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EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA

GÊNERO E ENSINO
Prof. Me. Jefferson Campos * Prof.ª Me. Raquel Fregadolli Gonçalves

UNIDADE I
introdução à
TEORIA DOS
GÊNEROS
UNIDADE II
OS GÊNEROS
DISCURSIVOS:
fundamentos
teóricos-metodológicos

UNIDADE III
GÊNEROS
TEXTUAIS:
procedimentos
de trabalho

FUNDAMENTOS
O ENSINO DE ESPECIFICIDADES DO
TEÓRICO-
LÍNGUA PORTUGUESA GÊNERO VERBO-VISUAL
METODOLÓGICOS
palavra do reitor

Reitor
Wilson de Matos Silva

Viver e trabalhar em uma sociedade global é um institucionais e sociais; a realização de uma


grande desafio para todos os cidadãos. A busca por prática acadêmica que contribua para o desen-
tecnologia, informação, conhecimento de qualida- volvimento da consciência social e política e, por
de, novas habilidades para liderança e solução de fim, a democratização do conhecimento aca-
problemas com eficiência tornou-se uma questão dêmico com a articulação e a integração com
de sobrevivência no mundo do trabalho. a sociedade.
Cada um de nós tem uma grande responsa- Diante disso, o Centro Universitário Cesumar
bilidade: as escolhas que fizermos por nós e pelos almeja ser reconhecida como uma instituição univer-
nossos fará grande diferença no futuro. sitária de referência regional e nacional pela qualidade
Com essa visão, o Centro Universitário e compromisso do corpo docente; aquisição de com-
Cesumar – assume o compromisso de democra- petências institucionais para o desenvolvimento de
tizar o conhecimento por meio de alta tecnologia linhas de pesquisa; consolidação da extensão univer-
e contribuir para o futuro dos brasileiros. sitária; qualidade da oferta dos ensinos presencial e
No cumprimento de sua missão – “promo- a distância; bem-estar e satisfação da comunidade
ver a educação de qualidade nas diferentes áreas interna; qualidade da gestão acadêmica e adminis-
do conhecimento, formando profissionais cida- trativa; compromisso social de inclusão; processos
dãos que contribuam para o desenvolvimento de cooperação e parceria com o mundo do trabalho,
de uma sociedade justa e solidária” –, o Centro como também pelo compromisso e relacionamento
Universitário Cesumar busca a integração do permanente com os egressos, incentivando a edu-
ensino-pesquisa-extensão com as demandas cação continuada.

Direção Unicesumar

CENTRO UNIVERSITÁRIO DE MARINGÁ. Núcleo de Educação a Distância: Reitor Wilson de Matos Silva, Vice-Reitor Wilson de Matos Silva Filho, Pró-Reitor de Administração Wilson
C397 de Matos Silva Filho, Pró-Reitor de EAD Willian Victor Kendrick de Matos Silva, Presidente da Mantenedora
Nome do Livro / Professor. Cláudio Ferdinandi.
Publicação revista e atualizada, Maringá - PR, 2014.
61 p.
“Pós-graduação Núcleo Comum - EaD”. NEAD - Núcleo de Educação a Distância
1. ?????????????. 2. ?????????????. . 3. EaD. I. Título.
Direção de Operações Chrystiano Mincoff, Coordenação de Sistemas Fabrício Ricardo Lazilha, Coordenação
CDD - 22 ed. ??? de Polos Reginaldo Carneiro, Coordenação de Pós-Graduação, Extensão e Produção de Materiais Renato
CIP - NBR 12899 - AACR/2 Dutra, Coordenação de Graduação Kátia Coelho, Coordenação Administrativa/Serviços Compartilhados
Evandro Bolsoni, Gerência de Inteligência de Mercado/Digital Bruno Jorge, Gerência de Marketing
NEAD - Núcleo de Educação a Distância Harrisson Brait, Supervisão do Núcleo de Produção de Materiais Nalva Aparecida da Rosa Moura, Design
Av. Guedner, 1610, Bloco 4 - Jardim Aclimação - Cep 87050-900 Educacional Nalva Moura, Diagramação Melina Ramos, Revisão Textual Hellyery Agda Gonçalves da Silva,
Maringá - Paraná | unicesumar.edu.br | 0800 600 6360 Fotos Shutterstock.
boas-vindas

Pró-Reitor de EaD
Willian Victor Kendrick
de Matos Silva

Prezado(a) Acadêmico(a), bem-vindo(a) à Comunidade do


Conhecimento.
Essa é a característica principal pela qual a UNICESUMAR tem sido
conhecida pelos nossos alunos, professores e pela nossa sociedade.
Porém, é importante destacar aqui que não estamos falando mais
daquele conhecimento estático, repetitivo, local e elitizado, mas de um
conhecimento dinâmico, renovável em minutos, atemporal, global, de-
mocratizado, transformado pelas tecnologias digitais e virtuais.
De fato, as tecnologias de informação e comunicação têm nos
aproximado cada vez mais de pessoas, lugares, informações, da edu-
cação por meio da conectividade via internet, do acesso wireless em
diferentes lugares e da mobilidade dos celulares.
As redes sociais, os sites, blogs e os tablets aceleraram a informa-
ção e a produção do conhecimento, que não reconhece mais fuso
horário e atravessa oceanos em segundos.
A apropriação dessa nova forma de conhecer transformou-se hoje
em um dos principais fatores de agregação de valor, de superação das
desigualdades, propagação de trabalho qualificado e de bem-estar.
Logo, como agente social, convido você a saber cada vez mais, a co-
nhecer, entender, selecionar e usar a tecnologia que temos e que está
disponível.
Da mesma forma que a imprensa de Gutenberg modificou toda
uma cultura e forma de conhecer, as tecnologias atuais e suas novas fer-
ramentas, equipamentos e aplicações estão mudando a nossa cultura
e transformando a todos nós.
Priorizar o conhecimento hoje, por meio da Educação a Distância
(EAD), significa possibilitar o contato com ambientes cativantes, ricos
em informações e interatividade. É um processo desafiador, que ao
mesmo tempo abrirá as portas para melhores oportunidades. Como
já disse Sócrates, “a vida sem desafios não vale a pena ser vivida”. É isso
que a EAD da UNICesumar se propõe a fazer.
sobre pós-graduação

a importância da pós-graduação

O Brasil está passando por grandes transformações, em especial


nas últimas décadas, motivadas pela estabilização e crescimento
da economia, tendo como consequência o aumento da sua impor-
tância e popularidade no cenário global. Esta importância tem se
refletido em crescentes investimentos internacionais e nacionais
nas empresas e na infraestrutura do país, fato que só não é maior
devido a uma grande carência de mão de obra especializada.
Nesse sentindo, as exigências do mercado de trabalho são cada
vez maiores. A graduação, que no passado era um diferenciador
da mão de obra, não é mais suficiente para garantir sua emprega-
bilidade. É preciso o constante aperfeiçoamento e a continuidade
dos estudos para quem quer crescer profissionalmente.
A pós-graduação Lato Sensu a distância da UNICESUMAR
conta hoje com 21 cursos de especialização e MBA nas áreas de
Gestão, Educação e Meio Ambiente. Estes cursos foram planejados
pensando em você, aliando conteúdo teórico e aplicação prática,
trazendo informações atualizadas e alinhadas com as necessida-
des deste novo Brasil.
Escolhendo um curso de pós-graduação lato sensu na
UNICESUMAR, você terá a oportunidade de conhecer um conjun-
to de disciplinas e conteúdos mais específicos da área escolhida,
fortalecendo seu arcabouço teórico, oportunizando sua aplicação
no dia a dia e, desta forma, ajudando sua transformação pessoal
e profissional.

Professor Dr. Renato Dutra


Coordenador de Pós-Graduação , Extensão e Produção de Materiais
NEAD - UNICESUMAR
Missão
“Promover a educação de qualidade nas diferentes áreas do conhecimento,
formando profissionais cidadãos que contribuam para o desenvolvimento
de uma sociedade justa e solidária”
apresentação do material

Professor Mestre Caro(a) aluno(a), é com grande satisfação que


Jefferson Campos apresentamos este livro a você, como subsídio para
Professora Mestre o desenvolvimento da disciplina “Gêneros textuais
Raquel Fregadolli Gonçalves e o ensino de língua”, do curso de pós-graduação
em “Metodologia do Ensino de Língua Portuguesa”,
oferecido na modalidade a distância. No decorrer da
obra, buscamos oferecer uma série de reflexões que
permitam a você, aluno(a), estabelecer relações sig-
nificativas entre o conteúdo teórico e a reflexão da
prática docente, no que compete aos processos de
ensino e de aprendizagem da Língua Portuguesa.
Como professores responsáveis por esta dis-
ciplina, permitam-nos que nos apresentemos. O
professor Jefferson Campos é graduado em Letras
(Língua e Literaturas em Língua Portuguesa), mestre
e doutorando em Letras, com pesquisa desenvolvi-
da na área de Estudos Linguísticos, com ênfase na
linha de pesquisa “Estudos do Texto e do Discurso”
pela Universidade Estadual de Maringá. Atualmente,
além de proferir cursos e palestras em diferentes
instituições de ensino, ministra cursos livres em
instituições privadas de Ensino Superior (IES), no
estado do Paraná, e congrega o corpo docente
de uma especialização em outra IES. A professora
Raquel Fregadolli Gonçalves é graduada em Letras
(Língua e Literaturas em Língua Inglesa), mestre e
doutoranda em Letras, com pesquisa desenvolvi-
da na área de Estudos Linguísticos, com ênfase na
Gêneros Textuais e o Ensino de Língua
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linha de pesquisa “Estudos do Texto e do Discurso” cenário social e considerando a necessidade de


pela Universidade Estadual de Maringá. Atua no um olhar atento a essas transformações, de modo
curso de Letras presencial e pós-graduação a dis- a estabelecer e/ou reorganizar a prática de leitura
tância de uma IES, na cidade de Maringá, no Paraná. e de escrita desenvolvida no decorrer das aulas de
No presente livro, acatamos o desafio de Língua Portuguesa, queremos convidá-lo a refletir
pensar, de modo significativo, a prática docente, sobre a prática docente na contemporaneidade, já
congregando, por um lado, a necessidade de se que, nessa obra, cotejamos pontos importantes do
pensar teoricamente o papel do texto e de sua(s) que, do ponto de vista dos PCNs – um documento
forma(s) de textualização e significação, isto é, sua oficial – e do ponto de vista acadêmico – o discur-
leitura, escritura e descrição linguística, isso porque, so dos mais renomados pesquisadores das Ciências
a prática de leitura escolar tem, já há algum tempo, da Linguagem – constituem um espaço privilegia-
deparando-se com questões que se apresentam do para o estabelecimento de contatos oportunos
ao contexto de sala de aula, com efeito, não só de entre teorias afins que delineiam uma abordagem
novidade, mas, e principalmente, com o de neces- promissora ao tratamento pedagógico dos tipos de
sidade de mudança, uma vez que estas questões textos emergentes na contemporaneidade.
instituem novos regimes discursivos cujos jogos de Nosso trabalho, o nosso e o seu, neste livro,
linguagem e de produção de sentidos escapam as é o de estabelecer relações significantes entre a
práticas ditas “convencionais” sejam elas de leitura, teoria dos gêneros discursivos e o ensino de Língua
de escritura e de análise linguística. Portuguesa o que, certamente, contempla uma
Como você já deve ter observado, na atual metodologia pautada na aprendizagem interati-
conjuntura sócio-histórico-ideológica na qual nos va. No mesmo ensejo, nos exemplos a que terão
encontramos, período que muitos preferem chamar acesso, privilegiamos o trabalho com o processo
de “pós-modernidade”, não se pode deixar de notar de leitura de gêneros a que denominamos verbo-
que, assim como as diferentes semioses consti- visuais, sobretudo, em razão da crescente demanda
tuem os modos de materialização dos textos e dos de questionamentos oriundos do “chão da sala de
discursos, também as teorias abarcam, de modos aula” sobre como tratar gêneros que circulam nas
diferenciados, o que se pode chamar de interação diferentes esferas de produção humana e que
social por meio da leitura e da escrita. se constituem na e pela relação entre palavra e
Agora que já conhecemos esse (não tão) novo imagem (ou outros signos). Embora destaquemos
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os gêneros com essa característica, propomos que paradigma teórico, quanto como percurso desse
você observe a extensão do que você aprenderá trabalho a Teoria dos Gêneros discursivos, desen-
nessa disciplina para a prática de ensino seja da volvida pelo filósofo da linguagem Mikhail Bakhtin
escrita, seja da leitura de gêneros verbais, seja na e seu círculo de estudo. Já na terceira unidade, nos
prática de análise linguística como ferramenta para preocupamos em propor um projeto de leitura, pro-
o estudo de determinado gênero. dução e divulgação do gênero charge jornalística,
Na primeira unidade, buscamos situar a teoria apoiando as práticas em uma proposta intersemió-
dos gêneros discursivos no interior da prática peda- tica instituída por meio dos pressupostos da Teoria
gógica do ensino de Língua Portuguesa. Para isso, dos Gêneros discursivos com uma articulação com
convidamos você, aluno(a), a revisitar conosco as a teoria da Análise de Discurso, norteada pelas con-
considerações de Mikhail Bakhtin e de estudiosos tribuições de Michel Foucault – aliás, teoria essa que
contemporâneos para mais bem compreendermos faz parte do componente curricular do curso em
essa relação. Na segunda unidade, propusemos um estudo –, de modo a estabelecer uma pedagogia
eixo metodológico de reflexão, no qual retoma- do olhar, isto é, um modo peculiar de tratamento
mos questões de ordem teórica sobre os gêneros de gêneros verbo-visuais.
discursivos, focalizando, sempre e como uma fi- Ao fim, convidamos a todos a uma reflexão
nalidade, a implementação da prática de ensino acerca do trabalho com gêneros verbo-visuais em
de Língua Portuguesa. Você encontrará conceitos, sala de aula, as contribuições dessa prática, a rele-
indicações de procedimentos e dispositivos de tra- vância e as possíveis deficiências dessa articulação
balho elaborados pelos teóricos e estudiosos desse entre as teorias descritas no processo de constru-
campo linguístico do saber, para instituir um modo ção de sentidos na prática de leitura escolar.
de abordagem pedagógica do gênero discursivo Observe que, ao final da disciplina, você poderá
verbo-visual. Delimitamos como objeto de estudo recuperar o trajeto que já percorreu nos outros com-
a charge jornalística, compreendida, nesse texto, ponentes da grade curricular do seu curso, o que,
como gênero discursivo verbo-visual. A aborda- com certeza, irá possibilitar uma formação mais
gem que propomos é constituída, pela articulação ampla e, insistimos, significativa, para sua forma-
de teorias que possuem, de uma outra maneira, ção como professor de Língua Portuguesa.
um objeto de estudo semelhante, qual seja, lingua-
gem em funcionamento. Assim, elegemos como
01
sumário
INTRODUÇÃO À TEORIA
DOS GÊNEROS

