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SOLO
P. I. B. de Queiroz
ITA
RESUMO: São discutidas neste trabalho possíveis causas de insucessos em simulações numéricas
de transporte de contaminantes no solo. Discute-se algumas das hipóteses de cálculo que são
freqüentemente adotadas sem questionamento sobre a aplicabilidade das mesmas aos problemas a
serem modelados. Apresenta-se também algumas limitações de métodos de cálculo bastante
empregados, como as formulações de elementos finitos, e algumas soluções analíticas. Comenta-se
também alguns erros de implementação de métodos de cálculo em compiladores e processadores
numéricos.
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supostamente irão acontecer no caso a ser efeito de cargas sobre solo no padrão de fluxo
modelado. da água subterrânea, e consequentemente, no
Deve-se escolher um programa de modelagem transporte de contaminantes. Nenhum dos
numérica adequado para a modelagem programas comerciais mais conhecidos é capaz
proposta. de conduzir uma análise com acoplamento
Deve-se estudar as condições de contorno que entre deformações, fluxo de água e transporte
melhor representem o problema a ser de contaminantes. Apesar de relações como a
modelado. equação de Konzeny-Carman serem aceitas
Sempre que possível, deve-se fazer universalmente, não se estuda a influência do
observações em campo, para que se possa peso de aterros sanitários sobre a
rever o modelo e fazer previsões cada vez permeabilidade do solo de base. Sorek e Adar
melhores. (1992) registraram que a influência do peso de
reservatórios de água sobre o regime de fluxo
Geralmente, inicia-se uma modelagem em aqüíferos em Israel causou afloramento de
numérica modificando um exemplo extraído água salina junto a tais reservatórios, e a
do manual do programa a ser utilizado, ou de evaporação desta água aflorante causou o
algum artigo sobre o assunto. Deste modo, é acúmulo de sal junto a eles.
comum que se adote algumas hipóteses da Outro aspecto pouco questionado nos dias
análise original, sem se fazer questionamentos de hoje diz respeito ao modelo de dispersão a
sobre a validade das mesmas para o problema a ser aplicado. Gelhar et al. (1992, em Domenico
ser tratado. e Schwartz, 1998) analisaram criteriosamente
Um questionamento pouco realizado diz alguns experimentos de campo, e mostram que,
respeito justamente ao primeiro ítem da ao contrário da prática normalmente utilizada,
estratégia proposta acima. Por simplicidade, o coeficiente de dispersão longitudinal não
utiliza-se geralmente a lei de Darcy para deve ser proporcional à escala do problema a
modelar o fluxo da água subterrânea, e utiliza- ser tratado, conforme mostrado na Figura 1.
se a lei de Fick para modelar os fenômenos de Além disto, Domenico e Schwartz também
difusão e dispersão. O maior desestímulo a se fazem ressalvas à aplicação direta do modelo
questionar estas leis parte dos próprios de dispersão Fickiana em maciços fraturados.
programas numéricos, que normalmente não
têm outras leis implementadas. 1E4
1E3
a dispersão solos não saturados são fenômenos
1E2
difíceis de serem formulados de maneira exata; Baixa
entretanto, a influência desta não saturação no 1E1
Mediana
transporte de contaminantes não pode ser 1E0
ignorada. Em uma discussão simplificada Alta
sobre este assunto, o transporte advectivo em 1E-1
308
3. SENSIBILIDADE DOS MODELOS À igual ou próximo a 0,5) é difícil de ser
VARIAÇÃO DOS PARÂMETROS DE modelado pelos métodos convencionais. Na
CÁLCULO história do tratamento numérico deste
problema, buscou-se uma solução através de
A sensibilidade dos modelos numéricos à integração seletiva (vide por exemplo, Reddy,
variação dos parâmetros possui basicamente 1993), mas verificou-se que este método
três aspectos. O primeiro diz respeito ao campo poderia levar a modos de deformação espúrios.
