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TÍTULO ORIGINAL: DOUTOR ARROGÂNCIA.

 
Copyright © 2023 por Bianca Pohndorf.
Preparação de texto: Mari Vieira
Revisão: Mari Vieira
Capa: Designer Tenório
Diagramação: Grazi Fontes
Ilustrador: Carlos Miguel Ilustrações
 
Está é uma obra de ficção. Nomes, personagens, lugares e
acontecimentos descritos são produtos da imaginação da autora.
Qualquer semelhança com nomes, datas e acontecimentos reais é
mera coincidência.
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser
reproduzida por qualquer forma e/ou quaisquer meios existentes
sem prévia autorização por escrito da autora.
Os direitos morais foram assegurados. A violação dos direitos
autorais é crime estabelecido pela lei nº. 9.610/98 e punido pelo
artigo 184 do Código Penal.
 
Versão Digital — 2023.
 
Essa autora é assessorada por Mari Vieira Editoriais.
Quaisquer dúvidas ou informações sobre suas obras, entre em
contato clicando aqui.
Sumário
NOTA DA AUTORA
SINOPSE
PRÓLOGO
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Epílogo
Avaliações
Agradecimentos
 
 
 
Para você: Leia, relaxe e goze.
Com carinho, Leon Dubrow.
Se você gosta de comédia romântica, um livro fofo e
que fará com que se apaixone pelos personagens ao longo
da história, amando com eles, sofrendo com eles e se
divertindo com eles, então este é o livro certo para você.
A história apresentada aqui não tem um super plot ou
reviravoltas surpreendentes, é apenas diversão simples e
pura.
Ainda assim, devo alertar que o livro possuí
conteúdo para maiores de dezoito anos, contendo
linguagem vulgar, cenas de sexo explícito e sem
preservativo, relacionamento tóxico familiar e luto.
Espero muito que você goste e que se apaixone por
eles como eu me apaixonei. Que Leon e seu ego enorme
conquistem você!
 

Boa leitura,
Leon Dubrow acha que arrogância é a chave do
sucesso, por ser um renomado médico no ramo de
reprodução humana assistida. A única coisa que ele
respeita é a medicina, pois as mulheres que ocupam sua
cama, não passam de uma mera noite, e nomes, para quê?
Leon não faz questão de nomear nenhuma.
 
Bridget Adams acha que a vida é para pessoas
obstinadas, recém-formada, estudiosa e com uma dívida
estudantil maior do que imaginava, ela está desesperada.
Quando consegue uma vaga de residente em uma clínica
famosa e renomada ela acha que seus problemas estão se
resolvendo, iludida, uma inseminação errada e seus
problemas estão apenas começando, ou não, depende
do ponto de vista.
 
Leon e Bridget terão a difícil missão de trabalhar
juntos, ela já detesta seu comportamento, ele já a
subestima. Eles já são o puro suco da confusão.
 
O que será que de pior, ou melhor, pode acontecer?
Dezoito anos antes

Brandon não era mais o mesmo desde que começou a


ficar doente. Ele não brincava mais comigo e às vezes nem
se levantava da cama para assistir desenho, como
costumávamos fazer.

Mamãe falava que eu não deveria incomodá-lo, que se


ele descansasse bastante, logo estaria curado para que
pudéssemos voltar a fazer as mesmas coisas de antes.

Mas o tempo estava passando, e nada do que ela


dizia parecia se concretizar.
Meu irmão tinha emagrecido tanto que eu conseguia
ver os ossos marcados das maçãs do rosto e ombros. Ele
também não tinha mais cabelos, nem um único fio e a voz
estava cada vez mais rouca e enfraquecida.

Antes de tudo isso acontecer, ele era meu


companheiro, me defendia quando papai queria brigar
comigo apenas para achar um motivo para me punir, me
acompanhava na escola e sempre brincava de casinha
quando eu queria.

Sentei-me encolhida no sofá, uma lágrima deslizou


pela minha bochecha direita enquanto encarava a nuca do
meu irmão com o coração apertado.

Eu vi mamãe chorando ontem à noite e orando para


que Deus não levasse o seu bebê para longe dela. Ela não
percebeu que estava sendo observada, as lágrimas
oprimiam a sua visão e a cabeça estava transtornada
demais para reparar na minha presença.

Não conseguia entender o que estava acontecendo.


Um dia, Brandon estava bem, brincando comigo na rua; no
outro, sangue escorria pelo seu nariz, as visitas aos
médicos se tornaram mais frequentes e o cabelo começou
a cair.

Ninguém me falava nada, só diziam que eu deveria


ficar ao lado dele e ser uma boa irmã, porque ele
precisava de mim, da nossa ligação de irmãos gêmeos. E
então foi exatamente isso que eu fiz, pensando que as
coisas melhorariam logo.

Brandon soltou uma risada fraca, os olhos estavam


fixos na televisão, concentrado no seu desenho favorito
que estava passando através da tela.

A chuva torrencial batia no vidro ao meu lado e a casa


estava desvanecida em escuridão por conta do céu
nublado. Podia ouvir o barulho da água na rua e da
madeira que rangia pelas rajadas de vento.

Era um dia muito feio para brincar na rua, mamãe


nunca permitia que saíssemos de casa em dias como
esses, mas Brandon e eu nunca escutávamos. Ele me
ajudava a pular a janela do quarto, então íamos para o
pátio sentir a água gelada em nossos rostos e fazer uma
competição de quem pulava mais longe, atravessando as
maiores poças em um pulo sem pisar na água.

Soltei um suspiro trêmulo, saudosa das lembranças da


nossa vida antes da doença acometer meu irmão.

Como se sentisse meus pensamentos, Brandon virou a


cabeça em minha direção, os olhos verdes — iguaizinhos
aos meus — fixaram-se em mim.

— Está triste? — perguntou, em um sussurro.


Balancei a cabeça em um sinal negativo.

— Estou entediada — menti.


Mamãe disse que eu jamais poderia mostrar minha
tristeza na frente de Brandon, mesmo que eu sentisse
vontade de chorar, nunca poderia deixá-lo vê-lo a
preocupação.

Brandon virou a cabeça para a janela e observou por


um momento as gotas de água que escorriam pelo vidro,
perdendo-se em pensamentos, como se sentisse saudade
como eu sentia dos nossos momentos no passado.

— Quer ir brincar na rua? — murmurou, depois de um


tempo em silêncio.

Arregalei os olhos e mordi as bochechas.

— Não podemos.

— E por que não? — retesou, pendendo a cabeça para


o lado.

Desviei o olhar para o chão, evitando encará-lo.

Mamãe disse que eu não podia induzir Brandon a


fazer alguma coisa arriscada, isso poderia piorar ainda
mais a saúde instável dele. Ela falou que eu deveria ser
forte e aconselhá-lo a fazer apenas coisas que não o
colocassem em risco de piora.

— Mamãe não deixa, você sabe...

Brandon jogou as cobertas para o lado e se levantou


com um pouco de dificuldade.
— E desde quando nós ouvimos o que ela fala, Bri?
Sabe que ela fica brava por um tempo, mas logo nos
perdoa.

Ele tinha razão, mamãe ficava muito chateada quando


nos pegava na chuva, mas depois isso passava e ela
começava a rir de como estávamos sujos e muito
molhados.

Ergui os olhos para o meu irmão, uma centelha


piscando em minha mente.

E se a doença dele foi causada por essas


brincadeiras? E se Brandon ficou assim por causa da
chuva? Mamãe sempre alertou que adoeceríamos se
ficássemos molhados.

Balancei a cabeça.

— Não quero, vamos assistir ao desenho — falei,


deitando-me de lado no sofá. — Ela vai chegar daqui a um
pouquinho e vamos poder fazer alguma outra coisa.

Brandon bufou e se ergueu do colchão em que estava


deitado no meio da sala, pulando para o chão de pés
descalços. Me ergui pelos cotovelos e o encarei com o
cenho franzido.

— O que vai fazer? — questionei.


— Eu vou tomar banho de chuva, ué, tá quente e
entediante aqui dentro, se quiser ficar aí, problema seu —
retrucou, correndo até a porta da frente.

Levantei-me do sofá em um movimento, meu coração


socava o meu peito com força. A vontade de ligar para
mamãe duelando com o profundo desejo de ir até a rua e
brincar com o meu irmão como nos velhos tempos.

— Você está doente, Brandon, não pode fazer isso —


contestei, correndo ao seu encontro.

Brandon abriu a porta e uma rajada de vento forte


soprou meus cabelos para trás e fez a minha pele se
arrepiar. Ele estremeceu, mas manteve-se firme no lugar,
decidido a sair para brincar.

— E daí? — refutou, removendo as meias dos pés e


jogando-as em um canto qualquer da casa. — Só temos
nove anos, Bri, vamos brincar e esquecer que estou
morrendo.

Abri a boca e arregalei os olhos chorosos.

— Não está morrendo, pare de falar besteira, deixe só


mamãe saber disso que você vai ver só — sibilei, cruzando
os braços em frente ao corpo para aplacar o frio.

Ele suspirou.
— Pense o que quiser, eu ouvi os médicos falando de
mim, eles disseram que não tinha mais nada que pudesse
ser feito, que a doença já tinha me tomado e que era
questão de tempo agora — revelou. — Vamos brincar, Bri,
por favor, quero ser criança outra vez, quero poder correr
com você como se nada de ruim tivesse acontecido.

Era mentira dele, não acreditava em uma única


palavra, Brandon só estava tentando me convencer a sair
para brincar, ele não morreria, era jovem demais para isso,
só pessoas velhas morriam, não crianças.

Eu também sentia falta dele, tanta que chegava a doer


o meu peito. Odiava ter que ir para a escola sabendo que
Brandon não me acompanharia, ele sempre estava comigo
na recreação e sentava-se na carteira ao meu lado.

Brandon não esperou que eu lhe desse uma resposta,


ele desceu os três degraus da área correndo e foi até o
quintal, a água respingou para todos os lados com as suas
pegadas na grama. Ele parou no meio do pátio e ergueu a
cabeça para cima de olhos fechados, sentindo os
respingos contra a pele pálida e sensível. Ele estava tão
magro, sua cabeça totalmente raspada. Meus olhos
encheram de lágrimas, minha vontade era de correr e
abraçá-lo, para aplacar a dor que eu sentia só pela ideia
de não o ter mais aqui.

— Vem, Bri, a água está tão quentinha — comentou,


sorrindo amplamente e girando pelos calcanhares,
esfregando os pés na grama.

Ponderei por um breve instante.

Mamãe ficaria uma fera, mas poderíamos voltar para


dentro e trocar de roupa antes que ela descobrisse o que
fizemos.

Chutei as meias para longe e entrei na chuva,


deixando a área coberta para trás. Os pingos fortes me
encharcaram em poucos segundos, empapando os meus
cabelos na testa e nuca.

— Vamos, Bri, acho que vi uma poça ali — gritou


Brandon, apontando para frente, fazendo-se ser ouvido por
cima do som alto da tempestade.

Rindo, corremos juntos em direção à rua e pulamos a


primeira poça, era pequena, a água turva respingou em
mim quando meus calcanhares aterrissaram nela.

Meu irmão gargalhou, havia tanta felicidade naquela


risada, uma felicidade que há muito ele não compartilhava.

— Você era melhor nisso — brincou, mostrando a


língua pra mim.

Brandon tentou pular outra poça de água, mas as


pernas fracas fizeram com que o pulo fosse lento demais
para que conseguisse atravessá-la, caindo no meio dela e
fazendo a lama respingar e sujar suas roupas.
— Ei, isso foi horrível — zombei, rindo e batendo
palmas.

Meu irmão ergueu a cabeça em minha direção e


engoliu em seco, havia pavor nos olhos que há pouco
estavam banhados em diversão.

— Eu… eu… não estou me sentindo bem, Bri… —


disse em um sussurro.

Meu sorriso murchou.

— O que foi?

Corri em direção a ele, o coração prestes a sair pela


boca, o peso corporal de Brandon oscilou e ele se jogou
para o lado, mas cheguei a tempo e consegui segurá-lo
antes que atingisse o chão. Ele revirou os olhos para cima
e então caiu em um sono profundo.

Gritei seu nome, alto o suficiente, forte demais para


que até a chuva fosse aplacada pelo meu desespero, mas
ele não pareceu me ouvir, perdido em um limbo escuro e
profundo.

— Brandon, por favor… maninho… — choraminguei.

Bati com a palma da mão em seu rosto, mas não


obtive nenhuma resposta.

— Por favor…
Gritei outra vez, até a minha voz falhar pela falta de ar
nos pulmões, até a minha garganta implorar por
misericórdia.

Em algum momento, a senhora Emma, a vizinha da


casa da frente, parou ao meu lado com o telefone no
ouvido e me ajudou a segurar o meu irmão. Depois disso,
os flashes de memórias foram alternativos. Me vi sendo
colocada no banco traseiro de um carro desconhecido e
sendo conduzida para o hospital.

Alguém me agarrou pelos ombros e me puxou para


fora do veículo com brusquidão. Pisquei, trêmula, o queixo
batia freneticamente pelo frio que se infiltrava em meus
músculos, as roupas pareciam pesadas e geladas demais.

— O que você fez com o seu irmão? — gritou papai,


chacoalhando-me, os respingos dos meus cabelos batendo
em seu rosto.

Balancei a cabeça.

— Na-nada — gaguejei, as lágrimas embaçavam a


minha visão.

— BRANDON… MEU FILHO — gritou mamãe de algum


lugar.

Papai me largou e correu na direção dela. Obriguei


minha mente inerte a agir e os segui para dentro do
hospital, o cheiro forte de álcool flutuou até o meu nariz.
As vozes se misturavam, avistei homens e mulheres
vestindo roupas brancas como o gelo correndo de um lado
para o outro.

— Aplica adrenalina — alguém gritou.

  — Me passa uma manta aquecida, a temperatura


ainda é de vinte e seis graus — outro falou.

Um barulho constante e irritante se sobressaiu, alto e


contínuo.

— Droga, desfibrilação… rápido… afastem-se.

Eles se aproximaram do corpo desvanecido de


Brandon com dois aparelhos grandes e os colocaram em
seu peito nu. Meu irmão deu um solavanco para cima, mas
o barulho constante não parou, nada aconteceu. Eles
repetiram o movimento.

— Voltou a distorcia, continuem massageando.

Ouvi o suspiro de mamãe ao meu lado.

 — Está hipotérmico — gritou um homem.

— Lavem a cavidade abdominal com soro aquecido —


disse uma das enfermeiras.

Não conseguia ver o que estavam fazendo através do


fluxo de corpos correndo e gritando ao redor da maca de
Brandon. Mamãe se ajoelhou no chão e juntou as mãos em
frente ao rosto, murmurando uma prece baixa e quase
inaudível. Papai esfregou os cabelos e começou a andar
de um lado para o outro.

— Qual é a temperatura dele?

— Saiu dos vinte e seis agora.

— Coloquem mais adrenalina.

Gostaria de entender o que estava acontecendo, mas


nada fazia sentido para mim. Como uma brincadeira tão
inocente poderia fazer isso tudo com Brandon? Nós
sempre brincamos na chuva e nada disso nunca
aconteceu.

Me aproximei lentamente de mamãe, minhas mãos


tremiam de frio e de medo. Estava assustada, sem saber o
que fazer.

— Mamãe… Brandon vai ficar bem? — perguntei em


um bramido.

Ela me puxou para si, ignorando as minhas roupas


molhadas e plantou um beijo no topo da minha cabeça.

— Sim, meu amor… tudo vai ficar bem, vai tudo voltar
a ser como era antes — repetiu, trêmula, a mesma coisa
que falou por várias e várias vezes nos últimos meses.

Queria saber quando tudo ficaria bem, porque eu


estava cansada de ver meu irmão se sentir mal por causa
da doença, queria que ele melhorasse logo.

As máquinas apitaram de novo.

— Qual é a temperatura?

— Está em trinta graus.

— Porra, estava em trinta e dois — gritou alguém,


suspirando forte.

— Fenômeno pós-queda.

— Reage, meu filho… por favor… por favor —


murmurou mamãe.

O barulho começou a irritar os meus ouvidos, era tão


chato e incessante, eu não sabia o que significava, mas
parecia preocupar os médicos e irritá-los também.

— Nós o perdemos — alguém comentou.

— Não! — Mamãe me empurrou para longe e se


ergueu do chão com uma rapidez vertiginosa, então correu
até a maca onde Brandon estava, sacudindo-o. — Meu
bebê, acorda… querido, acorda, volta pra mamãe.

— Me desculpe, senhora, ele estava com a imunidade


muito baixa e muito debilitado com o banho de chuva, seu
corpo acabou desfalecendo por conta de uma hipotermia.
— Um dos médicos se aproximou e depositou a mão no
ombro dela. — Fizemos de tudo para tentar salvar o seu
filho, eu sinto muito.

Que estranho soava a conversa deles, Brandon estava


bem, um pouco abalado por causa da doença, mas não
sabia como poderia piorar por causa do banho de chuva.

Com passos curtos e precisos, me aproximei da maca


onde ele estava. A pele estava mais pálida do que o
normal e um tubo saía de dentro dos lábios semiabertos.
Brandon não se mexia, os olhos estavam fechados e sem
movimento algum.

Puxei a blusa de mamãe, tentando chamar a sua


atenção, ela estava debruçada por cima da maca.

— Mamãe, Brandon vai ficar bem? — perguntei, sem


desviar o olhar da imagem aterrorizadora do meu irmão a
minha frente.

Um grunhido rouco e profundo foi expelido atrás de


mim.

— Sua criança maldita! Acabou de assassinar o seu


irmão! — acusou papai. — Eu disse que gêmeos não são
abençoados, ela deixou Brandon mais fraco no útero e
agora terminou de matá-lo.

— Senhor, acalme-se e pare de proferir absurdos,


entendo a sua dor, mas o câncer do Brandon não é culpa
de ninguém.
Uma mão agarrou os meus cabelos e me puxou para
longe da maca.

— Saia de perto do meu filho! — cuspiu papai, furioso.

— Contenham-no! — bradou um dos médicos.

Meu pai foi puxado para longe de mim, enquanto uma


das enfermeiras aplicava uma injeção em seu braço,
levando-o a um sono profundo.

Corri os olhos para Brandon, ele ainda estava do


mesmo modo, inerte… ele sempre me defendia quando
papai fazia isso, por que ele não estava me defendendo
agora?

Só então eu percebi que ele tinha morrido, assim


como vovó, a mãe da minha mamãe, tinha no ano passado.
Ele não se levantaria mais para me defender, tampouco
para brincar comigo na chuva. Brandon não voltaria mais.
A minha metade. Meu melhor amigo. Meu irmão gêmeo.

Morto.

Não conseguia suportar.

Doía tanto que eu mal conseguia respirar.

Eu não poderia ficar sem ele, nascemos juntos e


deveríamos permanecer juntos, era assim que deveria ser.

Não!
Fechei os olhos, sentindo o piso gelado bater em
minhas costas, antes e cair em um limbo escuro e indolor.
Eu não sabia quais eram os sonhos da maioria das
garotas da minha idade, mas sempre soube qual era o
meu.

A medicina.

Me tornar médica era algo que havia sido enraizado


em mim quando eu ainda era criança, quando eu tinha
apenas nove anos de idade obtive uma certeza absurda de
que um dia desfilaria por corredores brancos vestindo um
jaleco com um “DR.” na frente do meu nome.

Me formei no colegial com honras aos dezessete anos,


sem nunca ter reprovado em uma única matéria que fosse.
Aos dezoito, entrei para a faculdade. E agora, depois de
oito longos anos de abdicação da minha juventude, estava
prestes a segurar o meu diploma pela primeira vez.

Ainda precisaria enfrentar mais três anos de


residência, mas colocar em prática tudo o que estudei e
aprendi me deixava muito mais ansiosa do que entediada.
Todo estudante de medicina sonhava com a residência e
eu não era muito diferente da maioria da minha turma.

Assim que terminasse a residência, seguiria a minha


especialização em oncologia infantil que era a área que eu
gostaria de seguir. Odiava ver crianças doentes e
sofrendo, por isso queria ajudá-las de alguma forma.
Infelizmente, o câncer ainda estava fora do nosso alcance
de cura, mas se eu pudesse ao menos dedicar a minha
vida a dirimir um pouco da dor e do sofrimento causado,
faria isso com o maior prazer do mundo.

Sabia de perto como o câncer infantil era responsável


por devastar famílias inteiras e abalar o resto da vida e o
psicológico dos familiares que restaram.

Prendi os meus cabelos no alto da cabeça em um


coque frouxo e encarei meu reflexo no espelho. Minhas
roupas eram simples, calças jeans, blusa lisa de manga
curta e tênis. Eu não ia arrumada para a faculdade, não
tinha tempo para isso, passava a maior parte das noites
estudando e depois gostava de usufruir das poucas horas
restantes de sono. Me arrumar significava acordar mais
cedo e dormir menos estava fora de cogitação.
Recolhi a mochila de cima da cama e conferi se meus
cadernos estavam alinhados dentro dela.

— Último dia de aula, parece um sonho... — murmurei,


segurando a mochila contra o meu peito e soltando um
suspiro profundo.

Vários motivos me faziam querer terminar o curso de


uma vez, mas, dentre eles, havia o fato de que eu deveria
ter começado a pagar o meu financiamento estudantil na
metade do curso, eu já estava no final e nem havia
começado os pagamentos. Sabia que isso aconteceria
quando aceitei o financiamento para que pudesse
ingressar na faculdade, mas na época eu estava ocupada
demais vivendo em pura ansiedade para me tornar uma
estudante de medicina que não liguei para as
consequências que dever para o Banco poderiam me
trazer. Com o salário baixo de empregada doméstica da
minha mãe e os bicos de encanador do meu pai, eles não
teriam dinheiro o suficiente para sustentar a casa e ainda
pagar a faculdade. E, além do mais, não daria ao meu pai
a chance de jogar na minha cara pelo resto da vida como
eu tinha me formado graças a ele. Então, em um impulso
de desespero, eu aceitei, e agora precisava cuidar de
todas as cartas que chegavam em meu nome para que
meus pais não desconfiassem das dívidas astronômicas da
filha.
A residência pagava bem, ainda não era o salário que
eu esperava receber no futuro quando, enfim, me tornasse
médica, mas já daria para cobrir as minhas despesas e ir
quitando as minhas dívidas aos poucos.

Desci as escadas pulando os degraus sem conseguir


conter a animação. O cheiro de panquecas flutuou até o
meu nariz antes que eu chegasse à cozinha.

Ruth estava de frente para o fogão preparando o café


da manhã e papai estava sentado na ponta da mesa com
um jornal nas mãos.

— Posso saber qual é o motivo especial desse café


maravilhoso? — perguntei, caminhando até ela, beijando
sua têmpora e espiando as panquecas que cheiravam
deliciosamente bem. — Isso parece divino — comentei.

Me sentei na mesa e enchi uma xícara de café preto.

— É seu último dia de aula, querida, pensou mesmo


que não comemoraríamos? — disse ela, virando-se para
nós com a espátula na mão.

Encolhi os ombros.

— A formatura, no sábado, é mais importante.

Ela revirou os olhos.

— Vamos comemorar ambos, cada passo da sua vida


é importante para nós — avisou, recolhendo o prato com
panquecas e o depositando em cima da mesa. — Não é
todo dia que os pais têm a honra de formar uma médica na
família.

Um sorriso bobo curvou os meus lábios para cima.

— Ainda falta a residência, mãe, daqui três anos nós


voltamos a ter essa conversa — brinquei.

Meu pai dobrou o jornal e o colocou ao lado na mesa,


cruzando as mãos em frente ao rosto e me encarando com
afinco.

— Não fez mais do que a sua obrigação, Bridget —


crispou, descruzando os braços e sorvendo um gole do
café preto. — Mas não culpe sua mãe pelo orgulho bobo e
por querer te agradar.

Engoli o nó na garganta junto com o café quente.

A indiferença dele comigo não me incomodava tanto


quando Brandon era vivo, meu gêmeo fazia questão de
suprir todas as ofensas que eram proferidas pelo nosso
pai, mas desde que ele morreu, o comportamento apático
passou a me atormentar, assim como a culpa que ele me
fez carregar por tantos anos pela morte de Brandon, Mark
nunca perdoou Deus ou o universo por tê-lo tirado o único
filho homem que teve, muito menos perdoou a mim, a
responsável pelo banho de chuva.
Passei boa parte da minha vida tentando ser motivo
de orgulho para ele, tentando fazer com que me visse com
outros olhos além da culpa que evidentemente jogava para
cima de mim. Infelizmente, ele era ignorante demais para
isso. Mark tinha certeza de que eu era a culpada pelo
câncer de Brandon, ele achava que por termos dividido o
útero, eu o havia limitado de crescer forte, fazendo-o
sucumbir a doença ainda tão jovem.

Por um bom tempo, pensei o mesmo que ele, deixei


que a culpa me afogasse e a vida fosse sem graça e
desinteressante, mas isso mudou quando eu cresci o
suficiente para compreender que o câncer era uma doença
silenciosa e mortal, portanto, não haviam culpados pela
morte de Brandon.

Eu sabia o porquê estava endividada e porque


sucumbi a afobação para entrar na faculdade sem ligar
para as consequências. Queria ser motivo de orgulho para
Mark, de alguma forma, ao menos uma única vez na vida,
mas percebi não muito tarde que nada parecia surtir efeito
nele, que ele nunca me olharia como olhava para Brandon.
Era como se o coração tivesse se envolto em gelo após a
morte do filho, quando seu sonho de ser pai de um menino
foi corrompido.

Ruth bufou, ignorando as palavras frias e


depreciativas do marido.
— Nós amamos você, Bridget — disse ela, pousando
uma mão em cima da minha, apertando-a de leve para
enaltecer a fala.

Ela sempre tentava apaziguar a indiferença do marido,


mas nada fazia com que doesse menos, nem mesmo todo
o carinho que depositou em mim desde que a tragédia
assolou a nossa família.

Olhei para a parede do fundo da cozinha e encarei o


retrato de Brandon. Ele sorria para a câmera, alheio a
doença silenciosa que já se alastrava pelas suas células.
Brandon era como a luz que iluminava a nossa família,
depois que ele se foi, levou com ele um pedaço de cada
um de nós.

— Você é o meu maior orgulho — continuou minha


mãe.

Um gosto amargo impregnou em minha língua, me


forçando a engolir em seco e a abrir um sorriso que não
chegava aos olhos. A mentira trazia uma sensação ruim,
arrastando com ela o sentimento de culpa.

Eles não faziam ideia de que eu era uma grande


farsante, pensavam que eu era bolsista, que meu prestígio
no colegial foi o responsável pela minha bolsa de estudos,
não sabiam das dívidas estudantis que eu carregava.

A mentira me transformava em uma péssima filha?


Bem... eu mentia para eles há anos, vivia uma farsa que
eu mesma criei. Mas, se a minha mãe soubesse a verdade
ela ainda se orgulharia de mim ou eu teria que lidar com a
indiferença dela também? Não sabia a resposta, e a culpa
pela mentira não era forte o suficiente para me fazer criar
coragem e contar a verdade.

Puxei a minha mão da dela e bebi um gole do meu


café adocicado, tentando afastar o amargor da minha
boca.

— Coma as panquecas, fiz do jeitinho que você gosta.


— Ela sorriu, inclinando o queixo em direção ao prato.

Espetei o garfo em uma delas e virei o vidro de mel,


melecando-as mais do que costumava fazer, uma tentativa
de adoçar a merda que estava a minha vida.
Definitivamente, não era uma merda completa, já que
estava prestes a me formar e resolver um terço dos meus
problemas, mas isso não diluía o fato de que eu era uma
completa mentira. Se Brandon estivesse vivo, estaria rindo
da minha cara neste momento.

— Estão deliciosas como sempre — comentei,


mastigando, engolindo e colocando mais na boca para
evitar a conversa.

Em uma semana, as coisas mudariam, começaria a


pagar as minhas dívidas e eles nunca descobririam a
verdade, morreria sendo uma filha mentirosa e era isso.
Ao menos, ser uma mentirosa me dirimia de ter que
ouvir mais desaforos do meu pai. Se ele descobrisse a
verdade, nada poderia impedi-lo de jogar na minha cara, e,
para piorar, desta vez ele teria razão para isso.

Minha mãe se levantou bruscamente, tirando-me dos


devaneios. Ela caminhou até a pia e depositou dentro dela
a xícara e o prato vazios.

— Preciso ir para a casa dos Parkson, não quero me


atrasar — avisou, conferindo a hora em seu relógio velho
de pulso.

Ela trabalhava para o casal Parkson há anos, eles


foram bons-chefes quando ela ficou quase um ano de luto
pela morte de Brandon, assim como quando ficou afastada
para cuidar dele em seus meses doente. Os Parksons
eram um casal de idosos acolhedores, foram muito
respeitosos nos momentos de turbulência que a nossa
família enfrentou, por isso Ruth estava com eles até hoje,
mesmo quando já poderia estar aposentada, assim como o
marido estava.

Mark se aposentou logo após a morte de Brandon,


mas nunca deixou de trabalhar como encanador, ele
passava o dia na rua encontrando algo para ocupar a
mente, não conseguia ficar parado mais do que o tempo
necessário para descansar.
Assim, com os dois sustentando a casa, pude me
concentrar totalmente nos estudos, sem precisar arranjar
um emprego de meio-período para me manter.

— Quando será a sua consulta, querida? — perguntou


ela, mudando de assunto e recolhendo a bolsa do encosto
da cadeira.

— Amanhã — avisei, terminando o meu café e me


erguendo da mesa. — Na Fertility Partners.

Estava na hora de fazer alguns exames, não era mais


virgem há uns bons anos, mas nem lembrava mais o que
eram relações sexuais, já que não tinha tempo para isso.
Com a formatura chegando e o excesso de cólicas nos
períodos menstruais, resolvi marcar um exame e fiquei
muito feliz que o plano de saúde que os Parksons
ofertavam cobria a melhor clínica do Estado desse ramo.

A Fertility Partners era uma conceituada clínica de


reprodução humana, contendo em sua equipe renomados
ginecologistas e obstetras. Ela não oferecia somente a
inseminação assistida e a fertilização in vitro, possuía
também médicos responsáveis por todos os cuidados
íntimos da mulher.

— Fico feliz que tenha conseguido na clínica — disse


ela, suspirando e se afastando da cozinha. — Conte tudo
para a médica, Bri, não deixe nada de fora, já deveria ter
ido fazer esse exame a muito tempo.
Fiz um aceno com as mãos.

— Pode deixar. — Abri um sorriso amarelo. — Bom


trabalho, mãe.

Apesar de ser basicamente médica, era muito relapsa


com a minha saúde. Acontece que o tempo que eu perderia
em uma consulta eu poderia usar para estudar e encher o
meu cérebro de conhecimento, só assim poderia me tornar
uma médica conceituada e fazer a diferença que eu tanto
queria na vida das pessoas.

— Bom último dia de aula — falou, abrindo a porta da


frente para sair de casa. Ela parou no rol de entrada e se
agachou, recolhendo algumas cartas do chão. Folheando
uma por uma, virou-se para nós com a testa franzida. —
Chegou três cartas para você, Bri.

Pensei que vomitaria todas as panquecas que comi no


meio da cozinha, meu coração parou de bater e meu
sistema nervoso colapsou. O excesso de mel nas
panquecas não parecia mais tão boa ideia, pesava em meu
estômago como pedra.

Se eles descobrissem... Balancei a cabeça, tirando a


ideia absurda da minha mente.

Ruth fez menção de abrir a carta e eu arregalei os


olhos, suor empapuçou as palmas das minhas mãos.
Pisquei, forçando o meu corpo a agir antes que a minha
mentira fosse descoberta no pior momento e cenário
possível.

Corri até ela, as pernas duras pelos músculos rígidos


e puxei as cartas das suas mãos. Ela se retesou,
assustada e desconfiada com o meu comportamento
abrupto e incomum.

— Coisas de formatura — murmurei, revirando os


olhos. — É um saco, isso vai chegar pelos próximos
meses, são empresas me oferecendo financiamento ou
uma oferta de emprego limitada — menti, mexendo as
mãos em desdém.

Ela cruzou os braços e arqueou uma sobrancelha


grisalha.

— E por que está agindo tão estranha? — questionou,


estreitando o olhar em minha direção.

Uma risada estrangulada separou os meus lábios.

— Não estou agindo estranha, só não quero que a


senhora se atrase para o trabalho por causa de uma
besteira como essa — crispei, caminhando até a mesa e
pegando a minha mochila. Evitei olhar para o meu pai, pois
sabia que ele me encarava com a mesma desconfiança
que ela, mas a dele era muito pior e queimava o meu rosto
com mais ardor. — Também preciso ir para a faculdade,
nunca me atrasei e não quero fazer isso pela primeira vez
justo no meu último dia de aula.
Estalei um beijo na têmpora dela antes de passar ao
seu lado na porta e correr para a rua.

— Até mais tarde! — me despedi, limitando-me


apenas a um simples aceno de costas.

Pendurei a mochila sobre os meus ombros e caminhei


sem olhar para trás por alguns metros, embora tentasse
soar natural, tinha absoluta certeza de que eu parecia
rígida demais para alguém que estava descontraída e feliz
pelo último dia de aula.

Ignorei os raios do sol que pinicavam os meus olhos


verdes desacostumados com a claridade. Lacrimejei, sem
parar de me afastar da minha casa e das mentiras que
perpetuavam às minhas costas.

Abri uma das cartas para confirmar que era a


cobrança da minha dívida. Para piorar a porcaria da
situação, ao final, ainda havia o valor devido.

O Banco queria me matar do coração, tinha certeza,


se meus pais lessem as cartas de cobrança eles morreriam
de desgosto e eu de culpa.

Com raiva, rasguei os três papéis em milhares de


pedaços, a mandíbula rígida e grunhidos ressoando pelos
meus lábios.

— Idiotas insistentes — vociferei, jogando os picotes


em uma das lixeiras da rua. — Não estou me recusando a
pagar essa porcaria, só tenham um pouco de paciência,
santo Deus!

Precisava começar a pagar logo a dívida ou as cartas


não iriam parar de chegar. Não teria sorte para sempre, em
algum momento, quando o carteiro batesse à porta,
poderia não estar presente para recebê-las, e depois de
hoje, conhecia minha mãe suficientemente bem para saber
que ela leria uma das cartas na primeira oportunidade que
tivesse, estava curiosa e desconfiada de mim.

Céus, quando foi que deixei a minha vida se tornar


essa bagunça toda? Ah, eu sabia a resposta: quando me
desesperei para entrar na faculdade e aceitei o primeiro
financiamento que apareceu para que não perdesse a
oportunidade.

Pelo lado positivo, eu era uma quase médica.

Portanto, no final das contas, não deu tudo totalmente


errado.
Inclinei os meus quadris para a frente, fodendo a nova
enfermeira da clínica. Estoquei o meu pau em sua boceta
com brusquidão, agarrando os seus quadris com força para
mantê-la no lugar.

— Oh... Leon... mais rápido — gemeu, implorando por


mais.

Estoquei, minhas bolas bateram na bunda empinada,


enquanto aumentava o ritmo assim como ela tinha pedido.
Espalmei uma mão na parede e fechei os olhos,
apreciando a sensação boa de foder logo pela manhã.

— Mais rápido, Leon... — suplicou, arrebitando a


bunda.
A safada gostava de sexo bruto, não se contentava
com algo lento, nem mesmo queria apreciar a sensação de
ter o meu pau deslizando pela boceta apertada com
lentidão. Ela não queria fazer amor, queria ser fodida. E
eram essas as minhas favoritas.

Suor escorregou pela minha testa e minha respiração


se tornou densa e audível.

— Goza, Emily, goza pra mim — declarei, sentindo a


dormência do orgasmo se aproximando.

Me movimentei para frente e para trás, retirando todo


o meu pau para que pudesse enfiá-lo todo de novo,
estocando até o fundo da sua boceta apertada e melada. O
barulho da sucção da união dos nossos corpos retumbou
pela pequena despensa de produtos de higiene.

— Ah... assim... — gritou, me fazendo tapar a sua


boca com a minha mão.

Ela gozou, a boceta esmagou o meu pau, sufocando-o


tanto que eu não aguentei e a acompanhei, jorrando porra
na camisinha lubrificada. Cerrei a mandíbula e finquei os
pés no chão, tremendo em espasmos relaxantes e
deliciosos.

— Porra, isso que é começar bem o dia — comentei,


me afastando dela.
Removi a camisinha do meu pau amolecido e a joguei
dentro de uma das sacolas de lixo. Olhei para a garota e
ela estava com as bochechas vermelhas, os cabelos
castanhos bagunçados e os olhos escuros turvos pelo
recente orgasmo.

Ela era muito gostosa, tinha peitos no tamanho exato


para caberem em minhas mãos, uma bunda redonda,
cintura fina e quadris largos.

— Bem-vinda a clínica, gata — recepcionei-a, sorrindo


abertamente.

Peguei umas toalhas de papel e me limpei, jogando os


últimos resquícios do sexo sem compromisso na lixeira. Me
agachei e agarrei o cós das minhas calças que pendiam
em meus pés, puxando e a abotoando-as na cintura.

A garota arrumou a saia e ajeitou a postura, elevando


o queixo.

— Meu nome é Scarlet, seu idiota — sibilou.

Franzi a testa.

— Emily é quase igual Scarlet — retruquei,


encolhendo os ombros.

Ela bufou e passou por mim me dando um encontrão,


abrindo a porta com tanta força que a maçaneta estalou.
— Egocêntrico! — disse, saindo e batendo a porta em
um estrondo.

Caralho, quem é que decora nome em um simples


sexo sem compromisso? Nunca mais vamos transar, não
tem necessidade alguma de entrar nessa intimidade toda.

Alisei a minha camisa e saí da sala de produtos que


agora fedia a sexo e suor.

Perambulei pelos corredores da clínica com um sorriso


mordaz no rosto. O branco ímpeto das paredes, piso e
lâmpadas não me incomodava como fazia com a maioria
das pessoas, pelo contrário, me causava uma estranha
sensação de conforto, como se eu me sentisse relaxado e
em paz.

Passei pelo balcão principal e lancei uma piscadela


para uma das atendentes, a nova contratação da clínica,
uma loira gostosa e com peitos grandes demais para
ficarem encobertos pelo tecido fino da camisa branca do
uniforme. Ela sorriu e um rubor bonito cobriu as maçãs do
rosto.

Eu não tinha uma regra, na verdade, minha única


regra era transar e não se apegar, não me importava se
fossem as funcionárias da clínica ou uma desconhecida
que encontrei em um bar. Na maioria das vezes, dava
chance para as novas residentes, já que não tinha muito
tempo para sair e me divertir e abraçava a diversão
quando ela vinha até mim.

Sexo sem compromisso e a medicina eram minhas


coisas favoritas na vida e nada superava isso.

Meus pais fundaram a clínica quando eram jovens,


juntamente com outro casal de amigos, depois de anos
focados apenas no trabalho e com o avanço da idade de
ambos e a baixa taxa hormonal da minha mãe. Eles me
programaram, sou um filho de fertilização in vitro. A
reprodução assistida foi um arraso e a gestação tranquila
e estável, assim; seis anos depois do meu nascimento,
minha irmã veio ao mundo através de uma gravidez
natural.

Empurrei a porta do meu escritório e entrei na sala


ampla e clara. Tinha uma mesa de costas para extensas
janelas de vidros, banheiro privativo com closet, uma
estante cobrindo toda a parede da direita com vários livros
famosos da medicina moderna, um bar atrás da minha
mesa e um sofá muito confortável ao lado da porta de
entrada. Seguindo o padrão do restante da clínica, era
tudo em tons claros.

Eu passava tempo demais no lugar, costumava chegar


cedo e ir embora muito tarde da noite, mas não me sentia
desconfortável por isso, amava o meu trabalho e dedicar
todo o meu tempo para ele era um prazer.

Joguei as chaves do meu carro na mesa e recolhi um


dos jalecos do cabideiro, vestindo-o por cima da camisa
social azul e calças de terno escuras.

Caminhei até o banheiro e analisei o meu reflexo no


espelho, meus cabelos loiros-escuros estavam um pouco
bagunçados, esfreguei os dedos entre as mechas,
puxando-as para trás.

Alguém pigarreou às minhas costas.

— Quem foi a vítima da vez? — perguntou Ben Reed,


meu melhor amigo e filho dos outros cofundadores da
clínica. Ele mantinha as mãos nos bolsos da frente do
jaleco, uma postura relaxada e um sorriso incisivo no
rosto. Com os cabelos castanhos, olhos da mesma
tonalidade e um porte atlético de quem mantinha uma
rotina saudável de exercícios físicos e alimentação
regrada, Ben arrancava suspiros pelos corredores, mas
não parecia se importar, embora fodesse mulheres tanto
quanto eu.

Desviei o meu olhar para o dele e dei de ombros.

— Sabe que os novos residentes estão para chegar na


semana que vem? — contra-argumentei, virando-me para
ele e me escorando contra a pia. — Essa é a melhor época
do ano, cara.
Todo ano, em junho, a clínica ficava responsável por
receber uma parcela dos novos residentes de medicina.
Com o renome que carregávamos, escolhíamos os alunos
com a maior pontuação em todas as matérias e ainda
oferecíamos um salário maior do que eles receberiam se
fossem para os hospitais locais, isso tornava o cargo
concorrido, e, consequentemente, muito almejado.

Ben ergueu os lábios em um sorriso, mas antes que


pudesse responder, uma voz feminina soou às suas
costas.

— Você é um cretino de carteirinha, Leon.

Meu melhor amigo deu um passo para o lado e liberou


a minha linha de visão. Atrás dele, minha irmã me
encarava com o cenho franzido e os braços cruzados em
desgosto.

Mas que bela manhã... parece que todas as mulheres


da clínica decidiram destilar ódio em minha direção.

— Nunca disse que não era — retruquei, esfregando o


meu maxilar.

Minha irmã caçula desamassava a blusa do uniforme


de residente, os cabelos castanho-claros estavam presos
em um rabo-de-cavalo e o rosto assumia um semblante
cansado e pesaroso, ela estava no último ano da
residência e não via a hora de terminar essa fase da sua
vida de uma vez por todas. Izabela tinha metas muito
diferentes das minhas, enquanto eu pensava em trabalhar
para elevar ainda mais o nome da clínica da família, ela só
queria ter a sua própria.

— Em algum momento você precisará crescer, Leon —


revidou com um esgar nos lábios volumosos. — Essa vida
depravada precisa terminar e você precisa assumir que
está envelhecendo, querido irmão.

Estalei a língua no céu da boca.

— E é justamente por este motivo que eu já tenho


tudo planejado.

Minha irmã trincou a mandíbula com tanta força que o


músculo estalou, ela odiava quando entrávamos nesse
contexto, discordava veemente da minha forma de pensar.

— Vamos ver até quando — disse, em tom de desafio.

Izabela sonhava com o dia em que se tornaria mãe,


crianças e grávidas eram sua coisa favorita no mundo. Eu
gostava de realizar os sonhos dos casais que tinham a
mesma vontade que a minha irmã, mas não estava dentro
dessa estimativa. Não pensava em ter filhos, mas sim,
herdeiros, e embora soasse parecido, eram contextos
diferentes. Filhos eram desejados, planejados e criados
para suprir a necessidade que os adultos tinham em querer
procriar e gerar uma continuação de si próprio, enquanto
herdeiros, ao meu ponto de vista, prestavam o papel de
dar continuidade aos negócios dos pais. Tinha congelado
meu esperma há alguns anos, em algum momento,
encontraria uma barriga de aluguel para gerar os meus
herdeiros. Eles estudariam nas melhores escolas e
receberiam a melhor educação, então quando chegasse a
hora de me aposentar, teria alguém para assumir o meu
lugar.

Eu não era traumatizado, por mais que parecesse.


Meus pais tinham sido incríveis, na medida do possível,
eles quiseram ter filhos e não herdeiros. Contudo, percebi
ao longo da minha infância maravilhosa que medicina e
família não combinavam, era impossível dar conta de duas
coisas que exigiam a mesma atenção e quantidade de
tempo. Assim, de tanto trabalhar, meu pai foi muito relapso
com a saúde e teve um infarto que ceifou sua vida cedo
demais. Minha mãe, com a perda súbita do marido,
abandonou a clínica e resolveu que iria viver, que
aproveitaria o restante da vida enquanto ainda tinha
tempo.

Essa reviravolta toda aconteceu quando eu estava me


formando.

Meu sonho era ser residente do meu pai, mas,


infelizmente, ele não teve tempo de arcar com um sonho
que era somente meu. Filhos tinham mania de colocar
grandes expectativas sobre os pais e, na maioria das
vezes, elas não eram supridas e isso causava uma
pequena desilusão.
Não queria que ninguém colocasse expectativas sobre
mim, por isso não prometia nada, tampouco tinha o intuito
de fornecer aos meus herdeiros.

Sem expectativas, sem frustrações. Meu lema de vida.

E para que não ocorresse erro algum, ou alguma


chance do meu caminho ser desviado e meus planos
recalculados, eu era vasectomizado.

Revirei os olhos e deixei o banheiro para trás.

— Vamos, minha adorável e irritante irmã, seu dia


será cheio e é seu último ano de residência — falei,
escorando meu braço por cima dos seus ombros pequenos.
— Tire seu tempo para estudar a ficha dos nossos
doadores e descobrir quem será o pai do meu futuro
sobrinho.

Izabela estava decidida a ser mãe e como não tinha


tempo para procurar um namorado, tinha resolvido que
faria isso sozinha, ser mãe solo e arcar sozinha com todas
as responsabilidades e necessidades que uma criança
precisava a assustava menos do que simplesmente não ser
mãe.

— Não preciso, já escolhi o meu doador e o pote de


esperma que pertence a mim está guardado e pronto para
ser usado — comentou, me empurrando para longe dela.

Abri a boca em confusão.


— Certo. E quando pretende se inseminar? —
indaguei.

Não compreendia esse desejo absurdo dela de


engravidar, Izabela só tinha trinta anos, era jovem e
poderia viver outras coisas bem mais interessantes do que
trocar fraldas.

— Dentro de seis meses — respondeu, passando uma


mão nos cabelos. — Quero terminar a residência estando
grávida, assim posso iniciar a nova e melhor fase da minha
vida.

Não contive um estremecimento ao imaginar essa


nova fase da vida da minha irmã. Ela notou e revirou os
olhos.

— Você é um hipócrita, Leon, o homem que mais


engravida mulheres no país é o mesmo que não deseja ter
filhos — zombou, sorrindo para quebrar o clima.

Era bem diferente e minha irmã sabia muito bem


disso, mexer com espermatozoides e inseminá-los no útero
de alguma mulher, me causava certa satisfação pessoal.
Gostava de ver como a vida se desenvolvia e me sentia
feliz em saber que minhas mãos eram responsáveis por
interferirem na anatomia humana e capazes de gerar
milhares de novas vidas. Era a progressão do mundo, algo
para se orgulhar e tornava as mulheres ainda mais
independentes.
Puxei as lapelas do meu jaleco e me preparei para
deixar o escritório, o dia seria cansativo e cheio de
trabalho para fazer. Iria para o laboratório que ficava no
último andar do prédio, enquanto Izabela passaria o dia
assistindo as inseminações e coletando exames
ginecológicos de mulheres.

— Para ser bem sincero, fico feliz com os seus planos,


significa que Elizabeth passará o resto dos meses
cuidando do neto e me deixará, finalmente, em paz.

Minha mãe não estava muito contente com o jeito que


eu levava a vida, ela dizia que eu estava seguindo os
mesmos passos do meu pai e isso não a agradava, já que
ele tinha morrido sem aproveitar nada. E era por este
motivo que passava todos os seus dias em viagens pelo
mundo, conhecendo cada canto, aproveitando tudo o que
cada cultura poderia lhe dar.

Izabela riu.

— E por mais que você possa assustar a criança um


pouco, tenho certeza de que será um ótimo tio.

Levantei um dedo em riste.

— O melhor de todos! — expressei, imaginando tudo


que eu ensinaria para ele ou ela.

Ben coçou a garganta.


— É claro que sim, a pobre da criança não terá outra
opção para comparar — debochou, fazendo Izabela se
juntar a ele na gargalhada alta e exagerada.

Bufei.

— Ao trabalho! — ordenei, crispando um dedo em


direção a porta.

Izabela bufou e revirou os olhos, desfazendo-se das


minhas ordens, mas se direcionando para a saída do meu
escritório. E Ben colocou as mãos nos bolsos da calça e
fingiu me ignorar.

Assim que atravessei a porta, encontrei Bridget


Sulivan no corredor. Ela andava de um lado para o outro e
parecia nervosa. A garota era uma jovem enfermeira que
havia começado a trabalhar na clínica há pouco mais de
dois meses. Bridget era responsável por manter a
temperatura estável do banco de espermatozoides, assim
como congelá-los e remover os escolhidos pelas nossas
pacientes para que pudessem ser utilizados.

— Leon... eu preciso falar com você — disse, vindo


em minha direção.

Nós transamos duas vezes, foi a única com quem


acabei repetindo a dose, ela era muito focada ao trabalho,
assim como eu, costumava ir embora tarde da noite.
Porém, como nem tudo era feito só de coisas boas, Bridget
desenvolveu uma certa obsessão por mim depois da nossa
segunda transa, ela se sentiu especial por saber que tinha
sido a única a conseguir tal feito.

— Sim, Bridget, algum problema com o trabalho? —


perguntei, mantendo uma postura altiva e profissional.

Ela vinha me causando alguns problemas, o último


deles foi quando entrou em uma discussão acirrada com
uma das recepcionistas na frente de alguns pacientes.
Bridget descobriu, de alguma forma, que Hanna e eu
transamos, então foi tirar satisfação com a garota. Eu só
não a demiti porque ela era realmente boa com o trabalho
que exercia, mas deixei claro que não aceitaria outra
situação como àquela.

Ela balançou a cabeça, os cabelos ruivos oscilaram no


ar com o movimento.

Bridget era muito bonita, talvez uma das funcionárias


mais lindas da clínica, cabelos ruivos, olhos verdes, pele
clara e com sardas que a deixavam ainda mais atraente.

— Quero falar com você sobre... — comprimiu os


lábios, corando levemente. — nós — acrescentou.

Deus!

Izabela fez um barulho de desdém com o fundo da


garganta, o que aumentou a vermelhidão nas bochechas
de Bridget.
Suspirei, pensando em como responderia sua
afirmação absurda sem magoá-la ainda mais.

— Bridget, não existe um nós e nem nunca existiu —


expressei, balançando a cabeça. — Somos adultos, nos
divertimos e agora vamos trabalhar e ser profissionais,
seguindo as nossas vidas.

— Podemos seguir juntos, nossa diversão foi boa o


suficiente para entendermos que pode ser levada adiante
— cortou, aproximando-se um passo.

Não era a primeira vez que eu enfrentava uma


situação como essa, mas ainda assim não deixava de me
chatear menos. Não me importava em dormir com as
minhas funcionárias porque sabia separar as coisas e
esperava que elas fizessem o mesmo e, na maioria das
vezes, dava muito certo.

— Não! — afirmei, erguendo o maxilar e engrossando


a voz. — Por favor, vá para a sua sala, o expediente já
começou e não toque mais neste assunto comigo.

Os olhos claros de Bridget brilharam com lágrimas não


derramadas e os lábios carnudos tremeram levemente.

— Leon... não faça isso conosco — implorou.

Ela ainda era muito jovem, conseguia entender o amor


que criou por uma situação que só existia na mente fértil e
romântica dela. Lamentava por isso, mas não havia nada
que eu pudesse fazer.

— Bridget, vá para a sua sala — refutei.

Izabela me lançou um olhar cheio de reprovação antes


de pousar uma mão no ombro da garota.

— Venha, eu também preciso ir para a minha sala, vou


te acompanhar — murmurou, assumindo um tom de voz
condescendente.

— Vá com ela Bridget, os pacientes estão chegando


— concluiu Ben, induzindo-a.

A garota ergueu a mão e passou a ponta do dedo no


canto dos olhos, limpando as lágrimas acumuladas.

— Você vai ser meu — declarou, encarando-me no


fundo dos olhos. — Não importa o que diga, Leon, vamos
ficar juntos.

Dito isso, ela virou as costas fazendo os cabelos


baterem em meu rosto e atravessou o corredor em passos
largos, afastando-se e deixando um rastro de perfume
doce e enjoativo para trás.

— Essa garota vai causar mais problemas —


comentou Ben.

Confirmei com um aceno de cabeça.


— Parece que sim.

Izabela deu um tapa em meu ombro.

— Mantenha o seu pau dentro das calças e pare de


ser tão canalha, isso já seria o suficiente para evitar esse
tipo de situação — acusou, seguindo em direção por onde
Bridget sumiu momentos antes, sem esperar uma resposta.

Como eu disse, eram situações raras, portanto, nada


me impediria de conhecer pessoalmente e intimamente as
novas residentes que chegariam na semana que vem.

Ben riu, tirando-me dos devaneios.

— Sei bem no que está pensando... residentes e


essas coisa — zombou.

— Longe de mim.

Girei nos calcanhares e fui em direção ao elevador,


me isolar no meu laboratório, minha atividade preferida,
nada melhor do que o silêncio.
Percorri os corredores da clínica observando tudo ao
redor, era um lugar muito bonito e aconchegante, diferente
de alguns hospitais que precisei visitar ao longo da
faculdade. O ar-condicionado gelado arrepiou a minha
pele, me fazendo estremecer.

As paredes de vidro davam vista para a rua, as


películas espelhadas proibiam que a mesma visão se
sucedesse na parte de fora e que a luz solar incomodasse,
repelindo os raios.

O cheiro de álcool com pinho era forte e agradável.

Parei em frente a um balcão de mogno branco e sorri


para a recepcionista.
— Olá, tenho uma consulta marcada — avisei,
recolhendo a identidade da minha bolsa transversal.

A jovem — uma loira muito simpática –, recolheu o


documento e digitou em seu computador, mexendo os
dedos em uma velocidade vertiginosa.

Uma pilha de folhas ao lado do balcão chamou a


minha atenção, estreitei os olhos naquela direção e dei um
passo para o lado. Era formulários de inscrição para novos
residentes.

— Quando será as contratações? — perguntei,


sentindo o meu coração acelerar.

Não estava nos meus planos fazer minha residência


em uma clínica de fertilização, mas era inevitável o fato de
que a Fertility era uma das melhores do ramo. O salário
era maravilhoso e o renome carregava um peso importante
no currículo acadêmico.

A loira ergueu os olhos para mim.

— Semana que vem — avisou, franzindo uma


sobrancelha. — Está atrasada.

— Mas não sem tempo? — atirei, sorrindo amarelo.

Ela balançou a cabeça e voltou a se concentrar no


computador.
Não tinha pensado em tentar uma vaga na clínica,
estava focando nos hospitais mais badalados da cidade,
queria fazer minha residência em pronto-atendimento, mas
com as cobranças da minha dívida universitária batendo
em minha porta, a Fertility me parecia uma boa
oportunidade, não era a área que eu queria, mas me
ajudaria a respirar, conseguiria pagar os boletos atrasados
e ainda teria dinheiro para me manter, enquanto não me
tornasse médica de uma vez por todas.

Sem pensar mais, recolhi a caneta do lado dos papéis


e comecei a preencher o formulário. Talvez fosse Deus me
dando um sinal, tinha ido até a clínica para uma consulta,
mas poderia sair com uma proposta de emprego, então...

Retirei meu histórico de dentro da bolsa e o grampeei


atrás da ficha. Carregava algumas cópias comigo para que
pudesse chegar nos hospitais e fazer a mesma coisa que
estava fazendo agora.

— Sua sala de consulta fica no quarto andar,


senhorita Bridget, a responsável pelo seu atendimento
será a doutora Izabela Dubrow, uma de nossas residentes
— avisou a balconista, entregando-me de volta a minha
identidade e o papel da consulta.

Ergui a ficha preenchida para ela, que a recolheu e


colocou em cima de uma pilha atrás do balcão.

— Obrigada — agradeci.
— Boa sorte com a vaga, senhorita Bridget. — Sorriu
amplamente. — O elevador fica à direita no corredor.

Caminhei para longe do balcão com a mente em um


turbilhão, ansiosa para descobrir a resposta quanto a
minha inscrição.

Mais cedo, preenchi o formulário de um dos hospitais


mais requisitados da cidade, embora a vaga fosse
benéfica, o salário e o status alcançado nem se comparava
ao da Fertility. Óbvio que se eu estivesse podendo
escolher alguma coisa, iria para o hospital, mas na minha
atual situação, o que me pagasse mais seria o mais bem-
vindo.

Entrei no elevador e aguardei, uma música baixa e


agradável soava enquanto os números dos andares
apareciam no painel digital.

As portas foram abertas, dando para outro corredor


largo, extenso e claro.

Verifiquei o número do consultório no papel e comecei


a passar pelas portas, até chegar na sala indicada. Duas
mulheres ocupavam algumas cadeiras, uma delas estava
muito grávida. Me sentei em um lugar vazio e esperei.

O lugar estava silencioso, era possível ouvir apenas o


barulho rítmico do pé da gestante que batia
constantemente no chão, parecendo nervosa com alguma
coisa.
— Vou descobrir o sexo do bebê hoje — disse ela,
depois de um momento de silêncio. — Estou muito
nervosa, é meu primeiro bebê, sempre quis ser mãe e só o
doutor Dubrow que conseguiu realizar esse sonho.

Abri um sorriso para ela.

— Parabéns pelo bebê — falei, apontando com o


queixo para a barriga protuberante.

— Tem algum palpite? — perguntou a outra mulher. —


Estou aqui para ver o resultado dos meus exames, antes
de ver qual o tratamento indicado para o meu caso,
também sonho em ser mãe e não vejo a hora de realizá-lo.

A grávida espalmou as mãos na barriga, acariciando-a


de leve.

— Não tenho nenhum palpite, e nem me importa, para


falar a verdade, eu quis tanto esse bebê... não importa o
que seja, ele já é muito amado. — Virou o rosto em direção
a outra. — Vai dar tudo certo, estava ansiosa como você
quando vim olhar os exames na minha segunda consulta.

As duas se viraram para mim.

— Também veio fazer exames para engravidar? —


perguntou a gestante.

Engoli em seco e arregalei os olhos, balançando a


cabeça veemente.
Um dia, em um futuro muito, repito, muito distante, eu
me tornaria mãe, mas crianças estavam no final da minha
longa lista de desejos.

— Exames ginecológicos de rotina, nada que


envolvam gravidez — respondi, mordendo as bochechas.

Um fato que tinha ficado óbvio para mim, além do


nome que a clínica carregava, a maioria dos pacientes
vinham para engravidar ou acompanhar a gestação, uma
parcela muito pequena — como eu — aproveitava os bons
médicos para os exames de rotina.

— É jovem ainda, terá muito tempo pela frente para


realizar esse sonho — comentou a não-grávida.

Me abstive em apenas acenar.

Não entraria nesse assunto agora, as chances de eu


engravidar eram raras, considerando que eu não transava
há pelo menos dois anos, não desde que Liam e eu nos
afastamos.

Liam era um estudante de medicina, fomos colegas na


faculdade por um tempo e então começamos a nos
relacionar, mas quando as coisas apertaram e tivemos que
escolher entre os estudos ou os encontros, terminamos o
que estávamos tendo, seja lá o que fosse, tudo
amigavelmente, claro. Ele entendeu que o meu foco era a
minha profissão, foi legal o que tivemos, mas não deixaria
nada atrapalhar os meus planos.
Virei a tela do celular para cima e verifiquei as horas,
ainda faltavam longos minutos para a minha consulta e eu
gostaria muito que o tempo fosse apressado, pois tinha
que ir em alguns hospitais para preencher os formulário de
admissão depois que saísse da clínica.

— A consulta de alguma de vocês será a próxima? —


perguntei.

A grávida balançou a cabeça.

— Tem duas na minha frente ainda, fiquei muito


ansiosa e cheguei cedo demais — confessou, encolhendo
os ombros.

— Pelo horário da minha, devo ser a última — disse a


outra, rindo. — Se você ficou ansiosa, imagine eu para
descobrir o resultado dos meus exames e como proceder
daqui para frente.

Fiz o cálculo mental de quanto tempo eu levaria para


ser chamada, se não fosse a carona que peguei com o
meu pai, teria passado em um dos hospitais antes de vir
para a clínica.

— Quantos anos você tem? — perguntou a grávida,


me fazendo erguer a cabeça para encará-la.

— Vinte e sete.
Antes que ela pudesse falar mais alguma coisa, uma
porta foi aberta em um estrondo, assustando a nós três. O
barulho ecoou pelo corredor, aumentando o som. Uma
jovem ruiva saiu da sala com o peito ofegante e o rosto
corado.

— Seu maldito! Vai se arrepender do que está fazendo


— gritou, apontando o dedo para alguém que estava
dentro da sala. — Eu não admito uma coisa dessas, nós
estamos destinados a ficar juntos.

Abri a boca em espanto, acompanhando de perto o


barraco que se sucedia em uma das clínicas mais
renomadas do país.

O elevador apitou e dois seguranças atravessaram o


corredor correndo. Eles se direcionaram até a mulher e a
agarraram gentilmente pelos braços, arrastando-a para
longe.

— Me larguem! Leon, você está ferrado, não sabe do


que eu sou capaz! — acusou, elevando ainda mais o tom
de voz. — Não sou mulher de uma só noite, seu
desgraçado! Como ousa me demitir? — crispou. — Eu
tenho uma consulta marcada, me soltem!

Os seguranças a arrastaram até o fim do corredor,


sumindo com a jovem de vista. Os gritos dela continuaram
entoando por mais alguns segundos, até que o silêncio
tomasse conta outra vez.
Uau.

Nunca esperaria algo assim vindo da Fertility, mas até


mesmo os ricos não estavam imunes a um bom e velho
escândalo.

Um homem deixou a mesma sala em que a mulher


estava. Ele parou no meio do corredor e balançou a
cabeça, como se estivesse desgostoso com a situação.
Levando as mãos as lapelas do jaleco, puxou-o para baixo,
desamassando o tecido e então correu uma mão pelos
cabelos loiros-escuros, alheio ao fato de que estava sendo
observado.

Ele virou a cabeça em nossa direção, como se


sentisse o peso do meu olhar nele, fixando os olhos
verdes-azulados em mim.

Lindo.

Encarei-o, analisando as feições bonitas e


harmônicas.

O rosto era perfeito, nariz fino, boca carnuda, rosada


e bem-desenhada, maxilar quadrado coberto por pequenos
fios claros e maçãs do rosto definidas.  

Abaixei meu olhar.

Os músculos definidos dos braços se acentuavam pelo


jaleco apertado, os ombros largos faziam com que o tecido
se alargasse, deixando-o solto no abdômen liso. E, mesmo
estando um pouco longe, parecia ser bem mais alto que
eu.

Parado no meio do corredor branco e reluzente,


parecia um anjo sedutor.

Mordi as bochechas e desviei os meus olhos,


constatando que fiquei tempo demais encarando-o.

Pela visão periférica, podia vê-lo ainda no mesmo


lugar, sem mexer um único músculo. Um rubor cobriu as
minhas bochechas, a vergonha de ter sido pega
admirando-o esquentou o meu rosto e fez meu coração
acelerar.

O homem riu, a risada rouca, masculina e


extraordinariamente sexy, reverberou, arrepiando os meus
pelos da nuca. Girei a cabeça em sua direção, encarando-
o outra vez. Ele curvou os lábios, manifestando uma fileira
de dentes brancos e alinhados, me lançando um sorriso
depravado e malicioso e arqueando uma sobrancelha loira.

Um cafajeste.

