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AGÊNCIA NACIONAL DE MINERAÇÃO

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DESPACHO SEI Nº1475/COGER/2020

Processo: 48051.004837/2020-19
Interessado(s): Diretoria Colegiada da Agência Nacional de Mineração, Superintendência de
Arrecadação, Superintendência de Gestão de Pessoas, Coordenação de Gestão de Receitas
Destinatário(s): Diretoria Colegiada da Agência Nacional de Mineração, Superintendência de
Arrecadação, Superintendência de Gestão de Pessoas

A proposta de reestruturação noticiada pela Diretoria Colegiada por e-mail (1917426) a todos os
servidores da ANM em meados de setembro de 2020 implica na extinção da recém-criada
Superintendência de Arrecadação (SAR) sem motivo manifestado ou defensável, além de deixar à
área correspondente no novo arranjo uma quantidade insuficiente de cargos destinados à gestão
(redução de 13 atuais para apenas 3 para cobrir o território continental do Brasil), ou seja,
dificulta enormemente a organização de seu vultoso trabalho (passivo sob cobrança de
aproximadamente R$ 7 bilhões e dezenas de milhares de processos de cobrança).

Mesmo provocada pelos servidores lotados na Arrecadação por Nota de Repúdio assinada e
transmitida via SEI (1917425), a Diretoria Colegiada permaneceu irredutível na implementação da
temerária mudança. Usam como subterfúgio a consultoria da Fundação Dom Cabral (FDC).

A FDC, contratada com dispensa de licitação e por valor flagrantemente elevado, mesmo após
meses de um pretenso trabalho de consultoria supostamente baseado em sua larga experiência em
gestão pública, permanece requisitando dos servidores da ANM, por exemplo, o rol de atribuições
que desempenham (a última neste sentido respondi por e-mail em maio de 2020), algo que seria
o mais básico insumo para que fosse esta instituição realmente capaz de opinar sobre a
reorganização da agência.

A FDC alega, por sua vez, que entende ser possível atribuir cargos de gestão a servidores sem a
respectiva gratificação (isto consta de reunião gravada pelo TEAMS). No extinto DNPM houve
essa situação entre 2004 e 2011; muitos servidores que assumiram ônus semelhante ganharam mais
tarde na Justiça a devida e correspondente remuneração. Onde está a alardeada expertise da FDC
:
em gestão pública ao subsidiar uma decisão que produzirá um passivo trabalhista para a ANM?

Para assumir responsabilidades gestão, diversas daquelas estritamente identificáveis como análise
ou execução, é indispensável competência formal e remuneração adicional sim!
Responsabilidade envolve risco e este, por sua vez, precisa ser remunerado. Um pouco de
conhecimento de Teoria Econômica pode esclarecer muito a respeito.

Nessa mesma reunião que contou com a participação da FDC, um dos diretores da ANM alegou
que para ser gestor de uma área não precisa entender nada a respeito dela (está gravado). O
mesmo cidadão ainda aconselhou (também gravado) que os economistas e contadores da
Arrecadação fossem atrás de políticos por cargos! O que dizer sobre esse tipo de afirmação sem
correr o risco de ofender, não é mesmo?

A questão, senhor Diretor, não são os cargos em si, mas a gestão da área (há uma diferença abissal),
pois esta restará inviabilizada caso chegue a efeito a bisonha reestruturação proposta. Por incrível
que pareça, há quem realmente se importe com isso (gestão), talvez por passar 8 horas diárias ou
mais sofrendo as consequências das históricas mazelas do(a) DNPM/ANM, vendo o tempo de sua
vida sendo desperdiçado por nada no fim das contas (recomendo inteirar-se sobre o mito de Sísifo,
é muito esclarecedor).

Infelizmente as tentativas de reduzir a Arrecadação do DNPM/ANM foram recorrentes ao longo


dos anos. Antes da FDC, ainda nos tempos de DNPM, houve consultoria, contrata então pelo
Ministério de Minas e Energia, que recomendava também a junção da Arrecadação com o
Fiscalização da atividade de mineração propriamente dita. E como isso não aconteceu antes?
Porque áreas da sociedade impactadas pela nefasta medida e os órgãos de controle intervieram de
alguma forma. É inafastável na atividade pública prestar satisfação ao público o tempo todo, ainda
que a repercussão venha a contradizer os anseios dos dirigentes ou governantes do momento. O
Brasil é uma democracia apesar dos pesares.

