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PESQUISAS QUANTITATIVAS E QUALITATIVAS PARA A EDUCAÇÃO:

POSSIBILIDADES E LIMITAÇÕES

Rômulo Afonso Santos Ribeiro1

Introdução

A pesquisa permeia o ser humano desde os primórdios de sua existência. As


necessidades mais básicas inerentes a sobrevivência da espécie humana estão
relacionadas a busca pelo desconhecido. Podemos citar como exemplo as antigas
tribos do Alasca inuits que desenvolveram técnicas apuradas de sobrevivência nos
inóspitos e gélidos territórios. Essas técnicas, por elas praticadas, foram
desenvolvidas por conta de seus anseios e necessidades os quais remetem as
pesquisas do senso comum. São do cotidiano, as quais não exigem rigor técnico,
verificabilidade e diálogo com referenciais teóricos.
Porém, o que vamos tratar neste trabalho relaciona-se com a pesquisa
científica que é a busca metódica pela resolução do novo influenciada pela
intencionalidade do pesquisador, Kant (1958) afirma que nos é completamente
desconhecido a natureza do objeto em si mesmo somente percebemos tal objeto de
maneira peculiar, ou seja, o pontapé inicial da pesquisa é a necessidade e o
envolvimento do pesquisador com o que se deseja verificar. Ele é um ser social
carregado de emoções que se relaciona com o meio e por ele é influenciado, essas
inter-relações são permeadas por problemas que afloram e se revelam a serem
questionados pela sociedade.
Nesse contexto de que a pesquisa é o exercício intencional do intelecto em
prol da melhoria das condições práticas da existência, o presente texto, produto das
discussões e leituras ocorridas durante a disciplina de Seminário de Pesquisa, do
Programa de Pós-Graduação em Educação tem como objetivo principal
compreender importância das pesquisas qualitativas e quantitativas para a
educação, já que a investigação do objeto de pesquisa requer uma metodologia
enraizada em pressupostos matemáticos ou de cunho mais crítico e de múltiplas
determinações. Para isso, apresentaremos os principais objetivos e características

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Mestrando do Programa de Pós-graduação stricto sensu em Educação pela Universidade
Estadual do Oeste do Paraná
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de cada viés e suas contribuições para a educação dialogando com Gatti (2004) e
Bogdan (1994).
É notório que, ao término do período em que a educação abarcava o
tecnicismo e o progresso, as pesquisas sofreram mudanças trazendo em seu bojo
uma maior preocupação com o processo e não mais com o produto final dando lugar
as perspectivas mais críticas e humanizadas.
Os estudos qualitativos ganham espaço, pois, dão um enfoque maior as
perspectivas subjetivas em detrimento de experimentos controlados em laboratórios,
extremamente quantificáveis através de cálculos matemáticos e estatísticos. Porém,
há uma preocupação por parte dos estudiosos em que as metodologias atuais
estejam alinhadas com a prática deixando de lado o diálogo com o arcabouço
teórico.
Ao que se refere as pesquisas na educação no contexto brasileiro ainda é
ínfima no que tange a metodologia de viés quantitativo. Faremos discussões sobre
essas abordagens, a partir de meados do período tecnicista, em que evidenciam
trabalhos na área da educação que problematizam os processos.
Após as discussões das possibilidades e limitações de cada perspectiva,
ficará evidente que cada uma possui técnicas e meios para análise da realidade.
Caberá ao pesquisador identificar, a partir de referenciais teóricos e métodos de
apreensão da realidade, qual das pesquisas abarcará o melhor caminho em busca
de respostas.

