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Se você chegou de paraquedas nesse livro, saiba que você aterrissou no lugar
certo, em uma aventura que te fará suspirar, com um romance New Adult
com aquela pitada de fantasia, em que teremos um enemies to lovers
protagonizado por um vampiro amaldiçoado e a única sobrevivente da
linhagem de bruxas que o destruiu há mais de um século.
Se está disposto a entrar nesse universo, a entrar nessa nova jornada, nessa
nova fantasia e nessa nova viagem, que eu espero, do fundo do meu coração,
que toque você e lhe faça esquecer do mundo lá fora, separe o chapéu de
bruxa ou o pescoço, porque Levi Vodrak está pronto para te conhecer. Só
não esqueça que ele é altamente perigoso e apaixonante, certo?
Lembrando que esse livro faz parte de uma duologia, e para melhor
compreensão da história, é importe que leia o primeiro volume: Meu Jogador
é um Vampiro, disponível na Amazon e Kindle Unlimited.
Por favor, peço que se atente a cada um e respeite sua saúde mental em
primeiro lugar.
Caso tenha lido e deseja prosseguir mesmo assim, tudo o que eu posso te
desejar é uma... boa sorte.
— Conde Drácula
Para resumir toda essa história patética, havia, há muitos e muitos anos no
passado, bem no começo da idade média, uma mulher cujo nome era
Thereza.
Thereza não entendia sua força e seus poderes, fazia questão de esconder de
todos sua verdadeira identidade e seu espírito sensitivo, porém, em um
determinado momento, não aguentando mais a violência e as humilhações
diárias de seu marido, assumiu a sua natureza e os seus poderes, e o
amaldiçoo, transformando-o num monstro com sede por sangue, só para
atormentá-lo o suficiente por todas as vezes que a xingou e a diminuiu por,
periodicamente, sangrar pelo meio das pernas, a tratando como se ela fosse o
monstro assustador esse tempo todo, e não o contrário.
Ela queria vingança. Ela queria que ele pagasse por todos os anos de maus-
tratos e sofrimento que passou dentro de seu lar.
E ele pagou, porque o marido de Thereza nada mais era do que Vladimir
Vampir, o primeiro vampiro do mundo, que, diferente do que muitos
humanos acreditam, nasceu após ser criado por uma bruxa furiosa. Anos
mais tarde, seu sobrenome foi usado como base para o termo pelo qual nos
chamam até hoje.
Vampiro.
Mas antes de chegarmos nessa parte, preciso dizer que Thereza passou por
um tormento ao lado dele, de Vladimir, mesmo depois do homem já
amaldiçoado.
Como ela não entendia seus poderes e não tinha a noção do que poderia
acarretar no universo após ter brincado com o véu da vida e da morte, seu
feitiço deu completamente errado, e o tiro, na verdade, saiu pela culatra.
O que essa mulher tem a ver comigo e com o meu irmão? Bem, muitas
coisas, porque se não fosse por ela, ele e eu também não seríamos
amaldiçoados por uma outra bruxa, essa sendo, Alma Salazar, também
motivada por vingança, ao achar que meu pai, um viajante de Londres que
chegou aos Estados Unidos, mais precisamente numa pequena cidade no
interior da Virgínia, Emerald Grave, havia a trocado pela minha mãe quando
teve que voltar para o seu país, quando na verdade, teve que se casar e não
pôde fugir do casamento arranjado em que meus avós o colocaram à força, o
deixando sem nenhuma opção.
Ela foi vê-lo alguns meses depois, estranhando o fato de ele ter
desaparecido, e ficou furiosa ao se deparar com uma nova realidade, que era
a do seu amor por outra mulher que estava esperando bebês dele. Na mesma
hora, se sentiu traída e enganada.
Como as Bruxas Salazar sempre foram as mais fortes e as mais poderosas, as
que fugiram de Salém para Emerald Grave e as que tiveram posse dos
feitiços de Thereza, Alma simplesmente decidiu repetir a maldição. Não com
meu pai, não com sua nova esposa, mas sim com os filhos que nasceriam, só
para se certificar de que o sofrimento fosse muito maior e muito mais
doloroso para todo mundo.
Ela nos rogou que, quando meu irmão Luca e eu chegássemos no nosso
vigésimo primeiro aniversário, morreríamos e nos tornaríamos vampiros.
E não querendo cometer o mesmo erro de Thereza, Alma nos deu uma
chance para controlarmos nossos impulsos primitivos, para controlar o véu
da vida e da morte. Nossa força e nossa cura, pelo menos parcialmente,
estariam na natureza, em algum dos quatro elementos. Nosso organismo
também seria incapaz de transferir o vírus, justamente para não haver mais
vítimas.
Ela só queria que sofrêssemos, só queria nos dar trabalho, porque, ao mesmo
tempo que poderíamos encontrar nossa conexão rapidamente, ela poderia
demorar ou ela poderia, simplesmente, durar pela eternidade. A tortura seria
duplamente maior por causa disso. A tortura de vivermos vagando como
monstros, e a tortura de saber que tinha uma forma de controle, e não
sabíamos qual era.
Passamos por todo tipo de angústia e sofrimento, até que Luca se descobriu
na água, e eu no fogo.
Ele também tentou olhar para toda essa situação com bondade, porque é
como diz na história, se há gêmeos, um tem que ser o bom, e o outro
obrigatoriamente tem que ser o ruim.
Não fiquei satisfeito com o meu caminho e jurei passar o resto da minha
eternidade matando cada bruxa Salazar existente na terra. Eu faria uma
limpa e, se uma delas havia me amaldiçoado, eu amaldiçoaria todas elas de
volta, nem que toda a minha eternidade fosse desperdiçada nisso.
Porque seria um efeito dominó, cada uma pagaria o preço enquanto caía.
Então, como elas estavam fixas em Emerald Grave, foi para lá que eu fui.
E não parou por aí, que fique claro. Muitas bruxas se espalharam para outros
cantos, e eu continuei as perseguindo, mesmo com o meu irmão atrás,
tentando inutilmente me conter. O que Luca mais me dizia é que elas eram
inocentes, que não tinham nada a ver com os seus antepassados e que não
podiam pagar por
coisas que não cometeram, que, na verdade, não eram nem nascidas na
época dos fatos.
Quando Alma nos feriu, nós também não tínhamos nascido. Nós éramos
bebês inocentes, puros, com uma vida toda pela frente. Se ela não levou isso
em consideração, por que porra eu deveria?
Estava convicto, e nada poderia me fazer parar. A guerra era tanto por mim
quanto por ele, mesmo que não entendesse meus motivos e me pintasse o
tempo todo de vilão.
E não era um problema para mim ser tratado dessa maneira, os vilões sempre
me pareceram mais interessantes do que os mocinhos. Eles são sempre muito
água com açúcar, e eu sempre gostei muito mais de bebidas apimentadas. Eu
gostava do sabor de ser mau. Do sabor de parecer mau.
Pelo menos foi no que eu acreditei por anos, até receber a notícia de que uma
garota havia sobrevivido. A única Salazar estava vivendo livre e
perfeitamente em Emerald Grave, estudando e sendo uma jovem normal de
sua idade, como se não tivesse uma dívida a pagar.
Fiquei furioso, e comigo, que tinha a deixado escapar e nem sabia, poderia
passar anos e anos sem saber. Ela poderia se multiplicar, e todo o meu
sacrifício não valeria de nada.
Mas aí, me disseram que o nome dela era Evelyn Sutton e que quem tinha a
salvado naquele cruzeiro foi, obviamente, meu gêmeo bom. Eu voltei à
cidade para matá-la, e ele chegou pouco tempo depois, para salvá-la como o
herói que gosta de ser.
Fiquei enojado ao saber que Evelyn e Luca estavam apaixonados, entretanto
fiquei ainda mais quando, no exato momento em que tentei pôr em ação o
plano no qual fiquei meses trabalhando, me deparei com uma outra peça-
chave desse quebra-cabeça, que jogou no meu colo a revelação que seria a
minha nova maldição.
Era ela a bruxa. Era ela quem se escondeu de mim esse tempo todo, não
Evelyn, como achei. E mais uma vez, eu poderia ter ferrado tudo por causa
da minha cegueira acometida pela raiva. Se ela não tivesse se revelado,
ninguém saberia, pois a menina estava mesmo empenhada em ser discreta,
em passar despercebida e ser comum.
Ela é a última.
Se ela se esforçar, pode ser a minha destruição, foi o que percebi quando
olhei naqueles olhos penetrantes dela.
E eu sei que a garota sabe que não desistirei fácil, que estou me preparando,
juntando meu exército para a batalha final, e sei que ela sabe que, dessa vez,
é definitivo.
Quem vai ganhar essa? Será que vai ser possível haver vencedor?
Afinal, como eu poderia sentir que algo estava faltando na minha vida,
quando eu sempre tive de tudo?
Sem contar que nunca houve distinção, nós somos filhas deles. Ponto.
profundo e infinito. Nossa casa, apesar das dificuldades de toda família, era
e ainda é muito recheada de felicidade e harmonia. Na vizinhança, nós
sempre fomos conhecidos e vistos como exemplos, muitas pessoas, e até
amigas minhas, me param vez ou outra só para elogiar o que temos, que eu
sei que é bem raro de se encontrar hoje em dia.
Além de toda essa parte do afeto, eles também nunca deixaram faltar nada
material, para nenhuma de nós duas. Tudo o que eu queria, assim como
Evelyn, eu tinha, apesar de também sempre fazer por merecer, sendo
aplicada e não dando nenhum tipo de trabalho. E eu amava a minha vida.
Amava ser a filha mais velha dos Faulkner, a responsável, a líder de torcida
popular na escola, que viveu um perfeito clichê ao lado de um dos atletas
mais cobiçados da época do ensino médio, amava estar sempre com as notas
impecáveis, sempre falada, sempre elogiada, sempre comunicativa, com
amigos que viviam dando festas e fazendo nossa cidade nunca ser tão
entediante quanto ela parece e, sobretudo, amava ser eu, a Gabriella, que
todos conheciam e adoravam.
E ainda assim, mesmo envolvida de carinho e coisas boas por todos os lados,
aquele sentimento de vazio querendo me deixar para baixo voltava
constantemente. Ele não era passageiro, não era um pensamento intrusivo,
ele era, de fato, real. Mesmo não gostando, eu sabia que existia, sabia que
estava enraizado em mim e por muito tempo, me senti péssima, destruída por
causa disso. Era um sentimento de culpa terrível, e enquanto uma voz na
minha cabeça pedia para que eu corresse atrás do que estava faltando, a
outra, em um duelo, ficava me xingando de cruel, ingrata e insensível, em
um looping.
Contudo, para a minha sorte, não precisei ficar brigando comigo mesma por
muito tempo, pois, ao completar 16 anos, finalmente tive a minha resposta e
pude, pelo menos um pouco, respirar em paz, quando descobri que não era
nenhuma ingrata, nem lunática, afinal de contas, algo, uma força muito
maior, realmente estava flutuando pela Terra, só esperando o tempo de eu
tomar conhecimento sobre a sua existência.
Foi difícil, extremamente difícil e assustador lidar com toda a proporção que
aquela revelação trouxe para a minha história, para a minha vida e para a
vida das pessoas ao meu redor, contudo, ao mesmo tempo que foi um choque
gigantesco, também foi libertador e esclarecedor, porque
muitas coisas sobre mim, coisas essas que eu achava diferentes e anormais,
coisas essas que eu tentava, a todo tempo, esconder de todo mundo,
finalmente passaram a fazer sentido quando as explicações vieram, e eu pude
sentir, no meu mais profundo âmago, que passei, mesmo sem saber, todo
esse tempo esperando que esse grande momento acontecesse.
Quando aconteceu, eu entendi que tinha que ser daquele jeito. Eu entendi
que eu precisava descobrir a minha verdadeira identidade no auge da minha
adolescência, só para que no futuro, eu pudesse ser, com muita força,
sabedoria e resiliência, a mulher que fui destinada a ser desde o dia do meu
nascimento. Eu precisava ser essa Gabriella, e olha que essa Gabriella ainda
tem muito mais coisas para descobrir e um longo e árduo caminho para
trilhar. Só que eu já me encontro satisfeita, no entanto. Eu lutei e batalhei
muito para ser quem sou, estar onde estou, e não há mais nada de vazio em
mim. Pelo menos não como antes, já que agora está tudo perfeitamente em
seu devido lugar.
Sentada nem tão no fundo e nem tão na frente, meu subconsciente muito
certo pede, ou melhor, implora, para que eu pegue a caneta e comece a fazer
anotações o quanto antes, pois esse é meu dever, estou aqui, junto de todos
os outros jovens, para me formar em Ciências Biológicas, algo que está,
graças ao universo, muito perto de acontecer. Porém, a parte perversa do
meu cérebro, a que está ganhando o duelo nesse momento, simplesmente
ignora os meus afazeres, e, ao invés de pegar a caneta, eu abro a minha bolsa
e puxo, com muita cautela, meu diário de dentro dela.
trago, essa é a primeira vez, e por mais que ele fique superprotegido no meu
quarto, em segurança, hoje me deu essa vontade de carregá-lo comigo,
porque sabia que mais cedo ou mais tarde, a vontade de ler certos parágrafos
me pegaria com força, quando o tédio me invadisse.
Antes que eu possa fazer menção de abrir o diário, a pessoa sentada ao meu
lado, que até então estava em uma distância segura e considerável, agora faz
questão de se aproximar, me observando. Eu coloco o caderno virado de
cabeça para baixo e aprumo os ombros na mesma hora, fingindo
concentração no professor lá na frente e podendo, de rabo de olho, observar
o pequeno sorriso de canto brotando nos lábios do garoto, que tem suas írises
fixas em meu rosto.
— Me desculpe invadir o seu espaço pessoal, moça, mas é que meu celular
descarregou tem cerca de cinco minutos, e eu estou prestando atenção na
aula faz, bem, cinco minutos, o que é, basicamente, uma tortura, quando
aquele careca ali só sabe falar de planta. Preciso, você sabe, conversar com
alguém — sussurra, agora com o rosto virado, para não ficar muito claro que
está tentando puxar assunto comigo em um momento inoportuno. — Você
foi a única pessoa pedindo socorro em silêncio que encontrei, e acho que
podemos salvar um ao outro dessa tentativa implícita de suicídio coletivo
que, caso a palestra demore mais um pouco, pode vir a acontecer a qualquer
milésimo de segundo. Eu ainda não vivi o suficiente, moça e você?
Seus olhos nos meus se demoram um pouco, porém ele continua crescendo
seu sorriso conforme eu balanço a cabeça, tentando não voltar a sorrir só por
causa da sua cara de pau em escorregar ainda mais a bunda para o meu lado,
agora realmente próximo, sem nenhuma chance de distância entre nós.
Mais um sorrisinho ganha forma em seu rosto e dessa vez, nada inocente.
— Poxa, eu realmente costumo causar essa reação nas mulheres, elas sempre
dizem que ficam com falta de ar quando observam minha beleza, mas não
foi meu intuito dessa vez. Eu só queria fazer você falar comigo, não estava
tentando te deixar apaixonada nem nada. — Ele morde a boca quando se
encosta, colocando o braço atrás de mim na maior inocência fingida, seus
olhos agora descendo e subindo por mim, mesmo sentada. —
Só não me entenda mal, moça, eu não reclamaria se foi esse o efeito que
causei na senhorita.
— Plantas são chatas, ele não precisa ficar o tempo todo só falando delas.
Como se eu fosse a menina estrelando o filme O Exorcista, minha cabeça
vira com tudo em sua direção, uma careta de indignação se formando em
meu rosto.
— Cara, não sei se você percebeu, mas você está em uma aula de botânica
— sibilo pausadamente, meus cílios superiores e inferiores se chocando a
cada milésimo de segundo, conforme fixo minhas írises nas suas. —
Botânica — repito, dando um pouco mais de ênfase, só por garantia. — Do
que mais o professor poderia falar, senão plantas, plantas e plantas?
— Porcaria — xinga, ao bater a mão contra a testa. — Por isso essa merda
não estava fazendo sentido.
— Não se desapaixone por mim agora, mas sim. A minha tinha algo a ver
com fazenda e agronomia. Não me assustei tanto com a aula em um primeiro
momento porque caramba, tinha, de certa forma, algo a ver o que ele estava
falando. Plantas ficam em fazendas, não?
— Ficam, claro, mas por que você teria que saber todos esses termos
técnicos?
— Ok, tudo bem, não precisa fazer eu parecer mais burro do que já estou me
sentindo.
Ergo as mãos.
— Foi mal, só estava tentando ajudar. — O vejo juntar suas coisas com uma
certa pressa, como se estivesse atrasado. E olha só que engraçado, ele está
mesmo. — E não acho que você pareça burro, acho que você parece
desatento e desinteressado — completo.
— Melhor desinteressado do que desinteressante. — Pisca, pondo uma única
alça da mochila no ombro e me surpreendendo ao não perder a oportunidade
de flerte. — Eu realmente queria conversar com você agora, Gabriella, mas
você me fez perceber que não será possível. Era melhor não termos falado
sobre plantas, só assim eu teria a graça da sua companhia por mais tempo,
antes de precisar te deixar para ir para outra sala correndo, já que não posso
mais levar falta, o reitor é amigo dos meus pais, e eles estão de olho nas
minhas notas e no meu comportamento. — Respira fundo, passa a mão no
cabelo, olha para o professor e depois volta a me olhar. —
Nunca pensei que fosse dizer isso, mas plantas podem ser vilãs de histórias.
Tombando a cabeça um pouco para o lado, para me ver por outro ângulo, ele
confirma, ao repuxar os lábios para cima.
Uh, tudo bem, esse garoto é mesmo bom nisso, entretanto ainda precisa de
um pouco mais, se quiser me deixar desconcertada, tímida ou com as
bochechas pegando fogo.
Na verdade, tem tempo que não fico assim, a última vez foi no ensino
médio, provavelmente. De lá para cá, muita coisa mudou, principalmente eu
e o meu modo de lidar com o sexo masculino.
— Não vai rolar, você detesta plantas, e eu amo. Caso não tenha percebido,
sou uma futura bióloga, e vai totalmente contra os meus princípios conhecer
alguém como você — brinco, o que o faz ficar com cara de ofendido.
— Tem provas? Se não tiver, é crime o que está fazendo com a minha
pessoa. Se chama calúnia.
— Ah, com certeza, pode apostar que eu faço direito. — Malícia goteja em
cada sílaba, fazendo seus olhos brilharem, e mesmo que eu me deteste por
isso, acabo dando risada por ter conseguido achar duplo sentido nisso, numa
simples pergunta. — Gostei da sua risada e de poder conversar com você,
Gabriella Faulkner, mesmo que brevemente. Espero que possamos nos
trombar por aí qualquer dia desses.
— Não sendo para você falar mal de plantas e interromper minhas aulas,
para mim, tudo certo.
— Isso mesmo, gata. Fico feliz que também já me conheça. Acho que é o
destino agindo.
Depois de soltar mais uma piscadela, ele se levanta e vai embora no meio da
aula, me fazendo não ter mais dúvidas e sim certeza, quanto a ser um
mauricinho. Porque é ninguém mais e ninguém menos que Cody
Davenport, o garoto que ficou famoso pelo campus nas últimas semanas,
após ter gravado um vídeo jogando dólares no camarote de uma boate.
O dedilho mais uma vez, após virá-lo com a capa para cima.
Você estava conversando antes, não vou tolerar que permaneça desatenta na
aula, não quando é uma das minhas alunas prodígios.
As luzes da sala começam a piscar, até que a luz seja cortada completamente
e nos deixe no escuro, as cortinas fechadas impedindo que a claridade
perpasse pelas janelas.
Pelo barulho, ouço um leve desespero dos alunos, que ficam tentando
entender o que aconteceu, enquanto eu seguro firme no lugar em que me
encontro, o coração martelando na garganta por causa do susto e do que
acabei de fazer na minha faculdade.
Uma bruxa.
Sou, além de Faulkner, uma Salazar, e monstro nenhum, nem agora nem
nunca, vai me parar.
Por minha causa, a aula terminou antes do previsto e todo mundo foi
liberado mais cedo.
Não que tenha sido totalmente minha culpa, óbvio, se o professor não tivesse
me chamado daquele jeito na frente de todo mundo, eu não teria me
assustado, e os meus poderes não teriam sido ativados como se eu não
conseguisse me controlar nem minimamente.
E aí, por causa disso, o caos foi jogado por cima do auditório da Emerald
Grave University, e, mesmo após a luz voltar, os alunos ainda se mantiveram
agitados, cada um tentando descobrir o que havia acontecido para ocasionar
aquele tipo de falha em um lugar daquele tamanho que, com certeza, possuía
um gerador seguro. O professor, mesmo tentando muito, não conseguiu fazer
a turma focar no seu debate importantíssimo sobre as plantas carnívoras e as
suas nomenclaturas, e acho que o pessoal, no fundo, estava fazendo de
propósito, para que ele não tivesse outra alternativa a não ser encerrar o
conteúdo mais cedo por hoje.
professores faltavam, o que era bem raro, a propósito, e nós ficávamos com
aquele horário todo vago.
É, tudo bem, melhor não, não quero criar mais pânico do que já criei. Não
seria legal chegar para minha turma e simplesmente dizer: então, não fiquem
tão felizes assim, o que aconteceu foi que eu me assustei e eu sou uma
bruxa, caso não saibam, tenho poderes e sou capaz de fazer tudo o que
imaginarem, inclusive fazer vocês, e toda essa universidade, virarem cinzas
num piscar de olhos e estalar de dedos.
E juro, já tem gente demais querendo a minha cabeça, não preciso, nesse
momento, fazer a lista triplicar.
Posso ser poderosa e tudo o mais, mas ainda sou só uma. É necessário ter
cautela. A partir de agora, em tudo.
É aí que eu chego a mais uma nova conclusão, não vou, nem ferrando, trazê-
lo nunca mais comigo. É muita preocupação, e já basta as que eu já tenho.
Sem mencionar a distração, fica totalmente complicado prestar atenção na
aula, se as palavras guardadas naquelas páginas ficam me chamando o tempo
todo, algo que está acontecendo de novo agora.
Eu as ignoro dessa vez, entretanto. Não vou pegá-lo, ainda mais em público,
a céu aberto, com tantas pessoas indo e vindo no campus, não sou tonta a
esse ponto, mesmo curiosa. Eu só preciso... caminhar. Encontrar uma outra
distração para fazer a vontade passar.
— Deixei as luzes piscando por algum tempo, antes de deixar todo mundo
no escuro. — Agora que estou falando em voz alta, me sinto culpada. Até
cruzo os braços, um pouco envergonhada com a minha irresponsabilidade.
Tudo bem que ninguém poderia adivinhar que uma pessoa havia causado
aquilo, ainda mais com os poderes da mente, e se imaginassem, dificilmente
poderiam detectar o culpado em uma sala com um bocado de gente,
entretanto, não consigo deixar de sentir a dor da pontada de culpa que me
atinge no âmago. Sendo quem sou, não posso dar um mole desses, ainda
mais quando são bobos. — Eu consegui me recuperar a tempo, e a queda de
energia não pareceu tão longa. Depois disso, o nosso professor quis
continuar sua aula, só que já era tarde demais, ninguém estava mais disposto
a falar sobre botânica, e não tinha mais nada que poderia ser feito, a não ser
nos liberar. Estão todos por aí comemorando como se a EGU, tivesse feito
de propósito, mal sabem eles a triste realidade.
Trocando os pesos dos pés, Evelyn dá uma espiada para trás e nota a
movimentação.
— Bem que eu percebi uma alegria diferente no ar — ela diz, assim que
volta sua atenção para o que realmente interessa. — Está explicado agora.
Você acabou de dar para eles um pouquinho de paz, maninha, não é para se
sentir mal ou nervosa por isso.
— Mesmo não sendo sua intenção, você acabou de fazer uma boa ação aos
seus colegas, Gabriella Faulkner — é a vez de Luca mencionar, divertido. —
No fim das contas, foi legal. Se você estava aérea, aposto que estava sendo
um tédio, e se estava sendo um tédio, definitivamente, ninguém mais queria
estar lá dentro.
Desejo de todos realizado pela nossa bru-xa — a última palavra, ele sibila
sem som, entendo apenas por fazer leitura labial. — Você é poderosa, garota.
Em todos os sentidos, se é que me entende.
Ninguém consegue resistir a Luca, e isso é algo que venho percebendo desde
que tudo explodiu sobre nós, há quase dois meses, quando ele e a minha
irmã estavam se conhecendo. Antes, eles não sabiam o meu segredo, e eu
não sabia os deles, pois, infelizmente, Evelyn e eu não tínhamos tanta
aproximação. Ela levava uma vida reclusa junto da sua amiga Angelina
Chan, e eu sempre fui um pouco mais agitada, o que acabava não batendo
muito. Não só isso, claro, já que a Evelyn fora adotada um pouco mais tarde
que eu, lá pelos cinco anos de idade, depois de
ter perdido seus pais no incêndio do cruzeiro Shine Star, sendo a única
sobrevivente.
Só que aí Luca apareceu, e tudo mudou nas nossas vidas. Ele veio para
salvá-la, assim como fez na noite do acidente, em alto mar, e acabou se
apaixonando perdidamente justo pela garota por quem não podia. Minha
irmã também não queria deixá-lo se aproximar, no entanto, com muito
esforço e vontade do novato da cidade, ele foi o primeiro a quebrar todas as
suas muralhas, finalmente a alcançando. Eles ficaram juntos logo, contudo,
tinham vários segredos os envolvendo. Na época, assim como seu irmão
gêmeo, Luca achava que a única bruxa Salazar sobrevivente era Evelyn, e
além de esconder isso dela, ainda escondeu o fato de ser um vampiro.
Porque é isso que Luca Vodrak é. Um vampiro. Aquele que um dia fora
amaldiçoado por uma bruxa.
Quando a garota descobriu sobre a verdade, já dá para imaginar que não foi
bonito, mas os dois conseguiram um jeito de voltar um para o outro, como se
quisessem superar e enfrentar o inimigo juntos. Foi nesse meio tempo que eu
também estava finalmente entendendo o que estava acontecendo na cidade
após a sua chegada, quem era ele e o que a sua presença em Emerald Grave
significava.
A revelação, ao mesmo tempo que foi um alívio para ela, que estava
completamente sem entender como poderia ser uma bruxa, se nunca havia
sentido ou se visto fazendo nada de diferente, também foi como um peso.
Minha
Todos nós.
Eu, ela, Luca e até mesmo sua amiga Angelina, a humana que sempre
acreditou nos mistérios e nas lendas da cidade e que enfrentou bravamente
os vampiros que a pegaram. Estamos todos, agora, sem mais segredos e
mentiras, nos apoiando e dando suporte, já que temos o mesmo objetivo em
comum; nos proteger e enfrentar qualquer um que seja, para salvar quem
amamos e, claro, a essa cidade, que, no momento, segue em perigo por Levi
Vodrak e sua turma ainda estarem à solta, livres, calculando a hora exata em
que voltarão.
Enquanto um é bom, o outro é ruim, e isso é algo que vem sendo registrado e
escrito há anos e anos. Os dois passaram a vida toda sendo o alicerce um do
outro, porém, no instante em que se transformaram em vampiros, um seguiu
um caminho, o outro seguiu outro, e se afastaram oficialmente. Eles criaram
uma espécie de rixa, de briga, Luca nunca foi a favor do desejo ensandecido
de vingança do irmão, e quando ele chegou a ameaçar Evelyn, quando
chegou a quase matá-la, a raiva de ambos duplicou.
No começo, mesmo sabendo que ele era louco pela minha irmã e,
obviamente, por ter presenciado muitos momentos dos dois, inclusive vendo
de perto o quanto quase perdeu a cabeça por vê-la em perigo, ainda assim,
fiquei um pouco com o pé atrás, afinal, nada poderia mudar sua natureza, ele
era um vampiro, seria pela eternidade, e estava próximo de mim, da minha
família, e era extremamente perigoso, porém, como eu disse anteriormente, é
impossível não se render a ele em algum momento. Dá para notar porque
Evelyn Sutton se apaixonou por ele, Luca Vodrak é naturalmente uma boa
pessoa, nada foi capaz de mudá-lo, nem mesmo o monstro que por muito
tempo quis controlar o seu corpo.
Desde que Luca apareceu, ela é uma outra pessoa. Uma pessoa muito mais
feliz, muito mais segura de si, muito mais amorosa, apaixonada e aberta para
todas
as oportunidades em sua vida. Ela não se fecha mais em seu casulo, virou
uma linda borboleta que levantou voo e nunca mais parou. Nossa amizade e
irmandade também está se fortalecendo, e acho que é isso que está me
mantendo em pé esse tempo inteiro, sem perder as forças. Não quero e não
posso decepcioná-la. Não posso decepcionar nenhum deles.
Mesmo com medo do que sei que vem por aí, sigo com a cabeça erguida.
Evelyn se vira para mim e assim que abre a boca para me contar, meu
cunhado pressiona a mão em sua boca, a impedindo de falar. Enquanto ela
tenta se afastar dele, os dois dão risada, com ela balbuciando coisas
incompreensíveis cada vez mais. Para ajudá-la, eu olho feio para Luca, e
com mais a força dela para afastá-lo, ele finalmente a deixa livre para me
contar o que de tão grave ele fez.
— Nossa, achei que não fosse me soltar nunca — diz, dramática. — Enfim,
o que esse cara aqui fez, foi simplesmente jogar um livrão na minha cabeça
na primeira vez em que nos vimos. E ele era enorme. Parecia uma edição
muito maior de Os Miseráveis de Victor Hugo.
— Impossível? — soa perplexa. — Está dizendo isso só porque não foi você
que ficou sentindo como se um galo enorme fosse brotar na sua cabeça por
dias a fio.
— Não, nada. Só relembrando que foi com um galo na cabeça, que você
provavelmente se apaixonou perdidamente por mim.
Evelyn revira os olhos, tentando não amolecer na frente dele. Ela faz isso
todas as vezes em que Luca Vodrak faz ou fala qualquer coisa que a faça
corar.
— Vocês são mais enjoativos do que doces e dão mais diabetes do que eles
também.
— Acho que isso aí é inveja, Gabi. Cadê seus pretendentes? Lembro muito
bem que a senhorita nunca foi de passar muito tempo sozinha.
— Pois é, você deveria sair por aí para dar uns beijos também. Se ficar só
focada em se preparar para a chegada daquele que não pode ser nomeado,
vai enlouquecer — Luca agora fala sério, me aconselhando mais uma vez
sobre esse assunto. — Você não pode parar a sua vida por causa dele.
Rio.
— Não, tudo bem, maninha, Luca tem razão. Não quero o dinheiro dele, mas
se ele quiser gastar comigo e me levar a lugares incríveis, que mal tem?
Aproveite. Faça como sua irmã, ela adora fugir dos problemas quando está
na cama comigo.
— Que mente perversa que vocês têm, eu nem disse nada sobre o que
fazemos quando estamos na cama. Pode ser qualquer coisa.
— Sim, porque eu sou uma criança e não posso imaginar o que fazem
quando estão sozinhos.
Balanço a cabeça de um lado para o outro, com nojo, enquanto Evie quase
pode cavar um buraco no chão e se mandar para qualquer outro planeta por
causa do seu namorado sem filtro do cacete.
— Tudo bem, me deu uma pequena vontade de fazer aquilo com você, amor.
À medida que caminho, olhando para os meus sapatos, percebo que estou
realmente muito sozinha desde que tudo aconteceu. Minha mente não
consegue mais descansar, assim como meu corpo, e a única coisa que me
interessa é me tornar cada vez mais forte. Eu não tenho mais tempo para
garotos, na minha cabeça, pensar em coisas assim enquanto estou sendo
ameaçada, é uma completa bobagem, não faz sentido.
Contudo, para ser sincera, vendo Luca e Evelyn interagirem agora, percebo
quão desligada da minha realidade me encontro; sem festas, sem garotos,
sem sexos casuais.
Essa merda vai ter que mudar uma hora ou outra, mais cedo ou mais tarde,
quer queira, quer não.
Se há algo que eu gosto tanto quanto sangue, essa coisa é vinho.
Desde que tudo fora revelado e eu fui expulso de Emerald Grave, estou uma
verdadeira pilha.
Decidi recuar porque eu quis, porque eu sabia que era preciso e porque eu
precisava de um tempo longe para me organizar e, com calma, preparar os
meus
próximos passos, afinal, não estava esperando que a última bruxa Salazar
não fosse a tal da humana Evelyn Sutton, aquela garota franzina, sem sal e
tão amedrontada e trêmula quanto um cachorrinho abandonado. Na minha
cabeça, ela não tinha conhecimento dos seus poderes, ela não era forte, era
fraca, e seria muito, muito fácil derrotá-la, eu não precisaria fazer esforço
nenhum para matá-la e para fazer o meu irmão gêmeo sofrer por sua terrível
escolha errônea não ficar do meu lado quando pedi e quando lhe dei a
chance.
Para as bruxas, Gabriella é uma espécie de milagre, a única que pode fazer
justiça e acabar com toda essa guerra de séculos, e eu posso ser tudo, menos
burro.
Passei muito tempo agindo só na base da emoção e da raiva, agora, mais do
que nunca, eu devo ser ainda mais frio, ainda mais calculista, inteligente e
perverso.
Quero que me tema e, para isso, preciso calcular o que posso e o que não
posso fazer.
Terá que ser tudo estudado, tudo arquitetado, tudo muito bem montado, para
não ter falhas como da última vez. Porque o embate será final. Será épico. A
jornada de dor, destruição e vingança está só começando, tanto para mim
quanto para Gabriella, e eu sei que uma vez começando, ninguém será capaz
de parar, de se render, de desistir.
Inclusive, eu também tenho algo para me fazer lembrar dela todo dia.
Dentro dela, há tudo que eu posso precisar saber sobre Gabriella Faulkner,
sua data de nascimento, sua idade, todo o processo de sua adoção, como foi
sua infância, sua adolescência, tenho suas notas, todo o seu currículo na
Emerald Grave University e tenho, claro, tudo o que preciso para me inteirar
sobre seus pais biológicos. Há um dossiê completo sobre a vida de sua mãe
biológica, Zena Salazar, e de todas as outras de sua família e linhagem
medíocre. Há uma árvore genealógica, alguns dos feitiços mais usados e
seus modus operandi frequentes.
Dentro da pasta, eu tenho até uma foto revelada de Gabriella, uma que
encontrei em uma das suas redes sociais. É ela dentro do carro, sorrindo,
com o cabelo cacheado todo para frente, em evidência, e os lábios
emoldurados por uma generosa camada de gloss na cor marrom claro. A
olhando assim, parece tranquila, feliz, no auge da juventude, uma garota
qualquer, comum, cuja a única preocupação deveria ser se formar na
faculdade e encontrar o emprego dos sonhos, para ser bem sucedida.
Entretanto, nós sabemos que não é só isso. Nós sabemos
que ela tem uma outra vida, uma outra identidade, que suas preocupações
são superiores às de qualquer outra garota da sua idade.
E porra, detesto admitir uma merda dessas, mas por que a minha inimiga
tinha que ser tão, tão bonita?
Porém, não é a realidade, Levi Vodrak, você precisa se lembrar que a odeia,
o monstro que habita em mim tenta me recordar.
Não fazia ideia de quem se tratava e do que ele resolveu armar, mas, por
ora, ignorei e resolvi provocá-lo.
— Não, a única que restou fui eu. — Outro passo certeiro da tal Gabriella.
— Não, não entendi — respondi, já ficando com raiva da sua audácia e sua
insolência para se dirigir a mim. — A última que restou foi a sobrevivente, a
deixada para trás pelos seus pais.
— Sim, eu. — Cada vez mais, ela encurtou a distância entre nós, brava,
enfurecida, seus olhos conectados aos meus todo o tempo. Cerrei minha
mandíbula e senti meus ossos doerem com a força. Que caralhos estava
acontecendo? — A sobrevivente. A deixada para trás pelos meus pais.
Porque assim que a minha mãe biológica descobriu que estava grávida,
vindo a ser da penúltima geração e, automaticamente, transferindo o peso
para mim, sabia dos riscos que sua filha estaria correndo se fosse
descoberta e decidiu, para me dar uma chance de viver longe de ameaças e
de ser caçada, me colocar na porta da casa de uma família, algumas horas
depois de me ter. Eu fui parar na família que tenho hoje, emaranhada numa
manta e com um diário ao lado, que só deveria ser aberto no meu
aniversário de dezesseis anos. Foi quando descobri a minha verdade, a
minha linhagem. Lá estava tudo explicado. Inclusive, tinha tudo o que eu
precisava saber sobre os Gêmeos Vodrak. O bom e o mau. O que nos
ajudava, e o que nos caçava. — Cara a cara comigo, a desgraçada empinou
o queixo, me provocando. — Você, antes de ser cegado pela sua raiva,
deveria ter procurado mais um pouco. Deveria ter pensado mais um pouco.
Só achou que era ela porque, no sentido literal, Evelyn é uma sobrevivente
que ficou para trás. No entanto, uma sobrevivente de uma tragédia, que, por
coincidência do destino, teria a ver com a minha vida, porque meus pais
também foram mortos por você e seus outros vampiros, quando eles
tentaram fugir naquela mesma noite. Aí, você os tirou de mim e achou que
podia tocar na minha irmã? — Num mísero segundo, eu voei para longe,
pelo poder da garota. Quando os vampiros que estavam me ajudando na
vingança foram alcançá-la, ela levantou a mão no ar, e eles caíram também,
gritando e pondo a mão na cabeça, doloridos pelo feitiço que tentava nos
parar.
— Seus burros! — O grito, que parecia ter ficado muito tempo preso, saiu
com muita força por sua garganta, fazendo toda a igreja balançar. O fogo,
que estava sob os pés das duas garotas presas, feito por mim, num segundo,
desapareceu. —
Eu sou a Salazar! É comigo que vocês devem mexer! É muito fácil duelar
com alguém que, teoricamente, não tinha conhecimento sobre seus poderes,
huh?
Todos gritaram, inclusive eu, caído no chão e com uma pressão absurda na
cabeça.
Eu não queria dar o braço a torcer naquele momento, porém estava sem
aguentar, tive de desaparecer junto dos outros.
Enfrentá-la será o desafio mais difícil dos meus 148 anos de existência na
Terra.
O que importa é o tic tac do relógio, cronometrando todo o nosso tempo, que
está diminuindo cada vez mais.
Chego em casa acompanhada de Evelyn, e assim que passamos pela porta,
olhamos uma para a outra e depois suspiramos, à medida que o cheirinho de
comida sendo preparada adentra nossas narinas.
— Acho que a mamãe está fazendo torta — menciono, ao passo que deixo
minhas coisas da faculdade na sala e jogo meus sapatos para o lado, ficando,
finalmente, de pés descalços, o contato com o chão gelado me fazendo
estremecer. Minha irmã, após assentir em comemoração, me imita, deixa
seus pertences juntos aos meus e vem para o meu lado. Aproveito sua
aproximação para entrelaçar nossos braços. Nós nos olhamos ao mesmo
tempo, ela já sabendo exatamente o que se passa na minha cabeça. —
Quando estou prestes a empurrá-la para andar comigo, ela nos freia, fazendo
com que fiquemos estagnadas no mesmo lugar.
— Ué, o que gostaria que eu falasse, que você está fodida? — retruca.
Seria muito mais aceitável para alguém que anda fodendo por aí com o
namorado como se fosse uma coelhinha no cio.
— Por quê? — pergunto, com um sorriso tão debochado que a faz revirar os
olhos. — Está com medo que nossos pais descubram que a nossa bebezinha
já não é mais bebê, porque agora ela já faz bebês estando sozinha com o
namorado ou até com mais pessoas por perto?
— Se você falar qualquer outra coisa, juro por Deus, Gabriella, que vou
matá-la.
Por um momento, fricciono os lábios, para não sorrir diante de sua ameaça.
— Não é comigo que você tem que reclamar, é com Luca. Se ele não abrisse
aquela boca grande dele mais cedo, nada disso estaria acontecendo.
Mas não, ele tinha que se gabar e mudar a visão que eu tinha da minha
irmãzinha mais nova, apenas para me traumatizar para o reeeesto da minha
vida — prolongo as sílabas, dramática. — E ainda me fez perceber que estou
carente, o que é uma droga.
— Falei.
— Falei sim. Inveja — repete a palavra com um certo deboche, sendo a sua
vez de aproveitar a oportunidade perfeita para me provocar e brincar
comigo. — Aceite o quanto antes, que é melhor.
Ela finalmente libera a risadinha que tanto estava segurando esse tempo
todo. É rápida, muito, muito rápida, dá para perceber que não queria ter
perdido o controle, entretanto não é possível ignorar o fato de que está
achando graça das suas filhas sujas bem diante dos seus olhos. Estamos
como fantasmas, assombrações, e é tudo tão surreal, que não conseguimos
nem nos movimentar para nos limparmos. Permanecemos no mesmo lugar,
na porta e de frente para Leah, que está com o seu avental de cozinha branco
e rosa tão sujo e cheio de farinha de trigo, quanto Evelyn e eu.
— Sabe... — Nossa mãe dá uma pausa só para nos olhar de cima à baixo,
enquanto pressiona os seus lábios para tentar evitar continuar dando risada
do nosso estado caótico. E põe caótico nisso, acho que entrou farinha até
mesmo dentro do meu nariz, o que me dá coceira e me faz espirrar. Ao meu
lado, parecendo o Gasparzinho, Sutton me deseja saúde baixinho, ainda de
olho no que a nossa cozinheira favorita tem para falar. Eu também
permaneço estagnada no mesmo lugar. — Vocês até que estão uma gracinha
assim. Será que posso pegar o meu celular para tirar uma foto das duas e
postar no meu Facebook? Já estou vendo aqui, minhas amigas iriam adorar
nossa bagunça.
— Não! — em desespero, Evelyn e eu gritamos ao mesmo tempo. —
— É, mãe, não faça — minha irmã continua, seus olhos podendo saltar das
lentes, agora limpas.
— Por que não? — Sua expressão entristece um pouquinho, o que faz meu
coração dar uma titubeada dentro do peito. — Vocês estão lindas, estão
adoráveis. Eu gosto de poder compartilhar nossos momentos divertidos.
— Sim, nós sabemos e também adoramos, mas esse, dessa vez, terá que ficar
apenas na nossa memória e no nosso coração — eu digo, carinhosa, me
direcionando ao seu lado para entrelaçar nossos braços. —
Não é por nada não, mamãe, é que eu ainda não tenho namorado como a
Evelyn, e se algum gatinho acabar encontrando uma foto minha manchada
de farinha de trigo da cabeça aos pés nas redes sociais, ele não vai mais me
achar tão sexy e durona quanto eu tento parecer.
— Mas por que algum pretendente seu iria entrar no meu Facebook, minha
querida?
— Quem manda vocês ficarem correndo dentro de casa. — Pronto, pode ter
demorado, mas a bronca veio, é o que penso quando me afasto um pouco,
para ver dona Leah espalmar as mãos na cintura à medida que alterna o olhar
entre nós duas. — Achei que estivessem brigando ou que sei lá, uma pessoa
tivesse invadido a casa, então corri para ver o que estava acontecendo.
— Com o pote na mão? — Ergo uma sobrancelha, irônica. — Uma ótima
arma de defesa, pode apostar. Ninguém, absolutamente ninguém, é capaz de
sobreviver à farinha de trigo da dona Leah Faulkner. É
completamente letal.
— Olha só, ela está mesmo fazendo isso — menciono, com a boca ainda
entreaberta. — Estou começando a desconfiar que estava esse tempo todo só
esperando uma oportunidade para nos zoar.
para uma emboscada muito séria e muito grave de vergonha alheia, acho que
devemos ligar para o nosso pai, para contarmos as peripécias de nossa mãe e
a sua vontade de extinguir toda e qualquer chance de uma vida minimamente
sociável de suas duas filhas lindas e perfeitas que jamais se jogariam em
frente a um pote de farinha de trigo, se não tivessem sido atraídas para tal
situação vexatória. — Após terminar de falar meu discurso, que finjo ter sido
muito inteligente e convincente, respiro fundo, porque fiquei um tempo sem
respirar, vendo a garota ao meu lado confirmar cada palavra que saiu da
minha boca, ao passo que a nossa mãe parece prestes a puxar nossas orelhas
de novo, só que dessa vez, de brincadeira.
— Nos limpar — respondo por nós duas, como se fosse óbvio. — Ah, mãe,
não. — Choramingo quando, ao observar sua expressão, percebo o que ela
quer. — Simplesmente não dá para ficarmos assim por mais tempo.
— Você mesma disse que essa imagem adorável das duas não podia ficar em
foto, e sim na memória e no coração. Acho que vou precisar de mais um
pouquinho de tempo observando vocês, só para me certificar de que nunca
me esquecerei desse momento.
Por causa disso, giro nos calcanhares, voltando e indo em direção ao balcão,
para ficar ao seu lado. Evelyn faz o mesmo, se direcionando ao lado oposto,
com mamãe no meio. Leah para de pegar os ingredientes e nos observa, com
um sorriso grande e orgulhoso tomando conta de todo o seu rosto. —
O que foi? — quero saber, curiosa. — O que é que está se passando nessa
sua cabecinha agora?
Não sei como a nossa mãe é capaz de nos aguentar, quando queremos algo,
costumamos ser bem insistentes.
— Não, não é nada não, é que... bem, estou um pouco chorosa agora.
— Dessa vez, ela funga de verdade e seca o canto dos olhos. — Ver vocês
duas assim, próximas, me deixa tão, tão feliz, que não sou capaz de suportar
sozinha tanta emoção. Ver a minha família desse jeito, unida, foi o que
sempre sonhei. Só Deus sabe o quanto rezei e pedi para que momentos assim
acontecessem com frequência, e eu nem consigo acreditar que Ele realmente
me ouviu. Pode parecer boba essa minha reação, mas é que eu estive há anos
esperando por isso. É como ver um grande sonho sendo realizado bem diante
dos seus olhos. — Agora, estamos todas emocionadas, quase chorando. Era
para ser um momento divertido, engraçado, porém Leah conseguiu nos
deixar amolecidas com suas palavras sempre doces e certeiras. Eu ponho a
minha cabeça em um dos ombros da nossa mãe, e Evelyn coloca no outro,
nós três tentando, ao menos, dar um abraço, que mais parece desajustado do
que qualquer outra coisa. Contudo, é bom. Bom não, é maravilhoso. —
Vocês, suas sujinhas, são a minha vida. Eu amo vocês. E espero que
permaneçam amigas para sempre. — Ela ri.