Não tinha uma vasta experiência amorosa,


considerando que o único amante que tive havia sido Liam,
mas não era totalmente leiga no assunto, conseguia farejar
e identificar um de longe.
A imagem da mulher me alvejou, percebi que ela
estava falando dele, que ela estava sofrendo por ele. E ele
nem se deu ao menos o trabalho de parecer triste por ela e
por todo o escândalo que fez por ter tido o coração
partido.

Fiz uma anotação mental de que deveria me manter


muito longe do indivíduo, caso eu fosse admitida para uma
das vagas de residente.

Homens como ele eram uma dor de cabeça que não


estava nos meus planos.

Ele era bonito? Com toda a certeza, mas não valia a


pena o estresse que me causaria.

Outra porta foi aberta.

— Bridget? — A voz feminina entoou através do torpor


em que eu me encontrava.

Pisquei, franzindo a testa, desvanecendo a minha


mente da inércia em que se encontrava. Ergui o olhar e
encontrei uma jovem de cabelos castanho-claros e olhos
escuros grandes e expressivos.

— Bridget? — repetiu o meu nome, encarando-me, a


pergunta explícita em seu tom de voz.

Sentia como se o médico cafajeste tivesse dissolvido


o meu cérebro nos poucos segundos em que eu mantive o
olhar dele.

Engoli em seco e acenei.

— Por favor, me acompanhe — disse. — Sou a


doutora Dubrow, estou aqui para auxiliá-la em todo o
procedimento.

Me levantei, meus músculos estavam rígidos e


concisos sob o peso do olhar do médico cafajeste.
Atravessei o corredor e entrei na sala sem olhar para o
lado. Voltei a respirar quando ouvi o baque da porta sendo
fechada às minhas costas.

— Bridget, preciso que vá até o banheiro anexo e


troque de roupa para que possamos começar os
procedimentos — orientou.

Deixei minha bolsa em cima da mesa dela e fui até o


local indicado. Removi as minhas roupas, vesti a camisola
branca que estava pendurada em um cabideiro e calcei as
pantufas fofas. Encarei o meu reflexo no espelho, os olhos
verdes demonstravam meu desafeto com a consulta. Puxei
meus cabelos para cima e os enrolei em um coque.

Preferia mil vezes ser a médica ao invés da paciente.

Voltei para a sala e encontrei a médica de costas para


mim, organizando alguma coisa em cima de uma mesa de
alumínio ao lado da cadeira. Não conseguia ver o que
estava fazendo, pois o corpo dificultava a minha visão,
mas parecia separar os equipamentos para o exame.

— Vamos começar — avisou, por sobre o ombro. —


Fique de frente para mim, por favor.

Ela se virou e parou em minha frente, os dedos


precisos tocaram em meus seios, apertando-os,
verificando a existência de algum caroço. Era um pouco
desconfortável, mas nada absurdo.

— Sente desconforto? — perguntou.

— Sim, estão doloridos — confirmei.

Ao terminar, ela sorriu para mim.

– As glândulas mamárias têm receptores hormonais.


Portanto, quando ocorre a produção de estrogênio as
mamas podem ficar mais doloridas — explicou. — Isso é
ótimo. Bridget, sente-se, já vamos começar o procedimento
— avisou, apontando com o queixo para a cadeira.

O consultório exalava o mesmo cheiro do restante da


clínica e o ar-condicionado parecia ainda mais potente
dentro da pequena sala, me fazendo estremecer de leve
por conta do frio. Me deitei na cadeira e encaixei minhas
pernas abertas no suporte.

Tinha feito o exame uma única vez, anos atrás,


quando perdi a minha virgindade e minha mãe achou que
era necessário verificar se eu era saudável e se estava
tudo bem comigo. Não lembrava muito de como era feito,
só de quão desconfortável era.

Encarei o teto, as luzes incandescentes irritavam os


meus olhos, mas era o ponto mais relaxante de toda a sala
e o único que conseguia me fazer espairecer.

— Prontinho, Bridget, tudo certo? — falou a doutora


Dubrow, sentando-se na cadeira e a arrastando até a
minha frente.

— Sim — respondi, somente.

Não era como se tivesse muita coisa pra me preparar,


era um exame chato e de rotina que toda a mulher
passaria algumas vezes na vida, simples assim.

Olhei para a doutora Dubrow, ela examinava a ampola


que estava ligava ao fino cateter, concentrada e totalmente
voltada para a sua tarefa.

Ela suspirou, cansada, e se inclinou para a frente,


depositando a cabeça no meio das minhas pernas. Corri os
olhos para cima outra vez, um rubor esquentou as minhas
bochechas.

Senti o momento em que ela inseriu o cateter na


minha vagina, era desconfortável, porém, indolor.
— Respire fundo, Bridget, já estou quase acabando —
murmurou.

Fiz como o orientado, inalando uma profunda lufada


de ar pelo nariz e soltando-a pela boca.

Ocupei a minha mente com as coisas que eu ainda


precisava fazer, minha formatura seria em dois dias, na
sexta-feira, e eu pretendia estar empregada na outra
semana, por isso era muito importante que conseguisse
terminar de preencher o formulário de todos os hospitais
que me interessavam em trabalhar.

Deveria ter deixado para o último minuto algo tão


importante? Não, mas essa era Bridget Adams, a garota
que só sabia agir sob pressão.

— Prontinho — expressou a médica, afastando a


cadeira e removendo as luvas de látex. — Procedimento
concluído com sucesso.

Senti a minha testa franzir.

— Só isso? — perguntei, removendo as pernas do


suporte e me sentando.

— Sim.

Maravilha!

Pulei para o chão e esfreguei a mão em meus cabelos,


ansiosa para ir embora de uma vez e seguir a minha vida.
— Recomendo que fique em repouso apenas hoje.

Com certeza isso não iria acontecer, ainda assim,


limitei-me a confirmar com um aceno de cabeça, antes de
sumir para dentro do banheiro outra vez.

Repouso por causa de uma porcaria de um exame?


Senti vontade de rir.

Dívidas batiam em minha porta, precisava conseguir


uma boa residência, repouso e exames ginecológicos
estavam no final das minhas prioridades do momento.
Não podia acreditar que eu tinha finalmente me
formado, depois de oito anos focada apenas em estudos e
notas boas, a faculdade, tinha, enfim, terminado.

Era uma sensação estranha e conflituosa, o êxtase de


saber que uma nova etapa se aproximava e que eu estava
mais perto do que nunca de ser uma médica completa,
duelando com a insegurança que insistia em me
atormentar.

Eu não ficaria mais atrás de uma classe anotando


informações e decorando referências que seriam
essenciais no futuro, havia chegado a hora de mostrar que
todas as horas vagas de sono valeram a pena, pois eu
colocaria em prática tudo o que aprendi e decorei nos
últimos anos.

Alisei a minha beca com a mão, esfregando os dedos


no tecido, orgulhosa por estar finalmente vestindo a roupa
clássica de formatura. O tassel em meu capelo fazia
cócegas no meu rosto, mas eu não poderia me importar
menos com isso, estava honrada demais ostentando
através dele a cor da medicina, do curso em que estava
me formando. E para finalizar, em meus ombros havia uma
faixa, mais conhecida como stole, que indicava que eu era
uma formanda com honras.

O sol estava forte no céu, como se estivesse dividindo


essa alegria comigo e não pude deixar de pensar em
Brandon e em como ele se sentiria orgulhoso por mim se
estivesse aqui.

Caminhei até o pavilhão sem conter o sorriso que


insistia em se espalhar pelo meu rosto. Não tinha amigos
para dividir a minha felicidade, sempre fui a isolada da
turma, a estudiosa que não se misturava com ninguém. E
não me arrependia disso, mas gostaria de ter ao menos
uma pessoa comigo agora.

Às vezes me pegava pensando se eu seria assim se


Brandon ainda estivesse vivo, ele era meu melhor amigo,
minha metade da laranja. Quando ele se foi, levando uma
parte minha com ele, eu me fechei para o mundo, sentia
que estaria substituindo-o se encontrasse alguém para
dividir os meus problemas, então dediquei meu tempo aos
livros, assim não me sentia sozinha e nem culpada.

Subi os degraus que levavam ao palco onde os alunos


receberiam os diplomas e espiei, procurando pelos meus
pais no meio da multidão. Depois de tanto procurar, avistei
a minha mãe sentada sozinha.

Comprimi os lábios e respirei fundo.

Não sei por que ainda me surpreendia de Mark não ter


vindo me prestigiar, era óbvio que ele não faria isso, ele
tão pouco se importava comigo.

Idiota de coração mole! Grunhi em pensamento.

Por que mesmo depois de tanto tempo a indiferença


dele ainda me doía? Não sei quando, e se é que algum
momento isso fosse mudar.

Meu celular apitou, um número desconhecido piscava


na tela. Atendi no segundo toque.

— Alô? — murmurei, pigarreando para limpar a


garganta.

— Bridget Adams? — A voz da mulher ela melodiosa


do outro lado da linha.

— Sim.
— Bridget, aqui é da Fertility Partners, estou ligando
para informá-la que a senhorita foi aceita em nosso
programa de residência.

Oh, meu Deus!

Levei minha mão à boca e dei uma mordida forte o


suficiente para sentir o gosto de cobre na língua. Queria
ter certeza de que não estava sonhando e evitar que um
grito agudo soasse pela minha garganta e me fizesse
passar vergonha.

— Senhorita Bridget, ainda está aí? — A voz dela


reverberou através do torpor em que eu me encontrava.

— Sim, sim, estou aqui. — Limpei a garganta.

— Certo, venha na segunda-feira e traga todos os


documentos que solicitarei por e-mail, por favor — instruiu,
podia ouvir o barulho das teclas enquanto digitava no
computador. — A clínica agradece seu interesse em fazer
sua residência conosco e será uma honra ter você em
nosso time.

— Obrigada — ciciei, mas ela já havia encerrado a


ligação.

Não podia acreditar que isso estava acontecendo,


agora sentia que a luz estava brilhando mesmo para mim.
Nem mesmo o fato do meu pai ter se ausentado na
formatura da única filha me incomodava mais.
Minha vida estava seguindo o rumo que eu tanto
almejava, cada passo que dei nos últimos anos, fossem
eles bons ou ruins, eram para que eu pudesse estar neste
exato momento comemorando a essas conquistas.

Fazia isso pela lembrança de Brandon, por mim e pelo


resquício que restou do que eu podia chamar de família
depois da morte dele.

Em três anos, estaria trabalhando em um hospital e


ajudando crianças a enfrentar a batalha contra o câncer,
faria das vidas delas o mais leve possível. E enfim,
cumpriria a minha meta de vida.

Caminhei saltitante até o canto em que os formandos


deveriam ficar e aguardei. Segui atrás dos meus colegas
quando o diretor chamou a nossa turma, as salvas de
palmas flutuaram pelo ar, entre gritos e assobios dos
parentes.

Eles começaram a citar nome por nome, convocando-


nos para buscar o diploma. E quando enfim chegou a
minha vez, não pude fazer nada além de sorrir e sentir o
peito inflado de tanta felicidade. Subi ao palco com as
pernas trêmulas e as mãos empapadas de suor. Os
músculos das minhas bochechas estavam rígidos,
cansados de tanto sorrir.

Fechei a mão em punho ao redor do canudo de


veludo, segurando-o, enquanto o mestre de cerimônia
discursava no microfone as minhas honras de formatura,
antes de me entregar o cords que indicava a homenagem
por isso.

Uma salva de palmas soou às minhas costas,


desconhecidos comemorando comigo, alegres pela minha
conquista. Podia ouvir meu nome sendo clamado através
da algazarra, minha mãe gritando festivamente o nome da
filha.

— Parabéns, Bridget, foi uma honra tê-la conosco


esses anos todos de curso — disse o professor, sorrindo
para mim.

— Obrigada.

Desci do palco segurando em minhas mãos a minha


maior conquista, o maior feito da minha vida, tão feliz que
nem mesmo a desfeita do meu pai com esse dia tão
importante poderia me abalar.

Entrei na clínica contendo a vontade absurda de sorrir


que eu sentia. Era meu primeiro dia de residência e eu me
sentia tão eufórica que nem mesmo consegui pegar no
sono durante a noite, minha mente parecia não estar
disposta a colaborar e descansar, todas as vezes que eu
fechava os olhos, lembrava que em poucas horas estaria
atuando em minha profissão.

Um grupo de estudantes aguardava no rol de entrada,


quando cheguei ao prédio reconheci alguns rostos da
faculdade, dentre eles, Liam.

Entreguei os papeis para a balconista loira. Ela


checou os documentos em seu sistema, pegou algumas
assinaturas e, enfim, me entregou o crachá de
identificação.

Minha mãe tinha feito um delicioso café da manhã


para comemorar mais essa conquista, e, pela graça de
Deus, Mark não estava presente, ele já tinha saído para o
trabalho, o que tornou as coisas mais leves. No sábado,
quando voltamos para casa após a formatura, ele e minha
mãe entraram em uma discussão assídua, ela não
conseguia aceitar o fato de que o marido não compareceu
na formatura da única filha, mas ele deu uma desculpa
esfarrapada de que o cano da pia de um dos clientes mais
antigos estourou e ele precisou ir socorrê-lo. Ruth não
gostou da resposta, ficou sem falar com ele, enquanto eu
nem liguei, ignorei-o, entretida demais na minha própria
felicidade para deixá-lo me abalar.

Me aproximei do grupo de residentes e removi o


celular do bolso, mexeria nas redes sociais para que não
precisasse socializar com ninguém.
— Ei, gata, não sabia que também viria para cá. —
Ouvi a voz de Liam ao meu lado esquerdo.

Bloqueei o aparelho e lancei a ele um olhar.

Liam era muito charmoso e bonito, cabelos castanho-


claros, olhos verdes, ombros largos, alto e com um sorriso
arrebatador. Ele também era um homem muito esforçado e
tinha certeza de que um dia seria um bom médico.
Infelizmente, nossos planos eram diferentes como um
casal, mas poderíamos ser bons amigos.

— Para falar a verdade, nem eu sabia, mas fui


chamada e é uma boa oportunidade, então... — respondi,
encolhendo os ombros.

Liam tinha noção do quanto eu gostaria de ir para o


hospital oncológico, ele sabia algumas partes bem rasas
sobre a minha vida. Acontece que, infelizmente, o hospital
não pagava tão bem quanto a clínica. E com as minhas
dívidas, não arrecadaria dinheiro o suficiente para ir
abatendo-as.

— Mas a clínica de fertilização? — murmurou com a


testa franzida.

Ele fazia parte da parcela que não sabia a verdade


sobre o meu status financeiro, ou seja, todos. Exceto, é
claro, eu, faculdade e o Banco.
— Eles só contratam os melhores médicos do país,
Liam, não ache tão absurdo que eu tenha vindo parar aqui,
sabe sobre as minhas ambições — retruquei, estalando a
língua no céu da boca.

Não era bem uma mentira, tinha certeza que não


estaria dentre o pequeno grupo de residentes selecionados
se não tivesse me formado com honras. Mas também, se
não fossem as dívidas, jamais teria vindo parar em uma
clínica de fertilização, longe da minha verdadeira meta,
mesmo que o hospital não fosse tão renomado, me
colocaria no caminho que eu desejava.

— Por este lado... — comentou, pendendo a cabeça.


— Fico feliz que também tenha sido selecionada, Bri, é
bom ter alguém conhecido para dividir as experiências.

Sorri para ele.

— Está animado para qual parte? — perguntei,


pensando na minha pergunta.

Liam ponderou por um momento.

— Acho que quero fazer um parto... — revelou,


pensativo. — Sempre quis ver como é o primeiro instante
de vida. E você?

A imagem de Brandon alvejou a minha mente, dos


seus últimos instantes de vida, em como os sorrisos se
transformaram em medo e horror.
— Quero aprender o máximo possível, mas não quero
ver o primeiro instante de vida de uma pessoa, quero estar
presente no seu último, quero ser o apoio necessário que
precisam para dar o último suspiro.

Liam bateu com o ombro de leve no meu.

— Metas diferentes, mas não menos bonitas.

— Sim — concordei, suspirando.

Alguém pigarreou às nossas costas fazendo com que


Liam e eu pausássemos a nossa conversa e nos
virássemos. Dois homens nos aguardavam, dentre eles, o
médico que eu vi no dia da minha consulta na semana
passada.

Encarei-o, deslizando os olhos pelo corpo alto e


musculoso. Ele vestia o jaleco por cima da roupa social, os
cabelos loiros-escuros estavam impecavelmente
escovados para trás e um sorriso lustroso franzia os lábios
para cima. Ao lado dele havia um homem tão bonito
quanto, cabelos e olhos escuros, poucos centímetros mais
baixo e as feições sérias, menos amistosas do que o
amigo esbanjava.

— Bom dia a todos! — cumprimentou o médico gato.


— Sou o doutor Leon Dubrow, sou o diretor da clínica —
avisou, apontando a mão para o lado. — Este é o doutor
Ben Reed, o vice-diretor.
O nome de Leon titubeou pela minha mente, como se
eu já tivesse conhecimento dele, mas não conseguia
lembrar de onde.

— Viemos recepcioná-los e avisar que estamos


honrados por terem escolhido a Fertility para cursarem a
residência de vocês — disse Ben. — Vocês serão
conduzidos através da clínica para que possam se habituar
com as salas e o local e então cada um será induzido a
uma tarefa específica.

Ouvi alguns bufos e cochichos ao redor de alguns


estudantes que não ficaram contentes com a informação
do médico.

Já estava esperando por isso, no fundo, sabia que a


clínica não colocaria residentes em seus primeiros dias
para exercer tarefas importantes, um erro nosso poderia
causar grande prejuízo para a clínica.

— E quando vamos passar a exercer tarefas de


verdade? — questionou alguém.

Leon ergueu os lábios em um sorriso zombeteiro e


arqueou uma sobrancelha.

— O que quer dizer com “tarefas de verdade”? —


questionou.

— Inseminação, fertilização... parto..., algo que seja


realmente relevante — respondeu o residente.
Leon deu um passo para a frente, os olhos faiscavam
em uma ameaça silenciosa.

— Quando eu ou o doutor Ben acharmos pertinente,


enquanto não estiverem prontos, farão o que for ordenado,
caso estejam descontentes, sintam-se à vontade para
concluir a residência em outro lugar — refutou, cada
palavra soando mais trincada que a anterior. — A Fertility
é uma renomada clínica e faremos de tudo para que
permaneça assim, qualquer erro pode ser a nossa ruína ou
a de um paciente. Somos idealizadores de sonhos de
muitas famílias, as pessoas vêm até nós porque confiam
em nosso trabalho, portanto, se quiserem fazer parte das
equipes principais, sugiro que deem o seu melhor.

Leon não sabia, mas tinha acabado de acrescentar


uma nova meta em minha lista. Se para entrar nas equipes
principais precisava dar o melhor, então eu faria
exatamente isso.

Ergui o meu olhar e encontrei Leon me encarando tão


profundamente que precisei prender a respiração para não
suspirar audivelmente. Ele pendia a cabeça para o lado,
enquanto os olhos, fixos em mim, me analisavam com
minúcia.

Leon exalava um poder puro e absoluto de sedução


sem nem mesmo precisar fazer esforços, como se fizesse
parte de quem ele era.
Meu interesse amoroso era muito vago, Liam e eu
transamos porque fizemos um trabalho em dupla que, por
consequência, acabou nos aproximando e fazendo com
que as coisas rolassem de forma espontânea e natural.
Mas com Leon era diferente de tudo o que eu já tinha
sentido, desde que o vi pela primeira vez, fazia coisas com
meu corpo que eu nem sabia que eram possíveis.

Estudei o corpo humano isoladamente, aprendendo


sobre cada camada de pele, músculos, órgãos, veias e
ossos, mas o que eu sentia diante do olhar do médico
parecia tão diferente de tudo o que eu aprendi, não
conseguia identificar o que ele me fazia sentir, como se
cada célula do meu corpo se tornasse uma só.

Era estranho e me confundia de um jeito absurdo.

Desviei o olhar para o piso branco de cerâmica,


incomodada demais com tudo o que ele me causava.

— Acompanhe-nos, vamos mostrar a clínica para


vocês e então delegar as tarefas — disse Leon.

Passos ecoaram ao meu redor e forcei minhas pernas


a acompanharem os meus colegas residentes. Liam não
saiu do meu lado nem por um momento enquanto eles nos
apresentavam os funcionários da clínica e nos mostravam
as principais salas.

Os andares eram divididos por repartições, os dois


últimos eram responsáveis pelo armazenamento de
esperma, assim como o estudo e separação dos melhores
óvulos e espermatozoides; embaixo, ficavam os
laboratórios de coleta de sangue, berçários e salas de
parto; e, mais abaixo, os consultórios tanto para consultas
ginecológicas quanto para as obstétricas. A clínica já
deixava transparente em sua organização o motivo do seu
renome, cada funcionário e ala tinha tarefas exclusivas
incumbidas para si, assim, evitava transtornos
desnecessários ou erros.

Uma secretária se aproximou e entregou para Leon


uma prancheta. Ele vagou os olhos pelo papel e limpou a
garganta.

— Tenho aqui o nome e a ficha de cada um de vocês,


vou começar a citar um por um e indicando o local em que
começarão a residência — avisou, erguendo a folha para
olhar o final da lista. — Também já adianto que em breve
faremos uma lista dos plantões, embora seja uma clínica
de fertilização, a maioria das nossas pacientes optam pelo
parto na Fertility e nem sempre o bebê vem ao mundo no
dia e horário marcado. Aqui, vocês irão aprender
levemente o que é passar vinte e quatro horas de plantão
para que, no futuro, se quiserem ir trabalhar em hospitais,
estejam preparados. Bom..., vamos começar! Andrew
Davis, banco de esperma; Adam Miller, berçários... —
anunciou, chamando o nome de cada residente e indicando
o local de trabalho.
Parecia estranho, mas eu estava muito animada para
enfrentar um plantão, talvez essa animação se dissipasse
após o primeiro, mas até isso acontecer, queria estar no
topo da lista dos escolhidos.

A equipe começou a se dispersar e o número de


residentes a diminuir no corredor, conforme cada nome
chamado ia para a sua respectiva sala.

— Bridget Adams — chamou Leon, ergui a cabeça e o


encarei, ignorando o sorriso sacana que permeava em seu
rosto. — Coleta de sangue.– Coleta de sangue.

Concordei com um leve aceno de cabeça e lancei um


olhar na direção de Liam antes de me afastar. Coletar
sangue era uma das minhas tarefas favoritas na faculdade,
ficaria feliz em desenvolvê-la por um tempo na residência,
era tão fácil para mim quanto respirar.

Até então, estava tudo indo conforme eu tinha


planejado, a vida seguindo o rumo que eu escrevi para
mim.
Soltei um suspiro quando terminei de falar o último
nome da longa lista dos novos residentes. Esse grupo era
diferente do último que entrou, eles estavam ávidos por
experiência, animados e exasperados para aprender tudo o
que podiam e enfim se tornarem médicos por completo.

— O que achou? — perguntou Ben, apontando com o


queixo para o elevador onde os últimos residentes
entraram momentos antes.

Nós passamos o último final de semana analisando


ficha por ficha de cada um que preencheu os nossos
formulários, escolhendo apenas os melhores para fazer
parte das nossas equipes. Depois disso, pegamos os que
mais se destacavam dentre eles para realocá-los na
clínica. E, ao final da residência, quem tivesse interesse
em continuar trabalhando na clínica preenchia um novo
formulário para admissão.

— Acho que até o final do ano teremos apenas metade


do grupo conosco — revelei, entregando a prancheta para
uma das assistentes.

Nem todos conseguiam acompanhar o ritmo alucinante


da clínica, eles queriam colocar em prática tudo o que
aprenderam, eram jovens e imaturos. Eu entendia eles,
mas acontece que tudo na vida levava tempo, até mesmo
se tornar um especialista ou um bom médico. Eles
deveriam começar pelas atividades mais básicas, até
evoluírem para as mais complexas. Os que tinham
paciência, aguardavam e saíam daqui com empregos
definidos e uma carreira brilhante, já os impacientes...
tornavam-se apenas mais médicos de pronto-socorro,
salvavam vidas, mas não tinham destaque algum em um
corredor no meio de tantos jalecos brancos.

Ben fez um barulho com o fundo da garganta.

— Concordo, mas acredito que não levará todo este


tempo, tenho certeza de que a metade vai sair antes
mesmo do final do ano — bufou, afastando-se, os sapatos
lustrados fazendo barulho conforme caminhava. — Jovens
ansiosos, nosso pior pesadelo — zombou.
Era cada vez mais difícil encontrar mentes brilhantes
no meio de um grupo de residentes. Eles andavam
ansiosos demais, querendo pular as etapas que um
renomado médico precisava enfrentar.

— Então, eu vi o jeito como olhou para uma das


residentes... — comentou Ben, enquanto eu atravessava o
corredor com ele em passos sincronizados.

Abri um sorriso incisivo.

— Não sei do que está falando... — brinquei, piscando


um olho.

A garota já tinha chamado a minha atenção muito


antes de virar residente da clínica, quando estava
aguardando uma consulta com Izabela dias antes. Me senti
atraído assim que pousei os olhos nela e consegui
identificar perfeitamente bem que ela sentia o mesmo que
eu.

Bridget.

Passei uma mão nos cabelos engolindo uma risada


estrangulada.

Esse nome parecia me perseguir, no mesmo dia em


que a conheci, expulsei outra Bridget da minha vida.
Infelizmente, não consegui manter a enfermeira conosco, a
obsessão dela por mim começou a atrapalhar não só o seu
trabalho na clínica, como o de outros. Naquele mesmo dia,
soube que ela quebrou algumas análises do laboratório
após descobrir que eu transei com uma das novas
secretárias.

— Leon, não nos envolva em mais problemas, por


favor — murmurou, lembrando do mesmo fato que eu.

Revirei os olhos.

— O incidente com Bridget foi o único em anos,


felizmente, a maioria das mulheres sabe separar as coisas
como eu sei.

— Só... — Baixou o tom de voz. — Deixe o pau dentro


das calças por um tempo, as pessoas comentam, Leon, e
desde o escândalo com Bridget o seu nome não sai da
boca do povo.

Isso era... inadmissível! Eu não tinha culpa nenhuma,


nunca prometi nada a nenhuma das mulheres com quem
eu fodi, era apenas sexo e ponto. Todas as mulheres da
clínica sabiam como eu era, elas dormiam comigo porque
queriam, porque estavam buscando alívio rápido e sem
compromisso. Não havia nada para falar sobre o meu jeito
ou de como eu levava a vida, não havia mérito sobre isso
para entrar.

— Então faça-os parar de falar, somos todos adultos e


sabemos muito bem como separar as coisas, não quero os
meus funcionários falando de mim, assim como não admito
que me acusem de algo em que sou inocente — retruquei
com um esgar nos lábios.

— Não posso controlar o que eles falam, mas posso


orientá-lo como o seu melhor amigo que se comporte por
um tempo — disse, parando no meio do corredor e
virando-se para mim. — Se não se importa com a sua
fama, ao menos faça isso pela clínica, nenhum homem vai
querer trazer a esposa para ser inseminada ou fertilizada
em um ambiente de promiscuidade.

Mordi as bochechas para evitar um sorriso.

Promiscuidade? Deus, talvez Izabela tivesse mesmo


razão, Ben e eu estávamos ficando velhos.

— Mantenha a boca deles fechada e deixe que eu


cuide das residentes — refutei, acrescentando-o para calá-
lo quando o vi abrir a boca para contestar. — Vá enfiar seu
pau em alguma coisa, Ben, está tenso demais e estresse
causa cabelos brancos, assim como falta de sexo causa
estresse. — Ele me lançou um olhar fulminante. — Vou
cuidar dos bebês espermatozoides, até mais.

Adorava passar o dia no laboratório analisando os


melhores espermatozoides e separando-os para o banco
de esperma, assim como averiguar os óvulos mais
saudáveis para serem fecundados das nossas pacientes.
Deixava para Ben a administração da clínica e para
Izabela a responsabilidade da fertilização.
Era um médico especialista em obstetrícia e
reprodução humana assistida e amava a minha profissão.

— Porra, Leon, você é um desgraçado — sibilou às


minhas costas, me arrancando uma risada rouca que
reverberou pelo corredor vazio.

Eu só era um homem que gostava de aproveitar a vida


ao máximo e era muito bom no que fazia, ou seja, um
ótimo médico e uma máquina de sexo. Dane-se o que
diziam sobre mim, se fossem coisas boas... era tudo
verdade.

E como gostava de metas e desafios, colocaria como


uma delas levar Bridget para a cama, a nova residente da
clínica. Queria ver como os olhos verdes profundos
ficavam turvos enquanto gozava descompensadamente.
Sorri para a mulher que estendeu o braço em minha
direção, ela parecia nervosa.

— Medo de agulhas? — perguntei, apertando sua


circulação sanguínea com a borracha.

Ela balançou a cabeça.

— Não gosto muito de sangue, mas resolvi ser mãe,


então precisarei me acostumar com a ideia pelos próximos
meses — revelou.

Analisei a pele, ela tinha boas veias para a retirada de


sangue, fortes e grossas, seria fácil para mim e para ela o
exame.

— Não se preocupe, não vai doer nada, se quiser virar


o rosto... — murmurei.

Segurei a seringa e esperei que respirasse fundo


antes de espetá-la em seu braço e sugar o sangue do
corpo, enchendo o tubinho. Não levou mais do que vinte
segundos para o exame acabar.

— Prontinho — Apertei a veia para a cicatrização e


coloquei um adesivo, puxando a borracha e liberando a
circulação –, viu como é fácil? Nada com o que precise se
preocupar.

Ela abriu um enorme sorriso em minha direção.

— Obrigada doutora, espero agora que os resultados


sejam tão positivos quanto o exame ocorreu — brincou.

Ouvi-la me chamar de doutora causou uma estranha


sensação de reconhecimento na boca do meu estômago,
foi a primeira vez que isso aconteceu, ela foi a minha
primeira paciente como residente.

— Tenho certeza de que tudo ocorrerá como o


planejado — ciciei, ainda em êxtase pelo reconhecimento
que tanto desejei.

Ela baixou a manga da blusa e se levantou, lançando-


me um último sorriso antes de deixar a pequena sala de
coleta de sangue.

Era meu segundo dia na clínica e meu primeiro


coletando o sangue das pacientes. Ontem, eles apenas me
informaram como eu deveria proceder em cada caso e me
ensinaram o lugar onde cada coisa essencial ficava.
Normalmente, o sangue era coletado para verificar se a
fecundação havia ocorrido com sucesso ou para verificar a
saúde da paciente antes do procedimento, assim como os
exames de rotina e hemograma completo, também, em
casos mais isolados, para descobrir o sexo do bebê.
Coloquei o tubinho com o sangue dela no lugar certo e
me preparei para aguardar a próxima paciente. Estava
concentrada demais anotando o nome em um papel
quando ouvi a porta ser aberta.

— Doutora Adams — a voz do homem entoou pelo


cômodo. Era alta, grave e autoritária. E fez com que os
cabelos da minha nuca se arrepiassem. Girei em direção a
ela em uma velocidade vertiginosa.

— Sim? — pigarreei, piscando para conter a tontura


que me abateu por me mexer tão rápido.

Leon Dubrow me encarava, a postura altiva e as mãos


nos bolsos do jaleco. Hoje, diferente das últimas vezes em
que eu lhe vi, ele usava óculos de grau redondos que
acentuavam ainda mais as maçãs do rosto, deixando-o
incrivelmente mais sexy.

— Então, como está se saindo no seu primeiro dia? —


perguntou, analisando a sala com um olhar minucioso,
verificando se estava tudo em ordem como deveria estar.

Engoli para molhar a garganta que ficou


iminentemente seca.

— Tudo ocorrendo muito bem, obrigada pela


oportunidade — explanei, pousando os braços ao lado do
corpo para esconder as mãos trêmulas.
Ele deu um passo para a frente, aproximando-se. O
cheiro da colônia dele flutuou pelo ar. Inflei as narinas,
inspirando-o. Era amadeirado com um toque cítrico, tão
bom que eu poderia senti-lo o dia inteiro.

— Faça o seu melhor e mais oportunidades serão


abertas para você, Bridget, este é o nosso lema — falou,
me fazendo piscar e desvanecer a mente. — Eu vi a sua
ficha, doutora, é realmente incrível, uma mulher muito
inteligente e estudiosa, acredito que terá um futuro
brilhante pela frente se for tão esforçada na residência
quanto foi ao longo do curso.

Eu não sabia bem o que responder, havia um toque de


arrogância em seu tom de voz, como se estivesse me
testando de alguma forma. Não me admirava que ele fosse
um homem prepotente, descobri ontem à noite enquanto
pesquisava sobre ele na internet que o homem era um
fenômeno no que fazia, muito renomado e conceituado.

— Obrigada — falei, somente.

Ele se aproximou um pouco mais.

— Se precisar de mim para qualquer coisa, fique livre


para me procurar... — calou-se, ponderando — gosto de
ser bem receptivo com os meus residentes.

Eu pisquei, atônita.
Ele estava dando em cima de mim? Talvez eu
estivesse errada, já que não era nada experiente no jogo
de sedução, mas... era isso que estava parecendo, pelo
menos.

— Obrigada — repeti, prendendo a respiração.

Leon deixou uma risada escapar por entre os lábios


rosados, sedutores e muito beijáveis.

— Não é uma mulher de muitas palavras — comentou,


retoricamente.

Oh, Deus, ele estava mesmo tentando me seduzir?

Que ele era lindo era algo inquestionável, mas o


homem não valia a água que bebia e isso também não
estava em questionamento. Ficava óbvio como era
galanteador e muito cafajeste desde a primeira vez que eu
o vi na clínica.

Não passei toda a minha vida abdicando de tudo para


me tornar médica para ceder justamente agora. Leon me
fazia sentir coisas estranhas e desconhecidas, mas ele
ainda não valia o tempo que perdi estudando e me
dedicando a medicina.

Além do mais, ele era dono da clínica, as coisas


poderiam ficar estranhas, e, considerando a cena da
mulher que eu vi saindo da sala dele dias antes, poderia
arrumar rivalidade feminina, o que com toda a certeza do
mundo não queria.

Esfreguei as mãos suadas no uniforme.

— Precisa de mais alguma coisa, doutor Dubrow? Se


não me engano, tenho uma paciente me aguardando para
a coleta de sangue — falei, a voz esganiçada.

Talvez, em um futuro distante, quando eu finalmente


fosse médica e terminasse a residência, nos esbarremos
por aí em algum lugar e eu possa ceder as suas
investidas. Mas isso não seria agora ou tão cedo.

Um vinco se aprofundou na testa de Leon e ele


semicerrou os olhos, como se não estivesse acreditando
que eu havia acabado de romper suas investidas.

— É casada? — perguntou.

Arqueei as sobrancelhas.

— Não.

— Gosta de mulheres?

Espera! Ele estava... ofendido por que eu não tinha


demonstrado o mesmo interesse que ele?

— Não.

Ele abriu a boca e me lançou um olhar enviesado.


— E não está interessada em mim? — questionou,
apontando um dedo em riste para o próprio peito.

Minhas suspeitas foram respondidas, ele era mesmo


um homem egocêntrico demais para aceitar que alguém
não se interessasse por ele. Óbvio que me sentia atraída,
mas ele jamais saberia disso, não quando demonstrava ser
um poço sem fundo de amor-próprio.

— Não — menti, dando de ombros.

Leon arregalou tanto os olhos que eu precisei morder


as bochechas para conter uma risada. Ele não parecia
ofendido, ele estava, de fato, ofendido com a minha
desfeita.

— Incomum... — comentou, pensativo.

Pelo visto, o médico renomado e especialista no ramo


de reprodução humana assistida e obstetrícia não tinha o
costume de ser rejeitado, tampouco ter algo do seu
interesse negado.

— Posso chamar a minha paciente? — insisti,


cruzando os braços em frente ao corpo.

Leon ainda parecia absorto demais com a minha


recusa, levando segundos para compreender o que eu
havia dito. Ele piscou e então deu um passo para trás,
após outro e outro, afastando-se.
— Claro, doutora Adams — pigarreou.

O médico arrogante girou nos calcanhares e saiu da


sala em um piscar de olhos, como se estivesse fugindo de
mim. Diferente de como entrou, a compostura altiva cedeu
lugar para um homem desalinhado.

Eu riria, se não estivesse prestes a coletar mais


sangue.

Este era o meu trabalho, meu primeiro dia colocando


em prática tudo o que eu aprendi, e por mais que me
sentisse relevante com o iminente interesse dele em mim,
não deixaria que me desviasse do meu caminho.

Leon Dubrow era um cafajeste assumido e eu não


entraria para a sua lista de conquistas.
Entrei no escritório de Ben sem me importar em bater
na porta e pedir autorização. Ele estava sentado em sua
mesa de mogno branco, a cabeça abaixada, concentrado
em papéis que se espalhavam ao longo da superfície.

— Você não tem ideia do que acabou de acontecer…


— murmurei, andando de um lado para o outro.

Ben ergueu a cabeça para mim e removeu os óculos


de grau do rosto, esfregando a ponta do nariz com os
dedos.

— Um desastre, possivelmente, pelo jeito ávido com o


qual entrou aqui.

Confirmei com um aceno de cabeça.

— Eu fui rejeitado! — revelei, arregalando os olhos.

Ainda não podia acreditar nisso, era bem incomum


que ocorresse. Para falar a verdade, a última vez tinha
sido na adolescência quando eu era um nerd que só sabia
lidar com livros, não com mulheres.

Ben tossiu para encobrir uma risada.


— Nossa, isso é… caótico — comentou, e havia uma
pitada de zombaria em seu tom de voz.

Ergui os braços para cima, exasperado.

— Eu não disse? — Levantei os dedos, contando os


pontos que não faziam sentido nesta equação. — Ela não
é casada e é heterossexual, ainda assim, disse que não
tinha interesse em mim.

Uma risada estrondosa atravessou o escritório do meu


melhor amigo, Ben se curvou em cima da mesa, lágrimas
escorriam pelos cantos dos olhos e um rubor subia pelo
seu pescoço.

— Não estou entendendo o que tem tanta graça… —


crispei, entredentes.

Não era engraçado, era estranho, incomum e…


ofensivo.

Tudo bem que nem todo mundo demonstrava interesse


por mim, mas todas as mulheres por quem eu me
interessei e dei uma investida nos últimos anos,
corresponderam.

E o pior de tudo era que Bridget parecia mesmo


desinteressada de verdade, não como se estivesse
fingindo o desinteresse dela.

— Quem é a garota? — perguntou Ben, ofegante.


— Bridget, a nova residente.

Ele arrumou a postura imediatamente, o semblante


transformando a diversão em uma carranca de
desaprovação.

— Não acredito que você já foi atrás da garota.

Franzi a testa.

— É claro que eu fui, eu disse que estava interessado


nela.

— E ela renegou você…

— Exatamente.

Ele suspirou.

— Deixe a garota em paz, Leon, ela está aqui para


trabalhar, não a importune.

Ben me ofendia dizendo tais coisas, eu jamais faria


isso com ela ou com qualquer outra mulher. Demonstrava
meu interesse por elas, sempre era correspondido, então
transávamos e cada um seguia a vida.

Este caso em específico era incomum, me deixava


abismado e muito cismado, mas eu jamais colocaria
Bridget em uma situação desconfortável por conta disso.
Não era do meu feitio e eu repudiava tal atitude.
— Em nenhum momento eu disse que não a deixaria
em paz, só vim conversar com você sobre como eu fui
rejeitado pela primeira vez em anos — retruquei, franzindo
os lábios.

O desgraçado riu.

— Essa garota parece mesmo incrível — zombou.

Não adiantava falar com Ben, ele não levaria os meus


problemas de autoestima a sério. Ele nem estava fodendo
ninguém que eu soubesse nos últimos meses. Talvez
estivesse, enfim, se aposentando da vida depravada.

— Desde quando você virou um velho patético? Perdi


meu melhor amigo e nem percebi…

— Desde que eu percebi que a vida estava passando


e estava chegando a hora de me estabilizar, criar um
vínculo, uma família.

Abri a boca em confusão.

— Vai se casar?

Ele concordou com um aceno.

— Pretendo, Leon. Quero uma esposa para dividir a


minha vida, que me faça companhia na velhice, que me dê
filhos que trarão alegria para dentro da minha casa —
revelou em um suspiro. – A vida está passando rápido
demais, meu amigo, nós já estamos com trinta e oito anos.
Não quero mais chegar em minha casa após um
expediente exaustivo e ter que lidar com o silêncio
opressor da solidão.

Discordava veemente, mas não falaria nada, se esse


era o desejo dele, que fizesse como bem entendesse.

Um dia, a esposa dele poderia morrer iminentemente e


estraçalhar o coração dele de diversas formas, esmagando
todos os seus sonhos. Mas isso era o que eu pensava,
assim como tinha certeza de que seria sempre feliz
enquanto estivesse sozinho, sem ninguém para me
preocupar.

— Bom, desejo-lhe sorte e espero ser o padrinho do


casamento — expressei, por fim.

— Jamais deixaria o meu melhor amigo de fora dessa


jornada — Piscou um olho.

Jornada? Isso me soava mais como a marcha para o


abate do que uma simples trajetória de diversão.

Tentei disfarçar, mas pelos contornos de diversão ao


redor dos olhos de Ben, sabia que tinha falhado
miseravelmente nisso, ele me conhecia melhor do que
ninguém.

Ele não disse mais nada e muito menos eu.


Me afastei em direção à porta, voltaria para o meu
laboratório e dedicaria o meu tempo em minhas pesquisas,
assim ocuparia a minha mente da rejeição de Bridget e da
crise existencial de Ben.

Porra, meu melhor amigo pronto para casar e ser pai?


Isso era um completo desastre.
Fazia duas semanas que eu tinha começado minha
residência na clínica de fertilização. Descobri durante
esses dias que eles eram muito rigorosos com o horário e
organização, gostavam que tudo beirasse à perfeição ou
chegasse perto disso.

Eu estava gostando de trabalhar no local, ainda não


era animador ou emocionante como deveria ser nos
hospitais. Era um trabalho relativamente tranquilo e que
estava me ensinando muito sobre reprodução humana
assistida.

As cartas continuavam chegando; mas para a minha


sorte, eu sempre estava em casa quando isso acontecia,
então conseguia disfarçar muito bem e fingir que não era
nada relevante.

Entrei na minha sala e soltei um suspiro pesado.

Estava dando o meu melhor durante as coletas de


sangue, a maioria dos pacientes eram tranquilos, mas
tinha a minoria que eu precisava passar tranquilidade para
que conseguisse fazer a retirada sem mais problemas.

Coloquei as luvas de látex e folheei as fichas das


pacientes do dia. Hoje teria dez coletas para exame de
gravidez; cinco para exames de praxe antes de começar o
tratamento e dois para descobrir o sexo do bebê. Nada
trabalhoso ou cansativo, exceto que era meu primeiro
plantão.

Depois que terminasse minhas coletas, iria para a


maternidade onde deveria permanecer até o final da noite,
ajudando as enfermeiras e as médicas responsáveis, e, em
caso de um parto de emergência, poderia auxiliar.

Não desejava o mal de nenhuma mãe ou bebê, mas


gostaria tanto de auxiliar em um parto, fazer parte de um
procedimento cirúrgico pela primeira vez.

Me virei, prestes a organizar os vidros das coletas


quando uma tontura me assolou, fazendo pontos pretos
dançarem em frente aos meus olhos. Segurei na borda da
cadeira e fechei os olhos, respirando profundamente,
tentando me acalmar e fazer meus instintos básicos
voltarem ao normal. Minhas pernas estavam bambas e meu
estômago embrulhado.

Não era comum isso acontecer, mas acreditava ser


consequência do estresse do último mês com a formatura,
residência e dívidas.

Um pouco melhor, abri os olhos para testar e suspirei


aliviada quando percebi que já conseguia enxergar tudo
com clareza, continuava apenas enjoada.

Faria um exame de sangue qualquer dia desses para


verificar se estava anêmica, também precisava lembrar de
consultar o resultado do meu exame ginecológico feito
semanas atrás.

— Bridget, está tudo bem? — a voz soou à minha


direita.

Girei a cabeça e encontrei Helena, uma hematologista


de meia idade, cabelos encaracolados, pele negra e
sorriso sincero, me encarando. Helena era a responsável
pelo laboratório de análises, ela quem havia me ensinado
como proceder com cada paciente e era a minha
responsável na clínica.

Confirmei com um aceno.

— Sim, eu só fiquei um pouco… tonta.

Helena franziu a testa


— Vamos fazer um exame? Assim poderemos verificar
se está com alguma anemia ou falta de vitamina. Você é
uma menina muito esforçada, querida, pode estar sendo
relapsa com a sua saúde sem nem mesmo perceber.

Comprimi os lábios, pensativa.

Eu não era relapsa com a minha saúde sem perceber,


eu só não me importava muito com ela quando sabia que
precisava cuidar da saúde dos outros.

Pelo meu histórico familiar, sabia que não poderia ser


assim, mas… não era como se eu conseguisse me importar
ou me preocupar comigo mesma.

Lancei um olhar para a parede acima da cabeça dela,


onde havia um relógio pendurado, para conferir o horário.

— Tenho uma paciente em quinze minutos — avisei.

Ela sorriu com condescendência.

— Não se preocupe, Bridget, tirarei o seu sangue em


menos tempo que isso.

Suspirei.

— Tudo bem.

Me sentei na cadeira e estendi o braço para Helena,


acompanhando cada movimento seu com o olhar afiado.
Executando tudo com uma excelência invejável, Helena fez
tudo em um piscar de olhos, eu mal tive tempo de sentir a
agulha perfurando a minha pele, antes de me levantar.

— Eu vou analisar ele com muito carinho, assim que


tiver resultados, venho até você — avisou, apertando o
pote entre os dedos. — Agora, prepare-se para atender a
sua paciente, embora eu goste muito da sua companhia,
quero vê-la fazendo sucesso na clínica.

— Obrigada, Helena.

Ela saiu da sala, me deixando sozinha outra vez.

Quando o resultado do exame de sangue ficasse


pronto, lembraria de ir atrás do meu exame ginecológico
também. Por ora, não tinha tempo para ficar pensando
nisso, estava animada demais com o primeiro plantão que
enfrentaria em minha carreira.

O dia passou tão rápido que eu mal percebi que já


estava na última paciente. Fiquei absorta demais em minha
mente, imaginando várias teorias e analisando múltiplas
situações, me fazendo perguntas mentais em como eu
deveria proceder caso alguma das situações ocorresse.
Era uma forma estranha de estudar e redecorar tudo o que
tinha aprendido na faculdade.

Removi as luvas de látex e as joguei na lata de lixo.


Juntei todas as coletas sanguíneas do dia e as coloquei
em cima do balcão do laboratório de Helena que estava
parcialmente escuro, pois ela já havia ido embora mais
cedo.

Meu coração saltitava em meu peito e eu forçava


meus lábios para que se mantivessem fechados e não
expressassem um sorrisinho bobo por estar indo para o
plantão.

Juntei a minha bolsa de dentro do armário e sai da


sala, perambulando pelos corredores em passos
acelerados.

A maternidade ficava alguns andares acima de onde


eu estava e como me sentia muito animada e com a
energia acima do limite, resolvi subir pelas escadas,
mesmo que me arrependesse depois.

Nos dois primeiros lances de escada eu já estava


prestes a colocar os pulmões para fora do corpo, minha
respiração estava ofegante e suor escorria pela minha
nuca e testa.

Vamos, Bridget, você consegue!

Levantei o pé para pisar no próximo lance no momento


em que ouvi um gemido. Parei, concentrando toda a minha
atenção em minha audição.

— Ohhhh... — Uma mulher gemeu. — Mais forte...


mais rápido.
Engoli em seco, o barulho de corpos ritmados.

Plaft. Plaft. Plaft.

Não! Isso só podia ser uma brincadeira de péssimo


gosto.

— Isso... mais fundo — gritou a mulher.

Ah, pelo amor de Deus!

O que eu faria? Não queria ser pega como se


estivesse espionando esse casal indecente, mas também
não desceria tudo o que tive o trabalho de subir.

— Vai... goza pra mim, querida... — A voz do homem


era rouca, carregada de luxúria e... reconhecível.

Leon Dubrow.

Esse homem gostava mesmo de elevar o seu status de


cafajeste cada vez que nos encontrávamos.

Subi mais alguns degraus, tomando todo o cuidado


para não fazer nenhum barulho e ser descoberta, só queria
encontrar uma porta em algum lugar para que fugisse para
o corredor e esquecer dessa patifaria.

Inclinei a cabeça para o lado, espiando, morrendo de


medo de ser vista por alguém, mas não encontrei nada
além da parede vazia. Soltei um suspiro lento e aliviado.
Subi mais um pouco, os ruídos ficaram mais altos,
entoando pelas escadas, tornando-se gritos.

Plaft. Plaft. Plaft.

— Ohhhhh, Leon... — A voz da mulher era melodiosa.

Ouvi outro grunhido e... silêncio absoluto.

Estava rezando para que a desgraça tivesse acabado,


assim poderia seguir meu caminho em paz e tentar
esquecer isso e não ficar traumatizada.

Atravessei mais alguns degraus. Podia ouvir o chiado


de roupas sendo fechadas e murmúrios baixos deles
conversando.

Olhei para os lados, procurando alguma porta,


qualquer saída que fosse, mas não havia nada além de
concreto.

Lembraria de nunca mais usar as escadas de


emergência da próxima vez.

Vi o vislumbre de um cabelo loiro e me joguei contra o


parapeito da escada, se meu coração fizesse algum
barulho, me deletaria neste momento porque ele estava
prestes a sair pela minha boca. Reconheci a balconista da
clínica, a mesma que me atendeu no dia em que preenchi
a ficha de admissão para a residência.
Ela lançou um olhar sedutor às suas costas, então
mordeu os lábios e abriu a porta de emergência, sumindo
de vista.

Fechei meus olhos e esperei alguns segundos,


suplicando em silêncio que Leon a seguisse.

Eu esperei.

A porta continuava intacta, sem barulho, sem delatar a


passagem de ninguém.

Abri os olhos e encontrei Leon no topo da escada me


encarando com o cenho franzido, os cabelos bagunçados,
a camisa azul com listras toda abarrotada e as mãos nos
bolsos da calça jeans escura.

Oh. Meu. Deus.

Eu queria morrer.

Se os céus ouvissem as minhas súplicas, o chão se


abriria e eu seria engolida por ele.

Sentia o calor subir pelo meu pescoço e se concentrar


em minhas bochechas. Eu estava queimando viva, prestes
a entrar em combustão espontânea, mas não de um jeito
bom.

— Bridget... o quê? — perguntou, confuso.


Minha língua estava pesada e minha garganta seca,
meu peito subia e descia em rápidas sucessões como se
eu tivesse corrido uma maratona.

Você não tem culpa, só estava seguindo o seu


caminho, ele é quem é um depravado.

— Doutor Dubrow — cumprimentei, erguendo


levemente o maxilar.

— O que diabos você está fazendo aqui? — indagou,


erguendo tanto as sobrancelhas que elas quase se uniram
ao couro cabeludo.

Me senti um pouco incomodada diante do olhar


acusatório que ele me lançava. Cruzei os braços em frente
ao corpo, semicerrando os dentes.

— Eu estava subindo para a maternidade, tenho


plantão hoje — avisei, olhando para todos os lados
querendo fugir dessa situação.

— Pelas escadas? — disse, claramente descrente.

Inspirei uma profunda lufada de ar, antes de


respondê-lo.

— Precisava... hã... gastar energia, estou muito


animada para o meu primeiro plantão, então resolvi vir
pelas escadas.
Ele ponderou, pensativo, antes de um sorriso
convincente erguer os lábios bonitos para cima.

— Ou estava me seguindo? — refutou, cheio de um


autoconvencimento que me irritava.

— Eu não estava seguindo você — sibilei. — Como eu


disse, só queria seguir o meu caminho, mas não sabia que
essa clínica era tão... promiscua assim, caso contrário,
teria ido de elevador.

Leon pendeu a cabeça para o lado, os olhos verdes-


azulados tinham contornos de diversão.

— É uma clínica de reprodução humana, doutora


Adams, esperava o quê? — zombou.

Bufei, afastando-me do corrimão e subindo alguns


lances de escada.

— Tudo bem, estou seguindo o meu caminho, doutor


Dubrow.

Passei ao lado dele, ignorando-o, enquanto me dirigia


para a porta em que a secretária havia passado momentos
antes.

— Sabe que poderia se divertir também, não é? —


falou às minhas costas.

Soltei uma risada enfezada.


— Ah, muito obrigada, mas eu não gosto de restos e
coisas usadas demais — retorqui.

— Os mais usados são os mais experientes, e, por


consequência, oferecem as melhores experiências.

— Hum... — murmurei, ignorando-o.

Sentia a presença de Leon as minhas costas, sabia


que estava sendo seguida de perto por ele, mas
continuava fazendo de tudo para fingir que ele não existia.

— Eu ainda não consigo entender qual é o seu


problema — comentou.

Girei nos calcanhares tão rápido que meu braço


colidiu com o ombro dele.

— O meu problema? — perguntei, apontando um dedo


para mim.

Ele concordou com um aceno de cabeça.

— Vamos ser sinceros, eu sou muito atraente...

— Ainda assim, não tenho interesse nenhum em você


— menti, dando de ombros.

Ele era gato pra caramba, era impossível não sentir


atração por ele, mas Leon exalava uma arrogância tão
presunçosa que fazia a atração diminuir em níveis
drásticos.
— E eu não acredito em você — atirou, as palavras
deslizando pelos seus lábios com uma sensualidade única.

— Bom, aí o problema é todo seu!

— Tudo bem — disse, jogando os braços para cima


em sinal de rendição. — Não vou ficar te importunando, já
que não tem interesse algum em mim, vamos ser apenas
amigos e profissionais, você é a minha residente e posso
ver que terá um futuro próspero na clínica. — Abaixou uma
mão e a estendeu para mim. — Combinados?

Fiz o movimento para apertar a mão dele e selar o


combinado, nossas palmas se tocaram no mesmo momento
em que o cheiro de sexo e suor flutuou ao meu nariz, me
fazendo inflar as narinas. Uma vertigem me dominou e
meu estômago se contorceu em meu abdômen.

— Bridget? — Ouvi a voz de Leon, mas parecia tão


distante.

Virei-me para o lado, batendo os quadris em uma lata


de lixo, mal tive tempo de levantar a tampa e despejar todo
o meu almoço dento dela.

Levantei o queixo, respirando fundo, tentando me


acalmar, mas outra onda de enjoo me abateu. Despejei a
água da bile do estômago, sem ter mais nada para vomitar.

— Está tudo bem? — perguntou Leon, assumindo o


modo médico e medindo a minha temperatura com a palma
da mão. — Não está com febre, talvez tenha comido algo
que não lhe fez bem.

A situação já era constrangedora o suficiente e eu


ainda precisei piorar. Claro que ele não teria nojo de
vômito, já deveria ter visto coisas bem piores, mas, ainda
assim, não era nada agradável.

Fechei a tampa da lixeira e me afastei, limpando a


boca com o dorso da mão. Eu estava trêmula e ainda muito
enjoada.

— Está tudo bem, eu só preciso sair daqui e respirar


ar puro — avisei, puxando a porta da saída de emergência
abruptamente e fugindo para o corredor gelado e claro.

A mudança de temperatura me fez estremecer,


arrepiando os meus pelos corporais. Senti uma sensação
de alívio absoluto, embora sentisse frio, o embrulho em
meu estômago foi se desfazendo aos poucos.

— Bridget — chamou Leon, parando em minha frente e


removendo uma lanterna do bolso dianteiro da calça,
apontando-a para os meus olhos. — O que você comeu
hoje?

— Eu estou bem — repeti, pigarreando para limpar a


garganta.

— Diga — insistiu.
Ele tocou em meu rosto com a ponta dos dedos,
puxando os meus olhos para baixo. O toque dele era muito
profissional, mesmo assim me fez trincar a mandíbula por
me sentir atraída por um homem tão arrogante.

— Eu não comi nada demais — avisei, afastando-me


do seu toque, dando um passo para trás. — Fiz um exame
de sangue hoje, não se preocupe, seja o que for,
descobrirei em breve.

— Então isso está acontecendo com recorrência? —


questionou, semicerrando os olhos e arqueando uma
sobrancelha loira.

— Não! — respondi rápido demais, o que só o fez


franzir ainda mais o cenho em desconfiança. — Começou
faz pouco mais de uma semana, por isso fiz um exame de
sangue hoje, mas não é nada com o que deva se
preocupar.

Leon desligou a lanterna e guardou de volta no bolso


da calça.

— Certo, mas quero conferir os seus exames quando


estiverem prontos.

Balancei a cabeça.

— Por quê?

Ele suspirou.
— É minha residente, Bridget, se estiver doente, quero
estar ciente disso.

Resfoleguei, aturdida.

Abri e fechei a boca, sem saber o que falar, as mãos


trêmulas pelo nervosismo que eu estava sentindo.

— Va-vai me demitir por causa disso? — gaguejei, a


voz esganiçada.

Leon riu.

— Claro que não, Bridget, por qual motivo eu faria


isso? Só quero garantir, como o seu médico responsável,
que esteja tudo adequado com a sua saúde.

— Obrigada — agradeci.

Leon foi em direção a sala da maternidade e eu o


segui de perto. Ele puxou um jaleco do cabideiro ao lado
da porta e o vestiu, então passou uma mão nos cabelos,
arrumando as madeixas desorganizadas.

— Você será o médico plantonista hoje? — perguntei,


largando minha bolsa em uma das cadeiras.

Como a demanda era muito pequena, e, na grande


maioria das vezes, inexistente, ficava apenas um médico
responsável, três enfermeiras, um anestesista e um
residente, portanto, se Leon fosse este médico, significava
que passaríamos as próximas horas na companhia um do
outro e eu não sabia dizer se isso era, de fato, bom.

— Sim, hoje é meu plantão — crispou, arrumando as


lapelas da camisa e colocando os óculos de grau no rosto.
— Algum problema? — perguntou, franzindo um dos cantos
dos lábios em zombaria.

— Problema algum — retruquei, dando a volta e


analisando os berçários vazios.

Corri os olhos para o lado, encarando Leon pela visão


periférica disfarçadamente. Ele estava analisando algumas
fichas de pacientes em cima de uma mesa, as mãos
espalmadas na madeira, o corpo curvado, os músculos dos
braços saltados e bem-definidos no jaleco branco pelo
esforço. O semblante estava sério, mostrando o quanto
estava concentrado em sua tarefa.

Como ele conseguia ser tão bonito assim? Não


importava como estivesse, Leon era sempre atraente, o
que me irritava, muito.

Isso explicava também o quanto ele fodia mulheres


como se fosse um coelho no cio. Era fácil cair no charme
dele, relevando até mesmo a arrogância e prepotência.

Esfreguei o meu rosto e prendi a respiração, a


animação para meu primeiro plantão já não surtia mais um
efeito tão positivo.
Olhei outra vez para o médico, ele ainda me ignorava
com sucesso, como se a minha presença não causasse
nada para ele.

Droga, seria um longo plantão!


Nas primeiras três horas de plantão, absolutamente
nada aconteceu. Eu apenas fiquei sentada em uma das
cadeiras com um livro de anatomia no colo, redecorando o
nome de cada osso do corpo humano, enquanto Leon
girava na cadeira giratória e digitava furtivamente em seu
aparelho celular com um sorriso idiota no rosto.

Por um breve momento, me arrependi de ter começado


a residência na clínica, queria saber como seria enfrentar
um plantão em um centro de pronto-atendimento, mas logo
lembrei das minhas dívidas e do salário que eu receberia,
o que fez o arrependimento passar em um piscar de olhos.
Encostei a cabeça na cadeira e encarei o teto, as
luzes incandescentes brilhavam, me cegando por um
momento.

Um telefone tocou.

— Doutor Dubrow — atendeu Leon. Fechei os olhos, e


balancei a cadeira de um lado para o outro, o cansaço
estava se alinhando com o tédio e me deixando com sono.
— Mas ela não está grávida de sete meses? — perguntou
ele, a voz soando preocupada.

Arrumei a minha postura e o encarei, ele estava de


costas para mim, mas conseguia ver os músculos dos
ombros rígidos através do jaleco apertado.

— Porra, ela não pode ter o bebê agora, está cedo


demais! — crispou Leon, puxando os cabelos com força
para trás.

Fiquei em alerta de imediato, algo estava


acontecendo, e, pela reação do médico, algo bem ruim e
que não poderia acontecer.

— Mande-a imediatamente para a sala de parto,


faremos uma cesárea de emergência e prepare a UTI
neonatal para receber o bebê — ordenou, grudando o
telefone de volta ao gancho com tanta força que pensei
que iria se espatifar.
Leon ficou alguns segundos em completo silêncio,
imóvel, a mão permanecia no telefone e ele encarava a
parede como se estivesse procurando por respostas em
seu cérebro, perdido em pensamentos.

— Bridget — murmurou, me assustando. — Se prepare


para me auxiliar em uma cesárea de emergência. Agora.

Arregalei os olhos e me levantei da cadeira em um


pulo, fazendo-a oscilar com a falta do meu peso. Corri
para o armário ao lado e coloquei um Scrubs [ 1 ] . Lavei
minhas mãos com água corrente e sabão antes de colocar
as luvas de látex.

Leon se mexeu, saindo do torpor. Ele correu até o


armário e se vestiu como eu, arrumando-se para conduzir
o parto que parecia não o deixar nada feliz.

— A situação é muito ruim? — perguntei em voz baixa.

Ele concordou com um aceno.

— É a terceira gestação desta paciente e a primeira


vez que consegue chegar tão longe — revelou, tristeza
resplandecendo em sua face. — Eu a atendi na semana
passada e ela estava em êxtase por isso, se cuidando
corretamente e feliz em finalmente estar montando o
quarto do seu primeiro bebê... — Ele piscou, parecendo se
perder em pensamentos. — Essa criança precisa viver,
Alice merece sentir essa felicidade.
Dei um passo em direção a ele e coloquei uma mão
em seu ombro, dando-lhe algum conforto. Leon parecia
mesmo chateado com a situação, como se estivesse se
culpando de alguma forma por isso.

— Vamos conduzir a cesárea bem, Leon, o bebê virá


ao mundo com saúde e forte o suficiente para enfrentar a
prematuridade — murmurei, tentando convencê-lo do que
eu dizia.

Ele se limitou a apenas um aceno de cabeça, antes de


se afastar e correr em direção a porta. Atravessamos o
corredor e entramos em uma sala mais ao fundo. As três
enfermeiras de plantão já estavam no lugar, auxiliando a
paciente, uma jovem de cabelos ruivos e olhos castanhos
chorosos.

— Alice, vai ficar tudo bem com o bebê — disse Leon,


sorrindo para ela. — Vamos trazer essa menina ao mundo,
ela parece ansiosa para conhecer a mãe.

Alice fungou e deitou-se na maca.

— Ela poderia esperar só mais um pouquinho... —


ciciou, a voz arrastada e abatida.

Havia um acesso em seu braço direito e ela piscava


com dificuldade, como se estivesse fraca e muito
sonolenta. Me aproximei dela e analisei os batimentos
cardíacos.
Uma das enfermeiras arrumou o campo cirúrgico ao
seu redor, deixando apenas a barriga protuberante visível.

— Tudo certo, Alice? — perguntou Leon, tentando


distraí-la.

— Sim... apenas sonolenta — respondeu, a voz


tornando-se cada vez mais arrastada.

Leon ergueu a cabeça e me encarou.

