Disse que estudou por um tempo, para quando estivesse pronta. Tive uma

ponta de pena dela, não era fácil essa situação.


Voltei para casa, minha mãe estava na cozinha, como sempre.

Lembrei que ela disse que somente ficaria até eu melhorar do acidente.
Algumas semanas já se passaram, e ela continuava lá, não que eu faça

questão que vá embora. Nesses dias, pudemos evoluir em nossa relação,


algumas coisas foram construídas e outras, compreendidas, mas sinto que

ainda tenho tantas perguntas.


— O que aconteceu? Parou aí, do nada, e ficou me encarando.
— Mãe, preciso conversar com a senhora.

— É sobre eu ir embora, não é? Eu sei que disse que  ficaria até que
você estivesse melhor, mas estou procurando um lugar ainda e preciso de

um emprego e...
— Mãe, não é sobre isso, pode ficar o tempo que precisar. Eu preciso

fazer uma pergunta e quero toda a sua honestidade nela, você pode me dar
essa verdade?

— Existem coisas no passado que devem ficar no passado.


— Eu preciso dessas respostas. Sinto que não seguirei minha vida

sem saber disso.


— Se precisa tanto assim, vou tentar te responder. Qual a pergunta?
— O que aconteceu com você depois que o papai morreu?

— Isso é uma história inteira.


— Por favor. — Ela me olhava como quem não queria mexer em um

vespeiro, mas, para quem ama, minha mãe faria isso. E ela fez.
— Bem, não é algo que eu me orgulhe, mas vou contar. Eu me casei

com o seu pai nova, era um casamento por amor. Apesar de saber que o
trabalho dele nos deixava separados por um tempo, eu não tive medo. Você

foi o nosso maior presente, uma filha nossa era tudo o que queríamos.
Nossa família realmente era feliz, parecia que tudo era encantado, até

aquele fatídico dia.


O dia em que nossas vidas mudaram.

— Charles era minha base, meu pilar. Ele me sustentava nos


momentos mais difíceis e não o ter ao meu lado foi como se a escuridão

tomasse a minha vida. Me joguei no álcool e achei que seria melhor para
você se eu me afastasse. Às vezes, me sentia sozinha, sentia falta do carinho

do seu pai, de ter alguém cuidando de mim. Entrei em diversos


relacionamentos e deixava que toda a pressão me tomasse. Quando você

fugiu, eu quis ir atrás de você, mas pensei que estaria livre agora e seria sua
vez de voar.

Eu nunca pensei em me colocar no lugar da minha mãe, realmente


tomar suas dores.

— A dor de perder o seu pai me arruinou totalmente e nunca quis


jogar isso em você. Me desculpe por tudo o que aconteceu, sei que nunca

poderei reparar isso, mas sinto muito, de verdade.


Ela terminou.

Não tinham lágrimas, apenas um olhar perdido.


Eu tinha os olhos marejados e provavelmente choraria.

— Mãe, eu também peço desculpas. Não tentei te entender, apenas


julguei por seguir sua vida sem me incluir nela. Você se distanciou de mim
e esqueceu que nós duas sofremos a mesma perda, mas eu também não

levei em conta que você teve algo muito maior com ele. Eu quero que
minha filha tenha uma avó próxima e que seja rodeada de amor. Quero que

fique.
Terminei de falar, mas algo tinha capturado sua atenção muito antes

que eu terminasse.
— Você falou, filha. Descobriu o sexo do bebê? Vai ter uma menina?
Eu, esquecendo as coisas.

— Nossa, me esqueci de te dizer. Sim! Será uma menina. — Ela


pulou em mim e quase caímos do sofá. Fazia muitos anos que eu não tinha
uma demonstração de amor dela assim.

— Parabéns, minha filha. Cuide dela, a ame e a proteja de tudo nessa


vida. Eu prometo te ajudar no processo e quero muito estar presente para a

minha neta, aquilo que não fiz por você.


Ambas chorávamos agora.

Senti que, naquele momento, nossa história teve sua redenção.


Não que tudo será esquecido, existem traumas que ficam gravados na

mente como uma cicatriz. Nós decidimos que, a partir de agora, seria um
livro em branco para nós duas, uma nova história construída com a minha

filha.
As coisas voltaram à rotina de sempre, ou o mais próximo que

poderia estar. Contei a Roddie e a Fernanda que estava grávida. Eu e  Alec


conversamos e decidimos não falar quem era o pai, para que não tivéssemos

problemas, semanas antes da última fase. Depois que terminasse o evento,


eu falaria para eles.

Roddie adorou saber que eu teria uma menina, e a Fernanda ficou um


pouco preocupada por eu não morar com o pai, mas amou tudo da mesma
forma.
— Lila, o que precisar, pode me pedir. Você, sem ninguém para te

ajudar, tenho medo de que precise de algo, e eu não possa te ajudar.


— Minha mãe está dormindo na minha casa e está me ajudando

bastante. Agora que contei a vocês, vamos voltar a nos concentrar enquanto
eu ainda tenho humor com esses hormônios.

Os dias passaram e o protótipo estava praticamente pronto, apenas nas


últimas etapas de teste. Enquanto o meu trabalho estava bem encaminhado,

a gravidez estava me enlouquecendo aos poucos. O café voltou a ser


liberado, sem enjoos, mas eu precisava tomar descafeinado, minha

ansiedade já estava muito alta.


Minha vontade por doces teve que ser controlada, para que não

causasse problemas à gravidez, portanto, o meu café não tinha nada para
adoçar. Minhas roupas começaram a ficar muito apertadas e tive que trocar
boa parte do meu guarda-roupa. Eu e Alec decidimos colocar o quarto do
bebê na sua casa, já que a minha não tinha espaço. Ele até tentava ser

divertido, me animar pela manhã, mas a raiva e a alegria oscilavam


constantemente em mim e, sem café pela manhã, eu era um monstro.
Fui até a cafeteira do trabalho, mas as cápsulas de café descafeinado
tinham acabado. Fui me virar para procurar no armário e o copo caiu no
chão, isso foi o suficiente para me tirar do sério. Sapateei em cima do copo
de papel como se matasse o maior assassino do mundo.

— O que o coitado do copo fez?


— Ele assassinou minhas chances de usá-lo. — Encostei-me na
bancada, com a respiração funda. — Cansei só de sapatear alguns segundos
aqui, como que vou ter forças nesse parto? Érica, como que sua mãe
sobreviveu a tudo isso, me diz?

— Quando chegar a hora, a natureza dá um jeito. Ela sempre me dizia


isso, e nunca entendi. Só depois que estudei no colégio que a frase fez
sentido. Como está aguentando com os hormônios?
— Claramente não estou. Essas variações são cansativas. Tento

parecer tranquila, normal, para que a equipe não ache que pirei de vez e que
sou uma péssima capitã, mas é um baita trabalho isso.
— Talvez você devesse ser sincera. Não se espera que uma grávida
seja perfeita, se espera que ela surte, chore, grite e depois melhore. As

pessoas possuem fases, Lila. Quando você parar de se julgar e entender que
está passando por uma dessas fases, garanto que a vida vai ficar mais leve.
Vou indo, mas pensa no que eu disse.
Érica saiu. Eu e os hormônios ficamos.

— Vamos lá, Mel, a gente consegue. — Mel? De onde veio esse


nome? Saiu tão naturalmente.
O dia terminou e fui para a casa do Alec. Estava exausta, não
conseguia ficar em pé por muito mais tempo.

— E aí, como foi o trabalho? — perguntou Alec, colocando um vinho


para ele e uma água com gás para mim.
— Cansativo. Acho que estou com os pés inchados, passei muito
tempo em pé.

Alec foi até o quarto e voltou com algo nas mãos. Veio até o sofá e
colocou o meu copo ao meu lado. Sentou-se e me pediu a perna. Não
entendi, mas dei a perna para saber até onde ele ia. Pegou um pote de creme
que estava na mesinha, atrás dele, e começou a massagear o meu pé de

forma a melhorar a circulação.


— Eu poderia ter um orgasmo nesse exato momento. — Coloquei a
cabeça para trás e relaxei.
— Nada contra, fique à vontade. Espero que goste da massagem, vi
em um livro como fazer, mas é a primeira vez que faço.

— Você pesquisou sobre isso?


— Essa casa tem uma biblioteca para gestantes de tanto livro que
comprei. Já li vários da lista, quero estar pronto para quando a nossa bebê
vier ao mundo. Quero poder te ajudar ao máximo, já que a função de

carregadora ficou com você.


— Você sempre me surpreendendo. O que eu queria agora eram

férias. Eu quero viajar para um lugar legal, ficar a sós com você, aproveitar
enquanto somos apenas nós dois. Quando formos três, não vamos ter paz
tão cedo.
— E o projeto? Se viajar, vai ficar ansiosa com o protótipo.
— Nada, o projeto está quase no fim. A equipe está rodando a análise

final.
— Bom saber, então, Srta. Harrison. Vou pensar em algo para nós
dois. Agora, vamos dormir que amanhã é dia de exame e toda aquela
correria médica do mês.

Essa rotina de casal, dormindo e acordando com o Alec, tomando


banho com ele e jogando conversa fora, sem se preocupar com o que falar
ou fazer, essa leveza era tudo o que eu mais queria e não sabia. O som da
risada dele faz o meu coração acelerar, o seu cheiro me faz sorrir. Acho que

eu e a pequena dividimos o amor pelo mesmo cara.


Passei o dia fazendo os exames de rotina e tudo estava normal.
Fui até uma sorveteria, já que a cafeteria era proibida. Não tomaria
descafeinado, me recuso. Alec dividiu um sorvete comigo e avisou que

precisava se encontrar com Carson, algo rápido, e que me encontrava aqui


depois.
Ele saiu quando o meu celular tocou. Era minha mãe.
— Oi, mãe. Tudo bem?

— Tudo certo, como foram os exames?


— Foram normais, tudo maravilhoso, como deveria estar.
— Ah, que bom. Olha, estou procurando emprego, mas ainda é difícil
para mim me encontrar. Se souber de algum salão contratando cabeleireira,

me avisa, por favor.


— Aviso, sim, não sei se encontro, mas aviso.
— Obrigada, quero te ajudar com a casa.
— Já falei que não precisa, teimosa.

— Vou embora, tchau. — Ela desligou o telefone para fugir de mim.


Fiquei pensando em como ela estava motivada. Ontem, ela ainda me disse
que uma das primeiras coisas que fez foi ir até uma reunião dos alcoólicos
anônimos. Meu acidente a abalou, e ela os procurou antes de beber qualquer
coisa. Ainda continua indo e agora procurando emprego, tinha orgulho dela.

Alec veio andando em minha direção.


— Pronto, voltei. Quem te ligou naquela hora?
— Minha mãe. Ela está procurando emprego e, como não conhece a
cidade, está complicado. Me pediu que ficasse de olho.

— Ela trabalhava em quê?


— Cabeleireira. Sempre teve talento para essas coisas.
— Vou ficar de olho também. — Ele tirou uma chave do bolso e me

deu. — Tenho novidades.


— Quantas chaves você pretende me dar, Alec?
— Espertinha, essa é emprestada, é o lugar em que passaremos as
nossas férias.

— Vamos tirar férias?


— Faz tempo que não saímos e sempre é bom respirar um pouco.
— Tem certeza? Sei que eu quero, mas não quero te prejudicar.
— Está tudo organizado. Você vai amar.

— Nossas primeiras férias a três.


— Primeira de muitas. — Ele me beijou, e eu sorri com uma
felicidade gigante por finalmente relaxar de verdade.
 

A gravidez foi a melhor e maior coisa que já aconteceu em minha

vida.

Saber que a pessoa que amo está grávida de um bebê meu já é algo
perfeito, ainda mais depois de todo o meu caso.

Entretanto, não levei em conta que Lila teria uma vida bem

sobrecarregada agora e não parecia existir nada em que eu pudesse ajudar.


Sempre a observava da vista da minha sala e ela parecia estar bem

cansada, a barriga pesava e estava a cada dia maior. Foi até a cafeteira e
parece que o copo levou a pior, ela esmagou o coitado. Este era outro

problema da gravidez, nunca se sabia qual Lila aparecia quando a

encontrasse.

Ela já chorou no café da manhã, ficou irritada no carro, já sorriu

muito com o projeto e depois ficou sem vontade de fazer nada, diversas
mudanças em apenas um dia, e eu não sabia como acompanhar.

Às vezes fico pensando como Carson conseguiu sobreviver à gravidez

dos trigêmeos. Verdade! A pessoa mais entendida do assunto, em todos os

aspectos, era o meu irmão mais velho, então ele poderia me dar algumas

dicas de como ajudar a Lila.


Liguei para ele na mesma hora.

— Está disponível para um drink, hoje?

— Estou, mas qual a novidade para sair para beber tão cedo?

— Preciso da sua ajuda. No bar, te falo mais sobre o assunto.