14 o ensino de língua portuguesa

18 o que é gênero discursivo?

24 gêneros e os pcns

31 considerações finais
02
OS GÊNEROS DISCURSIVOS: FUNDA-
03
TÍTULO
MENTOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS

40 fundamenos teórico-metodológicos 72 conteúdo


gêneros discursivos em bakhtin:
76 conteúdo
46 retomada da definição e alguns
desdobramentos
82 conteúdo
operacionalizando o trabalho com
54
os gêneros discursivos
87 conteúdo
58 considerações finais
95 conteúdo

96 conteúdo

96 conteúdo
1 INTRODUÇÃO À TEORIA DOS GÊNEROS

Prof. Me. Jefferson Campos/Prof.ª Me. Raquel Fregadolli Gonçalves

Plano de estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estu-
dará nesta unidade:
• O ensino de Língua Portuguesa
Objetivos de Aprendizagem • O que são gêneros discursivos?
• Refletir sobre a relação dos gêneros discursivos • Gêneros e os PCNs
com o ensino de Língua Portuguesa.
• Compreender como os PCNs contemplam os
gêneros discursivos.
• Definir o que são e como se constituem os
gêneros discursivos.
Olá, aluno(a)!
Seja bem-vindo(a) à primeira Unidade do nosso livro. Esta unidade
é dedicada a uma abordagem teórica e reflexiva sobre a concepção
de gêneros, uma vez que o estudo que propomos a você tem como
objetivo maior explicitar a pertinência do trabalho com os gêneros
discursivos no ensino e na aprendizagem da Língua Portuguesa. Isso
porque, dentre as diferentes abordagens e teorias, cabe a nós, profes-
sores e pesquisadores da língua(gem), optar por aquela(s) que seja(m)
mais significativa(s), a fim de que se possa contribuir com a nossa prática
pedagógica. Também não podemos nos esquecer de que há um docu-
mento que orienta nossa prática, os Parâmetros Curriculares Nacionais
– Língua Portuguesa (PCNs), o qual, embora não seja explícito quanto à
menção de qual perspectiva teórica na qual podemos nos fundamen-
tar, nos ajuda a compreender quais aspectos devemos vislumbrar no
trabalho com a Língua Portuguesa, tanto no âmbito da escrita, quanto
na oralidade, nos eixos da leitura, da produção textual e da análise
linguística.
Uma das grandes contribuições dos PCNs é o olhar voltado ao ensino
para a construção de cidadãos ativos. Para isso, recorre-se aos gêneros
como condição de possibilidade para desenvolver no aluno a capacida-
de de interpretar e, assim, posicionar-se. O domínio sobre os gêneros é
relevante, conforme os PCNs, porque leva o aluno a refletir sobre o uso
da língua e os efeitos por ela produzidos. Trata-se de nos colocar menos
inocentes frente aos sentidos, uma vez que, muitas vezes, o alcance do
aluno reflete o nosso.
Nessa perspectiva e com a pretensão de ir mais longe no estudo e tra-
balho com os gêneros, assumimos como vertente teórica a perspectiva
bakhtiniana acerca dos gêneros aliada ao importante papel da inte-
ração, estabelecida na concretude dos enunciados. Essa postura nos
possibilita cumprir com os objetivos propostos pelos PCNs, além de
nos proporcionar um olhar mais crítico sobre os textos e sobre os pro-
jetos pedagógicos. Bons estudos!
Gêneros Textuais e o Ensino de Língua
14

o ensino de língua portuguesa

Cremos ser de conhecimento de todos nós pela observação do registro escrito da língua
envolvidos com a educação que o ensino pelos literatos considerados cânones, pois,
de língua materna na/pela escola sempre neste modo de “usar” a língua se concreti-
foi marcado por uma tendência tradicio- zava o ideal do bem falar e/ou escrever. O
nal, escolástica e, por isso, ideológica, cuja desvio desse registro era considerado pela
orientação principal era (ou é) o ensino, escola como um erro, motivo pelo qual se
somente, da norma culta padrão. Assim, as atribuía ao falante uma deficiência em se
práticas de ensino e de aprendizagem da apropriar do modo único e inequívoco de
Língua Portuguesa estiveram perpassadas uso da língua.
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N
a atualidade, com as contribuições contribuem para entender que passa por
da Linguística ao ensino de língua adaptações, uma vez que, pelo seu caráter
materna, mudaram-se os parâme- ideológico, tem “hora”, “lugar” e interlocutor.
tros, pois, como vimos na seção anterior, Não se fala, nem se escreve da mesma forma
alguns estudiosos passaram a defender a tese em todos os lugares. O estilo de linguagem
de que uma língua se constitui no movimen- com o qual você se dirige ao seu chefe no
to contínuo da sociedade e se manifesta de trabalho, não é o mesmo de quando ambos
modo tal que pode, de maneiras diferentes, estão no happy hour, por exemplo. Nesse
atingir seu objetivo primordial: o de colocar sentido, o ensino dos gêneros não sugere
os sujeitos em diálogo consigo mesmo, com deixar de lado o ensino da língua na sua
os outros e com a sociedade que os cerca. norma culta, mesmo porque ela também se
Essa inovação no modo de conceber a língua faz necessária em algumas situações que pas-
reverbera nos documentos que orientam o samos. Entendemos, portanto, que a língua
ensino de língua materna na escola, na atu- não pode ser concebida pelos professores
alidade, e reiteram a necessidade de tornar como um elemento estagnado e que não
as aulas de Língua Portuguesa um constante pode ter alterações, pois sua funcionalidade
refletir sobre a língua, tendo sempre em vista se perde em meio ao preconceito do modo
que dificilmente um determinado registro de falar do outro.
da língua constitui-se em um erro, incorre- Em função disso, a proposta das
se, no máximo, em um uso inapropriado ao Diretrizes Curriculares Nacionais de Língua
contexto comunicacional no qual figura. Portuguesa (DCEs) e dos Parâmetros
Entretanto, a postura do professor atre- Curriculares Nacionais (PCNs) é a de que o
lada, muitas vezes, à memória daquele aluno aprimore sua competência linguís-
que detém o conhecimento, faz da língua tica, de modo a estar apto a adaptar-se às
materna, uma língua “madrasta”. Desse modo, mais diferentes circunstâncias/contextos
a língua perde o seu caráter primeiro de co- de uso da língua. A sugestão que é dada
municar e passa a ter aspecto de exclusão. ao professor pelo livro didático para que
Avesso a esse efeito de sentido, o estudo este não avalie formalmente a atividade é
e o ensino da língua a partir dos gêneros muito problemática.
Gêneros Textuais e o Ensino de Língua
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A professora Marlene perce- veu abortar o trabalho com aproveitamento dos conhe-
beu que os alunos encontra- o gênero conto e investiu na cimentos sobre sequências
vam-se muito desmotivados leitura e interpretação de his- narrativas, o que possibi-
em suas aulas em razão da tórias em quadrinhos. litou à professora Marlene
dificuldade em entender al- O trabalho com os recursos reinvestir no trabalho com
guns recursos linguísticos de paralinguagem enrique- o gênero conto.
presentes no gênero con- ceram e complementaram a
Fonte: Situação verídica e
to, embora sua turma fosse comunicação. Os elementos
foi vivenciada por um dos
composta por leitores vora- das histórias em quadrinhos,
autores.
zes de quadrinhos. Atenta a em seu caráter atrativo, con-
esse fato, a professora resol- tribuíram para um melhor

Por pressupor que um projeto de ensino que


envolva o uso de uma variante não padrão da
língua não deve ser avaliada, nós, enquanto
A professora de Língua Portuguesa, há
professores precisamos voltar nossa preocu- dois semestres, ao chegar para minis-
trar a sua aula, ouviu reclamações dos
pação para aulas que prezem pela variedade
alunos a respeito do calor excessivo
linguística – considerando a realidade do pelo qual passam durante as aulas de
Educação Física em razão da não co-
aluno – para que o ensino-aprendizagem da
bertura da quadra de esportes. Não
norma culta seja menos traumático para o bastasse isso, vem percebendo um alto
nível de desinteresse dessa turma pe-
aluno e frustrante para o professor. O ensino
las suas aulas.
dos gêneros considera, sobretudo, a capa- Confrontada com essa situação e após
a leitura de alguns textos teóricos, re-
cidade de “comunicabilidade” do aluno. As
solveu trabalhar o gênero carta de re-
concepções de que o ensino da norma clamação com seus alunos, a fim de
que, por um lado, suas aulas fossem
padrão seja a única a ser ensinada; de que
mais significativas aos seus alunos e,
os gêneros são apenas forma/estrutura; e por outro, estes pudesses exercer seu
direito de reclamar de um problema
de que não deve ensinar muitos gêneros,
e solicitar adequadamente uma reso-
comprometem o desenvolvimento do olhar lução.
Vencido o entrevero entre o proble-
crítico do aluno, pois nega que o aluno deva
ma dentro e fora da sala de aula, os
conhecer e saber utilizar essas variantes da alunos e a professora concluíram que
não há nada mais importante do que
língua para se constituir como um falante
aprender a língua portuguesa com fins
apto e adaptável às diferentes imposições específicos e significativos.
que lhes são colocadas pelos contextos de Fonte: Situação verídica e foi vivencia-
da por um dos autores.
uso da língua.
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C
om o intuito de atender ao trabalho com gêneros do discurso na escola,
devemos, na condição de professores, levar em consideração a habilida-
de do aluno em vagar pelos diferentes registros da língua, atribuindo a
cada interlocutor e a cada contexto comunicacional a especificidade que lhe é
devida (PARANÁ, 2008). Orientados por esse propósito, seguimos juntos para o
próximo tópico. Nele veremos como os PCNs concebem o gênero.
Gêneros Textuais e o Ensino de Língua
18

O QUE É GÊNERO DISCURSIVO?


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Frente às inúmeras leituras e literaturas que perspectiva teórica, insistimos que os gêneros
tratam da noção de gêneros, recorremos dizem respeito às formas de funcionamen-
à perspectiva bakhtiniana para sustentar to da língua na prática social, ou seja, tratam
e orientar as discussões teóricas a serem do uso efetivo da linguagem. Isso porque ele
apresentadas nesta unidade. Diante dessa estabelece

uma interconexão da linguagem com a vida social. A linguagem penetra na vida por
meio dos enunciados concretos e, ao mesmo tempo, pelos enunciados a vida se
introduz na linguagem. Os gêneros estão sempre vinculados a um domínio da ati-
vidade humana refletindo suas condições específicas e suas finalidades. Conteúdo
temático, estilo e organização composicional constroem o todo que constitui o enun-
ciado, que é marcado pela especificidade de uma esfera de ação (FIORIN, 2006, p. 61).