de validade das leis a serem utilizadas no Uma solução razoável foi obtida através de
modelo, assunto abordado no ítem anterior métodos de formulação mista (vide por
deste trabalho. O segundo diz respeito a uma exemplo, Bathe, 1996), nos quais, abandona-se
sensibilidade real, em um modelo bem a convergência monotônica da formulação do
calibrado e convergente. O terceiro aspecto diz método dos deslocamentos, em troca de uma
respeito à convergência do processo numérico formulação convergente de maneira quase
utilizado. independente dos parâmetros de cálculo
O segundo aspecto citado acima é adotados.
geralmente o mais delicado deles, estando
relacionado à confiabilidade dos parâmetros de
campo. Sabe-se por exemplo que a degradação
biológica ou química da maioria dos
contaminantes pode ser bem ajustada por uma
curva exponencial, do mesmo modo que o
decaimento radioativo. Isto se deve ao fato de
que, geralmente existe no solo abundância de
microorganismos e de oxigênio, de modo que a
velocidade de degradação depende somente da
concentração do próprio contaminante. A
curva de decaimento da concentração dos
contaminantes é extremamente sensível à
constante de decaimento. Para se ter uma idéia
desta sensibilidade, apresenta-se na Figura 2
medidas de campo e dois cálculos realizados
para previsão da concentração de éter dietílico
no solo, a partir de um vazamento. Observa-se
que uma avaliação inferior em 10% à meia-
vida real do éter dietílico provocou uma
Figura 2 – Concentrações de contaminante
diferença de duas vezes em sua concentração
calculadas e previstas, após 12 anos da
máxima, após 12 anos. Sabe-se que a constante
contaminação do solo (McLymont e Schwartz,
de decaimento é extremamente sensível à
1987)
temperatura, aos microorganismos existentes
no solo e à presença de outros contaminantes,
No transporte de contaminantes, o
entre outros fatores. Por esta razão, mesmo que
transporte puramente advectivo (ou
esta constante seja obtida através de ensaios
predominantemente advectivo, com número de
em condições semelhantes às do problema a
Peclet elevado) com frente de contaminação
ser tratado, ela deve ser retroanalisada nas
brusca constitui-se ainda em um problema em
leituras de campo, para que se possa prever
aberto. Quando se utiliza o método dos
com mais exatidão leituras futuras.
elementos finitos com formulação de Galerkin
O terceiro aspecto diz respeito ao campo de
no espaço (utilizando-se diferenças finitas ou
validade dos modelos numéricos a serem
elementos finitos no tempo), ocorrem
utilizados. Por exemplo, na mecânica dos
geralmente oscilações numéricas na frente de
corpos deformáveis, sabe-se que um corpo
contaminação, podendo resultar em
elástico incompressível ou quase
concentrações negativas de contaminante
incompressível (com o coeficiente de Poisson
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próximas à frente de contaminação, e problema advectivo-dispersivo, e criou assim
concentrações maiores que as iniciais na um dos primeiros métodos Euleriano-
própria frente de contaminação (vide Figura 3). Lagrangeanos (EL). Os métodos EL
necessitam de muito mais capacidade de
processamento (velocidade e armazenamento)
que os outros métodos, o que torna
impraticável sua aplicação em grandes
domínios. Assim sendo, Neuman propôs um
método adaptativo, em que passa-se do método
EL a um método puramente Euleriano, no
cálculo do transporte, em regiões distantes da
frente de contaminação. A Figura 4 mostra a
solução de um problema advectivo-dispersivo
unidimensional realizada por Nishigaki (1991)
310
Ainda não foi proposto um método Euleriano- comerciais, a possibilidade de se obter alto
Lagrageano com adjuntos localizados bi ou tri- desempenho numérico em C++ pode ser
dimensional, com conservação local e global considerada bastante promissora para a
de massa. Ainda assim, o método original de programação de métodos numéricos em
Neuman, apesar de ser superior aos métodos de transporte de contaminantes, uma vez que a
Galerkin ou Petrov-Galerkin em alguns complexidade dos fenômenos a serem
aspectos, ainda não foi implementado em modelados tende a crescer cada vez mais.