Organizei tudo o que faltava e liberei a Érica. Saí e encontrei Carson

no bar.

— Tomei a liberdade de pedir seu drink.


— Obrigado. — Tomei um gole de um uísque muito bom.

— E, então, qual o problema com a Lila?

— Como você sabia que era sobre ela?


— Meu caro irmão, quando uma mulher engravida de um filho nosso,

tudo gira em torno dos dois. Lembro perfeitamente desses tempos.

— Ainda bem que lembra, pois preciso de muita ajuda. Lila está

passando por uma gangorra de emoções, algo biológico e esperado, mas

nem por isso deixa de ser complicado.

— Sei como é isso. Francine já jogou uma panela na minha cabeça,


porque eu coloquei na pia sem tirar o excesso de óleo. — Não sei se eu

ficaria são até o fim da gravidez se passasse por isso.

— Nem me fale — Terminei o copo e pedi outro ao garçom, que,

prontamente, colocou outra dose.

— Hoje, a Lila descontou toda a raiva do universo descafeinado no

coitado de um copo. Outro dia, resolvi fazer uma surpresa, comprei um

berço, o montei todo, vedei seus olhos e mostrei o quarto com o berço

montado. Lila chorou tanto que parecia que eu tinha dito que alguém

morreu. Achei que tivesse feito algo errado, mas ela me disse que estava

feliz.
— Imagino como deve ser. Você, então, quer dicas de como ajudá-la?

— Exatamente. Caso você tenha ideias para distraí-la, algo que

melhore seu humor, essas coisas são as que preciso. Mano, tenho medo de

que algo dê errado na gravidez e não quero nem pensar nas consequências,

estou fazendo de tudo para que ela fique bem.


— Alec, você precisa entender que nós somos meros espectadores

dessa experiência chamada gravidez. Somos atores secundários, e elas, as

protagonistas, infelizmente, o pai não consegue ajudar em tudo, mas você


pode dar forças e tentar limpar o caminho, deixar tudo tranquilo.

Achava engraçado ver Carson falando sobre isso. Apesar de Francine

ter partido tão cedo, ele não falava das lembranças com mágoa. Ele tinha

um brilho de nostalgia no olhar e um sorriso no rosto, esse Carson contador

de histórias é bem mais leve e nada durão. Devem ter sido os melhores anos

da vida dele.

— Lembra da cabana? A que nossos pais nos deram e vem sendo

passada de geração em geração? Tenho a chave dela comigo. Tenho certeza

de que o clima da cabana, com uma boa ajuda sua, vai deixar a Lila leve e

feliz quando voltar. Vivi muitos momentos de calmaria e sossego com a

Francine por lá.

— Carson, eu tinha me esquecido completamente dela. Boa ideia,

mano! Inclusive, a Lila estava falando de férias um dia desses. — Levantei-

me da cadeira e terminei meu drink.

— Vai embora?

— Preciso arrumar muita coisa para conseguir tirar esse fim de

semana de folga com a Lila. Vou voltar para a empresa, depois deixa a
chave na mansão, que pego lá.
— Alec Donovan, um viciado em trabalho, tirando o fim de semana

para relaxar?

— Pois é, parece que um bebê muda muito a vida de um CEO. — Me

despedi do Carson e fui embora, sorrindo. Espero que ele, um dia, encontre

alguém tão bom quanto a garota que me tirou das trevas.

Trabalhei algumas horas a mais durante os dias e aproveitei para

pesquisar por tratamentos e métodos que aliviavam as dores, melhoravam o

humor e renovavam as grávidas. Encontrei coisas bastante interessantes e

algo voltou à minha mente na mesma hora, a voz da Lila.

“Eu poderia ter um orgasmo nesse exato momento.”


Ela falou isso enquanto eu fazia massagem nos seus pés. Foi no

mesmo dia em que ela falou das férias.

— Ah, garota, você vai receber uma massagem de verdade nesse fim

de semana.

Depois dos exames, fomos a uma sorveteria. Tomamos um sorvete e

contei-lhe a surpresa. Uma chave emprestada para tirarmos férias, um lugar

incrível que só se sabe o real valor quando se está lá. Nunca vi alguém tão

feliz na vida, umas férias a três enquanto nossa filha ainda está no forninho.

No fim de semana, a cabana estava pronta e estávamos a caminho do

lugar. Para chegar, precisávamos passar por uma boa quantidade de

quilômetros. Entramos em uma estrada de terra, que somente acabou


quando chegamos ao nosso destino. A cabana ficava cercada por uma

floresta arejada, agradável e por ar puro à vontade.

— Seja bem-vinda à cabana dos Donovan. Um lugar feito para nos

livrarmos do estresse e dos problemas da vida.

— Bela introdução, já me ganhou na parte do se livrar. Alec, o

caminho é maravilhoso, essa cabana parece tão aconchegante.

— Vamos entrar, eu tiro as coisas do carro depois.

Entrei com a Lila para apresentar o interior do lugar. Não se tinha

muito o que mostrar em questão de cômodos, era a casa mais simples que a

minha família tinha, mas não deixava de ser calorosa. Além disso, a

quantidade de histórias que ela carregava era enorme.

— A cabana tem três quartos, um no térreo e dois no primeiro andar.

Aconselho dormirmos no térreo para não precisar subir e descer várias

vezes. — Ela concordou. — Lá também tem a varanda, que podemos tomar

algo lá depois.

— Saudades dos seus vinhos — falou, meio tristonha.

— Daqui a pouco você voltará para eles. Continuando, temos uma

lareira e madeira ao lado, deixa comigo, eu faço essa parte. Como sei que
não vai gostar de ficar parada, deixo a parte da cozinha com você. Tem tudo

por aí, mas peço que não se esforce desnecessariamente, certo?


— Certo. Acho que nem se eu quisesse, conseguiria. Minhas pernas

doem, meu corpo parece triturado e meus órgãos espremidos — ela fala

dessa dor numa naturalidade, eu sinto tudo por ela.

— Lila, eu queria fazer mais por você, mas minha ajuda se resume ao

campo humano.

— Só em você querer passar por tudo isso comigo, já fico feliz, Alec.

Ainda mais sabendo e vendo todo o seu esforço por nós. Agora, vou

precisar tirar um cochilo porque estou muito cansada, coisa rápida.


Ela foi para o quarto, não sem antes me dar um beijo carinhoso e um

abraço com uma grande barriga entre nós. Eu não sabia que precisava desse
tipo de carinho até conhecer.

Aproveitei que ela foi se deitar e tirei as coisas do carro. Coloquei


tudo na cabana e preparei uma tábua de frios, com queijos, azeitonas e mais

algumas coisas gostosas para acompanhar o suco de uva que trouxe. Queria
a experiência do vinho sem o álcool.

Achei que seria algo rápido, mas Lila dormiu até umas 16h. Fiquei
com pena de acordá-la, se conseguiu dormir bem aqui, é sinal de que a

cabana já estava fazendo alguns milagres. Cortei algumas madeiras e acendi


a lareira, o tempo esfriava um pouco na floresta nessa época. Tomei um
banho e estava ajustando o fogo quando a Lila acordou, meio desnorteada.

— Alec, que horas são?


— 16h. Você se empolgou no sono — falei, brincando, e me esqueci
que piadas não são bem recebidas, a depender do assunto. Ela queria ter

acordado cedo, mas não deu.


— Quê? Por que você não me acordou? Perdi o dia todo do nosso fim

de semana dormindo. Que raiva, não acredito nisso. — Ela se sentou no


sofá, furiosa.

— Lila, meu amor, viemos para cá para descansar e reduzir o estresse.


Você dormir tanto assim e tão bem significa que está tudo certo. Vamos
aproveitar o momento, e não nos deixarmos levar, temos muito tempo

ainda. — Ela me olhou chateada, mas concordou, disse que tomaria um


banho antes e saiu.

Aproveitei e arrumei a varanda para surpreendê-la.


— Alec, onde você está?

— Aqui em cima, na varanda. — Preferi que ela chegasse sozinha e


visse tudo. Lila subiu e estava distraída com a casa, mas, quando viu a mesa

à sua frente, ficou boquiaberta. Colocou a mão na boca, de surpresa, e


depois sorriu, um sorriso lindo e contagiante.

— Foi você quem fez tudo isso?


— Com certeza, não sou tão ruim assim na cozinha.

— Nossa, Alec, estou impressionada, mas lembra que não posso


tomar vinho?
— Lembro, sim, por isso trouxe suco de uva. Uma pequena
modificação, mas dá para aproveitar bem e pensar que está tomando vinho.

A experiência quase completa.


Sorrimos, felizes pelos pequenos atos que nos rodeiam.

— Srta. Harrison, sente-se aqui, por favor. — Ela foi até a cadeira e
puxei para que se sentasse. Sentei-me do outro lado e nos servi com alguns

petiscos da tábua de frios. Coloquei suco em nossos copos e propus um


brinde.

— Um brinde a outras novas experiências de calmaria e sossego nessa


cabana. — Brindamos e tomamos um gole do suco.

— De quem é essa cabana? Do Carson?


— Na verdade, é da família toda, mas a cada geração uma pessoa fica

responsável por cuidar dela. Carson é o responsável agora. O primeiro


comprador foi o meu pai.

— Então virou uma herança de família? Estou imaginando todos


brincando aqui.
— Bem, a cabana não é feita para crianças, é feita para os pais delas.

Desde o começo, meu pai queria encontrar um lugar para fugir do trabalho
e da rotina. Quando minha mãe engravidou, essa vontade ficou ainda mais

forte, queria desestressar e relaxar a minha mãe também. Assim que viu a
cabana, a comprou sem pensar duas vezes e sempre a chamou assim.
— Então, todo casal dos Donovan vem para cá quando a mulher

engravida?
— Não somente por isso, mas, sim, todos vem. Carson veio para cá

com a Francine, quando ela engravidou dos trigêmeos e depois da Piper.


Eles eram muito novos e a Fran tinha sido expulsa de casa por causa da

gravidez, estavam enfrentando maus bocados e, mesmo assim, Carson


continuou firme e forte. Tiveram uma linda história de amor, daquelas
arrebatadoras. Ele se casou com ela, criaram os meninos, cresceram juntos,

até que um câncer de mama a levou. Não foi instantâneo, levou um ano e
meio até sua morte, a Piper tinha 15 anos na época em que tudo aconteceu.

Me levei pela história e cheguei em uma parte triste. Até hoje, não sei
qual parte é pior: demorar a ir embora e prolongar o sofrimento ou sofrer

rapidamente.
— Lá estava o Carson, chorando no corredor, enxugando as lágrimas

e entrando com um sorriso no quarto, ambos sabiam que não era verdadeiro
aquele sorriso, mas fingiram que nada acontecia. Ele suportou muita coisa

pelo grande amor da vida dele. Por anos, tomei o casamento da Fran e do
Carson como exemplo de casamento para mim, daqueles que você não

desiste nunca. Depois percebi que tudo depende de quem te acompanha na


jornada.
Deu um sorriso triste, mas sincero. Lembrei-me da Abbie quando

implorou para ir embora.


— Nossa, não imaginava que a Piper, os meninos e, principalmente, o

Carson tinham passado por tudo isso.


— Dizem que a vida imita a arte e a arte imita a vida. Eu comparo

histórias assim àquelas grandes tragédias românticas. Romeu e Julieta, por


exemplo, se amaram e se casaram em um curto espaço de tempo que levou

os dois à morte. Mereciam ter mais tempo juntos? Com certeza, mas
acredito que viveram o máximo que podiam naquele tempo e não trocariam

por nada no mundo.


— Assim como nos conhecemos, que não é uma história nada alegre.

— Lila sorriu ao lembrar da cena do estacionamento.


— Exatamente, garota. Não mudaria em nada aquele momento. —

Conversamos sobre outras coisas e comemos mais um pouco. Depois de um


tempo, percebi que a Lila estava mudando muito a posição na cadeira.
— Quer mais almofadas na cadeira?

— Não, só minhas pernas que estão um pouco inchadas pelo peso e


minha coluna que dói um pouco. Males da gravidez.

— Tenho uma ideia, vou te fazer uma massagem relaxante. Li em um


livro e peguei algumas técnicas.

— Se for como aquela que você fez no meu pé, vai ser magnífica.
— Vou só descer algumas coisas, limpar aqui e daqui a pouco chego
no quarto. — Lila pegou alguns pratos, apesar das minhas reclamações, e

desceu com eles. Foi me esperar no quarto, enquanto eu limpava as coisas.


Fui à minha bolsa e peguei o óleo corporal e as bolinhas afrodisíacas
comestíveis. Como são para uso externo, não afetará em nada.

Cheguei no quarto, e Lila me esperava na cama, em uma camisola


transparente que cobria apenas o mínimo.

