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PONDERAÇÕES SUCINTAS SOBRE A FORMA DOS ACTOS DOS

DIRECTORES NACIONAIS E EQUIPARADOS

Walter Van-Trier

I. ENQUADRAMENTO

1. À luz da legislação pertinente sobre a matéria, nomeadamente a Lei n.º 7/14, de 26


de Maio, sobre as publicações oficiais e formulários legais (LPO), o Decreto-lei n.º
12/94, de 1 de Julho, sobre o regime jurídico e condições de exercício de cargos de
direcção e chefia (DLDC), o Decreto legislativo Presidencial n.º 3/13, de 23 de
Agosto, referente a criação, estruturação, organização e extinção dos Serviços da
Administração Central do Estado e dos demais organismos legalmente equiparados
(DSE) e o Decreto legislativo Presidencial n.º 2/20, de 19 de Fevereiro, sobre a
criação, estruturação, organização e extinção dos institutos públicos (DIP), Director
Nacional ou Equiparado (doravante DN/E) é a entidade que titula um cargo de
direcção, do nível central, do quadro de pessoal comum ou de carreira de regime
geral de um departamento ministerial ou de um instituto público de âmbito nacional,
desenvolvendo actividades de gestão, coordenação e controlo do
órgão/organismo/serviço e cabendo-lhe assegurar a gestão permanente do respectivo
órgão/organismo/serviço, que envolve assegurar a unidade de direcção, a gestão de
recursos humanos e a submissão à despacho do titular do departamento ministerial
competente de assuntos que carecem de resolução superior.

2. Os DN/E subordinam-se aos titulares dos departamentos ministeriais (Ministros ou


equiparados) onde se integram, não existindo em entre si (DN/E) qualquer
hierarquia administrativa (nenhum DN/E é subordinado do outro), pois se
encontram horizontalmente na mesma posição.

3. Por serem os “colaboradores directos” dos Ministros e equiparados, geralmente é


permitido por lei (ver artigo 20.º do DLDC) que estes lhes subdelegam
competências para emitirem instruções referentes à matéria relativa às atribuições
genéricas dos respectivos serviços/organismos/departamentos ministeriais –

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competências que não podem ser subdelegadas ao nível das chefias por eles. Assim,
os DN/E exercem competências próprias (aquelas conferidas directamente pela lei,
estatuto orgânico, regulamento ou, como refere o artigo 2.º/7 DLDC, o conteúdo
funcional genericamente definido para o cargo) e subdelegadas (as permitidas pelos
Ministros e equiparados).

II. FORMA DOS ACTOS E SUAS IMPLICAÇÕES JURÍDICAS

4. No exercício das suas competências, os DN/E praticam actos que, por exigências do
princípio da segurança e certeza jurídicas, devem revestir determinada forma. Esta
consiste, de acordo com os ensinamentos de Diogo Freitas do Amaral (2012, p.271),
na forma dos documentos onde são reduzidos a escritos os actos ou, segundo Celso
de Mello (2014, p.452-3), nas fórmulas, i é, meios pelos quais a Administração
exterioriza sua vontade, são veículos de expedição de actos.

5. Essas formas não são usadas indistintamente, reportam-se a certas qualificações que
permitem discerni-las. Assim, a alínea c) do n.º 1 do artigo 6.º LPO e a alínea e) do
n.º 1 do artigo 26.º DIP prescrevem que elas são despachos, instruções, circulares e
ordens de serviço. Importa dissecar essas formas dos (documentos) actos.

6. Por meio de despacho são praticados todos os actos cuja eficácia jurídica resulta de
publicação em Diário da República. Aqui se enquadram, por exemplo, os actos
determinados expressamente pela lei, estatuto orgânico ou regulamento; actos de
conteúdo genérico ou actos normativos; instrumentos que devem ser do
conhecimento público; anúncio de concursos públicos; actos cuja publicitação seja
de interesse público; aqueles que visem produzir efeitos jurídicos em relação a
terceiros.

