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PARTE I

Introdução e
fundamentos
teóricos

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PSICOTERAPIA POSITIVA
O que é e por que precisamos dela?

Por mais de um século, a psicoterapia tem sido da PPT podem funcionar (sem perder seus
o lugar em que os clientes discutem seus pro- elementos essenciais) levando em conta si-
blemas. Milhares de pessoas a cada ano parti- tuações específicas dos clientes. Cada sessão
cipam de palestras motivacionais, workshops, inclui pelo menos uma vinheta, além das im-
retiros e cursos e ainda compram livros e apli- plicações transculturais.
cativos digitais de autoajuda. O foco dessas
iniciativas terapêuticas está baseado no pressu- O QUE É PSICOTERAPIA POSITIVA?
posto de que a descoberta de traumas infantis, a
distorção de pensamentos falhos ou o restabe- A PPT é uma abordagem terapêutica emergen-
lecimento de relações disfuncionais é curativo. te amplamente baseada nos princípios da PP.
Esse foco nos aspectos negativos faz sentido A PP estuda as condições e os processos que
intuitivamente, mas, como autores deste ma- possibilitam que os indivíduos, comunidades
nual, acreditamos que os clínicos perderam e instituições prosperem. Ela explora o que
de vista a importância dos aspectos positivos. funciona, o que é certo e o que pode ser cul-
A psicoterapia faz um bom trabalho ao fazer os tivado (Rashid, Summers, & Seligman, 2015).
clientes se sentirem menos deprimidos e menos O impacto da PPT em áreas da psicologia pode
ansiosos, mas o bem-estar dos clientes não é ser verificado pelos resultados de uma exten-
um objetivo explícito da terapia. A psicoterapia sa revisão sistemática (Donaldson, Dollwet, &
positiva (PPT), por sua vez, é um esforço tera- Rao, 2015) que apurou 1.336 artigos publica-
pêutico dentro da psicologia positiva (PP) que dos entre 1999 e 2013. Desses artigos, mais de
visa aliviar o estresse sintomático por meio da 750 incluem testes empíricos das teorias, prin-
valorização do bem-estar. cípios e intervenções da PP.
Este manual direcionado ao clínico está divi- A PPT é o braço clínico ou terapêutico da
dido em duas partes: PP. A PPT integra os sintomas com as forças, os
riscos com os recursos, os pontos fracos com os
•• A Parte I apresenta a estrutura teórica da valores e os pesares com as esperanças, tendo
PPT, explora as forças de caráter e conclui como objetivo compreender as complexidades
com práticas, processos e mecanismos de inerentes da experiência humana de forma equi-
mudança. librada. Sem ignorar ou minimizar as preocupa-
•• A Parte II contém 15 sessões de PPT, in- ções do cliente, o clínico em PPT compreende
cluindo conceitos centrais, diretrizes, com- empaticamente, dá atenção à dor associada ao
petências e folhas de exercícios para a prá- trauma e simultaneamente explora o potencial
tica dessas competências. Cada sessão inclui para crescimento. Não consideramos que a PPT
uma seção de adequação e flexibilidade que seja um novo gênero de psicoterapia; em vez
apresenta várias maneiras como as práticas disso, a consideramos como uma reorienta-

