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a ordem do mundo dialético, continua, O Dr. Sigismond Bacstroem foi
sem exceção, sendo negativa. E assim
continuará sendo! admitido pelo conde de Chazal
na Ordem da Rosa-Cruz, em 12
de setembro de 1794, na ilha
LEIS DA POLARIZAÇÃO INVERSA
Maurício. O relato da cerimônia
faz parte do Diploma de Bacstroem,
Talvez não seja demais ressaltar que
documento sobre o qual foi aposto
a franco-maçonaria, da qual estamos
falando, admite tanto mulheres como um selo que representa um homem
homens: e, se tendes uma compreen- em um círculo em que estão
são correta das coisas, imaginai que
inscritos um triângulo e um
eles tomam parte na regeneração em
condição de perfeita igualdade. Quando quadrado.
Paulo fala da graça que a mulher rece-
be do homem, ele não está baseando-
se, com certeza, no Antigo Testamento: Para imaginá-lo de maneira correta, é
ele está visando a exata colaboração preciso compreender o que é ou não é
entre os dois sexos, de acordo com a lei uma religião natural. Trata-se, na reali-
da polarização inversa, sem nenhuma dade, de um conjunto de sentimentos
referência à religião hebraica que indica religiosos mais ou menos apoiados em
uma posição muito secundária às elementos intelectuais. No decorrer da
mulheres. Como prova, citemos um história do mundo, surgiu uma enorme
texto de um antigo irmão da Ordem quantidade de sistemas religiosos com
Rosa-Cruz, Dr. Sigismond Bacstroem, inúmeras subdivisões.
em que ele explica: “Não há nenhuma Nos últimos séculos, inúmeras igrejas
separação entre os sexos no mundo e seitas discutem infindavelmente sobre
espiritual. Nem entre os anjos celestes, o que é preciso entender verdadeira-
nem entre os espíritos racionais e imor- mente por cristianismo. E, apesar de
tais do gênero humano; além disto, foi todos os esforços, é muito difícil estabe-
uma mulher que tornou possível a sal- lecer qual fator seria o traço de união
vação da humanidade. E, como a beati- entre elas; isto necessitaria ainda de
tude é concedida tanto ao sexo feminino muitas conferências internacionais, o
quanto ao masculino, nossa que mostra claramente que o verdadei-
Fraternidade não exclui da iniciação ro cristianismo não é conhecido, que
nenhuma mulher que seja digna dela, estas religiões possuem somente
pois o próprio Deus não excluiu a alguns aspectos e conceitos sobre ele.
mulher de ventura que está por vir na Eis por que a franco-maçonaria que se
nova vida”. baseia em um sistema religioso qual-
Afirmamos, com toda a certeza, que quer não pode ser uma franco-maçona-
a franco-maçonaria que se baseia nas ria, no sentido superior do termo.
religiões tradicionais cai neste impasse, A franco-maçonaria conhecida na
inexoravelmente. A franco-maçonaria Europa e na América é baseada em
baseada na ciência sofre o mesmo des- rituais, símbolos e em uma magia que
tino e a que se entrega à filantropia provém da religião judaica. A ciência
corre em direção à completa esclerose. atual nasceu de imperiosas necessida-
A verdadeira franco-maçonaria trans- des da vida dialética. É uma atividade
cende tudo isto porque ela provém da intelectual que se apóia em hipóteses e
Doutrina Universal, de tudo o que era a experiências; em conseqüência, ela
realidade do gênero humano original. deve seguir seu curso sem deixar, por
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Representaçã
isso, de experimentar fracassos e pas- ra”, não permite que se dê à franco-
o bíblica dos
sos em falso. A franco-maçonaria que maçonaria interpretações divergentes. quatro rios
se baseia nesta ciência jamais será O verdadeiro franco-maçon não rejei- que afluem do
livre. O humanitarismo, tal como o tará, portanto, esta Pedra Angular viva; trono de Deus.
conhecemos, é uma filantropia engen- ele não pode fazer isto porque sabe que
drada pela compreensão das realidades ela fará dele um homem “renascido”. Ele
materiais da existência dialética; mas o sabe que a Sabedoria divina, oculta na
que um grupo qualifica de “bom” e de Pedra, a Verdade fundamental, possui
“humano” não é aceito por outro grupo. uma força capaz de abater todos os
Assim, percebeis que é impossível obstáculos dialéticos.
encontrar o bem absoluto deste modo. É por isso que há uma tarefa única a
No máximo, podemos desenvolver ser cumprida: aquela sobre a qual Pedro
alguns princípios determinados durante fala em sua Primeira Epístola (2:5) “E
um certo tempo, mas logo em seguida, vós mesmos, como pedras vivas, edifi-
irão trazendo com eles, desesperada- cai-vos para formar uma casa espiritual,
mente, seus efeitos contrários. um santo sacerdócio, a fim de oferecer
Quando percebemos isto, podemos sacrifícios espirituais agradáveis a Deus
penetrar a própria essência da verda- por Jesus Cristo”. Quando começamos
deira franco-maçonaria, e a razão pela esta livre construção como franco-
qual a roda gira, infinitamente. Como maçon, possuímos a preciosa Pedra
pedra angular de sua construção, a ver- Angular que, para todos aqueles que a
dadeira franco-maçonaria deve escolher desejam, desce do céu como desceu a
para si um valor, uma força que sejam pedra negra da Ka’ba.
superiores aos rituais e conceitos das A franco-maçonaria da Pedra Angular
religiões tradicionais: e este valor e esta
força são absolutamente independentes
da ciência experimental e das normas
do bem inerentes à humanidade
comum. Nas sagradas escrituras, esta
franco-maçonaria se caracteriza pela
escolha, pela posse de uma Pedra Viva.
Trata-se da escolha de um valor e de
uma força que, sem interferência de nin-
guém, se revelam total e livremente ao
aluno e companheiro construtor.
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afirma que ela está em ligação com o da pelos construtores porque é uma Manifestação
Reino Original da Luz, e sua atividade “pedra de tropeço, uma rocha de escân- das forças do
Espírito no
tem como objetivo único fazer com que dalo”, segundo as palavras de Pedro
cosmos
o homem decaído retorne a este Reino (Primeira Epístola, 2:8). (The Works
da Luz. Para este fim, o candidato deve Isto é perfeitamente compreensível! of Jacob
construir, ele mesmo, uma morada espi- O universo se dirige para um objetivo Boehme,
ritual, na qualidade de companheiro divino: a realização do plano divino para the Teutonic
construtor. Ele deve edificar uma nova o mundo e para a humanidade. No cen- Philosopher,
William Law,
personalidade quádrupla, absolutamen- tro deste plano grandioso está a Pedra 1754).
te de acordo com o tríplice princípio fun- Angular: Jesus Cristo. E tudo o que não
damental da consciência do homem se comporta em harmonia com esta
celeste. Pedra Angular entra irremediavelmente
Certamente sabeis que o antigo sím- em conflito com ela. As palavras de
bolo do homem é uma “pedra”, que Cristo: “Não vim trazer a paz, mas sim a
pode manifestar-se no universo de espada”, (Mateus, 10:34) se justificam
modo sétuplo, o que explica que a anti- plenamente, a partir do momento em
ga sabedoria falava da “pedra de sete que compreendemos que nossa ordem
olhos”. Compreendeis que se trata aqui de natureza deve ser rompida, a fim de
do homem em sua manifestação espiri- que o Todo se conforme ao plano de
tual sétupla. A “pedra de sete olhos” construção original. A franco-maçonaria
representa o microcosmo, que com- da Pedra Angular da Rosacruz áurea
preende um campo aural sétuplo dotado não visa humanizar o homem decaído ,
de sete núcleos de consciência que nem a torná-lo religioso; ela professa a
envolvem o Espírito central. Esta pedra idéia que irradia de Cristo: que o homem
de sete olhos (que é o sistema sétuplo deve tornar-se uma realidade viva em
humano) é a pedra que deve tornar-se um campo de vida absolutamente novo,
viva, e depois disto é preciso que esta a fim de que ele renasça e se deixe
pedra viva seja introduzida no Templo guiar rumo ao Campo de Vida Original.
