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DADOS DE ODINRIGHT

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Copyright © 2022 EVELYN SANTANA Todos os direitos
reservados à autora. Nenhuma parte deste livro pode ser
utilizada ou reproduzida sob quaisquer meios existentes
sem autorização da autora. A violação dos direitos autorais
é crime estabelecido na lei n° 9.610/98, punido pelo artigo
184 do Código Penal.

Esta é uma obra de ficção. Seu intuito é entreter as


pessoas.
Nomes, personagens, lugares e acontecimentos descritos
são produtos da imaginação da autora. Qualquer
semelhança com nomes, datas e acontecimentos reais é
mera coincidência.

SUMÁRIO

Sumário

Sinopse

Prólogo

Capítulo 01

Capítulo 02

Capítulo 03

Capítulo 04

Capítulo 05

Capítulo 06

Capítulo 07

Capítulo 08

Capítulo 09

Capítulo 10

Capítulo 11

Capítulo 12

Capítulo 13
Capítulo 14

Capítulo 15

Capítulo 16

Capítulo 17

Capítulo 18

Capítulo 19

Capítulo 20

Capítulo 21

Capítulo 22

Capítulo 23

Capítulo 24

Capítulo 25

Capítulo 26

Capítulo 27

Capítulo 28

Capítulo 29

Capítulo 30

Capítulo 31

Epílogo

LEIA TAMBÉM
Para Evy e Mid, minhas pincesas.

Obrigada por sempre estarem ao meu lado, me apoiando


quando tenho ideias loucas de madrugada, das quais nunca
me lembro no dia seguinte.

Vocês são minhas irmãs de alma, sempre e para sempre.

SINOPSE

Ele é um bilionário grego. Ela, uma garçonete


americana. Ele é

um solteiro cobiçado. Ela pensou que jamais


chamaria sua

atenção. Ele a seduziu, depois a rejeitou. Ela


engravidou e

escondeu dele seu bebê!

BILIONÁRIO GREGO É ELEITO O SOLTEIRO MAIS


COBIÇADO

DA DÉCADA

Com olhos azuis inesquecíveis e um sorriso matador, o


solteiro convicto Rafael Galanis está acostumado a deixar
uma pilha de corações partidos por onde passa.

Pilha na qual o coração de Helena estaria, se ela não tivesse


juntado os cacos no intuito de ser a melhor mãe possível
para o bebê crescendo em seu ventre, fruto do
envolvimento entre os dois.

Mas agora ela precisa voltar a encarar a família Galanis para


a leitura do testamento do pai de Rafael, ao mesmo tempo
que tenta proteger o filho que gerou da maldade que cerca
aquela família, ao manter a existência de seu bebê em
segredo.

As coisas deveriam ser simples, mas o desejo avassalador


que uma vez existiu entre Helena e Rafael ressurge com
força total, tornando humanamente impossível não ceder a
ele.

PARTE 1

Um ano atrás…

PRÓLOGO

Eu estava grávida.

Era isso que significavam os dois risquinhos azuis que


surgiram no teste de farmácia. Depois de fazer cinco deles,
de marcas diferentes, eu já havia me tornado expert no
assunto.

O resultado positivo do primeiro teste me fez comprar outro.


E

então mais outro. E mais outro…


Cinco dias, cinco testes e, agora, eu estava prestes a ter
minha quinta noite insone consecutiva.

Grávida e apavorada, era como eu estava, o que não devia


ser uma boa combinação para o bebê.

O bebê.

Pensar assim me assustou, minha cabeça fazendo o paralelo


entre estar grávida e ter um bebê no meu colo, com
bracinhos,

perninhas, uma boca para alimentar e um par de olhinhos


brilhantes me encarando.

Olhos azuis e expressivos, talvez? Como os do pai dele?

Santo Deus! Como eu contaria sobre o bebê para Rafael? E

mais importante do que isso: qual seria sua reação?

Nós não tínhamos um relacionamento, nossos encontros


aconteciam sempre às escondidas, porque era impossível
explicar à sua família como o interesse de seu filho pródigo
poderia recair justo em mim, que não passava da atendente
do café favorito de Rafael Galanis, o solteiro mais desejado
não apenas do ano, como da década!

As batidas potentes na porta do banheiro, onde eu me


refugiei, me sobressaltaram, arrancando um arfado do
fundo da minha garganta.

— Helena, você não é a única que precisa esvaziar a bexiga


antes de ir dormir! — minha mãe berrou do outro lado da
porta, e apertei os olhos com força em puro desgosto.
Eu precisaria contar para ela sobre a gravidez, e minha
única certeza era a de que sua reação não seria nada
bonita.

— Já estou saindo — respondi, apenas alto o suficiente para


que ela pudesse me escutar do lado de fora, algo que não
era difícil.

Com aquelas paredes finas, ela poderia ouvir até mesmo


meus batimentos cardíacos, se prestasse atenção o
suficiente.

Envolvi o teste usado num pedaço de papel higiênico, me


lembrando das cenas de livros e filmes onde a protagonista
embalava um deles e fazia uma surpresa bonita para seu
par romântico. Talvez isso funcionasse em algum universo
paralelo, porque, na minha realidade, precisei descartar o
bastão, lavar as mãos com o sabonete de erva-doce que eu
costumava amar, mas que agora me dava náuseas, e então
encarar minha mãe como se minha vida não tivesse
acabado de mudar para sempre.

— Alugue seu próprio apartamento, se quiser passar horas


trancada no banheiro sem ser incomodada — ela murmurou
de forma mal-humorada assim que abri a porta e passei por
ela., Se ela já estava achando o espaço pequeno para duas
pessoas, o que diria quando soubesse que havia mais um
morador a caminho?
CAPÍTULO 01

A ansiedade estava fazendo meu coração socar minhas


costelas a cada batida, e marquei seu ritmo com o batuque
dos meus dedos sobre o tampo de madeira da mesa,
checando meu relógio pela terceira vez, apenas para me
dar conta de que um mísero minuto se passara.

Tentei me ater à decoração aconchegante do restaurante no


qual Rafael e eu costumávamos nos encontrar, mas não
havia nada ali em que eu já não tivesse reparado. Por mais
que tirar meus olhos do cobiçado Rafael Galanis não fosse
uma tarefa fácil, ignorar a decoração que me fazia sentir no
Olimpo era impossível.

Esse foi o último pensamento que consegui formular antes


de ver quando os quase dois metros de altura de Raf
passaram pela porta. Ele ajeitou a gola alta de sua camisa
preta de lã, como se ela já não estivesse perfeita, e um
segundo depois seus olhos azuis de um céu limpo de
nuvens me encontraram,

Meus ombros relaxaram instantaneamente sob o calor do


olhar e do sorriso de Rafael, o único deus grego no meu
Olimpo, conforme ele caminhava até nossa mesa
recorrente, inclinando-se em minha direção para prensar
seus lábios nos meus.

Deveria ser um contato breve, mas movida por uma


urgência desconhecida, apertei meus dedos na nuca de Raf,
sentindo o calor de sua pele, a textura macia de seus
cabelos e aprofundando o contato como se quisesse fazê-lo
durar para sempre.

— Alguém aqui sentiu minha falta — ele murmurou com a


boca contra a minha, antes de selar meus lábios uma última
vez com os seus e ocupar seu assento logo à minha frente,
tomando minhas mãos entre as suas e beijando o dorso de
cada uma delas delicadamente, da forma que apenas um
cavalheiro o faria.

— Por acaso você não sentiu a minha? — eu me apressei a


perguntar, me chutando mentalmente pela possibilidade de
ter parecido insegura.

Mas era como eu me sentia, depois de ter passado os


últimos cinco dias fazendo testes de gravidez enquanto Raf
terminava de cumprir sua agenda de negócios na Grécia.

— Por acaso a Terra gira em torno do Sol? — ele devolveu,


unindo as sobrancelhas escuras sobre os olhos claros.

— Como é que é? — foi a primeira coisa que me ocorreu


pergunta, confusão se agarrando às minhas feições, porque
não entendi o que ele quis dizer.

— Perguntei se a Terra gira em torno do Sol. Achei que


estivéssemos apenas fazendo perguntas óbvias um para o
outro. —

Minha capacidade de discernimento, sem sombra de


dúvidas, estava prejudicada, de modo que apenas encarei
Raf, com a desordem dos meus pensamentos estampada no
meu rosto. —

Estou dizendo que senti sua falta, Helena, e que isso é tão
óbvio quanto o fato de que sim, a Terra gira em torno do Sol.

Eu era uma boba por rir? Talvez. Mas Rafael me


acompanhou no gesto, então eu não dava a mínima.

Ele estava de volta, logo à minha frente, depois de duas


semanas de uma separação angustiante, e isso era tudo o
que me importava.

— Não é tão óbvio pra mim que o bilionário grego Rafael


Galanis, proprietário de uma joalheria tão requintada quanto
a Amethystós, além de ser o solteiro mais cobiçado da
década, tenha pensado em mim enquanto estava cercado
por mulheres tão bonitas como dizem que são as gregas —
brinquei, apesar de haver um fundo de verdade ali.

Rafael podia ter a mulher que quisesse aos seus pés,


mesmo assim, me escolheu, ainda que eu não me
considerasse uma beleza exuberante que se destacasse
dentre as outras. Não havia nada de extraordinário nos
meus cabelos e olhos castanhos, ou mesmo algo glamuroso
em me enfiar em um uniforme verde com boné para servir
café para as pessoas. Menos ainda, joias sofisticadas
adornando meus dedos, pulsos e colo para chamar a
atenção de alguém que ligava com as mais lindas pedras
preciosas, como era o caso de Raf.

— Eu não ligo pra esses rótulos, você sabe. Só sou o solteiro


mais cobiçado da década porque sou um bilionário grego,
eu não teria esse suposto harém à minha espera, se não
fosse o meu dinheiro.
— Você ainda teria a mim — confessei. — Se ainda tivesse
esses lindos olhos azuis e esse sorriso matador, é claro — fiz
troça, porque eu não queria soar toda apaixonada. Não
podia, na verdade, ainda que estivesse.

Raf e eu nos conhecemos há menos de três meses, quando


lhe servi o primeiro latte na cafeteria onde eu vinha
trabalhando.

Seu sorriso lindo fez meu coração dar solavancos no peito, e


ali eu soube que jamais sentira nada nem remotamente
perto por outro homem.

Não que eu fosse a especialista em coisas do coração, mas


depois de dois namoros fracassados, era fácil saber quando
alguém

fazia nosso estômago se revirar com um gesto simples,


como um simples sorriso ou o roçar de seus dedos nos
meus.

Menos de uma semana depois, estávamos fazendo bem


mais do que roçar os dedos do outro. Em sua cama, na
mesa de sua cozinha, na hidromassagem… em qualquer
lugar em que pudéssemos estar a sós, longe dos olhares
curiosos das revistas de fofoca, que insistiam em descobrir
quem era seu mais novo affair.

Mas Raf era muito bom se esgueirando da imprensa e


conseguimos manter nosso envolvimento em sigilo, apenas
entre nós dois, e eu não podia negar que gostava daquilo.
Quanto menos gente soubesse de nós dois, menos gente
poderia tentar estragar nosso romance perfeito.

Talvez eu mesma fizesse isso, ao contar-lhe que estava


grávida, e o pensamento foi o suficiente para fazer com que
uma pedra se alojasse bem no meu estômago.
CAPÍTULO 02

Havia inúmeros motivos pelos quais eu adorava beijar


Helena.

Além de seus lábios cheios e suculentos, da língua morna


que sempre me recebia quando eu pedia passagem, havia
também o fato de que ela beijava com o corpo inteiro, e não
apenas com a boca.

Suas mãos estavam sempre afoitas, explorando cada


pedaço da minha pele que pudessem tocar, ao mesmo
tempo que eu tentava memorizar sob as pontas dos meus
dedos a textura de sua pele sedosa e cada ângulo de seu
corpo curvilíneo e convidativo.

— Fala de novo que você sentiu minha falta — ela pediu


enquanto eu beijava seu pescoço e a guiava para a cama,
onde a faria minha outra vez. Entre mim e Helena, não era
apenas sobre sexo, mesmo assim, depois de dias longe dela
e do jantar no nosso restaurante favorito, onde eu não pude
tocá-la como gostaria, era pedir demais que eu controlasse
a saudade que sentira dela.

— Senti muito a sua falta, e estou prestes a te mostrar o


quanto — sussurrei ao seu ouvido, mordendo o lóbulo de
sua orelha e a tomando em meus braços, depositando seu
corpo esguio e curvilíneo sobre meus lençóis de seda.

Em um outro dia qualquer, eu teria me demorado para


desnudar cada parte dela, mas não naquele momento,
depois da abstinência de beijos e carícias que precisei
enfrentar, descobrindo que o contato da minha mão subindo
e descendo pelo meu membro ereto não adiantava nada, se
eu não podia sentir o calor e o cheiro de Helena.

Eu estava viciado nela. Em seu cheiro, em seu gosto… na


cadência dos seus gemidos quando seu corpo vibrava de
prazer sob o meu…

Parecendo ser acometida da mesma urgência que eu, as


mãos de Helena se ocuparam de me despir também,
diminuindo o tempo que levaríamos até estarmos tombados
na cama, atrelados um ao outro.

No entanto nem toda a urgência me faria incapaz de


contemplar, por segundos que fossem, a beleza de uma
Helena nua com os cabelos espalhados pelo travesseiro,
ainda mais bonita do que a Helena de Troia jamais poderia
ter sido.

Toquei a pele sedosa com as pontas dos meus dedos,


traçando a depressão da cintura fina, rumando até os seios
macios, que agora pareciam mais cheios do que eu me
lembrava. Seria possível que a distância tivesse apagado,
em partes, toda a perfeição que era aquela mulher?

— O que foi? — ela perguntou, quando, aparentemente, eu


estava ocupado demais analisando suas medidas para fazer
qualquer outra coisa.

— Eles parecem maiores — devolvi, englobando os montes


com minhas mãos, dando-me conta de que eles já não
cabiam mais perfeitamente dentro delas, como
costumavam caber.

Helena engoliu a saliva com certa dificuldade, como sempre


acontecia quando ela estava excitada, e logo em seguida
abriu um sorriso vacilante muito similar ao que exibira
durante a maior parte do nosso jantar.

— É apenas impressão sua, eles estão exatamente do jeito


que você deixou.

Abri um sorriso sedutor para ela, inclinando-me para beijar


a ponta de seu nariz arrebitado e então sua boca
convidativa.

— Me desculpe se não posso confiar apenas na sua palavra,


preciso conferir por mim mesmo se eles estão tão
suculentos quanto estavam duas semanas atrás.

Tomei o mamilo túrgido entre os lábios, e a coluna de


Helena se arqueou em resposta ao contato, um gemido alto
rasgando sua garganta ao mesmo tempo que suas mãos
voavam para os cabelos da minha nuca, revirando-os.

— Raf… — ela murmurou, tomada pelas sensações, e meus


olhos se ergueram para observar sua expressão de prazer,
que era um espetáculo à parte. — Por favor…

Talvez eu devesse provocá-la, como fiz em tantas outras


ocasiões, impeli-la a dar voz aos seus desejos, porque seu
sussurro macio ao meu ouvido era um verdadeiro
afrodisíaco. Mas eu não podia torturar Helena daquele modo
sem torturar a mim mesmo, sendo assim, me estiquei
apenas o suficiente para pegar o pacote de preservativos
que mantinha em minha mesa de cabeceira.
Helena foi mais rápida, entretanto, pegando a embalagem
antes mesmo que eu pudesse fazê-lo e levando-a à boca,
rasgando-a entre os dentes e cuspindo o pedaço que
arrancou.

Não era o método mais seguro de abrir um preservativo,


claro, mas era o mais sexy, sem sombra de dúvidas, e
Helena sabia muito bem disso. Assim como sabia que me
deixava louco quando ela empurrava meu peito para que eu
me deitasse, uma de suas pernas passando sobre as
minhas, até ela se abaixar e deslizar o preservativo pelo
meu pau usando nada além de sua boca.

Eu sorri para a visão que ela era, me deleitando com a


carícia íntima que fazia meu baixo-ventre vibrar em
antecipação, jogando para o lado a cascata de cabelos de
Helena, que vez ou outra cobria seu rosto e não me deixava
ver exatamente o que ela estava fazendo, e observar meu
pau entrando e saindo por aqueles lábios suculentos não
era uma cena que eu gostaria de perder.

Ainda assim, eu não conseguia mais evitar estar dentro de


Helena, porque duas semanas pareciam tempo demais sem
ela.

Sendo assim, enfiei uma das mãos em sua nuca, puxando


seu cabelo levemente para trás, até que seus olhos
estivessem na mesma altura dos meus.

— O que acha de continuarmos com as preliminares na


próxima rodada? — sugeri, e os olhos de Helena brilharam
de excitação como entendimento. — Você já está pronta pra
mim?

Ela assentiu rapidamente, mas não importava, de fato, já


que minha mão direita se embrenhara por suas dobras para
sentir sua umidade. Um gemido delicioso saiu dos lábios de
Helena em puro abandono, conforme ela girava os quadris
sob meu toque.

— Eu sempre estou pronta pra você — ela murmurou antes


de guiar o meu pau para a sua boceta encharcada,
descendo sobre ele e abrigando-o entre suas paredes
quentes, apertadas e escorregadias.

— Você ainda vai me enlouquecer qualquer dia desses,


Helena — alertei.

— De prazer, eu espero.

Não tive tempo para responder, porque sua boca já estava


na minha assim que ela concluiu sua frase, nossas línguas
se encontrando nas fronteiras de nossas bocas, afoitas, e
minhas mãos agarrando os quadris fartos que me faziam
delirar a cada movimento, para que eu pudesse matar a
saudade que sentia de Helena e das sensações prazerosas
que somente ela era capaz de proporcionar.

Eu a girei na cama, seu corpo prensado contra o meu e o


colchão, os cabelos sedosos espalhados por todos os
lugares e os lábios úmidos e vermelhos dos nossos beijos
fazendo com que ela parecesse uma verdadeira deusa
grega, nascida para ser adorada.

E era isso que eu fazia a cada beijo depositado em seu


pescoço, a cada arremetida para dentro de seu corpo esguio
e receptivo, buscando como única recompensa escutar meu
nome saindo de sua boca em forma de gemidos
entrecortados enquanto ela se desmanchava sob mim o
alcançar o ápice do prazer.

Eu estava completamente viciado naquela mulher.


CAPÍTULO 03

Eu não sabia quão louca isso me fazia, mas o fato era que
eu amava assistir a um Rafael adormecido. Suas feições
bonitas de deus do Olimpo se suavizam quando ele estava
assim, completamente relaxado, algo que não parecia ser
possível quando sua cabeça estava tomada por seus
pensamentos nos negócios.

Sendo dono da Amethystós, a joalheria referência número


um no mundo, não era de se estranhar que sua cabeça
estivesse sempre se voltando para os negócios. Eu servia
apenas café e, quando um dos meus colegas de trabalho
precisava faltar o turno, era o bastante para que eu ficasse
preocupada com o atraso das entregas dos pedidos.

— Você vai ficar aí parada me provocando com esse cheiro


de bacon ou vai vir tomar o café da manhã na cama
comigo?

Rafael abriu apenas um dos olhos para mim, a prova


incontestável de que estava acordado.

Mas que fingido! Será que ele notou que eu ficara tempo
demais em pé, segurando a bandeja do nosso café da
manhã, só para ter uma chance extra de olhar para ele
adormecido, antes de interromper seu sono?

— Você está ficando mal acostumado com essa coisa toda


de café na cama — foi o que escolhi dizer, caminhando com
cuidado até a cama e entregando a bandeja para Rafael,
para que pudesse me acomodar ao seu lado.

Ele fincou os pés de madeira da bandeja no colchão macio,


certificando-se de que estava firme e a uma boa altura para
que pudéssemos comer ali.

— Não vou discutir quanto a isso, você tem me deixado mal


acostumado em muitos sentidos.

Raf se esticou na minha direção, e o gesto simples foi o


suficiente para fazer minha garganta se apertar e meus
olhos arderem pelo choro contido.

Eu precisava contar a ele sobre o bebê, não podia esperar


mais. Na noite anterior minha covardia e o medo de perdê-
lo foram maiores do que meu bom senso, mas eu precisava
dar um basta naquilo. Raf merecia saber a verdade o quanto
antes.

— Eu trouxe um presente — ele anunciou enquanto bebia


um gole de seu café puro. Era como ele gostava para
começar o dia.

Pensei em perguntar se ele trouxera um potinho da areia da


praia de Mykonos de lembrança, mas achei melhor não. Se
meu presente fosse outra coisa, eu não queria parecer
como alguém que criara expectativas.

Raf se estendeu até sua mesinha de cabeceira, e por um


momento contive minha vontade de revirar os olhos. Ele
não se atreveria a trazer preservativos gregos para mim,
certo? Não que fosse uma má ideia, já que os que eram
comercializados nos EUA não terem servido seu propósito.

Foi quando Raf me entregou uma caixinha de veludo


sofisticada que eu soube que, fosse o que fosse seu
presente, eu não o merecia. Contudo, nem mesmo tive
tempo de usar esse argumento, já que ele mesmo abriu a
caixinha para mim, exibindo uma pulseira que era um misto
de delicadeza e sofisticação. E

diamantes. Muitos deles, por todo o comprimento

— UAU — foi a primeira coisa que consegui articular,


olhando entre a joia e Raf. — É linda — admiti, e meus
ombros caíram naturalmente. — Mas você sabe que não
posso aceitar, isso custa uma fortuna. — E eu já deixara
claro que não me importava com o dinheiro dele.

— Você deve aceitar — corrigiu. — É um presente.

— Eu nem teria onde usar algo assim — argumentei, porque


não havia nada na minha lista de compromissos sociais
onde eu pudesse usar uma pulseira tão cara.

— Você pode usar quando sair comigo, pra ficar ainda mais
deslumbrante pra mim.

Rafael sorriu brilhantemente em minha direção, e eu soube


ali que estava derrotada. Primeiro porque cometi o erro de
me apaixonar por ele, segundo porque eu não fazia ideia de
como ele reagiria ao que eu estava prestes a lhe dizer.

— A gente precisa conversar — anunciei, pegando a


caixinha que ele estendia para mim e depositando-a sobre o
travesseiro.
— Você está meio estranha desde ontem. Aconteceu
alguma coisa enquanto eu estava viajando?

— Não — apressei-me a negar. — Quer dizer... sim —

considerei. — Mais ou menos. É algo que aconteceu quando


você estava aqui, mas só descobri quando você já estava na
Grécia, e então eu meio que...

— Helena — ele chamou, apoiando as duas mãos em meus


ombros como se me puxasse de volta para a realidade. —
Seja o que for, você pode me falar.

Anuí com um gesto de cabeça, respirando fundo em busca


das palavras certas.

— Não sei muito bem como dizer isso, então lá vai: eu estou
grávida.

Silêncio.

Tão ensurdecedor, que eu me perguntei se de fato aquilo


estava acontecendo de verdade ou se eu estava presa em
algum tipo de pesadelo.

— Que dia é hoje? — Raf perguntou depois do que me


pareceram horas inteiras.

— Como é?

— Isso é uma brincadeira de 1° de abril? — quis saber, com


um meio sorriso despontando em seus lábios.

— Estamos em maio — eu o lembrei, sem acreditar


realmente que um homem como ele fosse capaz de se
perder no tempo desse modo. — Raf, não estou brincando.
Jamais brincaria com algo assim.
Ele assentiu, e se antes havia um esboço de sorriso em seus
lábios, agora já não havia nada além de uma expressão
compenetrada de alguém que parecia a um único passo de
falar sobre negócios.

— Certo. Eu vou te perguntar isso com a melhor das


intenções, tudo bem? Você está insinuando que esse bebê é
meu?

Meu queixo caiu.

— Insinuando? — ecoei, quase mortificada. — Não... não


estou insinuando nada, estou te dizendo. Não estou saindo
com mais ninguém. Você está?

Ele estava?

Senti meu coração afundar no peito.

Claro que estava! Com uma mulher tão deslumbrante


quanto ele, eu podia apostar!

— Não — ele negou, colocando um fim às minhas


especulações internas. — Mas nunca falamos nada sobre
exclusividade, e como sempre usamos proteção...

— Eu sei que não falamos sobre exclusividade, mas nenhum


método contraceptivo é cem por cento, é?

Rafael não me respondeu. Não a isso, pelo menos.

Seu café matinal havia perdido o encanto, porque não fora


mais tocado, e os dedos longos de Rafael esfregando seu
rosto como se aquilo fosse tudo o que ele poderia fazer no
momento.
— Por que não me disse isso ontem, durante o jantar? — ele
questionou, trazendo seus olhos azuis de volta para o meu
rosto de um jeito que nunca vi antes.

— Porque... — Hesitei, sem saber ao certo quais palavras


usar, ou mesmo quais sentimentos colocar à mostra. Talvez
eu devesse ser sincera ao máximo, qual a pior coisa que
poderia acontecer, além de Rafael dizer que não sentia o
mesmo? — Fiquei com medo. Eu tive medo da sua reação,
de perder você... — Isso era o bastante para fazê-lo
entender o que eu sentia?

Talvez fosse. Na minha concepção era, pelo menos, apesar


de que… se Rafael me dissesse que não gostaria de me
perder, eu iria querer saber o motivo para isso. Essa
informação era importante para ele também?

— Raf, eu estou apaixonada — confessei, e seus olhos se


arregalaram em proporções que não julguei serem
possíveis. —

Talvez pareça meio louco dizer isso quando estamos juntos


há tão pouco tempo, mas essa é a verdade, e é exaustivo
ficar me policiando pra não deixar transparecer.

Vide o nosso jantar da noite anterior.

Tudo o que eu queria era segurar sua mão o tempo inteiro,


me aninhar a ele e ouvi-lo dizer o quanto sentiu minha falta,
que pensou

em mim tanto quanto pensei nele e que os dias longe de


mim foram caóticos, como os meus foram sem ele.

— Eu não sei o que dizer — ele murmurou, meneando a


cabeça de um lado para o outro. — É muita informação de
única vez.
É muita informação indesejada de uma única vez, foi o que
ele quis dizer. Mas quem poderia culpá-lo?

Rafael nunca me fez promessas a longo prazo, nós tínhamos


o ali, o agora, e o futuro era incerto para nós dois. Eu sabia
disso.

Então por que esse conhecimento era incapaz de me fazer


sentir melhor?

— Está tudo bem se você não sentir o mesmo — menti,


porque eu não estava nada bem. — Melhor eu ir embora e
deixar você digerir tudo o que acabei de dizer sozinho e
com calma.

Eu me levantei, torcendo para que Raf dissesse que eu não


precisava ir embora, porque resolveríamos tudo ali, naquele
exato momento. Não foi o que aconteceu, entretanto.
Vestida em uma das camisetas que ele usava para praticar
exercícios, tive que catar minha roupa espalhada pelo chão
e me trocar antes de enfim poder deixar Rafael sozinho com
seus próprios pensamentos.

CAPÍTULO 04

Grávida!
Helena estava grávida de um filho meu e eu não sabia por
onde começar a me desesperar, para ser sincero.

Antes de receber a notícia, minha vontade sobre ser pai ou


não ainda não estava muito bem definida. Vindo de uma
família grega tão tradicional, era esperado que um dia eu
me casasse e tivesse filhos, mas, apesar de eu já estar na
casa dos trinta, não esperava que teria um bebê nos meus
braços, um bebê meu, dentro de poucos meses.

Era assustador, para dizer o mínimo, e me preocupava a


calma com que Helena lidava com a situação. Ela era uma
década mais nova do que eu, estava começando a vida
agora… por que diabos parecia tão confiante com toda a
situação?

Sobretudo: como eu consegui engravidá-la se sempre


usamos proteção? Em todos os meus anos de uma vida que
faria com que muitas pessoas me chamassem de libertino,
nunca houve nenhum acidente desse tipo.

Não que eu duvidasse da palavra de Helena quando disse


que não esteve com mais ninguém além de mim, mas eu
duvidava muito que com o tempo meu sêmen tivesse
sofrido alguma mutação que o tornasse capaz de atravessar
o látex.

Apesar de que… caralho!

Helena abrira a porra do pacote de preservativos com os


dentes mais vezes do que a sorte estaria disposta a nos
ajudar. Ela ficava absurdamente linda e sexy fazendo isso, e
mesmo sabendo que aquele método não era seguro, eu
nunca a parei. Jamais passou pela minha cabeça pedir para
a Helena não rasgar a embalagem com os dentes, pelo
perigo de danificar a proteção, porque sempre que isso
acontecia, todo o meu sangue estava concentrado no meu
pau, não sobrando muita coisa com a qual meu cérebro
pudesse trabalhar.

Eu vinha sendo um irresponsável, e agora as noites de


prazer com Helena haviam se transformado em algo maior
do que eu estava preparado para lidar no momento.

— Você está estranhamente calado, o que houve? — meu


pai me perguntou após o jantar, depois de nos servir de
scotch em seu escritório particular.

Nestor Galanis tinha uma fixação por seus negócios que eu


claramente não herdara. Apesar de ter minha própria
empresa e ter conseguido torná-la mundialmente famosa
pelas joias de qualidade que produz, meu sucesso não era
fruto apenas do meu esforço, e sim da minha capacidade de
liderança e de saber delegar tarefas.

Eu tinha uma equipe competente espalhada pelo mundo


que fazia da Amethystós o sonho de consumo de grandes
nomes da música, do cinema, de sheiks e de fashionistas.

— Nada de mais, só tenho muito no que pensar,


ultimamente.

Nos últimos dois dias, para ser mais preciso. Desde que
voltei de viagem da Grécia e descobri sobre a gravidez de
Helena. Se Ophelia

Galanis, Yayá, soubesse que o bisneto pelo qual tanta


implorara já havia sido providenciado…

— Problemas com a empresa? — meu pai quis saber, mas


Nestor Galanis era impaciente demais para apenas esperar
por uma resposta que julgava já conhecer. — Eu sempre te
disse que você é desleixado demais com os seus negócios,
Rafael, em vez de ter pulso firme e estar sempre atento ao
que…

— Eu engravidei uma moça — eu o cortei, porque estava


farto de seus sermões sobre como eu manejava meus
próprios negócios. Era bem verdade que eu não viera do
nada, mas não apenas um homem cuja família tem dinheiro,
eu fiz meu próprio dinheiro, levando meu patrimônio à casa
dos bilhões sem me valer de uma herança para tal fim.

— Você fez o quê? — ele praticamente cuspiu, e me


arrependi no mesmo instante de ter lhe contado sobre a
gravidez de Helena antes que nós mesmos tivéssemos tido
uma oportunidade de conversar novamente sobre aquilo.

— Não é o fim do mundo — tentei amenizar, mas claro que


para Nestor Galanis um filho fora do casamento conseguia
ser ainda pior do que o fim do mundo.

— Quem é ela? Eu a conheço? Você tem certeza de que ela


está dizendo a verdade e que o filho é mesmo seu?

— Claro que o filho é meu, acha que sou idiota? — lancei de


volta para ele, me sentindo quase ultrajado com sua
pergunta, o que me trouxe um gosto amargo à boca.

Como fui capaz de perguntar a Helena se o filho que ela


esperava era meu? Por que mais ela me contaria que estava
grávida, se eu não fosse o pai?

Bebi um longo gole do meu scotch, sentindo-o queimar e


aquecer minha garganta pelo local onde passava.

— O que eu sei é que você tem um ponto fraco por


mulheres bonitas e fáceis, o tipo perfeito para aplicar um
golpe da barriga no primeiro desavisado que encontrarem
pelo caminho!

— É isso que acha eu sou? — explodi. — Um simples


desavisado?

Por favor! Será que pelo menos uma vez na vida você não
pode

reconhecer tudo o que construí? Que já não sou um simples


garoto, e sim um homem?

