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UNIVERSIDADE DE PASSO FUNDO

INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS


CURSO DE LETRAS
DISCIPLINA: ENUNCIAÇÃO E DISCURSO
PROFESSOR: DR. ERNANI CÉSAR DE FREITAS
ACADÊMICO: FELIPE QUEVEDO GIOVANONI

O sentido no discurso: O olhar da Teoria da Argumentação na Língua - Leci Borges Barbisan

Para chegarmos à compreensão do olhar que essa teoria (TAL) lança sobre a linguagem para
explicar o sentido construído no discurso, torna-se necessário que revisitemos teorias que a
antecederam, das quais ela se faz devedora, já que encontrou nelas seus fundamentos filosóficos.

Em busca das origens: Platão

1. Procuramos apoio da filosofia de Platão para a explicação dos fundamentos da Teoria da


Argumentação na Língua.
a. Toda coisa é, de fato, a mesma que ela própria, e diferente das outras; eis seus limites,
isto é, sua essência.
b. Identidade e diferença são, assim, dois princípios supremos - tornados possíveis pela
comunicação recíproca - que definem cada coisa.
c. Tudo que é real existe porque há um poder de comunicação recíproco. Esse poder de
comunicação é o ser. O que não produz nenhum efeito ou que não pode sofrer nenhum
efeito não existe
d. Cada coisa é idêntica a ela mesma, mas também é diferente das outras. Há um olhar
para dentro e para fora.
e. Então a definição de cada coisa é dupla: cada coisa não é só o que ela é; ela é também
diferente do que ela não é.
f. “Da essência do outro, diremos que ela circula através de todas [as categorias] porque se
cada uma delas, individualmente, é diferente das demais não é em virtude da sua própria
essência, mas de sua participação na natureza do Outro”.

Em busca das origens: Ferdinand de Saussure

1. Se tomarmos o Curso de Linguística Geral, veremos que, ao criar a noção de valor, Saussure
aplica às palavras da língua o que Platão disse sobre as Ideias.
a. “Para reencontrar na sua essência o platonismo saussuriano, é preciso reconhecer na
linguagem uma função mais fundamental. Uma função que se satisfaça com a pura
alteridade ou mesmo que a implique. É justamente o que fazem há alguns anos certos
linguistas, cuja reflexão alimentou-se das pesquisas de Émile Benveniste. Para eles [...] a
língua é, antes de mais nada, o lugar da intersubjetividade, o lugar onde os indivíduos se
confrontam, o lugar onde encontro o outro.”
b. Se a língua é o lugar da intersubjetividade, se é na língua que encontramos o outro,
então, do mesmo modo que o Outro de Platão, a realidade linguística é [...]
fundamentalmente opositiva, já que uma entidade linguística só pode definir-se num
diálogo.
c. O Curso de Linguística Geral (CLG) tomou a língua como objeto de estudo, então
Saussure construiu sua noção de valor, aplicando à língua o pensamento de platão.
O emprego da língua: ainda em busca das origens em Saussure e em Benveniste

1. Escritos de linguística geral:


a. A língua só é criada em vista do discurso, mas o que é que separa o discurso da língua,
ou o que é que, em certo momento, permite que a língua entre em ação como discurso?
b. O discurso consiste, mesmo que rudimentarmente, e por caminhos que ignoramos, em
afirmar um elo entre conceitos que se apresentam revestidos pela forma linguística,
enquanto a língua anteriormente não faz mais do que realizar conceitos isolados, que
esperam ser postos em relação entre eles para que haja significação de pensamento.
■ A língua tem por finalidade o discurso;
■ Língua e discurso são distintos;
■ A língua contém conceitos isolados revestidos pela forma linguística, os quais, se
postos em relação, produzirão sentido no discurso;
■ A ação necessária para que a língua produza discurso, deverá prever um agente,
um “indivíduo”, como refere Saussure, que servirá da língua para significar seu
pensamento para outro “indivíduo”.
2. A língua contém signos isolados, que, quando postos, por um “indivíduo”, em relação com outros
signos significam o pensamento e produzem sentido no discurso; uma sequência de signos
isolados, embora tenha conceitos, não produz discurso.
3. Com essas observações [...] encontramos o conceito filosófico da alteridade na construção de
sua concepção de valor linguístico e, em decorrência, no papel fundamental que o valor assume
na concepção de discurso.
4. Pensar em enunciação leva a pensar em Benveniste. Ora, Benveniste, sem ter tido
conhecimento dos manuscritos de Saussure, apresenta em seu último artigo “O aparelho formal
da enunciação”, muita semelhança com o pensamento saussuriano de transformação da língua
em discurso.

O emprego da língua em Ducrot

1. Também Oswald Ducrot criou uma proposta linguística do emprego da língua para pensar o
discurso. Sua Teoria da Argumentação na Língua faz a descrição semântica da linguagem
fundamentada em alguns conceitos saussurianos.
2. A teoria que Ducrot construiu parte do princípio de que o sentido é produzido pelas relações que
se estabelecem no discurso.
3. Ducrot encontra em seu trabalho diferentes formas de mostrar nas palavras da língua o que
Saussure já havia trazido de Platão para a linguagem.
4. É pela alteridade, fundamento da noção de valor, que o sentido se produz na linguagem.
5. Ducrot entende a língua como construção teórica para explicar a fala. A língua é construção do
linguista. A fala é constituída de dados observáveis, é o enunciado produzido pelo locutor para o
seu alocutário.
6. É a partir das palavras que a enunciação deve ser caracterizada, porque a escolha das palavras
cria uma imagem da fala, e essa imagem é pertinente para a compreensão do sentido no
discurso.
7. Do ponto de vista semântico, a frase é dotada de significação, e o enunciado, de sentido.
Significação e sentido são de naturezas distintas.
8. A significação, como objeto construído pelo linguista, faz referência ao sentido produzido pelo
locutor no acontecimento enunciativo que é o enunciado.
9. A enunciação é marcada no enunciado, constituindo parte de seu sentido. A relação entre
locutor e alocutário comporta imagens de ambos no discurso.
10. É pela escolha de diferentes formas de enunciar, ao relacionar palavras e frases, que o locutor
constrói seus sentidos e, ao mesmo tempo, evoca, pelas escolhas que faz, outros sentidos, com
os quais relaciona os seus. [...] Encontramos assim a polifonia, conceito criado por Ducrot.
Tocamos novamente na alteridade, desta vez pela relação que estabelece entre os discursos.
11. A palavra sentido remete, assim, tanto a significado quanto a direção, explica Ducrot (1990): o
sentido de uma palavra é, ao mesmo tempo, um significado, e uma orientação no discurso. Em
decorrência do valor argumentativo, que congrega subjetividade e intersubjetividade, ao
falarmos colocamos a realidade a serviço de nossas argumentações.

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