— A gente também ama você. Muito — é Evelyn quem fala, e nós sorrimos,
porque sabemos como significa bastante para ela poder falar assim, em voz
alta, sem medo, sem mais nada a impedindo. — E eu sinto tanto, tanto, por
tê-las afastado um dia. Ainda tenho um pouco de raiva de mim por ter
perdido tantos momentos incríveis que poderia ter passado ao lado de vocês
duas. — No instante em que Leah e eu vamos abrir a boca, ela nos impede,
ao balançar a cabeça. — Sim, eu já sei o que vão falar, já sei que não devo
me culpar e que colecionaremos muitos e muitos outros, como é o caso de
agora, mas, desde que tudo mudou para mim, estou me
— É, acho que está na hora, já ficamos fofas e chorosas por tempo demais.
Se continuarmos assim por mais tempo, a nova torta terá cobertura de
lágrimas, e acho que o gosto ficará uma merda.
Não sei o que é que acontece ou o que falamos dessa vez, porém nossa mãe
desperta, como se estivesse entrando em estado de alerta, e tanto eu quanto
Evelyn nos afastamos do abraço desajeitado, só para vê-la com mais
atenção, tentando entender o que está acontecendo.
E mamãe vai, ela pega uma espécie de luva, põe na mão e abre o fogo,
colocando a cara por ali, para se certificar de como está a situação. Eu fico
preocupada, acredito que Evelyn também, já que a mesma se põe na ponta
dos pés e estica o pescoço para tentar ver alguma coisa a mais, no entanto,
tudo se tranquiliza quando ela volta o rosto para nós, fazendo um positivo
com a mão, que segue com a luva.
Eu olho para os ingredientes que peguei e vejo que não está comigo, só que
antes de eu conseguir detectá-lo, escuto algo sendo aberto, agitado e, quando
levanto o rosto para ver o que é, sinto algo gelado melecando a ponta do meu
nariz.
O som é simplesmente perfeito, assim como o cheiro que vem do forno, que
cada vez mais, nos diz que a torta está praticamente pronta.
Olho para a minha irmã, e a minha irmã olha para mim.
Demora menos do que cinco segundos para que todas as nossas risadas
preencham o ar.
Aqui, eu encontro, além de muito açúcar e muito amor, a mais pura verdade
do universo.
Eu, Gabriella, posso até ser poderosa, contudo, elas são o meu maior poder.
No fim, tiramos todos juntos uma foto para Leah postar no Facebook e dessa
vez, não tivemos como fugir, o dia foi tão divertido, que queríamos todos
compartilhar com o mundo aquele momento, mesmo Evelyn eu parcialmente
sujas de farinha e chantilly.
E o mais importante, claro, queríamos fazer nossa mãe feliz, e ela merecia
compartilhar com seus amigos o tão sonhado e aguardado momento em
família naquela rede social que basicamente ninguém mais usa com
frequência, só ela.
Por ora, eu já acredito que vou gostar. Eles parecem mais brilhosos e mais
definidos, mesmo molhados.
De pés descalços, arrasto os meus pés pelo piso do meu quarto e começo a
desfazer a minha bolsa da faculdade, que trouxe para cima
quando subi, depois da comida. Eu tiro alguns livros de dentro dela e, claro,
meu diário.
— Ufa, o dia foi corrido, e quase não consegui te dar atenção — digo para
mim mesma, após dedilhar mais uma vez a capa em relevo. — Mas agora
estamos só você e eu, bonitinho. Enfim a sós.
Deixo tudo para trás, tranco a minha porta e esqueço do mundo lá fora.
Escorrego para baixo das minhas cobertas, ligo o abajur, encosto as costas na
cabeceira da minha cama e então, depois de muitas tentativas falhas de lê-lo
hoje, o abro nas primeiras páginas.
Durante todos esses anos, desde que o recebi pela primeira vez aos
dezesseis, eu tenho o lido, no entanto, depois do que aconteceu com o gêmeo
do mau e sua ameaça constante pairando acima de mim, venho o lendo com
cautela, analisando palavra por palavra, como se, talvez, fosse encontrar algo
muito importante que talvez tenha deixado passar antes.
Ainda não encontrei nada, que fique claro, mas sigo procurando, porque é
isso que meu instinto está me pedindo.
horrível demais para uma mãe pensar que a sua pequena, que ainda está se
No entanto, pelo menos você poderá saber como esteve a cabeça da sua mãe
enquanto lhe escrevia isso.
Confusa.
Sua mãe biológica, mesmo que pareça no começo, não é nenhuma lunática,
muito menos, vive em uma realidade alternativa, na verdade, quem dera que
fosse.
Sua mãe biológica é uma mulher muito poderosa, e agora, preciso que
respire fundo, pois vou te contar toda a história. Tanto a minha, quanto a
sua.
Inclusive, conheci meu grande amor, seu pai, em um piquenique com amigos
em um dia ensolarado. Ele era o garoto mais bonito e mais disputado do
pedaço. Eu o quis no primeiro segundo em que o vi, mas não tive coragem
de pegá-lo para mim.
Fala sério, na minha cabeça, seria impossível que ele se interessasse por
alguém como eu. Porém, ele se interessou. Ele correu atrás, fez todas as
declarações possíveis, me pediu em namoro e aceitou ficar comigo até o fim,
mesmo sabendo da minha verdade e do meu destino.
Então vamos lá, retomando, eu amava o seu pai, e o seu pai me amava na
mesma intensidade. Nosso amor sempre foi grande demais, ele
transbordava, e aí, por causa disso, veio você.
Nós tomamos todos os cuidados, mas você quis vir mesmo assim. Acho que
você consegue imaginar o susto. Ele foi bem grande. Principalmente, porque
eu não podia. Eu não queria.
Não me entenda mal, filha, por favor, eu sempre quis ser mãe, sempre foi o
meu maior sonho, porém não dava. Não era certo. Eu tinha abdicado desse
desejo há muito tempo, porque estava mais do que convicta que não iria
propagar meu sofrimento e a minha sina. Eu não ia colocar um ser humano
no mundo, para ele sofrer tanto quanto eu, para ele não ter vida.
Eu pensei em não te ter, sendo bem franca, mas eu também não podia. Me
apaixonei por ti no primeiro momento em que te vi naquele ultrassom, e seu
pai só faltou morrer de amores, quando ouviu o som do seu coraçãozinho
batendo pela primeira vez. Foi lindo. Nós dois choramos. De felicidade, de
medo, de desespero, de tudo.
Se você viesse ao mundo, seria nossa alegria, e o meu sobrenome seria o seu
pesadelo.
Sou uma Salazar. Eu venho de uma linhagem de bruxas. Nós duas, no caso.
E essa linhagem está sendo dizimada por alguém que nos odeia. Nosso povo
está morrendo. Nós estamos em guerra.
E meu amor por você sempre foi tão grande, filha, que, para te libertar
desse destino, optamos, seu pai e eu, por te entregar a um novo.
Você teria a chance de ser uma garota normal, você teria a chance de ficar,
e não fugir, teria a chance de ser quem eu sempre quis ser e nunca pude. Sua
felicidade seria prioridade, e mesmo que doa como o inferno pensar em
você longe, é o certo e a única alternativa.
E eu te escrevo essas palavras, porque você precisa saber da verdade. Eu
também devo isso a você, não posso te deixar crescendo, achando que te
abandonei porque quis. Toda a nossa situação me levou a isso. Se eu fosse
outra mulher, se eu fosse normal, comum, nós teríamos sido mãe e filha,
teríamos sido inseparáveis, e eu espero que, se existirem outros universos e
outras realidades, possamos viver juntas o que não vivemos nessa. É tudo o
que eu mais peço. É tudo o que eu mais oro e no que me pego confiando
para aliviar a dor.
E, além de você precisar saber que eu sempre te amei, você também precisa
estar a par das suas tendências e da sua natureza. Se esse seu lado for
aflorado, você pode ser uma bruxa extremamente poderosa. E só você é
quem pode decidir o que vai fazer com isso, não estou aqui para te obrigar
a nada, apenas para te informar e para te pedir que, independentemente da
sua escolha, seja se aprofundar nesse assunto ou simplesmente ignorar, para
continuar vivendo sua adolescência, tome cuidado.
Pelas palavras dela, você consegue notar todo o turbilhão de sentimentos que
ela sentiu enquanto estava escrevendo, você consegue se pôr no lugar dela,
uma mulher que teve que entregar seu bebê logo após dar à vida a ele, pois o
amava tanto, que precisava se certificar que ele crescesse em outra família,
para que não carregasse o peso da dela.
Durante muitos anos da minha vida, me perguntei o que tinha feito de tão
errado, para ter sido abandonada na primeira oportunidade. Era doloroso
pensar que haviam me rejeitado e que eu era tão insignificante, que fui
colocada na primeira porta que encontraram, mesmo com muita sorte de
terem sido a melhor família que eu poderia ter. E também, mesmo amando
muito os meus pais, eu não conseguia não me questionar sobre os motivos
que levaram a minha mãe biológica a fazer isso.
uma irmã e uma família, nada que tivesse me acontecido antes, e ainda
quando bebê, seria capaz de me dar dor de cabeça.
Quando recebi o diário, tudo mudou. E como Zena disse, tudo fez sentido.
Agora um pouco mais calma, ou pelo menos tentando ficar, pego o diário e o
abro de novo.
Ela também contou que, basicamente, estávamos em extinção, que ela era
uma das últimas restantes e que eu, possivelmente também viria a ser. Minha
mãe biológica também descreveu o que eu precisava saber sobre o meu lado
bruxa, sobre os feitiços, sobre controle e sobre como eu encontraria a minha
força.
Ela também não sabia que eu assumiria esse papel com afinco, e sim, me deu
a oportunidade de escolha, mas também não tinha certeza se eu teria
coragem.
Zena nem sabia se eu poderia encontrar meu lado bruxa, quem dirá as outras
coisas.
que acho que posso ser uma das mais fortes de todas. Algo me diz que
ficaria orgulhosa.
Meu coração bate forte, as chamas das velas se intensificam, e o chão sob
mim parece vibrar.
Ele está agitado, assim como minha mente, que só consegue pensar em uma
coisa.
Sim, uma festa. Com bebida, música alta, mulheres gostosas com pescoços à
mostra e tudo.
Elas me enxergam como uma presa em potencial, coitadas, mal sabem elas
que é bem o contrário.
distração, de diversão, de festa, de fazer o que mais adoro, que é beber até
não aguentar mais, ser o centro das atenções e tacar o terror, ao passo que me
infiltro no meio dos humanos, tão perturbados da cabeça quanto eu.
Que posso acabar com todos eles e matá-los, antes mesmo que percebam e
clamem por ajuda, bebendo não mais em copos, e sim diretamente de suas
veias, até não sobrar mais nenhuma gota para me saciar.
A sorte é que a desordem que quero causar hoje, eles vão gostar.
— Não estou sem roupa, estou sem camisa — explico o óbvio, depois de
beber o restante da cerveja no copo. — Sem roupa, vou ficar mais tarde,
quando encontrar uma ou duas humanas, para fazermos nossa própria
festinha em algum quarto dessa casa.
— Opa, eu também quero. — Larkin se agita. — Será que topa uma suruba
hoje?
— Estou cansada de ver seu pau, quero ver mais bocetas na minha frente.
Devon dá risada.
Na mesma hora, Larkin River arregala seus olhos e faz o sinal da cruz.
— Não tô dizendo. — Viro para Devon. — Esse maluco quer dar pra mim.
— É legal, mas agora eu quero só garotas. Os sangues delas são sempre mais
deliciosos, e não tô muito a fim de dividir esta noite. Preciso distrair minha
cabeça ou vou enlouquecer.
— Verdade, tem razão, a piranha daquela bruxa vem comendo seu juízo. —
Larkin, mais uma vez, revira os olhos, e agora por lembrar de Gabriella.
— Eu acho melhor a gente parar com essa conversa, falar as palavras sangue
e bruxa no meio de tanta gente, pode ser perigoso — Devon aconselha, já
que, dentre nós três, é o único mais sensato, que gosta de pensar antes de
fazer ou falar qualquer coisa. Quando precisa, ele é um pouco mais frio e
calculista que Larkin e eu, então preciso constantemente me lembrar de que
necessito ser mais como Mars, quando as coisas saem do controle. Balanço a
cabeça, assentindo, e o vampiro, que está nesse momento usando calça jeans,
camiseta branca e uma jaqueta de couro preta, olha para trás, observando
alguma coisa. É nesse instante que percebo que nós três temos o mesmo
estilo. Sempre jaqueta de couro, calça, botas de combate, óculos escuros,
roupas sempre pretas. As humanas costumam nos chamar de bad boys, e nós
somos mesmo. — A propósito, de quem é essa festa? De quem é essa casa?
Onde nós estamos? — ele quer saber, quando volta a me olhar.
— Não faço ideia. — Dou de ombros. — Essa cidade fica até que próxima
de Emerald Grave, mas a ambientação é bem diferente, dá pra perceber. As
pessoas são meio tontas, principalmente os universitários, eles convidam
qualquer estranho para suas festas. — Sorrio de forma atroz. — Péssimo pra
eles, mas ótimo para nós.
— Por isso que acontecem as coisas, e depois eles acham ruim. — Larkin
cruza os braços, também olhando para a festa. — Humanos são muito
burros, eles sempre acham que não vai acontecer com eles. A sorte é que
você está estranhamente muito calmo, o que foi que aconteceu?
Mais uma vez, sorrio. Adoro saber que eles também sabem da minha fama.
Um belo foda-se para você, humano idiota, tem sorte que eu só arranquei
sua garrafa, não seu coração, reflito, com a minha voz cantarolando dentro
da minha cabeça. Meus pés, sem perderem tempo, marchando até o lugar em
que quero ficar, o sorriso divertido não saindo do meu rosto nem por um
segundo.
— DJ! — Olho para o garoto que está tomando conta das músicas no andar
de cima. — Uma música mais sensual, por favor.
Elas gritam e me apoiam, pedindo para que troque a música.
E o DJ troca.
— Por que não sobem aqui, gatas? — Elas se olham, como se não
estivessem acreditando que falei com elas duas, então faço que sim,
apontando e depois as chamando com o dedo. — Venham, tem espaço para
nós três. Se não tiver, a gente faz caber.
— Dance para mim — peço para a loira atrevida, que já vira para ficar de
frente para mim, encarando fixamente seus olhos e já pondo a mão no seu
pescoço.
Seu cheiro logo atinge minhas narinas. — Ou me beije, gata. Sou seu. Faça o
que quiser.
Não preciso nem pedir de novo, porque ela me beija, e a festa toda vai à
loucura.
— Que tal se formos nós três para um quarto? — indago, sem pretensão, e
quando as vejo balançarem as cabeças ansiosamente na mesma hora, ouço
fogos de artifício e não posso mais segurar meu sorriso malicioso. Pulo para
fora da mesa e dou a mão para elas também descerem. — Vou satisfazer
vocês — sopro baixinho, para que apenas elas escutem. — E espero que me
satisfaçam também.
Lanço uma piscadela para os meus amigos e dou um tapinha nas bundas das
garotas, incentivando-as a subirem mais rápido pelas escadas, eu indo atrás
delas.
Daqui por diante, apenas uma única garota terá minha atenção. E espero que
ela esteja se preparando.
Naquele mesmo dia, eu disse a mim mesma que não importava onde Levi
estivesse, eu ia tentar parar de focar nele e no meu lado bruxa, nem que fosse
só um pouco, para poder pensar mais em mim, no meu lado humano de uma
jovem no auge dos seus vinte e dois anos de idade, porque, sinceramente,
estava precisando.
mensagens só hoje.
Pronto, ela acaba de me mandar outra, sinto o bolso do meu jeans vibrar.
Ah, ótimo, mais drama. Como se a minha vida já não tivesse o suficiente.
Eu sei que Savannah também é uma pessoa dramática, mas se ela diz que
precisa da minha ajuda, ela realmente precisa da minha ajuda. Ela não gosta
muito de ficar insistindo e se está insistindo nesse momento, significa que o
caso é sério.
Quando vejo que ela visualizou, guardo o celular novamente no bolso, enfio
os livros, que estou carregando, dentro da bolsa e faço o caminho inverso do
que eu deveria, indo em direção ao vestiário das líderes de torcida.
Infelizmente, Emerald Grave não faz nem um pouco jus aos meus gostos.
Eu me entupo de cor e hoje mesmo, como não está chovendo, coloquei uma
calça
— Oh, céus, Gabriella. — Corre até mim assim que me vê e logo me segura
pelos ombros, nitidamente afobada. Seu cabelo esvoaçante e loiro
rapidamente fica atrapalhando sua visão, voando em seu rosto, entretanto
está tão focada em controlar sua respiração e ver se eu sou mesmo real, que
nem se dá ao trabalho de tirar a cortina de fios lhe atrapalhando. — É você.
Finalmente você está aqui —
Pisco uma, duas, três vezes, estranhando toda essa sua reação.
Tudo bem que ficamos um tempo sem nos vermos, tudo bem que ignorei
algumas das suas mensagens, mas também não faz tanto tempo assim. E
ontem, eu ainda respondi algumas, querendo saber como ela estava.
Pelo visto, não muito bem, Savannah deve ter mentido para mim.
— Sim, sou eu — digo calmamente, só para que ela não se afobe mais. —
Estou aqui, como me pediu. — Ao perceber que está voltando a si, retiro,
com cuidado, suas mãos dos meus ombros, e a garota, também percebendo o
que acabou de fazer, dá um único passo para trás e abraça seu próprio corpo.
— Pode me dizer o que foi que aconteceu, agora que está mais tranquila?
— É uma coisa muito séria — faz questão de deixar claro, frisando a palavra
muito. — É um caso de...
— Ok, ok. Vou dizer. — Apruma os ombros, respira fundo e tenta se manter
um pouco mais séria e controlada, depois de me deixar descontrolada. —
Não sei muito bem por onde começar, mas acho que devo ir pelo começo.
Mesmo sendo redundante, é o que faz sentido no momento. — Assinto e, ao
erguer as sobrancelhas, peço silenciosamente para que continue, Savannah
entende e engole em seco. — Você deu uma sumida, eu, as meninas e todo
mundo ficamos preocupados, queríamos saber como estava, queríamos falar
com você e te contar as novidades. Entendemos que tinham coisas
acontecendo na sua casa, respeitamos e por isso, não te convidamos para a
última festa recente, que os meninos do time fizeram. Enfim, resumindo a
história, a Gianna ficou bem bêbada, eu me distraí, e quando fomos ver, ela
tinha subido em cima da árvore nos fundos do jardim e aí, quando foi descer,
se desequilibrou, escorregou, caiu e torceu o pé. Foi um desespero total,
porque ela começou a gritar e a chorar de dor. E como eu não tinha bebido
muito, peguei o meu carro e eu mesma a levei para o hospital.
— Merda, Savannah, você deveria ter me ligado. — Será que ela consegue
enxergar a minha expressão e o meu sentimento de culpa? Porque estive tão
atolada no meu próprio problema, que esqueci de conferir como as minhas
amigas estavam. — E a Gianna, o que aconteceu com ela? Ela está bem?
— Sim, ela está bem, está ótima. Pelo menos agora, já está. Mas antes não,
porque achávamos que era só uma torção, porém ela acabou, de fato,
quebrando o pé na queda. Ela vai precisar operar, ficar de repouso, ir para a
fisioterapia e todo aquele processo demorado. O médico disse que não sabe
quando ela vai poder voltar aos ensaios da equipe de novo.
— Sim, mas você a conhece, Gianna Bridges não fica para baixo por muito
tempo. Ela ficou bem triste quando recebeu a notícia, é verdade, porém já
está confiante de que tudo se resolverá o mais rápido possível.
— Espera — começo. — Você disse que vocês estavam ferradas e que eu era
a única solução. Vocês quem? E solução para quê?
— Ah, Gabriella, você era líder de torcida no ensino médio, e era uma das
melhores, nós sabemos disso. Até participou do Campeonato Nacional de
Cheerleading.
— Mas isso faz tempo — a recordo. — Não danço tem anos, provavelmente
estou enferrujada, e se está pensando que posso ser a melhor opção para
substituir Gianna, devo dizer que está equivocada. Eu vou é dar dor de
cabeça a vocês.
— Nada disso, mocinha. Você acha que estou esquecida do dia que fez as
acrobacias na minha casa?
— Porque eu tinha sido vista assim o ensino médio inteiro, eu queria buscar
outros ares. Sempre gostei de dançar e competir, mas depois de ter feito isso
por tanto tempo, eu meio que cansei. — Dou de ombros. — E eu tinha um
namorado que era quarterback, lembra? A gente terminou, e eu fiquei com
um pouco de ranço de atletas. Não queria ficar agitando pompons e torcendo
para eles por aí.
— Não vejo como voltar a ser líder de torcida pode ser um problema para
você, Gabriella.
É melhor você permanecer assim.
Inspiro uma grande quantidade de ar para os meus pulmões, sabendo que ela
não vai aceitar outra resposta, a não ser a que ela quer.
— Ok, mas siga o meu conselho. Continue procurando garotas, não pare,
porque você pode se frustrar quando me ver dançar. — Semicerro os olhos e
ergo
um dedo em riste.
— Duvido muito que isso vá acontecer, mas isso nós veremos amanhã. —
— Ah, você não só pode, como vai. Já estudou muito esse tempo que quis
ficar sozinha, agora vai se manter inteirada de todas as novidades, e ai de
você se reclamar.
Assim que me olha com cara feia, muito, muito brava, eu fecho a boca no
mesmo instante, não querendo contrariá-la, apenas aceitando quando passa a
nos conduzir.
É, eu disse que precisava focar mais em mim agora e acho que devo começar
por esse momento, começar pelos meus amigos.
Fui bastante ingênua, pensei que Savannah iria voltar atrás na sua ideia e
que, de ontem para hoje, iria encontrar uma nova garota para substituir
Gianna, sem ser eu. Mas é claro que foi apenas um pensamento bobo e
esperançoso meu.
Tanto Savannah quanto todas as outras ficaram felizes, e eu não tinha como
ser a chata quebradora de clima, não quando elas realmente estavam
necessitando da minha ajuda e não quando todas elas decidiram mostrar a
falta que eu estava fazendo, me recebendo com gritinhos e abraços calorosos
repletos de sinceridade.
Mesmo sabendo que sou e sempre serei boa, ainda tinha medo de
decepcionar as garotas.
Não por nada, mas porque não sabia se podia me dedicar cem por cento, do
jeito que precisavam. Eu ia tentar. E ia tentar por esse ensaio, que prometi e
do qual não podia fugir.
Por isso que vim correndo para cá quando as aulas acabaram, no horário em
que marcamos.
Como está? Está bem? Está animada? Preparada? Comeu e dormiu bem?
— Sim, sim e sim — respondo, quase podendo dizer: é, nem tanto assim.
Para muitas das perguntas. — E olá, meninas. — Aceno quando as vejo, se
vestindo, olharem para mim.
— Olá, Faulkner, nossa salvadora — é Maya Shaw quem diz, uma das
nossas amigas mais próximas também. Ela é tão espontânea quanto
Savannah, tão positiva quanto Gianna e tão famosa quanto... hm, é, acho que
ela mesma. Maya tem uma grande quantidade de seguidores nas redes
sociais e é uma das blogueiras mais queridinhas da cidade, que dá dicas de
beleza, tanto de maquiagem quanto de cabelo, e ainda agracia a vida dos
seus amigos da internet com os seus vídeos de dança e com os seus vídeos
mostrando toda a sua rotina como líder de torcida na universidade. E o
melhor de tudo, não é nem um pouco metida, tão pouco dá ataques de
estrelismo, como se se sentisse superior. Ela é ótima, e eu me identifico
muito com seu conteúdo, porque somos ambas negras e de cabelo cacheado,
mesmo que com diferentes curvaturas, e eu adoro pegar dicas de hidratações,
cremes e de finalizações. Acho que já deu para perceber que sou viciada
nessas coisas. — Seu cabelo acordou lindo no day after, o que foi que você
usou? — Não só eu, Maya é outra viciada, também deu para perceber.
— Os leave-ins da Briogeo?
— Por isso que te chamei assim. — Pisca. — Agora vai logo, sou muito
rigorosa e não tolero atrasos de jeito nenhum. E você está, tecnicamente, três
minutos atrasada.
— Tudo bem, tudo bem, já vou. — Começo a andar até os bancos, para
poder pôr as minhas coisas em cima. — Você parece uma general, eu hein —
resmungo, já de costas para ela, sem poder ver sua reação. — Reclame mais
um pouco comigo, e eu vou embora — brinco.
— Não estou reclamando, você pode fazer tudo o que quiser, linda.
Para a minha infelicidade e o meu completo azar, não somos só nós que
estamos presentes aqui, há alguns jogadores e outros curiosos, que
descobriram que Gabriella Faulkner vai dançar junto das líderes, também
vestindo o uniforme.
Eles estão de olho na minha saia, ou melhor, mini saia, que deixa minhas
pernas bastante expostas, e simplesmente não conseguem disfarçar. Estão
todos concentrados no nosso treino, nem piscam.
Olho para os pompons em minhas mãos e penso que não vai ter jeito, vou ter
que dar o show que todos eles querem. O mesmo show que Savannah
também deseja.
— Ah, sem problema, eu me lembro da dança, acho que vai ser bom.
— Não há nada em mim que não seja bom, docinho. — Aperta meu queixo
por um segundo e depois dá uns bons passos para trás, para poder ver melhor
a formação das meninas. Ela ergue a mão em um joinha, quando percebe que
está tudo em seu devido lugar e depois pega o apito em seu peito, para
prejudicar nossos ouvidos. Eu contraio o rosto em uma careta ao escutá-la,
assim como Maya e todas as outras. — Vou contar até três, vou pôr a música
e quero que vocês só...
minha atenção. — Venha um pouco mais para frente, por favor, quero você
sendo o foco. Incorpore a garota que te habitava no ensino médio, e todas
nós estaremos realmente salvas.
— Ok, capitã! — alguém grita, e não consigo perceber quem foi ou de onde
veio. — Boa sorte, Gabriella! — a pessoa também emenda.
Viro para trás, dando um sorriso e um aceno para todas como agradecimento.
Eu não lembro dos meus problemas, principalmente dos últimos tempos, não
lembro de Levi, de suas ameaças, de sua presença, que pode chegar a
qualquer momento e, principalmente, não lembro que não sou como as
outras que dançam comigo.
Eufórica e com o peito subindo e descendo, não sei se o som vem dos atletas
na arquibancada, se vem de Savannah, sem vem da gente ou se é uma
mistura de tudo junto. Voto na última opção, porque com certeza é o mais
provável.
— Meu Deus, meu Deus, meu Deus! — Summers exclama, quando começa
a saltitar até nós. Eu me levanto e quando percebo, estou sendo engolida em
um abraço por todas as líderes de torcida, que passam a rodar junto comigo.
E é claro que Savannah permite e faz parte da bagunça. — Ficou perfeitoooo
— prolonga as
sílabas para mim, quando eu me separo para buscar ar. — Do jeitinho que eu
imaginei. Não, estou errada, não foi do jeitinho que eu imaginei, porque
você, Gabriella, conseguiu superar todas as minhas expectativas. E devo
dizer que estou impressionada, você teve uma harmonia e uma conexão
incrível com todas elas. É
Quando eu vim, não achei que pudesse me sentir desse jeito, porém não
posso ignorar a verdade. Não posso ignorar que, no fundo, sempre serei uma
líder de torcida, não importa quanto tempo eu me mantenha afastada. É
como andar de bicicleta, uma vez que você aprende, já era, jamais será
apagado da sua memória, se lembrará para o resto da sua vida.
Não penso, apenas falo, deixo que meus desejos sejam atendidos, antes que
meu lado racional decida se expressar primeiro.
— Ai, que chique, que lindo, que tudo. — Seus lábios fazem bico, e dá para
perceber que está realmente emocionada. — Que tal mais uma coreografia
de comemoração? Dessa vez, não tem regra, vale tudo, incluindo deixar os
jogadores babando.
A capitã, ao ouvir a música, logo se junta na nova bagunça que está prestes a
começar.
Eu não sei se a gente é capaz de seduzir alguém com o que estamos fazendo,
é muito mais uma dança da comemoração, do que qualquer outra coisa.
Estamos brincando, leves, nenhuma, de fato, ligando para quem quer que
esteja nos olhando.
— Porque não sou, sou só amigo de alguns deles. E você, líder de torcida,
uh?
— Não, não estava. — Ele me olha de uma forma desconfiada. — Por que
você parece tão surpresa com a minha resposta?
— Ué, pelo óbvio. Não é você, Cody Davenport, que ficou conhecido como
o riquinho baladeiro que desperdiça dinheiro? — Cruzo os braços, mordendo
um sorriso. — Pois então, achei que não fosse capaz de perder nenhuma
festa, pelo menos não ainda vivo.
— Olha só, então ela ouviu falar de mim por aí. — Suas palavras gotejam
malícia e um pouquinho de soberba. É perceptível que está se sentindo
porque, na sua cabeça, acha que saí por aí querendo descobrir coisas ao seu
respeito. Muito pelo contrário, na verdade. Eu mesma nem o conhecia,
nunca nem tinha o visto ou sequer reparado no campus, só fiquei sabendo do
acontecido como todo mundo, ouvindo da boca de outra pessoa, simples.
Sendo bem sincera, não vou falar nada, vou deixar que continue pensando
dessa maneira, que continue se iludindo. Não sei outras mulheres, mas eu,
particularmente, gosto de ver até que ponto a autoestima de um homem é
capaz de chegar. Pela minha experiência, é sempre muito, muito longe. De
um jeito que você nunca viu igual. — Que pena, eles sempre exageram. Eu
estava apenas bêbado naquele dia, e, por causa desse dia mesmo que saiu o
vídeo, meu pai me proibiu de frequentar festas pelos próximos
— Eu que o diga.
Paro na mesma hora que a vozinha da minha cabeça diz que estou sendo
uma idiota insensível.
Desculpa, Gianna, não vai mais acontecer.
Por sorte, acho que Cody escuta a mesma voz na sua cabeça, também
parando, só que com um fantasma de um sorriso ainda passeando por sua
boca.
— Por favor, Gabriella, me diz que a sua amiga está bem e fora de perigo,
estou com um pouco de peso na consciência agora.
— Não, não por isso. Por ter agradecido, só por um momento, por ela ter
decidido ficar um tempo fora da animação das líderes de torcida.
— Porque ver você dançando no campo com aquele uniforme foi a coisa
mais esplêndida que meus olhos já presenciaram. Naquele momento,
também agradeci por enxergar. Era como se eu estivesse presenciando um
acontecimento, um fato histórico, algo que ficaria marcado para sempre na
história da humanidade.
— Nossa, que exagero. — Bufo uma risada, enquanto desvio do seu olhar
por um segundo. — Aquilo não foi nada, sério. As meninas se destacaram
muito mais do que eu.
— Foi sim.
olhos em fendas, fingindo. — Já disse, eu não dou chances para quem agride
o meio ambiente.
— Ei, a coisa está indo para outro patamar. — Toca o meio do seu peito,
também entrando na encenação. — Que tipo de acusações são essas? Eu
nunca agrediria o meio ambiente. O único crime que cometi, foi já ter jogado
papel de bala no chão, isso eu confesso.
— Só que você agrediu naquele dia, com palavras. E aposto que fez muito
mais do que está dizendo, aposto que já desperdiçou água também.
— Como sabe?
Balanço os ombros.
— Por acaso, anda vigiando meus banhos, e eu não estou sabendo, Gabriella
Faulkner?
Tento parecer séria, sem dar nenhuma brecha de que quero sorrir, e continuo:
— Não, é só que, como eu disse, conheço seu tipinho. Nada vai fazer com
que eu esqueça seus insultos às plantas e sua falta de empatia pela natureza.
— Qual é, gata, o que eu podia fazer? Aquela aula estava tediosa pra
caralho.
— Que mentira, você estava tão entediada e tão prestes a morrer quanto eu.
Tento muito continuar mantendo a pose e toda a encenação, juro que tento,
porém não aguento ver seu olhar sobre mim. É quase igual ao dos meus pais,
quando me pegavam mentindo na infância pelas coisas mais bobas possíveis.
— Ok, tudo bem, você venceu. Culpada. — Ergo as mãos entre uma risada e
outra. — Mas não pense que você não está no meu radar de desconfiança
ainda, porque está. Uma coisa é você achar a aula chata, outra coisa é você
achar as plantas chatas. E quem não gosta de plantas, bom sujeito não é, é o
que vivo dizendo.
— Caramba, já percebi que você não vai esquecer isso tão cedo. Será que
não tem nada que eu possa fazer para mudar essa sua opinião sobre mim?
— Ok, invasor. — Lambo os lábios de uma forma tão ardilosa, que até o
deixa desconcertado, seu pomo-de-adão descendo e subindo em sua
garganta. — E
tem certeza de que pode ser em qualquer lugar? Tem certeza de que pode me
deixar escolher?
— A mais absoluta das certezas, você tem cara, mas não pode ser tão má.
— Ah, posso ser sim, porque estou pensando em te levar para conhecer a
natureza, te fazer ter um contato mais íntimo com plantas, sabe como é, para
que nunca mais reclame delas de novo.
— Talvez... — Deixo no ar, só para lhe dar esperanças, sabendo que vou
cortar logo em seguida. — Ou, quem sabe, em um jardim bem bonito.
Talvez em uma floricultura, em algum viveiro. — Dou de ombros. —
Poderíamos plantar mudas também. Quem sabe.
Jogo a cabeça para trás para poder rir, sua expressão falando por si só o quão
tedioso nosso encontro seria se fizéssemos qualquer uma dessas coisas
mencionadas.
— Sem ter nada a ver com planta, Gabriella, por favor — solta, quase em
desespero.
— Hm, vamos lá. Vamos falar sério agora. Caso não tenha percebido, eu
ainda não aceitei cem por cento do seu convite. Estou pensando e dessa vez,
juro que não tem nada a ver com plantas.
Ao mesmo tempo que parece achar graça, Cody parece espantado com a
minha escolha de palavras. Tenho certeza que muitas pessoas também
ficariam assim, caso me ouvissem, mas o que posso fazer? É a droga da
verdade.
Essas mesmas pessoas, caso me ouvissem agora, poderiam achar que estou
no mesmo patamar de autoestima dos homens, só que, se eu pudesse
retrucar, diria que não estou. E não estou mesmo. O que estou sendo, é
realista. Sei muito bem a fama de Cody, e ele mal me conhece, não tem
como não pensar o que estou pensando. Até porque, seria surreal demais
pensar que o cara conhecido por ser herdeiro de boates e que vive em
camarotes com strippers, soltando dólares e mais dólares, me viu uma vez e
pensou: “nossa, quero um encontro com ela, quero levá-la para jantar em
um restaurante à luz de velas, escutar cada uma das suas histórias, estar
inserido em sua vida, mesmo que minimamente, e depois deixá-la segura na
porta da sua casa, e me despedir com um casto beijo na testa” .
Fala sério, não sou besta. E tão pouco estou dizendo que ele está errado em
querer o que ele quer, apenas estou pondo os fatos na mesa, para deixar tudo
bem esclarecido. Para nós dois.
— Tá, caso seja verdade o que você disse, você não deseja me comer
também, não?
Continuo com uma careta no rosto, no entanto, não estou assim de fato.
— Tudo bem, você pode aceitar o nosso encontro e me responder lá. Que
tal?
Hm, merda, agora não tenho para onde fugir. Gosto das tiradas dele, da
forma como nossa conversa flui bem e de como rimos à toa, um sempre
entendendo as brincadeiras do outro. Meu humor meio sem graça combina
com o dele, e, assim como eu, Cody tem resposta para tudo. Ele é bom nos
jogos, nos flertes, é decidido, sabe o que quer e é bem bonito, não posso
negar.
Tudo bem que seu estilo de mauricinho não é meu favorito, porém há algo
nele que me deixa entretida. Eu poderia ir para a cama com ele por isso,
estou precisando, e acho que seria uma boa deixá-lo me tirar da seca, já que
entrou no meu caminho e quis roubar minha atenção. Porém, entretanto,
todavia, a minha intuição, e dessa vez não sei se de mulher ou de bruxa, me
diz que não me parece tão certo assim…
Talvez possa dar ruim, e para Cody. Ele pode ficar em perigo por minha
causa. Não estou no meu melhor momento para adicionar pessoas novas à
minha rotina.
Contudo, é só uma noite, uma ficada, uma coisa de momento. Minha vida de
bruxa perseguida não poderá afetá-lo.
Certo?
Não vai dar em nada, eu repito para mim mesma, quando o vejo sorrir de
forma ladina.
— Quantos neurônios será que você fritou nessa? — Devon Mars também
participa.
O ruivo joga a cabeça para trás e revira os olhos de uma forma tão intensa
que, por um momento, penso que suas írises se perderão lá dentro.
— Só… cala a boca. Por um momento. Apenas para a minha dor de cabeça
passar — suplico, enquanto massageio as têmporas.
Balbucio coisas que nem eu mesmo entendo, à medida que sinto o olhar dos
dois me queimando, sem lhes dar nenhuma resposta. Estou totalmente
concentrado em massagear, com certa agressividade, cada lado da minha
cabeça.
— Acho que o problema do Levi não deve ser sangue — Devon diz ao
outro, como se eu não estivesse nem aqui. Mereço.
Depois de um tempo, voltam a olhar para mim, dessa vez com mais
intensidade.
Com tédio igual a mim, Devon se joga para trás, seu corpo imenso quase
afundando o colchão que mal está suportando a nós três.
— Não queria falar nada, mas estou com o mesmo pensamento. Não é nada
legal ficarmos nos escondendo como se fôssemos as vítimas, não quando é a
porra do contrário. Por que aquela bruxa está livre, e nós não? — Seu tom
de voz mudando revela que, como eu, Mars está a um passo de explodir. Dá
para ver quando a escuridão toma conta das suas feições e o deixa sombrio.
— Longe de mim ir contra você, Vodrak, sabe que concordei com sua ideia
desde o princípio, tanto que estou aqui com você até hoje, mas não acha que
estamos demorando demais, não?
— Não — sou direto e reto, pois não gosto de joguinhos ou rodeios. Não
com eles, meus braços direitos, meus amigos, as únicas pessoas que tenho
próximas. — Tudo no seu tempo. Já aprendi que não podemos deixar a raiva
falar mais alto, como antes. Sacrifícios são importantes às vezes. Agora, a
gente perde; lá na frente, a gente ganha.
— Eles vão achar que estamos com medo, que somos fracos.
Meus amigos acham que somos família, que, mesmo que briguemos feito
cão e gato, jamais seríamos capazes de matar um ao outro. Na cabeça deles,
nós morreríamos um pelo outro, e isso só porque nunca, de fato, entramos
em combate, apenas mantemos uma guerra fria durante todos esses anos.
Mostra que eles não entendem de porcaria nenhuma, pois, por mais que eu
tenha brigado com Luca por décadas a fio, ainda tentei fazer a minha parte
de família, mesmo até o último segundo.
Ele esteve o tempo todo contra mim, esteve o tempo todo me traindo,
escolhendo pessoas desconhecidas como prioridade e colocando qualquer
um na minha frente, inclusive Evelyn, sua namorada humana, e até mesmo
Gabriella, a última bruxa de uma linhagem que nos matou, que nos
machucou, que tirou tudo de nós dois e fez com que vivêssemos para sempre
em agonia.
Sua vida estúpida e mentirosa de humano, seu amor, seus amigos, sua
cidade.
Eu quero ver tudo pegando fogo.
Foda-se, é tudo o que eu tenho a dizer, porque sei que ninguém nunca vai
entender meus sentimentos mesmo. Não importa o que eu faça, não importa
o quanto eu tente, eu sempre serei o errado, afinal, ninguém para e tenta
escutar ou entender o Levi. O Levi está marcado na história como mau,
como descontrolado, ele sempre será visto dessa forma. E é isso que eu sou
mesmo. É esse lado que quero que vejam em mim.
— Até mesmo ele — garanto, com os meus dentes rilhando uns nos outros.
A raiva é tão grande ao pensar nele, ao pensar em tudo que vivemos, todas
as dores que sentimos, que enxergo tudo vermelho e sinto o meu interior
vibrar. É
como se eu tivesse uma besta, uma pessoa à parte dentro de mim, e ela
sempre fica instigando e aflorando o meu pior. É horrível, desesperador,
tento lutar contra e constantemente falho, perco as árduas batalhas, e talvez
essa seja uma das merdas da maldição da qual não consigo me livrar. Na
verdade, do que foi que eu me livrei? Nada. Nada é a resposta. — Ele não
foi capaz de se juntar a mim, então terá que aguentar o tranco de ter ficado
contra. Não vou facilitar. Para ninguém. Nem para ele, nem para a sua
namoradinha patética e muito menos para aquela bruxinha endiabrada.
Não sei o que posso ter falado para despertar isso em Devon, porém ele
esboça um pequeno sorriso de lado, assim que me escuta.
— Por que está parecendo tão debochado, idiota? Tem medo de morrer, não?
— Olha, que milagre, Larkin River falando algo que preste pela primeira
vez.
Não.
Devon, Larkin, e eu... nós três somos algo diferente. O que temos é único.
Temos muitas histórias, muita confiança, e, por mais que eu não confie em
ninguém nesse mundo, nesses dois idiotas eu confio mais do que em mim
mesmo.
Eles também sabem disso, inclusive. Sabem que o que temos não se compara
com nada, e que todas as minhas reclamações acerca das minhas revoltas e
mágoas, de nada tem a ver com qualquer um dos dois. Essa é só mais uma
das formas que encontram para me provocar.
Sinceramente, eu deveria odiá-los, assim seria muito mais fácil para a minha
sanidade. Como posso passar tanto tempo em suas companhias sem surtar?
Sem sentir uma vontade, mesmo que mínima, de matar e esganar pescoços?
Os deles, de preferência. — Cansei desse assunto, cansei de falar sobre
Luca, Gabriella ou Emerald Grave. Por que não falamos de outra coisa ou
então, sei lá, ficamos calados?
Hoje está um inferno, nunca senti nada parecido. A minha cabeça parece que
vai explodir, e dessa vez não é nem exagero ou drama referente ao fato de
esses vampiros atiçarem meu lado com pouca paciência. É que realmente
está doendo.
— Não, na verdade eu quero, sim, falar sobre Luca, porque acabei de me dar
conta de algo sobre ele. É algo que já venho pensando, criando teorias e só
não tinha falado ainda, porque não tinha encontrado brecha.
Quando River se levanta, Devon Mars e eu trocamos um olhar que
basicamente diz: “ei, por acaso você sabe me dizer o que está acontecendo?
”.
Pela expressão dele, que é exatamente igual a minha, tenho certeza que está
tão perdido quanto eu.
Uma vez que não temos respostas, nossos rostos, no mesmo instante,
acompanham o ruivo andando pelo quarto em busca de algo que só ele sabe
o que é.
Larkin vai na gaveta, pega algo e quando retorna, está com uma foto virada
para si em mãos.
— O que é isso?
Não responde, apenas se senta de volta na cama, agora com Devon em seu
encalço, esticando o pescoço para a foto, só de curiosidade.
Faço o mesmo, me junto mais perto deles para poder olhar melhor.
— Você deixou essa foto cair, Levi — informa, a confusão fazendo nós e nós
em meu cérebro. Em um primeiro momento, acho que sou eu na imagem,
mas não demora muito para eu perceber que não é. — Estava na sua pasta de
investigação, acredito eu. É o Luca.
Sim, obviamente é meu irmão gêmeo, como suspeitei. Podemos até ser
parecidos, porém eu sou muito mais bonito. E estiloso também. Luca não
sabe como cortar o cabelo direito e não usa jaquetas de couro, apenas
jaquetas ridículas do seu time de hóquei ridículo. Faço a maior força
extracorpórea para não revirar os olhos aqui.
— É. — Devon parece inquieto. — Por que você a guardou nas suas coisas,
ao invés de devolver para o lugar em que supostamente estava?
— Nossa, calma. — Ergue a palma, tanto para mim quanto para o outro
vampiro ao seu lado. — Será que vocês poderiam, por favor, só uma vez na
vida, me levarem a sério e me deixarem explicar? Não é nenhum tipo de
graça, estou mesmo querendo falar algo importante aqui.
Acho que eu mesmo já a vi incontáveis vezes, por anos, e ela é só uma mera
lembrança, um papel descartável, que só não joguei fora ainda, porque... me
esqueci.
— Ok, vou falar. — Larkin respira fundo, como se fosse fazer o discurso
mais importante, para o qual ele precisa se preparar para não errar ou não
deixar dúvidas. — Eu encontrei essa foto no chão do quarto e, assim como
você, Levi, assim como você, Devon, eu não vi nada demais. Era só uma
foto qualquer, uma em que ele andava pelas ruas, à tarde, é bom frisar isso, e
que não me interessava em nada. Então, quis rapidamente colocá-la de volta
no lugar, porém antes que eu pudesse fazer qualquer coisa com ela, algo me
chamou atenção na foto, e eu parei um instante para tentar decifrar o que era.
Não sei quanto tempo levou essa minha busca, não sei se foi rápido, se eu
bati o olho e logo percebi ou se realmente demorou algum tempo, no
entanto, quando percebi, já tinha encontrado e me dado conta do que era.
Larkin faz uma pausa dramática, e todos os meus nervos se abalam com sua
maldita demora em ser objetivo.
— De que bruxas fazem feitiços em pedras — explica, fazendo todo meu ser
congelar, tanto por dentro quanto por fora. — Certa vez, fiquei com uma
vampira em Atlanta. Ela estava desesperada, porque tinha perdido seu colar
de pedra de água marinha bruta, uma pedra da natureza em que uma amiga
bruxa dela tinha feito feitiço para que ela pudesse andar normalmente entre
os humanos, de dia e de noite, enquanto controlava seus impulsos por
sangue. Quando percebeu que havia o perdido, tentou voltar para o local em
que acreditava que podia ter caído, mas foi tarde demais, não o encontrou.
Lembro até hoje que ela dizia que algum humano podia ter visto e pegado
para usar, porque sempre a paravam para elogiar o colar em seu pescoço. —
Leva a foto para mais perto do seu rosto. — Fico me
perguntando se não é essa a pedra de água marinha, pois faria total sentido,
principalmente porque esse é o elemento do Luca. A água. Teria o feitiço da
bruxa e ainda teria a conexão da natureza, o que explicaria todo o seu
controle, toda a sua perfeição em se misturar e levar uma vida de humano
normalmente, sem levantar suspeitas, e, claro, o fato de ele conseguir andar
no sol. Não era isso que você vivia se perguntando e querendo descobrir?
Como ele consegue andar tranquilamente?
Olhando dentro dos seus olhos, eu tento ficar sério, entretanto, depois de
poucos segundos, estou rindo.
Acabo bufando mais uma risada e dessa vez, sem humor, algo estranho em
mim, se revirando por dentro. — Impossível mesmo. — Não sei se estou
querendo convencê-lo ou me convencer no processo. — Luca não poderia ter
encontrado esse colar, as contas não batem.