— Essa é sua oportunidade de demonstrar quão homem


você é —

provocou, estreitando os olhos tão iguais aos meus em


minha direção. —

Eu não vou admitir que haja um bastardo com sangue


Galanis por aí, você me ouviu?

Virei o copo com minha bebida de uma única vez,


depositando-o sobre a mesa de madeira do escritório de
Nestor Galanis.

— Em alto e bom som. — Foram minhas últimas palavras


antes de dar as costas ao meu pai e sair de lá.
CAPÍTULO 05

Ali estava. A primeira foto do bebê crescendo dentro de


mim.

Ele ainda era do tamanho de um amendoim, mesmo assim,


quando senti o gel frio na minha barriga, que antecedia o
aparelho capaz de me mostrar imagens do que estava
acontecendo ali dentro, aqueles borrões na tela foram
capazes de me fazer sentir uma emoção tão potente que eu
jamais seria capaz de nomear.

Eu teria um bebê. Seria mãe! Não estava nos meus planos


engravidar sob essas circunstâncias, mas acontecera, e eu
faria funcionar.

Com ou sem Rafael, por mais que me doesse a possibilidade


de ele não desejar o mesmo.

Três dias já haviam se passado desde a nossa conversa. Três


dias sem notícias dele, porque eu não me atreveria a ser a
primeira a mandar uma mensagem. Ele sabia onde me
encontrar, sabia que eu estava esperando um bebê seu,
apesar de ter duvidado a princípio.
Eu não diria que não doeu um pouquinho sua desconfiança,
porque doeu. Ao mesmo tempo, era compreensível. Nós nos
conhecíamos há

poucos meses, ele não sabia muito sobre a minha índole e…


eu era uma pobretona que não tinha onde cair morta. Tinha
tudo para ser um golpe da barriga, exceto que não era. Eu
não planejei me apaixonar por Raf, muito menos engravidar
dele, mas se minha palavra não fosse o bastante, então
eu…

— Desculpa — murmurei ao esbarrar em alguém.

No meu caminho até a saída da maternidade, enquanto me


perdia em pensamentos fitando incansavelmente o
borrãozinho na minha ultrassom, acabei não atentando aos
arredores e causando um mini acidente.

Meus exames caíram no chão, porém antes mesmo de eu


conseguir me abaixar para pegá-los, duas mãos grandes e
conhecidas já haviam se adiantado, reunindo todos os pés e
organizando-os ao mesmo tempo que os observava.

— Por que não me disse que hoje seria sua primeira


consulta? —

Rafael perguntou sem nem mesmo me olhar, analisando os


resultados dos exames da minha primeira consulta de pré-
natal.

Ergui minhas sobrancelhas para ele, sem acreditar que ele


ignorara as boas maneiras e, sobretudo, sem a menor ideia
de como ele fora parar ali.

— O que faz aqui? — dei voz ao meu pensamento, mas ele


nem mesmo se dignou a me olhar, ocupado demais com os
papéis à sua frente.
— Você tinha uma consulta, não tinha? Fui até a cafeteria
falar com você, Caroline avisou que você estava aqui,
depois de me ofender um pouco por ter te perguntado se eu
era mesmo o pai do filho que você está esperando.

Senti meu rosto esquentar em puro constrangimento


conforme eu levava meus olhos para longe de Raf, tentando
ao máximo não o encarar.

Caroline não deveria ter dito nada, mas eu já deveria


imaginar que seria demais pedir que ela mantivesse a boca
fechada diante do que julgava ser uma injustiça.

— Ela só estava tentando ser uma boa amiga, tenho certeza


— eu a defendi, porque no fundo era verdade.

Desde que comecei a trabalhar na cafeteria, Caroline me


mostrou a força que uma amizade pode ter e que amigos
são capazes de qualquer coisa para ver o outro bem. No
fim, ela só queria me proteger, apesar de agora ser tarde
demais para isso.

Envolver-me com Rafael deixou meu coração exposto, e


para completar eu estava grávida dele! A menos que
tivéssemos uma máquina do tempo, não tinha como voltar
atrás.

— Pra onde você está indo agora? — Rafael quis saber, ao


que parecia, dando-se por satisfeito com os resultados dos
meus exames e entregando-os de volta para mim. — Que
tal uma carona?

— Vou pro trabalho, mas não precisa se incomodar, ainda


tenho tempo de sobra pra chegar lá.
— Não é incômodo, além do mais, nós precisamos
conversar.

A mão que ele apoiou em minhas costas e o modo como me


guiou até seu carro, apesar de gentil, deixava claro que não
estava aberto a discussões.

— Pelos exames, está tudo bem com o bebê — Raf quebrou


o silêncio quando deixamos o estacionamento.

— Sim, está — confirmei, batucando com as unhas sobre os


papéis agora em meu colo, como forma de dissipar a
ansiedade.

— Você tem um plano?

— Um plano? — repeti, confusa.

— Sobre o que fazer. Suponho que, se você se deu o


trabalho de iniciar o pré-natal, significa que quer ficar com o
bebê.

— Ele não é uma coisa pra que eu decida ou não ficar com
ele —

apontei entre dentes cerrados, sentindo uma onda de


irritação crescer no meu peito. — É um pedaço meu. E seu
também, mesmo que você não acredite nem queira ter
nada a ver com ele.

— Eu vim até a clínica, não vim? — ele me lembrou,


erguendo uma sobrancelha em desafio. — Isso não é
postura de alguém que não quer ter nada a ver.

— Se você diz… — Dei de ombros, fingindo indiferença,


quando, na verdade, eu só não queria me apegar demais
àquelas palavras e criar falsas expectativas.
— Eu vou cuidar de vocês dois, Helena — ele prometeu, e
eu precisei conter as lágrimas que começaram a pinicar
meus olhos. — Não vou deixá-los desamparados, te dou a
minha palavra.

Raf estava dirigindo, ainda assim, vez ou outra seus olhos


se voltavam para mim. De qualquer forma, seu olhar ficava
fixo na estrada pela maior parte do tempo, o que era bom.
Aquela era a melhor maneira de termos aquela conversa. Eu
provavelmente desabaria se tivesse que encará-lo bem no
fundo de seus olhos azuis enquanto falávamos sobre a
sementinha crescendo dentro de mim.

— Você não precisa me prometer nada. Sei que não pediu


por isso, o que não me dá o direito de exigir nada.

— Você pediu?

— Não — concedi. — Mas decidi sozinha que vou ter o bebê


com ou sem a sua ajuda.

— Vai ser com a minha ajuda — ele garantiu, aproveitando


da pausa obrigatória no sinal para me olhar. — Eu gosto
muito de você, mesmo que não seja na proporção que você
espera, e…

— Não espero nada — apressei-me a negar, enfatizando o


que dizia também com um meneio de cabeça.

— Tudo bem. Mesmo que não seja na proporção que você


merece

— corrigiu. — Você não vai passar por isso sozinha, vamos


fazer isso juntos, estou aqui para tudo o que precisar, está
bem?
Lá estavam as malditas lágrimas queimando meus olhos
outra vez, e agradeci ao sinal aberto, porque agora a
atenção de Raf não estaria completamente sobre mim e eu
poderia enxugar a gotícula que escorreu pelo meu olho
direito de forma disfarçada.

— Isso quer dizer que posso te pedir um favor? — arrisquei.

— O que quiser.

O que eu quisesse?

Eu duvidada muito que ele poderia me dar o que eu queria.

Um beijo, um abraço apertado e sua voz no meu ouvindo


me dizendo que tudo ficaria bem. Isso era o que eu
realmente queria, mas jamais lhe pediria isso.

— Será que você pode guardar isso pra mim, ao menos por
enquanto? — escolhi dizer, indicando a pasta no meu colo
que trazia os meus exames, incluindo a ultrassom. — Não
estou pronta pra falar sobre a gravidez com a minha mãe,
eu sei que ela vai entrar em parafuso e… só não quero lidar
com isso agora.

— Como quiser — ele respondeu simplesmente, mas não


poderia estar mais equivocado.

Nada naquela situação estava saindo como eu queria.


CAPÍTULO 06

— Eu disse que você poderia usá-la para ficar ainda mais


deslumbrante pra mim.

Sentada à mesa de jantar na sacada do meu apartamento,


Helena encarou o bracelete de diamantes que trouxe para
ela da minha última viagem à Grécia. Era uma peça
exclusiva, feita especialmente para a nova coleção da
Amethystós. Mas claro que, teimosa e orgulhosa como era,
Helena não aceitara o presente, assim como nunca aceitara
nenhuma outra joia que eu lhe dera.

Exceto por um polvo de pelúcia que consegui pescar na


máquina da cafeteria onde ela trabalhava. Helena me
desafiou a conseguir pegar uma dessas pelúcias que
indicavam o humor. O

lardo cor-de-rosa era sorridente, o lado azul, enraivecido.

— Achei que tivesse dito que queria conversar sobre algo


sério. — Ela revirou os olhos, ignorando o bracelete e
bebendo da taça com suco de uva, que escolhi para
substituir o vinho.
— E quero — confirmei. — Há alguns dias, depois da
primeira consulta, eu te perguntei se você tinha um plano
sobre o que fazer de agora em diante, e sua resposta não
soou muito convincente.

Ela concordou com um aceno de cabeça.

— Bem, eu já contei pra minha mãe sobre o bebê.

— Como ela reagiu?

— Como imaginei… — Ela considerou antes de continuar: —

Só que um pouco pior.

— Quão pior? — insisti, franzindo o cenho.

— Ela me disse que é impossível fazer caber um bebê no


nosso apartamento. Mas está tudo bem, eu meio que
concordo com ela, e não apenas na questão do espaço.
Quero criar o bebê num lugar com boa energia, o que é
impossível se nós estivermos sob o mesmo teto que ela.

— Você nunca fala muito sobre a sua mãe — observei.

— Não tem muito o que falar. — Ela deu de ombros,


indicando que aquilo era tudo o que diria sobre o assunto. —
Você me perguntou se eu tinha um plano — retomou,
colocando um sorriso animado no rosto —, e agora eu
tenho. A colega de quarto de Caroline vai embora, e ela me
convidou pra morar com ela.

— E o bebê?

Helena rolou os olhos, como se a resposta fosse óbvia.

— Obviamente ela sabe que o bebê e eu somos um pacote,


Raf, está tudo bem — garantiu. — Ela está empolgada pra
ser tia, já até me rebocou pra escolher umas roupinhas e
nós ainda nem sabemos se é menino ou menina. Mesmo
assim, eu não resisti…

Helena vestiu a expressão de alguém que tinha aprontado


algo e sabia bem disso. Ela se levantou da mesa
rapidamente, indo até o aparador, onde estava sua bolsa,
mergulhando uma das mãos ali, que emergiu com o que, à
distância, parecia um par de sapatinhos de bebê.

Então ela veio em minha direção, estendendo-me o que de


fato eram sapatinhos de lã, tão pequenos que achei ser
impossível serem capazes de comportar o pé de um ser
humano, por menor que fosse.

— São as cores da bandeira da Grécia, não são? Azul e


branco? — Helena perguntou, com um sorriso que
ameaçava partir seu rosto em dois. — Achei tão bonitinhos,
pensei que o bebê poderia usá-los na saída da maternidade.

Não era um evento tão distante assim. Helena estava na


décima sexta semana, quase na metade da gestação… e ali
estava eu, contando o tempo em semanas e fazendo planos
para quando o bebê chegasse.

Depois do susto inicial, a ideia de ser pai havia me ganhado,


especialmente quando Helena me disse que sentiu o bebê
se mexer. Talvez fosse cedo para isso, mas, como pais de
primeira viagem, preferimos acreditar que se tratava do
nosso filho, não do estômago de Helena protestando por
estar sempre com fome.

Falaríamos sobre isso com a médica obstetra, na próxima


consulta, na qual descobriríamos também o sexo do bebê.
Nossa segunda tentativa, já que na primeira não obtivemos
sucesso algum.
— É uma ideia interessante, mas talvez minha mãe tenha
outros planos — considerei, depositando os sapatinhos ao
lado do meu prato com meu jantar intocado.

— Como assim?

— É o primeiro neto de Irene Galanis, e tenho a impressão


de que ela vai querer tricotar algo especial para ele.

O queixo de Helena pendeu, e ela ignorou a etiqueta por


completo quando, em vez de retomar seu assento, ela
puxou sua cadeira e colocou próximo à minha, de modo que
pudesse me fitar de perto, com os olhos arregalados.

— Isso quer dizer que você pretende envolver sua família


nisso tudo? — sussurrou, como se me contasse um segredo.

— Eu não sei o que mais posso fazer pra provar que falo
sério quando digo que vocês dois podem contar comigo pra
tudo.

Não era um eufemismo. Nas últimas semanas, me coloquei


à disposição de Helena mesmo quando ela jurava não
precisar de ajuda. Fiz questão de levá-la e buscá-la na
cafeteria, porque ela era teimosa demais para desistir do
emprego de salário irrisório, alegando que não estava
doente e não seria sustentada por mim.

Isso sem falar nas inúmeras consultas às quais


comparecemos, porque eu precisava ter uma equipe médica
de confiança cuidando da saúde da futura mãe do meu filho.

Mesmo com ações que diziam muito, Helena ainda


precisava de palavras que a confortassem, e eu estava
começando a entender isso.
— Bem, nesse caso… — Ela ponderou, pegando o par de
sapatinhos na mão. — Cada um fica com um pezinho —
decidiu, estendendo-me uma das pecinhas de tricô, a qual
peguei. — Você pode pendurar o seu no retrovisor do carro,
vai ser um verdadeiro ímã de mulheres.

— Não preciso de um ímã de mulheres.

— Claro que não — concordou, engolindo em seco logo


após.

— Você por si só já é um ímã ambulante. Que idiota… —


Helena cochichou, mais para si mesma do que para mim,
enquanto enterrava o rosto na mão livre, deixando claro que
ela não havia entendido o sentido das minhas palavras.

— Não foi isso o que eu quis dizer — retorqui, afastando as


mãos que cobria seu rosto para poder encará-la. — O que
acontece é que eu também tenho um plano envolvendo o
nosso filho, mas um pouco diferente do seu.

— Qual? — ela quis saber, de sobrancelhas franzidas.

— Bem, já estava nos meus planos fazer isso, mas confesso


que essa história de você ir morar com Caroline…

— O que tem isso? — pressionou, impaciente.

— Estique o braço — pedi, conforme alcançava o lindo


bracelete até então esquecido.

— Raf, eu já disse que não posso aceitar um presente assim

— Helena protestou pela milésima vez.

— E eu já disse que você pode e deve. Mas não é


exatamente um presente, faz parte de algo que eu quero te
perguntar.

— Me perguntar? — ela ecoou, com desentendimento


moldando suas feições.

Respirei fundo, esperando um nervosismo que não parecia


prestes a dar as caras, o que era diferente de como
imaginei a coisa toda.

Depois da breve conversa com meu pai, em que lhe contei


que eu havia engravidado uma moça, não lhe dei mais
detalhes sobre o assunto. Quando ele me perguntou se eu
lidara com a situação, eu apenas lhe disse que sim, e isso
pareceu ser o suficiente para ele.

Mas o mesmo não poderia ser dito ao meu respeito.

Suas palavras dizendo que não permitiria que um bastardo


com sangue Galanis existisse por aí me fez pensar sobre
meu arranjo com Helena, sobre nossos meses juntos e,
principalmente, como vinha sendo as últimas semanas,
desde que descobri sobre sua gravidez. Eu estava…
animado, na falta de palavra melhor, e eu não me sentia
assim há um bom tempo.

Tendo conquistado tudo o que eu queria antes mesmo dos


trinta, no fundo eu sempre soube que a vida de cafajeste
libertino não era para mim. Agora havia uma mulher grávida
de um filho meu, cuja companhia eu apreciava, cujos rosto
e corpo de deusa grega não saíam da minha cabeça e cujos
beijos eram doces e me embriagavam.

Só havia uma coisa certa a se fazer, e o fato era que eu


queria fazê-la.

— Helena Jones… — Chamei seu nome devagar, buscando o


braço que ela se recusou a estender para mim, e circulei
seu pulso com o bracelete de diamantes. — Você aceita se
casar comigo? —

Abotoei o bracelete, observando como ele pareceu feito sob


medida para Helena.

— Me casar? — ela quis se certificar, atônita. — Com você?


Seus olhos dançaram entre mim e o bracelete por alguns


segundos.

— Mas… você não me quer. Não me ama. Como…

— Claro que eu quero você — eu me apressei a interrompê-


la.

— É absurdo pensar o contrário depois dos últimos meses.


Desde que coloquei os olhos em você, naquela cafeteria,
fiquei completamente hipnotizado e não consegui te tirar da
cabeça.

— Mas você disse, no outro dia…

— Eu sei o que eu disse — voltei a cortá-la. — Em partes,


mantenho minha opinião. Meus sentimentos não estão à
altura do que você merece, ainda, mas isso não quer dizer
que as coisas não possam mudar. Um casamento não é feito
apenas de amor, mas também de respeito e admiração. E
nós vamos ter um filho. Não quero nem vou ser apenas um
nome na certidão de nascimento dele, ou um cheque
generoso no fim de cada mês. Vou ser pai, em todos os
sentidos que essa palavra contempla, e, se você deixar,
quero ser também seu marido. Cuidar de você, de vocês —

enfatizei, colocando uma das minhas mãos em sua barriga


já proeminente. — Construir uma família.
Seus lábios carnudos tremeram enquanto ela tentava conter
o choro, mas as lágrimas teimosas caíram mesmo assim.

— Isso está acontecendo de verdade? — ela quis saber. —

Você está mesmo me pedindo pra ser sua esposa?

— Estou — afirmei. — Com um bracelete, mas estou. Seu


anel de noivado já foi encomendado e…

A pressão dos lábios de Helena contra os meus me calou.


Foi o nosso primeiro contato minimamente romântico desde
que eu soube sobre a gravidez, e era bem-vindo.

— Quantas vezes eu preciso dizer que não quero nem


preciso de presentes? — ela perguntou com a boca ainda
colada à minha.

— Tudo o que eu quero está bem aqui, e vou fazer tudo o


que estiver ao meu alcance pra ser digna de você.

— Não diga bobagens — eu a cortei —, você é mais do que


digna. Agora, precisamos falar da sua mudança pra cá, e
também dos preparativos para o casamento.

CAPÍTULO 07
Rafael acariciou o membro ereto enquanto mantinha seu
olhar faminto sobre mim, e isso já era o bastante para me
deixar tão excitada quanto estaria se ele ainda estivesse me
tocando.

Desde que ele voltou da Grécia, nós tínhamos transado uma


única vez, e estar tão perto dele e ao mesmo tempo tão
longe era uma tortura que eu já não conseguia mais
suportar.

Eu não esperava ser pedida em casamento, mas seria


mentira dizer que não havia uma centelha de esperança no
meu coração de que Rafael gostaria de saber aonde nós
poderíamos chegar juntos, e eu apostava que iríamos longe
o suficiente para construir um relacionamento que não seria
apenas baseado em sexo e no fato de que teríamos um
bebê juntos.

— Eu disse que eles estavam maiores, não disse? — ele


perguntou apontando com a cabeça para os meus seios,
conforme

se tocava, caminhando para mais perto de mim, que já o


esperava na cama, ansiosa para ser sua outra vez.

— Tem certeza de que não precisa se certificar? —


provoquei, e em troca ele me cedeu um de seus sorrisos
arrasadores, inclinando-se para capturar minha boca com a
sua, mudando o curso do movimento assim que seu lábio
superior tocou o meu inferior.

Ele tomou meu seio na boca, sugando-o para si, a língua


dançando contra o meu mamilo e fazendo com que o tesão
percorresse meu corpo com mais força, concentrando-se no
meio das minhas pernas.
Gemi, entregue às sensações que apenas Rafael era capaz
de provocar no meu corpo, o que já era sublime
intensificando-se ainda mais, graças aos meus hormônios
bagunçados pela gravidez.

Afundei os dedos de uma das minhas mãos nos cabelos


castanhos do meu, agora, noivo, puxando-os pela raiz, a fim
de que ele levantasse a cabeça e me desse o beijo que tão
provocantemente me prometera.

Eu jamais poderia imaginar que a experiência de beijar a


boca de Rafael pudesse ficar melhor, mas ficara. Sua língua
resvalando contra a minha, meus mamilos intumescidos
resvalando seu peitoral quente, minha mão livre assumindo
as carícias no membro clamando pelo calor entre minhas
coxas da mesma forma que eu clamava por ele.

Raf gemeu contra o beijo, seus dedos buscando minhas


dobras molhadas até dois deles me penetrarem, estocando
em mim enquanto a palma de sua mão resvalava contra
meu clitóris carente de

atenção.

Meus

músculos

internos

se

apertaram

involuntariamente sob aquela doce tortura, e eu aumentei a


velocidade com que masturbava Rafael.
O toque na minha intimidade cessou, e seus dedos
molhados pela minha excitação seguraram meu pulso, me
forçando a parar de tocá-lo.

— Tudo bem, já entendi que esse é um jogo que nós dois


podemos jogar — ele murmurou através de sua respiração
pesada, e abri meus olhos para encontrar seus orbes de
safira fixos nos meus. — Só me deixa matar a saudade do
seu gosto antes de te foder como se não houvesse amanhã.

Aquilo não era nem de longe um pedido de permissão, já


que sua mão espalmou o espaço entre meus seios, me
empurrando para que eu me deitasse, e Raf caiu de boca
em mim no segundo em que minhas costas encontraram o
colchão.

Minha voz saiu arranhando todo o caminho através da


minha garganta em um grito desesperado. Os movimentos
de sucção e as lambidas no meu clitóris me fazendo tremer
da cabeça aos pés enquanto Raf apoiava a parte de trás das
minhas coxas nos seus ombros, o que parecia ter a única
função de me enlouquecer… e fazer com que seu rosto
fosse mais fundo no meu centro encharcado e pulsando de
prazer.

Talvez Raf estivesse certo e duas pessoas pudessem mesmo


jogar aquele jogo, mas quando suas unhas curtas traçaram
o caminho dos meus quadris até os meus seios, beliscando
meus mamilos, eu sabia que um de nós estava jogando em
desvantagem, já que eu explodi em um orgasmo alucinante
antes mesmo de conseguir formar um pensamento
coerente.

— Raf… — Seu nome saiu como uma súplica e uma


adoração, conforme eu me desmanchava em ondas
secundárias de um prazer arrebatador que fez tudo dentro
de mim latejar depressa e, então, amainar para espasmos
que, apesar de mais brandos, eram tão gostosos quanto o
pico da sensação.

— Eu deveria dar um workshop sobre como fazer uma


mulher gozar apenas com a boca. — Sua voz rouca soou, a
respiração quente batendo na parte interna da minha coxa
e me fazendo sorrir ao passo que Raf acomodava meus
quadris de volta no colchão, sem sair do meio das minhas
pernas.

— Não seja convencido, sou uma grávida em abstinência,


uma presa fácil.

Ele engatinhou sobre mim, o rosto enterrando-se em meu


pescoço e fazendo minha intimidade latejar como se não
tivesse acabado de experimentar o melhor orgasmo da
minha existência.

— Nesse caso, vou precisar continuar com os testes e saber


a real influência dos hormônios e da abstinência — ele
sussurrou ao pé do meu ouvido, mordendo o meu lóbulo e
deixando beijos por todo o caminho até a minha boca.

Parecia o cenário perfeito para mim, e se possível eu me


apaixonei um pouco mais por Rafael Galanis bem ali.

— Agora eu preciso cumprir aquela promessa de te foder


como se não houvesse amanhã — ele me lembrou, e eu o
senti guiar sua ereção para minha entrada, a glande
deslizando pelas minhas dobras e se banhando com a
minha umidade pós-orgasmo.

— Preservativo — murmurei em um suspiro, e todos os


músculos de Rafael se retesaram para brecar seu
movimento de se afundar em mim.
Ele se afastou apenas o suficiente para me encarar, os olhos
azuis desejosos cravados nos meus.

— Eu estou limpo, a prova disso é que você e o bebê estão


bem.

Acenei em concordância uma vez.

— Achei que você tivesse apenas esquecido.

E ali estava, seu sorriso arrebatador e que sempre me fazia


querer tirar a roupa e me atirar nos seus braços.

— Bem que eu poderia ter esquecido, nós estamos


transando com um pedaço de látex no meio a troco de
nada. — Raf lançou uma piscadela para mim, inclinando-se
para beijar o meu queixo. —

Eu nunca transei sem camisinha antes, mas se você


quiser…

— Não quero — eu o cortei. Não precisava que ele


terminasse o que quer que fosse dizer. Eu queria senti-lo
dentro de mim, apenas pele com pele, e se era isso o que
Raf também queria, não havia por que não fazer.

— Ótimo — anuiu, voltando a posicionar a glande na minha


entrada, deslizando para dentro do meu corpo com um
movimento lento e contido.

Minhas costas se arquearam involuntariamente, meus


músculos abraçando a ereção de Rafael como se não
quisesse deixá-la ir embora nunca mais.

Eu gemi, e Raf soltou algo parecido a um urro.


Rebolei contra ele, ávida por senti-lo inteiro dentro de mim,
mas Raf apertou meu quadril com uma de suas mãos, tão
forte que uma pontada de dor atravessou minha carne.

Abri meus olhos no mesmo instante, vendo seu rosto


contorcido numa expressão de dor.

— O que foi? — eu quis saber, preocupada, tentando me


levantar, mas Raf foi mais rápido ao ordenar:

— Não se mexa nem um único centímetro, por favor — ele


praticamente implorou, e eu franzi as sobrancelhas, em
confusão.

— Por quê?

Seus olhos se abriram para mim, as pupilas quase tomando


todo o espaço das íris azuis.

— Porque eu posso gozar feito a porra de um adolescente,


se você não parar de rebolar essa boceta apertada no meu
pau desse jeito.

Foi impossível conter a gargalhada, meu corpo se sacudindo


no processo sem que eu pudesse evitar.

— Porra! — ele praguejou, todos os seus músculos se


apertando enquanto ele tentava se controlar. — Vai ser a

performance mais curta de toda a história, mas vou ter uma


vida inteira pra te recompensar.

Antes que eu pudesse elaborar qualquer resposta, Rafael já


estava se arremetendo contra mim, sua boca buscando a
minha furiosamente, uma de suas mãos agarrando minha
coxa e puxando-a para cima como se assim pudesse ir mais
fundo.
Era o meu Raf de sempre, mas agora… eu sentia que ele
era realmente meu. Não havia nada igual ao contato de
pele com pele, sem absolutamente nada entre nós dois.
Apenas Rafael me tomando um pouco mais para si a cada
estocada, a cada vez que sua mão se fechava com mais
força em torno da minha coxa, a cada lambida lânguida que
ele deixava desde a base do meu pescoço até minha orelha,
gemendo ao meu ouvido da mesma forma sôfrega com que
eu gemia.

Então, no meio disso tudo, ele acariciou minha barriga já


aparente, e havia tanta ternura no gesto, que não consegui
conter as lágrimas que derramei. Eu as enxuguei antes que
Raf pudesse vê-las, porque não queria que ele se
preocupasse. Eram lágrimas de felicidade, de amor, de
desejo, porque nunca pensei que pudesse encontrar um
homem tão perfeito quanto ele.

Quando os primeiros tremores acometeram seu corpo, foi


como se o meu próprio seguisse algum tipo de comando
silencioso, entregando-se à sensação junto com Rafael, que
se derramou dentro de mim em jatos quentes, os músculos
retesados e sua boca se fechando ao redor da pele da
minha clavícula, onde seu gemido arrastado encontrou
espaço para ser liberto.
CAPÍTULO 08

— Ainda não consigo acreditar que você vai mesmo se


casar, não achei que eu fosse viver o bastante pra ver algo
assim acontecer.

Rolei os olhos para a fala engraçadinha de Orion, que não


deveria ser a pessoa a fazer piadas sobre minha demora em
assumir um compromisso. Entre mim, ele e Nikos, ele era o
primo mais velho, deveria ser dele a responsabilidade de
dar seguimento ao legado Galanis.

— Sendo sincero, não achei que o próprio Raf viveria o


bastante para isso — Nikos interveio, mas o sorriso que
esboçou através da videochamada era o indicativo de que
ele queria apenas implicar comigo.

Se não fosse por nossa avó prezar tanto a união da família,


eu já teria cortado relações com os dois. Seria muito fácil,
na verdade. Com nossas agendas sempre tão cheias e
ramos de negócios tão distintos, nós poderíamos facilmente
nos encontrar uma única vez no ano, no aniversário de
Yayá, já que ela amava comemorar cada ano de vida e
enxergava na ocasião uma oportunidade perfeita para
reunir toda a família Galanis.

Em vez disso, meus primos e eu tínhamos reuniões


quinzenais em videochamadas para tratar de… nada, em
específico.

O streaming Galanix+ comandado por Nikos era


simplesmente o mais assinado a nível mundial. O que
começou como um experimento na Grécia se tornou uma
febre global, graças às produções exclusivas.

Orion ia tão bem em seus negócios que vinha buscando


novos investimentos para se sentir de fato desafiado, e sua
nova aposta era um time de futebol, um assunto que ele
dominava tão bem quanto o idioma alemão. Mas Orion não
falava alemão.

E já eu… tinha a Amethystós, que era o resultado da junção


do tino comercial do meu pai com o apreço de minha mãe
por joias bem trabalhadas. Eu não esperava que minhas
peças se tornassem objeto de disputa tão depressa, mas foi
o que aconteceu, e eu não podia reclamar de nada disso.

Ainda assim, com a rotina complexa e fuso-horários no


caminho, os primos Galanis sempre tiravam um tempo para
se manter a par da vida um do outro e compartilhar
segredos e conselhos que, em sua maioria, não seriam
seguidos por ninguém.

Esse foi o motivo de eu ter escolhido contar a eles sobre


Helena e o bebê antes de contar para os meus pais. Meus
primos eram mais jovens, viajaram o mundo e não eram tão
ortodoxos. Para falar a verdade, talvez meu pai fosse o
único que ainda esperava que eu encontrasse uma boa
moça grega com quem me casar, porque seu próprio irmão,
Eros Galanis, pai de Orion, escolhera uma brasileira para
compartilhar a vida.

— Tenham mais respeito ao falarem comigo, a partir de


agora.

Dentro de poucos meses vou ser pai de família e exijo ser


tratado como tal

— alertei, mas claro que não fui levado a sério.

— Quando você pretende contar a Yayá sobre isso? — Nikos


quis saber.
— Pretende vir a Mykonos apresentar sua noiva, suponho —
Orion emendou.

— Tudo vai depender de como as coisas se saírem quando


eu contar aos meus pais. Tenho a leve impressão de o
digníssimo senhor Nestor Galanis não vai ficar nada feliz
quando conhecer as origens de Helena.

Se o rosto inflado do meu pai fosse algum indício, eu


acertara em cheio em minhas suposições sobre como ele
reagiria ao meu casamento com Helena.

Nestor Galanis me encarava com olhos esbugalhados e uma


veia saltada na testa que ameaçava explodir a qualquer
instante.

— Achei que você tivesse dito que lidara com isso, Rafael!
— ele bradou, saliva saindo de sua boca furiosamente
graças à sua revolta.

— E o que você achou que eu faria? Que abandonaria uma


mulher grávida de um filho meu? Não foi você mesmo quem
me ensinou que precisamos encarar com firmeza as
consequências de nossos atos, sejam elas quais forem? —
Eu me virei em direção à minha mãe. — E não foi a senhora
quem me criou para ser um perfeito cavalheiro?

Ela assentiu, emocionada, e logo seus braços circundaram


meu pescoço num abraço apertado.

— Um neto! — ela praticamente cantou de felicidade. —


Enfim, um neto! — Minha mãe segurou meu rosto com
ambas as mãos, e, apesar de ser uma mulher alta, precisou
se esticar nas pontas dos pés para depositar um beijo em
minha testa. — Quando nós vamos conhecer a tal moça, sua
noiva?

— Helena — eu lhe disse. — Ela se chama Helena.