Universal, que transcende toda e qual- Talvez estejais perguntando como
quer limitação graças à preciosa Pedra esta franco-maçonaria se exerce dentro
Angular, que é Cristo. da Rosacruz áurea. Devemos ressaltar,
quanto a isto, que a rosa de sete péta-
las, ou lótus, somente poderá edificar,
CONSTRUÇÃO SEM BASE AUTÊNTICA na vida presente, sua construção micro-
cósmica sete vezes sétupla, a “pedra de
sete olhos”, seguindo o caminho da
Como este fato é incontestavelmente cruz: por uma regeneração.
estabelecido, podemos afirmar que Para melhor compreender isto, dire-
qualquer pessoa que quiser construir, mos mais: que a realização deste cami-
que queira ser um verdadeiro maçom nho da cruz deve tornar-se perfeita-
(em francês, maçom = pedreiro, cons- mente natural, que vai acontecendo por
trutor), sem levar em conta esta exigên- si, e que ele exige:
cia, acabará fracassando e somente irá bondade em relação ao próximo,
obter resultados negativos. Apesar de comportamento pleno de humanida-
tudo isto ser um fato confirmado, é algo de,
difícil e, na realidade, há inúmeras ten- sentimento de fraternidade e de amor
tativas bem intencionadas para edificar por todos os seus semelhantes.
uma construção mais ou menos aceitá-
vel neste mundo! Nada impede (e os
fatos o comprovam) que a preciosa Catharose de Petri
Pedra Angular seja muitas vezes rejeita-
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REFLEXÃO SOBRE COISAS ESSENCIAIS
E ELEVAÇÃO DA ALMA
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A dança de
Shiva (século
II. Bronze do
museu Guimet,
Paris).
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O INFERNO DOS DESEJOS DO CORAÇÃO
CORROMPIDO
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Mas será que nós conseguimos isto? originais sobre as quais se fala na A Tábua
Será que conseguimos refletir sobre as Doutrina Universal. O homem foi ligan- Esmeraldina,
segundo uma
coisas essenciais e elevar nosso coração do-se passo a passo a sua própria cria- descrição do
com tranqüilidade, sem sermos assalta- ção (na cosmologia de Pimandro este Dr. Bacstroem
dos por algum desejo, sem nos distrair- processo de desenvolvimento na maté- no livro
mos com algum pensamento, sem nos ria durou milhares de anos); depois, Original
entregarmos a alguma atividade? houve a separação dos sexos, que é a Alchemical
Manuscripts
situação em que nos encontramos
(Manly Hall).
ainda hoje.
MORTE DAS ESTRELAS... Ora, quando alguém recusa descer
ainda mais na matéria e resolve purificar
seus desejos até o extremo, atinge o
Em um antigo escrito hindu sobre a ponto de toque da força salvadora da
Criação aparece a seguinte imagem: Gnosis. O fogo divino vem até ele, o
“Quando Brama criou o mundo e espa- abraça e o livra da prisão da natureza
lhou sobre ele as centelhas de seu fogo, da morte, com a condição de que real-
os ‘deuses contrários’ elaboraram um mente vá em busca do auxílio divino e
plano para reter as centelhas divinas, e que se esforce por si mesmo para esca-
os deuses assustados viram um monstro par às chamas mortais do monstro de
de fogo ardente subir até os confins do fogo dos “deuses contrários”.
mundo. Ele elevou milhares de cabeças
monstruosas contra a montanha celeste,
e de suas milhares de goelas ele fez jor- FIM DOS DESEJOS PROFANOS
rar línguas de fogo que lamberam a mon-
tanha celeste semeada de diamantes
faiscantes, de tal modo que as estrelas De que modo? Para começar, não se
morreram. Ele avançou sobre o mar deixando guiar por seus desejos, paran-
batendo nele com suas garras... do de alimentá-los, neutralizando-os e
Então, surgiu Shiva, o eterno dança-
rino. Com a força de seu poder divino,
que ele havia acumulado pouco a
pouco, de acordo com a lei inabalável
estabelecida pelos próprios deuses, ele
atacou o monstro. Ele rodeou os limites
da terra com seu corpo gigantesco,
abriu sua boca, abocanhou o fogo infer-
nal, e apagou-o mastigando-o, e então
o engoliu”.
Esta narrativa mostra que as cente-
lhas divinas correm o risco de se perde-
rem no mundo que elas criaram, mas
também que elas não estão abandona-
das a sua própria sorte, a sua infelicida-
de. E na região em que as centelhas do
Espírito mergulharam na matéria, de-
senvolve-se a luta entre o divino, imutá-
vel, e o humano, que está sempre se
transformando.
O homem original era masculino-fe-
minino e gerava a si mesmo. Assim, ele
povoou o universo com as sete raças
Em 1960 Jan van Rijckenborgh partir de então e tudo o que é velho se
publicou pela Rozekruis Pers, em dissolverá sistematicamente e assim
Haarlem, o primeiro tomo da será liberada a força que elabora e
constrói a nova base de vida, sobre a
Arquignosis Egípcia e seu chamado
qual pode ser edificado o Templo divino
no eterno presente, onde ele comen- que é mencionado pelo Corpus
ta a sabedoria hermética da Tábua Hermeticum. Somente será possível
separar, dentro de seu ser, a luz das tre-
Esmeraldina e do Corpus Herme-
vas, o bem do mal, o Espírito da maté-
ticum, de Hermes Trismegisto (a tra- ria quando o coração for um santuário
dução brasileira foi sendo editada purificado, tal como era no início da
entre 1984 e 1991). manifestação da humanidade original.
Este Templo é a morada da centelha
de Luz semeada no coração do homem,
mas que agora foi engolida pela matéria
finalmente os rejeitando; limpando den- e está completamente sujeita a ela.
tro de si as estrebarias de áugias em Quem purificar seu coração e restabele-
que seu coração se transformou e, nes- cer a ligação entre o coração e a cabe-
te campo de trabalho, purificado, refle- ça poderá dizer, como Hermes: “Vi em
tindo sobre as coisas essenciais e ele- meu Nous (Alma-Espírito), como a Luz,
vando seu coração. Em seus comentá- composta de inumeráveis potências,
rios do Livro de Pimandro, Jan van converteu-se num mundo realmente ili-
Rijckenborgh diz que a purificação do mitado, enquanto o fogo era cercado e
coração é a própria base de uma reno- dominado por uma força muito podero-
vação total. De fato, se o coração está sa e, assim, posto em equilíbrio”.
purificado e já não se alimenta de dese-
jos profanos, esta purificação se projeta (Arquignosis Egípcia, Tomo I, p. 28)
no santuário da cabeça. Então, coração
e cabeça se fundem em unidade total,
necessária para “poder refletir sobre as
coisas essenciais e elevar seu cora-
ção”, até o momento em que seja pos-
sível a cada um encontrar seu próprio
Pimandro.
Na manifestação de miríades de for-
mas que a humanidade original criou
quando abandonou o reino de Deus,
cada criatura, por menor que seja, é
dotada da força do Espírito, força que
torna possível o retorno ao Espírito. Em
cada entidade está oculto o princípio da
Luz.
Quem tornar-se consciente de tudo
isto e quiser escapar do inferno em que
Quem busca a vive e onde se mantém distraído, deve
verdade não se começar purificando seu coração: não
deixa desviar por para refinar e cultivar seu eu, mas para
nada (Tenjin Engi, colocar um ponto final a seus impulsos
século XIII,
básicos. Em seguida, vêm seus pensa-
Metropolitan
Museum of Art, mentos. Se a cabeça e o coração cola-
New York). borarem, nenhum karma será criado a
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NINGUÉM VIU O QUE IA ACONTECER?
