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relato de caso

Efeitos da Liberação Miofascial Sobre a


Flexibilidade de um Paciente com Distrofia
Miotônica de Steinert
Effects of the Myofascial Release on the Flexibility of a Patient With Myotonic Dystrophy Steinert

Elvyna Melo Rêgo1, Marilene Marfin-Martin2, Almir Vieira Dibai Filho3,


Francis Meire Fávero4, Acary Souza Bulle Oliveira5, Sissy Veloso Fontes6

RESUMO ABSTRACT
Introdução. A distrofia miotônica de Steinert (DMS) é a forma mais Introduction. The myotonic dystrophy Steinert (MDS) is the most
frequente das distrofias musculares, de início na idade adulta, mere- common form of muscular dystrophy, with onset during adulthood,
cendo uma atenção fisioterapêutica especializada. Objetivo. Analisar deserving special multiprofessional attention. Objective. Was ana-
os efeitos da liberação miofascial (LMF) sobre a flexibilidade de um lyzed the effects of myofascial release (MFR) on the flexibility of a
paciente com DMS. Método. Relato de caso de um paciente com patient with MDS. Method. Case report of a patient with MDS,
DMS, sexo masculino, 37 anos, submetido a 6 sessões fisioterapêu- male, age 37, submitted to six sessions of physical therapy based on
ticas baseadas na técnica de LMF, que consiste em uma abordagem the MFR, which consists of a manual approach by interactive pres-
manual da qual decorre uma pressão interativa entre a mão do tera- sure between therapist´s hand and fascia. It was performed two assess-
peuta e as respostas do tecido fascial. Foram realizadas duas avaliações ments of flexibility, one before and one after the treatment sessions.
da flexibilidade, uma antes e outra após as sessões de tratamento. Além In addition, the volunteer were asked about possible improvements in
disso, o voluntário foi questionado sobre possíveis melhoras em suas their daily activities after the intervention with MFR. Results. It was
atividades diárias após a intervenção com LMF. Resultados. Verifi- verified changes in range of motion for both increasing and reducing
cou-se alterações na amplitude de movimento para mais e para menos the degrees in joints evaluated, due to structural body reorganization.
graus nas articulações avaliadas, em decorrência de uma reorganização According to the subjective opinion of patient, there was an improve-
estrutural do corpo. Segundo opinião do paciente, houve uma me- ment in their condition during the course of their daily activities.
lhora da sua condição durante a realização de suas atividades de vida Conclusion. The MFR influenced the function of fascia and muscle,
diária. Conclusão. A LMF influenciou a função da fáscia e músculo, altering joint flexibility.
alterando a flexibilidade articular.

Unitermos. Fáscia, Neurologia, Modalidades de Fisioterapia. Keywords. Fascia, Neurology, Physical Therapy Modalities.

Citação. Rêgo EM, Marfin-Martin M, Dibai Filho AV, Fávero FM, Citation. Rêgo EM, Marfin-Martin M, Dibai Filho AV, Fávero FM,
Oliveira ASB, Fontes SV. Efeitos da Liberação Miofascial Sobre a Fle- Oliveira ASB, Fontes SV. Effects of the Myofascial Release on the
xibilidade de um Paciente com Distrofia Miotônica de Steinert. Flexibility of a Patient With Myotonic Dystrophy Steinert.

Trabalho realizado no Setor de Investigação de Doenças Neuromusculares,


Disciplina de Neurologia Clínica – Departamento de Neurologia e Neuro-
cirurgia, Escola Paulista de Medicina – Universidade Federal de São Paulo
(UNIFESP), São Paulo-SP, Brasil. Endereço para correspondência:
1.Fisioterapeuta, Mestranda em Fisioterapia, Universidade Metodista de Pira- Sissy Veloso Fontes
cicaba (UNIMEP), Piracicaba-SP, Brasil. Universidade Federal de São Paulo,
2.Fisioterapeuta, Psicóloga, Mestre em Psicologia da Saúde, Universidade Me- Departamento de Neurologia e Neurocirurgia.
todista de São Paulo (UMESP), São Paulo-SP, Brasil. Rua Estado de Israel, 899, Vila Clementino
3.Fisioterapeuta, Mestrando em Fisioterapia, Universidade Metodista de Pira- CEP 04022-002, São Paulo-SP, Brasil.
cicaba (UNIMEP), Piracicaba-SP, Brasil. E-mail: sissyfontes@gmail.com
4.Fisioterapeuta, Mestre em Ciências, Universidade Federal de São Paulo
(UNIFESP), São Paulo-SP, Brasil.
5.Neurologista, Doutor, Professor do Departamento de Neurologia e Neuro- Relato de Caso
cirurgia, Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), São Paulo-SP, Brasil. Recebido em: 28/02/11
6.Fisioterapeuta, Doutora, Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), Aceito em: 12/12/11
São Paulo-SP, Brasil. Conflito de interesses: não

