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Analisando as Fragilidades da Percepção Humana

A obra de Olafur Eliasson como um veículo de estudo


Ana Sofia Caldeira, nº 38778
FCSH - UNL, 2012

Introdução
Este texto pretende analisar o modo como as obras de Olafur Eliasson exploram as
problemáticas da percepção humana.
Inicia-se apresentando o antigo paradigma dominante da percepção humana. De seguida
refere-se o século XIX como um momento de mudança durante o qual se começou a questionar
a percepção. Aponta-se contudo a tendência dessas polémicas escaparem ao senso-comum.
Introduzem-se então as instalações de Eliasson como um modo de alertar o espectador para a
relatividade da percepção.
Apresentam-se em seguida os modos específicos em que as instalações de Eliasson
incentivam esse questionamento. Em primeiro lugar refere-se o carácter singular e paradoxal
das suas instalações, que se apresentam como espaços espectrais. Aponta-se também a sua
capacidade de criar o Visível, através da exploração da luz e da cor. Destaca-se o carácter
singular e irrepetível das obras de Eliasson. Salienta-se o papel activo do espectador. Por fim
exibe-se o carácter construído das próprias instalações em questão.

Desenvolvimento
1. Mudança no paradigma da Percepção – o trabalho de Olafur Eliasson como um
motor de consciencialização
1.1) O Antigo Paradigma
Durante muito tempo a percepção, e mais
especificamente a visão, foi encarada como algo
relativamente simples, objectivo, mecanicista,
quer por parte do senso comum quer pela
comunidade científica.
Os paralelismos que foram criados, no
século XVII, com o modelo da câmara escura
apresentavam o mecanismo da visão humana Fig. 1) Diagramas de uma edição do início do séc. XVIII de La
Dioptrique¸ René Descartes
(Apud Crary, 1999, p. 86)
como dependente de um processo claro e

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unidireccional. A luz exterior, ao passar pela abertura estreita da iris humana, é reflectida no
interior do olho trazendo com ela uma imagem do mundo objectivo (Jensen, 2004, p. 2).
Este modelo parece confirmar a visão como sendo um mero mediador de uma realidade
externa, verdadeira e objectiva (Jensen, 2004, p. 8), pois esta não depende da subjectividade
humana mas sim de factores externos, uma luz exterior que nos traz as imagens do “mundo
real”, autónomo. Através da visão somos transportados para o domínio da verdade, cuja
experiencia apresenta-se-nos como evidente em si mesma (Merleau-Ponty, 1945/2005, p.
xviii).
Como resultado deste paradigma objectivista da visão, o mundo foi considerado, durante
largos anos, como algo homogéneo, imutável, absoluto, matemático (Eliasson, 2008, p. 18) e,
como tal, algo que não devia, nem necessitava, de ser questionado.

1.2) O Momento de Mudança


No século XIX, com a disseminação dos estudos fisiológicos do sistema óptico, o
carácter mecanicista da percepção começou a ser activamente questionado.
Estudos como, por exemplo, os conduzidos por Helmholtz, que demonstrou que a
informação apreendida visualmente levava muito mais tempo do que o imaginado a atravessar
o sistema nervoso e a ser processada (Crary, 1999, p. 310), tiveram consideráveis
consequências epistemológicas sobre o modo como a percepção é encarada. Tais estudos, ao
revelarem a lacuna existente entre estímulo e resposta, criaram um sentido de disjunção entre
percepção e objecto.
No espaço de apenas algumas décadas a noção de visão como um veículo de apreensão
de verdades exteriores inquestionáveis foi erradicada dos discursos sobre esta.

With the collapse of the camera obscura model of vision and the emergence of physiological
optics, it became increasingly clear that perception was not a matter of a relatively passive
reception of an image of an exterior world, but that the makeup and capacities of an observer
contributed to the making of perception. (Crary, 1999, p. 155)

Surge então a ideia de uma visão subjectiva, menos dependente de estímulos externos do
que das condições de funcionamento do aparatus sensorial do indivíduo particular (Crary,
1999, p. 12). E como consequência deste novo modo de pensar a percepção, a visão surge-nos
como algo possivelmente defeituoso, arbitrário e, em geral, pouco digno de confiança.