nenhum programa comercial para cálculo Até meados da década de ’80, as operações
numérico de transporte de contaminantes. em ponto flutuante eram bastante
problemáticas, e cada computador (e cada
compilador) tinha seu padrão de manipulação
4. SOBRE A IMPLEMENTAÇÃO DOS numérica. Este fato tornava o transporte de
MÉTODOS NUMÉRICOS programas entre uma máquina e outra um
processo muito pouco confiável. Em 1984, foi
A implementação de métodos numéricos em criada a especificação IEEE 754, que
rotinas de cálculos passa por uma série de padronizava as operações de ponto flutuante,
detalhes que, embora aparentemente não sejam bem como a precisão que cada tipo numérico
do interesse direto do usuário final, certamente deveria suportar. Desde então, William Kahan
influenciarão na velocidade em que os (um dos criadores desta especificação) tem
programas fornecem os resultados, bem como tornado disponível em sua página na
na estabilidade do método de cálculo e na universidade da Califórnia (em
confiabilidade dos mesmos. http://http.cs.berkeley.edu/~wkahan/) fontes de
A confiabilidade de um programa está programas em FORTRAN e assembler (além
intimamente relacionada com o nível da dos próprios executáveis) para testar
linguagem de programação utilizada em sua microprocessadores quanto à concordância a
implementação, entre outros fatores (Sebesta, esta especificação. O professor Kahan também
1993). Segundo Booch (1994), um sistema disponibiliza cópias de vários de seus artigos
estruturado com mais de 10000 linhas deverá onde apresenta métodos de cálculo, bem como
estar no limite de sua confiabilidade para que aponta vários casos de processadores e
sua implementação deva ser realizada através compiladores que não estão em acordo com o
de uma linguagem simplesmente estruturada, IEEE 754, bem como as conseqüências de cada
ou numa linguagem orientada para objetos.A discordância. Entre os erros (ou não
linguagem orientada para objetos mais concordâncias) ao IEEE 754 mais sérios, pode-
indicada para a programação numérica seria o se citar:
C++. No entanto, seu uso em programação
numérica ainda é restrito, e ainda se escreve O erro na instrução de divisão de ponto
mais programas para engenharia em flutuante (FDIV) no Pentium. (Coe et al.,
FORTRAN do que em qualquer outra 1995)
linguagem (Smith, 1995). Isto se deve O erro na conversão de ponto flutuante para
aparentemente ao fato de que, além de existir inteiro no Pentium Pro e no Pentium II.
uma quantidade muito grande de bibliotecas, a (Collins, 1997)
otimização de “loops” em soma de vetores A relutância dos fabricantes de computadores
tornava a velocidade de execução de CDC e Cray em adotar os padrões IEEE
programas em FORTRAN maior do que a 754, alegando redução de velocidade de
implementação do mesmo algoritmo em C++. processamento. (vide artigos na página do
Porém, recentemente, Veldhuizen e prof. Kahan)
Ponnambalam (1996) criaram uma biblioteca A demora dos fabricantes de compiladores a
de vetores e matrizes que iguala ou supera o implementar fornecer facilidades de
desempenho de programas em FORTRAN. tratamento de exceção que já existem há
Embora esta biblioteca utilize recursos de décadas em hardware. (vide artigos na
programação orientada para objetos que não página do prof. Kahan)
estão disponíveis em todos os compiladores
311
As contradições entre a IEEE 754 e as fórmula otimizada (Gradshteyn e Ryzhik,
especificações da linguagem Java (vide 1965), em precisão dupla:
artigos na página do prof. Kahan).