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INTRODUÇÃO existentes, a cinesioterapia é considerada a intervenção
Apesar de consideradas raras, as doenças neuro- principal para pacientes com disfunções neuromotoras
musculares apresentam importância crescente, em decor- e compreende a terapia que utiliza exercícios e ou ativi-
rência da gravidade, da necessidade de estudos genéticos dades físicas. A massoterapia, também utilizada, consiste
e biológicos. Mesmo existindo um grande número de do- na mobilização de tecidos moles corporais superficiais e
enças, as manifestações clínicas são relativamente pobres, ou profundos5. Além disso, ainda fazem parte da mesma
em relação às suas formas de apresentação1. as terapias de mobilização de diferentes tecidos e fluidos
A distrofia miotônica de Steinert (DMS) é a for- corporais5.
ma mais frequente das distrofias musculares, de início na Uma dos recursos fisioterapêuticos que se desta-
idade adulta, merecendo uma atenção multiprofissional ca nos tempos atuais é a liberação miofascial, cujo termo
especial. A prevalência é de aproximadamente 4 casos fascia, do latim, significa uma banda ou bandagem e é
para cada 100.000 indivíduos. Trata-se de uma doença usado na anatomia macroscópica para designar diferentes
multissistêmica de herança autossômica dominante2. O estruturas, como todas as estruturas fibrosas de proteção
gene da DMS apresenta uma expressividade muito vari- (fáscia peri e intrafaringeana), conjunto orgânico (fáscia
ável, o que resulta numa grande variabilidade de quadros endocárdica) e tecidos conjuntivos de nutrição (fáscia
clínicos entre indivíduos afetados, dentro de uma mesma superficial e própria), representando assim um conjunto
família e entre famílias diferentes. A idade de instalação membranoso extenso. Neste contexto, constitui-se numa
e a velocidade de evolução da doença também são muito peça única, que se desdobra sobre si mesma em diferen-
variáveis3. tes espessuras e densidade, de acordo com as exigências
A DMS é considerada uma doença multissistê- funcionais para, ao mesmo tempo, envolver, separar e co-
mica, pois atinge diferentes órgãos e sistemas causando, nectar diferentes estruturas, em diferentes camadas – da
além do comprometimento muscular, alterações cardía- fáscia superficial ao endomísio – sobre a qual o menor
cas, pulmonares, oculares, ósseas, endócrinas, cutâneas e tensionamento, ativo ou passivo, repercute sobre o con-
cognitivas. Ela é caracterizada principalmente por fenô- junto, numa ideia de globalidade6.
meno miotônico (dificuldade de relaxamento após con- Portanto, justifica-se esse estudo uma vez que a
tração muscular), fraqueza muscular progressiva e atrofia DMS é uma doença multissistêmica, de caráter progres-
muscular das partes distais dos membros (mãos e pés), sivo irreversível1,2, onde os recursos terapêuticos manuais
do pescoço e da face, levando a disartrofonia e disfagia. se destacam como uma das possibilidades fisioterapêuti-
Ocorre também fraqueza da musculatura orofaríngea cas para o tratamento desta afecção neurológica. Dessa
e respiratória, gerando complicações respiratórias. O forma, o estudo de caso em questão teve como objetivo
comprometimento na visão é uma dificuldade marcante avaliar um destes recursos, a liberação miofascial, sobre a
causada por uma catarata leve ou mais severa. O retar- flexibilidade de um paciente com DMS.
do mental é comum, podendo assumir uma forma leve
ou mais acentuada. Desta forma, o tratamento da DMS MÉTODO
deve englobar a minimização dos problemas respiratórios Relato de caso
e ortopédicos3. Paciente do sexo masculino, 37 anos, branco, sol-
O somatório de alterações comuns aos indivíduos teiro, analista de sistemas, com DMS (confirmada por
com DMS resulta em consequências diversas, compro- avaliação clínica e através de exames subsidiários do ní-
metendo a qualidade de vida. Um estudo realizado nesta vel da CK e DNA), admitido e avaliado no ambulatório
temática com sujeitos com distrofia miotônica constatou de doenças neuromusculares da Universidade Federal de
que os mesmos têm uma redução da força muscular expi- São Paulo. Na história familiar relatou que o pai também
ratória, sendo comuns repercussões negativas, principal- apresenta a doença. Realiza natação duas vezes por sema-
mente, sobre o aspecto físico4. na, sendo 60 minutos o tempo de cada treino.
Dentre os diversos procedimentos fisioterapêuticos Atualmente apresenta ao exame físico: marcha len-