— Como você não consegue se deitar de costas, pode deitar-se de


lado. — Ela se ajeitou na posição até que eu percebi que não ia tirar a

camisola. — Lila, tira a camisola, por favor. Vou usar um óleo corporal para
ajudar na massagem.

Ela ainda tinha um pouco de vergonha, em alguns momentos, de ficar


pelada na minha frente, depois da gravidez. Eu não sei por que essa

vergonha, eu amava seu corpo agora. Seus seios estavam ainda maiores e
sensíveis e as partes baixas inchadas, como se me chamassem o tempo todo.

Além disso, os seus hormônios a deixavam louca.


Depois que tirou toda a roupa e ficou linda na minha frente, se

posicionou de novo na cama. Derramei o óleo nas minhas mãos e esfreguei


bem para esquentar um pouco, encostei as mãos em seu corpo e ouvi um

gemido. Um som natural, mas, ainda assim, me arrepiou.


Comecei uma massagem leve, deixando-a relaxada, reduzindo a
tensão em suas costas. Me concentrei na sua lombar, que estava dolorida, e

massageei um pouco os glúteos. Desci mais um pouco e passei perto da sua


entrada, que já estava úmida e me enlouquecendo. Só em me aproximar, seu

corpo retesava e ela gemia, isso me deixava excitado.


Continuei espalhando o óleo pelo seu corpo e massageando. Pedi que

virasse com a barriga para cima para ter acesso ao resto do seu corpo, a
parte que eu mais desejava e tudo o que eu via me fazia delirar de prazer.

Ela estava um pouco envergonhada, mas tentei relaxar o seu corpo


com alguns carinhos inocentes, para que não ficasse com tanta vergonha,

afinal, Lila era linda, e agora estava ainda mais. Por isso, comecei pelas
pernas, e ela pareceu relaxar, e o melhor de tudo, parecia gostar do que

acontecia.
Deixei que o óleo derramasse diretamente na sua barriga e fui
espalhando. Ela estava bem redondinha, linda demais. Comecei a espalhar o
óleo, levando até os seus seios enormes. Massageei embaixo deles e depois

no seu colo, tudo bem inocente para que relaxasse o suficiente.


Passei os dedos em suas pálpebras, um gesto a fim de pedir para que
fechasse os olhos, calmamente. Coloquei uma venda negra cobrindo a sua
visão, para que os seus outros sentidos ficassem mais aguçados.
Passei os dedos, embebidos em óleo, algumas vezes pelo bico do seu
peito, roçando meus dedos e deixando-os intumescidos. A cada vez que

passava, seu corpo reagia e ela soltava um gemido escondido, meu pau
estava doendo na cueca nesse momento, mas ainda não era o momento.
Fui descendo a mão e massageando suas pernas e seus pés para aliviar
a dor do inchaço, até que comecei na parte interna da coxa, na virilha.
Acariciei suas pernas que estavam dobradas e sua vagina se abriu como

uma flor para mim. Deliciosa. Da virilha, a massagem começou a ir mais


para perto da entrada e rodeei os grandes lábios, aplicando um pouco de
pressão internamente. Sentia suas pernas se contorcerem.
Peguei as duas bolinhas afrodisíacas e estourei por fora. Massageei

um pouco e passei por cima do clítoris e dos pequenos lábios. Alguns


minutos depois e Lila se contorcia a qualquer toque meu, o afrodisíaco
estava funcionando bem. Avancei para a parte de dentro e fiz massagem no
seu clítoris, não permitindo que gozasse agora.

Com um dedo, eu excitava o seu clítoris e, com o outro, eu introduzia


em sua entrada, úmida e escorregadia. Lila estava tão excitada que seu
líquido lubrificante escorria por fora. Tirei a cueca e deixei meu pau respirar
um pouco, não aguentava mais. Comecei a revezar a mão entre o clítoris e o

seio dela, parei quando senti que ia gozar.


Ela gemeu, suspirou, frustrada. Queria mais de mim. Eu gostava
dessa sensação que causava nela. A ouvi falar baixinho:

— Alec, me fode, por favor. Quero gozar.


— Calma, garota. Quero você gemendo alto para mim. — Esfreguei
meu pau na sua boceta e acariciei o clítoris com ele. Também não podia
estender muito, pois já estava louco de prazer.

Coloquei suas pernas apoiadas no meu ombro e abocanhei seu


clítoris. Precisava do gosto dela em minha boca, mas como eu adorava ver o
fogo do desejo em seus olhos, parei por um instante. Não resisti, pois
provocá-la me dava uma enorme satisfação. Assoprei meu hálito quente

sobre sua bocetinha e a vi estremecer de antecipação, repeti algumas vezes.


Ela ronronou como uma gata, reclamando para que eu não parasse, mas eu
queria ouvir Lila falar o que desejava de mim.
— Quero que você me peça.
— Me chupa, Alec, por favor. Eu te quero.

Soltei um sorriso e a chupei de verdade. Passei a língua por cada parte


íntima sua, sempre a levando à loucura. Parei um pouco, e ela quase
reclamou, mas nem dei tempo. Coloquei o meu pau em sua entrada e comi a
sua boceta quentinha e apertadinha. A fricção das paredes da sua vagina no

meu pau era algo que massageava e me enlouquecia, mas esta era a vez dela
de gozar.
Penetrei fundo e alternei entre estocadas brutas e leves. A posição em

que ela estava era ainda mais excitante, seus peitos balançavam e ela sentia
o meu pau entrando e saindo ainda mais. Lila gemia alto de prazer e prendia
o lençol da cama com as mãos, tentando segurar à vontade, em vão.
Sentia as paredes internas da sua vagina pulsarem, eu sabia que estava
perto de gozar e não iria parar até chegar a esse momento. Ela explodiu em

milhões de pedacinhos de felicidade. Agora era minha vez. A coloquei de


lado novamente e penetrei sua entrada por trás, na posição de conchinha.
Chegou minha vez, agora que ela estava satisfeita.
Estoquei devagar inicialmente e aumentei o ritmo à medida que o

prazer aumentava. Lila não reclamou, estava adorando. Nessa posição, eu


tinha acesso aos seus seios e a seu clítoris, tudo nela queimava por prazer.
Enquanto estocava, uma mão excitava seu bico do peito e outra massageava
seu clítoris. Eu sentia o seu corpo reagindo novamente ao meu. Ela

empinou sua bunda para que eu tivesse mais espaço para penetrar e foi
ainda melhor.
Meu corpo suava de todo o movimento, mas o meu tesão nunca
esteve tão no auge. Eu não tinha medo de broxar, não tive medo de que não

funcionasse, voltei a ser o que era antes e o corpo dessa mulher me


enlouquecia de qualquer forma.
Me preparei para gozar, as ondas de prazer aumentaram até que eu

explodi dentro dela e, para minha surpresa, Lila explodiu novamente. Essa
era a melhor sensação do mundo. A moleza bateu e ficamos um tempo ali,
parados e descansando. Recuperando o fôlego.
Lila me tinha na palma da mão. Tudo o que eu pensava era em seu

prazer, tudo o que eu queria era gozar para ela, pensando nela. Essa mulher
ocupou todo o meu ser, apesar de não ter fôlego, eu a observava buscando
ar depois da nossa transa e ela era a mulher mais linda do mundo.
— Uau!

— Relaxou?
— Depois de tudo isso? Impossível não relaxar. Te amo.
— Também te amo. Poderia ficar a noite toda aqui, agarradinho, mas
o sono bateu forte agora. Vamos tomar uma ducha juntos, na banheira.
A ajudei a se levantar, preparei a água e entramos. Passei sabonete em

todo o seu corpo. A mesma mulher, o mesmo corpo e zero tesão de sexo, só
vontade de cuidar. Tinha certeza de que, se me chamasse para transar, eu
iria, mas agora queria cuidar das duas ali.
— Eu tive medo de que você me olhasse diferente com toda essa

mudança em mim.
— Garota, o que sinto por você é essência, e não somente físico. Do
jeito que está agora, meu tesão é ainda maior, porque está ainda mais linda.
Do jeito que vai ficar depois que tiver nossa filha, a beleza vai aumentar

ainda mais. O que importa é estarmos juntos, o resto, damos um jeito.


— Nossa família é incrível.
— Com certeza é. — Trocamos carinhos e carícias e saímos do
banho. Dormimos como crianças, sono pesado e relaxado.

No outro dia, caminhamos pela floresta até um lago ali perto. Ficamos
olhando por um tempo, conversando e brincando com pedras na água. O dia
passou rápido e já era noite. Amanhã começaria tudo de novo.
— Quer ficar mais um pouco?

— Não me leve a mal, meu amor, adorei cada momento, mas preciso
voltar para a civilização e para o projeto. Podemos voltar aqui depois que
ganharmos o evento.
— E eu que sou viciado em trabalho. — A abracei, brincando.

Voltamos para a civilização e todo o estresse que nos aguardava. A


cabana conheceu mais uma geração dos Donovan e espero que seja assim
por um bom tempo. Deixei Lila em casa, mas ela pediu para ir comigo
porque precisava de sorvete de novo. Desejos de grávida não posso negar.

Sua mãe me cumprimentou da porta da casa, e eu me lembrei do que ela


falou para mim.
— Lila, depois leva sua mãe lá na empresa. Quero mostrar o lugar a
ela.
— Ok, mas sabe que não precisa, certo?
— Ela é minha sogra, virou família. — Ela me olhou sem
argumentos, queria retrucar, mas não pôde. Depois veria que foi por uma
boa causa.

Fomos até Carson e a deixei na sorveteria, que ficava ali perto. Fui
entregar a chave da cabana no seu escritório.
— Mano, muito obrigado. Essa cabana é mágica.
— Acho que você entendeu a calmaria e o sossego de lá — falou com

um sorriso safado no olhar. Agora entendi.


— Agora que entendi o que falou, mas pode apostar que conheci esse
sentimento. Lila está bem mais relaxada e humorada. Ela queria agradecer,
mas o sorvete ganhou de você, desculpe.
— Não se preocupe, entendo os desejos de grávida. Vou precisar sair

agora, pois vou viajar, mas, se precisar de algo mais, basta me ligar. Fico
feliz em ajudar os dois.
O cumprimentei e saí do escritório. Fui em direção à sorveteria onde
deixei Lila, e ela não estava por lá, olhei para dentro da loja, e ninguém por

perto. Liguei para o seu telefone e chamava até cair a ligação. Estranho.
Olhei ao redor, a procurando, até que vi, na esquina da rua, uma
mulher grávida de costas. Não tinha dúvidas de que era Lila, ia me
aproximar quando vi que um homem estava puxando o seu braço, e não era
amigável. Antes que eu falasse algo, vi uma arma na sua mão.
Congelei.
Meu maior medo passando na minha frente.

Não tive reação.


Não no começo.
 

— Pronto, pode matar seu desejo por sorvetes. Vou devolver a chave
da cabana a Carson e agradecer o fim de semana, daqui a pouco volto para

tomar um também. Pode ser?

— Acho que, quando voltar, vou ter tomado uns quatro sabores, então
pode ir tranquilo. Estou em boas mãos. — Eu salivava pensando no sorvete,

desejo é algo louco mesmo. Alec me deu um beijo e saiu para o escritório

do Carson, ali perto.

Tomei dois sabores e peguei mais um para comer na área externa

enquanto observava o entorno. O nosso fim de semana foi magnífico, voltei


muito leve e relaxada, parecia que não tinha estresse no mundo que

conseguisse me vencer agora. Alec sempre buscava melhorar as coisas e me

ajudar, não tinha como pensar em alguém melhor para passar comigo por

esse momento.

Novamente o nome Mel veio à minha mente.


— É pequena, acho que seu nome vai ser esse mesmo. Vou contar

para o papai depois. — Quase terminando o sorvete, uma voz ecoou atrás

de mim, bem perto do meu ouvido. Uma voz que eu esperava nunca mais

ouvir na minha vida.

Gelei na mesma hora.


— Olha quem eu encontro aqui. Parece que minha querida enteada

vai bem de vida. — Me virei e dei de cara com o meu padrasto, ex-padrasto

na verdade. Estava com medo, senti meu corpo gelar e travei com aquela

visão, mas não poderia deixar que ele percebesse. Me levantei da cadeira,

joguei fora o copo do sorvete e comecei a ir embora.

— Vai embora sem falar comigo?

— Não tenho nada para te dizer. Aliás, tenho uma coisa: suma da
minha vida de uma vez.

— Nada é tão fácil assim, querida.

— Eu não vou falar com você. — Continuei andando até os prédios,

ele me puxou pelo braço e me levou até a esquina, uma área mais afastada e
que ele podia falar livremente.

— Escuta aqui, sua vadia, eu sei que você ganhou uma bolada

naquele evento. Quero aquele dinheiro, considere uma compensação pelo

que me roubou junto dos juros dos anos.

— Eu não vou te dar nada. Daqui a pouco, meu namorado vai voltar e

você vai se arrepender.


