Formação e estrutura dos princípios fundamentais:
Anteriores constituições portuguesas: Os princípios fundamentais tratam-se, em geral,
de um conjunto de disposições sobre o território nacional (todas as constituições), a cidadania (a de 1822), o estado unitário (as de 1911 e de 1933), as tarefas do Estado (a de 1933), etc.. Não é difícil ver nesses preceitos precedentes diretos dos da atual CRP. A CRP não inclui nenhuma disposição sobre temas que eram comuns a várias constituições anteriores, como, por exemplo, a definição da nação, o estatuto das religiões, o conceito de regime político. Os princípios fundamentais e as revisões constitucionais: Primeira revisão (1982): Foram introduzidas algumas alterações significativas neste capítulo da CRP: o Supressão da referência explícita à herança revolucionária da CRP e atenuação da sobrecarga doutrinária programática de alguns preceitos, designadamente com eliminação das referências a «classes trabalhadoras» e «poder democrático das classes trabalhadoras»; o Admissão da vigência direta na ordem jurídica interna de normas emanadas de organizações internacionais de que Portugal faça parte. Além dessas alterações, importa ainda registar a introdução do conceito de: o «Democracia económica, social e cultural» e de «democracia participativa»; o A constitucionalização da figura da «zona económica exclusiva», o aditamento do «respeito dos direitos do homem» entre os princípios por que Portugal se rege nas relações internacionais; o A inclusão da proteção do património cultural, da natureza e do ambiente e recursos naturais, entre as tarefas fundamentais do Estado; o A reiteração do princípio da tipicidade constitucional das formas de exercício do poder político. Segunda revisão (1989): eliminação do objetivo da construção de uma «sociedade sem classes», da «transição para o socialismo, da «socialização dos principais meios de produção» e da «abolição da exploração e da opressão do homem pelo homem». Conjugadas com a profunda revisão da «constituição económica», estas alterações produziram uma substancial redução da dimensão finalista da CRP quanto à transformação do sistema económico e social. Foram introduzidos: «construção de uma sociedade livre, justa e solidária», «reforço da identidade europeia», «modernização das estruturas económicas e sociais». Nas tarefas fundamentais do Estado acrescentou-se uma nova destinada a «assegurar o ensino e a valorização permanente, defender o uso e promover a difusão internacional da língua portuguesa». Terceira revisão (1992): introduziu importantes novidades no capítulo dos princípios fundamentais, no que respeita à inserção constitucional da integração europeia, mediante o “exercício em comum dos poderes necessários à construção da união europeia”, observado o “princípio da subsidiariedade”. A constituição deu reconhecimento à “cidadania europeia”, conferindo direitos eleitorais aos cidadãos da União Europeia residentes em Portugal; Quarta revisão (1997): “separação e interdependência dos poderes” como dimensão do Estado de direito democrático, do “regime autonómico insular” e do “princípio da subsidiariedade” como dimensões da organização e funcionamento do Estado unitário português, da promoção da «igualdade entre homens e mulheres» entre as tarefas fundamentais do Estado e do princípio referendário como modo de exercício do poder político; Quinta revisão (2001): as suas principais alterações deram-se justamente nos princípios fundamentais, onde foi alterado o nº 6 do art.7.º, sobre a realização de um espaço de liberdade, segurança e justiça no âmbito da União Europeia, e acrescentado o nº 7 no mesmo preceito, autorizando a adesão ao Estatuto de Roma, que instituiu o Tribunal Penal Internacional; Sexta revisão (2004): A sexta revisão constitucional voltou a rever a “cláusula constitucional da UE” e introduziu a nº 4 do art.8º, sobre a vigência do direito da UE na ordem interna no termos previstos no próprio direito da União, consagrando assim os princípios da sua vigência direta e da sua primazia na ordem interna; Sétima revisão (2005): não afetou este capítulo da CRP.
Estrutura e relevância constitucional dos princípios fundamentais:
Estrutura dos princípios fundamentais: a lógica sistemática interna do capítulo introdutório da Constituição não é transparente. Os princípios fundamentais não são homogéneos quanto ao seu objeto e conteúdo, podendo identificar-se três grupos principais: oPrimeiro grupo: é constituído pelos preceitos que definem e caracterizam jurídico-constitucionalmente a coletividade política e o Estado em que ela se organiza; oSegundo grupo: é constituído pelas chamadas opções políticas fundamentais conformadoras da Constituição, através do princípio da independência nacional, do princípio democrático e do princípio do «Estado social», a identidade política de Portugal e as opções quanto ao sistema político, económico e social; oTerceiro grupo: é constituído pelos preceitos que contêm princípios fundamentais da ordem jurídico-constitucional. Lugar e função constitucional: Os princípios fundamentais visam essencialmente definir e caracterizar a coletividade política e o Estado e enumerar as principais opções político-constitucionais. Os princípios fundamentais, nas suas múltiplas dimensões e desenvolvimentos, formam o cerne da Constituição e consubstanciam a sua identidade intrínseca. Por isso, todos os princípios fundamentais estão, em maior ou menor medida, garantidos contra a revisão constitucional, erigidos em limites materiais de revisão. Nem todos os limites materiais de revisão têm expressão direta nos princípios fundamentais introdutórios. Relevância jurídico-constitucional dos princípios fundamentais: natureza, a estrutura e a relevância jurídica não são as mesmas para todas as normas deste capítulo. Há normas materiais e simples normas de remissão para normas extraconstitucionais, dentro das primeiras há princípios, normas programáticas em sentido estrito, normas qualificadoras de tarefas do Estado. Há algumas, como as normas-síntese ou normas-matriz contidas nos princípios políticos fundamentais, que têm uma relevância jurídica limitada essencialmente à interpretação e integração das normas de que são a súmula, ou que as desenvolvem. Preâmbulo da Constituição: a CRP inclui à cabeça um prólogo (“Preâmbulo”), que se apresenta como uma espécie de “certidão de nascimento” da Constituição, invocando a sua origem histórica e enunciando os seus grandes princípios. Não contendo preceitos constitucionais, ele (preâmbulo) não pode ser invocando diretamente como fonte de direitos ou obrigações constitucionais. O Preâmbulo nunca foi revisto. Por isso, ou se dá como caduca essa referência político- ideológica, ou se procede à sua “releitura” em conformidade com o novo texto da Constituição, no sentido de ver aí a consagração do princípio do Estado social.