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ção terapêutica – um modelo para “construir o ções em cardiologia (p. ex., betabloqueadores,
que é forte” – que complementa a tradicional angioplastia e estatinas), medicina geriátrica e
abordagem de “consertar o que está errado” asma (Wampold, 2007). Encontram-se dispo-
(Duckworth, Steen, & Seligman, 2005). níveis psicoterapias validadas empiricamente
A PPT vai mais além dos aspectos positivos. para muitos transtornos psicológicos, como
Como clínicos em PPT, não estamos sugerin- depressão, esquizofrenia, transtorno de estresse
do que outras psicoterapias são negativas, e, pós-traumático, transtorno obsessivo-compul-
na verdade, a PPT não pretende substituir as sivo, fobias, transtorno de pânico e transtornos
psicoterapias existentes. Em vez disso, a PPT alimentares (Barlow, 2008; Seligman, 1995).
é uma mudança gradual para dar um equilíbrio O website Substance Abuse and Mental Health
ao foco terapêutico nos pontos fracos. Clien- Service Administration (SAMHSA) lista 145
tes em sofrimento psicológico podem ser mais tratamentos manualizados para 84 dos mais
bem compreendidos e atendidos se aprende- de 365 transtornos mentais (SAMHSA, 2015).
rem a usar seus mais altos recursos – pessoais Aspectos mais sutis da psicoterapia, como
e interpessoais – para enfrentar os desafios na aliança terapêutica, nuances da comunicação te-
vida. Conhecer nossos pontos fortes; aprender rapêutica, linguagem não verbal, influências do
as competências necessárias para cultivar emo- terapeuta, processo de tratamento e processo de
ções positivas; fortalecer relações positivas; e feedback para o cliente e do cliente, foram todos
incluir significado e propósito em nossas vidas estudados (Wampold, 2001; Watkins, 2010).
pode ser tremendamente motivador, empode- O foco da terapia tradicional no que saiu er-
rador e terapêutico. O objetivo final da PPT rado resultou em tratamentos que reduzem os
é ajudar os clientes a aprender competências sintomas para muitos transtornos. No entanto,
concretas, aplicáveis, pessoalmente relevantes acreditamos que o foco intensivo dos psicotera-
que melhor utilizem suas forças para lutar por peutas no negativo chegou a um impasse: entre
vidas engajadas, satisfatórias e significativas. 20 e 30% dos clientes experimentam pouca mu-
Ao atingir esse objetivo, a PPT amplia o papel dança durante a terapia, e de 5 a 10%, na ver-
do clínico de uma autoridade prescritiva que dade, deterioram durante o tratamento (Hansen,
diagnostica déficits para uma que também fa- Lambert, & Forman, 2002; Lambert, 2013).
cilita ativamente o crescimento, a resiliência e Assim, a psicoterapia, segundo nosso ponto de
o bem-estar. vista, enfrenta uma barreira significativa, que
chamamos de “barreira dos 65%”, isto é, 65%
POR QUE PRECISAMOS DA dos clientes em psicoterapia encontram algum
PSICOTERAPIA POSITIVA? benefício com o tratamento. Acreditamos que
uma abordagem baseada nas forças, como a
A psicoterapia é a atividade central dos pro-
PPT, pode melhorar a eficácia da psicoterapia
fissionais de saúde mental (como psicólogos,
da seguinte forma:
psiquiatras, assistentes sociais e conselheiros)
e lança mão de um amplo espectro de métodos
•• expandindo a abrangência da psicoterapia
teóricos (Watkins, 2010). Entre todos os mé-
•• ampliando para além do modelo médico
todos, a psicoterapia demonstrou ser eficiente
•• expandindo os resultados da psicoterapia e
na melhoria do sofrimento psicológico (p. ex.,
•• atenuando o impacto no clínico
Castonguay, 2013; Seligman, 1995). Ela supera
significativamente o placebo e, em muitos ca-
Expandindo a Abrangência da Psicoterapia
sos, tem melhores resultados no longo prazo do
que medicação isoladamente (p. ex., Leykin & A tendência dos clínicos de voltar o foco na
DeRubeis, 2009; Siddique et al., 2012). De fato, direção dos aspectos negativos é compreensí-
a psicoterapia demonstrou ser tão eficaz quanto vel. A evolução nos dotou de cérebros que são
muitos tratamentos médicos validados empiri- orientados e mais fortemente responsivos às ex-
camente, entre os quais quase todas as interven- periências negativas do que às positivas (p. ex.,

