Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Tdha PDF
Tdha PDF
FORTALEZA
2006
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
CAROLINA DAMASCENO PORTO
Fortaleza
Universidade de Fortaleza – UNIFOR
2006
______________________________________________________________________
Cópia de computador.
Dissertação (mestrado) – Universidade de Fortaleza, 2006.
“Orientação : Prof. Francisco Silva Cavalcante Júnior, Ph.D.”
CDU 159.922.74
_______________________________________________________________________
Universidade de Fortaleza – UNIFOR
Mestrado em Psicologia
Sujeito, Sociedade e Cultura: Produção e Expressão
Sociocultural da Subjetividade
___________________________________________________________
Prof. Francisco Silva Cavalcante Junior, Ph.D – UNIFOR – Orientador
__________________________________________________________
Profa. Dra. Ana Maria Fontenelle Catrib – UNIFOR
_________________________________________________________
Profª. Dra. Suzana Maria Capelo Borges – UECE
__________________________________________________________
Prof. Dr. HENRIQUE FIGUEIREDO CARNEIRO
Coordenador do Curso de Mestrado em Psicologia – UNIFOR
À minha filha, um exemplo de aprendiz pela experiência viva, que utiliza corpo e
mente para entrar em contato com tudo a sua volta. À todos que querem vencer e
aprender com liberdade.
AGRADECIMENTOS
Ao meu grandioso mestre, orientador, prof. Francisco Silva Cavalcante Jr. que com
muita dedicação, sabedoria e paciência, caminhou junto em toda minha trajetória de mãos
dadas, com uma força de não me deixar fraquejar.
À professora Moreno pela sua sabedoria em estratégias e por seus auxílios nos
momentos em que precisei e lhe recorri.
À professora Rita Vieira, por ser um exemplo de educadora que incentiva uma
melhoria na educação.
À minha mãe, pelo seu incentivo e exemplo na minha trajetória acadêmica. E pelas
suas sugestões da língua portuguesa.
Ao meu querido e paciente esposo por sua compreensão nos muitos momentos de
minha ausência na trajetória deste trabalho.
It analyzes the resources and the strategies of learning utilized by the adult bearer of the
Attention Deficit Perturbation/ Hiperatividade (TDAH), that had success in his student path,
as also, in its professional life after concluding the upper level. It also examines the pleasures
and the displeasures generated by the experiences of learning. For it understand the aforesaid
aspects, utilizes the theoretical budgets that base the study of the TDAH in the adult; the
theories that try the strategies, specially of learning and the resources of learning and the
kinds of learning utilized by the subjects researched. Of qualitative nature, taking like
parameter investigative the approach of case study of the ethnographic kind, also named of
ethnography centered in the person, second Wolcott (1999). This kind of research is carried
out through a researcher that works near few informers. Participated of the research two
subjects diagnosticated bearers of the TDAH of the kind combined that concluded the upper
level. This work was carried out by means of observation, participation and interviews are
structured during seven months. The results indicate that were utilized learning strategies
kinds endless number and metacognitives, as also, resources and kinds of learning for
concluding the upper level and succeed in the professional life. Being the main displeasure in
the student life of the collaborators the bad use of the methodologies of education and not
properly the symptoms of the disturbance
Quero cinqüenta coisas ao mesmo tempo. Durmo irrequieto e vivo num sonhar
irrequieto. São palavras não só ditas no poema de Fernando Pessoa, mas também algumas
características e palavras de uma pessoa com o transtorno que vem sendo tão discutido nos
últimos tempos. Um transtorno que tem como sintomas, inquietude, impulsividade e sobre tudo
desatenta. Estou falando do Transtorno do déficit de atenção/ hiperatividade uma doença ou
melhor dizendo um transtorno, encontrado na definição atual de doença mental segundo a
Organização Mundial de Saúde (1993) no manual da Associação Psiquiatra Americana (DSM-
IV), discutido em quase todo o mundo, principalmente nos países ocidentais, não apenas por
médicos e psiquiatras, mas por outros especialistas e profissionais. Um assunto que cada vez
mais aumenta sua presença na mídia, que leva as informações para um maior número de
pessoas, como pais, professores, pesquisadores e interessados no tema. Um transtorno que
atinge não apenas crianças e jovens, mas adultos também, pois o indivíduo nasce com ele,
ficando os sintomas mais evidente quando criança na fase escolar, se estendendo na
adolescência e em alguns casos persistindo na fase adulta (HALLOWELL, 1999; CABRAL,
2003).
Este trabalho pretende abordar o TDAH (ou ADHD, em inglês) no adulto, algo que
até hoje no Brasil, ainda é raramente diagnosticado. Foi somente há algum tempo, após a
década de 1980, que descobriram que esse transtorno se perpetua também na vida adulta,
deixando muitas vezes seqüelas na vida profissional, afetiva e social. Apesar da identificação
do transtorno nos adultos, muitos ainda permanecem sem diagnostico, muitas vezes
questionando o que têm e provocando sofrimento. Como conseqüência da antiga teoria dos
estudiosos, que dizia ser o transtorno uma característica única e exclusivamente das crianças,
muitos adultos não foram diagnosticados corretamente e findaram por serem, muitas vezes,
confundidos com outras entidades clínicas psiquiátricas. Ou apenas eram diagnosticadas as
condições comórbidas, já que, os adultos com TDAH apresentam quase sempre comorbidades
(HALLOWELL, 1999; BARKLEY, 2002; CABRAL, 2003; SILVA, 2003; MATTOS, 2003;
HAYES, 2004; CHADD, 2005; LIMA, 2005). Entende-se por comorbidades, um ou mais
transtornos psiquiátricos em coexistência com um transtorno primário, neste caso, o transtorno
primário é o TDAH.
1
TDAH – Sigla que vou estar me utilizando no texto para evitar a repetição do longo termo: Transtorno de
déficit de atenção/ hiperatividade e impulsividade.
14
Assim como em crianças, você também já deve ter visto um adulto com TDAH.
São indivíduos demasiadamente impacientes, que também não ficam por muito tempo parados
ou fazendo uma mesma atividade, mudando constantemente. Mexem em tudo ou/e se
movimentam o tempo todo, quando estão sentados alguma parte do corpo está se
movimentando, o pé e as pernas balançando, a mão batendo e mexendo em algum objeto.
Tendem a gostar de atividades de risco, que desafiam seus limites e são marcados
principalmente por demonstrarem uma desatenção tão exacerbada em certos momentos, que
parecem estar em outro mundo.
Um ponto que precisa ser ressaltado é o fato de que na infância houve problemas
relacionados ao aprendizado e a escolarização desse adulto muitas vezes fica bastante
prejudicada nos anos seguintes. Em média entre 3% e 5% dos adolescentes e adultos
apresentam o quadro do Transtorno do Déficit de Atenção/ Hiperatividade (HALLOWELL,
1999; SILVA, 2003; MATTOS, 2003; LIMA, 2005) e a maioria têm problemas e dificuldades
nas instituições de ensino. Muitas pessoas têm o Transtorno de atenção, mas não sabem que
possuem, outras, só descobrem quando já estão adultas. Assim foi o caso do jornalista
Dimenstein (2003), que ressalta que, quando criança, vivia acuado, “numa guerra particular”
(p.15) e seu refúgio era o desligamento, assim, não aprendia nada na escola, não conseguia
reter nada em sala de aula.
É importante também deixar claro que esse transtorno não causa problemas de
aprendizagem, mas interfere no desenvolvimento cognitivo. Geralmente, quando o desempenho
acadêmico é baixo, isso é decorrência das dificuldades de atenção, hiperatividade e
impulsividade e não de algum problema específico de aprendizagem ou mesmo, algum
transtorno de aprendizagem. Assim, os sintomas do transtorno causam dificuldade na
aprendizagem, levando, na maioria das vezes a desistência nos estudos do portador. Desta
forma, a vida de muitos desses indivíduos é atravessada por insucessos, infelicidades,
decepções, perdas e por muitos outros pontos negativos. Não obstante de tudo isso essas
pessoas, freqüentemente, são rotuladas de forma negativa, dificultando assim, a mudança para
uma melhoria, para um caminho de sucesso.
apenas os vencedores. Já os que demonstram dificuldades são cada vez postos para baixo ou
esquecidos.
Meu grande interesse com essa pesquisa é mostrar um outro lado do TDAH, um
lado de caminhos positivos para essas pessoas que são diagnosticadas e muitas, por conta, dos
sintomas apresentados e da maioria dos relatos encontrados na mídia, a respeito deste assunto,
pensam que nunca hão de encontrar sua rota de sucesso, ou que nunca aprenderão e serão
consideradas para sempre incapazes. Gostaria de mostrar que são capazes, pois existem
pessoas utilizando meios para superar as marcas e dificuldades do transtorno. Eles são como
pessoas que apresento nesta pesquisa, que têm muitas qualidades e potenciais e que
ultrapassaram vários obstáculos de suas vidas ocasionados pelo transtorno e pelo ensino
dominante, o chamado ensino “tradicional”. Portanto, este estudo, antes de tudo, rompe com o
viés “negativo”, muitas vezes orientado por uma visão biomédica, que existe na vida estudantil
do TDAH. Inovando com descrições de adultos que tiveram uma trajetória de êxitos na vida
acadêmica, que utilizaram estratégias e diferentes tipos de aprendizagem para que esse sucesso
fosse possível.
17
de, desatenção, hiperatividade e impulsividade; também uma outra característica muito presente
em pessoas com TDAH é a criatividade, desta maneira abri um longo espaço para falar
especificamente desta forma criativa destas pessoas; também fora os principais sintomas e a
criatividade descrevo outros comportamentos que são comuns nessas pessoas, como a
dificuldade de iniciar e concluir projetos, como também a desorganização mental, a intolerância
a regras e rotinas. Finalizando esse capítulo, abordo o diagnóstico já na fase adulta, como deve
ser feito e quais são as formas que existem para se chegar a um diagnóstico preciso. O
tratamento também é um ponto que trago nas linhas deste capítulo, salientando a medicalização
abusiva nos tempos atuais. Sendo a medicação o tratamento mais eficaz, segundo a maioria dos
especialistas e a mais utilizada. Apesar da utilização dos medicamentos é importante que o
portador do TDAH seja acompanhado por psicólogo, ou seja, faça também uma psicoterapia,
sendo desta forma os resultados mais eficazes.
dificuldades causadas pelo TDAH e a própria carência de uma boa didática por parte dos
professores, os colaboradores encontraram formas de vencer todos os degraus de uma formação
acadêmica.
Na terceira parte, por meio de estratégias também falo dos tipos de aprendizagem
apresentados pelos sujeitos pesquisados: a aprendizagem pela experiência, a aprendizagem
siginicativa, aprendizagem pelos sentidos, a auto-aprendizagem e outras. Como também falo da
criatividade dos colaboradores como um auxílio crucial em suas formas de aprender. Algo, que
até hoje, não é muito valorizado nas instituições de ensino, também pouco estimulado em
vários setores da vida social, cultural e familiar, sendo somente valorizada e mais importante na
vida a inteligência, principalmente no meio acadêmico. Prejudicando não somente as pessoas
que têm uma maior facilidade de criar, como também outras que poderiam desenvolver seu
lado criador. A criatividade, sendo muito ou pouco, está presente na vida de todos os seres
humanos, sendo que são poucos os que são realmente dominantes do ato criativo e que
conseguem desenvolver de forma positiva.
Repleto de poesias dando mais proximidade ao que foi visto na realidade e leveza,
o texto que segue tem o intuito de apresentar uma melhor compreensão acerca desse transtorno
no adulto, ainda tão questionado e obscuro para muitos pesquisadores. Espero que o leitor
possa sentir, compreender e entender melhor a vida e a forma de aprender das pessoas adultas
que têm TDAH. Que diante de tantos fracassos, rótulos, esquecimentos, muitos se encontram
como verdadeiros “guerreiros”, como nas palavras de Masaharu Taniguchi “não existe nada
que não se possa vencer” e nas palavras dos meus brilhantes colaboradores, basta lutar e tentar
procurar formas diferentes de vencer, mesmo quando é algo considerado irreversível. E foi
assim o meu olhar diante dos meus colaboradores. Um olhar de observação e curiosidade que
ficou irradiado e amadurecido diante de tantas novas informações e descobertas.
Assim, inicio meu texto com uma história maravilhosa de dois sujeitos que tiveram
grandes batalhas e conseguiram com seus potenciais e suas formas de aprender, ultrapassá-las
com muitas vitórias e sucessos.
21
Primeiro, falo da história de Alexandre III que nasceu em 356 a.C. no palácio de
Pella, Macedônia. Filho do rei Felipe II, que logo cedo se destacou como um rapaz inteligente
e intrépido. Quando tinha 13 anos, seu pai incumbiu um dos homens mais sábios de sua época,
Aristóteles, de educá-lo. Alexandre aprendeu as mais variadas disciplinas: retórica, política,
ciências físicas e naturais, medicina e geografia, ao mesmo tempo em que se interessava pela
história grega e pela obra de autores como Eurípides e Píndaro. Foi protetor das artes e das
letras, fundou várias cidades, às que deu o nome de Alexandría. Também se distinguiu nas
artes marciais e na doma de cavalos, de tal forma que em poucas horas dominou o Bucéfalo,
que viria a ser sua inseparável montaria. Alexandre percebeu que o animal temia a própria
sombra e voltou-o contra o sol, conseguindo desta maneira domá-lo. Na arte da guerra
recebeu lições do pai, militar experiente e corajoso, que lhe transmitiu conhecimentos de
estratégia e lhe inculcou dotes de comando. O enérgico e bravo jovem teve oportunidade de
demonstrar seu valor aos 18 anos, quando, no comando de um esquadrão de cavalaria, venceu
o batalhão sagrado de Tebas na Batalha de Queronéia em 338 a.C. E logo foi chamado de
Alexandre O Grande. Como aspecto negativo, bebia muito e com sua impulsividade, a junção
dos dois causaram a morte de seu melhor amigo Clito.
Segundo, vamos dar uma volta e iremos para França, para falar da história de
Joana, no século XIV, na época da idade média e do feudalismo. Conhecida como Joana d
‘Arc, uma mulher de muita garra, verdadeiramente católica, que freqüentava os cultos e
vivenciava sua fé. Quando ainda muito pequena, a grande guerreira, passa por uma grande
tragédia, ela presencia a morte de sua família, dizimada pelos ingleses, sobrevivendo apenas
por conseguir se esconder atrás de uma porta, conseguindo através da fechadura assistir, de
forma violenta, todos morrerem. Aos 12 anos acreditava falar com Deus, começou a ter visões
e nelas ouvia vozes que lhe falavam da situação do país e lhe revelavam a missão. Ela deveria
ir em socorro do Delfim e coroá-lo rei de França. Para o povo, tratava-se realmente da eleita
de Deus. Para os nobres, não passava de um artifício para atingir seus objetivos de livrar a
22
França dos ingleses. Sem saber ler nem escrever conseguiu comandar um exército de homens,
na Guerra dos Cem Anos e vencer, se tornando a maior heroína da França. Muito católica,
acreditava sempre que venceria tudo que lutasse para conseguir. Numa época em que as
mulheres sofriam fortemente com o preconceito, encarnava papéis que seriam exclusivamente
reservados aos homens, usava espadas, vestia uma armadura que protegia seu "frágil" corpo
de mulher, utilizava os cabelos curtos e falava como comandante e desta forma, fortemente
determinada a seguir e atingir seus objetivos venceu muitas guerras, até o dia em que foi
queimada na fogueira como uma bruxa era queimada naquela época.
23
Primeiramente falo da história de Joana, uma mulher de trinta e oito anos, com
cabelos loiros e olhos castanhos. Com estatura baixa e magra, com o corpo bem torneado e bem
feito, como diz o cantador, “parecendo um violão”, típico corpo dos padrões brasileiros. Tem a
pele clara, bem branca, não parecendo uma pessoa que vive na “terra do sol”. Casada e com
uma filha e um cachorro, vive em um apartamento pequeno, mas muito confortável e adequado
para uma família pequena. Uma mulher bem sucedida para os padrões brasileiros, que trabalha
em seu próprio negócio. Administradora e coordenadora de uma escola, vive seu dia-a-dia
correndo para um lado e para o outro, tentado resolver todas as tarefas dispostas no seu dia.
Apesar de ter uma família pequena, sua agenda e atividades diárias são imensas. Iniciando às
cinco da manhã e terminando, não sei exatamente a hora, pois sua vida parece não ter momento
de repouso, momento parado, de conclusão das atividades. Apresentarei algumas atividades de
sua rotina, se é que também existe uma rotina, pois sempre acontecem mudanças. Pela manhã,
antes de todos acordarem, ainda clareando, passeia com o cachorro, faz o café e arruma
rapidamente a casa. Depois, saboreia a refeição matinal com sua família, deixa a filha na escola
e vai para seu trabalho, onde permanece até o horário do almoço.
utiliza muito do corpo para se expressar, sempre mexendo muito as mãos e os cabelos,
jogando-os para um lado e outro, também anda muito. Geralmente conversa com as
funcionárias andando, observando o que está ocorrendo ao seu redor e pelos corredores da
escola. Mas toda essa correria é porque gosta, pois vários compromissos poderiam ser divididos
com outras pessoas que lá trabalham, diz que prefere resolver pessoalmente muitos deles, pois
se sente mais segura. Tudo que for possível resolver dentro da escola ela está presente, seja
qual for a gravidade ou o problema. Na alimentação das crianças, no planejamento das aulas
das professoras, nas melhores brincadeiras realizadas no pátio da escola, no problema de escrita
de alguma criança e outros diversos compromissos. Foi por esse motivo, de querer resolver ou
pelo menos estar presente em quase todos os problemas que surgissem na escola ou
relacionados ao desenvolvimento da criança, que Joana concluiu três formações: pedagogia,
nutricionismo e psicologia. Todos foram cursados com a intenção de aprender mais sobre como
cuidar ou mesmo tratar de uma criança, proporcionar uma educação de qualidade. Após e
concomitante com esses cursos de graduação, realizou também alguns cursos de
especializações.
Quando sai da escola para almoçar, pega sua filha e vai para casa comer a refeição
feita por ela na noite anterior. Volta para o trabalho, que leva o mesmo ritmo da manhã.
Resolve um problema na cantina, outro na turma de alfabetização, escreve o texto da
comemoração do dia do índio, conversa com alguns pais em relação a seus filhos. Nos
momentos em que ela entra em sua sala, não é para ficar parada, é para pensar, mas não apenas
pensa, também escreve e cria suas artes. Diz que os momentos de criação são os melhores
minutos para pensar e refletir. Quando pinta ou cria alguma arte com argila, sempre tem
alguma nova idéia para seus planejamentos da escola.
A noite quando vai para casa, faz o jantar e o almoço do dia seguinte, sendo este,
um outro momento de reflexão e de criação, pois cozinhar para ela é uma arte, em que a pessoa
ou ama ou odeia. A que ama consegue fazer maravilhas com os alimentos e ingredientes, a que
odeia não deveria nem chegar perto do fogão. Após sua estadia na cozinha, conversa com a
família e arruma novamente a casa, entre uma conversa e uma arrumação, resolve também
25
compromissos e faz outras coisas como ouvir música e ler livros. Nessa intercalação de
atividades, a noite vai passando e quando vai dormir muitas vezes já é quase no horário de
levantar novamente.
Do outro lado da cidade de Fortaleza, existe Alexandre, já com seus trinta e três
anos, apesar de aparentar ser mais novo, um homem de vinte oito anos, por apresentar um
corpo malhado, bem torneado e ser moreno, bronzeado de sol. Alto e magro, chamando mais a
atenção das pessoas cearenses, que são mais acostumadas com homens de estatura mediana.
Solteiro e bem formado, mora em um apartamento sozinho, onde apenas duas vezes por semana
recebe uma ajuda de sua secretária para limpeza do local e lavagem das roupas. Seu dia, assim
como o de Joana é muito atarefado, cheio de compromissos, atividades profissionais e de lazer.
Também, outra característica em comum, é o excesso de atividades por gostar de sempre estar
fazendo algo. Seu corpo tem a necessidade de estar em movimento, de estar ocupado. Quando
observei seu dia, logo foi fácil de perceber, que muitas das atividades não eram preciso existir,
apenas por motivos de grande necessidade de sobrecarregar o dia. Quando desocupa alguma
atividade, logo procura fazer outra, não permitindo parar. Para ele ficar parado é motivo de
aborrecimento, motivo de ficar irritado.
qualidade. Demonstrando ser um momento sem importância e solitário, pois normalmente está
sozinho.
Nos finais de semana, passa mais tempo fora de casa, passeando pelas praias e
restaurantes da cidade. Também gosta de fazer caminhadas mais longas do que as que são
realizadas na semana.
Quero também neste espaço estar falando e contando um pouco dos nomes
escolhidos para os colaboradores - Joana e Alexandre são nomes fictícios escolhidos por eles
próprios. No primeiro encontro da pesquisa no campo foi explicado todo o percurso e objetivos
27
que gostaria de atingir com a pesquisa. Após toda explicação necessária para segurança dos
colaboradores em estar contribuindo com um pouco de suas rotinas e de suas histórias de vida,
em estar revelando informações nunca antes reveladas, pedi para escolherem um nome fictício
e disse que poderia ser o nome alguém que eles se identificassem ou de alguma coisa. Sem
minha sugestão, escolheram individualmente personagens da história antiga, apresentada no
início deste texto, os guerreiros e lutadores “Alexandre O Grande” e “Joana d‘Arc”. Fiquei
muito surpresa com a escolha, pois as histórias são diferentes em lugares diferentes, mas seus
personagens têm muito em comum, pessoas que lutaram, quebraram regras, utilizaram
estratégias, criatividade e venceram. Como a vida da Joana e Alexandre, pessoas diferentes,
que têm a vida diferente, mas que têm muitas características em comum. Para iniciar são
portadores do TDAH, são pessoas super ativas e inteligentes; para continuar, temos esse longo
e prazeroso texto que foi resultado de uma caminhada de muitas experiências, saberes,
vivências e principalmente aprendizagens.
Quando falo da caminhada de vida de pessoas com TDAH, falo da vida de Joana e
Alexandre, que dispuseram um pouco de seus tempos para estar dividindo preciosos
ensinamentos, experiências e aprendizagens que tiveram no decorrer de suas vidas e que foram
2
O Transtorno do déficit de atenção/ hiperatividade – TDA/H é escrito com barra hiperatividade pelo fato
do sujeito portador do transtorno poder ter ou não a hiperatividade, pois ele pode ter o déficit de atenção sem a
hiperatividade (SILVA, 2003).