The eye emerges in this text [Treatise on Physiological Optics] not only as a marvelous
apparatus but as one with built-in aberrations, proneness to error, and inconsistencies in its
processing of visual information. (Crary, 1999, p. 215).

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A visão continua a ser reconhecida como a faculdade perceptiva predominante pois o
nosso mundo é essencialmente visual, mas os seus limites são agora admitidos (Merleau-
Ponty, 1964/1968, p. 83).
O carácter frágil e singular da percepção humana ganha destaque nos discursos
científicos. O mundo empírico deixa de ser encarado como uma verdade dogmática e passa a
ser reconhecido como uma construção, dependente da subjectividade das nossas operações
sensoriais.
Pensadores como James e Bergson questionaram a noção de percepção pura ao
reconhecerem a importância do papel das memórias, desejos, vontade e antecipação,
associados à experiência imediata (Crary, 1999, p. 27) na construção da nossa concepção do
mundo.
A nossa percepção da realidade externa nunca é, então, algo apreensível num “estado
puro” mas sim uma experiência mediada.

The perception is not exclusively a ‘purely’ physical phenomenon, but something that arises
in what is often a complex interaction. (Ørskou , 2004, p. 3)

Ela varia consoante as nossas memórias e espectativas, consoante diversos factores


históricos, culturais e sociais que a condicionam.
É precisamente a contribuição da memória que permite organizar e impor significado
sobre a imensa quantidade caótica de informação sensorial que recebemos constantemente
(Merleau-Ponty, 1945/2005, p. 22 e 23).
Contudo, apesar de todos os avanços no estudo científico da percepção humana e das
suas fragilidades, o senso-comum continua, em larga escala, intocado por estas polémicas. A
maior parte das pessoas continua envolvida numa espécie de “fé perceptual” (Merleau-Ponty,
1964/1968, p. 28) que, apesar de qualquer prova científica, mantém a ilusão de uma percepção
natural, à prova de questionamento.

The percept is and remains, despite all critical education, on the hither side of doubt and
demonstration. (Merleau-Ponty, 1945/2005, p. 401)

1.3) Eliasson e o constante questionar


O que distingue o trabalho do artista plástico dinamarquês Olafur Eliasson é a sua
capacidade de questionar o que encaramos como um dado adquirido – a nossa percepção. As
suas obras visam a quebrar a “fé perceptual” que nos assola, desnaturalizando a natureza da
visão humana.

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With his works, Olafur Eliasson places a question mark alongside of the way in which we, in
our relations with the world, seem to naturalize our own visual and bodily experiences to the
point where the world suddenly begins to resemble its own representation. (Ørskou , 2004, p.
9)

As suas obras – entre as quais destaco Your Atmospheric Colour Atlas (2009), Your
Blind Movement (2010) e Din Blinde Passager (2010) – possuem uma natureza
desconstrutiva, que tornam o espectador ciente da sua própria percepção e da série de filtros
socio-culturais que esta possui (Ørskou , 2004, p. 4).

Altering spatial conditions enables the artist to play with ideas of reality, truth and
representation, and encourages viewers to question their sense of their surroundings. (May,
2003, p. 3)

Os trabalhos de Eliasson oferecem aos seus visitantes as ferramentas para que estes se
libertem dos modos tradicionais de percepção e reconheçam a relatividade da visão. As
instalações de Eliasson assemelham-se assim a experiências, com um carácter quase
científico.
Evitam no entanto cair no extremo do descritivo, deixando, pelo contrário, que os
espectadores cheguem livremente às suas próprias conclusões, não impingindo sobre eles
nenhuma tese rígida.

2. No Mundo de Eliasson – um ensaio vivo sobre a Percepção


2.1) Espaços Paradoxais
As obras em questão parecem ter um impacto tão forte nos seus espectadores, em parte,
pelo seu carácter tão invulgarmente singular, tão longe do que é considerado familiar e
espectável na experiência quotidiana (Crary, 1997, p. 10), ainda que estas explorem
problemáticas que são inseparáveis da vivência comum, como o são as questões da percepção.
As instalações de Eliasson são, de certo modo, o total oposto do que seria
tradicionalmente esperado do ambiente de museu e de uma obra de arte.