— Helena — mamãe ecoou, com um sorriso indisfarçável


nos lábios.

— Helena Galanis. Eu gosto de como soa. — Ela voltou a me


abraçar, dessa vez descansando a cabeça no meu peito. —
Não vejo a hora de conhecê-la, ajudar com os preparativos
para a cerimônia, acompanhá-la em suas idas ao médico e
fazer com minhas próprias mãos a roupinha de saída da
maternidade.

Sorri para a minha mãe, porque ela sempre fora meu porto
seguro e a maior apoiadora de minhas decisões. Ela
confiava no meu bom senso, o que era muito mais do que
poderia ser dito sobre o meu pai.

— Não sejam tolos. — A voz dele voz soou, colocando um


fim à pequena comemoração que minha mãe fazia. — Como
pode acreditar assim tão fácil que esse filho é seu? Não foi
isso que eu te ensinei, Rafael. Sempre haverá mulheres
fáceis e sem caráter prontas para aplicar o golpe da barriga
em um homem com muito dinheiro e ingênuo a ponto de
acreditar em palavras vazias.

— Nestor — minha mãe tentou acalmá-lo. — Por que é tão


difícil assim aceitar que nosso filho se apaixonou e
despertou o mesmo sentimento em alguém? Olhe só para
ele, que mulher em sã consciência não cairia de amores por
esse deus grego que temos como filho? A coisa mais
importante em Rafael está muito longe de ser o dinheiro
que ele possui.
Sua intenção era aliviar o ambiente, sempre era, mas teve o
efeito oposto. Quando contrariado, Nestor Galanis não
enxergava com lucidez e sempre erguia a voz como se,
assim, ele pudesse delimitar a linha que indicava quem
mandava e quem deveria obedecer.

— Essa história ainda não acabou entre nós dois, Rafael.


Quando terminar de brincar de conto de fadas com a sua
mãe, venha até o meu escritório, temos assuntos sérios
sobre os quais conversar.

CAPÍTULO 09

Não fui ao escritório do meu pai, como ele solicitou.

Eu já sabia perfeitamente o que ele iria dizer, de modo que


nós não precisávamos ter aquela conversa, sendo assim,
depois que me despedi da minha mãe, fui direto para a
minha cobertura.

Helena e eu nos casaríamos mesmo sem sua aprovação,


isso já estava decidido. A gravidez não-planejada era nossa
responsabilidade, minha e dela, e nós dois precisávamos
assumir as consequências de nossas imprudências.
Não que eu estivesse arrependido, longe disso. Seria
mentira dizer que eu não ficara receoso a princípio, mas o
tempo fez com que eu não apenas me acostumasse à ideia
de ser pai, como também gostasse dela.

A prova disso era que a simples lembrança do ultrassom de


Helena com o sapatinho de tricô que ela me dera,
guardados na primeira gaveta da minha mesa de cabeceira,
era capaz de me fazer sorrir como um perfeito idiota.

Além disso, havia ela. A própria Helena.

Quando cheguei da Grécia eu ainda não sabia como


denominar o que sentia por ela. Tudo o que eu sabia com
certeza era que, apesar de ter estado na presença de
mulheres deslumbrantes em desfiles de moda e reuniões de
negócios, nenhuma delas me despertou o desejo que
Helena era capaz de despertar.

O sexo entre nós dois desde que voltei de viagem estava


cada vez mais alucinante, eu mal conseguia olhar para ela
sem sentir a urgência de despi-la e tomá-la para mim. As
novas curvas que seu corpo ganhara para receber o nosso
filho eram simplesmente irresistíveis, e eu adorava me
perder em cada uma delas.

Talvez fosse cedo demais para afirmar com certeza, mas eu


acreditava estar apaixonado pela minha noiva. Havia meu
senso de responsabilidade, claro, e eu jamais deixaria uma
mulher grávida de um filho meu em situação de desamparo.
Mas pedi-la em casamento?

Assumir um compromisso desse porte com alguém por


quem eu não estivesse atraído por completo e cuja
companhia eu adorasse? Não… eu não era tão cavalheiro
assim.

O que Orion e Nikos diriam quando eu lhes contasse sobre


isso?

— Você não pode estar mesmo disposto a se casar com uma


mulher que conheceu há poucos meses apenas porque ela
disse estar grávida de um filho seu! — meu pai explodiu
assim que as portas do elevador privativo da minha
cobertura se abriram na minha sala de estar.

Eu deveria ter me recusado a recebê-lo, nada de bom viria


daquele encontro.

— Você me disse que não queria um bastardo com sangue


Galanis por aí, tomei as providências cabíveis — provoquei,
assistindo à veia de sua testa saltar um pouco mais. — Meu
filho e de Helena vai nascer dentro de um casamento e
obviamente ele vai ser um Galanis, no sentido mais
completo da palavra, quer você goste ou não.

Ele assentiu uma única vez, apesar de não parecer


satisfeito.

— Eu esperava não precisar chegar a esse extremo, Rafael,


mas você não me deixa alternativa.

— Do que está falando?

Com passos largos, ele se colocou logo à minha frente,


rompendo a distância que nos separava.

— Antes de eu poder explicar tudo, você precisa jurar que


não vai contar uma única palavra do que falarmos aqui para
a sua mãe. De acordo?
— O que minha mãe tem a ver com tudo isso? — perguntei,
confuso.

— Preciso que jure que isso fica entre nós — ele insistiu. —
Você está ou não de acordo?

Concordei com um aceno de cabeça, a contragosto.


Contanto que ele dissesse logo o que queria e me deixasse
em paz, havia poucas coisas com as quais eu discordaria.

O gesto foi tudo de que meu pai precisava para retirar seu
celular do bolso, os dedos passando pela tela com rapidez
até que ele a girou para mim, uma foto de Helena que eu
desconhecia.

— Esta é a mulher que supostamente está grávida de você?


— ele quis saber, e franzi minhas sobrancelhas para a
imagem.

— De onde tirou essa foto?

— De poucos meses atrás, quando paguei Helena para ser


minha acompanhante de luxo pela primeira vez. — O quê?
— Não demorou até que ela surgisse grávida, alegando que
o bebê era meu, mesmo quando eu sabia que ela se
envolvia com outros clientes.

— Clientes? — eu quis me certificar, com um nível de


estupefação que era impossível colocar em palavras.

— Ela cobrava por sexo, Rafael, e não me orgulho em dizer


que fui um dos homens que lhe deram dinheiro em troca de
seu corpo.

Helena, cobrando por sexo?


Não fazia sentido. Seu sorriso fácil e seu olhar doce
assaltaram meus pensamentos e eu não conseguia encaixá-
los dentro do contexto que meu pai descrevera.

— Helena jamais faria algo assim. — Havia tanta convicção


em minhas palavras que surpreendi a mim mesmo. — Eu a
conheço, estamos juntos há meses e ela nunca se
demonstrou interessada em nada que eu pudesse lhe
oferecer.

Eu me lembrei de todas as minhas tentativas de presenteá-


la, de como ela dizia que não queria o meu dinheiro, que
meus olhos azuis e meu sorriso eram tudo o que ela queria.

O único presente que Helena aceitara fora o polvo de


pelúcia, e o bracelete de diamantes, como símbolo físico do
nosso compromisso.

Nada além disso… nada perto de tudo o que eu poderia lhe


proporcionar, caso ela quisesse.

— Ela precisa parecer sempre tímida e condescendente, no


início, para conseguir dar o bote final. — A voz do meu pai
soou, estranha aos meus próprios ouvidos. — Se suas
intenções estivessem claras desde o início, ela jamais teria
chegado tão longe.

Nada daquilo fazia sentido. Simplesmente não fazia.

Então por que diabos meu pai tinha uma foto de Helena no
celular?

— Você está me dizendo que vem traindo minha mãe com


uma mulher tão mais nova que poderia ser sua filha? —
praticamente cuspi, sem conseguir conceber aquele
cenário.
E, sendo honesto, eu não conseguia me decidir qual era o
pior cenário: meu pai traindo minha mãe com Helena, ou
Helena me traindo com meu próprio pai.

Era a mesma coisa, ainda assim, tinha um peso diferente.


Nós não tínhamos um acordo de exclusividade antes de eu
saber sobre o bebê, com quem ela dormira ou deixara de
dormir não deveria me importar. Mas, porra! Importava!
Especialmente se esse homem em questão fosse meu pai.

— Foi um ato impensado do qual me arrependo


amargamente, sobretudo vendo que aquela mercenária está
usando você, tentando me castigar se casando com meu
filho e fazendo com que ele assuma um filho que não é
dele!

Conhecendo meu pai como eu conhecia, eu tinha certeza de


que ele dissera cada uma das últimas palavras aos berros.
Mesmo assim, elas

soaram distantes, como se eu estivesse preso em um


pesadelo com um filme de terror como trilha sonora.

No fundo, algo dentro de mim sabia muito bem o que ele


queria dizer, mas minha mente não se atrevia a pensar na
possibilidade.

— Quem é o pai do filho que Helena está esperando, de


acordo com você? — questionei no ímpeto, sendo
consumido por uma onda de arrependimento gigantesca
logo depois.

Eu não queria saber. A menos que ele me dissesse que eu


era o pai do bebê crescendo no ventre de Helena, ao qual
eu já me apegara e começara a amar, eu simplesmente não
queria saber.
— Sou eu. Por isso ela viu em você um alvo fácil. A criança
teria minhas características e, automaticamente, as suas.
Helena quis me chantagear, mas nem mesmo depois de eu
ter feito um cheque milionário, para que ela não trouxesse
toda a história à tona, ela se deu por satisfeita.

— Não — neguei imediatamente, sacudindo a cabeça de um


lado para o outro, me recusando a acreditar naquele cenário
macabro que ele descrevia. — Para que isso fosse verdade,
nós precisaríamos ter estado com ela na mesma época, e
isso não pode ser.

Ele mexeu no celular outra vez, e meu estômago ficou


embrulhado automaticamente.

— Aqui.

Quando ele girou a tela para mim novamente, havia uma


porção de coisas me obrigando a encará-la.

Um teste de gravidez que eu nunca vira, fotos de Helena


com uma das mãos na barriga, que já estava aparente, uma
porção de mensagens sem sentido naquela conversa
estranha e, de quebra, a foto do sapatinho de tricô igual ao
meu.

“Sua esposa já sabe que tem um novo Galanis a caminho?”,


dizia a legenda que pude ler através da minha visão
embaçada.

— Se isso não forem provas suficientes para que você


acredite em mim, só resta uma saída: confrontarmos Helena
juntos, assim ela não vai ter alternativa além de confessar
toda a verdade — meu pai sugeriu, mas não tive forças de
levar meu olhar para o dele, porque havia muitas
imagens dele com Helena nos braços que me açoitavam. —
Só não diga nada à sua mãe. Isso a deixaria devastada.

E como diabos ele achava que eu me sentia?

CAPÍTULO 10

Se alguém me dissesse, poucos meses atrás, que eu


poderia ser tão feliz quanto me sentia no momento, eu
jamais teria acreditado.

Eu tinha Rafael, um bebê a caminho e agora estava


empacotando as poucas coisas que pretendia levar comigo
do apartamento minúsculo que dividia com minha mãe.
Apesar de sempre termos morado juntas, só agora que eu
estava grávida e noiva conseguia de fato sentir que
pertencia a uma família.

Mamãe não era o melhor exemplo de amor materno, e eu


esperava poder ser melhor para o bebezinho crescendo no
meu ventre do que ela havia conseguido ser para mim.

O som de vozes alteradas vindo da sala, no entanto,


interrompeu meu momento de planejar o futuro, e eu me
apressei em direção ao cômodo. Antes mesmo de que
pudesse chegar lá,
porém, a porta do meu quarto foi aberta com brusquidão, e
um Rafael de feições nada amigáveis irrompeu por ela.

A mandíbula estava trincada, os olhos azuis endurecidos e


as narinas inflando a cada respiração.

— Raf, o que aconteceu? — eu quis saber, indo em sua


direção para abraçá-lo, na tentativa de acalmar seus
ânimos, independentemente do que estivesse acontecendo.

Mas ele se desviou do meu abraço, dando um passo para


trás, um rosto familiar e um desconhecido surgindo às suas
costas.

Minha mãe, acompanhado de um senhor de meia-idade,


seus traços indicando que ele e Rafael tinham algum grau
de parentesco.

Seria ele o pai de Raf?

Estupidamente, lancei um rápido olhar para minha camiseta


puída e para os shorts manchados de água sanitária que eu
vestia, agradecendo o fato de ter tirado do pulso minha
pulseira de diamantes, porque ela apenas me faria parecer
ainda mais ridícula.

Todavia, talvez fosse bom estar com ela, se eu tivesse a


chance de trocar de roupas para conhecer meu futuro sogro
com um pouco mais de dignidade.

— Eu te avisei que a verdade iria aparecer mais cedo ou


mais tarde, Helena! — mamãe falou num tom
estranhamente afobado, e estreitei meus olhos para ela,
sem entender a que se referia.

— O que quer dizer? — questionei, buscando no rosto de


Rafael alguma pista, mas não encontrei nada além de sua
expressão descontente.

— Você é uma acompanhante de luxo! — acusou, e meu


queixo pendeu em estupefação.

— Quê? — Foi tudo o que consegui dizer em resposta.

— Não tenho mais tempo nem paciência para os seus jogos


de manipulação, Helena! — Raf retomou em tom cortante.
— Me diga a verdade, pelo menos uma única vez!

Fiz uma nova tentativa de me aproximar, erguendo uma de


minhas mãos para tocar o rosto do meu noivo, mas ele
tornou a se afastar, desta vez, segurando meus dois braços
e me empurrando para trás, para longe dele.

— Eu não sei do que você está falando — admiti, meus


olhos indo para minha mãe e para o homem que supus ser o
senhor Galanis. — O que está acontecendo?

Sorri nervosamente, contra minha vontade, um reflexo de


desentendimento com uma pitada de desespero crescente.

— Chega, Helena — o senhor de meia-idade decretou. — Eu


disse que você não conseguiria ir até o fim com essa farsa.
Rafael já sabe de tudo, acabou. Já não há nada que você
possa usar para tentar manipular a situação ao seu favor,
nem mesmo as ameaças de contar o que aconteceu entre
nós dois para Irene.

Irene? A mãe de Rafael? Então aquele senhor era mesmo o


pai dele?

— Senhor Galanis? — eu quis me certificar, minhas


sobrancelhas unidas em confusão.
— Agora você vai fingir que não o conhece? — Raf
perguntou em tom sarcástico, o ar saindo por suas narinas
com força. — Que nunca dormiu com ele e que esse filho
que está esperando não é dele?

— Quê?! — Havia ainda mais perplexidade no meu tom


agora, porque nada que saía pelos lábios de nenhum deles
fazia o menor sentido.

Era um pesadelo. Tinha que ser.

— Só quero que você me diga a verdade, olhando nos meus


olhos — Raf retomou, o tom cortante. — É pedir demais?
Você já tem o dinheiro que tanto queria, não é o suficiente?
Quanto mais você quer pra admitir que o bebê que está
esperando não é meu?

Minha boca se abriu em completa surpresa. Raf achava que


o bebê não era dele? Como podia ser? Nós tínhamos
estabelecido um

compromisso, fizéramos amor alucinadamente nas últimas


semanas, de onde surgira aquilo?

Tinha mesmo que ser um pesadelo.

Cravei as unhas nas palmas das mãos com toda força que
pude, esperando que a dor aguda me fizesse despertar.
Quando o cenário não mudou, apertei meus olhos com tanta
força que me senti tonta, esperando que, ao abri-los, as
coisas tivessem voltado ao lugar.

— Olhe pra mim enquanto eu estiver falando com você! —


Era a voz de Rafael, mas uma versão esganiçada e nada
amigável da que eu conhecia.
Ele me sacudiu, demonstrando que fizera uma exigência, e
meus olhos se abriram ao mesmo tempo que lágrimas
grossas desceram pelo meu rosto.

— O bebê é seu! — Tentei falar com a voz o mais firme


possível, mas, devido ao choro, ela tremeu em cada maldita
sílaba.

— Mas é claro que o bebê é seu, como pode duvidar disso?


— A produção de lágrimas continuava incessante, e era um
milagre que eu ainda me mantivesse de pé. — Eu jamais
mentiria sobre isso, nem tenho a menor ideia de por que
você está me dizendo todas essas coisas!

— Já basta, Helena — mamãe interveio, cortando a distância


que nos separava ao passar por Rafael e pousar uma das
mãos em meus ombros, em um meio abraço.

Ela viria em minha defesa, eu sabia que sim. Corinne podia


não ser a melhor mãe do mundo, no entanto ele me deu à
luz, conhecia minha índole. Melhor que ninguém ela sabia
que eu não era capaz da atrocidade da qual estava sendo
acusada.

— Você não tem o direito de destruir essa família, é melhor


admitir logo a verdade! — Foi o que ela escolheu dizer, e eu
me senti sendo apunhalada pelas costas.

Eu a fitei, incrédula, minha vista embaçada de lágrimas não


conseguindo discernir muito bem a imagem logo à minha
frente.

— Qual verdade? — balbuciei através do meu choro, ciente


da resposta arrasadora que viria depois.

Entretanto, ela não olhou para mim, quando disse:


— Helena e o seu pai tiveram, sim, um caso, Rafael. Sou
testemunha de todos os presentes caros que ela trazia pra
casa, quando eu sei que ela não pode pagar por eles com o
salário da cafeteria.

— Presentes caros? — esganicei, me afastando dela com


indignação. — Não tenho nenhum presente caro.

— Vai negar também que te dei um bracelete cravejado de


diamantes? — Rafael questionou ironicamente, o tom de voz
e o semblante tornando-o tão diferente do homem que eu
tanto amava.

— Não foi um presente — eu o lembrei —, você me disse.


Era o símbolo do nosso noivado!

Ele não me respondeu. Não com palavras, pelo menos.

Apenas meneou a cabeça de um lado para o outro, um


sorriso amargo e, ainda assim, dolorosamente bonito
tomando seus lábios.

Um sinal claro de que ele não acreditava em mim.

— Sinto muito por todo o dano que minha filha causou, e


assumo toda a responsabilidade. É minha culpa que ela seja
tão mesquinha e ambiciosa, mesmo que eu não saiba onde
errei.

Por que minha mãe continuava falando? Por que sua voz
ainda martelava em meus ouvidos com todas aquelas
calúnias acerca de sua própria filha? Acerca de mim? O que
eu fiz para ela de tão mau para que quisesse ver minha
ruína?

— Sou eu quem sente muito — Rafael objetou, a voz


profunda atraindo minha atenção enquanto ele encarava
bem no fundo dos meus olhos. — Pelo bebê que você está
carregando. Filho de um porco traidor e de uma… — …
vagabunda, completei mentalmente,

sabendo sua escolha de palavra antes mesmo de que ele


pudesse fazê-la.

Fechei os olhos com força, prendendo a respiração para


receber o golpe final que acabaria de vez com tudo aquilo.

— Não existe palavra pra descrever quão inescrupulosa


você é. — Foi o que enfim saiu pelos lábios de Raf, depois
do que me pareceram horas de hesitação. — Maldito seja o
dia em que coloquei os olhos em você.

Eu solucei, tampando minha boca para abafar o som o


máximo que podia, meus joelhos cedendo e encontrando o
chão em um baque surdo, a dor irradiando por minhas
pernas e me fazendo urrar. Mesmo assim, não se
comparava em nada com o quão destroçada eu me sentia
por dentro.

— Isso é mentira — sussurrei enquanto escutava os passos


de Rafael se afastando. Apoiei minhas mãos no chão,
engatinhando vergonhosamente para tentar alcançá-lo. —
Tudo o que eles disseram é mentira — assegurei, mas ele
nem sequer se virou para me olhar. — Raf! — chamei
mesmo assim, sentindo as mãos da minha mãe me
segurando no lugar. — RAFAEL! — berrei, minha voz
rasgando minha garganta. — Eu amo você, por favor,
acredita em mim!

Mas ele não acreditou.

PARTE 2

Dias atuais…
CAPÍTULO 11

Nestor Galanis estava morto, e seria mentira dizer que a


notícia me deixara triste.

Apesar do choque inicial e de ter sentido meu peso afundar


um pouco mais na cadeira enquanto o advogado do falecido
senhor Galanis continuava falando, tudo o que eu conseguia
experimentar com essa notícia era o mais puro alívio.

Isso fazia de mim um ser humano ruim? Eu queria acreditar


que não, afinal de contas, que outro tipo de sensação eu
poderia vivenciar sabendo que o homem que vinha
assombrando meus pensamentos já não podia mais me
machucar?

Respirei fundo, aliviada, esvaziando meus pulmões de todo


o ar e me controlando ao máximo para que um sorriso não
se formasse em meu rosto.

— Dá pra notar o quanto a notícia a afetou, senhorita Jones


o advogado à minha frente murmurou, roubando minha


atenção para si no mesmo instante, com a falsa
reprimenda.
— E-eu… — gaguejei, meio sem graça. Talvez não tenha
sido capaz de esconder meu sorriso da forma que pensei. —
Não sei o que dizer — admiti. — Sinto muito. É só que nunca
fui muito próxima da família Galanis e perdi qualquer
contato que poderia ter com eles há mais de um ano, então
não entendo por que o senhor se deu o trabalho de vir até
aqui apenas para me dizer isso.

Ele acenou em concordância.

— Não é uma família fácil de se apreciar, estou certo? — ele


brincou, e havia um ar de divertimento em seu olhar que
me fez relaxar. — De qualquer forma, é parte do meu
trabalho informar à senhorita que a leitura do testamento
vai acontecer em três dias e que sua presença é
requisitada.

Minhas sobrancelhas se ergueram com tanta rapidez, em


surpresa, que eu podia apostar que o resultado disso foram
olhos esbugalhados e uma expressão completamente
atordoada de minha parte.

— Acho que não compreendi o que o senhor disse — foi


minha resposta imediata.

— Um dos últimos desejos do senhor Nestor Galanis era que


a senhorita estivesse presente para a leitura do testamento
— ele tornou a dizer, como se explicasse o conceito para
uma criança de cinco anos. O problema era que o meu
cérebro não possuía tamanha evolução, ao que parecia,
porque as palavras ainda não faziam muito sentido para
mim.

— Acho que talvez o senhor tenha se confundido, porque,


como eu disse, não tenho ligações com a família Galanis e…
— A senhorita se chama Helena Jones, não? — ele
interrompeu, dando indícios de que sua paciência se
esgotara. Ele me mostrou os papéis que trazia nas mãos,
estendendo-os para

mim para que eu pudesse lê-los. — Este é seu local de


trabalho, o número da sua documentação confere?

Acenei levemente com a cabeça em afirmativo.

— Sim, mas…

— A senhorita conheceu o senhor Nestor Galanis? — o


advogado voltou a me interromper, e trinquei a mandíbula,
me lembrando de nosso encontro amargo. — Fizeram
negócios, em algum momento? Porque há registros de
pagamentos feitos por ele para a senhorita.

— Transferências bancárias? — repeti, me dando conta de


que, de fato, havia mesmo algo muito errado naquelas
informações.

— Não… deve ter algum engano, não recebi nenhuma


transferência vinda do senhor Galanis. — A memória de
Corinne me estendo um cheque milionário assinado por ele,
contudo, piscou nos meus pensamentos, mas me recusei a
pensar naquilo. — Como eu disse, não tenho contato com
essa família há bem mais de um ano. —

Apesar de um dia ter sido boba o suficiente para acreditar


que seria uma deles.

— Não é isso que diz o extrato bancário do senhor Galanis,


senhorita — ele devolveu, levantando-se num gesto claro de
que aquela conversa estava encerrada. — Eu a aconselho a
ir à leitura do testamento, vai ser breve e, se estiver
dizendo a verdade e realmente não recebeu esses
pagamentos, é importante que esclareça tudo.

Esclarecer tudo? A que ele se referia?

Nós trocamos um aperto de mãos quando ele se despediu e


foi embora, um segundo depois, e, subitamente, o alívio que
eu experimentara se dissipou como bolhas de sabão no ar,
as lembranças de um passado muito mais recente do que
eu gostaria que fosse voltando para me atormentar.

Nestor e Rafael Galanis tiraram de mim a vida do modo que


eu conhecia. Não era necessariamente uma vida boa, mas
pelo menos eu não precisava me esconder e olhar sobre os
meus ombros a

cada esquina, como se fosse uma fugitiva da polícia. Mais


que isso, eu podia encarar meu reflexo no espelho sem me
sentir envergonhada pelas coisas que fizera.

Coisas como aceitar dinheiro de Nestor Galanis para colocar


um fim à existência de seu neto ilegítimo.

— Ele jamais permitiria que Rafael se casasse com alguém


como você, nem vai admitir que ter um neto bastardo! —
foram as exatas palavras de Corinne. — Se você insistir com
essa história de gravidez, o senhor Galanis vai tirar essa
criança de você. Não temos como competir com o dinheiro
dele, Helena, é melhor aceitar as coisas como elas são.

E eu aceitei.

Depois de ser rejeitada pelo homem que eu amava e de ter


meu coração destroçado pelo fato de Rafael não acreditar
em mim, aceitei o cheque milionário que Nestor Galanis me
oferecera por intermédio de Corinne.
Minha própria mãe, vendendo minha felicidade ao depor
falsamente contra mim num julgamento onde eu jamais
teria chances.

Claro que Rafael me alertara sobre o fato de que sua família


tradicional de gregos não veria nosso envolvimento com
bons olhos, mas eu subestimei o tamanho de seu
preconceito, então era minha culpa me sentir tão
machucada, porque eu deveria ter esperado pelo pior desde
o começo.

Rafael estava certo sobre seu pai, e talvez até mesmo sobre
minha índole.

Meu emprego na cafeteria pagava o bastante apenas para


que eu conseguisse sobreviver, mas eu não tinha como criar
um bebê ou onde encaixá-lo no apartamento que dividia
com Corinne, por menor que ele fosse no início. Eu ainda
precisaria de espaço para um berço e uma banheira digna
para quando ele nascesse, e roupinhas e fraldas, claro. Um
único pé de sapatinho de tricô não seria o bastante, e
abandonada pelo pai do meu bebê e traída pela mulher

que me trouxe ao mundo, eu precisaria me desapegar de


alguns princípios e de um pouco do meu caráter, se
quisesse sobreviver ao erro de ter desejado um homem que
não era para mim.
CAPÍTULO 12

“Eu amo você, por favor, acredita em mim!”

Foram as últimas palavras que ouvi saírem da boca de


Helena de tê-la confrontado sobre a verdade.

Fazia mais de um ano, mas eu ainda conseguia me lembrar


da cadência e do desespero que parecia banhar sua voz, a
ponto de me fazer girar cento e oitenta graus para voltar
até ela.

Meu pai me impediu, claro, e eu cedi. Não tinha mais nada a


ser dito entre nós dois, àquela altura. Ela não confessara a
verdade e eu não queria escutar mais mentiras. Se havia
alguma dúvida de que Helena e meu pai eram amantes,
elas acabaram no momento em que vi os comprovantes de
pagamento que ela recebia todos os meses em troca de
encerrar a gravidez e deixar a mim e à minha família em
paz.

Eu me perguntava como ela fora capaz de abrir mão do seu


bebê, numa gestação já tão avançada, em troca de dinheiro
ao mesmo tempo que eu desejava jamais ter descoberto a
verdade sobre a paternidade.
Acreditei com todas as minhas forças que seria pai, e,
então, de uma hora

para outra, o futuro que eu tinha planejado para mim,


Helena e o bebê foi abortado.

Assim como a criança que ela gerava.

Nada disso importava mais. Ou era o que eu pensava, até


meus olhos recaírem sobre ela todo aquele tempo depois,
minutos antes da leitura do testamento do meu pai.

Ela fora recepcionada por uma das ajudantes da casa, que


provavelmente se oferecera para guiá-la até… onde,
exatamente?

— Helena… — murmurei em reconhecimento. Minha


intenção não era ser notado, pelo menos era isso o que eu
pensava, ainda assim, Helena me ouviu, o sorriso educado
que ela abrira para a ajudante da casa desaparecendo
quase em câmera lenta.

— Oi — ela articulou simplesmente, com uma expressão


surpresa que indicava quão boa atriz ela era.

Como era possível que Helena agisse como se não


esperasse me encontrar ali? Justo na casa que pertencera
ao meu pai, no dia da leitura de seu testamento.

— O que diabos você faz aqui? — questionei,


experimentando um misto de sensações que não sabia
como nomear.

— Ela veio para a leitura do testamento. — A voz de minha


mãe soou logo atrás de mim, e meu pescoço girou de
pronto para que eu pudesse fitá-la. — Supondo que você
seja Helena Jones, é claro. — Ela sorriu para Helena,
estendendo-lhe a mão em cumprimento. — Irene Galanis, é
um prazer conhecê-la.

— O prazer é todo meu, senhora Galanis — Helena devolveu


imediatamente, apertando a mão de minha mãe de forma
gentil. — Sinto muito por sua perda.

Meu estômago ficou embrulhado. Ter a ex-amante do meu


pai sob o mesmo teto em que ele vivera com minha mãe
me deixou enjoado.

— Vou avisar ao advogado que já estão todos presentes


para a leitura do testamento de Nestor — mamãe declarou.
— Rafael… — Ela se virou para mim. — … seja um
cavalheiro e guie Helena até o escritório, por favor. Vou
reunir os outros e encontro vocês em poucos minutos.

Helena fora de ex-amante a sócia da empresa deixada por


Nestor Galanis, e eu sentia que poderia vomitar a qualquer
minuto.

Depois de escutar da boca do advogado que um dos últimos


desejos de meu pai era que eu assumisse a frente de seus
negócios — como se eu tivesse tempo para isso, com a
demanda que vinha da Amethystós —, precisei ouvir,
impassível, a notícia de que Helena herdara dez por cento
do império de Nestor Galanis.

Eu não conseguia decidir qual era a pior parte, a cara de


surpresa de Helena ou a expressão satisfeita no rosto de
minha mãe ao saber que a amante de seu falecido esposo
ficara com uma fatia generosa de algo que não lhe
pertencia.
Uma acompanhante de luxo. Fora isso o que ele dissera
sobre Helena uma vez, e estava certo. Poucos homens eram
capazes de pagar para ter em sua cama uma mulher jovem,
bonita e disposta como Helena.

Rechacei o pensamento de seu desempenho na cama junto


com o sentimento revoltante de ter sido usado por ela com
fins tão sórdidos.

— Minha mãe não faz ideia de quem você é, faz? — exigi


saber dela assim que a leitura do testamento foi concluída e
fomos liberados para ir embora.

Helena ficou sentada em seu assento por um tempo extra,


fingindo processar o que acabara de acontecer, e eu esperei
por ela sem nem mesmo me dar conta de que era isso que
fazia, prendendo seu braço firmemente entre meus dedos
quando ela ameaçou passar por mim enquanto fingia que
não estava me vendo.

Seus olhos me encararam com uma fúria contida que nunca


vi antes em seu olhar.

— Acho que você vai ter que perguntar isso a ela. — Então
ela puxou o braço para longe do meu toque, me fazendo
apertar meus dedos um pouco mais para mantê-la no lugar.

— Por que meu pai te deixou tanto dinheiro? — questionei.


— Por acaso vocês dois permaneceram amantes depois de
tudo o que

aconteceu?

A simples possibilidade me deixava simplesmente enojado.

— Eu diria pra perguntar ao seu pai, mas, como você bem


sabe, não vai ser possível.
Helena sorriu, um gesto que não esboçava nenhuma
felicidade, e sim dissimulação.

— Você está adorando o fato de ele estar morto, não está?

— Não vou derramar uma única lágrima por ele, se é isso


quer saber.

— Mas veio até aqui, à casa da minha mãe — observei. —


Com que intenção? Tripudiar?

