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BAD PRINCE
1ª Edição
sumário
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antes de ler
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nota da autora
epígrafe
prólogo
capítulo 1
capítulo 2
capítulo 3
capítulo 4
capítulo 5
capítulo 6
capítulo 7
capítulo 8
capítulo 9
capítulo 10
capítulo 11
capítulo 12
capítulo 13
capítulo 14
capítulo 15
capítulo 16
capítulo 17
capítulo 18
capítulo 19
capítulo 20
capítulo 21
capítulo 22
capítulo 23
capítulo 24
capítulo 25
capítulo 26
capítulo 27
capítulo 28
capítulo 29
capítulo 30
capítulo 31
capítulo 32
capítulo 33
capítulo 34
capítulo 35
capítulo 36
capítulo 37
capítulo 38
capítulo 39
capítulo 40
capítulo 41
capítulo 42
capítulo 43
capítulo 44
capítulo 45
capítulo 46
capítulo 47
capítulo 48
capítulo 49
capítulo 50
capítulo 51
capítulo 52
capítulo 53
capítulo 54
capítulo 55
capítulo 56
capítulo 57
capítulo 58
capítulo 59
capítulo 60
capítulo 61
capítulo 62
capítulo 63
capítulo 64
capítulo 65
capítulo 66
capítulo 67
capítulo 68
capítulo 69
capítulo 70
capítulo 71
capítulo 72
capítulo 73
epílogo
agradecimentos
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ouça caos
Eu jurei que tiraria férias depois de cinco anos presa a uma série.
Ele me jogou de cara na parede para enxergar coisas que a Zoe da vida
privada precisava mexer com urgência e, depois dos três meses mais
intensos, dormindo duas horas por noite, escrevendo até a exaustão, com
uma refeição no dia, alguns packs de monster de chá e maçã verde, nós nos
curamos.
em um texto.
Eu nunca senti tanta paz e orgulho por saber que, aqui, eu entrego para vocês
o que eu tinha de melhor até agora.
Eu nunca me senti tão segura para entender que: o medo de ser só a Zoe da
Dark Hand é infundado. Eu sou a Zoe da Dark Hand, para muitas das minhas
leitoras, eu sempre serei. Mas também sou a Zoe de Singular, de Bailando no
Inferno, de Azhara,
de Não Seja Uma Boa Menina, de Mirrors e de Mar aberto. Eu sou todas
essas Zoe’s de antes, mas agora, também, serei a Zoe de Bad Prince.
Espero que vocês gostem dessa minha versão. Que vocês também a
abracem.
Se você não conseguir fazer nada disso e não gostar do que entrego aqui,
está tudo bem. Só não fecha a porta para conhecer outro lado meu depois,
ok?
Sendo assim, espero que você chegue ao final desta história com a sorte de
ter algumas feridas curadas. Eu tive.
Com muito amor e respeito,
Zoe X.
Para H.
Fogo e fumaça.
E não havia nada que eu pudesse fazer a não ser odiá-la de volta.
scarlet
então me olhe nos olhos, diga-me o que você vê. paraíso perfeito se
desfazendo. eu queria poder escapar. eu não quero fingir. eu queria poder
apagar, fazer seu coração acreditar, mas eu sou um péssimo mentiroso.
b a d l i a r, i m a g i n e d r a g o n s .
Cinco segundos depois de soltar o ar preso nos pulmões, foi como se nunca
tivesse tido aquele pensamento.
Se eu tinha conseguido dormir três horas naquela noite, era muito, mas de
um jeito ruim, meu corpo já parecia adaptado para dar o seu máximo mesmo
com o mínimo de energia.
Aquele ciclo durava dias até que, finalmente, eu cairia na cama e nada
conseguiria me acordar. Eu preferia assim, pois, quando exausta, eu quase
nunca sonhava.
Era um tormento saber que na minha mente eu ficaria presa com ele, e há
anos eu vinha fugindo disso, mesmo que vez ou outra fosse obrigada a voltar
lá: no dia em que perdi tudo, no dia em que ele arrancou o resto de vida de
mim.
vez que ele não forçou quando ouviu minha milésima desculpa para evitar
assistir a mais um dos seus jogos de futebol.
Joguei as pernas para fora da cama, desistindo da ideia de ficar e ter pena de
mim mesma, vasculhei com a mão sobre a mesa de cabeceira, conferindo
que meu maço de cigarros já estava pela metade e, sacudindo para que um
pulasse do pacote, o prendi entre os lábios. Acendi e traguei em um
movimento natural, prendendo a fumaça nos pulmões, conforme ajeitava o
cabelo no alto da cabeça e me levantava para ir ao banheiro.
complemento não ajudava, já que por baixo da jaqueta de couro dos Fierce
Lions, a camisa xadrez vermelha e a regata branca não ficavam tão à vista,
mas era o bastante para enfrentar aquele começo de outubro mais gelado do
que o esperado.
Passando a mochila pelos braços, ensaiei o melhor sorriso que podia em
frente à porta, ajeitei o piercing de argola no nariz, girei a maçaneta e deixei
o único lugar seguro dentro daqueles muros para encontrar meu namorado.
Eu era uma mentirosa de merda, ainda bem que ele não percebia isso.
Eu não era pertencente, mas fazia o meu melhor para honrar a chance de
estar ali. Suas escadas largas, seus corredores escuros, seus vitrais góticos,
torres altas e salas esquisitas, de algum jeito sombrio e torto, se
transformaram no meu lar.
Meu ego havia sido extinto há alguns anos. Ou talvez nunca tenha existido,
porque no momento em que notaram minha presença, o jeito como Isaac
deslizou para fora do banco das líderes de torcida poderia ter me feito chorar.
Fingi estar distraída, fingi não o ver, e arranjei o que fazer para que ele
tivesse tempo de vir até mim. Arranquei os fones, procurei por tempo demais
o lugar onde o lixo estava para poder jogar a bituca do cigarro fora e,
finalmente, senti seu toque no meu ombro.
Eu não era baixa, no alto dos meus 1,76, quando me virei para encará-lo, o
sorriso de Isaac estava bem na altura dos meus olhos.
Ele parecia perfeito, como sempre, e ninguém diria que estava fazendo algo
de errado, minutos atrás, nem mesmo eu.
— Você ainda não se acostumou, não é? — Ele sabia que eu odiava aquela
sensação de ser observada.
Acostumado com isso desde que nasceu, sendo quem era, aquilo era natural
para ele.
“Aproveitadora.”
“Tenho certeza que morando naquela casa, ela deu para o pai e para o filho.”
Quando começou, jurei que aguentaria, que seria passageiro até que algo
maior acontecesse e nós saíssemos dos holofotes, mas Isaac Prince nunca
saía dos holofotes.
— Isso te faz repensar sobre nós? — A pergunta era sutil, mas feita com
tanta constância que eu precisava me controlar muito para não gritar com
Isaac.
— Não. Mas e você? — Ergui os olhos para os dele e sua expressão séria era
a mesma que havia conquistado minha confiança.
— Jamais. Você sempre será minha. — De novo, sua mão buscou meu rosto
e eu deixei que ele acariciasse minha bochecha.
— Ah, isso. — Isaac relaxou. — Acabamos com eles, é verdade. E com isso,
vamos ter uma boa festa no campo em comemoração amanhã, o que acha?
Meu pai disse que é ano de anunciar o Torneio das Espadas, então...
Mas e você?
— Amor, eu… — Tentei fugir, mas Isaac me encarou do modo mais pidão e
irresistível.
Meu namorado era lindo, meu único amigo naquela merda de lugar, e ele
sabia muito bem como arrancar as coisas de mim, já que eu odiava
desapontá-lo.
— Por mim, por favor. — Ele era profissional em fazer cara de cachorrinho
que caiu da mudança. — Preciso exibir minha namorada superinteligente e
rainha dos controles.
— Eu não sei… — Minha voz saiu baixa, um sopro, e tentei encarar a
janela, vendo o gramado vazio naquela manhã.
Era para eu ser uma Viper, mas escolhi os Lions porque não tinha estômago
para ver a desaprovação nos olhares de Isaac e do senhor Prince. Não
quando todos os Prince eram Lions e tinham orgulho disso.
— Não faço ideia, mas seria bom você me prometer não sair do seu quarto.
Sabe que aqueles idiotas não têm limite, e não quero nenhum deles podre de
bêbado ou sabe mais lá o que esses idiotas usam, pegando você fora do seu
quarto depois do toque de recolher…
aquele dinheiro que eu planejava ter um futuro em outro país, do outro lado
do oceano.
A América me esperava. Eu seria uma enfermeira das boas.
Isaac sorriu com os olhos e colocou uma das pernas entre as minhas. — Mas
ainda quero saber quando terei minha namorada em uma noite dessas… —
O suspiro era uma chamada de atenção.
Eu o amava, mesmo.
Não via a possibilidade da vida com outra pessoa que não ele.
Ele me protegia como podia e, de longe, era meu único amigo, mesmo que o
tempo entre nós fosse escasso.
— Acho que esta semana… Pós-festa? — Era uma merda aquele clima de
fugir do contato íntimo. Mesmo que nós já tivéssemos feito coisas, minha
virgindade estava intacta.
Como era atlético e todo geração saúde, Isaac odiava me ver fumando.
Eu já o tinha enfrentado mais cedo, mas com tanto trabalho para fazer, mal
comi e agora pagava por isso. Desci todos os lances de escada brincando
com o zíper da minha jaqueta, morrendo de medo de ser pega e, finalmente,
cheguei ao térreo.
Eu tinha que entrar lá de qualquer jeito, precisava comer, mas algo me dizia
para não fazer.
“Suba as escadas, volte para sua cama, beba água da torneira para tapear a
fome”, o instinto soprou nos meus ouvidos, mas ignorei. A curiosidade era
grande demais para voltar pelo caminho que havia feito.
Era uma bagunça sem fim, mas por quê? Festas ali eram proibidas quando
não oficiais. E se eram oficiais, por que não era aberta para todo mundo da
faculdade?
de dentro a puxou.
No último segundo, piscando, sabendo que aquilo era real, minha reação foi
uma só:
Eu corri.
Eu
voltei,
Red.
Tapei a boca, segurando o grito, mas não tive tempo de fazer mais nada antes
de ver outra mensagem pular vinda do mesmo número.
E vou fazer da
sua
vida
um
inferno.
Eu não tinha dúvidas de que ele conseguiria.
Conrad
nada é divertido, não como antes. você não me deixa bem, não mais.
costumava tomar um, agora é preciso quatro. você não me deixa bem, não
mais.
youdon’tgetmehighanymore,threedaysgrace.
Era ela.
Quis rir.
— O que Scarlet faria aqui, tão tarde? Ela odeia ser notada.
— Ela sabia que eu vinha? — perguntei para ele, voltando para dentro.
— Que bom, porque tenho certeza de que ela tem algo para te dar de boas-
vindas, e isso vai além de uma boa chupada.
A sala verde, prata e preta, revestida de pedras escuras era maior do que eu
me lembrava na infância, nas raras visitas que fiz até ali. Agora, em uma
noite de festa, o lugar estava lotado, o som no último, e eu era um deus.
Meu pai já tinha me xingado ao telefone mais cedo, quando avisei para onde
as minhas malas iam, mas não me importei. Na verdade, foi até divertido
irritar o velho.
uma garota chapada demais perguntou e eu não respondi. Aquela era só mais
uma suposição idiota do porquê eu havia sido expulso da faculdade francesa.
Os dois estavam comigo há anos, e mesmo que não soubessem tudo de mim,
eram os mais próximos de amigos que eu tinha.
tempo foi gentil com Bella. Ela era ainda mais gostosa do que na
adolescência e como eu tinha tirado sua virgindade, meio que nunca houve
uma pausa nas vezes em que queríamos transar. Ela nunca teve um
compromisso, eu também não. Quando a virei para mim, prendi seu corpo
no meu, tendo seu olhar preso ao meu rosto, vi o sorriso surgir quando
abaixei a cabeça na direção dela.
Não. Você não vai me infernizar assim — pensei, fechando os olhos para
beijar Bella ainda mais profundamente. Ainda assim, a visão de Scarlet de
anos atrás brilhou na minha mente.
E tentando distrair a cabeça, sabendo que o dia seguinte seria cheio, comecei
a organizar minha pequena fábrica de diversão.
— Você está atrasado. — Meu pai nem mesmo ergueu o rosto para me
cumprimentar naquela manhã. E eu sabia que um dos motivos disso era que,
agora, eu exibia a jaqueta de couro com o desenho dos Viper de maneira
orgulhosa.
— Qual é, pai? Me chamou até aqui para fazer coisa errada e quer que eu
seja o bom moço na luz do dia?
Quis gargalhar.
John Prince, o reitor, o dono do mundo, sabia que eu tinha sido um erro.
Mas ele me devia. Devia muito. E seu modo de lidar com isso era me tratar
como a porra de um sociopata que eu não era. O
odiava, mas nem sempre foi assim.
Eu tinha uma mágoa absurda dele, mas um dia tive esperança de dias
melhores e carinho pela figura que acreditei que pudesse me proteger. Eu
não era um monstro, tentasse ele fazer eu acreditar nisso ou não. No fundo,
ele devia saber que o monstro era ele, e agora que eu estava de volta, com
certeza o faria enxergar.
E, sim, vai seguir as regras durante o dia, além do mais, você não
deveria exibir essa droga de símbolo com tanto orgulho. — Ele quase
cuspiu.
— Você sabe da fama dos Vipers, e ninguém dessa família escolheu ir para
lá, nunca.
— Não sei qual a sua surpresa, pai. — Pesei o tom de voz, entediado. — Eu
não sou da sua família, e é uma honra ser diferente do restante de vocês.
Ele não queria admitir em voz alta a podridão que ele mesmo havia deixado
se instalar dentro daqueles muros. E, pior ainda, não queria enxergar que
havia colocado o próprio filho para cuidar de algo tão perigoso e sujo por
puro abuso de poder. — Você não me assusta mais, então eu te aconselho a
cuidar da própria vida e não me provocar.
Fazia cinco anos desde que nós tínhamos nos visto antes da minha volta, e
eu não era mais o garoto assustado e medroso que ele mandou para longe.
O som de batidas na porta foi o que fez nosso contato visual quebrar, e
quando eu vi quem entrava, senti meus dedos coçando pelo meu isqueiro ou
por um cigarro.
— Conrad — ele cuspiu meu nome quando se recuperou, mais rápido do que
sua namoradinha de merda. — O que faz aqui?
— Não é da sua conta — respondi, mas meu pai falou por cima:
provoquei.
Podemos nos dar uma trégua antes que as coisas saiam de controle. — Meu
pai não se intrometeu. Desde que ninguém saísse morto, a universidade
contava com o bom senso dos alunos e suas castas para a ordem tomar conta
daqueles corredores.
Sabendo que a preocupação de Isaac era o que eu poderia causar a ele e sua
namorada, respirei fundo e me ergui, encarando-o de cima, eu era bons vinte
centímetros mais alto do que seu um metro e oitenta e quatro.
— Certo.
Dei o primeiro passo, mas meu irmão não se conformou. Ficou no meu
caminho e ergueu a mão.
Ali tive plena certeza de que o ódio que sentia por cada um dos Prince era o
mais genuíno possível.
— Cara… nem se você chupar meu pau tão bem quanto sua namorada vai
fazer.
O sabor de perturbar e foder quem fez de mim miserável a vida toda era
saboroso demais para deixar passar tão rápido assim, e sabendo disso, fui
atrás do alvo que me interessava no momento.
winterbird,aurora
Eu sabia a resposta, mas era uma que Susan não gostaria de ouvir, então
respondi em um sussurro:
— Não sei…
— Você nunca sabe de nada. — O tom amargo e agudo foi a última coisa
que ouvi antes dela levantar e se afastar.
Não reclamei. Queria ficar sozinha. Queria continuar a observá-lo
secretamente sobre as páginas do exemplar de O morro dos ventos uivantes
que eu lia.
Eu era invisível. Ele era o garoto mais popular do colégio, talvez mais
popular que o próprio meio-irmão.
Mas mesmo parecendo ter a vida perfeita e não ligar para nada ao redor, eu
sabia que havia algo de errado com o príncipe bastardo.
Seu cabelo preto como petróleo tinha um corte rebelde que combinava muito
com ele. Sua pele, o que era exposto, era tão branco quanto a camisa que
usava. E ao contrário de todos os outros que erguiam as mangas na primeira
oportunidade, notei que Conrad nunca exibia os braços.
Nunca.
Tentei uma única vez, mas ele notou que era observado e quando me achou,
mesmo com mais um romance que eu havia alugado na biblioteca entre nós,
mesmo que tenha sido por menos de cinco segundos, foi como ser pega por
um buraco negro.
Conrad me atraía me puxando direto para sua órbita. Era assustador. Ainda
mais quando aqueles olhos tão escuros faziam parecer que ele podia ler
minha mente.
Olhava para ele todo, mas escapava dos olhos que tudo viam e tudo sabiam.
— Droga — minha irmã bufou, voltando para o banco sabe lá Deus quanto
tempo depois. — Acho que não vou ter alternativa, além de passar as férias
toda trancafiada com você.
Queria acreditar muito que era apenas uma reação passageira por todo o
nosso histórico, mas começava a duvidar que tivesse estômago para aguentar
mais um ano todo daquilo.
Minha irmã parecia me odiar cada vez mais desde a morte dos nossos pais.
Papai era muito bom em controlar o gênio de Susan, mamãe era melhor me
encorajando a colocar os sentimentos para fora, mas nosso avô não tinha
nenhuma experiência com meninas adolescentes e estávamos nós duas de
novo em nossas bolhas.
Era estranhamente confortável assistir àquela cena como se não fizesse parte
dela, e escapando de Susan, sabendo que precisaria de boas distrações no
verão, aproveitei o horário do intervalo do dia seguinte e fui até a biblioteca.
revista de moda.
Enfiei-me entre os corredores, analisei cada um dos títulos, pesei qual deles
deveria levar e, no final, todos os romances clássicos que ainda não tinha
lido estavam na minha pilha, menos o meu favorito.
Já havia lido e relido O morro dos ventos uivantes pelo menos quinze vezes.
Sabia a história de trás para frente e, ainda assim, toda vez que lia, o
sentimento de loucura, de pena, de compreensão e de ódio estavam lá.
Alguém o tinha colocado na prateleira mais alta e eu, apesar de não ser tão
baixa, não alcançava.
Tentei com afinco, fiquei na ponta dos pés, cheguei a pular para tentar puxá-
lo.
E eu estava certa de que faria aquilo sem problemas até que, por cima da
minha cabeça, a mão branca que parecia ter sido esculpida em mármore
atravessou o espaço entre mim e o livro e o pegou.
Eu congelei.
De repente, cada célula minha ficou ciente de que Conrad Prince estava atrás
de mim.
O efeito sobre minhas bochechas foi imediato. Senti o rosto queimar, assim
como o pescoço e as juntas dos braços. Tudo parecia desconfortavelmente
em chamas.
Ele retirou o livro, ouvi o barulho das folhas sendo folheadas e respirei
fundo, fechando as mãos em punho coladas ao corpo.
— Nunca li. — A voz dele era baixa e muito intimidadora para um garoto de
só dezesseis anos.
Levou pelo menos um minuto até que ele fechasse o livro e o oferecesse a
mim.
Ergui a mão, me sentindo uma idiota por tremer tanto e, mordendo a ponta
da língua a ponto de me machucar, peguei o exemplar do meu romance
favorito tomando cuidado para não tocar em seus dedos.
Seus olhos escuros eram ainda mais intensos tão de perto. A íris se
confundia facilmente com a pupila e eu não sabia o que era o
que sob os cílios grandes, escuros, tão contrastantes com o resto dele.
Levou menos de trinta segundos para que ele soltasse logo o livro na minha
mão, e parecendo incomodado, seu rosto se fechou, a sombra do sorriso
sumiu e os olhos se estreitaram, e no meio do meu silêncio, aproveitando os
últimos segundos que tinha para vê-lo, assisti a Conrad Prince virar as costas
como se não tivesse acontecido absolutamente nada e eu fui coberta
novamente pelo manto da invisibilidade, afetada demais para fingir qualquer
coisa ou correr.
Achei que renderia mais, mas mesmo lendo absurdamente devagar, acabei
com os primeiros três livros que havia pegado na primeira semana das férias.
O tempo, como prometido, começava a esquentar muito e, na segunda
semana, aquela tarde de terça parecia chata demais para passar dentro de
casa.
A parte de trás da casa dava para o que deveria ser um parque, mas pela
preguiça do governo, os moradores se esforçavam para manter a grama baixa
e o riacho que passava ali limpo. Com o esforço da comunidade,
conseguiram montar uma quadra, balanços e bancos, o que foi oportuno, já
que, com o meu exemplar de O morro dos ventos uivantes roubado debaixo
do braço, eu queria algum lugar minimamente confortável para sentar e ler, e
o encontrei no balanço próximo ao riacho, preso no galho grosso da árvore
onde minha irmã e suas amigas estavam sentadas no único banco sob uma
boa sombra, observando os meninos jogando basquete na quadra, na outra
margem. Meus olhos miraram
rápido, reconheci quase todos os rostos, mas os que se destacaram foram os
dos irmãos Prince.
— Acho que vou convidar Isaac e Conrad para viajar. Meu pai quer garantir
meu lugar na Prince University e o jeito de estreitar o laço vai ser esse… —
Heather, a loira de olhos verdes e lábios finos, comentou.
— E para onde vocês vão? — perguntei. Não deveria, mas não aguentei.
— Provavelmente, para a França. — Ela era a menos cruel das garotas mais
velhas e sempre era gentil comigo. — Vocês poderiam vir junto. Meus pais
não se importariam.
Era alguém mais velha, rica e popular convidando a mim para um ambiente
que Susan acreditava que só ela merecia pisar.
— Ela não vai! — Foi a primeira reação da minha irmã e todos nós nos
assustamos.
Quando me dei conta do que acontecia, estava meio que de pé, com o livro
contra o peito, usando-o de armadura, caso ela tentasse encostar em mim.
— Por que não posso? — A minha resposta foi uma só, baixa, chateada.
Mais atenção.
Fechei os olhos, sentindo algo queimar nas minhas costas e tive medo de que
fosse o olhar dele.
era raro, porque na frente das amigas, ela tentava só ser pouco cruel comigo
e me ignorar grande parte do tempo.
Era horrível perceber que minha irmã tinha uma mágoa de mim que eu nem
sabia o motivo.
Nesse minuto, a lágrima grossa rolou por seu rosto e nós estávamos na
margem.
Sua mão no meu ombro era dura, e quando me empurrou, meus pés não
tiveram apoio algum. Eu caí de costas, com o livro na
mão, dentro do riacho de correnteza forte, e o pior de tudo é que eu não sabia
nadar.
Tentei mais uma vez ir para cima, precisava de ar, mas não tinha no que eu
me agarrar e não tinha como procurar onde firmar os pés para pegar impulso.
Minha visão escureceu rápido demais. Eu precisava tentar, mas o peso nos
meus membros era demais, até que, por um milagre, alguém pegou minha
mão.
Eu não conseguia enxergar direito, mas não podia ser mais grata.
Sorvi o ar desesperadamente.
Ainda assim, a mão que me mantinha com a cabeça fora d’água não me
deixou.
Estava de costas para o meu salvador, com seu braço no meu peito, me
puxando junto de si conforme nadava para a margem.
Ninguém nos ajudou a sair da água, mas ele não parecia precisar de ajuda.
O garoto de cabelos pretos me jogou para terra firme e pulou ao meu lado
como se não precisasse fazer nenhum esforço.
Tremendo muito, com frio, com medo do que poderia ter acontecido, eu me
abracei.
Foi nesse segundo que o notei ajoelhado ao meu lado, as mangas compridas
molhadas nos braços de quem havia me salvado. Gentilmente, ele pegou
meu rosto e ergueu para o seu.
Olhou bem nos meus olhos, conferiu meu peito batendo, me deixando
constrangida pela atenção dada a minha blusa branca sem sutiã por baixo, e
sério demais para um garoto de dezesseis anos, ele me perguntou:
Engoli com dificuldade, minha garganta doía, mas fiz que sim com a cabeça,
agradecendo por estar molhada e as lágrimas que escapavam do meu rosto
não ficarem em evidência.
— Ela está bem. — Minha irmã apareceu e só então eu notei o ponto onde
eu havia caído, e onde eu estava agora. Também notei as folhas e a capa do
livro indo pela correnteza e senti meu coração doendo.
Por um segundo, não existia nada além das páginas cheias de anotações que
eu havia perdido. Pela primeira vez, senti ódio de Susan.
— Ela está bem, viu! Já ficou até de pé. — Ela riu o sorriso mais amarelo
que eu já havia visto e parei, pensando se valia a pena me descontrolar com
ela bem ali.
Os Prince eram como deuses e na sua imaginação, algum dia ela se casaria
com um deles.
— Obrigada… — Foi a única coisa que consegui dizer antes de passar por
ele, me abraçando para evitar que todos vissem o efeito da transparência da
blusa.
scarlet
decode,paramore.
Já havia mais de uma hora que estava no meu quarto, com as costas contra a
porta, e em nenhum segundo a coisa ficou mais fácil. Em nenhum minuto o
medo dele descobrir qual era o meu quarto, dele romper a barreira que eu
construí com muito custo para afastá-lo, foi embora.
Eu vi tudo desmoronar.
O pânico colocou as duas mãos sobre a minha garganta e me sufocou.
Um grande nada.
A merda da fobia desenvolvida quando percebi que era frágil demais para
um mundo cheio de perigos, onde quem você amava podia te destruir pedaço
por pedaço, sem nenhum remorso ou consequência, estava viva e presente, e
com ela, foi a vez dele, do meu velho conhecido, dar as caras.
Idiota, não comece a chorar! Ele não pode te fazer mal. Ele não tem mais
nada para levar de você — pensei, tentando me acalmar, mas meu coração
não ficou mais leve, ou a garganta menos dolorida.
Conrad era meu pior pesadelo, e com tudo, era injusto que ele estivesse de
volta.
Ele tinha sido o quebra-cabeça mais difícil de montar, e quando entendi que
nunca teria todas as peças, o guardei em um lugar onde ninguém poderia
tocar. Onde não poderia mais me machucar mesmo que, vez ou outra, o
subconsciente gostasse de me torturar trazendo-o nas noites de sono mais
inquietas que já tive.
Eu vivi por cinco anos na casa do pai dele, namorava seu irmão, como pude
ser inocente de achar que nunca mais o veria?
Ri da minha imbecilidade.
Mas o odiava. Odiava tanto que podia sentir meu coração quente em
contraste com todo o resto gelado, gritando que eu deveria acertá-lo bem no
meio da cara, caso tentasse algo.
Era isso — ri, mesmo sem graça alguma, me esforçando para ficar de pé.
Estava decidido. Conrad Prince não me machucaria. Não mais.
Era impossível.
Isaac tinha que ter me contado, mas ele não o fez e agora não atendia a
merda do telefone.
Ninguém mexia comigo ali e isso não era porque eles me respeitavam como
pessoa. Não. Eles respeitavam e temiam meu namorado.
Ele, eu e alguns alunos que pagavam taxa extra tinham a opção de escolher
quartos únicos. O resto dos dormitórios eram duplos ou quádruplos, e aquele
era mais um motivo para eu ser muito grata por John Prince gostar tanto de
mim, ou tentar calar a minha boca.
A memória da oferta de futuro promissor me fez ter mais raiva e quando bati
na porta de Isaac, não fui gentil.
Nada.
Bati de novo, e continuei batendo, mas ninguém abriu.
— Então, onde?
— Bem…
Minha mente mapeou o campus, os lugares possíveis para Isaac estar àquela
hora, e meus pés obedeceram. Procurei no
— Bom dia. — Num tom de voz profundo, sério, Isaac entrou pela porta
transparente e parou na minha frente.
— Por que você não atendeu seu celular? — Meu tom de voz era
melindroso, agressivo, mas baixo.
fechadas em punho, dava para ver a marcação no tecido, e ele estava tenso,
comprovei isso quando consegui forçá-lo a manter contato visual comigo.
— Precisei comer, não tinha nada no meu quarto e eu desci, como uma aluna
qualquer com fome na madrugada. — Minhas palavras eram duras, não
davam margem para ele tentar me questionar, ou mandar em mim.
— Merda. — E ali eu soube que ele já sabia ontem.
Isaac sabia de tudo quando me viu na manhã anterior, quando me pediu para
não sair do quarto.
— Meu pai me contou há uma semana, mas achei que algo aconteceria e um
dos dois desistiria da ideia. Você sabe que Conrad odeia nosso pai.
Tive medo de perder a única pessoa com a qual pude contar nos últimos
anos.
Os lábios de Isaac roçaram pelo meu pescoço, pelo desenho do meu maxilar
e então, ele estava lá, frente a frente comigo. Olho no olho, nariz com nariz,
boca com boca.
Com a testa tocando a dele, ainda de olhos fechados, acariciei seu rosto com
ambas as mãos e soprei baixinho:
— Não faça mais isso. — Era um pedido sério, do mais profundo do meu
coração.
— Existe alguma chance dele ir embora? — Era minha maior e mais frágil
esperança, e se partiu como um cristal quando meu namorado negou com a
cabeça.
John Prince era o meu tutor. Bancava meus estudos, o asilo do meu avô,
minhas roupas, comida, livros e tudo mais que eu quisesse ter. A sorte dele
era que eu achava tudo aquilo um grande abuso. Por isso, me mantinha com
os pés no chão, sabendo que alguma hora aqueles privilégios todos seriam
perdidos.
— Nem pensei nisso — Isaac respondeu num tom de voz mais ríspido, mas
logo se corrigiu: — Eu não poderia ficar sem você.
— De qualquer jeito, não tem para onde eu ir. — Relaxei contra a cadeira e
encarei o teto. — Que caralho! É injusto demais que seu irmão esteja aqui.
Ele deveria estar… — A palavra presa ficou entalada na minha garganta.
— Mas ele está aqui, e eu não acho que ele vá nos deixar em paz.
— E por quê? — Meu tom de indignação foi acompanhado dos meus pés
batendo no chão. — Por que Conrad só não vive sua vida e nos esquece?
Era desconfortável.
Ele se ergueu e sentou ao meu lado, colocando a mão sobre a minha e me
deixando deitar em seu ombro. Eu aproveitei. Precisava de carinho, queria
algum apoio.
Era uma merda, mas a vida tinha dessas: era injusta pra caralho e te dava
uma rasteira quando você menos esperava.
Sendo muito consciente de tudo ao nosso redor, cinco anos atrás, Isaac
forçou para adentrar minha nova bolha quando tudo aconteceu. Eu até tentei
pará-lo, mas dia após dia, lá estava ele com um videogame novo, um doce,
uma flor e foi assim, até que eu permiti que ele ficasse. Mas mesmo com
todo esse esforço, eu via quem ele era. O grande atleta, o bom menino da
família, o favorito do pai que contrastava muito com a concorrência. Ele
tinha o mundo na palma da mão e, sinceramente, não precisava de mim ou
de segurança comigo. Talvez fosse por isso que ele verdadeiramente nunca
conseguiu me acalmar, mas só de não estar sozinha, eu já ficava melhor. Até
porque, sabia que era muito errado, mas preferia
acreditar na mentira bonita dele de que ficaria tudo bem a que encarar a
realidade assustadora.
— Eu sei que você está tensa e tudo mais, mas você pode ir comigo à festa
hoje?
— É, eu sei, mas quero você comigo. Não quero te deixar sozinha por aí…
— Eu sabia que agora o motivo era outro. — E
você precisa distrair a cabeça. Qual foi a última noite em que foi curtir assim
comigo?
— Além do mais, agora com meu irmão nos Vipers, é bom mostrar que
ainda estamos na ativa.
— Você quer mostrar poder. — Quis rir daquela coisa de macho alfa
mijando para marcar território.
— Quero, por isso, se você disser que sim, quero que vista aquele vestido
vermelho que amarra no pescoço.
Quase gargalhei.
Ele raramente sentia necessidade de fazer isso, até porque eu não dava um
pingo de moral para nenhum outro cara naquele lugar, mas conhecendo o
modus operandi daquela família, sabia que aquilo era um recado que se
espalharia pelo campus em fotos nos perfis de Instagram e Facebook.
— Sem Vipers?
— Mesmo assim…
Eu não gostei daquilo. Eu disse que iria pensar, mas não discuti.
— Certo…
Isaac não demorou muito para sair. Já havia perdido o primeiro tempo todo
comigo, não queria arriscar um segundo. Eu tinha a agenda livre até às dez, e
aproveitei para fuçar entre os livros da biblioteca.
Sempre.
E mesmo que eu nunca mais tenha lido O morro dos ventos uivantes, as
cenas que li e os diálogos que destaquei no meu antigo livro ainda estavam
vivos na minha mente. Tudo vinha como um filme, e de forma injusta,
enquanto no colégio só havia uma cópia, na faculdade tinham muitas, das
edições mais diferentes possíveis.
Nenhum.
Sem pensar, parei em frente à bibliotecária e perguntei assim que ela ergueu
o rosto para mim.
— Desculpe, eu queria muito pegar O morro dos ventos uivantes, mas não
tem nenhum exemplar na prateleira. Há algum disponível?
— Todos? — perguntei mais uma vez e a mulher deve ter me achado burra.
— Sim, todos, queridinha.
Minha maquiagem não era das mais leves também, e eu gostava muito de
brincar com aquilo.
Quanto mais maquiada, mais fácil sustentar que eu estava saudável e feliz, e
com um bom delineado e batom vermelho, coturno e jaqueta de couro dos
Lions por cima, me senti pronta e muito bonita.
De fato, olhando mais uma vez no espelho, precisava admitir que era bonita.
Talvez quando mais nova, meus olhos não fossem tão fundos, e eu não era
mais a magra saudável, só era alguém que fumava
Foi enquanto retocava o batom com The Strokes tocando ao fundo no meu
computador, que ouvi a batida na porta.
Meu sorriso cresceu antes de vê-lo e, como sempre, Isaac estava perfeito.
— Ótimo.
— Eu queria muito… — ele sussurrou contra minha boca e eu senti sua mão
livre subindo por minha coxa. Sabia o que ele queria, mas por algum maldito
bloqueio, eu não tinha a mesma vontade.
Nós já havíamos feito tudo de cunho sexual que não envolvia penetração,
mas ele ainda queria, e eu não entendia por que eu não. Será que era algum
defeito do meu corpo?
Algum defeito da minha cabeça?
— Acho que o argumento é válido, mas não espere que eu vá dormir antes
de provar você. — Ele me beijou mais uma vez.
Fechei os olhos e me esforcei muito, mas não tinha a mesma ansiedade que
ele.
Isaac finalmente me puxou, tranquei meu quarto e nós descemos para a festa.
A caminhada foi longa, mas era importante, com uma quantidade gigantesca
de alunos, que o campo ficasse longe das salas de aula. Ninguém aguentaria
dormir com o som naquele volume e enquanto Doja Cat explodia cantando
sobre uma boa foda nas caixas de som do DJ, Isaac abriu caminho entre as
pessoas para nos levar até o palco.
O melhor amigo de Isaac cheirava uma carreira branca nos peitos de uma
menina em seu colo. Os outros pareciam entretidos em suas próprias bolhas,
e alguém arranjou cervejas estupidamente geladas que pararam em nossas
mãos sem eu saber como.
Fiz o básico de sorrir, acenar, beijar na hora certa, beber os shots que ele me
oferecia, rir de suas piadas e fingir que estava
tudo bem. Isso funcionou até minha quarta tequila, e eu sabia que era por
isso que Isaac amava me arrastar para as festas.
Eu não tinha limite quando começava a beber, e a bebida trazia uma parte de
mim que me esforçava muito para guardar.
Foi em alguma hora que ele veio para perto que girei até parar contra seu
peito. Mal precisei puxá-lo, Isaac já estava sobre mim e aproveitou que o
beijei com todo o fogo que nunca aparecia quando as luzes estavam acesas.
Minha língua brincou com seu lábio inferior, depois invadiu sua boca e o
dominou.
Ele estava duro, eu poderia resolver, mas era divertido vê-lo me querendo e
entre luzes vermelhas e laranja da fraternidade
rolando pela grande pista de dança, me virei de costas para ele, sentindo suas
mãos me pressionando contra si. Curtindo a música, a leveza na cabeça, os
risos sem sentido, rebolei, provocando-o de propósito.
Isaac mordiscou minha orelha, eu puxei sua mão para o meu rosto e
mordisquei a ponta de seu dedo indicador. Ele riu, eu também.
— Preciso ir… — Não sabia para onde, mas avisei, ignorando a cara de
poucos amigos de Isaac, e pulei para fora do palco.
Meus pés foram precisos e me senti inteligente demais por não ter arriscado
um salto alto contra o gramado. Caminhando entre a multidão, sentindo o
corpo mais leve que a cabeça, li em letras pouco embaralhadas o letreiro do
bar. Mudei a direção e em pouco tempo estava na fila para abastecer o
reservatório que judiaria do meu fígado. Quando chegou minha vez, sabendo
quem eu era, a garota do outro lado do balcão me deu uma dose de tequila.
Qualquer um dos dois parecia uma boa ideia. Rindo sozinha, ajeitei
Aquela sensação de estar fora do corpo, leve e feliz poderia durar para
sempre, mas quando endireitei a cabeça, quando meus olhos focaram no que
tinha ao meu redor, tudo o que senti foi como se estivesse presa, mais uma
vez.
Os olhos de Conrad queimavam em mim, e a minha reação foi ainda pior.
Era como se aquele fosse só mais um pesadelo, mas do tipo mais apavorante.
Todo o ódio que senti antes pareceu uma mínima fagulha perto do medo que
senti naquele segundo, na pouca luz da festa ele parecia ainda mais
ameaçador. Era como se a batida de “I love
rock’n’roll” fosse feita para acompanhar seus passos. E ele vinha na minha
direção.
Na minha cabeça, a distância entre nós era pouca, mas a espera, a ansiedade
do trajeto, fez com que eu sufocasse. Até porque, como uma maldição que
parecia ser eterna, ainda podia sentir seu olhar queimando em mim como
sentia anos atrás, como senti na noite passada.
Eu quis derreter, me dissolver na terra, sumir, mas não podia e, dessa vez, a
sensação de formigamento que ele causava atingia todo meu corpo, fazendo
com que me sentisse exposta, desprotegida.
Sabe lá Deus o motivo, mas esperei. E então, quando achei que não poderia
demorar mais, ele chegou.
Conrad Prince vestia calças e coturnos pretos, mas diferente de antes,
embaixo da jaqueta de couro com mangas erguidas, não havia nada. Ele não
tinha mais sua barreira de proteção e a primeira coisa que fiz foi revistar seus
braços.
Tatuagens desciam por seus braços e até uma das mãos. Estava escuro
demais, e junto da minha bebedeira, eu não consegui entender o que eram os
desenhos, mas isso não me impediu de continuar a esquadrinhá-lo com os
olhos. O peito e o pescoço também carregavam desenhos novos. Aquilo, de
algum jeito estranho, não me surpreendeu.
Quando cheguei ao seu rosto, soube que ele havia feito a mesma revista na
minha aparência, e agradeci por estar em um bom dia para aquilo acontecer.
Engoli em seco na minha última olhada para o todo e tentei ficar o mais
firme possível conforme via o abdômen marcado e forte pela brecha aberta
da jaqueta.
Foi inevitável controlar o calor nas minhas bochechas quando senti algo
esquentar no meu ventre só por vê-lo daquele jeito. Eu deveria me controlar,
mas havia um pedaço venenoso e sujo dentro de mim que não queria. E
prolonguei aquela sensação, aquela pequena guerra interna, até perceber que
a razão podia perder.
Culpei o álcool e me esforcei para erguer a cabeça, Conrad era muito mais
alto que eu nos meus 1,76. A mandíbula marcada foi a primeira coisa que vi,
seguido pelos lábios desenhados e cheios, o nariz bem-desenhado e um
pouco largo, e então, sabendo que tudo em mim desmoronaria, eu cedi.
Eu senti medo.
— Não é da sua conta — respondi num sussurro raivoso e ele precisou ler
meus lábios para entender.
Conrad deu mais um passo para frente, ficando a cinco centímetros de mim.
Sua mão deslizou pela minha cintura e ele me puxou com força contra si.
— A vítima persegue seus matadores, creio eu. — Era uma frase do meu
livro favorito.
— Não brinque com a sorte, Red. Eu vou te engolir, sua traidora de merda.
— A ameaça queimou nos meus ouvidos, rasgou minha pele, esfregou sal
nas minhas feridas.
Meu ar faltou, eu o empurrei.
— Eu te odeio. — Foi tudo o que saiu da minha boca junto do tapa estralado
que dei em seu rosto. Conrad mal sentiu o impacto físico, mas fechou os
olhos, sentindo o peso das minhas palavras.
Aproveitei o segundo incerto para fugir. Dei as costas a ele, e mesmo com o
mundo confuso ao meu redor, corri na direção que sabia estar o palco.
Era uma péssima ideia estar tão bêbada sabendo dos riscos.
E, pior ainda, era me sentir daquele jeito por causa de Conrad. A vontade de
chorar era quase incontrolável, eu só queria minha cama e meu quarto, mas
pensar nisso foi difícil quando vi gente correr em volta de mim.
Conrad enfiou a mão no bolso e algo em mim se retorceu por saber que ele
não era alguém que gostava de usar fósforos, ele gostava de isqueiros. Em
particular, do seu isqueiro prateado.
na minha direção. Eu não esperei, ainda olhando para ele, voltei a me mexer,
indo de encontro a Isaac.
Havia muito ódio nos olhos de Conrad para que eu arriscasse um confronto
físico, mas ele tinha planos piores. Caixas de som do outro lado do campo
fizeram todos os presentes ouvirem.
Play with fire vibrou alto da caixa de som dos rivais, as pessoas pararam de
correr, e todas elas foram testemunhas da fogueira que Conrad Prince fez
onde uma vez nosso DJ estava.
oh, porque eu continuo cavando minha própria cova e não vou parar até
chegar onde você está. eu continuo correndo, mesmo quando meus pés doem
e não vou parar até chegar onde você está; oh, quando você passa pelos seus
momentos mais obscuros eu teria percorrido todo esse caminho até o
cemitério.
graveyard,halsey
Ela não podia descontar todo o ódio que sentia do mundo nas minhas costas,
ainda mais quando isso podia me machucar ou me matar.
Segurei um suspiro.
Meia hora depois, a bronca havia acabado e ela correu escada acima,
provavelmente, para descobrir como faria um boneco vodu meu.
Parei de desenhar sobre a toalha e ergui os olhos para fitá-lo com timidez.
— Acha que esse problema com sua irmã pode ser superado?
— Susan odeia ser órfã. E odeia ser pobre. E odeia que não tenha as coisas
que suas amigas têm para poder se exibir — falei, desviando a atenção de
novo para a mesa. — Uma hora, eu acho que melhora. — Dei de ombros,
como se aquilo não me afetasse, mentindo mais uma vez.
— Sabe, seu pai nunca me deu trabalho. E eu não tinha uma outra criança
para me preocupar, era casado… Talvez uma mulher pudesse ajudar vocês.
— É, tem razão. Você é uma boa garota, Susan. — Ele bateu na minha
cabeça de modo carinhoso, confundindo meu nome, e eu não o corrigi. Sabia
que isso não importava.
Naquela noite, dormi no sofá. Apesar de não admitir em voz alta, tinha medo
de subir e minha irmã surtar. Pelo menos, ali embaixo, se ela descesse, eu
ouviria o ranger das tábuas da escada e acordaria antes.
— Já vai!
— Olá, bom dia, senhor. Meu nome é Conrad Prince e soube que Scarlet
mora aqui.
Meu avô parou por um segundo, devendo achar aquilo tudo estranho e eu
engasguei sob a coberta. O que Conrad Prince fazia na minha porta,
perguntando sobre mim?
Meu avô deveria ter entendido o recado dele: não, não somos amigos. Mas o
meu bom e amado avô não entendeu.
— Belo penteado.
— Passei para ver se você estava bem. Há casos de morte, horas após o
afogamento — ele disse com a mesma emoção de quem pede um copo
d’água, brincando com o isqueiro fechado em suas mãos.
Ele quase sorriu e meu coração pareceu pesar dez quilos, amassando meu
estômago. Se deuses fossem de carne e osso,
— Ótimo. Se for assim, acho que já posso ir. Cuidado por onde anda.
— Ok… — falei, observando-o sair de cena como se fosse um E.T.
Vovô foi abrir a porta para que a visita inesperada partisse, quando ouvi o
rangido alto da escada e, como se tivesse corrido demais para fazer aquele
pequeno trajeto, Susan surgiu.
— Até mais, Scarlet. — E com a cara fechada, ele saiu pela porta.
Meu avô ia dar alguma resposta que me colocaria em risco, então o cortei e
respondi primeiro:
Se ela tinha acreditado, eu não sabia, mas meus dedos tinham uma
necessidade fora do comum. Pulei do sofá o mais rápido que pude e corri
escada acima, pronta para trabalhar ainda mais firme no meu pequeno
projeto supersecreto de desenhar os olhos de Conrad com perfeição.
Acabaria confessando tudo e qualquer coisa, e ele teria acesso mesmo que eu
não abrisse a boca. Era como se depois de algum
tempo olhando para aquele ônix brilhante, não houvesse mais chance de
proteger os pensamentos mais profundos.
Pouco a pouco construí os traços, deixando tudo tomar forma no seu tempo,
e cada vez que pensava naqueles olhos, nas sobrancelhas perfeitas, nos cílios
longos, meu estômago era balançado por todas as malditas borboletas que
viviam escondidas à espera de qualquer coisa sobre ele.
— Não sabia que você era do tipo que gosta de invasão de propriedade
privada.
O medo de ele ver o que eu fazia me fez fechar o blackbook com tudo e
escondê-lo contra o peito. Conrad girou em volta de mim, parando do meu
lado direito e, com o isqueiro girando nos dedos da mão esquerda, ele
perguntou:
— O que é isso?
— Hm, acho que tenho algo interessante para te mostrar então, vem comigo
— dando a ordem, virou-se e começou a andar, como se soubesse que era
impossível não o obedecer.
Coloquei-me de pé, joguei a mochila nas costas e dei uma corridinha de leve
para acompanhá-lo numa distância segura. Notei quando Conrad enfiou a
mão no bolso, guardou o isqueiro e tirou de lá um molho de chaves.
Nunca sonhei que aquela mistura poderia ser boa, mas era.
Meu queixo foi ao chão, minha mochila caiu do meu ombro e eu fiquei um
bom tempo querendo rir sozinha.
Era uma grande floresta em preto e branco, com detalhes bem-feitos de luz e
sombra, numa profundidade intensa.
— Foi. Mas não sou bom com cores, e eu acho que seria bom pintar. Desde
que meu pai abandonou isso aqui, tinha a sensação de que o mato tomaria
conta em pouco tempo, então tentei acelerar as coisas.
Conrad deu de ombros, como se aquilo, aquela arte toda, fosse nada.
— O que quer que eu faça? — Caí com os olhos sobre ele e o vi de braços
cruzados, encostado na parede, com um dos pés apoiado nela. Seu rosto
tinha uma expressão blasé, mas seus olhos eram vibrantes demais para que
eu caísse naquela mentira de que ele estava desinteressado.
— Eu?
— Não há mais ninguém aqui, ou há? — Ele não era um doce de pessoa,
mas Conrad tinha razão, era uma pergunta burra.
— Bem, eu não tenho material para isso… — Antes que pudesse completar,
ele me interrompeu:
— Pelo que soube do seu talento, acho que você dá conta do recado.
Analisei mais um pouco o galpão, tentando processar que aquele garoto que
eu observei desde que mudei para aquele lugar esquisito e não pertencente
estava procurando saber sobre mim. As marcas de pequenos incêndios na
parede contrária denunciavam
que Conrad realmente passava algum tempo ali, e não consegui segurar a
pergunta.
— Já. — A resposta era fria, mas ainda assim fez minhas bochechas
corarem. — E já vi alguns rascunhos seus jogados por aí.
Será que ele sabia que era a inspiração de boa parte daqueles desenhos?
— É por isso que sei que você pode fazer isso por mim. Eu realmente não
sou bom com cores.
— É… — Ele sorriu de canto e meu coração bateu tão forte dentro do peito
que tive medo dele ouvir. — E não.
— Conhecer você — ele foi direto, sua expressão era séria de novo, seus
olhos fixos nos meus não me permitiram fugir.
— Eu sei.
Ah, o maldito parque. Eu até gostaria de ir, mas Susan odiava precisar me
levar junto.
— Acho que você não a conhece bem… — Não era uma boa hora
— Ainda assim, eu adoraria ir, mas não posso. Susan ainda está muito
magoada com os últimos acontecimentos e é bom evitar provocá-la por
alguns dias.
— E a parede, quando posso começar? — Tentei mudar o foco para que meu
coração se recuperasse daquela intimação.
— Amanhã.
— Certo… Então, acho que já vou.
Como não tinha ideia de que hora voltaria, engoli o pãozinho que meu avô
havia deixado para o nosso café, enfiei uma garrafa d’água na bolsa junto de
dois pacotes de biscoito e escrevi no porta-recados preso à geladeira “volto
mais tarde, qualquer coisa me liguem”.
Vovô confiava mais em mim do que em minha irmã, sabia que eu não era o
tipo de garota que causaria problema e que precisava
Fazendo o menor barulho possível, saí de casa ainda de meias, me sentei nos
degraus da porta e depois de calçar os tênis, ajeitei a mochila nas costas e
comecei minha caminhada.
Levou menos de meia hora até que eu passasse novamente pelo buraco da
grade, e se já estava ansiosa antes, montando um milhão de possíveis
diálogos na minha cabeça, pensando como deveria me comportar, quando vi
a porta do galpão aberta, meu cérebro derreteu.
Respirei fundo, apertei com mais firmeza o rabo de cavalo no alto da cabeça
e passei os dedos pelas alças da mochila antes de ter coragem de seguir em
frente. E de fato, ainda bem que eu estava preparada, porque quando entrei
pela porta, Conrad, sentado no meio do lugar com uma lixeira entre suas
pernas, colocava fogo em pequenos pedaços de papel e os fazia voar.
— O que você quer fazer? — Havia algo errado. Conrad parecia chateado,
mas eu não era sua amiga, nem sua colega, para perguntar o que tinha
acontecido.
Ele olhou em volta e então, não achando nada, virou a lixeira à sua frente de
boca no chão, dando algumas batidas no fundo, expulsando seu amontoado
de brasas.
— Isso serve?
Quem deu de ombros fui eu, uma vez que não tinha opção melhor.
— Obrigada, mas — peguei o que ele me oferecia — para mim? E você, não
vai trabalhar?
— Eu te disse, não sou bom com cores. — Ele voltou a olhar para a parede,
e então de novo para mim. — Você é.
Com ajuda do material que ele me ofereceu, abri as latas de tinta, mexi o
conteúdo e tentei pensar no que faria.
Conrad não falou nada, fez o que pedi e, de forma obediente, despejou as
quantidades de tinta conforme eu ia mexendo com o pedaço de madeira até
ter certeza do tom que precisava. Foi
quando ele finalmente colocou a tinta verde que meus olhos desviaram um
pouco para ver que a manga de sua camiseta estava erguida e um vergão
vermelho marcava a pele clara alguns dedos acima do pulso. Parecia a marca
de uma corrente, porém não tive tempo de ver melhor. O garoto notou que eu
tinha visto algo que não devia e largou o galão de tinta por um minuto para
ajustar as mangas da blusa.
Quando finalmente atingi o tom que desejava, pedi por tinta branca, e depois
de uma boa quantidade do tom que clareou minha mistura, o verde que eu
queria ficou perfeito.
Não tinha me chamado até ali para isso? Então que confiasse no que eu faria.
— Que isso pode dar errado. — segurei com todo meu autocontrole para não
revirar os olhos. — E que achei que você não viria.
— Eu disse que viria, não disse? Sou do tipo que cumpre o que fala.
— É, mas você poderia achar que isso era algum tipo de pegadinha, não? —
O tom dele não era ameaçador, mas a possibilidade de ser feita de boba foi
como ter um balde de água fria na cabeça.
— Se isso fosse algum tipo de brincadeira sem graça, eu teria que te matar.
Conrad riu.
— É claro que sim. — Por um segundo, acho que ele pensou que eu fosse
burra.
— E eu vou ter todo o trabalho da parede sozinha, sem receber por isso?
— Já disse que não sei pintar — ele insistiu, tendo certeza de que eu era
burra.
— Relaxe, vossa alteza — passei por ele, indo para o balde de tinta —, eu
vou te ensinar.
Conrad não discutiu. Marquei todos os pedaços que era para pintar com
aquela cor, expliquei para ele o que queria que fosse feito e, no final das
contas, depois de achar mais uma lixeira velha, dividimos a tinta e atacamos
cada um uma extremidade da parede.
E ele tinha razão, enquanto seus traços eram muito bem-detalhados, o garoto
Prince tinha zero talento para colorir, o que na minha cabeça, até aquele
momento, era tecnicamente impossível.
E de fato, sob aquele teto quente, sem nenhum vento, com o cheiro de tinta
inundando nossos pulmões e o suor escorrendo a ponto de molhar a
camiseta, eu não pude negar a possibilidade do descanso.
Aproximei-me dele, sabendo que não teria alternativa que não fosse sentar
naquele chão sujo de fuligem e resto dos seus pequenos incêndios, e
querendo uma confirmação, ao me sentar e encostar as costas na parede,
perguntei despretensiosamente:
Desviei os olhos dos dele, encostei a cabeça contra a parede e respirei fundo
antes de soltar meu resumo pronto.
— Mas não significa que não seja uma grande coisa. Seus pais eram bons
pais?
— Os melhores possíveis. Mamãe era linda e sabia fazer com que tudo
ficasse bem em menos de cinco minutos de conversa.
Papai era o tipo de pessoa rara no mundo, um abraço dele e você sabia que
nada poderia te machucar. — Suspirei, saudosa, e virei
um pouco a cabeça para olhar para Conrad. — Ok, você tem razão.
— Por quê?
— Porque… É assim que dói menos. — Sorri sem graça mais uma vez e
evitei seus olhos de novo.
— E sua irmã?
— Mesmo que ela quase tenha te matado. — Seu tom era imperdoável.
— São meu escape. Quase ninguém sabe que eu gosto de desenhar, é como
um hobby secreto que, nos últimos tempos, sem meus livros, me ajuda a
passar o tempo…
— E o que mais você gosta de ler além de O morro dos ventos uivantes?
Assim era mais fácil me abrir. — Eu tenho o meu favorito e é o que você
indiretamente me ajudou a roubar da biblioteca e agora está perdido para
sempre. — A tristeza daquele fato ainda não tinha me acertado e para
superá-la, eu precisei de ar. — Mas, de todo o jeito, eu adoro romances. Os
clássicos me trazem uma ideia estranha e tentadora de que os conflitos todos
provam ao casal que gestos e atitudes diante de uma sociedade problemática
são o que realmente importa. Adoro a ideia de um amor platônico, puro e
gentil, mas gosto ainda mais quando ele pode se tornar real e movimentar
toda uma cadeia que entra em colapso quando pessoas estão predestinadas e
fazem de tudo para ficarem juntas.
— Eles são peculiares. Ele é criado no ódio, na inveja. Cresce com a ideia de
que Catherine não acha que ele é digno dela por causa de um mal-entendido,
e mesmo com todo seu plano de vingança, todo seu ódio por ela e sua
família, ele não consegue deixar de amá-la. É visceral. É maior que ele.
Catherine, por outro lado, sabe o que a sociedade quer dela, porém, se
Heathcliff tivesse tentado, se tivesse ficado, ela teria ido com ele para
qualquer lugar no mundo. Os dois se pertenciam, mesmo que ela estivesse
com outro, o coração dela sempre foi dele. Eu gosto disso. Eles não são
perfeitos, eles são falhos, reais como nós, e perdem uma vida inteira para
descobrir no final que, não adiantava fugir, o amor é a coisa mais poderosa
do mundo.
— E é isso que você realmente acredita? — ele disse baixo, num tom mais
grave, depois de absorver o que eu havia dito.
favorito?
— Certo — prometi.
— Gosto de Jane Austen. — Sua voz era baixa, preguiçosa e meio grave,
boa de ouvir. — Minha mãe lia para mim, e depois de um tempo, enquanto
trabalhava, conforme eu estava aprendendo a ler, pedia para eu ler em voz
alta para ela.
— Eu gosto desses. — Sorri, feliz por mais uma coisa em comum entre nós.
Eu pude olhar para Conrad sem precisar me esconder, sem precisar fugir.
Por sorte, meu celular tocou, nos arrancando daquele transe esquisito.
— Oi, vovô! — atendi o mais rápido possível, e depois de dizer que voltaria
logo para casa quando ele disse que eram quase três horas, me coloquei de
pé.
— Posso te levar?
— Eu acho que não, seria complicado explicar, sabe? Outra que, quero evitar
conflitos. — Ele entendia o recado.
Ele me dava a oportunidade de ficar mais tempo junto dele, mas era demais
para um dia.
Conrad não gostou da minha negativa. Seu rosto virou aquela máscara
esquisita de mandíbula travada e olhos impenetráveis de novo. Eu me senti
culpada por barrá-lo, mas precisava fazer.
Precisava ou, pelo andar das coisas, em minutos eu estaria dizendo que o
imaginava como a minha versão de Darcy, ou Heathcliff, ou Coronel
Brandon, ou Edmund, ou todos os mocinhos de romance dos quais falamos e
dos que eu já tinha lido.
— Red — ele esperou que eu o olhasse para continuar —, amanhã nós não
podemos vir aqui.
— Mas, se você não for fazer nada amanhã à noite, eu realmente gostaria de
ir com você ao parque. E leve sua irmã, o
— Isaac? — perguntei.
— Acho que podemos, mas como… — Foi tão rápido que eu quase caí.
Em um segundo, Conrad estava na minha frente, com o peito quase junto ao
meu, seus olhos escuros me prenderam no lugar e seus dedos tocaram a
borda do bolso da frente do meu shorts, puxando meu celular para si.
Como se fosse a coisa mais natural do mundo, seus dedos digitaram rápido
algo na tela e percebi quando ele enviou a si mesmo uma SMS do meu
celular ao dele.
— Até mais, Red. — Seu hálito quente soprou sobre o meu rosto e eu
confirmei com a cabeça, não conseguindo falar nada.
Virei as costas e me obriguei a andar em linha reta para fora dali, com o
coração batendo contra o peito quase rasgando a carne, louco para gritar para
Conrad Prince que eu o amei desde o segundo que coloquei os olhos nele.
eu me tornei tão entorpecido, não posso te sentir aí. me tornei tão cansado,
tão mais consciente. eu estou me tornando isso, tudo o que eu quero fazer é
ser mais eu mesmo e ser menos como você.
numb,linkinpark.
Coloquei o cigarro na boca, cobri a chama do meu bom e velho isqueiro com
a mão e puxei o ar, fazendo a ponta brilhar em laranja enquanto enchia meus
pulmões com a primeira tragada. Apoiei os dedos no filtro como se fosse um
baseado e olhei para a porta enquanto soltava a fumaça no ar. O balde
escondido sob minhas pernas estava tapado com plástico filme para conter o
cheiro lá e,
apesar disso, Scarlet precisava agradecer por eu não ter ido atrás de
tioacetona (substância mais fedida do mundo), se tivesse ido, ela nunca mais
conseguiria se livrar do cheiro.
— Não pode fumar aqui dentro. — Ganhando minha atenção, ergui os olhos
para ver Bella se aproximar. Permiti que ela puxasse minha mão para sua
boca e notei seus olhos espertos em mim enquanto dava uma grande tragada.
— O cigarro ainda é seu. — A fumaça escapou por seu nariz e ela se sentou
entre Thomaz e eu. — Qual é o plano? Os Lions estão bem irritadinhos com
a gente depois do que fizemos.
— Não é só isso. Estão falando sobre Conrad estar com os Vipers, sobre os
motivos que o fizeram voltar. — Ela me olhou de soslaio, o lápis forte em
volta dos olhos escuros. — Estão tentando adivinhar.
— Que tentem. — Deixei de lado, mas Thomaz não parecia disposto e seu
ego às vezes lhe subia fácil demais à cabeça.
— É bom que vejam Conrad conosco e entendam que não há lugar para
coitadinhos aqui. Esta universidade tem nome, tradição, e é absurdo que
qualquer merdinha sem ter onde cair morto entre por aqui e se sinta algo
importante.
Apesar de não admitir, eu sabia por meios não muito decentes que a família
de Thomaz estava falida, mas eles ainda tinham um sobrenome forte, um
brasão que parecia valer mais do que qualquer bem, e o faro para gente
importante e talentosa. Se alguém sem dinheiro tivesse algo a oferecer, eles
poderiam facilmente fingir que a pessoa era do círculo deles. Se tivesse um
sobrenome poderoso em qualquer indústria que fosse, seria bem aceito, mas
qualquer coisa fora disso não valia nem mesmo uma segunda olhada. Bella
não era muito diferente, mas eu tinha certeza de que era a influência de
Thomaz sobre ela que a deixara tão arrogante. Ainda assim, com todos os
defeitos do mundo, ambos me acolheram e, por isso, e pela minha história,
quando meus olhos fitaram os do meu melhor amigo, ele soube que tinha
falado merda.
— Não foi o que quis dizer, você sabe. Vou ajeitar o telão. — E
— Nunca me senti melhor. — Era verdade. Cada vez que meu ódio era
ativado, cada vez que a possibilidade de pisar em quem havia acabado
comigo surgia, eu só sabia me sentir disposto a ir mais e mais longe.
— E, sobre o que você contou, quando vai… — Ela ia perguntar algo que
não deveria em voz alta e eu tirei sua mão de mim, fazendo Bella prender a
respiração e encerrar a pergunta.
— Nunca fale disso, ainda mais em um ambiente aberto como este. E as
coisas vão como devem ser. A noite da festa do tal torneio está chegando,
você vai saber em breve o que é uma
— Ok, se você diz… Estou ansiosa para experimentar, dizem que transar
com ela no sistema é… — Eu a interrompi de novo.
Eu não a respondi. O máximo que fiz foi sorrir de canto, sabendo que ela
tentaria o seu melhor e que, a qualquer hora, eu poderia precisar daquela
vantagem da nossa amizade, mas não queria nenhum sentimento envolvido e
sabia o que uma Supernova poderia fazer. Era melhor dar algumas amostras
de presente para que ela e Thomaz consumissem juntos, assim o risco de
Bella me olhar diferente cairia drasticamente.
Traga a estrela.
23h50.
Era inevitável ficar feliz sabendo que, além de me fazer rico, eu teria provas
o bastante para foder com ele, caso fosse pego.
Pensando nisso, me peguei listando o que faria mais tarde para matar hora,
antes de encontrá-lo. Era hora de ver minha mãe, hora
de mostrar à cidade que eu estava de volta. Não precisava mais me esconder
ou abaixar a cabeça. Eu não era mais o garoto que todo mundo odiava, ou
ainda era, mas não estava nem aí.
— Eu sabia que ela viria. — Menos de uma semana dentro daquelas paredes
e eu já sabia de tudo da rotina deles.
— Como?
— Porque meu irmão está ocupado demais fodendo com uma líder de
torcida para cuidar da própria namorada.
Sempre foi assim. De algum jeito sobrenatural, Scarlet sempre sentia quando
eu a olhava e, daquela vez, mesmo com todo aquele tempo de distância, não
foi diferente.
O fogo no meu peito cresceu ao pensar em como ela ficaria sem reação e
indefesa, toda suja, fedendo, marcada. Seria fascinante ver como todos
assistiriam àquela cena. Em como se orgulhariam de ver que eu era o vilão
perfeito para aquele teatro que armaram com tanto custo.
E ao meu sinal, com o vídeo que Thomaz passou o final de semana editando
enquanto Scarlet estava reclusa no quarto de Isaac, as paredes de tijolo
antigo do refeitório viraram uma grande tela onde, com o som engraçado de
algo gosmento caindo, ela era vista desmaiando e, em uma montagem
malfeita, virando merda ao chão.
Mas ela só ficou sentada ao som dos risos e dos olhares curiosos.
Era fresco, limpo, intenso. Era ela, sua personalidade, sua essência. Agora,
anos depois, ela tinha uma nota mais madura, algo a ver com o cigarro que
descobri ser seu novo vício. Ainda assim, eu adorava, odiava, queria
arrancá-la daquele pedaço meu que ainda sentia falta, e com essa vontade
berrando em cada célula minha, eu não pensei duas vezes antes de arrancar o
plástico do balde.
A mistura de terra, água e merda pareceu ainda mais nojenta quando ergui o
balde e o despejei sobre a cabeça dela e, finalmente, ganhei uma reação.
O grito de Scarlet atingiu meus ouvidos e meu coração. Era como uma
droga.
Eu adorei. Queria que ela se lembrasse para sempre que, se ela atormentava
minha existência, eu foderia com a dela duas vezes mais.
O riso em volta de nós foi ainda mais cruel, mas eu não ri.
Não era a graça que eu queria, mas ainda assim, estava satisfeito quando ela
levantou e me encarou, tremendo.
Dei dois passos para trás, mostrando todo meu nojo no olhar que dei de cima
a baixo nela e larguei o balde.
— Agora você tem o cheiro certo — disse em um tom de voz baixo e calmo
conforme a via entender o que eu tinha feito.
As mãos rentes ao corpo, fechadas em punho. Os olhos com uma raiva sem
igual.
Ela não tinha mais medo de me encarar como nos dias anteriores.
E quando achei que ela gritaria, que surtaria, que sairia correndo, ela abriu o
zíper da jaqueta. A primeira peça foi ao chão.
Depois a camisa. E, maldição, com todo aquele tempo, Scarlet ainda não
tinha aprendido a usar sutiã.
deu meia-virada para olhar para trás e ver o rosto das pessoas que a
apontavam.
— Agora eu sei por que o Prince a esconde — alguém gritou e fez a raiva
aquecer meu sangue de novo quando lembrei que meu irmão tinha livre
acesso à Scarlet daquele jeito.
— Posso estar fedendo agora, mas nós sabemos quem é o merda aqui, e não
sou eu. — Sua voz era mais firme do que eu
esperava ouvir, mas ainda assim baixa demais para que outro alguém
escutasse.
— Tem razão, é o cara com quem você fode que é o merda da situação, você
só está suja assim porque fica tempo demais com ele… — E ao final da
minha fala, surpreendendo a todos, inclusive a mim, a mão dela veio firme,
aberta, e deu um tapa estalado no meu rosto.
Aquela humilhação pública deveria bastar, mas era só o começo. Foi ela
quem me ensinou que eu era fascinado pela destruição e, por isso, talvez, eu
nunca fosse capaz de deixá-la de lado. Por isso, talvez, fosse eu quem
precisasse acabar de vez com ela, assistindo a cada pedaço se partir. Ou só
de vê-la por aí distribuindo sorrisos para o desgraçado do meu meio-irmão,
eu sabia que seria ela a me destruir.