— Prepare o local com antisséptico e faça uma incisão


de pfannestiel [ 2 ] de cinco centímetros — orientou.

Corri em direção a grávida, estava muito nervosa, mas


o olhar afiado de Leon servia como uma injeção de
adrenalina e confiança em mim mesma e em tudo o que
estudei e aprendi no curso nos últimos anos.

Leon me ergueu o bisturi e balançou levemente a


cabeça.

Respirei fundo, acalmando meu coração acelerado e


minha respiração densa.

Eu estava tendo a chance de aprender pessoalmente


com o melhor médico obstetra do país.

Apertei o bisturi no abdômen dela e fiz o corte de


cinco centímetros como ele havia orientado, rompendo as
sete camadas de pele. Leon se curvou de frente para a
barriga e enfiou a mão dentro do corte.
— Faça a sucção.

Uma das enfermeiras me entregou o aparelho e eu o


coloquei dentro do abdômen de Alice, tudo sobre o olhar
analítico de Leon.

Uma das máquinas começou a apitar e eu pensei que


teria um ataque cardíaco no momento em que ouvi o
mesmo som que me atormentou por muito tempo enquanto
eu era criança.

— BCF [ 3 ] em 110, BPM [ 4 ] caindo — falou, mantendo o


tom calmo.

— O meu bebê, o que está acontecendo? — perguntou


Alice, agarrando o braço de uma das enfermeiras que
estava ao seu lado.

Leon se aproximou mais da barriga e eu me afastei,


liberando a passagem para ele.

— A pressão arterial está em queda — avisou uma


das enfermeiras.

— Farei uma incisão superficial na parede uterina,


cuidando para não lesionar o feto — comentou Leon, e eu
sabia que estava falando isso apenas para me orientar. —
Estou vendo a cabeça — avisou.

Leon colocou a mão no útero de Alice e puxou a bebê


pela cabeça, removendo-a de dentro da mãe. Ela era
minúscula, a pele clarinha, quase transparente e coberta
por veias, os cabelos não passavam de uma penugem no
alto da cabeça, e estava... imóvel.

— Como ela está, como a minha bebê está? — gritou


Alice, soluçando.

Leon encarou o feto por um pequeno milésimo de


segundo, e, mesmo com a máscara cobrindo o seu rosto e
escondendo suas feições, conseguia sentir a dor dele de
onde eu estava.

— Ela não está respirando... — Comprimiu os lábios.


— Vamos começar a RCP [ 5 ] — gritou, colocando a criança
em um berçário. — Tragam o reanimador manual.

Ele começou a massagem no bebê usando os dois


dedos, apertando o tórax sucessivamente.

Eu estava sem reação, como se tudo o que estudei


durante anos não surtisse efeito algum em uma situação
como essa. Alice gritava e chorava na maca, tentando se
levantar para ver o que estava acontecendo enquanto uma
enfermeira tentava detê-la.

— Minha filha! Minha filha, por favor!

Sentia as lágrimas pinicando atrás dos meus olhos,


meu peito estava esmagado diante do sofrimento dela.
E então, Alice simplesmente fechou os olhos e parou,
como se estivesse desmaiado.

Outro equipamento começou a apitar.

Leon girou a cabeça para encarar o que acontecia,


enquanto mantinha massagem cardíaca na bebê.

— Tem alguma coisa errada com Alice, ela está


hipotensa e com taquicardia.

Pisquei, me forçando a agir com calma e frieza


mediante a situação. Eu era médica, fui ensinada a agir
assim, não podia entrar em pânico, mesmo que a situação
fosse comovente.

Me aproximei de Alice e encarei o corte aberto em seu


abdômen.

— Ela está sangrando — avisei.

— Nós vamos salvar as duas, não está em questão


perder qualquer uma delas! — grunhiu Leon.

— Me diga, o que eu devo fazer? — supliquei,


respirando o ar lentamente para dentro dos pulmões.

Leon ficou em silêncio por um segundo.

— Bridget, venha até aqui — crispou. Forcei minhas


pernas a se movimentarem e corri até ele, parando diante
da bebê morta. — Faça um RCP, dois dedos no meio do
tórax, aperte duas vezes por segundo a cada quinze
segundos, então pare e aperte o ambu [ 6 ] , não aperte com
muita força ou pode esmagar o coração dela.

Porra, RCP era uma das tarefas mais fáceis de


executar na faculdade, mas isso não incluía um prematuro
de sete meses muito frágil.

Vamos, Bridget, você consegue!

Leon me observou, conferindo se eu estava agindo da


maneira certa, então se virou e correu até Alice, deixando
diante de mim a responsabilidade pela vida da bebezinha
prematura.

— Vou implantar um cateter balão de bakri [ 7 ] para


conter a hemorragia, comprimindo-a pelo lado de dentro —
disse ele.

Olhei para a frente, vendo Leon inserir o balão até o


fundo do útero de Alice e inflá-lo, então ergueu a bolsa de
soro e começou a injetar. Ele esperou, os olhos fixos no
aparelho. Ninguém na sala parecia se mexer ou até mesmo
respirar, todos ansiosos, esperando que Alice respondesse
ao tratamento.

O bip constante parou.

— A pressão dela está 8 por 6, frequência cardíaca a


110 — avisou uma das enfermeiras, fazendo uma sucessão
de suspiros aliviados serem expelidos pela sala.
Alice estava bem e viveria.

Leon entregou a bolsa de soro a uma das enfermeiras


e correu até mim, curvando-se diante do bebê inerte.

— Pare a RCP, precisamos ver se ela respira


espontaneamente. — Ele segurou a bebê, levando o
rostinho dela até o ouvido. — Droga! — grunhiu, virando-
se. — Os pulmões dela estão cheios de líquidos, ela está
se afogando.

— Vamos usar o laringoscópio pediátrico — eu disse.

Uma enfermeira correu até nós e me entregou o


aparelho, Leon depositou a bebê de volta no berçário e
removeu laringoscópio das minhas mãos, colocando-o na
boca dela. Ele encarou o aparelho.

— É a síndrome de aspiração do mecônio, preciso de


um cateter de aspiração. — A enfermeira correu para longe
e Leon me encarou. — As fezes dela contaminaram os
pulmões e bloquearam as vias respiratórias — explicou,
embora eu já soubesse o significado.

A enfermeira entregou o cateter para ele e Leon o


infiltrou na boca do bebê, desobstruindo suas vias
respiratórias.

Um choro fraco começou a soar pelo ar, como um


bramido, uma reclamação. E logo se tornou algo alto e
forte.
— Levem-na para a incubadora do neonatal, ela está
bem, está viva — comemorou Leon, arrancando a máscara
do rosto, não conseguindo conter o sorriso de orgulho que
se espalhava por ele.

A bebê foi encaminhada, embora prematura, o choro


forte de quem havia lutado e insistido pela vida, permeava
pelo ar.

— Doutora Adams, quer dar os pontos em Alice? —


perguntou ele.

— Claro.

Sorrindo plenamente, fui até ela, saturação era um


dos meus fortes, um procedimento rápido, fácil e simples.

Alice acordou poucos minutos depois que o parto


terminou. A primeira coisa que disse assim que abriu os
olhos foi perguntar pela filha. Ela não conseguia conter a
alegria e a gratidão à Leon quando descobriu que a
bebezinha estava bem e já havia sido encaminhada para a
UTI neonatal onde receberia os cuidados básicos até
receber alta da clínica.

Já era meia-noite e meu turno de plantão havia


acabado.
Me encaminhei até o escritório de Leon e bati na
porta. Ouvi um murmúrio do outro lado, então eu entrei.

Leon estava jogado em sua cadeira com uma garrafa


de whisky na mão. O semblante denotava cansaço,
cabelos bagunçados e roupas amassadas.

— Está tudo bem? — perguntei, aproximando-me.

— Sim — disse, mas seus gestos não condiziam com


sua fala.

— A bebê de Alice... — murmurei, a voz falhando.

Leon balançou a cabeça.

— Ela está bem, está a salvo.

— Então está bebendo para comemorar? — indaguei,


inclinando o queixo em direção a garrafa.

Ele suspirou e esfregou os cabelos.

— Não importa qual ramo seja o escolhido, a medicina


nunca será fácil — comentou, pensativo. — Eu acompanhei
o caso de Alice desde o início, vi o quanto sofreu quando
os procedimentos não deram certo, assim como quando
teve os abortos espontâneos. Alice é uma advogada bem-
sucedida, sem cônjuge, decidiu ser mãe solo, mas as
coisas nunca foram fáceis para ela. E hoje... ela quase
perdeu a única gravidez que conseguiu levar adiante.
Puxei a cadeira da frente da mesa dele e me sentei.

— Mas não perdeu, Leon, você foi incrível, conseguiu


salvar as duas.

Ele me estendeu a garrafa de uísque, dando de


ombros diante das minhas sobrancelhas arqueadas em
questionamento.

— Você é a minha residente e isso é antiético, eu sei,


mas nós podemos lidar com o fato de que estou te
oferecendo whisky depois de um parto daqueles.

Eu precisava mesmo de álcool para chegar em casa e


conseguir pregar o olho, ainda mais com os raios que
atravessavam o céu na rua. Odiava tempestade, sempre
me sentia nervosa com elas.

Recolhi a garrafa e virei alguns goles direto do


gargalo, o gosto forte queimou o meu esôfago, causando
uma sensação de torpor e ardência.

— Elas estão bem, é isso o que importa — falei,


entregando-lhe a garrafa de volta.

— Mas por um momento... — ciciou, piscando, os


olhos vagos, perdidos em pensamentos — um único que
fosse, pensei que não ficariam, achei que teria que
escolher entre salvar a vida de Alice ou da sua filha, a
mesma criança que eu ajudei a ser desenvolvida.
— Sim, mas não aconteceu, você conseguiu salvar as
duas e isso só mostra o médico excepcional que é.

Assim, diante de mim, Leon parecia tão humano, como


se a faceta de homem arrogante que sempre carregava
tivesse se dissolvido como fumaça.

Ele tomou um longo gole do gargalo da garrafa e a


empurrou de volta para mim. Eu não tinha o costume de
beber, mas estava mesmo precisando depois de ter
enfrentado um dos dias mais conturbados da minha vida
nos últimos anos.

— Você vai como para casa? — perguntou.

Engoli o uísque sem conseguir conter a careta ao


sentir meu esôfago desacostumado derreter diante da
bebida que descia por ele.

— Tem uma parada aqui perto, vou pegar um ônibus


— avisei.

Sentia o efeito do álcool anestesiar os meus


movimentos. Pisquei, os olhos lentos, o cansaço me
dominando.

— Deixa que eu levo você — falou, erguendo o pulso


para verificar a hora em seu Rolex. — Meu plantão
terminou, a nova médica plantonista já deve ter chegado e
ficará responsável por Alice e sua bebê.
Me levantei e acomodei minha bolsa no ombro.

Eu não deveria aceitar a carona de Leon, mas ao olhar


para a parede de vidro às costas dele, um relâmpago
atravessou o céu, iluminando uma parte da cidade. Era
silencioso, um aviso de que a chuva estava chegando, e,
muito em breve, uma tempestade.

Estremeci, engolindo para molhar a garganta.

— Tudo bem — concordei. — Mas, será que


poderíamos ir agora? Quero chegar antes da chuva, não
gosto de me molhar.

Ele me encarou, os olhos se fixaram nos meus, como


se estivessem tentando olhar dentro da minha alma,
desvendar os meus segredos, desnudar a minha mente. Eu
o mantive, pronta para descobrir tanto dele quanto ele
tentava descobrir de mim.

Leon não fez perguntas ou piadinhas como


costumavam fazer quando eu dizia que não queria me
molhar, quando eu falava que odiava a chuva, ele apenas
acenou com a cabeça, como se compreendesse que existia
mais por trás do pedido incomum que eu fiz. E então se
levantou, recolhendo as chaves do carro de cima da mesa.

— Vamos para casa, Bridget, você foi incrível hoje e


merece descanso.
— Obrigada — agradeci, mantendo um sorriso singelo
no rosto, enquanto comemorava internamente.

— Para uma residente em seu primeiro mês, a vi agir


com mais rapidez e fazer mais coisas do que residentes
mais avançados que você.

Ele desligou as luzes do escritório e seguiu comigo


pelos corredores, lado a lado, os passos sincronizados. O
silêncio reinava pela clínica, absoluto e supremo.

— Não acho que eu tenha sido tão boa assim, acredito


que eu poderia ter sido mais rápida, fiquei em pânico por
um segundo, achando que... elas morreriam — confessei
em um sussurro.

Leon soltou um suspiro profundo e apertou o botão do


elevador.

— Isso é mais comum do que imagina, não se cobre


tanto. Como eu disse, também pensei que perderíamos as
duas ou uma delas, e, por um segundo, fiquei tão estático
quanto você, mas sou mais velho, carrego anos de
experiência, por isso posso garantir que você foi incrível
hoje.

Não falei nada, apenas absorvi as palavras dele,


sentindo um orgulho imenso de mim mesma.

Leon tinha razão, eu me cobrava demais, deveria


aprender a apreciar as pequenas vitórias. Eu era uma
recém-formada que tinha acabado de enfrentar um parto
difícil onde a mãe e a bebê quase morreram. Deveria me
orgulhar por ter conseguido agir nos momentos certos e ter
auxiliado Leon com a agilidade necessária.

Era uma conquista, uma vitória minha e não deixaria


que a falta de credibilidade do meu pai em mim me
afetasse.

Não mais.
Alice e a bebê ficaram bem, no final das contas. A
menina, a quem ela havia denominado como Hilary, ainda
não tinha previsão de alta, mas estava melhor a cada dia
mais.

Conseguia entender por qual motivo alguns médicos


tratavam seus pacientes carregados em frieza, era muito
fácil se apegar a eles. Eu mal conhecia Alice e Hilary e já
me sentia ligada a elas, mas precisava aprender a separar
as coisas, assim como a superar meus medos, pois nem
sempre funcionaria como no parto de Alice.

Entrei na sala de coleta de exames e joguei a minha


bolsa dentro do armário. Juntei meus cabelos no alto da
cabeça e os prendi em um coque solto, antes de colocar a
touca de uso obrigatório.

A porta anexa ao laboratório de Helena foi aberta e


ela surgiu no rol com o semblante taciturno.

— Bom dia, Helena — cumprimentei-a, sorrindo.

— Bom dia, Bridget, será que nós podemos


conversar? — perguntou, me lançando um olhar
condescendente.

Meu coração errou uma batida e minhas mãos


começaram a tremer. Fiz uma análise mental de todo
mundo que eu tinha atendido nas últimas semanas,
vasculhando em meu cérebro qualquer equívoco que eu
possa ter causado, mas nenhuma alerta me veio à mente.
Eu era cuidadosa demais e muito meticulosa para cometer
erros, queria ser a melhor e sabia que jamais conseguiria
se eles se tornassem recorrentes em minha vida.

— Claro — respondi, minha voz não passava de um


bramido fraco e rouco.

Segui Helena para dentro do laboratório dela e fechei


a porta. Seja o que fosse que ela quisesse me falar,
parecia querer privacidade e na sala de coleta qualquer um
poderia entrar a qualquer momento, já o laboratório de
Helena era terreno proibido, embora esbanjasse um sorriso
doce, Helena tendia a ser muito rigorosa quando se tratava
da sua sala, culminando no respeito de todo mundo com o
ambiente.

— Sente-se, Bridget — Apontou com a mão para uma


das banquetas disponíveis.

Ah, meu Deus! Eu infartaria a qualquer segundo.

Eu devia ter feito uma merda muito grande. Enorme,


na verdade. Era a única resposta para essa esquisitice
toda de Helena.

— Sim? — perguntei, engolindo em seco.

Meu estômago estava embrulhado e minhas mãos


empapadas de suor. Esfreguei as palmas no uniforme,
secando-as.

— Eu vou direto ao ponto com você — avisou e eu


agarrei a ponta do balcão com tanta força que os vincos
das minhas mãos começaram a embranquecer. — Analisei
o seu sangue, fiz diversos testes para descobrir como está
a sua saúde, Bridget, e talvez você não saiba, não queira
e não esteja preparada para o que está prestes a descobrir
já que nem mesmo considerou isso quando conversamos.

— O que eu tenho? — sussurrei, pálida e com os


olhos arregalados.

— Você está grávida — anunciou.

Eu pisquei.
— Como é? — questionei, confusa.

Helena suspirou e se aproximou de mim.

— Eu sinto muito, querida, essas coisas acontecem,


infelizmente, quando temos relações sexuais estamos
relapsas a isso.

Espera... ela estava mesmo falando sério? Pensei que


estivesse brincando ou tentando fazer alguma piadinha
antes de falar que estava tudo bem comigo, que nada de
grave ou sério me acometia.

— Helena, não estou entendendo...

Eu não conseguia nem mesmo ficar apavorada, na


verdade, não sabia bem como reagir a essa notícia
impossível. É óbvio que eu estaria infartando se achasse
meramente possível algo do tipo, mas este não era o caso.

— Bridget, você está grávida, seu resultado deu


positivo para uma gestação — disse, encarando-me com
os olhos semicerrados, como se estivesse tentando me
convencer a absorver de uma vez a notícia.

Senti a minha testa franzir e minha mente dar várias


voltas antes de cair em uma gargalhada que eu não
conseguia conter. Curvei o corpo para a frente, lágrimas
brotaram nos cantos dos meus olhos.
— Meu Deus — Ofeguei, entre uma crise de riso e
outra.

Coloquei uma mão em frente a barriga dolorida e


respirei profundamente, tentando me acalmar, mas todas
as vezes que a imagem de Helena e o aviso me vinham na
mente, outra crise me dominava, me fazendo rir até chorar
e sentir falta de ar.

— Eu entendo, está em negação — comentou ela em


um suspiro.

Qual era a porra da confusão que ela tinha feito? Era


óbvio que tinha misturado o meu sangue sem querer com o
de alguma paciente da clínica, com tantas tentantes
visitando o lugar dia após dia, não era difícil que ocorresse
essa confusão.

Inspirei o ar pelo nariz e o soltei pela boca,


acalmando-me, antes de respondê-la.

— Helena, eu sinto muito, mas o resultado não é meu,


talvez você tenha se equivocado... eu não sei.

— Bridget — disse, em tom sério, me fazendo encará-


la imediatamente. — O exame é seu, e por mais que esteja
em negação, não deixarei que coloque o meu
profissionalismo em pauta, jamais confundi o resultado das
pacientes e não será agora que eu farei.
Ajeitei a minha postura e mordi as bochechas, uma
tensão se espalhou pelo ar e pareceu me sufocar,
enquanto eu encarava os olhos castanhos de Helena.

— Olha..., tudo bem, mas tem algo errado, Helena, eu


não estou em negação, é sério — falei, levantando-me e
ficando de pé. — Eu não tenho relações sexuais com
ninguém há pelo menos dois anos, por isso eu falo que é
impossível.

Ela franziu o cenho, confusa.

— Espera, mas o resultado está aqui, é claro e óbvio


— avisou, abrindo o papel dobrado e o colocando no
balcão à minha frente. — O beta HCG é quantitativo.

Me inclinei sobre a folha e encarei os resultados,


confirmando o que ela havia dito.

— Mas... como eu poderia estar grávida sem transar?


— questionei, franzindo as sobrancelhas.

Helena parecia estar convencida de que este era


mesmo o meu exame de sangue, mas não fazia sentido o
beta HCG quantitativo, diante da improbabilidade de uma
gestação.

Precisei me segurar de novo no balcão quando uma


vertigem me fez perder os sentidos diante do pensamento
aterrorizador que eu tive. Senti o braço de Helena envolta
da minha cintura, me mantendo firme no lugar e impedindo
que eu fosse ao chão.

— Bridget, está tudo bem?

Balancei a cabeça, espremendo os olhos, tentando


afastar os pontos pretos que dançavam em frente a eles.

Não podia ser, não queria nem mesmo pensar na


possibilidade, mas era algo... impossível.

Engoli em seco, sentia a garganta tão embargada que


era até mesmo difícil de respirar.

— Helena... — disse em um sopro de voz. — câncer


também é responsável por reproduzir o hormônio beta
HCG.

Ela balançou a cabeça, confirmando.

— Sim, querida, mas existem outros sintomas além do


câncer, como problemas hormonais, por exemplo. —
Acariciou o meu braço, passando-me um pouco de
conforto. — Não seja tão dramática, é jovem ainda para se
preocupar com câncer.

Exceto o fato de que meu irmão gêmeo morreu para a


doença aos nove anos de idade?

Não podia culpar Helena por não saber a verdade,


poucas eram as pessoas que sabiam sobre a existência de
Brandon, e não porque eu sentia necessidade de escondê-
lo, mas porque ainda doía muito falar sobre ele.

Acontece que era um pouco apavorante que eu tivesse


testado positivo para uma gravidez sem estar grávida, era
muito raro um falso positivo e significava um indicativo
muito ruim.

— Tudo bem — cortou Helena, me puxando com ela —


vamos fazer uma ecografia, normalmente os cânceres que
reproduzem o hormônio beta HCG, são os tumores
produtores de hormônios, ou seja, câncer de mama ou
ovário, portanto, vamos tirar isso a limpo.

Limitei-me a acenar, concordando com um leve


balançar de cabeça já que a minha voz parecia não
funcionar.

Helena me arrastou pelo braço pelo corredor, parando


apenas em uma sala anexa onde as enfermeiras
costumavam ficar em seu horário de café. Ela abriu a porta
em um supetão e enfiou a cabeça para dentro da sala.

— Uma de vocês vá fazer as coletas de sangue do


dia, a doutora Adams está se sentindo doente — ordenou,
fechando a porta de novo e voltando a me arrastar com
ela.

E ela estava literalmente me arrastando, minhas


pernas, assim como a minha garganta e qualquer outra
parte do corpo, pareciam não querer colaborar. O choque
da situação me deixou inerte e inanimada.

Helena apertou o botão do elevador e se virou para


mim quando estávamos sozinhas dentro da caixa metálica.

— Respire, Bridget, você está branca feito um papel e


parece prestes a desmaiar, vai dar tudo certo, vai ficar
tudo bem — murmurou, compadecida.

Quando o painel digital apitou, Helena me puxou por


outro corredor até uma das portas, abrindo-a subitamente
e me jogando para dentro do pequeno cômodo. Havia uma
maca e o aparelho para o exame. Ela ligou as luzes e foi
até o aparelho para fazer o mesmo com ele.

— Deite-se aqui, Bridget — pediu, dando tapinhas na


maca.

Em passos muito pequenos e duros, caminhei até a


maca e me sentei, concentrando-me em apenas não
desmaiar e cair estatelada no meio do chão.

Não tinha certeza se queria fazer esse exame, talvez


fosse melhor absorver a notícia primeiro, mas Helena não
parecia como alguém que me deixaria em paz tão
facilmente. Percebi que eu também deveria ser assim com
as outras pessoas, o instinto de médica falando mais alto,
mandando agir em prol da vida do paciente e da sua
saúde, mesmo quando ele não queira.
— Eu… talvez seja melhor fazer isso em outro
momento — murmurei.

Helena apenas me lançou um olhar enviesado.

— Vamos fazer isso agora, embora a especialidade da


clínica não seja oncologia, está em um local renomado e
com aparelhos novos e de qualidade, podemos iniciar a
investigação e enviá-la para um local adequado depois dos
resultados.

A porta foi aberta e a mesma médica que fez o meu


pré-câncer semanas antes, entrou.

Agora, observando-a melhor, conseguia notar algumas


semelhanças que não pude perceber naquele dia. Cabelos
castanho-claros que desciam ao redor do pescoço em
ondas volumosas, olhos escuros e expressivos, jovem e
bonita. Ela tinha traços de Leon, mesmo que fossem
poucos. E o sobrenome… fazia todo o sentido, ela deveria
ser irmã dele.

Ela me encarou, piscando, como se estivesse


tentando me reconhecer de algum lugar.

Eu não a tinha visto mais pela clínica, ela era uma das
médicas responsáveis pelas consultas, um setor bem
diferente e muito distante do laboratório de coleta
sanguínea.
— Doutora Dubrow, como vai? — cumprimentou
Helena. — Essa é a doutora Bridget Adams, uma das
nossas novas residentes.

Assim que falou meu nome, os olhos dela se


iluminaram em reconhecimento e ela abriu um sorriso
reluzente.

— Eu atendi você… — ciciou, aproximando-se alguns


passos.

O perfume doce que ela usava flutuou pelo ar, me


fazendo trancar a respiração para evitar sentir o cheiro
enjoativo ou vomitaria no meio da sala.

— Sim — confirmei, balançando a cabeça


sucessivamente. — Inclusive, esse é um ótimo momento
para descobrir o resultado do exame que eu vim fazer.

Ela franziu as sobrancelhas castanhas.

— Exame? — Sorriu, o semblante denotando


confusão. — Você não fez um exame, fez uma inseminação
artificial.

— Não, eu vim fazer um exame — insisti, tremendo


tanto que meus dentes batiam uns contra os outros sem
que eu pudesse contê-los.

— Espera… — interrompeu Helena, a cabeça virando


na direção da doutora Dubrow em uma velocidade
vertiginosa. — Você disse que ela veio fazer uma
inseminação, ela disse que veio fazer um exame —  Fez
uma pausa, mordendo os lábios, analisando a situação
com calma e coerência. — E agora ela positivou para o
beta HCG...

Se um dia eu pensei que morreria, nada havia, de


fato, me preparado para o que eu senti quando absorvi a
notícia que ela deu.

— Oh, meu Deus… — Minha voz não passava de um


sopro. — Eu vim fazer um pré-câncer, um exame de rotina,
apenas isso… eu não… — Esfreguei a minha testa com o
dorso da mão, suor escorria pela minha pele. — Ah, meu
Jesus amado…

Nada fazia sentido, ao menos, nada queria fazer


sentido, não quando o resultado era horrível e catastrófico.

Olhei para a doutora Dubrow. Ela me olhou de volta.


Nos encaramos em silêncio por segundos opressores que
pareceram horas.

— Oh, meu Deus… — repetiu o que eu havia dito,


arregalando os olhos, a cor se esvaindo do rosto.

Só então, percebi que uma merda enorme tinha


acontecido.

Eu estava muito, repito, muito ferrada.


Pontos pretos dançaram em frente aos meus olhos e
eu não vi o momento em que cai em um abismo profundo,
eu apenas, me joguei nele querendo uma solução rápida
para a minha situação de completo desespero.
Abri os olhos, piscando sucessivamente, a claridade
da sala me incomodava e eu sentia um gosto amargo na
ponta da língua. Me ergui sobre os cotovelos e analisei
melhor o local onde eu me encontrava.

Não era a mesma sala de antes, não havia mais maca


ou um ecógrafo, eles foram substituídos por uma sala
aberta e arejada, composta por uma enorme mesa de
centro com diversas cadeiras ao redor, um bar de bebidas
ao fundo e um sofá enorme e muito confortável onde eu
estava deitada.

Me sentei e esfreguei as mãos no rosto, rezando para


que as minhas últimas lembranças antes de ter desmaiado
fossem apenas sonhos confusos e irreais.

Forcei meus calcanhares no chão, testando a força


das minhas pernas. Elas não cederam, então eu me
levantei e caminhei até o bar que ficava perto das janelas,
procurando por água. Precisava beber alguma coisa para
molhar a garganta e tirar o gosto ruim da boca.

Uma porta foi aberta e eu me virei imediatamente para


ela.

— Ah, você já acordou — comentou a doutora com


certa complacência.

Ela atravessou a sala e parou à minha frente, atrás


dela vinha Leon, Ben e Helena. Não sabia dizer o que
significava, mas nenhum deles aparentava felicidade, eles
traziam semblantes carregados.

— Sim, e quero saber o que está acontecendo —


rebati, cruzando os braços em frente ao corpo.

Leon puxou a cadeira da ponta da mesa, arrastando-a


pelo chão e fazendo um barulho que fez cócegas em meus
ouvidos. Ele parecia muito furioso, os lábios estavam
franzidos em um esgar e ele encarava a irmã com
labaredas no olhar.

— Eu tenho um comunicado para fazer — disse ela,


virando-se para me encarar. — Bridget, me chamo Izabela
e sou irmã de Leon. — Apresentou-se finalmente. — Por
favor, sente-se. — Inclinou o queixo em direção a uma das
diversas cadeiras vazias na mesa.

— Estou bem assim — respondi, mantendo-me imóvel.

Izabela suspirou, confirmando com um sinal.

— Bridget, primeiramente, quero pedir desculpa em


nome da Fertility, nós sentimos imensamente que este
equívoco tenha acontecido.

Comecei a tremer tanto que cerrei a mandíbula para


evitar o bater de dentes. Então não era um sonho ou
lembranças aleatórias, era tudo muito real, a porra da
minha realidade.

— Eu não sei se você sabe como funciona os


procedimentos, mas vou explicar cada um deles. —
Pigarreou, entrelaçando os dedos e olhando para o irmão
de canto de olho, como se estivesse pedindo permissão
para começar. Leon não fez nada, nem mesmo piscou os
olhos. — Então, existem dois tipos de procedimentos. A
inseminação artificial e a fertilização in vitro.

— Certo, mas qual a relação disso com o meu caso?


— insisti, perdendo a paciência.

— Apenas… me deixe explicar — disse em um


suplício. Percebi que isso estava sendo muito difícil para
ela, Izabela não estava contente com o olhar fulminante do
irmão, tampouco por ter sido a causadora do equívoco. —
A fertilização in vitro é uma técnica usada para mulheres
que possuem problemas para engravidar ou algum
problema relacionado, como as que fizeram ligamento nas
trompas, mas decidiram que querem engravidar outra vez.
Neste método, a fecundação é feita fora do organismo da
mulher, ou seja, o óvulo é aspirado, fecundado e realocado
no corpo. Assim, a mulher sai da clínica, em tese, grávida.
— explicou, parecendo ainda mais tensa conforme
discorria. — Já na inseminação artificial, os
espermatozoides são colocados diretamente na cavidade
uterina da mulher. Os melhores espermatozoides são
introduzidos através de um fino cateter, por meio de um
procedimento muito parecido com um exame ginecológico
de rotina. É bem simples e na grande maioria das vezes,
sucesso absoluto.

— Uhum… — Comecei a bater o pé no chão, sem


conseguir conter o nervosismo que dominava cada célula
do meu corpo. — E então?

Ela comprimiu os lábios.

— Houve um… equívoco no dia em que veio fazer o


exame.

Dei um passo para trás e então outro, até sentir


minhas costas contra o vidro gelado das janelas. Precisava
respirar, me acalmar e enfrentar a situação como a adulta
que eu era.
— Fale logo, Izabela, apenas assuma o seu erro,
porra, a situação já está suficientemente uma merda —
grunhiu Leon, manifestando-se pela primeira vez desde
que entrou na sala.

Izabela encarou o irmão com os lábios franzidos.

— É que não é tão simples assim…

Leon socou a mesa com força.

— Não é tão simples? Você simplesmente engravidou


a paciente errada, colocando o nome da clínica no lixo e,
também, anos de vida dedicada a isso dos nossos pais —
sibilou, uma mão fechada em punho em cima da mesa e a
outra escorada no maxilar.

Izabela respirou fundo e audivelmente.

— Acontece, Leon, que algo bem mais grave


aconteceu — confessou, erguendo o maxilar ao encarar o
irmão. — Não foi um mero equívoco o que aconteceu com
Bridget.

— Como assim? — Leon se ergueu da cadeira,


fazendo-a oscilar para trás diante da falta de peso e se
inclinou sobre a mesa, espalmando as duas mãos em cima
dela.

— Bom…, acontece que tinham duas pacientes com o


nome de Bridget para àquela tarde. Bridget Adams com um
exame ginecológico agendado e Bridget Sulivan com uma
inseminação artificial marcada.

— Como é? — retesou-se Leon, pendendo a cabeça


para o lado.

— Eu chamei apenas pelo primeiro nome, como


costumamos fazer. Eu sei, foi um erro que não deveria ter
cometido. Mas acontece que era para ser a consulta da
Bridget Sulivan e sua inseminação, não dessa Bridget
aqui. — Apontou para mim. — Acredito que a outra não
compareceu por causa da… hum… dos acontecimentos
que se sucederam.

— Você quis dizer da expulsão dela da clínica? —


rebateu Leon, cético.

Izabela olhou de mim para o irmão, um rubor cobrindo


as bochechas, antes de confirmar com um aceno.

— Sim, por causa da expulsão, então acabou que eu


inseminei a Bridget errada.

Havia um porém nessa história, conseguia sentir,


muito embora Izabela parecesse ponderar se continuava a
falar ou não.

— Só tem um erro nessa sua história, Izabela, porque


diabos a Bridget iria querer fazer uma inseminação
artificial? — refutou Leon, franzindo a testa de tanto
pensar.
Olhei para o rosto de cada um dentro da sala, apenas
eles conheciam essa tal de Bridget de quem tanto falavam,
queria encontrar qualquer pista, algo que me fizesse
entender melhor o que estava acontecendo, mas eles
pareciam tão confusos quanto eu.

— Porque ela planejava usar o seu esperma e


engravidar de você — sussurrou Izabela.

Leon arregalou os olhos e deu um solavanco para


trás, como se tivesse sido atingido com algo invisível.

— Não! — ciciou, balançando veemente a cabeça de


um lado para o outro. — Não, ela não faria isso.

Helena levou a mão aos lábios, prestes a sair


correndo da sala. Eu fiquei totalmente imóvel, ainda sem
entender a real gravidade do que estava acontecendo,
enquanto apenas Ben e Izabela pareciam saber a verdade
absoluta dos fatos.

— Sim, Leon, ela só não faria, como ela fez. —


Izabela, cruzou as mãos e se virou para o irmão. — Bridget
pegou todo o seu esperma do banco, ela iria se inseminar
com ele.

— Então… — Os olhos dele voaram em minha direção.


Ele engoliu em seco, sem conseguir terminar a frase. —
Puta merda!
— Sim, Bridget Adams carrega um filho seu —
continuou Izabela.

Fiquei em completo silêncio por um pequeno


momento, minha mente girando e tirando conclusões
próprias. As peças começaram a se encaixar e tudo
começou a fazer sentido.

— O QUÊ? — gritei, pegando todos de surpresa.

Olhei para Leon, então olhei para baixo para o meu


abdômen ainda plano, e de volta para Leon.

— Eu sinto muito, Bridget, você não deveria estar


envolvida nesta situação — lamentou Izabela. — A outra
Bridget era um antigo caso amoroso do meu irmão, ela
ficou um pouco obcecada por ele e… enfim, aconteceu
tudo isso.

Se eu estava entendendo bem a situação, a outra


Bridget tinha roubado o esperma de Leon do banco para
que pudesse se inseminar, mas por uma coincidência
horrível do destino, eu cheguei primeiro que ela.

— Ela pode… abortar, seria uma boa solução, ela não


quer o filho e eu também não, então… — ofereceu Leon,
como se a solução fosse óbvia.

Izabela balançou a cabeça.


— Você não está entendendo, meu irmão, Bridget
acabou com todo o seu esperma, ela transferiu uma parte
para se inseminar e… só Deus sabe o que fez com o resto,
talvez tenha jogado na privada para que assim o impedisse
de ter mais filhos no futuro. E, considerando a sua
situação de vasectomizado, este bebê que Bridget carrega
é seu único herdeiro possível.

Me afastei das vidraças e agarrei os cabelos ao lado


da cabeça com força, andando de um lado para o outro.

— Oh…. meu… Deus… — ofeguei.

Eu estava grávida? Tipo, mesmo grávida? Com um


bebê e tudo?

Me joguei contra as vidraças e esfreguei as mãos


suadas no vidro, procurando uma brecha, qualquer saída
de ar, qualquer coisa que me ajudasse a respirar.

— Eu… eu não consigo respirar… uma janela, não dá


pra abrir uma janela? — Passei as mãos de cima para
baixo, deixando um rastro de digitais.

— Não tem como abrir esses vidros — respondeu


Izabela.

Ah, meu Jesus.

— Só uma fresta, algo pequeno, só pra me ajudar a


respirar — implorei, grudando meu rosto no vidro gelado.
Eu precisava de ar, sentia que o oxigênio não estava
chegando aos meus pulmões.

— Bridget… — clamou Izabela.

— Ela está tendo uma crise de pânico — disse


Helena.

Pânico? Eu estava infartando, isso sim!

Me virei para eles, Leon me encarava com os olhos


confusos, a mente tão perdida quanto a minha estava.

— O pai é ele? — indaguei em voz alta, sem desviar o


olhar do dele.

— Sim, Bridget, o esperma usado para a sua


inseminação pertencia a Leon — confirmou Izabela.

Fiz uma careta e juntei as mãos em frente a boca,


respirando com dificuldade.

— Eu estou grávida do homem mais arrogante dessa


clínica? — Balancei veemente a cabeça — Ah, virgem
santíssima…

Leon estreitou o olhar em minha direção e cruzou os


braços em frente ao corpo, ofendido.

— Acredite, Bridget, estou tão feliz com a notícia


quanto você — atirou, franzindo os lábios em um esgar. —
A melhor parte da procriação é o sexo e eu nem mesmo te
toquei!

As cabeças giravam em ambas as direções, seguindo


o barulho das nossas vozes.

— Graças a Deus, isso já é suficientemente ruim sem


que eu tenha transado com você — cuspi, rondando a sala
em busca de uma janela. — Por que raios não tem uma
janela nessa porra de prédio?

Ouvi o barulho de uma cadeira sendo arrastada, em


seguida, a voz de Ben ressoou pelo local.

— Vocês precisam se acalmar, é uma situação que


saiu de controle e que, infelizmente, o verdadeiro culpado
não está aqui.

— Eu nem mesmo gozei e agora terei um filho? Porra!


— lamentou Leon, pensando em voz alta.

— Na verdade, você gozou sim, só não do jeito


convencional — refutou Izabela.

— Cale a porra da boca, Izabela! — grunhiu ele.

Eu estava grávida desse imbecil por um erro e ele


estava mesmo reclamando e lamentando da falta de sexo
para que esta criança estivesse infiltrada em meu ventre?
Meu Deus, era um caos.
Eu me esfregava nos vidros, querendo fugir da sala e
dessa gente louca que me engravidou sem que eu
soubesse. Leon balançava a cabeça e reclamava,
inconformado com a situação, enquanto Helena parecia
chocada demais, sentada e inerte no mesmo lugar de
antes. Izabela e Ben tentavam remediar o caos, mas era
impossível.

— Se ela abortar, Leon nunca mais terá um filho, essa


é a única chance dele de ser pai, mas… ela vai querer
criar uma criança que nem mesmo planejou ou desejou, de
um homem com quem não tem intimidade alguma? — Ouvi
Ben perguntar para alguém, a voz dele flutuou pelo meu
torpor.

Virei-me para eles, Ben conversava com Izabela, os


dois ainda tentavam encontrar uma solução inexistente.

Fechei meus olhos e respirei fundo, precisava analisar


tudo com calma e coerência. Bom…, eu estava grávida e
não era nem meramente culpa minha, já que nem mesmo
tinha transado com alguém para que isso acontecesse,
mas, pelo visto, quando se frequentava uma clínica de
reprodução humana, sexo não era muito necessário para
uma gravidez acontecer.

Puta merda… grávida!

Se acalme, Bridget, e pense, apenas pense.


  Eu conseguiria abortar? A resposta era um grande e
sonoro NÃO. Tinha feito medicina para tentar salvar
crianças e não o contrário, e embora fossem casos bem
diferentes, eu não conseguiria fazer isso, não sem morrer
com peso na consciência.

Então o que diabos eu faria com essa criança?

Ela não se encaixava nos meus planos, não se


enquadrava em nada. Depois da residência, ainda faltaria
a especialização e tudo isso iria requerer um tempo
absurdo de mim, como eu poderia ser mãe e estudante em
tempo integral? Impossível.

— Acho que eu sei qual pode ser a solução… —


comentou Izabela, fazendo todos os pares de olhos
voarem em sua direção.

— Então seja breve e direta porque eu não vejo uma


— contrapôs Leon.

E, mais uma vez em um lapso muito curto de tempo,


todos eles se voltaram para mim.

Engoli em seco.
Quando eu fiz a minha vasectomia, pensei que as
coisas estariam resolvidas e que eu estaria livre de
engravidar alguém sem querer, que tudo seria perfeito
daquele momento em diante. E quando chegasse meu
momento de ter herdeiros, procuraria uma barriga de
aluguel com boas qualidades para gestá-los. Ponto.

Mas na minha equação muito bem pensada e


planejada, a minha porra não seria, de fato, roubada e
inseminada sem a minha concepção no útero de uma
desconhecida.

E agora eu teria filhos.

Filhos!
Eu nem sequer tinha transado com Bridget, e, além de
tudo, ela tinha ferido o meu ego me renegando e não
demonstrando interesse algum em mim.

Era muita hipocrisia que a única mulher que me


rejeitou estivesse grávida de mim, e, pelo visto, seria a
única mãe que meu herdeiro teria.

Sorte de Bridget Sulivan que ela estava em algum


lugar bem longe ou eu a esgoelaria com as minhas
próprias mãos. Como ela ousou cometer essa patifaria? Eu
comunicaria seus atos ao conselho de medicina, pedindo
sigilo para que nada pudesse ser solto na mídia ou seria o
fim da minha clínica. E, ainda que fosse arriscado elevar a
notícia para além da sala em que estávamos discutindo o
bendito assunto, eu correria o risco se assim pudesse
acabar com a carreira da enfermeira.

Eu me sentia tão frustrado diante de toda a situação,


sempre tive tudo sob controle, por isso havia optado pela
vasectomia quando ainda era jovem para que pudesse
evitar riscos e manter o controle sobre a minha vida que
eu tanto queria e fazia questão.

Como médico, deveria saber que as coisas não


funcionavam tão bem assim, se fosse o caso, jamais
terminaria um parto ou uma cirurgia com um paciente
morto na maca ao final do procedimento.
— Eu estava pensando em uma solução para vocês
dois... — comentou Izabela, inclinando-se sobre o encosto
de uma cadeira. Minha irmã parecia nervosa e ansiosa, ela
sabia que tinha uma parcela de culpa no que tinha
acontecido, ela deveria ter analisado, pelo menos, o nome
dos pacientes que atenderia ao longo do dia, assim teria
evitado o ocorrido. Mas eu também era errado, por ser
minha irmã, depositei muita confiança nela como residente,
por isso estava apta a fazer inseminação e outros
procedimentos sozinha, sem a supervisão adequada.
Enfim, um conjunto de erros que nos levaram até o
desastre. — Bridget, acredito que você não gostaria de ter
filhos por agora, é uma recém-formada... — Fez silêncio.
— Ao menos é o que eu acho. — Lançou um olhar
questionador na direção da residente.

Bridget estava muito pálida, a respiração ofegante,


transpassando pelos lábios entreabertos. Os olhos verdes
pareciam maiores do que habitualmente, e os cabelos
estavam uma completa bagunça de tanto que ela os puxou
com as mãos.

— Se eu quisesse ser mãe, teria ido atrás do meio


mais convencional para isso — grunhiu ela, cruzando os
braços e trincando a mandíbula –, jamais imaginei que
sofreria isso na clínica mais conceituada do país.
Inclusive, foi o renome que me fez escolher fazer meus
exames aqui e não em um hospital qualquer.
Ela estava irritada, chocada, triste e abalada, isso era
claro.

Mas, quem não estava?

— Bom, Leon sempre quis herdeiros, por isso guardou


o esperma antes de fazer a vasectomia — continuou
Izabela diante da resposta afiada de Bridget –, portanto,
meu conselho é: Leon fica com a criança depois que ela
nascer.

Arqueei uma sobrancelha para a minha irmã.

— Nossa, irmãzinha, que ideia genial... — comentei,


esfregando o indicador nos pelos do meu maxilar. — E não
passou pela sua cabeça que eu talvez não queira a
criança?

— Não, porque não é como se você tivesse uma


escolha, irmãozinho, aquele bebê é o único que vai vir de
você nessa vida, se não o quiser, esqueça a ideia de ter
filhos um dia.

Droga, esqueci que toda a minha porra tinha sido


esvaziada do banco e que a maldita da enfermeira não
deixou um único esperma para contar a história. Era este
filho que estava em andamento ou não seria nenhum.

— Acompanho Izabela no mesmo raciocínio —


intercedeu Ben. — Você teria um herdeiro em algum
momento, Leon, portanto, o momento é agora, pois ele já
está a caminho. Bridget pode ser a sua barriga de aluguel,
quando a criança nascer, ela a entregará para você e vida
que segue.

Olhei para a garota, ela parecia confusa e


completamente perdida em uma mente tumultuada.

— Se você quiser, Bridget, é claro — completou


Izabela. — Afinal de contas, a criança também terá a sua
genética, já que foi implantado em um dos seus óvulos.

— Nos encarregaremos de todos os custos


necessários com o pré-natal e parto, também estamos
dispostos a lhe dar uma quantia generosa como
indenização pelo equívoco e problemas causados a você,
além, é claro, do valor que Leon disponibilizará pela
barriga de aluguel.

Não era uma ideia tão ruim, eu queria mesmo ter


herdeiros um dia, óbvio que não seria agora, mas iria ter.

Suspirei e me joguei contra a cadeira, exausto de tudo


isso, cansado e emocionalmente abalado.

— Eu aceito a proposta, não queria meu herdeiro para


agora, mas já que ele será o único que eu terei, só me
resta aceitar os fatos. — Elevei meu olhar até Bridget. —
Também não era exatamente a barriga de aluguel que eu
escolheria, faria testes de QI na mulher escolhida e
também faria testes genéticos para descobrir doenças
patológicas.
Bridget ergueu as sobrancelhas, semicerrando os
olhos.

— Então os requisitos mínimos para ser a mãe do seu


filho eram: inteligência, boa saúde... — começou a contar
nos dedos. — beleza, simpatia…?

Embora estivesse zombando, senti necessidade de


respondê-la.

— Primeiramente, mãe do meu herdeiro. E, sim, tinha


requisitos mínimos e essenciais na minha lista antes de
escolher alguém para gestar o meu herdeiro, mas isso não
está mais em pauta.

 — Herdeiro? — interrogou em tom esganiçado.

Santo Deus, era tão difícil para as pessoas


entenderem que existia uma grande diferença entre um
filho e um herdeiro?

Concordei com um sinal.

— Nunca tive planos de ter filhos, mas sempre


precisei de um herdeiro para comandar a clínica e
continuar o legado da família — falei, antecipando-me
quando percebi que Bridget abriu a boca para contestar. —
E sim, há diferença entre ambos, um herdeiro é apenas um
legado, alguém para dar continuidade ao sobrenome que
eu carrego, enquanto filhos são desejados e muito amados
pelos pais.
Bridget comprimiu os lábios.

— Então você quer ter um filho apenas para que ele


assuma a empresa da família e nada mais?

Fiz um gesto de desdém com a mão.

— Sim, por isso estava aguardando o momento certo e


a barriga de aluguel adequada.

Algumas pessoas achavam um pouco frio e indiferente


a forma como eu pensava, mas eu não conseguia ver nada
de errado nisso. Estava disposto a dar tudo do bom e do
melhor para o meu herdeiro, não deixaria que faltasse
nada. Ele ou ela teria uma boa educação e um futuro
próspero.

Bridget se aproximou da mesa, trêmula, e colocou as


mãos no encosto de uma das cadeiras, apoiando-se, como
se estivesse tentando permanecer em pé após todo o
baque do dia.

— Eu… eu não sei se consigo — confessou em um


sussurro tão baixo e rouco que precisei fazer esforço para
compreendê-la.

— O que você não consegue? — perguntei,


inclinando-me sobre a mesa em direção a ela.

Não poderia permitir que abortasse meu herdeiro, o


feto que crescia no ventre dela era a única coisa que havia
restado do que eu guardei no banco de esperma.

Ela engoliu em seco e jogou a cabeça para cima,


fechando os olhos e inspirando lentamente.

— Bridget, eu sinto muito que isso tenha acontecido


com você, mas nós prometemos que resolveremos tudo do
melhor modo — insistiu Izabela, tentando convencer a
garota a fazer a coisa certa. — A criança será bem cuidada
e você receberá para gestá-la, como uma barriga de
aluguel faz, apenas isso.

Não era tão simples quanto Izabela tentava passar, as


barrigas de aluguéis tinham acompanhamento psicológico
e normalmente eram mulheres bem mais maduras e
preparadas para assumir tal responsabilidade.

Bridget levou a mão até o rosto e limpou com a ponta


dos dedos uma lágrima que escorria pela bochecha direita.

— Tudo bem — concordou, por fim. — Mas não quero


que minha família saiba disso, sob hipótese alguma. E eu
tenho algumas demandas.

Ben puxou uma das cadeiras e se sentou, cruzando as


mãos em cima da mesa e encarando a residente com olhar
afiado e muito profissional.

— Estamos ouvindo, doutora Adams — murmurou.


— Como eu disse, meus pais jamais podem saber
sobre isso, minha mãe não permitiria, portanto, precisarei
me ausentar de casa por um tempo logo após a barriga
começar a crescer. Quero um apartamento que fique perto
da clínica, não quero e não vou parar a minha residência.

Ben abriu uma agenda e retirou uma caneta do bolso


da camisa e então começou a anotar o que Bridget dizia.

— Isso é fácil, vamos ver algo o mais próximo daqui,


assim evitamos que seja vista perambulando pelas ruas —
disse ele.

— Também vou precisar fingir, preciso mentir que


estou saindo da cidade… — Fez uma pausa, ponderando.
–E quero que a clínica emita um comunicado para que eu
possa entregar aos meus pais, algo sobre como eu fui uma
residente exemplar nas últimas semanas e por isso estou
recebendo uma oportunidade única.

Franzi a testa diante do pedido atípico dela, mas não


abri a boca para perguntar ou contestar nada. Pelo que eu
tinha percebido, Bridget sentia uma vontade absurda de se
mostrar aos pais, como se quisesse ser o motivo de
orgulho deles.

— Certo, e o que mais? — perguntou Ben, parando


com a escrita, esperando que ela continuasse.

Tamborilei os dedos na mesa de mogno, observando-


a.
— Vocês falaram em uma indenização…, que tipo de
indenização?

— Você sofreu danos morais em nossa clínica, nada


mais justo do que seja indenizada por isso — objetou Ben,
dando de ombros. — É claro, desde que fique em silêncio
sobre o que ocorreu aqui.

Bridget revirou os olhos.

— Acredite, doutor Reed, exijo tanta descrição sobre


isso quanto vocês — sibilou.

— Sendo assim, estamos dispostos a indenizá-la pelo


sofrimento que lhe foi causado, além do valor que Leon
pagará a você após o parto por ter sido a barriga de
aluguel dele.

Ela mordeu as bochechas e balançou um pouco o


corpo, ponderando alguma coisa.

— Eu quero essa indenização o quanto antes — disse,


por fim. — Eu… hum… preciso desse dinheiro, então essa
é uma das minhas demandas.

A caneta de Ben riscava as folhas da agenda com uma


velocidade vertiginosa, a letra do médico era quase
ilegível.

— Ok, então você quer a indenização, descrição, um


apartamento perto da clínica, uma carta de recomendação
para que seja afastada de casa e continuar na residência,
é apenas isso?

Bridget pensou por um milésimo de segundo.

— Sim, essas são as minhas demandas.

— Tudo bem — confirmou Ben, fechando agenda e


guardando a caneta de volta. — Como eu disse, fará o pré-
natal na clínica; e como aceitou ser barriga de aluguel,
Leon possui algumas exigências quanto a isso. Não pode
fumar ou ingerir bebidas alcoólicas, tampouco fazer algo
que coloque a saúde do feto em risco, também precisará
estar presente em todas as consultas marcadas e fazer
uso de cada remédio e vitamina indicado pelo obstetra
responsável pela sua gestação.

— Estou de acordo — concordou Bridget. — É só


isso? Pois eu quero ir para a minha casa, não me sinto em
condições psicológicas de permanecer com as minhas
coletas do dia.

Izabela lançou um sorriso acolhedor para ela.

— Está dispensada, Bridget, pode ir para casa e tire o


tempo que for preciso.

Bridget concordou e se afastou da mesa, correndo


para fora da sala como se sua vida dependesse disso.
Uma cadeira crispou no chão, sendo arrastada no
momento em que Helena se levantou e foi atrás da
residente, deixando-me sozinho com o meu melhor amigo e
a minha irmã.

— Como se sente, Leon? — perguntou Ben.

Me levantei em um só movimento e lancei um olhar


enviesado para Izabela, apontando um dedo em riste na
direção dela.

— A partir de hoje você está proibida de fazer


qualquer coisa dentro desta clínica sem a supervisão de
um médico — bradei com os dentes cerrados. — Se
cometer outro erro como esse, serei obrigado a comunicar
o conselho de medicina, Izabela, para uma residente em
seu último ano, isso é inadmissível!

Os olhos castanhos brilharam com lágrimas, mas eu


não me compadeci, qualquer equívoco da nossa parte
poderia ser mortal. E Izabela tinha cometido um erro
absurdo, eu não a protegeria por ser a minha irmã, não era
tolerante a erros, ainda mais erros inadmissíveis como o
dela.

Girei nos calcanhares e abandonei a sala, precisava


me esbaldar em uma bela garrafa de uísque. Sentia os
músculos das minhas costas rígidos pela tensão e minha
cabeça latejava.

Eu não queria ter um herdeiro agora e ter tido o meu


direito de escolha arrancado de mim não fazia com que as
coisas fossem melhores, não para um homem meticuloso
como eu.

Bridget aceitou tudo muito bem, não acabaria com o


nome da clínica e me entregaria a criança como eu sempre
quis, mas… isso não dizimava o fato de que eu estava
puto para cacete com toda a situação.
A minha vida tinha uma grande tendência para a
desgraça, não importava o que eu fazia para tentar evitar
que isso acontecesse com ela.

Pelo lado positivo, eu não estava com câncer, apenas


tinha um bebê — que eu nem sabia direito como tinha ido
parar dentro de mim — se desenvolvendo.

Ainda me sentia trôpega com a notícia, aérea, como


se estivesse absorvendo cada detalhe com calma para não
surtar de vez.

Destravei a porta de casa e entrei, soltando um


suspiro pesado e profundo ao avistar meu pai sentado no
sofá. Joguei minha bolsa no aparador ao lado da porta e
esfreguei meu rosto.

Ainda não sabia bem o que pensar ou achar, portanto,


era melhor não pensar em nada, não enquanto eu ainda
tinha tempo para isso. Fingiria que nada tinha saído do
controle e que a minha vida ainda era a mesma que eu
tinha planejado.

— Espero que não tenha sido demitida no primeiro


mês de trabalho, Bridget — comentou ele e podia sentir o
peso do seu olhar em mim. — Sabemos como trata
pacientes que são acometidos por doenças graves —
provocou.

Eu me sentia frustrada por tudo o que tinha


acontecido e estava muito abalada, não precisava que meu
pai me aborrecesse, acumulando suas provocações a tudo
o que eu sentia.

Compreendi a ambiguidade nas palavras dele, ele


sempre zombou em como eu seria uma médica
maravilhosa, ajudando a matar de vez um paciente, já que
esta era a minha especialidade.

Acontece que eu não tinha culpa na morte de


Brandon, eu era apenas uma criança quando tudo
aconteceu, não sabia que ele tinha câncer, tampouco o
significado que a doença carregava. E era muito injusto
que Mark imputasse essa culpa a mim, mais injusto ainda
que eu tenha crescido com essa culpa.

Removi as mãos do rosto e me afastei.

— Estou um pouco doente, vou ficar em meu quarto —


avisei, evitando olhar para ele.

Tentava não odiar o meu pai e diminuir toda a dor que


ele me causava, afinal de contas, entendia o lado dele, ele
também tinha perdido Brandon e deveria doer tanto nele
quanto doía em mim, e era só por este motivo que eu
ainda não tinha cortado relações, embora a presença dele
tenha se tornado cada vez menos importante para mim nos
últimos anos.

Ele soltou uma risada enfezada.

— Doente? Será que o castigo divino finalmente


chegou para você?

Forcei tanto meu maxilar que o músculo da mandíbula


estalou.

— Dane-se você e o que pensa! — gritei, rangendo os


dentes, virando-me finalmente para ele. O idiota estava
sentado no sofá com um boné do LA Dodger [ 8 ] , assistindo à
partida de Basebol. Na mão direita, uma garrafa de
cerveja, o que explicava o tanto de palavras que estava
trocando comigo, mesmo que ríspidas, já que preferia
ignorar a minha existência na maioria das vezes. — Fique
aí com a sua vidinha medíocre e frustrada e me deixe em
paz!

Ele se levantou em um único movimento, trôpego,


agarrando o encosto da poltrona para se manter em pé
sem cair.

— Olhe como fala comigo, menina! Mora na minha


casa e o mínimo que eu exijo de você é respeito — gritou,
arrastando a língua, e, consequentemente, embaralhando
as palavras.

Um bêbado idiota e inconveniente. Ele sempre fazia


isso quando assistia aos jogos. Se eu soubesse que
estava em casa, teria ficado na clínica.

Uma vez minha mãe me disse que assistir as partidas


sozinho era o que mais lhe doía, como um ídolo do
basebol, sentia falta da presença do filho o acompanhando
nesses momentos.

Eu não tinha culpa. Não tinha.

— Fique aí com a sua autocomiseração e me deixe


quieta — supliquei, puxando a minha bolsa e correndo
para as escadas.

Eu só queria sofrer em paz, era pedir muito?

Teria um bebê que não desejava, mas com o qual


ainda me importava e abriria mão dele assim que nascesse
como se fosse uma mercadoria.

Não conseguia parar de me punir por ter aceitado a


proposta de Leon, mas o que eu poderia fazer? Estava
endividada, tinha uma estrutura familiar de merda, era uma
recém-formada. Que tipo de vida eu poderia oferecer para
a criança?

E, embora o jeito como Leon falou da criança tenha


me assustado, ele poderia oferecer uma boa qualidade de
vida para ela.

Isso que importava, não?

Bati a porta do meu quarto e passei a chave na


maçaneta, me trancando dentro do único lugar onde eu
poderia desabar sem receber julgamentos e... sozinha.
Sempre sozinha.

Parei de frente para um espelho que eu tinha no canto


da porta e levantei a blusa, expondo a minha barriga
plana. Espalmei uma mão na pele lisa, não podia sentir
nada, mas sabia que tinha alguém ali dentro, confortável e
protegido.

Sempre sozinha... até agora.

Pelos próximos sete meses, eu teria companhia a


cada passo que desse, a cada momento do dia. Pela
primeira vez, eu teria alguém comigo desde a morte de
Brandon.
Alguém que eu me livraria assim que nascesse e que
eu estava tratando como se fosse uma mercadoria, não
uma pessoa, não um filho.

Não pude conter o soluço que separou os meus lábios,


nem as lágrimas que transbordaram pelos meus olhos,
criando um rastro pelas bochechas.

No final das contas, eu era tão hipócrita quanto o meu


pai.

Não toquei mais no assunto da gravidez desde que


descobri sobre ela e fiquei muito feliz quando notei que
Leon fazia o mesmo, oferecendo a discrição que eu
coloquei como uma das minhas demandas.

Há duas semanas eu tinha descoberto sobre a


existência do bebê e tentava ignorar o fato de que ele
existia, mesmo que fosse impossível.

Eu não poderia me apegar a ele, precisava continuar


fingindo que não era nada, que ele era apenas um erro e
que eu faria um trabalho digno, como tantas barrigas de
aluguel faziam, levaria felicidade para uma família e
realizaria seus sonhos. Óbvio que as coisas não eram
assim, mas eu preferia fingir do que encarar a verdade.
Era muito melhor.
O que também não significava que eu fosse uma
mãe... incubadora ruim. Me importava com o bebê e com a
sua saúde, por isso vinha evitando algumas coisas, como a
cafeína, pois sabia que fazia mal para ele ou ela.

— Bridget? — A voz de Helena me chamou, ecoando


através do meu entorpecimento. Olhei para ela, piscando,
voltando para a vida real. — Leon está te chamando na
sala dele — avisou.

Fiz um gesto com a mão.

— Estou indo.

Leon não tinha falado comigo desde o dia em que


descobrimos o erro e decidimos como trataríamos sobre
ele, nós mal esbarramos por aí nos corredores, ele parecia
querer me evitar enquanto eu tentava fazer o mesmo com
ele. E quando nos encontrávamos, era apenas um singelo
cumprimento, nada além disso.

Helena cruzou os braços e deu dois passos longos em


minha direção.

— Está tudo bem? — perguntou, vagando o olhar por


mim. — Você parece abatida.

Não estava nada bem, mas ela não ouviria sobre como
eu me sentia um lixo e estava confusa com o que eu sentia
em relação a existência da criança.
— Sim, eu só estou um pouco cansada — menti,
sorrindo amarelo.

Me levantei da cadeira em que estava sentada e


recolhi o celular de dentro da minha bolsa. Estava
esperando a próxima paciente para a coleta antes de
Helena chegar.

Ela suspirou.

— Vai ficar tudo bem, Bridget, não se preocupe,


depois que isso passar, vai poder seguir a sua vida,
lembrando da maior loucura que já fez — disse, tentando
apaziguar a situação.

Encarei-a com o canto dos olhos.

— Você possui filhos? — perguntei.

Helena franziu a testa, confusa, e balançou a cabeça.

— Não tive tempo ainda para crianças, minha vida é


muito focada na minha profissão e meu tempo curto
demais para pensar além dela — confessou. — Mas quem
sabe um dia eu possa pensar em ter um... — Passei ao
lado dela, mas sua mão se fechou em punho no meu pulso,
me fazendo parar. — Você ainda é jovem, Bridget, trate a
situação como deve ser tratada, não leve para o lado
pessoal ou se deixe abalar por isso.
Ergui os lábios em um sorriso que não chegava aos
olhos.

— Eu sei... como disse, estou apenas cansada.

Puxei o meu braço e sai da sala, caminhando em


passos acelerados para longe dela. Helena não queria o
meu mal, estava apenas preocupada comigo e tentava me
dar conselhos inteligentes, mas não tinha nada que ela
falasse que fizesse eu me sentir menos frustrada. E, para
ser bem sincera, não queria ouvir conselhos de ninguém,
nenhum deles poderia me entender, era uma situação
atípica demais.

Apertei no elevador o botão que levava até o andar da


sala de Leon e aguardei, encarando o meu reflexo no
espelho da parede de fundo. Eu estava mesmo uma
bagunça, manchas arroxeadas abaixo dos olhos e a pele
pálida demais. Era nítido que havia algo me incomodando,
o brilho nos olhos delatava o sofrimento que eu sentia.

Deixei o elevador e a minha imagem caótica para trás


e atravessei o corredor, parando de frente para a porta de
madeira branca. Encarei a placa com o nome de Leon,
fechei a mão em punho e bati.

— Entre! — Ouvi a voz dele do outro lado.

Girei a maçaneta e entrei, parando por um segundo,


criando coragem para continuar e avançar pela sala. Leon
estava sentado em sua cadeira, os olhos verdes-azulados
correram até os meus assim que me viu entrar.

— Bridget — cumprimentou com um leve aceno de


cabeça.

Ele era uma bagunça bonita. Os cabelos estavam


desalinhados, havia um rastro de fios enfeitando o maxilar
e os olhos pareciam cansados por debaixo dos óculos de
grau. Até mesmo o jaleco que era sempre de um branco
impecável, parecia amarelado, como se Leon não tivesse
tido tempo suficiente de cuidá-lo como deveria.

— Queria falar comigo? — perguntei.

Meu coração deu um solavanco em meu peito, não


conseguia identificar o que estava sentindo ao estar tão
perto dele depois de tudo o que aconteceu.