Here, there is no white cube, no carefully spaced series of rectangles on the wall. There are
no points of focus signified by elaborate bronze frames. I do not feel compelled to pay
attention to detail, read captions and important dates or walk in a prescribed path.
(Engelmann, 2008)

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O seu uso da luz, cor e condições atmosféricas, como a densidade do nevoeiro que
preenche as salas, reconfigura e transforma o ambiente, tornando-o num novo espaço
paradoxal que é simultaneamente uma obra a ser contemplada e um espaço performativo a ser
explorado livremente.
Eliasson cria e apresenta-nos espaços que poderiam ser definidos como duplamente
espectrais. Num primeiro e mais simples sentido referindo-se ao espectro luminoso
newtoniano, cuja variedade cromática explora. Mas, sobretudo, o carácter espectral destas
obras assenta na sua aparência irreal, insubstancial, como se de um fantasma se tratasse
(Crary, 2004, p. 4)

Fig. 2) Din Blinde Passager (2010)

Dentro das instalações de Eliasson não é apenas o espaço físico que é desconstruído,
também o corpo dos seus espectadores parece perder a sua materialidade, sendo
completamente absorvido num mundo de pura percepção, composto apenas de luz e cor.
Eliasson explora o reino do Invisível, mas este já não se encontra ligado ao mundo
místico e inexplicável do paranormal. Trata-se aqui, pelo contrário, de uma invisibilidade que
só pode ser atingida e revelada através da ciência, de experiências que se focam em explorar a
natureza da luz (Gunning, 2009, p. 51 e 52).

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2.2) Construindo a Visibilidade – Luz e Cor
Enquanto desmaterializa o visível, o trabalho de Eliasson, simultânea e paradoxalmente,
tem a capacidade de corporalizar, tornar visível, aspectos usualmente negligenciados da
realidade observável, como a luz e a cor.

By altering atmospheric conditions, the immaterial is materialised, the invisible becomes


visible, what was absent becomes present. Space itself is rendered, not only visible, but
palpable, substantive. The cognitive instrumentality and social significance of these
inversions is made explicit by Your atmospheric colour atlas, a fog-filled room in which thin
columns support a light grillwork fitted with RGB (red, green, blue) lights. The lights turn the
atmosphere into a dense multicoloured fog. (Blau, 2010, p. 7)

A luz, graças às suas


características imateriais, tende
muitas vezes a ser
menosprezada e a sua
importância a ser descurada
em prol dos objectos que esta
ilumina (Eliasson, 2008, p.
81). A sua existência é
considerada, erroneamente,
neutra e o seu carácter
universal. Fig. 3) Your Atmosferic Colour Atlas (2009)

Ao longo da sua obra, e em especial nas instalações em questão, Olafur Eliasson tenta
desnaturalizar a nossa relação com a luz, a chamar atenção para o seu carácter subjectivo e
culturalmente construído. Mas tenta, sobretudo, torna-la num elemento artístico autónomo.

I n many of my artworks I try to address the issue of light by giving it a ‘body’, a tangible
dimension. (Eliasson, 2008, p. 82)

À semelhança da luz, também a cor tende a ser desmistificada nas instalações de


Eliasson.
Pensadores como Descartes e Locke consideravam a cor como algo através do qual era
impossível apreender as “verdades” da realidade exterior, por causa da sua dependência dos
sentidos perceptivos e subsequente falibilidade (Crary, 2004, p. 2)
Na verdade não existem cores algumas no mundo empírico, apenas frequências variadas
de ondas electromagnéticas (Eliasson, 2008, p. 30). A cor só existe como tal quando é olhada

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por alguém. Assim torna-se incrivelmente difícil atribuir-lhe uma definição que não seja, no
mínimo, arbitrária. Apesar de existir um certo acordo intercultural sobre o que caracteriza
cada cor, a opinião pessoal continua a ser uma parte extremamente importante do processo
(Eliasson, 2006, p. 1 e 2).
Apesar da fragilidade do sistema cromático ser algo amplamente estudado cientificamente, o seu
carácter subjectivo raramente é questionado pelo senso- comum. E é para tal que as instalações de
Eliasson tentam alertar, contribuindo para a desconstrução de uma visão universalizada do sistema
cromático (Eliasson, 2006, p. 3).
A cor em Your Atmospheric Colour Atlas (2009), por exemplo, não é apenas uma escolha
estética, é um pensamento crítico reificado. E é também, e talvez mais importantemente, um modo de
criar e modelar ambientes, aos quais a cor confere visibilidade e materialidade.