— O que nos dá mais pistas de que esse pode ser, de fato, o colar perdido —
Larkin continua firme e forte com sua teoria, parece até mais feliz, mais
convicto.
— O Luca pode ter encontrado sem querer. O filho da mãe pode ser um
sortudo.
— Ou, como sempre, você está viajando, fazendo a gente viajar junto, e isso
não passe de um colar brega qualquer. Eu até entenderia, visto que meu
irmão não é o melhor no quesito se arrumar e parecer minimamente decente,
como eu costumo parecer. — Dou de ombros. — Esse controle dele e essa
habilidade de andar ao sol pode não ter nada a ver com isso, pode ter a ver
com poderes. Talvez ele tenha descoberto em si próprio, sozinho, um jeito de
controlar seu lado mais primitivo e animal. Com o tempo, ele pode ter
adquirido esse dom. — O que, com certeza, me faz odiá-lo um pouco mais.
— É por isso que ainda estamos aqui, indo com calma — o lembro. — Não
podemos subestimá-los, eles querem e estão esperando por essa luta, tanto
quanto nós. — Minha mente, sozinha, volta no assunto do colar, quando
ficamos em silêncio, e eu simplesmente não consigo controlar a minha
língua. — Sobre o feitiço, River, é verdade mesmo que uma bruxa é capaz
de fazer uma simples pedra ser capaz de ajudar um vampiro descontrolado e
em agonia?
— O problema é que, na maioria dos casos, 99% deles, uma bruxa não vai
querer, nem fodendo, se aliar e ainda por cima ajudar um vampiro, não
importa de que linhagem venha. Essa rixa sempre falará muito mais alto, por
isso que é raro, e não temos conhecimento de muitos casos assim. — Devon
volta a se deitar na cama, fitando o teto e com as mãos entrelaçadas em cima
da sua barriga.
— E feitiço assim, não é qualquer uma que faz, tem que ser forte, tem que
ser poderosa, tem que saber o que está fazendo, afinal, controlar um
vampiro, principalmente um amaldiçoado, não deve ser coisa fácil — River
completa seu raciocínio, e eu assinto. Dessa vez, nenhum dos dois está
mentindo. — É bom tomarmos mesmo cuidado.
— Sim, devemos, mas a sorte é que também não precisamos — Mars fala, e
me vejo engolir em seco. Não sei se é por tocar nesse assunto ou se é por
causa da minha cabeça mesmo, porém a sinto latejando um pouco mais forte
do que antes.
Sempre invejei Luca, sempre quis descobrir como ele conseguiu viver bem,
como conseguiu lidar com o monstro, com a besta dentro de si, como fez
para seguir com a sua vida normalmente e, muito mais do que andar no sol,
sempre quis saber como pôde ter superado, obtido controle, se salvado da
maldição, quando eu passei todos os meus anos aqui, na mesma, fingindo,
sendo usado de marionete para o monstro da sede por sangue, da sede por
destruição, queimação, ardor, fogo, que vive dentro de mim.
Há uma possibilidade.
Com dificuldade, tento alcançar a pia, minha cabeça voltando a doer, dessa
vez mais forte do que antes. Seguro um grito de dor na garganta e assim que
ergo
E agora não.
Agora não.
Agora não.
— Ei, Levi, vai demorar muito aí dentro? — É algum dos meninos que se
aproxima, bate na porta e me assusta, me fazendo voltar à realidade. Ao
olhar de novo para o espelho, tudo some. Sou eu de novo, sem presas, sem
monstros aparentes. — Anda, cara, me responde, estou querendo fazer uma
coisa.
Tremor.
Tudo o que eu vejo é tremor.
Por que não consigo fazer com que elas parem de tremer?
Não por querer, mas porque era necessário. Eu desconfiava do que podia
estar acontecendo comigo, desconfiava o que podia ser a dor de cabeça, os
tremores, a irritação, a fraqueza varrendo meu organismo como se eu tivesse
passado dias longe de sangue, conseguia imaginar, por tudo que vivi, que era
aquilo querendo dar seus primeiros sinais de que estava voltando. E
justamente por eu saber, que eu não podia dizer a eles o que estava
acontecendo, precisava disfarçar e fingir, como sempre, que eu estava
perfeitamente dentro dos conformes e seguindo como o planejado.
Eles têm uma outra imagem de mim, uma que possivelmente ninguém do
nosso mundo é capaz de ter, e eu não queria, sob hipótese alguma, que
vissem o verdadeiro eu, a face que tento, a todo custo, esconder, tanto dos
meus amigos quanto dos meus inimigos. Queria que continuassem vendo
que sou, dentro da nossa realidade sobrenatural, minimamente normal, e foi
por isso que permaneci
Achei que fosse dar conta, torci, até o último minuto, que não fosse nada do
que eu estava pensando, para eu poder melhorar o quanto antes, entretanto,
as coisas pioraram consideravelmente, para o meu terrível azar.
Passou a ser insuportável e, durante os últimos dois dias, fiquei mais fora, do
que no hotel junto dos outros, tanto para me esconder nas sombras, quanto
para pensar, porque eu não aguentava mais, de tempos em tempos, durante
anos e anos, ter que passar por essas merdas, ter que sofrer por causa da
maldição que uma bruxa Salazar me rogou. O sentimento sempre foi brutal,
as dores sempre foram além de físicas, e por mais que essas questões de
sintomas que me deixam fraco sejam tenebrosas, elas não conseguem ser a
pior parte para mim, mesmo que ainda seja muito difícil de suportar.
A pior parte para mim, sempre foi perder a porra da cabeça, a porra do
controle, como se uma força superior e caótica estivesse tomando conta do
meu interior e de todas as minhas ações, obviamente, contra a minha
vontade. Bastava uma única coisa para me tirar do sério, pequena que fosse,
e, quando eu percebia, coisas grandes e maléficas aconteciam, e pelas
minhas mãos. Eu só vinha cair em mim, quando a merda tinha sido feita e
não podia ser revertida. Meu ódio mortal por bruxas e a minha caçada a elas
se deu justamente por causa disso, se eu tinha que viver para sempre sendo
um monstro, eu ia começar sendo um monstro destruindo Alma, a que tinha
me amaldiçoado, e todas as outras, mesmo que eu me destruísse e me
perdesse completamente no processo, que foi o que aconteceu.
Não sei como é a sensação e nem ao menos sei se pode ser possível, porque,
desde que me transformei e morri, não conheço outra vida, a não ser a que
eu levo.
Ou melhor, a que eu decidi levar, e ela não é nem um pouco parecida com a
de Luca. A realidade, é que ela não é parecida nem mesmo com a que eu
faço questão de mostrar e de deixar claro para a história e para as futuras
gerações de vampiros.
Com as mãos dentro da jaqueta, eu entro no bar, depois de ter passado horas
e horas o rondando, esperando a hora certa.
É o famoso Potion’s.
Ao passo que caminho para dentro, passo os dedos pelo queixo e evito rir.
Porque sim, é irônico para um cacete esse lugar, tendo em vista que a dona é
uma bruxa de verdade.
E uma das poucas, senão única, bruxa que reside nessa cidade.
Eu não sabia sobre sua existência, que fique claro, até porque não procuro
saber sobre esse tipo de gente, não me interessa se não for Salazar, e só
fiquei sabendo quando resolvi ligar para outros conhecidos meus e perguntar
se eles sabiam me informar o nome e a residência de uma bruxa mais
próxima de mim.
Obviamente, não podia ser Gabriella, e para a minha sorte, Journee estava
bem aqui, tão perto, que seria extremamente fácil achá-la para tentar
arrancar as imprescindíveis informações que necessito.
— Olá. — Abre novamente um meio sorriso e dessa vez, só para mim, o que
já me parece um perfeito começo. Poderia ter feito uma careta, assim que
notou minha presença, poderia ter gritado, poderia ter fritado meu cérebro
com os seus poderes, mas não, ela sorriu. Talvez não tenha me reconhecido
ainda ou talvez só não faça ideia de quem sou eu. Por isso, abro um sorriso
como o dela e me aproximo mais no exato segundo em que também o faz,
fincando seus cotovelos no balcão que nos separa. — O que deseja pedir
para beber? — grita por cima da música, para ser ouvida, mesmo que
estejamos próximos agora.
— Ah, não sei — falo no mesmo tom e finjo estar totalmente tranquilo,
envolvido no ambiente. — Que tal se você me trouxer o melhor da casa?
— Primeira vez?
— Hã? — Dessa vez, eu realmente não entendo sobre o que pode estar
falando.
Primeira vez não é uma bebida, é?
Baixo a cabeça por um momento e rio, quase como se tivesse sido pego no
flagra, quase como se pudesse estar envergonhado e sem jeito.
E a sua resposta sobre a bebida, só foi capaz de deixar tudo tão cristalino
quanto água. Meus clientes, quando perguntado o que eles querem, eles não
soltam um:
“Não sei. Que tal se você me trouxer o melhor da casa?” — Engrossa a voz
de um jeito engraçado, para imitar a minha, e ainda faz aspas no ar, o que
acaba me tirando, genuinamente, uma risada inesperada. — Porque quem é
cliente e frequenta o Potion’s de verdade, sabe que não tem outra resposta
para a minha pergunta, a não ser: Um Black Magic, Journee, por favor.
Após soltar uma piscadela para mim de uma forma nada inocente, ela se
afasta com os olhos ainda conectados aos meus e, aos poucos, se vira para
fazer a minha bebida.
Para passar o tempo, fico admirando o seu traseiro, conforme vai de um lado
para o outro. No momento em que se abaixa para fazer sabe-se lá o quê, eu
quase me inclino mais por cima do balcão.
No entanto, me mantenho no mesmo lugar, é claro.
— Enquanto ela não fica pronta... — De costas, sua voz soa aos meus
ouvidos. Acho que gostou de mim, meu ego reflete sozinho, acho que está
querendo flertar. — Será que poderia me dizer o que te trouxe até aqui?
Posso.
Eu só... espero.
Sei que ela é a dona, que provavelmente tem mais experiência do que eu e
qualquer pessoa aqui, mas ela me parece demorar mais do que o esperado.
Talvez seja para sair perfeito, para me impressionar e para que eu volte mais
vezes ao bar.
Acho que só pode ser coisa de bruxa ser tão bonita assim, porque Gabriella
sofre da mesma perfeição que Journee, mesmo uma sendo uma Salazar, e a
outra uma Devine.
Um gosto amargo paira na minha boca, e nem é por eu ter provado a bebida
ainda, mas sim porque pensei nessa garota agora, quando não tem nada a ver.
Credo.
— Prove. — Outra vez, sua voz flutua até os meus ouvidos e me traz de
volta à realidade. — Eu posso apostar que você vai adorar o que tem aí
dentro.
A mulher de fios escuros parece muito mais sensual, muito mais séria, e os
seus olhos, só por um segundo, parecem diabólicos, quando me
esquadrinham e notam cada um dos meus movimentos, principalmente o que
eu faço para entrelaçar os meus dedos no vidro, à medida que espio o líquido
que há dentro.
— É surpresa.
Olho para a bebida, a trago para minha boca, bebo um gole e, quando a sinto
dentro de minha boca, eu cuspo para fora o pouco que ingeri, tossindo e
sentindo todo o meu organismo queimar como se tivessem posto fogo nele,
só por causa do líquido. Na mesma hora, fico pálido, gotículas de suor
salpicando minha testa, e derrubo com força o copo no chão, o vidro se
estilhaçando de forma bastante audível. Me agarro na bancada, enquanto
ergo minha cabeça para olhá-la, essa mínima ação parecendo demandar
muito de mim e da minha força.
— Que porra foi que você colocou naquela bebida, sua desgraçada? —
vocifero num tom não tão alto, ainda querendo não chamar atenção dos
outros.
Journee não sabe se sorri de maneira vitoriosa ou se mantém a sua pose de
que nada demais aconteceu, independentemente do que escolha, minha fúria
não será capaz de diminuir nem mesmo uma maldita polegada que seja.
As tatuagens combinam com ela, com sua aura, ela tem fama de garota má, e
eu não sei como não percebi que estava fingindo, que estava me enganando,
só para me dar o bote. Me deixei levar pela sua beleza e pela porra do seu
rabo grande.
Burro, burro e burro. — Fale agora mesmo o que está fazendo por aqui ou
eu juro, por tudo que é mais sagrado, que te enfio goela abaixo outra bebida
daquela.
De forma exagerada, eu respiro fundo. — Posso ser ruim, mas não sou tão
ruim assim. Eu sou só incompreendido.
— Dane-se.
— Ei, alto lá, não é só porque você é toda bonitona, que tem o direito de
falar desse jeito comigo não. — Transformo meus olhos em duas fendas. —
E não abuse só porque eu fui com a sua cara, posso mudar de opinião
rapidinho. Na mesma velocidade que eu gosto, eu desgosto. E na mesma
velocidade que eu entro em missão de paz, eu entro na de guerra, e isso
provavelmente você já sabe. Agora aproveite o meu bom humor, me traga
uma bebida de verdade e converse comigo, porque foi por isso que vim. Para
conversarmos.
— E quem lhe garante que quero fazer qualquer coisa com você?
Bufa.
— Não vou — a corto e faço com que veja a minha verdade. — Não estou
aqui para isso, Journee Devine, você tem a minha palavra. Se fosse para eu
fazer qualquer coisa contra você ou esse lugar, pode ter certeza que eu não
estaria aqui, já teria feito, e você só estaria lidando, nesse momento, com os
estragos.
Quando vejo, Journee está dando uma volta no balcão, para se aproximar,
puxar a cadeira ao meu lado e se sentar, o corpo virado para o meu.
— Tudo bem — diz, por fim. — Se não é para causar estrago, por que está
aqui, então? — Cruza as longas pernas. — Vamos, Levi Vodrak, responda,
estou curiosa, preciso saber o que você acha que pode querer de mim.
Minhas mãos tremem, e para disfarçar, eu sorrio, querendo que perceba que
eu não posso perder essa oportunidade por nada.
— Não, desculpa se te passei a impressão errada, mas eu não sou uma bruxa.
Rio sem humor, sabendo que está querendo blefar comigo, mesmo depois de
ter aceitado essa conversa e mesmo depois de ter escutado toda a história
que lhe trouxe.
— Você é, sim.
— Não, não sou — repete, quase tão sem paciência quanto eu. — Minha
família, mais precisamente minha bisavó, avó, mãe e minha irmã mais velha
são, mas eu não sou.
cansativo ter que explicar isso todas as vezes que me deparo com um de
vocês, entretanto, pela sua nítida frustração e estranhamento, vou ter que
explicar minha história resumida para você também.
— A cada palavra dita, ela afunda o indicador em seu próprio peito. — Não
me mande o que fazer, como se tivesse alguma autoridade, tudo bem? —
Pisco, impressionado, quase podendo ver minha versão feminina bem na
minha frente.
Até que parece, a língua afiada, o jeito bom para a trapaça e para desarmar
um inimigo, as tatuagens, a cara de má e o sorriso que, ao mesmo tempo que
consegue refletir um lado angelical, consegue também ser o próprio demônio
encarnado. —
Tem sorte que eu esteja conversando com você, ao invés de ter te colocado
para correr daqui, então abaixe a sua bola, por favor.
Cruzo os braços, agora adorando cada palavra que resolve proferir para mim.
— Tem certeza que quer mesmo falar das minhas bolas? — Duplo sentido e
maldade gotejam de cada sílaba, e eu prendo uma risada na garganta quando
a vejo rolar os olhos com uma raiva que sei que é fingida, pois, se estivesse
mesmo tão exausta de mim, da minha presença e do que eu represento, não
teria dado meia volta e sentado aqui, para começo de conversa. Journee,
como eu, é uma pessoa curiosa, uma pessoa que provavelmente gosta de tirar
suas próprias conclusões sobre as coisas e não tem nenhum medo de
provocar ou enfrentar alguém, caso for preciso. Está aqui porque quer,
porque talvez também gostou da minha presença, talvez se identificou com o
meu jeito e só está agindo assim para demonstrar que aqui, ela também
manda e não é capaz de baixar a cabeça, mesmo se dispondo a conversar
com quem não deveria. — Tudo bem, parei. — Ergo as mãos em sinal de
rendição. — Vai, Journee, me conte a sua história, eu sou todo ouvidos.
— Certo — eu falo, querendo pontuar alguns fatos que escutei, só para ver
se entendi mesmo. — Isso significa que seu lado bruxa nunca veio à tona?
— Não.
— Pois é, eu também não dei a sorte de ter encontrado a sua irmã, uma
bruxa de verdade — faço questão de frisar, fazendo Journee revirar os olhos
para mim mais uma vez. Eu gosto dessa coisa, faz parecer que eu tenho esse
tipo de poder com as pessoas. — Acho que você e eu estamos quites nessa,
no final das contas — declaro. — Somos parecidos, Journee.
— Deus me livre ser parecida com você, eu não mato nem uma formiga.
— Olha só, para uma pessoa que não é bruxa, você sabe de muita coisa
sobre o meu mundo.
— Sou inteligente.
Antes que ela possa pular da cadeira e voltar ao seu trabalho, eu a impeço,
segurando seu braço sem impor nenhuma força.
— Eu só tenho algumas dúvidas, Journee, não estou aqui para te pedir que
me ensine novas formas de matar e dizimar toda a população dos Estados
Unidos
— falo sério dessa vez, sem nenhum tipo de brincadeira ou gracinha para
irritá-la.
Ela não faz ideia, porém estou levemente desesperado, para dizer o mínimo.
— Eu vou te fazer algumas perguntas, e você vai me responder se quiser. Sei
que não tem motivos para confiar em mim, mas foi o Carter quem me trouxe
até aqui, ele disse que você poderia me ajudar.
Se antes seu corpo estava todo tenso sob meu toque, agora, após me ouvir,
parece que ele amolece como gelatina.
— Sabe dizer por onde ele anda? Sabe dizer se ainda está no país?
— Não, não sei — respondo, sendo sincero. — Mas não é esse o assunto da
nossa conversa, certo, docinho?
— Certo. — Acho que agora ela cai em si, pois seu corpo num instante volta
à postura de antes, quase como se tivesse se dado conta de que estava à
mercê demais, só porque toquei, por pouco tempo, em algo que parece ser
um dos seus pontos fracos. Journee ergue a armadura novamente, mas dessa
vez um pouco menos bruta, afinal, se alguém em quem ela confia me trouxe
até aqui, então está acreditando, ou querendo acreditar, que não vou metê-la
em problemas, nem pequenos, nem grandiosos demais, a ponto de não
conseguir dar conta. — Que respostas são essas que você precisa e acha que
sou capaz de lhe oferecer?
— Em que sentido?
não importa nem um pouco. Meu interior todo vibra, e também não tem nada
a ver com o fato de eu estar dentro de uma festa. Dessa vez, não é
adrenalina, não é algo bom e que gera combustível em minhas veias. —
Vampiros normais já sofrem bastante com toda a sede e com todas as
emoções, que passam a ficar intensificadas, porém nós, vampiros
amaldiçoados por bruxas, conseguimos sofrer o triplo. A sede é insaciável,
desesperadora, fora os sentimentos, a raiva predominante, o descontrole, o
fato de se tornar instável, de sentir dor física, como se estivesse, todos os
dias, passando pela transição, e entre outros. É por isso que quero saber se
tem como, por acaso, vocês, bruxas, ajudarem a diminuir esse lado, que é
capaz de nos assombrar por séculos. Algum remédio, algum colar com
alguma... não sei, pedra — solto essa.
— Olha, Levi, vou ser bem sincera com você, e acho que você até sabe, mas
a minha família nunca teve nenhum problema com os vampiros, elas nunca
quiseram fazer parte dessa briga, na verdade. Quem sustentou isso até o fim
foram as que fugiram de Salem para Emerald Grave, e mesmo morando
perto, nós sempre nos mantivemos na nossa, tanto que não há problema
nenhum com a nossa linhagem. Ela é uma linhagem tranquila, pura, uma
que, confesso, não é tão forte e não faz efeitos de magnitudes tão grandes e
poderosas quanto as outras, tipo as Salazar, por isso que posso te dizer com
toda certeza que, pelo que convivo, a minha não sabe e não está envolvida
com esses tipos de ajudas. Afinal, as únicas pessoas que ajudamos são os
humanos enfermos, com as ervas medicinais que plantamos nos fundos das
nossas casas.
— Mas... — Minhas írises logo se erguem, pela forma que ela fala. — Além
da minha família, eu tenho esse bar há anos, o que significa que eu já recebi
todo tipo de gente e já ouvi todo tipo de coisa, então posso te dizer que
chegou até mim, não sei se verídica, uma história de um colar perdido, que
tinha uma pedra mágica dentro dele. Até o próprio Carter me disse uma vez
que é tipo uma lenda entre alguns vampiros, eles sabem o que aconteceu,
porém não sabem, de fato, se foi verdade. Alguns acham que é verdade,
outros acham que é mentira, não há um consenso. Quem acha que é mentira,
costuma dizer que não tem como um vampiro ter tanto controle assim sobre
si mesmo, nem mesmo com feitiços feitos por bruxas poderosíssimas.
Luca pode sim, estar usando algo a seu favor, não é um fato mirabolante, é
um fato que pode ser real.
Porra.
Porra.
sou sincero, totalmente sincero, como nunca antes. — Aprecio sua atenção,
Journee, e pode ter certeza que nem me lembro mais daquela bebida
matadora. —
Para a minha total surpresa, ela ri, e isso me incentiva a continuar: — E pode
ter certeza também, que você já está adicionada à minha lista de amigos, que
passaram pelo meu caminho e me ajudaram em algum momento, dessa
forma, garanto que você e o seu bar estarão seguros. Novamente, dou a
minha palavra. —
— Sim, a Black Magic mesmo, mas aquela que eu te dei não era ela.
Nós dois rimos, e Journee, aos poucos, para para me olhar mais atentamente.
— Posso não ter desenvolvido nada, porém eu ainda tenho algo em mim
que, de vez em quando, sente e percebe coisas que outros não conseguem. E
eu percebi algo em você depois dessa nossa conversa, Vodrak.
efeitos da maldição e ainda não saiba direito quem é e o que quer. Acho que
você se deixou levar e se cegou pelas piores emoções possíveis.
Eu não baixei meu muro completamente, não sei como Journee pôde me ler
assim, no entanto, me deixa abalado e me faz baixar a cabeça, agradecer sua
ajuda em murmúrios baixos e andar sem nem ver seu rosto pela última vez,
um gosto amargo pairando em minha língua.
Acho que é o gosto de ter escutado, pela primeira vez, alguém falar assim
comigo, com tanta... ah, merda, dane-se, foda-se, não vou falar.
Eu já ganhei o que queria, só vou embora e não vou pensar mais em nada.
Serpenteio pelas pessoas, tentando fazer o caminho para a saída sem trombar
em ninguém, mesmo com os corpos cada vez mais perto, e, ao alcançar a
porta para finalmente respirar o ar livre da noite, tenho o azar de ter meu
corpo chocado contra o de outro cara, tão grande e tão mal-encarado quanto
eu.
Inferno, não sei se eu me bati nele ou se ele se bateu em mim, mas uma coisa
é certa, não está nem um pouco disposto a pedir desculpas.
— Você não olha por onde anda, não? — Seu bafo de cachaça alcança o meu
rosto, eu contorço o rosto em uma careta e, quando noto nosso entorno, vejo
que outros nos observam. O osso da minha mandíbula já começa a saltar. —
Você não fala? Está com medo, menininha?
Valentões. Esses são os famosos valentões humanos, que não sustentam suas
gracinhas depois que caçam brigas com desconhecidos até verem a merda
acontecer.
Em outro, estou me virando para o sujeito morto, aos poucos, as mãos agora
em cada lado do corpo, meus olhos pretos, e minhas presas praticamente
para fora.
Dói.
Dói muito.
Ainda com o meu corpo dobrado para frente, resolvo erguer minha cabeça e
buscar Journee, ignorando todas as outras pessoas que pararam para olhar.
Journee me olha como se... me entendesse. Como se me lesse mais uma vez
e tivesse certeza de tudo que vem acontecendo comigo desde que me tornei
vampiro.
Olhar para ela assim, é pior do que olhá-la se estivesse brava, então saio
correndo, sabendo que dará conta de tudo que ficou para trás. E quando não
estou mais na frente de nenhum humano, desato a correr com a minha
velocidade
Entro de uma vez pela janela e também muito rápido, eu me sento na cama,
buscando respirar com precisão e me acalmar. Não olho para nenhum deles,
mas sei que estão aqui. Não demora muito para que Devon e Larkin parem
de andar de um lado para o outro e se direcionem até mim, um de um lado, e
outro do outro.
— Onde você esteve esse tempo todo? — um deles pergunta, e nem consigo
saber quem é. Está tudo embaçado. Minha visão, minha cabeça, tudo.
Acabaram de ligar para o Devon, descobriram uma coisa que você não vai
acreditar.
Ótimo, eles não fazem ideia sobre mim, não fazem ideia do que aconteceu, e
isso é bom. Posso aguentar ouvir qualquer outra coisa agora, só preciso
tentar achar meu controle de volta.
Se antes ela era calada e se isolava, agora ela quer ficar no meu pé direto, e
isso é ótimo, não é ruim, de forma alguma é disso que estou reclamando. O
que estou reclamando é que, desde que soube que Cody Davenport me
chamou para sair, ficou me provocando e me enjoando o tempo inteiro para
que eu concordasse e aceitasse logo o pedido do rapaz, que insistiu por
várias semanas. Não bastando me perturbar junto dele, a garota resolveu
acompanhar de perto toda a minha produção como, é claro, a maior
incentivadora de que eu, Gabriella Faulkner, saia da seca e volte a dormir
com os garotos, como costumava fazer há algum tempo, porque, segundo
suas próprias palavras, não aguenta mais me ver levar a vida que costumava
levar antes da aparição de seu namorado Luca, pois era deprimente e
desprovida de emoção e adrenalina.
Não sei que tipo de adrenalina ela acha que vou ser capaz de encontrar nesse
encontro, mas estou apenas concordando com tudo que fala, porque eu não
aguento mais ter que ouvir seus argumentos, que são sempre os mesmos.
Vira e mexe, Evelyn traz à tona o assunto de Levi, das nossas preocupações,
mais especificamente, as minhas, que ela diz que carrego sem compartilhar
com ninguém, e é... urgh, insuportável.
Eu queria sair com Cody, é verdade, porém acho que só aceitei sair com ele
hoje, mais para calá-la, para mostrar que quero e posso sim me divertir
quando bem entender, que nada mudou e que não estou tão preocupada
quanto ela e o seu vampiro acreditam.
No fim das contas, para ser bem sincera, nem adiantou de nada, porque
Evelyn Sutton não fica quieta, ela tagarela sem parar.
É sério que essa é a nerd antissocial que se escondia até mesmo das
paredes?
Não parece.
Para o que estava falando antes e logo vem com essa pergunta, quando me
vê trocar as peças de roupa mais uma vez. Antes, eu estava de saia,
entretanto, agora visto uma calça, uma de couro justa e que é de cintura alta.
Estou apenas de sutiã, tentando encontrar outra blusa no meio do caos que já
virou o meu guarda-roupa.
— É que você está falando, falando, e a minha cabeça fica doidinha. Por que
não para, vem aqui e me ajuda?
porque é a primeira vez que está saindo de casa para curtir uma noite como
uma garota normal, depois de tudo que nos aconteceu.
— Não, você está. Essa voz aí na sua cabeça é a voz do medo. Você
provavelmente deve estar pensando que não deve ficar fora de casa por tanto
tempo, que não deve nos deixar sozinhos, eu, mamãe e o nosso pai, e que
também não deve ser legar ficar tão tarde se arriscando na rua. E, para
completar, deve estar pensando que Cody é um garoto legal e que não pode
ficar próxima dele a ponto de trazê-lo para sua vida. — Sacode os ombros,
quando eu entreabro os lábios. — Não me olhe desse jeito, como se estivesse
espantada, essas coisas estão praticamente escritas na sua testa, e eu sou uma
leitora, tenho um olhar mais apurado nessa questão de ler pessoas, ainda
mais se essa pessoa se trata da minha querida e incomparável irmã mais
velha.
Arfo diante de suas palavras e resolvo jogar meus braços ao lado do corpo.
Tudo bem, não sabia que ela conseguia me ler desse tanto, mas Evelyn pode
estar um pouquinho certa em sua análise. Esses pontos que destacou foram
exatamente os pontos que me fizeram prolongar ao máximo esse convite,
cortando o barato de Cody Davenport todas as vezes em que aparecia na
minha aula de Botânica só para me ver e em todas as vezes que resolvia me
mandar mensagem perguntando sobre quando, onde e como seria o nosso
encontro, e se eu já havia pensado em ficar com fome logo.
Minha fome gritou muitas vezes, óbvio, porém eu fiz com que a minha
barriga ficasse calada, enquanto colocava na balança os prós e os contras de
aceitar seu insistente convite, afinal, antes de ele aparecer, eu tinha dito a
mim mesma que precisava ficar mais leve e aproveitar um pouco mais, não
ficar tão neurótica com vampiros querendo me caçar e todas essas merdas,
no entanto, quando a oportunidade apareceu, eu me vi encurralada em um
beco sem saída, com duas alternativas: ou eu aproveitava e me tirava da seca
logo de uma vez, como tanto falavam Evelyn e Luca, ou eu parava de
acreditar nessa baboseira, porque não podia dar mole e precisava ficar
sempre em alerta.
cá, o que é exatamente o que vai acontecer, isso não seria nenhum problema
e, de fato, não é.
Eu tinha e ainda tenho ciência dessas coisas, de que está tudo bem, de que eu
dou conta, mas... merda, não sei o que é, é só a droga de uma sensação ruim.
— E aí, só para eu me sentir muito bem, com qual dessas duas opções vou
ficar mais gata?
— Claro — sou irônica. — Você só sabe usar esses seus suéteres sem graça.
—Ei, não fale dos meus suéteres, eles são confortáveis, aconchegantes e
quentinhos.
— Não estou falando das suas roupas especificamente, até porque você tem
ótimas escolhas e que combinam muito com você, estou falando das benditas
estampas.
Evelyn gira nos calcanhares para voltar a sentar na minha cama, entretanto,
não sem antes cruzar os braços e erguer os lábios no sorriso mais zombeteiro
possível.
— Ai, ai… — cantarola num tom alto, o que faz com que um vinco se forme
entre as minhas sobrancelhas. O que foi agora?, meus pensamentos não
ganham vida, porém minha irmã parece me escutar e me entender, mesmo de
costas, porque continua: — Você está de volta, Gabriella. Isso é bom. Isso é
muito bom.
É verdade.
Evelyn me trouxe de volta, se não fosse por ela, ainda continuaria uma pilha
de nervos. Disse no começo que ela estava sendo chata, contudo, na
realidade, eu quem estava sendo e não estava percebendo. Se continuasse
daquele jeito, a noite seria um completo fiasco.
Fico feliz que a nossa relação evoluiu tanto, mas tanto, que agora temos essa
liberdade uma com a outra, coisa que nunca imaginávamos ter. Agora ela me
olha e me entende, da mesma forma que eu a olho e a entendo.
Não quero e não vou, nunca mais, me afastar dessa garota. Ela que aguente
meus chiliques, minhas estampas e a minha personalidade totalmente
diferente da dela. O bom é que, pelo menos assim, nos completamos.
E vice-versa.
Ai, merda.
Guardo tudo de volta no lugar e fico com o batom, o lápis de contorno dos
lábios e o gloss.
Não sei quanto tempo leva esse amor que eu sinto por mim mesma, mas a
graça acaba completamente quando meu celular vibra, e é uma mensagem de
Cody, dizendo que já chegou e que já está aqui na frente.
— Ele chegou! — avisa com tanta empolgação, que parece que é ela que vai
sair com Cody, e olha que recentemente estava o considerando um babaca.
Tudo bem, ela pode ainda estar tendo esse pensamento, contudo, sua
vontade de me ver dando uns beijinhos é tão grande, que nem está se
importando com a fama do garoto, porque sabe que a minha também não é a
melhor das melhores, visto que gosto de sair e experimentar muitos caras.
Ela só não liga tanto e não fica preocupada, porque sabe que sei me cuidar e
sei proteger meu coração. — Já está pronta? Já pegou tudo? Não está
esquecendo de nada? — Sua parte tagarela, até então desconhecida, retorna
com mais perguntas, que saem desenfreadas e emboladas, uma atrás da
outra.
Permaneço tranquila e calma, enquanto confirmo.
saíssemos juntos, não vai aguentar esperar mais um minuto. Também não
quero tirar nossos pais do quarto, eles podem estar querendo dormir mais
cedo hoje.
— Por que ele te convidaria para ir a uma balada na primeira vez juntos?
— Por que ele é o futuro dono, esqueceu? — Ela bate a mão de leve contra a
testa, como se realmente tivesse se esquecido. — E porque ele disse que lá
também tem algumas salas VIPs, onde podemos desfrutar a companhia um
do outro. Parece que servem até jantar.
— Nossa, Gabriella, é melhor você ir embora logo. Não escutou? Cody está
gritando seu nome lá fora.
— Obrigado, Deus.
— Vamos, Faulkner.
— Ah, tem que ser mesmo, tendo em vista o tanto que você me procurou
para isso.
— Acho que você está esquecida do que me falou depois do seu momento de
líder de torcida. — Com a mão no volante e os olhos na rua, ele fala,
malicioso.
— Pois bem, se você não esqueceu, imagina eu. Não fui capaz de seguir a
minha vida normalmente depois daquilo, você entrou na porra da minha
cabeça.
Mordo os lábios.
— Antes era ruim, porque eu não tinha você, mas agora é bom. Vai ser bom.
Mais tarde.
Está tudo muito bem, saindo como planejado, mas desde que saí de casa, o
frio na barriga não passou, só fez aumentar. Minha preocupação e paranoia,
e aquele sentimento ruim que estava sentindo, também voltou e voltou muito
mais forte do que antes, tanto que, mesmo me forçando a prestar atenção no
que o garoto à minha frente fala, não sei dizer em que assunto está agora,
porque minha mente está em um lugar desconhecido.
Um lugar que me desespera e que faz tanto minhas mãos quanto meu corpo
por inteiro, suarem.
Deslizo as palmas novamente na calça, pelo que parece ser a milésima vez
esta noite.
que tanto Cody, quanto todos os outros à minha volta, estão completamente
normais, executando seus afazeres da forma mais plena e tranquila possível.
Com ele ainda falando sobre como seus pais pegam no seu pé, junto do
reitor da faculdade, que é amigo super próximo deles, eu balanço a cabeça,
sorrio e comento uma coisa ou outra, só para não demonstrar que estou tão
por fora, e pego, por baixo da mesa, meu celular, que estava dentro da minha
bolsa, para mandar uma mensagem para Evelyn.
Eu: Hey, cadê você? Está tudo bem por aí?
Demora cerca de dois minutos para que ela veja a mensagem e resolva
responder.
Irmãzinha: Sim, tudo tranquilo por aqui. Estou assistindo filme com Luca e
não tem nem cinco minutos que fui no quarto dos nossos pais, eles
obviamente pegaram no sono assistindo uma série infantil da Disney,
acredita?
Acredito, e muito, nossos pais criaram esse hábito agora. Eles dizem que é
divertido relembrar os velhos tempos de infância antes de dormirem.
Segundo a teoria dos dois, dá um sono melhor, muito mais tranquilo e leve,
com zero insônia ou pesadelos.
Os três pontinhos na tela surgem com rapidez, para indicar que ela já está
prestes a me responder.
Rio sozinha, sem querer, sem nem pensar, e é óbvio que isso chama atenção
de Cody, que para de falar e me olha de forma confusa.
— Está tudo bem? — pergunta, receoso. — Por favor, não me diga que estou
sendo tedioso.
Talvez essas reações sejam boas, e eu esteja confundindo, pelo tempo que
fiquei mais em casa do que na rua, devo ter desacostumado e só percebi
agora.
Cody se põe ao meu lado, me conduz para o lado de fora, fecha a sala VIP, e
tanto música quanto gritos nos envolvem com força, já que lá dentro, o
barulho não nos alcançava.
Ele me puxa pela mão, e a gente começa a passar pelas pessoas, descendo as
escadas dessa área e indo para o andar de baixo, com o futuro proprietário do
lugar abrindo caminho para passarmos. Alguns olham para nós, outros nem
ligam, continuam bebendo e dançando, entretanto, quando chegamos na
pista, eu tento não pensar em mais nada. Eu só penso na vibração da música,
na batida que faz com que o meu corpo trema, nas pessoas animadas
gritando ao redor e, claro, em Cody, que se aproxima, me olhando como se
quisesse me devorar por inteira. Ele me olha assim desde o começo da noite.
— Está com medo de mim? — grito por cima da música, vendo-o negar,
enquanto sorri. — Então por que você não se aproxima mais um pouco e me
toca?
O jantar estava bom, a conversa também, mas talvez seja disso que eu esteja
necessitada no momento, um pouco de distração e prazer.
A fome, que tanto viemos falando esses dias, aumenta no seu olhar, quando
eu alcanço a sua mão e coloco na minha cintura.
Um tão forte, tão forte, que abro os olhos e solto um gritinho que,
felizmente, ninguém parece notar. Meu corpo continua se movimentando,
porém, meus olhos não me obedecem, eles ficam procurando algo pelo
ambiente, indo de
Meu coração acelera no peito, porque tenho certeza que vi um vulto, uma
coisa se mexendo.
Quer dizer, não aparece por cerca de segundos, pois em seguida, vejo de
novo, se movimentando com as luzes, indo lá para cima, para a área VIP.
Pisco uma porção de vezes e já sinto minha testa com gotículas de suor se
acumulando.
Não.
Nem espero uma resposta ou uma confirmação da sua parte, já lhe dou as
costas e começo a praticamente correr, querendo chegar depressa no
banheiro, para jogar uma água no meu rosto e retocar a maquiagem, porque
devo estar num estado deplorável.
Respiro mais aliviada, quando vejo que não tem mais ninguém além de mim,
e corro para me equilibrar na pia. Agora, com a música abafada, posso ouvir
melhor o zumbido do meu coração vibrando no meu ouvido.
Me viro, tentando encontrar o que quer que seja, quando algo se materializa
à minha frente e me empurra para uma das paredes.
Não sei se ele me solta ou se eu faço alguma coisa sem querer, mas Levi não
está mais me agarrando, o maldito só dá um único passo para trás e continua
quieto, como se estivesse me esperando agir.
Você esteve esperando por esse momento, está na hora de mostrar o que
aprendeu.
Entretanto, não vou causar uma confusão aqui, não com Cody e todas as
pessoas lá fora. Não posso colocar ninguém em perigo, sendo que esse
problema é só nosso.
Ergo a mão no ar e fecho os olhos, pronta para fazer o mesmo feitiço que o
derrubou da outra vez. Me concentro, com as luzes piscando, e quando abro
os olhos, achando que funcionou, vejo que Levi permanece a mesma coisa,
no mesmo lugar, intacto.
Não, pior, ele parece mais confiante, mais prepotente, com os braços
cruzados, as botas pesadas batendo no chão, e a risada arrogante lhe
escapando.
Por que não funcionou? Por que ele não está no chão?
— O que foi que você fez? — Meu maxilar trinca, e as minhas unhas cravam
nas palmas. — O que foi que você fez? — repito, e à medida que avança até
mim, eu me colo mais na parede.
— Descobri um truque que faz com que você não tenha tanto poder assim
sobre mim. — Dá de ombros, como se não fosse nada demais. Eu juro, vou
matá-lo. Vou matá-lo aqui mesmo. — E para com essa cara de bravinha, para
a sua felicidade, eu não vou te matar. Meus planos com você agora são
outros, e aposto que vai gostar da proposta que lhe trouxe.
— Eu não quero nada com você — declaro, com um sussurro-grito. —
Nada.
Ele estala a língua no céu da boca e pega um cacho do meu cabelo entre os
seus dedos, quando vou empurrá-lo, obviamente, ele prende meu pulso com
seus dedos.
Não tenho nem tempo de gritar ou pedir ajuda, quando percebo, Levi já está
me levando consigo.
Eu sei que ele é um vampiro, um ser sobrenatural, mas porra, ele anda
rápido, muito rápido, e eu, agarrada a ele, não tenho sequer qualquer forma
de me tirar dessa situação.
Apertando ainda mais os olhos, rezo para que esse pesadelo acabe o mais
rápido possível.
Porque eu só posso estar sonhando.
Isso aqui não é Crepúsculo, não é The Vampire Diaries, é a porra do mundo
real, e, por mais que eu tivesse imaginado esse momento acontecendo na
minha cabeça umas trezentas vezes, sempre o repetindo como um looping,
várias e várias vezes, nada, nem uma vez, nunca, se pareceu com o que está
acontecendo. Eu imaginava que entraríamos em combate, que brigaríamos e
lutaríamos na primeira encarada, quando ficássemos um de frente para o
outro, pensei que ele traria os seus vampiros, seus cúmplices, e eu teria a
minha magia e o meu cunhado Luca para me ajudar no que fosse preciso. Eu
imaginei que teria muito fogo, grito, morte, caos e destruição, não isso, um
Levi Vodrak me dando um passeio por Emerald Grave na sua velocidade
sobrenatural para, talvez, um possível sequestro.
E como se a situação já não fosse ruim e absurda o suficiente, ele ainda disse
que não queria me matar, que me queria para outros fins, que me queria para
um passeio, logo depois dos meus poderes não terem funcionado com ele,
por simplesmente ter descoberto um truque.
Que truque?
Talvez eu tenha batido minha cabeça na pia depois de lavar o rosto e agora
estou em coma, alucinando.
Ou, para não ser tão pesado assim, talvez eu esteja só dormindo, depois de
ter mandado mensagem a Cody, dizendo que desisti do encontro.
Chego à conclusão de que Levi não está maluco, quem está sou eu.
É, só pode ser isso, porque agora nós dois nos materializamos na sala de uma
casa, uma espécie de cabana, no meio do nada, em uma montanha esquecida
da cidade.
Começo a gritar e o empurro para longe, dando uma joelhada no meio das
suas pernas. Levi me solta no mesmo instante, pego de surpresa, e dobra seu
corpo, urrando com a dor do golpe nas suas bolas.
selvagem, animal, e mesmo que não morra, se vier para cima de mim, eu
facilmente sou capaz de ataca-lo, abrindo mil buracos em seu corpo sem
nenhum tipo de dó.
E ele pode me alcançar depois, porém eu vou fugir sem nem olhar para trás.
Vou fazer o possível e o impossível para escapar, não vou entregar o jogo, se
é isso que está pensando.
— Nossa, você é mesmo brava, puxa vida. — Por que, mesmo numa
situação tão séria como essa, ele fica brincando? Bem que dizem que Levi
Vodrak
— É melhor se acalmar, baixar essa tesoura, baixar essa sua bola toda e ficar
de boa, pois hoje, por incrível que pareça, não estou aqui para tretas. Hoje,
estou uma vibe Luca, estou bonzinho, a fim de resolver todos os meus
problemas na base do diálogo. Inclusive, se ele estivesse aqui, me daria
parabéns e ficaria orgulhoso da minha conduta. É fofinha, não é?
Inacreditável.
Não acredito que estou tendo esse tipo de diálogo com o cara que quer me
matar.
— Que lugar é esse e por que me trouxe aqui? — Continuo com a tesoura
erguida. — O que você está tramando? O que quer comigo? — O filho da
puta fica em silêncio, observando minhas mãos tremerem, enquanto retorce
os lábios em um sorriso de canto. — É sério, estou falando com você —
digo, sendo a minha vez de dar um passo para frente. — Não pense que não
vão procurar por mim, pois vão. O
Cody estava comigo, ele vai notar que desapareci e então irá comunicar a
todo mundo.
Sinto como se todo sangue sumisse do meu corpo, junto de todo o meu ar.
A raiva que me consome é tanta que, quando percebo, minha fúria me leva
até ele, a ponta da tesoura praticamente enfiada em um dos seus olhos.
Eu juro que eu não me reconheço, porque Levi traz o meu pior lado à tona.
Estou me sentindo sanguinária, louca para entrar em uma briga corporal com
ele.
— Cara, estou começando a ficar chateado com a forma errônea com que as
pessoas me veem. — Suspira e, à força, Levi faz a minha mão com a tesoura
ser baixada. Mesmo ele sendo muito mais forte que eu nesse sentido,
continuo com o nariz e o queixo empinados, sustentando seu olhar. —
Vontade eu tive, mas eu não matei seu namoradinho, bruxa. Na verdade,
senti vontade de me matar, ao ver seu péssimo gosto para homens. Ele é tão
feinho, coitado, tão sem graça, tão sem sal e ainda te deixou entediada, que
eu vi. — Bufa uma risada, ainda segurando meu pulso. — Mas o que esperar
de bruxas, não é mesmo? Vocês escolhem os homens errados, são trocadas
por outras e, ao invés de agradecerem, ficam putinhas e fazem feitiços para
acabar com a vida deles, afinal, os homens são sempre errados, nunca vocês,
já que são sempre as vítimas das histórias, as incompreendidas, as que
tiveram o coração quebrado e por isso, podem tudo, inclusive se vingar de
criancinhas que de nada tinham a ver com seus pecados e suas escolhas
inúteis.
Aproximo tanto nossos rostos, que os nossos narizes se tocam. — Por que
essa raiva aprisionada, se você adora ser vampiro? Se você adora o sangue,
todo esse poder, toda essa força? É ridículo. — Rio sem humor. — Essa sua
briga toda durante mais de um século, te faz é passar vergonha, porque você
parece mais um menininho birrento, mimado e hipócrita, do que qualquer
outra coisa. Se essa mágoa toda por bruxas viesse de Luca, que não é capaz
de fazer mal a ninguém, eu até entenderia, mas vindo de você, é só idiotice,
falta do que fazer e muita, muita maldade.
— Linguinha afiada, eu gosto disso. — Mais uma vez, não é capaz de levar
nada a sério, embora eu perceba como seu pomo-de-adão sobe e desce em
sua garganta, e logo em seguida, o osso na sua mandíbula salta. Ele sente
raiva, muita raiva, entretanto quer pagar de controlado, e, definitivamente,
ainda não sei por qual razão. Se finalmente me tem em sua frente, o
desafiando, por que está parado? Por que está ouvindo cada palavra sair da
minha boca bem atentamente?
Por que ele não avança? Por que não luta, por que não me fere ou me mata?
Eu
preferia que fizesse isso, a vê-lo assim. Dessa forma, me sinto perdida, não
faço ideia do que esperar. — Para evitar problemas futuros, vamos encerrar
esse assunto. Como eu disse anteriormente, o que me trouxe aqui foi outro
motivo.
— Que motivo?
— Se quiser saber, primeiro você, além de largar essa tesoura, vai ter que
baixar seu murinho, sentar naquele sofá e me escutar. Mas me escutar de
verdade, sem pensar em derrubar esse chalé comigo e você dentro.
