Você está na página 1de 3

UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

FACULDADE DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES


MESTRADO EM EDUCAÇÃO
PROCESSOS FORMATIVOS E DESIGUALDADES SOCIAIS
Disciplina: Seminário de Fundamentação
Mestranda: Jane Marchon Cordeiro Celestino

Fios de uma pesquisa partilhada: entre textos e conversas


A partir das minhas próprias experiências docentes e com a participação das professoras da rede
em que atuo, busco uma pesquisa que se apresenta como formação partilhada. É pesquisa, mas
também é formação para ambas as partes, professora pesquisadora e professoras, todas
sujeitos da pesquisa. As histórias das professoras as quais fazem parte da pesquisa me
atravessam a todo o instante, pois sou uma delas. Professoras com suas histórias de vida e
processos formativos, vindas e também hoje imersas num sistema educacional que tenta a todo
o tempo homogeneizar professores, currículos e práticas. A pesquisa que venho costurando se
constitui na contramão das políticas de educação instituídas pelos governos em suas diferentes
instancias. Políticas que batem o martelo a uma Base Nacional Curricular Comum, num país tão
diverso como o Brasil. Como os currículos são colocados como únicos e práticas que emergem
do cotidiano, são destituídas por uma série de coleções, livros didáticos, sites, apostilas... que
trazem o fazer das professora junto as crianças como algo a ser replicado? Cerceiam crianças e
professoras com propostas socialmente instituídas no meio escolar e por considerarem seus
saberes menores, não sendo capazes de serem autoras e produtoras de conhecimento e de
práticas outras. Concordando com Macedo, 2010 apresento a pesquisa como perturbação ao
consenso político, pois não trabalha com a incapacidade dos sujeitos, e sim com o de mais
potente pode emergir na prática docente.

A BNCC tenta-se “silenciar as singularidades e diferenças nos e dos currículos, a partir da


institucionalização de cerceamento ao pluralismo cultural e a liberdade de pensamento na
docência” (MACEDO, 2019 ) fruto da ambição mercadológica, das concessões e diria até de uma
ditadura educacional, que nutre a comparação e a competitividade, ranqueando escolas e até
professores através das avaliações educacionais que vêem se desenhando ao longo do anos,
afim de que estes sedam as imposições de suas políticas educacionais conservadoras que só
reforçam a meritocracia e as desigualdades sociais.

A professora Elizabeth Macedo é muito feliz ao findar seu texto intitulado: Fazendo a Base virar
realidade: competências e o germe da comparação, (2019, p. 54 ) nos apontando o que é a base.
Ali encontramos um respiro para oxigenar os que buscam as brechas, por um currículo contra
hegemônico. Assim, sigo com a pesquisa com um pouco mais das certezas que tinha e sigo ainda
acreditando que professoras e professores ao refletirem sobre seus próprios fazeres e irem
além dos conhecimentos e informações que possuem, possam ser sujeitos da experiência no
que nos aponta LARROSA, (2002, p.19) “como aquele que se define não por sua passividade,
por sua receptividade, por sua disponibilidade, por sua abertura, mas aquele que vai além dos
manuais de instrução e modelos.” Encontra jeitos próprios (GALLO, 2014) de promover a
formação na prática na palavra, no fazer, no ser, são também sujeitos do currículo que é feito
nas escolas ou nos lugares e tempos em que acontecem (MACEDO, 2019).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

GALLO, Silvio. mínimo múltiplo comum. In: Ribetto, Anelice. (Org) políticas poéticas e práticas
pedagógicas (com minúsculas). Rio de Janeiro: Lamparina, FAPERJ, 2014. p.30.

LARROSA, Jorge Bondía. Nota sobre a Experiência e o Saber da Experiência. Revista Brasileira
de Educação, Rio de Janeiro, jan/abr.2002, n.19, p.20-28.

MACEDO, Elizabeth Fernandes. Fazendo a Base virar realidade: competências e o germe da


comparação. Revista Retratos da Escola, Brasília, v. 13, n. 25, p. 39-58, jan./mai. 2019. Disponível
em: <https//www.esforce.org.br>. Acesso em 17 de jun. de 2020.