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tificada, hipertrofia de panturrilhas com predomínio em car o método, assim como a avaliação também foi rea-
direita, hipercifose torácica, ptose palpebral, disartrofo- lizada por uma única fisioterapeuta. Foram realizadas 6
nia, disfagia moderada. Devido a DMS ser uma doença sessões de liberação miofascial, cada uma com duração
multissistêmica apresenta ainda cristais de catarata, insu- de 60 minutos, sendo realizadas uma vez por semana, to-
ficiência mitral leve, hérnia de hiato, má perfusão perifé- talizando um tempo total de tratamento de 1 mês e 15
rica, calvície, câimbras e não apresenta miotonia. dias. Assim, os achados alcançados são importantes por
A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em retratar os resultados de uma intervenção a curto prazo.
Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo, sob o Durante a realização do estudo, o paciente conti-
protocolo nº 2012/09. nuou a desempenhar suas atividades laborais, esportivas e
recreativas normalmente.
Avaliação
Após entender o protocolo experimental e concor- Análise dos dados
dar em participar do estudo, o paciente assinou um termo Os resultados estão apresentados em valores abso-
de consentimento livre e esclarecido. lutos. Utilizou-se a técnica de análise do conteúdo. Assim,
Foram realizadas duas avaliações, antes e outra conforme descrevem alguns autores, esta se estabelece no
após a intervenção fisioterapêutica, no período compre- texto como meio de expressão do sujeito, em que o ana-
endido entre janeiro e fevereiro de 2010. As avaliações lista realiza uma categorização, inferindo uma expressão
consistiram da mensuração da flexibilidade articular por que o represente6.
meio de um flexímetro Code Research Institute®, com fi-
xação através de faixas de velcro. Assim, foi avaliada a am- RESULTADOS
plitude de movimento dos ombros, cotovelos, punhos, As Tabelas 1 e 2 apresentam os dados referentes à
quadris, joelhos, tornozelos, tronco e cervical. amplitude de movimento das articulações avaliadas antes
Após as intervenções, solicitou-se que o voluntário e após as sessões de intervenção fisioterapêutica. A flexi-
respondesse ao questionamento: “Quais as mudanças que bilidade dos membros superiores e inferiores apresentou
você percebeu nas suas atividades do dia a dia após as 6 ganhos bilaterais nos seguintes movimentos: extensão e
sessões de Fisioterapia?” abdução de ombro; flexão, extensão, pronação, desvio
ulnar e radial de punho; extensão, rotação medial e abdu-
Intervenção fisioterapêutica ção de quadril; e flexão dorsal de tornozelo.
A técnica fisioterapêutica adotada foi a liberação Com relação ao tronco, verificou-se uma diminui-
miofascial. A mesma é realizada mediante uma técnica ção da flexibilidade em todos os movimentos avaliados,
que mescla apoios, pressão manual e deslizamentos no te- exceto para rotação lateral à direita, cuja alteração foi
cido miofascial, que requer o reconhecimento das áreas e nula, conforme mostra a Tabela 3.
trajetos de resistências e tensões e que se dá num processo A Tabela 4 apresenta a opinião do voluntário acer-
interativo, pois necessita da resposta do corpo do pacien- ca das mudanças no seu cotidiano após a intervenção fi-
te para determinar a duração, profundidade e direção da sioterapêutica.
pressão exercida sobre o tecido. O toque realizado com
as mãos é a sobrecarga inicial colocada sobre o tecido, a DISCUSSÃO
partir do qual se esperam as respostas bioquímicas e me- A DMS é considerada uma doença multissistê-
cânicas. O que é primeiramente afetado é o componente mica, pois atinge diferentes órgãos e sistemas, causando
do complexo elástico colagenoso do tecido (a amplitude alterações cardíacas, pulmonares, oculares, ósseas, endó-
elástica) e o terapeuta é capaz de sentir pelo tato uma crinas, cutâneas e cognitivas3. Ela é caracterizada prin-
resistência flexível (o limite elástico). cipalmente por fenômeno miotônico, entendido como
A intervenção fisioterapêutica foi realizada por uma dificuldade de relaxamento do músculo após con-
uma única fisioterapeuta capacitada e habilitada em apli- tração vigorosa, suas primeiras manifestações são no
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Tabela 1
Distribuição da amplitude de movimento das articulações dos membros superiores do sujeito do estudo antes e após as
sessões de liberação miofascial