28
úteis para torná-los as pessoas que são hoje. Então, neste trabalho que se segue, os leitores
poderão observar experiências e vivências do presente e do passado.
Foi em 1902 que um médico inglês, George Frederic Still, publicou em uma série
de conferências, crianças que apresentavam comportamentos descritos como agressivo,
indisciplinado, cruel, desafiante, com dificuldade de atenção e com pouco controle. Para essas
características foi dado o nome de “Defeito no controle moral”. O médico sugeriu que essas
crianças tinham uma dificuldade na inibição de respostas aos estímulos e identificou algum tipo
de influência hereditária. Em pouco tempo as crianças com este problema foram rotuladas por
outro nome: “disfunção cerebral mínima” (LCM sigla em inglês) (LEFEVRE, 1978; LIMA,
2005).
O termo hiperatividade (para se referir a estas crianças) foi introduzido por Laufer e
Denhoff, em 1957, e por Stella Ches, em 1960, mantendo-se a noção de que seria causada por
lesão do sistema nervoso central, sendo o sintoma principal, o excesso de atividade motora.
Nesta época, admitia-se uma relação muito consistente entre as dificuldades na aprendizagem
escolar e o comportamento hiperativo. Classificavam o TDAH como Distúrbio do Aprendizado
ou de comportamento. Hoje, já se sabe que a criança com TDAH tem problemas em prestar
atenção, ou dedicar um determinado tempo a uma atividade, mas não tem um Distúrbio de
Aprendizagem, podendo este coexistir com o TDAH (SCHWARTZMAN, 2001).
29
3
O nome do livro de Bellak foi publicado com o título: Psychiatric Aspects of Minimal Brain Disfunction
in Adults (citado in HALLOWELL, 1999).
30
Era um dia tranqüilo e calmo quando fui pela primeira vez conhecer meu possível
colaborador da pesquisa. Não tinha certeza, pois tinha sido indicada por um amigo.
Mas a certeza logo surgiu, quando passei quase duas horas conversando, observando
e mais escutando, ela não parava de falar, tinha uma enorme satisfação de contar
sobre sua história.
A colaboradora, uma mulher de 38 anos, alta, magra, de cabelos loiros e olhos
castanhos, muito bonita para os padrões brasileiros. Com seu jeito inquieto de falar,
mexia, remexia nos papéis de sua mesa, nas suas mãos, nos seus cabelos, andava para
um lado e para o outro. Muitas vezes falava com outras pessoas e fazia várias coisas
rapidamente ao mesmo tempo: andava, falava, escrevia, remexia, olhava, pensava,
perguntava e respondia... ufa. Diante de todos os relatos e observação do seu
comportamento, ela vai ser minha colaboradora.
4
O termo foi criado entre 1917 – 1918, apesar de não existir nenhuma lesão cerebral óbvia.
31
determinado período de tempo, muitas vezes por estar passando por problemas ou por algo
novo, mas não são atitudes permanentes a vida toda. Diferente de quem tem o Transtorno que
consiste em um problema para toda a vida ou quase toda, sendo crônico na maioria dos casos.
Neste estudo apresento dois adultos com TDAH, pessoas que desde criança apresentam as
características do transtorno e que vêem lutando e convivendo com elas até os dias atuais. Mas,
que apenas foram diagnosticados e descobriram sobre o transtorno, na fase adulta.
Não existe um caso igual a outro, sendo cada caso um caso diferente, podendo
existir muitas características em comum, mas não necessariamente iguais no comportamento.
Pois os sintomas podem ser os mesmos, mas a sua expressão vai depender de quem os
manifesta. Existe TDA/H mais desanimado, quase parado, e outro super-agitado, parece que
não para nunca, quando comparados nem parecem ter o mesmo problema. Sendo assim, o
tratamento também não pode ser o mesmo para todos, não existe uma receita certa
(GOLDESTEIN, 1996; LIMA 2005). Joana e Alexandre foram os dois colaboradores com
TDA/H estudados e observados nesta pesquisa. Muitas de suas características eram comum nos
dois, mas outras não, como todo ser humano, cada um tem seu jeito de ser individual, então por
mais que eles tenham o mesmo transtorno, são pessoas diferentes. Como na poesia de
Drummond (1988):
5
As comorbidades mais comuns no adulto com TDAH são: Depressão, Transtorno de ansiedade,
Transtorno Obsessivo compulsivo, Transtorno de conduta, Transtorno alimentar etc.
32
O TDAH pode existir de forma grave, onde o indivíduo mal pode atuar na
sociedade, pela sua desorganização, impulsividade incontrolável ou incompetência em levar
adiante ou concluir o que quer que seja. Ainda existindo as comorbidades, como a baixa auto-
estima ou depressão para intensificar os problemas dessa pessoa. Mas também podem existir
casos brandos, onde dificilmente os sintomas são notados, podendo passar despercebidos até
por especialistas ou pessoas que conhecem as características do transtorno. Nem sempre o
transtorno é óbvio, existem pessoas, no caso de TDAH leve, que conseguem se adaptar ao meio
com suas características sem problema, vivendo sem medicamento ou ajuda de profissionais
(HALLOWELL, 1999). Assim, trago uma passagem do autor exemplificando esse tipo brando
do TDAH:
Como uma linha vermelha costurada num terno de tecido fino, mudando sua
aparência, mas apenas visível quando se inspeciona de perto. A linha vermelha pode
ser distração, impulsividade ou desorganização, costurada num tecido de criatividade,
gregarismo e dedicação ao trabalho, e o tratamento pode não ser a remoção da linha
vermelha, mas apenas mudar ligeiramente o seu matiz, para que ela realce mais, em
vez de destoar do tecido ao redor (HALLOWELL, 1999, p.106).
Sendo esta forma a mais comum em amostras clínicas (GAUB e CARLSON, 1997 In:
MATTOS, 2003).
Alexandre e Joana foram diagnósticados sendo tipo combinado, pois tanto apresentam
hiperatividade, quanto desatenção em suas trajetórias de vida.
Como comenta Tredgold (apud LEWIS, 1993), no ano de 1908, o termo “disfunção
cerebral mínima”, foi elaborado para classificar crianças que se mostravam impulsivas,
desatentas e hiperativas. Contudo, não foi comprovado esse dado em todas as crianças com
TDAH. Da mesma forma, foram acrescentados outros fatores como possíveis causas do TDAH:
anormalidades genéticas, lesão perinatal, infecções, envenenamento por chumbo, traumatismo
na cabeça, transtornos metabólicos, transtorno dos neurotransmissores, problemas dietéticos e
fatores psicossociais.
35
Imagine você ir fazer algo e em segundos não lembrar mais o que iria mesmo fazer.
Ou perder e deixar objetos nos lugares que percorre. Ou mesmo, quando um amigo está
falando, você se perder dentro do seu imaginário e quando retorna não sabe o que ele falou.
Pior ainda, é memorizar ou lembrar o nome daquela pessoa que tanto você conversou. E
quando o chefe ou mesmo professor da faculdade pede um trabalho e você só lembra em cima
do prazo de entrega. Acho que muitos desses comportamentos, muitas pessoas já passaram e
passam. Mas, imagine essa desatenção diariamente. Ela consiste em você viver brigando com
sua própria memória e atenção constantemente. Esses comportamentos descritos foram alguns
observados no dia-a-dia dos participantes da pesquisa e também descrita pelos companheiros de
trabalho e familiares.
36
Sonhos e pensamentos que a fazem ter um olhar diferente para esse mundo ou
sociedade em que vive, que é dita como cruel para quem não sabe sobreviver nela. “Eu nunca
37
me adaptei ao mundo dos homens. Homens que chamo de carne e osso, insensíveis,
materialistas, preconceituosos e que nunca me aceitaram também”. Joana fala como se o
transtorno lhe causasse não apenas sofrimentos pela desatenção, mas benefícios. E ainda
ressalta que seria melhor se não deixasse de ser sonhadora, mas que pudesse regular ou
controlar sua desatenção tão exacerbada. Que sua sensibilidade e potencialidade de criar e ter
grandes idéias é causada por esse “vôo constante”, por essa facilidade de sonhar tantas vezes.
Como é visto em suas palavras: Ficar no mundo da lua muitas vezes é criar, ter idéias,
imaginar, mas muitas vezes é também perder momentos reais, tempo, informações. Sendo para
mim uma moeda de duas caras: boa e ruim. Seria maravilhoso se eu pudesse administra minha
desatenção, meus vôos constantes”. Assim como Fernando Pessoa (2002) descreve em seu
poema:
Viajei por mais terras do que aquelas em que toquei... Vi mais paisagens do que
aquelas em que pus os olhos... Experimentei mais sensações do que todas as
sensações que senti, porque, por mais que sentisse, sempre me faltou que sentir...
É interessante como pessoas que têm essa desatenção, como Joana e Alexandre,
buscam formas para driblar e conseguir se sair de situações constrangedoras. Como por
exemplo, levar sempre bloquinhos de papel na bolsa anotados as principais coisas que vai fazer,
ou mesmo com palavras chaves que possam lembrar o que dizer. Ambos se sentiam mal
quando gostariam de indicar algo, como restaurante ou rua, curso, etc, e não lembravam. Relata
um dos colaboradores essa angústia:
acho que as vezes demonstro até ser lesado, desligado, com pouca inteligência e essa
imagem passada não gosto, pois não sou, apenas não consigo memorizar facilmente
nomes. Quando alguém me pergunta algo, se for relacionado a nomes de pessoas,
ruas, telefones ou até mesmo nomes de objetos, não lembro no momento.
dessas áreas inferiores atravessam o lobo frontal central e alcançam o córtex pré-frontal”
(HALLOWELL, 1999, p.327). Sugerindo assim, que a dopamina tem o papel de conectar a
atividade motora, a atenção, a emoção e o controle dos impulsos. “Os lobos frontais sintetizam
as informações sensoriais e cognitivas, orquestram a atenção e funcionam como portal das
nossas ações” (p.326). Sem inibição cortical, o cérebro não é capaz de bloquear as respostas
impróprias, deixando de enviar mensagens inibitórias (HALLOWELL, 1999).
Sendo o Lobo frontal o grande filtro inibidor do cérebro humano e que no TDAH
esse filtro não é eficiente, a ação final será mais intensa do que deveria ser. Então, a atenção do
adulto com TDAH é invadida por uma avalanche de estímulos, deixando o portador desviando
seu foco a todo o momento. Daí a impulsividade no funcionamento desse cérebro tão sem freio
quanto veloz (SILVA, 2003). De acordo com Barkley (2002) a área frontal do cérebro é “que
nos dá poderes para o auto-controle e a capacidade de direcionar nosso comportamento para o
futuro” (P. 77).
interesse. Pois, quando algo é do seu interesse espontâneo ou paixão impulsiva, como caso de
esportes, computadores ou leitura de assuntos específicos, podem apresentar-se
hiperconcetrados, sendo, muitas vezes, difícil de desviar sua atenção (SILVA, 2003). Neste
caso eles não têm um déficit de atenção, já que, em certos momentos conseguem ter uma
atenção. O que eles têm como cita Hallllowell (1999, p.10) é uma “inconstância na atenção”.
Como também ressalta Silva (2003), o termo apropriado não seria Dificuldade da atenção,
sendo o melhor termo para se utilizar “Instabilidade da atenção”, já que a pessoa pode em
determinadas atividades, que lhe causam satisfação, concentrar-se.
Eu já me sai de muitas situações horríveis, como passar quase toda a noite com
alguém e não saber o nome, por não lembrar, ou esquecer várias vezes, tendo que
perguntar mais de três vezes. Hoje já tenho alguns tipos de brincadeiras que consigo
descobrir o nome sem chatear a pessoa. Pedir para escrever o nome e o telefone para
depois eu resolver alguma coisa, seja homem ou mulher é uma delas. Ou o jeito é
perguntar de forma bem inocente, também funciona.
6
conhecimento de suas habilidades.
41
1.2.2 Seres muito ativos: hiperatividade uma das características ainda existente
É possível que muitos de nós já tenhamos visto uma pessoa hiperativa ou um adulto
ou mesmo uma criança. Pessoas que não param de se movimentar, mexem em tudo, nos
cabelos, nos papéis e objetos em cima da mesa, balançam as pernas, os braços, levantam,
sentam, andam, roem as unhas, falam e falam e falam... mas não param. São como o nome
mesmo já diz hiper-ativas.
Joana, uma excelente profissional, que trabalha diariamente, o dia todo, na maioria
das vezes, também à noite. Formada em três áreas diferentes, mas apenas exerce uma delas e já
pensa em ingressar em outra faculdade, pois no momento não está estudando, apenas lendo e
trabalhando. Digo apenas, pois em suas palavras, estava achando pouco tudo que faz, sempre
buscando mais atividades para preencher o seu dia. É muito comum, segundo estudiosos,
pessoas com TDA/H´s serem muito ativas ou fazerem várias coisas ao mesmo tempo
(GOLDESTEIN, 1996; SILVA, 2003). Seu dia é todo preenchido de uma forma quase
impossível, para nós, pessoas que não têm característica de ser hiperativa. São tantas as
atividades que é quase impossível pensar em uma qualidade de vida para a mente e o corpo.
Minha colaboradora trabalha o dia todo, quase sem intervalos, cuida da casa, pois não tem
secretária, leva o cachorro para passear, faz exercício físico e cuida de sua filha. Em casa não
pára, sempre arrumando o que já esta arrumado, mexendo no que não tem porque mexer.
Cozinha e ainda tem tempo para pintar, escrever e ler.
Alexandre, formado em duas áreas, trabalha para o Estado, já tem um trabalho mais
parado, mas para sobreviver a monotonia sempre procura um jeito de levar trabalho para casa,
fugindo do seu escritório, descrito como: “um lugar chato, onde as pessoas só ficam paradas,
sentadas, escrevendo e fazendo seu trabalho sem nenhum desafio, sem nada novo, nem mudan.
Para eu não explodir de tanto tédio, prefiro trabalhar em casa”. Então, em casa pode fazer a sua
hora o seu ritmo e o seu jeito, de levantar, sentar, mudar de atividade e não ficar as seis horas
corridas trabalhando na mesma atividade. “Posso fazer um processo e parar para olhar o mar,
depois posso ler um pouco e até sair para caminhar e pensar em outras coisas ou realizar outras
42
atividades”. Olhando ele falando até parece que não gosta de trabalhar ou que não faz um
trabalho bem feito, mas gosta e muito, não gosta é de ficar parado, de se sentir inútil. Agindo da
forma que ele age, intercalando o trabalho com outras atividades seu rendimento e a qualidade
é bem melhor é surpreendente como consegue fazer bem feitas duas ou até três coisas
intercaladas.
Eu não consigo ficar sentado por muito tempo e só consigo ficar por algum tempo se
existir algo que me atraia e que me faça sentar. Meu corpo pede movimento, pede
ocupação, se eu fico parado, fico perdido, fico nervoso, me sinto preso comigo
mesmo. Tenho que falar, andar, agir, se movimentar. Só consigo pensar em fazer
algo (Alexandre).
vem-me uma idéia ou um sentimento e eu, em vez de refletir sobre o que me veio, ajo
quase que imediatamente. O resultado tem sido meio a meio: às vezes acontece que
agi sob uma intuição dessas que não falham, às vezes erro completamente, o que
prova que não se tratava de intuição, mas de simples infantilidade. (...) Quero
melhorar e não sei como. (O impulso – Aprendendo a viver).
Essa impulsividade foi relatada por Joana e Alexandre de forma positiva e negativa,
existindo um lado bom e outro ruim. Bom por muitas vezes, sem muito pensar, agem e
conseguem muitas coisas, que se fossem pensar antes de agir não teriam coragem, como muitas
brigas ganhas em reuniões de trabalho, como também declarações de amor ou mesmo início de
planos. Também muito presente em suas criações. Joana relata que muitas de suas criações
nasceram do impulso: “Penso algo e logo procuro por em prática. Uma idéia surge e
impulsivamente dou vida a ela”.
As pessoas com TDAH vivem a vida com muita intensidade, muitas vezes
transmitindo para outras pessoas a idéia de que gostam de arriscar a própria vida, parecendo até
quererem se matar (MATTOS, 2003). Mas é apenas o que parece, pois amam viver, se arriscam
muito, mas por adorar sentir, viver, experiênciar sensações e desafios. Joana já largou tudo,
trabalho bem sucedido, família, em sua cidade Natal e foi morar sozinha em outra cidade sem
nenhum emprego em vista, iniciando como gerente noturno no Mc Donald’s.
45
Segundo Silva (2003), tudo que elas vivem acontece com muita intensidade, muita
aventura, sempre buscando emoções, mas isso é por precisarem de estímulos para vida, que ao
contrário da imagem passada, amam até demais e querem curtir e viver com a máxima
intensidade possível. Para as pessoas com TDAH tudo é muito intenso, quando sentem dor é
muita dor, alegria, muita alegria, prazer, muito prazer. A autora também fala que a
impulsividade traz sérias conseqüências. Quando se encontra sobre pressão emocional ou
pessoal, o TDAH pode muitas vezes machucar as pessoas com seu impulso verbal ou
prejudicar-se profissionalmente, tornando assim, sua vida instável nos seus relacionamentos,
empregos e grupos sociais.
encontrando um trabalho que conseguem fazer bem. Hallowell (1999), também comenta sobre
a criatividade dos portadores, que só conseguem se utilizar verdadeiramente de seus talentos
criativos quando o TDAH é tratado.
Todos nós temos criatividade, mas não são todos que podemos chamar de seres
criativos (AUSUBEL, 1980). Apenas o sujeito que faz uma contribuição singularmente original
podendo ser na arte, na literatura, na ciência, na filosofia, na administração e assim por diante,
pode ser chamado de ser criativo. Sendo esta pessoa rara, muito mais que uma pessoa dita
inteligente. A criatividade como a inteligência existe em todos os indivíduos, apenas diferindo
em graus maiores e menores, apesar de que não tem como medir o grau de criatividade que um
indivíduo possui (ROGERS, 1997). Até o indivíduo considerado de pouca inteligência tem um
grau de inteligência, mas não é considerado uma pessoa inteligente. O mesmo acontece com a
criatividade, não são todas, mas algumas podemos chamar de criativas. “É importante, pois,
preservar o critério da originalidade única e singular ao designar uma pessoa como criativa”
(AUSUBEL, 1980, p.487). Essa pessoa produz, nas palavras do respectivo teórico, mais do que
algo novo ou original. O principal determinante das pessoas criativas é genético, sendo
auxiliado por fatores ambientais. Por este motivo existir pessoas que são criativas em potencial,
mas passam suas vidas como um sapateiro ou administrador e não um artista.
Arieti (1976, In: Ausubel 1980), descreve o processo criativo como uma mistura
dos aspectos irracionais do pensamento inconsciente do sujeito com os racionais, lógicos e
cognitivos do seu pensamento consciente. Segundo a definição do processo criativo de Rogers
(1997, p.406), “se trata da emergência na ação de um novo produto relacional que provém da
natureza única do indivíduo por um lado, e dos materiais, acontecimentos, pessoas ou
circunstâncias da sua vida, por outro”.
e uma dedicação bastante intensa. É por isso que Joana consegue ficar tanto tempo em seu
trabalho ou fazendo as coisas que gosta, como pintar, escrever e cozinhar.
Um momento de frustração que o sujeito com TDAH tem é quando não consegue
por em prática todas as idéias, “é a descoberta de um abismo entre o que sentimos e o que
somos capazes de expressar” (NACHMANOVITCH, 1993, p.70). Também pude analisar e
perceber isto em minhas observações. As idéias são tantas, o desejo de descobrir e criar, em por
em prática todas elas que chega a ser frustrante, pois não tem como, sendo muitas vezes o
tempo o maior inimigo. Desta forma muitas idéias ficam apenas em pensamentos e são
esquecidas. O desejo de criar, segundo Rogers (1997) é o desejo de se realizar, de por em
prática suas potencialidades, de ser ele mesmo. Devemos então encarar o fato de que o
indivíduo cria primeiramente porque o satisfaz, porque é uma auto-realização.
potentes ou mesmo criar novos vírus, sendo uma criatividade socialmente destrutiva. Desta
forma existem valores sociais diferentes para os tipos de criações (ROGERS, 1997). Apesar
disso de acordo com o referido autor não temos como julgar se são realmente boas ou más, pois
muitas vezes quanto mais original for a criação, mais facilmente podem julgá-las como más.
No caso dos meus colaboradores considero suas criações socialmente construtivas, trazendo
sempre benefícios tanto para eles como para os outros. Mas diferente de minha opinião, o
professor de Alexandre considerava muitas de suas inovações más. “Descobriu-se que, quando
o indivíduo está “aberto” a toda a sua experiência(...), seu comportamento será criativo e pode
ter-se confiança na sua criatividade como essencialmente construtiva” (ROGERS, 1997, p.409).
Acerca da criatividade estarei abordando no capítulo 4, como uma das maneiras que
Alexandre e Joana tiveram de estar “driblando” o transtorno, utilizando sua criatividade de
forma estratégica para aprender.
A sociabilidade dos portadores não é muito boa, apesar de gostarem de falar muito,
não conseguem ter muitos amigos, ou mesmo andar em grupo. Falam muito com pessoas
desconhecidas, nas lojas, ruas, mas não formam vínculos de amizade ou mesmo proximidade.
Joana vive e convive muito com sua família, passando o tempo livre, quando não está fazendo
suas tarefas pessoais.
49
Alexandre vive muito só, não gosta de andar em grupo e ter amizades fixas, quando
sai nas noitadas, prefere sair sozinho e no local destinado se encontra com seus amigos por
acaso. Conforme suas palavras:
grupo prende muito a gente, gostam de manipular. Temos sempre que fazer o que
todos do grupo fazem se não já ficam criticando. Existem regras. É uma panelinha,
não gosto. Gosto de ficar só. Quando saio, saio só e por acaso me encontro com
alguém, mas nada de me sentir preso.