A
formulação da noção de gênero de seu conteúdo ideológico ou relativo à
está submetida às condições da vida” (BAKHTIN, 1992, p. 96) ela não pode ser
língua. Esta, enquanto um sistema considerada, do ponto de vista do ensino,
que vive no interior de uma comunidade como fim do processo de aprendizagem
falante, funciona conforme as regras sociais, do aluno. Na verdade, a língua, conforme
consolidando a relação do verbal com o ex- entende Bakhtin (1992), é o que possibili-
traverbal (ideologia). Por essas normas de ta a interação social, por isso, o sentido que
funcionamento, os gêneros bem como a críamos estar nela encerrados é produzidos
língua, possuem caráter normativo. Apesar na relação dos sujeitos falantes em interação
do efeito de estabilidade que a língua e o verbal, em diálogo. Daí deriva a palavra dia-
gênero produzem por esse caráter normati- logismo na teoria bakhitiniana. O dialogismo
vo, é importante salientar que “essas normas é a força motriz da relação entre língua e so-
variam [...]. Mas, enquanto normas, a natu- ciedade, sendo esta a grande contribuição
reza de sua existência permanece a mesma” dessa teoria ao contexto escolar de ensino
(BAKHTIN, 1992, p. 91). Por isso é muito de línguas (DURAN, 2011).
comum ouvirmos que a noção de gêneros Par tratar do dialogismo precisamos en-
está ligada a ideia da perenidade das formas tender dois outros conceitos: enunciação e
de uso da linguagem no interior das práticas interação. O dialogismo se define pela noção
de interação sociais. Perceba, se a língua, para de diálogo, este “organiza a atuação de sujei-
Bakhtin, “no seu uso prático, é inseparável tos que interagem entre si através da língua
Gêneros Textuais e o Ensino de Língua
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compartilhada socialmente” (DURAN, 2011, seleção de recursos lexicais, fraseológicos e


p. 50). A enunciação pressupõe a interação, gramaticais da língua mas, acima de tudo,
uma vez que aquela implica em uma situ- por sua construção composicional. Todos
ação social delimitada com interlocutores esses três elementos - o conteúdo temático,
marcados e com uma finalidade. Dois ele- o estilo, a construção composicional – estão
mentos concretos compõem a enunciação, indissoluvelmente ligados no todo do enun-
os gêneros e os interlocutores. Em um pri- ciado e são igualmente determinados pela
meiro momento, são os interlocutores que especificidade de um determinado campo
importam, já que é pela determinação dos da comunicação (BAKHTIN, 2003, p. 262).
interlocutores que os gêneros se definem. É, Assim considerados, os gêneros discursi-
portanto, na enunciação que a escolha lin- vos, conforme bem nos lembra Duran (2011,
guística é realizada. p. 57), [...] são caracterizados por viabilizar a
O uso da língua está presente em todos dinâmica social. Acrescentaríamos ao que
os campos da atividade humana. E é justa- retrata o estudioso, os gêneros não só via-
mente por isso que ela é dialógica: assim bilizam a dinâmica social, eles mesmos são
como a ideia de interação exige uma co a dinâmica social, pois incidem sobre todas
-presença, isto é, a presença de dois sujeitos as práticas humanas que se realizam pela
(ainda que estejamos falando do diálogo palavra, com a palavra, na palavra.
consigo mesmo – o Eu-aqui, quem fala e Nesse sentido, convocamos você a refle-
o Eu-lá, como o outro na interação. É por tir: como o conceito de gênero se concretiza
isso, caro(a) aluno(a), que se pode compre- no nosso dia a dia? Para que essa disciplina
ender que o caráter e as formas desse uso se realize, foi necessário que nós, professo-
sejam tão multiformes quanto os campos da res, assumíssemos a posição de autores, para
atividade humana, o que, é claro, não con- produzirmos UM LIVRO sobre gêneros. Nesse
tradiz a unidade nacional de uma língua. O exemplo, já podemos destacar como a nossa
emprego da língua efetua-se em forma de relação, entre professores e alunos, se con-
enunciados (orais, escritos, visuais, sonoros, cretizam por meio de um gênero, o livro.
etc.) concretos e únicos, proferidos pelos inte- De igual maneira, as conversas cotidianas,
grantes deste ou daquele campo da atividade os e-mails, os fóruns de debates, as mensa-
humana. gens de SMS, os posts das redes sociais só
Esses enunciados refletem as condições se concretizam pela linguagem, por se ca-
específicas e finalidades de cada campo re- racterizarem como maneira privilegiada de
ferido não só por seu conteúdo (temático) concretizarmos nossa vontade incessante de
e pelo estilo de linguagem, ou seja, pela nos mantermos como parte da sociedade.
Pós-Graduação | Unicesumar
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O
s gêneros, em sua particularidade, O conteúdo temático é considerado o
são condizentes com as esferas primeiro item do gênero porque consiste em
discursivas em que circulam (mi- um elemento intimamente ligado ao gênero,
diática, educacional, jurídica, religiosa etc.). já que é correspondente à centralidade dos
Cada umas dessas esferas, através do tempo e sentidos por ele produzido. O tema é ine-
do uso efetivo da linguagem, foi elaborando rente à enunciação e se manifesta por meio
tipos relativamente estáveis de enunciados dos sentidos construídos nos gêneros do
os quais, por sua vez, são o que estamos tra- discurso (MENEGASSI, 2010). O gênero discur-
tando desde há muito como gêneros. Diante sivo “define a exauribilidade semântica, em
disso, compreendemos os gêneros como função da temática discutida, da finalidade
enunciados relativamente estáveis, constru- da produção, do seu interlocutor e, conse-
ídos historicamente pela atividade humana quentemente, pela situação comunicativa
em situação de interação e que traduzem a estabelecida” (MENEGASSI, 2010, s.p). Não há
eficiência de um uso mais ou menos específi- neutralidade no conteúdo temático, pois nele
co da linguagem em cada uma dessas esferas evidenciam-se o contato do gênero com o
discursivas. Diante da importância dessa defi- referente. Pela avaliação social, os aspectos
nição, indicamos que reflitam sobre ela, pois dos enunciados são definidos constituindo,
ela será primordial para o bom andamento assim, a escolha do conteúdo e da forma.
dessa disciplina. A escolha do objeto determina seus limites
Retomando, podemos definir a natureza e sua exaurabilidade semântico-objetal. O
dos gêneros como social, histórica, discursiva, objeto (tema) “determina, evidentemente,
dialógica e, sobretudo, ideológica. Esse caráter também a escolha da forma do gênero na
ideológico dos gêneros pode ser identificado qual será construído o enunciado” (BAKHTIN,
pelo estilo de linguagem. É por meio desse 2003, p. 281).
componente que podemos realizar os jul- O tema representa a vontade discursiva
gamentos de valor, pois, o estilo implica nas do falante (ou daquele que escreve). Para isso,
escolhas lexicais e gramaticais que produzem ele se serve de “formas estáveis de gênero
determinados sentidos e não outros. Tal ele- do enunciado” (BAKHTIN, 2003, p. 282). Tais
mento (estilo) é o que determina a entonação formas constituem-se por estrutura com-
do enunciado e produz efeitos sobre o seu in- posicional. A intenção do falante, ainda que
terlocutor, levando-o à avaliação sobre o que com toda a sua subjetividade e individuali-
foi dito a partir do modo como foi dito. Assim, dade, adapta-se a uma determinada forma
o estilo de linguagem se constitui como o de gênero.
elemento basilar para o gênero.
Gêneros Textuais e o Ensino de Língua
22

Até mesmo no bate-papo mais descontraído e livre nós moldamos o nosso discurso por
determinadas formas de gênero, às vezes, padronizadas e estereotipadas, às vezes mais fle-
xíveis, plásticas e criativas (a comunicação cotidiana também dispõe de gêneros criativos).
Esses gêneros do discurso nos são dados quase da mesma forma que nos é dada a língua
materna, a qual dominamos livremente até começarmos o estudo teórico da gramática
(BAKHTIN, 2003, p. 282).

D
iante das definições acerca dessa por meio da teoria dos gêneros discursivos
composição triádica dos gêneros, é um caminho para formarmos nossos es-
pudemos compreender o regime tudantes da língua em usuários proficientes
do olhar no qual se configura essa noção. nos níveis linguístico-discursivo e social, o
Tais elementos constituem-se não apenas que tornaria a sala de aula mais do que um
como teoria para análise dos gêneros, mas campo de repetição de conceitos, mas de
também como elementos a serem relevados conversão de ações sobre a língua em ações
na elaboração e execução das aulas com foco de cidadania.
no processo de aprendizagem dos alunos. Perceba que as ideias apresentadas nos
Sendo assim, após a exposição das ideias de levam a pensar sobre a teoria dos gêneros do
que tratamos até aqui, esperamos que você ponto de vista didático, de modo a cumprir o
possa compreender que, para que nossos principal objetivo pedagógico: levar o aluno
alunos possam ler e produzir textos com res- a pensar para mudar sua conduta política.
ponsabilidade e consciência social e política, Tarefa a que nos dedicaremos nas próximas
a proposta de ensino da Língua Portuguesa unidades desse livro. Vamos continuar juntos?
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23

Várias instituições de ensino serem solicitados nos con- expressar-se por escrito so-
superior, como a Universida- cursos vestibulares. Segundo bre um determinado assun-
de Estadual de Maringá, já o departamento responsável to, além de avaliar o domínio
exigem, na prova de redação, pela elaboração das provas, e o conhecimento dos meca-
os gêneros discursivos (e não “a lista dos gêneros textuais nismos da língua culta”.
mais as tipologias textuais). é divulgada com antecedên-
Em razão disso, há vários cia e, periodicamente, sofre Fonte: Parte extraída e adap-
anos, na cidade de Maringá, mudança, mantendo parte tada do Manual do Candida-
escolas vêm encaminhando dos gêneros textuais solici- to. Disponível em: <http://
o trabalho pedagógico nos tados. A prova de redação é www.vestibular.uem.br/ma-
anos finais do ensino médio o principal instrumento de nualcandidato/UEM-Manu-
a partir dos gêneros desig- avaliação da capacidade de aldoCandidatoInverno2014.
nados como passíveis de pensar, compreender e de pdf>. Acesso em: 20 jul. 2014.
Gêneros Textuais e o Ensino de Língua
24

gêneros e OS PCNs
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25

O
s Parâmetros Curriculares Nacionais investem na orientação pedagógica aos pro-
– doravante PCNs – orientam a fissionais da educação quanto ao trinômio
prática pedagógica visando a cons- USO -> REFLEXÃO -> USO de e sobre dife-
trução da cidadania como participação social rentes linguagens como forma de produção,
e política do corpo discente na ordem políti- expressão e comunicação das ideias; para
ca e social. A educação, no que compete ao interpretação e usufruto das produções cul-
ensino da Língua Portuguesa, comprometi- turais, em contexto público ou privado, de
da com o exercício da cidadania implica no forma que atenda às diferentes intenções e
domínio dos saberes linguísticos que pos- situações de comunicação. É com o foco no
sibilitem ao aluno o desenvolvimento da uso da língua que a teoria dos gêneros se
competência discursiva. É por isso que os constitui, se justifica e muito pode contribuir
PCNs, enquanto documento oficial, direta- para o ensino de língua. Razão de a proficiên-
mente relacionado às prerrogativas das leis cia em língua portuguesa ser, para os PCNs,
maiores como a Constituição Federal e a o princípio que deve orientar o ensino de
Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), Língua Portuguesa para que o aluno

amplie o domínio ativo do discurso nas diversas situações comunicativas, sobretudo


nas instâncias públicas de uso da linguagem, de modo a possibilitar sua inserção efetiva
no mundo da escrita, ampliando suas possibilidades de participação social no exercí-
cio da cidadania (BRASIL, 1998, p. 32, grifo nosso).