Como o bom aluno que era, frequentei toda a minha grade daquele dia,
anotei tudo o que precisava das matérias, e assim que minha última aula se
encerrou, fui direto para o meu quarto.
Meus últimos dias na Prince University foram cheios, dentro e fora do meu
quarto. A ausência de sono era a culpada em grande parte, mas sabia que
naquela noite eu dormiria o sono dos justos.
Separando os pacotes com os comprimidos azuis das Stars e os roxos com
Supernova, guardei tudo na mala, sabendo que aquele estoque na minha
faculdade anterior rendia pelo menos quinze dias e segui para ver minha
mãe.
Meu Mustang GT era preto, com duas riscas laterais brancas e finas de cada
lado, e outras duas mais grossas que iam do capô até o porta-malas. Com
algumas modificações que fiz depois de comprá-lo com o primeiro dinheiro
decente da minha produção, ele ficou perfeito para correr. Não era o modelo
mais novo, mas nunca
A viagem que daria uma hora e pouco na velocidade permitida foi reduzida a
quarenta e poucos minutos comigo pisando fundo no acelerador. Quando as
ruas conhecidas surgiram à minha vista, senti como se houvesse uma camada
de lava resfriada e dura sobre o meu peito. Nada poderia me atingir.
Conferindo as horas no relógio, esperei às seis da tarde e notei que tinha algo
errado ao não ver ninguém saindo, levou mais uma
hora e meia até que minha mãe saísse com o uniforme do trabalho gasto,
rosto cansado e desânimo sobre os ombros. Mesmo estranhando, tentei dar
meu melhor. Desci do carro, batendo a porta e a chamei.
Ela também tinha cabelos escuros como eu, mas os olhos claros de minha
mãe eram tempestuosos e envoltos em rugas, testemunhas de tempos nada
gentis junto da falta de sono e de dinheiro.
— Bem. Não sabia que viria hoje. — Ela me abraçou e eu a guiei para a
porta do passageiro do carro.
— É, mas eu vim, e quero saber por que está trabalhando até tão tarde. —
Não era uma pergunta.
O sorriso amarelo que ela me deu quase esgotou meu bom-humor por vê-la.
— Mas tem que mexer. É seu, mãe. — Me controlei muito para não
transformar aquilo em uma bronca, mas ela já tinha se magoado.
— São muito bons. Tenho ficado mais disposta, e consigo entender tudo. —
Aquilo era um bom sinal.
A criação da Star[2] veio quando notei que minha mãe tinha alguns
problemas graves de concentração que custaram alguns empregos, e junto de
traços depressivos, a vi ficar dependente de um bêbado desgraçado. Com
toda a merda que aconteceu, no meu tempo recluso, só me restou estudar.
Devorei cada livro de química possível, fiz todos os cursos disponíveis, e
vendo como minha mãe tinha se comportado com cada medicamento que ela
tentou ao longo dos anos, estudei, pesquisei e descobri algo novo.
Chamei-a de Star. Era a minha estrela da sorte, até cheguei a tomar algumas
vezes para absorver melhor alguns conteúdos. Era uma versão mais limpa e
potente do queridinho do mercado, talvez, pelo menos até o momento,
menos perigosa, e se misturada com alguns ativos recreativos, se
transformava na Supernova. E a Supernova era algo que a massa que
adorava uma boa viagem
— Ok.
— E, mãe…
— Estou de volta à cidade, isso quer dizer que se eu souber que você anda se
acabando por causa daquele desgraçado, vou acabar com ele, certo?
— Conrad…
Eu não era mais um garotinho frágil, e não seria mais refém do dedo podre
que minha mãe tinha para homens.
Ouvi atentamente quando ela contou as raras ocasiões em que viu meu pai, e
dei minha opinião quando ela disse que estava pensando em comprar uma
casa. Se realmente havia guardado todo o dinheiro que eu tinha dado para ela
nos últimos dois anos, ela tinha um bom valor.
— Faça como achar melhor, se precisar, posso levá-la para visitar algumas.
— O que foi?
Deixei minha mãe em casa e, assim que ela entrou pela porta, tirei um
cigarro do maço. Fumando, dirigi pela cidade, reconhecendo ruas que há
muito eu não andava. Conferi o novo endereço do meu
Segui em frente, mas quando vi que o final da rua daria no velho parque, que
agora estava desativado, fiz meia-volta e deixei mais uma memória trancada
para trás.
Não tinha mais por que enrolar, eu chegaria mais cedo no compromisso, mas
até aí, meu distribuidor não tinha motivos para reclamar, eram negócios de
pai para filho.
A primeira vez que eu fui até ali foi com Thomaz, Bella e nosso antigo
grupinho para fumar e beber escondido. Apanhei que nem um filho da puta
quando voltei para casa bêbado e minha mãe não
estava. Aquele era o tipo de memória que não ia embora, mas eu já tinha
superado.
Agora, aquele lugar não parecia atrair muita gente. Com toda a floresta
crescendo em volta e pelo estado das paredes e do teto, eu duvidava que
alguém apareceria, ainda mais em uma noite escura e com um céu nublado
como aquele.
— É costume seu fazer esse tipo de coisa? — Ignorei-o e traguei mais uma
vez, pegando o cigarro daquele jeito que parecia irritá-lo, soprando a fumaça
na direção em que ele vinha.
— Não. Mas você ainda é meu filho, e não vou te colocar em contato com
um traficante, a menos que não tenha escolha.
Aquilo me divertiu. Quis rir. Agora ele se importava pelo fato de eu ser seu
filho?
— Não vou manchar sua reputação, pai. — Ele fingiu não perceber o
sarcasmo na minha voz.
Meu pai havia envelhecido bem, ainda tinha poucos cabelos brancos, o rosto
sempre perfeitamente barbeado, e a pose de quem tinha dinheiro e sabia do
seu poder.
Herdei dele o bom gosto por anéis pesados, o cabelo escuro e a crueldade.
— Você sabe onde fica meu dormitório. Quero o dinheiro até domingo de
manhã na minha porta, ou nunca mais verá um grama sequer do que eu faço.
— Atirei a mochila contra seu peito. — E
— Conrad.
— Virando para frente, segui meu caminho, pensando que poderia deixar o
carro ali e caminhar de volta, talvez aquele fosse o único jeito de relaxar
depois daquele minuto de tensão em que, com certeza, eu mostrava que não
era um perdedor.
Meu pai aprenderia pela dor, e quando ficasse dependente de mim, mesmo
que fosse no bolso, eu o quebraria também. Ele me
devia. Devia quase mais que todo mundo, talvez só não tanto quanto Red.
Eu sabia onde era o dormitório dela, e mesmo que não soubesse, era
impossível ignorar as janelas abertas e a garota de cabelos ruivos compridos
com metade do corpo para fora, tomando chuva no rosto.
Ela era linda pra caralho, sempre foi e não tinha a mínima noção disso.
Era mais fácil odiá-la, era mais fácil sentir raiva, do que dor, do que mágoa,
do que tristeza.
Pensei que era por medo e quase sorri, mas no último segundo, ela deu o
dedo do meio para mim e fechou a janela.
scarlet
se você não consegue lidar com um coração como o meu, não perca seu
tempo comigo. se você não está disposto a sangrar, não, oh. se você não
consegue lidar com os enforcamentos, as mordidas, o amor, o sufocamento
até você não aguentar mais, não aguentar mais, vá para casa.
highschoolsweethearts,melaniemartinez
Tentei passar despercebida quando meus pais morreram porque sabia que
Susan precisava de uma assistência maior. Tentei
engolir tudo o que tinha na garganta e no coração porque via vovô lutando
com a missão diária de superar o luto e educar e criar duas adolescentes.
Quando Conrad surgiu, eu jurei que estava salva. Jurei que, pela naturalidade
das coisas, a solidão que eu sempre senti tivesse seus dias contados e eu
poderia secar minhas feridas ao sol, mas de repente, tudo foi por água
abaixo.
Pensar em feder para sempre, ou em ser apontada por aquele ataque aberto e
tão exposto me consumiu as entranhas por toda a tarde, e mesmo com o
choro preso na garganta, mesmo sentindo as lágrimas prontas para sair, eu
não conseguia chorar.
Estava pagando por um dia ter amado a pessoa que arrancou tudo de mim.
Isaac apareceu naquela tarde e eu não consegui tocá-lo. Não consegui ficar
perto. Tinha medo dele sentir aquele maldito cheiro, ou se descontrolar a
ponto de me silenciar, e daquela vez eu realmente queria brigar.
Queria revidar, queria fazer Conrad pagar, queria provocá-lo e mostrar que
eu não era mais a garotinha boba que ele deixou para trás. Agora seria olho
por olho e dente por dente, mesmo que acabássemos banguelas e cegos.
— Quero revidar. Conrad não agiu sozinho, os Vipers estão juntos nessa, ele
só apertou o botão.
— E você tem alguma ideia? — Meu namorado com o cabelo loiro bonito
colocou os olhos sobre os meus e eu sabia que sua
mente estava pensando em algo relacionado à violência física, mas eu não
era tão extrema.
— Acha que consegue sangue de porco? — Minha voz foi tão firme que vi o
sorriso no rosto de Isaac surgir.
— Sangue de porco?
— Amanhã. Eu não vou mais ficar presa aqui. Sábado nós temos uma festa
para aparecer e se for para ser lembrada por algo, não será por ter merda
jogada em mim.
Isaac veio até mim e, mesmo insegura, deixei que ele me beijasse.
Minutos depois, com um café na mão, sentada na parte mais privada, plana e
secreta do telhado, abri meu velho blackbook, vendo os desenhos que tinha
feito há tanto tempo de Conrad e não tive coragem de jogar fora.
De lá para cá, as coisas tinham mudado. Eu não era mais uma artista, mas
ainda era daquele jeito que gostava de me expressar quando parecia que nada
mais funcionava.
E daquela vez, meu plano foi arquitetado no desenho, no porco gigante com
os olhos negros, olhos dele.
Consegui o que
você queria e
descobri
que
jogar.
É a oportunidade perfeita.
Certo, deixe o
conta. Só arranje
gente disposta a
ajudar a fazer
uma
bela
bagunça.
Estamos sempre
dispostos. ;)
Preciso
treinar,
amor.
Te
vejo
depois.
Ver Conrad do lado de fora naquela noite de quarta fez eu me sentir em uma
jaula. Não que já não me sentisse em uma, mas agora nem mesmo sentir a
chuva eu podia mais, e na manhã seguinte, depois de conseguir cochilar
meia hora, decidi que tiraria o dia para cuidar do plano daquela noite. Fui
atrás de pincel, cetim e agulhas, e depois de fumar dois maços de cigarro e
beber um copo
Estamos
te
esperando
no
corredor
dos
Viper.
Respirei fundo, encarei meu reflexo no espelho e, me dando uma dose extra
de coragem, peguei as coisas e desci, sabendo que não poderia voltar atrás.
Cumprimentando-me com um beijo rápido, Isaac saiu da frente para que eu
visse os rostos do resto do time de futebol. Todos corresponderam ao meu
aceno fraco e me senti menos esquisita por isso.
Ele adorava ferrar com os Vipers, aquilo seria sua cereja do bolo.
— Acho que vai gostar de ver o que temos. Essa porra fede muito, é sério —
ele reclamou, mas virou para espiar pelo corredor e avançou sem falar nada.
O cheiro era nojento, mas puxei a blusa sobre o nariz, passei a respirar pela
boca e trabalhei rápido, quando vi, a faixa escrita Conrad Prince sobre o
porco estava perfeita, e eu já tinha um pincel sobre a mão. Mergulhei no
primeiro balde de sangue próximo, usando do resto do líquido viscoso e subi
numa poltrona, escrevendo sobre a parede de pedra:
Estava claro que ele não havia gostado, mas eu estava pronta para contornar
aquela situação.
— Vamos.
Era o que eu precisava. Uma pequena folga, um canto para não pensar
demais.
Ele ainda dormia. Como sempre, eu havia dormido depois dele, e acordado
antes dele sonhar em levantar. Meu namorado bonito parecia ter bons
sonhos, e nua, depois de mais uma noite cheia de amassos intensos, tentei
me levantar sem fazer nenhum barulho e vesti minhas roupas.
— Preciso ir, tenho aula no primeiro horário hoje. Além de que, é sexta.
Sabemos como são suas sextas…
— Você sabe que posso trocar qualquer coisa para uma noite dessas, e
podemos fazer isso melhorar. — Eu sabia, Isaac nunca escondeu o quanto
queria transar comigo.
Estávamos há anos brincando com mãos e boca, mas eu ainda não queria,
não me sentia completamente segura de ir até o final, e não sabia o porquê,
pois era natural acabar sem roupa dentro daquele quarto.
— Agora não temos tempo. — Beijei a cabeça dele, ri quando ele tentou me
segurar, mas me soltei em segundos e ajeitei minha mala nas costas. — Não
vá perder a hora, te vejo no almoço?
— Certo.
— Scar.
Dei a sorte de não cruzar com nenhum Viper popular no meio do caminho
naquela manhã, mas assim que coloquei os pés no andar do meu quarto, meu
peito congelou, e todo meu corpo paralisou. Havia uma grande plateia ali e
um único canto do corredor livre para passagem, e foi por ele que eu vi a
frase no fundo do corredor.
Era uma frase de Darcy, eu sabia, tinha decorado a porra do livro favorito
dele, e antes que desse por mim, minhas pernas descongelaram. Meus passos
até meu dormitório foram vacilantes, meus olhos estavam cheios d’água,
turvando minha visão, meus dedos estavam segurando as alças da mochila
com tanta força que poderiam arrebentar a costura.
O cheiro de queimado atingiu meu nariz assim que cheguei à porta, meus
olhos viram a bagunça que era meu maior refúgio dessa vida e eu quis
morrer.
Toda e qualquer emoção que eu não tenha dito ou escrito em todos aqueles
anos estavam presas ali. Ele tinha tudo o que mais me importava e ainda me
fazia humana nas mãos.
Notei água vindo no banheiro também e, entrando um pouco, consegui a
visão do chuveiro faltando.
Aquilo era além do permitido, era além das regras que eu conhecia, mas tudo
me fazia crer que agora não tínhamos mais um limite e esse jogo era
perigoso.
O contexto dela agora seria terrivelmente diferente, mas como Darcy, eu não
sabia como aquela merda toda havia começado, mas estava no meio dela,
enterrada até o pescoço e, de algum jeito louco, não ia me permitir cair.
Não mais.
scarlet
eu sei todas as suas razões para me impedir de ver. tudo está realmente uma
bagunça, mas agora eu estou partindo. todos nós só estávamos sonhando.
d r e a m s , i m a g i n e d r a g o n s cinco anos atrás
Eu não sabia dizer, mas parecia que eu tinha engolido uma porção de grilos e
eles não paravam de pular dentro do meu estômago. Eu tinha quatorze anos,
nunca havia sido beijada, ou
Será que ele sabia o quanto aquilo era diferente e especial para mim? Eu não
tinha ideia, mas sabia que ele já havia feito aquilo algumas dezenas de vezes,
afinal de contas, ele era ele, e eu não era boba de achar que com todo aquele
magnetismo e poder, o garoto tinha se privado de qualquer experiência.
Gostos dos quais ele não se sentia confortável em compartilhar com outras
pessoas.
— Repete. Como foi que ele te chamou para hoje? — Susan me chamou de
volta para a realidade quando chegamos ao parque e não o vimos.
— Susan, pare, por favor. — Olhei em volta com as mãos nos bolsos da
jaqueta jeans que combinava com o short que vestia. —
Era uma afronta, mas tentei não cair na dela. — Por que não deu meu
número para ele?
Minha irmã também não queria decepcionar, mesmo que a maquiagem que
ela tenha escolhido naquela noite a fizesse parecer mais velha e menos
bonita do que realmente era.
— Vocês estão esperando por Conrad também? — Foi assim que Isaac
Prince nos cumprimentou pela primeira vez. — Você deve ser Scarlet. — Ele
não me beijou, não me deu a mão, só me mediu de cima a baixo. — E você,
Susan. — Foi a vez da minha irmã ser inspecionada pelo garoto que cheirava
à colônia cara e escondia alguma coisa no olhar.
— Ah, a menina Simons, né? Ela até convidou, mas não vai rolar. Minha
mãe morreu no ano passado, então estamos todos meio que de castigo este
verão — ele comentou sem parecer sentir tanto a morte da mãe.
— Sabemos como é perder alguém assim — minha irmã completou.
— Sinto muito por sua mãe, Isaac. — Minha voz saiu num sopro baixo.
— Está tudo bem, ela está melhor assim, sabe? O câncer a pegou de jeito, foi
rápido demais para que pudéssemos fazer algo.
O bom é que o foco se virou para o futuro, ir para a Prince University, ser
alguém na vida do qual ela se orgulharia. Vocês já sabem para onde vão?
Pensei ter arruinado o humor dela cedo demais e que aquela noite acabaria
ali, mas, por sorte, a voz de Conrad acendeu a chama dentro de nós.
— Olá, Red.
Não havia outra possibilidade. Ergui a mão, toquei a sua, sentindo a pele
macia, fria, tão bonita quanto qualquer desenho que eu tinha feito. Quando
meus dedos ficaram sobre os seus, ele os cruzou e me puxou com gentileza.
— Até depois — ele disse para nossos irmãos e nos colocou em movimento.
Susan me mataria.
Mas eu não teria feito diferente, e por seu meio-sorriso ao sair de mãos
dadas comigo, eu sabia que ele também não.
Soltou minha mão, fazendo meu estômago afundar ao sentir falta do calor
gerado entre nós, e sem me olhar, deu a ficha para o homem que controlava a
brincadeira.
— É?
— Você entendeu. — Parecia que aquilo era algo estrondoso, mas para mim
era normal.
Nós comemos algodão doce, giramos nas xícaras malucas, brincamos nos
carrinhos de bate-bate, andamos na montanha-russa pequena, mas intensa, e
eu precisei fechar os olhos e esconder o rosto no ombro dele quando notei
que íamos mais alto.
Foi como ir ao céu e voltar a ter o braço de Conrad ao meu redor, me
puxando para si, parecendo querer me proteger.
— Qual o problema?
— Sem problemas. Não é nada de mais e tem outro lugar para ir.
Conrad daquela vez não pegou minha mão, mas eu o segui lado a lado, ainda
encantada com tudo o que tinha acontecido naquelas duas horas juntos.
— Não é proibido?
Meu coração tropeçou e senti meu rosto esquentar, mas não deixei Conrad
notar.
— É um pouco óbvio.
— Nem sempre. — Ele riu e eu quis ver, mas resisti ao último até estar no
topo do prédio.
— Não — menti. Queria dizer que tinha sido difícil passar tanto tempo sem
olhá-lo, mas com certeza ele me acharia maluca.
— Ótimo.
— Que nunca mais parei para ver o céu desde que perdi meus pais —
confessei no mesmo tom baixinho — e você?
— Você não quer saber de verdade. — Mal sabia ele que eu queria saber
daquilo e de todo resto. Queria ser capaz de montar de desmontar o quebra-
cabeça Conrad Prince de olhos fechados.
— Flutuando?
— Morto.
— Porque seria mais fácil. E eu desconheço alguém que tenha voltado para
dizer que há uma consequência.
Encaramos aquele pano escuro cheio de brilhantes por mais algum tempo
antes dele me dizer baixo:
— Desculpe.
— Você não tem culpa — rebati rápido demais. — Ninguém tem. — Minhas
palavras se perderam no meio do nó da garganta.
Conrad já me olhava.
Depois de dizer isso, com os olhos ainda nos meus, Conrad aproximou a
mecha do próprio rosto e cheirou.
Aquilo era algo novo, eu nunca havia experimentado, mas era bom.
Era como queimar, mas sem ser consumido pelo fogo. Eu gostava.
— Eu não sei sua história, Conrad. Mas se um dia quiser me contar, ficaria
honrada, e não contaria para ninguém. — Era uma promessa.
— Eu sei, Red… — Pegando minha mão, ele a puxou para cima do seu
coração, e aquela foi a primeira vez, em anos, talvez em toda a vida, que eu
tenha me sentido em casa.
Doeu, mas engoli aquilo mesmo que sangrasse por dentro e voltei ao parque
para procurar por Susan, sabendo que minha irmã acabaria comigo por todo
o caminho para casa, mas nada poderia
me atingir, já que a surpresa do dia seguinte coroava tudo o que aquela noite
havia sido de boa e mais um pouco.
— Sou eu. — Levantei, tapando o sol com a mão para poder enxergá-lo
melhor.
Minha irmã surtou. Ela sabia de onde tinha vindo antes mesmo de ver meu
sorriso.
Mas Susan podia colocar a casa abaixo que eu não poderia me importar
menos.
Conrad não era indiferente a mim e aquilo era, sem dúvida alguma, tão
grandioso e intenso quanto o nascimento de uma galáxia. Nada em mim
poderia resistir à beleza do que crescia no meu peito.
quando eu tinha 16 anos, os meus sentidos me enganaram. pensei que tinha
gasolina nas minhas roupas. eu sabia que alguma coisa iria sempre me
governar. eu sabia que esse odor era apenas meu.
tudo que você tem é o seu fogo e o lugar que você precisa atingir.
A humilhação de ver aquele porco podre envolto em uma faixa com meu
nome, passando no telão do campo, foi algo que pensei que não sentiria. De
fato, eu nem mesmo cogitei a possibilidade de
algum deles ter coragem de retalhar, mas quando cheguei à sala de descanso
dos Viper e vi a frase brilhando na parede, fiquei mais desacreditado ainda
por ver a mão de Scarlet naquilo. Se ela queria brincar, eu estava pronto.
Não era para ela ter qualquer tipo de controle sobre mim e o recado estaria
claro no dia seguinte. Scarlet podia achar que estava no mesmo degrau que
eu, mas perceberia logo que fugir era a única opção já ficar para lutar só
causaria mais dano. E eu soube exatamente onde atingir graças ao
presentinho que havia roubado do quarto dela naquela tarde.
— Não é da sua conta. — Não era minha intenção, mas sabia que quem não
me conhecia e ouvia nossa conversa me acharia rude.
— Reclame de novo e peça para a equipe de limpeza vir uma segunda vez,
porém, isso aqui não é problema seu, nem como eu lido com Scarlet.
Dei as costas a ela e já ia para a porta que dava para o corredor do meu
quarto, quando ela me chamou e me obrigou a parar.
— Achei que você estaria mais disposto a ferrar com seu irmão do que com
a garota Wright, e não sou a única…
— É você quem está dizendo. — Bella deu de ombros, tão venenosa quanto
eu.
Não voltei para respondê-la. Bella estava errada, não tinha nada a ver com
estar ou não com Scarlet, e eu provaria isso mais
tarde.
De fato, eu não errei. Não estava preparado para ver aquilo, ainda mais
quando era um desenho de mim, logo na primeira página.
Por que ela tinha aquilo quando namorava meu meio-irmão por tanto tempo?
Ali, Scarlet ainda era boa com cores, mas foi só passar algumas páginas que
percebi o quanto ela havia se perdido no próprio caos. Alguns desenhos
tinham frases, palavras, mas boa parte deles era uma completa bagunça
laranja, vermelha e preta.
Eu sabia o motivo.
Eu era o motivo.
Ela ainda desenhava minhas mãos, mas não tinha mais nada dos meus olhos
por ali.
Será que eu a assustava? Será que ela tinha pesadelos com eles?
Foi por ela que eu fui embora, e ela era uma mal-agradecida do caralho, uma
traidora.
Ele não conhecia Scarlet, e eu usaria aquilo a meu favor. Por causa disso, no
dia seguinte, sabendo que ela não havia consertado o chuveiro que eu tinha
quebrado, fui até ela.
aviso de Bella correu rápido entre as garotas e, para minha sorte, ninguém
era amigo o bastante de Scarlet para avisá-la, ou se era, o medo que Bella
causava era maior do que qualquer pingo de empatia. Por conta disso,
quando adentrei pela porta no banheiro revestido com pequenos azulejos
brancos e armários de tom verde-claro, cheio de vapor e do cheiro do xampu
dela por todo canto, soube que não teria nenhuma intromissão.
Era noite dela se exibir ao lado do meu irmão. Era dia de engolir os dois
sendo vendidos como o casal modelo por meu pai, e obviamente eu não
estaria presente, mas o gosto de deixar Scarlet desestabilizada e pensando
em mim pelo resto da noite foi mais forte do que eu.
Seu cotovelo esbarrou no meu peito quando ela o fez e a onda de choque foi
sentida por nós dois. Scarlet grudou as costas no armário, e eu acabei com o
último espaço que havia entre nossos corpos, grudando meu quadril ao dela.
A ruiva, tentando não parecer assustada, manteve o queixo erguido para
demonstrar que não tinha medo.
Era um desafio.
— Gostou? — provoquei.
— Se você gritar, vou fazer uma cena, Red. — Com a mão direita, toquei
seu queixo com o indicador, fazendo com que ela erguesse o rosto para me
ver com clareza. Aquele toque ínfimo fez toda minha mão formigar e, no
meio daquela iluminação de merda e do vapor, não sabia dizer se seus olhos
eram verdes ou se estavam naquele tom amarelo bonito que eu gostava
quando mais novo. —
Já pensou que legal. meu irmão saber que você estava aqui comigo, em uma
situação dessa?
— Em qual situação você acha que… — Antes dela continuar sua frase
vociferada, tirei a mão de seu queixo e, violentamente,
O tecido desceu fácil, Scarlet tapou os seios, enquanto eu olhava para baixo
e a prendia com a pressão contra seu quadril. A visão daquilo,
surpreendentemente, foi melhor do que antes, e seria meu tormento por mais
alguns dias. O corpo de Scarlet tinha se desenvolvido bem até demais. Os
seios cobertos pelo braço caberiam perfeitamente nas minhas mãos, a barriga
com dois pequenos vincos estava encolhida e eu vi a joia do piercing no
umbigo brilhar. Não consegui resistir e abri um sorriso pela novidade, mas
saboreando canto a canto da visão que tinha, sentindo a respiração dela
acelerar e meu corpo vibrar numa vontade alucinante de tocá-la direito,
soube que era perigoso continuar com aquele jogo, por isso fiz meu melhor
para não encarar demais a calcinha preta que abraçava o quadril dela tão
bem.
— Meu irmão gosta dessas rendas? — provoquei, respirando de propósito
contra sua boca.
— Adora, mas acho que deve ser de família, você parece não ter superado a
última vez que me viu usando uma dessas. — Eu
O sabor da provocação era doce na minha boca, e ver Scarlet não correr do
jogo me deixou com um tesão louco. Daquela vez, não fiz questão de me
segurar tanto, e conforme ficava duro, não a poupei nenhum pouco de saber
do meu estado.
Fui eu quem quis me afastar dessa vez. Ardeu no mais profundo do meu ego
ouvir aquilo. Mas Scarlet segurou minha
Scarlet ficou na ponta dos pés e aproximando a boca do meu ouvido, disse
baixo:
— Você fodeu meu coração, mas seu irmão — ela riu —, eu nem sei te dizer
quantas vezes ele me fez esquecer que você existia.
Minha mão foi direto para o seu pescoço, eu a empurrei contra os armários,
batendo com a cabeça dela contra o metal. Ela sufocou um grito, mas me
encarou como se estivesse adorando me ver daquele jeito.
— Você é uma mentirosa terrível, Red. Se ele é tão bom assim, por que é
que você ainda me desenha? Não vi menção alguma do meu irmão naquelas
páginas. — o sorriso dela morreu.
— Eu vou te tocar. Não aqui, mas vou. E quando fizer, você vai implorar
para eu não parar.
A primeira era jogar a toalha por uma hora e foder com ela ali com os dois
cheios de ódio. Seria do caralho, provavelmente a melhor transa de todas,
mas eu ainda queria brincar com a cabeça dela. Queria que Scarlet não
conseguisse virar a esquina sem ter medo de me encontrar do outro lado,
tanto por sofrer uma
— Nunca diga nunca, Red — soprei contra sua boca e fiquei encarando-a.
Ela fechou os olhos como no passado, sua boca se abriu um pouco mais.
Ela não era mais a garota de quatorze anos bêbada no banco do meu carro.
Ela era uma filha da puta que merecia pagar junto com o lado que havia
escolhido.
— Espero que meu irmão não se importe que todo mundo veja melhor o que
ele tem, já que você não pareceu nenhum pouco desconfortável antes. —
Minha voz saiu como um murmúrio, e ela abriu os olhos. A mágoa brilhou
neles, mas durou pouco, lá estava o ódio de novo.
Ela me empurrou, não se preocupando nenhum pouco em se cobrir, não pude
deixar de notar algo brilhando nos mamilos e só então notei os piercings.
— Se você ainda não entendeu — falei quando notei que ela não ia se mover
—, é agora que você sai.
Ela fechou os olhos mais uma vez, tapou os seios com o braço de novo
mesmo eu já tendo visto tudo, e respirou fundo antes de me encarar com o
maior desdém do mundo.
— Deve ser uma merda para você saber que só vai poder olhar mesmo, não
é? E, se você está aqui para ver uma segunda vez, é porque gostou muito do
que viu antes. — Ela começou sua caminhada, mas parou antes de sair, e
mantendo o resto do orgulho que tinha, disse: — Espero que saiba que não
importa com quem você transe, lá no fundo sempre vai se perguntar como
seria comigo, e se você quiser saber, só o seu irmão poderá te dizer.
Quando ela saiu do banheiro, ouvi os assobios e os gritos pelo corredor, mas
nem depois de tentar me conter a raiva foi embora.
Foi por isso que soquei a porta do armário dela e fiz questão de deixar a
merda do vestido laranja pegando fogo lá, junto de todo e qualquer desejo
que eu poderia ter por ela, como se meu ódio pudesse consumi-la como as
chamas faziam com o tecido, antes de sair dali.
— Ei, Prince! — Uma garota de óculos de grau, cabelo azul e que com
certeza não era uma Viper me encontrou no corredor, fumando meu terceiro
cigarro seguido. Eu a medi de cima a baixo
— Ok.
— A decoração é por conta da casa — falei, pulando suas pernas para ir até
o banheiro lavar as mãos. — O que quer?
— Você tinha razão. Eu é quem tenho o maior interesse pela Star. — Quase
bati palmas pela evolução de admitir que eu estava certo. — Mas, pela
Supernova, não. Tem alguém maior e mais perigoso próximo de nós que tem
interesse nela, e eu não quero você com mais problemas, é por isso que
tomei a frente das coisas.
Apoiei o ombro no espelho ao lado da minha estante, encarando meu pai,
tentando ler a mentira em sua voz, mas não a encontrei.
Meu pai me olhou com expectativa e, de fato, não achava ser mentira. Ele
gostava de se exibir nas horas vagas, eu só não imaginava que meu nome
estaria algum dia envolvido nesse papel.
— Eu acredito.
— Sem chance, só vou ter mais daqui, pelo menos, uma semana — me
desarmei. — Meu laboratório é pequeno, sou eu quem cuida de tudo
sozinho, então não adianta querer aumentar a produção e fazer alguma
merda no processo.
— Prudente. — Ele parecia não esperar aquilo de mim. — Mas eu estou aqui
para outra coisa também.
— O quê?
— Não quero.
— Farei o possível.
— Acenei para ele, indicando a saída, num sinal claro de que o queria fora, e
foi o que ele fez, saindo sem se despedir, fechando a porta a suas costas, me
fazendo anotar mentalmente que eu precisava trocar aquela fechadura logo.
Todos estavam saindo para o gramado, indo para a parte de trás do prédio,
para a floresta que naquela noite tinha tochas amarradas no tronco das
árvores para guiar o caminho da multidão.
Segui com o resto dos alunos até a clareira, vendo o palco armado, meu pai,
meu irmão e Scarlet lá em cima conversando
sair por baixo… respirei fundo e afastei o incômodo. Não era problema meu.
— Preciso subir. Jurei que estaria aqui para essa merda, depois encontro
você.
Enfiei as mãos nos bolsos da jaqueta de couro e, ignorando meu pai porque
não tinha o que gastar de palavras com ele, e louco para provocar meu
irmão, encarei Scarlet que tentava se esconder num meio abraço de Isaac.
Descaradamente, medi seu o corpo da maneira mais grosseira e sexual
possível, não fazendo questão de esconder que gostava muito de vê-la
usando o vestido esverdeado bem colado nos quadris, e não perdendo o
detalhe dos seios pesando no tecido graças às alças finas, dei um meio-
sorriso perverso.
— Esse vestido ficou melhor do que o que você ia usar. A cor te favoreceu,
Red. — Ela engoliu a respiração. — Só não é melhor do que aquela calcinha
preta, aquilo sim é um espetáculo. Você ainda está usando ou trocou depois
do nosso encontro?
Se ele me desse a brecha, eu o pegaria com todo o ódio que nutri por todos
aqueles anos e, com toda a certeza, se não me tirassem de cima dele, seria
capaz de matá-lo.
— Vocês dois, parem com essa merda agora mesmo — John mal moveu os
lábios quando nos repreendeu.
Seu rosto era uma máscara de ódio e frustração, seria de um prazer sem fim
quebrá-la.
Ele deu de ombros e, vendo que eu não seria mais um problema, se afastou
para ver algo com o DJ.
Scarlet não tirou os olhos de mim. Não do meu rosto, mas do resto do corpo,
como fazia antes. Claramente receosa, apreensiva, parecendo esperar meu
próximo golpe.
Fumei meu cigarro em paz, mas completamente consciente dos dois ali,
observando a maneira como meu irmão a segurava para si, e em como ela
fugia do meu olhar toda vez que eu a encarava diretamente. A tensão entre
eles, a conversa baixa.
Cheguei a ler os lábios dela um pedido para que Isaac não fizesse nada
comigo ali e quis rir. Não precisava da proteção dela, não queria que Scarlet
o fizesse desistir, porém Isaac era covarde o bastante para não me atacar em
campo aberto. A maior prova de
sua covardia, inclusive, era estar com Scarlet em seus braços daquela forma.
— Quem está pronto para mostrar que sua casa é maior que as outras?
O grito da plateia foi alto, a algazarra foi grande. John Prince, o hipnotizador
de massas, estava radiante e não pude deixar de notar os olhares de Isaac e
Scarlet. Meu meio-irmão sorria, admirando o próprio pai como um espelho
do seu futuro, comprando o discurso dele como todo mundo lá embaixo, mas
a ruiva? Apesar do sorriso no seu rosto, me surpreendi com a clareza que vi
em seus olhos.
Scarlet encarava meu pai sem uma capa de super-herói, e por quê?
Como poderia, se ele deu tudo a ela, se ela se manteve ao lado deles por todo
aquele tempo?
Algo me incomodou, mas não tive tempo de vasculhar minha mente naquele
segundo, já que fui anunciado.
Meu irmão foi todo orgulhoso até ele, e meu pai ergueu sua mão, como se
ele fosse o campeão dentro de um octógono. Todos os Lions e algumas
outras garotas de fraternidades diferentes gritaram para ele. — E, o primeiro
Viper da linhagem Prince, Conrad! — Eu não esperava por aquilo, mas todo
mundo em volta, até mesmo alguns Lions, gritaram por mim.
— Essa vai ser uma boa competição, mas vocês Birds e Badgers têm chance
de colocar o ego dos meus filhos no chão, hein? E não se esqueçam, o aluno
vencedor, que acumular maior pontuação, leva cinco mil libras. Já a
fraternidade que pontuar mais, ganha a taça dos campeões e mil libras para o
caixa da próxima festa. — Foi unânime, todos comemoraram. — Lembrem-
se que desonestidade e trapaça são inaceitáveis nessa competição. Se você
for pego, será suspenso e sua fraternidade será multada. E, sendo assim, que
o torneio comece!
A música começou a tocar de novo, meu pai abraçou a mim e meu irmão e
se virou para chamar Scarlet para a foto, mas antes que ela atravessasse,
passando por mim e por meu pai para chegar em Isaac, eu a peguei.
Passei a mão por sua cintura e prendi seu corpo ao meu lado, não dando
tempo de ela fugir quando o fotógrafo abaixo de nós disse: “diga xis”.
— Eu vou, mas antes quero saber, Red, vai pensar em mim quando foder
com ele hoje? Imaginando se sou maior, melhor…
Não consegui terminar minha frase, mesmo assim, fiquei feliz por ver sua
pele se arrepiar antes dela ser puxada por Isaac.
— Vem, Scarlet, porra. — O tom nervoso de Isaac fez o sorriso no meu rosto
se tornar genuíno, e eu assisti enquanto os dois se afastavam discutindo.
Era lindo ver meu irmão caindo sozinho, colocando todo o peso nos ombros
de Scarlet, desgastando aquela bosta de relacionamento que eles tinham. O
negócio cresceu tanto que, uma hora depois, com meu irmão e ela já tendo
bebido um tanto considerável, ambos gritaram um com o outro e ela foi
embora.
Ele não ligou. Foi Scarlet desaparecer no meio da multidão que Isaac
começou a conversar com uma loirinha que com certeza iria foder, e eu fui
atrás dela sem pensar duas vezes, disposto a começar minha tarefa de
mostrar que, mesmo depois de todo aquele tempo, mesmo depois de tudo
desmoronar, Scarlet ainda sentia algo por mim.
scarlet
e aqui estamos, nossa última noite vivos, e à medida que a Terra vai
queimando. oh, garoto, é com você que eu me deito enquanto a bomba
atômica se aproxima. oh, garoto, é você com quem assisto TV à medida que,
à medida que o mundo desmorona.
astheworldcavesin,sarahcothran.
Eu estava feliz demais. Tão feliz que o surto de Susan após a confirmação
que as flores vinham de Conrad não me causou nadinha, nem um pouquinho
de culpa sequer. E mantendo aquele
bom humor como uma cápsula protetora, organizei a casa toda, limpei a
mesa do jantar, só eu e meu avô comemos, e na manhã seguinte, não me
importei de cuidar do café da manhã também.
Susan não resistiu à fome e estava sentada bem atrás de mim, com a cara
inchada, me encarando como se pensasse um meio efetivo de esconder meu
corpo e não levar a culpa. Apesar de achá-la idiota, não podia julgá-la, já que
eu me machucaria tanto quanto, caso descobrisse o interesse de Conrad em
outra pessoa. Não era segredo algum para mim, depois de todo aquele tempo
observando-o de longe, que gostava dele, e agora conhecendo-o, as coisas
caminhavam numa crescente.
Ainda assim, fingi que sua cara de choro não era problema meu, que seu
olhar não me assustava, e organizei a louça limpa no armário, liberando
espaço no lava-louças para mais peças sujas.
— Filha, você pode me dizer quem foi que mandou as flores de ontem? — A
seriedade em seu rosto, o fato dele não olhar nos meus olhos quando
perguntou e o sorriso que surgiu no rosto de Susan, me fizeram pensar que
algo ruim estava chegando.
— Foi aquele garoto que me tirou do rio, vô. Conrad Prince, você o
conheceu.
— E você tem passado muito tempo com ele? — Ouvi a colher raspar no
fundo da xícara e quando notei, os olhos de meu avô estavam nos meus,
ansiosos pela resposta.
— E Scarlet sumiu com ele. Eu te contei, vovô, ele é bastardo, não é como o
irmão que tem berço. Conrad é o rebelde, anda com gente esquisita, fuma,
não é boa companhia para Scarlet. Aposto que foram fazer algo errado.
— Eu não sei. — Queria gritar com toda certeza que sim, mas eu não podia.
Minha voz saiu fraca, baixa. — Eu acho que gosta…
— Ele é mais velho, você precisa tomar cuidado. — Ele não conseguiu
terminar de falar, pois Susan se aproveitou do momento e, em um tom de
desdém, soltou:
— Conrad Prince gostar de Scarlet? Por favor, o mundo ainda não está
acabando. — Ela riu da própria piada. — O máximo que vai acontecer é ele
iludi-la, se divertir e jogá-la fora. Afinal de contas, o que é que ele ia ver em
você?
Simples, eu não sou uma vaca amarga que sempre que pode é horrível como
você. Me conte, qual é o prazer em sempre ser alguém tão desprezível?
Meu avô ficou quieto, Susan calou a boca, ambos surpresos pelo meu ataque.
— Ei, Scarlet, não é? — Eu não tinha parado para prestar atenção nos carros
que passavam na rua, mas quando ouvi aquele tom de voz, parei para olhar
quem me chamava.
— O que faz por aqui? Sei que você mora do outro lado da cidade… — Ele
olhou para frente, franzindo as sobrancelhas.
— Meu irmão está em casa, e acho que ficaria feliz de ver você.
— Está bem.
Atravessei pela frente do carro, abri a porta e apostei alto quando entrei no
carro.
— Falta pouco para fazer dezessete. — Foi a desculpa que ele me deu, mas
com o pai dele mandando na cidade, duvidava muito que alguém teria
coragem de parar um Prince e dizer que ele não podia fazer algo. Ele voltou
a acelerar pela rua e puxou o assunto.
— Ah, podemos não falar dela? — Meu tom de voz entregou tudo.
— Você também não conhece Susan, mas em meia hora com ela, o que foi
que achou?
— Certo, você tem um ponto. Mas somos os caçulas, sempre vamos sofrer
mais na mão dos mais velhos do que o resto do mundo.
Caí em mim quando ouvi a porta do carro abrindo e corri para tirar o cinto e
acompanhá-lo logo, mas foi só sair do carro e olhar para a casa suntuosa e
imponente que me senti pequena, meio suja e completamente inadequada
para entrar ali. Estava de short jeans escuro e uma blusa que quando nova
era branca, mas agora era meio amarelada, de um tecido levinho e que
deixava meus ombros e parte da barriga à mostra. Meu cabelo tinha sido
preso no alto da cabeça em voltas dele mesmo no meio da caminhada, e me
sentia suada, com meus tênis falsos nos pés. De fato, eu não era digna de
estar ali, e até cheguei a encarar o caminho bonito pelo qual havia acabado
de passar, pensando em quanto tempo correndo eu atingiria os portões
novamente e fugiria de Isaac sem maiores explicações.
— Ei, é por aqui — o garoto, parecendo ler minha mente, chamou, e tive
vergonha demais para seguir meu plano de arrependimento.
A entrada da mansão Prince tinha uma fonte d’água bem em frente à porta
principal, e eu segui Isaac pelos degraus de pedra da cor da minha blusa. Ele
passou por uma porta de vidro a qual eu provavelmente teria dado com a
cara se ele não estivesse me guiando e a luz do hall de entrada se iluminou
só pela nossa presença graças a algum sensor.
Passamos por uma sala de estar enorme, com sofás de couro, tapetes que
custavam o valor da casa onde eu morava e obras de arte das quais eu não
entendia o conceito.
Tudo me fazia sentir insignificante, mas o pior golpe veio quando viramos
no final do corredor e tudo ao meu redor se congelou.
A sala de jantar tinha um espelho no fundo, bem de frente para quem entrava
no ambiente, e eu me vi uma bagunça. Meu cabelo emaranhado, meu rosto
vermelho, minha roupa que não era nem de longe a certa para estar ali, tudo
isso somado a uma mesa de almoço posta para três, com cada mínimo
detalhe da decoração ajeitado para fazer quem não se encaixava naquela
roda íntima desconfortável. Ainda assim, aquilo não foi o que me fez vacilar,
mas sim o olhar de Conrad quando me viu.
Seu rosto passou de entediado para surpreso, e não era como se eu fosse uma
boa surpresa. Sua testa se vincou, as sobrancelhas se juntaram, os olhos
escuros que podiam ver através de mim me mediram de cima a baixo nada
felizes por me ver. Todo meu corpo esquentou e eu quis que a terra se abrisse
aos meus pés para eu poder pular dentro. Minha vontade era de chorar, de
pedir desculpas, mas não tive tempo de abrir a boca.
— É uma amiga minha e de Conrad. Esta é Scarlet, pai. Você a viu algumas
noites atrás. Eu a encontrei caminhando e como ela
Respirei fundo antes de sair dali e, reunindo cada mísera gota de coragem,
voltei à sala de jantar.
— Estão na mesma sala? — o pai perguntou antes de levar a taça com uma
bebida clara cheia de bolhas à boca.
— Não. Eu sou mais nova — respondi e me assustei com o braço que surgiu
ao meu lado, servindo o prato de salada na minha frente.
— Não — respondi, depois de ver qual garfo estava na mão dele. — Ainda
não sei. Não temos dinheiro para estudar na Prince University, então eu e
minha irmã vamos tentar alguma bolsa fora quando chegar a hora.
— Nós temos bolsas de estudo para bons alunos, como é sua média? E o que
mais você sabe fazer?
— Eu tenho uma média boa, mas não sei se tenho algum outro talento que
interesse a você…
— Meus pais faleceram há três anos. — O homem não me deu uma pausa e
comecei a sentir a tensão de Conrad adentrando minhas veias.
— Meu avô.
Eu nem mesmo seria uma opção para o filho de John Prince, e ficou bem
claro naquele segundo. Foi por isso que quando Conrad me guiou até o
primeiro carro perto da porta, uma picape mais antiga, não disse
absolutamente nada quando ele me colocou para dentro da porta do carona.
Havia um bolo de constrangimento, vergonha e culpa na minha garganta.
Quando ele deu partida e manobrou o carro para passar pelo arco de árvores,
não consegui ver mais um pingo de beleza naquilo, até porque minha vista
estava completamente embaçada pelas lágrimas gordas que se acumulavam
nos olhos antes de caírem pelo meu rosto.
Aquela foi a primeira vez que chorei por causa de um, ou todos os Prince.
Demorou pelo menos cinco minutos para que Conrad percebesse que eu
estava chorando, estava concentrado no seu silêncio furioso, mas assim que
ele viu meu estado, finalmente parou de acelerar feito um idiota e encostou o
carro.
para coisas. Não queria você exposta a ele tão cedo… — ele lamentou ao
mesmo tempo em que tremi no meio do soluço choroso.
Foi o que bastou para ele me abraçar mais forte e me manter ali mais tempo,
e ele só me soltou um pouquinho quando teve certeza de que meu choro
havia cessado.
Olhando para baixo, ele moveu gentilmente meu rosto para fora da curva do
seu pescoço e me encarou. Minha pele queimou sob seus dedos, será que ele
percebia?
— Não. Estou furioso com meu irmão, irado com meu pai, mas com você?
Como poderia, Red? — O meio-sorriso de Conrad fez meu coração acelerar,
e quando ele acariciou minha bochecha, pensei que eu fosse entrar em
combustão em seus braços, até fechei os olhos esperando por isso. —
Quando eu puder, vou sumir no mundo. — O prazer daquele momento durou
pouco. Arregalei os
olhos para encará-lo, mas Conrad não me olhava. Na verdade, apostava que
sua visão estava em um futuro no qual ele havia desenhado para si mesmo
muito antes de eu chegar. — Para bem longe deste lugar e dessas pessoas,
uma vez que fora daqueles portões, eu sou só mais um fodido. Não nasci
para viver de aparências, e não quero que você se suje com esse meio de
merda.
Eu não sabia de nada, mas desconfiava que a ferida daquela família era
profunda e feia demais para que eu tentasse mexer, ainda mais depois da
tarde desastrosa.
— Está com fome? — ele perguntou depois de soltar um suspiro e,
infelizmente, me devolver ao meu banco.
Quando ele parou em frente à casa do meu avô, confundindo ainda mais
minha cabeça, ele não me tocou. Isso foi meu meio de
entender que havia um limite, e eu estava pronta para lidar com ele quando
abri a porta da velha picape.
Meus pés escorregaram para o chão e eu suspirei antes de bater a porta, mas
quando o fiz, Conrad me chamou de volta e me virei para encará-lo.
d a i s y, a s h n i k k o
Queria gritar com Isaac, dizer que ele era um idiota por ficar bravo comigo
porque seu irmão me segurou, porque chegou perto de mim, porque sorriu,
porque me tocou, porque falou comigo. Eu não podia controlar a porra dos
Prince, nenhum deles! Era o pai querendo me usar de exemplo como boa
aluna dedicada, como garota com a qual ele fez caridade e que descobriu que
o filho mais
novo era seu par perfeito para a eternidade. Era Isaac querendo me exibir
como um troféu e Conrad no meio do caminho para foder com tudo.
Eu não queria mais aquele joguinho, mas parecia mais presa nele do que
nunca, foi por isso que quando perdi a paciência junto de um copo de vodca
com suco de morango que me deixou um pouco mais solta, eu deixei Isaac
falando sozinho e saí andando.
tinha a chave mestra dos dormitórios. A regra era nunca a usar a não ser em
caso de emergência, e para mim, aquilo era uma emergência e tanto.
Olhando em volta, conferindo se não vinha ninguém pelo corredor, enfiei a
chave na fechadura e a girei até ouvir o trinco ceder.
Meu sorriso de vitória veio fácil, e rindo, abri a porta e entrei, fechando-a
nas minhas costas, trancando-a de novo, sabendo que se fosse pega ali
dentro, Conrad me mataria.
Foi só abrir o quarto dele e respirar fundo que o cheiro esmagador ao qual
senti falta por tanto tempo me afogou.
Secretamente, por anos eu tentei sentir aquele aroma exato, mas nunca
encontrei nada que se igualasse. Era uma mistura de sabonete, amaciante e
cigarros que só ele tinha e eu, não resistindo, me joguei em sua cama,
mergulhando a cara no travesseiro, absorvendo ao máximo tudo o que podia.
Era bizarro odiar tanto alguém, mas se dar conta de que sentiu sua falta de
forma tão tremenda e significativa. Eu o queria longe, mas era divertido
poder ser a pessoa que devolvia o tapa que tomava. Era ainda mais estranho
me sentir de volta à minha pele
por conta disso. Verdade seja dita, aquilo ainda era um treino, mas Conrad
me forçava a ser forte, a ser eu. Se não fosse, ele já teria me engolido logo
no dia de sua volta.
Não tinha para onde correr, e com o travesseiro na mão, no auge do meu
desespero, me fechei dentro do armário o mais rápido que pude, usando do
objeto para abafar o som da minha respiração e me drogar um pouco mais
com o cheiro de Conrad.
Meu corpo todo gelou achando que tinha sido pega, mas meio segundo
depois, ele me deu as costas, se livrou das botas e tirou a jaqueta, jogando a
peça de couro em cima da cama.
Ok, ele está no quarto dele, tudo bem tirar a jaqueta quando não está tão
frio, não é? — pensei, e logo depois o vi tirar a camiseta.
Foi como voltar ao passado quando Conrad exibiu as costas cheias de
marcas. Meu ar faltou, eu quis chorar quando lembrei como aquilo havia
sido feito, quando me lembrei como foi cair dentro dele e me apaixonar pelo
garoto quebrado a ponto de nunca mais tirá-lo do meu sistema. Ver as outras
marcas cobertas me fizeram ficar sem entender o motivo daquelas ainda
estarem aparentes. Eu quis abrir a porta e perguntar, mas quando ele se virou
para mim, perdi a coragem. O peito de Conrad era definido, os braços fortes,
o abdômen delineado, a cintura mais estreita.
O olhar no rosto de Conrad quando ele colocou as mãos no cós da calça era
de triunfo.
Mas ele fez, e quando dei por mim, Conrad Prince estava abaixando calça e
cueca de uma só vez, ficando pelado bem na minha frente.
Eu quis gritar, não acreditando que aquilo acontecia, mas tudo o que fiz foi
morder o travesseiro quando o vi duro, grosso e grande, com algo inusitado
bem lá.
Não consegui fugir da sensação, todo meu corpo esquentou e meu ventre
pulsou como há muito não acontecia. Meus seios latejavam. Como era
possível? Aquele tesão todo deveria ser proibido, mas era impossível
ignorar.
Esfreguei as coxas uma na outra, tentando buscar algum tipo de alívio, mas
não adiantou de nada. Queria mesmo era me tocar, aliviar a pressão e o ódio
que sentia por aquele ser de mais de dois metros de altura, mas não podia
ceder, nem em segredo.
Meu prazer nunca seria de Conrad Prince, não enquanto eu ainda tivesse o
mínimo de força para negá-lo e mantê-lo longe. Já era difícil demais lidar
com ele no meu sistema por anos daquele jeito que era, se eu permitisse
Conrad vencer mais essa barreira, seria impossível não cair direto em sua
armadilha, e eu não era burra.
Mesmo assim, admirá-lo não era proibido, até porque eu não tinha outra
opção, ainda mais quando ele gemeu mais alto e mordiscou o lábio inferior
logo em seguida.
Seu pau brilhava de tesão, seu corpo parecia tenso na busca do alívio, e
enquanto eu apertava o travesseiro com toda minha
força para resistir, travando meu corpo em uma tensão nunca sentida, Conrad
abaixou a cabeça e olhou para onde eu estava.
— Sabe no que estou pensando? No que tem me deixado duro a cada cinco
segundos? Em você hoje mais cedo… — Ele continuou se tocando, dessa
vez mais rápido.
— Me conte, Red, como você acha que meu pau vai ficar entre os seus
peitos? — A pergunta foi quase um rosnado e me deixou mole.
Não era justo ele ser tão lindo, mais ainda do que quando éramos mais
novos.
Não era nada justo ele ser tão gostoso, ter um pau tão grande e grosso, e
ainda por cima ter aquele piercing! Não era certo eu desejar Conrad daquele
jeito, com aquela intensidade, não quando eu sabia que seria seu próximo
alvo para consumir e destruir, mas ainda assim, eu não conseguia evitar. Eu
era um grande ímã de desgraças e Conrad era a pior delas porque era o
veneno que eu consumia pouco a pouco e porque queria, eu sabia disso.
Havia mil e uma alternativas para não o ver mais. Eu poderia sim pedir
transferência com as notas que tinha, podia chorar para que John me
mandasse para longe, podia me jogar de cabeça nos trabalhos universitários
para juntar mais dinheiro e tentar bolsa do outro lado do oceano, mas não
queria.
E eu era uma mentirosa, uma traidora do pior tipo por admitir aquilo para
mim mesma e não fazer nada para mudar o rumo das coisas.
anfitrião, vou para o banho para que você saia daí, e espero que deixe meu
travesseiro no lugar antes de ir.
— E não volte mais aqui se não quiser foder comigo. Da próxima vez, não
serei tão gentil.
scarlet
estou andando rápido pelos semáforos, ruas lotadas e vidas ocupadas e tudo
o que sabemos é incerto. estamos a sós com nossas mudanças de ideias, nos
apaixonamos até que doa ou sangre, ou desapareça com o tempo. você chega
e a armadura cai, atravessa o quarto como uma bala de canhão. agora tudo
que sabemos é não deixar passar. estamos sozinhos, só você e eu no seu
quarto e nossas fichas estão limpas. então você nunca foi um santo e eu amei
em tons errados. nós aprendemos a viver com a dor, mosaico de corações
partidos, mas este amor é valente e selvagem. e eu nunca previ você
chegando, e eu nunca mais serei a mesma.
stateofgrace,taylorswift.
Estou na porta.
Pegou
sua
toalha?
Eu nem respondi. Já tinha avisado meu avô que não estaria em casa no dia
seguinte, mas que levaria o celular e que não era para ele se preocupar, ou
dizer para Susan. Ele não tentou me podar, só me pediu para ser cuidadosa e,
se precisasse, ligar que ele me buscaria em qualquer canto da cidade.
Mesmo que Conrad só me visse como amiga, no final das contas, mesmo
que ele só quisesse me manter perto sem nenhum
Cortei a distância entre nós em uma corridinha rápida e logo abri a porta,
pulando para dentro do carro, tomando cuidado para
não perder meus chinelos.
Eu deveria mentir?
— Já entendeu aonde vamos hoje? — Conrad deu uma boa olhada para
minhas roupas e eu olhei para baixo também, conferindo a parte de cima do
biquíni que havia roubado de Susan, eu não tinha nenhuma peça de banho
que me servisse, o short, e a mochila com toalha e coisas para comer, já que
não tinha dinheiro para gastar em canto nenhum.
Nunca fui. — Olhei sem jeito, encolhendo os ombros. — Meu avô nunca nos
levou.
— Bom, espero que ele não se importe de eu levar você hoje, então.
Meus segundos de preciosa intimidade com o menino que fazia meu coração
bater mais forte. E estava conformada que o final do verão podia ser o final
daquilo, era mais do que óbvio que meus os próximos amores poderiam ser
intensos, mas nenhum deles seria avassalador como o meu primeiro.
O trajeto foi rápido, e como Conrad gostava de correr, não demorou muito
para que eu finalmente pudesse ver o mar, escuro e cheio de ondas, batendo
contra a areia enquanto várias pequenas barracas estavam erguidas na areia.
— O tempo ia firmar e o pessoal resolveu fazer uma festa. Vai até à noite,
provável que se torne um luau, mas você não vai poder ficar, não é?
— É, meu avô não ia gostar muito da ideia de eu sair tão cedo e não ter hora
para voltar, ainda mais depois do que Susan disse da última vez… — O final
da frase era para ser um pensamento, mas escapou pela minha boca.
Olhei para Conrad, com medo de sua reação e o vi fazer uma careta
desacreditada enquanto dava seta para estacionar.
— Ok, mas o que ela disse? — ele insistiu, não parecendo mais tão passivo.
— Que você só queria brincar comigo, que não era uma boa influência, que
me faria de idiota e que... — meu tom de voz diminuiu, o nó voltou para a
minha garganta como no dia anterior, e eu soltei em um sussurro, desviando
o olhar do dele —... que eu não tinha nada de interessante para que você
quisesse algo comigo.
Meu ar faltou. Eu queria gritar, mas não pude. Estava presa em seus olhos,
refém do seu próximo movimento, prisioneira de qualquer vontade que ele
tivesse.
Seus olhos deixaram os meus por um minuto e ele fitou minha boca. Eu
lambi os lábios.
Conrad Prince abriu a porta, pulou para fora do carro e eu me joguei contra o
banco, deitando a cabeça no encosto, não acreditando que era real.
Sorri feito idiota, abri a porta, passei a mochila pelo braço e desci.
N a d a.
Com minha toalha estendida na areia não tão próxima ao resto das pessoas,
fiquei admirando Conrad que, com as mãos apoiadas na cintura, encarava o
mar. De bermuda e com aquela blusa, ele parecia um surfista, porém, algo
dentro de mim esperava que ele fosse se livrar dela em breve.
— Não — ele negou e ergueu o braço, como se fosse óbvio não precisar por
causa da blusa. Mordi a língua querendo perguntar, e ele notou. — Quer
saber o porquê não vou tirá-la?
Nem me deixa pegar em você nessas partes. — Fui direta demais e isso o
chocou.
— Não? Acho que já é automático. Me dê isso, vou passar nas suas costas.
— Ele pegou a embalagem do protetor e ficou atrás de mim. Ergui o cabelo e
senti um arrepio quando o produto gelado tocou minha pele já quente.
Conrad soltou um riso nasalado e eu mordi o lábio com força, não querendo
correr o risco dele se calar de novo.
Confirmei com a cabeça, querendo que ele não parasse de se abrir, nem de
me tocar.
E você?
— Eu o quê?
— Interna?
acontecer de verdade, mas a paz de saber que alguém imaginou algo daquele
jeito me conforta.
Ele fez uma careta, depois deitou com a barriga para cima e tapou a testa
com o braço.
— Prefiro Jane Austen. Ainda há falta de comunicação, porém sinto que tem
mais esforço dos personagens para resolver isso.
O garoto perseguia a menina e ela queria ser pega, mas ainda gritava entre o
riso para ele se afastar e corria dele.
— O exemplo está aqui. Ela quer que ele a pegue, mas a graça toda é saber
se ele está disposto a realmente pegá-la, entende?
— Tenho.
— Não deixe meu pai descobrir essa sua inteligência. Você seria um ótimo
ratinho no laboratório dele. — Conrad bufou e voltou a esconder os olhos
sob o braço.
— Nunca foi, mas fazemos o mínimo, assim ele continua a bancar minha
educação e minha mãe um dia vai ter a chance de sair da vida que leva.
— Você devia ver as fotos dela do passado. Dezesseis anos atrás, ela era a
mulher mais linda desta cidade, tanto que meu pai não passou impune.
— Minha mãe era dealer, dava as cartas na mesa e em uma bela noite, John
Prince, o rei do mundo, foi jogar.
— Minha mãe era bonita, inocente demais, ele era tão bonito quanto ela, e
de um caso de uma noite, eu nasci. Meu pai era casado, sua mulher vivia
lutando para engravidar e conseguiu dois meses depois que minha mãe
descobriu a gravidez, quando o assunto vazou e descobriram que havia um
bastardo Prince por aí, esta cidade caiu em cima da minha mãe como se ela
fosse uma criminosa. Ela perdeu o emprego, quase perdeu a casa em que
morava, e se não fosse um advogado meia-boca que conseguiu com as
últimas economias, ela teria chegado ao ponto de comer lixo. — O desprezo
na voz de Conrad fez os pelos do meu braço se arrepiarem. Eu odiaria meu
pai se ele tivesse feito o mesmo com minha mãe. — Finalmente, ela
conseguiu assistência, mas meu pai, muito inteligente, enrolou minha mãe de
novo. Hoje em dia ele
Ele riu.
— Eu não valho uma confusão desse porte, mas obrigada por me tirar de lá.
— O problema não foi você, Red. O problema foi meu irmão, mas isso é
assunto para outra hora.
— Certo, então é da sua mãe que você puxou o gosto para leitura?
cabeça é boa em decorar coisas — ele disse como se não fosse nada e eu o
achei ainda mais incrível.
— Me prove.
— Talvez essa seja a única forma de competir com o meu lado fodido. Se eu
fosse só o amontoado de erros e problemas, você nunca chegaria perto de
mim.
Eu não gostava muito deles, mas fiquei quieta, além de precisar engolir a
bola de ciúme que surgiu na minha garganta quando vi o abraço cheio de
intimidade da garota com Conrad.
— Bella, Thomaz, essa é Scarlet. — Ele se virou para mim como quem
sentia muito por sermos interrompidos e disse: — Esses são meus amigos.
— Obrigada.
— Vamos para a água? — Bella sugeriu sem nem cogitar minha presença.
— Scarlet não sabe nadar, acho que vou ficar por aqui. —
Era nítido que ele queria cair no mar, e eu seria a última pessoa a impedir.
— Não, relaxe. Eu vou ficar aqui um pouco, é bom ter alguma distância de
você. — Tentei sorrir.
— É, você faz minha mente nublar, Conrad Prince. Uma overdose de você
não me mata, mas pode me tornar uma viciada.
Conrad voltou para a areia três vezes, e vê-lo sorrir daquele jeito me
encantou tanto que não me importei de comer meus biscoitos sozinha, ou
tomar sol como precisava há tempos.
Eu até tentei molhar os pés, mas a água era tão gelada que na primeira
ondinha eu corri de volta para minha toalha e entendi que meu lugar era ali,
em terra firme.
Isso durou até perto das duas da tarde, foi quando Isaac me descobriu.
— Scar, eu não tinha te visto aí. — Sorrindo, com uma garrafa transparente
cheia de um líquido vermelho na mão, ele veio até mim com sua turma.
— Queria te pedir desculpas por ontem. Meu pai é um pouco sem noção,
mas não era minha intenção ter tudo aquilo. Eu até tentei pegar seu número
com Conrad, mas ele não me passou e, provavelmente, também não repassou
minhas desculpas, não é?
— Não — menti. — Você não podia prever o que seu pai faria.
— E acredite, ele mesmo não vê que fez algo errado. Logo depois que vocês
saíram, o papel de explicar para ele a merda que tinha feito ficou toda nas
minhas costas. — O sorriso faceiro no rosto dele me amoleceu.
— O que é isso?
— Alguma coisa com suco de morango. Não pergunte o que é essa coisa.
— Ela está saindo com Conrad Prince e não aguenta um copinho desse? —
Ouvi a risadinha de deboche e, mesmo sendo inteligente o bastante para não
cair naquele tipo de provocação, eu não queria ser vista como alguém não
pertencente. Nem indigna de Conrad.
— Vira, Scar! — Isaac começou a brincadeira e o coro de vira-vira ganhou
força.
— É forte, né? — falei para Isaac que riu da minha careta e já encheu meu
copo de novo.
Dois copinhos de trezentos ml cada para alguém que nunca tinha bebido.
Minha mente nublou em menos de cinco minutos, meu corpo ficou ainda
mais quente, e eu quis rir muito quando Isaac fez alguma piada que eu nem
entendi direito. Ele me ofereceu outro copo, tinha gosto de laranja, e quando
eu ia virá-lo, Conrad chegou.
O punho de Conrad afastou Isaac de mim tão rápido que eu nem tive tempo
de ter uma reação. E então, rápido demais para minha mente confusa
entender, Conrad recolheu minhas coisas com uma mão enquanto segurava
meu punho com a outra, e me arrastou de volta para o carro.
Senti-me estúpida vendo o quão bravo ele estava, e assim que ele me ajeitou
no banco do carona e prendeu o cinto na minha cintura, eu o segurei pelos
ombros molhados.
— Conrad. — O nome saiu com dificuldade, ver toda aquela braveza nele
me fez querer chorar e minha voz saiu um fio agudo.
— Você é uma criança, Red. Não tem que beber. — Depois de um suspiro,
ele me soltou, fechou a porta e rodou o carro. Eu o acompanhei com a
cabeça e assim que o vi entrar no carro, protestei.
Pelo jeito que ele me encarou, sabia que minha voz estava mole demais.
— Fale comigo, por favor, Scarlet — chamar pelo meu nome fez efeito.
Ergui o rosto para encará-lo e, tão perto, vi a exata linha onde pupila e íris se
fundiam. Conrad ficou em silêncio, me olhando de cima e acariciou meu
rosto, limpando as lágrimas do caminho.
— É mesmo?
— É. Mas tenho medo deles. Às vezes, quando você está distraído, eles
ficam sombrios demais. — O sorriso morreu, mas não me parou. — O que te
assusta tanto, Conrad?
— Coisas que tirariam seu sono. — Ele continuou a acariciar meu rosto, mas
eu o fiz parar, peguei sua mão e a ergui, olhando
— Posso?
— Acho que pode. — Minha mente estava lenta, confusa, parecia um sonho.
Sem me largar, ele se curvou e fez minha cabeça girar com o movimento,
mas quando trouxe meu blackbook para meu colo, eu o abri e mostrei cada
uma das folhas em que ele estava.
— É a primeira vez que você bebe, não é? — Seu tom de voz era calmo, ele
não parecia mais tão bravo agora.
Confirmei com a cabeça contra seu peito. Era tão óbvio assim?
— Não estou bêbada. — Fiz meu melhor em mentir, mas não ajudou em
nada.
— Está.
— Não tô!
Como se eu fosse uma criança, ele me puxou de novo contra seu peito e eu
não relutei.
— Está. Eu sei que está porque na minha primeira vez tomando essa merda
batizada que o Isaac rouba do meu pai, passei o dia todo vomitando depois.
E não posso te devolver assim ou sua irmã vai ter razão ao dizer que sou um
péssimo amigo.
Amigo. Eu não gostava daquela palavra agora. Era algum tipo de punição?
— Comigo?
— Não.