Ele saia só e sempre se encontrava com alguém. Até no relacionamento não gostava
de seguir as normas de um bom relacionamento, fazia do seu jeito, quando não, acabava em
briga. Essa intolerância a regras não se restringe apenas a regras de grupos de amizade, também
acontece em relação às regras postas externamente as suas. Apresenta enorme dificuldade de
aceitar regras das instituições, familiares e sociedade. Aceitando apenas as que forem
necessidade de existir para ser possível ter um convívio social. Como por exemplo, as regras da
escola dificilmente foram seguidas. No trabalho os horários têm que ser flexíveis, caso
contrário vira um tormento; a repetição de atividades diária nem pensar, como fardamento e
trabalho seriado. Apesar de serem intolerantes às regras externas e de outras pessoas, são
extremamente perfeccionistas, cheios de regras internas de perfeição em tudo o que fazem.
Visto muito nas palavras de Joana:
Não consigo ter uma secretária comigo, pois gosto de fazer tudo do meu jeito, minhas
coisas, minha casa, minhas roupas têm que estar da forma que eu gosto, se um
bonequinho ou cadeira estiver colocada diferente da forma que eu considero
adequada, só fico tranqüila quando colocá-la do jeito certo. E isso é em quase tudo
em minha vida. Só confio ou tenho tranqüilidade nas coisas que eu faço. Nos
trabalhos de curso eu mesmo fazia sozinha para depois não ficar reclamando dos
outros colegas.
Este perfeccionismo também causa muito sofrimento, deixando de ter confiança nas
outras pessoas e sobrecarregando a sua pessoa. Também trás insegurança até no que faz, muitas
vezes desacreditando até no seu próprio potencial. A sua necessidade de estar tudo perfeito é
50
tão grande, que nunca acha que está bom o bastante, trazendo angustia, ansiedade e sofrimento.
Como ressalta em uma de suas falas: “após as festas que preparo, sempre acho que não foi tão
boa, faltou algo, me causando o sentimento de impotência e às vezes até dias de depressão”.
Em relação aos vícios, o que foi verificado bastante presente em minhas leituras,
nenhum dos meus dois colaboradores apresentaram vícios considerados graves à saúde. Apenas
alguns vícios, mas nenhum que possam ser considerados prejudiciais em suas vidas. O mais
grave é o excesso de trabalho, já se tornando “workaholic”, trabalhando muito, mais de 12
horas por dia. Alexandre também tem a necessidade de ter o excesso de exercício, praticando
vários esportes e exercícios por dia. Também verifiquei a necessidade enorme por doces,
especificadamente chocolates, tendo a necessidade de comer todos os dias, pois sua falta
causava irritabilidade e dores de cabeça. Como relatado anteriormente, a bebida presente na
vida de um dos colaboradores não é considerada alcoolismo, pois apenas bebe nos finais de
semana, mas é algo que tem que ser controlado.
valores ou motivo de conclusão, apenas quando existe uma motivação externa, como, por
exemplo, ganhar determinado prêmio por sua conclusão, ou tirar um determinado lugar, 1o ou
2o são motivos para irem até o fim. Joana por perceber desde pequena essa dificuldade de
concluir seus planos, se esforça para terminar seus projetos, apesar de também abandonar
muitos pela metade. Como muitos de seus escritos, suas idéias, seus projetos. Em relação a
conclusão dos cursos, os dois conseguiram terminar todos que iniciaram, com exceção de um, o
curso de odontologia em que Joana iniciou, mas desistiu depois de um ano de ingresso.
Como exemplifico uma das características dos meus sujeitos anteriormente, que são
pessoas que têm dificuldade em concluir seus projetos, concluir no sentido de executar ou até
52
Ainda hoje não temos um teste específico que identifique o Transtorno de Déficit
de Atenção/Hiperatividade. Como na esquizofrenia e no autismo, a medicina ainda busca por
um diagnóstico específico, tendo como um dos recursos uma ferramenta antiga, a anamnese. É
importante comentar, que no adulto, a anamnese pode ser um problema, já que teríamos que ter
toda a história de vida, desde de sua gestação até os dias atuais, sendo muitas vezes difícil de
conseguir todas as informações, por motivos diversos, tendo só o relato do indivíduo, sendo
este relato muitas vezes deficiente em várias partes. Então, o melhor jeito de diagnosticar o
transtorno, é a própria história do indivíduo, vista pelos mais diversos ângulos: escolar e
profissional, afetivo, familiar e social (SILVA, 2003).
7
Manual que lista sintomas de enfermidades psiquiátricas, tornando o diagnóstico mais padronizados.
53
_________________________________________________________________________
A. Ou 1. ou 2
1 - Desatenção
A pessoa deve apresentar seis (ou mais) dos seguintes sintomas de desatenção persistentes por
no mínimo 6 meses, em grau que compromete a adaptação e é incompatível com o nível de
desenvolvimento:
• Freqüentemente não presta muita atenção nos detalhes ou comete erros por descuido
nos deveres escolares, no trabalho ou em outras atividades;
• Freqüentemente mostra dificuldade em manter a atenção em tarefas ou jogos;
• Com freqüência se distrai facilmente devido a estímulos externos;
• Freqüentemente parece não escutar o que lhe falam;
• Freqüentemente não obedece as instruções passo a passo e não completa deveres, ou
tarefas no trabalho (sem ser devido a comportamento de oposição ou por dificuldade de
entender as instruções);
• Freqüentemente tem dificuldade em ser organizado em trabalhos ou outras atividades;
• Freqüentemente evita, se incomoda ou se mostra relutante em envolver-se em tarefas
que exigem um esforço mental prolongado (tais como deveres escolares ou trabalhos de
casa);
• Freqüentemente perde objetos necessários para suas atividades, por exemplo, deveres,
lápis,
• Esquece-se freqüentemente de suas atividades diárias.
2 - Hiperatividade - Impulsividade
São necessários seis ou mais dos seguintes sintomas persistentes por no mínimo 6 meses, em
grau que compromete a adaptação e é incompatível com o nível de desenvolvimento:
Hiperatividade:
• Freqüentemente está mexendo com as mãos ou os pés ou se revira na cadeira;
• Freqüentemente se levanta da cadeira em situações nas quais o esperado é que ficasse
sentado;
• Freqüentemente corre ou trepa em demasia em locais inadequados;
54
Impulsividade:
• Freqüentemente responde precipitadamente antes de ouvir a pergunta toda;
• Freqüentemente tem dificuldade em esperar sua vez;
• Freqüentemente interrompe ou se intromete na fala dos outros (por exemplo, invade
conversa ou jogos de outros).
B. Presença de seis(ou mais) dos sintomas de desatenção e/ou seis (ou mais) de hiperatividade-
impulsividade, por pelo menos seis meses, em grau mal-adaptativo e inconsciente com o nível
de desenvolvimento.
C. Alguns sintomas de hiperatividade-impulsividade ou desatenção que causam prejuízo
estavam presentes antes dos 7 anos de idade.
D. Algum prejuízo causado pelos sintomas está presente em dois ou mais contextos (escola,
casa, trabalho).
E. Deve haver claras evidências de prejuízo clinicamente significativo no funcionamento
social, acadêmico ou ocupacional.
F. Os sintomas não ocorrem exclusivamente durante o curso de um Transtorno Invasivo de
Desenvolvimento, Esquizofrenia ou outro Transtorno Psicótico e não são melhores explicados
por outro transtorno mental.
Tipos:
1. Tipo predominantemente desatento (TDAH-D)
2. Tipo predominantemente hiperativo-impulsivo (TDAH-HI)
3. Tipo combinado (TDAH-C)
___________________________________________________________________
1999; SILVA, 2003). Pois quando criança esse comportamento muito ativo é bem visível,
levando-a permanecer sempre ativa, nunca parar de fazer ou mexer em algo.
De acordo com Mattos (In: ROHDE, 2003), o diagnóstico do TDAH “deve ser
considerado como dimensional, sendo necessário estabelecer um ponto de corte acima do qual
vários sintomas constituiriam uma síndrome específica" (p.219).
Foi relatado por um dos colaboradores que a sua mãe, pelo comportamento e
características, era uma suposta TDAH, mas que não sabia por não ter sido diagnosticada e nem
conhecimento. Alguns autores (SCHWARTZMAN, 2001; SILVA, 2003; BARKLEY, 2002,
GOLDSTEIN, 1996; HALLOWELL, 1999) dizem, que para se fazer o diagnóstico, em
primeiro lugar devemos verificar se alguém na família tem o TDA/H ou as mesmas
56
características. Pois, é muito freqüente, verificar que outros da família apresentaram as mesmas
dificuldades, podendo ser irmão, pai ou mãe, primos e outros parentes. Não podemos descartar
nenhuma informação, pois nenhum fator isolado ou conjunto de fatores definidos assinalam ou
excluem a possibilidade da presença do Transtorno. Por estes motivos é essencial que o
diagnóstico seja feito por uma equipe composta de médicos, psicólogos, neurologistas e
psiquiatras (MATTOS, 2003). Também alguns tios e primos são muito agitados e inquietos,
apresentando também o mesmo comportamento, sendo muito deles prejudicados, mas que
também por falta de informações por parte dos pais e deles próprios não buscaram ajuda.
todo o meu problema de ser inquieto, impulsivo, não conseguir seguir as regras do
mundo têm um nome, é TDA/H. Foi bom descobrir que todo esse meu jeito diferente
não era porque eu queria mas sim por conta de um transtorno que eu tenho. Para as
pessoas eu posso dizer hoje por que eu sou assim. Para mim foi bom que tentei me
compreender melhor, me adequar ao mundo, a sociedade sem tentar mudar minha
personalidade. Hoje eu me aceito, diferente de antes que eu me via como um
alienígena e aprendi a por meus limites.
É importante ressaltar que, quanto mais cedo for diagnosticado, menores serão as
conseqüências psicológicas sofridas por esse sujeito ao longo dos anos da sua vida. Como já
havia falado, esse Transtorno inicia-se na infância e persiste na maioria dos casos até a fase
adulta, desta forma o sujeito passa anos de sua vida sem saber por que tem certos
comportamentos que não consegue controlar facilmente ou nem consegue controlar. Outro
ponto importante, é que a identificação precoce possibilita a descoberta de outras doenças
associadas a esse transtorno (GENES, 2002).
57
Joana já tinha feito vários exames desde pequena, mas nunca davam um
diagnóstico preciso sobre seu comportamento desatento. Apenas adulta, fazendo terapia, que
iniciou seu processo de descoberta sobre o diagnóstico. Encaminhada para um neurologista e
psiquiatra, juntamente com seu psicólogo, que já vinha com seu histórico de vida (desde
nascimento até os dias atuais), seu comportamento diário e suas “queixas”, mais os relatos de
familiares e pessoas próximas, foi que chegaram ao consenso de que era portadora do TDAH. E
desde então tudo em sua vida começou a se encaixar, a ter explicações lógicas para alguns
comportamentos. Relata que foi muito bom, “me senti normal, apesar de ter um transtorno,
após o diagnóstico passei a não me sentir mais “extraterrestre”, pois era assim que me sentia,
uma pessoa que não era desse mundo”.
Me sentia diferente de todos, como se eu não fizesse parte deste mundo. Na escola era
muito inteligente, não precisava da ajuda de ninguém, lia muito, então, era muito
informada. Acho que por isso me destacava e ninguém era meu amigo, ficava sozinha
pelos cantos da escola sonhando e pensando em muitas coisas ao mesmo tempo, em
idéias, nas aulas, em planos e desejos, meu caderninho era meu melhor amigo. Era
58
diferente de todas as meninas. Era e ainda sou sonhadora. Ficava horas fora do ar.
Como poderia compreender minha desatenção? Esse meu comportamento. Realmente
achava que não fazia parte deste mundo. Hoje sei que faço parte, mas sei também que
realmente sou diferente da maioria das pessoas em muitas maneiras de agir e pensar.
Alexandre também foi diagnosticado, com TDAH na fase adulta, já tinha 18 anos
quando levaram-no ao psicólogo, que após um batalhão de testes e exames, chegou à conclusão
de que não sofria de pouca inteligência, como muitos o rotulavam, bem pelo contrário, os seus
testes apontaram uma alta inteligência e que haveria de seguir uma área que utilizasse a
matemática ou o desenho, pelo bom resultado e à elevada criatividade.
O referido colaborador, já havia lido a respeito e tinha algumas suspeitas que era
possível ele ser, alguns amigos já até o chamavam de hiperativo, mas nunca tinha feito exames
para descobrir se realmente o tinha. Foi fazendo psicoterapia, que seu interesse aumentou em
saber o que lhe fazia ser como era. Por que não conseguia mudar em alguns comportamentos
mesmo tentando? Assim, como dito no parágrafo anterior, foram feitos todos os exames e
procedimentos necessários para se obter o diagnóstico. Também, como no caso de Joana, seu
histórico desde o nascimento até os dias presentes, foi fundamental nas conclusões dos
médicos.
errada. Desta forma o tratamento é um processo ativo, envolvendo estudo, pesquisas, leituras,
conversas com especialistas e outras pessoas que também têm o transtorno.
Não pretendo estar criando um novo quadro de diagnóstico do TDAH nem muito
menos estar padronizando um quadro das características do transtorno. Até porque é importante
deixar novamente claro que cada indivíduo tem suas particularidades, muito das características
de um adulto com TDAH são também de sua própria personalidade. Como já falei
anteriormente essas são as características dos sujeitos desta pesquisa, podendo existir outras,
além das comorbidades que são muito freqüentes nesses adultos.
Também podemos incluir como um problema que afeta na vida dessas pessoas a
busca pelo sono tranqüilo. Pessoas que não param, até quando estão dormindo. Essa é a busca
dos portadores do Transtorno, relaxar e ter um sono de qualidade. Novamente me utilizando do
conhecimento de Silva (2003), relatando que a presença de pensamentos com uma velocidade
61
não existindo comprovação de um tratamento mais eficaz que a utilização de medicação, sendo
atualmente um consenso entre os especialistas e pesquisadores (MATTOS, 2003).
Alexandre relatou que quando tomava medicamento, era como se não se sentisse
ele mesmo, como algo inorgânico inibindo algo natural, não se sentia bem por um lado, apesar
da melhora em algumas características que o incomodava. Não ficava mais muito inquieto e
perdido, também seu humor não oscilava tanto como quando não utilizava medicamentos. Mas,
apesar desses efeitos positivos, existia um efeito que considerou maior de todos e negativo em
sua vida: sua maneira de criar, de inventar, de ser inovador e dinâmico, de pensar rápido, foram
adormecidos, prejudicando de qualquer forma sua vida pessoal e profissional. Assim, preferiu
continuar sem medicamentos. Preferiu as características do transtorno fervilhando em seu corpo
e procurou outras formas de amenizá-las ou mesmo utilizá-las de forma que não o prejudicasse
tanto.
Joana, não esquecia mais tanto de seus compromissos, se sentia mais calma, menos
ansiosa, no entanto, não conseguia mais ter tantos planos, idéias e trabalhar tão bem como antes
dos medicamentos. Sua produção, por não parar de trabalhar e pensar sobre ele, era bem maior,
apesar de sua qualidade de vida seria melhor estando mais relaxada e mais calma, com um
ritmo menos acelerado, optou não continuar com os remédios. Não estou querendo ir contra
todas as publicações a favor da utilização da medicação, apenas estou descrevendo opiniões de
sujeitos que felizmente ou infelizmente optaram por não continuar com o tratamento
medicamentoso.
63
Hoje já existem medicamentos que têm o efeito para o dia todo, pois antes sua
duração era por poucas horas (SCHONWALD, 2003). No Brasil a utilização da Ritalina
cresceu bastante nos últimos anos, tendo o aumento de 14% na sua prescrição, sendo vendido
em 2004 aproximadamente um milhão de caixas (LIMA, 2005).
Meu interesse por este tema surgiu quando minha filha foi diagnosticada com
TDAH. Neste dia tive duas sensações simultâneas, uma de alívio e outra de medo. Alívio
porque estava tendo resposta para todas as minhas perguntas e dúvidas em relação ao
desenvolvimento e o comportamento dela. Medo, por ter uma filha diagnosticada com
hiperatividade ou um transtorno que mal conhecia. Já havia estudado sobre o assunto na
graduação, e assustei-me por terem emitido um diagnóstico tão precoce e, pelas minhas
leituras, parecia-me muito leviano esse diagnóstico. Foi desde então, que passei a me
aprofundar sobre o assunto e não parei mais. Todas as reportagens que saiam, os livros, artigos,
sempre estava lendo e pesquisando.
Depois de muitas pesquisas, algumas perguntas foram ficando sem respostas. Uma
delas foi sobre o TDAH no adulto, pois ao passo que para a infância existiam muitas
informações, para a fase adulta a escassez era enorme. Sabia que o transtorno, na grande
maioria das vezes persistia na fase adulta. Então, começou a me incomodar e iniciei minha
grande jornada da pesquisa sobre o TDAH no adulto.
Neste caminhar, percebi em minhas leituras que muitos portadores passam por
grandes dificuldades na escola, na forma de aprender e de se concentrar no ensino, tendo
insucessos na vida estudantil. Muitos, por esse motivo, não conseguindo ter uma vida
profissional com êxito. Mas, diante de tantos fracassos, existem pessoas que conseguem,
66
ultrapassar as barreiras e limites do transtorno e conseguem ter uma vida escolar normal e às
vezes até brilhante tornando-se profissionais de excelência.
Pelo motivo de tantos adultos terem dificuldades de concluírem seus objetivos, suas
metas e terem dificuldade na escola, busquei conhecer adultos com o transtorno que concluíram
o nível superior, para entender melhor seu universo, suas lutas com o transtorno e descobrir
como fizeram para driblar as características do transtorno. Surge então, minha problemática da
pesquisa: Que meios e estratégias de aprendizagens foram utilizadas por essas pessoas com
o transtorno para que conseguissem concluir o nível superior?
Assim, o problema de uma pesquisa, como Rubens Alves comenta, é “alguma coisa
que perturba ou impede um curso de ação. Mas não é só isso. O que caracteriza um problema é
a possibilidade de solução” (1999, p.100). Para desenvolver esta pesquisa definiu-se um
objetivo geral, além dos objetivos específicos, na forma como exponho a seguir.
Para desenvolver a pesquisa não basta termos a problemática, temos que norteá-la
com objetivos, para que tenha um caminho a trilhar. Então, como objetivo geral e norteador da
pesquisa, busquei compreender as experiências de vida do sujeito adulto com TDAH e suas
possíveis relações com a aprendizagem escolar.
Delinear os caminhos percorridos por adultos com TDAH que driblaram o transtorno em
sala de aula.
Quando o meu interesse em pesquisar adultos com TDAH ficou definido, tive a
preocupação de não encontrá-los. Então, antes mesmo de fechar o tema e dar início minhas
pesquisas mais aprofundadas fui atrás de encontrar meus sujeitos da pesquisa e se era possível
realizar o trabalho que tinha interesse. Pois além de encontrá-los tinha que saber e ter a
autorização por parte deles da minha imersão em suas vidas.
8
O site é www.orkut.com, para se tornar usuário ou participante, é preciso ser convidado por um indivíduo
que já seja membro da comunidade.
69
disponibilidade do sujeito, foi selecionado um colaborador através do site Orkut. O outro foi
através de indicação de uma amiga.
Após a seleção dos dois colaboradores, que já estavam cientes da pesquisa, mas
apenas por contato de E-mails e por telefone, marquei um primeiro encontro, para falar mais
detalhadamente sobre esta e sobre o planejamento de minha imersão durante alguns meses em
suas vidas. Como também, para conhecer de perto e pessoalmente os sujeitos de minha
pesquisa.
Para garantia do anonimato dos colaboradores, pedi para que eles me dessem um
nome fictício que gostariam que eu utilizasse na pesquisa, este podendo ser de alguém da
história antiga, alguém importante ou que eles admirassem, que eles se identificassem.
Também não era obrigado ser nome de pessoa, poderia ser um outro nome. Assim, Joana e
Alexandre foram os nomes escolhidos por eles próprios. Advindos de Joana Dar`c e Alexandre
o grande, grandes lutadores da história antiga. Como visto no início do capítulo 1 que abre com
um pouco da história dessas duas personalidades.
Foi um pouco difícil no início acompanhar duas pessoas que têm o ritmo acelerado.
Convivendo pela manhã, à tarde, à noite e às vezes de madrugada, já que estes até neste horário
realizavam em atividades. Muitas vezes me peguei surpresa e questionando, como podia uma
pessoa viver daquela forma? Em um ritmo tão acelerado. Fazer tantas coisas ao mesmo tempo.
E nesse caminhar foram surgindo inúmeras perguntas que foram sendo compreendidas aos
71
mais criteriosas e mais próximas da realidade deles, me infiltrei em seus “mundos”, em suas
rotinas. Para observar suas maneiras de aprender, convivi com eles no trabalho, no lar familiar,
no lazer, no esporte. Me tornei parte integrante de suas rotinas, me fazendo quase que
imperceptível mas, visível.
Finalizei minha pesquisa de campo no dia 24 de outubro de 2005, após sete meses
de completa imersão, convívio e muita aprendizagem. Neste dia me encontrei com os dois
colaboradores juntos no mesmo lugar, onde se conheceram e trocaram muitas informações. Foi
difícil por um fim nos encontros, as visitas já faziam parte de minha rotina e eram prazerosas e
enriquecedoras, mas já havia obtido muitas informações. O campo já havia me apontado
algumas respostas que buscava e outras novas informações emergiram. Então, sabia que era o
momento de parar e iniciar um outro momento de minha pesquisa.
De acordo com Bogdan (1994), quase todo mundo já fez alguma vez pesquisa sobre
algum assunto. O processo nos parece tão familiar, que muitas vezes não sabemos que estamos
fazendo de fato uma pesquisa. Sobre a naturalidade do ato de pesquisar lembra-nos Brandão
(2003):
A pesquisa qualitativa tem seu início no final do século XIX, quando os cientistas
sociais começaram a questionar o método de investigação das ciências físicas e naturais, se este
deveria continuar sendo utilizado como método para os estudos dos fenômenos humanos e
sociais (BRANDÃO, 2003).
A opção pela pesquisa qualitativa justifica-se pelo fato dela apresentar uma visão
holística dos fenômenos que buscam uma compreensão maior e mais clara da realidade em “seu
acontecer natural, levando em conta todos os componentes de uma situação em suas interações
e influências recíprocas” (ANDRÉ, 1995, p.17).