7. Os actos que devem ser praticados por despacho apenas tornam-se vinculantes a
terceiros quando publicados na 2.ª série do Diário da República, salvo raras
excepções no âmbito do funcionamento interno da Administração Pública. Sua não
publicação neste diário torna-os ineficazes, ou seja, não são passíveis de
obediência/observação/cumprimento. Portanto, ninguém (sobretudo

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particulares/cidadãos) pode ser responsabilizado por não obedecê-los (artigo 3.º/1
LPO e artigo 52.º/2 CRA).

8. Quanto às instruções, Diogo Freitas do Amaral (2011, p.817) define-as como


comandos gerais e abstractos mediantes os quais o superior impõe aos subalternos a
adopção, para futuro, de certas condutas sempre que se verificarem as situações
previstas. Hely Meirelles (2014, p.203) diz que são ordens escritas e gerais a
respeito do modo e forma de execução de determinado serviço público, expedidas
pelo superior hierárquico com o escopo de orientar os subalternos no desempenho
das atribuições que lhes estão afectas e assegurar a unidade de acção no organismo
administrativo. Para Celso de Mello (2014, p.453) é a fórmula de expedição de
normas gerais de orientação interna das repartições, emanadas de seus chefes, a fim
de prescreverem o modo pelo qual seus subordinados deverão dar andamento aos
seus serviços.

9. Infere-se desses ensinamentos que as instruções resultam do exercício do poder de


direcção do superior hierárquico, são comandos ou ordens destes, em matéria de
serviço, aos seus subordinados; são destinadas somente aos subalternos deste,
produzindo efeito jurídico apenas internamente, no referido
serviço/organismo/órgãos; dispõem genérica e abstratamente sobre o modo e forma
de execução dos serviços, ou seja, sobre seu funcionamento e organização; não se
aplicam aos particulares/administrados, porquanto não têm efeitos em relação a
terceiros. Valem apenas internamente

10. Circular é fórmula pela qual autoridades superiores transmitem ordens uniformes a
funcionários subordinados. Não veiculam regras de carácter abstrato como as
instruções, mas concreto, ainda que geral, por abranger uma categoria de subalternos
encarregados de determinadas actividades (MELLO, 2014, p.453). Para Hely
Meirelles (2014, p.203) são ordens escritas, de carácter uniforme, expedidas a
determinados funcionários ou agentes administrativos incumbidos de certo serviço,
ou do desempenho de certas atribuições em circunstâncias especiais.

11. As mesmas inferências sobre as instruções servem para as circulares: são actos
internos; resultam do exercício do poder de direcção do superior hierárquica aos
seus subalternos; não vinculam terceiros.

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12. Porém ambas diferenciam-se significativamente. As circulares são de menor
generalidade que as instruções. As circulares não veiculam regras de carácter
abstrato como as instruções, mas concreto, ainda que geral, por abranger uma
categoria de subalternos encarregados de determinadas actividades.

13. As ordens de serviço são comandos individuais e concretos, através dos quais o
superior impõe aos subalternos a adopção de uma determinada conduta específica,
podendo ser dadas verbalmente ou por escrito (AMARAL, 2011, p.816). Para Celso
de Mello (2014, p.454) é fórmula usada para transmitir determinação aos
subordinados quanto à maneira de conduzir determinado serviço.

14. As três últimas formas (instruções, circulares e ordens de serviço) são


essencialmente caracterizadas por serem actos administrativos ordinatórios, isto é,
visam disciplinar o funcionamento da Administração e a conduta funcional de seus
trabalhadores. São provimentos, determinações ou esclarecimentos destinados aos
funcionários e agentes a fim de orientá-los no desempenho de suas atribuições. São
actos internos, só alcançam os trabalhadores hierarquizados à direcção/chefia que os
expediu. Não obrigam os particulares, nem os funcionários subordinados a outras
direcções/chefias. Geram deveres e prerrogativas para os agentes e funcionários a
que se dirigem. Sua inobservância dá lugar somente a responsabilidade disciplinar.

