É importante para um educador, tornar o conteúdo apresentado ao aluno
como algo a ser experienciado e partir daí dar um sentido prático e cotidiano para o conhecimento. Tendo isso como ideal, meu intuito com esse ensaio é trazer a partir das minhas experiências como aluno, artista e, a prática ainda pouco explorada, como educador, questionamentos sobre como o ensino é capaz de influir na criação artística e como isso se deu ao longo da minha trajetória. Segundo Vygotsky o desenvolvimento da linguagem se dá através das interações entre o indivíduo e a cultura em que ele está socialmente inserido. Ao tratarmos a arte como linguagem entende-se que ela possui a finalidade de comunicar uma ideia e/ou sentimento, portanto é algo que se desenvolve por meio de interações entre as pessoas que a consomem, produzem e ensinam. Assim como não se pensa o desenvolvimento da fala sem que haja uma exposição aos sons e gestos da língua, torna-se impensável o desenvolvimento da arte sem que se tenha uma exposição à ela, e assim como no desenvolvimento de uma língua como português por exemplo temos professores que nos ensinam a organizar aquilo que se quer comunicar de maneira mais clara e objetiva através desse instrumento, o mesmo se aplica às artes. Portanto o ensino se torna uma ferramenta imprescindível para que o indivíduo se expresse. Porém, tem-se hoje uma realidade em que para a maioria das instituições de ensino, sejam elas universidades ou escolas, o caráter subjetivo do aprendizado é muitas vezes deixado em segundo plano. É esse o ponto que acredito ser uma falha nas instituições de ensino que participei e participo. Há sempre uma grande preocupação com jogar os conteúdos para os alunos sem trazer isso para um âmbito afetivo, que como foi dito no artigo A relação afeto cognição se torna essencial para o aprendizado. Afetivo no sentido de considerar as experiências sensíveis e emocionais com o conhecimento parte importante do processo de desenvolvimento das habilidades e que não foque somente portanto, no âmbito racional. Quando tratamos do ensino da arte, no caso a música que é o que eu tenho mais vivência, não basta passar para o aluno estruturas teóricas e dar a ele um conjunto de regras que devem ser seguidas, sem fazer com que depois o aluno experimente isso, por tentativa e erro e a partir disso tire suas conclusões sobre o sentido daquela regra para o seu fazer artístico, a técnica deve ser apresentada como um meio e não como um fim. Essa experiência com o conteúdo que está sendo tratado faz com que o aluno tenha aquele conhecimento como algo sólido. Jorge Larossa Bondía em seu artigo Notas sobre a experiência e o saber de experiência defende o ponto de que existe um saber no ato de passar por situações e que isso é algo que não é valorizado na sociedade atual, Bondía parte da ideia de que vivemos numa “sociedade de informação”, ou seja, o saber e o conhecimento se resumem a entrar em contato com as informações e processá-las, assim, não se torna uma necessidade que algo efetivamente aconteça por não possuir tempo para experienciar o acontecimento. Como é o meu caso com o estudo da música. Durante a vida toda estudei a formação das escalas, e dos arpejos e como esses assuntos se relacionam com determinados acordes em contextos específicos e só fui perceber no início deste ano que eu não possuía esse conhecimento como algo concreto, como sons que tenho internalizados e sei reconhecer ou imaginar funcionalidades para eles. E a partir desse momento de consciência passei a revisar uma série de assuntos que são relativamente básicos porém agora com mais carinho e paciência com o processo de aprendizado, e com a perspectiva de tornar aquilo algo que eu realmente tenha como ferramenta para a imaginação. Portanto, é a partir dessas experiências afetivas com o conhecimento que o aluno começa a fazer das informações algo que ele consegue imaginar e reconhecer que imagina. E aqui entra um ponto chave da discussão que é a importância de fomentar nos alunos o desenvolvimento dos processos criativos. No documentário Tarja Branca, há uma discussão sobre o que significa o ato de brincar e como isso é importante no aprendizado do ser humano independentemente de sua idade ou momento de vida mas principalmente quando se é criança, pois entende-se a brincadeira como uma ação que instiga a imaginação do indivíduo, e o faz criar situações que apesar de não serem necessariamente reais no âmbito palpável, se tornam reais no que diz respeito à subjetividade humana e aos seus processos sensíveis. Para Wallon (1978) o conhecimento do mundo objetivo é feito de modo sensível e reflexivo, envolvendo o sentir, o pensar e o imaginar. (TASSONI e LEITE, p.9). Não me espanta, que os processos criativos do indivíduo seja travado ou inibido quando pensamos num sistema de ensino onde o brincar a partir de determinada idade é visto como um ato de imaturidade e exige-se da pessoa considerar o sentir e o imaginar esferas a serem deixadas de lado para um aprendizado efetivo e concreto. Transpondo isso ao contexto artístico, se torna difícil dar significado a uma linguagem quando se delimita a expressão, ao plano do pensar e não se estende o potencial que isso tem para a comunicação do sentir e do imaginar. Portanto instigar a imaginação e a criatividade do aluno se torna uma tarefa importante para o educador. Dar ao aluno ferramentas que o ajudem na transmissão daquilo se quer dizer se torna essencial para o desenvolvimento da linguagem artística como a expressão de um ser que pensa, sente e imagina. Essa visão holística do conhecimento leva o fazer artístico para a tarefa que lhe cabe que é por fim comunicar.