— Esse é o último lugar onde eu queria estar. — Helena


puxou o braço com mais força, e eu o soltei, com medo de
exercer mais pressão e acabar machucando-a. — Deve ter
sido algum engano, sei tanto quanto você sobre esse
suposto dinheiro que seu pai deixou pra mim, mas pouco
me importa. Não quero um único centavo vindo da família
Galanis.

Foi impossível conter um bufar de sarcasmo.

— Os pagamentos que você vem recebendo todos os meses


passam uma mensagem bem diferente, senhorita Jones —
apontei, erguendo uma de minhas sobrancelhas em desafio.
— Além desse novo comportamento zombeteiro e cheio de
si, é claro. Essa é a verdadeira Helena ou apenas mais uma
de suas personagens?

Seu olhar reluziu de forma familiar, mas tão rápido quando


surgiu desapareceu, quando ela fechou os olhos com força,
antes de dizer:

— Tenha um bom dia, Galanis.

Eu a deixei ir. Era o melhor a ser feito naquelas


circunstâncias. Eu resolveria com o advogado a questão
absurda do testamento depois. De jeito nenhum eu aceitaria
de forma pacífica aquela afronta.

— Helena… — Não, não pode ser… — Raf — minha mãe


emitiu em reconhecimento. — Vocês ainda estão aqui.
Juntos de novo.

Juntos de novo?

Algo naquele tom não parecia soar bem.

Eu me virei para a porta pela qual Helena deveria ter


passado, se não fosse minha mãe impedindo-a.

— Eu estava dizendo ao seu filho que já estou de saída,


senhora Galanis — Helena mentiu. Aquele não era o teor da
conversa, apesar de termos chegado ao fim dela. — Toda a
questão do testamento deve ter sido um mal-entendido,
mas vou resolver isso, não tenho intenção de ficar com o
dinheiro da sua família.

Dissimulada!, eu quis berrar, mas me contive.

Não por ela, senão por minha mãe, por quem mantive o
segredo da traição de seu marido. Eu não queria que ela
sofresse e, como eu, imaginei que ela preferiria que a
verdade jamais viesse à tona.

— Não seja boba, querida. — Mamãe abanou o ar com uma


das mãos num gesto despreocupado. — Nestor teve seus
motivos para incluí-la no testamento e, de verdade, eu não
me importo.

Não se importa?

— De qualquer modo… — Helena tentou, mas minha não


lhe deu chance para continuar.
— Nada disso. Você deve estar cansada da viagem até aqui.

Preparei um dos quartos de hóspedes para que você possa


descansar.

Quarto de hóspedes para Helena? Uma completa


desconhecida?

Onde Irene Galanis estava com a cabeça? Isso por acaso


fazia parte do testamento? Receber Helena como parte da
família, agora que ela fazia parte dos nossos negócios?

— Ah, não precisa se incomodar com isso, na verdade eu…

— Não é incômodo algum. — Minha mãe cortou a nova


tentativa de Helena de se esquivar. — Vamos, hoje foi um
dia cheio para todos nós. —

Mamãe passou o braço pelo de Helena como se elas fossem


velhas amigas, e elas saíram do escritório me deixando em
um estado catatônico no qual eu duvidava do meu próprio
nome. — Agora, mudando de assunto, o que você gostaria
de comer no jantar? — Foi a última coisa que consegui ouvir
de sua conversa, antes de suas vozes desaparecerem no
corredor.

Que diabos acabara de acontecer ali?


CAPÍTULO 13

— Meu Deus, se isso for um sonho, eu me recuso a acordar!

— Caroline murmurou através da videochamada, desistindo


de bater a massa dos bolinhos com o auxílio de uma colher
de pau e depositando o bowl na bancada da pia. — Helena,
você faz ideia do quanto isso vai ajudar nosso Bar de
Cupcakes?

Caroline estava fora de si, se achava mesmo que eu


aceitaria um único centavo da família Galanis para investir
no nosso negócio.

Já bastava o fato de eu ter penhorado a pulseira de


diamantes que Rafael me dera quando me pediu em
casamento. Tive que engolir todo o meu orgulho quando me
desfiz da joia em troca de dinheiro para investir no
empreendimento com minha melhor amiga.

Eu estava grávida, fora traída pela minha própria mãe e


rejeitada pelo homem que eu amava, depois de ele
acreditar no absurdo de que eu era amante do pai dele.
Dignidade era um luxo que eu não poderia me dar.
Penhorei a pulseira de diamantes para conseguir enterrar
meu passado de uma vez por todas e recomeçar a vida,
jurando que um dia juntaria dinheiro o suficiente para
recuperá-la e devolvê-la a Rafael. O dinheiro oferecido pelo
senhor Galanis ficou inteiramente com Corinne. Eu jamais
me submeteria a tocar naquele dinheiro imundo.

Sem dignidade, sim, mas o mínimo de caráter eu precisava


ter, se quisesse ser diferente da mulher que me trouxe ao
mundo.

— Obviamente não pretendo ficar com um único centavo,


Caroline — respondi para minha amiga.

— Você só pode estar de brincadeira comigo. — Seu queixo


pendeu, e ela pousou as mãos na bancada onde mantinha o
celular apoiado.

— Caroline… o que vai ser da minha consciência se eu


aceitar esse dinheiro?

— Estou mais interessada com o que vai acontecer com sua


conta bancária. Até onde eu sei, consciência não paga o
nosso aluguel.

Rolei os olhos para ela.

— Pare de ser reclamona, nós estamos indo bem, tendo em


vista o lugar de onde saímos.

A cafeteria onde trabalhávamos agora era apenas uma


lembrança em nossas vidas. Com o dinheiro da penhora da
pulseira de Rafael e o talento de Caroline para doces, nós
finalmente poderíamos investir no seu sonho de abrir uma
loja de cupcakes.
Não deu muito certo no início, até surgir a ideia de
colocarmos os cupcakes como pano de fundo e focar no que
de fato faria o dinheiro entrar: drinques. Foi como surgiu
nosso Bar de Cupcakes, e os negócios estavam começando
a andar.

— E o que você ainda está fazendo aí? — perguntou,


indicando o quarto pomposo onde eu estava com um aceno
de

cabeça. — Você já deveria estar em casa, a essa hora, me


ajudando com os recheios dos cupcakes.

Olhei em volta pelo que me pareceu ser a milésima vez,


ainda sem acreditar que aquele dia estava mesmo
acontecendo. Eu, Helena, na mansão dos Galanis, tendo que
encarar Rafael como se o que vivemos não tivesse
significado nada, apenas para descobrir que Nestor Galanis
me incluíra em seu testamento para deixar uma pequena
fortuna para mim.

Aquele dinheiro resolveria todo e qualquer problema


financeiro que Caroline e eu pudéssemos ter, nisso ela tinha
razão, porém eu não seria capaz de aceitar o dinheiro de
alguém que me fez tão mal.

O fato de ele não estar vivo para cumprir suas ameaças já


era alívio suficiente.

— Eu sei, mas ainda não consegui escapar. — Soltei um


suspiro cansado, meus ombros murchando no processo. — A
senhora Galanis é o ser humano mais adorável que eu já
conheci em toda a minha vida, e é impossível contrariá-la.
Ela me pediu pra descansar um pouco em um dos quartos
de hóspedes e ficar até o jantar. Quando eu vi, já estava
aqui…
Adorável. Era uma boa palavra para descrever Irene
Galanis, apesar de não ser a única. Suas qualidades
pareciam ser infinitas, e ela não se parecia em nada com o
retrato que pintei dela nos meus pensamentos. Como eu
poderia imaginar que alguém de coração tão bom seria
casada com um ser humano tão cruel quanto o senhor
Galanis?

O que ele me fez passar não tinha justificativa. Por mais que
me achasse indigna de seu sobrenome e de seu único
filho… eu estava grávida! E ele sabia muito bem que o filho
era de Rafael. Isso não lhe importou nem um pouco, assim
como não importou a Corinne. Juntos, eles ruíram todas as
minhas chances de formar a família da qual sempre desejei
fazer parte.

— Como é o colchão? — Caroline quis saber, talvez


percebendo meu longo silêncio como algo estranho, porque
era

como eu me sentia.

— Sem nós — contei. — Nem afundou pra me abraçar


quando me deitei.

Minha melhor amiga soltou um gemido revoltado, batendo


um dos pés no chão feito uma criança birrenta.

— Okay, agora eu estou com inveja. Um colchão novo! Esse


vai ser o nosso próximo investimento. A gente tem se
matado pra fazer o Bar de Cupcakes deslanchar, as nossas
costas merecem.

— Mesmo que não merecessem… — concordei, me jogando


no colchão confortável, pensando que poderia me
acostumar facilmente a ele. — Se tem uma coisa que eu
não recusaria, se tivesse herdado, seria essa cama. Duvido
que você iria me encoxar à noite se tivéssemos todo esse
espaço.

Caroline abriu um sorriso sapeca.

— Não faço isso porque a cama é pequena, no fundo tenho


uma quedinha secreta por você. — Ela piscou para mim
num falso flerte, me arrancando o primeiro sorriso genuíno
desde que cheguei àquela casa.

Caroline era uma ótima amiga. Mais que isso, ela era a irmã
mais velha que nunca tive. Nenhuma outra pessoa teria
pedido demissão do próprio emprego para embarcar em um
futuro incerto com uma mulher grávida que precisava fugir
de casa e da família malvada paterna de seu bebê.

O senhor Galanis fora bem claro quando disse que não


admitiria um neto bastardo, de modo que precisei garantir
que aceitaria o dinheiro que ele oferecera em troca de
interromper minha gravidez. O dinheiro serviu para fazer
com que Corinne desaparecesse da minha vida para
sempre, e eu me escondi sob o nariz grego e presunçoso de
Nestor Galanis ao me mudar para Newark.

— Você sabe que meu coração é todo seu e de Theo —

murmurei para Caroline, e seu semblante se acendeu de


imediato.

— Falando nele… — Ela pegou o celular apoiado na bancada


e andou com ele pelo nosso pequeno apartamento. — Diga
oi pro nosso garoto propaganda.

A câmera focou em Theo, confortavelmente acomodado no


carrinho onde Caroline e eu o colocávamos enquanto
trabalhávamos nos cupcakes. Porém, em vez de ele
aparecer vestindo uma de suas roupinhas normais, em seu
body branco, sobre a barriguinha protuberante de bebê,
havia a estampa das camisetas que Caroline encomendara
para fazer propaganda do nosso novo empreendimento.

Bar de Cupcakes, uma experiência sem igual.

— Santo Deus, Caroline… — soltei enquanto me levantava


de supetão. — O que você fez com o meu bebê?

— Nosso bebê — ela corrigiu, desfazendo uma ruga invisível


no body de Theo, como se achasse normal o fato de ele ter
a palavra “bar” impressa na roupa. — Ele mora nessa casa
de graça e metade do nosso dinheiro vai pra encher essa
barriguinha aqui. —

Ela indicou o local com pequenas batidinhas, e o sorriso


banguela mais lindo de todo o mundo surgiu na tela do meu
celular. — De hoje em diante, Theo vai precisar merecer
todo o leite que vem bebendo.

Eu amava Caroline com todo o meu coração. Mais que uma


tia, ela era a melhor segunda mãe que Theo poderia ter.
Isso fazia com que eu me sentisse menos pior em relação a
não poder oferecer-lhe a família perfeita de livros clichês.

Assim como eu, ele não conheceria o próprio pai, e eu


precisaria de uma história mais bonita do que a verdade
para explicar-lhe o porquê. De qualquer modo, ele sempre
teria em seu nome um pedacinho de sua herança grega. Era
minha forma de mostrar gratidão ao universo por ter me
presenteado com um bebê forte e saudável, apesar de
todas as adversidades.

Para mim, ele não era um filho bastardo, como Nestor


Galanis sugerira certa vez. Era o meu mundo todo, e eu
podia segurá-lo
entre meus braços e sentir seu coraçãozinho batendo contra
o meu peito. Isso era tudo de que eu precisava para superar
um dia ruim: abraçar Theo bem apertado, sentir seu
cheirinho de bebê e admirar seus olhinhos brilhantes que
sempre me fitavam com uma adoração que só podia ser
reflexo do que eu sentia por ele.

— Eu já estou morrendo de saudades de vocês — confessei.

Não que fosse um segredo.

Meu momento favorito do dia era quando eu estava com


Theo e Caroline. Mesmo com todo o tempo e cuidado que
um bebê requeria, e apesar de precisar dividir uma cama
com Caroline todas as noites desde que fomos morar juntas,
eu não conseguia ter o suficiente das minhas pessoas
preferidas no mundo.

— Então trate logo de vir pra casa — ela demandou. — Se


você tivesse pretensão de se tornar bilionária, poderia ficar
aí o tempo que quisesse, mas eu não vou ficar trocando
fraldas sozinha, já basta o fato de você ter fetiche por ser
pobre.

— Volto logo após o jantar, prometo. Deixe o meu lado da


cama quentinho pra quando eu chegar — gracejei, e ela
ergueu uma das sobrancelhas para mim em sua melhor
expressão engraçadinha.

— Certo, mas nada de me acordar no meio da noite, hein?


Se eu estiver ocupando todo o espaço do nosso colchão
cheio de nós e mestre em afundar, fique no sofá.
CAPÍTULO 14

No último ano, Helena parecia ter se tornado uma nova


pessoa, pelo menos no que dizia respeito a mim. Ou talvez
ela só tivesse revelado sua verdadeira face.

Fosse o que fosse, o fato era que ela estava diferente, ao


mesmo tempo que parecia exatamente a mesma quando
lidava com outras pessoas, dentre elas, minha mãe.

O que não havia mudado, entretanto, era como ela era


bonita.

O tempo lhe fizera bem, era inegável, como se nesse tempo


ela tivesse conseguido atrair um brilho extra para si, algo
que a tornava ainda mais desejável.

Eu não sabia quais eram as intenções de Helena se


mostrando tão gentil. Um prazer pessoal, quem sabe? Que
outra explicação poderia haver? Ela já tinha dinheiro mais
que suficiente para viver uma boa vida, agora que meu pai
estava morto, por que aceitara a

hospitalidade de minha mãe, quando esta lhe ofereceu um


quarto para descansar e a convidou para que ficasse para o
jantar?
— Então, essa moça, a tal Helena… — comecei como se não
quisesse nada, quando mamãe e eu já estávamos sozinhos
na sala de estar da mansão deixada para nós por Nestor
Galanis.

Eu gostava do meu apartamento e não tinha a intenção de


morar ali, mas também não deixaria minha mãe sozinha tão
depressa.

— Não precisa falar de Helena como se não soubesse muito


bem quem ela é — devolveu, um sorriso afável moldando
seus lábios e alcançando seus olhos.

Isso não podia significar o que eu achava que significava…

— A senhora sabe quem ela é? — eu quis me certificar,


estreitando os olhos em sua direção, porque não era
possível que ela soubesse de toda a verdade e, ainda assim,
tenha tratado Helena com tamanha compostura.

— Sua ex-noiva… — ela disse simplesmente, encarando-me


como se fosse óbvio, e eu engoli em seco. — A mãe do seu
filho —

emendou, e isso foi o bastante para me fazer trincar a


mandíbula. —

Acha mesmo que meu marido deixaria dez por cento de


todos os seus bens para Helena, se eu não soubesse quem
ela é?

Porco traidor miserável! Isso que ele era!

Como fora capaz de enganar minha mãe desse jeito? E


agora, depois de morto, ainda a obrigava a conviver com
sua amante depois de tê-la tornado bilionária, graças à
herança recebida. Ainda assim, Helena, que se mostrou tão
boa atriz com todas aquelas lágrimas que derramou,
quando foi confrontada, não foi capaz de derramar uma
única sequer durante a leitura do testamento.

— Isso é tudo o que a senhora sabe sobre ela? — pressionei


um pouco mais.

— Por quê? Há mais coisas que eu deva saber? — Suas


sobrancelhas se ergueram do modo inquisidor que sempre
fazia

com que eu lhe contasse qualquer coisa que ela quisesse


saber, quando eu era criança.

— Não… — apressei-me em negar. — Claro que não. Só te


achei extremamente afetuosa com uma pessoa que mal
conhecia, isso é tudo.

— Helena parece ser uma boa moça, e a vida não foi nada
gentil com ela. Não consigo nem imaginar uma realidade
em que eu não tivesse você. — Sua mão macia tocou a
lateral do meu rosto em uma leve carícia, conforme seus
olhos também azuis buscavam os meus. — Deve ter sido
muito difícil para ela lidar sozinha com a perda do bebê.

Ela teve um milhão de dólares para ajudá-la a enfrentar o


luto, era o que eu queria ter dito, mas me calei. O que
minha mãe sabia sobre minha história com Helena era que
ela havia sofrido um aborto espontâneo e decidiu ir embora
de Nova Iorque para recomeçar a vida, depois de ter
colocado um fim ao nosso relacionamento.

Deixei de fora o fato de que o bebê que ela esperava era, na


verdade, meu irmão, não meu filho.

— E a senhora não acha estranho que meu pai tenha


deixado uma pequena fortuna pra Helena, quando ele fora
tão contra nosso envolvimento?

Ciúmes, talvez? Ou ele de fato achava que Helena era boa o


suficiente para esquentar sua cama, mas não para se tornar
minha esposa?

O simples pensamento embrulhou meu estômago pelo que


me pareceu ser a milésima vez naquele dia.

— Você acha que eu deveria? — mamãe quis saber,


estreitando suas sobrancelhas para mim, e eu prometi a
mim mesmo que aquela história suja entre Nestor e Helena
jamais viriam à tona. Eu não deixaria que isso destruísse o
brilho inabalável de bondade que sempre havia nos olhos de
minha mãe.

— Não, não acho — escolhi responder, tomando seu rosto


entre minhas mãos e depositando um beijo em sua testa.

CAPÍTULO 15

Eu estava de volta à minha vida normal, depois do encontro


inesperado com a família Galanis. Apesar de a mãe de
Rafael ser o oposto do que eu esperava, eu precisava, pelo
bem de todos nós, que aquele encontro chegasse ao fim o
mais rápido possível.
Minha intenção quando me mudei para Newark — perto o
bastante de Nova Iorque e de Rafael, longe o suficiente de
seus círculos de convivências — era me afastar de todas as
pessoas que me machucaram.

Ela me vendera e se tornara milionária, com certeza estava


gastando seu dinheiro com o gosto das minhas lágrimas em
algum lugar paradisíaco.

Nestor estava morto, e apesar de eu não entender por que


raios de motivo ele me colocara em sua herança, sua
ameaça de tomar o meu filho de mim já não podia mais me
assustar. Isso já era o suficiente para que eu não fosse
capaz de lamentar sua morte.

No meio disso tudo, havia também Rafael, que não cumpriu


sua palavra quando prometeu cuidar de mim e do nosso
filho, um que ele acreditava ser biologicamente de seu pai.

Meu estômago se revirava em desgosto por ele acreditar


que eu seria capaz de algo tão vil e nojento, porém o tempo
me ajudou a não julgá-lo tão duramente. Nós mal nos
conhecíamos além da cama, quando engravidei dele. Uma
pobretona grávida de um bilionário grego do ramo de joias.

Eu sabia muito bem como isso soava, em especial com


alguém como Nestor Galanis, pai de Rafael, e minha própria
mãe me acusando de ser uma mulher perversa a ponto de
mentir para Rafael e fazê-lo assumir um filho que não era
dele. Apesar de eu ter decidido tratá-lo com indiferença e
uma pontada de sarcasmo, era apenas uma casca para
mantê-lo acreditando na mentira elaborada por seu pai e
minha mãe.

Aquela era a melhor saída. Nossa ínfima chance de um final


feliz deixou de existir, e não havia como mudar o passado.
— Você está muito aérea desde que voltou da casa dos
Galanis. O que houve? — Caroline perguntou enquanto eu a
ajudava com o recheio de nozes para a próxima fornada de
cupcakes, na cozinha da loja que alugamos.

O Bar de Cupcakes abriria em uma hora, e estávamos


atrasadas em nossa produção, uma vez que eu parecia meio
sem foco e extremamente lenta nas minhas funções.

— Não é nada de mais — assegurei. — Só fiquei apreensiva


com quão rápido me encontraram.

— Mesmo? — ela perguntou, erguendo uma de suas


sobrancelhas ironicamente ao mesmo tempo que apoiava o
quadril na bancada onde eu misturava o recheio dos
bolinhos. — Porque nós vivemos a uma hora de Nova Iorque,
onde tudo aconteceu, onde Rafael segue morando. Além do
mais, estamos falando dos Galanis. Você não pode estar tão
surpresa assim.

— Mas estou — retruquei. — Depois do nosso encontro há


um ano e de ter concordado em encerrar a gravidez em
troca de dinheiro, de jeito nenhum eu pensei que um
Galanis mandaria alguém vir atrás de mim.

E era mesmo verdade.

Corinne tinha seu dinheiro, e o senhor Galanis se livrara de


mim. Rafael não acreditaria em minha palavra nem mesmo
em um milhão de anos, nesse caso, eu não precisaria
percorrer o mundo para me esconder.

— Preciso perguntar uma coisa que está me remoendo por


dentro. Juro que tentei ser forte, mas não consigo mais. É
sobre Rafael. — Caroline mordeu o lábio, em hesitação, e
meu olhar a buscou imediatamente. — O que você sentiu
vendo-o tão de perto?
Apertei os olhos com força, desejando que Caroline tivesse
me perguntado qualquer outra coisa.

Eu não me permitira pensar naquilo, com medo de que meu


coração imaturo e apaixonado se rendesse aos encantos de
Rafael ao vê-lo sofrendo pela morte do pai, mesmo que
Nestor Galanis fosse um homem odioso. Não foi o que
aconteceu, entretanto.

Apesar de estarem claramente de luto, nem Rafael nem sua


mãe se pareciam com pessoas que haviam acabado de
perder um ente querido.

Ou talvez aquela fosse apenas a forma de Galanis de lidar


com as coisas: pragmática.

— Não sei dizer. — Foi o que respondi para Caroline. —


Medo, talvez, de ele descobrir sobre Theo. Raiva, por ele
continuar insinuando que fui amante do pai dele.

O pensamento me trouxe uma sensação ruim ao estômago,


e decidi que o recheio que havia preparado já está bom o
suficiente, então o deixei sobre a bancada.

— Nenhum sentimento bom? — ela insistiu. — Estou


perguntando porque vocês chegaram a ficar noivos.

Uma onda de nostalgia me envolveu, e meu olhar correu em


direção a Theo, brincando em seu carrinho como de praxe,
entretido demais com sua pelúcia favorita: o polvo do
humor que Rafael ganhara para mim, numa época em que
as coisas entre nós dois eram fáceis e descomplicadas. A
única lembrança que me sobrara dele, com exceção de
Theo e seus olhinhos tão lindos e idênticos aos do pai que
ele jamais chegaria a conhecer.
— Eu nem me lembro mais disso — menti, porque trazer à
tona aquele assunto, mesmo com Caroline, não tinha
sentido. —

Faz muito tempo. Eu era outra Helena, carente de amor e


atenção, disposta a me casar com um homem que nem
sequer me amava.

Tudo isso ficou pra trás.

Exceto o fato de que eu me perguntara, uma vez ou outra,


como teria sido a vida se o senhor Galanis e minha mãe não
tivessem arruinado minha história com Rafael. Talvez nem
mesmo tivéssemos chegado a nos casar… ou talvez ele
tivesse se apaixonado por mim no meio do caminho.

Não que nada disso importasse de verdade.

— Agora você é mãe e empresária no Bar de Cupcakes —

Caroline cantou alegremente, estalando um beijo em minha


bochecha e me arrancando um sorriso no mesmo instante,
antes de ir para o forno e retirar de lá nossa última remessa
de bolinhos.

Minha melhor amiga era maravilhosa, Theo e eu éramos


muito sortudos por tê-la em nossa vida.

Caminhando até ele, fiz cócegas em sua barriguinha coberta


com o body branco que Caroline mandara estampar para
ele, e ele gargalhou, soltando um gritinho agudo e
arrancando um sorriso de mim e de sua segunda mãe.

— A empresária aqui vai começar a organizar nossa vitrine



anunciei, pegando uma das bandejas com nossos cupcakes
de pistache, apoiando-a no antebraço conforme a mão livre
guiava o carrinho de Theo para fora da cozinha, rumo ao
balcão.

Uma manobra arriscada que Caroline e eu precisamos


dominar, já que com nosso orçamento apertado não
podíamos pagar por uma babá.

Quando a porta que separava a cozinha do nosso balcão


bateu logo atrás de mim, meu coração deu um salto no
peito como se quisesse sair por minha boca, e, em vez de
um grito esganiçado, tudo o que consegui emitir foi um
arquejo de puro desespero, o sangue correndo com força
pelas minhas veias e meus olhos se esbugalhando no
processo, devido à visão perturbadora.

— O que faz aqui? Como me encontrou? — perguntei de


pronto, estranhando minha voz esganiçada.

Ao que parecia, os fantasmas do meu passado decidiram


me assombrar em conjunto.

CAPÍTULO 16
— Acha mesmo que esse é o melhor esconderijo do mundo,
Helena, e que por isso o velho Galanis não foi capaz de
cumprir sua promessa de tirar o garoto de você? — Corinne
perguntou, rolando os olhos e abanando uma das mãos em
descaso, mas ela não se parecia muito com a mulher que
um dia chamei de mãe.

Ela usava roupas sofisticadas e um perfume forte e


enjoativamente doce. Bonita, sim, uma verdadeira antítese
do que trazia por dentro. Além disso, ela parecia mais
jovem, seguramente investiu em procedimentos estéticos
para que o tempo parecesse ter sido mais gentil com ela.
Uma gentileza que nunca tive, em se tratando de Corinne.

— Sabia que você fez muito bem em ter mantido esse


bilhete premiado? — Não me dei conta do significado de
suas palavras até ver suas mãos de unhas longas pintadas
de vermelho se esticarem em direção a Theo.

Senti o coração errar uma batida, minhas pernas


trabalhando por conta própria no momento em que Corinne
segurou Theo sob as axilas, erguendo-o conforme o levava
para si.

— Agora que Nestor está morto, além da fortuna que você


herdou, imagine só quanto dinheiro podemos arrancar dos
Galanis se…

— Meu filho não é um bilhete premiado, Corinne! — eu a


interrompi, ao me livrar da bandeja de cupcakes em tempo
recorde para liberar meus braços e arrancar Theo dos de
Corinne. — Nunca mais se aproxime dele, ouviu bem? Não
sei o que eu seria capaz de fazer se suas mãos imundas
voltarem a tocá-lo! — grunhi entre dentes, sentindo-me
tremer de pura raiva, da cabeça aos pés.
Como ela ousava tocar o meu bem mais precioso daquela
forma tão asquerosa?

Por sorte Theo não pareceu perceber a tensão pairando no


ar, ao contrário. Seus olhinhos brilhantes buscaram os meus
conforme eu impedia a queda do seu polvo de pelúcia. A
velocidade do meu movimento para tirá-lo dos braços de
Corinne deve tê-lo assustado, por um segundo ou dois, mas
eu o apertei forte contra meu peito, e ele mostrou suas
gengivas para mim em um sorriso.

Acariciei seus cabelinhos castanhos, sorrindo-lhe de volta


para assegurar que estava tudo bem, inalando seu
cheirinho suave de bebê para acalmar meus nervos.

— Podemos chegar a um acordo sobre isso. — A voz de


Corinne soou novamente. — Isso, claro, se você estiver
disposta a dividir comigo o que o velho Galanis lhe deixou
em testamento, claro.

Como ela sabia sobre o testamento e a herança? Como me


encontrou? Ela acabara de descobrir sobre a existência de
Theo ou sempre soube?

Havia inúmeras perguntas rondando minha mente,


perguntas que ficariam sem resposta, porque eu não tinha a
pretensão de

manter um diálogo com Corinne a fim de obtê-las. Era um


preço que eu não estava disposta a pagar.

— Acha mesmo que vou aceitar um único centavo desse


dinheiro? — eu quis saber. — Só existe uma pessoa aqui
capaz de tudo por dinheiro, e não sou eu.

Ela abriu um sorriso perverso que a fazia parecer com a má


e velha Corinne de antes.
— Que tal assim? — ela começou em uma falsa sugestão. —

Você aceita o que o velho Galanis deixou e divide comigo,


ou vou ser obrigada a ir até Rafael pedir dinheiro em troca
de informações sobre o filho dele. Ou talvez eu deva ir
diretamente até a viúva Galanis. O que você acha melhor?
— Sua cabeça pendeu para o lado, em um gesto de falsa
inocência, como se ela de fato estivesse ponderando, não
chantageando a própria filha.

Eu não estava surpresa, no entanto. Aprendi a esperar o


pior daquela mulher, e era isso que ela estava me
ofertando.

— Você já tem dinheiro suficiente pra viver muito bem pelo


resto da vida, Corinne. Apenas vá embora e me deixe em
paz.
— Só mesmo você pra acreditar que um milhão de dólares é
suficiente pra uma vida inteira — zombou.

— Vai ter que ser, porque não vou ceder às suas


chantagens!

Você vendeu minha felicidade ao senhor Galanis, não vou


permitir que tire nada mais de mim.

Aquela era uma promessa que eu pretendia cumprir a


qualquer custo. Corinne não sabia nada sobre instinto
materno, portanto não tinha ideia de quão longe eu seria
capaz de ir para assegurar a felicidade da criaturinha linda e
inocente nos meus braços.

Apertei Theo com um pouco mais de força, pressionando


meus lábios em sua testa para que a energia pesada que
Corinne emanava não tivesse nenhum efeito sobre ele. Eu
sempre faria com que ele se sentisse amado e protegido.
Um luxo que eu não tive,

graças à mulher que me trouxe ao mundo e sua displicência


e inaptidão para ser mãe.

— Se você não está disposta a me dar o que eu quero, vou


encontrar outros meios de conseguir — ameaçou, sua
sobrancelha extremamente bem-feita erguendo-se em
desafio. — Tenho certeza de que vou obter um bom dinheiro
quando surgir na mídia dizendo que o bilionário grego mais
cobiçado da década abandonou a noiva grávida.

— As coisas não aconteceram assim, e você sabe muito


bem!

— eu a lembrei, a um único passo da exasperação,


controlando minha voz por Theo e também para não alertar
Caroline. Ela não seria capaz de se conter, e eu não queria
armar um escândalo. —

Você e o senhor Galanis envenenaram Rafael contra mim. —


Havia tanto ressentimento em minha voz… mil anos
poderiam se passar, mas eu jamais os perdoaria.

— Nunca defenda um bilionário, Helena. — Ela balançou a


cabeça de um lado para o outro, mas seus cabelos
descoloridos pareceram incapazes de acompanhar o
movimento. — Será possível que não consegui te ensinar
nada?

— Não se engane, aprendi muitas coisas com você. — De


um jeito ruim, porque não havia nada de proveitoso sobre
aquela mulher odiosa.

— Vou te dar um tempo para que pense melhor sobre o


assunto. — Eu não precisava de tempo, e estava disposta a
dizer-lhe isso, porém ela foi mais rápida, pescando um
cartão de visitas de sua bolsa e depositando-o no balcão, ao
lado da minha bandeja de cupcakes. — Estou hospedada
nesse hotel, me procure quando mudar de ideia. Mas não
demore, não tenho uma vida inteira.

CAPÍTULO 17
Encarei a cópia do testamento de Nestor Galanis pelo que
me pareceu ser a milésima. Ainda assim, eu não conseguia
encontrar sentido em algumas de suas últimas vontades.

Meu pai nunca pareceu o tipo que trairia minha mãe, seu
envolvimento com Helena fora um ponto fora da curva, e
um dos motivos de eu guardar seu segredo sórdido foi
porque ele me prometera que aquilo jamais voltaria a
acontecer.

Não era um completo alívio, todavia. Helena esperava um


bebê Galanis que não tinha culpa de nada, e ele foi
sacrificado.

Talvez fosse a melhor coisa a ser feita por ele, no fim das


contas.