Foi no século XX que o investigador passou a entender que era preciso abandonar
seu gabinete de trabalho e ir ao campo pesquisar. Passou a realizar ele mesmo, sua própria
pesquisa de campo, dando importância ao trabalho da observação direta, não se contentando,
somente, em coletar materiais. “Pela primeira vez, o teórico e o observador ficam enfim
reunidos” (LAPLANTINE, 2004, p.66).
Nesta pesquisa, pretendia elaborar o retrato do adulto com TDAH que concluiu o
nível superior, sua trajetória na universidade, descrevendo as estratégias utilizadas para a sua
aprendizagem, dentro e fora da sala de aula. Aos poucos, como uma pesquisadora etnográfica,
sob a óptica de uma estranha, fui aproximando-me das formas de compreensão da realidade dos
indivíduos estudados. Como comenta Laplantine (2004, p.23), “a etnografia é antes de tudo
uma experiência física de imersão total, consistindo numa verdadeira aculturação”, onde devo
75
observação participante é importante tornar-se invisível no campo que está sendo observado. A
entrevista serve para aprofundar o que não ficou claro durante a observação participante. A
análise é uma compreensão a partir da visão do outro, sendo importante tomar cuidado para não
modificar ao que é natural do campo (WOLCOTT, 1995). Falando de outra maneira, essas
técnicas são três pontos básicos que o autor supracitado considera fundamental: “estar lá”,
“tornar-se intrometido” e “olhar por cima dos ombros dos outros”. Ressaltando, que essas
técnicas também fazem parte da pesquisa de campo descritiva, tornando-se uma pesquisa
etnográfica quando, finalizando, apresentamos uma interpretação cultural com lentes
antropológicas.
Tendo em vista o meu interesse estudar o percurso feito pelo adulto com TDAH
para concluir o nível superior, esse tipo de pesquisa permitiu que eu chegasse bem perto do
meu sujeito, tendo um contato direto, facilitando compreender melhor o seu dia-a-dia. Não
tenho dúvidas que a etnografia centrada no informante foi o melhor recurso, onde tive a
oportunidade de trabalhar com poucos colaboradores, que me ajudaram nesse percurso tão
cheio de experiências e aprendizagens.
Manter o foco em um determinado indivíduo faz com que a atenção seja voltada
para a compreensão da cultura de alguém (WOLCOTT, 1999), entendida como o contexto onde
se inserem os sujeitos colaboradores da pesquisa. Foi por isso que focalizei apenas dois sujeitos
diagnosticados com TDAH e que tivessem todos os pré-requisitos que exigi no início da
pesquisa.
É importante ressaltar que tipo de envolvimento o pesquisador deva ter com seu
colaborador, sendo necessário existir um pequeno distanciamento. Distanciamento este, que
não significa neutralidade, e sim um olhar de fora. Quando o pesquisador vai a campo ele já
tem um embasamento teórico, que vai sendo reconstruído ao longo da pesquisa. “Uma das
formas de lidar com essa questão tem sido o estranhamento um esforço sistemático de análise
de uma situação familiar como se fosse estranha” (ANDRÉ, 1995, p. 48).
é sempre feita por causa de um alvo que se busca e de um interesse específico por conhecer, o
que implica uma escolha teórica que pode e deve ser explicitada ao longo do estudo” (ANDRÉ,
1995, p. 42).
Nas observações participantes não precisava marcar, pois minha presença já estava
certa nos respectivos dias combinados no início da pesquisa de campo, sendo alterada apenas
alguns finais de semana, quando tivemos que incluir após o curso da pesquisa. Eu chegava no
local, falava com as pessoas, com o colaborador e ficava, as vezes, parada por certo momento
em um local somente observando outros participando de algumas atividades que não
atrapalhariam no cotidiano do colaborador. Procurei tornar-me parte ao mesmo tempo que não
era parte, pois não poderia modificar, interromper, mesmo que aos meus olhos e meus
pensamentos o que era visto fosse errado ou certo, injusto ou inadequado. O meu papel era
apenas a de como pesquisadora, não poderia da minha forma modificar algum comportamento
dos meus sujeitos. Se após minhas perguntas, eles refletissem e quisessem modificar suas
formas de agir por conta própria, seria um ganho após a pesquisa.
A análise dos dados é um processo mais longo do que simplesmente ler e reler
conteúdos. Considero que os achados advindos das entrevistas semi-estruturadas, requerem por
parte do pesquisador, a disposição, a paciência, para buscar as informações, sentimentos e
81
idéias que subjazem das palavras e gestos dos colaboradores. Como descreve Brandão (2003,
p.142),
Dentre todas, em meio a tantas, optar por algumas passagens mais fortes, mais
marcantes, mais poderosamente descritivas, mais carregadas de um momento de
“afeto crítico” dentro da meia hora de conversa com um homem ou uma mulher da
comunidade. De tudo que foi dito por todas as pessoas “visitadas”, algumas falas se
repetem, “tocam na mesma tecla”. É aí que são selecionadas as falas significativas.
Enfim, o caminhar de uma pesquisa, desde a escolha do tema, a coleta e análise dos
dados, não é um processo simples. Como nos atesta Bourdieu (1998, p.27):
...a construção do objeto (...) não é uma coisa que se produza de uma assentada, por
uma espécie de ato teórico inaugural, e o programa de observações ou de análises por
meio do qual a operação se efetua não é um plano que se desenhe antecipadamente, à
maneira de um engenheiro: é um trabalho de grande fôlego, que se realiza pouco a
pouco, por retoques sucessivos, por toda uma série de correções, de emendas,
sugeridos por o que se chama o ofício, quer dizer, esse conjunto de princípios práticos
que orientam as opções ao mesmo tempo minúsculas e decisivas.
Assim sendo, o caminhar de minha análise ocorreu da seguinte forma: uma análise
em artigos científicos e de jornais, periódicos, matérias televisivas, livros e sites. Analisei e
categorizarei as falas e os comentários dos entrevistados e concomitantemente entrelacei-os
com as teorias. De acordo com Bogdan (1994), as categorias de codificação constituem um
meio de classificar os dados descritivos que foram recolhidos, de forma a que o material
contido num determinado tópico possa ser fisicamente apartado por outros dados.
82
No final das descrições e feita a análise, apresentei o material escrito para cada
colaborador, estes puderam ler e omitir suas opiniões a respeito do que escrevi sobre suas vidas
e suas experiências de aprendizagem. Joana e Alexandre me retornaram com muita satisfação
que leram, me relatando terem também aprendido com meus escritos, que este trabalho já
contribuiu para duas pessoas com TDAH, mesmo sendo eles os colaboradores.
83
“Me sinto como parte de outro mundo e não deste mundo, onde as
pessoas são mais lentas do que eu, são menos sensíveis, menos
criativas... Tudo menos. Não sei; tudo quero muito, quando amo,
amo muito, quando sinto, sinto muito, quando choro, choro
muito...”
Alexandre.
84
O adulto com TDAH, para conseguir “driblar” o transtorno em sala de aula, utiliza
alguns ou várias estratégias de aprendizagem. Foi se utilizando dessas estratégias, que são
inerentes a cada indivíduo, que esses adultos conseguiram concluir seus estudos e ter sucesso
na vida acadêmica e profissional . É importante ressaltar que a pessoa com TDAH não
obrigatoriamente tem transtorno de aprendizagem e sim, problemas na atenção e no controle de
inibição que causam assim, problemas na aprendizagem. Visto que os colaboradores
aprenderam e aprendem, os problemas de aprendizagem existentes, muitos podem ser
contornados na medida que estes são identificados. Diferentemente e contraditório ao que é
visto e dito no meio acadêmico.
foram utilizadas por esses adultos estudados para concluírem o nível superior e para
aprenderem com êxito até os dias atuais. E que estes adultos especificamente, sujeitos da
pesquisa, têm suas individualidades e suas formas de aprender específicas, como cada sujeito
tem a sua maneira, a sua metacognição, servindo este estudo, como um resultado de exemplo
positivo de que pessoas com TDAH possam aprender e ter sucesso na vida acadêmica.
Tudo que falei no parágrafo anterior pode ser resumido no ato de que aprender é
buscar informações, rever a própria experiência, adquirir habilidades, adaptar-se às mudanças,
descobrir significados nos seres, objetos, fatos e acontecimentos, modificar atitudes e
comportamentos (ABREU, 1990). Conclui-se que a aprendizagem não é um aumento
quantitativo de conhecimentos e sim um processo qualitativo, pelo qual o aluno fica melhor
preparado para novas aprendizagens, tendo uma transformação estrutural da inteligência.
88
Enfim, realmente existem muitas definições para uma única palavra, mas que causa
grande diferença na vida do indivíduo. Um tema muito abordado e presente ao longo de nossas
vidas para quase tudo que vamos realizar e fazer, em qualquer lugar e em todo o tempo.
Para que a aprendizagem ocorra na sala de aula, não é apenas uma questão de
transmitir conhecimento, um professor falando e o aluno recebendo as informações, é preciso
muito mais que isto. Abreu (1990), comenta que existem alguns pontos importantes em relação
a aprendizagem que são comuns a todas as pessoas. Que toda aprendizagem precisa ser
significativa para o aluno; ela é pessoal; precisa visar objetivos realísticos; precisa existir um
89
De acordo com Moreira (1997), existem certas variáveis associadas ao aluno que se
supõem importantes para aprender. Exemplo disso é a boa vontade e a disposição para estudar
do aluno. Seus conhecimentos e experiências anteriores também são relevantes, assim como as
habilidades intelectuais e a de relacionamento. As pesquisas apontam a variável – “interesse do
aluno pelo tema”, como sendo uma das mais importantes para que ocorra a aprendizagem. Um
tema que agrade o aprendiz o colocará favoravelmente disposto em relação ao curso e ao
professor. No caso do adulto com TDA/H isso é fundamental, pois quando o tema os interessa
sua atenção é redobrada. No momento do trabalho de Joana ela conseguia ter total atenção às
atividades, por fazer o que gosta, não tinha dificuldade em se concentrar, mas quando estava
em sala de aula, estudando uma disciplina na qual não tinha nenhum relacionamento com seu
dia-dia ou trabalho, precisava recorrer a outros métodos para não perder a disciplina como um
todo, pois caso contrário não conseguia aprender nada. Do mesmo jeito, Alexandre, o assunto
tinha que ter alguma relação com que goste, poderia ser pequena, mas tinha que ter significado.
Zabalza (2004, p.197-221), aborda em seu livro: algumas dimensões básicas sobre a
aprendizagem do aluno universitário:
90
Assim, estando o aprendiz motivado, ele precisa ativar outros processos para obter
uma aprendizagem eficaz. E um desses processos é a atenção. Sendo esta, também considerada
um requisito para que aconteça a aprendizagem. A motivação pode ser intrínseca e extrínseca.
A primeira é quando o motivo do que se aprende está nas conseqüências que proporciona como
resultado. No que o aprendizado lhe dará em troca. A Segunda é quando o motivo está no que
se aprende de fato. Quando o motivo é o desejo de aprender (seja inglês, informática, música,
culinária, etc). De acordo com essa idéia Pozo (2002, p.141) comenta que os “motivos
intrínsecos ou desejo de aprender estão tipicamente mais vinculados a uma aprendizagem
construtiva, à busca do significado e sentido do que fazemos”. Falarei mais adiante,
detalhadamente, da atenção dos meus colaboradores e como eles driblaram as dificuldades para
aprender.
91
Pena que muitos dos passos, para que ocorra uma verdadeira aprendizagem, que
acabo de falar não é sempre o que acontece em sala de aula, muitos educadores não respeitam
as individualidades de seus alunos, tendo uma visão total de seus alunos, com a tendência de
massificar, que todos aprendem no mesmo ritmo e da mesma forma. As salas lotadas
inviabilizam a aproximação do professor e o conhecimento de seus alunos, dificultando assim
também, na estratégia de ensino. A falta de utilização do corpo como ferramenta para aprender,
também é outro ponto negativo existente nas instituições de ensino. Estou caminhando
primeiramente para essa rápida definição de nosso ensino, para poder chegar em um dos
maiores problemas encontrados pelos colaboradores. Estando em primeiro, suas dificuldades
causadas pelo TDAH, como já grifei anteriormente, a forma de ensino nas instituições foi e é
um grande obstáculo para os colaboradores aprenderem. A falta de didática, de amor pela
profissão e reconhecimento de sua importância, torna o ato de aprender e de conhecer dentro de
uma sala de aula cada vez mais difícil, fazendo com que cada vez mais alunos procurem
diferentes formas, aprendendo ou não, para concluírem seus cursos.
Ressalto, nessas linhas, falando sobre o ensino, pois foi algo presente em minha
pesquisa, nas falas dos colaboradores, quando o meu foco era a maneira em que eles aprendem,
sempre estava presente as dificuldades que eles tinham de aprender em sala de aula, mais do
que fora dela. Um dos colaboradores tinha grande dificuldade de ficar parado em sua mesa toda
a aula, tinha a necessidade de levantar, perguntar, debater, discutir e quase sempre que tentava
esse comportamento descrito, era intimidado pelo professor. Seu corpo pedia movimento, pedia
contato com o que estava aprendendo, mas não era ouvido pelo professor que o mandava sentar
ou se retirar de sala de aula. Seus questionamentos eram ignorados, mal respondidos ou o
professor fazia-o se sentir humilhado.
Felizmente, todas essas barreiras que acabo de citar não foram suficientes para
Alexandre desistir de aprender ou mesmo de estar presente nas instituições de ensino. Até hoje
busca novos cursos, está sempre se atualizando no que gosta de fazer e aprendendo cada vez
mais, dentro e fora de sala de aula. Pois, com o tempo, passando por difíceis barreiras para
aprender, com reprovações e até pensamentos negativos por parte de “todos”, buscou não se
92
intimidar e fraquejar, encarando todos os obstáculos como um desafio, de que era possível ser
alguém, de aprender, mostrar que seu jeito e comportamento diferente não era um obstáculo
para vencer na vida acadêmica e profissional. Pelo contrário que tinha e muito a contribuir.
Joana apesar de ser sempre considerada uma aluna “nota azul” ou como ela mesmo
falou, uma “aluna exemplo”, por causa de suas notas altas, também teve e ainda tem muitas
dificuldades nas instituições de ensino por conta do seu jeito “diferente” das suas amigas, de
não aceitar facilmente e rapidamente o que era imposto pelo outro, precisando de uma reflexão
e pela metodologia de ensino, que também não se adequava ao sua forma de aprender. Ao
contrário de Alexandre, Joana não teve reprovações por parte dos familiares e professores, por
sempre tirar notas altas, mas sua luta era consigo própria, para provar para si mesma que era
capaz de sempre permanecer a melhor em tudo o que fazia, como até hoje, tudo que faz é com
muita perfeição. O sacrifício é grande, até por que os sintomas do TDAH dificultam que atinja
esse nível que ela mesma exige e fala que sempre foi assim. Descrevo com sua próprias
palavras,
Acho que sempre exigi muito de mim, pelo fato de ninguém exigir. Minha família
nunca me elogiou pelas minhas notas, pela aluna que eu era. Então, procurei sempre
vencer para que um dia eles pudessem me elogiar. E até hoje faço muito, e sempre
procuro fazer muito bem feito, apesar de que para mim, sempre acho que poderia ficar
melhor. Então, tenho uma fome de aprender sem limites, sempre estou insatisfeita.
Acho que em cada obstáculo vencido busco minha satisfação, que nunca esta saciada.
Quando aprendo algo, já estou com outras duas idéias em busca.
Também, acho importante abordar sobre a nova cultura da aprendizagem, de que Pozo (2002,
p.25), dedica um livro inteiro para descrever. Assim suas palavras são:
Cada sociedade, cada cultura gera suas próprias formas de aprendizagem, sua cultura
da aprendizagem. Desse modo, a aprendizagem da cultura acaba por levar a uma
determinada cultura da aprendizagem. As atividades de aprendizagem devem ser
entendidas no contexto das demandas sociais que as geram.
Nossa sociedade gera uma aprendizagem que nada pode ser mais apreendida, tudo
tem que ser rapidamente esquecido para cada vez mais aprender novos saberes. Quero dizer
que a velocidade que as mudanças nas informações estão ocorrendo, as pessoas não mais se
preocupam em aprender determinada coisa, mas sim, se preocupam em saber de tudo um pouco
e esse saber, está em constante atualização, uma velocidade difícil de se obter qualidade no que
se aprende. Como comenta Pozo (2002, p.33) que nessa cultura da aprendizagem, na maioria
das vezes, “somos levados a correr quando mal sabemos andar”. Um conhecimento atropela o
outro, não dando tempo de um ser digerido o outro já esta sendo engolido.
Nesse contexto descrito, em que todos nós estamos inseridos, assim como meus
colaboradores, novamente surge a pergunta que vem me guiando em todo meu interesse por
esta pesquisa - como eles aprendem? Se é que aprendem? E como ultrapassam todas as
barreiras causadas pelos sintomas do Transtorno e por essa nova cultura da aprendizagem.
9
Este título foi escolhido por mim pela maneira, que mais me chamou a atenção, dos colaboradores
aprenderem. Como também o texto foi construído por mim a partir dos próprios relatos dos colaboradores e
familiares, sendo, portanto as idéias nele contidas reais, apenas expostas dentro de um contexto dissertativo.
95
Na década de 80, em uma escola católica muito tradicional, com muros altos e
cinza, com freiras circulando pelos corredores, estudava Joana uma aluna considerada difícil,
que sempre estava perguntando e questionando tudo e todos, não aceitava algo sem uma
explicação. Suas perguntas capciosas em relação ao conteúdo ou mesmo em relação ao
método que o professor utiliza causava um tumulto em sala e até mesmo na escola.
Uma menina “magrinha”, loira e de olhos azuis, sempre bem atentos a tudo que se
passava ao seu redor. Sua atenção não deixava nada passar, a fala do professor ao pássaro
que pousava na janela da sala, a moeda que caia no chão, a mosca que voava próximo, tudo ia
se passando e era difícil reter a atenção a uma delas só. Ficando mais tempo em seus próprios
pensamentos. Mas quando era algo do seu interesse, poderia jogar uma bomba do seu lado,
que seus olhos nem piscavam, sua atenção era total.
Na sala de aula, sentava bem na frente para que sua atenção não desviasse, já que
sabia que tinha uma grande facilidade de ficar no mundo da lua. Quando a aula terminava
corria atrás do professor para perguntar mais e tentava ficar o tempo que podia perto deste.
Seu jeito desatento fazia com que dificultasse em memorizar os nomes das pessoas e os
conteúdos das matérias que não gostava. Assim era preciso criar maneiras para driblar essa
dificuldade. Por sua inteligência incrível e uma enorme capacidade de criar, criou várias
maneiras de facilitar seu aprendizado na escola: códigos, desenhos, rimas, textos, imagens,
etc. Pois se fosse depender dos professores e do método da escola não teria aprendido nada
até hoje. Associava palavras e conteúdos que para você não tinham sentido a fatos e coisas
que tinham, para poder não esquecer. Nas leituras, sempre procurava ler o que não gostava,
alternando com uma leitura que gostava. E uma maneira estratégia que lhe ajudou muito no
seu aprendizado e na sua popularidade na escola foi ensinar os outros. Ela procurava
aprender o que não sabia para ensinar quem não sabia de uma melhor maneira, diferente da
do professor. Suas colegas quando tinham dúvidas, logo já sabiam a quem recorrer. E mesmo
sem saber da matéria, Joana aceitava como mais um desafio, estudava, associava, dava
significados, criava fórmulas e passava para os outros.
96
Joana foi crescendo e por ser muito inquieta e curiosa sempre aprendeu muito,
tendo como conseqüência uma boa classificação na sua escola. Nas disciplinas que não
gostava, procurava conversar, questionar, argumentar e ter uma aproximação maior com os
professores, pois para continuar tendo bolsa escolar não poderia tirar notas abaixo de 8,0.
Desta forma sempre se esforçou muito e sempre buscou caminhos que driblasse sua maneira
inquieta e desatenta no dia-a-dia.
As freiras da escola não gostavam, pois ela era diferente, muito inquieta, sempre
querendo descobrir tudo, gostava de “xeretar”, como elas mesmas falavam: “essa menina
xereta tudo”. Com o seu jeito impulsivo só desistia de algo quando os desafios terminavam e
lutava com todo seu desempenho para mostrar que muitas vezes o outro estava errado e quem
estava certa era ela. Algumas vezes sim, outras não, mas sempre era uma confusão em sala de
aula.
Joana não era a única da escola que deixava as freiras preocupadas, existia
Alexandre, um aluno inteligente, mas considerado um “demônio aprendiz”, graças à sua farta
criatividade e imaginação imensurável, que ele mal conseguia aplicar nas atividades
escolares. Para sofrimento dos professores não ficava parado, pois, não conseguia, andava
para um lado e para o outro. Mexia em tudo e todos que estavam quietos. Deixava os
professores loucos. Sentava na cadeira da sala, mas seus pés e braços não paravam e não
demorava muito seu corpo levantava, chamando a atenção de todos e levando muitas vezes o
professor a lhe retirar da aula, algo que muitas vezes foi desejado por ele, por não suportar
ser apenas um “receptor de informações”. Ele não queria, tentava ficar como os outros alunos
calmos, mas seu corpo não permitia:
Como é chato ficar horas sentado, ouvir o professor falando, sem poder falar ou fazer
nada. Não agüento, por que eu não posso estar no lugar dele, falando o que gosta e
ficar andando para um lado e para o outro ou pelo menos porque não posso emitir
minha opinião, ou porque a aula não pode ser fora de sala.
97
Para seu físico magro e pequeno era muito corajoso, pois sempre se metia em
brigas. Caso ocorresse alguma confusão e fosse por sua culpa ou não, Alexandre estava
presente. Os colegas já sabiam quem chamar para resolver algum problema. Ele era tido como
um líder, amado e odiado. Amado, pelo seu jeito diferente, criativo, corajoso e de sempre
buscar ajudar quem precisasse. Odiado, por não conseguir administrar sua impulsividade, seu
desejo de sempre buscar mais e mais motivos para estar em evidência, por não conseguir
“parar”, no momento de parar.
Os professores não sabiam o que fazer. – Esse menino não vai ficar quieto nunca?
Como fazer para que ele mude? Acho melhor expulsa-lo. Mas nunca conseguiram realizar essa
vontade, por outras características que também sobressaiam, como a de liderança.
