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O ALIENISTA

O Alienista de Machado de Assis, foi um primeiro passo para a construção de uma crítica da
loucura como lugar de exclusão, não apenas do entrave dos conceitos positivistas, mas por
toda a pretensão de conhecimento e tratamento sobre o tema. Está aí a criação do primeiro
hospital psiquiátrico brasileiro, o Hospício D. Pedro II, em 1852 .

É muito importante contextualizar o tema da loucura na literatura brasileira. Seu surgimento é


dado como nosso marco histórico sobre o tema, com a novela de Joaquim Maria Machado de
Assis (2002) intitulado O Alienista, saindo pela primeira vez no jornal A Estação, do Rio de
Janeiro, entre 15 de outubro de 1881 a 15 de março de 1882; publicado posteriormente na
coletânea Papéis Nada Avulsos, de 1882. Resumidamente, há um grande embate entre teorias
científicas vindas da Europa em sua crassa e irrestrita aplicação. O médico Simão Bacamarte
deixa a corte portuguesa e parte para fundar a Casa Verde, um hospital para alienados, na
cidade fictícia de Itaguaí no Brasil. Fica nítido na criação machadiana, durante boa parte da
narrativa, os critérios para a entrada de um interno na Casa Verde. “O principal nesta minha
obra da Casa Verde é estudar profundamente a loucura, os seus diversos graus, classificar-lhe
os casos, descobrir enfim a causa do fenômeno e o remédio universal.” (ASSIS, 2010: 23).
Machado apresenta a forte crença positivista de uma universalidade por intermédio da razão4
e aí também reside a indistinção de uma racionalidade prolongada até sua plena formalidade.
A ciência, na concepção de Simão Bacamarte, é um conhecimento que chega à verdade,
impreterivelmente. Contudo, como mostra Luciana Hidalgo (2008a: 144), “a certeza científica é
traiçoeira”, pois realiza a dicotomia entre a razão – Bacamarte – e a emoção – Dona Evarista,
sua esposa –, demonstrada na narrativa pela infertilidade do casal. Essas questões interessam
não apenas para a compreensão da narrativa, mas a uma tendência histórica que se gestou no
século XIX acerca da verdade e do conhecimento como objetos que poderiam levar a uma real
transformação da vida ordinária. Assim a doença mental, inicialmente o termo alienação de
Pinel e Esquirol, passa a ser pensado, em sua etimologia, como a perda da consciência sobre si
própria. São estabelecidos diagnósticos para que se conheça e se trate a doença mental5 . Ao
final, é o próprio Simão Bacamarte que torna-se o único paciente da Casa Verde: “A questão é
científica, dizia ele; trata-se de uma doutrina nova, cujo primeiro exemplo sou eu. Reúno em
mim mesmo a teoria e a prática.” (ASSIS, 2002: 70).

Lima barreto

Essa urgência de uma situação-limite que seu gesto literário tenta desesperadamente fazer
entender. É ele também um reflexo de uma angústia (HIDALGO, 2008b). É dessa angústia que
nascerá O Cemitério dos Vivos, obra póstuma que só será lançada no seu todo, e ainda assim
um todo inacabado, em 1956. Essa escrita de emergência, devido à desagregação de sua vida e
à baixa no hospício também estão incluídas na história da psiquiatria. Até que ponto as
instituições psiquiátricas realmente foram capazes de ajudar as pessoas que estão com
problemas psiquiátricos? Esse ponto esbarra com a prática de Philippe Pinel que ao
reconhecer diferentes diagnósticos clínicos busca também diferentes curas8 . O trabalho de
Pinel se aproxima em muito de uma utopia (ODA & DELGALARRONDO, 2007). A ideologia
francesa desenvolvida com Pinel é parte do encontro que Michel Foucault (2004) fez entre o
tratamento clínico e a história da humanidade, o que deu luz mais tarde ao conceito de
biopoder como o conhecimento das ciências para nortearem a vida, naturalizarem as relações
e explicarem o mundo de modo casual. Este foi o grande conflito utópico com o qual Lima
Barreto lutou.

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