Não vir ao mundo era melhor do que ter como pais duas
pessoas que não se importavam com o outro nem mediam
consequências para obter o que queriam.

Uma batida leve na porta me fez encarar meu relógio de


pulso no mesmo instante.

Mamãe vinha tendo problemas para dormir nos últimos dias,


desde que o quadro de Nestor se agravara e ele precisou
ficar internado. O que me surpreendeu não foi nem mesmo
o fato de seu coração apresentar defeitos, e sim que ele
tivesse um, em primeiro lugar.

— Está aberta — respondi, juntando a papelada sobre o


testamento para guarda-la na primeira gaveta da mesa
imponente que Nestor mantinha em seu escritório na
mansão Galanis.

Quem surgiu do outro lado da porta, no entanto, não se


parecia em nada com minha mãe.
Os cabelos escuros e lustrosos emolduravam o rosto de
feições jovens e extremamente bonitas, conforme ela
caminhava de modo indeciso para mais perto de mim.

— O que faz aqui a essa hora? — Meu tom cortante fez com
que ela se detivesse, estacando no meio do cômodo e
cruzando as mãos em frente ao corpo.

— Eu precisava falar urgentemente com você. Sobre… —


Ela hesitou, sua expressão se contorcendo em uma careta
como se ela não quisesse dar continuidade ao que dizia. —
Sobre a herança que o seu pai deixou pra mim.

— A herança que o seu amante deixou pra você — eu a


corrigi, sem conseguir acreditar que estivéssemos tendo
mesmo aquela conversa. — Você não tem vergonha de vir
até aqui? De ter sido recebida por minha mãe com tanta
gentileza, graças ao fato de que ela não faz a menor ideia
de que você engravidou do marido dela e depois me
enganou para que eu me casasse com você?

Os olhos de Helena cintilaram, como se estivessem


magoados, e eu precisava admitir que ela era uma
excelente atriz.

Se não fosse, não teria sido capaz de me enredar por


meses, me viciando nela e dando a cartada final quando
falou sobre o bebê.

Seria o truque perfeito, porque as chances de a criança


nascer com as minhas características eram muitas, visto
que partilhávamos o mesmo genitor.

A imagem de uma Helena nos braços de Nestor avultou


meus pensamentos sem pedir permissão, mas eu a rechacei
de imediato.
— Você me julga e acusa muito mais severamente do que
faz consigo mesmo —Helena protestou, em tom nem tão
firme. — Por que não contou pra sua mãe que o marido dela
teve uma amante que engravidou dele? Ela merecia
conhecer a fundo o tipo de homem com o qual se casou.

— O que ela realmente não merecia era ter sido enganada


de forma vil, como você e meu pai a enganaram. Não
compare o meu silêncio com esse circo orquestrado por
Nestor.

Helena engoliu em seco, assentindo conforme seus olhos


iam em direção aos próprios pés, fugindo do meu olhar.

— Você tem razão, e eu sinto muito. O coração da sua mãe


é precioso demais e merece ser preservado.

Mas o que diabos ela pretendia com aquela postura de boa


moça?

— O que você quer, Helena? — demandei saber. — Eu disse


que pediria para que o meu advogado entrasse em contato
quando tivesse os papéis para você assinar, renunciando
qualquer direito à herança.

Ela balançou a cabeça levemente em uma afirmativa,


trazendo seus olhos para mim.

— Sobre isso… — Seus dentes prenderam seu lábio inferior,


conforme ela parecia titubear. — Eu decidi ficar com o
dinheiro.

Um sorriso incrédulo me escapou, porque aquilo era mesmo


inacreditável.

Primeiro Helena aparecia decidida a não aceitar um único


centavo deixado por Nestor, para então mudar de ideia
poucos dias depois. No que ela estava pensando? Que tática
era aquela? Por que se deu ao trabalho de ir até ali quando
poderia simplesmente ter se recusado a assinar os papéis
de renúncia, quando meu advogado a procurasse?

— O que mudou tanto em tão poucos dias? — provoquei,


levantando-me do meu assento para ir para mais perto
dela, como se assim pudesse farejar sua mentira.

— Eu… pensei com clareza. — Ela engoliu em seco quando


me aproximei o bastante para invadir seu espaço pessoal, e
deu um passo atrás. — Além do mais, esse dinheiro não vai
fazer a menor falta pra sua família… vai? — Suas
sobrancelhas se juntaram quase por completo no centro de
sua testa, dando-lhe uma expressão de dúvida genuína.
Quase como se ela estivesse de fato preocupada.

Mas eu não acreditaria nela. Não cometeria o mesmo erro


do passado.

— Se eu disser que sim, que vai fazer falta, por acaso você
vai mudar de ideia? — questionei acidamente.

— Eu não preciso de todo o dinheiro. — Ela reiterou o que


dissera com um movimento severo de cabeça. — Uma
pequena parte vai ser mais do que suficiente, e então
prometo deixá-los em paz de uma vez por todas.

Como se a palavra dela tivesse algum valor, àquela altura.

— Quão idiota você acha que eu sou pra acreditar nesse seu
teatrinho de que acabou de mudar de ideia, hein? — Sacudi
a cabeça, incrédulo quanto ao tamanho de seu ego, por ela
sequer cogitar que poderia ficar jogando mentiras em minha
direção e que eu acreditaria em cada uma delas. — A
verdade é que você nunca teve a intenção de abdicar desse
dinheiro, porque você seria capaz de qualquer coisa por ele.
Ou não foi você quem colocou um fim à sua gestação em
troca de um milhão de dólares?

Helena resfolegou, dando um novo passo para trás,


boquiaberta. Ela moveu a cabeça suavemente de um lado
para o outro, e eu esperei que negasse o que eu dissera.
Mais de um ano havia passado, tempo suficiente para
Helena elaborar uma desculpa que pelo menos tentasse
justificar suas escolhas de antes. Ou ela achava que eu não
fazia ideia do acordo que firmou com meu pai?

Uma gravidez encerrada em troca de dinheiro para


recomeçar a vida onde bem entendesse. A ideia podia não
ter partido dela, mas o fato de que Helena concordara com
tal absurdo fazia dela um ser humano tão desprezível
quanto o meu pai.

— E-eu só vim avisar sobre a minha nova decisão — ela


gaguejou em resposta, esquivando-se da minha pergunta.
— Boa noite. — Helena girou cento e oitenta graus,
rumando em direção à porta com a mesma pressa que teria
o diabo fugindo da cruz.

Ainda assim, fui mais rápido que ela, puxando seu braço
para que olhasse para mim. A força do movimento fez com
que Helena se desequilibrasse, e no instante seguinte ela
topou contra meu peitoral, as mãos em punhos agarrando-
se à minha camisa social para não cair.

O rosto assustado, quase inocente, sob aquele ângulo,


estava a centímetros do meu, permitindo que eu respirasse
seu hálito doce depois de todo aquele tempo de
abstinência. Seus olhos marejados dançaram até os meus,
que caíram para os lábios volumosos que eu costumava
beijar sem reserva.
Com Nestor também era assim? Helena também se rendia
ao domínio dele, entregando-se irrestritamente?

Não fazia diferença. Não deveria fazer, pelo menos, ainda


que o pensamento espalhasse ira líquida por todo o meu
sistema sempre que surgia.

— Você brincou com o homem errado, Helena — eu lhe


avisei entre dentes, sem me deixar abalar. — Eu te deixei
sair impune da primeira vez, mas não vou repetir tal
gentileza.

Então ela se afastou de mim como se tivesse acabado de


ser eletrocutada e praticamente saiu correndo porta afora.

CAPÍTULO 18

Eu odiava Corinne com todas as minhas forças.

Isso era tudo em que eu conseguia pensar enquanto me


encaminhava para fora do escritório de Rafael. Eu me sentia
suja a cada sugestão que ele fazia sobre eu ter me
relacionado com o pai dele, mesmo que eu soubesse que
isso nunca acontecera.
Eu poderia ter me defendido, mas de que adiantaria? Rafael
não acreditou em mim um ano atrás e certamente não
acreditaria agora, uma vez que o senhor Galanis me deixou
uma fortuna em seu testamento e Corinne me obrigava a
aceitar esse dinheiro sujo.

Tinha que ter sido de propósito! Até mesmo do túmulo


aquele homem desprezível se certificou de que poderia me
humilhar.

Eu o detestava na mesma proporção que detestava Corinne.

E Rafael também.

Eu detestava todos eles!

— Helena? — A voz doce e macia chamou meu nome antes


de que eu tivesse a chance de sair daquela casa mal-
assombrada que os Galanis

chamavam de lar. — Eu não sabia que você estava aqui.


Aconteceu alguma coisa?

Soltei o ar devagar pela boca, tentando controlar o choro


que segurei na frente de Rafael, mas que irrompeu no
minuto em que lhe dei as costas.

Eu deveria apenas ir embora sem maiores explicações, lidar


com os advogados da família Galanis e em seguida dar a
Corinne o dinheiro que ela queria, no intuito de comprar
minha liberdade e a de Theo.

Mas era a senhora Galanis ali, e ela não fora nada menos do
que gentil comigo. Uma gentileza que nunca recebi vindo da
mulher que me trouxe ao mundo. Ela não merecia pagar
pelos pecados do marido.
Sendo assim, enxuguei minhas lágrimas o melhor que pude,
antes de me virar para ela e dar o meu melhor para exibir
um sorriso.

— Senhora Galanis — murmurei em reconhecimento. —


Desculpe ter vindo sem avisar. Eu estava por perto e decidi
passar por aqui pra tratar de um assunto rápido com Rafael,
mas já estou de saída.

Torci para que a desculpa funcionasse sem que fossem


necessárias maiores explicações. Eu não queria inventar
novas mentiras para aquela mulher, porque ela era
diferente de todos os outros que conheci. Não era justo com
ela nem com a minha consciência.

Seus olhos se estreitaram em minha direção, um azul


cintilante que lembravam os de Rafael, quando ele me
olhava gentilmente e fazíamos planos para um futuro em
que estaríamos juntos. Pisquei para afastar o pensamento,
porque não fazia sentido pensar sobre coisas que jamais
aconteceriam. O que recebi em troca, foi uma lágrima
teimosa que correu por minha bochecha sem a minha
permissão.

— Você está chorando — a senhora Galanis murmurou com


cuidado, e eu me preparei para negar. Eu queria dizer que
era uma reação alérgica, que algo caiu nos meus olhos,
qualquer coisa. No entanto, minha vida tinha o poder de
sempre sair conforme eu não planejara, e o que de fato
irrompeu por meus lábios foi um soluço, que deu vazão a
um choro descontrolado e humilhante.

Tampei os lábios com uma das mãos, como se o gesto


simples fosse capaz de amenizar meu pequeno espetáculo,
mas não obtive resultados.
Em vez disso, a mulher à minha frente se apressou em
minha direção e,

em silêncio, passou os braços ao meu redor, me apertando


entre eles como se quisesse me manter inteira.

Foi então que desmoronei.

Beberiquei o chá de camomila que a senhora Irene pediu


que trouxessem para mim, depois de eu ter passado a
última meia hora chorando abraçada a ela.

Em meio aos meus soluços e às lágrimas embaçando


minhas vistas, ela me guiou até os jardins para que eu
pudesse tomar um pouco de ar puro. Fazia frio lá fora, mas
o vento gelado batendo no meu rosto era bem-vindo, aliado
ao fato de que a senhora Irene acariciou meus cabelos
como se eu fosse uma garotinha indefesa precisando de
colo.

Certamente eu não era uma garotinha, mas me sentia


indefesa e seu colo fora mais do que bem-vindo.

— Se sente melhor? — ela perguntou quando pousei a


xícara sobre o pires, puxando uma longa respiração.

— Muito melhor, obrigada. — Não era uma mentira.

Depois de ter reprimido a avalanche de sentimentos que


tive que enfrentar nos últimos dias, foi bom poder colocar
tudo para fora. Eu não teria escolhido aquele momento para
isso, claro, porém não era algo que estivesse dentro do meu
controle.
— Foi Rafael quem te fez chorar? — Sua mão tocou minha
perna coberta pela minha calça jeans velha, dando
batidinhas no meu joelho.

Era um interesse genuíno, seu tom quase uma desculpa


pelos modos do filho.

Sacudi a cabeça de um lado para o outro, porque não queria


mentir para ela, não em palavras, pelo menos, e, se fosse
ser sincera, Rafael podia até não ter sido a pessoa que me
apunhalou pelas costas, mas sem sombra de dúvidas seu
abandono e desprezo torceram a faca fincada na minha
carne para que eu sangrasse sozinha.

Se não fossem por Theo e Caroline, eu não teria


sobrevivido.

— Por que a senhora é tão gentil comigo, sendo que nem


me conhece? — Dei voz à dúvida que vinha me corroendo, e
a senhora Galanis abriu um sorriso reconfortante em minha
direção.

— Não seja boba, claro que conheço você. Por acaso acha
que a mãe do meu neto iria aparecer na minha casa e eu
não iria reconhecê-la?

Congelei, e não tinha nada a ver com o vento frio batendo


no meu rosto. Era uma sensação que vinha de dentro para
fora, começando nos meus ossos e me paralisando por
completo, ao mesmo tempo que minha cabeça fervilhava
com um zilhão de pensamentos confusos.

Aquilo não era possível… ela não tinha como saber sobre
Theo. Se fosse esse o caso, ela não teria esperado tanto
tempo para me confrontar e…
— Sempre vou pensar em você assim… — O tom sussurrado
e o toque gentil no meu rosto interromperam meu
raciocínio, e eu apenas pisquei, inerte. — Mesmo que não
haja um bebê de fato nos meus braços, no meu coração eu
já o amava e ansiava por ele. Raf também, nunca duvide
disso.

Fiquei surpresa ao perceber que, mesmo depois de me


debulhar em lágrimas, ainda havia uma porção delas
esperando para serem liberadas.

Meu queixo tremeu conforme eu tentava conter meu choro,


mas foi em vão.

No momento em que a senhora Galanis me abraçou, tentei


não derramar meu chá em suas roupas caras e não me
sentir mal por mentir para ela. Minha única intenção era
proteger Theo e, para isso, fui obrigada a privá-lo de todo
aquele amor que sua avó tinha para lhe dar. Não que eu
soubesse disso, na época.

Com todo o desespero e desalento que me abraçavam, a


última coisa que poderia me ocorrer seria buscar amparo na
mãe de Rafael.

Apenas supus que os Galanis eram todos farinha do mesmo


saco, me esquecendo das memórias bonitas que Rafael me
deixou de lembrança e de como foi gentil e atencioso, antes
de o seu pai e Corinne o envenenarem contra mim.

Sua bondade deveria ter vindo de algum lugar, e agora eu


sabia de onde: Irene Galanis, a mulher que me tratara de
igual para igual mesmo

sabendo de minhas origens humildes.


O que disseram para ela quando precisei ir embora e o
casamento não aconteceu? Nestor deixou claro que eu
deveria me aproximar de sua família, e em minha conversa
com Rafael ele disse com todas as letras que não contara a
ela nada sobre meu suposto envolvimento com o pai dele,
mas eu não sabia o que isso significava.

Qual versão Rafael contou para a mãe dele?

Não importava. Não era da minha conta, muito menos


minha culpa que as coisas tivessem acontecido como
aconteceram.

Eu precisava sair dali o mais rápido possível, esperar que o


dinheiro de Corinne fosse liberado para que ela saísse de
vez da minha vida e, então, focar todas as minhas energias
no Bar de Cupcakes e ser a melhor mãe que eu pudesse
para Theo.

Respirei fundo, sentindo o perfume da senhora Irene e seu


abraço acolhedor uma última vez, antes de me afastar.

— Obrigada por tudo, senhora Galanis — agradeci, lutando


contra as lágrimas e contra a sensação de perda ao
desfazer nosso abraço. — A senhora teria sido a melhor avó
de todo o mundo, espero que saiba disso.

Como se espelhassem os meus, seus olhos azuis pareceram


piscinas transbordando, quando lágrimas caíram por seu
rosto.

Eu a encarei, em choque, porque não a vira chorar durante


a leitura do testamento de seu finado marido. Não havia o
menor resquício de toda aquela emoção que ela
demonstrava agora, quando nos vimos da primeira vez.
De forma automática, minha mão se estendeu para enxugar
seu rosto bonito com marcas leves que ameaçavam
entregar sua verdadeira idade. Ela sorriu, sacudindo a
cabeça de um lado para o outro num gesto efusivo,
tomando minha mão com as suas e me encarando com
intensidade.

— Não pense que sou uma velha chorona, mas esse assunto
ainda me emociona. — Mais lágrimas. Mais emoção. E eu
precisei de uma força hercúlea para não me jogar de novo
em seus braços e abraçá-la para sempre. — Só me prometa
que vai vir me visitar, sim? Que não vai desaparecer de
novo. Há tantas coisas que eu gostaria de conversar com
você…

Minha cabeça balançou em negação no mesmo minuto,


como se meu cérebro berrasse para a minha boca a
resposta que eu deveria formular.

Eu não podia voltar. Era loucura. A mãe de Rafael era


adorável e eu adoraria ter tido a chance de poder conhecê-
la em outras circunstâncias, mas as coisas não aconteciam
conforme nossa vontade.

— Senhora Galanis… — comecei, no meu melhor empenho


para que ela entendesse que, apesar de eu já adorá-la por
completo, aquilo não seria possível.

— Por favor — ela me interrompeu, intensificando o aperto


na minha mão. — Eu sempre quis ter uma filha e não
consigo parar de pensar que talvez o destino tenha te
colocado no meu caminho para que eu pudesse realizar
esse sonho, de algum modo.

Como era possível que minhas glândulas lacrimais tivessem


decidido fazer hora extra quando eu menos precisava delas?
CAPÍTULO 19

— Desculpe pelo mau jeito, como eu já havia dito, é uma


casa bem simples — eu disse à senhora Irene, que estava
sentada no sofá gasto que Caroline e eu adquirimos num
desapego, a fim de compor nossa sala de estar modesta.

Poderia parecer um pouco de loucura da minha parte, mas


depois de conviver com a senhora Galanis pelas últimas
semanas, continuar escondendo algo tão importante quanto
à existência de Theo não era uma opção.

A princípio, Caroline tentou me dissuadir da ideia, mas há


alguns dias ela mesma disse que eu não poderia mais
esconder Theo da própria avó. Eu sabia muito bem o que
era ter meu destino traçado por outras pessoas, não podia
fazer o mesmo com meu próprio filho nem com sua avó,
que me acolheu de braços abertos e me deu um vislumbre
do que seria ter o amor de mãe com o qual tanto sonhei.

Sendo assim, eu precisava contar-lhe a verdade. Ela


merecia saber, assim como Theo merecia todo o amor que
sua avó paterna gostaria de

lhe dar. Contanto que Rafael não soubesse da existência do


meu bebê, tudo ficaria bem. E ele não saberia, eu me
certificaria disso.

Avó e neto iriam conviver juntos em segredo, como ela e eu


vínhamos fazendo nas últimas semanas. Eu não voltara à
casa dela, mas ela gostava de aparecer vez ou outra no Bar
de Cupcakes e marcávamos encontros esporádicos para um
chá da tarde também. Ela era uma companhia agradável e
a maior entusiasta do meu negócio com Caroline.

— É um lar onde existe respeito e união — Irene Galanis


murmurou depois de olhar em volta, com um sorriso
satisfeito, trazendo sua atenção de volta para mim e para
Caroline, sentadas na mesinha de centro logo à sua frente.
— Isso é o que importa. Vocês podem receber muitos
julgamentos, mas nenhum deles nunca virá de mim.

Franzi as sobrancelhas, sem entender a que ela se referia,


porém não tive tempo de questioná-la sobre isso, porque
Caroline se adiantou.

— A senhora não está insinuando o que acho que está,


certo? —

minha melhor amiga quis saber, tombando a cabeça para


um lado.

Os olhos da senhora Galanis se arregalaram de imediato.

— Eu ofendi vocês de algum modo? Não foi minha intenção.


— Ela reiterou o que dissera com um movimento de cabeça
efusivo.

— Não ofendeu, é só que isso aqui não é o que pode


parecer. Nós somos apenas melhores amigas que dormem
juntas.
Encarei Caroline, mortificada, pois sua explicação apenas
piorava tudo.

Não era de se espantar que a pobre senhora acreditasse


que Caroline e eu éramos um casal, já que não nos
desgrudávamos para nada e eu falava dela em quase
noventa por cento do tempo.

— O que Caroline quer dizer é que dividimos um quarto,


porque a casa é pequena e não temos muito espaço
disponível — intervim, na tentativa de esclarecer aquele
mal-entendido. — Não temos um relacionamento romântico,
Caroline é como uma irmã pra mim.

A ideia de eu estar namorando minha melhor amiga não


pareceu despertar nenhuma emoção específica na nossa
visitante, no entanto agora ela me encarava com interesse,
o corpo pendendo de leve para a frente, suas mãos
delicadas e bem-cuidadas apoiadas nos joelhos.

— Isso significa que você está livre para um relacionamento


que seja de fato romântico? — ela quis saber, os olhos azuis
se iluminando.

Definitivamente não. As tentativas de inserir algum


romance em minha vida sempre terminaram mal, e mesmo
que talvez eu ainda fosse demais para ser tão taxativa, a
verdade era que não havia espaço em minha vida para
nada além do que já havia nela.

— Não exatamente. — Foi o que escolhi responder. — Mas


isso não tem a ver com Caroline. Senhora Galanis… —
Titubeei, sem saber quais palavras usar para guiar a
conversa até o assunto relevante. — Eu não sou boa com
essas coisas de dar notícias importantes, ao mesmo tempo,
não quero continuar mentindo pra senhora.

— Você vem mentindo para mim? — Não havia mágoa em


sua voz, apenas curiosidade genuína.

— Não é bem uma mentira — considerei —, é mais um


segredo, e pra que eu possa contá-lo, preciso que me
prometa que não irá dividi-lo com ninguém.

— Helena… você está me deixando assustada.

— Não precisa ficar assustada — assegurei —, só me


prometa que vai guardar meu segredo, especialmente do
seu filho. Por favor —

implorei, quando sua boca se abriu no que julguei ser um


protesto.

— Tudo bem — anuiu, balançando a cabeça para endossar


suas palavras. — Você tem a minha palavra…

Peguei Theo nos braços com todo amor que sempre


envolvia o gesto, e ele riu para mim, sacudindo seu polvo do
humor, que sempre exibia o lado cor-de-rosa que trazia a
expressão feliz.

Meu coração se apaixonou um pouco mais por aquela


criaturinha tão preciosa, e beijei suas bochechas rosadas,
sentindo seu cheirinho de bebê e alisando sua roupinha
nova, comprada especialmente para aquele encontro. A
calça que imitava jeans, com suspensórios e um body na
cor

creme com botões falsos conseguiu deixá-lo ainda mais


adorável, e eu tinha certeza de que sua avó se renderia
àquele sorriso banguela assim que o visse.
— Vou te apresentar a uma pessoa muito especial e que
também vai te amar muito — sussurrei ao seu ouvido. —
Seja bonzinho e tente não golfar na sua avó logo no
primeiro encontro de vocês, está bem?

Respirei o cheiro de seus cabelinhos escuros, me enchendo


de coragem para sair do quarto com Theo.

Não tinha mais volta. Eu fizera minha escolha e esperava


jamais me arrepender dela.

De decisão tomada, sabendo que não tinha mais volta, a


partir dali, fui com Theo até a sala, onde a mãe de Rafael e
Caroline conversavam animadamente sobre algumas ideias
que minha melhor amiga gostaria de implantar no nosso
empreendimento.

Como se sua atenção tivesse sido sugada para mim,


contudo, o olhar da senhora Irene pousou no meu colo, e ela
piscou, confusa, um milhão de perguntas estampadas nos
orbes azuis tão iguais aos do meu filho.

— Senhora Galanis… — chamei devagar — quero que


conheça Theo, o seu neto.

Ela se levantou no mesmo instante, como se tivesse sido


expulsa de seu assento, as mãos indo em direção à boca
aberta, devido à surpresa.

— Meu neto? — ela quis se certificar, como se tivesse medo


de ter compreendido minhas palavras de modo errado.
Aquiesci com um gesto de cabeça, percorrendo os metros
de distância que nos separavam, até estar perto o suficiente
dela para me sentir envolvida pelo seu perfume floral e
sofisticado. — Meu neto — ela tornou a sussurrar, porém,
dessa vez, não era uma pergunta.
Seus braços voaram para Theo, e eu permiti que ela o
segurasse enquanto seus olhos enchiam-se de lágrimas que
ela derramou sem o menor resquício de constrangimento.

Ela sorriu, beijando o topo da cabecinha de Theo e


inspirando seu perfume como eu amava fazer. Então ela
riu… para logo em seguida gargalhar, com Theo nos braços,
apertando-o junto ao corpo como se ele fosse a coisa mais
preciosa em todo o mundo, o que de fato era.

Meus olhos buscaram os de Caroline, e ela ergueu ambos os


polegares para mim, como se me parabenizasse.

E eu soube, ali, que havia feito a escolha certa ao permitir


que a uma avó amasse o neto com toda a intensidade que
ele merecia.

CAPÍTULO 20

Sentada na mesinha de centro da minha sala pequena, com


Caroline ao lado, ponderei que, se eu também não adorasse
a senhora Galanis, de volta ao sofá, mas agora com Theo no
colo, eu poderia ficar com ciúmes da forma com que meu
filho parecia tão encantado com ela.
Desde seus brincos, que seguramente eram da Amethystós,
até o colar, os olhos…

Theo quase perfurou um deles com o dedinho indicador, no


processo de descobrir tudo sobre ela. A reação de sua avó
foi sorrir e beijar cada pedacinho de Theo até levá-lo às
gargalhadas.

— Ele é idêntico ao meu Rafael dessa idade, você precisa só


ver as fotos que tenho guardadas. — Havia tanto orgulho
em sua voz, que fiquei com o coração automaticamente
aquecido.

Não, eu não gostaria de ver as fotos de Rafael quando bebê.

Não podia. Mas não me espantava que Theo fosse uma


cópia do pai. Ele não se parecia em nada comigo, exceto
pelos cabelinhos escuros, coisa que Rafael também possuía.
Nada isso importava, todavia. Ele era um bebê lindo, forte,
saudável… meu bebê, meu pequeno tesouro, e isso jamais
mudaria.

— Espero que a senhora possa me perdoar pelo tempo


perdido.

— Não tenho nada que perdoar — retrucou, ainda


parecendo enfeitiçada pelo bisneto. — Durante todo esse
tempo eu achei que um homem perverso tivesse roubado
de mim a chance de ser avó, e agora você me traz esse
presente. Só tenho a agradecer por você ter confiado em
mim a ponto de me deixar conhecer o meu neto.

— O que a senhora disse? — Ela me encarou de pronto, a


alegria em seu semblante dando lugar ao que parecia ser
nervosismo. — Sobre um homem perverso roubar sua
chance de ser avó — elucidei, quando não recebi uma
resposta imediata, e ela se contorceu de forma
desconfortável no sofá.

— Você não era a única que vinha guardando um segredo —

confessou, e minha coluna se aprumou no mesmo instante,


um arrepio percorrendo minha espinha. — Eu sempre soube
a verdade por trás do seu término e de Rafael, e se chama
Nestor Galanis e Corinne Jones. Mas quando me inteirei de
tudo, você já tinha assinado o acordo com Nestor,
concordando em abrir mão do bebê.

Eu queria ter contado tudo para Rafael, mas fui covarde


demais para isso. — Ela exalou com força, e me peguei
fazendo o mesmo, graças ao baque de sua revelação. —
Acreditei em Nestor quando ele disse que já estava feito,
que você realizara o aborto e não tinha mais volta —
continuou, ante minha inércia. — Por isso não contei nada a
Raf, porque não queria que ele passasse o resto da vida se
corroendo em culpa e autocomiseração. Sou eu quem
precisa te pedir perdão, filha. Por não ter te procurado
incansavelmente naquela época para esclarecer tudo.

Então ela sabia… desde o primeiro momento, quando pus


os pés em sua casa, ela sabia de tudo e não me disse nada.
Antes, até. Ela sabia que eu era inocente das acusações de
Nestor e Corinne e não moveu uma única palha para redimir
minha imagem.

Deveria haver raiva e mágoa dentro de mim, mas não


identifiquei nenhum desses sentimentos. Irene Galanis era
uma boa mãe, disposta a fazer qualquer coisa para manter
seu filho a salvo, e eu me identificava com isso.

Como ela poderia saber que ainda havia um neto pelo qual
lutar, uma vez que Nestor e Corinne eram tão bons tecendo
suas mentiras escabrosas?
— Não é sua culpa — murmurei, porque o tempo me
ensinou a responsabilizar quem de fato merecia. — Não é
culpa de ninguém, exceto do senhor Galanis e da minha
mãe. Por isso eu quis que a senhora conhecesse Theo,
porque quero que ele receba todo esse amor que a senhora
pode dar a ele, e também porque preciso que saiba que eu
realmente não quero o dinheiro da sua família, que é
Corinne quem está me chantageando, e não posso permitir
que ela torne meu segredo público.

Ainda havia aquela preocupação. O tempo com a avó do


meu filho me fez adorá-la e admirá-la na mesma proporção,
e eu já tinha suportado sofrimento suficiente quando Rafael
pensou o pior de mim, eu não queria enfrentar o olhar de
decepção no rosto da senhora Galanis no momento em que
ela descobrisse que voltei atrás no que dizia respeito à
recusa da herança.

Eu não aguentaria se ela também me achasse uma


mercenária oportunista.

— Você não está pensando em dar a Corinne parte de sua


herança, está? — ela quis saber, estreitando o olhar em
minha direção enquanto Theo traçava o contorno das
sobrancelhas da avó.

— Não quero um único centavo desse dinheiro amaldiçoado,


em especial porque tenho certeza de que o senhor Galanis
fez de propósito! Ele queria que eu ressurgisse na vida de
Rafael

reclamando a herança pra que então seu filho me odiasse


ainda mais!

— Nestor não teve nada a ver com isso — admitiu. — Fui eu


que exigi que ele mudasse o testamento para incluí-la. Era
minha tentativa de tentar recompensá-la por todo o mal que
teve que suportar por culpa do meu marido. E quanto a
Corinne… os pagamentos mensais que ela vem recebendo
em troca de seu silêncio não são o bastante?

As palavras do advogado quando ele me avisou sobre a


morte de Nestor Galanis voltaram aos meus pensamentos
de modo quase instantâneo.

Claro que Corinne vinha recebendo pagamentos mensais!

Como pude ser tão ingênua a ponto de não ligar os fatos?

— Helena… — a senhora Galanis chamou com cuidado,


quando eu não disse nada. — Não importa quanto dinheiro
você dê a Corinne, ela nunca vai deixá-la em paz.
Especialmente se souber sobre Theo. Ela foi capaz de usar
você para obter o que queria, e não vai hesitar a usá-lo
como trunfo.

— Velha cínica e desgraçada! — Caroline explodiu ao meu


lado, os olhos se arregalando ao mesmo tempo que uma de
suas mãos ia para sua boca, como se assim ela pudesse
engolir de volta o palavrão que acabara de soltar. —
Desculpe — emendou de pronto, os ombros murchando no
processo. — Mas Corinne tem o poder de despertar o
melhor em mim.

— Só há um jeito de resolver tudo isso — a avó de Theo


retomou. — Você precisa contar a Rafael sobre o filho dele.

Não, de jeito nenhum, nem em mil anos! Nem mesmo se


minha própria vida dependesse disso.

— Rafael não pode saber que eu tive um bebê, a senhora


me prometeu — apressei-me em lembrara, uma dose de
pânico me consumindo. — Ele realmente acha que tive um
caso com o seu marido e vai odiar o meu filho
instantaneamente.

— Rafael é um bom homem — ela o defendeu —, mesmo


que não seja essa a impressão que você tem dele. Apesar
dos erros de Nestor e de seus pensamentos retrógrados,
meu Raf não é assim.