MACEDO, E. A educação e a urgência de “desbarbarizar” o mundo. Revista e-


Curriculum, [online]. 2019, https://revistas.pucsp.br/curriculum/article/view/44534

Sobre histórias e currículos


Por Jane Marchon Cordeiro Celestino

Era início do ano letivo, eu e as crianças do 1º ano do Ensino Fundamental, nos reuníamos
todas as manhãs para abraços, cantorias, histórias e certa manhã, levei para a roda de
conversa um poema que ganhara da Professora Maria Tereza Goudard, ainda na
graduação e que compartilho agora com vocês:
NOMES E HISTÓRIAS
MARIA COMEÇA COM MAR JÁ VEM COM LEÃO AUGUSTO, LEANDRO,
E TERMINA COM DIA MARCADO AURORA
QUE MAIS POSSO O PEDRO TEM PEDRA NO JOÃO, MARINA DA GLÓRIA
IMAGINAR NOME BENEDITA, SÉRGIO,
COM QUEM SE CHAMA MARCELO PARECE VITÓRIA
MARIA? MARTELO CADA UM TEM SUA
ROBERTA É SORRISO O MARCOS É CHEIO DE HISTÓRIA
ABERTO MARCAS E VOCÊ, COMO SE CHAMA?
LUCIANA É LUZ QUE O SEVERINO É SEVERO? POIS A HISTÓRIA DO SEU
ATRAVESSA NOME
LEONARDO, Ê NOME SÓ VOCÊ PODE CONTAR.
DANADO!

Ainda na leitura do texto, as crianças iam associando alguns nomes as pessoas da família,
amigos, parentes, e quando o nome se coincidia com alguém da turma, era aquela
algazarra. Confesso, que inicialmente minha intenção era investir na associação dos
nomes das crianças a outras palavras para ampliarem seus repertórios de escrita, mas o
próprio texto faz um convite para cada um contar a própria história do nome e assim o
fiz. As crianças não conheciam as histórias dos seus nomes, assim, enviei a proposta para
que os responsáveis pudessem escrever a história do nome da sua criança. Na semana
seguinte iniciei a roda de conversa contando sobre meu nome e no centro da roda, ficou
recheada de histórias. Conforme o combinado, seriam lidas duas histórias por dia. Uma
mais encantadora que a outra, afinal um nome sempre tem um porquê de ser escolhido
para alguém.
As crianças ficavam empolgadas com a história de cada colegas. Teciam muitos
comentários e perguntas e essas revelavam quão rico poderiam ser nossos próximos dias.
Comecei a anotar o que as crianças se interessavam em saber ebulidos pelas histórias.
Entre desenhos e narrativas e escritas, as crianças iam dando muitas pistas. A partir
daquelas histórias as crianças se aproximaram muito mais umas das outras, os desafetos
da turma foram naturalmente resolvidos, as crianças passaram a usar vocabulários novos
e ter interesses pelos lugares, músicas, e outras histórias citadas pelos responsáveis. Ah,
não posso esquecer como esta proposta envolveu as famílias que entenderam que seriam
colaboradoras a todo o tempo nos processos de alfabetização de suas crianças sem que
tivéssemos que usar como balizadora das aprendizagens a cartilha.
A partir do poema, as histórias dos nomes, abriram inúmeras curiosidades das crianças e
um leque de possibilidades de práticas que puderam ser desenvolvidas em parceria com
as crianças. Conhecemos algumas particularidades das crianças e famílias, marcamos
entrevistas com pediatras, uma vasta literatura de onde e como nascem os bebês, uma
curiosidade apontada logo de primeira por muitas das crianças, a adoção, a costura e o
crochê como parte da cultura das famílias de preparar a chegada dos bebês e muitas outros
temas encaminharam o currículo do primeiro ano daquela turma. Muito mais que uma
lista de conteúdos a seguir, tínhamos como fio condutos as curiosidades das crianças
associadas a pesquisa e as linguagens comunicativas expressivas, assim, fomos
construindo uma gama de conhecimentos culturais, sociais, científicos e financeiros .que
se apresentavam em um currículo que emergia do cotidiano, com curiosidades e desejos
de crianças e professora.

Até a próxima conversa!

Você também pode gostar