— Você acha que sou idiota? Eu o vi saindo, e não tinha jeito de que

voltaria tão cedo. Eu te observo há um tempo, desde que sua mãe me

deixou ou pensou que eu simplesmente a tinha deixado ir embora. Confesso

que fiquei surpreso por ela ter me deixado e vim até aqui levá-la à força

para casa, pelos cabelos se fosse preciso, até que a vi indo para a sua casa.

Meu Deus! Ele realmente sabe onde moro. Coloquei a mão na barriga

por puro reflexo.

— Não tenho nada contra essa criança, pode ficar tranquila, não sou

tão baixo assim, mas quero a grana. A sua mãe foi uma boa fonte de renda

por um bom tempo. Aproveitei que estava carente, sentimental com a perda
do marido e me aproximei. Ganhei anos de pensão e uma vida confortável,

tudo com uma boa dose de chantagem e ameaça de morte, e ela fazia de

tudo para proteger você. Um dia, ela resolveu ter coragem e fugiu.

— Achei que vocês se amassem, do jeito tóxico de vocês. — Queria

respostas e ganhar tempo para Alec chegar.


— Amor verdadeiro é uma das moedas mais raras do mundo. Eu só

quero dinheiro, ia confrontar as duas antes, até que vi o ricaço indo até sua

casa, ele parecia ser o pai do bebê. Então pensei: “Posso pedir um resgaste,
tenho certeza de que ele vai pagar qualquer coisa”. E aqui estamos nós.

— Você é um crápula sem caráter. Estamos em público, vou embora

e, se tocar em mim, eu grito. — Eu ia me virar para ir embora, mas senti

algo frio encostando na minha barriga. Não queria imaginar o que era,

mesmo sabendo.

— Calma aí, vadia. Acha mesmo que vou te deixar ir embora assim,

tão facilmente? Assim como a sua mãe, você daria a vida por esse bebê,

então venha comigo até o meu carro, caladinha. Não tem necessidade de

alvoroço, quando chegarmos ao nosso destino, você liga para o ricaço e

pede o meu dinheiro.

Eu não tinha o que fazer, dessa vez não era apenas a minha vida em

risco. Mel estava em risco também e, de uma coisa ele estava certo, eu daria

minha vida por ela. Minha respiração ficou mais pesada, eu sentia o pânico

querer me tomar, coração acelerado e a tontura me tomava. Me mantive

firme até entrar no carro.

Sentei-me e comecei a praticar os exercícios de respiração que o Ross

me ensinou para controlar o ataque.


— Não vai ter o bebê antes do tempo, hein! Preciso das duas inteiras

para receber meu dinheiro e dar o fora.

Ele não se importava com nada, só queria dinheiro. Tomou minha

bolsa, ficou com o meu celular e me revistou para que eu não enviasse sinal

para outras pessoas. Depois disso, seguiu com o carro por várias ruas. Acho

que tentava despistar qualquer carro que estivesse nos seguindo.

Eu estava preocupada com Alec, o que ele pensaria se chegasse na

sorveteria e não me encontrasse. Tanta coisa passava pela minha cabeça

que, em um determinado momento, o ataque de pânico se foi e eu não

percebi. Ele continuou dirigindo até que o cenário ao redor mudou e ficou
mais deserto. Prédios foram substituídos por galpões, alguma área industrial

deserta. Lógico!

O carro foi estacionado, ele desceu e me puxou para fora do veículo.

— Ei, era só pedir que eu descia. Dá para ter paciência?!

— Já tive muita, sua vagabunda. Chegou a minha vez de ser feliz

aqui.

— Você acha que vai ter isso, mesmo que tivesse, não reconheceria a

felicidade de tão amargo e escuro que é. Seu nojento. — Cuspi em sua cara,

e ele me deu um tapa no rosto tão forte que fiquei alguns segundos sem

enxergar direito. A visão voltou com a dor que senti.


— É bom se comportar, na próxima vai ser pior. — A lágrima veio, e

eu prendi. Não ia chorar na frente dele. Um galpão foi aberto, uma cadeira

estava no centro do lugar. Ele me sentou e me amarrou lá mesmo. — Fica

quietinha aqui, vou ligar para o seu namorado. Em breve, eu volto e, quem

sabe, te trago um pouco de água e comida.

O portão foi fechado e as lágrimas desceram fortemente. Eu chorei de

medo, de angústia, de raiva. Senti uma cólica forte e me contorci na cadeira,

as amarras machucavam meus pulsos. Essa cólica não era bom sinal, e eu

não sabia o que fazer, me sentia perdida. Só uma pessoa veio à minha

mente, nesse momento.

— Charles, papai, essa é a última coisa que te peço: cuida da sua neta,

por favor. Não me importo comigo, mas não deixa nada acontecer com ela.

Preciso da tua ajuda, pai. — E chorei até que as forças se foram e eu caí no

sono.

Presa.

Em plena escuridão.

 
Eu não sabia quem era o homem.

Não sabia se era um assaltante que a pegou desprevenida.

O pensamento mais forte que passava na minha cabeça era um filme

de como seria minha vida sem as duas, sem Lila e minha filha. Como seria

tudo se algo acontecesse com elas e tinha certeza de que não queria viver

isso, porém, eu não podia avançar, o cara segurava uma arma e poderia

disparar a qualquer momento.

Não sei se era de verdade, mas não iria arriscar.


Tentei pensar em todas as pessoas que ganhariam com isso. Meus

inimigos, alguém que não gostasse da Lila, alguém louco o suficiente para
fazer algo assim. Nada me passou à mente, então lembrei que poderia ser

alguém da vida da Lila e uma pessoa veio à mente, seu padrasto.


Ela falou do medo que tinha dele, e a mãe fugiu recentemente. Deve

estar desesperado por dinheiro e, de alguma forma, sabe que Lila pode dar.
A entrevista que ela fez no evento, com o cheque da premiação, será que ele

viu?
Não pude continuar pensando na situação, Lila foi puxada pelo braço

até um carro ali perto. Não pensei, apenas agi e entrei no meu carro. Decidi
seguir os dois, não deixaria que sumissem facilmente da minha vista. No
caminho, liguei para o chefe da minha segurança.

— Sim, Sr. Donovan?


— Preciso que você rastreie meu carro e fale com a polícia. Avise que
o sequestro de uma mulher grávida está em andamento e estou em

perseguição.
— Sr. Donovan, essa situação é de extremo perigo.

— Eu sei, mas não posso deixá-las nas mãos de um cara que não vai
pensar duas vezes em atirar em alguém.

— Alguém está armado?


— Sim, o sequestrador está. Ainda não sei quem é, mas acho que é o
padrasto da Lila. Liga para a polícia e passa essas informações, eles

precisam intervir o quanto antes.


— Vou ligar agora. — Desliguei o celular e percebi que ele estava

dirigindo de forma a despistar qualquer pessoa, até chegar em um galpão.


Uma área industrial, conhecida pela alta criminalidade por não ter ninguém

por perto e ser deserta. Estacionei o carro um pouco longe e fui andando,
agachado e me escondendo entre alguns contêineres.

Alguma coisa aconteceu, e ele deu um tapa na Lila.


Esmurrei o chão de raiva, sangue saiu da minha mão.

Eu não consegui protegê-la como prometi. Ela deveria estar com


muito medo agora e tentando ser durona. Merda.

O cara entrou no galpão e saiu sem ela, deve tê-la amarrado em algum
lugar ali dentro. Fechou a porta e foi embora. Aguardei um pouco para
saber se voltava rápido, quando percebi que não, corri até o galpão e peguei
um dos metais retorcidos ali perto para quebrar o cadeado.

Quando abri a porta, Lila estava amarrada em uma cadeira e parecia


desmaiada.

O medo me tomou.
— Lila? Lila, meu amor, acorda, por favor. Garota, você precisa ser

forte um pouco mais para sairmos daqui. Abre os olhos, por favor. — Ela
foi retornando aos poucos. Seu rosto estava inchado do lado que levou a

tapa, passei os dedos por ali, me culpando por não estar presente quando ela
precisou.

— Alec? — Seus olhos ganharam foco, e ela ficou animada, deu um


sorriso e lágrimas desceram. — Alec, não acredito que me achou. O meu

padrasto é o culpado, ele quer dinheiro e vai te ligar para te chantagear. Me


desculpa, a culpa é minha por trazê-lo para as nossas vidas.

— Garota, não quero ouvir desculpas. Você não tem culpa da falta de
caráter dele. Agora me deixa te tirar daqui antes que ele retorne. — Soltei-a
da cadeira e ela se levantou, mas se contorceu com dor em algum lugar.

— O que houve?
— Uma cólica. Essa é a segunda de hoje, estou com medo dessa dor,

preciso ir para o hospital rápido. — Quando ia concordar, uma voz ecoou


no galpão.
— Não tão rápido, vejo que o ricaço é inteligente. Agora que está

aqui e a vagabunda deve ter contado o meu plano, basta que mande
trazerem o meu dinheiro e vocês podem ir embora. — Eu queria quebrar

todos os dentes dele só pelo tapa e por chamá-la dessa forma, mas precisava
manter a calma.

— Olha, vamos ter calma. Eu posso te dar o dinheiro que quiser, só


deixa a Lila sair daqui com o bebê, ela está com dor. Eu fico e você pode
pedir o resgate que quiser à minha família. — Lila apertou minha mão,

querendo falar que não sairia dali, eu não podia tirar os olhos dele até que
conseguisse uma resposta.

— De jeito nenhum! Ela é uma barganha ainda maior, esse bebê vale
ouro.

— Não se ela o perder por sua culpa. — O vi titubear um pouco e,


bem na hora, Lila gritou de dor novamente. O padrasto a olhou preocupado,

não queria ser culpado por assassinar um bebê, ao que parece, e essa foi
minha deixa.

Estava próximo dele e tentei roubar a arma.


Lutamos por ela por alguns minutos até que caiu longe da gente.

Tentei pegar, mas vi que ele alcançou primeiro. Voltei correndo para
proteger Lila de algum tiro e foi a melhor ideia que tive. Ele atirou na
direção dela, me joguei na frente e pegou de raspão no meu braço. Mesmo

assim, doeu muito.


Caí no chão e o sangue começou a tomar conta da minha camisa. Lila

se desesperou e, quando o padrasto dela vinha para terminar o serviço, a


polícia invadiu o galpão bem na hora. Se foi sorte ou calculado, o

importante é que fomos salvos.


— Polícia, largue a arma. — Diversos policiais com lanternas

invadiram o espaço, fiquei um pouco cego no início, mas as luzes


diminuíram quando o prenderam. Meu chefe de segurança veio correndo até

nós.
— Sr. Donovan, vim o mais rápido que pude. Esse sangue vem de

onde?
— É o meu braço, um tiro que pegou de raspão.

— Esse não, aquele ali. — Eu e a Lila olhamos na direção que ele


apontou. O sangue vinha dela, uma poça de sangue manchou seu vestido e
se formou entre suas pernas.

— Meu Deus! Mel!


— Preciso ir a um hospital, por favor — gritei para um paramédico

que veio correndo. Quando avisei que a refém era uma grávida, é protocolo
levarem paramédicos. Eles a colocaram em uma maca, e eu fui ao seu lado,

não podia pensar no pior, precisava acalmá-la um pouco.


— Meu amor, vai dar tudo certo. Vamos nos acalmar e deixar que os
médicos digam o que aconteceu. Nossa garota é forte, ela não vai embora

assim. — Por dentro, estava destruído de preocupação. A dor no braço era


nada em comparação a isso.
A ambulância chegou na entrada da urgência e uma equipe já nos

aguardava. Levaram a Lila e comecei a seguir a equipe até que uma


enfermeira me barrou.

— Eu sou o pai, preciso ficar com ela.


— Senhor, preciso que se acalme.

— Eu vou me acalmar quando estiver com as duas, me deixe entrar.


— Forcei para seguir e um enfermeiro me imobilizou.

— Senhor, se não se acalmar, precisarei aplicar um calmante. Não


conseguirá ajudá-las agora, precisa cuidar desse ferimento também. A

equipe médica já está fazendo exames e verificando o que aconteceu,


enquanto isso, me deixe ver o seu braço. Prometo que vou saber alguma

notícia sobre ela, depois.


Eu não queria receber um calmante e, também, não adiantava me

agoniar, agora era esperar, infelizmente. Fui até onde indicou, uma maca na
enfermaria, e me sentei. Ela fechou a cortina e fez um corte na minha

camisa, analisou o ferimento e deu apenas alguns pontos, foi de raspão.


Terminou o procedimento e foi saber da Lila.
Aproveitei para mandar mensagem para a mãe da Lila e para Carson.
Não queria alardear para os meninos até saber o que aconteceu.

A enfermeira voltou, e meu coração acelerou.