Veja que o ensino de Língua Portuguesa, na como relativa ao conhecimento que o falante
condição de língua materna, visa não só o tem de sua linguagem” (BRASIL, 1998, p. 27).
funcionamento da língua nas práticas lin- Diante disso, você, na posição de pro-
guísticas, mas também nas práticas sociais, fessor de Língua Portuguesa, pode nos
sobretudo pelo fato de tais práticas porem perguntar: “Como, então, pensar o ensino
à prova a autonomia do uso da linguagem, dessa disciplina diante da necessidade tácita
bem como as capacidades e os domínios de prover aos nossos alunos da educação
linguísticos de escolhas de fala e de escrita básica – ou superior – um conhecimento
(BRASIL, 1998). Por isso, o ensino de língua que não seja meramente metalinguístico, isto
materna pauta-se no ensino “[d]a linguagem é, que não se refira à aprendizagem de ele-
como atividade discursiva, [d]o texto como mentos gramaticais ou de ‘técnicas’ de bem
unidade de ensino e [d]a noção de gramática falar ou escrever”?
Gêneros Textuais e o Ensino de Língua
26

A resposta é curta, mas não muito simples de Segundo essa teoria, a concepção de gêneros
compreender: precisamos ensinar ao aluno (em detrimento a concepção de texto ou de
aquilo o que eles ainda não sabem! Então, tipologias textuais) recupera o caráter inte-
se considerarmos que, ao chegar à escola, o racional da linguagem, enquanto um fazer
aluno já possui um conhecimento significati- ideológico que se materializa e, razão dos
vo (baseado em observação e uso) da língua objetivos de uso que fazemos da língua(-
e que lhe serve cotidiana e rotineiramente gem). Língua(gem) que se molda às formas
para interagir socialmente (família, amigos da dos gêneros para comunicar e produzir sen-
escola, da vizinhança etc.), o que, necessaria- tidos. Prática linguística que implica refletir
mente, sobre e da língua ele ainda não sabe? sobre a língua(gem) e que requer, no traba-
lho pedagógico, levar os alunos a pensar e
a falar sobre a língua(gem) a partir do olhar
crítico, não para que sejam “estudiosos” da
língua(gem) – tarefa que compete a nós, pro-
fessores – mas para que sejam capazes de
Em 10 anos de seu Programa de Pós-
Graduação em Letras na Universidade identificar as nuances das diferentes condi-
Estadual de Maringá, foram defendidas
ções de uso da língua(gem) implicadas nas
10 dissertações de mestrado com a
temática dos gêneros textuais ou dis- diversas situações de comunicação a que são
cursivos.
expostos diariamente. Dessa maneira, o que
Fonte: Dissertações defendidas. Dis-
ponível em: <http://www.ple.uem. se espera do trabalho com os gêneros discur-
br/>. Acesso em: 12 ago. 2014. sivos em sala de aula é que os alunos saibam
se comportar linguisticamente diante das
coerções sociais estabelecidas para a cons-
trução dos discursos, bem como saibam
manipular a língua(gem) a seu favor, quando
Confrontado com esse cenário, o que se tratar de elencar diferentes elementos
propomos como caminho profícuo para a linguísticos-discursivos nos processos co-
resolução dessa situação-problema, é pensar municacionais. Observe que alçar as aulas
o ensino de Língua Portuguesa, em seus três de Língua Portuguesa a esse objetivo é dar
eixos – leitura, produção textual e análise consequência ao objetivo maior legado à
linguística – a partir de uma teoria que con- educação básica: formar cidadãos críticos e,
sidera a linguagem, inicialmente, como um no caso específico, habilidosos nos diferentes
campo ideológico e, de igual maneira, como usos a que a língua(gem) pode ser submeti-
um espaço privilegiado para a interação da a favor de seu usuário.
humana. Eis a razão para que busquemos De acordo com os PCNs (BRASIL, 1998,
amparo nos estudos dos gêneros discursivos. p. 34),
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27

ao tomar a língua materna como língua de ensino, a dimensão de como os sujeitos desen-
volvem sua competência discursiva não pode ser perdida. O ensino de Língua Portuguesa
deve se dar num espaço em que as práticas de uso da linguagem sejam compreendidas
em sua dimensão histórica e em que a necessidade de análise e sistematização teórica
dos conhecimentos linguísticos decorra dessas mesmas práticas.

Com o foco no funcionamento da língua sua organização discursiva, de sua sistema-


materna em sala de aula, a prática linguís- tização e de sua estruturação. Tais aspectos
tica é tomada por outro olhar, uma vez operam não apenas nas práticas escritas,
que o trabalho com língua, nessas condi- mas também na oralidade, razão de ambas
ções, estabelece outros objetivos que não as categorias terem por ponto de partida e
aqueles para os quais elegemos o gênero, finalidade, no ensino de língua materna, a
mas possui a finalidade de reflexão a partir de produção de discursos.

Quadro com teorias que tratam da noção de gênero e seus representantes.

NOÇÃO DE GÊNERO
TEORIAS OU VERTENTES REPRESENTANTES
SOCIOSSEMIÓTICA Jim Eggins, Michael Halliday, Désirée Mota-roth
SOCIORRETÓRICA Charles Bazerman, Bárbara Hemais , Bernadete Biasi-Rodrigues
INTERACIONISTA-SOCIODIS- Bernard Scheneuwly, Joaquim Dols, Roxane Rojo, Jean-Paul Bronckart,
CURSIVA Elvira Lopes Nascimento,
Vera Cristóvão
SEMIODISCURSIVA Patrick Charaudeau, Dominique Maingueneau, Maria Marta Furnaleto
SOCIOCOGNITIVA Ingedore Grunfeld Villaça Koch, Luiz Antônio Marcuschi
DIALÓGICA Mikhail Bakhtin e seu círculo de estudos, Beth Brait, Rosângela Hammes
Rodrigues, Wanderley Geraldi, Adail Sobral, Renilson Menegassi
Fonte: Elaborado pelos autores.
Gêneros Textuais e o Ensino de Língua
28

T
anto a oralidade como a escrita se da cidadania. Ainda de acordo com os PCNs
manifestam sob formas específicas, (1998, p.25), “cabe à escola ensinar o aluno
dadas as circunstâncias comuni- a utilizar a linguagem oral no planejamen-
cacionais a que o usuário está exposto. A to e realização de apresentações públicas:
categoria oral tem recebido menos atenção realização de entrevistas, debates, seminá-
pelas atividades escolares, uma vez que esta rios, apresentações teatrais etc.”. Apesar de
é equivocadamente entendida como natural os gêneros orais serem contemplados pelos
do ser humano por ser concebida nas rela- PCNs e vividos cotidianamente nas salas de
ções familiares. Apesar dessa noção acerca aulas, optamos por elencar outros pontos
da oralidade, a interação dialógica na sala de fundamentais que se referem ao trabalho
aula entre professor e alunos põe em fun- com gêneros escritos.
cionamento inúmeros gêneros orais, além No que diz respeito à categoria escrita,
de se tratar de “uma excelente estratégia de é preciso, sobretudo, contemplar na mesma
construção do conhecimento, pois permite proporção as práticas de leitura e de escrita,
a troca de informações, o confronto de opi- a compreensão/interpretação dos gêneros,
niões, a negociação de sentidos, a avaliação bem como a habilidade e a capacidade de
dos processos pedagógicos em que estão produzir um gênero conforme suas exigên-
envolvidos [alunos e professores]” (BRASIL, cias. Essa categoria exige um trabalho de
1998, p. 24). No entanto, o que se busca é o maneira heterogênea, uma vez que a finalida-
desenvolvimento de competências linguís- de de cada gênero contempla um trabalho de
ticas que ofereçam suporte para o exercício exploração didático-pedagógica específica.

Vale considerar que a inclusão da heterogeneidade textual não pode ficar refém de
uma prática ‘estrangulada’ na homogeneidade de tratamento didático, que submete
a um mesmo roteiro cristalizado de abordagem uma notícia, um artigo de divulga-
ção científica e um poema. A diversidade não deve contemplar apenas a seleção de
texto; deve contemplar, também, a diversidade que acompanha a recepção a que
os diversos textos são submetidos nas práticas sociais de leitura (BRASIL, 1998, p. 26).
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29

Chamamos sua atenção para o estudo das palavras, significa usar a língua materna nas
diferentes variedades de gêneros existentes funções políticas, sociais e culturais. Trata-se
e em crescente ‘nascimento’, tarefa, inclusive, de ensinar a usar a língua com prudência e
fundamental, porque os gêneros estão co- proficiência, estimulando e criando condi-
nectados com a vida social: se falamos a todo ções de possibilidade para cumprir com os
momento, a todo momento podemos “incre- objetivos dos PCNs: posicionar-se de maneira
mentar” formas cristalizadas de uso da língua. crítica e com responsabilidade sobre as situa-
É justamente essa possibilidade que roga ções sociais; conhecer-se a si com confiança e
uma observação atenta às modificações so- capacidade cognitiva, ética e estética; servir-
fridas pela língua em seu uso através do dia a se das diferentes linguagens para defender
dia, através da história. Veja, é justamente por seus direitos e cumprir com seus deveres. Ao
essa razão que os PCNs concebem o ensino apropriar-se dos conteúdos, o sujeito trans-
da variedade de gêneros na prática peda- forma-os em conhecimento, podendo agir
gógica, pois ensinar o aluno a lidar com a sobre ele através da interação com o outro.
diversidade de gêneros implica a familiariza- O conhecimento sobre os gêneros faz parte
ção dele com a língua portuguesa. Em outras do processo de aquisição da linguagem e
Gêneros Textuais e o Ensino de Língua
30

do seu desenvolvimento – e aqui nos refe- Diante do que expusemos, convidamos


rimos sobre os processos de letramento. O você, aluno(a), a comungar com a posição
domínio sobre os gêneros se concretiza pela que assumimos sobre o fato de que o estudo
capacidade de usar a linguagem para cons- e o ensino dos gêneros discursivos são a
truir novas capacidades e desenvolver novas condição de possibilidade de uma reflexão
habilidades cujo efeito é, cada vez mais, o e revisão sobre os procedimentos e recur-
domínio sobre os diferentes ‘padrões’ de fala sos linguísticos concebidos no processo de
e de escrita. ensino e de aprendizagem das linguagens
Nessa direção, as práticas de linguagem orais, escritas ou imagéticas. Ainda, que o
no espaço escolar devem voltar-se para ensino e a aprendizagem dos gêneros preci-
dimensões discursivas e pragmáticas da lín- sam ser priorizados, conforme os PCNs (1998),
gua(gem) tomada sob a condição de objeto pela necessidade do aluno e por sua possi-
de reflexão. A prática reflexiva sobre a língua bilidade de aprendizagem. Assim, o grau de
é constitutiva da atividade que permite ao complexidade também deve estar ajustado
sujeito o desenvolvimento da competência às condições dos alunos, diante das dificulda-
discursiva. Em razão disso destacamos que, se des inerentes ao processo de reflexão sobre
esperamos formar alunos proficientes em sua a linguagem e de construção do conheci-
própria língua – proficientes porque hábeis mento discursivo e linguístico.
nas diferentes formas de interação por meio
da língua(gem) – o uso só pode ser modifica-
do com a reflexão. Portanto, o que se espera
do ensino por meio de gêneros é uma prática
pedagógica voltada para o uso-reflexão-uso
Toda educação [...] comprometida com
novo. Perspectiva que esquematiza e justifi- o exercício da cidadania precisa criar
ca a necessidade de voltarmos à teoria dos condições para o desenvolvimento da
capacidade de uso eficaz da lingua-
gêneros no intuito de propor e alcançar mu- gem que satisfaça necessidades pes-
danças efetivas na conduta político-crítica do soais [...]. Cabe [...] à escola viabilizar o
acesso do aluno ao universo dos textos
aluno, que precedem, integram e sucedem que circulam socialmente, ensinar a
à sala de aula. produzi-los e a interpretá-los.
Fonte: BRASIL, 2001, p. 30.
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considerações finais

Nesta unidade procuramos compreender como os PCNs abordam o ensino


de gêneros, nas categorias oral e escrita. Apresentamos os principais concei-
tos da teoria bakhitniana, para que você relembre – para aqueles que dela já
se servem em seus trabalhos –, ou estabeleça um primeiro contato. É relevante
esclarecer que os conceitos aqui apresentados, frente à densidade e à comple-
xidade da teoria, tratam-se de orientações pontuais no interior de uma teoria
mais ampla e que requer de você uma dedicação circunstanciada, pois, como
vimos, muito tem a contribuir para o olhar sobre o funcionamento da língua.
Tais conceitos foram eleitos para que pudéssemos reconhecê-los posterior-
mente nas próximas unidades didáticas.
A contribuição teórica a que tentamos remontar nas páginas que se pas-
saram sustenta nosso olhar sobre os gêneros e nos aponta caminhos outros.
Assim, considerando que a escrita implica na leitura e que saber ler é elementar
para uma escrita, apontamos espaços pertinentes de reflexão sobre o caráter
progressivo do ensino de Língua Portuguesa. Lembramos que, no decorrer
dessa unidade inicial, foram explicitados os três elementos compositivos do
gênero, quais sejam, o conteúdo temático, o estilo e estrutura composicional.
No mais, é válido reiterar que os gêneros não são apenas uma nova nomen-
clatura para tratar da estrutura composicional de um texto. Equivocadamente
reconhecido como, apenas, uma estrutura estabilizada, os, gêneros vão além
desse caráter “esquelético” do uso da linguagem, significa, de maneira singu-
lar, os três aspectos já mencionados. Nas próximas unidades serão abordadas
questões metodológicas e práticas que visam auxiliar a construção de planos
de trabalho, cujo objetivo é de que possa concretizá-los em sua sala de aula.
Fique atento! Ao final desta unidade, você encontrará atividade de auto
estudo, materiais complementares e sugestões de leituras.
Gêneros Textuais e o Ensino de Língua
32

atividades de autoestudo

1. Os PCNs estabelecem o trabalho pedagógico com os gêneros como possibilidade de


um ensino de língua voltada para a prática cidadã. Diante dessa afirmativa, assinale a
alternativa verdadeira:
a. O ensino dos gêneros representa uma possibilidade de levar o aluno a compreender o
funcionamento social da língua.
b. A função da língua materna é apreendida naturalmente e, da mesma forma, se mani-
festa adequadamente nas mais variadas situações sociais.
c. O domínio das diferentes linguagens é socialmente predominante sobre a língua materna.
d. A língua portuguesa, por ser a língua materna, faz de seus nativos dominadores plenos
de suas regras e funcionamento social e cultura.
e. Ser falante de uma língua materna tem por consequência a ampliação do seu domínio
ativo e do universo da escrita por ser dela falante nativo, levando a uma conduta cidadã,
inevitavelmente.