Ele a pediu em casamento, lembra? Estava disposto a


assumir o bebê de vocês e…

— Nada disso importa! — eu a interrompi, à beira da


exasperação. — Pra Rafael eu não passo de uma… — …

vagabunda! A palavra surgiu de novo nos meus


pensamentos sem pedir permissão, como no dia em que ele
me deixou. Ele não chegou a dizê-la, mas eu podia ver
através de seus olhos o quanto ele amaldiçoava o dia em
que nos conhecemos… o quanto se sentia usado por mim.
Aquilo não tinha volta. — Ele acha que não passo de uma
interesseira. — Foi o que escolhi dizer.

— As coisas são diferentes agora, minha querida, porque


mesmo que Rafael não acredite em você, ele vai ter que
acreditar em mim. É a minha palavra contra a de Nestor, eu
sei de toda a verdade e, se isso não bastar, da mesma
forma que o silêncio de Corinne foi comprado, estou
disposta a pagar o que seja para que ela admita a farsa que
impediu Theo de sempre ter tido a família que merecia.
Pense no seu filho, não é justo que ele seja privado de ter
um pai por causa de pessoas desprezíveis.

Ela tinha razão.

Não era justo que Theo perdesse a chance de conhecer o


pai, assim como não era justo que eu privasse Rafael de
exercer tal função. Por mais magoada que eu estivesse com
ele, precisava me lembrar de quem eram os vilões e vítimas
de toda a armação de Nestor e Corinne.

Só havia duas possibilidades: contar a verdade a Rafael, ou


me submeter às chantagens de Corinne.

Honestamente, nenhuma delas parecia favorável para mim.

CAPÍTULO 21

— Você acha que eles estavam juntos por todo esse tempo?
— A voz de Nikos soou através da videochamada.

— Não quero pensar nisso — respondi esfregando a testa,


tentando impedir que novas imagens de Helena nos braços
do meu pai fossem formadas, porque não poderia mais
suportar nem mais um segundo daquilo.

— Então não pense, porque não vai resolver nada — Orion


decretou, soando ainda mais pragmático do que de
costume. — Não é como se esse dinheiro fosse fazer falta,
e, quanto antes você resolver a situação, melhor para você
e pra tia Irene.

— Odeio dizer isso — Nikos soltou com seu ar divertido e


extremamente irritante na maior parte do tempo —, mas
Orion tem razão.

Orion e eu rolamos os olhos, exasperados, contudo,


qualquer resposta que eu poderia elaborar morreu quando o
som de alguém batendo na porta do escritório me
interrompeu.

— Tenho que ir, um problema novo está batendo na minha


porta agora mesmo. — Encerrei a chamada no mesmo
instante, enfiando dois dos meus dedos na gola da camisa
de lá que eu usava, como se isso fosse me ajudar a respirar
melhor, então o fiz por três vezes consecutivas, antes de
me obrigar a me levantar e ir destrancar a porta, para
enfrentar o que quer que fosse que me esperava.

Ali estava ela novamente.

Helena.

O meu martírio contínuo, a mulher que não saía da minha


cabeça por mais que eu tentasse.

— Você outra vez — murmurei entre dentes, cerrando as


mãos em punho numa forma inútil de controlar a onda de
revolta que me invadia sempre que aquele rosto bonito
como o de uma deusa grega inundava minhas vistas.

— Mas não sozinha — minha mãe emendou, surgindo do


corredor e entrando em meu campo de visão. — Helena e
eu precisamos falar com você, Rafael, e sugiro que você se
sente para termos essa conversa.

Eu era pai.
Pai.

A notícia caiu no meu colo com o peso de um mundo inteiro,


e eu agradeci silenciosamente por ter me sentado, como
minha mãe sugeriu.

Nestor inventara mentiras indecorosas a respeito de Helena,


no intuito de me separar dela, endossadas por Corinne, e eu
caí como um patinho em sua manipulação.

Abandonei Helena. Abandonei o bebê que ela carregava. E,


como se não bastasse, fui um completo canalha com
alguém que só me disse verdades.

Eu sabia que Helena não tinha um bom relacionamento com


a mãe, bem como sabia que Nestor era um tradicionalista
imbecil que não foi capaz de aceitar nem mesmo o fato de
que um dos seus irmãos tivesse encontrado a felicidade ao
lado de uma brasileira. Os pais de Orion transbordavam
amor, ainda assim, para o meu pai o mais importante sobre
tia Cíntia era o fato de que ela era brasileira e, portanto,
indigna de ser uma Galanis.

Contudo, como eu poderia imaginar que a ganância da mãe


de Helena e a soberba do meu pai iriam tão longe?

Tudo fora arquitetado de modo tão perfeito, mas ao mesmo


tempo absurdo, que eu me sentia um néscio por não ter
percebido a farsa por conta própria.

Uma vida inteira jamais seria capaz de consertar o estrago


que causei quando não acreditei em uma Helena que, aos
berros, jurava me amar.

— É melhor eu ir — ela decidiu, ajeitando melhor sua bolsa


a tiracolo e preparando-se para sair do escritório.
— Não. — Minha voz saiu rouca e estranha até mesmo para
os meus próprios ouvidos, talvez tenha sido isso que fez
com que Helena detivesse seu movimento. — Você fica.

— Rafael — minha mãe interveio —, é muita coisa pra


absorver.

Você e Helena deveriam conversar com mais calma, em um


momento mais adequado.

— Esse é o momento mais adequado — retorqui, me


levantando e dando a volta na mesa, ainda que minhas
pernas não estivessem tão firmes, então encarei minha mãe
de perto. — Nos dê licença, por favor. O

que tenho pra falar com Helena só diz respeito a nós dois.

Mamãe vacilou por um instante, olhando entre mim e


Helena antes de decidir que era seguro nos deixar a sós.
Com um carinho sem medidas, ela depositou um beijo no
rosto de Helena, dando batidinhas em seu ombro logo em
seguida como incentivo.

Eu era um tolo. Era a única explicação para não ter visto


aquele relacionamento se desenrolando sob o meu nariz, e
eu não podia deixar de pensar que era minha culpa que
toda a bagunça que Nestor criara tivesse chegado a tal
ponto.

— Por que não me disse antes que não tinha desistido do


bebê? —

quebrei o silêncio, e a resposta imediata que recebi de


Helena foi um bufar incrédulo.

— Você não escutou nada do que sua mãe e eu acabamos


de dizer?
— devolveu, e esfreguei os olhos, exausto com o peso da
culpa em meus ombros.

— Claro que sim. Desculpe, sou um imbecil. Eu teria feito o


mesmo, no seu lugar.

— Acho que eu também teria feito o mesmo no seu lugar —


admitiu quase de forma inaudível.

— Teria? — quis me certificar.

— Nós não tínhamos um relacionamento até eu engravidar.


Eu era só a moça que servia café pra ganhar a vida e vez ou
outra esquentava sua cama. Então, do nada, apareci
grávida… — Ela deu de ombros. —

Sei como isso soa. Eu era ingênua, mas não idiota.

Helena poderia ter sido tudo para mim, naquela época,


menos a moça que servia café para ganhar a vida e vez ou
outra esquentava minha cama.

Ela era a mulher que me enlouquecia e tirava dos eixos, que


fez com que a beleza de todas as outras empalidecesse
perto da dela. Helena despertava minha libido de um modo
que eu jamais me sentia saciado.

Por mais que a tomasse para mim por horas a fio e


acariciasse cada recôndito do seu corpo perfeito, nada
parecia suficiente.

Pensar que ela se entregara ao meu pai me atormentou de


modo inenarrável, entretanto não foi capaz de amainar a
reação do meu corpo às suas lembranças, e eu me odiei por
isso durante todo o tempo em que estivemos separados.
Agora, o motivo da minha ira era outro: o fato de eu ter
acreditado que o abandono de Helena e a paixão de seus
beijos ao ser minha podiam ser fingidos.

— Não foi assim que as coisas aconteceram, você sabe —


apressei-me para lembrá-la. — Eu acreditei que você e meu
pai…

— Você acreditou que eu era amante dele e queria dar o


golpe da barriga em um bilionário — interrompeu-me, e tive
que engolir a vergonha em seco. — Mas se eu tivesse
dinheiro, minha palavra teria mais peso.

— Pra mim o fato de você não ter dinheiro nunca foi uma
questão.

Eu te pedi em casamento, planejei um futuro com você.

— Graças ao seu senso de responsabilidade, não por me


amar. —

Os olhos de Helena pareciam inflamados com uma emoção


contida. —

Você me disse com todas as letras que até gostava de mim,


mas não do modo que eu esperava.

— E você me disse que não esperava nada.

— Não importa mais — sentenciou, respirando fundo como


se quisesse convencer a si mesma do que dissera. — O que
passou, passou.

Sei que você não é o vilão da minha história, Rafael. Espero


que saiba que tampouco sou a vilã da sua, mas estou
disposta a ser, se você ao menos cogitar me separar do
meu filho.
Um sorriso gigante se formou em meus lábios de forma
quase automática, sem que eu pudesse contê-lo. Helena
parecia uma leoa prestes a defender o filhote de qualquer
mal que o rondasse, e isso fez meu peito se encher de
orgulho por ela.

— Achei que já tivéssemos estabelecido que não sou um


monstro como o meu pai, nem o vilão da sua história —
apontei. — Você disse filho… é um menino? — perguntei,
com a curiosidade a mil. Não que fizesse alguma diferença.
Eu amaria aquele bebê com tudo de mim,
independentemente do gênero.

Helena assentiu de leve com a cabeça, e precisei de todas


as minhas forças para não a abraçar e girá-la no ar.

— Theo — ela disse, porém não precisava elaborar mais


para que eu entendesse o que ela queria dizer.

— Sou pai de um menino — sussurrei para mim mesmo, o


coração a ponto de explodir dentro do meu peito. — Theo.
— Um nome grego.

Depois de tudo o que aconteceu, Helena escolheu um nome


grego para o nosso filho.

Não podia ser uma coincidência, e se aquilo não passasse


de um sonho, eu não queria acordar jamais.

— Quando posso vê-lo? Ele está aqui? Você tem ao menos


uma foto pra me mostrar?

Minhas perguntas saíram atropelando umas às outras, em


meio à minha euforia e ansiedade, porém Helena conseguiu
encontrar algum sentido nas minhas palavras, já que, em
silêncio, buscou pelo seu celular na bolsa, dando alguns
toques na tela antes de virá-la para mim.
No mesmo segundo, me lembrei de quando Nestor fizera
aquilo, todavia as sensações causadas não poderiam ser
mais distintas.

Com Nestor, foi como ter levado um chute no estômago.


Com Helena, foi como se apenas naquele momento eu
tivesse aprendido a respirar com eficiência.

Meus dedos estavam trêmulos, e só fui capaz de notar isso


quando estiquei minhas mãos para segurar o celular de
Helena, que exibia a imagem de um garotinho sorridente,
ao que parecia, no processo de bater suas perninhas e
braços.

O olhar que ele lançou em direção à câmera era


inconfundível, um reflexo do meu próprio, e novamente, lá
estava eu, sorrindo como um bobo, encantando por uma
foto, minha cabeça girando, tentando alinhar todas as
informações que meu cérebro recebera em tão curto tempo.

— Ele tem os meus olhos — eu disse o óbvio, sem conseguir


desviar o meu olhar da foto. — Na verdade, ele é uma cópia
minha, quando tinha essa idade.

Ela não disse nada.

Desde que despejara toda a verdade, num turbilhão


incessante de palavras, Helena apenas enxugou as lágrimas
que lhe escaparam e deixou que minha mãe me
confessasse que sabia de toda a verdade sobre o engodo de
Nestor. Em nosso intento de proteger um ao outro, só o que
conseguimos foi que Helena saísse ainda mais machucada e
que perdêssemos a oportunidade de acompanhar o fim da
gestação e todos os momentos de Theo desde que ele
chegara ao mundo.
Eu esperava que Nestor estivesse se contorcendo no
inferno, onde ele merecia estar, e que Corinne não
demorasse a segui-lo.

— Me deixe conhecê-lo — praticamente implorei a Helena,


desviando meus olhos da foto de Theo para encará-la.

— Sua mãe sabe como me encontrar. Quando for


conveniente pra você…

— Agora é conveniente pra mim, se estiver tudo bem da sua


parte.

Ela abriu a boca para responder, entretanto fui mais rápido,


entregando-lhe seu celular e me encaminhando até a porta
numa velocidade que não deixava brechas para
contestação.

Tempo demais já havia passado com meu filho longe de


mim, aquilo tinha que acabar.

Em resposta ao meu gesto, Helena suspirou, murchando os


ombros e indo em direção à porta do escritório, que mantive
aberta para que ela passasse.

CAPÍTULO 22
Theo era um bebê relativamente grande, para seus cinco
meses de idade. Forte, lindo e com um cheirinho tão
intrínseco a ele que fez meus olhos arderem.

Era uma emoção única tê-lo em meu colo e descobrir que a


foto que Helena me mostrara, por mais perfeita que fosse,
ainda não era capaz de fazer jus à visão de Theo ali de
perto, a poucos centímetros do meu rosto.

Abracei forte o corpo do meu filho, como imaginei que faria


durante todo esse tempo, enquanto acreditava na mentira
de Nestor e desejava jamais ter descoberto a verdade.

Não era suficiente, todavia. Nada parecia ser suficiente.


Theo nos meus braços, meus lábios beijando cada pequena
parte de seu corpinho, minhas mãos acariciando seus
cabelos escuros e macios… nada era suficiente.

Eu era pai!

Pai de um menino lindo e sorridente, que não fazia a menor


ideia da bagunça que precedera sua chegada ao mundo.

Como eu lhe explicaria meu abandono? Como faria para que


entendesse que ficar longe, sob nenhuma hipótese, era algo
que eu teria escolhido? Como faria para que ele e Helena
me perdoassem pelos últimos meses?

Eu nem mesmo estava certo sobre merecer ou não o perdão


de nenhum deles.

— Ele é simplesmente perfeito — quebrei o silêncio em meio


ao meu momento de admiração destinada a Theo. — Não
consigo pensar em palavra melhor pra descrevê-lo —
admiti, tocando a bochecha rosada do meu filho com o
dorso do meu dedo, sentindo a maciez e recebendo um
sorriso banguela. — Sou o seu papai, Theo, e juro que, a
partir de agora, vou cuidar de você como deveria ter feito
desde o início.

Sem sombra de dúvidas, aquela era uma promessa pela


qual eu daria minha própria vida, se preciso fosse, para
cumprir.

Eu não conseguia me desgrudar de Theo um único minuto.

Quando Helena disse que precisava ir para o seu Bar de


Cupcakes

— um nome engraçado e estranho na mesma medida, sobre


o qual eu perguntaria mais tarde —, havia apenas duas
alternativas: ir para casa, ou dar um jeito de fazer com que
ela aceitasse minha companhia.

Obviamente, me esforcei para que a segunda opção


acontecesse, ainda que Helena e Caroline não tenham se
mostrado tão satisfeitas assim com a ideia. Apesar de aquilo
não contar pontos ao meu favor, eu gostava do fato de que
Caroline tivesse um pé atrás comigo, porque condizia com a
postura de melhor amiga capaz de confrontar qualquer
idiota que fizesse Helena sofrer.

Eu era o idiota em questão, tinha um longo caminho a


percorrer, se quisesse ser absolvido, mas pouco me
importava. O cerne da questão era que Helena e Theo
nunca estiveram sozinhos na minha ausência, e esse era
um consolo maior do que minha mente atormentada por
remorso merecia.
Arrependimento sem ações, porém, não melhorariam as
coisas, e eu precisava agir, em vez de ficar remoendo os
momentos que perdi ao lado de Theo. Era o que eu estava
tentando fazer, ao me oferecer para ser a babá dele
enquanto sua mãe e Caroline encarnavam as
empreendedoras em que tinham se transformado.

Observei, com cuidado, o modo como Helena trocava a


fralda suja com a habilidade de alguém que já realizara
aquele movimento milhares de vezes, como uma forma de
me preparar para quando chegasse o meu momento.
Assisti, consternado, ao trabalho exaustivo que era precisar
cuidar dos atendimentos no balcão e checar a todo instante
se Theo estava bem e entretido suficiente.

Eu estava ali, dedicado apenas a ele, contudo Helena agia


como se eu não estivesse. Seus olhos nunca buscavam os
meus, ela não se dirigia a mim, a menos que eu fizesse
alguma pergunta, e não importava o fato de que mantive
Theo no meu colo durante todo o tempo, em vez de no seu
carrinho ou no cercadinho improvisado de bebê.

Estava tudo bem, por mim. Eu não merecia seu voto de


confiança assim, de mão beijada, portanto trabalharia duro
para merecê-lo.

— Ficou bem claro que esse garotão tem muita força na


mandíbula

— comentei ao mesmo tempo que assistia a Helena


amamentando Theo.

Nós estávamos de volta à sua casa, depois de seu


expediente no Bar de Cupcakes, e depois de tomar um
banho rápido, ela se sentou no sofá gasto, com Theo nos
braços, e fiz o mesmo, invadindo seu espaço pessoal de tal
forma que ela não poderia se mexer um único centímetro,
sem que seu corpo esbarrasse no meu.

— Dói? — eu quis saber, uma curiosidade genuína mesclada


à tentativa de não deixar que a proximidade de Helena
fosse tão perturbadora, uma vez que eu não conseguia me
afastar.

— Não mais — ela se limitou a responder, e os olhos de


Theo pareciam cada vez mais pesados, conforme ele se
alimentava e aninhava

sua pelúcia contra o próprio corpo.

— Como você consegue fazer qualquer coisa o dia todo,


além de olhar pra ele?

Um leve esboço de sorriso surgiu nos lábios de Helena pela


primeira vez em toda a noite.

— Alguém precisa trabalhar pra manter as despesas dessa


coisinha fofa. — Ela apertou as bochechas de Theo
levemente com o polegar e o dedo do meio, e, de olhos
fechados, ele sorriu para a mãe, sem tirar o mamilo que
sugava da boca.

Por mais que a visão fosse mágica e doce, a visão do seio


exposto e macio de Helena era perturbadora, de modo que
olhei ao redor, tentando não sexualizar aquele momento
especial entre mãe e filho só porque ele me fazia lembrar
de quando era minha boca explorando aqueles montes que
agora eram as mamadeiras naturais do meu filho.

— A vida não tem sido gentil com vocês dois — observei,


depois de algum tempo analisando o papel de parede gasto
da sala de estar.
— Esse é o seu ponto de vista, não o meu — Helena
retorquiu em um tom ácido, e compreendi que ela não
gostaria de falar das dificuldades que enfrentara com Theo,
quando lhe dei as costas.

— Você guardou o polvo de pelúcia — mudei de assunto.


Não que eu não tivesse percebido aquilo antes, mas aquele
pareceu o melhor momento para falar sobre isso.

— Theo gosta dele. — Deu de ombros, indiferente.

— O que mais você guardou daquela época?

— Tudo o que realmente importa.

— Você pode exemplificar? — insisti, ávido por saber se ela


considerava o pé do primeiro sapatinho de tricô que me deu
como algo importante, porque nunca fui capaz de me
desfazer dele.

— Não tenho mais sua pulseira de diamantes, se é isso o


que quer saber — praticamente cuspiu em resposta, com o
corpo enrijecido.

— Não ligo para a pulseira. Nunca liguei — reassegurei. —


Era sua, pra você fazer o que bem quisesse com ela.

Não obtive resposta. Pelo menos não uma articulada, já que


Helena se limitou a acenar uma única vez.

Theo acabou pegando no sono no meio de sua refeição, e a


mãe dele o ajustou sobre o ombro, o rostinho pequeno
virado para mim, conforme dava pequenos tapinhas em
suas costas, até ele enfim arrotar.

Como era possível que aquela cena fosse algo tão bonito?
— Sinto muito pelos últimos meses, Helena. — As palavras
saíram antes que eu sequer pudesse pensar sobre elas.
Talvez por isso tenham parecido tão simples e inúteis. — Sei
que um pedido de desculpas não muda o que aconteceu,
mas quero que saiba que você e Theo agora têm a mim, e a
minha mãe, e eu vou fazer tudo o que estiver ao meu
alcance pra provar, dia após dia, que falo sério.

Toquei a mão de Helena, apoiada nas costas do meu filho,


gentilmente, mas sua reação foi a de quem acabara de ser
eletrocutada.

Ela se levantou de pronto, e imitei seu gesto conforme ela


dava alguns passos atrás, impondo certa distância entre nós
dois.

— Está tarde. — Foram suas próximas palavras, com uma


nota de nervosismo. — Eu preciso descansar, e Theo
também. É melhor você ir pra casa.

— Como quiser — concordei. Pressioná-la não era a melhor


forma de lidar com a situação, e nós tínhamos percorrido
um longo caminho em menos de vinte e quatro horas. —
Será que posso segurá-lo só mais um pouquinho, antes de
ir? — A quem eu queria enganar? Separar-me de Theo
parecia tão atrativo quanto amputar um membro. — Cinco
minutos, cronometrados, e então vou embora. Juro —
prometi, quando ela pareceu reticente.

Depois de sua hesitação inicial, Helena estendeu Theo para


mim da forma mais cuidadosa possível, para não acordá-lo,
transferindo seu peso para o meu corpo até ele estar
totalmente em meus braços.
CAPÍTULO 23

— Você considera o seu apartamento um lugar neutro? —

questionei a Rafael conforme ele afastava a cadeira da


mesa posta para que eu pudesse me sentar.

O convite para jantar em um lugar neutro, no qual


discutiríamos as cenas dos próximos capítulos das nossas
vidas, surgiu graças às minhas tentativas de me esquivar de
Rafael sempre que ele tentava alguma aproximação.

Ele mantinha contato com Theo todos os dias desde que se


viram pela primeira vez, e, verdade fosse dita, meu filho o
adorava.

Rafael fez questão de aprender a trocar fraldas, dar banhos,


ninar e preparar mamadeiras. Era quase doloroso pensar
que Theo e eu tivemos nosso direito de usufruir do amor de
Rafael negado.

Exceto pelo fato de que ele não me amava, e sim a Theo.

Disso eu não poderia me esquecer.


— Só temos boas memórias aqui, não? — ele devolveu,
dando a volta na mesa para ocupar o seu lugar. — Além do
mais, eu precisava de um local privado pra essa conversa. O
assunto que vamos tratar é delicado, não quero ter que ficar
olhando sobre os ombros a cada palavra, e eu também
tenho algumas coisas pra te mostrar.

— Que coisas?

— Vamos por partes, sim? — sugeriu, me regalando um


sorriso acolhedor que vinha sendo constante em nossas
interações, desde que Raf descobrira sobre a farsa de seu
pai. —

Primeiramente, o que eu te disse quando conheci Theo é a


mais pura verdade. Você não precisa acreditar em mim de
imediato, sei que nosso passado não depõe ao meu favor,
mas eu vou te provar que pretendo cumprir cada uma de
minhas promessas e estou disposto a atender qualquer
exigência que você possa ter.

— Não tenho nenhuma exigência, não seja absurdo.


Contanto que você não pense em me afastar de Theo… —
apressei-me em emendar, pois aquele era meu único receio.

— De forma alguma — negou, balançando a cabeça de um


lado para o outro a fim de endossar suas palavras. — Quero
me aproximar dele, não afastá-lo de você.

Era reconfortante escutar aquilo, ainda que Rafael já tivesse


me assegurado de que tinha a melhor das intenções. A vida
me fizera meio cética, e coisas boas demais pareciam estar
acontecendo ao mesmo tempo, para que eu simplesmente
baixasse a guarda.

— Tudo bem, então. — Forcei meus ombros a relaxarem um


pouco.
Os últimos dias vinham sendo tensos. Entre contar para
Irene que ela tinha um neto, seus conselhos para que eu
contasse a verdade a Rafael, as mensagens constantes de
Corinne exigindo dinheiro em troca de seu silêncio, as
repercussões que enfrentar o pai do meu filho traria…

Eu me sentia como uma panela de pressão prestes a


explodir.

— Mais uma vez, sinto muito por tudo o que teve que passar
por minha culpa — Rafael sussurrou para mim, quebrando o
silêncio confortável que se instalara. — Eu fui um canalha e
não mereço a menor consideração vinda de você, mas vou
me esforçar pra merecer. Meu comportamento não tem
desculpa, eu…

— Corinne e seu pai são os verdadeiros vilões, eu já disse —

interrompi. Ele já havia se desculpado o bastante, mesmo


que eu ainda me sentisse reticente. — Somos apenas
vítimas tentando nos recuperar de um esquema mesquinho
do qual ninguém saiu ileso.

Era a mais pura verdade. Rafael tinha, sim, sua parcela de


culpa, contudo eu não podia me ressentir o resto da vida.
Ele era pai do meu filho e estava tentando executar seu
papel da melhor forma possível. Não precisávamos nem
sequer gostar um do outro, desde que nos respeitássemos.

Muito mais fácil dizer do fazer, claro, porque a presença de


Rafael ainda era perturbadora, e não ajudava em nada o
fato de ele ser tão prestativo e carinhoso não apenas com
Theo, mas também comigo.

Por isso eu evitava ao máximo fitá-lo. O mero vislumbre de


seus olhos e de seu sorriso matador já eram demais para o
meu coração, que só havia encontrado o significado do
amor nos braços de Rafael.

— De qualquer maneira, nunca vou me cansar de pedir o


seu perdão até conquistá-lo — reiterou, e precisei tomar um
gole da água servida na taça de cristal logo à minha frente,
para aplacar a secura da minha boca.

— Você já o tem — admiti pela primeira vez, sentindo um


peso enorme sair do meu peito. Manter a pose de
inabalável, indiferente, rancorosa ou qualquer outra coisa
capaz de definir minha postura era cansativo, e eu estava
farta. — Também preciso me desculpar por ter afastado
Theo de você e…

— Você fez o que julgou necessário pra proteger o nosso


bebê

— ele me cortou, capturando minha mão com as suas


quando depositei a taça de volta na mesa. — Talvez tenha
sido o melhor pra Theo — considerou. — Não precisar
jamais conviver com Nestor é uma bênção sem medida.

Ela tinha razão. O pai dele era um monstro e sua morte fora
a melhor coisa que acontecera para todos nós. Eu não
desejava mal aos outros, porém, tratando-se de Nestor, era
apenas alívio por ele já não ser uma ameaça.

— O que é que você tem pra me mostrar? — perguntei a


Rafael, numa tentativa deliberada de levar a conversa para
um tema mais brando.

— Um momento — pediu, erguendo o dedo indicador para


exemplificar.

Ele se levantou, rumando ao que eu sabia que era seu


quarto, e mordi o lábio enquanto o esperava voltar de lá,
tentando não ponderar acerca do cômodo. Não era da
minha conta se a decoração permanecia a mesma ou não.

Quando Rafael voltou, tinha uma pasta em uma das mãos, e


minhas sobrancelhas se uniram em desentendimento.

Estendendo-me o objeto antes mesmo de que eu tivesse


tempo de questioná-lo de que se tratava, ele se sentou na
beirada da mesa, logo à minha frente.

Foi quando reconheci a logo do hospital onde eu realizara


meu primeiro ultrassom. Meus dedos começaram a tremer
quase de imediato, e encarei Raf no mesmo instante, em
um questionamento mudo.

Ali estava. A primeira imagem de Theo. Tudo muito


embaçado, sem que eu soubesse muito bem como
distinguir os contornos, exatamente como da primeira vez.
Como se não bastasse, ainda havia o pé do sapatinho que
dei para Raf, dizendo-lhe para pendurar em seu retrovisor
para que fosse como um ímã de mulheres.

— Não é possível que você tenha guardado essas coisas —

soltei em um suspiro incrédulo, sacudindo a cabeça de um


lado para o outro sem nem mesmo entender o motivo de
fazê-lo. — Por quê?

O sorriso que me desarmava por inteiro surgiu de novo, e


meu coração deu um solavanco dentro do peito.

— Porque são coisas que realmente importam — ele disse


simplesmente, imitando uma de minhas falas. — Como eu
poderia simplesmente me livrar delas? Você ainda tem o
seu pezinho?
Se eu tinha o meu pezinho? Por acaso a Terra girava em
torno do Sol?

— Claro que sim! — respondi, meus olhos pinicando pelas


lágrimas.

Eu não queria chorar! Não podia chorar!

Mas como evitar que as lágrimas caíssem, quando Rafael


guardara aquelas lembranças tão preciosas para mim
mesmo durante o tempo em que acreditava que eu era um
monstro?

— Então você deve ficar com o meu também, mesmo que


os pés do nosso garoto já sejam grandes demais pra
caberem aqui dentro.

Sorri, porque era impossível controlar meus lábios. E chorei


também, tudo ao mesmo tempo, transparecendo um
pouquinho do caos que eu era por dentro.

— Tem certeza?

— Você me deu um filho, Helena, pode ter o que quiser de


mim.

Talvez fosse sua pose despreocupada, ou a camisa branca


de botões que ele vestia e lhe dava um charme extra. Podia
ser também minha carência ou qualquer outra coisa,
entretanto, a primeira coisa que passou pela minha cabeça
foi: “quero você”.

O pensamento me pegou de assalto, sobressaltando-me, e


fechei os olhos com força, esperando que Rafael não
pudesse ler o

que se passava dentro de mim através deles.


— Quero apenas que você ame Theo e que a felicidade dele
esteja sempre acima dos seus desejos pessoais. — Era uma
meia verdade, já que eu queria mesmo isso. Mas não
apenas isso. —

Pode me dar a sua palavra de que é assim que as coisas vão


acontecer?

Ele acenou com a cabeça, em concordância.

— Posso. E você? Acha que consegue acreditar na minha


palavra?

— Sim. — Na verdade, eu gostaria que fosse um pouco mais


difícil acreditar nele.

Depois de tanto me resguardar, o ultrassom e o sapatinho,


aliados às gentilezas de Rafael, estavam destruindo a casca
que eu insistia em manter para me proteger dele e de tudo
o que me fazia sentir.

— Eu te disse uma vez que estaria ao seu lado pra


cuidarmos juntos do nosso filho — ele retomou, estendendo-
me uma de suas mãos. Titubeei, porém decidi segurá-la
entre a minha, o contato quente de sua pele provocando
arrepios por toda minha espinha, ao passo que eu me
colocava de pé, frente a frente com Rafael. — Sei que
quebrei minha promessa por muito tempo, mas isso não vai
mais acontecer. Nunca mais vou duvidar de você, ouviu? Por
nada nesse mundo. — Suas mãos abarcaram meu rosto, e
fechei os olhos por um instante, para apreciar o contato. —
A sua palavra vai ser sempre mais importante do que
qualquer foto manipulada e testemunhos de quem quer que
seja. Sempre vou acreditar e confiar em você.

Antes que eu pudesse sequer calcular os riscos daquele ato,


me atirei nos braços de Rafael, apertando-o com todas as
minhas forças. Não considerei que poderia arruinar sua
camisa com meu choro mesclado a máscara de cílios
borrada, muito menos que estava sendo imprópria, e
qualquer chance de raciocínio foi mandada ao espaço
quando ele retribuiu o gesto, enxugando

minhas lágrimas com seus dedos gentis e me fazendo sentir


protegida de um modo que só era possível quando ele me
abraçava daquele jeito.

Seu cheiro, a textura de suas roupas contra a minha pele, o


calor do seu corpo prensado contra o meu…

Como era possível que eu ainda fosse completamente louca


por aquele homem?

CAPÍTULO 24

Como era possível que eu ainda fosse completamente louco


por aquela mulher?

Ter Helena em meus braços, apertando-a contra o meu


corpo, tornava incontestável que o desejo que eu sentira
por ela não arrefecera minimamente. Seu cheiro ainda era
inebriante, suas curvas ainda se moldavam com perfeição a
mim, e a boca continuava com a mesma aparência beijável
de sempre.

— E-eu já vou indo — balbuciou, rompendo nosso contato


cedo demais, pegando o envelope e o sapatinho de tricô
antes de fugir de mim.