— Sr. Donovan, elas estão bem, o médico o espera. — A segui pelo

corredor até ver Lila, corri até ela e a abracei o mais forte que pude.
— Alec, assim vou ter falta de ar.

— Me desculpe, fiquei muito preocupado com tudo e... bem, como


estão? Você e a bebê?

— Estão bem — o médico respondeu atrás de mim. — Não se


preocupe, sei que deve ter passado por um inferno. As duas passaram por

uma situação de extremo estresse e isso causou o sangramento. A Srta.


Harrison teve um princípio de aborto, mas a bebê não sofreu nada grave.

Agora precisa de repouso e um ambiente calmo até o fim da gestação.


— Graças a Deus. Obrigado, doutor.
— Por nada. Vou dar privacidade aos dois. — Ele foi embora, e eu a
abracei novamente, dessa vez a beijei, aliviado por tudo. Estávamos mais

relaxados quando alguém abriu a porta do consultório repentinamente.


— Lila, como você está? O que aquele desgraçado fez com você?
Cadê ele? Vou matá-lo e cortar em pedacinhos agora mesmo.
— Calma, mãe. Está tudo bem, eu e a bebê não tivemos nada grave,

só repouso agora. Ele deve estar preso, foi detido em flagrante. — Minha
sogra abraçou a filha e depois me abraçou.
— Me perdoem, por favor. Eu sou a culpada, fui eu quem o deixei

entrar em nossas vidas e o trouxe até você. Tenho certeza de que me seguiu
até sua casa. Eu vou embora, não vou deixar você e minha neta em perigo.
— Mãe, se acalme. Não precisa pedir perdão por nada. Já passou e
nos livramos dele de uma vez por todas, agora tudo ficará melhor. Ele me
contou que te chantageava, você não tinha o que fazer, estava com medo.

Hoje, vendo todo o contexto, eu te entendo. E quero que esteja presente na


vida da minha filha e quero que seja uma avó para ela como teria sido uma
mãe para mim. — As duas se abraçaram, emocionadas.
Carson chegou logo depois e o atualizei do que aconteceu.

— Mano, você sabe como deixar a vida agitada. Ainda bem que nada
sério aconteceu, vou ver a alta dos dois e levá-los para casa. — Carson saiu
e me lembrei de algo que ia falar antes de toda a confusão.
— Sra. Harrison, encontrei um trabalho para a senhora. Ia falar com a

Lila antes de toda essa confusão. Investi em um conjunto de salões na área


de beleza e estética e a senhora poderá trabalhar em um deles como um
teste. Se gostarem, vão te contratar. Apenas te indiquei, o resto é com a
senhora. O que acha?

— Pode deixar, vão me amar no primeiro dia. Agradeço, Sr.


Donovan, por toda a ajuda e cuidado com minha filha.
— Pode me chamar de Alec e vamos virar a página, começar algo
novo. — Ela concordou, e Carson nos deixou em casa. A mãe de Lila ficou

no quarto de hóspedes, e ela dormiu comigo.


No outro dia, Lila já estava de pé, fazendo café da manhã e se
preparando para trabalhar de casa.
— Bom dia, Srta. Teimosia. Deveria estar na cama, em repouso.

— Bom dia, Sr. Chatice. Não vou ficar na cama com o evento tão
perto de acontecer. Passei meses lutando por essa vitória, não vou desistir
agora e nem deixar a equipe na mão.
— Você sabe que o evento é uma fonte de estresse, e o médico pediu

para evitar exatamente isso, certo?


— Sei, sim, mas estou confiante com o meu protótipo e vou controlar
a minha ansiedade.
— No primeiro sinal de algo errado, eu te levo para casa.
Combinado? — Ela assentiu, mas acho que fez só para me conformar. Ela

não iria me ouvir por nada nesse mundo. Só espero que nossa filha seja
menos teimosa.
O dia do evento chegou.
Até o meu coração estava acelerado.

Lila estava nervosa e senti sua mão um pouco inchada. Pedi para a
Érica medir a pressão dela, estava alta. Apesar disso, Lila não cedeu em
momento nenhum e subiu ao palco para apresentar o projeto.

Medo, eu tinha muito. Orgulho, tinha ainda mais.


Minha garota lutava por tudo o que queria. Ia até o fim e mostrava
que estava pronta para qualquer coisa, qualquer momento. Ela apresentou
de forma profissional e impecável. Depois que desceu do palco, a levei para
casa e não a deixei ver a apresentação dos outros. Sabia que iria aumentar a

ansiedade.
Em casa, ela assistiu a tudo.
Roeu todas as unhas que tinha e, quando o resultado saiu dias depois,
só não pulou mais porque a barriga estava enorme. A equipe inteira se

abraçou, todos emocionados, e eu estava impressionado. Comecei todo esse


projeto e esperava apenas ver até onde iríamos. Ganhar o evento foi algo
fora do que eu esperava.
A felicidade e orgulho tomou conta de mim e a beijei.

Beijei na frente de todos.


— Alec, todo mundo vai descobrir.
— Não me importo mais, quero que saibam que sou o homem mais
sortudo do mundo. Parabéns, meu amor.

Foi nesse dia em que Lila teve a certeza de que nasceu para isso. Que
tinha talento, habilidade e só restava uma chance para provar ao mundo do
que era capaz. E provou.
3 meses depois...

Florence, minha sogra, fez o que prometeu.


Todos a amaram nos primeiros dias e não demorou muito para que
subisse de cargo. Agora era a gerente do salão e estava mais feliz que
nunca. Ainda morava com Lila, mas tinham combinado que ela ficaria com

a casa quando Mel nascesse. Sim, o nome dela seria Mel.


Lila me contou como o nome surgiu, e não pude contestar. Era um
sinal do destino, e eu aceitaria, além do nome ser lindo e doce, feito a Lila.
Depois da vitória no evento, criei um departamento na empresa e

transformei o projeto em algo mais concreto. Agora, Lila era a chefe do


Departamento de Inovação para novos e jovens talentos. A equipe foi
colocada em cargos importantes do departamento e cada um iria gerenciar
uma parte dele.
Essa ideia deixou a Lila louca de felicidade.

Tudo correu bem e faríamos uma inauguração com cobertura da


mídia, souberam que a equipe ganhadora do Hackathon agora cuidaria
desse departamento e pediram para transmitir e animar outras pessoas.
O problema era o dia da inauguração.

Lila estava com nove meses de gravidez. Mel não decidia quando ia
sair e já tinha dado inúmeros alarmes falsos. Entretanto, Lila não abriu mão
da inauguração acontecer no dia marcado, mesmo com a gravidez no estado

em que estava.
— Lila, pela milésima vez, não acho que deveria ir até o palco e ficar
em pé por esse tempo. Você está quase parindo.
— Alec, sem exageros. Mel não vai sair justamente na inauguração,

vamos terminar logo e voltar para casa.


Ela fingia que eu não via suas pernas mais inchadas e seu cansaço
com o tamanho da barriga. Seguimos com a parte em que cortamos a fita e
a parte do discurso. Ela se apoiou um pouco em mim e fingiu que foi só

para subir no palco, mas acho que estava sentindo algo.


Fez todo o discurso e depois foi o meu.
Só a vi saindo rapidamente.
 

A primeira contração veio quando cortei a fita.


Me apoiei no Alec e fingi que não era nada.
Depois do discurso, não aguentei por muito tempo e saí o mais rápido

que pude.
Ainda acho que deve ser mais uma contração falsa, não queria deixar
ninguém em alerta novamente. Senti umas três e suportei, mas a quarta
quase me derrubou de dor. Acho que agora era real, essa sensação era
diferente.

— Lila, o que aconteceu? O que está sentindo?


— Érica, chama o Alec, por favor. Dessa vez é de verdade, a dor está
maior.
Ela saiu correndo e fui me segurando até uma cadeira. Senti um braço

me levando.
— Como sei que minha paciente é muito teimosa, vim até aqui só
para ter certeza de que estava bem, pelo jeito chegou a hora. — Olhei para o
lado e vi o Ross. Soltei um sorriso.
— Está para nascer alguém tão calculista como você, Ross.

— Preciso ser essa pessoa em uma família tão movida pelos


sentimentos como essa. Como estão as contrações?
— Tive uma três minutos atrás.
— Vamos marcar a próxima, já chamei a ambulância. Estão perto

daqui.
— Você chamou quando?
— No momento em que cortou a fita. Acha mesmo que não estava de
olho?
— Às vezes me assusta esse seu jeito tão frio e calculista, mas foi um
timing perfeito. Obrigada.
— Por nada. — Uma nova contração.
— Sete minutos entre contrações. Dá tempo de chegar no hospital.

A ambulância apareceu na mesma hora em que vi Alec correndo até


mim.
 

Não sei quem estava mais nervoso, eu ou Lila.


Morria de medo com as histórias de mães que morriam na mesa de

parto com o bebê e isso rodeava minha mente dia e noite, mas essa era a
hora de apoiá-la.
Chegamos no hospital e fomos direto para a sala de exames. A
obstetra fez tudo o que precisava para confirmar se era o momento e

realmente Mel estava nascendo. Meu coração acelerou. Somente nós dois
ficaríamos na sala.
Eu não tinha noção de como era o processo. Somente Carson passou
por isso, e ele me disse que era um momento único para cada pessoa, não
tinha como explicar. Eu estava nervoso, suava frio, tentei me controlar e
nada conseguia apagar da mente que o momento chegou.
A cada vez que as contrações diminuíam com o tempo, eu sofria ao

ver Lila passando pela dor. Não sei se teria forças para passar por aquilo,
por isso precisava estar presente e dar todas as forças que ela precisava.
Quando o tempo entre as contrações ficou bem pequeno, a médica sinalizou
que chegou a hora.
— Não, calma, não. Eu não tenho forças para isso. Não consigo,

Alec. — Lila chorava com medo de tudo, e eu entendia perfeitamente o que


ela passava.
Eu me sentei atrás dela e pedi que se encostasse em mim.
— Meu amor, eu estou aqui com você. Pode apertar minhas mãos e

usar minhas forças quando faltar as suas. Vamos passar por isso juntos, a
cada minuto. Você não está sozinha. — A médica sinalizou que ela
precisava empurrar, e ela fez o máximo que podia. Diversas vezes, uma
atrás da outra.

— Já estou vendo a cabecinha dela, vamos para a última, Lila.


Empurre com todas as forças que tiver — a médica falou. Lila estava
deitada em mim, ofegante, cansada e suada.
— Chegou a nossa vez. Essa é a primeira de inúmeras vezes que

vamos ser fortes pela Mel, vamos, meu amor. Juntos. Um, dois, três... —
Lila empurrou com tudo o que tinha e apertou minha mão com todas as
forças. Eu já não sentia meus dedos e isso não me importava.
Mel saiu.

A médica a levou até a maca para limpeza e cuidados iniciais.


Não ouvi o choro.
Meu coração parou.
Respirar era complicado.

Lila apertou ainda mais minha mão pelo mesmo medo que eu.
Um choro, atrás de outro ainda mais forte.
Mel berrou com todas as forças que tinha, e eu chorei todas as minhas
lágrimas. Minha filha nasceu e Lila estava bem. Esse era o maior presente

da minha vida. A médica nos deixou vê-la antes que fosse para o berçário.
— Mel, minha linda, bem-vinda ao mundo. — Ela se acalmou no
momento em que chegou nos braços da mãe. Eu não sabia o que dizer, só
fazia chorar, emocionado com tudo aquilo. Uma cena que nunca pensei que

viveria e que sentiria. Toquei em sua mãozinha e ela agarrou meu dedo, eu
sorria como uma criança boba, vendo algo tão lindo.
Lila foi levada ao quarto, e Mel foi para o berçário.
Avisei que iria em casa buscar algumas roupas, mas que logo voltaria.
Elas estavam em boas mãos.

 
 

O parto foi extremamente cansativo.

Cheguei ao quarto exausta.


Quando o Alec falou que iria em casa, queria que ele ficasse, mas
precisava dormir um pouco. Mel, em breve, voltaria para mamar, e eu tinha
que estar descansada. Dormi um pouco e acordei com a enfermeira a

trazendo. Ela estava linda no berço, forte e com os olhos do Alec.


— Chegou a hora da comidinha, mamãe. Quer ajuda? — Agradeci,
não tinha muita ideia do que fazer, mas foi fácil. A própria Mel achou o
caminho do peito. Depois que terminou, a colocamos no berço novamente e

a enfermeira saiu. Estava bem desperta.


Alguém bateu na porta e falei para entrar. Era Carson.
— Estou incomodando?
— Nada, pode entrar, Carson.
— Não resisti e corri para cá assim que soube que essa coisa linda

chegou ao mundo. Trouxe presentes. — Ele trouxe um bicho de pelúcia


para a Mel e flores, para mim.
— Obrigada. Ela vai amar o ursinho quando crescer mais um pouco.
Quer pegá-la no braço?