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Psicoterapia positiva  5

Baumeister, Bratslavsky, Finkenauer, & Vohs, médico diagnostica uma doença com base nos
2001; Rozin & Royzman, 2001). Essa propen- sintomas e administra o tratamento desenvolvi-
são inata para a negatividade nos ajudou a ga- do para curar a doença. Em psicoterapia, tanto
rantir abrigo, alimento e parceria no passado a doença quanto o tratamento frequentemente
evolucionário. A mente humana consome uma dependem de características contextuais inter-
quantidade de tempo desproporcional pensando pessoais – que têm pouco a ver com medicina
no que está errado, mas nem de perto um tempo –, mas o modelo médico permanece como es-
suficiente pensando no que está correndo bem trutura descritiva dominante porque empresta à
em nossas vidas. Em essência, o negativo defi- psicoterapia um nível de respeitabilidade cultu-
ne em grande parte a função da terapia. Embora ral e vantagens econômicas que outros sistemas
os aspectos negativos sirvam a uma função im- descritivos não lhe conferem (Elkins, 2009).
portante em psicoterapia, eles também limitam Entretanto, diferentemente dos distúrbios mé-
sua abrangência. dicos, os transtornos psiquiátricos não podem
Como seres humanos, queremos vidas que ser atribuídos a agentes etiológicos simples.
sejam imbuídas de propósito e significado James Maddux (2008) observou que a influ-
(Duckworth, Steen, & Seligman, 2005). Com ência do modelo médico na psicoterapia pode
o crescente conhecimento das questões de saú- ser comprovada pelos termos que são mais
de mental, as pessoas com doença mental estão comumente associados à psicoterapia, entre
tendo mais voz, descrevendo como são suas os quais sintomas, disfunção, diagnósticos,
vidas e o que as ajudaria a ir além do papel de transtorno e tratamento. Essa influência deter-
um paciente com um transtorno psiquiátrico mina desproporcionalmente o foco clínico nos
(Secker, Membrey, Grove, & Seebohm, 2002). transtornos e nas disfunções, e não na saúde.
Esses clientes desejam uma recuperação ple- Em vez de abandonar o modelo médico da psi-
na, o que inclui esperança, relações positivas coterapia, o qual está totalmente arraigado no
e objetivos significativos (Secker, Membrey, treinamento, na pesquisa e nas organizações
Grove, & Seebohm, 2002; Slade, 2010). A psi- profissionais, sugerimos a incorporação de uma
coterapia apresenta uma oportunidade ímpar de abordagem baseada nas forças para tornar a
apoiar o desenvolvimento pessoal dos clientes psicoterapia mais equilibrada. Evidências mos-
por meio do cultivo de suas forças, e esse pro- tram que as forças podem se tornar ingredientes
cesso não deve ser desperdiçado pela atenção ativos no tratamento de aflições graves como
exclusiva à melhora dos sintomas ou déficits. psicose (Schrank et al., 2016), ideação suici-
Recuperação não é melhorar ou eliminar os da (Johnson et al., 2010) e transtorno da per-
problemas; é avaliar e fortalecer os pontos for- sonalidade borderline (Uliaszek et al., 2016).
Ao fundir e integrar os pontos fortes, o campo
tes, competências, habilidades, talentos e apti-
da psicoterapia pode enriquecer a experiência
dões (Crits-Christoph et al., 2008; Le Boutillier
dos clientes e dos clínicos. Slade (2010) defen-
et al., 2011; Rapp & Gosha, 2006).
de que essa expansão também pode oferecer
Ampliando para Além aos clínicos a oportunidade de desafiar o es-
do Modelo Médico tigma e a discriminação, além de promover o
bem-estar social. No entanto, expandir o mode-
A psicoterapia continua a operar segundo um lo psicoterápico do déficit para os pontos fortes
modelo médico em que os transtornos mentais irá exigir mudanças tanto na avaliação quanto
são doenças do cérebro causadas pela desre- no tratamento. Essa mudança no papel do clí-
gulação de neurotransmissores, anomalias ge- nico pode se tornar a norma em vez da exceção
néticas e defeitos na estrutura e na função ce- no século XXI. Alex Wood e Nicholas Tarrier
rebral (Deacon, 2013; Maddux, 2008). David (2010) sugeriram que a compreensão e o trata-
Elkin (2009) e muitos outros observaram que mento dos níveis clínicos de sofrimento devem
a sobreposição do modelo médico em psicote- ser equilibrados com um foco de mesmo peso
rapia é um problema. No modelo médico, um nos aspectos positivos porque