2. O ensino de Língua Portuguesa como língua materna repercute no entendimento da


língua nas práticas linguísticas sociais. Identifique a afirmação correta a partir do que
se considera práticas linguísticas:
a. Sobre as práticas linguísticas, reconhecidas apenas aquelas que acontecem em mo-
mentos de interação formal.
b. Na prática linguística cotidiana a gramática é um elemento irrelevante para a constru-
ção da fala.
c. A prática linguística, ou seja, a língua em uso é razão para reflexão sobre os gêneros.
d. Na prática linguística, considerando as relações sociais, a língua não produz sentidos
em formas pré-determinadas.
e. Reconhecer as práticas linguísticas no ensino implica pautar-se apenas na reflexão sobre
a gramática.
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33

3. O olhar pedagógico sobre a heterogeneidade de gêneros se fundamenta ao reconhe-


cer suas funções na vida social. Desse modo, sobre a variedade dos gêneros é falso
considerar que:
a. Compreender a variedade dos gêneros e o seu funcionamento na sociedade conver-
te alunos politicamente passivos em cidadãos socialmente ativos.
b. Os PCNs concebem o ensino da variedade de gêneros na prática pedagógica visando
familiarização do aluno com sua língua materna.
c. Servir-se da língua materna nas funções políticas, sociais e culturais é decorrência e um
ensino proficiente das mais variedades de gêneros.
d. O contato do aluno com a diversidade de gêneros faz com que ele se aproprie dos con-
teúdos, não sendo necessário transformá-los.
e. O ensino da diversidade de gênero tem por efeito promover reflexões acerca do fun-
cionamento da língua.

4. Diante da teoria exposta, a língua consiste em:


a. Uma forma de linguagem que impossibilita interpretações.
b. Um código estável e imutável de linguagem.
c. Um sistema alheio à comunidade que dele se serve.
d. Um instrumento de comunicação que transmite apenas mensagens predeterminadas.
e. Um sistema inseparável de seu conteúdo ideológico.

5. A partir dos pressupostos bakhtinianos, gênero não é:


a. Enunciado isolado na categoria escrita.
b. Enunciados concretos e únicos.
c. Formas estáveis de enunciado.
d. Determina-se conforme o interlocutor.
e. Individual e subjetivo.
Gêneros Textuais e o Ensino de Língua
34

Web

Palestra da professora Dra. Luciene Simões sobre gêneros


Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=AjjpQboxsho>. Acesso em 20 jul. 2014.

As considerações metodológicas de análise da linguagem postuladas por Bakhtin (2006, p. 128-129)


seguem os passos a seguir:
a) estudar as formas da língua e as situações de interação verbal a partir das condições sociais em
que se realizam essas formas e essas situações;
b) investigar as formas dos diferentes enunciados em ligação com a situação de interação de que
constituem seus elementos;
c) examinar, a partir daí, as formas da língua na sua interpretação habitual.
Em consonância aos postulados de Bakhtin (2003; 2006), Rodrigues (2001), em suas investigações
acerca do gênero jornalístico artigo assinado, apresenta a proposta de análise de gêneros do discur-
so a partir de suas dimensões social e verbo-visual. Com passos e dimensões inter-relacionadas, a
autora propõe que investiguemos a dimensão social dos gêneros considerando: (i) sua esfera social;
(ii) suas condições sociais de produção, circulação e recepção; (iii) sua situação social de interação;
(iv) sua posição de autoria; (v) seus interlocutores, dentre outros aspectos constituintes e funcionais
da construção social do gênero.
Quanto à análise da dimensão verbo-visual, Rodrigues (2001) pontua que estudemos (i) seu conteúdo
temático; (ii) seu estilo e projeções estilístico- composicionais; (iii) sua arquitetônica e composicionalida-
de, dentre outros aspectos enunciativo-discursivos do gênero, por exemplo, sua dimensão multimodal
(visual, audiovisual, dentre outras semioses). Além disso, em adição à proposta de Rodrigues (2001),
Rojo (2005, p.199) aponta que:
[...] A ordem metodológica de análise que vai da situação social ou de enunciação para o gênero/
enunciado/texto e, só então, para suas formas linguísticas relevantes [...]. Ao chegarmos nesse último
nível de análise, vale a interpretação linguística habitual, isto é, as teorias e análises linguísticas dis-
poníveis, desde que seguida a ordem metodológica que privilegia as instâncias sociais [...]. Dito de
outra maneira, aqueles que adotam a perspectiva dos gêneros do discurso partirão sempre de uma
análise em detalhes dos aspectos sócio-históricos da situação de enunciativa, privilegiando, sobre-
tudo, a vontade enunciativa do locutor – isto é, sua finalidade, mas também e principalmente sua
apreciação valorativa sobre seus interlocutores e temas discursivos -, e, a partir desta análise, busca-
rão marcas linguísticas (formas do texto/ enunciado/ língua – composição e estilo) que refletem no
enunciado/texto, esses aspectos da situação.
Dessa forma, a metodologia da ADD busca compreender as regularidades enunciativo-discursi-
vas que engendram e se engendram na constituição e no funcionamento dos gêneros do discurso,
Pós-Graduação | Unicesumar
35

objetivando entender a relativa estabilização linguístico-enunciativa desse gênero, e procurando re-


afirmar que “estar regularidades serão devidas não às formas fixas da língua, mas às regularidades e
similaridades das relações sociais numa esfera de comunicação específica” (ROJO, 2005, p. 199).
[...]
Entendemos que há diferentes correntes teóricas nos campos da Linguística e da [Linguística Aplicada]
LA que buscam investigar os gêneros do discurso/textuais como instâncias mediadoras de nossas
práticas sociais cotidianas nas mais variadas esferas/campos da atuação humana (ver, por exemplo,
ACOSTA-PEREIRA; RODRIGUES, 2009). Nesse estudo, procuramos delinear como esse objeto de pes-
quisa é investigado na perspectiva dos estudos da [Análise Dialógica do Discurso] ADD do Círculo de
Bakhtin, apresentando alguns dos conceitos fundantes dessa área e revisitando pesquisas sob esse
panorama epistemológico.
Discutimos os conceitos de enunciado e gêneros do discurso, pontuando como os enunciados apre-
sentam-se enquanto unidades reais de comunicação,
que, ao se estabilizarem, em determinadas esferas de atuação, a partir de situações de interação
típicas, tornam-se gêneros do discurso. Ao retomar as postulações bakhtinianas acerca dessas duas
questões, estamos cientes que deixamos de explanar sobre outros aspectos importantes no conjunto
de formulações das obras do Círculo, tais como: ideologia, cronotopia, sentido e significação, subje-
tividade, autoria, dentre outros.
Uma segunda consideração pode ser feita acerca do que entendemos como ADD e sobre uma teoria
dialógica de gêneros do discurso. Bakhtin não apresentou especificamente categorias metodoló-
gicas para análise do discurso ou dos gêneros. Pelo contrário, sob o escopo da ADD , entendemos
que cada gênero do discurso apresenta particularidades típicas, não apenas referentes à situação de
interação da qual o gênero significa, como também, ao seu horizonte temático, estilo e composiciona-
lidade. Dessa forma, para um analista do discurso e do gênero, no âmbito da ADD, é preciso projetar
a pesquisa partir de “idas e vindas” aos dados, para assim, ascenderem as regularidades enunciati-
vo-discursivas que se engendram na constituição e na funcionalidade do gênero, posto que não há
categorias a priori, mas regularidades sociointeracionais que se articulam para a sua significação. Com
isso, os estudos de Acosta-Pereira (2008a); Rodrigues (2001) e Silva (2007) são exemplos de como di-
ferentes gêneros, apresentam diferentes características sócio-funcionais.
Outra consideração relevante é quanto às pesquisas que procuramos revisitar ao longo do presente
estudo: buscamos explanar sobre aquelas que pertenciam ao nosso grupo de pesquisa, por estarem
mais próximas de nossos percursos enquanto pesquisadores nessa área. Assim, em um movimen-
to de retorno ao nosso trabalho, conseguimos retomar nossa investigação para reenunciá-la nesse
artigo, não apenas problematizando os resultados valorados na época, como os ressignificando para
o presente ensaio. Portanto, foi por meio desse diálogo constante entre os “já-ditos” e os “pré-figura-
dos” que buscamos desenvolver esta discussão.
Por fim, entendemos que a pesquisa aqui delineada apresenta-se importante, à medida que não
apenas colabora para a compreensão dos gêneros do discurso como enunciados que relativamen-
te estabilizam e normatizam nossas práticas interacionais e nossas relações interpessoais, como,
também, contribui para a consolidação da ADD no campo da LA.
Fonte: Texto extraído e adaptado da Revista Letras, Santa Maria, v. 20, n. 40, p. 147–162, jan./jun. 2010.
Gestão de Negócios
36

relato de
caso

Relato de uma experiência


Este relato compreende a experiência com oficinas pedagógicas de leitura e produção
de textos, oferecidas a um grupo de professores das quintas séries da rede municipal
de ensino. Os professores participantes ministravam diferentes disciplinas do currí-
culo escolar [...]. Foram propostas 15 oficinas, oferecidas quinzenalmente, de março
a outubro de 2007, com a duração de quatro horas-aula cada.
O principal objetivo das oficinas foi o de oferecer aos participantes um referencial
para o desenvolvimento de trabalho pedagógico com a leitura e a escrita, na perspec-
tiva dos gêneros textuais, associado à prática de atividades e realização de projetos
de trabalho. [...] Os objetivos específicos das oficinas correspondiam à descrição dos
desempenhos/das ações esperadas dos participantes ao longo da realização das ativi-
dades em relação a quatro dimensões, englobando: (a) apropriação da fundamentação
teórica; (b) emprego de metodologia de ensino compatível com os princípios teóri-
cos; (c) implementação de atividades em contextos reais de ensino e aprendizagem,
de modo interdisciplinar e integrado ao desenvolvimento dos programas em anda-
mento nas escolas; e (d) reflexão crítica e avaliação contínua do processo e do produto.
Com vistas à consecução dos objetivos estabelecidos, foram propostos os seguintes
tópicos de aprendizagem, trabalhados de forma articulada e adaptada às necessida-
des e aos interesses dos participantes, em um constante processo de construção de
conhecimento, baseado em aspectos significativos da realidade de ensino vivenciada
pelos participantes: (a) problematização inicial, a partir do conhecimento prévio e das
experiências pedagógicas dos participantes; (b) conteúdo teórico; (c) reflexão crítica,
discussões e relatos dos participantes, relacionados aos tópicos em estudo; (d) ativida-
des de sistematização teórico-metodológica; (e) produção de projeto ou de atividade
didática, apoiados nas noções teóricas tratadas; (f ) implementação das atividades em
sala de aula; e (g) socialização e avaliação das atividades docente e discente efetuadas.
Os trabalhos foram quase sempre realizados em duplas, grupos e estações de traba-
lho (grupos com tarefas diferenciadas), algumas vezes reunidos por disciplina e, em
outras, por escola, para oportunizar tempo de interação e de construção coletivas aos
Pós-Graduação | Unicesumar
37

relato de
caso

professores. Foram ainda utilizadas exposições orais e apresentação de projetos (hiper-


texto, jornal mural, fôlder, textos, mapas, gráficos e desenhos produzidos pelos alunos).
Os dois grupos de participantes, em função de necessidades específicas, desenvolve-
ram as oficinas de modo ligeiramente diferente.
Inicialmente, os participantes das oficinas, sequiosos por soluções para os muitos e
graves problemas que enfrentam, mostravam-se reticentes quanto a um trabalho de
base teórica. Mas, aos poucos, com a abertura de espaços para o diálogo, para a ex-
posição de dificuldades encontradas pelos professores, relativos à prática docente de
cada um em particular e do grupo como um todo, houve, no decorrer das oficinas, uma
mudança de postura daqueles que não estavam percebendo contribuições pedagógi-
cas. Constatou-se um aumento gradativo de receptividade às atividades planejadas, no
momento em que conseguiram relacionar o conteúdo com a realidade vivida e quando
houve uma integração maior entre os professores, tanto por área como por escola e,
também, quando perceberam coerência entre o que estava sendo proposto: abordagem
sociointeracionista de ensino e a própria planificação, execução, orientação e metodo-
logia das oficinas. Os depoimentos dos professores, durante as oficinas pedagógicas e
por ocasião do seu encerramento, levam a crer que houve resultados positivos e reper-
cussões significativas. Dentre elas, pode-se destacar a redescoberta de possibilidades:
de novas abordagens de ensino; de execução de ensino integrado; de geração de am-
biente de trabalho em equipe; de tratamento interdisciplinar dos conteúdos, partindo
de situações reais e concretas; de desenvolvimento de atitudes críticas e científicas; de
articulação entre teoria e prática; de conciliação da ênfase em atividades práticas de
leitura e escrita, com base na teoria dos gêneros de textos com transformações educa-
cionais e sociais, a partir das transformações pedagógicas dos fenômenos estudados.
Fonte: PAVIANE, Neires Maria Soldatelli; Niura Maria Fontana: Oficinas pedagógicas:
Relato de uma experiência. Adaptado pelos autores de <http://www.ucs.br/etc/revis-
tas/index.php/conjectura/article/viewFile/16/15>. Acesso: 15 ago. 2014.
2 OS GÊNEROS DISCURSIVOS: FUNDAMENTOS
TEÓRICO-METODOLÓGICOS

Prof. Me. Jefferson Campos/ Prof.ª Me. Raquel Fregadolli Gonçalves

Plano de estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará
nesta unidade:
• Fundamentos teórico-metodológicos
• Gêneros Discursivos em Bakhtin: definição e
Objetivos de Aprendizagem desdobramentos
• Apresentar os fundamentos teórico-metodológicos • Operacionalizando o trabalho com os gêneros
para o trabalho com os gêneros. discursivos
• Definir os gêneros discursivos em Bakhtin.
• Operacionalizar o trabalho com os gêneros discursivos.
Caro(a) aluno(a)!