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MANTENDO O EU ACIMA DA ÁGUA resultavam de movimentos sociais, de
uma visão mais ampla do futuro, ou de
lutas encarniçadas acabaram. Estas
A catástrofe do Titanic esclareceu transformações aconteceram no passa-
muitas coisas e isto é sempre verdadei- do: hoje em dia já não são possíveis.
ro para nossa sociedade atual: imprevi- O homem moderno está no seu limi-
dência, perda do senso de responsabili- te. Já não há distâncias. Tudo deve
dade, materiais defeituosos, luta para acontecer cada vez mais rapidamente.
tomar um lugar à força em um barco Pressão, tensão e super tensão! O res-
salva-vidas, corrupção. O que predomi- tabelecimento da situação está voltado
na é a luta para manter o eu fora da unicamente para a saúde “financeira” da
água e ter um bom fôlego. empresa, da instituição ou do país. A
O Titanic representa muito bem sua tensão não pára de aumentar, e a comu-
época: loucos sonhos de grandezas, o nicação entre indivíduos diminui à medi-
reinado da riqueza, a condição deplorá- da que as personalidades estão cada
vel dos pobres (pois os emigrantes eram vez mais voltadas para seus próprios
amontoados nos andares inferiores), interesses. Para perdermos nosso “eu”,
estrita separação entre classes, posi- podemos, talvez, mergulhar de cabeça
ções, status. Quem tinha dinheiro vivia na vida social. Ora, isto não traria
com largueza para mostrar o mais que nenhuma liberdade interior, mas traria
podia todas as suas vantagens. O pobre como resultado uma espécie de escravi-
nada tinha a perder e devia lutar para dão.
subir a escala social. Hoje, encontramo- Os países socialmente estruturados já
nos no mesmo ponto! A sociedade atual atingiram uma caricatura de igualdade, a
também dá a imagem de um luxo consi- ponto de terem programas de partidos
derável ao lado de uma miséria de dar políticos muito semelhantes. Mas, na prá-
dó. tica, a realidade é outra! E poderíamos
O naufrágio do Titanic fez com que dizer: “A distribuição é igual, os pobres
certos conceitos se mexessem e as coi- têm gelo no inverno, os ricos no verão”. É
sas começaram a andar de um modo próprio do homem somente preocupar-
um pouco diferente. Agora, cada navio se consigo mesmo e esforçar-se para
prevê um lugar para cada passageiro enriquecer, quando pode. Cada um
em seus barcos salva-vidas, o rádio fun- pensa, sente, trabalha dentro de sua pró-
ciona permanentemente, e as coorde- pria maneira de ver o mundo, e busca se
nadas dos icebergs são registradas e proteger por todos os lados (somos obri- Narciso se
transmitidas em âmbito internacional. gados!) graças a novas técnicas e a apaixona por
As experiências da Segunda Guerra novos dispositivos de segurança. seu próprio
Mundial abriram também a oportunida- E se chegasse a hora da grande prova reflexo na
matéria (água-
de de deslocar certas barreiras em cer- final? Todas estas técnicas de sobrevi- forte de Michel
tas regiões, principalmente na Europa. vência tão sofisticadas poderiam impedir de Marolles,
Naturalmente, o que ainda funcionava a morte? Qual seria o resultado? 1655, Quadros
bem não mudou tão rapidamente. Mas A história do Titanic nos fornece indi- do Templo das
as transformações indispensáveis que cações e pontos de comparação. Este Musas, Paris).
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navio era indestrutível: mas logo todos temem por sua própria pele. O homem
perceberam que sua construção não ou a mulher que se arrisca a isto geral-
era verdadeiramente perfeita. Enquanto mente é advertido sem piedade. E quem
a catástrofe acontecia, o orgulho, a estaria pronto a auxiliar seus semelhan-
estupidez e o desejo de ter razão cons- tes se, segundo as predições, “o barco
tituíram muitos obstáculos para a fuga e da humanidade” logo irá arrebentar-se
isto durou até o momento em que todos sobre seu próprio iceberg, logo que des-
perceberam claramente que o navio cobrimos que ele não é indestrutível?
“inafundável” já estava afundando. Os Há cerca de oitenta anos, algumas
que perceberam isto, tentaram fugir. horas eram suficientes para aniquilar o
Uns deixaram que seu destino os guias- próprio símbolo de todas as performan-
se. Mas a maioria brigou por lugares ces técnicas da época; entretanto, hoje
nos barcos salva-vidas, cujo número o homem está cada vez mais orgulhoso
havia sido limitado para dar mais espa- de seus próprios méritos. Orgulho, pre-
ço para a ponte do deck. Havia apenas tensão, ostentação, voluptuosidade de
1.178 lugares disponíveis ... para os exercer o poder constituem inúmeros
passageiros da classe de luxo! obstáculos no caminho da vida superior.
Os salva-vidas não estavam à altura Apesar de estar aumentando o número
de sua tarefa e abandonaram seu cargo de pessoas que se opõem à idéia de
diante do afluxo de vítimas. E, quando o que a humanidade é infalível, as autori-
majestoso navio desapareceu, enquan- dades agem como se nada pudesse
to 1.500 náufragos esperavam a morte acontecer. Como no caso do Titanic, há
nas águas geladas, um só e único barco “compartimentos estanques” que devem
salva-vidas (na versão cinematográfica) assegurar uma boa navegação. Como
tentou procurá-los. Os outros, carrega- no caso do Titanic, não se saberia pre-
dos de homens meio paralizados de frio, ver nenhum desastre.
flutuavam ao sabor das ondas e foram
descobertos um pouco mais tarde pelo
navio a vapor Carpathia que havia cap- ESFORÇOS INÚTEIS PARA ELEVAR
tado o sinal de alarme. A HUMANIDADE
Este único barco salva-vidas é a mais
trágica imagem do filme: um marinheiro
escuta com atenção a resposta a seus Sempre houve seres humanos que
chamados. Somente um homem se advertiram seus semelhantes sobre as
esforça para auxiliar seus semelhantes calamidades futuras que resultam de
no sofrimento e na morte. Um só sua temeridade e de suas concepções
homem, enquanto que todos os outros errôneas. Muitos tentaram fazê-los
já não sabem o que fazer e não querem mudar de idéia. Se os tempos não esta-
arriscar suas vidas. Um só e único barco vam maduros, eles falavam a surdos,
salva-vidas no meio de 1.500 pessoas tudo continuava como antes, e o apelo
prestes a se afogar para salvar algumas destes corajosos pioneiros, que sabiam
vidas nesta desordem espantosa. o que aguardava a humanidade, perdia-
Como se apresenta nossa socieda- se ao longe.
de? Ela é bem estruturada e provida de Agora que o fim do século XX se
todas as comodidades, desde o neces- aproxima para as sociedades cristãs,
sário até o supérfluo. Mas, nesta socie- está ficando cada vez mais evidente que
dade moderna endurecida surge tam- o poder pelo poder desemboca na
bém um fenômeno evidente: ninguém negação crescente dos valores huma-
ousa ajudar ninguém, porque todos nos e engendra manobras e manipula-
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ções que acabarão em um banho de sua origem divina, ela tornou-se latente
sangue, e não na elevação do homem. e, para muitos, perfeitamente teórica.
Não estamos mesmo na terra para Para o filósofo, ela é impossível de ser
massacrarmos uns aos outros? Para conhecida. Para qualquer outra pessoa,
dominarmos uns aos outros com nosso ela pode ser uma idéia digna de riso.
saber e nosso poder? A educação e o Para aqueles que estão percebendo
esporte preparam as crianças para lutar cada vez mais que estão prisioneiros da
uns contra os outros. O que começa matéria e que a vida cotidiana é o triste
com simples exames e concursos obstáculo que impede que a luz de sua
acaba na dura posição do EU no campo alma brilhe, o chamado da alma é uma
de batalha da vida cotidiana. Estará aí o realidade cada vez mais clara e mani-
nosso futuro? Ser o melhor de todos? festa. Presentemente, a alma ainda está
Ou será que a felicidade está na união cravada na matéria, mas ela se debate
profunda de todas as almas humanas? cada vez mais violentamente para desli-
gar-se dela. Ela faz sentir sua presença,
pois seu tempo chegou, sua libertação
A NOVA ALMA ROMPE SEUS LAÇOS está sendo anunciada e somente um eu
teimoso e irredutível pode ainda retar-
dar esta evolução.
Se a cultura da personalidade so-
mente gera a luta, o objetivo está mal
escolhido. As grandes cabeças devotam
suas vidas à pesquisa de sistemas para
ajudar a humanidade, cada vez mais.
Quando a bomba atômica caiu sobre
Hiroshima, os adversários do Japão
exultaram porque esta destruição total
devia fazer nascer a “paz”. Hoje, temos
um pouco mais de circunspecção...
