Você está na página 1de 416

Copyright © 2023 MIRLLA MUNIZ

Todos os direitos reservados

Esta obra foi revisada conforme o Novo Acordo Ortográfico da Língua


Portuguesa.
Fica proibido o armazenamento e/ou a reprodução de qualquer parte desta
obra. Nenhuma parte pode ser utilizada ou reproduzida através de quaisquer meios
existentes - tangíveis ou intangíveis - sem o conhecimento e prévia autorização da
escritora/autora.

A violação dos direitos autorais é CRIME estabelecido pela lei nº 9.610/98 e


punido pelo artigo 184 do Código Penal Brasileiro, com pena de DETENÇÃO de três
meses a um ano ou MULTA.

Esta obra literária é uma ficção. Qualquer nome, lugar, personagens e situações
são produtos da imaginação da autora. Qualquer semelhança com pessoas e
acontecimentos reais é mera coincidência.

Revisão:
Raquel Moreno (@raquelmorenoliteraria)
Ilustrações:
Gabriela Góis (@olhosdetinta), Júlio Cesar (@cesar_drawiings) e Mirlla Muniz
(@miharts.s)

Leitoras Betas:
Tan Wenjun | Cristiene Januária | Beatriz Matos |
Nana Domingos.

Capa e Diagramação:
Lilly Desiggn (@lillydesiggn)
Sinopse
Nota da Autora
Aviso
Playlist
Dedicatória
Epígrafe
Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Capítulo 32
Capítulo 33
capíutlo 34
Capítulo 35
Capítulo 36
capítulo 37
Capítulo 38
Epílogo
Agradecimentos
Caro leitor e leitora...
Tudo o que eu queria ao ir para Las Vegas, era tirar da cabeça
do meu irmão a ideia de que eu era careta, além de tirar da minha
cabeça a imagem do convite de casamento que recebi da minha ex-
namorada.
Mas tudo isso se tornou uma péssima ideia, quando no dia
seguinte, acordei ao lado de uma mulher desconhecida, com uma
aliança no dedo e uma certidão de casamento.
Não deveria ter ido a Vegas. Não deveria ter dado corda ao
idiota do meu irmão e tomado aquele copo de whisky batizado. Não
deveria ter casado com aquele pedaço de loucura.
Aurora Castelo é o nome dela. A mulher mais linda que eu já
vi, mas também é a mais trapaceira, mentirosa e golpista que já
passou pela minha vida, e olha que sou um magnata do ramo
imobiliário e várias pessoas já tentaram me passar a perna.
Nenhuma teve tanto sucesso igual a ela.
Ela precisa de um visto para ficar no país, e não me deu a
anulação. Eu preciso que ela assine o divórcio sem levar nada meu.
Agora, vou precisar ficar casado com uma mulher, dezenove anos
mais nova, insanamente gostosa, com a boca mais atrevida que eu
já vi, por seis meses.
E que Deus me ajude a sobreviver a eles.
Se você procura um livro leve, que te renda boas risadas,
suspiros e deixe o seu dia mais leve depois de carregar o peso do
mundo, como às vezes imaginamos, esse livro é para você.
Já me chamaram de remedinho para ressaca, e é das literárias
que eu estou falando, então, por que não escrever mais uma
comédia romântica? Se essa é sua primeira vez lendo uma história
minha, muito prazer, meu nome é Mirlla e eu amo escrever sobre
machos cadelinhas e mocinhas fortes. Às vezes, vocês irão ler e
pensar, ela não está sendo forte aqui, mas adivinha? Às vezes, se
você olhar bem, vai encontrar força na fraqueza.
Ninguém precisa ser forte o tempo todo, VOCÊ não precisa ser
forte o tempo todo, então embarque na história de Nicolas e Aurora
para sorrir e pensar: Tudo bem baixar a guarda hoje, tudo bem
suspirar por um casal grumpy x sunshine, tudo bem se eu ler até
madrugar e tirar o dia apenas para mim. Tá tudo bem.
Tá tudo bem parar de se cobrar e começar a ver o lado leve da
vida.
Só não faça como a Aurora, se você fizer, vai parar no
psiquiatra.
Sabemos que você faria se pudesse.
Quem hoje em dia não quer um velho rico que nos banque e
nos dê tudo? Se o velho for igual ao Nicolas, melhor ainda.
Brincadeirinha...
Ou nem tanto.
Ok, ok. Se você já me conhece, deve estar se perguntando,
cadê o Vince, Mirlla?
Alerta spoiler, é o estilista que aparece nesse livro, irmão do
italiano lindinho que... bem, vocês precisam terminar o livro para
saber.
Então, para os novos que estão chegando, Vince vai ter seu
próprio livro, porque ele faz parte de uma série de irmãos italianos
“Os Mancini”, os dois primeiros livros já estão disponíveis, você
pode clicar no link no final desse livro para conhecer a história deles.
Agora, para os que estão me cobrando o Vince – sim, eu tô
lendo sua mente agora – ele já está chegando. Precisei de um
respiro para escrever ele.
Aurora e Nicolas são esse respiro.
Todo mundo precisa respirar.
Sem mais delongas, espero que riam muito com Nicolas,
porque com Vince...
Ah... Com Vince vocês vão chorar.
Enlouquecidamente.
Mirlla Muniz.
Esse é um livro de ficção, qualquer semelhança com a
realidade, é mera coincidência.
Tudo o que for escrito nesse livro, é obra da mente dessa
autora, portanto, caso algo não seja passível de acontecer, esteja
longe da realidade, ou seja titica de galinha, lembre-se, É FICÇÃO.
Não, não sabemos se a relação de casamento acontece
assim, pois nunca me casei em Vegas. Não, não sei como funciona
o visto, além de umas pesquisas que não foram substanciais, e de
nunca ter viajado para fora desse forno que chamamos de Brasil.
Não, você não vai casar com um cara desconhecido em Vegas, que
seja a cara do Dean Winchester, seja milionário e mais velho. Essa
doeu, né?
Pois é. Aqui, você vai encontrar coisas que só existem em
livros, tudo bem? Espero que estejam bem com isso.
Um beijo.
Escaneie o QR CODE e ouça a playlist de
‘’Todas as Vezes que Te vi Sorrir’’
ou clique aqui para acessar.
Dedico esse livro a todas as
Auroras que fazem de tudo para
sobreviver.
Às Vezes, ser egoísta é
necessário, não se julgue por
isso.
“Alice: Como você sabe que eu sou louca?
Gato: Só pode ser. Se não,não teria vindo pra cá.”
(Alice no país das maravilhas)
Nem mesmo eles podem me parar agora.
Garoto, eu estou voando alto.
Suas críticas não podem me derrubar.
Garoto, eu ressurgi dos mortos.
Ninguém sabe o quanto a vida era difícil.
Eu nem sequer penso sobre isso agora, porque.
Eu finalmente te encontrei.
(Radio - Lana Del Rey)

Acho que enlouqueci, só não sei em que momento isso


aconteceu.
Mas que eu enlouqueci? Isso é certeza!
Talvez tenha sido quando decidi sair de uma relação familiar
onde era manipulada o tempo inteiro por meus pais, e ao invés de
me mudar para outra cidade ou estado, algo que facilitaria a minha
vida, tive a brilhante ideia de ir para outro país.
Realmente brilhante. Me diz se uma pessoa assim tem algum
juízo na cabeça? Não tem. Nenhum.
Nem o mínimo senso de preservação.
Eu saí do Brasil e vim para os Estados Unidos. Para os
Estados Unidos, vocês estão entendendo?
Sem falar inglês, desprovida de renda fixa ou poupança, nem
mesmo um trocadinho na carteira, apenas uma bolsa de estudos
que me inscrevi impulsivamente para uma faculdade que não
entendia bosta nenhuma.
Vê se uma pessoa assim não é um pouco pirada da cabeça? É
sim, confia!
Ou quem sabe essa loucura tenha aparecido quando transei
com o cara mais popular da escola, jurando que seria pedida em
casamento na formatura. Ele havia prometido fazer isso e como
tenho uma família tóxica, qualquer oportunidade de sair de casa, eu
estava aceitando. Qualquer uma, mesmo!
Claro que ele não me pediu em casamento, sabia que não iria,
mas a trouxa aqui ainda tinha esperanças.
Essa desilusão amorosa e os quatro anos que estou nos
Estados Unidos me fizeram enxergar o mundo de outra forma, com
outros olhos.
Olhos abertos, astutos, realistas.
Olhos que enxergam a verdade e não a ilusão que uma mente
adolescente cria para se sentir melhor consigo mesma.
Olhos egoístas.
Olhos que viram naquela bolsa de estudos, uma oportunidade,
assim como estou vendo agora.
Olhos loucos.
Talvez não tenha uma data específica para quando essa
loucura começou, ou talvez eu sempre tenha sido louca. Só isso
explica o fato de ser tão sem noção ao ponto de fazer a besteira que
estou prestes a cometer agora. O homem que jurei de pé junto na
sua frente de que era mais honesta do que uma freira, vai ter que
me perdoar, pois só Deus me faria desistir do que estou prestes a
fazer.
Uma merda grande.
Uma merda feia.
Uma merda que o fará me odiar.
Eventualmente tenho atitudes impulsivas e isso geralmente
afeta somente a minha vida. Só eu lidei com as consequências das
minhas burradas, só eu precisei me arrepender de cada uma delas.
Todavia, dessa vez, outra pessoa sofrerá com isso e não faz a
mínima ideia. Quer dizer, ele terá quando eu fizer a minha cena.
Marcos.
É tudo culpa do Marcos.
Não devia ter atendido a ligação dele. Quer dizer, devia, estava
esperando há algum tempo. Apesar disso, devia ter atendido depois
que essa situação acabasse. Só que não foi o que aconteceu e
vamos lá, esse homem pediu, ele é mais velho, não deveria ter mais
senso?
Marcos é foda, esperou o momento certo pra mim, porém o
momento errado para o homem ao meu lado.
Pelo menos, as aulas de teatro que fiz no ensino médio, depois
de sair daquela prisão de hipócritas, servirão para alguma coisa, e
essa coisa é: vou ferrar o pobre coitado que está ao meu lado no
carro e tenho certeza de que ele, e os amigos que estão nos bancos
da frente vão querer me matar depois disso.
Principalmente ele.
Ah, ele vai querer a minha cabeça em uma bandeja, com
direito a maçã na boca e tudo.
É triste, a sensação que eu tenho.
E isso é oh, uau, oh.
É um verão cruel.
Tá tudo bem, é o que eu digo a
eles.
Sem regras no paraíso frágil.
(Cruel summer - Taylor Swift)

Se eu tivesse a oportunidade de escolher ser qualquer pessoa


no mundo nesse exato momento, escolheria ser a Oleander Fallows,
protagonista da série de livros “Broken Bonds”[1].
Se existe alguém mais sortuda que ela, podem me apresentar
que talvez eu mude a minha escolha, se for para escolher ser
qualquer outra pessoa, tenho que escolher a melhor, não?
Mesmo que seja fictícia.
Se for pra escolher alguém tão lascado como eu, é melhor não
ter escolha alguma.
Por ora, minha inveja pertence a Oli.
E pensa em uma inveja grande.
Ela tem do seu lado não um, mas cinco homens maravilhosos
que fazem de tudo para vê-la feliz. Um moreno sarcástico, cheio de
tatuagens e que lambe o chão onde ela pisa. Tem um golden boy,
atleta e com um tanquinho maravilhoso que a trata como a coisa
mais preciosa do mundo, um general de time tático, musculoso que
tem um vigor maravilhoso e ainda cura a dor na boceta, — coisa
boa é ser fodida, mas ninguém se livra de ficar assada de tanto dar
— e dois irmãos mais velhos e podres de rico, sendo um controlador
e possessivo que cuida dela e coloca até a comida no prato e outro
que não deixa ninguém chegar a 50 km de distância antes de
verificar seus antecedentes.
Enquanto ela está lá de boa, eu estou aqui na fossa, sem
trabalho, acabando a faculdade e sem nenhum motivo para ficar,
além da minha força de vontade e pavor de voltar para o Brasil.
A inveja ainda perde para esse pavor, embora os dois sejam
enormes.
Quando se cresce em um lar onde suas opiniões são
anuladas, suas escolhas são negadas e você não recebe nenhum
tipo de afeto, quando finalmente você consegue sair, você não quer
mais voltar.
Voltar para o Brasil significa voltar para os meus pais
manipuladores, e não vou fazer isso, mesmo que minha vida
atualmente esteja uma merda.
Por isso, cobiço a vida de Oleander, ela está bem e com
relacionamentos saudáveis, depois de comer o pão que o diabo
amassou, é claro, e eu estou aqui, sem ninguém, pobre e
desempregada, comendo esse pão todo dia.
Ô pãozinho ruim, viu, o pobre não tem um minuto de paz!
A única pessoa que tenho aqui é a Elisa, ela é minha única
amiga nesse país, tem um emprego, um namorado e é rica.
Deus tem seus preferidos? Se tiver, Elisa é uma delas.
A única pessoa que deixei adentrar as minhas muralhas.
Conheci Elisa em uma matéria que fizemos juntas. Ela está se
formando em arquitetura, eu, em design de interiores e precisamos
fazer um trabalho em dupla. Não nos separamos mais desde então.
Falando nela…
Pego o meu telefone que toca com uma chamada sua e
atendo antes que encha o meu celular com mensagens
intermináveis que não lerei e que vai deixá-la com raiva.
— Bom dia, dorminhoca, tá fazendo o quê?
— Bom dia — respondo. — Café, por quê? — pergunto,
mexendo na cafeteira da cozinha do alojamento onde moro.
Nem casa eu tinha, senhor, o que faria morando aqui?
— O que você acha de passar o fim de semana em Las
Vegas? — pergunta como quem não quer nada, com um tom de voz
tranquilo. Paro o que estou fazendo e me sento no banquinho em
frente à bancada de mármore.
Nem combinava com o resto da cozinha e isso me dava urticária.
— Meu sonho, né Elisa. Mas sabe que não estou podendo. —
Confesso, observando minhas unhas. Até estavam bonitinhas,
deixá-las grandes davam muito trabalho, então as cortava pequenas
e eventualmente passava base incolor para deixá-las hidratadas.
Dinheiro para manicure é que eu não tinha.
Ser pobre é foda. Viver em um país estrangeiro é ainda mais,
mas quem disse que quero ir embora?
— Lembra da Lily, minha prima? — pergunta e na mesma
hora, faço uma careta.
— Lembro. — Uma vaca, maldita e mimada.
— Então, ela vai se casar, mas quer uma despedida de solteira
como manda o figurino e quer uma viagem para Las Vegas para
comemorar. Vai ser nesse fim de semana e ela é um pouco
insuportável e não tem muitas amigas, então me convidou e pediu
pra te chamar.
Por que não me surpreende ela não ter muitas amigas? Ah, é,
Elisa já respondeu.
Lily é insuportável e não é só um pouco, não.
— Você sabe que não gosto dela, né? — o motivo? Plagiou um
trabalho meu, pegou o crédito, me deixou sem nota e quando fui
reclamar para o professor, ele simplesmente fingiu que eu estava
fazendo um escândalo desnecessário, e quando falei que ia até o
reitor, a bonita veio tentar se safar, uma vez que eu tinha todas as
provas digitais de que havia feito o trabalho. Então ela me ofereceu
dinheiro em troca do silêncio e de conseguir uma nova oportunidade
de entregar meu trabalho.
Óbvio que aceitei, estava precisando de grana, mas porra,
nunca mais confiei naquela garota, mas acho que ela não percebeu
isso ou é sonsa demais.
Aposto tudo o que tenho que é a segunda opção.
— Eu sei, mas é Las Vegas, amiga. — Pelo telefone, dá para
perceber que está incrédula.
— E daí?
— Muita festa e bebida? — Insiste.
— Tô na faculdade e sou jovem, tenho isso todo dia. — Ergo
uma sobrancelha sarcástica, mesmo que Elisa não possa ver.
— Cassinos e Elvis Presley?
— Não jogo por medo de me viciar e se não for o original, não
vale a pena ver o Elvis. — Também não tenho nenhum dólar para
apostar em algo.
Dane-se que eu apostei tudo o que tenho na opção da sonsa.
— É 0800.
Lentamente um sorriso se abre em meus lábios e balanço
minhas pernas com empolgação. Elisa pega rápido as coisas que
falo, principalmente gírias brasileiras.
— Tudo?
— Tudinho na conta do noivinho dela.
— Agora você está falando a minha língua! — me levanto, indo
terminar de preparar meu café. — Se você tivesse falado isso desde
o começo, nós teríamos poupado tempo, amiga, você me conhece,
sabe como me convencer.
— Claro que eu sei, mas queria confirmar que só a minha
presença não seria o suficiente, você é uma vaca, Aurora!
— Uma vaca que não tem dinheiro para viajar para Las Vegas
por um final de semana inteiro, garota, se toca.
Gente rica e suas manias de achar que a gente tira dinheiro do
cu.
Com o café pronto, pego o queijo quente que havia preparado
antes de receber a ligação de Elisa e subo para o meu quarto.
— Tá, tá, eu poderia arcar com tudo, você sabe, mas tudo bem
— reviro os olhos para o seu drama e ouço vozes do outro lado da
linha enquanto abro a porta do meu quarto. Logo sua voz retorna. —
Amiga, preciso ir, liguei só para fazer esse convite, mais tarde a
gente conversa por mensagem, ok?
— Claro, só não sei se vou te responder, sabe que eu sou
horrível com mensagens — digo a verdade. Odiava responder, tinha
umas cinquentas conversas na minha caixa de entrada e isso sem
contar Instagram e e-mails.
— É por isso que eu ligo, você tem que aprender a se
comunicar normalmente, garota. Tchau. — Pensa que ela espera eu
me despedir? Não, simplesmente desliga na minha cara.
Vaca.
Sento na minha cama de solteiro que fica ao lado da janela do
quarto e começo a comer, com um ânimo bem melhor do que
quando acordei. No entanto, ainda com inveja de Oleander Fallows,
mas, fala sério, quem não tem?
Observo o quarto ao meu redor e penso um pouco no que
fazer de agora em diante.
Faz algumas semanas que enviei meu pedido de visto para
trabalho, uma vez que estava trabalhando meio período em uma
empresa imobiliária como designer de interiores, só que há três dias
a empresa decretou falência e todos os funcionários foram
demitidos. Vê se pode um negócio desse? Parece que o sócio do
meu chefe estava roubando dinheiro, acredito que isso ajudou a
imobiliária a falir. Agora estou nessa merda de dúvida sobre a
aprovação do meu visto ou não.
Por enquanto, não vou ser deportada, meu visto universitário
só vence em algumas semanas, mesma época em que irei me
formar em design, mas porra, eu estou apavorada.
Não tenho onde ficar depois que sair daqui, Elisa vai se formar
em duas semanas, mas vai viajar depois da formatura para Londres,
onde vai fazer um mestrado. Não disse a ela que pretendia ficar no
país, como a boa dissimulada que sou, disse que voltaria ao meu.
Prefiro morrer a voltar para lá sozinha e lascada, mas sou
ótima mentindo.
Péssima qualidade para se ter, ninguém gosta de gente
mentirosa, mas eu sou.
Quando preciso. No restante do tempo, sou tão sincera que as
pessoas ficam desconfortáveis. Mas resumindo a minha situação:
fodida!
Termino de comer e coloco a caneca na mesinha ao lado da
cama, me levantando pra começar a arrumar uma pequena mala
pra ir para Las Vegas.
Com 20 anos, tudo o que queria era estar bem resolvida, no
entanto, parece que a cada dia que passa, minha situação fica ainda
pior.
Por sorte ganhei essa bolsa de estudos assim que me formei
no ensino médio, aos dezesseis anos — não sou uma gênia, só fui
antecipada uma série — o que foi realmente algo que mudou a
minha vida e a primeira vez que as coisas deram certo pra mim.
Dizem que quando somos jovens, somos imaturos, e tomamos
péssimas decisões. Até hoje não sei se minha escolha foi boa ou
ruim.
Por um lado, saí de um lugar onde passava o dia tendo minha
saúde mental sendo danificada por uma relação familiar abusiva.
Por outro lado, onde estava com a cabeça para juntar minhas malas
e ir para outro país onde não tenho nem o direito de ficar? Por que
não pensei normalmente e fui para, sei lá, o Rio de Janeiro?
Rio de Janeiro é lindo, têm Cristo Redentor, Pão-de-Açúcar,
Copacabana, Barra da Tijuca, vê se não era uma boa opção? Era
sim.
Não estava pensando com a cabeça e sim com o coração
emocionado que eu tinha.
Tinha.
Porque não tenho mais.
Há quatro anos vim para os Estados Unidos e comecei a ser
dona de mim mesmo, quatro anos que moldaram uma nova Aurora.
Foi difícil no começo, para me adaptar à nova cultura, para
aprender uma nova língua. Precisei pedir na reitoria alguém para me
auxiliar nas aulas, mas aprendi rápido, em questão de três meses já
falava inglês intermediário, com sotaque, mas falava, depois de
quatro anos? Sou fluente.
Fluente em inglês, espanhol e português.
Sim, aprendi espanhol para ter um bom currículo.
Mas ser essa nova Aurora tem um custo, o custo é ser
sozinha.
E é pensando nisso, que decido aproveitar os últimos dias que
ainda tenho de certeza e esperar a merda bater no ventilador depois
com todas as minhas dúvidas.
Sou uma especialista em deixar a merda para depois.
A péssima notícia? É que ela sempre bate na minha cara.
Porque você nasceu para isso.
Um coração de pedra pulsante.
Você precisa ser muito frio.
Para sobreviver nesse mundo.
(Natural - Imagine Dragons)

Riley vai casar.


Riley vai casar e não é comigo.
Passei três anos com aquela loira ingrata, dormindo na mesma
cama, morando na mesma casa, indo aos mesmos eventos e
mesmo assim, ela não quis continuar namorando comigo, uma vez
que, segundo ela, sou muito workaholic, teimoso e orgulhoso, muito
controlador e um poço de mau humor.
Acha a lista pequena? Tem mais, só não me dei ao trabalho de
decorar aquele caralho.
PUTA QUE ME PARIU.
E é puta mesmo.
Qual é o problema em dar tudo de si no trabalho? Eu sou
presidente de uma imobiliária, várias pessoas dependem de mim e
de uma boa administração para ter seus empregos e sustentar suas
famílias.
Também não sou teimoso. Não sou! E não vejo vantagem
alguma em ficar correndo atrás de algo que não foi dado à primeira
mão.
Eu lá tenho cara de quem precisa da pena dos outros, porra?
Meu orgulho é meu e pronto. E de onde ela tirou que sou
controlador? Apenas gosto das coisas do meu jeito, porque
geralmente são as melhores decisões, o que tem de errado nisso?
Quando estava embaixo de mim, gemendo e implorando por
um orgasmo, ela gostava do meu controle. Desde quando ele virou
defeito?
E não, não fico sorrindo à toa para coisas que não tem a
mínima graça, me diz uma pessoa que fica de bom humor quando
tem tanta coisa para fazer e já acorda com pepino para resolver?
E pensa em uns pepinos grandes! Do tamanho do meu.
Acreditei que estávamos na mesma página, nunca pensei que
a mulher ia terminar comigo de um dia para o outro.
Literalmente. Estávamos fodendo em uma noite e na manhã
seguinte, eu estava solteiro.
Pensei que iríamos voltar, mas não, ela tinha que terminar,
começar a namorar dois meses depois e ainda ser pedida em
casamento com quatro meses de namoro. A mulher ainda tinha
coragem de me enviar a porra do convite de casamento! Como ela
pode superar três anos em alguns meses e ainda se casar com um
cara que acabou de conhecer?
Ninguém se casa com alguém que acabou de conhecer, isso é
loucura!
Já havia planejado o nosso futuro, meus planos sempre são
bem elaborados, mas ela fez o favor de frustrar todos eles.
Encaro as letras cursivas no papel e suspiro alto, desviando o
olhar para as janelas.
A vista da minha sala me dá ampla visão de grande parte do
centro de Manhattan. Gosto de olhar para a cidade e ver as pessoas
em miniatura andando lá embaixo.
Meus dois parceiros, aqueles que eu chamo de irmãos, e eu,
viemos de baixo, construindo uma sociedade do zero, uma empresa
imobiliária que cresceu ainda mais ao longo dos anos.
Começamos ela quando eu tinha 23 anos, hoje com 39, nossa
imobiliária era a mais procurada no ramo e tenho mais dinheiro do
que sonhei em gastar, para alguém que mal tinha onde cair morto,
estou muito melhor do que se tivesse ganhado na loteria.
Por que Riley não entendeu isso?
Claro que não entenderia, nasceu em berço de ouro, teve tudo
o que quis e ainda tem tudo o que quer na hora que quer. E teria
meu pedido de casamento se tivesse me dado um pouco mais de
tempo.
Tempo é bom, tempo é ótimo para fazer as coisas
funcionarem.
E eu só precisava desse tempo, iria pedi-la em casamento, só
demoraria mais um pouco.
Ouço um barulho na maçaneta da minha porta e logo em
seguida, meus dois sócios entram, se sentam na minha frente e me
encaram com semblantes preocupados, que pensam que
conseguem disfarçar. Não conseguem.
Bufo e fecho a cara.
Leonardo, meu irmão dois anos mais novo, pega o convite que
está na minha mão e o encara. Uma mecha do seu cabelo loiro cai
na testa quando franze o cenho.
— Você vai? — pergunta, entregando o convite para Matteo.
Meu melhor amigo pega, vira de um lado para o outro e ri.
— Claro que vou — perguntinha besta. — Ela é filha do nosso
maior cliente, não é como se pudéssemos negar algo a um cliente
tão importante. — Ele poderia ir tomar no cu também.
Como ele deixa a minha ex, noivar assim do nada com alguém
que não sou eu? E daí que ela é maior de idade? Ela ainda mora
sob o teto dele, cacete!
— Não é porque ele é nosso cliente que você tem que ir, ele
entenderia o motivo de você não comparecer — diz Matteo, jogando
o convite na minha mesa.
— Também seria horrível para a sua imagem chegar lá e não
ter ninguém, é como se não tivesse superado — o comentário de
Léo me irrita.
— Mas eu não superei — afirmo o óbvio. Ele é cego, por
acaso? Não tá vendo isso bem na sua cara?
Pelo visto, sim, já que seus olhos reviram com desdém.
— Mas tinha que superar — Matt nega com a cabeça, puto e
decepcionado comigo e com minhas atitudes desde que nos
separamos. Ele pode ir tomar no cu junto com o meu ex-sogro. —
Faz seis meses que vocês terminaram, cara, você só tem 39 anos,
tem que aproveitar enquanto ainda pode, está solteiro, é bonito e
rico, não acha que está na hora de seguir em frente? — seus olhos
azuis fixam nos meus, buscando algo em meu rosto que pudesse
explicar o fato de não ter seguido em frente.
Até parece que eu não fiquei com ninguém, ele pensa que eu
sou monge, porra?
— Já sai com outras mulheres!
— Mas não se interessou de verdade por nenhuma.
— Eu sou metódico e...
— E foi por isso que Riley te deixou, irmão, você é careta
demais. — Ergo a sobrancelha. Que porra, Léo? — Não me olhe
com essa cara, estou falando a verdade, sou seu irmão, mas se eu
não te der uns puxões de orelha de vez em quando, não estou
fazendo o meu papel e ainda que diga que é o mais velho, eu sei
disso, e é por isso que precisa se soltar mais e viver mais o
momento. Você esperou tanto para pedi-la em casamento que outro
veio e fez isso, tá cheio de gente que está esperando a
oportunidade de passar na sua frente — endureço tanto o maxilar,
que sinto os dentes rangendo.
Léo sabe que conseguiu me fazer escutar, e por isso, continua
a sua merda.
Esse filho da puta.
— Você não corre risco, você fica na sua rotina, fazendo as
mesmas coisas sempre, precisa se arriscar de vez em quando,
irmão. — Encaro seu rosto sério por longos segundos, sentindo meu
olho esquerdo tremer.
Sou um cara sem paciência e Léo está fazendo ela acabar
rapidinho.
— Eu não sou careta — retruco baixo. Se eu já estava de mau
humor antes, com eles jogando esse monte de verdades na minha
cara, piorou.
Ninguém gosta de ouvir verdades, é por isso que a mentira é
doce na nossa língua.
— Sim, você é — afirma Matt, sorrindo de canto. — Quando
você cometeu alguma loucura na vida? — pergunta.
— Quando iniciei uma sociedade com meu irmão e melhor
amigo? Porque isso foi loucura, pode ter certeza.
— Isso não foi uma loucura, isso foi algo que todos nós nos
preparamos para fazer, e investimos tempo e dinheiro na nossa
carreira, confiamos no nosso potencial. — Essa é a primeira coisa
sensata que sai da boca do meu irmão, hoje. Quer dizer, quase
nunca sai algo sensato da boca dele. — Loucura é transar sem
camisinha, pegar o primeiro voo do dia sem saber o destino ou
quem sabe, pedir a mulher que namora há três anos em
casamento? — Eu não disse?
Sinto uma veia na minha testa pulsar.
— Você é doido? — minha pergunta o faz franzir o cenho.
— Por quê? — Por quê?
— Quando você andou transando sem camisinha, seu
irresponsável? Não tem medo de pegar doença ou engravidar
alguém aleatório, seu idiota? — sério, pensei que tinha educado
bem esse pirralho, fiquei responsável por ele desde que tinha quinze
anos e nossa mãe achou legal comprar cigarros e nunca mais voltar.
Fumante é foda.
Deve ter encontrado o nosso pai na loja.
— E qual o destino que você pegou quando viajou no primeiro
avião do dia? — questiona Matteo, encarando meu irmão com uma
sobrancelha arqueada e controlando a vontade de rir. Não sabia de
onde Matteo tirava tanto bom humor, o filho da puta vivia com um
sorriso no rosto.
Mesmo quando a melhor amiga, que ele morre de vontade de
comer, está se casando com outro.
— Desde quando o assunto se virou pra mim? — Léo se ajusta
na cadeira e aponta para meu peito. — Minhas loucuras não têm
nada a ver aqui, apenas a caretice dele.
Claro, por que não jogar mais que minha ex me deixou por ser
chato na minha cara? É justamente o que estou precisando.
Reviro os olhos e encaro meu celular. Estava anunciando uma
mensagem de Josh, um de nossos clientes e amigo próximo.
— Não importa, só responda as perguntas — Matteo insiste
com diversão e Léo bufa. Pego o celular para saber o que Josh
quer.
— Fui para Bogotá, voltei no mesmo dia, porque não sabia
nada sobre o país, mas só depois de foder uma ruiva gostosa pra
caralho. Sobre camisinha? Eu sempre uso, mas decidi não usar com
aquela minha última namorada da faculdade, confiava nela, e estava
disposto a cuidar se tivéssemos um filho, mas era tão gostoso que
valia o risco. Viu, Nick? Eu corro risco e nunca perco mulheres —
ignoro seu sorriso debochado. Ou ignorava, ou jogava a planilha
que estava na minha mesa no meio da sua cara de pau.
A planilha quebraria, com certeza.
Josh: Ei cara, tenho uma casa de alto nível construída em Las
Vegas, queria vendê-la, faz isso por mim?
— Que eu saiba, Jully terminou com você naquela época —
debocho do seu sorriso de merda e sua cara se fecha.
Queria não ser do tipo que joga verdades também, mas
crescemos assim.
E Léo fala, como se o fato de eu não ter seguido em frente
fosse diferente de quando Jully terminou com ele. Meu irmão se
sentiu uma merda.
Ele tem problemas com abandono.
Eu: Lógico, quando posso dar uma olhada nela?
Josh: Esse final de semana está livre? Está estreando uma
de minhas novas boates no domingo e meu novo hotel,
aproveitamos a viagem, o que acha? Prestigiar um velho
amigo é sempre bom.
— Ela não terminou comigo porque não queria ficar, ela
acabou nosso relacionamento porque iria viajar com a família para
outro estado e nem a pau eu ia namorar à distância, ela tinha que
escolher entre ficar comigo e com a família e cara, a gente sempre
escolhe a família, principalmente se a segunda opção era um jovem
de dezoito anos que não tinha onde cair morto. — Meu loiro queria
que ela tivesse escolhido ele.
— Então seu significado de não ser careta é transar sem
camisinha? — desdenha Matteo, cruzando seu tornozelo no joelho.
— Não, mas correr risco sem ligar para as consequências,
coisa que Nicolas não faz. — Viro o foco de novo.
Tenho que trabalhar esse final de semana, há uma reforma em
um edifício de luxo que estamos tentando vender os apartamentos a
um preço acima da média, e iria lá para ver como estava ficando,
mas tenho que procurar um designer de interiores ainda esse final
de semana, pois estávamos muito atrasados no prazo e todos que
tínhamos só faziam merda.
Mas...
Eu: Beleza, vamos organizar as coisas e chegamos aí
amanhã, e parabéns pela boate nova.
Solto meu celular em cima da mesa e encaro o maldito convite.
— Não sou uma pessoa impulsiva — volto minha atenção para
os indivíduos a minha frente. — E nunca farei nada impulsivo, eu
sou assim e ponto, se Riley não me aceita do jeito que sou e achou
que aquele idiota é o cara certo para ela, foda-se. Eu não preciso
correr riscos, as coisas funcionam do jeito que quero que funcionem,
ou não funcionam de jeito nenhum. — Aperto o maxilar, puto por
estar passando por essa situação e decido mudar de assunto. — O
que vocês farão esse final de semana?
Os dois erguem as sobrancelhas desconfiados, mas Matt
acaba respondendo.
— O que tem em mente?
— Temos um trabalho novo — Léo sorri como se dissesse “É
disso que eu estou falando, sempre trabalho”.
Julga como se não adorasse receber o dinheiro que ganhamos
com cada cliente, e não gastasse adoidado.
É um hipócrita.
— Qual o cliente? Por que não pode ser outro corretor e por
que não podemos ir agora? — Meu irmão pergunta.
— É o Josh e não podemos ir agora porque a casa que ele
quer nos mostrar fica em Las Vegas — na mesma hora o semblante
deles muda. O sorriso gêmeo que abre no rosto dos dois é
maquiavélico.
Eu sei que, ou eu vou precisar carregar eles para o hotel à
noite, pois eles nunca passam a noite com companhia, afinal, dormir
junto pode fazer a pessoa se “apegar”.
Ou vão fazer uma merda muito grande que vai me colocar em
apuros.
Eu, porque sempre sou eu que me fodo com esses merdas.
— Porra, agora você está falando a minha língua. — Matt
comemora, fechando seu punho e batendo no de Léo.
Apenas ergo uma sobrancelha e espero que saiam da minha
sala, para que possa me martirizar pelo convite em paz, mas
justamente por isso, eles não levantam a bunda da porra da cadeira.
Um lado meu está irritado por não ficar sozinho.
O outro está agradecido por ter uma família tão incrível como
essa.
Claro que só deixo eles verem o lado irritado, é coisa de família.
Diga que você se lembrará de mim.
Usando um belo vestido.
Olhando para o pôr do sol, querido.
Lábios vermelhos e bochechas rosadas.
Diga que você me verá de novo.
Mesmo que seja apenas em seus sonhos mais selvagens.
(Wildest Dreams - Taylor Swift)

A boate em que Lily decidiu comemorar a sua despedida de


solteira, está abarrotada de gente na fila de entrada. Lotada de
verdade, nunca que todas aquelas pessoas conseguem entrar aqui
hoje, talvez as últimas estejam guardando o lugar para a festa da
semana que vem.
Sem brincadeira.
O dono inaugurou um hotel mais cedo, e decidiu que seria uma
boa ideia inaugurar dois estabelecimentos ao mesmo tempo. Se o
noivo de Lily não fosse um cara importante e tivesse o passe Vip
que pessoas ricas têm, passaríamos a noite ouvindo as músicas do
lado de fora.
Prefiro escutar músicas no fone de ouvido na privacidade do
meu próprio quarto, onde posso enlouquecer sozinha. Além disso,
esse passe Vip me deixou entrar sem problemas, tenho apenas
vinte anos e tudo só é legalizado pra mim aqui nos EUA depois dos
vinte um.
Uma merda, mas é a vida.
Elisa e eu chegamos em Vegas há algumas horas e mal
tivemos tempo de nos arrumar, antes de sua prima aparecer na
nossa porta, pedindo para nos apressarmos.
Tive uma pequena vontade de pular em seus cabelos e
arrancar cada tufo pelo que me fez passar na faculdade, mas
lembrei que estou no 0800 por conta do noivo dela, então apenas
abri um sorriso e fui simpática. Era domingo, o final de semana em
Vegas não aconteceu, pois tanto eu, quanto Elisa, tínhamos que
resolver assuntos da nossa formatura ontem.
Vesti um dos meus melhores vestidos, colado no corpo, com
decote em coração e mangas frouxas até o punho, bege e brilhante,
e um salto de dez centímetros, já que quero aproveitar muito bem a
noite em que não estou gastando nada, mas não quero morrer com
calos nos pés por dançar com um treco de quinze centímetros.
Também passei uma maquiagem levinha.
Base, corretivo, delineador gatinho, rímel, iluminador e batom
vermelho. Bem básica.
Sarcasmo.
Então saímos do hotel e entramos em uma limusine, e agora
estamos aqui.
— Vamos ficar na área Vip — a sonsa... quer dizer, a noiva,
aponta para uma área cercada, com sofá, mesa e uma cortina. Sim,
uma cortina, em uma boate.
Acho que é para se pegarem com privacidade.
Elisa, que está lindíssima em um vestido vermelho,
destacando sua pele bronzeada, segura minha mão e me arrasta
atrás da sua prima. Há mais duas meninas atrás de mim. Se não me
engano, irmãs do noivo, que vieram para a despedida também, uma
se chama Louise e a outra Daisy.
Até me sinto mal, Lily só tem a prima, uma menina que não
gosta dela e duas cunhadas que mal conhece em sua despedida de
solteira. Nenhuma amiga de verdade.
Isso é triste.
Então tento ser simpática. Empatia é algo que tenho de sobra.
Posso ainda sentir dentro de mim que ela não é digna da minha
confiança, mas é sua despedida, então vou ser legal.
Eu sou legal, sou maravilhosa!
Chegamos na nossa área e Lily apresenta um crachá para o
segurança e assim que ele libera a entrada, nos sentamos.
Logo um cara se aproxima e pergunta o que queremos beber.
Benefícios da área Vip: não precisar enfrentar fila com os
barman.
— Pode trazer cinco opções de todas as bebidas do bar. Minha
prima aqui vai se casar, vamos aproveitar a despedida dela. — Elisa
pede ao homem e ele anui, sorrindo.
— Sim, senhora — volta sua atenção para Lily e a parabeniza.
— Parabéns pelo casamento.
A noiva sorri.
— Obrigada! Pretendo enlouquecer hoje! — Então, olha para
as cunhadas e fica sem graça. — Não tanto, é claro.
As meninas riem e preciso controlar a vontade de revirar os
olhos.
Sou boazinha.
— Não se preocupe, também viemos aproveitar a boate —
Daisy, a mais nova, fala sorrindo.
O garçom se despede e sai para buscar nossas bebidas.
— Você sabe que é loucura misturar bebida, não é? — minha
pergunta faz Elisa me encarar e piscar.
— Loucura é seu sobrenome, amiga, e a intenção é
justamente perder o controle!
É por isso que amo essa garota.
— Exatamente, é minha despedida de solteira! — Grita a
noiva, quicando no assento e repetindo a mesma coisa que já disse
umas mil vezes desde que saímos do hotel.
— Eu não vou beber, então posso cuidar de vocês se as
coisas saírem do controle — Fala Louise, a irmã mais velha.
Concordo com a ideia, ter alguém sóbrio vai ser ótimo.
— Não seja por isso, eu tomo suas doses por você — sorrio
com Elisa.
— Então, qual a data do casamento? — pergunto, para puxar
assunto com a sonsa.
Lily brilha no lugar.
— Daqui a exatos dois dias. — Arregalo os olhos, mas logo
disfarço.
Como não namoro, acho cedo para me casar, só tenho vinte
anos e Lily apenas vinte e um. Mas quem sou eu para julgar? Só
faço merda na minha vida.
— Parabéns — repito o que o garçom disse, apenas porque
não tenho outra coisa para falar.
E é só pensar no carinha que ele volta, carregando uma
bandeja com vários shots em cima.
— Não deu para trazer todos de uma vez, mas é só
terminarem que trago a próxima bandeja — explica e sai logo em
seguida.
— Oh merda, isso vai fazer muito mal para o nosso fígado —
afirmo com um sorriso na voz, e Elisa devolve o sorriso.
— Pensa pelo lado bom — ergo uma sobrancelha e ela pisca
pra mim. — É grátis — sussurra baixinho e abro um sorriso grande.
Ela está certa.
Esse é o lado bom.
Não posso ficar gastando com coisas que não são essenciais,
meu dinheiro não é capim, poxa.
Beber é diversão. Comida é essencial.
Então, com as meninas que eu mal tenho contato, e minha
única amiga, começo a virar shot atrás de shot.
Depois de um tempo, nos levantamos e vamos para a pista, eu
danço como se não houvesse amanhã, bebo como se não fosse
ficar com ressaca, grito como se fosse meu último dia livre.
Desde que fugi para os Estados Unidos, venho me sentindo
livre como nunca me senti na vida, mas tenho uma impulsividade do
caralho que sempre me mete em encrencas, além de uma mania de
sempre deixar para resolver tudo depois. Espero que meu visto seja
aprovado, mesmo que esteja demitida.
Mas algo me diz que não vai.
Quando essa notícia chegar, vou dar um jeito. Eu sempre dou,
sempre em cima da hora, sempre sob pressão.
Mas a vida não é assim? Então continuo me divertindo em
uma noite em Vegas, bebendo, dançando e talvez até dando uns
beijos. Mas vou me divertir.
Vou me divertir enquanto ainda posso fazer isso.
Enquanto estou na faculdade.
Enquanto tenho vinte anos.
Enquanto é tudo grátis.
Enquanto Elisa não vai embora.
Enquanto eu não sou deportada.
Enquanto sinto olhos em mim, mas não sei de onde vêm.
Enquanto, enquanto, enquanto…
Por enquanto, é o que faço.
Continuo construindo castelos feitos de areia.
Ela é maravilhosa.
O fogo está ardendo.
Mais quente que Cajun, garota.
Você não quer chegar um pouco mais perto?
(Right Round - Flo Rida)

Assim que chegamos em Vegas, nos hospedamos no hotel,


que assim como a boate, está sendo inaugurado hoje por Josh. Léo
e Matt estão animados com a perspectiva de beber e foder. Porque
é isso que eles querem, foder.
E querem que eu faça isso também.
Não vou mentir e dizer que não dormi com nenhuma mulher
nesse período em que estou separado de Riley. Ela está com outra
pessoa, porra, desde quando tenho cara de besta que vive em
celibato só porque não pode estar com a mulher que quer?
Só que depois de receber aquela merda de convite, não estou
a fim de ficar com ninguém. Estou a fim de ficar no meu quarto,
pensando no que diabos está acontecendo e ligar para ela, e poder
tirar isso a limpo.
Estávamos conversando, porra, pensei realmente que
voltariamos e essa notícia fez o sentimento de traição me tomar por
completo.
Porém, prometi para os babacas que sairia com eles, e é onde
estamos agora. Na área Vip da boate de Josh, com o melhor whisky
que ele tem descendo pela minha garganta. Talvez tomar um porre
seja o que preciso para esquecer tudo que está saindo do meu
controle.
Odeio coisas que saem do meu controle, tenho angústia de me
enfiar em uma situação que não saiba como lidar. Isso me deixa
extremamente irritado.
— Fiquei sabendo que sua ex vai casar — Tão sutil quanto
uma bazuca, Josh comenta, observando a pista da sua boate.
— Os fofoqueiros sempre são os primeiros a saber —
resmungo, um pouco mais alto para que possa me ouvir por cima da
música.
— Ei, assim você me ofende — sua mão no coração e
expressão de ofendido não me convence nenhum pouco. — E para
a sua informação, só soube porque recebi o convite.
— Ela enviou um convite pra você? — que porra?
— Claro que enviou, sou rico e importante, e ela é uma
socialite da alta sociedade, óbvio que me convidaria — dá de
ombros como se o que disse fizesse sentido e... faz.
Faz, porque ela convidava todo mundo da alta sociedade de
NY para seus aniversários.
— Chegou um convite pra ele também, acredita? — Léo
desdenha, seu sorriso sarcástico no rosto. Está se divertindo muito
com a minha desgraça, esse filho da puta. — Ele ainda esperava
voltar com Riley e ganhou o convite de presente.
Sentir o olhar deles sobre mim é desagradável, principalmente
por saber que é repleto de pena. Odeio pena.
Eles podem enfiar ela no cu. A galinha inteira, se quiserem.
— Pensa pelo lado positivo — ergo a sobrancelha para a fala
do meu melhor amigo. — Agora que ela vai casar, você não precisa
ficar igual um otário esperando ela voltar para você, pode curtir sua
solteirice.
— Antes só do que casado com uma mulher que te trocou em
dois meses. — Léo colabora e aperto o copo com tanta força, que
fico com medo do vidro rachar na minha mão.
— Vocês não deveriam estar me consolando, porra? Não é pra
isso que vocês servem? — retruco com raiva.
— Você tem que entender que eu sirvo para muitas coisas,
irmão, mas consolar não é uma delas. — Léo ri, tomando uma dose
do seu Whisky.
— Não estamos te consolando? — Matteo franze as
sobrancelhas com falsa confusão. — E eu aqui pensando que
estávamos fazendo justamente isso.
— Vocês não querem ir se foder? — minha pergunta é irônica.
— Me foder, não, mas aquela morena ali, com certeza — Léo
aponta para uma morena que está no meio da pista de dança,
sorrindo, e cantando a plenos pulmões.
Porém, ela não chama muito a minha atenção, embora a
mulher seja linda, parece nova demais para meu gosto.
Só que a mulher que está a sua frente, de costas para mim,
dentro de um vestido bege, que brilha em reflexo às luzes da boate,
com cabelos cacheados descendo até acima da bunda redondinha
e... gostosa, faz um arrepio percorrer o meu corpo.
Tomo um gole do meu whisky, observando como ela remexe o
corpo, e talvez seja disso que preciso.
Uma boa foda com aquela garota.
Estou em Vegas, com meus irmãos, em uma boate e tudo o
que fiz até agora foi pensar na minha ex, que como Léo deixou
claro, me trocou por outro em menos de dois meses, como se tudo o
que vivemos não valesse nada. Como se tudo o que eu fiz para ela
não fosse o suficiente.
E estou aqui sofrendo por ela, enquanto ela provavelmente
está fodendo com o noivo filho da puta.
Estou em Vegas, porra!
E aquela mulher... eu quero ela.
Ela rebola até o chão, e não preciso ver seu rosto para saber
que é linda. Eu sinto que ela é.
Sinto que ela é o que eu preciso.
— Você está vendo isso, Matt? — Escuto meu irmão falando.
— Tô tentando acreditar no que meus olhos veem — Matt
responde, mas estou focado demais no rebolado do seu quadril para
me importar.
Hipnotizado me define melhor.
Seu corpo se move com confiança, experiência, todos os
movimentos feitos para seduzir um homem. É uma mulher que sabe
o que está fazendo, e sabe o efeito que causa nas pessoas...
— Caralho, quem não olharia? Olha aquela bunda... — Josh
fala e tenho que concordar.
— Você vai fazer algo a respeito, irmão? — Léo pergunta e
finalmente desvio o olhar para ele.
Todos estão me olhando como se estivessem presenciando o
evento do século. Eu já fiquei com outras mulheres, cacete! Reviro
os olhos e volto a olhar para a pista de dança e meu coração erra
uma batida quando não a encontro. Procuro por todos os lados, me
levanto tentando ver sobre as dezenas de cabeças, mas não
consigo encontrá-la.
A frustração me consome.
Que caralho, perdi a mulher!
Bufo e volto a me sentar, olhando para Josh.
— A mulher sumiu — murmuro. — Preciso relaxar, não tem
algo mais forte aí, não?
Josh franze o cenho.
— Mais forte do que Whisky?
— Eu tenho uma coisinha... — encaro meu irmão com as
sobrancelhas erguidas, vendo-o tirar um saquinho com alguns
comprimidos dentro.
— Isso é droga?
— É só uma mistura para bebida. Traz o efeito que você está
procurando e eu não uso sempre — dá de ombros como se fosse
normal, e Matt oferece o seu copo. Josh não fica pra trás e oferece
o dele também.
Como se já tivessem feito isso antes. Não usa sempre o meu
caralho, Léo!
— Deixa de ser cuzão, Nick — Matt revira os olhos e abre um
sorriso. — Estamos em Las Vegas, vamos no divertir, porra.
— O que acontece em Vegas, fica em Vegas — Josh
completa, piscando um olho para me incentivar.
— Menos Herpes, isso é pra vida inteira — Léo completa e
mesmo não querendo, rio pela primeira vez na noite.
Eles estão certos, nunca fiz nada fora do comum na minha
vida, nem mesmo quando adolescente, talvez deva aproveitar e
curtir a noite. Não vai fazer mal, o que poderia dar errado?
Ofereço meu copo e eles sorriem
— A essa noite, que será inesquecível — Léo brinda e
repetimos o brinde.
Bebo o líquido com o comprimido já dissolvido e observo a
boate.
Todos nos levantamos e vamos para a pista.
Não sei como acontece, mas meu humor melhora depois da
terceira dose de whisky.
Depois da quinta... bem, tudo vira uma confusão.
Prazer em te conhecer, onde você esteve?
Eu posso te mostrar coisas incríveis.
Magia, loucura, paraíso, pecado.
Te vi ali, e eu pensei.
Ai, meu Deus, olhe esse rosto!
Você parece com o meu próximo erro.
O amor é um jogo, quer jogar?
(Blank space - Taylor Swift)

Mas que barulho infernal, senhor! De qual ser desumano é


esse maldito despertador estridente que está tocando a uma hora
dessa da madrugada?
Meu não é, nunca uso despertador para nada e por isso vivo
chegando atrasada nos lugares. Mas entre chegar atrasada e
preservar o meu sono sagrado? Prefiro o meu sono e esse maldito
despertador não está colaborando comigo.
Se já não bastasse, a minha cabeça está prestes a explodir.
Inferno!
Resmungando, abro os olhos, piscando um pouco com a
claridade do quarto que com certeza foi feita para deixar alguém
cego e procuro a origem do objeto que vai virar picadinho assim que
eu botar minhas mãos. Se tem uma coisa que me deixa irritada, é
não dormir no mínimo oito horas de sono por dia, e isso é desde que
eu descobri que pessoas que não dormem essa quantidade de
horas podem morrer mais cedo em um vídeo na internet.
Não sei se é certo, mas sei que não vou brincar com a sorte.
Tá achando pouco o tanto de azar que já tenho?
Assim que tento me mexer, sinto algo me segurando no lugar e
paraliso.
Oh não!
Não tem um braço rodeando minha cintura, tem? Olho para
baixo e... Ô se tem!
Tem um braço cheio de veias e músculos, circulando o meu
corpo e me apertando com força, como se não me quisesse em
outro lugar senão nos braços dele.
Falando nele...
Hum... ombros largos, musculoso e sem camisa, cabelos
loiros, de um tom escuro, quase castanho, pescoço e clavícula bem
marcada, barba grande, toda bem-feita e aparada, loira escura,
rente a um maxilar quadrado, contornando uma boca de lábios bem
desenhados e cheios. Rosados também, do tipo que dá vontade de
morder e... Será que eu mordi?
Sigo com minha inspeção, observando o nariz perfeitinho, e
algumas poucas sardas, quase invisíveis de ver, que estão
salpicadas pelo nariz e bochechas. Fofo, isso é fofo.
Meus olhos sobem um pouco mais com a inspeção e… Se
conectam com um par de olhos verdes, intensos, sonolentos e
desconfiados.
E lindos. Os olhos são insanamente lindos.
— Quem é você? — A voz grossa e rouca, arrepia cada pelo
do meu corpo em uma onda de eletricidade hipnotizante.
Que coisa… gostosa.
Seu olhar escrutina cada parte do meu rosto, analisando
minhas íris, meu nariz, minha boca semiaberta — nessa, passa um
tempo a mais observando, até engolir em seco — e depois volta o
olhar para o meu.
Ele é lindo.
Abro um pequeno sorriso, mesmo que o coração esteja para
saltar pela boca com a intensidade com a qual me observa.
— Que engraçado, já ia te fazer a mesma pergunta —
respondo e seu cenho se franze em uma careta fofa, formando
pequenas linhas de expressão no cantinho dos seus olhos.
Não é muito visível, e provavelmente só consigo ver porque
nossos rostos estão quase colados. Ele é mais velho do que eu,
deve passar dos trinta.
— Como você veio parar aqui? — continua me interrogando,
agora com um olhar semicerrado e abro um sorriso maquiavélico.
— Nunca te disseram que é de uma extrema falta de
cavalheirismo não lembrar da mulher que dormiu com você e ainda
demonstrar isso para ela no outro dia? — ergo uma sobrancelha
sarcástica e ele arregala os olhos assustado.
Não demonstro que por dentro estou horrorizada e rezando
para que tudo o que nós tenhamos feito durante à noite tenha sido
dormir. É desconfortável para um caralho não lembrar de ter
transado com alguém.
Mesmo que esse alguém seja um dos homens mais lindos que
já vi, e olha que ele está com cara de sono, cabelo bagunçado e por
Deus... como ele é sexy!
— A gente dormiu junto? — pergunta ainda desconfiado, com
a voz rouca e miro seu braço ao redor da minha cintura que
continua a me agarrar com a mesma força, só que é tão
aconchegante que não reclamei ainda. Seus olhos seguem os
meus, admirando cada parte minha, inclusive os seios médios, e
quando percebe como estamos, se afasta de mim como o diabo
foge da cruz, pulando para o outro lado da cama. —Porra! — passa
a mão no rosto, como se ainda não estivesse acordado o suficiente
e juro que entendo perfeitamente o que ele está sentindo.
Principalmente quando segura a cabeça com se estivesse com
dor. Solto uma risada, enfiando um travesseiro na minha cara para
abafá-la. Essa risada é puro desespero. Oh merda, se ele não sabe
como viemos parar aqui, como diabos eu vou entender que porra
aconteceu ontem?
A última coisa da qual me lembro é de beber para cacete, e
depois das dez horas da noite não lembro mais de nadinha!
Juízo foi algo que durante toda a minha vida eu fui acusada de
não ter, e sinceramente, pela primeira vez, eu dou total razão para
essas pessoas!
— Essa é a primeira vez que alguém fica tão horrorizado com
a ideia de ter dormido comigo, estou me sentindo ofendida — rio
ainda mais da sua cara horrorizada.
— Do que você está rindo? — o desconhecido pergunta,
desligando finalmente o despertador que tocava em algum lugar, e
paro o riso na hora para observar ele. O cara está se levantando da
cama, apenas com uma cueca preta da Calvin Klein, que delineia
uma bunda durinha e redonda. Meus olhos fixam nela. — Por Deus,
garota, quantos anos você tem? — prendo outro riso de nervoso e
respondo.
— Estou rindo porque isso é muito bizarro, já que eu não faço
ideia se dormimos juntos, de como eu vim parar aqui e como isso
aconteceu, mas tenho resposta para duas das perguntas que você
está fazendo desde que acordou, sem nem mesmo me dar um bom-
dia — levanto dois dedos, sorrindo para ele que continua com o
cenho franzido, procurando algo no chão. Aposto que é pela sua
calça. Ele bufa para meus dedinhos finos erguidos. — Meu nome é
Aurora, e tenho 20 anos — O loiro trava o movimento da calça que
estava subindo por uma perna e me olha horrorizado. Continuo com
o mesmo sorriso, agora se tornando um pouco malicioso. — E você,
coroa?
Seus olhos se cerram. Ele puxa a sua calça, agora muito mais
rápido do que antes e prendo outra risada.
Ai Jesus, no que eu me meti agora?
— Primeiramente, coroa é seu pai — aponta o dedo em riste
na minha direção, e finjo estar chocada, colocando a mão no peito,
por cima do sutiã meia-taça que estou usando. Ele observa o
movimento, desviando os olhos rapidamente e engolindo em seco.
— E eu me chamo Nicolas — semicerro os olhos, enquanto ele
anda pelo quarto, procurando a camisa. Estou gostando mais do
que deveria da visão.
Finalmente crio coragem para me levantar também.
Primeiro, olho por debaixo da coberta e como suspeitei, estou
apenas com a outra peça rendada da minha lingerie. O que não é
surpresa se levar em conta que meu vestido está jogado ao lado da
cama, no chão.
Cacete.
Rapidamente me visto, sentindo olhos em meu corpo seminu e
deixando apenas o zíper das costas aberto, sabendo que não
conseguirei fechar sem ajuda. Não sou contorcionista e minha
flexibilidade é uma vergonha.
— Pode me ajudar aqui? — pergunto para Nicolas, que olha
para o celular como se fosse tirar todas as respostas do universo
daquele aparelho. O coroa me olha rapidamente e assente meio a
contragosto. Me viro e deixo suas mãos fecharem o meu vestido. —
Não me respondeu quantos anos tem.
Ele suspira.
Meu corpo se arrepia com seus dedos me tocando ao subir o
zíper.
— Trinta e nove, garota. — Responde, sua voz cheia de
arrependimento.
Mas, arrependimento de quê?
— Uau, você é coroa mesmo, hein? — brinco quando me solta
e me viro de frente para ele, com um sorriso aberto.
Sorrir é meu mecanismo de defesa, estou sempre sorrindo,
mesmo quando a situação não pede sorrisos.
— E você — chega perto e inspira o meu cheiro, deixando um
rastro de arrepios que ignoro por ora. — Tem cheirinho de leite — se
afasta e fecha o semblante.
Ah, com certeza eu sou o motivo do arrependimento.
— Deve ser o seu, então — pisco um olho, apenas para sair
por cima e vejo um dos seus olhos tremer e seu maxilar trincar.
Nicolas se senta na cama e encara o chão, com os cotovelos
apoiados no joelho, o queixo na mão.
— Vinte anos?
— Vinte lindos anos — respondo, sugando o interior da
bochecha.
Puta que pariu. Que situação!
— Meu Deus, onde eu fui me meter? — resmunga baixo,
negando com a cabeça.
— Fiz a mesma pergunta pra Jesus, agorinha — respondo. Ele
me olha, mas apenas dou de ombros. — Ele não me respondeu
ainda, se tem alguma dúvida. Então acho que não vai responder
para você também.
Seu olho treme novamente.
Continuo em pé, agora observando o quarto ao nosso redor…
Aqueles são os meus sapatos ao lado da porta? Com certeza, são
sim!
Continuo minha inspeção. Não sei onde estamos, mas o
quarto é todo equipado com uma cama king size, uma televisão de
no mínimo 60 polegadas na parede, todas as paredes em tons de
cinza, embora o teto seja branco. Tem um frigobar do lado em que
ele dormiu na cama. Também há duas portas, uma deve levar para
o banheiro e a outra para fora daqui.
— Você sabe pelo menos onde nós estamos? — pergunto,
passando a mão na testa, para tentar amenizar o latejar.
— Esse é o meu quarto — fala com desânimo e aceno em
concordância. É um belo quarto, mas estou vendo uma mala no
canto, então não deve ser o seu quarto de verdade. — Estamos no
hotel de um amigo, que foi inaugurado ontem, junto com a boate
Malice. — Explica quando nota que meus olhos ainda estão na mala
dele.
De repente, uma luz acende na minha cabeça.
— Eu fui à inauguração da boate! — gesticulo em sua direção.
— Você foi também, não é? Se foi, deve ser onde nos conhecemos!
— Solto uma respiração aliviada, quando ele assente, pois pelo
menos uma peça desse quebra-cabeças está se encaixando.
— Devo ter bebido demais para ficar com você — sussurra,
como se não quisesse que eu escutasse, mas eu o faço.
— Se serve de consolo, também não costumo ficar com
alguém que provavelmente precisa de pílulas azuis para o pau subir
— respondo com toda a maturidade que nunca tive.
Nicolas ergue a cabeça tão rápido que escuto o estalo do seu
pescoço. Os olhos semicerrados mostram que talvez, só talvez,
esteja perdendo a paciência, mas apenas abro o meu melhor sorriso
para ele.
— Olha aqui, garota... — aponta o dedo em riste novamente,
mas agora noto algo que não havia prestado atenção antes.
Arregalo os olhos em choque e me afasto dele.
— VOCÊ É CASADO? — Grito horrorizada. Nicolas se assusta
com a minha explosão, dando um pulo para trás.
Se tem algo que eu odeio mais do que o fato de que nunca vou
dar uns beijinhos no Henry Cavill, é homem traidor. E se esse
vagabundo que me encara ainda irritado me fez uma amante, igual
a maldita da Camila, eu vou matá-lo.
Sempre quis ser a Diana, nunca a Camila!
— Você está doida? — fala ofendido, como se o fato de trair a
mulher nunca ocorresse a ele.
Mas deve ter sido isso o motivo do arrependimento que vi na
sua cara quando acordamos.
— Doida eu vou ficar se tiver me transformado em uma
amante, coroa! — ele ainda me olha sem entender e reviro os olhos
apontando para suas mãos. — Você está de aliança!
Ele segue meu olhar e encara o dedo com a linha dourada
delineando o anelar esquerdo e seus olhos arregalam tanto que
faltam quicar para fora do rosto.
— QUE PORRA É ESSA? — fala para o próprio dedo e fica
encarando a mão em uma expressão de choque.
Apoio as mãos na cintura e nego com a cabeça. Deve ser a
culpa, sempre consome os homens até que eles façam de novo e
de novo.
E ainda chegam na gente e falam… Errei, fui moleque.
Nem todos os homens, mas sempre um homem... Até os
velhos são safados!
— Só me diga que ela não vai entrar aqui a qualquer
momento, porque eu não quero apanhar de mulher irritada...
— Eu não sou casado! — fala indignado e reviro os olhos.
— E eu sou virgem! — retruco, com sarcasmo, mas ele está
tão atordoado que apenas me olha.
— Você é virgem? — sai como um chiado da sua boca.
— É claro que não né, idiota? — olho sugestiva para a cama,
mesmo sem saber se transamos ou não, e... porra!
Agora Jesus me mostrou onde eu me meti.
É castigo!
Esfrego as mãos no rosto para clarear as ideias, mas Nicolas
pigarreia na minha frente. Abro uma fresta entre os dedos e olho
para sua cara de pau que está...
Meu Deus, o homem vai desmaiar!
— Você está bem? Está mais branco do que uma folha de
papel, coroa, na sua idade não é bom passar por problemas no
coração — ele aponta para minha mão ao perguntar.
— Você é casada? Por favor, diga que é, e me diga que não é
o que eu estou pensando.
Franzo as sobrancelhas e sigo os seus olhos até um anel
dourado no meu dedo anelar esquerdo e sinto meu coração parar
de bater.
Oh não.
Oh não!
— Ai caralho — xingo em português ainda olhando o maldito
anel. Sacanagem, Aurora, sacanagem!
— Cacete, só pode ser brincadeira, porra — Nicolas resmunga
e começa a andar pelo quarto à procura de algo, enquanto continuo
parada no lugar, estática com o que está acontecendo.
O coroa encontra um papel em uma mesinha no canto e bate a
mão na mesa com força, me assustando e finalmente me tirando do
transe.
Corro para onde ele está, e pego o papel de suas mãos.
Uma certidão de casamento.
Nicolas Ramsey e Aurora de Oliveira Castelo.
Eu e o coroa ao meu lado.
Oh merda!
— Como diabos isso foi acontecer? — reclamo.
— Isso é culpa sua — rosna, apontando o dedo na minha cara.
— Olha aqui, velhinho, ninguém nunca te ensinou que apontar
o dedo na cara dos outros é falta de educação? — Ô raiva que eu
tenho de quem aponta o dedo na minha cara. — E onde que essa
merda é minha culpa? — adoto minha postura mais altiva, com raiva
desse canalha que acha que pode fazer merda e me culpar por isso.
— O que você quer? Eu não lembro de ter ficado com você e
com certeza não iria de bom grado me casar, então o que é isso?
Armou pra mim? Quer dinheiro? Que merda você quer, garota? —
rosna aproximando o rosto do meu, desviando os olhos para meus
lábios, e xingando baixinho.
Vai tomar no cu e ser bonito assim no inferno!
Quem esse idiota pensa que é pra falar assim comigo?
— Primeiramente, de você eu não quero nada, eu nem te
conheço, e se for escolher alguém para ser meu marido, eu gostaria
de alguém que pudesse lidar comigo por mais do que três minutos,
que é o máximo que você poderia conseguir — ele trinca o maxilar e
sei que a idade dele é um ponto em que posso tocar para deixá-lo
irritado. Ótimo, estou irritada para caralho também. — Segundo, eu
ia armar para você por quê? O que eu ganharia com isso? E não
vou mentir, quero dinheiro sim, porque hoje em dia todo mundo
quer, mas sempre trabalhei para ter o meu, não é dando golpe nos
outros que eu vou conseguir, sou mais honesta do que você pode
imaginar ser um dia — quando termino, estou ofegante de tanto
falar, com o rosto próximo ao seu.
Sua proximidade faz algo comigo, então me afasto e vou pegar
meus sapatos na porta.
— Para onde você vai, garota? — pergunta, mas começo a
calçar meus lindos saltos sem olhar na sua cara.
— Dar um jeito de anular essa merda, porque nem fodendo eu
fico casada com um brutamontes como você — mesmo que pareça
um galã de cinema. Me levanto, procuro meu telefone e o encontro
em cima da pequena estante na parede do quarto.
Olho para a tela e vejo algumas ligações perdidas de Elisa, e
de Marcos, um amigo da imigração que disse que ficaria de olho no
meu pedido, mas nem crédito para retornar eu tenho. Então espero
que ele ligue de volta para atender.
— Eu vou com você — Nicolas finalmente sai do lugar e entra
no banheiro. Demora um pouco para sair, e logo que sai, me olha
com aquele olhar desconfiado, mas aponta para o banheiro. — Tem
escova reserva.
Aceno e entro logo.
Fiquei tão em choque com tudo que nem notei minha bexiga
prestes a explodir.
Assim como minha cabeça.
Que merda aconteceu ontem? Onde estão as meninas? Por
que isso sempre acontece comigo?
Veja bem, acordar casada não é meu ideal de amor, prefiro
conhecer o cara com que vou passar o resto da minha vida e o
idiota gostoso no quarto não é ele.
Faço tudo o que deveria fazer, limpo minha cara de bagaço,
arrumo o cabelo em um coque frouxo, mesmo os meus cachos
soltando em alguns lugares e saio logo em seguida. Ele está
encostado na porta, mexendo no celular, com a certidão nas mãos e
quando me nota, a abre sem me dar mais atenção e sai, segurando-
a aberta para mim.
Boa hora para ser cavalheiro.
Otário.
Não vejo a hora de resolver essa bagunça, então, apenas saio
em direção ao elevador e aperto o botão para chamá-lo.
Sinto sua presença as minhas costas.
Assim que o elevador se abre, um cara que estava lá dentro,
vagamente familiar, nos olha e abre um sorriso enorme.
— Como vai o casal de noivos mais lindo de Vegas?
Nem fodendo.
Essa sou eu rezando para que.
Essa seja a primeira página.
Não onde a história termina.
Meus pensamentos ecoarão o seu nome.
Até eu te ver de novo.
Essas são as palavras que não disse.
Enquanto eu ia embora cedo demais.
Eu fiquei encantada em te conhecer.
(Enchanted - Taylor Swift)