Abordagens quantitativas na educação

Nos dias atuais, as pesquisas no âmbito da educacional vêm sofrendo com o


abandono da perspectiva quantificável. É certo que ao se discutir o analfabetismo e
suas múltiplas determinações se faz necessário aplicar metodologias aliadas aos
cálculos e estatística para que tenhamos dados confiáveis a partir da identificação
de variáveis.
Segundo Gatti (2004), ao lidarmos com métodos quantitativos devemos
identificar o seu devido alcance ao ponto de nos depararmos com o novo e o método
não oferecer as devidas respostas que por ora emergem. Outra situação que
devemos nos precaver é a respeito da escolha da perspectiva epistêmica e as
perguntas que irão permear o processo de buscar por respostas. O pesquisador ao
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identificar e problematizar seu objeto da pesquisa, a partir da escolha de um método


científico, se valerá das diversas dimensões que envolvem a sua investigação.
Fato é que de nada vale tabelas e gráficos que representam dados sem que
o investigador tenha rigor científico e reflexão teórica para analisá-los fornecendo
valor qualitativo em prol da mudança da realidade. O investigador ao se deparar com
os dados experimentais em sua forma plena deve colocar intencionalidade balizado
pela cientificidade de forma a moldar tais dados e conferir autenticidade de acordo
com o objetivo da pesquisa.
Em meados do período da ditadura militar no Brasil, uma pequena parte das
obras literárias e trabalhos acadêmicos em suas mais diversas formalidades
apresentavam procedimentos descritivos ou análise de gráficos e tabelas, a outra
parte se valia de um viés qualitativo, porém, de análise e descrição histórica. Nesse
mesmo período, os estudos com viés quantitativo na educação eram realizados por
especialistas os quais não eram educadores: filósofos, sociólogos e economistas.
Tais estudos tinham por análise os dados categoriais que se apresentam em
classes, os ordenados que demonstram posições e os métricos que evidenciam
mensurações.
Gatti (2004), em sua obra “Estudos quantitativos em educação. Educação e
Pesquisa”, traz uma diversidade de obras de cunho quantitativo para educação
contempladas nos mais diversos periódicos para dialogar a respeito da
aplicabilidade e uso das metodologias. O autor traz em diversos textos de Alceu
Ferrari relacionados ao analfabetismo em que faz comparações e levantamentos de
dados de diversas naturezas o qual comprova-se que o ambiente escolar provoca o
analfabetismo por meio da exclusão ao acesso escolar e da reprovação dos alunos.
Ainda faz duras críticas as políticas educacionais do período em que a educação
tinha como viés o tecnicismo dizendo que o poder público da época era autoritário,
excludente e seletivo.
Ainda, o autor traz para as discussões as diversas formas de repetência
praticadas no dia-a-dia e suas consequências de forma quantificável relaciona
índices de renda e grupos populacionais diferentes concluindo que a repetência é
boa para o aluno e mostra que o sistema educacional se mostra eficaz.
No tocante a questão do letramento, Gatti (2004) nos traz pesquisas que
apresentam números e estatísticas a respeito de uma grande parcela da população
brasileira demonstrando habilidades restritas a leitura e essas restrições refletem o
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acesso aos bens culturais, melhores oportunidades de trabalho e engrandecimento


pessoal.
Quanto as políticas de educação básica, o papel do Estado tem grande
relevância enquanto detentor do poder já que determina as regulamentações no
âmbito educacional. Durante o texto Gatti (2004) faz inferências a respeito da escola
que se torna meio reprodutor das ideologias dominantes distanciando qualquer
possibilidade de ação arraigada de democratização e participação populacional.
As metodologias voltadas para estatísticas serviram pra elucidar que, quanto
mais subalterna a origem social do aluno, mais baixas as notas obtidas e mais altas
as porcentagens de repetência, especialmente nas séries iniciais o que nos remete
ao que Gatti (2004) dizia: a repetência é reprodutora da repetência.
Ao que concerne a avaliação escolar, ainda se verifica uma valorização dos
modelos avaliativos que se apresentam através de médias que agregam valor ao
conhecimento “adquirido” sem que haja a percepção de assimilação e construção do
saber aplicado em provas.
Os estudos apresentados no bojo da obra Gatti (2004) evidenciam fino trato
com a pesquisa quantitativa, distanciando-se do “achismo” e propiciando qualidade
aos dados numéricos que são apresentados. Percebe-se que sem os dados,
categorias e métricas muitos estudos se tornariam inviáveis ocasionando problemas,
ainda maiores, na resolução da problemática socioeducacional e, muito menos,
abririam vertentes para novas pesquisas de cunho qualitativo.

