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CONCENTRAÇÃO DE TENSÃO AO REDOR DE UM FURO CIRCULAR EM PLACA

SUBMETIDA A TRAÇÃO UNIAXIAL

Bruno Mastrandrea
Miqueias da Costa Oliveira
Thiago Leister Sá

RESUMO
Esse trabalho propõe analisar por meio de simulações em elementos finitos os efeitos do diâmetro na concentração de
tensões na borda do furo em uma placa de dimensões finitas submetida a tração uniaxial e comparar os resultados das
tensões obtidas com as formulações empíricas deste tipo de problema.

1. INTRODUÇÃO
A análise tradicional de tensões não leva em
consideração os efeitos localizados nas transições
geométricas bruscas como furos, rasgos e entalhes das
peças em estudo. Esses efeitos de tensões localizadas são
de grande importância na avaliação da resistência
estrutural de componentes, como por exemplo na indústria
automobilística, aeronáutica e aeroespacial, pois podem
gerar localmente tensões muito maiores do que as tensões
Figura 1 – Placa infinita submetida a tração uniaxial
no restante da estrutura ou sólido gerando pontos de
propagação de trincas e rupturas bruscas. Tais efeitos são Nesta formulação percebe-se que para 𝑟 = 𝑎 as
de grande importância nas análises da mecânica da fratura. tensões 𝜎𝑟 e 𝜏𝑟𝜃 são nulas, ou seja, ao longo da borda do
Para uma primeira compreensão deste fenômeno furo somente encontram-se tensões normais tangenciais
propõe-se analisar o efeito da concentração de tensões ao furo.
causado por um orifício circular em uma chapa de 𝜎𝜃 (𝑟 = 𝑎) = 𝑇(1 − 2 cos 2𝜃)
dimensões finitas submetida a um estado de tensões 𝜎𝜃 (𝑎, 0) = −𝑇 ; 𝜎𝜃 (𝑎, 𝜋⁄2) = 3𝑇
uniaxial. Havendo uma tensão de compressão, na borda do furo
Para tanto três diferentes situações foram avaliadas por alinhada com o eixo x, de mesma intensidade que a tensão
meio de análises de modelos em elementos finitos no aplicada, e uma tensão de tração, na borda do furo
software ANSYS e seus resultados comparados com a alinhada com eixo y, três vezes maior que a tensão
formulação empírica encontrada na literatura para este aplicada. Logo a presença do furo na placa causou uma
problema em específico. amplificação significativa das tensões, ainda que este furo
2. CONCENTRAÇÃO DE TENSÃO EM UM FURO tenha dimensões muito menores do que a placa. Este fator
CIRCULAR 3x observado é denominado de fator de concentração de
tensão e relaciona a máxima tensão observada ao redor de
O problema de tensões em torno de um furo circular
uma singularidade (furo, entalhe, chanfro etc.) com as
em uma placa foi abordado pelo Prof. Ernst G. Kirsch em
tensões aplicadas no sólido.
1898 que obteve uma formulação exata para o campo de
Este mesmo problema, no entanto, para uma placa de
tensões no caso de uma placa infinita, ou de dimensões
largura finita, não possui uma solução analítica derivada
muito maiores que o furo. Este campo, definido em
diretamente das equações de equilíbrio da teoria da
coordenadas polares com origem no centro do furo, para
elasticidade. Para tanto a concentração de tensão foi
um furo de diâmetro 𝑑 = 2𝑎 e tensão aplicada T pode ser
estudada e avaliada por meio de diversos ensaios de
expresso para um ponto 𝑃 = (𝑟, 𝜃) como: modelos fotoelásticos conforme mostra a Figura 2.
𝑇 𝑎2 𝑇 3𝑎4 4𝑎2
𝜎𝑟 = (1 − 2 ) + (1 + 4 − 2 ) cos 2𝜃
2 𝑟 2 𝑟 𝑟
2 4
𝑇 𝑎 𝑇 3𝑎
𝜎𝜃 = (1 + 2 ) − (1 + 4 ) cos 2𝜃
2 𝑟 2 𝑟
4 2
𝑇 3𝑎 2𝑎
𝜏𝑟𝜃 = − (1 − 4 + 2 ) sin 2𝜃
2 𝑟 𝑟