Antes da criação efetiva da ANM também houve intensa movimentação interna no então DNPM,
apoiada por alguns grupos políticos e entidades de classe, no sentido de passar à Receita Federal do
Brasil a competência de fiscalizar a CFEM (Compensação Financeira pela Exploração de Recursos
Minerais). À época o entendimento (agora aparentemente perdido) era de que essa atividade nada
tinha a ver com a fiscalização da atividade de mineração propriamente dita. Ou seja, conforme a
conveniência do gestor e dos grupos de interesse prevalentes, a natureza da atividade a ser
desempenhada (no caso, a fiscalização da CFEM) muda? Óbvio que não pode ser assim.

Oportuno salientar que a mudança pretendida na estrutura da ANM privilegia funções de livre
nomeação e exoneração ocupáveis por não servidores em detrimento daquelas exclusivas destes,
bem como incrementa a quantidade e a remuneração dos cargos de gestão das áreas meio da
agência em prejuízo das áreas finalísticas, que são as reais prestadoras dos serviços que a sociedade
espera e merece receber. A mudança proposta – e sobre a qual não se admite crítica – vai na
contramão de tudo o que o bom senso preconiza, de todo o arcabouço teórico que sustenta a criação
e manutenção de agências reguladoras.

Sou pai de um casal de gêmeos. Pouco antes deles nascerem, minha esposa quis pintar o quarto que
:
seria deles e disse que eu mesmo seria capaz de fazê-lo, pois qualquer analfabeto conseguiria e que
não havia necessidade de pagar alguém para fazer algo tão banal. Pois bem, descobri do pior jeito
que mesmo coisas aparentemente simples requerem conhecimento e preparo específicos. Ao
invés de gastar apenas uma vez contratando alguém apto, tive a despesa praticamente em dobro,
primeiro fazendo eu mesmo (errado) e, depois, pagando alguém para consertar minha lambança.

Este exemplo da pintura de um cômodo é apenas um dos muitos possíveis para ilustrar a seguinte
máxima: “experiência é o que fica quando os fracassos se acumulam”. Cabe aqui, entretanto,
explicar o que seria um fracasso: trata-se de uma intenção frustrada, não tem necessariamente a ver
com incompetência, mas com uma conclusão trágica. A SAR vai, infelizmente, figurar no meu
repertório.

Apesar de todo esforço despendido pelos técnicos e de toda vontade de acertar dos Chefes de
Divisão, Coordenadores e do Superintendente, não se chegou ao objetivo maior de dar à
Arrecadação o destaque e o reconhecimento merecidos. Ou seja, a SAR fracassou, porém não por
seus deméritos, mas por decisão da Diretoria Colegiada da ANM, que a criou dias antes (por
coincidência) do início de todo o imbróglio da pandemia e decidiu extingui-la precocemente em
proposta repassada por e-mail a todos os servidores da ANM sem sequer considerar seriamente
as críticas a respeito (vê-las aqui 1917425) por mais fundamentadas e polidas que fossem (algo
que, por si só, chama a atenção e faz questionar o porquê de tamanha aversão).

São pouquíssimos técnicos (não chegam a duas dezenas) aptos na ANM a fiscalizar e analisar as
cobranças da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM) em todo o
país e esses procedimentos em NADA, absolutamente NADA, se assemelham a outros tipos de
fiscalização exercidos pela Autarquia, inclusive com relação à formação acadêmica necessária e
indispensável. É totalmente contraproducente e temerário entender que fiscalização é uma
atividade homogênea. É quase como dizer que a Terra é plana, sem dúvidas.

Algo muito semelhante pode ser dito acerca da problemática afeta à distribuição do que é
arrecadado a título de CFEM, pois envolve um rateio extremamente complexo e o estudo anual da
questão para atualização dos parâmetros. Não há mais que duas ou três pessoas capazes de tratar
adequadamente na ANM do assunto. E de que forma elas são tratadas? Como descartáveis,
irrelevantes.

As pessoas certas nas atribuições adequadas, motivas e reconhecidas é condição sine qua non para
alcançar objetivos mais elaborados de gestão. Em um setor com tão poucos profissionais realmente
aptos como a Arrecadação na ANM, seria ainda mais crítico observar tais aspectos, mas nunca foi
assim até a criação da SAR (breve exceção).

Observa-se, no dia-a-dia, que há dois tipos de servidores na ANM – algo herdado do extinto
DNPM – a saber: os “com CREA” (servidores de primeira linha, dignos de algum respeito) e os
“sem CREA” (ou seja, o resto, os descartáveis). Economistas e Contadores – os profissionais aptos
a realizarem as auditorias necessárias à fiscalização da CFEM – não tem CREA, estão no grupo
“errado” (fazem parte do resto), e o trabalho que realizam é “fácil” ou “desimportante” a priori. É
um preconceito estúpido, odioso e injustificável que atrapalha a ANM, que precisa parar de ser
cinicamente negado e passar a ser efetivamente combatido. Muito dessa mentalidade parece habitar
:
a decisão de estrangular a estrutura da Arrecadação, mas não a explica isoladamente.

