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Rodolfo Viana PeReiRa

Thiago Coelho SaCCheTTo


ORGANIZADORES

ADVOCACIA PÚBLICA
EM FOCO
DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA
NA ESFERA ADMINISTRATIVA: ENFRENTAMENTO
À CORRUPÇÃO, À BURLA A SANÇÕES, AO ABUSO
DE FORMA E FRAUDE À LEI DE LICITAÇÕES

Renata Tatiana Nunes Junqueira Franco1

1. INTRODUÇÃO

As sanções de inidoneidade, impedimentos de participar de licitações e de con-


tratar com o Estado almejam evitar abuso de forma e fraude à Lei de Licitações.
São penalidades direcionadas às pessoas jurídicas contratadas, não interferindo as
pessoas físicas que compõe o quadro societário. Ocorre que os sócios das empresas
faltosas constituíam novas empresas com o mesmo objeto social para participar de
licitações e contratar com a Administração, desviando das sanções cominadas. Nesse
contexto, a desconsideração da personalidade jurídica no âmbito dos processos ad-
ministrativos se mostrou salutar mecanismo a propiciar a efetivação das penalidades
impostas. Em observância aos princípios da moralidade administrativa e da indispo-
nibilidade dos interesses públicos, os tribunais judiciais e a corte de contas vinham
admitindo a tese, ainda que inexistente previsão legal específica. Por sua vez, a Lei nº
12.846/2013, ao dispor sobre a responsabilização administrativa e civil de pessoas
jurídicas pela prática de atos contra a Administração Pública, nacional ou estrangeira,
disciplinou expressamente a desconsideração sempre que a personalidade jurídica for
utilizada com abuso do direito para facilitar, encobrir ou dissimular a prática de atos
ilícitos ou provocar confusão patrimonial, estendendo as sanções aplicadas à pessoa
jurídica aos seus administradores e sócios com poderes de administração. O presente
estudo tratará da tese da desconsideração da personalidade jurídica na esfera admi-
nistrativa antes e após a edição da Lei nº 12.846/2013, além dos decorrentes efeitos
na responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas e de seus responsá-
veis pela prática de atos contra a Administração Pública.

1 Pós-graduada em Advocacia Pública pela Escola da Advocacia-Geral da União – AGU/Instituto para o


Desenvolvimento Democrático – IDDE, Belo Horizonte-MG. Pós-graduada em Direito do Trabalho e Pro-
cesso do Trabalho pela Universidade Anhanguera – UNIDERP. Pós-graduada em Direito Civil e Processo
Civil pela Universidade Católica Dom Bosco. Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Mato
Grosso. Procuradora Federal no Estado de Mato Grosso.

FRANCO, Renata Tatiana Nunes Junqueira. Desconsideração da personalidade jurídica na esfera administrativa: enfrentamento à corrupção, à
burla a sanções, ao abuso de forma e fraude à lei de licitações. In: PEREIRA, Rodolfo Viana; SACCHETTO,Thiago Coelho (Orgs.). Advocacia
pública em foco. Belo Horizonte: IDDE, 2017. p. 91-128. ISBN 978-85-67134-03-1. Disponível em: <http://bit.ly/2mmm20G>
2. PROIBIÇÕES DE PARTICIPAR DE LICITAÇÕES E DE CONTRATAR COM A ADMI-
NISTRAÇÃO PÚBLICA

A aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica nas licita-


ções e contratações com a Administração Pública, representa eficaz ferramenta da
gestão pública para o combate dos expedientes de constituição de nova sociedade
empresária como manobra à aplicação das normas que vedam a participação de pes-
soas jurídicas e físicas em processos seletivos para contratação pela Administração
Pública.
É que nesses casos, a previsão legal de impedimentos e sanções existentes
não é suficiente, por si só, para coibir a participação dos impedidos e/ou punidos
em processos licitatórios e nas contratações de bens ou serviços, sob o manto de
sociedade empresária diversa, porquanto esta possui personalidade própria que não
se confunde com a da pessoa física e de seus sócios, não se podendo alcançar o
patrimônio daquela para quitar obrigações desta(es) última(os).
Proibições para que pessoas físicas ou jurídicas participem de licitações ou
contratem com o Estado foram fixadas pela Lei nº 8.666/1993, ao regulamentar o
artigo 37, inciso XXI da Constituição Federal, trazendo normas gerais sobre licitações
e contratos para órgãos da administração direta, fundos especiais, autarquias, funda-
ções públicas, empresas públicas, sociedades de economia mista e demais entidades
controladas pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios.
As hipóteses de impedimento constituem exceção à regra geral da ampla par-
ticipação em certames seletivos, a qual traduz opção política da CF/88 pela demo-
cratização do acesso aos cargos e empregos públicos por concurso público e aos
contratos administrativos por licitação (artigo 37, incisos II e XXI).
O procedimento administrativo para eleição das propostas mais vantajosas para
o interesse público deve atender aos princípios que regem a Administração Pública2,
sendo que além das normas positivadas, tais comandos também parametrizam as
hipóteses de impedimentos, que continuam configurando exceção, mas podem de-
correr de norma proibitiva específica ou de princípios, em aplicação contemporânea

2 Art. 37, caput, da Constituição Federal que prevê expressamente que a Administração Pública obe-
decerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e artigo 3º
da Lei nº 8.666/1993 que assegura que a licitação destina-se a garantir a observância do princípio da
isonomia e será processada e julgada em conformidade estrita com os princípios da legalidade, da im-
pessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação
ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos.

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flexibilizada do recurso hermenêutico à analogia e à extensão, afastando-se da antiga
tese de que exceções não admitem interpretações analógicas ou extensivas.
Nessa esteira, como ensina Celso Antônio Bandeira de Mello3:

[...] violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma. A de-
satenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento
obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É ainda a mais grave forma de
ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido,
porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valo-
res fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão
de sua estrutura mestra.

Como o impedimento está associado à imparcialidade ou à isenção do sujeito,


que pode ser o agente público ou a pessoa física ou jurídica que almeja o vínculo
contratual administrativo, a referência às regras do Direito Processual que consolidam
as situações de impedimento ou suspeição do juiz e de outros auxiliares da prestação
jurisdicional consubstanciados nos artigos 144 a 148 do Código de Processo Civil
(artigos 134 a 138 do anterior Código de Processo Civil) é suficiente à condução dos
procedimentos licitatórios e contratuais. Em suma, é a imparcialidade comprometida
que leva ao impedimento e a evolução do conceito de imparcialidade, aplicado em sin-
tonia com os princípios da isonomia, moralidade e imparcialidade conduz a satisfatória
identificação da relação de isenção dos agentes públicos e demais participantes do
processo para aplicação de recursos públicos na consecução dos interesses públicos.
No artigo 9º da Lei nº 8.666/1993 verificam-se hipóteses de impedimentos
de participar de licitações e de contratar com o Estado, decorrentes de conflito de
interesses público e privado:

Art. 9º. Não poderá participar, direta ou indiretamente, da licitação ou da execu-


ção de obra ou serviço e do fornecimento de bens a eles necessários:

I – o autor do projeto, básico ou executivo, pessoa física ou jurídica;

II – empresa, isoladamente ou em consórcio, responsável pela elaboração do


projeto básico ou executivo ou da qual o autor do projeto seja dirigente, gerente,
acionista ou detentor de mais de 5% (cinco por cento) do capital com direito a
voto ou controlador, responsável técnico ou subcontratado.

III – servidor ou dirigente de órgão ou entidade contratante ou responsável pela


licitação.

3 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 32. ed., rev. e atual. até a EC 84,
de 02.12.2014, São Paulo: Malheiros, 2015, p. 54.

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§ 1º É permitida a participação do autor do projeto ou da empresa a que se
refere o inciso II deste artigo, na licitação de obra ou serviço, ou na execução,
como consultor ou técnico, nas funções de fiscalização, supervisão ou geren-
ciamento, exclusivamente a serviço da Administração interessada.

§ 2º O disposto neste artigo não impede a licitação ou contratação de obra ou


serviço que inclua a elaboração de projeto executivo como encargo do contra-
tado ou pelo preço previamente fixado pela Administração.

§ 3º Considera-se participação indireta, para fins do disposto neste artigo, a


existência de qualquer vínculo de natureza técnica, comercial, econômica, fi-
nanceira ou trabalhista entre o autor do projeto, pessoa física ou jurídica, e o
licitante ou responsável pelos serviços, fornecimentos e obras, incluindo-se os
fornecimentos de bens e serviços a estes necessários.

§ 4º O disposto no parágrafo anterior aplica-se aos membros da comissão de


licitação.

A previsão legal intenta evitar que as informações que a Administração deseja


manter reservadas sejam indevidamente divulgadas pelo autor do projeto ou por ser-
vidor, antes da publicidade oficial.
O dispositivo transcrito não abarca parente do servidor ou dirigente da enti-
dade pública licitante, mas essa contratação agride os princípios constitucionais da
impessoalidade e da isonomia, pois poderia conduzir privilégios e favorecimentos, o
que justificaria a vedação. Nesse sentido o Supremo Tribunal Federal vedou a prática
do nepotismo nos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, esclarecendo não ser
necessária edição de lei formal para coibir a conduta, medida já amparada diretamente
nos princípios do artigo 37 da CF/88 (Julgamento do RE nº 579.951-4-RN, Rel. Mi-
nistro Ricardo Lewandowski).
Por sua vez, o impedimento de licitar e contratar com a Administração Pública
por efeito de sanção administrativa aplicada foi disciplinado na Lei nº 8.666/1993, e
em leis específicas.
Nos moldes do artigo 87, da Lei nº 8.666/1993 a Administração poderá, garan-
tida a prévia defesa, aplicar ao contratado as seguintes sanções pela inexecução total
ou parcial do contrato:

I – advertência;

II – multa, na forma prevista no instrumento convocatório ou no contrato;

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III – suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de con-
tratar com a Administração, por prazo não superior a 2 (dois) anos;

IV – declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração


Pública enquanto perdurarem os motivos determinantes da punição ou até que
seja promovida a reabilitação perante a própria autoridade que aplicou a pena-
lidade, que será concedida sempre que o contratado ressarcir a Administração
pelos prejuízos resultantes e após decorrido o prazo da sanção aplicada com
base no inciso anterior.