— Como assim, casal de noivos, Josh? — Nicolas entra no


elevador comigo e encara o homem à nossa frente. Pelo seu
semblante, tenho quase certeza de que está prestes a pular no
pescoço do cara.
Quase.
Está prestes a pular no meu também, acho que é uma reação
normal.
Josh — como Nicolas o chamou — franze o cenho em
confusão e nos encara.
Se fosse só você, querido, poderíamos até ter uma conversa,
mas todos estamos confusos agora, e adivinha quem está mais
lascado? Nós mesmo, bonitão.
— Vocês, ué — Não disse? — Vocês não se casaram ontem?
Estou bêbado ainda? — pergunta, esfregando os olhos castanhos e
nos encarando de novo.
Josh é um homem mais velho, também. Barba cerrada, pele
negra, músculos aparentes mesmo debaixo do terno caríssimo que
está usando e olhos maliciosos.
— Porra, como diabos eu não me lembro de nada do que
aconteceu? — Queria saber também, Nicolas.
Seu semblante estressado não é capaz de disfarçar a sua
beleza, puta merda. É um otário? É, mas é um otário gostoso pra
caralho.
Tá bom, tá bom. Acho que qualquer coisa que faça o deixa
lindo. Que ódio.
— Cara, você extrapolou na bebida ontem, e por ser a sua
primeira vez usando aquilo, não me surpreende que você não
lembre de nada — Josh desvia seu olhar para mim e me observa de
cima a baixo. Ergo uma sobrancelha. — Também não lembra de
nada? — pergunta com cautela. Nego. — Porra — xinga, desviando
a atenção de um para o outro. — Isso é confuso para caralho.
— Imagina como fiquei ao acordar agarrado com uma
adolescente? — Nicolas retruca com grosseria.
— Tenho vinte anos, coroa, e não te falei para não te deixar
constrangido, mas seu pau estava duro na minha bunda. — Seus
olhos se arregalam com horror e Josh bufa uma risada surpresa.
Sorrio de lado. — Acho que você ficou até animadinho comigo nos
seus braços, está reclamando não sei do quê. — Pisco
inocentemente.
Irritar esse cara está virando uma das minhas coisas favoritas.
Levar essa surra no meu ego é o que não está me animando.
— Caralho, garota, é por isso que eu gostei de você — por não
ter amor à vida? Não é motivo de orgulho, Josh. — Você não lembra
de nadinha? Nem de nos encontrar? — sua pergunta me faz
balançar a cabeça em negação. — Porra, isso vai ser complicado.
Não brinca, Sherlock.
— Eu estava sozinha quando encontrei vocês? — Não sei
onde o resto do meu grupinho está e preciso urgentemente falar
com Elisa, sua memória de elefante me ajudaria muito a lembrar dos
detalhes do que aconteceu noite passada.
Talvez sem a parte do sexo que a gente fez ou não…
— Não, — droga — você estava com mais três garotas, uma
delas estava na despedida de solteira. Você chegou reclamando
sobre sua amiga ter precisado ir embora quando o namorado veio
buscá-la. — Bufo em frustração.
Óbvio que a merda que eu joguei no ventilador está batendo
na minha cara quando eu menos espero. E atingindo todos ao meu
redor.
— Você sabe onde as outras meninas estão? — indago
novamente, pegando meu celular para poder enviar uma mensagem
para Elisa. — Esse hotel tem Wi-fi? — pergunto para ninguém em
específico.
— As outras meninas foram embora também, disseram que
precisavam ir ao banheiro e depois você recebeu uma ligação de
que todas tinham ido embora. — A voz de Josh é recheada de
cautela, e me pede o celular para colocar a senha do Wi-fi,
enquanto estou tentando processar que elas me deixaram sozinha.
Sozinha e bêbada na porra de uma boate.
Por que isso não me surpreende? Solto uma risada incrédula,
negando com a cabeça.
Elisa provavelmente foi embora porque eu disse que ficaria
bem, e porque deve ter confiado que a prima e as duas irmãs idiotas
ficariam comigo.
— Mas que vadias! Quem vai embora e deixa a convidada
sozinha em um lugar em que não conhece ninguém? — exclamo
com raiva.
Eu sabia, sabia que não deveria ter confiado naquela idiota,
não é à toa que não tinha amigas ontem, aquela tonta do caralho.
Tonta, sonsa, filha da puta!
Nicolas me encara com seu cenho franzido, e um sentimento
diferente passa pelos seus olhos, uma falsa preocupação que faço
questão de ignorar.
Eu sabia que Lily era uma vaca egoísta, mas as cunhadas?
Ah, elas entraram para minha lista negra!
— Suas amigas te deixaram sozinha em uma mesa com
quatro homens e bêbada? — pergunta o coroa, me observando com
atenção.
Indignado.
Pode até não gostar de mim, mas assim como eu, está
indignado.
Bufo, pegando o celular que Josh me entrega, já conectado no
wi-fi. Não olho para eles ao responder, ocupada digitando rápido
uma mensagem para Elisa.
— Aquelas garotas não são minhas amigas. — Eu lá tenho
cara de quem anda com gente mais falsa do que nota de três reais?
— Minha amiga de verdade é a que foi embora mais cedo, com
certeza confiando que as outras ficariam comigo. — Teclo com
força, várias mensagens para Elisa. — A noiva é uma vaca egoísta,
trapaceira e mimada que não tinha ninguém para comemorar a
própria despedida de solteira de tão insuportável que é, e eu,
aproveitei que era de graça e vim, além de ter ficado com pena dela.
As outras duas são as cunhadas que só vi quando estava a caminho
da boate. QUE ÓDIO! — Grito a última parte e Nicolas, que em
algum momento colocou o telefone na orelha para fazer uma
ligação, pula de susto com meu rompante e deixa o celular cair no
chão. — Desculpa.
Peço, passando a mão no rosto, buscando uma calma que
nunca existiu em mim.
Sinto o olhar dos dois em meu rosto.
— Para onde vocês estão indo, agora? — pergunta com
cuidado.
— Anular o casamento — falamos ao mesmo tempo. Nicolas
me fita, mas logo desvia o foco para o celular, o levando à orelha
novamente.
Parece que tem medo de me olhar demais, eu heim!
— Onde vocês estão? — pergunta para quem quer que seja e
começa a discutir pelo telefone. — Certo, chama o Matt, preciso que
ele me ajude em uma questão... sim, exatamente essa. Qual a porra
do seu problema? Como você... quer saber, eu vou matar você, sem
um pingo de dó, Léo! — Nicolas grita com quem quer que seja esse
Léo e automaticamente fico com pena do coitado.
Quando vou parar de ser imatura e começar a ser
responsável? Isso não pode acontecer de novo. Se eu tivesse sido
sequestrada? Abusada? Ou pior...
Ah, Deus, onde fui me meter?
O elevador abre no hall do hotel. Todos fazemos menção de
sair, porém os dois homens param e me deixam passar primeiro.
Tá, isso foi cavalheiro, mas deve ser a velhice, com esse tanto
de décadas vividas, devem ter aprendido uma coisa ou outra.
— No hotel tem um restaurante, vamos tomar um café
enquanto esperamos meus irmãos chegarem, pode ser? — Apenas
ergo uma sobrancelha para Nicolas. Pensei que estávamos os dois
ansiosos para anular logo esse casamento. — Meu melhor amigo é
advogado, facilitaria o processo. — Faz sentido.
Aceito e os sigo para o lado do hotel em que há uma porta,
porém, antes que eu possa entrar, meu celular vibra em minha mão.
Merda, é o Marcos.
Olho para onde Nicolas está com a porta entreaberta
esperando que eu passe, mas sinalizo para o celular. Já havia
chamadas perdidas, o que ele tem para falar pode ser importante.
Nicolas assente e acompanha o Josh até o restaurante.
Atendo Marcos.
— Aurora?
— Oi, Marcos, desculpe não atender mais cedo, estava
dormindo. — E enlouquecendo? Pirando na batatinha? Querendo
me jogar de um penhasco? Babando no homem mais lindo que eu
já vi?
— A noite foi boa? — pergunta com malícia.
Nem te conto...
— Foi tão boa que eu não lembro de nada — rio e escuto sua
risada do outro lado. — Tem boas notícias pra mim? — pergunto
com esperança.
Passa alguns minutos em silêncio, antes que fale.
— Você está na pasta dos vistos que serão negados, xuxu.
Sinto muito. — Meu coração para.
Sinto minha respiração começar a falhar e me encosto na
parede para que a tontura que me abateu não me deixe cair de
bunda no chão.
— Aurora?
— Tô aqui — falo por meio da respiração um pouco falhada.
Porra, por que tudo resolveu acontecer logo hoje? Eu sabia
que tinha a possibilidade do visto ser negado, mas ainda havia a
ínfima esperança de que não fosse. Minha cabeça lateja ainda mais,
como se já não bastasse a ressaca maldita.
Essas merdas só acontecem comigo. Tudo que tem de errado
só acontece comigo.
Caralho!
— Desculpa, meu bem, te liguei porque você pediu, mas
preciso desligar agora. A gente se fala depois, ok?
— Obrigada, Marcos, até mais — desligo e olho para o teto.
O que faço agora? O que faço para permanecer aqui?
Não tenho emprego, só tenho algumas semanas antes de ser
deportada, e nem tenho onde ficar aqui, nem no Brasil.
Mesmo se solicitar outro visto, ainda vai ser negado, porque
não há nenhum motivo para ser aceito, já que não estudo, nem
trabalho e não sou...
Arregalo os olhos e me viro para a porta que dá acesso ao
restaurante do hotel.
Uma ideia começa a se formar na minha mente, meu coração
enchendo de adrenalina e porra, eu sei, sei que vou fazer merda
agora, mas é a minha única opção.
Eu vou ficar nesse país. E acabei de achar o jeito mais infalível
de conseguir isso.
Você quer o que não pode ter.
Oh, garota, isso é uma pena.
Não toque no que não pode pegar.
Vai acabar com as duas mãos pra trás.
(Superman - Eminem)

Desde o momento em que Aurora parou para atender a ligação


antes de entrar no restaurante, vem agindo mais estranho do que o
normal. Havia pedido um café bem forte para passar um pouco do
efeito da ressaca pelo tanto que bebi ontem à noite, e pedi um a
mais, com croissant para Aurora, tendo a certeza de que deve estar
igual ou pior do que eu. Mas assim que se sentou na mesa, ficou
estranhamente calada, diferente da garota que não fechou a boca
desde que saiu da cama.
Garota.
Ela é tão jovem que vejo o brilho nos olhos que só alguém da
sua idade poderia ter. Vinte anos, porra, estou casado e
provavelmente dormi com uma menina que tem idade para ser a
minha filha.
Mesmo que nunca tenha visto uma tão linda em toda a minha
vida.
Ela é deslumbrante.
Tão atraente que pensei que estava sonhando quando acordei.
Abri os olhos e ela estava lá, me admirando. Demorei um
tempo para perceber que não era sonho, que não poderia beijá-la, e
levá-la à ruína com meu corpo.
Aurora tem uma beleza natural que não precisa de nada para
realçar seus traços. Olhos verdes, cabelos cacheados, pele
levemente bronzeada, alta e com um corpo todo curvilíneo, porém
esguio, onde minhas mãos encaixaram direitinho nessa manhã. Não
era cego, sabia que era linda e todos no restaurante perceberam
isso, já que faltaram quebrar a porra dos pescoços quando ela
entrou e andou até nossa mesa parecendo uma modelo profissional.
Será que é?
Isso não muda o fato de que não a conheço, não lembro de
dormir com ela e muito menos de me casar com essa garota.
Uma que está estranhamente inquieta. Seus olhos vez ou
outra se desviam para mim, e quando me pega a encarando de
volta, olha para qualquer outro lugar. O que foi, menina? Por que
está agindo assim?
Ela come o croissant quieta, e meus olhos não conseguem sair
de cima dela.
Até que meu irmão passe pela porta com meu melhor amigo,
sorrindo para mim como se não estivessem cientes das próprias
mortes. Josh havia saído há cinco minutos, pois acordou cedo por
ter um compromisso e nos desejou boa sorte. Não era com ele que
estava estressado, nem mesmo com a cacheada à minha frente.
Era com os idiotas que me deixaram fazer uma merda dessa sem
me impedirem e por estarem sorrindo como se nada de mais tivesse
acontecido.
Bando de filho da puta.
Eu sei que é normal vários casais se casarem em Las Vegas
depois de beberem demais, porém nunca pensei que faria parte
dessa porcentagem de idiotas.
Principalmente por não ser um “casal”.
— Bom dia, irmãozinho, como foi a sua noite? — Ao ouvir a
voz de Léo, Aurora se vira em seu lugar na cadeira e o encara,
franzindo o cenho para a sua fala. — Nossa, você é ainda mais
bonita ao acordar, cunhadinha. — Ergue as sobrancelhas em
admiração.
— Eu vou te matar — grunho por entre os dentes cerrados e
Matt senta ao meu lado, em uma posição que me impeça de me
erguer e avançar em Léo. Semicerro os olhos para o outro filho da
puta.
— Estou sentindo cheiro de ciúmes, é isso? — Meu irmão se
senta ao lado de Aurora e se curva para dar um beijo em sua
bochecha. Ela arregala os olhos e enfia o restante do croissant
inteiro na boca.
Boquinha grande, hein?
Será que coube o meu…?
— Isso é ódio, Léo — retruco, tomando o restante do meu
café. — Nem pensem em fazer pedidos, estamos saindo agora! —
falo antes que eles possam erguer o cardápio e ambos me fitam
indignados. Tô pouco me lixando. — Isso é mais urgente, comam
algo de alguma barraquinha no meio do caminho.
Me levanto e eles fazem o mesmo, incluindo Aurora, que ainda
tenta mastigar a bola de pão que tem na boca.
Deus do céu!
— O que exatamente é urgente? — pergunta Matt,
caminhando ao meu lado. — E, bom dia, Aurora — cumprimenta a
menina que o olha por sobre o ombro com olhos confusos, mas
acena em cumprimento, finalmente engolindo o pão.
— Bom dia — responde e continua andando, saindo do
restaurante em direção à porta da frente.
Aposto que não sabe o nome deles.
— Urgente é a merda que nos enfiamos ontem à noite e
queremos desfazer — aponto entre mim e Aurora, que não confirma
e nem nega.
— Já tiveram a primeira briga de casal? Poxa, deveriam
comemorar a lua de mel, maninho. — Léo estala a língua e juro que
por um momento me pergunto por que diabos eu sou irmão dele.
Não tive muita escolha, no caso.
— Aí é que tá o problema, não lembramos de porra nenhuma
do que aconteceu ontem, nem mesmo lembramos um do outro, Léo
— falo, passando a mão no rosto e saindo do hotel. À nossa frente,
o carro que Léo alugou quando chegamos está com a porta aberta e
Aurora não demora a entrar, seguida de nós três.
O semblante dos dois se torna assustado.
— Nadinha?
— Amnésia de bebida? — Léo pergunta, descrente.
— Amnésia de bebida, como vocês me deixaram fazer isso?
— pergunto aos dois, que sentam relaxados. Me sento ao lado de
Aurora.
— Cara, a gente estava bêbado igual a você, o mesmo ímpeto
que te fez casar, me fez apoiar, achei que seria uma mudança legal
para a sua vida. — Reviro os olhos para o idiota que lutei tanto para
cuidar e transformar em um bom homem e me viro para minha
esposa, que está nos olhando com curiosidade estampada nos
olhos. — Você não lembra da gente, também, cunhadinha?
— Cunhadinha é seu cu — retruco.
— Não lembro — Aurora responde ao mesmo tempo, me
olhando com reprimenda. Não surte um pingo de efeito em mim,
principalmente vindo de uma menina de vinte anos.
— Poxa, viramos melhores amigos ontem.
— Acontece sempre, tenho essa mania de fazer melhores
amigos quando bebo, no outro dia a gente sempre finge que nunca
aconteceu. — fala. — Mas podemos continuar sendo melhores
amigos, se você quiser.
Ela bebe muito, então? Muito nova para isso, porém deve estar
na faculdade e se me lembro bem, faculdade é onde todo mundo
vira alcoólatra.
Léo virou até drogado.
— É claro que sim! — sua mão vai até o coração e Matt segura
o riso ao seu lado. — Para onde estamos indo, mesmo?
— Para a capela em que nos casamos, vocês devem lembrar.
— Eles assentem e colocam o carro em movimento.
Leonardo e Matteo entram em uma conversa animada no
banco da frente, vez ou outra convidando Aurora a participar. Ela
fala, mas ao contrário da língua afiada quando falou comigo mais
cedo, com eles é educada, gentil até.
Embora a sinta meio tensa ao meu lado.
De onde será que ela veio?
Por que o meu eu bêbado quis casar com ela? Eu entendo o
apelo aqui, ela é linda.
Toda linda, mas não faz o meu tipo.
Vinte anos. Apenas vinte anos. Nego com a cabeça.
Assim que chegamos à capela, o dono nos informa que todos
os casamentos realizados até ontem, já foram enviados para a juíza.
Então, voltamos para o carro e vamos atrás da bendita.
Que bom que Matt é advogado e sabe dialogar com esse tipo
de gente, porque estou sem um pingo de paciência para lidar com
alguém hoje. Quase nunca tenho paciência para lidar com pessoas
em geral, apenas quando é algum cliente e tenho que agradar com
palavras gentis.
Assim que chegamos no tribunal de justiça, nos sentamos na
fila enorme de espera.
— Tem certeza que não quer ficar casado? — Ergo uma
sobrancelha em deboche para Matt. — O quê? Ela é linda, talvez
deva dar uma chance, você deve ter tido algum motivo para
escolher casar com ela em apenas uma noite.
— Se chama êxtase, whisky e falta de noção. — Noventa por
cento no êxtase.
— Ou deve ter sido aquela bunda fenomenal, eu casaria com
ela por aquela bunda — Léo observa a bela bunda de Aurora,
enquanto ela bebe água em pé, a alguns metros de nós.
É uma bela bunda mesmo. O quanto eu sou pervertido
assumindo isso?
— Eu não. Mas os olhos dela são encantadores, não viu
aqueles olhos, Nick? Talvez tenham sido eles que te conquistaram.
— Matt se intromete novamente.
— Duvido muito, aposto que foi a bunda. — Olhando bem…
ok. Talvez eu tenha me casado por aquela bunda.
É uma bunda espetacular.
Provavelmente não a ouvi falando enquanto nos casamos,
nem em sonho o meu eu bêbado escolheria casar com uma matraca
ambulante.
— Sua parada não é peitos? — Léo me olha ofendido.
— Coração. Minha parada é o coração delas, o problema é
que fica escondido entre aquelas obras divinas. — Tarado por
peitos. Léo é tarado por eles.
Solto uma risada para sua cara cínica.
Esperamos por alguns minutos, até que somos chamados.
Como Léo e Matt provavelmente foram as testemunhas da
minha burrice, eles entram conosco e todos nos sentamos em frente
à juíza que nos olha como se fôssemos o verme da merda que ela
pisou ao sair de casa.
— A que devo a honra? — Sua cara de poucos amigos não me
anima.
— Excelentíssima, viemos aqui para anular um casamento que
foi realizado ontem, ambas as partes estão de comum acordo, e
creio que o processo ainda não tenha sido homologado. — Matt
começa, com toda a sua pose de advogado e a juíza ergue uma
sobrancelha em desdém.
— Quem é o casal? — Olha entre nós quatro e ergo a mão,
junto à Aurora. — Certo, vocês são as testemunhas? — Eles
assentem. — Não é a primeira anulação que faço hoje,
sinceramente, deveria mandar um decreto que fechasse todas
essas capelas, o tanto de anulação que pedem é brincadeira. —
Nega com a cabeça e respiro aliviado.
Se pediram antes, significa que podemos anular.
— Qual o seu nome? — Me pergunta, pegando várias fichas e
certidões de casamento ao seu lado. São feitas duas? Porque nós
temos uma.
— Nicolas Ramsey.
— E o seu, garota? — Ela observa a garota mais atentamente,
de cima a baixo com olhos analíticos e depois me encara com uma
sobrancelha arqueada. Como se eu não soubesse que a menina
tem cara de adolescente, porra! — A certidão está com vocês?
— Aurora Castelo, Vossa Excelência, e está sim — responde.
Logo pego a nossa certidão e entrego para a juíza, que
observa toda a folha com atenção. Assim que termina de verificar,
pega outra ficha ao seu lado e começa a escrever várias coisas em
vários espaços em branco.
Fico até surpreso, pensei que perguntaria sobre o motivo de
anularmos o casamento, mas deve saber, pela nossa cara, que foi
um erro de bêbados em mais uma noite comum de Las Vegas.
Não disse que eram todos idiotas? Ela deve saber disso
também.
— Nicolas Ramsey está de acordo em anular o casamento? —
pergunta, olhando em meus olhos.
Assinto.
— Sim, Vossa Excelência.
Então olha para Aurora ao meu lado, mas não sigo seu olhar,
estou de olho na ficha em sua mesa.
Aquela que vai me tirar dessa tortura.
— E você, Aurora Castelo, está de acordo em anular esse
casamento? — O silêncio que se faz no escritório é longo. Me viro
para ver por que diabos Aurora não falou nada ainda e arregalo os
meus olhos quando vejo os seus vermelhos.
— Si... sim, Vossa Excelência. — Então ela começa a chorar,
me deixando horrorizado.
Ela. Começa. A. Chorar.
Por que você está chorando, menina? E por que sinto que
estou a ponto de me foder aqui?
Matt e Léo a encaram, ambos com os olhos arregalados para o
que está acontecendo.
— O que houve, querida? Você não quer anular o casamento?
— Viro o pescoço em um estalo para a juíza que tem olhos suaves
sobre minha futura ex-esposa.
— É claro que ela quer! — retruco e Aurora abre um berreiro
ao meu lado que me faz pular da cadeira e ficar de pé.
Que porra?
— Não perguntei a você, senhor Ramsey, por favor, sente-se.
— Faço o que a juíza manda, seu tom afiado não me deixando
escolha.
— Des... desculpa, se ele quer anu... anular o ca... casamento,
eu quero tam... também — Aurora fala em meio aos soluços que me
deixam angustiado. Angustiado não apenas comigo. Odeio ver
alguém chorando. Odeio pra caralho. — Tá tudo be... bem comigo, é
só que na... não sabia que ele era esse ti... tipo de homem. — Tipo
de homem?
Que tipo de homem, porra?
— Que porra é essa, Aurora? — pergunto para a chorona ao
meu lado e não faço ideia do que fazer.
Se mando ela parar de chorar e começar a falar sério para
anular essa droga de casamento. Ou se me aproximo e pergunto
por que ela está chorando, para que eu possa fazê-la parar.
Será que está com dor? Lembrou de algo? Está se sentindo
pressionada? Quer me foder com esse choro?
Será que é verdadeiro? Será que é fingimento? Eu não sei
porra!
— Senhor Ramsey, esta é a minha sala e eu exijo educação.
— Engulo a vontade que eu tenho de mandar essa mulher tomar
naquele lugar e me calo, observando Aurora. Ela não me olha de
volta, suas mãos no rosto, o cobrindo de qualquer um. Matt e Léo
me olham espantados e apenas dou de ombros.
Como vou saber o que aconteceu? Conheço essa menina há
menos de quatro horas.
— Quer me contar o que está acontecendo, querida? Que tipo
de homem você está falando? — Eu também quero saber, juíza,
ainda bem que perguntou.
— E... eu era virgem, Vossa Excelência — esse negócio
batendo na minha boca é o meu coração? Tenho certeza de que é,
quando ela me olha com os olhos verdes vermelhos, inundados com
lágrimas falsas. Como assim, virgem? É signo? — Vim de um
convento, até ia vestir o hábito, mas então o conheci e me
apaixonei, mas disse que só ia fazer essas coisas depois do
casamento, mas ele. — Aponta para mim que estou prestes a
infartar na cadeira. Eu fiz o quê, criatura? Que história é essa do
convento? Freira? Essa menina é doida? — Me conquistou e disse
que a gente poderia se casar rapidamente, aí me trouxe pra Las
Vegas, me fez ves... vestir essa roupa vul... vulgar e nos casamos.
— Ela volta a berrar chorando e a juíza me olha com sangue nos
olhos.
Os meus estão iguais. Mas é pra Aurora que estou olhando.
— Como é? — grita Léo, olhando de um para o outro.
— Cacete — Matt esconde o rosto entre as mãos.
Cacete? Cacete?
ESSA MENINA É DOIDA, PORRA!
— Que merda é essa, Aurora? Eu nem te conheço, menina!
Ela tá mentindo, Vossa Excelência. — Rosno com ódio, apontando
para a versão feminina de Barney Stinson[2], mas ela só alarma
mais, gritando e jogando os braços em cima da mesa da juíza,
escondendo o rosto e balançando os ombros com o soluço. — Para
com essa brincadeira, Aurora!
Eu vou matar essa menina.
Lentamente.
Ela volta os olhos para mim e por um momento, consigo ver
algo neles que é rápido demais para que eu consiga identificar. Ela
logo volta a chorar.
Ela é doida. Casei com uma mulher doida e nem tive como
escolher, merda!
Era só o que me faltava!
— Olha aí, Vossa Excelência, depois que me levou para a
cama, está falando isso — aponta para mim e a juíza balança a
cabeça.
— Isso é mentira, eu nem lembro dessa menina, só acordei
hoje e ela estava lá comigo...
— Então o casamento foi consumado — afirma a juíza com um
brilho de vitória nos olhos.
Mas é uma porra mesmo, viu?
— Não! Quer dizer... não sei, eu não me lembro! — levo as
mãos à cabeça, desesperado.
— Foi, Vossa Excelência, nunca pensei que uma mulher
poderia ser tão manobrada nas mãos de um homem, foi um pecado
o que fizemos naquele quarto, vou até precisar me confessar depois
que sair daqui — Aurora fala em meio ao choro.
Ah, eu vou te manobrar muito bem, Aurora, principalmente
quando pegar esse seu pescoço e torcer sem piedade.
Que merda está acontecendo aqui? Matt e Léo me olham com
algo como assombro, e depois olham para Aurora. Eles sabem que
ela está mentindo, sabem que ou ela é doida, ou é uma ótima atriz.
Espero que seja doida, porque se ela estiver fazendo essa
merda por vontade própria, nem sei o que sou capaz de fazer. Há
destinos piores do que a morte por aí.
— Vossa Excelência, somos testemunhas de que o senhor
Ramsey falou a verdade, estávamos com eles, conhecemos ela
ontem na boate que inaugurou...
— Olha aí — Aurora se ergue rapidamente, interrompendo
Matt no meio da fala. — São parceiros, Vossa Excelência, ele é o
melhor amigo do meu marido e esse aqui é o irmão. Estão todos
contra mim. — Ela põe a mão no coração e vejo a juíza amolecer
com esse teatro.
Não é possível…
— Ei, não me meta no meio dessa sua mentira... — Léo cala a
boca quando a juíza se levanta.
Todos ficam em silêncio, menos Aurora que ainda soluça ao
meu lado.
Meus dedos estão brancos de tanto apertar as laterais da
cadeira em que estou sentado, para controlar a raiva. Meu maxilar
trincado está doendo, mas isso tudo é para não soltar um grito de
fúria aqui dentro.
Ou xingar até a décima geração dessa infeliz.
— Diante dessa situação, e como o casamento já foi
consumado... — Ela tá onde? No século dezenove, porra? — A
anulação do casamento não será possível. — Arregalo os olhos
quando ela pega um carimbo e bate em cima do nosso processo. —
Se quiserem resolver, agora é só com divórcio que só pode ser
pedido após seis meses de casamento. E como se casaram em
comunhão parcial de bens, assim como todos os casamentos feitos
em Vegas, quando se divorciarem, Aurora tem direito a 50% de tudo
o que você adquirir nesse tempo, senhor Ramsey. E eu conheço o
seu sobrenome, aposto que vai ser bastante coisa. — A juíza me
olha com um prazer doentio nos olhos, enquanto eu, Matt e Léo
respiramos fundo em conjunto.
Metade de tudo o que eu adquirir depois de hoje.
Essa...
Fecho os olhos, e solto a minha respiração. Tenho quase
certeza de que minha pressão baixou, porque essa tontura não é
normal.
Metade de tudo.
Divórcio.
Aurora.

Eu vou matar a Aurora.


Veja como eu sairei com cada
pedaço de você.
Não subestime as coisas que
farei.
Tem uma chama surgindo no meu
coração.
Está tomando conta de mim e me
tirando da escuridão.
(Rolling in the deep - Adele)
Não sei dizer se é o instinto protetor ou meu sexto sentido que
está apitando em alerta máximo, mas algo me diz que estou prestes
a ser assassinada. Ou talvez seja o rosto retorcido em raiva dos três
homens com mais de trinta anos, que me encaram como se
pudessem me enterrar viva. Veja bem, já fiz minha listinha de
mortes que morro de medo de ter, enterrada viva está no topo delas.
Desde que entramos no carro e viemos parar novamente no
quarto do meu maridinho, eles não falaram uma só palavra.
Não me levem a mal, entendo o porquê da reação deles, não
sou burra e nem tão sonsa como a vaca da prima da Elisa, mas
posso ser muito cara de pau quando quero algo, geralmente isso só
respinga em mim, mas assumo que dessa vez, fiz uma merda muito
grande.
Mas acha que estou arrependida? Nem um pouco.
Nunca a expressão “pimenta no cu dos outros é refresco” fez
tanto sentido quanto agora. Antes no dele, do que no meu, não é o
que dizem?
Os três patetas estão em pé na minha frente, enquanto estou
sentada no meio da cama, com um travesseiro cobrindo minha
calcinha e as pernas cruzadas. Não que faça muita diferença para
Nicolas, acredito que ele já viu tudo o que tinha para ver, mas os
outros? Não, e sei lá, vai que meu esposo é ciumento do tipo que
não quer que mais ninguém veja a sua mulher com roupas íntimas?
Vai saber.
Seria bem excitante.
Mordo o lábio inferior e começo a assobiar uma musiquinha
aleatória, apenas para não morrer sufocada de tédio e culpa. Estou
me sentindo culpada pelo que precisei fazer, só não assumirei isso.
Nem sob pena de morte. Também não serei a primeira a abrir a
boca, pois tenho certeza de que Nicolas poderia voar no meu
pescoço.
Ele está tão vermelho. Será que vai entrar em combustão?
Parecendo sentir que estava falando dele em pensamentos, o
coitado dá um passo à frente, enquanto me movo para trás em cima
da cama.
— Qual a porra do seu problema? — fala baixo e sério, com
mãos em punho ao lado do corpo.
— Agora mesmo? Nenhum — sou sincera e abro um sorriso
de lado, escutando o ranger dos seus dentes. É, nunca fui boa em
ter senso, não é agora que vou ter.
Ninguém tem dúvidas disso, olha só onde eu me meti por
vontade própria.
— Posso matá-la? — ele pergunta ao irmão.
— Não em público — Léo responde e solto uma risada
nervosa.
— Eu estou aqui, vocês sabem, né? — comento, olhando para
os lados, não querendo sentir mais três pares de olhos me
fuzilando.
— Sabemos, pequena mentirosa, e você não vai sair desse
quarto enquanto não explicar o que você acha que está fazendo e o
que quer de mim, porque nunca que você veio de um convento...
— Quem disse? Eu sou bastante santa — retruco ofendida,
interrompendo meu esposo. Sua sobrancelha sobe desacreditada.
— Eu poderia sim, não tenho cara de anjo? — sorrio docemente
para os três homens e eles retribuem com uma careta.
— Só se for Lúcifer — reviro os olhos e decido ignorar que
Nicolas disse uma atrocidade dessa. — Virgem você também não é,
então não venha com essa baboseira, e eu nunca te vi antes de
ontem, o que você realmente quer de mim, Aurora? Porque ambos
saímos desse quarto querendo anular esse casamento! — Ele
respira fundo e consigo ver o ódio em suas pupilas.
Lindas dentro daquela floresta verde.
— Primeiro — ergo um dedinho. — Eu já fui sim para um
convento, até os quatorze anos — os três erguem a sobrancelha em
sincronia e solto uma risada. — Eu sei, é difícil de acreditar, mas
não é algo que eu saia contando vantagem, odiava aquela merda.
— Respiro fundo. — Segundo. Eu sou virgem sim, da porta de trás
— Nicolas se engasga com nada e me encara com olhos
arregalados, enquanto os amigos batem em suas costas. Apenas
continuo com o meu sorriso aberto. — E terceiro — levanto mais um
dedo, quando meu maridinho se recupera. — Preciso de um marido.
Simples e fácil.
Não sou uma gênia? Quem disser que não, pode ir tomar no
cu, e só minha opinião importa.
Três pares de olhos arregalados focam em mim, mas não
demoram a se semicerrar em uma ameaça clara. Nicolas anda em
minha direção e continuo me afastando até minhas costas baterem
na cabeceira da cama.
— E por que diabos você precisa de um marido? — pergunta
baixo. Não gosto do tom. Prefiro quando ele grita.
— Para não ser deportada — respondo, meu sorriso
esmorecendo, quando ele tomba a cabeça para o lado e começo a
falar, rápido demais para o meu gosto. — Recebi uma ligação de um
amigo da imigração hoje, ele disse que meu visto vai ser negado e
vou ser deportada em algumas semanas de volta para o Brasil e
não quero isso. Também não posso pegar visto de estudante agora,
nem de trabalho que foi justo o que me foi negado, então a solução
óbvia foi o marido. O casamento serve muito bem a meu favor. —
Dou de ombros como se estivesse falando do clima, mas logo volto
a observar à janela do quarto pensando seriamente em pular se
Nicolas enlouquecer.
Acho que vi fumaça saindo da sua cabeça.
Acredito ter mais chances de viver se pular a janela.
— E VOCÊ ACHOU QUE EU SERIA ESSE MARIDO? — Ele
volta a gritar e novamente o sorriso volta para o meu rosto. Com
gritos, eu sei lidar, são os tons ameaçadores que não gosto muito.
— Se serve de consolo, não estava planejando nenhum golpe
quando me casei com você, só soube do meu problema depois que
descemos até o Hall.
— Não serve de consolo, Aurora! É um casamento, um
casamento que nem quero, com uma menina que nem conheço e
que nasceu ontem, porra. — Ele leva as mãos ao rosto e esfrega
com brusquidão. — Isso não está acontecendo. — Murmura baixo.
— Por que você não disse isso antes que fôssemos até a juíza, se
sabia que não iria anular o casamento?
— Se eu contasse, você continuaria casado comigo por
vontade própria?
— É claro que não! — responde com seriedade.
— Então, tem a sua resposta — sorrio sem remorso algum.
Matteo se aproxima da cama e me olha nos olhos.
— Você sabe que ele pode te processar, não sabe? Falar para
imigração que esse casamento é uma farsa e você vai ser
deportada do mesmo jeito. — Tem algo como decepção nos seus
olhos, mas não me importo muito. Hoje, o foco sou eu e meu futuro
nesse país.
— Ele até pode, aí nos divorciamos, ele me dá metade do que
ganhar nesse meio-tempo e saímos os dois felizes. Se vocês acham
que estou atrás do dinheiro, então deve ter por aí, né? — Mostro os
dentes, no sorriso mais falso que eu já fiz e Nicolas falta desmaiar
do meu lado.
— Você disse que não queria a merda do meu dinheiro, Aurora
— acusa com um bico, emburrado.
— E não quero, mas a gente pode fazer um acordo, só preciso
de um marido por alguns meses, depois disso, te dou o divórcio sem
pedir nadinha, pode até fazer um contrato. — Aponto para Matt,
quando falo do contrato, com a maior cara de pau do mundo.
Do nada, Léo começa a rir.
Olhamos para o loiro, mas ele fica sem ar de tanto gargalhar
às nossas custas e sinto vontade de rir também, mas pelo meu
próprio bem, pressiono os lábios juntos.
— Qual a graça, Léo? — Nicolas pergunta.
Ele nega com a cabeça e pede um tempo com as mãos.
— Que quando eu disse para você cometer uma loucura, não
era disso que estava falando — aponta para nós dois e começa a rir
de novo. Levando Matt a fazer o mesmo.
Nicolas e eu apenas encaramos os dois e aproveito a sua
distração raivosa, para observá-lo em silêncio.
Nicolas é lindo.
Mesmo espumando pela boca, ele fica lindo, mas o que Léo
mencionou me chama a atenção momentaneamente. Loucura.
Nicolas não comete loucuras, percebi isso quando falou sobre a
nossa diferença de idade, e é revigorante saber que sou a maior
loucura que ele cometeu na vida. Vou ficar marcada nele como um
evento importante.
E eu nunca fui importante para ninguém.
— Tá achando que isso é brincadeira, Léo? Essa menina tá
aqui me forçando a ficar em um casamento e escute bem,
CASAMENTO, porque não quer ser deportada e o escolhido para o
sacrifício sou eu, que tenho que escolher entre perder metade de
tudo o que ganhar nesse meio-tempo, ou meses da minha vida,
porra! — Nicolas falta pular em cima de Léo, e ele para de rir na
hora, junto com Matt.
— Ei, você não perderia meses da sua vida, eu sou um achado
e tanto, tem sorte de ser “O” escolhido e... eu vou calar minha boca,
porque até calada, eu tô errada — aceno com a cabeça, voltando a
atenção para o meu colo, quando recebo um olhar fulminante dos
três homens.
De novo!
— É bom mesmo ficar caladinha, garota, porque estou a um
triz de segurar esse seu pescocinho.
— Eu até gosto, com um tapa na cara fica maravilhoso — ergo
os olhos e novamente Léo começa a rir, enquanto Nicolas me
encara intensamente. Meu sorriso se torna malicioso, porque eu
gosto de irritá-lo e por não ter amor à vida, ao que parece, então
completo. — Você gosta? Se a resposta for sim, deve ter feito
comigo ontem à noite, coroa. — Pisco um olho, vendo os outros dois
estalarem o pescoço na direção do meu maridinho e vejo seu olho
tremer. — E aí? Trato feito? Eu sou boazinha, vai, vocês ricos não
precisam de uma esposa? Tipo, para ser um troféu, ou para passar
aquele ar de respeitável? — pergunto, mudando de assunto e os
três tombam a cabeça para o lado. — Sei lá, leio muitos livros que
são assim. — Dou de ombros. — Mas posso ser bem útil viu, posso
ser sua faxineira, fazer sua comida, não tem nenhuma ex-
namoradinha que queira fazer um ciúme?
Os três arregalam os olhos ao mesmo tempo e sei que peguei
em um ponto que posso usar a meu favor.
— Tem, não tem? Posso ser a esposa perfeita pra você dar
uma volta por cima, ou posso ser a megera que fará ela ficar com
pena de você e te querer de volta. — Sou contra a rivalidade
feminina, mas o meu tá na reta aqui, uma atuaçãozinha nunca
matou ninguém.
Nicolas respira fundo e me olha de cima a baixo.
— É, tem Riley e o convite de casamento — Léo comenta e
fico atenta à conversa.
Quem é Riley? Sei que é uma ex, já que o assunto é esse,
mas terminaram por quê? Ele a deixou? Ela o deixou? Por que ele
vai no casamento dela? Será que é uma versão atualizada de
“Como Eu Era Antes de Você” e o melhor amigo tomou a namorada
dele? Será que ele a quer de volta? Se for, só daqui a alguns
meses, bebê.
Primeiro cuide da sua atual, para depois se preocupar com a
ex.
— Além disso, ela não quer o seu dinheiro, só um visto
permanente para não ser deportada. — Completa Matt e ergo o
braço, chamando a atenção deles quando lembro de algumas
coisas.
— E de um teto, vou ser jogada fora do meu quarto na
faculdade em três semanas — fecho a boca quando Nicolas me
fuzila e ergo as mãos. — Ou não, tá tudo joia, ouvi dizer que
debaixo da ponte é um ótimo lugar nessa época do ano.
— Se você não tem onde ficar, por que não quer voltar para o
seu país? — pergunta Nicolas cheio de curiosidade em seu tom.
— Porque quando se sai do inferno, ninguém quer mais voltar
— dou de ombros, com meu coração acelerando um pouco e desvio
o olhar.
Não é um assunto que eu gosto de mencionar, mas também
sou um livro aberto, se ele perguntar o que significa, falarei, não
vejo motivo para esconder as coisas que acontecem na minha vida,
acho que por isso eu sigo em frente e faço tudo pelo meu presente e
futuro, simplesmente deixo as coisas saírem, desabafar com
qualquer pessoa me deixa sem peso nos ombros e já carrego coisas
demais no presente para levar o passado junto.
Ninguém fala nada por alguns segundos, mas logo eles voltam
a discutir sobre a minha proposta, mesmo eu estando bem aqui.
— Ela está certa, mesmo se você falar que é um casamento
de mentira, a juíza já homologou o processo e agora apenas
divórcio, e só ela pode negar o direito a cinquenta por cento do que
ganhar e só hoje de manhã, cinco contratos foram assinados lá na
empresa, além de você precisar ficar no mínimo seis semanas em
Nevada, pelas leis daqui, antes de iniciar o processo do divórcio e
você não pode morar aqui por um mês e meio e o divórcio só sai
depois de seis meses. — Informa Matt, apontando pra mim, que
abro um sorriso inocente e o coitado nega com a cabeça. — Ainda
acho muito errado o que fez, mocinha.
Dou de ombros e continuo prestando atenção na conversa.
Tô pouco me lixando para a opinião de um desconhecido.
Quando você tem pena de um coitado, o coitado vira você.
— Além do mais, será bom pra você ter alguém ao seu lado
agora, o casamento de Riley e tal, as notícias vão começar a rolar...
— Vocês deveriam ter me impedido de fazer essa besteira
para início de conversa, nunca mais uso aquelas merdas que
usamos ontem. — Nicolas olha para o teto ao interromper o irmão, e
passa as mãos novamente pelo rosto.
Estão falando de drogas, será? Hum, interessante.
— No meu país tem o Proerd, sabe, seria bom vocês pegarem
umas aulas sobre uso de drogas. — Eles me encaram em confusão
e começo a rir sozinha, negando com a cabeça ao ver que eles não
entendem nada. — Proerd, é o programa, Proerd, é a solução —
canto a musiquinha que nunca sai da cabeça de um brasileiro e
começo a rir de novo. Eles voltam a me ignorar quando veem que
não explicarei mais nada.
— Não é como se você tivesse muita escolha, agora — fala
novamente o cara advogado e concordo efusivamente com a
cabeça.
Não tem mesmo.
Eles ficam em silêncio por alguns momentos e logo Nicolas se
volta para mim.
— E aí, coroa?
— Seis meses, sem pegar metade do que é meu e divórcio por
boa vontade? — pergunta e falto quicar no lugar de felicidade.
— Seis meses, sem pegar nada do que é seu e se quiser que
eu assine o divórcio pulando de alegria, eu o faço. — Respondo
sem titubear.
— Então temos um acordo — sorrio.
— Com certeza o acordo mais lindo da sua vida. — Pisco pra
ele e ergo a mão em dúvida. — Uma perguntinha, inclui sexo? —
Nicolas fica tão vermelho que começo a gargalhar alto e tanto, mais
tanto, que sinto minha barriga doer.
— Até parece que quero uma adolescente na minha cama —
resmunga, andando em direção à porta do banheiro, negando com a
cabeça e só rio ainda mais.
— Nem Judas mentiu tanto assim, coroa — ele ergue o dedo
do meio e me jogo de costas na cama sem conseguir me aguentar
mais sentada.
Ah, sei que estou bem fodida, mas não disse que sempre
deixo as merdas baterem no ventilador depois? É o que estou
fazendo agora.
De novo. Mas, pelo menos, não volto para o Brasil.
Eu sinto algo tão certo.
Fazendo a coisa errada.
E eu sinto algo tão errado.
Fazendo a coisa certa.
(Couting stars - Onerepublic)

Estava mesmo aceitando essa merda.


Não sei em que momento fiz algo tão ruim para só receber
castigo nesta vida, porque não era possível, era um tombo atrás de
outro.
Riley, casamento, anulação negada e ser obrigado a ficar seis
meses com uma adolescente.
Burro. Burro!
É isso o que sou, porque não fiquei quieto no meu canto,
tomando apenas uma cervejinha, sem ultrapassar meus limites?
Estava em Las Vegas, sabia que não deveria deixar o controle de
lado para apenas aproveitar, essa cidade é famosa pelas burradas
dos outros e mesmo assim, decidi fazer parte dessa porcentagem
de gente idiota.
Idiota é uma palavra que me define bem hoje, e ontem
também, já que me meti nessa. Agora estou sentado em frente a
uma mesa, no mesmo restaurante que vim logo cedo, com um
contrato feito pelo meu melhor amigo em frente a Aurora, só
esperando a sua assinatura. No contrato garante que ela concorda
em não tomar nada meu depois do divórcio além do que eu queira
dar a ela e que o casamento durará apenas seis meses, que é o
limite para o visto ser garantido. Além de várias cláusulas que
deixam claro como será o nosso casamento.
Ou não será.
Porque ele não será um casamento.
De jeito nenhum.
NEM FODENDO.
— Aqui diz que você pode ter casos extraconjugais, já que o
casamento é uma farsa... — ergo uma sobrancelha para o seu tom
de voz queixoso e o biquinho que forma na boca.
Bonitinho. Nem parece que pertence ao capeta.
— E? — Se ela pensa que vou ficar seis meses sem transar
com ninguém, terei a certeza de que posso interná-la em um
hospício, sem remorso. E não, me recuso a dormir com ela, por
vários motivos e por estar fazendo essa palhaçada comigo.
Porque é uma palhaçada. O circo inteiro se for pra ser sincero.
Sincera é uma coisa que a menina na minha frente com
certeza não é. Essa palavra deve passar longe do seu vocabulário.
Não deve nem saber o que significa.
Aurora ergue o olhar do contrato, fixando em mim, e faz um
bico maior ainda com os lábios, franzindo as sobrancelhas.
— Não sei se gosto da ideia de levar chifre — trinco o maxilar
com tanta força que escuto os meus dentes rangerem. Ela percebe
que não estou muito para brincadeiras e força um sorriso inocente.
— Mas quem não tem um par de chifres hoje em dia? Quer saber,
faz até bem, um animal sem chifres é um animal indefeso, né? —
Ela começa a tagarelar, voltando a olhar para o papel e pela
primeira vez no dia, meus lábios se contorcem para prender uma
risada incrédula. É muito cara de pau mesmo. — Dá até pra fazer
um berrante! — fala como se fosse a coisa mais interessante do
mundo e Matt, que está ao meu lado, começa a rir. Ele sempre foi o
mais sorridente de nós.
Mas não deveria sorrir para ela. Ninguém deveria sorrir para
essa pequena pilantra.
Tenho ódio de todas as vezes que ela sorri pra mim.
— De onde você veio mesmo? — Ele pergunta, apoiando os
cotovelos em cima da mesa e dando sua atenção a ela.
— Brasil, Amazonas, para ser mais exata — passa uma folha e
começa a ler a outra. — Nenhum beijinho? Sério? Vai se
arrepender, coroa, se me nega uma vez, vou te fazer correr atrás,
viu? — me provoca e novamente sinto meu rosto ficar vermelho.
Não é constrangimento, nem mesmo vergonha. É só raiva mesmo,
pensa em uma pirralha que gosta de me irritar.
— Duvido muito que eu faça isso — afirmo com confiança.
Seus olhos reviram.
— Depois não diga que não avisei — dá de ombros e volta a
ler a parte do contrato que fala sobre coisas que casais fazem e que
nós com certeza não faremos. Pega o seu hambúrguer e dá uma
mordida enorme. Com tanta coisa nesse restaurante e ela me vem
pedir essa bomba calórica ao meio-dia. Gostava de hambúrguer,
mas na hora do almoço já era demais.
Mas quem disse que ela liga? Está comendo como se não
houvesse amanhã. Não entendo essa menina, não mesmo.
Acho que nunca entenderei e não faço questão nenhuma de
fazer isso. Quanto menos intimidade tiver com ela, melhor será
quando ela sair da minha vida e isso não será difícil. Já dizia Riley:
Trabalho demais, controlador demais, lerdo demais. Não terei
nenhum trabalho em ficar distante dela.
Gosto da ideia.
— Então, onde você mora? Tô em movimento a partir de
agora, sabe, vou me formar em três semanas, sair do dormitório,
estou desempregada e sem lugar para morar, aliás, estudo na LSU.
— Aurora começa a falar novamente e toma um bom gole do seu
refrigerante. Ergo uma sobrancelha. LSU é uma das melhores
faculdades dos Estados Unidos. Não sabia que estavam aceitando
gente doida. — Falando em desemprego, vocês vão pagar por isso,
né? — pergunta apontando para a comida à sua frente com uma
careta assustada.
Juro, quero bater minha testa na mesa, agora.
— Moramos em Manhattan, vamos pagar por isso e o que
você estuda? — encaro Matt, que começa a fazer perguntas demais
para a garota. O que ele quer?
Não deve fazer amizades.
Sem amizade, porra, essa menina está destruindo a minha
vida aqui sem um pingo de remorso nesse corpo que eu agarrei à
noite e nem lembro disso.
Porra, como eu queria lembrar disso. Talvez seja melhor que
eu não lembre, não quero que o meu arrependimento seja ainda
maior do que o que estou sentindo agora.
— Designer de interiores, sou ótima organizando o interior dos
imóveis, tanto que no meu último emprego, os apartamentos líderes
de vendas eram os que eu decorava. Infelizmente a empresa faliu e
fechou, botando uma pessoa tão talentosa como eu, no olho da rua.
— Solta um suspiro dramático.
Designer de interiores? Sério mesmo?
Não é possível que essa menina tenha os mesmos interesses
que eu. Nem que seja exatamente o que eu estou procurando para
a minha imobiliária.
— Designer de interiores? — Matt também está surpreso.
Aurora acena alegremente, passando mais uma página, chegando
na última de dez. Sim, Matt é esse tipo de advogado, preparado
para cada mínima coisa que possa dar errado ou nos prejudicar de
alguma forma.
Ele poderia ter tido esse senso ontem. Pau no cu.
Ainda estou indignado que esses idiotas me deixaram casar, o
que mais me intriga é a certeza de que essa ideia não foi minha,
nem mesmo drogado eu teria um impulso de fazer algo assim por
vontade própria. E se eu descobrir que foi um dos dois que propôs
isso... não quero nem pensar em como vou me divertir com a cara
deles.
São bonitinhas? São, a do Léo ainda mais, por isso, precisam
de algum estrago.
— Sou sim, quer dizer, não ainda, mas no último período
precisei estagiar e a empresa acabou me contratando antes mesmo
de terminar o estágio, inclusive, como vocês têm cara de serem
cheios dos contatos, não sabem de ninguém que precisa de alguém
como eu? Tô aceitando o emprego na minha área — ela bebe mais
refrigerante. — Pensando bem, qualquer emprego seria bom, mas
agora sou esposa, não acho que dançarina de strip seja adequado.
Começo a tossir quando engasgo com a água que estava
bebendo, e novamente, Matt desconta as raivas que já o fiz passar
nas minhas costas.
Porra.
— Ei, se você morrer eu me torno uma viúva muito rica, mas
prefiro que esteja vivo, coroa, gosto de olhar pro seu rostinho bonito.
— Aurora me oferece vários guardanapos de uma vez e os pego
para poder limpar as lágrimas que descem sem permissão.
— É claro que não vai ser strip! — Declaro. Até parece que eu
deixaria isso acontecer. Ela é nova demais para fazer um negócio
desse, ela não tem noção, não? Pelo amor de Deus!
— Que pena, aposto que ganharia boas gorjetas, sei rebolar
que é uma beleza — decido ignorá-la totalmente, enquanto Matteo
falta morrer de rir ao meu lado. Ele ri tanto que falta o ar.
Claro, não é ele que está se fodendo, por isso está achando
graça.
Filho de uma puta.
— Ei, você trabalha com o quê? Ou não trabalha e é um
desses herdeiros ricos? Confesso que meu sonho de princesa era
ser herdeira, mas descobri que essa profissão não existe. — Minha
esposa falsa começa a tagarelar novamente, o que me dá a certeza
de que eu estava certo de manhã. Essa mulher em silêncio é um
perigo e anoto isso mentalmente para não me surpreender no
futuro.
Um futuro de seis meses.
Ótimo. Ótimo porra!
— Sou corretor de imóveis, um dos três donos da imobiliária
Ramsey&Collins — sabia que os seus olhos iriam se arregalar, mas
não sabia que sua boca cairia aberta.
Nem que meus olhos se atrairiam imediatamente para os
lábios cheios.
Abro um sorriso arrogante, não estou de bom humor, mas ver
essa garota sem palavras, com algo que eu disse hoje, é uma
enorme fonte de orgulho. Além disso, amo ver a reação das
pessoas quando falo da minha imobiliária. Ela se tornou tão grande
no país, que as pessoas que nem precisam de um corretor, ou
arquiteto, pesquisam sobre nós.
Nosso trabalho é tão bom, que temos revistas inteiras com ele
exposto. As mulheres sonham em ter uma casa que nós vendemos
ou fizemos. Os homens sabem que somos as melhores opções. E
alguém que está no ramo de imóveis com certeza já ouviu falar
sobre nós.
E ela ouviu.
— NÃO ACREDITO! — Se ergue na cadeira, ficando de pé na
minha frente. Infelizmente não consigo controlar o rápido olhar que
dou para o seu corpo, é automático. Ela chama atenção porra, só
não devia chamar a minha. — Minha nossa, meu sonho era
trabalhar com vocês, até enviei meu currículo, mas disseram que
não estavam pegando estagiários, inclusive, sua recepcionista é
bem chatinha, foi mal-educada pra cacete comigo. — Franzo o
cenho, vendo-a voltar a se sentar toda animada. — Minha nossa,
por que eu nunca pesquisei sobre os donos? Vai me dizer que você
também é? — pergunta para Matt.
— Sou — responde com um sorriso igual ao meu no rosto. Ele
também tem orgulho do nosso trabalho.
— Oh, minha nossa — ela começa a rir e volta a olhar para o
contrato, pegando a caneta e assinando quando termina de ler. —
Aqui diz que eu vou morar com você, apoio total essa ideia. — Eu
não apoio.
Eu não apoio nadinha, mas quem disse que tive escolha?
Matteo simplesmente disse que seria suspeito demais que
minha esposa não morasse comigo, tanto para a imigração, quanto
para as pessoas quando soubessem que estou casado, porque
saberiam.
Mandei-o tomar no cu, o que não adiantou em nada.
Para meter no cu dos outros esse filho da puta é bom.
Gosta de foder um que é uma beleza.
Adivinha quem ele gostou de foder hoje? Eu, sem um pingo de
lubrificante.
— Você se forma em três semanas? — Foi o que entendi e ela
anui para a minha pergunta. — Certo, me passe o seu número,
estarei lá no dia da sua formatura para pegar você e levá-la para
Manhattan.
— Com o maior prazer — ela me dá o seu celular, um antigo e
com a tela trincada e anoto o meu número. Logo recebo uma
notificação no meu telefone com seu número e já salvo.
— Como você vai voltar para casa? — minha pergunta faz
Matt sorri. , Mesmo não gostando dela, não sou um babaca que vai
deixá-la aqui sem saber como voltar para a faculdade.
— Ah, a passagem já está comprada, foi na conta da vadia
daquela noiva, inclusive... — Ela olha para o relógio e falta saltar os
olhos do rosto. — Puta merda, preciso ir para o hotel pegar minhas
coisas e ir direto para o aeroporto.
Ela se levanta, pega a comida que não terminou e dá a volta
na mesa, oferecendo a mão para nós dois.
— Já vou nessa, mas te mando o dia da minha formatura por
mensagem. Beijinhos — ela aperta a mão do meu melhor amigo e
se abaixa na minha direção. Arregalo os olhos quando estala um
selinho na minha boca. — Tchau, maridinho! — E sai correndo. —
Diz tchau pro Léo. — Grita.
— Ela me beijou — murmuro estarrecido.
Matteo começa a rir novamente ao meu lado.
— Cara, você se meteu em uma furada tão grande...
E eu não sei? Eu sei, porra.
Mas não tô conseguindo raciocinar agora. Porque ela me
beijou.
Ah, filha da puta...
Quando ela era apenas uma
garota.
Ela esperava conquistar o mundo.
Mas isso voou para longe do seu
alcance.
Por isso ela fugiu em seu sono.
E sonhava com o para-para-
paraíso.
Para-para-paraíso.
Para-para-paraíso.
Toda vez que ela fechava os
olhos.
(Paradise - Coldplay)

Confesso que estava ansiosa.


Faz três semanas que não falo com Nicolas, ele simplesmente
deu chá de sumiço desde o momento em que saí do hotel. Até
mandei mensagem, mas não me respondeu, também liguei na
semana passada para confirmar se viria, mas só chamou até cair na
caixa postal.
Sei que o que fiz foi errado, ele deve me odiar, mas preciso
dele. Infelizmente preciso dele.
Não providenciei nenhum lugar para morar depois da
formatura, estou confiando que vai cumprir com a promessa de vir
me buscar, mas talvez seja esperança demais que estou tendo. E
esperança demais nunca é bom.
Ele não precisa realmente vir me buscar, eu poderia arrumar
um lugar para ficar. Comecei a pesquisar sobre ele e ninguém sabe
ainda que ele está casado. Faz só três semanas, eu sei, mas ele é
importante demais para uma notícia dessa não ter saído em algum
meio de comunicação, então só posso crer que isso não saiu da
bolha dos três homens que eu passei a perna. Ele pode passar os
seis meses assim, se quiser, ele me prometeu continuar casado, e
isso já é mais do que eu poderia esperar dele.
Mas realmente pensei que viria hoje.
Nicolas não me mandou nenhuma mensagem me avisando se
viria, se tem lugar para sentar ou qualquer merda assim. Então paro
de pensar nele e foco na minha frente.
Estou na fila de formandos que estão entrando no grande
auditório da LSU, para pegar o meu diploma. Não olho para os
lados, não procuro ninguém.
A única pessoa que eu poderia procurar é Elisa, mas ela se
formou na semana passada e o pai a mandou para Londres sem
perder tempo. Suas mensagens de parabéns e apoio chegaram no
meu celular essa manhã. Gostaria que estivesse aqui, mas entendo
o porquê não está.
Não contei a ela que estou casada, não contei nada para
ninguém.
Estou sozinha.
Sempre fui sozinha.
Mesmo em meio a minha família no Brasil, posso até afirmar
que lá era muito mais solitário.
Então, meu foco é para frente, para a bancada de professores
que não lembrarão de mim depois que me formar, mas que se
orgulhavam enquanto eu estava em sala. Fui a melhor aluna, dei
cento e dez por cento de mim dentro de sala. Não tinha mais o que
fazer, só isso poderia me dar um futuro, então me esforcei e tentei
ser lembrada. Porque serei. Me formarei com honras, posso ser
esquecida pelas pessoas, mas serei especial para os papéis. Meu
currículo com certeza será ainda melhor.
A vida sempre trata de nos ensinar, desde cedo não ouvimos
nossos professores fazendo isso? Até mesmo nas broncas.
Sempre escutei deles: “Olhe para frente, a prova é individual.”
Agora faz total sentido. Não entendemos muitas coisas quando
somos crianças, mas se pararmos para analisar cada coisa que
passou pela nossa vida, teríamos tantas lições que não notamos,
que nenhuma pessoa nesse mundo faria besteira.
É isso que eu faço. Olho para frente. Tudo na vida é individual.
Na minha é, e estou tranquila com isso, não tenho como mudar
agora, só seguir em frente e é o que estou fazendo. Sou impulsiva?
Sou. Faço merda? Faço.
Mas é a minha vida.
Só eu sou a responsável pelas minhas escolhas.
Eu preciso lidar com as consequências dela.
Eu sou a pessoa que está vivendo.
E até estou bem reflexiva hoje. Acho que todos ficamos
quando estamos nos formando, no ensino médio, na graduação, no
mestrado e adiante. Sempre é um dia que nos muda e nos faz
refletir sobre a vida e o que estamos fazendo dela. Eu estou fazendo
o que posso pela minha.
Então, quando meu nome é chamado, e todos os professores
se erguem para me aplaudir, e a cerimonialista fala sobre todas as
honras que tenho, ergo o queixo e caminho de cabeça erguida, o
olhar focado e orgulho de mim mesma.
Orgulho da menina que saiu de um lar tóxico, onde todos
falaram que eu não valeria nada, e agora está aqui em cima,
recebendo meu canudo e uma grande faixa que mostra a todos que
me esforcei para chegar aonde cheguei.
Em lugar nenhum. Desempregada, sem teto e sem grana. Mas
pelo menos me formei.
Olho para a plateia, abrindo o meu melhor sorriso e viro uma
estátua quando meus olhos se deparam com os verdes intensos de
Nicolas.
Meu sorriso se torna ainda maior e deixo uma lágrima que eu
nem sabia que estava nos meus olhos escapar.
Ele está sorrindo, não é um sorriso aberto, é bem fechadinho,
e os olhos transmitem um tipo de orgulho. O orgulho que todos
sentem ao ver uma pessoa que conhece se formar com honras.
Tenho certeza de que ele não gosta de mim, mas gosta de saber
que eu não sou uma vadia sem coração que não liga para os
estudos.
Só uma vadia sem coração, eu acho.
Limpo a lágrima e me arrumo para a foto, e quando ela
dispara, agradeço por tudo e desço do palanque. Sei que a lágrima
não é por gostar de Nicolas também. Mas hoje é um dia especial, e
mesmo dando tudo de mim e fingindo que sou boa em ficar sozinha,
fico feliz de saber que ele está aqui. Que realmente veio.
Ele veio.
Ele vai me levar embora.
Ele vai me dar um teto.
Um visto.
Esperança.
Já chega, realmente estou emocionada hoje, puta merda.

Assim que a cerimônia termina e todos fazemos a famosa


cena de jogar o chapéu para cima, pego o meu ainda no ar, coloco
na cabeça e começo a olhar para os lados. Os familiares começam
a se aproximar para parabenizar os outros formandos, mas só me
preocupo em achar quem realmente me importa.
Já parabenizei todos.
E não tem ninguém para me parabenizar.
Encontro Nicolas falando com o diretor do meu curso e logo
vejo que as pessoas o reconhecem aqui. Estamos em uma turma de
designers de interiores que sonham em trabalhar e fazer carreira na
imobiliária dele, então, quando os sussurros começam, nem fico
surpresa.
Vejo que uns pais e familiares até arrastam gente em sua
direção, mas ele não dá muita atenção quando seus olhos pousam
em mim.
Hoje eu vim com a aliança. Não a usei desde que voltei
daquela loucura de Vegas, não queria meus colegas de classe
xeretando, mas hoje estou usando, só porque tinha esperança de
ele vir e poder irritá-lo.
Quando todos veem que ele tem outro foco, seguem o olhar
dele e me notam. Apenas sorrio e corro em sua direção, como a
maior cara de pau que sou, e me jogo nos braços dele.
Ele vira uma pedra e sinto vontade de gargalhar, mas ele está
na frente de várias pessoas que sabem quem ele é, então somente
me abraça de volta rapidamente.
Escuto uns murmurinhos da minha classe fofoqueira, mas não
ligo.
O solto e encaro seu rosto.
— Ei, coroa, você está realmente aqui — sorrio ainda mais dos
seus olhos semicerrados.
— Eu falei que viria — responde com tom de voz sério. —
Parabéns, não sabia que se formaria com honras, mas não estou
surpreso.
Ergo as sobrancelhas.
— Por que, não?
Ele abre novamente um minissorriso e fala baixinho, ao se
aproximar do meu ouvido.
— Você é insuportável quando quer algo e faz de tudo para
conseguir, pelo que sei no pouco tempo em que te conheço. É óbvio
que seria a melhor da turma. — Gargalho da sua fala, mesmo
sentindo o arrepio do pescoço aos pés.
— Sou boa em tudo o que faço, coroa — pisco, apenas para
provocá-lo, mas ele revira os olhos e olha em volta.
Não preciso olhar para saber que todos estão nos observando,
então, foco em sua mão e a agarro, feliz quando vejo que ele
também usa a aliança. A partir de hoje, sou a sua mulher, posso ser
falsa e por apenas seis meses, mas continuo sendo sua mulher.
Então vai começar agora.
— Obrigada por vir, pode não gostar de mim, mas é a única
pessoa que está aqui por mim, hoje — falo baixinho e com
sinceridade, meu sorriso vulnerável e culpo a emoção da formatura
por isso.
Seus olhos intensos ficam mais suaves, mas seu maxilar
trinca.
— Apenas eu? — pergunta com seriedade.
— É meu marido, então é o único que importa — dou de
ombros, rindo quando ele revira os olhos novamente, mas parece
que Nicolas está de bom humor hoje e que está mais calmo a nosso
respeito. — Pensei que não viria, não me atendeu e nem respondeu
minhas mensagens.
— Eu disse que viria — repete — você ainda precisa de algum
tempo para se despedir, ou podemos ir embora? — pergunta sem
explicar o porquê de não ter me atendido ou respondido, mas não
ligo. Nicolas não precisa me explicar mesmo, ele está aqui agora e
isso é tudo o que importa.
— Podemos ir, já me despedi de todo mundo antes de tudo
começar — dou de ombros e ele assente, pegando a minha mão e
me guiando por meio da multidão.
Escuto quando alguém repara em nossas alianças.
Escuto quando todo mundo fica surpreso.
Escuto meu coração ficar aliviado em saber que não vou morar
debaixo da ponte.
Porque não, não é bonito em nenhuma época do ano.
Todo mundo se machuca às
vezes
Todo mundo se machuca algum
dia, ei, ei
Mas vai ficar tudo bem
(Memories - Marrom 5)

Não gostava dela.