— Posso?
— Carson, você é a pessoa mais experiente nessa família para lidar
com crianças. Com certeza, pode. — Ele sorriu com o que falei e pegou a
Mel. Carson tinha um jeitinho tão prático de pegar o bebê e acomodar no

braço. Realmente fez muito isso.


— Olá, sobrinha linda! Chegou bem ao mundo? Já veio abençoada,
como um milagre, hein! Titio vai mimar muito. — Ele conversando com ela
era incrível. Veio até a ponta da cama e sentou-se com ela no colo.

— Durante o parto, Francine quase desistiu na metade do caminho.


Três filhos de uma vez, levou qualquer força que ela tinha; eu não tinha
para um. Quando a vi chorando, falando que não conseguiria mais, sentei-
me atrás dela e a ajudei com as forças que eu tinha. Nunca tinha visto

ninguém fazendo isso, mas senti na hora que era o certo, era o que ela
precisava. Ver a Mel aqui, com você, me traz uma grande nostalgia. Parece
que estou vendo a Francine com os bebês no braço. Um momento que eu
voltaria com imenso prazer.
Carson contou exatamente o que Alec fez. Acho que foi instintivo

também. Ele tinha um brilho de saudades no olhar ao falar da Francine,


como se conseguisse viver um pouco do passado agora. Tinha pena dele,

por tudo o que aconteceu.


Alguém bateu à porta novamente e ouvi a voz do Alec. Ele entrou e
viu  Carson.
— Carson, chegou antes de mim?
— Você demorou, perdeu o lugar no coração da minha sobrinha.

— Nada de querer roubar a minha filha, você já tem quatro. — Eles


sorriram, implicando um com o outro, e Carson deu a Mel para o Alec, que
a pegou um pouco sem jeito ainda.
— Mano, eu realmente estou feliz e emocionado por você e pela Lila.

— Ele tinha os olhos marejados. — Lembro que, um dia, conversamos e


você me disse que sofria por saber que nunca teria um filho. Hoje, com esse
pequeno milagre, vemos que o destino é incerto e tudo é possível. Alec,
essa é sua chance de ser feliz, agarre-a com tudo e não perca nenhum

momento, nunca se sabe o dia de amanhã. — Senti uma pontada de tristeza


pelo que ele perdeu.
— Não se preocupe, mano. Eu vou dar valor a cada minuto dessa
minha nova vida. — Carson o abraçou e se despediu de mim. — E vou te

incomodar muito ainda por conselhos, se prepare.


— Vou cobrar cada minuto. — Ele saiu sorrindo, e Alec perguntou
ainda uma coisa a ele.
— Carson, sabe do Michael?

— Infelizmente, não. Vou procurar melhor. — Alec concordou, e ele


se foi. O pai coruja ficou com a Mel no braço. Abri espaço do meu lado
para que sentasse comigo.
— Como está se sentindo?

— Como se tivesse sido atropelada por um caminhão, mas feliz por


tudo. Somos pais de uma menina linda.

— Somos, sim. Lila, acho que já te falei isso, mas te agradeço demais

por me dar esse presente. Sei que é a nossa filha, mas eu nunca pensei que
viveria esse momento, você me deu essa chance e permitiu que tudo isso

acontecesse. Muito obrigado, de verdade.

— Não precisa falar nada, meu amor. Sei que vamos viver
intensamente tudo com a Mel e sinto que você será um pai tão bom quanto

o meu.
— Sim, serei. A partir de hoje, começa a minha vida. Hoje, me tornei

pai e ganhei uma família incrível. O destino me deu um grande presente e

vou dar valor a ele todos os minutos da minha vida. Hoje, eu ganhei um
motivo de vida, mais um deles. Minhas duas garotas.
 

 
MEL COM 6 MESES...
 

Terminei de dar de mamar a Mel e me sentia exausta. Sentei-me na

cadeira de balanço para relaxar um pouco.

Ela dormia feliz no meu braço. Nada incomodava seu sono, era uma
garota feliz. Eu observava aquela bebê maravilhosa e me lembrava de todo

o nosso caminho até aqui. Entre noites maldormidas, choros incessantes,

sorrisos gostosos e um amor incondicional, eu nunca trocaria nada deste

momento.
Não posso negar que tive bastante ajuda.

Os Donovan não desgrudaram de nós nenhum minuto. Fizeram uma

grande força-tarefa para nos apoiar a todo momento e minha mãe era quem

coordenava tudo. Ela estava empolgadíssima com a chance de ser avó.

Florence feliz, achei que nunca mais veria. Se destacou no emprego e


cresceu rapidamente, agora era responsável pela sua própria loja. Pediu um

empréstimo para abrir o seu salão e ia muito bem. Eu me orgulhava da

mulher que ela lutou para ser e da família que ela tentou manter.

Piper estava mais animada ainda.

Se inscreveu para fazer parte da Orquestra da Juilliard e foi aprovada.


Agora vai rodar o mundo como uma das violinistas secundárias, mas logo

chegará nas principais, do jeito que ela é persistente, não tenho dúvida.

— Minha linda, nós somos abençoadas. — Seu sonho era feliz, pois

um sorrisinho tomou a sua boca. Encostei a cabeça na cadeira e cochilei um

pouco, fui acordada com alguém me chamando.

— Ei, garota, vamos para a cama? — Alec tinha chegado.

— Você demorou hoje, projeto complicado?


— Um pouco, mas deu tudo certo. E as minhas garotas, como

passaram o dia?

— Eu estou sem energias, a Mel tem uma bateria infinita. Nem sei

como consegui que dormisse.


— Amanhã ficarei em casa e vou cuidar dela para que descanse um

pouco. — Eu o abracei e depositei um selinho em sua boca.

— Muito obrigada, preciso.

Ele foi tomar uma ducha e estava falando algo, mas minha mente não

ouvia mais nada, apenas queria descanso. No outro dia de manhã, acordei

com um recado na cama.


“Levei a Mel comigo, não se preocupe. Preparei um dia de SPA somente

para você,  Fernando vai te levar até o local. Relaxe e goze.”

Alec não perdia o momento para falar algo com tom de safadeza.

Não posso negar que esse foi o melhor presente que ganhei nos

últimos meses. Meu celular vibrou e duas mensagens chegaram. Uma era da

Piper, perguntando se eu queria ajuda hoje, e outra da Abbie, mostrando a

roupinha que comprou para a Mel. Mantivemos a amizade e, hoje, a

entendo um pouco mais, nos tornamos amigas com o tempo.

Respondi as duas e fui tomar uma ducha. Precisava aproveitar o dia

ao máximo.
Fernando me levou até um SPA particular que ficava à beira-mar. Eu

me tornei uma pessoa extremamente rica. Sei que me tornei por estar com

Alec e pelos meus projetos, mas nunca pensei que chegaria nesse nível. O

mundo dá voltas mesmo. Meu padrasto foi condenado, e eu, finalmente,

tenho uma vida feliz.


Uma pessoa abriu a porta do carro.

— Bom dia, Sra. Donovan...

— Na verdade, é Srta. Harrison.


— Oh, me desculpe, Srta. Harrison. Seja bem-vinda ao nosso Resort

SPA, o Sr. Donovan deixou tudo reservado para a senhorita. Peço que me

acompanhe — ele falou isso com uma graciosidade e um sorriso no rosto

que me fazia esquecer qualquer problema, o lugar parecia uma fonte de

felicidade e relaxamento. Eu mergulhei sem nem pensar duas vezes.

Dormi.

Depois de massagem, limpeza facial, relaxamento e tantos outros

serviços que me deixaram leve como uma pluma, confesso que peguei no

sono. Acordei com a massagista me avisando que estava na hora do jantar e

minha roupa estava pronta, à minha espera.

Ainda estava confusa por ter despertado há pouco tempo, mas tenho

certeza de que a ouvi falar de uma roupa e um jantar. Quando ia perguntar,

ela saiu da sala de massagem. Olhei para o lado e ali estava um lindo

vestido marsala. Me aproximei e percebi o quão lindo era, bordado e

decotado, cairia perfeitamente em mim.

— Bem, já estou aqui mesmo, não custa nada ver o que virá.

Me vesti e calcei um par de sandálias que estava ali perto. Quando saí
da sala, uma pessoa, sorridente, como todos do resort, me conduziu até o
píer do lago. Lá estava a estrutura mais linda e delicada que já vi, um

gazebo com apenas uma cadeira no centro.

— Desculpe, me disseram que era um jantar. Por que tem apenas uma

cadeira?

— Siga o caminho e você descobrirá em breve. — Algo bem

enigmático. Me veio à cabeça Alec, o que será que ele estava aprontando?

Segui até a cadeira e encontrei um tablet, nele tinha um recado: ME

LIGUE.

Sentei-me na cadeira, virada para o lago, e fiz exatamente o que disse.

Um vídeo começou a passar na tela, fotos nossas do tempo em que nos


conhecemos, do evento, dos dias que passamos juntos. As fotos foram

passando e uma música instrumental romântica tocava no fundo. De

repente, fotos em que eu estava dormindo tomaram conta da tela e um

número começou a passar. Elas passaram rapidamente por toda a minha

gravidez e o nascimento da Mel.

Meus olhos estavam cheios de lágrima.

Não sei o que ele estava aprontando com isso, mas era um dos

presentes mais lindos que já vi. Quando o número chegou a 365, as fotos

pararam e um vídeo dele falando apareceu.

“Lila, meu amor, minha garota,


Eu não tenho como descrever em palavras tudo o que você fez em

minha vida.

Você me transformou, me deu um motivo para voltar a viver e ter

orgulho em estar vivo. Me mostrou como a vida deve ser vivida com sua

garra e coragem e me deu o mais belo de todos os presentes, a nossa filha, a

nossa Mel.

E ainda me permitiu entrar em seu coração.

Essas fotos são um pequeno pedaço da nossa história. Quis te

perguntar isso há muito tempo, mas não queria que pensasse que era por

causa da gravidez ou qualquer outro motivo.

Quero que saiba que o que vou te perguntar é fruto de todo o amor

que carrego comigo, todo o sentimento de orgulho, desejo, paixão e

admiração que tenho por você. Que tenho por aquela garota que cuidou de

mim quando nos conhecemos.

Te amo muito mais do que você imagina.

Agora, me faz um favor? Se vire. Beijo!”

O tablet apagou e me levantei para me virar e descobrir o que mais

me esperava.
Alec estava ajoelhado, bem na minha frente, com um anel apontado

para mim.
— Meu amor, você quer se casar comigo? — Levei a mão à boca, a

respiração falhou naquele exato momento. Lágrimas rolaram pelo meu

rosto, ele estava certo em esperar, ele me conhecia. Hoje sei o quanto ele

me ama e tenho certeza de quanto o amo.

— Sim, mil vezes sim! — Ele se levantou e me rodou no ar; eu o

abracei com todas as minhas forças, não o queria largar jamais. Me deu um

beijo enorme e colocou o anel em meu dedo.

— Para ficar perfeito, só falta um café com...


— ... duas colheres de creme e um cubo de açúcar. — Um dos

funcionários do resort se aproximou com o café em mãos. Eu não me


segurei e gargalhei com aquilo. — Eu sei como fazer as coisas

perfeitamente.
— Tenho que concordar. — Dei um beijo e o abracei enquanto

saboreava o café.
— Que venha uma vida inteira pela frente, Alec. Juntos, podemos

qualquer coisa.
O dia seguinte foi pura comemoração.

Piper enlouqueceu com a novidade e já pediu dispensa para estar


presente como minha madrinha. Ela falou que organizaria tudo à distância.
Alec já tinha marcado a data quando fez o pedido, então tínhamos pouco

tempo para organizar tudo.


Os trigêmeos se dividiram em tarefas, Abbie me ajudou com a
escolha da decoração, minha mãe disse que o seu salão cuidaria de tudo em

relação à preparação da noiva e das madrinhas. O pessoal da empresa


adorou a notícia e convidei a todos, inclusive a Érica, que percebi conversar

com o Joey um dia em que ele foi à empresa falar com o Alec, pareciam se
conhecer bem.

Ninguém deixou que me preocupasse muito com as coisas, eu apenas


escolhia e dava a palavra final em tudo. Alec fez questão que eu escolhesse
o que eu quisesse, então virei princesa por alguns meses, me deixei ser um

pouco. Minhas madrinhas seriam Piper, Fernanda, Érica e Abbie, tinha


poucas amigas ali. Já os padrinhos seriam os trigêmeos, para ninguém

brigar, e o médico que cuidou do Alec, o dr. Richard.


A cerimônia seria pela manhã, com o café e o vinho como tema da

decoração e do casamento. Duas bebidas que se completam, maravilhosas,


cada uma com suas particularidades, mas que podem harmonizar

perfeitamente.
Carson não entrou como padrinho porque tínhamos outros planos para

ele. Chamamos ele e Piper para falarmos reservadamente com ambos,


enquanto Mel dormia um pouco.