— Sente-se, por favor. — Apontou para uma das


cadeiras disponíveis de frente para a mesa.

 Meus movimentos eram tensos e calculados enquanto


me sentava totalmente ereta em uma das cadeiras e
aguardava. Leon se movimentou, abrindo uma das gavetas
de trás da mesa e retirando um bloco médico de dentro
dela. Com o movimento, o cheiro do perfume dele flutuou
até mim, me fazendo inspirar com força, impregnando-me
com o aroma agradável.
— Eu tenho algumas vitaminas para te receitar —
avisou, destampando uma caneta preta com dourado muito
bonita. — Também vamos marcar os primeiros exames, já
deve estar se aproximando do terceiro mês de gestação e
isso é muito importante para o desenvolvimento saudável
do feto.

Ele apertou a ponta da caneta no papel e começou a


riscar os nomes com a tinta preta, a letra era cursiva e até
mesmo bonita para um médico.

Desviei o meu olhar para a parede de vidro atrás dele,


observando a vista dos prédios altos e comerciais.

Tentava relevar o fato de como Leon tratava o bebê.


Antes do nascimento, o termo médico adequado era “feto”,
mas isso precisava se aplicar até mesmo ao filho dele?

— E como tem se sentido? Enjoos? Vontade de comer


alguma coisa especifica? Cansaço? — perguntou, sem
desviar o olhar do papel, a mão se mexendo de um lado
para o outro.

— Nenhum sintoma — falei, apenas.

Ele ergueu o olhar para mim.

— Está tudo bem com você? — indagou, franzindo o


cenho.

— Sim, está tudo ótimo.


Leon terminou de rabiscar o papel e fechou a caneta,
guardando-a no bolso do jaleco, então removeu o papel do
bloco de notas e se levantou.

— Vou examinar você — avisou, pegando um


estetoscópio de outra gaveta. — Levante-se, por favor.

Isso era ridículo, mas fiz como o ordenado. Ele


deveria estar pensando que eu estava doente pela minha
aparência e a minha apatia em responder suas perguntas.
Acontece que eu estava fisicamente bem, mas não podia
falar o mesmo sobre o meu emocional.

Leon colocou as peças articulares nos ouvidos e se


aproximou de mim com a peça auscultatória estendida em
uma das mãos. Pousando-a em meu peito, os olhos
concentrados nos meus, sem desviar, sem nem mesmo
piscar.

— Respire fundo, Bridget e solte o ar com calma —


instruiu.

Assim, tão perto, conseguia distinguir a fusão de


cores que seus olhos possuíam, as manchas verdes e
azuladas, um contraste bonito. Ele era alguns centímetros
mais alto que eu, o que me fazia erguer a cabeça para
poder encará-lo.

Leon era um homem lindo, tão atraente que eu poderia


ficar encarando-o por um dia inteirinho. Uma pena que a
arrogância e prepotência faziam parte do pacote.
— Isso... boa garota... — murmurou, enrouquecido,
conforme eu inflava o peito de ar.

O hálito quente bateu contra a minha testa, me


causando um estremecimento involuntário. Observei as
pupilas de Leon se dilatarem, cobrindo de preto as
manchas azuladas e esverdeadas.

Mordi o lábio inferior, a respiração tornando-se cada


vez mais densa e acelerada.

Por um tempo, apenas nos encaramos, como se


pudéssemos ler a alma um do outro. Tão próximos, tão
íntimos... tão arrebatador. Esqueci que gestava o filho dele
e que o conflito de sentimentos que eu sentia por ele não
poderia existir porque a nossa relação jamais poderia
passar de profissional. Por um pequeno momento, eu
apenas senti e não me preocupei.

Leon pigarreou e deu um passo para trás, quebrando


a conexão, e, com ela, toda a tensão sexual que nos
assolava.

— Não há constipação em seus pulmões e seus


batimentos cardíacos estão estáveis. — Ele tocou em meu
queixo com a ponta dos dedos e avaliou o meu rosto,
virando-o de um lado para o outro. — Também não noto
manchas em sua pele, então acredito que esteja tudo bem
com você.
— Eu disse que estava bem — retruquei, agradecendo
pela minha voz ter soado normal e nada abalada.

Leon bufou.

— O que claramente é uma mentira.

— E o que faz com que pense assim? — questionei,


arqueando uma sobrancelha.

— Está com uma fisionomia cansada, também possui


manchas abaixo dos olhos, o que significa que não tem
dormido ou se alimentado direito.

Removi a mão dele do meu rosto e me afastei, ficando


longe do seu alcance, longe da temperatura corporal
agradável e do cheiro que me fazia alucinar.

— Estou grávida, óbvio que estou cansada, não é


assim que as coisas funcionam? — objetei, esfregando os
cabelos. — Ele deve estar absorvendo a minha energia, o
que me deixa mais cansada do que o normal.

Leon suspirou e depositou o estetoscópio em cima da


mesa, substituindo-o em sua mão pela receita médica.

— Por isso vai começar a fazer uso de vitaminas, elas


são essenciais na gestação, principalmente o cálcio, se
não tiver suficiente em seu corpo, o feto começará a pegar
dos seus ossos e dentes para poder se desenvolver —
explicou.
Meu Deus, que horror era esse?

Arregalei os olhos.

— E então? — perguntei com o estômago embrulhado.

Leon fez a volta na mesa, retirou o jaleco, puxou uma


gaveta recolhendo o celular e carteira, guardando-os no
bolso da calça.

— Vamos passar na farmácia — disse, erguendo o


pulso e conferindo a hora no relógio. — Depois vamos
almoçar.

— Eu tenho almoço, mas obrigada pelo convite —


contestei.

Ele me lançou um olhar enviesado.

— Não estou pedindo, Bridget, estou ordenando. —


Ergui uma sobrancelha, desafiando-o. Ele revirou os olhos.
— Faço questão de ser o médico obstetra responsável pelo
bom desenvolvimento do meu herdeiro, portanto, alimentá-
lo e cuidar das vitaminas adequadas é algo que faço
questão.

Eu poderia negar, era algo bem discutível, mas eu


estava mesmo com fome e não sentia vontade alguma de ir
para a cozinha abarrotada de residentes e funcionários
que ficavam conversando incansavelmente enquanto eu
me mantinha em completo silêncio, perdida em
pensamentos. Também vinha evitando Liam, conseguia
perceber suas investidas e a vontade de repetir o mesmo
que fizemos no passado.

Mas eu não podia e também não queria.

Não era só sobre o bebê, havia uma barreira que me


impedia de me relacionar com pessoas. Eu não queria
começar uma relação na base da mentira e tampouco
poderia falar a verdade, portanto, era melhor ficar na
minha por um bom tempo.

Eu gostava de ficar sozinha, já estava acostumada


com a minha própria presença. Sempre fiquei tão focada
nos estudos que nunca cheguei a sentir falta de uma
companhia, e agora não seria diferente, muito embora
Leon surtisse um efeito distinto dos outros sobre mim.

— Tudo bem — concordei, finalmente.

Leon abriu um sorriso luminoso que me fez desviar o


olhar para evitar sentir o que ele me causava.

Pelo menos eu poderia culpar os hormônios da


gravidez por isso.
Eu sabia que desejava Bridget, sentia um tesão do
caralho pela garota desde que a vi ela primeira vez. Mas
se as coisas não andaram para nós no passado, agora é
que não andariam mesmo, não quando ela carregava um
filho meu na barriga.

Eu poderia culpar a falta de sexo pelo meu


descontrole no escritório, não transava com ninguém
desde que descobri que seria pai o mais breve possível. E
nunca me senti tão atraído por uma mulher que estava
examinando como fiquei com Bridget mais cedo, enquanto
analisava sua respiração e batimentos cardíacos.
Acontece que eu não sabia mais se queria transar com
as minhas funcionárias, levar a vida na esportiva e o sexo
faziam parte deste divertimento, mas depois do que
aconteceu eu percebi que nem todo mundo pensava como
eu, e estava pagando agora pelo meu erro e o excesso de
confiança em minhas atitudes.

Peguei uma cesta e perambulei pelos corredores da


farmácia com Bridget ao meu lado. Ela estava em silêncio
e claramente abatida com tudo o que estava acontecendo.

Por mais frustrado que eu estivesse com a situação,


sabia que precisava dar apoio para Bridget, ela era apenas
uma jovem de vinte e sete anos que se viu grávida sem ter
feito nada que causasse isso. Estava perdida, confusa,
triste. Eu já era mais experiente, no auge dos meus trinta e
oito anos, entendia de cor e salteado como eram as
inseminações, assim como as barrigas de aluguel e o que
os hormônios da gravidez causavam em uma mulher.

Fiquei um tempo recluso, alguns dias renegando a


nova versão que a minha vida teria. Me consolei com
algumas garrafas de whisky e a reclusão.

E estava confortável assim, ao menos até Izabela


bater em minha porta e me lembrar que o tempo estava
passando e que Bridget precisava de um obstetra para
acompanhar a gestação.
Minha irmã se colocou à disposição para acompanhar
a garota, mas eu neguei na mesma hora. Obstetrícia era
uma das minhas especialidades, não deixaria que ninguém
cuidasse do meu herdeiro além de mim. Claro que não
poderia ser o responsável por conduzir o parto por causa
do fator emocional, mas poderia ser o médico da gestação.

E foi exatamente isso que eu fiz.

Me obriguei a reagir e ordenei que chamassem


Bridget, estava na hora de enfrentar os meus demônios. A
garota e o bebê precisavam de mim.

Olhei os nomes das vitaminas nas prateleiras e


comecei a selecionar as que eu precisava.

— Vitamina B9 é responsável pela formação do


cérebro e medula espinhal do feto — falei, jogando um
pote dentro da cesta. Bridget me encarava com os lábios
franzidos e os olhos atentos. Dei um passo para o lado. —
O cálcio é o responsável pela formação do esqueleto,
como você bem sabe — Joguei outro pote na cesta e
passei para o próximo. — A vitamina B6 serve para
apaziguar os enjoos.

— Mas eu não sinto enjoo — contestou.

Lancei a ela um olhar reprovador.

— Ainda — rebati. — E ela também ajuda no


desenvolvimento do sistema nervoso do feto.
— Sabe que pode chamá-lo de bebê, não é mesmo?
Não vai causar um impacto maior apenas por apelidá-lo
carinhosamente que não seja com nomes técnicos.

Joguei a vitamina dentro do cesto, os comprimidos


fizeram barulho ao bater nos outros.

— Você se importa em como eu me refiro a ele? —


perguntei, inclinando a cabeça em direção a barriga ainda
plana dela.

Bridget ponderou por um segundo, desviando o olhar


para as vitaminas, e então suspirou.

— Sim, eu me importo — confessou, sussurrando. —


Prefiro que o chame de bebê, é estranho se referir a ele
como feto, embora ele seja um.

Usar os termos técnicos para se referir a criança seria


o caminho mais fácil, mas não queria me indispor com
Bridget, estava aqui para dar apoio a ela, para ampará-la
no que fosse preciso. Como pai do filho que estava
esperando, como médico responsável e... como amigo.

— Tudo bem — concordei, recebendo dela um sorriso


lindo. Estendi a mão e peguei outro pote. — Vitamina D
oferece proteção para a bolsa amniótica e para a placenta,
reduzindo risco de ruptura. — Joguei dentro da cesta e dei
mais um passo para o lado. — O ferro ajuda na produção
de hemoglobina do bebê.
Bridget cruzou os braços.

— Uhum... — concordou, lembrando-se de alguma


aula da faculdade.

Recolhi a última vitamina da prateleira e a elevei em


frente ao seu rosto.

— E, por fim, o zinco. Ele ajuda no desenvolvimento


neurológico e cognitivo do bebê. A falta dele pode retardar
o crescimento e a formação de neurônios.  — Joguei o
último dos potes na cesta, finalizando nossas compras.

Caminhei até o caixa e entreguei nossas compras para


a balconista. Percebi a forma ambígua como ela me
olhava, mordendo os lábios, apertando os braços para que
os peitos saltassem. E, como um maldito homem
responsável, simplesmente ignorei a proposta de sexo
rápido e fácil.

Eu nem era pai ainda e sentia que as coisas estavam


mudando, como se algo tivesse sido acionado em minha
mente, alterando o percurso dos meus pensamentos.
Dentro de poucos meses, haveria um bebê que precisaria
de mim e, por mais que fosse apenas um herdeiro, não
queria passar para ele ou ela um péssimo exemplo.

Ouvi Bridget bufar ao meu lado e sabia que ela tinha


reparado na proposta da balconista, assim como eu.
Fingindo naturalidade, ignorei ambas as mulheres e
removi algumas notas da carteira e joguei em cima do
balcão.

— Fique com o troco — avisei, recolhendo a sacola,


encarando a balconista apenas tempo o suficiente.

Girei nos calcanhares e sai da farmácia, surpreso


comigo mesmo e em como eu estava amadurecendo. O
novo Ben, o homem pronto para casar e ter filhos, ficaria
orgulhoso se estivesse conosco.

— E agora? — falou Bridget. — O que vamos fazer?

Abri a porta da minha Ferrari e joguei as sacolas no


banco de trás. Coloquei meu Ray-Ban estilo aviador e sorri
para a garota.

— Vamos comer alguma coisa, mas antes, preciso


saber o que o bebê deseja — avisei, escorando-me na
porta e inclinando o queixo em direção ao seu abdômen.

Bridget pensou, coçando o maxilar com o dedo


indicador, e quando me olhou outra vez, sabia que o
desejo por comida dela não me agradaria em nada, pois
ela abriu um sorriso traiçoeiro e os olhos brilharam, cheios
de provocação.

— Apenas dirija, doutor Dubrow, enquanto eu dito o


caminho — disse, sentando-se no banco passageiro.
Mulheres grávidas e suas vontades absolutas.

Escorado na porta do meu carro com os braços e


pernas cruzados, encarava Bridget com um olhar
reprovador.

— Eu disse que iria te levar para se alimentar e não


para envenená-la — anunciei, balançando a cabeça com
desaprovação.

A garota simplesmente encolheu os ombros e deu


outra mordida no cachorro-quente, sujando os cantos da
boca com maionese e mostarda.

De tudo o que poderia comer, Bridget resolveu me


arrastar até uma barraquinha de cachorro-quente que
ficava perto da praia. Ela ficou o caminho inteirinho
falando em como era o melhor que já tinha experimentado,
dizendo que estava com água na boca e até mesmo
sonhando com o gosto, tudo para me fazer ceder e levá-la
até o local.

— Mas estou sendo alimentada — retrucou, erguendo


o pão. — E isso aqui é a melhor coisa que existe, é sério,
você precisa experimentar.

Fiz um aceno de desdém com a mão, descruzando os


braços.
— Obrigado, mas eu passo.

Minha alimentação era regrada e saudável, priorizava


a minha saúde, e, como médico, sabia o quanto a
alimentação culminava para o bem-estar.

Deveria permitir que a garota comesse essas


porcarias? É claro que não! Mas como eu poderia negar
para ela quando ficou o caminho inteiro falando sobre isso
com um brilho nos olhos que eu não via há dias?

Olhei para o céu, nuvens escuras passeavam,


causando sombras no azul claro e afastando o sol. Em
breve, começaria a chover, o que era bem comum nessa
época do ano.

Bridget terminou o primeiro cachorro-quente e limpou


o rosto com um guardanapo. Em cima da mesa de madeira
em que estava sentada, havia outro sanduíche e uma
garrafa de água.

— Quantos desse você come? — perguntei.

Um vento gelado balançou meus cabelos, carregando


com ele o cheiro de grama molhada e chuva.

— Normalmente, apenas um, mas desde que... hum...


estou nessa condição, passei a ter um apetite um pouco
maior.

Um sorriso bobo se espalhou pelo meu rosto.


— Condição você quer dizer, grávida? — questionei,
rindo ainda mais com o rubor que se espalhou pelas
bochechas dela.

Ela fez um aceno com a mão.

— Você entendeu o que eu quis dizer — atirou,


revirando os olhos.

Sim, eu tinha entendido muito bem, mas não dirimia o


fato de que ela ficava muito linda envergonhada, a cor
rosada nas bochechas realçava o verde dos seus olhos.

Ela recolheu o segundo cachorro-quente de cima da


mesa e mordeu a ponta do sanduíche com tanta vontade
que nem parecia que tinha acabado de devorar um.

— Tá, me deixe provar isso daí, não é possível que


esteja comendo com tanta vontade como se não fosse
alimentada há semanas e ele seja ruim — falei, ignorando
o olhar vitorioso que ela jogou para mim.

Me afastei do carro e me sentei no banco de frente


para ela.

— Só um pedaço ou vai ter que comprar outro para


mim — avisou, me estendendo o sanduíche.

— Ciumenta com a comida, quem diria, doutora Adams


— gracejei, forçando o nome dela deslizar pela minha
língua com certo desfrute.
Não removi o sanduíche das mãos de Bridget, apenas
me inclinei para frente e dei uma mordida no pão,
lambuzando meus lábios com a maionese que saltava
pelos lados.

Era mesmo bom, não a melhor coisa que já tinha


experimentado na vida, mas não era ao todo ruim,
conseguia entender um pouco a fissuração dela pela
porcaria, ao menos em parte, porque tinha certeza de que
a gravidez e os desejos aleatórios contribuíam para esse
desejo todo.

— E então? — perguntou, ansiosa, puxando o


cachorro-quente de volta para si e dando outra mordida.

Puxei um papel toalha e me limpei, antes de


respondê-la.

— É bom... — revelei. — Mas ainda não consigo


entender essa fissura toda, existem lanches bem mais
saudáveis e gostosos.

Bridget revirou os olhos e bufou.

— Então vá comer suas “comidas saudáveis” e me


deixe em paz com o meu cachorro-quente nada saudável.

Descansei um braço em cima da mesa enquanto a


encarava, rindo.
— Sim, vou deixá-la comer em paz, mas da próxima
vez serei eu quem vai escolher o prato, a senhorita não
passou no teste. — Apontei um dedo em riste para ela.

— E qual teste seria esse?

— Sobre saúde e bem-estar. Não é uma jovem muito


zelosa com a própria saúde, embora seja médica e cuide
dos outros, não parece dar para si a mesma relevância que
dá aos seus pacientes.

Ela ficou em silêncio, enfiando mais e mais comida na


boca para evitar a conversa, fingindo que não ouviu nada
do que eu falei, o que só sanou as minhas dúvidas e
respondeu os meus questionamentos.

Uma gota pingou em mim. Olhei para cima e vi a


nuvem pesada e escura que tinha tomado conta do céu.
Esfreguei meus cabelos, secando a água que tinha
molhado algumas mechas.

— Ah, por favor, não... — Ouvi Bridget murmurar, o


que me fez olhar para ela imediatamente. Vaguei meus
olhos pelo seu corpo, procurando o indício da dor que
parecia sentir, mas não encontrei nada.

— O que está acontecendo? — perguntei, o desespero


beirando a acabar com a minha paz.

Bridget jogou o resto do sanduíche na mesa e levou


as mãos aos lábios. Percebi que ela estava trêmula e um
pouco pálida.

— Eu... eu não quero me molhar... por favor, me leve


para algum lugar coberto.

Franzi a testa.

Não era a primeira vez que ela falava assim sobre a


chuva, parecia que havia um pânico em sua voz todas as
vezes que tocava no assunto. E quando ergueu os olhos
até o céu e viu as nuvens espessas, tive a certeza de que
precisava.

Bridget não odiava tempestade, ela tinha pânico.

Mas, por quê?

— Meu apartamento fica aqui perto, vamos para lá,


não chegaremos a tempo na clínica de evitar a chuva —
frisei, estendendo a mão para ela.

— Tu-tudo bem — gaguejou.

Quando a palma dela tocou na minha, senti a pele


gelada, o medo cada vez mais escancarado. Assim como
senti uma vontade absurda de abraçá-la, um instinto
desconhecido de proteção me dominando.

Talvez o fato de que estivesse carregando um filho


meu me deixasse confuso, eu não saberia dizer, mas
Bridget tinha acabado de remover de mim, sem nem
mesmo perceber, sentimentos novos e profundos.
Eu levaria a garota para casa e a protegeria dos seus
próprios medos, ajudando-a a evitar os pesadelos que lhe
atormentavam. E ficaria por perto, para que pudesse me
contar quando se sentisse pronta para fazer isso.
Leon acelerou o carro, atravessando as ruas acima da
velocidade máxima permitida.

Olhei para o céu, suplicando que a chuva esperasse


eu chegar em casa, mas pingos caíam, densos e espessos,
ainda que não constantes.

Era muito idiota que o clima pudesse me atormentar,


mas não havia nada que pudesse ser feito quanto a isso,
era algo que carregava comigo desde muito cedo.

Leon apertou um controle e o portão de um prédio


luxuoso, de um dos bairros mais caros da cidade, que
ficava de frente para a beira-do-mar, começou a se abrir.
— Pronto, nós chegamos — avisou ele, como se
estivesse tentando me acalmar com a notícia.

O carro entrou em uma garagem subterrânea, bem


longe do céu aberto e só então eu consegui respirar com
calma. Encostei a cabeça no banco e fechei os olhos,
acalmando o meu sistema nervoso que estava prestes a
entrar em colapso.

— Vamos ficar aqui até a chuva passar — comentou


ele, estacionando o carro em uma das vagas disponíveis.

Percebi que era uma garagem privativa, havia mais


três modelos de carros, sendo dois conversíveis e uma
SUV, e, mais ao canto, uma moto.

Fiz menção de sair do veículo, mas Leon segurou o


meu braço, mantendo-me no lugar.

— Está tudo bem? — perguntou, evidenciando a sua


preocupação.

Acenei com a cabeça.

— Agora sim — revelei.

Ele me encarou por mais um momento, procurando a


verdade, antes de me soltar e manear a cabeça,
concordando.

Desci do carro e esperei por ele. Leon seguiu até um


elevador e apertou o botão que levava para o último andar
do prédio. Óbvio que ele teria um apartamento na
cobertura, típico de homens como ele.

— Se sente enjoada ou algo relacionado? — indagou,


assim que as portas da caixa metálica se fecharam e o
elevador começou a subir.

Fiz um barulho com a garganta.

— O cachorro-quente estava delicioso demais para me


deixar enjoada, Leon, pare de se desfazer da minha
comida favorita do momento. — Bufei.

Ele jogou os braços para cima.

— Longe de mim ofender aquela obra-prima —


zombou.

O elevador apitou no último andar e Leon digitou uma


senha no painel digital, fazendo as portas se abrirem,
dando direto para um rol requintado.

O piso de mármore escuro contrastava com as


paredes de vidro. A decoração era moderna e luxuosa,
toda em tons preto, vermelho e cinza.

— Venha, vamos fazer alguma coisa enquanto


esperamos a chuva passar — disse, me puxando pelo
pulso.

A parede de fundo tinha vista para a praia onde o azul


ímpeto do mar se distendia até onde os olhos podiam
enxergar. Também havia uma área com piscina infinita e
banheira de hidromassagem.

— O seu apartamento é lindo — elogiei, perplexa com


todo o luxo.

Leon foi até a porta de vidro que dava para a área


externa e observou a rua. Uma chuva leve e fina batia nos
vidros e remexia a água da piscina.

— Obrigado — murmurou. — Comprei assim que


comecei a trabalhar na clínica, queria sair da casa dos
meus pais e morar em um lugar que eu me identificasse —
Apontou com o queixo para o mar –, eu adoro essa vista,
amo observar o sol nascendo lá atrás, como se estivesse
saindo da água.

Sorri ao imaginar a cena de um Leon descalço, com os


cabelos bagunçados e o rosto amassado de sono,
segurando uma xícara de café nas mãos.

— Deve ser mesmo linda — comentei, ignorando o


fato de que eu estava sendo ambígua, já que apenas eu
sabia o que se passava na minha cabeça.

— Então... — Ele se virou para mim e colocou as


mãos nos bolsos da calça. — Qual é o seu problema com a
chuva? — perguntou.

Eu engoli em seco e senti o sangue correr mais rápido


pelas minhas veias, não queria falar sobre isso, o assunto
sempre me incomodava. Desviei o olhar, encarando as
gotas que enchiam a piscina, formando círculos na água
parada.

— Trauma de infância — ciciei, contando um pouco da


verdade.

— Que tipo de trauma? — insistiu ele, dando um


passo em minha direção.

Eu não falava sobre Brandon com ninguém, nem


mesmo com os meus pais, era como se ele tivesse se
tornado um assunto proibido. A ferida que a morte dele
causou na minha alma ainda era fresca, profunda demais
para cicatrizar tão rápido. E no fundo eu sabia que a
carregaria para sempre comigo, que ela jamais seria
curada por completo.

Falar sobre o meu gêmeo perdido me fazia lembrar de


tudo, inclusive da perda, da morte, da dor que era não tê-
lo mais por perto.

Meus aniversários eram uma tormenta, minha vida era


vazia e triste, por isso evitava sobrecarregá-la ainda mais,
por consequência, evitava falar sobre Brandon.

— Eu não quero falar sobre isso — sussurrei.

Leon suspirou.
— Estarei aqui quando se sentir pronta para
conversar, Bridget. Querendo ou não, teremos um vínculo
para sempre, por isso quero conhecer você melhor, quero
compreendê-la.

É claro que era isso que ele queria, com a cabeça


técnica que tinha, Leon provavelmente iria querer saber
tudo sobre mim para que pudesse deduzir como seria o
herdeiro e se ele supriria suas expectativas.

— Tudo bem — concordei, erguendo o maxilar. — E


então, o que costuma fazer quando está sozinho em casa?

Ele arqueou uma sobrancelha.

— Quando estou sozinho com uma mulher? — Riu,


balançando a cabeça. — Costumo foder, mas nós podemos
encontrar alguma outra coisa para fazer, algo que seja da
sua vontade.

E lá estava o idiota arrogante de sempre! Ele até


conseguia se esconder por debaixo de uma máscara, mas
a verdadeira face sempre acabava vindo à tona em algum
momento.

— Só vamos esperar a chuva passar e pronto, quero


voltar para o consultório, tenho algumas coletas para
fazer. — Caminhei até o sofá de couro preto e me sentei
nele, acomodando-me no estofado macio e confortável. —
A propósito, muito obrigada por ter reparado que havia
algo errado e por ter me trazido para a sua casa, significou
muito para mim.

Leon se sentou na outra ponta do sofá, fazendo-o


afundar e jogou o braço no encosto, obtendo uma posição
relaxada e distraída.

— Eu nunca trouxe uma mulher para a minha casa,


sabe como é, lar é um templo sagrado e pessoal. — Me
encarou. — Mas você não é qualquer uma, é a mãe do
meu herdeiro.

Ergui os lábios em um sorriso triste.

— Sua incubadora particular.

— Que seja. Também é minha residente e talvez uma


das minhas futuras funcionárias.

— Esquece, assim que terminar a minha residência


quero começar a trabalhar no hospital oncológico infantil,
não tenho planos de permanecer na clínica — revelei.

— Bom... é uma pena, pois você é um dos nomes de


sucesso dessa equipe de residentes. — refutou, sentando-
se de lado e ficando de frente para mim. — Mas é um
caminho muito bonito o qual quer seguir, assim como
precisa ser muito forte e ter um psicológico inabalável.

Se ele soubesse como eu compreendo isso, como


senti a dor pessoalmente, entenderia que estou pronta
para assumir este papel. Mais do que isso, sou preparada,
não pela faculdade ou pela profissão, mas pela vida.

— Eu sei, mas estou pronta, Leon, é isso o que eu


quero fazer — falei, convicta, sem deixar que nada
pudesse colocar em pauta a minha decisão.

Era bom saber que eu teria um trabalho garantido na


clínica se precisasse, e que eu estava me destacando,
pois trabalhava arduamente para isso, queria ser a melhor
em tudo o que eu fazia, sentia orgulho de mim mesma,
mas não seguiria esse caminho para sempre, só pelo
tempo necessário.

Esfreguei as mãos suadas uma na outra em uma falha


tentativa de dizimar o suor, mas enquanto eu continuasse
nervosa, nada adiantaria.

— Está pronta? — perguntou Leon, comprimindo os


lábios.

Limitei-me a acenar, sem conseguir proferir uma única


palavra.

Me deitei na maca com as pernas trêmulas e a


respiração ofegante. Então levantei a minha blusa e pousei
os braços ao lado do corpo, encarando as luzes
incandescentes que iluminavam o teto.
Leon colocou o gel gelado em minha barriga e ligou o
ecógrafo, aproximando o aparelho de mim até pousá-lo em
meu ventre.

— Vamos conhecer esse bebê — murmurou, os olhos


fixos na tela.

Ele começou a esfregar o aparelho ao redor do meu


abdômen, procurando o local exato em que o bebê se
encontrava.

— Olhe aqui — Apontou para o televisor — temos uma


cabeça, o corpinho, perninhas e os pés.

Era uma imagem distorcida, mas que deixava nítido


algumas partes da criança que ainda era tão pequena.

Tentei conter a emoção e fingir que não me importava,


mas o peito comprimido deixava claro que não seria
possível.

— Vamos ouvir o coração — falou apertando em um


botão.

Um barulho constante, acelerado e muito alto,


começou a entoar pela sala, como o bater de asas de um
passarinho. Para um leigo, era impossível identificar como
um batimento cardíaco, mas eu sabia o que significava.

— Espera… — Leon riu e pendeu a cabeça para o


lado, concentrando-se. — Ouça bem, Bridget, ouça bem —
repetiu, o sorriso se ampliando e se transformando em
uma risada alta.

Tentei identificar o que quer que fosse que ele


estivesse tentando me mostrar, mas eu não consegui.

— Está tudo bem com o bebê? — perguntei, sentindo


minha respiração falhar pelo medo de que algo estivesse
errado com ele.

Leon me encarou, os olhos brilhavam, cheios de uma


emoção genuína e… linda.

— Com os bebês, você quer dizer?

Arregalei os olhos e abri a boca em um “o” perfeito.

— São gêmeos? — crispei em tom esganiçado.

Leon esfregou o aparelho um pouco mais para baixo,


indo em direção a minha bexiga.

— Sim, olhe aqui o segundo saco gestacional —


Apontou outra vez para a tela. — Aqui se desenvolve outro
bebê perfeito. São gêmeos bivitelinos, portanto,
poderemos ter um de cada sexo ou do mesmo sexo —
explicou.

Ah, eu sabia bem como funcionava.

Mordi as bochechas e fechei os olhos para conter as


lágrimas, saber que gestava uma vida tinha me deixado
abalada, mas saber que eram gêmeos, assim como
Brandon e eu, era bem diferente. Mexia tanto comigo que
não conseguia controlar as minhas emoções conturbadas.

Eu me sentia tão quebrada que não suportava a dor


de ter que encarar o fato de que eu seria uma mãe de
aluguel, que não poderia comemorar a gestação gemelar
ou sentir emoção por isso. Eu só poderia ficar inerte com a
notícia e fingir que ela não me emocionava, mesmo
quando o meu coração dizia o contrário.

Me concentrei melhor no som que o aparelho fazia e


então pude perceber o segundo coraçãozinho batendo, o
bebê escondido revelando a sua presença. Ele era tão
constante quanto o primeiro e quase não dava para
perceber, exceto por uma pequena diferença de poucos
segundos.

Um coração batia. O outro acompanhava.

Eles eram perfeitos.

— Porra, Bridget, ganhamos na loteria — comemorou


ele, fazendo as fotos da ecografia. — Até meus
espermatozoides são bons e fortes, já foram logo e se
desenvolveram em dois. Dois herdeiros, isso sim que é
ganhar um prêmio.

Não consegui conter a gargalhada que separou os


meus lábios.
— Espero que eles não sejam tão egocêntricos quanto
você — zombei.

Leon fez uma careta, fingindo estar ofendido.

— Mas essa é de longe a melhor característica minha


que eles poderiam ter.

Revirei os olhos, fazendo-o gargalhar outra vez.

— Obrigado por isso, Bridget.

— Pelo quê?

Ele sorriu.

— Por me conceder momentos como esse que eu nem


sabia que precisava e que eu queria, até agora.

— De nada — falei, fingindo não me importar,


desviando o olhar do dele.

Virei a cabeça na direção contrária a do visor, não


queria ver como os bebês estavam se desenvolvendo, nem
mesmo pensar muito no fato de que eram gêmeos.

Se Leon soubesse que a minha genética pode ter


contribuído com isso, e muito, não iria se vangloriar tanto.

Gêmeos.

Como Brandon e eu.


Espremi meus olhos, evitando que lágrimas
escorressem e entregassem os meus sentimentos.

A vida era uma filha da mãe injusta pra caralho


mesmo!

De tudo o que poderia fazer para me deixar ainda


mais abalada do que eu já estava, essa era a pior coisa de
todas.
Levantei minha blusa e encarei o meu reflexo na
frente do espelho do banheiro feminino da clínica. Minha
barriga possuía uma densidade na parte debaixo, o
primeiro indício dos bebês que dividiam o corpo comigo.

Não dava para dizer, ainda, que eu estava grávida,


parecia apenas que eu estava comendo mais do que
deveria e ganhando alguns quilos por conta disso.

Já não conseguia mais usar roupas apertadas, sempre


optava por blusas largas e calças com elastano, assim elas
se adequavam bem à minha cintura e não apertavam a
minha barriga. Estava usando o uniforme de residente da
clínica alguns números maiores do que o adequado para o
meu corpo, assim conseguia manter a barriga escondida e
fazer as calças servirem adequadamente em meus quadris
que se alargavam mais a cada semana. Por sorte, meu
rosto não havia mudado absolutamente nada e o peso que
eu estava ganhando ia para os bebês.

A porta foi aberta abruptamente e Helena entrou no


banheiro, parando ao me ver. Os olhos dela voaram para o
meu abdômen e um sorriso curvou os seus lábios.

— Eles já estão começando a aparecer — murmurou,


apontando com a cabeça em direção a minha barriga.

Suspirei e deixei a blusa cair, ocultando de volta o


meu maior segredo.

— Sim, em breve eu terei que deixar a minha casa —


falei, ligando a torneira para lavar as minhas mãos.

Eu não me sentia infeliz por isso, na verdade, sentia


um pouco de alívio por ter que diminuir ainda mais a minha
convivência com o meu pai, mas sentia certa desolação
pela minha mãe, por saber que a deixaria sozinha.

Era irônico o quanto eu era uma mentirosa, movida e


moldada por mentiras completas. Ninguém sabia sobre a
minha vida, absolutamente ninguém. Enquanto os meus
pais sabiam sobre Brandon, não sabiam sobre os bebês e
as minhas dívidas. Já Leon e algumas pessoas sabiam dos
bebês e só. Cada um que passava pelo meu caminho sabia
tão pouco de mim. E isso era tão triste, só ressaltava
ainda mais como eu era sozinha desde que Brandon me
deixou.

— Nunca vai contar para os seus pais? — perguntou


Helena, escorando o quadril na pia.

Terminei de lavar as minhas mãos e puxei algumas


folhas de papel, secando-as, antes de amassá-las e jogá-
las na lata de lixo.

— Você não entende... — comentei, olhando no fundo


dos seus olhos através do reflexo do espelho. — Meu pai
jamais entenderia e a minha mãe nunca me perdoaria por
isso. Eles podem estar aqui por um erro, mas ainda
possuem uma parte minha, Helena. Querendo ou não,
sempre serei a mãe deles.

Ah, e como me atormentava.

Será que Leon seria mesmo um bom pai? Algumas


vezes ele parecia muito animado com a ideia, enquanto em
outras ele tratava as crianças como um negócio, um
investimento para o futuro.

Algum dia eles gostariam de saber sobre mim? Iriam


querer me conhecer ou me procurar? Eu não tinha como
saber, talvez desenvolvessem o sentimento de abandono
materno e me odiassem assim que aprendessem a falar,
tirando conclusões próprias sobre a história.

E eu jamais seria capaz de culpá-los por isso.


Poderiam denominar como fosse, mas, no final das
contas, estava vendendo os meus filhos, não importava o
que dissessem, era isso o que eu pensava e sentia que
estava fazendo.

Ela estendeu a mão e tocou em meu braço, passando-


me certo conforto.

— Entendo, Bridget, mas tente ver as coisas com um


olhar mais profissional — murmurou. — Muitas mulheres
fazem isso, é claro que elas são preparadas
psicologicamente para a situação, mas eu quero dizer que
é mais comum do que pensamos.

Não falaria para ela que já pesquisei tudo sobre o


assunto e que até mesmo fiquei com vontade de encontrar
uma barriga de aluguel para fazer algumas perguntas.
Mas, como ela mesmo disse, eu não era preparada para
isso, então não poderia ver a situação com um olhar
profissional que não existia para mim.

— Tudo bem... — falei, afastando-me dela. — Eu vou


almoçar, tenho uma coleta para fazer em alguns minutos e
preciso comer alguma coisa.

Ela ergueu o rosto em um sorriso acolhedor.

— Se alimente com calma e coma bem, afinal, não é


só você que depende disso — baixou o olhar para a minha
barriga –, posso fazer a primeira coleta para você, não se
preocupe.
Não tinha ido me alimentar mais cedo porque me
sentia muito enjoada e não conseguia nem mesmo pensar
em comer alguma coisa, então fiquei sentada, mexendo no
celular, enquanto esperava o enjoo passar. E agora estava
atrasada para o almoço.

— Obrigada — agradeci, sorrindo. — Tentarei ser


rápida, mas não sei como vai ser quando sentir o cheiro do
almoço... eu ando um pouco enjoada dos cheiros.

Ela balançou a cabeça e uma risada deixou os seus


lábios entreabertos.

— Isso se chama gestar uma vida — brincou. — E


esses são apenas alguns dos sintomas que ainda estão
por vir.

Franzi a sobrancelha, imaginando como eu ficaria


quando os outros sintomas chegassem. Provavelmente
estaria sozinha nessa fase, teria que sair de casa e fingir
que estava em uma viagem inexistente, quando, na
verdade, ficaria sozinha em um apartamento, tomando
conta de uma gestação não programada, dos sintomas
chatos e do meu psicológico abalado com tudo o que
estava acontecendo, não teria nem a minha mãe por perto
para me ajudar, não teria ninguém, apenas a mim mesma
para contar.

— Espero que eles sejam bonzinhos comigo —


murmurei, espalmando uma mão na barriga.
Helena seguiu para uma das cabines dos banheiros,
sorrindo do jeito assustado que deixei transparecer como
me sentia quanto aos possíveis sintomas da gestação.

A porta foi aberta outra vez e algumas residentes


entraram, aproveitei o momento para deixar o lugar.
Perambulei pelo corredor em direção ao refeitório, mas mal
pisei no local e senti o cheiro forte de comida, o que já fez
meu estômago se revirar.

— Por favor, nós precisamos comer alguma coisa ou


vamos desmaiar no meio do dia — sibilei, falando comigo
mesma, baixo o suficiente para que ninguém mais pudesse
ouvir.

Abri a geladeira e olhei dentro dela, procurando pelo


meu pote de comida. Todos eles possuíam identificação
para evitar transtorno. Recolhi o meu e me afastei em
direção ao micro-ondas, mas parei, decidindo se
esquentaria ou não a comida.

Eu estava tendo problemas com o cheiro e comida


quente exalava aroma.

Suspirei, girando nos calcanhares e caminhando até


uma das mesas.

Não me arriscaria, se eu ficasse tão enjoada como


estava mais cedo, nada entraria na minha boca, apenas
sairia por ela.
Sentei-me em uma das mesas e removi a tampa do
pote. Encarei a massa com molho, um pouco decepcionada
por saber que não ficaria tão bom estando frio.

Agora entendia quando as grávidas diziam como a


gestação era difícil e complicada. Meus hormônios
estavam um caos, quase acabando comigo. Eu me sentia
excitada na maior parte do tempo, só pensava em como
necessitava gozar e me aliviar. Também estava começando
a sentir desejos meio absurdos, como quando misturei em
uma manhã pasta de amendoim com feijão, comi tudo
achando que tinha encontrado a oitava maravilha do
mundo e meia hora depois vomitei até as tripas no vaso.

Segurei o garfo e o espetei na massa, o negócio


estava tão duro que parecia um pedaço de carne ao invés
de macarrão.

— Hum... que sustância deliciosa e... gelada —


zombei em um sussurro.

Enfiei o primeiro pedaço na boca e mastiguei com


calma, seguindo um padrão para não enjoar e,
consequentemente, vomitar.

Prender a respiração. Mastigar. Engolir. Repetir os


movimentos.

— Ei, acredito que eu tenha escolhido o dia certo para


alimentar você. — A voz de Liam soou à minha esquerda.
Olhei na direção dele e o encontrei segurando dois potes
de yakisoba. — Você parece mesmo infeliz comendo essa
massa aí... — comentou, estreitando os olhos para o meu
pote.

— Eu não estava me sentindo muito bem hoje, então


resolvi comer sem esquentar, só que não é uma ideia tão
genial quando o macarrão fica duro e sem gosto — refutei,
balançando o garfo de um lado para o outro.

Liam soltou uma risada alta.

— Por isso existem amigos incríveis como eu — disse,


estendendo o pote de yakisoba para mim. — Percebi que
não anda se alimentando direito nos últimos dias, e como
hoje eu precisava comprar algo para comer, lembrei do
tempo da faculdade e de como nos divertíamos comendo
isso.

Senti um rubor esquentar o meu rosto, esquentando o


meu corpo e fazendo a minha boceta pulsar em seco com
as lembranças. Nós costumávamos fazer isso antes de
transar no apartamento dele perto do campus.

Liam estava querendo mesmo transar comigo, repetir


o que fizemos no passado. Por um momento, pensei que
fosse apenas o jeito dele, até cheguei a suspeitar por
causa de algumas investidas, mas nada havia ficado tão
claro e óbvio como agora.Limpei a garganta.

— Obrigada — agradeci, pegando o pote da mão dele,


sorrindo amplamente.
Seria bom ter alguém para me ajudar a acalmar a
porcaria dos meus hormônios, mas acho que ele não seria
tão tolerante quando soubesse que eu estava grávida de
outro.

Eu poderia mentir e transar com ele logo, antes que a


barriga se desenvolvesse mais. Mas o que eu falaria para
ele assim que aparecesse bem grávida na clínica meses
depois disso? Ele com toda a certeza do mundo surtaria,
talvez até fizesse um pequeno escândalo e duvidava muito
que acreditasse que eu já estivesse grávida. Até fazer as
contas e perceber que o cálculo não batia, muita coisa
poderia acontecer, envolvendo um escândalo
desnecessário e talvez até mesmo uma demissão.

Então não, seria muito melhor manter a minha vagina


em greve enquanto eu não cuspisse as crianças para fora
do meu corpo.

— Vamos comer — disse ele, puxando a cadeira para


se sentar.

— Estou atrapalhando alguma coisa por acaso? —


perguntou Leon, surgindo em meu campo de visão.

Ele parecia irritado, os lábios estavam franzidos para


baixo e uma veia pulsava ao lado do pescoço. Os olhos
verdes-azulados encaravam a nuca de Liam com tanto
fervor que, se ele tivesse poderes, teria dizimado a
presença do residente apenas com a encarada.
— Doutor Dubrow, como vai? — cumprimentei-o
formalmente.

A nossa relação não era mais assim, Leon e eu


tínhamos evoluído para uma amizade, mas não queria
deixar nada transparecer, as pessoas não entenderiam e
logo me taxariam como apenas mais uma das amantes
dele.

Ele correu os olhos até mim, estreitando-os tanto que


pareciam pequenas fendas de puro ódio.

— Helena me disse que você passou mal — falou,


estalando a língua no céu da boca, então pendeu a cabeça
para baixo, voltando a encarar Liam. — mas parece que já
tem companhia e alguém disponível a cuidar de você.

Liam se virou na cadeira em direção ao médico, bem


alheio ao olhar mortal que estava recebendo. Ele sorriu e
estendeu a mão em cumprimento.

— Doutor Dubrow, é uma honra finalmente poder falar


com você pessoalmente, sou um fã — arquejou –, acho o
seu trabalho incrível, quero muito aprender com o senhor,
tenho interesse em seguir a área da obstetrícia no futuro
também.

Franzi as sobrancelhas e contive a iminente vontade


de revirar os olhos.
Liam estava forçando algo que não existia, Leon não
gostava dessa falsa bajulação e deixava isso óbvio pela
maneira apática com a qual ignorava o residente.

— Aham — ciciou Leon, ignorando-o. — Você está


melhor? — perguntou para mim.

Liam franziu o cenho e olhou para nós dois, a


desconfiança brilhando em seus olhos como brasas
flamejantes.

Enrijeci na cadeira, ajeitando a minha postura.

— Acho incrível o tratamento da clínica com os seus


residentes, obrigada pela preocupação conosco, doutor
Dubrow, mas estou bem sim, acredito que seja algo que eu
comi e que me fez mal — menti, erguendo os lábios em um
sorriso inocente.

Sob hipótese alguma eu deixaria que duvidassem da


minha capacidade como médica, e era justamente isso que
aconteceria caso pensassem que eu era apenas mais uma
das residentes que caiu no papinho de Leon Dubrow, o
médico gato, arrogante e cafajeste.

Leon trincou a mandíbula, a irritação fazendo um vinco


aparecer no meio da testa.

Ele ergueu a mão e deixou um cachorro-quente na


minha frente.
— Eu trouxe para você — avisou. — Comer coisas que
goste pode ajudar com os enjoos, embora não seja o certo,
é melhor do que ficar em jejum.

Meu coração errou uma batida com o gesto dele. Por


mais idiota que fosse, porque Leon só estava fazendo isso
pelos filhos que pertenciam a ele e eu carregava, não
podia deixar de me sentir um pouco... emocionada com o
gesto. Quando pensei que estava sozinha, aqui estava ele,
mostrando que se importava com a minha saúde e que iria
cuidar de mim.

Pigarreei.

— Obrigada.

Liam fez um barulho com a garganta.

— Viu só, Bridget, agora pode escolher o que vai


querer comer — brincou, ainda alheio à tensão que nos
cercava. — E como está enjoada dos cheiros, nenhuma
das comidas que nós trouxemos irá causar isso.

Leon cruzou os braços e arqueou uma sobrancelha


loira.

— Enjoada dos cheiros? — questionou, franzindo o


nariz.

Como eu poderia me concentrar quando ele exalava


uma posição tão sexy? Conseguia distinguir cada gominho
dos seus braços, os músculos estavam saltados por causa
dos braços cruzados. E as pernas afastadas e torneadas,
circundadas por uma calça jeans que era justa demais e
acentuava a virilha, delineando-a e me fazendo imaginar
tantas coisas. E, além do mais, ele ficava tão
incrivelmente... quente, exalando irritação e autoritarismo.

Oh, céus!

Balancei a cabeça.

Eu iria enlouquecer até parir essas crianças.

Quando falavam sobre pico hormonal eu imaginava


muitas coisas, mas nenhuma delas chegou perto do que
realmente acontecia. Eu poderia derreter apenas com a
porra do olhar de Leon. Simples assim.

Dispersei a minha mente do médico arrogante e sexy


como o próprio diabo deveria ser e me concentrei no fato
de que ele ainda aguardava uma resposta.

— Sim, estou enjoando cheiros — revelei, encolhendo


os ombros. — Acho que logo as coisas irão melhorar.

— Vamos conversar sobre isso mais tarde — avisou.

Liam se engasgou com a comida e eu arregalei os


olhos, lançando um olhar fulminante para Leon.

— Nosso plantão é só na semana que vem, doutor


Dubrow — retruquei com os dentes semicerrados.
Leon riu e ergueu uma sobrancelha, desafiando-me a
continuar rebatendo suas palavras.

Ele era a porra de um louco? Uma das partes do


nosso acordo era o sigilo absoluto e essa interação me
parecia intima demais para que não levantasse suspeitas.

Puxei o cachorro-quente e o removi da caixa,


erguendo-o e dando uma mordida, sem conseguir conter
um suspiro.

Leon olhou para mim, então para a comida que Liam


me trouxe e permanecia intocável em cima da mesa e, por
fim, para o cachorro-quente que lambuzava os meus
lábios. Ele abriu um sorriso que poderia compelir com o
sol, vitorioso, cheio de um orgulho masculino próprio e
genuíno.

— Até mais, doutora Adams — falou, antes de girar


nos calcanhares e sumir pelo meio das pessoas.

Qual era o problema de Leon? Ele parecia...


enciumado.

Mas é obvio que só parecia e não, de fato, estava.


Nossa relação era amigável em nome do acordo que
tínhamos e dos filhos que eu carregava, nada além disso.
Ou, ao menos, era o que eu achava.

— Então, qual é a sua com esse cara? — perguntou


Liam depois de alguns segundos em silêncio.
Abocanhei um pedaço enorme do pão, mastigando
com uma lentidão exagerada, postergando a resposta
enquanto pensava em uma desculpa.

— Nada demais... como sabe, estou na mesma escala


que ele de plantão, então acabamos criando uma certa...
hum... amizade — menti.

Liam soltou uma gargalhada.

— Amizade? Ele quer é foder você, Bridget, e deixou


isso bem óbvio.

Ora, mas que absurdo! Liam não podia simplesmente


se meter assim na minha vida ou fazer comentários
desnecessários.

Sorri para ele com ironia.

— E você não? — redargui, mudando de assunto.

Liam deu de ombros.

— Respeita a nossa história, gata! — Piscou um olho.

Eu ri e voltei a comer o meu cachorro-quente, sentindo


o peito expandir em felicidade por Leon ter se preocupado
o suficiente para ter ido até a barraquinha só para comprar
um para mim.

Lembraria de agradecê-lo por isso em algum


momento, não conseguiria mesmo comer outra coisa que
não desejasse tanto, mal tinha visto o yakisoba de Liam e
já me sentia enojada.

Os bebês estavam felizes com a atitude do pai.

E eu também.
Empurrei a porta da sala de reuniões com força,
fazendo-a oscilar para trás e bater na parede, causando
um barulho oco.

— O que diabos a porta fez para você? — questionou


Ben, erguendo os olhos das pilhas de papeis que mantinha
espalhadas por cima da mesa.

Ele estava trabalhando na sala de reuniões desde o


início da semana, quando decidiu que a mesa era muito
maior e melhor que a dele para os relatórios médicos que
precisava analisar, assim evitava que perdesse o foco ou
confundisse alguma coisa, misturando as folhas.
— Acredita que um engomadinho de merda de um dos
residentes estava tentando alimentar os MEUS filhos,
porra? — exasperei, passando uma mão nos cabelos.

Eu ainda não podia acreditar que tinha presenciado a


cena, como ele ousava pensar que poderia dar comida
para os meus filhos? Quem ele pensava que era?

Ben me olhou com as sobrancelhas franzidas.

— Como é?

Confirmei com um aceno.

— Isso mesmo que você ouviu — bufei, segurando o


encosto de uma das cadeiras com as mãos, apertando
tanto que os vincos das minhas mãos começaram a
embranquecer. — Eu fiquei sabendo que Bridget estava
passando mal, isso é muito normal nesse estágio da
gravidez, então eu fui até a porcaria de uma das barracas
de cachorro-quente que ela é viciada e trouxe um para ela,
mas quando cheguei no refeitório, um imbecil de um dos
novos residentes também tinha comprado comida para ela!
— grunhi, lembrando-me da cena.

Quando Helena foi até a minha sala mais cedo para


me comunicar que Bridget estava um pouco abatida,
sentindo-se enjoada e sem conseguir comer, soube na
hora o que precisava fazer para conseguir alimentá-la.
Nessa fase, era comum perder peso por conta dos enjoos
e náuseas.
— Espera, você está com ciúmes de Bridget? —
perguntou Ben, vincando a testa.

Revirei os olhos.

— Não ouviu mesmo nada do que eu falei antes? O


maldito estava tentando alimentar os MEUS filhos — disse,
dando ênfase no fato de que as crianças me pertenciam.

O desgraçado soltou uma risada enfezada, alta o


suficiente para fazer cócegas nos meus ouvidos.

— E esqueceu que eles estão na barriga de Bridget?


Não, ainda melhor, esqueceu que ninguém sabe sobre a
existência deles? O garoto só queria alimentar Bridget e
não suas crianças — contestou.

Cruzei os braços e comecei a andar de um lado para o


outro.

— Não importa, enquanto eles estiverem lá, não quero


saber de nenhum imbecil tentando alimentá-los — objetei,
respirando com dificuldade pela raiva que sentia. — E
ainda teve a audácia de falar que quer ser um obstetra
como eu, você acredita nisso? — perguntei, bufando e
arregalando os olhos. — É óbvio que estava tentando me
irritar, primeiro alimenta a minha gestante e depois fala
que quer ser obstetra também.

Foda-se que bem provável que ele não soubesse que


Bridget estava grávida, eu não queria o idiota perto da
garota, ele nem mesmo deveria ousar oferecer comida a
ela. Ele não passava de um residente do primeiro ano que
não entendia nada sobre cuidados básicos com uma
gestante, então deveria se manter bem longe da minha
grávida.

— Caralho, Leon, você está mesmo com ciúmes da


garota. — Riu ainda mais alto. — Quando falou que
estavam se encontrando mais vezes e conversando, pensei
que era apenas para manter o bom relacionamento por
causa das crianças, e claro, cuidar da saúde dela durante
a gestação já que teimou em ser o obstetra dela.

— E é para manter uma boa relação, ela vai ser a mãe


dos meus filhos — falei, fazendo um gesto de desdém com
a mão. — E, além do mais, ela pode processar a clínica
quando quiser, por isso é bom ter uma relação amigável
com ela. E não vejo problema algum em ser o obstetra,
sou o pai e especialista no assunto, não confiaria em
ninguém mais além de mim mesmo para assumir esse
papel.

Eu confiaria nele também, mas não via necessidade


quando eu poderia exercer a responsabilidade muito
melhor do que qualquer outro médico encarregado.

Ben negou com a cabeça.

— Está falando isso para convencer a si mesmo ou a


mim? É óbvio que está a fim da garota, por isso está
surtando, está com ciúmes dela e infeliz que tem outro
cara na volta. — Levantou um dedo. — E já conversamos
sobre ser o obstetra, não era o aconselhável, mas penso
como você, ninguém exerceria um papel tão bem além de o
próprio Leon Dubrow para o caso.

Nada do que ele dizia fazia sentido, eu nem sabia o


que era ciúmes e quais eram os sintomas, nunca senti
nada parecido em toda a minha vida. Minha relação com
Bridget era profissional, eu era o médico dela e apenas eu
poderia falar o que ela deveria comer ou não, por isso
estava muito irritado por ter encontrado um residente
qualquer tentando assumir o meu papel.

Ben soltou uma exalação.

— Quem era o residente? — perguntou, por fim.

Coloquei as mãos na cintura e afastei levemente as


pernas, virando-me para ele.

— Não sei, só reconheci como sendo um dos novos


residentes.

— Ele parecia amigo de Bridget?

Uma risada estrangulada soou pela minha garganta.

— Amigo? Ele parecia querer fodê-la e estava bem


animado para convencê-la a ceder.
Ben colocou a mão na boca, tossindo para disfarçar
uma risada.

— Não vejo problema nisso, ela é jovem, bonita e


inteligente, nítido que alguns homens demonstrariam
interesse por ela. — Abri a boca para falar, mas Ben
ergueu uma mão, calando-me. — E, além do mais, é
solteira, ou seja, pode transar com quem quiser.

Abri tanto os meus olhos que pensei que eles


pudessem sair de órbita. Sentia a veia pulsando em meu
pescoço, enquanto fuzilava o meu melhor amigo como se
pudesse dissolvê-lo em pó com apenas um olhar.

— Sob hipótese alguma ela vai enfiar um pau dentro


da boceta dela, não quando meus filhos estão lá dentro.

Dane-se se soava hipocrisia da minha parte, era


simplesmente inaceitável.

— E você por um acaso tem um contrato falando sobre


isso? Porque se eu bem me lembro, limitou apenas o
consumo de cigarro, drogas e álcool, sexo não estava
dentro das limitações.

Olhei para o lado, ponderando.

Porra!

Nem passou pela minha cabeça na época, mas agora


que eu estava convivendo com ela... não podia pensar em
um homem tocando nela de forma íntima.

— Pronto, então está resolvido, eu vou conversar com


ela e oferecer essa nova condição do acordo — avisei.

Ben me encarou com desdém.

— E você entra nessa limitação? — indagou


zombeteiramente.

— Os filhos são meus, portanto, o meu pau não entra


nessa restrição.

— Você é um cretino de merda! — acusou, balançando


a cabeça.

Levantei um dedo em riste.

— Sou um homem preocupado com a saúde e bem-


estar dos filhos, deveria sentir orgulho de mim, já sou um
pai e tanto.

Ele fumegou, irritado comigo.

— É um imbecil covarde, está interessado na garota e


morrendo de ciúmes dela, mas prefere mentir para si do
que enfrentar a verdade dos fatos.

Me afastei dele, caminhando em direção a porta.

— Quando foi que você se tornou um velho rabugento


e cheio de conselhos para dar? Puta merda, Ben, você já
foi bem mais divertido — atirei, encarando-o por sobre o
ombro.

— Não obstruí o fato de que você é um imbecil —


respondeu.

Fechei a porta com força, deixando-o para trás com


sua pilha de papeis e seu discurso monótono sobre idade,
família e afins.

Eu não transava há semanas, não desde que descobri


que seria pai. Eu nem mesmo sabia se ainda conhecia uma
boceta, se saberia enfiar o meu pau corretamente quando
encontrasse uma. Já podia declarar que era um
aposentado das orgias.

E, por um milagre do destino, não sentia tanta falta


assim, passava a maior parte do tempo preocupado com
Bridget e com a saúde dos bebês, ocupando a minha
mente com a gravidez.

Claro que meu corpo sentia falta do sexo, me fazendo


aliviar a tensão com uma boa punheta no banho antes de ir
dormir.

Pensar em sexo e em Bridget no mesmo contexto não


era uma boa ideia, não quando eu desejava foder a garota
com tanta intensidade que às vezes chegava a me
assustar.
Uma batida soou à minha porta e eu sabia quem era
antes mesmo de permitir a entrada.

Bridget avançou em meu escritório, ela não vestia


mais o uniforme de residente da clínica, usava calças de
moletom simples, uma blusa larga e tênis. Os cabelos
estavam soltos em ondas rebeldes, os olhos verdes
demonstravam certo cansaço e a pele não tinha mais
aquela tonalidade pálida de quando descobriu a gestação,
pelo contrário, na fase em que estava ela parecia brilhar.

Desci meu olhar para o abdômen dela, não podia notar


nada por causa da blusa solta, mas uma pontada em meu
coração me fez ansiar para descobrir como a barriga
estava.

— Bridget — cumprimentei-a.

Ela estava no quarto mês de gestação e parecia


incrivelmente mais linda de quando a conheci, como se a
gravidez combinasse com ela.

— O que foi àquilo mais cedo, Leon? — perguntou,


sendo direta.

Ela se inclinou sobre o encosto da cadeira com um


esgar nos lábios, deixando bem óbvio o seu desalento com
o meu comportamento.
— Não sei se estou entendendo... — menti.

— Um dos termos do contrato era o sigilo e você não


pareceu se importar com isso ao falar comigo com tanta
intimidade na frente de Liam — revidou.

Liam.

Então era esse o nome do babaca engomadinho.

Eu vasculharia a ficha dele e descobriria tudo sobre o


idiota. Queria saber quem ele era e por qual motivo
pensava ser alguém importante o suficiente para se meter
com as minhas coisas.

— Eu não disse nada demais, apenas levei cachorro-


quente para você, simples.

Ela bufou e puxou a cadeira para se sentar em minha


frente.

— Não seja cínico, fez de propósito porque viu Liam


comigo.

— O acordo era não falar sobre as crianças, Bridget, e


eu não fiz isso, embora seja irrelevante já que em breve
todo mundo nessa clínica verá a sua barriga e descobrirá a
existência deles.

— Eu sei, mas não estou falando sobre isso, não


quero que ninguém levante a hipótese sobre eu ser a sua
amante, Leon, porque seria uma mentira, não quero que
pensem que temos alguma intimidade.

Algum sentimento bem estranho e conturbado atingiu


o meu coração, era um pouquinho doloroso e deixava um
gosto amargo na ponta da minha língua. Eu não o
conhecia e não sabia o que significava, embora não
gostasse nem um pouco dele e de como me fazia sentir.

— Por causa de Liam? Por que você está fodendo com


ele? — perguntei, a voz soando esganiçada pela raiva que
não conseguia conter.

Bridget semicerrou os olhos, transformando-os em


pequenas fendas.

— E qual é o problema se eu estiver? — indagou,


arqueando o maxilar.

Como assim qual era o problema? Apenas, todos!

— Tem problema, sim, está com os meus filhos na


barriga — revidei, fazendo uma careta.

Me sentia ofendido pela forma como ela desdenhava


de mim, se eu achava que tinha problema, o mínimo era
ela evitar para que a nossa relação continuasse amigável.
Teríamos ainda muito contato pelos meses subsequentes,
então, para preservar a nossa boa relação, deveríamos
evitar de fazer algo que levasse o outro a um
aborrecimento, assim como eu me sentia quando a via
perto do imbecil.

Ela se levantou em um só movimento, fazendo a


cadeira ranger no chão.

— Com quem eu durmo ou deixo de dormir é problema


meu, Leon, pare de tentar controlar a minha vida só porque
estou grávida de você — atirou, apontando um dedo em
riste para mim. — E não quero que as pessoas saibam que
os filhos são seus, muito menos desconfiem de alguma
relação, não vou passar como apenas mais uma das
milhares de amantes que teve dentro dessa clínica.

Me levantei também, apoiando as palmas das mãos na


mesa.

— Tudo bem, então da próxima vez eu deixo você


passar fome.

A expressão de Bridget suavizou um pouco.

— Não é isso que estou falando — suspirou,


colocando uma mecha de cabelo atrás da orelha –,
agradeço a sua preocupação comigo e com os bebês, se
não tivesse me trazido o cachorro-quente, eu realmente
não conseguiria almoçar.

— Então por que é tão ruim que as pessoas


relacionem nós dois? — objetei, odiando o fato que me
sentia ofendido por isso.
— Porque eu quero me destacar por mim mesma, não
quero que falem por aí que eu só estou indo bem na
residência porque estou transando com o chefe, Leon. —
Mordeu o lábio inferior. — Me esforcei demais para ser
taxada como uma escaladora.

Não fazia sentido algum, já tinha transado com muitas


mulheres e nenhuma delas foi taxada disso, pelo contrário,
meus funcionários sabiam como eu tratava tudo de forma
profissional, conseguia separar e identificar as coisas.
Pelo menos até agora, até Bridget aparecer com o
engomadinho do Liam, o babaca que eu expulsaria da
minha clínica se continuasse na volta dela. E foda-se que
ele não tivesse feito nada de errado na residência, eu o
odiava apenas por... respirar perto de Bridget e a clínica
era a minha, portanto, poderia fazer o que bem
entendesse.

Enfim, fatos compreensíveis e consideráveis.

— Tudo bem, mas não posso garantir que não irei até
você, Bridget, quando se sentir mal ou qualquer coisa, não
posso simplesmente fingir que não existe.

Ela se afastou, saindo do labirinto entre a mesa e a


cadeira.

— Jamais pediria isso, é meu médico, pai das crianças


e se preocupa com elas, só quero que não seja tão óbvio
ou deixe a entender que temos alguma coisa. — Ela
segurou a alça da bolsa no ombro. — Liam perguntou se
estamos transando... — murmurou, olhando para os
próprios pés.

Fiquei rígido, cada músculo do meu corpo reagindo ao


ódio que eu estava sentindo pelo residente. Nunca na
minha vida eu já tinha odiado tanto uma pessoa como
estava odiando Liam agora.