Abordagens qualitativas na educação

Para trazermos as possibilidades e limitações da pesquisa qualitativa


dialogaremos com Bogdan (1994) que nos remete a vertente mais subjetiva do
objeto ser pesquisado, nesses casos, as multiplicidades que envolvem o problema
são de interesse de investigação. O que se pretende é contemplar as múltiplas
determinações do objeto que é determinado e determinante no amplo processo da
pesquisa. Para o autor, o viés subjetivo depreende cinco características que se
coadunam.
A primeira característica está relacionada ao ambiente natural de coleta de
dados por parte do investigador. O contato direto com do sujeito carregado de suas
vivências e subjetividades é que evidencia o entendimento do fenômeno
pesquisado. Porém, a apreensão do ambiente em que ocorre a pesquisa, também,
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se faz necessária, já que há um fundo histórico envolvente para os vários caminhos


que a pesquisa qualitativa pode rumar. Quando a investigação envolve a produção
do sujeito enquanto objeto de verificação, se faz necessária e rigorosa a apreciação
das condições e influências que originaram tal objeto.
A segunda característica relata Bogdan (1994) que é descritiva. Os dados
coletados, a partir das entrevistas, anotações, imagens e outros são diferentes dos
de expressões numéricas que são apenas informados. O pesquisador ao indagar
mundo a sua volta se depara com as necessidades, onde suas origens, segundo
Gamboa (2015), estão na realidade concreta. Esse processo de indagação passa
por uma atitude crítica geradora de perguntas e respostas as quais originarão o
problema. Tal problema se for abordado qualitativamente, suas determinações,
características e tudo que estiver interrelacionado deve ser observado
rigorosamente.
Diferentemente das premissas quantitativas que visam o produto final, o
autor fala sobre a terceira característica: a importância do processo para elucidação
do problema que se espera solucionar. A pesquisa subjetiva foca nas determinações
que permeiam toda a problemática, sendo que a pesquisa pode assumir novos
rumos.
E como quarta perspectiva, o investigador toma como método a indução em
que Bogdan (1994) relata que as abstrações são construídas conforme os dados
particulares são apreendidos e organizados no intelecto. O pesquisador ao se
debruçar em seu objeto de pesquisa vai montando um emaranhado de conceitos e
teorias para que ao final consiga dar conta de apresentar discussões e soluções
sobre a sua pesquisa.
Já o significado faz parte da pesquisa qualitativa. Os seres humanos
atribuem valores para as suas vivências, essas representações são de interesse do
método subjetivo. Ao estudar uma comunidade, as várias simbologias produzidas
por ela são de apreensão do investigador, pois, esses significados em conjunto
formam caminhos para que se compreenda a problemática.
Ao adentrarmos sobre os textos de pesquisador verificamos a utilização de
abordagens tanto quantitativa quanto qualitativas, porém, cabe salientarmos que o
emprego delas conjuntamente pode gerar grandes problemas, conforme Gatti
(2004), diz que pesquisadores inexperientes sem o domínio das características e
emprego podem ocasionar um perigoso ecletismo e frágil hibridismo. Sendo assim,
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nem uma, nem outra será aprofundada e utilizada de maneira a propiciar a busca
pelo rigor técnico.
Ao tratarmos da questão generalizante da pesquisa qualitativa, o que se
pretende é, a partir da investigação de um caso particular, chegar num consenso em
que os processos de busca do conhecimento sejam aplicáveis de modo universal.
Claro que ao nos debruçarmos sobre uma turma ou sala de aula devemos verificar
quais são multiplicidades e forças motrizes que em conjunto permeiam o movimento
de existência do objeto pesquisado. Tomemos como exemplo uma turma de alunos
em localidades ribeirinhas que são influenciados pela dinâmica natural
diferentemente de uma classe de alunos disposta em zonas de conflitos bélicos que
possuem determinantes totalmente diferentes e que não podem ser generalizados
nessa situação.
O pesquisador deve ter plena ciência de que os conceitos pré-concebidos
(preconceitos) e juízos de valor não satisfazem a pesquisa. A investigação investida
de método, metodologia, objeto bem definido e instrumentos de coleta não pode
abarcar, em hipótese alguma, discussões sem rigor e juízos concebidos de falácias
e “achismos”. Pois, dessa maneira não se faz ciência.
Por fim, coube em rápidas palavras apresentar as possibilidades e limitações
da metodologia qualitativa. Podemos perceber que as perspectivas fazem uso de
técnicas e instrumentos em prol do processo e busca de soluções pragmáticas sem
esquecer da teoria.