— Isaac?
— É. Meu irmão ama competir comigo. Ele precisa sempre ter a melhor
roupa, o melhor carro, as melhores garotas… Babaca.
— Não, você é a melhor delas. É por isso que ele está fodido de ciúme e
inveja.
— Não se preocupe.
— É?
E feliz por estar ali com ele, minhas pálpebras pesaram demais e, mesmo
sem querer, eu adormeci.
Foi como estar presa dentro de uma onda. Minha cabeça foi jogada de um
lado para o outro algumas vezes e quando abri os olhos, sabia que queria
vomitar.
Conrad foi rápido, abriu a porta do carro, segurou meu cabelo no alto da
cabeça e me manteve segura até toda a mistura de bebida e biscoitos sair do
meu estômago.
— Sinto muito — podia saber que ele sorria pelo seu tom de voz —, mas
não vou te contar.
— Onde estamos?
— No estacionamento da farmácia.
— Não é engraçado.
— Ah, é. É sim, agora espere aqui um pouco que vou atrás de remédio, mas
antes, preciso elogiar. Adorei os desenhos que você fez de mim, me faz
parecer melhor do que sou.
— O quê? — Ergui a cabeça e arregalei os olhos com tudo, mas ele já tinha
descido.
Fiquei cinco minutos quieta até o remédio começar a fazer efeito e quando
abri os olhos, a primeira coisa que fiz foi roubar uma bala de menta do
pacotinho que ele tinha no porta-copos do carro.
— Está melhor?
— Não muito.
A farmácia era na rua de cima de casa, então me ajeitei para tirar a blusa e
devolvê-la, mas com a mão na minha perna, Conrad me impediu.
— Ok.
Quando ele estacionou em frente à minha casa, eu não tive coragem de abrir
a porta e descer. Encarei o porta-luvas do carro e suspirei.
Me desculpe.
— Eu já disse isso mil vezes, mas vou repetir, não foi culpa sua. Só me
preocupa que você tenha se sentido pressionada, e acho que você precisa me
fazer uma promessa agora. — Encarei-o curiosa e ele continuou: — A de
nunca mais fazer nada se sentindo forçada, não importa se isso for comigo,
seu avô, sua irmã ou outras pessoas. Você pode, e deve, falar não, ok?
— Ok. Eu prometo.
Abri a porta, joguei as pernas para fora com cuidado e depois de fechá-la,
quando notei que Conrad ainda estava de olho, voltei para encará-lo.
— Preciso fazer uma pergunta.
— O que é?
— Somos amigos?
— Acho que sim — ele me respondeu sem entender aonde queria chegar.
— Então talvez eu não queira ser só sua amiga. — Usei cada grama de
coragem que tinha para ser tão verdadeira e direta, e a resposta daquilo não
podia ser melhor.
conrad
se você vai me segurar, e não vai me deixar entrar nas paredes do seu
castelo, nenhum de vocês pode mantê-las porque se eu tenho que queimar
tudo, então vamos queimar tudo.
burnitalldown,pvris.
Eu não conseguia ficar quieto, por isso, aquela merda de torneio acontecendo
era uma ótima distração. E verdade seja dita, os Vipers precisavam de um
braço forte no comando.
Thomaz era bom, mas boa parte do tempo estava chapado demais para
pensar racionalmente em como seguir com a liderança e ele não se
importava de me ver tomar a frente das coisas, já que
Era certo, eu não podia perder para o meu irmão em nada que fosse
individual, mas conseguir atropelá-lo junto de sua fraternidade seria bom
demais.
— É, esse crédito aos Lions eu preciso dar. O time deles é melhor que o
nosso.
— Que porra você fez com ela? — Isaac falou alto, entredentes, com as
mãos fechadas em punho.
Ele queria briga, mas não sabia o que o aguardava. Sua postura também não
me assustava, e fiz questão de deixar isso claro quando o enfrentei de peito
aberto.
Eu sorri, provocando-o.
posso fazer.
— Ou o quê?
— Não me peça para ficar longe dela quando é ela quem não sai do meu pé,
inclusive, pergunte se ela pode me devolver meu travesseiro.
Aquilo foi realmente mais eficiente que um soco. Meu irmão deu um passo
para trás, os olhos confusos, as sobrancelhas juntas.
— Não sabia que além de tudo, você era mentiroso. — Ele tentou, mas me
fez rir.
— Eu vou…
E conforme-se, ela nunca será sua — falei baixo essa última parte e meu
irmão entendeu que minha ameaça era real.
— Isso não acaba aqui. — Ele tinha perdido, sabia disso, mas não queria sair
por baixo.
faça o favor de tornar cada vez mais divertido, porque quando fico
entediado, você sabe, gosto de colocar fogo em lixo. Velhos hábitos não
mudam, e você pode ser o próximo a queimar.
O esforço que Isaac fez para não vir para cima de mim custou dele tudo de
si, eu sabia.
Quando ele saiu do campo, os garotos do time olhavam curiosos para mim e
Thomaz se aproximou.
Olhei em volta, vendo a plateia e falei alto: — Vocês têm um jogo para
ganhar, não? Vai, todo mundo se mexendo. — Bati palmas, espantando-os, e
peguei minha garrafa d’água do chão.
— Bom, seja como for, podemos ver como o território está na festa dos
Birds desta noite, o que acha?
— Festa?
— Eu vou.
Aquela era a primeira vez que eu a via solta no campus, e assumi uma
postura diferente. Não queria perder nada, queria estudar como as pessoas ali
se comportariam com ela, e pegando um copo de cerveja de cima do balcão,
fugi de Bella e de Thomaz, indo sozinho para o fundo da sala, fazendo um
garoto visivelmente deslocado se levantar de uma das poltronas para poder
sentar.
Com a mão livre, tirei o cigarro que havia pegado do maço de Bella de trás
da orelha e o apoiei nos lábios antes de conseguir pegar meu isqueiro do
bolso da jaqueta e acendê-lo.
A primeira tragada, no silêncio da minha mente, foi para aplacar a
frustração.
Eu sabia o motivo de ter ido até ali, e a procurei de forma insana com os
olhos enquanto atravessava o ambiente só para descobrir que Scarlet não
estava lá.
Matei meu copo de cerveja de uma vez, apoiei-o sobre o braço da poltrona e
coloquei os pés sobre a pequena mesa de centro, cruzando os tornozelos,
ignorando os casais se pegando nos dois sofás em volta. Meu foco era outro.
— Ei, você. — Bati nas costas de um dos caras que se amassava com uma
garota e ele me encarou meio aéreo. Sua expressão mudou rápido, em um
minuto, ele estava pronto para me xingar, no outro, ele tinha me
reconhecido.
— Prince?
— Agora.
Não levou cinco minutos até o garoto fazer o que eu tinha mandado, e na
minha frente, sorrindo como se acreditasse na possibilidade de eu querer
algo com ela, a garota alta sorriu completamente convidativa.
— Oi. — Ela acenou e depois passou a mão nos cabelos, jogando-os para o
lado.
— Claro! — Animada, ela sentou onde antes eu estava com os pés apoiados,
bem na minha frente.
Ela riu.
— Não, mas você parece um pouco alta demais, e talvez eu queira ficar igual
— menti.
— Ah, sim… Nós bebemos muito, então alguém trouxe maconha, e quando
passou o efeito, alguém enfiou uma estrelinha na minha boca. Eu gostei tanto
que roubei uma segunda beijando minha amiga ali. — Ela indicou com a
cabeça.
— Bom, eu tenho uma missão para você agora, será que pode me ajudar?
— Claro que sim, você é um Prince. — Ela tentou tocar meu braço, mas
puxei de volta, num reflexo que eu não devia mais ter.
— Ok, Peggy. Preciso que você coloque esse pirulito na boca por um tempo.
— Era emergencial, mas eu sempre levava alguns no bolso. E quando
ofereci um deles para a menina, ela pareceu ver ouro. Seus dentes
massacraram o doce quando o colocou na boca.
Aquela fissura toda não era bom sinal. — E a outra coisa é que, quero que
me leve até o seu quarto.
— Oh, meu Deus! Conrad Prince quer ir ao meu quarto! — ela comemorou.
tomando cuidado para ninguém em volta nos ver e, assim que entramos, ela
tentou me agarrar.
— Peggy, não foi para isso que eu te trouxe aqui — avisei, tentando afastá-la
sem machucá-la.
— Não? Mas nós podemos, não? — O tom pidão dela não me conquistou, só
me fez ter dó.
— Não, não podemos. Você está sobrecarregada. — Ela me olhou sem
entender. — É, a droga que você usou, você está começando a ter os efeitos
colaterais.
E antes que eu pudesse fazer algo, ela parou, segurou o estômago e disse:
O jato de vômito colorido molhou todo o chão e, por sorte, não pegou em
mim.
Ajudei a garota a terminar de colocar tudo para fora, lavei seu rosto e a
obriguei beber uma garrafa inteira de água gelada enquanto o corpo se
acalmava.
— Isso vai passar? Sinto meu corpo queimar — ela reclamou, querendo tirar
a roupa.
sono, o dia seguinte seria cheio, ainda mais se eu quisesse fazer meu irmão
comer aquela bola de futebol pelo rabo.
Os uniformes verde e preto do time dos Viper tinha um brasão que brilhava
no peito, além da cobra envolvida nos números na parte de trás. O estádio
estava lotado, a música que tocava do lado de fora também saía dos alto-
falantes dali de dentro, e acima dela, nós conseguimos ouvir os gritos.
Todos concordaram.
We will rock you começou a tocar alto de repente, e aquela era nossa deixa.
Fizemos uma fila indiana, seguimos lado a lado com o inimigo para fora da
cobertura, e quando entramos no gramado, o público foi à loucura. Todo
mundo sabia que aquele jogo era vida ou morte, o começo do desafio, Prince
contra Prince.
Scarlet estava lá, envolta em seu casaco, uma touca na cabeça, parecendo
querer se esconder não só do frio. Comprovei que era real quando ela se
encolheu ao sentir meus olhos em seu rosto.
Quando o time adversário passou para nos cumprimentar, nenhum dos Viper
deu as mãos.
— Preparado para perder? — meu irmão provocou quando chegou sua vez
de me cumprimentar.
— Vem, Isaac! — algum amigo dele gritou e meu irmão demorou para
obedecê-lo, mas finalmente me deu as costas, desconfiado.
E que surpresa agradável foi pegá-la no flagra, com os olhos nos meus.
O primeiro tempo foi intenso. Thomaz perdeu o cara ou coroa, mas roubou a
bola em cinco segundos do jogador adversário. Ele avançou bem, dividindo
a bola em um bom passe para o atacante mais próximo, e o garoto não
poupou força no pé ao mirar no gol.
E ele tinha razão, já que com vontade de revidar, o outro time contra-atacou
pesado.
Seus amigos bem que tentaram me tirar de perto dele, mas além de alto, eu
não era leve, e sabia como usar o corpo para afastá-los.
Foi graças a um desses trabalhos que meu passe entrou na área direto no
peito de um jogador Viper, e quando ele dominou a bola, era tarde demais
para qualquer um entrar em seu caminho.
O time se aglomerou para comemorar. Jordan, mais baixo do que eu, pulou
nas minhas costas. O choque do toque físico me fez parar no lugar. Meu
rosto se transformou em uma máscara, o ar faltou no fundo do peito, mas em
meio aos gritos, eu me recuperei rápido e ninguém pareceu notar meu
incômodo.
— Vai, caralho! — Thomaz ergueu a mão para que eu batesse nela e nós
voltamos à posição para cuidar da raiva que o time adversário traria para o
nosso lado.
Foi difícil marcar meu irmão, afastar a bola da nossa área, mas no sufoco,
conseguimos segurá-los até o intervalo. Quando o placar anunciou os
primeiros quarenta e cinco minutos de jogo, me juntei
ao pequeno bando de jogadores para beber alguma coisa e entender como
seguiríamos.
— Ei, vocês estão indo bem. Se conseguirmos marcar mais um, teremos
alguma folga — Thomaz puxou.
O juiz apitou, nós voltamos ao campo, e agora correndo para o lado que
havíamos defendido, as coisas estavam diferentes. Parecia que aquele
segundo tempo era mais difícil, que o ar estava mais pesado, que os
jogadores do time adversário não estavam tão
Meu irmão recebeu três passes, em dois deles eu consegui roubar a bola, no
terceiro, não consegui evitar um bom passe. Ele me empurrou quando
passou correndo por mim para acompanhar o time que crescia no campo, e o
narrador gritou:
— E lá vai Conrad para cima de Isaac. Ele passa por Ned, Robert, e
finalmente chega na bola. Conrad domina, Thomaz está perto, Nial também.
Ele vai fazer o passe, mas O IRMÃO ROUBOU
Meu irmão tentou dar de esperto para cima de mim. Seu sorriso de satisfação
ao tirar a bola de mim foi o estopim, e quando me vi, estava no chão junto
dele. Eu o derrubei, fazendo uma falta das feias.
Minha vontade era de quebrar a perna dele, e eu não tinha vergonha alguma
de assumir isso, tanto que quando o juiz veio com o cartão amarelo na minha
cara, nem gastei tempo discutindo.
— E o avanço de Conrad Prince contra Isaac Prince gerou uma falta! Será
que é isso que vai definir a partida, meus amigos?
Os garotos ainda reagiram, mas a pressão que o time adversário fez em cima
de nós não deu margem para uma reação mais expressiva, e antes que eu me
desse conta, mesmo com todos os acréscimos, quando o fim do jogo foi
anunciado e a bagunça
começou na arquibancada e no campo, meus olhos só conseguiram enxergar
uma coisa.
Com ela seria diferente. Quando o fogo a consumisse, eu a faria pedir por
mais.
scarlet
lendas nunca morrem. elas estão escritas na eternidade, mas você nunca verá
o preço que isso custa, as cicatrizes coletadas ao longo de suas vidas.
legendsneverdie,halocene.
Eu sabia que não estava no meu melhor desde nossa última discussão, e
depois de ter visto Conrad como vi, de sair do quarto dele como saí, não
consegui voltar à falsa normalidade. Estava distante, fria, pensativa, e era
involuntário, mas tudo aquilo me consumia de um jeito sobrenatural.
— É? Por quê?
— Desde que ele chegou, você está diferente. E não é o que eu esperava…
— Os olhos verdes analisavam meu rosto como um predador. — Você ainda
o odeia, não é? Por tudo o que ele causou…
Talvez eu fosse.
— É mesmo? Então, por que ele me mandou falar para você devolver o
travesseiro dele?
O minuto em que ficamos nos encarando durou o mesmo que uma longa
hora, mas finalmente os olhos verdes cederam. Isaac relaxou um pouco e
ergueu a cabeça, olhando para longe enquanto me abraçava.
— Não, você tem razão. Desculpe, Scar… Esse desgraçado mexe com a
minha cabeça e nós temos uma corrida amanhã…
Conrad tinha sido muito filho da puta por me colocar naquela posição, então
era óbvio que eu precisava mantê-lo longe. Era óbvio que, mesmo tendo
visto uma brecha sobre como ele se sentia sobre mim, ele não era confiável e
eu não deveria abusar da minha sorte ou trair a confiança de Isaac.
Nós nos separamos naquela tarde, ele resolveu levar o carro para ser testado
e eu tinha trabalho a fazer. E deixando ainda mais as minhas coisas de lado,
não recusei um só e-mail daquela lista sequer, pensando que aquela conversa
seria só a primeira de muitas, e uma hora eu não aguentaria mais. Eu
precisava dar um jeito de me livrar dos Prince. De todos eles. Mesmo que
me doesse e me fizesse pó.
comigo mesma. Eu sabia que a marca que Conrad tinha deixado em mim
nunca seria completamente apagada, era por isso que eu agora reforçaria
cada mínima ação negativa dele e me manteria longe.
Pensar em me afastar de Isaac era doloroso, mas ele superaria mais rápido do
que eu.
Ele era bonito, inteligente e forte. Meu namorado, quando virasse ex, ficaria
bem.
Merecia muito.
Meu namorado, apoiado no capô de seu Tesla junto dos amigos, se levantou
quando me viu e veio me abraçar, parecendo orgulhoso por me ver vestida
como ele tanto gostava.
— Que bom que você veio — ele sussurrou contra a minha boca.
decepcione.
— Nunca. — Selando os lábios nos meus, ele se afastou e pegou minha mão.
— A corrida não tem como ser aqui. Vamos até a cidade, naquele velho
aeroporto que meu pai tinha, lembra.
— É, meu pai mandou reformar a pista. Lá tem espaço de sobra para correr e
ele mandou instalar proteção em volta dos muros, assim, se acontecer algum
acidente, ninguém se machuca.
Aquela seria a porra de um grande teste, mas não tinha como fugir.
Entrei pelo carona do carro de Isaac, que fez questão de acelerar sob os
gritos dos amigos que nos seguiriam pela estrada, sabendo que precisaria
aguentar no personagem só até voltar para o meu quarto, só até cair de cara
no próximo trabalho.
Só até ter a chance de sair daquela merda de país e nunca mais olhar para
trás.
Eu queria vomitar, mas não o faria, não quando precisava passar naquele
teste.
Tinham aproveitado toda a borda do terreno livre, que não era pequeno, para
fazerem as pistas.
Controlando meu corpo para não tremer de nervoso, respirei fundo e abri a
porta olhando para o chão. Sabia que nossa chegada não tinha passado
despercebida, ainda mais com o show que as
buzinas dos amigos de Isaac fizeram ao nos verem passar. E foi só colocar o
pé para fora que senti aquela queimação louca que sempre acontecia quando
ele me olhava.
Supere — avisei meu cérebro, mas meu corpo não parecia disposto a
obedecer.
Firmei o passo para colocar o corpo para fora e ergui o rosto, encarando o
lugar para onde teria que ir, buscando uma rota alternativa para não passar
por Conrad que estava no meio do caminho.
Apesar das últimas discussões girarem em volta de Conrad, eu sabia que ele
me esfregaria na cara do irmão de propósito, e daquela vez, eu não achei
nenhum pouco ruim.
Meu relacionamento não era algo que ele pudesse tocar e destruir como tudo
em volta dele.
Eu não ia permitir.
— Boa sorte — soprei quando Isaac riu contra o beijo e selei a boca na dele.
Ele sabia.
Saber que todo mundo me encarava não melhorava o peso de saber que
Conrad continuava lá, mas foi fácil ignorá-lo como fiz com todos os outros
quando passei perto dele.
Segui para junto dos Lions, para perto de John que me deu um sorriso de
aprovação, ele havia acabado de assistir a toda a zorra
que havia provocado junto de Isaac, e depois de abraçá-lo, meu tutor me
segurou pelos braços, me olhando de cima a baixo e sorriu.
— Adorei.
— meu coração doeu miseravelmente quando ele disse aquilo —, mas acho
que posso usá-lo ainda, vamos ver o que o futuro reserva, não? — Ri sem
graça, tentando me conter.
— Ah, não. Não… Conrad é seu filho, ele tem direito de estar aqui. Isaac
sempre é o melhor, você sabe.
— Sei. — Havia orgulho em sua voz, mas algo mais em seu olhar. — Mas
me chateia ver uma das minhas melhores alunas perdendo o fôlego logo no
começo do semestre. Eu tenho algumas coisas que podem ajudar, que tal
você dar um pulo no meu escritório quando puder?
— Claro.
Aquilo era tudo o que eu não precisava, mas fingi que estava tudo bem, mais
uma vez.
Era quase fácil. Pelo menos costumava ser antes de Conrad voltar.
— Ótimo, te vejo depois, querida. — Depois de dar alguns tapinhas nos
meus ombros, ele me deixou e foi pegar o microfone.
De fato, John Prince merecia a fama que tinha. Sua língua era mágica e os
alunos, além de respeitarem sua autoridade, o admiravam. John era tudo o
que eles queriam ser no futuro.
Uma garota Viper ficou responsável por erguer a bandeira, e enquanto ela
caminhava para ficar em frente aos carros e o locutor reforçava as regras, o
motor de Conrad rugiu, fazendo com que todos duvidassem do que ele
guardava sob o capô.
Melhor do que ninguém ali, eu sabia o quanto ele gostava de correr quando
era mais novo. Sabia que ele tinha roubado os carros do pai na madrugada
uma porção de vezes só para correr pela
estrada e se sentir vivo junto do motor. Sabia que ele era bom naquilo, e que
com certeza não deixou aquela paixão de lado ao longo dos anos que passou
afastado. Seu carro era muito bonito e bem-cuidado, mesmo não sendo novo,
e com certeza daria trabalho.
Eram doze carros naquele dia. Oito estariam fora quando a fila rodasse, e
aquela era a sexta corrida. Isaac correria a última volta daquela etapa. Rezei
para um dos dois perder antes do final chegar, mas quando a garota desceu
os braços e os carros avançaram, quando Conrad passou por nós como um
raio e cresceu em distância na primeira curva, tive a infeliz certeza de que
não me livraria de ver irmão contra irmão até o final do dia.
Como esperado, com folga, e sem preocupação, Conrad passou pela linha de
chegada e todo mundo comemorou, menos eu.
Ele sorriu, eu lhe dei o dedo e me virei para entrar no meio da multidão.
Precisava de um cigarro antes de Isaac correr, e não podia fumar na sua
frente.
Ele estava tão concentrado que nem mesmo seus olhos queimaram em mim
como da última vez, e eu soube, quando Isaac cruzou a linha de chegada em
sua terceira volta, que a próxima seria um combate de gigantes.
— E a disputa final aqui será de Prince contra Prince. Lions contra Vipers, e
quem será que leva?
— Que problema?
John colocou uma das mãos sobre a ponte do nariz e respirou fundo.
— E vocês não pensaram sobre isso antes? — ele reclamou, mas não era
para os alunos e sim para a secretária que seria
— Esperem… — Foi a hora de Conrad abrir a boca, e eu, mais uma vez, caí
na besteira de prestar atenção nele. Seus olhos escuros e intensos tinham
ideias perversas, eu soube quando o meio-sorriso cruel surgiu em sua boca.
— Estão achando que vou perder para ele? Nem que ele estivesse pilotando
um avião. — Ele riu. — Mas, para resolver as coisas, vamos deixar assim,
eu
— Se você ganhar, com o seu carro, não será uma novidade, não é?
— Eu…
— Isaac, nem pense. — Dei um passo em sua direção, mas a mágoa do dia
anterior surgiu em seus olhos. O filho da mãe não havia superado a
provocação do irmão.
Isaac ia me testar.
Isaac estava abrindo mão de mim para uma aposta ridícula com Conrad.
Ouvi Conrad provocar já voltando para o carro, mas Isaac veio até mim.
— Baby, ele não vai ganhar. — Sua mão tentou tocar meu rosto, mas meu
primeiro reflexo foi repeli-la com um tapa.
— Não! — Dei um passo para trás, negando com a cabeça, sendo consumida
pelo mais puro ódio. — Você me colocou em risco. Com ele. Isaac… — Seu
nome saiu num rosnado que nem eu reconheci da minha voz. Eu queria
chorar, eu me senti traída, mas estava na cara que ele não entendia.
— Louca? Isaac, volta pra merda do seu carro e ganha essa porra, ou você
vai se arrepender muito do que acabou de fazer.
Aquilo seria trair minha família, seria trair Isaac, seria trair a mim mesma.
Foi algo fora de série ver como Conrad estava focado, e mesmo com um
carro inferior, os dois correram quase que lado a lado antes da primeira
curva. Naquele segundo, eu tive certeza de que Isaac ganharia, mas do nada,
um rugido mais alto que a música ganhou o ar, fogo saiu dos escapamentos
estilizados do Mustang, e o carro voou na pista.
Eu não queria nenhum dos dois machucados, verdade fosse dita, mas
também não queria precisar cumprir minha parte numa aposta a qual eu não
tinha entrado.
— Ela está aqui! — Um garoto dos Viper me pegou pelo ombro e gritou. Eu
o empurrei com um solavanco.
— Me solte!
Alguém riu.
O olhar que eu dei ao locutor o fez perceber a merda que havia feito.
Eu não conseguia parar, mesmo que minhas botas tenham riscado o chão, as
pessoas pareciam ansiosas por aquele momento.
Engoli em seco, mas de uma hora para outra, entendi que queria evitar
aquilo porque, de um jeito sujo e vergonhoso, eu queria beijar Conrad.
Queria esfregar na cara de Isaac que ele havia feito uma cagada homérica.
E foi por isso que engoli toda e qualquer vontade de fugir, sentindo as
borboletas no meu estômago piores do que nunca, assumi a postura que
precisava.
Fechei os olhos de novo, tirei as mãos dos bolsos, girei os ombros para tentar
relaxar e, num último suspiro pesado, tomei coragem, abri os olhos
encarando-o, e enquanto queimava, dei o primeiro passo na sua direção.
meu pescoço e mandíbula, meu coração foi de zero a cem mais rápido do
que qualquer motor naquela tarde. Ele sentiu. Meu rosto queimou. Eu o
encarei.
Estávamos perto demais. Não havia nada entre o meu peito e o dele que não
fossem as roupas, ainda assim eu não o toquei.
— Acabe logo com isso. — Foi tudo o que consegui dizer, e o vi sorrir.
Com os olhos nos meus, Conrad se abaixou para acabar com a última
distância que havia entre nós e eu aguardei, sabendo que ele podia ouvir
muito bem as batidas do meu coração insano naquela pouca distância.
E não tive vergonha daquilo. Meu real problema era com o que acontecia no
resto. Minha pele parecia queimar onde ele tocava, e quando ele desviou da
minha boca para roçar os lábios cheios nas minhas têmporas, me afogando
com o cheiro do seu pescoço, meu ventre pulsou. Conrad arrastou a boca
contra minha pele devagar, como se provasse algo ali, causando uma
expectativa desgraçada.
Eu tremi sob aquele ataque baixo e tentei reclamar, mas o som que saiu da
minha garganta quando eu entreabri a boca foi quase um gemido.
— Ah, Red… Posso sentir o cheiro da bala de morango — ele disse tão
baixo que me causou arrepios.
Seus olhos vasculharam meu rosto, então desceram para minha boca e eu o
imitei.
Seus dedos acariciaram minha pele devagar, ele voltou a encarar meus olhos
e quando finalmente desceu para minha boca, quando seus lábios roçaram os
meus, Conrad caiu numa gargalhada tão cruel que tudo em mim pareceu
morrer.
— Você achou mesmo que eu ia beijar você? — isso ele disse alto, para que
todo mundo ouvisse.
Minha respiração acelerada machucou meus pulmões, mas nada foi pior do
que o riso em volta.
— Conrad… — soprei seu nome com tanta dor, mas não vi um pingo de
compaixão em seu rosto. — Você é cruel.
— E você é uma traidora mentirosa, mas quem está contando pecados por
aqui?
Naquele segundo, com toda a certeza, Conrad ouviu meu coração, aquele
que demorou anos e anos para conseguir se recuperar pelo menos um
pouquinho, terminar de se quebrar. Cada maldita borboleta no meu estômago
se transformou em vespa, e elas me picavam com tanta força que doía, e com
isso, mesmo que minha vontade fosse de socá-lo, mesmo que eu quisesse
reagir, não conseguia.
Era realmente demais para mim. Eu estava farta.
— Foi tudo o que consegui soprar para ele antes de sair pelo lado
Mas mesmo odiando, eu ainda amava Conrad Prince, e era uma idiota por
não ter visto isso antes.
conrad
é, eu estava procurando uma saída, agora não posso escapar. nada acontece
depois das duas, é verdade, é verdade. meus maus hábitos levam a você.
Porra, eu teria beijado Scarlet. Eu queria beijar Scarlet, mas ela não merecia.
Não depois de esfregar mais uma vez seu relacionamento com meu irmão de
propósito na minha cara. Ela não queria dar show?
— Filha da puta — xinguei mais uma vez, olhando para o caminho onde ela
tinha ido, imaginando a garota sozinha rodando pelas ruas que ela caminhou
um milhão de vezes no passado. Será que estar ali mexia tanto com ela
quanto comigo?
Talvez eu nunca fosse descobrir, ainda mais com a frase dela martelando na
minha cabeça.
Meu pai agora era controlável, meu irmão era frágil, fácil demais de quebrar,
e ainda que isso não fosse livrá-lo de um ataque futuro, o melhor jeito de
comer sua mente era mexer com o que ele se vangloriava tanto de ter
roubado de mim. Além de que, Scarlet era a única forte o bastante para
aguentar tudo o que eu tinha, tanto antes quanto agora. E eu a levaria ao
limite, tanto por ter me traído, quanto por ter se vendido.
Como ela podia me julgar cruel quando era ela quem deitava na cama de
quem deveria odiar? Quando comia na mesma mesa do homem que comprou
sua vida toda em troca de silêncio?
Isso não abalou John, e ele veio com as mãos no ar, pronto para me dar um
abraço.
Ele bateu nos meus ombros como podia e se afastou, dando um tapinha na
lataria do carro antes de encostar ao meu lado.
— Você nunca imaginou que eu fosse capaz de qualquer coisa que não fosse
foder com tudo, mas te perdoo, sua mente é realmente limitada, John Prince.
— Soprei a fumaça dos pulmões, joguei a bituca no chão e pisei sobre ela
antes de me apoiar ainda mais contra o capô.
Ele tentou fazer graça, sorrindo para parecer próximo de mim para qualquer
um que espiasse de fora. — Seu irmão não está acostumado a perder.
— Você não é tão esperto quanto pensa, filho. Armar aquela cena toda com a
pobre da Scarlet? O que foi? Ainda gosta dela ou só quis mexer com seu
irmão?
— Não, estou preocupado porque você está mexendo em algo que talvez não
possa controlar, e vá se arrepender.
— Quero dizer que seu irmão pode ser mais vingativo do que você espera, e
isso pode recair sobre ela também.
Dei de ombros.
— Ela quer ir? — Meu pai não pareceu surpreso. — Acho até que demorou
muito.
— Não.
Neguei com a cabeça, tirando o maço de cigarros do bolso para pegar mais
um.
pesei o tom, usando toda minha ironia — que você me deve, um deles é
manter Scarlet bem aqui. Ela não vai embora.
— Ótimo.
— Juízo, Conrad.
— Até mais, papai. — Acenei, num claro recado que nosso papo tinha se
encerrado.
John me deu as costas, e foi só ele se afastar que Bella e Thomaz chegaram.
— Você tinha que ver a cara dele! Enquanto você tava lá fazendo a ruivinha
passar vergonha, Isaac assistiu a tudo, e meu Deus, ela realmente ia beijar
você na frente de todo mundo! — Ela já estava bêbada e sua fala era meio
mole. — Você é um sádico louco, Conrad. Fez o casal brigar sem nem
mesmo colocar a boca na dela.
— O que não é verdade, já que você quase a beijou mesmo, não foi? —
Thomaz também não parecia sóbrio.
Bella se soltou no meu pescoço depois de beijar minha bochecha com muito
esforço.
— Até vou acordar pelado, mas não aqui. — E ele abraçou Bella que só
sabia rir.
Com a minha volta, achei que ela seria a primeira a se jogar em mim, mas de
alguma forma, Bella parecia ter amadurecido o bastante para entender que,
talvez, eu só fosse seu amigo e nada mais, pelo menos naquela fase da vida.
Não foi algo desagradável, mas foi esquisito entrar no carro e deixar os dois
para trás naquela noite. Quando, ao som de gritos, assobios e aplausos, eu saí
da pista, soube que precisava mergulhar minha cabeça em trabalho, ou
acabaria fazendo uma besteira.
Rodei um pouco pela cidade, fui perto da casa da minha mãe, me lembrando
de como foi encontrar uma boa casa para ela depois de todos os anos
embaixo do teto do meu padrasto, passando por tudo o que passei só para ela
ter onde morar… Por um minuto, pensei em descer, mas decididamente não
queria encontrá-la naquele humor desgraçado piorado pelas lembranças
todas. Até mesmo perto da casa do meu padrasto, onde cresci, eu fui, mas
quando percebi que poderia descontar nele toda aquela espiral de raiva que
sentia dentro de mim, estacionei o carro e bati no volante.
Com Scarlet longe, sem seu cheiro, sua pele, sua boca, seu corpo sendo
tentação, era muito difícil enxergar qualquer outra missão que não fosse
magoá-la tanto quanto ela me magoou. Que não fosse rasgar seu peito como
ela fez com o meu.
Que não fosse trair sua confiança, como ela havia feito com a minha.
Agora, comigo liberto, eu estava pronto para fazê-la pagar, e era culpa dela,
e só dela.
A chave no meu bolso voltou a pesar quando meus dedos bateram nela,
procurando meu isqueiro, mas me senti um covarde de merda. Não queria
entrar no galpão. Não queria ver o que o passado tinha de bom.
Nada era igual, e ver provas de que o passado existiu, sentir que ele
realmente tinha sido tão bom, me fez jogar a chave no porta-luvas do carro e
largá-la lá.
Eu não queria nada da parte boa, era o caos que me alimentava, e era nele
que eu me refugiaria.
Mais calmo, com a cabeça um tanto quanto mais limpa, dei partida e saí dali,
pegando o rumo da Prince University de uma vez, já que aquela madrugada
seria longa.
Já era quase meia-noite, estava escuro e uma garoa contínua e fria caía na
estrada vazia. No rádio do carro, Metallica tocava alto, e eu mal pude
acreditar no que meus olhos viram.
perguntei.
provoquei.
De repente, aquilo era mais divertido do que qualquer outra coisa no mundo.
— Nem morta.
Prefiro comer lama a beijar você, Conrad. Prefiro dar uma volta inteira no
mundo a pé a entrar nessa porcaria de carro.
— É, até porque — olhei em volta — essa é a única opção que você tem.
Está brava comigo, mas foi seu namorado que te colocou na merda e ainda te
largou aqui. Mas você é interesseira, não é, Red? Uma vadia interesseira. —
Os olhos dela queimaram, mas eu estava cansado de ser legal. — E amanhã,
mesmo com Isaac te tratando que nem merda, você vai estar embaixo do pé
dele. Eu deveria saber…
jaded,aerosmith
Era eu e todo o meu desespero, toda minha tristeza, toda a minha decepção,
sozinhos pelos corredores, e quando a chave girou na fechadura, eu me
arrastei para dentro, e tudo o que fiz foi cair na cama.
Como eu sabia que aconteceria, meu nariz acordou tapado, minha cabeça
doendo, e apesar do frio, sentia meu corpo suado.
Meu quarto estava claro, graças ao sol que batia contra a janela que tinha as
cortinas abertas, e eu pensei se não era melhor deitar e dormir mais, porém o
medo de entrar em um sonho lúcido com Conrad era tanto que pulei da cama
direto para o chuveiro.
Eu não ia esperar o dia seguinte para uma conversa definitiva com John
Prince.
Eu ia embora, e treinando mais uma vez o discurso que faria para o meu
tutor, subi até a ala mais alta do castelo.
— Até mais, Maressa — soprei antes de ter chance de dizer mais alguma
coisa e a secretária acenou com a cabeça. Havia algo sombrio, mas não tive
tempo de me concentrar em qualquer mensagem secreta. Não quando minha
mente reforçava o discurso pré-pronto que havia feito para me despedir
daquela vida.
Assim que John me abraçou e me passou para dentro de sua sala quentinha,
fechou a porta e veio indicar a poltrona próxima à sua mesa para que eu
sentasse.
Quase engasguei.
— Viu?
— Ah, bem… Noite passada foi uma pequena bagunça — com as mãos
juntas dentro do bolso da blusa, encarei meu colo —, acabei tomando chuva
e peguei um belo resfriado.
— Conrad foi um idiota de provocá-la como fez, mas Isaac jamais poderia
ter colocado você em jogo, não é mesmo?
John foi mais meu pai que meu avô um dia conseguiu, e era por isso que eu
o amava. Ainda era um fantoche em suas mãos?
Tinha. Mas não podia jogar fora e excluir as partes boas da nossa relação, e
por conta disso, não consegui me conter.
Desviei o olhar para a janela e a limpei como se não fosse nada antes de
conseguir encarar o homem que cuidou de mim nos últimos anos.
— Minhas notas estão abaixando porque eu não consigo mais lidar com a
pressão que a presença de Conrad vem causando —
desabafei, encarando os olhos do reitor, em um tom de voz mais alto para ser
ouvida. — E não acho que isso vá melhorar. — Ri sem graça e não parei
mais nenhuma lágrima. — Sei que é infantil vir até você para me queixar
disso, e como falei, Conrad é seu filho e tem até mais direito do que eu de
estar aqui, mas… — suspirei —... eu não consigo mais. — Minha voz saiu
em um sussurro.
tão longe mesmo sob todo o falatório. Conrad não é fácil, mas é meu filho, e
você, apesar de tudo, também é. Sei que quer ir embora, que a pressão é
demais, e que o pedido deste velho não deveria ser tão levado em conta, mas
aqui e agora, Scarlet, eu gostaria de manter minha família unida durante esta
guerra. Você acha que consegue aguentar um pouco mais por mim? Só até eu
me recuperar, ou até seu aniversário? Não gostaria de perdê-lo.
Meu aniversário era em janeiro. Ainda tinha todo o final de outubro pela
frente, um novembro e dezembro intensos…
Ergui-me, indo até ele e peguei o potinho para ler a embalagem, mas não
havia nada, nem etiqueta, nem uma marca.
— Faz um tempo…
— Farei meu melhor nisso — concordei. — E você, por favor, não deixe de
me dar notícias.
Ok, que ele era uma pessoa extremamente racional, por vezes, muito frio e
arrogante, mas John Prince tinha me dado tudo e além do que precisava para
me recuperar, para ter uma boa vida, e sim, de algum jeito torto e esquisito,
eu era parte da família.
Apesar da promessa de ficar pelo menos até o meu aniversário, não tinha
como relaxar. Eu precisava de dinheiro, e continuaria juntando cada mísero
centavo que conseguisse, sem distrações, e o mínimo envolvimento entre
Conrad e Isaac.
Na segunda-feira, quando saí do meu quarto para assistir à primeira aula, me
surpreendi com um Isaac recém-saído do banho,
Por um minuto, eu não soube o que falar, mas com a movimentação em volta
de nós, fechei a porta e o encarei.
— Mais efetivo que um buquê de flores, mas não vou ser comprada com um
copo de café. Tenha um bom dia. — Dei as costas para ele, mas o conhecia
bem para saber que ele insistiria.
Como se alguém tivesse colocado gasolina nas minhas veias e Isaac fosse a
fonte de calor mais próxima, eu explodi.
— Ah, pelo amor de Deus. — Revirei os olhos e voltei a andar, mas ele
pegou meu braço.
— Você não tem que querer nada, porque eu já decidi por nós.
— Espere! — Ele tentou mais uma vez, mas era tarde demais.
Fiquei tentada a roubar o café, mas foi mais legal sair andando e deixá-lo ali,
pensando em tudo o que tinha causado, em como me machucava. Era bom
que ele sentisse minha falta, eu não queria mais correr atrás do rei do mundo.
Antes de entrar na aula, feliz por começar a colocar as coisas no lugar, levei
mais um daqueles comprimidos à boca. Queria correr atrás do tempo perdido
e, de fato, eu não me lembrava de uma aula tão bem aproveitada quanto
aquela.
conrad
não é do seu feitio pedir desculpas. eu estava esperando por uma história
diferente. dessa vez eu estou errado por entregar a você um coração que
valesse a pena partir e eu estive errado, eu estive deprimido. estive no fundo
de todas as garrafas, estas cinco palavras dentro da minha cabeça gritam: nós
ainda estamos nos divertindo?
Scarlet gritou sobre ser humilhada, ser deixada para caminhar até aqui
debaixo de chuva e Isaac não soube nem mesmo responder, só ficou lá como
um palhaço pedindo desculpas, é isso que estão dizendo — Bella contou.
— Qual o plano?
Ela e Thomaz foram sentar e eu fui até o final da sala confirmar minha
presença.
que eu ensinei, anos atrás, para os dedos deslizarem melhor sobre o controle.
Por quatro rodadas, eu joguei; Scarlet também, até que, na semifinal, fomos
chamados.
Levou alguns minutos e, no meio deles, pensei que ela desistiria, que fugiria
pela memória que aquele ato traria para sua mente. Que, como a maldita
mentirosa que era, correria da possibilidade de me enfrentar e encarar o
passado.
Repetiram nossos nomes, e nada dela, mas no último segundo, quando achei
que Scarlet tinha mesmo ido embora, ela finalmente surgiu, abrindo caminho
e pegando o controle. Só então fui para o lado dela.
— Olha só, como nos velhos tempos… — provoquei quando percebi que ela
não queria papo.
debochei.
— Nem fodendo.
Era óbvio que eu não cumpriria com a minha parte do acordo, mas ela não
precisava saber.
Ela, na verdade, foi mais rápida do que eu para escolher o que queria, e
quando vi que selecionou Kung Lao, eu escolhi Shao Kahn.
A atmosfera à nossa volta ficou densa, e assim que o jogo começou, fui para
cima dela sem pensar duas vezes. Scarlet defendeu bem, tomou pouco dano
do que eu esperava e então veio devolver o que eu tinha dado com muito
mais intensidade.
ombro e disse:
E dando as costas, ela foi embora, me deixando louco de ódio, com as veias
queimando para pegá-la pelos cabelos. Eu só não sabia se queria matá-la ou
fodê-la. Talvez os dois, mas não conseguiria descobrir, não tão cedo.
scarlet
canyouholdme,nf
Minhas coxas suavam na parte de trás, onde ficaram em contato com banco
do carro do meu avô naquela tarde e eu fiz o melhor que pude para me
manter fresca com o vento da janela, o que foi por água abaixo quando ele
estacionou seu carro antigo em
Nos meus pés, não havia uma segunda opção, e os tênis de sempre estavam
lá.
Assim que os bati sobre a calçada ao descer do carro, me arrependi de não
ter prendido o cabelo, mas não tive tempo de fazer qualquer coisa, já que
quando encarei a fachada da casinha novamente, lá estava ele na janela,
dobrado sobre o parapeito.
Eu duvidava muito.
— Se eu disser que ela não é minha amiga, você vai implicar, caso eu a leve
para o meu quarto? — ele disse para a mãe com os olhos em mim e eu quase
tropecei no degrau da entrada.
— O quê? — a mãe perguntou, por não ouvir com clareza, mas Conrad não
repetiu.
O sorriso que ele deu quando viu minha reação foi um dos mais lindos que
eu já tinha visto.
Tínhamos deixado claro que não queríamos ser só amigos, mas com a minha
falta de experiência, eu não fazia ideia do que havia no meio do caminho
depois disso.
— Gosto muito deles — assumi, dócil, realmente ansiosa para ver Caroline.
— Por favor, tente não dizer nada sobre… — Sua voz saiu em um sussurro,
eu precisei me esforçar para ler seus lábios, mas ele não conseguiu terminar
o recado.
Ela era mais baixa que ele, mas ainda mais alta do que eu.
O cabelo escuro estava na altura dos ombros e uma franja meio infantil
cobria sua testa.
Seus olhos eram claros, muito diferentes dos do filho, mas eu conseguia ver
Conrad no desenho de sua boca cortada, e talvez o veria melhor se a maçã
direita de seu rosto não estivesse tão roxa e inchada.
— Você deve ser Scarlet — animada, como se não houvesse nada de errado,
ela me cumprimentou com um sorriso caloroso.
— Caroline? — Ela confirmou com a cabeça.
ruim quanto por fora. Engoli em seco, quando pensei sobre Conrad vivendo
entre dois mundos completamente diferentes.
— Mãe…
— O quê? É verdade. — Ela parecia feliz por fazê-lo passar por aquilo pela
primeira vez.
Encarei o gesto com o coração flutuando e, sem pensar duas vezes, a peguei.
Foi o tempo dele se aproximar e sussurrar:
— Obrigado.
Eu tinha entendido, mas isso não significava que não queria perguntar,
mesmo entendendo que talvez não fosse a hora de
saber.
Havia uma porta que dava na sala que, por um momento, pensei ser o
banheiro, porém, quando olhei para o corredor e vi a porta do banheiro
aberta, desconfiei que fosse o quarto da mãe. E
se era assim, a outra porta, preta, era dele. Se não houvesse nada segurando,
meu estômago teria saído voando quando ele colocou a mão livre na
maçaneta e a girou.
Parecendo inseguro pela primeira vez, Conrad parou sob o batente da porta e
me colocou para dentro, soltando meus dedos para que eu pudesse olhar as
coisas mais de perto.
Vi uma estante no fundo do quarto com alguns títulos que não conhecia,
algumas fotos com a mãe quando mais novo, um pote
— Não sei se algum dia vou te levar em casa, principalmente, ao meu quarto
— falei, tocando nos pequenos objetos dele, sabendo que isso o provocaria
de alguma forma.
— Porque, antigamente, ele era um armário. Quando nós viemos morar com
meu avô, a casa já era pequena e cheia de coisas, mas Susan foi mais esperta
e reivindicou o único quarto disponível. Vovô, já sabendo que não seria fácil,
ou seguro para mim, manter duas adolescentes no mesmo ambiente, liberou
o armário do corredor.
— Eu tenho sorte por esta casa ser a última da rua. Consigo uma visão boa
do céu daqui também — ele indicou a janela —, mas raramente me lembro
de olhar.
— E você mora aqui há quanto tempo? — A pergunta causou desconforto.
— Desde os cinco anos. É o mesmo tempo em que minha mãe está com meu
padrasto. Esta casa é dele. — O tom de Conrad era morto e fiquei sem saber
para onde ir com a conversa.
Juntei as mãos sobre o colo, não querendo abrir uma porta a qual ele não se
sentia confortável para compartilhar e encarei
minhas unhas.
Por alguns segundos, pensei que Conrad tinha se arrependido de me levar até
lá, mas não conseguia encontrar palavras para dizer que eu estava feliz por
ser a primeira ali.
Quando tentei formular uma frase decente, ele suspirou ao meu lado,
escorregou para a beira da cama e abriu a gaveta embaixo da mesa.
Até então, ali dentro, ele não havia me encarado, e continuou assim quando
colocou o controle no meu colo.
— É sério?
— Não, claro que não. — Tentando ser sério, Conrad juntou as sobrancelhas.
— Vamos de novo.
Mas eu não era tão boba. Tinha usado a primeira vez para ver que comando
fazia o que, e via como Conrad combinava botões para conseguir golpes
com poder. Minha segunda rodada foi usada para descobrir isso. Na terceira,
eu realmente dei trabalho e ele resolveu reagir. Dessa vez, ele não me deixou
ganhar e, apesar de ter entendido como funcionava, não tinha um décimo da
sua prática.
— Não era você que não tinha me deixado ganhar? Eu só estou tentando
fazer por merecer. — Virei o rosto, apoiando o
queixo no ombro, não fugindo dos olhos escuros que, naquele dia, pareciam
ainda mais sombrios. — O que foi que aconteceu?
— O que foi? — Tão próximo, senti sua respiração contra o meu rosto e não
me movi.
Minha pele toda arrepiou de uma vez, meus pés pareciam formigar, e quando
neguei com a cabeça, ele, tão lentamente quanto podia, girou o corpo para
ficar de frente para mim.
Eu era uma pequena mariposa naquele segundo. Conrad era a luz que
confundia meu radar. Eu queria chegar até a lua, mas havia encontrado algo
muito mais quente, mais brilhante, mais intenso e, mesmo que me queimasse
no processo, não conseguia desviar.
— Você devia corrigir sua mãe — apontei quando notei que ele não ia se
afastar.
— É.
— Por quê?
— Eu também não. Não mais. — Pouco a pouco, ele veio para perto.
Seu nariz estava a cinco centímetros de distância, seus olhos nos meus
pareciam ter me enfiado em um transe sem volta, e eu suspirei
profundamente esperando pelo meu primeiro beijo.
— Red. — Ele ajeitou a mão em mim e seus dedos acariciaram parte da
minha nuca.
Depois daquilo, não teria volta. Depois daquilo, nada conseguiria tirar
Conrad Prince do meu sistema. Depois daquilo, não importava quantos
viessem, ele sempre seria o primeiro.
— Eu…
— Você não deveria estar aqui! — Ouvi Caroline gritar e então, o olhar de
Conrad se arregalou. Sua mão na minha nuca pesou.
— Não saia daqui. — Era uma ordem séria demais para alguém de só
dezesseis anos dar.
Conrad se afastou e saiu do quarto tão rápido, que eu não entendi o que
acontecia até estar de pé, seguindo-o, preocupada.
— Moleque folgado, por que não manda aquele seu pai me pagar para
aguentar você e a puta da sua mãe? — E o homem não parou. Com os
punhos e pernas, mesmo alterado pela bebida, atingiu Conrad como dava.
— Pare! PARE! Pelo amor de Deus! — Caroline se jogou entre eles, ganhou
um soco, empurrou o marido. — Ah, meu Deus! — Ela
agarrou Conrad, havia sangue em sua mão, eu quis gritar, mas mal tive
tempo.
Juntei-me à parede, querendo ter algum poder mágico nas mãos para me
tornar parte dela, mas nada aconteceu. Ele lambeu os lábios como se eu
fosse suculenta e arrancou o cinto que prendia suas calças com dificuldade.
De algum modo insano, por nada, ele queria me bater também e, por um triz,
achei que faria.
Minha garganta ardeu, meu coração pareceu voltar a bombear sangue, mas
nada me preparou para ver Conrad tão descontrolado sobre o outro, socando-
o de uma forma quase animalesca.
— Você não vai tocar nela! — A frase saiu entredentes, quase rosnada.
A coisa toda era tão caótica que, quando o padrasto parou de reagir, Conrad
pareceu se acalmar, empurrou a mão da mãe e me encarou.
Havia vergonha, medo e raiva em seu olhar, mas nada disso me afastou.
Assim que ele se levantou, me joguei contra ele, abraçando-o com tanta
força, tão assustada, que quando percebi, ainda estava agarrada a ele, mas do
lado de fora da casa.
Levou, pelo menos, meia hora antes de eu me afastar o bastante para olhar
para o seu rosto, e nele eu não consegui ler nada. Com medo do que viria a
seguir, grudei de novo a cabeça contra seu peito e agradeci por ele não dar
nenhum indício de que iria me largar.
—... está bem? — Sua pergunta era baixa, dura, distante, ainda assim,
queimou nos meus ouvidos.
— Não. E você?
Sem pensar muito, minhas mãos foram parar em suas bochechas, meus olhos
nos dele eram sérios, inquisidores, reais demais para ele tentar ignorar.
Conrad me largou, desviou o rosto do jeito mais brutal que poderia fazer, e
como se não se importasse, tentou me ferir.
— Vá em frente, Red. Vá embora e amanhã espalhe para a cidade toda. A
casa miserável que vive o Prince bastardo, conte o que viu aqui…
— Se você acha que eu faria algo do tipo, você não me traria aqui. Acha que
eu me importo com sua casa? Acha que vou te abandonar depois de ver o
que eu vi? Você só pode estar louco.
Os olhos dele estavam naquele modo em que eu não sabia onde começava
uma coisa e terminava outra. Conrad lia minha alma naquele segundo e,
mesmo assim, ele me testava.
— E o que vai?
— Diga agora que me quer longe, que isso tudo foi um erro, que vou embora
nesse instante, mas não pense que isso tudo lá dentro poderia me machucar
mais do que ficar sem você.
— Você tem quatorze anos, Scarlet. — Eu odiei ouvir meu nome naquele
minuto. — Não sabe o que diz.
Foi aí que tudo girou. Conrad me afastou e, mesmo no meio da rua, mesmo
evitando fazer isso por todo o tempo em que eu o
observava secretamente, Conrad tirou a blusa e eu vi o horror que haviam
feito dele.
Meu horror não o conteve. Conrad, evitando olhar para o meu rosto, girou, e
então se ainda havia em mim alguma lágrima presa, ela se soltou ali.
Suas costas eram marcadas na parte de cima com várias e várias outras
cicatrizes. Alguns machucados eram recentes e se tornariam novas marcas
muito em breve.
Aquilo não era obra de uma ou duas surras. Aquilo era a prova de uma vida
inteira de agressões. Era feio, doloroso, pesado.
— Não há Deus nenhum nisso. — Foi a resposta mais dura dele naquela
tarde.
— Vai, Red. Você não precisa ficar por pena de mim. — Ele evitou me
encarar daquela vez, mas eu vi as lágrimas se acumulando nos seus olhos.
você está contando isso da forma como vê, como se a verdade fosse o que
você decide. algumas pessoas vão acreditar e algumas vão ler nas
entrelinhas.
As cinzas do meu cigarro estavam indo para dentro do copo de café vazio
que eu tinha largado sobre a mesa, mas sentada na
Isaac tentou contato o dia todo. Precisei desligar o celular quando ele sugeriu
que eu queria beijar Conrad e isso o magoou.
Eu não queria mentir, mais uma vez, então esperei que o meu silêncio me
acobertasse da verdade, mas lá no fundo, esfregando suavemente meu lábio
inferior com os dedos, quase conseguia senti-lo na minha língua.
Nosso primeiro beijo foi caótico, me senti no céu, fui guiada por um anjo
mesmo que ele estivesse no meio do inferno. E ainda que a memória
estivesse fresca como se eu ainda estivesse lá, conseguia ver a linha onde
minha lealdade a Conrad ainda teimava em existir.
Mesmo depois de tanto tempo, eu nunca tinha aberto a boca sobre aquele dia
para ninguém. Eu nunca contei sobre seus segredos, sobre seus medos, sobre
toda aquela loucura da qual ele tinha vergonha.
Eu nunca o expus ao ridículo, nem faria. Não era o meu jogo, ao contrário do
dele.
— Falta pouco — repeti para mim mesma no escuro e dei mais uma tragada
no cigarro.
Pelo menos, ela tinha um prazo para acabar, e eu não gastaria mais tempo
com aquela loucura de família. Quando o relógio no meu pulso vibrou às
23h50, apaguei o cigarro com mais força do que o necessário na sola da
minha bota, e pegando os papéis que precisava, saí para a entrega daquela
noite.
O garoto dos Badgers, que já havia comprado comigo algumas vezes, não
falou nada quando me viu. Separei seu trabalho, ele me passou o dinheiro e
eu dei as costas em silêncio depois de conferir
— Costumava ser, e é por isso que ninguém vai acreditar se você abrir a
boca, entendido? — Meu tom mais ameaçador saiu no automático, e os
olhos claros dele pareceram entender o recado.
Ele me passou o dinheiro, entreguei o trabalho e dei as costas sem dizer mais
nada.
A última entrega era no dormitório de uma garota que havia ficado doente e
eu não tive alternativa, a não ser entregá-lo em mãos, dentro do prédio.
Ela era uma Bird, e apesar de parecer inteligente, era alguém que
sempre pedia ajuda extra bem no final do semestre. De tudo, eu não podia
reclamar. Minha taxa de urgência era alta, mas quase pensei em ignorá-la
para todo o sempre quando virei o corredor e a vi lá, de camisola, cabelos
soltos, bem-arrumada, acompanhada por Conrad.
— Eu juro que não sei, mas posso te ajudar nisso — ela flertava baixinho
com ele e eu quis vomitar. Era uma pena não conseguir voltar pelo caminho
que havia feito, já que pelo som dos meus passos, ambas as cabeças giraram
na minha direção.
Podemos ir até ali? — Indiquei o outro lado do corredor, longe dele, para
fazer aquilo.
Por um mísero segundo, desviei o olhar para o rosto dele, querendo ler sua
reação.
Ele era mesmo amigo dela? Pela sua falta de expressão, eu diria que não,
mas e se fosse isso ou algo a mais? Meu peito queimou. A vontade de
picotar o trabalho dela virou um pequeno monstrinho dentro da minha
cabeça, mas me contive quando a vi vindo na minha direção, balançando os
cabelos castanhos, parecendo no céu por ter a atenção de Conrad Prince.
— Achei que estivesse doente. — Meu tom de voz foi duro com a menina.
Como eu poderia fazer aquela garota calar a boca e não contar nada para
Conrad?
— Mas eu fiz aquele nosso trabalho. Vim te trazer agora que terminei, leia,
faça algumas correções, se quiser, te encontro
amanhã na aula — falei alto para que ele ouvisse e não achasse que tinha
algo de errado.
E burra o bastante para não entender que eu realmente não podia me foder
com Conrad mais do que já estava fodida, ela me ofereceu o dinheiro na
frente do desgraçado.
Fechei os olhos, aceitei, e jurei por Deus e todos os santos que nunca mais
aceitaria nenhum trabalho dela.
Quando dei as costas para Peggy naquela noite, sabia que as consequências
viriam, e tão certo quanto poderia ser, meu celular vibrou antes mesmo de eu
entrar no meu quarto.
Vendendo
trabalhos
esta
hora da noite,
Red?
Não é da sua
conta.
minha
conta.
merda de boca
fechada?
Está
tentando
negociar, Red?
é pegar ou largar
Vou pensar em
se
preocupe.
Continue
trabalhando
na
ilegalidade,
combina
com
você, trapaceira.
O ódio por Conrad ganhou naquele segundo, e precisei ser rápida para voltar
ao meu quarto e gritar contra o travesseiro todos os palavrões que conhecia,
antes de haver possibilidade de eu bater em sua porta.
Também descobri da pior forma que o remédio que ele havia me dado tinha
um efeito esquisito. Se eu começasse a estudar depois de tomá-lo, aquele
seria meu único foco, mas se minha cabeça puxasse qualquer outra distração,
ficaria presa nela, e naquele minuto, eu estava arrependida de ter abusado da
dose, tomando um comprimido a cada quatro horas, para desperdiçá-lo
encarando o teto.
Eu só não imaginava ter que colocar algum deles em prática naquela noite.
Não eram nem seis da tarde quando meu celular tocou e meu estômago
pareceu mais pesado que um saco de cimento quando atendi a ligação de
John Prince.
— Alô? — perguntei, esperando pelo tom de voz duro.
Gostaria de chamar você e meus filhos para um jantar em família, acha que
pode fazer isso por mim?
— Certo, até.
— Merda — soprei o palavrão pulando para fora da cama e indo para baixo
do chuveiro, sabendo que não teria alternativa que não fosse fazer o papel da
garota agradecida e gentil, mesmo que minha vontade fosse mandar meio
mundo à merda naquele dia frio de outubro.
Quando adentrei pela porta de vidro e cruzei a casa para chegar à antiga sala
de jantar dos Prince, decorada como anos atrás, respirei fundo pela volta da
memória a qual eu fugia sempre que me via refletida no espelho atrás da
mesa.
— Estou chegando ao ponto da vida onde acredito que fui um péssimo pai e
um ótimo administrador. Veja, não te criei, mas cuidei da sua vida, e você é a
única aqui. — Ele serviu minha taça com o espumante que estava bebendo.
— Bom, eu ainda sou menor de idade — avisei, vendo a taça sendo enchida
até a boca quase.
— E fuma e bebe desde nova, pelo menos, essa parece ser uma tradição
nesta casa e uma falha na minha administração. É, talvez eu não seja nem
bom pai, nem bom administrador. — Ele riu sem graça.
— Não. Não era. — Peguei a taça e dei longo gole, resolvendo ser um pouco
honesta. — Mas você cuidou de mim, mesmo que isso tenha sido só uma
contenção de danos.
O olhar que ele me deu foi o único que eu imaginava que não ganharia.
— Mesmo que não seja mais uma garotinha inocente, a qual desconfio que
você nunca foi, não é?
— Hm… Isaac primeiro? — Ele pegou sua taça, cruzou os braços e esperou.
— Acho que seus filhos são muito parecidos, John. Os defeitos… Nenhum
dos dois gosta de esperar, nenhum dos dois aceita ser contrariado. Eles
odeiam a possibilidade de alguém comandá-los, gostam de mostrar que são
bons, não, que são os melhores…
— E o que os difere?
— Os motivos para fazê-lo. — Era real, e foi duro ouvir o que veio em
seguida.
Ri sem graça, tentando encarar aquilo com uma leveza que não tinha.
— Não. — Era uma meia-mentira. Era não para um deles, mas pelo outro?
Foi por isso e muito mais. — Conrad sempre esteve lá, e Isaac... — Sorri,
lembrando em como ele veio ganhando terreno, se
esforçando para conquistar seu espaço, sabendo que competia com o irmão
dia e noite, mesmo sem o outro estar presente. — Isaac fez por merecer.
— Talvez eu precise conversar com meu filho, para saber como fazer um
relacionamento durar — ele brincou, mas eu não ri daquela vez.
— Você terminou com ele depois do que ele fez? Se sim, eu não a julgo.
— Porque ela não quis, que fique claro. — A voz de Isaac me chamou para
prestar atenção na porta.
Seus olhos estavam um pouco fundos, mas, de resto, meu não sei se ex ou
atual namorado, estava perfeito. A blusa de mangas compridas de tecido
fino se agarrava aos músculos dos braços, sua barba estava começando a dar
o ar da graça e os cabelos estavam perfeitamente arrumados.
Ele veio até mim e, por trás da minha cadeira, se curvou para beijar minha
bochecha.
— Olá. — Seu tom era carinhoso e imponente. Eu sabia que não escaparia
de uma conversa com ele naquela noite. — E oi, pai.
John se ergueu para abraçar o filho e indicou o lugar à sua esquerda para que
Isaac se sentasse.
— Conrad não vem? — ele encarou o lugar vazio e perguntou, olhando para
mim.
— Sei dele tanto quanto você. — Tentei meu melhor tom de desprezo.
Todos falamos um pouco sobre como ia o torneio, John falou dos filhos com
orgulho, e na ausência de Conrad, alimentou o ego de Isaac. Falei um pouco
da minha jornada de estudos, expliquei que estava querendo focar em
melhorar minhas notas de novo e Isaac contou as novidades do campus que
o pai não sabia.
— Estou tão relapsa… A última vez que o vi, foi pouco depois do começo
do semestre. Já faz um mês que não apareço. — A culpa junto do álcool
marejou meus olhos.
Eu deveria ser uma neta melhor, mas depois de tudo, como poderia?
— Você é ótima, querida. Ele entende que sua vida é agitada agora. Me
deem licença por um minuto? — O patriarca Prince se levantou e foi na
direção do lavabo, deixando a mim e Isaac sozinhos na mesa.
— Se quiser, amanhã não vou usar meu carro. Me ofereceria para ir com
você, mas terá um jogo em outra cidade, vamos jogar
contra outra universidade e, como você odeia isso e não vou poder implorar
para me acompanhar desta vez, acho que seria legal visitar seu avô.
Suspirei e deitei a cabeça para trás, não querendo lidar com aquilo.
— Você… — Eu ia dizer que ele também podia usar seu tempo para analisar
a situação, mas ouvi a porta do banheiro destrancar e soprei: — Estamos em
um tempo, certo?
— De onde paramos?
Horas mais tarde, depois da minha sobremesa favorita ser servida, John
anunciou que precisava se recolher e Isaac disse que me levaria embora. De
qualquer modo, eu não recusaria a carona, mas sabia que a viagem de meia
hora seria cheia de uma conversa que não sabia se queria ter. Para minha
sorte, quando entrei no carro, Isaac quis me comprar com memórias e todas
as músicas
— Eu sei o que você está tentando fazer… — Meu tom de voz era baixo, e
apesar do meu sorriso, era um alerta.
— Eu sei que você sabe, mas preciso te mostrar que temos mais boas
memórias do que ruins. Sei que falhei, e que vou falhar muito mais, Scarlet,
mas não quero desistir de você. — Ele suspirou e, com cuidado, pegou
minha mão que estava pousada no colo e, entrelaçando nossos dedos, a levou
para o seu rosto. — Por favor, não desista de mim, ainda.
— Isaac… — Suspirei mais uma vez e recolhi a mão que ele havia pegado,
soltando o cinto de segurança e me ajeitando para ficar de frente para ele. —
Eu amo você, isso não se perde do dia para a noite, mas realmente preciso de
um tempo. Preciso respirar…
sorrimos. Era difícil dizer não quando ele assumia aquela postura e parte de
mim gostava muito daquela sensação de controle. Só por isso, permiti que
ele chegasse perto o bastante para tocar o nariz no meu. — Não demore.
Sinto muito sua falta.
Isaac estava perto demais, e de um jeito ruim, ele era minha âncora.
E quando dei por mim, quando os lábios do garoto loiro roçaram nos meus,
tentei expulsar Conrad do meu sistema e beijei seu meio-irmão.
Beijei o garoto que permiti entrar, que se esforçou dia e noite para ter sua
chance, que batalhou contra a merda de uma memória forte demais para ser
superada e que agora voltava para nos assombrar.
Eu quis amá-lo acima de tudo, e por causa de tudo, mas não era algo que eu
pudesse comandar. O coração tinha suas regras e, para o meu azar, o meu era
insanamente louco e gostava do perigo, ainda mais quando ele vinha
acompanhado por um par de olhos escuros mais profundos do que qualquer
abismo.
— E eu estou tentando aceitá-las. Não deveria ter beijado você. — Não parei
para me despedir, virei o corpo para abrir a porta e, do mesmo jeito que tudo
tinha começado bem, terminava em completa ruína.
Não entendia aquele sentimento de luto por alguém que ainda estava vivo.
Mas sabia que, por causa do que sentia, se Isaac desconfiasse, com certeza
eu morreria para ele, e eu não tinha certeza se conseguiria sobreviver
sabendo que machucava a única pessoa que se preocupou em me fazer
inteira de novo, depois de tudo o que havia acontecido.
scarlet
eu ainda escuto sua voz no trânsito, nós dois rindo por cima de todo aquele
barulho. deus, eu estou tão triste, sei que terminamos, mas eu ainda te amo
pra caralho, amor.
driverslicence,halocene.
vez eu vi o sol ganhar força naquele outubro, e a primeira coisa que fiz foi
vestir uma das minhas saias favoritas. Ela era curta, preta com riscas
brancas, rodada e de cintura baixa. Junto de uma regata simples mais
curtinha que exibia meu piercing do umbigo, caso eu me mexesse muito,
joguei a jaqueta de couro por cima, coloquei as botas mais pesadas que tinha
no armário, e depois de tomar uma das — carinhosamente apelidadas de —
estrelinhas da concentração, peguei minha bolsa, acendi um cigarro e desci
para o estacionamento.
Ainda assim, eu não tinha outra opção naquela manhã. Me adaptando aos
vidros escuros, tirei o carro da vaga sem dificuldade alguma e, quando passei
pelo lugar que sabia que Conrad parava o carro, espiei a vaga vazia um
pouco decepcionada, um pouco aliviada, e me senti idiota.
Será que existia alguma magia, algum feitiço, que pudesse fazer aquele
sentimento desaparecer? Será que um dia, de tão machucada, eu só o olharia
com o desprezo que ele merecia?
Esperava que sim, àquela altura, ele não havia me chantageado e eu não
sabia se era porque tinha esquecido ou porque estava armando algo maior e
mais maligno do que antes.
Sentia-me uma neta relapsa, mas meu avô entendia que eu tinha mudado. Ele
não era do tipo de forçar, e eu sabia que, apesar de tudo, sua vida naquele
lugar era muito boa.
Vovô não tinha os joelhos tão bons quanto quando era novo, e eu sabia que
ele às vezes acabava dormindo na sala da nossa antiga casa porque tinha
dores para subir as escadas. Ali, seu quarto era no térreo, e para ajudar, agora
ele usava uma bengala vez ou outra.
— Cheguei…
Ele ainda era o militar de coração mole que eu amava e que nunca sabia
direito como começar uma conversa, mas que demonstrava em atitudes o
quanto se importava.
— Um pouco corridas…
— Perfeito.
— Você sempre avisa quando vai vir, por que não fez isso hoje?
— Ah… — Olhei para frente, para vista bonita que o terreno verde e cheio
de árvores tinha, tomando coragem de contar para o meu avô o que
precisava. — Eu só quis vir. Precisava te ver —
encarei minhas mãos no colo e brinquei com a chave do carro —, não quero
falhar com você mais do que já fiz.
— Pare com isso. Você é boa, é jovem, precisa superar o passado e viver sua
vida.
— C-como?
— Espere. Você está dizendo que Conrad Prince esteve aqui, hoje?
— Sentado nessa mesma cadeira. — Ele fez que sim com a cabeça. — Ele
foi minha visita da manhã.
— Eu posso estar velho, mas ainda estou lúcido. — Ele tocou com a ponta
dos dedos na cabeça. — John Prince pode mandar na sua vida enquanto você
deixa, mas não manda na minha. O garoto não é um monstro.
— E eu não acho que nem ele, ou você, deveria se culpar pelo resto da vida
pelo que aconteceu.
— Eu não me culpo. — Tinha mágoa na minha voz, e eu não entendia o
motivo.
Minha garganta ganhou um nó, meu estômago parecia prestes a colocar todo
o café que eu tinha tomado para fora, minha cabeça doeu.
— Vô…
— Eu volto para te ver. — Foi o que consegui dizer quando abracei meu
avô.
— É bom que volte mesmo, menina. — Dando mais tapinhas carinhosos nos
meus braços, ele me liberou para ir.
E achando que não podia ficar pior, saí do quarto meio tonta, fora de mim,
até chegar à beira do corredor, de frente para a recepção, e dar de cara com
Conrad.
Não tá nem dando uma cuspidinha, né, universo? O dedo no meu cu vai
entrar no seco — pensei.
— O que você faz aqui? O que veio falar com meu avô? — eu o ataquei sem
pensar duas vezes, e ele, que estava de costas, me olhou sobre o ombro com
tanto desprezo naqueles olhos pretos que quis arrancar minha própria pele.
— Está com a chave daquela merda de carro aí? — Ele não estava no melhor
humor.
Ele suspirou, virou de costas para o balcão e mirou o chão por um segundo
antes de decidir me pedir algo.
Oi?
— Quê?
— E o que faz você pensar que vou dar? — Seus olhos engoliram minha
resposta atravessada e ele sorriu daquele modo cruel ao qual eu odiava.
— O que te faz pensar que pode recusar qualquer coisa que eu pedir? Ou
esqueceu que eu sei do seu esqueminha sujo?
E ele foi para fora, não me dando alternativa a não ser ir atrás.
Ele estava no lugar certo mesmo, era uma víbora venenosa. Suas botas
pesadas fizeram barulho contra os pedregulhos do caminho e ele me olhou
sobre o ombro para ver se estava atrás dele.
— O que pensa que está fazendo? — perguntei, indo para o mesmo lado que
ele.
— Acha mesmo que vou deixar você dirigir? — A arrogância em seu tom
me fez querer socá-lo. — Vamos, passe a chave logo.
— Em quantas línguas você quer ouvir que não me importo com isso, Red?
— Era nítido que ele se divertia. E com a mão esticada na minha direção,
voltou a me apressar. — As chaves.
Encarei os dedos, agora tatuados, ainda tão brancos e bonitos quanto antes, e
suspirei.
Aonde vamos?
— As chaves.
Conrad recolheu a mão, girou para ficar com o corpo de frente com a porta e
apoiou os punhos em cima do carro. Sem me encarar, ele cumpriu com sua
parte.
— Vim pedir desculpas para a única pessoa nesta cidade a qual eu devia
alguma coisa.
— Então meu avô não enlouqueceu… Você realmente veio fazer isso. Uau.
— Soltei um riso cheio de ironia. — Não sabia que você era capaz de sentir
remorso.
— Parece que temos a mesma opinião um sobre o outro. Por que está com o
carro do meu irmão hoje? Deu a boceta em troca da chave, já que vocês não
são mais um casal? — Ele queria me ofender como o troco por se sentir
ofendido.
Joguei a chave na direção dele com força, queria que pegasse na cabeça e o
machucasse, mas Conrad foi rápido ao mover o braço, pegando a chave no
ar.
— Existem algumas coisas que não mudaram, uma delas é a minha mira.
Então tenha cuidado, Red, você é um alvo muito fácil de atingir.
Quando ele entrou pela porta do motorista, todo meu corpo doeu, mas era
pegar ou largar, eu não tinha escolha, ou até tinha, mas queria pagar para ver.
conrad
friends,atlantic
— Então, você voltou mesmo com meu irmão tendo te feito de palhaça? —
perguntei, assim que manobrei o carro para fora do estacionamento. Aquilo
seria insuportável, o cheiro cítrico dela estava forte demais para ignorá-la ali
dentro.
— Eu já disse, não é da sua conta. E nós não vamos para a cidade? É para o
outro lado. — Scarlet parecia disposta a me evitar o máximo que podia, mas
ciente de que talvez eu devesse fazer o mesmo, não conseguia evitar, ainda
mais com ela vestida daquele jeito.
Ainda que ela mantivesse suas pernas juntas, o comprimento da saia não
escondia muita coisa e minha imaginação não perdoou.
Era uma distração e tanto, e precisei me repreender porque aquele dia estava
completamente fora de mão.
— Tem uma cidadezinha aqui pra cima, mais próxima. Não vou ficar mais
do que meia hora com você, Red. Não adianta implorar.
sobre quem eu era agora. Naquilo, eu tinha dado sorte. O velho parecia feliz
de me ver, e além de me achar homem por voltar e pedir desculpas por
arruinar sua família, me concedeu seu perdão.
O que ainda pesava na minha cabeça eram suas últimas palavras para mim
naquela manhã.
— o senhor que não se levantou nem mesmo para se despedir de mim, disse
quando eu ia saindo pela porta.
— Minha neta. Aquela pela qual você invadiu minha casa uma vez às três da
manhã, se lembra?
— Acho que tem algo de errado aqui. — Voltei para dentro do quarto e
fechei a porta. — Scarlet, ao contrário do senhor, se vendeu ao meu pai. Me
virou as costas, me repudiou…
O término com Isaac era um sinal de que ela não era completamente
vendida, ou se era, algo tinha mudado, mas assim que eu a vi com o carro
dele, toda e qualquer vontade de tentar descobrir o que havia acontecido foi
quebrada.
— Não faz isso aqui! — Ela bem que tentou me impedir, mas fui mais
rápido, afastando o cigarro dela, abrindo minha janela também.
— Ele odeia o cheiro — ela lamentou. — E diz que peguei essa merda de
vício de você.
— E foi?
— Tem certeza? — Não tirei os olhos dos dela, tragando meu cigarro e
soltando a fumaça pelo nariz enquanto a analisava intensamente.
Mordisquei o lábio quando a medi de cima a baixo. Até onde aquilo iria?
Era inevitável, meu corpo todo respondia quando Scarlet estava perto.
Sentia o coração acelerado, o tesão batendo tão forte que meu pau ficava
pesado na calça, mas sabia que aquilo era tudo
Nós nos odiávamos e aquilo era intenso demais para o cérebro compreender
totalmente.
— Me conte, como é conviver todo santo dia com uma cópia inferior e mal-
feita de mim? — provoquei, vendo pela visão periférica os olhos dela
mudando da minha boca para os olhos em um ritmo lento.
Era bom ver que eu não era o único sofrendo o efeito daquela atmosfera
desgraçada, já que nem as janelas abertas ou a fumaça do cigarro fez o
cheiro dela ficar menos delicioso.
— Isaac não tem nada a ver com você. — Foi a vez dela avançar. Scarlet
ficou tão próxima a mim que sua respiração bateu contra meu rosto. Sua voz
era macia, orgulhosa, ela queria me machucar também. — E acredite, ele é
muito melhor do que você jamais foi, do que jamais será um dia. — E aquela
provocação foi demais.
Meus olhos escaparam para o visor do GPS. O lugar que eu precisava ir
ficava a cinco minutos de caminhada, e do que faria, eu realmente precisaria
caminhar.
Sem pensar duas vezes, desliguei o piloto automático, dei seta e parei no
acostamento.
Soltei meu cinto e o dela. Scarlet não se moveu, paralisada pelo medo, ou
pelo choque, também não resistiu quando a peguei pela nuca.
Grudei sua testa na minha, a respiração dela pesou. Não a julguei, pois,
estava igual.
Seu corpo era quente, seu hálito ainda tinha o mesmo cheiro de morango de
antes.
Ela arfou.
— Repita. — Trouxe seu rosto mais para perto do meu, e parecendo tomar
coragem, ela suspirou e, com tanta raiva quanto eu, cuspiu as palavras:
— Você é inferior, Conrad. Você é mau. — Seus olhos encheram d’água,
mas ela resistiu. — É cruel. É terrível. Seu irmão é muito melhor que você
como amigo, como namorado, como parceiro. Como pessoa. — Ela me
esbofeteou sem se mover. — Me fodendo, me beijando e me amando…
Toquei sua coxa nua com a mão livre e ela não se moveu. Seu coração batia
alucinadamente, e eu senti sua veia pulsando contra
os meus dedos.
Aproximei a boca de sua orelha e rocei os lábios por ela, rindo para provocá-
la.
Ela não disse nada, nem se moveu. Entendi que não era a fuga que ela
queria.
pedido, mas ainda assim, ela ergueu o quadril e eu abaixei a calcinha. Havia
maior consentimento que aquele? Eu duvidava.
Tirando a peça de roupa dela com sua ajuda, larguei o pedaço de pano em
cima do banco e, afastando bem suas coxas, deslizei a mão por seu monte
liso e escorregadio, me sentindo duro feito pedra por vê-la daquele jeito pela
primeira vez na vida.
— Caralho, Red… — rosnei com a boca contra sua bochecha e ela arfou
quando, com o dedo anelar e o médio, a abri ao meio e esfreguei toda sua
extensão.
Ela estava tão encharcada que mal tive atrito fora o clitóris inchado,
implorando por atenção. O corpo de Scarlet estava tenso, seu quadril dançou
procurando alívio contra minha mão e eu apertei ainda mais seu pescoço
antes de me ajeitar no banco para ter acesso a ele com a boca.
— exigi dela, mas aquilo a desgraçada não quis me dar com facilidade.
Sua boca entreabriu, ouvi quando arfou e senti sua mão que estava apoiada
na minha coxa me apertando com força. Ela tentou resistir, e talvez, se eu
não fosse tão baixo, ela teria conseguido, mas minha mão escorregou de seu
pescoço e envolveu seu seio esquerdo sobre a blusa. Ele coube na minha
mão perfeitamente e, sentindo o piercing contra o tecido, eu o apertei e
estimulei, ao mesmo tempo em que meus dedos tocavam o ponto inchado
dela com mais intensidade.
Ela tentou se segurar. Deitou a cabeça para trás, mordeu o lábio, mas nada
ajudou. Quando lambi do pescoço à base de sua orelha, Scarlet abriu a boca
e gemeu alto, tão gostoso que eu seria capaz de gozar só de ouvi-la daquele
jeito.
Sem vergonha, sem conseguir se conter, ela jogou a toalha e colocou a mão
sobre a minha que estava em seu seio, me fazendo apertar mais forte. Aquela
não era uma ordem para eu recusar. O
rosto dela veio para o meu. Scarlet buscou minha boca no meio daquela
insanidade e eu quase, por muito pouco, tendo visão do seu rosto no meio do
prazer, cedi.
Consciente do que fazia, tentado demais para deixar passar, peguei minha
dose de pecado e mordi seu lábio com força. Ela quase gritou, mas desistiu
quando escorreguei dois dedos para sua entrada e a invadi sem cuidado
algum.
Ela deu um gritinho contra minha boca e deitou a cabeça para trás. Seu lábio
rasgou entre meus dentes e o gosto do seu sangue preencheu minha língua.
Ainda assim, não parei. Ajeitei seu corpo no meu colo de modo que
conseguisse estimulá-la por dentro e quando meus dedos encaixados dentro
dela começaram o atrito contra a parede interna, Scarlet choramingou algo
ininteligível.
— Eu vou fazer você gozar aqui, Red. Vou entrar tão fundo na sua mente
que você nunca vai me tirar de lá, não adianta para onde tentar correr.
Ela estava em outro planeta naquele segundo, assim como o meu juízo.
Suas pernas estavam escancaradas, seu corpo suado, sua boceta pingando. O
barulho que ela fazia contra os movimentos da minha mão era a única coisa
além dos seus gemidos, e quando seu ventre começou a se contrair, ela ficou
tão apertada que tentou expulsar meus dedos. A garota no meu colo se
desesperou.
Eu tinha certeza de que o bostinha egoísta do meu irmão nunca a tinha feito
gozar feito um homem de verdade, mas lá estava eu, mostrando que era
superior em tudo, inclusive, na cama.
seu rosto ao vê-la abrir os olhos e levei os dedos molhados com o gosto dela
até a boca e os chupei.
— Quase melhor que o gosto de morango. — Ela piscou algumas vezes, não
acreditando no que via. — Que desperdício, Red.
Foi uma pequena confusão para ela voltar ao seu lugar, mas conseguiu.
Olhando para baixo, morta de vergonha, sem entender o que tinha
acontecido, se apertando contra a porta do carro para ficar longe de mim, o
arrependimento estava escancarado em seu rosto.
Aspirei uma última vez aquele cheiro, sabendo que minhas bolas ficariam
doloridas, e abri a porta do carro.
— Fique tranquila, Red. Isso foi só uma amostra para te mostrar que sim, em
muitas coisas, eu sou superior ao meu irmão.
Seja sendo cruel, seja sendo o melhor que você um dia vai chegar perto. —
O sorriso no meu rosto era difícil demais de dissolver. —
Aproveite para se lembrar disso quando for encontrar com ele. Eu sou
melhor em tudo, e as provas estarão para sempre aqui. —
Quando desci do carro, não demorou dez passos para ouvir o grito dela.
Ela me queria. Ela viria até mim. E eu aceitaria, não por querer machucá-la,
mas porque não via a hora de me enterrar nela.
scarlet
E há exatos sete dias, nós só nos desgrudávamos para dormir, e ainda assim,
a troca de mensagens até o sono ganhar era intensa.
— Depende, o que vou ganhar com isso? — Conrad ganhou minha atenção
junto de um sorriso.
— Acho. — Ele continuou encurtando a distância até sua boca estar contra
minha. — Isso é um problema, Red?
Ele e as mãos de Conrad em mim. Suas mãos e a boca. Sua língua na minha.
Nem em mil anos, pensei que aquilo pudesse ser tão bom, mas era. Na
verdade, era melhor. Macio, quente, intenso. O beijo de Conrad parecia fazer
surgir uma espiral dentro de mim e tudo me consumia, inclusive, o
desconhecido.
Meu corpo formigava, quase doía, queimava. Eu queria que ele me tocasse,
que me abraçasse, que se apertasse contra mim, e quando avancei, trazendo
mais seu rosto para o meu e o abracei com as pernas, fui brecada.
Eu sabia que Conrad já tinha saído com muitas garotas, e que provavelmente
fez sexo com algumas delas. Ele tinha muito mais experiência do que eu, e
por mais que adorasse beijá-lo, e algum dia quisesse que ele fosse meu
primeiro em outras coisas também, naquilo eu concordava com ele. Quatorze
anos parecia cedo demais para uma experiência daquela dimensão.
— Você não tem culpa. Na verdade, nenhum de nós tem, mas é o que eu te
disse…
— Tudo tem seu tempo — repeti o que ele disse da primeira vez em que me
colocou contra a parede e eu fiquei com medo das expectativas dele sobre
mim.
— Química?
— Eu tive educação sexual. — Fiz com que ele parasse com aquele papo
constrangedor. — Eu sei o que acontece, só… A gente pode mudar de
assunto? — Engoli em seco, não porque fosse tímida demais para falar sobre
sexo, mas sim porque a ideia de falar sobre sexo com Conrad não era nada
confortável.
— Não estava falando de sexo, Red. — Ele riu, pronto para descer. —
Estava falando sobre química.
A provocação em seus olhos me pegou de jeito, e quando dei por mim, tinha
passado o pincel no rosto de Conrad, deixando uma risca vermelha em suas
bochechas e nariz.
— Mas, que porra? — Ele ficou sem fala por meio segundo, me olhando de
boca aberta, sem acreditar. — Espera aí, que você vai sair daqui realmente
vermelha.
— Não, não, não! — gritei, meio rindo, pulando em suas costas antes de ele
alcançar o balde de tinta, impedindo-o. Ainda assim, Conrad girou comigo
presa a ele, e quando conseguiu se soltar, me segurou na sua frente e passou
o rosto sujo na minha blusa, pescoço e contra o meu rosto também.
— Abusada. — Foi um sussurro baixo feito com um sorriso nos lábios, mas
foi o bastante para me render.
— Estou dizendo que é perigosa para mim. Ou que eu sou para você agora
que não posso deixá-la ir. — E ele me abraçou de novo.
Quando ele os abriu, eu soube que nosso tempo ali tinha acabado.
— Pegue suas coisas, vou te deixar em casa…
— Levar o carro até a casa do meu pai e, provavelmente, dormir lá. Amanhã
é dia de almoço em família. — Seu tom de voz estava mais maleável. — Por
quê?
— Porque vou conseguir dormir em paz, sabendo que você terá uma noite
segura.
— Red… Você pode esquecer o que viu? — Era a segunda vez que ele me
perguntava aquilo.
Conrad riu de um jeito triste, então me fitou e, ignorando que o sinal havia
ficado verde, pegou meu rosto com ambas as mãos e me
segurou como se fosse a coisa mais preciosa do mundo conforme se
aproximava.
— O quê?
— ele citou Jane Austen mais uma vez. — E eu não sou idiota, Red.
Tinha sim aquela paixão adolescente louca, tinha sim toda a intensidade que
só Conrad Prince parecia capaz de carregar, mas havia mais, e eu não sabia o
que era, só que estava disposta a enfrentar o universo todo para proteger.
conrad
oh, a miséria. todo mundo quer ser meu inimigo. poupe a simpatia, todo
mundo quer ser meu inimigo.
e n e m y, i m a g i n e d r a g o n s .
Era inevitável, como a colisão entre dois carros desgovernados, não reagir à
memória da visão de Scarlet se contorcendo nos meus braços, não
conseguindo lutar contra, me permitindo deixá-la daquele jeito… Seu cheiro
era outro problema, qualquer dose dele seria insuperável, e depois de prová-
la daquele jeito, de sentir seu gosto agridoce ganhando minha língua, tudo o
que conseguia pensar era a próxima vez que a teria daquele jeito.
Não.
— Foi mal, mãe. Meu carro deu problema, por isso me atrasei.
Será que teria me deixado entrar sob sua pele? Será que teria permanecido
mesmo vendo toda a merda que eu já carregava naquela época? Pelo nosso
encontro de mais cedo, eu podia jurar que sim, mas naquele ponto, quem era
eu para julgar?
Era um claro sinal de que Isaac ainda estava no radar, que ele ainda a queria,
mas eu esfregaria com tanto gosto em sua cara que Scarlet nunca lhe
pertenceu mesmo comigo longe que, só de imaginar o que faria mais tarde
naquele sábado, não pude deixar de
Já temos mais
produto?
Peguei
material
algo.
Ótimo. Me deixe
informado.
— Você gostou?
— De todas, esta foi a que mais me agradou. Não é tão perto da cidade, mas
não me importo de andar… — parecendo insegura, ela argumentou.
— Então eu vou pagar por ela — falei com os olhos no rosto da minha mãe e
esperei ansiosamente ela processar a informação.
Pouco a pouco, o sorriso quis ganhar seu rosto, mas ela o tapou.
— Conrad, como?
— Eu posso, mãe. Não pergunte como, só acredite, eu posso.
Só nós dois tínhamos noção do que significava não ter medo de ficar na rua.
E por tudo aquilo, por todos os anos de dor, a segurei firme e soprei baixinho
em seu ouvido:
Morrer no dia seguinte não seria um problema, desde que ela ficasse bem.
— Acha que agora vai poder vir dormir comigo alguns dias?
— Se você voltar a cozinhar, aposte com isso. Vou ter um espaço na
garagem?
— E como vai ser descer para o trabalho? Aliás, você ainda vai querer
trabalhar? — Curioso, olhei para ela de canto. — Eu já disse que você não
precisa mais. Já tenho o suficiente para cuidar de você.
— Seu padrasto também. Como eu pude deixar que ele te machucasse por
tanto tempo?
— Porque tinha que ser, porque o pai que eu tenho seria capaz de me colocar
para dentro, mas te deixaria na rua, e eu nunca deixaria você para trás. Você
é a única que nunca mereceu nada disso. Agora, se não quer acabar com
nosso dia feliz com mais memórias fodidas, podemos mudar de assunto?
— Você tem razão. Essa casa nova, esse passo, é só a certeza de que o futuro
é adiante, e não vai se construir olhando para trás, não é? — Confirmei com
a cabeça. — Ótimo. Vai ser ótimo me mudar, assim Philip não vai mais me
incomodar.
— E ele tem feito isso? — Ela notou a mudança no meu tom de voz.
— Não se preocupe, ainda mais que agora, com esse passo, tudo ficará ainda
mais enterrado no passado.
E o assunto cheio de pesar foi encerrado com minha mãe perguntando como
eu gostaria do meu quarto novo.
Nosso almoço foi leve, deixá-la em casa com a promessa de que voltaria
para ajudá-la a empacotar tudo me deixou verdadeiramente feliz, e quando
voltei para o carro, pronto para voltar para a universidade, recebi mais uma
mensagem.
Tá sabendo de
Halloween.
Era Thomaz.
Não
fazia
ideia.
é que Bella já
cuidou de tudo.
Até depois.
Minha única vontade de devolver aquilo era para descobrir o que Scarlet
pintaria em seguida, e quando meus dedos terminaram de rodar as páginas
com desenhos, lembrei-me de como era bom naquilo, de como nunca mais
me atrevi a desenhar desde que a ação me lembrava ela e nosso projeto
juntos.
Ainda assim, para o plano perverso daquela noite, eu precisava voltar a tocar
naquela memória, naquele dom secreto que escondi sob uma pilha de outros
hobbies. E enquanto minha produção ia a todo vapor, busquei os lápis que
havia comprado quando a ideia do que faria bateu na cabeça e tratei de me
esforçar para forçar o traço ser o mais próximo do dela.
Se era um empurrão que ela precisava para se livrar do meu irmão e cair no
meu colo, era isso que eu daria.
— Você sabe que vou esquecer essa merda e vou me coçar alguma hora —
resmunguei, provocando-a e ganhei mais um beliscão.
— Se você borrar todo esse meu trabalho espetacular, mato você. — Seu
sorriso perverso era pura brincadeira, mas qualquer um que ouvisse seu tom
de voz e não a conhecesse, acharia ser verdade. — Estou quase terminando,
fique parado só mais um pouquinho.
Seus dedos esfregavam tinta preta por todo lado e eu imaginava o estado da
minha toalha de banho depois que tentasse me livrar daquilo. Sem camisa,
tinha tinta por todo meu torso, braços e mãos, preta para a ilusão de falta de
carne, branca para delimitar o desenho dos ossos.
Suspirei pesado, evitei encarar Bella tão perto e enquanto Thomaz fuçava na
minha estante, esperei ansiosamente ela acabar o que fazia.
— Ok, levanta, vai ver no espelho. — Saindo do meu colo, ela me pegou
pela mão com cuidado para não estragar seu trabalho e eu obedeci. Fitando o
meu reflexo, o dela e o de Thomaz, agradeci a Bella com o olhar e girei para
roubar um dos cigarros de Thom.
Confirmei com a cabeça e, sem ser muito discreto, ergui a mão e peguei o
blackbook que estava no alto da estante.
— O quê?
Com toda certeza, ela tinha bebido, já que o copo em sua mão estava pela
metade e o sorriso no seu rosto era de alguém que não se lembrava daquela
manhã.
— Não faço ideia. — Dei de ombros, não querendo admitir que a ver
daquele jeito me incomodava.
Parando no bar, cada um de nós tomou três shots de bebida e fomos para
longe. O plano precisava ser colocado em prática e enquanto Thomaz
reuniria um grupinho para brincar de verdade ou
desafio, Bella atrairia o projeto de casal que era Scarlet e meu meio-irmão.
Não levou mais de vinte minutos até a rodinha estar formada no fundo do
salão com uma garrafa no chão. Meu irmão e sua namorada apareceram para
participar e só depois disso que me aproximei, ficando bem de frente para a
garota que ainda não tinha me visto e batia palmas, animada, enquanto outra
menina que eu não conhecia abria a boca para receber bebida.
Era lindo ver a insegurança expor seus tentáculos e abraçar Isaac e Scarlet.
— Seu…— Ele ia me xingar, mas Scarlet apertou seu braço, fazendo com
que Isaac se calasse.
— Eu…
Ergui a mão e encarei Isaac, sabendo que meu irmão cairia na minha
armadilha e antes que os dedos de Scarlet sonhassem em se erguer, seu
namorado arrancou o caderno da minha mão com muita brutalidade.
Eu só sorri.
— Eu… — Ela tentou se defender, mas ele chegou até a última página.
Ela encarou a página, o meu desenho de mim cheio de “quero você” escritos,
como no primeiro desenho do caderno.
— Uou, a leoa tem garras — fiz graça e a plateia riu. Eu ri também, mas ela
parecia prestes a me matar, assim como meu irmão, que olhava de mim para
ela, não sabendo em que acreditava.
— Não! Para, não! Eu não sinto absolutamente nada por esse desgraçado,
Isaac. Eu não fiz nada… — Ela engoliu a mentira. —
Por favor, não quero brigar aqui, não quero mais isso. — Ela ia chorar.
Estava quase…
Eu adorei.
— Peça para ela me beijar, então, e veja com seus próprios olhos se ela
mente ou se sou eu que estou mentindo. Você não conhece sua namorada? E
sobre seu carro, aquele detalhe quadrado do painel é meio zoado, não? —
provoquei ainda mais e ele não se aguentou.
Pegando Scarlet pelos ombros, ele a fitou sério. Ela parecia com medo, mas
não resistiu.
— Não me peça para fazer isso! — ela gritou, tentando trazer meu irmão
para a racionalidade. — Eu não quero beijá-lo!
— Mas você vai.
scarlet
Em geral, aquele dia tinha sido esquisito. Mais cedo, com Isaac por perto
tentando puxar assunto, Conrad não pareceu feliz quando me viu nos bons
termos com o irmão, mas eu realmente acreditava que todo mundo merecia
uma segunda chance e que, impondo limites, alguma hora o garoto ia cair
em si e se afastar de mim com segundas intenções.
Minha irmã era outra que parecia começar a desistir de me ignorar. Deve ter
sido realmente doloroso para Susan entender que eu e Conrad éramos algo,
mesmo que sem um título. Eu ouvi seu choro antes de dormir nas noites em
que Conrad me levava até a porta de casa e sabia que não devia ser fácil. Eu
mesma, se estivesse no lugar dela, não conseguiria ser tão boa. Ainda assim,
mesmo com a sensação de que a qualquer segundo ela me afogaria na tigela
de cereal com leite, aos poucos ela começava a falar pelo menos o mínimo
comigo e eu achei que, em breve, com aquela evolução, poderia começar a
trazer Conrad para dentro de casa.
— Nós vamos ficar muito? Vovô me deixou ficar até às vinte e uma na rua,
graças a sua promessa de me levar para casa.
— Não se preocupe, vou cumprir com a minha palavra. Só quero que você
conheça melhor meus amigos. — O desejo era genuíno e, por um minuto,
apreciei a inocência de Conrad em achar que aquilo teria alguma liga.
Eu não tinha o mesmo apreço por seus amigos como tivera por ele nos
últimos anos.
— Não te acho cruel. — Foi mais forte do que eu e quando botei os olhos
nos dele, notei o desconforto.
— Está longe?
— Não muito.
E, menos de cinco minutos depois, Conrad diminuiu a velocidade e parou no
acostamento.
Sem questionar, tirei o cinto de segurança e não esperei por ele para abrir
minha porta.
— Sei que eles não são o melhor exemplo da boa moral, mas são os amigos
que me acolheram quando precisei, e que estão comigo mesmo com toda a
merda que você sabe. E acredite, eles não sabem de tudo como você. Eles
nunca viram…
— Suas marcas?
— E aí — Conrad os cumprimentou.
— Peguei, está lá na estrada perto do seu, mas… achei uma merda. Gosto de
câmbio manual. — Ele deu de ombros.
— Mais práticos? Sim — Conrad rebateu, nos levando para mais perto. —
Melhores? Nunca. Scarlet estava comigo, ela pode provar. — Ele tentou me
incluir na conversa, mas tudo o que ganhei foi o olhar desinteressado
daqueles dois.
Era nítido que, por mais que Conrad fosse tentar fazer aquilo funcionar, não
aconteceria tão cedo, e a prova veio quando Bella, depois de matar quase
toda a garrafa de vodca sozinha, me
encarou quando Conrad e Thomaz voltaram até os carros para pegar mais
bebida e cigarro, e perguntou:
— E qual é a sua, ruivinha?
— A minha?
— É. Você é muito nova para estar aqui. E sabemos que Conrad é Conrad.
Ele nunca se envolve com ninguém de fora por tanto tempo… — Era uma
direta. Ela era a única, eu era uma intrusa, passageira.
Minha vontade era revidar, mas encarei o fogo e me concentrei nas chamas,
sabendo que os olhos dela estavam em mim.
sabe? O histórico dele não deixa. — Minha vontade era de calar a boca dela
com meu pé, mas, por sorte, Conrad vinha com Thomaz pela estrada e,
assim que eu o vi, me coloquei de pé.
— O que foi? — O sorriso que ele dava sumiu quando viu meu rosto.
— Mas ainda são oito horas… temos tempo, Red. — Ele parecia chateado e
me doeu mentir daquele jeito, ainda mais com Bella sabendo que eu só
queria ir embora por estar incomodada com ela.
— Não temos mais. — Tentei não ser tão desagradável. —
Obrigada, Bella, Thomaz. A gente se vê. — Passando por eles, fui para o
carro sem esperar por Conrad.
Não demorou cinco minutos para que ele viesse até o Maserati e liberasse o
alarme para eu poder voar para o banco do passageiro. Quando ele entrou
pela porta do motorista, seu rosto era uma máscara a qual eu queria muito
quebrar.
— O que aconteceu?
— Nada — menti.
— E o que é?
— Por quê? O que eles fizeram? — Incomodado, ele encostou o carro para
me encarar.
— Não é de hoje, não esqueça que eu observo você e quem está na sua
órbita há tempos, e eu sei o quanto aquela garota pode ser cruel, ou ele, e…
Eles não são bons. Sinceramente, se fossem, já teriam dado um jeito de te
ajudar, não ficar no meio do mato fumando aquela erva fedida.
Conrad suspirou, pousou uma das mãos no volante e negou com a cabeça.
— Vocês precisam funcionar, ou…
— Espera… — me virei para ele, tentando ser lógica —... eu posso arranjar
briga dentro de casa por você, mas não posso não gostar dos seus amigos?
— Então passe bem com eles. — Sem pensar duas vezes, abri a porta do
carro e desci.
Queria distância dele, dos amigos que não eram verdadeiros, daquela versão
que parecia colocar o que tínhamos em aprovação de outras pessoas.
Eu não queria ser aceita por eles. Eu não queria passar na merda de um teste.
Meus pés doíam muito, mas não mais do que meu peito, e quando minha
irmã ergueu os olhos de sua revista para me encarar, vendo meu rosto
inchado pelas lágrimas, deu um sorriso cruel.
Quando passei por ela, pronta para subir as escadas, ouvi Susan dizer:
De todo o coração, eu queria ter forças para responder, para brigar, para
dizer que Susan estava errada. Mas não tinha.
Tudo o que me sobrou foi correr escada acima e me trancar no meu quarto,
deitando sobre a cama com os pés doloridos, coração em frangalhos e
lágrimas nos olhos, encarando a lua crescente lá fora, sabendo que ainda não
estava pronta para perder Conrad e que, talvez, nunca estaria.
Não depois dele ter me abandonado na estrada, não depois de me sentir tão
insignificante.
Deitei na minha cama e fechei os olhos, fingindo não ver nenhuma de suas
tentativas de me chamar atenção às duas e meia da madrugada.
Quando ele percebeu que eu não responderia ao seu chamado, tudo silenciou
e meu coração se escureceu. Ele tinha desistido, e tudo bem.
No final das contas, eu não sabia o que mais doía, eu ter confiado em Conrad
ou as falas da minha irmã fazerem sentido.
Quão surpreendente não foi abrir os olhos e encontrar Conrad Prince do lado
de fora, no telhado, determinado a falar comigo? Meu estômago e suas
milhões de borboletas deram sinal de vida e, sem alternativa, me levantei,
abri a janela empurrando-a para cima e enfiei a cabeça para fora.
Seus olhos nos meus eram sérios e intensos. Ele não se colocava como
inferior, mas era óbvio que queria me convencer a perdoá-lo.
— Você não merece, pelo menos, não hoje. — Suspirei, não aguentando a
pressão de manter seu olhar e encarei o chão, pronta para mandá-lo embora.
— Encontrei você. — Ele foi rápido quando viu minha intenção de fechar a
janela. — Você é minha afinidade. — Meus olhos se ergueram para seu
rosto, reconhecendo o que ele fazia, o que citava. Meu coração foi a milhão
e precisei morder o lábio inferior com força para não chorar mais. — Meu
melhor lado, meu anjo bom. — Conrad não era mais tão silencioso, e pegou
minha mão direita, colocando sobre seu peito, se aproximando o bastante
para que eu sentisse seu calor, as batidas que seu coração dava, quase
alucinado. Encarei seus olhos, vendo a verdade naquele poço negro e
brilhante. — Estou ligado a você por laços muito fortes. — Ele se ajeitou
para ficar estável apenas pelas pernas e sua mão livre veio para minha nuca,
me puxando para fora até minha testa encostar com a sua. Seu hálito bateu
contra o meu rosto, era uma mistura confusa de bebida, cigarro e hortelã. —
Acho-a boa, talentosa, adorável. — E então, segurando meu rosto com
ambas as mãos, ele se afastou um pouquinho e me encarou de novo, como se
eu fosse a única coisa que importava antes de declamar a parte que fez meu
coração parecer como novo. — Uma paixão fervorosa e solene surgiu em
meu coração. Ela se inclina para você, traz você para o centro e para a
fonte da vida, envolve minha existência em torno de você e, através de uma
chama pura e poderosa, nos funde. — Eu já
chorava de novo, e vendo seus olhos, apostaria que, se não fossem os anos
de autocontrole sob o que ele vivia, Conrad também estaria chorando.
Chorando por mim. — A você e a mim, num só ser. [6]
— Conrad… — sussurrei seu nome de forma tão profunda que doeu nos
meus ossos.
— Scarlet, por favor, foi estupidez da minha parte fazer o que fiz mais cedo.
Não sou dado a pedir desculpas, nunca precisei, mas não sei como acordar
amanhã sem você lá.
INTRUSO!
— O que está acontecendo? — Ouvi quando meu avô veio pelo corredor e
chegou até a porta do quarto.
— Vovô, eu juro, não foi nada disso. Conrad veio me pedir desculpas, ele
estava para fora do quarto, mas eu o abracei, ele se desequilibrou e caiu.
Minha mão voou pesada sobre seu rosto, o tapa a fez virar a cabeça e
silenciar.
Quando Susan se deu conta do que acontecia, virou para mim cheia de ódio
e gritando como se estivesse possuída, resolveu revidar.
Eu não fugi. Enquanto suas mãos vinham para me unhar o rosto e puxar o
cabelo, eu dei um belo soco em um dos seus olhos e um chute certeiro na
canela. Foi um pandemônio, e mesmo com Conrad tentando me segurar e
vovô fazendo o mesmo com Susan, nós ainda gritamos ofensas pesadas uma
contra a outra.
— Vagabunda!
— Mesmo assim, eu sou algo para ele, coisa que você nunca vai ser, sua
idiota! — gritei de volta, conforme ela era arrastada para fora.
porque eu era boa demais para dizer em voz alta que gostaria que minha
irmã estivesse morta no lugar dos meus pais, mas porque eu sabia que não
era hora de dizer.
Eu, pelo menos, só consegui isso com a cabeça contra o peito dele, ouvindo
seu coração bater, tentando ajustar meu ritmo ao dele.
Isso durou pouco, muito pouco, já que menos de dois minutos depois, meu
avô apareceu na porta e, com sua voz grossa, cansada e aparentemente
decepcionada, ele me chamou:
— Scarlet.
— É, quis ser notado e, com certeza, foi, não só por Scarlet, mas como por
toda a rua. Rapaz, por favor, me acompanhe até a saída e vá para casa.
Scarlet, deitada. Se eu ouvir algo vindo daqui, vou te deixar de castigo.
— Tchau — Conrad soprou quando passou por mim e, sem abaixar a cabeça,
ele passou por meu avô, me deixando sozinha depois de toda aquela
confusão.
Deitei contra a cama, com a luz apagada de novo e fechei os olhos, deixando
a tensão escorrer do meu corpo, dando lugar à vontade de rir.
— Mas não ia embora tão facilmente assim. Já perdi muito tempo longe de
você.
Quando a ponta dos seus dedos acariciou minha bochecha, com ele tão perto
invadindo meu cérebro com seu calor, sua presença, seus olhos escuros
hipnotizantes e sua boca cheia e tentadora, não me afastei.
O beijo de Conrad naquela noite foi casto, diferente, e eu entendi que aquilo
mudaria tudo quando ele se afastou por um
segundo depois de puxar meu lábio inferior entre seus dentes e soprou contra
minha boca.
Não houve chance de resposta. Ele não deixou, e acho que nunca precisou.
Eu o amava, o amava com cada pedaço meu. Com cada fibra e célula do meu
corpo.
O tipo de amor que quebra cadeias, move montanhas e vem de outras vidas.
O tipo de amor que ou me ressuscitaria, ou me mataria E eu nunca me
arrependeria.
scarlet
estou paralisado, estou com medo de viver, mas estou com medo de morrer.
e se a vida é dor, então eu enterrei a minha há muito tempo atrás, mas eu
continuo vivo.
paralysed,nf
— Tem certeza de que quer fazer isso? Te convidei porque, você sabe, é
importante ter você comigo, mas… — Ele tentou me convencer de desistir
da ideia mais uma vez, mas peguei sua mão em meu colo e sorri, mostrando
que estava tudo bem.
Achei que aquilo era melhor do que a roupa na qual apareci da primeira vez
na mansão, e como era aniversário de John Prince, achei que aquilo merecia
uma atenção especial.
Aquilo não era bem uma verdade. Eu tinha amado, adorado, ficado
completamente encantada com Conrad de social. A gravata preta de cetim
não estava justa como deveria. Em seu pescoço, uma corrente grossa
prateada aparecia graças ao primeiro botão da camisa aberto e, apesar das
calças também serem naquele estilo engomadinho, suas botas pesadas no pé
diziam que, de fato, aquele era o filho problema. O cabelo meio bagunçado
também não era algo dentro do código, mas caía tão bem em Conrad que
ninguém se atreveria a tentar mudá-lo.
— E por que não está lá atrás? — Conrad ignorou a interação de seu irmão
comigo. Eu realmente não tinha ideia de como eles estavam desde o episódio
da bebedeira na praia, e aquilo fazia mais de três semanas.
— E o que ela é?
Eu também queria saber, mas Conrad não disse, só pegou minha mão e me
tirou da vista do irmão.
— Aham… — Meu tom o fez dar risada e eu também queria rir, mas logo
nos viramos para encontrar o mundo de gente espalhado no quintal da
mansão e meu estômago ferveu de nervoso.
Talvez eu tenha entendido Conrad ser como era naquele minuto. Ele nunca
ia se encaixar naquela casa enorme e cara, mas também nunca pertenceria à
casa precária que vivia com a mãe. Ele viveria constantemente em dois
mundos sem nunca se sentir pertencente a nenhum deles. Era triste.
— Obrigado.
Conrad repetiu isso uma centena de vezes, até que seu pai nos viu e encerrou
a conversa com amigos que vestiam bermuda e camiseta polo.
— Prepare-se — ele me avisou discretamente quando beijou minha
bochecha e soltou minha mão para poder abraçar John.
Feliz aniversário.
— Não vamos ficar muito — Conrad avisou, pegando minha mão logo que
ficou livre e roubando a atenção do pai de volta para
si.
— Imaginei que não, ainda assim, você poderia tocar para mim? Sinto uma
falta enorme do talento de Giana.
— Por favor, filho. Aposto que Scarlet adoraria vê-lo tocar, não é mesmo,
mocinha?
— ele pediu de novo para o garoto ao meu lado, que parecia que ia quebrar a
mandíbula a qualquer segundo pela tensão em seu rosto.
— Me ajude, Scarlet.
— Mozart?
— Alegre demais. — A voz séria, mais baixa e rouca dele arrepiou cada
centímetro do meu corpo.
O pai encarou-o como se algo o incomodasse, mas não disse nada, e depois
de uma bufada claramente nervosa, Conrad disse para mim entredentes:
E eu o obedeci.
Seus olhos passaram pelo rosto do pai antes dele sentar no banco e, como o
resto daquelas pessoas, notei quando a respiração de Conrad mudou.
Ele encarou as teclas, umedeceu os lábios e mordiscou o inferior antes de
começar.
A canção pesada e triste soou primeiro meio baixa, e então foi ganhando
corpo. Os dedos de Conrad não se distanciavam muito uns dos outros, e seus
olhos de repente estavam fechados conforme a melodia mudava. Ficou
devagar, as notas quase sumiram, até que uma nota forte preencheu o ar e
depois morreu.
A música mudou.
O ritmo era diferente do começo, mas não era menos melancólico, e ele se
derramou enquanto suas mãos dançavam em cima das teclas avidamente.
Não havia ninguém impune à beleza daquilo, mas era doloroso também.
Tão doloroso que eu quase conseguia tocar a dor de Conrad toda hora que a
música mudava, que via sua concentração contra as teclas, sua feição, sua
respiração.
Sua dor parecia ser um monstro que crescia em suas costas, que o rasgava a
cada nota emitida.
Meus olhos estavam cheios d’água quando ele finalmente encerrou a música
e todos em volta bateram palmas, menos eu e seu pai.
— Por que você fez isso com ele? — As palavras saíram baixas da minha
boca.
— Porque ele precisa superar. — A resposta de John Prince não fez sentido
algum, mas quando Conrad cambaleou na minha direção com os olhos
vermelhos, só aceitei sua mão massacrando minha cintura, enquanto
entrávamos na casa sem dizer nada.
Enquanto ele me guiava, não disse uma palavra e eu também não. Minha
mente estava concentrada em me manter em pé e andando na mesma
velocidade que ele. Quando subimos as escadas, me surpreendi com
corredores superbrancos, bem-iluminados e portas gigantes, mas não tive
tempo de notar nada com muita atenção já que Conrad quase arrebentou a
quarta porta à direita e me jogou para dentro.
O lugar não tinha janelas e, de forma sufocante, estar no escuro sem saber o
tamanho daquele ambiente fez minha claustrofobia dizer olá. O ar ficou
ainda mais denso, eu quase gritei por ajuda, mas os dedos dele foram rápidos
em apertar um botão e, imediatamente, a lareira acendeu.
Verdade fosse dita, não estava frio para justificar o fogo, mas eu sabia que
não tinha nada a ver com a temperatura.
Fui mais rápida, e mais baixa, com agilidade, me enfiei entre ele e a parede,
amortecendo sua tentativa, acolhendo-o para o meu ombro.
Meu menino quebrado gritou contra minha pele, então cravou os dentes
contra o meu ombro e me mordeu com força. Eu segurei o grito, e chorei
com ele quando seu corpo se sacudiu junto dos soluços.
Chorei pela dor física, pela que ele carregava, pela minha.
Chorei por nós, por querer curá-lo, por saber que, talvez, eu fosse incapaz de
fazê-lo.
— Acariciei suas costas, sua nuca, e pouco a pouco, ele começou a relaxar.
Levou pelo menos meia hora para sairmos daquela posição, mas quando ele
se recuperou e se ergueu, evitou me olhar, limpou o rosto contra o antebraço
e foi para frente da lareira. Eu não me movi. Observei Conrad lá, encarando
as chamas, inerte, visivelmente exausto e perdido. Por mais de meia hora, ele
ficou daquele jeito e eu esperei, vendo que havia sangue em meu vestido
onde ele havia me mordido.
que eu só ouvi por estar concentrada nele, e por vê-lo começar a falar,
entendi que ele queria colocar para fora.
Talvez, aquela fosse a peça que faltava no quebra-cabeça que era Conrad
Prince. A mais escura e dolorosa peça daquele quebra-cabeça de cinco mil
peças. Me coloquei de pé o mais silenciosamente possível e fui até ele.
Não houve a mínima resistência de sua parte quando o abracei por trás e
achei que aquilo era um bom sinal.
Aspirei seu cheiro, toquei seu abdômen e peito, ouvi seu coração.
— Se quiser, você pode me contar. Eu nunca falaria para ninguém, você sabe
— incentivei.
Doeu dentro de mim, mas nós dois juntos éramos mais fortes.
— Nunca — neguei.
— Meu pai era casado. A mãe de Isaac, Giana. Vaca desgraçada que deve
estar queimando no inferno — ele rosnou, cheio de ódio. — Essa mulher fez
o que podia para foder com a minha mãe, mas o que ela fez comigo… Sabe
aquele piano lá embaixo? Eu costumava adorá-lo. Com quatro anos, Giana
fingia gostar de mim e me ensinou a tocá-lo, então aos seis, ela disse ao meu
pai que eu era muito talentoso e que queria me dar aulas. —
Conrad tremeu, mas pegou minha mão e, erguendo a camisa, passou meus
dedos por cima de uma textura estranha. — Essa foi a primeira vez que ela
me queimou por errar. — O horror prendeu o ar na minha garganta. — Os
abusos físicos não pararam aí. Em casa, eu tinha que lidar com meu padrasto
bêbado batendo na minha mãe. Aqui, eu tentava me esconder, mas Giana
sempre me achava e sempre dava um jeito de me punir quando eu não a
agradava.
Isso durou até os doze. Fiquei bons seis meses sem dar as caras por aqui,
depois de uma briga feia com meu pai, e quando voltei, com meu corpo
mudando, de repente, ela começou a me agradar.
esquentava a ponta de uma bengala esquisita que usava para cima e para
baixo e marcava meus braços com a ponta em forma de lua nova. — Ele
ergueu o braço nu para que eu pudesse ver direito e, contraluz, Conrad
parecia um tigre malhado, cheio de pequenas marcas de texturas diferentes.
— No meio da confusão de hematomas que eu já tinha por coisas que você
já sabe, ninguém desconfiou dela. Foi então que, do dia para noite, ela
começou a me elogiar, e um dia, aqui nesta biblioteca, ela me tocou…
Agarrei Conrad com mais força, meus dedos pressionando sua carne, meus
olhos arregalados, o pânico daquela situação me sufocando.
Fechei os olhos com força, pedindo para que Deus, o universo ou qualquer
outro ser divino ouvindo pudesse ajudar e nos tirar daquele sonho horrível,
mas nada aconteceu. E pior, ele continuou a falar:
entre as mãos e chorou. Seu corpo todo tremeu, ouvi-lo cortou minha alma
em pedaços.
Conforme ele avançava, eu dava passos para trás, até não ter para onde fugir,
ficando contra a parede ao lado da lareira. Minhas costas doeram com o
impacto, seus dedos massacraram minha carne, mas engoli qualquer
reclamação. Não podia. Não conseguia. Encarando-o sem nenhuma barreira,
seus olhos eram mais selvagens do que nunca, sem aquela maldita divisão de
íris e pupila. O rosto em uma máscara assustadora de dor e ódio, sua postura
era de quem poderia me matar. — Me mande sair da sua vida! — ele exigiu.
Eu mal me movi. Meu coração parecia prestes a abrir meu peito e pular fora
dele.
— Você vai ser engolida por toda essa merda uma hora. —
Quando ele disse isso, voltou a erguer os olhos para medir os meus,
analisando minha reação.
Sua língua invadiu minha boca com tanta vontade, com tanto desejo, que a
única coisa que pude fazer foi aceitar. Deixei que Conrad me guiasse pela
espiral conflituosa de seu peito, que me mergulhasse no fogo das suas veias,
que me despedaçasse no meio dos sentimentos tempestuosos. Permiti que ele
me levasse até o mais profundo abismo do que éramos, do que poderíamos
ser, e eu, que tinha tanto medo de água, nunca mais quis voltar à superfície.
scarlet
somos uma tragédia anunciada, vender minha alma ainda parece nada. peço
perdão pois prefiro esse caos a um amor mortal.
caos,camaleoa-músicafeitaparaBadPrince
Eu ainda não tinha me recuperado do que havia acontecido mais cedo.
Quando Conrad saiu levando minha calcinha, quando entendi o que tinha
permitido acontecer, como tinha permitido… A vergonha me comeu por
dentro, a vontade de arrancar meu coração do peito também. Sequei o carro
o melhor que pude, corri de volta
para casa com as janelas abertas e prometi que nunca mais encostaria no
Tesla, que nunca mais ficaria sozinha com Conrad, que fugiria daquele
monstro dentro do meu peito que implorava por mais.
Eu não podia.
Eu não devia.
— É assim que se ganha uma guerra, Red. — Sua voz ardeu na minha pele,
assim como o calor do seu corpo me atraiu feito um ímã.
Vê-lo pintado daquela forma era perceber que, se a morte tivesse aquela
aparência, aquele magnetismo maldito, se eu fosse passar pelo véu e não
voltar mais, eu aceitaria. Mas aquela não era a realidade e eu me conhecia
muito bem para saber que beijar Conrad foderia com tudo. Nada do que
tinha acontecido até ali era
tão perigoso quanto beijá-lo porque, por todos aqueles anos, eu não havia
superado. Por todos aqueles anos, todo e qualquer beijo que dei em seu
irmão nunca chegou aos pés do mínimo beijinho que Conrad já tinha me
dado antes. Não tinha competição, nunca teve.
— Estou cansada de ser seu alvo, Conrad. Eu não vou beijar você. —
Tentando me manter firme, estava pronta para dar as costas a ele e causar o
pandemônio antes de encerrar as coisas de vez com Isaac. Para o inferno se
ele achava que era meu dono para ordenar daquela maneira.
estava colada à do garoto que era meu tormento, minha ruína, meu inferno.
Quando ele forçou o rosto contra o meu e sua boca se abriu junto à minha,
todo meu corpo endureceu. Meu cérebro emitiu o alerta vermelho, e mesmo
um pouco alterada pelo álcool, quando o gosto de cigarro e hortelã se
alastrou pela minha língua, eu caí. Caí como quando coloquei os olhos nos
dele pela primeira vez, depois de todos aqueles anos. Caí como quando senti
seu cheiro. Caí como quando me dei conta de que não o havia esquecido,
que não o odiava, que não o queria longe. E, por um erro que nunca poderia
ser evitado, o correspondi. Envolvi sua língua com a minha conforme uma
das suas mãos corria pela minha cintura e, quando no quadril, passou para as
costas, pressionando meu corpo contra o dele, suguei seu lábio inferior antes
de avançar com a língua para dentro de sua boca, matando a sede, a vontade,
a saudade. Eu não era mais uma garotinha perdida e quando o dominei,
quando impus meu ritmo sentindo meus seios dolorosamente sensíveis
contra seu peito duro, movimentei a cabeça, segurando sua nuca com uma
das mãos como ele fazia comigo e, propositalmente, para mostrar que
não era a única atingida, a única a cair, ergui a mão livre e a encaixei sobre a
divisa da sua calça no quadril, roçando as unhas nas entradinhas que ele
tinha ali, provocando-o como o diabo dizia que devia fazer.
Ele não aguentou. Sua mão desceu para minha bunda e ele apalpou com
força, gemi contra sua boca, ele me puniu. Conrad pareceu disposto a me
devorar e sugou minha língua, meu lábio, meu queixo e voltou a me beijar a
boca como se o mundo todo tivesse parado naquele segundo.
Não havia música. Não havia Isaac. Não havia uma plateia fofoqueira.
Havia o cara para o qual eu tinha dado meu coração e tinha me devolvido em
frangalhos.
Que me viu gritar por ele na rua e não virou para trás.
Conrad era o meu maior tormento, mas também era a única ponte para uma
versão minha a qual eu sentia falta demais para esquecer.
— Chega! — Ouvi Isaac gritando, mas não parei. Não queria parar. Nem
Conrad. — Chega, caralho! — Meu não mais namorado
enfiou os braços entre nós e nos afastou. — Scarlet, que porra é essa?
Quando ele nos afastou, meu peito sujo de tinta preta subia e descia rápido.
O de Conrad também. Seus olhos não conseguiam deixar os meus, e eu tinha
certeza de que a mesma dúvida que rondava minha cabeça o perturbava
também.
Qual era o controle que aquela merda de sentimento ainda tinha sobre nós?
E sem esperar uma resposta, sem querer uma também, eu dei as costas
àquela cena ridícula, caminhando direto para o banheiro, com a vista
embaçada pelas lágrimas que queriam descer.
Assim que me olhei no espelho, tratei de esfregar a tinta preta do meu rosto e
corpo. Qualquer coisa de Conrad que estivesse do lado de fora precisava
sair, mesmo que o veneno contido em sua saliva já fizesse efeito sobre mim.
Minha boca tinha seu gosto, meu corpo sentia o rastro de seu toque e, como
o inferno, minha pele queimava onde ele havia encostado.
— Nossa, essa tá pior que a gente… — Meu olhar foi direto para a dona do
comentário e, quando viu que havia sido pega, a garota arregalou os olhos.
— Droga. Esconde! — ela disse para outra.
— Esconde o quê? — Indo até elas, me metendo como nunca faria antes, em
uma fúria que poderia colocar aquele castelo abaixo, peguei a mão que a
garota tentava esconder e, segurando seu pulso tão forte que seria capaz de
machucar, a obriguei mostrar o que escondia.
Dentro dela, quatro estrelinhas roxas apareceram. Parecia uma versão maior
do que eu havia ganhado de John.
— O que é isso?
Virei três doses da bebida que queimava minha garganta e esperei que o
gosto dele na minha língua diminuísse. Erro meu.
Eu o queria.
Eu precisava dele.
Seus olhos em mim eram cruéis como sempre, mas havia mais. Um mais tão
cheio de coisas e sentimentos que me consumiu.
Parei de dançar e encarei-o de volta abertamente, e cansada de lutar contra,
cansada de me conter, cansada de ter medo, fui na única direção possível.
Conforme atravessava o salão cheio de gente, desviando dos corpos, sabia
que em algum lugar, a marcha fúnebre tocava. Sabia que assinava meu
atestado de burrice. Que era cega, fraca e idiota.
Mas Deus sabia que, quando ele esticou a mão para pegar a minha, eu não
tinha um pingo de arrependimento no corpo.
Era só desejo.
Era só eu.
E ele.
Para sempre.
scarlet
Ninguém atendeu.
Coloquei a mochila nas costas, calcei os tênis e saí sem dar satisfação para
Susan que me olhava, curiosa.
bati na porta da mansão dos Prince, precisei parar para recuperar o fôlego.
Meu corpo todo pareceu relaxar e lágrimas se acumularam nos cantinhos dos
olhos.
Ergui o corpo, coloquei as mãos sobre o coração, e ainda que não gostasse
daquele lugar, nunca me senti tão feliz por percorrer a pé o caminho bonito
sob as árvores.
Não havia vida vindo dali de dentro. E eu não entendia o motivo de Conrad
estar lá sem ser nos dias em que era obrigado.
— Está procurando meu irmão? — A voz de Isaac não era tão convidativa
como sempre, e todo o suor que escorria pela minha nuca, de repente,
congelou.
— Mas — olhei confusa para trás e apontei sobre as costas —, disseram que
ele estava aqui.
Ah, então esse era o rapaz Prince em questão — pensei, incomodada com
aquele jogo de palavras.
— Scarlet, espere. Posso ir procurar com você, mas preciso comer algo
antes. — Parei no lugar e virei só um pouquinho do corpo para vê-lo. —
Tenho hipoglicemia, é meio que um saco. —
Não me movi, ainda encarando-o. Isaac tirou uma mecha do cabelo loiro do
rosto e jogou para trás, voltando ao tom de voz que usava para tentar me
amansar. — Vai, vem comigo. Aposto que vai ser melhor do que rodar a pé
por aí sem saber aonde ir.
— E você sabe?
— Sei. Posso não ser o melhor amigo dele, mas conheço meu irmão. —
Sabendo que havia me pegado pelo ponto fraco, ele seguiu para uma área da
casa que eu não conhecia, e não me restou nenhuma opção a não ser ir atrás.
Segui a uma distância segura de Isaac e quando ele entrou na cozinha, parei
embaixo do batente, encarando a grandiosidade do ambiente. Uma ilha
realmente grande ficava em frente à pia. O
— Água — incisiva, ganhei seu olhar por alguns segundos e percebi que ele
notou a diferença no meu tom.
do meu irmão.
O garoto riu para si mesmo antes de dar uma mordida em seu lanche.
Enquanto mastigava, largou o pão sobre a mesa, foi até um dos armários
altos e arranjou dois copos, servindo com água gelada. O meu, ele empurrou
sobre o balcão e eu o parei com a mão, molhando um pouco da bancada.
— Obrigada.
— Agora que já tem uma visão pré-fabricada de mim, com Conrad, com as
infelizes experiências anteriores, acha que
conseguiria me conhecer?
Entendi aonde ele queria chegar e abaixei o copo quase vazio, um pouco
ofegante, tentando processar aquela informação.
— Eu duvido muito. — Queria ter mais água para enfiar na boca e fugir
daquilo.
— É o que tenho visto desde que cheguei, Isaac — fui clara, cristalina, sobre
o que pensava dele.
— Então não vê muita coisa com clareza. O que meu irmão inventou para
você? Que meu pai é péssimo? Que minha mãe era uma vaca? Que eu sou
um idiota mimado? — Fiquei quieta,
engolindo o preço do segredo. — Podemos ser tudo isso, mas Conrad não é
nenhum santo. Sabia que ele já tentou me matar?
— Tudo bem, Scarlet. Vamos fazer o seguinte. — Ele mordeu seu sanduíche
mais uma vez, mastigou e me encarou numa profundidade absurda. —
Vamos aguardar. Conrad vai acabar com você, eu não dou mais um mês para
esse conto de fadas sobreviver, e aí, quando você precisar de um amigo de
verdade, estarei aqui.
— Espero que sim, porque, do jeito que está apaixonada por ele, será uma
tristeza sem fim ver você se machucar.
— Eu… — Mas antes que pudesse falar qualquer coisa, o som de algo sendo
destruído, gritos e buzinas vieram do lado de fora.
— Que porra é essa? — O garoto Prince foi mais rápido do que eu e correu
para a entrada comigo nos seus calcanhares, e nenhum de nós estava pronto
para ver aquilo.
Isaac não se escondeu dela, o que eu achei ser uma péssima ideia, porque
quando a distância entre os dois se encurtou, Bella desceu um tapa forte,
estalado, grosseiro e certeiro no rosto dele. Suas
— Onde ele está? — Não tive coragem de ir em sua direção, mas finalmente
ganhei sua atenção.
— O que é que você faz aqui? — Eu seria a próxima vítima de sua raiva.
— Vim procurá-lo. Ele não me encontrou hoje como tinha dito que faria, não
o achei em sua casa, nem onde marcamos de ir, pensei que ele estivesse
aqui…
— Era uma bronca, mas ela não parecia mais querer me bater.
— Escute bem o que vou dizer — com o dedo apontado na cara do meio-
irmão de Conrad, ela abaixou seu tom de forma tão
ameaçadora que até eu tive medo —, se seu pai não começar a cuidar direito
de Conrad e da mãe dele, vou fazer um inferno nesta cidade até que todo
mundo saiba o quanto John Prince é um lixo, entendido? Não vão conseguir
pisar em lugar nenhum sem que vejam o que vocês permitem acontecer. O
preço de arrumar essa bosta de portão vai ser pouco perto do que ele vai ter
que pagar.
— Mas… — Isaac bem que tentou dizer algo, mas ela não deixou.
— Mas nada. Eu cheguei ao limite. Se seu pai acha que tem poder, minha
família tem ligação direta com a porra da rainha, então não me provoquem
mais! — ela voltou a falar alto, engolindo qualquer intenção de Isaac dizer
algo.
Quando ela percebeu que seu recado foi entendido, voltou para o carro e
assim que abriu a porta, me viu parada sem saber o que fazer.
— E você aí, cabeça vermelha, se quiser ver Conrad, te dou dois segundos
para entrar no carro.
sabe que sua presa, inevitavelmente, vai cair em sua armadilha, cedo ou
tarde.
— Desta vez? — Engolindo o ódio que sentia, ela socou o volante antes de
parar o carro atrás da caminhonete, me fazendo entender aonde iríamos. —
Veja com seus próprios olhos. É melhor ele te contar essa parte antes que eu
acabe falando o que não devo.
O garoto tinha uma garrafa d’água na mão e, pela primeira vez na vida, tinha
uma expressão que não era blasé na cara. Isso me alarmava muito, mas meus
pés continuaram seguindo, até que ele entrou no meu campo de visão e eu
não consegui me mover, sufocando no lugar.
Minhas mãos estavam na boca, tapando meu grito. Meus olhos encheram
d’água, evitando que eu visse o resto dos machucados.
Daquela distância, a única coisa que via era o único olho meio aberto de
Conrad, me notando bem ali.
— O quê? — Conrad olhou para ela sem entender. Consegui ver isso porque
as lágrimas liberaram meus olhos, escorrendo quentes pelo meu rosto.
— Invadi a porra da casa do seu pai. Arrebentei o portão, e bati no seu irmão
— ela completou com nenhum peso na consciência.
— Ah, cale a boca. Inclusive, se não tivesse feito isso, não tinha salvado a
princesa ali.
A atenção dos três rostos veio para mim e, engolindo em seco, consegui me
mover.
primeiro momento, até ergui a mão, mas desisti e voltei a tapar minha boca.
— Meu Deus, o que fizeram com você? — Meu tom embargado e baixo o
fez virar o rosto.
O rosto de Conrad estava desfigurado. Seu olho esquerdo estava tão inchado
que não abria e, corajosamente, toquei seu queixo com muito cuidado e o
obriguei a me mostrar a obra completa. Seu olho esquerdo era uma mistura
preta e vermelha.
Alguma veia tinha estourado. Havia um corte no supercílio, outro na maçã
do rosto. Seu nariz, por um milagre, parecia intacto e precisei soltar o ar dos
pulmões para continuar vendo os hematomas.
era Thomaz quem respondia, e ainda assim, meu olhar não conseguia deixar
o rosto do garoto que eu amava. — Começou a bater na mãe dele, mas
Conrad se meteu e…
— Onde está sua mãe? — Não entrava na minha cabeça que ela deixasse o
filho passar por isso, que ela aguentasse viver naquele inferno de agressão e
brigas.
— A polícia? — foi Bella quem perguntou. — Seu padrasto vai ser preso,
finalmente?
Caroline não prestou queixa, com medo do que John faria quando ligassem o
nome dela e de Conrad ao dele.
— Mas… você não está bem. Já foi até um hospital? — Ele deu um riso sem
graça e segurou as costelas. Ver aquilo me enfureceu e eu aumentei o tom de
voz: — Você precisa de um médico!
— Não. — Seu tom de voz frio, distante e seco me calou por dois segundos.
Caralho, que merda você tinha que trazer ela aqui? — mudando seu foco, ele
brigou com sua amiga, que, me surpreendendo, se colocou de pé e veio me
puxar para si.
— Vocês são surdos? Não ouviram meus motivos? — Ainda que eu não
conseguisse enxergá-lo porque meu choro magoado
Então, surgindo no mato com seu terno bem-cortado, com o policial à sua
esquerda, e Isaac à sua direita, John Prince apareceu.
Com todo o esforço que podia fazer, o garoto continuou a olhar para o chão,
conforme tentava ficar de pé sozinho, recusando a ajuda do amigo.
— Odeio vocês. — Sua frase baixa nos bateu como um chicote. Não era um
amontoado de palavras vazias, e quando digeri, no segundo seguinte, senti
meu coração se desmanchando em cinzas.
O garoto seguiu para longe e o policial o acolheu, seu pai ainda ficou
encarando-nos e avisou:
— Senhorita Mountbatten — era com Bella que ele falava, e a garota não se
intimidou —, ligarei para o seu pai para conversarmos sobre o portão.
— Não sei, cabeça vermelha, mas é bom rezar. Conrad vai querer nos matar
— foi Bella quem disse.
Dos três, eu achava ser a menos apta para aquilo naquele segundo.
conrad
agora você me pegou porque estou drenado. tento tanto que meu cérebro está
ficando dormente. mais do que eu posso aguentar, esperando aqui, eu sei que
está longe de ser luxúria. muito fodido para dizer que você é quem está
controlando nós dois. por que você tenta jogar? todas as palavras que eles
dizem se alinham. você aparece quando estou sozinho, quando estou preso
nesta zona, quando estou caindo mais rápido do que respiro.
apareça quando eu estiver preso nesta zona. agora, você me pegou porque é
fraca. eu posso ver como você mudou, sentindo todo o peso do mundo,
nunca pensei que esse fosse o seu destino.
n u m b , k i i a r a , p v r i s & d e a t h b y r o m y.
Minha mão estendida foi um convite. Meu pau duro feito pedra desde a hora
que ela tinha colocado a boca na minha era outro, e quando seus dedos
deslizaram delicadamente sobre os meus, aceitando, meu coração bateu tão
forte dentro do peito que precisei me repreender mentalmente.
Ela sabia, eu não era o cara de foder por foder. Não era do tipo que me
exibia com números, mesmo que gostasse muito do ato, pelo meu histórico,
por ser doente, por aceitar que minha natureza me puxava para aquilo, de
qualquer forma. Medi o corpo de Scarlet de cima a baixo. O tecido que
cobria seus peitos só fazia ser pior o relevo dos piercings e do mamilo,
denunciando sua excitação. Ela estava suada, acelerada, podia ver pela sua
íris fina que havia algo a mais no seu sistema, mas o modo como ela me
olhava não deixava brechas para saber que aquela decisão era sóbria.
Fechei a porta logo que entrei atrás dela e antes que pudesse fazer qualquer
coisa, foi ela quem me grudou contra a porta. No escuro, suas mãos não
foram tão delicadas quando me bateram contra a madeira, ou quando ela
agarrou minha nuca e me puxou para baixo, sedenta por continuar de onde
havíamos parado.