Nesta segunda unidade do nosso livro, partimos dos pressupostos


teóricos sobre os quais nos detivemos na primeira unidade e en-
veredamos pela busca de elementos norteadores, bem como de
procedimentos metodológicos que subsidiem a prática pedagógica
em que estão envolvidos os processos de ensino e de aprendiza-
gem por meio da teoria dos gêneros discursivos.

Sendo assim, logo nas primeiras páginas desta unidade, você notará
que os esforços envidados visam pontuar questões que tocam a
prática docente orientada pela teoria dos gêneros.

Ao elencar as orientações de pesquisadores da área das Ciências


da Linguagem, esperamos que esta unidade, notadamente teóri-
co-metodológica, possa colaborar com seus estudos no que tange
ao ensino de Língua Portuguesa, considerando a leitura e produ-
ção oral e/ou escrita, bem como a análise linguística de diferentes
gêneros do discurso.

No decorrer da unidade, você terá acesso a informações comple-


mentares em espaços e seções com as quais você já deve estar
acostumado, considerando o padrão dos materiais didáticos aos
quais você tem tido acesso durante todo o curso.

Enfim, desejamos que vocês possam aproveitar as discussões a que


daremos início nesta unidade e que elas ganhem consequência na
prática de ensino de cada um. Sigamos juntos nessa caminhada,
cujo trajeto é extenso, mas muito proveitoso.

Boa leitura!
Gêneros textuais e o ensino de língua
40

fundamentos
teórico-metodológicos

As considerações sobre a adoção do traba- aos processos de aprendizagem. A leitura


lho com gêneros discursivos na e pela escola e produção de textos orais e escritos, pelos
tornaram-se objeto de investigação pelos es- alunos, parte dos conhecimentos adquiri-
tudiosos da educação e da linguagem. Os dos socialmente antes da escola para chegar
primeiros resultados dessas pesquisas ressal- ao domínio de modos de se valer da lingua-
taram a importância dessa abordagem em gem, que os alunos ainda não apreenderam,
sala de aula, tal como aponta Barbosa (2005), para comunicar-se e interagir no mundo.
Lopes-Rossi (2006) e Dolz e Schnewly (2004). Conforme explica Barbosa (2005), o ensino
No decorrer dos ensinos Fundamental tradicional tinha como objetivo ensinar
e Médio, a linguagem é um produto caro a leitura e a escritura de textos a partir da
Pós-Graduação | Unicesumar
41

observância da gramática e das estruturas da como ponto de partida para o ensino. Através
língua escrita. Contudo, como já havíamos dessa guinada, muitos conceitos surgiram,
mencionado na primeira unidade, notou-se tais como coesão, coerência, intertextu-
certa falência dessa abordagem pelo fato de alidade, contexto etc. Essas noções foram
que tais conhecimentos já não davam conta importantes à Linguística, contudo, ainda
das especificidades de boa parte dos modos apresentavam limitações. A categorização
de uso da linguagem nos seus mais variados em que se propunham enquadrar os textos
contextos de comunicação. eram generalizantes e, mais uma vez, não
Em meados da década de 1980, estudos davam conta dos pormenores que diferen-
sobre a Língua Portuguesa tomaram o texto ciam drasticamente um texto do outro.

Entre os anos de 1977 e 2003, uma pesquisa apresentou um retrato quanti-qualitativo de


trabalhos sobre a temática gêneros discursivos publicados nas revistas mais expressivas da
área das ciências da linguagem, conforme dados apresentados a seguir.

Fonte: Adaptado pelos autores de ARAÚJO, Antonia Dilamamr. Gêneros textuais acadêmicos: reflexões sobre metodologias de in-
vestigação. Revista Letras, n. 26, v. 1/2 – jan./dez. 2004. Disponível em: <http://www.revistadeletras.ufc.br/rl26Art04.pdf>. Acesso
22 ago. 2014.
Gêneros textuais e o ensino de língua
42

P
ara relembramos, chamamos sua um pouco depois, de Roxane Rojo. Os traba-
atenção para o fato de as ações pe- lhos desses dois pesquisadores encamparam
dagógicas que se voltam para a uma movimentação em torno da questão
consolidação desse objetivo serem várias e do trabalho do texto como objeto e objetivo
datarem de décadas anteriores a promulga- de ensino em sala de aula (GERALDI, 1984) e
ção da Lei de Diretrizes e Bases da Educação de como situar as relações entre texto, pro-
Nacional, da qual derivam os PCNs. Das mais fessor e aluno nesses mesmos processos,
significativas contribuições, não podemos tendo como base as leituras bakhtinianas
deixar de retomar, também, a produção sobre gêneros do discurso (GERALDI, 1984;
teórica de Mikhail Bakhtin. A mudança do ROJO, 2005). “Neste sentido, nas práticas de
paradigma linguístico/gramatiqueiro para ensino e de aprendizagem, a língua só tem
o textual propiciou não só a mudança do existência no jogo que se joga na sociedade,
objeto de ensino, mas o resgate da figura do na interlocução, e é no interior de seu funcio-
aluno como fundamental nos processos de namento que se pode procurar estabelecer
ensino e de aprendizagem, sobretudo pela as regras de tal jogo” (GERALDI, 1984, p. 43).
relação de interlocução instaurada entre pro- Em tempo paralelo, sobressaltaram os
fessor, objeto de ensino e aluno. estudos do Grupo de Genebra, que pro-
A passagem da compreensão de textos e punham um novo objeto de estudo. Na
sequências textuais para a noção de gêneros realidade, não se deixou de ter a língua
implicou, a partir da década de 1980, na mo- como meta de ensino, de uso e de signifi-
bilização dos estudos sobre os processos de cação, fato considerado por esses estudiosos
ensino e de aprendizagem de língua materna, como a língua enquadrada em gêneros dis-
dos quais sinalizamos as leituras bakhtinia- cursivos. Conforme explica Barbosa (2005,
nas realizadas por João Wanderley Geraldi e, p.4),
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43

o conceito do gênero não se limita a considerar apenas aspectos estruturais ou formais


do texto. Mais do que isso, esse conceito incorpora elementos de caráter social e his-
tórico, pois considera a situação de produção de um dado discurso (quem fala, para
quem, em que situação, em que momento histórico, em que veículo, com que objeti-
vo, finalidade ou intenção, em que registro, qual a condição social dos interlocutores,
seu posicionamento ideológico etc.) e a forma de dizer, que não é inventada a cada
vez que nos comunicamos, mas que está disponível, pois circula socialmente.

Portanto, a adoção da proposta de ensino os gêneros discursivos, pois:


e aprendizagem através do trabalho com • [...] nos permite identificar mais
gêneros discursivos busca não só a apreen- precisamente a que forma de dizer em
são das características formais e estruturais circulação social estamos nos referindo,
em que se fundamenta cada gênero, mas, fornecendo ao aluno parâmetros para
principalmente, objetiva habilitar os usuá- compreender ou produzir textos e, [a
rios da língua a mobilizar conhecimentos nós, professores], critérios para intervir
que lhe permitam compreender como tais com mais eficácia no processo de
caracteres postos em uma temporalidade, compreensão e produção de textos.
elaborados por um determinado sujeito que • [...] permite captura, além de aspectos
se dirige a outro sujeito também específico, estruturais presentes num texto,
por meio de um dado meio e com uma fi- aspectos de ordem social e histórica,
nalidade demarcada promove a produção fundamentais à compreensão e à
de determinados sentidos e não de outros. produção de textos.
Dessa maneira, facilita-se o acesso aos co- • [...] favorece a integração entre práticas
nhecimentos e informações construídos de leitura, escrita e análise da língua
historicamente e concede-se, ao aprendiz, (incluindo gramática, que pode ser
a possibilidade de inscrever-se em práticas de trabalhada de modo contextualizado).
exercício pleno de sua cidadania (BARBOSA, • [...] fornece instrumentos para pensarmos
2005). as sequências e simultaneidades
Em resumo, é relevante o trabalho com curriculares (BARBOSA, 2005, p. 08).
Gêneros textuais e o ensino de língua
44

Após dois anos de investi- O nosso segundo passo na rubrica, atestado, abaixo-as-
gação e aprimoramento de continuação dessa experiên- sinado, anais de eventos etc;
nossa prática pedagógica no cia foi elaborar um roteiro de e (b) gêneros do domínio ju-
que se refere ao ensino de investigação. Foi a partir des- rídico, tais como os verbetes
língua portuguesa, procura- se roteiro guia que os alunos de petição, citação, certidão,
mos enfocar dos temas e/ou foram capazes de estudar a declaração, edital etc.
objetos de estudo aspectos prática discursiva e social dos
de investigação inerentes ao gêneros de investigação que Fonte: Experiência relatada
texto e também inerentes mais lhe agradassem den- por Alex Caldas Simões e
ao gênero. Em se tratando tro das opções oferecidas adaptada pelos autores de:
do ensino superior, organi- por nós. Esse compilado de <http://www.ufjf.br/praticas-
zamos a investigação sob o opções foi extraído integral- delinguagem/files/2014/01/
rótulo de seminário, o que mente do livro Dicionário de 49-%E2%80%93-58-Os-g%-
em outros estratos de ensino gêneros textuais, de autoria C3%AAneros-discursivos-
pode ser visto como pesqui- de Sérgio Roberto da Costa na-sala-de-aula-proposi%-
sa ou trabalho de grupo ou (2009). C3%A7%C3%B5es-did%-
de campo. Antes de apresen- Desse livro, selecionamos C3%A1ticas-para-o-ensino-
tarem os seminários, os alu- gêneros pertencentes a superior-e-outros-segmen-
nos foram instruídos sobre o dois domínios: (a) gêneros tos-de-ensino.pdf.>. Acesso
que significa os conceitos de do domínio administrativo, em: 15 ago. 2014.
texto, gêneros textual, tipo tais com os verbetes de de-
textual e suporte. claração, ata, requerimento,

No que se refere à importância da abordagem processos de leitura e produção textual que


proposta pelo Grupo de Genebra, Lopes-Rossi executa. Já o segundo, estende-se ao pro-
(2006) comenta que tal perspectiva possui fessor de Língua Portuguesa, pois, para que
uma relevância e requer um compromisso. essa abordagem obtenha êxito, é necessá-
A primeira se estende ao aluno: uma vez que rio que o professor crie condições para que
este se apropria do funcionamento da lingua- os alunos sejam colocados em situações que
gem ao ser exposto às atividades relativas ao se aproximem ao máximo de condições reais
trabalho pedagógico com os gêneros dis- de leitura e produção dos gêneros aos quais
cursivos, torna-se mais independente nos estão sendo expostos.
Pós-Graduação | Unicesumar
45

Isso pode ser feito com muita eficiência por meio de projetos pedagógicos que visem
ao conhecimento, à leitura, à discussão sobre o uso e as funções sociais dos gêneros
escolhidos e, quando pertinente, à sua produção escrita e circulação social (LOPES-
ROSSI, 2006, p. 74).