Reviro os olhos.
— O que você quer que eu faça? Não posso ficar de boa no mesmo ambiente
em que você está, se eu não confio em você nem de olhos fechados.
— De tudo que eu falei, foi nisso que focou? — Lambe os lábios. — Citou
isso para que, para me deixar a par do seu status civil? Tudo bem, anotado.
— Ai! — Levi finge que foi afetado novamente por outro golpe. — Não
destrua meu ego, ele é a única coisa que eu tenho que é incapaz de me
abandonar.
E se quer saber, nem mesmo se você se oferecesse para mim, eu aceitaria.
Não estou passando fome para pegar qualquer porcaria.
Oi?
ofendi, que não senti absolutamente nada e até abro um pequeno sorriso sem
descolar os lábios.
— Unhum.
Aos poucos, Levi solta a minha mão, dá um passo para trás e fica esperando
que eu devolva o objeto metálico, que ainda está em minha mão.
Só que não.
Antes que possa compreender o que estou fazendo, pego a tesoura e enfio
com toda força em sua clavícula. Como na parte do chute, Levi grita de dor,
que é basicamente música para os meus ouvidos.
— Sua cadela desgraçada, é a porra da minha jaqueta preferida! — grunhe,
ao tirar a tesoura do seu corpo, sangue pingando por ela e pelo buraco
formado no tecido de couro, que vê o estrago causado e lhe dá ainda mais
raiva. Quando retorna o rosto para mim, está com a sua face assombrosa de
vampiros, os olhos pretos, as veias abaixo deles, e as garras pontiagudas para
fora. — Eu tentei o modo fácil, tentei ser paciente, mas se você quer o meu
lado mau, você vai ter o meu lado mau.
— Faremos o modo difícil agora, bruxinha — é o que sua voz ardilosa sopra
no pé do meu ouvido. Outro arrepio, aquele mesmo que eu estava sentindo
antes de sair de casa. É nesse momento que percebo, eu posso senti-lo. Perto
ou a quilômetros de distância, eu sou capaz de sentir sua ruindade me
fazendo cócegas.
— Depois não diga que não lhe dei oportunidade. Posso até ser o vilão dessa
história, porém você também não é nenhuma mocinha.
Eu grito.
Ele é tão rápido, que só tenho noção do que acabou de fazer, quando se põe
em minha frente, dando uma olhada e sorrindo orgulhosamente para trabalho
feito em questão de segundos, e mesmo me movimentando e me puxando,
não consigo me locomover nem para um lado, nem para o outro, tão pouco
para frente ou para trás.
Estou definitivamente presa, literalmente sem saída.
E grito mais por causa disso, a plenos pulmões e no volume máximo, só para
que uma alma caridosa, mesmo que no meio do nada, seja capaz de me
escutar e de me ajudar.
os dentes e faço que vou mordê-lo, mas é claro que se afasta antes que eu
possa fazer qualquer coisa, dizendo: — Wow, wow, bruxinha dos infernos, o
vampiro aqui sou eu, não confunda. E pare de me olhar desse jeito, você que
se colocou nessa posição, agora aguente.
— Vou matar você, mas antes, vou fazer com que pague por tudo que
cometeu.
Tudo. Cada mínima coisinha. Você, Levi Vodrak, vai se arrepender de ter me
achado, cruzado o meu caminho e de um dia ter pensado que seria capaz de
me enfrentar ou derrotar. Eu acabarei com toda essa sua marra, com toda
essa sua história hipócrita e colocarei um ponto final em tudo, fazendo
justiça pelos meus pais e por toda geração Salazar, que você perseguiu por
anos. Vou fazer mesmo, e não é blefe. Vou acabar com você, nem que eu
acabe comigo também.
Aposto que está se segurando, que está brigando internamente com a sua
razão e a sua emoção, sem saber qual deixa vencer essa batalha para dominá-
lo.
Porque sei que, mesmo sua boca querendo expor um sorriso, seus olhos
presos aos
meus, brilham e não mentem sobre sua verdadeira realidade, a que, não sei
por qual motivo, está tentando esconder de mim.
Eu o vejo.
Aposto que todas elas são dolorosas, torturantes, sangrentas, onde Levi se vê
me humilhando e sendo sua vez de colocar o ponto final nessa história
macabra de vingança, que cultivou por décadas a fio.
Por que ele não faz? , a pergunta ecoa em minha mente de forma
inconformada.
Por que ele continua sentado, de frente para mim, escolhendo camuflar a sua
raiva para poder sorrir?
Falso.
— Se você continuar com essa fúria toda, bruxinha, vai acabar tendo um
ataque cardíaco, mesmo na flor da idade. — O sorriso dele é tão petulante,
que me faz rosnar de novo. — Eu, hein, quanto ressentimento. Que tal se
deixarmos o passado no passado? — Suas sobrancelhas dançam de forma
sugestiva. — Acho que a gente deve esquecer o que aconteceu, ter um novo
começo. O que me diz?
Eu já vi gente cínica e cara de pau, só que da marca dele, está para nascer.
— Por favor, por que você não vai logo direto ao ponto? Por que você não
me diz o que está tramando de uma vez por todas?
Não tenho outra opção, tenho que respirar fundo e me controlar, pois preciso
saber o motivo de sua volta, e, principalmente, o motivo de ter me trazido
para este lugar com um discurso de que não vai me matar, porque
precisamos conversar.
Seja lá o que estiver tramando na sua cabeça doentia, nada do que estou
fazendo, vai me ajudar a descobrir. Preciso aprender com a sua frieza e seu
jeito
E rio.
Prendo outra risada que quer vir, porque esse cara não pode estar sendo
capaz de se escutar. Deve estar no seu modo lunático, deve estar possuído,
deve ter usado alguma coisa bem forte, que o deixou completamente sem
sentido, sem noção da realidade.
— Tá bem, vamos supor que isso que acabou de falar faça algum tipo de
sentido e tenha fundamento, de que tipo de ajuda, só para eu saber, você está
falando?
— Oi?!
Parada.
Levi corre, com seu jeito sobrenatural e veloz para minha frente, agora
completamente sério, com o maxilar trincado. Parece muito mais com o
vampiro que vi aquele dia, quando tentou matar a minha irmã, achando que a
bruxa sobrevivente era ela, sem nenhum pingo de vontade de se controlar.
Ele me enfrenta cara a cara, e seus dedos, quando percebo, tocam e seguram
o meu queixo, para me manter imobilizada.
— Não, eu sei sobre o colar — digo, com raiva, porque é só isso que Levi
consegue tirar de mim. — Eu só não sei de que merda de feitiço é esse que
está falando. Luca nunca pediu para colocarem nada ali, ele o achou no mar,
perto da praia, sei lá. Foi quando ele salvou a Evelyn da tragédia que você
fez acontecer naquele navio, em 2009.
— Porque ele sempre, sem esforço, consegue tudo. Não importa o que seja,
ele sempre vai sair na frente, enquanto eu fico cada vez mais para trás. Até a
merda de um colar, que foi dado a uma vampira depois de ter sido
enfeitiçado por uma bruxa, para que ela andasse no sol e se controlasse, ele
conseguiu achar depois de ela ter o perdido. Para você ver o nível de sorte
dele, esse colar provavelmente rodou por muitos lugares, por muitas pessoas,
até que o encontrou.
Levi descobriu sobre o colar, ficou com inveja por ter perdido mais essa para
o seu irmão e agora não precisa mais de mim morta, precisa de mim viva,
porque está necessitando de uma bruxa que venha a fazer esse feitiço para
ele. Quer me usar, quer se favorecer da minha linhagem e dos meus poderes,
só para sair ganhando na disputa irrefreável que trava contra o irmão.
Que lute sozinho, na verdade, já que Luca nunca quis fazer parte de uma
competição.
— Jura? — Ergo uma sobrancelha e soo tão irônica quanto ele. — Você
mata basicamente todas as pessoas da minha família biológica, sequestra a
minha irmã, a melhor amiga dela, me ameaça de morte e acha que tem o
direito de me pedir alguma coisa?
— Com você falando assim, não, mas eu juro que tenho um motivo muito
grande para acreditar que você vai aceitar. — Solta o meu queixo, para poder
apertar o meu nariz. Preciso reunir todo meu autocontrole para permanecer
quieta.
Vai, me responde, porque era isso que éramos. Dois bebês. Dois bebês
condenados à morte e à dor, por culpa de terceiros que não sabiam lidar com
suas próprias frustrações. Agora me diz, o que você diz sobre isso?
— E o que eu te digo, é que toda ação gera uma reação, Gabriella. Quem
pode me julgar? Eu tinha os meus motivos. Errados ou não, eles eram meus,
e só eu sei tudo o que eu passei.
sozinho, porque você lhe deu as costas, enquanto ele tentava ao máximo,
lidar da melhor forma com a sua realidade.
— Porque ele era e continua sendo um frouxo. — Levi parece que explode,
até dá passos para trás e bagunça os fios do seu cabelo. — Eu tentei ao
máximo e o chamei para me acompanhar, mas ele não quis, preferiu ficar
sozinho, bancando o herói, só para, no fim, jogar na minha cara que ele
sempre foi o melhor dentre nós dois. Ele arquitetou tudo, e... quer saber,
foda-se, eu não vou ficar discutindo com você sobre isso. Eu não te trouxe
aqui para resolvermos esses problemas, te trouxe para resolvermos outros.
Quero meu feitiço na pedra. Quero em colar, anel, broche, em qualquer
objeto que você conseguir.
— Você, por algum acaso, quer ter controle? Quer andar entre os humanos?
Quer ter uma vida parecida com a de Luca, a de que tanto reclama e julga?
Não é você o vampiro fodão, que se controla pelo fogo, que curte a noitada,
as festas e ama esse lado sobrenatural? — pergunto retoricamente. — Então
por que você quer esse feitiço? Por que está pedindo só agora, esse tipo de
ajuda?
— Primeiro, não te interessa — tem a audácia de dizer, o que faz com que
minha boca se entreabra em um O gigantesco. — Segundo, não estou
pedindo nenhuma ajuda, eu não preciso, estou bem, perfeitamente bem. —
Ele passa a mão no rosto, diferente de quando chegou, e não parece, nesse
estado, nada bem. —
Talvez, a pedra enfeitiçada pode ser para outra pessoa, ou para mim, que
posso estar querendo competir com Luca. Se ele tem algo assim, eu também
posso querer ter, e aí? — Chacoalha os ombros, e suas botas novamente se
arrastam em minha direção, um sorriso diabólico começando a crescer em
seu rosto. — E sabe quem vai me proporcionar isso? Você, minha bruxinha.
— Aponta com o indicador para a minha testa.
— Eu até queria, mas não posso, dizem que esse tipo de feitiço só é feito
pelas mais fortes. Você é a única que conheço, que tem acesso ao colar de
Luca e que pode me fazer um igual.
por isso que vou ficar aqui em Emerald Grave, te rondando, até você
aprender, e eu ter o que eu quero.
Tombo a cabeça para trás, gargalhando tanto, que a minha barriga dói.
Eu dou risada, muita risada, e não sei como vou conseguir parar.
quê? Não posso rir da sua cara e da sua confiança, ao dizer isso?
Sua certeza, aos poucos, me faz parar de sorrir e ficar séria, já começando a
ficar com um pouco de medo.
Sim, só pode ter, ele não faria isso tudo sem uma certeza de que eu toparia.
Por um momento, Levi me dá as costas, mas é rápido, só dura até que pegue
a cadeira novamente, a ponha na minha frente e se sente.
— Porque eu tenho algo que você, Luca e até mesmo sua irmãzinha sem
graça, podem querer saber. Você tem a noção, eu sou uma pessoa bem
informada, muitas coisas chegam aos meus ouvidos em primeira mão. —
Dobra a coluna para frente. — E o que eu descobri recentemente, é que
você, Gabriella Faulkner, ou melhor, Gabriella Salazar, está com outro
vampiro querendo a sua cabeça, e um muito, muito pior do que eu.
Vladimir Vampir.
O original.
— É mentira sua — eu digo de uma vez, sem rodeios, já que essa sua
revelação simplesmente não entra e não bate. — Por que esse vampiro
estaria atrás de mim? E por que, se estivesse, você me avisaria algo assim,
de bandeja?
— Eu te odeio, mas preciso de você viva, e ele te quer morta, ou seja, quer
arruinar os meus planos. E para conseguir o que eu quero, sou capaz de tudo,
até mesmo me unir com a minha maior inimiga, em prol de me beneficiar. —
Dá de ombros. — E se quer saber, Vladimir também quer usar a mim e a
Luca no seu planinho mirabolante de reverter a maldição.
Pelo que parece, ele quer a cura, quer voltar a ser humano, e para isso
acontecer, precisa dos principais elementos que mantêm de pé esse feitiço.
Uma Salazar, e outros vampiros, amaldiçoados como ele. — Quando
percebo, Levi arrasta a cadeira para mais perto e aponta com o indicador
para mim. — Você é a única Salazar existente, você é a bruxa, e parece que
para quebrar o feitiço, só usando o seu sangue por completo. Depois que eles
te usarem, você, no fim, acabará morta, enquanto Vladimir seguirá o resto da
sua vida como um humano.
Ri.
— Bruxinha, nós dois sabemos que você é incapaz de deixar sua família e
Emerald Grave para trás. E não seja inocente, mesmo se você fugisse, ele
seria
— Aí, você já quer demais da minha pessoa, eu não sei. Talvez você, talvez
outra.
Nego.
— Então vai ser outra — responde com desdém. — Se tinha isso em mente,
por que perguntou?
O ignoro.
— Veja bem, Levi, você mesmo falou que Vladimir é o mais forte entre
vocês, por qual motivo ele faria algo para tentar voltar a ser um humano de
novo?
— Porque ele pode até ser um vampiro forte e que reside no mundo há
séculos, mas ele não é um vampiro transformado, é um vampiro
amaldiçoado por uma bruxa. Como o próprio nome já diz, não é uma
bênção, é uma maldição. Não sei os motivos dele, mas não seria tão difícil
assim imaginar. Todos nós temos as nossas dificuldades, até mesmo os mais
controlados, como Luca, passam por algum tipo de sofrimento, mesmo que
mínimo. É a regra da brincadeira, querida bruxa, vocês não mediram
esforços para nos castigar. São todas umas cadelas sem coração, acho que
você consegue perceber agora.
— Então é por isso que quer o feitiço na pedra? — eu solto, só para ver sua
reação. Em um primeiro momento, fica sem entender, porém quando observa
minhas feições, desvia o olhar e é nítido que vacila e engole em seco. É
muito mínimo, quase imperceptível, entretanto não deixa de passar por mim.
— Você, Levi, como Luca, quer diminuir o sofrimento que carrega e quer se
controlar.
Talvez não seja tão forte assim, talvez finja — o provoco, vendo-o se
contorcer cada vez mais de raiva. — Estou mentindo ou não estou?
— Que bom te ouvir falar assim, porque se eu não sei de porra nenhuma, eu
não sei fazer feitiço nenhum, então me deixe em paz — vocifero de volta,
pois se acha que vai gritar comigo, e eu vou me manter calada, está muito
enganado.
Tento, mais uma vez, me soltar das cordas, que já estão me irritando e me
fazendo entrar em colapso por estar assim, presa por tanto tempo, desde que
me trouxe até aqui. — E se quer saber, eu não acredito em uma palavra do
que soltou. Não tenho motivo nenhum para confiar em alguém da sua laia,
que pode muito bem estar querendo dar o golpe final com todo mundo por
aqui.
— Eu sei que não tem motivos para confiar, eu também não confio nem um
pouco em você. — Sorrio de forma irônica ao ouvi-lo, quase podendo dizer:
isso mesmo, imbecil, não confie, pois posso acabar com a sua raça em
segundos, se eu quiser. Ele percebe, porém opta por me ignorar e continuar
com seu discurso. —
Também não pense que estou amando fazer isso, porque não estou, o que eu
quero é o feitiço na pedra e estou aqui para oferecer minha ajuda contra
Vladimir, em troca dos seus serviços, afinal, ele também quer a mim e ao
meu irmão nesse plano idiota.
Umedece os lábios com a ponta da língua, que passeia de uma região à outra,
e continua ostentando seu ego maior do que esse bendito chalé no meio do
mato. —
— Não, sinceramente, eu acho muito engraçado que você ache que vou
topar. — Balanço a cabeça. — Essa história pode até ser verdade, tem
fundamento, mas essa sua conversa, esse seu teatrinho, não é capaz de
convencer ninguém.
Você quer vingança, você nos odeia, a mim, ao seu irmão, à minha irmã, a
todos nós. Acha mesmo que vamos confiar que está aqui querendo nos
ajudar? —
Vai se virar contra o seu irmão na primeira oportunidade e vai garantir que
eu morra, antes mesmo que Vladimir seja capaz de me alcançar.
Pode ser uma ótima bruxa, uma forte e que carrega dentro de si todas as
outras, entretanto ainda é iniciante, não tem experiência como tantas outras,
o que significa que estamos na mesma posição. No entanto, nós dois
sabemos que, se qualquer um dos dois desviar do combinado, perderemos. Já
era. Você desfaz o feitiço, eu fico sem, e aí começamos tudo de novo o lance
da perseguição.
É minha vez de engolir em seco, sabendo que, dessa vez, ele tem razão, e
não gosto nem um pouco de saber que ele sabe disso. De que não tenho tanta
experiência, de que ainda estou aprendendo, de que, se essa história do
primeiro vampiro for verdade, estaremos interligados, teremos que trabalhar
juntos, um em prol do outro.
Seus dedos voam para a pele da minha bochecha, e por mais que eu tente me
desviar, e fazer cara de nojo, o fulminando com os olhos, Levi me alisa,
deliberadamente.
E ele parece estar em outro mundo, preso em mim, preso na sua própria
mente.
algum feitiço?
Pisco.
— O quê?
— Não.
Sinto as minhas mãos livres e arfo, podendo respirar. As trago para mim e,
ainda sentada, começo a massageá-las, porque as sinto dormentes. É quando
ele retorna.
— Está livre — diz simplesmente. — Para você ver que tenho palavra, vou
te deixar ir para casa com calma, para absorver o que aconteceu e para tirar
suas próprias conclusões.
— Onde estamos?
— Em uma das cabanas da montanha Locker Gray, foi aqui que fiquei da
outra vez.
— Sim, estamos.
Eu me viro para ele, dando passos para trás, e é óbvio que ele sorri.
— Hm, acho que valeria a pena descobrir. Se você é gostosa, seu sangue
deve ser também.
— Coloque essas suas presas demoníacas para fora, e eu juro que faço seu
cérebro fritar igual da última vez. Acabo com todos os seus neurônios, se é
que existe algum aí dentro.
— Vai me lançar um feitiço? — Veneno goteja por cada sílaba. — Que nem
os que você fez desde que chegou?
Mais sarcasmo.
Levi me joga contra a parede, ainda agarrado a mim e com a mão no meu
pescoço, só que mais forte.
Idiota.
A bile me sobe.
Ao nosso redor, é tudo floresta, tudo mato, tudo escondido, na mais absoluta
vibe de filme de terror.
Se Levi quiser esconder meu corpo em algum lugar por aqui, capaz de nunca
o encontrarem.
Por isso que, da outra vez, ninguém sabia dizer onde Levi estava, pois o
gêmeo de Luca estava muito bem escondido, ao mesmo tempo que muito
perto, também muito longe de todos nós.
E eu, depois do que fiz, não quero ficar mais nenhum segundo aqui.
Por isso que deixo a cabana para trás e continuo a correr, entrando na
floresta.
Não me importo com o que posso encontrar aqui dentro, com o perigo que
estou passando ao entrar em uma mata fechada, justamente à noite, no
escuro, enquanto minha bolsa, junto do meu celular, nem comigo estão mais,
provavelmente deixei cair no banheiro da boate de Cody, quando Levi
chegou, e eu me assustei.
Eu não paro.
Por nenhum segundo, eu paro, me sentindo uma finally girl dos filmes, a
própria Sidney Prescott que, ao invés de um psicopata humano, foge de um
psicopata vampiro que tem mais de 100 anos.
E meus pulmões ardem pela força que imponho, a respiração fica ofegante, o
coração galopa no peito, o mundo fica em completo silêncio, e a única coisa
que sou capaz de escutar, são as chicoteadas que as plantas dão, tanto no
meu rosto quanto no meu corpo.
Ardem, e mesmo assim, não são suficientes para me parar, pois há algo em
mim, aquele mesmo pressentimento que tive antes de sair de casa, me
induzindo a continuar, a olhar para frente, nunca para trás. E os arrepios
voltam. Os arrepios não me abandonam.
Encaro o céu escuro, para ver a lua vertiginosa acima de mim, e é quando
um pingo de água cai na minha testa.
E outro.
E mais outro.
Pelo visto, meu lado racional estava mesmo certo, foi uma péssima ideia.
Corro mais um pouco e então, quando tento parar para me abrigar embaixo
de uma árvore, ouço barulho, passos e vejo pegadas serem formadas no solo
lamacento, ao mesmo tempo que, novamente, meu lado médium se aflora, já
que vejo os mesmos vultos de hoje mais cedo, quando estava no encontro.
Lado médium? É apenas uma brincadeira sem graça minha, para não ficar
tão tensa, pois sei exatamente do que se trata essa movimentação rápida na
floresta.
— E olha que a gente se conheceu há pouco tempo, não esperava que fosse
ficar molhada tão rápido assim.
Seu duplo sentido e a sua malícia não passam despercebidos por mim.
Tento fugir, caminhando para trás, mas estou sem alternativa, minhas costas
já estão completamente presas ao tronco dessa árvore, infelizmente, ainda
não aprendi o feitiço de como me integrar a essa parte da natureza, para não
ter que passar por isso.
— Você acha mesmo que tem o direito de fazer essas piadinhas para cima de
mim? — Ponho a mão no seu peito e tento afasta-lo. — Você tentou me
matar, você não tem nenhum tipo de intimidade comigo.
— Engraçado, na hora de ficar sentindo meu pau com seu joelho, você não
pensou nisso. — Meu queixo quase vai ao chão quando o escuto, e meu
corpo todo paralisa. — É, isso mesmo que você ouviu, bruxa. Acho que
gostou tanto da primeira vez, que teve que fazer a segunda.
— Porque suas garras estavam perto do meu pescoço! — digo, como se
fosse óbvio, emburrada. — E você podia cometer uma atrocidade, você é
desses.
— Eu não disse que não vou te matar? — grunhe. — Se eu não vou te matar,
eu não vou te matar, você não tem o que temer. Mas se você continuar com
essa palhaçada, em dois tempos, eu mudo a minha opinião e faço você se
arrepender rapidinho. Não importa a pedra, não importa Vladimir, não
importa nada, o que vou deixar assumir, é o meu ódio por você.
Estalo os meus lábios, inconformada, nem aí para o frio, nem aí para porra
nenhuma, porque a raiva que sinto dele é imensa e me faz ferver por dentro.
— Eu acho muito engraçado que você se coloca como o rei da história, o que
manda, desmanda, e os outros obedecem. O poderoso, o dono da verdade, o
assustador, sendo que não é bem assim. — Empurro seu peito novamente,
várias e várias vezes. — Eu também sou poderosa. Eu também tenho o poder
de escolha, de fazer o que eu quiser, inclusive, ceifar a sua vida desprezível
ou te deixar vivendo com sua própria amargura. E você fala como se
estivesse me fazendo um favor, como se decretasse que é você o único capaz
de me matar, e não o contrário.
Isso é o que, machismo? Medo de admitir que a sua vida também corre
perigo e que você pode estar comendo bem na minha mão? Na mão de uma
mulher, de uma bruxa, da sobrevivente que você tanto julgou como fraca e
descartável?
Desempine esse seu nariz, seu merdinha, porque se você não tem medo de
mim, eu também não tenho medo de você!
Quando vou empurra-lo mais uma vez, Levi agarra meus pulsos e, com
força, os prende em cima da minha cabeça, agora cortando qualquer
distância que restava. E, definitivamente, não há mais frio, meu corpo todo
pega fogo, próximo do seu. Podemos estar abrigados embaixo da árvore,
protegidos da chuva torrencial que cai, com todo o vento e ruídos da floresta,
porém parece que nada no mundo acontece, parece que estamos presos
dentro da nossa própria bolha, e a sensação é aterrorizante, me faz sentir
impotente, me faz contorcer os dedos dos meus pés.
— Claro, porque você fala, fala e não faz nada. Se finge de malvadona, mas
na real, é boazinha, com o coração mole. Pode ser capaz de me machucar,
porém, não de matar. Acho que você é incapaz de matar qualquer pessoa, até
mesmo aquele que um dia já lhe fez mal. E isso é bem, bem ruim. Quando
Vladimir chegar ou se ele te pegar desprevenida, você vai ser incapaz de se
salvar. — Abro
— Não preciso de sua ajuda, não preciso de nada seu. E se deseja tanto que
eu não tenha piedade, posso mostrar a você, o quão ruim eu posso ser,
porque talvez eu só esteja aqui, esperando o momento certo para te atacar,
esperando o momento certo desse truque, que você usou para ficar imune
aos meus feitiços, passar, pois tenho certeza que o efeito deve ser só por
algumas horas. Às vezes, tudo faz parte de um plano. Às vezes, eu estou na
frente, e você nem sabe.
Mentira.
Um grande blefe.
É nítido que não estou na frente, é nítido que, desde que me pegou à força,
estou afetada e não conseguindo raciocinar direito. Poderia já estar em casa
há horas, se fizesse algum feitiço que me permitisse escapar, entretanto, na
presença de Levi, é totalmente diferente do que imaginei.
Exatamente por esse motivo, que a minha cabeça está uma completa
confusão.
E a culpa é dele.
E de Vladimir.
Contudo, só pode ser, Levi não me aguentaria tanto assim, se não fosse, e ele
ainda me deu a chance de procurar saber, para depois tomar uma decisão.
Ele sabe que eu vou procurar, checar com Luca e ver se tem pistas do que
pode estar acontecendo, o que, automaticamente revelaria se está mentindo
ou não. E se estiver, eu não lhe daria absolutamente nada, e o vampiro não
poderia perder essa oportunidade de me manter presa a ele, de me manter
forçada a lhe ajudar, porque,
de certa forma, também vou precisar de sua ajuda se a casa, de fato, cair para
o meu lado, quando me acharem.
— Eu não menti quando disse que estudei você, enquanto estive fora, bruxa.
Tento muito não demonstrar minha surpresa, embora tenha a ciência de que
Levi Vodrak é bem capaz de fazer algo assim. Se é que não fez.
— Duvido.
— Você estudou na Emerald High School durante a sua vida toda, fez
ginástica desde pequena, num centro esportivo a dois quarteirões da sua
casa, entrou para a equipe de líderes de torcida assim que adentrou no ensino
médio, fez parte de algumas competições, ganhou boa parte delas e engatou
um namoro clichê de adolescente com Will Montgomery, quarterback do
time de futebol americano, que decidiu terminar com você por mensagens de
texto no último ano, porque queria se concentrar no esporte. E aí, graças ao
universo e talvez à praga de bruxa, o babaca lesionou o joelho em um
campeonato estudantil contra as melhores escolas da Virgínia, nunca mais
pôde ser o mesmo e se mudou da cidade pouco tempo depois, por pura birra
e vergonha.
A cada mínima palavra que solta, eu fico mais embasbacada. Não é possível.
Quer dizer, pelo visto é, já que está descrevendo praticamente toda a minha
vida.
E o mais impressionante, é que não para, arrasta as botas até minha frente,
para poder continuar falando.
— E aí, você entrou na Emerald Grave University, cursa Ciências
Biológicas e já está bem perto de se formar. Fora isso, sua mãe biológica se
chama Zena Salazar, eu acho que não preciso mencionar aqui como foi que
ela morreu, para não gerar mais atrito, sua irmã é a Evelyn, sua mãe é a
Leah, seu pai, o Elliam e o seu cunhado, o Luca. Você tira notas boas, é a
típica garota popular, que anda só com os populares da faculdade e, por mais
que nunca mais tenha namorado depois do Will, não virou uma freira
imaculada, saiu pegando geral. Pelo visto, gosta de festas, de roupas que te
destacam e de proteger sua família, mais do que a si mesma. É também
muito confiável, articulada, adora velas, fogos, aprender
— Viu, bruxa? — Seus dedos ágeis tocam meu queixo e me trazem para
mais perto. — Eu sou uma pessoa de palavra, eu nunca minto. Sua história
de vida até que é interessante, me tirou do tédio muitas vezes. — Chacoalha
os ombros para cima. — Não me olhe com tanta surpresa, depois do que
aconteceu da última vez, eu precisava conhecer mais a fundo a minha
inimiga, tinha que me preparar, e eu sempre tenho meus métodos, sempre
tenho minhas fontes. É por isso que eu digo e repito, sou a melhor opção que
você e o meu irmão idiota terão, para se salvarem. — Agora,
cuidadosamente, o que me assusta pra cacete, tira alguns cachos molhados
do meu rosto e os coloca para trás da minha orelha. — E acho que isso
significa que, de um jeito ou de outro, teremos que derrubar nossos muros,
para entendermos que, dessa vez, estamos do mesmo lado. Não sou eu o
inimigo agora, bruxa. Se eu quiser continuar te odiando, vou te odiar depois,
pois primeiro, preciso do meu feitiço, preciso mostrar a Vladimir quem é que
manda no pedaço, e, para que isso aconteça, temos que ser do mesmo time,
afinal, você também precisa derrotá-lo, precisa ficar viva, e tenho certeza
que não conseguirá fazer isso sozinha.
Tiro sua mão de mim, indo novamente para o lado, para fazer com que
entenda que não gosto quando fica querendo se manter por perto.
Mas se você pode ajudar tanto, por que já não começa expondo o que
escondeu?
— Não vou — declaro, porque sei que já não tenho mais volta. — Eu vou
tirar essa história a limpo, ver o quão verídico é isso que me trouxe e depois
de me sentar para conversar com os meus amigos, eu vejo o que podemos
fazer. Só te digo que não vai ser fácil, nenhum de nós gosta de você. Nem
eu, nem minha irmã, nem o seu.
— Ótimo, não estou aqui buscando aprovação, muito menos me tornar ídolo
de vocês, Turma da Luluzinha, estou apenas buscando vencer. E se vencer
significa me juntar a vocês e depois desaparecer, eu aguento, faço esse
sacrifício.
Pela sobrevivência, sei que farão isso também, e, quando acabar, cada um irá
para o seu lugar. — Cruzo os braços, sentindo o frio voltar e acho que Levi
percebe, porque parece fixar suas írises na minha boca, que volta a tremer e
com mais intensidade. — A respeito de Luca, deixa que com ele, eu mesmo
me resolvo. Nós temos nossas pendências e nossos problemas familiares em
atraso. Não queria ter que confrontá-lo tão cedo, mas pelo visto, agora que
estamos os dois em ameaça, não temos como fugir. Ou é agora ou é nunca.
Respiro fundo.
— Não — é incisivo ao responder, suas írises ainda fixas na minha boca, nos
meus tremores. — Já está tarde, você está assim, com frio, é melhor voltar
para a cabana, lá tem lareira, comida, banheiro e algumas roupas que podem
te servir.
— Não se anime, bruxa dos infernos, estou só dando essa sugestão, porque
não quero que a mulher que vai me fazer um favor, morra de hipotermia. Se
não morreu na minha mão, não é na mão de uma chuva que eu vou deixar
que parta dessa para uma melhor.
— Devo agradecer?
— Deve me obedecer.
— Uma ova — guincho.
Balanço a cabeça incontáveis vezes. — Você não saiu com aquele cara?
Então, é de se esperar que você durma fora. A não ser, claro, que a sua
irmãzinha já saiba que você seria incapaz de dar para ele. Eu, se fosse você,
jamais daria. Mas só um conselho, não que você tenha perguntado minha
opinião.
— Você não vai achar a saída, está indo para o lugar errado, vai se perder
nessa floresta. Deixa de ser teimosa e volte.
— A única forma de eu voltar, é se for como cadáver. Me mate e estarei lá.
É a primeira vez que me chama pelo meu nome, me faz olhá-lo nos olhos de
imediato. E parece sério. Tão sério, que me pergunto se ficou alguma vez
assim desde que me trouxe até aqui.
Viro sobre os ombros, só para ver se tenho algum sinal dele, e não encontro
nada.
Feliz e achando que vou me livrar, olho para a frente e sei que tenho a
convicção de dizer para mim mesma que não devo parar, no entanto, me vejo
sendo obrigada a parar.
Meus pés tropeçam num galho e, quando percebo, estou caindo no chão.
Devo bater a cabeça em algo duro, porque sei que apago em questão de
segundos.
Acho que é o que acontece comigo agora, pois, aos poucos, eu abro os olhos,
sinto a maciez do colchão, sinto a minha cabeça deitada em um travesseiro,
E eu lembro.
E não é o meu quarto, não, não tem nada a ver com o meu quarto ou a minha
casa.
Parece...
Nada de pijama, nem mesmo pijama seco, estou com roupa de festa e
molhada.
Grito de susto, tendo certeza da realidade, quando vejo Levi Vodrak parado
ao lado da lareira, de frente para mim, sem jaqueta, apenas de camiseta
branca que, por causa da água da chuva, está transparente e grudando em seu
corpo definido.
— Meu Deus — sussurro num sopro, com a mão já repousada em meu peito,
e, infelizmente, meus olhos curiosos acabam me traindo e se fixando em seu
peitoral e abdômen. Não deixa margem para imaginação, está tudo
transparente, cada mínimo detalhe revelado. Vejo os traços do seu corpo,
seus músculos e as tatuagens que circulam por sua pele. Não são muitas, são
poucas, espalhadas em locais diferentes e mesmo assim, são bastante
convidativas. Eu disse...
convidativas? Oh, céus, eu realmente devo ter batido com a cabeça, não
posso estar prestando atenção dessa forma em um homem como ele. Um
vampiro, na verdade. Um que não pode e não deve ser nem um pouco
admirado. — Você me assustou.
— Eu caí feio — digo, muito mais para mim do que para ele. — E você me
trouxe para cá, como disse que ia fazer.
Ponho meus pés para fora do sofá, sabendo que ele vai sentar ao meu lado.
— Estou. — Continuo sem encará-lo. Olho tudo, menos Levi. Até que...
algo surge em minha mente, e eu viro meu rosto em sua direção, unindo as
sobrancelhas. — Há quanto tempo estou desacordada? Há quanto tempo
estou aqui dentro com você? — Começo a olhar cada centímetro da minha
roupa, com medo de encontrar alguma coisa fora do lugar. Não confio nele,
não tenho motivos, mas tudo parece da mesma forma que estava antes, só
um pouco menos ensopado. —
— Sei lá, não sei das suas intenções e muito menos tenho conhecimento
sobre a sua vida sexual. Nem quero ter, na verdade.
Semicerro os olhos.
— Eu jogo meu charme para todas, mas nem sempre significa que eu as
quero. Com você, no caso, é só brincadeira.
— É por isso que você é amiga do Luca, é uma chata igual a ele. Combinam.
Flexiono meus joelhos, me levanto e agora que estou bem, que parece ter
parado de chover lá fora, vejo se deixei alguma coisa pelo caminho e me
preparo para ir embora.
Ficar ao lado dele é pedir para cometer um crime, uma atrocidade sem
tamanho.
— Ei, bruxinha, para onde pensa que vai? — Já estou girando nos
calcanhares, nem aí para os seus chamados. — Você acabou de bater a
cabeça, Gabriella, volte aqui, não vai sair desse jeito.
Parece que eu acabo de elogiá-lo, de pôr para fora as palavras mais lindas
que uma pessoa poderia dizer à outra, pois, ao invés de se ofender, parece
adorar.
Sinceramente, sou uma pessoa tão boa, não faz sentido que estou tendo que
lidar com algo tão complexo e tão complicado assim, numa fase que deveria
ser a melhor da minha vida.
E Levi chega por trás, me chacoalhando, pois estou usando os meus feitiços,
fritando o cérebro deles, colocando esses dois, provavelmente vampiros,
para sentirem, com mais intensidade, toda a dor de seus vasos se rompendo.
— Ei, para, para com isso, bruxa! — Continua me movendo, sua voz soando
longe. — São amigos, eles são amigos. Meus amigos, eu os chamei, está
tudo bem.
Eles vão fazer parte do time, estão aqui para nos ajudar. Não é ameaça, por
favor, para com isso.
— Já não basta ter que lidar com um, vou ter que suportar a presença de
mais dois? — estou falando diretamente com Levi. — O que é isso? Um
método de tortura, para que eu me lembre dia após dia do que fizeram com
as pessoas que eu amo?
e com aquela outra, a amiga dela. Sabemos que elas não tinham nada a ver
com a história.
— Ah, verdade, esse trato é bom — Devon, o moreno, que também tem
tatuagens, e algumas subindo pelo pescoço, emenda. — Todo mundo vai sair
ganhando.
Fantástico Mundo de Bob, é nesse lugar que eles vivem, onde tudo é
simples, onde é tudo acolhedor e onde todos os problemas e dificuldades são
esquecíveis, só pode.
— Todo mundo quem? — não consigo não questionar. — Minha mãe e meu
pai biológico, toda a minha família, as pessoas inocentes que morreram
naquele cruzeiro, as que morreram anos antes em Dantown? São essas que
estão mencionando? Porque, se for, tenho a mais absoluta das certezas que
todas essas saíram ganhando, claro.
— Nossa — um deles sopra, e não faço nenhuma questão de saber quem. —
— Você vai ver só daqui a pouco, quem é que vai latir — ameaço.
Até nos momentos mais inoportunos, Levi consegue fazer suas piadinhas.
— Ei, agora que eu parei para pensar. Cadê a raiva toda que você sentia por
ela? — Devon cutuca Vodrak. — Você não era assim antes. Que discurso é
esse de que Gabriella tá certa?
— É, eu sei, ele disse que faria, mas estou impressionado que esteja
conseguindo. A personalidade dele é meio explosiva.
— Foi mal, foi mal, esqueci que vocês têm toda uma história de décadas
juntos. Ela é a sua bruxa, não está mais aqui quem falou.
Arrgh!
Marcho até a saída, passo pela porta e continuo a caminhar de volta pela
floresta.
Nem que eu me perca, mas eu vou sair daqui por contra própria, não preciso
de ninguém, se é para sofrer algum tipo de perigo, prefiro sofrer com
qualquer coisa que não seja Levi.
Passo com cuidado entre as plantas e olho para o chão em cada pisada, para
não cair pela segunda vez, indo bem devagar, até que um vento forte
bagunça os meus cabelos, e, numa velocidade que já não me assusta mais,
Levi me pega pela cintura e corre comigo.
Pela montanha.
Assustada e com a veia do meu pescoço latejando pela adrenalina, olho para
os lados e não o encontro.
Foi embora.
É como vivem dizendo, nada é tão ruim que não possa piorar.
Não demorou muito para que Devon e Larkin parassem de andar de um lado
para o outro e se direcionassem até mim, um de um lado, e outro do outro.
Precisava me acalmar.
Por pouco, não causei novas mortes e fiz novas vítimas, por causa da
maldita besta que se aflora em mim quando sou instigado, talvez por uma
pessoa ou uma força maior, a colocá-la de uma vez para fora, destruindo a
tudo e a todos que estão em meu caminho.
Balancei a cabeça, afinal, não podia continuar pensando, tão pouco podia
deixar que as imagens rondassem a minha cabeça, como um carrossel
mortal e infernal.
Era impressionante? Era, claro, porém o teor do que me falavam, era muito
mais.
que nós tínhamos ido ao encontro dela. E eles estavam procurando em nome
de Vladimir, que deseja quebrar a maldição de Thereza e descobriu que há
um jeito para isso, depois de fazer algumas pesquisas.
— Envolve você e Luca também — Devon cortou Larkin, e eu olhei para ele,
com as minhas sobrancelhas batendo quase que no meu couro cabeludo. —
Para quebrar o feitiço, tem que fazer um novo feitiço com os elementos que
ainda mantêm de pé o feitiço que quer quebrar. Ou seja, você, Luca,
Vladimir e Gabriella.
Puta.
Que.
Pariu.
— Não. — Larkin River balançou a cabeça. — Não é para isso que precisam
dela e não é para isso que estão incansavelmente a procurando. O que eles
precisam é, na verdade, do sangue dela. A quebra do feitiço necessita do
sangue de uma bruxa Salazar. Parece que o sangue será drenado do seu
corpo, literalmente como em um sacrifício, para ela morrer, e assim, com
Vladimir conectado a ela, ele voltar a viver. Acho que é tipo uma
transferência de sangue, quase como uma transfusão que os humanos
conhecem, sai o de vampiro e entra o de um humano, para ele voltar a ser
um. Carter disse o nome do sacrifício, ele disse que alguém da linhagem
Salazar, estudando o caso de Thereza, já que elas tomaram posse dos
feitiços e dos conhecimentos que a mulher tinha na época, mesmo que
poucos, o criou numa tentativa de ser possível reverter o que tinha sido feito
no passado, eles tomaram conhecimento e querem testar.
— Carter não soube responder essa parte com muita certeza — é Larkin
mesmo quem continua. — Ele acha que precisa do sangue de vocês também
para a quebra, e, se não morrerem por isso, podem morrer quando o véu da
vida e da morte voltar ao eixo. Vocês podem, simplesmente, evaporar,
pararem de existir no exato segundo em que Vladimir recuperar sua
humanidade.
Fiquei em silêncio e olhei para todos os cantos, menos para eles, que
pareciam indecifráveis. Sabia que não queriam me mostrar, no entanto,
podia perceber que estavam escondendo o medo e o terror que estavam
sentindo, afinal, apesar de sermos fortes, Vladimir era o primeiro vampiro
do mundo, ele era extremamente invencível, pelo menos, era isso que as
histórias que ouvimos por décadas nos diziam.
— Você não vai nos perguntar o motivo de ele querer ser humano?
Os fitei novamente e percebi que, dos dois, Larkin era o que escondia menos
suas emoções, o que também não era muito surpreendente. Ele sempre foi
muito mais real e muito mais espontâneo que nós, nada era capaz de passar
despercebido pelo ruivo.
A eternidade pode ser dolorosa para vampiros, às vezes, o que nós queremos
é só um pouco de normalidade. A vida, quando você sabe que vai acabar um
dia, é muito melhor de ser vivida. Quando você sabe que para sempre terá o
amanhã, ter propósitos não é mais uma opção. E se não é mais uma opção,
por qual motivo você vai querer acordar no dia seguinte?
Devon permaneceu do mesmo jeito, sério, e acho que Larkin percebeu que
realmente, mesmo que tentasse, não tinha clima para nenhum tipo de graça.
— Temos que nos juntar aos nossos inimigos — respondi de uma vez. —
Temos que voltar, temos que avisar à Gabriella e ao Luca o que está
acontecendo.
de informações o suficiente para levar ao lado de lá. Temos que estar muitos
passos à frente, pois, se não estivermos, eles não vão confiar.
— Se eles não confiarem, Levi, problema deles. Nós damos o nosso jeito.
Devon cruzou os braços e bufou, com raiva mais aparente dessa vez.
— Não, não podemos. Eles têm uma bruxa, e nós, o que temos?
E naquele momento, eu não sabia exatamente como essa junção poderia dar
certo, como que eu ia fazer para convencê-la ou então obrigá-la, entretanto,
no fundo, no fundo, pelo que tinha me acontecido no bar, pelos sintomas
recorrentes que estava sentindo e a recém-descoberta de um possível colar
de controle sobre vampiros, algo em mim se agitava para encontrar a
melhor forma de, diante dessa história fodida, achar uma brecha para me
favorecer, porque, se eu tinha que mantê-la viva, nem que fosse só para
derrotar o outro vampiro original, eu precisava de algo extremamente
favorável em troca.
Do quanto vai me ajudar, pois sei que, mesmo na marra, vai voltar até mim.
Assim como eu também não tive, ela não vai ter saída. Gostemos ou não,
vamos ter que trabalhar juntos, não importam nossos problemas ou nossas
diferenças.
Ew.
Falando neles, quando soube o que queria fazer com Gabriella, contei o meu
plano e tive que mencionar o colar aos meus amigos. Obviamente, não
contei toda a verdade, não revelei que sou, diferente do que pensam, um zero
à esquerda, mas mantive a conversa de que só queria provar o mesmo que
Luca, já que não queria ficar para trás. Eu disse que usaria apenas numa
ocasião ou outra e que só estava fazendo isso para tirar algo de Gabriella,
transferindo muito mais peso aos seus ombros, do que aos meus, para não
facilitar nem um pouco. Seria basicamente para emputecer a sua vida tanto
quanto a minha, que, de um dia para o outro, virou de cabeça para baixo.
Eu disse que não precisavam nem ter pedido e acho que já estou começando
a ser bom nisso. Gostei de vê-la perder completamente a cabeça comigo. Foi
divertido.
Mais uma dor de cabeça, das muitas que tenho que aguentar.
Arrasto os pés para sala e paraliso, encontrando os meus dois vampiros, que
deveriam demonstrar bravura, bebendo chocolate quente em canecas que
dizem Feliz Natal, com desenhos de corações e renas sorridentes.
— Nossa, que tipo de vampiro é você, que nunca ouviu falar de The Vampire
Diaries? — Larkin que soa incrédulo agora. — É uma série que tem um
irmão bom e um irmão mau, tipo o Luca e o Levi. Esse irmão bom, é o
Stefan Salvatore, o Damon zoa ele, porque não se alimenta de sangue
humano, apenas de animais, com preferência em coelhos.
De onde estou, perto de pegar a xícara que eles realmente prepararam para
mim, eu falo:
— Uau, ele assiste coisas que os humanos inventam sobre a nossa raça,
pessoal. Que traidor.
Devon, ao escutar, meio que ri, meio que assobia, meio que bate palma e
meio que faz tudo isso junto. O idiota parece achar hilário.
— Puta que pariu, nós somos uns vampiros de merda — constata, entre uma
risada e outra. — Não revelem essas coisas que vocês fazem a ninguém, por
favor.
Nós não vamos ter credibilidade nenhuma, e olha que a história nos chama
de assassinos. Que assassinos são esses, que maratonam seriado de
televisão?
— Eu não chorei na morte da Elena, é mentira desse idiota. — Me enfio no
meio deles. — Só fiquei triste, porque a atriz ia sair da série, ela era gata, um
colírio para os meus olhos. — Fica um completo silêncio, como se
estivessem me julgando, e com raiva por estarem desse jeito, olho para cada
um deles, depois de beber um gole do chocolate. — É Nina Dobrev o nome
dela, depois pesquisem fotos, vão me entender. Ou melhor, Devon vai
entender, o Larkin só está fingindo que não pensou o mesmo que eu.
Finjo seriedade, entretanto ela dura tão pouco que, pouco tempo depois,
estamos os três quase que cuspindo o chocolate quente para fora, explodindo
em risadas.