Sua boca tinha um gosto diferente, um pouco mais amargo, muito álcool,
mas ainda era ela.
Meu coração disparou, minhas mãos seguiram sem pudor algum para sua
bunda e eu a apalpei sem dó, sabendo que era doloroso o que fazia quando
Scarlet deu um gemido incômodo e mordeu meu lábio com força. Puxei seu
corpo contra o meu,
Queria puni-la por cada vez que deixou meu irmão tocá-la, beijá-la, fodê-la.
Queria machucá-la tanto quanto ela me machucou, mesmo quando não tinha
ideia do que fazia.
Seu cheiro me atingiu, minhas bolas pulsaram. Que caralho de mulher era
aquela?
Sustentei-a no alto com meus quadris, e sabendo que seu corpo estava um
pouco acima do meu, avancei por sua garganta.
Suguei sua pele ciente de que a marcava, lambi preguiçosamente conforme
minhas mãos subiam desenhando sua cintura, tocando suas costelas,
precipitando seus sentidos do que queria fazer em seguida.
A ansiedade dela foi transmitida pela pele. Senti sob meus dedos quando ela
se arrepiou e ri contra a curva do seu pescoço.
— Minha voz era baixa, grave, e minha respiração contra sua pele fez com
que ela tremesse.
— Acho melhor você fazer do que falar — no mesmo tom de voz que o
meu, muito mais ofegante, ela respondeu.
Engoli em seco quando lembrei que, antes, causar aquilo nela era minha
motivação diária.
— Ele ainda está valendo — avisei pela última vez e voltei a beijar seu
pescoço enquanto meus dedos atingiam seus mamilos excitados. E tomando
cuidado com os piercings, pincei-os e puxei, ganhando um grito de dor e
prazer vindo dela.
— Conrad… — ela choramingou meu nome.
— Shiiii. — Mantive um dos bicos apertado entre meus dedos e com a mão
livre, a peguei pelo pescoço, batendo sua cabeça contra a porta, voltando
minha boca para a sua. — É para doer mesmo, Red. É para você sentir o que
fez comigo quando me destruiu.
E tomei sua boca de novo, ganhando uma mordida enquanto ela me socava o
peito.
Soltei seu corpo quando senti algo molhado e ela foi para o chão. Dei meio
segundo para ela me soltar, mas brutal, em uma raiva que nunca pensei ser
capaz de vir dela, Scarlet me empurrou enquanto mantinha a boca na minha,
me jogando para trás.
A sensação daquele mínimo toque me fez pegar fogo. Tentei puxá-la para
sentar no meu colo, para fodê-la de uma vez e acabar com tudo, mas ela não
deixou. Me apertou com força, fazendo com que
Daria minha vida para não perder os olhos de Scarlet quando ela se ajoelhou,
quando seus dedos espalharam a prova da minha excitação pela cabeça do
meu pau. Quando a desgraçada, mostrando ser experiente no que fazia, me
encaixou em sua boca e brincou com a língua contra meu piercing, tentando
atingir o freio do meu pau. Eu não aguentei.
Ela não fugiu. Senti a cabeça do meu pau bater no céu da sua boca, mas ela
se ajeitou e o colocou mais para dentro. Nem assim conseguiu ir até o fundo,
não aguentando todo meu tamanho. Ela me deu um tapa forte na coxa, eu a
liberei e a vi tossir.
— Não tá acostumada, é?
completamente dos meus sentidos para acompanhar o que ela fazia. Scarlet
cuspiu em mim, o som daquilo me deixou mais duro.
— Vai, caralho. — Até ergui a mão para pegá-la de novo e me forçar, mas
Scarlet foi esperta, bateu na minha mão e apertou minhas bolas, me fazendo
obedecer e desistir da minha intenção.
Scarlet não parecia ter pressa, ora tentava me forçar mais, ora brincava com
a cabeça do meu pau com lábios, língua e dentes, me surpreendendo por não
causar um acidente mesmo no escuro, e foi
Claramente, ela não esperava, mas quando a sentei contra o meu quadril,
com meu pau batendo contra sua bunda, tão duro que seria capaz de parti-la
ao meio, a ruiva tentou me beijar.
Eu jurei que não me importaria, mas aquilo ia contra tudo. — Tem certeza?
O silêncio dela em seguida fez todo meu corpo tensionar. Se ela dissesse que
não, nem um banho no gelo acalmaria meu pau.
Nem dez anos longe a arrancaria, seu cheiro, seu gosto e seu corpo do meu
sistema. Ainda assim, por tudo o que passei, eu não podia forçá-la. Não
estava ali para isso.
Mas a queria consciente, porque no dia seguinte, ela teria que encarar suas
escolhas como nunca.
O corpo dela se curvou para frente, sua boca encontrou a minha, suas mãos
vieram para o meu rosto e ela acariciou minhas
Eu imaginei que ela diria um simples sim. Que me deixaria fazer o que
queria, porque era assim que tinha que ser, mas senti quando ela ergueu o
quadril e tirou as mãos do meu rosto.
— Ele está sempre, sempre, no meu pensamento. — Sua fala contra minha
boca era pesada, dolorida. — Não por prazer, tal como eu não sou um prazer
para mim própria, mas como parte de mim mesma, como eu própria[7] —
ela citou contra os meus lábios antes de me morder e eu senti seu movimento
ao mover a calcinha para o lado. — Eu te odeio, Conrad. — Sua voz estava
embargada de novo quando Scarlet pegou meu pau e, me desarmando
completamente, esfregou-me contra si. Era molhado, quente, tão bom que
fechei os olhos e segurei o palavrão. — Mas uma parte gigante e indomável
dentro de mim ainda quer você. E estou aqui, neste momento, para matá-la.
— Scarlet suspirou quando me encaixou em sua entrada.
Eu a amava.
Eu a odiava.
— Então, por favor, faça doer. — O pedido dela morreu na minha boca.
Envolvi seus lábios com os meus de forma bruta, firme, alucinada. Minhas
mãos no seu quadril foram perversas. Apertei sua carne e, enquanto a puxava
para baixo, fui de encontro com o quadril, entrando de uma vez.
As mãos dela agarraram meus ombros, sua boca implorou por afago da
minha, mas não era isso o que eu tinha para dar. Não era isso que ela tinha
acabado de pedir para mim.
Suas lágrimas molharam meu rosto, sua boca procurou por ar, e eu não parei
de meter por nenhum segundo. Seu quadril cedeu contra mim, sua boceta
massacrou meu pau. Tão apertada, tão quente, tão dolorosamente boa. Eu a
ajeitei no meu colo, sua boca saiu da minha e eu encaixei o rosto contra seu
ombro. Ela cravou as unhas no meu torso, eu cravei os dentes em seu ombro
como anos
atrás. Bati em sua bunda com força. Ela tentou segurar o grito. Suas unhas
rasgaram minha pele, meu pau invadiu sua boceta mais uma vez até o fundo.
Ela gemeu pesado e eu a abri para me receber melhor, e quando meus dedos
resvalaram em seus lábios externos pressionados por conta da minha
grossura, suguei onde eu havia machucado e desci com a boca para seu seio.
Queria que tivesse a porra de uma luz acesa para que eu pudesse enxergá-la
naquele segundo. Queria ter filmado para assistir para sempre quando Scarlet
ergueu o peito tentando fugir, mas não teve tempo de fazê-lo.
Seu grito foi mais alto do que a música que vinha de fora.
Nada me preparou para ouvi-lo, assim como nada me preparou para senti-la
tremendo daquele jeito, me apertando tanto que quase me expulsava.
Larguei seus braços e ela caiu sobre mim, ainda encaixada no meu pau.
Scarlet choramingou, mas não tive dó.
Envolvi meus dedos nos cabelos de sua nuca e bati de leve em seu rosto. Ela
tremeu.
— Relaxa, Red. — Minha voz era quase um rosnado, mas ela não atendia.
Seu peito descia e subia, ofegante, e eu podia sentir seus olhos queimando
sobre os meus, mesmo que não os visse direito.
— Ah, mas vai aguentar. — Puxei sua boca para minha e a ergui de novo no
colo. Tinha visto uma mesa de relance atrás de nós e com Scarlet encaixada
em mim, me segurando com toda força que tinha, limpei um canto
empurrando as quinquilharias que tinham largado ali e apoiei sua bunda
contra o tampo. — Vai aguentar porque, se você quer matar o que sente por
mim, eu vou fazê-lo viver.
— Vou fazer isso te corroer, meu amor — disse contra sua boca, prendendo
seu rosto contra o meu. — Vou fazer você sofrer, e vai doer, como doeu para
mim.
— Por favor… — ela choramingou, tentando puxar meu rosto para encostar
a boca na dela. — Eu não aguento mais, eu não aguento mais…
— Estou ligado a você por laços muito fortes — citei o texto que havia
declamado para ela, anos atrás, pendurado do lado de fora da sua janela, e
senti suas lágrimas molhando meus dedos que agora estavam em seu rosto.
Sua boceta me apertou dolorosamente conforme seu corpo tremeu. — E você
será minha para sempre.
Curvei-me um pouco, obrigando a garota a deitar para trás e, enquanto
mantive o pescoço de Scarlet preso com uma das mãos, controlando a
quantidade de ar que ela podia respirar, desci com a outra vasculhando sua
boceta até achar seu clitóris.
Queria seu gosto na minha língua mesmo sabendo que demoraria uma vida
toda para me livrar dele. Voraz e intensa, seus lábios cobriram os meus, suas
mãos puxaram meu corpo para frente e seu quadril dançou contra meu pau,
contra minha mão.
Investi pesado contra ela, saindo quase no limite e voltando até o fundo. Sua
boca na minha se revezava em gemer, beijar, morder e sugar. Era uma
bagunça e eu a imitava. A mesa batia contra a parede com violência, minha
mente me recriminou por gostar tanto de me enterrar nela daquele jeito, mas
lembrar que Scarlet tinha feito aquilo mil vezes antes com meu irmão, que
trepou feito uma puta suja com Isaac, que deixou ele marcar seu corpo por
dentro e por fora, me enfureceu de tal forma que precisei me afastar.
Saí dela e, segurando com força em sua cintura, a apertei e apoiei a cabeça
sobre seu ventre. O cheiro de sexo dela me pegou de jeito. Eu o aspirei como
um viciado.
E queria chorar por perceber que ao longo de todos aqueles anos, meu
coração destruído continuava a bater por aquela desgraçada.
— Desgraçada — repeti em voz alta, pegando seu rosto entre as mãos com
força, sabendo que a machucava, esfregando meus lábios nos dela. — Eu te
odeio — soprei em um tom agoniado.
Desci Scarlet da mesa, virei seu corpo de costas para mim e pegando em sua
nuca, abaixei sua cabeça contra o tampo. Afastei seus pés com o meu,
notando que aquilo não seria o suficiente, com a mão livre, ergui seu joelho
e, segurando meu pau na base, esfreguei o prince albert [8]contra seu
clitóris, me masturbando enquanto isso.
Precisei fechar os olhos, minhas mandíbulas travaram com força antes que
eu conseguisse abrir a boca e gemer.
Respirando fundo, acalmando o fogo que corria pelo meu corpo daquele
orgasmo insano, eu a larguei. O corpo trêmulo de Scarlet foi ao chão e ela
caiu sentada.
Ergui as calças que estavam nas canelas, ajeitei meu pau dentro da cueca e
me recompus.
Quando coloquei a mão na maçaneta, olhei para trás e lutei muito com tudo
o que passava pela minha mente.
Pegue-a.
Perdoe-a.
— Espero que tenha te machucado o bastante, Red. — Foi tudo o que pude
dizer antes de sair, sabendo que ela não aguentaria levantar pela próxima
meia hora, pelo menos.
Foi só quando entrei no meu quarto, que me dei conta de que havia algo de
errado. Thomaz estava deitado sobre a minha cama, fumando um baseado,
olhando para o teto.
— Porra. — Ele tapou os olhos com uma das mãos e forçou a vista para me
encarar — Não… Conrad, você se machucou?
Meu peito estava cheio de arranhões, alguns sangravam, mas eram meus
dedos que preocupavam. Havia sangue nas minhas
sussurrei. — Não, não, não! — Meu tom mais urgente fez Thomaz se sentar
para me encarar e entender o que acontecia.
Dito e feito.
Das duas uma, ou meu irmão tinha o pau muito pequeno, ou Scarlet era
virgem.
Desgraçada! Que alma amaldiçoada eu seria agora que sabia como ela era?
scarlet
quando você esteve aqui não conseguia te olhar nos olhos. você é como um
anjo, sua pele me faz chorar. você flutua como uma pena em um mundo tão
belo. eu queria ser especial, você é especial pra caralho, mas eu sou uma
aberração. eu sou um esquisitão. que diabos estou fazendo aqui? eu não
pertenço a este lugar.
creep,gleecast.
A falta dele, do seu cheiro, dos seus beijos, dos seus braços, me consumiu e
quando achei que não suportaria mais, naquela quinta, quando minha irmã
saiu pela porta, desisti de esperar.
Eu era uma covarde, e admitir isso para mim mesma enquanto descia pela
rua em direção à estrada aliviou o peso no meu coração. A verdade era que,
em vez de procurá-lo pelos cantos da cidade, ou ir até sua mãe, ou enfrentar
de novo a mansão Prince, eu procurei por seus amigos.
— Não vim vê-lo. — Meu tom de voz era nada além de um ruído.
— Então veio fazer o quê? — Bella bateu seu cigarro, e sentada, abraçou os
joelhos e continuou me encarando, curiosa.
— Mas…
— Não — neguei.
— O quê? Não faz o mínimo sentido. — Fiquei tão confusa que dei um
passo para frente.
Chamar a polícia
vocês.
— Isso não se parece com Conrad. Digo, por que é que ele não me mandou
nada? Como é que…
E por isso, acreditei que eles foram capazes de ouvir a rachadura que surgiu
no meu coração se formar.
Quando dei por mim, o sino da porta que eu abria anunciou minha chegada e
os olhos claros de Caroline encontraram com os meus. Não consegui nem
mesmo dizer oi.
— Eu não sei também. — Percebi que ela queria chorar. Sua voz embargou.
— Não posso falar ou ver meu filho sem supervisão. E não posso tê-lo de
volta até ter um canto decente para morar… — A mulher encarou as
próprias mãos, desconfortável, derrotada, em uma dor que eu nunca pensei
ser capaz de entender.
— Você o viu?
— Não. — Neguei com a cabeça. — Eu vou com você. — Não era uma
pergunta, era um aviso, e eu não dei tempo dela me dizer que não.
— Não agora. — O sorriso que ela deu era quase bom demais para ser
verdade, mas com tudo o que vínhamos passando, não tinha a mínima
vontade de saber o motivo.
Deixei minha irmã para trás e caminhei até estar na frente da mansão dos
Prince, antes das quinze. Não queria perder a chance de entrar.
Era um convite?
Daquela vez, não tinha uma alma viva para que eu desse um oi no meio do
caminho, e atravessei a alameda de folhas verdes achando que meu corpo
entraria em curto quando, apesar do calor que sentia, tudo em mim congelou.
Entediado, como se aquela parte morta dele tomasse conta do corpo, ele
mudava os canais da televisão gigantesca à sua frente, parecendo
desinteressado em qualquer coisa ali, até que me notou.
Eu, na minha gana de chegar até ele, apressei o passo, mas assim que desci o
primeiro degrau para a sala, precisei parar. Seu olhar era raivoso, acusador,
terrivelmente cruel, e colocou em volta de si uma barreira que, no primeiro
choque, não consegui atravessar.
— Conrad… — disse seu nome numa mistura de alívio e medo, mas ele não
ouviu.
— O que faz aqui? Quem te deixou entrar? — Aquilo era raiva na sua voz?
— Eu… — me desarmei. Não havia como lutar contra ele. —
Não funcionou por muito tempo. — Se queria me ver, já viu. Agora pode ir
embora.
Meu tom magoado não o atingiu e eu tentei dar um passo para trás, me
afastando daquela versão de Conrad que eu não gostava. Ele se ergueu em
resposta e deu um passo na minha direção, me deixando ver com mais
atenção os machucados dos mais variados tons de amarelo na pele clara.
— Você acha mesmo que nós chamamos a polícia? Acha que queríamos
separar você e sua mãe?
— Não — neguei. — Não importa o que você diga ou faça agora. Eu sei que
você está machucado, que está magoado. Sou capaz de virar as costas agora
e fingir que este encontro aqui nunca aconteceu, mas, por favor, por favor,
diga que vai ficar tudo bem. —
Ergui o rosto o mais rápido que podia, sabia não estar no meu melhor, mas
não fugi.
— Achei que sua visita seria mais tarde, não sei se Conrad…
— Não, é loucura. Isaac, faça isso. Leve a garota. — Era uma ordem direta,
e naquele momento, eu não tinha força alguma para contestar.
Foi como ter meu coração esmagado quando Conrad me deu as costas e saiu
pelo outro lado do sofá. Não consegui nem mesmo ver para onde ele ia.
— Scar? — Isaac colocou a mão no meu ombro sabe lá Deus quanto tempo
depois. Seu tom gentil ainda não me inspirava
confiança. — Ei, eu sei que você não está bem. Vamos sair daqui, ok?
Eu queria mesmo sair dali. Queria nunca mais voltar. Queria, na verdade, ser
capaz de apagar aquela tarde toda da cabeça.
Por todo o caminho, enquanto via o tempo fechar, fiquei trancada na minha
mente, e só quando Isaac desligou o carro em frente à minha casa, é que
suspirei, parecendo que todo o ar que tinha respirado dentro da sala dos
Prince só tinha sido solto ali.
— Scar, não leve tudo isso para o pessoal. Meu irmão está machucado e…
— Quem inventou isso? — Pela indignação de seu tom, não parecia mentir.
Eu o medi por longos segundos, até ver que ele não tinha motivo para
mentir.
— Esqueça. — Suspirei e meneei com a cabeça. — Acho que todo mundo
precisa de um tempo para digerir essa droga.
— Ah, isso explica muita coisa, aquela vadia louca… — Não gostei do tom
de voz dele. — Sabe que ela mentiu, não é?
— Seja lá o que ela disse, mentiu. Bella saiu de casa hoje, lá pelas três da
manhã, e se está duvidando da minha palavra, posso provar.
— Como?
Bufando por não gostar que eu duvidasse da sua palavra, ele mexeu no
celular e me mostrou o vídeo da garota de cabelos escuros cruzando o
corredor.
— Isso pode ter sido de qualquer outro dia, Isaac. — Não o levei a sério.
Não podia.
— Quer que eu procure nas câmeras de segurança de casa para doer mais?
Todo mundo sabe que eles têm um lance meio fixo há anos.
— Relaxe, Scarlet. Eu agora tenho outros planos, e eles estão vindo aí.
Ouvi a porta de casa bater e uma Susan bem-arrumada e feliz saiu jogando
os cabelos.
— Vocês estão…
— O vovô avisou que vai demorar hoje — Susan me avisou quando passei
por ela.
Quando eles saíram pela rua, me deixando sozinha, não pude dizer o quanto
me senti aliviada. Queria chorar. Queria gritar. Queria entender. E seria
muito melhor sem ninguém dizendo “eu avisei” nas minhas costas.
scarlet
Porque eu te amava naquela época e te amo agora e não sei como… acho
que é difícil saber quando ninguém mais vem por aí, se eu estou te
superando ou apenas fingindo que estou me convencendo de que te odeio.
Ajeitei a roupa sobre o corpo, tateei no escuro atrás da maçaneta e, sem nem
olhar em volta, caminhei silenciosamente de volta para o meu quarto. Sem
coragem de ver o estado do meu corpo, não acendi a luz, não olhei para
baixo. Passei os dedos no maço de cigarros e no isqueiro sobre minha mesa
de cabeceira e fui direto para o banheiro.
Bati a testa contra a parede algumas vezes, querendo ter coragem de fazer
com mais força. Querendo ser capaz de rachar meu crânio ao meio e arrancar
Conrad, seu olhar, suas mãos, seu
gosto, seu sexo e seu cheiro dos meus pensamentos, das minhas memórias
mais cruéis.
Queria mesmo que ele não estivesse lá para me salvar, porque estar morta
significaria não sentir, e eu odiava o que sentia naquele segundo.
Na verdade, eu odiava o que sentia por todos aqueles últimos cinco anos.
Por que era tão difícil odiá-lo, mesmo com todos os motivos do mundo?
Eu o odiava por me fazer querê-lo, e o odiava por ter aceitado minha mão
naquela noite, mas não podia dizer que ainda o odiava quando o beijei,
quando revivi a única época feliz da minha vida, quando o tive da forma
mais brutal e significativa que alguém poderia ter.
Suspirei, com o peito tremendo, não sabendo como ainda conseguia chorar.
Enquanto a água gelada descia, esfreguei meu rosto, meu peito, os braços.
Tentei me lavar entre as pernas, pensando se aquilo seria o suficiente para
evitar um acidente ainda pior, e entendi que não era hora de me punir ainda
mais pensando em uma possibilidade tão remota quanto uma gravidez
acidental.
Conrad tinha me marcado, muito, mas eu nunca pensei que poderia ser
diferente.
Não sabia.
E eu não podia, e nem queria, machucar quem esteve comigo por todos
aqueles anos.
E, fosse ele o que fosse, mimado, difícil, arrogante, era tudo o que eu tinha.
A fofoca devia ter se espalhado. Eu sabia que todo mundo estava de olho em
mim e em Conrad entrando naquela salinha. Que meu corpo exibia marcas
demais depois de eu sair dela.
Isaac Prince, o loiro atlético e perfeito, o único amigo que tive durante todos
aqueles anos, estava quebrado. A fúria o fez entrar embaixo do chuveiro e
erguer meu corpo do chão.
— Valeu a pena?
E, daquela vez, por mais que eu fosse muito boa em mentir, tudo o que saiu
da minha boca foi:
— Eu sinto muito.
Ele me machucou fisicamente, mas nada doeu mais do que o nojo em seu
rosto.
finalmente ele saiu pela porta, desliguei o chuveiro e, pisando sobre vidro
quebrado, sentindo a dor massacrar meus pés, achei o resto da cartela de
comprimidos para dormir jogada e tomei os últimos três de uma vez, triste
por não ter mais.
Qualquer coisa seria melhor do que lidar com a realidade, e foi convencida
disso que deitei e apaguei, querendo nunca mais acordar.
conrad
scars,paparouch
Queria colocar as mãos em Scarlet no claro. Queria olhar em seus olhos para
entender, mas assim que virei no corredor do seu dormitório, o que encontrei
fez todas as minhas boas intenções apodrecerem.
— Esperei por ela por cinco anos. Cinco longos anos. E você nem mesmo
chegou direito e já a tomou de volta… Como? Depois de tudo, como você
conseguiu? — Erguendo o rosto para o meu, Isaac parecia inconformado.
— Você acabou com ela, Conrad. Você é o vilão. Quando sugeri o que
poderia ter acontecido, ela enlouqueceu, quebrou o quarto todo. Só
conseguiu se acalmar quando prometi que estaria ao seu lado, caso ela
quisesse te denunciar. O que acha? Será que desta vez você se livra da
prisão?
Ameacei ir para cima dele e meu irmão deu um passo para trás, rindo.
— Isso, me bata. Bata muito. Vai ajudar na hora de dizer que fui defender
Scarlet e você me agrediu. Mais uma queixa na sua ficha.
— Seu…
— Você sabe que o que te deu a chance de ficar com ela, de se aproximar, foi
eu ter ido embora, não é? — provoquei também. —
— Mas agora é o que ela acha que aconteceu, até porque, você tem noção de
quão delicada é a pele de Scarlet? Seu controle de raiva não está em dia,
está? Acho que não, ou você não teria feito tudo aquilo com ela… E se você
duvida do que eu contei, a porta está aberta. Volte aos seus joguinhos de
perturbá-la, eu não ligo, isso só vai fazê-la te odiar mais. E se você não se
importa, estou indo porque deixei uma amiga em comum na minha cama,
completamente nua. — Ele passou por mim e parou antes de continuar: — O
que será que você tem feito de errado que todas as garotas que tinham algum
tipo de paixão por você, agora estão todas comigo?
Quando Isaac sumiu pelo corredor, precisei respirar fundo algumas vezes.
Não seria nada difícil ir atrás dele e socar seu rosto até quebrar cada mínimo
osso. Dar com sua cabeça na parede ou esganá-lo até que ele parasse de
respirar…
Não podia permitir que ele vencesse quando, no dia seguinte, a minha
vingança poderia acabar com ele.
Porém, depois de tudo, aquela ameaça… Ele tinha mesmo feito a cabeça de
Scarlet?
Caí na tentação.
Minha mão foi direto para a maçaneta de seu quarto. Meus dedos gelaram,
mas eu a girei. A porta rangeu quando abriu e, pela luz da lua do lado de
fora, precisei engolir a seco minha vontade de xingar, de gritar comigo
mesmo.
O quarto estava uma bagunça. Havia sangue no chão, cacos de vidro, livros e
roupas por todo lado, mas não era aquilo que me preocupava.
O cabelo meio úmido estava uma bagunça, mas não foi ele quem chamou
minha atenção.
Os braços, a cintura, as costas, a bunda… até a altura das coxas, não havia
um canto de Scarlet onde minhas mãos não tinham apertado, batido,
machucado.
Mas mais do que isso, como é que Scarlet, me pedindo por aquilo, tinha
acreditado na ideia louca do meu irmão?
Eu…
Para minha sorte, ela não acordou. O máximo que Scarlet fez foi deitar de
barriga para cima, me dando uma visão perfeita de
tudo. Foi então que entendi que não importava o que eu dissesse.
— Desgraçada — soprei mais uma vez quando bati a porta do quarto e senti
o sabor da derrota na boca. Era amargo demais, assim como perceber que o
que a garota tinha tentado matar naquela sala escura quando fodeu comigo
estava vivo.
scarlet
O
que
está
fazendo?
Conrad?
Olá, Red.
Meu coração estava tão machucado, eu tinha tantas perguntas para fazer que,
antes de respondê-lo, olhei para o céu noturno. Já passavam das oito, meu
avô não estava em casa e Susan cantava no chuveiro.
Nada.
você?
Queria
vê-la.
me encontrar no
parque?
Agora?
É.
Precisamos
conversar
Meu coração sentiu. Pesou. Mas ainda que eu soubesse, meus dedos
teimosos e ansiosos responderam rápido.
Estou
indo.
— Aonde vai?
— Ao parque. — Tentei não discutir, ou dar brechas para ela causar. — Quer
ir?
Saindo com Isaac, ela sabia muito bem da minha situação com Conrad.
Nós nunca o julgamos, ele tinha direito de continuar a ter uma vida, mesmo
depois de assumir a responsabilidade de criar a mim e a Susan, mesmo que
aqueles momentos de diversão agora fossem menos frequentes.
Quando caí na rua e enfiei as mãos nos bolsos da calça, me encolhendo
contra o vento de chuva, tomei aquilo como um aviso.
Mãos geladas e coração frio, Scarlet. Você precisa descobrir como as coisas
estão — pensei.
Aquele era um bom caminho para seguir, ainda que eu tivesse certeza que ao
colocar os olhos em Conrad, cada célula minha
pegaria fogo.
Vasculhei cada centímetro do lugar, cada fila de brinquedo, cada atração que
sabia que ele gostava, até que, foi só olhar para cima que, milagrosamente,
eu o vi.
Quando corri dali, achei que meu corpo não fosse suportar a dor.
Aquela era eu, o pequeno Heathcliff correndo com o coração quebrado por
Catherine Earnshaw. A diferença era que não havia meias-verdades. Eu tinha
visto tudo.
scarlet
— Scarlet, se você não abrir, vou entrar. — Reconheci a voz John e eu dei
um pulo, sentando e fazendo tudo girar.
— Espere — falei o mais alto que podia e voltei a fechar os olhos, tentando
me localizar no mundo.
Tentando o meu melhor para esconder as marcas que sabia ter, abri uma
fresta da porta e vi os olhos de John mais aflitos do que nunca sobre mim.
— Tem certeza?
— Então, por favor, se arrume e desça. Você é um dos nomes inscritos para a
última prova do torneio.
John saiu andando pelo corredor antes que eu tivesse tempo de pensar em
fechar a porta.
Por sorte, Maressa ficou ali. A mulher de pele negra e grandes olhos sábios
se aproximou da fresta da porta e me perguntou:
— Scarlet, querida?
— Não. Na hora, eu nem pensei nisso… — Mais uma burrada para a lista
interminável.
— Ah, menina. — Doce como sempre, ela sorriu para mim, tentando me
confortar. — Não se preocupe. Mais tarde, encontro você com ajuda.
— Certo. Obrigada. — Tentei sorrir de volta. — O que eu devo vestir?
— Roupas de banho e algo atlético por cima. Vocês vão para a floresta.
Eu não podia conversar com Conrad. Não me atrevia ficar sozinha com ele
de novo.
E não queria mais falar com Isaac. Sabia que aquele boato ganhava vida pela
minha traição à sua confiança, mas também tinha dedo do seu ego quebrado
por saber que eu tinha dado ao irmão algo que sempre neguei a ele.
banho, já que não entraria de jeito nenhum no lago, pois não sabia nadar, e
então quando chegasse a hora, choraria para John me deixar voltar ao meu
quarto com a desculpa de que estava com dor de cabeça e aquele inferno de
parecer uma família feliz ao lado daqueles três acabaria.
Vesti a calça preta de tecido sintético, meus tênis, joguei a jaqueta dos Lions
por cima de tudo e saí do meu quarto evitando qualquer olhar, qualquer
conversinha fiada.
Parecia meu coração, e eu não fiquei parada ali para me ver congelar e
quebrar como ele.
Por sorte, o palco não estava armado naquela noite, e apesar de eu ver Isaac
perto de seu pai na pequena clareira, me mantive longe o bastante para
mostrar que não queria aproximação. Meus olhos estavam aflitos por outro
motivo, e foi um misto de alívio e frustração não ver Conrad lá.
— Se você está inscrito nesta noite, saiba que vantagens foram adicionadas
ao desafio. O time vencedor da noite leva cinco mil libras extras, cedidas por
velhos patrocinadores. O jogador que liderar melhor seu grupo, ganhará duas
mil libras a mais. —
Então, caso você seja um dos competidores, venha até aqui para que
encontre seu grupo e receba sua missão. Há itens escondidos nesta floresta e
vocês precisam encontrá-los fugindo das armadilhas e de sabe lá mais o que
se esconde no escuro — John tentou fazer graça e ser minimamente
assustador, mas ninguém levou aquela parte a sério.
Certa de que faria meu melhor, fui para a fila de espera como qualquer outra
pessoa, sabendo que havia olhares demais queimando nas minhas costas, e
esperei minha vez.
— O que faço?
— Procure outras pessoas com esse número. Elas serão seu grupo. Cada uma
de vocês terá um envelope com dicas e o objeto que precisa ser encontrado.
— Não tenho nada para falar com você. — Meu tom de voz cortou suas
intenções ao meio. Isaac esfregou o queixo, inflou os pulmões e concordou
com a cabeça.
— Boa sorte. — O desejo dele era o mesmo que nada, e sem mais
explicações, ou querer continuar perto de Isaac, dei as costas,
Alguma hora, eu conseguiria ser racional e gritar com ele por saber que a
mentira tinha se espalhado por sua culpa, mas aquele não era o momento.
Meu foco era outro, e usei dessa energia para procurar meu grupo.
— Tem certeza?
— Terá que me suportar pelo resto da noite. — Havia orgulho em sua voz e
eu fiz a maior cara de nojo possível.
Quanto mais cedo aquilo acabasse, mais cedo eu poderia dar no pé.
— O seu primeiro.
— É uma faca. — Mostrei o card entre os dedos, girando para que ele visse
o pequeno mapa atrás.
— O meu é uma tocha. Mas qual a ordem disso? — Seu cérebro não parecia
ter sido derretido depois de tanta droga, no final das contas.
— Vocês têm duas horas para terminar a prova, e isso significa que
precisarão correr. As trilhas estão sendo monitoradas, então tentem não se
perder. Se, por acaso, isso acontecer, cada um de vocês agora vai receber um
apito. — Uma garota de boné azul veio distribuindo de mão em mão o
objeto. — Soprem apenas em caso de emergência, e isso se enquadra em
membro ferido ou perdido.
Entenderam?
— Certo. Boa sorte até a fogueira. Até lá, vocês estarão juntos, e depois…
— O tom misterioso dele daquela vez conseguiu causar arrepios na minha
nuca. — É, boa sorte.
Meus olhos não captaram os seus naquele minuto, mas aquela queimação
maldita de quando ele estava perto não parava de me incomodar.
A plateia gritou.
Nós corremos.
Ignorei a dor dos pés feridos e tive plena certeza de que ainda havia
estilhaços de caco de vidro neles. Mesmo assim, não parei de correr por
nenhum segundo. Meus pulmões reclamaram daquele
esforço já que eu não era dada a exercícios e fumava feito uma chaminé,
porém, nada me fez parar de correr na direção da grande fogueira que
brilhava há vários e vários metros à nossa frente.
Essa sensação só piorou quando algo grande uivou e fez todas as equipes
pararem no lugar. Eu mesma fui uma que desacelerou bruscamente para
ouvir melhor.
— Acho que é a faca. Com ela, nós vamos cortar a corda da chave e então
vamos para o lago.
— Vamos precisar entrar na água? — O tom desanimado da garota me
confortou.
— Eu não vou entrar naquela porra. A água vai estar mortal, além de que é
fundo. — Ele tentou fugir.
Alguns anos atrás, logo quando Isaac entrou na universidade e eu ainda não
podia frequentá-la, fui visitá-lo e resolvemos caminhar.
Isaac e eu nos enfiamos na floresta por achar que seria uma boa ideia acender
uma fogueira perto do rio e acabamos descobrindo uma caverna no pé de
uma das paredes de rocha que sustentavam o terreno do castelo que ficava no
alto.
Aquele desvio nos faria atrasar, era como se estivéssemos voltando todo o
caminho em ziguezague, pois a chave ficava para o outro lado e o píer do
lago um pouco mais para frente de onde iríamos buscar a faca.
— Quem vai subir? Não conte comigo. Sou uma merda em escalada —
Thomaz avisou.
Dei a tocha para a garota mais próxima e indiquei para Thomaz que
precisaria de ajuda.
meu peso por elas e comecei o maldito exercício, pensando no porquê havia
começado a fumar.
Eu sabia o motivo. E aquela era mais uma coisa que Conrad Prince direta ou
indiretamente tinha estragado para mim.
Com muito custo, completamente concentrada e com medo de enfiar a mão
onde poderia ser picada por aranhas, ou ter uma bela queda ao escorregar,
ganhei alguns arranhões, mas finalmente meus dedos roçaram o cabo da faca
pendurada no alto.
— Consegui! — avisei. — Saiam de baixo, vou jogar! — Mas não ouvi uma
devolutiva. Por um segundo, um frio desgraçado passou pela minha espinha
e eu soube que havia algo errado. —
Eu caí mais uma vez sem entender direito o que acontecia, e quando
processei, era tarde demais.
Eles iam me matar. Eu tinha certeza. Eu ia morrer.
Quando meu corpo foi erguido como se eu fosse nada sobre o ombro de
alguém, tentei me acalmar. Conrad não me faria mal. Ele não podia me fazer
mal. Não tinha a mínima condição de alguém fazer o que tínhamos feito na
noite passada e a consequência daquilo ser um assassinato, mas, minutos
depois, quando fui jogada no chão, pensei que estava errada. E não era
porque, quando o pano preto saiu da minha cabeça, eu vi uma multidão
segurando velas e me encarando como se eu fosse um bicho.
Nunca era.
scarlet
você me fez odiar esta cidade e eu não falo merda sobre você na internet.
nunca disse nada de ruim a ninguém porque essa merda é constrangedora.
você era tudo para mim e tudo o que você fez foi me deixar triste pra
caralho, então não desperdice o tempo que eu não tenho e não tente fazer
com que eu me sinta mal.
— Isso dói — reclamei, tentando me manter em pé, mesmo que meu corpo
tremesse tanto que mal conseguia dar um passo.
Por que é que ele fazia aquilo? Por que é que, depois de tudo, ele ainda vinha
tirar mais e mais de mim?
— Por que você está fazendo isso? — com toda a dor que conseguia traduzir
na voz, perguntei, inquisidora.
O rosto dele era uma máscara. Seus olhos dois abismos negros, frios demais
para qualquer compaixão, profundos demais para que eu conseguisse colocar
os pés em algo que não fosse ódio e crueldade.
Conrad não me respondeu. Na verdade, tudo o que ele fez foi desbloquear o
celular em sua mão e me mostrar algo pelo qual eu nunca me recuperaria.
— Nós não estamos mais juntos. — Engoli o orgulho. — Isaac pode dormir
com quem quiser. — Com as mãos juntas, limpei o canto dos olhos.
Eu realmente sabia.
Eu sempre soube.
— Por que está me mostrando isso? — Minha voz era menos que um sopro,
que um ruído.
respiração bateu contra mim, e quando ele disse aquelas palavras, sua
crueldade me fez cair como nunca: — Só estou te fazendo colher as
consequências das suas escolhas, Red.
— Aqui jaz uma mentirosa — ele gritou para a plateia, com os olhos nos
meus, absorvendo todo o meu choque por não entender aonde aquilo
chegaria. Ele me enterraria viva?
Conrad apertou a tela do celular e jogou para mim.
— Veja o que seu eleito disse sobre você, depois de te convencer que eu a
estuprei ontem…. — Quando o aparelho caiu na minha barriga e eu
consegui olhar a tela, era Isaac gemendo, o som de corpos batendo, e lá
estava Bella.
Mais rica, mais legal, mais descolada e que tinha acesso ilimitado a Conrad
Prince.
— Scarlet é uma vadia… — Me livrei das cordas que prendiam meus pulsos
e consegui desligar o celular.
Até Thomaz parou de jogar terra na minha cova para assistir enquanto eu
saía dela e ia para Conrad.
Avancei para cima dele, o rosto tão próximo que podia ver cada mísero
detalhe das íris escuras sob a luz das tochas, e quando ele
deu um meio passo para trás, eu avancei, não dando brecha alguma entre
nós. — Eu fui tudo isso porque eu esperei por você, porque eu lutei por
você, porque pintei você e escrevi para você um bilhão de cartas que você,
covarde, nunca teve coragem de responder. Eu realmente esperei você. EU
LUTEI POR VOCÊ, CONRAD. — Bati contra seu peito com o dedo
indicador, seus olhos eram ilegíveis, suas sobrancelhas franzidas não me
diziam muita coisa, mas nada importava naquele segundo. — E eu não
deixei de amar você por nenhum segundo, mesmo quando você partiu meu
coração naquela merda de roda-gigante, ou quando incendiou minha casa e
assassinou minha irmã! — O choque foi geral. A plateia segurou a
respiração. Conrad engoliu em seco, mas eu não me calei. Não aguentava
mais. — É por isso que eu não comprei, nem de longe, essa ideia de estupro.
Eu nem mesmo sabia dela. Fiz porque quis, porque de algum jeito maldito,
você ainda está em mim, porque, mesmo depois de todos esses anos, eu
guardei tudo o que era nosso, todos os seus segredos, todas as boas
memórias. Fiz porque acreditei no seu amor com uma fé inabalável, mas isso
tudo era ilusão. Você não pode ter me amado um dia, Conrad, porque quando
se ama, não se quebra, não se destrói, não se machuca o outro como você fez
comigo.
Ergui a mão e dei com tudo o que tinha e o que não sabia ter.
O tapa estalado em seu rosto deixou a marca dos meus cinco dedos contra a
pele branca.
— Vou dar uma referência clara, que você vai entender. Aqui, nessa história,
na nossa história, você não é o amável e injustiçado Darcy, você é o merda
do Wickhan! O único traidor aqui, o único covarde, é você. E eu cansei!
Estou te expulsando de vez da minha vida, Conrad Prince. Estou agora
acabando com você tudo e qualquer coisa que um dia achei que pudesse ter,
porque você é podre. Você não tem coração. Você é realmente o pior dos
Prince.
— E eu corri, porque por mais que minha boca dissesse aquilo, por mais que
eu quisesse que a magia daquelas palavras fizesse algo de imediato, elas não
faziam.
scarlet
l o v e l y, b i l l i e e i l i s h , k h a l i d
Nossa distância, minha e daquela multidão, era pouca, já que graças às velas
que eles erguiam, eu conseguia ver o caminho até o píer.
Naquele segundo, quando olhei sobre o ombro, odiei o fogo.
Tentando não tropeçar, sentindo meu tornozelo doer mais do que poderia
demonstrar, andei o mais rápido que pude para a água e, inevitavelmente, as
memórias que tentei repelir por todo aquele tempo, me acertaram como um
soco, uma punição.
Ardeu.
Machucou.
Eu deveria ter sabido que, com tudo, eu nunca bastaria para alguém como
Conrad Prince.
Meu peito doeu quando o soluço o atingiu, igual naquela noite quente de
verão.
Caminhei pela rua, não acreditando no que via, querendo poder salvar
alguma coisa.
A eu do presente parecia ter mais coragem de acabar com tudo, já que não
havia coisa nenhuma pela qual lutar. Arranquei os tênis enquanto a multidão
atrás de mim ria, assobiava e me xingava.
Eu pensei que lutaria, que tentaria desistir da ideia, mas ali era silencioso.
Confortável.
Fechei os olhos, me lembrando de ver Conrad pulando para fora pela janela
lateral.
Seus olhos estavam assustados. Era a primeira vez que eu os via tão
profundamente com medo. Nós nos encaramos, eu não entendi.
Conrad Prince havia colocado fogo na minha casa, logo após quebrar meu
coração.
— Scarlet! — Ouvi a voz do meu avô de fundo não sei quanto tempo depois,
e quando me virei no escuro do lago, lembrei a expressão de pânico em seu
rosto. Ele me abraçou e perguntou, exasperado: — Onde está sua irmã?
— Susan? — Minha ficha caiu aos poucos, então encarei a fogueira que
iluminava toda a rua e queimava cada madeira e
Imbecis. Não se pode lutar contra ele — pensei naquela hora, no auge da
minha inocência.
Idiota, você não pode lutar contra ele — minha mente me corrigiu, e a visão
de Conrad entre as chamas com seu isqueiro me atingiu.
Foi por isso que quando apaguei, sentindo a água entrando pela minha
garganta, me senti feliz pela primeira vez, em anos.
Se aquilo confortava Conrad Prince, que ele ficasse com a vitória da guerra.
Eu só queria paz.
conrad
Pensei ter encontrado um caminho, pensei ter encontrado uma saída, mas
você nunca nunca se vai, então eu acho que tenho que ficar agora.
l o v e l y, l a u r e n b a b i c
Eu queria afastá-la.
Queria matá-la, verdade fosse dita.
Feito para ela quebrar, para ela enxergar — pensei, enquanto cavava aquela
cova mais cedo.
Seus olhos queimavam em mim, sua voz era clara, mas suas palavras
trouxeram muita confusão. Ela me acusava de ser insano, e aquilo eu
realmente era. Mas onde é que havia perdido todo o resto?
Uma conversa que John Prince e seu filhinho amado fizeram de tudo para
não acontecer no passado, que minha mãe havia sido
o maior peso para isso, que minha idiotice e rebeldia tinha falhado em deixar
ver a necessidade.
Desci pelo terreno, abri caminho entre os idiotas que seguiam minha ideia de
acabar com a vida de alguém, e quando vi a cabeça ruiva na ponta do píer,
tirando os tênis, gritei:
— SCARLET, NÃO!
Precisava impedir, precisava ser rápido, mas nem todo o controle do mundo
me daria o poder de desacelerar o tempo, ou revertê-lo. Foi por isso que
quando ouvi o baque do corpo na água e a comemoração em volta, o
desespero me consumiu.
NADAR!
Não, não, não — minha mente repetia continuamente — por favor, não.
Mesmo rápido, quando a madeira do píer reclamou sob meu peso, eu sabia
que era tarde.
conrad
todas estas palavras não são da boca para fora e nada mais importa.
nothingelsematters,metallica.
Scarlet, com suas sardas, bochechas rosadas e coração leve me trouxe vida.
Mas só durou um instante.
Minha carga era demais para que a garota que tinha um caleidoscópio verde
no lugar dos olhos pudesse entender. Que pudesse abraçar.
Quando acordei daquele pesadelo, daquela última surra, sabia que era sorte
estar vivo.
— Conrad…
— Me odeie agora, cara, mas eles são adultos. Eles que se virem.
— Não. — Neguei com a cabeça. — Não é tão simples. Eu não posso deixá-
la…
Era absurdo que o todo poderoso John Prince não cuidasse da mãe do seu
filho, mas eu era só um bastardo indesejado, que
arranjou problemas demais no seu casamento e ainda comeu sua mulher.
Não. Meu pai era bem vingativo, e por mais que fingisse não ver, ele sabia.
— Tarde demais.
Eu odiava o olhar de pena vindo deles, mas não era tarde para acabar com
tudo.
— Aonde vamos?
— Minha mãe não fez nada. Philip não fez… — interrompi o policial com
mais uma mentira, mas meu pai, que se aproximou sem que eu pudesse ver,
colocou a mão na porta e tirando o homem da lei de perto de mim, me calou
a boca.
— Olhe seu estado. Sabe lá Deus se não quebrou algo, se não tem uma
hemorragia interna, se vai conseguir enxergar direito desse olho fodido. —
Ele raramente falava palavrão. Aquilo significava muito.
— Pai — ele me lembrou. — Meu título aqui é pai. E não me peça para
acreditar em mais uma mentira sua. Essa brincadeirinha de vocês acabou
aqui. Depois do hospital, você vai para casa e eu, para a delegacia.
Meu peito parecia sangrar, mas eu não podia nem mesmo me encolher para
chorar.
Travando com tudo o que podia, fazendo o maior esforço do mundo, sendo
capaz de quebrar alguns dentes no processo, apertei minha mandíbula e
deitei a cabeça contra o banco. Fechei os olhos, tentando ter um pouco de fé.
Um pouco de calma.
Nada vinha, além do velho e confortável sopro do diabo nas minhas orelhas.
Eu não avisei? Você é um erro — sua voz macia tomou meus pensamentos, e
eu concordei.
— Não adianta ficar com raiva de mim. Você é um Prince, goste disso ou
não. — Meu pai rompeu minha bolha e, naquele minuto, virou minha
cabeça.
Nenhuma das duas soube calar a boca, mas só consegui me chatear com
Scarlet.
Meio que, Bella e Thomaz sempre estiveram lá, sempre souberam de tudo.
Scarlet não. Para ela, eu apresentei meu mundo. Para ela, eu tinha aberto a
porta.
— Nossa, minha irmã disse que estava ruim, mas não imaginei que era
tanto…
Meu olho já tinha desinchado, o pior agora eram os roxos e, ainda, as dores
musculares.
— Sua irmã disse? — Foi a única coisa que consegui pegar daquela frase.
— É, Scarlet contou para todo mundo como você apanhou do seu padrasto,
de como sua mãe é uma fraca desregulada que…
Eu a enfiei para dentro em pedaços, junto com as palavras que deveriam sair
quando cruzei com meu pai, mas só consegui fazê-lo depois de um jantar
servido no quarto.
Ouvi o toque na porta e pensei ser uma das empregadas, mas quando olhos
escuros como os meus surgiram, procurando alguma resistência no meu
rosto, suspirei, afastei a bandeja e pedi:
— Como está? — Meu pai entrou, fechou a porta e puxou a cadeira que
ficava em frente à mesa de estudos.
— Melhorando.
O olhar dele me respondeu. Havia ódio lá, mas nada que me abalasse já que
era completamente e intensamente recíproco.
— Sua mãe está livre da cadeia. Achei que você merecia saber. — Jogando o
corpo para frente, ele apoiou os cotovelos nos joelhos e juntou a ponta dos
dedos enquanto me encarava como se aquela fosse uma notícia ruim.
— Para começo de conversa, ela não deveria ter sido presa e você sabe.
— Conrad, tudo o que eu sei é que ela vem te usando como escudo há anos.
— E, mesmo assim, te fez achar que eu sou o pior pai do mundo. — Minha
respiração ficou ofegante e eu neguei com a cabeça ao ouvir aquilo.
— Não. Você é quem me mostrou que é isso. Eu não deveria ser seu filho.
— Vim avisá-lo que, se você quiser, permitirei que sua mãe venha visitá-lo.
O desgraçado me desarmou.
— Como?
— E o que mais?
— Você vai chamar seus amigos, conversar com eles e desmentir todas as
histórias mirabolantes que tem contado sobre
mim.
Você vai voltar a conviver em sociedade, com nomes que importam para o
seu futuro. Vai mostrar orgulho do sobrenome que carrega.
— Eu já não disse? Ela poderá vir vê-lo. Uma vez por semana, de forma
assistida no começo…
— Como prisioneiro?
— Como convidado.
Quis rir.
Quando John passou por mim, saindo do meu quarto se sentindo o melhor
pai do mundo, o vencedor, minha vontade foi bater com a bandeja na sua
cabeça. Só não fiz porque aquilo não me ajudaria em nada, e eu não tinha
mais espaço para guardar as lágrimas que acumulei.
Por tudo o que tinha perdido, e por tudo o que nunca mais poderia ter.
Chorei pela raiva que queimava nas minhas veias, pelo pensamento impuro
de como resolver isso em um curto prazo.
Quase, por muito pouco, não coloquei as mãos em volta de sua cintura.
Não desci o rosto para o dela, beijando sua boca mentirosa, tentando
entender por que é que ela tinha falado aquelas coisas sobre mim, sobre
minha mãe… Por que é que ela não tinha guardado o meu segredo se dizia
que me amava?
Seus olhos não deixaram minha mente por nenhum segundo desde que
minha mãe tinha saído, e eu não conseguia dormir.
Queimava.
Não — rosnei para o monstro que havia crescido dentro de mim. — Não
posso.
Eu não podia negar que queria. Era real, e eu era de carne e osso, mas sabia
dos limites.
Era cedo para você também, mas ninguém ligou, por que você liga? — era
verdade, mas eu não podia acabar com ela só porque tinham acabado comigo
antes.
Porque, por mais que ela tenha me traído, eu não posso quebrá-la, não
posso machucá-la. Eu a amo — doeu admitir aquilo, mesmo na minha
mente.
Era Bella.
E mesmo que parte dela ainda teimasse em insistir em algo além da amizade,
nós nunca seríamos mais do que aquilo. Transar com Bella era divertido e
me ajudava a não acabar com mais ninguém. Eu precisava da fúria, do
alívio. Ela precisava do sexo, do carinho.
Eu me conformei.
No fundo, Scarlet não merecia, e não aguentaria tanta sujeira, tanta desgraça.
encontre
no
parque
mais
dezenove.
isso?
Porque
eu
preciso. E você
ainda é minha
amiga
com
benefícios.
Esperei cinco minutos para receber uma resposta, mas ela não veio.
Estarei lá.
conrad
venha deitar-se ao meu lado, isso não machucará, eu prometo. ela não me
ama, ela ainda me ama, mas ela nunca vai amar de novo.
theunforgivenII,metallica.
— Está melhor? — As mãos dela vieram para o meu rosto e ela se afastou o
bastante para me revistar inteiro. — Meu Deus, achei que você nunca mais
ia abrir esse olho.
— Certo. E o que quer? O que quis dizer sobre ser sua única amiga com
benefícios? Achei que você me odiasse, ainda mais depois daquela
mensagem.
— Não. — Ela cruzou os braços. — Está falando sério que não sabe do que
estou falando?
— Mas é do mesmo número que me enviou as de hoje, como não eram suas?
— Estou brincando. Não ligo de você me usar como alívio para sexo. A
verdade é que você também é o meu, mesmo que eu ainda goste de você. Sei
separar as coisas, sou prática. Aproveite isso enquanto não decido se transo
com outra pessoa quando você estiver ocupado.
Era aquilo que eu mais gostava em Bella. Ela era decidida, e eu não tinha
mais tempo para perder.
— Vamos.
Nós entramos na fila e ela me contou sobre o pai brigando com ela por causa
do carro, falou sobre como arrebentou o portão da mansão, de como bateu
em Isaac e o ameaçou. Me falou sobre como Thomaz estava chateado com a
minha ausência, mas que ele era fechado demais na bolha dele e que sua
casa também não ia bem. Quando foi nossa vez de entrar na cabine, Bella
parecia mais ansiosa do que eu. Passou pela minha frente, se sentou e bateu
no banco ao seu lado.
— Está — menti. — Me fale mais sobre o que fez enquanto não estávamos
juntos nessas férias.
Primeiro, minha melhor amiga beijou meus olhos, depois meu nariz.
Seu cheiro era quente, bom, mas eu esperava sentir algo fresco e cítrico…
— Posso.
Já conhecia a boca de Bella. Seu gosto, suas manias, o modo como ela
ronronava quando o beijo a deixava excitada.
Eu poderia culpá-la?
Nunca.
— Ah, porra… — Bella xingou quando viu o que eu via.
Essa história de que acabou, que superou e que não é para ser, é mentira.
— Bella… — avisei que aquele não era um bom terreno pela mudança do
meu tom de voz.
— Desculpe, Conrad. Mas se você vai começar a agir como ele, não precisa
mais me procurar. — Erguendo o corpo para fora, ela fez um X com os
braços.
Vinha um temporal por aí e, sabendo que tinha feito merda, não tive
alternativa, a não ser andar logo, fazendo o caminho da casa de Scarlet,
prevendo que a volta para casa seria um caos molhado, já que meu pai não
tinha me liberado o carro.
Aquela sensação no meu peito não passou. Nem o peso sobre os meus
ombros.
E por mais que ele e a irmã de Scarlet estivessem saindo, o que ele fazia na
casa delas sem o avô por perto?
Pronto para pegar meu irmão fazendo algo errado e colocá-lo contra a parede
com alguma moeda de troca na mão, eu não fui direto para a porta de
entrada. Primeiro rondei as janelas do andar de baixo, vendo que tudo estava
apagado e que a luz vinha do andar de cima, do quarto de Scarlet.
Se meu irmão estava lá, consolando-a…
Tentei engolir o monstro do ciúme e, como já tinha feito antes, escalei a casa
por fora, tomando cuidado para ser o mais silencioso possível, enquanto ia
na direção do quarto ao lado do de Scarlet, o que devia pertencer à Susan. A
janela aberta me ajudou muito e quando me sentei nela com as pernas para
dentro do cômodo, fiquei quieto, ouvindo o que vinha do quarto ao lado.
— Meu Deus, uma hora dessa minha irmã deve estar em prantos. Você tem
certeza do que aconteceu?
Sua irmã viu Conrad e Bella se beijando. Não fiquei para ver o depois, vim
direto para cá. Queria ser o primeiro a recepcioná-la. —
Ele riu.
— Não é por ela. É por ele. — A raiva na voz de Isaac me fez ficar ainda
mais atento e meus dedos coçaram, fazendo com que eu pegasse meu
isqueiro do bolso e o abrisse o mais silenciosamente possível para assistir a
chama dançando enquanto o ouvia. — Eu vi
algo que não devia, anos atrás, e Conrad é o culpado de muita merda.
— O que você viu? — Curiosa, ouvi o som dela sentando ao lado dele,
forçando as molas da cama.
— Não posso dizer, baby. Mas sua irmã odiando Conrad para o resto da vida
será uma pequena parcela do pagamento.
— Você acha que ela acreditou naquele vídeo? Eu tenho a mesma altura de
Bella, a peruca que compramos está bem escondida na minha gaveta de
calcinhas, ela nunca vai descobrir…
— Imediatamente, eu me ergui e abri a primeira gaveta da cômoda com
cuidado. Afastei as peças de roupa íntima e encontrei a tal peruca. Ergui
aquilo na mão e senti meu sangue ferver. — Espero que o que ela viu hoje,
junto do vídeo, a faça achar que eles estavam juntos.
Demorou para pegar, mas logo a chama ganhou força e eu taquei o cabelo
dentro do lixo cheio de papel bem embaixo da janela. A fogueira crepitava e
eu saí do quarto para acabar com aquela festinha.
O plano do meu irmão era sujo demais, e assim que eu saí no corredor, o
ouvi dizer:
— Espero que sim. Consegue ligar para ela? Quero ver logo sua cara ao
descobrir quem é Conrad e que eu não estava errado sobre ele.
— Como você pode dizer quem eu sou, se vai descobrir isso agora? —
Brincando com o isqueiro na mão, olhando para eles dois assustados, dei um
meio-sorriso. — O que foi, Susan? Cansou de tentar chamar minha atenção e
resolveu chupar meu irmão?
— C-conrad — ela gaguejou meu nome. — Não. Quer dizer, não é o que
você está pensando.
Ainda que ela falasse, meus olhos estavam sobre o rosto de Isaac.
Sua voz, a provocação, a raiva que senti dele, tudo foi ao limite.
Eu não estava em um bom dia.
Abri os olhos, encarando meu alvo e, sem esperar, voei para cima dele,
acertando seu corpo, jogando-o no chão.
E eu não parei.
Isaac reagiu, tentou me tirar de cima de si, e como era forte, conseguiu.
Ele me jogou contra a janela, senti minha cabeça cortando, mas aquilo só me
alimentou. Acertei um soco de direita no rosto de Isaac e o empurrei com o
pé para cima da cama. Subi em cima dele, ganhei um soco na costela, mas
não parei de acertá-lo.
Nem o grito de Susan avisando que a casa estava pegando fogo nos parou.
Quando a parede do quarto de Scarlet começou a escurecer e as chamas
avançaram para engoli-lo, eu e Isaac caímos para o corredor que também
brilhava em laranja.
Sem conseguir ver outra coisa que não fosse o rosto dele, vacilei sendo
empurrado contra a parede e ele tentou me enforcar.
Para me salvar, tentei enfiar os dedos em seus olhos. Não adiantou muito, até
que Susan se meteu.
Isaac tentou afastá-la, ela lutou contra ele e a resposta que ganhou foi um
soco forte no rosto. Sua cabeça bateu contra a parede e ela amoleceu no
chão. Consegui me soltar pela distração
dele, mas meu irmão queria acabar comigo tanto quanto eu com ele e Isaac
avançou sobre mim, me empurrando pela escada.
Quando voltou, estava com uma cadeira na mão e a quebrou contra minhas
costas que ainda não estavam cem por cento. Isaac me chutou, eu segurei seu
pé. O calor era alucinante dentro daquela casa, o ódio também. Puxei o pé do
meu irmão e o virei.
Isaac foi mais esperto do que eu, o desgraçado aproveitou que me afastei da
primeira viga que desceu sobre nós em chamas e, mancando, saiu pela porta.
Eu não tive essa sorte. Bem na hora que ele saiu, o teto da sala desabou.
— Porra, Susan — lembrei-me da garota escada acima, mas não tinha o que
fazer, eu não podia subir. — Porra!
Ainda tentei brigar com o fogo. Pela primeira vez, quis que aquela minha
fascinação fizesse com que eu fosse imune ao calor arrebatador, mas não.
Não era.
Não tinha como salvá-la sem morrer junto, mesmo que parte de mim
estivesse morrendo lá com ela. Tive certeza disso quando pulei pela janela e
vi Scarlet.
Fogo e fumaça.
E não havia nada que eu pudesse fazer a não ser odiá-la de volta.
Então eu corri.
conrad
— Mas não está respirando. — Dava para sentir meu desespero em cada
palavra.
Não consegui prestar atenção nele, nem no meu irmão chamando por ela.
— Vamos, Red. Vamos. Reaja — pedi depois de inflar o ar por sua boca.
— VOCÊ A MATOU! — Ouvi Isaac chegar, mas não olhei para ele.
Tentei forçar o ar em seus pulmões mais uma vez, mas fui afastando.
Tudo parecia muito rápido ao meu redor, mas o meu tempo mental corria
devagar.
Eu iria junto dela para o hospital, não tinha nem mesmo o que ser
conversado.
Não pensei duas vezes e o soquei no rosto. O impacto o fez cambalear e meu
pai se meteu entre nós.
MUNDO VIU!
comecei em um tom de voz baixo e fui aumentando, até que estava perto
dele, com o punho erguido novamente.
Naquele segundo, era demais para mim. Ignorei meu pai, empurrando-o, e
caí matando em cima do garoto loiro que já tinha sangue na boca. Aquele
desgraçado havia fodido a única coisa boa que eu tinha. Se o meu ódio por
Scarlet havia sido alimentado por todos aqueles anos, se ela era o meu alvo
constante, a culpa era dele.
Dele.
E minha.
— Eu não tenho tempo para isso agora. Conrad, você tem explicações a dar.
Eu tinha?
É, eu tinha.
Isso e ver Scarlet sendo colocada dentro da ambulância que, por um milagre,
tinha conseguido descer até o lago.
— Ela vai ficar bem, não vai? — Foi a pergunta mais inocente que fiz na
vida quando meus olhos cruzaram com os do meu pai.
— É bom que ela fique, porque temos testemunhas demais desta vez para a
sua ficha continuar limpa. — Como sempre, cruel, John Prince não me
poupou.
Eu estava fodido, e não porque tinha medo de ser preso.
Os olhos dela nos meus, sua boca, seu corpo, sua risada que há tanto eu não
ouvia, seu cheiro, suas mãos, tudo dela que bloqueei por anos, tudo o que
evitei lembrar, ver ou sentir, veio como uma avalanche nos minutos mais
tortuosos da minha vida.
Eu precisava estar lá para, pela primeira vez na minha vida, dizer que sentia
muito.
Daquela vez, eu não correria como uma criança assustada, e quando acelerei
tanto a ponto de encontrar com a ambulância, eu a segui até o hospital sem
pensar duas vezes.
Quando nós viramos na entrada da emergência, parei meu carro de qualquer
jeito, abri a porta, deixando a chave no contato, e desci.
— Rapaz, para trás — ele avisou, mas eu não queria obedecer. Queria ver o
rosto de Scarlet.
— Ela está bem? Está viva? — insisti, tentando ver algo além de Scarlet
imobilizada, quieta, com um monte de coisa sobre a boca. — O que é
aquilo?
— Garoto, você não pode parar o carro ali. Deixe os socorristas fazerem seu
trabalho. — Ganhei um empurrão como
aviso.
— Mas…
Agora vá se ajeitar, tirar essa roupa molhada… Te ligo se for para voltar
aqui. — Os olhos escuros nos meus eram sérios, cansados, punitivos.
copos do carro e desci. Não pedi permissão, não avisei que estava indo, e
quando terminei de subir as escadas, quis muito acreditar que estava
alucinando.
Quê?
— Filho, eu…
Era a primeira vez que eu sentia algo ruim por minha mãe e não sabia se
aguentaria mais aquela decepção, ainda mais naquele
dia de merda.
— Você — mudei meu foco para Philip —, o que faz aqui?
Minha vontade de chorar, como não fazia há anos, cresceu no meu peito.
Eu ia explodir.
— Mãe… — Minha voz saiu baixa, eu mal conseguia olhar no rosto dela. —
Que porra é essa?
Fechei os olhos e dei dois passos para trás, saindo do pequeno apartamento,
batendo com as costas contra a parede, já trazendo as mãos para a testa.
— Não pode ser, não pode ser — falei baixo, querendo que uma mágica
acontecesse, que aquilo fosse efeito de muita droga,
que qualquer merda pudesse justificar aquele circo, mas quando ela falou de
novo, eu sabia que era real.
— Você é uma puta. — Minha crueldade a atingiu. Ela cobriu a boca com as
mãos. — E eu odeio você — completei, sabendo que a machucava ainda
mais.
Entrei no carro, pronto para ir para lugar nenhum, só sabendo que não podia
continuar ali.
Segurei aquele peso no peito e na garganta até que meu carro fez o caminho
que eu andava evitando. Nem pensei direito quando abri o porta-luvas,
pegando a chave que parecia queimar contra meus dedos e desci com o
corpo molhado contra o vento frio.
A pista de corrida que meu pai havia mexido estava vazia, escura, mas eu
acertei o caminho até a porta do galpão.
Ela não havia apagado o de trás, mas tinha construído sobre ele.
Como característico da arte dela, sempre havia um texto, uma palavra junto,
e daquela vez, raspado com a espátula por cima do que deveria ser nós,
pequenos infinitos de “eu te amo” estavam espalhados. Se não bastasse
aquele soco que fez a primeira lágrima rolar no meu rosto, a data era ainda
pior. Aquilo tinha quatro anos.
Eu já tinha ido embora há um bom tempo, mesmo assim, ela ainda estava lá
por mim.
As memórias me fuzilaram.
As vezes em que fui mais adulto do que todos em volta de mim eram
infinitas, mas foi Scarlet quem pagou quando minha arrogância prevaleceu.
Eu a deixei para trás por mil e um motivos que o meu eu, de dezesseis,
achava válidos.
E talvez, agora, fosse tarde demais para recuperar o que eu tinha arruinado.
scarlet
eu quero você e sempre vou querer. eu gostaria que eu valesse a pena, mas
eu sei o que você merece. você sabe que eu prefiro me afogar do que
continuar sem você, mas você está me puxando para baixo.
oceans,seafret.
Eu estava em choque.
"Conrad te traiu. Conrad colocou fogo na sua casa. Conrad matou sua irmã".
Mas não conseguia reagir. Não conseguia falar, nem andar, nem chorar.
"Susan está morta." Ouvi minha mente dizer, mas não conseguia processar.
Foi naquele momento, em que eu me dei conta de que não sabia onde ia
passar a noite, que a mão de John Prince pesou no meu ombro.
John Prince me guiou para o outro lado da rua, minhas pernas só seguiram,
tanto que eu mal notei quando entramos em seu carro.
— Você contou isso para mais alguém? — O tom terno e preocupado na voz
do homem ao meu lado não me comprava, mas ele também não me
assustava.
— Minha pergunta é clara. Você vai contar? Porque, se o fizer, Conrad não
tem escapatória. Se souberem o que ele fez, de colocar
fogo em sua casa e causar essa fatalidade com sua irmã, ele será preso.
— Scarlet, escute. Sei que está magoada, mas preciso da sua ajuda agora.
Pense no seu futuro, no do seu avô. Sei que Charlie não tinha um seguro, que
mal recebe do governo. Sei que você é uma aluna exemplar, uma garota
bem-educada…
— O que quer, John? — Virei o rosto com os olhos desconfiados, analisando
o rosto do patriarca Prince e o vi dar um meio-sorriso. Seus olhos brilhavam
na fraca iluminação, e por onde ele levava a conversa, sabia que viria algo
pesado.
— Não quero que isso vaze. Não posso deixar meu filho ir preso, e vim
perguntar se você está disposta a aceitar esquecer que viu Conrad aqui hoje
por uma ajuda. — Ele ajeitou o paletó e voltou com a mão para perto do meu
cabelo, pegando uma mecha entre os dedos, me causando estranheza. —
Estou aqui oferecendo ser seu
tutor. Seu avô e você terão um teto, e quando chegar a hora, Charlie terá à
sua disposição enfermeiras, ou uma casa de repouso da melhor qualidade, o
que ele e você acharem melhor. Para você, eu serei como um pai. Ou melhor
do que isso, já que talvez tenha falhado na missão com pelo menos um dos
meus filhos.