2 ∞
2 k x 2⋅k +1
erfc( x) = 1 − e −x ∑
2
(2)
k = 0 (2 ⋅ k + 1)!!
Embora a IEEE 754 seja clara em relação ao
π
suporte a funções exponenciais e
trigonométricas, ela não diz nada específico a
respeito de outras funções transcedentais, que onde (2⋅k+1)!! = (2⋅k+1)⋅(2⋅k-1)⋅(2⋅k-3)...1.
acabam ficando a cargo de implementações
1
particulares. Portanto, é de se esperar que as
0.8
implementações independentes de funções
1° termo
transcedentais possam sofrer erros ou 0.6
c
2° termo
imprecisões superiores à precisão comum da 0.4
soma
aritmética de ponto flutuante. Um caso típico 0.2
312
solução apresentada na Equação (1), onde Chiou, C.T. (1989). Theoretical Considerations
despreza-se o segundo termo da solução of the partition uptake of nonionic organic
analítica, e despreza-se também a componente compounds by soil organic matter.
de difusão na dispersão hidrodinâmica, Reactions and movement of organic
tomando-se apenas a dispersividade chemicals in soils (Sawhney e Brown, eds.),
longitudinal αx. Soil Science Society of America, Madison.
Celia, M.A. , Russel, T.F. , Herrera, I. , Ewing,
R.E., (1990) An Eulerian-Lagrangean
Localized Adjoint Method for the
C ( x, t ) 1 x − v ⋅t
= ⋅ erfc advection-diffusion equation, em Advances
C0 2 2 ⋅ α ⋅ v ⋅ t 1 / 2
x (4) in Water Resources, vol.13, no. 4, pp.187-
206.
Coe, T. , Mathisen, T. , Moler, C. e Pratt, V.
5. CONCLUSÕES (1995) Computational Aspects of the
Pentium Affair, IEEE Computational
Procurou-se apresentar neste trabalho Science and Engineering, vol. 2 no. 1
algumas das principais causas de inexatidão Collins, R. R. (1997) Inside the Pentium II
dos resultados das análises numéricas, Math Bug, em Dr. Dobb’s Journal, no. 268,
particularmente em geotecnia ambiental. pp. 52-57
Buscou-se também mostrar um panorama Domenico, P. A. e Schwartz, F. W. (1998)
atual, mostrando-se também algumas Physical and Chemical Hidrogeology, 2ª
tendências, perspectivas e sugestões sobre o ed., John Wiley & Sons Inc., New York
assunto, para futuras pesquisas. Gelhar, L. W., Welty, C. e Rehfeldt, K. R.
(1992) A critical review of data on field-
scale dispersion in aquifers. Water
6. AGRADECIMENTOS Resources Research, v. 28 no. 7, pp.1955-
1974.
O autor agradece ao colega de trabalho e Gradshteyn, I. S. e Ryzhik, I. M. (1965) Table
amigo Makoto Namba, por ter traduzido o of Integral Series and Products. Academic
artigo de Nishigaki (1991), um trabalho de Press, New York
valor inestimável, (a ser publicado em Healy, R.W. e Russel, T.F. (1998) Solution of
português, em alguma oportunidade futura), advection-dispersion equation in two
além de haver estudado em conjunto uma série dimensions by a finite-volume Eulerian-
de outros assuntos pertinentes a este trabalho. Lagrangean Localized Adjoint Method,
Advances in Water Resources, vol. 21, no.
1, pp. 11-26
7. REFERÊNCIAS Helmig, R. (1997) Multiphase Flow and
Transport Processes in the Subsurface – a
Abramowitz, M. e Segun, I. A. (1968) contribution to the modeling of
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Bathe, K.-J. (1996) Finite Element Procedures, Mecânica dos Fluidos Computacional,
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Bernat, S. Cambou, B. e Santosa, P. (1997) Rio de Janeiro.
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Booch, G. (1994) Object-Oriented Analysis Neuman, S.P. (1981) Computer Prediction of
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