Um escolhe o eu impiedoso, geral-
mente levado pelas circunstâncias;
outro, o desenvolvimento de uma alma
superior. Um baseia-se na matéria, que
é nosso terreno de experiências; o
outro, cansado da luta, volta-se para a
eternidade, que, nos bastidores de toda
esta agitação, espera como uma rocha
inabalável aquele que se elevará além
deste “vale de lágrimas” que é nossa
terra.
Em nossa época está surgindo um
novo aspecto: a oferenda consciente do
eu ao princípio superior da alma. A alma
é um princípio contestado. Há muitas
espécies de alma: a alma material, a
vegetal, a animal. A alma que habita o
ser humano é de origem divina, mas
hoje ela está acorrentada ao mundo das
experiências do homem-animal. Desde
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“E EIS QUE ESTÁ AQUI QUEM É MAIS DO QUE SALOMÃO”
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estes três personagens têm um grande texto que a Bíblia (pois esta lenda foi Os cruzados trans-
formaram a mesqui-
significado esotérico, tanto para o acrescida a ela) porque a construção do
ta que, segundo os
desenvolvimento espiritual individual rei Hiram é considerada aqui como uma judeus, os muçul-
quanto para o da humanidade em geral. pedra importante de toda a obra espiri- manos e os
O Evangelho de Mateus (12:42), sublin- tual empreendida em prol da cristãos, foi con-
ha esta importância com estas palavras humanidade. Entre outras obras, Hiram struída sobre o
Santo dos Santos
de Jesus: “A rainha do meio-dia se lev- havia construído um “mar de bronze”.
do Templo de
antará no dia do juízo com esta geração Segundo os especialistas, este “mar” Salomão (Chronicle,
, e a condenará; porque veio dos confins era uma bacia de bronze com diâmetro Hartman Schedel,
da terra para ouvir a sabedoria de de cerca de 5 metros, com uma altura 1493).
Salomão. E eis que está aqui quem é de aproximadamente dois metros e
mais do que Salomão”. meio. Seu peso, quando vazia era de
Não precisamos deter-nos em dados trinta toneladas e podia conter cerca de
históricos, mas sim nesta última frase: 40.000 litros de água. Apesar de
“E eis que está aqui quem é mais do inúmeras descrições desta bacia, nen-
que Salomão”, que, sem dúvida, faz hum vestígio dela jamais foi encontrado.
alusão ao trabalho cumprido por Hiram, Hiram tinha preparado cuidadosa-
o rei de Tiro. Certas fontes esotéricas mente todas as misturas necessárias na
aprofundam mais o significado deste fonte deste “mar”, mas seus três com-
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HIRAM ABIFF, O partir do momento em que o processo
MESTRE-CONSTRUTOR chega a este ponto, chega o segundo
assassino. Este dá um vigoroso golpe
No livro O Caminho Universal*, Jan em Hiram com uma esquadria de ferro
van Rijckenborgh diz o seguinte sobre em forma de cruz. No centro desta
Hiram Abiff e o Templo de Salomão: cruz, está plantada uma ponta aguda
Não devemos pensar aqui em um per- que lhe traspassa o coração. Quando
sonagem histórico chamado Hiram o sangue do coração é tocado, de
mas em um irmão construtor que maneira correta, o aluno, nesta
sabia construir um templo. Hiram é o segunda fase, ultrapassa todas as
sublime mestre-construtor que sabe limitações que até então mantinham-
expressar o verbo criador. Ele é “ani- no ligado ao tempo. Na Segunda fase,
mador”, ou, segundo as palavras de ele adquire, em primeiro lugar, a liber-
Paulo, na Epístola aos Coríntios: “De dade, antes de empreender a viagem
Alma vivente ele passou a ser Espírito de volta ao lar. A viagem de regresso
vivificante”. Tal é Hiram, rei de Tyro e não pode iniciar-se se o centro do
de Sidon. (...) Como Hiram alcançou coração não estiver perfurado e a rosa
este estado de ser e como tornou-se aberta no santuário do coração. Por
digno de auxiliar os outros na constru- conseguinte, a viagem de volta
ção de seus templos? Para com- somente termina quando a rosa flo-
preendermos isto, devemos fixar um resce no santuário do coração.
momento nossa atenção em uma das Quando a rosa irradia sua glória no
narrativas sagradas que tratam deste coração do candidato, vem o terceiro
personagem. Lemos que Hiram é assassino. Ele dá um golpe final e
acompanhado por três assassinos mortal na cabeça, com um martelo em
que o fazem passar por uma morte trí- forma de círculo. O símbolo da terceira
plice. Aqui também está oculta a fase pode ser visto como o círculo da
morte trípice segundo a natureza, a eternidade; o aluno participa da vida
que o aluno deve sujeitar-se; a mesma original. Hiram, o sublime, constrói o
morte do eu de que fala a Rosacruz templo e quer auxiliar os outros nesta
áurea, e a mesma morte pela endura construção, com um amor infinito.
dos tão injustamente odiados Cátaros.
Jan van Rijckenborgh, O Caminho Uni-
O primeiro assassino golpeia versal, Rozekruis Pers, Haarlem, Holanda,
Hiram com uma régua de 24 polega- edição revista, 1996.
das. Às vezes se diz também que o
primeiro assassino estrangula Hiram
com uma corda de agrimensor de
vinte e quatro polegadas. Este símbo-
lo nos indica que Hiram, o aluno, vai
desprender-se da natureza e libertar-
se do aprisionamento do tempo... A
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panheiros ainda simbolizaria a
não estavam com- busca e Salomão, a
pletamente prontos; compreensão pura
trata-se, simbolica- da origem e do
mente, do coração, destino da hu-
da cabeça e das manidade. O pro-
mãos. Por isso, no fundo desejo da
último momento, ele Verdade (Sabá) e a
teve oposição, trai- pura compreensão
ção. A fonte não pô- da Verdade (Sa-
de ser realizada lomão) estão certa-
conforme o previs- mente ligados um
to, pois a água e o ao outro. Eles se
fogo se encontra- encontram, e com-
ram em má propor- preendem pouco a
ção e a bacia ex- pouco sua missão
plodiu. mútua e evoluem
Uma das lendas um em direção ao
conta que Hiram outro. Nesta situ-
tinha recebido os ação, uma terceira
meios de vencer força pode ligar-se
todos os obstácu- a esta síntese do
los, ou seja, um martelo e um triângulo puro desejo e da pura compreensão: a
em ouro puro. Ele escondeu o triângulo força representada por Hiram, o rei de
de ouro em uma fonte, em local seguro, Tiro, o mestre-construtor capaz de edi-
e divulgou que seus inúmeros filhos ficar o templo do Novo Homem.
continuariam sua obra até o final. Nos períodos em que a humanidade
Também se diz que o triângulo de ouro mergulha na matéria e tem muita dificul-
devia ser guardado no santuário mais dade para se direcionar para a vida
interior, e ser mostrado somente a quem superior, se tentar desligar-se da
compreendesse o sentido profundo matéria, fica fraca e impotente. Então,
desta lenda. muitos buscam um ponto de apoio em
Mas qual é, portanto, o significado coisas perecíveis e direcionam sua con-
desta narração para a humanidade em sciência unicamente para a vida materi-
geral e para o indivíduo, em particular? al, negligenciando, assim, a construção
O que representam Salomão e a rainha do templo interior do Espírito divino.
de Sabá? Parece possível aprofundar- Eles tentam dar forma a uma ética e a A rainha de Sabá
mos um pouco o segredo deles se fizer- seus sonhos, construindo edifícios que surge diante de
mos a relação entre seus nomes e as logo são levados pelo tempo. Estão Salomão (vitral
da igreja de São
fases de desenvolvimento da alma. sempre em conflito, assim como suas
João em Gouda,
Seus mantos púrpuras poderiam repre- idéias, seus sentimentos e suas obras, Holanda, por
sentar o estado da veste astral. A partir que sofrem contínuos ataques; e, ao Wouter Crabeth,
deste ponto de vista, a rainha de Sabá mesmo tempo, sempre são impulsiona- século XVI).