Não queria estar com ela.
Mas até o mais babaca ser desse planeta veria nos seus olhos
a vulnerabilidade e a tristeza. Mas só nos olhos, aqueles tão verdes
quanto os meus.
Na boca que só fala besteira sempre que está aberta,
mostrava o maior sorriso do mundo. Um lindo, se estou sendo
sincero hoje, mas tão falso quanto as mentiras que ela contou para
me amarrar na frente da juíza.
Ela tinha que ter essa carinha de santa? Porque Aurora não
mentiu quando disse que tinha a carinha de anjo, ela é fofa, jovem e
passa um ar inocente, mas quem disse que o capeta também não é
assim?
Por isso, ao invés de agir como um idiota, resolvi ser o homem
maduro que sou, de trinta e nove anos, calmo, controlado e não
gritei com ela assim que a vi.
Porque a vontade que tenho de esganar aquele pescocinho só
foi aumentando todas as vezes em que me lembrava da merda que
estava metido. E pensa em uma merda grande.
No entanto, como eu disse, resolvi ser tranquilo hoje, é só ela
não abrir a boquinha para falar besteira e tudo será as mil
maravilhas. E ela estava calada.
Entrou no carro calada, passou no dormitório e pegou suas
coisas em silêncio. Entrou no avião ainda sem abrir a boca e agora
estávamos entrando no meu apartamento e seus lábios
continuavam fechadinhos. Sabia que ela calada não era boa coisa,
mas sabia que hoje era por um motivo diferente.
Ela não tinha ninguém que estivesse sentado naquele
auditório, que estivesse lá por ela além de mim, porra, nem mesmo
um amigo. Assim que peguei a sua mão, ela simplesmente aceitou,
saiu e nem se despediu. Não tinha uma pessoa que importasse a
esse ponto.
Acho que é empatia que estou sentindo, mesmo por essa
pirralha que fez o que fez comigo e que não merece esse
sentimento, mas empatia é foda, ela aparece do nada e por quem a
gente menos espera, bem que essa pilantra poderia ter tido um
pouquinho comigo antes de me foder, né? Mas teve? Não, mas o
tonto aqui tem por ela, vê se eu não sou bonzinho? Eu sou.
Quando quero, eu sou.
Então, por hoje, declaro silenciosamente uma trégua.
Quando disse que não estava surpreso por ela se formar com
honras, disse a verdade. Ela é inteligente e corre atrás do que quer,
mesmo que pise nos outros no caminho. Mas foi uma grata
constatação.
Saber que ela tem o talento necessário que eu estava
procurando, porque ninguém se forma com honras sem ser
desejado por todos os departamentos. Fiz uma pesquisa sobre ela
nessas três semanas. Seu diretor disse que ela havia recebido boas
propostas, mas como já tinha um emprego, acabou não aceitando
as outras. O que foi péssimo, pois acabou sendo demitida.
Ela não vai ficar na minha casa sem fazer nada, corrompendo
meu querido lar com suas... sei lá, o que uma menina de vinte faz
hoje em dia? Não, melhor, o que uma menina de vinte anos,
mentirosa e trapaceira faz hoje em dia? Aurora me mostrou ser um
furacão, tenho medo de deixá-la sozinha aqui e ela simplesmente
tacar fogo no meu amado apartamento.
Então, que ideia melhor do que colocá-la para trabalhar na
minha imobiliária? A garota não sabe disso ainda, mas pode até
gostar. Ela fica no canto dela, eu no meu, não nos esbarramos, já
que não costumo sair da minha sala para interagir, e
consequentemente, não enche o meu saco.
Gosto de encher meu saco com outras coisas, Aurora não é
uma delas.
Assim que passamos pela porta do apartamento, com as duas
malas da bonita, a garota olha ao redor com admiração.
É um belo apartamento em um dos nossos edifícios, todo
arquitetado por meu irmão e eu, ambos somos formados em
arquitetura e engenharia civil. Mas aproveitei e fiz uma graduação
em gestão imobiliária também quando decidi ficar com a parte de
corretor na Ramsey&Collins. Gosto de estudar, gosto de me
especializar na área em que trabalho. Meu ramo vende imóveis,
sendo de outras pessoas ou que nós mesmos planejamos.
Tenho orgulho de falar que o meu apartamento que pega toda
a cobertura do edifício, de dois andares e todo equipado, foi obra
nossa. Todos os outros apartamentos já foram vendidos, e os dois
abaixo do meu pertencem a Léo e Matteo. É o nosso melhor, em
questão de segurança, localização e ambientação.
Mas não temos um bom decorador, então a arquitetura é linda,
a decoração? Bem, é tão minimalista quanto poderia ser.
— Seu apartamento é lindo, sem graça, no entanto, adorei a
arquitetura. — Estava demorando para abrir a boca.
— Não precisa ter graça, não é um circo — retruco, pegando
suas malas e levando para o andar de cima, onde ficam os quartos,
inclusive o reserva onde vai ficar. Pode até morar comigo, mas em
hipótese alguma vamos ficar no mesmo quarto.
— Conversinha fiada... — comenta alegremente e nem parece
que está triste pela formatura solitária.
Talvez não esteja, Aurora pareceu bem feliz ao me ver,
pareceu bastar para ela.
Dá até para esquecer que me deu um golpe para conseguir um
visto. Hum, não…, nem assim eu esqueço.
— Para onde estamos indo? Não deveria me dar um tour pelo
apartamento? — pergunta atrás de mim, enquanto subimos as
escadas.
— Não te mandei me seguir — sorrio ao escutá-la bufar.
— Falta de educação, hein? Tão velho e não sabe tratar uma
dama.
— Você fez um show na frente de uma juíza, me fez passar
por mau-caráter, além disso, ainda está me chantageando para ficar
casado com você, você passa longe de ser uma dama pra mim
agora, garota. — Abro a porta do quarto de hóspedes, e entro,
arrastando as malas comigo, as deixando no meio do quarto.
— Isso foi grosseiro — põe a mão no coração e se faz de
ofendida. — Mas vou te perdoar, porque esse quarto é perfeito —
grita, dando um pulinho no lugar e se jogando na cama. — É meu,
né?
— É meu, mas você vai dormir aqui, por enquanto — informo,
sem querer que fique muito à vontade na minha casa.
Só em pensar que vamos passar cinco meses e uma semana
juntos, já me dá urticária. Ainda bem que tive três semanas para me
preparar psicologicamente para esse momento, para tê-la na minha
casa.
Na minha vida.
Na minha imobiliária.
Para tê-la comigo.
Mesmo tendo esse tempo, ainda me sinto completamente
despreparado quando olho para ela sorrindo, alisando o lençol da
cama e olhando ao redor do quarto.
— Tem banheiro e closet — aponto para as portas adjacentes.
— Nesse andar tem apenas mais o meu quarto no final do corredor.
A sala, cozinha, lavanderia, banheiro social e escritório ficam no
andar de baixo. Você está com fome? — pergunto, me virando para
a porta e saindo, sabendo que vai me seguir.
— Estou — fala atrás de mim.
Sorrio e nego com a cabeça. Já viram aqueles cachorrinhos
que ficam nos seguindo por onde andamos? Aurora é esse
cachorrinho.
— Vou pedir comida, já está tarde e só tenho comida
congelada na geladeira.
— Pode ser pizza? Amo pizza, hoje é minha formatura, seja
bonzinho comigo. — Seu tom de voz pidão só colabora para a
minha comparação com o cachorrinho.
— Já estou sendo, está na minha casa, não? Poderia estar
sendo deportada, agora. — Estou sendo legal.
Muito legal. Tudo porque declarei trégua ao ver seus olhos
tristes.
Não deveria me importar, mas o que posso fazer se sou um
ser humano decente? Empatia é foda.
Casamento é foda.
Aurora é foda.
Puta merda.
— Aff, você é mesmo um velho chato, hein? Supera, homem,
vai viver. — Trinco o maxilar, parando de andar e me virando para
ela.
— Você está ultrapassando um limite aqui, Aurora.
Ela para e me olha, depois suspira pesado.
— Desculpa, tá? Eu não queria te prejudicar com o casamento,
mas precisava de você, sei que não queria, sei que fui impulsiva e
fiz merda, mas aconteceu, desculpa — dá de ombros e morde o
lábio, receosa, olhando para os lados. — Não me orgulho do que fiz,
mas não me arrependo.
— Como não se arrepende e está pedindo desculpa? —
pergunto incrédulo.
— Porque você precisa delas, a desculpa nunca é sobre nós,
mas sobre os sentimentos de outras pessoas, eu peço desculpa a
você, não a mim, é uma coisa lógica. — De novo, sorri de lábios
fechados.
Faz sentido.
Decido encerrar o assunto e faço o pedido da pizza, falando
para Aurora que ela pode olhar tudo na casa sozinha. Estou
cansado e só quero me sentar um pouco. Ela o faz sem reclamar, só
escuto os seus passos, andando de um lado para o outro pelo meu
apartamento, às vezes ouvindo uns gritinhos eufóricos.
Que merda, meu lugar de paz, silencioso e tranquilo, agora
tem uma jovem tagarela, que por acaso é minha esposa e que eu
não gosto da presença.
Porque eu não gosto.
Não gosto de estar perto dela.
Não gosto de ter casado com ela.
Não gosto de morar com ela.
Não gosto dela.
Ponto.
Só que foda-se esse ponto agora, não tenho escolha a não ser
ter ela aqui.
Metade de tudo que eu já ganhei nessas três semanas, só isso
que eu tenho a perder se quiser o divórcio agora. Milhares de
dólares. Então fecho os olhos e faço um pedido silencioso para que
eu possa aguentar esses meses sem jogar essa menina da janela.
Vai ser difícil. Vai ser muito difícil.

Entro embaixo do chuveiro e deixo a água cair em mim, em


uma temperatura que qualquer pessoa normal não aguentaria. A
água não está fria, está congelante e sim, foi escolha minha.
Acordei duro e não posso nem bater a merda de uma punheta,
porque não consigo fazer isso com Aurora dormindo no quarto ao
lado do meu. Meu quarto tem isolamento acústico, é a suíte
principal, afinal, mas é estranho saber que ela dorme do outro lado e
me tocar.
Principalmente se o motivo de eu estar duro é ela.
Sonhei com ela, mais especificamente a noite em que nos
conhecemos. Ainda não lembro de como nos conhecemos, mas
lembro de ficar observando uma mulher muito gostosa, com uma
bunda deliciosa dentro de um vestido bege na boate. Lembro que
estava de costas, dançando com movimentos experientes que me
chamaram a atenção e me fizeram desejá-la. Também lembro do
mesmo vestido no corpo da Aurora no outro dia. Agora me sinto um
pervertido de merda que ficou babando em uma garota que ainda
estava na faculdade.
Isso porque eu ainda não lembro de como foi transar com ela,
e prefiro que esse sonho nunca aconteça.
Termino de me banhar, com o corpo bem mais relaxado,
embora gelado pra caralho, e faço minha higiene matinal. Ainda não
são sete horas, mas preciso acordar minha querida esposa para o
seu primeiro dia de trabalho e espero que ela aceite, porque já
tenho várias entregas atrasadas por não ter um bom designer de
interiores. Todos os que trabalharam conosco, não entregaram o
que queríamos, então farei o teste com Aurora com um projeto, e se
for mesmo tudo isso que fala, darei um emprego vitalício a ela.
Tá vendo a porra da empatia de novo?
Foda.
Visto meu melhor terno, penteio os cabelos e a barba e desço
para fazer o café.
Tenho alguém que vem ao meu apartamento três vezes na
semana para fazer a limpeza, mas gosto de fazer comida, sempre
fui bom na cozinha, precisava ser para alimentar Léo com algo
decente quando éramos jovens.
Sempre fiz de tudo para aquele ingrato me retribuir com dor de
cabeça, daquelas que nenhuma aspirina dá conta.
Abro a geladeira, tiro tudo o que posso fazer para o café e
decido novamente ser bonzinho hoje e alimentar aquele Taz[3] que
dorme tranquilamente, sabendo que não será deportada hoje.
Também quero que ela não me irrite, por isso estou sendo
bonzinho, meu pavio já é curto, mas ela tem um talento nato para
queimá-lo com uma rapidez que ninguém até hoje foi capaz de fazer
e olha que Léo é meu irmão, e Léo é um desgraçado cruelmente
sádico quando o assunto é me tirar do sério.
Balanço a cabeça lentamente. Léo também não está gostando
da cara da minha nova inquilina e torço para que continue assim,
nem um santo seria capaz de aguentá-los caso se juntassem.
E de santo, eu não tenho nada.
Faço o café e subo para o quarto para acordar a bela
adormecida. Bato na porta e a chamo, mas não ouço nada. Bato
novamente e espero alguns minutos, mas ainda nada. Então, abro a
porta que está destrancada e torço internamente para que ela seja
uma boa garota e tenha dormido com o bendito hábito que ela tão
orgulhosamente anunciou para a juíza e não do jeito que dormiu
comigo.
Seria tão mais fácil se ela tivesse decidido vestir o bendito
hábito.
Eles não nos disseram: Não
apressem as coisas?
Você não piscou seus olhos
verdes para mim?
Você não ouviu falar do que
acontece com mentes curiosas?
Ooh, tudo isso não parecia novo e
empolgante?
(Wonderland - Taylor Swift)
Nunca pensei que dormiria tão bem depois que me formasse e
fosse obrigada a sair do alojamento. Gosto de deixar as coisas para
depois, mas sabia que quando acabasse, não teria tanto sossego
para dormir uma noite de sono inteira, sem nenhuma preocupação
com o dia seguinte.
Mas dormi, mesmo tendo passado horas arrumando minhas
malas, tirando todas as minhas coisas que acumulei nos últimos três
anos, decorando o quarto e organizando o closet do jeito que eu
queria. Depois de tudo estar no seu devido lugar, dormi lindamente
no colchão mais macio que eu já tive o prazer de deitar.
Até um filho de uma rapariga tirar o cobertor de cima de mim à
força, me matando de susto no processo. Arregalo os olhos,
sentindo meu coração acelerar com o puxão abrupto e encaro o
meliante, que está todo charmoso em um terno preto caríssimo, me
olhando com cara de poucos amigos.
Eu já disse que não gosto de acordar cedo? Não gosto, porra,
sei que estou na casa dos outros, mas nada me impede de ficar
extremamente irritada quando não tenho minhas amáveis oito horas
de sono.
— Se você não tiver um bom motivo para me acordar de
madrugada, eu juro que mato você — resmungo, virando o rosto
para o outro lado, onde a janela não clareia tanto, voltando a fechar
os olhos.
— Já são sete horas, Aurora. O sol já nasceu!
— E o que você quer que eu faça? Fotossíntese? — retruco
com raiva, enfiando minha cara no travesseiro.
Ódio, ódio que eu tenho por saber que não conseguirei dormir
novamente. Tenho esse pequeno problema, não consigo dormir à
tarde e não consigo dormir depois que acordo de manhã. Se Nicolas
já quer me matar, vou dar um motivo muito bom para ele fazer isso,
ao triturar suas bolas.
Aquelas que devem ser uma delícia.
— Pensei que no convento acordasse cedo, para rezar e tal.
— Já foi para um convento? — resmungo.
— Não.
— Então, cala a boca.
— Está na hora de acordar, precisa trabalhar, garota —
devolve com sua voz grossa, sem se abalar.
— Não sei se você é lerdo assim naturalmente ou é sintoma da
velhice, mas eu sou desempregada — respondo, desistindo de
fechar os olhos e me sentando na cama. Ainda bem que dormi de
calça moletom e uma blusinha curta, porque se tivesse dormido
como costumo fazer, que é só de calcinha, o coroa ficaria
traumatizado.
Seria uma visão e tanto, mas ele parece não querer ver essa
cena tão cedo. Uma pena, ele é chato, mas é um gostoso, não
posso nem negar. Pensa em um homem bonito e nem posso dizer
que transei com ele, porque não transei.
Encontrei um vídeo no meu celular, de nós podres de bêbados,
chegando no quarto para transar, mas enquanto eu fui ao banheiro e
conversava com o celular como uma verdadeira estrela pornô,
Nicolas tirou a roupa e ficou só de cueca em cima da cama, só que
dormiu. Antes de eu sentar, ele dormiu.
A minha eu do passado e embriagada, ficou muito triste, mas
essa eu aqui não fiquei, gostaria de lembrar se transasse com esse
homem, seria um evento e tanto.
Poderia até comprovar se ele sabe me manobrar bem, como
eu fiz a juíza acreditar.
— Não é mais, trabalha para mim, agora — estalo o pescoço
em sua direção tão rápido que fico meio tonta.
— Em quê, exatamente? — pergunto receosa, do jeito que ele
não gosta de mim, é capaz dele me colocar para limpar o seu
banheiro. — Olha, se for para arrumar a casa, eu até aceito,
trabalho sexual também, seria um prazer, mas isso não poderia ser
depois que eu acordasse naturalmente? — tagarelo, vendo seu
rosto ficar vermelho quando falo de sexo e abro um sorrisinho.
Nicolas revira os olhos com força e se afasta em direção à
porta.
— Tome banho e se arrume, agora você é a designer de
interiores da Ramsey&Collins, saio em quarenta minutos, é bom
estar pronta antes disso e descer para tomar café, estou te
esperando lá embaixo. — Continua andando como se não estivesse
vendo a minha boca aberta, quase encostando no chão. — E vista
uma roupa social.
Vejo-o saindo pela minha porta, mas ainda não consigo reagir
depois do que me informou.
Ele vai me dar um emprego? Será que eu vou trabalhar de
graça?
Quem se importa? Trabalhar de graça seria o mínimo depois
de tudo o que ele está fazendo por mim, embora ser contratada
apenas por ser a mulher de alguém não era muito o que queria.
Mas, se eu provar o meu valor, talvez quando tudo isso acabar,
Nicolas possa me dar ótimas cartas de recomendação ou me deixar
ficar lá e...
Minha nossa, eu vou trabalhar!
Me levanto em um pulo e corro para o banheiro, faço xixi,
escovo os dentes e me enfio debaixo do chuveiro, quase
desmaiando ao fazer isso logo depois de acordar, mas há
adrenalina percorrendo o meu corpo, o que impede que isso
aconteça.
Corro para o closet e peso minhas opções. Tenho roupas
sociais, trabalhava, afinal, era óbvio que precisava, então, pego o
meu terno mais novo, com calça branca em alfaiataria, uma blusa
até o pescoço em um tom mais puxado para o nude e por cima, jogo
o blazer. Calço sandálias de saltos brancos, que deixam os dedos à
mostra e são segurados apenas por uma tira e me sento para me
maquiar.
Quando me visto para o trabalho, sempre parece que tenho
mais do que vinte anos. Sou alta e sempre soube como andar com
elegância, posso até não ter dinheiro, mas com o pouco que tenho,
realizei o primeiro mandamento dos trabalhadores. A primeira
impressão é a que fica, e ninguém quer contratar uma designer que
vai de jeans e camiseta.
Então, agradeço por ter feito um investimento em peças de
alfaiataria, que não são de marca, mas que me ajudam a passar a
imagem de mulher responsável que eu quero.
Termino de me maquiar, coloco um brinco e ajeito os cachos
em minha cabeça, em um coque alto, com algumas mechas
escapando.
Já pronta, desço para o andar de baixo, faltando apenas dez
minutos para os que Nicolas me deu acabarem. Sinto o cheiro de
comida vindo da cozinha e caminho até lá.
Nicolas está de costas, tirou o paletó e está só com a camisa
social preta por dentro da calça que delineia lindamente a sua
bunda. Quando escuta o barulho dos meus saltos, começa a falar
sem se virar.
— Têm panquecas, frutas e queijo quente, fiz café, não tem
açúcar, mas o pote está em cima da mesa e você pode dosar as
medidas. Temos poucos minutos antes de precisarmos... — Ergo o
olhar da mesa que tinha a minha atenção enquanto Nicolas ia
falando, até os seus olhos que estão passeando por todo o meu
corpo.
Sinto a mesma coisa que senti quando acordamos naquele
quarto, aquele arrepio gostoso percorrendo todo o meu corpo.
Antes dele estragar tudo falando que eu estava dando um
golpe nele. E não é que eu dei?
— Sair. — Termina de falar e solta uma respiração profunda,
xingando baixinho e desviando os olhos para a mesa. — Sente-se.
Sorrindo, faço o que manda e ponho panquecas no meu prato.
— Você que fez tudo isso? — pergunto surpresa.
— Sim, estava com tempo, mas não se acostume — semicerro
os olhos quando noto o tom de voz um pouco rouco, mas ele
pigarreia, e começa a se servir.
— Não vou — digo, dando de ombros e começo a comer. —
Por que decidiu me dar um emprego?
— Estou precisando de um designer, você está disponível —
dá de ombros, comendo um queijo quente.
Ergo a sobrancelha.
— Eu poderia ter arrumado um emprego nessas três semanas.
— Acordou hoje e falou que estava desempregada —
responde com sarcasmo e bufo.
— Droga, não posso nem me fazer de difícil — nego com a
cabeça e juro que por um momento, algo como um sorriso se forma
no cantinho da sua boca. Então, decido provocá-lo. — Mas você é
meu marido, sou facinha, facinha pra você.
Nicolas se engasga e começo a rir quando ele se recupera.
— Você precisa parar com isso, garota — nega com a cabeça,
os olhos injetados de repreensão.
— Com o quê, exatamente, coroa? — ele trinca o maxilar
quando o chamo de coroa e meu sorriso se torna felino.
— De dar em cima de mim — responde como se fosse óbvio.
Reviro os olhos. Se ele soubesse como eu gostaria de dar em cima
dele, teria um infarto.
— Você é meu marido.
— Seu marido falso, é um casamento falso — respiro fundo,
mas não falo nada, apenas enfio vários pedaços de panqueca na
boca para não abrir e falar merda. Eu sei, otário, nunca brincou na
vida? — Inclusive, não fale na empresa que é minha mulher, isso
fará as pessoas te olharem com outros olhos, e não os profissionais,
e eu não quero anunciar aos quatro cantos que estou casado.
Aceno com a cabeça, vendo que mesmo sem perceber,
Nicolas foi fofo ao pensar na minha reputação lá dentro, mas ao
mesmo tempo, me esfaqueou ao falar que não quer que as pessoas
saibam que ele está casado.
É comigo, poxa, sou um pitelzinho!
— Certo, como você vai explicar o fato de chegarmos juntos?
— pergunto com curiosidade, tomando um gole do café
maravilhoso. — Inclusive, você é muito bom fazendo a comida. — E
simplesmente, não consigo evitar falar em seguida. — É bom
comendo, também?
Seus olhos brilham, se tornando em um verde muito mais
intenso.
— Não era você que disse à juíza que eu te manobrei muito
bem? — pergunta com sarcasmo e gosto muito mais de ver o
sarcasmo do que a falta de paciência.
— Menti — pisco e ele revira os olhos.
— É claro que mentiu, não lembra de nada, assim como eu —
nega com a cabeça, o que ele faria se soubesse que nem
transamos? — Se sou bom, isso você nunca vai saber, garota. —
Fala diretamente. — E ninguém vai notar que chegamos juntos,
Leonardo, Matteo e eu temos um elevador privativo que sai no
nosso andar, entrando pela garagem. Depois você pega o elevador
comum e ninguém saberá como você entrou.
Dá de ombros e faz muito sentido.
Terminamos de comer em silêncio, sem que eu fizesse mais
perguntas, e logo depois, saímos da casa e entramos no elevador.
Um andar abaixo do nosso, ele abre novamente e Léo, para a
minha surpresa, entra.
— Você — me olha de cima a baixo, erguendo uma
sobrancelha para o irmão. — Já está hospedada, pelo visto. — Sei
pelo seu tom, que não está gostando muito de mim.
Mas puderas, enganei o seu irmão e estou o obrigando a ficar
comigo por seis meses contra a sua vontade, que irmão ficaria feliz
em me ver?
— Bom dia — cumprimento-o com um sorriso, não me
abalando com sua cara de poucos amigos. — Estou, um belo
quarto, para falar a verdade.
— Para onde está indo? — Pergunta curioso.
— Para a imobiliária. — Nicolas responde por mim, encostado
no espelho do elevador, com os braços cruzados. Prestando
atenção, dá para ver como são parecidos, embora Léo tenha o estilo
muito jovem, com os cabelos mais loiros e escapando para a testa.
Mas a constituição corporal é bem parecida, até o jeito que se
vestem é igual. Mudando a cor, já que o terno de Léo é azul.
— Fazer o quê? Vai ficar de babá? — pergunta com sarcasmo,
no mesmo momento em que o elevador abre novamente e Matt,
outra surpresa, entra.
Moram tudo no mesmo edifício? Sério mesmo?
Agora eu tô lascada.
— Estamos precisando de uma designer, ela é uma designer
— responde simplesmente o meu maridinho, e tanto Matt quanto
Léo se viram para mim.
— Bom dia — Tá vendo, Léo? Poderia ser educado como
Matt, levam tudo para o coração, Deus me livre!
Antes que eu responda, ele fala.
— Sério? Vai colocar sua mulher para trabalhar na
Ramsey&Collins? Quando o pessoal descobrir, vão cair em cima
dela, você sabe, né? Acusando-a de nepotismo.
Ele pode tá com raiva, mas é preocupado como o irmão, que
fofo.
— Agradeço a preocupação, mas se ela mostrar que é tudo o
que diz, então teremos como refutar esse argumento — comenta
Nicolas, fixando seus olhos intensos em mim.
— Ela disse que é boa e agora tem um emprego?
— Ei, eu estou bem aqui, oh — estalo o dedo na cara do meu
cunhadinho que me amava quando acordei em Las Vegas, mas
agora parece querer passar com um caminhão em cima de mim. —
Me formei com honras, tá? Sou muito boa e recebi diversas
propostas, pena que foram preenchidas antes de eu ser demitida de
onde trabalhava. — Resmungo, mas me aprumo quando sinto os
olhos deles novamente.
— Honras? — pergunta Matt, encarando Nicolas. Seus
cabelos pretos dão a ele um charme à parte, seus olhos cor de mar
não são ressentidos como os de Léo, ele até parece curioso a meu
respeito.
— Com direito a faixa e tudo — responde, acenando com a
cabeça e abro um sorriso grande. Tá, pareço um pavão mostrando o
rabo com orgulho.
— Muito bom — acena Matt, com aprovação.
— Claro que é muito bom, sou ótima — dou de ombros e ele
bufa uma risada, arrancando uma minha.
Sinto Nicolas se aproximar de mim, mas logo eles entram em
outro papo, até que saímos na garagem e cada um segue para o
próprio carro. Sigo com Nicolas, me acomodo no banco passageiro
do seu carrão e logo ele coloca o veículo na estrada.
— Pronta para o primeiro dia de trabalho?

— Pronto para o primeiro dia


como marido?
Venha como você é, como você
era.
Como eu quero que você seja.
Como um amigo, como um
amigo.
Como um velho inimigo.
(Come As You Are - Nirvana)
A levo para almoçar, ou deixo que se vire sozinha? Sozinha
né? Ficar sozinho é bom para pensar na vida, justamente o que ela
precisa. Pensar em tudo o que faz e deixa de fazer. Principalmente
as burradas em que mete pessoas inocentes. Eu sou a pessoa
inocente, no caso.
Eu não disse que queria arrumar um trabalho para ela não me
encher o saco? Eu disse.
E por que diabos eu estou me perguntando se a levo ou não
para almoçar? Ela pode muito bem se virar sozinha, é adulta e está
vivendo há quatro anos em um país estrangeiro sem ninguém.
Então por que eu estou ansioso?
A empatia.
A merda da empatia de novo, só pode ser isso.
Solto uma respiração lenta e ergo os olhos para a porta. Vou
pedir comida, não preciso sair para almoçar, estou muito bem
sentado aqui, confortável até. Minha cadeira é ótima, boa para a
lombar e pescoço, aconchegante. Não preciso sair.
Ela pode acompanhar alguém do seu setor para almoçar, com
certeza chamaram ela como prova de boa vizinhança, são colegas a
partir de agora, não é possível que nenhum infeliz a chame para
comer, né? Se bem que com aquela boquinha irritante dela, é capaz
de não chamarem mesmo. Só que ela deve ter dinheiro, não deve?
Para de pensar nela, Nicolas! Ela só precisa de você para um
visto, fora isso, ela não é problema seu!
Aperto no botão que chama no canal da minha secretária.
— Sim, senhor Ramsey?
— Laura, por favor, peça o pedido número 6 da minha lista
para o almoço, não pretendo sair hoje.
— Sim, senhor, alguma coisa para beber?
Mordo a língua, mas nem assim a coceirinha passa.
É por isso que eu não gosto de mulheres mais jovens, porque
são sempre uma preocupação. Por que Riley não continuou
comigo? Eu não teria ido a Las Vegas e não teria me casado.
Mas será que ela tem dinheiro? Será que a confiança no meu
pessoal é bem depositada? Será que ela trouxe lanchinho de casa?
Não. Esse ela não trouxe, eu vi.
Tá vendo, Riley? Olha a situação em que eu me meti por sua
causa, agora sou obrigado a ser um homem decente…
— Pede duas porções da comida, e um refrigerante de um litro
sem açúcar — respondo. Laura sabe que não precisa perguntar
mais nada, então desliga.
Agora tenho que ligar para a Aurora.
Meu telefone em cima da mesa parece zombar de mim, passei
semanas ignorando a garota, para precisar ligar apenas para que
venha almoçar comigo, sendo que o intuito de não responder, era
não dar a ela esse tipo de intimidade.
Tenho medo até de pensar no que ela pode me enviar, caso eu
comece a respondê-la.
Tenho medo de gostar de respondê-la, como gostei de olhá-la
esta manhã.
Gostosa. Toda gostosa e sensual naquele terninho elegante.
Tão sensacional que perdi a fala e fiquei duro na mesma hora. Meu
corpo e minha mente discordam muito sobre o que fazer e o que
não fazer com ela. Não sei qual o padre do convento do qual ela
veio, mas tô pensando em ir lá dar uma voltinha e me confessar,
porque com certeza foi errado pensar em tirar cada pecinha daquele
maldito terninho.
Foi por pouco que não fiz, depois que disse que era facinha
pra mim. Tenho um pouco mais de senso do que meu irmão que
topa qualquer loucura, e esse senso me impede de dormir com uma
garota que me enganou.
Fui enganado por uma pirralha que nasceu ontem, olha só!
Sempre julguei alguns clientes que apareciam casados com
meninas muitos anos mais novas e jurei para mim que não seria um
desses pervertidos. Sempre gostei de ter mulheres da minha idade
ou bem próxima, na minha cama, Riley tem trinta e dois anos,
embora pareça ter vinte e cinco. Gostava da nossa harmonia,
tínhamos interesses em comum, estávamos na mesma fase e
éramos maduros. Mesmo que ela seja mimada, ainda era madura.
Aurora não.
Ela é impulsiva, tagarela e parece uma criança curiosa sempre
que vê algo novo. Ela é imatura, isso é o que ela é.
E mesmo assim, é com ela que estou casado. Contra a minha
vontade, mas estou.
E foi por ela que acordei duro, hoje.
Pego o telefone e disco o seu número. Ela não demora dois
toques para atender.
— É almoço? Se for, eu tô morrendo de fome. Algumas
pessoas até me chamaram para almoçar, mas tô zerada, marido,
agora se não for almoço, acho que vou precisar ir pra casa mais
cedo e assaltar a sua geladeira.
— Suba — é tudo o que digo, e desligo antes que ela
responda com alguma coisa.
Zerada.
Agora ganhei outra responsabilidade.
Volto a me concentrar no meu trabalho, mas o convite de Riley,
que nunca saiu de cima da minha mesa, me chama a atenção.
Faz quase um mês que chegou e ainda não liguei para ela,
não tomei nenhuma atitude e como eu poderia? Estou casado, o
que falaria para ela?
Não se casa com esse homem, pode me esperar por seis
meses? Quando eu me divorciar a gente se casa.
Até sendo lerdo do jeito que eu sou, sei que isso não é coisa
que se diga a uma mulher. Principalmente a uma ex-namorada por
quem você era apaixonado.
Uma mulher que demorou dois meses para namorar outra
pessoa, enquanto eu passei seis esperando por ela. Todos os meus
planos para o futuro incluíam a Riley, ela simplesmente chutou todos
esses planos fora e isso me frustrou pra cacete.
Escuto a porta da minha sala ser aberta. Ergo os olhos,
encarando uma Aurora com bochechas coradas, e um sorriso
imenso no rosto.
— Eu estou simplesmente amando isso aqui — faz um círculo
com o dedo indicador — sério, eu sabia que vocês eram ótimos,
mas ainda nem tive o meu primeiro trabalho prático e já estou
empolgadíssima, estava dando uma olhada nos outros projetos e já
tenho até planos para o que fazer neles — parece um vagalume
com o rabo aceso quando se senta à minha frente.
— Que bom que está gostando, é bom que seja eficiente
também — Aurora revira os olhos e se encosta no assento, olhando
tudo ao redor da minha sala. Meus olhos não saem da maldita. —
Por que você está vermelha? — Dois morangos, é o que estão
parecendo.
— Está quente hoje — ela se abana, desviando os olhos.
Estreito os meus.
— Tem ar-condicionado no seu setor, e o clima hoje não passa
de vinte e cinco graus.
Ela ergue as sobrancelhas surpresa.
— Sério? Deve ser isso então, tá frio demais, sempre fico com
as bochechas vermelhas no frio — apalpa elas, para dar mais
ênfase a sua mentira descarada.
— Aurora — repreendo.
— Nicolas — responde sorrindo.
Trinco o maxilar.
Bochechas vermelhas. Essa menina que não tem um pingo de
vergonha na cara me chega aqui com essas duas raspas de tinta na
cara e me inventa uma merda dessa.
E por que eu me importo?
Eu não me importo, simples!
— Você me chamou para almoçar mesmo ou era outra coisa?
Seu “SUBA” não me deixou muitas dicas, sabe. — Fala, apoiando
os cotovelos na mesa e me encarando.
— O almoço deve estar chegando — informo, voltando os
olhos para a mesa no mesmo momento em que sua mão pega o
convite de Riley.
Fecho os olhos.
— É da sua ex? A que fez você me aceitar como esposa? —
pergunta com curiosidade.
— Eu não te aceitei como esposa.
Ela ainda está vermelha.
— Semântica, coroa — e volta a olhar o convite.
— Quando eu era adolescente...
— E você ainda se lembra? — fecho a cara e ela começa a
gargalhar. Meu olho treme.
Puta que me pariu.
Basta abrir a maldita boquinha que forma um biquinho nesse
exato momento, que minha paciência acaba. Como pode? Como
alguém consegue ser tão irritante?
Antes que eu fale algo, o nosso almoço chega. Aurora se
ergue para pegar as duas sacolas com porções de filé e risoto das
mãos de Laura que nos olha com uma curiosidade descarada.
Apenas ergo uma sobrancelha e ela sai da minha sala correndo.
Pego as sacolinhas de Aurora e sirvo a nós dois. Logo estamos
comendo em silêncio, mas claro que não dura muito.
— Quando você era adolescente o quê? Você não terminou —
volta ao assunto como se fosse a coisa mais natural do mundo.
— Quando era adolescente, sabia quando parar de falar
besteira. — Bebo um gole do refrigerante.
— Eu não falo só besteira, mas sinto prazer em te irritar, é
estimulante ver essa sua carinha de bravo — semicerro os olhos
para seu sorriso.
Sente prazer em me irritar.
Prazer.
Tá de brincadeira.
— Você tem mesmo vinte anos? Lembro de ser mais maduro
na sua idade. — Lembro que nessa época estava juntando dinheiro
para investir na nossa imobiliária, mesmo ainda fazendo faculdade.
Minha esposa falsa dá de ombros.
— O fato de você se lembrar, já é fonte de muito orgulho,
parabéns — reviro os olhos, escutando sua risada. — Eu sou
madura quando me convém, pra falar a verdade, sempre ajo de
acordo com aquilo que me convém.
— Ah, eu sei muito bem disso — afirmo com ironia, o que ela
não deixa passar. — Não acha que isso é egoísmo? — A pergunta é
retórica, porque com certeza é, mesmo assim, ela responde.
— É, eu sei que é egoísmo, mas passei boa parte da minha
vida seguindo os passos e os desejos de outras pessoas, precisei
viajar para outro país para me sentir livre pela primeira vez, e eu sou
sozinha, Nicolas, não tenho ninguém para me preocupar e ninguém
para se preocupar comigo, então de que adianta não fazer o que eu
quero e o que é melhor para mim, se no final, eu só tenho a mim
mesma? — tomba a cabeça para o lado e me encara intensamente,
me desafiando com suas esferas verdes a falar algo.
Mas pela primeira vez, deixo de olhar apenas para como eu
me sinto e começo a pensar sobre ela. Porque ela está certa, é
egoísta sim, mas se está sozinha, deve fazer o que é melhor para
ela.
Só não acho que deva prejudicar os outros no meio do
caminho.
Principalmente a mim.
O que ela fez não tem desculpa, pode ter pra ela que fez o que
tinha que fazer e eu entendo isso, mas não concordo. Não concordo
porque eu estou casado com ela.
E eu não quero estar casado com a Aurora.
Não quero morar com ela.
Não quero me preocupar com essa garota.
E mesmo assim, aqui estou eu, almoçando, dando um
emprego, abrigo e um visto a ela.
Ela vê isso em meus olhos e nega com a cabeça.
Não respondo nada, apenas volto a comer, com os olhos fixos
no convite de Riley em cima da minha mesa.
O que eu faço agora?
— Passaram quanto tempo juntos? — ergo o olhar.
— Três anos. — Respondo.
— Muito tempo. Nunca namorei tanto tempo assim. Para falar
a verdade, só namorei uma vez e não passou de alguns meses. —
Ergo a sobrancelha.
— Só teve um namorado?
— Sou do time que curte uma boa foda, mas não tinha tempo
para gastar com namorado depois que vim para esse país, quando
precisava pensar em um futuro. — Pensava do mesmo jeito quando
tinha a sua idade.
Sempre pensei no meu futuro e por isso, não namorava antes
de me tornar alguém importante no meu meio.
Pelo menos uma coisa nós temos em comum.
— Se apaixonou? — ela tomba a cabeça.
Pisca os olhos verdes e sorri.
— Por homens reais? Nunquinha. Gostava do meu namorado,
mas era mais dependência emocional e hormônios e coisas que eu
não gosto de falar sobre. Mas já me apaixonei várias vezes por
homens fictícios. — Prendo um sorriso.
— Não vai me perguntar se eu já me apaixonei? — sondo,
com curiosidade. Ela mastiga e mastiga.
— Passou três anos com uma mulher, e ficou todo doído por
esse casamento, se não tivesse se apaixonado por ela, eu diria que
você é um babaca por fazê-la perder tanto tempo com alguém que
não a amava e ainda fazer bico por ela estar com outro homem. —
Faz sentido.
E eu não sou babaca.
Só às vezes.
— Também tem o fato de que não é possível que com trinta e
nove anos vividos, ninguém tenha conquistado seu coração.
— Tem gente que nunca foi conquistado. — Argumento, mas
ela só balança a mão em desdém.
— E Léo? — pergunta.
— O que tem ele?
— Não está gostando muito da minha cara, né? — nenhum
pouco, Aurora. Ele até quis acertar a asa do seu avião com uma
bazuca.
Pena que tinha outros passageiros.
— O que você queria? Que ele te entregasse flores quando
vocês se encontrassem? — Dá de ombros.
Léo está magoado. Ele é a pessoa mais rancorosa que eu já
conheci.
Olha eu, que estou me consumindo com o que Aurora fez,
agora imagine alguém que sente isso duas vezes mais? Léo.
— Não, mas vou reconquistar o afeto dele. — Ela sorri.
Eu sorrio.
— Eu duvido muito disso, precisaria conquistar o meu primeiro
e te digo logo, não vou deixar você fazer isso.
— Não preciso que você deixe, quando você menos esperar,
vai estar louco por mim — pisca um olho e reviro os olhos.
Não respondo.
Ela não vai conquistar o meu afeto.
Nem minha confiança.
Nem nada meu.
Principalmente… eu.

— Então ela disse que vai conquistar o meu afeto —


resmungo, contando tudo o que aconteceu hoje para meu irmão e
melhor amigo, largado no sofá de Léo.
Decidi dormir aqui hoje. É muito o que pensar e tudo está
confuso e saindo do meu controle, preciso da minha única família
comigo.
— O meu ela não conquista — eu sei que você vai tentar não
ser conquistado, Léo, mesmo que tenha se apaixonado por ela em
Vegas.
Não no sentido romântico.
— Ela não é tão ruim. Ter uma atitude ruim não faz dela uma
pessoa má. — Fuzilo o traidor do meu melhor amigo que ergue as
mãos. — Tô falando sério, ela disse que fez o que fez porque não
tem ninguém que faça nada por ela. É egoísta, mas eu seria
também se estivesse no lugar dela.
— Você já está de quatro por ela, Matt, assume. — Meu irmão
resmunga, tomando um gole da sua cerveja, enquanto procura um
jogo na televisão.
— Não gosto do que fez, mas ela é legal, eu lembro de tudo
naquela noite e fora a anulação, não fez mais nada de ruim.
— E a cena que ela fez já não deveria ser o bastante? —
pergunto, erguendo a sobrancelha.
Ainda lembro como se fosse ontem quando a miniatura de
Barney Stinson [4]mentia como uma profissional na frente da juíza.
— Ela já estava casada, só aproveitou a oportunidade — dá de
ombros.
De novo, me vejo a olhando pelos olhos dela.
Eu faria a mesma coisa se estivesse em seu lugar? Não sei,
talvez sim.
Talvez não.
— A porta dela está aberta, então? — Léo pergunta, curioso.
Franzo o cenho.
— Que porta?
— Aquela em que ela dá uns beijinhos, tira a roupa e mexe a
bunda bonita?
— Tá muito interessado na bunda dela — reclamo e seus
olhos reviram.
— A bunda é bonita, mas meu papo é o coração — peitos, o
papo dele é peitos. — Só quero saber se caso essa porta esteja
aberta, se você irá entrar.
Mordo o lábio inferior, pensando.
— Não teria nada de mais, sabe, se for consensual, os dois já
estão casados e com uma data para acabar bem-marcada, não tem
nada de errado nisso, ninguém disse que só porque o casamento é
falso, que vocês dois não podem se beneficiar disso — completa
meu melhor amigo.
— Além do fato de ela ter me dado um golpe e ter vinte anos?
— argumento.
— Já falamos sobre o golpe, agora a idade… — É Matt, a
idade fode.
— Vocês já foderam, pelo que a gente saiba, repetir não vai te
matar, sabe, seria bom para a convivência de vocês, não significa
que vai se apaixonar por ela. — Por que não é surpresa que
mesmo sendo rancoroso, Léo esteja me empurrando para cima
dela?
Ah, é. Porque Léo quer que eu viva mais.
Porque Léo quer me ver fodido.
— Não acho que a porta dela esteja aberta — falo. Não que eu
queira que esteja. Acho que tudo que Aurora fala é mais uma
provocação do que um chamado para agir.
Ela é jovem, gosta de brincar com o perigo, não significa que
queira correr em direção a ele.
— Mas e se estiver?
— Então a minha estará fechada. — E os dois me olham como
se soubessem que o que falei é mentira.
E eles estão certos.
Perdida, mas agora me encontrei.
Eu posso ver que já fui cega uma
vez.
Eu estava tão confusa quanto
uma criancinha.
Tentei pegar o que podia, com
medo de não conseguir encontrar.
Todas as respostas que preciso.
(Born to die - Lana Del Rey)
Veja bem, não sou ladra, juro que não sou. Esquecendo
aquela vez em que peguei o lápis emprestado da professora
Lucinda, de geografia, para fazer uma prova e nunca mais devolvi.
Ou aquele batom nude da minha mãe, que peguei para o dia da
minha formatura e até hoje ela está procurando. Mas foram eventos
isolados, não justificam nada. Nem servem de argumentos se for
parar no tribunal, seria inocentada na hora.
Mas todo mundo tem uma fase rebelde, e eu não escapei,
todavia, não me arrependo de ter roubado mais uma coisinha de
nada hoje. Foi o convite de casamento na mesa de Nicolas quando
ele estava distraído.
Para falar a verdade, tô fazendo muita coisa da qual não me
arrependo ultimamente, embora a coceira da culpa esteja me
irritando um pouco. Fala sério, todo mundo sente culpa por algo,
mesmo que não se arrependa, não vamos começar com hipocrisia
aqui.
Só tenho pena de mim quando a merda do karma me pegar.
E o karma pega todo mundo. Ele chega, pega a sua mãozinha
e te joga de um penhasco sem dó alguma.
Olho o papel na minha mão.
Riley & Mason.
A ex do meu atual marido falso, e o noivo dela.
Será que ela e Nicolas ainda se falam? Eu sei que sou cara de
pau, mas nem mesmo teria a coragem de enviar um convite de
casamento para um ex assim na boa, sem remorso, então eles com
certeza ainda se falam.
Tá, talvez eu tenha essa coragem, mas eu sou única.
Talvez sejam amigos, nem sempre final de relacionamento
significa final de amizade.
Talvez sejam amigos, nem sempre final de relacionamento
significa final de amizade.
Talvez eles ainda se encontrem? Será que ele toma café com
ela? Troca mensagens? Ligam quando sentem saudade? Não sei
por que isso me incomoda.
Não deveria, mas incomoda bastante.
Não gosto de Nicolas, acho ele incrivelmente atraente e não
recusaria sentar nele algumas vezes, principalmente quando ele
está irritado. Mesmo assim, não estou apaixonada pelo cara, mal o
conheço para ter esse sentimento. Só que a ideia de ele ser amigo
dessa mulher e de um dos motivos para ele ter concordado em
continuar casado comigo, mesmo um quase insignificante, contando
com os outros que o deixariam em uma péssima situação, me deixa
com o estômago embrulhado.
Deve ser medo.
Odeio sentir medo.
É desgastante.
Vem junto com a ansiedade e adivinha? Odeio estar ansiosa.
E se ela ainda sentir algo por ele e desistir do casamento e
Nicolas simplesmente me pedir o divórcio?
Mesmo que tenha sido corajosa e dito que tomaria o que
pudesse no divórcio, menti. Sou ótima mentindo, posso até dizer
que sou profissional nessa arte, mas é óbvio que se ele pedir o
divórcio, eu não pediria nada dele.
Não tomaria nada dele, não sou assim.
Infelizmente não sou assim. Sou trouxa, tonta, coração de
bombom.
Mas seria deportada.
Ainda não recebi a notificação da imigração sobre o meu visto,
não acho que vou receber agora, já que ele tecnicamente ainda não
venceu, faltam alguns dias para isso acontecer, mas se eles
chegarem a me notificar e Nicolas escolher ficar com essa mulher
mesmo com as consequências que acha que terá, eu simplesmente
vou me foder feio.
E sabe o que é pior? O pior é que mesmo assumindo ser uma
pessoa egoísta agora, não seria capaz de separar eles dois, caso
queiram ficar juntos. Amor é uma coisa complicada, mas única,
mesmo assim.
Odeio o amor.
Odeio amar.
Odeio ser uma boa mentirosa, mas não tanto para me
convencer de que odeio esse sentimento.
Eu amo. Eu amo amar.
Que tipo de monstro eu seria se eles decidissem ficar juntos e
ainda atrapalhar? Mas se for parar para pensar, caso isso aconteça,
o noivo dela fica disponível, não? Será que se ele for abandonado
como eu, não aceita ser meu marido? Será que Nicolas ficaria puto?
Ou será que ele não se importaria?
Eu me importaria.
Eu me importaria e muito.
Mas ele não, provável que agradeça a Deus se isso acontecer,
só para se livrar de mim.
Mas a ideia de ser esposa de mentirinha de outra pessoa não
me agrada nem um pouco, confio em Nicolas. Confio apenas nele,
sem motivo, apenas intuição.
Foda.
Essa situação é foda, puta merda.
Saio do meu quarto em meu pijama mais indecente, apenas
para provocá-lo.
Nicolas não está na sala, nem na cozinha e nem no quarto,
então caminho direto para o escritório. Bato na porta e entro quando
escuto sua permissão. Poderia entrar sem bater, é mais a minha
cara, mas estou erguendo a bandeira da paz, que combina com o
branco do meu pijama indecente.
Não quero dar motivos para Nicolas me abandonar agora, não
quero ser deportada e se eu precisar ser alguém legal, eu consigo.
Se ele gostar do que vê, e isso me ajudar, será melhor ainda.
Desde o dia em que me chamou de egoísta, estamos em um
clima estranho. Odeio climas estranhos, odeio ficar desconfortável,
e olha, tenho um talento nato em construir situações
desconfortáveis, mas essa está me desgastando.
Uma semana.
Foi o máximo que aguentei.
— Você não está dormindo em casa — começo, me
encostando na porta ao fechá-la. Seus olhos sobem até meu rosto,
desviando rapidamente para o meu corpo.
— Não sabia que te devia satisfação — desdenha, voltando a
fitar os papéis, com várias informações sobre imóveis.
Filho da puta!
Esse coice de cavalo ainda vai acabar comigo. É um mais forte
que o outro, porra.
— Não deve — otário, acrescento mentalmente e abro um
sorriso forçado. Me aproximo da sua mesa, sentando-me na
pontinha dela e observando seu trabalho. Um belo trabalho. Uma
casa linda. — Tá cumprindo com o que disse que faria? — pergunto
cautelosa, sem olhá-lo.
Sinto seus olhos em mim, mas não devolvo.
— E o que eu disse que faria? — pergunta.
— Você sabe, enfeitando minha cabeça — dou de ombros,
pegando alguns papéis sem permissão. — Geralmente gosto de
tiaras, coroa também me convém, sempre soube que eu seria uma
ótima princesa, sabe, mas já usei uma tiara de chifres, me fantasiei
de diabinha no halloween, assim que saí do convento, mas se tiver
um agora na minha cabeça de verdade, gostaria que me avisasse.
— Por quê?
— Para economizar, é claro, ao invés de comprar outra tiara de
diabinha, posso só pintar os meus de vermelho, sempre soube que
era a minha cor — volto a atenção para o seu rosto.
Juro que vejo um pequeno sussurro de sorriso no canto da sua
boca.
— Você foi mesmo para um convento? — Olha, Henrique e
Juliano, vocês podem aprender o significado daquela musiquinha de
vocês com o Nicolas.
Tentativa furreca de mudar de assunto dessa...
— Por quatro anos, mas fui convidada a sair, quando encobri
uma amiga, falando que havia sido eu em uma foto de duas
meninas se beijando. — Sua sobrancelha ergue. — Ela estava de
costas e o cabelo era cacheado, seu pai era um homofóbico de
merda e eu sabia que ela se ferraria, eu já queria sair, então dei
meu jeito.
Minha família também é, mas quem está contando vantagem?
— E como alguém que vai para o convento, fica tão
encapetada como você? — pergunta com curiosidade genuína e
solto uma risada.
— Foram quatro anos, e depois fui colocada em um colégio
católico, eu já era um capetinha antes disso — olho em seus olhos
ainda sorrindo. — Você mudou de assunto — comento, mas seus
olhos desviados para a mesa me dão a minha resposta.
Aquele incômodo de cedo? Com a ideia de ele preferir voltar
com Riley? Bem, parece nada comparado com o que eu estou
sentindo agora. Mas como ele disse, não me deve explicações, mas
foi legal saber em que pé estamos.
Os pés do curupira.
Bem legal.
Meu cu.
— Podemos ser amigos? — pergunto e seus olhos se voltam
para mim novamente.
— Amigos não dão golpes em outros amigos, Aurora. — Sua
mão desfaz o nó na gravata e ele a tira, desabotoando as mangas
da camisa com o semblante sério.
— Cinco meses, Nicolas, temos um acordo de mais cinco
meses, estou morando com você, dormindo no quarto ao lado do
seu, trabalhando como sua funcionária e sou a sua esposa, nosso
relacionamento pode ser mentira, mas sou sua esposa de verdade,
tenho um papel que comprova isso, só quero que a gente pare de
se evitar, faz uma semana que eu cheguei, e essa é a maior
conversa que tivemos desde aquele almoço no seu escritório. —
Acuso, me colocando de pé. Os olhos dele são atraídos
automaticamente para mim e aquele friozinho que não gosto de
admitir sentir, mas sinto mesmo assim, percorre por todos os
lugares que ele olha rapidamente.
— Ainda não aceitei o que aconteceu, como quer que eu haja
como se não tivesse me forçado a casar com você? — apoia os
cotovelos na mesa, me encarando com seriedade.
Reviro os olhos.
— Você parece um disco arranhado, Nicolas — nego com a
cabeça. — Você nunca supera nada? É por isso que precisa de mim
para mostrar a sua ex que superou? Não consegue fazer sozinho,
né? — Ele abre a boca, mas interrompo. — Não venha mentir e
dizer que só é porque eu tenho direito a metade do dinheirão que tá
fazendo esses dias ou que eu te forcei a aceitar, você aceitou e um
dos motivos foi ela, seja para tentar sair por cima, ou por querê-la de
volta, não me importo, seja sincero consigo mesmo — aponto para
ele. — Só estou te pedindo para que possamos viver em harmonia,
não quero que se apaixone por mim, nem mesmo que esse
casamento se torne real, só quero poder ser alguém com quem
você converse, sem que eu me sinta como a merda que sai do cu
do cachorro do mendigo — respiro fundo e desvio os olhos.
Passamos alguns segundos em um silêncio desconfortável, eu
sei que ele está me analisando, sinto seus olhos em mim.
Não disse nada mais do que a verdade. Odeio sentir que
minha presença é indesejada. Eu sei que é, mas não gosto de saber
disso. Me lembra deles. Daqueles que não posso chamar de pais.
Eles nunca foram realmente.
— Do mendigo?
— E nem é do Atlas[5], veja só!
Seu cenho se franze, mas ele não pergunta sobre quem é
Atlas. Poderia ser um homem real, mas não é.
Como eu queria estar casada com o Atlas, agora.
— Então não quer que eu te evite...
Sugo as bochechas.
— Sou ótima colega de quarto, coroa, podemos encarar assim
— dou de ombros, ainda sem olhá-lo. — Bandeira branca, viu? Vim
até combinando a cor — aponto para meu pijama e dou uma volta,
essa para provocá-lo, já que deixo minha bunda bem à mostra, e
escuto quando ele pigarreia.
— Tudo bem, vou tentar olhar para você e não lembrar do que
fez, não prometo mudar minhas atitudes, sou assim, Aurora, sou
chato, e adivinha? Riley terminou comigo por eu ser como sou, não
sou carinhoso, não sou muito presente e não sou o melhor dos
amigos, mas vou parar de te evitar e querer esganar o seu pescoço.
Ergo os olhos até os seus, já abrindo um sorriso e ele fala
antes que eu abra a boca.
— E deixa de ser bocuda, garota, ou a parte de querer te
esganar nunca vai sumir — avisa, e solto uma gargalhada.
— Não garanto, todo mundo quer me esganar, alguns só têm
mais sorte do que outros — pisco maliciosamente e saio da sua
sala, assim que ele trinca o maxilar e se levanta.
— Aurora!
— Vou pedir pizza na sua conta, coroa — grito, batendo a
porta e sorrindo, caminhando de volta para o quarto.
Estou incomodada pra caralho com o que senti lá dentro, mas
agora tenho absoluta certeza de que não vamos ter nada, Nicolas já
cumpriu com o que disse, me colocou um lindo par de chifres, só
basta seguir em frente.
Ele com o rumo dele.
Eu com o meu.
Tento encontrar razões para nos
separar.
Mas não está funcionando porque
você é perfeita.
E sei que você vale a pena.
Eu não posso ir embora, oh!
(Die for you - The Weeknd)

Duas horas e esse desprovido de noção ainda não parou de


reclamar no meu ouvido.
Não, eu não quero saber que você transou ontem, Leonardo.
Não, eu não sei o nome da nova advogada gostosa da R&C.
Não, eu não tenho queijo, porque usei tudo para fazer o café
do pedacinho de loucura que entrou em minha vida.
Não, eu não estou fodendo esse pedacinho.
Só liguei para avisar que não ia mais alugar seu sofá e ele
tomou isso como um incentivo para me fazer de diário ambulante. É
tanta coisa que desabafa comigo, que quando termina, não lembro
mais qual foi a primeira que escutei.
Desligo depois de informar que não, não quero comer ninguém
hoje, e que não, isso não é por conta da Riley ou de Aurora.
Psicologicamente, me preparo para não ser hostil com essa
última, porque ela está certa. Quando abriu a boca, me senti um
jovem de quinze anos recebendo uma bronca. Nunca fui bom em
receber broncas, sempre me senti inútil depois de uma.
Mas ela me deu.
Não foi merecida, mesmo assim... foi.
Ela foi gentil em fingir que não estava me acusando.
Dormir ao lado do quarto dela não é algo que eu apreciava.
Fiquei com medo. Medo de sonhar com ela de novo, medo de
desejá-la de outro modo. Medo de abrir a porta, bater na sua e ficar
babando na sua bunda gostosa e redondinha, enquanto meu pau
babava em outra coisa.
Já assumo aqui que tenho tara na bunda dela.
Por isso, evitei ficar perto da tentação, Léo não gostou da
invasão de privacidade, mas quem disse que eu ligo? Não ligo. Ele
também está evitando-a.
Quando Aurora fez o que fez, mudou a opinião que ele tinha a
respeito dela, seus olhos mudaram, a amizade feita entre dois
bêbados e drogados foi pelo ralo. Léo é louco, mas leal.
Ele é leal a mim. Mesmo que tenha dito para que se a porta
dela estivesse aberta, eu entrar e me trancar lá dentro.
Ninguém é cego. Ele muito menos.
Todos enxergam o quanto essa menina é linda.
Agora tenho que dar um jeito de guardar o ressentimento e
cumprir com a palavra que eu dei a minha “esposa”. Ao contrário
dela, eu não minto, eu sou sincero.
Ela pediu e novamente, olhar para aqueles olhos de anjo me
convenceu.
Lúcifer era um anjo lindo, não é o que dizem?
Não sonhei com ela, ainda bem, dormi maravilhosamente na
minha cama, mas foi interessante saber que ela ficou afetada por eu
ter dormido fora de casa. Ela acha que eu a chifrei. Nunca chifrei
uma mulher na minha vida. Mesmo que o nosso relacionamento não
exista, o casamento é real na lei dos homens, como ela disse, então
seria traição.
Não que eu me importe, não prometi nada a ela, ainda deixei
claro que se quisesse ficar com outra mulher, ficaria. Também não
disse em momento algum que não poderia fazer o mesmo. Porém,
foi interessante mesmo assim, ver que o pedacinho de loucura usa
do humor para sair de situações que desgosta.
Porque ela não gostou, vi a decepção que tentou disfarçar
quando mudei de assunto, dos olhos baixos, das bochechas
mordidas por dentro, dos dedos mexendo nervosamente, mas
mudei apenas para ver sua reação.
Foi gostoso, ver ela incomodada foi gostoso.
Aurora gosta de me provocar, acabei de perceber que, ao meu
jeito, gostei de fazer isso com ela também.
Estava descendo para seu setor, tínhamos uma casa para
entregar hoje, uma que ela passou a semana trabalhando. Matteo
disse que estava de acordo com nosso padrão e confio em Matt,
mas quero ver com meus próprios olhos.
Quando disse que a evitei, realmente evitei. Não houve mais
almoços, mas garanti que fosse entregue um na sua mesa todos os
dias, não houve mais conversas, mas fiquei antenado no que
falavam dela pela Ramsey&Collins, não havia mais carona, mas
Matt a levava sempre após seu expediente, então mesmo a
evitando, não a deixei desamparada.
Sou decente, eu disse que era.
Culpa da Riley, que terminou comigo e me fez ver o quanto eu
era um merda.
O elevador para e saio no seu andar, logo a localizando na sua
sala, cercada com paredes de vidro, concentrada em algo que um
loiro engomado fala. Quem é esse?
Suas bochechas estão vermelhas.
Novamente essas merdas estavam vermelhas.
— Chefe, a que devemos a honra? — Otávio, o chefe direto de
Aurora, aparece como um fantasma à minha frente, sorrindo como
se fôssemos velhos amigos. Não somos. Eu mal conheço o pessoal
da Ramsey&Collins, costumo não interagir muito.
— Bom dia, Otávio — cumprimento, estendendo a mão e
esperando que faça o mesmo. — Estou indo entregar uma casa e
vim buscar um de seus designers, para me fazer companhia.
Se ele estranha, não fala nada. Apenas olha ao redor e depois
para si mesmo.
— Posso ir com o senhor, é claro. Qual a casa, chefe? — Já
vai tirando o celular do bolso e ergo a sobrancelha.
Em que momento eu disse que seria ele?
— Não precisa, já tenho alguém em mente. — Aponto para a
sala da golpista e ele segue meu olhar.
Otávio fica nervoso. Ele sabe que não está fazendo um bom
trabalho, ninguém está, por isso precisamos buscar outra pessoa.
É bom ficar nervoso mesmo, não tenho tempo para lidar com
gente inútil.
Deixo-o para trás com um cumprimento e sigo meu caminho.
Ela parece sentir quando me aproximo, pois desvia os olhos
para mim, e seu sorriso se torna um pouco mais divertido. Me
provocando apenas com a boca.
Essa boca…
Ela fala besteiras, me dá broncas, me provoca…
Será que beija bem também?
Abro sua porta sem pedir sua permissão, como ela nunca
pediu permissão para entrar na minha vida e desvio o olhar para o
loiro oxigenado. Ele está com um sorrisinho arrogante de merda no
rosto, mas quando me reconhece, apruma a postura e me olha com
respeito.
— Senhor Ramsey — cumprimenta.
— Bom dia — respondo, não dedicando mais atenção a ele e
voltando a olhar a cara de pau na minha frente. — Tá com calor?
Seu sorriso aumenta mais.
— Por quê, senhor Ramsey? — abusada, é assim que o
“senhor” sai da sua boca.
Puro abuso.
— Está vermelha — tombo a cabeça para o lado, enfiando as
mãos nos bolsos da calça social grafitti que levou meu rim
esquerdo, a qual escolhi hoje.
O rim valeu a pena, é da marca de um grande amigo.
— É que tá quente, não acha? — Ela começa a se abanar,
toda fingida e sem vergonha. Atuando exatamente como uma
semana atrás e é o que basta para que eu saiba o motivo dos seus
morangos no seu primeiro dia. Reviro os olhos e tento novamente
lembrar que prometi ser razoável com ela.
— Está pronta? Temos alguns minutos antes do cliente chegar
na casa tijolinho. — Começo, vendo a surpresa em seus olhos.
Foi ela que apelidou a casa, e gostávamos de colocar apelidos
para ser mais fácil de identificar.
— Não sabia que podia ir — podia, sempre um designer
acompanha um dos corretores, mas não falarei para ela. Aurora se
levanta rapidamente, pegando o celular e a bolsa. A aliança brilha
no dedo.
Não sei onde arrumamos essa aliança, mas é ouro puro. Fica
até bonita na mão dela, combina com os dedos finos e delicados.
Não parece que é uma algema. Coisas bonitas costumam
disfarçar muito bem o significado feio delas.
— Não é a casa que você terminou ontem? — o loiro volta a
falar, chamando nossa atenção.
— É sim, ela está linda — Aurora responde com animação,
aumentando o sorriso e o loiro se aproxima.
— Acredito em você, me mostrou o projeto no computador,
lembra? — semicerro os olhos. Desde quando ele tem essa
intimidade? E por que Aurora está ficando ainda mais vermelha? —
Posso acompanhá-los? — Pergunta, se virando para mim.
— Não — respondo, sem ligar para seus olhos arregalados e
encaro Aurora. — Estamos saindo — decreto antes que minha
esposa responda e me viro, sabendo que ela me acompanhará.
Posso acompanhá-los?
Que loiro mais idiota. Hunf.
— Você nem sabe o nome do seu funcionário, né, coroa? —
fala com a voz risonha, quando entramos no elevador.
— Muita gente trabalha aqui, meu papel não é saber seus
nomes, é pagar seus salários. — Volto a olhar para seu rosto, bem
incomodado com o que vejo. — Fica vermelha para ele.
Foda-se.
Seus olhos brilham divertidos.
— Fico? Não me olho no espelho quando ele está perto —
cara de pau.
Tanta cara de pau, que nem óleo de peroba resolve.
Talvez um verniz para ficar mais brilhante, já que não tem jeito.
— Por que ficou vermelha para ele? — tombo a cabeça,
curioso. O cara não tem nada de mais, é absurdamente... comum.
Seus dentes mordem os lábios, enquanto ela pensa se vai me
responder ou não.
— Não é da sua conta.
— Por que ficou vermelha para ele? — repito sem paciência.
— Isso é ciúmes?
— Por que ficou vermelha para ele? — Insisto e ela solta um
suspiro.
— Ele parece um personagem de um livro, toda vez que olho
para ele, lembro do Aaron Warner, é quente — abana novamente o
rosto e trinco o maxilar.
Não é possível.
— Você fica vermelha porque ele te lembra um personagem de
livro? — pergunto descrente.
— Tá muito incomodado com meu rosto, qual o problema? —
estreita os olhos e põe as mãos na cintura apertada em um vestido
preto de gola alta, que vai até a canela, modelando cada parte do
seu corpo.
Partes que olho com mais interesse do que deveria.
— Nenhum, mas não vou ficar com fama de corno na minha
empresa, Aurora, uma hora ou outra vão descobrir o que somos, e
com você olhando para ele assim, vão surgir boatos. — É só isso,
ela não tem uma reputação a zelar, eu tenho, corno não é um título
que eu gostaria de ter.
Só isso.
— Eu não sou burra, Nicolas, mas admirar a vista nunca matou
ninguém. — Dá de ombros, se virando para a porta do elevador
abrindo. — Assim como você pode admirar minha bunda nesse
vestido quando eu sair na sua frente, ela está espetacular — fala,
saindo como disse. Não resisto, é automático depois do que ela
falou.
Me recrimino assim que meus olhos batem na bunda redonda,
e sinto um puxão em um lugar que eu não deveria. Ergo os olhos
com raiva.
— Fez de propósito — a acompanho em direção à garagem,
sem me escapar o sorriso convencido em seu rosto.
— Claro que fiz, sou muito consciente dos meus atributos,
nada do que fale me fará sentir menos do que perfeita. — Abro a
porta do passageiro do meu carro, e ela entra.
— Não ia falar nada. — Me acomodo e coloco o carro em
movimento.
— Então concorda? — pergunta divertida. Nem me digno a
olhar para sua cara.
— Não disse isso — rebato, mentindo descaradamente, com
sua risada preenchendo o ambiente. — Mas você está certa. —
Cedo. — Só não quero notar isso.
— Que sua esposa é muito gostosa?
— Que minha esposa tem vinte anos — respondo, lançando
um olhar acusatório. Seus olhos reviram. — Você não tem nem
idade para beber legalmente, Aurora. Como diabos estava tão
bêbada na boate? — pergunto, curioso pela primeira vez, porque
Josh não é alguém tão irresponsável assim.
— A noiva tinha passe vip, o segurança nem olhou minha
identidade, e eu fiquei bêbada a ponto de perder a memória, porque
experimentamos todos os drinks da noite. — Confessa, recebendo
um olhar duro, meu. — Nem vem, coroa, você também estava
bêbado, pelo que eu escutei, também estava drogado, costuma usar
drogas sempre? Já é velho, não deve fazer bem para sua saúde —
bufo.
— Foi a primeira vez que usei algo do tipo e dá para parar de
me chamar de velho, porra? Tenho apenas trinta e nove anos! —
Viro uma esquina, quase chegando no nosso local.
Aurora se vira pra mim.
— Claro que dá, se você parar de me olhar como se eu fosse
uma adolescente, porque eu sou uma mulher, uma mulher jovem,
mas uma mulher — a encaro, vendo desafio em seus olhos, e a
sobrancelha arqueada só dá mais intensidade ao que falou e decido
mais uma vez, ceder.
Tô cedendo demais para essa garota.
Minha casa.
Meu quarto.
Minha amizade.
Meu trabalho.
Minha mão.
Ela nem pediu, só foi lá e tomou minha mão em casamento na
marra, poxa. Nem pagou um jantar, primeiro. Mas tudo bem.
Como eu disse, decidi passar por cima disso, e estou tentando,
só é difícil.
Por que não ceder mais um pouco e começar a deixar meu
preconceito de lado e vê-la como mulher? Meu pau já acha que é,
só falta minha cabeça entender isso.
Talvez depois do trabalho que verei hoje, não há nada que me
admire mais em uma mulher do que a dedicação a algo que faz.
Vamos ver o quanto ela se dedicou na casa tijolinho.
Talvez eu não jogue um tijolinho nela.
Queria tanto jogar um tijolinho nela.
— Temos um acordo, então — estaciono e saio para abrir sua
porta.
— Vai parar de me tratar como se eu estivesse no jardim de
infância? — pergunta surpresa. Ela realmente não acreditava que
eu seria razoável? Eu sou, só estava ressentido.
Ainda estou.
— Claro, depois que ver o que fez lá dentro — aponto com o
polegar para a casa e nos viramos juntos. — Espero que tenha feito
um bom trabalho.
— Eu sempre faço um bom trabalho, coroa.
Sorrio. Eu não duvido.
Vá em frente e chore, garotinha.
Ninguém faz isso como você.
Eu sei o quanto isso importa para
você.
Eu sei que você tem problemas
com teu pai.
E se você fosse minha garotinha.
Eu faria tudo o que pudesse.
Eu fugiria e me esconderia com
você.
(Daddy issues - The
Neighbourhood)