Articulação Flexibilidade (direita) Flexibilidade (esquerda)


Ombro Antes Após Diferença Antes Após Diferença
Flexão (0 a 180º) 103º 124º 21º 148º 135º - 13º
Extensão (0 a 60º) 39º 47º 8º 40º 47º 7º
Rotação medial (0 a 70º) 63º 57º - 6º 51º 85º 34º
Rotação lateral (0 a 90º) 78º 55º - 23º 60º 44º - 16º
Abdução (0 a 180º) 84º 97º 13º 84º 97º 13º
Adução (0 a 45º) 46º 25º - 21º 33º 29º - 4º
Cotovelo Antes Após Diferença Antes Após Diferença
Flexão (0 a 150º) 102º 113º 11º 115º 109º - 6º
Punho Antes Após Diferença Antes Após Diferença
Flexão (0 a 80º) 33º 56º 23º 36º 63º 27º
Extensão (0 a 30º) 45º 47º 2º 42º 60º 18º
Supinação (0 a 80º) 62º 36º - 26º 46º 37º - 9º
Pronação (0 a 80º) 56º 64º 8º 55º 80º 25º
Desvio ulnar (0 a 30º) 8º 17º 9º 6º 24º 18º
Desvio radial (0 a 20º) 9º 22º 13º 6º 15º 9º

Tabela 2
Distribuição da amplitude de movimento das articulações dos membros inferiores do sujeito do estudo antes e após as
sessões de liberação miofascial

Articulação Flexibilidade (direita) Flexibilidade (esquerda)


Quadril Antes Após Diferença Antes Após Diferença
Flexão (0 a 120º) 95º 87º - 8º 148º 135º - 13º
Extensão (0 a 70º) 15º 20º 5º 16º 18º 2º
Rotação medial (0 a 45º) 19º 33º 14º 21º 35º 14º
Rotação lateral (0 a 45º) 35º 35º 0º 34º 45º - 11º
Abdução (0 a 45º) 25º 36º 11º 30º 39º 9º
Adução (0 a 30º) 23º 15º - 8º 12º 15º 3º
Joelho Antes Após Diferença Antes Após Diferença
Flexão (0 a 135º) 98º 90º - 8º 119º 114º - 5º
Tornozelo Antes Após Diferença Antes Após Diferença
Flexão dorsal (0 a 20º) 11º 20º 9º 10º 20º 10º
Flexão plantar (0 a 50º) 21º 20º - 1º 23º 15º 8º
Inversão (0 a 35º) 18º 20º 2º 16º 15º - 1º
Eversão (0 a 15º) 19º 16º - 3º 18º 14º - 4º

músculo esquelético, sendo a característica clínica mais Na falta de força em alguns músculos e outros não,
relevante uma debilidade muscular progressiva e atrofia o indivíduo tende a compensar isto adotando a postu-
muscular8. Neste estudo, de forma excepcional, o volun- ra que melhor se ajuste à força da gravidade em todos
tário não apresentava miotonia. Logo, observa-se que o os movimentos que realiza, gastando dessa forma menos
diagnóstico deve ser pautado no quadro clínico do pa- energia. As compensações tendem a ser assimétricas e,
ciente e apoiado por exames complementares. por isso mesmo, são geradoras de desconforto, onde o
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Tabela 3 A relação entre as estruturas ocorre através da fás-