21
dos a pensar novamente que a vida atravessa, inúmeros são aqueles que
deve ter um objetivo mais elevado. chegam ao limite de sua consciência
Então, aquele que está buscando acaba terrestre. É um estado indicado pelo
reconhecendo que seus esforços no termo “Galiléia” ,no Novo Testamento,
plano terrestre não o farão ir muito longe ou seja, a região em que a consciência
e que não é o “templo do eu” que ele começa a transformar-se. A rainha de
deve construir, mas o Templo do Sabá, que nas lendas expressa o dese-
Espírito, que está fora do tempo e do jo de renovação, torna-se, portanto, um
espaço. personagem que podemos considerar
É assim que, no decorrer do proces- como símbolo do buscador da Verdade
so de desenvolvimento da humanidade, no plano espiritual. Neste sentido, é o
chega um momento em que a alma símbolo da busca da Verdade, que está
deve dar o grande passo, que consiste tomando um grande impulso neste final
em voltar as costas para as limitações de século XX.
do eu para devotar-se à construção do Quais são as circunstâncias que
Templo de Salomão. Trata-se de um fazem com que o eu afrouxe os laços
processo de desenvolvimento anuncia- que prendem a alma original?+ Como
do há muito tempo pelos verdadeiros esta pode despertar de seu sono mortal
gnósticos, e realizado no século XX. e preparar-se para receber a sabedoria
Impulsionados por um grande sofrimen- superior?
to interior, os homens que aspiram a A Bíblia descreve Sabá como sendo
O Templo de uma consciência completamente nova um reino próspero rodeado por um
Salomão, (comparável àquela em que Salomão deserto inacessível. Mil anos antes de
segundo o bebeu sua sabedoria legendária) foram- Cristo, Sabá era um importante cruza-
gravador
se agrupando, e para eles a construção mento de várias rotas comerciais que
Mattheew
Merian
do templo interior tornou-se a tarefa vinham da China, da índia, do Egito, da
(Amsterdam, mais importante de suas vidas. Babilônia, da Assíria e de Canaã. Sua
1675). A cada crise que a humanidade capital, Marib, era uma das cidades
22
mais ricas da Arábia antiga. Neste sen-
tido, Sabá é o símbolo que fala de um
TEMPLO CONSTRUÍDO
local em que se encontram diversas cul-
COM CARVALHO
turas, e também onde se encontra uma
escola importante.
A realeza clássica de que os mis-
Nestes tempos modernos tão
térios nos falam pereceu muito antes
fugazes, esta imagem pode ser muito
de nossa era e não tem, por conse-
esclarecedora. Para muitos, a vida par-
guinte, nenhum sentido discorrer
ticular é como um local perdido em um
ainda mais sobre isto. Desejamos
deserto, onde se encontram abatidos
porém dirigir vossa atenção para o
pelas preocupações, pela aridez espiri-
fato de que todo o verdadeiro sacer-
tual e pelos esforços infrutíferos para
dote e iniciado da antiguidade foi, na
atingir o inacessível. Entretanto, alguns
linguagem dos mistérios, indicado e
não se deixam dominar pelo jugo da
comparado a uma árvore. Sabendo
vida cotidiana e se voltam para um obje-
disto, podemos retornar imediata-
tivo superior, a fim de liberar dentro de
mente a nosso ponto de partida e
si a alma real. Logo que se tornam con-
entender Hermes, quando ele diz que
scientes de sua situação, eles decidem
Deus é uno em essência com o can-
encarar a vida de uma maneira total-
didato nele despertado e que a este
mente nova e adotam uma nova atitude,
candidato ele se dirige, entre outras
desviando sua consciência das coisas
coisas, por intermédio de carvalhos: o
exteriores, ao mesmo tempo em que se
termo velado que indicava os inicia-
aprofundam cada vez mais na fonte da
dos da Fraternidade Universal.
vida interior. Neste processo, o papel
Com isto, entramos imediatamen-
mais importante é desempenhado pelo
te em terreno bíblico, pois pensai tão-
desejo crescente por uma outra vida,
somente nos cedros do Líbano, os
gerado por uma sabedoria superior.
cedros com cuja madeira, segundo o
Invadida por uma grande inquietude
mito, o templo de Salomão deveria
interior, a alma experimenta seu apri-
ser construído. Esse templo nunca foi
sionamento no deserto da vida e pouco
destruído! Ele nunca existiu na
a pouco adquire a capacidade de se
Jerusalém conhecida pela geografia,
desligar desta esfera de influência
pois o templo de Salomão é um dos
estéril, que é tão degradante para ela.
verdadeiros templos viventes do
Ela percebe a voz da vida original,
campo divino da vida, construído e
reconhece seu chamado e “volta sua
mantido por árvores viventes, por
face” para ela. Seu desejo profundo a
meio dos homens-almas viventes em
dirige para o caminho do entendimento
Deus.
superior.
Todas as almas, quando chegam à A Arquinosis Egícia, Tomo IV, Jan van
maturidade, são atraídas e elevadas Rijckenborgh, p. 132, 1ª edição brasilei-
para a união com as almas irmãs, ra, 1991, Lectorium Rosicrucianum, São
preparadas para este encontro. Quando Paulo, Brasil.
os buscadores da verdade se encon-
23
O faraó indica tram desta forma, percebem que, mes- moniosamente para a construção do
o lugar em que mo que seus caminhos tenham sido templo. Mas, a todo o momento,
deve ficar o
muito diferentes nos detalhes, eles Salomão deve continuar consciente de
novo templo,
segundo os seguiram a mesma via principal. No que ele nada pode por suas próprias
dados cósmi- ponto de encontro, eles podem reunir-se forças; o mesmo vale para o coração, a
cos (templo de em grupo, o que reforça seu desejo fun- rainha de Sabá. É preciso que eles man-
Edfou, no damental. Eles procuram ter uma tenham total humildade para poder
Egito).
imagem clara da criação da qual eles servir a humanidade.
fazem parte, assim como todos os seus Portanto, é importante que o bus-
irmãos humanos. Suas almas, se eles cador da Verdade se aprofunde no
forem realmente libertados, conhecerão aspecto espiritual de sua vida, e vá-se
profundamente a sabedoria que não é importando cada vez menos com seus
deste mundo. O Antigo Testamento fala, impulsos dialéticos. Boa vontade e res-
a este respeito, da sabedoria dos julga- oluções sublimes não são suficientes: é
mentos de Salomão. preciso agir, libertar sua alma das cor-
O coração que já se tornou receptivo rentes do ego e orientar-se a partir da
(Sabá) encontra a compreensão ilumi- força que age além dos poderes
nada da cabeça (Salomão) em cada humanos. O rei Hiram simboliza esta
buscador da Verdade, e, a partir deste força: é o construtor que dá sua forma
encontro, constrói-se um novo mundo. ao templo do Espírito.
Cabeça e coração, prestes a realizar a
grande obra, aprendem a colaborar har-
A ALIANÇA ENTRE HIRAM E SALOMÃO
24
Salomão (961-922 a.C.), rei de texto mais tarde, nada se sabe. A
Israel, é mencionado na literatura forma mais antiga mostra, entretanto,
judia e islâmica como o maior sábio uma certa semelhança com tradições
que já existiu. A ele são atribuídos, sírias, palestinas, árabes e egípcias
especialmente, o livro bíblico dos que remontam aos quatro primeiros
Provérbios, o Cântico dos Cânticos, o séculos da era cristã... O primeiro
Eclesiastes, Sabedoria, Salmos e as texto em língua etíope data do século
Odes, apesar de não terem sido VI”.
escritos na mesma época. Pesquisas A Bíblia mostra Hiram, rei de Tiro,
recentes mostraram que as Odes como o mestre-construtor do Templo
foram redigidas muitos séculos depois de Salomão, que ele decorou magni-
da morte de Salomão e seriam de ins- ficamente, segundo o Livro dos Reis,
piração gnóstica cristã. Também se capítulo 8. Hiram surge nas lendas
acreditava que Salomão tinha poder esotéricas como Hiram Abiff, o cons-
sobre os espíritos dos mundos invisí- trutor do templo místico em que se
veis. Com a ajuda de Hiram, ele cons- encontra o mar de bronze, ou mar de
truiu em sete anos um templo como vidro.
nunca se havia visto. A crônica etiópi- A rainha de Sabá, ou Seba, reinou
ca que trata de Salomão e de sua na época de Salomão em uma região
descendência, o Kebra Nagast (A que corresponde ao atual Iemen. Até
Glória dos Reis), relata em detalhes a cerca de 115 a.C. este foi um dos
visita da rainha de Sabá a Salomão. O mais poderosos estados do Sul da
Dr. E. A. Wallis Budge, no livro The Arábia.