Sua desatenção também era bem saliente, prejudicando em suas leituras. – “Eu
não consigo aprender lendo, eu aprendo vivenciando, tocando, sentindo”. Uma de suas
“peraltices” congelou um gato por dez minutos, para compreender a temperatura do corpo.
Noutra pulou da arvore, quando estudava a lei da gravidade. Desta forma Alexandre sempre
que possível tentava transformar o que era teórico em prática, o que ouvia dos professores em
sala de aula tentava relacionar a algo vivencial. Mas nem sempre dava, as aulas e os textos
muitas vezes não tinham sentido para ele, então na maioria das vezes suas notas foram baixas,
ficando sempre de recuperação. Chegando a reprovar uma vez.
Apesar das notas baixas, sua inteligência surpreendia a todos, sua forma de
dialogar e contrapor os professores era de um verdadeiro gênio, que sempre tem respostas
para tudo. Muitas vezes deixando-os sem resposta.
98
Partindo desse texto que foi escrito a partir dos relatos dos próprios sujeitos, surgiu
a primeira análise em relação às estratégias, que todos nós temos algumas dificuldades para
adquirir habilidades que gostaríamos de dominar, também dificuldades em controlar e mudar
nossas emoções ou mesmo nossos hábitos de conduta e atitudes. Quantas vezes tivemos
dificuldades em recordar uma informação que deveríamos saber. Decorar fórmulas de física ou
mesmo lembrar do nome de alguém que você sabe que conhece. Como também dificuldade em
aprender algo sem menor significado dentro de uma sala de aula. Possivelmente várias vezes. E
possivelmente você pensou em maneiras de não se repetir mais esse erro, mas como? Com as
pessoas que têm o Transtorno de déficit de atenção esses comportamentos são mais repetitivos
e mais intensos por conta dos sintomas, prejudicando não só na aprendizagem como em vários
setores de suas vidas. Por conta dos sintomas que o transtorno ocasiona, principalmente a
desatenção, impulsividade e a hiperatividade mental dificulta ainda mais aprender. No caso
particular de Joana e Alexandre tendo a desatenção como forte inimiga no seu caminhar
estudantil e profissional.
Cada vez mais existe a oferta de atividades para aprender a aprender e aprender a
pensar. Cada vez mais as pessoas estão procurando formas de aprender melhor ou de forma
mais eficaz. Mas mesmo assim, cada vez mais aparecem aprendizes com dificuldade em
aprender. O problema está nos cenários de aprendizagem e instruções que muitas vezes não são
pensados, levando em conta as características dos aprendizes e mesmo de seus educadores
(POZO, 2002; VALDÉS, 2003; ZABALZA, 2004; ALVES, 2005). Sendo este cenário de
aprendizagem outro ponto que não posso fugir e deixar de falar, apesar de não caber neste
trabalho uma discussão mais extensa acerca dessa falácia, preciso expor às principais queixas
dos meus colaboradores, como esta, também uma das principais causas para dificultar suas
formas de aprender.
ocorrências de insucessos dos alunos nas disciplinas seriam menores e com certeza teriam uma
aprendizagem mais significativa.
Primeiramente, para iniciar essa caminhada, seguramente, nas trilhas corretas das
estratégias de aprendizagem, busquei a definição da palavra estratégia, que no Aurélio tinha a
seguinte: “arte de aplicar os meios disponíveis ou explorar condições favoráveis com vista a
objetivos específicos” (p.232). Muitas pessoas utilizam esta palavra “estratégia” para
caracterizar algo que foi planejado para atingir um fim. Trazendo estratégia para dentro da
proposta de aprendizagem, que é meu interesse nessa pesquisa. Valdés (2003), delineia
pensamento estratégico como a capacidade de buscar diferentes vias para atingir um objetivo
de aprendizagem.
Também, acho relutante expor uma das minhas dificuldades no início dessa
pesquisa, foi o entendimento de como adquirir as estratégias de aprendizagem, ressaltando essa
importância para compreensão de como meus colaboradores evoluíram em suas estratégias.
Uma das questões surgidas eram se as estratégias utilizadas pelos meus colaboradores foram
ensinadas ou criadas pelas suas próprias necessidades. Essas questões surgiram pelo fato das
estratégias de aprendizagem normalmente são vistas na literatura se referindo ao
ensino/aprendizagem, onde os professores vão auxiliar seus alunos a aprender a utilizar
estratégias para melhor aprender, ou seja, ensinar a aprender a aprender. Na minha
compreensão e análise, no caso dos colaboradores, Joana e Alexandre não tiveram ajuda de
seus professores, seus conhecimentos a respeito de estratégias foram advindos de suas
necessidades em aprender, de suas próprias necessidades de atingir os objetivos acadêmicos:
conclusões de cursos e diplomas, e pelo prazer de conhecer e aprender. Ficando posteriormente,
claro para mim esta questão específica, prosseguindo meu percurso com mais segurança.
De acordo com Borges (2005), existem vários tipos de estratégias, podendo uma
pessoa utilizar várias para aprender. “Algumas estratégias podem nos ajudar a relembrar, mas
oferece pouca ajuda à nossa compreensão. Contrariamente, outras estratégias favorecem nossa
compreensão, mas são de pouca ajuda para a memorização” (p.37). Para saber qual melhor
estratégia ou estratégias para determinada situação, utilizamos nossa metacognição, que vou
estar explanando mais profundamente adiante, reservando uma seção só para esse assunto.
maneiras de aprender. Ao longo do tempo essa capacidade vai melhorando, à medida que novas
experiências são incorporadas e interligadas, e o sujeito perceber quais são as estratégias mais
adequadas a cada situação de aprendizagem.
Tardif (1992) defende que quanto mais o sujeito organiza os conhecimentos, maior
probabilidade ela terá de poder associar as novas informações de forma significativa e reutilizá-
las funcionalmente.
Iniciando pelas estratégias cognitivas, Pozo (in COLL, 1996, p.53), ressalva que,
elas “governam o próprio comportamento do sujeito que aprende; são capacidades
internamente organizadas, que servem para guiar e dirigir a atenção, a codificação, o
armazenamento, a recuperação e transferência”. E ainda com as palavras do mesmo autor,
diferencia estratégias cognitivas de habilidade, de forma que, “aprender uma regra é uma
habilidade intelectual; aprender a aprender regras é uma estratégia cognitiva”(idem, p.53).
De acordo com Pozo (in COLL, 1996), dentro dos tipos das estratégias cognitivas
encontramos as aprendizagens associativas e as de reestruturação. A aprendizagem associativa
“está relacionada com aquelas estratégias que incrementam a probabilidade de recordar
literalmente a informação, sem introduzir alterações estruturais na mesma” (p.183). Dentre as
estratégias associativas a mais simples é o repassamento ou repetição, que tem como
103
habilidades: repetir, destacar, copiar, sublinhar, etc. Segundo o mesmo autor a eficácia das
estratégias associativas só ocorrerá sempre que a tarefa for meramente reprodutiva. No caso de
tarefas produtivas, este tipo de estratégia é ineficaz, sendo necessárias as estratégias de
reestruturação.
Foi observado nos relatos e na maneira de agir no dia-a-dia dos participantes vários
tipos de estratégias cognitivas, algumas associativas, outras de restruturação, sendo muito mais
presente e visível as segundas, como as palavras-chaves que utilizavam que facilitava pelo fato
do aprendiz associar e estabelecer um elo verbal entre duas palavras que devem ser associadas,
mas que não têm uma relação significativa entre si. O mesmo acontecia com a imagem. Outros
tipos destacados como facilitadores, alguns já citados no parágrafo anterior como exemplo de
Joana, foram: as rimas, as músicas, desenhos, as frases e códigos também muito utilizadas por
eles.
Ainda podemos falar das estratégias de apoio, que são aquelas que ajudam na
eficácia da aprendizagem, aumentando a motivação, a atenção, a concentração, a auto-estima
etc.
104
Cada tipo de aprendizagem está vinculado a uma série de estratégias que são
próprios do sujeito. Cada participante da pesquisa tinha suas formas individuais de aprender.
Por isso que nesse estudo não pretendo estar modulando uma forma ou técnica certa de
aprender, visto que cada sujeito tem sua própria forma. O que pretendo mostrar e analisar são
as possibilidades desses sujeitos de aprenderem e se destacarem nessa área. Assim destacarei as
estratégias mais utilizadas pelos colaboradores, teorizando de forma que possa compreender o
processo de aprendizagem de cada um.
Falando de motivação e atenção, dedico um espaço, mais adiante, para falar sobre a
atenção e a criatividade dos colaboradores já que são dois pontos que andaram juntos na vida
dos colaboradores da pesquisa.
Dedico esta seção, a partir de uma vasta pesquisa em artigos e livros, para uma
melhor clareza do conceito de metacognição10, pois, no que foi observado dos sujeitos da
pesquisa, eles se utilizaram também das estratégias metacognitivas para poderem aprender, e
assim, para driblar suas dificuldades de aprender. Primeiro, tenho que definir que
metaconhecimento ou também chamado de metacognição é a capacidade do sujeito de pensar
sobre sua atuação (BORUCHOVITCH, 1999; VALDÉS, 2003). Conhecimento que o sujeito
tem sobre como eles percebem, pensam, relembram e agem. Ou seja, é o que eles sabem sobre
o que eles sabem (FLAVELL, 1979; 1996; MATURANO, 2002; RIBEIRO, 2003). E as
estratégias metacognitivas são os procedimentos utilizados para planejar, regular e monitorar o
próprio pensamento (DEMBO, 1994 in BORUCHOVITCH, 1999).
Diferente da função das estratégias cognitivas, que são destinadas a levar o sujeito a
um objetivo cognitivo, as estratégias metacognitivas propõem avaliar a eficácia das primeiras.
10
A palavra metacognição, etimologicamente significa para além da cognição, com outras palavras, a
faculdade de conhecer o próprio ato de conhecer.
105
Para que um aprendiz tenha eficácia na aprendizagem não basta que tenha
experiência e nível intelectual, que conheça estratégias de aprendizagem, mas também ter o
conhecimento sobre quando e como utilizá-las, sobre sua eficácia e oportunidade, sobre sua
utilidade, como também saber dirigir a compreensão, de planificar e de avaliar o que foi
aprendido, que segundo Flavell (1979) dá-se o nome de metacognição. De acordo com o
referido autor, o introdutor do termo na psicologia, desde 1970, o desenvolvimento da
metacognição tem grandes resultados eficazes na aprendizagem.
Tanto Alexandre quanto Joana tiveram consciência de suas dificuldades para atingir
determinados objetivos no processo de aprender e como aprendizes ativos nesse processo,
construíram diversas maneiras de suprir as necessidades, de forma que não afetasse no
progresso de aprender e sim tendo como resultado uma aprendizagem significativa, assim,
duradoura.
106
Como comenta Ribeiro (2003), que o conhecimento que o aprendiz tem sobre o que
sabe e o que não sabe e dos processos do seu conhecimento, parece ser fundamental, para a
utilização de estratégias de aprendizagem, pois tal conhecimento auxilia o sujeito a decidir qual
e quando utilizar determinadas estratégias. Tendo como conseqüência disto, uma melhoria no
desempenho estudantil.
107
Mesmo com inconstância na atenção, de conseguir ficar por muito tempo fazendo a
mesma atividade, Alexandre não desistiu de ler, ressalto novamente a leitura, pois era algo que
gostava de fazer, mas tinha dificuldades. Além da estratégia da exploração, com o
conhecimento de sua dificuldade, intercalava a leitura com outras atividades. No momento que
estava lendo, para não saturar sua atenção, procurava a cada poucos minutos fazer outra coisa,
como: comer, beber água, ir ao banheiro, ouvir música, desenhar, escrever e até intercalar com
outras leituras. Sobre esse assunto vou estar ampliando mais em seguida quando falarei da
leitura e escrita dos colaboradores.
108
Nesta seção vou estar falando dos tipos de aprendizagem utilizados pelos sujeitos
da pesquisa em suas trajetórias estudantis. Pois diante de todos os sucessos e estratégias
existem, como algumas estratégias, os tipos de aprendizagem que mais eles utilizaram para
melhor aprender, driblando as dificuldades da mesma. Os enfoques comentados logo adiante
proporcionam diferentes teorias de aprendizagem. Também aparecem muitas alternativas
teóricas, inclusive dentro do mesmo enfoque. Tento desta forma, fazer uma costura entre elas
para mapear a aprendizagem de Alexandre e Joana.
Também pude perceber e aprender como um dos frutos desta pesquisa que, cada
aluno tem suas maneiras de aprender particular, e como resultados dessas maneiras serem
diversos. Mesmo alunos com capacidades intelectuais idênticas podem ter diferentes níveis de
realização escolar devido à forma como cada um atua sobre os seus próprios processos de
aprendizagem. Por isso o que vou apresentar a seguir não são formas de melhor aprender para
todos, como uma forma solidificada, como já incitei anteriormente, não é uma receita
congelada, ao contrário são as formas que dois sujeitos utilizaram e utilizam para melhor
aprender, podendo ser adaptada ou modificada de acordo com suas necessidades. Ou seja, essas
maneiras que ilustro a seguir podem ou não também ser uma melhor forma de você aprender.
Introduzo este texto com o nome, “a arte de aprender”, pois tomando emprestado o
significado de arte segundo o dicionário Aurélio (1993), é a capacidade que tem o homem de
(...), por em prática uma idéia, habilidade; engenho. Apesar, que uma definição precisa e única
sobre arte é, ainda, inviável, de acordo com Herbert Read (2001), autor do livro Educação pela
Arte. Na sua opinião, a definição de arte é um conceito indefinível. O autor fala que a arte está
em todos os lugares, não sendo algo, como algumas pessoas pensam, que apenas encontramos
109
nos museus e nas galerias de artes. Como o mesmo deixa claro em suas palavras, “a arte, seja lá
como a definimos, está presente em tudo que fazemos para satisfazer nossos sentidos” (READ,
2001, p.16). Em suas discussões, arte e “forma” tem o mesmo significado. A arte é a forma que
o indivíduo criou. Como mesmo explica:
A obra de arte “assume” sua forma, mas, na verdade, a forma lhe é atribuída por uma
determinada pessoa, que é chamada de artista; e lembremos que um artista não é
apenas um homem que pinta quadros, mas também um homem que faz música, poesia
ou móveis – e até mesmo sapatos e roupas. Existem todos os tipos e graus de artistas,
mas sempre se trata de pessoas que dão forma a algo (idem, p.17).
E aprender é tomar conhecimento de algo; retê-lo. Desta forma, vejo que saber
aprender também é arte, não é fácil, não é igual, não é uma forma única, não é receita, não é
rígido. Quem sabe aprender a aprender, quem cria suas próprias estratégias e maneiras de
aprender, na minha opinião, também é um artista, pois eles – os colaboradores para aprenderem
nos cursos, no colégio, na faculdade e fora dela, encontraram a sua “forma” de aprender. Uma
forma que é possível ser transmitida, só não é possível virar receita para todos. Pois, como os
artistas têm sua forma de criar, as pessoas têm sua forma de aprender. Podendo algumas
técnicas, ou mesmo, maneiras coincidir.
Assim, diante de toda essa explicação, venho tentando traduzir o meu olhar para a
aprendizagem dos meus colaboradores, considerados artistas-aprendiz, não apenas por
pintarem, escreverem poemas, criarem artes, fazerem comidas maravilhosas, tocarem, mas
principalmente por suas maneiras de aprender. Utilizando as palavras de Alexandre, de que
aprender pode ser, “a capacidade que o indivíduo tem de por em prática uma idéia, idéia que
perpassa seu corpo e mente e após entranhadas nele é impossível não retê-las”. Assim, para
aprender algo é preciso sentir esse algo, é preciso que seu corpo e sua mente mergulhem nesse
algo, como seu corpo e mente mergulha uma piscina em um dia ensolarado, deixando que as
águas tomem conta dele como um todo, ao mesmo tempo em que ele todo toma conta que essas
mesmas águas não o afoguem. E apenas o prazer permaneça nessa relação.
110
Existe uma vitalidade, uma força vital, uma energia, uma vivacidade que é traduzida
em ação por seu intermédio, e como em todos os tempos só existiu uma pessoa como
você, essa expressão é única. Se você a bloquear, ela jamais voltará a se manifestar
por intermédio de qualquer outra pessoa, e se perderá. ( Martha Graham).
Inicio o texto falando de criatividade uma característica que todo mundo quer ter
um pouco ou muito. Um assunto que para mim, muito prazeroso de falar, principalmente
quando este envolve a criatividade de Alexandre e Joana, algo que me fascinou e me mostrou
diferentes caminhos de se viver com qualidade e construtivamente. Dois sujeitos super criativos
em suas maneiras de viver e de aprender. Mesmo na correria do dia-a-dia, nas complicações e
problemas existentes, buscam sempre, de todas as formas dar colorido e sabor. Como define
Lima (2005), quando fala de pessoas com TDAH, “a criatividade é um dos maiores bens desses
adultos”(p.108), ainda continuando com as palavras do referido autor que ressalta:
Seu cérebro desatento e impulsivo lhes prega peças, mas também lhes presenteia com
curiosidade e inquietude necessárias para que povoem o mundo com suas obras. É por
isso que se costuma considerar alta a concentração de TDA/H’s no meio artístico: lá,
111
eles estariam liberados para criar sem as exigências de organização tão difíceis de
serem cumpridas (idem, p.108).
Foi assim que eles, Joana e Alexandre terminaram o nível superior e é desta forma
que continuam aprendendo. Juntamente com seu caderno, os pesquisados muitas vezes
conseguiram fugir da sala de aula tediosa e tradicional e ir para um lugar onde poderiam criar
suas possibilidades de liberdade de aprender. Ressalto que ambos não tinham somente um
talento criador, mas a criação fazia parte de suas vidas. Segundo alguns teóricos (AUSUBEL,
1980; ROGERS, 1997), um único indivíduo pode possuir sim mais de um talento criador.
Também, este talento não está restrita a um determinado conteúdo, disciplina ou área. Como
prova minha colaboradora Joana, em seu comportamento criativo do dia-a-dia. Seu talento
criador está em várias áreas, tem um talento para escrever (criar histórias, poesias, textos), nas
112
artes, na cozinha e em outros ramos, diz que em tudo coloca seu toque de criação, de inovação.
Na escola, sempre procura criar diferentes artes de decoração, criar novas maneiras das
crianças terem cada vez mais aprendizagens significativas, também muitos textos para os pais.
Como também, Alexandre, que toca maravilhosamente bem violão e bateria, escreve textos
gostosos e fáceis de serem lidos, e ainda pinta telas. Mas, não são apenas essas criações que
existem em suas vidas. Em quase tudo que fazem, existe um toque criativo, diferente. Como já
falei anteriormente, muitas de suas formas de aprender, também são resultados de suas
criatividades.
Assim, dou continuidade a meu texto sobre criatividade, dizendo que a realização
criativa, segundo Ausubel (1980, p.488) “reflete uma capacidade rara para o desenvolvimento
de discernimentos, sensibilidades e avaliações numa área circunscrita de conteúdo de atividade
intelectual ou artística”. De acordo com Rogers (1997, p.405), “os resultados devem ser novas
construções (...). A criatividade tem sempre a marca do indivíduo sobre o produto, mas o
produto não é o indivíduo, nem os seus materiais, mas o resultado da sua relação”. Por isso é
que em suas criações – de Alexandre e Joana é que estão suas marcas.
que cada pessoa tem diferentes níveis de ritmo de aprender e de conhecimento. Dificultando
muito o aprendizado destes.
É importante que o professor olhe para cada caso como um caso particular,
diferente, pois cada turma, cada pessoa têm suas individualidades, tem seu jeito de aprender.
Esta foi outra dificuldade que os colaboradores tiveram que ultrapassar para poder aprender - a
“forma” de ensino nas instituições e não só as dificuldades que transtorno causa. Não vou
demorar falando da forma de ensino, apesar de que no meu estudo sobre aprendizagem existe
uma ligação entre eles, já que estou falando de aprendizagem de alunos ou de pessoas que
aprendem. A forma que os professores trabalham dentro das salas de aula, suas didáticas são
muito, ainda, massificadora, dando muita ênfase, apenas uma opção de aprender ou posso dizer
não aprender, a memorização ou “decoreba”. Um ensino onde os aprendizes ficam sentados
enfileirados em uma sala, praticamente que escutando do que debatendo ou discutindo. Alunos
que têm dificuldade em aprender desta forma não são vistos como “normais”, são vistos como
alunos que não querem aprender, que não querem estar em sala de aula. E quando a criatividade
dos alunos transbordam em seus trabalhos de pesquisa, em suas aulas teóricas. Muitos
professores não aceitam como algo científico ou mesmo correto.
Novamente, retomando Rogers (idem, p.404), não é apenas na educação que existe
a escassez de criatividade ou falta de estímulos.
Existem crianças, adolescentes e adultos que procuram praticar algo que tem que
ser aprendido. Muitas vezes não sabem nem por que estão praticando ou querem aprender
aquilo. Depois de um tempo de tanto praticar conseguem atingir a performance desejada ou
não, conseguem atingir uma aversão à prática daquela atividade. Por isso que existem muitas
crianças que odeiam literatura, matemática, tocar piano. A prática é bastante importante para a
aprendizagem, mas o amor pelo que está fazendo, a falta de cobrança no momento certo, a
fluidez e a liberdade de poder criar são muito mais (NACHMANOVITCH, 1993). Para que as
pessoas possam criar, possam sentir prazer no que está fazendo, é preciso existir um espaço, um
momento para que elas sintam e percebam esses sentimentos. Se em uma determinada atividade
somente existir pressão, cobranças e nenhum interesse pessoal, também existira aversão e
pavor. Para ocorrer a aprendizagem é preciso existir algum tipo de identificação ou propósito
com o que está aprendendo. Como na vida estudantil de Alexandre, não conseguia fazer nada
se fosse muito cobrado ou pressionado, e se caso o fizesse não sairia bem feito. No momento de
suas criações, que fluem naturalmente, não pode existir pressão. Diz que na universidade
muitos professores pressionavam para que ele tivesse uma “forma”. Forma esta igual a dos
outros alunos, mas era impossível, pois ele não se via igual aos outros e não conseguia aprender
com a forma imposta.
115
Alexandre buscou uma saída para tipos de atividades ou disciplina que não gostava.