— Nós ainda não jantamos — eu a lembrei, ao seu encalço.

— Não estou com fome. E ainda tenho que buscar Theo na


casa da sua mãe, então só depois ir pra Newark, é uma
longa viagem.

— Vou levar você, não espero que faça esse percurso de


metrô. Nós mal começamos a conversar.

— Já falamos o mais importante. Perdoamos um ao outro,


isso é o suficiente, por ora. As outras coisas podemos ir
descobrindo durante o

percurso, não há pressa — soltou, meio esbaforida pelo


turbilhão de palavras.

Helena vestiu o casaco preto com o qual chegara ali, da


mesma cor do vestido que acentuava todas as suas curvas,
no entanto, eu não podia permitir que ela se fosse, não
quando acabáramos de fazer tanto progresso.

— Claro que há pressa — contrapus, segurando seu braço,


para que ela se aproximasse e olhasse para mim. — Não
acha que já perdemos tempo demais?

O leve movimento de sua cabeça concordou comigo, e ela


engoliu em seco, tirando os fios pesados de seu cabelo de
sob o tecido do casaco que vestira, antes de perguntar:

— Sobre o que mais você gostaria de falar?


Sobre absolutamente tudo e nada. Sobre qualquer coisa que
a fizesse jogar os braços ao meu redor outra vez, para ser
sincero.

— Você consideraria a possibilidade de se mudar para Nova


Iorque?

— Foi a primeira coisa que me ocorreu perguntar. — Sei que


você e Caroline têm um negócio recente, mas quero
aproveitar cada segundo possível ao lado de Theo.

Helena ponderou por um instante, antes de responder.

— Entendo que se sinta assim, só que não posso fazer isso.


Eu moro com Caroline, e nós tomamos qualquer decisão
juntas. Seria desgastante para ela, sem contar os custos e…

— Obviamente eu pagaria toda e qualquer despesa —


emendei rapidamente.

— Eu não aceitaria. — Claro que não. E eu era um imbecil


por pensar que sim. — Meu interesse no seu dinheiro é
inexistente, achei que isso tivesse ficado claro.

— Claro como água — aquiesci. — Mas ter vocês mais perto


seria algo que eu estaria fazendo por mim. Porém entendo
que talvez seja pedir demais.

O certo seria que eu me mudasse para Newark. Não era o


cenário ideal para mim, porém, desse modo, eu estaria
perto de Theo, e no momento essa era minha prioridade.

— As coisas não vão se resolver da noite pro dia, Rafael —


Helena cochichou para mim, e havia tanta cumplicidade no
gesto… — Vamos dar um passo de cada vez. Tudo o que
importa, no momento, é que você e Theo estão inseridos na
vida um do outro. Nós vamos dar um jeito de fazer as coisas
acontecerem.

— Eu acredito em você — admiti, tomando sua mão livre


com as minhas e beijando-lhe o dorso demoradamente,
desejando fazer muito mais do que apenas isso. — Desculpe
se estou ansioso demais.

Toquei seu rosto, as maçãs bem esculpidas, e o suspiro que


Helena soltou entre os lábios me provava que nossa
proximidade também mexia com ela.

— Preciso mesmo ir embora — ela insistiu no assunto,


desvencilhando-se de minhas mãos e dando um passo
atrás, para mais perto do elevador privativo.

— Ainda está chateada comigo? — eu quis saber, e ela


acenou uma negativa, com olhos arregalados pela surpresa.

— Claro que não — verbalizou, mas eu sabia que ela não


estava sendo cem por cento honesta comigo, já que seu
corpo comunicava outra coisa.

— Então por que está fugindo de mim?

— Não estou — ela negou com veemência, engolindo a


saliva com dificuldade. — Só está tarde e…

Meu polegar pressionando os lábios de Helena foi o


suficiente para interromper a desculpa que ela estava se
dando o trabalho de reformular.

Cortei a distância entre nós dois, minha mão livre buscando


a curva delicada de suas costas, puxando o corpo curvilíneo
para se encaixar ao meu.
Eu não tomara a decisão deliberada de seduzir Helena,
porém a urgência que me acometia sempre que a tinha por
perto não podia ser ignorada. Então eu a beijei, minha boca
pressionando a sua num movimento calmo e gentil que fez
com que Helena se sobressaltasse, mas ela não se afastou.
Em vez disso, ficou nas pontas dos meus, apertando-se
mais contra mim, dando-me todo o incentivo de que eu
precisava.

Tomei a pasta que ela trazia em uma das mãos e,


cegamente, a depositei no aparador mais próximo.

O corpo de Helena fora feito para ser adorado.

Eu já sabia disso antes, mas agora… depois do nosso tempo


de abstinência, não havia outra forma de fazer amor com
ela que não envolvesse um culto à perfeição que ela era, de
modo que a depositei na minha cama, afastando seus
joelhos com uma das mãos para apreciar sua nudez.

Segundos foram tudo o que separaram nosso beijo do


momento em que nossas mãos afoitas começaram a despir
um ao outro, e agora Helena estava ali, com a boceta
molhada implorando por atenção.

Meu rosto se enterrou nas dobras macias, quentes e úmidas


de Helena, e seu corpo reagiu como sempre reagia ao
contato da minha boca: sua coluna arqueando-se em uma
entrega que jamais poderia ser fingida.

Minha língua se refestelou em seu sexo, sedenta pelo gosto


de mulher de Helena, ao passo que minhas narinas
inalavam com força seu cheiro viciante concentrado entre
suas pernas.
Eu não era um celibatário, longe disso, mas desde que
Helena fora embora, estive apenas com outras duas
mulheres, a quem usei para tirar do meu sistema a minha
ex-noiva.

Não funcionou, porque, apesar de bonitas, elas não eram a


própria visão de deusas gregas, como era o caso de Helena.
O beijo não era tão bom, o corpo não tinha o encaixe
perfeito… sendo assim, eu encontrava muito mais prazer
sozinho, com minha mão acariciando meu membro rígido ao
mesmo tempo que meus pensamentos iam direto para
Helena.

A lembrança de seus beijos, dos gemidos de prazer, do seu


cheiro inebriante e do olhar hipnótico… era nela que eu
pensava a cada orgasmo, era o nome dela que eu chamava
entre dentes, mesmo que me

sentisse um lixo depois, por desejar a mulher que eu achei


que se deitava com meu pai.

Isso ficara para trás, no entanto. Helena estava ali,


gemendo de prazer sob meu corpo, se contorcendo, as
coxas pressionando minhas orelhas enquanto eu agraciava
seu clitóris com leves sucções e lambidas demoradas.

— Raf — ela chamou, a respiração ofegante, e adorei o fato


de ela usar meu apelido. — Estou tão perto.

Deslizei dois de meus para dentro de Helena, e seus


músculos internos se apertaram ao redor dele de imediato,
fazendo com que minhas bolas ficassem ainda pesadas pelo
tesão que eu vinha tentando manter sob controle.

Eu precisaria me dedicar ao corpo de Helena com calma


depois, quando meu desejo mais urgente, porque no
momento tudo em que eu conseguia pensar era em como
seria delicioso ter meu pau sendo abrigado por Helena.

Voltei seus quadris para a cama, e, sem conseguir me


conter, enterrei minha ereção entre as dobras quentes, que
me receberam com uma espécie de abraço apertado,
convidando-me para ir mais fundo, e, incapaz de resistir ao
convite, eu fui.

A sensação era de estar de volta em casa depois de ter


vivido em um completo inferno por tempo demais.

Com um cotovelo apoiado no colchão, arremeti contra o


corpo de Helena, sentindo sua boceta nua ao meu redor, a
umidade facilitando o processo de entrar e sair dela num
ritmo alucinante que sempre fora nossa marca registrada.

Quando meus lábios se fecharam ao redor de um dos seus


mamilos, a boca de Helena se abriu em puro deleite, um
gemido arrastado passando por ela.

— Você não faz ideia do quanto senti sua falta — confessei,


porque ela precisava de palavras também, não apenas de
gestos. — Diga que também sentiu a minha…

— Mais do que posso colocar em palavras — murmurou,


antes de segurar meu rosto entre suas mãos para que
pudesse me beijar com urgência. Ao fim do contato, seus
olhos se abriram para mim. — Me faça

gozar — pediu, porém meu cérebro interpretou como uma


ordem, de modo que aumentei o ritmo das estocadas, uma
de minhas mãos descendo para o encontro de nossos
corpos, a fim de massagear o clitóris de Helena.

— Eu já disse que você pode ter o que quiser de mim —


lembrei-a.
— O que quiser — reiterei, roubando sua boca para um
beijo, bebendo dos seus gemidos desesperados.

Os tremores começaram quase tímidos e espaçados, e


então evoluíram para uma entrega completa e arrebatadora
quando Helena e eu gozamos em sincronia, chamando pelo
nome um do outro.

CAPÍTULO 25

Eu estava nos braços de Rafael, depois de pertencer a ele


novamente e de ter me sentido mulher de um jeito que não
me sentia desde nossa última noite juntos.

O sorriso que ameaçava partir meu rosto ao meio foi


involuntário, por mais que eu soubesse que aquele era
apenas um momento roubado que eu me permitira ter
depois do caos completo que fora minha vida nos últimos
tempos.

Girei dentro do abraço de Raf, de frente para ele,


observando seu rosto bonito e relaxado enquanto ele
dormia, a respiração compassada, o peito subindo e
descendo e os cabelos uma completa confusão, graças aos
meus dedos ansiosos revirando os fios castanhos e macios.
Um vislumbre do que poderia ter sido nossa vida.

A ponderação trouxe um nó à minha garganta, porém eu


não iria chorar, nem me arrepender do que acabara de
acontecer. Era uma nova memória bonita à qual eu poderia
me agarrar nos meus momentos solitários.

Com cuidado para não acordar Rafael, segurei o braço que


me prendia pela cintura junto ao seu corpo, ao passo que
deslizava o meu para fora da cama, um verdadeiro
malabarismo para alcançar meu propósito. Todavia, quando
eu estava quase lá, o braço de Raf pesou sobre meu
estômago, me puxando para si e colando nossos corpos nus
outra vez.

Foi o suficiente para que minha respiração ficasse alterada.

— Aonde você pensa que vai? — inquiriu ainda de olhos


fechados, a voz rouca e sonolenta.

— Achei que você estivesse dormindo.

— Eu estava, até você tentar fugir de mim. — Os orbes


azuis me encararam, e mesmo com a iluminação parca do
quarto, eles pareciam lindos e convidativos. — Que horas
são? — Ele relanceou o olhar para a mesinha de cabeceira
atrás dele, mas eu duvidava que tivesse sido capaz de ver
qualquer coisa.

— Já está tarde. Tenho que ir até a casa da sua mãe, buscar


Theo. O que ela vai pensar de mim? Que sou uma mãe
desnaturada, com certeza. — Na melhor das hipóteses,
visto que eu deixara meu bebê com ela para ir a um jantar e
já era madrugada.

— Você não é uma mãe desnaturada — Raf retorquiu, com


uma expressão divertida que implicava que eu estava me
desesperando por nada. — Nosso filho está seguro, com a
avó dele, e você merece uma noite só sua. Além do mais,
com certeza já estão dormindo, a essa hora, então você fica
aqui comigo.

Ele enterrou o rosto em meu pescoço, o contato de sua


barba curta fazendo com que minha pele se arrepiasse em
resposta, seus beijos e mordidas provocando todas as
minhas terminações nervosas, em especial minha sanidade.

— Rafael… espera — pedi, tentando me afastar dele ao


máximo, mas não obtendo sucesso. — Isso que aconteceu
foi um erro, nós não devíamos…

— Devíamos, sim — atalhou de pronto. — Eu te quero, você


me quer… seria um crime desperdiçar essa química
deliciosa que nós temos.

Seus dentes prenderam meu lábio inferior, deslizando por


ele languidamente.

— Não foi pra isso que eu vim até aqui, e sim pra que
pudéssemos conversar — eu o lembrei com um sussurro
débil.

— Podemos fazer as duas coisas. Ou você se esqueceu de


que sou multitarefas? — Era uma pergunta retórica, já que
ele não esperou por uma resposta e beijou calma e
longamente, sua língua explorando o interior da minha de
forma despreocupada. —Consigo continuar o que estou
fazendo ao mesmo tempo que te digo que precisamos
organizar uma viagem à Grécia — continuou, migrando os
beijos para o meu pescoço e colo, as unhas curtas
arranhando minha coxa.

— Como assim, uma viagem pra Grécia? — questionei, meio


alarmada, enfiando meus dedos na nuca de Raf e puxando
seu cabelo de leve, apenas para impeli-lo a olhar para mim.

— Minha mãe não se conteve e contou para a minha avó


sobre Theo. Agora ela exige conhecer o bisneto para dar-lhe
sua bênção.

— Ela não pode fazer isso através de chamada de vídeo? —

Ele negou com um meneio de cabeça. — Não é mais fácil


que ela venha, então?

— Yayá não viaja mais de avião. Ela sente desconforto e


dores nas articulações, pela idade.

— Não posso me ausentar do Bar de Cupcakes, Caroline


precisa de mim.

— Não se preocupe com isso, tenho uma solução —

murmurou despreocupadamente, tornando a buscar minha


boca e contentando-se com meu pescoço, quando me
esquivei no último segundo.

— E quem te nomeou solucionador dos meus problemas?

— Vamos falar disso pela manhã, o que acha? — sugeriu,


deixando pouco espaço para discussão quando me girou na
cama, minhas costas agora apoiadas no colchão e Rafael
entre minhas pernas, o rosto pairando sobre o meu. — No
momento acredito que temos outras coisas para priorizar.

— Como o quê? — Minha voz deveria ter saído com um


pouco mais de força, porém não passou de um gemido
ansioso, que se alongou no momento em que os dedos de
Rafael torceram um dos meus mamilos ao passo que sua
boca se ocupava do outro.
CAPÍTULO 26

Quando pousamos no pequeno aeroporto de Mykonos, eu


não tinha muita certeza se o meu estômago estava se
revirando por causa do voo ou do nervosismo de estar em
um país estrangeiro, cuja língua eu desconhecia, prestes a
ser apresentada à matriarca Ophelia Galanis.

Irene me assegurara que sua sogra receberia a mim e ao


bisneto de braços abertos, porém nem mesmo isso foi capaz
de colocar os meus ânimos no lugar. Em especial com a
visão de Rafael vestindo uma camisa branca com alguns
botões abertos. Ele dobrou as mangas até os cotovelos e
escolheu uma calça esporte-fino num tom claro de cinza
para a parte de baixo.

Theo estava vestido igualzinho ao pai, exceto pelos tênis, já


que o pai dele usava sapatos lustrosos. E decidiu cobrir seus
incríveis olhos azuis com óculos escuros, provando que
conseguia parecer irresistível de qualquer jeito.

Ralhei comigo mesma em pensamento, porque eu não


deveria ficar reparando — muito menos desejando — o pai
do meu filho dessa forma.
Depois da noite que passamos juntos, eu sabia que não
tinha como me arriscar daquele modo. Rolar nos lençóis de
Rafael ao mesmo tempo que estava longe do seu coração
não me traria bem nenhum.

— Tenho uma coisa pra você — ele disse em nosso caminho


até o carro que nos esperava para nos levar até a casa de
sua avó.

Ou pelo menos era isso que eu achava que suas instruções


em grego significavam. Theo, que passara a maior parte da
viagem nos braços do pai, estava dormindo tranquilamente
em seu bebê conforto, o qual Raf apoiou no chão, me
obrigando a deter meus passos.

Irene não esperou por nós. Na verdade, eu nem mesmo


podia determinar se ela percebera que não estávamos mais
a seguindo.

O toque de Raf no meu pulso roubou minha atenção de


volta para ele, e, antes que eu pudesse detê-lo, uma
pulseira de diamantes já estava adornando meu braço.

— Rafael…

— Nem ouse tentar recusar — atalhou, não me dando a


chance de concluir meu protesto —, você não faz ideia do
trabalho que deu encontrar isso.

Abri a boca para lhe perguntar como encontrara a pulseira


que precisei penhorar, quanto pagara por ela e por que
fizera aquilo, mas outro pensamento me ocorreu.

— Achei que você não ligasse pra pulseira. — Fora o que ele
dissera antes, não fora? O que havia mudado?
— Sem sombra de dúvidas me importo bem mais com
outras coisas, mas gosto de como ela fica em você. — Ele
acariciou o local com a joia, e, quando o vento bagunçou os
meus cabelos e sacudiu sua camisa, me senti como em uma
cena de um filme clichê. — Além disso, o que minha avó iria
pensar se não visse a mãe do meu filho usando nada da
Amethystós? — Rafael me lançou uma piscadela, e rolei os
olhos para isso.

Nós poderíamos entrar em uma nova discussão sobre


aquilo, porém, de que adiantaria? Eu não seria capaz de
argumentar, depois de tantas horas de viagem.

— Você é incorrigível e teimoso ao extremo — escolhi dizer,


e seu sorriso matador se abriu de forma preguiçosa. — Não
faça essa cara, não foi um elogio.

Então retomei minha caminhada, dando-lhe as costas e


apressando-me para alcançar Irene, não me permitindo
ponderar sobre o significado daquele gesto.

— Theo Galanis… meu primeiro bisneto.

Ophelia Galanis não se parecia com alguém que não viajava


de avião por problemas de articulação.

A forma como segurou Theo nos braços — pesado como ele


era —

demonstrava quão forte e, sobretudo, lúcida ela era.

Surpreendendo a um total de zero pessoas, meu filho


esfregou os olhos sonolentos e então abriu um sorriso
encantador para a bisavó, quando esta roçou o nariz no
dele.

Meu bebê era o melhor julgador de caráter que eu conhecia,


e quando ele se derreteu pela matriarca da família, meu
coração se aqueceu de forma inenarrável.

— Obrigada por terem trazido essa preciosidade pra que eu


pudesse conhecer — a avó de Rafael voltou a falar, seus
olhos incrivelmente azuis dançando entre mim e seu neto, o
sotaque forte ao inglês, porém cem por cento
compreensível. — Perder um filho não é fácil, mas a
chegada de uma nova vida ameniza qualquer dor. — Então,
focando novamente em Theo: — Não é mesmo, pequeno?
Você está feliz de conhecer a sua bisavó Ophelia?

Rafael, Irene e eu nos entreolhamos, um tipo único de


comunicação muda que desenvolvemos com o passar do
tempo.

Nós havíamos concordado que contaríamos uma versão


mais bonita da minha história e de Rafael. A matriarca
estava perto de completar noventa anos, perdera o marido,
o filho… por mais que Nestor não

valesse um único centavo, eu não queria ser a responsável


por levar ainda mais tristeza à senhora Ophelia. De
qualquer modo, que bem lhe faria saber a verdade?

— Ele não é uma cópia perfeita do nosso Rafael, sogra? —


Irene se adiantou, dando-lhe um meio abraço.

Na euforia de conhecer Theo, sua bisavó não se ateve às


boas maneiras e não se incomodou em cumprimentar a
nenhum de nós, antes pegá-lo nos braços e beijar suas
bochechas rosadas.
— E eu vou fazer o meu melhor para mimá-lo ainda mais do
que mimei Rafael — a mais velha devolveu, recebendo um
beijo estalado de Irene na maçã do rosto.

— Faço questão de ajudá-la.

Os olhos perspicazes da matriarca Galanis voltaram para


mim e Rafael, e ela cortou a distância que nos separava,
dirigindo-se ao neto.

— E você achando que seu bem mais precioso era a


Amethystós. —

Ela estalou a língua, apontando um dedo em riste para Raf.


— E você…

— Meu sangue gelou quando sua atenção se fixou em mim.


— Espero que saiba quão preciosa você é para todos nós,
Helena, querida. Sem você, eu não estaria segurando o
bebê mais lindo de todo o mundo nos braços.

Meus ombros relaxaram de forma automática, e o sorriso no


meu rosto ameaçava dividi-lo em dois.

Eu me sentia tão feliz e abençoada pelo fato de que Theo


teria uma família tão bonita e amorosa como aquela. Uma
que nunca tive, mas com a qual sempre sonhei. No fim, meu
compromisso de ser melhor do que Corinne se mostrava
cada dia mais fácil.

Com a mesma facilidade que o pensamento se formou, eu o


enxotei.

Eu não pensaria em Corinne, em Nestor… em nada de ruim.


Toda minha atenção estaria focada em agradecer todo o
amor que meu filho receberia.
— É um prazer conhecê-la, senhora Galanis… — Estendi
minha mão para cumprimentá-la, todavia, dona Ophelia
apenas a empurrou para lá, encarando-me como se eu
tivesse perdido o juízo.

— Nada disso. Minhas noras são as senhoras Galanis —


frisou —, algo que espero que você também seja em
breve…

— Yayá… — Rafael chamou numa falsa advertência,


enquanto eu mal conseguia lembrar meu próprio nome,
devido à surpresa.

— Um bracelete de diamantes, por mais bonito que seja,


não está à altura da mulher que fez de você um homem
completo, Rafael. — Aquilo fora uma repreensão? E em que
momento ela notara o bracelete, se não tirara os olhos de
Theo? — A propósito, é assim que eu gostaria que você me
chamasse — continuou, dirigindo-se a mim. — Yayá, como
todos os meus outros netos.

Minha boca se abriu para corrigi-la, dizer que eu não me


tornaria uma senhora Galanis, que não esperava que Rafael
me desse presentes em troca de ter dado à luz um filho
seu… e o que ela queria dizer com outros netos? Ela não
estava insinuando que me adotara… estava?

Qualquer coisa que eu pudesse dizer ficou entalada na


minha garganta no instante em que Rafael passou um braço
pela minha cintura e juntou nossos corpos. Encarei-o,
embasbacada, conforme ele sorria para a avó.

— Eu sempre soube que a senhora adoraria Helena e que


faria questão de transformar meu primogênito na criança
mais mimada de toda a Grécia.
A senhora Galanis… Yayá… assentiu, os olhos reluzindo no
processo.

— Vocês devem estar exaustos. Por que não vão descansar


um pouco? — sugeriu. — Os quartos já estão prontos, e eu
faço questão de ser a babá de Theo.

CAPÍTULO 27

Quando Yayá disse que nossos quartos estavam prontos, ela


se esquecera de mencionar que Helena e eu dividiríamos
um deles.

Por mim estava tudo bem, pois se eu quisesse seduzi-la, tê-


la comigo todas as noites ajudaria muito a minha causa.

Nós não havíamos transado de novo, e a saudade dela


estava me matando. Uma única noite, por mais prazerosa
que fosse, não era capaz de aplacar o desejo que eu sentia
por aquela mulher. Um simples toque dela era o suficiente
para fazer que eu quisesse consumi-la por inteiro.

Isso devia ser paixão. Desenfreada e avassaladora. Era a


única teoria que explicava o fato de que todas as outras
mulheres pareciam desinteressantes para mim. Eu estava
subindo pelas paredes de tesão acumulado e, mesmo
assim, preferia me aliviar com a ajuda na minha mão —
conforme pensava em Helena,

imaginando seus toques e beijos — a ir em busca de um


corpo quente e disposto a me receber.

Porque o único corpo quente que eu queria não parecia


nada disposto.

— Você deveria ter dito à sua avó que não temos nada um
com outro — Helena reclamou pelo que pareceu ser a
milésima vez em menos de vinte e quatro horas.

Assim que chegamos, lhe dei privacidade para que pudesse


tomar um bom banho e descansar um pouco. Ela quis
relutar, porém estava cansada demais para iniciar uma
discussão. Ponto para mim.

Depois, quando nos reunimos à mesa para o jantar, ela


praticamente saiu correndo ante minha menção de
espalmar uma das mãos em suas costas para guiá-la até a
mesa de jantar.

Helena estava me evitando. Depois de transar comigo uma


noite inteira, me presenteando com gemidos, arranhões e
beijos apaixonados, agora ela simplesmente tentava me
afastar, me negando o prazer de tê-la para mim.

Eu não iria permitir que aquilo acontecesse.

Não foi falta de sentimento — muito menos de tesão — o


que me afastou de Helena, no passado, e sim as mentiras
de Nestor.

Ainda assim, eu a desejei ardentemente por todo esse


tempo, apesar da culpa que achei que deveria sentir.
A culpa já não existia. Havia apenas desejo, cru e
desenfreado.

— Não minto pra Yayá. — Foi a minha resposta, e o rosto de


Helena se tingiu de vermelho ao passo que ela parava de
andar no quarto, de um lado para o outro, já vestida em seu
pijama.

Um pijama cinza, surrado, com a estampa de uma das


séries originais da Galanix+… e sexy . Pra. Caralho.

— Estou falando sério, Rafael! — chiou, cruzando os braços


sob os seios fartos, me dando água na boca. — Como se
não

bastasse toda a tensão de conhecer os outros membros da


sua família, agora estou presa num quarto com você?!

Sem esperar uma resposta, ela bufou, sumindo closet


adentro e voltando de lá com cobertores e um novo
travesseiro, jogando tudo no chão e… espera! Mas que
porra era aquela?

— Helena, pelo amor de Deus… — Esfreguei o rosto com as


duas mãos, exasperado. — Isso é idiotice. Somos adultos,
podemos muito bem dividir uma cama, não é como se
nunca tivéssemos feito isso antes.

Ignorando minhas palavras, ela apenas seguiu montando


sua cama improvisada. No chão. Como se estivéssemos em
um acampamento ou algo do tipo.

— Eu não vou te atacar no meio da noite nem te obrigar a


nada — tentei mais uma vez. — A menos que você tenha
medo de não conseguir se controlar perto de mim.
Da forma mais convencida possível, ergui uma de minhas
sobrancelhas para ela, uma provocação deliberada, afinal
de contas, se tratava disso. Era impossível que em uma
noite Helena estivesse queimando de paixão nos meus
braços, me cavalgando com desespero, e depois
simplesmente estivesse satisfeita.

Eu queria mais, e ela também, nisso eu podia apostar.

— Quem você acha que é pra que eu não consiga me


controlar perto de você? — retrucou, irônica. — Um deus
grego?

Antes mesmo que eu esboçasse qualquer reação, Helena


percebeu que seu trocadilho fora infeliz. Pelo menos era isso
que indicava o bufar que ela soltou e a forma como
marchou para a cama, depois de recolher os cobertores
extra e o travesseiro.

— Não invada meu espaço pessoal — exigiu, acomodando-


se em uma extremidade da cama, usando o travesseiro
sobressalente como uma barricada, dando-me as costas. —
E vista uma camisa!

— Por quê? — provoquei, me juntando a Helena,


perigosamente perto dela, mas sem invadir seu espaço
pessoal,

como ela demandara. — Por acaso, saber que estou usando


apenas uma boxer enquanto durmo a menos de um metro
de distância de você te deixa perturbada? — As pontas dos
meus dedos traçaram a pele exposta de seu ombro, e testei
minha sorte, ao me inclinar para depositar um beijo no
ombro de Helena.

Ela se esquivou, quase caindo da cama no processo,


trazendo seu travesseiro, pseudo-barricada, para junto do
peito, os olhos arregalados me encarando com
determinação.

— Se você não parar com esses flertes sem propósito, juro


que sou capaz de dormir no sofá da sala, mas não divido o
quarto com você!

Pisquei, atônito, sem compreender a reação exacerbada de


Helena. Foi apenas um beijo no ombro, nada perto de todas
as coisas que já tínhamos feito com ela… ou dos lugares
onde já a beijei tantas outras vezes.

— O que tem de errado com o fato de eu flertar com você?


questionei, visivelmente confuso.

— Flerte com quiser, só não comigo! Talvez eu tenha


passado uma impressão equivocada ao aceitar ir pra cama
com você, mas acabou! Não quero nem vou ser um
passatempo pra você, entendeu? Não vou!

Os olhos de Helena estavam injetados. De fúria, melancolia


e uma determinação imensurável, de modo que apenas
assenti, afastando-me dela o máximo que o espaço
permitia, apoiando minha cabeça no meu travesseiro e
encarando o teto.

A respiração de Helena, ao meu lado, estava pesada,


porém, ela não se levantou, como achei que faria. Apenas
apagou a luz do abajur que havia sobre sua mesa de
cabeceira, reinstaurou sua barricada e tornou a se deitar de
costas para mim.

Foi quando me atingiu: eu também não queria que Helena


fosse meu passatempo.
CAPÍTULO 28

— Fazia tanto tempo que eu não te via sorrir assim, sem


nenhuma sombra de medo ou incerteza. Estou feliz e
orgulhosa de você e do meu filho. Quando vocês voltam?

Sorri para Caroline através da chamada de vídeo, e Theo


deu pulinhos animados no meu colo, estendendo uma das
mãozinhas em direção à tela, abrindo-a e fechando-a como
se quisesse que Caroline viesse até ele.

Nós estávamos morrendo de saudade dela. E do Bar de


Cupcakes, claro. Minha melhor amiga vinha, inclusive,
reclamando de não nos ter por perto. Eu para cuidar dos
recheios dos nossos bolinhos, Theo por ser o melhor garoto
propaganda pelo qual poderíamos pagar.

— A ideia era já termos voltado, mas Yayá pediu que Rafael


ficasse um pouco mais, pra comemorar o aniversário dele
aqui. Vai ser um jantar simples, apenas para a família. Acho
que é só uma

desculpa pra manter Theo por perto — confessei, visto que


a família grega do meu bebê parecia aficionada nele.
Eles foram, sim, receptivos comigo, e era inegável o carinho
e a felicidade que sentiram ao poder ver Rafael e Irene
outra vez.

Porém nada se comparava às suas expressões


embasbacadas por terem o mais novo membro da família
Galanis logo ali.

— Yayá, hum? — Caroline ergueu ambas as sobrancelhas


repetidamente algumas vezes, em um gesto deliberado de
me provocar. — Isso, por acaso, quer dizer vovó, em grego?
É assim que você vem chamando a bisavó do seu bebê?

Rolei os olhos para ela, comportando-me como uma criança


birrenta, talvez? Sim. Mas ela bem que merecia.

— Não é nada de mais, só um gesto carinhoso, e foi ela


quem pediu. — Dei de ombros, no intuito de fazer com que
meu corpo passasse uma casualidade que estava longe de
sentir.

Chamar a avó de Rafael de Yayá fora um dos pontos altos


da viagem e mexera com mais coisas dentro de mim do que
eu gostaria de acreditar.

Cresci acostumada a nunca ter ninguém por perto com


quem pudesse contar, e, agora, havia um batalhão de
pessoas dispostas a fazer tudo em nome da segurança do
meu filho… batalhão, este, que me recebeu de braços
abertos como se eu fosse uma deles.

Yayá dissera que gostaria de que eu fosse uma Galanis com


todas as letras, e foi só ali que a possibilidade voltara a
cruzar minha cabeça.

Não iria acontecer, obviamente. Desde que chegamos a


Mykonos, Rafael me levara para conhecer as ilhas mais
próximas e famosas. A viagem de balsa até Santorini e
Creta, além de agradável, também me deu uma vista mais
ampla do Mar Egeu, e eu precisava fincar as unhas nas
palmas das mãos, vez ou outra, para ter certeza de que
aquilo estava mesmo acontecendo e não se tratava de um
sonho.

Como se minha imaginação pudesse ser assim tão fértil…

— E como estão sendo suas férias? — uma Caroline


sonolenta perguntou, disfarçando um bocejo.

Graças às setes horas de fuso-horário que nos separavam,


conseguir conversas ao vivo não era tão fácil, por causa de
toda a logística,

— Eu fico desejando que você estivesse aqui na maior parte


do tempo — admiti, me abaixando para pegar o polvo de
pelúcia que Theo derrubara no chão, entregando-lhe. —
Você ia adorar as praias, as paisagens… é tudo tão lindo,
nem parece ser de verdade.

Caroline murchou os ombros, com uma falsa expressão


malcriada no rosto.

— Por que não fui eu quem engravidou do Rafael? A vida é


tão injusta. — Minha melhor amiga estalou a língua, e tornei
a girar os olhos para o seu teatro.