Tais projetos configuram-se, na abordagem gêneros que circulam socialmente, às suas


proposta, como uma maneira didática pode- regras de formação estrutural, social e ide-
rosa para alcançar os objetivos do ensino de ológica, pode-se contribuir para um melhor
língua, pois, além de abarcarem as peculiari- aproveitamento dos conteúdos de língua
dades já mencionadas, podem dar conta das materna, como também para uma instru-
demandas curriculares da escola dimensiona- mentalização dos aprendizes no que se refere
das no modo de aprendizagem em espiral e ao domínio das regras em que se inscrevem
contínuo exigidos pelos documentos que ar- os diferentes modos de uso da linguagem.
regimentam o sistema educacional no Brasil.
Ao tratar da progressão dos conteúdos
programáticos da escola, visando ancorá
-los como justificativa ao ensino de língua
cujo objeto de estudo é materializado nos
gêneros discursivos, Dolz e Schnewly (2004,
p. 51) defendem a ideia de que a metodo-
Cada gênero possui determinados
logia de ensino, a qual a abordagem em princípios de seleção, determinadas
formas de visão e concepção da reali-
projetos pedagógicos estruturados em se-
dade, determinados graus na capaci-
quências didáticas, instaura “uma primeira dade de abarcar e na profundidade de
penetração nela.
relação entre um projeto de apropriação de
Fonte: BRAIT; PITORI, 2012, p. 400.
uma prática de linguagem e os instrumen-
tos que facilitem essa apropriação”.
Desse modo, através de atividades nas
quais os alunos são expostos aos diversos
Gêneros textuais e o ensino de língua
46

gêneros discursivos em Bakhtin:


retomada da definição e alguns
desdobramentos
Pós-Graduação | Unicesumar
47

Você deve se lembrar de que os gêneros dis- gêneros literários. Resulta daí a difícil tarefa
cursivos têm como característica primeira de conceber um plano geral que abarque o
a heterogeneidade, porque compreendem estudo dos gêneros. No entanto, para que
desde o texto constituído por um relato do de fato se encaixem na categoria proposta
dia a dia (tal como as anotações de uma por Bakhtin,
agenda) até os mais elaborados, como os

[...] consideremos que todo gênero se define por três dimensões essenciais: 1) os con-
teúdos que vão (que se tornam) dizíveis por meio dele; 2) a estrutura (comunicativa)
particular dos textos pertencentes ao gênero; 3) as configurações específicas das unida-
des de linguagem, que são, sobretudo, traços da posição enunciativa do enunciador, e os
conjuntos textuais e de tipos discursivos que formam sua estrutura (DOLZ; SCHNEWLY,
2004, p. 52).

Retomando as palavras do filósofo da lin- cotidiana, pois se originam em/por uma


guagem, é válido salientar que “estes três vivência de maior complexidade, mais ela-
elementos (conteúdo temático, estilo, borada. Já aqueles, constituem-se com base
construção composicional) fundem-se in- em fragmento destes, uma vez que “ao se
dissoluvelmente no todo do enunciado, e tornarem componentes dos gêneros se-
todos eles serão marcados pela especificida- cundários, transformam-se dentro destes
de de uma esfera de comunicação” (BAKHTIN, e adquirem uma característica particular:
1997, p. 280). perdem sua relação imediata com a realidade
Há, no plano das caracterizações, uma dis- existente e com a realidade dos enunciados
tinção feita pelo pensador entre os gêneros alheios” (BAKHTIN, 1997, p. 282). A relação e
do discurso primário (os mais simples) e os a distinção entre os gêneros primários e se-
secundários (complexos). Estes últimos, que cundários são imprescindíveis aos estudos
compreendem o romance, o teatro, o texto bakhtinianos, pois a partir dessas conside-
científico etc., são compostos em circuns- rações elabora o tratamento dos gêneros
tâncias comunicacionais mais elaboradas, enquanto enunciados individuais concretos
são produtos culturais que exigem recur- cujo vetor do sentido é estabelecido na in-
sos linguísticos menos comuns à interação tersecção da língua com a vida.
Gêneros textuais e o ensino de língua
48

P
ara o estudo dessas intersecções, é ne- é a discussão de problemas sociais contro-
cessário estabelecer uma abordagem versos e cuja linguagem predominante é a
que leve em consideração a hetero- da sustentação e negociação de tomadas de
geneidade dos gêneros e, ao mesmo tempo, decisão. Agrupam-se aqui a carta ao leitor,
instaure certa ligação entre ele, com o intuito resenha crítica, debate regrado etc. O quarto
de facilitar o trabalho com essas modalida- agrupamento dos gêneros é composto pelos
des de linguagem. Dolz e Schnewly (2004) da ordem do expor, que se referem à transmis-
propõem cinco agrupamentos dos gêneros são e construção de saberes. Sua linguagem é
discursivos através da observância de três apresentada por diferentes formas de saberes.
critérios que consideram essenciais, quais São exemplos desses gêneros o seminário,
sejam, os domínios sociais de comunicação, a conferência, o resumo etc. E por último, o
as capacidades de linguagem e as tipologias agrupamento dos gêneros da ordem do ins-
textuais. truir ou do prescrever, que englobam textos
Nesse ponto, chamamos sua atenção para de instrução e/ou prescrição que são de uso
o que segue: um resumo do que Dolz e de toda a sociedade. Exemplos desse agru-
Schnewly (2004) expõem sobre os cinco pamento são as bulas de remédio, regras de
agrupamentos em que se organizam os jogo e a Constituição Federal.
gêneros discursivos. Apesar do caráter didático instituído por
O primeiro agrupamento congrega os essa proposta, nota-se que dos critérios estabe-
gêneros da ordem do narrar, cujo domínio é o lecidos como distintivos de cada agrupamento
da cultura literária ficcional e cuja linguagem é privilegiado o da tipologia textual em detri-
dominante é a reconstrução do verossímil. mento dos outros dois, o que coloca no plano
Lendas, fábulas, conto, romance, novela, piada da invisibilidade características essenciais à
etc. são exemplos de gêneros desse agru- análise dos gêneros, sobretudo no que diz res-
pamento. O segundo comporta os gêneros peitos aos elementos da ordem da enunciação
da ordem do relatar, que visam à memória e e do discurso. Tendo em vista esse problema,
àdocumentação das experiências humanas: aproximou-se o olhar para a proposição bakh-
biografias, testemunhos, reportagem, notícia, tiniana de agrupamento de gêneros por meio
relato e anedota são exemplos desse agrupa- do estabelecimento de esferas de atividades
mento de gêneros. Os gêneros da ordem do ou de esferas de comunicação, baseado na
argumentar estão no terceiro agrupamento. metodologia de estudo da língua em suas re-
Esses são aqueles cuja característica principal lações com história e a sociedade.
Pós-Graduação | Unicesumar
49

e das suas situações de interação; (ii) estudos


dos enunciados, em ligação com seus gêneros,
da esfera cotidiana e das ideologias formaliza-
A reportagem que segue apresenta
um exemplo brilhante de como um das e, (iii) a partir daí, o exame das formas da
trabalho sequenciado por módulos oti-
língua na sua interpretação linguística habitu-
miza e torna circunstanciada as aulas
de Língua Portuguesa: al. Para Bakhtin (2006, p. 115), no centro desse
Disponível em: <http://g1.globo. método sociológico “o centro organizador de
com/rs/rio-grande-do-sul/rbs-no-
toda enunciação, de toda expressão, não é in-
ticias/videos/t/edicoes/v/professo-
ra-cria-atelier-de-textos-para-alu- terior, mas no exterior: está situado no meio
nos-de-escolas-publicas/2970737/>.
social que envolve o indivíduo”.
Acesso em 20 jul. 2014.
Por isso, no método sociológico, são observa-
dos os agentes envolvidos na enunciação, as
atividades desenvolvidas em cada esfera, os
Nessa outra forma de agrupar os gêneros, diferentes interesses inscritos na prática de
aborda-se a língua partindo da dimensão linguagem dessa esfera, as relações de poder
social de seu uso para suas formas linguísticas, estabelecidas nessas práticas de linguagem,
priorizando a relação entre o sistema linguísti- os tipos de gênero que nelas circulam, dentre
co e seu funcionamento social. Nesse sentido, outras observações. A seguir, sintetizamos
os critérios estabelecidos para o agrupamento um quadro/resumo que abarca o agrupa-
dos gêneros se constituem pela observação mento dos gêneros em suas respectivas
de três passos: (i) estudos das esferas sociais esferas de comunicação:
Gêneros textuais e o ensino de língua
50

Tabela 1 – TABELA DE GÊNEROS CONFORME AS ESFERAS DE COMUNICAÇÃO.

ESFERAS SOCIAIS ABORDAGEM TEÓRICO-METODOLÓGICA AVALIAÇÃO


DE CIRCULAÇÃO
COTIDIANA Advinhas Diário
Álbum de família Exposição oral
Anedota Fotos
Bilhete Música
Cantiga de roda Parlendas
Carta pessoal Piada
Cartão Provérbio
Cartão postal Quadrinha
Causos Receita
Comunicados Relatos de Experiência Vividas
Convite Trava-línguas
Curriculum Vitae
LITERÁRIA/ARTÍSTICA Autobiografia Letras de músicas
Biografia Narrativas de Aventura
Conto Narrativas de Enigma
Conto de fadas Narrativas de Ficção Científica
Conto de fadas contemporâneo Narrativas de Humor
Crônica de ficção Narrativas de Terror
Escultura Narrativas Fantásticas
Fábula Narrativas Míticas
Fábula contemporânea Paródias
Haicai Pinturas
História em quadrinhos Poemas
Lendas Romances
Literatura de Cordel Tankas
Memórias Textos Dramáticos
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ESCOLAR Ata Relato Histórico


Cartazes Relatório
Debate regrado Relatos de Experiências Científica
Diálogo/discussão argumentativa Resenha
Exposição oral Resumo
Júri simulado Seminário
Mapas Texto Argumentativo
Palestra Texto de Opinião
Pesquisa Verbetes de Enciclopédia
IMPRESSA Agenda cultural Fotos
Anúncio de emprego Horóscopo
Artigo de opinião Infográfico
Caricatura Manchete
Carta ao leitor Mapa
Carta do leitor Mesa Redonda
Cartum Notícia
Charge classificados
Reportagens
Crônica jornalística
Resenha Crítica
Editorial
Entrevista (oral e escrita)
Sinopses de Filmes
Tiras
PUBLICITÁRIA Anúncio Música
Caricatura Paródias
Cartazes Placas
Comercial para TV
Publicidade Comercial
E-mail
Publicidade Institucional
Folder
Publicidade Oficial
Slogan
Texto Político

Fonte: Quadro elaborado pelos autores com base em Paraná (2008).


Gêneros textuais e o ensino de língua
52

Tabela 2 –Trabalhando com os gêneros do discurso: uma perspectiva enunciativa para


o ensino de Língua Portuguesa.

ESFERA SOCIAIS DE CIRCULAÇÃO ABORDAGEM TEÓRI- AVALIAÇÃO


CO-METODOLÓGICA
POLÍTICA Abaixo-assinado Debate Regrado
Assembleia Discurso Político “de Palanque”
Carta de Emprego Fórum
Carta de Reclamação Manifesto
Carta de Solicitação Mesa Redonda
Debate Panfleto
JURÍDICA Boletim de Ocorrência Estatutos
Constituição Brasileira Leis
Contrato Ofício
Declaração de Direito Procuração
Depoimentos Regimento
Discurso de Acusação Regulamento
Discurso de Defesa Requerimento
PRODUÇÃO E CONSUMO Bulas Regras de Jogo
Manual técnico Rótulos/Embalagens
Placas
MIDIÁTICA Blog Reality Show
Chat Talk Show
Desenho Animado Telejornal
E-mail Telenovela
Entrevista Torpedo
Filmes Torpedos
Fotoblog Video Clip
Home Page Video Conferência
Fonte: Adaptado de BARBOSA, Jaqueline Peixoto.
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53

É época de festa junina e a es- com a comunidade, propõe fizeram, cada um, o seu pró-
cola se prepara para receber um trabalho a ser desenvol- prio cartaz para ser fixado na
a comunidade. Professores vido em sala de aula sobre o rua onde moravam. O resul-
e alunos estão empolgados gênero convite. tado? Além de momentos ri-
para o acontecimento, mas, Os alunos se empolgam! quíssimos de aprendizagem
entre a festa e as tarefas das Ao final de oito aulas, os alu- da língua portuguesa, os alu-
aulas está o conteúdo pro- nos não só tinham estudado nos puderam participar da
gramático. A professora de as características do gênero construção efetiva da festa
Língua Portuguesa, atenta em questão, através de ativi- da qual participaram.
às demandas da escola, da dades de leitura, escrita co- Fonte: Situação fictícia ela-
sua disciplina, mas, princi- laborativa e análise de ele- borada de acordo com a ex-
palmente, da necessidade mentos linguísticos comuns periência dos autores.
de interação de seus alunos a esse gênero, com também
Gêneros textuais e o ensino de língua
54

operacionalizando o trabalho
com os gêneros discursivos

Recuperados os conceitos de gênero, seus desdobramentos e especificidades é


necessário observar as possibilidades de implementação de uma metodologia
de ensino por intermédio de uma abordagem de trabalho com os gêneros do
discurso, aqui baseadas nas proposições de Lopes-Rossi (2006).
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55

São muitos os gêneros que circulam na e O planejamento de um projeto de


pela sociedade cuja produção não se presta leitura, nesse caso, requer a proposição de
ao trabalho pedagógico, isto é, não se adéqua atividades que instrumentalizem ao aluno
aos modelos de produção escrita em sala de a aprendizagem dos modos de compo-
aula. Entretanto, tais gêneros são viáveis à sição dos gêneros aos quais estão sendo
proposição de projetos de leitura. expostos.