O babaca estava tão afim da garota que pensava que


tinha intimidade o suficiente com ela para perguntar com
quem ela transava ou deixava de transar? Meu Deus, e se
eles tiveram um caso? E se Bridget correspondesse ao que
ele sentia?

Esfreguei o colarinho da minha camisa, abrindo o


primeiro botão, buscando desobstruir a passagem de ar.

Inspirei o ar para meus pulmões pelo nariz, soltando-o


pela boca. Precisava me acalmar antes de responder
Bridget, ou teríamos outra discussão.

— Ele perguntou o quê? — expressei, sorrindo para


conter a carranca que insistia em deformar meu rosto.

— Nada... esquece que eu disse isso, só não faça com


que as pessoas entendam que estamos, porque nós não
estamos.

Fiz a volta na mesa e parei a centímetros dela,


cruzando os braços.
— Inclusive, é bom que tenha entrado no assunto
sobre o babaca — joguei, observando a careta que fez ao
notar o apelido carinhoso que dei para o amiguinho –, não
quero que transe com ele, nem com qualquer outro
homem.

Ela piscou, absorvendo o que eu havia dito, e então


começou a gargalhar.

— Qual é a graça?

Bridget se curvou para frente e colocou uma mão na


barriga, enquanto lágrimas escorriam pelos cantos dos
olhos.

— E você espera que eu obedeça? — zombou,


arfando.

Ora, mas que audácia!

— Eu vou adicionar como um dos termos do contrato.

Ela levou a ponta dos dedos até os cantos dos olhos,


limpando a água acumulada neles, então deu de ombros.

— Pode adicionar, vai levar o quê, uma semana para


ser oficializado e formalizado? Até lá posso me aliviar com
Liam — provocou, dando de ombros

Cerrei os dentes.
— Eu não quero saber de nenhum pau enfiado em
você enquanto estiver gestando os meus filhos.

— Bom, problema é inteiramente seu, meus hormônios


estão uma loucura e eu me sinto a beira de um colapso,
como se fosse uma histérica por sexo — Apontou para a
barriga –, e isso é culpa dos seus filhos.

Mordi as bochechas e dei um passo em direção a ela.

— Então use o meu pau para se aliviar — ofereci.

Bridget arqueou uma sobrancelha.

— Você disse “nenhum pau”. — Fez aspas com os


dedos.

Descruzei os braços e balancei as mãos em desdém.

— Exceto o meu, é claro, já que os filhos são meus.

— Então eu não posso transar com ninguém, exceto


com você?

— Exatamente.

— Você é um hipócrita, Leon. — Riu. — Vou transar


com quem eu bem entender.

Soltei um grunhido e me aproximei dela, segurando o


seu queixo com a ponta dos meus dedos, puxando o seu
rosto para mim.
— Apenas o meu pau vai entrar nessa boceta, Bridget,
o meu e o de mais ninguém – sibilei.

Tínhamos um impasse que poderia ser facilmente


resolvido. Ela queria transar. Eu queria transar. Só o meu
pau invadiria a boceta apertada, então... problema
resolvido, eu seria a solução.

Ela colocou a língua para fora da boca e molhou os


lábios ressecados, os olhos estavam vidrados e com as
pupilas dilatadas.

— E como vamos fazer depois? — questionou,


enrouquecida.

Balancei a cabeça.

— Nós vamos transar, Bridget, eu quero foder você e


você me quer, então estamos de acordo?

Ela pensou por um segundo.

— Se eu não posso ficar com mais ninguém, sugiro


que você faça o mesmo ou teremos um problema. Essa
relação não será unilateral, Leon, se quer exclusividade
precisa oferecê-la também. Por mais que a gente transe
apenas dessa vez, vai ficar em celibato até o fim da minha
gestação, assim como eu terei que ficar.

Ah..., se ela soubesse que eu me sentia quase virgem


outra vez, talvez eu nem acertasse o caminho para a sua
boceta.

Soltei uma risada que a fez estremecer.

— Não existe ninguém desde que você entrou na


minha vida arrastando tudo, transformando o que eu
pensava e planejava em nada, Bridget — confessei.

— E se as coisas ficarem estranhas entre nós dois?


Não podemos esquecer do fato de que estou grávida de
você e que ainda teremos longos meses de convívio pela
frente — ponderou, mordendo as bochechas.

— Nada ficará estranho, somos adultos e saberemos


como diferenciar as coisas. Você quer transar. Eu quero
transar. Sou o único que sabe sobre o segredo que
esconde por debaixo das roupas largas que está vestindo,
e é isso — reiterei, quase me ajoelhando na frente dela e
suplicando para que me deixasse fodê-la. — Temos um
acordo?

Eu tinha as minhas necessidades, mas quando se


tratava de Bridget, as minhas necessidades tornavam-se
carências quase beirando ao desespero para tê-la. E ela
pensava mesmo que eu a foderia uma única vez? Embora
o acordo que eu tivesse comigo mesmo ordenasse o
contrário, Bridget estava grávida e necessitada, e como o
pai dos filhos dela, precisava estar disponível para ajudá-
la com o que fosse, e isso incluía um acordo sexual que
duraria meses. Eu que não reclamaria, é claro, estava bem
feliz, na verdade.

Os olhos dela brilharam, excitação e incerteza


duelando dentro dela, sem saber se agia conforme deveria
ou conforme necessitava. Eu esperei, ansioso, querendo
tomar os lábios dela nos meus e me perder no corpo que
desejava desde que a vi pela primeira vez.

Ela ofegou.

— Sim, nós temos.

Glória a Deus!

Puxei-a para mim e colei sua boca na minha, me


esbaldando no que eu queria desde a primeira vez que a
vi, provando o gosto que flutuava em meus pensamentos
com o desejo mais intenso que já senti nos meus trinta e
oito anos de vida.
Leon devorou a minha boca, deslizando a língua para
dentro de mim, experimentando, provando e se deliciando.
As mãos dele agarraram os meus quadris, afundando os
dedos na carne macia, puxando-me para ele, até que a
ponta da minha barriga protuberante tocasse em sua
cintura.

Esfreguei os seus cabelos, experimentando a textura,


comprovando a maciez das mechas.

Ele era delicioso.

Um gemido escapou por entre os meus lábios quando


a mão dele deslizou pela minha bunda, apertando a
nádega. Senti a ereção em minha barriga por baixo da
calça.

Talvez estivéssemos cometendo um erro, mas não


conseguia parar e pensar com coerência, nem mesmo
conseguia me arrepender quando tinha Leon colado em
mim, a boca me explorando com vontade e desejo.

Ele agarrou os meus cabelos pela nuca e afastou o


meu pescoço, encarando os meus olhos, a boca estava
inchada e vermelha pelo beijo.

— Não pense demais, Bridget, consigo ouvir as


engrenagens da sua mente daqui — murmurou, mordendo
o lábio inferior.

Esfreguei meus dedos no maxilar dele, brincando com


os pelos crescidos que pinicavam a minha pele e inspirei
fundo, absorvendo o único cheiro que não me deixava
enjoada.

— Então me faça parar de pensar, doutor Dubrow.

A boca dele franziu em um sorriso incisivo, cheio de


promessas depravadas que ele estava ansioso para
cumprir.

Leon me empurrou em direção ao sofá de canto do


escritório, minhas panturrilhas roçaram no estofado macio,
os dedos dele roçaram no cós da minha blusa, puxando-a
para cima e removendo-a pela minha cabeça. Então, com
uma única mão, abriu o meu sutiã, libertando os seios
fartos e pesados.

Ele deu um passo para trás, vagando os olhos pelo


meu corpo com uma fome genuína.

Senti um calor subir pelo meu pescoço e abaixei os


braços, cobrindo-me. Meu corpo não era como antes, meus
seios pareciam que iriam explodir, cheios de veias, densos
e pesados e a minha cintura não era mais tão marcada, os
quadris estavam mais largos e a barriga estava
pontiaguda.

Leon segurou os meus pulsos e removeu os meus


braços, impedindo-me de me esconder dele, bufando.

— Não se cubra de mim — pediu, olhando no fundo


dos meus olhos e beijando a curva do meu pescoço. —
Nunca mais.

Suspirei, a barba dele fazia cócegas em minha pele.

— Eu não tenho o mesmo corpo das mulheres que


você costuma foder, Leon, estou grávida e sem curvas —
ciciei, prendendo a respiração quando ele esfregou a
língua no osso da minha clavícula.

A risada rouca e áspera dele me fez arquejar.

— Não tem mesmo — disse, segurando-me com mais


força quando tentei me afastar. — Você é incrivelmente
mais gostosa e atraente aos meus olhos.

Franzi o nariz em desgosto.

— Não seja sarcástico.

Ele sorriu.

— Não estou sendo. — Ele segurou um dos meus


seios com a mão, fechando-a ao redor do mamilo. Agarrei
os ombros dele e finquei as unhas na camisa, arqueando
minhas costas diante do toque. — Eu já vi inúmeras
grávidas ao longo da minha vida, tantas que não consigo
enumerar, e nunca me senti atraído por nenhuma delas,
até você.

Abri e fechei a boca, sem saber o que falar.

— Por quê? — perguntei em um sibilo quando ele


esfregou o dedo no bico do seio, brincando e me
provocando.

— Porque eu sou fascinado pela anatomia do corpo


humano — ele baixou uma mão, tocando na minha barriga
pela primeira vez e suspirou –, e saber que são os meus
filhos dentro do seu ventre, me deixa louco. Pare de se
diminuir, Bridget, você está gostosa pra caralho!

Ele esfregou a palma grande para cima e para baixo


no meu abdômen, sentindo a textura endurecida da barriga
protuberante, acariciando os bebês que pertenciam a ele,
mas que seriam uma mistura de nós dois.

Trêmula, corri os dedos para os botões da camisa dele


e comecei a me desfazer de um por um, puxando o tecido
para o lado e revelando o peitoral definido. Ele escondia
uma tatuagem, a tinta preta cobria toda a metade do seu
peito, da cintura ao ombro.

— O que elas significam? — perguntei, dedilhando-a.

— Um pouco de tudo o que eu amo — disse.

Era uma mistura, reconheci o símbolo da medicina,


assim como alguns sinais que apontavam para a
reprodução humana assistida e o símbolo da clínica.

Abaixando-se, Leon colocou um mamilo na boca, me


fazendo tirar o foco da tatuagem.

Fechei os olhos e joguei a cabeça para cima ao sentir


a língua explorar a aréola, áspera, quente e molhada.

— Leon... — exasperei, esfregando as unhas em sua


pele.

Ele sugou o mamilo com força, mamando e lambendo


com tanta vontade que lubrificação molhou a minha
calcinha.

— Porra de mulher gostosa! — sibilou contra a minha


pele.
Afastando-se, ele voltou a encarar os meus seios,
admirando a vermelhidão ao redor da pele e o brilho da
saliva que escorria por eles. Ele me empurrou, sentando-
me no sofá e se agachou à minha frente, removendo os
meus tênis e abrindo o botão do meu jeans. Observei cada
um dos seus movimentos, admirando os gominhos do
abdômen, salivando de desejo, querendo passar a língua
por cada vinco que havia entre eles.

— Se continuar me olhando assim, Bridget, eu vou te


foder agora mesmo.

Arqueei uma sobrancelha.

— E essa não era a intenção?

Leon me encarou, semicerrando os olhos, e então


puxou a minha calça, retirando-a pelos pés e jogando o
tecido para o lado.

— Antes, eu quero te chupar — disse, me fazendo


ofegar.

Minha calcinha de renda preta não estava molhada,


ela estava encharcada.

Levantando-se, Leon retirou a camisa e abriu a calça,


desfazendo-se dela e dos sapatos ao mesmo tempo. A
boxer preta estava distendida, o pau grande marcava o
tecido, a cabeça brilhava em excitação, molhando a cueca.
Olhei para o meio das pernas dele e me escorei contra
o sofá, franzindo o cenho.

— Gostou do que está vendo? — questionou,


colocando as mãos na cintura e afastando levemente as
pernas.

Um sorriso zombeteiro se espalhou pelo meu rosto.

— Boxer bonita... — debochei.

Leon bufou e revirou os olhos, então puxou a boxer


para baixo, liberando o pau duro e ereto.

Minha garganta secou com a visão.

Com os pelos pubianos aparados, ele tinha um pau


grande e grosso, as veias saltavam ao redor e a cabeça
rosada estava brilhando pelo líquido pré-ejaculatório.

Meus lábios franziram em um esgar.

Deus tinha os seus preferidos e estava óbvio demais


para mim, não bastava Leon ser gato pra caramba e
inteligente, ele ainda precisava ter um pau grande e
atraente? Injusto!

— E agora, o que me diz? — questionou.

Dei de ombros, fingindo indiferença.

— Nada demais.
Ele arregalou os olhos e cerrou a mandíbula.

Nunca que eu diria a verdade para ele, o único homem


que estive antes dele havia sido Liam, e eu podia afirmar
com convicção que Leon era bem mais... viril.

Ele se ajoelhou na minha frente e puxou a calcinha,


expondo minha boceta lubrificada e desejosa.

— Já que o meu pau não te surpreende, vou ver se


consigo fazer isso com a minha boca — disse, jogando a
calcinha para o lado e abrindo ainda mais as minhas
pernas. — É uma mulher muito rigorosa, doutora Adams.

Oh, meu Deus!

Eu não sabia bem o que deveria fazer, nunca tinha


sido chupada na vida, o sexo era algo bem normal e banal,
penetração na vagina e ponto final.

Mordi meu lábio, decidindo se contava a verdade ou


não para ele.

Porra, se eu soubesse teria assistido a alguns filmes


pornôs, assim saberia o que eu deveria fazer.

Eu precisava, tipo, gritar? Ou eu tinha que gemer e


grunhir? Minhas pernas deveriam ficar paradas ou eu
podia remexê-las sem atrapalhar o trabalho dele lá
embaixo?
— Leon... eu... hã... — murmurei, sem saber ao certo
o que dizer.

Ele removeu os olhos da minha boceta e me encarou,


franzindo a testa.

— Algum problema? — perguntou. Fiquei em silêncio,


triturando minhas bochechas com os dentes. Um vinco se
aprofundou no meio da testa dele. — Tem alguma coisa
que eu precise saber, Bridget?

O maldito era um cafajeste experiente e eu era uma


otária virgem de sexo oral que não sabia nem disfarçar.
Ele estava ficando muito desconfiado e eu nem mesmo
poderia culpá-lo por isso.

— Eu... hum... nunca fiz isso antes — confessei. Leon


parou, franzindo as sobrancelhas, atônito. — Eu não sou
virgem — gritei, antecipando-me ao notar que ele estava
confundindo tudo, embranquecendo feito um papel. — Mas
ninguém nunca fez sexo oral em mim, era apenas... hã...
penetração normal, pau e vagina, essas coisas.... — Fiz
um gesto de desdém com a mão, morrendo de vergonha.

Ele ficou em completo silêncio por um momento,


imóvel, os olhos estavam fixos em mim enquanto analisava
a situação, cético e confuso.

E então ele simplesmente abriu um sorriso genuíno e


os olhos dele assumiram um brilho de pura satisfação
masculina.
— Só aproveita, enquanto eu me banqueteio — falou,
empurrando minhas pernas para cima.

— O quê? — perguntei, confusa.

Meus joelhos batiam em meu rosto, eu estava tão


aberta e exposta, e, ainda assim, não conseguia pensar
direito, estava preocupada demais em fazer algo de
errado. A posição não era confortável, mas dava para
aguentar.

Ele se inclinou e plantou um beijo no interior da minha


coxa, a respiração me fez estremecer, arrepiando os meus
pelos corporais. Os beijos foram subindo e subindo, até
que Leon chegou em minha boceta rosada, encarando-a.

— Leon... — sibilei, ofegando.

Ele cuspiu nela, erguendo os olhos para me encarar,


sorrindo. A saliva quente escorreu pelo queixo, pingando.
Sem falar nada, Leon se abaixou e me chupou com força.

Arqueei as costas para fora do sofá.

A língua dele esfregou o meu clitóris, precisa e


certeira, em movimentos vaivém.

— Puta merda! — bufei, agarrando os cabelos dele


por entre os meus dedos.

Mudando os movimentos, Leon começou a esfregar o


rosto em toda a minha boceta, a barba pinicava a pele
sensível, ampliando a capacidade das sensações. Meu
clitóris pulsava e eu sabia que estava pingando
lubrificação, sentia escorrer pelas minhas nádegas.

Leon ergueu o rosto e soltou uma mão das minhas


pernas e a levou até a boca, chupando dois dedos, antes
de penetrá-los em mim. E então se abaixou, fechando os
lábios ao redor do meu clitóris, sugando o nervo entre
eles, me chupando como se eu fosse o doce mais delicioso
que já experimentou.

O barulho da sucção dos dedos me invadindo


reverberou, molhado e contínuo.

Ele regulou os movimentos, a boca chupava o meu


clitóris, os dedos me fodiam acelerados.

— Leon... — roguei o nome dele, fechando os olhos,


remexendo-me incontrolavelmente.

Ele retirou os dedos de dentro de mim e baixou a


cabeça, me penetrando com a língua, fazendo movimentos
circulares.

— Ohhh... — gemi.

— Deliciosa... — murmurou, sem se afastar.

Ele levou os dedos que estavam dentro de mim até o


meu clitóris e começou a friccioná-lo.
Uma sucessão de palavras ininteligíveis deixava a
minha boca. Mordi os nós dos dedos da minha mão,
calando-me, ou poderiam nos ouvir através do corredor.

O orgasmo veio sem aviso.

Estremeci, o corpo chacoalhando, suor escorria pelas


minhas costas e pelo meio dos meus seios.

Leon continuou me chupando, engolindo tudo o que eu


tinha para oferecer com satisfação.

Céus, eu nunca tinha gozado tão rápido.

Ele ergueu a cabeça e lambeu ao redor da boca, o


rosto estava encharcado, a barba molhada, brilhando com
o orgasmo que ele fez questão de engolir cada maldita
gota.

A cena foi tão quente que eu seria capaz de gozar de


novo, só de relembrar o que a língua dele tinha feito
comigo.

— Boa menina — parabenizou, o pomo-de-adão subia


e descia, enquanto engolia a saliva espessa, misturada
com o meu gosto.

Me deitando confortavelmente no sofá, ele subiu por


cima de mim e se acomodou no meio das minhas pernas,
pincelando o pau na minha entrada.
— Quer que eu coloque camisinha? — perguntou,
segurando o pau com a mão em punho, esfregando-o para
cima e para baixo na minha boceta enquanto esperava
pela minha resposta.

— É limpo?

Ele riu.

— Nunca transei sem camisinha, tenho vasectomia,


mas sei como isso funciona e que há chances de ocorrer
uma recanalização, por isso sempre evitei, além, é claro,
de todas as doenças sexualmente transmissíveis.

— E confia em mim para não usar camisinha? — A


pergunta era idiota, considerando que a quase virgem na
situação era eu.

— Você está grávida dos meus filhos, Bridget,


portanto, não há mais chances de ocorrer um erro e
engravidar. E sim, eu confio em você para isso.

Me inclinei sobre os cotovelos para olhar a junção dos


nossos corpos. Mordi os lábios, o tesão parecia me afogar.

— Me fode logo — supliquei, deitando a cabeça no


sofá.

Leon empurrou os quadris para frente e entrou em


mim. Fazia tanto tempo que eu não transava que precisei
trancar a respiração quando senti o pau me abrindo
centímetro a centímetro, acomodando-se no meu interior.

— Que boceta apertada do caralho! — ofegou,


espalmando as mãos no sofá ao lado do meu corpo. —
Tudo certo? — Ergueu a cabeça para me olhar, suor
brilhava em sua testa e ele estava trêmulo pelo esforço de
ficar parado.

— Não sou virgem, Leon — retruquei.

— Mas também não é a voz da experiência. —


Inclinou-se, plantando um beijo nos meus lábios. — Tem
duas coisas que eu faço muito bem na vida, ser médico e
foder, Bridget, quero que seja tão bom pra você quanto
está sendo para mim.

Revirei os olhos.

— Nossa..., doutor arrogância, quanta presunção da


sua parte.

— Não é presunção, é um fato, querida. — Piscou.

— Certo, me mostre — impliquei.

Leon ergueu os lábios em um sorriso impiedoso.

Impulsionando-se para trás, ele retirou o pau, antes


de repetir os movimentos, afundando-se em mim. Os
quadris se moviam lentamente, em vaivém, até que eu
pudesse me acostumar bem com toda a virilidade dele.
Fechei os olhos e gemi, apreciando a sensação de ser
invadida por ele.

— Se toca pra mim, Bridget, me deixa ver como toca


nessa boceta apertada e deliciosa.

Não precisava me olhar no espelho para saber que


minhas bochechas estavam coradas pela vergonha. Eu
sabia me masturbar, mas não fazia isso na frente de
ninguém.

— Vamos, Bridget, ou eu mesmo vou fazer — grunhiu.

Desci uma mão pelo meu abdômen e cheguei até o


meu clitóris, mal o tocando e suspirando, ele estava
inchado e sensível depois de ter sido chupado por Leon.
Girei os dedos ao redor, mordendo as bochechas para
conter um gemido.

— Isso... gostosa.

Leon aumentou o ritmo das estocadas, me fodendo em


uma velocidade frenética. Meus gemidos ecoaram,
juntando-se aos dele.

A cada impulso dos quadris, meu corpo dava um


solavanco para trás. Ele foi fundo, bruto e rápido.

— Leon... céus... — Agarrei o pulso dele, virando a


cabeça para o lado e espremendo os olhos.
Ele retirou todo o pau, apenas para que pudesse se
afundar em mim uma segunda vez.

De novo. Repetidamente.

Meu corpo trepidou.

Leon se inclinou mais, fazendo a cabeça do pau tocar


em um lugar delicioso. Meus pelos se arrepiaram, suor
escorreu pela minha nuca.

Arquejei e ofeguei ao mesmo tempo.

Acelerei os meus dedos ao redor do meu clitóris e abri


um pouco mais as pernas. Sentia as bolas de Leon
batendo em minha bunda a cada vez que ele se afundava
em mim, retesando os músculos das pernas pelo esforço
contínuo.

Uma dormência se concentrou na boca do meu


estômago, acumulando-se e se expandindo.

— Que boceta apertada... — ciciou Leon, inclinando-


se para me beijar.

A língua dele serpenteou para dentro da minha boca,


brincando com a minha, em um beijo gostoso e
arrebatador, me deixando ofegante.

Eu gozei com tanta força que vi estrelas brilharem


atrás dos meus olhos. Gritei, ignorando o fato de que
estávamos na clínica e que qualquer um pudesse ouvir do
corredor.

Meus músculos se contraíram ao redor do pau de


Leon, apertando-o enquanto o orgasmo me dominava, me
fazendo trepidar.

Leon grunhiu e trincou a mandíbula, fazendo as veias


ao lado do pescoço saltarem.

— Porra, essa boceta está enforcando o meu pau.

Ele gozou, ejaculando dentro de mim, vibrando e


soltando um suspiro profundo e pesado.

Fiquei com os olhos fechados, esperando a minha


respiração entrar em um ritmo constante e lento. Minha
mente vagava e meu corpo estava tão relaxado que eu me
sentia cansada e satisfeita.

Leon se deitou por cima de mim tomando cuidado para


não esmagar a minha barriga.

— Você está bem? — perguntou, beijando a minha


testa.

— Sim, e você?

Ele riu.

— Ah, eu com certeza estou.


Eu me sentia bem nos braços dele, me sentia
protegida e acolhida. Leon tinha muitos defeitos, mas, ao
ter a casca que o moldava removida, escondia por debaixo
dela um homem maravilhoso.

Se ele se deixasse sentir, seria um bom pai.

Mas não era como se eu me importasse, os bebês


eram dele e ele poderia cuidá-los e tratá-los como bem
entendesse, e isso incluía denominá-los apenas como
herdeiros.

Outra vez, eu estava pensando demais.

Eu tinha acabado de ter o melhor sexo da minha vida,


deveria desligar a minha mente apenas um pouco,
aproveitar a letargia gostosa do meu corpo pós-orgasmo, e
não trazer os problemas do dia-a-dia para o momento.

— Quer comer alguma coisa? — perguntou, a voz


abafada pelo sofá.

Ele estava tão imóvel que cheguei a pensar que


estivesse dormindo.

— Não sei se vou conseguir — confessei.

Meu estômago não estava na fase mais confiável, era


ele quem escolhia quando eu deveria comer ou não.

— Pode ser o cachorro-quente, mas depois vai fazer


um exame para verificar a sua glicose.
Levantando-se, Leon se afastou e retirou o pau já
amolecido de dentro de mim, então se sentou ao meu lado
e espalmou a mão em minha barriga, acariciando a pele
como se quisesse confirmar que estava tudo certo com os
bebês.

— Precisa comer, Bridget, e em dose tripla, os bebês


precisam do ganho de peso para se desenvolver —
murmurou. — E, além do mais, é muito difícil levar uma
gestação gemelar até o nono mês, há grandes chances
deles nascerem antes e por isso é importante que estejam
com um peso adequado para que possam nascer
saudáveis.

— Não estou deixando de comer por livre e


espontânea vontade — revidei.

— Eu sei que não, por este motivo estou oferecendo a


porcaria calórica e gordurosa que tanto gosta.

Me remexi no sofá, sorrindo levemente ao sentir um


desconforto no meio das pernas causado pelo sexo, uma
lembrança de que estive fodendo o médico mais arrogante
da clínica, mas que também mostrava a cada dia mais que
carregava inúmeras qualidades.

— Tudo bem, vamos testar o cachorro-quente.

Ele se levantou e juntou as nossas roupas do chão,


colocando as minhas ao meu lado no sofá.
— Vamos nos vestir, eu alimentei a mãe, agora
preciso fazer o mesmo com os filhos.

Estreitei meus olhos nele.

— Alimentou a mãe?

O idiota confirmou com um aceno e puxou o jeans


pelas pernas.

— Sim, alimentei com prazer, dois orgasmos e muita


porra.

Levantei-me, revirando os olhos.

— Às vezes eu me esqueço como você é arrogante,


doutor Dubrow.

Ele estalou a língua no céu da boca.

— Um arrogante de pau grande e que fode bem. —


Leon me puxou pela cintura e beijou os meus lábios. —
Agora se vista, mulher, preciso te alimentar com sustância
de verdade.

— Hum... parece bom — debochei, desfazendo-me do


toque dele. — Se não fosse tão narcisista, seria fácil me
apaixonar por você.

Leon parou de vestir a camisa no meio do caminho e


me encarou com fervor.
— Não se apaixone por mim, Bridget, seria um erro.

Eu ri.

— Pode parar de se preocupar, não há a mínima


possibilidade de isso acontecer.

Ele vincou as sobrancelhas.

— E por que não? — objetou, parecendo ofendido.

— Velho demais, arrogante demais, convencido


demais e cafajeste demais. — Enumerei com os dedos. —
Assim como você, minha maior paixão é a medicina,
portanto... sinto muito, meu coração já tem dono.

— Discordo de todos esses adjetivos, principalmente


do velho, eu só tenho trinta e oito anos, garota, como
ousa? — crispou, franzindo os lábios para baixo.

— Um coroa. — Encarei-o da cabeça aos pés. —


Hum..., mas um coroa bem conservado, sinta-se
lisonjeado.

Ele murmurou palavras ininteligíveis, reclamando, ao


virar-se para pegar os sapatos no chão. Sorri para as
costas dele, amando que tivesse conseguido tocar na
ferida ao mesmo tempo em que temia causar um infarto
nele por ter ofendido o ego enorme.
Deitei-me na maca e puxei a blusa para cima, Leon
estava concentrado organizando o aparelho para dar início
ao exame morfológico.

— Acha que vamos conseguir descobrir o sexo hoje?


— perguntei, prendendo a respiração ao sentir o gel
gelado em meu abdômen.

— Possivelmente — confirmou Leon, concentrado no


aparelho.

A tela foi ligada e a imagem pontilhada começou a


aparecer, Leon esfregou o aparelho pelo meu abdômen,
enquanto clicava no teclado, batendo fotos das partes mais
importantes.
— Olhe aqui, Bridget — Apontou para o televisor –,
aqui está um bebê, mas parece que ele não está feliz em
ser visto — brincou. — As perninhas estão cruzadas.

Fiquei um pouco frustrada, queria muito descobrir o


que eles eram. Estava ansiosa, chegava a sonhar com
eles, que segurava as duas crianças, uma de cada sexo,
em meus braços. Acreditava que associá-los a Brandon e
eu estava me levando a isso, me levando a pensar que
seriam um casal como nós.

— Poxa, que pena — murmurei, batendo de leve com


os dedos em minha barriga. — Vamos bebê, seja
colaborativo e nos mostre o que você é.

Nada aconteceu, o bebê parecia bem confortável com


as pernas cruzadas, ignorando-nos.

Leon riu.

—  Vamos tentar a sorte com o outro, esse aqui


parece teimoso demais — zombou.

Ele esfregou o aparelho pelo abdômen, procurando o


local exato em que o outro bebê estava, encontrando-o um
pouco mais abaixo. Leon empunhou força e virou o
aparelho.

Fixei meus olhos na tela, o coração saltitava em meu


peito com tanta força que podia senti-lo em meus ouvidos.
Estreitei o olhar para a imagem, observando-a, associando
as partes visíveis do bebê.

Tronco, pernas e...

Meu Deus!

Um sorriso enorme distendeu o meu rosto e eu pisquei


para afastar as lágrimas. Engoli com dificuldade, a
garganta embargada pela emoção.

— É um menino... — murmurei em tom esganiçado.

Este bebê, diferente do outro, estava com as


perninhas abertas e dava para notar que havia um
pequeno pênis entre elas, evidenciando o sexo.

Leon olhou para mim e confirmou com um sorriso tão


emocionante como o que eu expressava.

— Sim, temos um menino — disse, o pomo-de-adão


subia e descia com dificuldade.

Girei a cabeça para cima e apertei os meus olhos,


soltando uma exalação com dificuldade. A vontade de
chorar era absurda, mas não sucumbiria a ela.

Um menino.

Eu teria um menino. Não, eu não teria nada, Leon


teria.
Mordi as bochechas com tanta força que senti o gosto
do sangue na língua. O corte na boca doía, mas nem se
comparava ao que meu coração estava sentindo no
momento.

Leon moveu o aparelho de novo, retornando para o


outro lado do abdômen. Mantive-me inerte, evitando
encarar o televisor.

— Esse continua escondendo-se, parece que não vai


ser hoje que vamos descobrir o que ele é — comentou.

Minha cabeça girava, deixando-me tonta, enquanto eu


apenas evitava pensar. Não queria imaginar os bebês, mas
não conseguia evitar.

Um menino.

Ele seria parecido com quem? Será que teria algo meu
para carregar, fisicamente ou até mesmo um pouco do meu
gênio? Qualquer coisa que fosse que lembrasse a mim, a
incubadora.

Senti os dedos de Leon resvalarem em meu braço em


uma carícia lenta.

— Está tudo bem? — perguntou.

Encarei-o e balancei a cabeça, abrindo um sorriso que


não chegava aos olhos. Engoli tudo o que eu sentia, tão
fundo que o sentimento não passava de um pequeno
incômodo.

— Sim — menti. — Os bebês estão bem?

Ele ficou em silêncio por um segundo, os lábios


comprimidos, observando-me com tanto afinco como se
quisesse desnudar até a minha alma, antes de acenar
levemente com a cabeça e se afastar, como se sentisse o
mesmo que eu, como se dividisse os meus tormentos, mas
não quisesse assumir.

— Eles estão ótimos — afirmou.

Nós deixamos o assunto morrer, enquanto eu me


levantava da maca e limpava a minha barriga com alguns
papeis. Leon se manteve de costas para mim, perdido em
seu próprio limbo. Ele me evitava, assim como eu o
evitava, precisávamos de uns segundos de silêncio para
colocar a cabeça em ordem.

Nada estava certo, mas fingiríamos que sim.

— Eu vou passar esse exame na frente de qualquer


outro. — Riu Helena, segurando o vidro com o meu sangue
com tanto amor que me fez sorrir de volta para ela.
— Obrigada. — Esfreguei uma mão contra a outra. —
É a primeira vez que eu tiro sangue e fico nervosa.

— É óbvio, quem não estaria? Por mais que seja uma


porcentagem pequena, ainda é uma chance.

Embora tivesse tentado, não consegui parar de pensar


nos sexos dos bebês. Tinha a confirmação de que um
deles seria um menino, mas a curiosidade para saber
sobre o segundo me deixou tensa e inquieta. Percebendo
que havia algo errado, Helena se ofereceu para fazer uma
sexagem fetal, era bem difícil descobrir o sexo dos dois
quando se tratava de uma gravidez bivitelina, mas como já
tinha uma confirmação, ela tentaria. Se fosse uma menina
o segundo bebê, teria chances de aparecer o cromossomo
X no exame, assim como poderia aparecer apenas o
cromossomo Y porque um deles era um menino e o outro
continuar escondido, sendo o que fosse. Enfim, era só uma
tentativa de burlar os esforços do bebê de se manter no
anonimato.

Desdobrei a minha camiseta e me levantei da cadeira


de coleta.

— Quanto tempo, mais ou menos? — questionei,


estalando os dedos da mão.

Tentarei o mais breve possível.

Não consegui conter um sorriso que insistia em


enfeitar meu rosto.
— Não vejo a hora, quero muito saber se
conseguiremos descobrir o sexo do segundo bebê.

Mudaria alguma coisa? Obviamente não, os bebês


ainda eram de Leon, mas não lograva êxito em mandar no
meu coração e simplesmente fingir que não importava,
quando, na verdade, importava e muito.

— Bom… vou para o meu laboratório descobrir o


resultado. — Ela piscou, afastando-se com o frasco
vermelho na mão.

Ergui meu olhar até o relógio da parede, já estava


perto do horário do almoço e meu estômago se remexia,
faminto.

Não havia mais pacientes para o turno da manhã,


então aproveitaria para almoçar mais cedo e tentar evitar a
aglomeração que se fazia no horário de almoço em ponto.

Peguei o meu celular e deixei a sala, caminhando pelo


corredor com o coração agitado.

Leon e eu não falamos sobre o sexo, nós seguimos a


vida e fingimos que nada aconteceu, não que tenhamos
tido tempo para conversar sobre muita coisa, ele estava
focado no banco de esperma, separando uma nova cota de
espermatozoides para congelamento.

E não houve tempo ou até mesmo chances para uma


conversa durante o exame morfológico. Descobrir que eu
esperava um menino havia mexido com nós dois, tanto ao
ponto de ficarmos em silêncio, absortos em nossas
próprias mentes, medos e anseios.

E, independentemente, sabia que não se repetiria


mais, Leon não era um homem que fazia reprise das suas
fodas, era uma única vez e ponto. Repetir a dose ia contra
tudo o que ele acreditava e pensava. E embora tivesse
sido o sexo mais incrível da minha vida, não me apegaria a
isso, tinha planos e precisava seguir em frente sem deixar
que meus sentimentos conturbados prejudicassem a atual
situação.

Virei em um dos corredores no exato momento em que


bati de frente com alguém. Arregalei os olhos e dei um
passo para trás.

— Me desculpe — falei, encarando a mulher.

Ela aparentava estar um pouco desorientada, o rosto


negro parecia alguns tons mais claros do que normalmente
deveria ser e os olhos estavam arregalados, como se
estivesse preocupada e abalada.

— Está tudo bem? — perguntei, aproximando-me um


passo, minha veia médica pronta para entrar em ação.

Ela balançou a cabeça negativamente.

— Eu... eu preciso encontrar o doutor Dubrow — disse


em um sussurro.
Pisquei, sem reação.

— A senhora falou com a secretária...?

— Eu preciso falar com o doutor Dubrow. Agora! —


Interrompeu-me, estendendo o braço e pousando a mão
em meu ombro para se manter de pé.

Segurei na cintura dela, verificando o corredor às suas


costas e a possibilidade de encontrar alguém que pudesse
me ajudar, mas estava vazio, sem barulhos ou
movimentação de pessoas.

Ela me olhou com tanto anseio e desespero que não


pude fazer nada, eu apenas concordei com um aceno,
cedendo aos seus desejos.

— Tudo bem, vamos ver se ele está no consultório


dele.

Isso poderia me causar inúmeros problemas, até


mesmo a minha demissão da clínica, mas... o que eu
poderia fazer? Ela estava tão triste, desesperada e
debilitada.

— Qual é o seu nome? — perguntei.

Escorei o corpo dela contra o meu e comecei a


caminhar, um passo de cada vez, forçando minhas pernas
trêmulas a aguentarem o peso de carregar dois corpos.
— Tay... — respirou com dificuldade — meu nome é
Taylor.

Havia algo errado, conseguia notar pela contração do


peito dela, a cada vez que respirava, podia ouvir uma
rouquidão, era baixa, não passava de um ruído, mas
estava lá. O contraste de cor do rosto dela com as mãos
também era outro indício de que ela estava com
problemas, além do fato de que estava fraca, mal
conseguia parar em pé.

— Meu nome é Bridget, sou a doutora Adams,


residente da clínica. — Apresentei-me, virando o corredor,
me esforçando para não a deixar cair. — Me conte, Taylor,
é paciente da clínica? — indaguei, precisava mantê-la
acordada a todo o custo.

Os cantos dos lábios de Taylor se ergueram em um


sorriso fraco.

— Prazer em conhecê-la, doutora. — Engoliu para


molhar a garganta. — Sou paciente do doutor Dubrow.
Tomei a medicação que ele indicou para aumentar a minha
ovulação antes da inseminação, mas... tem algo de errado,
acordei não me sentindo muito bem hoje e estou com
muita dor no meu lado direito.

Tentei encontrar na minha mente algo que pudesse


relacionar com o que ela estava sentindo, mas não
consegui. Talvez alergia aos medicamentos ou uma
gravidez ectópica.

Apertei o botão do elevador que levava para o andar


de Leon e esperei, batendo o pé insistentemente no chão.
Taylor piscava devagar, levando tempo demais para reabrir
os olhos e o corpo dela pendia cada vez mais ao lado do
meu, sem forças, depositando todo o seu peso sobre mim.

— Vai ficar tudo bem... — murmurei, encarando o


painel digital, observando os números enquanto o elevador
avançava.

Meu coração batia com tanta força que podia ouvir o


zunido em meus ouvidos. Estava nervosa por estar sozinha
e com uma paciente com um problema que parecia ser
grave.

O elevador abriu e eu entrei, arrastando Taylor


comigo. Ela nem conseguia levantar os pés para caminhar,
as forças estavam desvanecendo-se a cada segundo que
passava.

— Chegamos, Taylor, apenas fique acordada —


implorei, assim que o elevador abriu no andar certo.

Rastejei pelo corredor com ela ao meu lado, o braço


que pendia em meus ombros estava caído, sem forças
para se estabelecer sobre mim. Taylor era pesada, me
obrigando a impor tremendo esforço para mantê-la.
Um passo de cada vez, lentos e arrastados, consegui
alcançar a porta do escritório de Leon. Quase chorei de
alívio, mas não tinha tempo e nem forças para isso. Abri a
porta sem me preocupar em bater, Leon estava sentado em
sua mesa lendo alguns papeis. Ele ergueu os olhos para
mim e franziu a testa.

— Bridget? — Olhou para a mulher que se agarrava


em mim. — Taylor? — perguntou, confusão atravessando
os olhos.

— Ela estava procurando você e apenas você — falei,


me agarrando no marco da porta para não ceder. — Há
algo errado, Leon.

Percebendo que eu estava arfando, a confusão de


Leon foi substituída por preocupação. Ele se levantou em
um único movimento e correu até mim, retirando Taylor do
meu ombro e segurando-a em seus braços.

— O que você tem? — perguntou, olhando-me da


cabeça aos pés.

Fiz um sinal negativo com a mão e esperei, exalando


com dificuldade, minha garganta estava tão seca que eu
seria capaz de beber dois litros de água de uma só vez.

— Nada... ela só é um pouco pesada — ofeguei,


engolindo em seco.

Leon semicerrou os olhos, cheio de raiva.


— Nós vamos conversar sobre isso depois — grunhiu.

— Tudo bem..., estou disposta a aceitar as


consequências, sei que deveria ter procurado alguém, mas
ela estava tão desesperada atrás de você que não
consegui negar — sussurrei.

Um vinco se aprofundou na testa dele.

— Não estou falando disso, Bridget, fez certo em me


procurar, Taylor é minha paciente.

Agora, quem estava confusa era eu.

— Está falando do que exatamente? — questionei,


pousando as mãos na cintura, meu peito subia e descia em
rápidas sucessões.

— Estou falando sobre você fazer algo que demandou


muito esforço físico, esqueceu que está gravida de
gêmeos, porra? — sibilou.

Me encolhi, constatando que eu tinha feito mesmo


uma merda muito grande, mas eu simplesmente esqueci,
não consegui pensar em nada além de ajudar Taylor.

— Eu... eu sinto muito... — sussurrei.

Espalmei uma mão em minha barriga, lágrimas


brilharam atrás dos meus olhos, a culpa me corroía aliada
ao medo de ter prejudicado meus bebês de alguma forma.
— Bridget, olhe para mim — pediu Leon, comprimindo
os lábios. Encarei-o, prestes a chorar. — Vamos fazer um
exame mais tarde, tudo bem? Se você não está sentindo
cólica e nem sangramento, está tudo certo com os bebês.
— Balancei a cabeça, confirmando. — Agora preciso que
vá até a ala cirúrgica e avise as enfermeiras que temos
uma possível paciente, vou atrás carregando a Taylor, mas
podemos estar correndo contra o tempo para salvá-la de
algo pior.

— Tudo bem — concordei.

Girei nos calcanhares e comecei a correr, meus pés


derraparam no piso quando virei em um dos corredores,
agarrei-me na parede para me manter de pé e continuei a
me movimentar, sem parar. Parei na frente dos elevadores
e chamei os dois, deixaria o que chegasse por último para
Leon. Entrei no primeiro que abriu as portas e selecionei o
andar cirúrgico.

— Céus, o que está acontecendo? — murmurei,


mordendo a ponta do polegar.

Eu estava nervosa, tinha percebido que trabalhar sob


pressão não era um dos meus fortes, mas seria algo que
eu precisava aprender, não seria sempre tão tranquilo
quanto aqui quando eu fosse para o hospital oncológico.

O elevador chegou no andar certo e eu corri para


dentro da sala cirúrgica. Três enfermeiras estavam
sentadas em cadeiras, conversando e rindo
descontraidamente.

— Doutor Dubrow está trazendo uma paciente neste


momento e precisa de tudo pronto — gritei, entre uma
lufada de ar e outra.

Em um piscar de olhos, as mulheres começaram a


correr para todos os lados. Uma delas me jogou a roupa
cirúrgica, fiz menção de negar, mas encarei o tecido e
repensei na possibilidade. Seria uma grande oportunidade
de aprendizado, portanto, se Leon não me corresse para
fora, ficaria presente para acompanhar o procedimento.

Leon entrou no momento em que escondia meus


cabelos debaixo da touca, ele caminhou até a maca e
deitou Taylor sobre ela. Uma das enfermeiras começou a
vestir Leon, enquanto outra puxava um ecógrafo para perto
da maca em que Taylor estava.

— Bridget, coloque o ambu nela — ordenou ele.

Me aproximei de Taylor, o rosto dela brilhava de suor


e os cabelos da testa e nuca estavam colados na pele.
Peguei o umbu e pressionei em seu rosto, apertando-o de
leve para ajudá-la a respirar melhor.

Leon pressionou o ecógrafo no abdômen da mulher.


Ela gemeu, ainda inconsciente, ao ter a barriga
pressionada, como se estivesse sentindo dor. O médico
observou a imagem que aparecia na tela, absorto, os olhos
ávidos a procura do que estivesse de errado com a sua
paciente.

— É uma gravidez tubária — avisou, apontando um


dedo para o televisor. — A trompa se rompeu e causou
uma hemorragia grave.

Senti uma dor no coração com o diagnóstico, Taylor


havia procurado a clínica por algum motivo, possivelmente
dificuldade em engravidar pelos meios naturais. E quando
finalmente conseguiu o que tanto queria, era uma gravidez
ectópica, ela perderia uma das trompas e isso limitaria
ainda mais suas possibilidades de uma gestação futura.

— Chamem o anestesista. Agora! — ordenou Leon,


arrumando os aparelhos respiratórios para introduzir em
Taylor, assim como o acesso venoso. — Vamos operá-la.

Ele não precisava falar nada, pude perceber o quanto


estava chateado pela forma com a qual se portava. Leon
tinha um jeito único de se apegar aos seus pacientes e as
suas histórias de vida e odiava quando as coisas saiam do
controle.

— Ela não sabia que estava grávida? — perguntei.

Ele balançou a cabeça.

— Taylor tentou engravidar por três anos antes de vir


nos procurar, os exames dela nos mostraram que ela tinha
baixa ovulação — explicou, colocando as luvas de látex. —
Então começamos o tratamento para uma inseminação
artificial, mas acredito que apenas a indução de hormônios
para a reprodução de óvulos tenha ajudado, essa gestação
foi natural.

— Quando seria a inseminação?

Leon me encarou, os olhos brilhavam com desgosto.

— Na semana que vem.

O anestesista entrou no bloco cirúrgico, ele e Leon


começaram a conversar enquanto analisavam o caso de
Taylor e verificavam a quantidade de anestésico que seria
necessário para sedá-la completamente pelo tempo que a
cirurgia poderia levar.

Fui afastada da maca enquanto ela era anestesiada e


entubada para a cirurgia. Observei tudo ao canto, temendo
atrapalhar. Leon fez a incisão no abdômen dela e começou
a cirurgia.

— Vai ficar tudo bem com ela? — perguntei,


espichando a cabeça para espiar.

— Ela perdeu bastante sangue, mas estou remediando


a situação — respondeu ele, concentrado no corte.

O bip constante dos aparelhos demonstrava o que


Leon havia dito, era pacífico e até então mostrava que
Taylor estava fora de risco. Leon removeu a trompa e
retirou o pequeno feto que se desenvolvia, colocando-os
em uma bandeja cirúrgica.

Por instinto, espalmei a mão em minha barriga,


sentindo a protuberância, a presença dos meus bebês, só
então consegui soltar a respiração que nem havia
percebido que estava presa nos pulmões.

— Estou controlando a hemorragia — avisou Leon,


preparando-se para fechar a incisão no abdômen de
Taylor. — Não foi muito grave, a outra trompa continuará
funcionando e ela poderá tentar engravidar outra vez.

Senti um alívio absoluto ao ouvir o diagnóstico dele,


me compadecia com a situação da mulher. Ela ficaria
arrasada quando acordasse e descobrisse o que tinha
acontecido.

Esse tipo de coisa me fazia questionar como tudo


funcionava, aqui estava diante de mim alguém que queria
muito ser mãe, assim como imaginava o quanto o
companheiro dela gostaria de ser pai, por isso estavam
lutando juntos para realizar este sonho. Se eles tivessem
gêmeos, ficariam realizados, tão felizes que nem
conseguiriam conter.

Eles mereciam essa felicidade.

Enquanto isso, o homem que eu chamava de pai,


lamentava-se e cuspia aos quatro cantos o quanto eu era
uma aberração da natureza e que jamais deveria ter
nascido.

A vida era mesmo muito injusta com algumas pessoas!

Meu coração comprimiu diante do meu pensamento,


da constatação óbvia que eu tinha feito.

Não era culpa minha. Não era. Entoei mentalmente.

Olhei para Leon que estava concentrado, costurando a


pele de Taylor, tentando deixar a menor cicatriz possível
em seu abdômen.

— Eu... — pigarreei. Ele me encarou. — Eu posso ir?

— Está tudo bem com você? — perguntou, vincando a


testa.

Balancei a cabeça.

— Só preciso me sentar, beber água e tentar me


alimentar — confessei.

O esforço de ter mantido Taylor comigo por tanto


tempo estava começando a me abater. Minha garganta
estava seca, sedenta por água, e, embora parecesse
estranho diante do fato de que eu estava presenciando
uma cirurgia, me sentia faminta.

Ele manteve os olhos azul-esverdeados fixos em mim,


incisivos, cheios de perguntas e desconfiança, antes de
acenar.

— Vá! Falarei com você mais tarde — murmurou,


abaixando o olhar para o corte que saturava.

Algumas enfermeiras me olharam de forma enviesada,


desconfiadas com a forma como Leon falou comigo. Sabia
que logo se espalharia a fofoca sobre estarmos tendo um
caso.

Suspirei e deixei a sala para trás.

Era impossível tentar conter Leon, não quando eu


gestava os filhos dele e teríamos que manter convívio
diariamente. E, além do mais, eu tinha mesmo meio que
um caso com ele. Bem... nós tínhamos transado, então...

Céus, eu enlouqueceria antes de parir as crianças.

Estava confusa com relação a absolutamente tudo.

Antes, eu não queria que desconfiassem de nós; mas


agora eu não poderia me importar menos. Antes, eu não
queria me relacionar com Leon; e agora, gostaria muito de
repetir a dose. Antes, repetia para mim mesma que o
melhor a se fazer era entregar as crianças para Leon e
seguir a vida; agora, não tinha tanta certeza disso.

Perdida. Confusa. Perturbada.

Essa era eu no momento.


Me perguntava como me sentiria quando me livrasse
de todas as minhas dívidas, só não imaginava que eu me
sentiria livre, como se tirasse um enorme fardo das minhas
costas.

A clínica depositou o valor da indenização pelo erro


causado. Assim que o dinheiro caiu na minha conta, corri
até o Banco e fiz um acordo, dizimando toda a dívida que
eu tinha com eles.

Era uma mulher livre, formada e sem dívidas,


finalmente.

Sorri amplamente, andando pelas ruas sem conter a


alegria que me dominava.
Nunca pensei em ficar devendo para o Banco, pelo
contrário, fazia questão de pagar tudo o que eu devia, até
a última moeda, assim que possível. E foi exatamente o
que fiz, recebi o dinheiro e paguei. Gastei cada dólar que
recebi da clínica, mas paguei o que devia.

Entrei na clínica saltitando, deslizando pelo piso claro


como se estivesse no céu. Me sentia tão aliviada que nem
notei o caminho enquanto me direcionava para a sala de
coleta, ignorando tudo ao meu redor, absorta em minha
mente.

Joguei a bolsa em cima do armário e recolhi o meu


uniforme do cabideiro, vestindo-o por cima da blusa.

— Bom dia, Bridget! — Ouvi a voz de Helena, ela


estava escorada na porta que levava ao seu laboratório. —
Você parece feliz, menina.

Olhei para ela e dei de ombros.

— Pode-se dizer que eu realizei um sonho hoje, então


sim, estou feliz — confessei, sem revelar muito.

Preferia deixar as coisas sobre o meu financiamento


entre o Banco e eu. Não era vergonhoso, mas jamais
deixaria meus pais saberem a verdade, meu querido
progenitor não teria isso para jogar na minha cara.

— Fico feliz por você, Bridget — ela sorriu,


descruzando os braços e me estendendo um papel –,
tenho uma novidade. Acredito que, além de mim, você seja
a primeira pessoa que deveria olhar o resultado e poderia
denominá-lo como um milagre, mesmo sendo difícil, nós
conseguimos.

Semicerrei os olhos e dei um passo para frente,


recolhendo o papel das mãos dela, desdobrei e comecei a
ler.

No resultado da sexagem fetal foi sinalizado o sinal de


amplificação do marcador do cromossomo X.

Uma menina.

Helena conseguiu descobrir o sexo do outro bebê, ela


desvendou o mistério sobre o que o bebê de pernas
cruzadas era.

Dei um passo para trás e coloquei a mão na boca,


engolindo a angústia que ameaçava me afogar.

Um casal.

Eu estava grávida de um casal de gêmeos, assim


como Brandon e eu.

— Bridget, está tudo bem com você? — perguntou


Helena, estranhando a minha reação.

Abri a boca, mas nenhuma palavra saiu por causa da


garganta embargada. Fechei os olhos e respirei fundo,
acalmando o turbilhão de sentimentos.
— Eu... eu preciso ir em um lugar — avisei, retirando
o uniforme de qualquer jeito e recolhendo a minha bolsa.

— Querida, o que está acontecendo? — Helena


avançou e segurou o meu braço.

Estava controlando meus batimentos cardíacos,


respirando com calma, tentando manter a postura,
engolindo o martírio, ou começaria a chorar na frente dela.

— Sim, eu só preciso... conversar com alguém sobre


esse resultado — confessei, a voz esganiçada. — Não vou
conseguir trabalhar hoje.

Pouco conseguia controlar a minha emoção, estava


sucumbindo ao desespero que sentia a cada segundo que
passava. E Helena percebia isso, estava claro pela
preocupação que brilhava em seus olhos.

— Tudo bem... — concordou, soltando o meu braço.

Avancei para fora da sala, correndo como se a minha


vida dependesse disso. Eu não queria enfrentar Helena,
muito menos ver Leon, não quando estava me afogando e
sucumbindo ao desespero.

Ouvi alguém me chamar de longe, reconheci a voz de


Liam, mas não parei, eu simplesmente continuei. Meus
passos acelerados se transformaram em uma corrida
desesperada.
Atravessei a porta de entrada da clínica e senti o
vento quente e abafado bater em meu rosto, divergindo
com o frio da clínica climatizada. Estava nublado, choveria
em algum momento.

Uma mulher desceu de um táxi e eu corri até o carro,


segurando a porta e deslizando pelo banco traseiro.

— Para onde? — perguntou o homem.

— Me leve... — Engoli, sentindo que não conseguia


respirar. A visão estava embaçada pelas lágrimas
acumulados. — Para o cemitério — conclui, sentindo o
primeiro esboço de choro escorrer pela minha bochecha.

Ele concordou e colocou o carro em movimento. Olhei


para o lado e vi Leon correndo em direção ao carro, os
olhos arregalados, o jaleco esvoaçando para trás conforme
se mexia.

O carro se moveu, afastando-se da clínica conforme


avançava pelas ruas. Até que a imagem de Leon foi se
tornando um pequeno borrão, desaparecendo de vez.

Não conseguiria falar com ele agora, nem se eu


quisesse. Esse era um momento apenas meu e ninguém
poderia me ajudar.

Também não me surpreendia que Helena tenha ligado


para ele assim que deixei a clínica, era nítido que eu
estava abalada e precisando de ajuda.
O primeiro soluço separou meus lábios, deslizando
para fora sem a minha permissão. Então outro
acompanhou o primeiro. E mais outro. E outro.

Me embolei no canto do banco e comecei a chorar,


deixando a devassidão da minha alma partida me destruir
de vez.

Eu não vi o caminho até o cemitério, não acompanhei


o percurso. Fiquei focada demais em minha bolha de
comiseração, abraçando o meu próprio corpo como se eu
pudesse me consolar sozinha.

Mas não havia consolo para mim.

Não havia cicatriz para uma ferida tão profunda e


antiga.

Não havia nada além da dor e da saudade.

— Chegamos, senhorita — comunicou o motorista.

Abri a minha bolsa e retirei uma nota da carteira,


estendendo-a a ele.

— Fique com o troco, obrigada por me trazer aqui —


murmurei, abrindo a porta e pulando para fora.
— De nada, moça, espero que fique bem —
respondeu.

Encarei a placa do cemitério com o coração vazio, há


anos que eu não comparecia no lugar que me causava
arrepios ruins.

Meu pai não tinha sido melhor comigo depois do dia


em que Brandon morreu no hospital, ele fez questão de me
menosprezar durante todo o velório e enterro, murmurando
coisas que faziam com que eu me sentisse culpada e a
cada vez que uma nova lágrima caía ou que ele percebia
que estava conseguindo me atingir, ele falava mais. Como
uma criança inocente e muito idiota, pensava que estava
fazendo isso para tentar suprimir a dor que ele sentia, mas
agora conseguia ver que ele só era um desgraçado
mesmo.

Atravessei os portões do cemitério e caminhei por


entre as lápides, observando o tapete de grama que se
distendia pelo lugar. Era bonito e agradável, embora o
local só refletisse sentimentos ruins.

Parei na frente da lápide de Brandon e respirei fundo,


sentando-me de frente para ela.

— Olá, irmãozinho — sussurrei, sentindo uma nova


enxurrada de lágrimas verter pelos meus olhos. — Eu sinto
a sua falta todo dia, a todo o momento e instante.
A lápide dele era como todas as outras, algo padrão
do cemitério.

— Eu sinto muito por àquele dia, Brandon, se eu


soubesse qual era a sua situação... eu... — Soltei um
soluço e olhei para o céu, tentando me acalmar. — Eu só
sinto muito.

Evitava frequentar o cemitério porque era doloroso


demais lembrar que tinha sido nesse lugar que eu o tinha
visto pela última vez. Que minha última lembrança dele era
dentro de um caixão, enquanto meia dúzia de amigos
próximos e vizinhos consolavam a nossa família
despedaçada.

— Estou grávida, Brandon... — revelei, abrindo um


sorriso que não chegava aos olhos. — E se você estivesse
aqui, sei que estaria alucinado com a ideia de ser tio,
assim como furioso com a clínica por ter cometido o
equívoco, mas... no fim das contas, a animação pela
chegada dos bebês predominaria e você seria uma figura
presente na vida deles. Sei que sim.

Arranquei um punhado de grama do chão e comecei a


brincar com ela por entre os meus dedos. Uma lágrima
pingou em meu braço. Eu ainda estava chorando e nem
havia percebido.

— Evito pensar sobre isso, dói demais, dói imaginar


que a minha vida está tomando um rumo, que eu já tenho
vinte e sete anos, que sou formada e... em breve serei
mãe, enquanto você teve um destino traiçoeiro e diferente
do meu. É injusto pra caramba que isso tenha acontecido
com você. — murmurei, olhando para a lápide outra vez e
lendo o nome dele. — Você foi o melhor irmão que eu
poderia ter, Brandon, mesmo quando era uma criança, me
protegia e me defendia acima de tudo, não importava de
quem fosse, inclusive do nosso pai. Eu te amei em vida e
continuo te amando em morte, você é a minha metade da
laranja, meu gêmeo, meu complemento.

Uma rajada forte de vento balançou os meus cabelos


e arrepiou os meus pelos. Dobrei os joelhos e abracei o
meu corpo.

— Eu estou esperando gêmeos, irmãozinho, como


nós. Um menino e uma menina. Mas eles não pertencem a
mim, eles pertencem a Leon, devo entregá-los a ele assim
que nascerem.

O primeiro pingo de chuva caiu em meu rosto, me


assustando de imediato. Então um segundo molhou o meu
cabelo e um terceiro o meu braço. Espremi meus olhos
com força, libertando todas as lágrimas que vibraram em
minhas íris.

Sentia a chuva me molhar, mas não fiz nada, eu


apenas fiquei parada, absorvendo o que estava
acontecendo.
— Eu deveria entregá-los, eu deveria... — Solucei e
apertei as mãos em punho, as unhas afundaram na pele,
causando uma ardência que nem se comparava a dor que
eu sentia no meu coração. — Mas eu não consigo, não
posso fazer isso — confessei, explanando o que estava me
consumindo por semanas.

Não tinha deixado a culpa por entregá-los me


consumir, tampouco havia pensado mais do que o
necessário no apego que eu já nutria por eles, até agora.
Não dava mais para fingir indiferença, eu não conseguiria
continuar com isso, não era forte o suficiente.

Ergui a cabeça para cima e absorvi a chuva em meu


rosto, misturando-se com as lágrimas que banhavam
minhas bochechas. E inspirei fundo, apreciando o cheiro
de grama úmida e terra molhada.

As lembranças do tempo que tive com Brandon me


alvejaram. Das nossas brincadeiras; dos banhos na chuva;
das poças de água que manchavam as nossas roupas e
deixava a nossa mãe louca da vida por causa da sujeira;
de como ele me defendia de qualquer um, não importava
quem fosse; de quando ele dormia comigo porque eu
estava com medo do escuro; de quando dividia o doce dele
comigo porque eu tinha devorado o meu e queria mais.

De como ele me completava.


— Eu não consigo fazer isso — repeti, balançando-me
para frente e para trás. — Eles são como nós fomos, ele
vai cuidar dela como você cuidaria de mim, eles vão ser
melhores amigos. E eu não poderei participar disso se
estiver longe, eles são a minha redenção, Brandon, a
remissão que eu precisava.

Um trovão cortou o céu, iluminando as nuvens


acinzentadas.

— Eu sei que não sou culpada pela sua morte, embora


nosso pai tenha tentado tatuar essa imagem em mim desde
que você se foi. — Suspirei. — Por um bom tempo, ele
conseguiu o que queria e eu precisei crescer com a culpa,
mas quando finalmente me libertei e entendi que foi uma
fatalidade, consegui seguir em frente. Não inteira, não
completa, mas eu consegui.

Eu não poderia mais negar para mim o quanto estava


apegada a esses bebês. Estive desde o momento em que
descobri que eles cresciam dentro de mim, amplificando-se
quando descobri que eram e explodindo de vez ao
confirmar que eram um casal, como eu e meu irmão
gêmeo.

Não me considerava uma mãe excelente por ter


concordado entregá-los em um primeiro momento, mas
também não cairia em comiseração outra vez, me julgando
por algo que não pertencia a mim. A maternidade era isso,
errar e aprender. Não planejava ser mãe, mas... aconteceu
e talvez esse fosse o meu destino no final das contas.

Os bebês também me pertenciam, eles tinham uma


parte minha. E dane-se o que iriam falar sobre isso, eles
eram meus e ponto final.

— Não vou deixar que sofram como eu, não vou deixar
que Leon os crie como herdeiros, sem amor, apenas com
um propósito, não deixarei que vivam um relacionamento
tóxico com o pai como eu vivi. — Estendi o meu braço e
descansei os dedos gelados em cima da lápide. — Eles
terão um ao outro, e espero que o destino deles seja
diferente do nosso, que a vida não os separe tão cedo. —
Meus cabelos molhados grudaram em meu pescoço, eu
estava ensopada e mal tinha percebido. — Eu te amo
tanto, Brandon, sempre e para sempre.

Precisava espairecer, pensar com coerência, por isso


havia corrido para o único lugar onde eu poderia fazer
isso, para a única pessoa que me ouviria sem me julgar e
que apoiaria qualquer que fosse a minha escolha.

Levantei-me com dificuldade por conta das roupas


encharcadas que se colavam ao meu corpo. Olhei para
baixo e vi a protuberância em meu ventre. Estava
aparente, como se eles finalmente estivessem felizes por
se mostrarem, como se fosse o certo, como se fossem
sempre meus, mesmo quando eu não conseguia ver isso.
Toquei na protuberância, acariciando-os e sorrindo,
sentindo-me em êxtase, livre, realizada.

— Meus... — sussurrei para a minha barriga. — Não


vou deixar nenhum de vocês. Jamais.

Ergui o olhar de volta para a lápide de Brandon e


soltei uma respiração ruidosa.

— Eu deveria ter vindo antes, mas não conseguia me


apegar ao fato de que deveria deixá-lo partir de vez, me
sentia egoísta por fazer isso, como se fosse errado, como
se eu estivesse abandonando você. — Acariciei a barriga
outra vez. — Mas a verdade é que isso nunca acontecerá
porque você faz parte de mim, desde o nascimento até
depois da morte. Nós nos encontraremos na eternidade,
Brandon, enquanto eu não chego, aproveite e pule nas
maiores poças de água e suje muito as suas roupas, como
adorava fazer.