Fui o primeiro colocado no concurso de 2006 para a área de Economia Mineral, assumi o cargo em
Brasília e defrontei-me com o diretor indicado politicamente (apesar de servidor do DNPM) e
completamente inapto para o cargo sob qualquer ponto de vista, pois não sabia lidar com os
subordinados e não demonstrava ser bom técnico, tão pouco entendia seu papel como gestor. E
quais resultados ele produziu? Nenhum, apenas confusão e conflito. Mas este é apenas um
exemplo, o citei apenas por tê-lo vivido com especial intensidade. É muito deprimente testemunhar
desventura análoga, faz crer que todo o sofrimento é em vão, que o “certo” é permanecer alienado
e indiferente, à mercê de decisões equivocadas, cujas verdadeira motivações não são jamais
apresentadas. A meritocracia não existiu no DNPM e, pelo visto, não chegará à ANM porque não
convém.

A prestação de serviços públicos, por mais sistemas informatizados que se use, se dá sempre
através de pessoas. Mesmo os sistemas mais elaborados precisam de pessoas responsáveis por sua
concepção e manutenção. Sendo assim, seja um mau gestor de pessoas, e logre um mau
resultado como gestor público, eis a tautologia que está sendo deliberadamente ignorada pela
Diretoria Colegiada na ANM com relação ao pessoal lotado na Arrecadação, mas não por falta de
insistentes avisos.

A Coordenação de Gestão de Receitas (COGER), pela qual respondi até a elaboração deste
documento, tem uma intensa relação com a Procuradoria Federal e um volume extremamente
elevado de processos a serem respondidos no SEI diariamente. A maioria deles trata de baixas de
crédito, conversões em renda, pedidos de ressarcimentos ou de compensações, de inscrições no
CADIN, de ajustes diversos em valores de cobranças (inclusive CFEM), entre outros assuntos
menos recorrentes. Todos esses tópicos são corriqueiros, mas não banais, já que exigem
conhecimentos bem sólidos da legislação, de matemática financeira e há risco real de
responsabilização em caso de erro (há casos de cobranças envolvendo milhões, com cálculos
atuarias complexos).

Desde a criação da COGER, ao menos 1500 processos passaram por mim (um volume
expressivo em comparação a qualquer outro setor da ANM), sendo que muitos eu mesmo
analisei (por vezes durante finais de semana) porque os colegas a mim subordinados (apenas 4) não
detinham o conhecimento suficiente para entregar uma conclusão satisfatória em tempo hábil.
Sendo assim, a menos que eu não tivesse um pingo de dignidade, jamais admitiria que
dissessem que trabalho pouco ou, pior, que não faço nada como ocorreu, segundo relatos, em
reunião da Diretoria Colegiada recente. Quem afirmou isso não tem o menor conhecimento de
causa e não mede as consequências do que fala ou faz. Execro esse tipo de fanfarronice. Sim,
trabalho muitíssimo e exijo respeito, não sou “moleque”.

Não bastasse o mencionado volume de processos, ainda estive responsável por tratar junto à
GTGS/SDI e à empresa contratada Squadra das ordens de serviço de manutenção e das evoluções
do atual Sistema de Arrecadação, o qual remonta a 2004 e está muito defasado. São mais de uma
centena de ordens de serviço abertas. Devido ao acúmulo de anos de problemas e da linguagem de
programação antiga, é comum que sejam homologadas “x” ordens de serviço e abertas “x + ∆”
com novos transtornos em um mesmo intervalor de tempo (ao longo de uma semana ou de um mês,
:
por exemplo). Cada homologação que faço implica em gasto para a ANM. É uma tarefa que exige
resiliência, conhecimento e responsabilidade (recebo muitas críticas injustas, aturo muitas
cobranças sem o devido embasamento), então não é algo que qualquer um consegue fazer.

Não satisfeito com o volume de processos descomunal e com a quantidade crescente de ordens de
serviço relacionadas ao Sistema de Arrecadação atual, estive a frete também do projeto que
pretende substituí-lo gradualmente. Devido à natureza e a dimensão do problema, trata-se de
assunto extremamente complexo que exige conhecimento teórico e prático. Sou economista e lido
com o Sistema de Arrecadação desde 2009. Também com relação a este novo sistema, chamado de
SINARC, meu “aceite” de cada entrega realizada pela Squadra implica em vultoso dispêndio para a
ANM. Não é tarefa que se pode exercer sem conhecimento e responsabilidade, não é adequada a
qualquer um.