2.3) Um Momento Singular


Os nossos sentidos apresentam-nos, a cada momento, um mundo caótico e em constante
mudança (Eliasson, 2008, p. 49). É esta mutabilidade que Olafur Eliasson tenta emular nas suas
instalações.
As suas obras são compostas de uma série de momentos singulares e irrepetíveis, variáveis para
cada espectador, e como tal estas desafiam o carácter comodificado e objectificado que é
tradicionalmente atribuído a uma Obra de Arte (Crary, 2004, p. 2)
Mas como acontece no mundo quotidiano, também nas instalações de Eliasson, quando
confrontado com uma corrente caótica de informação sensorial, o cérebro humano tenta estabilizá-la
de modo a ser capaz de conferir-lhe sentido (Eliasson, 2008, p. 49). Tal acontece através de
mecanismos de atenção, que fragmentam a percepção do mundo de modo a ser capaz de reorganizá-la
num sistema coerente e homogéneo (Crary, 1999, p. 24 e 25).

Attention thus became an imprecise way of designating the relative capacity of a subject to
selectively isolate certain contents of a sensory field at the expense of others in the interests
of maintaining an orderly and productive world. (Crary, 1999, p. 17)

No entanto é precisamente a capacidade de atenção localizada e prolongada que acarreta em si


mesma a possibilidade da sua desintegração (Crary, 1999, p. 47). Um excesso de atenção conduz ao
seu oposto e o objecto observado, ao invés de se apresentar como estável – como era inicialmente
pretendido, dissolve-se no meio de diversas aberrações visuais e cromáticas (Crary, 1999, p. 300).
Eliasson acolhe de bom grado essas perturbações visuais, abordando-as criativamente nas suas
instalações (como com a possibilidade de criação de imagens residuais), que ajudam a acentuar o
carácter singular da experiência visual que são as suas obras.

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2.4) O Papel Activo do Espectador
Para Olafur Eliasson, como é possível perceber através das suas obras, ver não é algo passivo,
que nos acontece quer queiramos, quer não. “Seeing is an activity. Seeing is an event.” (Eliasson,
2008, p. 20) O único modo de compreender algo é vivê-lo (Merleau-Ponty, 1945/2005, p. 379) e é com
isso em mente que Eliasson coloca o espectador como o elemento central das suas instalações.

The viewer/user is made a part to the entire process of production and reproduction. She can
enter into the work itself, can occupy the space of transformation between light source and
screen, and can, along with the moving sculptures, be translated into abstract spatio-
temporal projections on a flat screen. Rather than representing the process of spatial
creation, Eliasson enacts that process. (Blau, 2010, p. 6)

As instalações de Eliasson dissolvem as fronteiras pré-estabelecidas entre quem é o autor e quem


é o receptor da obra. Ao recorrer a processos subjectivos e intrinsecamente ligados à corporalidade do
espectador, como é o caso da criação de imagens residuais, Eliasson chama a atenção para a
precariedade das distinções entre o que pertence ao mundo e o que pertence ao espectador (Crary,
2004, p. 1).
O corpo do observador é trazido para a equação, é tornado parte constitutiva da obra,
tornando-se simultaneamente produtor e receptor da experiência sensorial (Crary, 1997, p. 8).

Quite simply, to vividly experience one's own after-images is, at least temporarily, to cease to
be a mere consumer of radiant images or energy from screens, monitors, pages, and other
sources that clutter our lives. It is to recognize one's self as a generator of luminous
phenomena. (Crary, 2004, p. 3)

Paralelamente, o trabalho de Eliasson dissolve também a fronteira entre o corpo do


espectador e o espaço que o rodeia. Eliasson coloca os seus espectadores em espaços que
requerem a sua atenção e participação activa, e não mera contemplação artística, impelindo-os
a entrar em diálogo com o ambiente que os rodeia (Ørskou , 2004, p. 8).
Tal leva a uma reconfiguração da dinâmica entre corpo e espaço, interlaçando-os de tal
modo que deixam de ser apenas os espaços que são alterados pelo sujeito, mas o próprio
espectador que é influenciado e mudado pela sua presença no espaço (Jensen, 2004, p. 3 e 4).

