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A Bruxaria e a Feitiçaria no contexto da

Inquisição – Parte 3
POR PROF. FELIPE AQUINO  
28 DE FEVEREIRO DE 2019 HISTÓRIA DA IGREJA

A partir do século XV a questão das bruxas intensi cou de


tal forma que a Igreja atuou com mais vigor.

Quase a metade dos 200 processos por bruxaria na


Alemanha, ficaram aos cuidados de dois inquisidores
alemães: Jacob Sprenger (1436-1495) e Heinrich Institores
(1432-1492). A sua
rígida perseguição
às bruxas no Sul da
Alemanha
provocou a
oposição das
autoridades civis e
eclesiásticas. Os
dois inquisidores,
porém, apelaram
para o Papa
Inocêncio VIII
(1484-1492), que
respondeu com a bula “Summis Desiderantes Affectibus”,
de 5 de dezembro de 1484, bula na qual enumera os
malefícios causados pelas bruxas. Entre outras coisas diz
a Bula:

“Inocêncio Bispo, Servo dos Servos de Deus, para a


perpétua recordação dos fatos… Recentemente chegou
aos nossos ouvidos, não sem nos molestar
profundamente, a notícia de que em territórios da
Alemanha Setentrional (províncias da Mogúncia, Colônia,
Tréviris) assim como nas províncias, cidades, terras e nos
locais de Salzburg e Bremen, várias pessoas de ambos os
sexos, esquecidas de sua salvação desviadas da fé
católica tem relações com demônios íncubos e súcubos e
mediante encantamentos, canções renegam
sacrilegamente a fé do seu Batismo… por instigação do
inimigo do gênero humano…”. “Matam as crianças no
ventre das mães, assim como os fetos do gado, tiram a
fertilidade dos campos, destroem as vinhas e as uvas,
enfeitiçam os homens, mulheres e animais… fazem
fracassar as plantações e pomares, pastos, trigais e
outras plantas; além de molestar e torturar homens e
mulheres com espantosos e terríveis sofrimentos e
dolorosas enfermidades internas e externas…” O texto
completo pode ser lido no Anexo 2 das Atas do Simpósio
do Vaticano, p. 596.

Esta bula papal


foi colocada em
anexo no Manual
de Heinrich
Institoris e Jacob
Sprenger e teve
milhares de
cópias a partir de
1468. A partir daí
houve forte
perseguição às
bruxas no século
XVI, na Itália,
França e
Alemanha, com milhares de vítimas.

Leia também: A Bruxaria e a Feitiçaria no contexto da


Inquisição – Parte 1

A Bruxaria e a Feitiçaria no contexto da Inquisição – Parte


2

Em sua Bula InocêncioVIII dá seu apoio a Kramer e


Sprenger:
“E embora nossos queridos filhos Heinrich Kramer e
Johann Sprenger… tenham sido por cartas Apostólicas
delegados como Inquisitores… Nós decretamos… que os
acima citados inquisidores tenham poderes para
proceder à justa correção, prisão e castigo de qualquer
pessoa, sem folga ou embaraço” (Baigent, p. 123).

Havia uma ênfase exagerada na época entre os


protestantes e católicos em relação à ação do demônio. É
preciso notar que não se tinha na época uma noção
correta como a teologia tem hoje sobre o demônio e seus
poderes, bem como sua ação no mundo. Não havia
naquele tempo a psicologia, a neurologia, a psiquiatria, a
psico-análise, etc, que ajudam a discernir melhor casos
reais de possessão diabólica, de problemas mentais e
psicológicos.

O historiador W. Neuss diz que a razão deste pânico


demoníaco consistia também na decadência religiosa
da época:

“… onde a ação repressiva contra a bruxaria continuava


na competência da Inquisição, como na Itália e Espanha,
não as produziram perseguições de notável importância.
Só depois da cisão religiosa pela Reforma, principalmente
no século XVII, elas deviam – primeiro na Alemanha e
propagadas dali nos demais países do Norte – celebrar
suas horrendas orgias” (Bernard, p. 26).