Esplêndida.
A casa inteira está esplêndida.
Não sei como, mas a mistura de texturas está tão harmoniosa,
que não parece que há mais de um estilo na organização, a
modernidade, misturada com elementos rústicos torna tudo ainda
mais aconchegante. Aurora é mesmo boa no que faz.
Desde os móveis, ao planejamento da estrutura interna.
É talentosa de verdade.
Que bom que a trouxe para trabalhar comigo e não a deixei
ficar mofando no meu sofá, abusando da minha boa vontade,
tomando conta da minha casa. O cliente também adorou. Wilian, um
empresário mais novo do que eu, já foi apresentado a cada canto da
sua casa nova, comigo explicando todos os benefícios do lugar e
está satisfeito com absolutamente tudo.
Mais de uma vez, ele elogiou o design interno, e mais de uma
vez, deixei claro que era trabalho de Aurora. Porque foi.
Sou justo.
Ela trabalhou a semana inteira aqui, pegou o antigo projeto
decrépito que outros do seu setor haviam feito, inclusive seu chefe
de merda e o renovou com maestria, deixando tudo do jeito que o
cliente queria. Tinha como eu não a elogiar? Não tinha. A golpista é
mesmo boa.
Muito boa.
A observo de lado, enquanto Wilian sai para atender uma
ligação, e franzo o cenho quando noto algo que ainda não havia
notado.
— Está tremendo — miro seus dedinhos que se apertam com
minha fala. Seus olhos focam em mim, focam no meu olhar e vejo
ali a minha resposta. — Está nervosa. Por que não disse que estava
nervosa?
— Não estou nervosa — sorri, desviando os olhos.
— Está tremendo — repito.
— É apenas um reflexo de eu ser uma tremenda de uma
gostosa — reviro os olhos, mas acabo deixando um sorriso escapar.
— Aurora — repreendo, me aproximando e tocando seu
queixo. — Você fez um excelente trabalho aqui, muito bom mesmo,
ele adorou, eu adorei, você também, ou não teria entregado, então
não precisa ficar nervosa, ele quer a casa, vamos assinar depois
daqui e sairemos com a venda — falo olhando em seus olhos. —
Parabéns. — Digo, com seriedade. — Você merece.
Ela sorri lentamente, tombando a cabeça para o lado.
É um sorriso adorável.
Adorável.
Pisco.
Pisco.
Não é adorável porra nenhuma.
— Tá bonzinho comigo, coroa, o que você quer? — Que você
pare de ser adorável.
— Não quero nada, só estranhei como uma pessoa que tem
um ego enorme e nenhuma vergonha na cara, pode ficar nervosa
com uma simples entrega — rebato, com sarcasmo, vendo o cliente
voltar para onde estamos.
— Tá muito engraçadinho para alguém desprovido de humor
— retruca, me olhando de esguelha. — Me vê como mulher, agora?
— Sempre foi uma mulher para mim. — Confesso, cedendo.
Sempre cedendo.
— Foi difícil admitir isso? — ouço o sorriso em sua voz, mas
não desvio os olhos de Willian que se aproxima.
— Foi.
— Agora admite que eu sou maravilhosa e estava certa em
falar do meu talento.
— Você estava certa.
— Qual o gosto disso na sua boca?
— De vinagre. — Gargalha e fecho os olhos para escutar.
Logo abro.
Abro rápido.
— Onde eu assino? — Pergunta o ruivo sorridente, alternando
o olhar entre Aurora e eu.
Sorrio. O projeto de freira pega uma pasta em cima da mesa e
traz até nós.
— Nesse pequeno contrato aqui — abre as páginas e deixo
que trabalhe sozinha, observando a conversa entre os dois,
decidindo pegar as chaves do meu carro, que deixei na cozinha,
junto com meu celular.
Ainda tenho muito trabalho para fazer hoje, e com essa venda,
mais alguns milhares de dólares vão parar na minha conta, o que
seria de bom grado a Aurora, caso queira pegar o que não lhe
pertence com um divórcio. O que não fará por conta do contrato.
Eu acho.
Volto rapidamente, mas paro antes de adentrar a sala,
escutando algo que me para.
— Você é nova na Ramsey? — É sim.
— Sou, entrei faz uma semana.
— Fez um ótimo trabalho, é muito talentosa, Aurora — também
acho.
— Obrigada, Willian, é muito bom ouvir isso, principalmente
com meu chefe aqui e trabalhando para uma imobiliária tão grande
e famosa como a Ramsey&Collins — Adoro ouvir isso. — Prontinho,
tudo assinado, toda essa papelada será enviada para você, assim
que passar pelo nosso financeiro, tem alguma dúvida?
Eu não tenho.
Nenhuma dúvida de que ele vai dar em cima dela agora.
— Nenhuma, mas que tal um almoço? Deve estar com fome,
já passou do horário adequado, mas conheço um restaurante
italiano ótimo aqui perto. — Eu não disse?
Sério? Sério mesmo?
Também conheço, é ótimo, obrigado pela ideia, otário. Não
está vendo a merda da aliança no dedo dela? Ninguém mais hoje
em dia tem respeito pela mulher dos outros?
Não que eu me importe com a tal mulher, porque eu não me
importo, mas com meus clientes, não! Nem com meus funcionários,
é sacanagem.
Entro na sala antes que a sacana possa responder,
interrompendo-a com a boca aberta.
— Tudo certo? — Sonso. Sou sonso quando me convém.
Pareço até a Aurora.
— Sim, tudo certo — Willian aponta o contrato.
— Então, aqui estão as chaves da sua nova residência — dou
o chaveiro na sua mão, com um sorriso cordial. — Não sei o que
fará agora, mas se fosse eu, inauguraria ela no melhor estilo —
acho que ele entendeu errado, porque olha para Aurora, sorrindo.
Sorrindo maliciosamente para a mulher dos outros, como se
esse outro não estivesse bem na frente dele.
— Acho que está na nossa hora, vamos, querida? Tenho uma
reserva em um restaurante italiano aqui perto — minto sem
remorso. Talvez a cara de pau seja contagiosa, porque a dela nem
treme.
Anui sorrindo, juntando suas coisas.
Esse é um sorriso de quem esconde um segredo. Esse eu
decorei no seu rosto.
— Claro, boa sorte e boa vida, Willian, espero que inaugure
bem seu novo lar — Ele nem treme a cara também, mesmo que
olhe para nós dois com muito mais interesse, decepção e algo como
malícia.
— Vou sim, nos vemos por aí — nos leva até a porta e nos
despedimos.
Não demora nem o tempo da minha bunda sentar no meu
querido banco de couro, antes que ela abra a boca.
— Passou? — pergunta quando nos acomodamos no carro.
— Passou o quê? — respondo confuso, saindo do bairro
residencial e entrando em uma avenida movimentada.
— A vontade de mijar — franzo o cenho, a olhando
rapidamente. — Não foi o que fez? Mijou em mim para marcar
território lá dentro.
Olho para frente.
— Não sei do que está falando.
— Assume logo.
— Por que eu mijaria em você? Não é minha.
— Sou sim.
— Não é não.
— Ai — põe a mão no coração, mas continua sorrindo. — Não
quero comer italiano, queria um hambúrguer.
— Hambúrguer no almoço, Aurora? — repreendo.
— Poderia ser em qualquer hora, tem um excelente na esquina
da R&C. — Rebate.
Por que eu sabia que falaria algo assim? Porque vejo quando
ela sai para comprar com o cartão corporativo que fiz Matt dar a ela,
fingindo que tinha sido ele, com a desculpa de ser para o almoço.
— Por que não um filé? Queria um filé. — Minha comida
favorita.
— Já comeu isso ontem.
— Mas quero de novo, e desde quando sabe o que eu como?
— além de golpista, é stalker?
— Subi para almoçar com Matt e vi seu almoço chegando.
Perguntei a Laura o que era, ela nem titubeou ao falar.
— Fofoqueira do jeito que é, eu não duvido. — Quando Laura
morrer, vai ser um caixão para ela, outro para a língua. — Não sei
como ela não espalhou que tinha almoçado comigo no seu primeiro
dia.
— Ela espalhou. Já me perguntaram o porquê fui almoçar com
o chefe, não nessas palavras, mas todos estão curiosos,
principalmente porque sempre vou embora com Matt. Acham que eu
namoro ele.
É o quê?
— O que você disse sobre isso?
— Que sou casada e que meu marido não é ele — menos mal.
Pessoal fofoqueiro que gosta de cuidar da vida dos outros. Se
as pessoas começassem a cuidar das próprias, e fodessem mais,
duvido se não estariam ocupadas demais para fazer fofoca.
Mudo de assunto.
— Por que decidiu vir para os Estados Unidos? E não outro
lugar? — pergunto.
— Qual o motivo de tanta curiosidade?
— Só responde.
— O motivo? — hesita. Assinto. — Tenho uma família muito
manipuladora que não me deixavam ser eu mesma, minha mãe é
religiosa ferrenha e meu pai é muito conservador, isso não seria
problema se eles me respeitassem, mas nada do que eu falava ou
queria era digno de atenção, só fazia o que eles queriam, ia para
onde iam, vestia o que me mandavam, até minha comida era eles
que escolhiam, chegou um momento em que isso ficou insuportável,
meu pai me prendia em casa e sempre que eu questionava, ele
erguia a mão pra mim...
— Seu pai te batia? — Quem esse imbecil pensa que é? Onde
ele mora? Como ele se atreve a erguer a mão pra ela?
Ela me olha.
— Batia, mas não bate mais, dei um basta na situação e decidi
sair de casa. — Fez bem. Ninguém merece não se sentir seguro
dentro do próprio lar.
Não que eu não tenha vontade de esganá-la, mas é só
vontade, nunca encostaria um dedo nela. A vara da infância nunca
pegou esse cara? Se me virem casado com ela, vão me pegar, com
certeza.
— Não quis denunciar?
— Não, apesar de tudo, são meus pais, só que eu me amo
demais para ser obrigada a me diminuir para caber na vida deles,
por isso fui embora.
Entendo.
Entendo muito bem o significado de família tóxica.
— E por que os Estados Unidos? — sondo, tentando não
pensar que o seu pai a batia.
Covarde.
Covarde de merda.
— Ah, então, estava lá, vivendo minha vida, até aí tudo
péssimo, então o meu professor de português disse que havia
vários cursos de intercâmbio voluntário para fora do país, onde
cuidaríamos do meio ambiente, e como vim do pulmão do mundo, o
meio ambiente sempre é fonte de importância primordial, só que eu
gostei da ideia de sair do país e procurei faculdades que estavam
com inscrições abertas para bolsas de estudos completas, ao invés
de alguns cursos de intercâmbio — Tagarela, enquanto entro na rua
da R&C. — Me inscrevi apenas por inscrever, não achei que
realmente iria conseguir, embora minhas notas fossem as melhores,
mas quando a LSU me aceitou, não pensei duas vezes, me
organizei e vim. Ponto final.
Aceno com a cabeça.
— Não pensou no que eles achariam da sua ideia?
— Para falar a verdade, pensei, porque eles não queriam me
ajudar financeiramente, disseram que se eu saísse, nunca mais
poderia voltar, só que então pensei: Se eles não vão me ajudar, não
poderão se meter na minha vida e finalmente poderei ser livre, então
aceitei e aqui estou eu.
— É aquele ditado, quem não paga as minhas contas, não se
mete na minha vida. — Comento, tentando relaxar o clima.
— Ou seja, nem eu mesma podia me meter nela — ri e abro
um sorriso, negando com a cabeça.
Paro em frente à hamburgueria e entramos, logo nos sentamos
em uma mesa.
Um garçom para na nossa frente e anota nossos pedidos,
Aurora pede um hambúrguer, uma porção de batatas fritas, um
refrigerante e um bolo de chocolate para a sobremesa. Eu não peço
nada, apenas olho para a garota.
— O que foi? — pergunta com a sobrancelha arqueada,
quando não aguenta mais o peso do meu olhar.
— Onde você enfia toda essa comida? — desço os olhos pelo
seu corpo esguio com curiosidade. Tenho que malhar todo final de
expediente para ficar com o corpo em forma, e não vi Aurora indo
para a academia nessa semana, mas comer? A menina come mais
do que eu, Matt e Léo junto.
— Ora, você não sabe? — ergo a sobrancelha e seu sorriso se
torna felino. — Para a bunda que você ama olhar quando pensa que
eu não estou notando.
— Não olho para a sua bunda.
— Olha tanto que tenho certeza de que já sonhou em dar uns
tapinhas.
— Uns tapinhas em você seria o de menos, eu sonho em te
jogar pela janela.
— Sonha em me jogar em cima da cama e me foder em cima
dela.
— Você que sonha com isso.
— É, isso eu não posso negar — suspira sonhadora e meu
pau contorce com esse suspiro. E com o que ela disse.
Com o que pode significar.
Aquela porta…
Desvio os olhos e pego o celular que está vibrando no meu
bolso.
É Riley.
Riley está me ligando.
Minha ex, que me mandou um convite do seu atual casamento,
está me ligando.
Aurora nota minha mudança de humor e tomba a cabeça.
Guardo o telefone no bolso sem atender a ligação e relaxo um
pouco na cadeira, respirando fundo.
Não vou atender. Não quero falar com ela, não depois de ter
esperado essa ligação muito antes do convite.
— Qual a merda? — pergunta minha falsa esposa. — É sua
ex? — tão perceptiva...
— É sim — concordo, quando seu prato chega, ela não
demora a começar a comer e ainda fala de boca cheia.
— E dizem que eu que sou a cara de pau.
— Talvez seja maturidade — ela engole o conteúdo em sua
boca e me olha, atenta ao que eu digo. — Somos adultos, uma hora
ou outra ela me ligaria.
— Está defendendo sua ex para a sua atual? — questiona com
a boca aberta. — Que coisa feia, Nicolas.
— Não é minha atual — não é.
— Sou sim.
— Não é.
— Vocês ainda se falam? — pergunta curiosa, desistindo de
insistir. Por enquanto. Do jeito que ela é, vamos nos divorciar e é
capaz de ela aparecer na minha casa para falar besteira.
Se bem que não faço ideia de para onde ela vai. Será que vai
alugar um lugar? Dinheiro pra isso ela vai ter, assim como emprego
para se manter.
— Não depois que recebi o convite, antes disso? Quase toda
semana. — Sou sincero, não tenho por que esconder nada.
— E conversavam sobre o quê?
— Sobre coisas que não são indicadas a menores de idade —
falo com diversão. Só tentando.
— Seu cu — retruca, mas tem um sorriso na sua voz,
enquanto termina de comer o hambúrguer em duas dentadas e
começa a atacar as batatinhas. — Ela terminou mesmo com você
por você ser chatinho assim? — indaga.
— Não sou chatinho.
— Assume logo.
— Sim, justamente por eu ser chatinho assim. — Suspiro
cansado.
— Quando vocês começaram a namorar, você era diferente?
— come com pressa.
— Por que você é tão intrometida? — pergunto. — E tem
como comer mais devagar? Vai se engasgar assim, Aurora —
repreendo.
Seus olhos reviram, e ela limpa a boca com guardanapos e
toma um gole de refrigerante.
— Deixa de besteira, sou acostumada a comer rápido, só me
engasgo com outra coisa que pode ter certeza, não é comida — de
novo aquele puxão entre minhas pernas com a piscadinha da
maldita. — Me conta, vai? — e lá vem aqueles olhinhos de anjo.
Desgraçada!
Solto uma respiração.
— Era, sempre fui desse jeito, desde que eu me entendo por
gente — cedo.
De novo.
— Nossa, que vaca — arregalo os olhos, surpreso com seu
tom grosseiro. — O quê? Quando começaram a namorar, ela sabia
que você era assim, foi totalmente injusto ela terminar por você ser
você mesmo. Quando amamos uma pessoa, temos que escolher ela
por suas qualidades e defeitos, se Riley quis ficar com você mesmo
com sua chatice, terminar com você por causa disso é crueldade.
Estreito os olhos, analisando-a.
Tão inteligente.
Tão perceptiva.
Tão linda.
Tão golpista, também.
Tenho que lembrar disso sempre.
— É legal saber que não sai só besteira da sua boca — ela
solta uma risada e pega sua sobremesa, quando o garçom volta.
— É raro, mas acontece. — E novamente, sorrio pra ela.
— Muito raro — ri.
— Como você está? — pergunta.
Ergo a sobrancelha.
— Por que a pergunta?
— Porque a sua ex está te ligando, e até pouco tempo, ainda
pensou que voltaria com ela — certa de novo. Mas não sei explicar
o que sinto no momento.
Decido ser sincero.
— Não sei o que eu sinto — Confesso. Seus cotovelos apoiam
em cima da mesa e seu queixo se apoia na mão.
— Você está com ciúmes dela? — franzo o cenho.
— Nunca fui um homem ciumento — verdade. Controlador
sim, ciumento nunca.
— O que você sente com a ideia de vê-la com outra pessoa?
— pisca, pisca.
Semicerro os olhos.
— Virou psicóloga, porra?
— Me conta, vai...
— Você quer que eu pule de alegria em ver minha ex seguindo
em frente sem mim, enquanto eu fico estagnado no mesmo lugar
em que ela me deixou?
— Você está casado — não me diga! Comprimo ainda mais os
olhos para seu sorriso ladino.
— Aurora — repreendo.
— É a verdade, você está, ela está noiva, talvez hoje seja o dia
em que você finalmente tire essa venda dos seus olhos e veja que o
tempo está passando e nada mais é como antes, às vezes, a vida
traz o passado para nós, para que não cometamos o mesmo erro, é
sua chance, coroa — Dá de ombros e volta a beber refrigerante
como se não tivesse me dado mais uma lição de moral.
Ela gosta de fazer isso.
— Ok, vinte anos, vamos ver se eu não cometo o mesmo erro
outra vez — seus olhos reviram, mas ela sorri, pega seu bolo e se
levanta.
— Tem várias outras pessoas por aí, disponíveis para você.
— Você está incluída? — Sondo, olhando de esguelha e quero
matar Léo e Matt por me fazerem pensar nela assim.
Como se eu não a quisesse desde que acordei naquela cama.
— Você gostaria disso? — pergunta com interesse.
Se eu gostaria?
— Tenho medo.
Ela me olha, enquanto tiro o meu cartão para pagar pela sua
bomba calórica.
— De quê? Eu não mordo, não. A não ser que você goste, eu
até gosto, umas mordidinhas no pescoço aqui, na bunda ali,
saudade disso, aliás.
— De mordidas? — ergo a sobrancelha, abrindo a porta para
que saia na minha frente. A maldita sabe que vou olhar para a sua
bunda, principalmente depois de me fazer pensar nela com aquela
nossa conversa, só isso explica o fato de rebolar com tanta vontade
ao andar.
— De sexo. — Travo o maxilar. — Não me falou do que tem
medo.
— Da vara da infância e da juventude? Conselho tutelar?
Professores do jardim de infância? — Falo brincando e ela gargalha
e nega com a cabeça.
— Não pode voltar atrás, disse que ia parar de me tratar como
uma adolescente.
E eu vou, mas se ela pode brincar com a minha idade me
chamando de coroa, posso dar uns apelidos para ela, não?
— Entra no carro, Aurora. — Antes que eu caia na tentação de
dar uns tapas na sua bunda e te mostrar o quão adulta eu sei que
você é.
Estamos nos afogando em
nossos olhos
Não sei o que iremos encontrar
Não tenho certeza, deveríamos
voar ou lutar contra isso?
Estamos apavorados
Fingindo agora que não nos
importamos
A tensão sobe pelo ar
Estou mais do que assustada
Estou me afogando em seus
olhos
Estou apavorada
(Come back home - Sofia
Carson)

Acordo com um e-mail que já estava esperando há algum


tempo.
Depois de quase dois meses que estou casada.
Finalmente a imigração deu algum sinal de vida e me mandou
o que eles chamam de aviso. Tenho sete dias para apresentar um
motivo justificável para ficar no país. Uma semana.
Se fosse em outro momento, uma hora dessa já teria rezado
doze ave maria e pedido a Deus que me socorresse. Provável que
eu estivesse chorando em posição fetal.
Ainda bem que Nicolas se drogou e eu me embebedei naquela
festa. É uma merda dizer isso? É, mas é a verdade.
Bendita a droga que estava no copo do Nicolas e bendita seja
Lily por ter me convidado para aquela despedida de solteira.
Olha aí, até achei um motivo para não voar em seus cabelos
se ela aparecer na minha frente mais uma vez. Bendita Lily, posso
até te dar um beijo agora.
Não, não poderia. Ainda a odeio por ter me deixado na mesa
de quatro caras, completamente bêbada e sozinha, se eu não
tivesse tido sorte, não sei o que seria de mim.
Desço as escadas antes do que costumo e vejo Nicolas já em
frente ao fogão, em toda a sua maravilha. Ele ama cozinhar. Nicolas
ama acordar cedo também, não houve um dia em que desci aqui
que ele já não estivesse. Meu falso marido se vira com o som dos
meus passos e me olha com um olhar estranho.
— Tinha formiga na cama, hoje? — E meu bom-dia, cadê?
— Por que teria?
— Uma hora dessa e você já está acordada, uma coisa muito
séria deve ter acontecido, tô apostando nas formigas. — Prendo o
riso.
Ele não está errado em falar isso. Nicolas não me acordou
mais depois do primeiro dia. Ele notou que não gosto quando me
acordam, gosto quando acordo sozinha, pois assim, não tenho
ninguém para culpar a minha falta de sono. Nicolas é legal.
Mesmo quando planeja a minha morte.
— Preciso falar com Matt — o mais bonzinho dos três. O único
com olhos da cor do céu. O advogado bonzão que almoça comigo e
às vezes me traz pra casa.
Não gosta de mim, mas não joga esse fato na minha cara. Já
eu? Eu gosto dele.
Eu gosto de todos eles. Nenhuma pessoa seria gentil comigo
depois do que fiz, mas eles são, até mesmo Leonardo. O loiro gatão
que está me ignorando porque está de bico. Ficou magoado comigo
e não posso nem dizer que não tem razão pra isso. Tadinho dele.
Além disso, ainda tem seu irmão.
Nicolas faz o café pra mim, me deu um emprego, mesmo que
ainda não tenha me dito se vai ser pago ou não, eu não ligo, estou
tendo uma ótima experiência e mais algo sendo acrescentado no
meu currículo. Além de me trazer para morar com ele, também me
deu um quarto, me alimenta, e está me garantindo a minha
cidadania neste país. Eu gosto do Nicolas, mesmo que tenha odiado
quando ele me acusou de golpista naquele quarto em Las Vegas.
Passou assim que ele teve razão.
Todos os dias tomamos café juntos. Todos os dias vamos
trabalhar juntos, mas passamos o dia separados e a noite, às vezes
ele não vem cedo para casa.
Nessas noites, desconfio de que possa estar saindo com outra
pessoa, mas não julgo. Não gosto, mas não julgo.
— O que quer com ele? — cerra os olhos em minha direção, e
se senta à mesa para tomar café. Seu terno está todo alinhado, nem
uma peça fora do lugar.
— Chegou a notícia do departamento de imigração, preciso
saber se ele pode dar início ao meu processo de visto permanente,
você sabe, agora que estou casada. — Com você.
Eu estou casada. Eu, vê se pode?
Sempre pensei que quando isso acontecesse comigo, seria
com alguém que amasse muito. Alguém da minha idade, maduro o
suficiente para se comprometer, e nós iríamos construir a nossa vida
juntos.
Nunca pensei que fosse me divorciar.
Não tenho ilusões de que acharei esse espécime perfeito que
idealizei, mas nunca pensei que acabaria se acontecesse.
Falei a verdade a Nicolas quando disse que assinaria sorrindo.
Ele não sabe que provavelmente assinarei com o coração chorando.
Anulação é uma coisa, pela lei, nunca chegaríamos a ser um casal.
Divórcio é outra. Mas a culpa é totalmente minha.
Tem coisas que não consegui mudar, mesmo depois de sair do
convento. Pensar que o casamento é sagrado e deve ser pelo resto
da vida é uma dessas.
— Qual foi o prazo que te deram? — começo a encher meu
prato de panquecas. As panquecas de Nicolas são as mais
gostosas.
— Sete dias, ele resolve, não resolve? Não tenho dinheiro para
pagar ele, vai ser na conta da família — seus olhos reviram, mas ele
sorri de lado.
Ele tá sorrindo mais pra mim ultimamente. Gosto do sorriso
dele.
Nicolas fica ainda mais lindo quando sorri.
— Resolve — sabia. — Vou vender uma casa hoje, quer ir
comigo? — Ponho a mão no coração.
— Você me convidando de livre e espontânea vontade para ir
com você? O que é isso, um filme? — seu rosto se fecha.
— É um dos seus projetos, achei que gostaria de falar sobre
ele, tem mais propriedade. — Verdade.
— Claro que quero — ele assente. — Pergunta.
— Faça.
— Se você é o CEO, não tem outros corretores que possam
fazer esse trabalho por você? Não tem muitas coisas para fazer?
— Tenho — gemo quando provo o gosto da panqueca com
chocolate. Quando ergo os olhos, pego Nicolas olhando para a
minha boca intensamente. Passo a língua nos lábios só para
provocá-lo. Sua garganta se move com o engolir seco. — Mas é a
casa mais cara do nosso catálogo aqui em Manhattan, não posso
deixar nas mãos de qualquer pessoa, sempre sou eu que cuido das
casas mais valiosas.
— Hum hum — murmuro, entendendo seu ponto. Engulo as
panquecas com um pouco de café para ajudar a descer. Tenho uma
mania feia de colocar mais comida na boca do que realmente
aguento. — Vou com você, gosto de te ver trabalhando.
— Gosta? — seus olhos brilham.
— É claro, não importa o que aconteceu, você ainda é uma
fonte de inspiração para mim, ouvi muito sobre você na faculdade, e
sobre sua imobiliária, assim como escutei muito sobre Léo e seus
edifícios espetaculares. Não lembro de ter visto seus rostos, por isso
não os reconheci logo de cara. Mas os tinha como inspiração. Ainda
os tenho — ele para de comer.
Algo passa pelos seus olhos.
— Não sabia disso — murmura.
— Não tinha como saber, mal conversamos — faço drama e
seu sorriso se abre no belo rosto.
— Acho que Matteo ainda está no seu apartamento, pode
descer lá, dois andares abaixo, passo lá para pegar você e irmos
trabalhar — assinto e comemos em silêncio.
Gosto de comer em silêncio, sempre tenho tempo para
observar Nicolas. Gosto de provocá-lo e venho notando que ele se
abriu mais para minhas provocações desde o nosso momento na
hamburgueria. Nossa relação evoluiu bastante nas últimas semanas
e se minha experiência serve de algo, posso até dizer que tem uma
tensão sexual agora, não parece mais que estou falando sozinha,
Nicolas retribui minhas provocações e estou gostando disso, pois
ele abriu uma brecha para mim.
Se eu não estiver enganada, talvez possa rolar algo, mas não
sou iludida, sei que não vamos nos apaixonar.
Sei que ele ainda vai querer o divórcio.
Sei que não teremos uma linda história de amor para contar
para os nossos filhos.
Sei disso tudo, porque eu não tenho mais um coração iludido.
Não sou mais a garota tonta que esperava casar assim que se
formasse no ensino médio. Não sou mais a trouxa que fazia tudo o
que os pais queriam. Não sou mais a idiota que acredita em contos
de fadas. Esses contos não são pra mim.
Nicolas não é pra mim.
Nicolas pertence a uma mulher da sua classe social, da sua
idade, alguém que ele realmente escolhesse como esposa. Não
uma menina com metade da sua idade, que ele se casou drogado e
que no outro dia, o fez ficar com ela contra a sua vontade.
Nicolas é um anjo, ele está certo em me chamar de capeta.
No final, eu sou a errada da história.
Eu nasci para ficar sozinha, disso eu já sabia.
Por isso não sou iludida.
Por isso e porque Nicolas não mente para mim. Ele é sincero,
não fala algo querendo falar outra coisa. A verdade dói, mas ele
prefere verdades amargas do que mentiras doces.
Termino de comer, me levanto e levo minha louça até a pia.
Hoje é o dia que a moça que trabalha na limpeza vem, ainda bem, a
casa está uma bagunça e nem temos tempo de limpar.
— Diga a Matt que preciso falar com ele depois — grita Nicolas
quando já estou quase saindo.
— Ok — grito e saio.
Pego o elevador, desço até o andar do santinho e toco a
campainha.
Passa algum tempo e ninguém vem. Toco novamente e de
novo, e de novo, se ele estiver dormindo, vai acordar na força do
ódio.
E vai me matar com essa força também.
— Já vai, porra! — Não disse? Ódio purinho.
Escuto passos dentro do apartamento, passos duros e irritados
e temo pela minha vida por um instante. Olho para os lados para ver
se há alguma câmera, e me contento em ver que tem duas. A porta
se abre bruscamente à minha frente e antes que eu abra a boca
para me defender, a baba escorrega.
Puta merda, hein. De onde esses homens saíram?
Um Matteo, com olhos azuis furiosos e dilatados, sem camisa,
mostrando todos os gominhos para minha visão e apenas uma
toalha enrolada na cintura, me atende.
Suor escorre por seu corpo, e olhando para baixo…
— Aqui em cima, Aurora — repreende e sorrio.
— Desculpa, é que é difícil não olhar quando eu tenho a
doença da galinha cega — seu cenho se franze.
— Que doença é essa?
— Muito tempo sem ver um pinto — mesmo não querendo,
Matt gargalha e eu o acompanho soltando uma risada gostosa.
A minha é mais de desespero. Como já disse a Nicolas, gosto
de uma boa foda, mas todo dia tenho um surto diferente ao sonhar
com aquele homem. Não posso ficar com outra pessoa, não faz
parte da minha educação, mas porra, o tanto que Nicolas me faz
ficar molhada deveria ser proibido.
Nunca pensei que gostaria de ser humilhada.
— O que você quer, Aurora? Tô ocupado — acena com a
cabeça para dentro, agora o semblante bem mais tranquilo.
Ocupado transando, né?
— Queria que resolvesse algumas questões sobre o meu visto
para mim, Nicolas disse que eu podia passar no cartão família para
pagar seus serviços. — Seu sorriso entorta.
— Disse nada.
— Não disse, mas você é bonzinho, né? Faz isso por mim? —
faço beicinho e abro bem meus olhos. Tenho um rostinho de santa
que sempre me ajuda. Meus olhos ficam iguais aos do gato de
botas. Sempre consigo algo com esses olhos arregalados e esse
bico na boca.
— Resolvo suas coisas, outra hora, ok? Tem uma bela bunda
que eu estava comendo ali, que não estou a fim de mandar para
casa sem terminar. — Faço careta.
— Você vai mandar a mocinha para casa depois de comer a
bunda dela? — repreendo.
Ele ergue a sobrancelha.
— É você que acha que eu sou bonzinho, Aurora, nunca falei
que era — verdade, verdadeira.
— Vê se paga um café para ela e uma pomada para assadura,
nunca dei minha bunda linda, mas deve doer. — Ele assente e se
manda para dentro. — Nicolas disse que… — ele fecha a porta na
minha cara. — Grosso — grito para a madeira.
Grosso mesmo, garrafinha pet. Nem a toalha foi capaz de
esconder.
Será que o de Nicolas é assim também? Não tive tempo de
olhar quando acordei ao seu lado, só de sentir. Era um tamanho
considerável na minha bunda.
Volto para o elevador e espero ele chegar para entrar.
Nicolas já está dentro dele, quando as portas se abrem.
— Tá vermelha por quê? — De novo isso? A obsessão desse
homem com a cor das minhas bochechas me assusta. Toco minhas
bochechas, as sentindo quentes e sorrio para meu marido e seus
olhos semicerrados. — Deixa eu adivinhar, ele estava fodendo?
Parece que ver as pessoas fodendo e saber que as pessoas
estão indo foder tem a mesma reação com as minhas bochechas.
As duas cenas me deixam vermelha.
— E não é que você adivinhou? Já jogou na loteria? Não, não
precisaria, já é ricaço — respondo, tagarelando como um papagaio.
Nicolas tomba a cabeça e cruza os braços.
Sua pose é durona, seu semblante também está fechado.
Nicolas com raiva é um evento.
— Ele pelo menos falou com você?
— Disse que resolvia depois.
— Só isso? — é raiva em seus olhos? É raiva sim.
Deus do céu, o que eu fiz agora?
— Era uma bundinha, ele deve ter feito por merecer aquela
bundinha. — Seus ombros ficam tensos. Sorrio para ele, minha
boca capturando seus olhos.
Às vezes acho que Nicolas me deseja, eu sou bonita porra,
sou sim. Bem gostosa também, acho que se fosse em outra
ocasião, ele já teria ficado comigo.
— Ele estava pelo menos vestido? — então é isso?
— De toalha. — Seu olho pisca.
— E você…
— Vi o pau dele? Só o contorno.
— Porra, Aurora! — esbraveja, passando a mão no rosto. Meu
sorriso se torna malicioso.
— Isso é ciúmes? — Provoco.
— Isso é senso, quem aparece de pau duro na frente da
esposa do melhor amigo? — exclama indignado e meus olhos
brilham.
— Esposa falsa. — Se você disser que mesmo assim sou sua,
te beijo agora.
— É, tem isso. — Essa foi por pouco.
— Pra mim isso é ciúmes — seus olhos se reviram, mas
mesmo com eles em chamas, e um bico do tamanho do mundo,
vejo diversão nele.
— Nem fodendo.
— Nem me fale em foder agora, faz tanto tempo que eu não
faço nenhuma brincadeirinha que não sei mais o que é isso — faço
drama e sua cara se fecha ainda mais.
Gargalho alto. Meu Deus, eu nunca vou cansar de provocar
esse homem, meus dias se tornaram muito mais divertidos desde
que ele entrou na minha vida.
Não que eu vá dizer isso a ele.
— Cala a boca, Aurora. — Faço como se fosse um zíper
fechando a minha boca e continuo sorrindo.
Sorrio porque é fácil sorrir para ele.
Sorrio porque é bom sorrir com ele.
Sorrio porque consigo arrancar um sorriso dele, e isso é tudo o
que importa.
Procurei pelo amor em todos os
estranhos.
Demorou muito para aliviar a
raiva.
Tudo por você, sim, tudo por
você.
Eu tenho corrido pela selva.
Eu tenho chorado com os lobos.
Para chegar até você.
(Wolves - Selena Gomes)
Algo estava estranho.
Assim que chego na R&C, caminho direto para a minha sala,
mas antes que possa chegar, pego meu chefe Otávio me encarando
com raiva.
Não lembro de ter feito nada de errado desde que botei meus
pés na R&C pela primeira vez e olha, eu sou mestre em fazer
merda, geralmente são daquelas bem feias como já mostrei, do tipo
colossal, menos quando é no meu trabalho. Nunca dei um motivo
para ficarem com raiva ou me darem uma advertência.
Então, sentir o clima estranho e sentir que a causa sou eu, me
deixa ainda mais desconfiada.
Sento na minha mesa, mas o incômodo não passa. Ergo os
olhos e vejo o que não queria. Sabe quando estamos na
adolescência e pensamos que todo mundo está cochichando sobre
nós? Que todos os olhares são direcionados a você?De que todo
mundo só está esperando um erro seu para te caçoarem? Quase
sempre é coisa da nossa cabeça, mas hoje não é.
Todos me olharam e desviaram quando meus olhos se
conectaram com o de alguém. Há alguns grupinhos que estão
fofocando e cochichando e sempre me olham. Dá para perceber que
eu sou o assunto da conversa. Eu só não sei o porquê.
Ligo o meu computador, tentando deixar isso de lado. Sei que
em algum momento vai chegar até mim, mas como disse, estou
trabalhando e não quero de jeito nenhum que meu trabalho seja
afetado por pensar demais e me desconcentrar com o que podem
ou não podem estar falando sobre mim.
Passo as primeiras duas horas da manhã trabalhando no
projeto de um apartamento e me distraindo com isso. Amo o que
faço. Sempre amei, desde que era novinha. Coisas sobre lar sempre
me chamaram a atenção. Sempre sonhei em fazer o meu próprio
enxoval de casa nova, mas ainda não consegui fazer isso.
Um dia.
Um dia eu faria.
Me distraio do meu trabalho, quando um loiro lindo, mas tão
cara de pau quanto eu, bate em minha porta. Aceno para que entre.
Menti pra Nicolas. Disse que ele me lembrava Aaron Warner,
de uma série de livros que eu gostava. O idiota acreditou como se
algo assim fosse mesmo possível, quem fica vermelha porque viu
um cara que se parece com um personagem de livro? Fala sério!
Ele não me lembrava ninguém, eu ficava vermelha porque o peguei
metendo a vara na sua estagiária no meu primeiro dia de trabalho.
Ele não sabe que vi, eu tinha entrado no banheiro e estava dentro
de uma cabine quando entrou com ela e trancou a porta. Ele a fodeu
em cima da pia.
Tadinha da pia, levando porrada logo cedo.
Minha porta estava entreaberta, porque já estava quase saindo
quando eles entraram, mas não perceberam. Philips precisou tapar
a boca da pobrezinha enquanto metia na ruiva gostosa. Porque era.
Era muito linda a ruiva dele, e ele é muito lindo também.
Principalmente a bunda dele. Agora, toda vez que eu o vejo, me
lembro daquela cena. Nunca presenciei sexo fora do quarto. São
coisas que o convento impregnou em mim e nunca havia feito.
Assim como nunca trairia o meu marido, mesmo que seja falso e
não ser uma voyeur. Mas não tive muita escolha e confesso que
fiquei um pouco excitada.
— Bom dia, Philips, a que devo a honra? — além de me fazer
lembrar que a cabeça do seu pau é rosinha e agora minha cara
deve tá rosinha também?
E olha que eu sou uma sem-vergonha.
— Tá rolando um boato aqui, é sobre você, achei que gostaria
de saber — ergo a sobrancelha.
Olha só, quem diria que além de ninfomaníaco também é
fofoqueiro?
É claro que quero. Quero até demais.
Deixo meu computador de lado e aponto a cadeira à sua
frente.
— Me conta, por favor, Philips, não tô aguentando mais esses
olhares sobre mim.
— Pensei que não havia notado, você entrou, sentou aqui e
não deu atenção a ninguém. — Senta essa bunda que eu vi nua na
minha cadeira e abre logo a boca, criatura.
— Estou trabalhando.
— Todo mundo viu.
— Manda logo a bomba — mordo o polegar.
— É verdade que você é esposa do chefe?
— Pensei que ele fosse gay — claro que meu coração
acelerado sabe que ele está falando do Nicolas. Mas finjo que ele
está falando do chefe que estava me encarando com raiva quando
cheguei. Ele é gay. Ele é casado até.
— Nicolas Ramsey, com certeza, não é gay — ergue uma
sobrancelha desdenhosa.
— Como você sabe? — desvio do assunto.
Philips me olha como se soubesse disso.
— Ele já declarou que era hétero em uma entrevista para a
Forbes, que inclusive, colocou ele na lista dos solteiros mais
cobiçados, ou era um desses solteiros. Ao que parece, ele é
casado.
— Quem falou isso? — Tão sonsa quanto Lily, encaro Philips.
— Saiu hoje no THE NEW YORK TIMES, a notícia do suposto
casamento do magnata da imobiliária Ramsey&Collins, você deve
saber que depois do último relacionamento dele ter chegado ao fim,
todos pensaram que ele acabaria voltando com a ex.
Nem por cima do meu cadáver.
— E saiu a notícia de que ele estava casado comigo? — Ergo
uma sobrancelha.
— Não, foi Laura, a secretária dele falou para suas amigas
ontem depois do expediente, parece que chegou um e-mail para o
chefe do tribunal de justiça, falando sobre o casamento, e você
sabe, ela é a secretária dele, filtra os e-mails e acabou vendo. Ela
espalhou a notícia.
Que grande merda.
Nicolas não vai ficar nada feliz em saber que sua privacidade
não é nenhum pouco respeitada. Ela não tinha nada do que falar
para os outros, principalmente se seu trabalho incluía justamente
essa função. A de ser leal à privacidade do seu chefe.
— E foi? Fofoqueira, ela, né? — Me estico na cadeira.
Philips sorri.
Ele sorri ainda mais quando olha para meu dedo anelar
esquerdo e nota o arco de ouro que o delineia. Não posso dizer que
sou, não sei se Nicolas quer que todos saibam agora, e estou
tentando ser uma pessoa do bem.
— A maior fofoqueira da empresa — seus cotovelos se apoiam
na minha mesa e seu queixo em sua mão. — Mas ela sabe das
coisas, nunca é notícia falsa, é por isso que todos acreditam que
Nicolas está casado. — Ele se aproxima um pouco mais e sussurra.
— E com você.
Verdade.
Mas nego até ter permissão para falar que sim, sou esposa
dele.
Tem coisas que eu prezo muito nesse mundo, minha vida é
uma delas.
O som do meu telefone tocando me tira do foco intenso de
seus olhos e o pego rapidamente para atender. Nem mesmo vejo de
quem é o número.
— Alô — falo e Philips sorri mais e se levanta.
— Estou saindo, mas você sabe, minha sala é em frente a sua,
pode me visitar quando quiser para conversarmos sobre isso. —
Aponta para minha aliança, mas não faço menção alguma de
respondê-lo. Ele sai logo em seguida.
— Quem era esse, Aurora? — a voz grossa e ainda mais
rouca pelo telefone, me tira dos devaneios.
— Esse quem? — Sorrio.
— Esse que está te chamando para sua sala, para conversar.
— Disse que não era ciumento.
— Não sou. É só senso de preservação. — Ai. Quem precisa
de inimigo quando se tem um marido que ama esfaquear o meu
ego?
— Até parece que eu te colocaria chifre com o pessoal da sua
empresa — reviro os olhos, mesmo que não possa ver. — Falando
nisso, viu a matéria a seu respeito que saiu no The New York
Times? — hoje estou fera em mudar de assunto.
— Claro que vi, sempre somos os primeiros a saber dessas
porcarias de fofocas. É sobre isso que queria falar, antes que se
espalhasse pela empresa.
Solto uma risada.
— Sinto muito, marido, mas parece que seu segredinho sujo já
foi descoberto, ou isso, ou eu cuspi no café de todo mundo, porque
os rostos deles não estão nenhum pouco bonitas para cima de mim.
— Tem uns que são feios de natureza, mas quem está ligando?
Escuto Nicolas praguejar do outro lado da linha.
— Suba, Aurora. Agora.
Me levanto depois de ter uma gostosa desligada na cara, coisa
que eu odeio, e me mando para o andar de cima.
Claro que sinto os olhos em mim, mas finjo mexer no celular,
principalmente quando passo em frente à sala do meu chefe. Ele
tem sangue nos olhos.
Enquanto subo de elevador, fico pensando na sua reação.
Otávio já está velhinho e não tem muito talento para a modernidade.
Suas casas antigas são divinas, mas é difícil alguém hoje em dia
querer um modelo assim. Deve estar pensando que como sou a
provável esposa do chefe, esteja almejando pegar seu emprego e o
mandar para uma linda casa de repouso para curtir sua
aposentadoria. Quem me dera já pudesse me aposentar, seria
divino. Amo meu trabalho, mas isso não significa que ame trabalhar.
Saio no andar de Nicolas e nem me dirijo a sua secretária. Ela
não sabe ainda, mas está demitida a partir de hoje. Posso não ser
uma esposa verdadeira, mas ela não vai continuar espalhando
segredos do homem que está me abrigando.
Assim que entro na sua sala, Léo já está lá, ao lado de
Nicolas. Se Matt não tivesse tirado o dia de folga, certamente estaria
aqui também.
Parece que os gentis olhos azuis estavam dedicados hoje a
outra pessoa. Sua melhor amiga.
Sim, ele tem uma melhor amiga e ela está noiva. Ele foi
experimentar o bolo com ela. Fofo da parte dele. Como eu sei
disso? Às vezes ele me leva para casa e não gosto de passar tempo
em silêncio.
— Olha se não é a Madre Teresa de Calcutá. — O loiro
oxigenado cumprimenta com sua costumeira cara de cu, que é
dedicada somente a mim.
Com as outras pessoas, parece um teletubbie. Sempre feliz.
Faço bico.
— Um dia você vai ter que me perdoar.
— Sonha — volto meus olhos para Nicolas.
— Por que está com essa cara de bunda também? — Seus
olhos reviram.
Os dois estão bem parecidos hoje, vestidos em ternos
idênticos em estilo, mas diferentes em cor. Onde Léo está com um
tom de azul céu, combinando com seus olhos, Nicolas está com seu
habitual preto, que combina com seu humor.
— Como as pessoas estão te olhando? E como elas
descobriram que é você a minha esposa? Não contamos a ninguém,
você contou?
— Estão me olhando como se eu não merecesse estar onde
estou, embora isso não me afete em nada, sei muito bem do meu
talento e não contei a ninguém, mas sei como eles descobriram, só
não sei se você vai gostar do que tenho a dizer. — Os irmãos
cobiçados por Manhattan me olham, esperando que eu fale.
— E como eles descobriram? — pergunta Léo, com cautela.
— A sua secretária, ela é muito eficiente, mas também não
respeita nada a sua privacidade, chegou um e-mail do tribunal de
justiça sobre o nosso casamento, e ela viu. Agora a empresa inteira
está sabendo. — Nicolas fecha a cara lentamente.
Fecha o punho também, bem em cima da mesa, mas sei que é
só ele tentando manter o controle. Muitas coisas têm fugido dele
ultimamente.
— Porra — Léo xinga, passando a mão no rosto. — Vou ligar
para Matt.
Ele se levanta, pega o celular e sai da sala, para fazer a
ligação.
— Você confirmou algo? — pergunta o Ramsey mais velho.
Seus ombros estão tensionados e odeio Laura por ter traído
sua confiança. Eu faço merda? Ótimo, ele mal me conhece. Ela?
Que eu saiba, já trabalham juntos há dois anos.
— Não, sua empresa, sua decisão. O que você disser, pra mim
tudo bem, embora saiba que uma hora ou outra, vão saber a
verdade. — Dou de ombro e ele assente. Seus olhos se voltam para
a porta.
Sei, pelo seu olhar, que não está irritado pela notícia vazar, ele
está furioso por não ter tido sua privacidade respeitada por uma das
pessoas que mais confia aqui dentro.
— Vai demiti-la? — pergunto.
— Isso é óbvio.
— Não se segure por mim, acho até que vou gostar. — Foi
uma falta de respeito enorme.
Odeio falta de respeito com pessoas que estão fazendo algo
por você.
Nicolas me olha.
— Só depois que Matt ver a questão logística de tudo. Ela vai
ser demitida, mas ele garante que não levaremos um processo
depois. — Assinto.
Penso seriamente em contratar Matteo como meu advogado.
Ainda tenho vinte anos, do jeito que sou, vou pegar uns trocentos
processos ao longo da vida. Se duvidar, até Nicolas pode me
processar ainda.
— Então, o que eu faço? Nego?
— Pode dizer que é, vão descobrir que é você de qualquer
jeito, só não deixe que te coloquem para baixo por você ser minha
esposa, como se só estivesse no seu cargo por isso.
— Mas só estou no meu cargo por isso — sorrio divertida e
Nicolas semicerra os olhos.
— Você sabe do que estou falando. — Sei sim. — Além disso,
você tinha um tempo teste, você passou nele. — Abro a boca em
choque.
— Além de trabalhar de graça, você ainda ia me demitir se não
fosse boa o suficiente?
— É claro que sim — solto uma risada alta. O canto da sua
boca também se ergue em diversão.
Meu Deus!
Que sorriso lindo. Eu sou encantada pelo sorriso dele.
— Você é um idiota, Nicolas.
— Precavido — corrige. — Você já vai receber seu primeiro
salário no final do primeiro mês, não se preocupe com trabalhar de
graça. Além das comissões, é claro.
— Sabia que me contrataria de verdade quando visse meu
trabalho em primeira mão, não que eu não aceitasse trabalhar de
graça para você, sou grata por não ter me deixado morar debaixo da
ponte.
— Você fala como se fosse realmente para debaixo da ponte
— eu ia, querido, mas é bom você pensar que não.
Dou de ombros, fingindo indiferença e me levanto.
— Precisa de mais alguma coisa? Preciso terminar um
trabalho para hoje, meu chefe já está me olhando com ódio, não fez
bem para minha fama aqui, já chegar pegando vários projetos e
ainda ser casada com o chefe de todo mundo — resmungo.
Nicolas passa os olhos pelo meu corpo lentamente, como se
estivesse vendo a melhor e mais bela obra de arte e para na saia.
Puxo ela para baixo, com um sorriso travesso e seus olhos intensos
sobem até os meus.
Como ele consegue ser tão sexy, porra? Eu só queria uma
bitoca dele. Foi bem gostosa aquela que eu roubei dele em Las
Vegas.
— Você está linda — elogia e arregalo os olhos de surpresa.
— Sabe que pode fazer bem mais do que olhar, não é?
— Tipo o quê? — pergunta, sentado em sua cadeira, apoiando
o queixo nas mãos.
Isso é um flerte?
— Isso depende do que você gostaria, sempre apoiei a ideia
de ir a um parque de diversões e andar em todos os brinquedos.
— Me deixaria andar em todos os brinquedos?
— Faria questão de te ensinar a usar cada um.
— Acho que tenho idade o suficiente para saber o que fazer,
Aurora. — Eu sei que tem.
Sorrio.
— Basta saber se quer fazer. — Ele sorri também.
— Você deveria ter cuidado com o que fala, garota. Não
sobraria nada de você se eu decidisse te tomar como minha. — Sua
voz é um sussurro rouco. Um sussurro que faz os bicos dos meus
seios enrijecerem.
— Não quero que sobre — sussurro de volta, apoiando as
mãos na mesa e aproximando o meu rosto do seu.
— É exatamente o que você quer, não é? Me enlouquecer até
eu ceder e te levar para cama. De novo e sóbrio. — Pela primeira
vez, mas não assumirei isso agora. Não com minha calcinha
molhada com suas palavras.
— Não, quero te ver implorar para me comer — sorrio, seus
olhos escurecendo, focados em minha boca. Com a língua,
umedeço os lábios e quando o vejo se aproximar, me afasto de uma
vez. — Te vejo em casa, marido.
Seu semblante se fecha e ele xinga quando viro de costas.
Sorrio e nego com a cabeça, saindo da sua sala.
O que aconteceu aqui?
A vista da minha varanda me dá ampla visão de quase toda a
Manhattan. Foi por isso que escolhi esse edifício para morar, a
localização é perfeita e a vista mais ainda. Olhando para baixo, vejo
apenas miniaturas e luzes piscando como se fossem uma enorme
árvore de Natal. Admirando essa paisagem, me permito refletir
sobre como a minha relação com Aurora mudou recentemente.
Aurora adora essa vista. A peguei lendo semana passada
enquanto estava sentada na pequena poltrona que fica de frente
para a cidade e ela me confidenciou que amava ler ali. Eu nem
mesmo sabia que ela gostava de ler por prazer.
Adorei saber disso.
Adorei que ela perguntou se havia algum problema em falar
sobre a história e apenas me sentei ao seu lado e a escutei falar
sobre elfos e putaria.
Ela até leu uma cena pra mim. Nem mesmo sabia que era
possível colocar putaria dentro de um livro.
Tive que subir duro para o quarto, tentando disfarçar o máximo
possível para que não visse.
Quando Aurora decidiu entrar na minha vida, nunca pensei que
abriria uma brecha na minha armadura para ela entrar, e olha que
eu relutei bastante. Mas como eu não abriria quando todos os dias
ela se esforça para mudar o modo como eu a vejo?
E ela se esforça, se esforça muito para mudar a imagem da
menina que errou feio ao fazer o que fez comigo e está funcionando.
Está funcionando perfeitamente.
Passei a apreciar a companhia dela, e ficou difícil não retribuir
todas as suas provocações depois do que aconteceu há alguns
dias.
Depois que tive uma visão de como ela é linda por baixo das
roupas.
Estava chegando em casa depois do trabalho e tinha avisado
que não chegaria cedo para ela, porém, precisei vir quando minha
reunião foi cancelada. Assim que comecei a subir as escadas,
esbarrei com ela descendo. Nua.
Ela estava completamente nua para o meu desespero e do
meu pau que ficou duro na mesma hora por ela. De novo! Ver
aqueles seios empinados e mamilos rosados me deixou louco. Não
consegui ver o seu triângulo que provavelmente é tão perfeito
quanto os seios, pois ela virou de costas com um grito e me fez
latejar com a visão da sua bunda enquanto corria para o quarto e se
trancava lá dentro.
Perguntei o porquê de estar andando nua dentro de casa em
frente a sua porta e ela me disse que era porque estava sem toalhas
e estava indo buscar na lavanderia no andar de baixo. Depois gritou
comigo e disse que eu tinha avisado que não chegaria cedo.
Senti desejo por ela desde a primeira vez que a vi, e quase me
deixei levar por ele, naquele dia no meu escritório, quando quase a
beijei. Agora que tive uma visão daquelas? Estou enlouquecendo
revivendo a cena em minha cabeça.
Meu interesse duplicou.
Meu corpo chama por ela. Queria continuar apenas com a
visão que tinha da sua bunda escondida por uma calcinha de renda
que vi naquele quarto em Vegas, aquela imagem tinha sido
amenizada por tudo o que fez depois, mas essa nova? Com ela
demonstrando ser uma mulher adulta, talentosa e provocadora?
Não sei por quanto tempo mais sou capaz de resistir.
Não quando ela me conquista de outros jeitos, também.
Depois que a fofoca sobre nós explodiu há alguns dias e ela não
confirmou nada até ter certeza de que eu aprovaria, pois era a
minha empresa e ainda descobriu quem tinha vazado a notícia,
passei a confiar nela.
Confiei nela porque ela aguentou olhares julgadores em cima
dela e em nenhum momento abaixou a cabeça. Nem falou algo ou
destratou alguém por estar em uma posição de “poder” aos olhos
dos outros por ser minha esposa.
Se alguém tivesse me dito há algumas semanas que confiaria
naquela mulher, eu teria rido. Sim, mulher. Porque como havia
prometido a ela, deixe-me enxergá-la como realmente é. Uma
mulher. Uma muito gostosa, por sinal.
E sim, confio nela, sinto desejo por ela e pelo visto, gosto de
estar com ela. O que poucas semanas podem fazer, não é?
Muito.
A desgraçada realmente conquistou o meu afeto
Não quero saber.
Que tipo de vestido você está
usando esta noite.
Se ele está te segurando tão
apertado.
Da maneira que eu fiz antes.
Eu tive uma overdose.
Deveria saber que seu amor era
um jogo.
Agora eu não consigo tirar você
do meu cérebro.
Oh, é uma pena.
(We don’t talk anymore - Charlie
Puth feat Selena Gomes)

Tentação: 1. Impulso para a prática de alguma coisa


censurável ou não recomendável.
Isso eu nunca havia sentido, nem um impulso censurável ou
não recomendável, sou um cara tranquilo em relação a fazer
besteiras, que gosta das coisas sendo feitas com calma para que
tudo saia perfeito.
Foi assim quando comecei a R&C com Matt e Léo, sem
nenhum impulso, tudo de caso pensado. Foi assim que nunca cedi a
me viciar em algo, como bebidas, drogas, jogos. Não queria nada
que me tirasse da minha zona de conforto. Nada que me tentasse.
Porém, contudo, todavia... conheci o segundo significado
dessa palavra quando Aurora entrou em minha vida.
Tentação: 2. Desejo veemente ou violento.
Tão violento que quero quebrar algo sempre que ela sai de
perto de mim.
Quero esmurrar algo só para liberar a tensão que ela faz
percorrer meu corpo. Quando ela está perto, me controlo mais do
que achei que fosse possível. O que é aquela bunda? E aqueles
seios empinados?
O que é aquela boca atrevida e carnuda, que eu cheguei tão
perto de provar? Ela é a porra de uma sereia que me seduz e tenta
me afogar em tudo que ela é.
Deve ter um beijo tão bom...
E aquele sorriso que ela sempre abre pra mim?
Estou decorando os sorrisos de Aurora.
Todos os sorrisos, porque simplesmente, não posso desviar os
olhos deles. Se eu foco em seus olhos, vejo um anjo lindo me
pedindo o mundo e minha maior vontade é de dar tudo o que ela
quiser.
Se eu olho para o busto, quero mamar naqueles seios que
caberiam perfeitamente na minha mão... e na minha boca.
Se eu desço os olhos, quero colocá-la de quatro na minha
mesa e a fazer de café da manhã. Quero fodê-la de todas as
maneiras possíveis, com as mãos, a boca, meu cacete.
Tudo em mim grita por ela.
Então estou focando sempre a minha atenção nos seus
sorrisos.
Decorei todos eles.
Quando ela sorri de lado, é porque vai falar algo que me fará
ficar duro.
Como nessa manhã. Estávamos os dois tomando café, como
fazemos todos os dias e que já virou nossa rotina, quando ela
perguntou, toda tímida se poderia sair em um happy hour com os
amigos do trabalho, para verem como ela é legal e não está tirando
vantagem por ser minha mulher. Nunca pensei que pediria
permissão, simplesmente achei que sairia, mas não. Aurora bate
ponto comigo. Se vai sair para comprar algo, me avisa, se vai sair
mais cedo do trabalho, passa na minha sala, se quer nadar na
piscina no edifício, diz que horas vai voltar. Se sai para projetar
algum interior, me convida para ir junto. Minha esposa me relata
absolutamente tudo.
Aurora não me deve satisfação, mas me deixa extremamente
satisfeito com essas atitudes suas. Para um homem que gosta de
estar no controle? Ela é perfeita.
Perfeita para mim, vê se pode?
Que pena...
Então, quando eu disse que deveria ir se fosse sua escolha e
ainda disponibilizei meu cartão para usar, o pedacinho de mau
caminho pulou de alegria e sorriu de lado. Me preparei
psicologicamente para o que sairia da sua boca bonita.
“Eu poderia ficar de joelhos, marido, e te mostrar o quanto eu
sou agradecida”
Tudo o que eu queria era abrir meu zíper e deixá-la me
mostrar o quão obediente era.
Eu já conhecia o seu lado capeta. Aquele sorriso dela, é o
desse lado.
Estamos flertando muito nos últimos dias, não avançamos,
mas tudo nela me chama a atenção, tudo nela me atrai.
Estamos a ponto de explodir.
Quando sorri de lábios fechados, é porque eu fiz algo que
gostou, então repito.
Como quando fica exultante quando a levo para vender ou
apresentar alguma casa comigo. Aurora ama me acompanhar e ficar
me admirando em silêncio. Ela não sabe que eu faço o mesmo
quando se distrai com algo.
É difícil não fazer. Mesmo com minha mente repetindo que é
uma farsa, meus olhos ainda insistem em me mostrar que ela é a
mulher mais linda que eu já vi na vida.
Quando sorri aquele sorriso de dentes à mostra, significa que
está feliz com algo, porque seus olhos se fecham um pouquinho e
brilham.
Semana passada, explodiu a fofoca de que Aurora e eu
estávamos casados. Saiu na Forbes, no The New York Times, e em
vários jornais e revistas menores. Eu sabia que iam cair em cima
dela, mas a garota ergueu a cabeça, e quando a primeira pessoa a
julgou, ela o olhou de cima a baixo e disse: “Se você fosse tão bom
quanto falam, não precisariam contratar outra designer e muito
menos, a favorecerem só por foder com o chefe.”
Não estávamos fodendo, tudo porque eu sabia de algo que ela
não sabia ainda.
Se eu cedesse... não conseguiria parar.
E eu estava tão perto de entrar por aquela porta…
A minha já estava escancarada.
Ela precisou me convencer a não demitir aquele filho da puta
do Otávio por ter a desrespeitado na frente de todos. Só ia aumentar
os boatos.
Então, na reunião que fizemos com o pessoal do seu setor,
onde havia uns projetos para serem apresentados por todos, ela
mostrou para todo mundo o porquê precisávamos contratá-la.
Então abriu um sorriso enorme e seus olhos brilharam, quando
falei que fiz bem em me casar com a melhor aluna de design da
LSU, e que todas as honras que ganhou foram merecidas. Se isso
não fosse o bastante, Léo — sim, o meu Léo — ainda disse que
tínhamos tido a sorte de conseguir um talento tão raro, quando
tantas empresas haviam a convidado para se juntar a elas.
Ele não mentiu, as vagas só foram preenchidas quando ela
recusou todas e acabou aceitando a errada.
Então tem o sorriso com a língua entre os dentes, que é
quando fala algo comigo e respondo com algo que a deixa
pensativa.
Tem outros sorrisos, todos dados de maneiras diferentes. O
malicioso, o dengoso, o de menina, o de mulher. Tem o que ela dá
quando acha algo engraçado, mas não quer demonstrar, tem o que
diz: “Estou sorrindo, mas quero te matar.”
Vários e vários.
Eu decorei todos eles. Todos os que ela já abriu para mim.
Isso me ocupa, ocupa minha mente e tira a vontade que eu
tenho de fazer tudo o que há de errado com ela.
Mas pensando nela...
A água está gelada, mas nem mesmo o gelo impede os
pensamentos que rondam minha mente e o sangue quente correndo
em minhas veias. Queria me sentir culpado para não fazer. Mas,
infelizmente, esse sentimento só chega quando eu gozo.
Porque não há um dia em que eu não tenha batido uma para
Aurora.
Não há um dia em que eu não a tenha desejado e negado
esse desejo.
A primeira vez foi o estopim. Me senti sujo, não quis fazer algo
com ela tão perto. Lutei contra, passei uma semana sem cair na
tentação, mas foi só ela falar sobre seu parque de diversão que
deixei meu pau se divertir também.
Mesmo que minha cabeça me negue a levar as coisas com
Aurora para outro nível, meu corpo já cedeu ao que sente por ela.
Minha mente e meu corpo não precisam sofrer juntos.
Eu só não posso me apaixonar pela golpista. Isso eu me
recuso.
Mas bater uma...
Movimento minha mão por todo o meu comprimento em um
ritmo lento. Duro. Aurora saiu para a confraternização com um
vestidinho preto, moldando todas as suas curvas que me deixaram
completamente hipnotizado.
Saber o que ela tem por baixo dele… porra!
Com o polegar, pego a gota lubrificante que escorre de mim e
melo a cabeça do meu pau, imaginando tirar com os dentes aquela
calcinha de dentro do seu rabo, e descer com a língua até sua
boceta.
Será que é gorda? Magra? Rosinha como seus lábios? Será
que ficaria inchada se eu arrastasse minha barba por ela?
Aperto meu cacete com força com a imagem mental e solto um
grunhido.
Porra... Aurora.
Poderia estar metendo gostoso, mas a infeliz é a única mulher
que eu quero. E faz meses que não sei o que é foder alguém.
Começo uma masturbação mais forte, do mesmo modo que
me imagino fodendo a sua boceta.
Forte, intenso, duro.
Ela gritaria? É do tipo calada? Chamaria meu nome quando
gozasse?
Chamaria sim. Faria questão de deixar claro que só gozaria se
fosse gritando o meu nome. Será que gosta de tapas? Gosta, ela
não me provocaria com menções a tapas e enforcadas, se não
gostasse disso.
Ela já disse, em todos esses dias juntos, como gosta de ser
fodida.
Como quer ser fodida.
Acelero o movimento, mordendo o lábio e descansando a
cabeça na parede.
Aurora vem preparando o terreno.
Solto uma risada, incrédulo. Puto.
Tô puto com Aurora.
Tô puto porque só em pensar em todas essas coisas que eu
poderia fazer com ela e todas as coisas que ela quer que eu faça,
eu gozo com seu nome na minha boca.
Gostoso.
Gozo tão gostoso com o nome dela na minha boca.
Tão forte que preciso apoiar os braços na parede do box. Será
que se ela estivesse aqui comigo, seria assim? Tão intenso que me
deixaria letárgico?
Tão bom que deixaria minhas pernas sem forças? As dela
ficariam. Ela nem conseguiria andar direito se eu a pegasse do jeito
que ela tá merecendo.
Nego com a cabeça e termino o meu banho.
Filha da puta.
Aurora é muito filha da puta por me fazer gozar sem ser
metendo nela.

O telefone tocando, tira meu foco dos projetos que tenho


arquitetado em parceria com Léo. Não tenho me dedicado muito a
eles, a administração toma muito do meu tempo com papeladas e
ser corretor tira o pouco de tempo que me sobra. Mas vez ou outra,
Léo me chama para fazer alguns projetos com ele, que tem o selo
dos irmãos Ramsey.
Eu gosto, é algo que amo fazer, não estudei arquitetura à toa.
Pego o telefone e atendo assim que vejo o nome da garota à
qual dediquei meu precioso orgasmo hoje.
E ontem...
— Aurora.
— Ei, marido! — afasto o celular da orelha com seu grito.
— Que barulheira, Aurora, onde você está?
— Não faço — soluça — ideia, mas sabia q... que todos me
amam? Todos me amam, Nick, só que eu pre...ick — outro soluço
que me faz trincar os dentes — precisei beber um pouquinho, e
tenho medo de entrar em um Uber sozinha, pode vir me buscar? —
Pego a minha carteira que estava ao lado do celular e me levanto, já
irritado.
Mesmo sentindo algo quando meu chama de Nick.
— Pode passar o celular para alguém que saiba onde você
está? — solto um suspiro.
Só em pensar que ela está completamente bêbada, com
aquele vestido sensual e rodeada de desconhecidos...
Porra, Aurora!
Que menina mais irresponsável!
— Alô — a voz daquele loiro oxigenado e idiota, fala, o timbre
demostrando que está tão bêbado quanto Aurora e fecho a porta do
meu apartamento com força.
Por que ela foi dar o celular para esse idiota que faz ela corar,
cacete?
Ela cora pra ele, e ELA NÃO CORA PRA NINGUÉM, PORQUE
AURORA É SEM-VERGONHA!
— Qual o bar que vocês estão? — no começo, ainda saía para
beber com todos, gostávamos de ir a um lugar diferente todas as
sextas, mas depois de todos esses anos no comando da R&C? É
difícil até ter tempo de descanso.
Léo nem para sair com eles, aquele filha da puta. Vive de festa
e não acompanha a cunhada em uma!
Eu nem convidado fui, e não quis aparecer com ela, porque a
bonita queria mostrar como era legal, independente de mim. Um
caralho!
O filho da puta me diz o endereço, embolando mais do que
fala, mas no final, consigo entender e já entro no meu carro, com o
endereço no GPS.
— Você vem, não vem? — sua voz é risonha, mas tem um
toque de hesitação.
— Chego em dez minutos — só vou precisar avançar alguns
sinais, mas dinheiro para pagar as multas é o que não falta.
Agora paciência...

A primeira pessoa que eu vejo quando entro no bar, é ela. Em


pé, cabelos cacheados altos e bagunçados e um sorriso enorme,
enquanto conta algo que faz todo mundo rir.
Ela tropeça nos próprios pés, ao fazer isso.
Nunca duvidei que Aurora seria amada pelas pessoas da
minha empresa. Com eles, a trapaceira é gentil, engraçada e
adorável. É comigo que gosta de implicar, é a mim que gosta de
irritar ao ponto de eu precisar sair da minha casa às duas da
madrugada — sim, eu estava acordado esperando essa golpista
festeira — para buscá-la bêbada.
Me aproximo, sendo automaticamente o foco da sua atenção e
descubro mais um sorriso de Aurora.
O bêbado.
Mal tenho tempo de raciocinar antes de sentir suas pernas
rodeando minha cintura e seus braços finos, ao redor do meu
pescoço. Também não raciocino direito quando minhas mãos vão
parar na minha tentação em forma de coração invertido, que é a sua
bunda nua, porque o vestido sobe.
Foi para apoio.
Foi sem pensar.
Não me julgue.
— Desculpa te ligar, mas ficaria mal eu ligar para outra pessoa
na frente deles — ela aponta para trás, com o rosto enfiado no meu
pescoço.
Ela cabe lindamente em meus braços.
Que pena...
Puxo seu vestido para cobri-la dos olhos de quem ela não
pertence, e foco minha sobrancelha erguida no idiota loiro que
estava babando na visão perfeita que deve estar tendo.
Eu falei que era um filho da puta, não falei?
Que vontade de bater...
— Para que outra pessoa você ligaria, Aurora? — pergunto
com o cenho franzido. Algo se mexendo em meu peito. Deve ser o
sentimento de raiva.
Raiva por ela pensar que poderia ligar para outra pessoa.
Raiva por ela estar tão provocante nesse vestido.
Raiva por ela ficar bêbada novamente no meio de
desconhecidos.
E raiva porque ela está chamando a atenção de todos os
homens nesse lugar.
Ela tem dono, caralho!
Pela lei.
Pela lei ela tem dono!
Foda-se essa porra!
— Para o Matt, é claro. Matt é bonzinho, ele sabe como ser
amigo de uma mulher — sabe tanto, que a melhor amiga faz dele de
gato e sapato e ele nunca pensou em foder ela.
Só todo dia.
Bonzinho o cacete, se não fosse minha mulher, mesmo que
falsa, ele já teria tentado levar para a cama dele.
Quem vê, pensa que Léo é vagabundo e mulherengo, mas só
quem conhece, sabe que Matt é mil vezes pior. Só come quieto.
— É bom não ter ligado — retruco, acenando para as pessoas
que trabalham para mim, que estão sorrindo bêbadas, mas ainda
hesitantes. — Tô levando minha esposa pra casa, acho que ela
passou um pouquinho do ponto — aviso, querendo não gritar por
terem deixado minha mulher bêbada.
Todos assentem e o loiro idiota se aproxima.
— Se ela precisar de alguma coisa, pode me ligar, ela tem meu
número — ergo novamente a sobrancelha com incredulidade e
Aurora ergue a cabeça, sorrindo e corando.
— Não tem mais — devolvo irritado e Aurora me olha com os
olhinhos brilhando.
— Não tenho?
— Não, não tem — respondo, mas me acalmo quando vejo
seus malditos olhos doces.
— Não tenho, então — responde com a voz embolada e se
vira para o loiro. — Não tenho seu número.
As pessoas que estão na mesa riem, e o loiro sorri sem graça,
mas não ligo para o que isso pode ou não parecer.
Não é nada. É só um homem que preza pela própria esposa.
Na frente dos outros eu posso fingir que ela é minha de verdade e
que não quero matar o rapaz por ainda estar comendo com os olhos
a Aurora.
Me despeço com um aceno e Aurora fala vários “tchau”, “até
segunda”, “vocês são demais”. Ainda com ela em meu colo, agora
muito mais à vontade, já que cheira meu pescoço e me aperta com
as pernas, saio do bar e caminho até meu carro.
— Se embebedou sem ninguém de confiança por perto, Aurora
— repreendo, mesmo tentando me controlar.
— Não vamos brigar, não faz bem para o bebê — estaco no
local e a encaro com os olhos arregalados.
— Que bebê? — sussurro e ela sorri.
— Eu — mas é muita cara de pau mesmo.
Nego com a cabeça, enquanto a garota que eu roubei do
jardim de infância ri contra meu pescoço.
Não demora para que eu a coloque no banco do passageiro,
passe o cinto e saia com o carro, não demora pra ela abrir a boca e
começar a falar besteiras que já estou acostumado a escutar.
Não demora para que ela pegue no sono, com a boca aberta e
babe no meu banco de couro. O tempo passa tão rápido que
quando vejo, já estou com ela no colo de novo, entrando no seu
quarto e a depositando em sua cama.
Faço ela engolir alguns comprimidos para ressaca, mas tenho
medo de dar algo muito forte para dor de cabeça, então me contento
com as de enjoo, ligo o ar-condicionado e tiro seus saltos, um a um,
depois penso se a acordo para tomar banho ou não. Ou se a ajudo
a trocar esse vestido por um pijama. No fim, decido só a deixar
dormindo, com o mesmo vestido e no outro dia ver como ela está.
Não demora para que eu saia do quarto dela.
Não demora para que eu esteja deitado na minha cama.
E não demora para minha mente se encher de coisas sobre
ela.
Por que só penso nela?
Por que quero cuidar dela?
O que eu estou fazendo?
Eu acho que ninguém nunca me
fez sentir assim tão nas nuvens.
Te desejo, querido, garoto, é você
que eu desejo.
Seu amor, seu amor, meu amor.
(West Coast - Lana Del Rey)

Que vontade de morrer.


Sério!
Nunca pensei que sentiria essa vontade algum dia, uma vez
que amo demais a minha vida, mas de novo... que vontade de
morrer.
Abro os olhos, segurando a cabeça com ambas as mãos.
Parece que alguém pegou um martelo, virou o pequeno
polegar e entrou pelos meus ouvidos para ficar martelando meu
cérebro e adivinha? Nem lembro o que fiz para esse pobre coitado
estar me castigando tão cruelmente.
Abro os olhos e me situo.
Não demora para que as imagens da noite anterior voltem a
minha mente. Happy hour. Bebidas – apenas de um tipo, para não
esquecer tudo novamente – e muita festa. Ligação para Nicolas, ele
indo me pegar, me trazendo pra casa e me colocando na cama...
Nicolas me colocando na cama.
Ah, não!
Sério que eu liguei para ele? Sei que liguei por medo de vir
sozinha no Uber, viu, até tenho um pouco de senso.
Mas será que ele está estressado comigo? Não quero nem me
levantar dessa cama hoje. Um cloro me parece um belo suco para a
minha primeira refeição do dia.
Me obrigo a me levantar, andar até o banheiro e me jogar
debaixo do chuveiro depois de tirar esse vestido apertadinho. Foi
uma ótima noite.
Só não consegui fazer amizade com meu chefe Otávio, que
me odeia ainda mais, depois que dei uma dura nele. Ele não teve
mais o que fazer e veio me dizer que eu estava me beneficiando do
meu casamento para subir na vida. Tive que segurar Nicolas para
não o demitir, mas minhas palavras o deixaram irritado para cacete
comigo.
De resto, consegui mudar a imagem que tinham de mim
durante essa semana e ainda mostrei que sou uma ótima pessoa
fora do trabalho.
Foi bom.
Foi bom tirar um dia para mim, quando passei dias orbitando
ao redor de Nicolas.
Termino de tomar banho e escovar os dentes e saio para
procurar o que vestir. Opto por uma calça de moletom frouxa e uma
blusa branca curta. Me recuso a colocar um sutiã.
Outra coisa que foi boa, foi sentir o olhar de desejo de vários
homens.
Saber que eles estavam ali e estavam me querendo, trouxe de
volta a sensação de me sentir a pessoa mais linda do mundo.
Eles estavam ali, disponíveis para mim, e prontos para
investirem. Se eu tivesse aberto a porta, eles teriam entrado com
tudo. Mas não podia.
E além de não poder, eu... não quis.
Sei que já faz mais de dois meses que eu e Nicolas estamos
casados, sei que talvez ele esteja vendo outras mulheres, ou que
tenha visto enquanto eu ainda estava em Louisiana.
Sei que não tenho direito nenhum de opinar no que faz ou não
da vida.
Mas nada disso me faz querer ficar com outra pessoa.
Porque é com Nicolas que eu estou casada.
Só foi legal saber que quando essa farsa terminar, terei opções
para seguir em frente. Ver que existem pessoas além do Nicolas ao
meu redor, pessoas realmente disponíveis para mim.
Além disso, entendi por que ele sofreu tanto com a perda da
ex. Me mostraram uma foto dela. É a mulher mais linda que eu já vi.
Parece a Barbie.
Desço para o primeiro andar, sabendo o que vou encontrar e
sinto o cheiro de comida boa.
Amo a comida do Nicolas e fico surpresa por não sentir
vontade de vomitar. Sempre acontece por conta da ressaca.
— Bom dia, coisa rica — cumprimento vendo de canto de olho,
ele no sofá da sala, indo em direção aos armários, onde estão
guardadas as benditas aspirinas.
— É uma hora da tarde, irresponsável — reviro os olhos, e
tomo meu remédio com um copo grande de água, já sabendo que
vou tomar esporro uma hora dessa.
Viro na direção da sala, mas tomo um susto quando bato em
um peitoral largo e musculoso. Cheiroso também, bem cheiroso.
— Credo, Anabelle, vai matar outro do coração. — Seus olhos
se reviram em desdém, enquanto tento acalmar minhas batidas
aceleradas com a mão, onde uma parte é pelo susto e a que sobra,
bem, a que sobra é por ele.
Gostoso.
Puta homem gostoso, viu?
Como eu olho ao redor com essa visão na minha frente?
Foco, Aurora!
— Foi aspirina que tomou? — pergunta me olhando
intensamente.
Sua barba está aparada, isso explica o cheiro de loção pós-
barba, misturado com seu perfume amadeirado. Sua bermuda
esportiva é preta e prestando atenção, seu peitoral nu é cheio de
pintinhas também. Como as pequenas e quase invisíveis sardas que
se escondem em suas bochechas.
Tão lindo.
— Diz a embalagem — respondo, me escorando na bancada e
cruzando os braços.
Sua sobrancelha se ergue.
— Você me ligou duas horas da manhã completamente
bêbada, Aurora — sabia que ia falar isso.
Vai, coroa, come meu rabo aí.
— Não era para ter ligado? — faço minha maior cara de
magoada e ainda faço um biquinho para acompanhar. Seu olhar
foca em meus lábios, mas logo desvia e os fecha, passando a mão
no rosto.
— É claro que é para ligar para mim, mas bêbada, Aurora?
Você baixou sua guarda com pessoas que nem conhece, tinha
vários caras naquele bar só esperando uma chance de te pegar em
um lugar escuro, e outros que estavam querendo te pegar no meio
de todo mundo e você estava tropeçando nos próprios pés, não
tinha nem como se defender! — Arregalo os olhos.
— Era com as pessoas da sua empresa! — me defendo, sem
ter uma defesa boa.
Seu olho treme.
— E desde quando eles são o ideal de segurança? Eu os
conheço como funcionários, não sei nada sobre suas vidas
pessoais, eles estavam tão bêbados quanto você, como te
defenderiam? Será que notariam se você sumisse? Não notariam
porque estavam todos embriagados, caralho! — faço uma careta,
sabendo que está certo. — Você nem mesmo tem idade pra beber!
— Para de me tratar como criança!
— Não estou te tratando como criança, porra, se quer tanto
ficar no meu país, deve saber que isso é um fato!
— Já sou até casada, beber é o menor dos meus problemas —
fecho a boca quando seu semblante fechado, fica ainda mais
fechado.
— É perigoso para uma mulher sair desacompanhada, Aurora,
você quer sair? Saia, mas não tire sua capacidade de pensar
coerentemente, não baixe sua guarda para quem você não
conhece, só se cuida, porra, não é mais uma adolescente pra ser
irresponsável desse jeito! — Comeu meu rabo gostoso, viu?
Abaixo a cabeça, olhando para os meus pés, enquanto cutuco
o interior das minhas bochechas com a língua.
Queria chorar.
Não porque ele está me dando esporro, mas porque sei que
sou impulsiva, sei que na última vez que fui irresponsável, coloquei
minha vida em perigo e acordei casada com um desconhecido. Não
corri nenhum perigo com eles, mas eu não sabia disso e poderia ser
outras pessoas.
Pessoas com más intenções. Pessoas que poderiam querer
me fazer mal.
— Desculpa — sussurro e sinto seu dedo em meu queixo,
erguendo meu rosto para encarar o seu.
Ele me avalia, olhando entre um olho e outro e depois suspira.
— Está arrependida de ter se colocado em perigo, ou só está
falando para que eu me sinta melhor? — dou um meio-sorriso, por
lembrar do que falei quando pisei aqui pela primeira vez.
— Realmente estou me sentindo péssima por beber demais e
me deixar vulnerável com desconhecidos.
— Não precisa se desculpar comigo, é com você mesma que
precisa. Se quiser se embebedar, certifique-se que tem alguém de
confiança por perto para cuidar de você, ok?
Dou de ombros e continuo olhando.
— Só para deixar claro, me arrependo só de ter bebido
demais, o happy hour estava realmente bom. Foi importante para
mim me apresentar como uma pessoa comum e não a esposa do
chefe para eles. — Nicolas assente, me entendendo.
— É bom essa confraternização, as pessoas se aproximam
mais, deve ser por isso que não conheço quase ninguém, faz muito
tempo desde que saí para um. Já até mudaram os funcionários.
Assinto e respiro fundo.
Só agora noto a posição em que estamos.
Nicolas me prendeu entre a bancada e seu corpo.
Ergo uma sobrancelha e abro um sorriso de lado.
— Se me colocar em cima da bancada, a posição melhora. —
Provoco.
Só que a coisa mais impressionante acontece.
Suas mãos se encaixam em minha cintura e como se eu não
pesasse mais que uma pena, me coloca em cima da bancada e
minhas pernas automaticamente se abrem para ele se encaixar no
meio delas.
Meu coração acelera em meu peito.
O lado útil do coração, aquele que pode me causar um infarto,
não aquele lado que eu estou escondendo a sete chaves.
Aquele lado que sente...
— Você gosta de me provocar demais, Aurora — minha
respiração se torna ofegante. Tão ofegante que preciso apoiar
minhas mãos em seu pescoço para me segurar e não cair para trás
desmaiada.
Tudo bem, você faria isso também.
Não me julgue.
— Eu gosto de investir, é diferente — sussurro de volta,
observando seus olhos escurecendo à medida que umedeço meus
lábios.
É automático, foi sem malícia, só desejo mesmo.
— Não, você gosta de me provocar. Desde o primeiro
momento, quando acordamos naquele quarto, que você vem
fazendo isso, o que quer de mim, Aurora? — a intensidade com a
qual fala, em um timbre rouco e potente, molha minha calcinha.
Por que eu sou tão fraca com esse homem?
Por que minha boceta me humilha tanto?
— Você, eu quero você.
— O que quer de mim, de verdade?
— Somos casados.
— Eu sei, você sabe, todos sabem.
— Quero ter meu marido — sussurro, com a boca perto da
sua. E daí que ele estava me dando esporro? Se eu soubesse que
era essa tensão que viria depois, teria aprontado antes.
— Não vai me ter como marido — responde e meu sorriso fica
ainda maior.
Meu peito fica menor.
Eu sei, Nicolas, eu sei que você não será meu marido. Não de
verdade.
— Quero a outra parte do casamento — dou de ombros,
tentando controlar minhas batidas aceleradas.
— Quer a melhor parte — sorri, tombando a cabeça para o
lado.
Nós temos ideias diferentes do que é a melhor parte, mas não
vou te corrigir, Nick.
— Quero a parte carnal.
— Quer apenas a foda e não o sentimento?
— Te garanto que vou sentir muitas coisas quando estiver no
seu quarto.
— Se...
— Quando — o interrompo, e ele morde o lábio, balançando a
cabeça.
Seus olhos esquadrinham meu rosto, o verde tão intenso que
me tira o restinho de fôlego que ainda tenho e tudo o que quero, é
grudar nesse homem e não largar mais.
Sou tão dada pra ele.
— Quando estávamos em Vegas, você me roubou um beijo —
sussurra.
Sorrio.
— Roubei.
— Eu quero de volta.
Não tenho tempo de responder, porque no momento seguinte,
sua boca ataca a minha.
Nicolas está me beijando.
Nicolas está me beijando!
Então tudo silencia.
Meus pensamentos fogem e tudo o que consigo sentir é sua
presença intensa, meu corpo alerta em cada lugar que toca o seu.
Várias ondas de eletricidade passando por nós, me deixando
arrepiada e minha coluna arqueia em sua direção.
Nicolas agarra com força o meu cabelo da nuca com uma mão,
enquanto me puxa pela bunda para mais perto de si com a outra e
então me beija com fome, sua língua invadindo minha boca no
primeiro sinal de que eu iria abrir os lábios.
E tudo se transforma em poeira.
É intenso, é íntimo, é nosso.
É doce, é lento, é sensual.
Circulo minhas pernas em seu quadril, puxando seu corpo
ainda mais, enquanto movimento meus lábios nos seus no melhor
beijo que já dei em toda a minha vida.
O melhor beijo.
Me rendo completamente em seus braços, me esquecendo
completamente da dor de cabeça.
O que é ressaca? Nunca vi na vida.
Minha língua encontra a sua em movimentos exploratórios, seu
gosto explodindo na minha boca e se transformando no meu
favorito. Tem gosto de perfeição. Sugo seu lábio, quando ele move
minha cabeça na posição que deseja para aumentar a intensidade.
Arranho suas costas, quando morde meu lábio e o suga. Gemo e
escuto seu grunhido. Porra, que beijo bom.
É como se finalmente conseguisse respirar, depois de meses
prendendo o fôlego. É tudo o que sonhei e é mais.
É como se tudo se encaixasse.
Nós nos encaixamos.
Que pena.
Sua boca larga a minha e desce em beijos lentos pelo meu
maxilar, indo até meu pescoço e deixando uma lambida que sinto na
minha boceta. Minha barriga gela e dessa vez o gemido é mais
sôfrego, porque começo a me esfregar no monumento que ele tem
entre as pernas.
Um monumento que está pronto pra mim.
Caralho… sinto minha boceta pulsar e escorrer, pronta para
ele também.
Ele grunhe e volta a atacar minha boca.
Dessa vez é violento, faminto, gostoso.
Dessa vez sua mão puxa minha bunda e me movimenta contra
ele.
Dessa vez meu coração falta sair pela boca, tamanho o desejo
que toma conta de mim.
Movimentos fortes de vai e vem. Ele me esfrega contra si
como um animal no cio. Nossas respirações falham, mesmo assim,
continuo com os lábios nos seus, chupo sua língua e ele aperta a
mão em meus cabelos. Mordo seu lábio inferior e ele me pressiona,
ao ponto de sentir uma dor gostosa.
Arranho suas costas e...
A campainha toca.
O susto é tão grande que pulo no lugar e Nicolas dá um passo
para trás, olhando ao redor assustado.
Respiro fundo e o encaro.
Estávamos tão focados em nós, que o barulho quase nos
matou do coração, que já estava acelerado.
Sorrio de lado, sentindo minhas bochechas quentes e quando
Nicolas volta a me encarar, seus olhos brilham.
— Te deixei vermelha — sussurra encantado, entre a
respiração ofegante.
— E molhada — suas mãos seguram o meu rosto e ele me
beija novamente, um gemido saindo de encontro a minha boca.
Antes que eu consiga aprofundar o beijo, a campainha toca de
novo.
— Caralho, mas quem é o filho da puta? — ele rosna, se
afastando de mim. — Vou ver quem é, ok? — prendo o riso.
Nicolas me pedindo permissão? É uma piada.
— Respira fundo e tenta abaixar essa barraca aí — desço os
olhos até seu pau. Porra...
Está quase furando a bermuda de tão duro.
Ouço seu suspiro e o vejo andando de costas, negando com a
cabeça.
— É melhor você ir — pulo da bancada, agora rindo e assinto
em resposta, mordendo o lábio quando vejo sua mão ajeitar seu
membro dentro da cueca.
— Ok — respondo, andando em direção à porta, feliz da vida
por tudo o que aconteceu nessa manhã e tudo o que pode
acontecer, agora que isso começou.
Mas meu semblante se fecha assim que abro a porta e vejo
quem está do outro lado.
Quem não deveria estar aqui.
Quem não deveria ter permissão de subir.
E quem não deveria ser tão linda.
Riley.
A ex do meu marido.
Quando eu olho nos seus olhos.
Eu posso ver um amor reprimido.
Mas, querida, quando eu te
abraço.
Você não sabe que eu sinto o
mesmo?
(November Rain - Guns N’
Roses)
— Boa tarde — franzo o cenho quando ouço o timbre hesitante
de Aurora.
— Boa tarde, Nicolas está? — entendo o porquê logo que
escuto a voz da minha ex.
Merda.
Olho para baixo, tentando respirar fundo e sinto o sangue
voltar a bombear corretamente pelo meu corpo.
Porra.
Porra!
Simplesmente acabei de dar o melhor beijo da minha vida e
matar o desejo que me consome desde que a vi pela primeira vez e
Riley tinha que aparecer justo agora?
Mas você só tem estragado meu humor ultimamente hein,
Riley? E que porra ela está fazendo aqui?
Não a convidei, nem mesmo atendo as suas ligações, será que
ela não entendeu que eu não quero contato? Que ela me magoou?
Saio rumo à sala, quando retomo o controle do meu corpo,
para encontrar uma Aurora mordendo os lábios vermelhos dos meus
beijos e uma Riley a analisando com curiosidade.
— Estou — respondo por Aurora, me aproximando e ficando
atrás da minha esposa. — Boa tarde, Riley, o que faz aqui? — além
de empatar minha foda?
Seus olhos encontram os meus e tudo o que vejo neles é
acusação.
Tanta acusação e mágoa que me sinto estático por alguns
segundos.
Você não tem esse direito, Riley. Não tem o direito de ficar
magoada comigo.
— Queria conversar com você, não tem atendido as minhas
ligações — não tenho mesmo.
Não tenho porque você está noiva.
Não tenho porque eu estou casado.
Não tenho porque não senti vontade de falar com você e isso...
isso é surpreendente.
Riley aparecer na minha porta, em um terno rosa e elegante, é
surpreendente.
— Não temos assuntos em aberto, para conversar — devolvo
com indiferença forçada. Olho para Aurora e seus lábios sorriem pra
mim. Aquele sorriso que diz: Eu vou matar você. Gelo por dentro. —
Desculpa, não te apresentei a ela — aponto com o queixo para
minha ex. — Aurora, essa é a Riley.
Aurora sorri e oferece a mão, como a boa cara de pau que é.
— Muito prazer, Riley, Nicolas já me falou sobre você — fui
interrogado, é diferente. — Sou Aurora, esposa dele.
Ela sabe.
Riley sabe, por isso tanta acusação nos seus olhos.
Porque minha foto e de Aurora foi estampada em vários jornais
e o nome da socialite também foi mencionado.
— Muito prazer — sorri pra minha esposa.
Quero morrer.
Quero morrer porque um dia pensei que poderia mostrar a
Riley que estava com outra pessoa, só para ela ver que a superei,
mas não sinto como se estivesse de igual a igual com ela. Não
porque vejo seus olhos machucados.
Mas porque ela está na minha porta.
E porque ela é minha ex.
E porque Aurora está desconfortável.
Aurora, que nunca fica com vergonha ou sem graça na frente
de ninguém, além daquele loiro idiota, está desconfortável. E eu não
gosto disso.
Acabei de beijá-la, porra.
— Eu vou almoçar, você fez comida, né? — olho para ela e
assinto, perdido. Ela sorri com os lábios inchados.
O melhor beijo, simplesmente o melhor beijo é o que eu lembro
quando olho para seus lábios.
Além da dor que sinto das suas unhas em minhas costas.
— Entra, Riley, vocês podem conversar no escritório, não vou
atrapalhar vocês — fala, sendo cordial com ela, e sei que é a reação
normal, porque ela não é minha esposa de verdade, mas meu
coração se aquece um pouco com sua atitude.
De confiar em mim.
Ao mesmo tempo que um lado meu pensa que ela está sendo
indiferente.
Perdido, porra.
Me sinto perdido.
— Não precisa, vamos conversar aqui fora, ok? — Falo para
Riley, só porque sei que ela quer conversar, mas não quero que ela
entre na minha casa, não quando a atmosfera do nosso primeiro
beijo ainda está presente.
Não quando é uma falta de respeito do caralho trazer a ex pra
minha casa, quando minha esposa está aqui.
Falsa.
Esposa falsa.
Essa foi por pouco.
Riley concorda me entendendo.
Ela sabe que eu respeito a mulher que está comigo. Mesmo
que não saiba que o casamento é uma fachada.
Aurora concorda também e se vira, saltitando rumo à cozinha,
cantarolando uma música da Lana Del Rey.
Saio do apartamento e fecho a porta atrás de mim, ficando
frente a frente com a mulher que até algumas semanas atrás, queria
que voltasse comigo, mas que agora...
Olhando pra Riley, tudo o que eu vejo é o meu passado.
Ela me trocou em menos de dois meses, eu ainda estava louco
por ela e ela me trocou. Depois de ter me descartado como se fosse
a coisa mais normal do mundo, terminar com alguém por ser do
mesmo jeito que era, quando se apaixonou por ele.
Aurora estava certa. Riley foi uma vaca comigo.
— Você está casado — mal tenho tempo de abrir a boca,
quando sua acusação vem.
— E você, noiva — devolvo, me encostando na porta e
cruzando os braços.
Ela continua a mesma de meses atrás.
O mesmo cabelo loiro, cheio de ondas feitas com babyliss. Os
mesmos olhos azuis, que transmitiam malícia à noite e mesquinhez
de dia. Os mesmos lábios pequenos e cobertos por um gloss, que
eu beijei por três anos.
Foi bom.
Mas com Aurora...
— Casado, Nicolas, noiva é muito diferente de casado e
quantos anos aquela menina tem? — me irrito.
— O que veio fazer aqui? — ignoro sua pergunta.
Suas mãos se firmam em sua cintura, e ela desvia os olhos
para minha porta.
— Passamos três anos juntos e você nunca me pediu em
casamento, três, Nicolas. — Fala magoada. — E então, você me
disse que não estava namorando, mas foi só eu aceitar o pedido de
Mason que você se casou do nada? Você já estava com ela ou fez
isso para me punir?
Ergo a sobrancelha.
— Está se sentindo punida? — que piada.
Seus olhos me fitam.
— Fez de propósito para me magoar, porque sabia que eu
queria me casar e nunca me fez esse pedido. — Sério que ela
acredita que eu sou idiota a esse ponto?
— Não terminou comigo por não receber um pedido, Riley,
terminou por vários outros motivos, não finja que foi sobre
casamento.
— Não responde mais minhas mensagens, não atende minhas
ligações, e fiquei sabendo que estava casado por uma página de
jornal! — eu recebi o convite, viu só quem o vilão aqui? Não sou eu.
— Quando vocês se conheceram? — pergunta, com um tom
beirando a raiva.
— Não é da sua conta, Riley — a corto. — Mas foi depois que
você me deixou. Não estava mais com você e você já estava com
outro, não lhe devo satisfação nenhuma depois de ter recebido
aquele convite. — Solto uma risada amarga.
— Então foi mesmo para me punir? — mas não é possível!
Olho para a versão em carne e osso da Barbie e nego com a
cabeça.
Sempre soube que Riley era mimada, egoísta e um pouco
narcisista, mas nunca pensei que ela não teria respeito com o
próprio noivo assim.
Ao ponto de vir na minha casa, e praticamente assumir com
seu interrogatório, que não gostou de saber que eu segui em frente.
E é isso que me incomoda.
Com seus olhos, me diz que queria que eu estivesse aqui,
esperando por ela, correndo atrás.
Eu estava.
Era justamente o que estava fazendo.
Até não estar mais.
— Não, não foi para punir você, porque o mundo não gira ao
seu redor — embora você ache que sim.
— E por que me afastou? — me acusa, cruzando os braços.
— Porque você é de outro homem, assim como sou de outra
mulher — mentira, não sou de Aurora. Não realmente. — Não temos
mais nada um com o outro, você fez sua escolha, eu fiz a minha,
agora precisamos lidar com elas.
Ela fica com raiva.
Riley realmente pensa que eu estou punindo-a.
— Continuamos nos falando quando comecei a namorar
Mason, não entendi por que parou depois, foi por causa do meu
casamento ou do seu?
— Dos dois. — Primeiramente do seu.
— Você se casou mesmo com ela? — acredita que eu nem
lembro de ter feito isso?
— Sim.
— Ela tem cara de novinha. — De anjo. Aurora tem cara de
anjo.
— É porque ela é.
— Gostava de mulher da sua idade, ou mentiu pra mim? —
Seu semblante fica confuso.
— Gostava, Aurora é minha exceção. — Não quero continuar
magoando-a. —Riley, meu casamento não teve nada a ver com
você — culpe o Nicolas drogado. — Você deveria voltar para sua
casa, para o seu noivo. Não deveria ter vindo aqui, pedindo
satisfação como se merecesse uma. Não merece. Você me largou e
seguiu em frente. Eu tô fazendo o mesmo.
Mais mentiras.
São tão fáceis de falar.
Mais fácil ainda de acreditar.
— Você vai ao meu casamento? — Vou? Disse a Léo, a uma
vida atrás, que precisava ir. Porque seu pai é meu cliente. Porque
eu tive mais consideração por eles do que eles tiveram por mim.
Mas não é mais assim.
Não sinto mais como se devesse alguma coisa a ela, ao pai
dela. Não sinto mais vontade de voltar com ela, de esperar por ela.
Não estou mais apaixonado por Riley há meses.
Meu coração está fechado para ela e pra todo mundo.
— Não.
— Não vai mais me mandar mensagens, não é? — seus olhos
se enchem de lágrimas.
— Não. — Suspiro e fecho os olhos. É como Aurora disse, o
destino vai colocar algo novamente na minha vida, apenas para que
eu não erre de novo.
— Tudo bem. Espero que não se arrependa da sua escolha.
— Não vou.
— Ela é linda — elogia, mesmo sem querer.
Ela é, você parece a Barbie, Riley, mas ela é a mulher mais
linda que eu já vi.
— É sim — ela assente e se despede e fico olhando-a,
enquanto se enfia no elevador e some da minha vida.
Quase quatro anos. Foi o tempo em que dediquei a Riley na
minha vida. Estando com ela ou não. Tá na hora de deixar no
passado.
Volto para dentro, encontrando a dona do beijo mais gostoso
que já provei, sentada, almoçando e assistindo um filme com
Sandra Bullock como protagonista.
Ela ama essa atriz.
Me sento ao seu lado e observo seu rosto fechado e o bico do
tamanho do mundo.
— Por que esse bico? — quer morrer, Nicolas?
— Você é mesmo um trouxa, né? — devolve com amargura,
enfiando comida até o talo na boca. Seguro sua mão quando tenta
enfiar mais comida.
— Por que isso? — ergo a sobrancelha, sorrindo um pouco.
— Por que ela ainda tem permissão para subir? Apenas
pessoas autorizadas na portaria podem subir, você deveria ter
cortado o acesso dela.
— Não pode me exigir esse tipo de coisa — ela está puta. —
Mas para a sua informação, nem me lembrei de cortar seu acesso.
— Claro que não lembrou. — Bufa e me ignora, bebendo a
coca dela com raiva, tentando empurrar tudo o que está entalado na
garganta para a barriga.
Odeio quando Aurora faz isso. Come rápido e eu morro de
medo de que morra engasgada.
— Por que esse mau humor todo? Não te beijei o suficiente
para te deixar felizinha? — eu a beijei. Eu a beijei mesmo. Eu cedi à
tentação e o pior, é que eu não me arrependo. Só quero de novo.
— Ah, não fode, né, Nicolas. — Se levanta e sai. — Terminei
meu almoço, vou tomar banho e terminar uns projetos, se precisar
de algo, não me chame.
— Precisamos conversar — peço, seguindo-a em direção à
cozinha, onde joga o prato na pia.
Quase quebra, mas falo algo? Não falo.
— Você já conversou demais por hoje — retruca e foco meus
olhos na sua bunda bonita, quando se abaixa para pegar um
salgadinho na dispensa que fica na parte de baixo dos armários.
Eu não disse que parecia um dragão comendo? Haja espaço
nessa bunda pra aguentar tudo que ela coloca pra dentro.
— Não pode ficar com ciúmes, não a convidei, Aurora —
franzo o cenho, e cruzo os braços, a seguindo quando sobe para o
próprio quarto.
— Só você pode ficar com ciúmes? — rosna, se jogando em
cima da cama, e abrindo o saco de salgadinhos.
Ergo a sobrancelha.
— Quando eu fiquei com ciúmes? Não sou ciumento — me
defendo.
Quando eu fiz isso?
Seus olhos me encaram cheios de incredulidade.
— Hipocrisia combina mesmo com você — reviro os olhos e
sento ao seu lado na cama, tomando seu rosto em minhas mãos.
— Não pode ter ciúmes de mim, Aurora — olho em seus olhos,
e aviso. Mesmo que tenha me deixado satisfeito pra cacete que
estivesse com ciúmes.
Nós temos um prazo de validade.
E ele acaba em poucos meses.
— Pois não temos um relacionamento? — pergunta.
— Porque não temos um relacionamento. — Respondo. Ela
assente. — Disse que queria a foda, sem o sentimento.
— Não se preocupe, Nicolas, sentir um pouco de ciúmes não
significa que vou me apaixonar por você. Assim como você sentir de
mim, não significa que vai se apaixonar por mim. — Dá de ombros e
solto outro suspiro. Não tento negar de novo que senti ciúmes.
— Ok, então — resmungo, com um aperto estranho no peito.
— Ok, então — responde e me olha com seus olhos de sereia.
— Estamos bem?
— E quando foi que ficamos? — ergue uma sobrancelha e
sorrio um pouco.
E... simplesmente acabo selando meus lábios nos seus
novamente, em um beijo casto, gostoso e que ela termina rápido
demais.
— Vou trabalhar, Nicolas, quero fazer isso sozinha — assinto e
me levanto, deixando seu quarto meio perdido.
Sabendo que fui dispensado.
O que aconteceu?
O que está acontecendo com a gente?
Porra…
Eu adoro como você me toca.
Daquelas formas elaboradas.
Tenho a guarda liberada.
Para relaxar do dia.
É só você.
(I know what you want - Mariah
Carey feat. Busta Rhymes)
— Você precisa parar de ser rancoroso.
— Não preciso parar de ser nada, não sou obrigado.
— Quantos anos você tem?
— Trinta e sete.
— E não tem vergonha na cara de agir igual a um adolescente
de quinze, não?
— E você não tem vergonha de sair dando golpe nos outros,
não? — todo dia isso. Uma hora eles vão ter que superar.
— Não dei golpe, não quero dinheiro.
— E mesmo assim, está casada com um dos homens mais
ricos do país. — Ergo a sobrancelha.
Mais rico?
Desvio o olhar de Léo e do seu bico enorme e encaro Nick na
cozinha, de costas para mim.
Estava dentro do quarto desde que ele saiu de lá, depois de
me dar um beijo casto. Decidi descer quando escutei vozes no
andar de baixo e sabia que eram da sua turminha e vim tentar um
acordo de paz com Léo. Matt já me aceitou, não que morra de
amores por mim, às vezes o pego me olhando com o maior
julgamento do mundo, e não sei como ele não é um juiz ao invés de
advogado, mas o cu doce do loiro chato não quer nem ver a minha
cara pintada de ouro. O problema é dele, vai ter que ver e vai ter
que gostar de mim. O irmão eu até entendo, e mesmo assim,
Nicolas tem se esforçado muito para não ser um babaca completo
comigo e ainda me beijou. Nicolas me beijou.
Ainda estou puta da vida, pela visita de Riley. Eu entendo que
eles se falavam e entendo o porquê ele não ter revogado o seu
acesso.
Eu entendo, porra. Eu sou só a mulher que ele beijou hoje e
que daqui a alguns meses, vai sair da sua vida. Mas ainda estou
com raiva pelo sentimento de ciúmes que me percorreu.
Pela insegurança também. Mas como ele disse, não tenho
esse direito.
Então boto o meu maior sorriso no rosto e finjo que minha crise
nunca aconteceu.
— De quanto é seu patrimônio? — pergunto cheia de
curiosidade ao espécime perfeito e pau no cu do meu marido.
— Maior que o seu, com certeza — humilha mais.
Com uma careta, volto a olhar para Léo e para seu sorrisinho
de merda.
— Vai, o que eu preciso fazer para voltar a ser sua amiga? Eu
nem lembro de ter sido, mas é melhor do que receber essa sua cara
de cu todos os dias, já faz tempo que estou tentando, porra —
reclamo.
— Não é não, Léo é um porre, você não está perdendo nada
— Matt fala do seu lugar no sofá. A cerveja cobre o sorrisinho que
dá para a cara fechada do amigo e sorrio junto.
— Eu já pedi desculpas ao seu irmão, ele desculpou, você é o
único que fica de mimimi pra mim — continuo tentando.
— E meu pedido de desculpas, cadê? — ergue a sobrancelha,
levando a cerveja à boca. Queria uma, mas ainda estou sentindo os
efeitos da ressaca de ontem.
— Desculpa, coisa rica, por ter sido uma mocreia egoísta que
só pensou no próprio rabo ao amarrar seu irmão ao sagrado
matrimônio comigo. — Faço um beicinho, toda manhosa. Seus
olhos me analisam, a cerveja volta para a sua boca em um gole
grande e depois seu bico volta a se formar.
— Vou pensar no seu caso — bufo e cruzo os braços.
— Mas é rancoroso, viu? Você que está perdendo, sou um
amor de pessoa, poxa — resmungo, magoada.
— Os apartamentos que você projeta o interior estão
vendendo superbem, Aurora. — Matteo muda de assunto,
dedicando a Leonardo um olhar feio que o loiro ignora com
maestria.
Eu sabia que estavam.
Sabia que meu trabalho estava sendo bem reconhecido,
principalmente depois que descobriram que sou casada com
Nicolas. Fez um favor danado para mim, que estava liderando as
vendas.
As pessoas não querem apenas um exterior bonito, não é fora
que eles irão ficar, e olhar todos os dias para um interior feio é de
cair o cu da bunda. Estudei, me formei com louvor, tenho
experiência, sou uma ótima designer de interiores e sabia que
quando pudesse mostrar o meu trabalho, ninguém questionaria. E
isso estava acontecendo. Mesmo sendo a mais nova da equipe, já
provei meu talento e não por ser esposa de um cara que não quer
ser meu marido, que por um acaso é o chefe deles, mas porque eu
sou demais.
Euzinha.
— Tá surpreso? Porque eu não tô — dou de ombros e Léo
bufa. — Que foi, hein?
— Muito convencida, você. — Responde, e Nicolas me olha da
bancada como se dissesse: Cadê? Não ia conquistar o afeto do
meu irmão?
Pau no cu dele.
Desvio o olhar, beijo nenhum me faz tirar da cabeça que ela
veio aqui.
Nunca disse que era madura.
— Realista, seja sincero, até você concorda, é da sua empresa
que estamos falando, assume que vocês tiraram a sorte grande
comigo, hum? — mexo os ombros e pisco os olhos.
— Azar, Aurora, foi azar — ponho a mão no coração, enquanto
Matt e Nicolas riem.
— Você não tem coração, não?
— Se eu não tivesse, teria te matado na primeira
oportunidade..
— Chega, vocês dois — a voz grossa de Nicolas nos
interrompe e seu irmão faz uma careta. Mimadinho. Se ele não me
amar, vou fazê-lo me odiar, com toda a certeza. — O jantar está
pronto, podem comer e parar de agirem como duas crianças? —
Ergo a sobrancelha. — A Aurora eu até entendo, mas você já é
adulto, Léo — o infeliz gargalha e minha boca cai aberta.
Cerro os olhos para o sorriso de merda que Nicolas dá, e não
sei se fico com raiva ou encantada pelo jeito sexy que sua boca se
move.
Não me julgue, poxa, faz tempo que eu não fodo.
A última vez que sentei gostoso foi na faculdade, um calouro,
Pietro Mancini. Me arrependi de muitas coisas na minha vida, mas
passar uma noite com aquele homem não foi uma delas. Italiano,
vinte e dois anos, cavalheiro e com um pau de vinte e um
centímetros. A cereja do bolo? Tinha um piercing naquela obra de
arte. Ele foi o último cara com quem fiquei, e eu pude gemer em
português, por que adivinha? Ele é italiano, mas mora no Brasil
desde que nasceu.
Com ele foi ótimo, mas não tenho dúvida nenhuma de que com
Nicolas seria ainda melhor. Eu desejo cada parte desse homem.
Mesmo que ainda esteja puta.
— Vocês são tão idiotas — resmungo e me levanto para
colocar minha comida, sentindo os olhos de Nicolas me
acompanhando.
Ele que se foda.
E que me foda também.
— Então, como é no Brasil? — já passa das onze e os
meninos estão um pouco altos por conta da cerveja. Não beberam
muito, mas não foi pouco também. O bastante para ficarem mais
alegres, mas não o suficiente para ter ressaca no dia seguinte.
— Quente, tropical, animado — dou de ombros. — Lá não
presenciamos as estações e sua forma mais bela como aqui. Não
que eu esteja reclamando, mas uma das coisas as quais sinto falta
do meu país é das frutas. Por conta do nosso clima, nossas frutas
são muito naturais e não tão industrializadas quanto aqui. Também
sinto falta de um bom churrasco no domingo. — Tagarelo como sei
bem fazer. Matt assente com a cabeça, pela minha resposta à sua
pergunta.
— Como se chama elevador no Brasil? — Pergunta Léo.
— Apertando o botão — seu dedo do meio é rápido em
levantar pra mim. Solto uma risada baixa.
— Não tem nenhuma vontade de voltar? — meu marido, que
está agora, deitado com a cabeça no colo de Léo, recebendo um
cafuné muito gostoso, pergunta.
Não sozinha.
— Bem que você queria — respondo e seu semblante se fecha
em uma careta.
— Não é verdade — só essas três palavrinhas já chamam a
atenção dos outros dois curiosos que estão conosco.
Léo balança a cabeça com incredulidade.
— Vocês estão fodendo — afirma e Nicolas fica vermelho em
seu colo. Faço uma careta.
— Bem que eu queria — depois que minha raiva passar.
— Mas já rolou algo, vocês estão se olhando como se já
tivesse acontecido algo, pensei que fosse apenas coisa da minha
cabeça — Matt fala com convicção, um sorriso se formando em sua
boca.
— Quer saber? Está tarde, estou com sono, por que não vão
embora, também? — Nicolas levanta e puxa Léo pelo braço.
— Ei, quando você ficou todo chorão por ter feito bosta e foi
dormir no meu apartamento, eu não te expulsei — mimadinho, reviro
os olhos. — E não revire os olhos pra mim, mocinha, tem é que me
agradecer, já que fui eu quem deu a ideia de vocês se casarem.
— O QUÊ? — Arregalo os olhos quando vejo Léo pular o sofá
e correr em direção à porta, com um Nicolas furioso correndo atrás
dele. — Seu filho da puta! Ainda negou pra mim que tinha sido ideia
sua, é claro que seria, você é doido!
Explodo em uma risada alta, junto com Matt, vendo Léo correr
do irmão mais velho.
— Doido para ver você feliz, olha como eu sou mal! — grita
Léo, já fora de casa e Nicolas saindo atrás dele.
— Não corre na escada, Léo, é perigoso, porra! — escuto os
gritos dos dois, mas logo se perdem quando ambos entram na
escadaria.
Olho para Matt.
— Você sabia disso? — nega, sorrindo e caminhando para a
porta.
— Vocês estão ficando? — pergunta curioso. Dou de ombros.
— Apenas um beijo, nada de mais — volto a olhar para a
televisão, dando as costas ao melhor amigo de Nicolas.
— Eu sabia que ele ia acabar cedendo — escuto sua voz se
afastando. — Se machucá-lo, Aurora, posso gostar de você, mas te
meto o processo, ok?
O fito por sobre o ombro.
— E se ele me machucar? — Nicolas precisa sentir mais do
que tesão por mim para ter um coração partido.
Matt sorri e nega com a cabeça.
— Garanto que arrombe o bolso dele no divórcio. — Sorrio
com cumplicidade.
Matt é bonzinho.
Léo é rancoroso e doido.
Nicolas é...
Meu marido.
Nicolas é meu marido.
— Boa noite, Matt.
— Boa noite, Aurora. — Ele sai, ao mesmo tempo em que
Nicolas entra novamente. Tenho certeza de que Léo já se enfiou no
próprio apartamento no andar de baixo e fechou a porta na cara
dele, pelo seu semblante irritado. Eles se despedem e a porta é
fechada. Volto minha atenção para a televisão, tentando ignorá-lo.
O que se torna a coisa mais difícil que já fiz na vida, porque
sinto tudo.
Sinto sua presença se aproximando.
Sinto seus olhos em mim.
Sinto desejo em todo o meu corpo.
Droga, Nicolas, você tinha que beijar tão bem?
— Amanhã tem o evento de inauguração de uma grife de um
amigo meu, nós da R&C que fizemos a sua loja e fomos
convidados, gostaria que fosse comigo.
— Seria o nosso primeiro evento como marido e mulher,
oficialmente — ele não se assusta.
— Seria sim — concorda. Ergo a sobrancelha.
— Por que, não? — respondo. — Só vou precisar procurar um
vestido em um domingo, não sei se vou achar.
Seu olhar se desvia para a televisão, todo desconfortável.
Franzo o cenho.
— Eu já comprei um vestido para você — arregalo os olhos e
me levanto.
— Você comprou um vestido para mim? — falo com
incredulidade. Ele coça a nuca e fica vermelho.
Ele está sem graça.
— Comprei vários, na verdade — abro a boca, tamanho o
choque com essa notícia.
Nicolas comprou vestidos pra mim. Nicolas comprou vestidos
pra mim muito antes de nos beijarmos.
— Por quê? Quando? Onde eles estão?
— Comprei quando a notícia se espalhou. Sabia que precisaria
ir comigo em alguns eventos, seja da empresa ou outros, então me
precavi. Eles estão lá no meu closet, não sabia qual você gostaria,
então comprei os que eu gostaria de ver em você, se não gostar,
podemos comprar outros, você que sabe.
— Estou recebendo agora, poderia comprar meus próprios
vestidos — ele faz uma careta e se levanta, andando em direção ao
seu quarto. Vou atrás.
Não estou mentindo. Recebi meu primeiro salário que foi
altíssimo e ainda não gastei nenhum real, porque não tenho com o
que gastar. E porque quero ter como me sustentar quando sair
daqui. Quando assinar aquele divórcio.
— Eu que estou te convidando, Aurora. Eu que tenho que
bancar você quando sair comigo, não precisa gastar seu dinheiro
por algo que estou pedindo. — Sorrio, aquela raivinha finalmente
amenizando um pouco.
— Você é fofo, Nicolas. — Seus passos param no meio do
caminho e ele se vira para mim com olhos semicerrados.
— Fofo? — repete incrédulo.
— Fofo — dou de ombros e passo por ele, entrando em seu
quarto.
Nunca estive aqui antes.
Nem mesmo tive coragem de futricar quando Nicolas não
estava em casa. Já estou invadindo muito a sua privacidade, isso
não seria algo que eu passaria por cima sem sua permissão.
Ele não me deu agora, mas era óbvio que me deixaria entrar.
Entro pensando no que ele fez.
Ele comprou vestidos pra mim.
Ele me comprou presentes.
Assim como o meu quarto, o dele tem paredes brancas e
cinzas, mas a textura da pintura cinza é marmorizada. Tem um
espelho que cobre metade de uma parede ao lado da cama king
size. Duas portas, uma para closet e outra para banheiro.
Uma televisão enorme, escrivaninha com um quadro dele, com
os dois amores de sua vida e vários itens que tornam o lugar, o mais
aconchegante da casa.
É enorme, também.
Não me atento a isso, vou para o closet onde estão os meus
vestidos.
— Roubei uns vestidos seus da lavanderia para saber seu
tamanho, então acho que caberão em você, caso não façam,
podemos trocar, estão todos com as etiquetas ainda. — Solto uma
risada alta, olhando por sobre o ombro.
— Ladrão, Nicolas? Não era mais fácil ter me perguntado? —
seus olhos reviram e ele me empurra para entrar no closet, onde eu
vejo, em uma sessão inteira, vários vestidos.
Longos.
Curtos.
Coloridos e em cores neutras.
Lindos.
E a maioria de uma marca específica.
— Vinces? — pergunto, olhando a etiqueta de um longo
vestido azul Royal.
O que mais gostei.
— É a marca de um amigo, o evento é dele, na verdade. A
maioria das minhas roupas são dessa marca. — Então é um
estilista?
Ele comprou roupas do amigo para mim?
E que amigo talentoso. Olho encantada para as peças de alta
qualidade.
Mas tem algo que me chama atenção no nome.
— Essa marca é brasileira? — franzo o cenho.
— Brasileira e italiana. Ele é italiano, mas cresceu no Brasil.
— Lembro dessa marca, é mundialmente conhecida e um sucesso
maior no Brasil. Nunca tive uma roupa dessa marca.
Volto os olhos para Nicolas, emocionada pelo seu gesto.
— Você comprou vestidos para mim. — Seus olhos me
sondam.
— Não é um grande gesto, Aurora — eu sei, eu sei que não é,
mas é um gesto mesmo assim.
— Obrigada — sorrio com os lábios fechados, sentindo todo o
meu rosto esquentar, assim como meu coração.
Ele tá quentinho e cuidado agora.
Nem parece que capotou hoje cedo.
— Posso escolher qualquer um? — o azul que estou
segurando, foi o que mais me chamou a atenção.
— São seus, Aurora, pode escolher qualquer um, pode levar
para o seu closet, se quiser — hum, não.
— Prefiro deixar aqui, vão ficar bagunçados no meu —
mentirosa.
Só quer um motivo para voltar no quarto dele outra vez, deixa
de ser dada, Aurora!
— Tudo bem — concorda e fica ali, me olhando admirar cada
vestido.
Tem Gucci, Valentino, Vinces.
Todos lindos e por incrível que pareça, todos fazem o meu
estilo.
Tiro cada um do cabide e coloco na minha frente, quando me
viro para o espelho. Nicolas fica atrás de mim, e pede para que eu
experimente.
Eu aceito e tiro minha roupa, ficando em peças íntimas. Ele
aprecia a visão, mas não faz nada para se aproximar, sabe que não
foi para isso que tirei. Então, pega a primeira peça e me ajuda a
vestir.
Pelos próximos minutos, é isso o que fazemos. Experimento
todos eles.
E enquanto experimento, meu coração vai ficando cada vez
mais apertado. Minha barriga gela quando coloco alguns que fazem
os olhos dele escurecerem.
Acho graça quando um lilás fica preso em meus cabelos e
Nicolas precisa tocar meu corpo para que o vestido encaixe.
Encaixa, fica perfeito no meu corpo. Sorrio quando Nicolas
escolhe quais quer que eu experimente, alguns ele gosta mais do
que outros, mas percebi que todos o agradam.
Só que eu os amo.
Amei cada vestido que experimentei, e estou sorrindo quando
volto o último ao cabide e visto minha roupa comum novamente.
Olho para Nicolas.
— Vem cá — me chama e eu? Eu vou.
Me aproximo do seu corpo e seus braços circulam minha
cintura.
— Vou te beijar de novo. — E lá se vai minha calcinha.
— Não sei se está merecendo. — Me faço de difícil.
— Te dei vestidos novos. — Sussurra contra minha boca.
— É um suborno?
— Funcionou? — Nem precisava dos vestidos.
— Funcionou. — E selamos nossos lábios em mais um beijo
que faz meu mundo parar.
Nem acredito que Nicolas está me beijando.
Mas ele está, pela terceira vez.
Nos beijamos até que o fôlego acabe.
Nos beijamos até que o clima esquente.
Nos beijamos até ele me olhar nos olhos e me mandar para o
meu quarto.
Você disse: Beba de mim, beba
de mim.
Quando eu estava tão sedento.
Derramou uma sinfonia.
Agora, eu não consigo me cansar.
Colocou suas asas em mim, asas
em mim.
Quando eu estava tão pesado.
Despejou uma sinfonia.
Quando estava pra baixo, baixo,
baixo, baixo.
(Hymn for the weekend -
Coldplay feat Beyoncé)

Quando Leonor decidiu que seus filhos não eram o bastante


para lhe fazer ficar, como se fosse a coisa mais normal do mundo,
organizou suas coisas, comprou sua passagem e saiu de casa com
o novo marido. Tinha quinze anos na época e Léo tinha apenas
treze. Dois adolescentes que não sabiam o que fazer e nem como
sobreviveriam daquele dia em diante, cheios de hormônios e
sentimentos conflitantes.
Leonor nunca mais olhou para trás, nunca mais ligou e nunca
mais vimos a sua cara. Não sei se está viva, se está com o mesmo
marido, se formou outra família.
Simplesmente, não sei de nada.
A única coisa que eu sei, é que nossa vida não piorou com sua
saída. Ela não era a mãe do ano, nem da vida, se formos claros. Era
uma vadia sem coração que nos agredia, nos culpava por ter sido
abandonada pelo nosso pai que nem sabemos quem é, e que nos
fazia trabalhar para colocar comida em casa, enquanto ela se
ocupava na casa dos idiotas que à fodia.
Nosso doador de esperma caiu fora quando ela engravidou de
Léo. Não tenho nenhuma lembrança dele, era muito novo quando
ainda fazia parte da nossa vida, mas Léo não teve nenhuma
convivência com o covarde. Quando ficamos sozinhos, continuei no
meu emprego de jardineiro dos Wilsons e de garçom em um
restaurante perto de casa. Foi onde aprendi a cozinhar. Não deixei
Léo trabalhar, não era seu dever fazer isso, eu era o mais velho, já
sabia como as coisas funcionavam. Meu caçula havia acabado de
entrar na adolescência e ainda lembro como ficou deprimido com o
abandono, pensando que era sua culpa.
Leonor não poupou seus ouvidos ao dizer que era culpa dele
não ter um pai presente, que Léo não era desejado, que não deveria
ter nascido.
Odeio aquela mulher pelo que dizia ao meu irmão, a odeio por
como o tratava, a odeio por ter o abandonado. Não ligo para o que
fez comigo ou como me deixou magoado, minha prioridade sempre
foi Léo. Léo é a pessoa que eu mais amo no mundo.
Consegui nos sustentar, consegui entrar em uma faculdade
com uma bolsa de estudos, consegui ajudar meu irmão a passar em
uma também.
Consegui fazer dele um homem incrível.
Consegui construir um império com ele e nosso melhor amigo.
Matteo, que dividiu o dormitório comigo enquanto se matava
para estudar direito e trabalhar para não passar fome. Matteo só
tinha duas coisas que o faziam feliz naquela época. O direito e sua
melhor amiga.
Então, sempre que estávamos em algum evento grande,
pensava em tudo o que passamos para chegar até aqui.
A essa altura do campeonato, deveríamos estar acostumados
a estar rodeados de pessoas importantes, eu deveria estar
acostumado.
Somos tão importantes quanto todos que estão aqui, e mesmo
assim, ainda me surpreendo ao ver pessoas realmente famosas,
modelos, cantores e até mesmo atores tão acessíveis e puxando
assunto como se fôssemos velhos amigos.
Óbvio que já trabalhamos com pessoas famosas, somos a
melhor imobiliária dos EUA, mas trabalhar para eles e conversar
como se fôssemos íntimos é uma coisa completamente diferente.
Aurora está em êxtase.
Ela está com o sorriso mais lindo que eu já vi no rosto, com
pouca maquiagem e lábios com um tom rosinha, quase natural, com
o vestido azul Royal da última coleção do estilista da noite, ela
entrou chamando todos os olhares da festa.
Linda. Todas suas curvas marcadas deixam o tecido se
movendo pelo seu corpo como se fossem ondas.
A iluminação do ambiente faz com que Aurora pareça uma
sereia dentro de um mar revolto, seus cabelos presos em um coque,
com cachos emoldurando seu rosto, a deixam parecendo alguém da
realeza.
Princesa.
É só uma farsa, Nicolas. Ela pode ser a pessoa mais linda,
adorável e combinar tanto com você, mas ainda é uma farsa.
Mesmo que ambos estejam se beneficiando dela.
Com seu braço no meu, andamos pelo meio da festa e
paramos para conversar com algumas pessoas que ainda não
havíamos cumprimentado.
Assim que chegamos, nos sentamos em nossos lugares e nos
entretemos com o pequeno desfile organizado com a mais nova
coleção que ainda não está em nenhuma parte do mercado, mas
estará disponível hoje na inauguração da grife.
Aurora não percebeu que eu a estava observando.
Ela não percebeu que via quando seus olhos brilhavam para
alguma peça.
Ela mal sabe que todos que despertaram seu interesse já
estão vendidos e no final da festa, serão embalados, levados e se
juntarão aos que estão em meu closet.
Não significa nada.
Só estou sendo legal.
Só estou sendo o homem atencioso que sempre fui, com ela.
Porque nunca fui esse homem com ela.
Não significa nada.
Depois que o desfile terminou, várias pessoas rodearam o
estilista e estamos esperando uma brecha para que eu possa
apresentá-la ao meu amigo.
Ninguém o deixou em paz desde que o desfile terminou.
Quando vejo um garçom passando, aceno em sua direção.
Aurora gosta de beber, pelo menos estarei aqui caso ela queira
passar do limite hoje.
Seus olhos me observam trocar sua taça por uma nova com
um brilho indecifrável.
Só estou cuidando da minha esposa.
Não significa nada.
— Acho que seu amigo pode finalmente respirar um pouco —
sussurra e olho para onde ele está.
Realmente, a fila de pessoas tentando cumprimentá-lo
diminuiu consideravelmente.
— Pensei que os urubus o comeriam vivo — rio. — Vem, vou
te apresentar a ele. — Ela me segue pelo meio do mar de pessoas,
olhando ao redor admirando cada uma. Ela está surtando por
dentro. Eu sei disso.
Vejo isso no modo como sua respiração falha sempre que vê
ou fala com algum famoso.
Ela sorri para disfarçar.
E eu decoro mais um sorriso.
Chegamos perto dele quando o último que estava conversando
sai com a sua acompanhante e seus olhos castanhos escuros
encontram os meus.
Eles reviram.
— Sinceramente, sempre soube que a capacidade das
pessoas de puxarem o saco era grande, mas cazzo, o meu já está
até doendo, porra — resmunga, abrindo um sorriso que imita o meu,
quando me puxa para um abraço. — Que bom que veio, meu amigo.
— É claro que eu viria — me afasto dele, apenas para me
voltar a Aurora que o encara com um semblante engraçado e
seguro o riso. — Aurora, esse é Vincenzo Mancini — ela estende a
mão e Vince sorri, a puxando para um abraço. Precisava ter essa
intimidade? — E essa é Aurora Castelo — resmungo ao ver seu
olhar percorrer o seu corpo com interesse, e sei que é porque
reconhece seu vestido, mas não me contenho. — Ramsey, minha
esposa. — Acrescento meu sobrenome.
Seus olhos disparam para mim com surpresa e ele a afasta
para encarar seu rosto.
Não, ela não tem o meu sobrenome, e não, eu não fiquei
satisfeito ao falar isso.
— E eu pensando que meu irmão era o que gostava de pegar
mulher pra criar — não entendo o que ele diz, porque tenho a
impressão de que foi o português que usou. E só tenho mais certeza
quando Aurora responde no mesmo idioma.
— Quem cria tem muitos ensinamentos para ensinar, não? Te
garanto que aprendo muita coisa — não entendo nada do que
falam, mas Aurora deve ter aberto sua boca grande para falar
alguma besteira, já que Vince solta uma gargalhada alta, com o
rosto vermelho.
— Brasileira, Ramsey? Sempre soube que tinha uma queda
pelo meu sotaque. — Balança as sobrancelhas e reviro os olhos
puxando Aurora pela cintura, para mais perto de mim.
— Seu sonho — respondo com diversão. — Salmão? Você
não cansa dessa cor? — Ele tem uma obsessão assustadora com a
cor Salmão. Seu blazer perfeitamente alinhado em seu corpo é
dessa cor. Os sapatos são brancos, assim como a camisa de gola
alta no pescoço, mas quase sempre que o vejo, ele tem alguma
coisa puxando para seu tom preferido.
Blazer, terno, sapatos.
Ele a ama.
— O sujo falando do mal lavado, você nunca troca de terno?
Sempre te vejo com o mesmo — ele sabe que são ternos diferentes,
ele tem um olho ótimo para reparar em pequenos detalhes, mas
assim como eu, está me provocando.
— É para combinar com o senso de humor quase inexistente
dele — semicerro os olhos para Aurora que esconde um sorriso com
a taça de champanhe e nego com a cabeça.
— Pelo menos ele tem você para compensar, os opostos se
atraem, não? Você deve ser uma mulher muito divertida se isso for
verdade. — Vincenzo responde com diversão. — Então, gostaram
do desfile?
— Gostar? Eu adorei, é minha primeira vez vendo um desfile
ao vivo e foi demais! Suas peças são incríveis, me apaixonei por
todas — é, Vince, você terá um cheque bem gordo no final da noite.
— Meus modelos caem bem em você — elogia apontando
para o vestido. — Posso até dizer que de todos aqui, você foi a que
mais chamou atenção com um look meu.
— Você acha? Ah, obrigada! Nicolas que comprou para mim,
ele tem bom gosto, hum? — Aurora me encara e franze o cenho. —
Por que esse bico? — desfaço o bico na hora.
Vince bate nas minhas costas com um riso preso na boca.
— Calma, amigo, gosto de elogiar a mulher dos outros, mas é
com respeito. Meus irmãos faltam enlouquecer de ciúmes porque
não largo o pé das minhas cunhadas. — Pisca para mim e reviro os
olhos. — Cadê o corno do Léo? E Matt?
Olho ao redor e vejo Léo flertando com uma modelo e Matt ao
seu lado, flertando com uma cantora.
Será que eu estaria assim também se não estivesse casado?
Se eu viesse sozinho?
— Procurando companhia para a noite, suponho — aponto
para os dois desnaturados e Vince segue meu olhar, os
encontrando.
— Não os convidarei para minha festinha particular depois, os
idiotas não vieram nem me parabenizar pela excelente coleção,
cazzo! E ainda dizem que são meus amigos. — Sorrio. Vince gosta
de uma festa com putaria, então Léo e Matt ficarão bem tristes ao
ter essa notícia.
Vou fazer questão de falar para Léo, esse filho da puta que
influenciou o meu eu bêbado a casar.
Mas foi culpa da Aurora…
Por que está tudo confuso agora?
Eu sei o porquê.
Porque eu a beijei e tudo fez sentido na minha cabeça. Porque
eu a beijei outra vez e outra... e a beijaria uma terceira se ela não
tivesse me impedido de borrar a sua maquiagem.
Porque agora eu não sei se fico feliz ou estressado ao lembrar
do que ela fez para que continuássemos casados.
A porra do beijo bagunçou tudo na minha cabeça,
absolutamente tudo.
Mas é só isso.
Não significa nada.
— Festinha particular? — sua voz me faz focar na conversa
novamente e antes que Vince a convide, nego com a cabeça.
— Não é permitido para menores de idade — brinco e ela
revira os olhos.
— Vinte anos só é menor aqui, coroa, no Brasil não é e já sou
casada, poxa, posso fazer o que bem entender — fala como uma
verdadeira menina de vinte anos, o que só faz Vince sorrir.
— Falando em Brasil, deixa eu apresentar meu fratello mais
novo para vocês — Sei quem são todos os irmãos de Vince, mas
apenas por conversa, nunca tive a oportunidade de conhecer um
deles pessoalmente. Vince chama alguém atrás de nós, e me viro
para olhá-lo, enquanto Aurora coloca a taça na bandeja de outro
garçom que passa e não pega outra. Acho que parou nas duas.
— O que é fratello? — sussurra baixinho.
— Irmão — respondo no mesmo tom.
— Ei, você está aí — o rapaz que acredito ser Pietro, fala com
Vince, sorrindo para todos com simpatia. O sotaque quase nulo,
como o de Vince. — Oi, prazer, sou Pietro Mancini e... Aurora? —
franze o cenho quando ela se vira para ele com olhos arregalados.
Sinto quando endurece ao meu lado, sinto quando eu mesmo
endureço.
De onde ele conhece minha esposa, porra?
— Seu irmão... é o Pietro? — responde ficando tão vermelha
quanto alguém pode ficar e sinto meu dente doer com a força que
trinco o maxilar.
— Sim, vocês já se conhecem? — Vince me encara com o
semblante mais sério e depois encara os dois jovens.
— Estudamos na mesma universidade — mas não no mesmo
curso, não é, Aurora? Lembro de Vince me falar que o irmão fazia
administração. — E aí, quanto tempo — ela oferece a mão e um
sorriso ao recém-chegado e ele toma a mão dela, a que está sem
aliança e beija.
Beija a mão da minha mulher.
— Alguns meses, acredito eu — Pietro sorri, mas não tem
nada de malicioso, principalmente quando encara minha mão na
cintura dela. Seus olhos desviam para o irmão, depois focam em
mim. — E você é? Tenho a impressão de já ter visto seu rosto
recentemente.
— Nicolas Ramsey.
— Das imobiliárias Ramsey&Collins? Que fez esse lugar
incrível para meu irmão?
— Esse mesmo — Vince se intromete e passa o braço no
ombro do irmão com um sorriso cafajeste. — Ele também era um
dos solteiros mais cobiçados de Manhattan, mas acabei de
descobrir que não é mais.
É um aviso.
Ele está avisando o irmão.
Aurora sorri, erguendo a mão com a aliança e por um
momento, Pietro fecha a cara ao encará-la.
— Você casou — fala com surpresa. — Estão juntos há quanto
tempo?
Quer saber há quanto tempo eu estou com ela, para fazer as
contas de quando fodeu minha esposa? Porque é isso o que eu
percebi com essa interação de merda.
Quer saber se me chifrou? Porque se está querendo fazer as
contas, quer dizer que é recente, porque eu e Aurora só estamos
casados há dois meses e ninguém se casa com dois meses de
relacionamento.
É um caralho mesmo, porra!
— Menos de três meses — ele respirou mesmo aliviado? Ele
fez isso mesmo?
Ele sorri agora, os ombros cedendo.
Não posso nem justificar a raiva que preenche minhas veias,
porque ele não fez nada de mais.
Só ficou com a minha mulher.
— Caralho, pensei que meu fratello mais velho que era
apressado em relacionamento, mas você o supera, Nicolas — Vince
solta uma risada para aliviar o clima e dou um sorriso.
Você nem faz ideia, Vincenzo.
— Dei meu jeito de amarrar esse homem — Aurora ri e todos a
acompanham sem fazerem ideia de que ela está falando bem sério.
Um telefone toca e Pietro o tira do bolso, abrindo um sorriso
alegre.
— Certo, foi um prazer conhecer você, Nicolas e um prazer
revê-la, Aurora, mas preciso atender — ele olha para o irmão. — É
Mamma.
Os olhos de Vincenzo brilham e aproveito que sua mãe ligou,
para me despedir.
— Foi um prazer — mentira. — Seu evento está incrível, meu
amigo, mas preciso ir ao banheiro, acho que bebi demais, pode me
dizer onde fica?
Vincenzo me olha com desculpas no olhar, porque ninguém
nessa merda de rodinha foi burro de não ter notado que seu irmão e
minha esposa já tiveram algo e me instrui o caminho.
Pego a mão de Aurora depois de nos despedimos e a levo
comigo.
Essa filha da puta...
Encontro o banheiro e a puxo para dentro.
— Esse é o masculino... — a empurro contra a porta, enfiando
minha perna entre as dela e faço o que ela vem me pedindo para
fazer desde que acordou comigo naquela cama em Vegas. Cerco
seu pescoço com minha mão.
— Já fodeu aquele merdinha, Aurora? — seus olhos se
arregalam, ao mesmo tempo que suas pupilas dilatam.
— Isso não é da sua conta — a pressiono mais com o meu
corpo, a prendendo com meu olhar.
Uma porra que não é da minha conta.
— Não me provoque, Aurora, vou perguntar mais uma vez, já
fodeu com aquele merdinha? — chego meus lábios bem perto dos
seus, sem deixar escapatória.
Diga que não.
Diga que entendi errado.
Diga que fizeram a merda de um trabalho juntos.
Diga qualquer coisa, menos a verdade que vejo em seus
olhos.
Ela solta um suspiro e me encara ao assumir.
— Sim.
Então eu tomo uma decisão.
Eu quero ser seu escravo.
Eu quero ser seu dominador.
Eu quero fazer seus batimentos
cardíacos.
Acelerarem como uma montanha-
russa.
(...)
Eu quero te acalmar.
Eu quero te irritar.
Eu quero te deixar livre.
Mas sou ciumento pra caralho.
(I wanna be your slave -
Maneskin)