2.5) Destruindo a Ilusão


O trabalho de Eliasson é um veículo para a consciencialização sobre a fragilidade da
percepção humana e sobre o seu carácter culturalmente construído. Explorando e
questionando esta problemática em variados níveis o artista procura assim quebrar a “fé

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perceptual” que assola ainda o senso-comum, criando no espectador não certezas mas sim a
possibilidade de novas interrogações.
Mas, enquanto obra de arte, as instalações de Eliasson são, também elas, uma
construção.
Tal facto é reconhecido e activamente assumido por Eliasson. De modo a enfatizar o
carácter dinâmico e negociável das suas obras, o artista opta por não ocultar os meios técnicos
através dos quais os efeitos são criados.
As suas instalações são simultaneamente o palco da percepção e o seu behind the scenes.
O revelar das técnicas de produção realça o carácter experimental e quasi-científico das obras.
Eliasson chama a este processo de desmistificação e revelação do aparatus tecnológico
‘Seeing yourself seeing.’ (Engelmann, 2008)

By making us conscious of the construction so that we perceive the staging behind the
representation, he also makes us conscious of the act of perception, of being caught in the
moment of awareness. (May, 2003, p. 2)

Conclusão
A finalidade deste texto é explorar os modos como as instalações de Olafur Eliasson
exploram as problemáticas da percepção humana e tentam desnaturalizar a sua natureza.
Inicia-se apresentando o antigo paradigma dominante da percepção humana, que através
de paralelos estabelecidos com o modelo da câmara escura apresentam-na como algo simplista
e objectivo, como um mero mediador da realidade externa.
Em seguida refere-se o século XIX como um momento de mudança, durante o qual
estudos científicos desenvolvidos levam ao questionar da percepção. Estes estudos criam uma
sensação de disjunção entre os mecanismos de percepção e o mundo exterior, revelando o
carácter subjectivo e arbitrário da visão. Destaca-se o papel da memória na percepção, que a
tornam numa experiência mediada pelas espectativas prévias e como tal variável consoante
condicionantes socio-culturais. Frisa-se, contudo, a tendência do senso-comum a continuar a
ignorar estas problemáticas.
Introduzem-se as instalações de Olafur Eliasson como um modo de tentar desnaturalizar a
natureza da visão humana, ao tornar o espectador ciente da sua relatividade. Entra-se na então
especificidade dos modos como as instalações de Eliasson funcionam como um ensaio
experimental, de carácter quasi-científico sobre a percepção humana.
Primeiramente aponta-se o carácter singular e distinto da experiência quotidiana das
obras de Eliasson, nas quais o uso da luz, cor e condições atmosféricas são coordenadas de

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modo a criar novos espaços espectrais, de aparência insubstancial. Nestes o corpo dos
espectadores perde a sua materialidade e estes são confrontados com a exploração do Invisível.
Paradoxalmente expõem-se as instalações de Eliasson como veículos para a construção
do Visível, capazes de materializar a luz e a cor. As obras chamam a atenção para o carácter
subjectivo e arbitrário destes elementos, desnaturalizando a relação do espectador com estes e
usando-os não como meras escolhas estéticas mas como elementos artísticos autónomos, com
uma dimensão tangível.
Evidencia-se ainda o carácter singular e irrepetível das obras de Eliasson, acentuado pelo
seu uso deliberado de mecanismos subjectivos de visão, como as imagens residuais.
Destaca-se o papel do espectador como elemento central das instalações que, ao tornar-se
parte integrante do processo de produção, dilui as fronteiras entre autor e receptor da obra.
Refere-se também o modo como a participação activa do espectador reconfigura as dinâmicas
entre este e o espaço envolvente.
Finalmente revela-se o carácter construído das próprias obras de Eliasson e analisa-se o
modo como a não-ocultação dos meios técnicos acentua o carácter dinâmico e experimental
destas, tornando simultaneamente o espectador ciente do acto de percepção em si mesmo.

Referências
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