Distribuição da amplitude de movimento do tronco e da cervical do sujei- cia, que separa e ao mesmo tempo une cada uma, dando
to do estudo antes e após as sessões de liberação miofascial
suporte físico ao adentrar no interior das células pela co-
Articulação Flexibilidade nexão com o citoesqueleto. Além disso, a matriz extra-
Tronco Antes Após Diferença celular, na qual a fáscia está embebida, é um ambiente
Flexão (0 a 95º) 41º 36º - 5º único externo com o qual cada célula interage com o seu
Extensão (0 a 35º) 37º 22º - 15º metabolismo e, nesse sentido, a fáscia novamente se des-
Cervical Antes Após Diferença
taca, dessa vez, como estrutura de suporte funcional às
Flexão (0 a 65º) 67º 50º - 17º
demais9. Por isso a eleição da liberação miofascial como
Extensão (0 a 50º) 68º 53º - 15º
técnica a ser aplicada no sujeito do estudo, já que se rela-
Flexão lateral à direita (0 a 40º) 56º 36º - 20º
ciona com a flexibilidade e a elasticidade corporal, tendo,
Flexão latera à esqueda (0 a 40º) 49º 26º - 23º
Rotação lateral à direita (0 a 40º) 65º 65º 0º
portanto, grande capacidade de alterar funções de uma
Rotação lateral à esquerda (0 a 40º) 75º 70º - 5º forma holística10.
Experimentos já evidenciaram que os tecidos ten-
dinosos e septos intermusculares exercem importante
Tabela 4 papel no controle de movimentos isocinéticos das arti-
Resposta do voluntário da pesquisa à pergunta “Quais as mudanças que
culações, pela força e capacidade de armazenamento de
você percebeu nas suas atividades do dia a dia após as 6 sessões de Fisio-
terapia?” energia durante a contração, alongando mais do que os
músculos em várias atividades, dentre elas a deambula-
Técnica de análise Resposta do voluntário
ção, corrida, e vários esportes que impliquem em força de
Eu senti uma melhora no meu desempenho
para atividades como caminhada e treino impulsão, como boxe, arremessos, arco e flecha, dentre
de natação. Aumentou o tempo de duração outros11.
da minha caminhada com menos cansaço
Análise do conteúdo Além da participação fundamental da fáscia na
e aumentou o tempo do nado imerso com
menor intervalo de descanso. Percebo uma
transmissão de forças no sistema musculoesquelético,
melhora na minha resistência ao exercício
físico. constatou-se, mediante análise do conteúdo da resposta
do voluntário da pesquisa, um aumento na resistência ao
exercício e diminuição da fadiga. As técnicas de terapia
corpo continua sob ação da gravidade ao mesmo tempo manual têm sido descritas pela melhora da mobilidade
em que perde de forma progressiva o alinhamento vertical da caixa torácica, costelas, melhora na função pulmonar
de sua organização tridimensional. Na tentativa de evitar e qualidade de vida, aumento da oxigenação arterial e re-
o desconforto, novas compensações vão se desenvolven- torno linfático12, proporcionando uma melhor capacida-
do, afetando progressivamente a funcionalidade de todo de em realizar exercícios dinâmicos com grandes grupos
o organismo, podendo causar retrações não aparentes ao musculares, como caminhar, nadar e pedalar, por perí-
nível de fáscia e músculo. Isso se explica pela reciprocida- odos de tempo prolongados13. Novamente, salienta-se a
de entre os sistemas, que se mantêm conectados pelo te- ação global da fáscia sobre o organismo14,15.
cido conjuntivo, sendo possíveis implicações patológicas A melhora da locomoção do paciente está relacio-
na saúde como um todo do indivíduo9. nada à capacidade da LMF de agir sobre o tecido conjun-
Ao realizar a LMF, regiões do corpo são liberadas tivo, afetando sua viscoelasticidade e, ao mesmo tempo,
de retrações, aumentando a flexibilidade, e, em contra- a função estática ou tônica da fisiologia da locomoção
partida, outras regiões se retraem em prol de uma reor- repercutindo, dessa forma, no tensionamento ativo ou
ganização estrutural e biomecânica favorável à postura e passivo sobre todo o conjunto de estruturas16.
à realização das atividades funcionais. Este novo padrão Portanto, podemos afirmar que: a) houve uma re-
estrutural favorável é corroborado pela análise qualitativa modelagem da fáscia no organismo do voluntário do es-
da resposta do voluntário. tudo; b) que isso ocorreu através de um melhor equilíbrio
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de peso e de forças ao longo do seu eixo vertical; c) que REFERÊNCIAS
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isso contribui favoravelmente para o conjunto dos mo-
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plitude de movimento para mais e para menos graus, em tudo Clínico e Diagnóstico. São Paulo: Editora Atheneu; 2001, p.19-33.
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Sugere-se a realização de estudos futuros com o
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