O artigo 88 do mencionado texto legal dispõe que “as sanções previstas nos
incisos III e IV do artigo anterior poderão também ser aplicadas às empresas ou aos
profissionais que, em razão dos contratos regidos” pela Lei de Licitações:

I – tenham sofrido condenação definitiva por praticarem, por meios dolosos,


fraude fiscal no recolhimento de quaisquer tributos;

II – tenham praticado atos ilícitos visando a frustrar os objetivos da licitação;

III – demonstrem não possuir idoneidade para contratar com a Administração


em virtude de atos ilícitos praticados.

A Lei nº 8.443/1992 (Lei Orgânica do Tribunal de Contas da União) já estabe-


lecia, em seu artigo 46, se verificada a ocorrência de fraude comprovada à licitação,
o Tribunal declarará a inidoneidade do licitante fraudador para participar, por até cinco
anos, de licitação na Administração Pública Federal.
Na Lei nº 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa) verifica-se:

Art. 12. Independentemente das sanções penais, civis e administrativas pre-


vistas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade
sujeito às seguintes cominações, que podem ser aplicadas isolada ou cumu-
lativamente, de acordo com a gravidade do fato: (Redação dada pela Lei nº
12.120/2009).

I – na hipótese do artigo 9º, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente


ao patrimônio, ressarcimento integral do dano, quando houver, perda da função
pública, suspensão dos direitos políticos de oito a dez anos, pagamento de
multa civil de até três vezes o valor do acréscimo patrimonial e proibição de
contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou
creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica
da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de dez anos;

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II – na hipótese do artigo 10, ressarcimento integral do dano, perda dos bens ou
valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, se concorrer esta circunstância,
perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de cinco a oito anos,
pagamento de multa civil de até duas vezes o valor do dano e proibição de
contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou
creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica
da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos;

III – na hipótese do artigo 11, ressarcimento integral do dano, se houver, perda


da função pública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, paga-
mento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo
agente e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou
incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermé-
dio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos.

IV – na hipótese prevista no art. 10-A, perda da função pública, suspensão


dos direitos políticos de 5 (cinco) a 8 (oito) anos e multa civil de até 3 (três)
vezes o valor do benefício financeiro ou tributário concedido. (Incluído pela Lei
Complementar nº 157, de 2016)

Na Lei nº 9.605/1998, que dispõe sobre as sanções penais e administrativas


derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente:

Art. 72. As infrações administrativas são punidas com as seguintes sanções,


observado o disposto no artigo 6º: [...]

XI – restritiva de direitos. [...]

§ 8º As sanções restritivas de direito são: [...]

V – proibição de contratar com a Administração Pública, pelo período de até


três anos.

Na Lei nº 10.520/2002, que instituiu a modalidade de licitação denominada


pregão, para aquisição de bens e serviços comuns, no âmbito da União, Estados,
Distrito Federal e Municípios:

Art. 7º. Quem, convocado dentro do prazo de validade da sua proposta, não
celebrar o contrato, deixar de entregar ou apresentar documentação falsa exi-
gida para o certame, ensejar o retardamento da execução de seu objeto, não
mantiver a proposta, falhar ou fraudar na execução do contrato, comportar-se
de modo inidôneo ou cometer fraude fiscal, ficará impedido de licitar e contratar
com a União, Estados, Distrito Federal ou Municípios e, será descredenciado
no Sicaf, ou nos sistemas de cadastramento de fornecedores a que se refere o

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inciso XIV do artigo 4º desta Lei, pelo prazo de até 5 (cinco) anos, sem prejuízo
das multas previstas em edital e no contrato e das demais cominações legais.

A Lei nº 12.529/2011, que estrutura o Sistema Brasileiro de Defesa da Concor-


rência, dispõe sobre a prevenção e a repressão às infrações contra a ordem econô-
mica e dá outras providências, fixa:

Art. 38. Sem prejuízo das penas cominadas no art. 37 desta Lei, quando assim
exigir a gravidade dos fatos ou o interesse público geral, poderão ser impostas
as seguintes penas, isolada ou cumulativamente:

[...]

II – a proibição de contratar com instituições financeiras oficiais e participar de


licitação tendo por objeto aquisições, alienações, realização de obras e servi-
ços, concessão de serviços públicos, na administração pública federal, esta-
dual, municipal e do Distrito Federal, bem como em entidades da administração
indireta, por prazo não inferior a 5 (cinco) anos;

A Lei nº 12.846/2013, que trata da responsabilização administrativa e civil de


pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou
estrangeira, prevê:

Art. 6º. Na esfera administrativa, serão aplicadas às pessoas jurídicas conside-


radas responsáveis pelos atos lesivos previstos nesta Lei as seguintes sanções:

I – multa, no valor de 0,1% (um décimo por cento) a 20% (vinte por cento) do
faturamento bruto do último exercício anterior ao da instauração do processo
administrativo, excluídos os tributos, a qual nunca será inferior à vantagem au-
ferida, quando for possível sua estimação; e

II – publicação extraordinária da decisão condenatória.

[...]

Art. 19. Em razão da prática de atos previstos no artigo 5º desta Lei, a União,
os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, por meio das respectivas Ad-
vocacias Públicas ou órgãos de representação judicial, ou equivalentes, e o
Ministério Público, poderão ajuizar ação com vistas à aplicação das seguintes
sanções às pessoas jurídicas infratoras:

I – perdimento dos bens, direitos ou valores que representem vantagem ou


proveito direta ou indiretamente obtidos da infração, ressalvado o direito do
lesado ou de terceiro de boa-fé;

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II – suspensão ou interdição parcial de suas atividades;

III – dissolução compulsória da pessoa jurídica;

IV – proibição de receber incentivos, subsídios, subvenções, doações ou em-


préstimos de órgãos ou entidades públicas e de instituições financeiras públi-
cas ou controladas pelo poder público, pelo prazo mínimo de 1 (um) e máximo
de 5 (cinco) anos.

[...]

Art. 30. A aplicação das sanções previstas nesta Lei não afeta os processos de
responsabilização e aplicação de penalidades decorrentes de:

I – ato de improbidade administrativa nos termos da Lei nº 8.429, de 02 de


junho de 1992; e

II – atos ilícitos alcançados pela Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, ou outras


normas de licitações e contratos da administração pública, inclusive no tocante
ao Regime Diferenciado de Contratações Públicas – RDC instituído pela Lei nº
12.462, de 04 de agosto de 2011.

No Decreto nº 8.420, de 18 de março de 2015, que regulamenta a Lei nº


12.846/2013, dispondo sobre a responsabilização objetiva administrativa de pessoas
jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira,
as sanções administrativas e dos encaminhamentos judiciais, o acordo de leniência,
o programa de integridade, o cadastro nacional de empresas inidôneas e suspensas
e do cadastro nacional de empresas punidas:

Art. 16. Caso os atos lesivos apurados envolvam infrações administrativas à Lei
nº 8.666, de 1993, ou a outras normas de licitações e contratos da administra-
ção pública e tenha ocorrido a apuração conjunta prevista no art. 12, a pessoa
jurídica também estará sujeita a sanções administrativas que tenham como
efeito restrição ao direito de participar em licitações ou de celebrar contratos
com a administração pública, a serem aplicadas no PAR.

O rol adrede descrito ainda pode vir a ser ampliado. Há iniciativas em debate
para alargar as hipóteses restritivas, dentre as quais, está o Projeto de lei (PLS
80/2009), que incluiria na Lei nº 8.666/1993 norma impeditiva à participação em
licitação e contratação com o Poder Público, de entidades empresariais condenadas
judicialmente por prática de assédio moral contra empregados nos últimos cinco
anos. A proposta também sugere a criação do Cadastro Nacional de Proteção contra
a Coação Moral no Emprego, a ser gerido por órgão do Poder Executivo. O cadastro

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seria referência para os gestores públicos que buscam informações qualificadas sobre
a atuação dos licitantes no cumprimento de obrigações.
Enfim, diferentemente dos impedimentos referidos no artigo 9º da Lei nº
8.666/1993, cuidando-se de penalidade cominada, estas somente são imponíveis
após o regular processo administrativo com observância aos princípios do contradi-
tório e da ampla defesa. Doutrina e jurisprudência coadunam que a ausência de aber-
tura de prazo para oferecimento de defesa final sobre a possível aplicação da pena
acarreta nulidade no processo administrativo a partir desse momento processual, por
manifesto cerceamento de defesa4.

3. DA RESPONSABILIZAÇÃO ADMINISTRATIVA E CIVIL DE PESSOAS JURÍDICAS


PELA PRÁTICA DE ATOS CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, NACIONAL OU
ESTRANGEIRA PREVISTA PELA LEI Nº 12.846/2013

A Lei Ordinária nº 12.846/2013, de 02 de agosto de 2013, advém do Projeto


de Lei nº 6.826/2010 proposto pela Controladoria Geral da União em fevereiro de
2010, buscando assegurar garantias de lisura aos eventos internacionais que seriam
sediados no Brasil (Copa do Mundo 2014 e Olimpíadas Rio 2016). Foi aprovado na
Câmara dos Deputados em maio de 2011, mas permaneceu paralisado no Senado até
que as manifestações populares ocorridas em junho de 2013, nas quais a população
brasileira reivindicou, com ênfase, o combate à corrupção, cobrando atuação ética,
moral e íntegra dos governantes, dispararam o prosseguimento da tramitação, culmi-
nando com a aprovação final e conversão em lei.
O ordenamento pátrio já abarcava crimes, atos de improbidade e infrações
administrativas praticados contra a Administração. Além disso, o Brasil ratificou a
Convenção das Nações Unidas contra corrupção (ONU)5, a Convenção Interameri-
cana de Combate à Corrupção (OEA)6 e a Convenção sobre o Combate à Corrupção
de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais da

4 Precedente: AgRg na RCDESP no MS 15.267-DF, DJe 1º/2/2011. MS 17.431-DF, Rel. Min. Castro Meira,
julgado em 26.09.2012.
5 O Decreto nº 5.687, de 31 de janeiro de 2006, promulga a Convenção das Nações Unidas contra a
Corrupção, adotada pela Assembleia-Geral das Nações Unidas em 31 de outubro de 2003 e assinada
pelo Brasil em 09 de dezembro de 2003.
6 Decreto nº 4.410, de 07 de outubro de 2002, promulga a Convenção Interamericana contra a Corrup-
ção, de 29 de março de 1996, com reserva para o artigo XI, parágrafo 1º, inciso “c”, considerando que
o Congresso Nacional aprovou por meio do Decreto Legislativo nº 152, de 25 de junho de 2002, o texto
da Convenção Interamericana contra a Corrupção, adotada em Caracas, em 29 de março de 1996, com
reserva para o artigo XI, parágrafo 1º, inciso “c”.