Figura 2 – Modelo fotoelástico de uma placa finita com furo


central submetida a tração uniaxial (FONTE: [1])
1
Nestes casos, a concentração de tensão não é mais direção x restringidos, já que, sendo estas faces
relacionada diretamente com a tensão aplicada nas pertencentes aos eixos de simetria do problema geral não
extremidades da placa, mas sim com a tensão esperada na apresentam deslocamentos normais. Uma única carga
seção líquida da placa, definida pela largura menos o uniforme e paralela ao eixo x é aplicada no modelo na face
diâmetro do furo, denominada de tensão nominal. Através de extremidade x=L/2.
destes ensaios foi desenvolvida uma expressão polinomial
aproximada para esta relação.
𝑃
𝜎𝑚𝑎𝑥 = 𝜎𝜃 (𝑎, 𝜋⁄2); 𝜎𝑛𝑜𝑚 =
(𝐻 − 𝑑)𝑡
𝜎𝑚𝑎𝑥 = 𝛼 𝜎𝑛𝑜𝑚
2 3
𝛼 = 3,00 − 3,13(𝑑⁄𝐻) + 3,66(𝑑⁄𝐻) − 1,53(𝑑⁄𝐻 )

Interessante observar que para 𝑑 ⁄𝐻 ≪ 1, ou seja, Figura 4 – Modelo reduzido considerando dupla simetria do
diâmetro do furo muito menor que a altura da placa, problema estudado
obtém-se 𝛼 = 3 e recaindo sobre o a solução analítica de
O material adotado na modelagem numérica é
Kirsch para a placa infinita.
homogêneo, isótropo e de comportamento elástico-linear,
Definindo a tensão aplicada ao longe com relação a
sendo considerado o aço para as propriedades mecânicas
carga aplicada e as dimensões da placa, pode-se definir
de módulo de elasticidade E = 200 GPa e coeficiente de
um fator de concentração de tensão.
𝑃 Poisson ν = 0,30.
𝜎𝑚𝑎𝑥 𝛼 (𝐻 − 𝑑)𝑡 𝐻 𝛼
𝐹𝑐 = = =𝛼 =
𝜎∞ 𝑃 (𝐻 − 𝑑) 𝑑
𝐻𝑡 (1 − )
𝐻
Neste caso, quando d se aproxima de H, apesar de 𝛼 se
aproximar de 2, a área da seção líquida tende a zero e,
portanto, o fator de concentração de tensão vai a infinito,
já que relaciona a tensão máxima na seção líquida com a
tensão aplicada.
3. RESULTADOS
Foram realizados três casos de simulação variando o
diâmetro do furo e mantendo as dimensões da placa e
carga aplicada. A placa adotada nos modelos tem 10 cm
de comprimento, 2 cm de altura e 1 mm de espessura Figura 5 – Malhas de elementos finitos utilizadas nas análises
uniforme. A carga aplicada ao longe foi de 4 N, gerando
Foram utilizados elementos sólidos tridimensionais
uma tensão de tração uniforme de 200 kPa na extremidade
prismáticos de base quadrilátera e aproximação linear. A
da placa. Os diâmetros de furo analisados foram 0,33 cm,
malha foi gerada com otimização por curvatura
0,67 cm e 1,0 cm, respectivamente uma relação d/H de
possibilitando assim maximizar a discretização da malha
0,165, 0,335 e 0,50.
dentro das limitações da versão gratuita do software que
permitisse fornecer o resultado mais refinado possível. Os
elementos obtidos variam de dimensões máximas de 0,3
cm a mínimas de 0,0006 cm. A simulação foi realizada
considerando-se linearidade geométrica.