Queen of Sheba and her Only Son
Menyelek (1922), diz: “O Kebra
Nagast reúne uma série de lendas
tradicionais: algumas são históricas,
outras puramente folclóricas. Elas
vêm do Antigo Testamento, de escri-
tos hebraicos mais tardios, de fontes
egípcias (pagãs e cristãs), árabes e
etiópicas. Sobre a origem, a composi-
ção, o autor e os que arranjaram este
25
está livre, pois, quando não pode tornar- O MAR DE BRONZE SIMBOLIZA TAMBÉM
se o mestre, o eu escuta com bom PONTO MAIS ALTO DA PIRÂMIDE
grado os bons conselhos que são o eco
de seus críticos secretos.
Hiram possui o Espírito de Deus: ele Da fusão espiritual da água pura e do
serve à esfera divina, e portanto é inat- Fogo puro se forma o campo de
acável. Ele moldou o mar de bronze vibrações superior, o campo sagrado, a
dentro de si mesmo e por isso pode pedra do ponto mais alto da pirâmide.
dirigir interiormente o grupo que aspira Todas as comunidades espirituais que
ao mesmo objetivo; mas, na fase aspiram a este objetivo elevado devem
preparatória, as forças naturais domi- realizar, na hora certa, um campo de
nantes podem arruinar, aniquilar a vibrações perfeitamente puro de tal
atividade do princípio superior. Então, modo que as forças do campo de vida
a palavra do mestre se retira e a con- original possam aí se derramar sem
strução do templo se perde. Somente obstáculos. É por isso que um campo de
quando a antiga natureza mortal se vibrações como este será sempre prote-
apagar inteiramente é que o entendi- gido por trabalhadores vigilantes, de
mento superior pode tomar seu lugar acordo com as leis simples do triângulo
para garantir a construção do templo. de ouro de Hiram, o Trigonum Igneum,
As narrativas que dizem respeito a onde todos os elementos estão em per-
Prometeu, Hércules, Mitra, Osíris e feito equilíbrio, o que significa:
muitos outros mencionam os obstácu-
los enviados pela antiga natureza. 1. um aprofundamento cada vez maior
Estes “traidores” tentam desviar a do plano pela pura compreensão rece-
força renovadora para oferecê-la à an- bida;
tiga natureza, anulando, assim, a ativi- 2. o devotamento a este plano, em amor,
dade do Espírito divino. Entretanto, a pela auto-rendição;
luz triunfa! Assim é o mistério do “Sol 3. a execução do plano, baseada em um
Invictus”, o sol espiritual invencível, comportamento puro, segundo a lei
que cada um deve seguir um dia e interior.
sobre o qual deve dar testemunho. No ser que aspira à renovação, o con-
É dito que o mistério da terra traiu a hecimento, o amor e o comportamento
fusão harmoniosa da água Viva da alma são, portanto, os componentes do triân-
e do Fogo puro do Espírito. Sob a gulo equilátero.
influência de três companheiros indig-
nos, a alma fica turva e não pode rece-
ber de maneira correta o Espírito puro, o
Fogo puro. A fonte do mar de bronze fra-
cassa por falta de bons materiais, os
materiais vivos.
26
ENCONTRO COM O ESPÍRITO DIVINO ATRAVÉS
DA NATUREZA*
27
“FICA EM SILÊNCIO E COMPREENDERÁS”
28
O flamenco é uma espécie de
canto e dança ciganos. Originário “Meu coração aspira dia e noite
da índia, esta arte popular viu-se A Ti e ao encontro
misturada, no decorrer dos sécu- Que será como a morte
Que tudo consuma.
los, com influências mouriscas,
Varre-me como a tempestade,
andaluzas e, principalmente, Toma tudo o que tenho,
européias. Somente no século Penetra meu sono
XIX o flamenco foi reconhecido Desordena meus sonhos...
Priva-me de meu mundo.
em diversos lugares.
E neste deserto,
Nesta nudez absoluta
Do Espírito, que eu me una a tua mag-
uma estreita afinidade com o Universo. nificência.
Quem quiser adquirir o conhecimento Ah, que vaidade, um voto como este!
de Deus e do mundo deve, antes de Onde reside esta esperança de união
tudo, aprender a conhecer a si mesmo. Senão em ti, ó meu Deus?”
Deus se oferece a nós em seu Amor
inconcebível. Portanto, que tua alma fla- Não há, nas palavras destes dois
meje como um fogo diante dele; que ela autênticos buscadores de Deus, nenhu-
corra como um riacho até ele; deixa-te ma erudição inútil, nenhum alarde de
penetrar por sua essência como as flo- informação supérflua. Elas dão testemu-
res se deixam penetrar pelo perfume. nho de um coração ardente, de uma
Que o obreiro no Universo faça res- alma sedenta e de uma intensa aspira-
soar a corda de sua energia universal, ção de realizar uma vida pura.
como o vento da primavera sopra jubilo- Quem esvaziou até a última gota a
so como a tempestade. Que ela ressoe taça do sofrimento, quem já está farto
sobre os vastos campos da vida huma- do mundo e de sua confusão desespe-
na trazendo consigo o perfume das flo- rada pode libertar-se deste turbilhão de
res; que ela umideça nossas almas res- sabedoria fingida e de aparente erudi-
secadas, a fim de que nosso amor ter- ção. Uma voz dá testemunho, em seu
restre acabe desejando lutar para se foro íntimo:
elevar totalmente até o Amor universal”. Quero abandonar este mundo (e por-
A nostalgia do coração que se tanto a mim mesmo). Quero abrir meu
expressa no canto flamenco dos ciga- coração totalmente, a fim de descobrir
nos espanhóis se encontra, idêntica, em se existe um outro mundo, o mundo da
um dos poemas de Rabindranath Verdade vivente!
Tagore:
29
O QUE OS ROSA-CRUZES ENTENDEM POR...
30
visíveis quanto invisíveis da terra. cia suas experiências, que vão forman-
do pouco a pouco sua consciência.
Eternidade: este termo é freqüente- Quando esta consciência atinge seus
mente associado à imortalidade. Neste limites, uma outra vivificação entra em
sentido, ele se refere a este estado em jogo. Vista sob a luz da realidade gnós-
que já não há opostos e onde o espaço tica superior, a “vida” na natureza da
e o tempo já não desempenham seu morte não passa de uma caricatura de
papel. Assim, a eternidade é ilimitada e vida (ver Natureza original).
atemporal.
Santuário da cabeça: originalmente, era
átomo-Centelha-do-Espírito: princípio a sede do Espírito divino. O mental
central fundamental do microcosmo voltado para o eu fez com que o Espírito
onde está inteiramente inscrito o plano se tornasse inativo. Quando os san-
divino. A centelha do Espírito é consid- tuários do coração e da cabeça purifica-
erada o último vestígio do homem espir- dos agem em harmonia, então se abre
itual original. A purificação e o restab- o caminho de transfiguração.
elecimento do microcosmo podem rea-
cender esta centelha a fim de que ela se
manifeste em seguida como princípio
central do homem original.