— Você não precisa de um filho meu pra ser convidada a vir


a Mykonos, Caroline. — A voz grave de Rafael soou pelo
quarto que dividíamos, e só isso foi capaz de provocar
agitação no meu estômago. — Assim que puder se afastar
por um tempo do Bar de Cupcakes, vai ser um prazer tê-la
aqui — ele gritou de algum lugar do closet, e, sem deixar
minha posição confortável na poltrona da sacada da suíte
que dividíamos, tentei enxergar o que ele estava fazendo,
ao olhar sobre um dos meus ombros.

— Não precisa falar duas vezes — Caroline respondeu do


outro lado da linha. — Mande Helena e Theo de volta pra
assumirem meu lugar e compre minha passagem de uma
vez.

Rafael surgiu do closet vestindo nada além de uma sunga,


com uma toalha branca jogada sobre um dos ombros de
forma displicente. Ele caminhou para mais perto do celular,
que exibia a imagem de Caroline, agachando-se para que
seu rosto ficasse no enquadramento.

— Por mais tentadora que seja sua proposta, não me sinto


pronto pra ficar longe deles tão cedo. — Rafael apontou com
a cabeça para mim e para Theo, ainda falando com minha
amiga, antes de se virar para mim. — Desculpe interromper
a conversa, só vim me trocar. Nós vamos pra piscina, me
encontre lá quando terminar. — Então seu olhar voltou para
a tela do celular, e ele acenou brevemente com uma das
mãos. — Até mais, Caroline.

— Bampás! — Theo chamou a atenção de Rafael, erguendo


os bracinhos num pedido desesperado para que o pai o
pegasse no colo, e foi exatamente o que Raf fez, tomando o
filho nos braços com um sorriso orgulho nos lábios, antes de
beijá-lo por inteiro.

— Isso mesmo, garotão! Eu sou o seu pai. — Os orbes azuis


se viraram para mim. — Tudo bem se ele e eu formos juntos
agora?

— Sacudi a cabeça em uma negativa, tentando esconder ao


menos um pouco do quanto aquela cena me enchia de
orgulho e de uma alegria sem fim. — Theo, dê tchau pra sua
tia Caroline.
Sem precisar de ajuda, meu bebê levou a mãozinha aos
lábios, largando ali um beijo estalado antes de acenar um
tchauzinho para Caroline e ser levado pelo pai dele.

— Me diz que vocês estão se pegando, por favor — voltou a


dizer, quando já estávamos sozinhas.

— Caroline!

— Helena! — Ela copiou meu tom incrédulo. — Você não me


contou que estavam dividindo o mesmo quarto. A mesma
cama também?

— Não é o que parece — apressei-me a explicar. — Nós só


estamos dormindo juntos… na mesma cama, quer dizer! —
emendei mais que de pressa, para que Caroline não tivesse
tempo de criar teorias românticas acerca do assunto.

Nós estávamos na Grécia há dez dias e, apesar de não


termos mudado de quarto, na maior parte do tempo era
assim que eu me sentia. Raf e eu raramente nos
deitávamos no mesmo horário, e era comum que eu
pegasse no sono antes mesmo de vê-lo chegar.

Os flertes tinham acabado, os beijos impróprios, deixando


em seu lugar apenas um respeito absurdo, capaz até
mesmo de fazer com que Rafael usasse uma calça de
moletom e camiseta para dormir todas as noites.

Ele perdera o interesse quando eu lhe disse que não queria


ser apenas um passatempo, e eu não poderia culpá-lo nem
me ressentir com isso.

— Que desperdício! — Foi o suspiro teatral e exasperado de


Caroline.
— Me conta sobre o Bar de Cupcakes — pedi —, não te
liguei pra falar sobre Rafael.

— Tudo bem — concordou, demonstrando certa relutância.


Mas só porque sou feminista e empoderada e não converso


exclusivamente sobre homens com a minha melhor amiga,
com quem tenho um bebê. Vamos falar de negócios, sócia.

CAPÍTULO 29

— Vocês realmente acham que ela vai gostar? — inquiri a


minha mãe e a Yayá, depois de mostrar-lhes o anel de
noivado que encomendei para Helena quando ela ainda
estava no início da gestação de Theo.

Eu o mantive no fundo da minha gaveta por todo esse


tempo. A ideia inicial era que fosse uma peça exclusiva,
mas mesmo que Helena nunca tenha chegado a usá-lo,
jamais o coloquei à venda na Amethystós.

— Ela se interessou por você, não foi? Isso demonstra bom


gosto.
— Yayá deu leve batidinhas em meu ombro, como forma de
encorajamento.

— A senhora é a culpada por eu ter a autoestima tão


elevada, Yayá.

— Não seja bobo. — Ela abanou uma das mãos, em descaso.


Vou me certificar de que as coisas estejam perfeitas para


jantar. Hoje nada pode dar errado. — Então deixou o
escritório, com passos rápidos que não condiziam com a
imagem que a maioria das pessoas fazia de uma senhora
com quase noventa anos de idade.

— Estou tão feliz por você e Helena finalmente terem o


desfecho que merecem. — Minha mãe me abraçou,
emocionada, e devolvi o gesto, beijando seus cabelos.

— Helena tem seu próprio fã clube Galanis, não é? —


perguntei, mesmo que soubesse a resposta.

— Do qual, orgulhosamente, sou fundadora — confirmou, e


alívio puro me inundou.

Tudo seria diferente para mim e Helena, desta vez.

Um jantar nunca me parecera tão longo antes, regado a


conversas paralelas intermináveis que apenas tiravam meu
foco.

Helena e Orion se deram muito bem, tanto que meu primo


parecia estar apresentando um workshop sobre
empreendedorismo para ela. Os pais dele, Eros e Cíntia,
estavam encantados com o sobrinho-neto, e tia Cíntia se
oferecera para dar o jantar de Theo, também sentado à
mesa com sua cadeirinha elevada, mas interessado em
lançar sua comida por todos os lados do que de fato comê-
la.

Olhei em meu relógio de pulso, tentando me decidir quanto


mais eu poderia esperar para fazer o que realmente me
importava, mas os ponteiros pareciam estar parados, não
era possível.

Mandando a etiqueta ao inferno, eu me levantei num


rompante, roubando toda a atenção para mim.

Ótimo, aquilo iria servir.

— Eu gostaria de agradecer a presença de cada um de


vocês, aqui reunidos — comecei, ainda sem ter muita
certeza de quais palavras usaria. “Não te quero como um
passamento” parecia uma frase objetiva, porém eu gostaria
de mirar em algo um pouco mais romântico. — Esta é uma
noite especial, e não por causa do meu aniversário, mas
porque é primeira vez que tenho a oportunidade de
comemorar a data com o meu filho, de quem tenho muito
orgulho, e também com a mãe dele,

que, para mim, é um dos maiores e mais lindos exemplos de


superação e resiliência que eu já vi.

O queixo de Helena pendeu, e ela piscou para mim, sem


entender aonde eu queria chegar.

— Helena e eu não tivemos um percurso muito fácil até aqui


continuei, olhando ao redor da mesa, mas evitando Orion de


propósito. —
Nossa história tinha tudo para ser linear do início ao fim,
mas não foi bem assim que as coisas aconteceram.

Limpei a garganta, na tentativa de ganhar tempo para que


meu cérebro trabalhasse antes que minha boca tivesse que
se abrir para eu continuar falando.

— De qualquer modo… — Eu me virei para Helena, ainda


inerte, ao meu lado, com o pescoço pendendo para trás a
fim de olhar para mim. —

… nós estamos aqui agora, na frente do nosso filho, da


minha família… —

Soltei o ar em uma lufada, me dando conta de que


cometera um erro terrível. — Só agora me ocorreu que
talvez Caroline jamais vá me perdoar por não estar presente
nesse momento — admiti —, mas a verdade é que não
posso esperar mais.

Eu me ajoelhei, e ouvi alguns murmúrios de surpresa pelo


meu gesto, um deles vindo da mãe do meu filho.

— Helena Jones… — chamei, tirando a caixinha de veludo


com seu anel de noivado de dentro do bolso da minha calça,
mostrando-o para Helena. — Você me daria a honra e o
presente de ser minha esposa?

Seus olhos vacilaram entre mim e a joia que eu ainda trazia


nas mãos, e havia umidade neles.

— E-eu… — começou, engolindo a saliva com dificuldade. —


Não posso.

Uma onda de arquejos correu pela sala de jantar,


estupefatos, seguida por um silêncio tão absurdo que eu
podia sentir as batidas do meu coração.
— Não pode? — quis me certificar, desconhecendo minha
própria voz.

Helena meneou a cabeça em uma negativa, arrastando sua


cadeira para trás e pousando seu guardanapo de linho na
mesa.

— Com licença — ela pediu, antes de praticamente correr


para fora do cômodo, me deixando ali plantado.

CAPÍTULO 30

Rafael era um idiota e não media as consequências de seus


próprios atos.

Um idiota que eu amava? Sim, sem sombra de dúvidas,


ainda assim…

Como lhe ocorrera de me pedir em casamento? Com uma


plateia de Galanis, ainda por cima!

As insinuações de Yayá… era isso que esperavam de Rafael,


não era? Que ele fosse um perfeito cavalheiro e se casasse
comigo, visto que tínhamos um bebê juntos. Os Galanis
eram amáveis, sim, mas isso não queria dizer que não
tivessem um único de tradicionalismo dentro de si.
Eu era tão estúpida! Em que planeta eu achei que pudesse
me esquivar do que sentia por Rafael de modo a não sair
machucada

de tudo aquilo? E por que era tão difícil me convencer de


que dizer-lhe não era a coisa mais sábia a ser feita?

Houve uma leva batida na porta do quarto, e prendi minha


respiração instantaneamente, como se isso fosse capaz de
convencer quem quer fosse ali a ir embora. Em vez disso, a
porta se abriu, e eu nem mesmo precisava me virar para
saber de quem eram os passos que quebraram o silêncio.

— Ei, o que foi? — Rafael perguntou, e corri para enxugar


uma lágrima teimosa que correu pelo meu rosto.

— Nada. — Eu me virei para encará-lo, forçando um sorriso.

— Eu só precisava tomar um pouco de ar.

— Dentro do quarto? — Raf inquiriu, os olhos azuis


perspicazes me desafiando a me explicar melhor.

— Eu…

— Você não precisa mentir — atalhou, caminhando m minha


direção. — Todo mundo sabe que saiu por causa do pedido
de casamento. Foi tão ruim assim? — Ele tombou a cabeça
para o lado, em uma expressão tão casual e bonita que fez
meu coração doer.

— Foi perfeito — declarei, reunindo toda coragem disponível


dentro de mim para ser o mais verdadeira possível com
Rafael.

— Mas você recusou — contrapôs.


— Você me disse uma vez que um casamento não é feito
apenas de amor, mas também de respeito e admiração —
eu o lembrei. — Só que amor é uma parte importante que
não deve ser subestimada.

— Helena… — ele tentou argumentar, porém eu não


deixaria que o fizesse.

— Nós vamos fazer dar certo. Com Theo — elucidei. — Eu


moro a apenas uma hora de distância de Nova Iorque, e
você não precisa de um dia específico pra vê-lo. Minha
rotina é simples, do trabalho pra casa, de casa pro trabalho.
Eu sei que você tem os

seus negócios, que é um homem muito ocupado, mas


também sei que vai ser um pai maravilhoso pro nosso filho.
Já está sendo, e isso não vai mudar.

— O que você está tentando me dizer, exatamente? —

questionou, franzindo o cenho.

Ele realmente não via aonde eu queria chegar?

Respirei fundo uma voz, na tentativa de sufocar o choro que


queria escapar.

— Que amor pode até não ser a única coisa necessária


dentro de um casamento, mas é essencial. — Para algumas
pessoas, pelo menos, e eu era uma delas. — Você é jovem,
bonito… e tem um dos sorrisos mais lindos que eu conheço
— apontei o óbvio. — O

que acontece se você se casar comigo e em uma das suas


viagens a negócios encontrar o amor da sua vida?

O que aconteceria comigo, no caso? Com o meu coração?


— Helena…

— Eu sei que um relacionamento amoroso não está nos


seus planos, mas isso é algo que nem mesmo você pode
controlar —

interrompi seu novo protesto. — O coração batendo


depressa como se tivesse acabado de correr uma maratona,
as mãos meio trêmulas esperando um toque, a ansiedade
de ouvir a voz de alguém porque te traz paz e euforia ao
mesmo tempo. São coisas que todo mundo deveria sentir,
mesmo que não seja recíproco. — Era o que eu sentia por
ele, com uma dose extra de necessidade que não era
saudável. — Eu jamais me perdoaria se fosse um empecilho
pra sua felicidade — desabafei, dando-lhe as costas para
que ele não visse as novas lágrimas se formando em meus
olhos.

As mãos de Raf seguraram meus ombros com delicadeza, e


ele me impeliu a voltar a ficar de frente para ele,
enxugando uma lágrima que pesou em meu olho e caiu na
minha bochecha com cuidado.

— Então por que está fazendo exatamente isso? —


perguntou simplesmente, e meu cenho inteiro se franziu em
desentendimento.

— Isso o quê? — devolvi, genuinamente incerta.

— Sendo um empecilho para a minha felicidade.

Meus olhos se arregalaram, minha cabeça se movendo de


um lado para o outro por conta própria.

— Não… — neguei, sem nem mesmo saber o que fazia. —


Quer dizer… eu não sabia, não fazia ideia. Sinto muito, eu
não pensei…

— Consigo entender tudo o que está dizendo sobre se sentir


apaixonado, apesar de discordar um pouco — ele
interrompeu minha enxurrada desconexa de palavras. —
Não acho que seja algo tão divertido, a menos que seja
recíproco. Chega a ser doloroso, não acha?

— Um pouco, talvez — considerei, murchando os ombros.

— Um pouco, talvez? — ecoou, como se não pudesse


acreditar na minha resposta. — Você deveria experimentar
ter um pedido de casamento recusado, especialmente em
público. Aposto que mudaria de opinião.

Abri a boca para dizer algo, mas Rafael foi mais rápido,
pousando o dedo indicador em meus lábios.

— Theo não é o motivo de eu querer que seja minha esposa,


Helena. Quando você estava grávida e te propus
casamento, eu me perguntei se teria tido essa atitude, caso
a mãe do meu filho fosse outra mulher.

— Claro que teria — respondi de imediato, mesmo que


Rafael não tivesse de fato perguntado nada.

— Não foi a essa conclusão que cheguei, na época. Eu


nunca fugiria da responsabilidade de ser pai, mas da de ser
um marido? —

Ele estalou a língua. — Sempre gostei demais da minha


liberdade pra abrir mão dela assim tão fácil.

— E já não gosta mais? — eu quis saber, ansiosa, afinal de


contas, ele me propusera casamento há poucos minutos.
— Um pouco, talvez — considerou em um meneio de
cabeça, imitando minha resposta anterior. — Mas gosto mil
vezes mais de você.

Meu coração deu um solavanco dentro do peito com tanta


força, que cambaleei para trás. Se não fossem as mãos de
Raf me aparando, eu não tinha certeza se ainda estaria de
pé.

— Acho que não estou entendendo — admiti em um


sussurro débil, quase inaudível.

— Eu explico. — Os dedos de Rafael colocaram uma mecha


do meu cabelo atrás da minha orelha, e ele me fitou com
tanta intensidade que me senti fraca. — Quero você,
Helena, não apenas por ser mãe do meu filho, mas também
porque é a pessoa mais honesta, decidida, genuína e
abnegada que eu conheço. Porque adoro sua companhia e o
jeito que me sinto quando estou perto de você.

Minha respiração já havia se resumido em ofegos, no


momento em que Rafael apertou minha cintura, me
puxando para mais perto de si. Uma de suas mãos foi parar
na minha nuca, e quase soltei um gemido arrastado de puro
deleite com o contato.

— Seu cheiro, seu beijo e seu gosto me enlouquecem —

sussurrou ao meu ouvido, a respiração quente batendo na


minha pele e me fazendo derreter entre seus braços. — Meu
corpo inteiro queima com o desejo de ter você, e não
suporto mais te ter tão perto, mas ao mesmo tempo tão
longe. — Uma mordiscada no glóbulo da minha orelha e a
língua de Rafael passeando pelo ponto sensível logo abaixo
mandou um arrepio delicioso por todo meu corpo. — Você
me enlouquece, e estou cansado de te ter em doses
homeopáticas. — Abarcando meu rosto com as mão
grandes, Raf mirou no fundo dos meus olhos. — Seja minha,
e me permita ser seu. Não quero que você seja um
passatempo, porque te amo, e quero estar com você
sempre, só com você. — Nossos narizes se

tocaram, minha respiração ofegante encontrando espaço


através da minha boca aberta pela surpresa de ouvir o que
Raf me dizia. —

Case-se comigo, Helena, e me deixe te amar sem reservas.

Sobretudo… — Ele titubeou por um momento, um sorriso


divertido brincando em seus lábios, ao acrescentar: — Não
me rejeite pela segunda vez na frente da minha família.

O homem que eu amava correspondia aos meus


sentimentos!

Fora isso o que Rafael acabara de me dizer, com todas as


palavras, sem deixar espaço para dúvida. E como se todas
as declarações dele não fossem mais do que suficiente para
me deixar atônita, ainda havia o fato de que uma tropa
Galanis estava ouvindo tudo —

ou quase tudo — que eçe me dissera?

— Eles estão aí fora? — quis me certificar, a voz saindo


meio esganiçada.

— Essa espera está me matando! — A voz de Yayá saiu


abafada no corredor, devido à porta fechada, e eu sorri e
chorei ao mesmo tempo, passando os meus braços ao redor
do pescoço de Rafael, com tanta felicidade dentro de mim
que eu parecia a ponto de explodir.

— Isso é um sim? — insistiu ao pé do meu ouvido, e


balancei a cabeça freneticamente em positivo, ao passo que
eu não conseguia desfazer o sorriso idiota preso ao meu
rosto.

— Sim — murmurei contra os lábios dele. — Mil vezes sim.

Rafael me beijou longa e a apaixonadamente, as mãos


explorando meu corpo, apertando todas as partes que
alcançava, antes de se afastar e dizer, em alto e bom tom:

— Ela disse sim!

No mesmo instante, uma enxurrada de Galanis atravessou a


porta do quarto, quase não dando tempo para que Rafael
deslizasse o anel de noivado pelo meu dedo, antes de
começarem a nos parabenizar, em meio a abraços e risadas
que eram fruto da mais pura e contagiante alegria.

Eu iria me casar com Rafael! Não por seu senso de dever,


mas porque ele me queria ao seu lado para dividir uma vida
inteira, assim como eu o queria.

CAPÍTULO 31

A ilha de Gaia era uma homenagem à tia de Rafael, mãe de


Nikos, e eu tinha certeza de que o lugar era encantador,
assim como a mulher que dava nome ao lugar, a quem
conheci recentemente, em minha festa de noivado oficial.

A família Galanis fora toda convocada, assim como os


amigos mais próximos, e claro que Caroline não ficaria de
fora dessa.

Rafael se encarregou de todos os gastos que


proporcionaram que Caroline dividisse aquele momento tão
único comigo. Diferente de mim, minha melhor amiga não
tinha problemas em receber presentes caros.

Se eu fosse ser honesta, também não tinha mais.

Raf me deu um filho, todo seu amor e a promessa de um


futuro pelo qual eu mal podia esperar. Para mim, nada
poderia ser mais valioso do que isso.

— Enfim, sós — ele murmurou assim que colocamos os pés


no quarto preparado para nos receber, a boca cobrindo a
minha em um beijo urgente.

Nikos oferecera sua ilha particular para que Raf e eu


pudéssemos fugir um pouco da família, a fim de termos
alguma privacidade, o que seria bem-vindo. Desde que
ficamos noivos, no aniversário de Raf, mal tivemos a chance
de ter um momento íntimo de qualidade.

Não que as mãos dele me estimulando até o orgasmo não


fossem de qualidade, porém eu estava acostumada a tudo o
que Rafael Galanis era disposto a oferecer.

Com isso em mente, meus dedos afoitos correram para


desabotoar sua camisa azul-clara, o abdômen perfeito
exposto para que eu pudesse apreciá-lo e explorá-lo.
Rafael também se apressou a tirar minhas roupas, e ficamos
nus em tempo recorde, apalpando e acariciando um ao
outro de forma íntima e, ao mesmo tempo, tão nossa…

— Você já está pronta pra pra mim, não é? — Foi a pergunta


que ele sussurrou ao meu ouvido. Eu não precisava
responder, não quando seus dedos já estavam molhados
enquanto ele massageava meu clitóris com uma lentidão
agoniante.

— Espero que não esteja tentando me fazer implorar —

consegui soltar através de um gemido arrastado.

— Eu não sabia que essa era uma opção.

— Porque não é.

Okay, aquilo era uma mentira. Eu imploraria a plenos


pulmões, se preciso fosse, para que Raf parasse de me
torturar e me desse todos os orgasmos dos quais fui privada
com sua distância.

— Tem certeza? — insistiu, deslizando dois de seus dedos


para dentro do meu sexo encharcado, em movimentos de
vai e vem lânguidos que mais provocavam do que matavam
o desejo que me consumia.

Segurei o membro ereto do meu noivo, provocando-o do


mesmo modo que ele fazia comigo, assistindo com uma
satisfação imensa à sua mandíbula trincar e os músculos
ficarem enrijecidos.

— Você é muito boa nisso — ele chiou entre dentes, e fiquei


nas pontas dos pés para beijar sua mandíbula.
— Estamos há dias nas preliminares, você pode só me
prensar na primeira superfície plana que encontrar, porque
já estou pronta.

Um rugido saiu do fundo da garganta de Raf, suas pupilas


dilatando-se até quase tomar o espaço de suas íris azuis.

Havia uma cama confortável a poucos metros de distância,


mas Raf encarou meu pedido de forma muito literal, de
modo que apenas me prensou contra a parede, encaixando
sua glande na minha entrada e empurrando-se para dentro
de mim em uma estocada dura.

Gritei de prazer, contente por não precisar ser silenciosa


como vinha sendo, e recebi um tapa na nádega, antes de
Rafael agarrar ambas para me impulsionar. Minhas pernas
em torno de sua cintura, minhas costas sendo pressionadas
com mais força contra a parede a cada arremetida urgente.

— Você é a coisa mais deliciosa do mundo, agapi-mou — ele


gemeu, e um sorriso involuntário se formou em meus lábios.

Eu adorava as declarações de Raf, em especial quando as


fazia em grego. O idioma materno apenas fazia com que ele
parecesse ainda mais sexy.

— E sou toda sua…

— Toda minha — ele confirmou, sem deter as estocadas


ritmadas. — E sou todo seu. Para sempre. Amo você, minha
Helena.

— Amo você, Raf — devolvi entre arquejos, quando a boca


do meu noivo se ocupou de um dos meus seios, meu
mamilo sendo acariciado pela língua habilidosa.
Minha cabeça pendeu para trás, batendo contra a parede,
mas eu não me importava.

A sensação de estar nos braços do homem que eu amava,


que correspondia aos meus sentimentos, era uma das
melhores coisas que eu já havia experimentado, e aquilo
nunca iria mudar.

Que Rafael e eu trilharíamos a vida juntos era uma das


maiores certezas que eu tinha na vida.

EPÍLOGO

O beijo no meu pescoço e as mãos correndo pelo meu peito


fizeram com que um sorriso bobo se instalasse nos meus
lábios.

Três anos se passaram vivendo ao lado daquela mulher, e


eu não acreditava que estava próximo o dia em que eu não
seria completamente louco por ela.

A versão extremamente feliz da minha Helena irradiava um


brilho singular e viciante, e eu adorava saber que, em parte,
era responsável pelos olhos reluzindo e pelo seu riso fácil.
— Não deixe Yayá saber que você se esgueirou pela festa e
se trancou no banheiro no intuito de atender uma chamada
de trabalho.

Ela abriu a boca, fingindo-se ofendida, olhando ao redor


para se assegurar de que ninguém escutara.

— Eu não tenho culpa se meus clientes exigem um


tratamento personalizado — defendeu-se.

Ah, sim… seus estimados clientes, fornecedores e toda a


equipe por trás do empreendimento de Helena e Caroline,
que venderam sua primeira franquia do Bar de Cupcakes há
poucos meses.

O negócio era um completo sucesso, e Helena se orgulhava


do fato de eu não ter precisado investir nele para que isso
acontecesse. Sua experiência e de Caroline, depois de
trabalharem anos numa cafeteria requintada, era um
conhecimento precioso que se tornou o diferencial do
estabelecimento.

A ideia de misturar drinques com cupcakes e um ambiente


agradável foi um completo sucesso, e o negócio acabando
se expandindo para além da loja. Agora o Bar de Cupcakes
atendia casamentos,

festas

de

aniversário

quaisquer
outras

comemorações onde bolinhos fossem bem-vindos.

Inclusive, o aniversário de noventa anos de Yayá.

Eu já havia perdido as contas de quantos elogios os


cupcakes de Helena e Caroline haviam recebido.

— Tem uma coisa que preciso te contar, mas estou em


dúvida se devo fazer isso agora ou quando estivermos
sozinhos.

Dei uma leve olhada ao redor, decidindo que ninguém


perceberia nossa ausência tão cedo, em meio àquele mar
de pessoas. Sendo assim, espalmei uma das mãos na base
da coluna da minha mulher, guiando-a para o quarto que
ocupávamos na casa de Yayá.

— Sou todo ouvidos.

Helena mordeu o lábio inferior, em seu gesto característico


de hesitação, então soltou o ar pela boca de uma vez.

— Você sabe que não sou boa com notícias, então aqui
vamos nós: estou grávida.

Oh, sim, ela estava! E eu não aguentava mais ter que fingir
que não fazia ideia de que um novo bebê Galanis crescia
em Helena.

Sendo assim, minha resposta imediata foi beijá-la,


prendendo-a em meus braços e girando com ela pelo
quarto, distribuindo beijos por sua mandíbula, bochechas,
testa…

— Por que demorou tanto pra me contar?


Ela franziu as sobrancelhas, confusa.

— Do que está falando? Eu acabei de fazer o teste, está na


pia do banheiro, porque não quis descer com ele pra festa.

Foi minha vez de esboçar confusão.

— Você não tinha suspeitado há mais tempo? Quem sabe há


algumas semanas? — sugeri, e o vinco de confusão em sua
testa se acentuou.

— Você sabia? — ela perguntou, piscando, incrédula. —

Como?

Meu olhar caiu para o decote em V do vestido vermelho que


ela usava, percorrendo languidamente toda a extensão de
seus seios de pele cremosa que estava à mostra.

— Acha mesmo que os seios da mulher e o apetite sexual


dela vão aumentar sem que eu me desse conta?

Era uma pergunta genuína, porém levei um tapa na altura


do ombro.

— Está insinuando que meu apetite sexual não atende às


suas expectativas, Rafael Galanis?

— De modo algum, senhora Galanis — neguei de pronto,


adorando chamá-la daquele modo. — O que eu quis dizer é
que, quando você está grávida, preciso de todo grama de
forças que há em mim para conseguir satisfazê-la da forma
que merece.

Não que eu estivesse reclamando, mas o fato era: uma


Helena grávida se tornava insaciável, e ela se recuperava
muito mais rápido
do que eu a cada rodada, mesmo experimentando
orgasmos múltiplos.

Seu corpo mais parecia uma máquina de dar e receber


prazer, e eu ficava cada vez mais apaixonado por aquela
conforme o tempo que passávamos juntos crescia.

Talvez eu devesse demonstrar-lhe o quanto eu a queria e…

— Achei vocês! — Theo comemorou assim que conseguiu


abrir a porta do quarto, e não se parecia em nada com sua
versão arrumadinha de horas atrás.

— O que aconteceu com você? — Helena foi a primeira a


questionar, levando uma das mãos à boca.

— A gente tava blincando de futebol, aí… eu me sujei.

— Por acaso você era a bola? — eu quis saber, e era uma


dúvida real.

— Nããããão, papai! — Ele sorriu, e era impossível não imitá-


lo todas as vezes, com o coração enchendo-se de orgulho a
cada vez que ele me chamava de papai.

Eu era pai de um garoto lindo, forte, saudável e


inteligente…

tinha outro bebê a caminho e a mulher mais linda do mundo


aceitara dividir a vida comigo.

Como diabos pude ter tanta sorte?

— Vamos — chamei, estendendo-lhe uma das mãos. —

Apenas uma troca de roupas não vai adiantar — comentei,


depois de verificar o estado em que ele se encontrava de
perto, então me virei para Helena. — Vou dar um banho
nesse pestinha e ele vai ficar novinho em folha em quinze
minutos.

— Estarei esperando pela minha dupla favorita lá embaixo,


com as demais senhoras Galanis. — Helena selou meus
lábios com os seus ao passar por mim, bagunçando ainda
mais os cabelos de Theo, antes de desaparecer porta afora.

Quem disse que não se podia ter tudo na vida, claramente


jamais se deparou com um Galanis e com toda a felicidade
que esbanjávamos.

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Prólogo

— Como foi que isso aconteceu? — perguntou minha


madrinha enquanto encarava o exame pela centésima vez.

Não a julguei pela surpresa, menos ainda pelo pavor. Fiz


exatamente a mesma coisa quando abri o envelope e vi o
chão sumir diante de meus pés.
Grávida. Aos dezenove anos, solteira e sem um parceiro que
pudesse me apoiar nos momentos mais desesperadores.

Esperando o filho de um idiota desconhecido que me tratou


como prostituta depois de tirar a minha virgindade numa
noite incrivelmente prazerosa, da qual eu não havia me
arrependido mesmo após ser ofendida, mas lamentei
miseravelmente assim que desconfiei da consequência
daquela transa casual.

Grávida e sem um tostão furado. Desempregada e morando


de favor na casa de minha madrinha, que finalmente
desviou a atenção do exame e me olhou com um semblante
mais sereno e compassivo.

Ela estava com pena de mim.

Eu mesma estava com pena de mim!

— Não preciso explicar como foi que aconteceu, né,


madrinha? — Tentei um tom debochado, mas falhei
miseravelmente e a vi revirar os olhos para em seguida
soltar um longo suspiro.

— Você já é grandinha o bastante para esse tipo de


resposta, não acha? Ninguém sai por aí andando na rua e,
de repente tropeça, caindo com a boceta em cima de um
pau e póf, engravida por acidente!

Senti meus olhos lacrimejarem. Se a situação não fosse tão


caótica, eu certamente teria rido da sua resposta malcriada,
mas cutuquei a onça com vara curta e o que ela tinha
acabado de dizer fez o choque de realidade vir com tudo.

— Quão azarada eu sou, madrinha? — Meus lábios


estremeceram, mas tentei não ceder ao choro. — Foi a
minha primeira vez… e usamos camisinha!
Dona Maristela se aproximou, sentando-se ao meu lado no
sofá da sua minúscula sala, onde eu tinha me afundado
desde que cheguei para compartilhar com ela a notícia que
mudaria minha vida de muitas maneiras.

— Ah, menina! — Puxou-me para seus braços, acolhendo-


me com carinho. — Você já contou pra ele? Aliás, quem é o
pai desse bebê, Alana?

Fechei os olhos com força, abraçando-a como se minha vida


dependesse da sua proteção. Foi então que me permiti
desabar em lágrimas, pois o que eu diria a seguir tornaria
aquela realidade ainda mais desesperadora.

— E-eu… eu não sei quem é o pai.


Sobre a Autora

EVELYN SANTANA

Autora de protagonistas resilientes, planos perfeitos que


dão errado, finais felizes aparentemente impossíveis e que
aquecem o

�� .
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Vou adorar conversar com você! <3


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Sumário
Sinopse
Prólogo
Capítulo 01
Capítulo 02
Capítulo 03
Capítulo 04
Capítulo 05
Capítulo 06
Capítulo 07
Capítulo 08
Capítulo 09
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Epílogo
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