Sim.
Sim.
Sim.
Colo sua boca na minha, sem me importar com seu batom
borrando, sem me importar se estamos em um banheiro de um
evento lotado. Sem me importar se o que eu estou sentindo significa
alguma coisa.
Só me importo em castigar Aurora com minha boca, por me
fazer ter vontade de sair desse banheiro e descer a porrada em um
garoto que já conheceu todas as partes do seu corpo em que eu só
sonho em chegar.
Só me importo em devorar seus lábios e sentir o melhor gosto
que já provei na vida, confirmando a maciez deles, misturado ao
gemido de prazer quando minha perna pressiona sua parte mais
íntima.
Só me importo em substituir qualquer lembrança que ela tenha
com outro homem além de mim. Quero que ela esqueça qualquer
outra mão que tenha a tocado de forma mais íntima. Qualquer outra
boca que tenha tocado a sua.
Quero que Aurora esqueça todo mundo, menos de mim.
A pressiono ainda mais contra a superfície da porta,
movimentando meus lábios nos seus, buscando sua língua com a
minha e a chupando ao primeiro toque. Ela tem gosto de pureza e
safadeza.
Tempestade e calmaria.
Ela tem gosto de guerra e paz.
Ela é perfeita.
— Nicolas — ofega e aproveito para enfiar minha língua ainda
mais entre seus lábios molhados.
Não significa nada.
O ciúmes que me consome, não significa nada.
O aperto em meu peito, não significa nada.
O fogo queimando em minhas veias significa tudo. Não há
nada racional em mim quando sugo seu lábio inferior. Não há nada
que me tire da sua boca, da sua presença.
Desço os beijos pelo seu maxilar quando me falta o fôlego e a
ouço ofegando deliciosamente com um chupão que dou na curva de
seu pescoço delicado.
Só a ideia de que outro homem tenha a beijado desse jeito me
tira qualquer força que me fez me manter afastado. Não suporto.
Não suporto a ideia de mais alguém a tendo assim,
completamente entregue.
Não significa nada.
— Disse que não podemos sentir ciúmes — sussurra e a
mordo levemente, com força o suficiente para que escute seu
gemido sôfrego.
— E você disse que sentir ciúmes não faria eu me apaixonar
por você — devolvo no mesmo tom, pressionando minha mão em
sua garganta, passando o polegar em um vai e vem e delineando
seu delicioso corpo com a outra mão. Tê-la a minha mercê assim...
por que não fiz isso antes? Inspiro fundo, sentindo seu cheiro
inebriante. Vejo os pelos arrepiando por onde passo. — Você fodeu
aquele moleque e isso está me fodendo, porra. — Volto a subir
meus beijos até sua boca, massageando a bunda gostosa sobre o
tecido do vestido.
Maldito vestido.
— Não era sua mulher, Nicolas — eu sei. Mas só em pensar
que esses olhos pesados de desejo podem ter ficado assim por ele
eu quero quebrar esse lugar inteiro. — Nem mesmo sou agora. —
Sussurra e solto seu pescoço para agarrar suas coxas e a erguer,
escutando seu gritinho quando circula meu quadril com elas e sente
suas costas ainda mais pressionadas na porta pelo meu corpo.
— É minha, Aurora. Você escolheu ser minha esposa, você
pediu para ser fodida, você se deu para mim, então é minha,
entendeu? — Afirmo um tanto desesperado contra seus lábios.
Vejo o momento em que minhas palavras têm efeito nela, vejo
quando sua respiração trava, vejo quando suas pupilas dilatam,
quase ocupando o verde intenso, cheia de tesão, porra.
Enterra os dedos em meus cabelos, em um aperto firme que
me puxa para si.
— Sou?
— É, porra, é minha!
Só ela para me tirar a racionalidade e falar coisas que não
faziam sentido na nossa situação.
Selo meus lábios nos seus novamente, totalmente perdido nas
sensações que estão me consumindo e me deixando fora de mim.
Sabia que isso aconteceria.
Sabia que seria intenso assim.
Sabia que sentiria demais e por isso demorei tanto a me
entregar.
Sabia que ela se entregaria desse jeito e me deixaria louco por
cada pedaço seu.
Louco por ela.
Sugo seu lábio inferior, sentindo tudo em mim esquentar,
sentindo sua intimidade quente contra meu pau que há tempos está
duro por ela e afasto o rosto quando ela geme.
Solto sua perna, apenas para puxar a fenda do vestido para o
lado e revelar a calcinha minúscula, no mesmo tom do vestido.
Porra.
Porra, porra, porra.
Ela é minha perdição.
Solto um xingamento, escutando sua risadinha, mas não dá,
porra. Ela é absurdamente gostosa.
Fito seus olhos, avisando exatamente o que vou fazer, e
quando ela respira fundo, toco com o meu polegar, por cima da
calcinha, a sua boceta encharcada de prazer.
Meu cacete pulsa.
— Puta que pariu... — geme gostoso no meu ouvido, quando
começo com movimentos circulares lentos bem em cima do seu
clitóris, o tecido de renda ajudando a intensificar seu prazer e sorrio
ao sentir meus cabelos sendo puxados.
Deixo beijos molhados em seu pescoço, arrepiando cada parte
em que meus lábios tocam e uma de suas mãos desce para minhas
costas.
Será que ela sente o quanto a desejo? Será que assombrei
seus pensamentos como assombrou os meus?
Será que seus dedos delicados já tocaram essa bocetinha
gostosa e gozou chamando meu nome como fiz muitas vezes
chamando o dela enquanto batia uma?
Desço a alça de seu vestido com os dentes, sem parar de
masturbá-la e fito seus seios expostos. Engulo em seco com a
visão, vê-los por trás do sutiã, é muito diferente de vê-los sem nada
e o desejo insano que essa garota desperta em mim me assusta.
Mas também faz meu pau pulsar.
Linda.
Os mamilos duros e rosados fazem minha boca salivar de
desejo.
— Minha, Aurora — sussurro contra seu corpo, a olhando de
baixo. — Esses seios são meus — aviso. Não demoro a deslizar
minha língua sobre eles, circulando a aréola e sugando com força,
ouvindo seu gemido de dor, misturado com prazer.
Ah, eu amava misturar os dois.
E estava amando os sons que saíam da sua boca.
— Para quem não me queria nem pintada de ouro, você está
bem possessivo — mordo o biquinho com um pouco mais de força e
ela geme em repreensão.
— Para quem ficou putinha por minha ex ter ido na nossa
casa, você está bem hipócrita — sussurrei, mamando com vontade,
matando o meu desejo, aumentando o ritmo do meu polegar no seu
clitóris. Seu quadril começa a se movimentar de encontro a minha
mão, e ver ela assim... tão entregue.
Porra...
Essa imagem vai me assombrar pelo resto da vida.
— Nenhum de nós tem esse direito, e mesmo assim, estamos
aqui — ofega, com os lábios entreabertos, batendo a cabeça na
porta. — Puta que pariu.
— Você continua sendo minha. — Assopro seu mamilo e subo
meus beijos, mordendo e chupando, deixando seu pescoço
completamente vermelho.
— Só quando você for meu — responde e começa a se
esfregar em meus dedos atrás do próprio orgasmo.
Eu vou dar a ela.
Eu vou dar tudo a ela.
Isso não significa nada...
Beijo sua boca ansiosa, sentindo seu corpo começar a tremer
com a chegada do orgasmo e aumento o ritmo e a intensidade junto,
sabendo brincar nesse parque de diversões, mesmo nunca estando
aqui antes.
— Você é tão gostosa, Aurora — sussurro, observando cada
parte sua. — Goza pra mim, linda, fica bem molhadinha para que eu
possa entrar em você.
— Nicolas... — ela goza tão facilmente.
E goza chamando meu nome.
O meu nome.
Porque ela é minha, porra.
Porque ela é tudo o que eu mais quero, agora.
— Deixa eu comer você? — sussurro em um grunhido, o
pedindo saindo com tanto tesão do fundo da minha garganta, que
deixa minha voz rouca. Seus olhos pesados me fitam com surpresa.
Aproximo meu rosto e mordo o lóbulo da sua orelha, sussurrando.
— Posso comer você?
— Nicolas...
— Posso te ver corar enquanto eu te fodo? Enquanto goza
comigo metendo nessa sua boceta melada?
— Pede por favor — sussurra, me provocando.
— Deixa eu comer você, linda, por favor? — ela sorri cheia de
luxúria e malícia.
— Pode fazer o que quiser comigo, Nicolas, ainda não
entendeu isso? — Sorrio.
A beijo novamente, tateando meu bolso atrás da carteira, tão
ansioso para estar dentro dela que me atrapalho. Quando a acho,
entrego para Aurora que entende o recado e procura a camisinha,
sem nunca largar meus lábios.
Em um momento estamos nos beijando com toda a
intensidade do mundo. No outro, meu zíper está aberto, com meu
pau sendo massageado e uma camisinha o encapando.
Não tenho tempo de sentir suas mãos em mim, porque estou
louco para comer essa garota que vem tirando meu juízo como a
muito ninguém conseguia.
— Você é lindo — geme manhosa, movendo a mão para cima
e para baixo pelo meu pau, lambendo os lábios.
Ainda vou me enfiar fundo dentro deles. Ainda os sentirei ao
meu redor, molhados e quentes... que imagem perfeita.
— Afasta essa calcinha para mim, linda? — peço, e Aurora?
Aurora afasta, me dando a visão incrível da sua boceta gordinha e
depilada.
Me obedecendo como a boa garota que eu sabia que era.
Pincelo meu pau por toda a sua lubrificação, para cima e para
baixo, entre seus lábios, gemendo ao contato molhado e
escorregadio. Meu corpo está implorando por ela. Doendo para se
juntar a ela.
Meto a cabecinha em um vai e vem gostoso que arranca um
grunhido do meu peito.
Suas unhas se infiltram por baixo da minha camisa e arrancam
sangue das minhas costas.
— Aurora...
— Nick!
— Você é tão gostosa, porra, como pode ser tão gostosa? —
rosno e gemo, nem sei mais o que sai da minha boca.
Procuro seu olhar e quando travamos um no outro, vou
aumentando o ritmo e metendo mais fundo a cada arremetida lenta,
a cada vez que ofega me engolindo, até que meu cacete esteja
atolado dentro da bocetinha apertada e deliciosa.
Aurora está prendendo o ar.
Eu estou prendendo o ar.
Com meus olhos nos seus, observo quando solta o fôlego, sua
vagina me apertando, se acostumando ao meu tamanho e vejo
quando seus olhos imploram para eu me mexer.
Então eu dou a primeira estocada.
— Ohh... — fecho os olhos, seu cheiro me inebriando, o cheiro
do sexo me inebriando.
— Ahh… Nick!
— Sim, linda, sou eu — a preencho por completo.
Dou a segunda, a terceira, a quarta e estabeleço um ritmo
intenso e profundo, voltando a mamar em seus seios, a estimulando
de todas as formas que consigo na posição precária que estamos.
— Nicolas… estamos fazendo barulho nessa porta. —
Estamos mesmo.
— Não me peça para parar — suplico contra o mamilo.
— Não vou — sussurra perdida nas sensações que tomam
conta de todo o seu corpo.
Sensações que eu causo nela.
Que meu cacete causa nela.
Seguro seu corpo, e ainda dentro dela, a levo para a última
cabine, beijando seus lábios especialistas em falar baboseiras e a
jogo contra a porta fechada novamente, começando a meter com
força.
Aurora grita contra minha boca.
Eu rosno contra a dela.
Estoco com toda a vontade que tem me tomado nos últimos
meses.
Solto sua boca para poder acompanhar seu corpo subindo e
descendo de acordo com minhas estocadas intensas.
Não vou conseguir. Não vou conseguir durar muito tendo essa
visão.
Seus cabelos completamente bagunçados, seu vestido todo
embolado na cintura, a calcinha de renda azul, apenas afastada
para o lado enquanto meu pau é engolido pela sua boceta rosada.
Isso é perfeito.
Nossa junção, nosso cheiro, nosso beijo... é tudo perfeito.
— Você fica ainda mais linda com meu cacete todo dentro de
você, sabia? — ela sorri maliciosamente e caralho, o barulho
molhado que nossos sexos fazem me deixa ainda mais duro,
juntando com esse sorriso dela.
Esse sorriso dela ainda vai me matar.
— Porque você não viu ainda quando ele estiver na minha
boca — caralho de menina abusada! — Vou acabar com você,
Nicolas.
Eu tinha certeza disso.
A olhei cheio de malícia, puto ainda pelos ciúmes que odeio
admitir estar sentindo, e mordo seu lábio inferior. Sua expressão se
anuvia.
Sua cabeça bate na porta enquanto me oferece seu pescoço.
Não sei como ela sairá daqui sem que todos saibam que eu a fodi.
Lambo sua pele suada pelo que estamos fazendo e pego seu
quadril com as duas mãos, uma em cada parte da sua bunda
gostosa e a puxo contra mim, intensificando as estocadas. Aurora
se apoia na porta, enquanto me rasga com suas unhas. Seu rosto
corado me alucina.
Meto com mais intensidade.
Ela grita.
Eu a beijo para calar sua maldita boca.
— Quietinha, porra! — a fodo com força, fazendo ela gritar
mais e me deixando com uma vontade imensa de agarrar seu
pescoço. — Não deixe mais ninguém nessa festa ouvir seus
gemidos, Aurora, ou eu juro que te deixo sem andar por dias, então
fecha a porra dessa boca.
— Vem fechar, marido — a beijo, irritado só em pensar que
mais alguém possa ouvir seus gemidos.
Eles são meus.
Ela é minha.
E ela goza pra mim, caralho.
Sinto suas paredes me apertando e suas unhas arrancando
sangue das minhas costas quando o orgasmo a atinge.
— Nicolas...
— Você goza tão lindamente, querida — puxo sua bunda e
meto com tanta força, a empurrando contra a porta para gozar junto
com ela que a porcaria quebra, quase levando nós dois ao chão.
O que só não aconteceu porque Aurora agarrou meu pescoço
e eu tenho senso de equilíbrio.
Esporro dentro da camisinha, segurando Aurora em pé, como
se minha vida dependesse disso e olho para o lado, completamente
ofegante, vendo a merda que a gente fez.
Ainda sentindo meu pau pulsar dentro da sua vagina, sem
parar de meter lentamente, até sair tudo e olho para minha mulher,
tão ofegante quanto eu e tão vermelha que me encanta, vendo seu
rosto se abrir e...
Ela solta uma gargalhada alta.
— Porra, o que nós fizemos? — fala em meio ao riso.
O melhor sexo da minha vida.
Foi isso o que fizemos.
Não sei o porquê, mas ela é dona das minhas melhores vezes.
Mas isso não significa nada.
Eu acho que somos como fogo e
água.
Eu acho que somos como vento e
mar.
Você está queimando, eu estou
esfriando.
Você está em cima, eu estou em
baixo.
(Brooklyn Baby - Lana Del Rey)
Não deveria gostar tanto do que aconteceu.
Não deveria estar tão tonta de prazer, que só a ideia de não
fazer mais me entristece.
Isso não vai durar.
É só o tesão falando mais alto.
Uma hora eu conseguirei tirar Nicolas do meu sistema. Só
espero fazer isso antes que cometa o erro de me apaixonar.
Não quero me apaixonar por Nicolas Ramsey.
Em seus olhos, vejo a mesma coisa.
Nicolas Ramsey não quer e não vai se apaixonar por Aurora
Castelo.
Mesmo assim, mesmo sem saber o que estamos fazendo,
mesmo tudo tendo se tornado confuso com o primeiro beijo, deixo
Nicolas me depositar na sua cama depois de termos fugido às
escondidas do evento do seu amigo.
Mesmo não querendo sentir demais, o deixo tirar meu vestido,
que coloquei de qualquer jeito ao sair daquele banheiro e ter seu
terno me cobrindo da vista de todos, deixo que tire meus saltos,
minha calcinha.
Mesmo sabendo que ele nunca será meu, tiro seu terno, peça
por peça, seus sapatos, um a um, seu relógio e o deixo me jogar na
cama.
Mesmo não querendo me viciar na sua boca, deixo que desça
pelo meu corpo, sugando meus seios em movimentos
enlouquecedores com sua língua molhada, me fazendo gritar seu
nome apenas com sua boca rodeando meus mamilos, descendo
pela minha barriga e se acomodando entre as minhas pernas. Deixo
que beije minha boceta como se fosse minha boca, sugue meu
clitóris gemendo contra ele, e dê lambidas lânguidas com a língua
quente e molhada, que me fazem ver estrelas atrás de minhas
pálpebras fechadas. Deixo que me chupe como um profissional, que
beba do meu orgasmo.
Mesmo que não queira me apegar aos seus toques, permito
que envolva meu pescoço me empurrando contra a cama, que erga
minha perna até seu ombro e a apoie nele. Deixo que beije ela,
enquanto enfia o pau grande e grosso, cheio de veias saltadas e
com a cabecinha avermelhada de tanto tesão, todo em minha
boceta.
Mesmo que não queira algum dia sentir saudade dos seu olhar
em mim, continuo focada nele, me admirando enquanto me fode
sem dó, arremetendo em mim e me tratando como sua puta.
Enquanto o barulho do nosso sexo se espalha por todo o seu
quarto, virando meu som favorito.
Tento não gostar demais de cada arremetida, para não me
viciar, mas não tem jeito.
Mesmo não querendo decorar suas expressões, memorizo
cada movimento seu, inclusive a mordida no lábio inferior, quando
goza depois de me deixar em pedaços com um orgasmo intenso.
E observo quando não se joga ao meu lado, pois se levanta,
tira a camisinha e vem para cima de mim.
Não me apego a ele quando me beija. Não é isso o que temos.
Podemos sentir tesão um pelo outro.
Não significa nada.
Não vamos nos apaixonar.
E repetimos tudo de novo quando o beijo se intensifica.
Acordo em um déjà-vu de meses atrás, quando acordei de
ressaca em um quarto em Las Vegas, depois de uma noite louca em
que não lembrava nem onde estava, com quem estava e porque
estava com ele.
Porque me casei.
Tem o mesmo braço musculoso, aconchegante e agora
conhecido, me rodeando. Tem os mesmos olhos verdes, tão lindos
quanto da primeira vez que eu vi, me olhando como se eu fosse a
coisa mais linda que já viu na vida.
Ele é.
Ele é a coisa mais linda que eu já vi na vida.
A única diferença dessa manhã, para a de dois meses atrás, é
que dessa vez, ele não está me olhando como se eu tivesse lepra.
— Bom dia, Nick — seus olhos brilham quando digo seu
apelido em um sussurro. Até agora, só falei enquanto o sentia em
mim, foi automático. Foi delicioso. Ele apenas me olha, fitando cada
parte do meu rosto com admiração, mas não responde. — Está
pirando?
Pirando por estar comigo?
Pirando por gostar de estar comigo?
Pirando por me foder como se sua vida dependesse disso?
— Não vou me sentir culpado por comer a minha mulher —
responde e sua voz rouca… ah, essa voz faz minha barriga gelar.
Suas mãos começam a se movimentar em carícias lentas em minha
cintura. — Queria me lembrar da primeira vez.
— Primeira vez? — Pergunto curiosa. Mexo em sua barba com
meus dedos, lembrando de como ela me deu prazer a noite inteira.
Nicolas sabe foder como ninguém.
Tudo foi intenso demais, todos os toques, beijos, carícias,
estocadas, foi tudo… demais.
Ele foi profissional em me dar prazer.
— Que te tive na minha cama, não é justo que eu tenha
esquecido de foder com você pela primeira vez, não é justo não
lembrar de cada detalhe seu enquanto gemia pra mim. — Meu
rosto esquenta, meu coração estremece as batidas. — Adoro
quando cora pra mim.
Ofego, vendo o seu sorriso torto.
— Você está mesmo falando sério? — pergunto um pouco
chocada.
— Quando eu não falo? É tão chocante assim eu ter ficado
encantado com tudo que fizemos que a ideia de ter perdido alguma
reação sua me incomoda? — É sim, é sim porque isso pode me
iludir. E eu não vou ser iludida por você, Nick. Eu sei exatamente o
que você quer.
E não é ser meu marido.
Sorrio para disfarçar o que sinto, mas seus olhos parecem
captar algo.
— O que foi? — escondi um segredo.
— O que foi, o quê? — faço a Lily... ops, a sonsa.
— Está com o seu sorriso culpado — E eu tenho um sorriso
culpado desde quando? Sou tão boa atriz.
— Como você sabe? — está tão na cara assim?
— Sou especialista em seus sorrisos, Aurora. Sei dizer quando
se sente culpada, excitada, feliz, zangada, agora me diz o que você
fez. — Passo alguns segundos estática, tentando não acionar
aquela parte do meu coração que sente, porque o que ele falou...
Não, coração, você está proibido de acelerar pelas coisas que
ele diz. Está proibido de bater por ele.
— Decorou meus sorrisos? — sussurro encantada.
E lá se vai a minha ordem pra puta que pariu.
— Não foge — igual você está fugindo?
Respiro fundo e me preparo para contar aquela verdade que
escondi desde que saí de Vegas.
— Não transamos em Las Vegas — não olho em seus olhos
ao dizer, mas sinto suas carícias pararem.
Fecho os olhos.
Sei que deveria ter falado isso há muito tempo para ele, não
entendo o porquê não fiz. Não entendo, mesmo. Não tinha nenhum
motivo para esconder, porque contar não mudaria nada.
Ou mudaria?
— Você se lembra daquela noite? Você disse que não se
lembrava, ou o que disse para a juíza foi verdade? — pergunta com
cuidado.
Verdade foi, você me manobra como ninguém, mas só soube
agora.
— Não, mas tem um vídeo no meu celular que gravei quando
estava bêbada, e eu vi quando estava no avião de volta para
Louisiana, que mostra que você dormiu antes que acontecesse algo.
— E que se eu estreasse na carreira pornô, seria muito boa. Minha
cara de safada é um marco e tanto.
Será que ele vai gritar, agora?
— Há quanto tempo sabia disso? — ergue o troco e busca
meus olhos. Mesmo não querendo, foco nos seus.
— Desde antes de vir morar aqui — seu rosto se fecha. Merda.
— Não achou que seria uma boa ideia me contar isso? — não
respondo. — Porra, Aurora, você não gostaria de saber se transou
comigo, caso não tivesse visto o vídeo?
— Desculpa — é tudo o que peço, sem coragem de
argumentar, porque não tem argumento. — Eu realmente me sinto
mal agora.
Nicolas se joga na cama novamente, agora encarando o teto,
com os braços cruzados em cima da cabeça.
Sinto meu peito apertar.
Nicolas fica em silêncio por alguns minutos e aproveito para
observá-lo. Seu peito nu tem a marca das minhas unhas e seu
pescoço… bem, dá para qualquer um ver que ou ele pegou alguma
alergia muito forte, ou passou a noite com um vampiro.
No caso, eu.
Seu semblante é indecifrável.
— Está com raiva?
— Não estou feliz — devolve, e me encolho. Ele nota e solta
um suspiro. — Mas não estou com raiva, de certo modo, é
reconfortante, não lembrar de transar com você estava me matando.
— Desculpa, eu ia contar, não sei por que não contei e depois
simplesmente esqueci, desculpa
— Desculpo — seus olhos se fecham. — Pelo menos agora,
sei que tenho na memória a primeira vez que tive você.
Minha barriga gela.
Minha respiração trava.
Meu sorriso é automático. Eu também tenho na minha
memória a primeira vez que o tive.
E a segunda.
E a terceira...
— E o que isso quer dizer?
— Quero você, Aurora, me controlei por muito tempo, mas
quero você — Quero você também, Nick. — Quero você a todo
momento.
— E suas outras mulheres? — Aquelas que não posso odiar,
mas que quero que não existam?
— Outras mulheres?
— Disse que não tinha exclusividade no nosso acordo, me fez
assinar isso, e tem dias que chega tarde em casa…
Também tem as vezes em que joguei verde e ele fugiu do
assunto.
Ele ri.
Não, ele gargalha. Alto.
— Meu Deus, Aurora, em que mundo você vive? — no das não
iludidas. — Não existem outras mulheres, quando chego tarde, é
porque estou resolvendo algo na R&C, não porque estou atrás de
outra pessoa. Você para mim, já basta. Bastou desde o momento
em que te conheci de verdade.
Olha aí, isso é coisa que se diga para alguém?
— Está dizendo que não ficou com ninguém desde que nos
casamos? — pergunto com incredulidade.
Seus olhos me fitam. Por um longo tempo, até que seu
semblante se fecha.
— Não, não houve mais ninguém. Mas e você, Aurora? Você
ficou com mais alguém? — Sorrio, negando com a cabeça.
— Coroa bobinho — me jogo em cima dos seus braços,
beijando todo o seu rosto de tão feliz que estou. Suas mãos são
automáticas em se apoiarem em minha bunda. — Você tem tara
nessa bunda, né?
— É minha, então posso ter tara por ela — quando ele diz isso
com essa voz grossa… — Há quanto tempo não fica com alguém,
Aurora?
Mordo o lábio, pensando.
— Seis meses — confesso, me abaixando para morder seus
lábios. — E você?
— Cinco — sussurra e sorrio.
— Sabe, um dia você me disse que não era um cara
ciumento… — seus olhos reviram e solto uma risada. — Quase
botou um ovo de ciúmes ontem.
— Pode me culpar? O garoto é novo, herdeiro e ainda ficou
com você antes de mim, só em pensar nisso, quero quebrar alguma
coisa — sua mão acertando a minha bunda com força, me assusta.
Arregalo os olhos.
— Você me bateu, coroa? — outro tapa, dessa vez mais forte.
— Bati, você está merecendo para deixar de ser bocuda e de
me provocar. — Sorri maliciosamente, agarrando uma banda com
uma pegada firme e me movendo sobre si.
Sobre o pau que já está duro para mim.
— Como você… — arregalo os olhos. — Eu estou acabada,
Nicolas, como você não está?
Seu sorriso se torna felino.
— Não pareço precisar de pílulas azuis para o pau subir agora,
né, querida? — querida.
Solto uma risada alta, lembrando de como o provoquei com
isso quando nos conhecemos, só para quebrar a cara com ele me
mostrando tudo o que faz.
Nunca gostei tanto de quebrar a minha cara.
— Minha boca ainda vai me meter em problemas grandes um
dia — respondo, sorrindo.
— Que tal meter um problema grande dentro dela? — sussurra
e minha respiração falha.
Minha boceta já está molhada, melando minha calcinha, mas a
sinto dolorida, e mesmo disposta a sentir a dor deliciosa que seria
dar para ele tão sensível, prefiro andar hoje.
E não conseguiria se fosse empalada mais uma vez.
Então, irei me contentar em fazê-lo gozar com a minha boca, e
tentar ser tão boa no oral quanto ele.
A língua de Nicolas é um pecado.
Sorrio, e beijo seu maxilar, descendo para seu pescoço,
sentindo quando se arrepia ao contato da minha boca.
— Você é tão gostoso, Nick — sussurro, mordendo seu mamilo
e gemendo quando sua mão agarra meus cabelos pela nuca em um
aperto firme.
— Sou seu — quase gozo só com essas palavras.
São só isso, palavras.
Desço, sendo guiada por sua mão e fico cara a cara com sua
ereção, babando e me fazendo salivar.
Ele ter dormido completamente nu, serve muito bem a meu
favor.
Aproximo o rosto e inspiro seu cheiro, com meu nariz
acariciando de cima a baixo a textura macia e cheirosa.
— Não torturei você, querida — lambo a gota lubrificante na
cabecinha vermelha e inchada e gemo ao sentir seu gosto. Ele
geme e estremece debaixo de mim. Volto meus olhos aos seus para
não perder nenhuma expressão de prazer. Seu lábio inferior está
sendo castigado, enquanto repito o mesmo movimento, pegando
sua ereção com a mão e botando a língua para fora, lambendo da
base até a cabeça com lentidão. — Mete esse cacete na boca,
Aurora — manda e obedeço, caindo de boca no seu pau, deslizando
os lábios para baixo e revirando os olhos de prazer.
Ele é uma delícia.
— Ohhh — sua cabeça bate no travesseiro, enquanto ofega e
pisca devagar. — Aurora… — suspira, sorrindo maliciosamente.
Sua mão puxa meus cabelos e começa a me guiar em
movimentos de vai e vem, não tomando o controle, esse ele deixa
comigo e sinto seu pau bater no fundo da minha garganta. Relaxo o
maxilar, tentando engolir mais dele, mas não cabe tudo, então movo
minha mão em uma punheta lenta, que segue os movimentos dos
meus lábios. Sugo a cabecinha, rodeando-a com a língua e sorrio
safada, sendo alvo de seus olhos de pálpebras baixas.
Ele sentindo prazer é um evento.
Nick geme roucamente, quando solto o membro e desço com a
língua até as bolas pesadas, sugando uma de cada vez para dentro
da minha boca.
Ele ofega.
Eu salivo.
Minha boceta pulsa dolorida.
Desço a língua um pouco mais baixo, na pele sensível que tem
ali. Seus dedos em meu cabelo apertam ao ponto de dor.
Eu gosto.
Gosto de deixar Nicolas fora de controle.
Lambo o trajeto de volta até a cabeça, sugando com vontade,
arrancando gemidos dele e meus do fundo da garganta e volto
meus olhos até o seus, preenchendo minha boca com seu pau.
Nicolas me encara, focado e ansioso, completamente entregue
a mim. Finjo não ver o fascínio descarado. Mas não finjo quando
solto um gemido contra ele, que o faz rosnar e engolir em seco, o
pomo de adão subindo e descendo com esforço.
Com o olhar, dou a permissão que ele quer para foder minha
boca e vejo os pelos do seu corpo arrepiando.
— Vai me deixar foder essa boquinha atrevida, querida? —
Solto seu pau com um estalo molhado.
— Goza na minha boca, marido — sua mão empurra minha
cabeça para baixo, enquanto Nicolas murmura todos os
xingamentos possíveis, completamente ofegante e vermelho e sorrio
contra seu pau.
— Vai engolir tudo como a boa garota que é? — pergunta, com
um sorriso safado, pisco os olhos, sugando com mais força. — Vai,
não é? É isso que quer, querida? Engolir toda a minha porra?
Assinto com seu pau na boca e seu quadril começa a erguer
em movimentos firmes, intensos e ritmados, sua mão segurando
minha cabeça no lugar, enquanto a outra delineia meus lábios o
engolindo.
Mexo em suas bolas, sentindo quando pulsa em minha boca e
não demora para que sinta o jato quente contra minha garganta.
— Ohhhh — seu corpo estremece e seu gemido é uma delícia
de ouvir.
Não perco nenhum detalhe do seu rosto enquanto goza na
minha boca.
Decoro todas as microexpressões enquanto bebo do seu
orgasmo e gemo ao sentir minha boceta pulsar.
Solto seu pau com um estalo molhado, quando sua mão em
meu cabelo me puxa para cima, e Nick ataca minha boca,
perseguindo seu gosto, movendo sua língua em busca da minha em
um beijo de tirar a razão.
— Quem está corado para mim é você, agora — sussurro.
— Gostou de me chupar, linda?
— Você é delicioso.
— Traz essa boceta aqui e senta na minha cara, meu bem —
meu bem — deixa eu te deixar vermelhinha, também.
Sorrio, negando com a cabeça e saindo de cima dele de
supetão.
— Nem pensar, minha boceta tá encharcada de tesão, mas
não sou uma adolescente que não consegue se controlar, estou
extremamente dolorida de sentir você em mim a noite inteira. —
Seus olhos brilham, quando ele se levanta e vem atrás de mim.
— Que tal um banho, então?
Sorrio de lábios fechados.
— Acho uma ótima ideia.
Ela tem um sorriso que parece.
Me lembrar de memórias de
infância.
Onde tudo era fresco.
Como o brilhante céu azul.
Às vezes, quando eu vejo seu
rosto.
Ela me leva para aquele lugar
especial.
E se eu olhar por muito tempo.
Provavelmente perderia o
controle e choraria.
(Sweet Child O' Mine - Guns N'
Roses)

— Sua cor favorita é preto?


— Não é tão difícil de adivinhar, né? — ergo a sobrancelha,
apontando para minha camisa e escuto sua risada, que toma conta
de toda a nossa cozinha.
Hoje ela está linda dentro de uma camisa social minha, apenas
com a calcinha por baixo.
Vê-la com ela, faz o sentimento de possessividade me inundar,
mas não demonstro. Não demonstro porque não preciso. Ela está
toda marcada por mim, e mesmo o banho não foi capaz de tirar o
prazer que foi marcar toda a sua bunda com a minha porra, depois
de comê-la de quatro.
Por que fui idiota e não fiz isso antes?
— Tá, essa foi uma pergunta estúpida, então, o que você acha
que eles irão perguntar?
Hoje de manhã, Matt entrou na minha sala e avisou que o
departamento de imigração havia entrado em contato acerca do
visto de Aurora.
Ele está meio abalado. Sua melhor amiga, Tiana, pediu para
que se afastasse, a pedido do noivo, e Matt não está lidando muito
bem com esse pedido, embora o respeite.
Eu entendo o noivo, entendo mesmo. Está na cara de todos
que Matt quer a sua melhor amiga, e é desconfortável para caralho
saber que um homem deseja a sua mulher.
Mas entendo Matteo mais ainda. Ele nunca seria o cara que
ultrapassa o limite com Tiana. Nunca fez isso em todos os anos de
amizade, não seria agora que ela está noiva que o faria.
Mas quando quis conversar, ele disse que preferia se
embriagar do que falar sobre sentimentos.
Sobre o visto de Aurora...
O departamento está desconfiado, então irão enviar uma
pessoa a serviço deles, para nos conhecer e entender melhor a
nossa situação, trazendo um questionário sobre nosso
relacionamento.
Matteo deixou claro que seriam perguntas íntimas, acerca de
coisas que apenas casais saberiam um sobre o outro, mas que
também teriam perguntas como: Há quanto tempo estão juntos? Por
que se casaram antes de fazerem o pedido do visto? Por que
Aurora já chegou pegando tantos projetos na sua empresa?
Mas também haveria perguntas do tipo: Qual a cor favorita
dela? Qual seu sonho mais íntimo? Qual calcinha fica melhor na
bunda dela?
Duvido que o homem faça essa última pergunta, mas Matt
ficou realmente curioso.
Filho da puta, né?
Aurora, para minha completa satisfação, dorme na minha
cama todos os dias e passamos o último mês fodendo como dois
coelhos no cio.
Meus olhos não saíram dela na semana passada, enquanto
apresentava um projeto na reunião e isso só confirmou a suspeita
que Matt e Léo tinham de que tínhamos algo. Então disse aos dois
que havia entrado na porta que ela deixou aberta.
Eu estava adorando.
Estava adorando ter ela disponível para mim.
Estava adorando estar disponível para ela.
Era a melhor coisa do mundo não precisar mais me controlar
perto do meu pedacinho de loucura, apenas ceder ao desejo que
tenho de fodê-la em cada canto daquela casa.
Amava fodê-la.
Ela é tão gostosa que queria não estar, mas estou viciado nela.
E agora, com a notícia da imigração, estamos tentando saber
mais um sobre o outro.
— Não faço ideia, só vamos tentar saber coisas que casais
normais sabem — Falo, distraído com a batata que estou cortando
em tiras.
— Estou tão lascada! Não sabemos nada um do outro — ergo
a sobrancelha, a fitando com sarcasmo. Seus olhos reviram. —
Além do que ambos gostamos entre quatro paredes.
Sorrio de lado.
Ela pode não saber muita coisa sobre mim, mas eu sei muita
coisa sobre ela.
Sei que ela ama trabalhar com terninhos, mas quando o clima
está quente, gosta de usar um vestido ou saia para não a deixar
irritada com o calor. Ela também come mais do que um elefante e
sempre tem um copo de água ou refri por perto para poder engolir,
senão se engasga, já que parece que nunca aprendeu a mastigar
na vida.
Também sei que sua comida favorita é hambúrguer, com
batata frita e Coca-Cola.
Que é justamente o que estou fazendo agora. Batatas na
airfryer, porque já basta de óleo no seu organismo.
Sei que a cor favorita dela é branco, o oposto da minha.
Assim como ela é o meu completo oposto.
Sei que ama Sandra Bullock e comédias românticas, enquanto
prefiro Jason Statham e filmes de ação.
Que prefere trabalhar com casas, enquanto eu prefiro
apartamentos.
Que geme mais gostoso quando aperto seu pescoço, mas eu
gosto mais quando arranha minhas costas.
Que sua posição favorita é por baixo, enquanto a minha é por
cima. O que não vou negar, é o oposto, mas se encaixa
perfeitamente.
Sei que seu beijo é o melhor do mundo e sua boceta a mais
viciante.
Sei muitas coisas sobre ela.
Sei todos os sorrisos dela.
— Certo — belisca as uvas que coloquei na sua frente para se
entreter enquanto termino de fazer o nosso jantar. Decidi comer
hambúrguer com ela hoje. Eu comendo hambúrguer só porque a
princesa quer. O que ela está fazendo comigo? — Qual o seu maior
sonho?
— Era ter meu próprio negócio, e que ele fosse um sucesso, já
faz anos que realizei, nunca pensei em um novo sonho. —
Pensando bem, é deprimente que meu sonho seja apenas trabalho.
— Sério? Não tem outra coisa que deseje tanto ao ponto de
sonhar com ela? — você, eu sonho com você.
Penso um pouco na sua pergunta, enquanto coloco as batatas
já cortadas, dentro da airfryer.
O que eu quero tanto?
— Acho que férias. Não sei o que é tirar férias há mais de
quinze anos. — Seus olhos arregalam em choque e sua boca cai
aberta.
— Mentira! — verdade. — Para onde você iria se tirasse férias
agora? Qual o lugar que já desejou ir, mas nunca pôde?
É difícil, porque já viajei para muitos lugares com Léo e Matt a
trabalho, estudando arquitetura e o mercado de ações.
— Grécia — respondo, depois de pensar um pouco. —
Sempre admirei muito a Grécia, gostaria de ir lá algum dia, a
arquitetura do lugar me encanta bastante.
Ela sorri.
— Ah, eu acho a Grécia linda demais, e amo a mitologia grega,
também. Sou apaixonada por Percy Jackson, então seria demais ir
lá algum dia. — Fecho a cara.
— Quem é Percy Jackson, Aurora? — resmungo. E onde
posso encontrá-lo?
Ela solta uma gargalhada.
— Ah, meu Deus, você não sabe quem é Percy Jackson? —
Nego. — É um personagem fictício, semideus, filho de Poseidon.
Tem até filme! Você estava com ciúmes de um personagem que
nem existe, Nicolas?
— Não — minto, na maior cara de pau, temperando a carne
para passar na chapa.
— Você não tem limite com essa sua possessividade — não
com ela e só com ela. — Continuando… meu maior sonho,
profissionalmente falando, é chegar no alto escalão dos designer e
sair em revistas com meu trabalho exposto e bem avaliado. —
Gosto que pense alto. Gosto ainda mais de saber que isso não vai
ser difícil de realizar. — Agora, sonho pessoal? Eu gostaria de
formar minha família um dia.
Paro o que estou fazendo, e a encaro.
Por que meu coração apertou?
Por que ele está estranho?
— Sua própria família? — pergunto com a voz rouca.
Ela dá de ombros, separando as uvas por tamanhos, como se
fosse algo que fizesse sentido.
Muitas coisas sobre ela nunca farão sentido para mim.
— Sempre fui sozinha, e não quero continuar assim para o
resto da minha vida. Quero ser de alguém, e quero que sejam meus
também.
— Você é minha, já — devolvo com meu coração na garganta
e seus olhos se erguem até os meus, arregalados.
Ela é minha.
— Eu sei — responde, mas sorri aquele sorriso de incerteza e
dá de ombros, tentando disfarçá-lo ao lembrar que sei o que eles
significam.
Eu sei o que ela está pensando.
Por quanto tempo? Por quanto tempo será minha se eu falei
que não seria o marido dela?
Eu quero ser o marido dela? Realmente marido?
Não. Eu a quero, mas isso não significa nada.
Corto os pães, tentando não pensar nisso e faço outra
pergunta.
— Qual é sua sua série favorita?
— Alquimia das Almas, queria não ter assistido só para sentir a
emoção de assistir tudo pela primeira vez.
— É tão bom assim? — Sua boca se abre.
— É só o melhor dorama lançado neste planeta! — solto uma
risada da sua empolgação. — Qual a sua série favorita?
— The Big Bang Theory — viro a carne na chapa, adicionando
em cima dela queijo, bacon que já estava pronto, e deixando
esquentar mais. — É uma série que você pode assistir quantas
vezes quiser e nunca irá enjoar. Você já assistiu? — A encaro,
vendo enfiar a última uva na boca.
Uva de sorte.
— Já sim, eu amo também! Tem algum livro favorito?
— Senhor dos Anéis: A Sociedade do Anel e você, tem? — ela
assente. — Vem me ajudar aqui, querida, preciso que vire as
batatas na airfryer, enquanto monto os hambúrgueres.
Ela salta do banco e dá a volta na bancada, fazendo
exatamente o que mandei.
— Reino de Cinzas, o último livro da série Trono de Vidro da
Tia Sarah. — Ergo a sobrancelha.
— Tem uma tia escritora? — Seu cenho se franze por um
momento, até que solte uma risada.
— Não, não. É que a Sarah J Mass, que é o nome dela, gera
vários memes na comunidade bookstan. Alguns chamam ela de tia
Sarah, outros Sarah Gmails, Sarah etc… é besteira, mas é divertido.
— Dá de ombros, tagarelando. — Minha cantora favorita é…
— Lana Del Rey — respondo por ela, levando o jantar quase
pronto para a mesa em uma bandeja, junto com o refrigerante sem
açúcar. Se ninguém colocar limite na Aurora, ela morre antes dos
quarenta só pelo que coloca na boca. — Eu tenho banda favorita,
Guns n Roses, tem uma música deles que me lembra muito você. —
O que faz ela se tornar minha favorita.
— Como sabe que minha cantora favorita é a Laninha? —
Reviro os olhos e ergo a sobrancelha a encarando. Ela solta um
suspiro. — Tá bom, talvez eu cante músicas dela algumas vezes
durante o dia. — Ergo a outra sobrancelha. — Entendi, coroa. Mas
que música te lembra a mim?
— Sweet Child O’ Mine — seu sorriso aberto me faz sorrir
também. — Conhece, não é?
— É a única que eu conheço — solto uma risada e seus olhos
brilham.
Eles sempre brilham quando sorrio ou gargalho.
Mas não significa nada.
— As batatas estão prontas? — ela olha dentro da airfryer e
ergue o polegar. Me aproximo, e começo a organizar o que falta
para nos sentarmos à mesa.
Logo estamos comendo e Aurora começa a falar mais sobre si.
— Então, eu gosto de dançar, sabe? Vez ou outra eu danço
sem nenhum sentido, escutando músicas que me alegram, também
gosto muito do meu trabalho e tudo o que sinto quando transformo o
interior do lar das pessoas, é vontade de um dia ter o meu também
— porque ela sempre me faz ficar sem fôlego com as coisas que
diz?
— Você pode trabalhar aqui, se quiser — aponto para o
apartamento e seus olhos se arregalam.
— Sério? Posso dar vida a essa coisa sem graça? — fecho a
cara, escutando sua risada.
Sabia que ela não gostava da decoração do apartamento,
embora goste da arquitetura.
— Não me faça mudar de ideia — resmungo, a observando
comer. — Mastiga, porra! Toda vez isso, Aurora, alguma vez você
aprendeu que precisa mastigar antes de engolir essa merda e que
sua boca não é um saco para encher desse jeito? — repreendo de
novo, e parece que vou fazer isso para sempre, porque ela nunca
aprende, merda. Começo a mastigar com calma, apenas para que
veja como se faz e seus olhos reviram.
Ela começa a mastigar com raiva, e desvia o olhar.
— Posso fazer o projeto no estilo que eu quiser, ou você tem
um em específico que goste mais, além do de cemitério? — cerro os
olhos.
— Pode ser o que você quiser — contanto que não seja tudo
rosa. — Eu não danço. — Ela faz uma careta. — Mas gosto de
música, e de filmes da Marvel. Queria ter um cachorro, mas eles
necessitam de atenção e não tenho como dar, então acho que
adotaria um gato.
Não sei se o cara da imigração perguntará sobre isso, mas
está tão confortável falar sobre essas coisas com ela.
Coisas que eu gostaria de fazer, ter, ou simplesmente porque
gosto.
Sobre nós dois.
Estou amando saber mais dela.
— Eu gosto de gatos, e de cachorros também, o que acha dos
coelhos? — ergo a sobrancelha.
— Fofos.
— Teria um? — penso um pouco, enquanto bebo refrigerante.
— Não sei, você teria?
— Teria, são fofos, como você disse. Então, tem crush em
alguma famosa?
— Não acho que o departamento de imigração colocaria esse
tipo de pergunta no questionário. — Rio. — Não, não tenho, você
tem?
— Henry Cavill — reviro os olhos com força. — Que foi? Ele é
lindo!
— Eu sou lindo, Aurora. — Devolvo, fechando a cara. — O que
esse cara tem que todas as mulheres têm crush nele?
— Tudo? — pergunta como se fosse óbvio. — Tudo bem, tudo
bem, não vamos atiçar seu lado ciumento que ativou com Percy
Jackson que é fictício, imagina com um real? — Boa garota. — O
que mais eu preciso saber sobre você?
Volto os olhos para minha mão, com quase metade do meu
jantar já devorado e penso se conto ou não sobre meu passado.
Ela sabe sobre meu namoro com Riley, sabe sobre minha
empresa, sabe sobre meu relacionamento com meu irmão e melhor
amigo. Sabe que sei cozinhar, e várias outras coisas que aprendeu
hoje.
E eu sei sobre o passado dela e o motivo que a fez vir para os
Estados Unidos.
— Quando tinha dois anos, Léo nasceu. Ele se tornou a
pessoa que eu mais amo no mundo no segundo em que o vi. Nosso
pai havia ido embora, eu não tinha entendido na época, nem me
lembro dele, na verdade, então era a única figura masculina dele.
Léo me seguia para todos os lados e eu amava isso. — Eu amava
Léo. Ainda amo. Aurora termina de comer e fica cutucando as
batatas, me observando falar. — Quando tinha quinze anos, nossa
mãe foi embora e nos deixou sozinhos, tomei a total
responsabilidade de sustentar Léo e de agir como seu pai e sua
mãe. É por isso que sou mais fechado e como ele gosta de dizer,
careta. Mas foi porque sempre precisei ser responsável por ele e
fiquei com muito medo de errar e ele me odiar.
Seus olhos suavizam, sua cabeça tombando para o lado.
— Oh, Nick. Léo nunca odiaria você — eu sei. Mas o
sentimento era o mesmo.
Dou de ombros e continuo falando.
— Perdi minha virgindade com quatorze anos, trabalho desde
os dez, onde limpava o terreno do vizinho. Não tenho avós
maternos, eles morreram antes que eu nascesse e não sei quem
são os paternos. — Ela não desvia o olhar, nunca, eles apenas
brilham mais. — Minha primeira namorada foi aos vinte e quatro
anos, se chamava Emily, nem lembro mais o sobrenome ou qual era
a cor dos olhos dela. Gosto de assistir a jogos de futebol americano
e hóquei, mas amo assistir basquete com Léo e Matt. — Matt é a
segunda pessoa que mais amo no mundo. — Acho que a última vez
que chorei foi quando Léo ganhou uma bolsa para arquitetura.
— A última vez? — pergunta incrédula. Sorrio, assentindo. —
E quando terminou com Riley? Ou conseguiu seu primeiro cliente?
Ou conquistou seu primeiro milhão?
— Nada disso se comparou a ver a felicidade do meu irmão ao
receber aquela bolsa, você tinha que ver, Aurora. Não tínhamos
nem onde cair mortos e nossa mãe abusava psicologicamente dele
— não falarei o que ele sofria, isso é Léo que deve contar, é sobre
ele. — Então quando ele viu que tinha a chance de um grande
futuro nas mãos, foi o melhor dia da vida dele.
— Você ama muito o seu irmão. — Assinto e solto um suspiro.
Amo. Amo mesmo.
— É isso — já despejei muita coisa, mais do que fiz com Riley
em quatro anos de relacionamento, porque ela nunca soube do meu
passado.
Mas vai que o cara da imigração pergunta?
Foi só por isso. Não significa nada.
Volto minha atenção para a comida e continuo a jantar, como
se não tivesse despejado minha vida em cima dela.
— Perdi minha virgindade com quinze anos, com meu primeiro
namorado e me iludi pensando que me pediria em casamento
depois da formatura. — Ergo os olhos, mas ela não me olha
enquanto continua divagando. — O nome dele era Thomas, e ele
era bastante popular, mas me deixou assim que se formou. Nunca
tive nenhum animal de estimação, meu primeiro show foi da Lana,
na Califórnia, no meu terceiro ano aqui nos Estados Unidos,
inclusive, me mudei para cá com dezesseis anos, e meus pais,
assinaram tudo o que podiam assinar para que eu vivesse sozinha
com essa idade, já que não queriam mais me ver. Meus avós, tanto
maternos, quanto paternos, são iguais aos meus pais, e
simplesmente me viraram as costas quando dei uma de “rebelde”.
Não tenho irmãos. Ou não tinha quando saí de lá. Já quebrei o
braço escalando uma mangueira, as mangas estavam muito altas e
as que caíam esbagaçavam no chão, então tentei a sorte em tirar
uma verde. — Seus olhos reviram, mas tem um sorriso nostálgico
no rosto. — Foi uma péssima ideia. Meu aniversário é dia quinze de
dezembro, então sempre ganho apenas um presente neste mês, o
de Natal. Inclusive, Natal é minha época favorita do ano. Sou
sagitariana, o que explica muito a minha personalidade e não gosto
de filmes de terror. — Dá de ombros e toma refrigerante.
— Só um presente em dezembro? — pergunto sem acreditar
que alguém tenha tido coragem de fazer um negócio desse com ela.
É aniversário.
É natal.
No mínimo, deveria receber dois presentes, e nas datas certas.
— Acredita nisso? Uma lástima — nega com a cabeça e seu
cabelo balança, deixando uma mecha encaracolada cair na testa.
Tão absurdamente linda.
— Meu aniversário é em fevereiro. Dia doze. — Revelo, o que
foi uma idiotice não ter revelado no começo. — Terminou? —
pergunto, apontando para o seu prato.
— Sim, tô bem cheia, você é ótimo na cozinha, sabia? Devia
me ensinar algumas coisas, não sei fazer quase nada além do
essencial. — Me levanto, pegando nossos pratos e os levando para
a pia. Ela pega o restante da louça e me ajuda.
— O que considera essencial?
— Pão com ovo, miojo, água quente — solto uma risada alta, e
deixo a louça na pia para lavar mais tarde, me virando para ela.
Agarro sua cintura e a ergo para colocá-la em cima da
bancada, me encaixando em cima dela.
— Posso te ensinar quando você quiser, basta pedir — beijo
sua bochecha, tirando aquela mechinha de cabelo e a levando para
trás da sua orelha. — Você fica linda com minha camisa em você,
sabia?
— Por que não assume que é só possessividade por me ver
em algo seu? — brinca, circulando meu pescoço com os braços.
— É possessividade, mas é um fato, você é linda,
principalmente usando minhas roupas. — Sorrio, vendo seu sorriso.
— Será que isso foi o suficiente para conhecermos um ao outro?
— Eu ainda tenho muito o que saber sobre você, Nick —
sussurra, toda sensual.
— Tipo o quê?
— Você vai saber quando chegar a hora — diz e me beija.
E eu sei, sei que tudo o que quiser saber sobre mim, direi.

É esse o poder que os sorrisos


dela têm sobre mim.
Eu acho que vou sentir sua falta
para sempre.
Como as estrelas sentem a falta
do sol nos céus da manhã.
Antes tarde do que nunca.
Mesmo se você tiver ido, eu vou
dirigir.
(Summertime Sadness - Lana
Del Rey)
— Casada? — que saudade eu estava de ouvir essa voz.
Finalmente criei coragem de falar para Elisa, que está
aproveitando o mestrado em Londres, sobre tudo o que aconteceu
em Vegas.
A parte que me lembrava, no caso.
Só havia contado a ela o que sua prima e as cunhadas fizeram
e que acordei na cama de um estranho. Não revelei que havia
cometido a maior loucura da minha vida ao me casar com um
desconhecido e aproveitar a oportunidade para ficar no país.
Desde que viajou, temos nos falado por mensagem, mas ainda
não havia tido a oportunidade — coragem — de falar para ela sobre
Nicolas.
Até hoje.
— Desculpa não ter te contado antes, amiga, mas foi uma
loucura enorme, eu sei disso, e não queria que me julgasse. — Falo,
olhando para as latas de tintas na minha frente.
O tom acinzentado das paredes de Nicolas não é ruim, mas
gosto do tom marmorizado do seu quarto, então estou pensando
seriamente em fazer isso pelo apartamento inteiro.
Tirei o dia de hoje para começar a minha reforma dentro do
seu apartamento, tudo o que ele tem é bom, mas é sem graça e ele
me deu carta branca para fazer o que eu quisesse.
Não vão ser muitas mudanças.
— Não julgaria você, Aurora, te internaria no hospício, sua
louca! — Acho que Nicolas te ajudaria, Elisa. — Não pode mesmo
estar falando sério, não era você que estava falando que Lily era
doida por se casar tão nova? — Ah, é. Falei sim.
Enquanto estávamos voando para Vegas, mas eu não tô só
quebrando a cara desde que nasci? O que é mais uma porradinha
no meu orgulho? Nada.
Nem orgulho eu tenho mais, minha dignidade há muito foi
jogada no lixo.
— Mas eu meio que não escolhi casar por vontade própria, né,
Elisa? Foi a bebida que fez isso por mim. Eu só escolhi continuar
casada. — Precisei, precisei continuar casada.
E que ótima decisão.
— Com um homem que você acabou de conhecer!
— Já o conheço bem, agora — argumento, escolhendo a tinta
cinza mais clara e a mais escura, tentando pensar em como
misturar as duas cores em apenas uma parede.
Estou começando a reforma pela lavanderia que é onde
menos entramos. Graças a Deus, Nicolas paga dona Cecília para
lavar e organizar a casa, eu sou uma bagunça ambulante e Nicolas
é até organizado, mas não tem muito tempo de sobra na sua
agenda.
Então, quando pintar, o cheiro de tinta não vai incomodar
muito.
— Você precisa de um psiquiatra, urgente, Aurora! — todos
precisamos, Elisa. Reviro os olhos e saio em busca de um copo de
água e alguma frutinha, porque Nicolas disse que se eu quiser
continuar comendo besteira, preciso equiparar com comidas
saudáveis.
Eu disse que ele não mandava em mim.
Aí ele disse que eu não era uma criança e que precisava
começar a me alimentar como gente.
Eu sou gente!
— Bem, aconteceu, passou e estamos bem agora.
— Defina “bem”. — Escuto seu tom incrédulo, mesmo que
tente disfarçar.
— Estamos fodendo. — Escuto quando se engasga e sorrio
para a geladeira.
— Você se apaixonou pelo seu marido?! — tiro o celular da
orelha com seu grito e sinto meu coração acelerar.
Depois começo a rir, porque é tão surreal escutar essa frase,
que em outra circunstância seria idiota.
“Você se apaixonou pelo seu marido?
É óbvio, muito antes de casar”
Agora quando essa pergunta é feita na minha situação? Uma
tragédia.
— Não, né, Elisa? A gente só está aproveitando que já
estamos juntos, para se curtir, você já viu como ele é gostoso?
— Tô com a tela do meu computador aberta em matérias
sobre ele, é um pedaço de mau caminho mesmo, e ainda tem irmão.
Cê tá muito bem servida.
— Eu tô.
— Mas tem certeza de que não é um psicopata?
— Tenho, vamos nos divorciar daqui a três meses, ele está me
ajudando, me deu emprego, um teto, ele é bom, Elisa — ele é ótimo,
na verdade.
Maravilhoso.
E eu não queria me divorciar dele.
Mas isso não significa que estou apaixonada.
Só que gosto dele.
Eu gosto de Nicolas. Gosto muito.
— E tem certeza de que não está apaixonada por ele? —
reviro os olhos, pegando uma maça na fruteira depois de beber
água e começando a comê-la.
— Absoluta. — Mesmo que ele tenha comprado quase a
coleção nova inteira de roupas do amigo estilista para mim.
Mesmo que esteja pensando nele nesse exato momento.
— Que bom, porque você já foi sem noção ao casar em Vegas
com um desconhecido, se apaixonar por ele seria ainda mais —
solto uma risada alta.
— E como está aí, em Londres? E seu namoro? — Pergunto,
tentando sair do alvo da conversa.
— Aqui está ótimo, e meu namoro continua o mesmo de
sempre, sabia que semana passada eu fui sondada por uma
empresa grande, aqui? — Elisa é formada em tecnologia da
informação, e quando ela diz empresa grande, tenho certeza de que
quer dizer do nível de Mark Zuckerberg.
— Sério? — Pelos próximos minutos, Elisa me conta tudo o
que está acontecendo de novo na sua nova vida, tanto com o
namorado, quanto com os pais.
Gosto de falar com ela.
Tenho Nicolas, e falo com Léo e Matt, mas é bem
superficialmente.
Conversar com Elisa, mesmo sabendo que o tempo e a
distância vai nos afastar, é um respiro nesse mundo um pouco
solitário.
Um mundo que só é preenchido por mim e Nicolas. Enquanto
o mundo dele tem outras pessoas.
Se alguém chegasse agora e me perguntasse quem é a
pessoa mais importante para mim, eu diria que é ele.
Não porque ele signifique o meu mundo, mas porque todas as
outras significam menos e é a pessoa mais próxima de mim, a única
na verdade, já que não tenho mais ninguém. Isso é triste.
Saber que um cara que eu conheci há três meses e por dois
desses meses não tínhamos uma relação de amizade é a pessoa
mais importante para mim, é péssimo.
Ao mesmo tempo, saber que ele está ali, que confio nele e que
sinto por ele um carinho enorme, faz meu coração bater mais forte.
Mesmo quando brigo comigo mesma para não sentir essas coisas.
Quando a ligação com Elisa termina, fico sozinha com meus
pensamentos.
Nicolas está trabalhando e hoje é meu dia de folga, então
estou sozinha. Sozinha para olhar ao meu redor e ver que esse
apartamento lindo e que vai ficar ainda mais depois que eu der o
meu toque… não é meu.
Sozinha para ver que um dia precisarei sair daqui.
Será que Nicolas se tocou que a data do nosso divórcio vai
cair pertinho do meu aniversário? Me formei e me casei em junho, e
nossos seis meses acabam em dezembro.
Será que ainda vai querer ficar comigo depois que esse acordo
acabar?
Será que eu vou querer?
Será que quando o Natal chegar, vai me dar outro presente?
Será que vai dar o primeiro, que é no meu aniversário? Ele pareceu
bem indignado quando falei que só recebia um.
Será que vai passar o Ano-Novo aqui ou vai viajar com os
amigos? Tudo é uma incógnita.
Por enquanto está tudo indo a mil maravilhas, ainda flertamos,
só que agora geralmente acaba com nós dois na cama, ainda
discutimos, mas novamente, acaba com nós dois na cama, mas é
isso.
Sexo.
Para ele.
E para você também, Aurora!
Ele cuida de mim, eu sei disso, mas no final… eu não sei. Não
sei mesmo o que acontecerá, porque temos um prazo de validade e
nenhum de nós dois gosta de tocar nesse assunto, então, conecto
meu telefone na Alexa e coloco uma playlist aleatória para tocar,
uma feliz, porque nem só de Lana Del Rey vive essa putinha aqui e
não quero mais saber de depressão e coisas para baixo. E começo
a dar vida a esse apartamento.
Você é como uma droga que está
me matando.
Eu te elimino completamente.
Mas fico nas alturas quando estou
dentro de você.
Sim, você pode recomeçar, pode
correr livremente.
Pode encontrar outro peixe no
mar.
Pode fingir que estava destinado
a acontecer.
Mas não consegue ficar longe de
mim.
(Animals - Marrom 5)

Não estava nos meus planos passar o dia pensando nela.


Não estava hoje, não estava ontem, nem anteontem. Mas ela
não sai da minha cabeça em momento algum!
É como se estivesse tão marcada em mim como uma
tatuagem.
Inclusive, vontade de fazer uma nunca me faltou.
Assim que bateu o horário padrão para a saída da R&C, pulei
da minha mesa, peguei meu carro e dirigi como louco de volta para
ela.
Senti saudades dela.
Passei o dia sentindo saudades dela.
Por quê?
Pois ela não foi trabalhar comigo hoje por estar de folga? Não,
porque simplesmente sinto falta dela assim que sai do mesmo
cômodo em que estou.
Encaixo a chave na fechadura da minha porta e destranco,
ouvindo a voz de Lana Del Rey tocando na Alexa em alto volume.
Chemtrails Over The Country Club me agracia com a visão da
minha mulher se balançando e rodando lindamente pela sala, como
uma verdadeira bailarina.
Me lembro de me falar que gosta de escutar música e dançar
sem sentido algum e agora que entendo. Seus passos não têm
coreografia, ela apenas sorri e se balança de olhos fechados, em
um vestido azul claro, de alcinhas com laços nos ombros e soltinho
na saia, com estampas de várias flores diferentes.
Tão adorável.
Um anjo.
Um anjo lindo que andou mexendo no apartamento, se o
cheiro de tinta vindo de algum lugar indica algo.
Ela não nota minha presença, apenas continua se movendo
como se a música estivesse tomando conta do seu corpo, a
movendo como se fosse o mar. Tranquilo e revolto ao mesmo
tempo. É essa a sensação que ela passa. É desse jeito que se
move.
Os cabelos estão presos no alto da cabeça por um coque
frouxo, deixando vários cachos emoldurando seu belo rosto e não
consigo não me aproximar dela.
Meus passos me levam até o meio da sala, antes que eu
possa notar, onde deixo minha maleta de trabalho em cima do sofá
e acabo despertando sua atenção. Ela para de rodopiar com a
melodia lenta e me encara.
Seu sorriso é de surpresa.
— Você chegou! Não te ouvi abrindo a porta — que bom,
porque teria parado de dançar se fosse o caso, como está fazendo
agora.
— Acabei de entrar — me abaixo para beijá-la, quando seus
braços circulam meu pescoço. — Você está linda. — Sussurro
contra sua boca.
— E você também — suado, e cansado, mas aceito seu elogio
com um sorriso no rosto.
— Estava dançando sem sentido?
— Estava dançando sem sentido — ri. — Teve azar de me
pegar só nessa melodia, hoje quebrei um copo quando fiz uma
coreografia ensaiada e estiquei muitos os braços, tocando no
coitado sem querer. — Gargalho, beijando-a de novo.
— Gostaria de ter visto isso — confesso e puxo seu corpo para
mais perto. — Dança comigo.
Seus olhos se arregalam em surpresa.
Você não está mais surpresa do que eu, querida, só que não
consigo evitar. A vontade despertou assim que te vi.
— Você não dança. — Fala com o rosto corando e puta merda,
essa garota corando é tudo pra mim.
— Por você, eu danço — movo nosso corpo, de acordo com a
melodia lenta e Aurora sorri pra mim. Aquele sorriso que deixa seus
olhos brilhantes. Então, ela encaixa uma mão na minha, enquanto a
outra fica no pescoço e deita a cabeça no meu ombro.

I'm in the wind, I'm in the water.


Nobody's son, nobody's daughter.
Watching the chemtrails over the
country club.
Suburbia, The Brentwood Market.
What to do next? Baby, what of it?
White picket, chemtrails over the
country club.

Ela cantarola baixinho, movendo os pés, não sei o que estou


fazendo, apenas deixo a música nos levar em um vai e vem lento,
até a giro para deixá-la feliz e escuto sua risada alegre ao voltar pra
mim e me olhar com muitos sentimentos nos olhos verdes.
Assim como ela pode ver muitos nos meus.
Nos balançamos ao ritmo da voz de Lana, olhando um nos
olhos do outro e vez ou outra, a giro em meus braços, fazendo seu
vestido se abrir sobre seu corpo, e vários cachos se soltarem do
penteado.
Gosto do que estamos fazendo.
Gosto de dançar com ela.
Ela.
Eu gosto dela.
Quem diria, não?
Aproximo meu rosto do seu, totalmente ruborizado e a beijo,
tão lento quanto nos movemos.
Seus lábios nos meus são doces, ela me prova como se
estivesse morrendo de fome, explorando minha boca com a língua,
perseguindo meus movimentos com ela, assim como faz com o
corpo.
Ela se encaixa tão bem em mim.
Assim que a música chega ao seu fim, ela se afasta com um
sorriso no rosto.
— E não é que você sabe dançar? Para alguém que disse que
não dançava, guiou meu corpo como ninguém.
— Eu só balancei você de um lado para o outro, Aurora. E te
rodopiei, não vejo isso como uma grande apresentação. — Ela ri.
— Como foi seu dia? — pergunta, ainda com as mãos em meu
pescoço.
Chato.
Senti sua falta.
— Mais do mesmo — é o que respondo.
— Saiu hoje ou só ficou na empresa? Se tiver saído e não tiver
me convidado, vou ficar puta, Nick.
— Não saí, mas mesmo se saísse, hoje é seu dia de folga, e
parece que não foi tanto assim, tô sentindo cheiro de tinta. — Seu
sorriso de quem aprontou aparece.
— Pintei a parede da lavanderia, um tom parecido com o
marmorizado do seu quarto, apenas para fazer um teste na
iluminação, ficou lindíssima. — Eu acredito.
Ergo a sobrancelha.
— Você que pintou? — Ela assente. — Por que não chamou
alguém para fazer isso? Eu nem mesmo sabia que você sabia pintar
uma parede.
—Eu tenho vários talentos que você não sabe e que só vai
saber com o tempo, seja paciente, homem! — Reviro os olhos. Por
dentro, fico ansioso para descobrir cada um deles. — Pintei para
fazer o teste, mas quero te mostrar para saber se gostou, porque aí,
eu chamo alguém profissional para vir pintar.
— Vou gostar, seus projetos são incríveis — afirmo, levando
uma mecha do seu cabelo para trás da sua orelha.
— Fiz o jantar — fito seus olhos e ergo a sobrancelha.
— Pizza ou…
— Filé com risoto — o meu favorito. Deixo um beijo no seu
queixo.
— E fez o jantar em qual restaurante? — ela gargalha, se
soltando dos meus braços e me virando as costas.
— No que você sempre pede, oras, é o seu favorito. — Dá de
ombros e começa a caminhar para a cozinha. — Vai tomar banho
enquanto preparo a mesa.
Ela não me espera responder, apenas rebola até a cozinha,
gritando para a Alexa tocar Summertime Sadness.
Nego com a cabeça e faço exatamente o que pediu.
Faço com meu coração acelerado.
Faço com vários pensamentos sobre ela.
Faço sem saber o que isso significa.
Não significa nada.
Nego com a cabeça e faço exatamente o que pediu.
Amor (sim).
Eu disse que amor verdadeiro.
É como não sentir medo algum.
Quando você está diante do
perigo.
Porque você simplesmente quer
muito aquilo.
(Cherry - Lana Del Rey)
Estou ficando doida ou tem mesmo algo se mexendo naquele
saco de lixo?
Não, doida eu já sou, então é provável que seja coisa da minha
cabeça, só que… parece mesmo que tem algo se mexendo lá
dentro.
Havia saído apenas para comer um saco de M&Ms, sem estar
sobre a mira de Philips — aquele loiro safado gosta de pedir e não
estou a fim de dividir meu chocolate hoje — na parte da frente da
R&C, mas do outro lado da rua, tem um beco onde ficam umas
caçambas cheias de sacos de lixo e havia sim, algo se movendo
dentro de um deles.
Será que é um rato?
É claro que é um rato! O saco é de lixo!
Mas e se não for?
E se alguma filha da puta tivesse deixado um bebezinho ali?
Não vivem saindo notícias assim nos jornais? Ainda não consigo
colocar na minha mente uma explicação para essa gente
perturbada. Tantos lares adotivos e mães prontas à espera de uma
oportunidade e tem desalmadas que não tem o mínimo senso e
fazem uma patifaria dessa!
Tá bom, é melhor ir checar.
Não acho que seja um bebê, talvez seja um gatinho fofo e de
rua, de qualquer modo, deve ser difícil respirar dentro de um saco.
Atravesso a rua na faixa e corro até a caçamba de lixo,
enfiando meus chocolates no bolso da calça de alfaiataria que
Nicolas comprou para mim no dia da inauguração do amigo e me
aproximo do saco, que está fechado.
Ainda não acredito que ele comprou todas as peças que eu
mais gostei sem nem mesmo eu ter pedido.
É ainda mais difícil ele ter comprado essas peças sem me
perguntar qual eu havia gostado mais, e ter simplesmente acertado
todas.
Mas o que esperar de um homem que gosta de estar no
controle?
Nicolas gosta de me deixar feliz e…
— Au.
Arregalo os olhos, sem me importar em sujar minhas mãos e
pego o saco abrindo com um puxão e vendo uma cena que nunca
vai sair da minha mente.
Um filhote.
Um filhote de cachorro, com olhinhos inocentes e que estava
dentro de um saco fechado.
Para morrer.
Alguém o deixou nesse saco para morrer!
Meus olhos marejam, e meu coração acelera quando pego o
pacotinho de fofura que choraminga nos braços. Um filhote de
beagle, com a pelagem branca e marrom.
Meu Deus! Como alguém teve a coragem de deixar essa
preciosidade aqui? Como existe esse tipo de monstro no mundo?
O pequenino começa a farejar em minha direção, lambendo a
minha mão e meu peito se enche de amor.
Olho para os lados e pego o meu celular para fazer uma
ligação.
— Desde quando tem meu número?
— Desde sempre, você está muito ocupado?
— Para você? Claro! — reviro os olhos.
Minha relação com Léo melhorou depois que ele descobriu que
o irmão tinha realmente esquecido o que eu fiz e começamos a ter
algo. Léo não acha mais que está traindo o irmão ao confraternizar
com o inimigo, mas nossa relação é assim.
Regada ao mais puro sarcasmo.
— Preciso que me ajude com algo — choramingo, olhando nos
olhos pretinhos do filhote. — Mas tem que ser agora.
— O que você quer?
— Que vá comigo a um lugar.
— Para o aeroporto? Pelo menos se despediu do meu irmão?
— Há há há, engraçadinho. Preciso que vá em outro lugar
comigo e não é para o aeroporto.
— Está com sorte, acabei de chegar de um restaurante e ainda
estou no estacionamento. Te espero no meu carro.
Ele não espera uma resposta, apenas desliga na minha cara,
mas eu? Eu estou sorrindo quando saio do beco e atravesso a rua.
O pequeno em meus braços parou de choramingar e agora
está deitado, com os olhos fechados, e a linguinha para fora, tão
quietinho...
Que fofura, modeusoooo!
Será que Nicolas me deixa ficar com ele?
Ele disse que não tinha um porque não tinha tempo para
cuidar, mas eu tenho. Além disso, quando tudo isso acabar —
porque um dia vai — eu levo o cachorrinho comigo.
Ele nem vai precisar se incomodar com esse neném.
Sempre quis ter um animalzinho de estimação para me fazer
companhia.
— Quem foi o monstro que fez isso com você, hum, neném? —
falo amorosamente e com uma voz mansa. — Vamos torcer para
que ele pegue uma doença venérea, hum? Que tal? — Ele abre o
olhinho brilhante e late. — Oh, esse desnaturado merece uma
praguinha, quem deixa uma coisa linda como você para morrer,
hein? É sim, você é lindo — e pulguento, se essa pulguinha na testa
dele diz algo. — Vamos cuidar de você, hum? Tá com fominha, tá?
Fico tão distraída com o cachorrinho, que quase sou
atropelada por um táxi, quase no fim da faixa de pedestre.
Mas consigo me desviar ao escutar a buzina alta.
— NÃO SABE DIRIGIR, NÃO TIRA A CARTEIRA DE
MOTORISTA, PORRA! — Xingo alto, com o coração na garganta e
corro para o estacionamento.
Vejo o carro de Léo e ele mexendo no celular no banco do
motorista, distraído enquanto me aproximo.
Sento ao seu lado e ele pula de surpresa. Pula mais ainda
quando olha em minhas mãos e vê o cachorrinho.
— Onde você achou isso, Aurora? — exclama em choque.
— Não o chame de “isso”, é um filhotinho e já está muito
sensível, acredita que o colocaram em um saco de lixo fechado para
morrer? — Tadinho!
— Você estava fuçando o lixo por quê? — ele liga o carro e
começa a manobrar para a saída.
Reviro os olhos.
— Não estava fuçando o lixo, mas vi o saquinho se mexendo,
tive que conferir. — O filhote me olha como se dissesse: que bom
que conferiu.
Sim, neném. Que bom!
— Poderia ser um rato — poderia — e por que você está tão
ofegante?
— É que um táxi quase me atropelou.
— Qual era a placa para eu dar cinco estrelas? — ponho a
mão no coração e escancaro a boca em choque.
— Que horror! — ele ri. — Sabe onde tem algum veterinário
nas proximidades? — pergunto, e ele assente.
— Sei, fiquei com uma mulher na semana passada que pediu
para passar em um veterinário aqui perto na manhã seguinte,
porque o seu cachorro estava internado. Ela me fez pagar o
veterinário, acredita? — ergo a sobrancelha.
— Estão juntos há muito tempo?
— Conheci ela naquela noite, Aurora. Fodemos e no outro dia
eu estava sendo cavalheiro ao pagar o veterinário. Foi só porque
dormi demais, geralmente saio antes que elas acordem. — É um
safado mesmo.
O encaro e balanço a cabeça em negação.
— Não dá nem café da manhã?
— Eu disse geralmente, não sempre — se defende, como se
tivesse uma defesa.
— Sair depois de comer é falta de educação, Léo, sair depois
de comer e ainda deixar a pessoa com fome é desumano — igual a
pessoa que deixou esse cachorrinho lindo no lixo. — Você não é um
cachorro como o tio Léo aqui, né, neném? — faço a voz fofa e ele
começa a se mexer em meus braços, me olhando e balançando o
rabo.
Não tem nem tamanho, gente!
— Não sou tio dele — é mesmo? E por que tá olhando para ele
com os olhos brilhando?
— Já teve um cachorro, Léo?
— Nunca — murmura, parando no sinal vermelho. — Tinha
que estudar muito quando era novo para compensar Nick, já que ele
trabalhava feito um condenado. Focava todo o meu tempo em
estudar para um dia conseguir um bom emprego e devolver a ele
todo o esforço. Depois que começamos a empresa, mesmo eu
trabalhando menos tempo que ele, ainda não é o suficiente para ter
um cachorro. Eles demandam muita atenção.
— Não acho que Nicolas esperava que você devolvesse o
esforço dele, ele só cuidou de você porque te ama, não porque
esperava algo em troca. — Léo faz uma careta, avançando quando
o sinal abre.
— Já estão conversando sobre o passado? — desvio o olhar
para a rua, mordiscando o lábio, assim como o filhote mordisca meu
dedo.
— Precisamos conversar, um funcionário do departamento de
imigração vai nos fazer perguntas sobre o nosso relacionamento, e
queremos saber tudo um sobre o outro para poder despistá-los. — É
só isso.
— Conversinha fiada — Léo resmunga, estacionando o carro
na frente de uma clínica veterinária. — Esse negócio entre vocês,
como tá indo?
Curioso, hein?
Ergo a sobrancelha e abro a porta, com meu dog latindo nos
braços. Saio do carro e começo a caminhar, sabendo que o
fofoqueiro está atrás de mim.
— Estamos bem, somos amigos e estamos fodendo, quer
coisa melhor? — entro e vejo uma atendente, de cabelos ruivos bem
sorridente, me olhando. — Oi, boa tarde, eu achei esse filhotinho, e
queria fazer um check-up nele.
Ela olha para meu cão e fala.
— Como ele é lindo! Achou ele faz muito tempo? Ele parece
não ter mais do que umas semanas.
— Achei não faz uma hora, dentro de um saco de lixo, acho
que está com fome, também — falo e ela assente, se levantando.
— Vou chamar a doutora, pode esperar ali. — Aponta para uns
bancos na lateral e assinto, indo até lá e me sentando.
Léo se senta ao meu lado.
— Só fodendo? Ele disse que você está reformando o
apartamento. — O que você quer saber, hein, Léo? Por que não
pergunta logo?
— E o que uma coisa tem a ver com a outra?
— Que se vocês estão apenas fodendo, significa que um dia
ainda vão assinar o divórcio, mas você está arrumando o
apartamento do jeito que você quer, o que significa que planeja ficar,
não acho que vocês dois estão sabendo foder direito, acho que
estão mais envolvidos do que pretendiam. — Meu coração dá um
salto.
E cai espatifado no chão.
Ergo os olhos até os seus e faço uma careta.
Será? Será que estamos mais envolvidos do que
pretendemos? Não, não estamos.
Eu gosto de Nicolas, gosto muito, mas nós fizemos um acordo
silencioso de não nos apaixonarmos, e isso significa, que um dia
aquele divórcio vai ser assinado.
Que um dia seremos duas pessoas solteiras de novo.
Talvez Nicolas até comece a namorar alguém que realmente
tenha sido escolha dele, e não alguém que o tenha obrigado a ficar
com ela.
Então, mesmo se meu coração acelerar em sua presença, se
meu estômago gelar quando sorri, e todo o meu corpo o sentir,
quando está perto, isso não significa que estamos mais envolvidos
do que a maioria.
Só que nós estamos em sintonia.
“Não vai me ter como marido.”
Lembrar que Nicolas disse isso, vai me ajudar a não enganar
meu coração, ele não vai ser tão bobo de acabar comigo assim.
— Ou significa que ele tem um apartamento muito sem graça e
que chamou sua melhor funcionária para mudar para ele. — Dou de
ombros, fingindo indiferença, mas o rosto de Léo me diz que sabe
que estou mudando de assunto. — Não planejo ficar, Léo, sei o meu
lugar nessa história. — “Não vai me ter como marido”. — Quando
ele me entregar os papéis do divórcio, farei o que prometi a ele e
assinarei.
Mas não sorrindo.
Agora, com toda a certeza, vai ser chorando.
— Já que você diz — comenta, não caindo nem um pouco na
minha lábia, mas não tento mais me explicar, porque a veterinária
chega e me convida para a sua sala.
Graças a Deus.