31
SOFRIMENTO DA CONSCIÊNCIA FRAGMENTADA
32
poderosa e caminha no Amor e na Luz Espírito. Para eles, este novo estado de
é um aluno da Luz. Em seu coração vida interior não passa de uma teoria
purificado, ele ouve então a voz de que não pode ser demonstrada. Então,
Cristo que tenta recuperá-lo como a eles pegam as pedras da vida terrestre
ovelha desgarrada, rumo à unidade de para tentar aniquilar a luz. Pode-se con-
tudo o que é. “O Pai e eu somos um.” siderar a pedra como símbolo de uma
densificação e de um extremo endureci-
mento interior. Quem quiser captar a luz
ROMPIMENTO ENTRE A CONSCIÊNCIA E A com seu eu duro como pedra, sentirá
UNIDADE UNIVERSAL que caminha diante de grotescos confli-
tos. Durante a Segunda Guerra Mundial,
alguns prisioneiros de um campo de
A consciência fragmentada não concentração se reuniram para acusar a
conhece a unidade de Cristo e do Pai, Deus pela miséria em que se encontra-
nem Cristo como Sol espiritual, nem vam. No final do processo contra seu
Cristo dentro de seu próprio coração. É Criador, eles o declaram culpado;
por isso que a consciência fragmentada depois, eles começaram a rezar para
busca uma prova e pergunta a Jesus se fazer com que Deus se arrependesse!...
ele é realmente o Cristo. Mas a respos- É claro que isto é absurdo! Mas tam-
ta dele não a satisfaz. bém é sinal de que o homem não perce-
Quem chega aos limites da consciên- be que na verdade ele está denuncian-
cia fragmentada e vivencia a luz da nova do sua própria criação e suplicando a si
consciência sabe que ultrapassou os mesmo para tudo mesmo.
limites antigos e pode entrar em um pro- Como está preso à ilusão a este
cesso de desenvolvimento totalmente ponto, ele projeta sua ignorância em
novo. Muito se escreveu e se filosofou seu próprio firmamento microcósmico.
sobre este assunto. No entanto, o tempo Seus pensamentos formam nuvens que
das descrições e especulações está acabam obscurecendo sua consciência
consumado. As condições de vida sobre até se encontrar na obscuridade total
a terra mudam rapidamente. A densifi- para a escolha que ele deve fazer: ou
cação da matéria atingiu um limite e escapar rumo à luz, ou mergulhar em
coloca a humanidade diante da necessi- suas ilusões. Se ele não encontrar a
dade de uma consciência inteiramente saída, a dualidade, a desarmonia será
nova. A luz crística deve nascer no impulsionada dentro dele até o paroxis-
homem e rasgar as nuvens do egocen- mo, sua consciência irá fracionando-se
trismo. O princípio fundamental no cada vez mais, e, como um animal feri-
homem, Cristo, deve-se unir ao Espírito. do, ele começará a resistir àquele que
O eu (a alma imortal), e o Pai (Espírito o quer salvar. Em sua escuridão, seu
original) devem novamente tornar-se medo e sua angústia, ele se opõe ao
um. Então o Espírito irá comunicar-se salvador. No entanto, o animal ferido
com a alma que se tornou receptiva, o percebe que seu salvador é digno de
Espírito divino irá manifestar-se por confiança e se rende, enquanto que o Rei Amenotep
meio da alma imortal e o ser humano homem ferido em seu coração entra em IV, conhecido
entrará no processo de transfiguração e luta e arma seu intelecto, argumentando como
Akhenaton.
o conduzirá ao bom fim. para se conservar a todo o custo tal Escultura em
Quando a alma e o Espírito se fun- como ele é. Então ele pega as pedras uma coluna do
dem em unidade e a pessoa começa a para apedrejar a luz. Templo de
dar testemunho disto, ela é atacada por Aton, em
aqueles que não têm nem vontade nem Karnak
(Museu do
capacidade para libertar a alma mortal, DUALISMO E CONSCIÊNCIA FRAGMENTADA
Cairo).
e portanto não podem reconhecer o
33
O dualismo aproxima-se da filosofia Palavras e conceitos como “Maia”
própria do budismo, da antiga religião (ilusão), Arhiman (poderes das trevas
egípcia, dos ensinamentos de no antigo sistema persa), Seth (deus
Zaratustra e Mani, das filosofias de egípcio da noite e do mal), Satã (pólo
Pitágoras e Platão, da filosofia neopla- oposto do divino) são a tradução do fun-
tônica, de Basílio e Valentino, ambos cionamento interior da consciência frag-
membros da escola de Alexandria. Esta mentada. Para quem vive no mundo de
doutrina é tão antiga quanto a consciên- Maia, é impossível alcançar o Nirvana;
cia fragmentada e explica a realidade para quem se entrega a Arhiman, é
da vida por meio de dois elementos impossível receber a Luz; para quem se
contrários. Do lado oposto encontra-se inclina diante das forças de Satã, é
o monismo: Deus e a criação são ape- impossível encontrar o Cristo dentro de
nas um. Em si, o dualismo e o monismo si mesmo; para quem se deixa arrastar
são dois sistemas contrários. pelas ondas do oceano dialético, é
Fraternidades como a dos impossível encontrar o ponto de toque
Paulicianos, Priscilianos, Cátaros e do divino dentro de seu próprio coração.
Bogomilos baseavam suas crenças no
pensamento dualista. Para eles, exis-
tiam dois campos de vida: a ordem divi- FILOSOFIA: PONTE TEMPORÁRIA RUMO À
na perfeita e o reino do mundo onde VERDADE
vive o homem decaído. A Escola da
Rosacruz áurea, centrada em Cristo,
fala de uma “ordem de socorro” para Muitos filósofos e fraternidades que
indicar que a região na qual o homem ensinavam o dualismo como prepara-
decaído vive é apenas temporária. No ção do caminho interior que conduz ao
momento em que sua queda se trans- Reino divino falavam aos alunos mais
forma em elevação espiritual, a ordem adiantados sobre a unidade de toda a
de socorro vai sendo destruída pouco a criação. É por isso que não podemos
pouco. dizer que um destes dois sistemas
Há muitas discussões entre dualistas (dualismo ou monismo) esteja errado.
e monistas, mas a Verdade não precisa Eles podem constituir uma ponte para a
ser discutida: ela está bem viva, apesar alma que busca seu Criador. No
das opiniões e especulações dos teólo- momento em que a alma aprende a
gos. Ela é como a branca flor de lótus fazer a distinção entre um deus criado
que se eleva da lama para, assim, ima- por ela mesma e o Criador do universo,
culada, mostrar sua glória. ela encontra a Verdade que está em
Muitos partidários do dualismo res- toda a parte e é sempre a mesma.
tringiam sua doutrina aos pólos opostos Uma filosofia digna deste nome deve
que existem no interior da vida humana. somente servir para estabelecer conta-
Na Doutrina Universal, o dualismo e o to entre o divino e a alma vivente. A
monismo coexistem. O dualismo é, partir deste contato, desta ligação com
então, considerado como sendo dialéti- a luz, a alma vivente prossegue seu
co: bem e mal, luz e trevas, vida e caminho e recebe a Verdade que está
morte; ou então dá a imagem das duas destinada a ela a fim de obter uma nova
ordens de natureza: o reino da luz e o consciência restabelecida e santificada.
das trevas. Estes dois reinos não se O ser humano faz parte da ordem de
misturam, como, por exemplo, o bem e socorro que se manifesta em cada um
o mal dialéticos. de nós, seja sob a forma da harmonia
perfeita da natureza, seja sob a forma
de um grande conflito entre a natureza
SÍMBOLOS DOS CONFLITOS INTERIORES terrestre e a alma originalmente divina.
34
Separação e fragmentação são pró-
prios do homem e, para reencontrar a
unidade, ele deve ultrapassar as oposi-
ções e alçar-se até a Verdade.
Muitos dos grandes iniciados pronun-
ciaram um “Sermão da Montanha”, a
fim de dar diretrizes que permitissem à
alma atingir o ponto mais alto ou reen-
contrar-se com o Espírito. Eles faziam
isto de acordo com o conhecimento
interior que tinham da unidade de suas
almas com a Fonte original de vida.
Falar sobre uma “montanha” significa
falar com consciência de viver as pala-
vras: “o Pai e eu somos um”. Esta cons-
ciência não tem nenhuma relação com
a consciência fragmentada: ela sente
que por toda a parte, no mundo dos
contrários, o alento do Tudo-em-Um
está presente. Aqui e agora.