— Falando sério, Levi, como foi a conversa com a Gabriella? — quer saber.
— Ela não chegou a confirmar, mas tudo leva a crer que sim. — Dou de
ombros. — A garota é cabeça dura e está com raiva, então eu lhe dei um
tempo para pensar. Acredito que vai contar à irmã e ao Luca, e os três vão
tentar descobrir sozinhos se é verdade ou não. Posso até deduzir que vão
tentar, ao máximo, fazerem tudo sozinhos, só que quando perceberem que
ainda possuem mais questionamentos do que respostas, me procurarão. Nos
procurarão — friso.
Tentou, Devon, bem que tentou, reflito na minha própria cabeça, porém não
externo.
A verdade é que tive sorte, depois que voltei ao bar de Journee, no dia
seguinte, para tentar me explicar e me desculpar pelo ocorrido, eu, enquanto
conversávamos, perguntei se tinha alguma maneira de, mesmo que por um
tempo determinado, ficar incapaz de sentir efeitos de qualquer feitiço de uma
bruxa. Ela
disse que não, que era impossível, tentou desconversar, mudar de assunto e
no fim, sem nem perceber, me soltou, por cima, que havia uma erva que, se
tomada antes e em uma certa quantidade, talvez poderia dar um efeito
reverso, cortando o contato entre a bruxa e a pessoa que tomou, por cerca de
alguns minutos.
— Tranquila, tranquila, não foi, mas também não fritou minha cabeça. Na
verdade, ela não tentou usar feitiço contra mim em mais nenhum momento,
depois que começamos a conversar. Por todo tempo em que estivemos
juntos, acho que ela esqueceu que é capaz de me derrotar.
— Não, meus caros amigos. — Lambo os lábios. — Ela não pode me matar.
— Não seja Eva, não tente comer a maçã — Larkin, de um jeito que ele acha
que é muito sábio, aconselha.
— Não que eu queira, mas vocês não estão em posição de exigir nada aqui.
Giro nos calcanhares, porque a minha escolha agora, é parar com essa
conversa.
Que absurdo, eles pensarem que vou tirar uma casquinha da maçã.
os monstros não podem alcança-la, onde é capaz de dormir uma noite inteira
de sono, com os lábios entreabertos e prestes a babar a qualquer segundo, de
tão bom que está sendo.
Queria me juntar a ela, me proteger na sua cama, debaixo das suas cobertas,
contra o seu abraço. Queria pôr a minha cabeça em seu ombro e também
poder dormir plenamente, hoje e nas outras noites, mas sei que não será mais
possível.
Agora, mais uma vez, as coisas mudaram de cenário, e eu vou ter que me
reajustar, porque tem novos vampiros, e esses, mais fortes, querendo me usar
de sacrifício e depois me matar.
Isto é, se for mesmo verdade toda a história que Levi me falou sobre
Vladimir.
Se não for, minha única preocupação continuará sendo ele, que está de volta
à cidade. Não mais longe, agora perto, tendo acesso a qualquer um de nós.
E medos.
Muitos medos.
Não quero falhar comigo mesma, muito menos com a minha família e com
os meus amigos. Não quero tirar o sono calmo de Evie, não quando ela
passou por infinitos traumas e hoje, tenta, mais do que nunca, se reerguer e
ser feliz.
É cruel.
Se fosse só em mim, seria bom, eu poderia aceitar, mas não, elas podem
muito bem respingar nas pessoas que amo, e isso sim é a pior coisa que
poderia me acontecer.
E não posso suportar ver Evelyn sofrer de novo, sem nem ter a ver com o
meu destino e com os inimigos que fiz por causa disso.
Não posso suportar pensar em deixar meus pais desprotegidos, não quando
eles sempre me protegeram e me deram as estrelas e o mundo.
Abraço meu próprio corpo, mordo os lábios para evitar chorar e penso que
tenho tanto, tanto medo. Eu não sei o que sou capaz de fazer, caso qualquer
uma dessas coisas aconteça. Eu só espero que, depois de hoje, eu só fique
cada vez mais forte, para vencê-los.
— Sim — minto.
— E foi bom?
— Foi bom — digo em um tom tão baixo, que nem sei se ela escuta. —
Assim que clarear, assim que estivermos acordadas, eu te conto como foi —
a tranquilizo, só que, mais uma vez, mentindo. Eu me aproximo dela, no
entanto. —
— Tenho.
Sutton pode parecer boba aos olhos dos outros, porém ela não é nem um
pouco.
Engatinho, me coloco ao seu lado e me enfio por baixo da sua coberta, que
também vai comportar muito bem nós duas. Em todo o processo, ouço a sua
risada.
— Vai dormir com essas roupas? — Aponta com o queixo para o meu corpo.
E querendo ser protegida por você, nem que seja só por essas horas, penso.
É só uma desculpa para que, mais de perto, não possa se dar conta do quão
emocionada estou.
É surreal, parece que ela pressente, parece que percebe que preciso disso, do
seu abraço.
— É, talvez.
Por meses, ela detalhou tudo o que eu precisava saber, se decidisse assumir a
minha força de uma Salazar. Porque, nas folhas, ela dizia que tinha se
sacrificado para me dar uma chance, para me dar o poder de escolha entre
permanecer com o meu lado bruxa apagado ou o meu lado bruxa aflorado.
Por isso, tinha contado a história, tinha separado os feitiços e tinha deixado
para mim, o poder de escolha.
Mas também, tinha me dado uma coisa muito mais valiosa e importante,
para caso eu precisasse, para caso eu sentisse que estava em perigo e
precisasse me salvar.
Valerie.
Valerie Moore.
A vizinha idosa que mora na casa ao lado, para quem mamãe vive enviando
tortas.
Eu não sei o que ela é, nem o que pode fazer por mim, porém eu finalmente
a procuraria.
Me parecia a hora certa, e eu só não tinha feito ainda, porque não sabia se ela
sabia sobre mim, não queria me revelar para uma outra pessoa assim, mesmo
que Zena tenha deixado por escrito que era de confiança. Eu também, no
fundo, tinha medo do que poderia encontrar com aquela senhora, tinha medo
de cavar mais um pouco e perceber que só sei desse mundo o básico do
básico, que tem muito mais coisas escondidas na nossa cidade.
Valerie sabe desse mundo, e ela é uma pessoa antiga, que vive há bastantes
anos por aqui, deve conhecer Vladimir Vampir.
Precisa conhece-lo, se não tiver respostas para mim, eu só vou ter Levi.
Apesar de ser final de semana, e todos acordarem um pouco mais tarde, sei
que a Sra. Moore não é adepta a essa modernidade. Ela é aquela que acorda
junto das galinhas.
E, de qualquer forma, vai ter que me atender, porque já subi na sua varanda e
já estou tocando a sua campainha.
E continuo.
— Ah, você. Oi. — Seus olhos pequenininhos se concentram nos meus, e ela
sorri, fazendo suas bochechas enrugadas alargarem. — É uma das filhas da
Leah.
— Não é uma pergunta, é uma afirmação. Algo me diz que ela sabe muito
mais do que isso, que está fingindo, como fez a vida toda. — Me trouxe
alguma torta?
Geralmente é a outra que traz, a de óculos, acho que é Evelyn o nome dela.
É uma boa garota. Gosto da companhia dela. Mas cadê?
— O quê?
— A torta.
Engulo em seco e dou alguns bons passos para frente, pois percebi que
estava muito afastada.
— Não há tortas — esclareço e olho para os lados. Sei que ninguém está por
perto, que ninguém pode nos ouvir, mas não custa conferir, o assunto é
mesmo muito sério. — Estou aqui por outro motivo, Sra. Moore.
Sem pensar duas vezes, eu passo pela sua porta, sabendo que, ou eu avanço
ou eu continuo no mesmo lugar.
Desde que eu me entendo por gente, a minha família e eu moramos na
mesma cidade, na mesma casa, no mesmo bairro, em um lugar onde a
vizinhança não muda, o que significa que, de um jeito ou de outro, acabamos
conhecendo, mesmo que por cima, a vida de cada vizinho.
E a Sra. Moore, claro, é a pioneira desse bairro, com seus quase 90 anos de
idade, foi uma das primeiras a construir tudo por aqui, tanto sua casa, quanto
toda a sua vida. E a sua vida, tanto quanto a sua pessoa, com o tempo,
acabaram sendo bastante famosas entre os moradores dessa região.
Eu, por exemplo, cresci sabendo da sua existência. Sempre que brincava na
rua, com todas as crianças do bairro, a via sentada na porta, em sua cadeira
de balanço, tricotando e fazendo suas previsões sobre o tempo todas as vezes
em que passávamos perto da sua casa, já que tinha um dom muito forte de
acertar quando iria chover ou não, sempre mandando a mim ou as outras
crianças voltarmos para as nossas casas, para não ficarmos gripados por
causa do frio.
Eu lembro de achá-la simpática, atenciosa e lembro também de, conforme
crescia, ver seus filhos namorando, casando, tendo filhos e saindo de casa,
um a um, até deixarem-na sozinha, mesmo com a idade avançando. Lembro
que começaram a circular conversas e boatos, depois do seu marido falecer,
que ela
tinha ficado com muito dinheiro, que estava com uma condição de vida
muito melhor e mesmo que tentasse dar de tudo aos netos, eles também
cresceram e passaram a não vir vê-la com frequência nos finais de semanas
mais.
Os boatos, de repente, passaram a não ser mais boatos, já que nos últimos
anos, a própria Sra. Moore fazia questão de dizer, não importando com quem
parasse para conversar, que ela estava praticamente abandonada por sua
família, mesmo com toque de piada e bom-humor. Foi por causa disso, que a
vizinhança começou a ser solidária com ela, as pessoas começaram a tirar
horas dos seus dias para visitá-la, para agradá-la, e uma delas foi mamãe,
que passou a trazer umas das suas tortas rotineiramente, para deixá-la mais
alegre, sempre de abóbora, que é a sua favorita.
Como crescemos sempre ouvindo histórias sobre ela, falavam muito que sua
casa era uma das mais bonitas e aconchegantes do bairro. Como nunca tinha
entrado, não fazia ideia se estavam certos ou não, mas agora, sentada no seu
sofá, com a xícara de café servida, e com Valerie de frente para mim, em sua
poltrona, eu posso confirmar, porque meus olhos percorreram cada
centímetro da residência, curiosos.
Tem muitas coisas antigas, como vitrola, discos de vinis como uma coleção,
taças e copos de vidros enfileirados em um móvel, mas também muitas
outras coisas modernas. E mesmo que eu tente notar algo de diferente, que
possa me revelar o que ela é, não encontro. Parece tudo absolutamente
normal para a idade que tem.
Bebo alguns goles do café, para não ficar com a boca seca, e depois o
repouso no centro à minha frente, cruzando as pernas, respirando fundo e me
preparando.
— A senhora sabe quem sou e o que sou. — Também não é uma pergunta,
estou só constatando os fatos. — Primeiro, para começarmos, eu gostaria de
tentar entender qual a sua ligação com a minha mãe. Na verdade, qual a sua
ligação com isso tudo. A senhora é uma bruxa também? Tipo, de outra
linhagem? Uma bem antiga, sábia e poderosa?
Não sei o que falo de tão engraçado, porém a minha vizinha sorri, enquanto
balança a sua cabeça.
— Não, querida, eu não sou uma bruxa. — Repousa sua xícara no primeiro
lugar seguro que encontra e se acomoda melhor na poltrona, parecendo saber
que a conversa vai perdurar por horas. — Eu vou te contar tudo, fique
tranquila, mas primeiro preciso saber, sua mãe escreveu mesmo sobre mim
no diário, não foi?
— Calma, eu vou chegar nessa parte — Valerie diz, e acho que percebeu as
interrogações pairando sobre mim. Assinto, pedindo silenciosamente que
continue, que estou preparada para ouvi-la. — Só me responda uma coisa,
antes de partirmos para as histórias, você leu tudo que estava escrito?
— Ótimo, é bom que nos poupa tempo, e eu não preciso fazer a revelação de
que o namorado da sua irmã é um vampiro, um dos gêmeos Vodrak.
Não é bruxa e sabe até disso? Capaz de ser igual a melhor amiga de Evelyn,
uma humana que tem total ciência do que se esconde por Emerald Grave,
que sempre soube primeiro que todo mundo.
— É, mas também não se preocupe, ele está do nosso lado.
Meu coração se tranquiliza mais, sabendo que ela sabe disso, não quero
arrumar mais problemas para o Luca ter que resolver.
— E o que a senhora é, para ter tido essa conexão tão grande com a minha
mãe?
Uau.
Ainda estou um pouco chocada, no entanto. Por muito tempo, desde que li as
anotações de Zena, ficava me perguntando o que Valerie, minha idosa
vizinha, poderia ser, e ser uma senhora que é capaz de prever o futuro, nunca
foi algo que passou pela minha cabeça.
— Eu também contei isso para ela naquele mesmo dia, e ela ficou igualzinha
a você, surpresa — continua. — E nas minhas visões, quando Zena esbarrou
comigo, eu vi que ela estava passando por dificuldades, a chamei para um
café, e ficamos conversando a tarde inteira. Foi quando me contou da
maldição, dos vampiros, que eu já conhecia, por sinal, e quando decidiu
revelar que estava grávida, carregando você no ventre, totalmente
desesperada, por não saber o que fazer. Não tinha nem contado ao seu pai
ainda. — Sra. Moore suspira. — Eu fiquei com muito dó na época e me
dispus a ajudar, a manter contato e lhe entreguei meu número fixo, junto do
meu endereço, para caso precisasse. Poucos dias depois, Zena apareceu na
minha porta, mais uma vez fugindo, sempre ao lado do seu pai.
Ela disse que ia gerar o bebê e que iria dá-lo para adoção, porque não queria
lhe entregar o mesmo destino. Nesse mesmo dia, Zena pediu que eu lesse
algumas cartas para ela, queria ter a certeza de estar fazendo a coisa certa.
Quando Valerie para e me encara, tenho certeza que pode ver meu coração
no chão, totalmente despedaçado.
Queria ajudá-la, mas também sabia que não podia fazer muito, que só
precisava trabalhar com a verdade, mesmo que as cartas me mostrassem que
o futuro era
doloroso. E ele veio para mim totalmente doloroso, menina. Porque o futuro
me dizia que vinha guerra, fogo, morte e destruição em massa. Na mesma
hora, Zena e o seu amado ficaram desolados, porém tiveram a certeza de que
não tinham mais saída, eles precisavam te entregar para outra família, depois
que sua mãe gestasse você. — Ela enxuga o canto dos olhos, dá para ver que
é algo que também mexe com ela. — Acabei conseguindo um lugar para eles
ficarem aqui em Emerald Grave, e por mais que Zena não gostasse da ideia
de ficar, pelo fato de toda a rixa dos vampiros e bruxas ter começado aqui,
ela sabia que não tinha mais dinheiro, não tinha mais escapatória, e que aqui,
eu poderia ajudá-la no que fosse preciso. E
— A senhora foi como uma mãe pra ela — exponho, emocionada e com os
olhos marejados. — A senhora resolveu ficar, quando estava tudo
desmoronando, resolveu ficar, quando possivelmente nenhuma outra pessoa
ficaria.
Não pense que você nunca os conheceu, porque você os conheceu, e foi
lindo.
Foram algumas poucas horas mais bonitas de toda a minha vida, e olha que
eu já era velha naquela época.
— O que aconteceu depois? Como eu vim parar na casa dos meus pais, Leah
e Elliam?
— Depois de você nascer e ficar um tempinho com eles, ela entregou você a
mim, disse, com muita dor no coração, que se ficasse segurando você por
mais tempo, iria perder a coragem. E disse que eu podia fazer o melhor para
a bebê dela, contanto que o diário fosse junto à sua cesta. — Sra. Moore se
levanta com cuidado e bem devagar, por causa da sua idade, vem até mim e
se senta ao meu lado, para segurar as minhas mãos. Eu fungo, sentindo o seu
toque. — No começo, eu iria a um orfanato, é verdade, mas eu me lembrei
na mesma hora da sua mãe, da Leah. Ela sempre foi uma mulher incrível,
com um marido tão bom quanto, com uma família estruturada, e, além disso,
eu, assim como todo mundo no bairro, sabia do seu amor por crianças, do
seu sonho de gerar filhos e de toda a sua
— Presumo que a senhora não sabia que ela e o meu pai estariam no
cruzeiro Shine Star.
— Era por isso que sempre ficava na porta, quando eu passava brincando?
Não conseguia não te vigiar, você sempre foi como uma neta para mim,
ainda que eu tivesse que te ver crescer distante. E me desculpe por não ter
me aproximado ou te contado a verdade, eu não podia.
— Porque eu não sabia se você tinha herdado seu lado bruxa, se você tinha
recebido o diário quando ficou mais velha, se tinha lido e, principalmente, se
acreditava e se queria mesmo falar sobre. Eu tinha que te deixar vivendo,
como Zena e Trent tanto queriam. Você foi colocada ali para ter outra
oportunidade de vida, outro destino, eu não podia me intrometer. Meu
trabalho já tinha sido feito, e eu estava muito feliz com o resultado dele. —
Seca as poucas lágrimas que ainda insistiam em cair, depois ergue meu
queixo, ao segurá-lo com os dedos em formato de pinça. — Mas agora que
está aqui, minha menina, posso imaginar que, além de ter assumido o seu
lado bruxa, assumiu todos os problemas da herança de uma Salazar, não é?
— Sim, Sra. Moore — assumo, sem poder mentir, afinal de contas, se estou
aqui em busca de respostas, não posso sair sem elas. — Zena disse que você
era confiável, agora eu vejo que é, e que podia me ajudar, caso eu estivesse
passando por apuros. Acredito que seja com suas visões, com suas cartas.
— Há alguns meses, Levi Vodrak achou que Evelyn, minha irmã, era uma
Salazar, porque foi a sobrevivente do navio que pegou fogo, e então decidiu
que queria caçá-la. Ele a levou, junto da amiga, para a igreja abandonada em
Dantown, lugar onde aconteceu um dos massacres dele, e tentou matá-las.
Por sorte, pude chegar lá junto de Luca, contando a verdade e os expulsando
em seguida. No fim das contas, estava claro que ele voltaria para me matar e,
durante esse tempo todo, estive esperando que voltasse para cumprir sua
promessa. E ele voltou. — Meu corpo inteiro se vira totalmente para Valerie,
na intenção de vê-la melhor. — Mas não para me matar, para me informar
que outro vampiro está atrás de mim. O
— Esse mesmo.
— Eu sei, Sra. Moore, mas não posso evitar o meu destino. Essa maldição
vai ter que acabar comigo, de um jeito ou de outro. Seja eu morrendo ou
derrotando meus inimigos, ela vai ter que chegar ao fim.
— Vira essa boca para lá, menina, você não vai morrer.
— É, se Levi ajudar a derrotar Vladimir como disse que faria, já é meio
caminho andado. Isto é, se não estiver querendo me enganar também.
Posso imaginar que desde o último futuro que previu de uma Salazar, não
está muito animada para fazer o mesmo agora, depois de anos.
Também não estou nem um pouco animada, para ser sincera, e por motivos
óbvios. Não sei o que vai ela vai ver, entretanto acredito que nada do que
puder me falar, vai me tranquilizar.
Só para ter uma noção de como me encontro, a Sra. Moore fica olhando as
cartas viradas para baixo por um tempo, que se equivale provavelmente a
segundos, mas que no meu entendimento, parecem horas. É fruto do meu
— Vou virar — Sra. Moore anuncia, acho que percebe o nível da minha
ansiedade, que é palpável. Fico olhando de forma vidrada para o caminho
que suas mãos fazem até as cartas, porém, quando chega bem perto, bem
perto mesmo, ela simplesmente paralisa, quase paralisando o meu coração
junto. Eu olho para Valerie, e Valerie olha para mim, e sei que quer me dizer
algo importante. É o que faz. — Antes de descobrirmos o que tem aqui,
queria que soubesse, filha, que uma vidente nem sempre é capaz de ver
detalhadamente o futuro. Nós temos visões e nós mesmos fazemos nossas
interpretações sobre o que vemos nelas, podendo muitas vezes, serem certas
ou erradas. Sou uma velha senhora sincera e mesmo que tenha acertado
muito mais do que errado, já errei também, não posso esconder.
— Tenho uma clara ideia de como funciona, Sra. Moore, já assisti muito As
Visões da Raven, acompanhei pela televisão as enrascadas em que ela se
metia por interpretar suas visões de forma errada.
Sua testa enrugada fica ainda mais enrugada, quando fica sem entender do
que estou falando.
Está vendo, é o bendito nervosismo me deixando sem noção, até parece que
a Sra. Moore alguma vez na vida já assistiu As Visões da Raven passando na
tevê.
O máximo que ela deve assistir, quando não tem nada para fazer, é Bingo.
Outra questão são as cartas, elas não são precisas, normalmente costumam
ser muito vagas, podendo indicar qualquer segmento da sua vida. Com Zena,
as cartas diziam morte, diziam fogo, e duvido que ela imaginou que essas
duas previsões se juntariam e aconteceriam bem ali, em um cruzeiro em alto-
mar. É por isso que, por favor, menina, não se desespere. Tudo pode alterar o
futuro, inclusive você estar sentada a essa mesa comigo. E lembre-se
sempre: você é forte, você é a última, você é uma bruxa, você é poderosa.
— Obrigada, Sra. Moore. Por tudo — friso, ao sorrir. — Por ajudar a minha
mãe Zena, por me ajudar quando bebê, me trazendo minha família e
principalmente, por estar me ajudando agora. Eu não sei o que seria de mim
hoje, se não te encontrasse.
A Gabriella de anos atrás, a que achava ter sido abandonada, fica muito,
muito agradecida e feliz por finalmente saber toda a verdade.
Valerie toca as cartas por cima, depois decide virar primeiro a do meio.
Prendo o ar.
entender nada. — Gabriella, minha menina, você não vai acreditar. — Joga
novamente a carta para mim, com cuidado. Eu a pego entre meus dedos e a
trago para mais perto do meu rosto, podendo observar os desenhos. Parece
um casal, tipo Eva e Adão, um de frente para o outro, no que parece ser o
paraíso. — Essa aqui, significa romance. Amor verdadeiro. Aquele que é tão
forte e arrebatador, que muitas vezes pode ser considerado proibido. Ele
também promete abalar suas estruturas, te tirar dos eixos e te fazer viver
intensamente, como nunca imaginou viver antes.
— Não sei se ouvir uma coisa dessas é boa ou ruim, diante de toda situação.
— Passo a carta rapidamente para Valerie, e mesmo que eu acredite cem por
cento no seu trabalho e no seu dom, nessa parte, eu não coloco tanta fé
assim. É mais fácil eu acreditar se ela me disser que vou virar um
dinossauro, do que se me disser que vou achar o amor verdadeiro no meio do
turbilhão de loucura que é a minha existência nesse mundo. — Melhor
passar para a próxima, Sra. Moore.
Noto que está mais contente, que está menos tensa e preocupada, como se
acreditasse que tudo fosse melhorar a partir de agora, quando virar e se
deparar com a próxima. Contudo, não é o que acontece. A senhora perto de
mim dá um pequeno sobressalto, seus lábios se abrem lentamente em um O,
que a todo tempo tenta muito não deixar tomar conta, e os olhos ficam fixos
nas imagens, arregalados. E antes mesmo que eu possa fazer qualquer
pergunta sobre o que houve, a carta simplesmente cai da sua mão e vai parar
no chão.
Alterno meu olhar entre a carta e Valerie, mas acabo percebendo que ela não
se mexe, que fica como uma estátua, sem cor, pálida, totalmente branca, com
os seus olhos perdidos por trás das lentes da sua armação.
Vê-la nesse estado, me deixa mais preocupada do que qualquer coisa que
pudesse falar sobre o meu futuro, então me levanto da cadeira em um
ímpeto.
Quando vou me virar para buscar ajuda, ela me puxa, ao prender os dedos
em meu antebraço.
Seus cílios se chocam uns nos outros, e parece finalmente me notar de novo.
— Eu vi você, lado a lado com Luca e um outro, extremamente parecido
com ele.
Tinham mais pessoas, era uma luta. Você, Luca e o outro estavam no mesmo
lado,
Cubro a minha boca com as mãos trêmulas, sem acreditar que teve esse tipo
de visão agora, comigo em sua frente.
— Ei, Sra. Moore, olhe para mim, está tudo bem, fiquei assustada, mas
entendi que é uma visão. As visões têm diferentes interpretações, certo? Não
foi isso que me disse? E também é como a senhora mesmo falou, o futuro
pode ser alterado, qualquer coisa que fizermos, mesmo que mínima, pode
impactar mais lá na frente, e se pensarmos assim, talvez o que viu, nem se
concretize. Vou trabalhar nisso, não vou deixar que nenhuma pessoa que eu
amo, morra.
— Algo em mim também me diz isso. Acho que é a nossa conexão fluindo.
— A senhora vai ficar bem? — Faz que sim, ao pôr suas mãos em cada lado
do meu rosto. — Certo, eu preciso ir agora, mas saiba que continuarei
voltando para vê-la. Agora não precisará me ver crescer de longe, farei
questão de me manter por perto.
— Sim, sim, pode deixar. Ficaremos batendo papo aqui com a senhora, até
enjoar de nós.
— Não, não, isso nunca. — Ri. — E qualquer coisa que acontecer, não deixe
de vir aqui. Se precisar da minha ajuda, este lugar também pode ser o seu
refúgio.
— Mais uma vez, muito obrigada, Sra. Moore. — Me afasto, pego a bolsa
que tinha colocado em cima de uma outra cadeira, e, antes mesmo de eu me
dar conta, ela já está em pé. — Não, é melhor a senhora ficar aí, eu posso,
sem problema algum, ir até a porta sozinha, não quero fazê-la se esforçar
mais do que já se esforçou comigo aqui.
É, bem que os vizinhos dizem que Valerie Moore é uma força da natureza,
capaz de fazer tudo sozinha, sem depender de ninguém.
E ao abrir a porta para mim, ela se despede com mais um beijo.
Meus passos são certeiros, me levam à outra casa, no que parece ser menos
de um minuto.
Minhas mãos com os punhos fechados também são rápidas, pois começam a
bater desesperadamente na porta de Luca, assim que meus pés se estagnam,
agora em sua varanda.
Para a minha sorte, ele também é rápido em abrir e me olhar com uma
expressão de quem acabou de acordar, e não está entendendo nada.
— Ela está bem. — Seguro seu ombro, para fazer com que pare de procurá-
la. — Ei, olha para mim, deixei a Evelyn dormindo em casa, está tudo bem.
O
assunto não é sobre ela, é sobre mim. Sobre nós. Eu, você e Levi.
— Levi? — Dá para ver que, quando se segura na porta, segura com muita
força, porque o local fica um pouco amassado. — Não me diga que aquele
desgraçado apareceu.
— Ele apareceu — conto de uma vez. — Ontem, quando saí com Cody, Levi
apareceu. — Abraço meu próprio corpo, sentindo o frio da manhã de
Emerald Grave me atingir. — Resumindo a história, ele não quer mais me
matar, ele quer me deixar viva, para que eu consiga fazer para ele o mesmo
colar que você usa, e aí, em troca, vai nos dar informações sobre Vladimir
Vampir, que quer desfazer a maldição para se tornar um humano e, para que
isso aconteça, precisará do sangue de uma Salazar e de todos os elementos
que mantêm esse feitiço ainda funcionando, que no caso é Vladimir, você e
Levi. Basicamente, estamos todos perto de morrer, tipo, bem perto mesmo.
— Entre — diz, com o maxilar trincado. — Entre, porque essa história não
está fazendo sentido nenhum, Gabriella.
Passo por Luca, entro em sua casa e ouço quando fecha a porta, e vem até
mim.
Isso se a própria Gabriella já não lhe contou em primeira mão naquela noite
mesmo ou no dia seguinte, mencionando minha aparição e as informações
sobre Vladimir, que trouxe comigo e só joguei em seu colo. A bruxa
provavelmente deve ter falado sobre a festa, sobro o nosso passeio e sobre a
cabana na montanha, que a fiz conhecer à força.
Espero muito que tenha tocado nesse ponto, a propósito, porque tentei muito
me ajustar naquele lugar em meio à floresta, no entanto, depois de já ter
passado tanto tempo na companhia de Larkin e Devon, seja referente à outra
vez que viemos juntos ou seja referente à nossa última estadia naquele
quartinho na beira da estrada de outra cidade, fiquei simplesmente cansado
de dividir lugares pequenos com aqueles dois, então disse, hoje mesmo, há
poucas horas, que eles
E é até bom que Luca já tenha ciência da minha presença, pois a casa para
onde estou me mudando é, na verdade, a dele.
Fui convidado? Não, porém, apesar das nossas diferenças, ele é meu irmão, e
o que é dele, é meu.
Gostando ou não, não posso passar dificuldades por causa do seu egoísmo,
ele tem que aprender a dividir e tem que aprender a lidar comigo daqui por
diante.
Na minha cabeça, parece uma ideia genial, só preciso falar isso olhando
para a cara dele agora e espero que não me mate, penso, quando já estou
parado na sua porta com uma mochila nas costas, contendo minhas roupas e
minhas coisas mais importantes.
Está prestes a chover, com o céu cinzento acima de mim, mas ando mais
rápido, para poder me cobrir em sua varanda. Parado nela, fico sem saber se
entro como um vampiro ou se ajo como um humano normal, que esperaria
até que viesse me atender.
Pondero as duas opções e por mais que eu saiba que os meus poderes de
vampiro são muito mais divertidos, não posso perder a oportunidade de
flagrar a sua cara, quando escutar a campainha, vir abrir a porta e perceber
que sou eu. Não para uma visita, não para uma conversa, não para uma
discussão, como seria o normal, e sim para morar.
Morar.
Umedecendo os lábios, faço o que vai ser mais impagável, eu aperto o dedo
na sua campainha e o deixo pressionado ali por alguns segundos, para que
ela soe e chegue de forma estridente e insuportável aos seus ouvidos. Ouço,
com os meus ouvidos de um bom ser sobrenatural, quando Luca murmura lá
dentro, por causa da minha insistência, ao passo que começa a se
movimentar, descendo as escadas.
mãos virada para ele, em uma forma que encontro de dizer olá, sem soltar
nenhuma palavra.
Também contém sarcasmo, ironia, porém o que posso fazer, se esse é meu
jeito de ser?
Posso estar puto por dentro, entretanto estarei sempre matando meu inimigo
com um sorriso ou uma provocação. E fazer isso com Luca funciona... hm,
bem, desde sempre.
olho de cima à baixo. — Ei, cara, calma, eu não sou uma bandeira vermelha
sendo balançada na sua frente, para você me olhar assim, como se fosse um
touro de desenho, que sai fumaça. Se bem que... posso até ver um par de
chifres na sua cabeça. Foi a Evelyn quem meteu um desses aí? — Com o
queixo, aponto para o topo da sua cabeça.
Nada.
— Você tem que parar com essa mania terrível de me cumprimentar dessa
forma, maninho — ironizo a última palavra, e Luca praticamente rosna para
mim, querendo sair do meu aperto. — Credo, isso foi só por que eu apareci
ou por que falei da sem sal da sua namoradinha? — Lambo os lábios,
tentando evitar rir. —
Falando nela, por onde anda? Evelyn Sutton já soube, pela minha bruxinha,
que estou de volta?
— Você deve estar adorando tudo isso, não é? — Me empurra, só que dessa
vez, é fraco, para me afastar. Luca parece com raiva, inconformado, e já
posso imaginar que está falando de Vladimir. Está na cara que sabe, como
suspeitei. —
Está adorando que encontrou um motivo para se aproximar, para ficar perto
de mim, da Gabriella e da Evelyn a pulso, porque acha, na sua cabeça, que
vai ser útil para nós. E não pense que Gabriella não me contou, ela contou
cada detalhe do que você fez e falou com ela. Até a porra do meu colar, você
fez questão de
— Não sei do que está falando. — Jogo os ombros para cima e para baixo.
— Eu estou aqui para ajudar, não estou aqui para maltratar ninguém, apenas
Vladimir. Inclusive, ouviu falar dele ou também quer que eu te conte a
historinha?
O osso na mandíbula do meu irmão salta para fora, e ele fecha as mãos ao
lado do corpo.
— Ela disse que vai procurar o feitiço, porque, de um jeito que não te
interessa, descobriu que estava falando a verdade e precisa que você solte
mais coisas que possam ajudá-la a montar seu plano para se manter salva. —
Mais outro passo, e Luca parece mesmo como um touro, alto, forte,
indomável. Só é capaz de ficar desse jeito, quando se trata de mim. — Sério,
fico me perguntando como você pode não sentir um remorso sequer. Fico me
perguntando, dia após dia, como foi que o meu irmão se tornou isso aí, esse
monstro que só sabe chantagear, ameaçar e tirar vantagem da
vulnerabilidade dos outros para seu próprio benefício.
Entreabro os lábios, pois penso que, agora que parou de falar, é o meu
momento para quebrar o clima, mas sua raiva é incapaz de mantê-lo calado
por mais do que segundos, já que provavelmente tem uma infinidade de
coisas guardadas, necessitando serem jogadas na minha cara. É perceptível,
só pelos seus olhos, o tamanho da sua decepção, mágoa, vergonha, tristeza e
desprezo por mim.
De nós dois, ele sempre foi o gêmeo mais expressivo e verdadeiro, nossa
mãe costumava dizer que Luca seria um garoto de ouro até o fim de sua
vida.
— Você tentou tirar de mim a garota que eu amo duas vezes. Duas — dá
ênfase, ao erguer os dedos. — No cruzeiro, quando ela era só uma criança, e
há pouco tempo, quando resolveu executar sua ideia estúpida de que Evelyn
era a Salazar sobrevivente. Você não foi capaz nem de pensar em mim, no
seu irmão, na dor que me causaria. Você só soube pensar no seu ego, na sua
vingança, no ódio e no monstro que deixa te consumir. Ou você acha que
não posso imaginar que quer
— Claro, Levi, você estava matando inocentes, fazendo vítimas pelo mundo!
Mas está tudo bem, eu conheço o seu tipo, Luca. Você sempre vai querer ser
o
único, você sempre vai querer poder se olhar no espelho toda manhã, bater
no peito e dizer em voz alta que é muito melhor e muito superior a mim no
quesito caráter e escolha de vida. Seu maior prazer é viver sabendo que,
enquanto tem tudo, eu não tenho nada. — Encontro forças para empurra-lo,
fazendo-o cambalear para trás. — E quer saber? Foda-se você, sua vida
perfeita e o seu amor verdadeiro. Estou pouco me lixando, eu não dou a
mínima, não me atinge. Minha vida está ótima, adoro ser esse vampiro que
sou, e você vai ter que me aturar por muito, muito tempo, porque não
pretendo sair dessa cidade tão cedo.
Ando para pegar minha mochila e quando a coloco em um dos meus ombros,
cruzo os braços, percorro as minhas írises por cada canto da sua casa e mudo
minhas expressões, assumindo novamente o meu sorriso.
— Espero que tenha separado um quarto para o seu irmão favorito, já que é
aqui que vou morar.
— Gostaria que eu estivesse, né? Eu sei, mas não estou. Trouxe as roupas
que vou precisar, trouxe meus amigos comigo, Larkin River e Devon Mars,
acho que os conhece, e claro, as informações que precisamos para
derrotarmos Vladimir Vampir, quando o momento chegar. Porque, querido
irmão, é para isso que estou aqui, para derrotá-lo, para fazê-lo entender que
ninguém ameaça um Vodrak e sai ganhando, e para ajudar minha bruxa a
fazer os feitiços que eu quero, não tem nada a ver com resolver nossas
pendências do passado. Essa barreira entre nós sempre existirá, de qualquer
forma.
Dou de ombros.
— O único erro que eu cometi, foi não ter matado você quando tive a
chance, garanto que teria poupado muito sofrimento.
— Você sabe que não poderia lutar sozinho, por isso veio. Você é esperto,
Levi, cada passo seu é calculado para, lá na frente, ganhar. Acho que acabei
de entender todo o seu plano.
Como vejo Luca se sentar no sofá, eu vou até ele fazer o mesmo.
Jogo a minha mochila na primeira cadeira que noto pela frente, depois me
sento ao seu lado e, quando percebo que vai beber mais um gole do álcool,
eu roubo da sua mão.
Bebo direto do gargalo e faço uma careta pela queimação, e por meu gêmeo
puxar a garrafa de volta.
— Eu acho que você que está com inveja — acuso e desdobro o assunto,
para que continue com suas dúvidas, sem nenhuma necessidade de precisar
receber uma pista minha. — Por quê? Não quer que eu também possa andar
ao sol? Quer ser o único? Isso também configura egoísmo, só para você
saber.
Me viro para o meu irmão, que, ao mesmo tempo que é tão parecido comigo,
é tão diferente. No rosto, no estilo, na personalidade.
— Todo vampiro pode andar no sol, Levi, contanto que use óculos. O que
nos impede são nossos olhos, que ficam mais sensíveis e parecem que vão
explodir. O colar só protege contra isso, não faz mágica.
— Pelo que percebi, Gabriella tem uma boca bem grande — comento.
— Ela também disse que, se eu te visse, não era para te matar, porque quer
ver o que vai dar. Disse que quer pagar para ver.
— Não conversamos sobre isso, e acho que ela também nem vai ligar, eu
precisava, de algum jeito, descontar a raiva. Não é muito fácil lidar com a
sua cara.
— Cara, acho que você não entendeu, estou falando mesmo sério, vou morar
aqui.
Nada melhor do que fazermos isso morando sob o mesmo teto. — Dou de
ombros.
— Ah, está sim. — Me levanto e, pela segunda vez, passeio com meus olhos
pela casa, para conhecê-la. Depois de perceber que é um lugar como esse
que eu
estava mesmo precisando, volto a encarar Luca, que segue de cabeça baixa,
como se estivesse rezando. — Agora que estamos conversados, e você está
mais calmo, poderia me mostrar meu quarto? — Ele segue em silêncio. —
Eu também fiquei do mesmo jeito, quando percebi que teria que me
aproximar de vocês, mas daqui a pouco, você supera e faz que nem eu,
começa a esquecer do passado e foca no futuro, para que as coisas
aconteçam rápido, e assim, nunca mais precisemos nos ver.
Luca ergue o olhar, mas não tenho certeza se ele permaneceria no seu
silêncio mórbido ou se me responderia, porque nós dois paramos e
prestamos, ao mesmo tempo, atenção no que acontece lá fora, nossos
ouvidos captando uma movimentação.
Poucos segundos depois, quem está lá fora toca a campainha e bate na porta,
simultaneamente.
Sinto o cheiro.
O cheiro dela.
De outra pessoa também, porém é nela que foco toda a minha atenção.
— É Gabriella — Luca me diz o que eu já sei, se levantando e se colocando
ao meu lado. — Ela e Evelyn. Tínhamos marcado esse horário para falarmos
sobre o que faremos com Vladimir.
Tenho certeza que ele me xinga, porém estou ocupado demais subindo as
escadas da minha nova casa.
— Nossa, que demora pro Luca atender. O que será que ele está fazendo?
Eu já disse para ela ficar calma umas cinco vezes, isso só desde que
chegamos, o que não deve ter nem um minuto, e me recuso a ter que falar de
novo.
A garota está assim desde que saímos de casa, ou melhor, desde que eu, há
três dias, resolvi contar o que estava acontecendo com Levi e Vladimir, tanto
para ela quanto para o seu namorado, que a chamou para sua casa pouco
tempo depois de eu ter revelado sobre a Sra. Moore, nossa vizinha anciã e
vidente, para que ambos se inteirassem sobre as novidades juntos.
E a princípio, eu não sabia dizer se a minha irmã tinha ficado mais assustada
com Valerie, que, segundo sua cabeça pensante, imaginava que a senhora já
estivesse caducando, ou se ficava assustada com o sacrifício que Vladimir
estava desejando fazer, junto da oferta que Levi Vodrak estava nos
oferecendo, acerca do colar.
Ela ficou e ainda está muito preocupada, a revelação foi como um baque
para Evelyn, afinal, mesmo que eu estivesse e ainda esteja, escondendo a
visão final de Valerie, nem ela, nem nenhum de nós, estava esperando por
algo assim.
Esperávamos sim, uma luta com Levi a qualquer momento, isso é fato, mas
não
Porque nós sofremos o pão que o diabo amassou, tanto quando ele quase a
matou, junto de sua melhor amiga, tanto quando foi embora, nos deixando
um monte de dúvidas, medos e inseguranças, já que não sabíamos quando
podia voltar para terminar seu trabalho.
E agora ele estava de volta, entretanto não para terminar o trabalho, e sim
para começar um novo. Um que inseria a todos nós. Um que me usaria de
isca, porque quer a merda de um feitiço no colar e não vai falar o que sabe,
até me ver progredindo na minha procura.
Por isso, que eu também disse à Evelyn e a Luca que, não importava o que
ele fizesse ou falasse, tivessem paciência. O gêmeo mau, como é conhecido,
por mais que tenha essa fama e seja um vampiro odioso, ele ainda tem muito
conhecimento, e talvez, se eu conseguir domá-lo e tratá-lo da maneira certa,
ajude muito mais do que atrapalhe.
Só o fato de ter que ficar perto dele, tratando-o como se estivesse tudo bem,
me deixa louca e me mata por dentro, porém há uma guerra chegando, e, de
qualquer forma, Sra. Moore disse que ele estava lutando ao nosso lado.
Preciso ver com meus próprios olhos até que ponto podemos confiar nele.
Provavelmente, até um ponto bem pequeno, mas ainda é alguma coisa, e se
ele quer o colar, vai precisar de mim também.
Como disse na cabana, não dá, nesse momento, para trairmos um ao outro.
Essa parte ainda não entrou muito na cabeça de Evelyn, é por isso que está
desse jeito, tocando a campainha do seu namorado pela terceira vez
consecutiva.
Posso muito bem ouvir o suspiro de alívio dela, que corre para abraçar o
namorado.
Uma lufada de ar densa escapa por entre os lábios do meu cunhado, e antes
de responder o que está havendo, bagunça os fios do seu cabelo de forma
impaciente.
— Ele vai morar aqui — Luca fala por mim, e meu coração acelera um
pouco mais. — Pelo tempo que for necessário.
— Pelo amor de Deus, amor, você acha que Levi Vodrak precisa ser
convidado? Ele não tem escrúpulos, ele faz o que ele quiser e não está nem
aí.
Mande-o embora, chute-o para fora, não dá para simplesmente tê-lo na nossa
vizinhança assim. E não tem nem sentido Levi estar aqui, se me disse que
estava ficando na cabana em Locker Gray. Deve ser por pirraça, só para nos
provocar, para nos tirar do sério.
— Quando ele veio, também pensei assim, mas depois, na minha cabeça,
percebi que não posso me opor. Não é melhor tê-lo debaixo das minhas
vistas, do que longe?
— Tá. — Revira as írises azuis por trás das lentes de seus óculos. — Mas se
ele pensa que vou tratá-lo bem, está muito enganado.
Afinal, estou aqui para me proteger, não para brigar com Levi, por mais que
ele mereça. Até porque também, o foco nem é esse agora. No futuro, tenho
certeza que o carma vai agir, e ele vai ter o que merece, e se esse momento
do hoje não é o momento certo, então que Vladimir Vampir passe na frente e
receba o seu primeiro.
Estou com medo? Com certeza, contudo, ainda estou pensando no que
prometi à Sra. Moore, repetindo a mim mesma todos os dias, como se fosse
o meu mantra.
Sou forte, como mulher e como bruxa, no que depender de mim, farei o
possível e o impossível para garantir que nada nos aconteça.
Se eu preciso conviver com aquele arrogante bad boy e fingir ser pacífica
para ter o que quero, vou fazer, não tenho alternativa.
Não que eu vá aceitar tudo calada, claro, mas tentarei me comportar bem.
O que você deve duvidar que aconteça, Gabriella, a voz chata no meu
subconsciente resolve atormentar o meu juízo, quando resolvo entrar na
casa, atrás do casal.
Cruzo os meus braços, olho para eles andando à minha frente e quando ouço
um barulho na escada, no andar de cima, minhas írises automaticamente,
sem eu nem pensar, se erguem, esbarrando com as írises escuras de Levi, que
está descendo e já de olho em mim. Ele esboça um pequeno sorriso de lado,
uma pequena ação que já é capaz de me irritar e de me dizer que não adianta,
nem mesmo que eu tente muito, muito, vou conseguir suportá-lo com
facilidade, afinal, o cara é um imbecil arrogante e prepotente do cacete, para
dizer o mínimo. Você olha para ele e consegue perceber como se sente o
dono do pedaço, o rei, o indispensável, e até mesmo aqui, nessa casa que
nunca pisou os pés, já age como se fosse tão sua, quanto é de Luca, dá para
notar pelo modo como faz das escadas sua passarela, seu principal palco
para descer e fazer seu showzinho particular.
— Olá, querida Evelyn, que prazer revê-la. Que prazer poder ver com meus
próprios olhos que está tão... — Parece procurar as palavras certas. — Viva.
— Me assustar? — Sutton ri pelo nariz e quando avança para Levi, Luca fica
ao seu lado, segurando o seu braço. — Você sequestrou a mim e à minha
melhor amiga, nos levou para a igreja abandonada de Dantown, onde
aconteceu um massacre, e como se não fosse terrível o suficiente, ainda nos
pendurou, amarrou nossos pulsos com cordas e colocou fogo abaixo de nós.
Não causou isso para nos assustar, causou isso para nos matar. Queria que
morrêssemos queimadas vivas, como se fôssemos bruxas na idade média.
— Nossa, qual é, você falando assim faz até parecer que sou realmente um
monstro da pior espécie. Já disse, foi um equívoco, eu errei e exagerei na
brincadeira, estava em um mau dia, não sabia muito bem o que estava
fazendo. —
Na maior atuação cínica, a qual parece dominar muito bem, Levi para bem
em frente à Evelyn, toca o meio do peito, faz um bico e pisca os cílios,
tentando passar um ar inocente. Rá! Fala sério, até parece que conseguiria.
— Achei que já tivesse superado, sabia? Nós somos praticamente família, e
eu fui tão generoso com você.
Te deixei completamente livre para viver seu romance patético e fui focar na
sua irmã.
Luca exaspera e começa a andar com Evelyn até o sofá, para se sentarem.
Levi os segue, e como não posso ser a única em pé, também vou ao encontro
deles.
— Rapaz, o cara traz a novidade que ninguém fazia ideia, quer ajudar e
ainda é crucificado. — Balança a cabeça e, por um momento, parece mesmo
inconformado. A minha sorte, é que eu já consegui captar que ele é muito
bom em fingir. — Mas tudo bem, como eu disse à Gabriella, não estou aqui
para entrar na Turma da Luluzinha, tão pouco para brincar junto de vocês de
Três Espiãs Demais, numa missão comandada para derrotarmos os inimigos
e terminarmos nossos dias como melhores amigos. Todo mundo sabe muito
bem qual que é o meu papel aqui, todo mundo sabe o que eu quero e o que
estou disposto a fazer para conseguir.