Apesar de toda sobrecarga de trabalho relatada nos últimos três parágrafos, gostaria de continuar
desempenhando todas essas atribuições, pois: (1º) preciso do dinheiro extra que a função de
coordenador proporciona (sim, trabalho por dinheiro, que inusitado, não? Prefiro trabalhar e
merecer que depender de favor) e (2º) entendo-me competente para tanto, mas não há o devido
reconhecimento fora da Arrecadação e não há mais ambiente em virtude da absurda hostilidade
por parte da Diretoria Colegiada. Como ter motivação de lidar com tantos afazeres complexos
em meio a um contexto tão adverso e injusto? Se existe, não conheço. Adoece viver assim e
preciso perdurar por mais alguns anos para terminar de criar meus filhos.

Houve manifestação documental dos diretores no sentido de substituir todo o quadro diretivo da
SAR, o que denota falta de confiança deles em nós (embora por motivo até agora “secreto”).
Também houve o encaminhamento da nota de repúdio assinada pelos 70 servidores lotados na
Arrecadação contra a extinção da SAR para a Corregedoria (para apurar o quê não se sabe, é
incompreensível), o que significa uma óbvia intenção de constranger, censurar e dissuadir
qualquer tipo de crítica. Porém, as razões que os levaram a tais medidas fazem-me crer que não
sou mesmo adequado, pois meu compromisso é com a probidade e o interesse público. Se tiver que
criticar qualquer decisão da Diretoria Colegiada por observância a estes princípios, o farei. Nunca
fui e não me tornarei um adulador por mais que precise do dinheiro de uma função. Trabalho
para merecer o que ganho, mas se o mérito é insuficiente, o que posso fazer, não é?

Quanto ao Superintendente de Arrecadação, o colega Eduardo Alvaro Pinto de Freitas Neto, é dos
mais aptos e interessados técnicos que a ANM possui. Em toda a Autarquia há poucos como ele e,
na Arrecadação, dois ou três se tanto. Foi, sem dúvida, a melhor escolha para o cargo e será
defenestrado pelas piores razões possíveis. É vergonhoso, ultrajante e profundamente injusto a
tratamento dispensado a todos os servidores lotados na Arrecadação, mas em especial ao
Eduardo.

Importante, neste ponto, registrar explicitamente: a quais interesses serve a decisão de reduzir a
um mínimo claustrofóbico, inviabilizador, a estrutura da Arrecadação? Quem ganha com uma
ANM crescentemente incapaz de fiscalizar a CFEM? Quem se beneficia com a provável
insegurança na distribuição da CFEM? Seriam as grandes empresas devedoras contumazes? Seriam
os milhares de mineradores inscritos no CADIN? Seriam os sindicatos de produtores, assíduos
frequentadores de gabinetes e patronos de lobby? A quem se destinam os cargos que serão criados
:
com o sacrifício da área finalística da ANM? Serão esses cargos moeda de troca na lúgubre
barganha política que arrasta o país para o cadafalso? Honestamente, a sociedade brasileira e os
entes beneficiários da CFEM vão perder, isso é certo. A quem realmente interessa a
desestruturação da Arrecadação? Infelizmente são perguntas que permanecerão apenas retóricas,
não acredito que as respostas venham à luz. Não acredito que os órgãos de controle ou nossos
legisladores, supostos fiscais do Poder Executivo, vão tomar alguma iniciativa. Sou brasileiro há
quase 42 anos, se ainda tivesse esperança em algo seria muito tolo.

Por todo o exposto, por dever de consciência e com muitíssimo pesar, solicito minha imediata
exoneração tanto do cargo de Coordenador de Gestão de Receitas (Portaria nº 204/2020)
como da condição de substituto eventual do Superintendente de Arrecadação (Portaria nº
354/2020). A SAR tornou-se mais uma oportunidade tragicamente perdida, mais uma experiência
malograda. “Parabéns” à Diretoria Colegiada da ANM, a responsabilidade é toda sua!

Documento assinado eletronicamente por Luciano Ribeiro da Silva, Coordenador de


Gestão de Receitas, em 10/11/2020, às 21:38, conforme horário oficial de Brasília, com
fundamento no § 1º, do art. 6º, do Decreto nº8.539/2015.

A autenticidade do documento pode ser conferida no site www.anm.gov.br/autenticidade,


informando o código verificador 1917443 e o código CRC 55F150EF.

48051.004837/2020-19 1917443v9
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