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Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE)7. Ocorre que
tal cenário não foi suficiente para afastar a corrupção disseminada no país. Como
resposta aos clamores populares para tratamento mais rigoroso quanto às suas con-
sequências, a Lei nº 12.846/2013 encerrou lacuna sobre a responsabilização admi-
nistrativa e civil de pessoas jurídicas por atos contrários à Administração Pública,
nacional ou estrangeira, possibilitando a punição das pessoas jurídicas, inclusive as
que resultam de alteração contratual, transformação, incorporação, fusão ou cisão
societária, além do alcance aos dirigentes.
Dentre as inovações trazidas, vale destacar a responsabilidade objetiva de pes-
soas jurídicas, o acordo de leniência em casos de infrações à ordem econômica, a
previsão expressa de desconsideração da personalidade jurídica no curso de processo
administrativo, o compliance, o Cadastro Nacional de Empresas Punidas (CNEP) e
uma maior rigidez das sanções previstas.
Conforme determina o Código Civil:

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem,
fica obrigado a repará-lo.

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de


culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente de-
senvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos
de outrem.

Já em seu artigo 1º, a Lei Anticorrupção estabelece expressamente que será


objetiva a responsabilidade das pessoas jurídicas pelos atos lesivos praticados em
desfavor da Administração Pública. A possibilidade de responsabilização de pessoa
jurídica pela prática de atos ilícitos em prejuízo da Administração já era reconhecida
pelo Superior Tribunal de Justiça no sentido de que em ação de improbidade a pessoa
jurídica pode figurar no polo passivo mesmo que desacompanhada de seus sócios,
respondendo com seu patrimônio pelo ato ímprobo (REsp. 970.393), mas expressa
previsão legal não existia.
Por consequência, como a responsabilidade civil objetiva da pessoa jurídica
incide independentemente da culpa ou dolo do agente, uma vez comprovado o fato
e o nexo causal, será responsabilizada, inobstante a pessoa natural que realmente
tenha praticado o ato lesivo. Noutro turno, a responsabilidade dos dirigentes e admi-

7 Decreto nº 3.678, de 30 de novembro de 2000 promulga a Convenção sobre o Combate da Corrupção


de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais, concluída em Paris,
em 17 de dezembro de 1997.

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nistradores ou de outra pessoa natural autora, coautora ou partícipe do ato ilícito é
subjetiva.
Na lição de Maria Sylvia Zanella Di Pietro8:

E a responsabilidade, tal como prevista na Lei nº 12.846/2013, é objetiva, para


a pessoa jurídica, nas órbitas civil e administrativa. Por sua vez, a responsabi-
lidade subjetiva dos dirigentes e administradores bem como de terceiros que
participem do ilícito, também se aplica nas duas esferas, civil e administrativa.

Aparentemente, a Lei quis dar aos entes privados o mesmo tratamento que a
Constituição, no artigo 37, § 6º dá ao Estado e seus agentes: o Estado respon-
de objetivamente pelos danos causados a terceiros, porém os agentes causa-
dores do ato lesivo respondem subjetivamente.

A regra da responsabilidade objetiva exige, no caso da Lei nº 12.846/2013, que:

1. haja nexo de causa e efeito entre a atuação da pessoa jurídica e o dano


sofrido pela Administração Pública;

2. seja praticado ato lesivo, tal como definido no artigo 5º;

3. o ato lesivo seja praticado por pessoas jurídicas (art. 1º, caput);

4. o ato lesivo cause dano à Administração Pública, nacional ou estrangeira.

Em sentido contrário, Justen Filho9 afirma que as sanções previstas na lei anti-
corrupção apenas serão consumadas se a pessoa física agir com dolo:

[...] em momento algum a Lei nº 12.846/2013 instituiu uma espécie de ‘cor-


rupção objetiva’, em que seria bastante e suficiente a ocorrência de eventos
materiais. Ocorre que, consumada a infração em virtude da conduta reprovável
de um ou mais indivíduos, poderá produzir-se a responsabilização de pessoa
jurídica. Essa responsabilização será ‘objetiva’, na acepção de que bastará a
existência de um vínculo jurídico com a pessoa física infratora.

Adversamente, entendemos que para responsabilizar objetivamente a pessoa


jurídica, bastaria atuação genérica da empresa inclinada à fraude, prescindindo de in-
dividualização de conduta ou comprovação do elemento subjetivo de pessoas naturais
a ela vinculadas, pois se assim não fosse, afastar-nos-íamos do objetivo pretendido

8 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 28. ed., São Paulo: Atlas, 2015, p. 1000.
9 JUSTEN FILHO, Marçal. A “Nova” Lei Anticorrupção Brasileira (Lei Federal nº 12.846). Informativo
Justen, Pereira, Oliveira e Talamini. Curitiba, n. 82, dez. 2013. Disponível em: <http://www.justen.
com.br//informativo.php?&informativo=82&artigo=1110&l=pt >. Acesso em: 20 jan. 2017.

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pela lei. Mesmo porque o artigo 3º esclarece que a responsabilização da pessoa
jurídica não exclui e independe da responsabilidade individual de quaisquer pessoas
naturais – autoras, coautoras, partícipes, dirigentes, administradores. Ademais, os
elementos subjetivos utilizados pelo legislador no artigo 5º, alíneas, “a” a “f”, não
afastam a intenção de se coibir a irresponsabilidade das pessoas jurídicas por au-
sência de comprovação de elementos subjetivos como o propósito de causar o dano.
Sem prejuízo, também restou regrada a responsabilização subjetiva dos diri-
gentes e administradores que tenham concorrido para a prática do ilícito, na medida
de sua culpabilidade. Portanto, estes indivíduos serão penalizados por suas condutas
independentemente da responsabilização objetiva da pessoa jurídica pelos ilícitos pra-
ticados, já que a responsabilização da pessoa jurídica não exclui a responsabilidade
individual de quaisquer pessoas naturais.
Vale mencionar a possibilidade de indagações acerca da constitucionalidade
da lei que penaliza empresa sem prova de sua culpa ou de dolo, em especial acaso
empregados pratiquem atos ilícitos para deliberadamente prejudicar a empresa ou
havendo prejuízo ao sócio-investidor com menor poder de administração lesado por
funcionários ou por sócios que praticam a gestão. Nesse eito, Patrícia Toledo de
Campos10 observa que a Lei nº 12.846/2013 ao dispor expressamente sobre a res-
ponsabilidade objetiva de pessoas jurídicas foi além dos limites previstos na Consti-
tuição Federal (art. 173, § 5º).
A responsabilização administrativa das pessoas jurídicas que praticaram ilícito
administrativo disciplinada na Lei nº 12.846/2013 consiste na cominação das san-
ções de multa e publicação extraordinária da decisão condenatória (art. 6º), aplicadas
isolada ou cumulativamente, não estando excluída a obrigação da reparação do dano
causado.
As balizas para aplicação das sanções estão enumeradas no artigo 7º. São elas:

I – a gravidade da infração;

II – a vantagem auferida ou pretendida pelo infrator;

III – a consumação ou não da infração;

IV – o grau de lesão ou perigo de lesão;

10 CAMPOS, Patrícia Toledo de. Comentários à Lei nº 12.846/2013 – Lei anticorrupção. Revista Digital
de Direito Administrativo USP, v. 2, n. 1, 2015. Disponível em: <http://www.egov.ufsc.br/portal/sites/
default/files/80943-127259-2-pb.pdf>. Acesso em: 20 jan. 2017.

102 Renata Tatiana Nunes Junqueira Franco


V – o efeito negativo produzido pela infração;

VI – a situação econômica do infrator;

VII – a cooperação da pessoa jurídica para a apuração das infrações;

VIII – a existência de mecanismos e procedimentos internos de integridade, au-


ditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e a aplicação efetiva de códigos
de ética e de conduta no âmbito da pessoa jurídica;

IX – o valor dos contratos mantidos pela pessoa jurídica com o órgão ou enti-
dade pública lesados.

Cabe adicionar que tais parâmetros não afastam a observância ao princípio


da razoabilidade, de modo a não se atribuir à pessoa jurídica infratora uma medida
repressiva inadequada, desnecessária e desproporcional11.
Por sua vez, configurada a prática do ilícito a autoridade competente deve aplicar
a punição. É ato vinculado, mesmo que a dosagem da pena deva obedecer aos pa-
drões do artigo 6º, segundo o qual o valor da multa foi limitado entre 0,1% (um
décimo por cento) e 20% (vinte por cento) do faturamento bruto do último exercício
anterior ao da instauração do processo administrativo, excluídos os tributos, nunca
inferior à vantagem auferida, quando for possível sua estimação. Quando não for
possível utilizar o critério do faturamento bruto da pessoa jurídica, a multa será de R$
6.000,00 (seis mil reais) a R$ 60.000.000,00 (sessenta milhões de reais).
Apesar da vasta margem na dosimetria da pena, não se verifica discricionarie-
dade, porquanto não existe apreciação de oportunidade e conveniência na escolha da
dosagem da pena.
O Decreto nº 8.420, de 18 de março de 2015, regulamenta a responsabilização
objetiva administrativa de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a adminis-
tração pública, nacional ou estrangeira, de que trata a Lei nº 12.846/2013 e dá outras
providências.
Os destinatários dos valores arrecadados pelas multas na seara administrativa,
bem como do perdimento de bens, direitos ou valores aplicados na esfera judicial
serão os órgãos e entidades públicos lesados (art. 24 da Lei nº 12.846/2013 e art.
25 do Decreto nº 8.420/2015).

11 3ª Seção do STJ reconheceu a nulidade do ato sancionador por não observar o princípio da proporcio-
nalidade e pela decisão administrativa não encontrar respaldo no conjunto probatório colhido no pro-
cesso. (MS nº 13.091/DF, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 27.02.2008, v.u., DJU 07.03.2008).

DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NA ESFERA ADMINISTRATIVA: 103


Com o claro objetivo de se conferir grande publicidade à punição, a publicação
extraordinária da decisão condenatória se dará na forma de extrato de sentença, as
expensas da pessoa jurídica, em meios de comunicação de grande circulação na área
da prática da infração e de atuação da pessoa jurídica ou, na sua falta, em publicação
de circulação nacional, bem como por meio de afixação de edital, pelo prazo mínimo
de 30 dias, no próprio estabelecimento ou no local de exercício da atividade, de modo
visível ao público, e no sítio eletrônico na rede mundial de computadores.
Importante notar que a aplicação das sanções previstas na Lei nº 12.846/2013
não afeta os processos de responsabilização e aplicação de penalidades decorrentes
das Leis nº 8.429/1992, nº 8.666/1993 e nº 12.462/2011. Contudo, a aplicação de
sanções administrativas idênticas pela mesma conduta em igual ou em outro procedi-
mento de apuração de irregularidade é vedada em razão da proibição do bis in idem.
Já se a mesma conduta for punida com cominação de sanções distintas em mais de
uma legislação não ocorrerá duplicidade, havendo a previsão legal de cumulação de
sanções descrita no artigo 30 da Lei Anticorrupção.
A responsabilização civil das pessoas jurídicas que praticarem os atos lesivos
descritos no artigo 5º, da Lei nº 12.846/2013, pode se dar por meio do ajuizamento
de ação com vistas à aplicação das sanções pelos entes da Federação e pelo Mi-
nistério Público Federal. As penalidades aplicáveis na esfera judicial estão previstas
no artigo 19, são mais severas e têm grande possibilidade de atingir os objetivos
sancionatórios no combate à corrupção.
Consistem em perdimento de bens, direitos ou valores que representem van-
tagem ou proveito direta ou indiretamente obtidos da infração, suspensão ou interdição
parcial de suas atividades, dissolução compulsória da pessoa jurídica e proibição de
receber incentivos, subsídios, subvenções, doações ou empréstimos de órgãos ou
entidades públicas e de instituições financeiras públicas ou controladas pelo poder
público.
Havendo condenação é certa a obrigação de reparar, integralmente, o dano
causado pelo ilícito, cujo valor será apurado em posterior liquidação, se não constar
expressamente da sentença (art. 21, parágrafo único, da Lei Anticorrupção).

104 Renata Tatiana Nunes Junqueira Franco


4. A DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NA ESFERA
ADMINISTRATIVA

A teoria da desconsideração da personalidade jurídica tem origem na necessi-


dade de coibir a utilização abusiva da pessoa jurídica e/ou para fins diversos daqueles
definidos em lei. Foi no âmbito do Direito Anglo-Saxônico que se desenvolveu a Disre-
gard doctrine ou Disregard of legal entity (desconsideração da entidade legal), visando
imputar ao controlador de uma sociedade de capitais as obrigações assumidas pela
sociedade empresária por ela não satisfeitas, de modo a trazer à tona as relações
reais, independentemente da sua estrutura formal, descortinando situações em que
a pessoa jurídica é mero instrumento para cometer fraudes e abusos perpetrados
através da autonomia patrimonial.
A legislação pátria admitiu a teoria em hipóteses de falência, insolvência ou
encerramento das atividades da sociedade empresária, se e quando de qualquer forma
a personalidade jurídica for manejada como obstáculo ao ressarcimento de credores
ou instrumento para a prática de ilicitude12.
No Código Civil Brasileiro:

Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio


de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento
da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que
os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos
aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.

No Código de Defesa do Consumidor:

Art. 28. O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade


quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de
poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato
social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, esta-
do de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados
por má administração.

[...]

12 PEREIRA JUNIOR, Jessé Torres; DOTTI, Marinês Restelatto. A Desconsideração da personalidade jurí-
dica em face de impedimentos para participar de licitações e contratar com a Administração Pública:
Limites Jurisprudenciais. Revista da Virtual da AGU, ano XI, n. 109, fev. 2011. Disponível em: <www.
agu.gov.br/page/download/index/id/3667152>. Acesso em: 20 jan. 2017.

DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NA ESFERA ADMINISTRATIVA: 105


§ 5º Também poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua
personalidade for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos
causados aos consumidores.

Na Lei nº 9.605/1998 que cuida das sanções penais e administrativas derivadas


de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente:

Art. 4º. Poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua perso-
nalidade for obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados à qualidade do
meio ambiente.

Na Lei nº 9.615/1998 que institui normas gerais sobre desporto:

Art. 27. As entidades de prática desportiva participantes de competições pro-


fissionais e as entidades de administração de desporto ou ligas em que se
organizarem, independentemente da forma jurídica adotada, sujeitam os bens
particulares de seus dirigentes ao disposto no artigo 50 da Lei nº 10.406, de 10
de janeiro de 2002, além das sanções e responsabilidades previstas no caput
do artigo 1.017 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, na hipótese de
aplicarem créditos ou bens sociais da entidade desportiva em proveito próprio
ou de terceiros. (Redação dada pela Lei nº 10.672, de 2003).

Na Lei nº 12.529/2011 que estrutura o Sistema Brasileiro de Defesa da Concor-


rência, dispõe sobre a prevenção e repressão às infrações contra a ordem econômica,
dentre outros:

Art. 34. A personalidade jurídica do responsável por infração da ordem eco-


nômica poderá ser desconsiderada quando houver da parte deste abuso de
direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos
estatutos ou contrato social.

Em verdade, a aplicação da teoria em nosso sistema jurídico antecede a própria


edição dos diplomas legislativos referidos13. Fábio Ulhoa Coelho14 enfatiza a desneces-
sidade de legislação específica para viabilizar a aplicação da técnica:

Na doutrina brasileira, ingressa a teoria no final dos anos 1960, numa confe-
rência de Rubens Requião (1977:67/86). Nela, a teoria é apresentada como
superação do conflito ente as soluções éticas, que questionam a autonomia
patrimonial da pessoa jurídica para responsabilizar sempre os sócios, e as téc-

13 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Informativo 732 do STF – 2013. Transcrições: MS 32.494-MC/
DF. Disponível em: <http://www.conteudojuridico.com.br/informativo-tribunal,informativo-732-do-s-
tf-2013,46346.html>. Acesso em: 20 jan. 2017.
14 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial – Direito de Empresa. Volume 2. 15. ed. São Paulo:
Saraiva, 2011, p. 57.

106 Renata Tatiana Nunes Junqueira Franco


nicas, que se apegam inflexivelmente ao primado da separação subjetiva das
sociedades. Requião sustenta, também, a plena adequação ao direito brasileiro
da teoria da desconsideração, defendendo a sua utilização pelos juízes, inde-
pendentemente de específica previsão legal. Seu argumento básico é o de que
as fraudes e os abusos perpetrados através da pessoa jurídica não poderiam
ser corrigidos caso não adotada a ‘disregard doctrine’ pelo direito brasileiro. De
qualquer forma, é pacífico na doutrina e na jurisprudência que a desconside-
ração da personalidade jurídica não depende de qualquer alteração legislativa
para ser aplicada, na medida em que se trata de instrumento de repressão a
atos fraudulentos. Quer dizer, deixar de aplicá-la, a pretexto de inexistência de
dispositivo legal expresso, significaria o mesmo que amparar a fraude.

Ainda assim, inexistindo norma legal expressa no direito positivo brasileiro sobre
a aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica no âmbito dos
processos administrativos, era frequente a discussão sobre a legitimidade da aplica-
bilidade da teoria a licitações e contratações administrativas por possível ofensa ao
princípio da legalidade.
A Lei nº 8.666/1993 não prevê a desconsideração da personalidade jurídica. É
certo que a aplicabilidade desta no âmbito das licitações e contratos da Administração
visa atender aos princípios da moralidade administrativa e da indisponibilidade dos
interesses públicos. Desse modo, considerando a concepção moderna de legalidade,
que não está adstrita à literalidade formal da norma, mas a compreensão do ordena-
mento jurídico enquanto sistema, não há afronta ao princípio da legalidade15.
No entendimento de Ricardo Watanabe16:

No entanto, além do princípio da legalidade, existem outros aplicáveis especi-


ficamente às licitações, quais sejam: isonomia; publicidade; impessoalidade;
moralidade; probidade administrativa; vinculação ao instrumento convocatório
e adjudicação compulsória (Lei nº 8.666/1993).

No caso de fraude ao procedimento licitatório, há evidente ofensa ao princípio


da moralidade.

Uma empresa constituída com desvio de finalidade, com abuso de forma e em


nítida fraude à lei, que venha a participar de processos licitatórios, abrindo-se a
possibilidade de que a mesma [sic] tome parte em um contrato firmado com o
Poder Público, afronta os princípios de Direito Administrativo.

15 Vide Acórdão RMS 15.166/BA, Rel. Min. Castro meira, Segunda Turma, DJ 07.08.2003.
16 WATANABE, Ricardo. Desconsideração da personalidade jurídica no âmbito das licitações. Dispo-
nível em: <http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas/files/anexos/31461-35563-1-PB.pdf>. Acesso em:
20 jan. 2017.

DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NA ESFERA ADMINISTRATIVA: 107


No particular, se, num lado, há o princípio da legalidade como controle da atu-
ação administrativa, noutro, existem princípios (como o da moralidade admi-
nistrativa e o da indisponibilidade do interesse público) que também hão de ser
respeitados pela Administração Pública.

Diante de tal conflito, no intuito de se extrair a maior eficácia da atuação do


Poder Público no caso concreto, deve-se proceder a ponderação, de modo
que se atinja a melhor solução, harmonizando os referidos dogmas, sem que a
aplicação de um deles acarrete o sacrifício de outro.

