Você está na página 1de 10

INFLUÊNCIA DE VIBRAÇÕES NA RESISTÊNCIA DO

CONCRETO DURANTE EXECUÇÃO DE SERVIÇOS DE


FUNDAÇÃO

1.INTRODUÇÃO

Na fase de execução de fundações, de uma maneira cada vez mais expressiva, tem-
se a necessidade de executar tarefas de forma simultânea, visando equalizar prazos e
reduzir custos fixos.
Em determinadas situações específicas, tal simultaneidade se apresenta como uma
necessidade logística, muito além de preocupações com custos e prazos. Isso
acontece, por exemplo, em reforços de fundação de obras de arte, onde a interdição
da via para execução destes trabalhos causaria enormes desconfortos.
Assim, teríamos peças recém concretadas sob o efeito de vibrações, cenário que
também pode ocorrer em casos onde tenha-se que, em um mesmo período, cravar
estacas e concretar blocos de coroamento ou até estacas escavadas.
Em tais cenários, teríamos o concreto, logo após sua mistura, sujeito a vibrações, fato
que pode influenciar nas propriedades deste concreto, conforme citação de diversos
autores, entre eles:
Sussumu (2006), “Como se sabe, quando o concreto fresco ou “verde”, em processo
de cura, se submetido a vibrações pode ter sua resistência diminuída”.
Ansell e Silfwebrand (2003, apud Fernandes 2011, p. 602), “A cura do concreto é
vulnerável a perturbações de vibrações de grandes magnitudes”.
Fernandes (2011) ainda cita que vibrações podem ser danosas ao processo de cura
do concreto, além de poder prejudicar a aderência aço-concreto.
Hulshizer and Desai (1984, apud Tawfiq 2003), “Concreto com menos de 24horas de
idade é particularmente vulnerável ao enfraquecimento de suas propriedades caso
sujeito a intensa vibração”.
Desta forma, é relevante entender os efeitos de vibrações nas propriedades do
concreto em suas idades iniciais, em função da ordem de grandeza destas vibrações e
de distâncias entre a fonte de vibração e o elemento de concreto.

1
2.CONCEITUAÇÃO - VELOCIDADES DE ONDA E DE PARTÍCULA

Sabemos que quando um esforço dinâmico é aplicado em um meio elástico, a


deformação correspondente se propaga sob a forma de ondas elásticas. Sendo que
estas ondas transferem energia por meio de movimento de partículas.
Como definição de ondas, podemos considerar como um fenômeno físico, pelo qual
ocorre propagação da energia no tempo e no espaço.
As ondas podem ser eletromagnéticas, transportando energia eletromagnética (luz,
ondas de rádio), ou ondas mecânicas, transportando energia mecânica (som, onda na
corda e ondas sísmicas, as quais são relevantes ao estudo em questão).
O movimento das partículas no meio caracteriza diferentes tipos de ondas sísmicas,
indicadas nas figuras 1,2, 3 e 4:

• Onda compressional P (primária) – O movimento das partículas é paralelo à


direção de propagação (longitudinal).
As ondas P se propagam mais rapidamente nos materiais (são as primeiras
que chegam).

Figura 01 – Onda P (Gandolfo, 2013)

• Onda cisalhante S (secundária) – O movimento das partículas é perpendicular


à direção de propagação (transversal).
Propaga-se apenas pela porção sólida do solo, não sendo afetada pela
saturação do terreno. É mais lenta do que a onda P.

Figura 02 – Onda S (Gandolfo, 2013)

2
• Ondas superficiais – Formam-se e propagam-se nas camadas superficiais da
terra. Amplitude diminui fortemente com a profundidade e possuem grande
energia. Só se propagam se houver interface com o ar acima de um semi-
espaço sólido.

Onda Rayleigh- Caracterizada pelo movimento elíptico das partículas

Figura 03 – Onda Rayleigh (Gandolfo, 2013)

Onda Love- O movimento das partículas é horizontal e perpendicular à direção


de propagação.

Figura 04 – Onda Love (Gandolfo, 2013)

Como as ondas transferem energia por meio de movimento de partículas, os valores


de pico de velocidade de partícula serão fatores de comparação para análise do efeito
das vibrações nas características do concreto em suas idades iniciais.

3.LIMITES DE PICO DE VELOCIDADE DE PARTÍCULA

Diversos estudos foram elaborados visando determinar um limite de pico de


velocidade de partícula, a partir do qual esperam-se impactos nas propriedades dos
concretos em suas idades iniciais. Tais preocupações estão relacionadas, por
exemplo, a execução de estaca escavada próxima a estacas recém concretadas, ou
ainda para cravação de estacas na mesma região onde haverá tais concretagens.
A FDOT Roadway and Bridge Specifications – indica que a uma distância de 3 vezes o
diâmetro do fuste de uma estaca, estão proibidas vibrações por um período de
12horas para proteger o concreto “verde”.