— Exatamente, garota. Até que para uma bruxa, você é bem inteligente.
pelo menos nesse momento, adiantar falar mais nada referente a tudo o que
passamos no passado, as coisas começarão a andar.
Eles não sabem, mas acho que Levi se tornou uma das minhas últimas
preocupações agora, tendo em vista o que a Sra. Moore me contou de suas
visões.
Não vou deixar isso me consumir, é o que digo a mim mesma, prestando
atenção quando um dos Vodrak, o todo de preto, infla o ar nas bochechas,
com tédio.
— E ele não pode se juntar a nós por livre e espontânea vontade, mana,
mesmo necessitando. Tem que ameaçar, tem que ganhar algo em troca e tem
que se favorecer — deixo o jogo bem claro, para que não haja dúvidas para
ninguém.
E Levi se levanta.
— O que ele está aprontando dessa vez? — Evelyn Sutton pergunta para
ninguém específico.
— Os próprios.
— Ai, meu Deus, era só o que faltava. — Aperta a têmpora, ficando mais
branca do que já é. — Como pode vocês não estarem surtando?
Que situação.
Que porra de situação tenebrosa do cacete.
— Não muda muita coisa, amor, mas né, se fomos empurrados para esse
mar, vamos nadar.
Não falo nada, porque é bem na hora que eles entram, o trio pinico, papel e
cocô.
Levi é o primeiro a voltar para o seu lugar, deixando Larkin e Devon de pé.
— Pera lá, gata, nós somos bons de briga, mas nunca entramos em conflito
com o vampiro mais antigo do mundo. Somos tão novatos quanto vocês
nisso —
Larkin faz questão de falar, porque, pelo que já percebi, é o que mais gosta
de ser o centro das atenções, já que o outro, o Devon, é um pouco mais na
dele. — A
— Não.
— E você não é uma bruxa? — é a vez de Devon, que tira os óculos escuros
e põe na cabeça, para poder me enxergar melhor. — Bruxas fazem feitiços
de localização, é a coisa mais simples. Por que não fez?
— Com todo respeito, vampiro do mal, se você não sabe como funcionam
nossos poderes, por que merda está querendo opinar sobre? — Tento, com
muito esforço, manter meu tom de voz baixo e neutro. — Porque, para o seu
governo, não é tão fácil assim. Feitiço de localização se faz quando a bruxa
tem forte ligação ou, ao menos, conhece aquela pessoa. Não posso fazer com
qualquer um, se fosse assim, eu fecharia os meus olhos agora mesmo e
pensaria onde Justin Bieber está, para eu poder ir atrás.
Ouço Levi, no seu canto, rir baixinho, como se tivesse, de alguma forma,
gostado do meu afronte. Larkin também tenta neutralizar suas expressões,
porém é péssimo nisso. Você olha para ele e já dá para perceber que está a
um passo de dar risada do amigo.
— Por acaso, você tem um objeto, um fio de cabelo ou qualquer coisa que
possa ligar a mim, disponível?
— Devon e Larkin, não falem nada. Hoje, nós só escutaremos — Levi avisa
aos seus amigos, sorrindo e fazendo com que tanto eu, quanto Luca e Evelyn
o matemos só na base das encaradas.
— Vocês são tão inocentes — ele, Levi, estoura nossa bolha. — É claro que
Vladimir sabe onde estamos. Seus capangas devem estar por aqui, só estão
esperando o momento certo de agir, quando ele resolver chegar. Deve estar
se preparando também.
— Essa não é uma informação que sei e que posso dizer que é oficial — se
explica. — É só a parte lógica da coisa, River. E se seus capangas não
estiverem, deve ter mandado uma bruxa sumir com tudo. Porque é disso que
ele precisa, huh?
Uma bruxa para quebrar o feitiço de outra bruxa, e como a própria Salazar
terá que ser sacrificada, precisará haver outra.
Levi fica em silêncio, não quer dar o braço a torcer, porém posso perceber
que também sabe que posso estar certa no meu raciocínio.
soltar nada agora, por causa da Gabriella, e se não podemos falar sobre
Vladimir ou no que consiste essa quebra de maldição de forma verdadeira e
sem gracinhas, de nada adiantará estarmos todos aqui, se não for para
passarmos raiva. E acho que, por hoje, já está de bom tamanho.
Ainda está desleixado no sofá, seus dedos passeando pelo seu queixo, e suas
írises presas nas minhas pernas, quando fico de pé.
Tem quem me pare até para falar sobre o clima, como hoje, que
milagrosamente, está fazendo calor na cidade.
Se querem saber, já estou muito bem ficando louca sozinha, não preciso de
plateia.
Por causa dos meus devaneios e minha falta de atenção, acabo me batendo
com alguém no campus.
— Nossa, Gabriella, oi. — Seus lábios se erguem para cima, e, pelo visto,
não parece com raiva pelo bolo que lhe dei sem querer. — Você está bem?
— Uh, novamente essa pergunta. Estou começando a pensar que estou
demonstrando estar abatida demais e não estou percebendo, embora os
outros à minha volta estejam.
— Desculpa, eu deixei minha bolsa na balada do seu pai, deve ter caído no
banheiro. E sobre eu ter ido embora, eu queria pedir...
Eu poderia muito bem ficar confusa nesse momento, tentar entender de onde
diabos surgiu esse homem com essa história sem pé e nem cabeça, que
claramente não foi o que aconteceu, mas não precisa ser um gênio para
chegar à conclusão de quem foi que planejou essa desculpa esfarrapada.
Ainda meio sem graça e envergonhada, eu sorrio fraco.
— Não voltei mais lá, desde aquela noite — comenta. — Posso perguntar ao
meu pai ou a algum funcionário, tem basicamente um “achados e perdidos”
lá dentro da boate. Se alguém encontrou a sua bolsa, pode ser que esteja lá.
— Não exatamente, mas ela ainda continua sendo a minha bolsa favorita.
Arregalo os olhos.
— Ei, aí também não, gato, não sou rica que nem você.
— Levou mesmo.
— É melhor pensar em outra coisa, para não ter nenhuma ereção no meio do
campus da faculdade. Imagina só, se o pessoal vê seu pau duro?
— Foi mal. — Cubro a boca com a minha mão. — Eu sempre esqueço meu
filtro em casa. E quando estou em casa, sempre o esqueço na rua. No fim do
dia, a gente nunca se bate, acredita?
É, é óbvio que ele acredita, eu provavelmente sou a pessoa mais sincera que
já viu.
Por isso que comigo é assim, tem que jogar o feitiço contra o feiticeiro.
Saindo de mim, que sou de uma linhagem de bruxas, essa frase parece um
tanto quanto errada, pois saiu no seu sentido mais literal possível.
— Mas falando sério agora, Sra. Sem Filtro, você está bem? — deseja saber,
ao passo que me analisa com mais atenção. Eu chacoalho a cabeça, parando
de divagar. — Tipo, bem mesmo?
Não.
— Agora que falei com você e sei da verdade, estou ótimo. — Meneia a
cabeça, depois olha para um lado, para o outro, sorri para algumas pessoas
que passam por nós, e quando ficamos a sós novamente, passeia com suas
írises por todo o meu rosto. — Ei, sei que pensa que só estou querendo pegar
você por pegar e que não estou interessado no que tem a dizer, mas gostaria
que soubesse que não
— Você fez isso por si só, gata, quando começou a fazer questão por uma
bolsa.
Na mesma hora, a cor do meu rosto some, a minha risada se perde no ar, e
cada músculo do meu corpo enfraquece.
Porque é ele.
Levi.
E não basta mexer com a minha cabeça, o filho da puta mexe com cada
maldita célula minha. Eu sinto frio, minha barriga congela, e os arrepios
voltam, tudo de uma só vez.
E é claro que também sinto raiva... porque, minha nossa, o que Levi pensa
que está fazendo na minha faculdade?
Quase caio por me embolar nos meus próprios pés, quando Cody me gira de
volta, ainda me segurando.
Meu coração bate mais forte, e não consigo encontrar a minha voz.
Eu não consigo nem ao menos identificar o porquê dessa minha reação.
Não é como se ele não tivesse o visto na festa, não é como se ele fosse mata-
lo por nada. Nós não estamos mais naquela página em que ele quer me
destruir, pelo menos, não por agora, e Cody é só meu amigo, um humano,
não é uma ameaça.
— O que foi?
Puta.
Que.
Pariu!
Foda-se tudo, eu vou ter que matá-lo, não quero nem saber.
Prendo a minha respiração e sinto o arrepio de novo, porque já sei que está
às minhas costas.
— Ora, ora, ora... — É gutural, rouca, grave, entorpecente. Sua voz desperta
sentimentos que nem eu mesma sabia ser capaz de sentir. — Não sabia que
tinha voltado para o seu namorado, Gabriella. Me lembro muito bem que
disse estar solteira.
— Você o conhece?
— Pois bem, Cory — prossegue, e é claro que é uma artimanha para irritá-
lo. Está conseguindo, eu posso sentir a atmosfera entre nós mudando
completamente. — A Gabriella e eu temos meio que uma história de décadas
e décadas juntos, ela não te contou?
— Não.
— Gabriella não tem jeito, ela sempre, sempre quer me manter em segredo.
Se os problemas que está tendo são por causa desse cara, não precisava
mentir para mim.
Paro a frase no meio, por que o que posso dizer? Que não tem nada a ver
com Levi? Aí sim, seria mentira. Tem a ver com ele. Tem tudo a ver com ele.
— É melhor você dar o fora, vai por mim, ela é complicada — Levi resolve
se meter de novo. Como se eu estivesse estrelando o filme O Exorcista,
minha cabeça gira em sua direção, e os meus olhos quase saltam para fora,
de ódio. —
Sério, Gabriella age de uma forma tão errada que, às vezes, me lembra uma
bruxa.
Ela parece com uma, não acha, Cory? Só falta o chapéu, a verruga no nariz e
a vassoura — soa irônico, fazendo essa piada idiota com duplo sentido.
Que merda, o que me dá mais raiva, é que tudo que ele fala é verdade, porém
fica usando as frases que pareçam outros contextos, justamente para
confundi-lo.
Não espero nem um minuto, já avanço para cima de Levi, usando meus
punhos para agredi-lo. Eu soco seu peito, o empurro, bato em seu ombro, e,
enquanto murmuro xingamentos que provavelmente invento agora, tudo o
que ele faz é aceitar, rindo e se divertindo.
— Que merda você pensa que fez? — solto, brava. — Ficou louco, perdeu a
droga do juízo? — Meu tom de voz aumenta, e só não grito, porque não
quero fazer uma cena maior no campus. — Primeiramente, o que pensa que
está fazendo
Você sabe o que Cody está pensando agora? Isso mesmo, que sou uma
mentirosa.
Já não basta ter estragado meu encontro, quer estragar minhas amizades
também?
— Está vendo, é exatamente por isso que eu fiz o que fiz, olha só a forma
como está falando dele. — Um vinco se forma na minha testa, mas também
não dou o gostinho de perguntar nada. — Você fala que ele é seu amigo, e eu
estava ali observando, por mais que a cena de vocês juntinhos tenha sido
bonitinha, o cara não é para você. E nem vem falar que eu não sei do que
estou falando, eu também observei vocês na festa, lembra?
— Tudo bem, ele pode ser um garoto bom, mas não incendeia as suas veias.
— O meu mundo novamente gira. Por que ele está falando algo assim? — E
os garotos bons são entediantes, bruxinha. Você alguma vez já conheceu os
maus? —
Reviro os olhos, porque acho que nem me ouve, está com a atenção vidrada
nos meus seios.
— Levi, eu já disse a você, meus olhos estão aqui em cima, pare de desviar
do meu rosto quando estamos falando algo sério. Essa é a segunda vez que
faz isso
— friso.
— Porque estou te secando desde aquele dia, você deve ter desidratado. —
Levi bufa.
Psicótico.
Medo rasteja pela minha pele, pois não há a menor dúvida em mim, de que é
capaz de cumprir com o que está dizendo.
Eu acho que nunca vou conseguir ser intimidadora o suficiente com Levi,
tudo o que eu falo, o idiota sorri.
— Meu pau é grande, mas não tão grande quanto você está pensando, a
ponto de vir e alcançar a minha boca. — Tomba a cabeça para o lado,
parecendo me estudar de outro ângulo. — Mas alcançar a sua, no entanto...
Não sei qual o milagre, mas Levi me obedece, fica a um passo de distância.
— Eu só posso estar pagando meus pecados, tendo que aturar você. — Fico
em negação, quando começo a apertar o nariz. — O que é que o trouxe até
aqui, afinal? — Bato meus tênis no chão e nem preciso procurar suas írises,
elas seguem aprisionadas nas minhas. — Duvido que saiu de lá da sua casa
nesse horário, só para vir até aqui me ver, você não faria esse sacrifício se
não tivesse com alguma coisa em mente.
— Você é tão teimosa, como as coisas que digo podem não entrar em sua
mente?
Levi não perde tempo, parece que suas mãos possuem uma necessidade
absurda de me tocarem, pois, antes mesmo de eu sequer processar suas
ações, elas seguram meus ombros, o que significa que já destruiu nossa
distância de novo.
As pessoas que passam por nós, devem pensar o que diabos acontece aqui.
Nem eu sei.
— Estou aqui porque estou te protegendo, tenho que ficar de olho em você,
não posso deixar que Vladimir te encontre, antes que eu tenha o que eu
quero —
pela primeira vez hoje, é sincero, e seu rosto não parece mais divertido. — E
eu vou continuar assim, te perseguindo, você gostando da ideia ou não. Até
porque, não estou nem aí para a sua opinião, eu faço o que eu quero, como
eu quero e quando eu quero. — Pega um fio do meu cabelo em seu dedo, o
enrolando. É
uma vez, não consigo me mexer, estou que nem estátua. — E por falar no
que eu quero, eu também vim aqui te dizer algo importante. Não acha que
estamos perdendo muito tempo, não?
— Eu já falei mil vezes, que não quero que você flerte comigo.
— O quê? — Fica tão confuso quanto eu, quando falou da água. Chacoalha a
cabeça um tempo depois. — Não estou flertando com você, besta, estou
falando de Vladimir. Não acha que estamos perdendo muito tempo ficando
calados, não?
— Você quem está calado — pontuo. — Abra a boca, conte o que você sabe,
e todos nós sairemos da estaca zero, simples assim.
Reviro os olhos.
— O quê?
— Revirar esses seus olhos para mim, achando que não posso perder o
pouco do autocontrole que me resta.
— Por Deus, Levi, não mude de assunto, você é o único aqui perdendo
tempo.
Exalo todo o ar que nem sabia estar prendendo mais uma vez e, com calma,
ao notar que não está me segurando mais, eu delicadamente dou um passo
para o lado.
— Fique sabendo que se acha que só vai falar alguma coisa, quando eu te
entregar o que quer, está muito enganado. Como disse, um minuto a mais,
um minuto a menos, já é uma perda de tempo enorme.
Mesmo que eu odeie, essa é a minha realidade, e eu tenho que encará-la com
a mesma frieza que Levi o faz.
— Temos um acordo.
Eu gostava de moto, tinha uma muito especial nos anos 50, chamada Betty,
em homenagem à Betty Cooper da história em quadrinhos Archie Comics,
mas quando ela resolveu me abandonar e partir dessa para uma melhor,
depois de eu tê-la usado por anos, disse para mim mesmo que ficaria de luto
e que não andaria de moto nunca mais, não importando quantos novos
modelos lançassem dali para frente.
Como não sou besta nem nada, já a testei por cada canto dessa cidade,
pilotando em alta velocidade, como há tempos não fazia.
Eu a faço soar mais alto, não economizando no barulho e na festa que faço,
ao me aproximar da casa que agora também é minha, gritando e buzinando
ao estacionar.
Ou não, porque agora com a Harley, não darei nenhum sossego a eles.
É uma pena.
Parece que estava dormindo, pulou da cama e saiu correndo, para ver o que é
que estava acontecendo. Seu cabelo está uma bagunça, seus olhos estão
menores, e ele até ergue as mãos, como quem diz: o que é que você está
fazendo?
— E aí, irmão. — Dou espaço para que veja minha moto, sendo o primeiro
de nós dois a falar. — Olha só o que comprei. Muito linda, não?
Ele coça os olhos e estica o pescoço.
— Nossa, esqueci que você é um chato, incapaz de ficar feliz por mim. —
Rolo os olhos. — Vim te mostrar a minha moto, e você a trata desse jeito.
Ela tem sentimentos, sabia?
no entanto, não importa o que eu faça, não importa de que forma eu ande ou
fale, ele sempre irá desconfiar e duvidar de cada uma das minhas ações,
sejam elas exageradas ou mínimas, como agora, que desconfia até da compra
da minha Harley-Davidson.
Ele só pode ser uma outra versão barata minha mesmo, porque é tão
exagerado...
— Quem é Betty?
Acho que Luca vai simplesmente balançar a cabeça, murmurar alguma coisa
e voltar para casa, nem aí com o que falo ou compro. No entanto, me
surpreendendo, meu irmão também cruza os braços, igual a mim, e não volta
para casa, ele anda. Anda até a minha Harley. Ele olha toda a moto, toca o
couro, segura no guidão e assente, como se estivesse aprovando a minha
escolha, embora tenha me dado uma bronca há alguns minutos.
Sendo que eu tinha certeza que Luca bufaria para mim e iria embora.
— Ela é bonita — comenta, e também não estou acreditando que está
fazendo isso. Por um momento, só por alguns segundos, me lembro de
quando éramos adolescentes, irmãos que faziam tudo juntos, eram
inseparáveis. Naquela época, não existiam carros ou motos, mas tinham as
carruagens, e quando ninguém estava por perto, Luca e eu fugíamos com
elas, para que corrêssemos pela cidade.
Porra, não.
Posso aguentar todas as brigas e todas as raivas que acumulamos, mas isso
não.
— Valeu.
Acho que meu irmão também percebe o clima estranho instaurado, porque
resolve limpar a garganta e aprumar os ombros, se afastando tanto da Harley,
quanto de mim.
— Se era só isso, vou entrar. — Aponta para a casa com o polegar e fita o
chão por alguns segundos, como se estivesse pensando em alguma coisa.
Depois olha para mim. — E vê se toma cuidado quando for andar com a
Harley, não vai querer que ela encontre com a Betty, vai?
— Foi só um conselho.
estou te abrigando na minha casa, perto da casa das garotas. Foi por isso que
mandei tomar cuidado, não tente interpretar de outra forma.
Ótimo, não sei como pude pensar naquela estupidez sobre o passado.
Pior, não sei como pude achar que Luca Vodrak estava pensando o mesmo.
Meu irmão me odeia, a verdade é que ele só está me aturando, como todos
os outros. Mal pode esperar a hora de eu sumir de novo, para nunca mais me
ver.
Como se eu quisesse qualquer coisa dele, que também odeio com todas as
minhas forças.
Sinto meu corpo entrar em combustão e vejo, mais uma maldita vez, minhas
mãos começarem a tremer.
E eu é que não volto para aquela casa agora, tanto pelo que acabou de
acontecer com Luca, quanto pelo meu estado, e não posso lhe dar nenhum
gostinho de me ver miserável, com a maldição mais ativa do que nunca.
Merda, e é assim sempre, não posso ficar com raiva, que perco
completamente o rumo de mim mesmo. Passar por certas situações tensas é
como se fosse um gatilho.
Monto nela e quando a ligo, querendo deixar tudo para trás, meus olhos me
traem e voam para a casa de Gabriella, quando passo por ela.
Ignoro.
Depois de ter passeado com Harley para inaugurá-la e também para esfriar
um pouco a cabeça, estou de volta, só que dessa vez, batendo na sua porta e
tocando sua campainha.
Detesto esperar, porém Gabriella não demora muito, para a minha sorte. Ela
atende no mesmo minuto, já se colocando para fora e fechando a porta atrás
de si.
Sorrio.
Ergo uma única sobrancelha quase que no meu couro cabeludo, adorando o
fato de ter sido ela a fazer a piada com duplo sentido.
— Se você não tiver uma régua, bruxa, pode ser uma varinha. Aposto que é
do mesmo tamanho. O único problema é que varinhas são finas demais, e o
meu pau é grosso.
Gabriella não ri, ela fica me fitando, como se eu tivesse uma doença
contagiosa e ela quisesse sair correndo desesperadamente, para não ter
contato comigo e se infectar.
— Estou só brincando com a sua cara, bruxinha, não leve para o coração, vai
dar tudo certo. Já viu meus braços? — Como estou sem a minha jaqueta de
couro dessa vez, vestindo só uma camiseta preta lisa, eu arregaço mais as
mangas e mostro o meu bíceps. — Eles são enormes, e eu dou conta. Minhas
presas são bem afiadas também, mas isso eu não acho que posso te mostrar
agora. Em um outro momento, quem sabe. Quando estivermos no escuro, à
sós, no meu quarto, talvez no seu. Se quiser, posso enfiá-las no seu pescoço.
Se quiser, posso chupar seu sangue. Se quiser, posso enfiar e chupar outras
coisas mais interessantes também, que o horário não permite.
— De verdade, eu não vou nem me estressar, porque já sei que você vai
dizer que é brincadeira.
Me assusto com a voz que surge em minha cabeça, sem saber se veio de
mim ou do monstro enjaulado que habita o meu corpo.
Não, nem vem, eu só gosto de irritá-la, de vê-la com ódio, de fazer com que
se sinta no purgatório comigo, pois, se eu não posso matá-la ou infernizá-la
de forma eficaz como eu gostaria, ainda posso fazer desse jeito, de forma
mais suave.
Isto é, se eu ver que Gabriella realmente merece, pois, como vivo dizendo,
não é tão fácil assim você ver seu trabalho de décadas ser arruinado, e é o
que vai acontecer, se eu deixá-la viva. Nada do que eu fiz no passado, vai ter
valido de algo.
Por mais que o feitiço vá me ajudar, por mais que ele seja extremamente
importante, e o sacrifício de também deixá-la ir seja importante para me dar
uma eternidade estável, não gosto da ideia.
— Talvez, mas não posso dizer aqui — responde, à medida que olha de um
lado a outro, como se ficasse com medo de que alguém estivesse por aí, nos
ouvindo. Não tem ninguém, estamos sozinhos, porém a sua preocupação é
válida.
— A cabana?
Idiota foi o mais leve que saiu por entre seus lábios, e ela dá uma corridinha
para me alcançar, e ficar ao meu lado.
Pego o outro capacete que comprei e jogo para ela, que nem estava
esperando, a sorte é que minha pontaria é muito boa.
— Acha mesmo que vou andar pela cidade pendurada na sua garupa?
Não é como se eu andasse com várias garotas na moto, você vai ser a
primeira, bruxa. Sinta-se privilegiada.
— Não, não. — Vem me entregar o capacete, entretanto, eu a deixo no
vácuo. — É sério, Levi. Eu não vou andar por aí, como se eu fosse seu
troféu.
— Bruxa, ninguém vai desconfiar, só porque você vai estar andando de moto
comigo, na minha garupa, abraçadinha a mim, eu juro.
Mais uma vez, passa a me xingar, mas coloca o capacete embaixo do braço e
sobe na Harley.
— É sério, bruxa, põe logo, não faça com que eu me arrependa de tê-lo
comprado para você.
Agora sim, sua expressão muda, e é de surpresa, choque.
— Comprei.
— Por quê?
— Porque não há mais ninguém nessa cidade que possa andar comigo, além
de você.
— Porque nós vamos trabalhar juntos a partir de agora, bruxa, não ficou
claro?
— Ficou, mas é que do jeito que você falou, parecia que não queria que eu
me machucasse.
— Sem o colar — também resolvo responder. — E é por isso que estou aqui
— Ah, claro, o colar. — Solta uma risada e desvia o olhar, para se concentrar
em pôr o capacete na sua cabeça. Olho para frente e faço o mesmo. — Não
sei como pude ter esquecido, se você só se importa com isso, mais nada.
Ponho as mãos no guidão com mais força do que seria necessário e quando
sinto que está preparada para me ver sair daqui, ligo a minha Harley e
acelero.
Depois de avançar por mais uma ou duas ruas, ela fica com medo e envolve
de uma vez a minha cintura, porém não sem antes soprar em meu ouvido:
Mas não se preocupe, bruxa, não vou dizer a ninguém que partiu de você a
ação de dar nosso primeiro abraço.
Gabriella reclama, pelo que eu acredito ser a sexta vez, desde que desceu da
moto e começou a me acompanhar mata adentro. — Você disse um lugar
novo, Levi.
— Essa aqui não é a montanha de Locker Gray, essa é a floresta onde fica o
Swan Lake. Nós não viemos aqui em momento algum, ou seja, é um lugar
novo sim, pare de reclamar. Parece que você só é capaz de fazer isso,
reclamar, reclamar e reclamar. Dê um tempo.
Ela grunhe um intenso argh, mas, por sorte dessa vez, fica calada, e eu posso
me concentrar no que está perto de aparecer às minhas vistas.
um fascínio por parte dos humanos, que fizeram aqui, muitas vezes, de
parque aquático.
Agora, por essas épocas do ano, ele não é um lugar tão movimentado, então
é o lugar perfeito para conversarmos e testarmos os feitiços, caso seja
possível hoje.
Quer dizer, eu deveria ter encontrado no fogo. Ainda não encontrei. O fogo
que me encontrou e me dominou, de uma forma tão forte, que... bem, estou
no estado em que estou.
— Se reclamar, porque não gosta de lagos, eu juro que te largo aqui e te faço
voltar para casa andando a pé.
— Nossa, que grosseria, eu só ia dizer que nunca tinha chegado até aqui. Da
última vez que vim, não consegui avançar tanto na floresta, porque fiquei
com medo. Agora percebo que foi bobagem minha, eu deveria ter vindo
tomar banho, quando tive a chance.
— Por acaso, bruxa, está querendo deixar subentendido que quer que eu te
chame para nadarmos pelados um pouco, do jeito que viemos ao mundo?
— Vem comigo então, a gente pode sentar naquele tronco caído ali.
Me sento, e, quando penso que também vai se sentar e ficar ao meu lado,
Gabriella pega e se acomoda no chão, no meio da relva, como se não visse
problema nenhum nisso.
— É mais confortável.
Dá de ombros, fica com as pernas na posição de yoga, tira a mochila das
costas e a põe em sua frente, a abrindo. De lá de dentro, a bruxa tira alguns
livros e depois a deixa de lado, repousando os livros em seu colo.
Feitiços que a minha mãe achou importante me ensinar, e que eu, obediente,
decorei e fiquei, desde os meus dezesseis anos, reproduzindo, quando
encontrava uma oportunidade.
Assinto de novo, com uma pontada de esperança de que as coisas talvez não
precisem ser tão difíceis, talvez possam ser magicamente fáceis.
Com Levi Vodrak, as coisas sempre vão ser mais difíceis, é o carma.
— Na verdade, não tem nada aqui sobre a pedra da água, nem colar, nem
vampiros que precisam de colar. — Não falo nada, nem penso, porque fico
prestando atenção no modo como abre o diário e passa as páginas com
extremo cuidado. — Mas tem isso aqui, dê uma olhada.
Eu endireito minha postura, quando me passa o seu diário para ler, e tento
pega-lo entre os dedos com o mesmo cuidado, minhas írises
automaticamente
— É, mas vai saber. — Arranca o diário das minhas mãos e volta a se sentar
no chão, provavelmente relendo aquele trecho de novo. — E a propósito,
você ainda tem dúvidas de que eles podem existir? Nunca trombou com
nenhum deles, não?
Toco o meu queixo, quando uma pergunta me invade. — Mas o que é que
isso tem a ver com o que estamos procurando, bruxinha?
— Esse trecho, nada. Só foi para te mostrar que, apesar de eu não ter
encontrado nada específico sobre a pedra da água de Luca, que
possivelmente foi passada de uma bruxa para uma vampira, como você havia
me contado, eu pude, de algum jeito, ter a confirmação de que é mesmo
possível que isso aconteça. É
— Deixa o diário de lado e agora pega o outro. — Nesse aqui, que conta um
pouco da história das bruxas que fugiram de Salem para Emerald Grave,
menciona que elas, na época, faziam tudo de acordo com a natureza, de
acordo com os seus sentimentos, da forma mais caseira possível. Eu acho
que pode ter a ver, ou pelo menos, ser parecido com o feitiço que se faz
quando quer entrar na cabeça de alguém para ler seus pensamentos. Você só
precisa se concentrar, pensar nos seus propósitos, e acho que a bruxa tem
que ter algum tipo de ligação com a pessoa também. Ou, ao menos, tentar
entender o que o outro deseja ao receber o feitiço.
— Me olha profundamente, de uma forma que faz parecer que ela está
olhando para o fundo da minha alma, como se ela estivesse inteira, ao invés
de destruída.
— Controle? — sugere, e eu, mais uma vez, engulo em seco. Será que o que
Gabriella está fazendo é algum tipo de truque? Algum tipo de feitiço
silencioso que não estou percebendo? — Calma, eu não estou lendo a sua
mente, se é isso que está pensando. Eu não faço esse tipo de coisa, a
propósito. É tipo uma maldição entre as bruxas, uma vez que você o ativa,
você passa a ler os pensamentos a todo instante, e deve ser horrível. Tenho
pavor só de pensar.
Gabriella não fala nada em seguida, porque está óbvio que está esperando o
momento em que eu vou revelar o que é que eu preciso.
— Eu só preciso do feitiço, Gabriella. Eu só preciso dele, e é isso, por que
tanto importa para você?
— Me fala a verdade, eu sei que tem uma verdade. Você me trouxe para o
meio da natureza, Levi, esse aqui é o meu habitat, eu posso sentir as suas
vibrações.
Não!
Não acredito que, pela segunda vez no dia, estou passando mal de novo.
O monstro.
Isso é a porra do que tento esconder de todo mundo. Esse meu lado. Essa
minha dor. Essa maldição infernal que carrego comigo durante todas essas
malditas décadas, me corroendo, se instaurando no meu âmago e se
libertando nos momentos em que o monstro deseja. Não é por falta de
sangue, não é por nada, e sim para me torturar, para me fazer sofrer, para
retirar meu controle e me fazer perceber que não importa o que eu faça ou o
quanto eu tente, estarei sempre preso dentro desse corpo, que já não me
pertence mais, mesmo morto.
Ele é só uma carcaça, uma que vem me torturando durante longos e longos
anos, e que eu fiz questão de esconder de tudo e todos, preferindo enfrentar
sozinho, do meu jeito.
Foi por isso o meu ódio e o meu rancor pelo meu próprio irmão.
Foi por isso que assumi essa identidade, foi por isso que, desde que percebi
que ia viver na miséria, ia ser tão podre e tão miserável quanto. Passei a
desejar que as pessoas me odiassem, pois só assim, seria muito melhor e
muito mais fácil me odiar também.
E meu Deus... tem sangue saindo do seu nariz, Levi. Você está... chorando?
Puta que pariu!
Dor.
Muita dor.
Eu não enxergo nada, não posso nem ao menos vê-la, só sinto que se mexe,
como se estivesse procurando desesperadamente por alguma coisa.
— Sim, isso também — concorda. — Mas não é só isso, você vai precisar
me contar tudo. Vai precisar me contar o que sente, como se sente e o que
costuma fazer quando perde o controle. Quero fazer o feitiço, te entregar e
ver como reage, para ver se é suficiente ou se será necessário adicionar mais
alguma coisa.
— Eu ainda vou ajudar vocês — digo, piscando os olhos para ver seu rosto
mais focado em frente ao meu. De alguma forma, Gabriella parece
preocupada, com muita atenção em mim. — Eu ainda estou forte, eu ainda
sou... bom de briga, não pense que irei atrapalhar, por favor.
— Tá.
Depois, ela não fala mais, e eu também não, porque sei quão complexa e
dolorosa é toda essa situação.
Para os dois.
Meu peito se agita, mas dessa vez, não tem nada a ver com o que acabou de
me acontecer.
É como... conexão.
Confesso, não pensei tão rápido que pudesse ser alguma coisa série. Mas
depois, quando o vi gritar, chorar e se contorcer de dor, aí sim, não teve
como, eu vi com meus próprios olhos que a coisa era completamente
anormal e preocupante.
Pensei até que pudesse ser alguma interferência de Vladimir, como um
feitiço para derrubá-lo ou alguma coisa tão ruim quanto, entretanto Levi me
garantiu que não era.
Continuou gritando, continuou tremendo. Foi a pior coisa que vi, e acho que
nem ele tem noção do quão ruim e debilitado fica. Tanto, que eu mesma nem
me reconheci, fiquei em choque por ele, tive que colocá-lo em meus braços,
abraçá-lo e fazer um feitiço que pudesse tirar aquela sua dor. Foi quando
Levi me contou a verdade, foi quando revelou o que eu suspeitava, que era o
fato de não ter conseguido encontrar o seu controle, pelo menos não como
seu irmão Luca, e que passava, todas as vezes, por aquelas dores e agonias.
E se Levi Vodrak não quisesse ter causado aquele desastre, porém foi
induzido pela maldição?
Ele passou anos dedicado a matar bruxas, ele escolheu isso, não foi um
único caso isolado, foram vários, durante anos e anos. E escolheu essa forma
de tortura por vingança, para que todas as outras pagassem pelo que vem
sofrendo, e isso até dá para entender, mesmo que não justifique, mesmo
assim, não dá para esquecer o que fez com a minha mãe Zena, com o meu
pai Trent e o que quase fez com a Evelyn.
Ele não se arrepende, e é óbvio que também deve ter feito por querer, foi
total tolice minha querer diminuir seus atos, só porque o vi vulnerável, só
porque pude perceber o que a maldição de uma bruxa foi capaz de fazer com
ele, com seu corpo.
ele é.
Eu estava ao seu lado para me ajudar também, para ter reforços quando a
guerra chegasse e por isso que estava empenhada em fazer o que me pediu,
pôr o feitiço na pedra. Mesmo sabendo, de fato, o motivo e sabendo que vai
me auxiliar no processo de ser mais rápida, vou fazer apenas pela troca que
combinamos, não por nenhum outro motivo.
Ainda preciso, para o feitiço, saber como ele se sente e do que precisa, é
claro, porém já decretei a mim mesma, que não vou mais me fazer
questionamentos. É errado.
E é doloroso, principalmente porque vai contra tudo o que imaginei sobre ele
durante todo esse tempo. O que eu sinto por Levi está muito bem
estabelecido, e não vai mudar, não importa o que aconteça. Minha
aproximação e a minha ajuda só vão continuar sendo para fins de
autopreservação, até porque, se estiver mal, como vai poder fazer parte do
time que lutará contra Vladimir e sua tropa de vampiros antigos e fortes?
Minimamente controlado.
Levi Vodrak ainda continua sendo o vilão, não importa as partes fracas que
me mostre.
Falando em partes fracas, depois desse desastre, eu não o vejo há dias. Acho
que deve estar trancado na casa de Luca, porque não o vejo mais passeando
com a sua moto Harley-Davidson e nem o tenho mais me acompanhando na
faculdade, como se fosse um s talker.
Também não veio me encontrar mais nenhuma vez para perguntar quando
vou poder tentar fazer o feitiço do jeito que pensei, e desconfio que seja
porque, quando voltou para casa, começou a se sentir envergonhado, ou com
raiva, por ter me mostrado seu lado fraco. Com dor, Levi não estava
raciocinando o que estava acontecendo naquela floresta, não pôde perceber o
que podia significar para nós dois, e aí, quando se deu conta que revelou seu
segredo para a garota que odeia, ficou recluso e não quer mais ver minha
cara.
Se não quiser nunca mais me ver, eu acho que é até melhor, só assim não
corre o risco de eu ficar pensando em bobagens.
Me concentro nela.
— Não, não sei, toda hora é uma novidade diferente, e eu não consigo
acompanhar. O que foi agora?
Dou de ombros.
Já não basta os pensamentos que tive ao longo desses dias? Não quero ter
que ficar pensando em seus atributos físicos agora, mesmo eu sabendo que
são muitos e que são de forma exagerada.
E daí que ele tem cabelos escuros, um corpo malhado, uma beleza
sobrenatural e um sorriso capaz de molhar qualquer calcinha? Ele é um
vampiro assassino, porra.
E um que está me ignorando, me deixando com raiva e não deve ser foco de
nenhuma conversa ou pensamento meu, nem aqui, nem em lugar nenhum.
— Por quê?
— Porque não.
Respiro audivelmente.
— Vai por mim, eu estou te ajudando. Você não vai querer conhecê-lo.
— Não vejo motivos, se ele é carne nova no pedaço, eu quero dar uma
mordidinha. — Finca os cotovelos na mesa redonda que nos separa e se
aproxima.
Você não é para o bico de Levi Vodrak. — Meu rosto se contorce em uma
careta, quando começo a pensar nos dois juntos. Que nojo. A bile me sobe, e
o meu peito queima. — E se quer um conselho, ele é um garoto terrível,
fique longe dele. Se vê-lo passar na mesma rua que a sua, corra e mude de
calçada. É perigoso. O
— Ai, que merda, eu tenho um fraco por esses, e sei que você também.
— Olha, se a gente continuar nessa, vamos nos atrasar para o ensaio. Você
não acha melhor parar de fofocar, se levantar e me acompanhar, não?
Também revira as írises para mim, mas acata minha decisão, reúne suas
coisas, pega a sua bolsa e se põe ao meu lado, começando a andar comigo,
para sairmos do refeitório.
Acho que nada acontece com Savannah, porque, ao meu lado, ela para de
andar e puxa meu braço, para que eu também não avance e fique no mesmo
lugar que ela.
— O que foi? — Pestanejo uma porção de vezes, seu rosto virado para
frente, agora em foco. — Por que está abrindo a boca assim?
— Só pode, é a versão bad boy do Luca Vodrak parada bem na minha frente.
—
— Olá, garotas. — Levi se aproxima, e Savannah volta para o meu lado, mas
não sem antes me cutucar outra vez. — Olá, Gabriella. — Sorri para mim e
depois encara a minha amiga. — Você é a...?
— Levi Vodrak. — Ele beija o dorso da mão dela, com as írises erguidas
para o seu rosto, fazendo charme. Consigo perceber quando a capitã das
líderes de torcida se amolece sob seu toque. — É um prazer conhecê-la,
Savannah.
Devolvo o sorriso e encaro Levi, sabendo que não sairemos daqui tão cedo.
— Foi recente, por causa de uma das meninas que se acidentou. Fiquei
desesperada e pedi ajuda à Gabi, ela é muito boa no que faz.
Que ódio, a informação nem mesmo passou pelo meu cérebro, só saiu,
escapuliu.
— É que nós temos meio que uma história juntos, Savannah. Seja lá o que
ela tenha te dito, não acredite, ela provavelmente está com raiva de mim,
porque fiquei uns dias sem vê-la, depois de um momento superimportante e
esclarecedor que passamos juntos.
— Não tenho nada a ver com meu irmão, mas muito obrigado, Savannah.
Ela sorri, acena e vai embora, como se quisesse nos deixar a sós o mais
rápido possível.
E Levi parece sério, parece transtornado, mais uma vez, me deixando vê-lo
por completo.
— Você viu como eu fico, não é uma coisa da qual me orgulho e com a qual
consigo lidar tranquilamente — expõe baixinho, quase não querendo que eu
escute. — E eu ainda não sei lidar com o fato de que outra pessoa sabe, e
que essa pessoa é você. Aposto que está me achando fraco, uma completa
farsa e, sinceramente, por causa disso, não queria mais te ver, estava certo
que iria te deixar em paz. Entretanto... não consegui. Você me assistiu,
poderia muito bem ter virado as costas e me deixado ali, não tinha motivo
nenhum para me ajudar, mas mesmo assim, ajudou. Tirou a minha dor, e eu
queria... eu queria... hm... t-te... —
— Euqueriateagradecer.
— Gabriella...
Por causa da nossa diferença de altura, eu tombo a cabeça para trás, para
olhar seu rosto com precisão.
— Pode ter sido a planta, ela serviu de canalizador, tirou a sua dor e resgatou
a sua força, o que pode significar que você não precisa, necessariamente, de
uma pedra, pode ser qualquer coisa ligada à natureza. — Fico perto de Levi,
para que não corra o risco de outras pessoas escutarem nossa conversa. —
Pode ser que funcione com alguma erva, sabia? Você poderia, todo dia,
tomar um pouco e assim ir conhecendo melhor seu corpo, seu lado humano e
o seu lado vampiro, aquele
que pode controlar e aquele que quer te controlar. Lembrando que não é
certeza, mas pode ter sentido.
— Certo. — Assente de novo. — E também não vai usar isso contra mim
um dia, vai? Lembre-se que eu te livrei do seu destino e que estou aqui para
te proteger, e te manter viva, indo contra tudo o que acreditei por décadas e
décadas.
Abri mão de muita coisa, inclusive do meu próprio orgulho, e quando fiz
aquele trato com você, quando demos as mãos, eu estava mesmo empenhado
em firmar algo sério.
— Não vou usar — soo sincera e percebo que precisa escutar isso vindo de
mim. — Se eu estou aqui cumprindo com o nosso trato, querendo fazer as
coisas melhorarem para você, como vou parar, para usar contra você um dia?
Até lá, não passará mais por nada disso, ou seja, não terei nada para passar
na sua cara, pode ficar despreocupado.
— Hm, ok. Tem razão.
Balanço a cabeça.
— E espero que isso signifique que você não vai mais sair fugindo de mim
por aí, não quando estamos com problemas, precisamos resolvê-los e
estamos todos te esperando abrir a boca.
— É, sobre isso, já conversei com Luca, disse que estava pronto para nos
reunirmos de novo e dessa vez, para falar tudo que sei.
— E ele?
— É porque foi hoje, antes de eu vir até aqui. Acho que meu irmão também
estava me dando um tempo, enquanto me observava, para ver se eu tinha
algum comportamento estranho e suspeito. Mas fique tranquila, ele não
encontrou nada, estou mesmo empenhado a trabalhar para derrotar Vladimir
Vampir.
Levi aceita, só que antes de eu conseguir me virar por completo, ele me para.
— Percebi que é um saco ficar em casa o dia inteiro, quero fingir poder ser
um jovem humano, como meu querido irmão gêmeo. Para ele gostar tanto
dessa vida, pelo menos, tem que ser minimamente interessante.
Não sei que mania é essa, que do nada adquiriu, mas pega um cacho do meu
cabelo e começa a brincar, ao envolvê-lo no seu dedo. Aproveita a
oportunidade para se aproximar, encaixando os lábios próximos da minha
orelha, para sussurrar:
— E também estarei aqui para ficar de olho em você, bruxa. Esse é o motivo
principal.
Eu até poderia perguntar de novo como foi que conseguiu fazer isso sem
documento, porém seria estupidez.
The way he makes me feel, I never seemed to act so stupid (A maneira como
ele me faz sentir, nunca agi de forma tão estúpida) Oh, there we go
He a part of me now
He a part of me
Ele resolveu ficar, para me ver dançar. Nem sei se as outras percebem a sua
figura aqui, me acompanhando com os olhos por trás dos óculos, mas eu
estou muito ciente, e acho que isso já é o bastante.
Mesmo sem nem falar nada, ouço a sua voz na minha cabeça.
Eu não deveria me importar que Levi as visse dançando, não deveria estar
com essa coisa em mente de que preciso ser a melhor, de que preciso que
seus olhos estejam em mim o tempo todo, sempre nas minhas curvas, vendo
as coisas loucas e mágicas que posso fazer com elas enquanto danço.
Merda, eu não sei nem o que é que está acontecendo comigo, só sei que não
importa sobre o que seja, Levi Vodrak sempre me deixa com os nervos à flor
da pele.
E na altura do vampiro, com meus lábios erguidos num sorriso, pisco, como
quem quer dizer: viu só, arrasei, espero que tenha olhado cada segundo.
As meninas me colocam no chão de novo, e com elas também vibrando, a
gente se abraça e dá pulinhos de alegria.
Porque Levi não se encontra mais no lugar em que estava sentado, agora está
tudo vazio, sem nenhum sinal dele.
Será que esse momento existiu mesmo e ele estava aqui ou eu apenas
inventei tudo na minha mente?
Acho que acabei ficando mais tempo lá do que o necessário, pois, quando
retornei ao vestiário com as mesmas dúvidas em minha mente, as meninas
tinham ido embora.
Ou ao menos, tentei.
Minha cabeça estava e ainda se encontra a mil por hora, meus pensamentos
estão bagunçados, tumultuados, e eles meio que brigam entre si, já que,
sinceramente, meus próprios sentimentos estão em conflito.
Contudo, outra coisa também não saía da minha mente: Por quê?
Por que eu fiquei daquele jeito? Por que quis mostrar alguma coisa para
Levi, se Levi não tem nada a ver com a droga da minha vida?
E por que raios, ele foi embora sem mais nem menos?
Só pode ser isso que aconteceu, não estou ficando louca, muito menos tendo
delírios ou alucinações.
Balanço a cabeça.
Sigo adiante, vou atrás do meu armário, ponho a minha senha e me assusto,
quando as luzes começam a piscar, como se estivessem muito perto de
falhar.
Voltam ao normal e ficam assim por um minuto inteiro, o que significa, pelo
que eu acredito, que não vão mais dar problema.
Ciente disso, volto para pegar as minhas coisas no armário e é quando ouço
passos.
A veia do meu pescoço começa a latejar com o medo de quem pode estar
aqui, e, na ponta dos pés, eu ando para ver se consigo encontrar alguma
coisa.
Mais passos.
Não tem reposta, porém meu corpo parece sofrer uma descarga elétrica, e eu
me arrepio toda com a sensação.
Vultos passam por mim bem na hora, como se uma coisa muito rápida
estivesse indo e voltando, de forma sobrenatural.
Meus pés ficam no mesmo lugar, e eu paro tanto de andar, quanto de tentar
entender, porque não há mais dúvidas de quem se trata.
É ele. De novo.
Não acredito que estou deixando-o me ver assim. — Está tão confortável
assim na minha frente, bruxa? Que não pensa mais que posso te matar, que
não liga mais para as suas vestes diante da minha presença?
em relação à minha roupa, você invadiu meu banho, seu idiota, como posso
me trocar, se você simplesmente me prensou aqui?
— Ah, não seja por isso, eu te deixo livre, se isso significar que vai fazer
agora, na minha frente.
Meneia a cabeça.
— Muito engraçadinho.
— Por favor, saia daqui — peço e tento empurra-lo para trás, que, como em
todas as vezes, é inútil, pois, além do corpo forte e alto como a Muralha da
China, ainda tem a força de um vampiro. — É sério, estou sendo educada,
saia já daqui, não posso ficar com você nessas condições. E esse lugar aqui,
não é lugar para você.
