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Anais do Enelin 2011. Disponível em: www.cienciasdalinguagem.net/enelin
se ver aí uma estética da destruição, ao se utilizar de rastros e ruínas para construir uma
narrativa visual? Haveria aí uma estetização da catástrofe ao transformar a miséria em
arte?
Todos os ambientes capturados por Polidori foram construídos pelo homem,
porém este raramente aparece nas imagens. É uma presença-ausente (ou ausência-
presente), contudo, porque os sujeitos estão lá, fatalmente, nos rastros arruinados das
casas destruídas pelo furacão ou no manuscrito em uma lousa de uma escola em Pripyat
que diz: ―Não há retorno: adeus. Pripyat, 28 de abril de 1986‖. Esta foto,
especificamente, foi tirada 15 anos depois de o aviso ter sido escrito. Chega até nós 25
anos depois; o passado se atualiza no presente através da imagem capturada, pois o
tempo como que nos fala: não há mesmo retorno. São imagens estáticas (porque fotos),
mas em movimento, já que — como nos ensina Didi-Huberman — estar diante de uma
imagem é estar diante do tempo.
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consequência do que linearmente se consideraria progresso, mas também num sentido
―reversamente‖ benjaminiano de progresso.
Amã, Jordânia, 1996: uma narrativa fotográfica do ponto de vista dos vencidos
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Sala de controle, reator 4, Chernobyl, Ucrânia, 2001: a história a contrapelo
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4. Para o que olha o Angelus Novus
Nesse momento de travessia que se chama de contemporaneidade, a história
move-se, rapidamente. Talvez a longo prazo, com o exercício de explicação e
problematização desse conjunto caótico de eventos e fenômenos em movimento, poder-
se-á esclarecer se a representação da memória contemporânea sob a ótica do
antimonumento demonstra ser mais condizente com o que se entende por realidade, uma
vez que, na sua concepção própria, o antimonumento demanda estratégias de
memorização coerentes com o que aconteceu de fato. Ao não ocultar a catástrofe e a
ruína, o antimonumento as ressignifica: não vistas mais como restos, agora são mesmo
testemunhos da história. Um conceito que se pretende reverso à ideia de enaltecimento
patriótico. É a construção da história do ponto de vista dos vencidos.
Nesse movimento de história a contrapelo que acompanha o conceito de
antimonumento, resgata-se a imagem do Angelus Novus, quadro de Paul Klee descrito
por Benjamin na sua Tese IX, o qual o denomina de anjo da história. Benjamin descreve
apenas o olhar do anjo. E o quadro de Klee mostra também apenas o olhar, e não o que
ele olha. Mas como seriam essas imagens que ele vê, que o fazem querer se afastar e
arregalar os olhos? Talvez as imagens capturadas por Polidori, bem como as
manifestações realizadas sob o signo do antimonumento, sinalizem para o que olha o
Angelus Novus.
Referências
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Rouanet. São Paulo: Brasiliense. 7 ed. 1994.
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memória e escritura. Chapecó: Argos. 2006.
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ROSENFIELD, Kathrin H. Broch, Musil e Benjamin: três abordagens da imagem e
da história. In SELIGMANN-SILVA, Márcio (org.). Palavra e imagem, memória e
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SERAPIÃO, Fernando. O silêncio de Robert Polidori. In Instituto Moreira Salles.
Robert Polidori Fotografias. 2009.
SONTAG, Susan. Sobre fotografia. Tradução de Rubens Figueiredo. São Paulo:
Companhia das Letras. 2004.
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