Não por outra razão, o princípio da legalidade tem sido tratado numa concepção
moderna, que não exige tão somente a literalidade formal, mas a análise siste-
mática do ordenamento jurídico vigente.

Destarte, o simples fato de não haver norma específica autorizando a desconsi-


deração da personalidade jurídica não pode impor à Administração que permita
atos que afrontem a moralidade administrativa e os interesses públicos envolvi-
dos. Embora não haja regra legal específica, deve-se empregar a analogia e os
princípios gerais de Direito (art. 7º, da Lei de Introdução ao Código Civil). Daí
porque aplica-se, com uma maior flexibilidade, a teoria da desconsideração da
personalidade jurídica na esfera administrativa.

Ora, até com base no próprio princípio da legalidade, não parece razoável per-
mitir o abuso de direitos e a validade de ato praticados com manifesto intuito
de fraudar a lei.

Vale o escólio de Lamartine Correia de Oliveira:

[...] o desconhecimento da forma da pessoa jurídica em casos de fraude à lei


não passa de aplicação específica do princípio geral segundo o qual o abuso
de um instituto jurídico não pode jamais ser tutelado pelo ordenamento jurídico.

[...]

Provado o intuito de fraude à norma legal, será perfeitamente defensável deci-


são que desconheça a pessoa jurídica (RT 06/52).

Tanto que, no âmbito do Direito Tributário, a Fazenda Pública tem como costu-
me desconsiderar atos jurídicos praticados com o intuito de dissimular a ocor-
rência do fato gerador, de modo que a tributação incida numa situação diversa
da realidade fática.

Nesse particular, também houve resistência por parte de defensores do princí-


pio da legalidade e do formalismo exacerbado dos institutos jurídicos. A despei-

108 Renata Tatiana Nunes Junqueira Franco


to disso, prevaleceu o entendimento a desconsideração de atos praticados com
fraude à lei e com nítido intuito de sonegação fiscal.

Com efeito, à Administração foi dado o poder de desconsiderar uma simulada


forma jurídica e passar a tributar com base na realidade fática, preservando,
assim, o interesse da coletividade.

Tanto que a Lei Complementar nº 104/2001, positivando tal prática antiga da


Administração, admitida até pelo Judiciário, acrescentou o parágrafo único ao
artigo 116, com a seguinte redação:

A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios jurídicos


praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tribu-
to ou a natureza dois elementos constitutivos da obrigação tributária, observa-
dos os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária.

Com efeito, se a própria Administração, por iniciativa própria e apesar de não


haver (na época) norma específica, podia desconsiderar a forma jurídica de
um ato ou negócio praticado, na busca de sua realidade econômica, é perfeita-
mente cabível admitir que, na fraude às licitações, a Administração possa des-
considerar a personalidade jurídica de uma empresa constituída com manifesto
intuito de fraudar a lei, sem a interveniência do Poder Judiciário e apesar de não
haver norma específica positivando tal conduta.

Em arremate, a desconsideração da pessoa jurídica na seara administrativa en-


contra suporte legitimador não só na teoria dos poderes implícitos, mas, também, no
princípio constitucional da moralidade administrativa, que foi erigido como um dos
vetores que devem conformar e orientar a atividade da Administração Pública (art. 37,
caput, da CF/88), no intuito de inibir o emprego da fraude e de neutralizar a prática
do abuso de direito.

5. ENTENDIMENTO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

O Superior Tribunal de Justiça afirmou a possibilidade de se estender a uma


sociedade empresária, na esfera administrativa e com base na teoria da desconside-
ração da personalidade jurídica, os efeitos de uma sanção aplicada pela Administração
Pública à outra sociedade formada pelos mesmos sócios e com mesmo objeto social.
Vejamos a ementa do julgamento prolatado no RMS nº 15.166-BA, verbis:

ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. LI-


CITAÇÃO. SANÇÃO DE INIDONEIDADE PARA LICITAR. EXTENSÃO DE EFEITOS
À SOCIEDADE COM O MESMO OBJETO SOCIAL, MESMOS SÓCIOS E MES-

DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NA ESFERA ADMINISTRATIVA: 109


MO ENDEREÇO. FRAUDE À LEI E ABUSO DE FORMA. DESCONSIDERAÇÃO DA
PERSONALIDADE JURÍDICA NA ESFERA ADMINISTRATIVA. POSSIBILIDADE.
PRINCÍPIO DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA E DA INDISPONIBILIDADE DOS
INTERESSES PÚBLICOS.

– A constituição de nova sociedade, com o mesmo objeto social, com os


mesmos sócios e com o mesmo endereço, em substituição a outra declarada
inidônea para licitar com a Administração Pública Estadual, com o objetivo de
burlar a aplicação da sanção administrativa, constitui abuso de forma e fraude
à Lei de Licitações, nº 8.666/1993, de modo a possibilitar a aplicação da teoria
da desconsideração da personalidade jurídica para estenderem-se os efeitos da
sanção administrativa à nova sociedade constituída.

– A Administração Pública pode, em observância ao princípio da moralidade


administrativa e da indisponibilidade dos interesses públicos tutelados, descon-
siderar a personalidade jurídica de sociedade constituída com abuso de forma
e fraude à lei, desde que facultado ao administrado o contraditório e a ampla
defesa em processo administrativo regular. (RMS nº 15.166-BA)

A decisão foi proferida quando inexistia previsão legal a autorizar a aplicação,


no caso pelo Estado da Bahia, da teoria da desconsideração da personalidade jurídica
por ato de índole administrativa. Vale transcrever o seguinte trecho do voto do Relator
Ministro Castro Meira:

Assim, não há como negar que as informações carreadas aos autos pelo Es-
tado da Bahia militam, inegavelmente, em desfavor da sociedade Recorrente.
Uma empresa constituída com o mesmo objeto social, com os mesmos sócios
e com sede no mesmo endereço, dificilmente conseguirá provar que não agiu
em fraude à lei, para furtar-se dos efeitos danosos de uma sanção administra-
tiva. Parece claro, no presente caso, que a Recorrente valeu-se [sic] do “véu
da pessoa jurídica” – para usar de metáfora já consagrada –, com o evidente
intuito de fraudar a lei e descumprir uma punição administrativa que lhe havia
sido imposta.

Firmado o entendimento de que a Recorrente foi constituída em nítida fraude à


lei e com abuso de forma, resta a questão relativa à possibilidade de desconsi-
deração da personalidade jurídica, na esfera administrativa, sem que exista um
dispositivo legal específico a autorizar a adoção dessa teoria pela Administra-
ção Pública.

A atuação administrativa deve pautar-se pela observância dos princípios cons-


titucionais, explícitos ou implícitos, deles não podendo afastar-se sob pena de
nulidade do ato administrativo praticado. E esses princípios, quando em con-

110 Renata Tatiana Nunes Junqueira Franco


flito, devem ser interpretados de maneira a extrair-se a maior eficácia, sem
permitir-se a interpretação que sacrifique por completo qualquer deles.

Se, por um lado, existe o dogma da legalidade, como garantia do administrado


no controle da atuação administrativa, por outro, existem Princípios como o
da Moralidade Administrativa, o da Supremacia do Interesse Público e o da
Indisponibilidade dos Interesses Tutelados pelo Poder Público, que também
precisam ser preservados pela Administração. Se qualquer deles estiver em
conflito, exige-se do hermeneuta e do aplicador do direito a solução que melhor
resultado traga à harmonia do sistema normativo.

A ausência de norma específica não pode impor à Administração um atuar em


desconformidade com o Princípio da Moralidade Administrativa, muito menos
exigir-lhe o sacrifício dos interesses públicos que estão sob sua guarda. Em
obediência ao Princípio da Legalidade, não pode o aplicador do direito negar
eficácia aos muitos princípios que devem modelar a atuação do Poder Público.

Assim, permitir-se que uma empresa constituída com desvio de finalidade, com
abuso de forma e em nítida fraude à lei, venha a participar de processos lici-
tatórios, abrindo-se a possibilidade de que a mesma [sic] tome parte em um
contrato firmado com o Poder Público, afronta aos mais comezinhos princípios
de Direito Administrativo, em especial, ao da Moralidade Administrativa e ao da
Indisponibilidade dos Interesses Tutelados pelo Poder Público.

A concepção moderna do Princípio da Legalidade não está a exigir, tão-somen-


te, a literalidade formal, mas a intelecção do ordenamento jurídico enquanto
sistema. Assim, como forma de conciliar o aparente conflito entre o dogma
da legalidade e o Princípio da Moralidade Administrativa é de se conferir uma
maior flexibilidade à teoria da desconsideração da personalidade jurídica, de
modo a permitir o seu manejo pela Administração Pública, mesmo à margem
de previsão normativa específica.

Convém registrar, por oportuno, que a aplicação desta teoria deve estar prece-
dida de processo administrativo, em que se assegure ao interessado o contradi-
tório e a mais ampla defesa, exatamente como realizado no caso dos autos. Ao
prejudicado restará sempre aberta a porta do Judiciário, para que então possa
provar, perante um órgão imparcial, a ausência de fraude à lei ou de abuso de
forma, afastando, por conseguinte, a aplicação da teoria da desconsideração
da personalidade jurídica. No presente caso, a Recorrente não se desincumbiu
desse ônus probatório.

Ademais, como bem lançado no Parecer Ministerial acostado às fls. 173/179, o


abuso de um instituto de direito não pode jamais ser tutelado pelo ordenamento
jurídico. Seria uma grande incongruência admitir-se a validade jurídica de um

DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NA ESFERA ADMINISTRATIVA: 111


ato praticado com fraude à lei, assim como seria desarrazoado permitir-se, com
base no Princípio da Legalidade, como é o caso dos autos, a sobrevida de um
ato praticado à margem da legalidade e com ofensa ao ordenamento jurídico.
Não pode o direito, à guisa de proteção ao Princípio da Legalidade, atribuir
validade a atos que ofendem a seus princípios e institutos.

Neste diapasão, acompanhe-se o escólio do Ilustre Professor Lamartine Cor-


reia de Oliveira (RT nº 06, p. 52):

[...] o desconhecimento da forma da pessoa jurídica em casos de fraude à lei


não passa de aplicação específica do princípio geral segundo o qual o abuso
de um instituto jurídico não pode jamais ser tutelado pelo ordenamento jurídico.