A leitura de gêneros discursivos na escola não pressupõe sempre a produção escrita.


Esta, no entanto, pressupõe sempre atividades de leitura para que os alunos se apro-
priem das características dos gêneros que produzirão. É por isso que [...] um projeto
pedagógico para a produção escrita deve sempre ser iniciados por um módulo didá-
tico de leitura para que os alunos se apropriem das características típicas do gênero a
ser produzido (LOPES-ROSSI, 2006, p. 75).

No que compete aos gêneros discursivos, o gênero que será trabalhado. Conhecer a
cuja produção é exequível em atividades materialidade real na qual circula o gênero
de sala de aula, são trabalhados a partir de é de extrema importância, pois coloca em
módulos didáticos. evidência boa parte das condições de pro-
Nessa perspectiva, o objeto de estudo é dução que circunscrevem esse modo de
abordado através de atividades que visam usar a linguagem. As atividades proposta
à leitura, produção escrita e circulação do nesse módulo devem propiciar ao aluno
gênero estudado. o conhecimento da organização linguísti-
No primeiro módulo, o de leitura, o ca do gênero, bem como de seus aspectos
aluno é colocado em contato direto com discursivos.
Gêneros textuais e o ensino de língua
56

Esse nível de conhecimento [...] permite uma série de inferências por parte do leitor
para escolha vocabular, o uso de recursos linguísticos e não linguísticos, a seleção
de informações, o tom e o estilo entre outros. São comentários que proporcionam
aos alunos, ainda que de forma gradual, a percepção da relação dinâmica entre os
sujeitos e a linguagem e a percepção do caráter histórico e social do gênero discur-
sivo em estudo (LOPES-ROSSI, 2006, p. 76-77).

A
observância desses passos no âmbito Durante as atividades desse módulo, a
da leitura habilita o aluno não só a produção de várias versões a revisão e a cor-
apreensão da organização textual reção participativa são tarefas fundamentais.
ou ao conhecimento das regras de produção A escrita entendida, nessa perspectiva teórica,
e circulação dos gêneros, mas a produção como um processo que requer aprimora-
escrita através da seleção e organização dos mento, daí a necessidade de uma primeira
conhecimentos sobre a temática e as outras produção, de uma correção, de uma leitura
especificidades do gênero que emerge no crítica e de uma refacção. Através dessas ati-
decorrer do módulo de leitura. vidades o professor terá a possibilidade de
O módulo de produção escrita sucede o perceber a necessidades dos alunos, sejam
anterior. Neste módulo didático, são previstas, elas no campo das especificidades temáticas
além das atividades de escrita propriamente ou de estruturação do gênero, ou propria-
ditas, aquelas que compõem as informações mente linguísticas, o que servirá de base para
e necessidades de composição do gênero que, nesse módulo, sejam desenvolvidas ati-
em questão. Lopes-Rossi (2006, p. 79) ressalta vidades de análise linguísticas que subsidiem
que “é necessário, para manter a essência da a apropriação dos conhecimentos pertinen-
proposta pedagógica, que a obtenção de in- tes à produção do gênero.
formações necessárias ao texto e à redação O último módulo proposto por Lopes-
propriamente dita seja feita de acordo com a Rossi (2006) é o de divulgação. Nesse módulo,
produção desse gênero em nossa sociedade”. finaliza-se o processo de produção do gênero,
Dessa maneira, o aluno tem consciência de pois é nele que leitura e escrita se concreti-
que a aprendizagem do gênero com o qual zam, sendo colocado o gênero no suporte
tem contato está se dando no uso real da em que costumeiramente é veiculado, como
língua, ou seja, a aprendizagem se dá ligada também adequado à esfera em que circula
ao processo em que, socialmente, o gênero socialmente.
aprendido é produzido.
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57

A execução de projetos de leitura e a pro- assumir o compromisso de ser um facilita-


dução de gêneros discursivos, não são tarefas dor do acesso dos alunos à apropriação de
relativamente fáceis e envolvem algumas cada gênero, orientando os alunos em suas
considerações. Cada projeto requer deter- dificuldades e incitando a formação de um
minado tempo para ser executado, cada contexto que permita ao aluno a visualiza-
módulo requer algumas horas-aula para ser ção do circuito estrutural, social e linguístico
desenvolvido, por isso, a impossibilidade em que se inscreve cada gênero.
de ser implementada uma grande quanti- Finalizando, Lopes-Rossi (2006, p. 83) con-
dade de projetos no decorrer de um ano sidera que
letivo. O professor deve estar preparado para

A prática pedagógica com projetos de leitura e de produção de gêneros discursivos [...]


mostra-se possível mesmo em escola com poucos recursos financeiros. Depende de um
professor melhor informado sobre a fundamentação teórica básica a essa prática e deter-
minado a mobilizar alguns recursos materiais mínimos para a realização da tarefa.

Dada as considerações feitas até aqui, surge


a necessidade do tratamento de um gênero
específico a fim de que, ao final deste livro,
possamos demonstrar uma possibilidade de
abordagem de um trabalho com o gênero
em estudo. Mas isso é assunto da próxima
unidade.

“O acompanhamento de contribuem significativa- para êxito dos alunos não


projetos [tais como os apre- mente para o desenvolvi- apenas nas atividades esco-
sentados nesta unidade] tem mento das competências de lares, mas também em suas
mostrado que o professor leitura e escrita dos alunos ações e interações sociais.”
teoricamente bem funda- de forma motivadora, intera-
mentado pode desenvolver tiva e dialógica. Certamente Fonte: Lopes-Rossi (2012, p.
práticas pedagógicas que essas práticas contribuem 243)
Gêneros textuais e o ensino de língua
58

considerações finais

Esta unidade se preocupou em apresentar fundamentos teórico-metodológi-


cos, no intuito de darmos os primeiros passos para a prática. Tratou-se, portanto,
de apresentar estratégias sobre como operar com os gêneros a partir da teoria.
É dizer, considerando o percurso que traçamos até aqui não escapou ao trata-
mento das formas de produção e de circulação da linguagem humana. Pudemos
compreender, nas palavras do teórico, que “a utilização da língua efetua-se em
forma de enunciados (orais e escritos), concretos e únicos, que emanam dos
integrantes duma ou doutra esfera da atividade humana” (BAKHTIN, 1997, p.
280). Os enunciados a que ele se refere mantém, por suas formas de uso, uma
espécie de perenidade no que se refere às suas características. Em razão disso, o
que muito importa dessa seção é a noção de enunciado. Para Bakhtin (1997, p.
280) “o enunciado reflete as condições específicas e as finalidades de cada uma
dessas esferas, não só por seu conteúdo (temático) e por seu estilo verbal, [...],
mas também e, sobretudo, por sua construção composicional”. Essa definição de
enunciado justifica a razão para que “os gêneros se constitu[a]m e se estabiliz[e]
m historicamente a partir de novas situações de interação verbal (ou outro mate-
rial semiótico) da vida social que vão se estabilizando, no interior dessas esferas”
(RODRIGUES, 2005, p. 164-165).
Esperamos que você, aluno(a), ao observar a totalidade da discussão, perceba
a relação tácita entre a discussão sobre os gêneros discursivos e a mudança epis-
temológica que tal discussão requer nas práticas de ensino e de aprendizagem
da Língua Portuguesa nas diferentes etapas da educação básica e superior.
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atividades de autoestudo

1. Na contemporaneidade, os gêneros se tornaram relevantes para as pesqui-


sas voltadas ao ensino. Quanto ao ensino de gênero, assinale a alternativa
correta:
a. A teoria bakhtiniana é a única abordagem teórica legitimada no Brasil.
b. O ensino a partir dos gêneros é legitimado pelos PCNs, por significar uma
abordagem reflexiva da língua.
c. O ensino, com a descoberta dos gêneros, entende que a linguagem é um
produto da língua enquanto código.
d. O ensino a partir dos gêneros contempla o ensino de língua como um pro-
cesso estanque ao social.
e. O ensino de gêneros, pela perspectiva bakhtiniana, preza, sobretudo, pela
estrutura composicional.

2. O ensino da Língua Portuguesa, em meados de 1980, tomou o texto como


ponto de partida. Sobre isso, assinale a alternativa correta:
a. Razão para desenvolvimentos significativos no âmbito da linguística textual,
que já não são contemplados nos estudos contemporâneos.
b. A língua deixou de ser objetivo do ensino, passou aos textos.
c. Desconsiderou-se a interpretação na condição de possibilidade de leitura.
d. Enunciados estanques tomaram o lugar do uso e das significações da língua.
e. O texto passou a ser condição de possibilidade para a emergência nos
estudos dos gêneros.

3. Sobre os gêneros primários e secundários, assinale a alternativa correta:


a. Gêneros primários são complexos e gêneros secundários são simples.
b. Gêneros primários se caracterizam por serem reconhecidos como produ-
tos culturais evoluídos.
c. Os gêneros secundários estabelecem relação com a realidade.
d. Distinguí-los é fundamental para compreender os gêneros como enuncia-
dos individuais concretos.
e. Os gêneros primários não integram os secundários.
Gêneros textuais e o ensino de língua
60

4. No método sociológico, não é considerado:


a. Os agentes envolvidos na enunciação.
b. As esferas sociais de circulação.
c. Os diferentes interesses inscritos nas práticas de linguagem de determina-
da esfera.
d. As relações de poder estabelecidas nas práticas de linguagem de determi-
nada esfera.
e. A linguagem acabada em si mesma e estanque ao extraverbal.

5. A leitura e a escrita são atividades fundamentais para o trabalho com gêneros.


Sobre tais processos, assinale a alternativa correta:
a. A produção escrita de um gênero representa unicamente o contato do
aluno com o gênero.
b. A escrita de um gênero deve ser a primeira experiência do aluno com o
gênero.
c. A leitura é o processo menos importante no contato com os gêneros, porque
não evidencia os aspectos discursivos do gênero.
d. A leitura e a escrita são processos que evidenciam os aspectos discursivos
do gênero e as condições de produção.
e. O aluno entra contato com os gêneros apenas no processo de escrita.

Web

Programa da TV UNIESP sobre a utilização de atividades baseadas nos gêneros do discurso


em situações concretas de uso da linguagem.

Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=mB3TwwXsbZg>. Acesso em 15


ago. 2014.
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SEQUÊNCIA DIDÁTICA E ENSINO DE GÊNEROS TEXTUAIS


O que são sequências didáticas?
As sequências didáticas são um conjunto de atividades ligadas entre si, planejadas para ensinar um
conteúdo, etapa por etapa. Organizadas de acordo com os objetivos que o professor quer alcançar
para a aprendizagem de seus alunos, elas envolvem atividades de aprendizagem e de avaliação.
São exemplos de sequências didáticas para o ensino de Língua Portuguesa as oficinas dos fascículos
distribuídos nas três edições do Prêmio Escrevendo o Futuro. Nas edições 2004 e 2006, são: Pontos
de vista, Poetas da escola e Se bem me lembro... Essas sequências orientam o professor para o traba-
lho com os seguintes gêneros de texto: artigo de opinião, poesia e memória.
[...]
Por que usar sequências didáticas ao ensinar Língua Portuguesa?
Para ensinar os alunos a dominar um gênero de texto de forma gradual, passo a passo. Ao organizar
uma sequência didática, o professor pode planejar etapas do trabalho com os alunos, de modo a ex-
plorar diversos exemplares desse gênero, estudar as suas características próprias e praticar aspectos
de sua escrita antes de propor uma produção escrita final.
Outra vantagem desse tipo de trabalho é que leitura, escrita, oralidade e aspectos gramaticais são
trabalhados em conjunto, o que faz mais sentido para quem aprende.
[...]
Quais as etapas de realização e aplicação de uma sequência didática de gêneros textuais?
Para organizar o trabalho com um gênero textual em sala de aula, sugerimos a seguinte sequência
didática:

1. Apresentação da proposta.

2. Partir do conhecimento prévio dos alunos.

3. Contato inicial com o gênero textual em estudo.

4. Produção do texto inicial.

5. Ampliação do repertório sobre o gênero em estudo, por meio de leituras e análise de textos do
gênero.

6. Organização e sistematização do conhecimento sobre o gênero: estudo detalhado de sua situação


de produção e circulação; estudo de elementos próprios da composição do gênero e de caracterís-
ticas da linguagem nele utilizada.

7. Produção coletiva.

8. Produção individual.

9. Revisão e reescrita.

Fonte: Adaptado pelos autores de: AMARAL, Heloísa. Sequência didática e ensino de gêneros
textuais. Disponível em: < <https://www.escrevendoofuturo.org.br/index.php?option=com_content&-
view=article&id=212:sequencia-didatica-e-ensino-de-generos-textuais&catid=23:colecao&Itemid=33>.
Acesso em: 15 ago. 2014.

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