Figura 3 – Problema da placa finita com furo centralizado


submetida a tração uniaxial

Devido a dupla simetria do problema é possível


reduzir a carga computacional analisando apenas um
quadrante de placa com as devidas condições de contorno
que mantenham o problema reduzido equivalente ao
problema inicial.
Para tanto, em um quarto de placa as condições de
contorno utilizadas foram que a face da placa em y=0 está
apenas com os deslocamentos na direção y restringidos e
a face em x=0 está apenas com os deslocamentos na Figura 6 – Resultado das simulações em elementos finitos para
os 3 casos de diâmetro

2
Na Figura 6 são apresentados os resultados das
simulações para os três casos de diâmetro analisados.
Como indicado pela solução analítica de Kirsch para a
placa infinita e observado no modelo fotoelástico para
placas finitas, ocorre uma concentração de tensão de
tração no ponto 𝑃 = (𝑎, 𝜋⁄2) na borda do furo sobre o
eixo y. Conforme o diâmetro do furo aumenta percebe-se
um aumento nesta tensão máxima na borda 𝜎𝜃 (𝑎, 𝜋⁄2).
A Tabela 1 apresenta os valores das tensões máximas
obtidas para cada relação d/H e o fator de concentração de
tensão obtido. A tabela também compara estes valores
com os esperados pela formulação empírica apresentada.
A diferença entre a simulação em elementos finitos e a Figura 8 – Comparação gráfica do fator 𝛼 definido na
formulação empírica foi abaixo de 4% para os diâmetros formulação empírica com as simulações
analisados, sendo maior para diâmetros maiores de furo.
4. CONCLUSÕES
Tabela 1 – Comparação do fator de concentração de tensão
obtido em MEF com fórmula empírica A distribuição das tensões na região do furo do modelo
numérico segue a mesma distribuição prevista na solução
σmax [kPa] Fc
d/H dif % analítica e com valores próximos a formulação empírica.
MEF Empír. MEF Empír. Pode-se observar um desvio dos resultados obtidos
0,165 628,2 617,1 3,141 3,085 1,8 pela análise de elementos finitos em relação aos obtidos a
0,335 715,4 694,9 3,577 3,466 3,2 partir das expressões empíricas à medida em que o
0,500 897,1 863,5 4,486 4,317 3,9 diâmetro do furo aumenta. Porém, dada a grandeza do
desvio (entre 2 e 4%), pode-se concluir que a análise por
A Figura 7 apresenta os valores de fator de elementos finitos fornece resultados satisfatórios ao
concentração de tensão obtidos nas simulações de problema estudado.
elementos finitos comparados com a função empírica
5. REFERÊNCIAS
apresentada no texto. Pode-se observar o aumento dos
fatores simulados e empíricos conforme o diâmetro do [1] YOUNG, W. C. e BUDYNAS, R. G. Roark’s
furo se aproxima da altura da placa. Formulas for Stress and Strain. New York:
McGraw-Hill, 7th edition, 2002.
[2] TIMOSHENKO, S. P. e GOODIER, J. N. Theory
of Elasticity. New York: McGraw-Hill, 2nd
edition, 1951.
[3] SADD, M. H. Elasticity – Theory, Application
and Numerics. Oxford: Academic Press, 2nd
edition, 2009
[4] PILKEI, W. D. Peterson's Stress Concentration
Factors. New York: John Wiley & Sons, 2nd
edition, 1997

Figura 7 – Comparação gráfica do fator concentrador de


tensão para as simulações realizadas

A Figura 8 apresenta em vez do fator de concentração


de tensão, o fator 𝛼 que relaciona tensão máxima com a
tensão nominal na seção líquida, e novamente os valores
obtidos comparados com a função empírica apresentada.

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