[...]

Provado o intuito de fraude à norma legal, será perfeitamente defensável deci-


são que desconheça a pessoa jurídica.

6. ENTENDIMENTO DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO

O Tribunal de Contas da União pacificou o entendimento no sentido de admitir


a desconsideração da pessoa jurídica na esfera administrativa. No exercício da fis-
calização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial das entidades
administrativas, tanto tem cominado sanção de multa a ex-sócios de empresas por
usufruírem pessoalmente de recursos públicos ilicitamente auferidos da Administração
Pública Municipal contratante, como tem estendido os efeitos da sanção de inidonei-
dade a empresas posteriormente constituídas para burlar a proibição, em ambas as
hipóteses com fundamento na teoria da desconsideração da personalidade jurídica.
Nesse turno, vejam-se os arestos colacionados:

RESPONSABILIDADE. REPRESENTAÇÃO. INIDONEIDADE. DESCONSIDERA-


ÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. Aplica-se a desconsideração da perso-
nalidade jurídica para estender os efeitos da sanção de inidoneidade (art. 46, da
Lei nº 8.443/1992) a outras empresas posteriormente fundadas com o intuito
de burlar a proibição de licitar com a Administração Pública, desde que asse-
gurados o contraditório e a ampla defesa a todos interessados. Declaração de
inidoneidade das empresas envolvidas. (Acórdãos 1986/2013 Plenário)

***

REPRESENTAÇÃO FORMULADA COM FULCRO NO ARTIGO 113, § 1º, DA LEI


DE LICITAÇÕES. EMPRESA CONSTITUÍDA COM O INTUITO DE BURLAR A LEI.

112 Renata Tatiana Nunes Junqueira Franco


FRAUDE EM LICITAÇÃO. AUDIÊNCIA. REJEIÇÃO DAS RAZÕES DE JUSTIFICATI-
VA. DECLARAÇÃO DE INIDONEIDADE DE LICITANTE. NULIDADE DO CERTAME
E DA CONTRATAÇÃO.

1. Confirmado que a empresa licitante foi constituída com o nítido intuito de


fraudar a lei, cabe desconsiderar a sua personalidade jurídica de forma a pre-
servar os interesses tutelados pelo ordenamento jurídico.

2. Deve ser declarada a nulidade de licitação cujo vencedor utilizou-se de meios


fraudulentos. (Acórdão nº 928/2008, Plenário. Processo nº 003.533/2006-1,
Relator Min. Benjamin Zymler)

E do Informativo nº 108 do TCU:

[...] em caso de fraude comprovada, é possível a responsabilização não só da


empresa, mas também dos sócios, de fato ou de direito, a partir da desconsi-
deração da personalidade jurídica da instituição empresarial. (TCU. Acórdão nº
1327/2012-Plenário, TC 008.267/2010-3, Rel. Min. Walton Alencar Rodrigues,
30.05.2012)

7. DA EXTENSÃO DAS PENALIDADES ADMINISTRATIVAS IMPOSTAS APÓS A DES-


CONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NO ÂMBITO DO PROCESSO
ADMINISTRATIVO

Por conceito legal a pessoa jurídica é ente diverso de seus membros. Na maior
parte das modalidades societárias previstas no direito positivado pátrio, a regra é a
separação patrimonial do ente social das pessoas físicas que o compõe. O fomento ao
desenvolvimento econômico passa pela criação de facilidades na atuação empresarial,
objetivando o favorecimento à circulação de riquezas e geração de empregos.
No entanto, o enfoque no progresso social e econômico não pode encobrir
fraudes e deturpações do uso abusivo da pessoa jurídica, com desvio de finalidade e
confusão patrimonial.
O Ministro Celso de Mello, no MS 32.494-MC/DF enfatiza que:

[...] a desconsideração da personalidade jurídica, quer seja analisada sob a égi-


de da teoria maior, quer seja discutida sob a perspectiva da teoria menor (REsp
279.273/SP, Rel. p/ o acórdão. Min. Nancy Andrighi), não implica extinção da
personalidade civil nem afeta a liberdade de iniciativa, pois as sociedades per-
sonificadas (simples ou empresárias) preservam tanto a sua autonomia jurí-
dico-institucional, quanto a sua autonomia patrimonial em relação a terceiros.

DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NA ESFERA ADMINISTRATIVA: 113


A aplicação dessa doutrina permite, como observa Ulhoa Coelho17, a superação
pontual, transitória e episódica “da eficácia do ato constitutivo da pessoa jurídica”,
desde que se torne possível “verificar que ela foi utilizada como instrumento para a
realização de fraude ou abuso de direito”.
A desconsideração da personalidade jurídica com fundamento no artigo 50,
do Código de Processo Civil; no artigo 28, do CDC; ou no artigo 34, da Lei nº
12.529/2011, confere ao juiz a prerrogativa para admiti-la. Em tais casos, depende-se,
portanto de atuação judicial para o uso da técnica. Até a edição da Lei nº 12.846/2013
não havia previsão legal de aplicação da teoria no âmbito dos procedimentos adminis-
trativos, ou seja, sem necessidade de intervenção jurisdicional. Independente disso, já
era considerada viável pelo STJ e pelo TCU, com extensão de seus efeitos para afastar
a possibilidade de uma empresa que tenha sido suspensa ou impedida de participar
de licitação ou contratar com a Administração Pública, ou ainda, declarada inidônea,
possa ter seus sócios integrando, direta ou indiretamente, outra pessoa jurídica que
participe de licitação com o Poder Público.
No Supremo Tribunal Federal, às questões decididas pelo STJ com base em
lei infraconstitucional aplicam-se as Súmulas nº 279 e nº 280 daquela Corte18. Por
sua vez, a determinação da desconsideração da personalidade jurídica pelo Tribunal
de Contas da União (TCU), foi objeto do MS 32.494-MC/DF, no qual, o Ministro Re-
lator Celso de Mello suspendeu a decisão do TCU, com fundamento, sobretudo, no
periculum in mora, reconhecendo, que a questão da possibilidade da Administração
Pública determinar a desconsideração ainda é tema pendente de análise pelo Supremo
Tribunal19.
17 COELHO, Fábio Ulhoa. Desconsideração da Personalidade Jurídica. São Paulo: RT, 1989, p. 54.
18 “CASO EM QUE O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA DECIDIU A CONTROVÉRSIA EXCLUSIVAMENTE
À LUZ DA LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL PERTINENTE. A alegada ofensa à Carta da República,
se existente, dar-se-ia de forma reflexa ou indireta, não ensejando a abertura da via extraordinária.
Incidência, ainda, da Súmula 279 desta colenda Corte. Agravo desprovido” (AI nº 549.737/PB-AgR,
Primeira Turma, Relator o Ministro Ayres Britto, DJ de 09.12.2005).

“Licitação. Declaração de idoneidade. Controvérsia que exige o exame de normas infraconstitucionais
e de provas (Súmula 279). Ausência de prequestionamento (Súmulas 282 e 356). Regimental não
provido” (AI nº 482.189/DF-AgR, Segunda Turma, Relator o Ministro Nelson Jobim, DJ de 07.05.2004).
19 [...] Todas as considerações que venho de fazer, ainda que expostas em sede de sumária cognição e
fundadas em juízo meramente precário (sem qualquer manifestação conclusiva, portanto, em torno da
postulação mandamental), levar-me-iam a denegar o pleito cautelar ora deduzido na presente causa.

Ocorre, no entanto, que razões de prudência e o reconhecimento da plausibilidade jurídica da pretensão
deduzida pela parte impetrante impõem que se outorgue, na espécie, a pretendida tutela cautelar, seja
porque esta Suprema Corte ainda não se pronunciou sobre a validade da aplicação da “disregard doc-
trine” no âmbito dos procedimentos administrativos, seja porque há eminentes doutrinadores, apoiados
na cláusula constitucional da reserva de jurisdição, que entendem imprescindível a existência de ato ju-
risdicional para legitimar a desconsideração da personalidade jurídica (o que tornaria inadmissível a uti-
lização dessa técnica por órgãos e Tribunais administrativos), seja porque se mostra relevante examinar

114 Renata Tatiana Nunes Junqueira Franco


Transposta a discussão sobre a validade da aplicação da Disregard doctrine
no âmbito dos procedimentos administrativos após a consolidação dessa possibili-
dade por expressa previsão legal, uma vez desconsiderada a personalidade é possível
impelir aos sócios gestores e à outra(s) empresa(s) constituída(s) com os mesmos
sócios e objeto social as mesmas sanções já destinadas à empresa contratada
inadimplente.
Quando há sanção prevista e ela é aplicada, deve coibir a reincidência daquele
praticante da conduta e cumprir função exemplar para a sociedade. O impedimento
de licitar e contratar com o estado em decorrência de sanção cominada é efeito de
penalidade administrativa, imponível após o regular trâmite de procedimento adminis-
trativo com observância da ampla defesa e do contraditório. A simples imposição da
sanção sem o impedimento pode em nada repercutir ao infrator. Isso porque a decla-
ração de inidoneidade sem a imposição do impedimento permitiria a continuidade da
participação em licitações e contratação com a Administração. É o impedimento que
assegura efetividade à sanção20.
A manipulação da pessoa jurídica, com o ilícito propósito de viabilizar o abuso
de direito e a prática de fraude, principalmente no que concerne aos procedimentos
licitatórios, ofendem o dever de moralidade e de probidade, deveres que se impõem à
observância da Administração Pública e dos participantes. Por essa razão, o licitante
de má-fé deve ter a sua conduta sumariamente repelida pela atuação das entidades
estatais e de seus órgãos de controle, que não podem tolerar o abuso de direito e a
fraude como práticas descaracterizadoras da essência ética do processo licitatório.
Nesse passo, quando os bens da empresa faltosa forem insuficientes ao res-
sarcimento dos danos causados ao erário, os quais foram causados pelos sócios
daquela, cabível é a responsabilização destes, com repercussão patrimonial. De modo

o tema da desconsideração expansiva da personalidade civil em face do princípio da intranscendência


das sanções administrativas e das medidas restritivas de direitos, seja, ainda, porque assume significa-
tiva importância o debate em torno da possibilidade de utilização da “disregard doctrine”, pela própria
Administração Pública, agindo “pro domo sua”, examinada essa específica questão na perspectiva do
princípio da legalidade.