A doutrina do filósofo grego Heráclito
(cerca de 500 anos antes de Cristo) não
nasceu de especulações sem fim, mas
de uma experiência interior, o que pro-
vocou incompreensão e por isso ele foi fonte, da Causa sem causa, da Luz que
qualificado de “obscuro”. Heráclito via a emana das trevas. Nada fica (o nada
unidade na multiplicidade da criação. que é aquilo que não é). A realidade é
Para ele, a dualidade não existia: tudo sempre diferente daquilo que imagina-
era uno em sua consciência. O mundo mos: ela não depende de pensamentos
do devir era, para ele, apenas uma apa- nem de opiniões humanas. Heráclito
rência enganosa, um véu que encobria aprofundava-se no mistério da forma e
a Verdade e a Realidade da Vida eter- do tempo que, para ele, eram dados fic-
na. tícios e relativos, ilusão. Com esta com-
Segundo ele, o homem se encontra preensão, ele antecipava Einstein.
em um riacho. Quem se agarra às mar- Por detrás da vida da forma temporá-
gens não vai para a frente, mas quem ria corre a unidade da Vida original,
se deixa levar pela correnteza eterna da fonte única, perpétua, luminosa, que
Vida renovadora jamais segue em fren- não pára de afluir e de preencher. Tudo
te no mesmo riacho. Para Deus, o velho em todos. A unidade se manifesta na
não existe, pois o que é velho pertence multiplicidade. A consciência desviada
ao passado e o passado pertence ao vê apenas a multiplicidade. Heráclito via
tempo. Tudo passa, nada fica. “Panta que a energia original incomensurável Rei Amenotep
rhei”. penetra e alimenta tudo em todos. Esta IV, conhecido
energia divina domina toda a criação: como
Akhenaton.
ela é o centro dela, mesmo sem ter um
Escultura em
NA FRENTE DE SEU TEMPO centro próprio, e harmoniza em si uma coluna do
mesma todas as oposições. A Gnosis Templo de
não conhece a dualidade. O que se Aton, em
A vida da forma passa. A corrente manifesta no grande está presente no Karnak
(Museu do
interior da vida real nasce da Fonte sem que é pequeno. “O que está embaixo é
Cairo).
como o que está em cima”, diz o axioma
hermético. “Deus é dia e noite, inverno e
verão, guerra e paz, saciedade e fome”,
diz Heráclito.
Este filósofo grego introduziu o termo
“dialética” no pensamento ocidental.
Este termo foi utilizado por Hegel,
Spencer, Nietzsche, Darwin, Marx e
muitos outros. Mas, o que Heráclito
ensinava nem sempre era aceito. Como
os gnósticos, ele não se limitava às res-
trições e limitações do dualismo. Quem
a elas se limita cai inevitavelmente no
abismo de suas próprias contradições.
É sem dúvida, por isso que o filósofo
“obscuro” dizia: “Por mais longe que vos
aprofundeis e por qualquer caminho
que sigais, não encontrareis o limite da
alma de tanto que este limite é profun-
do”.
Se estudarmos a filosofia dualista
como uma doutrina, negligenciaremos o
coração. Ora, este poderoso centro con-
tém a chave que permite neutralizar
todas as contradições! Se quisermos
conhecer nosso ser mais profundo,
Deus em nós, é preciso parar de pensar
“com a cabeça” para pensar “com o
coração”. Quando a luz entra no cora-
ção, todos os problemas vão-se resol-
vendo aos poucos. Não se trata de um
novo método para ter sucesso, elabora-
do por um filósofo especializado, nem
de uma nova doutrina, mas do novo
pensamento que emana da nova cons-
ciência, pois a religião do coração,
“inflamada pelo Espírito divino”, abre a
prisão na qual estão aprisionadas as
almas humanas. E é assim que ela nos
interpela de uma maneira tão particular,
nestes tempos modernos e anárquicos,
em que muitos percebem que a solução
para seus sofrimentos se encontra no
centro divino oculto no fundo deles
mesmos.Alquimia (gnóstica): processo
de transformação espiritual que prepara
a alma para um desenvolvimento supe-
rior.
36
SOBRE A FELICIDADE
Fizeram esta pergunta aos alunos sentimento de estar acima de algo traz
de um colégio: “Será que alguém uma mistura de alegria e de tristeza. A
pode ser feliz se não tiver oportuni- partir da “combinação destes dois senti-
mentos contraditórios”, ele deduz que o
dade?” A expressão dos rostos
homem é dotado de duas naturezas
marca espanto, incredulidade. opostas. Quando uma pessoa consegue
Finalmente, uma jovem responde: elevar-se acima de uma determinada
“Tudo depende da visão de vida que situação, seu espírito, na maior parte do
esta pessoa tem. Se ela possui tempo, se bem menos dm suas percep-
ções sensoriais. Segundo Schiller, as
alguma coisa mais importante a
leis da natureza não prendem forçosa-
seus olhos do que uma simples feli- mente o homem, pois ele possui dentro
cidade comum, ela pode ser feliz, de si mesmo um princípio autônomo,
apesar de tudo”. independente das experiências dos
sentidos. Ele chega à conclusão de que
o homem está submetido como um
Q ue força é esta que dá a um ser a escravo à violência dos sentimentos.
liberdade de se elevar para além da Quem se desprende da influência
infelicidade exterior ou interior e de dos sentidos experimenta um estado de
vivenciá-la como felicidade? O poeta e elevação infinita, enquanto que, gover-
filósofo alemão Schiller (1759-1805) diz nado por eles, ele ficaria profundamen-
em seu tratado Sobre o Sublime que o te abatido nas mesmas circunstâncias.
O astrólogo
mede e calcu-
la as influên-
cias que
determinam a
vida (Giulio
Campagnola,
1569, New
York Public
Library).
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Através de influências sempre cambian- de que tem necessidade para seguir em
tes do mundo exterior e de reações da seu caminho espiritual. Iria parecer-lhe
sensibilidade, é possível descobrir que absurdo ir buscar uma outra coisa em
carregamos em nós um princípio espiri- outro lugar. Depois de ter chegado a
tual e que assim se abre o caminho da este ponto em sua vida, somente terá
liberdade interior. E esta compreensão que dizer adeus, com reconhecimento e
conduz à descoberta da verdadeira feli- grande humildade a todas estas expe-
cidade. Em princípio, esta verdadeira riências que até então foram mestras
felicidade está presente em cada um e severas.
nenhum golpe de sorte pode suprimi-la. Quando a pessoa pode olhar sua vida
Esta fonte de felicidade, o núcleo da a partir deste ponto de vista, ela se dá
alma imortal, deve ser despertada para conta de toda a energia que empregou
a vida e pode dirigir o eu daquele que a para conservar sua infelicidade. Se ela
experimenta conscientemente, de tal tivesse servido para ultrapassá-la real-
modo que assim dispõe de um instru- mente, a pessoa teria conseguido apro-
mento capaz de neutralizar os efeitos do ximar-se mais rapidamente do objetivo
destino. espiritual. No momento em que o busca-
dor for liberado do sofrimento, ele pode
entregar-se a uma atividade inteligente
O TERRENO EM QUE CRESCEM AS DECEP- e criadora proveniente da região da Vida
ÇÕES original. Ele se põe a serviço das idéias
e das forças que vão contribuir para o
desenvolvimento espiritual do mundo e
De fato, ele vê agora a origem das da humanidade. Então, a felicidade se
preocupações, das misérias e os laços torna sua propriedade.
que o acorrentaram tão dolorosamente,
e ele pode reconduzi-los a seu justo
valor, sem preconceitos nem emotivida-
de. Ele vê, então, a insignificância deles
ao lado do grande objetivo que ele visa.
Ele descobre também que muitas vezes
foi o artesão de sua própria personalida-
de, mesmo quando se considerava víti-
ma. Logo que este fato for reconhecido,
ele se libertará da idéia obsessiva de
que “é sempre culpa dos outros”.
RETIFICAÇãO
Graças a esta percepção, quem
busca obtém uma visão clara e objetiva Pentagrama 1-1998, p. 26, Sutton:
Oh, como eu do estado de sua vida. Vê as forças
sonhava com opostas da vida, suas ações recíprocas, O Centro de Sutton fica a 100 km de
coisas impos- e agora percebe como agir positivamen- Montreal, perto da fronteira de Vermont,
síveis! te, ou seja, de modo autolibertador, para e não perto do Lago Ontário.
(William Blake,
rasgar esta teia de aranha. Já não terá
1757-1827),
British necessidade de pedir à astrologia que
Museum, lhe forneça argumentos pró ou contra,
Londres). pois ele percebe que a vida lhe traz tudo
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