3
Woods (1997), fez uma pesquisa com diversas agências americanas reguladoras de
transporte e apontou que, 28 das 48 agências consultadas indicaram problemas no
concreto devido vibrações.
Entretanto, alguns autores apresentam resultados de pesquisas onde a preocupação
com alteração nas propriedades do concreto devido vibrações são desnecessárias.
Bastian (1970 apud Tawfiq 2003), estudou o efeito da vibração nas propriedades do
concreto, devido execução de estacas escavadas.
Ele aponta em sua pesquisa que estacas escavadas, ou cravadas, seja com martelo
vibratório ou de impacto, normalmente, não causam danos ao concreto em período de
cura. Em sua pesquisa ele reporta um caso onde uma estaca foi cravada 5,4m
distante de uma estaca que acabou de ter sido preenchida com concreto. Amostras
foram retiradas e, três dias após a mistura, verificou-se um pequeno aumento na
resistência à compressão do concreto, comparando-se com as amostras que não
foram submetidas a vibração.
Bastian realizou outros cinco estudos e chegou à seguinte conclusão: “Não existem
razões para acreditar que vibrações devidas à cravação de uma estaca, inclusive
durante as horas críticas, de 12 a 14 horas, influenciariam no concreto de estacas
escavadas. Portanto, restrições de cravação de estacas próximas a concretos recém
lançados devem ser baseadas em outros fatores além da vibração”.

Apesar da divergência nas opiniões, muitos pesquisadores concordam que a vibração


pode afetar as propriedades do concreto em suas idades iniciais.
A tabela a seguir e seu respectivo gráfico, indicado na figura 05, apresentam as
propostas de quatro autores quanto ao limite de pico de velocidade de partícula (ppv)
para não causar danos nas propriedades do concreto, nas primeiras 12 horas de
idade.
Nota-se que nestas primeiras 12 horas, os autores recomendam um limite de pico de
velocidade de partícula entre 5 e 38,1mm/s.

ATÉ 12 HORAS DE IDADE


Idade do Pico de velocidade de partícula permitido (mm/s)
concreto Kwan and Lee Hulshizer and Desai Gamble and Bryson and
(hs) (1998) (1984) Simpson (1985) Cooley (1985)
<3e4 10,16 10,16
6-8 20,32 38,1 5,08 5,08
10-12 30,48 38,1

4
12
Idade do concreto no momento da vibração (horas) 11
10
9
8
7
6
5
4
3
2
1
0
0 5 10 15 20 25 30 35 40
Pico de Velocidade de Partícula (mm/s)

Hulshizer and Desai (1984) Kwan and Lee (1998)

Gamble and Simpson (1985) Bryson and Cooley (1985)

Figura 05 – Limites de vibração para concreto com idade de até 12 horas

Entre 12 e 24 horas, o limite de velocidade partícula varia entre 10 e 70mm/s, sendo


35mm/s valor médio. Já para 48 horas, as velocidades variam entre 25 e 100mm/s,
sendo 50mm/s um valor médio, conforme tabela e gráfico da figura 06.

APÓS 12 HORAS DE IDADE


Pico de velocidade de partícula permitido (mm/s)
Idade do
concreto Gamble and Bryson and Olofesson Hulshizer
(hs) Simpson Cooley Kwan and (1998) and Desai
(1985) (1985) Lee (1998) (1984)
12 5,08 5,08 30 0 38,1
24 10,16 50,8 70 14 50,8
48 25,4 50,8 80 30 100
72 30,48 50,8 100 40 175
168 50,8 101,6 125 60 175

5
180
Idade do concreto no momento da vibração (horas) 168
156
144
132
120
108
96
84
72
60
48
36
24
12
0 25 50 75 100 125 150 175 200

Pico de Velocidade de Partícula (mm/s)

Gamble and Simpson (1985) Bryson and Cooley (1985) Hulshizer and Desai (1984)

Kwan and Lee (1998) Olofesson (1998)

Figura 06 – Limites de vibração para concreto com idade a partir de 12 horas

3.1 – CASO DE CRAVAÇÃO DE CAMISA METÁLICA E ANÁLISE DE SEUS


EFEITOS NO CONCRETO.

Para estudar a influência da vibração induzida em estacas escavadas na obra, Tawfiq


(2003), cravou, com auxílio de um martelo vibratório, uma camisa metálica com
diâmetro de 90cm e comprimento de 12m, em um solo arenoso na cidade de Boca
Raton, na Flórida, EUA.
Para medir as vibrações, ele instalou 8 geofones triaxiais, que são transdutores
eletromecânicos que convertem o movimento das partículas do terreno (vibrações
mecânicas do solo) em um sinal elétrico, gerado a partir do deslocamento relativo
entre um condutor em forma de bobina móvel e um forte imã permanente.
Os geofones foram instalados de maneira a formar um “círculo” ao redor da camisa
metálica, em profundidades diferentes, círculo este com raio de 2,70m.
Também foram instalados acelerômetros na camisa e no solo.
A figura 07 a seguir ilustra a disposição citada acima.