Sendo assim, em sede de estrita delibação, e sem prejuízo de ulterior reexame da pretensão manda-
mental deduzida na presente causa, defiro o pedido de medida liminar, para suspender, cautelarmente,
a eficácia do item 9.4 do Acórdão nº 2.593/2013 do Plenário do E. Tribunal de Contas da União.

Comunique-se, com urgência, transmitindo-se cópia da presente decisão à Presidência do E. Tribunal
de Contas da União.
20 O artigo 97 da Lei nº 8.666/1993 tipifica como crime a admissão à licitação ou a celebração de contrato
com empresa ou profissional declarado inidôneo, cominando a pena de detenção de seis meses a dois
anos e multa para o agente público que assim proceder, incidindo na mesma pena aquele que, declara-
do inidôneo, venha a licitar ou a contratar com a Administração.

DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NA ESFERA ADMINISTRATIVA: 115


algum se justifica favorecê-los com a intangibilidade de seu patrimônio pessoal, como
se houvessem de ser beneficiados apesar de terem afrontado o ordenamento jurídico.
Do mesmo modo, é possível estender aos sócios-gerentes e diretores a pe-
nalidade de suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de
contratar com a Administração Pública pelo prazo fixado, a fim de evitar que venha a
constituir uma nova empresa para participar de procedimentos licitatórios, antes de
adimplir as obrigações firmadas pela empresa encerrada.

8. DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DE RESPONSABILIZAÇÃO DA LEI Nº


12.846/2013 E PREVISÃO DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA

A instauração e o julgamento de processo administrativo para apuração da


responsabilidade de pessoa jurídica cabem à autoridade máxima de cada órgão ou
entidade dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, observado o contraditório e
a ampla defesa. A competência poderá ser delegada, porém é vedada a subdelegação.
A Controladoria-Geral da União (CGU), substituída pelo Ministério da Transpa-
rência, Fiscalização e Controladoria-Geral da União, tem, no âmbito do poder execu-
tivo federal, competência concorrente para instaurar processos administrativos de
responsabilização de pessoas jurídicas ou para avocar os processos instaurados com
fundamento na Lei, para exame de sua regularidade ou para corrigir-lhes o andamento.
À CGU também competem a apuração, o processo e o julgamento dos atos ilícitos
previstos na Lei, praticados contra a administração pública estrangeira, observado o
disposto no artigo 4º da Convenção sobre o Combate da Corrupção de Funcionários
Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais, promulgada pelo De-
creto nº 3.678, de 30 de novembro de 2000.
O processo administrativo será conduzido por comissão composta por dois ou
mais servidores estáveis, designada pela autoridade instauradora. O ente público, a
pedido da comissão, poderá requerer as medidas judiciais necessárias para a investi-
gação e o processamento das infrações, inclusive busca e apreensão. Cautelarmente,
a comissão poderá propor à autoridade instauradora que suspenda os efeitos do ato
ou processo objeto da investigação. O processo deverá ser concluído no prazo de
cento e oitenta dias contados da data da publicação do ato que o instituir – podendo
ser prorrogado, mediante ato fundamentado da autoridade instauradora – e, ao final,
deverão ser apresentados relatórios sobre os fatos apurados e eventual responsabili-
dade da pessoa jurídica, sugerindo de forma motivada as sanções a serem aplicadas.
Anexados os relatórios, o processo administrativo será remetido à autoridade ins-

116 Renata Tatiana Nunes Junqueira Franco


tauradora para julgamento (art. 12). O prazo de defesa da pessoa jurídica objeto de
investigação é de trinta dias, contados a partir de sua intimação.
O Decreto nº 8.420, de 18 de março de 2015, que regulamenta a Lei nº
12.846/2013 traz normas disciplinadoras do Processo Administrativo de Responsa-
bilização (PAR).
É de se observar que o legislador optou por conferir competência para instaurar
e julgar os procedimentos administrativos a diversas autoridades. No Decreto regu-
lamentador foi fixada a competência para a instauração e para o julgamento do PAR
pela autoridade máxima da entidade em face da qual foi praticado o ato lesivo, ou, em
caso de órgão da administração direta, do seu Ministro de Estado. Tal competência
será exercida de ofício ou mediante provocação e poderá ser delegada, não sendo
permitida subdelegação.
Ocorre que o extenso rol de autoridades acaba por incluir ocupantes de cargo
em comissão ou de livre nomeação, além de autoridades administrativas que não
gozam de autonomias institucionais, independência funcional nem garantias contra
interferências políticas. Essa previsão vem sendo criticada pela doutrina, porquanto
a decisão do processo administrativo será proferida por indivíduo ocupante de cargo
político e essa decisão não está vinculada a parecer de servidores efetivos que inte-
graram a comissão, ainda que o relatório final do PAR seja precedido de manifestação
jurídica, elaborada pelo órgão de assistência jurídica competente. Isso pode desem-
bocar em desequilíbrio do processo administrativo previsto na Lei Anticorrupção pelos
existentes riscos de politização das instâncias administrativas.
A norma não contempla previsão recursal. A opção pode estar ligada ao fato
de que a autoridade máxima de cada órgão ou entidade é a responsável por instaurar
e julgar os processos administrativos. Tal ponto logo sofreu críticas doutrinárias por
destoar da previsão contida na Lei nº 9.784/1999, reguladora do processo administra-
tivo no âmbito da Administração Pública Federal, inciso X, parágrafo único de seu ar-
tigo 2º, que dispõe que deverá ser observada a garantia dos direitos “à interposição de
recursos, nos processos de que possam resultar sanções e nas situações de litígio”.
Não obstante, o Decreto nº 8.420, de 18 de março de 2015, estabelece que da
decisão administrativa sancionadora é cabível pedido de reconsideração com efeito
suspensivo, no prazo de dez dias, contado da data de publicação da decisão.
A autoridade julgadora deve decidir sobre a matéria alegada no pedido de re-
consideração e publicar nova decisão no prazo de trinta dias. Se mantida a decisão
administrativa sancionadora, será concedido à pessoa jurídica novo prazo de trinta

DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NA ESFERA ADMINISTRATIVA: 117


dias para cumprimento das sanções que lhe foram impostas, contado da data de
publicação da nova decisão.
A revisão é salutar e pode oportunizar a identificação de acordos ilegais entre a
Administração e grandes grupos econômicos.
Sobre as garantias à ampla defesa e ao contraditório a Lei nº 12.846/2013 foi
bastante econômica, apenas mencionando o prazo de trinta dias para defesa, o que
não impede nem obsta a observância em todos os processos administrativos em
trâmite na Administração Direta e Indireta da União, ainda que não haja disposição
em lei específica, dos artigos 2º, parágrafo único, inciso X, 3º, inciso III, 26, 28, 46
da Lei nº 9.784/199921.
No artigo 6º do Decreto regulamentador há previsão de observância ao con-
traditório e à ampla defesa no Processo Administrativo de Responsabilização (PAR);
além da intimação da pessoa jurídica para, no prazo de trinta dias, apresentar defesa
escrita e especificar eventuais provas que pretende produzir (art. 5º).

8.1 Da Desconsideração da Personalidade Jurídica

Em sintonia com o artigo 50 do Código Civil Brasileiro e entendimento do Supe-


rior Tribunal de Justiça, no artigo 14 a Lei Anticorrupção (Lei nº12846/2013) trouxe
previsão legal de desconsideração da personalidade jurídica no âmbito administrativo,
verbis:

Art. 14. A personalidade jurídica poderá ser desconsiderada sempre que utili-
zada com abuso do direito para facilitar, encobrir ou dissimular a prática dos
atos ilícitos previstos nesta Lei ou para provocar confusão patrimonial, sendo
estendidos todos os efeitos das sanções aplicadas à pessoa jurídica aos seus
administradores e sócios com poderes de administração, observados o contra-
ditório e a ampla defesa.

A desconsideração configura exceção à regra geral de penalização de pessoa


jurídica trazida no artigo 1º, caput e parágrafo único, como medida de repressão ao
abuso da personalidade jurídica.
Pode ser aplicada quando a pessoa jurídica é utilizada para acobertar e dis-
simular a prática de atos em prejuízo da Administração ou provocar confusão
patrimonial.

21 MARRARA, Thiago; NOHARA, Irene Patrícia. Processo administrativo. Lei nº 9784/99 comentada. São
Paulo: Atlas, 2009, p. 438.

118 Renata Tatiana Nunes Junqueira Franco


Configurada conduta de facilitar, encobrir ou dissimular a prática dos atos ilí-
citos previstos no artigo 5º, ou para provocar confusão patrimonial, no curso de
processo administrativo, a autoridade competente deverá aplicar a teoria da descon-
sideração da personalidade jurídica, visando coibir o abuso de direito e inibir a prática
de fraude através de adulteração do instituto da personalidade civil. Entretanto, os
sócios sem poderes de administração que não tenham contribuído para as condutas
ilícitas não serão alcançados pela desconsideração, uma vez que o dispositivo prevê
tal ressalva22.

8.2 Do Cadastro Nacional de Empresas Punidas (CNEP)

O já existente cadastro único de fornecedores proibidos de licitar e contratar


com o estado, criado para viabilizar o intercâmbio das informações restritivas aos
diversos gestores públicos, tem como um de seus módulos para subsidiar os órgãos
e entidades integrantes do Sistema de Serviços Gerais (SISG) o Sistema de Cadastra-
mento Unificado de Fornecedores – SICAF, que:

[...] não contempla o registro de ocorrências, a exemplo das impeditivas de


contratar, de órgãos ou entidades não integrantes do Sisg e que optaram por
ter cadastro próprio, nos termos da Lei nº 8.666/1993, artigo 34, § 2º. O
fato possibilita a contratação de pessoa impedida de licitar e contratar com a
Administração Pública, a exemplo das sanções previstas no artigo 7º da Lei
nº 10.520/2002 e no inciso IV do artigo 87 da Lei nº 8.666/1993. (Acórdão
nº 1647/2010, Plenário, Processo TC-012.538/2009-1, Rel. Min. Benjamin
Zymler)

Diante da importância e utilidade do cadastro único de fornecedores penali-


zados, registre-se o avanço trazido pela Lei nº 12.846/2013, verbis:

Art. 22. Fica criado no âmbito do Poder Executivo federal o Cadastro Nacional
de Empresas Punidas – CNEP, que reunirá e dará publicidade às sanções aplica-
das pelos órgãos ou entidades dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário
de todas as esferas de governo com base nesta Lei.