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•• As forças podem servir como defesa contra o (Davidson, Shahar, Lawless, Sells, & Tondo-
efeito de acontecimentos negativos no sofri- ra, 2006).
mento, potencialmente prevenindo o desen- Uma análise temática de 30 documentos
volvimento de transtorno psicológico (Huta internacionais que oferecem um guia prático
& Hawley, 2008; Marques, Pais-Riberio, & orientado para a recuperação recomenda que a
Lopez, 2011). noção de recuperação seja expandida além da
•• As forças têm sido associadas a vários in- remissão dos sintomas para incluir o bem-estar.
dicadores de bem-estar, como qualidade de A análise sugere que a recuperação inclua a
vida (Proctor et al., 2011), bem-estar psi- avaliação e a utilização das forças e dos apoios
cológico e bem-estar subjetivo (Govindji naturais para informar a avaliação, revisões,
& Linley, 2007), e quase todas as forças de planos de atendimento e objetivos e que a as-
caráter estão relacionadas a satisfação aca- sistência e o tratamento façam uso efetivo des-
dêmica, média das notas (Lounsbury et al., sas forças (Le Boutillier et al., 2011). Definir e
20099) e saúde mental (Littman-Ovadia & expandir a recuperação também expande o pa-
Steger, 2010; para uma revisão, veja Quinlan pel do profissional de saúde mental, com maior
et al., 2012). ênfase na parceria com o cliente (Slade, 2010).
•• Intervenções baseadas nas forças produzem Schrank e Slade (2007) conceituam recupera-
inúmeros benefícios. Elas predizem transtor- ção como um processo único profundamente
no psicológico além do poder preditivo da pessoal no qual a atividade, valores, sentimen-
presença de características negativas ou de tos, objetivos e papéis do indivíduo se modi-
sintomas (Wood et al., 2009). Intervenções ficam. Recuperação completa significa que,
baseadas nas forças conferem inúmeros be- apesar das limitações causadas pelo sofrimen-
nefícios (para uma revisão, veja Quinlan et to psicológico, o indivíduo é capaz de ter uma
al., 2012). vida gratificante e satisfatória. Recuperação
•• O aprimoramento das forças pode ser mais completa também envolve o desenvolvimento
eficiente e aceitável para clientes de diferen- de novo sentido e propósito na vida enquanto
tes origens culturais (Harris, Thoresen, & o indivíduo se desenvolve e supera os efeitos
Lopez, 2007; Pedrotti, 2011). catastróficos da doença mental.
•• As forças de caráter de inteligência social
e gentileza são indicativas de menos estig- Atenuando o Impacto no Clínico
ma em relação a pessoas com problemas de
A própria natureza da psicoterapia requer que
saúde mental. Pessoas de mentalidade aberta
os clínicos em saúde mental escutem descri-
não consideram os indivíduos com diagnós-
ções graficamente detalhadas de acontecimen-
tico de transtornos mentais como pessoal-
tos algumas vezes terríveis e sejam testemu-
mente responsáveis por adquirir esses trans-
nhas da repercussão psicológica (e algumas
tornos (Vertilo & Gibson, 2014).
vezes física) de atos de intensa crueldade
e/ou violência. Se a psicoterapia em grande
Expandindo os Resultados da Psicoterapia
parte implica confrontar lembranças negativas
Pesquisadores dos resultados da psicoterapia e experiências adversas – sutis e severas –,
enfatizaram que indicadores de qualidade de a experiência cumulativa de tal engajamento
vida e bem-estar psicológico devem ser incor- empático pode ter efeitos negativos nos clíni-
porados à definição de recuperação (Fava & cos. Evidências demonstraram que esses efeitos
Ruini, 2003). Larry Davidson e colaboradores se manifestam por meio da exaustão emocio-
usaram o termo “atendimento orientado para nal, despersonalização e falta de realização pes-
a recuperação” para descrever o tratamento soal – o que causa burnout e fadiga por compai-
que cultiva os elementos positivos da vida de xão (Berzoff & Kita, 2010; Deighton, Gurris,
uma pessoa – como recursos, aspirações, es- & Traue, 2007; Hart, 2014). Ao explorarem o
peranças e interesses –, pelo menos na medida que mantém o bem-estar dos clínicos e o que
em que tenta melhorar e reduzir os sintomas os torna exemplares, Harrison e Westowood