Coisas quebradas não poderiam ser consertadas,


apenas remediadas. E era assim que eu me sentia. O
machucado que a morte de Brandon deixou, era muito
profundo para ser curado sem que deixasse uma cicatriz.
Eu jamais seria completa outra vez, mas poderia seguir em
frente agora. De alguma forma, os bebês reascenderam
uma esperança dentro de mim que tinha se apagado a
tanto tempo que eu nem sabia que ela ainda existia.
Não era mais sobre mim ou sobre o meu luto, era
sobre os bebês que eu carregava e que precisavam de
mim; sobre como eu queria defendê-los e protegê-los de
tudo e todos; sobre como poderia dar para eles um futuro
diferente do meu.

Eu daria a eles muito amor e carinho, eles seriam


respeitados e jamais seriam tratados com desigualdade.
Faria com que ambos soubessem como eram especiais.
Faria com eles bem diferente de como tinha sido feito
comigo.

Soltei uma exalação pelo nariz e arrumei a minha


postura, preparando-me para enfrentar a primeira batalha
por conta da minha decisão.

Mas não importava quais seriam as consequências, eu


estava decidida, os bebês eram meus.
Eu tremia da cabeça aos pés quando empurrei a
chave na fechadura de casa e girei, destrancando a porta.
Meus dedos estavam duros por conta do frio e a minha
mandíbula rígida de tanto bater os dentes.

Minhas roupas ainda estavam encharcadas, marcando


a minha barriga para quem quisesse ver.

E eu não poderia me importar menos com isso.

Não quando eu finalmente tinha aceitado o fato que


seria mãe e que os bebês seriam presenças frequentes em
minha vida, de agora em diante.
Entrei em casa e suspirei ao sentir o calor
reconfortante. Precisava de um banho quente e uma boa
xícara de chá para afastar o frio, antes que ficasse
gripada.

Mas era tão libertador ter estado na chuva depois de


tanto tempo de medo e tristeza. Fazia anos que eu não
sentia nada parecido quanto ao que estava sentindo no
momento. Me fez lembrar tanto de Brandon, de como os
banhos de chuva eram animados e vibrantes. Me fez sentir
saudade, mas também me causou um alívio absoluto.

— Bridget? — Ouvi a voz da minha mãe entoar. Ela


veio da cozinha secando as mãos em um guardanapo de
pano, franzindo as sobrancelhas e me olhando da cabeça
aos pés. — O que você está fazendo, querida, quer
adoecer?

Pensei que teria mais tempo para essa conversa, que


eu poderia pensar um pouco melhore em como abordaria o
assunto, mas nada era como o planejado.

— O que a senhora está fazendo em casa? —


questionei.

— Os Parkson foram passar a semana na casa de


campo, então me deram folga. — Explicou-se, balançando
a cabeça com um olhar repreendedor de mãe. — E a
senhorita não deveria estar encharcada desse jeito, vai
pegar um resfriado, sabe como não gosto desses banhos
— ralhou.

A chuva não tinha causado um trauma apenas em


mim, minha mãe também fazia parte disso. Eu via como
ela se encolhia todas as vezes que um relâmpago cortava
no céu. Ela odiava dias nublados, mas fingia não se
abalar.

— Deixe a garota inconsequente, Ruth, ela adora agir


assim para chamar a nossa atenção — retrucou Mark, a
voz soando ao fundo.

Mordi os meus lábios e prendi a respiração, se eu


tinha alguma expectativa de ter uma conversa amigável ou
respeitosa com a minha mãe, essa esperança tinha
evadido em fumaça no momento em que percebi que meu
pai também estava presente.

— Tenho algo para contar — avisei, entrelaçando os


dedos em frente ao corpo.

O quão ruim poderia ser? Bom, considerando o pai


que eu tinha, muito ruim!

Minha mãe deu um passo para a frente, o semblante


denotava preocupação.

— O que foi? O que está acontecendo com você? —


inquiriu, segurando-se no aparador.
Mark apenas soltou uma risada enfezada.

— O que você acha que é, mulher? Olhe bem pra cara


dela, claro que foi demitida da clínica — zombou. —
Devem ter percebido que é melhor enterrando gente do
que salvando. Inclusive, Bridget, eu sempre disse para
você virar coveira, eu avisei que a medicina não era a
profissão certa.

Cerrei a mandíbula e engoli um grunhido de raiva.

Não importava o que acontecesse depois da conversa,


eu não me submeteria mais a ouvir esses desaforos. Se
Mark era um homem amargurado, problema era dele, eu
seria mãe e queria viver em paz com os meus filhos, e isso
incluía defendê-los do próprio avô.

Minha mãe olhou para mim, questionando em silêncio


a afirmação do marido.

— Eu não fui demitida, estou indo muito bem na


residência, na verdade, me destacando a cada dia mais. —
Lancei ao meu pai um sorriso incisivo, o que o fez sibilar
uma palavra incompreensível. — Mas o que eu tenho para
falar é muito importante. E não importa o que vocês
pensem ou digam, eu não vou mudar de ideia.

— Ah, meu Deus! — crispou Ruth, estalando uma mão


no peito.
— Fale logo, garota! Ou quer matar a sua mãe assim
como fez com o seu irmão? — resmungou Mark.

Fechei meus olhos por um momento e apenas respirei,


absorvendo as coisas boas que tinham me acontecido e
eliminando tudo de ruim que eu carregava. Precisava criar
coragem através da minha força para enfrentar os meus
medos e dar um basta na relação mais tóxica da minha
vida.

Não era nada fácil, mas era preciso.

Eu amava Mark, mesmo que ele fosse um imbecil,


porque, no final das contas, ele ainda era o meu pai. E não
importava o que ele dissesse para mim, nada supriria a
ausência que eu sentia por ter recebido apenas desprezo
da parte dele. Morreria com o desejo de ter tido mais, de
ter merecido mais.

Eu como filha nunca teria amor paterno e respeito


vindo dele e nada poderia ser feito quanto a isso, mas
como mãe, impediria que meus filhos passassem pelo
mesmo.

Abri os olhos e encarei os dois pares de olhos que


estavam fixos em mim, principalmente os do meu
progenitor, com quem eu era tão fodidamente parecida.

— Estou grávida — confessei, dando de ombros para


diminuir a relevância do que a notícia causava.
Minha mãe deu um passo para trás, como se tivesse
sido atingida por algo invisível, e se agarrou com tanta
força no aparador que os vincos da mão começaram a
embranquecer. Enquanto Mark parecia absorver a notícia,
incrédulo e em silêncio.

— Como é? — perguntou Ruth em um sussurro.

— Estou grávida, são gêmeos e é um casal.

Os olhos dela voaram em direção à minha barriga,


duplicando de tamanho ao notar o ventre saliente que eu
carinhosamente enunciava para todos.

Poderia ter descolado a blusa molhada da pele?


Poderia.

Eu queria fazer isso? Não.

Meu pai se levantou da cadeira em um só movimento,


fazendo-a raspar no chão e causar um zunido chato. Então
avançou em minha direção, me forçando a dar alguns
passos para trás.

Ele nunca me agrediu fisicamente, limitava-se as


palavras ríspidas, mas não confiava que não pudesse fazer
algo agora.

— Você sabe quem é o pai, sua vadiazinha? — cuspiu,


franzindo nariz com nojo enquanto encarava a minha
barriga.
Senti uma estranha necessidade de defender os meus
bebês da raiva dele, coloquei as mãos na frente do meu
abdômen, tapando-o do olhar asqueroso que ele me
lançava.

— Sim, eu sei quem é o pai — confirmei, erguendo o


maxilar.

Eu sabia que isso poderia acontecer, Mark só queria


um motivo para me atacar. Não tinha pensado bem no que
eu faria, mas sairia de casa, não estava mais endividada e
teria o salário da residência todo para mim e com ele daria
para alugar alguma coisa e ir me mantendo. E, além do
mais, esperava que Leon pudesse me ajudar quando os
bebês nascessem, já que teria que me afastar da
residência por um tempo. Isso atrasaria um pouco os meus
planos, mas nada que não pudesse ser remediado.

— Meu Deus, Bridget, o que foi que você fez? —


sussurrou mamãe.

Revirei os olhos.

— O pai é Leon Dubrow, o médico responsável pela


minha residência.

Uma cor vermelha começou a subir pelo pescoço de


Mark, dominando o rosto, fazendo-o mudar de cor.

— SUA PIRANHA! — acusou, dando um passo para


frente e eu outro para trás. — Deu o golpe da barriga, não
foi? Não bastava ter matado o seu irmão, tinha que jogar o
nome da família na lama. Sabia que tinha algo de errado
quando anunciou que conseguiu a vaga na clínica, só não
esperava que fosse tão baixa e suja ao ponto de
engravidar para conseguir o que quer.

Ponderei, imaginando se valia a pena tentar me


explicar, contar a verdade sobre a gravidez, mas não valia
a pena. Mark talvez pudesse tentar usar isso contra mim,
Leon ou a clínica no futuro. Eu não confiava nele para
espalhar o segredo.

Também, contra fatos não havia argumentos. Ele tinha


uma opinião formada sobre mim, não importava o que eu
dissesse, ele nunca mudaria.

— Não dei golpe da barriga, apenas… hum…


aconteceu.

As ofensas que ele proferia não chegavam nem perto


do que falava quando eu era apenas uma criança, por isso
não tinha relevância alguma para mim.

Ruth começou a chorar, deixando um sorriso escapar


pelos lábios.

— Céus, Bridget, não acredito que você fez isso,


minha filha! — Balançou a cabeça. — E quanto a sua
residência, o seu futuro?

Mark riu sombriamente.


— Não seja boba, mulher, ela deu um golpe bem dado
— olhou para mim com asco –, está grávida de um dos
homens mais ricos do País, ela garantiu o futuro dela como
a vadiazinha que é.

Dane-se o que ele pensava sobre mim.

Dane-se ele.

O melhor jeito de cortar um mau, era podando-o. E


Mark Adams era péssimo para a minha vida, só servia para
me desestabilizar emocionalmente, acabar com o meu
psicológico, fazer com que eu me sentisse culpada, nada
além disso, não havia nada nele que eu pudesse me
apegar como bom, que me fizesse sentir falta dele.
Absolutamente nada.

— Não estou pedindo a opinião de vocês sobre a


minha gravidez, só estou comunicando-os como uma boa
filha faria.

— E acha que vai me envergonhar assim? Eu quero


você fora da minha casa! — gritou, apontando para a porta
atrás de mim.

— Mark… por favor, pare com isso — choramingou


minha mãe.

Eu sorri para ele, cheia de zombaria e depreciação.


— Não se preocupe, faço questão de ir embora.
Sempre me tratou como se eu fosse um lixo, não vou
deixar que faça o mesmo com os meus filhos. Foi um
péssimo pai e seria um péssimo avô, jamais permitirei que
façam distinção de sexo com eles. Você está proibido de
chegar perto deles.

Ele soltou uma gargalhada que fez com que eu me


encolhesse.

— E acha que eu quero esses bastardos? — objetou


com tanto ódio que meus pelos se arrepiaram. — Não
quero nada que venha de você, para mim você nunca
passou de um lixo, um feto assassino. Brandon nunca
deveria ter adoecido, você por outro lado, sim.

— Mark, pelo amor de Deus, pare com isso, pare de


tratar a nossa filha assim — implorou ela, chorando e
fungando.

— Só estou falando a verdade, já que você nunca teve


coragem para fazer isso, eu tenho, Ruth.

Não fiz nada, apenas fiquei observando-o falar,


orgulhosa de como as palavras dele não me atingiam mais,
de como eu tinha evoluído quanto a isso e de como estava
me curando dos ferimentos que ele havia me causado.

— Não, meu adorável e amoroso pai, não ficarei na


sua casa, tampouco faço questão de ficar. Como eu disse,
não deixarei meus filhos conviverem com alguém tão
amargo e tóxico quanto você.

— É claro, já usou o meu dinheiro quando era


necessário, agora vai ocupar de gastar o dinheiro desse
coitado que não sabe quem você é de verdade.

Encolhi os ombros.

— Na verdade, agora sou médica, posso usar o meu


próprio dinheiro, papai. — Sorri para ele.

Ele grunhiu e avançou em minha direção, agarrando o


meu braço com força, cheio de ódio e rancor.

— Vai sumir da minha casa, não vou ter uma filha


prostituta que dá o golpe da barriga — bradou, me
puxando com força.

— Me solta, seu asqueroso! Eu mesma faço questão


de ir embora dessa casa. — Tentei me desfazer do toque
dele, mas sem sucesso. — Saiba que não me culpo pela
morte de Brandon, eu amava o meu irmão, mas não
preciso provar isso para você e nem para ninguém. Eu o
quero longe de mim e longe dos meus filhos, nunca foi um
bom pai, na verdade, nem sei se posso te denominar como
“pai”.

— Me denomine como quiser, garota, não me importo


com você. Já disse e repito, era pra você ter morrido no
lugar do meu filho tão amado.
— Mark, cale a boca e solte a nossa filha. Agora! —
gritou Ruth, recompondo-se do estado de inércia que se
encontrava.

— Ela não é minha filha, e eu a quero fora da minha


casa.

— A casa também é minha e eu digo que ela vai ficar


— protestou ela, batendo o pé.

— Tudo bem, então será uma escolha. Ela ou eu, não


ficarei presente quando esses bastardos nascerem e a
vizinhança toda desprezar a nossa família por essa
vergonha.

Eu ri.

— Você já é desprezível o suficiente, não precisa da


vizinhança para isso. — Ele pressionou o meu braço com
mais força, me fazendo trincar os dentes. Sabia que
deixaria marcas que eu teria que esconder por um tempo.
— Me solte, estou indo embora desta maldita casa. Vou
pegar as minhas coisas e finalmente me livrar de você.

Sem esperar, ele abriu a porta e me arrastou para a


rua, me jogando debaixo da chuva. Dei uns passos para
trás, estarrecida com o absurdo que presenciava.

— Você vai embora assim, com a roupa do corpo, é


um desgosto pra essa família. Tudo o que te pertence foi
eu quem comprei e ficará aqui. Pegue seus bastardos e
suma da minha frente.

Olhei para trás dele, vendo minha mãe chorando no


rol da porta e balançando a cabeça, inconformada com o
que acontecia. E então olhei para mim, me sentia
humilhada, com frio, molhada e sozinha.

Tinha certeza de que a conversa seria uma desgraça,


só não pensei que tudo aconteceria dessa maneira. Pensei
que ao menos pudesse entrar e pegar as minhas coisas,
não ser expulsa de casa com a roupa do corpo.

Eu não tinha nada, apenas a minha bolsa, uma roupa


encharcada e a minha dignidade.

— Tudo bem, pai, mas desejo que você encontre o seu


lugar no inferno e que queime pela eternidade —
praguejei.

Ele avançou de novo em minha direção, não se


importando com a chuva ao sair da área coberta para me
encontrar no meio do jardim.

— Vai aprender a me respeitar agora, sua


prostitutazinha!

Ele levantou o braço para bater em meu rosto, fechei


os olhos esperando o tapa, mas ele nunca chegou. Quando
os reabri, a mão do meu pai era agarrada por outra e ele
encarava além de mim com fogo nos olhos.
— Se levantar a mão outra vez para tocar na minha
mulher grávida, eu arrebento você — sibilou Leon.

Dei um passo para trás, sentindo minhas costas


colidirem contra o peito duro e quente dele, soltando um
suspiro que nem havia percebido que estava preso. Leon
jogou o braço do meu pai para trás com raiva e circulou a
minha cintura, defendendo-me.

— Abra os olhos, rapaz, essa puta só está interessada


no seu dinheiro, deu um belo e velho golpe da barriga.

Os cantos dos lábios de Leon se ergueram em um


sorriso mordaz.

— Se ofendê-la na minha frente de novo, eu vou


acabar com a sua vidinha medíocre e miserável. — Ele
pendeu a cabeça para o lado. — É uma pena que não
saiba valorizar a filha maravilhosa que tem… — Comprimiu
os lábios. — Mas como parece ser egocêntrico demais
para isso, deixa que eu dou a Bridget o respeito que ela
merece, ela ficará muito melhor longe de você.

Mark riu de Leon.

— Leve-a, sinta-se à vontade, não sabe a cobra que


está colocando para dentro da sua casa. — Fez um gesto
de desdém com a mão. — Boa sorte para você.

Ele não disse nada além disso, sem ofensas


proferidas contra a minha honra, parecia ter mesmo ficado
com medo do que Leon poderia fazer. Mark era um
hipócrita, mas não burro, sabia o poder que Leon tinha, o
renome do sobrenome que ele carregava, não compraria
uma briga que sabia que não iria ganhar.

— Bridget! — gritou Ruth da porta. — Bridget, fique!


Seu lugar é aqui.

Mark deu um passo para trás, e outro e outro, até


assumir uma distância segura de mim e de Leon.

— Vamos, você está gelada e tremendo — murmurou


Leon em meu ouvido, beijando o topo da minha testa.

Ele me puxou para ele e me levou até o carro, abrindo


a porta e me colocando para dentro, então fez a volta e se
sentou no banco do motorista. Ao ligar o motor, Leon
colocou o ar-condicionado no máximo e acelerou. Observei
através da janela os meus pais ficando para trás,
diminuindo até não ser mais nada além de um borrão.

— Vamos para a minha casa Bridget, pelo visto, temos


muito o que conversar — comentou, virando as ventanas
do ar para mim, tentando me aquecer.

Fechei os olhos e deixei o calor se infiltrar em meus


músculos rígidos e liquefazer o frio que me dominava.
Minha mente girava, tentando encontrar uma definição
para o que tinha acontecido, sem sucesso.
A primeira batalha tinha sido um horror, meus pais só
confirmaram o que eu cogitava. Eu estava sozinha.

Eu era uma pessoa sozinha desde Brandon.

Agora bastava descobrir se Leon também me


expulsaria quando descobrisse que eu não compactuaria
com os seus planos, mudando o rumo da sua vida tão bem
planejada uma segunda vez.
Não foi difícil conseguir o endereço de Bridget, estava
no cadastro dela na clínica.

Quando Helena me ligou me informando que Bridget


tinha reagido muito mal ao resultado da sexagem fetal que
elas fizeram, saindo correndo da clínica, eu fiquei
desesperado. Não consegui nem mesmo reagir direito ao
fato de que os bebês eram um casal, de que eu teria um
menino e uma menina.

Não sabia o que encontrar ou porque ela tinha reagido


daquela maneira, mas a garota simplesmente entrou em
um táxi e fugiu de mim como o diabo fugia da cruz. Então
retornei e comecei a pensar em como poderia encontrá-la,
até que tive a ideia de conferir o endereço dela na ficha.

Bridget era muito reservada com relação a vida


pessoal, eu só sabia o que os papéis do cadastro
mostravam e nada além disso.

Claro que resolvi aprender sobre ela.

Sabia que ela odiava chuva, apesar de não contar o


motivo, e que não era um ódio simples, era medo puro,
como um trauma. Ela também tinha uma vontade absurda
de se destacar em tudo o que fazia, assim como me
observava de canto nas vezes em que trabalhamos juntos
em alguma cirurgia ou parto, atenta aos meus movimentos,
mas sem coragem de me perguntar, o que me fazia exalar
em voz alta os passos que eu estava dando e os motivos,
ensinando a ela sem que precisasse pedir.

Eu também conseguia reconhecer a inexperiência dela


no sexo, sempre que falava algo de cunho sexual, um
rubor bonito cobria as bochechas, destacando ainda mais
os olhos claros.

Ela era viciada em cachorro-quente e só conseguia


comer a porcaria nas últimas semanas, embora não
admitisse, o que me fazia levar um para ela sempre que
possível.

Mas, de tudo o que fazia, era nítido o quanto não


conseguia disfarçar como estava apegada aos bebês,
mesmo que tentasse negar.

Isso me preocupou? Um pouco.

Mas o que eu poderia fazer quando até mesmo eu me


sentia apegado a eles? Eu, o homem que era invicto ao
falar que teria herdeiros e não filhos, mal conseguia
controlar a animação quando tocava na barriga dela.

Eu tinha acompanhado muitas gestações, via como os


meus pacientes ficavam bobos todas as vezes em que
ouviam alguma novidade sobre os filhos, mas pensava que
era diferente, eles queriam muito aquilo, enquanto eu
trataria como um negócio.

Estava enganado.

Uma gestação tinha um jeito único de mudar a gente,


e era bem estranho para falar a verdade, porque se
infiltrava sem que fosse perceptível. Em um dia, estava
denominando-os como feto; no outro, comemorava que
eram gêmeos e me alegrava de tanto orgulho.

Algo havia mudado para Bridget com o resultado, era


nítido apenas pelo fato de que tinha contado aos pais
sobre a gravidez. E, depois do que presenciei, entendia
por que ela tinha tanto medo de que eles soubessem.

O pai dela era o maior imbecil de todos, nunca tinha


presenciado um homem tratar tão mal o próprio filho como
hoje. Era acostumado com casais que amavam os bebês,
que os desejavam tanto ao ponto de contar os segundos
pelo resultado positivo, não com o desprezo que
presenciei. E isso me chocou na mesma magnitude em que
me deixou possesso de raiva.

Ver Bridget na situação em que a encontrei, molhada,


abalada e humilhada, fez com que algo dentro de mim
evadisse para fora. Eu só queria protegê-la, tanto que
parecia uma necessidade.

Fizemos o percurso até o meu apartamento em


completo silêncio. Bridget não abriu a boca quando
estacionei o carro, nem mesmo enquanto esperávamos o
elevador chegar.

Ela estava tremendo tanto que podia ouvir os dentes


batendo. Removi meu casaco e o coloquei sobre os seus
ombros finos e delicados.

— O-obrigada — gaguejou, limpando o rosto com o


dorso da mão.

Bridget estava ensopada, os cabelos estavam colados


ao redor do rosto, as roupas pregadas à pele e um rastro
de água ficava para trás por onde ela andava.

Mas não era só isso, ela nem parecia notar o quanto


tremia de frio, como se estivesse alheia ao que lhe ocorria
ao redor, presa em uma mente turbulenta.
O elevador chegou e eu avancei com ela ao meu
encalce.

Grudei os braços ao lado do corpo e trinquei as mãos


em punho para conter a raiva que eu sentia. Se eu
soubesse que Bridget passava por isso em casa, já teria
tirado ela do lugar há muito tempo.

Ela pediu um apartamento para morar nos últimos


meses de gravidez e Ben improvisou um local, mas Bridget
nunca mais entrou em contato para comunicar a mudança,
pensei que ela quisesse postergar até o último segundo,
que ficaria com saudade dos pais pelos meses que ficaria
fora.

Soltei uma exalação frustrada.

Por que inferno essa garota não me contou?

Entramos em meu apartamento e eu recolhi o controle


da climatização para aumentar a temperatura. Bridget ficou
parada no meio do corredor, sem saber o que fazer, os
olhos fincados em seus pés, evitando-me.

— Você precisa de um banho — avisei, aproximando-


me dela lentamente. — Vou fazer um chá de camomila
para você, vai ajudar a relaxar os músculos tensos. —
Toquei no queixo dela com a ponta dos meus dedos,
erguendo o rosto para mim. Os olhos de Bridget pareciam
opacos e vazios. — Vou te dar roupas minhas para vestir,
não pode ficar molhada desse jeito.
Que Deus me impedisse de, em um impulso de raiva,
ir até a casa dela e acabar com o maldito homem que ela
chamava de pai.

— Não precisa fazer nada disso, estou bem, só


preciso encontrar um hotel para ficar e...

— Venha, Bridget, não aguento mais ouvir os seus


dentes batendo, está me deixando nervoso. — Puxei-a em
direção aos quartos. — E não vem com esse papinho de
hotel, vai ficar comigo e pronto.

Entrei no meu quarto e fui até o closet. Olhei ao redor,


sem saber ao certo o que daria para ela vestir. Peguei uma
boxer e uma camiseta de algodão preta. Retornei e a
encontrei parada perto da porta, olhando com curiosidade
para o local.

— Aqui está o banheiro — avisei, abrindo a porta em


anexo. — Tem toalhas no balcão da pia e tudo o que mais
irá precisar para um banho disponível. Leve o tempo que
precisar, estarei na cozinha preparando o seu chá.

Ela fungou e removeu meu casaco molhado dos


ombros, entregando-o de volta para mim.

— Obrigada — agradeceu e sumiu para dentro do


banheiro, fechando a porta em seguida.

Entendi que ela precisava de um tempo sozinha,


talvez nem ela mesma estivesse esperando a reação de
merda dos pais dela.

Voltei para a cozinha e coloquei a água para ferver.


Me escorei no balcão e cruzei os braços, encarando a vista
da sacada, observando o mar até onde se encontrava com
o céu, tornando-os apenas um.

Bridget era uma boa garota, mas carregava algumas


cicatrizes, só não sabia quantas e nem mesmo a
magnitude delas. Mas sentia uma enorme necessidade de
lamber cada uma até que cicatrizassem por completo.

Sentia uma gratidão enorme por Bridget, ela poderia


ter agido de forma diferente quando soube o erro que a
minha irmã cometeu. Poderia ter tentado tirar dinheiro da
clínica ou até mesmo ter procurado a imprensa para
conseguir status e ganhar a visibilidade que todo o médico
recém-formado queria, mas ela não fez nada disso. Ela só
seguiu a vida e fingiu que estava tudo bem, quando na
verdade não estava. Era visível que não. Então eu fiz o
que deveria ter feito desde o início, me aproximei dela e
tentei consolá-la de alguma forma, tornando-me o amigo
que precisava, já que não poderia contar a situação para
ninguém e estava deixando que o segredo a consumisse.

A chaleira chiou, me tirando das divagações. Pisquei,


virando-me para o balcão e enchendo a xícara de Bridget.

Removi a minha camiseta e a joguei no chão da


cozinha, estava molhada e me irritando, grudando em
minha pele toda vez que eu me movimentava. Espalmei as
mãos no balcão e me inclinei para frente, soltando um
suspiro pesado.

— Leon? — Ouvi a voz de Bridget e girei a cabeça em


direção a ela.

A garota me encarava, minha camiseta parecia mais


como um vestido nela, mas a deixou tão absurdamente
sexy que precisei me agarrar ao mármore para não ir até
ela e fodê-la contra a parede.

Bridget me encarava, os olhos deslizaram pelos meus


braços e peitoral. Ela engoliu em seco e deu um passo
para frente, entreabrindo os lábios em uma respiração
densa.

Olhei para a frente e fechei os meus olhos. No


momento, ela era proibida, ao menos até que
conversássemos. E eu sei que disse que nunca mais
repetiria uma mulher, mas... isso não se aplicaria a
Bridget, seria impossível.

Juntando toda a força que eu tinha, recolhi a xícara


fumegante de cima do balcão e fui até ela.

— Vamos nos sentar na sala, nós precisamos


conversar.

Ela fez um aceno com a cabeça.


— Sim, mas você ainda está molhado e pode adoecer,
não é imune a um resfriado — contestou, cruzando os
braços em frente ao peito.

Os mamilos duros marcaram o tecido fino, ficando


bem desenhados e visíveis. Engoli em seco e desviei o
meu olhar, girando nos calcanhares e caminhando até a
sala.

— Estou bem — retesei-me, ignorando os protestos


dela. — Vamos conversar e quero que seja sincera comigo,
Bridget, que não me esconda nada, preciso compreendê-la
e jamais poderei fazer isso se você não se abrir comigo.

Me sentei no sofá e aguardei. Bridget sentou-se ao


meu lado, cruzando as pernas e evidenciando a minha
boxer preta que ficava bem larga no corpo dela.
Estendendo o braço, recolheu a xícara da minha mão e
tomou um pequeno gole, suspirando.

— Eu vou me abrir com você, mas antes preciso


contar uma coisa que acho que não vai gostar nenhum
pouco — disse, encarando-me com afinco. — Só espero
que seu comportamento não seja tão ríspido quanto o do
meu pai. Se quiser me colocar para fora, apenas avise e
me deixe sair com respeito e dignidade, não me expulse,
por favor — pediu, com os olhos brilhando em emoção.

Muita sorte que estivéssemos do outro lado da cidade,


ou eu esmurraria a cara do pai dela sem pensar duas
vezes se o imbecil estivesse na minha frente.

— Eu jamais faria isso com você — afirmei.

— Promete? — insistiu, ansiosa pela minha resposta.

— Sim, eu prometo e reitero, nunca, sob hipótese


alguma, faria isso com você.

Ela esfregou a ponta do dedo na borda da xícara,


brincando com a fumaça e olhou para frente.

— Eu vou ficar com os bebês, Leon — avisou, não era


um pedido, mas sim uma afirmação. — Eu sei que disse
que entregaria eles pra você, mas não farei isso. Eles
também são meus e embora eu não os quisesse no início,
agora eu os quero e não irei abrir mão deles. — Ela me
olhou com os lábios comprimidos. — Nós podemos fazer
isso juntos ou eu farei sozinha.

Me escorei contra o encosto do sofá e esfreguei os


meus cabelos. Minhas têmporas latejavam dando início a
uma dor de cabeça chata e constante.

— Eu sabia que isso iria acontecer — expressei,


encolhendo os ombros.

— Sabia? — Bridget franziu a testa.

— Sim, você já estava apegada mesmo quando


achava que não, era muito nítido, Bridget. Eu tinha certeza
de que não iria entregá-los, mas pensei que só se daria
conta no parto, não antes.

— Então... você vai renunciá-los? — perguntou,


baixinho.

Neguei com um sinal.

— Você disse que nós poderíamos fazer isso juntos ou


você faria sozinha — falei, ela concordou. — Então aqui
está a minha resposta, Bridget: nós faremos isso juntos. E
não estou bravo por isso, você não tem culpa e nem eu,
caímos em uma armadilha do destino.

— Mas e quanto ao seu desejo de ser pai solo e ter


um herdeiro?

Eu ri e balancei a cabeça.

— Meu desejo caiu por água abaixo no momento em


que eu soube que você foi inseminada por equívoco. —
Estalei a língua no céu da boca. — Nós fomos golpeados
pelo destino, simples assim.

Ela suspirou, aliviada.

Percebi que Bridget esperava uma reação adversa de


mim, ela achava que seria escorraçada como havia sido
pelo seu pai. O que me fez levantar outro questionamento
sobre o que ele fazia com ela para que temesse tanto a
reação das pessoas com as suas escolhas.
— Tudo bem, fico feliz que concorde, mas tenho
alguns termos quanto aos bebês.

Semicerrei os olhos.

— E quais termos seriam?

Ela levou a xícara aos lábios e tomou outro gole do


chá, antes de continuar.

— Não vou deixar que trate eles como herdeiros, se


não estiver disposto ou... preparado para dar carinho a
eles, é melhor que fique longe. Eles não irão sofrer pela
sua indiferença, Leon, não se eu puder impedir.

Eu ri sem humor nenhum.

— Era meu plano, sim, mas, assim como as coisas


mudaram para você, elas também mudaram para mim. Eles
já são mais do que simples herdeiros. — Foi minha
resposta.

— Se estiver tentando me induzir...

— Não estou — cortei. — E não teria motivo para


fazer isso, estou sendo sincero com você. Agora, quero
que me conte a sua história para que eu possa contar a
minha.

Sentei-me de lado, ficando de frente para ela, e


descansei o braço no encosto do sofá. Estava pronto para
ouvi-la, concentrado em tudo o que diria.
— Eu sou fruto de uma gravidez gemelar —
confessou, franzindo o nariz. –, meu irmão gêmeo, no
entanto, morreu aos nove anos de idade em decorrência
de uma leucemia. Isso acabou com a nossa família, mas
principalmente, comigo.

Fiquei sem reação, espantado demais com a


revelação.

— Eu sinto muito — disse, sendo a única coisa que


deslizou pelos meus lábios.

Ela soltou uma respiração densa e assoprou a fumaça


do topo da xícara.

— Brandon morreu depois de um banho de chuva. Ele


já estava doente na época, mas eu e ele não sabíamos a
magnitude da doença, nem entendíamos direito o que era.
— Desviou o olhar de volta para o meu. — Ele ficou
hipotérmico, fomos para o hospital, mas... acabou
morrendo naquele dia. E, desde então, meu pai passou a
me culpar pela morte dele. Todo dia, por todos esses anos,
sempre fazendo questão de relembrar que eu era a maior
culpada.

Não consegui controlar a indignação que me


atormentou. Me remexi no sofá, inquieto, sentindo a raiva
correr pelas minhas veias como brasa.

— Você não teve culpa nenhuma, era só uma criança,


não tinha como saber que ele estava imunocomprometido.
Ela balançou a cabeça.

— Eu não tinha, mas isso não diminuiu a culpa que


carreguei por tantos anos por causa do meu pai. —
Soluçou, uma lágrima correu pela bochecha. — Ele nunca
gostou de mim, sempre me tratou com indiferença,
deixando claro que Brandon era o filho favorito. Nós, é
claro, nunca brigamos por causa disso, pelo contrário,
Brandon me defendia dele e de qualquer um com unhas e
dentes, ele sabia que nosso pai fazia uma distinção dos
filhos e não apoiava.

Puxei os meus cabelos para trás, a respiração


acelerada pela raiva que sentia ao imaginar Bridget diante
dessa situação.

— Seu pai é um imbecil — retorqui, franzindo os


lábios em nojo ao pensar no homem.

— Sim. Um grande imbecil — concordou. — Ele


precisava de algo para me agredir, então usou a morte de
Brandon para isso. Dizia que eu era um erro, que gêmeos
deveriam ser proibidos, que Brandon adoeceu porque eu o
impedi de absorver as vitaminas dentro do útero. Enfim,
ele sempre disse muitas coisas. E eu acreditei em todas
elas, até entrar na faculdade de medicina e descobrir como
o organismo humano funcionava e perceber que não era
culpa minha e nunca foi. — Ela tomou outro gole do chá.
— Por causa dele, tentando ser a filha perfeita, entrei para
a faculdade através de um financiamento estudantil, eles
nunca souberam disso, eu menti que era bolsista.

— Porra, Bridget... — expirei, massageando minhas


têmporas com o indicador e o polegar.

— Está tudo bem, eu já paguei o financiamento. —


Lancei a ela um olhar questionador, franzindo uma
sobrancelha. — Eu paguei com o valor que recebi da
clínica. Afinal, não vou devolvê-lo, era algo que me foi
devido, embora eu queira os bebês, sofri muito com o erro
no início, portanto, o dinheiro era sim um direito meu.

— Eu não o pediria de volta, de qualquer forma —


expressei. Ela franziu a testa. — Penso como você, era um
direito seu e ponto. Se estivesse no seu lugar, talvez eu
até mesmo teria feito pior, não aceitaria tão facilmente
como você.

Ela riu.

— Acho que fiquei em pânico, por isso eu


simplesmente voltei a seguir a vida como se nada demais
tivesse acontecido, eu só queria fingir que estava tudo
normal.

Estendi o braço e toquei nos cabelos úmidos dela,


brincando com uma mecha dentre os meus dedos.

— Eu sei, fiz o mesmo que você, esqueceu? Eu te


evitava porque quando eu a via, lembrava que estava
grávida de mim e que eu não me sentia pronto para ser
pai.

— Nós dois enfrentamos a notícia do nosso jeito,


Leon, e ninguém pode nos julgar por isso. Nunca ninguém
entenderá o que passamos, é uma situação incomum.

— Eu sei — murmurei.

Ela se inclinou e depositou a xícara vazia na mesa de


centro, sentando-se com o joelho dobrado e escorando a
cabeça em cima dele, enquanto me olhava.

— Fiquei com medo da chuva depois da morte de


Brandon, não dela em si, mas do que ela significava e
poderia causar. Era o nosso passatempo favorito na
infância, era muito importante para nós, mas depois do que
aconteceu, eu passei a odiar e nunca mais me molhei.

— Até hoje... — sussurrei, pensativo.

— Até hoje — confirmou. — Quando descobri que era


um casal e que eles representariam o que eu e meu irmão
representamos, eu não consegui fingir e seguir plena como
se não me abalasse, porque me abalava. — Ela parou,
assustando-se e me olhou com os olhos arregalados. —
Ficou sabendo disso, que teremos um menino e uma
menina?

Confirmei com um aceno.


— Helena me contou. — Sorri, sentindo uma emoção
inflamada, exacerbada, misturando-se com tantos outros
sentimentos que eu nem mesmo conseguia compartilhar
com ela. — Um menino e uma menina — repeti.

— Eu lembrei de mim, lembrei de Brandon, lembrei de


nós dois — comentou em um sussurro.

Reprimi a notícia sobre o sexo dos bebês, fundo,


evitando pensar por um momento, concentrando-me na
conversa séria que Bridget e eu estávamos tendo. Logo,
teria a chance de aproveitá-la do jeito certo, desfrutando
do que significava, apreciando o fato de que eu seria pai
de um casal.

Vinquei a testa, pensativo.

— Você foi até o cemitério — expressei, não uma


pergunta, mas uma afirmação.

— Fui. Precisava conversar com ele, visitar o local


que eu evitava. E a chuva foi simbólica, eu me molhei
depois de anos, assim como visitei o túmulo de Brandon
depois de tanto tempo. Precisava deixar o passado para
trás para que pudesse seguir em frente. Eu já vinha me
curando ao longo dos anos, mais e mais. Comecei o
processo de cura assim que entrei na faculdade de
medicina e compreendi o câncer. — Fiquei em silêncio,
ouvindo o relato dela, sentindo-a se abrir completamente
para mim, revelando sua alma. — Eu entendi que os bebês
eram a minha segunda chance, que eu poderia protegê-los
de sofrer como eu sofri, que eu poderia criá-los, amando
os dois como se fossem um só e jamais diversificando-os.

— O que foi que disse aos seus pais?

— Eu disse que estava grávida, omitindo como


ocorreu a gravidez. — Levando a mão ao rosto, limpou as
bochechas molhadas com o dorso. — Não esperava uma
boa recepção, nem queria isso, tinha decidido que meus
filhos ficariam bem longe do meu pai e a presença tóxica,
dele, mas também não imaginei que seria tão... humilhada.
— Levantou-se, exalando uma respiração sufocada. —
Droga, ele estava prestes a bater em mim, mesmo sabendo
que eu estava grávida! — grunhiu, substituindo a dor pela
raiva.

— E eu o mataria se tivesse feito — falei.

Ela me olhou, um sorriso franzindo os lábios de leve,


fazendo meu peito inflar de satisfação.

— Eu preciso encontrar um lugar para morar, não


tenho mais a dívida para pagar e com o meu salário de
residente conseguirei cobrir as despesas de um aluguel. —
Sentou-se de novo no sofá, ficando inquieta demais,
ansiosa. — Não voltarei para àquela casa, mesmo que eu
passe necessidade, jamais submeterei meus filhos a
passarem pelo mesmo que eu. Ele nunca conhecerá os
netos, eu sei que daria mais atenção para o menino e não
aceitarei isso.

Dessa vez foi eu quem me levantei, levando as mãos


à cintura, encarando-a com um esgar nos lábios.

— Por um acaso você esqueceu que essas crianças


têm um pai? — questionei, sentindo-me ofendido.

Ela pareceu confusa.

— Não.

— E acha mesmo que eu vou deixar que passe algum


tipo de trabalho, Bridget? — Ela não respondeu, o que só
me irritou ainda mais. — Para começo de conversa, você
não precisa procurar um lugar para morar, vai ficar comigo.

A boca de Bridget abriu em um “o” perfeito e uma


agitação atravessou sua face.

— Mas... eu não posso simplesmente morar com


você..., quer dizer, tenho que ter a minha própria casa.

Fiz um aceno de desdém com a mão.

— Está grávida, o último estágio de uma gravidez


gemelar é complicado, além do mais, como acha que vai
dar conta sozinha de dois bebês quando eles nascerem?
— objetei, não esperando uma resposta dela antes de
continuar. — Eu disse que estou dentro dessa com você,
dessa forma, faremos isso juntos.
Ela ponderou, pendendo a cabeça para o lado e
esfregando a língua nos dentes.

— Tudo bem. Então posso morar com você por um


tempo? Quando os bebês estiverem crescidos, procuro
outro lugar para nós.

Não haveria possibilidade de ela sair da minha vida


assim, mas não entraria nessa discussão com ela.
Primeiro, deixaria as coisas acontecerem de forma natural
e no tempo delas.

— Estamos combinados — falei, agachando-me de


frente para ela e segurando as suas mãos. — Preciso
contar a minha versão agora, Bridget, não tão dolorosa
quanto a sua, e talvez bem menos relevante, mas ainda é
a minha.

Não me conformava em como Bridget tinha sido


criada, em como a mãe dela deixou que a filha sofresse
preconceito do pai por tanto tempo. Ela não merecia isso,
era uma garota excelente, uma filha exemplar.

Depois dos relatos, tudo fazia sentido quanto a garota,


conseguia juntar os cacos que estava coletando sobre ela.
O jeito como era retraída com todos, o quanto queria ser o
destaque no que fazia, como havia ficado abalada quando
soube que eram gêmeos, deixando óbvio, mesmo que
tentasse disfarçar.
A morte do irmão gêmeo a havia afetado de diversas
formas, mas a indiferença do pai e a taciturnidade da mãe
com relação a isso, lhe causaram feridas que jamais
seriam cicatrizadas.

Meus pais foram perfeitos e eu me sentia um otário


mimado por me abrir com ela depois de tudo o que eu ouvi.
Enquanto eu recebia demais dos meus pais, Bridget
recebia de menos dos dela.

Eu ficaria ao lado dela, assim como ela tinha ficado do


meu lado quando descobriu o erro e a gravidez acidental.
Se fosse preciso, lamberia cada ferida até que todas
estivessem cicatrizadas.

Seria para ela algo que nunca teve e mostraria que


ela não estava sozinha, não mais e nem nunca mais
estaria.

— Estou ouvindo você, Leon.


Era estranho a sensação que eu sentia, algo como
libertação e paz. Depois de anos escondendo todas as
verdades de todos os ramos da minha vida de todo mundo,
eu simplesmente abri a boca e cuspi para fora tudo sobre
mim para Leon.

Não teria feito, no entanto, se ele discordasse comigo,


se quisesse brigar para ficar com os bebês. Eu teria
engolido o meu orgulho, vestido minhas roupas molhadas e
ido embora do apartamento sem olhar para trás.

Desolada, sim. Sem honra, nunca.

Eu me sentia bem, não sentia a devassidão de toda a


solidão que eu carregava. Eu só me sentia... leve.
Olhei para ele, esperando que começasse a falar,
podia notar que seria a primeira vez dele tocando no
assunto, que estava prestes a abrir cada uma das suas
camadas para que eu pudesse ver dentro dele, assim como
eu tinha feito comigo momentos antes.

— Meus pais eram médicos, foram eles que


construíram a clínica, juntamente com os pais de Ben. Eles
se dedicaram a vida toda para a profissão. — murmurou, a
ponta dos dedos brincavam com os riscos da minha palma.
— Eu cresci amando a medicina, curioso e muito
interessado em como era feita a reprodução humana
assistida. Entrar para a faculdade foi por conta própria,
assim como aconteceu com Izabela, eles nunca nos
induziram ao que queriam, sempre deixaram que
tivéssemos livre arbítrio sobre nossas próprias vidas.

Leon se levantou e voltou a sentar-se ao meu lado, o


sofá afundando diante do seu peso. Ele estava mais
próximo, tanto que podia sentir o calor corporal que
emanava, o que tornava difícil não olhar para o abdômen
trincado e desviar minha atenção para outras coisas...
impróprias, podia-se assim dizer, diante do momento sério
que estávamos tendo.

— Então, por que tem tanto medo de ter filhos?

— Como toda a criança pensa que o pai é o seu


super-herói, eu não era diferente disso. Passei tempo
demais no laboratório com omeu, aprendi a amar a
medicina e a admirar o que ele fazia e como ministrava as
coisas. E quando decidi que queria fazer medicina, meu
principal foco era ser residente dele, aprender com o
próprio tudo o que ele sabia. Eu coloquei tanta expectativa
nisso, que deixei a minha vida de lado, meu foco era nos
meus estudos e na minha formatura, apenas. — Ele bufou
e soltou uma risada sem humor. — Mas como nada é como
queremos, em um dia qualquer, ele sofreu um infarto e
morreu, pouco tempo antes da minha residência.

Meu coração comprimiu diante do olhar dele, Leon


ainda sentia um pesar pela morte precoce e iminente do
pai.

— Eu sinto muito por isso — falei.

— Com isso, eu fiquei tão frustrado, Bridget, tanto que


nem consigo imaginar. — Exalou, esfregando o maxilar. —
Resolvi que mudaria a forma como eu via a vida, que
nunca mais colocaria expectativas em nada e que não teria
filhos, mas herdeiros, assim não poderia causar um
desconforto desses para a minha família. Eu sei que não
foi culpa do meu pai o que aconteceu, mas... algo mudou
dentro de mim desde então.

— Você tinha planos, Leon, e seguiu cada passo deles


sem desviar o caminho, por isso entendo a sua frustração,
pois as coisas mudaram sem que pudesse controlar.

Ele concordou.
— Parece idiota perto de toda a merda que viveu, mas
não era idiota para mim. Fiz com que ninguém criasse
expectativas comigo, nem minha família, meus amigos ou
os casos amorosos que eu tive. Queria ser um homem
livre, sem frustrar ninguém. Teria filhos no momento certo
e os criaria sem amor algum, não queria que me vissem
com orgulho, queria apenas que me vissem como um pai
renomado, alguém que sentissem vontade de seguir, sem
expectativas, claro.

Me sentei sobre os joelhos no sofá e me virei para ele,


segurando as palmas grandes e ásperas.

— Não é idiota, Leon, cada um sabe os traumas e


cicatrizes que carrega. O meu caso foi diferente, mas não
menos importante que o seu. Para você foi traumático,
simples assim.

Ele deitou a cabeça no sofá e fechou os olhos.

— Não acha que eu fui mimado demais?


Simplesmente não tive o que queria e vivi os últimos anos
sendo um otário egoísta, afastando as pessoas de mim.

— Eu não acho — discordei. — Mas sabe o que eu


acho? — Ele abriu os olhos e ergueu a cabeça para me
encarar. — Acho que os bebês não foram apenas um erro,
foram uma remissão. Eles me mudaram, assim como
mudaram você. Talvez precisássemos deles para seguir
adiante, talvez sejam um presente do destino, uma
segunda chance.

Eu entendia Leon porque eu mesma tinha colocado


expectativas em cima do meu pai. Entrei na faculdade, me
endividando no processo, apenas para que ele sentisse
orgulho de mim, o que não ocorreu. Mas fiz muitas coisas
ao longo da minha vida com o intuito de agradá-lo, de
fazer me enxergar de outra maneira, apenas para me
frustrar no final de contas.

Enquanto isso, Leon tinha um pai presente, alguém


que o amava de verdade, mas que foi arrancado da vida
dele por um infortúnio do destino.

Eram situações diferentes, mas que carregavam um


peso parecido, arrastando com elas um rastro de
cicatrizes.

Eu não queria ter filhos agora, muito menos esperava


que pudesse engravidar sem ter sequer transado.

Mas aconteceu.

E eu conseguia entender que os bebês foram, sim, um


presente. Gêmeos, iguais a mim e ao meu irmão, que eu
precisava para seguir em frente e diminuir a culpa que
carregava. E filhos de uma mãe comum, não uma barriga
de aluguel, de fato, que levaria tudo de forma profissional,
evitando, assim, que Leon pudesse se apegar a eles.
Ele acariciou a minha bochecha e sorriu para mim.

— Você foi mesmo escolhida por um acaso —


murmurou. — Poderia ter ido a qualquer dia ou horário,
mas foi justamente no dia em que Bridget resolveu se
inseminar por conta própria.

Eu sorri, chegando a mesma conclusão que ele.

Era pra ser eu. Era pra ser nós dois os pais desses
bebês.

— Ela achava mesmo que Izabela não perceberia? —


perguntei, mudando de assunto. — Ficaria um pouco
óbvio.

Ele revirou os olhos e suspirou, puxando-me para ele.


Deitei a cabeça no peito dele, ouvindo os batimentos
rítmicos do coração.

— Eu não sei bem o que se passou pela cabeça dela,


acho que nada de coerente, para falar a verdade. A garota
ficou maluca, colocou a carreira fora ao fazer isso.

— Colocou?

— Sim, eu a denunciei para o conselho de medicina,


levei as provas todas e pedi sigilo total. Recebi um
relatório na semana passada, Bridget teve sua licença para
exercer a enfermagem revogada, nunca mais poderá atuar
nesta área.
Não a odiava pelo que tinha feito porque não me
arrependia dos meus filhos, mas também não a perdoava,
no entanto. Ela não soube diferenciar as coisas, usou da
profissão para trapacear, portanto, não merecia exercê-la,
não tinha honra para isso.

— E agora, o que vamos fazer? — inquiri, expirando


com força para sentir o cheiro dele. — Minha barriga já
está aparecendo, logo as pessoas vão notar a diferença,
não conseguirei esconder mais por tanto tempo.

Acariciei a minha barriga, um toque gentil e que se


tornava recorrente e involuntário a cada dia que passava,
sem que eu percebesse.

— O que você quer fazer?

Essa era uma boa pergunta, já que nem eu mesma


sabia a resposta para ela.

— O que nós vamos contar na clínica? Posso omitir o


fato de que o pai é você.

Não precisei me virar para sentir a raiva dele, podia


ouvir o chiado do grunhido preso na garganta em seu
peito.

— Estamos saindo juntos, você engravidou e é isso.

Virei-me para encará-lo, franzindo a testa.

— E quanto a sua vasectomia?


— Poucos sabem sobre isso.

Suspirei.

— Não queria que duvidassem de mim, vão me olhar


com julgamento, achando que eu dormi com o chefe para
chegar ao topo.

— Deixem que duvidem, Bridget, você sempre estará


apta para mostrar a eles que estão errados.

Concordei com um aceno.

— Além do mais, não pretendo ficar na clínica após a


minha residência, faço questão de ir para o hospital
especialista em oncologia infantil.

— E você vai, é muito esforçada, se tornará uma


grande médica do ramo. — Leon se inclinou e plantou um
beijo em meus lábios. — Venha, vamos comer alguma
coisa, deve estar faminta.

Pensei por um segundo.

— Na verdade, estou mesmo faminta.

— Então me deixe alimentar os meus filhos.

Sem camadas.

Era assim que estávamos diante um do outro. Eu


conhecia Leon, sabia sobre seus traumas, anseios e
medos, assim como ele me conhecia. E era o único que
sabia tudo sobre mim, cada detalhe minucioso da minha
vida por completo.

Era um passo importante para nós dois, um passo


essencial para que continuássemos a segunda fase do erro
que mudou as nossas vidas. Assim, poderíamos seguir em
frente e ser bons pais para as nossas crianças. Juntos.

Acordei ao sentir o cheiro de café flutuar pela névoa


que eu me encontrava, dissipando o meu sono.

Pisquei, acostumando-me com o ambiente, olhando ao


redor, me habitando ao mundo real.

Estava no quarto de Leon, ele tinha insistido que eu


deveria dormir com ele, mesmo que o apartamento tivesse
outros quartos vagos. Então eu cedi, e tinha uma vaga
lembrança de ter usado o peito dele como travesseiro no
meio da noite.

Me levantei e corri até o banheiro, fiz minha higiene


matinal e penteei os meus cabelos com os dedos. Encarei
o meu reflexo, notando nos olhos inchados por ter chorado
muito no dia anterior. Esfreguei água gelada, pressionando
os dedos no local, tentando diminuir os danos e melhorar a
minha aparência.
Eu não tinha porra nenhuma.

Leon precisou comprar uma escova de dentes nova


para mim, ou não teria nem mesmo isso. Não tinha roupas,
um pente de cabelo, um desodorante. Nada.

Meu pai era um filho da puta, me expulsou de casa


sem pensar duas vezes e não me deu, ao menos, a
dignidade de recolher as minhas coisas.

Lancei um último olhar para o espelho antes de sair


do banheiro, nada do que eu fizesse melhoraria a minha
situação. Eu estava fisicamente acabada, um caco, era
nítido que estava abalada com alguma coisa.

Entrei na cozinha e encontrei Leon escorado contra o


balcão, sem camisa, vestindo apenas uma calça de
moletom. Com a posição, os músculos dos braços e
abdômen estavam retesados e em evidência. Ele segurava
uma xícara de café em uma mão e na outra mantinha o
iPad flexionado para cima, enquanto lia alguma notícia no
aparelho.

Eu poderia tatuar a imagem na minha mente, ele


estava tão sexy e descontraído que era impossível não me
sentir quente como o inferno.

Pigarreei, delatando minha presença, e cruzei os


braços em frente ao corpo. Ele correu os olhos em minha
direção e sorriu.
— Bom dia, pensei em deixá-la dormir um pouco mais
— avisou. — Tem café pronto na cafeteira e torradas
quentes no micro-ondas.

Arqueei uma sobrancelha.

— Fez café para mim, doutor Dubrow? — zombei, indo


até a cafeteira e servindo uma xícara.

— Está se alimentando por três, acostume-se com


isso, Bridget, sempre irei alimentá-la.

Sorvi um gole de café e o encarei, olhando-o da


cabeça aos pés.

— Hum... — murmurei.

Bem que ele poderia me fazer de café da manhã, ao


invés de fazer algo para mim. Não me incomodaria nem um
pouco e também não me sentiria ofendida.

Leon deixou a xícara no balcão e se virou para mim,


me encarando com os olhos semicerrados.

— No que você está pensando?

Oh, merda!

— Em nada — menti, bancando a desentendida e


inocente.

O vinco em sua testa se aprofundou mais.


— Fale a verdade.

Bufei.

— Estou falando.

— Não, você não está falando a verdade.

— E como sabe disso, consegue ler mentes agora,


doutor Dubrow?

— Mentes não, mas consigo ler os sinais que o seu


corpo dá quando quer alguma coisa.

Senti um calor subir pelo meu pescoço, mas não daria


o braço a torcer de jeito nenhum.

— É mesmo? E o que o meu corpo quer?

O olhar dele fincou no meu e os cantos dos lábios se


curvaram em um sorrisinho irritantemente incisivo.

— Eu diria... — Fez um sinal com as mãos, apontando


para o meu rosto. — Pelo rubor em suas bochechas, os
lábios entreabertos e o olhar pesado, que quer ser fodida.

Abri e fechei a boca, sem saber o que falar.

Eu estava sendo tão óbvia assim? O quão


desesperada eu parecia, céus?

— Bom... você errou — menti, virando-me para o


balcão e largando a xícara de café.
Precisava enfiar comida na minha boca e pensar em
coisas bem aleatórias, assim, impediria de passar outra
vergonha como essa.

Senti as mãos de Leon em minha cintura antes de


detectar os seus movimentos. Ele mordeu o lóbulo da
minha orelha, o hálito quente arrepiou os meus cabelos da
nuca. O desgraçado me puxou contra o corpo dele,
grudando a minha bunda em um pau muito duro por baixo
da calça de moletom.

— Você não quer um café da manhã, não é mesmo,


Bridget, você quer ser ele – sussurrou.

Ergui o queixo e mordi o lábio, impedindo que um


gemido se desprendesse da minha boca.

— Você não repete o cardápio — debochei.

Leon subiu uma mão e apertou o meu seio por cima da


blusa dele que eu vestia, me obrigando a suspirar com o
toque que me deixou molhada instantaneamente.

— E quem disse que você é um cardápio? É a mãe


dos meus filhos, vou repeti-la muitas e muitas vezes —
contestou.

Fechei os olhos e inspirei fundo, roçando a bunda no


pau dele, de propósito, roubando um gemido seu.

— Então me fode, Leon — ordenei.


Em um só movimento, ele me virou de frente e grudou
os lábios nos meus, me beijando com tanta intensidade
que minhas pernas amoleceram. Ele tinha gosto de café,
tão gostoso. Agarrei os cabelos dele, puxando-o mais para
mim.

Leon me ergueu e me sentou sobre a ponta do balcão,


então se afastou e removeu a minha camiseta, deixando-
me com os seios de fora. Abaixando-se, colocou um na
boca, sugando o mamilo com força.

Arqueei minhas costas no ar e joguei a cabeça para


cima, gemendo o nome dele.

— Leon... por favor... — implorei.

Ele soltou um seio para tomar o outro, revezando-os.


A língua girava ao redor da aréola, áspera, quente e
úmida. Passei as unhas nas costas, arranhando-o. Minha
boceta pulsava, louca para ser tomada e receber a mesma
dedicação dele.

— Caralho, mulher, como pode ficar mais gostosa e


linda a cada dia que passa? — grunhiu, segurando o bico
entre os dentes, me arrepiando e me fazendo gritar.

— Me fode, Leon, por favor.

Ele se afastou e olhou para mim, os olhos brilhavam


de malícia e tesão. Inclinando-se, plantou um beijo na
ponta da minha barriga arredondada. E então baixou as
calças, soltando o pau duro e ereto, a ponta rosada
brilhava com a lubrificação.

— Agora estou pronto para fodê-la.

Franzi a testa.

— É mesmo? Ficou pronto depois de ter beijado a


minha barriga, estava pedindo algum tipo de permissão
para os bebês? — gracejei, sorrindo.

Aproximando-se, agarrou o cós da boxer que eu vestia


e a puxou para baixo, descendo-a pelas minhas pernas e
removendo-a do meu corpo, me deixando completamente
nua na cozinha.

Estremeci ao sentir a bunda contra a pedra gelada do


mármore.

— Apenas comuniquei aos nossos filhos que eu sei


que eles estão aí dentro e que serei respeitoso, embora vá
foder a mãe deles com desespero, forte e bruto — avisou.

Estalei um tapa em minha testa.

— Meu Deus, você é mais esquisito do que eu


pensava.

Ele passou o polegar pela ponta do pau e espalhou a


gota lubrificada por toda a cabeça, as veias ao lado
estavam salientes e as bolas duras de tanto tesão.
Segurando-o com a mão em punho, direcionou-o para a
minha entrada.

— Fala que sou esquisito enquanto como essa


bocetinha desejosa — sibilou, inclinando os quadris e me
penetrando.

Arfei, acostumando-me com o tamanho dele. Agarrei


os seus ombros e resvalei para a ponta do balcão, abrindo
mais as minhas pernas.

— Os bebês nem sabem o que está acontecendo —


murmurei.

Ele se inclinou para trás e então para frente,


afundando-se todo em mim a cada vez que saía. Começou
em um ritmo lento, mas constante.

— Eles não se importam porque é o pau do pai deles


que está aqui — disse, estocando de novo.

Minha lubrificação aumentou, assim como o meu


desejo. Deitei a minha testa no ombro dele e fechei os
olhos, apreciando o momento.

— E se fosse o pau de outro homem... — perguntei,


mas me calei ao ouvir o grunhido de Leon.

— Como ousa? — questionou.

Confusa, olhei para ele sem compreender.


Com uma mão, Leon segurou o meu ombro, enquanto
a outra descia para o meio das minhas pernas, tocando no
lugar onde o pau me invadia para lubrificar o dedo antes
de levá-lo ao meu clitóris e brincar com o nervo. Ele
aumentou o ritmo, afundando-se em mim com mais
brutalidade.

Circulei as minhas pernas ao redor da cintura dele e


espalmei as mãos no balcão, jogando o corpo para trás e
fechando os olhos. Sentia o orgasmo na beira, perto
demais, forte o suficiente para me tirar de órbita.

— Droga, Leon, isso tá muito bom... — murmurei,


mordendo o lábio.

Ele estocou uma, duas, três vezes.

Entrando e saindo.

Forte. Bruto. Constante.

O pau dele cutucava algo dentro de mim que me fazia


estremecer todas as vezes em que as bolas batiam em
minha bunda.

Os dedos eram rápidos e ágeis ao redor do clitóris,


circundando-o, lubrificados e precisos.

— Goza no meu pau, Bridget, goza no pau que manda


nessa boceta e pare de pensar em outro homem enquanto
eu fodo você.
Mas... que porra?

Então era por isso que ele estava furioso!

Eu só estava brincando, mas, pelo visto, o ego de


Leon não gostava desse tipo de brincadeira, ele gostava
de ser único e exclusivo, tanto na minha vida, quanto nos
meus pensamentos.

O barulho dos nossos corpos entoou pela cozinha,


misturando-se com os meus gemidos e os dele.

O calor se concentrou no meu abdômen.

Ele grunhiu.

— Essa boceta gulosa está me enforcando, caralho!

Eu gozei.

Tão forte que vi pontos pretos atrás dos meus olhos.


Meu corpo trepidou e um grito estrangulado  atravessou a
minha garganta.

— Puta merda, Bridget!

Olhei para ele, retendo a imagem enquanto gozava.


Veias saltaram aos lados do pescoço e ele ficou vermelho.
A mandíbula cerrou e um gemido agudo saiu através dos
dentes selados. Os olhos verdes brilharam e ele começou
a tremer, suor brotou em sua testa.
Lindo!

Como ele conseguia ser tão perfeito até mesmo


gozando?

Leon tirou o pau de dentro de mim e abaixou a


cabeça, grunhindo palavras desconexas. Porra espirrou da
ponta do pau e pingou em minha virilha, escorrendo por
ela, misturando-se com o que saía de dentro de mim.

Fechei os olhos e apreciei o torpor que o pós-orgasmo


trazia, suspirando, aliviada e relaxada. Feliz.

Por alguns segundos, ficamos em silêncio,


aproveitando o momento.

— Eu não tenho roupas... — murmurei, por fim.

Leon riu contra o meu ombro e plantou um beijo.

— Na verdade, você tem roupas. Muitas.

Abri meus olhos e o encarei, vincando a testa em


desconfiança.

— Tenho? — questionei.

— Eu mandei comprar roupas novas para você.

— Por quê? — crispei, desconfiada.

— Não quero que volte para a casa dos seus pais,


muito menos que se humilhe para aquele imbecil, e
precisava de roupas para voltar a residência — disse,
beijando a curva do meu maxilar. — Também tem o fato de
que logo nada iria servir por causa da barriga, então já
aproveitei e resolvi todos os seus problemas.

— Obrigada por isso, mas faço questão de pagar por


cada uma delas.

Ele negou.

— Aceite como um presente, está gestando os meus


filhos, nada mais justo do que isso.

Revirei os olhos.

— Nossos filhos, Leon. Nossos.

— Sim, nossos, mas ainda me sinto na


responsabilidade de agradecê-la por isso, então apenas
me deixe mimá-la, Bridget.

Eu não era mimada desde que meu irmão se foi, ele


era o único que se importava mesmo comigo, com o meu
bem-estar ou em como eu me sentia. Por mais que doesse
admitir, minha mãe era boa, mas não era a melhor de
todas. Tentava me defender do marido, mas não o fazia, de
fato.

Era justo que eu pudesse ser feliz e aproveitar o fato


de que alguém se importava comigo depois de tanto tempo
em completa solidão. Ainda era um pouco estranho e
incomum, mas eu me sentia tão feliz, tanto ao ponto de
esquecer o que meu pai tinha feito comigo e como minha
mãe, outra vez, havia se abstido de revidar o marido, tão
feliz ao ponto de colocar em um canto bem fundo da minha
memória a família tóxica que eu tinha.

Ter alguém para contar... soava incomum, mas era


bom, como se a vida estivesse finalmente sorrindo para
mim outra vez.

Por isso, eu apenas concordei e abri um sorriso


satisfeito e repleto de gratidão.
Entrei na clínica com o queixo empinado, olhando
diretamente para frente e ignorando o burburinho de vozes
ao redor conforme eu caminhava.

Eles estavam reparando na minha barriga, na


protuberância que distendia a camiseta azul do uniforme
da residência que eu vestia, só que, dessa vez, bem mais
justo do que os que foram vestidos nos últimos meses. A
calça do conjunto era a única que estava diferente, alguns
números maiores do que o habitual, só assim para que
pudesse entrar na minha cintura larga.