§ 1º Os órgãos e entidades referidos no caput deverão informar e manter atua-


lizados, no Cnep, os dados relativos às sanções por eles aplicadas.

§ 2º O Cnep conterá, entre outras, as seguintes informações acerca das san-


ções aplicadas:

22 CAMPOS, Patrícia Toledo de. Comentários à Lei nº 12.846/2013 – Lei Anticorrupção. Revista Digital de
Direito Administrativo USP, v. 2, n. 1, 2015. Disponível em: <http://www.revistas.usp.br/rdda/article/
download/80943/pdf_10>. Acesso em: 01 abr. 2015, p. 20.

DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NA ESFERA ADMINISTRATIVA: 119


I – razão social e número de inscrição da pessoa jurídica ou entidade no Cadas-
tro Nacional da Pessoa Jurídica – CNPJ;

II – tipo de sanção; e

III – data de aplicação e data final da vigência do efeito limitador ou impeditivo


da sanção, quando for o caso.

§ 3º As autoridades competentes, para celebrarem acordos de leniência pre-


vistos nesta Lei, também deverão prestar e manter atualizadas no Cnep, após a
efetivação do respectivo acordo, as informações acerca do acordo de leniência
celebrado, salvo se esse procedimento vier a causar prejuízo às investigações
e ao processo administrativo.

§ 4º Caso a pessoa jurídica não cumpra os termos do acordo de leniência, além


das informações previstas no § 3º, deverá ser incluída no Cnep referência ao
respectivo descumprimento.

§ 5º Os registros das sanções e acordos de leniência serão excluídos depois de


decorrido o prazo previamente estabelecido no ato sancionador ou do cumpri-
mento integral do acordo de leniência e da reparação do eventual dano causa-
do, mediante solicitação do órgão ou entidade sancionadora.

Art. 23. Os órgãos ou entidades dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário


de todas as esferas de governo deverão informar e manter atualizados, para
fins de publicidade, no Cadastro Nacional de Empresas Inidôneas e Suspensas
– CEIS, de caráter público, instituído no âmbito do Poder Executivo federal, os
dados relativos às sanções por eles aplicadas, nos termos do disposto nos
arts. 87 e 88 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993.

Verifica-se a pretensão do legislador em agrupar e conferir publicidade às san-


ções aplicadas pelo Poder Público às empresas responsabilizadas pela prática de atos
lesivos à Administração Pública, bem como aos acordos de leniência celebrados.
Registre-se que qualquer punição conferida às pessoas jurídicas ensejará inscrição
de sua razão social no Cadastro Nacional de Empresas Punidas (CNEP), o qual deverá
ser alimentado periodicamente pela autoridade competente de cada órgão.
O cadastro nacional é relevante para distinção dos quadros societários em que
estariam os mesmos sócios de pessoas jurídicas impedidas de licitar e de contratar
com a Administração Pública, daqueles em que figurariam terceiros, a encobrir os
antigos sócios impedidos. Facilita a identificação dos casos de indivíduos que operam
como intermediários, vulgarmente conhecidos como “laranjas”, que seriam sócios
de direito, mas não de fato, sendo que em muitas ocorrências sequer têm conheci-

120 Renata Tatiana Nunes Junqueira Franco


mento dessa situação, muito menos formação nem meios para assumirem os devidos
encargos.
Por fim, o CNEP servirá como banco de dados importante para consulta pre-
liminar às contratações dos órgãos da Administração direta, fundos especiais, au-
tarquias, fundações públicas, empresas públicas, sociedades de economia mista
e demais entidades controladas pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios,
impedindo às empresas com restrições pactuar com o Estado. É o que se extrai do
Decreto nº 8.420/2015:

Art. 43. O Cadastro Nacional de Empresas Inidôneas e Suspensas – CEIS con-


terá informações referentes às sanções administrativas impostas a pessoas
físicas ou jurídicas que impliquem restrição ao direito de participar de licitações
ou de celebrar contratos com a administração pública de qualquer esfera fede-
rativa, entre as quais:

I – suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de con-


tratar com a administração pública, conforme disposto no inciso III do caput do
art. 87 da Lei nº 8.666, de 1993;

II – declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a administração


pública, conforme disposto no inciso IV do caput do art. 87 da Lei nº 8.666,
de 1993;

III – impedimento de licitar e contratar com União, Estados, Distrito Federal ou


Municípios, conforme disposto no art. 7ºda Lei nº 10.520, de 17 de julho de
2002;

IV – impedimento de licitar e contratar com a União, Estados, Distrito Federal


ou Municípios, conforme disposto no art. 47 da Lei nº 12.462, de 04 de agosto
de 2011;

V – suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de con-


tratar com a administração pública, conforme disposto no inciso IV do caput do
art. 33 da Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011; e

VI – declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a administração


pública, conforme disposto no inciso V do caput do art. 33 da Lei nº 12.527,
de 2011.

Art. 44. Poderão ser registradas no CEIS outras sanções que impliquem res-
trição ao direito de participar em licitações ou de celebrar contratos com a
administração pública, ainda que não sejam de natureza administrativa.

DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NA ESFERA ADMINISTRATIVA: 121


9. CONCLUSÃO

Como o objetivo da definição das infrações administrativas e aplicação de san-


ções a quem nelas incorrer é o desestímulo à prática dos comportamentos proibidos,
por certo o aprimoramento dos mecanismos de coerção à burla a tais cominações é
compatível com a essência ética do Direito, além de desejável, salutar e eficiente aos
casos práticos.
Desconsiderar a personalidade jurídica como forma de atender aos princípios
da moralidade administrativa e da supremacia do interesse público no âmbito do pro-
cedimento administrativo permite que a proibição de participar de licitações e/ou de
contratar com a Administração Pública atinja os sócios e, dessa forma, inviabilize
a criação de uma nova empresa com o mesmo objeto para desviar da penalidade
imposta.
O legislador inseriu a desconsideração da personalidade jurídica pela Adminis-
tração Pública na Lei nº 12.846/2013, superando a discussão sobre a legitimidade da
aplicação da Disregard doctrine em face do princípio da legalidade, já que a doutrina
tradicional negava aos órgãos administrativos a possibilidade de manifestarem von-
tade autônoma nos casos em que inexistir legislação específica.
O dispositivo legal consolidou importante ferramenta a evitar que se constitua
nova sociedade, com idênticos objetos sociais, sócios e endereço, em substituição
a outra declarada inidônea para licitar ou contratar com a Administração, além de
contribuir à correta aplicação das pesadas penalidades trazidas na Lei para que as
empresas se abstenham de atos destoantes de parâmetros ético-jurídicos.
De modo geral a corrupção propicia a apropriação privada de recursos públicos
que deveriam ser investidos na persecução de políticas funcionalizadoras de direitos
fundamentais. Viola frontalmente os objetivos elencados no artigo 3º, incisos I, II, III
e IV, da CF/88 e, em última análise, o princípio da dignidade da pessoa humana, des-
tacado em seu artigo 1º, inciso III. Como resultado do clamor popular, a denominada
Lei nº 12.846/2013 veio a reforçar as estratégias de combate à corrupção em sentido
amplo, de modo a atacar fraudes, conluios licitatórios, manipulações do equilíbrio
econômico-financeiro de contratos da Administração, atos de corrupção ativa, bem
como práticas destinadas a obstar a ação fiscalizatória do Estado.
Malgrado somente a previsão de sanções potenciais graves não baste para
produzir efeitos dissuasivos enérgicos quando vige um clima de impunidade, não raro
resultante da reconhecida incapacidade estatal de investigar e descobrir indícios de

122 Renata Tatiana Nunes Junqueira Franco


infrações complexas, é daí que decorre a relevância da inserção da desconsideração
da personalidade jurídica na Lei Anticorrupção.
A desconsideração da personalidade jurídica pela própria Administração Pública
visa justamente reprimir condutas de agentes privados lesivas ao erário. É correto e
adequado instrumento contra manipulação da pessoa jurídica com o ilícito objetivo de
viabilizar o abuso de direito e a prática de fraude. Mesmo como prática excepcional e
em estrita observância dos postulados básicos garantidores do devido processo legal,
possibilita a cominação e persecução das sanções administrativas, além da reparação
dos danos ao patrimônio estatal.

REFERÊNCIAS
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05 de outubro de 1988, com as alterações adotadas pelas Emendas Constitucionais nos 1/1992
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2003 e assinada pelo Brasil em 09 de dezembro de 2003. Diário Oficial [da] República Fede-
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DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NA ESFERA ADMINISTRATIVA: 123


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da Presidência da República e dos Ministérios, a legislação da Agência Nacional de Aviação
Civil (Anac) e a legislação da Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero); cria
a Secretaria de Aviação Civil, cargos de Ministro de Estado, cargos em comissão e cargos de
Controlador de Tráfego Aéreo; autoriza a contratação de controladores de tráfego aéreo tempo-
rários; altera as Leis nos 11.182, de 27 de setembro de 2005, 5.862, de 12 de dezembro de 1972,
8.399, de 07 de janeiro de 1992, 11.526, de 04 de outubro de 2007, 11.458, de 19 de março de
2007, e 12.350, de 20 de dezembro de 2010, e a Medida Provisória nº 2.185-35, de 24 de agosto
de 2001; e revoga dispositivos da Lei nº 9.649, de 27 de maio de 1998. Diário Oficial [da] Re-
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altera a Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, o Decreto-Lei nº 3.689, de 03 de outubro de
1941 – Código de Processo Penal, e a Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985; revoga dispositivos
da Lei nº 8.884, de 11 de junho de 1994, e a Lei nº 9.781, de 19 de janeiro de 1999; e dá outras
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128 Renata Tatiana Nunes Junqueira Franco

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