Considerações finais

Considerar as duas perspectivas como de fácil compreensão e leitura não é


algo simplório, apenas, com o aprofundamento teórico de autores que discutem a
temática é que nos conduzem a um desvelar das pesquisas. A investigação está
presente no movimento contraditório da existência do ser social. As relações da
sociedade com o meio evidenciam a importância da pesquisa já que ela possui um
bem maior: apresentar soluções de problemas que afligem a o convívio social.
Identificamos as abordagens quantitativas e qualitativas dialogando com
autores como Bogdan (1994), Gatti (2004), Gamboa (2015), cada um trazendo as
devidas contribuições e limites de cada perspectiva. Ao que concerne a pesquisa
qualitativa verificamos que o investigador faz parte do processo enquanto ser social
munido de todas experiências e vivências, utiliza instrumentos de coleta de dados
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que propiciam a criticidade e descrição do objeto e considera que a problemática é


permeada por diversas determinantes de sua existência, ou seja, há de se
considerar que a coisa a ser investigada não existe por si só, é determinante e
determinada pelas suas relações com meio envolvente.
Quanto a pesquisa de cunho quantitativo, o investigador se coloca como
observador sem influenciar ou ser influenciado pelo objeto apenas coleta o dado e o
trata em “laboratório”, o método dedutivo em que a análise se faz do geral para o
particular e, principalmente, de técnicas mensuráveis requer apenas que os dados
numéricos sejam confirmados e atestados aliados a verificabilidade e plausibilidade.
Por fim, compreendemos que mesmo desacreditada a pesquisa quantitativa
foi importante através das obras que a partir do período tecnicista mostrou em
números, de fato, as várias problemáticas que permeiam o processo educacional no
Brasil e que a pesquisa qualitativa por mais que abarque mais possibilidades
inerentes ao objeto, também, se depara com limitações que devem se tratadas e
corrigidas pelo pesquisador.

Referências

BOGDAN, Robert; BIKLEN, Sari. Características da investigação qualitativa. In:


BOGDAN, Robert; BIKLEN, Sari. Investigação qualitativa em educação. Uma
introdução à teoria e aos métodos. Porto-Portugal: Porto, 1994. p.47-51.

______, Robert; BIKLEN, Sari. Nove questões frequentes sobre a investigação


qualitativa. In: BOGDAN, Robert; BIKLEN, Sari. Investigação qualitativa em
educação. Uma introdução à teoria e aos métodos. Porto-Portugal: Porto, 1994.
p.63-74.

GATTI, Bernadete. Estudos quantitativos em educação. Educação e Pesquisa, Vol


30, n1, jan-abr, 2004, pp 11-30.

GAMBOA, Silvio Sanchez. Projeto de pesquisa, fundamentos lógicos: a dialética


entre perguntas e respostas. Chapecó-SC: Argos, 2015.

KANT, Immanuel. Critique of Pure Reason. Nova York, Modern Library, 1958.

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