Eu tinha decidido que ficaria com os bebês, então


nada mais justo que as pessoas soubessem sobre a
existência deles. Sabia que a fofoca se espalharia como
fumaça ao vento e que duraria por algumas semanas,
assim como sabia que eles duvidariam da minha
capacidade, mas não era como se eu me importasse.

Não mais.

Entrei na sala de coleta e suspirei, sorrindo


amplamente. Esperaria até a hora do almoço e tinha
certeza de que Liam me procuraria para confirmar o que
ouviria pelos corredores.

— Bom dia... nossa, você parece muito grávida hoje —


comentou Helena, entrando na sala e parando no meio do
caminho ao notar em minha barriga destacada,
arregalando os olhos.

Eu não tinha voltado ao trabalho nos dois dias


anteriores, Leon me deixou em casa para que pudesse
organizar as roupas novas, mas, principalmente, pare que
pudesse espairecer depois de tudo o que aconteceu.

— Nós precisamos conversar — falei, cruzando os


braços.

A última vez que eu tinha visto Helena, sai da clínica


feito uma louca, assustando-a tanto ao ponto de entrar em
contato com Leon.

Ela abaixou os olhos para a minha barriga, correndo-


os de volta para o meu rosto.
— Acho que sim — murmurou.

— Leon e eu entramos em um acordo, eu resolvi que


vou ficar com as crianças. Não sou uma incubadora, não
consigo ficar alheia ao fato de que eles existem e também
são parte minha, portanto, eu serei mãe.

Ela riu.

— Eu sabia disso, Bridget, você estava muito apegada


a eles e era bem nítido. — Passou uma mão nos cabelos.
— Fico feliz que tenham se resolvido, vocês dois caíram
em uma armadilha que não esperavam, merecem que as
coisas deem certo.

— Obrigada.

Helena era uma boa pessoa, eu a considerava como


uma amiga, embora não confiasse totalmente nela, ela era
uma das únicas que sabia sobre o segredo, assim como
tentava me entender. Por este motivo tinha me mostrado o
resultado certeiro da sexagem, antes mesmo de mostrar
para Leon que, em tese, seria o único progenitor até então
das crianças.

— Estarei no meu laboratório, pode me procurar


sempre que precisar. — Afastando-se, caminhou até a
porta do laboratório, mas parou e me lançou um último
olhar. — E, Bridget, sabe que as pessoas já estão
comentando, não é? Percebi o rumorejo nos corredores
enquanto vinha para o laboratório, mas não sabia do que
se tratava.

Descruzei os braços e acenei.

— Eu sei, esperava por isso quando cheguei.

Ela encolheu os ombros, sorrindo de um jeito


cúmplice.

— Eles devem estar ensandecidos pela fofoca, você


some por dois dias e volta grávida. — Gargalhou,
balançando a cabeça e entrando no laboratório, fechando
a porta às suas costas.

Assim como ela, eu não perdia por esperar todo o


fuzuê que a minha gravidez causaria.
Não precisava ser nenhum gênio para notar que a
clínica inteira só falava sobre a gravidez misteriosa de
Bridget. Por onde eu andava, ouvia os murmurinhos sobre
isso.

As principais perguntas: “quem seria o pai?” ou “como


ela conseguiu esconder por tanto tempo?”.

É claro que eu faria questão de responder a cada uma


delas no horário de almoço da garota e já aproveitaria para
marcar território, mais conhecido como: mijar no poste. E
me livrar do idiota do Liam de uma vez por todas.

Vesti o meu jaleco e passei uma mão nos cabelos,


passaria a manhã inteira no laboratório de esperma, antes
de ir buscar a comida de Bridget e aparecer no refeitório
ao meio-dia para marcar o meu território.

— Então é verdade o que estão falando, Bridget


assumiu a gravidez? — A voz de Ben soou às minhas
costas.

Me virei e encontrei ele e Izabela entrando na minha


sala, ambos desconfiados e evidentemente curiosos.

— Bridget vai ficar com as crianças — avisei.


Izabela arregalou os olhos e levou as mãos à boca.

— Droga, e agora, o que você vai fazer? — perguntou.

Ben apenas me encarou, semicerrando os olhos,


analisando os meus gestos e falas, me lendo como sempre
conseguia fazer.

— Nada, nós vamos criá-los juntos — avisei, dando de


ombros. — E, a propósito, é um casal.

Minha irmã sorriu, batendo palmas, animada com a


ideia de ter sobrinhos e ignorando o fato de que eu criaria
as crianças com Bridget.

— Oh, meu Deus, parabéns, irmão, estou louca para


mimá-los. Serei a melhor tia de todas, vou comprar muitas
roupas estilosas e dar os brinquedos mais legais.

Balancei a cabeça.

— Eu sei que sim.

— Mas e quanto a sua situação com Bridget? Vão


conseguir dar conta? Afinal, você sempre foi enfático com
o quanto queria ser pai solo, sem se apegar a ninguém,
tinha um planejamento de como criaria os filhos e tudo
mais — expressou ela, mexendo as mãos
incontrolavelmente.

Ben continuava calado, eu sabia o que o maldito


estava fazendo e tentava me manter o mais imparcial
possível.

— Sim, nós vamos chegar a um consenso quando eles


nascerem. Juntos seremos pais melhores do que
separados.

Ela concordou.

— Estou tão feliz que teremos um casal, tanto que


nem consigo mensurar, finalmente teremos não só um
bebê na família, como dois para que eu possa embalar e
brincar, enquanto não tenho os meus próprios — ela gritou,
assustando tanto a mim quanto Ben. — Preciso conversar
sobre isso com alguém e então ir até uma loja e suprir a
necessidade de presenteá-los. — Parou e olhou para mim.
— Acha que Bridget vai ficar chateada se eu comprar
algumas... hum... coisinhas para eles?

Meu Deus, minha irmã era incontrolável.

— Acho que ela vai gostar — respondi, colocando as


mãos nos bolsos do meu jaleco.

Bridget era muito sozinha, seria bom para ela fazer


amizade com Izabela, as duas poderiam fazer algumas
coisas juntas.

— Ah, fico feliz! — disse, dando um passo para trás e


então outro e outro até atravessar o rol da porta e parar no
corredor. — Estou indo, tenho que ser tia.
Virando-se, ela correu pelo corredor e sumiu de vista,
deixando-me sozinho com Ben.

Ele esperou dois segundos. Dois malditos segundos,


antes de abrir a boca.

— Está fodendo a garota — comentou, retoricamente.

Comprimi os lábios.

— Talvez.

Ele franziu tanto os olhos que os transformou em


pequenas fendas que me encaravam.

— E como, talvez, se fode alguém? — sibilou. — Fale


logo, porra!

Eu ainda descobriria como esse maldito conseguia ler


a minha mente sem que eu precisasse expressar uma
única palavra.

— Estou transando com ela, sim — acenei. — E tem


mais...

— Como assim tem mais? Além do fato de que está


fodendo com ela e não me falou absolutamente nada!

— Ela está morando na minha casa.

Ben, de algum jeito, engasgou-se com a própria


saliva. Ele começou a tossir como um louco e dobrou o
braço atrás das costas, batendo-se para desobstruir a
saída de ar.

— Puta merda, Leon, o que diabos? — refutou em tom


esganiçado. — Cara, se ela decidiu ficar com as crianças,
não pode tratar ela como uma mulher qualquer, tenha
discernimento, porra, vocês vão ter um vínculo para o
resto da vida.

Retesei os lábios em desgosto.

— Fico muito feliz que tenha tal pensamento sobre


mim — manifestei, cruzando os braços em frente ao corpo.

— E como quer que eu pense outra coisa? Sempre foi


um filho da puta cafajeste, nunca quis nenhuma mulher por
mais de uma vez. E agora vem me falar que está fodendo
a mãe dos seus filhos e que ela está morando com você.

— Ela foi expulsa de casa pelo maldito do pai dela


assim que contou que estava grávida.

— Então está fazendo por caridade?

Bufei.

— Estou fazendo porque... porra, porque estou


gostando mesmo dela. De verdade. Não é só sexo, eu
quero ficar com ela, quero ter esses filhos, construir uma
família... — Agarrei meus cabelos com força e exalei,
constatando que eu, talvez, estivesse apaixonado por ela.
— Puta merda, sua crise existencial passou para mim!

Ele revirou os olhos e sorriu zombeteiramente.

— Não é crise existencial, é a idade mesmo.

— Cale a boca, caralho! — sibilei, cerrando o maxilar.

Ele gargalhou alto, o que me deixou ainda mais


irritado.

— Está bem óbvio para mim que você se apaixonou


pela garota, está caidinho por ela.

— E você está adorando isso, não é?

Ele estalou a mão no peito.

— Mas é óbvio que sim, ou esqueceu que eu te falei


sobre construir uma família meses atrás e ficou zombando
de mim? — Riu mais uma vez. — Quem diria que o maior
debochado cairia primeiro na armadilha.

Puxei a minha cadeira e me joguei contra ela,


desistindo de tentar debater com ele porque sabia que o
maldito estava certo. Algo tinha mudado dentro de mim,
desde o momento em que eu descobri que seria pai.

— Eu pensei que seria fácil, que eu criaria os filhos


como herdeiros, me apegaria a eles, mas não permitiria
que me admirassem, mas... era mais fácil pensar do que
fazer — confessei, erguendo o meu olhar para encará-lo.
— Eu senti alguma coisa que não consigo expressar e que
foi crescendo a cada evolução, a cada exame... quando
descobri que eram dois... e quando percebi que Bridget
também dividia os mesmo sentimentos que eu, que ela
também não era alheia aos bebês, embora tentasse... —
Fiquei em silêncio por um segundo, encarando um ponto
qualquer, perdido em pensamentos. — Algo mudou, não
sei dizer o que, só sei que mudou.

— Sempre soube que isso aconteceria — comentou


Ben, dando de ombros diante do olhar inquisidor que lhe
lancei. — Você acha que engana a quem com esse
discurso de herdeiro, Leon? Já percebeu como trata as
suas pacientes grávidas, como se importa com o estado de
saúde delas e dos fetos.

— É óbvio, sou médico.

Ele negou.

— Nunca foi apenas isso, se fosse, não ficaria


abalado quando a inseminação não tem sucesso, ou
quando ocorre algum problema na gestação — expressou,
arregalando os olhos. — Porra, Leon, você se importa até
mesmo com os malditos espermas, cuidando
minuciosamente da coleta. Quem é que se importa tanto
com a droga de espermatozoides? — Enfezou, erguendo
os braços.
Descansei a cabeça no punho fechado e o observei
com tédio.

— Se não está lembrado, espermatozoides valem ouro


para nós.

— Sim, estou bem ciente disso, mas, como sempre,


está tentando mudar a questão.

— Então qual é a porra da questão, Ben?

Ele se aproximou da minha mesa e espalmou as mãos


em cima dela, inclinando o corpo para frente,
aproximando-se de mim, enquanto murmurava.

— A questão é que você nunca poderia ser para os


seus filhos alguém que não representa quem é de verdade.
— Ele riu. — Fala sério, Leon, você adora crianças, ama
cuidar de grávidas aleatórias e acreditava mesmo que
conseguiria ficar alheio à sua própria grávida?

Sim, eu acreditava fielmente nisso.

Minha profissão era justamente esta e por mais que eu


amasse o que fazia, pensava que poderia, sim, ficar alheio
a gestação dos meus filhos e tratá-los como herdeiros. E
talvez até desse um pouco certo, se a mãe não fosse
Bridget, uma garota muito teimosa, linda, persistente e...
atrevida.
— Mas fico feliz que tudo tenha se resolvido, no
entanto. É um cara incrível pra caralho e merece essa
felicidade que Bridget está lhe proporcionando —
continuou. — E quem diria, era eu quem estava
procurando uma família, mas foi você quem a encontrou
primeiro, justamente o mulherengo inveterado.

Franzi meus olhos para ele.

— Espera... vocês já sabiam, não é mesmo? —


questionei. Ben deu um passo para trás e ergueu as mãos
em rendição. — Por isso Izabela não insistiu sobre Bridget
querer ficar com as crianças.

Ele deu mais um passo, então outro e outro.

— Óbvio, ficava desfilando com a garota por aí, era


nítido que estava rolando alguma coisa entre os dois. Só
nos confirmou o que já desconfiávamos.

— Então por que diabos veio com o papinho de família


pra cima de mim?

— Só queria ter certeza de que não seria um imbecil e


estragaria as coisas para você, só para se autossabotar. —
Ben atravessou a soleira da porta, abaixou os braços e fez
um sinal com a cabeça. — Acompanharei de perto as
próximas notícias sobre Leon, de cafajeste a pai de
família. — Piscou e sumiu no corredor.
Não me dei ao trabalho de respondê-lo, Ben só estava
tentando me irritar, zombando de mim como o belo maldito
que era. Mas, no fundo, sabia que merecia isso, fiz o
mesmo com ele quando me disse que se casaria, que
desejava esposa e filhos.

Eu cuspi merdas, só não pensava que cairia no meio


da minha testa.
Me sentei no meu lugar habitual do refeitório e
esperei. Sentia o olhar das pessoas queimando a minha
nuca e conseguia ouvir o chiado das vozes, baixo o
suficiente para que eu não pudesse entender, mas alto
para que pudesse ouvi-las.

O principal questionamento do burburinho deles: quem


era o pai do meu filho? Típico. Nítido que desconfiavam de
um envolvimento meu com Leon, considerando o tanto de
vezes que fomos vistos juntos nos últimos meses.

Abri o meu pote e encarei o sanduíche que eu tinha


preparado mais cedo. Parecia tão sem graça diante dos
meus olhos. Meu paladar estava muito seletivo
ultimamente, o que tornava bem difícil tentar manter uma
alimentação saudável.

Suspirei.

Faria um jantar, assim poderia trazer para o almoço o


que sobrasse da comida. Era melhor do que me alimentar
com sanduíche durante toda a gestação.

Recolhi o pão do pote, criando coragem para dar uma


mordida. Não havia nada de errado com ele, só tinha os
ingredientes que eu gostava, mas parecia que os bebês
não concordavam com isso.

— Hum... Bridget, então... — A voz de Liam soou ao


meu lado.

Ele não sabia, mas tinha aparecido em um bom


momento. Aliviada, coloquei o sanduíche de volta no pote
e cruzei os braços em cima da mesa, erguendo meu olhar
para ele.

— Sim? — questionei, sorrindo de boca fechada.

Liam arrastou os olhos para baixo, e então de volta


para cima e coçou a cabeça, um pouco sem jeito em como
abordar o assunto.

— Grávida? — perguntou, por fim.

Mordi as bochechas para evitar sorrir e engoli a


saliva.
Eu deveria ser mesmo uma péssima amiga para que
ele não se sentisse confortável em me abordar sobre os
boatos.

— Sim, grávida — confirmei.

Arregalando os olhos, ele segurou no encosto de uma


das cadeiras e soltou uma exalação, pendendo a cabeça
para o lado.

— Bom... nossa, isso é... estranho. — Calou-se,


olhando para mim. — Quer dizer, é que eu queria meio que
voltar a transar com você, estava dando o meu melhor
para conseguir fazer isso e agora descubro que esteve
este tempo todo grávida — disse com sinceridade.

Arqueei as sobrancelhas.

— Eu sinto muito por ter frustrado os seus planos,


Liam. — Dei de ombros. — E nós não vamos transar de
novo.

Ele esfregou a testa, balançando o corpo de um lado


para o outro. Liam parecia confuso, chateado e insatisfeito
com a notícia. E o problema era inteiramente dele, nunca
dei a entender que queria voltar a ser amante dele,
tampouco demonstrei algum interesse que não fosse
amigável, apenas.

— Você sabe quem é o pai? — indagou.


Se eu sei quem é o pai? Mas que filho da mãe
inconveniente!

Meus lábios se retesaram em uma carranca e eu senti


um calor se impregnar em minhas veias, o ódio puro e
absoluto.

Eu já tinha ouvido o suficiente do meu pai dias antes,


não precisava ficar escutando besteiras de Liam também,
ou de qualquer outro. Eu merecia respeito e ponto final. O
mínimo que ele poderia ter feito era ter me parabenizado e
demonstrado um pouco de decência.

— Primeiro, você fala que quer foder a minha mulher


com todas as letras e depois pergunta se ela sabe quem é
o pai dos filhos dela? — disse Leon, a voz grave, alta e
clara soando pela cantina.

Fiquei rígida ao mesmo tempo em que me senti


aliviada por ele estar presente. Liam arregalou os olhos e
virou-se em uma velocidade vertiginosa para o médico.

Ignorando-o, Leon se aproximou de mim e depositou


um cachorro-quente em minha frente, inclinando-se e
plantando um beijo na minha testa. O gesto dele fez-se
ouvir uma sucessão de suspiros ao redor da sala.

— Aqui está seu prato predileto — murmurou,


sorrindo.
Eu estava imóvel, não conseguia me mexer ou até
mesmo respirar. Leon tinha me dado carta branca para
anunciar que ele era o pai dos bebês, eu só não pensava
que ele fazia questão de se juntar a mim durante a
revelação.

— Doutor Dubrow... eu... — Liam engoliu em seco,


encarando Leon com assombro.

Leon olhou para ele com tanto descaso que eu senti


um pouco de pena de Liam.

— Se continuar importunando a minha mulher, serei


obrigado a colocá-lo para fora do programa de residência
— comentou Leon em um sibilo baixo e ameaçador.

Liam balançou a cabeça.

— Eu... eu não sabia, me desculpe — disse, trêmulo.

Leon abriu um sorriso incisivo.

— Mas agora sabe — atirou, deslizando a língua pelos


dentes. — Se continuar insinuando o seu desejo de fodê-
la, eu vou tomar algumas medidas, dentre elas, garantir
que nunca mais encontre um emprego no país.

Nossa, ele estava pegando pesado com Liam.

— Me perdoe, isso não vai mais acontecer —


respondeu, abaixando a cabeça. — Me desculpe, Bridget,
não sabia que estava comprometida e nem que teria um
filho, isso me pegou de surpresa.

— Dois filhos — corrigiu Leon. Liam abriu ainda mais


os olhos.

— Gêmeos? — refutou ele, perplexo.

— Sim, meus filhos e gêmeos — gracejou o médico,


elevando a voz para que mais gente escutasse.

Liam se esquivou, calculando os movimentos,


temendo o peso do olhar que Leon atirava na direção dele.

— Parabéns — felicitou, afastando-se um pouco mais.

Leon riu sem humor algum.

— E era justamente isso que deveria ter falado desde


o início ao invés de ter sido um hipócrita perguntando se
ela sabia quem era o pai.

A cor sumiu do rosto de Liam, como se todo o sangue


tivesse sido drenado em segundos.

— Eu sinto muito — persistiu, sem saber o que falar.

Agarrei o braço de Leon e o puxei, forçando-o a olhar


para mim.

— Está tudo bem, ele já se desculpou, tenho certeza


de que ele não fez por mal.
Leon não se dignou a olhar para Liam uma segunda
vez, então o residente aproveitou e sumiu pelo refeitório,
deixando apenas o rastro do perfume para trás.

— Não precisava ter sido tão rude — comentei,


baixinho.

Ele semicerrou os olhos.

— Era isso ou eu acabaria com a carreira dele que


nem sequer começou.

— E por que faria isso? Ele só teve coragem de


perguntar o que todo mundo da clínica queria.

— Porque eu não vou aceitar de forma alguma ficar


ouvindo por aí como ele quer fodê-la. Você é minha,
Bridget, e se sentará apenas no meu pau e no de mais
ninguém. — Seu timbre baixo e rouco era tão quente que
me colocou em estado de ebulição.

Entreabri os meus lábios para que uma respiração


ruidosa pudesse passar e apertei minhas coxas uma contra
a outra.

— Não pode falar isso por mim — retruquei, a


respiração descompensada.

Os olhos dele brilharam em desafio.

— Sim, eu posso. — Ele se inclinou um pouco mais,


colocando os lábios bem perto do meu ouvido para
sussurrar. — E eu não vejo a hora de foder essa bocetinha
de novo, com a minha língua e com o meu pau. Quero
chupar esse clitóris rosinha com força e enfiar minha
língua dentro do buraquinho apertado, provando o gosto
direto da fonte. Depois, quero me afundar dentro dela até
ser enforcado quando a fizer gozar e gritar o meu nome, o
nome do único homem que vai foder você.

Arquejei, endurecendo minha coluna.

Não precisava de um espelho para saber que estava


vermelha feito um tomate. A cantina estava cheia e a
atenção da maioria das pessoas estava em nós, como
Leon tinha o descaramento de falar sobre essas coisas?

Ele era muito arrogante, por isso. Respondi a minha


própria pergunta.

Leon riu, então se levantou e me lançou um sorriso


bruto e sexy, o sorriso de quem sabia que, embora
estivesse morrendo de vergonha, estava com a boceta
pingando como uma torneira aberta.

— Te vejo mais tarde — anunciou, afastando-se.

Ele caminhava como se fosse o rei do local,


deslizando pelo piso com indiferença. Ombros eretos,
postura altiva e com uma graciosidade própria.

Lindo como um Deus.


Arrogante como o Diabo.

Leon Dubrow era, de fato, o pacote completo para a


perdição. E eu tinha caído direitinho, me condenando a
ele.

Eu nunca quis tanto que meu turno acabasse como


tinha desejado hoje durante todo o dia. Depois da ceninha
de Leon no refeitório, eu ouvia o meu nome ser proferido
em cada canto que eu passava.

Banheiros, corredores, cantina... em qualquer lugar.

Meu desconforto era tão nítido que Helena não


conseguiu segurar a risada ao olhar para a minha cara de
aflição. Ela simplesmente fechou a porta do laboratório e
me deixou na sala, sorvendo sozinha o que estava
acontecendo.

Ignorando os olhares que eu estava recebendo,


caminhei pelos corredores com o queixo erguido e a
respiração calma. Leon estava no laboratório de esperma e
eu precisava ir até ele para pegar a chave do apartamento,
pois estava indo embora e não sabia por quanto tempo
mais ele pensava em ficar na clínica.

Entrei no elevador e soltei um suspiro de alívio assim


que as portas se fecharam e eu finalmente fiquei sozinha,
sem olhares disparados para mim.

Passei uma mão em minha barriga e mordi os lábios,


olhando ao redor do elevador vazio, aguardando chegar ao
andar solicitado.

As portas foram abertas e eu avancei. O corredor


estava vazio por conta do horário adiantado. Parei na
frente da porta e olhei o nome do laboratório disponível em
uma placa diante dos meus olhos.

Eu nunca tinha estado no local, apenas fui


apresentada a ele no meu primeiro dia, então não sabia se
deveria entrar com algum tipo de roupa especial ou algo
assim.

Ah, dane-se, estou com fome e quero ir embora!

Leon não atendeu às minhas ligações e nem


respondeu minhas mensagens. E quando fui até Ben para
descobrir aonde ele estava, o médico me disse que,
possivelmente, aqui, e que ele não ficava com o celular
quando estava concentrado demais no serviço.

Girei a maçaneta e entrei. Leon estava sentado em um


banco no fundo do local, a coluna curvada enquanto
analisava algo no microscópio. Ele não usava nenhuma
roupa diferente, exceto luvas e máscara.

— Leon — chamei, dando um passo adiante.


Ele se ajeitou e girou no banco, ficando de frente para
mim.

— O que aconteceu? — perguntou, confuso.

Ele amava mesmo isso, tanto que nem via o tempo


passar. Leon não fazia por profissionalismo, ele fazia por
amor.

Abri um sorriso de canto, meu coração errando uma


batida diante da imagem. Ele puxou a máscara para baixo,
descobrindo o nariz e boca. Os cabelos estavam
bagunçados, demonstrando que ele havia esfregado os
dedos nas mechas por muitas vezes.

— Não aconteceu nada — murmurei, acalmando-o e


sentindo outra pontada no coração diante do alívio
absoluto em seu rosto. Ele já era um pai tão incrível. — Eu
só vim perguntar se pretende ficar muito tempo aqui e se
pode me entregar a chave do apartamento, pois já estou
indo embora.

Em outra ocasião, eu teria procurado um homem como


Leon para ser o pai dos meus filhos. Ou, no caso, eu teria
procurado a ele, já que o destino nos uniu antes mesmo
que soubéssemos a existência dos bebês, tornando-me
uma das residentes dele.

Nunca tinha parado para pensar em como seria o


homem com quem eu ficaria, mas tinha certeza de que ele
seria bem diferente do meu pai. Como mãe, não deixaria
que um filho meu se submetesse a tanta humilhação. E se
eu não encontrasse o homem perfeito, eu apenas não seria
mãe.

Mas Leon apareceu e mudou todas as coisas.

O cara mais incrível que eu já conheci. O pai dos


meus filhos. Meu chefe da residência. Meu obstetra.
Apenas, ele, Leon Dubrow.

Arregalei os olhos e me segurei em um dos balcões.

Puta merda!

Eu estava apaixonada?

Tipo, apaixonada de verdade e tudo mais?

E como diabos eu tinha tanta certeza de que sim se eu


nunca tinha me apaixonado antes?

Merda, isso não poderia ter acontecido. Nós teríamos


filhos, um vínculo eterno e muita convivência adiante.
Como eu suportaria um coração partido, no final das
contas?

Balancei a cabeça, removendo os pensamentos de


mim.

O amor era um pensamento intrusivo, assim a ciência


explicava. Estar apaixonada significava focar muito nos
pontos positivos da pessoa e se abster dos negativos,
portanto, era só pensar nas coisas ruins de Leon para que
a paixonite evaporasse.

Oh, Deus, e quais eram além da arrogância iminente?

— Bridget, o que está acontecendo com você? — A


voz dele entoou pelo torpor em que eu me encontrava.
Ouvi a oscilação do banco em que estava sentado
segundos antes de sentir as mãos dele ao meu redor. — O
que foi que lhe assustou, o que está sentindo? — insistiu,
preocupado.

Pisquei, retesando-me.

— Não foi nada, só estou cansada — menti, erguendo


a cabeça para encará-lo. Leon franziu os olhos em minha
direção, desconfiado. — Estou falando sério, se fosse
alguma coisa, eu diria a verdade. — Suspirei. — Só não
aguento mais as pessoas me olhando e falando de mim o
tempo todo, foi o dia inteirinho assim, não importa para
qual lugar eu vá, sempre tem alguém cochichando o meu
nome pelos cantos.

Ele concordou, por fim.

— Isso vai passar logo.

— E como você sabe?

— Não é a primeira fofoca que se espalha pela clínica.


— Deu de ombros. — Eu mesmo já ouvi várias pelos
corredores, os funcionários sempre têm algo para falar, e
sempre surgem com algo novo quando a fofoca antiga
esfria. Portanto, hoje e pelos próximos dias, você será o
centro das atenções, até que um burburinho quente surja e
eles esqueçam totalmente de você.

Cruzei os braços e franzi o nariz.

— Mesmo que eu esteja grávida do chefe mulherengo?

Ele teve a audácia de rir, mas não discordar.

— Até mesmo isso — confirmou. — Sabe como se faz


um espermograma? — perguntou, mudando de assunto,
entrelaçando os nossos dedos e me puxando para onde ele
estava. — Venha ver como são os bebês antes de tudo.

Isso me interessou, era adepta a conhecimento e


adorava aprender coisas novas. Ele me fez sentar na
banqueta em que estava e puxou o microscópio para mim.

— Aqui está a minha análise desse espermograma,


antes de começar a separação dos espermatozoides
saudáveis — disse, apontando para um bloco de notas ao
lado. — Nesse caso em específico, o casal me procurou
porque não conseguia engravidar, e depois de oito anos
sendo tentantes, vieram em busca de ajuda.

— E você descobriu o motivo da dificuldade?

Concordou com um aceno.


— Olhe no microscópio, Bridget — orientou.

Inclinei-me e posicionei meus olhos no aparelho.


Havia várias manchas, círculos e alguns espermatozoides.

— Os espermatozoides que estão se movimentando


sem dificuldade são os normais, também conhecidos como
saudáveis e são esses que separamos para a inseminação
ou fertilização. — explicou. Observei enquanto eles
corriam de um lado para o outro, movimentando-se com
rapidez. — Os que estão se mexendo, mas não estão se
movimentando, são os espermatozoides com motilidade
não progressiva. Eles não possuem a funcionalidade de
fecundar um óvulo, não conseguem, então são
descartáveis.

— Eles mexem só a cabeça — murmurei.

Embora estivessem em movimento, os


espermatozoides não saíam do lugar.

— Sim — concordou Leon, colando minhas costas no


peito dele e beijando o topo da minha cabeça. — Se
observar melhor, vai encontrar espermatozoides imóveis,
estes estão mortos, ou seja, não servem para nada.

— Mas são tantos mortos... — comentei, inclinando-


me mais para ver toda a placa de observação.

— Sim, quase todos estão mortos, na verdade. — Ele


esfregou a mão em meu braço em uma carícia lenta e
gostosa. — Vai ver uns que estão com defeito no pescoço,
eles também possuem dificuldade em se movimentar, mas
se observar melhor, há uma mancha na base, tornando-os
descartáveis e defeituosos.

Ele tinha razão, consegui enxergar vários com a


descrição que falou. Eles só mexiam a cabeça e mais
nada, balançando-se de um lado para o outro.

— Ele tem bastante leucócitos — comentei.

— Uhum... — murmurou Leon no topo da minha


cabeça. — O que significa que ele tem função espermática
deficiente.

Me levantei e Leon me girou no banco de frente para


ele.

— Então ele não poderia engravidar a parceira? —


perguntei.

Leon negou.

— Não de forma natural, mas com o tratamento


adequado, sim. Estou separando os espermatozoides
saudáveis para isso, tentaremos uma inseminação artificial
e se não obtivermos sucesso, uma fertilização in vitro.

— E qual delas você acha que tem mais chances de


dar certo?

Ele ponderou por um segundo.


— Bom, os espermatozoides podem aparentar ser
saudáveis, mas não significa que consigam fecundar com
facilidade. Além do mais, eles já estão com uma idade
avançada. Então eu diria que a FIV [ 9 ] tem grandes chances
a mais de gerar embriões.

— Então por que já não vão direto a este método?

Ele bufou e revirou os olhos.

— Porque o casal quer tentar uma gestação o mais


natural possível, eles possuem um pouco de preconceito
com a reprodução assistida, por isso levaram tanto tempo
para procurar a ajuda necessária.

Franzi a testa.

— Que caso bem... específico — comentei.

Ele riu, mas concordou.

— Não tão específico quanto o nosso. — Piscou. — O


que me lembra que eu disse que queria algo mais cedo e
chegou o momento de pegar o que eu quero.

— E o que é?

Ele não respondeu, Leon afastou as minhas pernas e


agarrou o cós das minhas calças, abaixando-as
abruptamente e levando a calcinha junto com elas.
Meus olhos voaram imediatamente em direção a porta
e eu senti o meu coração descompensar. Ao mesmo tempo
em que me sentia excitada, morria de medo de sermos
pegos.

— O que pensa que está fazendo? — perguntei com a


voz esganiçada.

— Eu vou chupar a sua boceta e depois vou gozar


dentro dela — disse, apenas, dando de ombros e abrindo o
botão do jeans.

Meu queixo caiu e eu arqueei as sobrancelhas.

— Ah, apenas isso — zombei. — E esqueceu que


estamos na clínica, no meio de um laboratório em que a
porta não está trancada e qualquer um pode entrar?

Ele ergueu um dedo em riste, enumerando enquanto


falava

— Primeiro, a maioria dos funcionários já foi embora;


segundo, estamos em um banco de esperma, nada mais
justo que eu possa acrescentar o meu também, e, por
último, ninguém entra no meu laboratório sem a minha
permissão.

Ele desceu a calça e libertou o pau duro, então se


ajoelhou na minha frente.
— Mas eu entrei no seu laboratório sem autorização
— avisei.

Os olhos dele encontraram os meus, sérios e precisos.

— Você entrou na minha vida sem autorização,


Bridget, e agora também não tem autorização para sair.

Inclinando-se, senti o hálito quente antes da língua


áspera esfregar o meu clitóris.
Eu adorava chupar Bridget, era fofo o modo como ela
tentava se controlar para não gritar alto ao mesmo tempo
em que se perdia completamente enquanto gozava.

Além do mais, ser o primeiro homem a chupar a


boceta rosinha e delicada, fazia com que algo se
ascendesse dentro de mim. Acreditava que era orgulho
masculino, mas não tinha certeza.

Esfreguei a língua no clitóris inchado e chupei a


pequena protuberância, babando e gemendo.

Bridget arqueou as costas e se jogou contra o balcão,


fechando os olhos e abrindo ainda mais as pernas para
mim.

Levei meus dedos até a boceta e esfreguei a


extensão, espalhando a minha saliva com a lubrificação
dela, antes de afundá-los no canal apertado. Salpiquei
beijos pela virilha lisa e esfreguei a língua na região do
períneo, retornando para o clitóris.

Bridget estava tão molhada que lambuzava as pernas


e uma parte da banqueta.
Meus dedos entravam e saíam da boceta dela,
observei-os serem engolidos, sumindo dentro da garota
que rebolava em minha mão sem pudor algum.

Endureci a ponta da minha língua e comecei a


esfregá-la no clitóris para cima e para baixo, em
movimentos acelerados.

— Leon... eu vou gozar — avisou, agarrando-se em


meus cabelos.

Eu não parei, continuei penetrando-a, fodendo a


boceta e o clitóris, decidido a arrancar os gemidinhos
deliciosos que ela exalava sempre que chegava ao ápice.

E então ela fez.

Removi os dedos da boceta e coloquei a minha boca


no local, enfiando a minha língua e tomando cada gota do
orgasmo dela, apreciando o gosto único e delicioso.

— Hum... sua língua é tão deliciosa — comentou,


perdida na névoa de luxúria.

Sentia a minha barba encharcada e meus pêlos


brilhavam com o orgasmo dela. Me levantei, segurei o meu
pau e o direcionei para a entrada. Puxei a bunda dela para
frente e me afundei em Bridget, deslizando para dentro
com facilidade.

— Porra de boceta gostosa — grunhi.


Me movimentei, saindo e entrando da boceta,
fodendo-a como tanto desejei durante o dia inteiro, desde
a conversa sacana que tivemos ao meio-dia no refeitório.

— Eu vou gozar de novo — arfou, fincando as unhas


em meus ombros.

Eu sorri, orgulhoso de mim mesmo por conseguir


arrancar dois orgasmos da minha garota em uma transa
rápida no meio do laboratório.

— Quer que eu toque na sua bocetinha? — sussurrei


ao pé do ouvido dela.

Bridget se arrepiou com a minha voz, ela ainda


mantinha os olhos fechados, e arqueou as costas em
minha direção.

— Hum... — ciciou.

— Eu quero uma resposta coerente... quer que eu


toque de novo nessa bocetinha gulosa e molhadinha?

Ela abriu os olhos verdes, fincando-os em mim.

— Sim, esfrega a minha boceta, Leon... — Prestes a


zombar, inclinei-me mais e me afundei outra vez, calando-
a. — Puta merda, me fode gostoso! — grunhiu.

Ela contraiu a boceta ao redor do meu pau,


arrancando um suspiro áspero de mim.
Desci a mão e toquei no clitóris inchado, circundando-
o com os dedos lambuzados. Bridget gritou e gozou,
sufocando o meu pau ao ponto de eu não conseguir me
aguentar e me juntar a ela, pintando o útero com a minha
porra.

Meu corpo tremia e minha respiração estava densa.

— Satisfeito? — sussurrou, entre uma lufada de ar e


outro. — Agora tem esperma seu no laboratório também.

Eu sorri,

— Sim, estou satisfeito, já podemos ir embora para


que eu possa alimentar a minha mulher grávida.

— Hum... isso seria bom, estou com fome —


concordou.

Ela ainda não sabia, mas eu já a conhecia bem o


suficiente. Sempre que estava com fome, franzia o nariz
com constância, como se estivesse pensando no que
comeria e algumas das ideias sugeridas pela mente lhe
deixasse enjoada.

Beijei a testa dela

— Então vamos alimentar vocês três.


Semanas depois

A dinâmica que Leon e eu adotamos era incrível, tão


tranquila que conseguimos nos adaptar muito bem à rotina.
Era básica e simples. Ele acordava primeiro que eu e fazia
o café na maioria das vezes, ou me acordava antes, me
chupando, e fazendo de mim o café da manhã particular
dele. Depois, íamos juntos para a clínica. No final da noite,
quando ele estava muito atarefado, eu voltava sozinha
para casa e lhe esperava com o jantar. Ou voltávamos
juntos.

Leon tinha razão quando disse que uma hora as


conversinhas iriam parar. Parece que uma das enfermeiras
foi pega transando nas escadas de emergência com um
dos residentes. E ela era casada. Isso sim gerou um
escândalo no local.

Eu odiava aquelas escadas de emergência, tinha


encontrado Leon no lugar transando com a secretária e me
lembrar da cena, hoje, me causava uma raiva desenfreada.

Minha barriga estava muito volumosa, com cinco


meses de gestação gemelar, os bebês cresciam saudáveis.
Eles já se mexiam incontrolavelmente. Na primeira vez que
os senti, não consegui conter a emoção e ainda era uma
experiência eletrizante todas as vezes que os sentia, não
importava quantas fossem.

Eu tinha me tornado o que mais temia, um poço sem


fundo de choro, desejo, raiva e felicidade. Às vezes, os
sentimentos refletiam em mim juntos, e isso levava Leon a
loucura e desespero.

Retirei o crachá da clínica de dentro da bolsa


transversal e me aproximei das portas giratórias.

— Bridget? — Alguém me chamou.

Parei meus passos instantaneamente e virei para o


lado, reconhecendo o som da voz da minha mãe. Ela
estava me esperando, de pé, a alguns metros de distância,
os olhos transbordavam lágrimas enquanto corriam através
do meu corpo.
Não conseguia descrever o que eu estava sentindo.
Decepção por ela ter levado tanto tempo para me procurar.
Alívio por vê-la e saber que estava bem. Tristeza por ser
uma filha descartável para ela tanto quanto era para o meu
pai. E, por último, satisfação por saber que estava
construindo a minha própria família e que poderia ser para
os meus filhos alguém muito melhor do que meus pais
foram para mim.

— Mãe — cumprimentei, maneando a cabeça.

Ela se aproximou lentamente, passando uma mão no


rosto para limpar uma lágrima que escorria.

— Como você está, querida? — perguntou,


averiguando-me com os olhos. — Sua barriga está
enorme... — Sorriu com certo pesar. — Meus netos estão
bem?

Suspirei, esfregando minha barriga.

— Sim, nós estamos muito bem, obrigada por


perguntar — retorqui.

Ela separou os lábios em um soluço.

— Ah, minha filha, eu sinto muito por tudo o que


aconteceu... — chorou, balançando a cabeça. — Como eu
gostaria que as coisas fossem diferentes, que Deus tivesse
tido piedade de nós.
Olhei para ela, removendo toda a mágoa que eu tinha
dentro de mim. Ela não era a mesma mãe que eu conhecia
quando criança, àquela mulher amorosa e que fazia de
tudo para agradar os filhos que, enquanto o marido fazia
distinção, lutava para igualar ambos, mostrando que o
amor era o mesmo.

Não, ela não era.

Ruth tinha partido junto com o filho, quando o enterrou


aos nove anos de idade. Algo dentro dela mudou. Ela não
sorria mais com tanta felicidade, como se o mundo tivesse
se tornado cinza, ofuscando as cores vibrantes.

Ela se tornou incompleta. Mark se tornou rancoroso. E


eu me tornei quebrada, uma pessoa jovem que não tinha
aproveitado a vida, focando apenas nos estudos para
esquecer a vida de merda que eu levava ao lado deles.

A nossa família já era quebrada, mas terminou de se


estraçalhar com a morte de Brandon e sendo enterrada
com ele.

— Está tudo bem, mãe, estou feliz assim.

— Mas não está certo, você deveria estar em casa,


conosco, onde é o seu lugar. — Limpou outra lágrima com
o indicador. — Eu não vim atrás de você antes porque
precisava absorver a ideia de que estava grávida, ah...
querida, lutou tanto para conseguir se formar. Foi um
choque para mim, nunca pensei que isso aconteceria, você
era tão focada nos estudos.

— Eu sei e também não estava esperando, mas


aconteceu e não me arrependo dos meus filhos, eu os amo
incondicionalmente, mesmo que não tenham sido
intencionais.

Ela fungou e sorriu fracamente.

— Isso se chama ser mãe, querida — murmurou.

Olhei para o lado, inspirando o ar com força, não


podia evitar me sentir chateada com a indiferença dela, no
entanto.

— Por que não me procurou antes? — perguntei, por


fim. — Levou semanas para vir atrás de mim, para conferir
se estava tudo bem.

Ela arfou e comprimiu os lábios, mais lágrimas


brilharam atrás dos olhos dela.

— Eu sabia que estava bem, soube que ficaria bem no


momento em que o rapaz a defendeu, mostrando o quanto
se importava com você. Como eu disse, precisava de um
tempo para absorver tudo o que aconteceu, foi uma virada
e tanto no nosso caminho. Você escondeu a gravidez
durante meses e um dia simplesmente chegou em casa e
jogou essa notícia para cima de nós, não foi fácil de
compreender.
— Eu não estava procurando compreensão, estava
apenas avisando a vocês que estava grávida. Eu iria
embora de casa de qualquer forma, só não pensei que
seria tão humilhada como fui — cuspi, cerrando os punhos
ao lado do corpo. — A senhora poderia ao menos tê-lo
impedido, ter me concedido a oportunidade de pegar as
minhas coisas. Eu fui expulsa de casa grávida e apenas
com a roupa do corpo, se não fosse por Leon... nem sei o
que teria sido de mim.

— Se ele não tivesse aparecido, jamais deixaria que


tivesse ido embora, Bridget, só permiti porque vi como o
garoto se importava com você, tanto ao ponto de enfrentar
o seu pai para defendê-la. Então permiti que fosse com
ele, confiava nele e... teria chances de ser mais feliz ao
lado dele — disse, tão baixo que precisei fazer esforço
para compreendê-la.

Enruguei minha testa.

— Como assim, mãe?

Ela espalmou a mão no peito e começou a massageá-


lo, como se estivesse sentindo dor no local, tentando
consolar um coração desolado.

— Seu pai é um homem complicado, ele sempre foi,


mas as coisas pioraram depois que Brandon morreu. Ele
mudou muito, tanto comigo, mas, principalmente, com
você.
— É claro, ele me culpa até hoje pela morte do meu
irmão — atirei, erguendo os cantos dos lábios, com nojo do
que ele representava para mim.

— Nós mudamos com a morte dele, querida, todos


nós. Brandon se foi e levou com ele um pedaço da gente.
— A boca dela começou a tremer em uma nova onda de
soluço e choro. — Eu só queria que a nossa família fosse
como antigamente, que nem quando tínhamos Brandon.
Queria uma família feliz, apenas isso.

— A nossa família nunca foi feliz, mãe, Mark nunca


gostou de mim, sempre me tratou com indiferença e a
senhora sabe disso. Poderia ser feliz, no entanto, para a
senhora, mas não era para mim.

Ela me encarou com tristeza, o corpo tremendo para


conter os soluços.

— Você não entende, meu bem, o seu pai sempre teve


trauma de filhos gêmeos, o que só se consolidou com a
morte de Brandon.

— O quê? — Contorci meu rosto em uma careta.

— A genética de gêmeos vem da família dele. Jenna,


sua avó paterna, engravidou de gêmeas quando seu pai
tinha oito anos, mas elas morreram durante o parto e
Jenna nunca se recuperou do trauma, entrou em
depressão e morreu meses depois. Então seu pai passou a
odiar gêmeos e ficou mais descontente ainda quando
soube que eu esperava por dois filhos. Como sempre quis
um menino, adotou Brandon como seu favorito, e estava
tudo bem, ele superaria isso um dia, principalmente
quando percebesse que Brandon não aceitaria que ele
continuasse te desprezando, seu irmão era muito
apaixonado e protetor com você. Mas então o câncer veio,
tudo aconteceu, e seu pai se perdeu de vez, afundando-se
na mágoa que sentia de uma gravidez gemelar até se
afogar de uma vez por todas nela.

Fiquei imóvel, em choque com a revelação dela.

Não conhecia minha família paterna, sabia que meu


pai era filho único e que os pais dele morreram quando ele
ainda era muito jovem. Da parte da minha mãe, conheci
apenas a minha avó, uma mulher incrível e que fez parte
da minha infância e de Brandon. Carregava boas
lembranças dela, até a sua morte quando Brandon e eu
tínhamos oito anos de idade.

— Não peço que perdoe o seu pai por tudo o que ele
fez para você, só imploro que tente entendê-lo — suplicou.

Espalmei as duas mãos em minha barriga, sentindo


um medo absurdo pelos meus bebês. Eu não me
recuperaria se os perdesse, mesmo não os conhecendo,
eu já os amava com todo o meu coração. Era estranho,
forte, profundo e incondicional.
Fechei os olhos e respirei lentamente, acalmando o
meu estômago revolto e afastando o frio que se
impregnava pelas minhas veias. Nada aconteceria comigo,
Jenna deve ter tido um parto complicado em uma época
diferente e sem muitos recursos. Por outro lado, eu estaria
em boas mãos. Leon era bom no que fazia, só precisava
confiar nele.

E eu confiava nele.

Balancei a cabeça.

— Eu não o quero perto dos meus filhos — disse com


convicção, abrindo os meus olhos. Ruth fez um sinal,
implorando, mas eu neguei. — Eu sinto muito que a
gravidez de Jenna tenha o deixado traumatizado, mas eu
não merecia toda a indiferença e rancor que ele jogou para
cima de mim. Não merecia todo o ódio que recebi da parte
dele depois da morte de Brandon, eu era apenas uma
criança e também estava sofrendo. Então, mãe, não me
peça para perdoá-lo ou para entendê-lo por que eu não
vou. Não pude me proteger dele, mas posso proteger os
meus filhos, ele nunca vai chegar perto das minhas
crianças, elas nunca serão alvo do rancor e da mágoa
dele. Ele não foi um bom pai e não seria um bom avô.

— Por favor, Bridget...

— Não. Essa é a minha decisão final. A senhora


pecou comigo também, como mãe, não deveria permitir
que ele me tratasse daquela forma. Mas estou tentando
entender o seu lado. Já perdeu um filho, não precisa
perder outra. Então apenas aceite a minha decisão se quer
ficar perto de mim. Terá livre arbítrio para conhecer os
seus netos, mas não Mark. — Dei um passo para trás,
afastando-me dela. — Estou feliz, pela primeira vez na
minha vida em anos, estou apenas feliz, sem culpa, sem
tristeza, sem nada. Deixe-me viver em paz, mãe, quero
você perto de mim, mas não farei isso se insistir em trazer
seu marido junto.

— Meu marido é o seu pai! — contestou.

Fiz um sinal negativo.

— Não, ele não é. Ele é apenas o meu progenitor. Um


pai nunca teria feito o que ele fez e nunca teria dito o que
ele me disse. Leon é um pai, Mark, no entanto, não.

Esperava que ela conseguisse me entender, mas se


não o fizesse, eu apenas a cortaria da minha vida também.
Seria sofrido e doído, mas seria o melhor para a minha
saúde mental.

Ela limpou o rosto com o dorso da mão e fungou.

— Está bem, respeitarei a sua decisão — falou, por


fim.

Do jeito dela, ela tinha sido uma boa mãe, só pecou


na parte de achar que a dor do marido era maior do que a
dor da filha, e que tudo o que ele fizesse ou dissesse
pudesse ser justificado porque tinha perdido alguém.

Mas, no fim das contas, todos nós tínhamos.

E nada. Absolutamente nada, justificaria o quão


intolerante Mark foi comigo. Para pessoas tóxicas, havia
uma única cura: a distância.

— Obrigada — agradeci, dando outro passo para trás.


— Eu vejo você... — comentei, sorrindo.

Olhei bem para ela, soltando a respiração densa.


Estava triste com a nossa situação, mas não me abalava
mais. Fiquei me sentindo sozinha por muito tempo, e agora
que tinha meus filhos e Leon, minha própria família, não
via motivo para sofrer por algo que nunca me foi dado por
completo.

Eu amava a minha mãe? Sim. E também amava o meu


pai, mas era madura o suficiente para entender que eles
me fariam bem enquanto estivessem longe de mim.
Sempre estaria disponível quando precisassem, mas não
perto para que me fizessem mal outra vez.

Eu sorri. Ela retribuiu.

— Eu te amo, minha filha, estarei sempre disponível


para o que precisar e prometo ser uma boa avó para os
meus netos — sussurrou.
— Eu sei, mãe, eu também te amo. — Joguei um beijo
no ar para ela.

Girei nos calcanhares e fui em direção a entrada da


clínica, o coração pesando algumas toneladas a menos
depois de ter removido outro peso de mim, um que eu
carregava por anos.

Enfim, a cada dia que passava, eu me tornava uma


nova mulher.
Semanas depois

Sentia mãos ao meu redor, mas não conseguia


identificar se era um sonho ou real.

Me remexi, virando-me para o lado e resmungando


palavras ininteligíveis.

As mãos deslizaram pela minha cintura, ignorando os


meus protestos. E então, agarraram o meu pau.

Abri os olhos, piscando, afastando a névoa do sono e


me habituando de volta ao mundo real. Estava no quarto
que dividia com Bridget e tudo parecia normal, até meu
pau ser esmagado outra vez.
Olhei para baixo e encontrei Bridget tocando em mim,
a boxer estava presa nas pernas e meu pau estava ereto,
preso no meio das mãos dela.

Levantei-me sobre os cotovelos.

— O que você está fazendo? — questionei, franzindo


a testa.

A imagem era excitante pra caralho.

Ela estava inclinada por cima de mim, a camisola


pendia, revelando a curva e os bicos dos seios. Os cabelos
estavam bagunçados, desordenados ao redor do rosto,
deixando-a linda e com o aspecto de alguém que havia
acabado de acordar. A ponta da barriga de seis meses de
gestação tocava de leve em meus tornozelos e ela olhava
para o meu pau com tanto desejo que me fez engolir em
seco. A mão estava fechada em punho ao redor dele, os
dedos resvalando na pele, como se estivesse
inspecionando-o.

Ela ergueu a cabeça.

— Bom dia, Leon — sorriu amplamente, mostrando


toda a fileira de dentes brancos e retos.

Tinha alguma coisa muito errada acontecendo, ela não


parecia... ela mesma.
— Bom dia! — cumprimentei, semicerrando os olhos.
— Hum... você quer transar?

Eu fodi a boceta apertada dela por muitas horas antes


de pegarmos no sono. A garota conseguiu o que ninguém
nunca tinha feito antes: me esgotar. Ela dizia que os
hormônios da gravidez estavam deixando-a tão louca ao
ponto de pensar que era uma ninfomaníaca. E eu, óbvio,
não reclamava nem um pouco. Se ela queria pau, estava
aqui para dar a ela.

Ela encolheu os ombros.

— Eu sonhei com você — revelou. — Sonhei que


estava lambendo o seu pau e chupando a cabeça,
engolindo o líquido que ele soltava.

Minha deglutição foi audível e eu fiquei duro feito


pedra só com a declaração dela. Bridget corou.

— É mesmo? — questionei, erguendo um dos cantos


dos lábios em um sorriso zombeteiro.

— Sim, e então eu acordei com tanto desejo de prová-


lo... hum... chegou a me dar água na boca. — Passou a
língua nos lábios ressecados.

Porra, eu gozaria antes mesmo que ela chegasse


perto de mim.
Algo piscou em minha mente, um alerta vermelho e
muito chamativo. Arregalei os olhos.

— Você não vai me morder, não é? — sibilei em um


bramido.

Nos últimos dias, Bridget estava tendo uns desejos


bem estranhos, para dizer o mínimo. E ela me acordava no
meio da noite e me fazia ir atrás de todo o absurdo que
tinha vontade de comer. E eu, como um bom pai, não
negava nunca.

Ela também esteve mais emotiva desde que conversou


com a mãe dela, preocupada com o nascimento dos bebês.
Chegou até mesmo a pensar que gêmeos pudessem ser
um tipo de maldição na família, já que nos dois casos, um
ou ambos deles, morreram.

Precisei ser bem convincente de que estava tudo bem.


E para confortá-la, passei a fazer ultrassons semanais,
mostrando a evolução deles, ouvindo os corações e
reiterando o quanto eram saudáveis e que eu não largaria
a mão dela nem por um minuto. Não poderia fazer o parto,
pois estava emocionalmente envolvido, mas confiaria
apenas na minha melhor equipe para fazê-lo e isso incluía
Ben como o médico principal, embora estivesse mais
focado na parte burocrática da clínica, ele ainda era bom
para caramba no que fazia, não importava o que fosse.

Ela balançou a cabeça, me fazendo suspirar de alívio.


— Só quero provar — avisou.

— Bom, então estou mais do que disponível... —


gorgolejei as palavras, engasgando-me quando a maldita
se inclinou e abocanhou a cabeça do meu pau. — Puta
merda, mulher! — Arfei.

Ela esfregou a língua na fissura e sugou, mamando


com tanta vontade que fiquei embasbacado, encarando-a
com olhos arregalados. A mão que se fechava ao redor
começou a se mexer, para cima e para baixo, batendo uma
punheta gostosa enquanto me lambia.

Era a porra do paraíso.

A garota queria me infartar logo pela manhã.

Senti a língua ao redor da glande, para frente e para


trás, lambendo como se fosse o doce mais gostoso que
colocou na boca.

— Hum... isso é bom — murmurou, o hálito quente


soprando na pele molhada e sensível.

Me deitei no colchão e fechei os olhos, deixando-a


fazer o que bem entendesse comigo, me entregando para
ela sem pensar duas vezes.

Bridget abocanhou o meu pau, enviando o meu cacete


até o fundo da garganta. Fechei as mãos em punho ao
redor do lençol. O barulho da sucção da boca dela me
engolindo, entoou, me fazendo gemer alto.

— Eu vou gozar, Bridget — avisei.

Não queria que ela engolisse a minha porra e ficasse


enjoada, ela ainda tinha alguns enjoos, embora não
fossem tão recorrentes.

— Eu quero beber tudo — grunhiu, aumentando o


ritmo.

  Me inclinei mais uma vez para apreciar a visão dos


lábios dela se fechando ao redor do meu pau e suspirei.
Era tão lindo, sexy e adorável.

Bridget engoliu de novo, conseguia colocar até a


metade na boca, antes de cuspi-lo de volta e repetir o
movimento. A cabeça se mexia para cima e para baixo,
meu pau sumia dentro dos lábios e surgia todo molhado, a
saliva dela misturado com o meu líquido pré-ejaculatório.

Senti minhas bolas doloridas e meu abdômen começou


a queimar. Contraí as pernas e trinquei a mandíbula.
Bridget aumentou o ritmo, engolindo-o e esfregando a
língua na glande quando o retirava da boca. Sempre em
vaivém, dando o melhor de si.

Deitei a cabeça no travesseiro e gozei sem controle


algum. Ejaculando na boca carnuda, rosada e muito
gulosa, que engoliu cada gota da porra que expirava em
sua garganta.

Foi, literalmente, o melhor boquete da minha vida


inteira. Como é que essa garota podia ser tão boa em tudo
que fazia?

Relaxei meus músculos, inerte, aproveitando o torpor


de ter ganhado uma mamada das boas logo ao acordar.

— Você gostou? — perguntou, limpando os lábios com


a ponta do dedo, antes de levá-lo a boca e chupá-lo. — Foi
meu primeiro boquete, pesquisei algumas coisas na
internet, mas... posso melhorar com o tempo.

Ela estava brincando, caralho?

— Porra, se eu gostei! Quero foder essa boquinha


virgem muitas e muitas vezes — crispei. — Se quiser fazer
isso mais vezes, sinta-se à vontade.

Ela sorriu, orgulhosa e eu resfoleguei, cheio de


exaltação e honra por ter sido o primeiro a enfiar o pau na
boca dela.

— Quer que eu foda você? — indaguei, me


preparando para comer a bocetinha gostosa.

Ela ponderou.

— Na verdade, ainda estou dolorida de ontem à noite,


mas aceitarei a oferta mais tarde.
Encolhi os ombros.

— Tudo bem, sou todo seu, pode pegar e usar a hora


que quiser.

— Eu sei que sim — disse, levantando-se. — Preciso


de um banho e então de um café bem forte.

Observei a barriga protuberante admirando o corpo da


mulher que tinha dissolvido a minha mente, fazendo-me
pensar nela o dia inteirinho e desejá-la como nunca
desejei ninguém.

Ela estava a cada dia mais linda e mais... grávida. E


eu só conseguia amar o quanto ela ficava atraente assim.
Saber que eram os meus filhos que ela carregava me
deixava louco por ela.

— Vamos montar os berços hoje? — perguntei,


dobrando os braços atrás da cabeça e encarando a bunda
com água na boca.

Meu pau amolecido pelo orgasmo estava endurecendo


apenas com a visão.

— Sim, vamos fazer isso — concordou.

Era sábado, não tínhamos expediente na clínica e


nenhum compromisso inadiável, então decidimos que seria
um bom momento para montar os berços dos bebês no
quarto que estava quase pronto para eles. Bridget fez
questão de escolher cada mínimo detalhe ela mesma,
deixando qualquer profissional especializado de fora dos
seus planos. Então nos unimos em prol disso, para que
tudo ficasse do jeito que ela queria e ao agrado dos bebês
que nasceriam em menos de três meses.

Ela parou na porta do banheiro e se virou para mim,


arqueando uma sobrancelha.

— Você não vem?

Eu sorri e me levantei em um pulo.

Caralho, eu amava essa garota!

Abri a boca em um impulso para falar justamente isso


para ela, mas me calei.

Ainda não.

Ainda era cedo demais.

Esperaria os bebês nascerem para que ela pudesse


ter tempo de se apegar a mim tanto quanto eu estava
apegado a ela.

— Não precisa nem pedir duas vezes, amor.


Observei Leon com os olhos famintos, ele estava
agachado no chão, tentando encaixar uma das peças de
um dos berços dos bebês. Estava sem camiseta e gotas de
suor escorriam pelo peitoral definido, perdendo-se na
tatuagem e no cós das calças de moletom.

Nós descobrimos que montar móveis era mais difícil


do que pensávamos e que a internet enganava as pessoas.
No YouTube, havia vídeos ensinando a montar, no entanto,
esqueciam de deixar bem claro que levaria horas e não
apenas vinte minutos que era o tempo total do vídeo.

— Tem certeza de que não quer chamar alguém? —


perguntei, espichando o pescoço na direção dele.

Leon bufou e me lançou um olhar sério.

— Estou conseguindo, só mais um pouco e terminarei


o primeiro berço — contestou, teimando.

Olhei para a infinidade de parafusos e peças no chão.


Não, ele não estava nem perto de terminar, bem pelo
contrário.

— Hum... posso fazer algo para ajudar? — questionei,


mordendo os lábios.
A culpa era minha, eu era muito teimosa em querer
fazer tudo sozinha e achar que cada detalhe era
importante e Leon era insistente e orgulhoso demais para
confessar que não conseguiria montar a droga do berço.

— Nada, por enquanto — murmurou, ofegante.

Desse jeito, precisaríamos dos próximos três meses


de gestação para terminar os quartos.

Precisava pensar em alguma coisa para tirá-lo da


tarefa, não queria ficar o final de semana inteiro focada
apenas nisso, tinha planos bem... melhores com ele.

Uma ideia surgiu.

— Leon... — chamei em um murmúrio.

Ele parou o que estava fazendo e se virou para mim,


encarando-me por sobre o ombro.

— O que foi? — perguntou, descendo os olhos para a


minha barriga, averiguando se estava tudo certo.

Eu amava quando ele fazia isso, adorava a forma


como se preocupava comigo e com os bebês, em como já
era um pai incrível antes mesmo do nascimento dele. Leon
era prestativo e dedicado, cedia a maior parte do tempo
para mim, principalmente nesse último trimestre de
gestação. Ele não media esforços para me agradar ou
fazer as minhas vontades e deixava isso bem claro a todo
o momento.

Eu o amava, tinha certeza absoluta disso, mas depois


de tanta rejeição, não conseguia exprimir em voz alta. Não
importava, no entanto, eu o amava ainda assim, mesmo
que ele jamais soubesse.

— Quero transar — avisei, fazendo um biquinho com a


boca.

Se eu pedisse algo para comer, ele mandaria que eu


encomendasse. E seria injusto fingir uma dor apenas para
preocupá-lo o suficiente e fazê-lo sair de uma tarefa que
eu mesma o havia colocado. O sexo era a melhor saída,
não poderia fazer sozinha e ele disse que sempre estaria
disponível para mim.

— Agora? — objetou, arqueando as sobrancelhas.

— Sim, agora.

Ele soltou a chave de fenda no chão e se levantou, os


músculos do abdômen retesaram-se com o movimento.

— Então tá bom — concordou, caminhando em minha


direção.

As mãos dele passearam pelo meu corpo, apertando


os meus seios com força e me fazendo gemer. Os lábios
fundiram-se com os meus, brutos e famintos. Arrastei as
unhas pelos ombros largos, desenhando em sua pele.

— Quer ir para o sofá? — murmurou contra os meus


lábios. — Posso te foder de quatro enquanto observo o
mar.

Eu ri, fingindo ponderar. Desci uma mão pelo corpo


dele e apertei o pau duro por cima da calça de moletom.
Ele gemeu.

— Pode ser, desde que eu ainda seja a visão mais


bonita para você. — Pisquei.

Leon segurou a minha cabeça entre as mãos e beijou


a ponta do meu nariz.

— Com toda a certeza, você sempre será a visão mais


linda de todas.

Inclinei-me e beijei seus lábios.

— Então me fode.

Me empurrando para fora do quarto, Leon me arrastou


até o sofá, beijando-me, sem nunca quebrar o nosso
contato físico. Uma mão dele desceu para o meio das
minhas pernas e esfregou a minha boceta por cima da
calcinha.

— Hum... — ciciei, prendendo o lábio dele entre os


meus dentes.
— Se ajoelha no sofá e ergue essa bunda pra mim —
ordenou, me empurrando com delicadeza.

Me ajoelhei no sofá e esperei, senti a mão de Leon na


minha bunda, brincando com o meio das minhas nádegas.
O sofá afundou diante do peso dele, ajoelhando-se detrás
de mim. Leon ergueu o vestido leve que eu usava e
colocou a calcinha para o lado, enfiando um dedo em
minha boceta.

— Como sempre, encharcada — exclamou, estalando


a língua no céu da boca.

Encarei-o por sobre o ombro, admirando os músculos


retesados do abdômen conforme baixava as calças e
liberava o pau duro. Ele o segurou com a mão em punho e
o induziu para a minha entrada.

— Isso sim que é passar um bom final de semana —


comentou e então me penetrou.

Meu corpo deu um solavanco para a frente com sua


investida, agarrei o sofá com força, fechando as mãos em
punhos e arrebitei meus quadris para ele. Leon me fodeu,
entrando e saindo. As mãos agarravam a minha cintura
para me manter no lugar a cada vez que investia fundo e
bruto.

— Eu nunca vou me cansar disso — gemeu.


Ergui a cabeça e olhei através da janela, observando
o encontro do mar com o céu, enquanto era fodida por ele.

Leon levou a mão ao meio das minhas pernas e


massageou o meu clitóris, circulando-o, enquanto entrava
e saía de dentro de mim.

Ofeguei.

Apertei minha boceta de propósito e o ouvi gorgolejar.


Eu sorri, comprimindo um pouco mais. Ele grunhiu.

— Puta merda, Bridget!

Fechei os olhos e deitei a cabeça no sofá, relaxando


meus músculos e apreciando a sensação do orgasmo se
aproximando.