— Quero o bem do meu filho, assim como você também quis um dia, estou
errado? Se firmarmos este acordo aqui, se você disser que aceita, Conrad
estará fora da cidade na primeira luz do dia e você e seu avô estarão seguros.
— Eu… — Os olhos de Conrad, suas mãos, seu último beijo, tudo passou
pela minha mente naquele minuto e eu me curvei, escondendo o rosto entre
as mãos, querendo ser capaz de não sentir o impacto do que falaria em
seguida. — Eu aceito. Só... só me deixe falar com ele antes dele ir.
Eu não agradeci.
Quando desci daquele carro, sabia que não fazia aquele acordo por mim, ou
por meu avô.
Eu fazia por Conrad, para livrar sua cara. Para tentar amenizar as coisas e
dar a chance de ele explicar o que tinha acontecido, já que, nem com ele
acabando com tudo, meu coração conseguia amá-lo menos. Nem com ele
colocando fogo em tudo, não conseguia transformar meu amor por ele em
cinzas.
Tentei puxar o ar. Doeu. A garganta incomodou muito. Minha boca secou.
Sentia-me pesada, grogue. Pior do que qualquer vez em que usei drogas ou
bebi demais.
Eu não sabia se já tinha passado uma hora ou quatro desde o momento que
tentaram me acordar, se aquilo era verdade ou um sonho. O que sabia era
que estava cansada de ficar deitada, e incomodada com aquela dor na
garganta. Quis me forçar a acordar e, aos poucos, minha mente ficou mais
consistente.
Minha última memória era da cova.
Eu só queria me sentir bem de novo, algum dia, mesmo que agora achasse
impossível aquilo acontecer.
— Está tudo bem, está tudo bem — disse a mulher de branco que eu nem
mesmo vi a face e me acariciou os braços. Mas ela não sabia de nada.
Não estava nada bem, nunca estaria de novo, e a culpa era toda minha.
Levou muito tempo até que eu me acalmasse. Avisei que não queria dormir
de novo, mas ninguém se importou em me ouvir.
Acordei de novo mais tarde. Sabia que era noite porque só tinha uma luz
mais fraca acesa no meu quarto e não tinha claridade nenhuma vinda das
persianas. Minha boca estava seca, minha língua parecia uma lixa, e respirar
continuava sendo esquisito, dolorido.
A dor na minha garganta não era muito melhor, mas daquela vez, minha
mente confusa não me permitiu pensar muito em nada do presente,
principalmente, quando meus olhos focaram nos girassóis ao lado da minha
cama, espalhados pelo chão do quarto, em cima do sofá.
— Você acordou — ele constatou quando viu meus olhos abertos. — Como
se sente?
— Me desculpe… — soprei.
— Não precisa se desculpar, só não… Só não tente outra vez, ok? Faço o
que precisar, mas quero minha filha bem.
— Não discuta. — Bebericando seu café, ele tirou a mão de mim e eu quis
sorrir.
Era sério?
Para ser mais exata, até aquela última humilhação, aquilo funcionaria.
Mas agora, sobre a cama hospitalar, nem que ele transformasse meu quarto
em um campo de girassóis, eu conseguiria perdoá-lo.
Eu precisava me libertar.
Eu não podia negar, era uma merda estar entre os Prince, mas era muito bom
quando me sentia pertencente.
Por longos dez dias, eu fiquei internada.
preocupante está ok, o edema pulmonar está sob controle, mas a água suja
daquele lago…
— O tratamento fez efeito? Quanto tempo mais ela precisa ficar aqui? —
John perguntou.
— Bom, pelos últimos exames, ela já pode ir para casa, mas é bom não
abusar. Nada de cigarros, certo? — A olhada acusadora dele na minha
direção me fez encolher os ombros. — Se não cuidar desses pulmões, você
realmente pode complicar as coisas, menina.
— Poder, pode. Mas quero você aqui para refazer os exames na semana que
vem. Também vou passar uma medicação para casa, e quero você seguindo
tudo à risca e descansando.
— E eu mesmo a trarei.
— Ótimo, até porque vou indicar que ela faça fisioterapia pulmonar se não
ver melhora nos próximos exames — o médico disse rabiscando algo no
bloco de papel em sua mão. — Vou deixar as medicações prescritas e cuidar
das coisas para a alta.
Deitei a cabeça contra o travesseiro, relaxando os ombros, sentindo o peso
indo embora.
E mesmo que ficar sem fumar estivesse me matando, até aproveitaria aquela
oportunidade para tentar parar de vez.
— Vou sair para você se arrumar. Suas roupas estão ali. — Ele indicou a
bolsa em cima do sofá. — Se agasalhe porque está frio. —
Livre de tudo sobre minha pele, do acesso em minha mão, finalmente pude
sair da cama. Me levantar rápido fez o mundo girar, apesar disso, me segurei
firme no lugar e percebi que o cansaço, até ficar boa de novo, seria meu novo
companheiro por algum tempo.
Meu primeiro passo foi abrir a lixeira e enfiar todas as flores lá dentro.
Os olhos de Conrad estavam fundos. A pele, que antes era clara, estava
escura sob os olhos. Quanto tempo será que ele tinha ficado ali?
Sua voz era séria, baixa, inquisidora, e seus olhos queimavam na minha
nuca.
— Scarlet… — Odiava ouvir meu nome em sua boca, ainda mais depois de
tudo.
— O que você pensou? — Minha voz era fria e mesmo quando seus olhos
estavam nos meus, demonstrando pela primeira vez a guarda baixa, eu não o
poupei. — Que depois de jogar um balde de água e merda em mim, me fazer
atravessar a faculdade pelada duas vezes, destruir meu quarto, me aterrorizar
psicológica e fisicamente, me humilhar em público tantas vezes, que até
perdi a conta, e tentar me enterrar viva, eu ia te perdoar por causa de
merda de uma lembrança sobre como você achava que girassóis
combinavam comigo? — Ri, nervosa, sendo cruel como nunca em toda
minha vida. — Eu não tenho mais quatorze anos, Conrad.
— Eu… — perdido, Conrad balbuciou, mas não deixei que ele continuasse.
— Você se parece com um anjo, mas é um demônio. Acreditei uma vez que
você era um deus do Olimpo, mas se isso for verdade,
você seria como Hades — a raiva me fez soltar, entredentes, enquanto uma
única lágrima caía pelo meu rosto. Eu a limpei. — E
eu não vou ser a porra da sua Perséfone. Você queria me odiar, não queria?
Então estou te dando uma oportunidade concreta. Vá, faça de mim a pior de
todas. Me odeie pelo resto da vida, mas me odeie no seu canto, longe de
mim.
conrad
Quando forcei a janela do meu antigo quarto e pulei para dentro, não
imaginei que seria ali o lugar onde buscaria por abrigo, por proteção.
Meu braço ainda latejava pela queimadura e uma bolha ganhava forma nele.
O peso dela é diferente, idiota. Dessa vez, é o lembrete de que você errou.
De que você é feito da mesma matéria dos que tanto odeia — o diabo soprou
nos meus ouvidos, e com as mãos contra a porcelana branca, vendo a água
ficar escura conforme eu limpava a fuligem do corpo, não consegui
desmentir. Não consegui me defender daquelas acusações.
Foi tudo acidental. Não foi você quem matou a garota… — disse para mim
mesmo, como se fosse meu melhor amigo, e tentei me obedecer.
O ar entrou pelos meus pulmões, fechei os olhos e aos poucos os nós no meu
estômago foram se soltando.
— Conrad, eu sei que está aí. Abra. — Ele não parecia nada amigável.
Qual era a chance de eu fingir não estar?
— Conrad, se você não quer se meter em mais problemas, abra essa merda.
— Raramente John Prince falava palavrão, e impelido pela ideia de que,
daquela vez, ele poderia ser um pai decente, eu abri.
Seus olhos escuros como os meus foram mais cruéis do que nunca.
Tudo impresso em seus olhos, em sua voz, em como passou por mim
medindo a casa. — Sente-se. — Não tive tempo de me recompor para
rebater. Quando ele puxou uma das cadeiras, eu já estava sentado na outra à
sua frente.
Era esquisito vê-lo ali. Ele não combinava de jeito nenhum com o cenário.
John Prince nunca devia ter colocado os pés em algum lugar onde o piso não
fosse mais caro do que toda aquela construção.
— Estou perguntando sua versão dos fatos. Aproveite enquanto ainda tem a
chance de me contar.
— Fiz uma merda, achei que pudesse resolver as coisas com Scarlet, com
Bella. Mas parece que seu outro filho estava determinado a fazer as coisas
mais difíceis. Ele e a irmã de Scarlet estavam saindo e trabalhando juntos em
uma história insana querendo me foder. Eu acabei saindo com Bella, Susan e
Isaac deram um jeito de Scarlet ver e quando fui até a casa dela para encerrar
as coisas como deveria ter feito, vi o carro de Isaac lá. —
Ri, sem graça, pensando que deveria ter esperado Scarlet do lado de fora da
casa. Idiota. — Tinha algo estranho e eu escalei a casa…
— Conrad, pelo amor de Deus, essa garota tem quatorze anos! — Meu pai
levou aquilo para um lado que eu não gostaria de entrar.
— Entrei pela janela de um dos quartos, ouvi toda a conversa de Isaac com
Susan, e acabei colocando fogo em algo… Foi no impulso, sem querer. —
Afastei a cadeira, me curvei um pouco, apoiando os cotovelos nos joelhos e
massageei minhas têmporas.
— Juro que coloquei fogo só na lixeira, mas deve ter pegado em algo que
não vi. — A raiva dominou minha voz. — Pelas coisas que ouvi, estava
nervoso e não pensei direito antes de ir até os dois.
Acabei brigando com Isaac. O fogo se alastrou enquanto isso, a garota tentou
nos separar na hora que Isaac tentava me enforcar e ele a socou também. Sua
cabeça bateu tão forte contra a parede
que ela desmaiou na hora. Depois disso, nós rolamos escada abaixo, foi uma
loucura do caralho… — Eu não queria mais falar.
— E?
— E seu filho tentou me matar — ergui os olhos para encarar meu pai —,
ele me culpa por coisas que aquela sua mulher imunda fez. Ele sabe, pai.
— Continue.
— Eu sei.
embora.
— Como? Eu não tive culpa, foi tudo um acidente! Eu não matei ninguém!
— Me ergui, me afastando da mesa, me sentindo encurralado.
— Como vou explicar isso? A garota te viu lá, ela só sabe que você, que
adora brincar com fogo, estava na casa dela em chamas, e que a irmã dela
morreu lá dentro. No momento, ainda está em choque, mas o que você acha
que vai acontecer quando passar? O
que acha que vai acontecer com nosso nome, com nossa honra, quando você
for acusado por todos os crimes que ela era a única testemunha?
— Mas eu…
— Alguém viu Isaac saindo de lá? — meu pai me interrompeu.
— Não sei…
— Então você não tem como provar ser inocente. Isaac vai dizer que estava
em outro canto da cidade, que quebrou o pé, que nunca poderia fazer nada
do tipo. A garota morta não vai poder te defender agora. Scarlet está
processando, e quando a raiva chegar…
— Ela não faria, você não a conhece. Me deixe falar com ela.
— Oi?
Nem que ele tivesse arrancado meu coração do peito, poderia doer mais.
— Mas…
— Não tem mas, nem mais. Temos uma adolescente confusa, órfã, que
acabou de perder a irmã em um incêndio causado pelo namoradinho que
quebrou seu coração mais cedo. O que é que você acha que vai sair disso?
— É só mais alguém que tem interesses em jogo, sorte sua que pude brincar
com eles — John Prince, o carrasco, anunciou quando se levantou.
Ele não viu a última lágrima, a mais dolorosa, escorrer pelo meu nariz e
pingar sobre a pia.
— Você fica aqui. Tome um banho, faça suas malas. Amanhã sua vida nova
começa.
— Não?
— Conrad, eu…
— Isso não tem negociação. Ou você cuida dela, ou todo mundo vai saber de
tudo, inclusive, do que eu passei por todos os anos aqui e na sua casa. — A
ameaça era genuína.
Vestindo a máscara que usou por todos aqueles anos quando ficava
desconfortável, ele ajeitou a gravata e o terno antes de me responder:
— Farei o possível.
Se ela aceitou sua proposta antes de falar comigo, ela sabe que não há
chance de eu ouvi-la.
— Boa noite, Conrad. — Com as mãos no bolso, sem paciência para mais
problemas, ele foi embora.
Preferia mil vezes nunca ter sentido absolutamente nada das coisas boas, se
fosse para perder tudo daquele jeito.
scarlet
se você me disser que está indo embora, eu facilitarei. vai ficar tudo bem. se
não podemos parar o sangramento não temos que repará-lo, não temos que
ficar.
Tinha fumaça saindo do que sobrou da casa, mas não havia nada em pé.
Ele ergueu a mão e, com muito custo, me obriguei a caminhar até ele. Foi
nesse minuto que me senti pisando em algo escorregadio e quando olhei para
baixo, vi a prova do crime.
Franzi os olhos graças ao sol que castigava meu rosto com sua luz.
— Uma torção grave, vou precisar ficar imobilizado, mas como meu carro é
automático, não estou tão ferrado assim. — Ele abriu a porta do carro, com
dificuldade pousou a bota preta no chão e se ergueu. Isaac não me deu tempo
de dar um passo para trás.
Quando sua mão firme me puxou para si pelo braço, fui encaixada em seu
peito e fiquei imóvel ali. — Eu sinto muito por sua irmã, Scar…
— Susan deve estar gritando com Deus neste minuto, dizendo que Ele levou
a irmã errada. — Ri sem graça e senti as lágrimas escapando
silenciosamente pelos cantinhos dos olhos. — Mas tudo
bem, talvez ela tenha razão desta vez. — O embargo da minha voz fez Isaac
me apertar contra si.
— E, você sabe do seu irmão? — Desviei os olhos para os meus sapatos. Era
o único par que eu tinha agora. — Sabe de Conrad? — A vergonha de
perguntar me atingiu. Minhas bochechas ferveram.
— Ele foi atrás do meu pai ontem. Disse coisas absurdas de você, coisas…
— Ele parecia com vergonha de repetir.
— Eu acho que seria melhor ele te dizer, mas meu irmão assumiu que foi ele
quem matou sua irmã, que colocou fogo na casa… E foi por isso que meu
pai veio aqui, foi por isso que veio fazer o acordo com você. Neste
momento, acho que Conrad já está de malas prontas para ir embora e se
livrar das consequências de ter, você sabe, arruinado tudo.
— Está tudo bem, garota. Está tudo bem. Nós vamos cuidar de você. Vamos
te deixar inteira de novo, ok?
— Como você tem tanta certeza de que ele vai estar lá? —
perguntei mais uma vez, incerta de como tudo seguiria se aquele plano desse
certo.
— Você não me viu ligando para o meu pai? Ele disse que Conrad está se
despedindo da mãe. É sua chance. — Isaac estava acelerando mais do que
devia pela via, mas não reclamei.
O posto de gasolina onde a mãe dele trabalhava estava vazio, a não ser por
um carro preto parado ao lado da porta da conveniência, e chegamos perto o
bastante para ver Caroline abraçando o filho.
Isaac não foi discreto quando estacionou, e pude ver o olhar de Conrad
atento a nós quando se afastou da mãe. Aquele olhar…
Tentei soltar meu cinto, mas paralisei vendo o alerta ali. Era um claro “não
se aproxime” no rosto machucado de mandíbula travada, lábios comprimidos
e sobrancelhas franzidas.
Conrad saiu de perto da sua mãe, e só depois disso minhas pernas pareceram
querer responder ao comando de se mover.
— Conrad, por favor — implorei, dessa vez tentando abrir a porta trancada.
E quando dei por mim, estava correndo o mais rápido que aguentava. O
máximo que minhas pernas podiam, tudo para vê-lo continuar como se eu
não valesse nada, como se não se importasse.
Aquilo doeu. Doeu mais do que quando meus pés falharam, do que quando
caí no chão e o vi desaparecer pela estrada.
Só sabia chorar.
Eu o esperaria.
conrad
Então eu afogo isso como sempre faço dançando pela nossa casa com o seu
fantasma, e eu o persigo, com um tiro de verdade.
ghostofyou,5secondsofsummer
— Não! — gritando, Bella veio para cima de mim. — Vai, levanta. Você tá
podre, precisa de um banho, de um copo de café e de uns tapas na cara. Se
não levantar em dois segundos, a ordem vai ser invertida. Anda, Conrad!
Empurrei a garota magricela de cima de mim com uma mão só, mas ela
aproveitou a deixa e me mordeu. Seus dentes cravaram com força no meu
braço.
— Você não sabe do que está falando. — Minha voz mais grossa a fez
erguer as sobrancelhas.
seu irmão, depois deixou seu irmão e seu pai manipularem todo mundo junto
da cabeça vermelha. Aí você teve que ir embora e quando voltou, começou a
se vingar, a garota não aguentou, tentou se matar e aí, como em um passe de
mágica, você, o cara que nunca dá para trás, se enfia neste quarto e parece
que morreu e esqueceram de enterrar. O que está faltando aqui?
— Cuidando da vida dele, mas eu não tinha nada mais importante, então vim
cuidar da sua. — Ela deu de ombros. — Vai, anda logo, chuveiro. —
Apontando para a porta onde eu deveria ir, minha melhor amiga me fez
sentir com três anos de idade.
Mas ela não estava errada. Eu não conseguia mais me encaixar, não
conseguia entender.
Era demais pedir para voltar lá e acabar com tudo, antes que um fosse capaz
de magoar o outro da forma como aconteceu?
— Sua versão adulta está de parabéns. — Ela foi a única capaz de arrancar
um sorriso meu. — Deixe de besteira, venha, sente aqui.
Aliás, você tem certeza de que ela era virgem? — Os olhos castanhos
estavam vidrados no meu rosto, mas eu não conseguia encará-la.
— Scarlet não fez o que achei que tinha feito. — Dizer aquilo em voz alta
me fodeu. Suspirei pesado, meu peito tremeu. — Na verdade, estou certo de
que tudo o que joguei em cima dela por todos esses anos, nunca foi
realmente sua culpa.
Você precisou deixar sua mãe, precisou mudar de país, tudo por causa dela…
— Bella não entendia, e foi nessa hora que eu a encarei.
Scarlet nunca abriu a boca para falar sobre mim, ou sobre minha mãe.
Scarlet nunca contou a ninguém sobre ter me visto saindo da casa, e mais do
que isso, ela não tentou subir na vida. Isaac a amarrou. — Como eu podia ser
tão burro? — Naquela noite, eu realmente tirei a virgindade dela. Isaac
estava puto do lado de fora do quarto antes de ir até você. E ele disse tanta
merda… — Minha boca amargou. — Não sei se fui mais idiota de acreditar
nele ou de descontar tudo nela. — Escondi o rosto nas mãos e inflei as
bochechas na hora de soprar o ar. — Meu cérebro parece que vai explodir.
— Ok, vamos jogar com a possibilidade de Scarlet ser — ela fez aspas com
as mãos — “inocente”. Você fez tudo isso pela sua
mãe, Conrad.
— Mãe que, na noite em que Scarlet se afogou, descobri que ainda sai com o
cara que nos espancou minha vida toda.
— Puta que pariu… — Minha amiga me abraçou e ficou quieta por alguns
minutos, pensando junto comigo. — É, você se fodeu.
Quis rir.
— Ok, não sei dizer o que faria agora. Provavelmente, eu teria batido na sua
mãe.
— Como?
mais que sua parte, né? Porque, de onde eu vim e do que entendo, os pais é
quem devem cuidar dos filhos, não o contrário. Você não pode mais ser o
super-herói da sua mãe, nem de mais ninguém.
Você é maior, vacinado, o que sua mãe tinha de obrigação com você já foi, já
era. Vocês fizeram o melhor com o que tinham e, cara, olha só pra quem
você se tornou, mesmo no meio da merda?
— Não. Quem não entende é você. Todo mundo na vida vai arcar com as
consequências das escolhas, Conrad. Deixa sua mãe viver as delas e cuide
das suas. Inclusive, chega disso de brincar de Breaking Bad, né? Você já fez
dinheiro o bastante para se manter pelos próximos anos. Que tal se formar, ir
atrás de um laboratório que invista em pesquisa decente, que te dê respaldo
para ser o novo garoto de ouro do mercado farmacêutico? Porque, apesar de
você hoje controlar seu pai e sua mãe pelo poder que isso te traz, a longo
prazo, você vai desperdiçar tudo se for preso.
Fiquei mais ainda quando deixei de ser apaixonada por você. — Era
brincadeira, mas tinha um fundo de verdade.
— Sério, você sabe que tem tudo o que precisar de mim, sempre.
— Que seria?
Não conseguia suportar a ideia de olhar para ela, não depois de tanto…
Aquilo sim era traição. Aquilo sim era agressão. Ela deveria saber das
consequências.
Já Scarlet…
encará-la sem estar pautado sobre a pilha de mentiras na qual me apoiei nos
últimos anos para justificar querer destrui-la.
A verdade era que, talvez ela tivesse sido o meu alvo principal porque ela
sempre havia sido. A polaridade havia mudado, já a pessoa, a intensidade?
Não.
Sempre seria ela e isso me fez tirar o resto de novembro para cuidar das
coisas como precisava, antes de pensar no próximo passo, antes de resolver
colocar parte de coisas inegociáveis minhas no chão.
Foi na tarde mais fria do ano até ali, depois da primeira neve do ano aparecer
antes do esperado, que saí com quatro malas de viagem cheias do meu
quarto com a ajuda de Thomaz e me dirigi até a reitoria.
— Fechado.
— Olá, Conrad. No que posso ajudá-lo? — Ela tinha um tom mais duro
sobre mim.
— Com quem?
Fui direto para a porta e meti a mão na maçaneta, pegando John e Caroline,
próximos demais um do outro. Ela, sentada na poltrona em frente à lareira.
Ele, em pé, apoiado ao lado do fogo.
— Que porra mais eu não sei? — vociferei, fazendo minha mãe pular da
poltrona e meu pai dar um passo para trás.
— Foda-se. Você sabia que ela ainda trepa com o cara que me espancou a
infância toda? Que me fez roubar da sua casa para pagar contas? — O olhar
do meu pai saiu do meu rosto e foi para o de Caroline, inquisidor.
— Caroline?
— Não é isso…
— Conrad, não fale assim! — Magoada, minha mãe com os olhos cheios
d’água, tentou me repreender, mas eu só tinha ódio para dar de volta.
— E quer que eu fale como, mãe? Quer que eu te dê parabéns? Quer que eu
diga que a casa que comprei, depois de anos de abuso do meu pai sem te dar
um tostão, uma ajuda, um nada, é um presente para seus anos de ouro com
Philip? Quer que eu perdoe as vezes em que com um tempo pior do que este
—
apontei pela janela — ele me colocou nu para fora de casa antes das seis da
manhã quando chegava bêbado e me pegava dormindo na sua cama com
você? Eu tinha o que, uns seis, sete anos? — Ela
tremia, olhando para o meu pai com medo e eu estranhei, mas não me
contive. — Quer que eu finja que nunca me coloquei entre vocês, enquanto
ele se descontrolava, enquanto tentava te matar?
Que apanhei, que passei fome algumas vezes, que fiz de tudo para você
porque acreditava que, se não tivéssemos aquele teto, estaríamos na rua e eu
teria que viver com meu pai sem coração e a mulher amiga do diabo que ele
tinha e nunca mais veria você?
Quando me calei, minha mãe chorava e, no meu rosto, uma única lágrima
escorreu.
Eu não a limpei. No fundo, queria que ela soubesse que havia quebrado a
única coisa sagrada que tinha.
— Caroline? — O tom do meu pai era frio, lento. — O que Conrad acabou
de dizer, é verdade?
— John…
Éramos meu pai e eu contra ela naquele minuto, coisa que nunca pensei ter
possibilidade de acontecer.
— Conrad, sua mãe nunca te contou que eu a ajudava com três mil euros,
mais as suas despesas? — Os olhos de John estavam sobre ela tão julgadores
quanto os meus.
— O quê? — Aquilo era uma novidade e tanto, já que ouvi a vida toda que
meu pai não ajudava, que a massacrava e tudo mais.
— O combinado era que eu daria isso para o resto da vida dela, cuidaria dos
seus gastos e ela não me pediria mais nada. Era por isso que todas as vezes
em que você dizia algo, eu falava que você podia ir morar comigo, se
preferisse. — Meu pai olhou para mim, entendendo boa parte das coisas que
começavam a fazer sentido para mim também.
Meus olhos foram dele para ela uma porção de vezes, e quando eu
finalmente processei tudo, vi a imagem de super-heroína da minha mãe se
partir bem na minha frente.
— Mãe. — Minha voz saiu mais baixa e ela continuou tapando o rosto
enquanto chorava. — Caroline — falei mais alto, em um tom
— Esqueça a casa. Esqueça tudo. A partir de hoje, eu não sou mais seu filho.
Fiz o que fiz, por você e por mim. Achei que fosse seu herói, achei que fosse
importante, e agora vejo que não. Que não passei de um idiota, mais uma
vez. — Aquilo me quebrou. —
O silêncio que se seguiu foi pesado. Meu corpo todo parecia rejeitar a ideia
de falhar.
Como tudo podia virar daquele jeito em dois meses? Quando pisei naquele
lugar, tive certeza de que destruiria tudo e todos, que acabaria com cada um
dos que me feriram, e agora eu repudiava a única pessoa pela qual era capaz
de me sacrificar. Agora eu tinha certeza de que havia falhado com a única
pessoa que tinha me
— Você não conhece alguém que queira brincar de roleta-russa agora, não é
mesmo? — Meu tom de brincadeira não a enganou.
— Acho que você precisa de uma boa cerveja e dos seus amigos. — O
conselho dela foi feito em tom maternal e eu dei um sorriso sem dentes, com
os lábios comprimidos e fiz que sim com a cabeça.
— Até depois.
scarlet
gritando para o céu, gritando para o mundo, querido, por que você foi
embora? eu ainda sou sua garota. me mantendo firme, com a cabeça nas
nuvens. só o céu sabe onde você está agora. como eu amo de novo? como
confio novamente? eu fico acordada a noite toda, digo a mim mesma que
estou bem. querido, você é mais difícil de ver do que a maioria. eu coloco
música para tocar, espero até eu ouvir a nossa música. toda noite eu danço
com seu fantasma.
dancingwithyourghost,sashasloan.
Largar o cigarro quando decidi ficar em casa foi uma péssima ideia.
Mas dia após dia, conforme tudo se tornava real, eu me permitia fugir de
tudo e deixar as memórias boas dançando pelo quarto, bebendo delas ao
máximo para suportar o dia seguinte, e o dia seguinte, até que não sobrou
nada para se aproveitar.
Isaac foi meu parceiro nisso, e quando todas as cartas voltavam com o
carimbo de devolução ao remetente, foi ele quem aturou meus choros todos.
Não tive coragem de jogá-las fora, e naquela manhã, quando abri meu closet
e meus dedos tocaram as caixas do fundo do armário, me senti um pouco
mais corajosa de encarar meus sentimentos encapsulados.
Eram duas caixas grandes, lotadas até a boca de coisas que me lembravam
Conrad.
A primeira tinha todas as cartas que escrevi, as letras de música que copiei,
os devaneios, os sonhos quebrados, a decepção pela ausência de resposta,
por ele nem mesmo querer ler o que eu tinha para falar, mas em nenhuma
delas houve cobrança.
Em nenhuma delas, o meu amor por ele foi menor.
Naquela época, eu ainda acreditava que o tempo podia curar tudo, mas como
eu estava enganada. O que Conrad sentia por mim,
com o passar dos anos, se transformou no mais puro ódio, desprezo e, por
Deus, eu não queria mais pensar sobre aquilo.
Ainda assim, quando abri a segunda caixa, vi a blusa de frio dele que tinha
sido largada na casa do pai e foi meu travesseiro por quase dois anos, até
uma empregada desavisada lavar e tirar o cheiro de Conrad dela. Folhas do
quintal, uma para cada estação do ano em que ele ficou longe. Minha
primeira caixa de cigarros, porque sim, eu sabia que tinha começado aquela
merda de vício por causa dele. Alguns desenhos que fiz em guardanapos dos
lugares onde ele costumava me levar. Um potinho com areia da praia onde
fomos juntos e, escondidos, como meu maior tesouro proibido, o isqueiro
antigo dele. O que fez com que eu me apaixonasse por suas mãos, o que
queimou minha casa.
Era muito claro o que eu precisava fazer, e quando vesti minhas botas, passei
os dedos no telefone e liguei para John.
— É claro que pode. Só tente não voltar tarde, ok? E me ligue se precisar de
algo.
— Certo.
Como antes, quando eu ia até ali escondida para deitar no banco e chorar até
adormecer, passei os dedos nas chaves, abri a porta do motorista e, depois de
um suspiro saudoso, entrei. O carro ainda tinha o cheiro dele, mesmo depois
de tanto tempo, e todas as lembranças presas nas costuras dos bancos.
Coloquei as caixas no lugar do passageiro, girei a chave e, ao ouvir o motor
rugir, senti meu coração acelerar, revivendo as vespas que viviam no meu
estômago agora.
Parei com a picape o mais próximo da calçada e quando desci, abri a porta
do carona, peguei tudo o que precisava. Caminhei lentamente, sozinha pela
pequena rua de concreto, beirando às lápides grandes e já meio apagadas.
Com a touca do blusão sobre a cabeça para me proteger da garoa fina que
teimava em cair, rezando para não ficar tão frio a ponto de nevar de novo
como na noite passada.
O cemitério era antigo, com uma aparência meio acabada proposital, mas a
cada estátua que passava, a cada mausoléu que via, notava a beleza daquilo.
Talvez Susan estivesse feliz em algum outro mundo, talvez estivesse
dormindo, ou reencarnado, ou sabe lá a resposta do que acontece após a
morte.
Quando achei sua lápide, precisei me segurar ao máximo para não começar a
chorar antes do tempo. Me aproximei dela, segurando as caixas encaixadas
no quadril, levei a mão livre até a pedra bem ao lado do nome de Susan
entalhado lá, e suspirei.
— Hoje eu vim aqui te pedir desculpas. Hoje, vim dizer que eu gostaria de
nunca ter tido vontade de ter outra vida e, por isso, precisar mergulhar nos
livros. Hoje, vim te dizer que eu trocaria toda essa dor, todas as minhas
escolhas erradas, para te manter viva. —
Mas eu também sei que você me amou. É uma droga pertencer ao mundo
que você tanto amava, que tanto queria. Acredite, não é tão bom estar aqui.
Dinheiro pode te deixar dormir aliviado por não precisar pensar nas contas,
mas ele não consegue limpar a culpa dos erros do passado ou trazer a leveza
de um lar unido. Nós tivemos isso, lembra? Faz muito tempo, mas tivemos e
eu sinto uma falta absurda. Acho que foi isso que nos separou, Susan. Acho
que, quando papai e mamãe se foram, eu senti muito medo de ficar sozinha e
isso me fez me trancar e não tentar abraçar sua dor e frustração. Me
questionei seiscentas vezes sobre isso no último ano, acredite, e eu sinto que
deveria ter tentado mais. Não podia ter desistido de você… E eu sei que sua
última mágoa minha, o motivo mais recente para você me odiar, foi o
mesmo que te matou. Eu sei.
— O choro era tão intenso que sacudia meu corpo. — E eu te juro que se
soubesse, se pudesse… Mas nunca pude. Essa é a verdade.
Por mais que eu queira voltar no tempo e desfazer todos os laços que me
levaram até Conrad, hoje, vítima deles, eu não consigo nem mesmo suportar
a ideia de tirar esse amor de dentro do meu peito.
É ele quem sustenta parte do ódio que sinto, mas também é ele quem me faz
ficar viva — confessei. — Irmã, eu juro. Eu tentei me livrar disso. Eu me
esforcei muito, mas por mais que lutasse contra, por mais que o repudiasse,
ele aparecia nos meus sonhos, nas pequenas vontades, nas comparações
involuntárias… Me pergunto se, se você estivesse aqui, conseguiria entender
a magnitude do que eu sinto. De carregar esse amor amaldiçoado e perpétuo
por alguém que só me machucou, que me tirou tudo, que tem prazer em me
destruir. — Coloquei uma das mãos livres sobre o coração. —
minhas cargas pesadas demais para ele carregar. Não tenho John, porque
apesar de ser como um segundo pai, algumas vezes eu consigo ver
perfeitamente os números da matrix se movendo atrás dele enquanto suas
palavras são calculadas e os seus atos muito bem pensados. E, eu acho que,
depois de tudo, eu nunca tive Conrad.
Eu não aguentava mais chorar.
Eu só não esperava que precisaria ficar pronta para a briga tão rápido.
Quando abri os olhos, quando limpei o rosto nas mangas da blusa, algo se
moveu no meu campo de visão e eu ergui a cabeça para olhar.
Atrás da lápide de Susan, com os olhos escuros queimando nos meus, estava
Conrad.
conrad
f o r e v e r, l a b r i n t h
A garota caiu para trás, assustada.
— O-que você faz aqui? Há quanto tempo está aí? — Apesar de parecer
confusa, ela não estava.
O impacto de cada uma das suas palavras me pegou, mas se ela se achava
boa em fingir, era porque não me conhecia direito. A
Scarlet pareceu demorar meio segundo para processar que não precisava me
responder, e o fez se sentando direito.
Querendo acreditar que o destino não tinha me puxado para aquele lugar à
toa, eu a segui.
— Ficou óbvio que está.
Linda.
Scarlet não se moveu, mas sua respiração se tornou ofegante, seus olhos nos
meus eram intensos. Um alerta para eu parar, ainda assim, não me importei.
— Você me odeia, Red? — Olhando para baixo, para o rosto mais bonito
que já havia visto na vida, acompanhei a confusão nublar sua expressão.
— Acho que usar meu carro antigo não é bem um atestado concreto de ódio.
— Forcei o corpo um pouco para frente e prendi seu quadril com o meu.
Scarlet bufou.
— Não, idiota. Mas as lágrimas que derramei no banco dele por sua causa
são. — Ela não abaixou a guarda, não se moveu. —
Vistoriei o corpo de Scarlet com o meu. Ela era a única fonte de calor
interessante naquela droga de cidade, naquela merda de mundo. Minha pele,
minha mente, meu pau, tudo a queria. Negar era burrice, nós dois já
tínhamos tido a prova e eu podia jurar que seus mamilos estavam duros junto
da pele arrepiada por baixo daquele moletom maior que ela.
Seus braços entre nós eram a única coisa que me impedia de senti-la.
— Red, eu não sou de pedir — rosnei baixo, naquela porra de tensão que
fazia todo o ar em volta de nós parecer elétrico.
— Você não pode, esqueceu? — Scarlet soprou contra meus dedos, contra
minha boca, e ergueu os olhos verdes, me matando no último segundo. —
Eu não tenho nada para te dar.
Scarlet envolveu minha língua com a sua brutalmente. Seu ódio todo foi
traduzido quando se afastou de mim e seus dentes vieram sobre meu lábio
inferior. Ela me machucou, mas era bom.
Não permiti que se afastasse e a busquei, indo com os dedos para sua nuca,
segurando os cabelos, mantendo seu rosto erguido e parado para que eu a
beijasse mais.
As mãos dela invadiram minha pele sob a blusa, tatearam todo meu corpo
que, sob o toque mais frio e molhado, reagiu de imediato.
Me pressionei contra o ventre de Scarlet, mostrando que a queria, mostrando
seu efeito desgraçado sobre mim.
Ela me devorou no segundo seguinte, sua boca na minha era esperta, hábil,
gostosa demais para eu pensar em parar.
Queria fazer tudo o que tínhamos sido impedidos de fazer. Ser tudo o que
não pudermos ser.
Será que existia, em algum lugar da Terra, alguém que fosse capaz de
traduzir aquilo em todas as línguas para que ela entendesse que eu sentia
muito e a queria de volta?
Era caótico.
Ela me queria.
Ela me odiava.
Ela me mantinha.
Ela me afastava.
A chuva piorou.
Nem queria. Mas precisei erguê-la para cima do capô quando percebi que era
capaz de transar com ela bem ali, ignorando a hora, o local, a situação.
Ela também não parecia disposta a parar.
Até que suas caixas caíram no chão e ela, em um tranco esquisito, como se
tivesse tomado um choque, se afastou.
— O quê? — Olhei para baixo, para a bagunça que tinha dentro das caixas
rolando pelo chão. — O que é isso?
Eram cartas? Tentei pegar algumas, mas notei outras coisas lá, como um
moletom meu. Era antigo e eu só usava na casa do
meu pai…
Suas lágrimas se misturavam com a chuva e ela nem tentava mais disfarçar.
— Isso são cartas? — Eu realmente não entendia, mas Scarlet parecia ter
esgotado toda sua paciência. Ela revirou os olhos, bateu no meu peito, me
afastando e desceu para o chão.
— Não se faça de idiota. Você as rejeitou, lembra? Enviei cada uma delas, de
novo e de novo, mesmo quando você nem mesmo as recebia. Gastei todos os
meus papéis bonitos e as melhores músicas que ouvia com você, e por mais
que eu te ame, e eu acho que amo muito, não posso esquecer que você jogou
isso no lixo. —
— Por que você está com isso aqui? — Foi a única pergunta que fiz.
— Eu juro pela vida da minha mãe. — Era a única coisa que me importava
naquela época.
— Não sei se posso acreditar em você. Ainda assim, agora você sabe delas.
Adeus, Conrad. É a minha vez de sair andando e te deixar para trás.
conrad
o que eu sou agora? e se eu for alguém que não quero por perto?
estou caindo de novo, estou caindo de novo, estou caindo. e se eu estiver
disposto? E se eu desistir? e se eu for alguém de quem você não falará?
estou caindo de novo, estou caindo de novo, estou caindo. e eu tenho a
sensação de que você nunca mais precisará de mim novamente.
não entrega algo e você precisa ir buscar, mas quando chega lá, o pacote já
voltou para o remetente.
Boa parte das cartas estavam encharcadas. Se forçasse para tentar abri-las
ali, o papel ia se desfazer na minha mão e não sobraria nenhuma palavra,
nenhuma frase para eu tentar desvendar.
Na outra caixa, onde meu moletom antigo e que nem cabia mais em mim
estava, vi guardanapos com os logotipos de onde já tinha ido com Scarlet e,
infelizmente, pela chuva, os desenhos que ela fez sobre eles viraram borrões.
Abri cada uma das cartas do painel com o maior cuidado possível e, até a
penúltima, todas estavam estragadas. Ainda assim,
Conrad, eu não sei até quando vou ter forças para isso.
Hoje faz oitocentos e cinquenta e dois dias que você se foi, e apesar de todos
os medos, todas as coisas que ficaram entreabertas, todas as dores que você
me causou, eu ainda não consigo te odiar. Eu ainda não consigo aceitar que
o garoto de olhos
Quantos romances eu vou precisar ler para entender onde nos encaixamos?
Talvez, por nunca conseguir encontrar uma resposta, eu venha deixando
meus livros de lado.
Desta vez, memória nenhuma nossa, das boas, parece ser suficiente já que
eu as usei todas. Elas estão velhas, puídas, sem brilho. Não são mais tão
resistentes para me segurar quando eu caio.
E eu caio quase todos os dias quando, antes de dormir em uma cama que
ainda não sinto cem por cento como minha, sinto sua falta.
Espero que um dia você volte.
Espero que quando isso acontecer, eu ainda seja capaz de te perdoar como
sou agora, já que eu preferia morrer naquela casa em chamas do que sentir
a dor da sua perda dia após dia.
Espero que eu ainda tenha coragem de te enviar esta carta, e espero muito
mais que, finalmente, você a receba. (Se aceitá-la, saiba que outras centenas
te esperam.)
PS: acho que consegui algo. Acho que, agora, sou Heahtcliff.
“E o que não me faz recordá-la? Não posso olhar para este chão, pois seus
traços estão impressos nas lajes! Em cada nuvem, em cada árvore…
enchendo o ar à noite, e vislumbrada em cada objeto de dia… Estou cercado
pela sua imagem! Os rostos mais comuns de homens e mulheres, meus
próprios traços, debocham de mim com alguma semelhança. O mundo
inteiro é uma terrível coleção de recordações de que ela existiu, e de que eu
a perdi!” [9]
Ela realmente me esperou. Ela realmente achava que eu ia voltar, até que não
suportou mais…
Meus sacrifícios, minhas atitudes, meus medos… tudo tinha me levado até
ali, e como minha mãe, agora era eu quem colhia as consequências das
minhas escolhas.
Ela me viu saindo da sua casa em chamas e era óbvio que a culpa era minha.
A prova estava ali, guardada por ela há anos, escondida para me proteger
além do combinado com meu pai, além do peso do seu sangue, além da
minha possível traição.
scarlet
— Eu... é... — Mordisquei o lábio inferior, com vergonha. — Ele tinha suas
questões.
— Uma delas era achar que eu era um pai relapso, não? — ele desabafou. —
E não nego. Fui mesmo, mas não adianta lamentar
agora.
Não esperei um pedido, passei para ele um copo de suco e depois dele beber
e respirar fundo, segurando o copo com mais força que o necessário, ele
soltou:
— John, eu não posso… — Tentei fugir daquela conversa. Não era problema
meu.
dela sempre fugir dos encontros triplos. Era só assim que poderia fazer a
cabeça do garoto.
— Conrad descobriu, no dia do seu acidente, que a mãe ainda tem contato,
ou uma relação mais íntima, se é que me entende, com o homem que quase
matou o próprio filho no passado.
— Esse. — John ergueu o copo, validando minha fala e terminou sua bebida.
— Mas… Ela não vivia com ele porque não tinha onde morar?
— Então você também sabia dessa história? — Ele não pareceu surpreso.
— Eu…
— Não precisa se explicar, Scarlet. A falha foi minha. Eu deveria dizer que
dava dinheiro para a mãe dele, devia ter deixado claro como as coisas
funcionavam, mas achava que ele era criança demais na época.
Conrad tinha perdido o chão. Eu sabia, eu tinha visto, presenciei tudo o que
o amor pela mãe o fez passar, e nem imaginava como é que ele devia estar se
sentindo depois daquela descoberta.
A vontade de levantar-se e ir até ele foi grande, mas dessa vez, não tinha o
que fazer.
Eu não podia.
Eu não conseguia.
Então fiquei e engoli a comida que, misteriosamente, tinha ganhado gosto de
cimento e acabado com minha fome.
Depois de dar boa noite a John, escovar os dentes e tomar meu remédio para
a ansiedade que agora ocupava o lugar ao lado das estrelinhas da
concentração que eu tomava todo dia, tirei os chinelos, liguei meu abajur, e
antes de deitar, fui para perto da janela, encarar o céu noturno enquanto
trançava os cabelos.
— O senhor Prince avisou que não era para você estar aqui, menino! — Ela
tentou convencê-lo, mas Isaac a desprezou. Sua
Pousei a mão no ombro da senhora que eu não sabia o nome, já que o rodízio
de funcionários naquela casa era absurdo e a confortei.
Vendo que aquilo era um acordo de cavalheiros, ele demorou um pouco para
admitir que não teria como fugir e concordou com a cabeça.
Meu tom de voz amável e dócil fez a senhorinha confiar que podia ir.
— E, em qual viagem ácida você se meteu, para achar que eu quero seu
perdão? — perguntei, impressionada pelo ego nas alturas realmente ser algo
de família e segui logo atrás dele.
— Você é um idiota. — Minha fala foi tão séria que o fez arregalar os olhos.
Eu nunca fui minimamente grosseira com ele ao longo daqueles últimos
cinco anos. — E eu preciso ir até uma igreja e agradecer que não entreguei
minha virgindade na mão de um imbecil que acredita que por ter um pau é
justificável trair.
— Se está tão nervosa assim, se o que fiz foi tão grave, o que acha que vão
pensar de você ter dado para o assassino da sua irmã?
A ofensa não doeu como pensei que faria, mas ativou um lado meu tão cruel
quanto poderia.
— Vão achar bom, já que ele me fez gozar de primeira. Duas vezes. —
Ergui os dedos, contando — Três, se a gente contar a vez do seu carro.
Seus olhos nos meus eram violentos, seu corpo todo gritava que ele queria
poder me agredir, mas não tive medo. Ele não era louco, ou até podia ser,
mas até gente doida sabia com quem podia extrapolar, e no meu estado atual,
eu não era uma boa opção.
— Isso não muda o fato de que você foi quem me entregou de bandeja para
ele toda vez que me deixou sozinha, ou quando me apostou, ou quando me
traiu.
— E você não me traiu, Scarlet? — Ele alterou o tom de voz e tentou chegar
mais perto.
— Sinceramente, Isaac? Traí a mim mesma achando que isso aqui daria
certo. — Fitei os olhos do cara que tinha tentado me fazer superar nem que
fosse à força o que sentia por Conrad e, naquele minuto, me senti burra.
Isso não anulava o carinho, o amor que cultivei por ele, mas se colocado
lado a lado com o que sentia por Conrad, era a mesma coisa que querer
comparar o volume de uma gota contra o oceano.
Suspirando, ele parou de se forçar contra mim e me deu uma folga enquanto
ia revirar suas gavetas.
— Você está cometendo um erro — ele disse, abrindo uma após outra,
jogando coisas para fora em busca de algo específico.
— Conrad vai acabar com você e desta vez eu não estarei lá. —
Eu teria continuado a colocar Isaac em seu lugar, mas isso foi só até que
meus olhos grudaram em uma caixa girando para o chão, com o selo do
correio. — O que é isso?
— É meu, deixe isso aí! — Isaac até tentou, mas fui ágil em abrir a caixinha
de papelão bem ali, liberando o carimbo e a almofada. A palavra que
marcava todas as cartas que ele deveria ter levado até os correios brilhou à
minha vista e, somando um mais um, quando ergui os olhos para Isaac, não
podia ter uma atitude diferente.
Minha mão voou firme, com dedos juntos, direto para o seu rosto.
O nojo impresso nas minhas palavras o atingiu e ele me soltou antes que os
seguranças chegassem. Quando o primeiro homem de terno apareceu, vesti a
capa de Prince que aprendi a usar ao longo daqueles anos e anunciei:
— Senhores, Isaac vai pegar o que precisa e sair. Por favor, acompanhem-no
até a saída e depois comuniquem o senhor Prince que ele esteve aqui.
Voltei ao meu quarto sabendo que os olhos dele queimavam nas minhas
costas e quando fechei a porta, encostei nela e escorreguei para o chão,
enfiando os dedos na raiz do cabelo, soltando todo o ar dos pulmões.
Mas também não entendia a felicidade por, finalmente, entender que Conrad
não tinha mentido.
Ele nunca havia recebido nenhuma das minhas cartas porque, de fato, elas
nunca tinham sido enviadas.
scarlet
Briguei com ele, tentando obrigá-lo a diminuir seu ritmo, mas ele sempre
vinha com a história de que não era mais jovem como eu para que pudesse
perder tempo. Aquilo era um carinho, até porque, depois da briga que o ouvi
ter ao telefone com Isaac, imaginava que só lhe restava a mim.
Outro problema que precisava ser resolvido era que fiz John prometer que
ninguém entraria no meu quarto enquanto estivesse fora e eu precisava
limpar aquela bagunça maldita.
Era meio que meu ritual de passagem. Ou, pelo menos, fazia parte dele. Por
isso, naquela quinta, conferi os pneus da picape e, sem pensar muito, joguei
as malas vazias na traseira dela, limpei a neve do vidro e esperei o motor
aquecer o bastante para sair pelos portões.
Dirigi com cuidado, o tempo não estava dos melhores, cantarolei minhas
músicas na busca de paz, mas minha mente, insana, forçava a visão de
encontros mágicos pelos corredores.
Parecia que, depois da ideia de não ser completamente rejeitada por Conrad,
minha eu de quatorze anos tomava conta do corpo da pessoa de dezenove.
Não era justo, mas era incontrolável.
esforço sobre-humano para subir até o andar dos dormitórios femininos dos
Lions.
Dizer que desejava o meu bem depois de tentarem acabar comigo era fácil,
né?
Fiquei tentada a fazer uma pequena cena, mas não valia a pena.
Mantendo a porta encostada, abri as janelas para correr vento ali dentro e
comecei a limpeza. Joguei muita coisa nas malas, tirei tudo o que precisaria
levar embora e, o que sobrou, organizei em
Ergui o corpo rápido demais, com os cacos de vidro na mão, sem entender o
que ela fazia ali.
— Como soube que… — Ela nem me deixou terminar a frase, abriu a porta
em um sorriso que podia ser considerado maligno e me olhou como se eu
fosse burra.
— Garota, todo mundo achou que você tinha morrido. É óbvio que quando
você apareceu lá fora, todo mundo comentou sobre também. — Entrando
sem convite, Bella veio para perto de mim e me mediu de cima a baixo.
— Anos atrás, no dia em que sua casa pegou fogo, você me viu com Conrad,
não é?
Aí, era aquilo? Meu corpo todo tremeu, rejeitando a sensação que se repetia
só de lembrar da cena.
— Por que você foi até lá? — A pergunta de Bella fez minha eu de quatorze
anos chorar.
sem celular. Usou o do irmão para mandar mensagens para mim, ou seja…
— Foi Isaac — meu tom cansado a atingiu —, mas que caralho… — Lambi
e mordisquei o lábio inferior, processando a informação. — Bella, ainda que
tenha sido armado, isso não muda o que eu vi.
— Não — ela nos forçou a levantar —, não muda. Conrad realmente tinha
me chamado lá para conseguir se aliviar de algum jeito, para tentar tirar você
da cabeça. Você conhece do histórico dele e, infelizmente, ele cresceu
achando que sexo também era uma forma de punição ou de extravasar. Nada
saudável, mas incrivelmente interessante, você sabe. — O comentário dela
fez minhas bochechas ferverem. — Mas, o ponto é, ele mal me deixou beijá-
lo naquele dia, e quando vimos você, quando eu entendi o que acontecia…
Conrad foi até sua casa para ajeitar as coisas, Scarlet.
— Acho que vocês finalmente merecem essa conversa. — Ela soltou meu
punho e me ofereceu os cacos de vidro que tinha recolhido.
— Acho que você não tem que se meter, até porque, para que eu ouça, ele
vai ter que fazer por merecer.
Ela demorou um segundo para analisar o que eu dizia, mas assim que
entendeu, deu de ombros e fez um biquinho estranho.
— Justo.
— Ah, desculpe ter transado com Isaac também. Nem foi bom, eu juro. Me
esforçar para não ter meu rosto vazado na sextape me obrigou a ficar numa
posição desconfortável. Fora que, né? Meio mixuruca o negócio.
— Eu não estava mais com ele. — Foi tudo o que consegui responder diante
daquela naturalidade toda.
— Que bom. Porque, transando com os dois, posso te garantir, fica só com
Conrad. É mais vantajoso, viu? — Ela demonstrou o tamanho da vantagem
com as mãos e eu quis rir, mas me segurei.
— Ok, Bella. Obrigada pela ajuda. — Sacudi a mão com os cacos no alto.
enquanto tentava pensar em como faria para descer com todo aquele peso,
procurando qualquer alternativa que não fosse dividir tudo em duas viagens
cansativas, que a voz profunda, que fez todos os pelos do meu corpo se
arrepiarem, surgiu.
Poderia dizer que desceria pelas escadas fazendo snowboard em cima das
malas, mas tudo que saiu da minha boca foi um simples e sonoro:
— Sim.
— Achei que não veria você aqui tão cedo — ele disse, me olhando de
soslaio, e eu não soube entender de onde vinha a
naturalidade daquilo.
— É que eu precisava de algumas coisas que tinham ficado por aqui, como
meu computador…. — Parei de tentar me justificar e, depois de um suspiro
pesado que fez meu peito tremer, eu o encarei abertamente. — E, de
verdade, vamos mesmo fazer isso? — Minha pergunta fez um sorriso surgir
no canto do seu lábio.
— Você quer mesmo falar sobre isso agora? — Sua pergunta era genuína.
Foi você quem foi embora, e foi você que não tentou me ouvir… —
Meu peito doeu com a memória e eu não o poupei. — Nunca vou conseguir
me esquecer da sensação de cair no chão depois de tentar te acompanhar e,
mesmo assim, saber que você não parou…
Conrad não discutiu. Nem tinha o que tentar. Mas continuou ao meu lado,
me acompanhando em silêncio até a saída do castelo.
— Como está sendo dirigir meu carro? Achei que você não gostasse dele. —
A pergunta foi tão natural que a resposta saiu pulando da minha boca.
— É assim que você vai ficar, Scarlet. É isso que meu irmão vai fazer com
você. Está preparada? Sua hora está chegando.
E quase conseguiu o que queria. Vi Conrad dar o primeiro passo, mas, por
sorte, a voz de John desarmou todo mundo. Ele, naquele minuto, era o reitor
e o pai zangado.
Em cinco anos, sob os tetos dos Prince, eu nunca tinha visto aquilo, mas
quando Isaac colocou os pés no chão e tentou começar a se explicar, John o
interrompeu, pegando-o pela orelha, punindo-o na frente de todos, enquanto
anunciava:
Meu corpo pareceu descongelar e a troca de olhares que tive com Conrad
naquele segundo, me fez lembrar do passado. Houve uma espécie de
cumplicidade que eu não sentia há anos com mais ninguém e, lado a lado,
seguimos atrás de John e Isaac na direção da reitoria.
conrad
nunca nos libertaremos, cordeiro para o abate, o que você vai fazer quando
houver sangue na água? o preço da sua ganância é seu filho e sua filha, o que
você vai fazer quando houver sangue na água?
b l o o d / / w a t e r, g r a n d s o n .
Tentei algum contato visual, mas ela não ergueu a cabeça de jeito nenhum,
parecendo acuada. Isso se devia ao show de puta que Isaac continuava
dando, chutando e resmungando, tentando se manter dentro de um padrão
que meu pai aceitava, já que ele sabia que o pior estava por vir.
— O que pensa que está fazendo, garoto? — John Prince, naquele segundo,
era o reitor não nosso pai. Seu tom de voz frio, sério e cheio de repreensão
agoniou Isaac.
Meu irmão parou por um minuto, fitou meu pai com olhos vidrados, mãos
em punho e veias do pescoço saltadas. Ele era pura raiva e gritou em
resposta:
— É, você arruinou tudo desde que chegou, mas eu sei como você vai voltar
para o buraco de onde saiu. Quer que eu conte, ou você conta para o papai
sobre o seu negocinho ilegal? O sorriso que cortou meu rosto naquele
minuto confundiu Isaac.
A cara de Isaac foi ao chão. Ele não conseguia acreditar e, por quase um
minuto, ficou calado, olhando do meu rosto para o do meu pai.
melhor para todo mundo que essa conversa não saia daqui.
Está magoado pelo seu papaizinho não ter contado nada, por você ser um
imbecil? Um burro sem noção do caralho?
— Venha — chamei o desgraçado que tentou de todo jeito tirar tudo o que
era meu. — Mas saiba que eu só vou parar quando você não estiver mais
respirando.
— Como você pôde? Ele arruinou tudo! Você sabe! A minha mãe, você,
Scarlet… Ele acabou com todos nós! — Meu irmão enfiou as mãos no
cabelo, os puxando pela raiz, completamente fora de si.
Meu pai trocou um olhar tão piedoso com meu irmão que me fez pensar que
houvesse ainda um pedaço humano dentro dele.
Quando ele abriu a boca, quis saber mais daquela mudança, mas fui
impedido.
— Conrad, por favor, saia para que eu e Isaac possamos ter uma conversa.
— Ah, eu vou perder o show? — provoquei, mas nenhum dos dois olhou
para mim.
Saí do escritório um pouco decepcionado por não poder ver mais daquilo. O
que era uma caminhonete quebrada, perto de ver a humilhação que Isaac
passava ao perceber que o papaizinho dele era meu cúmplice?
Não pude esconder o sorriso no rosto quando cruzei o portal, mas foi só ver
Scarlet lá, ainda tremendo, com copo d'água entre as mãos com Maressa
ainda ao seu lado, que fui atingido. A garota não merecia nada daquilo, e a
culpa dela estar envolvida até o último fio de cabelo era minha. Fui eu quem
achou Scarlet interessante, a trouxe para o meio da bagunça e, infelizmente,
soltei sua mão quando ela mais precisava ser protegida.
Um gosto amargo tomou minha boca junto da vontade de fumar. Meus dedos
tocaram meu isqueiro no bolso só pela segurança de tê-lo ali.
A verdade era uma só, ela estava presa naquilo por culpa minha e eu
precisava encarar que, no final das contas, era muito mais fácil lidar com as
consequências dos meus atos quando elas só batiam em mim.
Respirei fundo, pensando que deveria levá-la para a casa do meu pai, mas no
primeiro passo que dei em sua direção, meu telefone tocou.
Era muito raro Thomaz me ligar e não pensei duas vezes em atendê-lo.
— Alô?
— Cara… — sua voz do outro lado da linha era desesperadora
— Eu… — Ele respirou fundo. — Você consegue vir até a casa dos meus
pais?
— A casa dos seus pais? — O que Thomaz foi aprontar a uma hora e meia
dali? — Posso, mas o que aconteceu?
— Cara, não consigo falar agora, mas se você puder, traga um pouco de
Supernova com você.
Aquilo estava muito estranho, mas ainda assim, eu confiaria minha vida a
Thomaz.
Era tão intenso que meus dedos pareceram queimar e precisei enfiar as mãos
nos bolsos da jaqueta.
— Acho que sim. — Sua voz era baixinha, meio que um sopro.
— Até mais, Red. — Não havia mais nada que eu pudesse fazer ali.
Foi desconfortável sair dali daquele jeito, mas não tive escolha.
Quando entrei no meu carro para ir até Thomaz e vi minha antiga picape
toda fodida, pensei em descontar aquilo, mais cedo ou mais tarde, na cara do
meu irmão.
Vi meu melhor amigo crescer sob o olhar de pais rígidos, que o puniam
ignorando sua existência sempre que ele os desagradava.
— Cara, o que foi que aconteceu? — perguntei, pousando uma das mãos em
seu ombro, falando baixo.
— Conrad — ele falou mais baixo do que eu —, porra, eu não sei como ele
soube, mas me pressionou tanto que eu não tive como mentir.
— Sobre o que você está falando? — Deu um leve tranco para ver se aquela
agonia acabava.
— Meu pai, ele sabe sobre a Supernova, sobre a Star, e eu fodi tudo quando
disse que era você quem produzia.
O choque no meu rosto foi recebido com ainda mais desespero por Thomaz
e fui pego no meio do caminho, enquanto pensava em uma solução rápida.
— Vou mandar colocarem mais um prato, você fica para o jantar. — Não era
uma pergunta e eu odiei aquele tom. — Thomaz, por que você não leva seu
amigo até seu pai? Como você bem sabe, eles têm muito a tratar.
Ele não conseguiu respondê-la, mas soltou baixinho para mim um “venha”.
Sem outra opção, segui com ele, atravessando a sala em direção à escada que
corria pelos dois lados da parede até o andar superior.
Se eu tinha pisado ali na adolescência três vezes foi muito. A verdade era
que eu sempre fui muito bem-tratado por ser um Prince, mas nunca
valorizado o bastante por ser bastardo, ainda assim, a casa continuava sendo
impressionante com suas esculturas em mármore espalhadas pelos
corredores, tapetes de couro, ornamentos de diferentes culturas, sombras de
um tempo em que a família ainda tinha muito dinheiro para gastar com tanta
superficialidade.
Ele tomou fôlego e eu o imitei antes que sua mão trêmula girasse a
maçaneta, revelando um senhor Craig de sorriso pretensioso no rosto. Foi
um choque quando entrei, ser recebido com um abraço. Aquele ganhava na
lista dos mais falsos que já havia recebido.
— Bom, o meu trabalho é bem diferente do de vocês — meu corte foi frio
— e o que o senhor trata com meu pai, é um problema dos senhores.
ele soprou a fumaça — para te fazer uma proposta. Uma mais vantajosa do
que a que seu pai tem oferecido.
— E essa seria?
— E o que mais?
Fiquei em silêncio, pensando em tudo até ali, e quando respondi, meu tom de
voz era mais do que frio, era perigoso.
— Acho que — fiz uma pequena pausa e considerei antes de responder —
não.
Meu melhor amigo se segurou na cadeira ao meu lado, mas nem eu pude rir
da minha piada feita fora de hora.
— Thomaz me contou que você poderia ser mais resistente, mas você não
deve fidelidade ao seu pai com tudo o que o passado nos reserva, não é
mesmo?
— O passado não interessa ao senhor. Nem Scarlet. E caso tente usar ela ou
Thomaz para me coagir, acredito que vai perder um filho, ou algo mais.
O olhar que dei a ele naquela ameaça aberta não era nenhum pouco dócil e o
homem recuou.
— Acho que o senhor deveria saber quais palavras usar na tentativa de uma
negociação. Depois disso, não tenho mais nada para fazer aqui.
Boa noite.
Eu sabia que seu pai nos observava da janela do escritório e só por isso não
dei um soco na sua cara.
— Você deveria ter calado a boca — dei uma bronca sutil, tentando não
descontar nele meu nervosismo.
Vendo o medo nos olhos do meu melhor amigo como eu nunca vi antes,
recuei para entrar no carro. Manobrei na direção da saída e parei ao seu lado,
abaixando o vidro para o último aviso.
— Saia dessa merda antes que ela te consuma igual me consumiu. A única
família que presta aqui é de Bella e você sabe disso.
poderia salvá-lo.
scarlet
agora, de repente, você está pedindo para voltar. você pode me dizer onde
conseguiu essa coragem toda? É, você pode dizer que sente falta de tudo o
que tínhamos, mas eu realmente não me importo com o quanto dói quando
você me quebrou primeiro, você me quebrou primeiro.
— O que tem?
— Como você sabe, Isaac não estará presente. O enviei para férias
antecipadas e prolongadas com uma tia por parte de mãe, mas temos um
pequeno problema.
— Conrad brigou com a mãe, e soube que está sozinho nos dormitórios da
universidade. Ele é meu filho, e você, a única que sabe do meu estado de
saúde, entende que eu não posso deixá-lo lá, não é?
— Com certeza, John. — Engoli a borboleta que tentava voar pelo meu
esôfago. — Acho que você realmente deve chamar Conrad para passar a
semana aqui. — Tentei meu tom mais calmo e, pela feição dele, havia
funcionado.
— Pensei que você também poderia convidar seu avô. Sei que talvez ele se
sinta desconfortável pelas escadas, mas podemos dar um jeito no quarto lá
de baixo e, minimamente trazê-lo para o dia do Natal, o que acha?
— E você pode cuidar da casa para esta data? As coisas são tão mórbidas
que…
Ele realmente queria tentar algo, e eu faria aquilo por John. Eu lhe devia.
Estiquei-me na sua direção, peguei em sua mão, estranhando os dedos tão
gelados e os apertei de levinho.
— Acho que este ano não quero ninguém de fora. — A resposta veio fácil.
Como é que os dois podiam ser tão iguais, mas tão diferentes ao mesmo
tempo?
Contudo, analisando o último mês em que ele ficava meio esquecido e tirava
pelo menos um dia de folga na semana para descansar, me forcei a ficar com
John mais algum tempo na
— Disse que tinha trabalho a fazer. — John não me deu muita atenção. —
Tenho uma consulta às onze hoje, você precisa de algo?
— Não, tenho seu cartão, lembra? — Ergui o adicional que ganhei dois anos
atrás e nunca usei mais do que o necessário. —
— Espero que sim. Faça o papai Noel aparecer com aquele saco mágico, por
favor — ele disse em um bom humor raro antes de matar sua xícara de café e
sair pela porta.
Coitado do velho John Prince — pensei. — Será que ele não entende que só
boas crianças ganham brinquedos? Todos nós naquela casa, com exceção
talvez do meu avô, ganharíamos carvão.
Terminei meu café da manhã, peguei a droga do Tesla de Isaac que era o
único carro que eu me atrevia a dirigir na garagem, já que a picape ainda
estava toda quebrada, saí para as compras e tentei ao máximo encher minha
cabeça naqueles dias para fugir da ansiedade que era pensar que eu e Conrad
ficaríamos a um corredor de distância do outro.
Depois de uma noite de insônia pesada, como não tinha há muito tempo,
desci descabelada e de mau humor para tomar café
E esse susto era Conrad, perfeito como sempre, entrando pela porta, vindo
na minha direção.
— Bom dia, Red — ele disse, parando ao lado do sofá.
— Achei que você só viesse dia vinte e três. — Tentei meu melhor para não
gaguejar.
— Ah, neste caso, eu vou voltar para a cama. — Ergui a mão, acenando de
forma robótica.
conrad
e bem diante dos seus olhos estou desmoronando, sem passado, sem
motivos, apenas você e eu. esta é a última vez que estou te pedindo isso,
coloque meu nome no topo na sua lista. esta é a última vez que eu pergunto
o porquê você parte meu coração num piscar de olhos.
t h e l a s t t i m e , t a y l o r s w i f t Eu ainda não sabia como tinha
aceitado aquele convite, na verdade, sabia.
Trabalhei que nem um filho da puta durante todo mês, tentei acabar com
todo o estoque de matéria-prima que tinha para
entregar logo nas mãos do meu pai e me livrar de uma possível ameaça
vinda do pai do meu melhor amigo, além de querer fugir de um possível
futuro tenebroso, ao qual só então depois daquela conversa com Bella, me
dei conta de que poderia ter. Ainda assim, quando estacionei em frente à
mansão do meu pai e entrei pela porta daquela casa, onde não pisava há
anos, vendo Scarlet descendo as escadas com os cabelos rebeldes e cara de
sono, percebi que o trabalho não era nada perto da minha vontade de estar
ali. Eu ainda tinha as minhas obrigações a fazer, ainda precisava dar conta
daquilo que tinha deixado maturando no meu laboratório, mas era Natal e
para não pensar em minha mãe possivelmente passando a data junto daquele
desgraçado, quando meu pai fez o convite, pensei estar resolvendo dois
problemas com um único tiro depois da recepção calorosa que tive por parte
da ruiva.
Encostei-me em uma das grandes janelas que davam para o quintal, abri uma
brecha, e vendo a imensidão branca que era o jardim, coberto de neve,
acendi um cigarro.
Era estranho não ter Isaac para brigar, pior ainda, estar ali com um objetivo
completamente diferente do que tinha quando voltei àquela cidade.
Tentei tirar minha cabeça daquilo, ou começaria a pirar antes do tempo.
Voltei para o carro, peguei minhas coisas, e sozinho subi para o meu antigo
quarto, fazendo as contas involuntariamente na minha cabeça sobre a
distância da minha porta até a porta de Scarlet.