Buscou de várias maneiras ou possibilidades de entender ou até mesmo gostar, olhar de forma
diferente para esse determinado assunto ou disciplina, pois de acordo Nachmanovitch (1993), o
exercício se torna chato ou interessante dependendo da forma como o percebemos. Depois de
compreendido esqueceu das críticas e dos julgamentos dos outros e de si mesmo e começou a
desenvolver, no caso sua escrita, que tinha muita dificuldade, pois sempre se preocupava muito
com a forma técnica de escrever. Depois com os olhos da crítica fechados e o do coração e da
intuição abertos, pode verificar e julgar. Podendo neste momento fazer as correções
necessárias. Quando tocava bateria e construía seus ritmos agia dessa forma e sempre criou e
teve sucesso, então passou a agir em outras atividades de sua vida.
116
No caso do adulto com TDAH dificulta aprender, determinados assuntos, por conta
do transtorno na atenção ou como compreende Silva (2003), dificuldade na atenção. Assuntos
estes, que não são do seu grande interesse. E é nesse caminho que pretendo seguir nas próximas
linhas. Se o adulto com TDAH tem dificuldade de reter atenção em um determinado assunto
que não seja do seu grande interesse, como ele aprende na instituição de ensino? Já que faz-se
necessário cursar várias disciplinas para a conclusão de um curso, como também diferentes
conteúdos.
Com certeza nem todos os conteúdos e disciplinas agradam a todos, sempre existem
alguns que cursamos por fazer parte da grade curricular obrigatória. De acordo com Pozo
(2002, p.148), “Nem todos os estímulos e informações chamam a atenção igualmente”. Para
esse autor as pessoas têm o costume de dar mais atenção à informação que consideram
interessante, a que tem a ver com sua motivação. Por isso muitas vezes prestamos atenção ao
117
sapato do professor e não na aula, ou no barulho que está fora da sala de aula e não no livro ou
na matéria. Principalmente nos dias de hoje, em que a sociedade nos bombardeia de
informações de todos os lados, a todo o momento, tantas informações competindo por nossa
atenção, o que podemos fazer é nos inclinar para aquelas informações que mais nos chamam
atenção. Como descreve o autor supracitado,
No caso do adulto com TDAH, a atenção seletiva fica mais restrita ao mesmo
tempo em que a mente funciona mais rapidamente. Os recursos cognitivos não só são limitados
em cada momento, em cada instante do processamento, como também o são através do tempo.
Se caso forçarmos muito a atenção durante um tempo contínuo, os recursos acabam, pois se
esgotam. É por isso da dificuldade do professor manter a atenção contínua dos alunos em uma
aula. Para isso, exige-se que o professor seja bastante criativo e conhecedor de seus alunos para
saber que estratégias utilizar para captar a atenção dos seus aprendizes.
E por que falo de atenção e criatividade? É pelo fato de terem uma relação
importante, uma podendo ajudar na outra. O indivíduo com TDAH tem problemas na atenção,
desviando-a rapidamente de uma coisa para outra a todo instante, mas em contrapartida tem um
potencial enorme em criar. Assim, grifo que quando o adulto com TDAH sabe usar de sua
energia criativa para crescimento pessoal e profissional, ele pode se sobressair perante os
outros, por sua dedicação, competência e principalmente criatividade. A mente deles não param
e por isso eles sempre estão pensando, criando, tendo novas idéias. E quando a atividade é de
seu interesse sua atenção é maior que a normal, posso dizer ela é redobrada.
A criatividade ainda não é tão valorizada no meio acadêmico, sendo ainda muito
voltada a atenção para a apreensão do conteúdo passado e a nota final do aluno, deixando
muitos alunos super criativos passarem por maus alunos. Sujeitos criativos na arte, na literatura,
na ciência ou em outras áreas são mais inteligentes do que os sujeitos não criativos. De acordo
com Ausubel (1980) indivíduos criativos são mais inteligentes que indivíduos não criativos,
sendo mais comum em nossa cultura encontrarmos pessoas muito inteligentes, bem sucedidas
profissionalmente, mas que nunca geraram uma idéia original. Não querendo dizer que seres
muito inteligentes não são criativos, mas que seres criativos na maioria são muito inteligentes.
Mas, apesar disso não temos como medir o grau de criatividade de um indivíduo (ROGERS,
1997).
Segundo o teórico Ausubel (1980), autor de uma das mais conhecidas teorias sobre
a aprendizagem significativa, a aprendizagem tanto pode ser significativa como mecânica, ou
seja, a aprendizagem se situará entre esses dois pólos, pois estes não podem ser dicotomizados.
Ausubel (1980), defende que toda aprendizagem precisa ter um significado para o aluno. Ele
associa a nova informação ou habilidade com o que já sabe, dando-lhe um lugar dentro de um
todo mais amplo (AUSUBEL, 1980; VASCONCELOS, 2003). “A conseqüência disto”, conclui
11
Grande teórico que iniciou a proposta do ensino centrado no estudante.
119
(ABREU, 1990, p.10), “é que o aluno se capacita, então, a aplicar o que foi aprendido em
determinada situação a uma variedade de situações semelhantes, o que chamamos de
transferência de aprendizagem”.
Quando o texto era de pouco interesse e não era imposto como algo fundamental
para dar continuidade em suas atividades era deixado de lado ou dedicado pouco esforço para
ler e compreender. Por isso, foi verificado em Alexandre, a presença, algumas vezes de notas
baixas ou na média, pela falta de interesse no assunto em questão, precisando apenas atingir a
média ou o mínimo para concluir, tendo como resultado o não aprendizado. E para aprender
algo inicialmente insignificante, muitas vezes obrigatoriamente, eles davam significado ao
insignificante ao desinteressante, pois só assim conseguiriam ir adiante, para atingir o objetivo.
De acordo com Ausubel (1980), quando a atividade de aprendizagem não é familiar, “a
descoberta autônomia provavelmente aumenta o significado intuitivo intensificando e
personalizando tanto a concretude da experiência como as operações reais de abstrair e
generalizar dos dados empíricos”(p.440).
De acordo com Rogers (1997), o aluno somente está realmente interessado nas
aprendizagens que tenham uma influência significativa sobre seu comportamento. Para o
referido autor aprendizagem significativa é “aquela que provoca uma modificação, quer seja no
comportamento do indivíduo, na orientação da ação futura que escolhe ou nas suas atitudes e na
sua personalidade” (p.322). Diz que é uma aprendizagem que “combina o lógico e o intuitivo, o
121
Não consigo aprender só lendo e lendo, muitas vezes é preciso ver algo, que consigo
associar. O que acho bastante eficaz no meu caso é experienciar, vivenciar o que
estou estudando. Se for possível preciso tocar, sentir, ver e ouvir o que estou
122
aprendendo, principalmente se for algo que não me interessa, ai é que tenho que
buscar todos os recursos e bastante tempo. (Alexandre).
Outra maneira deles tarem aprendendo algo insignificante era conhecendo este algo
de perto. A necessidade da utilização dos sentidos como maneiras de aprender até o que não
interessava, dando desta forma um pouco de interesse ou curiosidade a algo que inicialmente
não tinha nenhum atrativo. Rogers (1997), Acredita que “o único aprendizado que influencia
significativamente o comportamento é o aprendizado autodescoberto, auto-apropriado” (idem,
p.318). Também uma outra maneira de aprender é confessar as próprias dúvidas, tentar
esclarecê-las, tendo como objetivo compreender melhor o significado real de sua experiência.
Precisava associar algo que não era do meu interesse a alguma figura ou mesmo criar
rimas e músicas, eu era forte em criar. Até hoje tudo que leio ou vejo e que tenho
dificuldade em aprender, eu associo a alguma imagem ou mesmo tento escrever da
minha forma associando a minhas vivências. (Joana).
O referido teórico (DEWEY, 1971) defende que na escola não devemos encontrar
crianças rigidamente sentadas em salas de aulas em todo o período escolar. Devemos encontrar
um lugar onde as crianças possam viver e trabalhar as disciplinas que serão ofertadas. Trabalho
que as crianças possam experienciar e viver o que faz parte do seu meio social. A educação
deve ser para educar as crianças para vida. Como também a escola deve oferecer para as
crianças a oportunidade de fazer atividades diárias ou de “aprender fazendo”, aprender por
experiência. Desta forma as crianças aprendem a pensar ou aprendem a aprender.
Assim, são propostas atividades que estão presentes em suas vidas, que já são
familiares e não atividades que não têm nenhum vínculo ou relação com seu meio. As
atividades também variam de acordo com a faixa etária, podendo ser proposta atividades
domésticas, de marcenaria, jardinagem, pesquisas científicas, anatomia, eletromagnetismo,
124
economia política, fotografia e outras. Também existe diferenciação nos horários, não existindo
horários segmentados para abordar as diferentes disciplinas (BELTRÁN, 2003).
Portanto, Dewey (1971), defende uma educação em que os educandos vão à escola
para fazer e agir e não somente para teorizar. Que não exista ensino direto das disciplinas, mas
um processo de descobertas, experimentação (por tentativa e erro) e indagação e
questionamentos. Algumas escolas já trabalham com a aprendizagem pela experiência, muito
fácil de ser vista em escolas de Educação infantil. Mas, na opinião, de Dewey (1971), alguns
tipos de experiências que são empregados nas escolas, são em grande parte, erradas. Também
outros teóricos defendem este tipo de aprendizagem, como Rogers (1985), que propõe a
existência na escola de uma aprendizagem significativa e experiencial. O aprendiz é o sujeito
ativo de sua própria aprendizagem.
É importante que o educador valorize a experiência que seus alunos já têm, pois é o
ponto de partida para outras aprendizagens. Pelos relatos de meus colaboradores foi fácil
perceber a experiência como forma de aprenderem. Tanto a experiência que já tinham
previamente ao conteúdo, como experienciar este conteúdo foram importantes para que
ocorresse a aprendizagem. Nas palavras de Alexandre era bem evidente essa necessidade:
com animais e objetos, mas sentar em uma cadeira e passar horas estudando foi algo difícil de
ser visto ele fazer. Lia, relia, mas no final, para aprender, tinha que passar para prática, para
experienciação, visto esse comportamento até hoje no trabalho, quando prefere fazer a mandar,
quando vai ao local questionar, entrevistar, refletir do que ficar atrás de uma mesa apenas com
descrições em papéis.
Mas é importante também saber trabalhar com a proposta da experiência, não basta
oferecer atividades do tipo que gere somente experiência, pois de acordo com Dewey (1971),
nem todas experiências são educativas e genuínas, podendo existir também experiências
“deseducativas”. Sendo estas últimas as que produzem um efeito de destorcer ou parar o
crescimento para outras experiências posteriores. As experiências deseducativas pode também
habituar o aluno a um só caminho, a uma única atividade automática, fechando-lhe outros
caminhos a novas experiências. O resultado vai depender da qualidade da experiência que o
aprendiz vivencia.
Preciso ler muito para aprender sobre e trabalhar com crianças, pois
existem muitas teorias que ajudam nessa compreensão, como também,
cada dia que passa aparecem mais mudanças e problemas para tratar e
darmos uma vida melhor para elas. Mas, o que me faz aprender mais do
que as próprias leituras, realmente, é a interação que tenho com elas, é o
convívio, a observação, a escuta. Digo que, a primeira me dar uma base,
uma abertura, um conhecer. A Segunda, me faz aprender, transformar,
pois é onde sinto, toco, experiencio e consigo dar significado às leituras.
Assim, falando de sentir, experienciar, perceber, tocar, vivenciar, acredito que para
toda essa experiência é preciso algo mais, preciso utilizar os sentidos, estes têm que estar
educados a sentirem, perceberem, a seguir a bordo a aprendizagem pelos sentidos.
De acordo com o poema de Fernando Pessoa, que utilizo para caracterizar alguns
dos comportamentos de Alexandre e Joana, pois, estes, posso dizer que são guardadores de
127
rebanhos, rebanhos que são sonhos, pensamentos, sonhos que são postos muito em realidades
ou pelo menos tentados a existir, sentir, viver. Outros, ficam apenas no imaginário, de forma
que dá um colorido no real. Esta, foi uma das características que mais me chamou a atenção, a
sensibilidade que eles demonstram em viver, em apreciar o que a vida nos proporciona, no que
está ao seu redor. Tudo ou quase tudo era percebido, nada passava despercebido e logo tudo era
esquecido, ficando registrado de múltiplas formas. Em relação esses registros e expressões de
múltiplas formas, dedico uma seção, mais adiante, só para descrever todas elas.
Diante do que observei, posso dizer que sentir não é o mesmo que tocar; olhar não é
o mesmo que ver; ouvir não é o mesmo que escutar. De acordo com o dicionário da língua
portuguesa Aurélio (1993), ver significa: conhecer, examinar, investigar, perceber, sentir. Já
olhar significa fitar os olhos. Laplantine (2004), descreve o significado de ver e olhar de forma
contrária. Olhar, nos mostra detalhes do nosso cotidiano e torna familiar o que era estranho
inicialmente. É com ele que captamos os mais minuciosos detalhes das coisas e
acontecimentos, como, os ruídos, os gestos das pessoas, o silêncio, os suspiros. Mas, o que
estou querendo dizer, é que realmente existe uma diferença qualitativa entre essas palavras.
Para mim, o que significa realmente cada uma não é o que importa e sim saber sentir e perceber
as coisas de forma mais sensível, de forma que realmente consiga perceber, ser sensível ao que
esta ao seu redor. Assim, que pode observar na forma de sentir e viver de Joana e Alexandre.
Inspirada pela criatividade dos meus sujeitos, que está presente em quase tudo
realizado por eles, trago a escrita de Rubem Alves (2005), tirada do seu livro Educação dos
sentidos, também repleta de criatividade, fala que poesia, música, pintura, escultura, dança,
teatro, culinária, são artes que são inventadas para que o corpo encontre felicidade, ainda que,
como comenta Guimarães Rosa (in ALVES, idem) em breves momentos de distração. Dedico
este item, aqui presente, para falar da sensibilidade dos sentidos, da utilização do corpo e do
movimento para estarem aprendendo e sentindo o seu mundo externo. Pegando carona de
Guimarães Rosa nas linhas supracitadas, digo que é muito próximo ao comportamento dos
meus sujeitos da pesquisa, seus momentos de construção são momentos de muito prazer e
128
distração, onde possam representar, dar sentido ao que não tem sentido, se colocar e
principalmente ser livre de todas as barreiras que existem em suas vidas.
O que me conduz de volta às palavras de Fernando Pessoa (2002), quando este diz
em seu poema:
Por que é que ver e ouvir seria iludirmo-nos. Se ver e ouvir são ver e ouvir?
129
O essencial é saber ver. Saber ver sem estar a pensar, saber ver quando se vê, e nem
pensar quando se vê, nem ver quando se pensa.
Mas isso (triste de nós que trazemos a alma vestida!),
Isso exige um estudo profundo, uma aprendizagem de desaprender
E um seqüestro na liberdade daquele convento
De que os poetas dizem que as estrelas são as freiras eternas (...).
Que difícil ser o próprio e não ver senão o visível!
Se Joana não tivesse a sensibilidade dos sentidos e da mente não fazia muitas de
suas coisas que sente prazer em fazer. Como exemplo dessa minha afirmação, trago a culinária,
uma atividade prazerosa presente na vida de Joana. Se ela cozinhasse apenas utilizando o
intelecto, provavelmente a comida não sairia tão saborosa ou até poderia queimá-la. Mas por
utilizar seus sentidos e o intelecto, consegue fazer maravilhas. Não posso esquecer da força do
prazer em realizar tal atividade. Ou seja, a junção do corpo sensível, intelecto e prazer
proporciona um melhor resultado nas atividades. Tentarei ser mais descritiva ao que acabo de
falar: quando Joana inicia uma receita, está inventada por ela, muitas vezes na hora que esta
realizando, pega os legumes e condimentos, cheira-os, toca-os, experimenta-os. No momento
em que suas mãos trabalha com todos os coloridos que estão a sua frente, me parece que esta
produzindo uma arte. Sua mente não se desconcentra do que está fazendo, sua atenção é total,
como relata, “me entrego de corpo e mente”. Existem outras atividades que sente prazer em
130
realizar, como a arte, a educação que é o seu trabalho, a escrita, a pintura e quase tudo que
procura fazer no seu dia-a-dia.
Acho melhor definir “prazer”, pois nas próximas linhas vou estar me remetendo
mais vezes a esta palavra. Utilizo a palavra prazer, no sentido de satisfação, de sentimento de
alegria. No caso dos colaboradores da pesquisa, eles têm satisfação em realizar suas buscas de
conhecimento, de realizar suas atividades, de concretizar seus objetivos.
Como pessoas intuitivas, em páginas precedentes já foi possível visualizar que esse
conceito se refere a pessoas que percebem com clareza as coisas. Eles percebiam com clareza e
rapidamente resoluções dos problemas existidos na sala de aula e fora dela. Mesmo, em
131
disciplinas da universidade que não tinham nenhum significado de importância para eles,
conseguiam no final, se sair bem. Se utilizavam da experiência que tinham, da sua intuição, da
percepção do mundo ao seu redor, da interligação com outros saberes, chegando a uma solução
coerente para eles e as vezes para o professor. Este muitas vezes, relutava nas colocações e
idéias postas por eles, pois algumas poderiam ser muito modernas ou irreais, no sentido de
inapropriadas para pais em que vivemos, outras por acomodações dos próprios professores, não
se esforçavam para entender por serem complexas.
Então, afirmo novamente que seus pensamentos intuitivos os fazem tomar decisões
muitas vezes corretas, quando não, com que fujam das erradas, como mesmo afirma, já dito
anteriormente, Silva (2003), quando descreve pessoas com TDAH são intuitivas e que tendem a
se saírem bem por essa característica.
Após todas essas linhas falando de intuição, percepção, sentidos e sensibilidade não
posso deixar de citar algumas palavras do psicólogo e professor Duarte Jr. (2006), autor do
livro “o sentido dos sentidos”. Quando o autor fala sobre a importância da junção corpo e
mente para sentirmos o mundo, para apreendermos o mundo, condenando a educação que
trabalha somente a mente do aluno:
Infelizmente, este saber obtido através do corpo, ainda, não é levado a sério pelos
nossos educadores ou pela nossa educação. Até levando-nos a acreditar que não sabem ou
ignoram, que primeiramente e primitivamente aprendemos com o corpo. Por esse motivo, na
133
maioria das vezes, Alexandre não aprendia em sala de aula, mas fora dela, onde tinha a
liberdade de vivenciar, sentir, movimentar o que estava conhecendo.
No entanto, acho importante deixar claro que ao fazer algumas críticas a nossa
educação, não estou querendo aqui tentar mudá-la, meu objetivo é apenas mostrar formas que
pessoas com TDAH aprenderam mesmo com suas dificuldades e os problemas existentes no
ensino. Relaciono somente a ensino, pois me refiro a todos os níveis, sem muita imposição de
alguém que se porta superior.
Quando seus corpos se movimentam estão sentindo, quando andam, pensam a todo
estante estão aprendendo ou tentando apreender algo. Quando sobem, descem, mexem,
remexem, andam, correm, sentam, levantam, tocam, sentem, experimentam e experienciam,
134
enfim, se movimentam para sentir com todos os sentidos estão aprendendo e por isso a todo
estante estão criando novas idéias.
E mais uma vez me remeto as palavras de Duarte Jr. (2006) que ressalta, “Produzir
sentido, interpretar a significância, não é uma atividade puramente cognitiva, ou mesmo
intelectual ou cerebral, é o corpo, esse laço de nossas sensibilidades, que significa, que
interpreta” (p.130).
Sei que pessoas com TDAH se movimentam muito, não conseguem ficar muito
tempo parados, fazendo uma mesma atividade. Mas, não posso afirmar que é uma característica
do TDAH a necessidade de sentir ou ter sensibilidade ao mundo que lhes rodeia. Posso sim
afirmar que Joana e Alexandre são seres sensíveis ao mundo que está ao seu redor. Sensível no
sentido de ter sensibilidade ao que está a sua volta. E perceber da melhor forma com todos os
sentidos. E desta forma conseguiam aprender com prazer.
que de acordo com meus colaboradores, uma aprendizagem deva ocorrer de forma satisfatória
para o aprendiz, de forma a valorizar seus desejos, suas sensações, sua forma de ser natural e
não sedimentá-lo a atitudes passivas, receptivas e copiadora, cortando qualquer relação de
prazer com aprender.
Não consigo deixar de sentir o que estou aprendendo. Se caso não consigo ou não for
possível sentir por inteiro aquilo que estou estudando, preciso pelo menos caminhar e
buscar outras coisas que me façam associar. Por isso, que gosto muito de caminhar na
praia ou mesmo nadar no mar.
Joana diz que as vezes já foi rotulada de “doida” ou de ser muito poética, diferente,
por gostar de sentir, ouvir, falar, tocar, olhar, tudo com intensidade. Mas, que nunca se
incomodou muito com os nomes que já deram para ela, pois, é assim sua maneira de ser, sua
necessidade de existir, como ressaltei anteriormente no texto, sua maneira que encontrou para
aprender, suas conchas de molusco que foram construídas para driblar o que sua natureza não
aceitava.
A leitura e a escrita são assuntos muito debatidos nos últimos anos quando se fala
em aprendizagem, uma vez que são problemáticas existentes no Brasil, enquanto alfabetização,
136
leitura e compreensão do mundo. Meu interesse aqui não é sobre a alfabetização, nem tão
pouco, sobre os processos da leitura e da escrita, mas como ocorre essas duas atividades na vida
de Alexandre e Joana e mais precisamente como a leitura e a escrita podem ajudá-los na
aprendizagem.
Alunos saberem ler de forma não apenas de decifrar signos, mas saber interpretar e
refletir sobre sua leitura. E escreve aquilo que sabe refletir, pensar, questionar e não apenas
mera cópias, é um comportamento ainda muito raro de ser ver nos alunos e ainda mais raro nos
professores, pois estes têm que permitir o que acabo de descrever.
Primeiramente, falando da escrita dos colaboradores, pois é algo que fazem todos
os dias, em vários momentos, para várias situações. Tento retratar o motivo que eles
demonstraram e declararam da necessidade enorme da escrita em suas vidas, assim, para essa
descrição me utilizo das palavras de Donald Murray (in CAVALCANTE, 2003), que listou em
um de seus livros 12 razões que o fazem escrever:
Também, a escrita era vista como um meio de criar. Com a escrita vai construindo e
registrando seus pensamentos, idéias e criações, de forma, para não esquecer e dar sentidos aos
seus pensamentos. Como relatou Joana,
minha mente funciona 24 horas, penso em muitas coisas ao mesmo tempo, muitas vezes
idéias maravilhosa para meu trabalho, então para não esquecer, tenho que registrar,
sempre tenho um caderninho em mãos.