Eu sei que eu sempre digo que não sou de ficar corada, mas dessa vez,
minhas bochechas e meu rosto inteiro esquentam de vergonha.
Ele estava mesmo lá, Gabriella, não era imaginação, a voz diabólica do
meu subconsciente cantarola. Ele te viu, ele te notou e ele, com certeza, pôde
ver seu lado perverso e sujo, que queria atenção do único homem no planeta
que você não poderia querer.
Não.
— Não foi isso que aconteceu — consigo externar, com a voz arrastada e
nervosa. — Você... entendeu errado.
— Todo mundo para você entende errado, não é? Cody, sua amiga
Savannah, eu. Pode mudar o disco, já não está mais colando com ninguém.
Me fazendo prender todo o ar nos pulmões, Levi desce uma única mão e
começa a deslizar os dedos por todo o meu braço, em seguida fazendo o
caminho de volta, para poder alcançar o meu ombro desnudo. Não gosto da
reação involuntária que meu corpo tem, reagindo, e pior, gostando do seu
toque. Deveria me repelir, não me atrair, afinal, não é porque vi o que vi na
floresta, que vou parar de senti tudo o que senti durante tanto tempo. Não é
porque resolveu vir até mim e continua me mostrando sua parte fraca e
minimamente humana, que tudo vai ficar bem. Não, não vai. Não pode ficar.
— Acho que você já percebeu, Gabriella, não tem como fugir. Nós temos
uma história, errada, problemática, do avesso, seja o que for, mas temos.
Temos uma conexão também, um imã, que nos puxa para perto um do outro.
E depois do
— Pare com isso — imploro, e merda, não estou entendendo essa minha
estúpida vontade de chorar. — Pare de se abrir pra mim, para de querer esse
tipo de aproximação e contato, tudo que estou fazendo é por causa de
Vladimir, para que fique bem e forte para me ajudar, para ajudar a Luca. Não
coloque em mim essa responsabilidade, não me veja com outros olhos,
porque eu não consigo suportar a ideia de querer te ajudar só... por querer.
Você sabe o que fez para mim, sabe o que fez para a minha família, nada do
que tente me mostrar agora, vai mudar isso. Nada. Eu te odeio!
— E acha que eu também não te odeio? Acha que eu não me odeio? — Seu
tom de voz se altera, seu peito infla de ar, e Levi parece completamente puto,
com o maxilar trincado. Ele até se afasta, chutando a lixeira para o lado. —
Acha que eu queria estar aqui, confessando todas essas merdas para você?
Acha que eu queria esquecer todo o mal que sua família me fez? E você sabe
o tamanho do estrago, você viu com seus próprios olhos, e aposto que pôde
entender, pelo menos um pouquinho, os meus motivos de vingança. Tudo
bem, eu entendo que pode parecer horrível para quem está de fora, eu
entendo que seja coisa de monstro, mas é a porra do que eu sou! É nisso que
me transformaram!
— As mesmas questões que você tem, eu também tenho, não percebe isso?
— Coloca a mão acima da minha cabeça de novo, e com a outra, toca meu
queixo, para que eu possa olhá-lo, para que eu possa, novamente, ver aquela
dor em seus olhos. — Nós dois estamos fodidos, não podemos gostar um do
outro, nem como amigo, nem como porra nenhuma. A história toda diz por
nós, você é uma Salazar, eu sou um Vodrak. Você é uma bruxa, eu sou um
vampiro. Durante décadas e décadas, estivemos em lados opostos, e
basicamente, por minha causa. Mas agora eu estou aqui, na sua frente, te
dizendo que, talvez, só talvez, eu não me importe mais com todas essas
baboseiras que eu mesmo criei, porque estou, em suma, gritando por
socorro, coisa que também, por anos e anos, não consegui fazer, por decidir
engolir cada maldito sofrimento calado. Entre você e eu, quem está na pior?
Quem que está precisando se humilhar, só por precisar de um braço para se
apoiar? Lembre-se, você não me mostrou suas fraquezas, Gabriella Faulkner,
e eu
fiz isso, sem nem querer, sem nem perceber. Está a quilômetros de distância
na minha frente, como pode estar com medo?
— Você matou pessoas, destruiu a vida de inocentes, me tirou uma vida com
os meus pais biológicos. — Sinto o choro preso, praticamente fechar toda a
minha garganta. — Como eu posso deixar isso de lado? Como eu posso
ignorar algo tão grave? — Empurro a sua mão do meu queixo, e Levi parece
fraco, porque eu o empurro para me livrar da sua proximidade, e ele cede. —
Se não fosse por essa história de colar e de Vladimir, a uma hora dessas, eu
estaria correndo de você, tentando me manter a salvo. Sem nenhum tipo de
pena ou compaixão, me mataria sem nem hesitar e sem nem pensar. Sem
pensar em quem eu sou, sem pensar que tipo de mulher eu gostaria de ser e,
principalmente, sem se dar ao trabalho de descobrir minhas dores ou as
minhas lutas. Se você não faria isso por mim, por que eu tenho que fazer por
você?
Vejo que continua apertando forte sua mandíbula, em silêncio, e sei que o
deixei sem argumentos.
— Eu vou te ajudar com o que você sente, mas é só isso — declaro, tentando
soar convicta. — É a minha parte bruxa te ajudando, não eu, Gabriella. É
tudo pensado na luta que está por vir, não pensando em você, Levi. Então,
por favor, pare de me tocar, pare de me prender em seus braços, pare de
tentar bagunçar a minha cabeça e a dos meus amigos com essa historinha de
que temos uma conexão pessoal. Não temos — sibilo para que entenda. —
Pode me falar suas dores quando estivermos juntos, pode desabafar, mas não
quero que interprete de outra forma, a não ser pela que é, que é para eu poder
saber direito o que fazer na hora de conduzir o feitiço. Eu não vou ser sua
amiga, eu não vou estar ao seu lado em todos os momentos, não posso,
então, se quiser uma pessoa para se apoiar, chame o seu irmão. Não projete
em mim essa figura.
Ouço seus passos soando para se aproximar, o que me faz dar a volta.
Me sinto estúpida.
Por ainda estar de toalha, por estar tendo essa conversa, por estar tão
estranha e tão... irreconhecível.
— Você me ouviu alguma vez hoje, dizer que eu quero que você seja minha
amiga? — Arrepio. Outro maldito arrepio, quando Levi encosta seu corpo
em minhas costas, minha bunda perto de uma área extremamente perigosa.
Se só o fato de ter se aproximado abala as minhas estruturas, cada músculo
meu fica pior e se contrai, quando resolve tocar a minha cintura. — Eu não
sei se amigos são capazes de sentir o que você está me fazendo sentir,
bruxinha. Você dançou na porcaria daquela mini saia de líder de torcida e me
deixou tão, mas tão duro. Te vi rebolar gostoso e se eu já não estivesse
morto, teria morrido bem ali, e por sua causa. — Me pressiona mais contra
seu quadril, e eu, sem querer, gemo baixinho.
Porra. — Amigos não fazem isso, acho que inimigos também não. E esse
som que você acabou de fazer, mocinha, tenho certeza que não é de raiva.
— Pode ter certeza, bruxa, nada do que aconteça entre nós, vai fazer com
que eu pare de odiá-la. Não tem como não odiar alguém que é proibida para
mim.
— Me solte.
Faz que não com a cabeça, e seus olhos descem para os meus lábios.
— Você pode até ser um pecado, mas eu vivo há mais de um século sendo
pecador.
De mim.
Da minha...
Ah, não.
Não sei por quanto tempo ficamos parados assim, com Levi me agarrando, e
eu parecendo uma estátua de cerâmica exposta em um museu, mas para
mim, parece uma eternidade, já que o mundo ao nosso redor congela.
— Ai! — grita, com dor, pois estou fritando seu cérebro com o poder da
minha mente. — Para! Para com isso, Gabriella!
— Por amor à sua vida, nunca mais ouse fazer isso de novo. Nunca mais.
Aquela conversa e aquele quase beijo não estavam saindo da minha cabeça,
e por mais que eu tentasse me distrair com outros assuntos, nada conseguia
mudar a rota dos meus pensamentos.
Eu estava nervosa.
Angustiada.
Revoltada.
Inconformada.
Levi, antes queria minha cabeça, e agora parecia querer arrancar meu
coração para fora do peito.
No entanto, só não era mais apavorante do que as coisas tenebrosas que senti
quando se aproximou, me tocando. Eu perdi o fôlego, perdi a noção do
tempo, do espaço, do certo e do errado e só fiquei ali, parada, não
conseguindo me mover, como se estivesse somente esperando seus próximos
passos.
Afinal, quem Levi Vodrak pensava que eu era? Uma garota movida apenas a
desejos? Uma garota sem escrúpulos, que esquece as coisas rápido?
Tudo bem que ele é lindo, um gato e faz completamente o meu estilo,
entretanto, nós somos incompatíveis nessa vida. Se fosse em outra, eu
poderia aceitar seu beijo e tudo que quisesse me oferecer, porém nessa, nem
se fosse o último homem na terra.
Ele fez coisas terríveis, monstruosas, coisas que me afetaram, e não dá para
passar pano.
E eu juro que não queria ter que vê-lo, ainda mais tão precocemente, com o
meu pensamento ainda sendo todo sobre ele, porém estamos aqui, na sala da
casa de Luca, para escutá-lo falar sobre Vladimir.
Por ironia do destino e total azar meu, estou bem na sua frente e posso
analisar com propriedade a maneira como me olha. Não tem mais o brilho
lúdico nos seus olhos, não tem os lábios retorcidos em sorrisos maldosos, e
ele também não parece carregar mais, pelo menos por ora, a sua pose
arrogante e autoconfiante. Na realidade, para ser bem sincera, Levi está um
pouco cabisbaixo, não faz suas típicas piadas e se limita a falar apenas sobre
o assunto.
Deve ser porque ele está assim por sua causa, Gabriella, e só vocês sabem o
que passaram.
— Vai, Levi, prossiga — Luca pede. — O que foi que você descobriu.
Viro minha atenção para ela e a vejo com algumas folhas em mãos,
provavelmente de sua própria pesquisa. Ela pode não ter nada a ver com essa
história e me deixar com muito medo de que acabe achando que pode
interferir de alguma forma, só por nós, para nos ajudar nessa confusão toda,
no entanto, já me garantiu que só está fazendo o seu papel de nerd que gosta
de estudar e buscar conhecimento.
Minha irmã me disse que esse era o único jeito que ela podia ajudar e pediu
encarecidamente que eu não atrapalhasse, porque já bastava Luca em seu pé.
Evelyn tenta disfarçar e se afasta um pouco, não deixando que a gente olhe
muito para o seu rosto.
A verdade é que eu estou um completo caos por dentro, só não caio no chão,
porque já estou sentada.
— Mas onde diabos foi capaz de encontrar uma informação dessas? Como
ele teve acesso a isso? Como descobriu que existe essa forma de quebrar a
maldição? —
Devon e Larkin estão aqui também, então resolvem falar antes de Levi.
— A resposta para essa pergunta, nós ainda não temos — é Larkin mesmo
quem continua. — Porém, temos uma teoria. Acreditamos que tudo vai
envolver sangue para a quebra, tanto de Gabriella quanto de vocês,
provavelmente numa quantidade menor, e se não morrerem por isso, podem
morrer quando o véu da vida e da morte voltar ao eixo. Vocês dois podem,
simplesmente, evaporar, pararem de existir no exato segundo em que
Vladimir recuperar sua humanidade.
Outro silêncio.
Guerra.
Não demonstro, no entanto. Da mesma forma que fiz com a senhora, com a
nossa vizinha, eu fico quieta, querendo passar confiança, pois não vou e não
posso desestabilizar ainda mais a minha irmã.
— Qual vai ser o plano? — sou a primeira a soltar isso, na lata. — De que
forma todos nós aqui, vamos reverter essa maluquice? Porque nem fodendo,
que vou deixar aquele idiota usar do meu sangue e se transformar em
humano. Vou nem perguntar o motivo de ele querer se tornar um, deve ser
insuportável para ele pensar em passar a eternidade sozinho no corpo dele
mesmo.
— Dizem que é por amor. — A voz de Levi falando por cima da minha, me
faz fechar a boca rapidamente. — Que Vladimir, durante esses poucos
últimos anos, encontrou uma mulher humana por quem se apaixonou
perdidamente, por causa disso, não suporta a ideia de vê-la morrer e quer
fazer de tudo para conseguir reverter sua condição. — Quando revira os
olhos, é quando percebo que consigo ver o Levi que ele é. — O amor na vida
real é sempre diferente da fantasia, ele sempre vem para ferrar com tudo.
Mesma coisa das mulheres, que sempre arrumam um jeito de entrar na
cabeça dos homens, a ponto de eles serem capazes de fazer qualquer coisa
por elas. Patético.
Fita meu rosto de modo tão intenso que, por um momento, me questiono.
Isso por acaso foi algum tipo de indireta dirigida à minha pessoa?
— Eles são mais velhos que vocês — Evelyn relembra, como se ele não
estivesse pondo em consideração esse fato. — Não dá para confiarmos só na
luta, precisamos de um plano. Um plano bom.
— Não sei se vão gostar do que eu vou falar — receoso, Larkin entra de
volta na conversa. Todos nós o encaramos —, mas fiquei pensando nesse
sacrifício por dias, horas e horas a fio. Até que cheguei à conclusão de que
há sim, um jeito de revertermos isso, porque acredito que Vladimir não está
com o feitiço original, está provavelmente uma cópia, que encontrou em
algum lugar ou com alguém, e se foi feito por uma Salazar, passou de
geração para geração e só pode estar com, hm, vejamos bem, uma... Salazar.
— Aponta o dedo indicador para mim, e minhas sobrancelhas já se unem em
confusão. — E aí, quando Vladimir chegasse, nós, ou melhor, Gabriella,
usaria esse feitiço contra ele, usando um pouco do seu próprio
— Foi só uma ideia. — Larkin balança os ombros. — Eu não sei se pode ser
possível, por causa do véu da vida e da morte. Gabriella, se fizesse isso,
também poderia morrer, ou por causa da força do feitiço ou porque,
deixando os Vodrak vivos, uma Salazar não possa existir no mundo. Tudo
sempre vai girar em volta desse véu.
— A gente pode tentar — fala e puxa Evelyn para perto. — Se for para
salvar todo mundo, eu não me importo de voltar a ser humano. Eu toparia,
pela Evelyn. Para passar o resto da vida com essa mulher.
— É arriscado — diz, com raiva, para o irmão. — Pode nem dar certo, pode
simplesmente dar tudo errado. E eu não aceito, não aceito deixar de ser
vampiro.
Esse é quem eu sou e eu não vou mudar toda a porra da minha vida, para que
Luca possa viver feliz com a sua namoradinha. Quando arrumarem outro
jeito que não seja esse, me falem, que eu ajudo. Só que essa merda está
totalmente fora de questão.
E então, como um furacão, vira as costas para todo mundo e corre para subir
as escadas, e se esconder em seu quarto, coisa que atualmente está adorando
fazer, pelo visto.
Não quer lidar com problemas? Ótimo, vou sumir, e vocês que se danem. O
caralho que vai pensar assim.
Também revoltada e já com chamas por dentro, por tudo que está
acontecendo em tão pouco tempo, eu me levanto, abaixo o meu vestido e só
digo:
— Com licença.
Percorro o mesmo caminho que Levi fez, subo as escadas de dois em dois e,
mesmo não sabendo onde diabos está ficando nessa casa, eu começo a
procurar por ele pelo corredor.
O encontro pela porta entreaberta e entro sem nem pedir licença, fechando a
porta e nos trancando aqui dentro.
Ele aperta a ponta do nariz e serpenteia meu corpo para fugir de mim.
— Que show foi esse que deu lá embaixo, ofendendo o seu irmão e a minha
irmã a troco de nada, hein? — Cutuco as suas costas, quando se vira para
mim.
Acha que vai me parar? Rá! Estou só começando. — Tudo bem que você
poderia dizer que não queria fazer merda de sacrifício nenhum, que gostaria
de continuar sendo vampiro, coisa que eu também nem entendo se quisesse,
já que estava praticamente, há algumas horas, desabafando comigo que não
suporta a dor que carrega, mas agora ficar putinho por besteira, subir e
deixar todo mundo lá embaixo com cara de palhaço, já é demais. Estamos
nessa juntos, seu babaca, o Larkin e o Luca estavam tentando ajudar, não
precisava agir daquele jeito. E se Luca topou, foi por desespero, ele nem
estava pensando direito, e eu obviamente não ia dizer que aceitava algo
daquele tipo, sem antes pensarmos em outras soluções.
— Sei lá, talvez tentar entender que porra passa na sua cabeça — esbravejo,
e Levi novamente marcha para outro canto do quarto, dessa vez, perto da
cama. —
Que tanto gosto é esse que você faz em ser vampiro, se tudo que essa merda
faz é te fazer sofrer? Que tanta raiva foi essa que você ficou por uma simples
pergunta?
Quanta hipocrisia. — Eu mesma dou risada, sem humor. — Diz que detesta
bruxas por uma delas ter te transformado nisso, saiu se vingando, e aí,
quando alguém diz que talvez você possa não sofrer mais, que talvez você
tenha uma chance, mesmo que mínima, de ser um garoto que nunca
conseguiu ser, a primeira coisa que passa na sua cabeça, é ficar com raiva?
Juro, não entendo. Não entra na minha cabeça.
Ou está mentindo para mim ou está mentindo para si mesmo, porque não
condiz com o que foi me dizer no vestiário.
— Sério, me diz, por que está aqui? — Um passo, e já está parado à minha
frente. — Por que você está se importando se eu quero continuar com o meu
sofrimento ou não? Você mesma fez questão de jogar na minha cara que não
está nem aí — cospe as palavras com dor, dá para ver. — Vai, me diz,
Gabriella, por que você se importa? — Mais um passo. — Por que está
sozinha aqui comigo, tentando relembrar o que aconteceu no vestiário?
Fico inconformada.
Quando estou prestes a empurrá-lo, prende meus pulsos com só uma das
mãos, nossas írises travando uma guerra também, tipo uma competição para
ver quem perde primeiro.
— Egoísta? Eu? — Libera uma risada anasalada. — Puta que pariu, não
pode ser possível. Tudo que você é capaz de fazer é me julgar, me julgar e
me julgar? Você nem sabe os meus motivos, nem sabe porque descartei e
decidi tirar aquela ideia estúpida da cabeça deles.
Nega.
— Na verdade, aposto que é porque você não tem uma, aposto que é porque,
no fundo, no fundo, sabe que estou certa. É um egoísta, um mimadinho, um
esnobe.
— Babaca.
— Teimosa — rosna.
Bufo.
Estalo os meus lábios, passando por ele e batendo no seu corpo de propósito.
— Olha, vamos voltar para o começo. Por que você saiu daquela forma?
Não tem nada a ver com eu continuar sendo vampiro ou não, tem a ver com
você.
Satisfeita?
— Eu... — Me perco até no que quero falar, porque obviamente, não estava
esperando por isso. — Eu...
— Gabriella?
— E minha cabeça está... querendo doer. Vai voltar. Ai, meu Deus, vai
voltar.
O conduzo até sua cama, e quando ele se senta, fico de joelhos no chão, para
que seus olhos consigam me ver melhor.
Seguro as suas mãos e aperto firme, exatamente como fiz da última vez.
— Ei — o chamo, porém não me olha. — Ei, Levi, olhe para mim. Isso, para
mim. Só para mim. Eu estou aqui, não vai acontecer nada, vai ficar tudo
bem.
Ai, meu Deus, não acredito que vou fazer mesmo isso.
Mas faço.
Fico na sua altura, o puxo pela gola da jaqueta e pressiono sua boca na
minha.
Ele, surpreso, murmura algum palavrão contra os meus lábios, porém não
me afasto, eu continuo. Fecho os olhos e o sinto, aos poucos, parar de ficar
tenso.
Não demora muito para que também pare de tremer, voltando a ficar leve.
— Ajudou.
— Obrigado. — Fica sério, e acredito que seja para que eu perceba o poder e
a verdade em suas palavras. — Sei que me odeia, mas você me ajudou.
Segurou a minha mão. Fez tudo desaparecer. De novo.
Uma pontada de dor alcança meu coração, ele se questionando se não estou
sendo dura demais.
Abro a boca para falar alguma coisa, porém batem na porta, e como se
estivéssemos fazendo algo de errado, nos levantamos os dois na mesma
hora, em um ímpeto.
Como o orgulhoso que é, não falou nada, porém ficou muito mais disposto a
opinar e a ajudar de verdade, sem nenhum tipo de indireta ou briguinha.
Também falamos dos planos, do que cada um poderia fazer, no que cada um
poderia ajudar, como nos defenderíamos, como poderíamos ser mais fortes
que eles e assim, quando percebemos, já estava muito tarde, e tanto eu,
quanto a minha irmã nos encontrávamos exaustas, jogadas no sofá,
praticamente dormindo.
Devon e Larkin tinham sido os primeiros a irem embora para a cabana, só
tinha sobrado nós duas. E os moradores da casa, claro. Eles foram os
primeiros a dizerem que, por mais que morássemos na vizinhança, muito
perto, podíamos dormir aqui, caso estivéssemos muito cansadas.
E estávamos.
Evelyn Sutton foi a primeira a me puxar para o andar de cima, só para nos
enfiar no segundo quarto de hóspedes, após ouvir seu namorado dizer que o
espaço estava disponível para nós. Ela ligou o ar-condicionado, arrumou a
cama para que ficasse confortável para ambas e está agora, nesse exato
momento, virada de frente para mim, sem conseguir dormir, porque quer
ficar conversando.
— Acho que foi por isso que você negou o convite de Luca para dormir no
quarto com ele — eu sussurro, brincando, depois de ouvi-la dizer que quer
fazer mais uma pergunta. Estou querendo colocá-la para dormir, tentando
fazer com que entenda que amanhã temos aula na EGU, porém não me
escuta. Parece que seu sono evaporou de um segundo para o outro. Deve ter
fingido esse tempo todo, do jeito que é espertinha quando quer. — Está
querendo ficar aqui me interrogando, enchendo o meu saco.
— Eu só quero conversar com a minha irmã, que mal tem? — diz, cínica, e
eu rolo os olhos de forma dramática. — É sério, Gabi. O que é que custa
você me responder?
Foi duro e extremamente difícil, mas acho que ele entendeu isso.
— Larkin disse que você saiu da sala como se só você fosse capaz de
controlá-lo.
— Eles são gêmeos. — Pego a sua mão e faço carinho na palma. — Eles
sempre vão ter uma conexão maior do que o mundo. É uma pena tudo o que
aconteceu entre eles.
— É mesmo — concorda. — Eu mal posso imaginar como deve ser ficar
brigado com o seu irmão por anos e anos. Deve ser um pesadelo.
Realmente, é um pesadelo. Não sei como eles suportaram viver tanto tempo
longe um do outro.
Ela fica em silêncio, e, mesmo não falando nada, posso imaginar que sua
mente foi para um lugar totalmente terrível.
— Você está com medo, Gabriella? — Sabia. Eu sabia que essa é e vai
continuar sendo a sua maior preocupação do momento. — Está com medo
do que pode vir a acontecer? Porque eu estou morrendo. — Sua voz embarga
na mesma hora. — Não posso suportar a ideia de perder você, de perder
Luca. Vocês são, literalmente, tudo o que eu tenho nessa vida. São os meus
maiores amores, minha fortaleza.
— Não faça piada, por favor — suplica, com a voz doce. — Eu tenho
mesmo muito medo.
— Todos nós estamos com um pouco de medo, mana. É normal. Mas vai
ficar tudo bem, eu prometo. Você não confia em mim, não? Porque não vou
deixar
que nada nos aconteça. — Nem que eu tenha que me sacrificar até o último
minuto por isso.
— Confio e é por isso que ainda não entrei em desespero. Estou confiando
na melhor bruxa de todas.
Emocionada, a puxo para mim, lhe dando um abraço, para depois lhe encher
de beijos, e ela logo faz questão de me afastar, fingindo que não gosta.
— Eu te tenho para mim agora, Evelyn, e nada mais será capaz de nos
afastar.
— Prometo.
— Por que você não vai para o quarto do seu namorado, hein? Sei que deve
estar morrendo de vontade.
Faz beicinho.
Fica quieta, como se estivesse me observando para notar se tem algum traço
de brincadeira da minha parte.
— Vai logo, criança — insisto. — Seu namorado não vai conseguir nem
dormir essa noite, se você não for lá abraça-lo.
Ela se levanta no mesmo instante, com pena.
— Ai, meu Deus, tadinho, não posso deixar isso acontecer. Mas você não vai
ficar chateada comigo, vai?
— Claro que não, Evie. Vai ser até bom, que fico com essa cama espaçosa
toda para mim.
— Certo, estou indo lá agora mesmo. — Pula para fora, calça seus pés e vira
para mim. — Já avisei a mamãe que dormiremos aqui, então não precisa
ficar preocupada, pode dormir à vontade. Sinta-se em casa.
Sonsa, minha língua coça para falar, porém fico quieta, observando-a abrir a
porta e sair por ela logo após me mandar um tchauzinho e um beijo no ar.
Continuo sorrindo mesmo sozinha, achando graça de como ela fica sem
graça quando falo algo assim. É sempre muito divertido.
Peço que Evelyn entre, porque só pode ser ela, afinal, saiu daqui há poucos
minutos, mas nada acontece, só novas batidas.
Seu cabelo está lavado, e o cheiro do seu sabonete irradia. Faço o esforço
que eu consigo, para não descer os olhos para o seu abdômen, então
continuo ligada em seu rosto, tentando encontrar algum sinal do que pode ter
acontecido.
— Você está bem? — Troco o peso dos pés. Foco. Total foco. — Aconteceu
alguma coisa? Está sentindo aquilo de novo?
Quando começa a andar para frente, eu começo a andar para trás, não
entendendo nada. A minha confusão só piora, quando Levi fecha a porta, a
tranca e volta até mim.
Tenho um milhão de motivos para dizer o quão errado isso está sendo e
posso listar agora mesmo.
Mas também tenho um milhão de motivos para não deixar que escape, para
permitir que continue.
Ele é gostoso.
E ele geme.
Ele rosna.
Juro, não pode ser. Não pode ser. Não acredito que estou mesmo excitada
pelo meu inimigo. — E caralho, Gabriella, não quero largar da sua boca tão
cedo. Ela cabe perfeitamente na minha. É macia, quente e aposto que pode
envolver meu pau muito bem também.
Finge que acabou de costurar sua boca e agora me puxa pelo pescoço, me
beijando na mesma intensidade de novo. Me arrepio na mesma hora e fico
elétrica, sem saber muito o que vai acontecer, mas ansiando por cada
segundo.
Senhor, alguma coisa está possuindo e se apossando do meu corpo, não sou
eu.
Eu jamais permitiria que Levi me jogasse em uma cama e ficasse por cima
de mim, segurando uma perna minha, deslizando uma mão e a cravando por
toda a minha coxa em seguida. E olha que loucura, é justamente o que está
acontecendo.
— Temos que ser silenciosos — sussurra. — Já rodei com você por esse
quarto todo, possivelmente batemos em móveis, e agora te tenho em uma
cama. A vontade de te ouvir fazer barulho é enorme, bruxa, mas não
podemos, certo? Sei que você não vai querer que os outros descubram o que
está fazendo a essa hora da noite, quando seu cunhado e sua irmãzinha
pensam que já está dormindo, então seja uma boa garota uma vez na vida e
me obedeça.
— O que pensa que vai fazer comigo? — o desafio, embora eu esteja muito
certa de onde isso vai parar.
Oh, porra.
Sei que eu falo que prefiro que ele fique de boca fechada, porém é tudo
mentira. Suas palavras também me deixam molhada.
ficar bem com a minha ajuda, eu quero, de alguma forma, tê-lo, o que é
terrível.
— Isso é tão errado — consigo externar em voz alta. — Mas vai acontecer, e
você precisa entender que é só sexo. Só vai acontecer agora, essa vez, nunca
mais.
— Nadinha.
Na verdade, em algum momento desde que Levi pôs os pés aqui, eu estou
pensando?
Não.
Não é a resposta.
E continuo sem pensar, porque sai de cima de mim, ainda sorrindo, e começa
a tirar o meu vestido, que, a uma hora dessas, já estava na minha barriga, de
tanto que nos mexemos. Eu levanto os meus braços com certa pressa, ele
escorrega a peça para fora do meu corpo com uma agilidade impressionante,
e, no mesmo segundo, ela é descartada no chão do quarto.
Estou sem sutiã, meus seios pulam para fora, e Levi só falta babar quando os
encara. O brilho cheio de luxúria aumenta nas suas írises, e meu Deus, sobre
a pouca luz do ambiente, o homem fica ainda mais gostoso e irresistível,
porque o deixa mais perigoso, o torna ainda mais da noite, das sombras,
aquele que pode te caçar, ficar à noite inteira atrás de você, e você jamais
seria capaz de perceber.
— Ah, bruxinha… — Arfa. — Vou comer você com tanto gosto, que vai me
sentir por dias aí no meio das suas pernas. Não pretendo ir com calma, que
fique sabendo. Eu quero me enterrar em você bem fundo, para castigar essa
boceta do jeitinho que vem merecendo. Se eu sou o vilão, você vai conhecer
o vilão. E se é só hoje, se é só sexo, vou garantir que eu te dê uma foda
completamente inesquecível, digna de um vampiro.
— Filha da mãe.
Perco o fôlego quando o vejo tirar o cordão da sua calça, o coração batendo
com força na minha caixa torácica.
lambuzando sua boceta primeiro. Não vai poder falar, não vai poder gemer,
não vai poder gritar, nem se mexer e muito menos me tocar. Agora, eu que
vou te usar.
Agora, eu que vou te mostrar como você é minha para o que eu bem
entender.
Você riu quando eu disse isso, não foi? Vamos ver quem vai rir agora.
Levi prende meus pulsos com o cordão na maldita cabeceira, apertando com
uma força, que sabe que não vai ter como eu escapar. O olho com atenção e
penso que vai se abaixar para me beijar, então entreabro os lábios, porém
não é o que acontece. O vampiro chupa o vão entre os meus seios, depois
muda a rota e abocanha um mamilo, sugando, chupando, raspando os dentes
e mordendo.
— Você vai se surpreender tanto, bruxa, e eu vou rir da sua cara. Pior, vou te
castigar mais um pouco e impedir que você goze.
Sem esperar por uma liberação da minha parte, Levi abre as minhas pernas,
que eu já estava tentando fechar para controlar meu desejo, e enfia a cara no
meio, inspirando o meu cheiro, a minha excitação. Ele inspira uma, duas,
três vezes, se esbaldando, se deliciando com a visão do que está prestes a
comer.
Rasga inteira.
— Estou conseguindo ver daqui que pode molhar esse colchão a qualquer
momento — avisa, como se eu não pudesse sentir o líquido escorrendo pelas
minhas pernas. Não sei como posso estar desse jeito, já que Levi ainda não
fez basicamente nada. E olha que sou uma pessoa tecnicamente experimente,
já saí com alguns garotos, já tive algumas boas transas, outras terríveis, e
mesmo assim, nenhuma delas consegue se comparar ao nível de vazamento
que estou hoje. Só pode ser o tempo que fiquei longe de garotos e seus paus,
só isso explica. —
Espero que seque até de manhã, porque se Luca não se der conta de que
estava fodendo comigo, vai achar que estava fodendo consigo mesma. Não
importa a forma, o resultado será o mesmo. Ele terá a noção que de pura,
você só tem a cara, Gabriella Faulkner.
Sorri, adorando cada maldito segundo. Tenho ainda mais certeza que deve
estar nas nuvens, que deve achar que alcançou o paraíso, ganhou a maior
batalha de todos os tempos, agora que me tem à sua mercê dessa maneira.
O que achou que nunca seria possível, está acontecendo bem agora.
Mas é só sexo.
Só sexo.
Não é o que acontece agora, no entanto. Eu vejo estrelas, mas é com eles
bem abertos, arregalados, admirando e enlouquecendo, quando Levi se
abaixa um pouco, põe a língua para fora e lambe a minha lubrificação,
sumindo com o rastro que estava fazendo a minha pele brilhar. Em seguida,
beija a minha coxa, minha virilha e parte para a minha boceta, o lugar que
mais implora por atenção da sua parte, praticamente choramingando. Com os
olhos erguidos em minha direção, ele transforma seu rosto na maior
expressão maldosa, as írises carregadas de volúpia.
— Aprecie minha língua socar você, bruxa. Observe e sinta o poder dela.
Não vou deixá-lo ganhar, nem mesmo em uma hora como essa.
Mais uma vez, ri da minha cara, obviamente, já que tem tanta certeza de si
mesmo.
— A única ajuda que você vai pedir, é para que possamos conseguir trazer
de volta a sua alma para o corpo.
Fico em êxtase quando, sem esperar, Levi me dá uma lambida, de baixo para
cima, bem lentamente, como fazemos quando estamos provando um sorvete.
Arqueio mais os quadris, não aguentando quando Levi passa tempo demais
brincando com ele, dando atenção ao meu clitóris para me provocar. Ele
lambe, chupa e morde, em uma sequência infernalmente deliciosa, que só me
deixa cada vez mais molhada, excitada, mole e sem forças, meu pulso já
doendo de tanto que eu tento me mexer, querendo toca-lo também. Querendo
puxar seu cabelo, querendo esfregar seu rosto ainda mais contra a minha
boceta, querendo, desesperadamente, sentir cada um dos seus músculos sob
o meu toque.
É quente.
Dói o peito, dói a alma e ao invés de doer o meu juízo, acho que ele foi parar
nos pés.
— E aí, Gabriella, será que ainda acha que eu não sei como é que chupa
gostoso? — murmura, se deliciando tanto com a minha vagina, quanto com a
pergunta que paira no ar como uma provocação, não parando de me comer e
de me provar nem por um segundo, chupando, sugando, tentando enfiar a
língua para dentro de mim. Acho que esquece de usar a língua no minuto
seguinte, porque, depois de me deixar mais lubrificada do que o normal,
Levi me pega desprevenida e enfia seus dedos em minha entrada. Não um,
não dois, mas três. Me sinto alargando e com meus músculos internos os
apertando, como se quisessem explodir seus dedos. Arquejo, arfo, resfolego,
tudo de uma vez, revirando os olhos e gemendo baixinho, quando começa a
bombear, ao mesmo tempo em que volta a enfiar seu rosto entre as minhas
pernas. — Ah, bruxa, você não sabe o quanto eu queria isso. O quanto eu
queria provar dessa sua boceta, o quanto eu queria marcá-la, o quanto eu
queria torná-la minha. Decreto de antemão, não tem mais jeito, ela é minha.
Propriedade de Levi Vodrak, qualquer homem que tentar chegar perto, está
morto. Posso muito bem passar mais mil séculos torturando cada um dos
filhos da puta que achar que pode tirar você de mim.
— Queria que você pudesse gemer, bruxa. Mas continue rebolando na minha
cara, faça daquele jeito que você fez no campo, não tenha medo ou
vergonha, venha para mim.
Novamente grunho, ou rosno como um animal, sei lá, porque sinto seus
dedos indo de dentro para fora, estocando, me levando ao limite. Levi se
sente mais invencível, mais poderoso, mais excitado, porque também geme e
xinga, não parando, metendo duro, forte, como se imaginasse seu pau aqui
dentro de mim. Eu me sinto, em todos os cantos, preenchida. Consumida.
Destruída. Me sinto em pedaços, sem nenhum tipo de poder sobre mim, pois
acabo de entregar tudo nas mãos de Levi Vodrak, pelo menos por ora.
E ele sabe muito bem o que está fazendo. Ele sabe muito bem como me
tocar. Sabe muito bem como me dar prazer. Sabe muito bem como foder
com a minha cabeça, tanto dentro quanto fora de um quarto.
— Porra, chame meu nome assim de novo, e eu juro que gozo nas calças.
Juro que mando um foda-se para Luca e te faço gritar agora mesmo.
Abro e fecho a boca, pois ele volta a beijar minha virilha, depois sobe para
circular meu umbigo e ir subindo pela minha barriga. Chupa novamente um
dos meus seios, com força, e então, me pegando de surpresa, me beija com a
mesma intensidade. Bruto. Fatal. Perigoso. Ele suga cada pedacinho da
minha alma e leva consigo o resto da minha sanidade.
É rápido, Levi, na mesma hora em que me revela esse absurdo, abre o botão
da calça, desce com o zíper e se livra logo da peça. Fica nu, de joelhos, e
meus olhos automaticamente descem para o seu membro finalmente livre.
É grande. Grosso. Cheio de veias. A cabeça rosada está perolada, por causa
do líquido pré-gozo. Eu fico salivando imediatamente, admirada, porém
assustada.
— Isso aí que você carrega entre as pernas não tem nada de pequeno.
— Não o chame de “isso aí” , como se ele não tivesse importância. Ele é
seu pau. Seu novo brinquedo.
Minha nossa.
Esse é Levi.
Levi Vodrak é o nome do meu pesadelo. Ele tem o sorriso mais cafajeste do
mundo, a típica pose de bad boy com sua jaqueta de couro, coturnos e sua
sede incontrolável por sangue.
— Então enfie seu pau dentro de mim de uma vez — peço, já sem aguentar
mais.
Ele se toca, bem na minha frente.
— Deixa eu te contar uma coisa, antes que você se assuste. — Retorna para
me fitar. — Meus olhos mudam de cor no sexo. Não é nenhuma possessão
ou alguma coisa que estou querendo cometer contra a sua vida. É apenas
meu lado vampiro tentando lidar com o fato de que estou comendo alguém
de outra forma.
Não se assuste.
Entreabro os lábios.
Reviro os olhos.
— Agora você pode fazer isso, eu deixo. Estou prestes a te foder de qualquer
maneira mesmo, sua teimosinha.
Foder.
— Outra coisa, eu sou um vampiro. Estou morto, ou seja, não tenho doença.
E nem posso ter filhos, ou seja, não tenho como te engravidar.
— Tudo isso para me dizer que vai entrar sem capa? — Ergo uma
sobrancelha. — Nunca fiz sem, mas já tinha entendido que essa seria a nossa
realidade. Você é um ser sobrenatural, não um humano. As coisas são
diferentes aqui. Espero que o sexo também.
— O sexo vai ser simplesmente o melhor da sua vida. Você acha que já foi
bem servida antes, mas é porque nunca teve um vampiro te fodendo. Agora
vai ver o que é ser comida de verdade.
minha reação. Eu finco minhas unhas na carne do seu braço, com raiva,
querendo que pare a brincadeira e empurre de uma vez.
— Tão inocente — soa zombeteiro. — Acha que vou te comer nessa posição
sem graça? — Estala a língua no céu da boca e balança a cabeça. — Não,
não mesmo. Você vai ficar de quatro pra mim, bruxa. Eu vou te pegar por
trás.
Paraliso por um momento e depois, tão perversa quanto ele, sorrio, porque
essa é, definitivamente, minha posição favorita.
Sai de cima de mim, eu me ergo e quando tento me mexer para lhe dar a
visão que tanto quer, Levi não deixa, porque ele mesmo quer fazer isso por
mim. O
Forço a minha bunda contra ele, para ver se agiliza, pois já estou encharcada
de novo, necessitando da sua atenção.
Todo meu corpo se retesa, o esperando. No entanto, sem perder mais tempo,
Levi entra, aos poucos, em mim, empurrando na minha entrada até caber.
Sinto meus olhos encherem de lágrimas, porque ele é grande, é mesmo
grande, e não estou mais acostumada. Mas é aquele ardor, aquela dor boa,
que aos poucos se dissipa, quando o seu parceiro te espera e faz você se
acostumar, algo que demora pouquíssimo tempo. E para me deixar entregue
de novo, Levi se curva sobre as minhas costas, para beijar minha coluna e
apertar os meus seios, estimulando meus mamilos.
Meus seios balançam com o movimento, o ar parece não chegar aos meus
pulmões, tudo fica turvo, e os meus lábios cortam, pela força dos meus
dentes os mordendo, tentando não gritar e gemer como uma garota que está
descobrindo o sexo só agora.
Contudo, parece que é isso que está acontecendo mesmo, afinal de contas,
mesmo que eu odeie admitir, Levi Vodrak tem razão. Não há nada
comparado a ele na cama. Não há nada como nós e a nossa química.
Muito, muito perto de gozar. Muito perto de gozar em seu pau. O ajudo na
velocidade, esfregando minha bunda, o querendo muito mais por dentro. E
ao virar novamente para vê-lo, um oh de surpresa me escapa dos lábios, pois
Levi está mesmo com os olhos de outra cor. Eles estão vermelhos.
Vermelhos vivos. — Você é a minha maldição. É a minha ruína. Porra, estou
fodendo você aqui, mas sei que eu quem estou fodido de verdade. Nenhuma
outra vai superar isso que estamos tendo. É única. Única.
Dá mais tapas na minha bunda, fazendo com que eu venha logo, seus
xingamentos me levando ao ápice.
A visão é magnífica.
Se for, não quero acordar, não quero nunca sair daqui, porque Gabriella, por
incrível que pareça, me faz ficar bem, e ela foi a primeira pessoa que me
estendeu a mão, mesmo quando não deveria. Ela foi a primeira a me mostrar
empatia, quando tudo o que eu merecia era a sua raiva, o seu ódio e o seu
desprezo.
Tudo bem que a bruxa ainda luta para sustentar seus sentimentos, porém,
diferente de todo mundo, ao invés de fugir, ela fica. Tive crise pela maldição
duas vezes, e nas duas, ela ficou. Na primeira, me abraçou. Na segunda,
segurou a minha mão e me beijou.
Foi tão puro, foi tão doce, foi tão real, e eu nunca tive nada disso. Nunca.
Não sou um santo, estou muito longe disso, sou fodido da cabeça e tenho um
zilhão de defeitos que fazem com que todos queiram se afastar, mas antes
mesmo, quando eu estava passando pela transição, eu me vi sozinho. Me vi
sem um ombro
amigo que pudesse me apoiar, que pudesse ouvir as minhas dores, que
pudesse me entender.
Todas as coisas que fiz, foram movidas à raiva, dor e revolta, afinal, eu não
conhecia mais sentimentos diferentes desses. Eu não conhecia mais
sentimentos bons.
Eu não queria conhecer, eu queria que pagassem pelo que tinham me feito.
Agora, a olhando, sabendo que ela nunca pode me ver com outros olhos,
percebo que eu podia ter feito tudo diferente. Não sei se gosto mais da visão
que Gabriella tem sobre mim.
— Ei... — Eu toco seus cachos, e quando ela olha para mim, fico mudo por
um segundo. Nunca sei reagir muito bem com tanta beleza. — Sei que não é
hora de conversa, depois de um sexo incrível desses, sei que também pediu
para que eu não desabafasse ou projetasse essa figura de amiga em você,
mas acho que... que...
Por Luca.
— Você tem razão, eu não quero escutar ou falar sobre essas coisas. —
Assinto, mas também nem serve de nada, porque Gabriella nem percebe, ela
só pula da cama, pega de volta seu vestido e se enfia no banheiro, ligando
rapidamente o registro.
Com vontade.
Com determinação.
— Vou lá.
— Certo.
— Vai logo!
— Hm, Luca, veja só. — Minha cunhadinha cutuca seu namorado. — Acho
que alguém acordou de bom humor hoje.
— Mudando? — Meu irmão quase se engasga, e olha que ele nem colocou
nada na boca. — Duvido.
— Pois acredite.
Oh, cunhada, provavelmente deve ter a ver com o fato de eu ter macetado a
sua irmã e ter gostado tanto, que quero mais vezes.
Porque, se for, estou tão de bom humor, que posso aceitar. E se quer saber,
acho que você nem me odeia mais.
Luca tenta disfarçar, porém noto seu sorrisinho de canto. Parecem, por
estarem me vendo tentando ajudar e não causando nenhum problema ou
tendo atitudes suspeitas, que os dois estão mais habituados a mim.
Em silêncio, nós continuamos a comer, até que Evelyn olha para a tela do
seu celular, provavelmente vendo o horário, e franze o nariz.
— Ah, vocês não viram quando ela foi embora? — pergunto, como quem
não quer nada. Os dois se olham e balançam a cabeça, negando. — Nossa,
achei que ela tivesse avisado a vocês, mas pelo visto foi só a mim. Ela foi
para casa na madrugada mesmo, disse que não conseguiu se acostumar com
uma cama que não era dela.
— Isso é tão a cara da Gabriella — Evelyn fala, e só não fico tão surpreso
pela mentira ter colado, porque realmente é a cara da bruxa. — Por isso fui
para o quarto de Luca, só para dar mais espaço a ela também. Mas não tem
jeito, ela é assim desde pequena.
Sei que Gabriella vai querer se esconder e não vai querer me ver mais,
provavelmente já arrependida do que aconteceu, mas vou mostrar pra ela que
não
Ele está chocado, ainda estava surpreso que eu estivesse frequentando uma
faculdade depois de anos, já que nunca liguei para isso, e parece ainda mais
chocado por eu ter dito o que ouviu.
Que vou fazer parte do time de rugby, o time do qual Gabriella é líder de
torcida.
Que estaremos juntos em mais uma coisa divertida agora.
Sou bom em esportes, assim como Luca, só nunca pensei, de fato, em fazer
parte de um time. Era só hobby. Agora, é para ficar um pouco mais de olho
naquela garota. Vou fazê-la entender que pode sim, me ver de uma nova
forma.
Reviro os olhos.
— Olha, sei o que está querendo insinuar, mas não tem nada a ver com você.
— E é o quê?
— Depois vou querer ver você jogar — diz, e eu sorrio. — Vou querer saber
de mais coisas dessa história também, mas agora vou ter que ir. Tenho que
entregar uns livros que peguei na biblioteca.
Luca assente de novo, e eu giro nos calcanhares, para andar no lado oposto,
indo ao bloco onde Gabriella estuda Ciências Biológicas.
Cerro os punhos.
Eu estava tão mal essa manhã, mas encontrei Cody. E ele finalmente me
escutou.
Eu contei que aquele cara que nos atrapalhou é Levi Vodrak, irmão de Luca
Vodrak, capitão do time de hóquei da faculdade, meu cunhado. Contei que
ele e eu temos algumas desavenças, e que Levi só estava tentando espantá-lo
de propósito, porque não gosta de mim e porque sua maior mania é
infernizar a minha vida quando surge uma oportunidade.
— Desculpa — peço mais uma vez, depois de ele rir por falarmos sobre a
forma como Levi o abordou. — É sério, desculpa mesmo. Você não tem
noção do quão envergonhada fiquei. Depois me senti muito triste também,
porque não queria perder a sua amizade.
E põe completa confusão nisso, de uma forma que Cody Davenport jamais
poderia desconfiar.