Foi uma surpresa ver meu quarto praticamente intocado por todos aqueles
anos.
aquilo foi outra coisa que me chocou em uma análise interna: eu tinha
passado muito tempo longe, mas alguns hábitos permaneciam os mesmos,
como as roupas pretas, o gosto musical e a organização, vide os CDs antigos
guardados nas gavetas da cômoda em ordem de preferência, e o meu velho e
saudoso videogame, que quando toda a merda estourou, acabou ficando na
casa do meu pai.
Como ainda era cedo e minha noite anterior foi regada a energético e
trabalho, liguei a TV em um canal qualquer, deitei sobre o colchão que havia
sido trocado depois daqueles anos todos e mal notei quando o sono me
pegou.
Acordei de repente, sabe-se lá quanto tempo depois, com uma batida seca na
minha porta. Em um pulo, estava pronto para abri-la e, como esperado,
peguei a ruiva do outro lado, com a mão erguida, pronta para bater de novo.
O cabelo dela dessa vez estava arrumado, solto, tão comprido quanto
qualquer outra vez que eu tinha visto. Ela vestia calças jeans
— Com quantos anos você fez esses piercings todos? — Fui tão direto que a
assustei.
Sem me dar espaço para pensar, ela perguntou também: — E suas tatuagens?
— Hm… — Seus olhos baixaram para o meu pescoço que era o único lugar
fora minhas mãos, exposto. — Alguma tem, você sabe
— E seu avô?
— Vovô também está descansando. Segundo ele, a velhice pesa. — Nós dois
meio que sorrimos, e aquilo foi estranhamente bom. Muito bom.
— Você está falando que comprou cortinas para uma sala que tem um pé
direito de quatro metros e quer trocá-las agora?
— Se tem funcionários na sua casa, pra que caralho você quer que EU suba
para trocar a cortina?
— E eu sou?
De fato, deu um trabalho da porra fazer tudo que ela queria, mas, no final das
contas, ficou tudo muito bom. Levamos pelo menos três horas para
trocarmos as cortinas todas e montar a base da árvore de Natal.
Como não era escravo, parei para almoçar, mas ela nem isso fez.
Quando voltei até a sala, ela se esforçava para passar o pisca-pisca em toda
árvore de Natal no alto de uma escada menor que a que usei para trocar as
cortinas.
— Pode voltar para ajudar, seu intervalo já acabou. — Ela era minha nova
chefe?
Scarlet tentou se cobrir e fingir que nada tinha acontecido, mas ao mesmo
tempo que ela fazia isso, minha mente não colaborava.
— Olha só, isso está ótimo! — meu pai elogiou quando entrou pela porta da
sala carregando alguns presentes. — Já posso colocar sob a árvore?
— Acho que vou colocar os meus agora também... — ela comentou mais
para si e eu perguntei:
— Eu posso também?
— Você trouxe algo? — Não era uma provocação vindo dela e sim pura
surpresa.
— Trouxe — provoquei, me aproximando — e olha só como eu sou
bonzinho, não é nenhuma bomba. — Apesar da minha ideia de fazer graça,
nem ela ou meu pai riram.
— Eu vou fazer o pedido, e vocês dois estão liberados. Aviso quando chegar.
meu pai falou baixo, só para mim —, mas conforme os anos foram passando,
cada vez mais eu entendi o que você viu nela.
Só atravessei a sala e subi as escadas, de volta para o que era o meu quarto.
Ela deve ter pensado que eu tinha dormido ou qualquer coisa do tipo, mas a
verdade é que passei boa parte da noite jogando videogame como não fazia
há muito tempo.
Quando o relógio marcou 23h, larguei o controle do videogame, tomei um
banho decente, me lembrando do quanto era bom o chuveiro daquele
banheiro, e vesti as calças de moletom. A verdade é que eu tinha me
acostumado a dormir só de cueca, até por causa do piercing, e mesmo no frio
não conseguia ficar com tanta roupa. Achava que aquilo era resquício de
uma infância vivida
Antes de deitar, não pude negar que me arrependi de não descer para comer,
e contrariando a ideia de adolescente rebelde que dorme com fome para
contrariar os pais, do jeito que estava, resolvi descer.
Nada tinha mudado, e por isso não foi um problema, no escuro, abrir a
geladeira e tirar de lá os restos do jantar.
Me deu sede e minha garrafa do quarto está vazia… — ela justificou como
se me devesse alguma explicação conforme se aproximava.
Meus olhos não conseguiam focar em outra coisa que não fosse seu corpo, e
para minha surpresa, ela também não parecia mais tão imune a mim. Me
olhando de soslaio, como eu fazia com ela, Scarlet mordiscou o lábio
inferior algumas vezes, enquanto tentava ver melhor minhas tatuagens.
Minha vontade era de pegá-la com força, beijar sua boca, seu corpo, foder
aquela bunda gostosa… Mas me segurei, mesmo com o desejo queimando
nas minhas veias e afastei aquela ideia. Não queria queimar largada. Quando
Scarlet se ergueu, respirei fundo e ela me imitou, e como quem não queria
nada, soltou numa voz meio baixa e rouca:
Desviei o olhar, tentei brigar com meu corpo enquanto passava as mãos no
rosto e no cabelo, mas era tarde demais.
Fechei os olhos, achando que aquilo era uma piadinha de mau gosto do
destino.
Eu tinha jurado que ia tentar levar as coisas de um outro jeito com Scarlet.
Que ia tentar ser minimamente decente, mas era impossível, ela não se
ajudava!
Scarlet largou a garrafa aberta sobre o balcão, e como se fosse a coisa mais
sensual do mundo, mantendo os olhos nos meus, pegou um dos morangos e
o levou até a boca. Ela o mordeu, mastigou lentamente e engoliu, lambendo
os lábios no final, assinando meu atestado de loucura.
— O quê? — Ela tentou entender o que acontecia, mas minha boca sobre a
dela impediu qualquer diálogo e erradicou qualquer dúvida.
Suas mãos deslizaram do meu peito para minha nuca, as minhas não
perderam tempo. Mergulhei em sua bunda, puxando-a para cima do balcão,
me forçando entre suas pernas, ao mesmo tempo em que devorava a sua
boca. Scarlet era uma bruxa, a porra da maior tentação, eu era fraco demais
para resistir.
Sua língua tinha gosto de morango mais intenso do que qualquer outra vez e
aquilo acabou comigo. Nosso beijo não era gentil, principalmente seus
dentes contra meu lábio, mas eu devolvi na mesma moeda. Apertei suas
coxas, pressionei meu pau contra sua boceta, mesmo com todo aquele tecido
entre nós, envolvi os cabelos de sua nuca com a mão e forcei sua cabeça a
ceder conforme mordia seu lábio inferior. Ela gemeu contra minha boca e
me vi enlouquecendo. Desci para o seu queixo. Trilhei um caminho de beijos
por sua garganta, seu pescoço. Scarlet arfou, nossas peles se arrepiaram num
claro recado: não dava mais para ficar tão perto sem as malditas
consequências.
Mas, como um balde de água fria sendo jogado tanto nela quanto em mim,
antes que eu pudesse descer a boca sobre seus seios, ouvimos um ataque de
tosse vindo do quarto onde seu avô estava.
Desisti de fugir.
Tudo era branco, mas parecia quente sob a luz da luminária infantil que
reproduzia estrelas amarelas que dançavam pelo teto e
paredes.
Quando ela o fez, o choque e a surpresa não foram suficientes para que se
cobrisse.
Seu corpo molhado e arrepiado gritava por mim.
scarlet
nunca existiu neblina nos meus olhos, insanidade é nosso purgatório. peço
perdão, pois eu pequei, eu acho que eu me entreguei, ao rei mau. virei rainha
do meu próprio caos. a linha é tênue entre o amor e o ódio. posso sangrar pra
mostrar que me importo, mas não se engane ao duvidar, que eu também
posso te fazer sangrar, somos espelho, peça perdão, você pecou primeiro.
caos,camaleoa-músicafeitaparaBadPrince
Aquilo pareceu ser a única coisa capaz de fazer meu corpo esfriar, de
mandar aquela vontade, aquele desejo insano, embora.
Mas era tarde demais para colocar aquele plano em prática.
Aquele dia era prova viva disso. Funcionar tão bem ao lado de Conrad me
fazia pensar que, talvez, se ele tivesse outra chance, se eu fosse capaz de dar
outra chance, as coisas dariam certo.
Eu realmente quase gritei, mas não por causa do frio. A culpa era daquela
porra de vontade desgraçada que não ia embora. Eu ainda queria descer.
Ainda queria ser devorada por ele.
Resistir?
Foi então que meu corpo queimou. Aquela sensação incômoda, mas muito
conhecida, de quando ele me observava.
Soube, naquele instante, que não importava quanto tempo passasse, quantas
vidas eu vivesse, quantas pessoas eu conhecesse, ninguém nunca chegaria
aos pés de Conrad.
Deus sabe que tentei ser forte, que tentei fugir, que tentei negar, mas quando
ele adentrou no chuveiro junto de mim, sem roupas, não havia o que fazer.
Não havia mais tempo para esperar, e nisso, nós pensávamos igual.
Quando ele me encaixou contra seu pau, soltei o quadril e o recebi de uma
vez.
Conrad soprou contra minha boca entreaberta, roçando os lábios nos meus.
— Relaxa para mim, Red. — A voz baixa, meio rouca, arrepiou cada pedaço
do meu corpo que ainda estava a salvo. Meu ventre pulsou contra a investida
dele, saboreando o entra e sai lento, curto, que me preenchia por inteiro a
ponto de doer. — Caralho — ele rosnou —, eu mandei você relaxar essa
bocetinha apertada.
Seus dentes contra meu pescoço fizeram meu ventre se contrair, mais uma
vez. Ele gemeu alto, numa forma meio animalesca, e aquilo me excitou pra
caralho. Não queria que ele me poupasse de nada.
Entendendo fácil o que eu queria, ele desceu para o meu seio direito
e sugou o mamilo com tanta pressão que gritei. Suas mãos abriram minha
bunda, tentando dar mais abertura para seu pau como se aquilo fosse aliviar
de algum jeito o que acontecia dentro de mim.
Mas ele não podia controlar aquilo. Era involuntário o modo como minhas
paredes apertavam Conrad. Era tão íntimo, tão profundo, tão apertado, que
de um jeito muito louco, eu sabia exatamente onde aquele piercing dele
roçava, e a pressão certeira que fazia.
Analisei suas coxas grossas entre as minhas, suas mãos grandes e fortes
sobre meu quadril, os braços, os ombros, o pescoço… Conrad era cheio de
desenhos. Uma decoração muito bem-vinda nas paredes daquele templo.
E depois de uma revista minuciosa sobre seu corpo, sabendo que ele fazia o
mesmo comigo, umedeci os lábios ao ver o efeito que tinha sobre ele. Era o
misto de orgulho e uma luxúria que seria capaz de me condenar para sempre,
mas ver que o deixava duro, com as veias saltando, tão úmido que seu
piercing brilhava, me fez querer sorrir. E eu o fiz, antes de, finalmente, focar
em seu rosto.
de uma vontade insana, assim como eu sabia que os meus também estavam.
Quando ergui um dos joelhos e abri mais as pernas, sabia que meu recado
ficava claro. Eu queria cair naquele abismo, e cairia outras mil vezes com e
por ele.
Seus lábios roçaram contra minha pele, depois deram espaço para os beijos
começarem e, logo em seguida, sua língua e dentes apareceram. O caminho
tortuoso que ele fez, aquele clima de
Sentia-me pesada, molhada, pronta. E, meu Deus, como eu queria ver como
seria o final daquilo.
— Puta que pariu. — Ele parecia um viciado, finalmente tendo acesso à sua
droga favorita.
Deitei a cabeça para trás, perdendo um pouco da visão maravilhosa que era
tê-lo entre minhas pernas, mas fiquei refém da sensação dele agarrando
minhas coxas, deixando a gentileza de lado.
Incentivando-o, minhas mãos foram os meus seios ao mesmo tempo em que
ele me lambia de cima a baixo e me sugava na fonte.
Senti o riso na sua voz. Eu mesma quis rir, mas não tive tempo porque, sem
me preparar, Conrad arrancou de mim o gemido mais alto que me permitia
dar dentro daquela casa.
Sua língua girou várias e várias vezes sobre meu clitóris, seus dedos
acariciaram minha entrada e, de repente, eu o senti em outro lugar.
Conrad faria de mim o que quisesse, como quisesse. Estava ali para servir.
— Eu não vou comer esse rabo hoje, ou você vai acordar a casa inteira, mas
você me paga pela tentação lá embaixo.
Não discuti, fiz que sim com a cabeça e coloquei uma das mãos sobre os
seus cabelos, puxando-o, incentivando para que ele continuasse a me chupar
conforme dançava com os quadris contra sua boca, rebolando contra sua
língua e sentia seus dedos dentro de mim em todos os lugares possíveis.
Com maestria, Conrad manteve o ritmo, e não parou nem quando eu tentei
impedi-lo de continuar. Meu ventre tremeu mais do que qualquer outra vez.
Perdi o controle da minha respiração, do volume dos gemidos, e senti
quando Conrad precisou se desdobrar para manter um dedo no meu cu outro
na minha boceta, o ritmo sobre o meu clitóris além da mão sobre a minha
boca. Quis rir, mas tudo o que consegui fazer foi gritar contra sua pele
conforme gozava tão intensamente que podia ouvir o barulho do atrito dos
seus dedos contra mim.
Mordi sua mão conforme meu corpo sofria daquela porra insana que ele
causava. Conrad parou de me chupar aos poucos, parecendo disposto a beber
tudo de mim antes de vir com o rosto contra meu quadril e mordê-lo.
Conrad era realmente grande, pesado, para fechar a mão em volta do seu
pau, lembrei que precisei realmente forçá-lo. E só para comprovar que não
era loucura minha, encaixei a mão entre nós e comprovei o fato.
Quase engasguei quando ele tentou forçar tudo até o fundo da minha
garganta, mas era impossível colocá-lo inteiro na boca, pelo menos, naquela
posição. Ainda assim, fiz o meu melhor. Vi o quanto ele gostou de me ver
cuspindo sobre ele, ouvi seus gemidos de aprovação e prazer quando o
mantive no mais fundo que aguentava, percebi a surpresa em seus olhos
enquanto massageava suas bolas.
— Caralho, Scarlet! — ele rosnou quando me puxou pelos cabelos para ficar
com o rosto na altura do seu. E no meio de um beijo agressivo e insano,
caótico como nós dois, ele disse:
— Se você não parar agora, vou fazer você engolir minha porra e me chupar
de novo, até eu ficar duro para gozar dentro de você.
Sua mão no meu pescoço me travou no lugar, a outra mão livre beliscou
meus mamilos e estapeou meus seios, depois desceu pelo meu ventre e foi
direto para minha boceta.
Com a ponta dos dedos, Conrad esfregou meu clitóris e eu busquei por ar.
Os olhos nos meus eram intensos de uma maneira que eu nunca tinha visto
antes.
Conrad bebeu do meu desespero por ar, do meu prazer ao gemer conforme
ele me tocava, e quando se enfiou de uma vez em mim, até o fundo e liberou
minha garganta, juntou a língua com a minha sem gentileza alguma.
Ele me prendeu na cama com seu peso. Minhas pernas estavam erguidas e
seu quadril vinha cada vez mais rápido, fazendo o colchão gemer contra
nosso peso e a intensidade das estocadas.
Arranhei suas costas, puxei seu corpo contra o meu. Queria fundir Conrad a
mim de todas as formas que pudesse e ele parecia ter a mesma ideia. Por um
minuto, eu pensei em reclamar quando ele saiu de mim, mas agradeci a
consciência de um de nós dois, quando ele foi atrás de camisinha.
Fui para cima dele e, quando o senti encaixado na minha entrada, forcei o
corpo para baixo de uma vez. As mãos de Conrad massacraram meu quadril.
Encarei o garoto pelo qual eu esperei por toda a vida, que tinha meu coração
nas mãos desde que ele descobriu que podia bater por outra pessoa, e
acariciei seu rosto.
Acelerei o ritmo dos quadris sobre ele e o vi respirar fundo enquanto fechava
os olhos.
Saber que eu tinha algum controle sobre seu prazer era divertido também.
Suas mãos seguiram o desenho do meu corpo, subindo dos quadris para a
cintura, então para os seios, e ele os envolveu.
— Conrad… — sussurrei, sem muito controle e ele puxou meu tronco para
baixo.
Meu peito ficou contra o seu, mas fiquei meio de lado e ele se aproveitou.
Fiz de novo, mas o castigo foi outro. Conrad segurou minha bunda, como se
me abrisse mais e então, apoiando os pés contra o colchão, investiu contra
mim em uma intensidade insana.
Tentei sair de cima dele, mas minhas pernas pareciam feitas de gelatina.
Tremiam como se o exercício tivesse sido muito intenso.
— O que foi, Red? Não consegue andar? — zombando de mim, Conrad me
ajudou a ir para o lado, e como se fosse sua boneca, me colocou de joelhos
na cama.
— Agora sim…— Me pegando por trás, roçando o pau ainda duro entre
minhas coxas, ele afastou meu cabelo das costas e desceu beijando minha
coluna conforme me colocava para baixo, me deixando de quatro, com a
bunda bem erguida.
Senti sua língua sobre meu cu e não acreditei que, na segunda transa da
minha vida, o negócio estava naquele nível. Mesmo assim, não neguei.
Ele forçou a língua no espaço estreito, enquanto seus dedos brincavam nos
lábios da minha boceta, pronto para me deixar excitada de novo.
— Melada desse jeito, acho que você quer passar a noite fodendo… Na
verdade, Red — seu pau forçou a entrada, mas escapou, acabando sendo
envolvido por meus pequenos lábios —, acho que você vai dar esse cu pra
mim hoje.
Seu quadril fez um vaivém lento e curto antes de mal se encaixar em mim e
entrar até o talo. Enfiei a cara contra o travesseiro e berrei.
De repente, eu tinha um novo som favorito e ele era a mistura dos nossos
gemidos, com o som dos nossos corpos se chocando e da minha boceta
engolindo seu pau completamente encharcada.
Era som de sexo, do nosso sexo, e eu queria ouvir aquilo todo dia.
Conrad não deixou de estimular onde tanto parecia querer entrar e, relaxada
como estava, senti quando um dos dedos deslizou para dentro.
Eu queria gritar, queria que durasse horas, mas a sensação que tinha era que
meu corpo entraria em combustão a qualquer segundo.
E, sem pudor algum, desci uma das mãos para me tocar, enquanto ele
investia mais pesado contra mim, triplicando a intensidade daquilo.
Eu o sentia latejar dentro de mim e o apertei mais ainda com toda aquela
pulsação enlouquecedora no meu ventre.
Meu corpo parecia ter perdido a força, eu não conseguia me mover, e Conrad
parecia estar na mesma situação.
Levou pelo menos cinco minutos para que nós nos soltássemos um do outro,
e quando ele se afastou, eu desmoronei na cama.
Aninhei-me contra ele, abracei seu corpo quentinho e aspirei seu cheiro feito
uma viciada.
— Fique — quase implorei. — Fique porque, quando você sair por aquela
porta, eu não sei como vai ser quando eu vir você.
E entendendo que era assim que tinha que ser, Conrad me abraçou mais
forte, beijou minha testa de novo e, cansados pelo sexo e pelo desgaste
emocional daquela relação caótica, nós dormimos juntos pela primeira vez,
depois de tudo.
scarlet
jurava que abri os olhos de cinco em cinco minutos para conferir se Conrad
ainda estava lá, mas acordei perto da uma da tarde, coberta, com o cheiro
dele por toda a cama, completamente sozinha.
Meu corpo ainda estava dolorido, mas quando passei as mãos sobre os
lugares onde ele havia tocado, não consegui não sorrir.
Ok, Scarlet, você sabia que seria assim — tentei me conformar antes de
colocar os pés para fora da cama.
Engoli em seco, imaginando que horas Conrad tinha colocado aquilo ali e,
com a mão sobre o peito, sentindo meu coração batendo tão forte a ponto de
fazer meu corpo tremer, tomei coragem de pegá-lo.
Eu sempre fui fascinado pelo fogo. Queria estar dentro dele, queria queimar
junto dele, e no dia em que meu olhar pegou o seu me observando, algo
mudou. Lembro-me de como suas bochechas ficaram vermelhas enquanto
você fingia se concentrar no seu livro favorito, e do meu primeiro
pensamento ao analisar você. O que me atraiu primeiro, e eu seria um
grande mentiroso se dissesse outra coisa, era que você era rara, era beijada
pelo fogo, e como eu já disse, eu sempre fui fascinado pelo fogo, então era
óbvio que ficaria por você.
Depois de te descobrir, tentei não parecer tão obcecado, mas descobri tudo
o que podia.
Seus hábitos, seus talentos… Red, eu fui a porra de um stalker para poder
conquistar você.
Ali foi a primeira vez que senti seu cheiro. Foi a primeira vez que vi seus
olhos de perto.
E, por causa disso, achei que deveria me manter longe, já que, mal tinha
virado as costas e queria voltar para vê-la, para cheirá-la… Era doentio
sentir aquilo de primeira, mas você me atingiu como se eu fosse um murro
no meio da estrada sendo arrebentado por um carro a 200km/h.
Tentei o meu melhor para te evitar. Aproveitei o início das férias para fazê-
lo, mas inconscientemente, não recusei nenhum convite para jogar bola
atrás da casa do seu avô, na esperança de você aparecer.
Thomaz brigou comigo por perder lances e não tirar os olhos do outro lado
do rio, espiando toda vez em que sentia seus olhos em mim. Mas era
impossível não ficar hipnotizado pela garota de cabelos laranjas vibrantes
que dançavam contra o vento como a chama do meu isqueiro. Lembro-me
das suas roupas, onde pisou, da sua feição.
Assisti atento à sua discussão com sua irmã assim como todos em volta. Foi
bom ter todo mundo te olhando, porque então eu seria só mais um, mas
quando você caiu, quando eu pensei na possibilidade de você se machucar,
só notei o que fazia quando te tirei da água.
Como ela se atrevia a fazer aquilo com você? Porra, eu sabia como era
viver com duas famílias destrutivas e, mesmo não querendo que aquele fosse
nosso primeiro laço, eu quis proteger você.
Fiquei tão mortalmente afetado por você, com medo de algo te acontecer,
que sai dali direto para o hospital. Fui procurar o médico
Verdade seja dita, eu já tinha te visto algumas vezes na pista de pouso, mas
sempre de capuz, sempre distante, e parecendo concentrada demais nos
desenhos que claramente te frustravam.
Admito, roubei três jogos de Isaac naquele verão e os vendi para completar
o dinheiro das tintas, para, finalmente, ter um tempo com você. Queria
entender se aquela fascinação toda era só física
Doeu não poder esconder de você a minha parte feia, o pior de mim.
Porque, acredite, Red, de onde os últimos meses saíram, não é uma porta
dentro de mim a qual você queira entrar. Ainda assim, você me surpreendeu
vez após vez em uma maturidade inesperada, em uma compaixão
impressionante, quando viu minhas feridas, parte dos meus traumas, da
maldita bagunça que eu era, e não me amou menos por isso.
por cinco anos, durante a porra do meu exílio, enquanto teorias malucas
eram formadas no fundo da minha mente, mesmo com todos os motivos que
eu tinha e que pareciam tão palpáveis para te odiar, nada conseguiu apagar
a memória de como os seus lábios nos meus, pela primeira vez, foram
capazes de aplacar parte da agonia que eu sentia. Era como, finalmente,
não ser só.
Eu estava pronto para ser o pior de mim, para ser sozinho, para ser a porra
do rei do caos, e você me desmontou. Você fez isso quando amou minhas
imperfeições, quando acolheu meus medos, quando, com todos os motivos
para me odiar, correu atrás do carro até não aguentar mais, e me
transformou na porra do vilão por não ter parado por você.
Os últimos cinco anos foram uma bagunça, não conseguiria explicar nem
que tentasse. Tudo que posso te dizer é, dia após dia, tentei te odiar, tentei
arrancar a memória dos seus cabelos, do seu maldito cheiro viciante, da sua
boca, das suas sardas e do seu olhar.
Hoje, depois de tudo, eu sei por que Isaac te queria: você é irresistível
demais para passar despercebida. Seu coração é
Eu não acredito em Deus e você sabe disso, mas se Ele não existe, como
poderia ter me enviado a porra de um anjo?
Que fique claro, Red, não quero nublar seus pensamentos, confundir seus
instintos, ou convencê-la de que não sou merecedor do seu ódio, da sua
desconfiança, da sua raiva.
Nem pense o contrário, eu fui um filho da puta, mas, se você ainda me ama,
se já consegue enxergar que não sou nenhum personagem de romances e
sim de tragédias shakespearianas, permita-me ficar. Permita-me tentar.
Permita-me convencer você de que não há outro no mundo que te mereça
como eu.
Se sua resposta for sim, se assim como eu, você não consegue e desistiu de
lutar contra, me encontre no velho galpão hoje à noite.
Estarei esperando.
Eu o queria.
E estava cansada demais para admitir, para pensar nos erros, para tentar ser
moralmente correta. Que inferno me condenaria por amar? Quem poderia
me julgar por só pensar em estar ao seu lado?
Engoli em seco, olhei para a porta da frente, voltei a encarar a carta nas
minhas mãos e soltei um suspiro profundo que levou tudo de mim.
Precisava reler aquela carta até decorá-la, até levantar todas as pequenas
dúvidas em cada letra. Até entender que aquilo não era mais uma brincadeira
sem graça para me machucar.
conrad
tenho medo de tudo que eu sou. minha mente parece uma terra estrangeira. o
silêncio ressoa dentro da minha cabeça. por favor me leve para casa.
a r c a d e , d u n c a n l a u r e n c e Eu tinha me empenhado.
O velho galpão mal parecia o lugar abandonado que encontrei depois de
tantos anos.
Jurei que, se ela não aparecesse até à meia-noite, eu iria embora e enfrentei
aquela uma hora e meia como uma das piores da minha vida.
Eu não era bom esperar. Não era bom em pedir desculpas. Eu não suportava
olhar para os possíveis erros que tinha cometido, mas esperava ansiosamente
por Scarlet, que era a manifestação de todas essas coisas em forma física.
Eu realmente achei que ela não fosse vir, mas, pouco a pouco, a felicidade de
ver Scarlet parada ali, me encarando de volta, fez com que todo e qualquer
frio corresse para longe da expectativa que aquecia minhas veias.
Mas, ainda que minha vontade fosse ir até ela, pegá-la no colo, girá-la no ar,
beijar sua boca e todo o resto, usei todo meu autocontrole e fiquei onde
estava.
— Achei que você não fosse vir — falei alto o bastante para ela me ouvir.
— Eu não sabia se devia vir. — Quando seus olhos encontraram meu rosto
de novo, ela indagou, firme, direta: — Sua carta, Conrad. Se tudo aquilo é
verdade, como é que chegamos nisso?
— Que resposta você quer, Scarlet? — Meus olhos foram sobre os dela com
toda a crueldade que sabia que escondia dentro de mim. — Porque, sabendo
que eu te traí, que queimei sua casa, e assassinei sua irmã, você ainda está
aqui — pontuei em claro e bom tom. — Você ainda é a garota com quem eu
passei a noite passada, que me esperou para tirar sua virgindade, que tentou
dar chances mesmo quando eu não merecia.
Era nítido o desconforto dela ao ouvir toda a verdade sendo jogada daquela
forma.
Scarlet engoliu em seco algumas vezes, seus dedos nervosos brincaram com
o zíper da jaqueta, e mesmo de longe, vi seus olhos encherem d'água.
— Você sabe que tudo isso é verdade — continuei —, até mesmo, porque
essa foi a realidade que você viveu durante todos esses anos. Então, me
responda, o que muda a minha versão dos fatos? Muda que você vai ter uma
justificativa para dizer que eu me arrependi, que eu que mudei, ou que eu
não fiz por mal? — Sabia que abria uma ferida em seu peito naquele
momento, mas não tinha jeito. Antes algo que eu poderia curar do que algo
que arrancaria o chão sob seus pés. — Por que você quer tanto ouvir uma
versão de fatos que só vai te magoar mais?
Seus olhos tentaram fugir dos meus por um minuto, ela abriu a boca, mas
não tinha nada para dizer, fechando-a logo em seguida.
Dando um passo para trás, vi quando a primeira lágrima rolou pelo seu rosto.
os olhos verdes quase em chamas —, acho que foi um erro vir até aqui.
coisa[10] . Estou desistindo de fugir, Red. Estou pronto para admitir que é
você quem eu quero.
velas todas, a garota de cabelos ruivos correu para mim e pulou no meu colo,
e eu, sem poder esperar, sem poder me conter, a beijei.
Beijei Scarlet como deveria ter beijado anos atrás, antes de ir embora,
deixando muito claro que não importava a distância, o tempo, as
circunstâncias, os acidentes e as perdas no caminho. Não importava nada
nem ninguém, eu era dela, sempre seria.
— Não há vida sem você, Conrad Prince. E não há romance na Terra que vá
conseguir traduzir isso.
conrad
querida, este amor, eu nunca vou deixar morrer. não pode ser tocado por
ninguém, eu gostaria de vê-los tentar. eu sou louco pelo seu toque. menina,
eu perdi o controle. eu vou fazer isso durar para sempre, não me diga que é
impossível. Oh querida, minha alma, você sabe que ela anseia pela sua, e
você tem preenchido este espaço desde que você nasceu. porque você é a
razão pela qual eu acredito no destino, você é o meu paraíso e farei qualquer
coisa para ser seu amor, ou ser seu sacrifício porque eu te amo até o infinito.
i n f i n i t y, j a m e s y o u n g
Suas mãos sobre as minhas eram novidade. Gostei do som de seus anéis
tilintando contra os meus e segurei o sorriso junto da ansiedade enquanto ela
se dava conta do que eu havia feito.
Scarlet demorou um pouco para processar, mas ao ver o que eu tinha pintado
na parede contrária da sua obra esquecida, seus dedos apertaram os meus e
seu queixo tremeu.
uma pincelada contra a parede branca. Pelo menos, era a minha ideia do
começo, mas quando acordei naquela manhã, sabia que precisava mostrar
mais.
O cheiro da tinta ainda era forte, mas seus olhos tinham os mais diferentes
pigmentos verdes, como um verdadeiro caleidoscópio a olho nu.
— Menti? — Incerto do que ela queria dizer, endireitei a postura e girei seu
corpo, fazendo a garota ficar de frente para mim.
Tão de perto, sabia que nem em mil anos conseguiria detalhar a beleza
daquele rosto direito, muito menos os detalhes daqueles olhos.
— Mentiu. Disse que não sabia pintar, que não era bom. —
Movi uma das mãos que estavam em suas costas para seu rosto, e
desenhando o contorno da mandíbula, assumi:
— Então estou pronta para saber o que mais mudou nesse tempo. — Os
olhos dela, espertos, vagaram pelo meu rosto e se
— Seu desejo é uma ordem, mas primeiro — quando a soltei para dar espaço
entre nós, vi seu peito tremer —, eu tenho outros planos.
— Então você sabe para que serve um sutiã? — Usando de toda minha
ironia, ela riu.
— Sei. Dar trabalho para ser mais uma peça para você tirar —
Não podia estragar aquela noite, mesmo sabendo que rápido ou devagar,
estar com Scarlet valeria a pena de qualquer jeito.
A visão da noite passada, dela sobre mim, me soprou que aquilo seria
impossível.
Seu rosto naquele minuto me fez entender o que queria fazer e como faria.
As mãos dela abraçaram minha cabeça. Ela me acariciou com a ponta das
unhas da nuca para cima e eu a mordi em resposta.
Uma mão na base da sua coluna, a outra nos cabelos de sua nuca, forçando-a
a me sentir, a me encarar.
Quando empurrei seu corpo no colchão e ela caiu, me diverti com a surpresa
em seu rosto.
— Mas quero tocar você também. — O modo como ela se lamentou fez meu
peito tremer.
— Eu sei, Red. E você vai, mas eu tenho uma dívida para pagar.
— É. Ninguém deveria ter uma primeira vez como a sua. Você não merecia,
amor. — Vi sua garganta afundando conforme ela engolia em seco ao me
ouvi-la chamando daquele jeito pela primeira
vez. Me divertindo com aquilo, desci o rosto para o seu colo, beijando um
pequeno caminho até perto de seu pescoço e, aspirando, soprei próximo do
seu ouvido: — É por isso que hoje eu vou te dar o que você merece
primeiro, e depois vou tomar o que quiser.
— Eu… — A interrompi:
— Vai ficar quietinha, porque se não fizer como eu mandar, vou recomeçar.
O peito dela tremeu, seu ventre também e notei que ela pressionava uma
coxa contra a outra. Quem era eu para julgá-la?
Minha cueca já estava com uma mancha enorme, molhada, e meu pau já
marcava completamente duro. Ainda assim, fui firme.
todo o cuidado para que meu lado sombrio não fodesse tudo.
Minha língua sobre a sua foi gentil, carinhosa. Seu gosto doce quase me
impulsionou a aprofundar as coisas, e quando ela arfou entre o beijo, precisei
me afastar um pouco.
Desci beijando seu queixo, cheirei seu pescoço como um viciado, engolindo
em seco minha vontade de marcá-la logo, e enquanto minha mente aprendia
que tinha muito pouco controle do corpo, já que meu pau estava pulando
para fora da cueca, cheguei sobre a peça de roupa que a cobria os seios.
As alças pretas sustentavam uma renda transparente. Não havia cor naquilo,
a não ser quando se aproximava dos mamilos. Ali havia um desenho
complicado, que segui com os dedos da mão livre, feito cuidadosamente
para esconder os mamilos, coisa que com Scarlet não parecia funcionar
muito bem, ambos os bicos
— Acertou. — Não conseguia olhar para outra coisa que não fosse seu peito
subindo e descendo mais rápido, conforme eu provocava a região com a
ponta do dedo indicador, deslizando com a ajuda do tecido, testando seu
limite. Scarlet ofegou e eu a encarei por um breve segundo. Seus olhos
estavam presos em mim e ela se remexia. — Eu gostei.
Abaixei o rosto para perto do seu seio com qual brincava e, puxando o sutiã
para baixo, liberando a visão da perfeição do mamilo rosados ainda mais
colorido pelo estímulo, soprei contra sua pele em um riso de satisfação e o
envolvi com a boca por completo.
Meus olhos escaparam para o rosto de Scarlet, vendo-a erguer o tronco para
mim, enquanto fechava os olhos e soltava o primeiro gemido daquela noite.
Meu pau pesou tanto que pensei que não fosse aguentar.
— Porra, Conrad! — ela xingou tão gostoso que quem tremeu daquela vez
fui eu.
Ofegante, começando a suar, ela mordeu o lábio inferior com força para
resistir ao meu toque. Envolvi a mão em volta de onde tinha a boca e
enquanto continuava a provocar a ruiva sugando e liberando aquele ponto
cheio de tesão, massageei seu seio até que suas pernas tentaram envolver
meu quadril.
— Não. — Deixei seu seio, descendo por sua barriga e pude ver a frustração
no rosto dela.
— Por favor… — Scarlet choramingou como uma criança e eu ri.
— Não… olhe para mim — pedi e ela puxou o travesseiro para baixo da
cabeça para fazê-lo.
— Não posso mais ouvir em silêncio. — Seus olhos queimaram nos meus.
Ela sabia o que eu fazia. — Preciso falar com você pelos meios de que
disponho neste momento, Red . — Minha adaptação ao trecho a fez suspirar.
— Você partiu minha alma. —
Eu a beijei mais para baixo, na última marca dos meus dedos em sua cintura.
— Sou metade agonia, metade esperança. — Rocei a boca até a primeira
marca de seu quadril e a beijei cuidadosamente.
— Não me diga que é tarde demais, que sentimentos tão preciosos foram-se
para sempre — soprei e parei, trazendo a seriedade com que aquilo
precisava ser dito. — Ofereço-me para você de novo com um coração muito
mais seu do que quando você quase o despedaçou há cinco anos . — Percebi
que o brilho nos olhos de Scarlet não era só tesão quando ela piscou e o
canto de seus olhos ficou molhado. — Não se atreva a dizer que o homem
esquece mais
rápido do que a mulher, que seu amor morre mais cedo. — Voltei a beijá-la,
ainda com os olhos nos seus, indo na direção do seu ventre. — Eu tenho
amado somente você, mais ninguém. — E
quando desci o rosto, finalmente, fechando os olhos ao cheirá-la sobre o
tecido que cobria sua boceta, sentindo meu corpo gritar pelo dela,
mordisquei-a e completei: — Injusto posso ter sido, fraco e ressentido
também, mas nunca inconstante. [11]
Scarlet ergueu a perna para tentar se mover, mas eu a impedi, passando sua
coxa sobre meu ombro conforme me ajeitava entre suas pernas, pronto para
prová-la mais uma vez, descobrindo que eu só fumava tanto por não ter a
boceta de Scarlet disponível o tempo todo.
Meu tesão rugiu, queimando minhas veias. Hipnotizado, eu não perdi tempo
em tocá-la com as mãos. Caí de boca em Scarlet, provando dela conforme a
lambia de baixo para cima, sentindo sua entrada contrair ao ter seu clitóris
alcançado.
Scarlet gemia, lutando para manter as mãos no alto, mas eu sabia que seu
controle estava no limite. Ele se quebrou quando, propositalmente, com os
olhos nos seus, suguei seu clitóris e o mantive sob pressão enquanto
deslizava para dentro dela dois dedos de uma vez.
Scarlet pingava, literalmente. Parecia que seu corpo sabia que precisaria de
lubrificação extra, que estava se acostumando ao meu tamanho.
Seu gosto inundou minha língua. Meu pau doía de tanto ser roçado contra o
colchão, mas ela teria que pedir. Eu a faria pedir.
— Você. — Firme, ela se afastou dos meus dedos, do meu rosto, e se sentou.
Sua voz, sua postura, não eram mais de uma garota dócil e obediente.
Ergui-me, segurando Scarlet pela cintura conforme ela vinha direto para
minha boca, sugando minha língua, se provando do melhor jeito.
Inesperadamente, fui derrubado quando ela forçou o peso para o lado.
— Não aguento mais esperar. — Sensual, quente, quase venenosa, ela pegou
meus lábios com os seus e depois me mordeu.
— Quero que me ame. — Sua mão deslizou pelo meu peito, direto para o
meu pau. Ela só terminou de retirá-lo da cueca e, erguendo o quadril,
encaixou-me na sua entrada. — Quero que grite meu nome, Conrad. Que
mostre como sentiu saudade, em como desejou estar aqui assim, pele contra
pele, sem nada mais…
Sua boceta me apertou tanto naquela troca de posição que o único jeito de
me controlar foi com a boca em seu seio. Castiguei o mamilo rosado
enquanto minhas mãos iam para sua bunda, ajeitando-a sobre o meu colo.
Ela era quente, gostosa, estreita pra caralho e eu precisei respirar fundo.
— Espere — mandei.
Sob controle da situação de novo, nos girei sem sair de dentro dela,
colocando Scarlet com as costas no colchão, e erguendo um pouco o tronco
para não perder nada, afastei o quadril do seu só para entrar devagar, até não
haver nada de espaço entre nós, enquanto eu olhava em seus olhos.
— Quero morar em você. — Beijei seu pescoço quando ela ergueu a cabeça
e soltou um gemido alto, gostoso de ouvir, que me arrepiou por inteiro. —
Quero foder você. — Saí dela quase que por completo e voltei com tudo,
batendo nossos corpos. — Dia e noite, Scarlet. — Repeti o movimento e ela
gemeu mais alto, arranhando meus braços. — Quero viver com o cheiro da
sua boceta em mim.
— Erguendo o rosto para roçar meus lábios nos dela, perguntei num rosnado
raivoso: — É isso que quer ouvir?
Ela perdeu a fala, mas fez que sim com a cabeça e me abraçou ao me beijar.
Aceitei sua língua sobre a minha, mas não poupei sua boceta, e com as mãos
em sua cintura, apoiando os polegares sobre o desenho de suas costelas, eu a
apertei contra o colchão, prendendo seu corpo no lugar, enquanto arremetia
meu quadril contra o seu, indo tão fundo nela, sentindo tão intensamente o
atrito entre nós dois, que quando Scarlet gozou daquele jeito, gritando meu
nome, precisei sair dela com pressa, ou gozaria também.
Suada, claramente sem controle do próprio corpo graças a intensidade do
orgasmo, Scarlet não fugiu quando a peguei pela garganta e beijei seu rosto
por todo canto.
Seu pulso contra meus dedos era intenso, a respiração também, e só por isso
não a apertei tanto, mas conforme ela voltava a si, começava a corresponder
meus beijos entre as arfadas, roçando suas unhas contra meus quadris.
O plano daquela noite era terminar enterrado no seu rabo, e eu faria por
merecer.
Diferente do que ela esperava que eu fosse fazer, subi em cima do seu peito,
encaixando cada joelho debaixo de seus braços, e me mantive na altura dos
seus peitos, com o pau erguido bem à sua frente. Scarlet voltou a se apoiar
nos cotovelos, me olhando desconfiada, como se esperasse que eu fosse seu
guia.
Coloquei as mãos para trás, numa forma de controle que duvidava que fosse
manter, e com minha vista privilegiada, assisti a garota sob mim se ajeitar,
me envolver com uma das mãos e depois lamber os lábios inchados,
encarando meu piercing.
Sua boca envolveu a cabeça do meu pau e ela sugou gostoso, lambendo todo
e qualquer resquício meu e dela. Quando achei que ia tirá-lo da boca, a ruiva
fez o inverso.
Bati contra sua garganta, fui pressionado por sua língua e a vi roçar os
dentes no meu comprimento enquanto tentava ir além.
Respirei fundo, ergui a cabeça, olhei para o teto e busquei por ar.
Suas mãos acariciaram minhas bolas, e quando voltei a encará-la, como uma
diaba, ela sorria. Uma de suas mãos foi para minha bunda e a filha da mãe
moveu meus quadris para frente, me forçando contra seu rosto.
Peguei os cabelos dela, prendendo tudo em uma das mãos e fodi sua boca,
gemendo de tanto prazer, vendo os olhos dela lacrimejando quando meu
piercing batia no fundo da sua garganta.
Ela engasgou na minha última investida e eu puxei sua cabeça para trás, me
movendo um pouco para baixo com os joelhos, para poder beijar sua boca.
— Eu podia fazer você engolir minha porra hoje, mas os planos são outros
— rosnei contra ela. Ganhei uma mordida em resposta. — Eu vou gozar no
seu cuzinho, amor.
Larguei seu cabelo e, com o colchão contra a parede, me sentei apoiando as
costas.
Meu pau estava tão duro, que enquanto me masturbava com uma mão,
tentando me dessensibilizar um pouco, procurei a camisinha, colocando
aquela merda, e o lubrificante anestésico que havia deixado ali no canto,
pronto para o uso.
— O que eu faço?
Chamei-a com dois dedos, fazendo um vem cá que ela obedeceu de primeira,
engatinhando na minha direção.
— De pé.
Ela se ergueu.
Movi seu corpo como bem queria. Fiquei entre suas pernas, os pés dela bem
próximos da parede, sua boceta praticamente na minha cara. Arranquei
aquela porra de calcinha finalmente, dei uma boa lambida em Scarlet
naquela posição e um belo tapa na sua bunda antes de mandar.
Ela desceu, se apoiando nos meus ombros para não cair e, enquanto com
uma mão segurava meu pau, a outra apoiava suas costas para que ela
pudesse se encaixar em mim.
no processo.
Seus gemidos eram música para os meus ouvidos.
Minha resposta foi só uma, e não houve protesto quando, com carinho,
comecei a forçar os dedos em seu rabo.
— Amor, relaxa.
Aproveitei sua distração e enquanto brincava com sua língua e lábios, abri
caminho para um segundo dedo. Quando o enfiei, Scarlet puxou o ar entre os
dentes, com meu lábio inferior preso entre eles e deitou a cabeça para trás,
forçando o corpo contra minha mão, parecendo querer mais.
— Peça.
Tirei os dedos de dentro dela, a ajudei a levantar e encarei meu pau. As veias
evidentes mesmo sob a camisinha, sob os fluidos dela. A porra da química
fazendo efeito tantos anos depois. Scarlet me deixou guiá-la, e eu voltei a
deitá-la.
— Sem isso. — O pedido era sobre a camisinha.
Deitando atrás dela, coloquei seu corpo de lado e me encaixei, mordendo seu
pescoço.
Passei um braço por seu ombro, envolvi seu seio com a mão e massageando-
o com força, rocei os dentes por seu ombro e pescoço, seguindo até
mordiscar o lóbulo da sua orelha.
Estimulando seu corpo como podia, com uma das mãos e com a boca, me
forcei aos poucos contra ela. A resistência contra o meu tamanho não era
uma novidade, mas Scarlet parecia tão excitada
com a ideia de me deixar foder seu rabo que, quando ela puxou o ar entre os
dentes e eu parei, continuou a se forçar contra mim.
Scarlet deu um grito quando dei a primeira estocada, mas não foi por dor.
Remexeu os quadris, moveu minha mão em sua boceta para que eu metesse
os dedos nela e assumiu seu clitóris sozinha.
— O que foi? — Movendo seu corpo sem muita gentileza para que ela
ficasse de barriga para cima, ergui suas pernas para os meus ombros e abri
sua bunda.
Quando me encaixei de novo sobre seu rabo, que já parecia resistente a uma
nova invasão, Scarlet abaixou as pernas, flexionando os joelhos e gritou
quando meu peso forçou a penetração.
Ela perdeu o controle final quando, com o polegar, esfregava seu clitóris.
Seu cu apertou tanto que quase fui expulso no segundo seguinte, mas travei
o quadril contra ela, sentindo minhas bolas na sua bunda. Contra aquela
pressão, fodi Scarlet até perder a razão.
Era ela.
Sempre seria.
— Por que você não tirou meu sutiã? — Foi a pergunta mais inesperada de
um pós-sexo que já tinha recebido na vida.
Eu acariciava seu rosto, sem nenhum problema de admitir que não queria
mais tirar os olhos dela, deitado de barriga para cima, só de cueca.
O sorriso que ela deu antes de esconder o rosto na minha mão e beijar a
palma me fez ficar quieto, pensando em quantos daquele não havia
perdido… E então, sem querer, acabei pensando em tudo.
— O que foi? — Notei a ruga de preocupação entre seus olhos junto do tom
de voz ameno, como se minha mudança fosse sua culpa.
— O que você sabe? — Virei o rosto para olhá-la e ela deu de ombros.
— Acho que tudo. Que John nunca foi o pai terrível que a gente achou, que
sua mãe…
— Mas precisa.
— Porque senão, vai passar a vida toda se cobrando por ter dado mais do
que ela podia retribuir. Sem ajustar tudo.
— Desculpe, eu…
— Você a perdoaria?
— Vamos ver. — Me ajeitei sob a coberta e ofereci o braço para ela, que
prontamente aceitou. Scarlet se enroscou no meu pescoço e eu a abracei.
— Ah, pelo amor de Deus. — Senti o riso em sua voz, mas ela estava
cansada. — Desisto. Amanhã a gente fala sobre isso.
— Não, Red. — A abracei com mais força e aspirei o cheiro dos seus
cabelos. — Não quero.
Era real.
Scarlet suspirou, selou a boca na minha e, gentilmente, acariciou meu rosto.
— Boa noite, Red. — Muito mais leve do que em qualquer outra noite da
minha vida, consegui dormir.
scarlet
eu ainda queimo por você, como o sol queima no céu. eu ainda queimo por
você, por toda a minha vida estive em chamas. eu ainda queimo por você.
Mas o sono só durou até eu entender que realmente estava nos braços dele.
Ele encheu os pulmões de ar. Seu corpo se pressionou contra mim e, para o
meu castigo, senti cada detalhe.
— Precisamos acordar — avisei quando ele se aninhou contra meu pescoço.
— Por acaso, você bateu a cabeça ontem e eu não vi? Tem seu pai e meu
avô. Eles nem sonham que eu saí, Conrad.
— Preciso ir para casa, me arrumar, conferir tudo e, por isso, vou na frente.
— Vou. Ou fique, mas não espere que eu volte aqui. — Fiz alguma
chantagem e funcionou.
E eu corri para o Tesla porque, se voltasse para aquela cama com Conrad,
sabia que não levantaria tão cedo, além de que, não queria que nos vissem
chegando juntos.
Uma coisa era estar entendendo, entre nós, como aquilo funcionaria.
Outra coisa era entrar pela porta da casa de John, deixando claro o que tinha
aprontado com Conrad naquela véspera de Natal.
Tirando meu avô, que parecia estar me esperando de propósito em uma das
poltronas da sala de estar assim que entrei, ninguém notou minha ausência
noturna.
Sem muitas explicações, passei por ele e fui direto para a cozinha,
conferindo se tudo estava em ordem para o almoço antes de subir para o meu
quarto o mais rápido possível.
Era como se desligasse a parte racional e eu respondesse cem por cento aos
meus sentidos, ao que sentia. Era primitivo, e tão
bom… Pena que ele era bem proporcional em tudo, e por isso, conferi
minhas partes para ver se tudo estava no lugar.
Ok, talvez eu consiga uma folga hoje. É Natal e… — A ideia morreu quando
pensei em Conrad nu. Não era ele o perigo. Era eu.
— Porra.
Como tomei banho de banheira, carreguei toda minha roupa para dentro do
banheiro, minhas maquiagens, o secador e o babyliss. De um modo
adolescente meio ridículo, em uma ideia romântica meio ultrapassada, queria
ficar bonita para ele.
Por isso, coloquei as meias pretas que iam até metade da coxa, a saia xadrez
preta e vermelha que era bem curta e precisei ajustar um pouco para baixo,
junto de uma blusa vermelha de mangas compridas.
A plataforma, também vermelha, que botei nos pés era um presente antigo
de John, e depois de várias camadas de rímel,
ainda que fosse um risco fazer parte da decoração, passei meu batom
vermelho favorito nos lábios.
Enrolei o cabelo para cair em ondas sobre as costas, passei perfume, escovei
os dentes, e conferindo minha aparência no espelho, não vi nada de errado.
Parada com a mão contra o coração, sentindo-o bater mais rápido não mais
pelo susto, estranhei a expressão fechada de Conrad.
— O que é isso, Red? — Seus olhos não estavam em mim, mas sim no chão,
enquanto ele sacudia o potinho.
— Meu remédio de ansiedade. — Me recuperei, respirando fundo. —
Inclusive, preciso de um se você vai me dar sustos assim.
Estiquei a mão e dei um passo em sua direção, mas ele afastou ainda mais o
potinho, abruptamente.
Conrad considerou algo que não consegui captar, então ergueu os olhos para
o meu rosto, sério, parecendo meio nervoso.
Conrad parou por muito tempo me analisando, então suspirou, negou com a
cabeça e colocou os pés no chão.
meus olhos, minha reação. — Posso te dar o remédio, mas em troca, quero
sua calcinha.
— Está me vendo rir? — Cruzando os braços, seus olhos nos meus diziam
que sim.
— Meu Deus, você é impossível. — Bufei, nervosa por passar por aquela
barganha inusitada. — E um tarado — reclamei, como fazia parte do jogo,
mas de repente a ideia me deixou excitada.
Ergui a saia e, querendo que ele tomasse alguma atitude, me exibi um pouco
antes de abaixar a peça.
Ele suspirou tão pesado que fui capaz de ouvir quando me abaixei.
— Filha da puta. — O xingo foi feito com um sorriso nos lábios e eu não me
importei.
— E agora?
Conrad a pegou da minha mão, enrolou nos seus dedos, e me fitando como
se fosse capaz de me foder e me matar, a cheirou.
— Caralho, Red. — Sua voz era tão forte que só de ouvi-lo daquele jeito,
meu corpo sofreu o impacto. Meus seios pareciam desesperados para que eu
os livrasse do mínimo aperto do tecido da blusa nos mamilos. Meu ventre
pulsou. — Você mal acabou de sair do banho e já está molhada?
Senti-me quente, fervendo, mas suspirei e tentando não tremer, ergui a mão
em sua direção de novo.
— Então toda vez que eu precisar tomar meus remédios, vou ter que te dar
uma calcinha? — Cruzei os braços, furiosa. Mas ele pareceu continuar
vendo graça.
Cada proposta me fazia mais molhada e irritada, como isso era possível?
Conrad colocou uma das mãos enormes bem ao lado da minha cabeça e
soprou contra o meu rosto. Hortelã, cigarros e amaciante.
— É isso mesmo que você entendeu, Red. — Seu quadril bateu contra o
meu.
pensei.
— Você perdeu o juízo? — Encarei seus olhos, seu rosto perfeito, o sadismo
em tudo aquilo. — Não posso descer assim —
choraminguei.
Enquanto seu lábio roçou por minha pele, na direção da minha boca, um dos
seus pés afastou minhas pernas uma da outra. — Ou eu vou foder você aqui,
agora. Feito a porra de um animal. E eu juro, Scarlet. — Seus lábios roçaram
os meus, tentei tocá-lo com minha língua, mas fui ignorada enquanto sua
mão livre envolvia meu pescoço. — Se eu te pegar, vou fazer você gritar
tanto e tão alto que vão chamar a polícia.
— Pense, que lindo vai ser o almoço de Natal da família Prince ao som dos
seus doces gritos, amor. — Seus dedos acariciaram minha garganta e eu
arfei.
— Boa garota. E caso fique alguma dúvida, como fez de manhã, isso é uma
punição.
Conrad se afastou. Senti a pressão no meu ventre explodir, mas calei a boca,
sabendo que não podia enfrentar aquela guerra, ainda mais naquele segundo,
segui para o corredor. E molhada a ponto de saber que estava escorrendo
pelas minhas coxas, fui expulsa do meu quarto, ciente de que aquele almoço
não seria nada do que eu tinha planejado.
sentado bem ao lado de John Prince que, como sempre, se sentou na ponta.
Eu segui para frente do meu avô e Conrad ficou com a cadeira livre entre
mim e seu pai, mas assim que me ajeitei na cadeira e contei os pratos,
estranhei que havia mais três lugares à mesa.
O almoço seguiu muito mais alegre do que eu pensei que seria, ainda assim a
preocupação sobre não ter comprado presentes para as visitas inesperadas
me atormentou. Minimamente, eu tinha feito a minha parte e o exagero na
quantidade de comida foi muito bem-vindo. Logo a música ambiente junto
do papo animado fez aquela sala ganhar vida e tentei relevar, sabendo que
Maressa compreenderia minha surpresa.
John parecia satisfeito. Meu avô, pela primeira vez, não parecia tão mal-
humorado dentro da casa dos Prince. E Conrad, me surpreendendo e
assustando, tentou pegar minha mão sobre a mesa. Eu recuei não uma, mas
sim três vezes, e notei o incômodo dele ao meu lado, bufando, ficando de
mau humor pela minha recusa.
O ar ao nosso redor pesou. Eu sabia que ele não gostava daquela minha
decisão, mas era muito errado para mim, virar para família que me acolheu
durante anos, que me viu namorar Isaac, de repente, me ver com seu irmão,
o qual eu tinha mais do que motivos plausíveis para odiar.
Tentei ser discreta, soprei um não bem baixinho, mas Conrad me ignorou.
Limpei a boca com o guardanapo de pano que estava no meu colo e quando
voltei a colocar lá, tentei afastar a mão de Conrad.
Ele me apertou com tanta força que doeu.
Todos estavam entretidos com o assunto, e ninguém sonhava que, por baixo
da mesa, Conrad afastava minhas coxas, me beliscando quando tentava
fechá-las.
Esse filho da puta não vai fazer isso.— tentei jurar para mim mesma, mas
caí feio quando seus dedos ganharam terreno por baixo da saia.
Eu quis gritar.
Ele me abriu.
Comecei a suar.
Desgraçado.
O filho da puta atacou meu clitóris sem dó. A cara fechada em uma máscara.
Mimado.
Havia outras cinco pessoas na mesa, entre elas, meu avô. Deus do céu, que
sufoco — choraminguei em pensamento.
Não ia dar. Tentei empurrar a cadeira para trás, mas descobri que seu pé me
prendia ali.
Seus olhos no meu rosto eram uma mistura estranha de fascínio e ódio.
Será que Conrad era burro o bastante para não perceber que eu não iria a
qualquer lugar sem ele?
— Pode deixar. — Dando uma piscadela para a figura paterna mais próxima
que tinha, atravessei a sala, deixando um beijo no topo da cabeça do meu
avô que estava sentado no sofá, e pegando meu casaco vermelho, pendurado,
passei pela porta de vidro e fui para a imensidão branca que era o quintal.
Vendo-me, Conrad soprou a fumaça para cima e voltou para o outro lado,
continuando a fumar.
— Porra — xinguei quando vi que ele continuaria a fingir que eu não estava
ali.
Tomando cuidado com o salto contra a neve, tremendo de frio, fechei a cara
e fui até ele.
— Conrad Prince! — gritei mais perto, acelerando o passo, mas não fez a
mínima diferença. — Caralho. — A passos de distância, gritei mais alto,
com as mãos em concha em volta da boca: — CONRAD PRINCE! ESTOU
FALANDO COM VOCÊ!
Olhei meio sem entender como suas mãos podiam me massacrar a cintura,
mesmo com toda a roupa por cima quando minhas costas bateram contra a
árvore, mas lá estava ele, furioso, tremendamente cruel, pronto para acabar
comigo.
— Você ficou doido? — Não recuei. — Você não pode me tocar daquele
jeito, na mesa! — Tentei brigar, mas ele não se abalou. Conrad continuou a
ignorar o que eu dizia. — Você está surdo?
Seus olhos estavam tão profundamente escuros que tive medo de encará-lo
por tanto tempo. As sobrancelhas grossas estavam franzidas, os olhos, meio
apertadinhos.
— Você — ele rosnou a palavra, ofegante, com os olhos nos meus como se
fosse me dilacerar. Tive medo e engoli meu atrevimento conforme seu rosto
veio para o meu. — É. Minha —
entredentes, quase como um animal, Conrad disse aquilo em uma certeza tão
absoluta que me fez engolir seco. — E você não vai embora.
— Eu…
— Porra, Red! — ele xingou, mergulhando o rosto contra o meu, com uma
mão no meu queixo, me segurando com firmeza. —
Você não vai embora. — Seus lábios roçaram contra os meus violentamente.
Não era um beijo, era um reconhecimento de território. — Você não pode ir.
— Conrad… — soprei contra sua boca, mas não tive tempo de fazer mais
nada.
— Você é minha.
— É — admiti, não sabendo se ria ou chorava. — Eu sou.
— Então pare de fugir. Pare de negar. E pare com essa ideia absurda de ir
para longe.
— Mas eu não vou. — Ele parou por alguns segundos, analisando minha
expressão, procurando a mentira lá.
Não encontrou.
envie seus sonhos para onde ninguém se esconde. dê suas lágrimas para a
maré.
wait,M83
Parei atrás do sofá, cruzando os braços, com uma guerra dentro da cabeça,
assistindo a ruiva tomar cuidado ao abaixar para pegar seus presentes.
Ela já estava com seu avô, abrindo o que parecia ser um kit de pesca.
— Feliz Natal. — Minha voz tinha pouca emoção nela, mas John pareceu
precisar conter algo na garganta. Olhou para o saco de presentes,
impressionado, e não esperou para abri-lo.
Deixei meu pai com seu novo relógio na mão e, depois de ser forçado a um
abraço meio desajeitado, segui para perto de Scarlet e seu avô.
Escolher o presente do velho foi fácil. Comprei um porta-retratos e Thomaz
me ajudou a fazer uma montagem decente dele, Scarlet e Susan.
Percebi que ela tentava pensar no que falar e, tentando fazer daquilo o menos
constrangedor possível, ofereci meu presente primeiro.
— Somos nós. — Peguei a caixinha de suas mãos que tremiam, tirei o anel
de dentro e, pegando sua mão esquerda, encaixei em seu dedo anelar,
reforçando em um tom de voz baixo que só ela ouviu: — Você é minha.
Scarlet lambeu o lábio inferior e o mordeu com força, se segurando muito
para não se jogar nos meus braços. Mal sabia ela que meu esforço era ainda
maior para não a beijar ali mesmo, independente da plateia.
Eu adorei assistir.
Mas logo, Scarlet limpou o rosto, tentando não borrar a maquiagem, e disse,
enquanto ria:
Era uma maneira sutil de bater em você. Tem todos os meus trechos
favoritos destacados.
— Obrigado, amor. — A palavra saiu com tanta naturalidade que foi uma
surpresa.
Nós nos encaramos em silêncio por um tempo e, sabendo que o final daquele
dia ainda reservava muita coisa, Scarlet sacudiu de leve a cabeça, como se
voltasse para a realidade, e engoliu em seco.
Queria fugir.
— Te espero no carro.
A primeira coisa que fiz quando Scarlet entrou no meu carro foi pegar seu
rosto entre minhas mãos e beijá-la. Intensamente.
Desesperadamente.
Aquilo não era confortável. Sentir tanta necessidade de alguém, sentir falta
mesmo com a pessoa em frente aos meus olhos. A única coisa que acalmou
meu coração foi ver que, toda aquela confusão, aquele caos, era
correspondido.
— Sinto a sua o tempo todo. — A resposta não podia me deixar mais feliz.
— Mas precisamos ir. — Selando os lábios nos meus, Scarlet se afastou e
não me deixou escolha.
Naquele momento, eu não sabia muito bem diferenciar uma coisa da outra,
mas imitei Scarlet e saí do carro, encarando a porta por onde entraríamos,
me sentindo a porra de um covarde.
— Quem é?
Rezei para ela dizer não, mas o barulho que ouvi foi o da trava elétrica
abrindo a porta.
Fechei a porta e, tentando não pensar muito, subi os degraus, um a um, atrás
dela.
A visão das pernas de Scarlet ajudou. Minha cabeça tinha maneiras muito
sujas de fugir das coisas que me perturbavam e, por
Minha mãe não respondeu, mas abriu a porta, em um claro sinal de que nos
queria dentro.
Scarlet foi a primeira a entrar. Pensei em desistir mais uma vez, mas com ela
lá dentro, não podia ser tão covarde. Meti as mãos dentro dos bolsos,
sentindo meu isqueiro lá no fundo, e acariciando a caixinha de metal, passei
pela porta na maior distância física que podia da mulher que havia me
colocado no mundo.
Eu não acreditava.
— Sozinha? — A ironia me ganhou em segundos quando, finalmente,
encarei minha mãe. Seu rosto era uma mistura de tristeza e vergonha. —
Tem certeza?
— Conrad, o que você viu aquele dia… — Ela bem que tentou me enrolar,
mas não permiti.
— Filho, eu… — Dando um passo na minha direção, ela parou do outro lado
da mesa.
Miserável. E mentiu.
— Não é isso… — ela choramingou, as mãos foram para o rosto, mas não a
poupei.
A raiva aquecia meu peito de uma maneira tão brutal que me senti dentro do
próprio inferno.
— Meu tom de voz foi ficando cada vez mais cruel. — Você tem ideia das
coisas que fiz por você? De como, depois de espancado,
praticamente torturado, eu sacrifiquei tudo o que tinha naquela época por sua
causa, pelo seu futuro e segurança?
— Então tente explicar. Tente me trazer algum bom argumento que justifique
tudo o que fez.
— Não. Mas Philip foi bom para mim, ele… — Ela se enrolou.
— E isso durou quanto tempo? Porque, desde que nós mudamos para
debaixo do teto dele, eu não consigo me lembrar nem de ele sóbrio, nem de
um bom tempo entre vocês.
— Não, você é uma estranha — vociferei. — E tem mais, quero saber onde é
que o dinheiro que meu pai te deu, por todos esses anos, foi parar. — Os
olhos dela se arregalaram ainda mais.
Nunca teria.
Tudo o que eu tinha dado, tudo o que tinha feito para a minha mãe, foi em
prol de uma pessoa que não existia. Foi para a ilusão que montei dela como
coitada na minha cabeça.
E ali, descobri que quando você vê alguém como coitada, você realmente
acredita que ela nunca vai sair daquela merda toda. Você acredita que ela é
incapaz.
E, mais do que nunca, eu sabia que todo mundo era responsável por si.
Espero que você e meu pai continuem nos bons termos, que o dinheiro que
te dei por todos esses anos a mantenha na velhice, porque de mim, não
espere mais nada. Não sou mais um garoto assustado e você deveria saber
que, um dia, eu descobriria.
— O óbvio. Que não sou como você e me orgulho disso. Tenha uma boa
vida, Caroline.
A adrenalina me consumiu.
Queria dilacerar minha mãe viva. Que o remorso e a dor a fizessem acordar
para a vida.
Mas ela tinha quarenta anos. Não era mais uma criança.
scarlet
Não consegui segurar o choro ao ouvir tudo o que Conrad sentia, e sabia que
aquela era a forma resumida. Era triste ver que Caroline não se dava conta
do que tinha feito, do que tinha perdido, do que ia perder.
antes de ver mulher desolada na porta, vendo que seu filho não voltaria
— Você o perdeu, Caroline — precisei avisar, e ela se virou para mim, sem
acreditar, sem entender a proporção das coisas.
— E como o recupero?
— Eu nunca quis ser mãe. — O choque de ouvir o que dizia em voz alta fez
seus olhos azuis grudarem no meu rosto, sedentos por continuar: — Quando
engravidei de Conrad, pensei em tirar.
Seu sorriso foi triste. — Eu queria alguém para mim. Conrad foi essa pessoa.
Era a minha pessoinha. Mas, ainda assim, ele não supria o que precisava.
Quando Philip apareceu, eu realmente acreditei que pudesse ser feliz, que
pudesse ter uma família, que me sentiria como uma mulher completa, mas a
quem eu queria enganar? Pouco
tempo, depois o vício dele com a bebida acabou com tudo, eu despejei a
minha frustração no lugar errado e acabei com a vida do meu filho… — As
lágrimas voltaram a jorrar dos seus olhos conforme ela se colocava como a
pior pessoa do mundo.
— Não. — Neguei, tirando ela daquele lugar. — Eu prefiro acreditar que
você só estava perdida. Prefiro acreditar que você era uma jovem sem
estrutura, que ninguém deu a mão e que, infelizmente, se perdeu no
caminho. — Suspirei pesado e limpei a última lágrima escorrendo no meu
rosto. — E eu não concordo com o discurso de Conrad. Eu não acho que
você seja um completo monstro, Caroline, mas acredito sim que você precisa
se atentar às consequências das suas escolhas. Philip pode estar sóbrio e
pode ser uma pessoa completamente diferente, mas o que ele fez no passado,
e como fez, sinceramente, eu não seria capaz de perdoá-lo.
— E vou colher as consequências disso. Estou pronta para isso. Mas e você?
Estava pronta para hoje? — O olhar perdido dela me respondeu que não. —
Fique bem, Caroline.
Quando eu desci as escadas, entendi que não dava para julgar ninguém. Não
dava para ditar o certo e errado na vida alheia, até porque, na hora do
purgatório, o julgamento seria individual.
conrad
iris,googoodolls.
O carro já estava ligado quando ela entrou. Meu vidro aberto, minha mão
com o cigarro para fora.