O inquisidor Heinrich Kramer era um dominicano que,


por volta de 1474, foi nomeado inquisidor em Salzburgo e
no Tirol; e em 1500 foi nomeado Núncio Papal e
inquisidor para a Boêmia e Moravia. J. Sprenger, também
dominicano, foi prior do convento da Ordem em Colônia
e nomeado inquisidor para as províncias de Colônia,
Mainz e Treveris. Em 1480 tornou-se diretor de toda a
província germânica da Ordem.

Kramer e Johann
Sprenger redigiram
o “Malleus
Maleficarum”, o
“Martelo das
bruxas”, com mais
de 500 páginas. Em
1520 já havia treze
edições. O livro se
propõe a mostrar
as manifestações
da bruxaria, para
os juízes,
magistrados e autoridades seculares; fornece fórmulas
de exorcismo. Tornou-se um manual para os inquisidores
e “era aceito não só pela legislatura católica, como
também pela protestante” (Baigent, p. 125).

O Manual refere-se a várias práticas de bruxaria. Crianças


que são assassinadas, cozinhadas e comidas nos Sabás
das bruxas, o espetamento de alfinetes em imagem de
cera, o sexo com o demônio incubo, etc.

O “Malleus Maleficarum”, em consonância com a Bula de


Inocêncio VIII, de 1486, afirma que: “Esta pois é a nossa
proposta: os demônios, com sua arte, causam maus
efeitos por meio da bruxaria, mas é verdade que, sem a
ajuda de algum agente, não podem fazer nenhuma
forma… e não afirmamos que podem afligir danos sem a
ajuda de algum agente, mas com um tal agente doenças,
e quaisquer paixões ou males humanos, podem ser
causados, e estes são reais e verdadeiros” (idem, p.126).

Para esses inquisidores o demônio é impotente sozinho,


e só pode fazer o mal por meio de uma pessoa humana.
E através das bruxas podiam causar os males citados
pelo Papa em sua Bula. Acreditava-se que podiam por
exemplo: causar chuvas de granizo e tempestades,
causar impotência e esterilidade em homens e animais,
causar pragas, doenças, assassinar crianças como
oferendas aos demônios, levar um cavalo a enlouquecer
sob o cavaleiro, causar grande amor ou ódio entre os
homens, matar homens ou animais com um olhar (mau
olhado), revelar o futuro, viajar pelos ares. Era o contexto
da época onde a ciência era pouco desenvolvida.

O Malleus garante que as bruxas “não podem fazer mal


aos inquisitores e outras autoridades, porque eles
ministram justiça pública” (idem, p. 127).

“Existem três classes de homens abençoados por Deus,


aos quais essa detestável raça não pode fazer mal com
sua bruxaria. E a primeira são os que ministram a justiça
pública contra eles, ou os processam em qualquer
condição oficial pública. A segunda são aqueles que,
segundo a tradição e os santos ritos da Igreja, fazendo
uso legal do poder e virtude que a Igreja, com seu
exorcismo, fornece na aspersão da Água Benta, na
tomada do sal consagrado, no porte de velas bentas… a
terceira classe são aqueles que, de várias e infinitas
formas, são abençoados pelos Santos Anjos… Pois os
exorcismos da Igreja são para esse mesmo propósito, e
remédios inteiramente eficazes para preservar-nos dos
males das bruxas” (idem, 127).

O Malleus é
fortemente
motivado pela
ação do demônio:

“Pois quando as
moças são
corrompidas, e
foram desprezadas
por seus amantes,
após terem
imodestamente
copulado com eles,
na esperança e
promessa de casamento com eles, e viram-se
desapontadas em todas as suas esperanças e em toda
parte desprezadas, se voltam para a ajuda e proteção dos
demônios” (idem, p. 128).

Os autores do Malleus parecem ter visto na imensa


gravidade do ato sexual com um espírito desencarnado,
como que uma tentativa de simular a concepção
milagrosa de Jesus no seio da Virgem Maria, por obra do
Espírito Santo; e aí parece estar a gravidade do pecado.
Não nos esqueçamos que a teologia também evolui como
toda ciência.

Baigent e Leigh afirmam que a perseguição em massa às


bruxas continuava, fanaticamente, também por parte dos

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