Quando o colaborador diz “escrevo para não me perder”, esta querendo dizer, que
escreve para não se perder em seus próprios pensamentos, em suas próprias idéias, que são
muitas. Sua mente é bombardeada com pensamentos e idéias a todo instante, e pela
característica de desorganização de pensamentos, ficou evidente que a escrita é uma forma que
eles utilizavam para organização e dar direção no dia-a-dia. Tornando-se desta forma, a uma
estratégia para driblar a desatenção.
138
Sendo fundamental e como estratégia para driblar sua desatenção, como refúgio
para seus sonhos, “para por em prática aquilo que desejo e sonho, para suportar tantos
pensamentos e idéias”. A escrita é uma forma de estar dividindo o peso de tantos pensamento
ao mesmo tempo. Como segundo Cavalcante Jr. (2003), criador do método (con)texto de
letramentos múltiplos, a escrita tem o poder terapêutico, com ela as pessoas podem dar sentido
as suas vidas. Como ressalta um dos colaboradores, “se não dividisse meus pensamentos com
meu caderno, acho que não seria normal, preciso estar externando-os para não explodir, para
me sentir bem”. Também era para se sentirem vivos, registrar suas histórias: “Sempre gostei
muito de escrever, pois me sentia viva, escrevia de tudo, histórias, acontecimentos, resumos de
livros, sonhos etc.”. Como na lista de Murray, que escreve para dizer quem é, para descobrir
quem é e para criar sua vida.
Também a escrita é utilizada para seus desabafos, como se fosse um amigo, que
poderiam contar o que quisessem e não teriam que se preocupar com julgamentos. Escreviam
suas dores, seus sentimentos, necessidades e desejos, sem criticas, nem opiniões, apenas de
forma de desabafo, novamente agindo como uma terapia.
Como comenta Cavalcante Jr. (1997), à escola acaba levando os alunos a terem
aversão à escrita. A maioria dos jovens chegam na universidade não gostando de escrever,
muitos com medo dessa atividade que vai revelar seus pensamentos e sentimentos para alguém
que pode rejeitá-las e considerá-las erradas. A maioria dos professores valoriza a forma,
estética não valorizando o conteúdo. Como nas palavras do referido autor, quando se refere ao
texto escrito por um aluno: “Foram palavras saídas do coração que um dia foram cortadas,
rabiscadas e julgadas por uma pena vermelha de um professor”(p.2). Hoje Alexandre continua
com dificuldade na escrita, preferindo utilizar o computador, por conta dos erros ortográfico e
sua caligrafia, mas ainda escreve muito seus textos, pois lhe causa muito prazer.
Joana sempre gostou muito de escrever, mas tinha tanta dificuldade em sua escrita
cobrada pela escola, que se dedicou a trabalhar essa escrita de forma como um desafio para sua
vida. Com o tempo foi melhorando e seus trabalhos começaram a ser elogiados pelos
professores, tanto em relação a estética quanto a ortografia. Como relata Joana, que demonstra
não ter mais tantos problemas em relação à escrita:
Meus trabalhos passaram a serem todos escritos com tanto capricho que eram
elogiados e até hoje tudo que vou escrever é desta forma, tem que sair perfeita. Passei
a gostar tanto de escrever que na faculdade meus trabalhos eram escritos, não utilizava
computador, tinha prazer em fazer uma perfeita letra, uma capa caprichada, um
trabalho bem alinhado e bem produzido, pois no final conseguia ver o resultado,
minha arte da escrita.
140
A escrita foi como um obstáculo, um desafio que tinha que ser ultrapassado. Como
autores abordam na literatura (SILVA 2003; MATTOS, 2003; BARKLEY, 2002), o TDA/H
gosta de desafios, tudo que é colocado como forma de desafio, como forma de obstáculo é
provocador para essas pessoas. Assim, o português se tornou algo muito presente em sua vida,
sendo um prazer sempre escrever muito corretamente, sem erros gramaticais. E até hoje não
utiliza computador tudo que escreve é escrito a mão, para sentir essa maravilhosa sensação que
descreve ter quando escreve muito bem alinhado, “a escrita é uma verdadeira dança das mãos
com as letras, os movimentos são relaxantes para mim.
Joana também não demonstrou somente ser artista na estética da escrita, mas
também é uma excelente escritora. Criava textos surpreendentes, uma junção de palavras ricas
literalmente com um deslizamento gostoso de palavras suaves tornando os textos quase que
poesias. Relata que na faculdade era chamada de “Clarice Lispetor”, por um dos professores,
por escrever textos tão criativos e bem escritos.
Eu adoro ler. Leio muito, mas assuntos que me interessam, pois ao contrário é muito
difícil me concentrar e ai vou deixando por último ou vou intercalando a leitura que
me interessa com a que não me interessa até conseguir terminar, podendo levar muito
tempo. (Joana).
Suzana Borges (2005), relata em sua tese de doutorado sobre a leitura de crianças com TDAH,
que a desatenção é a maior causa dos problemas de leitura destas pessoas.
Joana quando mais nova lia de tudo, relata que pelo fato de não saber o que queria
ser, então fazia de tudo, lia de tudo, experienciava de tudo para tentar saber o que mais gostava,
não tinha um parâmetro e não conseguia visualizar um futuro distante, então lia e fazia tudo.
Em relação aos problemas que a desatenção causava nas leituras, já tinha algumas formas para
conseguir ler um texto integral, ou pelo menos, saber as informações principais, como a leitura
dinâmica, leitura por partes principais. Dificilmente lia todo o texto ou livro, apenas, quando a
leitura interessava-a muito. Também tinha uma estratégia de iniciar os textos pelo final, pois
não tinha a paciência de ler totalmente o texto, mas as partes principais. Por isso, as disciplinas
que tinha mais dificuldades na época do colégio eram história e geografia pelo fato de não ter
paciência de ler todo o texto passado pela professora. Mas, pelo fato de conseguir rapidamente
compreender as informações passadas pelo professor e aprender estratégias para ler conseguia
sempre tirar notas altas.
142
Outra maneira observada para evitar ler um texto integral era fazer um resumo das
idéias principais do texto, e como procurava prestar o máximo de atenção a fala do professor e
associa-las a fatos significativos, conseguia ter a idéia geral do texto e categoriza-lo. Quando
Joana fala que lê muito, por gostar de descobrir novos assuntos, novos saberes, me remeto as
palavras de Brandão (2003), quando fala da importância da leitura nas descobertas de
conhecimentos:
tenho muitos livros em minha casa que apenas iniciei um capítulo e deixei de lado.
Livros da faculdade que eram obrigados a serem lidos e que não tinha menor interesse
eram um terror para mim, mas sempre buscava uma saída, lia partes do texto, pegava
informações com colegas e lia o resumo do texto, desta forma conseguia montar as
idéias e ter uma visão geral do autor. Dificilmente leio um texto longo integralmente.
Mas, tanto para Joana, como para Alexandre, leituras que os interessavam eram
motivos para ficarem horas lendo e pesquisando. O que nos remete a estas palavras de Rubem
Alves (2006, p.94), “a arte de ler é exatamente igual à arte de tocar piano ou qualquer outro
instrumento”. Como também Brandão (idem), ressalta nas suas palavras supracitadas nos
parágrafos anteriores, quando a leitura é interesse do leitor se torna uma aventura.
143
3.2.6 A auto-aprendizagem
Nos dias de hoje, onde a velocidade com que novas informações vão sendo
disseminadas, mostra-se que mais importante do que a aquisição dos conhecimentos é saber
utilizar e construir estratégias pessoais de interação com os diversos saberes (TOLEDO, 2006).
A educação não deveria ou mesmo não deve se restringir à mera transmissão de
conhecimentos, mas sim auxiliar os aprendizes a “aprender a aprender” e “aprender a pensar”.
Pois desta forma estes serão ativos em suas formas de aprender e em sua aprendizagem.
12
Quem se instrui por si, sem auxílio de professores.
13
Que tem autonomia, que não depende de outro.
145
que despertou interesse. Na verdade todos os assuntos que eles estudam ou buscam despertam
um certo interesse neles, tem que despertar, pois caso contrário não estariam aprendendo.
O importante é está falando na facilidade que eles têm de está auto aprendendo, de
serem autodidatas. Não precisam de alguém mandar ou obrigar estarem aprendendo, basta se
interessarem, já é uma grande motivação, para construírem um novo projeto ou trabalho, para
estudar e iniciar uma idéia nova no trabalho, para passarem horas fazendo algo sem precisar da
ajuda diretamente de ninguém.
E essa forma é vista desde que eram adolescentes, talvez antes. Na faculdade não
aprendiam em sala de aula e sim fora dela, utilizando suas estratégias metacognitivas e
cognitivas (estratégias já citadas nas seções anteriores). Como pesquisadores, quando não
compreendiam algo ou quando tinham um interesse de conhecer algo buscavam de forma
atenta, aberta e perspicaz, até que este fosse descoberto ou respondido. Como quando uma
criança, onde Joana trabalha, apresentou um comportamento que para ela desconhecido e que
estava causando muito tumulto e sofrimento na vida da família, da professora e da própria
criança. Joana, primeiramente observou e conviveu com a criança por um longo período de
tempo, claro que no momento escolar. Pediu informações aos familiares sobre a criança em
outros ambientes, recorreu a informações na Internet, livros e artigos como também opinião de
outros especialistas, até descobrir como ajudar aquela criança. Todo o percurso feito por Joana,
de pesquisa de campo, pesquisa teórica e história, lhe fez aprender sobre como ajudar aquela
criança e no final conseguiu.
146
Alexandre apesar ter dificuldade em ler, sempre procurou suas formas de aprender
e sempre estudou, buscou estar sempre aprendendo, independendo de estar fazendo um curso
ou não. Da mesma forma Joana, sempre esta lendo, mas com grandes dificuldades de uma
rápida compreensão quando este é apenas lido. Então, sempre procurou questionar, conversar e
discutir com seus professores ou colegas, facilitando seu entendimento sobre os conteúdos. Mas
também tinha seus momentos de Auto Aprendizagem, onde cada vez mais ficava mais hábil em
suas estratégias. Momentos onde mobilizava seus conhecimentos prévios e entrelaçava com as
novas informações, adquirindo um novo conhecimento. Como em seu relato:
Quando não entendia o conteúdo ou assunto, ficava seguindo o professor após a aula,
até conseguir trocar informações. Questionava e perguntava até ter uma explicação
mais próxima de um entendimento. Depois tentava da minha forma aprender, lia e
relia, associava as outras coisas mais fáceis de compreender a outros exemplos e no
final quando estava compreendendo para Ter um aprendizado melhor explicava para
minhas colegas. Eu dava uma aula para elas. Uma aula diferente do professor, bem
mais didática e fácil de compreender o conteúdo.
diferentes, como também em suas pinturas, que estão cada vez melhores ou mesmo diferentes
por suas vivências e interesses serem diferentes.
Joana também, não cansa de fazer o que gosta, diz que sempre é diferente,
posso dar significado, longe dos muros grandes que tentou me aprisionar por muitos anos
consigo construir minhas próprias hipóteses e respirar meu próprio ar”.
Joana, dona de uma escola, não deixa seus alunos passarem pelo o que ela passou
e procura adotar uma educação significativa, onde a vivência e a experiência também sempre
estão presentes.
Conseguiram concluir o nível superior com sucesso. Considero com sucesso, pois,
conseguiram aprender. Não foi apenas uma passagem de derrotas, de angustia e sofrimento,
mas também de conquistas e vitórias. Ou, de apenas meras “decorebas”, cópias e memorizações
obrigatórias para concluir o curso. Foi um caminhar de descobertas sobre muitas coisas e
principalmente de amadurecimento, pois também foi uma grande fase de autodescoberta. Para
passar por todo esse caminhar de aprendizagem que falei anteriormente, para aprender e saber
utilizar seus metaconhecimentos, tiveram que ter um grande conhecimento sobre eles mesmos,
um auto-conhecimento. Conhecendo suas limitações e seus potenciais ficou mais fácil de
atingir os objetivos no campo da aprendizagem e em outros campos de suas vidas.
Nesse novo século, onde o mercado de trabalho está cada vez mais exigente,
procurando profissionais competentes, dedicados, que opinem e discordem, que criem, que
tenham inteligência não só racional, mas também emocional, tendo um trabalho
verdadeiramente humano e sabendo lidar com as pessoas. Ao mesmo tempo, um mercado frio,
149
onde o que reina são as máquinas, a velocidade de decisões, de raciocínio, de fazer acontecer.
Uma sociedade da informação, como descrito anteriormente, em que os conhecimentos vão
sendo modificados, outros substituídos em uma velocidade difícil de acompanhar, tendo que o
indivíduo estar em capacitação, renovação diariamente. Leituras constantes devem existir e
fazer parte de sua vida. Caso contrário vai estar desatualizado e fora do mercado.
Sendo assim, com essa descrição, acredito que o adulto com TDAH tende a ter seu
lugar no mercado de trabalho, tendo como diferencial mais precioso a oferecer, a criatividade.
De acordo com Silva (2003), o TDAH não só tem a criatividade para oferecer ao trabalho, mas
também seu entusiasmo, sua energia e até mesmo sua alegria de viver. Já que a criação, a
renovação e inovação está em voga em nossa atual sociedade.
Também é importante salientar, que não são todos os tipos de trabalho que o TDAH
pode estar exercendo, existem os tipos ideais para seu perfil. Os trabalhos repetitivos,
monótonos são impossíveis para ele (NADEAU, 2005). O que podemos tirar como lição, é que
apesar de ser criativo, inteligente, intuitivo e amoroso, o adulto TDA/H é também hiperativo,
impulsivo, intolerante para atividades paradas e desatento, além de ter suas comorbidades,
atrapalhando assim, na sua vida profissional.
Como dito por Barkley (2002), a pessoa com esse Transtorno pode ter bastante
sucesso ou se sobressair em situações que se utilizem das emoções, em áreas humanas,
(escrever poesias) ou artes (música, pintura etc) e “nas áreas onde é desejável convicção
apaixonada, como negociações ou vendas”(p.73). Podendo ela se destacar nessas áreas. O autor
também fala, que essas pessoas precisam de motivação, pois não têm a motivação interna que
as muitas pessoas sem TDA/H normalmente possuem. Quanto mais desprovidas ou
desvinculadas de recompensadores forem as atividades ou trabalhos, mais difícil será para
executá-los. É por isso também a necessidade de desafios, pois estes motivam essas pessoas a
tentar atingir ou conseguir uma meta. Observado nos colaboradores uma necessidade por algo
que os desafiasse, caso não existisse, era muito fácil existir uma desistência logo no início da
atividade.
150
Fazer algo, aprender ou estudar sem uma recompensa no final, sem um retorno
rápido não os atraia muito. No caso de Joana, só fazia curso que lhe trouxesse benefícios no
trabalho. Se no início deste, percebesse que não era muito atrativo para sua capacidade, desistia
rapidamente. Alexandre, quando era obrigado, posto pelo Estado, a fazer um curso que não
encontrava nenhuma afinidade ou interesse, procurava desafios dentro da sala de aula, como
por exemplo, questões para discutir com o professor, na maioria das vezes questões para objetar
as colocações do professor. Ou então, passava todo o curso, fazendo outras coisas na sala de
aula, como dormindo, desenhando ou escrevendo textos sobre outras coisas, tendo como
resultado o não aprendizado. Para ele, não tinha importância não aprender algo que não iria
utilizar em sua vida ou que lhe trouxesse algum benefício. É por esses e outros motivos que
muitas pessoas com TDAH ou TDA acabam desistindo de estudar, pela falta de motivação de
dar continuidade, por não conseguirem estudar algo que para eles não têm significados ou
utilidades para suas vidas.
Todo o meu problema de ser inquieto, impulsivo, de ter dificuldades de seguir regras
tem um nome – TDAH. Foi bom descobrir pelo fato de me compreender melhor, mas
não para me rotular em algo, pois não me vejo como um TDAH, mas como uma
pessoa que tem algumas dificuldades e características singulares. O conhecimento do
transtorno me ajudou bastante, até para me sentir humano, pois muitas vezes achava
que não fazia parte deste mundo. Hoje me aceito, me compreendo e procuro me
adaptar ao mundo excludente que existe externo a mim.
Como dito antes, o transtorno inicia-se na infância e pode persistir até a fase adulta.
Por isso, quanto mais cedo for diagnosticado, menores serão as conseqüências psicológicas
sofridas por esse sujeito ao longo dos anos. Outro ponto importante, é que a identificação
precoce possibilita a descoberta de outras doenças associadas a esse transtorno. Como a
depressão muito comum em adultos com TDAH (GENES, 2002). No caso dos colaboradores
foram diagnosticado já não mais crianças, mas tiveram forças para ultrapassarem todos os
rótulos que adquiriram enquanto pequenos. Em relação às comorbidades, algumas podem ser
observadas claramente nos sujeitos da pesquisa, como a depressão, que foi comum nos dois e
problemas no sono. Mas não, pretendo entrar nesses assuntos, já que meu objetivo é na
aprendizagem e as estratégias.
Nas próximas linhas, apresentarei mais algumas formas de aprender que persevera
até os dias de hoje nos colaboradores. Com o amadurecimento, o auto-conhecimento e as
diversas experiências de aprendizagem e de vida de aprendiz, algumas formas são mais
utilizadas por eles, podendo descrever como suas personalidades de ser aprendiz. As que me
chamaram atenção e que não poderia deixar de descrever aqui nesta pesquisa foram, as
múltiplas formas que eles utilizam para expressar o mundo, sentimentos, pensamentos e idéias;
a busca de estar sempre aprendendo e finalmente aprenderam a aprender, conseguindo assim,
acompanhar o mundo que os rodeia e suas necessidades enquanto aprendizes.
Expressei-me logo no início deste texto me referindo que meus colaboradores longe
das salas de aula conseguem ser “livres” para aprender da forma que melhor conseguem
aprender, conseguem ser livres para utilizar das suas múltiplas formas de expressão. Falo em
ser livres, porque me utilizei de suas próprias assombrações e reclamações sobre o ensino
institucional. O significado de ser “livre” pode denotar vários sentidos, o sentido que estou me
referindo é o de não está sujeito a alguém, de possuir independência em suas escolhas de
expressão. De acordo com os relatos de Joana e Alexandre tiveram grandes batalhas com
imposições de professores em salas de aula e consigo próprio para ter que muitas vezes se
curva diante da decisão dos mestres. Tendo que muitas vezes seguir a regra posta mesmo
sabendo que não era o melhor caminho ou melhor maneira de se expressar ou de construir.
Trazendo as palavras sábias de Carl Rogers (2001), quando se remete na explicação de que a
pessoa tem que está aberta, livre para experiênciar o que pretende fazer ou mesmo construir,
sem julgamentos. “Quando o indivíduo está “aberto” a toda a sua experiência (...), seu
comportamento será criativo”(p.409).
14
Habilidade de decodificar e codificar sentido através das várias formas sociais através das quais o sentido
é transmitido (EISNER, 1991, p.120 in CAVALCANTE JR., 2001).
15
Criador do Método (con)texto de letramentos múltiplos, já mencionado anteriormente no corpo deste
trabalho, na seção 3.2.4.
153
ortográficos. Mas tocar e pintar sempre gostou muito e fez muito bem feito. Com o método
(con)texto do professor Cavalcante Jr. (2003; 2005), o educador abre um espaço para que o
aluno escreva da sua forma e ajuda em sua auto-estima, fazendo com que tenha mais confiança
em si mesmo. Pena, que são poucos professores que se utilizam de propostas que abrem espaço
para o aluno se expressar de sua melhor maneira, utilizando suas potencialidades.
Hoje, longe das pressões e cobranças estéticas, Alexandre escreve muito bem.
Escreve suas reflexões, seus pensamentos e sua interpretações textuais e do mundo. Longe do
que também Cavalcante ressalta como um dos pontos para a aplicação de seu método “sem
julgamentos” no momento da leitura e da escrita do aluno. Conseguiu encontrar seu caminho na
escrita, não deixando é claro seu prazer na música e na pintura. Posso dizer, como leitora de
alguns de seus escritos, que é um excelente criador de histórias, ou como ainda Rubem Alves
(2005), fala estórias, sempre criando e escrevendo em seu caderninho. Dizia,
tenho muitas idéias e adoro criar, para mim nada pode ser igual, se tenho algo igual
em minhas mãos, logo transformo em algo diferente. Minhas histórias são histórias
da vida real, mas com uma pitada a mais de humor, sentimentos, aventura e amor
Muitos de seus escritos ficam guardados, pois ainda não tem segurança de mostrar
para o mundo, relata que essa insegurança ainda é algo que não venceu do passado, trazido das
muitas rejeições e interrupções da escola. Mas, já acredita que é capaz e sente prazer em
154
realizá-los. Já nos desenhos sempre espalhados por sua mesa de trabalho sentia mais segurança
e até já pintou alguns quadros e expõem em sua sala.
Alexandre já percebe também que nos cursos já se sente mais livre, não que os
professores e o sistema tenha mudado, mas por sua autoconfiança e sua maturidade. Sua
autoconfiança é totalmente estável, sua opinião colocada em sala pode não mudar a do
professor, mas é respeitada. Acredita ser por causa de sua idade e formação. Hoje é respeitado
pelo profissional que é, pelo cargo que possui.
Nos cursos que curso sou respeitado, consigo me expressar melhor e brigar menos
com os professores, acho que pelo cargo que possuo profissionalmente. As pessoas já
me olham com muito respeito. Então, posso ser mais eu, ter a liberdade de expressar
mais minhas idéias e não ser tão rebatido. Por tudo isso não me arrependo das lutas
passadas que tive para aprender.
155
Já nas palavras do outro sujeito pesquisado - Joana: “escrevo muito, escrevo textos,
sobre minha vida, sobre pessoas e crio poemas. Outras coisas que gosto de fazer quando não
consigo me expressar com a escrita é pintar e cozinhar”. Também gosta de construir objetos e
criar artes.
Com muita criatividade Joana consegue transmitir na pintura sua mensagem e até
na arte da cozinha muitas vezes essa mensagem tão desejada ser externalizada é passada. A
diferença que na cozinha o resultado é ingerido, mas a criação existiu e o resultado foi benéfico
e terapêutico para quem o criou.