A garota entrou, deu um suspiro e, antes que eu pudesse sair, se curvou para
pegar um cigarro meu também, o acendeu, tragou e soprou pela fresta em
sua janela.
Isso aconteceu depois de ela me oferecer o terceiro cigarro. Depois de, sem
entender o porquê, eu parar o carro no acostamento perto da entrada do
velho moinho, como anos atrás.
— Que você tinha parado de fumar. — Observei de canto como era sensual
pra caralho o modo como ela dava a primeira tragada.
— Sabe como é — ela segurou a fumaça nos pulmões e então soltou pelo
canto da boca —, uma vez viciada, sempre viciada.
— Em como sua mãe não se deu conta do que aconteceu, em como você
aguentou tanto. — O lábio inferior de Scarlet tremeu quando ela desviou os
olhos para o vidro da frente, claramente segurando o choro. — Eu nunca vou
me esquecer de como te vi aquele dia. Nunca vou conseguir apagar a
sensação de impotência, de achar que, pela primeira vez na vida, eu seria
capaz de matar alguém… — Sua voz era baixa, mas seu tom poderoso.
Não consegui me controlar. Meus olhos vagaram da sua boca para as coxas
descobertas, para o lembrete de que, por baixo daquela saia, Scarlet não
usava nada, e antes que ela se desse conta, eu a puxei pela nuca.
— Ei. — Houve uma tentativa de protesto, mas cobri sua boca com a minha.
Sua língua tinha o mesmo gosto da minha e eu a obriguei vir para o meu
colo. — Conrad, porra! — ela xingou, tentando afastar o rosto do meu,
tentando fugir depois de jogar o cigarro que mal tinha acendido pela minha
janela.
Nossas respirações bateram uma contra a outra. Scarlet não me largou, não
me afastou. E enquanto começava a me acalmar, a vontade de chorar cresceu
tanto na minha garganta que me sufocou.
Quando dei por mim, estava gritando, com o rosto enfiado contra o peito
dela, sendo abraçado por Scarlet, enquanto molhava
sua blusa com as lágrimas mais intensas, raivosas e dolorosas que já havia
produzido na vida.
— Shhhhhh, isso. — Ela acariciou meu rosto, meu cabelo, minhas costas. —
Coloque pra fora, não guarda.
Das feias? Então, essa é a minha. — Liberei uma mão para limpar meu rosto
e, aos poucos, me afastei dela e me encostei de volta ao banco. — Eu não sei
ser leve, Red. — Encarei Scarlet, envergonhado, surpreso pela bondade em
seu rosto. — Não sei ser de boa na hora de transar, porque sexo pra mim é
escape, é a merda da única fuga que resolve.
— Não dá pra resolver tudo com sexo, Conrad — ela declarou como se eu
fosse uma criança.
camuflagem.
Engoli em seco.
— Conte.
— Sabe por que não fechei as costas? Por que não cobri aquelas marcas?
— Porque não quero esquecer que há feridas que nunca se curam, mesmo
que pareçam cicatrizadas. Porque, não quero esquecer que, não há beleza
perfeita, ninguém pode ter tudo, Red.
— Eu te amo — ela respondeu tão certa, tão pronta, que escorreguei a língua
por seus lábios e avisei.
— Hoje não.
Quase fiquei triste, mas então, ela me confundiu quando apertou o botão para
fechar os vidros do carro, e começou a tirar a blusa, exibindo os seios bem
na minha frente.
Engoli em seco.
— Vamos fazer amor — Scarlet anunciou tão certa que eu quis rir.
Então ela se curvou, o rosto de volta ao meu, mas dessa vez beijando minha
testa, minhas têmporas, minhas bochechas e a ponta do meu nariz antes de
tocar os lábios nos meus.
Ela.
Sua boca era um bálsamo. Não havia beijo melhor e eu deixei que ela me
guiasse, sem arrependimento algum quando Scarlet lentamente moveu a
cabeça, dançando com minha língua contra a sua e gemeu baixinho ao se
encaixar direito no meu colo.
Engoli seu suspiro, bebi da tortura de saber que, sob aquela saia não havia
nada, e que a única coisa que nos separava agora eram minhas roupas.
Contive-me.
Segurei com firmeza em sua cintura, acariciei suas costas, e conforme ela
começou a se roçar contra mim, me deixando duro pra caralho, arfando
contra minha boca, liberei seus lábios e desci por seu pescoço.
Scarlet segurou com firmeza nos meus ombros e depois seguiu para acariciar
minha nuca, meus cabelos, guiando meu rosto para onde ela queria ser
beijada, e pouco a pouco, como ela comandava, seu seio estava na minha
boca, um dos bicos duro contra minha língua, e eu não resisti.
Ela balbuciou meu nome uma porção de vezes, incentivando, pedindo mais.
Sem tirar a boca de seu corpo, com uma das mãos desci um pouco meu
banco e fiquei mais inclinado, voltando as mãos para as
— Está assim por mim, amor? — ela provocou quando, com ambas as mãos,
me segurou com firmeza e me encarou ao começar a me masturbar.
— Acho que você deveria conferir como me deixa molhada também. Acho
que deveria meter seus dedos em mim como fez mais cedo, que deveria me
fazer gemer, assim, bem aqui…
Scarlet melou minha mão toda quando a tateei. Os lábios externos estavam
lambuzados por todo aquele esfrega-esfrega, e os internos, inchados,
fizeram-na tremer quando os acariciei.
O primeiro gemido baixinho veio soprado contra minha pele.
Seu rosto voltou para o meu. Minha mão livre se encaixou em seu rosto.
— Amor, a camisinha…
— Não gosto. Quero você assim. — E, fodendo com tudo, me fazendo ver
estrela, Scarlet tomou conta do que faríamos, me impedindo de fazê-la
mudar de ideia quando esfregou a cabeça do meu pau contra sua boceta toda
e, quando atingiu sua entrada, sentou de vez.
Começou por conta e risco a cavalgar, escorrendo tanto sobre meu pau, tão
molhada, que sentia escorrendo por minhas bolas.
Aquilo era difícil de conter. A visão dos seus seios pulando, excitados. A
maneira como ela me olhava, sua boca entreaberta, gemendo.
gostou.
A filha da mãe desceu uma das mãos para se tocar enquanto continuava a
mexer os quadris naquele ritmo e, então, piorou tudo quando, me vendo
completamente rendido, ela pediu:
Ela se deitou contra o volante que, por sorte, com as modificações que eu
havia feito, não tinha a buzina no lugar tradicional. Seus peitos dançaram na
minha frente e não resisti.
E ali, em seu seio, dentro dela, no momento mais íntimo e fodido que
poderíamos ter, recitei, marcando aquelas palavras em seu corpo:
Passado o cataclisma, Scarlet deitou sobre mim. Suada, cansada, mas feliz.
Eu sabia que quando saísse dela, meu gozo e o seu escorreriam por suas
pernas e, como a porra de um doente, fiquei excitado.
— Quando você comprar um carro maior. — Ela tremeu contra o meu peito,
rindo, e achando que estava brincando, se esticou para beijar minha boca.
— Ainda bem que eu gosto de vários livros, assim isso pode durar para
sempre.
Para sempre.
— Escute — chamei por ela da janela, depois de ganhar alguns tapas para
deixá-la descer. Scarlet, voltou e, segurando a saia para cobrir a bunda, se
abaixou.
— Quero que fique com isso. — Respirando fundo, cacei meu isqueiro no
bolso e ofereci.
— Por que está fazendo isso? Eu sei que é algo importante para você…
Scarlet sorriu tão abertamente que não pude não sorrir de volta.
— Não vou.
Quando deixei os portões da mansão Prince, ela ainda estava lá, na neve,
acenando.
Por um minuto, me deu uma vontade do caralho de dividir o teto com meu
pai.
conrad
em algum lugar no final, seremos todos loucos por acreditarmos que uma luz
poderia nos salvar do túmulo que está no fim de toda essa dor.
Mas meu pior pesadelo foi virar e ver as portas do closet abertas.
— O que foi?
— Tudo, porra. Entraram no meu quarto, não tem mais nada aqui. Meu
laboratório está destruído, minhas coisas… — Quis gritar de raiva e soquei a
madeira do fundo falso que ainda se mantinha no lugar.
— Você suspeita…
— Ah, pai, acorda! Você sabe quem foi. E eu vou atrás de Thomaz agora.
pode pegar suas coisas e voltar para cá? Não quero você sozinho aí.
— Estou indo.
Não queria pensar na possibilidade de ter Thomaz como inimigo. Não ainda.
Eu queria sim descontar a frustração do dia em sexo, mas tinha que ser com
ela.
— Faz quinze minutos que ele desceu para pegar uma água, e subiu. — Me
encarando um pouco perdida, ela tentou de novo: —
Como eu falaria para ela que não? Que eu era um produtor de droga,
inclusive, da que ela consumia, e que tinham roubado meu estoque e eu não
pude ir até a polícia?
Passando por ela, evitando tocá-la, ou sentir seu cheiro, porque sabia que se
fizesse alguma dessas coisas, acabaria com a boca na sua boceta ou meu pau
enterrado nela, passei por trás do sofá, sabendo que Scarlet me seguia com
os olhos enquanto eu subia as escadas correndo.
Não pensei duas vezes quando segui até o final do corredor, pronto para
entrar no escritório. Eu não bati na porta. Meu pai não esperava isso de mim
e, definitivamente, não foi um problema. O
que me surpreendeu foi que John Prince parecia genuinamente preocupado
comigo quando nossos olhos se encontraram.
— Você está bem? — Ele nem esperou eu fechar a porta por completo. —
Viu alguém ou alguma coisa?
— Sabemos que foi ele, não vamos negar, mas se fez não, fez sozinho. O
que sabe de Thomaz, o filho?
— É uma boa pergunta. Como eu te disse, Thomaz acabou vazando para seu
pai que era eu quem produzia a nova droga. Ele não parecia muito
interessado na Star, na verdade, ele nem a citou.
— Thomaz andou fazendo coisa errada. Nos últimos tempos, veio com um
papo de que a droga era muito cara comparada às outras do mercado e me
repassou o valor diferente, dizendo que era o que tinha conseguido, mas,
misteriosamente, da última vez em que vi sua esposa, ela tinha um diamante
do tamanho do meu punho entre os seios.
— Está sendo roubado pelo seu traficante, papai? Achei que esse ramo tinha
mais lealdade envolvida — provoquei e ganhei uma olhadela cruel de John.
— Nós dois sabemos que não devemos confiar nem mesmo no nosso sangue,
quanto mais nos estranhos. Eu te disse que tinha gente perigosa envolvida. O
meu jeito de te proteger delas era me
envolvendo. E eu não dependo da venda de drogas para porra nenhuma,
Conrad, é só você olhar bem à sua volta. — Ele parecia bravo, com alguma
razão, e fui obrigado a engolir a vontade de xingá-lo.
— Então me explique, porque não fui eu que organizei essa minha volta para
cá. Foi você quem foi me buscar. Foi você quem me trouxe. Esse discurso de
que queria me proteger não faz muito sentido quando penso nisso.
Meu pai segurou uma risada debochada, girou a poltrona para ficar de frente
para mim e indicou a poltrona na sua frente.
Cheguei até a fazer empréstimos para eles, tudo para manterem um padrão
de vida que não conseguiam mais. Há alguns anos, Thomaz pai, me
perguntou se eu não queria entrar no seu novo esquema de distribuição de
erva pelo país, já que eu poderia facilitar a abertura na faculdade. Segurei
isso por muito tempo, até porque, meu filho,
mesmo com você longe, eu sabia do que você fazia. Sua mãe, toda vez que
ia visitar você, vinha aqui pedir dinheiro na ida e na volta, e contava
orgulhosa dos seus progressos financeiros. Principalmente, do medicamento
que você arranjou para ela. E apesar de você não acreditar, Conrad, eu cuidei
das lacunas para que se alguma hora precisasse, tivesse como te defender. —
Não consegui ver mentira naquilo. — Enfim, não vou ser falso agora e dizer
que não me interessei no que sua droga, a Star, podia fazer quando me
explicou sobre ela. A rigidez dos estudos na Prince University sempre foi
algo que levei a sério e a chance de ajudar meus alunos fez meus olhos
brilharem, sim, sem dúvida alguma. Mas, quando na alta sociedade começou
o burburinho sobre algo novo na França, eu desconfiei que era de você que
falavam e me enfiei no esquema. Quando tirei os holofotes de você, todo
mundo pensou que eu estava mantendo o produtor preso em algum lugar,
mas agora que Thomaz sabe, sinceramente, estou preocupado com sua
segurança física.
— Não está com medo disso respingar em você? Na sua vida social?
— Não. — Com uma paz que nunca pensei ver em seu rosto e ouvir em sua
voz, ele continuou: — Mas, não estou disposto a ver
Quão fodido eu devia estar para admitir que realmente acreditava naquele
discurso?
— Primeiro, preciso que me diga o que você acha que ele queria. Se eles
destruíram seu quarto, sabendo onde ficava o laboratório, se reviraram tudo,
estavam buscando algo, alguma fórmula.
— Por quê?
— Porque, papai, não existe isso em forma física. Queimei anos atrás. A
receita está aqui. — Bati com dois dedos contra a têmpora. — Se eles
quiserem, vão precisar abrir meu cérebro para arrancar.
Aliviado, meu pai passou as mãos pelo rosto e relaxou contra sua cadeira.
— Ótimo, sendo assim, fique aqui nos próximos dias, até que eu entenda em
qual terreno estamos pisando.
A primeira delas é que Scarlet se tornou uma filha para mim, então faça o
favor de cuidar dela, inclusive, sobre uma gravidez não desejada. — Eu
estava pronto para mandá-lo cuidar da própria vida e que ele não era um
exemplo sobre aqui, mas com a mão erguida, ele me calou e continuou: — A
segunda coisa é que seu irmão em breve estará de volta. E você sabe do que
Isaac é capaz.
— Apesar do seu gênio, você nunca me deu trabalho, mas seu irmão, por
outro lado? É uma bomba relógio. Preciso mantê-lo perto para saber a hora
de desarmar. Estou te avisando porque quando ele souber que você e Scarlet
estão juntos, ele vai tentar pegá-la de volta.
nosso amor está a sete palmos abaixo da terra. eu não posso deixar de me
perguntar: se o nosso túmulo fosse regado pela chuva rosas floresceriam?
Era bizarro como meu sono havia mudado com ele por perto, em equilíbrio.
Se bem que, eu não podia deixar de me dar os créditos por ter deixado certos
fantasmas trancados em seus túmulos. Um deles, o mais assustador, a culpa,
era a que menos me assombrava agora.
Como acordei com a cama vazia, realmente acreditei que Conrad tinha ido
embora, mas foi só acordar e sair do quarto para ir tomar café, que qualquer
sono que ainda restava no meu corpo sumiu.
— Você ficou. — Minha voz saiu mais grave, ainda meio sonolenta. Aquelas
eram as primeiras palavras do dia.
— Desculpe, Red. Até fui ao seu quarto, mas você dormia tão
profundamente que desisti de te acordar.
— Até podia, mas ontem… — Ele suspirou, desviando o olhar do meu corpo
para a janela que dava para o quintal, parecendo não ter superado algo.
— O que aconteceu? Já pode me contar? — Curiosa, imitei sua posição e
esperei.
— Ah, garoto… — Revirei os olhos, pronta para descer, mas ele me pegou
pela cintura, me puxando contra si, me abraçando com tanta força que não
pude manter qualquer distância.
— Eu sei, mas acredite, é para o seu próprio bem. — Seus dedos acariciaram
minha cabeça e ele me beijou no topo da testa.
— Não gosto quando decidem por mim, assim como você também não. —
Tentei não ser muito dura enquanto ouvia seu
— Achei que você tivesse entendido que não vou embora. Não posso. Estou
eternamente presa a você.
— Então faça isso. Eu vou ajeitar algumas coisas e, mais tarde, nós
conversamos longe daqui. O que acha? Podemos sair?
— Qualquer lugar, desde que você use uma saia. — Conrad me fez rir
enquanto me afastava.
— Nem pense.
— Ah, eu penso nisso e em muito mais, mas fique tranquila, desta vez tenho
outra coisa em mente.
— Sempre soube. E gosto muito dele. É mais decente do que aquele outro.
Não gosto daquele menino. — Sua carranca se fechou
ao falar de Isaac.
— Vovô, Isaac…
— Não era pra você. — E orgulhoso, encerrando o assunto, ele abriu a porta.
— Ei, eu não terminei de falar. — Minha bronca era uma piada, da qual ele
riu quando me olhou de canto.
Digitei uma mensagem para Conrad, avisando que estava voltando, e segui
pela estrada o mais devagar possível, já que a neve continuava caindo. Foi
por culpa da velocidade baixa que não
pude ignorar o rosto de Thomaz, na neve, pedindo ajuda com seu carro.
Ele realmente não merecia, mas como era o melhor amigo de Conrad…
— O que aconteceu?
— Meu carro não quer ligar. Acha que podemos tentar algo com a bateria?
— Eu não entendo nada deste carro… — Tentei não ser tão cuzona. — Quer
uma carona? Assim você e Conrad podem voltar e ver o que aconteceu.
Parecia ok.
Por trás de mim, Thomaz colocou algo contra meu nariz e boca.
Eu me desesperei.
— Não lute, Scarlet. Não lute, por favor. Eu não quero te machucar.
Eu não queria morrer, eu não queria… Mas tudo ficou escuro demais.
conrad
diga adeus enquanto nós dançamos com o demônio esta noite. não ouse
olhá-lo nos olhos, enquanto nós dançamos com o demônio esta noite.
dancewiththedevil,breakingbenjamin
Pode ser a nevasca — pensei, olhando pela janela para ver o tempo fechado
lá fora —, mas ainda assim…
Não pensei muito quando, depois de duas horas e uma agonia crescente, ela
ainda não tinha chegado. Peguei o celular de cima da mesa e disquei o
número do meu pai.
John também havia saído cedo e até agora não tinha dado notícias. Dados os
últimos acontecimentos, nada parecia tão aleatório assim.
Estava pronto para sair com meu carro e ir atrás dela pela estrada, quando
meu telefone tocou. Tirei do bolso sem nem olhar quem era, já levando ao
rosto, na expectativa de ouvir a voz de Scarlet, mas não foi o que eu
esperava.
— Bella, desenrola.
— Thomaz estava esquisito, muito esquisito. Falando sobre tomar decisões
que podiam me decepcionar, que podia fazer você querer matar ele… Que
porra tá acontecendo?
— Você o viu?
— Ele veio me ver no dia vinte e três, de manhã. Me trouxe presente, mas
foi embora logo, estava esquisito e… Conrad, que merda tá acontecendo?
esperava que eu ficasse com ele, mesmo assim… Eu não entendi direito, até
ele perguntar se, entre ele e você, com quem eu ficaria.
Eu disse que não precisava escolher, que os dois eram meus melhores
amigos e eu não tinha que decidir nada. Ele ficou todo estranho, falando que
eu precisaria pensar logo, que o futuro estava chegando, que ele não tinha
opção… Conrad, ele estava muito louco! Parecia que ia pirar. Hoje eu
acordei com essas mensagens de voz dele, escute.
— Gata — a voz mole de Thomaz estava pior, com certeza ele estava
chapado. —, eu vou fazer uma merda hoje… Eu não tenho escolha. Ou é
isso, ou… — A mensagem acabava ali.
— É só isso?
— Eu espero que você não me odeie se eu precisar ser o monstro que minha
família precisa que eu seja. Eles precisam de mim, Bella. Eles precisam que
eu seja homem. — Ela mexeu no celular mais uma vez, seguindo para a
última mensagem. — Conrad vai me matar se tudo der errado, porra.
— Acabou? — confirmei.
— Agora acabou. E ele não atende minhas ligações, nem visualiza minhas
mensagens. Porra, eu tô com muito medo! — ela gritou dentro do carro.
— Ele ameaçou Scarlet. E ela saiu cedo para levar o avô de volta ao asilo e
não voltou até agora.
Eu vou descer, e você vai ligar para Thomaz. Insista até ele atender.
Meu único passo agora era ir atrás dele. Caçá-lo como nunca pensei na vida.
— Nada?
— Conrad…
— Se ele fez o que eu acho que fez, sou eu quem vai acabar preso… — E
não por mexer com drogas, mas sim por assassinato.
E a única coisa pela qual eu pude agradecer aos Craig era pela porra do
portão aberto, já que eu teria atropelado aquela merda com meu carro, caso
ninguém abrisse.
Parei de qualquer jeito logo na entrada, desci do carro e Bella veio atrás de
mim.
Quando cheguei em frente à porta, eu não bati.
Eu esmurrei.
E então, com cara de poucos amigos, Virgínia Craig abriu a porta, pronta
para me dar uma bronca.
Não pensei duas vezes. Minha mão seguiu para o pescoço da mulher e seus
olhos se arregalaram enquanto eu a empurrava conforme entrava.
— Isso é só uma amostra grátis do que vou fazer com vocês, se Scarlet
estiver machucada. Onde está seu filho e aquele merda do seu marido? —
vociferei contra ela, dando uma sacudida em seu corpo que a fez entender
em que página estávamos.
— Largue ela, Conrad. — Era a voz do Thomaz pai, que vinha descendo as
escadas.
— Filho. — A voz do meu pai me fez olhar para a sala, e sentado em uma
poltrona, um pouco descabelado e visivelmente cansado, com um roxo no
olho, ele pediu: — Solte-a. Scarlet está bem.
Só então eu recuei. Joguei a mãe do meu melhor amigo para trás, e mirei
meu pai.
— Júnior — aquele nome nunca foi aceito pelo cara que chamei de melhor
amigo ao longo da vida — está cuidando dela lá fora, no carro, você não os
viu?
Parei no lugar, meu corpo tremendo de raiva. A realidade de que eu era, sim,
capaz de matar alguém por ela exalando de cada poro meu.
mas então, ele tirou a mão de trás das costas, exibindo uma arma preta, bem
lustrada.
O vidro escuro não me deixou enxergá-lo, mas só pela olhada que dei, ele
sabia, ele sentia, que quando colocasse minhas mãos nele, não sobraria nada.
— Traidor — disse com clareza, querendo que ele fosse capaz de ler meus
lábios enquanto entrava no carro.
— Meu Deus, meu Deus, meu Deus! — Bella surtou dentro do carro. —
Todo mundo enlouqueceu nessa porra?
— Eu não devia ter trazido você. — Ela seria meu pior empecilho na hora de
acertar as coisas com Thomaz.
Liguei o carro, esperei meu pai sair pelo portão e, mantendo uma distância
segura, conferindo se Thomaz me seguia, caí na estrada.
— Nem pense. Eles podem forçá-la nos ameaçando. Se ela mentir e nós
errarmos, estamos fodidos.
— Eu não sei o que fazer, não sei o que fazer…. — Bella olhou para frente e
eu mirei seu rosto por um segundo. E foi minha vez de assustar. O olhar
aflito e desesperado dela, seu grito com meu nome, me fez olhar para frente
no último segundo.
Era um tiro.
E no segundo seguinte, meu pai jogou a Dodge na contramão.
scarlet
quando os anjos caem com as asas quebradas eu não posso desistir, eu não
posso ceder. quando tudo está perdido e termina o dia, eu te carregarei.
Na verdade, ele parecia tão drogado, tão absorto, que tive medo de continuar
dentro daquele carro. Eu não queria morrer. Não queria mesmo morrer.
Seu carro era um Jeep alto, escuro, que cheirava à maconha tão forte que
piorava tudo o que eu sentia.
Seu cheiro tinha medo também, mas eu não queria tentar compreendê-lo.
Esfreguei os olhos, travei os polegares dentro das palmas para tentar conter
aquela sensação maldita, e os abri, me forçando a ficar acordada e ciente de
tudo à minha volta.
Só queria sobreviver.
Sem muita ideia do que acontecia, com mil teorias na cabeça, tentei mais
uma vez arrancar alguma informação do garoto que passei a vida odiando e
que deveria ter deixado no meio da estrada.
— Vomita aí no chão.
Meu coração bateu rápido, mas o tempo à minha volta correu devagar.
Era John!
Mas meus pés pousaram no chão tão suavemente que mal pude acreditar.
O cheiro dele me acalmou, e quando dei por mim, estava contra o peito de
Conrad, suas mãos vasculhando meu rosto, meu corpo, desesperado.
— Ei, garota, tá tudo bem. — A morena chorava, vindo até mim, pronta para
soltar minhas mãos.
— O que tá acontecendo?
— Uma porra muito fodida. Vem. — Ela me pegou pelo pulso, me
obrigando a correr junto dela na mesma direção para onde Conrad tinha ido.
Quase caí uma porção de vezes. Minha visão estava embaçada pelas
lágrimas que começavam a ganhar força, mas fui capaz de ver Conrad no
que um dia foi o vidro do carro do pai. O
conrad
nesta despedida não existe sangue, não existe álibi, porque eu estava fadado
ao remorso da verdade de milhares de mentiras.
Metade de mim havia se quebrado de uma forma que pensei ser incapaz de
sentir.
John Prince e Thomaz Craig pai eram nada além de partes de metal e carne
embebidas em sangue, e eu vi tudo, cada detalhe. A cor, a bagunça, o cheiro.
— Fique aí.
Quando me virei, encontrando o cara que tinha sido mais minha família do
que meu sangue, tudo virou um borrão vermelho.
No meu primeiro soco, tão forte que tive certeza de que lhe quebrei alguns
dentes, ele caiu.
Eu queria matá-lo.
Eu ia matá-lo.
Sabia que as mãos delas estavam sobre mim, tentando me puxar pela roupa.
Mas não era nada quando tudo o que eu via era o rosto de Thomaz virando
uma massa vermelha sob meus punhos.
A ruiva, muito menor e mais fraca do que eu, fez um esforço sobre-humano
para me derrubar para o lado. Ela chorava com as mãos no meu rosto,
tentando me trazer para a realidade. Bella chorava, conferindo se Thomaz
estava vivo. E enquanto eu caía em mim, enquanto o som do carro de polícia
vinha, enquanto minhas mãos esfriavam sobre a neve na estrada, eu gritei.
Desesperadamente.
Dolorosamente.
E caí de cara no colo de Scarlet, sabendo que aquilo seria mais uma daquelas
malditas feridas invisíveis. Nada curaria. Nada faria melhorar.
Sou…
— Ótimo. Por que você não pega Scarlet e vai para casa?
— Eu…
— Ótimo. Então vão. Eu vou cuidar das coisas aqui e, mais tarde, ligo para
vocês.
— Você vem?
Não respondi.
Por mim, ele podia ir para a casa do caralho. Para o mais profundo inferno.
scarlet
estou tão cansada de estar aqui reprimida por todos os meus medos imaturos.
s se você tiver que ir embora, eu queria que você simplesmente fosse, porque
a sua presença ainda permanece aqui e ela não me deixa em paz. essas
feridas parecem não se curar, essa dor é muito real e existe muita coisa que o
tempo não pode apagar.
Só sentia que a queda ainda não estava na metade. Só sabia que, quando
chegasse ao fundo, não aguentaria o baque.
Eu não permitiria.
— insisti.
— O que Caroline tinha a ver? — Quando saí daqui, minha maior distração
era estudar. Eu não queria ser um fodido, não queria depender do meu pai...
— ele pausou, tomou fôlego e continuou
— De todo meu estudo, nasceram a Star, o medicamento que minha mãe usa
e que melhora a concentração como você pôde experimentar. E a
Supernova…
Ele tentou me comprar, para fazer uma produção por fora, para ele, mas eu
disse não…
Bati com a testa contra o vidro e voltei a encarar a neve lá fora, concluindo a
história de Conrad.
Desprendi meu cinto, abri a porta, e mesmo com ele me chamando, segui
correndo para dentro de casa, para o meu quarto, para a minha cama,
enquanto sentia que meu mundo estava se partindo, mais uma vez, e a
imagem do carro de John sendo arrastado cobriu meus olhos.
pois, estou quebrado quando estou aberto e não sinto que sou forte o bastante
pois, estou quebrado quando estou sozinho e não me sinto bem quando você
vai embora.
Por um segundo, pensei que, se Deus existisse mesmo, será que Ele tinha
colocado o mundo no mudo? Se ele tivesse feito isso mesmo, será que tinha
me poupado de um último grito do meu pai?
John Prince, o monstro que viveu no meu armário por muito tempo, tinha
morrido.
Mas, se tinha sido tudo tão ruim assim, se eu o odiava tanto, por que é que
doía daquela forma massacrante?
Não tinha.
Ele estava morto.
O modo como ela havia saído do carro ao ouvir toda a verdade, a maneira
como correu de mim… Caralho, aquilo me destruiu.
E, naquele segundo, eu era a pessoa magoada por não ter tido um pingo do
amor que sonhou e o adulto que só sabia que abrir a porta para qualquer um
machucava.
Pensei em Bella, perdida, com medo de eu encarar sua última atitude como
traição.
E pensei em Isaac.
Morria a única pessoa que podia atestar que eu não era um completo
desgraçado.
chão, o sangue de Thomaz nas minhas mãos ainda escorria pelo ralo.
De mim, eu não sabia o que sobraria.
Que aquele vazio, o qual ignorei por tanto tempo, parasse de crescer e tentar
me engolir.
Que eu não precisasse olhar para o fato de que, por toda a vida, tentei
mostrar para meu pai que não precisava dele e que seria melhor e maior do
que ele e sem sua ajuda, só porque o odiava por não ter me amado.
Porém, se não me amava, por que ele tinha feito tudo o que havia me
explicado na noite anterior? Se não me amava, por que é que John Prince
tinha dado a vida por mim e por Scarlet?
Foi por isso que não entendi quando ouvi a porta do banheiro abrir.
Achei que Scarlet não falaria comigo. Achei que ela me deixaria
completamente sozinho.
E eu merecia.
Mas não.
Continuava sendo um covarde. Não queria ver rejeição ou mágoa nos olhos
dela.
Não podia…
Enxerguei seus joelhos, seus quadris, parte dos seus seios, mas não seu rosto.
Destruiu de forma tão visceral, tão pesada, tão intensa, que eu a agarrei com
força e tremi de tanto chorar. Ela não reclamou, fazendo igual. E esperamos
juntos, até que os escombros do que havia sobrado de nós dois ficasse visível
para começarmos a nos encaixar.
scarlet
eu só quero congelar, posso te dar mais do que você quer. agora eu vejo você
parada sozinha, eu nunca pensei que o mundo se transformaria em pedra.
então me chame de idiota, me chame de triste, você é o melhor que já tive,
você é o pior que já tive e isso continua fodendo com a minha cabeça.
Eu não queria mais me sentir sozinha, e ali, contra ele, era mais fácil ver que
não estaria.
Sua mão veio até o meu rosto e seus dedos se embrenharam no cabelo
molhado.
— Nunca.
Eu queria seu lado feio. Queria seu pior, e me coloquei de joelhos entre suas
pernas, pronta para pegar seu rosto entre as mãos, para beijá-lo, para fazê-lo
meu.
— Scarlet, porra! — Ele me sacudiu, mas não parei. Forcei as mãos até que
ele parou de lutar contra, até que, finalmente, seus olhos escuros e profundos
acertaram os meus.
Queria tudo e cada parte dele. Soltei sua boca para beijar sua garganta,
empurrando seus ombros contra a parede, forçando-o a olhar para cima.
— Scarlet, não, porra! — Ele tentou brigar, mas seu pau já duro entre nós
era o recado claro de que ele não queria parar.
— Por favor, não — pedi, roçando os dentes por suas clavículas, me
apoiando nos joelhos e erguendo o corpo,
Ele ainda chorava. Os olhos estavam vermelhos, sua expressão era triste.
Acariciei seu rosto com a ponta dos dedos, desenhei suas maçãs do rosto,
seu nariz, seus lábios. Ele chupou meu dedo e eu sussurrei:
E ele obedeceu.
argola de metal, depois meu bico rijo. Seus dentes, seus lábios, o calor do
toque, a textura, tudo.
Eu podia gozar só daquele jeito, mas Conrad não era dado a serviço pela
metade.
Seus dedos, brutos, não se preocuparam com meu clitóris que pulsava, com
meus lábios inchados. Eles entraram em mim com força, brutos, rápidos,
forçando meu corpo a se adaptar ao ritmo do movimento que pressionava
minhas paredes internas.
O que precisava. E como na minha primeira vez, ele fez de mim o que
queria.
Sua boca acertou a minha, a água do chuveiro nos molhou o rosto e eu bebi
dele.
Fugi de seu colo mesmo com Conrad tentando me fazer ficar, mas suas mãos
escorregaram na minha pele molhada. Eu o obriguei abrir as pernas, e
apoiando os cotovelos no chão de pedra, ficando meio que de quatro, segurei
seu pau com firmeza, cuspi sobre a cabeça, melando o piercing e depois de
envolvê-lo com a língua, espalhando saliva por sua extensão, olhei em seus
olhos e o abocanhei ao máximo.
Saliva escorria pelo meu queixo, mas ele esfregou os lábios nos meus,
mesmo assim.
— Gosto quando me xinga — falei entre o beijo e ele arfou contra minha
boca enquanto se masturbava. — Gosto quando me machuca.
— Então engula meu pau, minha putinha. — Ele me desceu, dessa vez
segurando seu membro na base e o enfiando ao máximo na minha boca.
Daquela vez, eu engasguei, mas Conrad não me liberou tão fácil. Parecia que
a contração que minha garganta fazia era gostosa e eu tentei mantê-lo ali até
não aguentar mais.
Sua mão aliviou um pouco o peso contra minha cabeça e, para me recuperar
um pouco, investi em tocá-lo, masturbando-o enquanto fazia movimentos de
vaivém até senti-lo no limite.
Eu queria responder que sim, mas ele me deu um tapinha leve no rosto.
Ergui os olhos para vê-lo. Seu rosto era uma máscara de fúria e prazer
descarado.
— O que eu disse? Toda vez que você tiver meu pau na boca, eu quero que
me olhe. Quero que veja o que faz comigo, Red, como me deixa duro, como
me deixa louco…
— Hoje eu quero gozar nessa boca, mas antes vou comer essa boceta.
Ajudando-me a ficar de pé, ele ergueu os joelhos para me apoiar as costas e
quando fui descer sobre seu corpo, Conrad me segurou, me abraçando com
força ao mesmo tempo em que mordiscava meu mamilo esquerdo com força.
Com uma das mãos ele brincou, roçando o piercing contra minha extensão,
provocando meu clitóris e se melando na minha entrada. Quando o
desgraçado fez aquilo pela quinta vez, me forcei para baixo e ele riu contra
minha pele.
— Não conte com Ele agora, amor. — Conrad mordiscou meus lábios. — Só
tem eu aqui — e descendo devagar, me fazendo ofegar a cada centímetro
que deslizava para baixo —, eu e essa bocetinha apertada, gostosa, molhada
— ele me soltou de propósito, seu pau bateu no fundo, eu perdi as forças
gemendo
contra sua boca — e minha. — Ele concluiu: — Senta gostoso pra mim,
Red.
Meus gemidos ganharam ritmo e volume, minha boca escapou da dele, mas
seus dentes deram uma última puxada no meu lábio inferior antes de descer
ao meu pescoço.
O jeito como Conrad cravou os dentes na minha pele antes de me dar uma
bela chupada me diziam que eu acordaria com marcas na manhã seguinte.
Com a água caindo sobre minhas costas, me ajeitei como antes na sua frente
e, enquanto ele se masturbava, mantive a boca aberta, a língua de fora,
provocando a ponta inchada de seu pau, obediente como ele queria que
fosse, com os olhos presos aos dele.
Quando o primeiro jato de porra veio sobre minha língua, cobri toda a
cabeça vermelha com os lábios e suguei cada gota dele, até seu corpo parar
de tremer, até senti-lo relaxar.
E quando acabou, quando finalmente toda aquela agitação diminuiu, Conrad
me puxou para seu colo, roçou os lábios nos meus
e soprou:
— Você é tudo.
O beijo com o gosto dele na boca foi o melhor de todos, o mais carinhoso, o
mais cúmplice.
scarlet
estou tão cansada de todo esse azar, ouvindo mais um: mantenha sua cabeça
erguida. isso nunca vai mudar?
y o u d o n ' t k n o w, k a t e l y n t a r v e r.
Demorei para me localizar, mas quando entendi tudo, foi inevitável não
sentir aquela porcaria de tremor no peito. Fazia três dias desde o acidente.
Desde que tudo tinha mudado. Desde que a polícia e o advogado apareceram
em casa.
A polícia pedindo detalhes do acidente, o advogado para avisar que Isaac
seria avisado e chegaria em breve para o velório
Faltavam dois dias para a virada do ano. Seis dias para o meu aniversário.
Queria conseguir ser gentil, compreensiva, pensar que ele também passaria
pelo processo de perda, um ainda pior que o meu, porque John realmente era
seu pai, mas não consegui.
Tudo o que eu precisava e queria era que as coisas andassem logo, que
soubesse para onde deveria ir, como precisava fazer…
Quando voltasse para aquela casa, poderia ser a última vez que colocaria os
pés nela.
Aquilo doeu tão absurdamente que não tive coragem de compartilhar.
Sabia que Conrad odiava aquele lugar, mas eu? Eu amei a casa que me
acolheu quando perdi o teto, quando tive o coração quebrado, quando pensei
que nunca mais teria uma chance.
E sim, contudo, eu fui muito feliz ali dentro enquanto tentava me curar pelos
últimos anos.
— Vai ser rápido. Não vamos receber ninguém depois, mas você sabe, se
quiser ir embora… — A voz dele era morna, baixa, compreensiva.
— Não. Sei que você precisa fazer isso, que precisa estar lá, mas eu também.
E não precisamos fazer sozinhos, no final das contas.
— É — ele suspirou —, além do que, meu irmão virá direto para cá, se é que
já não chegou.
E mesmo sob o olhar acusador de Isaac, para nossa sorte, ninguém quis
brigar.
Bella. Caroline, que fez a mão de Conrad apertar a minha com tanta força
que precisei abraçá-lo. Alguns alunos, Maressa e sua família, e outros tantos
estavam lá. Por ele, mesmo que com falsas condolências.
Obrigada, John. Obrigada pelos últimos anos, pela segurança, por, mesmo
que as razões que me levaram até você não tenham sido ideais, me acolher.
Você foi o mais próximo que tive de um pai.
Você me fez sentir parte da família, mesmo do jeito torto e eu nunca vou
saber agradecer o bastante pelo seu ato de coragem. Por mim.
Bom para uns, terrível para outros. Às vezes, os dois para uma única pessoa.
Mas não importava mais, porque, no fundo, aquilo era consequência da sua
partida.
Fugimos da multidão.
Não entendia por que tinha que ir naquilo, parecia meio desesperado o
homem mal morrer e todo mundo descobrir o que ele tinha para deixar.
— Até lá então.
conrad
deite-se ao meu lado, me diga o que eles fizeram. diga as palavras que eu
quero ouvir para fazer meus demônios fugirem. a porta está trancada agora,
mas ela estará aberta se você for sincera. se você puder me entender, então,
eu posso entender você.
theunforgivenII,metallica.
— Para Scarlet ficam oito milhões de libras, a mansão Prince com tudo o
que há dentro dela, um prédio comercial em Londres, e a Dodge. — A mão
de Scarlet tremeu junto da minha e ela parecia não acreditar no que ouvia.
Meu pai foi justo. Ela merecia tanto quanto qualquer um.
Apertei seus dedos com um pouco mais de força, mostrando que estava ali e
ela correspondeu, mas sem me olhar, limpando as lágrimas que caíam.
— Queria família quebrada, tenho muito para dizer, uma vontade imensa de
consertar coisas que nunca poderei, e tempo em falta. Há alguns meses, fui
diagnosticado com uma doença que, por mais tratamentos que o dinheiro
possa comprar, tomou conta do meu corpo. Em breve, eu não estarei mais
entre vocês, e talvez,
seja só desta forma que eu tenha coragem de dizer tudo o que preciso.
Maressa, eu nunca fui o chefe mais dócil do mundo, mas espero que não
tenha falhado como amigo. Se posso pedir um ou dois últimos favores é que
perdoe minhas falhas e abrace meus filhos. Não os desampare.
— Para Isaac, meu filho, eu falhei com você. — Meu irmão parecia
concordar. — Falhei com você mais do que com Conrad, mais do que com
Scarlet, mais do que com qualquer outro. Deixei que você crescesse sem
limites, que não sofresse as consequências dos seus atos e te transformei na
caricatura de um homem forte. Me perdoe por isso. Espero que, com a
minha partida, você coloque os pés no chão, já que acaba de perder a
última bolha que te protegia do resto do mundo. Que enxergue a vida e
todas as oportunidades que têm como bênçãos, e que as faça valer a pena.
Siga seu caminho reconhecendo que suas verdades não são absolutas, e que
nem tudo é uma corrida. Nem sempre o importante é ser o primeiro. Amo
você o bastante para dizer que espero que você se molde para o que a vida
tem de bom para trazer. Que você não perca o tempo da largada e aproveite
o caminho. — Isaac tinha
o rosto manchado pelas lágrimas, mais vermelho do que qualquer outra vez,
e parecia magoado. É, meu pai realmente tinha falhado.
— Para Scarlet, minha doce e amável filha do coração, eu peço perdão por
acreditar algum dia que você só seria uma hóspede dentro da minha casa.
Você, sua beleza, inteligência e sagacidade trouxeram vida para todos nós.
Sinto muito que minha família tenha te causado tanta dor. Que eu mesmo
tenha te contado mentiras e feito você acreditar em coisas que não deveria.
Acredite, se eu pudesse voltar no tempo, te pouparia de tudo isso. Aprendi a
amar você em sua singularidade e bondade, espero que não perca esses
pequenos detalhes agora, depois do que tenho a dizer para pagar uma
dívida que me atormenta toda santa vez que coloco os olhos em você e
enxergo a tristeza que carrega. Espero que você possa perdoar cada um de
nós. Ser um Prince na mesma sala que você neste momento será terrível. —
Aquilo me assustou e, a pequena troca de olhares que aconteceu entre mim,
Scarlet e Isaac naquele segundo, foi a pior coisa que eu já presenciei.
Porém preciso que outros saibam da verdade. Que saibam que Giana
abusou de você, física, emocional e sexualmente. E eu não fiz nada para
impedir. O meu pior crime? Não ter te defendido. Meu maior
arrependimento? Usar tudo o que tinha na época para não precisar mais ver
você. Para não precisar lidar com o peso que era te ver após a morte dela,
carregando tanto sofrimento, o meu junto do seu. Então, naquela noite,
quando Isaac chegou com o pé quebrado em casa e me contou que ele tinha
acabado com você e com a irmã de Scarlet, não vi outra solução. Então,
sim, Scarlet. Se algum dia o seu instinto a alertou de que havia algo além, o
além fui eu escondendo o fato de que protegi Isaac das consequências de ter
matado Susan.
Nunca foi Conrad. Eu sempre soube, e me arrependo de nunca ter dito nada.
Diante disso, peço perdão pelas feridas que causei. Espero que, quando
vocês forem pais, acertem mais do que eu. Sejam
felizes.
Filho da puta — pensei, mas foi tudo o que tive tempo para processar,
porque no segundo seguinte, Scarlet estava de pé, saindo pela porta, e meu
único reflexo, assim como o de Isaac, foi ir atrás dela.
conrad
rastejando dentro da minha pele, essas feridas, elas não irão se curar. o medo
é o que me derruba, confundindo o que é real.
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Ela tentou abri-la, mas meti a mão por cima de sua cabeça contra a madeira,
obrigando-a a se fechar. Ela insistiu, tentando abri-la de novo.
— Sai! — ela gritou. O calor de sua raiva foi o que me espantou, mas Isaac
estava bem atrás de nós, e mais atrevido do que eu, ele a puxou pela cintura.
Minha primeira reação foi pegá-lo pelo pescoço, apertando com força até ele
soltá-la.
— Porra, não, Scar, você sabe que não fui eu! Nós já falamos disso um
bilhão de vezes antes. Você viu Conrad lá. Você viu como ele correu, como
ele agiu depois!
Scarlet aproveitou daquele momento insano para abrir a porta, mas parou
sob o batente, encarando a mim com os olhos desesperados, sedentos pela
verdade.
— Claro que não! — Isaac tentou, mas eu o sacudi, um recado claro para
que ele calasse a boca. E percebendo que eu deveria ter dito antes. Que
deveria ter confiado nela lá atrás, na adolescência, suspirei, engoli em seco e
fechei os olhos, sabendo que o pior me esperava.
— Me conte.
— Fui até a sua casa naquele dia. — A memória queimou na minha cabeça.
— Vi o carro dele lá e escalei até o quarto da sua irmã, ele e ela estavam no
seu. Os dois estavam com um planinho sacana de nos separar, ele já te queria
naquela época, Red…
— Quando ouvi o que eles tinham feito, parti para cima de Isaac, mas antes
eu coloquei fogo em uma peruca que sua irmã usou e joguei no lixo cheio de
papel. O fogo deve ter pegado nas cortinas e no carpete. Isaac tentou me
enforcar, sua irmã foi tentar me defender e ele a socou. Susan ficou
desacordada na hora, porra, amor… — Meu peito tremeu, eu ri de desespero.
— Nós caímos escada abaixo e, não consegui subir para salvá-la. Eu tentei,
mas não consegui.
Eu não pensei em rir. Não mesmo, porque sabia que seria o próximo.
Eu merecia.
— Você me abandonou por uma mentira. — Magoada, abalada, prestes a
desabar, a voz de Scarlet tremia como ela. —
Você me deixou viver com ele — ela disse entredentes, a respiração ofegante
—, como vivi, sabendo que tudo era culpa dele! Você me deixou dormir ao
lado da morte, você sabia do que ele era capaz, Conrad!
— Não queria te ver assim, não queria acabar com você. Eu juro que foi com
boa intenção.
Ela tinha razão. Eu era péssimo em perdoar, e fácil de enxergar o pior nos
outros.
— Eu fiz tudo o que fiz porque ninguém que deveria me amar foi fiel até o
final. Era só o que eu tinha para dar, Red. Dizer que sinto muito muda
alguma coisa?
— Não desta vez. Não mais. — Se afastando, ela mirou a mim e Isaac com
os dedos e disse: — Cansei dessa merda. Não quero ver a cara de vocês
nunca mais. Nunca mais.
scarlet
conheço me traz de volta para nós. eu não quero ir, já estivemos aqui antes.
onde quer que eu vá me leva de volta para você.
i ’ m m i s s y o u , i ’ m s o r r y. g r a c i e a d a m s .
Soltei a fumaça pelo nariz. A lágrima pequena e fina escorreu pelo canto dos
meus olhos.
Como Conrad podia ter ido embora como foi, sabendo de tudo, e me deixar
para trás com o assassino da minha irmã? Como conseguiu me deixar viver
um romance com ele, sabendo da crueldade, da verdade?
Abandonei toda medicação, assaltei a adega de John, já que ele disse que
tudo ali dentro era meu, e depois de beber mais do que um gambá, não tomar
banho por dias e me sentir um lixo, não aguentei mais.
O medo fez meus ossos doerem e, quando terminei o cigarro, acabei com a
garrafa de Bourbon no gargalo e me levantei.
Precisava de um banho.
Precisava sair.
Nós nunca tivemos um título. Será que amor da minha existência era
demais?
E desci.
Andei por onde dava, tentando me lembrar com exatidão do que ficava onde,
mas minha memória não era mais tão fiel. Foi por isso que, tentando não
cair, com o equilíbrio já afetado, atravessei a fundação da casa e saí pelos
fundos.
O som do riacho bravo me fez ficar alerta. Achei que ele estaria congelado.
Que estaria calmo. Mas mostrando que era mais forte do que eu pensava, a
água corria pela depressão e eu, sem querer admitir que estava velha demais
para aquilo, sentei no velho balanço de onde vi Conrad naquele verão.
Queria gritar, queria chorar, queria sentir qualquer outra coisa que não fosse
aquela dor.
Assisti por um tempo como ela lutava para se manter em pé e ri sem graça.
amor, ele, o modo como me sentia junto dele, aquilo era meu combustível.
— Então, feliz aniversário. — A voz atrás de mim era conhecida, mas não
tive tempo de virar.
conrad
nós estamos brincando com fogo, mas eu gosto desse jogo. e eu conheço
seus demônios, conheço eles por nome.
inflames,digitaldaggers.
Uma da manhã.
Rodei pela cidade a noite toda, querendo uma desculpa para invadir seu
espaço, quebrar sua muralha, mas não me sentia digno.
Ver através de Scarlet, das merdas que nos enfiaram, tê-la tão intensamente
sob a pele… O que eu poderia dizer? Eu a entendia por não conseguir me
perdoar. Minha única alternativa era esperar passar.
Foi o que tentei fazer naquela última semana, mas como um cachorro
rodando atrás do próprio rabo, eu sempre acabava nela.
Em alguma memória, com algo seu, preso na minha maior cobiça, sofrendo
dos efeitos da minha pior maldição.
— Conrad, ela não te perdoou ainda, não é? — O riso de Isaac não era
natural. — Babaca.
— Onde está Scarlet? — Entredentes, já ligando o carro, coloquei o celular
no viva-voz.
— Ela está aqui, comigo… Estava passeando por aí, nesta noite fria e a
encontrei desamparada, desprotegida. Achei que Scarlet seria a minha
melhor companhia no inferno. — O tom de voz dele mudou completamente.
— Essa puta, desgraçada. Me conte, Conrad, é gostoso foder com ela? Como
a acertei com muita força na cabeça, ela não gemeu nenhuma vez quando me
enterrei…
Eu o mataria.
— Há dois anos, eu lhe dei uma camisola francesa, desses modelos cheios de
babados e amarras. Vesti-la para nossa primeira vez foi mais complicado do
que eu esperava. Você quer saber como foi, Conrad?
— Desgraçado.
Ajeitando a jaqueta de couro sobre o corpo, desci para invejar Isaac pela
primeira vez na vida. Ele tinha feito a loucura que era meu sonho. Ele tinha
colocado fogo na casa toda.
A prova daquilo eram os galões de gasolina que ele tinha jogado no quintal.
Parecia que aquele era o único caminho livre, para entrada, e para a possível
saída.
Tentando não inalar tanta fumaça, suando pelo calor absurdo dentro daquelas
paredes, atravessei o corredor para a única parte
Deu tempo de ver seu novo passatempo. Ele molhava os livros favoritos de
Scarlet com álcool, colocava a ponta na lareira, e quando o fogo pegava,
jogava em algum canto da biblioteca, fazendo o fogo se alastrar.
— Vem, irmão — ele me chamou, de costas para mim. — Não é você quem
gosta de brincar com fogo?
— Porque ela quis, seu idiota! — Rolamos no chão, Isaac pegou impulso
melhor do que eu e, com as mãos no meu pescoço, tentou usar seu peso e sua
força em vantagem para me sufocar com ambas as mãos.
— Você acabou com a minha família! VOCÊ VAI MORRER, VOCÊ VAI
MORRER… — Isaac não estava normal. Ele não podia estar normal.
Aquele idiota devia ter usado tanta droga de uma vez que havia perdido o
rumo.
— Desta vez, eu não vou falhar! — ele gritou por cima do som da
destruição.
E quase no limite, meio sem ar, com medo de realmente morrer ali, naquela
sala, olhei para cima. Acima da minha cabeça estava a lareira, o fogo.
Scarlet e seu vestido de girassol, seu coração mil vezes melhor e mais
merecedor do que o meu, seus olhos verdes, brilhando, magoados por uma
última experiência assustadora em que eu era o traidor.
Merda, eu não podia morrer assim. E não podia deixá-la morrer pensando
aquilo de mim também. Se não fosse aquela vontade de me provar, eu não
teria prestado atenção no velho atiçador pintado de verde, que Giana me
queimou e bateu tantas vezes antes, encostado lá, resistindo como
testemunha do tempo.
O fogo me feriu.
A dor me acordou.
Eu consegui respirar.
Meu irmão abriu a boca para balbuciar algo, mas o único som que saiu foi
um engasgar surpreso. As mãos dele foram para o pescoço, tentando
entender o que tinha acontecido. Seus olhos se encontraram com os meus.
Seu sangue caiu no meu rosto, na minha boca.
Eu não queria prová-lo. Não queria carregá-lo. Mas não tive opção.
E livre dele para sempre, sabendo que daquele crime eu não seria perdoado,
eu me ergui.
Voltei para Scarlet o mais rápido possível, arranquei dela aquele tecido
esvoaçante, mantendo-a só de camisola curta, a cobri da melhor maneira
possível com as toalhas úmidas e, com ela no colo, enfrentei o resto do
inferno, sentindo como se fosse derreter, como se a casa quisesse acabar com
todos de uma vez, antes de cair com ela no quintal, sobre a neve, não
sabendo o que fazer.
— Vamos, amor. Vamos, Red. Reaja. — Tentei sacudi-la, bati em seu rosto
sujo de fuligem. — Por favor, Red. Por favor —
implorei, colocando um pouco de neve sobre seu colo, sobre seu rosto.
Abraçando seu corpo, me sacudi junto dela. — Eu não te contei sobre Isaac,
porque eu sabia que algo aí dentro de você o amou também. — Queria que
ela levantasse para me entender, para me escutar. — Eu não podia quebrar
você mais do que já tinha feito. —
Nunca um choro meu foi tão doloroso. — E de algum jeito, eu sei que ele
pensou que também tinha te amado. Mas não, nunca, Red.
Ele nunca te amou. — Beijei o rosto de Scarlet uma porção de vezes, meus
lábios queimando contra sua pele que não parecia pegar fogo. — Se ele te
amou com todo o poder de sua alma por uma vida inteira, ele não poderia
amar você tanto quanto eu em um único dia. — Me enterrei em seu pescoço.
Agora os sons vinham de dentro da propriedade, mas não importava mais. —
Eu te amo, Scarlet. Eu te amo. Não me deixe sozinho, por favor, você
prometeu.
É engraçado, você é quem está destruído, mas eu sou a única que precisava
ser salva.
s t a y, r i h a n n a .
Naquela tarde, longos doze dias depois de tudo, depois de mais remédios
para dor e para dormir, senti alguém no quarto. Foi por isso que, quando vi
que conseguia abrir a boca. Que podia falar.
Eu o chamei:
— Conrad? — Foi muito mais baixo do que eu esperava conseguir, mas só
aquela palavra levou todo meu esforço.
Sabia que me colocar para dormir era melhor do que me ouvir alucinar.
Sabia que era ele por causa daquela queimação boa que tinha quando seus
olhos estavam em mim. E quando senti sua mão cobrindo a minha, mesmo
com medo de olhar para baixo, eu quis chorar de felicidade.
— Soube que queria me ver. — Sua voz penetrou na minha pele tão
intensamente, que mesmo baixa e profunda daquele jeito, fez cada fibra
minha relaxar.
— Por que eu estaria bravo com você, quando sou eu quem tenho fugido de
olhar para os seus olhos, depois de tudo?
E, invadindo meu campo de visão, Conrad parou com o rosto sobre o meu.
— Estamos brigando?
Sorri, erguendo a mão dolorida pelo acesso para tocar seu rosto.
A lágrima que correu pelo seu rosto molhou a ponta dos meus dedos.
— Então, acho que não é um sonho. — Ele suspirou contra meu rosto e me
esforcei para aspirar seu cheiro. — Senti sua falta, Red.
Livre?
— O que isso quer dizer? — perguntei, não gostando de seu tom tristonho.
— Que vou embora, Red. Você não precisa de mais desgraças na sua vida.
Os Prince quase acabaram com você. — A risada amarga de Conrad fez meu
peito doer.
— É melhor, Red…
— Nunca. Você não pode me deixar. Não pode desistir, não pode… — E
aquela sensação de quase morte, de novo, me pegou.
Dessa vez era diferente. Dessa vez era a morte real. Do espírito, da alma.
Eu ia afundar.
— Conrad, por favor, não, não, não — implorei, mas não podia me mover
por causa de seus braços me mantendo no lugar.
—, eu acabei com a sua vida. Eu… Isaac quase te estuprou. Quase te matou.
O filho da puta estava tão drogado que só conseguiu trocar suas roupas. —
Notando o pânico nos meus olhos, ele
preferiu justificar: — Mas ele não te tocou. Foi a primeira coisa que pedi
para verem quando você chegou aqui…
— Agora?
— Certo… Mas é isso, eu acabei com você, Scarlet. Como você quer que eu
fique?
— Porque eu te amo. — Não era óbvio? — Por favor, não me deixe de novo.
Por favor, não vá embora. Só me leve para casa. —
scarlet
toda vez que fecho os meus olhos é como um paraíso sombrio, ninguém se
compara a você, tenho medo de você não estar me esperando do outro lado.
— Safada, geme mais alto, geme? Deixa todo mundo saber que eu estou te
fodendo, deixa todo mundo saber que essa boceta é minha.
Quis rir, mas Conrad arrancou qualquer chance de eu produzir outro barulho
que não fossem gemidos.
— Eu vou gozar em você, Red. E lá fora, torcendo por mim, vai me sentir
escorrendo nas suas coxas só para mostrar que é minha.
formigamento nos meus seios, no meu ventre, seu dedo no meu cu, seu pau
na minha boceta. Era informação demais para processar e, quando ele fez o
que prometia, me travando em si para gozar pesado, eu o acompanhei.
aquelas cicatrizes, estava meu nome em uma letra rabiscada, gigante, como
uma etiqueta de pertencimento.
— Ninguém seria louco de te impedir de descer, Red. — Sua voz era quase
mortal, como se pagasse para ver alguém tentar.
Foi só sairmos do vestiário para o campo, que Bella veio nos encontrar.
Thomaz devia estar em algum lugar lá fora, mas Conrad ignorava sua
existência e eu também. Era a maneira que tínhamos de preservar a amizade
tão importante da garota.
Ele era o meu deus grego, o meu namorado, o meu Conrad Prince.
— Eu não queria admitir, mas sempre soube que seria assim entre vocês. —
O tom vitorioso dela me vez revirar os olhos.
— Mas você não o deixaria nem que sua vida dependesse disso. — Olhei
para Conrad correndo no campo e lambi os lábios. —
É, eu sei como é.
— É... — Ela riu, sem graça. — Acho que vamos ter que descobrir como
fazer funcionar, não é? — Querendo fugir do peso daquele assunto, ela virou
a chave, usando um tom de voz mais animado. — Veja você, até de
fraternidade mudou!
Virando-me pelo ombro, ela deu uma bela olhada na minha jaqueta nova,
dando risada.
— Ele estilizou, é?
scarlet
caos,camaleoa
Ever, minha pequena Ever, dormia nos meus braços, enquanto eu a ninava
olhando pela janela de seu quarto, esperando Conrad voltar para nossa casa
depois de doze dias fora.
Naquele futuro, que eu acreditei ser impossível muitas vezes, eu era médica.
Ele, o químico mais incrível e inteligente que alguém já tinha visto. E
faríamos história juntos.
De social, ainda tão tatuado quanto antes, Conrad parecia leve. Parecia não,
ele era. As sombras do passado, os sacrifícios que precisou fazer, ficaram
para trás.
Sua única pedra no sapato ainda era sua mãe, mas ele a mantinha a uma
distância segura e raramente trazia esse assunto à frente.
De vestido azul e pés no chão, me joguei contra ele e fui pega no ar.
— Doze dias sem você. — Finalmente beijando-o, sedenta por sua língua na
minha boca e em todo o resto do corpo, fui colocada
Encarando os olhos mais negros que a noite, que ainda eram tão lindos
quanto antes, não deu para segurar.
— E o que é? Um presente?
— Mais ou menos.
Pegando sua mão, sorri de canto e o guiei para a cozinha, conferindo que não
havia nenhum funcionário no caminho.
— Hm... — Fiz mistério, largando Conrad para fechar as portas para que
ninguém entrasse. — Até que é.
Ele ainda era uma obra de arte, e eu uma colecionadora muito, muito
sortuda.
— Tire — exigi.
Ele beijou o caminho da tatuagem até meu clitóris e quando o acertou, não
suportei mais segurar. Segurei meus seios, atiçando os bicos duros e gemi
gostoso, movendo o quadril para rebolar em sua boca.
— Me fode — implorei.
E sem dizer nada, Conrad me puxou para baixo e só tirou o pau de dentro da
calça.
Bruto, forte, excitante pra caralho, ele me girou e desceu meu corpo para o
balcão.
Com o rosto contra o mármore branco, senti seu pau procurar minha entrada
e entrar de uma vez.
Sua outra mão estapeou minha bunda com força, e seu pau me fodeu como
se aquilo fosse tudo o que sabia fazer.
Ele travou o quadril contra o meu, envolvendo meu pescoço com ambas as
mãos, me enforcando da maneira mais excitante que podia enquanto gozava
pesado dentro de mim.
— Caralho, Scarlet! — ele me xingou, meio puto, meio querendo rir, e caiu
sobre minhas costas, me largando para dar um tapa na minha bunda.
Meu corpo parecia leve demais para que eu tivesse controle das pernas.
— Feliz aniversário, amor. — Foi tudo o que consegui dizer quando ele me
puxou e me abraçou.
Conrad acordou cedo. Mais cedo do que eu, e só soube disso quando tateei a
cama e não o encontrei. Me levantei em um único impulso e saí para
procurá-lo, mas nem precisei ir muito longe.
Não consegui me mover. Admirar aquela cena, o meu presente, era uma
necessidade.
E fiquei ali, com os braços cruzados, contra a porta, quieta, pensando em
como tudo tinha mudado. Em como aquela bebezinha
— Podia ter ficado na cama. — Conrad disse, trazendo Ever para perto de
seu peito e me encarando, como se pego no flagra.
— A cama sem você fica fria — falei baixo e, depois de um suspiro, sorri.
Conrad ajeitou a bebê que tinha a marca do nosso elo no nome em seu colo
e, com a mão livre, tocou meu rosto. As pontas
Eu só tinha olhos para Conrad, confirmando o que pensei pela primeira vez
que o vi: ele era o amor da minha existência.
Bru, eu nem sei como começo te agradecendo. Você foi a responsável pela
pulguinha me picar e eu fazer essa história acontecer, e eu nunca vou
conseguir ser grata o suficiente. Você é boa. Genuinamente boa. E eu espero
que o mundo não arranque isso de você.
Obrigada pela troca, pela amizade, pela lealdade, pelo almoço de horas de
olho no olho e mão na mão. Obrigada por ter se desdobrado em quarenta
para ajudar o lançamento deste livro ser grandioso como ele merece em meio
ao todo caos de mudança de país. Eu te amo MUITO e morro de orgulho de
saber que você está indo atrás dos seus sonhos. Que seu intercâmbio te traga
tudo aquilo que você precisava e não sabia. Viva.
Para
minhas
betas
(@aana_r,
@biaindica,
Obrigada por discutirem com Conrad. Por cada xingo (porque, nossa
senhora, teve xingo, NÉ, BEATRIZ?), por cada surto, por cada lágrima (né,
Luandra?), por cada bronca pela indignação do que acontecia página após
página (Bianca e os “EU NÃO
não esqueci, seu dia vai chegar). Por tudo isso e mais, muito mais, eu sou
muito grata por vocês estarem comigo neste processo.
Amigos que falam a verdade, mesmo que aquilo possa nos machucar, são
raros. Ainda bem que eu tenho você e que nossa relação é sobre isso.
Obrigada por cada ligação, por cada áudio gigante, por cada crise de riso,
por cada troca. Pela sinceridade do nosso abraço, pela verdade da nossa
relação e por como ela nos coloca para crescer juntas. Sei que você queria
mais 250 cenas hots neste livro, mas Conrad já te mandou tomar no cu
algumas vezes HAHAHAHA.
Amiga, queria que você soubesse que eu nunca desistiria de você. E tenho
dó de quem um dia se atreveu a fazer.
Você é DO CARALHO.
A primeira coisa é: obrigada por não terem me internado nos últimos três
meses. Obrigada por terem pegado na minha mão quando eu pensei que
falharia. Quando tive medo. Quando chorei de desespero por causa disso.
Obrigada por viverem cada segundo da construção disso comigo. Por cada
sprint em que vocês assistiram ao meu show de graça (porque só quem viveu
sabe como
Obrigada por estarem comigo em todas e, por quando eu avisar que vou ser
cancelada, vocês pensarem em algum jeito de eu não ser (kkkkkkkkkkkk a
cara da Duda nunca será superada). Obrigada por me fazerem dar risada alto
pra caralho, me lembrando de todos os momentos bons que tenho com vocês
enquanto todo mundo aqui dorme. (Manu, deixe Diego ser o espírito livre
que é e fazer Sherlock perder a paciência.)
@_ester_gomes)
Jaque, Mari e Ester. Vocês três são resposta de uma oração silenciosa, feita
com muito medo do que precisaria enfrentar até encontrá-las, mas que
precisava ser feita.
Em especial, obrigada, Jaque, por não dormir, por se desafiar, por aguentar
uma pessoa doida como eu. Obrigada por ter chegado e se oferecido, por ter
vindo sem interesse algum e transformar o último mês de um jeito que eu
nunca pensei ser capaz de ver acontecer. Obrigada por confiar em mim e
todo dia a gente dar um passo juntas nessa amizade. Obrigada por me ajudar
a dividir.
Eu nunca vou conseguir explicar o que sinto vendo você acreditar tanto no
que eu entrego.
Eu amo você.
Obrigada à minha caçula, Tay Ferreira (@autoratay), por ter me dado a mão
e feito eu acreditar que conseguiria entregar algo
decente em algo que ela é mestra. Que quase teve infarto na madrugada
comigo chamando no meio do silêncio para avisar que o pomodoro estava
em pausa hahahaha e que aceitou as coisinhas que eu tinha para tentar
ensinar. Amo você, menina. Você vai MUITO longe.
Por último, mas sempre importante, minha base nesse mundo aqui.
@tmkechichian e @nanasimonss
Amigas, eu tô cansada, vocês sabem, mas vocês sempre vão ser meu top1.
TM, que você fique doida lendo este livro, obcecada igual eu fiquei com
Destroyer, e não consiga largá-lo como eu não consegui largar Matt e Liz.
Problema seu que tem que levantar cedo, você que lute HAHAHAHAHA.
Obrigada todo o carinho, apoio e vibração enquanto eu escrevia esta história
aqui. É muito bom ter um lugar para respirar.
de tanto que chorava? Essa pessoa está aqui agradecendo por você não ter
soltado a mão dela.
Obrigada por nunca, sob nenhuma hipótese, em qualquer tropeço, ser menos
para mim do que é. Obrigada por meus afilhados, pelo colo, pelo
macarrãozinho gostoso da tia. Obrigada por me deixar depilar na sua cama e
foder como lençol, deixando tudo grudado de cera, e desculpa. Obrigada por
ficar na minha casa e lavar meu cachorro quando eu preciso de um respiro.
Eu te amo tanto que nem sei explicar. E sim, você sabe, todo mundo sabe,
você é a pessoa que mais amo no mundo. Eu te amo.
E eu mandei mensagem para Ariana Grande virar sua amiga. Mas você não
pode ser mais amiga dela do que minha quando acontecer.
Beijo.