A porta da frente se abre e meu coração acelera de nervoso.


Apenas uma mensagem o avisando que precisava sair mais
cedo foi o que recebeu de mim, mas o que eu poderia fazer? Tinha
que passar no pet shop, comprar ração, roupinhas, remédios,
vasilhas, uma caminha linda, algumas coleiras, de diversas cores,
para combinarem com as roupinhas e claro, chocolate para mim.
Hoje é o último daqueles dias, e tudo o que mais gosto nesses
dias é chocolate.
Então, fiz Léo prometer que não contaria nada sobre meu
filhote — cujo nome ainda não escolhi — para Nicolas, e
simplesmente tirei a tarde de folga.
Otávio já me odeia mesmo.
— Por que saiu mais cedo, querida? Aconteceu alguma coisa?
Léo passou na minha sala e disse que tinha te trazido e que estava
tudo bem, mas está mesmo? — fala da porta, deixando a chave do
carro na mesinha ao lado e a trancando.
Aperto o cobertor ao meu redor e continuo fazendo carinho no
doguinho por debaixo dele, enquanto finjo assistir televisão.
— Precisava fazer algumas coisas — tipo adotar um cachorro.
— Como foi seu dia?
Diga que foi ótimo e que você está um poço de bom humor.
— Foi péssimo — droga! — Tive uma reunião a manhã inteira
e nem consegui almoçar com você, como tínhamos combinado,
sinto muito.
Ihhhhh, eu nem lembrava disso.
— Não se preocupa, estava cheia de trabalho essa manhã
também. — Ergo os olhos para ele, quando se aproxima e se joga
sentado na minha frente, no chão, apoiando um braço no sofá e o
outro vem para o meu rosto.
Então ele me beija.
Amo beijar o Nicolas.
Todo o meu corpo incendeia com o beijo dele.
— Você já jantou? — nego com a cabeça, meus lábios
raspando os seus. — Quer escolher o que pedir, hoje? Estou
disposto a comer uma piz...
— Au.
Droga!
Nicolas para de falar na hora e cerra os olhos para mim. Sorrio,
tentando disfarçar, mas desfaço o sorriso assim que seus olhos
semicerram ainda mais.
Por que ele tinha que decorar meus sorrisos? Vou precisar
aprender novos.
— Isso foi um latido? — pergunta todo desconfiado e franzo o
cenho.
— Isso o quê? — finjo a Lily.
Sua boca entorta.
— Au Au Au. — Seus olhos arregalam, enquanto os meus se
fecham.
— Isso são latidos!
Nem para esse filhotinho fingir a Lily também, né?
Só me entrega.
— Não é não — me afasto dele, quando sua mão vem até o
cobertor.
— Tira essa coberta — manda.
— Hoje não vai dar, marido, estou naqueles dias, mas são só
três e hoje é o último, podemos brincar de ver o que tem embaixo da
coberta um do outro amanhã, o que acha? — tagarelo, tentando
desviar a sua atenção, mas ele não cai no meu joguinho e se
levanta.
— Aurora — repreende e reviro os olhos, soltando a coberta,
quando seu puxão aumenta.
Então ele para e olha para meus braços.
Braços que aconchegam um beagle macho muito fofo, com
uma coleirinha lilás no pescoço, sapatinhos da mesma cor e tão
cheiroso quanto qualquer cachorro poderia estar.
Até mais cheiroso do que o Léo.
Ergo os olhos até os dele, que encaram o cachorro com um
brilho diferente, um tão carinhoso que meus ombros cedem.
— Surpresa — sorrio de lado, erguendo o cachorrinho com as
mãos e ele começa a farejar na direção de Nicolas.
— É mesmo um cachorro — sussurra mais para si, do que
para mim.
Ele pega o cachorro que começa a se mexer como doido em
cima dele, farejando, latindo e abanando o rabo e Nicolas solta uma
risada, quando o leva para mais perto do rosto e o doguinho começa
a lamber ele.
— Ei, garotão, calma aí, me leve para um jantar, primeiro —
solto uma risada, muito aliviada. — De onde ele veio?
— Do lixo — Nicolas me olha espantado e afasta o filhote do
rosto. — Calma, já levei na veterinária, ele tá muito bem higienizado,
acredita que o deixaram dentro de um saco preto?
— Quem tem coragem de deixar uma coisinha fofa dessa no
lixo? — não é?
— Uma pessoa não foi, deve ter sido um demônio — comento
despretensiosamente e Nicolas ri. — Podemos ficar com ele? —
pergunto cheia de esperanças e ele me encara.
— Ele já tem um nome?
— Estava esperando que você deixasse eu ficar com ele,
porque aí eu poderia dar um nome e me apegar de verdade. —
Seus olhos suavizam. — Como é o seu apartamento, não sabia se
você deixaria.
— Você mora aqui também, Aurora. — Não por muito tempo.
— O apartamento continua sendo seu e eu preciso da sua
permissão, então, posso dar um nome, agora? — pergunto voltando
ao foco do assunto, mas Nicolas me encara com um semblante
fechado. — O que foi, não posso?
Ele nega com a cabeça e olha para o cachorrinho.
— Claro que pode. — Pulo do sofá com alegria.
— Eu sabia que ia se apaixonar por ele também! — falo. —
Não se preocupa com barulho, ele vai dormir comigo no meu quarto,
então não vai te perturbar.
Novamente ele me olha, dessa vez a cara ainda mais fechada.
O que eu fiz, agora?
— Por que você iria dormir no seu quarto? — Ué, não é óbvio?
Franzo o cenho, confusa.
Pra mim a conta é óbvia.
— Estou menstruada, Nicolas, não faríamos nada se eu fosse
dormir com você e o cachorrinho precisa dormir na cama hoje para
se sentir mais acolhido, ele precisa disso, foi deixado no lixo, esse
neném precioso.
— E? — Nicolas pergunta, com a sobrancelha arqueada, mas
pelo tom de voz. Ele está estressado.
Meu coração acelera.
— E que se não vai haver sexo, então você não precisa dormir
comigo.
— Você quer me irritar, Aurora? — Pergunta, sem tirar os olhos
dos meus, e sua boca fecha em uma linha fina. Nego.
— É óbvio que neste momento, não, em outros, talvez.
Ele olha para o teto.
— Eu sei que você está menstruada, e nesses dias
continuamos a dormir na mesma cama.
— Mas você estava cansado demais para fazer algo.
Ele me olha com raiva.
— Eu vou subir, vou tomar um banho e vou pedir pizza. Depois
vamos assistir qualquer merda da Sandra Bullock, você vai se
entupir de chocolate, em seguida vamos subir, você, esse filhote e
eu, e vamos para a minha cama. Você vai virar essa bunda para eu
dar umas palmadas, para aprender a não me estressar quando eu
chego do trabalho cansado e depois nós vamos dormir, você
entendeu?
Engulo em seco, o olhando.
Com meu coração batendo na goela.
Com meu estômago gelado.
Não faz isso, Nicolas. Não faz eu me apaixonar por você.
— Entendeu, Aurora? — repete a pergunta, o tom de voz mais
grave, agora.
— Sim.
— Ótimo — ele me entrega o cachorrinho. — Agora dá um
nome a esse cachorro e não coloque nada que não passe medo, ele
já é pequeno, precisa de um nome forte. — Vira as costas e começa
a andar. — Ah, e antes que eu me esqueça, recebi uma ligação do
departamento, vão mandar alguém amanhã pela parte da manhã, lá
para a empresa, então quando chegarmos, vamos direto para a
minha sala.
Pelo menos isso eu posso resolver.
— Você vai mesmo bater na minha bunda?
— Até você ter dificuldade de sentar, amanhã.
Sorrio e o vejo subindo pela escada.
É normal eu ansiar por esses tapas?
Olho para o meu doguinho.
— Que tal... Hunt, hum? Sim, é o caçador da mamãe, hum? —
o trago até meu rosto e ele começa a lamber meu nariz em um
beijão gostoso.
Finalmente tenho um cachorrinho. Meu novo companheiro.
Depois que isso acabar, meus dias não serão mais tão
solitários.
Segredos que tenho mantido em
meu coração.
São mais difíceis de esconder do
que pensei.
Talvez eu só queira ser seu.
Eu quero ser seu, eu quero ser
seu.
(I wanna be yours - Arctic
Monkeys)
— Muito obrigado pelo tempo de vocês, daqui a alguns dias,
enviaremos a resposta sobre o seu visto, senhora Aurora. — Fala
Dionisio, o filho da puta enviado do inferno, depois de fazer seu
interrogatório sobre nosso relacionamento.
Até a nossa posição favorita no sexo, esse idiota perguntou e
estou tão possesso que poderia empurrá-lo pela janela.
Sem um pingo de medo de ir para a cadeia.
Como que um departamento tão grande quanto o da
imigração, envia esse filho da puta para fazer o trabalho?
— Tudo bem, até mais, senhor Dionisio — fala Aurora, entre
os dentes trincados, com tanta raiva quanto eu.
— Esperaremos a resposta — falo com ódio.
— Certo, até mais — espero que nunca mais.
Ele se despede, abrindo a porta.
— E que Deus te guarde. — Fecha a porta as suas costas. —
E esqueça onde, seu pervertido do caralho. — Aurora fala com
raiva.
Passo a mão no rosto, bufando.
— Mas que velho desgraçado! — Rosno.
Desde que entrou na minha sala, o imbecil não tirou os olhos
de cima da minha mulher, mais especificamente, dos seios dela.
Sério, ele quase babou em cima da minha mesa e o sorriso
pervertido daquele velho estava me dando nojo. Além disso, fez
várias perguntas que com certeza não estavam no questionário e
nem tive como falar alguma coisa, pois o futuro de Aurora está
dependendo disso.
— O que ele perguntou quando estava a sós com você? —
Tivemos que responder perguntas individualmente, para ver se
nossas histórias batiam, mas se for de acordo com as que ele me
fez, as delas foram muito piores.
Houve perguntas sérias, eu sei porque foram as únicas em que
ele olhou para o papel a sua frente, mas de resto? Uma palhaçada.
— Perguntou se você acha bom o meu boquete — a encaro
em choque.
— Eu vou matá-lo — caminho até a porta, mas seu corpo se
coloca à minha frente, e suas mãos se apoiam em meu peito. A
encaro e ela me repreende com o olhar.
Não é normal a calma que me preenche só em olhar para os
olhos dela.
Continuam sendo olhos de anjo.
Ela continua sendo o capeta.
Mas é minha.
— Vamos pensar coerentemente, assim que a imigração
aprovar o visto, vamos entrar com um processo contra eles...
— E vamos alegar o quê?
— Assim que ele começou a fazer perguntas estúpidas, eu
coloquei meu celular para gravar tudo — levanta o telefone, sorrindo
com um brilho orgulhoso nos olhos.
Ergo a sobrancelha e abro um sorriso pela primeira vez desde
que chegamos no meu escritório hoje.
— Boa garota, estava com tanto ódio que nem consegui
pensar em fazer algo do tipo.
— Matt não vai ter trabalho para fazer aquele merda perder o
emprego. — Não, não vai. — Falando nele, como ele está? Ele me
disse que a Tiana o afastou. — Faço uma careta.
— Por fora parece bem, mas não quer tocar no assunto, ele é
assim, gosta de se meter na vida dos outros, mas é mais fechado do
que eu com a própria vida.
— Você devia sair com ele para beber, passa as noites comigo
agora, talvez ele esteja precisando da sua companhia. — Foco
meus olhos nos seus e não evito o sorriso. Seu cenho se franze. —
O que foi?
— Nada, só que você é incrível — agarro sua cintura e a
empurro contra a porta fechada. Sua sobrancelha se ergue quando
passo a tranca e sorrio maliciosamente. — Ainda estou puto com
aquele imbecil, Aurora, que tal a gente desestressar um pouco?
Suas mãos passam pelos meus ombros, o olhar seguindo os
movimentos enquanto morde o lábio inferior.
— O que sugere, coroa? — fala, a voz adotando um tom mais
sensual. Ergo a sua cintura, escutando o seu gritinho e suas pernas
são rápidas em me rodear.
— Ainda está naqueles dias?
— Já acabou.
Viro de volta para minha mesa e a apoio em cima dela,
agradecendo por Aurora ter decidido vir de vestido hoje.
Esse maldito vestido que me fez desejá-la assim que saiu do
closet nele.
— Chupar você — suas bochechas coram adoravelmente —
Chupar você sempre me acalma.
— Nick — sussurra cheia de desejo, enterrando a mão em
meus cabelos, sem se importar se vai bagunçá-los e os puxa ao
ponto de dor.
Mordo o lábio, vendo-a umedecer o seu.
Porra, eu a quero tanto.
Não sei como essa garota é capaz de me tirar o juízo ao ponto
de eu querer comê-la na minha sala, com o secretário do outro lado
da porta.
Nunca comi ninguém na minha sala, mas quero Aurora o
tempo todo, em todos os lugares, de todos os modos.
É sempre assim e isso está me enlouquecendo, ninguém
deveria querer tanto alguém a ponto de ficar obcecado por ela.
A beijo, roubando seu ar, e seu gosto, movimentando meus
lábios nos seus, até chupar sua língua, sentindo meu pau pulsar.
— Não pare — ofega contra mim e sorrio.
— Não ia, meu bem — minha voz é coberta de satisfação.
Satisfação por tê-la para mim.
Só pra mim.
Nunca fui um homem ciumento, porra, nunca tive essa
possessividade por ninguém, o que Aurora tem que faz esse meu
lado despertar?
O que ela está fazendo comigo?
Volto a beijar sua boca, descendo com meus lábios por seu
maxilar, lambendo a curva do seu pescoço e deixando beijos
molhados de encontro ao decote reto. Por que isso ainda está no
meu caminho?
Subo as mãos até as alças finas, sem nunca tirar a boca do
contorno do seu seio e abaixo as alcinhas, deixando seus mamilos
expostos ao ar gelado da minha sala e ao meu olhar feroz.
Que caralho, como que alguém é tão perfeita assim? É como
se fosse feita para mim!
Sua mão puxa minha cabeça na direção dos seus mamilos e
solto uma risada, meu hálito os arrepiando.
— Você disse que queria chupar — fala, toda safada
mordendo o lábio inferior.
— E eu vou, só precisa ficar quietinha, amor, porque ninguém
pode te ouvir gritar, ok? — ela assente rapidamente e empurra
minha cabeça novamente contra seu mamilo e eu não perco tempo.
Caio de boca, sugando o biquinho intumescido, fechando os
olhos com o prazer que me percorre apenas com ele na boca. Cada
parte dessa mulher foi feita para o meu prazer.
Foi feita para mim.
Deslizo a língua pela aréola, saboreando a sua pele doce, e
abro os olhos para enxergá-la se contorcendo em cima da mesa. As
bochechas vermelhas, os olhos pesados enquanto me admira... Ela
vai me enlouquecer.
Com uma mão, começo a massagear o outro seio, pegando o
bico entre os dedos e os apertando ao ponto de Aurora gemer de
dor.
E ela geme gostoso, porra.
Tão gostoso que a repreendo com o olhar.
Ela sabe que seus gemidos são meus, sabe que não quero
que mais ninguém escute.
— Nick — geme, movendo seu corpo em direção ao meu,
tentando procurar mais contato, mas vou dar a ela o que precisa.
Mamo gostoso em um seio, sugando, lambendo e gemendo
contra sua pele, depois faço tudo de novo no outro, tão ansioso
quanto ela.
Ela me tem inteiro e não faz ideia disso, porra.
— Sim, linda? — brinco, enquanto procuro o zíper lateral que
sei que esse vestido tem, já que fui eu que o subiu hoje, e assim
que acho, começo a descer pelo seu corpo, afrouxando a peça até
ficar amontoada na sua cintura.
Ela ergue o quadril para me ajudar a tirar e me olha toda
safada.
Eu olho para ela atordoado para caralho.
— Cadê a porra da sua calcinha, Aurora? — rosno, olhando
para sua boceta depilada e brilhante.
Ela já estava tão pronta pra mim.
A desgraçada sorri, abrindo as pernas e apoiando um pé em
cada canto da mesa, ficando completamente exposta para meus
olhos famintos.
Meu peito se move fortemente com minha respiração ofegante,
nenhum fôlego é suficiente para essa visão.
Levo o polegar até sua bocetinha inchada e com os lábios
vermelhinhos e a acaricio, ouvindo o seu gemido baixo.
Minha boca saliva de vontade de prová-la.
— Seria muito safado da minha parte, ter vindo pensando em
fazer justamente isso? — E quando algo em você me surpreende,
meu bem?
Nego com a cabeça sorrindo, passando o polegar para cima e
para baixo entre a fenda, espalhando sua lubrificação.
Desliza tão fácil.
Salivo ainda mais.
— Seria, mas eu gosto, mas você não virá mais sem calcinha,
Aurora, odeio saber que pode andar por aí sem essa peça cobrindo
uma parte tão preciosa minha — trago o polegar até a boca e o
chupo, olhando em seus olhos, sentindo o seu gosto doce se
espalhar por toda a minha língua.
Solto um gemido.
Meu cacete pulsa dolorosamente.
Tão deliciosa...
Volto a mão até o seu pescoço e a empurro para trás, a
deitando, e olho para baixo.
Beijo sua barriga, circulo seu umbigo com a língua e vou
descendo uma trilha de beijos lentos até chegar ao púbis.
Com o nariz, acaricio seus lábios vaginais, sentindo seu cheiro
e tudo em mim vibra de desejo. Meu caralho já se pressiona contra
a cueca e Aurora já está derretida contra a mesa.
Completamente rendida por mim.
— Nick — choraminga, e sorrio contra ela.
Passo a língua lentamente desde seu buraquinho até o clitóris,
e o sugo, sentindo ela estremecer, mas não gritar, como costuma
fazer.
Não, ela está me obedecendo, mesmo que esteja maltratando
seu lábio inferior ao fazer isso.
Vou recompensá-la, querida.
Circulo seu clitóris com a língua, e começo a dar lambidas
ritmadas nele, quando os “isso, isso, isso” da minha mulher
começam a se repetir loucamente. Seu gosto se espalha na minha
boca e nunca provei algo tão bom na minha vida. Não ligaria em
morrer entre as pernas de Aurora. Morreria sorrindo e com a língua
enfiada nela. Trago um dedo até sua entrada e acaricio o
buraquinho por fora, antes de enfiar dentro desse lugar quente e
molhado.
— Nick, ohhhh, que gostoso — geme quase sem voz,
começando a mover o corpo contra minha mão e minha boca em
busca do próprio orgasmo e aumento o ritmo dos dedos, chupando
seus lábios, um de cada vez e depois a beijando como se estivesse
beijando a sua boca.
— Gostoso é o gosto da sua boceta, meu bem — gunho rouco.
— Vai me deixar chupá-la quando eu quiser, Aurora? — mando,
desesperado.
— Sim, sim, sim. Ô porra, vou gozar — sua mão em meu
cabelo me puxa para mais perto, como se pudesse enfiar minha
cara na sua boceta.
Isso me faz rosnar contra ela, tão louco para beber do seu mel,
quanto ela para gozar na minha boca.
— Goza, linda, goza na minha boca — e ela estremece,
fazendo o que pedi, com um grito silencioso.
Bebo todo o seu prazer, fechando os olhos para desfrutá-lo,
me embebedando dela e depois me ergo, abaixando minha calça e
liberando meu pau, tão duro quanto uma rocha. Pego uma
camisinha na minha carteira, e não demoro a estar pronto para
entrar na boceta apertada.
— Vou te comer tão gostoso, Aurora — falo, louco pelas suas
bochechas vermelhas, pegando cada uma de suas pernas e as
apoiando em meus ombros.
Seus pés balançam ao lado da minha cabeça e deixo um beijo
em cada um, achando um charme o salto alto. Sua pele está
brilhante de suor e sorrio, ao ver como a deixei satisfeita. Ela sorri
também.
Pego meu pau pela base e olhando em seus olhos, bato contra
sua intimidade molhada, bem em cima do seu clitóris sensível.
— Nossa — geme ofegante.
— Você gemendo baixinho assim é tudo pra mim, sabia? —
sussurro rouco, encaixando a cabecinha na sua entrada e a
sentindo molhada. — Meter assim em você? Me enlouquece, Aurora
— começo a me enfiar na boceta quente e macia.
Ela toda é macia, porra.
— Você é tão gostoso — ofega, me sentindo todo dentro de si.
— E você é deliciosa, meu bem. Perdidamente deliciosa.
Começo a estocar firme, batendo minha pélvis na sua e seguro
suas pernas, enquanto vejo seus seios balançarem a cada
estocada, para cima e para baixo, em um vai e vem delicioso.
Nada nunca me fez sentir tantas coisas ao mesmo tempo,
quanto Aurora me faz sentir.
Porque enquanto meto na boceta dela, desejo poder fazer isso
sempre, e não apenas até o nosso acordo acabar, a ideia de não ter
ela me apertando assim? É inconcebível.
A ideia dela fazendo isso com alguém que não eu? Me deixa
em um estado assassino. Quanto mais me movo contra seu corpo,
mais meu coração acelera no peito, mais nossos corpos ficam
suados, mais me sinto pertencente a ela.
Estar com Aurora é como estar em casa. Mas isso não
significa nada, significa?
O som molhado dos nossos sexos se encaixando e se
batendo, ecoa pelo escritório. Desço uma mão até seu clitóris e
começo a masturbá-la em movimentos ritmados.
— Nick, Nick, Nick... — geme meu nome diversas vezes e o
Nick saindo da sua boca me faz sorrir.
— Aperta esses peitos para mim, linda — ela aperta,
arqueando a coluna e me fazendo rosnar com a nova posição, que
me faz entrar ainda mais fundo nela.
Estoco meu cacete com força, maltratando sua bocetinha com
ele e com meus dedos e a vejo ficando completamente vermelha.
Sua boceta, seu pescoço, suas bochechas.
Sua barriga se contorce, ela me aperta e sinto minhas pernas
começarem a tremer com a onda de prazer que me percorre.
Meto sem dó, até senti-la gozando, seus dedos dos pés se
contorcendo, suas pernas tremendo e sua intimidade me apertando
lindamente, então não seguro, gozo junto com ela.
Tudo o que eu quero fazer é junto com ela.
Mas é a convivência.
É o sexo.
Uma hora isso passa.
— Porra, a gente pode fazer isso mais vezes? — Solto uma
risada e me baixo, completamente ofegante, mas não resistindo a
beijá-la. Ela está acabada em cima da minha mesa, mas sou eu que
me sinto acabado por ela.
Ela me fode de todas as maneiras possíveis.
Mas... não significa nada, significa?
Há coisas que eu quero te dizer,
mas vou apenas deixar você
viver.
Se você me abraçar sem me
machucar.
Você será o primeiro a fazer isso.
Há coisas sobre as quais quero
conversar, mas é melhor eu
esquecer.
Mas se você me abraçar sem me
machucar.
Você será o primeiro a fazer isso.
(Cinnamon Girl - Lana Del Rey)

— Essa daqui você gosta? Ela se encaixa no padrão que estou


procurando — aponto para as cortinas à minha frente e Nicolas as
olha com interesse.
— Prefiro essa à anterior — ótimo!
Me viro para a vendedora e aponto para as cortinas.
— Vamos querer essas.
— Quantas unidades, senhora?
— Quatro — ela assente e sai sorrindo porque vai ganhar uma
bela comissão.
Estávamos há mais de duas horas no shopping, depois de ter
passado a manhã em lojas de móveis. Nicolas estava me
acompanhando, porque mesmo dizendo que eu poderia fazer o que
quisesse, trouxe ele para dizer se é o que quer mesmo. E teve
várias coisas que ele aprovou nesta loja.
Ele foi paciente o dia inteiro, mesmo carregando várias sacolas
ao seu lado e eu fiquei feliz demais com isso.
É só o que falta para a reforma completa, decoração!
E eu arrasei nas compras.
Comprei quadros, jarros de flores, roupas de cama, peso de
papel, tapetes, itens minimalistas, de tudo um pouco.
Comprei até plantas!
— Ainda vamos demorar muito? — Nicolas fala, me olhando
com um sorriso discreto.
— Por quê? Está cansado?
— Não, mas estou com fome, me surpreende você não estar
com fome — solto uma risada, agarrando seu braço coberto por
uma blusa de botões preta, que combina perfeitamente com sua
bermuda de mesma cor.
Ele estava uma delícia.
Lindo de morrer.
Nicolas é lindo de morrer.
— Estou com fome, mas estava esperando a gente terminar
aqui, antes que você se cansasse, para que eu pudesse passar a
tarde comendo.
— Ah, disso eu não duvido. — Rio ainda mais alto, nos
encaminhando para o caixa, quando a vendedora volta. — O que
você quer almoçar?
— Ham...
— E se disser hambúrguer, eu vou castigar sua bunda com
palmadas novamente, Aurora — repreende e meu rosto queima.
A vendedora prende uma risada e olho para Nicolas com
repreensão. Mas ele não tem nada além de um sorriso satisfeito no
rosto.
Ainda lembro das últimas palmadas que me deu, minha bunda
ficou vermelha por dias, e minha boceta também pelo modo que
fodeu no dia seguinte.
Foi delicioso, mas me deixou acabada.
Ele foi gentil em comprar pomada para assadura.
Eu quase morri de vergonha quando aceitei.
— Pra quê você pergunta, se não vai acatar meu pedido?
— Porque ainda tenho esperança de você escolher
decentemente. — Bufo e ele solta uma risada.
Ele está muito sorridente ultimamente.
Conheci Nicolas sendo fechado, me dando patadas, sério e
com um humor do cão. Agora parece que está mais leve, como se
um peso tivesse saído dos seus ombros.
Não queria pensar que posso ser o motivo disso, porque isso
significaria que as coisas podem ser diferentes.
Significa esperança.
E eu já estou cheia dela no momento.
— Que tal sushi? — faço uma careta.
— Se eu quiser comer peixe cru, é só comprar no mercado —
reclamo. Sua boca se contorce, enquanto me guia para algum
restaurante.
— Não gosta?
— Uma vez comi um, passei umas duas horas mastigando
aquela merda e não consegui engolir — me arrepio só em lembrar
da massa rançosa na minha boca. Urgh.
— Duas horas? — pergunta com ironia e belisco seu braço.
— Foi modo de dizer — idiota!
— E italiano? — minha barriga chega a roncar, arrancando
uma risada sua. — É, acho que você está a fim de massa e não,
não vai ser pizza, já comeu isso essa semana. — Adivinha quem
comprou?
Ele, assim como começou a fazer hambúrgueres, batatas
fritas, começou a lotar o congelador com sorvete natural, feito com
fruta e iogurte integral, até o vi pesquisando receitas de bolo
saudáveis.
Ele fala da minha alimentação, mas não existe alguém mais
dedicado a ela do que ele.
E só ele mesmo, por mim, eu morro aos quarenta de infarto
fulminante.
— Aceito a massa. — Concordo. — Será que Léo tá cuidando
bem de Hunt? — pergunto, lembrando do meu neném.
É a primeira vez que deixamos ele com Léo, já que a creche
que o deixamos quando saímos para o trabalho está fechada hoje.
— Ele sempre quis um cachorro, aposto que está babando
nele, agora — não duvido disso, já que faltou quicar de alegria
quando passamos no seu apartamento para deixá-lo.
Passamos alguns minutos procurando um restaurante italiano.
Andar com Nicolas é revigorante. Ter ele ao meu lado, com
uma presença firme, me faz sentir segura. Há muito tempo não me
sentia segura com ninguém.
Mas confesso, estava me acostumando com isso e não podia
me acostumar. Ter Nicolas comigo sempre, cuidando de mim, sendo
tão bom comigo é um sonho. Como se diz ao coração que ele não é
nosso? Que isso não é o que eu penso que é? Que ele está apenas
sendo ele mesmo, mas não significa que sente algo diferente por
mim?
Nicolas pega a minha mão e me guia a entrar em um
restaurante. Andamos até uma mesa e ele é cavalheiro ao puxar
minha cadeira. Fico o admirando enquanto estava fazendo nossos
pedidos com o garçom que mal esperou a gente sentar para
aparecer.
Gosto que ele tome essas atitudes.
Gosto de não precisar me preocupar com tudo, porque ele
sempre está lá para tomar conta.
— O que você está pensando? — pergunta quando o garçom
sai de perto.
— Que gosto de você — seus ombros tencionam na mesma
hora e me recrimino por ter soltado a língua. — Calma, coroa, não
pira.
— Não estou pirando — devolve, mas vejo nos seus olhos a
mentira.
Ele está sim.
Está pirando só porque eu disse que gostava dele.
Ah, Nick...
— Que bom, porque isso não vai me fazer parar de gostar de
você, você é incrível — dou de ombros tentando disfarçar, me
fazendo de autoconfiante. — E isso é mais do que eu esperava
depois do seu mau humor em Vegas. — Sorrio, lembrando da cena.
— Naquele dia eu quis arrancar uns tufos do seu cabelo perfeito.
Ele solta uma risada baixa, sem tirar seus olhos de mim.
Está me analisando.
— Você não fica muito para trás, Aurora, eu quase internei
você em um hospício.
— Então estou salva de ir para um agora?
— Claro que não, mas tenho certeza de que me levará com
você. — Ergue a sobrancelha em ironia, relaxando a postura. —
Mas também gosto de você. — Por que meu coração está doendo?
Eu sei o porquê.
Porque ele gosta de mim.
E eu acabei de perceber que não é do jeito que eu gosto dele.
— Que bom, coroa — sorrio com sinceridade.
O garçom para ao lado da nossa mesa novamente e o olho
desconfiada, pois não é possível que a comida já esteja pronta.
Mas não, ele tem um vinho nas mãos.
— Aqui, senhor, nosso melhor vinho.
Nicolas assente, agradecendo e o abre, depositando em
nossas taças, que também foram trazidas pelo garçom.
— Você entende algo de vinhos? — pergunta com curiosidade
e nego com a cabeça.
— Porcaria nenhuma, prefiro outras bebidas, tipo tequila.
— Esse aqui é um vinho de cem anos. — Faço uma careta.
— E se em cem anos ninguém bebeu, por que você acha que
eu quero tentar a sorte? — brinco e ele solta uma risada alta, seu
pomo de adão mexendo com a vibração que sai do seu peito.
Tento não sorrir com sua risada, mas é impossível.
Eu estou encantada na risada dele.
Ele.
Eu estou encantada por ele.
— Porque você merece o melhor, e esse vinho é o melhor
daqui — e com ele falando essas coisas quem não se encanta?
Suspiro, deixando um sorriso escapar e negando com a
cabeça.
Negando a mim mesma algo que eu não queria que
acontecesse.
Porque eu sou uma ótima mentirosa, mas nem mesmo sendo
uma profissional, consigo mentir para mim mesma sobre o motivo
do meu coração estar batendo tão furiosamente no peito, desde que
ele aceitou vir comigo no shopping.
Só queria que ele não fosse assim.
Que ele me fodesse e continuasse distante.
Que ele não fosse tão bom em ser o meu marido.
“Não vou ser seu marido”
Preciso me lembrar que ele disse isso a cada minuto do dia
para não cair aos seus pés, como uma menininha emocionada.
— Já que você diz — pego a minha taça e provo o bendito
vinho, que para mim é igual a todos os outros baratinhos que já
comprei em conveniências, mas faço uma cara de aprovação,
erguendo o polegar. — É muito bom!
— Você nem notou a diferença, né? — prendo o riso e nego
com a cabeça.
— Juro que é bom — seus olhos reviram. — Ei, tem coisas
que eu aprecio e tem coisas que não prendem minha atenção.
Qualquer bebida para mim, me deixando alcoolizada, já está de bom
tamanho. — Ele bufa, negando com a cabeça.
— Você é de outro mundo, Aurora. — Pisco um olho, me
aproximando.
— E você tem a sorte de me ter no seu. — Sussurro em um
tom confidencial e Nicolas tomba a cabeça para o lado, me
analisando com tanta intensidade que engulo em seco.
Seus olhos em mim sempre têm a capacidade de me deixar
em chamas.
Estou sempre queimando por ele.
E isso não é bom.
— É, eu tenho — e todo o meu corpo se arrepia com sua fala.
É isso.
É aqui que morre uma sem-vergonha.
Aqui jaz, Aurora Castelo.
Causa da morte?
Coração não aguentou bater tão forte pelo marido.
— Aurora? — tomo um susto, piscando e engolindo em seco,
vendo o olhar de Nicolas desviar para o meu lado e me viro,
encarando o meu professor de Linguagem de decoração e estilos,
Sven. — Ah, é mesmo você. — Fala com um sorriso.
Arregalo os olhos de surpresa.
Sabe aqueles professores que todas as alunas são
encantadas de tão lindo e gostoso que o cara é? Sven é esse
professor.
Cabelos castanhos bagunçados, óculos de grau cobrindo os
olhos azuis, pele bronzeada, músculos torneados que quase saltam
da camisa, barba cerrada, contornando um sorriso de lábios
grandes e mais de 1,90m de altura.
E tenho certeza de que ele já comeu metade da universidade.
A comunidade feminina e masculina.
— Professor Sven, que surpresa — isso é óbvio pela minha
cara de tacho. Sorrio e me levanto para cumprimentá-lo.
— Eu que fico surpreso, dificilmente vejo um de meus alunos
depois que se formam. — Ele me abraça em um abraço respeitoso,
mas se minha nuca arrepiando significa algo, o abraço poderia ser
comigo enfiada dentro de uma fantasia do homem de ferro e ainda
seria errado para meu marido.
— É mais difícil ainda ver um professor — brinco, me
afastando e me virando para Nicolas. Seu olhar é indecifrável, mas
seu maxilar está trincado.
Tão ciumento.
É por isso que minhas borboletas batem asas no meu
estômago.
— Nicolas, esse é meu ex-professor da faculdade, Sven
Owens e professor Sven, esse é...
— Nicolas Ramsey — ele fala por mim, como alguém da nossa
área, já sabendo quem Nick é.
Parece que só eu tenho memória de formiga.
— É um prazer conhecer pessoalmente um magnata tão
importante do ramo imobiliário. — Os ombros de Nicolas relaxam
quando percebe que é um professor meu e não algum ex-ficante,
mas não totalmente.
Seus olhos ainda são indecifráveis.
— O prazer é meu em estar de frente para alguém que deu
aulas para minha esposa — por que eu sabia que ele falaria isso?
Prendo o riso, vendo os dois apertarem as mãos.
— Esposa? Não sabia que era casada — fala pra mim,
erguendo uma sobrancelha. — Sua esposa era minha melhor aluna,
nunca tive alguém tão dedicado quanto ela. — Fala para Nicolas.
Olhando para os dois, lado a lado, qualquer um poderia fazer
uma pintura e vender, ambos são lindos e tem aquela arrogância
sensual que só homens que sabem o poder que têm, passam.
Óbvio que Nicolas é um milhão de vezes mais bonito e com
certeza mais poderoso, mas meu professor não se deixa abalar pela
presença imponente.
Ele apenas sorri, carismático e não é difícil ver o apelo nele.
Esse sorriso desce a calcinha de muita gente com facilidade.
No meu tempo de faculdade? Eu implorava por uma
oportunidade do destino, mas hoje?
Ele continua atraente, só não... para mim.
Eu não desceria minha calcinha para ele.
Agora para Nicolas? Eu nem visto uma.
— Ela é assim, ótima em tudo o que se dispõe a fazer — pisco
com o elogio de Nicolas, sendo alvo dos dois olhares.
Meu rosto esquenta.
— O que faz por aqui, professor? — pergunto, mudando de
assunto.
Sven mora em Louisiana, e que eu saiba, ainda é professor da
LSU.
— Vim visitar minha irmã, fazia um tempo que não vinha vê-la
e estamos montando uma sociedade em conjunto, inclusive, vários
dos seus colegas de classe estão se juntando a nós, mas acredito
que você já esteja trabalhando, hum? Ou ainda posso fazer uma
proposta? A melhor da turma é sempre a mais desejada. —
Pergunta me fazendo arregalar os olhos de surpresa e puta merda,
sinto meu rosto esquentar ainda mais com a frase de duplo sentido.
— Ela já trabalha comigo — Nicolas responde com um sorriso
e Sven concorda com a cabeça.
— Suspeitava — solta uma risada. — Sabia que não ficaria
disponível por muito tempo, nem como designer, nem solteira. —
Rio, agarrando a mão de Nicolas.
— Parabéns pela sociedade, espero que dê tudo certo — falo,
com sinceridade e ele assente, levando a mão ao bolso.
— Bem, não vou mais atrapalhar vocês, foi um prazer
conhecê-lo, Ramsey, e um prazer revê-la, Aurora. — Ele tira um
cartão do bolso e me entrega. — Caso tenha contato com algum
amigo seu precisando de emprego, envia esse número, estamos
aceitando pessoas ainda.
É muito prestativo, esse homem!
— Claro, vou passar para os contatos que eu tenho da
faculdade — ou seja, nenhum!
Sorrio enquanto ele se despede e sai, indo até uma mesa no
final do restaurante, onde uma morena o espera e me sento
novamente, sentindo o olhar de Nicolas queimar em mim.
— Sabe o que me deixa puto, Aurora? — Ihh, lá vem!
— O quê? — pergunto, bebendo o vinho que restou na taça
em um gole.
— Que cobicem o que é meu — sabia.
— Acho que eu saberia se Sven estivesse me cobiçando. —
Ele toma o seu vinho em um gole, assim como eu, depois enche sua
taça novamente, sem tirar os olhos de mim.
— Não, se soubesse, notaria que os olhos dele desviaram
mais de uma vez para a boca que é minha e mais de uma vez ele
desceu os olhos até esses seios que também são meus.
— Mandou registrar no seu nome, foi? — brinco, mas ele não
está para brincadeira.
Tão mal-humorado com ciúmes.
— Não mandei, mas está registrado, e pela lei. — Reviro os
olhos, querendo não sentir meu coração acelerando.
Querendo não sentir a felicidade que é saber que esse homem
me deseja tanto ao ponto de enlouquecer de ciúmes.
E nós dois sabemos que isso não é legal.
Mas é loucura minha se eu falar que gosto? É a primeira vez
que sinto que realmente pertenço a algum lugar.
A alguém.
E é ruim que esse alguém seja meu falso marido.
Será que é falso, ainda?
— Bem, eu não vi e sou uma pessoa linda, Nicolas — ele
assente a contragosto. — Vai ter mais de um homem me desejando,
o que quer que eu faça?
— Tem como parar de respirar o mesmo ar que outros
homens? — prendo o riso.
— Não.
— Como você é desobediente — resmunga e solto uma
risada, vendo seus olhos brilharem pra mim. — Você é mesmo linda
— sorrio, sentindo meu peito aquecer. — É a mulher mais linda que
eu já vi, Aurora. — Meu sorriso esmorece.
E é aqui que eu sei que estou fodida.
É aqui que eu sei que tudo o que estou sentindo não é uma
simples reação ansiosa, ou tesão por ele.
Que meu coração acelerado não é infarto.
Que meu corpo arrepiando não é frio.
Que minha boca seca não é sede.
Que meus olhos o seguindo quando estamos no mesmo lugar,
não é apenas admirando a beleza dele.
É aqui que eu noto que meu coração está nas mãos de Nicolas
e ele não faz ideia disso.
E isso me apavora.
— Você também é o cara mais lindo que eu já vi — tombo a
cabeça para o lado falando com toda a sinceridade do meu coração.
— Simplesmente, o mais lindo.
E isso é tudo o que eu consigo dizer, porque novamente, ele
engole em seco.
Novamente seus ombros tensionam.
Só queria que sorrisse e seus olhos brilhassem como os meus
quando eu falei isso, Nicolas.
Quando eu falei que gosto de você.
Só queria que não sentisse medo.
Porque eu já estou sentindo o suficiente por nós dois.
Derramei uma lágrima, pois estou
sentindo sua falta
Ainda me sinto bem o suficiente
para sorrir
Garota, eu penso em você todo
dia agora
Houve um tempo em que eu não
tinha certeza
Mas você acalmou minha mente
Não há dúvida de que você está
no meu coração agora
(Patience - Guns’ N Roses)

— Me dá ele aqui.
— Não.
— Você não pode ter um filho e não dividir ele comigo, sou o
tio dele!
— Aurora disse que você havia dito que não era — ergo a
sobrancelha para Léo, que está quase chorando para pegar Hunt
dos meus braços, mas não consigo soltar meu filhote. Ele é uma
gracinha.
— Aurora não tinha que dizer nada, aquela ingrata, sabia que
fui eu que fui com ela ao veterinário? — resmunga, passando a mão
nos cabelos para afastá-los da testa, o que não adianta nada, assim
que termina, estão todos no mesmo lugar que antes. — Ela ainda
teve coragem de me julgar, porque eu gosto de sair depois de
comer. — Tem que julgar mesmo, é um vagabundo. — Eu cuido
dele sempre que vocês querem sair, ele já me ama! — fala e ergo a
sobrancelha, vendo ele formar um biquinho. — Deixa eu pegar ele
só um pouquinho? — Pede e solto um suspiro, olhando nos olhos
inocentes de Hunt.
— Você quer ir para o tio Léo, Hunt? — questiono
carinhosamente meu cachorrinho que já está bem maior do que
quando chegou há mais de um mês.
Mais gordinho também, o deixando muito fofo com suas
orelhinhas caídas
— Au! — Late, colocando a língua para fora.
— Olha aí, ele quer, me dá logo — reviro os olhos e deixo que
pegue o pequeno dos meus braços, que está com uma roupinha
azul, e uma coleira da mesma cor. Meu coração dói assim que não o
sinto mais. Sou apaixonado por esse cachorro. — Quem é o garotão
do titio, hein? Quem é?
— Quem vê, pensa que vocês estão falando com um bebê —
debocha Matt.
— É um bebê — Leo e eu falamos ao mesmo tempo.
— Humano! — Exclama meu melhor amigo, arregalando os
olhos azuis. — Vocês adotaram um cachorro, Nicolas!
O encaro, erguendo a sobrancelha.
— E o que é que tem?
— Um cachorro, você sabe o que isso significa? — Que você
usa qualquer desculpa para se meter na minha vida, mas quando
falo algo sobre Tiana, parece que vai botar um ovo?
— Que eles vão ter que brigar por esse cachorro no divórcio e
vão ter que dividir a guarda? Você pode tomar ele para nós, Matt?
— Fala Léo e meu coração erra uma batida.
— Significa que eu tenho um coração no peito e nunca deixaria
essa coisa linda em um lar para adoção?
— Significa que ele finalmente criou juízo depois de casar e fez
uma coisa decente?
— Não, significa que eles ADOTARAM UM CACHORRO! — Já
disse isso, Matt. — Isso é coisa que casal de verdade faz, vocês
não estavam apenas fodendo?
“Você é o homem mais lindo que já vi”
“Gosto de você”
“Gosto de você”
“Gosto de você”
— Estamos — e é uma delícia.
— Não, não estão, vocês dormem juntos — todos os dias —
vocês trabalham juntos. — Ela é incrível, o que posso fazer? —
Vocês adotaram um cachorro, — quem não adotaria essa
preciosidade? — e ela reformou todo o seu apartamento do jeito que
ela quis. — Porque é o melhor, do jeito que eu quis não estava bom.
— Vocês estão agindo como marido e mulher de verdade, Nicolas
— o quê? — Você ainda acha que vão se divorciar quando isso
acabar? — Ele e Léo me encaram ao mesmo tempo.
Engulo em seco, não sabendo como responder essa pergunta
e por um instante, isso me apavora.
Não saber responder me apavora.
Ainda lembro da conversa que tive com Aurora no shopping,
ela mal sabe que quase infartei com suas palavras.
“Gosto de você” “Você é o homem mais lindo que eu já vi”
O que isso significa?
Por que Aurora me confunde tanto assim? Ela não sabe o
quanto meu coração vibrou quando falou que gostava de mim.
Mas um lado meu ficou decepcionado.
Um lado meu não queria que ela dissesse apenas isso.
Mas preciso entender que temos um acordo, não importa o
que sinto. No fim, Aurora iniciou isso tudo por um visto, e não sei se
agora que o tem, ela ainda vai querer ficar comigo.
— Nós temos um acordo, Matt. É claro que vamos — por que
dizer isso foi como sentir uma facada no meu peito?
Por que minhas mãos começam a tremer?
Por que quero quebrar alguma coisa, de preferência a cara do
Matt por me fazer pensar nesse caralho?
Por que desejo tanto que isso seja mentira? Que Aurora não
assine a merda do divórcio? Que ela não queira me deixar quando o
prazo acabar?
— Trouxe pizza — sinto todo o meu corpo gelar, quando
escuto a voz de Aurora atrás de mim.
Todos nos assustamos e a olhamos quando caminha para o
meio da sala e deposita duas caixas de pizza na mesinha de centro.
Ela havia saído para comprar bolo na padaria da frente, há
alguns minutos e estava demorando para voltar.
Não escutei quando ela abriu a porta.
Pelas caras culpadas dos dois idiotas, eles também não.
— Não tinha ido comprar bolo? — pergunto, engolindo em
seco, e procurando seu olhar, para saber o quanto da conversa
escutou, mas ela não me olha.
Não foi nada de mais, só a verdade, não?
Por que estou estranho então, porra?
— Tinha pedido pizza antes de descer, então quando estava
voltando, estavam entregando na portaria, eu não quero, então
vocês podem comer tudo, vou ficar só com o bolo, alguém quer um
pedaço? — oferece o bolo com cobertura de chocolate que está na
outra mão, mas negamos com a cabeça.
— Trouxemos refrigerante, mas tem cerveja também. —
Comenta meu irmão, acariciando a cabeça de Hunt que não tem
mais olhos para ninguém na sala além de Aurora.
Assim como eu.
— Ok, sobra mais para mim, então — é um bolo enorme e
adivinha? Nenhum de nós duvida que ela coma aquilo tudo. — Vou
aceitar o refri.
A observo saindo da sala e indo até a cozinha e fecho os
olhos, soltando um suspiro pesado.
— Isso não é apenas foda — sussurra Matt e abro os olhos
para encará-lo com ódio.
— Por que você não cala a boca, porra? — ele olha para a
cozinha e sei que está pensando no que falou.
Sei que ele só quer saber o que está acontecendo, mas
porra...
— Será que ela ouviu alguma coisa? — Léo murmura, mas
não tenho tempo de responder, porque Aurora volta para a sala.
— Pode me dar Hunt, hum? Vou subir, preciso terminar um
projeto hoje enquanto estou com inspiração, e quero ele pertinho de
mim para me fazer companhia. — Mesmo a contragosto, Léo ergue
o cachorro e entrega nas mãos de Aurora, que tenta equilibrar o
cachorro em uma mão e o bolo na outra.
Sua língua cutuca o interior na bochecha e me xingo
mentalmente de todos os absurdos que consigo pensar.
Ela está desconfortável.
É óbvio que ouviu, o que não é óbvio, é eu me sentir culpado
por isso, e ela estar desconfortável.
Isso não é óbvio.
Isso é confuso pra caralho.
— Deixa que eu te ajudo, dá aqui esse bolo — me levanto,
mas ela continua sem me olhar, apenas me entrega o bolo, agarra
Hunt e sorri para Léo e Matt.
— Boa noite — vira as costas e sai andando.
A sigo em silêncio até o seu quarto.
O seu.
Ela não entra no meu e Aurora não dorme no seu quarto há
meses, nem mesmo trabalha lá. Ela passou a fazer tudo no meu
quarto. Até suas roupas, fora os vestidos que nunca saíram do meu
closet, estão lá, agora.
E por que continuo insistindo que não significa nada?
Por que eu continuo mentindo para mim mesmo? E para ela?
— Ele ficou lindo com essa roupinha, não é? — ergue Hunt na
frente do rosto e sorri encantada para ele.
— Ficou — concordo, a acompanhando quando abre sua porta
e deposito o bolo em cima da sua cama. — Ele ainda não jantou,
estava esperando para jantarmos todos juntos, para ele não ficar
olhando para a comida e sentindo desejo de comer.
Ela se joga ao lado do bolo de chocolate.
— Pode deixar que dou o jantar para ele, você pode descer, eu
vou jantar bolo, hoje. — Ô mulher com o paladar infantil! — pode ir,
aproveite sua noite dos garotos, coroa. — Está falando com
animação, mas está desviando os olhos por quê, querida?
Engulo em seco, com as mãos na cintura, coçando para me
aproximar dela e pegá-la. Mas não sei o que fazer.
Decido tentar a sorte, me abaixando para deixar um selinho
em seus lábios e ela retribui, sorrindo contra os meus.
É um sorriso triste.
Esse sorriso me quebra.
— Quando subir, vou te ver na minha cama? — pergunto,
nervoso à espera da sua resposta.
— Quando não me vê? — responde, com o tom falsamente
alegre e meu peito pesa.
— Bom trabalho, querida — desejo. Ela assente e começa a
comer o bolo, pegando seu notebook na escrivaninha ao lado da
cama. Hunt a encara, todo enroladinho, com os olhinhos brilhando.
Ele é louco por Aurora.
Nós dois somos loucos por ela.
Desço para a sala novamente, me sentando onde estava,
sentindo os olhos de Leonardo e Matteo em mim.
Por alguns momentos, o silêncio reina e apoio minha cabeça
no encosto do sofá, pensando.
Sofá novo, porque o antigo não combinava com o apartamento
no estilo de Aurora.
Assim como o painel é novo, como a cor das paredes é nova,
como a estante cheia de livros, a maioria dela, é nova também.
As cortinas nas paredes, a louça, a roupa de cama, as vigas
de madeira no teto do apartamento, os jarros de flores e quadros
pela parede, tudo é novo.
Assim como o sentimento se aflorando dentro de mim.
— Você está pirando, Nick — meu irmão me chama, mas
apenas nego com a cabeça. — Não adianta mais dizer que isso é
apenas foda, você está fodido.
— É difícil ver a verdade — Fala Matt.
É. Levando em conta que eu a fodo em todas as superfícies
disponíveis, faço sua comida, durmo de conchinha e não suporto a
ideia de ela não dormir comigo, além de comprar tudo o que eu sei
que ela gosta e ainda digo que não significa nada, é difícil.
Porra, é claro que significa.
Como tu é burro, Nicolas! Tu é idiota se achou que tudo o que
sente em relação a ela não significava nada.
Eu decorei os sorrisos dela, caralho, todos eles! Como isso
não significa nada?
Como me sentir doente por estar longe dela não significa
nada?
Como sentir saudades assim que ela sai de perto de mim, e
desejar olhar para ela por horas infinitas não significa nada?
Significa que eu estou fodido.
Estou fodido pela Aurora.
Quando a olho é como se finalmente as coisas começassem a
fazer sentido para mim, quando fala, é como se o mundo ao meu
redor calasse e só a voz dela existisse. E suas manias de
alimentação?
Que idiota procura receitas saudáveis das comidas favoritas da
esposa falsa se não sentir nada? Que idiota sente todos os ossos
do corpo derretendo assim que são tocados pelas mãos da mulher
que jura não sentir nada?
Eu fico doente de ciúmes quando um homem chega perto de
Aurora. Não suporto a ideia de mais alguém a desejando.
Porque morro de medo de perdê-la. Porque isso é um acordo.
Porque temos um prazo e nem sei se ela vai me querer depois
que ele acabar.
Porque ela é linda, encantadora, engraçada e tão sensual...
Porra, ela é minha.
E eu sou dela. Completamente dela.
Ela pode fazer o que quiser de mim e nem mesmo sabe disso.
Será que ela sabe que me dói fisicamente lembrar que está
perto do divórcio? O visto dela foi aprovado, e quando chegou a
notícia, me alegrei por ela, mas meu coração doeu quando lembrei o
que isso significava.
Aurora casou comigo por esse visto.
Ela está comigo porque precisava dele e agora não precisa
mais.
Não posso, não posso imaginar perdê-la assim.
Preciso saber se os objetivos dela com esse casamento
mudaram. Pois os meus sim.
Eu estou fodido.
Estou fodido porque me apaixonei pela minha esposa.
E acho que acabei de cometer um erro.
Se eu soubesse de tudo isso
antes, eu faria de novo?
Eu faria de novo?
Se eles soubessem que o que
disseram iria direto para minha
cabeça.
O que eles diriam então?
(Everything I wanted - Billie
Eilish)
“Nós temos um acordo, Matt. É claro que vamos”
Tão cristalino quanto água.
Respiro fundo.
O que eu esperava? Que estivesse errada sobre o nosso
relacionamento?
Que relacionamento, sua tonta? Vocês só estavam fodendo
porque ele te desejava e era cômodo transar com a mulher que
dorme debaixo do teto dele todos os dias.
Ele avisou não foi? Ele disse que não queria ser meu marido
incontáveis vezes e me enganei ao pensar que estava bem com
isso.
Que ele deixando isso claro, eu não poderia me iludir.
Trouxa, trouxa, trouxa!
Mas foi errado da minha parte? Foi errado criar sentimentos
tão fortes por alguém que me trata tão bem? Que cuida de mim? Foi
errado pensar que ele sentia alguma coisa além de tesão?
Não é porque ele só quer me foder, que isso significa que ele
seja uma pessoa ruim. Ele está sendo incrível comigo, mas eu sou
tão carente de afeto que mesmo não querendo, cometi o maior erro
que poderia cometer com Nicolas.
Eu me apaixonei por ele.
Me apaixonei pelo meu falso marido.
Aquele que é real perante a lei, mas que nunca quis ser real
perante a mim.
É fácil se deixar levar por risadas sinceras, toques carinhosos
e ciúme obsessivo.
É claro que sentiria ciúmes. Enquanto estivesse me fodendo,
eu seria dele, e Nicolas é controlador demais para deixar alguém
cobiçar o que é dele. É só isso.
Mesmo que tenha dito que nunca havia sido alguém ciumento.
Isso me fez pensar que sou diferente.
Eu não sou diferente.
Por que me deixei levar?
Por que fui tão burra?
Tonta, tonta, tonta.
Sinto minha garganta arder com vontade de chorar, mas me
recuso a fazer isso aqui. Na sua casa.
No seu quarto.
Na sua cama.
Com seu braço ao meu redor.
Eu nem mesmo sei como vim parar aqui, talvez Nicolas tenha
entrado no meu quarto e me trazido no colo quando me viu
dormindo. Nem mesmo lembro em que momento dessa noite
adormeci. Acredito que tenha sido depois de devorar o bolo de
chocolate e desabafar com Hunt. Meu cachorrinho me olhava,
enquanto despejava tudo o que estava sentindo nele.
Estava magoada. Mas não devia estar.
Quando desci para comprar um bolo, estava animada porque
consegui comprar dois ingressos para um show da Lana aqui em
Manhattan e planejava pedir para que fosse comigo assim que Matt
e Léo saíssem do apartamento e ficássemos a sós com Hunt.
Mas foi só entrar pela porta para que essa alegria saísse pela
janela.
Eu escutei tudo. Tudinho mesmo, até sobre o meu cachorro.
Querem tomar até meu cachorrinho, esses idiotas!
Será que eles não veem que já tem uns aos outros e tudo o
que eu tenho nessa porcaria de apartamento é meu cachorro? Será
que eu me enganei tanto assim acerca da personalidade deles?
Hunt vai aonde eu for e se eu precisar fugir do país, só para
ficar com ele, eu vou.
Não seria a primeira vez que fujo do meu passado.
Escutar da boca de Nicolas que o nosso acordo ainda valia e
que nos separaremos foi um baque no meu coração.
Ainda estou sentindo, porra.
É como se milhares de pessoas estivessem com giletes nas
mãos, escolhendo partes do meu coração para rasgar. Dói.
Dói saber que o homem que você é apaixonada não sente o
mesmo que você.
Dói ainda mais saber que a única culpada disso é você.
Mas o pior? O pior é que não foi surpresa nenhuma ele não
sentir.
Doeu, mas eu já esperava o golpe.
Nicolas não é a primeira pessoa a quebrar meu coração. Mas
ele é a primeira pessoa que é sincera ao fazer isso.
Em nenhum momento me prometeu mais do que poderia dar.
Ele me deu o que tinha para dar. Prazer.
Eu o obriguei a ficar casado comigo, porra! Neguei a ele a
anulação do casamento e ele nem mesmo me queria por perto,
como eu achei que algo mudaria? Como achei que ele se
apaixonaria por mim depois do que eu fiz? Ele não entrou nesse
casamento por vontade própria, ele só está aproveitando enquanto
dura.
Ele disse com todas as letras que não queria ser meu marido,
disse que não “iria” ser, mas disse que queria me dar prazer sem
sentimentos e eu aceitei.
Eu disse que queria apenas transar com ele também.
Eu sou tão boa mentirosa.
Por que eu fiz isso?
Por que me apaixonei pela maneira como me olha? Como me
beija? Como sorrir para mim?
Não sei se vou suportar quando isso acabar. Vou sentir
saudade de tudo em Nicolas, até do seu mau humor. Vou sentir falta
dos flertes, da possessividade, das suas carícias.
Vou sentir falta dos seus beijos, do seu corpo grudado ao meu
e vou sentir falta de me sentir pertencer a alguém.
Porque sou de Nicolas.
E vai ser tão difícil não ser mais de Nicolas.
Vai ser mais difícil ainda, um dia realizar meu sonho de
construir uma família e não ser com ele.
Porra, eu estava tão iludida!
Me estico na cama, sentindo-o se mexer e resmungar, mas ele
não acorda.
Até esses resmungos eu vou sentir falta.
Do seu corpo colado ao meu.
De sentir sua presença tão perto de mim.
Pego meu celular na escrivaninha e procuro um contato que
salvei, para começar a seguir a minha vida.
Se eu continuasse sendo aquela menina egoísta que obrigou
Nicolas a ficar com ela, nada disso estaria acontecendo. Se tivesse
seguido com meu objetivo e nunca tivesse deixado minha guarda
abaixar, meu coração não estaria se quebrando agora.
Por quatro anos eu consegui ser essa pessoa. Por quatro anos
consegui deixar todo mundo de fora do meu coração. Abri uma
brecha apenas para Elisa, mas ela foi a minha única exceção.
Porque quanto mais pessoas você deixa entrar, mais pessoas te
decepcionam.
E eu não abri uma brecha, abri uma porta inteira para deixar
Nicolas entrar.
E ele não entrou sozinho.
Até do idiota do seu irmão e do bonzinho, que não é bonzinho,
do seu melhor amigo eu vou sentir falta.
Suspiro.
Está na hora de voltar a pensar em mim mesma, porque no
final é como sempre foi. Eu só tenho a mim.
E Hunt.
Agora eu tenho Hunt.

Olá, boa noite. Aqui é Aurora Castelo, o professor Sven Owens


passou esse número depois de me fazer uma proposta de emprego.
Gostaria de saber se essa proposta ainda está disponível.
Nós estamos dando um tempo ou terminando?
Não consigo entender as entrelinhas.
Me pedindo por espaço aqui na minha casa.
Você sabe como ferrar comigo.
Agindo como se não estivéssemos juntos.
Depois de tudo que passamos juntos.
Dormindo sobre segredos.
Como posso estar tão longe de você?
(Cold - Marrom 5)

Faz dois dias desde que descobri que sou completamente


apaixonado por Aurora.
Dois dias que estou completamente na fossa.
Aurora se afastou de mim.
Quando os meninos foram embora e subi para o quarto dela, já
a encontrei dormindo agarrada com Hunt. Não queria dormir longe
de Aurora e não queria dormir no seu quarto, pois significava que
ela não queria dormir no nosso.
E mesmo que eu saiba que é esse o caso, preferia mentir para
mim mesmo.
Preferia pensar que nada estava diferente.
Assim que a vi embolada, parecendo um anjo que eu sei que
não é, a peguei no colo e a trouxe para a nossa cama.
Então dormi com o objetivo de conversar sobre nós dois no dia
seguinte.
Conversar sobre o que sinto, sobre nosso futuro junto. Ou se
caso não me correspondesse, nosso futuro separado.
Odiei pensar nessa possibilidade.
Senti falta de ar ao imaginar isso.
Mas aí é que tá. Não tive abertura alguma para falar sobre nós
dois, pois quase não vi Aurora esses dias.
Quando acordamos no outro dia, ela já estava distante,
desconectada.
Acordou quase na hora de irmos trabalhar e quando tentei
puxar assunto, começou a tagarelar sobre o novo projeto.
Depois disso foi só ladeira abaixo.
Ela aceitou meus beijos, mas não me deixou aprofundá-los.
Ela aceitou meus toques, mas apenas os superficiais.
Perguntei o que ela tinha, tentando abrir uma brecha para que
eu pudesse falar sobre nós. Mas ela disse que estava cheia de
coisas na cabeça e que só precisava descansar um pouco.
Eu não ultrapassei essa linha.
Eu a esperei descansar.
No trabalho também não a vi e na volta para casa, ela já havia
pegado carona com Léo.
Ela também já estava dormindo quando eu cheguei, na cama
dela.
Ou fingindo que dormia.
Até que repetiu tudo novamente no dia seguinte.
Porém, ela ainda sorria.
Sorria como se nada houvesse mudado.
Como se nada importasse.
Eu não conhecia esse sorriso dela.
Eu odiei esse sorriso dela. O indiferente a mim.
Meus sentimentos estão me consumindo e senti-la se
afastando está acabando comigo. Está me matando, porra!
E o pior é que eu só culpo a mim mesmo. Tenho quase certeza
de que o que ela ouviu naquela sala é o motivo de estar assim e
nem tenho como culpar os filhos da puta que são minha família, pois
a frase saiu da minha boca.
Espero mesmo que se for isso, que ela me deixe conversar
com ela, explicar o motivo de ter dito aquilo.
É por isso que saí mais cedo do trabalho hoje.
É por isso que pedi para Otávio me ligar assim que Aurora
saísse.
A segui com meu carro, ela nem mesmo pediu carona hoje, só
pagou um táxi.
Eu sei que ela não está no nosso quarto. Nesses dois dias,
Aurora tem tentado disfarçar, mas já a vi carregando várias coisas
de volta para o seu e não gostava disso.
Não queria Aurora longe de mim.
Entro no seu quarto, escutando o chuveiro ligado e me sento
na sua cama pronto para esperá-la. Hunt, que estava todo
embolado perto do travesseiro, não demora a correr e sentar no
meu colo.
Ele ama ficar com a gente na cama.
Ele ama ficar no nosso colo.
— Hoje vamos passar o pano limpo com a mamãe, né, meu
filho? — ganho uma lambida gostosa na bochecha e sorrio.
Hoje vamos ter aquela conversa, não importa o quanto ela
queira fugir de mim. Se ela me mostrar que não quer isso, que não
existe um “nós”, então...
Então talvez eu precise beber quando sair desse quarto.
O barulho de uma mensagem chegando, me faz desviar os
olhos para a tela acesa do seu celular, jogado na cama ao meu lado.
Desvio o olhar de volta para Hunt, mas... que porra é essa?
Volto o olhar para a tela com o cenho franzido, sentindo tudo
em mim ficar em alerta.
As mensagens de Aurora não ficam ocultas pela tela de
bloqueio e o que vejo... o que vejo me faz ofegar.