Entre uma atividade e outra era inserida uma atividade considerada “prazerosa”, ou
satisfatória pelos colaboradores. Joana incluía a pintura, a escrita e a culinária no seu dia
corrido. Na escola onde trabalha, nos momentos mais difíceis, turbulentos de problemas, corria
para seu escritório e começava a escrever. Como se naquele momento a escrita lhe concederia
as soluções que precisava. Ou em sua casa começava a criar uma receita e naquele momento
sua atenção era toda voltada para sua criação. E nesse momento de criação, as saídas, os rumos
que deveria tomar para solução de seus determinados problemas evocava. Nem sempre
solucionava o problema, mas suas atividades de criação lhe traziam conforto, força e
discernimento para continuar sua caminhada. Era nesses momentos de criação que refletia
sobre muitas coisas.
Fico muitas vezes perdida, quando estou tendo que resolver muitos problemas. Pelo
fato de ser perfeccionista, as cobranças comigo mesmo aumentam. Para pensar preciso
escrever ou iniciar, fazer uma arte. E consigo no momento da criação, seja na escrita,
na arte ou na culinária, criar soluções, criar eventos, criar novos trabalhos dando desta
forma qualidade ao que faço, qualidade na minha vida.
Alexandre intercalava suas atividades do dia com esportes, mas também em suas
atividades sempre recorria à escrita, pintura e tocar bateria.
156
Há pessoas que buscam aprender porque precisam, outras porque gostam ou porque
querem. Seja lá qual for a motivação a aprendizagem sempre é bem vinda e fundamental para o
melhoramento da vida social, profissional e pessoal. No caso de Joana e Alexandre buscam
aprender porque gostam, como já salientei anteriormente, eles mesmos buscam estar
aprendendo, são autodidatas. Desta forma, a auto-motivação em interesse pelo desconhecido,
dos colaboradores, faz com que sempre estão em busca pelo novo. Algo “novo” para eles, no
sentido de desconhecido. Toda a trajetória acadêmica percorrida até hoje foi motivada pelo
prazer de descobrir algo novo, algo que ainda não conhecem, que os desafia a conhecer e
aprender.
Como Joana que terminou três formações, inclusive psicologia, e está iniciando a
Quarta graduação. Por que? Já que é bem sucedida no seu trabalho. Porque existe uma grande
“fome” de aprender, aprender cada vez mais e conhecer o desconhecido. É prazeroso no meio
de tantas informações incompreendidas, no meio de algo que ainda é novo e desafiante para seu
conhecimento, no final ser totalmente claro.
alguma motivação externa para fazê-lo continuar ou até mesmo concluir o que terminou. Por
esse motivo a existência de inúmeros trabalhos maravilhosos inacabados. A rotina é a principal
inimiga deles, nunca passam muito tempo fazendo a mesma coisa, têm a necessidade de mudar.
Muitas vezes Joana e Alexandre trabalham com mais de três assuntos, mal conhece
um inicia o outro. Esta é uma forma de estratégia utilizada por eles, para não saturar com um
único assunto, mas mesmo assim, quando o desafio de conhecer e aprender determinada
atividade ou assunto acaba, também acaba o interesse por este. Este é o grande problema, tendo
que existir uma motivação externa para não abandonarem o projeto em andamento.
“qualquer atividade de busca, no singular ou no plural, de algum saber não sabido, e que seja
realizada através de um trabalho com algum fundamento, alguma sistemática e algum método
confiável, é uma experiência de pesquisa” (p.121).
Quando a pessoa sabe que não sabe de algo ou reconhece o que não sabe e procura
conhecer, ela investiga até encontrar suas respostas, assim sendo uma pesquisa. Joana e
Alexandre estão sempre abertos a novos saberes, estando em constante aprendizado e
“desaprendizado”. Pois a nova informação, quando apreendida, se integra ou/e substitui a
outros já existentes. Em relação ao que acabo de dizer me retomo novamente as palavras de
Brandão (2003, p.118) que explica de forma clara quando conhecemos algo desconhecido:
No percurso deste capítulo me remeto a uma das características que define a “nova”
cultura da aprendizagem, que vem sendo utilizada por muitos educadores e teóricos (POZO,
2002; DEMO, 2002; VALDÉS, 2003; ROGERS, 1985; DUARTE Jr.,2006), que é “Aprender a
aprender” ou “Aprender a Pensar”, os termos são para mesma definição, do aluno saber que
formas ou estratégia melhor aprende, saber que caminhos tomar para aprender. Grifo a
expressão “nova”, para explicar que ela não é nova em termos de surgimento, mas em termos
de um conhecimento ou algo estar sendo valorizado atualmente ou no sentido de nunca visto
antes pelo indivíduo, então para ele é um saber novo.
Então, o caminho qualitativo para aprender nesse século presente, onde a rapidez
com que ocorre as mudanças e as informações é notório em nossas vidas e instabilizador não é
tentar conhecer tudo, saber tudo, até porque é impossível o fundamental é aprender a aprender.
O sujeito que não se utiliza de estratégias e agilidade, que não se percebe, nem cria para dar
sentido a si mesmo e ao mundo a sua volta está fadado a ser sempre o outro, a se uma mera
cópia do outro e seu destino será determinado pelos outros. Assim, complemento minha fala
acrescento, que o aprendiz não se pode deixar aprender apenas através do outro e dos modos
acadêmicos e tradicionais. É urgente que este busque aprender a aprender, que engloba o auto-
conhecimento, a metacognição, o autodidatismo e as estratégias. Desta forma, o sujeito
aprendiz conseguira ter sua própria fala, suas próprias idéias, emitir juízos, se perceber e
perceber o outro, ter emoções, pensar, refletir, criticar e elogiar, ter escolhas e acima de tudo ter
liberdade de aprender e ser. Como mesmo Pozo (2002, p.241) descreve:
160
Esta nova cultura da aprendizagem deve, para ser real, desenvolver estratégias de
aprendizagem de acordo com essas metas. Realmente aprender a aprender é uma
demanda de formação cada vez mais difundida em nossa sociedade, uma das
características que definem a nova cultura da aprendizagem.
Quando Joana aprende algo, como quando esta lendo uma nova teoria, ela toma
uma postura aberta aos seus saberes e aos seus não saberes, podendo assim, fazer um
interligação entre as novas informações e as já adquiridas, dando significado as desconhecidas
tornando-as significativas. Como também, quando pinta não utiliza apenas o saber e as técnicas
de pintar, mas sua mente e seu corpo aberto e sensível expressa vários saberes e internaliza
outros mais. Não de forma como um depósito, que vai sendo armazenado os saberes e estes vão
se interligando. Mas, de forma que esse algo novo, para ser compreendido, interage com outras
idéias já conhecidas, podendo após ser aprendido, existir uma diferente visão ou idéia. Para me
apoiar trago as palavras do antropólogo Brandão (2003), que explica muito bem a construção
de um novo saber e interligação de novos e antigos saberes, descrevendo que,
você não incorpora à sua consciência um ou alguns novos saberes. Você ampliou,
através deles e da maneira como os integrou nas teias de seus afetos, de suas múltiplas
inteligências, de suas motivações, de sua identidade, toda sua complexa teia e tessitura
de vivências interativas em você (aquilo que alguns gostam de dar o nome de
autoconsciência) e entre você e os outros (p.119).
informação” (p.216). Nessa direção os colaboradores não foram apenas um estoque de coisas
sabidas, não apenas memorizaram, copiaram ou mesmo fizeram provas e “colaram”. Eles
encontraram formas de aprender, habilidades de desvendar desafios e realidades, questionando,
repensando o que se sabe, refazendo um outro saber, reciclando-se sempre, criando horizontes
próprios da informações e de seus saberes.
Quanto mais nova é uma situação (ou menor sua semelhança com situações de
aprendizagens anteriores), mais difícil será dispor de conhecimento transferíveis. E, ao
mesmo tempo, quanto mais cambiantes forem os contextos de uso do conhecimento,
mais necessário será a transferência. Na complexa sociedade da aprendizagem,
necessitamos de habilidades e conhecimento transferíveis para novos contextos, já que
não podemos prever as novas demandas que o mercado de trabalho e a sociedade da
informação vão colocar num futuro próximo para os aprendizes (p.63).
Joana e Alexandre desde começo sabiam o que lhes causavam satisfação, não
sabiam o que queriam ser, como até hoje, ainda existe uma ambigüidade e insatisfação quanto
ao que querem ser enquanto profissional, pelo motivo de quererem exercer mais de uma
profissão. Mas, não tinham dúvidas no que se referia a suas satisfações, as coisas que lhe
traziam boas sensações. Com essa sabedoria buscaram sempre percorrer os caminhos que seus
desejos trilhavam, os caminhos que lhe faziam melhor para sua pessoa, para sua vida,
independente da dos outros ou no que os outros achavam melhor. Em suas falas não foi
verificado em nenhum momento alguma dúvida no que queriam fazer, ou por medo, ou por
causa dos outros, simplesmente faziam. Existiram muitos arrependimentos, derrotas,
165
desistência, mas, foi por algo que eles queriam fazer e não imposto pelo outro ou desejado pelo
outro. Então, não existia grandes sofrimentos pela desistência ou não irem até o fim com algo
que iniciaram ou mesmo quando existia a negação em realizar algum trabalho. Os grandes
sofrimentos existem quando estão lutando por algo que querem fazer, por algo que querem
atingir e quando esse é atingido a satisfação rapidamente é substituída por outro projeto.
o que “deviam” ser, quer esse imperativo venha dos pais, ou da sociedade, quer ele
seja definido de uma forma positiva ou negativa. Não querem moldar-se a si mesmos
ou ao seu comportamento dentro de um modelo que seja do agrado dos outros. Não
querem, em outras palavras, escolher o quer que seja de artificial, algo que lhes seja
imposto ou definido do exterior (p.193).
Dessas palavras posso dizer ou mesmo considerar Joana e Alexandre sujeitos livres,
pois sofrimento para eles, é fazer algo que o desejo não vêem de dentro deles e sim imposto, ou
mesmo, para mostrar para os outros do que são capazes. Em todas minhas observações
participantes, em minha permanência em campo e pelos relatos dos dois, é inviável dizer que
em algum momento estavam fazendo algo para agradar apenas o outro.
É por isso, a dificuldade de aceitar alguma disciplina ou conteúdo que não tinham
afinidades ou sentido. Para conseguirem ultrapassar tinham que tornar algo daquela matéria
significativo para desta forma aprender ou apenas passar.
166
Em suas, falas e relatos dos familiares são vistas como pessoas egoístas, por muitas
vezes só fazerem da maneira deles, ou da forma que agradam eles. Segundo Carl Rogers
(2001), um pessoa com liberdade interior pode parecer egoísta, parecendo somente pensar nela.
Mas não é isso, apenas ela está buscando sua liberdade de ser, buscando ser um pouco ela e
seguir seus desejos. Como os colaboradores, já é da natureza deles terem dificuldades de seguir
regras, leis e imposições, como também, lhes causavam sofrimento ter que fazer algo somente
para a satisfação dos outros ou que para eles não tinham o menor sentido. Quando tinham que
aprender algo, simplesmente imposto sem explicação lógica e significativa, não conseguiam ou
se tornava um tormento, pois, o seu próprio “eu” não aceitava. No dia-a-dia são pessoas que
têm sua profissão livre, para poderem ter um melhor desenvolvimento profissional e uma
qualidade de vida. Apesar de Alexandre ser concursado, preso as regras da instituição, tem
autonomia em relação ao horário e forma que desenvolve seu trabalho.
167
Gostaria de expressar, que, nem sempre esta caminhada foi sem dificuldade e
somente de prazer, como deixo explicito minha satisfação em vários momentos do texto. Tive
muitos dias, horas, minutos, “emaranhados”, de difíceis compressões nas falas, nos
comportamentos e observações, nas teorias estudadas, principalmente em relação às estratégias.
Tive que me aprofundar no transtorno, em relação ao déficit que é causado ao funcionamento
do cérebro. Um estudo profundo sobre estratégias e principalmente o comportamento e a forma
de aprender dos colaboradores, independente das teorias estudas. Atingindo estas três faces
consegui fazer o entrelaçamento das informações com mais compreensão. Também tive
limitações em relação as informações existentes sobre a aprendizagem de pessoas adultas com
TDAH, sendo esta minha pesquisa uma abertura para outras. Também em encontrar e
acompanhar pessoas adultas diagnosticadas e que autorizassem uma etnografia.
para aprenderem de forma qualitativa, de forma a terem uma aprendizagem permanente. Uma
aprendizagem não utilizada apenas para os exercícios e trabalhos da faculdade ou do curso, mas
utilizada fora das instituições de ensino, no meio profissional, em outras áreas. Por isso, que
chamo de aprendizagem permanente, saberes realmente aprendido e utilizado nos seus
cotidianos. E ainda hoje, com o amadurecimento e o crescimento de seus conhecimentos
utilizam estratégias de aprendizagem para aprender e terem sucesso no meio profissional e
acadêmico.
Não se trata apenas de que os professores levem em conta como os alunos fazem seu
trabalho na hora de planejar as atividades de instrução. Além disso, trata-se também
de gerar uma nova cultura da aprendizagem a partir de novas formas de instrução.
Trata-se de que os professores organizem e planejem suas atividades levando em
conta não só como seus alunos aprendem, mas principalmente como querem que seus
170
alunos aprendam. Para isso, é preciso compreender em que consiste uma boa
aprendizagem, conhecer as dificuldades que enfrentam os alunos para ajudá-los a
superá-las (p.58).
No capítulo 3 também me refiro que grande culpa dos sucessos dos aprendizes pode
ser direcionada para um professor que procura conhecer seus alunos, que procura trabalhar
aprendizagens significativas e experienciadas. Pois, é mencionada as dificuldades que meus
pesquisados tiveram por não terem tido a oportunidade de ter um “bom” professor, que dessem
a liberdade deles aprenderem significativamente e respeitassem suas individualidades. Sendo
este, um dos desprazeres de aprender em sala de aula. Assim, retomo às palavras de Brandão
(2003) quando fala da educação, considerando importante a liberdade dada ao aluno de
desenvolver seus potenciais. Descrevendo desta forma:
algo permanente em suas rotinas e não algo passado, apenas quando estavam na escola ou
mesmo na universidade.
Os dois acreditavam que era possível vencer os obstáculos existentes para aprender
e até hoje acreditam que tudo é possível vencer basta lutar, acreditar e procurar uma forma.
Esse pensamento contribuiu muito para não desistirem no meio do caminho. Contribuiu para
não desistirem de aprender. Acreditar que as dificuldades existentes eram superáveis ou de
alguma forma driblada, já que em relação aos sintomas do TDAH não é possível uma exclusão
e sim uma adequação do sujeito.
sentir, construir e reconstruir, e principalmente ser livre para ser e aprender. O prazer de Joana
e Alexandre estavam em experienciar o que estavam conhecendo, a aprendizagem acontecia
quando podiam sentir, tocar, vivenciar ou mesmo dar significado a nova informação. Quando
era imposto um conhecimento de forma apenas teórica, que apenas o cognitivo trabalhava não
conseguiam ter uma aprendizagem permanente, quando existia alguma aprendizagem, pois
desta forma não conseguiam nem fixar a atenção.
uma regra para todos, nem uma receita congelada, mas pode ser um início de uma reflexão e
uma luz para a busca de suas próprias soluções.
174
REFERÊNCIAS
Eu sou uma alma viva do ensino que de uma forma sem querer,
destrui o que temos de melhor dentro de nós. Mas, que com amor,
consegui me erguer e fazer com que esse ensino fosse diferente para
meus filhos, para os pequenos que ainda tem a chance de não terem
roubado sua natureza natural de descobrir, de aprender e conhecer
o desconhecido.
Joana
175
ABREU, Maria Célia de. (1990). O professor universitário em aula: Pratica e princípios
teóricos. 8º ed. São Paulo: MG.
ALVES, Rubem. (1988). As credenciais da ciência. In: ____ Filosofia da ciências: Introdução
ao jogo e suas regras. São Paulo: Brasiliense, P. 166-181.
ALVES, Rubem. (2003). Conversas sobre educação. Campinas, SP: Versus Editora.
ALVES, Rubem. (2005). Educação dos sentidos e mais. Campinas, SP: Verus Editora.
ANDRÉ, Marli Eliza D. A. de. (1995). Etnografia da prática escolar. Campinas, SP: Papirus.
AUSUBEL, D., Novak, J. D., & Hanesian, H. (1980). Psicologia Educacional. Rio de Janeiro:
Editora Interamericana.
BELTRÁN, Francisco. (2003). John Dewey: democracia como vida – in: SEBARROJA, Jaume
C. (et al.), Pedagogias do século XX. Porto Alegre: Artmed.
BORGES, Suzana Maria Capelo. (2005). Caminhos da leitura: análise das dificuldades e
possibilidades de leitura de alunos portadores do transtorno de déficit de
atenção/hiperatividade (TDAH). Tese de doutorado não-publicada, Faculdade de
Educação, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2005.
BRAGHIROLLI, Elaine Maria et al. (1990). Psicologia Geral. (9ª ed.) Porto Alegre: Vozes.
CAVALCANTE JUNIOR, Francisco Silva. (2003). Por uma escola do sujeito: o método
(con)texto de letramentos múltiplos. 2º ed. Fortaleza: Edições Demócrito Rocha.
CONCA, Lydia. (Dec 1997/ Jan 1998). Performance Breakthroughs for Adolescents with
Learning Disabilities or ADD: How to help students succeed in regular Education
Classroom. Journal of Adolescent e Adult Literacy. Vol. 41.
CRESPO, Nína Maria. (2004). La metacognicíon: Las diferentes vertientes de una teoría.
Revista Signos, Chile, 33(48), 97-115.
DEMO, Pedro. (2002). Desafios modernos da educação. (12ªed.), Petrópolis, Editora Vozes.
DEWEY, John. (1971). Experiência e educação. São Paulo: Companhia editora nacional.
DUARTE Jr. J. F. (2006). O Sentido dos sentidos: a educação (do) sensível (4a ed.). Curitiba –
PR: Criar Edições.
HAYES, Susan. (2004, Jul). ADHD: not just for kids (Vol.56). ProQuest document ID:
652880441.
MOREIRA, Daniel A. (1997). Didática do ensino Superior: Técnicas e Tedências. São Paulo:
Pioneira, 1997.
NADEAU, Kathleen. (2005.) ADD in the workplace: juggling the dual responsibilities of
home and work. Article from National Center for Gender Issues and AD/HD, recuperado
em agosto de 2005: www.ncgiadd.org
PESSOA, Fernando. (2002). Antologia poética de Fernando Pessoa (2ª ed.). São Paulo:
Ediouro.
180
POZO, Juan Ignacio. (2002). Aprendizes e mestres: a nova cultura da aprendizagem. Porto
Alegre: Artmed Editora.
______________. (1998). Teorias Cognitivas da Aprendizagem (3ª ed.). Porto Alegre: Artes
Médicas.
READ, Herbert. (2001). A educação pela Arte. São Paulo: Martins Fontes.
ROGERS, Carl. (1985). Liberdade de aprender em nossa década. Porto Alegre, Artes
Médicas.
_____________. (2001). Tornar-se pessoa (5ª ed.) – São Paulo: Martins Fontes.
SAMUELSSON. Stefan. (2004). ADHD and reading disability in male adults: is there a
connection? Journal of Learning Disabilities, Vol.37, No. 2.
SCHONWALD, Alison D. (2003). New options for ADHD. New York, Sep 22.
SILVA, Ana Beatriz B. (2003). Mentes Inquietas: entendendo melhor o mundo das pessoas
distraídas, impulsivas e hiperativas. São Paulo: Editora gente.
SPINK, P.K. (2003, Jul/Dez). Pesquisa de campo em Psicologia Social: Uma perspectiva pós-
construtivista. Psicologia e Sociedade, São Paulo.
ZABALZA, Miguel A.. (2004). O ensino universitário: seu cenário e seus protagonistas.
Porto Alegre: Artmed.
WEYANDT, Lisa L. et al. (2003, Jul/Aug). The internal restlessness scale: Performance of
college students with and without ADHD. Journal of Learning Disabilities.
WOLCOTT. Harry F. (1999). Ethnography: a way of seeing. Walnut Creek, CA: AltaMira
Press, 335 p.
____________. (1995). Fieldwork: The basic arts. Walnut Creek, CA: AltaMira Press, 285 p.
____________. (1997). The anthropology of leaning. In: SPINDLER, G. (Ed.). Education and
cultural process: anthropological approaches. 3.ed. Prospect Heights, IL: Waveland
Press, P.310-338.
ANEXOS
TERMO DE CONSENTIMENTO
Proposta
Estamos convidando você para participar de uma pesquisa que faz parte do Mestrado em
Psicologia da Universidade de Fortaleza. Antes que você aceite participar, é importante
antecipar bem algumas informações sobre esta pesquisa.
Tudo que conversaremos nesta entrevista, será sigiloso. Sua participação é voluntária e
você está completamente livre para decidir se quer ou não participar desta pesquisa.
Riscos e desconforto
Os riscos de participar nessa pesquisa são mínimos. Se você não quiser responder a
alguma pergunta, basta dizer que não quer responder. Se você achar alguma das
185
Benefícios
Esperamos que sua participação, nesta pesquisa, ajude-nos a compreender como
algumas pessoa com TDAH consegue ter sucesso na vida escolar e universitária, afim de
que possamos contribuir para que outras pessoas possam ter um olhar diferente, uma
visão positiva desse transtorno e consigam também, passarem pela universidade.
Confidencialidade
Sua privacidade será protegida. Isso significa que seu nome nunca será ligado às
informações que você fornecer. Haverá um outro nome fictício nas cópias das
entrevistas. Somente os responsáveis pela pesquisa terão acesso a estes dados.
Nenhuma informação será dada a terceiros. O seu nome nunca será usado em escritos
ou artigos resultantes deste projeto, e todos os esforços serão efetuados para que as
descrições dos participantes não sejam identificáveis.
Questões
Se você tiver qualquer dúvida sobre esta pesquisa por favor entre em contato comigo,
Carolina Porto, no telefone: (85)88035885 ou e-mail: cpmoreira@yahoo.com.br
_________________________________
Consentimento do colaborador
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )