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t n o s.
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 (ROMANCE)

• •
CEARA'

Typ. Moderna a vapor - Ateliers Louls

J
71, RUA' FORMOSA, 71
• J
1902 .
•

••
 ~. cJlaria ®ug,cnia ttos, ~anto~

• •

••
 CARTÃO DE VISITA

Não pense o leitor benevolo que vai

r diante dos olhos um romance de sce-
s apparatosas, cheio de peri pecias erno- .
nantes e de lances extraordinarios.
E' uma historia singela de duas crea-
ras que se a maram com pureza; e as
aes o destino torturou acerbamente an-
s de dar-lhes a felicidade almejada
A maior parte da acção desenrola-se
campo, n'urn pequenino povoado, em
na existencia matuta, por entre a har-
nia dos. ninhos, traduziria pelos gor-
eios das aves festivas
Trescalla a narração o aroma das flores
estes, é um innocente idyllio que pode
r comprehendido pelo olhar mais casto.
 II
Não está filiado á escola alguma dos
grandes Mestres; os seus personagens exis-
tem, e a côrverdadeira que apresentam é o
me rito unico da obra extI'emamente sin-
gela.
Relevem os innumeros defeitos, a sim-
plicidade rustica da forma, a pobreza de
colorido, devida talvez ao meio excessiva-
mente burguez em que se deslisou a vida
da-Divorciada.
A autora.
I
SOL avisinhava-se do occaso.
A impressão suggestiva do crepus-
.de uma bella tarde de Maio vibrava do-
nte' nos espíritos mais crentes, fazendo-
ensar por instantes nas cousas do céo.
Alegremente o sino da capellinha branca
situada em uma pequena elevação domi-
o povoado, chamava os devotos aos
cicios do mez mariano.
entia-se um cheiro agradavel de mange-
S e boninas levados em bouquets pelas
rigas mais bellas do logar, e meninas em
o. cantarolavam baixinho os versos que
m de responder por occasião da no-
a.
dos os semblantes apresentavam signaes
tisfação e ao chegarem ao adro da egreja
uma verdadeira festa. Quando se appro-
 10 F. CLOTILDE
ximára O moço encarregado de exercer as
funcções de celebrante e que era um dos mais
guapos mancebos do povoado, de rosto sym-
pathico, olhar expressivo, sorriso insinuante,
a alegria augrnentava, e mais de um rosto
de devota se denunciava coberto de um ruo
bõr mysterioso ao corresponderern a saud a-
ção feita com aquelle bom modo que mos-
tra o homem superior, mesmo sob a appa-
rencia rustica do filho do campo.
Era muito estimado o Chiquinho, já pelas
excellentes qualidades que o collocavam em
esphera superior a elos outros seus conterra-
neos, já pela influencia política de seu pai,
homem de rija tempera e que, embóra de ge-
nio violento e sujeito a explosões bem intern-
pestivas, era de uma rectidão de caracter a-
toda a prova. Alem disso o Chiquinho tinha
alguns conhecimentos bebidos na leitura con-
stante de livros que lhe emprestava o vigario,
que o nomeára procurador da capella e que
.nelle depositava a maior confiança.
D'ahi o chamarem-no para todas as festas.
Si havia um terço de promessa levavam-
no quasi processionalmente para tiral-o, si
um pobre agonisava n'um grabáto miserável I
em mansarda escura, lá ia o rapaz, e era con-
A DIVORCIADA 11
Iador vêl-o, tão cheio de vida, os bellos tra-
traduzindo a dôr de vôr soffrer um se-
Ihante, a recitar as orações ria hora su-
a. Os pobres adoravam-no, e raro era o
1 desprotegido da fortuna que não o es.
hía para padrinho dos filhos.
Para as moças era um - Santo An toninho
e te porei,-e noite de S. João choviam as
minhas de voz melliflua e olhares ternos
convidal-o para passar ::I. fogueira.
Elle, que não era perfeito, porque neste
JIe de lagrimas todos temos as nossas fra-
ezas, tinha o fraco de borboletear e conju-
a sempre o verbo amar por méra brinca-
a.
Contavam que urna moça filha de um ama-
nista tivéra por elle uma f~rte paixão e as-
ltára-Ihe o coração por todos os modos, sem
lher o mínimo resultado e contentando-se
ser, depois de muitos suspiros, e quiçá de
itas 'lagrimas, uma simples priminha de
ueira como as outras .
A irmã do Viga rio manifestára-se tambem
mo assaltante de seu coração e era bem
nita ella, com uma cõr teutadôra de jambo
uns cabellos negros a emmoldurarem-Ihe
rosto gentil.
J
 12 F. GLOTILDF. A Dn'or.CIADA 13
~==~===-~==============----
Bateu igualmente em retirada, e depois para antes da meditação levantou-se um
della muitas outras fizeram as mesmas tenta- urro entre o povo feminino e foi preciso
tivas e sempre com um resultado negativo. um psiu meio severo quebrasse aquelle
Não perdiam entretanto as esperanças, e ar intempcstivo. O que se passára de ex-
quando o Chiquinho com o livro do mez ma- dinario? .
riano debaixo do braço entrou ri'aquella bo- begára no trr-m das 6 e 3/4 a familia do
nita tarde de. maio na capella para resar os DeI Pedrosa que viéra pedir ao clima do
exercicios do 10° dia, mais de um suspiro se tP0 o restabelecimento completo de- uma
levantou e muitos olhares fizeram delle o alvo nas dilectas filhas, a Nazareth, a quem o
de suas settas. prescrevera mudança' de clima pela
Elle cumprimentou as que estavam á por- ia que ainda apresentava, convalescente
ta principal com um sorriso que mostrava- ma febre prolongada.
lhe serem agradáveis aquelles signaes de es- tres moças, ao saltarem do trem, ven-
tima e entrando respeitosamente na aceiada s preparativos da novena correram mes-
igrejinha foi ajoelhar junto da cornmoda, onde e guarda-pó á capellinha, e com a maior
se guardavam os paramentos sacerdotaes. Um eerimonia, as duas mais velhas, affectan-
silencio respeitoso e ungido de fé estabele- res de pracianas, que não fazem caso de
ceu-se de prornpto. Cessaram os cochichos, iros foram-se aboletando nos degráos,
as cantoras subiram ao côro, e minutos mais JUDto do «elebrante que, um tanto enfia-
I tarde ás ultimas vibrações do sino, resoavam :::mudou a entonação da voz e mastigou
vozes de uma frescura deliciosa, sem atavios de. uma vez as palavras do-Acto para
de arte, simples e harmoniosas como gargan- is da meditação.
teios de ave pelas rarnarias frondentes, e o am bem bonitas as recemvindas e tinham
Chiquinho, já defronte do altar mór resava chie especial que distingue a eearense,
com voz cheia, de um timbre varonil (, "Vinde, mo trajada com um modesto vestid inho
Espirito Santo". hita.
Quando terminada a ladainha foi ler o aço justiça a minhas patricias dizendo
 14 F. CLOTILDE
A~AAAAAAAAAAAA~AAAAAAAAAAAAAAAAAA

que possuem no olhar, nos gestos, no modo eJ.:§ .• ~ - é.~~""-~<t= i0lF-'~'êí<9'-""®i9~

de andar uma graça que as torna superiores
a muitas moças de outros Estados que fre-
quentam casas de modas e não tiram das
mãos os jornaes illustrados.
II
Não se cansavam as devotas do logar de
examinar as pracianas, e desde- o penteado
feito com um certo exagero até a grega que
enfeitava o abainhado das saias, tudo foi sub-
CAVA por traz da estação a casa P111 que
mettido á mais rigorosa analyse.
ia residir tcrnporariarnent« o Coronel Pe-
Diziam baixinho: Qual dellas será a tisi- tl com a f'amilia. Grande, porém mal l1ivi.
ca ~ Deve ser a mais magra e a mais triste. não accornmo.lava bem os moradores
Vejam como está apertada! Aquelle espartí. compartimento mais sympathico e que
lho é que a mata.
ecia melhor abrigo á uma moça nas con-
, Terminou a novena e o Chiquinho que es de Nazareth, a filha convalescente do
sorrateiramente estivéra observando ás moças onel, era um cujas jancllas davam para
levantara-se. do da estrada da Redernpção.
Sahiu o povo, o sachristão apagou as ve- hipassava ella grande parte da manhã
las e em breve a monotonia habitual dos ar o horisonte onde se recortavam os
pequenos povoados substituiu os ipstantes is das serras e que apresentava uma
festivos que se tinham passado com a rapi- ectiva magnifica cim 0-; verdes cana-
dez propria das horas felizes da vida. s o as plantações dos siti'JS á rnirgr-m do
As ultimas vibrações do sino perderam- escnhan.lo se ao longe. Abstrahida em
se ao longe, emquanto a lua emergindo no dc~valloios de doo ntc, pensando que ha
céo azul banhava a terra em uma doce e poucos mezes achava-se forte, capaz de
poética claridade. •
2
 16 F. CLOTILDE
acompanhar as irmãs no seu viver de socie-
dade indo corri ellas ás reuniões, aos thea-
tros e á avenida, conquistando applausos, por
que realmente era bella e destacava-se den-
tre as outras pela velludez de seus olhos de
um negro duvidoso e pela g entileza de seu
sorriso que tentava os corações mais refrac-
tarios ás expansões de affecto deixava-se em-
balar pela suavidade das recordações.
Era uma creatura privilegiada, tinha uma
alma de eleição sempre disposta á bondade,
procurando ensejo para derramar consola-
ções no soffrimento alheio. Chorava pelos
outros, sentia pelas creanças infelizes uma
ternura especial. As outras chamavam-na de
irmã de caridade e ella era realmente digna
desse titulo quando sentava ao collo um pe-
querrucho que a desgraça orpha~~ra. bem
cedo e cobria de beijos suas íacesinhas es"
maecidas onde timidamente appareciam sor-
risos que se accentuavam á tepidez d'aqueIlas
carícias nascidas ao influxo da caridade.
Quando a molestia attingiu-a pesou sobre a
casa uma tristeza de morte, um presentimcn.
to negro de fatalidade, e o pai que a idola-
.
trava , ainda mais depois da morte da esposa,
curtiu longas torturas em noites de insomnia,
A DIVORCIADA.
o perder a mais bella esperança de sua
dos os cuidados foram empregados para
ão se rcalisasse a previsão do medico e
ontando ao menos dilatar-lhe a t'xis-
que tinham abandonado a capital e
~eitar·se ávida insípida do campo. Na-
, desde que chegara, apresentava algu-
elhoras. Fôra aos exercicios do mez
o, visitara a estação, passeiára até a
e a não ser a tossesinha pertinaz que
queda, teria inspirado alguma espc-
e prornpto restabelecimento.
mpanhava as irmãs nos passeios hy-
pela manhã até o rio e, cornquanto ti-
eeeio do banho frio, não deixava de
o rosto e aprazia-se em br incar na
orno uma menina despreoccupada e
avam-lhe nessas occasiões as côres ro-
sorriso dos bons tempos enflorava-Ihe
S, e era realmente lindo o amorenado
Tosto purpurcando-sc com o exercicio
ado e infantil.
ia-se bem, longe d'aquelle bulício da
.1
A blvORCIADA 19
18 F. CLOTILDE

te pelos golpes do mais cego e implaca-

Sempre tivéra uma grande predilecção
destino.
pela vida obscura dos legares pequenos.
as suas longas horas de insomnia, ou nos
A existenc.ia de febre em meio de prazeres 'os de fraqueza que a prostravam n'um
que, á força de se repetirem, acabam por en- ;pamento de modórra recordava os me-
fastiar causava-lhe tedio. Admirava-se quando detalhes das scenas passadas entre as
lia romances, do meio entontecedor das gran- creanças que se tinham identificado a
des capitaes. de uma não poder passar sem a outra,
Revoltava-se com aquellas noites de loucu- ginava que no logar de Virginia não te-
ra passadas na opera de Pariz, nos restau- mbarcl1do, ausentando-se do seu com-
rantes, em que a saúde dos moços se arruína iro de infancia. Chorára tanto ao desen-
e a falta de repouso acarreta conscquencias d'aquelle idyllio infantil e apostrophára
funestas para o vigor physico e o bom humor. ínopportuna que cortara a ventura da
Era tão feliz o casal rústico morando em uma amiguinha de Paulo.
casinha perdida na folhagem, perto de um re· doença arrancando-a aos prazeres da
gato murmurante que lhes trazia agradavel atirara-a á tranq li illa existencia do
frescura e onde os pássaros CIO doce rcvoada, c no seu espi rito fazia-se uma grande
vinham dessedentar-se nas horas de calor! Esquecera-se de tomar os remcdios,
Parece que no isolamento os corações se a-se tonificar ao influxo d'aquelle ar li-
comprehendem melhor, pois que o habito do ue lhe levava aos pulmões o puro oxi-
mundo extremamente corrompido, crosta qua- o, de que era tão escasso o ambiento
si sempre a flôr das affeiçõcs no seu pleno aça. Projectou fi 'aquelle dia ir visitar
desenvolvimento. oente de que lhe haviam falado na ves-
Era uma velhinha que sé finava con,
Lêra aos 13 annos 4:P3U]O e Virginia> c
a pela cruel tuberculose Sentia um de-
guardára no intimo do coração a íragrancia
;ardente de suavisar o soffrimento da
virginal d'aquellc poema que immortalisou o
creatura, que devia ter começado como
amor ingenuo de duas creanças feridas rude-
 20 F. CLOTILDE
o seu, levando-lhe um pouco de conforto,
ella que ás vezes tinha tanta necessidade de
consolação. Convidou as irmãs e á tardinha
foram as tres do outro lado do rio á casinha
da doente. Ella, inspirada pela generosidade
de seu coração angelico, levava uma caixa
de passas e uma garrafa de vinho do Porto, c
ligeira corno se estivesse bôa caminhava. adi-
ante apressada para chegar e levar seu au-
xilio á familia da misera enferma. A' porta do
casebre estacou admirada. Era uma miseria
que transparecia na propr ia phisionomia dos
moradores.
Parecia que ahi só existiam ruinas, só ha-
via cousas que se desmoronavam. Um cheiro
activo de hortelã tresandava, e a humidade
sentia-se no sólo desigual e nas paredes onde
o cupim passara deixando o rastilho denun-
ciador. Corno se podia viver sem a menor
commodidade, exposto ás correntes de ar,
n'aquelle quarto escuro onde a morte encon-
trava elementos os mais favoraveis para exe-
cutar sua missão destruidora? Sentiu uma
compaixão indefinivel apoderar-se della, e em-
. quanto as outras recuavam receiosas, ella pe-
netrou ousadamente no quarto infecto, per-
guntou pelo estado da doente, tornou-lhe o
A ÍHVÓRCiADÀ 21
e não poude reprimir um movimento de
sa ouvindo uma vóz que partira de um .
para onde não olhára ainda. Então,
ue ella tem febre ~ Conheceu a pessõa
e dirigira a pergunta e o som daquelIa
ia que tinha um encanto inexprimi-
ocu-lhe agradavelmente aos ouvidos.
,elIa tem febre, respondeu. E seus
ue se tinham levantado para observar
baixaram-se meio envergonhados, por
olhar deIle lhe fôra direitinho ao co-
o explicar a emoção subita que lhe
aquelle olhar ~
o emtanto era bem simples o gesto do
fôra com o mais visivel acanhamento
ilé formulara a pergunta acerca do és-
bril da doente.
reth sentiu acerejarern-se-Ihe as fa-
palledecidas, recordando o dia em que
ra ao povoado e fôra assistir aos exer-
na capellinha branca, cujas janellas
já desbotadas pela acção· do tempo
m receber com alegria o ar virifican-
mattagaes em flôr. Vieram-lhe ra-
te ao espirito as versões que corriam
.do rapaz; sua caridade, seus bons
 22 F. CLOTILDE
A DIVORCIADA 23
costumes, O ascendente que exercia sobre os
entreter relações mais estreitas, e assim
habitantes do povoado, envolveram-no ao seu
O Chiquinho [alou que tinha urna irmã
olhar como em uma espécie de aureola e
esma idade da Nazareth, esta perguntou-
achou-o muito superior aos janotas da cida- eigamente : Porque já não levou-a lá
de, ridiculamente enfatuados nos seus uni-
sa ? Quando a enferma chegou aos ulti-
formes custosos. com pretenções a agradar momentos os dois jovens, já unidos por
pela forma de dar o laço na gravata e collo. inexpIicavel sympathia, suavisaram-Ihe
car ao peito uma orchidca meio desabrocha- ma e foram os dedinhos transparentes
da. Este possuía a tez crestada pelo sol do ritativa moça que lhe cerraram as pal-
campo, as mãos eram callejadas pelo traba- s, emquanto as filhas soltavam gritos
lho grosseiro; mas que expressão de bonda- sespero vendo-se agora completamente
de não se lia nos seus olhos! quantos be- paradas n'aquelle casebre que se de-
neficias espalhava a mãos cheias pelos po- va como as derradeiras esperanças de
br-es e desvalidos! O pensamento da moça ra que a morte viéra bruscamente inter-
estabelecia comparação e trouxe-lhe a con- er.
clusão de que neste mundo o thesouro mais
solido, a recommendação mais preciosa é um
caracter honesto e uma consciencia sem
mancha.
Demorou um pouco a visita, e ao sair, en-
tre palavras de animação prometteu voltar.
D'ahi 'em diante ia quasi sempre visitar a
doente e rarissimas vezes deixou de encon-
trar o Chiquinho no casebre da pobre.
Estahelccêra-se uma especie de intimidade
. respeitosa entre os dois. A' força de se ve-
rem quasi todos os dias acabaram por dese-

')
·~
>f1j; *>j1f~~1f);f~1f~*1PJ~1f~1f~*1í *
/'FVV'JV'.~~
~~~~~~~~~~~~~~~
lU
M ELHoKAVAsenSivelmenteaNazareth. Des-
apparecôra o fastio, fugira a insomnia e,
a não ser a pallidez .que ainda subsistia e uma
tosse fraca ao menor esforço, julgal-a-iam
completamente curada.
O medico que viéra um domingo mostrara-
se satisfeito e prcscrevêra um regimen pura-
mente hygienico. Voltára a alegria, accentua-
I vam-se as esperanças e o Coronel Pedrosa
<i
I esfregando as mãos, gesto que lhe era habi-
tual, quando estava satisfeito dizia: A moci-
,I dade e a sciencia triumpharam da morte I O
que elle não podia. prevêr era que o coração
de sua filha estava ferido pelo dardo traiçoeiro
do deus vendado e que em sua cabecinha
romanesca germinava pela primeira vez uma
ideia de amor. O Chiquinho levára a irmã á
casa do Coronel.
=====
A DiVORCIADA 25
rena, elegante, uns olhos avelludados e
de meiguice, um sorriso engraçado, a
.conquistára as sympathias de todos.
uco timida, mas tendo certo espírito
modo de responder por pequeninas
, corando quando lhe dirigiam a pa-
fio se mostrou desageitada e falou com
o sobre a maneira de viver do po-
sobre a festa do Padroeiro, que estava
, terminando por convidar as moças
iarem donativos para o leilão da ul-
ite. Era o período mais alegre que
de passar.
ria muita animação, pois a novena
r de noitarios e era celebrada pelo
ulinha, a filha mais velha do Coronel
rtteu bordar um porta-cartões para o
a Elvira faria uns bolos e a Nazareth
ia vir da capital uma prenda.
i inho lisongeado pelo bomacolhí-
íspensado irmã conversava com uma
á
idade agradável e sorria de vez em
ante a 'perspectiva de um S. João ani-
em que por certo teria ensejo de dar
sorte, como nos annos anteriores.
ez, porém, as priminhas não o at-
 26 F. CLUTILD~
.. A DIYORCIADA 27
trahiam, e apenas um rostinho pallido ainda
e bôa educação o esmagava. Protestou
conservando uns vestígios de doença, um
ar-se d'aquella casa; mas o Coronel ins-
rostinho, onde refulgiam dois olhos incom-
para que elle viésse passar os serões.
paraveis fazia o desejar a vinda da noite feliz.
ue motivo apresentaria para justificar a
Que mudança se operara nelle! Andava
auscncia, depois de ter offerecido com
alegre como si uma esperança de lisongeiro
franqueza a sua' amizade ~ Ser-lhe ia
futuro lhe allumiasse a alma. Até ali borbo
custoso deixar de ir todas as noites á

leteára ligando pouca importancia ás torturas

d'aquella que lhe perturbára o socego e
que fazia soffrer, e si lhe di~iam que alguma
convivencia o [azia tão feliz. Poucas
moça soffria por elle, achava ISSO bem absurdo
ia á loja do Tho m az , o seu intimo ami-
e não lhe remordia a consciencia, porque
nde outr'ora passava horas esquecidas
afinal que culpa tinha de o quererem, si elle
do a bisca ou palestrando descuidosa-
não se declarava? O caso, porem, mudava.
Outra qualquer distracção aborre-.
Uma attracção invencivel, o quer que era que
J achava insípidos 0-; passeios á Redem-
elle não podia explicar impellia-o ta gostar
aborrecidas as conversas das calçadas,
~da Nazareth. Ah! o coração tem exigencias
cs priminhas que andavam a torturinar-
t.erriveis e aos 20 annos faz explosões de .
s ouvidos palavras meigas faziam-no
Vesuvio '! Comprehendia que não lhe era in-
· 11 oso e hypocond riac«. A noite, sim, tinha
differente : mas quem poderia affirmar que,
elle irradiações de aurora. Esperava as
prestando~lhe alguma attenção, ella ~bedecia
/2 com uma anciedáde febril contando
somente a um capricho de coqueterie, que-
nutos, o coração parecia querer' saltar-
rendo passar menos insipida aquella tempo-
o peito quando subia a calçada e a Na-
rada no campo? Achava uma loucura julgar-
h que o esperava sempre de branco com
se amado. Si .bem que o amor podesse nas-
achenêz cõr do rosa diz ia entre séria e
cer de um olhar, o tempo de suas relações
ha: Tardou tanto! Queria deixar hoje
era tão curto! E depois sentia-se arnesqui-
pao enfastiar-se ~
nhado diante della I Com todo oseu appara-
a sim é que achava tristes, enormemen-

1I

I
 F. eU.TII DE

te tristes as horas que estivéra a esp<lral·o, e

já impaciente naquella noite fôra a estação
assistir a chegada do trem e convidara as
outras a irem pagar a visita da Loló. Afinal
elle chegara e na sala onde as irmãs faziam
crochet e o pai lia os ultimos jornaes des-
prendiam os idyllios de seu primeiro amor e
como as flores que esperam o sereno da noite
para desatar as petalas expandiam os corações
ao sentimento que os prendia, sem que uma
só pala vra mais terna tivesse sido proferida
entre ambos.
No meio das phrases indifferentes que in-
tercalavam na conversação passava-lhes pelo
espirito a ideia de uma separação proxima e
calavam-se de subito, e a brincando com as
borlas do cachenez e elle ante vendo um
abysmo que havia de surgir quando chegasse
o momento de fazer as suas declarações.
~ rahidamente um romance francez
ara casar com um pintor que lhe
IV
m eblina fria e impertinente.
to azul do céo estava toldado de
Dto que soprava com mais for-
ava as pobres florinhas, que tinham
viçosas e, como as melhores cou-
, haviam levado unia existencia
fi sentia-se um pouco indisposta,
he uma pontinha de febre, talvez.
mudança de tempo, tossia de quan-
ndo, e nm quebranto de fraqueza
a-lhe o corpo.
esejava traduzir certas passagen;
bem ás condições em que se acha-
. ha-se a heroina do livro , uma
ajosa que arrostava com a vontade
 30 F. CLOTILDE .\ DIVORGrADA 31

conquistara inteiramente a alma. No logar da o .ue lhe acenava em horisontes bem

protogonista teria feito o mesmo. Os pais não trocar a vida alegre das senhoras de
tinham o direito de oppor-se ás inclinações m pela rude existencia de mulher de
dos 'filhos, desde que visavam um fim legiti- nez ! Envergonhava-se de que o seu
mo. Era muito obediente, idolatrava o pae, romanesco a tivesse levado tão longe.
mas si a sua felicidade dependesse de alguem I de uma existencia a dois longe dos
que elle visse com máos olhos saberia reagir. s do mundo n'uma casinha perdida
Não era possi vel que a contrariassem. Habi- verdura dos prados era belIo, mas
tuada desde a infancia á toda sorte de mimos inexequivel para uma moça nas suas
11
só podia esperar a continuação desse carinho es.
em que a haviam envolvido e que era como va em tudo isso e uns arrepios de
um manto agasalhador muito tepido e macio saram-lhe pela epiderme. Deram
estendido continuamente sobre a sua Ira- Uma vóz ouviu-se no limiar: Dão
qucza Voltava-lhe a reflexão. Fazia mal em , E o Chiquinho com o mesmo ar pra-
ler romances que lhe exaltavam a imaginação de quem se desvanece de uma hon ra
doentia Para que havia de estar pensando • concedida, entrou na sala Sentiu
em casamento'? Convinha-lhe cuidar primei imeira vista que a Nazareth não esta-
II ro da saude , E depois que ideial era o seu '? ouviu-lhe a tossesinha fraca, a respi-
Um matuto que não sabia entrar em um araçada, o olhar incerto. Vexado,
salão, que não poderia ser apresentado na p de repente perdeu a graça que
melhor roda sem provocar censuras e abitual e antes de 8 horas sahiu di-
ironias. Como haviam de escarnecer-lhe o e uma de suas tL1.'3 vióra de Ióra com
máo gosto'! Devia acabar aquelle idyllio (lue ssar uns dias em casa e clle tinha
em má hora começara. Desgostár o seu pae- ade de ir mais cedo. Uma prima! A
sinho tão bom, tão carinhoso para desposar um de repente ('nciumára,se ! Amava-o
roceiro que mal conhecia, sacrificar a sua f. Cahiam por terra todas as objecções
mocidade á uma chimera de momento, matar llmADA 3
 32 F. CLOTILDE A DIVORCIADA 33

que estivéra a fazer ha pouco, desfazia-se a voejavam sedentas do aroma das flo-
camada de gelo que ella superpozéra ao ardo hára o Chiquinho antipathico n 'aquella
febril de seu coração, já não pensava no gran-
de affecto do pae, no desdem das irmãs, no reola de poesia que o circurndára já
veredictum da -sociedade. Pensava somente :Jgía em torno de sua fronte.
naquella prima. que viéra intempestivamente, ho nom com) os outros, tendo além
como a apresentar-se e a ímpôr-se. desprestig io da vulgaridade. Aca-
Seria talvez bonita! Ha tantas creaturinha aborrccel-o, e no dia seguinte quan-
hellas nestes povoados pequenos e- devia se lesse com o ar sonso que não deixava
forte e sadia, ella que não respirara os ares per eer o menor vislumbre de galanteio
niciosos da cidade e tinha o sangue enriqus oncederia a honra de recebel-o. Era
cido de globulos varrnelhos, emquanto o se tal prima. Tinham nascido um para
deppauperava-se e convertia-se em lympha Seria um rebaixamento para elIa
Julgavam-na tísica. Ouvira muitas vez asneira de apaixonar-se. Sua natu-
quando passava cochicharem e lamentarem aI revoltava-se, contra aquellcs im-
na baixinho. coração. Sentia-se, porem, triste to-
Pobre moça I Está no ultimo gráo! resolução de mostrar-se reservada
1I
Tudo isto lhe causava um mão estar in .() Chiquinho. De que o accnsava ?
explicável e a ideia da morte lhe roçava e que os olhos delle tinham scin-
imaginação como um descanso a que tinh ue irrompiam do incendio que lhe
direito depois de tanto soffrimento. Pens urdarnento a alma; mas os lahios
que eram bem felizes as moças que morria am dito ain.la. Era uma creauça
em plena exuherancia de juventude e iam c n 'aquellas tolices. Em b reve re-
rll roadas de flores de laranjas em um caix á capital e tudo estaria acabado. Si
I
azul enfeitado de cravos e jasmins dormir e a saude poderia passeiar, espai-
ultimo somno em um logarzinho ridente pirito nos passeios em casa das
cernlterio, onde as aves gorgeiavam e as bo o socego das naves silenciosas dos
 34 F. CLOTILDE
ADIVORCIADA 35
templos, ao longo da praia vendo o movimen.
i estivesse falando comsigo mesmo:
to incessante das ondas -. Ia cuidar seriamen.
ssas moças romanticas curam-se mais
te de melhoras para o seu organismo depau.
a com banhos de egreja do que com
perado. Recomeçaria a usar os remedios,
preparados therapeuticos que eu pos-
voltaria aos seus habitos de caridade, torna- itar.
ria a ser a creança descuídosa e feliz, a quem
amores viriam muito a proposito. para
nem apropria molestia causava grande inquie.
Nazareth d 'aquella abatimento que a
tação.
Será bom aconselhar o Coronel a
Deitou-se mais cedo. Continuava a neblina te de arranjar-lhe um noivo.
e uma rajada de vento humido levantava-se
no silencio da noite tornando mais imperiosa
a necessidade do agasalho. .Não conseguiu
dormir, a cama tinha espinhos que a magoa.
vam, pesadellos acommettiam-na em sacudi.
dellas bruscas, uma sensação estranha inva-
dia-a do estomago para a garganta, experi-
mentou uma tensão fortissima nos nervos, e
I pela madrugada as irmãs despertaram assus-
I 1
I
tadas ouvindo-a gritar e estrebuchar forte-
mente n'um ataque de nervos que bem podi
ser o preludio da molestia que faz tantas vi-
étimas entre as moças e que se manifesta sob
tão extravagantes e variadas formas: o hys-
terismo. .
O Coronel Pedrosa mandou vir o medico.
Conversaram ambos muito tempo. Ao termi-
nar a conversa o medico dizia á meia vóz,
 A DIVORCIADA 37

!ám que brevemente chegaria do Rio

um primo que se formára e que des-
cia lhe apresentavam como noivo.
ão ligára a menor importancia a esse
e pouc~s v~zes a imagem do primo
v ava na imaginação. Era forte, sy m-
:cheio de espirito,. um tanto zombe-
~i cista; mas não lhe agradava. Fizera
na Academia, onde conquistára
a crise. Nazareth melhorou consi- bavam-no sempre, procuravam in-

P
ASSOU
n'alma uma grande estima por elIe .
deravelmenle.
As alegres manhãs do Junho trouxeram- ão, porem, conservava-se indifferen.
lhe ensejo de dar longos passeios atravez das o~s que conhecia o Chiquinho, á
déa de que o primo voltaria no fim
estradas, onde o barnburral viçoso soltava o
entr~sf,~cia-a. Tinha um bom pre-
cheiro agreste.
Estava corada, já não tossia, passára a a eximir-se á responsabilidade de
cto de casamento: a sua má saude.
I I diga que a invadia ao mais leve esforço.
o caso haviam de surgir insistencias
medico declarou-a livro de perigo.
. m os obstáculos para que elIa cor
A prima do Chiquinho voltára
sse confiadamente ao amor de Chi-
e, depois de vêl-a acalmara-se o ciume
I! i podésse esquecel-o ! Todos os dias
Nazaroth.
A moça era feia, magricella, picada
a tratal-o com rudeza, sahir á hora
evia apparecer, mostrar-lhe que não
,I bexigas, de um acanhamento estupido, não
o de sua visita; mas quando dava
sabendo ligar duas ideias. Não era d'ali que
ll:ava impaciente para o relogio e um
lhe viria o mal. Sentia-o no seu proprio cora-
e passava contrariava-a e fazia-a
ção, pois tinha certeza do que s~u pae não
ue poder tinha o amor!
approvaria sua escolha.
 38 F. CLOTILDE
~======:~~~=========~
Não havia argumento a que não resistisse,
logica que não derrotasse. Até ali a existen_
cia se lhe dcslisára pura e limpida como um
arroio por entre margens cobertas de flores ..
Não pensara em trocal-a por outra: o affecto
do pae e das irmãs enchia-a de ineffavel ven-
tura, e de repente quando oseu organismo en-
fraquecido pela doença pedia repouso, um
olhar do Chiquinho havia transtornado tudo.
Até ali dominara-se diante das irmãs, ciosa
de seu segredo, na timidez de que a ridicu-
i;
larisassem; convencia-se da desigualdade de
posições entre ella e o Chiquinho, avaliava o
desejo .que o pai tinha de assegurar-lhe um
futuro explendido dando-lhe um esposo que
lhe franqueasse brilhante entrada na socie-
dade.
Casar-se com um matuto ! Si ha dois mezes
atraz lhe tivessem prognosticado semelhante
cousa ter-se-ia rido, solida no despreso que
tinha pelos homens vulgares. Agora estava a
prender-se sem querer, tentando fugir ás ma-
lhas que a envolviam e que, parecendo frageis,
offereciam uma resistencia inesperada.
. Vinham-lhe ímpetos de pedir ao pai que a
levasse d'ali para o Quixadá, para outro logar
onde não lhe fosse possivel ver o Chiquinho,
I I'
I
»: A DIVORCIADA
falar delle. Ser-lhe-ia comtudo preci-
esentar razões e bem penosa se tornaria
ssão d'aquelle sentimento que a delicia-
as que tambem a torturava n'um grande
o de revolta e de vergonha.
ordou um dia disposta a dar o golpe de-
n'aquelle 'amor que se enraizava. So-
11 noite inteira com o Chiquinho ven-
O lado da prima que tinha a pelle fres-
signal de varíola, os olhos fascinan-
uma vóz dulcifluamente encantadora.
do almoço falaria ao papai, já se sentia
o havia mais necessidade de prolongar
da n'aquelle povoado insípido. Vinha-
:nostalgia da cidade que lhe apparecia
suas ruas alinhadas, bem claras, onde
grupos desenfastiando-se dos peza-
vida. Desejava ver de novo as aveni-
:vaivem dos habitués do passeio fazia-
ades. Causar-lhe-ia bem o aturdimen-
eceria no meio do bulício a imagem
~istia em acompanhal-a, Quanta ínco-
I Amava os logares ermos, silencio-
os como até ha bem pouco fôra sua
ia, e agora lamentava não estar em
ça bem populosa, onde não faltasse
de manhã á noite houvesse a
 ==4=O===========F=.=ú=L=OT=I=L=b=E======== ~ A DIVORCIADA 4t
mais delirante animação, o mais ardente fre,
o e tem ideias muito originaes sobre
mito de vida. que a mulher ha de representar
Fôra bastante razoavel a té ali. Era tida
mprehender bem os seus deveres.
como muito ajuisada e em situações difficeis
eutãra-o distrahida, pensando na
quando se tratava d e alguma questão de Iami,
4Jlzera á velha doente, em cuja casa
lia pediam logo a sua opinião que era acatada primeira vez o Chiquinho.
Como mudára assim ~ I .
o mal allumiado por uma vela que
Esperou o pai ao almoço para falar-lhe do
o á imagem da Virgem sobre a mesi-
proximo regresso, balbuciou palavras, ensaiou
nehosa. Tres moças a chorarem bai-
termos; mas quando ia formular o desejo de
resaltar desse quadro sombrio a
voltar á capital, lembr ou-se do Chiquinho, re-
earidoso rapaz consolando aquellas
cordou-se do sonho da vespera e entregou-se
procurando dar um lenitivo ás an-
cegamente á vontade do destino que a impel-
~ desolavam os habitantes d'aquellc
lia n'uma corrente fatal a gostar delle.
nas,
O pai estivéra muito amavel, e como se
esqueceria o olhar que elle lhe lan
adivinhasse a procella que lhe ia n'alma falou-
0, como a pedir-lhe desculpa pela
lhe com a maior ternura. olhal-a de frente. Fõra a timidez
Conversaram sobre o que deviam fazer
ra que mais a fascinara. Defronte
quando voltassem á cidade, construiram lar-
ordicar o pedunculo de uma rosa
gos planos para o futuro. . raao cabello, corando e empallide-
O nome do sobrinho bacharel era entre-
a al~ernativa de medo e esperança,
meiado de adjectivos encomiasticos.- Si ou- OUVIr-lhe a arenga cncomiastica
visses como elle falia bem, dizia o Coronel, é cia ao primo, disse pausadamen.
um prodigio de oratoria, e com que facilidade do a flôr :
prepara um discurso. Fiquei pasmo um dia e tudo isso eu não acho o Ar-
de ouvil-o discorrer sobre a emancipação da llíico.
mulher. E' um grande apologista dos direitos estarias de ser sua mulher?

I I
 42 F. cr.o'nr.oa
=========================~
-Deus me livre de tal.
Fôra bem energico o gesto de repulsa Com
que ella acompanhou esta phrase.
O Coronel ficou desorientado e talvez a
suspeita de um amor nascente lhe surgisse
ao espirito, porque respondeu.
-H as de mudar de opinião quando vires
o rapaz. Nada de precipitarmos os aconteci-
mentos. Eu sou de opinião que - o casamen-
to e mortalha no céo se talham.
lautil luctar. A corrente do affecto
II
VI
Devia ser um axioma o que o pai lhe
éra ultimando a conversa. «O casa-
a mortalha no céo se talham».
attracção irresistivel impellia-a Ia-
para o Chiquinho.
a impetuosamente para o lado delle.
aterno,que até ali a escudára garan-
s assaltos do coração, ia ser pretc-
ím a natureza.
ita prende-se ao ninho em quanto
ssario o conchego materno e a ali-
que lhe tráz no bico a mãe solicita;
que pode devassar o ar, distende as
ue acabaram de ernplu mar e vôa
he ser dado ir algures, n'um galho
.entoar o epithalamio. de seus amo.
o noivado que ha de ensinar-lhe
 F. CLOTILDE A DIVORCTADA 45
a harmonia suave do primeiro idyl1io, ~uinte pôz toda a casa em alvoroço.
do á lúz do sol, por entre as ramarias e Julinha andavam n'uma az ama
centes, sôb os jasmineiros em botão. reparando uma recepção condigna
Nazareth começava a sentir o desejf) li charel. Viraram e reviraram o po-
desprender o vôo.Já c affecto paterno não b: tQdas as direcções á procura de
tava á sua felicidade. Desde os 8 annos, ida am encommendas para a cidade,
em queperdêra sua mãe, vivêra refugia obter flôres.
n'aquelle seio amigo que lhe dava o balsarn apresentou um aspecto de festa.
nos momentos de afflicção e lhe tornava a cxi ocadas cortinas nas portas, enfeita-
tencia uma aurora de venturas. com bandeirinhas e Iestões. .
Sentia mais fundas as saudades da infa '0 tapete foi desenrolado e collo-
cia. Via-se pequena, rodeada de mimos, be 6:do sofá.
jada e acariciada de vez em quando. A .im ece que vamos esperar um noivo;
gem de sua mãe emmoldu~ada.e.m um mm nha, sorrindo maliciosa.
refulgente desenhava-se-lhe nitidamente em nos diz que breve: não desabro-
espirito. .. . e nós flôres de larangeira, retor-
. Si elIa fosse viva dir-lhe-ia tudo, abri ~ olhando intencionalmente para
lhe-ia o coração na expansão de uma con
dencia completa pletamente abstrahida fazia flôres
Com o pai não se animava tanto. E s
essas recordações do tempo ditoso que n de canarios que lhe déra a irmã
mais voltaria, guardando nos recessos d'al ho cantava na gaiola, e ella acom-
o segredo de seu amor, reservada para c
e vêz em quando com o olhar dis-
as irmans que a observavam secretamen
uções das avesinhas, pensava
calando-se com prudencia fOI passando o te o em breve desapparecer o soce-
po até que Dezembro chegou e uma bella a e que aproxima vinda do primo
nhã o telegramma de que o Arthur chega enrso á sua existencia.
 F. CLOTILDE A DIVO RCIADA 47
=====
Percebia os gracejos das irmãs, iam agora truindo de uma vêz seus planos
apoquental-a com projectos de casamento ? Sondaria o terreno, e si visse
Cessaria o doce- periodo de seu enlevo. A hora areth fraquejava teria coragem de
tranquilla em que recebia a visita do Chiqni_ relações e esquecel-a-ia.
nho não se reproduziria mais e assim que o: O dia. O bacharel foi recebido
primo chegasse com aquelle genio de troçar Elvira e Julía com a mais fran-
de tudo, descobriria o sentimento que a prer, e. Abraçou-as como si ellas fos-
dia ao moço e ridicularisaria sua inclinação, mans, mas ao ver a N azareth ligei-
Não podiam' agora tratar de casamento. rada, muito linda no seu gesto de
Os recursos do Chiquinho eram muito li. uns longes de desconfiança que
mitados e depois elle sabia que o Coronel sobresahir suas feições graciosas,
não consentiria. lexo.
Gostava delle para parceiro de jogo; mas. nr os braços; mas um clarão de~
para genro achava-o medíocre. brou-lhe a vista. Uns cabellos
Elle tinha um bocado de orgulho e não s frisos naturaes tornaram-no ti-
rebaixaria. Aguardando o futuro encorajava- t o galã da côrte, que dcsemba-
se no amor de Nazareth que conhecia e qu penetrava nos camarins das ac-
não podia mais esconder aos olhos de muita oudoirs das damas a;>istocraticas
gente. ender a mão á prima e dizer-lhe
Com a próxima chegada do primo bacha mmovida: Mas que mudança I
rel entristeceu-se. Ouvira em casa falarem do. da! E' uma cearense que honra
projectos de-noivado e adivinhou que elle cs
colheria a mais gentil, a mais prendada di)
seguiu-se o
tres, aquella que lhe revolucionara a alma e
subjugára a um simples gesto de carinho. olhos para a prim.nha
lucta era desigual. Ficar-Ihe-ia bem fugir, au
sentar-se aos poucos, esmagando suas espe
 48 F. CLOTILDE A DIVORCIADA 49

mais nova. «Nem parecia ter e ença do Arthur puzéra de alarma a

dizia: dedos ociosos. Uns achavam-no an-.
Que bonita côr lhe roseava as faces! Q com o seu ar zombeteiro, outros
nova seiva de vida e saúdé lhe alentava o o i avam-no e attribuiam ao desernba-
ganismo! praciano a-juelle eterno sorriso que
Não havia nada comparavel á mocidad a nos labios. Foram até a casa da
E que bom era o ar do campo! No Rio a gen a quem a N azareth cerrárn os olhos.
respirava um ambiente impregnado de micI' estavam a fazer renda e a mais nova
bios, asphixiava-se na atmosphera das ru a em crochet.
estreitas, onde a multidão se acotovellav . é o Snr. DI'.
Depois as noites passadas em claro, nos th adas queriam armar a unica rede
atros, nos cafés-concertos, nos logares
e havia no casebre. Desenrolaram
divertimento estragavam a organisação ma
rias. Viviam agora de trabalhar de
robusta. ã.noíte. pois o irmão' que embarcára
Elle pretendia demorar-se alguns dias rte ainda não déra notici:J.s.
povoado Ao fOSS0 esta moça, e designavam a
O aspecto de suas casinhas mal alinhad , ainda peior seria. Ella todas as se-
formando irregularmente uma praça agrad
os envia ás sextas-feiras uma bôa
ra-lhe.
A companhia das primas cornpensal-o m de bella, santa, dizia meio serio o
da monotonia a que se ia sujeitar. volta 110 passeio.
E com um olhar terno contempland . feliz será o mortal que merecer o
Nazareth que se rubo risava perguntava-I , prima.
Encommódo-a, minha prima'? Sou de 01'
nario falador e quando me tornar cacête dig
com franqueza. .
A' tarde depois do jantar foram
~~~~~~-~~
~~~ A DIVORCIADA 51

• hou no Arthur um rival e teve me-

~l-o triumphante a esmagal-o com um
despreso. Procurou a Nazareth e um
elIa animou-o. Oh I como a achou
a sua toilelte de musselina branca,
VII estacavam uns lacinhos azues ! Os
frisados erguidos e adornados com
de rosa-amelia formavam-lhe uma
e belleza e graça é de toda aquella
de adoravel emanava um encanto
ia o coração mais avêsso ás manifes-
-Q UIZÉRAM festejar a chegado do Dr. co
uma dansa, para a qual foi convidado
ternura.
ahia entre as outras com uma ele-
tural que despréza os atavios e não
Cbiquinho com a família, o agente da estaçã requintes da vaidade para exhibir-
o telegraphista, as manas uo Silvino, o maio ente. O Chiquinho contemplan-
commerciante do povoado e mais uma famili cio entristecia-se. O tal bacharel
que visitava as pracianas uma vez por outra. parenthesis ás delicios-as palestras,
Chamaram um tocado r de harmonica e -se entre elle e a eleita de su'alma e
bacharel '- tendo acolhido com enthusiasmo . lher e portanto facil de variar, so-
ideia do festejo que lhe iam offerecermostro condições vantajosas que lhe tra.
se muito expansivo e cada vez mais gracej CQm o primo. .
dor. um pretexto para falar-lhe mais
Abriu a dansa com uma valsa escolhen ente e sabendo que ella ainda
para seu par a Loló. O Chiquinho _estava r receiando tonturas, pediu-lhe a
trahido. Uma sombra de melancolia velav ma quadrilha.
lhe o semblante. emos a segunda, quer? disse-lhe
 52 F.CLOTILDE
ella pon do a descoberto os dentinhos ebur
neos no mais angelica dos sorrisos.
A segunda quadrilha é a dos namorados e
isso equivaliaá uma confissão. O Chiquinho
cambaleou de alegria; mas de repente sentiu-
se apoderado de uma raiva incxprirnivel ou-
vindo o Arthur que se achegara da Nazareth
dizer-lhe com o desembaraço que somente a
cõrte entre noivos póde autorisar.
-Prima. você andou levianamente conce-
dendo áquelle rapaz a segunda quadrilha.
EUa mordeu os labios.
-Andei levia'namente porque ~ tornou ella
80rpresa.
-Não sabe que é dos que se amam a segun-
da quadrilha?
-Eu como não amo ninguem posso dan-
sal-a com quem quizér.
-Reflicta, prima, e desligue-se do com-
promisso.
-Eu só tenho uma pala, ra.
Admirado da accentuação energica com
que Nazareth profer ira esta ultima phrase,
Arthur, pratico no traquejo da sociedade e
portanto apto para conhecer o segredo .de uNm
coração ainda puro e que a hypocflsla nao
contaminára, viu de repente levantar-se um
A DIvORCiADA
10 á realisação dos seus projectos.
que vira a Nazareth no esplendor de
mosuraque ti convalescença poetisára ,
e sentia que a affeição que ella lhe
lspensar não era sufficiente para tor-
liz.
e o Coronel Pedrosa e as filhas não ti-
escoberto elle via perfeitamente por
aição que o ciume nascente tornava
ais viva.
zareth amava o matutinho I Roman-
natureza procurara aquelle idyllio
nisar as horas de insipidêz que devia
ange do bulício da cidade. Eram as-
ulhere Não faziam questão de es-
pr. er que apparecia co.n palavras
40 enfeitiçava-as. Elle não havia de
que aquelles amores se desenvol-
:Obstal-O'S-ia, e si fosse preciso luctar
ompto para tudo. O ciume dava-lhe
ompanhou com olhar febril as
uadrilha que a Nazareth con-
hiquinho e no fim dando vasas ao'
ue lhe fermentava n'alma, debicou
mas o matuto, desenvolveu todo o
troça que o animava e levou-o a um
rroroso.
 54 F. CLOTILDE
N azareth percebeu o jogo do primo, ava-
liou o vexame do .Chiquinho c compadecida
de ser ella a causadôra dclle pediu-lhe que
dasculpasse os gracejos um tanto pesados do
Arthur.
_E' genio, dizia e11a. Está sempre a levar
tudo ao ridiculo.
Ao terminar a dansa quando penetrou no
quarto invadiu-a uma tristeza im~~nsa.
Ouvindo as irmans falarem baixinho com-
prenhendeu que zombavam d'e11a e dev~ras
aborrecida desatou a chorar em uma das crises
nervosas que a assaltavam depois da noite em
que tivera a primeira ameaça do ataque hys-
terico.
O primo entrava como uma aza negra a
perturbar a limpidez do céo de suas esperan-
ças. Começou a aborrecel-o.
VIII
a da esquerda, onde de ordinario
il"onel Ped rosa j oga va longas par-
amão com o sobrinho, o candieiro
ao sopro do vento e em tom con-
lles conversavam ás 11 horas da
s de ter saboreado o café com al-
to .
tinham-se recolhido cedo. Naza-
ára uma enxaqueca e as outras
do um longo passeio e voltaram
o dialogo.
o suspeitava e nem teria imagi.
hante cousa. .
gabo-me de bom phisiol0gista e
r-lhe, meu tio, que a prima está
do rapaz.
ível que a Nazareth tão ajuizada,
 56 F. CLOTILDE
~~====~~==========- A DIVORCIADA
57
tão extremosa para commigo caia na asneira
de se deixar levar como uma moçoila qual- sympathia passageira'
um belIo dia. Eu sei como essas cou~
quer? !
sam. Um passeio no campo por
Vou interrogal-a e fica certo de que a Co-
hã formosa. quando ha flores em pro-
nheço muito bem para affiançar-te que, si en-
aves gOl'geiam ~ispõe os moços ás
tre ella e o rapaz existir alguma inclinação,
do sentimento. Depois, coitadinha!
francamente m'o confessará.
nto já enfastiava-a da capital e desde
-Meu tio confia assim nas mulheres ~
de sua mãe é elIa o meu iJolo e adivi-
-Minha filha tem um genio excepcional e
das as vontades. Já vês que tenho a
jamais proferirá uma mentira.
Ua uma bôa retribnÍção e jamais a
-Deus queira que desta vêz ella seja sín- rata.
cera.
uida ao dialogo foram descansar. O
-O que me cumpre Jazer si infelizmen-
em, que é rebelde quando a imagi-
te ella está enamorada, eu o sei. Consen-
excitada fugiu-lhes das palpebras e
tir em uma união que a rebaixe, nunca! Le-
aram a revol ver-se na rede sem dor-
val-a-ei por meios brandos porque nes~es
que á~ '. 1/~da manhã levantaram-se
casos o rigor de nada ser ve e aggrava mais a
pertar o corpo do quebranto de in-
situação. Então si ella resistir, veremos ".
um banho nas agoas do rio que
O amor ás vezes transforma-se em rigor,
damente, encrespada a superficie
e quando se trabalha para o bem d'aquelle
s matinaes, alagando os canaviaes
que procura um carní n ho errado.,: forçamos
muitas vezes os impulsos do coraçao e nos re- undancia de curso, deslisando em
vestimos com a couraça da severidade. óSas por baixo da ponte, murmure-
~ -Bem despressa evaporaram-se as minhas ÍXoso a acarioiar as pedrinhas (}os
illusões.
do banho fitando a Nazar"eth que pen-
-Cumpre a ti fazer a conquista plena do
coração de minha filha. Aquillo entre ella e o 110sem frente ao espelho do toilet-
o Coronel : Quero falar comtigo.
 58 F. CLOTILDE
Vamos passeíar. Um estremeci.mento imperce_
ptivel agitou-lhe o corpo franzmo. Esgarçára_
se o véo que encobrira o doce segredo <ie seus
amores. O pai sabia tudo. E fôra o primo en-
ciumado, cheio de despeito que a denunciára!
Preparou-se para a defesa. EUa herdára
altivez do genio de sua mãe. Não se mancha
ria com uma mentira. Confessaria sem a menor
hypocrisia o que lhe ia no intimo. O primo an
dára muito erradamente apresentando-se co
ares de Othelo. Ella havia de pedir-lhe explica
ções. Não tinha ainda falado de seu amor a
Chiquinho e somente. os olhos trocavam as
confldenoias mutuas.
Recatada e modesta como uma verdadeir
donzella chrístã achava inconveniente um nam
ro sem o fito do casamento, e desde que se sen
tira affeiçoada devéras ao Chiquinho descans~
va n'aquella estima e deixava que os aconteci
mentos se succedessem, porque confiava que
Providencia velaria por ella.
Não desgostaria o pae casando co~tra a. von
tade delle ,. mas tambem não se sacrificaria
~ a
ceitando por marido um homem que nao am~
se. Estava sempre a ouvir falar dos graves 1
convenientes de um casamento sem amor
Uma sua collega que casára.com um paroar
A DIVORCfADA
= 59
inada pelas fulguraçães do dinheiro
trouxera do norte, depois de uns mezes
rosa lucta domestica, voltára para a
a. E, abandonada. vegetava triste-
uestrada do mundo e arrastando pesa-
o fardo da vida. Em plena juventude,
alegrias e as esperanças podiam íne-
mhava no 'Seu papel de desprezada e
a reclamar o seu direito porque o rnarí-
para longe e constava-lhe que iIludira
elIa se casára civilmente. O que lhe
er o pai? Certamente ia falar-lhe no
tas vezes discutido.
lu muito tempo fingindo ler para dís-
oCcupação e foi com um sorriso que
á pergunta do Coronel: Estás prorn-
papai, já estava sua espera.
á
u um engraçado chapeosinho de pas,
ligeiramente as irma'ns e dando o
desceu a calçada, emquanto o primo'
ava distrahidamente o horisonte e a .
serras que se perdiam ao longe.
o passeio o Coronel com uma sub-
avel procurou sondar o coração da
-lhe do Arthur, disse-lhe que ello
a mente o desejo de casar com
 60 F. CLOTILDE
A DIVORCIADA
61
ella e que só dependia do seu con sentimenr-, rea-
liasarse o enlace. Como lhe seria grato vêl-o va ás vezes nos lares rnaís des[a vore-
unidos! Tinha pelo Arthur quasia estima d illuminando-os com um esplennor do
um pai, apreciava o seu talento robusto e Com
prehendia que elle era desses que chegam á ~ro, a posição eram estorvos á mo-
mais altas posições sociaes, pois contava co e por entre a senda florida das íllusõos
elementos poderosos para se salientar. Era u a altiva desanando os temporaes da vi-
futuro de -rosas que a Nazareth preparava par i exigiu a confis~il0 franca e de repen-
si casando-se com elle. Era melhor decidir-a ° ar severo do juiz que não é suscepti_
logo, voltariam para a cidade, ella já estava for ndulgencias perguntou: O teu coração
te, não havia mais necessidade de estar no ís , minha filha?
lamento d'aquella aldeia sem vida. :tornou-se rubra, um suspiro agitou-llJe
Alem disto os matutos eram pretencíoso, e baixando os olhos disse:
maldizentes Constava-lhe que commentava posso acceitar a proposta do primo
a familiarídade della com o Chiquinho e qu nunca hei de chegar a amal-o !
este, animado pelo acolhimento delicado que lh
haviam feito levantára as vistas até a esphe
em que ella estava collocada.
A Nazareth indignou-se e n'um accento na
voso disse que o Arthur não passava de II
Intrigante reles e que quería impôr-s~ u.sa~do
meios muito baixos. Ella amava o Chíquính
E se assim fosse ha veria nisso um crime? E
que guardasse o pergaminho e fosse. espe.euI
para outros lados. Começára. por ~ntIpathIsaI
e estava certa de que acabaria odiando-o. L
mentou não ser pobre e obscura. A felicida
.'

~~~~~~~~~~~ ~~~~~~~~~~ A DIVORCIADA 63

f"\~f\../V"\./".f'\./"\./\.f\./'\.r"/V'\.f"\.f"'..I"\.J'"V'V"V'\./'V"'V'J~rv.~

f7\~~~ f7\~~~~~f7\~ ~~;?1\~.

phenesi para o corpo inanimado da
liando-a com lágrimas,
ida olhou fixo para o Chiquinho que
o fíoára extatíoo na porta e bradou'
IX o sei que necessidade havia de vir des-
deIla I
como a , filha
, o amava! Recalcára o
o no mümo d'alma ; mas diante da
a de uma separação torturante ven-
tomára uma resolução extr
CHIQU1NHO
uinho com a dor de ausentar-sa della
O ma: ia embarcar para o norte!
Consultára o coração e este lhe aconselhá
~ba~ido, não se pudera conter e mai;
:4Ommada pelos nervos deixára explo-
que interpuzésse entre elle e a Nazareth o aby ento no grito que antecedera o des-
mo da ausencia.
Fõra cruel o sacrificio ; mas o orgulho nob ivel golpe para o Chiquinho! Via a
de quem não se rebaixa inspiràra-lhe um alv e até ali adorára em silencio, com
tre supremo,' Na vespera da partida fora de nado ~e quem ama pela primeira
pedir-se do Coronel, e no momento em q a.•pallida como um Iyrio emmur-
estendêra a mão febril N azareth dísséra-l á
era para fugir aquelle amor que se
com a vóz estrangulada:· Rese por mim! do ~odo mais energico que elle ia
EUa sentira de subito uma nuvem escurec aria ,a, terra da patria, fugiria ao
lhe a vista, zumbiram-lhe os ouvidos, o nó famiha, alancearia de saudades o
garganta comprimiu-lhe a respira7ão e, S rno, despedaçaria o seu proprío ,
que ninguem podesse susteI-a, cahiu sem s se martyrlO era preferivel a vêl-a
outro e sentir o despreso do pai a
tidos,
O pai allucinado, não calculando o que di
e
 64 F. CLOTILDE
A DIVvRCIADA 65
Seria cobarde fugindo o terreno, livre para,;
via de sair de fronte erguida, por-
qUE!o seu rival triunphasse ? Não!
A dignidade só lhe apresentava aquelle uma palavra desrespeitosa lhe ir-
minho; era o mais honroso. os labios dirigindo-se aquella por
Si a Nazareth esperasse uma epocha prop sacrificar. Não via outro alvitre a
cia e constante se conservasse solteira agua
dando a vinda delle ainda poderiam ser felizes mais ultrapassaria o limiar d'a-
mas si ouvisse as seducções do prímo e o esqn d'onde injustamente fôra expul-
cesse, então estaria tudo acabado! rteza que, assim mesmo pequeno
Longe da Patria, exposto ás intemp ia sombra ao noivo que queriam
ries de um clima insalubre, sujeito ao trab azareth.
lho rude do seringueiro, gastaria a melhor qu das indecisões e das tristezas que
dra de sua existencia, comtanto que podes uma alegria estonteante dava-
obter dinheiro, fazer-se impôr pelo prestígio i e lenitivo. Era amado!
resistivel do ouro. Comprehendia que a príno nos olhares, nos gestos, nos sor-
pal causa da repulsão que lhe tinha o pai ntil moça e o seu desespero no
Nazareth era a sua pobreza. despedida mais puséra em evi-
Hoje, como os ísraelítas de outrora, os 11 ndcza desse amor que tinha todas
mens adoravam o bezerro de ouro e tudo fica idades e todo o casto frescõr da
deslumbrado pelas fascinações da riqueza.
proprio genio devia tragar humilhações am~ de obrigava-o a partir quando a
gas, curtir miserias occultas, arrostar um~ ~rI desvendára um horisonte côr de
ibuição do seu affecto, e lá bem
de privações porque muito alem das VIVI.
fulgurações da intelligencia brilhavam as SOl idão dos f1ore~taes amazonicos,
tillações de urna libra esterlina. . te a despoetisado do exílio, ha-
EUe estacara sorpreso diante do gesto I r tlté as fézes ó calix do soffrí-
perioso com que lhe haviam ordenado q
har buscando no lidar sem tre-
 II
#"

li 66
I1
I!
I
I
, I

TA O ferro o vapor.
brandamente caminha sobre o dorso
ado dos verde-mares cearenses.
m luar bellissimo. A bordo divertem-
e se julgam felizes e aproveitam a
a noite para matar agradavelmente o

am atráz os coqueiraes da praia. A

princeza do norte desappareceu na'
o horisonte e diante do mar immen_
confunde com o céo azul, todos os
oncentram-se pensando na mages-
ens e nas tJ'isteza~ do apartaménto.
muitas lagrirnas na oecasião dos
:Filhos que sahiam pela primeira vêz
aterno em procura dos meios de
'a negados pelo sólo cearense, tão
tão sujeito á crise das seccas, pais
 68 F. CLOTILDE
de farn ilia que cansados de um trabalho e~te-
ril deixavam a esposa e os filhos e deslumbra_
dos pela vertigem do ouro iam muitas veze
encontrar a morte nos fócos miasmaticos do
pantanos do norte, pobres rapazes que s
vendiam a um patrão consciencioso que os sr.
duzia com promessas fallazcs de grandes pro
ventos e quebravam todos os laços para s
. aventurarem a ganhar no fim de tantos tra
balhos um mesquinho saldo que mal chegav
para salvar a familia de morrer de fome, en
chiam o vapor, e emquanto as ondas soluçan
tes confundindo-se com o gemido das mães
entoavam o poema eterno da dõr oceaníc
iam elles tratando de atordoar-se. de esquece
pelo mar á Ióra
O Chiquinho soffria o que não se pode d
screver. Com a frente encostada ás mãos vi
passar como n'um sonho, a revoada de reco
dações.
Desde aquella tarde de maio, lirnpid
cheia de harmonias e de perfumes agrest
até o momento horrivel em que o pai de N
zareth o interpellara tão rudemente atirand
lhe em cheio o desprezo em que o envolvi
tudo se lhe gravava no espirito. Via-se t
longe, tão abandonado! Nem mais os affag
A DIVORCIADA 69
davam-lhe a doçura balsamica que
visa as agruras da vida. Só não ti-
afogo da amizade. Eram estranhos
~ue o fitavam, ninguem podia com-
lia magoa que o opprimia.
em toda a refulgencia de seu brilho
inda mais força á saudade. Que
va a claridade da noite, si dentro
a havia o trevôr dos abysmos ?
ia buscar alento para a lucta em
enhára?
DOS momentos de desanimo. o en-
sse o desejo que tinha de con-
posição digna na sociedade, de
pela posse do ouro a ter accésso
oda, com certeza teria desanima;
ia na primeira opportunidade.
ia de ir para diante, os obstaculos
eendrariam a coragem. Quando,
ou tl annos voltass« ao Ceará tra-
eiras recheiadas e poderia en-
orilmente aquelles que hoje o
amo
a desforra em regra. Saboreava
o prazer de se ver collocado bem
.ser permittido dominar e impôr-
 70 F. CLOTILDE
= ~~~~~~~~~~~)~~
I se a esses que constituiam a parte sã da so- ~ cf> ~~ q~ ~~ q~ q~ ~ ~~q~
11t1111111t111f1tt~t11t1111tt1f
I~I ciedade e que em muitos casos poder-se-iam
comparar aos phariseus hypocritas semelhan_
tes, na ph rase de Christo, a sepulchros bran-
queados por fóra e no intimo encerrando po-
dridões.
D'envolta com os calculos interesseiros, XI
com os projectos que lhe fervilhavam no ce-
rebro inspirando-lhe audacias e asso mos de
animo nunca experimentados, appareeia-Ihe
de novo a imagem mcig a e chorosa da Na-
sados 6 mezes.
zareth, via ainda uma vez agitar-se o lenei-
areth para quem a partida do Chiqui-
nho branco-mensageiro do ultimo adeus-
um golpe cruel c que o acoimár.i
ouvia o estertor de um soluço, e um grande
':V'endo-o ausentar-se sem lhe incutir
remorso de haver perturbado a calma d'a-
rança sólida, quiz conservar-se no
quella existencía virginal matava-lhe por
instantes a energia.
ans voltaram para a capital: ella,.
Tornava-se de repente fraco, e á luz d
stinou-ss a p~rmanecer ali 'no legar
luar que se espraiava sobre a immensid~de
necêra o Chiquinho, e sem enco n-
das aguas, ouvindo o gemer do oceano m-
estimulos para dar dcsenvolvímsn ,
domito chorava ... chorava e arrependia-se
, eto que lhe consagrava, sem um Ic-
de ter deixado a terra natal matando em flô
"
,; e a consolasse nos momentos amar-
a mais bella esperança de sua vida.
a, passava os dias a espalhar he-
fi
ornando-se uma espécie de provi-
ra os desventurados.
o instante procuravam-na os po-
 72 F. CLOTILDE
A Sr." Agueda-ll décana das cegas-guia.
da pela netinha, uma morenita galante cuj
ar bregeiro agradava mesmo com os vestidi
nhos maltrapilhos, tinha por ella uma predi
Iecção especial. As creanças orphãs encontra
vam em seus carinhos o conforto de que h
viam mister, os doentes a enfermeira solicit
e a pharmaceutica caridosa que lhes dav
remedios e os tratava com o devotamento da
.irrnãns de caridade, todos os que soffriam
todos os que viviam desamparados sem farní
lia, sem um agasalho expostos aos reveze
da existencia mereci un della uma consolaçã
e uma esmola. E com que modestia e reco
lhimento ella serneiava os beneficios! N
um vislumhre de ostentação, nem um desej
de attrahir sobre si a attenção dos outro
Consolava as miscrias alheias para consol
se a si propria; sentia um ineffavel praz
em ver que podia ser util aos desprotegid
da sorte, e tendo sido a caridade o élo que
prendia ao Chiquinho queria, exercendo se
pre essa virtude, continuar a missão benefi
a que se impuzéra. Com o mesmo gesto a
gelico que tivéra a cabeceira da. m?ribun
n'aquella tarde em que vira o Chiquinho . e
xugando o suor da agonia da pobre velhi
A DIVORCIADA 73
'a a todo o momento e a sua pre-
udada com bençãos e sorrisos de
'a-se como um clarão beatifico
u rosto gracilmente emmoldn-
bêllos louros quando ella penetra-
io da miseria, semelhante a um
ja missão na terra fosse suavisar
erramar um balsamo nos cora-
os, O céo para compensal-a tal-
a que a pungia com a derrocada
sões de moça fortalecera-lhe a
a-lhe coragem para arrostar a vi-
eíos de uma verdadeira filha de
osta ao contacto do mundo e por
blime na sua abnegação.
lhe vinhaá ideia abandonar de
ilompas da existencia e votar-se
te ao be n dos outros; mas não
verJadeira vocação e, diante de
da virgem de Nazareth, risonha
COm o seu manto estrellado, pa-
ta a refugiar todos os misera-
m lagrimas que protegesse o Chi-
rrompia-Ihe d'alma purissima e
as emanações das madresil vas
ndia ao throno do Eterno por
 F. CLOTILDE
A DIVORCIADA 75
entre as supplicas das virgens, noivas que
chegava um tanto envergonhado e
em vez das flores de laranjeira, colhiam sau~
e ar trocista que o distinguia,
á casa
dades rorejadas de prantos.
perguntar onde estava a prima sen-
O pai censurava-a pela vida que levava
ação tão forte apoderar-se delle
querendo attrahil-a de novo por excessos 'd
stava ao portal e não podia suster
amorosa ternura invidava tudo para condu•.
do coração sedento de amor.
zíl-aá capital e fazel-a esquecer o máo epi-
sodio que fôra corno urna pagina sombria n
livro luminoso de sua existencía.
O primo vinha um domingo e outro espai
recer no povoado, e diante delle, como se fi-
casse esterilisada de subito a fonte de sua
sensibilidade, tornava-se c ncentrada e my .•
santropa.
A aureola do anjo caritativo desappareci
um sentimento de odio mal suffocado mode
rava-lhe o desejo de fazer bem e n'aquelles di
os pobres eram privados de sua visita e d
_consolo que ella lhes dispensava.
Apenas uma palavra doce sahia-Ihe do
labios, si alguma creancinha protegida po
seu amante desvelo vinha trazer-lhe braçad
de flõres agrestes perguntando se estava do
ente.
O Arthur voltava despeitado protestand
não repetir a visita; mas aos domingos, ím
pulsionado por urna força invenoivel, tomav
 ~~~~~~~~~~~~~~~~~ A DIVORCIADA
~~~~/\/V\/\~/'; 77
exs-@)@) @X9 .•.;9 e(§ 09 - ~@)@)-@)9-~-",@)

nte ; todas essas esperanças, po-

pguiam diante do gesto frio, pesa-
avalanche a reprimir-lhe os ím-
XII
medrosamente, sem o desemba-
fr'ora, deixando transparecer no
são de seu affecto, tinha grande
úlsão que ella manifestava.

C elle estava mudado!

OMO

Diante do indifferentismo da prima de

fízéra-se o gelo que envolvia su'alma, via p
artidas amorosas, fanfarrão em
onjuanescas, habituadoa consí,
r um passa-tempo agradavel, via
um outro prisma, divisava novos hoÍ'isont ente dominado por aquella mo-
sentia-se apto para ernprehendimentos m . a e nevroticJ que tinha a ma-
arrojados Pensava nas doçuras da familí bem aos outros e timbrava em
no concheg» intimo do lar e vinha-lhe do a Talvcz que sendo infeliz, fazendo
go o desejo enor:ne de casar-se, de aband seu altruísmo essencialmente
nar por uma vez a vida de solteiro propen se algum di rei to á uma retrí-
a aventuras, ávida de sensações noyas. um ar rn'elancolicJ, deu para
Oh! como seria deliciosa uma existencía .anto ao longo do arvoredo som-
dois na identidade de sentimentos, no 00 enluaradas, como um poeta
munisrno de ídeias que fazem de dois se , passava horas esquecidas na
uma só alma! (Ias estradas silenci08as appa-
Si ella o amasse teria forças para ama 00 -pesar inconsülavel e sentindo
pleta regeneração. Tinha esperanças de v 6- o martyrio de quem ama sem

cel-a e á força de dedicação e per'eYer~n

conquistar seu coração ainda cheio da 1 veiu mais triste e scismativo do
a n'urn momento em que se
I. 1

A DIVORCIADA 79
78 F. CLOTILDE

encontrou a sós com Nazareth, pediu-lhe co
lagrimas na vóz que não o deixasse resval
nas profundezas di) aby smo. Achava-se no ca
rel de um despenhadeiro, à falta de uma aITe"
ção duradoura, sanccionada por Deus e pela lel
procurava distracções em amores fáceis, n
alternativas do jogo. Passava noites em ela
tentando a fortuna sem ter outro fito mais
que atordoar-se, matar o tempo que tinha ale
tídão das horas que valem seculos.
~ ívelmente
EUa podia estender sobre elle suas azas
arminho e salval-o n'um bello impeto de
nerosidade e então fazia-se muito terno 00
. inflexões de supplica, quasi a implorar-lhe
joelhos a felioidade que lhe reousava.
Tão bôa para todos, entornava-lhe n'al
o fel dos desenganos, o veneno lethal da d
crença Que mal tão grande lhe havia elle feit
Guardava-lhe odio porque falara ao tio de s
sympathia pelo Chiquinho '?
Aquillo era uma creanoice, uma phaní
de moça que começa a sonhar e a ter vag
ova de amizade lhe dera o outro '?
ª-se e fugira, não dando um passo
a energica resístencia que encon-
ím que ella desejava ser amada '?
, apesar de repellido, conservára-se
vido apenas pela impetuosidade de
o que mais se consolidava em fren-
uIos qu~ surgiam, estava a espe-
nça que o absolveria ou condemna-
resse o levava a implorar a piedade
ra tão prodiga para com os outros '?
rventura alguem que neoessitasse
orto do que elle '? Vegetára desde
sem uma affeição solida, o tio era
ais proximo e o unico que ligára
sse ao seu bem estar.
ra um pergaminho, achava-se ca-
par uma posição honrosa nasocio-
aspirar ás mais altas posições; mas
.8 elIe uma questão secundaria.

anceíos de amor. Tudo pas-;aria. EUe rodeial itlVO mais importante que tinha em

ia de ternura, construiria um altar de que e a para onde convergiam t~dos os

: r

seria o idolo e podiam ser muito felizes. era a posse do coração da prima.
Dependia della, unicamente deUa. r3alis
6
aquelle sonho.
, I
80 F. CLOTILD""
Que ell~ se resolvesse e a ventura. sorriria p
ambos. Nazareth ouvira-o calada, os 01h08
n'um ponto distante, pensando talvez na
de soffrimento que o Chiquinho passa Tano
te; mas as palavras do primo não lh
tão mal aos ouvidos. Emquanto eram phr
de galanteio, madrigaes ridículos repetidos
millesima vez, ella sentia uma repulsão en
me por elle ; sua vaidade não accei tava a in
sação dos termos rebuscados; mas desde
sabendo a ternura de que era dotada appell
para o seu coração e revelara singelamente
dores secretas que o trucidavam ouvira-o c
padecida.
-Eu quizéra, primo, disse ella no final
conversa dar-lhe a ventura a que aspiro;
não devo' enganal-o. Será sempre para mim
irmão. Si acceita a minha amizade nestas
díções farei tudo para que ella lhe possa ser
E deste dia em diante associou-o a suas o
de caridade. Incansavel percorreu com ell
choupana dos pobres anediando cabecinhas
ras, enxugando lagrimas de semblantes e
gados. . muito bem as mulheres e ha-
Uma pobre mulher perdera o filho UnICO
estava no norte e no auge do desespere q
attentarcontra apropria existencia. EUa 1
A DIVORCIADA 81
falou-lhe da resignação, pintou-
faria vendo seu filho morrer cru':'
dois facinorosos, mostrou-lhe o
nobre e de edificante no soffrimen-
desvaira por um excesso quasi
e tanto fez que a mãe desolada
rimas a saudade cruciante que
:ra a morte acabou. por se submet-
aos decretos da Providencia.
:vez uma pequerrucha que ficára
e chorava desesperadamente sem
trou em seu coração todo o desve-
ura de uma irmã mais velha solí-
avel em fazer o hemo
não errára appellando para sua
Era o caminho uníoo pelo qual
parto de seu coração.
eonquístal-a era um pouco mais
o caso não desanimava.
são muitas vezes esquecidos, e
que a Nazareth não acabaria por
uinho?
re em contacto com aquellas
aflectidamente especulam com
 -=
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..

82 F CLOTILDE

Depois a Nazareth vivia muito isolada

tre o pai e uma tia já. velha, e o i~olamento p
dispõe á ternura. Quem sabe SI elle não
ria victorioso tentando conquistal-a? XIII

eI Pedrosa perdêra completamen-

om humor que lhe era habitual.
aido as partidas de gamão, dei-
vezes de responder ás perguntas
mostrando-se de todo alheio ao
:va em torno delle.
pouco appetite, dormia mal e
em que passou a braços com a
is pertinaz. Um dia olhando com
pronuncinda para Nazareth disse-
és a mais nova de minhas filhas,
qual eu tenho tido sempre uma
~pecial.
a felicidade tem sido o grande
a vida. Tens necessidade de
s mais prudentes e de um
e, e por consequencia atten-
vou dizer:

I I
 84 F. CLOTILDE
A DIVORCIADA 85
Vejo que ainda não esqueceste o pret
yrios de uma tremenda desillu-
cioso matuto que perfidamente perturbo
socego de tu'alma e po~ isso não presta
ai me aconselha a casar com o
devida attenção a teu primo.
a não o ame ~!
Affliges-me tanto com esse teu modo
o-te que esqueças aquellas Iou-
pensar que já vou, me s,entindo doente e or
s seriamente. Sempre te dis-
que pouco viverei, pOIS, como sabes: q
tuas irmãns pelo bom senso que
quer desgosto intimo ,affe~ta extraordma
nova revelaste, Não queiras por
mente a minha orgamsaçao. Quererás se
de nervoso estragar o teu Iutu-
causa de minha morte '? Tu que eu amo c
eu viver não consentirei que
I I o mais acrysolado affecto e por quem d
a contrair uma união indigna
I até a ultima gotta de meu sangue ha
morrer e persistires em seguir
ser culpada da amargura q,ue me. enveI:en
nclinaçã« has de -sentir o remo r-
l
I
os derradeiros dias da existencia ~ Nao,
não posso esperar isso de ti.
s vilipenJiado a memoria.
não fale assim. Eu não quero ca-
-Que quer o papae que eu faça para
jo mesmo outra vida senão a
fique satisfeito? Tanto se interessa que
do até hoje ao teu lado e de mi-
case com o primo ! , ,
-Mas si eu vejo nisso a tua felicidade
melhor ires para um convento
-Um casamento sem amor pode traz de caridade.
felicidade ~ , viver por muito tempo, sinto-
-Conforme. Tenho visto mUltas. fi
o e ultimamente tenho soffri-
que se casam sem ter grande syrnpathia ~
noivos depois de casadas chegam a asti
feito si consentisses em casar-
os devéras' e outras que se casam ve,rda ur,
ramente a[:aixonadas, passados os prime
ue lhe falta a elle para te agra-
dulçores da lua de mel arrependem-se e
m talento, ha de fazer uma
 86 F. CLOTILDE
lirilhante carreira, pois o seu nome foi se
pre aureolado na academia Dispõe de t
dos os element03 para te fazer feliz, e, co
está devéras subjugado por ti, perdoará
desdens com que adualmente o tratas
fará o possi vel para que venhas a amal
muito.
Nazareth calou-se. Temia contrariar o p
que era muito carinhoso, mas que se m
trára bastante severo relativamente aos se
amorescom·úChiquinho. Vendo-o com ose
blante amargurado, onvindo-lhe a voz t
mula receiou aggravar a situação e sem a
mar-se a erguer a vista para elle, levantou-
subtilmente, entrou no quarto e desatou e
soluços que comprimia para que não fosse
ouvidos pelo pai.
Chorou muito tempo I As irmãns não
tavam ahi para consolal-a. a tia pouca att
ção prestava a essas cousas que ella cham.l
-dengues de menina mimosa. Alem d.IS
entretida com os arraojos domesticos nem I
ginava a proce11a que se desencadei~va
coração torturado da sobrinha. Entendla po
co de sentimental idades. Casára-se por co
veniencia, amára o marido por habito e a
lha unica que tívéra de sua união casára
I
.1
I
A DIVORCIADA 87
·0 de Janeiro, de onde poucas ve-
evia.
a o convite do irmão para passar
ma Nazareth no povoado, e ali
m a lide caseira e com os traba-
ivo de uma horta levava horas
feliz de vegetar n'aquella exis-
a. sem preoccupações pelo dia
abituada a viver aqui e ali, con-
asse certas commodidades e ti-
ntinho onde plantasse suas hor-
va de flores, não tinham utíli-
a no entender della e ninguem
que as rosas e os jasmins en-
ista. Preferia as couves, as al-
olhos, as cebolas e as vinagrei-
os cravos e begonias que podes-
um jardim.
creatura material dessas que vi-
e não olham por outro pris-
o do bem estar proprio. Que
m, pois, as dores moraes da
. m se animava a procurar nella
vo. Conhecêra-Ihe o egoismo,
para receber censuras quan-
 88 F. CLOTILDE
do precisava de consolação resignou-se a
frer calada a má impressão que deixára
seu espirito a conversa que tivéra com o
Exigia elle então que ella desposasse o Art
Que lhe competia fazer?- Sacrificar-se
satisfazel-o, matar de um só golpe toda
illusões de moça para acceder ás aspira
do primo? Elle que dirigisse as vistas p
outra parte. Não faltavam moças ancí
por se casar ; com certeza podia escolher
melhores condições e muito mais no «as
o tornarem feliz.
Veiu-lhe um desejo ardente de ac
tudo aquillo tomando a resolução her
de ir ser irrnan de caridade. Cedam
Deus a chamava para-essa vida calma a
sentando-lhe obstaculos, offerecendo-lhe
vações a que ella não resistiria ficando
entregue á sua naturesa que ás vezes
quejava.
Era preferivel viver nos hospitaes d
tando-se ao tratamento dos pobres, exerce
a todos os momentos a missão mais sub
que a mulher pode desempenhar, ou ens
creanças nos collegios velando pelo de
volvimento do bem nos corações tenros
pequenitos, mostrando-lhes o verdadeir
A DIVORCIADA 89
=
ir para não se enveredarem nos
aixões. De que lhe servia viver
aterno. ao lado das irmans, ven-
ariado e uma hora por outra
por não se ter casado com o
a vida religiosa senão '0 des-
de tudo que o mundo apresen-
uetor, o completo despreso por
tros ambicionam, e o que se-
encia se sacrificasse os impul.
<coração e acceitasse um noivo
issem sem elIa sentir por elIe
rosa?
ndições o casamento tornar-
rtura lenta que elIa amaldi-
instante. Mas seu pai andava
mortificado ! EUa bem sabia
lh 'o dis.séra manifestando o
ha de vêl-a casada com o
ear-se? O amor filial insp].
ões de um heroismo admira-
prece fervorosa pedia com la-
e a protegesse e suggerisse-
solução.
imagem do Chiquinho ap-
 90 F. CLOTILDE

parecia-. 111e sempre e mesmo " no meio da o

- virginal' que ascendia pura e fragr
çao d .
te ao throno do Eterno, o, nome o quer
ausen t e subia-lhe aos Iabios
, e ella o .
· na mesma supplica em que pedí
vo 1via ifi , d
Deus forças para o enorme sacri icio e
quecel-o. XIV

da Gloria, a sobrinha do Coronel

osa, morava no Rio de Janeiro
cha de seu casamento realisado
marido era empregado no Hospi-
lr e ganhava apenaso sufficien-
m vivendo com muita economia,
gostava de ostentar a belleza e
Iformava com os escassos rendi-
ão lhe permittiam ter bonitos
ornos indispensaveis á garri-
ureza frivola .
.e mal educada deixava-se galan-
as vezes passando nas lojas, onde
expunham centenares de objectos
éxhibição da vaidade feminil sus-
ia 'comsigo mesma: Si eu quizes-
uelles ornatos!
lhes um olhar de cubiça fitando
I·
F. CLOTILDE
A DIVORCIADA 93
92
ludibriado tangeu-a a ponta-
depois desconsolada o seu modesto ves
a plantar batatas.
de merinó já desbotado e as botinas que
rosto valeu-a. Um moço dou-
viam perdido o lustre primitivo EUa era. r
e um barão que se achava em
mente bonita e possuia certa distincçao q
eu-a no transe difficil em que
nalureza concede a algumas mulheres fa
de-as sobresahir dentre outras que tr
oude.brilhar, pisar em tapetes,
melhor e occupam posição mais eleva-i
-e offuscar as outras cslrellas
mundo. Teve um cortejo de adorado-
Ti n ha '24 an nos e desde os J 5 vivêra
t"ê á mariposa fascinada pela
sempre Ióra das vistas maternas. Pouco
he queima as azas, deixou-se
timava a mãi e corn eUa se parecia no
de encarar as cousas. Casára-se para
• lso ~rilho ?:l riqueza compra-
farnia, e VIveu essa vida ficti-
livre de andar por casas alheias support
na o organismo e atrophia
desafôros, agoentando imposições; ma
ento bom.
cabo de tres dias de casada, si algum sed
meio honesto' especulou com
lhe tivesse offerecido uma existencia lux
maneira mais vil c quando
teria abandonado o marido sem um ar
-se em casa do irmão a fazer
de remorso. O seu ideial era ser lisong
ha, ella no Rio de Janei-
au,rahir a attenção. Encontrou no mei
o os últimos degl'áos de
que vivia facilidades para sustentar. sua
ao hospital, victirna de uma
dade sem dar escandalo, e mystenosa
deixou ás portas da morte.
de aventura em aventura deixou-se pr
0, ao sahir dó hospital, um
em amores faceis. O marido, si descon
pudor levantou se-lhe do iu-
de suas fraquezas, fechava os olhos e
a revolta da consciencia que
soplticamente ia supportando-a e~ caso
remente o seu procedimento
que afinal sabia guartiar as convenlencl
Um dia, porém, deu-se um encontro
\1
I,
95
F. CLOTILDE
94
hados pela luz brilhante de uma
Lembrou-se UO luarido tão bom, tã de Abril sentiu dilatar-se-lhe a
uesceollente que lhe guardara. a rep
dos assaltos da maledicencia e sentiu u tos de manter-se no caminho do
fundo despreso por si mesma. Como o
fraga no supremô esforço pa,ra livrar- o asqueroso deixava-o na Capital
ondas enfurecidas agarra-se a taboa de e a casinha mobiliada e parecen-
ção, ella procurou salvar-se <ia .degra de noi vos on de estreára seus
que a esmagava. e procurem refugio no dos até a enfermaria silenciosa
hospital em que expiára as horas
lho.
- Entrou a instancias de uma amiga tudo lhe veiu á imaginação e.
lhe conservára fjrme nos dias advers soffrér o despreso dos paren-
uma fabrica de camisas e, corno tinha g bem collocados, entrou nas ruas
habilidade para costuras e queria gran com o aspecto modesto e a ap-
confiança LIa dona do estabeleciment a de mulher inimiga de vaida-
conservou-se honestamente podendo :de sua reputação.
dentro em poucos mezes algum saldo. rosto a mascara da hypocrisia.
Teve desejos de voltar ao Ceará. O orpresa para alegrar a mãe e
materno, uepois da existen.c~a tem Ia não estava na capital e fôra
que levára era como o arCO-ll'lS da pa paohia á Nazareth hospedou-se
metter-Ihe bonançosOs dias. . • onde foi recebida como uma
Felizes os que se vendo repelhdos m marido déspota e tres dias
dos tem para descançar i fronte um o trem, dirigia-se ao povoado
amoroso de mãe inuulgente e sempl'e erna cahiu-lhe em cheio sobre
de luz que lhe esgarçava o
ta ao peruão!
Conseguiu transportar-se ás plaga passado criminoso.
ço adas da terra da liberdade e quan 7
. s CO
o nosso abençoado solo e viu o
, I

96 F. CLOTILDE
/'V""\f'\/'I./\/\./"IJ\A./\../V'\/\.AAA/"V'\f\/\/"\./\J\fV"\,f'\.

-~ eJ(9 "êX9~ ~4§í(t

Si O marido a -visse com aquelle a
tado de mulher escrupnlosa e intransi
si podesse sondar com o olhar de um
logista aquelle rosto de uma belleza
teria exclamado: xv
Eis o perfeito prototypu da maldad
refalsada e da hypocrisia mais fina!

e 15 dias a Maria da Gloria achava-

lramente á vontade em casa do
conquistar de todo o coração in-
areth, que, levada pela sua bon-
vira nella uma victima do casa-
otogonista interessante de um
intimos _que despedaçam a
ilias.
ena ouvira a descripção feita
a habilidade de uma cornica
as opportunas e sabe pintar
as mais triviaes, a longa se-
que o marido lhe fizérasof-

niado ! Si ouvisse a accusação

sobre elle pesava teria esbo-
mulher desleal que o cobrira
procurava no seio dos paren-
 98 F. CLOTILO E
A DIVORCIADA 99
tes nobilitar-se r-hamando o odioso sobr
fôra muito infeliz porque não ti-
que merecia apenas compaixão.
Fingiu admiravelmente o papel de m cção de sua mãe.
era tão bom moço, parecia amal-a
honesta, procurou com a mais refinada h
tremo. Pontue não lhe agradava ~
erisia impôr-se á estima de todos, e ve
ertel'-se-ia nos seringaes do norte.
doçura do caracter de sua prima mais
um fóco de corrupção. Calumnia-
fez os maiores esforços para conquista
nenses como o fizéra com o mari-
a confiança.
lhes os costumes com as côres
Nazareth precisava de desafogar as
Os-donos de barracão eram to-
que lhe iam n'alma, tinha necessidade d
as mulheres, Jesus! EIla nem
seio amigo onde repousasse nos mom
al-as.
mais amargurados. N ada mais attrahente
h defendia o Chiquinho; mas no
os que soffrem do que o soffr imento al
que a prima tinha razão em
A prima com o diadema de martyrio,
que fizésse a vontade do pai. .
do subido o Calva rio dos desenganos
tivesse apresentado outro alvi-
tão nova e bella, fascinou-a.
gado desassisada. Todos que a
Teve por ella uma affeição de irmã,
nselhavam-lhe a mesma causa.
tou-lhe a innocente histeria de seus amo
coração recriminava-a quando
botão de lyrio que não chegãra a eles
vagamente em casar-se com o
char, falou-lhe dos projectos do pai e
sua opinião sobre a attitude que lhe eu
perjurio que ella commetteria?
tomar. promessa alguma, e seu amor
A outra ouviu-a com um ar muito
a inclinação que nem tivéra
pungido, consolando-a offerecendo-lhe
samo da amizade leal prompta a chora .star-se por meio de palavras.
ella e .d'epois comprehendendo o terren Ia vendo-a ás vezes vacillar
qu~ pisava aconselhava-a a que obed dvogar a causa do Arthur car-
es do quadro em que o emmol-
 100 F. CLOTlLDE
101

durava e com tanta arte se insinuava n

ar felicidade, de enxugar pran-
ração inexperiente da incauta jovem qu
a bdiicava a vontade e só faria qualquer
' ce
reciar os seus sentimentos cari-
de accôrdo com a prima.
ais depressa fazer a conquista
Já a consultára sobre a hora da visit
ãosinho indomavel, o unico que
lares dos pob~es alternavam-se na distr]
resistir á força de sua enorme
ção das esmolas e ambas igualmente b no intimo achava ridiculas tan-
conquistavam bençãos e applausos por t ões de- piedade.
parte. ia evitar o soffrimento dos ou-
O Arthur fazia da Gloria sua confiden
certo do ascendente que elia exercia 80 o que a Nazareth tivesse uma
animo irresoluto da Nazareth, lhe confíát "a que convertesse as mansardas
seus projectos de felicidade, pintara-lhe a 05 trapos da miseria em rou-
vida de solteiro no isolamento de um qu didas, ficaria· sempre muita
de hotel, pois não lhe ficava bem abusa ,r relativamente a minorar os
hospitalidade do tio, falou -lhe dos peri esmagam os pobres morado-
que estava exposto si não o sustivesse a h de lagrimas. Era, pois uma
do abysmo a caridosa mão da Nazareth e, 1 Iesejo immoderado de ' fazer
exagero proprio da Gloria, maldisse o di rualmente ser o desabafo de
que tivéra a ideia de vir do Sul ascravis sa que estivesse a Iancear
coração que era tão livre. ça misericordiosa e a im-
Elle amava a prima, é verdade, capti W tissão consoladôra e quasi
se nos seus olhos cheios de doçura, na
tileza que se espalhava de toda a sua pes
mas o seu affecto era um pouco mabria
que meROS apreciava nella era a bon
d'alma, aquelle instincto delicado de
 A DIVORCIADA 103

alminha. sel-

a do Coronel, o desejo sempre

r.OI· elle .de ver a filha unir-se
tinham ainda. maior força p ara
XVI
' t .ancia da Nazareth
a cons no
I o CIriquinho. Vendo o paiI apo-
.mpre aborrecido, já um pouco
nho~ que tão prodigamente lhe
entiu um como remorso accu-
cada Vf'Z mais a ami causa de toda aquella trans-
E
STREITAVA-SE
entre a Nazareth c Maria dr Gloria. em saber o que fizesse para
A serpe tentadora dotada decncanto ção pe~osa em que se acha-
gestionadores prendia pouco a pouco -se á ?ISCripção da prima. .
perfidas malhas o coração ingálUO e lea te avezinha cahia afinal e t
e d' n re
candida donzella. e rapina. O genio do mal
Com uma subtileza admir:vel ella ap
rára-se da vontade da Nazarth e , com Q ro~esque~i~o. Atordoada, sem
exercesse sobre ella uma frça hypno da felIcld~de própria e que-
fazia-a ceder facilmente ao eu influxo 8 alegrar o pai, satisfazer a pri-
O Arthur repetia as -sitas duas v Arthur do tenebroso pélago
na semana, já se julgava .oivo, sentia veu-se a dar o sim ao alme-
a imagem do outro ia seJesvanecendo Pobre Chiquinho l Lá
ul tA' . nos
poucos e elle conquista' cada dia al e a mazoma devias ter
r
terreno no coração da ma. A's vezes, s vezes nesse desenlace e sen-
diante de alegria aper!va furtivament presentimento de tão cruel
mão da Gloria dizendc,he: você é a~m
 104 F CLOTILDE 105

Para que te serviria o dinheiro adq atirou-se-Ihe aos braços quasi

do á custa de tanto sacrifício si aquella e-lhe: Quero pedir-te uma
quem trabalhavas com tal extremo esqu baudones !
te e te deixava por outro ~ que eu não tenho no mundo
O casamento foi marcado para Setem e qu e na tua companhia dar-
A Nazareth não quiz enxoval pomposo ente.
grcssando á capital para cuidar em prop que havia. ue SOl' a mesma,
se retrahiu-se eornpletameute. Não sahi o lhe .mudarIa o modo de pen-
casa, recebia as visitas constrangida, m Iagrirnas aljofrarcrn os bellos
ver o 'pai satisfeito e voltando a tratal-a um pensamento negro assal-
o. .
a ternura de outr'ora sentia-se compe
pelo sacrificio que fizéra esperava o di mbe?I uma das victimas do
casamento pedindo a Deus que a susti r-se~la algum dia na dura
para não fraquejar. .pe?lr a prot0ção dos outros ~
A Gloria irradiava de satisfação. Tinh ntímo .u.m desejo invencivel
nho a causa do Arthur, trabalhara para em esprrito o lencinho bran-
felicidade; era justo que esperasse al ~,ue se agitava da portinho_
recorri pensa. via -lhe um sentido adeus e
Que planos architectára para o futuro m abysmo entre ambos t~r-
zéra um estudo perfeito do genio da faz elle apartamento!
e aquelle coração cheio de todas as bond ou-lhe
. as faces ,- deu lh e um
mas irresoluto e fraco agradava-lhe. F ano aos olhos e quando en-
possível p.ara continuar a exercer sobr os atavios nupciaês provo-
a mesma influencia. SUSsurro de admiração entre
No dia do casamento, quando a Naz ados.
já vestida de noiva olhava-se ao espelh Diziam todos.
mirada da pallidêz que se lhe espr~lá lhoso e commovido olhou-a'
 106 F. CLOTILDE

deslumhrado. Ia abdicar sua liberdade d

teiro, entregar os braços ás algemas d
samento; mas era tão bella a mulher a
fazia este sacrificio que certamente lhe
receria plena compensação.
XVII

r de novo a Nazareth dezoito

.depois de casada. Em frente a
azuladas cortinas contempla
que dorme. E' seu filhinho de
O louro e gentil Oscar, que ella
oroso desvelo
lhe a vida agradavel, prende-a
um élo ind issoluvel que talvez
estreitado tanto si aquella cre-
·1 não os tivesse approximado
tro.
o extasi de uma adoração ver.
materna contempla o filho ador-
sorriso de indetinivel ternura
os labios que se agitam n'urn
rece.
o relogio prestes a marcar 11

.'
 108 ~ DIVORCIADA
109

horas, e um certo movimente de inqui sorrisos do filho -

. encantam
se nota em suas feições tão serenas. mais a vida do lar e ame-
E' que o marido sempre ponctual a ra a prima sorpreza·' •
tal ar d ' ~as ve no seu
ás 9 horas demora-se naquella noite. e zombarIa
Ter-lhe-á acontecido alguma cousa? Icuio.a para que]1 ~ que receia
. e a nao supp ,
po decorre. Já meia noite soou e ella ciumes do Arthur f ozes,
, sobre a attrac à al~ sobre o pe-
poder conter abandona o berço do filh
ao quarto da prima. ~
erce n'aquelles qçueOsdlab~lica que
e, e vendo-a dis o e deIxam do-
-Gloria, Gloria, brada nervosa.
errompido mu'~ s~a a.recomeçar
A outra levanta-se sobresaltada,
ffrendo, 'sáe ~ or~ndJfferente ao
porta e ao vêl-a cheia de impaciencia p
em trente a crea~c .cuhra de novo
tranquillisal-a. In a adorme_
-Teu marido está bom, entretem-se
a jogar. Não te afflijas, vai te habitu horas, sôarn umas ' .
que tem as no't apos outras
essas excursões nocturnas que todo 0·1
gôres da ales passadas em
da bôa sociedade é obrigado a fazer. urora com
e,quando el1a eçam a ro-
Querias então que o Arthur vivesse dormitar um ,exhausta da vigi-
mente a te fazer a côrte ~ stada . pouco.
Ah! louquinha, quão mal conhece ,POIS sente em
o com violen . purrarem a
mens! I a
o olhar desvCa . .dOmarido entra
Nazareth revolta-se ante aquella lin Ira o o h Iit
rra a mulh b ' a I o en-
d a prima que achava muito natural o er ruscam
a e depois cá b ente, sa-
deixal-a sosinha e ir arriscar grossas q ito. e so re o tapete
no voltarete ou no baccarat.
Não o pintava ella assim antes d mprehende que '
sentO o Arthur está
nunca lhe-havia falado dessa possibili Imento de asco invade-a
ir pro curar distrações longe della, fi
 110 F. CLOTILDE

Lágrimas profusas lhe irrornpom lios o} A DIVORCIADA

e, como si um circulo de ferro lhe comprimi 111
a garganta, sente falta de ar levanta-se d
r que a quer subjugar de vêz
rientada e achega-se mais do berço do filho
ali que vae procurar refugio para a clôr e
na prima a me.\lma confiança
que lhe causa o despertar cio sonho.
nova que espera conselho e
N'este momento a creancinha de.-pe
boceja de manso, agita os bracinhos
-n~ as Péllavras que eUa lhe
quasi imperceptível sorriso abre-lhe a b
d"omIn~da pela impacicncia da
nha rubra. A moça comprime-a ao seio rido, fô ra pedir-lhe um
-
sa-Ihe a cabecinha sobre o coração dilacc olaçao. •DOU .
de repente pelo dardo do mais cruel d
não toma ao scrio COu~aalgu-
gano e já mais alliviada chóra, chóra .•
do n('1Ia certos modos inteira-
Que horrorosa mudança! O Arthur
na vespera tão bom, tão terno aprescnts "Idos <rue apresentara no prrn,
} ':1. com () enCanto dulci
.
.
novo dominado pelo vicio. E que víci CI~slmo
e leal, de uma ternura inequi-
mais abjecto de todos, aquelle que coll
homem ao nivel do animal. tantu que a trouxél a
Deverá dizer ao pai o proceclimen p:lra cas:a
ra-a com ti dedicaç80 d
marido ~ ea A . e uma
. pensar nIsto levára o d'
Foi a primeira vez que elle nssim pr á 't 1;1.
nOI e, depois do chá , f'ICIJU
cumpre-lhe, portanto, ser indulgente. .'
a quando viu o Arthur que p _
A prima bem o disse. Elle não porli .posto enfiar o paletó e as
eternamente a fazer-lhe a cõrtc. Quan Ir. prcpa-
ver mais calma pensará o que deve"faz -o l,el/indo-lhe amoro~ament
sou o dia febril escondendo as lagrim as cal) . e
( U-se ao Ouvir a prima di-
a certa malicia.

8
 112 F. CLOTILDE

-Então, vae dar uni passeio? O ar:

te ha de fazer-lhe bem.
Olhou-a com uma expressão inde
não poude conter duas lagrimas irnp
que lhe queimaram as faces. O marid
va ao jogo, atirar-se-ia de novo á embr
E fôra para saval-o desses vicios q~e
casára. Havia de salval-o de novo. E
de seu filho e contava que Deus havia
~ge~a. .
Achava ínexplicavel o procedim
prima. Que tinha ella que vêr com os p
do Arthur f Olhou-a de novo e. ao v
bella o quer que fosse de diabolico a lh
parecer no rosto, veio lhe ao espírito u
samento medonho. A sua lealdade rep
Estava nervosa, não pensava cousa ne
acertadamente.
Que interesse teria a, Gloria em
sua desgraça?
Resignou-se a soffrer calada, e no o
ao entrar em casa' do pai apparentou o
ar prasenteiro dos bons tempos. Não
absolutamente que ninguem desconfi
seu soffrimento.
XVIlI
atirou-se em cheio ao jogo.
grandes quantias, e impellido
da cobiça que o incitava á des
rçadú a contrahir emprestimos
se ao sogro. O Coronel es-
e pedido, emprestou o dinhei-
gou a filha.
o não "está procedendo bem,
se está endividando e é preci-
ntou falar-lhe um dia em que
eito afim de fazel-o entrar
• lembrou-lhe o filho por cujo
velar cuidadosamente' , elle ,
do a cabeça como quem leva
usas mais serias da vida

Não te fica

1\
 114 F. CLOTILDE A DIVOnCTADA 115

bem quereres te intrometter com a runhamento acabará por te adoe- .

vida. vir que tomas muito a serio os
Ella tragou o calix mais amargo; e te dá será muito difficil a sua re-
. freu longas noites o abandono immer
e a não ser o filho que a prendia á vid te tentadora citou mil exemplos
desejado morrer. Cahiam por terra to que soffriam atrozes desgostos
esperanças. Fôra horrivelmente cas a e apparentavam felicidade em
pela leviandade com que acceitára um
mento sem amor. A's vezes o ciume m é guardar as conveniencias ,
valhe o marido a conquistar outra m -te de fazer o papel de victima,
deixando-a já aborrecido, ávido de lagrimas e vamos passeiar.
amores. aer principio recusou-se; mas afi-
Mas não! ·Eram outros vicios que o marido comprehendesse que
polgavam e rara era a noite em que o s a ciumes delle e despresava-o,
lito alcoolisado não o denunciava. trações nos passeios, tornou-se
EUa fugia delle n'um grande sent urou atordoar os desgostos que
de repulsão e vinham-lhe impetos, a ; mas coitada I Ao voltar da-
cambaleando, o olhar allucinado, de 'os onde seu prazer fôra sim-
o filho e voltar á casa paterna. fic.ticio sentia-se mais desgraça-
A Gloria vendo-a um dia chorar. diante do berço do filho orava
bordado em que trabalhava achegou grimas copiosas. Um mundo
e com a entonação affectuosa do te a esmagava. A epocha de sua
que a seduzia para o casamento disse- vinha-lhe ã memoria e sem
c: E's uma louquinha, Nazareth, em Iindo-a como uma lembrança
finares por teu marido. . ~em do Chiquinho lhe surgia
Elle cansará depressa desta existe mmando-a, exprobando-a por
.ciosa e voltará arrependido: Distrae- a a um juramento que os la-
 116 F. CLOTILDE
bios não tinham proferido, mas que o co
havia formulado. . , falou-lhe com energia e ter-
Uma especie de volupruosidada amar
vadia-a no .seu soffrimento. As tortur
racsque experimentava alliavam-se me
longe ás dores physicas do Chiquinho
norte, longe da patria entregue aos aza
sorte, soffrendo mil cncommodos em
ma inhospitaleiro que lhe envenenava a
e lhe estragava o organismo. S,3U pai jâ:
ter comprehendido o procedimento i
do marido. Pedir-lhe-ia que interviés
de recriminal··o e ver se lhe acordava
os sentimentos de brio que pareciam a
cidos.
Uma manhã, depois do almoço, ves
foi á casa do pai. Encontrou-o á ler, a
nomia contristada parecendo a braç
algum desgosto. Falaram longameu:
queixou-se de ser o grande culpado
cidade que sobre ella pesava.
O Arthur tinha-o illudido complet
mas nem tudo estava perdido. EUe e
to moço, podia voltar ao caminho
EUa que se revestisse de resignação.
A' noite procurou o genro no Cl
elle jogava sob palavra, chamou-o d
A DIVORCIAbA 117
as graves inconveniencias de seu
o que si elle não mudasse de
urgado do seio da gente limpa e
com o maior despreso todas as
até ali lhe dispensavam amizade.
uviu-o calado sem saber o que
vergonhado na vilania de sua
quando elle retirou-se, em vez
a e p-edir á esposa perdão para
es de seu proceder, tornou ao
uou a jogar com a fleugma e
que caracterisam o jogador
poucos dias o Arthur caminhara
nte na senda do vicio e, sem
agir contra a força impetuosa
ava chegaria &0 ultimo degrao
Poucas horas demorava-se em
da mulher com o rosto guar-
de lagrimas mal contidas. o
o do filho banhado nas graças
â'rimeiros dias de vida, fazia-
vam-lhe remorsos. Uma oé-
ra almoçar não encontrou a
Va a Gloria bordando silencio-
da que precedia á sala de jan-
 118 F. CLOTILDE A DlV()RCIADA 119

tar. O Arthur sentou-se-lhe ao ezes, afim de illudir a bôa fé da

sobre as decepções que xoffrera ultimam apoderar-se inteiramente de sua
no jogo. Um azar terrivel, disse elle, e endo agora a conducta que elIe.
sem dinheiro, crivado de d ivi das e já vej nselhava-o a que embarcasse
zer-se em tomo de mim um vácuo no cir ulher e o filho e fosse levar a vida
dos amigos. A meu sogro nada pedire' de quem tenta a fortuna por todos
minhas eco no mias foram-se todas; não q esmo os mais illicitos.
favor es do governo e mesmo um E'mpreg que ella pagava a hospitalidade,
condições em que m e acho só me traria de que a prima incautamente lhe
res difficuldades. E' tal' de para sahir d
d açal em que me atirei. nceiava por morde r' o seio que lhe
~E porque o primo não embarca p ho.
norte t Lá depre ssa g an h aria uma fo da liberdade de outr'ora já lhe
sem sugeitar-se a certas humilhações. pel de virt ao sa que estava repre-
-Mas a Nazareth e me u filho ~
-Ora, a Nazareth ! Tem o papai que th já não tinha por ella aquella
a deixará soffrer privações, e depois p a que fazia consultal-a a todo o
você que ella sentirá muito esta separaçã tia-o desde o ultimo dia em que
Ultimamente o supporta por honra d asseia r juntas e ella mostrara-lhe
ma. Como todas as moças avezadas a o um ador ador frenetico de sua
julga-se com o direito de trazer o mari oltãra-se e fugira da cornpa-
cravisado aos seus menores caprichos e uito digna para enveredar no
que elle se rebella envolve-o no despreso 080 du adulterio, fechara os ou-
fldas insinuações dá serpente.
profundo.
O Arthur sentiu revoltar-se-Ihe a con -a ao casamento; mas ao abys-
cia ante a linguagem da prima. Cahia a 'a conjugal, nunca I
1) filho a escudava, assim mesmo
cara que ella trouxera afivellada ao rosto
 120 F. CLOTILDE A DIVORCIADA 121
pequeno e Iragil, inconsciente no seu SOl a existencia trucidada por desen-
angelico, puro corno as emanações das b m para amenisar-lhe as torturas
nas nas tardes de Maio. Ia agora trabalhar oíãoante de um filho innocente ! Só
vingar-se do despreso que experimentava m avaliar o bem que faz a carícia
modos frios e reservados da Nazareth. a creaturinha innocente, ainda
Os vicios do Arthur facilitavam-lhe os líto do mundo e candida como os
jectos de vingança. Jamais tivera uni ~e esvoaçam, junto ao throno de
mento sincero para com a prima. Esforç' considerar-se verdadeiramente des-
para vél-a casada, conscia do ascendente 11e11aque no supremo auge da dôr
sobre ella exercia: mas desde a 'primeilll a estreitar ao seio um corpinho ten-
cue
, sondara a bondade de su'alrna apode iêz lhe infiltra n'alma o balsamo
se de uma inveja horrorosa. para todos' os males da vida.
Muitas vezes zombára do Arthur, a
chamava ironicamente de marido mode
dono de casa inimitável.
Quero ver si o primo ha de ir até o
nesta vida concentrada e sedentaria de m
ciumento.
Um dia elle ha de cansar.
Suas previsões realisaram-se, e .a Na
apezar de sua meiguice e dos encanto
nella seduziam logo á primeira vista fo
terida pelo jogo. Soifrendo com uma
de animo admirável aquelle despreso nu
cido a consolação unica que tinha era ref
se no amor do filho.
Oh l bem feliz a mulher que no meio d
~~~~~~~~~~~~~~~
~/V"'J'VVVVVVv':-~:,:~rVV·V\/V\A/V\.f'V\
$
""êXil @X9 @X9 ••.. ex9 <iJJ@"
XIX
grande balburdia no Hotel do N
R EINA.
Chegou o vapor trazendo grande qu
dade de passageiros do Acre e alto-Purús,
paroaras são recebidos pel0.absequioso pro
tario com finezas e offerecimentos e rode
pela multidão de ociosos que sempre ~e p
movimento á chegada dos vapores-vindos
q uelles rios.
Um vago cheiro de ma rezia evapora-s
bagagens espalhadas em desordem. Um r
de 2.J annos, moreno e forte, um tanto p
achega-se do dono do Hotel e depois de
sobre o quarto em que deve se aboletar e
ca do agasalho de uns cearenses que vol
dos seringaes adoentados precisando mel
commodos, perguntou-lhe com um certo tr
ná vbz :
~Conhece o Coronel Pedrosa ?
A DIVORCIADA 123
b::============------
@.<9~19-@Xi)-e:19-
o.genro delle é freguez aqui da casa.
dalle?! O moço mostrou-se verda-
admirado. Receiando perguntar
de agasalhar-se e lá em cima no
especíe de desfallecimento inva-
ntimento triste apoderou-se delle.
ria pisara o torrão da patria!
havia dois annos.perdido nos flores-
zonía, a braços com a rudeza de um
m tregoas, exposto ás ínternperics,
a maior coragem para conquistar
una. A s saudades e ultimamente o
11e o assaltara não lhe permittiram
mais e com um saldo de cinco con-
ra-se a voltar ao Ceará. Quantas
. ndo os encommodos de sua vida de
• mordido de piuns, cansado pelo lí-
te vinham-lhe impetos de transpôr
de e vir cahir nas praias alvejan-
luz, da gráciosa patria de Iracema!
céo entristecido com os negrores
ão tinha o azulfestivo do bellissimo
do Ceará, onde em noite" escuras
renas de esplendor inexcedivel e
as ha toda a poesia. ineffavel, de
rbo.
 J24 F. CLOTILDE
A imagem da filha do Coronel não o dei
e na distancia mais se retemperava o senf
to affectuoso que lhe votara.
Conquistar um futuro para torn3.r-sa
della, chegar ao torrão patrio enalte~ido
merecimento de um trabalho honesto
proporcionasse meios de subsistir sem
sado aos outros, era o ideial que tinha em
a suprema aspiração de su'alma generosa.
A saude ameaçada por um beri-beri qu:
modificado beneficamente na viagem a
fízéra-o voltar mais depressa sem ter con
do a fortuna que o tentava; mas era .sua
ção, depois de leniti var as saudades e gos
encantos da vida da família por alguns
voltar e atirar-se de novo ao trabalho. A
ples palavras que o dono do Hotel proferi
respostaá sua pergunta tinha perturbado
gria estonteante que sentira ao pisar na a
nossas praias. Mas que tolice a sua! O
nel tinha tres filhas. Podia bem ser q
das mais velhas se houvesse casado e &
reth continuasse solteira aguardando o
Não! Ella era a mais linda, a mais a
da. Tinha um iman poderoso na bon
se evolava de sua pessoa e que lhe den
a pureza de sentimentos como a esse
A DIVORCIADA 125
te. mesmo ocultas, embalsamam
ncias deliciosas.
ho embalde procurou descansar
imas horas. Pouco enjoára na
sentia um atordoamente na cabe-
e tar que o privava de dormir. O
meia noite, quando um grande
evantar-se sobresaltado.
ão ao dinheiro que trazia amarra
chou-o íntacto. Viu que algumas
rmiam em quartos visinhos aos
ra-se inquirindo a causa d'aquelle
ativo e, por uma curiosidade
avel n'aquellas circumstancias,
sas e desceu. Em um dos salões
gatina diversos homens procura-
ois jogadores. que em um mo-
se tinham aggredido violenta-
e as maiores injurias.
de pagar-me, seu tratante, os
roubou!
que se tratar perguntou um su-
ia interessado pelo restabeleci-
em.
andija que jogou sob palavra e
ar o documento.
arei, e ladrão é quem faz pato-
 126 F. CLOTILDE A DIVORCIADA 127

ta para ganhar illicitamente o dinheiro a influencia de um pesadello

-Bem, vou ter com o seu sogro e roximou-se do homem que
eRpa1har nos jornaes, em publico, que a terminar a questão pergun-
Arthur Pedr osa Guimarães é um mis
um patoteiro, uma creatura indigna d o à genro do Coronel Pedrosa ?
em sociedade u-se com a mais nova e a mais
-Mas, Sr., dizia o homem, que has delle.
querer conciliar as cousas, entendam-se sco despertar O soalho fugiu
gente limpa O Dr. Arthur assigna o Chiquinho, faltou-lhe oxygenio
mento e está terminada a questão. As
dejogo são sagradas e a palavra de um h o heroico fêl-o voltar á razão.
de bem vale dinheiro. nce viu a existencia da Naza-
-A palavra de um homem de be da, trucidada a todo o momen-
valer muito; mas a de um tratante nã ria feito tão feliz! Comprehen-
valor algum. O Dr. Arthur é a esco eonducta do Arthur já descon-
jogadores. Progrediram os insultos. E mo entre aquelles jogadores,
rivel o cspectaculo que apresentavam soffrendo epithetos injuriosos,
les dois homens meio atordoados pelo r com altivez a divida que C011-
a se cobrirem de doéstos. m minuto horrivel destes que
-Não assigno o documento, não tomar' uma resolução de que
este papel sujo, berrava o Arthur. Si es a desgraça.ou a ventura da
dinheiro pagar-Ihc-ia osf'regando-c n :e sondou a extensão do abys-
-Então ha de ver amanhá o honi atirara inconsciente, levada
Sr. Coronel Pedrosa, si não quizer ver casar-se, e um sentimento
do genro reduzido á ultima infamia mou-o.
os 500$000 que me ficou a dever.
O Chiquinho ouviu tudo aquillo, 9
 A DIVORCIADA 129
128 F. CLOTILDE
.====~::::=
de jogo. Pobre Nazareth! Fôra .".
Approximou-se do Arthur cabisbaix nho o destino que a fizéra escolher
da tremulo de colera, chamou-o á pa nheíro de sua existencia um ho-
,vando-o para umajanella que se abria di.ções do Arthur.
do passeio, por onde entrava uma raí at'via o pergaminho que o salien-
do vento
't
da meia noite com um ch el1'~ o cobria de vilipendios, depre-
d e pi angas e resedas e disse-lhe. tremedal do vicio ~
-Si o Dr. quizer eu posso arranjar quasi arrependido de ter vindo do
500$000 para satisfazer o seu comprom r desfeito o bellismo sonho de sua
Talvezque oArthuraindatranstorna :va apenas concluir negocias im-
lucta que sustentára não tivesse conh e o detinham na capital para ir
seu generoso protector, talvez que co mãe e receber na benção arnoro-
do-o uns restos de dignidade o tivesse via entornar-lhe na fronte o con-
bido de acceitar o seu offerecimento ,. itivo para as desillusões que lhe
tão publico o insulto e havia tantas ame acoragem.
maior publicidade, que elle agarrou
auxilio que lhe cahia do céo e, sem
. perguntar o nome do moço, apodero
cedula de 500$000 dizendo: - O ami
curar-me-à para ser embolsado do SC'1l.
ro ; eis aqui o meu cartão.
O Chiquinho contemplou o pedaci
papel em que se lia em bonitos cal'
Bacharel Arthur Pedrosa Guimarães.
amarrotou-o com um gesto de des
atirou-o pela janellaá fóra. Causava-l
o procedimento d'aquelle homem
momentos depois via-o já sereno, se

xx
para não assustar o
D
E,vAGARINHO
que está adoentado ha tres dia
zareth entra na alcova e senta-se jun
lett.
Lagrimas silenciosas deslizam-se-I
as faces empallideciclas pelas insom
tiriuas, pelo soffrimento que a torna
deiramente desgraçada.
Um novo pezar lhe accentúa as
e a graciosa bocca que outr'ora de
alegres sorrisos tem a expressão da
funda magoa.
Soube ha poucas horas pela pri
succedêra ao marido no Hotel. Ell
lhe o occorrido com todas as particu
parecendo deleitar-se em que ella
até que ponto de degradação chegá
rido.
A DIVORCIADA 131
áz vindo do norte apresentan-
ta generosidade no momento
o Arthur ia ser talvez corrido
ub não podia ser senão o 'Chi-
ação della adivinhava-o e con-
ergonha.
11ea encontrasse feliz, rodeada
s fõra bem cruel o seu fadario !
ornára-se um jogador insacia-
e revolver no vicio não hesi-
maiores baixesas.
500$000 provava-o exuberan-
e com todas as forças para não
famias que elle fazia recair 90-
resolução e, já fortalecida
os sentimentos. que a guiavam,
gavetas do toilette e della ti-
estojo de velludo carmezim.
peram de dentro scintillações
. Era um riquissimo adere-
S com que o pai a presenteá.
u casamento
delle para pagar a divida
500$000 não lhe sahiam da
 A DIVOI\C1ADA 133
i32 F. CLOTILDE

da prima. Tinha desejos de vol-

Sentia-se humilhada diante do Chi
.. d qu bril de peccadora.
e 11e vingara-se o esquecimento em o

ça do tio e das prinias insplrávà-

envol.vêra e devia estar plenamente
ortificação. Não tinha pela mãe
feito.
apaz de dedicação e pouco lhe
Nada diria. Ultimamente escondia
usar-lhe um desgosto.
os menores desgostos, porque sentia-o d
~ pensamento de suggerir ao Ar-
o e as suas revelações apressariam o des
de embarcar para o norte e de
fatal.
anhia delle aventurar-se na es-
Chamou a ama do menino e vest:
sua belleza que agora esplendia
com muita simplicidade disse que ia
o dos 25 annos. As cousas não
umas compras, recorurnendou-lhe a cr
inuar n'aquelle pé. O lar do pri.
com muita insistencia e sahiu.
re um volcão e a Nazareth leal
A Gloria mordeu 0'3 beiços despe
o era não se sujeitaria por muito
A prima emancipára-se de sua tutcll
infame arrastada pelo marido.
Já sahia e entrava sem ligar-lhe a
daçaria aquelle grilhão que ain-
importancia. Via-a enxugar as lagrimas
por causa do filho. O nome do
do ella entrava furtivamente no quart
va dcsconceituado publicamen-
tava que elIa já a supportava por mér
O do Hotel fôra grandomente
cadeza e o odio ia lançando raizes 11
coração, onde nunca tinham germina . 'O Coronel já não ia á casa delle
lindo-se indignado pela sua con:
não mãos instincLos.
O proprio Arthur a informára d
e.
do Hotel e, depois de inJagações sobr vez que lhe podéra Ialar frente
selhara-o vivamente a que em-
paz, chegara a saber definitivamente q
a o norte.
o Chiquinho.
envergonhado, eu que sempre
Que terrivel coinciuencia !
fronte erguida. O Sr. atira todos
Já estava cansada de viver sob
 134 F. CLOTILDE
os dias lama ao meu nome impolluto.
mulher soffre-o por dignidade e eu sint
um dia não poderei conter-me e o esc
será maior. Cumpre, portanto, evital-o
Estava, pois, definitivamente assen
proxima partida do Arthur.
O sogro recommendal-o-ia a amigo
tinha em Manáos, facilitar-lhe-ia todos
cursos para que fizesse uma viagem de
A filha volveria ao tecto paterno,
acolhida com todos os mimos e cuidad
se dispensam as almas martyrisadas in
mente. Si o Arthur comprehendendo
gror de seu procedimento trabalhasse
regenerar-se seria de novo recebido c
braços abertos. Pobre Coronel! A de
da filha abalára-lhe fortemente a sau
esperança que lhe sorria mais proxim
do tumulo.
Em certas oocasíões revestia-se de co
e quando o netinho lhe sorria incons .
gentil estendendo os bracinhos como pa
dír-lhe protecção, desejava viver muito a
amparar aquelle ente fragil.
Fóra cruelmente punido no seu
pela filha ! .
Achava que um principe se honraria
A DIVORCIADA 135
êra o sobrinho a quem prognos-
ro lisongeiro para que a visse
morrer tranquillo; mas Deus
mal o rapaz que ousára con--
to a belleza da Nazareth, deixan-
por ella e expulsára-o como um
! Agora cllc voltara a tempo
0:11 um rasgo de genero,idade
e oorrompido que em poucos
uma fortuna.
eía se revelara fazendo-o beber
do desengano. Urgia debellar
r partido a seguir era fazer com
se para longe buscar a reha-
balho a que até ali se eximira
de um dia para outro o em-
r da abastança domestica e do
ía.

XXI
AvAM6 horas no relogio da Sé.
D O Chiquinho tendo acabado de j
saboreára uma pequenína chicara do deli
café-a melhor sobremesa-e muito pref
aos doces e bons bocados e preparava-se
ir dar, umas voltas no passeio.
A noite promettia ser linda. Estrella
pareciam aqui e ali no caris do firmam
Soprava o brando zephiro agitando hast
bertas de flores e o velho mar a soluçar.
mente embalava os ouvidos na rude
das ondas; Uma senhora com o rosto o
em um véo cõr de liláz com pontinhos b
entrou em um dos salões latteraes do H
faiou baixinho ao creado. Este achegou
Chíquinho e chamou-a á parte.
Os salões áquella hora estavam. d
Sahiam os freguezes para fazer a dIgas
A DIYORCIADA 137
!k===========------
avenidas frescas rescendentes
rese Iás em flor. A Nazareth
um sophá tremula, nerVOS8-,a
1agrill1as que vinham do âmago do
seja a Sr." ? perguntou-lhe o Chí-
rmado pelo criado de que ella o
&lavra.
d'aquella "óz fez o rapaz estreme-
do-se ao braço do sophá agitado
moção subita.
u o véo e um semblante bellissi-
do pelo vestígio da dor [1 ppareceu,
o embaraço. visível da moça.
iora ' E não encontrava palavras ,
olhos, como si elle fosse cul-
m ella, ou como sí não. lhe assís
direito de olhal-a de frente.
u a carteirinha que guardara no
mer tirou a importancia de 500$000
dizendo:
tuir-Ihe os tlOO$OOO que empres-
rido hontem e agradecer-lhe a
intervenção, pedindo-lhe ao mes-
culpa.
ho olhou o dinheiro com o mes-

138 F. CLOTILDE
mo gesto de asco com que olhára o ca
esteve um momento calado. Depois Ilni
do-se de subito, tendo acordado nelle f
te a dignidade que já estivera prestes
cal'- aos pés por causa daquella creatura ,
lhe:
-Eu não tenho negocios com a Sr.1
marido é que deve entender se commigo
tituir-me o dinheiro que lhe emprestei.
-Mas, Sr., eu lhe peço receba este di
evitando assim algum desgosto,
O Chiquinho contemplou aquella mulh
amava tanto tremula e quasi lacrimosa
rendo resgatar uma divida que os desvarí
marido tinham contrahido. Estava alli,
salão de Hotel, que de uma hora para out
dia ser invadido até pelos proprios jogad
cumpria terminar aquella entrevista p
para ambos,
Vinham aos labios do Chiquinho pa
em borbotão para recriminar a Nazaret
sua instancia; porém elle as comprimia,
tando-se a suspirar e fital-a c impungíd
vantára a cabeça, seus olhos se encontra
os della traduziram tão eloquentemente a
ria de muitas lagrimas, o poema secreto
res tão lancinantes, que elle compadeceu
A DIVQRCIADA 139
di "se-lhe
m, minha senhora, acceito o di-
nto-a porque é verdadeiramente
represadas desceram, e sob o
indiscreto que mal encobria a
ea do dolorido semblante. viu-as
fulgirem como pérolas. EUe que
ra de longe ávido por ver a mu-
pertencia a oútro, elle _que cur-
vehementes no exilio, nas estra-
dos seringaes, sôb a treva do céo
noites de escuro, ou na corrente
alosos em fragil canôa, vendo a
-se sobre elle da bocca escanca-
bio ou do seio dos pantanos pes-
uejou diante d'aquellas lagrimas.
mão gelada que ella apenas to-
os tremulos e entrou desorien-
0, emquanto ella se afastava li-
sonho que se evapora.
os salões se encheram. A. musica
ava variações soberbas, ouvia-
passos. o alegre zunzun dos pra-
nsões da mocidade festiva
o lá em cima no quarto ainda es-
 1~O _ .....&_ ~~P.L. P.L. .r:, _-RL RJ..-
F. CLOTILDE I"\J\..~AAI"\.f'\.j"\A/'\/"\A/\.J\.A/'\/'\.fV'\.f"V"\J"\./\./'V'V'"A

AAAAAAAJ\.A~AAAAAAAAAA/'\AAAAA~
~~:;:;':s~eC"C:(§=
w(9@i§@i§@X9@(§ex9@X9
curo julgou-se mais desgraçado do qUI) 11,:
meira vez que dormira no barracão 10
patria milhares de legoas, perseguido) pel
rão dos piuns, sem poder conciliar o s
tendo pesadellos horriveis. . XXII"
Atirou-se á cama mesmo vestido e
que tinha febre Era o sangue que se revo
nára, abalando-lhe todo o organismo
Não poude dormir e ás 11 horas des
voltou do Hotel cansada, sob a
salão onde jogavam.
ortissima dos nervos que haviam
Bebeu um calix de cngna " a~celldéU u
él abalo, a Nazareth mudou ás
ruto e, sentado junto a janella, acompai,
upa e recomeçou a sua tarefa de
jogo n'aquella noite bem animado. inveja
Q filho.
fleugma d'aquella gente que perdia tal
dera um pouco; a creança dor-
nheiro, sem que um só musculo do ro
ella mais tranquilla com relação
notasse a mais leve alteração,
o pequenito sentára-se na chaíse
de descansar um pouco das emo-
ntadas. Parecia que estivera a so-
a pouco tempo de sua visita no
visto mesmo o Chiquinho ~ Sim,
bello e mais sympathico do que
pela ultima vez. Sempre bom e
ra o marido do vexame em que se
infames co mpromissos de jogo, e
do não via a humilhação que
ida pelo nobre rapaz.
 142 F. CLOTILDE
Como se podia descer tão depress, a
da abjecção ~! Ella já não acre litava na
neração do Arthur. Via o sangue frio
elle arrostava o clamor da opinião publ
o recriminava acremente, admirava o c
. com que elle ria dos conceitos odiosos
contra seu nome. ..
E aquelle homem tão moço e já tão
cido no vicio era o pai de seu filho! !
O que fazer para recondusil-o ao ca
bem?
Palavras nada produziam, lagrim
veriam para exasperal-o. Pelizmente o
va ali bem perto de braços aberto') p
bel-a, prompto a indomnisal-a dos soff~
que lhe trouxera o tal casamento visto
sôb um prisma tão lisongeiro. Mas, q
se enganaria n'aquellas condições?
. Quem supporia um moço como o A
raz de rebaixar-se tanto ~
Tinha pena d'elle, A lama em que
dára ennodoava-Ihe tambem a pureza
recahia até sobre r.s arrninhos do ber
repousava o filhinho ído'atrado :\Iel'!~
profunda meditação roi arrancada. (f,
suas scismas pelos passos do marid
trava.
A DIVORCIADA 145
a um semblante alegre, o olhar es-
impido. Acercou-se do berço, beijou
do filho, tão rosea por entre a cam-
~misinha e sentou-se junto da mu- •••
tens, filha ~ perguntou-lhe dando á
flexão amorosa e misturada de com-
oravas ~
encontrou palavras para respon-
ção do marido, e apenas uma Ia-
loquente do que as outras correu-
o da face esmaecída
e te tenho causado afflíções, minha
e queres?
em é sujeito ao erro e aquelle que
10caminho sinuoso do vicio diffi-
orna a estrada limpa do bem; mas
tá perdido. Vim hoje ter comtigo
ajudes a sair de um máo passo
e seriamente compromettido e não
-rne do Ceará sem liquidar minhas
o,
'das de jogo!
de dois annos elle tinha desba-
nito capital, tinha estragado quasi
expondo aos azares da banca mal-
tO
 146 F. CLOTILDE
dita do baccarat e do voltarete
unico filho.
Esperando sempre uma bôa collo«
mamente já não pedia favores ao gov
quem o sogro fazia opposição e vivia
para o vicio a que se abraçara com ver
delirio.
Ah! o jogo, quantas famílias tem
á miséria, quantas lagrimas tem arran
esposas e ás mães! . , mas de que lhe serviria va-
A Nazareth conservou-se um Insta
da, depois enxugando u~a nova la?ri
víéra perolar-lhe a face, disse ao marld~
Que queres que eu faça para te h
máo pnsso em que te achas, meu po
thur ~ Com movida ante o ar melanco
eÚe apresentava-fêz-se terna, quiz sal
um excesso de bondade, disposta ao s
sublime no seu papel de victima res
misericordiosa.
EUe contou-lhe os prejuísos que ti
ultimas noites, pintou-lhe com as 111.
sas cõres as alternativas ela vida de J
seducção terrível do vicio sobre as
fracas e terminou pedindo- IIre :-e~ a
'.
brilhantes para empenhal-o e aSSIm
de credores impertinentes
A DIVORCIADA
dirigir-se ao sogro que ultima-
elle mostrando-lhe o mais pro-
. A tranquillidade do lar estava,
s della Havia de encontrar o
as joias e então elever-lhe-ia
salvação.
a misera responder?
dasflzéra-se do adereço para pa-
. so mais serio do marido. Ti-
A a questão do marido eram os
reduziriam mil vezes mais e
nele facilidade de serem vendi-
das?
hesitar sentiu se contrariado e
que recebeu encheu-se de raiva.
chaves do toilette, abriu ner-
a em que ella gu-rrdava o es-
revirou-a, ernquanto ella chora-
. te e nada encontrando exaspe-
-se dolla com um gesto brutal
óra ató ali, nem mesmo quan-
ida e sacudiu-a dizendo:
dar o adereço ainda mesmo con.
é.
genio da Nazareth revoltou-se
 148 F. CLOTILDE A DIVOR.CIADA
====~=
e levantando-se já sem lagrimas erecta. e com a tua leviandade. Nazareth
berba nos assamos da dignidade que não yictima de um pesadello e abrindo
xava praticar uma vilania, nem mesmo arrecida, sahiu desorientada, tro-
ohar-se com uma mentira respondeu: ()-tapete, como se estivesse sob a
-Eu não posso dár-lhe o adereço .:de um somnarnbulismo estranho.
hontem empenhei-o para pagar a dividi ve um sorriso mephistophelico .
baixa que o Sr. contrahiu no Hotel do olhos scintillaram e fechando ~
Um relampago que lhe tivesse deslu em seguimento da prima sabere-
de repente a vista não o teria assustado t temão os deleites ambrosiacos da
Comprehendeu que a mulher sabi
lembrou-se do passado, e um pensamen
me surgiu-lhe no cerebro desvairado.
Que pressa tivéra ella de pagar os
do rapaz! Tinha então falado com elle
a informára tão bem do occorrido t C
teza haviam falado a respeito de sua
famante I O adio cegou-o, e hallucina
gido pelo demonio que lhe soprava a
do palavras de vingança deixou a
quasi desmaiada, nem ouviu os va
filho que acordára assustado com o
seus' passos e sahiu pela rua á fora c
louco.
Subtilrnente a Gloria penetrou
e abalando a prima ainda entorpeci
lhe de chofre: I •
-Vai salvar teu marido da desgr

..
.-&-.-&-~...P.-~Jh_J.,> ~.J.L -8....... .c;>,
/"\~I'\/'\.I"\.f\./"\.A./"\.Ar\./\./"\,r../\.r\./"\.~

~/\'/"\A/'\,/'\.A/'V"V'\/\./"\./"\.rv"~fV\ AA.
A DIVORCIADA 151
~êX9 ~ ii9-eJ(9 ~êX9-@)~@X9--e:xt
ornem está louco ou tem a razão
pelo alcool, disse afinal.
r a bebado ha pouca distancia
ratava sem o menor vislumbre de
XXIII
tuna da familia não teria certa-
tle entregar-se ao hediondo vicio
ez.
njectados, os labios crispados em
os, o gesto de furor, a vóz "rouca

O aconselhava
no desvario da colora
ARTHUR
a vingar-se no pobr
da desfeita que a mulher acabava de ta
do nelle indicava uma paixão
plodira furiosa ameaçando chc-
() extremo O Chiquinho tinha co,
recusando o adereço, entrou tresl
am aquellis bravatas que o fa-
mente no salão do Hotel e vendo o Chi
as lembrava-se que tinha dian.
que acabava de justar suas contas, dis
do da mulher que,ainda na ves
ir ernbóra na madrugada seguinte i
a expressão mais viva da dôr
sobre elle insultando-o, cobrindo-o de
mblante, da mulher que viéra
tOS injuriosos.
a resgatar a divida do marido,
-Cobarde ! Especulador! bradava e
hida para dar expansão ao vicio
dendo todo o sentimento de delicade
elle amára tanto t que amav;
conservando O menor gesto de homem
mado á pratica da bôa sociedade. II.A tu reprimisse o sentimento no
o.
rosidade era um calculo infame. Eu
e, a imagem tantos dias, tantas
tudo o que se passou e não consenti
eeo estrellado a bordo, ou em
teus intentos se realisem.
a terra do exílio, jamais dei.
O Chiquinho estupefacto nem soub
ella. P~voáva aquella imagem
cipio o que responder.
da, quasí sem abrigo tendo ape-

nas o companheiro que, exhausto pelo
lho e com o coração livre tratava de ent
se ao descanço.
Vagando na íragil canôa sobre a co
caudalosa dos rios gigantescos sentia na
que encrespava a superficie das águas u
mulo de esperança e toma va-a por men
de um protesto de amor e fidelidade vi
tt\fl'a do berço onde ella pensava igu
nelle e implorava a Deus por SU3. felie
Desilludira-se ante a realidade cru
matara .de um só golpe todas as aspí
de su'alma. Nos primeiros momentos t
se de odio por ella; mas sabendo-a
compadecêra-se de seu infortunio e Ia
va-a.
A fatalidade collocava-o em frente d
e este, desvairado atrevia-se a insultal
tuitamente como si elle fosse um farro.
qualquer sem direito á menor attenção.
Si elle o tivesse aggrcdido reservad
el-o-ia desprezado como a um louco;
aggressão tivêra por testemunhas. u
pessoas, e elle seria um miseravel SI a
se calado.
Havia de degradar-se
A DIVORCIADA 153
~=============----------
[lludira e n em lhe déra a menor pro,
zade durante a ausencia ?
a cobardia, e elle jamais fugira do
seguiu-se o tem peste ar da colera
uma desforra immediata.
ma destresa de quc ninguem á pri-
o julgaria capaz, agarrou o insul-
punho e disse-lhe:
vai retratar-se do que disse e reti-
ltos que me dirigiu, senão eu esbo-
quiz intervir; porem a maior
spectadores era a favor do Chiqui-
. vamesmo que elle désse uma li-
Vido bacharel, a quem ainda na ves-
tão magnanimamente de um apu-
o emprestando-lhe avultada som-
maldizente, verdadeii (I parasita
e falar dos outros e á custa dos
~ou logo um mysterio n'aquelle
rene que bem podia ser motivado
que é bem bonita a.mulher do DI'.
urou baixinho, e ... quem sabe f
 A DIVORCIADA 155
154 F. CLOTILDE

e trazia no bolso feriu-o de um

Mas o quer que fosse de estranho o
o a não terminar a phrase vacillou, quiz falar; mas a voz
A Nazareth entrava no salão do Cl e na garganta. A perda de san-
desvario de uma afflição terrivel e ao ou-lhe vertigem e cahiu, emquan-
pecto fez-se um silencio imponente. sahia precipitamento, sem que
A mão que o Chiquinho erguêra par asse em detel-o, tão grande fôra
fetear o atrevido bacha rei cahiu inerte.
rapido o ataque.
Os espectadores mal respiravam,un
a acudir o Chiquinho; mas um
padecidos d'aquella mulher tão jovem
80 repercutiu nos ambitos do sa-
a quem o marido dava tão crueis de
I"eth. debatia-se em um violento
outros desejosos de que o escandalo ro
l'VOS e jazia semi-morta esten-
os diques da conveniencia.
o.
Ella, a pobre moça, mal podia c
foi enorme. Soaram os apitos,
borbotão de pranto que lhe corria ao
s no encalço do fugitivo, e em,
do rosto vendo o marido pr-estes a s
&- o medico, trataram os que
affronta mais cruel que um homem po
do mais interesses de reanimar
frer de outro: ser esbofeteado em pu . as.
Ficou extatica sem dar um passo, ar o Coronel.
zer um gesto. Apenas a eloquencia da
a escrevia elle as cartas mais
mas, o poder imperioso da formosura
igo de Manáos recomrnendan-
lada pelo soffrirnento indicavam que eU
Talvez que nem a visse o Arthur c
lido e tremulo ao Hotel, t~ ven-
raiva, ebrio de furor. filha, a quem o ether fazia re-
Aproveitando o momento em que
pouco os sentidos julgou-se
tentes d'aquella triste scena se distrahi
,d~ e infeliz que desejou não
a entrada da Nazareth atirou-se de no tuída ávida.
bre o seu antagonista, e sacando o
 A DIVORCIADA 157
15B F. CLOTILDE
nos braços apertando-o bem
Sim! A motre era preferivel á um ração.
tencia tão atormentada como a que ella a xo d'aquella tepidez suave como
tava, ligada á uma creatura sem dec· sentiu-se reanimar.
. fiim devi
JO evra ser d esastroso, si não are epetidas vezes o rostinho angelico
no caminho do dever regenerando-se d e depois dirigiu-se ao quarto da
sado envilecido. Grossas lagrimas corr
longo das faces do venerando Coronel -a. por muito tempo, bateu áporta
nem pensava em contêl- as, nem se mguern respondeu. Aquella hora
constrangido diante d'aquella gente p ia ido ~
verdadeira dôr impôe sempre respe'ito.
Afinal a Nazareth abriu os olhos e
se despertasse de um forte ·pesadello·
••
rou-se ao pai n'um gesto febril desa
soluços.
-Quero sahir d'aqui,
para fóra.
Quero respirar!
N'este tempo o
o ~xame feito no feril1lento do Chi
declarava ser grave o estado delle
era preciso levarem-no á Santa Casa,
via mais facilidade de fazer-se um
em regra. .
O Coronel tendo acompanhado á
filha que fôralevada cuidadosamente
cadeira mandou ver o netinho e um
 A DIVORcrADA 159

m seu cérebro desvairado uma

o pungia: a desolação de sua po-
e o esperava tão alegre,· anciosa
-o nos braços! Como prevenil-a
licidade? Devia levar-lhe a triste
XXIV legramma no seu terrivellaconis~

não podia ficar assim sem explí-

'tiemora. Ia pedir que escrevessem,
do o ~ue se tinha passado; mas

E STARA' d isperto f .
Ainda atordoado, parecendo c
a influencia de um máo sonho, o Chi
u pai sob um pretexto qualquer.
na revolução que haveria em
e tudo era alvoroço e festa, não
.ern uma enfermaria reservada, para o
o pranto. Fazia-lhe mal qualquer
recommendado pelo medico nem po rte, pois o medico reoommendá-
I I coordenar as ideias. as para que ligar tanto interesse
Na vespera telegraphára para a fami
lias condições?
venindo-u de que no dia seguinte ida;
ncarregada da enfermaria veiu
çal-a e a fatalidade fizera delle uma
edio e com a delicadeza que tem
A Nazareth lhe era funesta! Por cau
ca~idade agei~ou-lhe a cabeça
amor que clle recalcára no intimo
. sserro, passou-lhe a mão pela
com o maior heroismo, estava so e
Ida e recommendou-lhe que des-
rorosas dôres! Mas ... que culpa tin
bresinha t Não era igualmente um a
o podésse fazer I O somno é
Não soífria o maior supplicio que uma
ara os que soffrcm; mas a Ira-
pode experimentar neste mundo-a~
tão rehelde que Em vão procu-
queneia de um casamento desastrad
para esquecer.
No meio dos pensamentos sem ne
 A DIVORCIADA 161
160 F. CLOTILDE

leito, e mais baixo, como si qui-

Era a hora da visita. Uma mulher
inguem a ouvisse disse-lhe:
jpyem,. envolta em um vro negro e os ima da N azareth, e vim a pedido
entrou na enfermaria e acompanhada d
moça que auxiliava a irmã nos seus mi não poude dizer mais nada o Chi-
de caridade approximou-se da cama do meio de seu soffrimento a lembran-
quinho. alecia-o! Não o esquecêra de todo!
Este sentiu o coração bater com ma'
generosa para com elle. Sabendo-o
ça e lançou um olhar curioso sobre a r
esposo tresloucado que lhe inflin-
vinda que erguêra o véo. Era a primei rigorosas torturas mandava aqu.il-
que via aquelle rosto levemente moreno
ns eira informar-se das condições
fulgiam dois olhos negros a desp
ava.
chispas de lúz. mentia descaradamente, pois sa-
Achou bem graciosa aquelJa moça e
a da prima desde a vespera ; mas
o frescôr da idade, elegante, a despren .. '
a impellia fazendo aquella visita
si esta graça irresistivel que denuncia
mguagem melliflua de actriz com
lher da moda e lembrou-se da Nazareth,
ludir os mais espertos descreveu
Que lhe quereria aquella jovem?
vida intima da Nazareth, o arre-
o conhecia? Que interesse podia ligar a
que ella sentia de haver casado,
do em que elle se achava?
~ue soffria por ver o marido jo:
-Como vai? lhe perguntúu ella, est
~Iadamente atirando todos os re-
do-lhe a mãosinha aristocratica, bet
ilia na voragem do vicio e ter-
veias azues e tresandando de leve e
á

ndo-Iho que para satisfazer a divi.

de rosas. que o marido contrahira para
-Melhor, reslJ{)lHlcu clle, muito
obrigado! Apenas a fraqueza me enc
ainda bastante. 11
Então ella desembaraçadamente se
 162 F. CLOTILDE
A DIvnRC1ADA 16::\

com elle empenhãra .o adereço de bril u repetir o remedio.

a melhor joia que possuia. e que, alem do medicamento
O Chiquinho ouviu-a falar sem ba influira poderosamente para a~
uma palavra e quando ella ia retir::tr-se rapáz.
do pelo encanto que a envolvia e que e
á confiança ao primeiro lance de vista
lhe o obsequio de receber os ~OO$O
desempenhar o adereço.
_ -Espero que a Sr.· ha de arranj
muito bem. Será o maior obsequio que
prestar-me e eu jamais o esqu erei.
Guardara o dinheiro em uma cartel
estava sôb o travesseiro, abriu-a com
esforço e entregou á Gk ria a quantia
cebêra na antevespera das proprias
Nazareth.
Poderia acaso desconfiar d'aquclla
ra adoravel, de voz tão blandiciosa, pa
a Nazarcth não tinha segredos?
Satisfeito por ter tido uma prova p
de que ella não o odiava e antes lig
resse á sua saude conservou- c cal
tardou a a-lormecer.
O somno fêz-lhe um bem enorme, e
o medico veiu vêl-o encontrou-o nas
songeiras condições.

xxv
o apito do trem.
O UVE-SE
Na casa do Chiquinho
alvoroço.
A Loló radiante de alegria dá um
della ao espelho e collocando nos ne
bellos um boião de rosa branca chama
os irmãos para irem á estação.
A mãe não sabe o que faça para q
moço seja o melhor possivel.
Vai da cassarola de gallinha feita d
pardo á frigideira do lombo appetito
os ovos para a omelette, limpa o palit .
rcita os guardanapos, verifica si está
ordem e ainda lhe sobra tem po par
perta da rua.
A visin hança está igualmentl' al
Todos querem bem ao rapáz e dese
çal-o depois de tão longa ausencia.
A D!VOnCIAD \. 165
mostram-se prasenteiras e prepa-
etes de flores para desfolhará sua
Uns fremitos de alegria sacodem os
'ncel'os d'aquella gente que não sa-
umprimentos em phrases rebusca-
ue revela o sentimento d'alma na
das faces, na expressão dos olhos
alviçareira dos sorrisos.
vêz o Chiquinho casa mesmo, diz
a, a filha do carpina que era uma
aentes do rapaz.
. Dizem que os seringaes são mui-
~ara quem vai sosinho a vida ainda
? A namorada do Chiquinho, aquel-
[Ua da cidade casou.
um que cara vai ficar o Chiqui-
.
em si elle casasse com ella em
m anuo ficava viuvo.
orno tarda o trem i dizia uma outra.
Mariquinhas já foi para a estação
do correio.
um silvo mais approximado, e
entos o fumo da machina turbou
te nitidez do ar.
dos meninos de taboleiro resoou.
é I O leite! O cuscú~! A aguar-
 166 F. CLOTILDE

dente da bôa! As cegas, á cuja fren

Sr.' Agueda, levantaram-se, o galpã
deserto e o rumor que se agita se
chegada dos trens se fez ouvir n'um c
do espantoso .
Nada de Chiquinho !
Não veiu ! Não veiu! dizia a
pontada.
-E' possivel ?! E o velho percor
carros indagando, já afflicto, .pensan
tivesse acontecido alguma causa ao fil
Elle ha de telegrapha r. Teria pe
trem?
Não creio. Madrugador como é
nos prevenido que vinha hoje só algu
sa extraordinaria poderia prival-o d
prir a palavra.
O velho entristecêra e um presen:
negro invadia-lhe a alma. A Loló s
custo as lagrimas.
Voltaram immensamente tristes,
uma carta explicava a demora do
mãe afflicta veiu rccebel-os com mil
tas, e por entre lagrimas commentou
rentes modos a demora do filho.
Toda. a alegria converteu-se em t
os guisados em um abandono imrne
 A DIVORCIADA 167

tos nas càssarolas, pois ninguem

e almoçar com aquelle desanimo
ã uma decepção.
egramma! Até que emfim !
, nervosa a Loló apoderou-se do
ue lhe entregára o agulheirr e
asgar o envolucro.
ta acontecido, meu Deus ~ Para
hiquinho meu pai ~
explodiram.
untas se fizeram; a visinhança
os que esperavam fartar-se no
e em algum trago de bom vinho
do cruzes na bocca.
ma dizia:
falar meu pai antes seguir. Venha
 A DIVORCIADA 169
=======
a Pa-

thur abraçou-a n'um transporte de

. Aqucllas duas almas torpes estavam
XXVI :e iam de hora em diante trabalhar jun-
sua felicidade culpada.
te 1hes acenava com a perspectiva
auferidosá custa das maiores infa-

estava em poder embarcar disfar-

A GLORIA atravessou
n'aquelle andarzinho
ligeiramente
faceiro co
corria ás aventuras no Rio de Janeiro
de modo a não serem conhecidos.'
ateiro prometteu arranjar as passa-
o véo descido, como quem deseja não s ha um amigo que/morava na praia e
nhecida,dirigiti-se a uma casinha retir e se encarregar desses negócios, me-
Oiteiro, por traz do Collegio das educan bôa esportula.
N'ella morava um sapateiro compad casa delle foram o Arthur c a Glo-
mãe da Gloria e que lhe era muito de dia seguinte; elle com uma simples
e fôra ali abrigar-se o Arthur, até po perario e ellasingelamente vestida,
vrar-se da enrascada em que se en uma costureira despreoccupada e
ferindo o rapaz. maram passagem no' vapor "Espi-
Afflicto para sahir da Capital. onde
momento para outro podia ser desc - a ao vel-os tão junto.'! sempre en-
combinára com a Gloria ir esta visit versas mysteriosas que eram dois
ente á Santa Casa e arranjar as co reand o os dulçores da lua de mel
modo que os taes 500$000 voltassem ás nte nenhum conhecido mais perspi-
O estratagema tivéra bom resultado. ívinhar que sob aquelle trajo gros-
A Gloria entrou resplandecente avaso um bacharel que deixára

170 F. CLOTILD~
nome na Academia e ainda ha pouco
flanàva nos Clubs perdendo sommas f
sas tentado pelo demonio do jogo.
A Gloria, para chegar ao fim a que
punha, persuadira ao Arthur que a
não o amava e mais de uma vez lhe con
ra ter-se arrependido do casamento qu
trahira, somente para tomar uma desfor
ausencia do namorado, a quem jamais
cêra.
Calumniava a prima com o maior s
frio, com aquella indifferença que tin
tr'ora para saquear as bolsas dos rapa
sentimento polluidos.
O Arthur c••nsiderava a mulher cap
todas as deslealdades e felicita vá-se
ferido o antigo rival, pondo-o ao men
algum tempo Ióra de combate.
Fazer da Gloria sua amante era um
feerico; mas associar- se aos provent
ella podia auferir na indecente especul
sua belleza era mil vezes mais agrada
Incapaz de comprehender a belleza
da esposa, passada a embriaguez
ros mezes de casado, ahandonára·a co
mente pelo jogo e em seguida, preso c
mais em solidas correntes, subme
A DIVORCIADA 171
fSi==========:::~~====
desmoralisa-
the mal soffrer aquelle despreso bem
ver fecharem-se á sua passagem as
se lhe. franqueavam e sobretudo a
recursos que não lhe permittia sa-
aixão devoradora causava-lhe des-
loucura.
heiro a todo o transe era o seu ideial.
er nas condições da Gloria, cheia
ões e de defeitos, convinha-lhe
te. Assim pactua- am de corpo e
juntos. . _
jogavam. O Arthur arriscou al-
iro é ganhou. Isto era um bom aus-
lle que ia entregar-se d'ali em di-
sorte de aventuras. A Gloria quiz
á sombra até chegarem ao Pará.'
vin?a expô r-se assim tão depres-
~lOS da rapaziada de bordo. Fi-
rmentada do epílogo de suas
turas e a cama do Hospital onde
. '
noites de febre em vigilias de-
ão lhe sahia da imaginação.
s
80 saber marcar bem o alvo para
trabalho.
tomou amizade com um dono de
 A DIVORCIADA 173
172 F. CLOTILDE
Identes até Canutama, onde se demo-
seringal que ia ao Alto-Purús levando al guns dias.
miseros cearenses suggestionados por rthul' voltando para o hotel deu com
messas deslumbradoras e a quem encant ete em que a prima explicava-lhe a
os bellos olhos da Gloria velados pela terminava dizendo:
seductora modestia. brei o meu compromisso; mas como
Saltaram juntos no Pará. O amasollis dos não se beijam trata de procurar
vou-os a um bom hotel, pagou a de sob a protecção da dama de ouros,
mostrou-se generoso e, vendo o fraco u aventurar-me nas campanhas dos
Arthur tinha para o jogo, favoreceu-o em o amor.
tand o-lhe dinheiro. eravel! bradou o Arthur amarrotan-
A Gloria fez-se garrida, e vendo que ete. Mas; afinal de contas aquella
jeito estava enfeitiçado, pôz em campo a a podia ser-me fatal, e assim foi me-
manobras com as quaes contava sempre :batido a linda plumagem!
ria.
O Arthur com a febre de jogo torn
um trambôlho e, corno o amazonista e
l'apagão sacudido, e indinheirado pare
não ter em muita conta os contos de rei
tando-se de desfructar a vida, uma bell
em que o Arthur jognva arriscando I
que lhe déra' o amigo, a Gloria fugiu 00
e no outro dia, no vapor da casa forn
ra, singravam ambos as aguas do rio.
Enlevados nas promessas que se t<l1a
ao outro de se queft~rem muito e de c
logo que chegassem ao ponto terminal
gem, proseguiram em agradavel tra
 A DIVORCIADA 1'i5
~~H~~n
'H'~"~~~tHH~H~~H~~J}HtH}
~r@ @ @OO ~~> @ ~T pultura. Desde a fatal noite em que
1fffftttt1t1~~f'U~ff'Uf.t1~f.'f~·U1~'fUí'f exhibira tão desastradamente no
otel, trouxera a filha para sua casa
della com o mais affectuoso des-

XXVII s tambem tinham sido incansaveis

11 pobre moça de attenções e cui-
ta de muito extremo consegui-
voltasse d'aquelle desanimo que
polgal-a.

D EPoIs de muitos dias passados n'um

mento que fazia nec ia.r uma grave
midade, a Nazareth pôde levantar-se
ais o Coronel pronunciara
havia posto a irmã em campo para
o nome

radeiro ela Gloria; mas tinham

um curto passeio no jardim. Estava-se
todas as investigações.
do inverno, as flores cheias ainda da 1
-se diariamente elo estado do
nia hybernal espalhavam emanações de
nal tivéra a satisfação ele saber
vissimos perfumes. Entrava alegremen
raio ele sol por entre as ramarias de em convalescença, fôra para
ramanchão de madresilvas e jasmins, que arranjara uma engenhosa
explicar a aggressão de que Iôra
sombra o Coronel gostava de tomar
do inteiramente a coberto a re-
café á tarde.
azareth.
EUa muito pallida contemplava. em
cio a pequena área ajard~na?a ~uc se vem-se 3 mezes que o Arthur em-
dia a seus pés e uma lagrimâ aljofara o mais leve indicio havia sido
lava-lhe o rosto gentil. roteiro que seguira.
O pai achegou-se della, o andar V? tava um mimo, era oraio de sol
arrastando os pés, parecendo soffrer l~ o interior d'aquelle lar mergulha-
mente um mal que não custaria mui • Quando entreabria um sorriso
 176 F. CLOTILDE A DIVORCIADA j77

meigo sacudindo OR bracinhos n'um iava o marido e pedia a Deus com

desenvolto e gracil parecia animar a o trouxesse regenerado e arrcpen-
creaturas que o infortunio firira tão de
dadarnente, e como que lhes dizia nos b Ia tarde de Maio descêra ao j ardim
cios encantadores :-Não sou eu o mais e no banquin ho rustico veiu-lhe
mensageiro da esperança, a melhor ga queno povoauo onde fôra conva-
da paz? hou os olhos c pareceu-lhe ver uma
Para que tantas lagrimas ~ io ruinada. Em um quarto mal
Realmente ellas iam escasseando agonisava uma velhinha tisica,
porção que os seus sorrisos se tornavam uas raparigas na flõr da idade
f'requentes. esesperadamente. Ella sustentava
A Nazareth quando o tinha nos luz bruxoleava ao vento que en-
sentia um calor benefico aquecer-lhe o tersticios das paredes' esburaca-
ção regelado e desejava viver para po rapaz moreno e syrnpathlco em .
pertar por muito tempo o corpinho n gava aos labios da moribunda o
seo que lhe communicava resignação redempção. Esse quadro estava
forto e experimentar ainda a doçura ba Q seu espírito que parecia ter-se
d'aquelIes beijos a compensal-a dos e scena na vespera.
de fel que seus labios haviam tragado. u arrancal-a á essa reminiscen-
Pensava a miúde no Chiquinho feri dulçurosa recordação do passado
causa della e arriscando-se a morre ia uns laivos de saudade e ha-
aquelle pensamento não lhe caursva vemente no hombro disse-lhe com
leve remorso.
Sentia por elle um affccto calm pensavas, minha filha?
o soffrimento tivesse sanctificado aqu um sorriso desconsolado e, ava-
tima e dado ao seu amor um caract
elevado, 12
 178 F. CLOTILDE
--- A DIVORCIA1JA 179
liando o que o pai soffria por causa
mostrou -se calma. IJlS, seria de min ha parte uma acção
-Eu nem sei mesmo em-que pensa e jamais praticarei assim.
pai. re e admiravel o teu procedimento,
Conversaram alguns instantes 80 ,• mas has de fazer um sacrifício
sas triviaes.
Em seguida fazendo um violento tua saude debilitada, no teu fi-o
o Coronel tirou do bolso um pedaço d im que já me sinto proximo do
marcado com um lapis encarnado e m o teu marido colher os fructos
á filha. as que praticou. Deus é infalli-
A leitura do fragmento fez subir jus~ça e cedo ou tarde pune os
da Nazareth uma onda de sangue.
Entregou-o ao' pai e disse resolut fosse feliz eu não me resolveria a
-São muito infames esses que p ao seu destino; mas é desgraça-
analysar a vida alheia para deleitar sosaband onal.n á corrente da 801'-
com escandalos e novidades; mas eu S
hei de fazer. . EUa releu o trecho do jornal
-Devias requerer o divorcio, ro firmeza; Estou decidida aem-
de uma vez os laços que te prendem rirneiro vapor e espero que não
miseravel. meu designio que é dictado pela
-Oh ! meu pai, não fale assim l
pai de meu filho e eu, no caraoter d -se já com um passo mais firme
posa, tenho o dever de soccorrel-o e mirou o heroismo inquebrantavel
tal-o em casos como este em que se squecer as tortui as soffridas e a
agora. . . .ao encontro do mando, de quem
. Abandonal-o quando elle expia o a nestes termos :
de uma vida viciosa, á mingoa do ontem ao Hospital de Misericor-
o que foi acommettido de uma
 180 F. CLOTILDE
~~~~~~~~~~~~~~
J"\../\./"'J\./,\"/'V"\..r\.rV\/"'V\.rI./'\../\..r'v"v/\AA~

congestão na Hospedaria. * * quando se e - oi.s-@;@ -e,@)-':::-@)(§""~~-ex9~

gava a um jogo desenfreiado em que per
o ultimo oeitil.
Tratando-se de verificar a identida
referido moço, chegou-se a saber que é
charel Arthur Pedrosa Gui.m~rãe~, ~e XXVIII
casado com uma senhora dlstmctlsslma,
de um íllustre Coronel que prestou relev
serviços á causa do bem PUb~ICO.
Lamentamos este acontecimento
encher de afflição a familia do inditoso RONELPedrosa teve que conformar-
·h rel que tão mal sabe presar os seus com a deliberação da filha, que, em
cd 'homem
a , bem educado aVIilt an d o-se na uma resolução inspirada pelo dever,
e .. erc.
xas espeluncas do vicio t
e t c. logo de a pôr em pratica.
ecidido que a mãe da Gloria acom-
a Nazareth na viagem e o Oscar fi-
tregue aos carinhos do avô e aos
das tias. Custou a Nazareth mu itas
o ter que separar-se do filho, alegria
sua existencia; .mas a natural bon-
ue era dotada impulsionava-a e não
'8 diante dos maiores sacrificios para
o marido ávida infamante que arras-

a em mil planos para chamalo ao

o bem, caso eUe se restabelecesse,
a tivesse de sair do Ceará, onde a
os mais doces laços da família e da
 182 F. CLOTILDE
amizade, preferiria ir viver com o m
algures e a poder da mais solicita affeiç:t
conquistal-o em uma rehabilitação com
Durante a viagem chorou amarga
A fuga do Arthur, o desapparecimento da
fia tinham-lhe esphacelado a alma. A
fõra ingrata em extrem o, pagando-lhe
mais. negra traição a generosa e fidalg
pitalidade que lhe dér a.
A's vezes pensava nas. consequencí
união do marido com a Gloria e um
mccimento de indignação sacudia-lhe o
vos provocando-lhe nauseas.
O balanço do vapor, o murmurio d
das a entoarem a queixa saudosa do m
vava-lhe o espirito ao passado e, com
do-o ao presente horroroso,experimen
sensação de quem se vê no cairel d
despenhadeiro prestes a sentir a vertig
fascinação.
Saltou no Pará abatida physicatnente
no moral robustecida pela coragem
tornava capaz de grandes dedicações.
rou a casa de um amigo de seu pai, u
tuguez rico, o Sr. Amorim, a quem
commcndada, e depois de ter descans
gumas horas, dirigiu-se á Santa Casa.
A DIVORCIADA 18&
Q ver o marido como uma creatura
ia, atirado ao leito da caridade ,
u-a uma crise nervosa, 'da qual
'depois de ter chorado convulsíva-
ante uma hora.
ur conheceu-a, teve mesmo um
do-a á borda do seu leito e no dia
transportado para a casa do ami-
o, onde foi tratado com todo o
eth não se poupou ás maiores fa-
u noites e noites velando cuidado-
e elle tomasse a poção receitada
á hora marcãda e teve a satisfa-
o dentro de 20 dias completamente
o. Teve vontade de perguntar
; mas a tia antecipou-se, e ao sa-
lha se Internara nos seringaes em .
de um ho mem que lhe promettera
não pôde conter uma explosão
;.de dor. O amor materno sensíhí-
as creaturas mais endurecidas. e
desgraça da mulher que se dei-
or falazes promessas e tudo sa-
m homem as vezes incapaz da
va de affeição.
rido bom a Nazareth interro-
 !84 , A DIVORCIADA t85
F. lLOTILDE
==~==~======~~~======~~ ::::====
g0U-O, afim de saber si elle conti'ahit'a di aú chegou a noite e não viram o Arthur
c em que disposições se encontrava, si q za do chá.
demorar-se ainda no Pará, ou preferia leio tol-o-ia empolgado de novo t
até Manáos, onde o pai desejava qu generoso homem tratou de indagar nas
abrisse es críptorio de advogado j as casas de jogo mais em voga e soube
Y citar ao Ceará é que não cOlwinha verdadeiro despr.izer que elle não somente
reconhecendo quanto a presença do til a de pagar as dividas, mas arriscára ainda
neccssaria ao velho Coronel, já hastan entemente em grandes paradas todo o
ente e cheio de maguas, precisando d'a oro que a mulher lhe dera para satisfazer
raio, de sol como uma planta defínhad compromissos !
fC1Ü estar separada elo filho. Alem disto
ma do Amazonas pod ia ser fatal á crean
ainda estava no perigoso período da
tição.
EUe respondeu que devia uns 400$0
desejava pagar com a máxima brevi
pedia á mulher que esperasse ainda
, dias na capital do Pará.
O amigo franqueava a casa, pois devi
des favores ao Coronel e desejava
concorrer para a cura moral do Arthur.
disto a bel1eza e a bondade inexcellivel
zareth tinham-lhe despertado o maior.
resse e ser-lhe-ia grato vêl-a feliz ind
da do que soffrêra. Animou muito
offereceu-lhe seu auxilio com a melh
tade, e ambos tiveram uma amar a d
 A DIVORCIADA 187

calada, esmagada sob aquella brutal

o de alcool e de máos sentimentos, e
pelo procedimento do marido na casa
teve apenas no pranto o desafogo da
intensa. Esperou que elle estivesse
XXIX e no outro dia falou-lhe da viagem para

sso dinheiro está se exgotando, disse,

s fica bem abusar tanto tempo da de-
ospitalidade que nos foi dispensada.
T mSTE d'aquelle que envereda nas sinu
sidades do vicio, si a dextra da Pro
dencia não o detem no seu caminhar incer
-me com que pagar as minhas divi-
, e eu estou prompto a acompanhar-
m do mundo.
O Art hur insensivel ao amor puro da
posa, verdadeiro anjo do lar a estender sob , as tuas dividas serão pagas. Vou
comprar passagens," pois o vapor de-
elle as nevadas az as, sem olhar para o futu
amanhã c pedirei ao ~r. Amorim para
já esquecido da forte lição que lhe dóra o i
r-se de tudo.
lamento do Hospital, ao lado dos desherda
e dos miseráveis, continuou ajogar com ph mente fazes muito pouco em mim,
some tão mentecapto que me deixe
nesi, com loucura. Quando perdia vinga
om as tuas promessas!
se no absy ntho, esquecia os revezes de
no desejas é que a minha desmoralí-
vicio no seio de outro vicio mais degrada
conhecida, pois: em vez de me fa-
Entrou por duas vezes completamente
s meios. para pagar meus compro-
briagado. Maltratou a Nazareth com pala
-encarregas alguern de liquidal-os ;
desabridas, acoimando-a de ciumenta.
consenti rei.
alarde dos dias passados a bordo ao lado
ar-me o dinheiro de que preciso já e
Gloria , referencias zrosselras ao matuto
b
escandalo será medonho e eu nar-
500$000, como chamava ao Chiquinho.
 188 F. CLílTILDE
rarei ao nosso obsequioso hospede a s
passada no Hotel do Ceará comtigo e o te
morado, aquem sinto não ter ferido no cora
A pobresinha ass im ultrajada levan
rosto aljofrado de lagri mas e ante a expr
de tão sympathica physionomiadivinisada
martyrio, qualquer outro que não fosse o
thur ter-se-ia apoderado de vergonha e ca
de ioelhos pedindo perdão dos erros q
tru;..:idavam tanto. Elle, porem, conserv:
impassível. A Nazareth, como se obede
à uma força autonoma, abriu o hahú e
delle o dinheiro que lhe entregou treme
A' noite esperaram embalde o Arthu
Sr. Amorimvendo a moça enxugar as 1
mas disse-lhe:
-Minha senhora, o seu marido m
Volte para o Ceará onde a espera m o am
seu pai e o carinho de seu filho Não é p
me pése hospedal-a, no que tenho a m
satisfação, mas no pé em que as cousa
seu marido não tardará a arrastal-a ao
.do abysmo em que resvalou. .,
No outro dia estava no dOl111l11Opub
grande roubo feito em um importante e
lecimento de um p~rtuguez, ainda apar
com o Sr. Amorim.
A DIVORCIADA 189
!
azareth quando ouviu falar- nelle teve
esalto. Do jogo á embriaguez desceria
o-ao furto 1 Era horrivel pensal-o I E
to mais tard e suas previsões se rea-
quando a policia entrou em casa do
orim á procura do Dr. Arthur Pedro-
jogador de profissão, inculcado como
e do roubo feito em uma importante
mercíal da praça de Belem.
as fezes do calix. A inditosa Nazareth
com o stoicismo da virtude ret empe-
mais rudes e oontinuas provas. De-
uma crise que a colJocou em uma
o enorme pôde levantar-se e a sua
ideia foi voltar ao Ceará.
. Amorim pediu-lhe que se demorasse
uns dias para avigorar as forças gran-
abatidas, depois do que acompa-
sua terra.
ali que liquida r um negocio e apro-
ensejo para pôr á disposição della
anhia durante a viagem,
spera da partida' a Na zareth quiz ir
á hospedaria que o marido mais
a afim de pagar-lhe as divida se.
com o dono da casa a seu respeito.

190 F. CLOTILDE
Ao entrar na sala teve uma grande sor
sa que a deixou extatica. P a pareceu-lhe uma indiscrição
O Chiquinho sentado a um sophã par
entregue á funda meditação, e ao vêl-a lev
tou-se como impellido por uma força estra
-O Sr.!
-A Sr."!
Affluiam as palavras aos labios; mas
lhia-as a emoção Iortissima de se verem a
tão inesperadamente Conservaram-se
dos por alguns momentos.
Afinal serenando um pouco a Naz
perguntou ao rapáz :
-Ficou de todo restabelecido?
-Felizmente, minha Sr.", ainda não h
chegado minha vez; mas como está mud
Acha-se doente? Reside agora nesta cap
Convidou-a a sentar-se, porque viu-a
mula, prestes a desmaiar. O Sr. Amorim
falar ao dono da casa pedindo-lhe a con
Arthur, e ella, já não podendo ~er-se c
sentou-se machinalmente no sophá. O Ch
nho conservou-se levantado, apezar do tr
que o invadira.
-Estou aqui simplesmente de passei
go amanhã para o Ceará.
Ah!
A DIVORCIADA. 191
perguntar-lhe pelo marido; mas tal
mitta-me que lhe agradeça o interes-
mou pela minha saude mandando a
a visitar-me em seu nome na enferma-
anta Casa. Eu não merecia tanto;
mo eu desejava vêl-a ! Tinha tanto que
e, e nada me occorre neste momento.
ia perguntar-lhe qual o motivo do odio
arido me vota e porque razão quiz.
amente matar-me.
da lhe posso dizer, e sei ia melhor que
erguntasse. Tenho soffrido muito e
nfcsso-Ihe tudo porque reconheço a
erosidade e talvez seja esta a ultima
nos encontremos.
volta aos seringaes, á procura de um
e lhe sõrri no horisonte vasto de sua
ia de moço, emquanto eu, triste e des-
a [,elo infortúnio, volvolao lar paterno
refugiar-me dos vondavaes da sorte
s que não falham nunca: entre meu.
filho innocente.
~ôde continuar. Uma torrente de la-
nudou-lhe o rosto. O Chiquinho ven-
uella afflição teve vontade de cahir-
és para pedir-lhe perdão.
 192 F. CLOTILDE

Mas de que se accusava para com ella f

Têl-a-ia DffendíJo ao menos com um pe
monto indigno ~ Não! EUe a considel'av
mais perfeita e a mais elevada de todas as
Ihcres e respeitava-a com o mesmo acata
to que~l'jbutavaásua mãe e irmã. xxx

:AYl!'TARJS praias cearenses,alvasegra_

íosas, banhadas por um claro sol de ju.
êr emergir dentre os coqueiraes a cida-
, immortalisada pelas victorias dajan-
Iicionista, ao sentir o bafejar das bri-
nhas a refrescar-lhe a fronte, ao pensãr
ppi oximava do lar, onde abraçaria seu
maus o onde teria a inef[avel ventura
r uma e mil vezes o filhinho idolatra,
zaretli mediu toda a extensão de seu
io. Voltava só, tendo perdido o gran-
do qne fizera, havendo sido inuteis
provas de acrysolacla dedicação que
arido.
mulher de um ladrão!
ava- r, sentia repulsào ror si rnes-

13
 lD~1~=========F=.=C=I=,O=T=1=L==DE========~~
ma. Por um funesto encadciamento, o Art
deixara-se ir de um vicio a outro, até aíund
se de todo no lodaçal mais immundo. Com
hendia que elle só por um milagre conseg
regenerar-se e depois a má reputação, esta
doa que ás vezes muitos annos de vida reg
não apagam, ennublaria sempre a sua feli
de, si é qne ella poderia desfructal-a um di
Como o viajante tentado pela belloza
fructos do Mar Morto buscando apanhal-o
fre a desillusão de encontrar-lhos no ínti
vacuo das cousas apodrecidas, assim a
venturada creatura illudira-se com o a
lisongoiro do primo e, querendo saival-o
bortinaacm e elo vicio, saoriflcára o so
sua vid~ ínteira.itornára-se infeliz, e agor
que não recaísse sobre ella a infamia q.ue
chára, cumpria-lhe quebrar de ~ma v.oz
que a prendiam procurando o ~l'\~OrclO.
em terra com o coração opprimido ; ma
que o pai não tivesse de chofre a ~oticia
desastre entrou em casa serena e simula
ma. Quem pôde, porem, enganar os •
esquadrinhadores de um pai estremeci
Coronel ao estreitar a filha notou-lhe
gios de fraqueza estampados no ro~o
a densidade das maguas que a haVIam
A DIVORCIADA 195
urante a estada no Par.í, As irmãs aco-
a corn lagr-imas o o Oscar, na íngenua
da idade papagueou a palavra : vovó !
lhand i desconfiado para a Naza: oth.
'tarde o Coronel informado da nova ín-
tícad 1 pelo genro tomou-se da mais
gnação e tmpóz á filha que rompesse
vêz os grilhões que a acorrentavam
esgraeado ,
COI'l'Í para o teu infortuníI fazendo que
por marido o ultimo elos miseravois ,.
um filho sobre quem se l'cflcctirá a
conducta delIe. E', portanto, indís-
subuuhír a creança á essa illfdicidade
r a cxistencia de s bresalros e torturas
rovídencíar no sentido de arranjar
di} modo a qu te divorcies Hei de
o parado]: o do infame, e então vcn-
e pela lei dessa- jugo desmoralisador,
orrer tranquillo
nel t ính bõas relações em 1\1an;10s c
tos pontos do interior do e tado do
: \.)Sül'CYCU empenhando-se com ins-
.abo de poucos mezes sabia onde
thur.
--encarregou um advogado de grande
 196
----o F. CLOTILDR

A DIVORCIADA
nomeada de tratar da questão do divorcio de s = 197
filha, e conseguiu o resul~ado que desl'ia
graças a pertinazes esforços" • para mais tarde abandonar a vida ínoorn-
O genro continuava a mesma vida vící dos seringaes e vir ostentar a belleza em
5, onde lhe acenavam grandes visões de
nos centros do Amazonas, á margem dos ri
ístencía luxuosa, entontecedôra, n'uma
onde fazia toda a sorte de vergonhosas esp
lações, e alliado a um dono de seringal do infinita, no mercadejamento torpe que
scíenoia elastica e cujo unico fito era enriqu a mulher ao abysmo sem fundo da des-
roubando os inditosos fregueze~, encontrou e onde só as azas refulgentes do anjo do
go campo para expandir o seu genio díssíp adímento, banhado em prantos de C011-
perfeita poderão puríôcal-a redimida
Os mais baixos ramos de negocio foram z do perdão!
tos em execução por elle e dentro em pouco
po era conhecido como um elemento perni
so, de quem se arreceavam os homens pr
e só não conseguia juntar dinhoiro porque o .
1h'0 absorvia, todo insaciavel, impellin
para que vazasse na banca o producto m
querido e que deixava espoliados tantos en
tos que nelle confiavam.
A Gloria era mais precavida e encara
futuro com o olhar medroso de quem n
sente bem com a oonscíenoía.
O homem que a trouxera do Pará fõra
ma de suas espertezas e convicto do que ell
lia cedêra-a a um outro. A seducção do
tentára a mísera tresloucada, e sem um vi
bre de dignidade tratava apenas de jun
 A DI\'Or\(~IA1)A IO!>

ysolar su'alma virtuosa na adversidade,

ístan, resig'nava-se, Tinha de viver dali
te totalmente sequestrada do mundo oc-
a mais triste posição na casa paterna,
XXXi commentarios se faziam a respeito

ue a conheciam ele perto faziam-lhe jus-

iedavam-se de seu infortunio; porem
nhos?
IVORCJAD,~ ! E~ta palavra fatídica "ill
D , o-pirito da :;azaroll~ logo pela m
quando desporta:'H o o ~OlTISO do fil.ho lh
vam -lhe aos ouvidos, pela tagarelice
dos cs rumores de fora, e doia-lhe ser
ada desfavoravelmente."
viava um bom dia dulciflcante e cheio de
. uíam o desfecho triste de seu casamen ,
ranças e de p 12 • .
ídez de genío, ao seu ciume ímpla-
Quebrára todos os laços que a uniam
rido: mas seucoracão igualmente se U8S
ôz fazia o papel do victírna, e a pro-
cara. Que tcrri vcl desenlace tivera o seu
tação da inditosa moça soffría ínvos-
men~! . sseíras,
Perguntava a si mesma no silencio, r
a o Hotel apparecia pintada óórn
da e desolada, o q ue hav ia feito pa II mero
côres, como um verdadeiro drama de
rude castigo, e a sua consciencia de nad
vrohava Iiepousava serena na cr-rteza do mplicado, no qual o matuto era o po-
rdia, o Adonis preferido,
cumprido.
Quantas supplicas leYanta.\'~ todos mada! Embóra se 'encerrasse entro
redes, vivendo exclusÍyamonto para
ao Deus bondoso para que desvia S0 o
via de attingil-a o bote traiçoeiro da
do caminho do mal!
Elle não lhe escutara a prece fo. yorvS3
do luctára muito antes de tomar a 1'0-
 '200 . F. CLOTILDE
solução decisiva de requerer o divorcio' mas
ultima proeza do Arthur arrancára-lh~ a V
da dos olhos e despedaçara-lhe de todo a ens
gia que a sustinha.
Um ladrão! O ser que a sociedade exp
do gremio como um elemento de destruiçã
respeito da propriedade, o ente que sy nthe
toda a infamia que o homem pode praticar.
Seu filho havia de sentir mais tarde a
gonha da conducta indigna do pai e não pode
marchar-de fronte erguida, por entre a rapazi
feliz e orgulhosa de seus progenitores.
Si algum dia lhe dissessem: Teu pai
um ladrão, elle si tivesse a nobresa de cara
do avô, a altivez de genio da mãe, mor
de pejo! Era horroroso pensal-o !
Depois a sua posição de mulher separa
marido pungia-a cruelmente até os recessos
ma, como um sty lete agudo.
Si não fosse a má saude do Coronel qlle
a dia se aggravava, impellinJo-o para o e
descanso, teria desejado morrer.
O filho ficaria sem apoio, e ella tornar-
causadõra de seu infortunio. Assim esta
tura fragil hauria elementos de coragem no
materno e no meio do desolamento em qu
via cuidava do filho com a mais extrema t
A DIVORCIADA 201
ívorciada ! Esta palavra maldita causa-
a mesma impressão que o lettreíro escr í-
ás paredes do salão do festim baby Ioníco
io Balthazar.
ra castigada simplesmente porque se ca-
i'deixando o coração occupado pela imagem
ro.
o Oscar balbuciante dizia: papá, ella en-
olhos de lagrimas e ensinava-lhe a cha-
ovô,
tão era engraçado ouvil-o, depois de ba-
mãosinhas, todo elle desfeito n'um sorriso
e afaceírava as covinhas do rosto dizer:
vovô!
a manhã o velho fôra ao jardim e trou-
e lá uma rosa, uma linda Paul-Neron co-
de gouas de orvalho.
eníno que o recebia sempre alegre, pu-
no enthusia srno engraçado da infancia,
u a mãosinha para a flôr e disse: Papá I
o o velho conservasse a rosa nas mãos
ou mais forte: vovô! vovô!
orvalho que rorejava a flor juntou-se
perola de uma lagrima, que das faces
o deslisava silenciosamente.
 A DIVORCIADA 203

desespero que á custa de muitos esfor-

nseguiu debellar, para não aggravar o
melindroso do doente.
te só alliviava um pouco quando lhe tra-
o neto e, á luz daquelle sorriso adoravel
XXXII ynthetisava um poema de amor e de soffri-
, esquecia a prostração que o molestava
rimentava um pouco de conforto. Era
dar-lhe sempre este calmante, e a crean-
mo se na ignorancia de sua ínnocencia
O CORONEL chegol~a u,:n tal ex:remo de f
queza que um dia nao se pode levaní
As filhas convidaram-no a fazer uma peque
~e o be.n que fazia ao avô, de vez em
o chamava-o em altas vozes, zangando-se
f) não o traziam junto ao leito do en-
excursão no jardim, e elle forcejou por se
em pé; mas invadiu-o uma tontura forte e
ão o avô envolto na treva do crepuscu-
obrigado a cahir.
ida c o menino aureolado com 0 esplen-
Mandaram vir o medico que sahiu bem
lvorada, prenuncio de auspiciosos dias,
animado.
um ao outro a alegria ineffavel, a unica,
-O mal dolle tem uma causa moral forti
oça os travores da vida. .
ma que os recursos da therapeutica talvez
a tarde o velho chamou a Nazareth e
possam debellar ; em todo caso cumpre ali
-a entr istecida, o sulco de lagrimas re-
tal-o confortavelmente , distrahil-o , dand
11 cavar-lhe o bello rosto, outr'ora loução
um regimen puramente hygienico quand
lyrio desabrochado, tomou-lhe a mão
lhe restaurarem as forças, e assim talvez
cissimo carinho e disse-lhe:
v iva "mais algum tempo.·
inha filha, eu morreria contente si te
As filhas ouviram esta declaração aflo
feliz, unida a um homem de bem que,
om pranto, e a Nazareth que sabia perf
do a belleza de tu'alma, comprehendesse
mente o que matava o pobre pai entrego

F. CLOTILDE
o valor inexcedivel de tua virtude inquebrant",
vel Deus não o quiz. Todos os meus calcul
falharam, as illusões que o meu affecto pater
nal, quiçá um pouco egoista, crcára para o te
futuro desfizeram-se ante a realidade acabru
nhadora. Sinto-me a dois passos do tumul)
morro tranquillo porque sempre trilhei o caro
nho indicado pelo dever. Peço-te que vív
para teu filho, para seres o arrimo de tu
irmãs.
Não te entreguesá uma dor excessiva, res
gna-te e pensa que esta vida transitoria n
vale as mortífícaçõ es que nella experimen
mos.
Eu levo um uníco remorso: o de haver 00
corrido para tua infelicidade.
Sei que alem do tumulo Deus ha de reco
pensar os que aqui penaram e levaram pacie
tes ao Calvario a cruz do sacrifíoio ; e esta as
rança me fortalece. Promettes-me cuidar do
Eu t'o peço, e os pedidos dos moribundos t
um valor enorme.
EUa não respon dia porque os soluços e
bargavam-lhe a palavra.
Notou que a voz do pai enfraquecia, qu
seu olhar tornava-se embaciado. Cobria-Ih
corpo um gélido suor.
li. DIVORCIADA 205
--'
ssu",tad<1chamou ~3 irmãs e perceberam
que eram os symptomas da morte que se
oximavarn. Mandaram chamar o medico,
am vir o sacerdote, e ambos entraram ao
mo tempo.
-Nada tenho a fazen, disse o facultativo; a
e está imminente!
padre desempenhou sua missão consola-
e C0'11 todos os signaes da mais perfeita
ição recebeu o Coronel os ultímos sacra-
Era cnterneccdór vêl-o beijar o sym-
da redempção e com os olhos humidos
as filhas que não chorassem.
erenou um pouquinho e quiz beijar o neto.
rouxeram-lh'o e, elle agarrando-se ao pe-
rucho n'um derradeiro esforço beijou re-
s vezes as Iace sinhas rosadas.
p...ís dirigindo-se á Nazareth, disse-lhe en-
rtadamente : Trata de viver para o teu fi-
para tuas irmãs. Tens de me substituir
a terra.
as côres ela aurora douravam o horisonte
íando a manhã, as avesínhas despertas
arn a orchestra maviosa de gorgeios, as
entreabriam a corolla rociada pelo pran-
oite, quando aquelle espírito attribulado,
o martyrio da filha impellira depressa
 206 F. CLOTILDE

para d tumulo, desprendia-se do envolucro t

rena para ascender ás regiões immortaes. D
pedaçava-se um dos élos fortíssimos que pr
díam Nazareth á vida. Apenas o affecto d
irmãs e o carinho do filhinho reatavam-lhe
naufragío de sua ventura, tão implacavelme XXXIII
trucidada pela aspereza da sorte.
As ultimas palavras do pai resoavam-ljs,
ouvidos como um reclamo de vida, e ella ouvi
murmurar com o accento debilitado pelos MA febre maligna que sobreveiu quando
roxismos da agonia: Vive para teu filho ~ o Oscar completava 2 annos de idade
Sim, era preciso viver para que a mim
ou á Nazareth, extremamente ciosa da
creaturinha não ficasseorphã,cluplamente orp
do filho, a procurar na povoação, onde
Seria a mais forte piova de energia que
convalescer, melhoras para o estado me-
pedíria á sua coragem. oso em que elle se achava.
Embora o viver lhe fosse extremame
s puros ares do campo ricos de oxigenio e
amargo, devia sacríflcar-se para que o fi
gnados do olôr silvestre das flôres ma-
crescesse sob sua tutella, para que bebesse
dcra~'1 ao pcqucníto o vigõr que lhe fugi-
seu exemplo as puras lições do amor ao dov ambIente corrompido da capital.
não podesse um dia resvalar ni negro aby colorido das faces voltou mais rubro , os
do vicio e da desmoral.sação, corno o
.
graCIOSOS tor:1avam-se mais interessan-
Arthur. phraseado meigo e gorgeiado foi toman-
EUa havia de estender sobre elle as azas p a expressão maís alacre, e, como para
ctoras,equandolhefraquejas:"eacorrtgem p. mar a Nazareth do que havia soffrido,
ao espirito do pai as forças de que havi~ .IlU r reunia o que se pode desejar na crean-
O espirito dos que se vão deve auxrhaI'- 18 mimosa.
nos transes dífflceis da vida. tmava sua desolada mãe, dava-lhe o Ie-
 208 F. CLOTILDE
nitivo no meio das dõres mais fundas, era o
santelmo a guial-a na noite borrascosa de sua
oxistencia. O que seria della si não fosse aquel-
Ia creança meiga que tinha nos olhares irra-
diações do paraiso e assim mesmo pequeno e
fragillimo abroquelava-a contra os perigos?
Agora poderia ella ter alguma esperanç
das alegrias terreuas ? Fõra escrav.1 de um
estrella infausta, o infortunio perseguia-a aio
da no albõr da mocidade, e desde a estrela d
marido no vicio experimentára os maior
tormentos que podem torturar um coraç
feminino.
A morte do pai deixara-a aniquilada, e
não fosse o pedido quasi supplicante feito co
a vóz estertorada dos agoni:qntcs e a cren
que a escudava, ter-se-ia refugiado no suic
dio , recurso extremo dos entes fracos e s
verdadeira religião.
No povoado, para disfarçar a tristez.a q
a envolvia em uma continua treva, contmu
a mesma missão de caridade que iniciára
bons tempos de sua adolt,cencia; voltav
a nevrose do bem.
Tinha sêde de lenitivar as afflições
outros e agora, possuidora de uma fortuna
gular, reservára a parte do filho e se comp
A DIVORCIADA 209
a em repartir entre os miseraveis a que era
a.
Entrar nos lares sombrios onde a mí .
ia iseria
a 1dOJ bra era. levar um raio de sol , uma sensa-
'
. e em estar, o pão alvo e macio para os
mt~s, a roupinha agasalhadora para as
a~cInhas esfarrapadas. Privava-se de com-
didades para que a necessidade dos outros
se valida. '
Tinha o cortejo dos cegos, dos aleijados,
doen,tes que lhe cercavam a porta de ma-
á noite.
Suas visitas eram para elles.
As irmãs a principio censuravam-na hran-
ente; mas vendo que aquelle ardôr de
~lhar beneficios dava-lhe refrigerio ao co-
o desolado, acabaram associando-se ás
olas prcfusamsnn, scrneadas por sua ge-
osa mae.
ubstit~ia, vantajosamente o Chiquinho
eus, m~stercs de câridade O menor elo-
ue faziam dclla era chamarem-na-mãe
obres.
~ creancinhas sobretudo festejavam-na e
Iam-na batendo as palminhas e chaman-
de moça bonita.
14
 210 F. CLOTILDB
o Oscar tendo diante dos olhos exemplos
frisantes de amor do proximo já distribuia es
molas entre os pobresinhos, e quando algu
vinha esmolar elle corria para dentro apre
sado e solicito e dizia: Mamãe! mamãe! v
nha dar uma esmolinha ao pobre!
Pairava sobre aquella familia composta d
quatro mulheres e uma creança uma seren
dade como a que vem depois das grandes t
mentas.
Modesto e simples offerecia sempre hos
talidade ao viandante, soccõrro ao necessi
do, auxilio ao desamparado da fortuna.
E não ostentava as suas moradoras a p-
tica dos beneficios; era reservada e discr
a caridade que magnanimamente dispensav
a todos indistinctamente, cumprindo á ris
sublime dictame do Evangelho «Que a
esquerda não veja o que fáz a direita > •
A familia Pedrosa era para os habita
da pequena povoação uma providenci~,
angelica impulsionadora daquelle movi
to caridoso merecia de certo que Deus
demnisasse do que havia soffrido.
XXXIV
CAÚ do Chiquinho está em festas.
Eil-o pela segunda vêz em regresso do
e, sadio, róbusto, já sem a pallidez que
xéra na primeira viagem.
eina o mais effusivo enthusiasmo, reper
a alegria franca e cornmunicativa em todos
oradores do povoado.
excelIente rapaz foi recebido com mu-
e flores.
a plataforma da-estação achava-se a me-
gente e todos á porfia queriam abraçár o
rraneo trabalhador e honrado que se ati-
â lucta pela vida expondo-se aos azares
stino, em sólo estranho, sob um clima
o e pernicioso.
trou em verdadeiro triumpho pela porta
ttro, e foi com delírio que abraçou a bôa
ha, como elle chamava sua mãe.
 212 F. CLOTILDE
D'esta vez não o deti vera o punhal traçoei_
ro do rival dissipado e indigno e fôra gosar os
dulçores do affecto dos seus progenitore
em dulcissima paz, entre as serras verdcjan
tes e os campinaes floridos, onde passára des-
cuidoso os melhores dias da vida n» cp11ch
deleitosa da infancia.
-Nem o Sr. Bispo seria recebido assim
dizia a Mariquinhas do correio com o ar d
quem gosta de troçar, um pouco philosopha
á moda de Democrito, encarando as cousa
pelo lado mais comico.
-Vejam as cegas corno se alvorocara >I
continuava o Ambrosio, o professor, pigarr
ando, ás voltas com a bronchite que não
deixava. Hoje a Sr." Agueda esquece a maca
e arregirilenta o seujbatalhão para fazer con
nencia ao recem-chegado.
A velha Fortunata, andando muito devo
garinho e tossindo quando se approximou
estação, para mais aggravar o seu estado
excitar assim á caridade publica pergunto
-O Seu Chiquinho já foi para casa 1 A
chegou o pai dos pobres ~Já sei que hoje co
um pirãosinho descansada ~
E mais ligeira, á proporção que se affas
A DIVORCIADA 21&
dirigiu-se á casa do rapaz á busca da es-
~a.
Veêm-se doidos os paroaras quando che-
do norte a um povoado. Chovem os pedi-
, apparecem as comadres. surgem os afi-
dos, os mendigos invadem a casa, e sup-
do que os que vêm do pretenso el-dorado
zem fabulosas riquezas, todos aspiram a
pequenino quinhão.
O Chiquinho com o bom modo que lhe era
itual recebeu a todos com delicadeza, dis-
uiu algumas esmolas e depois do jantar á
e deu um passeio pelo povoado e quasi á
inha dirigiu-se á casa da familia Pedrosa ,
ava-o ahi uma missão penosa; mas que se
uzéra a cumprir porque elle, como a Na-
th, fazia bem até mesmo aos que lhe ha-
feito mal, ou podiam retribuir-lhe com
is negra ingratidão.
pproximou-se tremulo, sentindo o cora-
ulsar desordenadamente.
ercorrêra aquelle caminho tantas vezes
ora com o coração palpitante de emoção
:ternura I
o bater palmas assaltou-o um receio es-
o de ser mal recebido.
as porque? Elle já soubera pela familia
 214 F. CLOTILDE
da morte do Coronel e ao ver a Nazareth tra~
jandu rigoroso lucto, pallíd~, com os traços
de uma dôr intima tirando-lhe o frescôr da
face mimosa, estendeu-lhe a mão que resfriá-
ra e apertou a della silenciosamente. EUa en-
xugou depressa a lagrima que viéra balouçar-
se na extremidade dos longos cilios e offere-
ceu uma cadeira ao rapaz.
Passada a primeira emoção o Chiquinho
disse, :
-Minha senhora, um triste e penoso dever
obrigou-me hoje a importunal-a com a minha
presença. Seu marido, ..
-Meu marido t l Ah I já não o tenho! A
lei separou-me delle para sempre.
-Escute-me. Eu não ignorava isso; mas
um impulso de caridade me faz dirigir-lhe uma
supplica a favor de um infeliz. O Dr. Arthur
chegou um dia doente e sem o menor recurso
á minha barraca. A Providencia ou a fatali-
dade talvez fizeram-no ir procurar um refugio
na humilde e tosca habitação do rude se-
ringueiro que elle cobardemente aggredira
que só por um milagre pôde escapar ao golp
traiçoeiro. Meu primeiro impeto foi ati ral-
de porta ã fóra, porque me repugnava esta
A DIVORCIADA 215
o do meu assassino, do seu algôz; mas
brei-me de que pagar o mal com o bem é
preceito de nossa Santa religião e acolhi
esventurado dando-lhe os soccorros de que
ia mistér.
~oitado! 'Expiou em crueis soffrimentos
desvarios de sua vida. Longas noites passei
ndo á cabeceira d'e seu leito, e somente o
nome, minha Sr.", o nome de seu filho lhe
iam dos labios.
-Meu Deus, não me deixeis morrer sem
,sem pedir-lhe perdão do mal que lhe
ei, dizia de quando em quando.
azareth nada dizia; mas o pranto corria
dante e via-se o palpitar infrêne do cora-
.soh o corpinho de chita preta.
Consegui que me melhorasse, addusiu o
uinho, e como constantemente me pedia
trouxesse ao Ceará, fiz-lhe o pedido, e
a. eis-me aqui diante da Sr.· para implo-
he um pouco de compaixão, não para o
sposo, que não o merece; mas para o
seu filho!
O pai de meu filho! Sim eu dar-lhe-ei
perdão inteiro: mas vêl-o I Pense bem
 2J6 F. CLOTILDE '
A DIVORCIADA 217
Parece-me um sacrifício alem de minhas
forças. -Olha, mamãe, é para o aleijadinho do al-
endre este pedaço de pão.
Depois o Sr. que o acolheu como um chris-
EUa estendeu a mão ao Chiqu'inho e, ane-
tão perfeito continúe a sua obra de misericor_
dia. iando os cabellos louros do filho, murmurou
soluta: Irei I
-Elle quer vêla, ao menos por um instan-
Em torno delles parecia fulgir o diadema
te, e está perdido. Deixei, o a luctar com a
ne deve circundar a fronte dos heróes.
morte e, para evitar commentarios e o ciesper-
tal' do interesse entre os maldizentes e ociosos ,
não o quiz trazer a este povoado, onde a Sr.'
se acha. O caso é urgente, minha ST.a, e com-
prehende, sim deve comprehender o esforço
que faço para aconselhar-lhe esta nobre re-
solução '
A Sr." que é a mãe dos desventurados leve
sua bondade, a meiguice de su'alma até o leito
do desditoso e dê-lhe o bálsamo de seu per-
dão, a esmola ungida de piedade de uma pa-
lavra sua. Levantou-se á espera da decisão.
Via-se-lhe o tremor nervoso agora mais pro-
nunciado.
A Nazareth não teve tempo de responder,
porque o Oscar entrou trazendo nas mãos i-
nhas uma grande fatia de pão, e na gargan-
teiada e dulçurosa linguagem dos innocentes
disse:

rocedimento indigno que a arrastára pela rua
xxxv
ARTHUR está irremediavelmente perdi-
O do.
A vida desregrada que levou no norte, al-
liada aos rigores do clima minaram-lhe o or-
ganismo. A molestia chegou ao extremo, e é
inevitavel a morte.
Vê em derredor do leito visões sinistras,
o phantasma do remorso apavora-o durant .a
noite, e n'um delirio horrível estorce-se no lei-
to sem gosar um momento de repouso.
Os nomes da mulher e do filho saem-lhe a
miude dos labios e em certos momentos grita
allucinadamente: Quero vêl-os I Preciso de
seu perdão!
Falaram-lhe em mandar vir o sacerdote;
elle, porem, recusou. Queria antes a ~bsolvi-
ção partindo das mãos da Nazareth. Fora elle
o grande culpado de sua desventura, fôra o seu
A DIVORCIADA 219
amargura.fazendo-a verter o pranto acerbo
e lhe crestára o viço dajuventude. Emquan-
o jogo conservou-o debaixo de seu poder
potico embriagou-se no atordoamento que
abafar o remorso; passado en tretanto o
riodo da felicidade e quando os primeiros
saltos da adversidade se fizeram sentir,então
beou-se da esposa e do filho,tão cruelmen-
desprezados, e veiu-lhe do seio d'alma en-
pecida um arrependimento devorador.
Esse remorso pungente aggravava-lha . a
.
ostração physica e todos os dias approximá-
-se a grandes passos do tumulo.
Ver a mulher afim de receber de seus Ia-
os uma phrase de perdão, implorar com
os supplices o esquecimento de uma vida
ira de degradação e de opprobio, era o
.• o desejo que lhe agitava o peito. Confia-
que a bondade desvelada do seu caritativo
lvador obteria da Nazareth esta ultima'
rcê.
Como eUe, avaliando a fidalguia da con-
ta do mancebo philantropico, sentia-se
squinhado diante de tanta exceltitude de
timentos!
 220 A DIVORCIADA 221
F. CLOT:=I=L=D::;:E=======

Quem procedia d'aquelle modo era inca- cas resgatem todos os erros de minha vida sa-
páz de praticar baixezas. . turada de opprobrio. Deus .. Vinha entrando' o
Scismava assim quando o apito do trem sacerdote que haviam chamado para fazer uma
quebrou o silencio da tarde, já envolta na nova tentativa junto do enfermo.
meia luz crepuscular. Uma especie de torpôr Era um velho respeitavel de sorriso meigo,
dominava-o pouco a pouco, como se fosse a de coração modelado pelas doces theorias do
morte que chegasse suavemente, sem o horror Evangelho. Nazareth approximou-se doArthur
da agonia. e disse-lhe:
Ouviu passos e a porta abrindo-se deu E' preciso reconciliar-se com Deus para
passagem á Nazareth vestida de preto trazen- depois im plo rar o perdão das creaturas.
do o filhinho pela mão. Elle levantou um Elle baixou a cabeça, n'um gesto de assen-
pouco a cabeça que pendia enlanguecida e, timento, e tendo ficado a sós com o ministro
n'um esforço enorme conseguiu sentar-se. da Religião, contou-lhe a tétrica historia de
Estendeu os braços para a creança linda, cujo sua vida com signaes da mais vehemente com-
rosto emmoldurado em cabellos de ouro asse- puncção. Depois chamando a mulher pediu-lhe
melhava-se ao de um cherubim e o Oscar re- que o perdoasse e ouvindo as palavras de
cuou. Indulgente compaixão que ella lhe dirigia no
-Não conheço aquelle homem, mamãe, mais alto gráo de bondade e caridade ínexce-
disse com receio, prestes a chorar. diveís, seu rosto cobriu-se de grande sereni-
dade.
Então ella impelliu-.o brandamente para o
leito e o Arthur pôde beijar o filho. Segu- Um como reflexo que se desprendia da fron-
rou a mão gelada da mulher e com a entona- te da magnanima creatura que tudo esquecêra
ção dos que já tem um pé no tumulo murmu- -e perdoara, rodeou-o por instantes.
rou: Tomou em uma das mãos a mãosinha avel-
-Perdôe-me ... Si eu pudesse, pediria o Judada do filho, e, fitando a imagem do Cru-
seu perdão de joelhos; mas ... sinto-me mo~- cificado que se achava em uma mesinha de-
rer ... rese por mim ... Talvez as suas suppli- fronte do seu leito, pronunciou devagar entre
 222 F. CLOTILDE

O arquejar dos derradeiros esforços que Iáz o

espirito ao desprender-se do envolucro terre-
no:
-Meu Deus, recebei a minha alma e puri-
fícae-a na fonte inexhaurivel de vossa mise-
ricordia. Fui em extremo culpado; mas estes
anjos mostraram-me as excellencias do arre-
pendimento e dissiparam com alluz do perdão
o negrôr de minha vida. Perdoai-rne tambem
e dai áquelles que me salvaram a verdadeira
felicidade na terra! Nazareth ... Oscar!. ..
A vóz sumiu-se gradativamente, e em bre-
ve só se lhe ouviram uns balbucíos confusos.
Uma lagrima deslisou-se-Ihe ao longo do sem-
blante cadaverico, a bocca contrahiu-se numa
crispação fortissima, e em poucos momentos
o Dr. Arthur deixou de existir.
A Nazarath cerrou-lhe brandamente os
olhos e, enxugando as lagrimas que corriam
merencoriamente atravéz do rosto livido, ajo-
elhou-se junto do leito.
O Oscar dobrou .gualmente o joelho, c a
sua vozinha melodiosa, de uma crystallinida-
de de gorgeio, elevou-se para o céo dizendo:
Padre Nosso que estaes no céo, etc.
 ~~~~~~~~~~~~~~
"'1'V\../'V'Vv'"\/'V'V~"r./\./V'\.rv\.I"V\/"\.

~~ ~ 'iX§" iX§-:o:..~@'(9~~~

XXXVI

A quebrara de uma vêz a odiosa

MORTE
deia que prendia Nazarsth ao desve
rado bacharel, que terminára tão mal a car
ra iniciada do modo mais brilhante!
Tristissimo e eloquente exemplo d« vi
Podia ter desfructado a uníca Ielicidad
vida no amor da esposa, um verdadeiro
que tivéra a dita de possuir e atirar-se no
velinho das paixões de'3encadeiadas qu
haviam atirado ao mais negro abysmo.
E lá no norte a Gloria-mariposa qu
lúz do falso amor sedusira-vqueirnãra-s
pyra ardente da especulação mais baixa, m
cadejanclo (; sentimento .que mais divini
mulher e tornando-o um vil negocio de
embalde ella procurava auferir lucros re
S6 tinha em resultado desillusões tremen
A bellesa ia-se eclipsando nas noite
 F. CLOTILDE

, porque agora ella estava em Manáos e

tregára-s(' a todos os desregramentos.
incipio tivera um grande triumpho, ar-
ra sêdas, ornava-se de brilhantes, fizéra
ra a outras infelizes suas companheiras;
começavam os dias aziagos. Uma mo-
que se inoculára no seu organismo e
ubira ao rosto n'uma asquerosa erupção
a desfigurára, fazia com que della se dis-
o S8em os adoradores de outr'ora .
.oram escasseando os recursos o o •

o apogêo do vicio dourado cahiu na mi-

mais negra, passou da casa atapetada,
de móveis ricos para o casebre nú e de
se arredavam até os menos escrupulo-
porque a molestia progredia, progredia
aordinariamente, e todos fugiam da-Ic-
-como a chamavam.
m dia sentiu fome o • o

ã se desfizer a das joias,dos vestidos sum-

os, dos moveis de luxo. Mal lhe restava
que cobrir a nudez repugnante.
pelle tão ai va e macia outr'ora engros-
e della porejava uma agua fetida que
ceava nauseas; as orelhas cresciam, os
encovados mal luziam sôb as palpebras
escidas e flàcidas. A bocca que se asse-
 A DIVORCIADA

elhava á uma pequenina flôr vermelha per-

"ra a expressão dos alegres sorrisos e des-
hía cavando uma ruga precoce na face lu-
ia e averrnelhada.
O corpo era um horror! Si os amadores
a plástica o vissem recuariam assombrados.
s pés enormemente inchados tinham prúri-
os incessantes que a obrigavam a coçal-os
é verter sangue.
A vida tornara-se-lhe o peior dos suppli--
íos.
Lamentou ter sahido do Ceará, onde a
ndade da prima a acolhêra com tanto cari-
9, sentiu a consciencia exprobar-lhe a per-
dia de sua conducta para com ella.
Fizera-lhe tanto mal! Odiara-a simples-
ente porque era bôa e nobre e sentira gran-
e jubilo em vêl-a soffrer a amargura infinita
os entes superiores ante o desmoronamento
os castellos de ventura que architectaram.
Fôra victoriosa; mas agora pagava carissi-
o esse triumpho ephemero. O mundo dava-
he o premio da existencia aventurosa e galan-
que arrastara entregue aos amOI'0S livres.
sua mãe!

• A DIVORCIl DA 15
 226 F. CLOTILDE
Ah! si a pudesse ver!
Sentia-se isolada, maldita.
Todos fugiam do seu contacto, o seu cor-
po decompúnha-se como um farrapo de car-
ne apodrecida, e ella havia de morrer como
um cão tinhoso, á mingua, só, privada do au-
xilio de Deus e dos homens.
Nem o leito do hospital a abrigaria.
Aventurára-se uma vêz a sahir para men-
digar e quando a viram, muitos fecharam as
portas.
Tentou um ultimo esforço para voltar ao
Ceará. '
Foi á casa de uma senhora rica, cuja ca-
ridade era proverbial e pediu-lhe os meios de
se transportar á terra natal.
A bondosa dama apiedou-se de tanto in-
fortunio e obteve-lhe o recurso pedido. Não
conseguiu, porem, embarcar. O commandan-
te do vapor não a quiz acceitar a bordo, pois
os passageiros reclamaram com energia e afi-
nal foi para o hospital, n'um canto isolado,
onde só a caridade se atrevia a penetrar e lá
morreu miseravelmente.
~~~~H~H,~~H~~~~~H~~~~~~~~~~~~H~Ht
~-(@OO~ij ~~~ ~@OO~@
1t11íttttt~tit1ttttt1ít1t1tttttttttttttttt~
XXXVII
Q UE linda surgiu a manhã!
Parece que por urna transformação na
ordem da natureza a estação pluvial do Ceará
mudou-se em uma ridente primavera!
Abril está a findar, e as avesinhas jubilo-
sas enchem o ar de sonoridades dulcíficantes.
Revestem-se de flores os campos verdejantes
e deleitam a vista offerecendo a mais beIla e
~prasivel das perspectivas.
Corre o arroio crystallíno entre cespedeg
alcatifadas de musgo, onde o bamburral cresce,
trescalando o cheiro agreste que faz a gente
delíeíar-se no seio pacifico do campo.
As borboletas se foram em emigração a1-
viçareir~; mas as flores de chanana abrem as
eorolkrs brancas semelhando azas espalmadas,
erdidas no meio da folhagem.
 230 F CLOTILDE A DIVORCIADA 231

A Nazareth está Iíndíssíma com o ves- os quaes, após as mais horrificas provações,
tido côr de lilaz que lhe dá ao rosto for- encontravam o repouso no seio carinhoso da
mais doce ventura.
moso uma sombra de melancolia e o Chi-
quinho um tanto pallido no seu uniforme Agora sim vinha a compensação! Fica-
preto, elegante e sem a timidez que tinha vam bem longe as saudades, o amargar da
outr'ora. ausencia, os extensos dias de inquietação e
Duas alas de meninas vestidas de branco
de receios torturantes !
desfolham flores sobre os noivos, repicam Surgia 3 alvorada rosea que trazia os dias
alviçareiramente os sinos, pois não ha nada limpidos e auspiciosos.
que melhor exprima a alegria popular do que Sahiram os recem-desposados sob a mes-
essa harmonia cheia de mysterios que eleva ma chuva de petalas deflo ros, e de um canto
o espirito e faz o homem pensar nas delicias a outro ouvia-se a voz de uma velhinha que,
de uma vida melhor. juntando as mãos, dizia: Deus os faça felizes!
O padre faz uma bella allocução falando Deus os abençôe !
do amor puro qlle une duas almas, identi- A' tarde o jantar dos pobres esteve na ~1-
ficando-as pelos laços sagrados do casa- tura de uma verdadeira festa. Foram as mo-
mento. ças que serviram as miseras creaturas, e
Exhorta o noivo a que ame sempre com a nada faltou para que todos ficassem satis-
mesma ternura a esposa, pois é a melhor fe- feitos e repetissem seus votos pela felicidade
Iicidad« que o homem pode encontrar na vi- dos que não esqueciam os soflrimentos dos
da : a posse de uma m ulhor bôa que o com- outros e, no meio dos mais frementes transpor-
prehenda e o ajude a soffror os males de que tes de jubilo tratavam d~ enxugar lagrimas
está cheia a existencia ; á noiva que obedeça alheias.
ao esposo e lhe seja fiel como a Egreja é a O Oscar batia as palminhas alvoroçado
Jesus Christo. diante dos pobres e ria porque um velho-o
O conjugo uobis sanccíona a uniâo.ds dois Gonçalves-comia com extrema voracidade,
corações, que de ha muito se estremeciam, enchendo as bochechas e murmurando de
 232 F. CLOTILDB A DIVORCIADA 233

vez em quando: Que de comer bom I Que A noite continuava bella. As estrellas
guisado incellente Não ha nada como a ri-
í
tinham irradiações deslumbradõras em um
queza! céo de turqueza, as flores meio fanadas in-
O menino applaudia igualmente a Sr." censavam coin seus perfumes o thalamo dos
Agueda que comia no mesmo prato com a ne- recém-casados, cuja união Deus abençoara
ta, muito bonitinha, vestida decentemente e do céo.
de um momento a outro perguntava:
-lnda tem comida no prato, Adelina 1
Terminado o festim da caridade foram dis-
tribuídos pelos meninos bolos e confeitos e a
multidão espalhou-se com os mais expressi-
vos signaes de contentamento.
Desceu a noite. O plenilunio illuminou
o povoado com o seu esplendor deslum-
hrante.
Foram-se retirando os convivas, e em breve
só ficaram as pessoas da familia.
Foi servido um chá intimo, e no meio das
expansões de prazer que fechavam com cha-
ve de ouro a festa do enlace de duas almas
nobres, 'ouviu-se a vózinha do Oscar, adorme-
cido no quarto proximo, que dizia a sonhar:
-Vovô! Vovô! Está aqui o vovô!
A lembrança do Coronel que do alto via a
ventura da filha afinal realizada foi a unica
sombra que ennublou a felicidade d'aquelle
lar abençoado.