Sven Owens: Oi, Aurora, desculpe a demora em responder,


estamos cheios de trabalho e fica difícil olhar o celular, mas que
prazer receber sua mensagem.
Sven Owens: Estamos sim interessados em você e a proposta
ainda está de pé, mas você não trabalha com seu marido? Bem,
isso não é da minha conta de qualquer maneira, vou mandar abaixo
o endereço da nossa sede. Apareça para uma apresentação formal,
por favor.
Me levanto com o seu celular na mão, sentindo meu coração
estraçalhar e Hunt se assusta, correndo para sentar em cima de um
travesseiro e me encarar com olhos desconfiados.
Mas o quê...? Que porra?
O que merda isso significa?
Solto uma risada amarga. É claro que sei que merda significa,
só não é possível que a minha Aurora esteja fazendo uma
sacanagem dessa comigo.
Não ela.
— Nicolas? O que faz aqui? — pelo visto, sendo um idiota.
— Quando ia me dizer que planeja me deixar, Aurora? — ergo
o celular, sem coragem de olhar para ela.
Sem coragem de ver nos seus olhos a verdade.
— Como? — pergunta hesitante, quase confusa, mas não
pode ser real.
— Você não ia ter nem a decência de me falar que além de me
abandonar, ainda ia me deixar na mão na R&C? — Tudo dói.
Todo o meu corpo começa a doer.
Começando pelo peito.
Ah... Aurora, o que você está fazendo comigo?
Por que está me traindo assim? Ergo os olhos, finalmente a
encarando.
Seu cenho se franze ainda mais e me aproximo lhe entregando
o celular.
Ela olha para a tela e fecha os olhos e isso é toda a
confirmação que eu preciso.
A confirmação de que mais uma vez, vou ser abandonado por
uma mulher.
Como se eu já não tivesse sido abandonado o suficiente.
O que há de errado comigo?
— Nicolas... — fala hesitante. Isso não está acontecendo,
porra!
— Planejava contar tudo em cima da hora? Quando assinasse
aquele divórcio? Não tem consideração por tudo o que tivemos,
Aurora?
Não tem consideração por mim? Você disse que gostava de
mim, porra!
Ela me olha.
Ela me olha e vejo mágoa em seu olhar.
— Consideração? Você não pode estar falando sério!
— Não estou? — ergo a sobrancelha, engolindo o nó na
garganta. — Porque eu acho uma coisa muito séria que a mulher
que dorme comigo, esteja enviando mensagens para aquele
professorzinho de merda, que estava babando em cima de você,
pedindo um emprego. Você tem um emprego, Aurora! — agarro
meus cabelos, os puxando ao ponto de dor. — Nós somos casados
e você planeja ir embora, inferno!
De novo.
Vou ser abandonado de novo.
— Eu planejo ir mesmo, Nicolas. — Vai, porra, quebra mais o
meu coração. — O dia do divórcio está cada vez mais próximo e
você queria que eu esperasse sentada que você me desse um pé
na bunda e me demitisse? É por isso que está com raiva? Por que
eu não estou chorando por você? — seus olhos verdes, tão lindos
quanto os de um anjo, marejam a contradizendo. Respiro fundo, me
aproximando. Ela se afasta de mim e paro na mesma hora, estático.
— Chorando por mim? Eu não quero que esteja chorando por
mim — nunca vou querer ser o motivo das suas lágrimas, mesmo
quando obviamente, você será o motivo das minhas. — Mas nós
estamos nos envolvendo, e duas pessoas que se envolvem
conversam antes de decidirem sumir da vida um do outro.
— Você deixou claro naquela sala, diante da sua família, que
não importa o que a gente tem, Nicolas, o que importa é o acordo
que fizemos. Você quer a porcaria da minha assinatura naquele
papel de divórcio, eu entendi isso. Só não sei por que está putinho
por eu começar a seguir em frente. — Ela se abraça, desviando o
olhar.
Putinho?
Ela não sabe de nada, porra!
— Estou puto porque você nem mesmo falou comigo, porque
está me ignorando há dois dias e não me deixou explicar o que
aconteceu naquela sala...
— Explicar o quê? Não preciso de explicação, você estava
certo, tudo foi um acordo e eu só estou seguindo com a minha vida,
me preparando para quando o dia chegar, porque não sei se você
percebeu, mas eu não tenho nada, porra. Eu moro na sua casa,
trabalho na sua empresa e não tenho um maldito teto para ficar
quando sair daqui. Você tem seu irmão e melhor amigo, você tem
tudo o que eu sonho, mas EU NÃO TENHO NADA. — Grita,
deixando lágrimas escaparem.
Meus olhos começam a embaçar e odeio isso.
— E quanto a mim? — olho em seus olhos, com a mão em
cima do órgão que está batendo desesperadamente. — E eu,
Aurora? Eu não estou aqui? Eu não sou o suficiente para você? —
sussurro com a voz rouca, engolindo em seco.
— Você disse com todas as letras que não queria ser meu
marido, o que você queria que eu pensasse? Eu já saí de um lar
onde todos faziam o que queriam comigo, Nicolas, não estou a fim
de ficar em um lugar onde meu marido disse que só quer me foder.
Eu quero mais do que isso, eu mereço mais do que isso. Queria que
eu me prestasse a esse papel de novo?
O quê? Quem ela pensa que eu sou? Um monstro?
— Não, porra! Eu queria que você me perguntasse ao invés de
tirar conclusões precipitadas! É por isso que eu estou aqui, porque
está me evitando, enquanto eu passei esses dias perturbado com a
ideia de você se afastar e é exatamente o que você está fazendo! —
Passo a mão no rosto, com raiva.
Com raiva de mim.
Com raiva da situação.
Com raiva de Aurora.
Mas acima de tudo, estou acabado.
Completamente acabado.
— Você disse que não me queria de outro jeito. — Sussurra e
procuro seus olhos, com os meus arregalados em desespero.
— Mas eu quero, porra! Te quero na minha cama e fora dela,
te quero como esposa e como amiga, te quero nos momentos bons
e nos ruins. Eu te quero de todas as maneiras possíveis, já não
demonstrei o suficiente? — Ela ofega, arregalando os olhos.
Minha voz sai rouca e isso me apavora.
Não, não...
— Nicolas...
Passo a mão no rosto, sentindo minha garganta fechar, mas
não posso, não posso ser tão fraco assim na frente de Aurora.
Não posso chorar.
Não posso.
— Quer saber, faça como quiser, Aurora. — Viro as costas,
desesperado para sair do seu quarto, sentindo tudo em mim doer.
Meus olhos quase não enxergam o caminho, enquanto meus
passos são rápidos me guiando para qualquer lugar longe daqui.
— Nicolas, espera...
Não espero. Não consigo.
Se eu esperar, vou me ajoelhar aos seus pés e me humilhar
pedindo para que fique comigo. Eu não sou assim. Eu não sou esse
tipo de homem e Aurora não merece alguém que se humilhe por
uma pessoa.
Mesmo que a pessoa seja ela.
Ela merece alguém forte.
Apenas saio do seu quarto, e depois do apartamento, batendo
a porta atrás de mim e escutando seus gritos me chamando, mas
não paro.
Não paro até entrar no meu carro e sair desse maldito lugar.
Então, depois de quase vinte anos sem derramar uma lágrima,
eu desabo pela minha mulher.
Não tenho muita certeza de como
me sentir quanto a isso.
Algo no modo como você se
mexe.
Me faz sentir como se não
pudesse viver sem você.
Isso me leva do começo ao fim.
Eu quero que você fique.
(Stay - Rihanna)
São três horas da manhã e Nicolas ainda não voltou para o
apartamento.
Ele não atende minhas milhares de ligações que foram
enviadas direto para caixa postal, não responde minhas infinitas
mensagens e não deu nem sinal de fumaça sobre sua localização.
Estou muito angustiada sem ter notícias suas. Ele saiu
completamente transtornado, o semblante em desespero e isso está
quebrando o meu coração.
Onde você está, Nicolas?
Ainda corri atrás dele, mas Nick saiu e não quis me ouvir, não
depois daquela discussão, não depois do que falei e da mensagem
que viu. Não depois de eu ter cometido um erro tão grande, sendo
exatamente como a menina de meses atrás. Impulsiva.
“Eu te quero de todas as maneiras possíveis, já não
demonstrei o suficiente?”
Ah, Nick... você demonstrou tão bem.
Tão bem que eu me apaixonei por você.
Tão bem que me fez amar você, e é tão bom amar você…
Tão bem que me quebrou ouvir que “temos um acordo” saindo
da sua boca.
Você demonstrou de todas as formas possíveis, mas fui tão
burra em não enxergar o óbvio. Por que eu tinha que estragar tudo?
Por que eu não esperei para conversarmos? Por que me enganei
desse jeito? Porque você disse que tínhamos um acordo, Nick?
Deus, por que isso sempre acontece comigo?
Porém, não posso culpar apenas a mim, não depois do que
falou. Nicolas me conheceu dando um golpe nele, então como
queria que eu agisse diferente se não fosse para me preservar,
quando o ouvi falando que me dispensaria?
“Eu quero você de todas as maneiras possíveis.”
Quais maneiras, Nicolas?
Por que você não volta para casa para que eu possa te
mostrar de quantas maneiras eu consigo te querer também?
Por favor, coração, não me mate agora, pode bater um pouco
mais devagar e não tentar explodir no meu peito? Só até ele
chegar? Só até eu conseguir perguntar qual o significado da sua
frase? Só até eu confessar o tanto que amo ele?
Porque é muito.
Eu o amo tanto...
Não sei o que é respirar direito desde que nossa discussão
começou. Eu sabia que tínhamos que conversar, sabia que uma
hora ou outra falaríamos sobre nós, mas não queria ouvi-lo falar que
não sentia nada.
Porra, eu estava tão enganada…
Fungo, limpando meu rosto que está inchado de tanto chorar.
— Au. — Abraço meu filhinho. Hunt não tirou seus olhos de
mim desde que Nick saiu, e seus olhinhos brilhantes me analisando
com tanto amor, me faz chorar mais.
— Onde seu pai está, neném? — sua cabecinha peluda
tomba para o lado.
— Au, au, au — assinto, entendendo tudo, limpando o nariz
que está escorrendo como uma cachoeira.
— Sim, também acho que ele está sendo cachorro por aí —
fungo, e Hunt late mais uma vez, lambendo a minha cara. — Tá
bom, filho, eu paro de chorar, prometo. — Quando Nicolas chegar.
Hunt me olha como se soubesse que estou mentindo.
Ele é tão adorável.
Me viro no sofá, passando os canais na televisão, esperando
que algum chame minha atenção, mas meus pensamentos insistem
em ficar em Nicolas.
Nem mesmo Sandra Bullock ou Henry Cavill conseguem tirar
meus pensamentos do meu Nick.
Porque ele é meu.
E ele me quer.
E ele está fora de casa há mais de oito horas, e estou a ponto
de ligar para a polícia. Já liguei para Léo e Matteo, os dois disseram
que iriam procurar ele e me mandaram ficar aqui, para caso ele
chegue.
Minha voz desesperada os fizeram me perguntar o que
aconteceu, mas não queria contar.
Estou magoada com eles, estou mesmo. Eu sei que a lealdade
deles é de Nick, mas eles tinham que falar em tomar o meu
cachorro?
Com o meu cachorro ninguém mexe!
Alguém batendo na porta me tira do transe e me levanto
assustada.
Nicolas tem a própria chave, ele não precisaria bater, mas será
que ele esqueceu?
Caminho até ela com Hunt aos meus pés e meu coração na
mão e vejo Léo do outro lado pelo olho mágico. Abro rapidamente a
porta, sendo presenteada pela visão do meu cunhado carregando
meu marido, quase desmaiado.
O cheiro de álcool me estapeia com força na cara.
— Ele está completamente embriagado — isso é óbvio, Léo.
Abro a porta para que ele entre, sentindo minhas pernas tremerem
com o alívio que ver Nicolas me causa. Porra! — Dá para sentir o
odor de whisky de longe. — Reclama.
— Tem um bafômetro... ick — Nicolas soluça — enfiado no cu,
porra? — fala em meio à voz embolada e Léo o joga no sofá.
— Nem é preciso de um — resmunga o irmão, com as mãos
na cintura, negando com a cabeça. Nicolas se deita e joga um braço
na frente do rosto, resmungando coisas ininteligíveis. — O que fez
com ele? Parece que ele andou chorando. — O Ramsey mais novo
fixa sua atenção em mim. — E você também, o que houve, Aurora?
Me encolho.
Meu coração sangra.
Nicolas chorando.
Nicolas, que a última vez que chorou, foi quando o irmão
ganhou uma bolsa de estudos. Nicolas, que nunca mais
desperdiçou lágrimas com coisas que não mereciam. Nicolas, que
disse que me queria. O meu Nicolas chorou por mim.
E estou me sentindo uma merda por isso.
— Nós discutimos quando ele chegou do trabalho, tínhamos
assuntos pendentes e as coisas saíram do controle.
— Esses “assuntos pendentes” têm algo a ver com o que
escutou naquele dia? — pergunta com cuidado. Desvio os olhos
para Nicolas no sofá, cutucando o interior da bochecha. — Como
você está?
Estalo a língua, olhando para Nicolas.
— Tô bem, Léo, eu sempre fico bem — mentirosa. — Pode ir,
eu cuido dele. — Falo, olhando para os meus pés.
Ele não sai.
— Sinto muito por aquele dia, Aurora. — Dou de ombros e
assinto. — Me desculpe mesmo, sou irmão dele, sabe, é difícil vê-lo
tão confuso com algo e não poder fazer nada, só queria que ele
notasse o que estava acontecendo debaixo do nariz dele.
— E tirar meu cachorro.
— Ia ser guarda compartilhada, não seja má — minha boca se
contorce, mas não deixo o riso escapar.
— Ia? — pergunto, erguendo o olhar até o seu.
Seus olhos reviram.
— Ao que tudo indica, sim — ri, coçando a nuca. — Se minha
opinião importa de algo pra você — começa. Importa, Léo. Importa
sim! — Eu amaria ter você como cunhada. De verdade. — Meus
lábios tremem. — Ei, vem aqui, vem. — E eu vou.
Seus braços me circulam, em um abraço apertado, enquanto
Nick balbucia coisas aleatórias com Hunt como se fizesse muito
sentido.
— Não sei o que aconteceu com vocês, mas deve ser algo
sério, faz tanto tempo que não vejo meu irmão chorar, Aurora. Mas
ele chorou por você. Você deve saber o que isso significa. — Meu
coração chora comigo.
Espero que seja o que estou pensando, Léo. Espero mesmo.
— Se resolvam, ok? Amanhã eu venho aqui ver como ele está.
— Assinto, sem conseguir falar por cima do nó da garganta e Léo se
afasta, olhando para Nicolas mais uma vez e logo saindo do
apartamento.
Observo Nicolas, ele está resmungando, enquanto recebe
várias lambidas no rosto.
Me aproximo, me ajoelhando no chão e ficando cara a cara
com ele.
Toco seu rosto de olhos fechados.
— Onde você estava, amor? — sussurro e seus olhos tentam
abrir, mas sem sucesso.
Isso não impede da sua mão pegar a minha e afastá-la do seu
rosto.
— Não me toque — arregalo os olhos, sentindo minha
respiração travar.
— Nick…
— Não me toque… ick— soluça. — Eu tenho mulher! — Volto
a respirar, com o coração na mão.
Não é possível.
— Nicolas, sou eu. — Falo, emocionada.
Ah, Nick, o que você fez comigo, meu amor?
— Ela vai me deixar, sabia? — meus olhos marejam mais. —
Me abandonar, como todas as mulheres da minha vida. — Sinto
tudo ao meu redor parar, quando as lágrimas começam a escorrer
de seu rosto. Ah, Nick.
Não chore, por favor.
Não chore por mim, quando ninguém nunca fez isso antes.
— Não vou deixar você, meu amor — sussurro, mas parece
que ele está em um mundo só dele, pois nem mesmo me olha.
— Depois de tudo o que passamos, ela vai me abandonar.
Exatamente como minha mãe me abandonou.
Abaixo a cabeça e encosto a testa no seu ombro. Saber que
Nicolas se sente assim...
Ah, Nick, o que eu fiz? Minha intenção nunca foi te magoar,
amor, só não queria me magoar mais.
— Não, ela não vai, ela nunca seria igual aquela mulher que se
foi sem olhar para trás, se sua mulher fosse embora — engulo em
seco, erguendo a cabeça novamente. — Aposto que desejaria
apenas um pedido seu para ficar.
— Vai sim, vai me deixar… ick… e vai trabalhar para aquele
idiota… ick… e depois vai ficar com ele… — ele tá falando do
professor Sven?
— Ela gosta de você, apenas de você. — Ele nega com a
cabeça, abraçando Hunt. Quero rir da cena. Meu coração está a
ponto de explodir.
— Sabe o que ela é? — ele não me espera responder. — Uma
golpista… ick… trapaceira, mentirosa… ick — soluça. —
Dissimulada... talvez eu tenha outro apelido para ela.
— Qual? — pergunto com diversão.
— Ladra. — Oxe! Arregalo os olhos.
— Ué, por quê?
— Porque ela roubou o meu coração. — Solto uma risada
engasgada, tentando respirar por meio da garganta fechada, o
olhando encantada.
Sua camisa está suja de bebida.
Sua calça amarrotada, seu cabelo jogado para todos os lados,
como se tivesse enfiado a mão neles várias vezes e tudo o que
consigo pensar, é que ele ainda é o homem mais lindo que já vi na
vida.
Você também roubou meu coração, Nicolas.
— Vem, Nicolas, me ajuda a te levar para a cama. — Me
levanto e tento passar o braço pelo seus, mas ele se mexe
incomodado.
— Sai, demônio! Eu já disse que sou casado! — Solto uma
risada alta e nego com a cabeça. Ao que parece, não posso me
aproximar, porque Nicolas não vai me trair comigo mesma.
Decido ir procurar remédios para ressaca na cozinha. Faço
tudo rapidamente. Dou a ele, que o toma reclamado sobre copo
batizado e que havia casado na última vez que aceitou remedinhos
de um estranho. Por minutos ele repete que é casado e isso me
diverte cada vez que sai da sua boca.
Espero que durma, então, mesmo que ele cheire como um
mendigo alcoólatra, me deito ao seu lado.
E durmo à espera de um amanhã.
E de todos os amanhãs que
teremos juntos.
Eu me lembro de anos atrás.
Alguém me disse que eu deveria
ter.
Cuidado quando se trata de amor,
eu tive.
E você foi forte e eu não fui.
Minha ilusão, meu erro.
Eu fui descuidado, eu esqueci, eu
esqueci.
E agora, quando tudo está feito,
não há nada a dizer.
Você se foi e tão sem esforço.
(Impossible - James Arthur)

Deixo a água cair pelo meu corpo, tentando limpar por fora,
tudo o que está sujo por dentro. Toda a mágoa, todo o
ressentimento e todo o medo.
Medo de perdê-la.
Porra, eu não queria perdê-la, mas parece que não tenho mais
poder de escolha na nossa relação, ela já decidiu isso por nós dois.
Ela vai me deixar. Ela vai partir e me deixar completamente
quebrado com sua ida. Vai levar meu coração e suspeito que nunca
me devolverá.
Eu nasci para amar Aurora. Eu nasci para ser dela e se não for
para tê-la ao meu lado, então para que eu preciso desse coração?
Para que meu coração vai servir se ele só bate por aquela maldita?
Nunca me senti tão mal assim.
Nem quando Leonor foi embora, nem quando Riley me deixou.
A partida de nenhuma das duas me fez chorar, mas a ideia de
não ter mais Aurora na minha vida, me fez desabar como há muito
tempo eu não fazia.
Me surpreende que eu não esteja com dor de cabeça.
Me surpreendeu ainda mais, acordar no sofá, agarrado a ela.
Nossa, como eu amo agarrar Aurora. Eu amo tudo sobre ela.
Sua bagunça, sua mania de alimentação, sua língua afiada.
Amo até seu jeito impulsivo de lidar com a vida, sua cabeça erguida
diante dos problemas. Amo até mesmo que ela tenha se priorizado
e decidido seguir em frente depois do que eu disse naquela sala.
Mesmo que ela me deixe, mesmo que quebre meu coração.
Precisei beber todo o estoque do bar para me colocar no lugar dela.
Não foi isso que me fez dizer aquela merda? Não foi pensar
que ela não me queria, que me fez dizer que tínhamos apenas um
acordo? Como posso culpá-la por pensar que eu não a queria?
Não importa o quanto eu demonstrei, porque com uma frase,
eu arruinei tudo.
E com uma mensagem, eu percebi que Aurora não sente por
mim o mesmo.
Eu amo Aurora.
Eu a amo de todas as maneiras.
Mas ela não sente o mesmo por mim.
Mesmo que quando eu acordei naquele sofá, ela estivesse
agarrada a mim, com o rosto inchado denunciando que chorou.
Nosso pequeno Hunt estava em cima de nós, me olhando quando
acordei. Dei comida e água e ele decidiu ficar por lá.
Não sei como cheguei em casa, só me lembro de ter saído
daqui e ido direto para o primeiro bar que eu vi aberto enquanto
dirigia sem sentido, mas aqui estou eu, de algum jeito, voltei para
casa e dormi no sofá. Com ela.
A trouxe comigo para o meu quarto, segurando-a com força e
tentando não a deixar cair, já que bebi tanto, e tentando me agarrar
a tudo o que ainda posso, antes que ela vá embora. Ela está
deixando seu cheiro na minha cama. Se for possível, pedirei que
durma nela todos os dias até decidir ir, eu durmo no quarto dela, só
preciso sentir sua presença quando ela não estiver mais deitada
comigo.
Eu nunca fui tão patético em toda a minha vida.
Termino meu banho, escovo meus dentes e logo saio do
quarto, a vendo deitada, dentro de uma camisa minha, como
costuma dormir desde que começamos a nos envolver. Ela ama as
minhas camisas.
Com cuidado, me deito ao seu lado, sem tirar a toalha da
cintura, a puxando para os meus braços. Ela se remexe, se
encaixando em mim. Enfio meu nariz no seu cabelo, aspirando seu
cheiro doce e sentindo meu peito pesar.
Vou sentir tanto a sua falta, Aurora.
Nossa, como eu vou sentir sua falta.
Vou sentir saudades suas quando deitar e não te ter ao meu
lado. Vou sentir quando for fazer o café e ser apenas para uma
pessoa, quando olhar para o banco passageiro e não ter você indo
trabalhar comigo. Vou sentir sua falta quando sentir meu coração
bater.
Vou sentir sua falta quando respirar.
Porra, Aurora, vou sentir tanto a sua falta.
— Onde você estava? Me deixou preocupada, Nicolas. —
Escuto seu sussurro contra meu peito e a pressiono mais contra
mim.
Acho que a acordei com a força que estou fazendo ao segurá-
la.
— Desculpa, querida — murmuro. — Não quis te deixar
preocupada.
Só quero um pouco mais de nós dois.
— Você passou mais de oito horas fora — seu rosto procura o
meu. — Chegou completamente bêbado. — Ela sorri. Um sorriso de
quem esconde um segredo. — Fez uma cena e tanto.
Engulo em seco.
— Desculpa — peço de novo, enfiando meu rosto no seu
pescoço.
— Precisamos conversar, Nicolas. — Eu sei.
Mas não posso ouvir você falando que vai me deixar de novo,
Aurora. Por favor.
— Pode ser depois? Me deixa ficar aqui com você só um
instante, querida. — Murmuro e suas mãos começam a fazer um
carinho nas minhas costas.
E dói ainda mais saber que é um carinho comum. Que não é
com amor, porque Aurora não me ama.
Como fui acabar assim?
— Nick, olha pra mim — nunca fui tão covarde. — Por favor.
Respiro fundo e tento acalmar meu coração.
Tento acalmar, antes que ele seja despedaçado.
Então, a olho. Meus olhos focando nos seus lindos olhos
verdes de anjo.
— Não me deixe, Aurora. — Não consigo.
Não consigo não fazer nada e apenas a observar ir embora.
Tenho que pedir.
Pedir para que fique. Fugi mais cedo para não me humilhar,
mas estou quase fazendo isso de novo.
— Fique comigo, amor — peço, e seus olhos suavizam. Ela
parece tão calma.
Tão em paz, tão leve.
Ela parece tão decidida que fecho os olhos, encostando minha
testa na sua.
— Desculpa pelo que falei, isso não é apenas um acordo,
Aurora, não para mim. Deixou de ser a partir do momento em que
comecei a conhecê-la de verdade. — Como demorei tanto tempo
para perceber que Aurora é o amor da minha vida? Como esperei
perdê-la para assumir isso para mim mesmo?
— Não tem o que desculpar, Nicolas… — nego com a cabeça,
falando tudo o que tenho para falar antes que ela me deixe.
Meu último fio de esperança.
— Tenho sim, porque eu entendo, Aurora. Eu entendo você
querer me deixar, eu falei besteira, disse que temos um acordo e
além disso, não sou o melhor dos maridos — ela nega com a
cabeça, mas continuo. — Sei que sou controlador, que sou ciumento
demais com você, quando nunca fui ciumento com ninguém, sei que
trabalho demais e que sou chato, na maioria dos dias sou
insuportável de tão ranzinza, também sei que sou mais velho e que
você ainda tem muito o que viver para se amarrar tão cedo a
alguém, mas…
— Você tá falando besteira. — Não estou. Só que sei o motivo
de uma mulher não ficar por muito tempo na minha vida. — Eu
gosto de como é controlador, Nicolas, porque nunca me senti no
controle de nada, nem mesmo da minha vida, gosto que você tome
a dianteira em tudo, que me deixe viver sem o peso do mundo. —
Ah, Aurora. Se você soubesse tudo o que sou capaz de fazer para
você viver feliz. Inclusive, te deixar ir. — Adoro que sinta ciúmes de
mim, me faz sentir que sou sua. E amo que seja insuportável de
chato, faz par com o meu eu cheio de vida. E eu não quero deixar
você, Nicolas. — Não quer? Meu coração dispara e meus olhos
arregalam. — Mas, preciso saber, Nicolas, o que quis dizer com me
querer, preciso que seja claro. — Pede, me olhando cheia de...
Não, não pode ser.
— Não sei em que momento aconteceu ou como, mas sei que
não quero que você vá, e não é apenas porque quero alguém para
foder, Aurora — seus olhos enchem e levo minhas mãos para seu
rosto. — Preciso que entenda que não é apenas uma foda. Quero
você para cuidar, para proteger, para respeitar e ser fiel, para
alimentar com minhas infinitas receitas que aprendi na internet,
quero você ao meu lado, quero para te amar — ela arregala os
olhos, mas não paro. — Eu amo você, Aurora. Amo você
incondicionalmente. — Limpo suas lágrimas sentindo as minhas
escorrerem.
— Me ama, Nicolas? — sussurra cheia de encanto.
— Tem como não amar? Me diz, Aurora, tem como não amar
você? — sussurro.
— Ah, Nicolas…
— Não tem, Aurora, você é absolutamente apaixonante, tudo
em você me encanta, tudo em você me deixa em alerta, tudo em
você foi feito para mim. — E nunca falei uma verdade tão
verdadeira.
— Você está falando sério? — prendo seus olhos nos meus e
olhando para ela, falo.
— Me apaixonei por você, Aurora. E esse sentimento
aumentou em todas as vezes que te vi sorrir.
Ela se joga em meus braços, me apertando com força e só
consigo retribuir, só consigo pensar que ela não quer me deixar.
Finalmente consigo sentir ar entrando em meus pulmões.
Só consigo sentir ela.
— Ah, Nicolas, me desculpe, me desculpe por enviar aquela
mensagem e pensar em ir embora, eu tive tanto medo, Nicolas,
tanto medo de te perder. — A deito na cama, ficando por cima do
seu corpo.
— O que isso significa, Aurora?
— Significa que você também é absolutamente apaixonante,
Nick. — Minha resposta é sorrir. — Que foi impossível não te amar,
que doeu como o inferno ouvir aquilo saindo da sua boca e pensar,
por dias, que eu estava amando sozinha. — Ah, minha pequena
trapaceira... — Que depois do que eu fiz, seria impossível me amar,
porque ninguém nunca me amou de verdade na vida, Nicolas. —
Seus olhos escorrem lágrimas que limpo com meus polegares. —
Não tanto, não ao ponto de ficar. De ficar ao meu lado.
— Me ama, Aurora? — sussurro a pergunta.
Ela sorri.
É um sorriso apaixonado.
Um sorriso que ainda não sabia o significado, mas lembro de
todas as vezes em que abriu um desses pra mim.
Foram tantos, como não percebi?
— Incondicionalmente — responde e nego com a cabeça.
— Ah, meu amor, eu vou cuidar tão bem de você. Tão bem. —
E abaixo minha boca na sua, pronto para beijar o amor da minha
vida.
Sua pele.
Oh, sim, sua pele e ossos.
Transformaram-se em algo
bonito.
Você sabe.
Você sabe que eu te amo tanto?
Você sabe que eu te amo tanto?
(Yellow - Coldplay)
Lembram que no começo disso tudo, eu sentia uma puta inveja
de Oleander Fallows por ter cinco homens a adorando e dando tudo
o que ela queria?
Não sinto mais, porque não importa se ela tem vários caras a
venerando. Ela não tem Nicolas.
Ninguém, além de mim, tem Nicolas.
Finalmente, depois de tanto tempo esperando alguém que me
amasse incondicionalmente, eu achei. Achei alguém que pediu para
que eu ficasse.
Alguém que não suportava me ver partir.
Tudo o que sinto no momento, é frio na barriga, um frio
desconcertante da ansiedade de tudo que viveremos juntos. O que
é o oposto do calor que toma conta do resto do meu corpo, com o
beijo quente do meu amor.
Do meu amor.
Do meu Nick.
Com sua boca na minha em um beijo regado do mais puro e
belo amor, tudo ao meu redor passa a não existir, além dele.
Eu me entrego a Nicolas.
Me entrego de corpo, coração e alma.
Tudo em mim pertence a ele, e tudo dele pertence a mim.
Somos o lar um do outro, finalmente! Finalmente achei meu lar, e
não estava em um país, um estado ou um apartamento.
Estava no coração de Nick.
Meu lar é no coração de Nick.
Será que é possível morrer de amor? Se for, acho que posso
morrer feliz.
Seu rosto se afasta do meu e seus olhos intensos me fitam
cheios de amor. Como não notei isso antes? Como não percebi que
toda a admiração, todo o cuidado e atenção, toda possessividade,
era amor? Como não percebi que Nicolas me ama?
Circulo sua cintura com as pernas e o puxo para mais perto.
Seus olhos escurecem quando nossos corpos colidem.
— Faz amor comigo — peço em um sussurro. Seus olhos
brilham.
Eu sou tão apaixonada por esse homem.
— Faço amor com você há muito tempo, esposa — sussurra
de volta, fazendo meu coração bater descompassado no peito.
Sorrio contra a sua boca.
— Esposa, é? — Tem como ficar mais feliz? Algo me diz que
tem. Algo me diz que Nicolas vai me fazer ainda mais feliz todos os
dias.
Seus olhos enrugam nos cantinhos com seu sorriso aberto.
— Sim, minha esposa. Minha linda e adorável esposa. — Seus
lábios tocam os meus. — Minha para sempre e apenas minha.
— Já disse que amo a sua possessividade, amor?
— Adoro ouvir você me chamando de amor.
— Você me chamou primeiro, sabia? — seu rosto se afasta e
ele franze o cenho.
— Chamei?
— Enquanto me fodia na sua sala, disse “fica quietinha, amor”,
quase gozei, sabia? — Seu sorriso sacana aparece.
Eu quase gozei mesmo, mas fingi um costume que não tinha
para não passar vergonha.
— Então te chamar de amor faz você ficar tão mexida quanto
eu? — aceno em concordância, ofegando um pouco quando sua
mão começa a acariciar minha coxa, subindo em uma carícia lenta,
até adentrar a sua camisa que estou vestindo. — Que bom. —
Sussurra.
— É difícil não ficar mexida com você — confesso uma
verdade.
— Meu amor — sussurra no meu ouvido, sua mão passando
pela minha cintura e chegando ao seio. — Eu vou te comer tão bem,
agora. — Sinto minha respiração falhar quando aperta meu peito e
desce a boca na minha.
Sinto todo o amor que sente por mim nesse beijo, junto com
toda a intensidade do seu desejo, quando suga minha língua, me
fazendo gemer contra sua boca.
Agarro seus cabelos, derretendo em seus braços, porque com
ele é assim. Com Nicolas eu não tenho controle sobre mim, ele que
tem. Gosto do seu controle. Gosto que seja firme ao me tomar para
si, que me mostre que sou dele.
Ele não tem pena de mim.
Ele não é carinhoso ao me tomar, mesmo assim, hoje sinto ele
diferente.
Hoje sinto amor quando ele solta a minha boca e olhando em
meus olhos, tira a mão do meu seio, para começar a abrir os botões
da minha camisa, um por um, lentamente.
Sinto amor quando ele a tira e olha para meu corpo, com
apenas uma calcinha de renda azul, que coloquei para combinar
com a blusa azul clara e me admira com os olhos brilhantes,
enquanto engole em seco.
Sinto amor quando seus olhos voltam para os meus e ele fala.
— Você é tão linda, amor — sua mão cobre minha barriga
inteira que vibra ao contato. — E é minha, nossa, como eu amo que
você seja minha. Assim como eu sou seu. — Sorrio, olhando para
todo ele.
Seu maxilar marcado.
Sua barba cerrada.
Seus músculos enormes, que o fazem parecer esculpido por
um artista.
Seus lindos olhos verdes.
Seu cuidado, seu respeito.
Eu que não acredito que esse espetáculo de homem seja meu.
— Eu te amo — sussurro e sua atenção volta para o meu
rosto.
Ele sorri.
Eu me apaixono um pouco mais.
— E eu amo você — então ele está me beijando de novo e
dessa vez, não é mais carinhosamente.
Suas mãos me circulam e ele se ergue, me levando junto, sem
nunca parar de explorar minha boca com sua língua. Logo minha
camisa é retirada e jogada em algum lugar do quarto, logo puxo sua
toalha e o tenho nu pra mim.
Logo estou deitada novamente, com sua boca deixando beijos
molhados pelo meu maxilar.
Nossa, como eu amo os beijos desse homem.
Gemo alto, quando deixa um chupão entre a curva do ombro e
pescoço e Nicolas me morde grunhindo.
Suas mãos passam por todo o meu corpo, enquanto faz o
caminho até meus seios e ele coloca um mamilo inteiro na boca.
Puxo seu cabelo em resposta.
— Isso... — gemo cheia de tesão, arqueando as costas e seu
grunhido vibra contra mim. Sua língua circula a aréola e sua outra
mão agarra o seio livre, apertando meu mamilo com o polegar e o
indicador, o que me faz gritar mais alto.
— Você geme tão gostoso, Aurora. — E repito o gesto quando
passa a língua pelo vale entre eles e se concentra no outro,
lambendo, mordiscando e sugando meu mamilo.
Que tesão... tanto que minha boceta pulsa e sinto ela molhada
contra a calcinha. Daria tudo para senti-lo dentro de mim agora.
Me remexo contra seu corpo, sentindo seu pau duro contra
minha coxa e solto um resmungo quando não tenho o contato que
eu quero.
— Tão apressada, amor. Isso não é uma rapidinha, isso sou eu
te comendo bem gostoso e fazendo isso com amor. Tenha calma,
ok? — resmungo de novo, mas solto um grito alto.
— Você… isso é bom, repete — ele sorri do meu pedido e
estapeia minha boceta novamente, bem em cima do clitóris e me
arrepio inteira. Mordo o lábio e seus olhos pesam.
— Toda vez que morde o lábio, tenho vontade de me enfiar
fundo na sua boca, amor — porra... — castigá-los e deixá-los
inchados de tanto me chupar. — Salivo, lambendo-os. Nicolas
rosna. — Você amou a ideia, não é?
— Você é gostoso demais para que eu não amasse, amo te
chupar, Nick, é meu pirulito favorito — ele sorri maliciosamente e vai
deixando beijos por toda a minha barriga, descendo até estar de
cara com minha intimidade.
— E você, amor, também é meu doce favorito — lambe os
lábios e passa o nariz por toda a minha intimidade, inspirando meu
cheiro. — Tão cheirosa e molhada, amor. Tão ansiosa por mim.
Não consigo responder ao observar seu olhar faminto,
enquanto abre ainda mais as minhas pernas.
Puta merda, eu vou gozar tão rápido!
Seu indicador pega o lado da minha calcinha e o afasta. Seus
olhos procuram os meus quando desce a boca e me beija.
Que beijo gostoso.
Jogo a cabeça para trás, inundada de prazer e gemendo alto.
Isso tudo... tudo o que estou sentindo é novo.
É novo porque é a primeira vez que sei que estou fazendo isso
com alguém que me ama também.
E é tão bom.
Tão bom ser chupada por ele.
Ofego quando sua língua começa a ficar mais bruta na minha
boceta. Puta merda, isso é demais... Nicolas suga meu clitóris e
lambe minha entrada com sede.
É como se estivesse morrendo.
Morrendo de sede por mim.
Ele me devora, e geme, fazendo minha vagina vibrar. Ele não
para, continua chupando meus lábios, mantendo um ritmo intenso
em cima do meu clitóris e depois enfia a língua molhada na minha
entrada.
Meu corpo estremece.
— Minha nossa — ofego, sentindo todos os meus pelos se
arrepiando.
— Você é deliciosa, porra — rosna contra mim, metendo dois
dedos de uma só vez. Agarro seu cabelo o puxando para mais
perto, bêbada de prazer.
— Mais, Nick — estou tão perto...
E ele me dá. Sua língua fica mais ritmada e seus dedos
começam um vai e vem gostoso. Nicolas me fode com a língua e
com as mãos e só estou esperando que me diga para...
— Goza, amor, goza e me deixa beber de todo o seu prazer —
e eu gozo em sua língua, ofegante e murmurando palavras
desconexas. A sensação é como pular de paraquedas. Cair em
queda livre. É assim que me sinto ao estremecer na sua boca. —
Que delícia, meu amor.
Ele continua me chupando, até que meu corpo pare de
estremecer, até que tenha lambido toda gota do meu orgasmo,
então abaixo a cabeça e o encaro.
Encaro o homem da minha vida.
— Só em pensar que vou ser chupada assim para sempre,
quero gozar de novo — confesso e Nick solta uma risada, se
erguendo e ficando cara a cara comigo.
Suas pupilas estão dilatadas. Nick parece querer me devorar
inteira e estou disposta a deixar. Estou disposta a deixá-lo fazer
qualquer coisa comigo.
Meu amor...
— Não seja por isso, amor, vou te fazer gozar de novo agora e
em todos os dias que você quiser — minha resposta é ofegar de
prazer, ao ver ele trazer os dedos molhados que estavam em mim,
até a sua boca e os chupá-los. — Pode sentar na minha cara
quando quiser, eu amo seu gosto — sussurra malicioso e leva a
mão até minha calcinha, a arrancando com um puxão.
— Que bom que você é rico para comprar calcinhas novas
para mim — brinco e ele ri.
— Que bom, porque planejo acabar com várias — ele beija
meu sorriso. Nós gememos quando seu pau molhado se encontra
com a minha boceta encharcada.
Eu gemo sentindo meu gosto na sua boca.
Nicolas circula meu pescoço com a mão e se afasta para olhar
em meus olhos. Eu sinto quando ele se encaixa na minha entrada.
Minha boca e a dele se abrem quando começa a se enfiar
lentamente. Em seus olhos vejo prazer.
Mas também vejo pertencimento quando chega até o fundo e
geme, mordendo o lábio. Seu aperto aumenta em meu pescoço. Eu
sorrio, porque amo isso.
Ele.
Eu amo ele.
— Ahhh — grito quando estoca com força em mim, o barulho
molhado dos nossos sexos se tornando musica e mesmo embebida
de prazer, não fecho os olhos.
Não conseguiria nem se quisesse, Nicolas os prende nos seus,
enquanto começa a me tomar para si.
Então tudo silencia novamente.
Só existe ele e eu, e nossos corpos se unindo. Só existe nossa
conexão e nossa escolha de ficar juntos. Só existe seu aperto em
meu pescoço ficando mais forte a cada estocada.
Arranho suas costas, gemendo contra sua boca e seguro sua
bunda o puxando para mim. Começo a ondular meu quadril em
direção ao seu e o contato fica maior. O barulho das nossas
intimidades se batendo fica mais alto.
Os nossos gemidos ficam mais gostosos.
Minha barriga vira gelo quando Nicolas desce a boca em meu
mamilo.
São tantas sensações. Tantos estímulos.
Eles só aumentam quando Nick me beija. Quando ele me
abraça e nossos corpos suados se grudam.
Mordo seus lábios, escutando seu grunhido.
É tudo de mais... É tudo perfeito.
Seu abraço aperta e quase nos fundimos um no outro. Puta
merda, puta merda...
— Ahhhhh — ofego.
— Vem comigo, amor.
Gozo sentindo meus dedos dos pés contorcerem, com meu
clitóris sendo acariciado pela sua pélvis e seu pau tão fundo
metendo gostoso em mim. Gozo com sua boca na minha, e sua
mão acariciando cada parte do meu corpo.
Gozo ao sentir o jato quente de porra no meu íntimo, porque
Nicolas goza comigo.
E vai ser assim de agora em diante.
Nós dois.
Nós dois juntos, fazendo coisas juntos, vivendo juntos.
Vai ser uma vida perfeita, porque temos um ao outro.
Porque mesmo não sabendo, tomei a melhor decisão da minha
vida ao topar ir para aquele fim de semana em Vegas. Por ter
tomado todas e casado com um desconhecido.
Porque mesmo sabendo que foi maluquice, não me arrependo
de ter ficado com ele por todos esses meses.
Por ter decidido continuar casada com Nicolas. Por ter o
chantageado para continuar casado comigo.
No fundo eu sabia, desde o momento em que o vi pela
primeira vez naquele quarto de hotel, que aquele arrepio que me
percorreu não era normal. Que os olhos verdes me encarando eram
diferentes. Que tudo o que aconteceu mudaria minha vida.
No fundo eu sabia, por isso fiz minha escolha. Porque mesmo
quando sou impulsiva, é apenas o meu instinto me ajudando a
encontrar o caminho para ser feliz.
A encontrar o meu destino.
A encontrar o meu lar.
No fundo, a minha eu bêbada também sabia, foi por isso que
se casou com Nicolas, com o amor da minha vida.
E se nós reescrevermos as
estrelas?
Diga que você foi feita pra ser
minha.
Nada poderia nos manter
separados.
Você será aquela que eu deveria
encontrar.
Você que decide, e eu que
decido.
Ninguém pode dizer o que nós
podemos ser.
Então, por que não reescrevemos
as estrelas?
(Rewrite the stars - James
Arthur)

— Dá pra vocês calarem a boca, porra, o prédio inteiro tá


escutando vocês! — reclamo.
Léo e Matteo reviram os olhos.
— Quem diria que o amor te deixaria ainda mais chato, não
dizem que ele nos deixa mais leves? Será que foi efeito reverso com
você? — reviro os olhos.
— Você quer ficar quieto? Se ela chegar vai dar para escutar
que tem gente aqui dentro mesmo do lado de fora, vocês sabem
qual o sentido de surpresa ou estão se fazendo de burros? — mas
que caralho!
— Não quer ir tomar no cu, não? — Matt reclama, bufando e
virando a cara.
Mas o que ele quer? Passei semanas preparando essa
surpresa para Aurora, é seu aniversário e ela me disse que sempre
há apenas uma comemoração no mês de dezembro.
Seu aniversário e Natal.
Preciso mostrar que ela não errou ao me escolher, que sou
diferente das pessoas que passaram pela sua vida e que cada
comemoração, assunto, medo ou desejo seu, são importantes para
mim.
Porque tudo que for importante para ela, é para mim também.
Por isso, desde que nos acertamos e decidimos ficar juntos,
venho preparando esse dia.
Toda a casa foi decorada por mim, Léo, Matt e Elisa que
chegou ontem e ficou em um hotel, pago por mim. Tem um bolo de
apenas um andar, mas tem todos os tipos de besteira que Aurora
gosta de comer. Tem bebida. Tem também uma pilha de presentes,
que ela vai se divertir abrindo.
Léo e Matt compraram vários presentes, pois não conseguiam
se decidir no que dar.
Eu comprei vinte e um.
Um para cada aniversário em que teve que esperar até o Natal
para ganhar.
Hoje é um dia especial, não só pelo seu aniversário, mas por
todas as surpresas que preparei para ela.
— Estou tão ansiosa para vê-la novamente — começando por
essa.
Encaro a amiga de Aurora, que mandei buscar em Londres, só
para comemorar seu dia. Foi difícil? Nada, ela estava louca para vir,
e Aurora fala com ela todos os dias.
Via a saudade que sentia nos seus olhos.
E se puder gastar milhares de dólares para que ela amenize
essa saudade um pouco, farei com gosto. Já basta todos os anos
que viveu sozinha, agora Aurora não precisará mais passar por isso.
— Ela morre de saudade de você — falo, com gentileza.
— Por que com ela você é gentil e comigo é na patada? —
resmunga Léo.
— Porque ela não me enche o saco desde que nasceu, você já
esgotou toda a paciência de uma vida, Léo. Não sobrou nenhuma
para lidar com você.
Nenhuma mesmo.
O barulho da porta faz todos ficarem em alerta.
E quando digo todos, quero dizer, Matt, Léo e Elisa. Além de
mim.
Para o que preparei, não queria ninguém além dos que sabem
sobre nossa situação.
A porta se abre e o amor da minha vida passa por ela.
Nossa, como ela é linda.
Ela ainda arranca o meu fôlego.
Eu sou uma vergonha de tão rendido que sou por ela.
Ela nem percebe que tem gente em casa, falei que passaria
em uma construção antes de vir e que íamos sair para comemorar
seu aniversário.
Ela ficou feliz com isso.
Percebi que com Aurora, apenas estar com ela basta. Ela pode
ter tudo o que quiser agora, e sempre lutou para conseguir o que
não podia.
Menos amor.
Menos afeto.
E era a única coisa que a minha garota precisava.
De alguém que a amasse incondicionalmente.
Era a única coisa que me faltava também. Ela. Era ela a parte
que me faltava.
A luz da lua reflete em seus cachos. Reparo isso tudo em
apenas cinco segundos. Esse é todo o tempo que preciso para notar
tudo na minha mulher.
Apenas cinco segundos.
Também é o tempo que ela tem antes que todos gritem...
— SURPRESAAAAAAAA!
— MISERICÓRDIAAAAAAA — grita, o sangue sumindo do seu
rosto quando as luzes são acesas e sua mão vai para o coração. —
Deus do céu — fala em meio à respiração ofegante, mas um sorriso
largo se abre em seu rosto, seus olhos batendo em mim.
— Parabéns para você, parabéns para você — Léo puxa o
coro, com o bolo na mão e cantamos em conjunto. Aurora pula de
felicidade, sem nem reparar ninguém ao redor, porque ela só olha
para mim.
Como eu amo essa garota.
— Feliz aniversário, amor — ela corre e se joga em meus
braços. A agarro como se minha vida dependesse disso, sentindo
suas pernas rodeando minha cintura.
— O que é isso, amor? — sussurra contra meu pescoço.
— Sua festa de aniversário. — Ela se afasta e me fita nos
olhos, os seus tem água — Eu amo você, querida. — E a água
escorre por suas bochechas. — Você merece todas as festas de
aniversário do mundo, todos os presentes que quiser, todos os votos
de felicidade, mas acima de tudo, eu que tenho que agradecer o
presente que eu ganhei.
— Que presente, Nick?
— Você — é tão clichê que ela sorri.
Ela sorri e me beija.
Me beija como todas as vezes. Porque todas as vezes são
marcantes, únicas e especiais.
Ela é especial.
E é minha.
— Parabéns, encosto. Agora, vamos comemorar enchendo a
cara? Você finalmente tem idade para beber, cunhadinha! — rio
contra os lábios de Aurora, vendo-a sorrir e desviar o olhar para
Léo.
Só para se deparar com sua amiga no meio da sala, que por
conta da emoção, nem mesmo reparou.
Entre mim e Aurora é assim. Sempre procuramos primeiro um
ao outro.
Sempre nos encontramos.
— ELISAAAAAAAA — faço uma careta, sentindo meu ouvido
zunir e a solto, quando ela se remexe e pula na amiga.
Rio da careta que Léo faz, porque provavelmente pensou que
seria o segundo a ganhar abraços.
Vejo Aurora e Elisa se abraçando e se emocionando com o
reencontro.
Vejo Aurora se jogar nos braços de Léo que a abraça com
muito carinho.
Vejo ela abraçando Matt que fala várias coisas boas sobre
aniversários.
Então vejo quando olha para a pilha de presentes.
— Isso tudo é para mim? — pergunta com a voz embargada e
assinto. — Mas são um monte. Estão adiantando o Natal também?
— pergunta brincando e todos riem, mas eu não.
Eu não, porque sei que não é brincadeira.
— Ainda não fizemos as compras de Natal — comento e seus
olhos brilham.
— Tão falando sério? — Ela olha para todos como se
esperasse uma pegadinha, mas não há.
— Pode abri-los se quiser. — Comento, torcendo para que o
faça.
Sabendo que o fará.
Porque Aurora nunca ganhou presentes de aniversário, então
é óbvio que ela se senta na frente das caixas e chorando, começa a
abrir, com Hunt latindo ao seu lado com alegria.
— Eu queria comer — comenta Matteo, sentando-se no sofá
ao lado sem realmente reclamar.
— Pode comer — fala Aurora sem dar atenção, abrindo o
primeiro presente da pilha, é o de Elisa. Um estojo com um conjunto
de brincos e colar em forma de coração. — Que lindo — fala se
emocionando. — Quem me deu?
Elisa se joga ao seu lado.
— Eu, é claro, desde quando homem sabe escolher joias para
mulheres? — brinca e escondo um sorriso.
Aurora ri, abraçando a amiga e agradecendo. Logo ela abre
outro.
Uma caixa com edições de colecionador de Trono de vidro,
cortesia minha e que a faz me olhar encantada. Ela tenta agradecer,
mas digo que é para aproveitar os presentes, pois ninguém precisa
de agradecimento. Só queremos ver ela feliz.
Ela ganha um quadro de uma aurora boreal de Matteo, que diz
que ela deveria ter um, já que tem o nome igual. Ganha uma boneca
da Aurora, a princesa da Disney, de Léo, que faz todo mundo rir.
Ganha um celular novo, porque nem a pau eu a deixaria com o
velho que a tela estava pela hora da morte desde que acordamos
juntos em Vegas.
Ganha roupas, calçados, maquiagem, livros. A chave de um
carro, que faz ela enlouquecer.
Ganha a inscrição para tirar a carteira de motorista também.
Ganha ursinhos de pelúcias, anjinhos que combinam com ela,
ganha até um par de chifres do capeta.
Esse último, foi do Léo.
Então, quando ela está abrindo o último presente, um Ipad de
última geração, eu deslizo mais um na sua frente sem que ela
perceba.
Então, todos ficam na expectativa para que ela abra.
E ela o faz.
E começa a chorar quando vê o lindo anel, com um diamante
no meio, rodeado de vários outros menores, deixando no formato de
uma flor.
E quando olha para mim, estou de joelhos na sua frente.
— Nicolas — ofega, com o rosto vermelho.
Engulo o nó na garganta para poder fazer o pedido.
Porra, depois que abriu a represa, esse caralho não quer mais
fechar!
— Não sei qual foi a força do destino que nos uniu da primeira
vez, mas eu agradeço a ela todos os dias por ter colocado você em
minha vida — ela prende os lábios trêmulos. — Você é linda,
divertida e cada parte sua é apaixonante. Eu quero você para
sempre, quero fazer seu café, quero cuidar da sua alimentação, pois
morro de medo de perder você para um infarto — ela bufa, o que sai
com um barulho estranho por conta do choro. — Quero te amar
todos os dias e te venerar todas as noites, e porra, quero muito que
me deixe fazer um filho em você, Aurora. Morro de vontade de fazer
um filho em você — confesso.
— Ah, Nicolas...
— Eu aceito o sobrinho — grita Léo.
— Eu sou o padrinho! — fala Matt apressado.
— E eu a madrinha! — grita Elisa e rio com Aurora.
Minha Aurora.
— Eu sei que já somos casados — nossos amigos riem. — E
eu amo estar casado com você, Aurora. Mas percebi que nunca, ou
pelo menos, não que eu me lembre — ela ri. — Fiz esse pedido.
Então aqui estou eu, pedindo, sóbrio e sendo alguém que te ama,
para que se case comigo, e você pode escolher como fazer. Pode
fazer uma festa, ou pode se divorciar de mim para fazer da maneira
correta, mas pelo amor de Deus, escolha a festa, por favor, não
quero me separar de você — falo desesperado e ela gargalha se
jogando em meus braços. — Casa comigo, amor? De novo?
— SIM, MIL VEZES SIM, MEU AMOR — grita e meu coração
falta explodir de amores. — Ah meu Deus, podemos renovar nossos
votos todos os anos e fazer disso uma tradição!
E eu aceito sorrindo.
Porque casaria com Aurora todos os dias se for o seu desejo.
Porque faria qualquer coisa por ela.
Para fazê-la feliz.
— Elisa! Prepara a minha despedida de solteira! — Arregalo os
olhos e a afasto.
— De jeito nenhum! A última que você foi, acabou casada com
um desconhecido! — ela gargalha.
— E foi a melhor loucura das nossas vidas — semicerro os
olhos e nego com a cabeça.
Ela é minha loucura.
Aurora nunca vai se arrepender de ficar comigo, e eu?
Acho que achei a minha princesa, e finalmente estou vivendo o
meu final feliz.
Mas você nunca estará sozinha.
Eu estarei com você do anoitecer
ao amanhecer.
Eu estarei com você do anoitecer
ao amanhecer.
Amor, eu estou bem aqui.
Eu vou te apoiar quando as
coisas derem errado.
Eu estarei com você do anoitecer
ao amanhecer.
Eu estarei com você do anoitecer
ao amanhecer.
Amor, eu estou bem aqui.
(Dusk till dawn - Zayn feat Sia)

Paz.
Não sei o que essa palavra significa desde que Aurora entrou
na minha vida, mas não tem um dia em que eu me arrependa de a
ter ao meu lado.
Nenhum mísero segundo do meu dia.
Quando a vi deitada ao meu lado pela primeira vez naquela
cama em Las Vegas, com seus lindos olhos verdes de anjo me
encarando e com um sorriso de tirar o fôlego, eu soube que minha
vida nunca mais seria a mesma.
Foi como um estalo, obra do destino ou conexão.
Aurora é minha alma gêmea.
Só demorei mais do que deveria para perceber que já estava
casado com o amor da minha vida.
Sempre fui uma pessoa séria que nunca dava um passo fora
da linha e me orgulhava disso. Me orgulhava da minha vida
monótona e sem graça. Até Aurora.
Até ela chegar, arrombando a porta da minha vida e fazendo
morada no meu coração. E ela nunca mais saiu de lá. Graças a
Deus.
Aurora é a loucura que me faltava. A metade do meu coração
bate por ela.
Bate no peito dela.
Nunca pensei que faltava algo, até a encontrar e porra... foi tão
bom encontrar Aurora.
Foi tão bom ir a Vegas e me casar com ela. Foi ainda melhor
me casar com ela pela segunda vez.
Ela vestida de noiva? Quase infartei de tanta emoção. Ela
entrou com Léo, em um vestido colado até a cintura e rodado em
baixo.
Uma verdadeira princesa.
Nossa rotina? Mudou ao decorrer dos anos. Mas ainda
trabalhamos juntos, ainda tomamos café todos os dias juntos, ainda
fodemos igual a coelhos.
Mas nos mudamos. Temos uma casa, do jeito que Aurora
queria. Nós fizemos do jeito que nós queríamos.
Hunt adorou ter um quintal para brincar.
Agora Léo, Matt e Aurora são como irmãos.
Eles sempre dão um jeito de me enlouquecer, mas adivinha?
Eu nunca poderia ser mais feliz.
Minha mulher é a mulher mais linda do mundo.
Ela é a “mais” tudo para mim.
A mais engraçada.
A mais louca.
A mais safada.
A mais sexy.
A mais impulsiva.
A mais mandona.
A mais gostosa.
A mais perfeita... tudo com Aurora é em excesso.
Até os filhos.
Olho a bagunça ao meu redor e tento não ficar tonto.
Eu disse que Aurora é a mais bagunceira também? Não disse?
Então estou dizendo agora.
Minha esposa é ligada no duzentos e vinte e é um dos motivos
dos furacões terem nome de mulheres, mas nossos filhos? São mil
vezes piores.
— Papai, Luna escondeu o oto pá dos meus patins e se eu
não achar, a mamãe vai ficá bava comigo. — E eu? Eu não fico
bravo também, não? — me ajuda a pocurá, papai? — como que diz
não para essa miniatura de anjo com esses olhinhos verdes cheios
de água por medo de decepcionar a mamãe?
Como dizer não quando ela ainda está aprendendo a
pronunciar o R e todas as suas falas são a coisa mais fofa?
Ela me quebra toda vez que abre a boca.
— Claro, meu anjo — solto um suspiro, pegando Angel no
colo, tirando alguns de seus fios loiros e cacheados da testa. Ela
está muito fofa em um macacão verde e com uma blusinha branca.
— Onde está Luna? — pergunto, caminhando para o seu quarto e
chutando vários brinquedos espalhados pela sala.
Nunca mais soube o que era uma casa arrumada.
— Tá no cato com o Kili e não quer me dizer ondi tá meus
patins — choraminga no meu colo, apoiando a cabeça no meu
ombro e meu coração aperta, como sempre faz ao ver algum dos
amores da minha vida, triste.
— E por que ela esconderia seus patins, meu amor? —
pergunto desconfiado.
Se tem uma coisa que aprendi em todos esses anos vivendo
com Aurora, é que eles sempre estão apontando. Tanto a mãe,
quanto os filhos que são minicópias suas.
Três. Aurora me deu três filhos e não se engane, aquela
mulher quis me causar um infarto em uma só lapada. Trigêmeos.
Não veio um primeiro para nos preparar, vieram três de uma
vez para nos enlouquecer e eu não fiquei surpreso. Sabia que
quando Aurora entrou na minha vida, nada mais seria tão monótono
e chato.
Ela é meu pedacinho de loucura.
E me deu mais três pedacinhos para amar.
— Puquê eu comi o chocolate dela, papai — confessa toda
fofa e sorrio, negando com a cabeça. Sabia. Eles só aprontam uns
com os outros, quando um deles apronta primeiro. Abro a porta do
seu quarto e Hunt pula em minhas canelas, latindo e pedindo
carinho. Me abaixo para deixar um beijo na cabeça do meu
primogênito e ele começa a lamber Angel que solta uma risada
gostosa. — Pala Hunt, sua baba fede! — fala em meio aos risos e
me ergo, olhando para dentro do quarto.
O puro caos. Tem brinquedos, tinta, cobertas espalhadas.
Luna, a mais parecida com a sua mãe, olha para o teto
assobiando.
Prendo o riso da pequena dissimulada. Não parece que tem
apenas cinco anos, não parece mesmo, é tão esperta!
— Ouvi dizer que tem um duende dentro dessa casa. —
Comento descontraído.
Killian desvia os olhos da tela onde pinta alguma coisa e
escancara a boca.
Ele é o único menino no meio de duas meninas e adivinha? É
o mais calmo.
Tão calmo que na semana passada Hunt apareceu no meu
quarto todo pintado de azul, pois segundo meu filho, nosso cachorro
é tão bonito quanto o céu.
Não sabia se brigava ou se me encantava com as coisas que
saíam da sua boca.
Eu repreendi, é óbvio. Já Aurora? Ela amou a veia artística do
nosso pequeno.
— Tem? Onde, papai? — pergunta, olhando para os lados com
empolgação.
— Dentro desse quarto, eles costumam esconder as coisas
das pessoas, esconderam um dos patins da Angel, acreditam? —
Luna assovia mais alto e tenho que morder o interior da bochecha
para não gargalhar.
Ela é a mãe dela inteirinha.
E nem sei como aprendeu a assobiar, sai mais baba da sua
boca do que som.
— Mas, papai, foi a Luna, não um doente — Angel puxa minha
mão para me fazer olhar para ela e sua cabecinha tombada para o
lado é a coisa mais adorável. — A Luna, papai.
— Ela pegou meu chocolate pimero, papai — Luna se
defende, porque sabe que não pode mentir para o papai e para a
mamãe. — Ela nem pediu, papai. — Cruza os braços, fazendo bico.
— É “duende”, meu anjo, não “doente” — corrijo Angel, que
franze o cenho e concorda com a cabeça, andando até onde Killian
está para ver o que seu irmão está pintando depois que a solto no
chão.
Sento ao lado de Luna na sua cama, ela se levanta e se joga
no meu colo.
— Onde estão os patins da sua irmã, minha lua? — pergunto,
fazendo cafuné nos seus cachinhos cor de mel.
— Escondi, papai — responde toda travessa, com o rostinho
feliz. Bufo uma risada e deixo um beijo na sua testa.
— Angel te pediu desculpas por comer seu chocolate? —
pergunto, tentando ser mediador.
Ser pai é sempre um desafio. Ser pai de três? É quase
impossível.
As bochechas de Luna ficam vermelhas.
— Pediu, papai — murmura.
— Então se ela pediu desculpas, por que você aprontou com
ela? — é sempre difícil ensinar lições para crianças. Elas são
adoráveis e só quero fazer o que elas me pedem.
— Puquê... fui injusta, papai? — pergunta com o cenho
franzido, já sabendo o que eu ia dizer e beijo sua testa.
— Foi, meu amor, foi injusta. Deveria pedir para Angel dividir
algo dela com você, ou pedir para o papai e mamãe comprarem
outro. Vocês são irmãs, precisam aprender a dividir, ok? — ela
assente e sai do meu colo e do quarto, para procurar os patins de
Angel.
Angel percebe e não demora para ir atrás da irmã.
Me levanto, tendo feito meu trabalho e saio do quarto. Killian
nem nota, de tão concentrado no seu desenho que está.
Os pais de Aurora e os meus, perderam a chance de conhecer
elas. Quando perguntaram pela primeira vez sobre avós, Aurora
decidiu entrar em contato com os pais só para saber se gostariam
de conhecer as crianças, ela ainda tinha o número deles, mas
quando ela ligou, eles falaram que não queriam nenhum contato
com ela. Minha mulher não ficou triste por ela, mas ficou chateada
em contar para os filhos que eles só tinham papais e vários tios.
Caminho até o nosso quarto, meu e da minha Aurora e a
encontro jogada na cama, com os cabelos mais longos do que
quando a conheci, há dez anos, mas o mesmo sorriso encantador,
os mesmos olhos de anjo e a mesma boca afiada.
E a mesma mania de vestir minhas camisas.
Nossa, como ela fica gostosa nelas.
— Como você está, querida? — me jogo ao seu lado, e ela
não demora a vir para o meu colo, se encaixando em mim.
A mesma mania que minhas crianças têm.
— Com fome, o que você acha de a gente ir fazer um
hambúrguer? — minha resposta é negar com a cabeça e sorrir para
o seu sorriso.
— Dez anos sendo seu marido e nunca consegui fazer você
desapegar dessa sua alimentação horrível — ela gargalha.
— Isso é um sim, marido? — pergunta.
— Quando eu nego algo para você?
Dez anos e eu continuo fazendo tudo o possível para ver
Aurora sorrir pra mim.
Continuo apaixonado pelos sorrisos dela.
Continuo apaixonado por ela.
Amo Aurora com todo o meu ser.
Amo ela e nossas crianças.
Amo ela e nosso cachorro.
Amo ela e é isso.
Simplesmente amo ela.
— Então vamos, as crianças devem estar com fome. — Ela
aproveita e me rouba um beijo e ainda é como se fosse a primeira
vez.
Ainda me arrepia.
Ainda faz meu estômago gelar.
Ainda me faz sentir o homem mais amado do mundo.
— Vamos. — Assinto, a pegando no colo, escutando seu
gritinho.
— Como suas costas aguentam? Com a sua idade, a maioria
dos homens não conseguem nem subir o pau — ela gargalha,
quando fecho a cara.
— Eu não sou a maioria dos caras, amor, e você sabe disso —
aperto a sua bunda e seu sorriso se torna malicioso.
— É, eu sei. — Deita a cabeça em meu ombro e desconfio na
hora do seu tom.
— O que foi?
— Queria mais um neném — paro de andar e a espero olhar
para o meu rosto.
— Mais um? Três não são o suficiente? — Ergo a sobrancelha,
sentindo meu sorriso alargar no rosto.
— São, mas eu quero mais um, nem sei se você ainda
consegue fazer...
Calo sua boca com uma mordida no seu lábio inferior. Ela sorri.
— Hoje, quando as crianças forem dormir, vou fazer mais um
filho em você, amor, então quando ele nascer, vou fazer outro. E
você vai ver o quanto ainda sou eficiente com meu pau. — A beijo e
ela suspira contra meus lábios.
— Mal posso esperar.
Eu também mal podia esperar.
Principalmente quando nove meses depois, vieram gêmeos.
Primeiramente, quero dizer que estou muito feliz que você
chegou até aqui. Muito feliz mesmo. Não foi fácil, teve barreiras no
caminho e muitas inseguranças, mas graças a Deus, esse livro
chegou ao fim e chegou a você, leitor e leitora.
Então, primeiramente quero agradecer a Deus, pois ele me
guia ao caminho de realizar meus sonhos.
Segundo, quero agradecer minha mãe, que passou dias
incontáveis falando para todos ao redor “não atrapalhem ela, ela
está escrevendo e precisa de concentração.” Agradeço minha irmã,
que é minha fã número 1 e sempre diz que sou o top 1 dela.
Agradeço ao meu pai por ter me feito me dedicar a minha educação,
e agradeço ao meu namorado, que me apoia e passou dias
gastando sua energia com o ar-condicionado ligado para que eu
escrevesse sem sentir calor. Hahaha. Eu amo vocês, são minha
família.
Agora, agradeço as pessoas que estiveram comigo do começo
ao fim desse livro.
As minhas amadas e incríveis betas. Sem vocês esse livro não
sairia nunca, minhas inseguranças, meus medos, meus chiliques,
tudo isso teria me parado, mas vocês seguraram a minha mão e me
disseram que eu conseguiria, nossa, como vocês são especiais para
mim. Tan Wenjun, minha inspiração, Beatriz Matos, minha força,
Cristiene Januária, minha direção, Nana Domingos, meu apoio
incondicional. Vocês foram incríveis comigo, eu amo vocês do fundo
do meu coração.
Agradeço também a minha Cat e assessora incrível, Hanna
Câmara. Eu amo que você está ao meu lado desde o início e que
nunca me abandonou, amo saber que você está ao meu lado e que
faz tudo o que pode para meus lançamentos darem certo. Eu amo
você incondicionalmente, também. Obrigada por tudo.
Evelyn Fernandes, eu amo que somos tão conectadas que
estamos lançando livro no mesmo dia, hahahah. Obrigada por me
ajudar a evoluir na escrita, por me chamar para sprint, por ser minha
amiga e me apoiar, assim como eu sou sua amiga e apoio você.
Obrigada por sempre estar ao meu lado também. Você foi a primeira
pessoa desse meio literário que se tornou minha amiga. Agradeço a
você por isso e te amo muito.
Agradeço também a pessoa que faz esse livro se tornar algo
digno de ser lido e que não me julga por ser analfabeta
(brincadeira). Hahaha. Obrigada Raquel Moreno, minha revisora que
viu eu chegar de última hora, com um livro pela metade, faltando
menos de vinte dias para lançar. Foi sufoco, mas você ainda me
aceitou. Obrigada por todo o apoio e por todos os puxões de orelha
que você sabe, eu ainda vou continuar errando. Amo você.
E obrigada a minha capista e diagramadora, que está sempre
pronta para mim em cima da hora. Lilly, meu amor, você é uma
amiga incrível e nunca me deixa na mão, não sei o que seria de mim
sem você.
As minhas parceiras, obrigada por estarem me apoiando e
fazendo esse lançamento dar certo. Vocês são essenciais e sou
muito feliz por cada uma que escolheu caminhar ao meu lado nessa
jornada. Amo vocês.
Agora, a você leitor, obrigada por ler meu livro, mesmo que
você nunca chegue a ler esse agradecimento, pois nunca passa do
final do epílogo, mesmo assim, obrigada por me dar a oportunidade
de te mostrar a história de amor de Aurora e Nicolas.
Por favor, não esqueça de avaliar, isso ajuda muito e faz essa
história chegar a mais pessoas. Obrigada.
[1]
Série de seis livros distópicos de harém reverso.
[2]
Personagem da série: Como eu conheci a sua mãe.
[3]
Diabo
da Tasmânia.
[4]
Personagem da série: “Como eu conheci a sua mãe”
[5]
Protagonista masculino do livro: É assim que começa.

Você também pode gostar