15. A respeito disso, é expressiva a advertência de Diogo Freitas do Amaral (2011,


p.817):

... as manifestações do poder de direcção se esgotam no âmbito da relação


hierárquica, não produzindo efeitos jurídicos externos. Mesmo quando têm
natureza genérica – como será o caso das instruções ou circulares -, os
comandos emitidos pelo superior hierárquico são meros preceitos
administrativos internos, não são normas jurídicas. Consequentemente, não
podem os particulares invocar perante um tribunal administrativo a violação de
uma instrução, circular ou ordem de serviço para fundamentar o pedido de
anulação de um acto administrativo. A eficácia de tais comandos é meramente
interna, cifrando-se o seu desrespeito apenas na responsabilidade disciplinar
do subalterno perante o superior. (grifo nosso).

16. Por conseqüência, esses actos não necessitam de ser publicados em Diário da
República para serem eficazes juridicamente. Basta sua divulgação/notificação
interna ou publicidade nos lugares de estilos. É neste sentido, por exemplo, que
deve ser interpretado o n.º 4 do artigo 6.º do actual estatuto orgânico do MINSA,
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que refere “Em matéria de natureza interna, o Ministro emite ordens de serviço,
circulares e directivas”.

III. CONCLUSÕES

17. Face ao exposto, conclui-se que:

a) Os DN/E exercem cargos significativos na vida pública e por isso têm, nos
termos da lei, de regulamentos, do estatuto orgânico, competências para
praticarem actos que vinculam também terceiros
(particulares/cidadãos/instituições etc).

b) De acordo a alínea c) do n.º 1 do artigo 6.º LPO e a alínea e) do n.º 1 do artigo


26.º DIP, os DN/E emitem despachos, instruções, circulares e ordens de
serviço. Esta exigência é extensiva a todos os DN/E, quer estejam integrados
num departamento ministerial, quer titulem um instituto público nacional.

c) Nos termos do artigo 3.º/1 LPO e artigo 52.º/2 CRA, o despacho é a forma
legalmente exigida para os actos dos DN/E produzirem efeitos em relação a
terceiros, por isso devem ser publicados na 2.ª série do Diário da República para
serem juridicamente eficazes e gerarem dever de obediência dos
cidadãos/particulares/instituições.

d) As instruções, circulares e ordens de serviço são actos internos, direccionados


aos subalternos do superior hierárquico que os expediu, vinculando somente
estes e não se aplicam a terceiros. Daí não ser necessário publicá-los no Diário
da República.

e) Todos os DN/E devem ser exercer suas competências ou as subdelegadas


praticando os actos de acordo as formas legalmente previstas, publicando
obrigatoriamente em Diário da República aqueles exigidos por lei, para efeitos
de eficácia externa.

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IV. REFERÊNCIAS

Legislação:

• Constituição da República de Angola


• Lei n.º 7/14, de 26 de Maio, sobre as publicações oficiais e formulários legais
(LPO).
• Decreto-Lei n.º 12/94, de 1 de Julho, sobre o regime jurídico e condições de
exercício de cargos de direcção e chefia (DLDC).
• Decreto legislativo Presidencial n.º 3/13, de 23 de Agosto, referente a criação,
estruturação, organização e extinção dos Serviços da Administração Central do
Estado e dos demais organismos legalmente equiparados (DSE).
• Decreto legislativo Presidencial n.º 2/20, de 19 de Fevereiro, sobre a criação,
estruturação, organização e extinção dos institutos públicos (DIP).

Doutrina:

• AMARAL, Diogo Freitas do. CURSO DE DIREITO ADMINISTRATIVO. 2.ª ed.


Coimbra: Almedina. 2012, vol. II.
• ______. CURSO DE DIREITO ADMINISTRATIVO. 3.ª ed. Coimbra: Almedina.
2011, vol. I.
• MEIRELLES, Hely Lopes. DIREITO ADMINISTRATIVO BRASILEIRO. 41.ª ed.
São Paulo: Malheiros Editora, 2014.
• MELLO, Celso António Bandeira de. CURSO DE DIREITO ADMINISTRATIVO.
32.ª ed. São Paulo: Malheiros Editora, 2014.

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