Sou uma bruxa, meu cunhado é um vampiro, e tem o irmão dele, que é um
vampiro também, mas que queria me caçar recentemente, depois de ter
descoberto que eu estava viva, a última da linhagem de bruxas que
amaldiçoou tanto ele, quanto seu gêmeo.
E aí, quando foi ontem, nós transamos. E eu fiquei de quatro para ele.
Uma coisa bem simples e bem tranquila, que acontece na vida de qualquer
garota no auge dos seus vinte e poucos anos.
Só que não.
— Sabe, Gabriella, não acho que você está mentindo para mim — solta, do
nada, me trazendo para a realidade. — Acho que está mentindo para si
mesma.
Você pode não perceber, mas tem algo com aquele cara, sim. E inclusive, ele
está voltando agora, vindo até nós com um rosto muito, muito assassino. Eu
realmente disse que não quero mais drama na minha vida, e é verdade. Você
é uma garota legal, qualquer coisa que precisar, estou aqui, mas espero que
se resolvam.
Retorno para frente, e então, Cody está indo embora, virado para mim, só
para me dar tchau, depois sumindo com os outros alunos.
Será que ainda não entendeu que foi só sexo? Um único erro, e acabou?
Assim que para em minha frente, abre a boca para reclamar, no entanto eu
sou mais rápida, pisando duro.
— Não acredito que já veio bisbilhotar a minha vida — soo sem paciência,
como em todas as vezes que tenho que conviver com esse homem. — Será
que você não pode me deixar em paz nem por um segundo?
— Não, porque você é que nem criança, se a gente desvia a atenção, você já
está fazendo merda.
— Ah, pode saber sim. Posso listar. — Cruza os braços e dá um passo, sua
figura me engolindo. — Primeiro, aquela droga de bilhete deixado no quarto.
Foi para casa só para passar creme no cabelo, sério? Acha mesmo que sou
trouxa? Eu vi você, sabia que estava arrependida no segundo em que
acabamos.
— Certo, vou fingir que acredito nessa sua desculpinha. — Arrgh. Santo
Deus, como uma pessoa pode ser tão irritante? — E não foi só isso, bruxa.
Você mal saiu da minha cama e já estava atrás de outro cara?
— Era Cody, e você não tem nada a ver com o que eu faço ou deixo de fazer,
só porque transou comigo. Eu já transei com vários outros, já cometi vários
erros, você não é o primeiro, e nem será o último.
— Óbvio que não gosta, você sabe que ele me quer. — Dou um passo
também, o afrontando. — E se quer saber, acho que vou atrás dele. Vou atrás
porque, se não sabe, na consulta com a Sra. Moore, nossa vizinha, ela me
disse que eu ia encontrar um grande amor. Um amor que me consumiria, que
me arrepiaria, que seria inesquecível, e aposto que esse amor pode ser Cody.
Aposto que ele pode ter alguma coisa para me oferecer. Que ele pode ser
bom, calmo, que pode me tratar bem e que não vai ser um problemático no
futuro. Ele é claramente a escolha certa.
— Eu já disse, ele pode ser bom, mas ele não é o que você quer, Gabriella.
Cody não faz o seu tipo, muito menos será capaz de te tratar do jeito que eu
trato, como fiz naquela cama ontem. Você sabe que é a mim que seu corpo
quer e só está se negando tanto, por causa do passado, eu entendo. — Toca
em meu rosto, e, como sempre, não consigo afastá-lo. — O passado já não
importa mais. Você deixou de ser minha inimiga, deixou de ser a garota que
eu deveria odiar, e, sinceramente, é melhor assim. E se parasse de ser uma
covarde e me escutasse, iria entender que, talvez, só talvez, eu posso ter me
arrependido de ter passado anos
cego por raiva e vingança, quando deveria ter gastado esse tempo todo
procurando uma cura, uma forma de viver bem, porque de sofrimento, já
bastava o meu.
— Nesse caso, Levi... — interrompo a frase no meio, para morder o interior
da bochecha, os olhos marejados. — Só falar não vai apagar tudo o que você
fez.
Você pode estar falando aí, mas pode ser muito bem da boca para fora. Eu
não sei se pode ter mudado tão rápido, eu preciso de ações, preciso acreditar
e confiar primeiro.
Cada um tem seu modo de lidar com as coisas, não dá para comparar Luca
com o Levi. Nem todo mundo conseguiria ter a paciência e o discernimento
do seu irmão gêmeo ao ter sua vida roubada, muitos poderiam agir como
Levi, querendo vingança. Eu poderia muito bem ser desse tipo, poderia sim,
odiar a pessoa que me transformou num monstro com sede por sangue,
enquanto eu ainda era um bebê, no ventre da minha mãe.
E Levi também sofreu, dá para notar. Não tem como não notar.
talvez, só talvez, eu não fugisse mais. Nem eu, e tenho a mais absoluta
certeza, que nem o seu irmão também.
E eu estou tão cansada dessas brigas, dessa montanha-russa com Levi, que
não tenho nem forças para externar mais nada, acho que cada um já entendeu
o lado do outro.
E o que eu não quero, nesse momento, fala muito mais alto para mim.
— Sabe... — Respiro de forma densa, sabendo que tenho que falar pelo
menos essa última coisa importante. — Acho que a gente está desviando do
foco do que realmente interessa. Nós temos que derrotar Vladimir, Levi, ou
tanto eu quanto você morreremos, e isso aqui. — Aponto para nós dois,
depois de jogar meus livros para um braço só, com ar triste. — Não vai
existir nem da maneira que você quer, nem da maneira que eu quero.
Tento manter a postura de que o que acabou de me dizer, não foi capaz de
me abalar nem um pouquinho.
No entanto, foi.
— Você falar isso me mostra que tem gratidão para dar, é bonito.
— Tenho a faixada de bad boy e tentei sustentar isso por muito tempo, mas
não sou um monstro. Pelo menos, não quero mais ser um para você.
— Eu vou provar, vou te mostrar o que tanto quer. Vou fazer você confiar
em mim. — Assinto, olhando para baixo, porém Levi segura meu queixo
com os dedos em formato de pinça. — Me deixa te beijar de novo —
implora. — Só mais um.
Nego.
Não sei nem o motivo que me leva a falar isso, acabou de ser uma péssima
ideia, já que o vampiro faz questão de me puxar para um lugar em que
ficamos fora da vista de todos.
Me deixando mais uma vez sem reação, Levi pega os meus livros, coloca-os
no chão e vem para cima de mim, minhas costas colando automaticamente
na parede. Ele beija meu pescoço, põe minhas mãos acima da minha cabeça
e investe contra a minha boca, me apertando. Quando pede passagem, eu
cedo no mesmo segundo, nossas línguas se encontrando e duelando, como se
estivéssemos em uma batalha épica.
Ele sempre me deixa sem fôlego quando me beija assim, e minha mente,
como foguete, viaja rapidamente para o momento íntimo que tivemos ontem.
Sinto um raio atingir o meio entre as minhas pernas e, quando percebo, já
estou gemendo e chamando seu nome.
É a porra da atração fatal, da conexão que nunca senti com garoto nenhum.
— Eu tenho aula agora também — fala, assim que se afasta de mim. — Mas
não vou conseguir prestar atenção, não quando você gemeu assim para mim
e me deixou de pau duro. Se eu te fizer uma proposta agora, será que aceita?
— Qual?
— Só não me mate.
Estou prestes a negar, mas ele me beija de novo, e eu já não sei nem mais o
meu nome.
Eu sou um vampiro que gosta de festas.
Bebidas.
Na minha antiga rotina, não podia faltar sangue e mulheres, afinal, eram
como combustíveis.
A sorte é que ela topou mais uma aventura comigo, nos enfiando e nos
trancando no vestiário das líderes de torcida na primeira oportunidade em
que percebeu que não tinha ninguém.
Agora, nós estamos nos beijando, nos empurrando e nos batendo nos
armários, um não sabendo o que fazer primeiro com o outro, porque a
vontade é
tanta, o tesão é tanto, que ficamos afobados e queremos fazer tudo ao mesmo
tempo.
— Bruxinha, devagar com ela — zombo num fio de voz, quando a observo
se afastar da minha boca para começar a tirar a jaqueta do meu corpo,
relembrando implicitamente do que fez com uma na primeira vez em que
nos encontramos na cabana. A ajudo, deixando-a cair no chão, e quando
percebo que estou só com a camiseta, puxo-a pelo pescoço, ficando ainda
mais de pau duro, quando a vejo deslizar as írises ousadas pelo meu peitoral.
— E aí, gostando da vista? Tira uma foto.
Revira os olhos, daquele seu jeito impaciente, que só a deixa mais gostosa.
Mentirosa.
— Ah, é? E pra quem é que você vai dar a sua boceta agora?
— Boca suja.
— E a sua uma delícia, que não consigo ficar longe. — Puxo seu rosto de
volta para o meu, e, de novo, como provavelmente em todas as vezes em que
estivermos juntos, viramos um completo caos de apertos, chupadas,
mordidas, gemidos e roupas pelo caminho. Tocando meu peito e sendo a sua
vez de lamber o meu pescoço, ela desabotoa a minha calça sozinha, com
seus dedos trêmulos. —
Calma aí, bruxinha. Deixa que eu te ajudo.
Desço o zíper, desço a calça, que cai nos meus tornozelos, e também deslizo
a cueca, tirando tudo com a ajuda dos calcanhares. Essas roupas se juntam
no chão com todas as outras, e quando estou completamente nu, percebo que
Gabriella está de sutiã e calcinha.
Boa garota.
— Aposto que está bem molhadinha para mim. — Lambo os lábios, com
fome. É monstruoso. Essa garota alimenta meu lado monstro, e porra, pela
primeira vez parece que ele gosta, que ele aceita e não faz nenhum tipo de
objeção.
— Para...
— Não é para parar de me dar atenção, Levi, mas parar de jogar essas coisas
na minha cara. É a segunda vez que me entrego para você, dá perceber que
sou mentirosa e que não se confia nem mesmo no que eu digo.
Ergo meus lábios para cima, e, quando retorno para chupá-la, Gabriella me
empurra, me fazendo tropeçar e cair sentado no banco do meio do vestiário.
— Uma rapidinha?
Falando nele, com o mesmo sorriso malicioso, ela mesma o pega e, comigo a
firmando, segurando cada lado da sua bunda, direciona meu pau para a sua
entrada.
Vermelhos.
Ela não demonstra medo, não demonstra nem mesmo ficar assustada.
Parece gostar muito do que vê, parece que se sente impressionada, instigada.
Passo a língua pelas minhas presas e rosno para a garota, deixando-a me ver
por completo.
Acho que isso dá um impulso maior no seu tesão e na sua vontade de estar
fodendo comigo, porque começa a cavalgar mais rápido, subindo, descendo
e rebolando no processo, engolindo meu pau como uma gulosa.
— Morda, Levi. — A voz soa em meu cérebro, fazendo eco. Meu pau está
sendo esmagado pela sua boceta, e o meu organismo não pensa em outra
coisa a não ser prová-la, mesmo que um pouco. — Eu sei que você é um
vampiro amaldiçoado, não tem o poder de passar o vírus transformador.
Então me morda.
— Sou eu. — Olha de novo para o meu rosto. — Você não vai querer me
machucar.
Faço que sim e perco toda a minha linha de raciocínio, quando Gabriella
joga a cabeça para o lado, me dando total acesso ao seu pescoço.
Doce.
Viciante.
E é tudo meu.
No entanto, Gabriella grita quando sugo mais um pouco, o que me faz parar.
— Está doendo?
É apenas eu e ela.
Pouco tempo depois, gozamos juntos, suados, e a levo comigo para fazermos
um segundo round no banho, em uma das cabines.
— Com você, não há espaço para rapidinhas. Você tem que simplesmente ter
todas as horas do meu dia — declaro, arrancando um sorriso seu. Para mim,
já é o bastante. Já ganhei o dia. — E você vai ter, porque preciso te contar
algo.
— O quê?
— Não me pergunte como, mas entrei para o time de rugby. Estarei com
você nos ensaios e nos jogos.
— Não posso acreditar, Levi.
— Claro — afirmo, categórico. — E para que nenhum atleta pense que pode
mexer contigo, também.
Rugby.
Acredito que todo mundo saiba que é um esporte coletivo de intenso contato
físico. Eu, por exemplo, também estava ciente disso, no entanto, mesmo
sabendo, eu não fazia ideia do quão intenso poderia ser. Os garotos são
muito bem treinados, muito bem desenvolvidos, são monstros do esporte,
que não pensam
duas vezes em entrar em combate pela bola, e por mais que eu seja bem
melhor que eles, por causa do meu lado vampiro, ainda assim, fiquei
cansado.
E olha que por muitos dias fiquei no banco, esperando uma oportunidade de
me mostrar.
A sorte é que eu tinha Gabriella para me ajudar, já que toda vez que aparecia
no campo, aumentava em 100% minha vontade de ficar ligado, só para vê-la
rebolar com aquela mini saia e com aqueles pompons engraçados.
Semanas depois de treinos exaustivos e uma rotina firmada junto dela, Luca,
Evelyn e até mesmo Devon e Larkin, que as vezes sumiam para aprontar em
outras cidades perto, eu estava me considerando uma parte essencial do time.
Meu irmão não parecia mais desconfiado, e Evelyn, sua namorada, aos
poucos, abaixava a guarda. Eu também me sentia bem mais à vontade com
todos eles.
Às vezes, a bruxa ainda brigava comigo, ainda insistia que não éramos nada,
e, em outros momentos, estava calando a sua boca na minha. Nada tinha
mudado, ainda éramos nós.
Sol e lua.
A lua é Gabriella, que está com a cara fechada, fingindo ficar emburrada
com a amiga, quando lhe manda corrigir um passo da coreografia.
— Seu namorado, como em todas as vezes desde que veio transferido, está
assistindo um ensaio seu. Vocês vão se assumir quando, hein?
— Claro, e o seu cunhado sabe que você está fodendo com o irmão dele? —
Fricciono os lábios para não rir da ousadia de Savannah. Adoro essa garota.
—
Sinceramente, não tem mal nenhum, ele nem é da sua família e ainda por
cima é bonitão. Por qual motivo mentir?
— Nós estamos longe, garota, e eu ainda estou falando baixo. Não tem
como.
Eu sorrio de volta, mostrando que sei que ela sabe que estou ouvindo toda a
conversa.
E toda vez que ela fica nervosa em uma conversa, significa que, no fundo,
no fundo, concorda com o que está sendo dito e não quer externar.
Gabriella pensa que eu não sei, mas eu sei, e talvez deve estar me
escondendo, porque não quero voltar no assunto de me tornar humano.
Faço tudo em questão de uma hora e quando saio do vestiário, já está tudo
vazio. Sem os atletas, sem as animadoras, sem ninguém.
Vladimir.
Estou prestes a correr até lá, quando ouço outro som atrás de mim.
Já me preparo para entrar em ataque, porém me viro e vejo Savannah.
Olho para os lados, tentando encontrá-lo. Minha cabeça roda com tanta
procura.
É da própria Savannah, que não tem nem tempo de completar a sua frase
porque, por trás, Vladimir tapa a sua boca e fixa os olhos completamente
negros em seu pescoço, eu penso que vai mordê-la, transformá-la, porém,
contrariando a todas as possibilidades, ele usa suas garras para machucá-la,
cravando fundo em seu pescoço. Seu sangue esguicha para todos os lados.
Me levanto, com tanta raiva, que não vejo nada, só ódio, chamas invisíveis
percorrendo todo meu corpo. Eu grito novamente e corro, rápido, o pegando
pelo pescoço também.
Nós dois rolamos juntos na grama.
Não dá para negar o quão forte é, não dá para negar que pode muito bem me
matar, entretanto, tenho certeza que não quer isso, que não pode, justamente
por causa do sacrifício.
Parece que estou pegando fogo, e quando olho para uma das minhas mãos, é
isso mesmo que acontece.
Não sei o que está acontecendo, mas é como se eu precisasse disso, porque,
ao ver o que está acontecendo e o que posso fazer, Vladimir dá um passo
para trás, e posso ver um breve medo cintilar nos seus olhos.
Psicopata do caralho!
Era isso que as pessoas sentiam quando me viam? Quando sabiam sobre o
que eu era capaz de fazer?
Acho que consigo entender ainda melhor a forma horrenda como Gabriella
se sente suja comigo. É como se só agora, a minha ficha caísse
completamente.
Trago seu corpo para o meu colo, ficando desesperado quando noto seu rosto
sem cor, seus olhos fechados, e seu pescoço à mostra, em carne viva.
Ela está desmaiada, fraca, praticamente sem vida, já que aquele filho da puta
drenou quase todo o seu sangue.
Não posso.
Parar?
Aquela sensação que parece que sua alma sai do corpo, e você se torna um
mero telespectador da sua vida?
Pois bem, foi exatamente assim que me senti quando Evelyn me procurou,
depois de Luca ter ligado para ela. Minha irmã estava em desespero e
quando ela me disse o que tinha acontecido à Savannah, eu não consegui
reagir durante cinco minutos.
Não sei muito bem como cheguei até aqui, provavelmente sendo arrastada
pela minha irmã.
E se antes eu achava horrível o que podia ter acontecido com ela, se antes eu
não conseguia ter reação nenhuma, só sabendo que Summers tinha sido
atacada, agora, a vendo nesse estado, é aí que não consigo fazer nada
mesmo.
Minha amiga está desacordada no sofá do Luca, foi trazida por Levi até aqui,
depois de Vladimir ter a machucado para deixar o seu recado. Está pálida,
com o
Desfalecida.
E tenho certeza que as pessoas, tão desesperadas quanto eu, passam por
mim, falam comigo, esperam que eu faça algo. Alguma coisa, pelo menos.
Nem que seja chorar. Nem que seja gritar. Nem que seja ver o que Luca e
Levi estão planejando fazer com ela para salvá-la.
Ouvir a voz dele me traz de volta à realidade, pelo menos um pouco. E eu sei
que ele também parece desesperado, tão atordoado quanto eu, afinal, foi ele
quem viu tudo. Ele quem viu Vladimir chegar e ele quem viu Savannah ser
machucada. —
É quando ele diz isso, que me forço a sair da janela para, com cautela, me
aproximar.
Fico ainda mais baqueada quando olho para ele e percebo que seu estado é
ainda mais caótico do que pensava. Seus olhos estão com bolsas arroxeadas,
o cabelo uma completa bagunça, as roupas rasgadas, e um semblante que dá
para ver, pelo menos eu, que está se sentindo perdido, impotente, angustiado,
nervoso e principalmente, assombrado.
Ele olha para Savannah e parece tremer. Parece ficar exatamente do mesmo
jeito de quando está mal, tendo suas crises.
E se ele…
— Luca, nós temos que dar nosso sangue a ela — avisa, ficando de joelhos
na frente do sofá. Apesar de falar isso para o irmão, que também se mobiliza
e fica ao lado dele, Levi é o primeiro a pôr as presas para fora e morder seu
pulso, deixando que sangue comece a vazar. Com cuidado, levanta a cabeça
dela e a faz beber. — Isso, bebe. Vai cicatrizar. Ela vai ficar bem, ela vai
ficar bem — repete, e parece que é muito mais para si, do que para nós.
Não consigo parar de pensar que Levi não está bem, porque é o que percebo.
Ele não está nem um pouco bem. O que acabou de acontecer, lhe afetou de
uma forma muito, muito significativa.
Será que Vladimir disse algo? Ou Vladimir fez algo com ele e não quer
falar?
Me agacho também no chão, ficando ao seu lado. Intercalo meu olhar entre
ele e Savannah.
O pavor.
Sei que ela estava no lugar errado e na hora errada, mas eu não conseguiria.
— Foi por isso que deixou Savannah com a opção de ficar viva, não a
matando de fato — Luca menciona. — Na hora que ela apareceu, foi a
oportunidade perfeita que encontrou para nos assustar e chamar nossa
atenção. O
— Você, nem pense em fazer besteira — Levi me repreende, tão sério, que
faz o silêncio esmagador se instaurar sobre todos nós. Certeza que Luca e
Evelyn estranham o tom de voz que usa comigo, porém não falam nada,
apenas se olham.
— Aquele homem é forte, poderoso. Por favor, por tudo que é mais sagrado,
bruxa, eu te imploro, não faça nenhuma besteira, não coloque sua vida em
risco.
Se ele fizer qualquer coisa com você, parecida com o que fez com a
Savannah, eu… — Arfa, bagunça os fios do seu cabelo e se levanta num
ímpeto, assustando a todos nós. — Ah, porra, acho que não posso mais
esconder. Não, não posso.
Ele olha para mim, e meu coração se despedaça diante do seu estado.
Morde os lábios, sem olhar para nenhum de nós, não conseguindo. — Foi
como se eu tivesse tomado um choque. Foi como se eu tivesse sido colocado
na realidade, na minha realidade. Olhei para Vladimir e, por um segundo, vi
que muitos poderiam me ver daquela forma. Odiei, detestei. Me senti e
continuo me sentindo péssimo. — Cruza os braços, indefeso. — E eu…
queria o colar, o feitiço, para levar uma vida como a do Levi. É Inveja? Não.
Juro por tudo que não é. É
— Ele é generoso mesmo. — O ajudo, porque não posso ficar calada. Ando
até onde estão Luca e Levi. — Ele… me alcançou. Insistiu para que eu visse
seu outro lado. De uma forma totalmente errônea, nós nos conectamos, e
desculpa se escondemos isso de vocês, mas é que passamos muito tempo
escondendo isso de nós mesmos. Ou melhor, eu escondendo isso de mim
mesma. Mas estou aqui para dizer que sou a prova viva de que Levi Vodrak
não é mais o mesmo. Eu pedi para que ele me provasse, e, sem perceber, está
fazendo isso. Fez muito antes e está fazendo agora, quando trouxe Savannah,
quando se importou com a vida da minha amiga e ficou tão abalado, mas tão
abalado, que resolveu se abrir. — Enxugo o canto dos olhos, rindo para
despistar as lágrimas. — Levi se abriu da mesma maneira comigo também.
Acho que, no fundo, ele sempre quis isso e nunca conseguiu pedir. Ele
queria um abraço do irmão, um ombro amigo para desmoronar, e pessoas
que o apoiassem.
tão, tão mal por tudo que fiz. Pelos seus pais. Pela sua família. Pelo dia em
que sequestrei Evelyn e, por pouco, não a matei também. Me sinto mal por
tudo. Por favor, acreditem em mim. — Choraminga.
Antes mesmo de terminar sua frase, Savannah geme do sofá, se senta e toca
no seu pescoço.
— Vamos ter que fazê-la esquecer. — Luca olha o seu gêmeo. — Ela não
pode conviver com isso.
Ninguém quer cruzar sua vida com vampiros assim, do nada. Vamos libertá-
la.
Enquanto eles falam com ela, a capitã das líderes de torcida vai, aos poucos,
se acalmando, em transe.
— Não sei como me sinto ainda em relação a ele, Levi, mas estou feliz que
eles finalmente conversaram e estarão agora cada vez mais perto de se
entenderem.
Sim.
De nadinha.
Estava mesmo desesperada e ainda estou, é verdade, mas agora nada mais
importa, já que ela está bem, viva, saudável e sentada aqui conosco.
Já a abracei várias vezes, entretanto acho que ainda não é suficiente. Quero
abraçá-la bem mais.
— Levi que encontrou você — eu conto, porque não deixa de ser verdade.
— Obrigada, Levi — ela o agradece mais uma vez. — Acho que não ingeri
proteínas o suficiente para me deixar forte, então posso ter desmaiado por
isso.
— Ai, meu Deus, isso soo tão mal. Não é porque eu quero dar em cima do
seu boy não, Sutton. É porque realmente estou me sentindo importante, o
cara é popular, é capitão do time de hóquei.
— E a capitã das líderes de torcida sabe que eu só tenho olhos para a minha
nerd.
Mais uma vez, rimos, e Luca vai atrás de abraçar a sua namorada, um clima
muito mais leve se instaurando entre nós.
Óbvio, ainda está tudo muito recente e tenso, porém dá para sentir que, aos
poucos, podemos voltar ao eixo.
— Ei, vamos parando — tento fingir autonomia. — Não quero falar sobre a
minha vida pessoal com nenhum de vocês. Me deixem em paz.
Savannah se levanta.
— Ai, Gabriella, você não engana ninguém. Mas se quer minha permissão,
pode ficar tranquila, que eu aprovo. — Ri e manda beijos no ar. — Agora
falando sério, preciso ir para casa. Muito obrigada pela ajuda, pelo jantar e
pela conversa.
Pisco para ela quando me olha, e ainda atrás de mim, Levi limpa a garganta.
— Vem, Savannah, eu te dou uma carona até em casa. Não é bom você ir
caminhando, pode ser perigoso.
Luca fica em alerta, eu também.
Uau.
Eu sorrio de volta.
Porém, no instante em que saem por aquela porta, todo o clima sai junto
deles.
O silêncio sepulcral em que Luca, eu e Evelyn nos enfiamos, faz até mesmo
a minha alma se arrepiar.
— Ela está segura — menciona, falando de Savannah. Vou mais para o lado,
para lhe dar mais espaço para sentar aqui comigo, nas escadas. — E vai ficar
bem também. Vladimir, na cabeça dele, não vai querer perder tempo com
ela, vai querer perder tempo com... bem, eu, você e Luca. Aqueles que
mantêm o feitiço vivo.
Talvez possa ser tarde demais para ele, para nós. Precisava deixar claro.
Precisava fazer com que vocês soubessem.
— E conseguiu. — Aperto suas mãos de volta e aposto que pode ver meus
olhos brilhando. — Você, hoje, e em outras vezes também, conseguiu me
mostrar o que tanto pedi. Parou de falar e começou a agir, começou a
demonstrar. E eu sei, eu sinto no meu coração, que é a mais pura verdade.
— Você ter fé em mim, já é o que me motiva, bruxa. Vai dar tudo certo para
nós.
Ela está tão linda, parece querer nos iluminar, nos mostrar um caminho.
— Obrigado, Gabriella. Por ter me ajudado quando eu mais precisei e por ter
me apoiado mais cedo. Obrigado mesmo. Por tudo.
— Eu quem agradeço.
Espiando pela janela, observo que ainda fica um tempo parado, observando
o céu, como se estivesse fazendo um pedido.
No entanto, quando minhas írises passeiam sem querer pelo chão, eu vejo.
Procurei esse negócio por todos os lugares, verifiquei esse diário de cabeça
para baixo, para ver se Zena tinha escrito algo, porém nada encontrava. E
claro, ele não estava escrito, estava escondido esse tempo todo, bem na
minha cara.
Minha mãe, de fato, o guardou para mim, era como se soubesse que eu fosse
mesmo precisar.
Não disse nada a nenhum deles, porque não queria que achassem que eu
estava os pressionando só para livrar a minha bunda.
Levi com a Harley na frente, Luca com o carro atrás, porque os gêmeos são,
obviamente, preocupados com as garotas da família Faulkner.
Levi freia bruscamente com a sua moto, parando-a em uma rua não muito
movimentada de Emerald Grave, Luca logo atrás, e quando vou ver o que
está
Vladimir.
Luca pula para fora do carro, que dá ré e sai correndo pela pista.
Foi Evelyn, e tenho certeza que, mesmo desesperada e odiando a ideia, teve
que sair daqui depois do seu namorado provavelmente passar o recado de
que não a queria no meio dessa briga de vampiros x bruxas.
E eu sou uma bruxa, uma que está diante de outra bruxa, uma mais velha e
que pode muito bem ser muito mais estudada e forte que eu.
Fora que Vladimir trouxe uns dez vampiros, e no meu time só tem quatro.
A situação está meio injusta e desfavorável aqui, mas ninguém, ninguém vai
recuar.
— Luca, ele trouxe sua equipe de cachorrinhos, o todo Vladimir Vampir não
se garante sozinho — mesmo nessa situação, Levi ainda encontra forças para
debochar. Mas essa é sua arma, não? Sorrisos perversos e palavras que
gotejam veneno são suas maiores aliadas na arte da desestabilização. — Para
mim, não muda porra nenhuma. Estou morrendo de ódio, queimando por
dentro. Se vocês vierem, vão levar.
Vladimir ri, e como se fosse ensaiado, todos os outros dão risada também.
Isso também infla minha raiva, meu ódio, minha vontade de lutar.
você não pode nem fugir, minha amiga Alicia aqui, colocou uma proteção
nessa rua, tipo uma redoma. Nenhum vampiro ou bruxa pode escapar mais.
— Se está pensando que vai fazer qualquer coisa com a gente, está muito
enganado. Você pode até ter uma bruxa ao seu lado, mas nós também temos
uma
— Luca tenta manter o controle da sua voz, não querendo perder a razão,
porém dá para perceber que está tão possesso quanto nós. — E ela é forte,
muito forte.
— Mas é uma iniciante, não é como Alicia — Vladimir diz, muito ciente do
que fala. Não é como se estivesse blefando, é como se tivesse certeza
absoluta de que tudo sairá como planejou. — E Alicia vai me ajudar a
prender vocês agora mesmo. Pode ir, Alicia.
A tal bruxa vem até nós, pisando duro, confiante, e eu troco um olhar com os
meninos. É em questão de segundos que isso acontece, porque já corremos
até ela, mas caímos no chão no mesmo instante. Minha cabeça dói, a vista se
torna turva, e começo a gritar, entretanto não sei se é pela dor que estou
sentindo ou se é por ver os corpos de Luca, Levi, Devon e Larkin no chão.
Corpos.
Dos meninos ao longe.
De Luca e Levi.
Eu no meio.
Gritando.
E não acredito que Alicia está conseguindo entrar na minha cabeça, não
estou conseguindo acreditar que está me pegando à força, com outros
vampiros me puxando para cima, prendendo os meus braços e me jogando
de volta no chão.
— Que porra você fez? — Em meio às lágrimas, eu grito mais forte. Para
Alicia. Para os outros. Para Vladimir. Ele está parado, de braços cruzados,
observando tudo como se fosse o rei, e o restante seus servos em serviço. —
Que porra você fez com eles? Você os... matou? — A pergunta sai como
outro grito esganiçado, doloroso.
Não.
Não pode ter sido tão rápido assim, que nem nos deu tempo para pensar.
Eu ficaria devastada.
Porque porra, ali está Levi, e ele tem que acordar. Ele tem que levantar e me
encontrar para lutarmos juntos, foi isso o que me prometeu, e o que tínhamos
combinado. Ele precisa vir gritar comigo, precisa vir me chamar de
bruxinha, precisa me abraçar, segurar as minhas mãos e dizer que vai ficar
tudo bem.
Ele tem que me escutar, tem que me ouvir dizer em que pé nós estamos.
E Luca é meu amigo, ele precisa se casar com a minha irmã, precisa fazê-la
feliz pelo resto da vida.
E os dois, Luca e Levi, precisam de mais tempo juntos. Eles precisam viver
tudo o que nunca viveram, tudo o que fizeram questão de perder de forma
egoísta.
Não sei como uma bruxa pode ter se sujeitado a uma situação dessas,
querendo se tornar marionete na mão de um vampiro que só quer se
beneficiar, porém, se não está sendo chantageada, se é tão má quanto ele,
precisa pagar também.
Só começo a me debater, quando vejo Alicia fazer uma roda com sal grosso,
chamas aparecendo na mesma hora. Um vampiro se aproxima dela num
instante em que ela para, lhe entregando uma espécie de cálice dourado, o
qual observa e verifica se tem algo dentro.
— Seu sangue, junto ao de Luca e Levi, vai ficar aqui, depois que eu
dissecar você, a peça mais importante desse feitiço, já que o seu sangue será
usado como cura — explica, como se eu quisesse saber. A mulher de cabelos
escuros e olhos cinzentos me olha, e é estranho. É um olhar muito, muito
intenso. Parece querer olhar para além de mim. — E aí, ele entrará no corpo
de Vladimir, fazendo-o voltar à vida. É melhor não tentar nenhuma gracinha.
Se tentar fazer algum feitiço contra mim ou contra qualquer pessoa aqui,
pode acabar dando muito, muito errado — dá ênfase, não desgrudando suas
írises das minhas nem por um segundo. — Só observe, mocinha, porque a
mágica de verdade começa já, já.
Alicia me parece... não sei. Só sei que tem algo diferente nela, algo estranho.
Acho que consigo sentir essa coisa de bruxa para bruxa. As suas energias
irradiam dela para mim.
Estão os matando.
— Não sei o que está acontecendo — Alicia fala rápido, parecendo surpresa
também. — O feitiço foi feito, eles que estão conseguindo reagir. E eu não
sei como, sério. Juro que não sei como.
— Tô tentando!
— Sua imprestável, eu bem que não deveria ter confiado essa missão a você.
E sai, querendo pegar Luca e Levi que, a essa altura, junto de Devon e
Larkin, já estão derrotando os dois últimos vampiros, que caem no chão, sem
cabeças, essas sendo roladas para vários lados, inclusive para o meu. Vejo os
olhos, a expressão assustada, o rosto todo roxo, e na hora que sinto o cheiro
pútrido que emana deles, quase gorfo com o nojo e a vontade de vomitar que
me sobe pela garganta.
— Ei, Vladimir — Alicia chama, com um certo deboche e sorriso nos lábios.
— Acha que eu, uma bruxa, me sujeitaria a ficar com você, se eu não
quisesse nada em troca? — O choque me pega, e é agora que tudo faz
sentido. A paixão que diziam que Vladimir estava tendo, é verdade, e é ela.
Alicia. — Acha que eu acreditei no seu papo torto de que tinha se
apaixonado e queria a humanidade para ficar comigo para o resto da vida?
Me poupe, eu sabia que você só queria parar de se sentir tão castigado,
porque era e ainda é extremamente difícil para você, saber que ficou assim
por causa da sua ex-mulher, Thereza. E
naquele dia mesmo, quando você se aproximou de mim no bar, eu sabia que
estava interessado no feitiço que eu poderia proporcionar a você. No
começo, fiquei com nojo, queria te colocar para correr, mas depois, quando
percebi que queria fazer mal a mais uma bruxa, não bastando ter acabado
com a vida de Thereza, tive que
aguentar a tortura de fingir te amar, só para fazer parte de todo esse plano e
acabar com você, por vingança a todo mal e todo sofrimento que causou a
infinitas mulheres.
— Sua...
— Não, espera. — Alicia estala a língua no céu da boca, gostando da mágica
de verdade, como disse que faria. — Você vai ter o que você quer, e vai ser a
morte. Mas primeiro, você vai dormir e vai experimentar o feitiço completo,
aquele que não joguei nesses meninos.
Vladimir voa para acabar com Alicia, entretanto, num piscar de olhos, já está
no chão, parecendo morto, depois da bruxa ter levantado a mão e o parado
com a sua mente poderosa.
— Eu também.
— Levi...
— Eu sabia que eles iam ter uma história — Larkin também fala, e seus
olhos claros parecem emocionados. — Gabriella acabou de tirar toda a pose
de bad boy do nosso amigo, Devon, mas é lindo.
— E eu quero ficar com o meu irmão, meu gêmeo — Luca se direciona para
o lado de Levi. — Eu quero que possamos aproveitar uma vida inteira
juntos.
Ela nos chama para o meio do círculo e coloca tanto Levi quanto Luca para
ficarem de joelhos. Meu coração vai nas alturas, Alicia pega o cálice de
novo e vai até Vladimir, se ajoelhando. Após tirar uma pequena faca afiada
da sua jaqueta, ela pega o braço do vampiro, faz um corte profundo em seu
pulso e o deixa pingar um bom tempo no cálice.
— Luca e Levi vão desmaiar, vão parecer que estão mortos, e nós vamos
ficar aqui, fazendo o feitiço e controlando o véu da vida e da morte, não o
deixando cair, até passarem pela transição. O sangue vai ficar rodando no
cálice, para representar o sangue da cura chegando até eles, e quando isso
acontecer, Vladimir Vampir desaparece de vez, acaba a maldição, e eles
voltam a viver, como se Alma Salazar nunca tivesse passado pelo caminho
deles.
Assinto mais uma vez e olho para Levi, quando vejo que já está pronto, bem
como Luca, eu volto a fitar Alicia, respirando fundo e dizendo a mim
mesma: se acalme, Evelyn, querida irmã, estou levando, em breve, seu
homem de volta para você.
Como Levi, que irá deixar tudo para trás e viver comigo. Simplesmente não
tem prova maior da sua mudança, do que essa.
— Preparada?
— Preparada.
— Então repita comigo. — Aperta as minhas mãos e fecha os olhos. Eu
fecho também, relembrando todo o feitiço que decorei, desde que o
encontrei em meu diário. — Sanguis naturae vis est. Aeris fortitudo. Hic, in
hoc spatio et tempore, sanguis commutabitur.
A bravura do ar.
— Sanguis naturae vis est. Aeris fortitudo. Hic, in hoc spatio et tempore,
sanguis commutabitur — repito como Alicia, canalizando nossas forças de
bruxa para o sangue se misturar, e o véu da vida e da morte não ser puxado
para baixo.
Meu coração se aperta, com medo, mas Alicia não me deixa desistir.
Sinto a sua energia vir para a minha, a minha energia ir para sua e consigo,
na minha mente, ver o fio da vida de Levi e Luca novamente se juntando,
como se estivessem se tornando um só outra vez, como gêmeos da mesma
placenta.
— Sanguis naturae vis est. Aeris fortitudo. Hic, in hoc spatio et tempore,
sanguis commutabitur — falamos juntas, o que acredito ser a última vez.
— Ai, meu Deus — digo, sem acreditar que realmente deu certo. — Como
vocês estão se sentindo? Está tudo bem?
— Vivos.
Assim que chegamos na casa dos Vodrak, Evelyn, que estava na varanda
toda aflita, corre para nos ver.
Eu disse correr?
Correr é muito pouco, a minha irmã praticamente voa em nossa direção, sem
saber o que faz primeiro, se me abraça, se chora mais por estarmos todos
vivos ou se fica preocupada por Luca estar andando apoiado em Larkin,
enquanto Levi se apoia em Devon.
— Evie, calma. Respira — eu peço, tocando em seu rosto. — Está tudo bem,
está tudo mais do que bem. Nós acabamos com Vladimir, ele morreu. E
acabamos com a maldição também.
— Vladimir estava com uma bruxa, ela que nos desarmou completamente e
fez um feitiço para que ficássemos apagados. Mas então, cerca de poucos
minutos depois, nós acordamos, eu, Devon, Larkin e Levi, e matamos todos
aqueles outros vampiros. Foi exatamente nesse momento, que a bruxa se
revelou, fazendo Vladimir e todos nós entendermos que ela estava ali para
nos ajudar, e não a ele. A bruxa era irmã de uma amiga de Levi, então
apagou Vladimir e, junto de Gabriella, quebrou a maldição.
Somos humanos. Nossos corações agora batem, e ele, agora vivo, bate ainda
mais por você.
— Meu Deus, Luca. — Abraça o seu amado, e ele, mesmo com dor, porque
agora é capaz de sentir, fica calado, não mostra, apenas a abraça de volta. —
Eu nunca quis te dizer, mas eu morria de medo do tipo de para sempre que
tínhamos.
— Você nunca mais vai precisar se preocupar com isso, meu amor. Nunca
mais. Agora podemos refazer todos os nossos planos e ter a nossa família.
— Sim, sim, sim. — O sorriso da minha irmã passa a crescer copiosamente
no rosto. No entanto, mesmo querendo dar atenção para o seu namorado, ela
se vira para Levi e, surpreendendo a ele e a todo mundo, o abraça também.
—
Obrigada, Levi. Sei que se você não quisesse se tornar humano, nada disso
aconteceria. Obrigada por... nos escolher, por proporcionar esse tipo de
felicidade a mim e ao seu irmão.
Meio sem jeito e impactado, Levi fica alguns segundos sem tocá-la, sem
abraçar de volta, com os olhos meio arregalados e molhados, porém é apenas
por pouco tempo, porque suspira e a abraça, tão profundamente e
verdadeiramente, que sinto meu coração bater mais rápido no peito.
Ela também.
E tenho certeza que esse momento acaba sendo muito importante para os
dois.
— Tudo bem, Evelyn, já chega, fique com o seu Vodrak, que eu fico com o
meu — brinco, e quando ela se afasta, com a boca entreaberta em um O
perfeito, eu já corro, para, com cuidado, abraçá-lo de lado. — É, pois é, não
fique surpresa, ele meio que se declarou na frente de todo mundo de novo e
agora é totalmente meu, não vou mais fugir. Pronto, falei.
— Não sei de onde você tira que estou surpresa, estava todo mundo
esperando por isso, você que foi a tonta esse tempo todo.
Meu cunhado avisa, assim que começamos a andar para dentro da casa, se
apoiando agora em Evelyn.
Estar com seus lábios nos meus é como alcançar o paraíso, e acho que nunca
vou me cansar dessa sensação.
E minha nossa, nem consigo acreditar que tudo acabou, que não há mais
brigas, que não há mais ameaças, que não há mais vampiros do mal
querendo acabar com as nossas vidas.
Parece um sonho.
Deito em seu peito, só para ouvir seu coração, só para ter certeza se é mesmo
real ou se estou sonhando, em um mundo utópico.
— Completamente.
— Completamente.
— Você é a minha pedra, Gabriella. Esse tempo todo, foi você que me curou,
e foi por isso que não insisti mais no assunto de feitiço. Porque você, para
mim, era o feitiço. Seu sangue, definitivamente, foi a minha cura.
— E por mais que eu detestasse pensar, você, a todo tempo, foi a visão da
Sra. Moore. Você é o meu amor cheio de fascínio, de fogo, aquele amor que
me consome, que me enlouquece, que é tão intenso que nem parece real. —
Mordo um sorriso, sem poder acreditar que, depois de tudo, essa é a nossa
realidade, o nosso destino. — Você chegou e mudou tudo. Tudo.
— Jura?
— Juro, eu não menti. Agora que tenho uma nova oportunidade, vou passar
o resto da minha vida, empenhado em me redimir com todas as pessoas que,
de alguma forma, magoei ou machuquei. — Assinto, sabendo que ele
também precisa disso para se libertar. — Mas no momento, eu só quero ficar
abraçado com você.
Os irmãos Vodrak com as irmãs Faulkner, tudo tão perfeito, que parece ter
sido milimetricamente calculado pelo destino.
— Sim, seria tipo um New Adult — Evelyn, que é a fanática por livros, não
deixa de comentar. — Aqueles com atletas na universidade, no auge do
sucesso e popularidade. O pessoal ia amar.
— Não entendi nada, mas concordo — Levi diz e faz todo mundo dar risada
com a sua espontaneidade de sempre. — Só preciso acrescentar uma coisa.
Sabem o que nunca mudaria?
— O fato de que somos família. Nós sempre estaremos ligados, nessa vida,
em outra, na realidade ou na ficção.
— Sim, sempre.
Na universidade.
Completamente.
E eu o odeio.
O odeio muito.
E foi esse amor mesmo que me tornou tudo que sou hoje, tudo aquilo que
um dia imaginei que nunca fosse conseguir. Por causa de todo meu corpo
consumido, por causa de toda paixão e de todas as aventuras que viemos
colecionando ao longo desses anos em que estamos juntos, eu posso afirmar
categoricamente que entendo o que Damon disse à Elena em The Vampire
Diaries.
Entendo, principalmente, aquele amor intenso que ele sentia por ela.
Antes, meu mundo era obscuro, sombrio, cheio de dor, e aí, quando ela
apareceu e me estendeu a mão, foi a minha luz, o meu feitiço, a minha
pedra, o meu porto seguro.
Ela me quis na minha pior fase, acreditou em mim e hoje desfruta de tudo o
que aprendi, e de tudo que colhemos juntos, porque, se ser vampiro já é
difícil, ser um humano também não é nada fácil, e é por isso que também
preciso dizer que ainda brigamos, que ainda discordamos em muitos
aspectos, que fazemos coisas erradas, que acertamos, que erramos, mas que,
sobretudo, nunca perdemos a fé um no outro.
Gabriella permanece ao meu lado, mesmo quando digo que não quero ir ao
médico fazer exames periodicamente, para saber como está a minha saúde.
Quando peço para usar algum dos seus feitiços, mesmo quando diz que não
quer ficar usando dos seus poderes para coisas levianas.
E ela ficou ao meu lado todas as vezes em que tive dificuldade e não soube
agir como um humano.
Porque, mesmo você se misturando em meio a eles por anos, uma coisa é
você fingir ser um, e outra coisa é você ser um.
Hoje em dia, posso afirmar com todas as letras que, assim como Devon
Mars e Larkin River, Luca Vodrak é o meu melhor amigo. É nele em quem
eu confio de olhos fechados e por quem sou capaz de fazer qualquer coisa,
não importa onde ou com quem.
E ainda tem a minha cunhada, a Evelyn Sutton, que não posso deixar de
mencionar como uma das melhores coisas que ganhei durante os últimos
anos, pois, além de ser uma amiga incrível e para todas as horas, ela
também está prestes a dar à luz ao meu primeiro sobrinho.
Ou melhor, sobrinha.
E eu, apesar de ter adorado o rugby, não segui carreira profissional, mas me
tornei treinador de garotinhos, em uma escola infantil próxima da nossa
casa.
Sim, aquela de Luca, que hoje em dia é minha, depois de eu tê-la comprado.
Falando na casa, agora ela está toda decorada, em festa, já que tanto eu
quanto Luca iremos nos fundos, no jardim.
Mas é, mesmo depois de todos esses anos, ele ainda continua o mesmo.
Calmo, bondoso e com um espírito tão jovem e tão livre quanto o meu.
As pessoas que conhecemos dizem que ficamos ainda mais parecidos com o
tempo, e por mais que antes eu não gostasse de afirmar isso, hoje eu posso
ver que é verdade.
Cerimônia.
— Olá, irmão. — Sorrio e aponto para o meu pescoço. — Tem como fazer
o nó em mim?
Dito isso, queria agradecer primeiramente ao sucesso que foi com Luca e
Evelyn, no lançamento de Meu Jogador é um Vampiro. Eu realmente nunca
imaginei que eles dois fossem alcançar tantas pessoas, e todo carinho que
recebi foi surreal. Esse livro aqui, do Levi, é totalmente dedicado a vocês,
que me pediram sem parar pela continuação.
Obrigada, pai, que está no céu sendo a estrelinha que me guia e não me
deixa nunca desistir. Nos momentos mais difíceis, eu olho para aquela nossa
foto que fica na minha escrivaninha de trabalho, lembro do seu sorriso, do
seu constante apoio e tudo passa. Tenho certeza que é a minha
Obrigada, mãe, por ser a melhor pessoa que eu conheço. Você é a pessoa que
mais me inspira e, pode ter certeza, que se não fosse por você e por suas
ideias geniais, muito dos meus personagens nem existiriam. Pois é, leitores,
já podem agradecer à minha mãe, Luciana, porque ela é demais.
Falando neles, Levi, Luca, OBRIGADA por terem aparecido na minha vida
e mudado muita coisa para mim. Vocês serão para sempre lembrados.
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