— Carson, mano, você não foi padrinho, porque, além de ter tido três
filhos que precisam fazer tudo juntos, escolhemos você e Piper como
padrinhos da Mel. São as duas pessoas que mais marcaram nossas vidas e
fazemos questão de entregar nosso bem mais precioso aos cuidados dos

dois. Piper, sei que você será a perfeita representante da sua mãe aqui —
Alec falou, e Piper ficou histérica, pulou no meu pescoço quase chorando

de emoção. Carson abraçou Alec e a mim, visivelmente emocionado.


— Nem sei o que dizer aos dois. É uma honra para mim e, tenho

certeza, para minha filha também por sermos responsáveis pela Mel. Estou
muito emocionado e sei que a Francine está desejando muitas coisas boas a

todos nós, onde quer que esteja. Vocês merecem toda a felicidade do
mundo.

Agradeci a  Carson cada palavra.


Para mim, ele era o pai que nunca tive. Fico muito feliz que ele

também faça parte da vida da minha filha.


O grande dia chegou.

Como costume, ficamos separados o dia todo, apenas nos veríamos na


cerimônia. Estava ansiosa, um friozinho na barriga, mas gostava dessa
ansiedade. Minha mãe me deu um dia de noiva perfeito, Mel ficou comigo

o tempo todo, um dia das mulheres. Quando vesti o véu branco que cobria o
meu corpo, aquela roupa, aquele manto...

Eu me senti uma princesa.


Uma lágrima caiu do meu olho esquerdo.
Dizem que é a lágrima conectada aos sentimentos, ao amor.

Naquele vestido, percebi que eu me tornei uma princesa, me senti


uma princesa pela primeira vez, não apenas por ter encontrado o meu

príncipe real, mas por ser amada como eu realmente mereço, por eu me
sentir merecedora de tudo e qualquer coisa boa no mundo.

É isso que quero que minha filha sinta.


Foi isso que meu pai queria que eu sentisse.
— Obrigada, pai. Obrigada, Char. Agora posso seguir em frente.

Piper entrou na sala.


— Lila, vamos que já estamos atrasadas. Você está chorando? Guarda

as lágrimas para o altar, amiga. Vou chamar alguém para retocar a


maquiagem e seguirmos para a capela.

A maquiadora retocou tudo e fui de carro até o local do casamento,


para a grande entrada da noiva. Atrasei um pouco, como toda noiva no seu

dia, mas desci do carro deslumbrante. A grande marcha nupcial no ar, as


portas se abrindo para que eu seguisse no corredor e eu só pensava em vê-lo

novamente.
As portas se abriram por completo.

Nossos olhos se encontraram, e meu coração acelerou.


Ele estava magnífico no altar. Um sorriso ganhou seus lábios e os

meus também. Não era a primeira e nem a última vez que nos veríamos
assim, que nos desejaríamos com essa intensidade, mas era única.

Caminhei até o altar e seus olhos logo se encheram de lágrimas, Alec


chorou ao me ver se aproximando.

— Você está incrível, minha garota.


— Você está gostoso, meu futuro marido.

Nos viramos para o padre que celebrou nosso casamento. Nossas


mãos unidas e nossos corações entrelaçados, o nosso amor proclamado

entre a terra e os céus. Quando a tradicional saída dos noivos terminou,


fomos direto para o local da festa. Brindamos a felicidade, e que ela perdure

até o fim das nossas vidas.


Cumprimentamos a todos. Estávamos terminando de conversar com

um casal de amigos quando Abbie se aproximou com o seu acompanhante.


— Vim desejar felicidades aos noivos.

— Obrigada, Abbie. Agradeço muito por ter me ajudado com a


decoração.
— Não foi nada, me diverti bastante no processo. Queria aproveitar

para apresentar para vocês o Robert, meu namorado. — Fiz um olhar de


surpresa. Não pensei que Abbie teria alguém para chamar assim.

— Prazer em te conhecer, Robert. Estou muito feliz por você,


Abigail. Desejo felicidade aos dois. Estão juntos há muito tempo? —

Robert cumprimentou Alec com um olhar orgulhoso por ter esse título.
— Quatro meses. Estava tentando manter em segredo o máximo
possível, ele é modelo e não queríamos essa repercussão. — Robert falou

que pegaria alguns drinks para nós.


— Abbie, fico feliz por você ter investido em algo de verdade.
— Confesso que vocês foram a minha fonte de inspiração. Quando vi

o quanto o Alec mudou ao se abrir para alguém, senti uma vontade de sentir
isso também. Conheci o Robert e me permiti ser feliz, ele é incrível e estou

curtindo o momento.
— Aproveite, sei que será muito feliz.

— Obrigada por tudo, Lila. Por ter sido tão compreensiva comigo, sei
que nosso início não foi dos melhores, mas quero que sejam muito felizes.

Eu vim me despedir, vou viajar com o Robert para Milão hoje ainda. — Ela
nos abraçou e disse que, quando voltasse, ia marcar um café, depois

encontrou o Robert para o drink.


— Vejo que somos fontes de inspiração para o amor, esposa.

— Fico muito feliz por isso, marido. Tem algumas pessoas nessa
família que desejo “contaminar” com esse vírus. Espero que Carson seja o

próximo e tem os trigêmeos também.


— E a Piper?

— Talvez demore um pouco, a sua alma gêmea precisa ter uma


personalidade que desafie a dela.
— Vejo que já mapeou a família toda, esposa cupido.
— Mas não se preocupe, sempre vou ter todos os meus olhares para

você. — O beijei, e ele me abraçou. Observamos o entorno e estávamos


muito felizes, de verdade. Eu não me cansaria de repetir essa palavra...

FELIZ...
Não conseguimos dormir muito, pois, no outro dia, era o batizado da

Mel.
Todos nos encontramos na mesma capela do meu casamento, e seria o

momento da nossa filha. Agora eu tinha novas memórias e todas elas


complementavam a minha ideia de família.

O padre batizou a Mel e os padrinhos estavam conosco.


Piper nunca chorou tanto na vida, até mais do que no meu casamento.

Acho que perdi o lugar prioritário em seu coração. Após o batismo,


seguimos para a mansão.
— Gente, estou super cansada, não sei como vocês estão aguentando
— Piper falou, ainda de óculos escuros dentro de casa por causa da

claridade.
— Você se empolgou demais na bebida, amiga. Deve estar cansada.
— Estou exausta, ressaca pesada e nem posso descansar, meu voo sai
daqui a algumas horas. Acabaram as minhas férias.

— A paz vai reinar novamente nessa casa — Joey falou.


— Olha quem fala! Vocês dois não conseguem ficar sem gritar um
minuto — Ross retrucou os irmãos.

— E começaram a agir feito crianças. É passar por essa porta e o


túnel do tempo acontece — Alec falou, e todos sorrimos. Estávamos nos
divertindo até que Carson se afastou para atender uma ligação. Olhando de
longe, ele parecia preocupado.
— Lila, você acha quem de nós três dará mais trabalho para a esposa?

— Chandler me perguntou.
— Os quatro. Até a Piper é difícil. — Ela reclamou e a briga
continuou.
— Esse é o nossos felizes para sempre, esposa.

— Não, marido. Todos os dias serão nossos felizes para sempre, meu
príncipe real.
— Obrigada por me dar tudo isso, minha rainha.
Ele me chamar assim me faz sorrir. Nos beijamos e eu faço uma prece

silenciosa agradecendo a Deus pela certeza que sinto em meu coração de


que eu serei plenamente amada, pois essa certeza eu vejo nos olhos do meu
Alec e sei que ele também vê nos meus.
 
 

 
SÉRIE FAMÍLIA DONOVAN
LIVRO 2
 

 
 

Um momento.

Uma chamada.

Bastou apenas isso para trocar um momento feliz por algo de extrema

preocupação.
Estava conversando com a família na mansão quando meu celular

vibrou. Olhei o nome na tela, Alexsandra Collins. Na mesma hora, atendi e

me afastei de todos.
— Alô?
— Carson?

— Alex? É você? Aconteceu alguma coisa?

— Bem, sim e não. Me desculpa te incomodar no dia do batismo da

sua sobrinha, posso te ligar outra hora se preferir — dizia, mas sua voz

aparentava medo e urgência.


— Pode falar agora, estou disponível. — Ouvi uma voz masculina ao

fundo e o celular ficou um pouco abafado, como se ela estivesse

escondendo o celular. A voz lhe perguntava o que estava fazendo, e ela

dizia que apenas lendo documentos, fiquei em total silêncio.

Após alguns minutos, ouço um tapa e um gemido de dor feminino, era


a Alex. Trinquei os dentes e fechei o punho com raiva, não poderia esboçar

nenhum sinal para não complicar ainda mais a situação.

A voz masculina falou que tinha lhe chamado, e ela não havia

respondido, que era uma secretária executiva terrível e, por isso, merecia

ser disciplinada para não errar novamente. Que a próxima vez seria pior.

Tive medo por ela.

Passos foram se distanciando e o telefone voltou a ter um som limpo.


— Carson, está aí? — Sua voz estava chorosa.

— Estou. Onde você está? Posso te tirar daí agora.

— Não! — respondeu, assustada, na mesma hora. — Não quero que

você se envolva dessa forma e complique a sua carreira por minha causa.
Só queria te pedir para me recomendar para outra pessoa, uma carta de

recomendação de um diplomata tem um grande peso.

— Você não pode deixá-lo se safar assim. Precisamos denunciar isso

que ele te fez, isso é crime.

— Carson, eu não tenho voz contra o meu chefe, pois é uma pessoa

importante acima até de você. Quem vai acreditar em mim?


— Eu acreditei.

— Você é uma das poucas pessoas, se não a única, naquele meio, que

realmente se preocupa com o ser humano, independente de classe, dinheiro

ou qualquer idiotice criada pelo homem. Por isso confio no que diz, mas

isso vai além do que você pode alcançar.

— Alexsandra, precisarei ir até aí novamente? — Ouvi a voz

masculina, o chefe dela ao longe.

— Já estou indo! — respondeu de volta. — Por favor, faça a carta e

deixe que eu sigo a minha vida, não quero te trazer problemas.

— Alex... — O telefone foi desligado. Tentei retornar, e não tinha


sinal.

— Merda! — praguejei baixinho, não queria preocupar meu irmão e

a família em um dia tão especial, mas eu não conseguiria ficar calado por

muito tempo. Uma das coisas que mais me irritavam era alguém achar que
podia dominar a vida de outra pessoa, principalmente quando envolvia

violência.

Tinha que admitir, ela mexia comigo de uma forma que eu não
imaginava. Eu gostava de ajudar as pessoas, mas não me arriscaria assim,

demais, por uma estranha. Algo nela, nos seus olhos, um segundo que

nossos olhares se cruzaram e nunca mais consegui esquecê-la.

Precisava ajudar.

— O que Alec faria? — Ele gostava de arriscar, momentos

desesperadores pedem medidas drásticas. Tenho certeza de que Alec

armaria uma fuga. Fui até ele.

— Alec, preciso falar com você. — Nos afastamos da família. — Não

se assuste e aja despreocupadamente. Vamos sequestrar uma pessoa para

libertá-la.

— Carson, isso é algum tipo de piada? — Ele observa minha

expressão e não leva nem dois segundos para entender que eu não

brincaria com algo assim. — O que houve? Você se envolveu em algo que

eu deva me preocupar? Está correndo algum risco?

— Estou, sim. Preciso da sua ajuda.

— Percebe que você me disse que um crime de sequestro vai provar

uma liberdade? Não faz sentido.


— Alec, lembra que tudo que você me pedia para confiar, eu

confiava?

— Lógico.

— Confie em mim, por favor. — Ele me olhou como se analisasse se a

sua decisão seria um risco ou uma estupidez.

— Essa pessoa realmente vale a pena?

Eu não sabia explicar, não sabia dar uma resposta para essa

pergunta, porque nem eu tinha certeza do quanto ela era importante. Fui

sincero.

— Não sei o quanto ela é importante, mas tenho 90% de certeza que
ela é o mesmo que a Lila foi para você no início. O botão de reiniciar,

aquele choque necessário para voltar à vida. Ela é isso para mim. — Ele

deu um sorriso e balançou a cabeça, pensando que seria uma loucura. Ele

aceitou.

— Lila, meu amor. Surgiu uma emergência no trabalho do Carson, e

eu preciso ajudá-lo. Tem algum problema? Prometo voltar o mais rápido

que puder. — Ela simplesmente acenou para irmos com um sorriso nos

lábios também. Mais tarde, eu entenderia o porquê.

— Qual motivo te fez aceitar?

— Seus olhos.

— Meus olhos?
— Você tinha o mesmo olhar que imaginei ter no dia em que conheci

a Lila. Esperança. E porque você jogou a carta do irmão que embarca nas

loucuras. Sempre vou estar com você, mano. Ainda espero que  Michael

apareça. — Ele foi convidado para o casamento e o batizado, mas não

apareceu. Estava preocupado.