Gozei, tremendo e suando, gritando o nome dele,


enquanto lambuzava o pau com o orgasmo. Leon me
acompanhou, fincando os dedos na minha cintura quando
me invadiu uma última vez e ejaculou, mantendo o pau
fundo em minha boceta.

Algo soou através do torpor em que nos


encontrávamos. Abri meus olhos e pisquei
sucessivamente, tentando me habituar.

O barulho estridente me fez estremecer.

— É a porra do interfone — avisou, grunhindo e


saindo de dentro de mim, levantando-se com raiva.
Me joguei de vez no sofá e respirei fundo.

— Eu só queria relaxar um pouquinho... — murmurei.

Senti as mãos de Leon ao meu redor.

— Vá tomar um banho, seja quem for, não quero que


tenha a visão linda que é você depois de gozar, isso eu
guardo apenas para mim. — Beijou o topo da minha
cabeça.

— Como quiser, doutor Dubrow.

Me desfiz do enlace dele e corri para o quarto,


sorrindo feito uma boba por ser sempre tão mimada pelo
homem mais incrível que eu conhecia.
Caminhei até a sala de estar enxugando os meus
cabelos com a toalha, mas paralisei no caminho quando
avistei uma mulher parada no meio do cômodo.

Ela se virou para mim, fixando os olhos castanhos nos


meus. Com a idade avançada, possuía marcas de
expressão no rosto, mas que não diminuíam a sua beleza
natural. Os cabelos — uma mistura de mechas castanhas e
grisalhas — estavam presos em um coque e ela vestia
roupas elegantes, mas confortáveis. Ela me lembrava
muito Izabela, até mesmo o jeito de se portar.

— Bridget, essa é a minha mãe — apresentou Leon,


parando ao meu lado e pousando a mão na minha lombar.
— Elizabeth, essa é Bridget.

Engoli em seco e ajeitei a minha postura, não estava


vestida adequadamente para conhecer a avó dos meus
filhos.

Droga, eu tinha acabado de ser fodida no sofá!

Olhei para baixo e vi que Leon ainda vestia a mesma


roupa de antes, apenas uma calça de moletom. As marcas
das minhas unhas em seus ombros ainda eram frescas,
estavam vermelhas e inchadas, mas o desgraçado pouco
parecia se importar com isso.

Eu queria morrer.

Abri um sorriso envergonhado para ela e estendi a


minha mão em cumprimento.

— Olá, prazer em conhecê-la — eu disse, trêmula.

Elizabeth focou os olhos em minha barriga


protuberante antes de arrastá-los de volta para os meus e
apertar a minha mão.

— Então é verdade que meu filho será pai e nem


mesmo teve a decência de me informar sobre — crispou,
lançando um olhar afiado para o filho.

Leon encolheu os ombros.


— Estávamos... resolvendo algumas questões —
expressou.

Eu sabia quais questões eram essas, se eu ficaria ou


não com as crianças. Em caso negativo, ele os
apresentaria para a mãe apenas quando nascessem.

— Questões muito importantes, suponho, ao ponto de


esquecer de me comunicar que eu seria avó — retrucou,
soltando a minha mão e dando um passo para trás. — Se
não fosse por Izabela, seria convidada apenas para o
aniversário de um ano?

Eu olhava de um para o outro em completo silêncio,


com os lábios comprimidos, um pouco retraída. Não me
envolveria nessa briga familiar, eu já tinha os meus
próprios problemas familiares para resolver.

Leon bufou.

— Não seja tão dramática, Elizabeth, você saberia


sobre os seus netos, uma hora ou outra. Nunca quis
esconder nada de você, se fosse o caso, exigiria silêncio
absoluto de Izabela.

Ela riu e balançou a cabeça.

— Minha filha não esconde nada de mim, não importa


o que diga para ela. — Elizabeth foi até o sofá e sentou-se
na ponta dele, cruzando as pernas e abrindo um sorriso
incisivo. — Ela confia tanto em mim que, inclusive, contou
sobre o equívoco na minha clínica. A mesma clínica que eu
e Robert demos muito duro para construir e deixar nas
mãos dos nossos filhos irresponsáveis.

A cor se esvaiu do meu rosto e eu engoli com


dificuldade.

Leon parecia relaxado ao meu lado enquanto eu


estava rígida feito um cadáver.

— Deveria se lembrar, minha adorável mãe, que foi a


sua filhinha confiável que cometeu o erro — enunciou,
reagindo ao sorriso dela com outro.

Elizabeth fez um aceno com a mão.

— De alguma forma, vocês entraram em um consenso


sobre as crianças? — indagou, mudando de assunto.

— Estamos juntos — respondeu Leon, apenas.

Evitei olhar para ele, mantendo meu olhar fixo em um


objeto inanimado. Não estávamos, de fato, juntos. A gente
morava na mesma casa, dormia no mesmo quarto,
transava toda hora, mas... isso não queria dizer nada.
Nunca conversamos sobre a nossa situação, nós apenas
vivíamos um dia de cada vez.

Elizabeth bateu palmas.

— Isso é bom! — expressou. — Finalmente tomou


juízo, meu filho, odiava ver como levava uma vida
depravada e sem responsabilidade alguma.

Eu tinha que concordar com ela.

— Apenas levava a vida que eu queria, do jeito que


me agradava — retesou-se Leon, irritado.

— Mas não agrada mais... — murmurou Elizabeth.

Leon olhou para mim e abriu um sorriso amplo e


iluminado, os olhos brilharam de satisfação.

— Estou melhor agora.

Eu me desmancharia em uma poça se ele continuasse


me encarando como se... como se me amasse, como se eu
fosse a pessoa favorita dele no mundo.

Elizabeth se remexeu no sofá, me fazendo quebrar o


contato visual com Leon. Ela retirou um pequeno embrulho
de dentro da bolsa e o entregou para mim.

— Um presente para você — disse.

— Hum... — ciciei, mordendo os lábios e pegando o


embrulho. — Obrigada.

Envergonhada, desfiz o nó com os dedos trêmulos e


retirei o objeto de dentro. Era uma pulseira simples feita
de miçangas que formavam um grafismo abstrato. Embora
fosse simples, era muito linda e possuía uma delicadeza
sutil e única.
— É linda, obrigada — agradeci, passando o polegar
pelas miçangas.

Elizabeth sorriu.

— É uma pulseira indígena Kayapó [ 1 0 ] , comprei de uma


tribo indígena em uma das minhas viagens para o Brasil,
ela serve para proteger uma gravidez — explicou. — Não
sei quais são as suas crenças, mas achei que gostaria de
algo simbólico, eu, por exemplo, amo.

Lágrimas brilharam por detrás dos meus olhos.

— Eu adorei, vou usá-la sempre — afirmei.

Elizabeth tinha feito por mim algo que a minha mãe


não tinha sido capaz de fazer. Depois de ouvir os relatos
dela sobre as irmãs natimortas do meu pai, fiquei muito
preocupada com a minha gestação, com medo de perder
os meus bebês no parto. Tentava não ficar traumatizada
como o meu pai era, mas, como mãe, não podia evitar.
Elizabeth não sabia, mas a pulseira era sim muito
importante, eu a usaria sempre, ao menos seria mais uma
forma de me sentir segura.

Coloquei a pulseira no meu pulso e esfreguei a minha


barriga, controlando o medo que ameaçava se instalar em
mim.

— Está tudo bem com a sua gestação? — perguntou


ela, semicerrando os olhos.
Confirmei com um aceno.

— Está tudo ótimo, eu só... — suspirei — fico


preocupada por serem gêmeos, tenho medo de que alguma
coisa possa acontecer durante o parto. — Balancei a
cabeça, esquivando-me de pensar demais.

Elizabeth riu.

— Ah, querida, isso é bem comum em mamães de


primeira viagem, estranho seria se você não estivesse com
medo. — Ela olhou para Leon antes de continuar. — Eu
tive meu filho quando já era velha demais para tentar
conceber naturalmente e durante a minha gestação, tinha
medo até da minha sombra. Morria de pânico que algo
pudesse acontecer a ele. Sofri antecipadamente por muito
tempo por causa do parto. Mas no final, Leon nasceu
saudável e forte. E eu ainda consegui engravidar de
Izabela de forma natural anos depois. — Ela me olhou com
afinco. — Somos mulheres, nosso corpo é um templo
divino, estamos aptas a conceber, e somos fortes,
guerreiras por natureza. Você nasceu preparada para o
parto, não se doa por isso, é um momento único e muito
especial. E nada acontecerá com você, estará nas mãos
dos melhores médicos do país.

Funguei, limpando os cantos dos olhos com o


indicador.

— Obrigada, Elizabeth, mais uma vez.


Leon me puxou para ele e esfregou a palma em
minhas costas. Ele sabia como estava sendo difícil para
mim o último trimestre da gestação e como eu tentava
superar os meus medos e falhava algumas vezes. E
quando isso acontecia, ali estava ele, sempre disponível
para mim.

— Quando será a sua próxima viagem? — perguntou


Leon.

Ele me disse uma vez que Elizabeth passava grande


parte do tempo viajando. Ela era fissurada por
conhecimento, amava viajar, estava sempre em constante
movimento. Conhecendo um novo povo, aprendendo os
seus costumes, se acomodando a eles. E então, quando
adquiria tudo o que queria, ela simplesmente ia embora,
mudando de país e aprendendo tudo de novo.

A mulher se dedicou uma vida inteira para a clínica,


depois para os filhos, e quando o marido morreu, viu que
estava na hora de aproveitar a vida e viver o máximo que
podia com o resto dos anos que ainda tinha.

— Não tão cedo, suponho, quero estar presente


durante o restante da gestação, assim como no
nascimento dos meus netos. — Fez um aceno com as
mãos. — Não sei se você tem mãe, Bridget, mas saiba que
estarei aqui para apoiá-la com o que precisar e para sanar
suas dúvidas.
— Obrigado, Elizabeth, isso é muito importante para
nós — respondeu Leon.

Não falei nada, não verbalizei o fato de que eu tinha


sim uma mãe, mas não tinha a certeza se poderia contar
com ela ou não. Então achei melhor ficar calada.

A campainha tocou e Leon se afastou para ir atender,


sabendo que encontraria Ben no rol de entrada — que era
o único que possuía livre arbítrio para subir sem ser
anunciado. Ouvi um burburinho de vozes antes dele surgir
de volta no corredor, seguido por Izabela e Ben.

— Dá próxima vez coloca uma camiseta antes de ir


atender a porta, caralho — grunhiu o médico, baixinho,
mas alto o suficiente para que eu conseguisse ouvir.

Meu rosto queimava de vergonha, mas me mantive


firme e em silêncio, fingindo desentendimento na maior
cara dura.

— Pensei que estivesse sozinho — retrucou Leon.

— Oh, agora a família está completa. — Sorriu


Elizabeth, levantando-se para abraçar a filha.

Ben me cumprimentou com respeito, enquanto Izabela


me agarrou em um abraço, descendo a mão para tocar em
minha barriga e sorrir toda contente.
— Eu trouxe algumas coisas para os bebês, falei para
Leon que faria umas comprinhas quando ele me disse que
eram gêmeos... enfim, demorei, mas comprei — avisou, me
puxando para o sofá e me mostrando inúmeras sacolas de
lojas de bebês.

Izabela tinha um gosto divino, eu amei tudo o que ela


tinha comprado. E, além do mais, demonstrava sentir um
carinho enorme pelos sobrinhos sem nem ao menos
conhecê-los ainda.

Fiquei por muito tempo conversando com Izabela e


Elizabeth no sofá, apresentei a elas o quartinho dos bebês
e algumas das coisas que já havíamos comprado.
Enquanto nos mantínhamos entretidas com as coisinhas,
Leon e Ben bebiam whisky na sacada.

Quando a tarde se foi e deu lugar para a noite. Leon


encomendou comida de um restaurante italiano para o
jantar. A mesa cheia e farta me deixou satisfeita e feliz.

Em casa eu não tinha nada disso, sempre fazia as


refeições em silêncio, e, para falar a verdade, rezava por
ele porque quando alguma coisa era dita, normalmente
eram palavras desprezíveis do meu pai direcionadas a
mim.

Mas não com Leon ou com a família dele.

Eu me sentia respeitada e adorada. As conversas


eram leves e triviais, todas com o intuito de nos fazer rir e
tornar a noite ainda melhor. Era um ambiente tão
agradável que eu poderia me acostumar facilmente com
ele.

Leon estava sentado na ponta da mesa e eu à sua


direita. Ele olhou para mim e segurou a minha mão,
entrelaçando os nossos dedos, ignorando o fato de que
havia companhia conosco.

Quando o jantar acabou, eles foram embora para nos


dar privacidade, mas prometeram que faríamos isso mais
vezes, pois agora tínhamos um motivo em dose dupla para
unir a família.

Leon fechou a porta, despedindo-se deles e caminhou


até mim, parando à minha frente.

— Espero que minha mãe e Izabela não tenham lhe


enchido a paciência.

Neguei.

— Elas foram incríveis, Leon, foi o melhor jantar em


família que eu tive em anos — confessei, esfregando
minha barriga. — Para ser bem sincera, o último que eu
me lembro estar tão feliz como o de hoje, eu tinha apenas
oito anos, quando minha avó e Brandon ainda eram vivos.

Ele se inclinou e beijou a minha testa.


— Que bom que gostou, porque vai ter que se
acostumar. — A mão dele pousou ao lado da minha
barriga. — Porque quando esses bebês nascerem, elas
não vão sair da nossa casa.

Eu sorri.

— Espero mesmo que não, gosto da energia delas e


tenho certeza de que precisarei de ajuda.

Um dos bebês se mexeu em minha barriga, arregalei


os olhos e coloquei a mão de Leon em cima do local. O
bebê chutou de novo e ele suspirou, sorrindo feito um
bobo.

— Eles estão animados hoje — murmurou.

— Eles gostam de ter a família por perto. — Pisquei.

— Então, como vamos chamá-los? Não dá pra ficar


pelo resto da vida denominando-os como bebês, eles
precisam de um reconhecimento.

— Tem alguma ideia em mente? — perguntei.

Ele mordeu as bochechas.

— Na verdade, eu tenho sim.

— Me fale — pedi.
— Eu pensei em Bonnie, acho um lindo nome para
uma menina — disse. — Bonnie Dubrow. — O nome da
filha deslizou pelos lábios dele com um orgulho genuíno.
— E você, gostou? Pensou em algum?

O bebê se mexeu outra vez e eu prendi a respiração,


algum deles estava pressionando as minhas costelas, a
sensação não era agradável.

— Eu amei, achei o nome dela lindo e combina muito


com o sobrenome — arfei. — E fico feliz que tenha
escolhido o da menina, porque eu só pensei no do menino.

— Me diga em qual pensou.

— Noah, significa consolação, e embora pareça


egoísta, eles são uma espécie de consolo para mim, a
chegada deles está consolando um coração muito
machucado — confessei em um sussurro. — Noah Dubrow.

Leon riu.

— Bonnie e Noah Dubrow. — Ele beijou os meus


lábios. — Os nomes são lindos e combinam perfeitamente.
— Ajoelhando-se na minha frente, beijou a minha barriga e
sussurrou contra a pele. — Meus filhos, Bonnie e Noah,
não vejo a hora de conhecer vocês.

Recebi outro chute que me fez ofegar.

Eu sorri e Leon correspondeu.


Fechei os meus olhos, emocionada com o momento,
querendo eternizá-lo em minha memória.
Semanas depois

Eu explodiria a qualquer momento e nem era


brincadeira. Minha barriga estava gigante, a pele
totalmente esticada para que Bonnie e Noah pudessem
crescer dentro do corpo.

Saudáveis e muito agitados, eles poderiam nascer a


qualquer momento.

Diferindo com todos os meus medos, Bonnie e Noah


pareciam estar confortáveis dentro do útero. Eu deveria
tentar mantê-los por, pelo menos, 37 semanas, mas já
estava na semana 38 e nada deles mostrarem interesse
em nascer, o que significava que talvez eu tivesse sorte de
mantê-los pelas 40 semanas.

Eu poderia culpar a pulseira que Elizabeth me deu por


este feito, já que não a tirava de forma alguma do meu
pulso, nem mesmo para tomar banho. Ou talvez fosse
apenas o clima leve e a vida feliz que eu estava levando.

Meu pai não tinha me procurado e nem eu estava


esperando, sabia que ele não faria isso. Mas conversava
semanalmente com minha mãe no celular, embora a visse
muito pouco, raramente, para ser mais exata. Ela ainda
estava trabalhando para aceitar que eu não voltaria para
casa e que não me submeteria mais a Mark, mesmo que
fosse o meu pai.

Percebi nesse meio tempo que minha mãe era boa e


amorosa comigo, até mesmo me apoiava quando eu
aceitava viver em casa e me submeter a tudo, apenas para
preservar a fachada de família feliz. Quando me rebelei,
não servia mais tão bem como filha.

Também não fazia questão de pensar muito, queria ter


uma gravidez calma e Leon e a família dele contribuíam
para isso, então apenas me apegava a eles e aos mínimos
detalhes que faziam para me agradar e eram muito
importantes para mim.

De resto, Liam fingia que eu não existia, nem me


cumprimentava quando passava por mim no corredor. Ele
estava bem chateado comigo e morrendo de medo das
ameaças de Leon.

Eu não conseguia mais usar o uniforme de residente


da clínica, minha barriga não cabia mais na maioria das
minhas roupas, me fazendo usar vestidos quase todos os
dias, apenas eles eram confortáveis o suficiente para mim.
Também me ajudavam na hora de ir ao banheiro, já que
mal conseguia me mexer.

Helena estava me ajudando a deixar tudo organizado


para trancar a residência. Não poderia continuar
trabalhando depois que os bebês nascessem, ficaria, no
mínimo, seis meses distante das minhas tarefas, mas
voltaria assim que possível. Queria concluir esta etapa da
minha vida de uma vez para que pudesse dar o passo
seguinte.

Perambulei pelo corredor concentrada nos papeis da


residência que eu segurava em minhas mãos. Precisava da
assinatura de Leon, já que ele era meu médico
responsável.

Uma porta foi aberta ao meu lado e uma mão me


agarrou, puxando-me para dentro da sala. Abri a boca para
gritar, mas me acalmei quando reconheci o cheiro de Leon.

A sala estava parcialmente escura e estava cheia de


arquivos e papéis.
  — O que você estava fazendo aqui? — perguntei,
estreitando o meu olhar para ele e cruzando os braços.

Ele beijou a minha boca e desceu os beijos pelo meu


maxilar.

— Vim ver a ficha de uma das pacientes — respondeu.

Não era culpa minha se ele fodia em todo o canto da


clínica antes de me conhecer e eu não conseguia controlar
o ciúmes que eu sentia dele, mesmo que tentasse.

— Hum... — murmurei.

Ele riu contra a minha pele.

— Está com ciúmes, Bridget, é isso mesmo? — Ele se


afastou para me encarar. — Pode procurar, não vai
encontrar ninguém aqui além de mim. Estava averiguando
a ficha da paciente quando a vi passar pelo vidro da porta.

— Não, obrigada — retruquei.

— Eu só quero foder uma única boceta, amor, a


mesma que fiquei viciado desde a primeira vez e quero
continuar para o resto da minha vida.

Meu coração sempre batia descompensado quando ele


me falava essas coisas.

— É mesmo? — zombei, esfregando os dedos no cós


do jaleco dele. — E de quem seria?
Os olhos dele brilharam em desafio. Puxando-me,
Leon me levou até o outro lado da estante e me sentou em
cima de uma mesa de madeira vazia.

— Eu vou chupar a boceta que sou viciado agora,


estou sedento por ela — grunhiu, ajoelhando-se na minha
frente.

Arqueei as sobrancelhas.

— Mas você já fez isso esta manhã.

— Sim, mas como eu disse, sou viciado e preciso


suprir minhas necessidade.

Ele levantou o meu vestido e puxou a minha calcinha


para o lado, então puxou as minhas pernas, deixando a
minha bunda na beira da mesa de madeira.

— Não grite alto, alguém pode ouvir você do corredor


— avisou.

Abri a boca para responder, mas me calei, engolindo


as palavras quando senti a cabeça dele no meio das
minhas pernas e a língua passear pelo meu clitóris.
Agarrei os cabelos dele com força e fechei os olhos.

— Hum... que gostoso, Leon... — murmurei, mordendo


os lábios.

Endurecendo a língua, ele começou a pressionar a


ponta em meu clitóris, mexendo para cima e para baixo
com movimentos rápidos.

Se tinha algo que Leon sabia fazer bem na vida, era


chupar uma mulher. O homem tinha um talento nato para
isso, às vezes conseguia me fazer gozar sem nem precisar
usar os dedos, apenas com os movimentos da boca e
língua.

Escorei minha cabeça contra estante e abri um pouco


mais as pernas, aproveitando a sensação boa que ele me
proporcionava.

— Coloca um dedo em mim — pedi.

A porta foi aberta e eu arrumei a minha coluna,


arregalando os olhos. Através do espaço entre as caixas
da prateleira, podia ver quem é que tinha entrado.
Observei as costas de Izabela, ela beijava alguém
fervorosamente, agarrando os cabelos do homem e
soltando gemidos baixos.

Leon estava concentrado demais fodendo o meu


clitóris para perceber o que acontecia.

Eles se viraram, o homem colocou Izabela em cima da


outra mesa e...

Puta merda!

Era Ben.
Izabela estava fodendo com o melhor amigo do irmão
dela.

Meu Deus, o que eu faria?

Ben agarrou o seio de Izabela por cima do tecido e ela


soltou um gemido alto. Senti o exato instante em que Leon
notou que tínhamos companhia, a língua dele cessou os
movimentos em meu clitóris e ele fez menção de se
levantar.

Eu precisava impedi-lo.

Pressionei minhas coxas aos lados da cabeça dele e


empurrei-o de volta pelos cabelos. Ele ergueu o olhar para
mim, franzindo a testa.

— Eu estava quase... — menti.

Como um bom amante, ele voltou a me chupar, dando


o melhor de si diante da minha declaração. Leon sugou o
meu clitóris, beijando-o e chupando com vontade e prazer.

Olhei de volta pelo vão das prateleiras e notei que a


camisa de Ben estava entreaberta. Izabela esfregava as
unhas no peitoral dele e a mão do homem estava em um
local bem inapropriado... na mesma direção em que Leon
estava enfiado.

— Ohhhh... eu vou gozar só com os seus dedos em


mim — grunhiu Izabela.
Leon parou outra vez, rígido.

Eu continuei pressionando minhas pernas aos lados


da cabeça dele.

— Porra... isso... mais fundo... hum... acrescenta


outro... — sibilou Izabela.

Ah, meu Deus!

Seria um desastre.

Leon tentou se levantar. Eu tentei impedi-lo, mas ele


era bem mais forte que eu e conseguiu se desfazer do meu
aperto. Lançando-me um olhar questionador, fiz um sinal
para que ficasse em silêncio.

— É só um casal fazendo o mesmo que nós — menti,


sussurrando.

— A clínica não serve pra isso — revidou.

Arqueei uma sobrancelha.

— Sério? E o que significa isso daqui? — Fiz um sinal


para as minhas pernas abertas e a minha boceta exposta.

Ele encolheu os ombros.

— Eu sou o dono, posso fazer o que eu quiser.

— Ahhhhh... que delícia... mais forte... — gritou


Izabela.
Notei o exato momento em que Leon reconheceu a voz
da irmã, a expressão dele se alterou, tornando-se severa.
Ele se inclinou para espiar pelo mesmo vão que eu olhava.
Tentei empurrá-lo, mas ele se desfez do meu aperto.

Um.

Dois.

Três segundos se passaram antes que ele reagisse ao


que tinha visto.

Leon empurrou a porra da prateleira inteira, tentando


derrubá-la. Ela não caiu, mas várias caixas se
desmontaram e encontraram o chão, papeis crisparam no
ar, sobrevoando nossas cabeças.

Izabela gritou e Ben a puxou para trás, removendo-a


de cima da mesa. Leon saiu detrás da prateleira e fuzilou o
melhor amigo com as mãos fechadas em punho ao lado do
corpo. Pulei para o chão, arrumando o vestido de qualquer
jeito e o segui.

— Ficou maluco, caralho? — gritou Ben, segurando


Izabela, protegendo-a da fúria do irmão.

A garota estava com os cabelos bagunçados e o botão


da calça aberto, deixando a situação ainda mais
constrangedora.
Se eles estavam tendo um caso amoroso, não era
muito inteligente da parte deles fazer isso dentro da clínica
onde qualquer um poderia ver e comentar, ou, em casos
piores como o que estava ocorrendo, o próprio Leon
descobrir.

— Está fodendo a minha irmã, porra?

Eu e Izabela nos entreolhamos de olhos arregalados,


ela estava com os lábios comprimidos e sem coloração
alguma no rosto.

— Eu posso explicar... — comentou Ben.

— Então comece antes que eu quebre a sua cara —


refutou Leon, sibilando, o ódio escorrendo por cada poro
dele.

— Nós estamos... juntos.

Leon afastou as pernas e colocou as mãos na cintura.

— Deixa de ser um cínico de merda, Ben! Me disse


que queria se casar e construir uma família e agora está
por aí fodendo a minha irmã, porra! A minha irmã era
terreno proibido e você sabia disso.

Ben suspirou.

— Faz algum tempo que estou saindo com Izabela,


Leon, não é apenas uma foda, estamos juntos há alguns
meses.
Leon cerrou a mandíbula, veias saltaram aos lados do
pescoço dele, os olhos dele voaram para Izabela.

— Você me disse meses atrás que já tinha o pote de


esperma selecionado para a sua inseminação — acusou.
— Agora estão me dizendo que estão fodendo há meses e
não me falaram nada? — Ele agarrou os cabelos,
esfregando-os. — Vocês se conhecem desde sempre,
caralho!

— O esperma, no caso, era de Ben — Izabela


encolheu os ombros.

Leon fez menção de avançar no amigo, mas uma das


caixas o impediu de atravessar o local.

— Se acalme, Leon, nós evitamos falar para você


porque sua vida virou de cabeça para baixo e não
queríamos adicionar mais isso, sabíamos que ficaria
chateado e que não entenderia — protestou Ben.

— E como dois desgraçados, resolveram me enganar?

— Ninguém enganou você, nós só omitimos isso por


um tempo.

— E quando se cansar da minha irmã, vai fazer o quê?

Ben grunhiu, parecendo não gostar do tom que o


melhor amigo havia falado com ele.
— Eu quero me casar com Izabela, falei disso com
você há meses, falei que queria construir uma família, que
estava pronto para isso, como ousa me desonrar dessa
maneira? Eu sou seu melhor amigo, acha mesmo que faria
isso com a sua irmã?

Leon ficou em silêncio, o peito subia e descia em


rápidas sucessões.

— Eu o amo, quero ficar com ele, quero ter meus


filhos com ele... — murmurou Izabela. — Amo desde que
era só uma garota, me apaixonei por Ben quando tinha
quatorze anos. Ele nunca retribuiu os meus sentimentos,
até meses atrás.

Entendia o lado de Leon em querer proteger os


sentimentos da irmã, mas eu conseguia ver verdade no
que falavam. Ben parecia se importar mesmo com a
garota, enquanto ela parecia feliz estando nos braços dele.

Abri a boca para falar alguma coisa quando senti uma


pontada na minha barriga. Olhei para baixo e uma poça de
água se criava aos meus pés, respingando em minhas
pernas.

— Ah. Meu. Deus — resfoleguei.

Leon se virou para mim, vincando a testa.

— O que foi, Bridget?


Apontei com o queixo para baixo, imóvel, o pânico
estava me impedindo de me mexer.

— A bolsa estourou.

Leon enxergou a água aos meus pés e então ficou tão


branco que eu pensei que desmaiaria. E foi a primeira vez
que eu entendi porque médicos não podiam se envolver
emocionalmente em casos cirúrgicos. Embora ele já
tivesse feito milhares de partos e tivesse participado de
inúmeros procedimentos, me encarava com o mesmo
pânico que eu estava sentindo, como se fosse leigo e não
soubesse o que fazer.

— Caralho! — ele disse, apenas, tão imóvel quanto eu


estava.
Era irônico que eu fosse um dos homens mais
requisitados por gestantes porque tinha renome nesse
ramo, mas não conseguia nem me mexer direito quando
era a minha mulher deitada na maca prestes a ter os
nossos filhos.

Em pânico seria um eufemismo para dizer como eu me


sentia.

Eu sabia como era feita a incisão do parto, quantos


centímetros de corte e quantas camadas de pele deveriam
ser cortadas, até mesmo qual a força empunhada para que
não afetasse os bebês durante o procedimento. Também
sabia o que deveria ser feito após, mas... simplesmente
não conseguia fazer nada, apenas encarar Bridget com os
olhos arregalados e o estômago embrulhado.

— Tudo certo aí, Bridget? — perguntou Ben, sorrindo


para ela.

— Sim, só um pouco nervosa — confessou.

— Não se preocupe, é bem normal.

Ela estava pronta para parir e logo Ben faria a incisão


e daria início ao parto. O anestesista já tinha feito o
trabalho, o essencial havia sido feito enquanto eu me
mantinha como uma maldita estátua.

— Quer uma cadeira, Leon? — perguntou Ben,


zombando.

Fechei os olhos e respirei fundo, acalmando-me,


controlando o nervosismo que eu sentia. Precisava assistir
a cirurgia, Ben poderia fazer alguma coisa errada ou...
droga, ele era bom no que fazia, não teria pedido a ele se
não confiasse em seu trabalho, mas, ainda assim,
precisava reagir.

— Eu vou assistir — falei.

Caminhei até Bridget e plantei um beijo na testa dela,


antes de fazer a volta e parar ao lado de Ben. Meu melhor
amigo olhou para mim e franziu os olhos em um sorriso por
baixo da máscara que eu não conseguia ver.
— Vamos começar, vamos trazer seus filhos ao
mundo.

Com dedos ágeis e precisos, Ben levou o bisturi até o


abdômen de Bridget e fez a incisão. Um corte médio e
alinhado acima da virilha, ele era cuidadoso, tentando
fazer o melhor possível para deixá-la com uma cicatriz
agradável.

Engoli em seco.

Sangue escorreu do corte feito. Satisfeito, Ben largou


o bisturi ensanguentado em cima da mesa e me lançou um
olhar.

— Quer fazer as honras? — perguntou.

Olhei para o monitor, observando a frequência


cardíaca de Bridget e a sua oxigenação. Estava tudo certo,
ela parecia incrivelmente bem.

— Sim, eu quero.

Ben deu um passo para o lado, liberando a minha


passagem. Me aproximei do corte ensanguentado e
coloquei as minhas mãos protegidas pelas luvas de látex
dentro do abdômen dela. senti uma cabeça e a puxei para
fora, retirando o primeiro bebê.

Um choro áspero e agudo preencheu a sala.

Nada havia me preparado para o momento.


Nenhum dos inúmeros partos que eu fiz pareceu ser
tão... arrebatador quanto eu mesmo retirar meu filho do
útero da minha mulher.

Meu coração parecia prestes a explodir em meu peito


e eu senti lágrimas transbordarem em meus olhos.

O bebê ensanguentado se remexeu em minhas mãos,


piscando e fungando. Olhei para ele. Ele era minúsculo,
mas gritava alto e forte. Havia uma penugem de cabelos
claros em sua cabeça, o tom iguaizinhos aos meus.

  — Noah — murmurei, a voz embargada, cheia de


emoção.

Plantei um beijo na cabeça dele antes de entregá-lo


aos braços de Ben para os procedimentos.

— Parabéns, irmão! — gracejou Ben.

Me aproximei outra vez do corte e coloquei as minhas


mãos dentro do abdômen de Bridget. Encontrei a segunda
cabeça, tranquei a respiração e puxei Bonnie para fora.

Assim como o irmão, ela gritou e se remexeu em meus


braços.

Aproximei-a do meu peito e encarei o pequeno bebê


que gritava, estressada e muito irritada por ter sido
removida do lugar tão aconchegante que era o útero da
mãe.
–Bem-vinda ao mundo, minha filha! — Beijei a cabeça
dela também.

Eu não tinha nojo do sangue que cobria os corpinhos


ou do vérnix. Eles eram meus, pertenciam a mim, tinham
uma parte minha.

— Essa daí parece impaciente... — comentou Ben,


estendendo a mão para pegar Bonnie. — Assim como o
pai. — Piscou.

Eu ri.

— Ela já nasceu mostrando do que é capaz.

De fato, Noah era bem mais calminho que Bonnie, ele


chorava, mas não era um choro irritado e sim
desconfortável, o bebê que deixou o útero, mas não
queria. Já Bonnie parecia furiosa, como se não aceitasse a
situação.

Ben terminou os procedimentos neles e me entregou


os dois, segurei um em cada braço com muito cuidado e
delicadeza. Não tinha o costume de pegar os bebês,
apenas quando fazia o parto deles, mas logo entregava
para as mães ou enfermeiras.

Não nesse caso.

Eu queria eles, queria muito ficar perto, velar o sono,


controlar a respiração, garantir de que ficariam bem, de
que estavam bem.

Fiz a volta na maca e olhei para Bridget, ela chorava,


os lábios tremiam e havia tanta emoção em seu rosto que
parecia brilhar, ofuscando as lâmpadas incandescentes.

— Conheça os nossos filhos — eu disse, colocando


um de cada lado dela. Um soluço profundo dividiu os
lábios de Bridget e mais lágrimas escorreram pelos olhos.
— Essa é a mamãe e nós ficaremos juntos para sempre —
sussurrei.

— Eles são saudáveis? Eles estão bem? — perguntou.

Me inclinei e beijei a testa dela, sorrindo.

— Eles são incríveis, Bridget, tão incríveis quanto


você.

Noah e Bonnie estavam quietos e de olhos bem


abertos, sentindo o calor da mãe, reconhecendo a voz
dela. Eles estavam calmos apenas por estarem ao lado
dela.

— Começarei a saturar, logo vocês poderão ir para o


quarto — avisou Ben, depositando as placentas em cima
da mesa de alumínio ao lado.

Os olhos de Bridget se fecharam, ela estava sonolenta


pelo efeito da anestesia, mas o sorriso fraco não deixava
os seus lábios.
Eu me sentia tão feliz e completo, como se o espaço
que faltava dentro de mim tivesse acabado de ser
preenchido.

E era isso que tinha acontecido.

Mas eu ainda queria mais.

Eu era pai, mas só me contentaria quando me


tornasse também um marido.

Entrei no quarto em que Bridget estava se


recuperando da cesárea. Recolhi os buquês de flores ao
lado da porta e os coloquei no outro canto, o mais longe
possível dela e dos bebês. Odiava que enchiam o pequeno
ambiente com plantas, poderia fazer mal a algum dos
recém-nascidos.

Minha mãe e minha irmã não queriam ir embora,


saíam por algumas horas e retornavam em seguida,
ansiosas para ficar mais tempo com Noah e Bonnie.

Izabela estava eufórica com os sobrinhos, ela amava


crianças e não conseguia se controlar de tanta felicidade.
Elizabeth estava radiante com a ideia de ser avó, não
conseguia controlar o sorriso e tirava foto deles em cada
posição em que ficavam e achava todas lindas e perfeitas,
mesmo que fossem iguais.
Bridget estava sentada na cama amamentando um
pequeno embrulho rosa, enquanto Noah dormia no berço
ao lado. Ela passava um dedo pela penugem acima da
cabeça da filha.

Eu via como a minha família fazia bem para Bridget e


jamais seria capaz de agradecê-los o suficiente por isso.
Minha mãe e minha irmã foram cruciais nos últimos meses
de gestação, deixando Bridget confortável e relaxada o
suficiente para se preocupar pouco com o parto.

— Eles são parecidos com você — murmurou ela,


desenhando as feições perfeitas da criança. — Até mesmo
a cor dos cabelos.

Me sentei na borda da cama e beijei a cabecinha de


Bonnie, inspirando o cheirinho bom de bebê. Ela vestia um
macacão rosa, os olhos estavam fechados e a boca cobria
o bico do peito de Bridget, enquanto as bochechas faziam
a sucção para chupar o leite.

— E isso te incomoda? — perguntei.

Bridget riu e balançou a cabeça.

— Nenhum pouco, você é gato pra caramba, então...


— brincou.

Segurei o maxilar dela com a ponta dos dedos e a


puxei para mim, beijando os lábios carnudos.
— Eu amo você, Bridget — confessei. Ela arfou e
arregalou os olhos. — Não sei em qual momento isso
aconteceu, estaria mentindo se dissesse que sim, porque
foi tudo tão natural entre nós dois, mesmo que tenha
começado por um erro. — Olhei para a nossa filha e então
para Noah, antes de arrastar meus olhos de volta para ela.
— Um erro que, no fim, foi o maior acerto das nossas
vidas.

— Leon... — rogou meu nome em um arquejo.

— Não importa o que você fale, nada vai mudar o que


eu sinto, mesmo que não seja recíproco — avisei,
levantando um dedo, interrompendo-a. — Você é uma
mulher incrível, Bridget, nunca esqueça disso e jamais
deixe que digam o contrário.   — Soltei uma risada sem
humor. — Entrou na minha vida de um jeito torto, mudando
tudo o que eu pensava e sentia. Com uma única dose sua,
nunca mais fui o mesmo.

Embora tivéssemos sido colocados nessa situação, o


que nós dois tivemos foi tão natural que eu nem mesmo
consegui perceber em qual momento estava apaixonado,
não conseguia lembrar quando que isso aconteceu porque
era como se tivesse existido desde o primeiro momento em
que eu a vi. Ela estava sentada no corredor com outras
pacientes e me encarava com tantos sentimentos que
conseguiu foder com o meu cérebro. E isso aconteceu
segundos antes de ter sido chamada por Izabela e ser
inseminada com o meu esperma, sem nem mesmo me
conhecer.

— Acho que nós dois era para acontecer e que o


destino apenas deu um empurrãozinho para ajudar —
expressei, pegando a mão dela e acariciando o dorso com
carinho. — Não sei se teria sido diferente se não tivesse
sido justamente você, Bridget, eu estava convicto de que
estava certo em minhas suposições. Não queria filhos,
apenas herdeiros, mas então você me mostrou que eu era
um idiota de merda, me mostrou que o meu medo era
muito imbecil, assim como me mostrou a mulher forte que
é, e que mesmo carregando traumas de um passado ruim,
decidiu seguir em frente e confiou no que acreditava, no
que achava ser certo. E por causa dessa resiliência, hoje
estamos aqui com os nossos filhos, felizes, completos e
realizados.

Ela removeu a mão da minha e a levou até o rosto,


limpando as lágrimas que transbordavam pelas bochechas.

— Eu te amo, Leon, também não sei bem quando


aconteceu, mas me apaixonei. Me vi querendo ficar mais
com você, querendo criar os nossos filhos ao seu lado, ser
sua companheira e a mulher que gostaria de encontrar ao
retornar para casa depois de um dia cansativo de trabalho,
porque eu também queria que fosse você quem eu
encontraria após um plantão. Mas eu tive medo de
confessar, medo de que não retribuísse o que eu sentia,
medo de ser rejeitada.

Algumas cicatrizes são profundas demais para serem


consertadas.

Por causa do pai, Bridget sempre viveria temendo a


rejeição, mas eu estaria com ela para mostrar que isso
nunca mais aconteceria, que eu a amaria até o fim da
minha vida.

— Nunca tenha medo de expressar o que sente,


Bridget, sempre fale comigo. Serei seu pelo resto das
nossas vidas, serei o que você precisar. Um amante, um
amigo, um marido ou somente o pai dos seus filhos. Não
importa. Apenas, fale comigo. — Beijei os lábios dela. —
Vocês são o meu coração fora do peito.

— E você é o nosso... — sussurrou.

Acenei e colei nossas testas uma na outra, ouvindo a


respiração fraca dela e os ruídos que Bonnie fazia
enquanto mamava no peito da mãe. Eu estava em paz, no
paraíso, e não queria sair do momento. Se pudesse, criaria
uma bolha para nos preservar no tempo, mantendo-nos
juntos e inseparáveis.

Sempre e para sempre.

De um erro do destino ao maior acerto da minha vida.


Olhei para Ben do corredor, as mãos descansavam
nos bolsos e eu não sabia bem o que dizer para ele.

Bridget estava arrumando as crianças dentro do


apartamento, depois que meu melhor amigo nos trouxe
para casa, ajudando a carregar todas as malas.

— Então, vai ficar tudo bem entre nós? — perguntou.

Suspirei e encarei o homem que esteve presente


comigo em todos os momentos da minha vida, tanto nos
importantes quanto nos mais tristes. O homem que não
saiu do meu lado, mesmo quando não apoiava as minhas
decisões.

— Ama Izabela de verdade? Ou é só mais um dos


casinhos amorosos? — perguntei, erguendo um dedo para
interrompê-lo. — Espera! Eu quero a verdade, Ben, e nada
além dela. Você já se envolveu com outras mulheres
algumas vezes e também se dizia apaixonado, mas
nenhuma dessas relações teve um futuro. E se o que
Izabela diz é verdade, que ela é apaixonada por você há
anos, preciso saber se o coração dela estará intacto.

Eu confiava cegamente em Ben e odiava ter sido


colocado nessa situação. O medo de perder meu melhor
amigo ou a minha irmã, de ter que escolher entre um dos
dois em algum futuro me causava arrepios.

Ele deu um passo, aproximando-se, e pousou a mão


em meu ombro. Os olhos castanhos se fixaram nos meus,
sem piscar, sérios e expressivos.

— Eu amo Izabela, estou planejando me casar com


ela em breve e quero ser o pai dos filhos que ela tanto
deseja — afirmou, convicto, não deixando brecha para
desconfianças.

Sorri e o puxei para um abraço.

— Sendo assim, só espero que sejam felizes e que me


deem muitos sobrinhos — murmurei contra o ombro dele.

O peito dele sacolejou em uma risada.

— Se depender da sua irmã, os sobrinhos vão chegar


o quanto antes.

Me afastei e semicerrei os olhos.

— E como você se sente em relação a isso?

Ele deu de ombros.

— Ansioso, nervoso e... eufórico — revelou.

Um grito agudo soou do outro lado da porta.


— É a melhor sensação do mundo, o maior amor que
vai sentir e... o melhor presente que poderia esperar.

Apertando o botão do elevador, ele sorriu.

— Eu sei — Fez um aceno com o queixo. — Apenas


vá cuidar dos seus filhos, sua mulher precisa de você.

Despedindo-me com um sinal de mãos, corri para


dentro de casa a procura de Bridget. Encontrei ela no
quarto, tentando se virar bem com os dois bebês. Noah
chorava no trocador de fraldas, enquanto Bridget embalava
Bonnie mamando em seu peito de um lado para o outro.

— Precisa de ajuda? — perguntei.

— Sim, troque a fralda de Noah, ele não gosta de ficar


sujo.

Arregalei os olhos e comprimi os lábios.

— Hum... podemos chamar uma enfermeira ou até


mesmo a minha mãe... — considerei, parando na frente do
trocador e encarando o bebê minúsculo, sensível e
inquieto.

Bridget revirou os olhos.

— Não temos tempo para isso, apenas troque a fralda


dele, Leon.

Engoli em seco.
— E se eu quebrar as pernas dele? — sibilei.

— Deus, você é médico, tem a precisão dos dedos de


um, então pare de surtar e troque a fralda do bebê, é uma
tarefa fácil, rápida e simples.

Puxei a perna dele para cima, Noah abriu mais a boca


e soltou um berro que me fez estremecer e dar um pulo
para trás, apavorado. Meu coração estava na garganta e
minha respiração densa.

— Meu Deus, o que eu fiz? — gritei em tom


esganiçado.

Eu morreria cedo se continuasse assim, era onze anos


mais velho que Bridget, não tinha mais idade para ter o
coração testado dessa maneira.

— Não fez nada, ele só está chorando porque sentiu


você e sabe que vai ter a fralda limpa.

Morrendo de medo, comecei a remover as roupinhas


dele com a maior calma do mundo.

— É uma criança, Leon, ele não vai quebrar porque


você está tocando nele. — Riu Bridget.

— São mais fáceis quando são espermatozoides —


murmurei, abrindo os lados da fralda.

— Nossa, uau! — exclamou Bridget. — Apresento a


você a evolução dos espermatozoides que tanto ama
cuidar. Incrível, não? Eles fecundaram, tornaram-se
embriões e então bebês que choram e precisam ter a
fralda limpa. Olha como a ciência da vida é maravilhosa —
zombou.

Bufei.

— Você está muito engraçadinha.

A fralda estava encharcada de tanto xixi, levantei um


pouco a lombar de Noah pelos pés e inseri outra fralda,
substituindo a suja pela limpa. E, como se fosse um
milagre, a criança simplesmente parou de chorar. Ele
fechou a boca e me encarou com o semblante sério, como
se não tivesse me deixado quase surdo momentos antes.

— Esse garoto é muito manipulador — comentei.

Os olhos azuis me encararam e um sorriso curvou os


lábios do bebê levemente. Balancei a cabeça e me inclinei,
beijando a bochecha gorda e macia.

— Acho que ele vai ser igualzinho ao pai — comentou


Bridget, removendo uma Bonnie sonolenta do peito. — Já
demonstra características desde agora.

— Então será um garanhão dos bons. — Pisquei.

Ela grunhiu.

— Não fale assim do meu filho, ele vai ser um bom


homem.
Espalmei uma mão no peito.

— Mas eu sou um bom homem! — retorqui.

— Sim, e mulherengo.

Levantei um dedo em riste.

— Ex-mulherengo, agora sou um pai de família e... —


Parei de falar, percebendo que Bridget e eu estávamos
morando juntos e praticamente casados, mas não de fato.
— Você quer se casar comigo? — perguntei.

Ela ficou boquiaberta, me encarando com a testa


franzida.

— Sim? — insisti.

— Resolveu me pedir em casamento ao trocar a fralda


do nosso filho?

Soltei uma gargalhada e peguei Noah no colo.

— Na verdade, já estamos casados, mas eu faço


questão de oficializar as coisas.

Parei de frente para ela, segurando Noah enquanto


ela segurava Bonnie. Nossa família estava completa e
embora o pedido não parecesse nem um pouco romântico,
parecia certo e parecia ser o momento adequado.
— Aqui, com nossos filhos presentes, nossa família
completa e feliz. Eu peço de novo, Bridget, a mulher da
minha vida, a mãe dos meus filhos, a garota por quem eu
me apaixonei perdidamente — falei, sentindo o seu olhar
recair mais intenso em mim a cada palavra que era
proferida. — Doutora Adams, quer se casar comigo?

Ela trancou a respiração e mordeu os lábios. O


silêncio dela me incomodava, mas eu sabia que só estava
tentando me deixar tenso.

Inclinando-se, beijou meus lábios e suspirou.

— Sim, doutor Dubrow, eu aceito me casar com você.

— Você é minha Bridget, apenas minha.

Puxei ela pela cintura e beijei os lábios com tanto


amor que Bridget começou a chorar, fungando.

— Sua — confirmou, balançando veemente a cabeça.


— Obrigada por me mostrar outra vez o que é felicidade.

— Obrigado por me acordar para a vida — respondi.

— Eu te amo, doutor Dubrow, sabia que mudaria a


minha vida desde a primeira vez que nos vimos — disse,
referindo-se ao encontro no corredor da clínica, quando
trocamos olhares tão intensos antes mesmo de saber que
nossos destinos já estavam entrelaçados.
— Eu também te amo, doutora Adams, e soube que
seria a minha ruína quando coloquei meus olhos em você.

Se era acaso ou destino eu não sabia, mas tinha a


certeza de que pertencíamos um ao outro.
Cinco anos depois

Leon e eu erámos muito bom juntos. Além dos filhos


lindos e saudáveis que tivemos, formamos uma equipe e
tanto durante toda a minha residência na clínica.

Fiquei com o coração partido quando os meses de


residência chegaram ao fim e estava na hora de seguir o
meu caminho. Eu gostava de trabalhar no local, amava as
pessoas e o ambiente de trabalho, mas estava na hora de
seguir em frente.

Então comecei a minha especialização no hospital de


oncologia infantil. No começo não foi nada fácil, ver
crianças sofrendo e morrendo diariamente, mexeu tanto
comigo que eu passava noites em claro me debulhando em
lágrimas, mas tinha Leon ao meu lado, me amparando e
apoiando.

Com muita persistência, consegui vencer o que eu


sentia e permanecer na especialização. Eu devia isso a
Brandon, queria ajudar as famílias de alguma forma, tornar
um pouco mais fácil um momento que era tão difícil.

E hoje eu era uma das cirurgiãs oncológicas mais


requisitadas do hospital e a mais jovem de todas.

Eu amava a minha profissão, ela não era nada fácil,


mas era linda e sincera. Eu exercia o meu trabalho por
amor e isso tornava as coisas mais leves para mim.

A última vez em que tive contato com o meu pai foi


quando me expulsou de casa. Depois daquele dia, ele
nunca mais me procurou e nem eu a ele. Minha mãe, por
outro lado, visitava os netos com frequência, embora a
nossa relação ainda fosse conturbada, era saudável e era
isso que importava.

No fundo, sentia uma dorzinha no peito por causa


deles. Meu pai cresceu com o luto e deixou com que a dor
corroesse o seu coração, transformando-o em um homem
amargo e rancoroso. E Ruth tinha se entregado ao
sentimento com o marido. De certa forma, eles morreram
junto com Brandon e quase me arrastaram com eles, mas
no meio desse caminho de autodestruição, eu encontrei
Leon e consegui me salvar, uma pena que já era tarde
demais para os meus pais.

Meu celular apitou e eu olhei a notificação na tela.

“Estou esperando você na loja de bebês.” — Izabela.

Sorri para o aparelho e soltei um suspiro.

Izabela estava à espera do primeiro bebê com Ben e


não conseguia conter a felicidade e emoção por estar
realizando o seu sonho. Toda a semana ela me arrastava
com ela e Elizabeth para lojas de bebês, pois queria ajuda
com as escolhas dos móveis do quarto de Victória.

Ela e Ben se casaram meses após o meu casamento


com Leon. Nossa festa foi simples e pequena, apenas para
alguns familiares e amigos próximos. Já a festa de Ben e
de Izabela foi luxuosa e extravagante, saiu até mesmo em
alguns jornais e revistas.

Depois do casamento, eles decidiram aproveitar um


pouco, viajar e apreciar os primeiros anos entre o casal.
Izabela retificou um pouco a forma como pensava, ela
queria ser mãe e focava somente nisso, como se sua vida
fosse incompleta até que esse sonho se realizasse. Com a
convivência, ela percebeu que filhos eram uma
responsabilidade enorme e que muitas vezes os pais
precisavam renunciar seus próprios sonhos ou vontades
em prol de suas proles. Então, apaixonada, decidiu que a
maternidade seria um sonho realizado mais para frente,
quando estivesse, de fato, pronta para vivê-lo. E então,
anos depois, ela engravidou.

Verifiquei a hora e percebi que estava atrasada.


Levantei-me e removi o jaleco, depositando-o sobre o
encosto da cadeira. Peguei minha bolsa e deixei a minha
sala.

Conforme eu avançava pelos corredores,


cumprimentava funcionários e parentes de pacientes.
Estava prestes a virar o corredor quando ouvi umas
enfermeiras cochichando e suspirando.

— Ele é tão lindo... — comentou uma delas.

— Bem que poderia vir ao hospital mais vezes —


disse outra.

Não precisava olhar para saber sobre quem estavam


falando. Virei o corredor e encontrei Leon conversando
com um dos diretores.

Lindo como sempre.

A idade vinha fazendo tão bem para Leon, parecia que


a cada ano que passava, mais incrivelmente lindo ele
ficava.

Meu marido vestia calças pretas, camisa social azul


por dentro da calça e sapatos. Os cabelos estavam
organizados e impecáveis e ele franzia os olhos verdes-
azulados através das lentes do óculos de grau que cobria
o rosto.

Me aproximei, inclinando-me e plantando um beijo em


sua têmpora. Ele sorriu e segurou a minha cintura.

— Como vai, esposa? — murmurou.

— O que você está fazendo aqui? — questionei,


esfregando as mãos nos ombros largos.

— Izabela está prestes a ter uma síncope nervosa,


caso não apareça na porcaria da loja, então eu vim buscar
você.

— Eu já estava de saída — avisei.

— Vou deixá-los, é sempre um prazer encontrar com


você, Leon — despediu-se Harry, um dos diretores do
hospital.

Leon passou o braço pelos meus ombros e me


conduziu pelo corredor em direção a saída.

— Sabe que paciência não é uma das virtudes da


minha irmã, muito menos quando se trata da gravidez tão
minuciosamente planejada por ela.

Soltei uma risada abafada.

— Ah, eu sei bem como ela é.


Nós atravessamos as portas giratórias do hospital e
eu mal pisei na rua quando dois corpinhos se jogaram em
minhas pernas, abraçando-me e me rodeando como se eu
fosse a coisa mais preciosa do mundo.

— Ei, vocês vieram buscar a mamãe no trabalho? —


perguntei, agachando-me e plantando um beijo na cabeça
de cada um.

Não permitia que entrassem no hospital, além das


doenças que poderiam pegar, evitava que vissem o
sofrimento que um hospital oncológico carregava. Um dia,
levaria eles ao local e explicaria sobre as doenças e a
morte, mas por enquanto, deixaria apenas que fossem
crianças leves e felizes.

Fui apresentada para o câncer quando era muito


jovem e para a morte logo em seguida. Não queria que
meus filhos carregassem as mesmas dores que eu,
portanto, se podia evitar, faria isso.

Já na clínica eles tinham livre arbítrio, Leon os levava


direto para o local. Eles corriam livremente e amavam os
tons brancos revestidos. Bonnie adorava também o
laboratório, ficava horas analisando os espermatozoides
no microscópio, mesmo que ainda não soubessem o que
eram ou de onde vinham, ela os denominava como
“minhoquinhas”.
— Papai disse pra esperar aqui — falou Noah,
olhando para Leon.

Elizabeth estava de pé a alguns metros de distância,


zelando os netos enquanto Leon entrava para me chamar.

— É mesmo? E vocês foram crianças muito


comportadas? — indaguei, olhando de esguelha para o
meu marido.

Nossos gêmeos não eram muito... colaborativos com


as nossas ideias. Com cinco anos, tendiam a teimar
quando queriam alguma coisa e já tinham uma
personalidade forte.

Bonnie era igualzinha a Leon, tanto que às vezes eu


conversava com ela, mas parecia que estava falando com
o meu marido. Já Noah era mais contido, curioso e um
poço de educação. Ele me lembrava Brandon.

Fisicamente, eram idênticos a Leon, ambos. Cabelos


loiro-escuros, olhos verdes-azulados. Nariz, boca, maçãs
do rosto. Tudo. Uma cópia perfeita do amor da minha vida.

— Se a gente ficasse aqui, papai nos daria sorvete —


confessou Bonnie, cruzando os braços.

Fuzilei Leon antes de me erguer.

— Seu pai sabe que não pode trocar comida por


educação — retesei-me.
Leon encolheu os ombros.

— Tente contê-los, então.

Bufei.

— Se você não os mimasse tanto, conseguiria


também.

— Mas agora nós vamos ganhar sorvete, papai


prometeu, não pode descumprir uma promessa — insistiu
Bonnie.

Eu mataria Leon quando chegássemos em casa, com


certeza teríamos uma longa e entediante conversa sobre
como as crianças devem ser educadas e nunca compradas
com comida ou besteiras.

— Ele vai dar sorvete pra vocês — avisei. Eles


gritaram e correram até Elizabeth. — Depois teremos uma
conversinha — sussurrei para Leon.

Os olhos dele brilharam em animação.

— Com ou sem roupa? — retrucou.

— Provavelmente com roupa e com você dormindo no


sofá se continuar manipulando os nossos filhos.

Ele ergueu os braços em rendição.


— Não estou fazendo nada, só ensinando a eles como
os acordos financeiros funcionam. Eles entram em um
acordo e recebem por isso. — Exasperei, balançando a
cabeça. — Sabe quem eu encontrei hoje? — perguntou,
mudando de assunto e me abraçando outra vez.

— Quem?

— Alice e a pequena Hilary, e, como sempre, não


mediu esforços para me agradecer por tê-la dado a
oportunidade de viver a tão sonhada maternidade.

Um sorriso sincero contraiu os meus lábios.

Alice foi a minha primeira paciente em casos


extremos, o primeiro trabalho que Leon e eu fizemos
juntos. Tinha um apego por ela e pela criança e estava
muito contente que elas estavam bem.

— Nós somos uma dupla e tanto — ciciei, beijando a


bochecha dele.

— Sim, nós somos, doutora Dubrow — concordou,


sorrindo.

Fechei a porta do quarto das crianças com uma


lentidão exagerada, cuidando para não fazer um ruído que
fosse. Bonnie tinha um sono leve e acordava por qualquer
coisa.

Chutei alguns brinquedos no meio do caminho


enquanto retornava para o quarto que dividia com Leon.

A regra era clara, ou o casal tinha uma casa


organizada ou eles tinham filhos. Os dois não tinham a
mesma coerência, tampouco combinavam na mesma frase.

Fechei a porta do quarto e me joguei na cama. A porta


do banheiro estava fechada e um pouco de fumaça
flutuava pelas frestas do banho quente de Leon.

O final de tarde havia sido incrível e cansativo.

Izabela era uma figura, as crianças eram apaixonadas


pela tia doidinha deles. E Ben seria um ótimo pai, já dava
indícios do quanto se dava bem com crianças. Elizabeth
tentava remediar a situação quando tudo saía do controle,
já que lidar com gêmeos não era uma tarefa fácil. No fim,
tínhamos uma dinâmica maravilhosa de família.

Leon saiu do banheiro com os pés descalços, vestindo


apenas uma calça de moletom e enxugando os cabelos
molhados com a toalha.

Eu o amava tanto que meu coração acelerava sempre


que o olhar dele encontrava o meu. Leon não me deu
apenas uma família, ele me deu um propósito, iluminou os
meus caminhos, fez com que eu me sentisse importante e
relevante, mas, acima de tudo, me amou como ninguém
nunca tinha amado.

— Tenho uma surpresa para você — revelou,


caminhando até a cama e sentando-se na borda dela.

— Hum... estou ansiosa.

Ele se virou e apontou para o peitoral, onde as


tatuagens cobriam metade da pele. Havia uma nova
tatuagem no local, avermelhada e inchada por ter sido
acrescentada a pouco tempo. Me inclinei para ver melhor.

Era um coração humano muito bem desenhado, com


uma descrição perfeita das veias e dos músculos que tinha
ao redor. Dentro dele, três nomes fluíam pela veia
principal, como se fizessem parte do órgão.

Bridget.

Bonnie.

Noah.

Soube que estava prestes a chorar quando a minha


visão ficou embaçada e eu não conseguia mais focar no
desenho.

— Você gostou? — ele perguntou.

Funguei, esfregando a ponta do indicador nos cantos


dos olhos para dissipar as lágrimas.
— Eu amei, Leon, é lindo. — Puxei ele pelo pescoço e
enchi seu rosto de beijos, inspirando o cheiro da colônia
que eu amava desde sempre. — Obrigada por tudo. Eu te
amo tanto.

Ele fechou as mãos em punho nos meus cabelos e me


encarou com tanta paixão que eu senti que derreteria nos
braços dele.

— Eu disse que vocês eram o meu coração fora do


peito, Bridget, isso aqui é apenas uma simbologia do que
eu sinto por vocês.

— Ah, doutor arrogância, seus espermatozoides foram


o melhor erro da minha vida — falei, rindo de como soava
tão incomum ao mesmo tempo que parecia tão natural para
mim.

Deitando-me na cama com delicadeza, Leon cobriu o


meu corpo com o dele e acariciou o meu pescoço com
beijos e lambidas que me fizeram estremecer. Esfreguei
meus dedos pelas mechas sedosas que eu tanto amava,
sentindo a textura através dos meus dedos.

— E eles escolheram o melhor útero para fecundar —


brincou, descendo os beijos aos meus seios. Ele
mordiscou um mamilo por cima da camisola de pijama. Eu
arquejei e fechei as mãos em punhos no lençol. — Agora,
deixe-me aproveitar a minha esposa, tenho vários planos
esta noite.
Soltei uma risada enfezada.

— Só esta noite? — Arqueei as costas quando senti a


língua dele em contato com a minha pele sensível.

Ele parou e se inclinou sobre os cotovelos para me


encarar.

— Para falar a verdade, tenho planos com você para a


vida toda, mas podemos começar com o agora.

— Fique à vontade, doutor Dubrow.

— Sempre, doutora Dubrow.

Ele se abaixou e voltou a me beijar com amor absoluto


e plena devoção.

FIM.
Ei, você chegou até aqui!

Espero que tenha gostado do livro, que Leon e seu


ego enorme tenham conquistado você, assim como
conquistou a mim e a Bridget.

O destino é uma força misteriosa que ninguém


consegue compreender, e ele achou justo juntar esses
dois. Leon precisava de Bridget assim como ela precisava
dele. E juntos, construíram uma família linda e tiveram o
seu “felizes para sempre”.

Se você gostou do livro, é muito importante que deixe


uma avaliação na Amazon, pois elas, além de servirem
como inspiração para os autores, também importam para
que outros vejam e se interessem pelo livro.

Se não gostou, sinto muito, espero que algum dos


meus outros livros faça mais o seu estilo. Desejo que
possamos nos conectar com algum dos meus trabalhos, no
futuro.
 

Com carinho,
Agradeço às minhas leitoras maravilhosas que
vibraram comigo a cada postagem do livro, sempre me
dando apoio e inspiração. Vocês são incríveis, sou muito
grata por tê-las na minha vida!

A minha família, por me amparar e vibrar por mim,


mesmo quando eu corro todo mundo da minha casa porque
preciso finalizar um livro.

Ao Kevinn, meu parceiro, por estar sempre


acompanhando, estar sempre por perto, sempre disposto a
me ajudar, até mesmo quando estou pirando por conta do
prazo esgotado.

A Vanessa Pavan pelo cuidado com a minha


assessoria, obrigada por todo o apoio.

A Mari Vieira, que aguenta os meus surtos e que está


sempre disponível, mesmo quando eu atraso para entregar
um trabalho. Obrigada por ser uma assessora e uma amiga
extraordinária.
A Ivy Matarazzo, a amiga incrível que o mundo
literário me trouxe, obrigada por estar sempre presente e
disposta a me ajudar no que eu precisar.

Às minhas parceiras literárias por serem tão incríveis,


sempre engajando e me ajudando em cada lançamento.

Gratidão!

[1]
Scrubs ou Roupa Privativa como é conhecido, são as roupas sanitárias usadas por
cirurgiões, enfermeiros, médicos e outros profissionais envolvidos no atendimento ao
paciente em hospitais e clínicas.
[2]
Incisão transversal de laparatomia suprapúbica, efetuada na região pilosa do púbis,
para disfarçar a cicatriz operatória.
[3]
Presença de batimentos cardíacos fetais;
[4]
Batimentos por minuto;
[5]
Ressuscitação cardiopulmonar
[6]
É uma máscara de válvula de bolsa, às vezes conhecida pelo nome proprietário Ambu
bag ou genericamente como ressuscitador manual ou "bolsa auto-inflável"
[7]
Utilizado para fornecer controle temporário ou para a redução da Hemorragia Pós-Parto;
[8]
O Los Angeles Dodgers ou LA Dodgers é uma equipe profissional de beisebol com sede
em Los Angeles, Califórnia. O Dodgers são membros da Divisão Oeste da Liga Nacional da
MLB.
[9]
Fertilização In Vitro
[10]
Os caiapós, também conhecidos como kayapó são um grupo étnico jê, habitantes da
Amazônia brasileira.

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