6
Figura 07 – Disposição dos elementos para estudo da vibração no concreto
(Tawfiq 2003)

Tais medições indicaram picos de velocidade de partícula no solo de:


20mm/s a 1,50m da fonte;
6,8mm/s a 3,0m da fonte;
2mm/s a 4,5m da fonte.
Período de vibração:
Lote 1 – Desde o início da mistura (cimento/água) até o tempo que atingiu
4000psi (28MPa) – 21 horas.
Lote 2 – A partir do momento que atingiu 500psi (3,45MPa) até 4000psi
(28Mpa) - Entre 11,00 e 15,00 horas.

A figura 8 a seguir indica os valores de resistência à compressão do concreto em


função de picos de velocidade de partícula que os corpos de prova foram submetidos.
Para este exemplo, a vibração iniciou-se após 11 horas da mistura, e terminou com 15
horas após a mistura, ficando exposto a vibração por 4 horas.
As amostras do lote 1 não apresentou redução na resistência à compressão do
concreto.

7
Figura 08 – Resistência do concreto em função de ppv (Tawfiq 2003)

Nota-se uma pequena redução na resistência do concreto dos corpos de prova


submetidos a 50mm/s de ppv. Desta forma, segundo Tawfiq (2003) conclui-se que a
partir de 50mm/s de ppv, podem ocorrer reduções na resistência à compressão do
concreto.
Além disso, alguns outros fatos foram verificados no estudo:
• A velocidade de partícula reduz com o aumento da profundidade;
• Corpos de prova submetidos à vibração de 50mm/s de ppv durante 21 horas, a
partir da mistura do cimento com a água, apresentaram segregação de 80 e
94%. Já os corpos de prova submetidos à vibração de 228mm/s durante o
mesmo período, apresentaram segregação de 64 a 73%.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O concreto em sua idade inicial, quando submetido a vibrações, pode sofrer impacto
em suas propriedades, inclusive com redução de resistência à compressão.
A ordem de grandeza e as condições destas vibrações, assim como destas reduções,
variam em função, principalmente, do pico de velocidade de partícula, da distância
entre a fonte de vibração e o ponto de lançamento do concreto, do período que este
concreto fica exposto a tal vibração, entre outros.
Para execução de estacas escavadas, pode-se concluir, com base em diversos
autores, que deve-se respeitar uma distância mínima de 3 vezes o diâmetro da estaca
para execução de outra estaca, sendo que até atingir seu tempo final de cura, o

8
concreto não deve ser submetido a vibrações que gerem picos de velocidade de
partícula superiores a 50mm/s.
Para estacas metálicas cravadas, nossa experiência pessoal em um caso particular
mostrou um pico de velocidade de partícula de 9 mm/s a uma distância de 10 m, para
um martelo de cravação de 2.000 kg. Desta forma, espera-se que para menores
distâncias, obtenha-se ppv maior que o medido, onde, desta forma, as preocupações
com as propriedades do concreto nas proximidades se tornem necessárias.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Fernandes, F. J.; Bittencourt, N. T.; Helene. P. (2011). Concreto submetido a vibrações


nas primeiras idades. Revista Ibracon de estruturas e materiais. Volume 4, Number 4,
p. 592-609 – ISSN 1983-4195.

Gandolfo, O. C. B.; (2013). Métodos sísmicos para a caracterização geotécnica dos


maciços. Apresentação na Faculdade de Engenharia de São Paulo. 218p.

Junttan – Número de golpes por minuto, Finlândia Disponível em


https://www.junttan.com/products/hydraulic-impact-hammers acesso em 24.11.2016.

Kwan, A.K.H.; Lee, P.K.K. (1998). A Study of the effects of Blasting Vibration on Green
Concrete, Consulting Agrement n° CE21/94 - GEO Report n°12. Government of the
Hong Kong Special Administration Region.

Reddy, D.V.; (2012) Response of a Freshly Placed Full Scale Concrete Drilled Shaft to
Vibrations Induced by Adjacent Shaft Installation, 37th Conference on Our World in
Concrete & Structures: 29 - 31 – August 2012, Singapure.

Tawfiq, Kamal (2003). Effect of Vibration on Concrete Strehngth During Foundation


Construction. Final Report. Florida Department of Transportation. FDOT Contract BC
No. 352-14.

Woods, R. D.; (1997). Dynamic Effects of Pile Installation on Adjacent Structures.


NCHRP Synthesis 253 – Transpotation Reserch Board – National reserch Council

9
10

Você também pode gostar