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Psicoterapia positiva  7

(2009) encontraram uma orientação positiva ção de mudança pode ser percebida como ame-
abrangente transmitida por uma habilidade de açadora e impossível de ser atingida.
manter a confiança em três atributos: (a) o self Na verdade, muitos clínicos abandonaram a
como suficientemente bom – isto é, o clínico noção de cura. A gestão da saúde e os orçamen-
tem confiança em sua expertise; (b) o processo tos limitados para tratamento algumas vezes re-
de mudança terapêutica; e (c) o mundo como sultaram em situações em que os profissionais
um lugar de beleza e potencial (apesar e além de saúde mental dedicaram seu tempo e talento
da dor e do sofrimento). Esses três atributos são para apagar incêndio em vez de fazer preven-
essenciais para a orientação teórica da PPT e ção de incêndio. Seu foco é quase inteiramente
são promovidos durante as práticas. no manejo da crise e na oferta de tratamentos
cosméticos. O fato de o tratamento ser com fre-
A BARREIRA DOS 65% quência apenas cosmético explica parcialmente
a barreira dos 65% (Seligman, 2006).
Conforme observado anteriormente, alguns Na psicoterapia tradicional orientada para o
clientes não obtêm nenhum benefício com psi- déficit, muitos clínicos acreditam que uma for-
coterapia, e outros (entre 5 e 10%) na verdade ma de minimizar as emoções negativas, espe-
deterioram durante a terapia (Lambert, 2007). cialmente a raiva contida, é expressá-las, com
Vamos discutir essa barreira aplicada à forma a suposição de que, se a raiva não for expressa,
mais comum de psicopatologia: a depressão ela se manifestará por meio de outros sintomas.
– um transtorno algumas vezes denominado A literatura terapêutica está repleta de expres-
como “o resfriado comum entre as doenças sões, como “esmurrar a almofada”, “relaxar” e
mentais”. Considere dois tratamentos que sa- “botar pra fora”, que ilustram esse tipo de pen-
bemos ser efetivos: terapia cognitivo-compor- samento (Seligman, 2002a). No entanto, essa
tamental e uso de inibidores seletivos da re- abordagem deixa a psicoterapia atual em gran-
captação da serotonina como Prozac, Zoloft e de parte como uma ciência da vitimologia que
Lexapro. Cada tratamento produz uma taxa de retrata os clientes como respondentes passivos
resposta de aproximadamente 65%, e sabemos às circunstâncias. Impulso, instinto e necessi-
que essa resposta incorpora um efeito place- dade criam conflitos inevitáveis que podem
bo que varia de 45 a 55% (p. ex., Rief et al., ser aliviados apenas parcialmente por meio do
2011); quanto mais realista o placebo, maior desabafo. Em nossa opinião, desabafar é, na
a resposta ao placebo. Esses números ocor- melhor das hipóteses, um remédio cosmético e,
rem repetidamente. Uma revisão metanalítica na pior das hipóteses, um tratamento que pode
recente de 30 anos de ensaios randomizados desencadear raiva amplificada, ressentimento e
de antidepressivos controlados com placebo doença cardíaca (Chida & Steptoe, 2009).
documenta que uma alta porcentagem do efei-
to do tratamento pode ser atribuída à resposta
ALTERNATIVAS ÀS ABORDAGENS
ao placebo (Kirsch et al., 2002; Undurraga &
PSICOTERÁPICAS TRADICIONAIS
Baldessarini, 2017).
Por que existe uma barreira de 65% e por Aprender a funcionar bem em face do sofri-
que os efeitos específicos da terapia são tão pe- mento psicológico é uma abordagem alternati-
quenos? Acreditamos que isso ocorra porque va que é adotada pela PPT. Depressão, ansieda-
a mudança comportamental é difícil para as de e raiva frequentemente resultam de traços de
pessoas em geral e especialmente difícil para personalidade herdados que podem ser melho-
os clientes que estão buscando terapia, que po- rados, mas não eliminados. Todas as emoções
dem não ter motivação, que têm comorbidades negativas e traços de personalidade negativos
ou que vivem em ambientes insalubres que não têm fortes fronteiras biológicas, e é irrealista
são suscetíveis à mudança. Em consequência, esperar que a psicoterapia possa ultrapassar
muitos clientes continuam a se comportar de esses limites. O melhor que a terapia tradicio-
maneiras arraigadas e mal-adaptativas, e a no- nal pode fazer com sua abordagem paliativa

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é ajudar os clientes a viver na parte superior coterapia, não pode ser plenamente atingida
dessas variações de depressão, ansiedade ou por meio da estrutura tradicional orientada
raiva. Considere Abraham Lincoln e Winston para o déficit. Por exemplo, em um estudo
Churchill, duas figuras históricas que sofreram que controlou essas características negativas,
de doença mental grave (Pediaditakis, 2014). os pesquisadores encontraram que pessoas
Ambos eram seres humanos com funcionamen- que tinham poucas características positivas
to incrivelmente alto que desempenhavam bem (p. ex., esperança e otimismo, autoeficácia
apesar de vivenciarem problemas significativos e gratidão) tinham risco duas vezes maior
de saúde mental. Talvez eles funcionassem bem de desenvolver depressão (Wood & Joseph,
porque utilizavam seus pontos fortes. A psico- 2010). Da mesma forma, a presença de for-
terapia precisa desenvolver intervenções que ças de caráter (p. ex., esperança; apreciação
ensinem os clientes a utilizar suas forças para da beleza e excelência; e espiritualidade) de-
funcionarem bem na presença de sintomas. Es- monstrou prestar uma contribuição significa-
tamos convencidos de que a PPT pode ajudar tiva para recuperação de depressão (Huta &
os clientes a funcionar bem e possivelmente Hawley, 2008). Esperança e otimismo (Carver,
romper a barreira dos 65%. Scheier, & Segerstrom, 2010), além de gra-
Há outra razão essencial para desafiar e tidão (Flinchbaugh, Moore, Chang, & May,
mudar as abordagens tradicionais da psicote- 2012), demonstraram conduzir a níveis mais
rapia. Uma boa vida, o objetivo final da psi- baixos de estresse e depressão.

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