— Um problema de cada vez. Vamos sequestrar uma garota.

— Isso é errado de tantas formas... Vamos.

Nunca imaginei que diria isso na minha vida.

 
 

CONTINUA...
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ME APAIXONANDO PELO MEU CHEFE


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CLICHÊ CHEFE E SECRETÁRIA;

AGE GAP;
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ENEMIES TO LOVERS.

MALCOM CAMPANELLI é o chefe que ninguém quer ter.

De que adianta um salário obscenamente alto se, para recebê-lo, é preciso passar 24 horas do
dia à disposição do homem mais insuportável e grosso do mundo?

SAVANNAH ARMSTRONG  precisava muito daquele emprego. Precisava muito mesmo, já

que estava prestes a ser despejada por estar devendo quatro meses de aluguel.  Daquela entrevista,

viria a resposta se ela teria ou não um teto sob sua cabeça quando voltasse pra casa naquele dia.
Mas nada a preparou para o lindo, másculo e perfeccionista CEO Malcom Campanelli no auge

de seus 36 anos, nem mesmo o treinamento que recebeu secretamente da assistente idosa dele, que
está louca para se aposentar, mas precisa de uma substituta que aceite ter o diabo em pessoa como

chefe. Tudo que Savannah faz parece estar errado. O chefe a ignora ou a crítica, quando não faz

questão de dizer que ela não está fazendo direito o trabalho para o qual está sendo paga, gentil como

um cavalo, dando coices. E todos que trabalham na Diamantes Campanelli parecem ter medo do

bilionário.

Para piorar, a mente de Savannah parece ter vontade própria agora e vive bombardeando a
moça de vinte e quatro anos, nos momentos mais inapropriados, com cenas muito eróticas dela e do

chefe, e Savannah nunca se sentiu assim por nenhum homem antes.

INSUPORTÁVEL.

TIRANO.

INTIMIDADOR.

O PRÓPRIO DIABO ENCARNADO.

É isso que quem conhece Malcom Campanelli pensa a seu respeito. Ele intimida seus
funcionários, que evitam, a todo custo, cruzar o caminho do CEO mais temido e respeitado de Nova

Iorque.

Malcom foi criado para comandar um império, e é o que ele faz de melhor. Ter o total controle
de tudo sobre sua empresa e sua vida é o que ele mais preza. Um chefe que não admite falhas. Ele

nunca agradece. Nunca pede desculpas. Nunca diz por favor.Mas, para infelicidade de Malcom,
sua assistente pessoal, a insubstituível senhora Marshall, está decidida, dessa vez, a não adiar mais

sua aposentadoria e o obriga a entrevistar e escolher uma substituta. É assim que Savannah
Armstrong entra em sua vida. E ele torna a vida da moça com sotaque sulista um verdadeiro inferno,

mas se surpreende com a forma que ela diferente de todos nunca de intimida perto dele.
O que Savannah não entende foi como aceitou a proposta de fingir ser namorada de
Malcom Campanelli para a mãe, que ele reencontrou muito doente e que não via desde menino.

Mas fingir estar perdidamente apaixonada por seu chefe insuportável depois de conviver com o
verdadeiro Malcom Campanelli, que mais ninguém conhecia, acaba deixando de ser fingimento
depois da primeira noite de amor dos dois.
É quando Malcom percebe que não está mais no controle de seu coração.

ATENÇÃO: Este livro contém cenas de sexo explícito e linguajar inapropriado para menores
de 18 anos. Contém gatilhos, palavras de baixo calão e conduta inadequada de personagens.
AVISO: Este é o livro 1 da Série Família Campanelli. O livro 2 contará a história de ARTUR

CAMPANELLI.
Todos os livros da série poderão ser lidos separadamente, pois se tratam de histórias

independentes
 

 
UMA FAMÍLIA INESPERADA PARA O CEO:
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Arturo não acreditou na única mulher que o amou incondicionalmente. Ele humilhou e
expulsou Natália de sua vida. Três anos depois acabou descobrindo que é pai e agora ele a quer de
volta a qualquer preço.
ARTURO BRUSMAN  comanda seus negócios com mãos de ferro e é conhecido por sua

busca pelo perfeccionismo em tudo na vida. Um homem que se fez sozinho e, por ter conhecido a
extrema pobreza, entende o valor de cada centavo que ganhou e não aceita nada que não se enquadre

em seus padrões exigentes. Contudo, o nome do bilionário que construiu um império na indústria de
software aos trinta e quatro anos também ficou famoso após a revelação do teste de paternidade de

sua ex-noiva, uma exuberante modelo internacional, ter dado negativo e a notícia vazar para a mídia.

NATÁLIA MEIRELLES era a assistente da assistente do CEO Arturo Brusman e quem, na

verdade, fazia todo o trabalho e nunca recebia o crédito. A moça tímida com excelentes ideias e que
era extremamente competente em tudo que fazia foi injustamente demitida. Natália nunca se

importou em trabalhar até depois do horário até engravidar e se tornar mãe solo. No entanto, após

uma grande injustiça, Natália acabou sendo demitida quando mais precisava do emprego.
Anos se passam e o acaso faz com que o filho de três anos de Natália e o chefe que a humilhou

publicamente ao mandá-la embora, além de garantir que ela não conseguisse um bom emprego na

cidade, fiquem cara a cara. Arturo Brusman nem precisa fazer as contas entre o dia da realização de

sua vasectomia e a idade daquela criança que é sua cópia em miniatura para saber quem é o pai
daquele garotinho.

Para não perder a guarda do filho, Natália aceita os termos do contrato e se casa com o homem

mais controlador e detestável que conheceu em sua vida. É assim que ela se torna a esposa do único
homem a quem entregou seu corpo e seu coração, mas que, ironicamente, nem se lembrava da noite

em que tudo aconteceu. Todavia agora é ela que não o quer e, por mais que tenha concordado em

usar seu sobrenome, na cama de Natália, Arturo não é bem-vindo.


ATENÇÃO: Este livro contém cenas de sexo explícito e linguajar inapropriado para menores

de 18 anos. Contém gatilhos, palavras de baixo calão e conduta inadequada de personagens.

AVISO: Os outros dois livros da Série Família Brusman contarão as histórias dos irmãos

Anton e Gustavo. Poderão ser lidos separadamente, pois se trata de histórias independentes.
 
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"Eu vou matar o meu chefe! Isso mesmo, irei matá-lo, mas antes, preciso salvá-lo."
MEREDITH BYRNE convive diariamente com um homem lindo, inteligente, sedutor e...Que

a deixa maluca: seu chefe, NOAH O´DONNEL. Eles não se dão bem, mas precisaram aprender a

tolerar um ao outro.

Por vezes, Meredith se vê forçada a apagar incêndios causados por seu chefe que parece ter
satisfação pessoal em arruinar sua paz de espírito. A moça de vinte e nove anos jamais teria aceitado

aquele emprego, se não fosse um pedido feito pelo CEO da Petrolífera O' Donnel, um amigo muito

querido.
Mas ela foi alertada que nenhuma assistente durou mais do que algumas semanas trabalhando com

Noah, porque ou elas acabavam se demitindo ou na cama dele.

Uma coisa que Meredith não pode negar é que o miserável do seu chefe é lindo e gostoso de

morrer. Uma verdadeira tentação de quase um metro e noventa de músculos e charme.


E o pior, Noah O'Donnel sabe muito bem disso.
Mas por trás desse estereótipo de bilionário devasso que troca de conquista como se troca de

camisa, ele esconde uma grande dor. Noah foi traído pela mulher que mais amou na vida e mascara

as cicatrizes dessa grande decepção não permitindo que mulher nenhuma se aproxime o bastante para

se tornar importante em sua vida. A exceção é sua assistente intrometida que parece dedicar cada
minuto de sua existência para agir como sua babá.

E o pior é que ele não pode demiti-la.

Meredith é muito competente e a única pessoa em que ele confia cegamente, apesar de jamais
dizer isso a ela. Além de ser a mulher mais determinada, pragmática e proativa que conhece.

Sua assistente é linda e parece nem se dar conta do quanto é prazeroso para Noah vê-la todas as

manhãs, reclamando de algo que ele fez ou que deveria ter feito e não fez.

E teve aquela noite em que ele bebeu demais...


Depois eles estavam nus...

Mas Noah jamais imaginou que Meredith desejava ser mãe e que  sua assistente optou por

uma inseminação artificial para realizar seu sonho, muito menos que ele é o pai do seu bebê.
ATENÇÃO: Este livro contém cenas de sexo explícito e linguajar inapropriado para menores

de 18 anos. Contém gatilhos, palavras de baixo calão e conduta inadequada de personagens.

AVISO: Este é o livro 1 da Série Irmãos O´Donnell e o próximo livro contará a história do

irmão mais velho JEREMY. Todos os livros da série poderão ser lidos separadamente, pois se tratam
de histórias independentes.

 
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GRAVIDEZ INESPERADA DE GÊMEOS.

MUITAS CENAS HOT.


CEO VIÚVO E PAI SOLO.

AUDREY SMITH estava com sérias dificuldades financeiras. Ela precisou suportar, por mais

tempo do que deveria, ficar em um emprego em que ela era assediada e desrespeitada todo santo dia.

Nada nunca veio fácil pra ela e Audrey não queria nada de mão beijada também. Precisava ajudar nas

despesas de casa, pois sua mãe dependia do seu salário para ajudar a quitar dívidas deixadas por seu

pai. Ela queria muito ter um lugar só seu, mas pagar um aluguel não era uma opção. E certa noite,
quando o homem mais lindo que ela já viu em toda sua vida insiste em querer oferecer ajuda, após

ver seu rosto vermelho de tanto chorar, Audrey o trata muito mal e lhe diz um monte de
desaforos. Aquele estranho era diferente de todos os cafajestes que tentavam se aproveitar dela no

bar em que trabalhava, mas a moça de vinte e dois anos não sabia disso. E, apesar de sentir algo

diferente e que não sabia explicar por aquele desconhecido, para Audrey, ele era só mais um cretino
querendo levá-la pra cama. Aparentemente, o homem de mais de 1,90m parecia tão gentil e bem-

intencionado, mas de boas intenções o inferno está cheio, ela pensa. Por isso, lhe dá as costas e segue

seu caminho.

JEREMY O´DONNELL não é um homem comum. Nasceu rico, melhor dizendo, podre de

rico, e multiplicou a fortuna da família como um homem de negócios focado e visionário que sempre

teve tudo sob seu controle. Destinado a comandar um verdadeiro império, o CEO da maior

companhia petrolífera europeia, apesar disso, sente prazer nas pequenas coisas que um homem
comum pode fazer como ir beber à noite em pub em completo anonimato sem ser notado. E é em

uma noite dessas, que ele encontra a garota mais surpreendentemente desaforada, desafiadora e

que lhe dá o maior fora de sua vida sem pensar duas vezes. Jeremy não sabia nem o primeiro nome

dela, já que ela não quis dizer. A questão é que ele não conseguia tirar a moça atrevida e de língua

afiada de sua cabeça ao ponto dela passar a povoar seus sonhos. Ele a procurou por toda parte, mas a

reencontrou justamente onde jamais poderia imaginar: trabalhando dentro dos muros de sua mansão.

A garota desconhecida que ele procurou incessantemente, após vê-la uma única vez em uma noite
chuvosa, foi contratada para passear com seu cãozinho e agora é sua funcionária.

Dizem que os homens da família O´Donnell são pacote completo além de obscenamente

ricos, são extremamente atraentes e verdadeiros libertinos sem pudor nenhum na cama, mas que

quando se apaixonam, se tornam homens de uma mulher só. O mais velho dos irmãos O´Donnell

se permitiu viver apenas aventuras breves e sem compromisso depois de perder a esposa que tanto

amava e que se foi cedo demais, cabendo a ele criar o filho sozinho. E seu coração de luto nunca

mais foi ocupado por outra mulher. Até aquela linda jovem sem papas na língua entrar em seu mundo
e tirar todo seu controle.

Aquela garota era quase vinte anos mais nova que o CEO bilionário. Mas, então, por que

para Jeremy parecia tão certo a forma como seus corpos se encaixaram perfeitamente na primeira

vez em que fizeram amor?


E por que, quando ele a tocava, Audrey não desejava mais nada da vida?

Mas uma simples fotografia mudou tudo. Ela se sentiu enganada pelo homem a quem entregou

pela primeira vez seu corpo e seu coração.

E assim Audrey vai embora para bem longe, grávida dos gêmeos do CEO.

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AVISO: Este é o livro 2 da Série Irmãos O´Donnell e o próximo livro contará a história do

irmão caçula IAN. Todos os livros da série poderão ser lidos separadamente, pois se tratam de

histórias independentes.

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