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Grupo de Estudos em Ensino Superior

2o semestre de 2013 – Encontro 1: Formação Docente

Comentários sobre o livro Saberes Docentes e Formação Profissional,


de Maurice Tardif

Guilherme Mirage Umeda

O livro explora o que o autor denomina uma “epistemologia do saber docente”, ou seja,
as noções que perpassam a natureza daquilo o que um professor sabe. O que é esse
saber? Como ele é adquirido? De onde ele advém? São estas as questões fundamentais
que guiará o percurso do livro.

Fica evidente ao longo da leitura que se trata de uma coletânea de ensaios, mais do que
uma obra escrita organicamente. Não por falta de coerência; pelo contrário, vê-se
claramente a especialização do autor em torno do tema tratado. Porém, por isso mesmo,
o texto se torna por vezes repetitivo, quando retorna a pressupostos da concepção
central de Tardif sobre a questão do saber docente como se deles já não se houvesse
falado. Há ganhos e perdas nesse sentido: por um lado, acredito ser possível ler os
capítulos de maneira isolada sem maiores prejuízos; por outro, as repetições tendem a
cansar.

Nesse sentido, acredito que a leitura da introdução e do primeiro capítulo são as mais
importantes para se familiarizar com a obra. Gosto também do oitavo capítulo, que traz
uma reflexão sobre as reformas que ocorrem há décadas no ensino canadense e norte-
americano, no que diz respeito à formação docente. De certa maneira, fornece pistas do
que o autor considera como sendo um programa interessante para a preparação
profissional de um professor.

É preciso destacar que o livro foi escrito pensando-se predominantemente no professor


de ensino infantil, fundamental e médio. Isso é relevante em muitos aspectos. A começar
que há na educação junto aos adultos especificidades que não são condizentes com as
condições gerais da educação de crianças. Segundo, porque toda a regulamentação em
torno do ensino básico cria um contexto diferente no que diz respeito à aquisição dos
saberes docentes. Logo explicarei melhor essa ideia.

A primeira noção central da obra de Tardif é a de que os saberes docentes – aquilo o que
um professor sabe e que lhe é exigido no exercício da profissão – são plurais,
heterogêneos e construídos no tempo e socialmente. Não é um saber individual,
tampouco impessoal: na verdade, trata-se de um saber altamente pessoal, mas de
pessoas imersas em um contexto social. A segunda ideia que me parece importante na
leitura da obra é a importância, na opinião dos próprios professores, dos saberes
adquiridos, forjados e aplicados na prática docente – chamado pelo autor de saberes
experienciais.

Tardif fornece ao longo do livro modelos classificatórios ligeiramente distintos para


tratar dos saberes docentes. Combinando dois deles, podemos pensar nos seguintes
componentes:
a. Saberes pessoais (adquiridos ao longo da história de vida, nas socializações primárias e
secundárias. É fundamental aqui lembrar que o professor é um profissional que passou
16 anos de sua vida em seus ambientes de trabalho antes mesmo de começar a
trabalhar).
b. Formação profissional (ciências da educação e doutrinas ou saberes pedagógicos. Aqui,
vejo uma diferença significativa em relação aos professores universitários, que, via de
regra, não possuem este tipo de formação).
c. Saberes disciplinares (específicos das áreas de conhecimento no qual o professor
ministra – ex. matemática, física, química, etc.).
d. Saberes curriculares (programas escolares – uma espécie de herança institucional,
transmitida em seus discursos).
e. Saberes experienciais (“brotam da experiência e são por ela validados”).

Sobre estes saberes, o que me chamou atenção ao longo da leitura foi a ideia de que os
experienciais são os mais valorizados pelos próprios professores e, por isso, têm espaço
privilegiado na discussão empreendida por Tardif. Nas pesquisas do autor, demonstra-
se que os conteúdos tratados nas faculdades (em especial nos cursos de Educação e
Pedagogia) não fornecem tanto suporte à prática docente quanto os saberes adquiridos,
testados e consolidados no próprio exercício da profissão. Duas consequências
importantes são: torna-se necessário melhor valorizar o saber específico dos
professores, cujo dia a dia constitui o principal campo de reflexão e geração de
conhecimento sobre o que é ser professor; é imprescindível que se repense os modelos
atuais de formação de professores, centrados muitas vezes em saberes que não
contribuem de maneira efetiva para a prática docente.

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