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GUIÃO DE EDUCAÇÃO

GÉNERO E
CIDADANIA
Pré-escolar
Maria João Cardona (coord.), Conceição Nogueira
Cristina Vieira, Marta Uva, Teresa-Cláudia Tavares
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Maria João Cardona (coord.), Conceição Nogueira,


Cristina Vieira, Marta Uva, Teresa-Cláudia Tavares

Lisboa, 2015
Podem ser reproduzidos pequenos excertos desta publicação,
sem necessidade de autorização, desde que se indique a respetiva fonte.
O conteúdo apresentado não exprime necessariamente a opinião
da Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género.

Guião de educação género e cidadania: pré-escolar

Maria João Cardona (coord.), Conceição Nogueira, Cristina Vieira, Marta Uva e Teresa-Claúdia Tavares

Sílvia Castro

Teresa Vasconcelos e Teresa Joaquim

Marta Gonçalves

Divisão de Documentação e Informação e Núcleo para a Promoção da Cidadania e Igualdade de Género, CIG

1.ª edição 2010; 2.ª edição 2015

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Editorial do Ministério da Educação e Ciência

978-972-597-401-8 (impresso) | 978-972-597-402-5 (pdf)

Validado pela DGIDC/ME


Também disponível em: http://www.cig.gov.pt/documentação-de-referencia/doc/
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V
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Com a reedição dos Guiões de Educação Género e Cidadania, pretende a Comissão para a Cidadania
e a Igualdade de Género (CIG) responder à crescente e generalizada utilização destes materiais na
prática docente e às inúmeras solicitações dos mesmos por parte de escolas, bibliotecas, instituições
de ensino superior e outras organizações, públicas e privadas, de âmbito educativo e formativo, e
profissionais de educação e/ou de formação, de todos os níveis de ensino. Face ao impacto dos
Guiões no sistema educativo, estes foram considerados pela Comissão Europeia, em 2012, uma Boa
Prática em Género e Educação, publicando a CIG, em 2013, no seu sítio web, a versão digital em inglês
dos Guiões destinados ao pré-escolar e ao 3.º ciclo do ensino básico. Em 2015, foi a vez do Conselho
da Europa integrar estes materiais nas Boas Práticas no combate aos estereótipos de género na e
através da educação.

Os Guiões de Educação Género e Cidadania, cuja publicação se iniciou em 2010, constituem uma
iniciativa da CIG, apoiada, no quadro do QREN, pelo POPH, através do Eixo 7 – Igualdade de Género,
no que se refere à sua conceção e publicação, e acompanhada pela Direção Geral de Educação (DGE)
que validou a adequação do seu conteúdo às orientações curriculares do Ministério da Educação.

Destinando-se à educação formal, os Guiões são instrumentos de apoio para profissionais de educação
de todas as áreas curriculares, disciplinares e não disciplinares, e de todos os tipos e/ou modalidades
de ensino. A finalidade destes Guiões é a integração da dimensão de género nas práticas educativas
formais e nas dinâmicas organizacionais das instituições educativas, com vista à eliminação gradual dos
estereótipos sociais de género que predefinem o que é suposto ser e fazer um rapaz e uma rapariga.
Pretende-se, assim, contribuir para tornar efetiva a educação para a cidadania para raparigas e para
rapazes, garantindo que a educação, e a cidadania como uma das suas áreas transversais, se
configure e estruture a partir, entre outros, do eixo das relações sociais de género, visando uma
verdadeira liberdade de escolha dos percursos académicos e profissionais e dos projetos de vida por
parte, quer de raparigas, quer de rapazes.

A produção destes Guiões enquadra-se nos compromissos internacionais assumidos por Portugal,
inscrevendo-se, nomeadamente, nos Objetivos Estratégicos da Plataforma de Ação de Pequim (1995)
relativos à educação1 e na Convenção Sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação
Contra as Mulheres (Convenção CEDAW)2, e constituindo uma resposta às Recomendações dirigidas a
Portugal por este Comité, em novembro de 2008. A nível nacional, os Guiões respondem às medidas
da área da educação previstas nos Planos Nacionais para a Igualdade (PNI) que têm abrangido
vertentes como a orientação escolar e profissional, o currículo, a organização escolar, a prevenção da
discriminação sexual, o combate à violência de género e a formação, inicial e contínua, de profissionais
de educação. Os Guiões respondem, ainda, às Recomendações para um Plano de Ação de Educação
e de Formação para a Cidadania emanadas do Fórum de Educação para a Cidadania, em 20083.
Decorrendo das responsabilidades da CIG que, por força da sua Lei Orgânica de 2007, passou a ter
competências na área da educação para a cidadania, os Guiões traduzem também a intervenção da
CIG nesta área enquanto Mecanismo Nacional para a Igualdade entre Mulheres e Homens.

1
Objetivo Estratégico B.4, “Desenvolver uma educação e formação não discriminatórias”, cujas medidas foram retomadas
em 2000, nas Iniciativas e Ações futuras. Igualdade de Género, Desenvolvimento e Paz para o século XXI, aquando da
avaliação do progresso da Plataforma de Ação.
2
No que se refere ao art.º 5.º e principalmente ao art.º 10.º relativo à Educação.
3
Em especial no que se refere aos Objetivos Estratégicos 4, 5 e 6. O Fórum decorreu entre 2006 e 2008 e foi promovido
pela Ministra da Educação e pelo Secretário de Estado da PCM.

VII
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Os Guiões de Educação Género e Cidadania inscrevem-se na linha de atuação da Comissão que


sempre elegeu a educação como área de intervenção prioritária, nela desenvolvendo uma atividade
estrategicamente conduzida, assente em projetos de intervenção delineados e concretizados de
forma articulada, numa lógica de continuidade, consolidação e avaliação de resultados, identificação
de resistências, lacunas e respostas às mudanças do sistema educativo e à evolução das práticas de
profissionais de educação. Da ação desenvolvida pela Comissão resultou, entre outras, a criação de
uma Rede Nacional informal (a Rede Coeducação) de especialistas, investigadoras e investigadores
em Género, Educação e Formação, docentes do ensino superior e não superior e elementos de
ONG. Esta Rede é, hoje, um recurso nacional incontornável para uma intervenção na educação, no
domínio da igualdade de género, fundada em rigor, adequação e sustentabilidade científica e
pedagógica. A ela pertencem muitos dos elementos da equipa que concebeu estes Guiões.

A elaboração dos Guiões foi acompanhada por ações complementares, de formação de docentes
em 2008/09 e de intervenção em escolas-piloto, onde se auscultaram profissionais de educação
(educadoras e educadores de infância, docentes e psicólogas/os), tendo participado neste processo
escolas do Grande Porto, da Grande Lisboa, de Santarém e de Setúbal4.

A par do rápido e crescente sucesso dos Guiões de Educação Género e Cidadania junto das e dos
profissionais de educação de infância e dos ensinos básico e secundário, a procura de formação por
este grupo profissional tem aumentado de forma significativa. Deste modo, e tal como previsto nos IV
e V PNI, a formação contínua de docentes para a aplicação, efetiva e integrada, destes materiais na
prática pedagógica tem constituído, desde 2011, uma aposta da CIG concretizada5 através da
colaboração com elementos da Rede Coeducação e as respetivas instituições de ensino superior, de
norte a sul do país6, com a Direção Geral de Educação e, mais recentemente, com algumas
autarquias no quadro dos respetivos Planos Municipais para a Igualdade7.

Os Guiões de Educação Género e Cidadania têm, assim, constituído um valioso e inestimável meio de
concretização do mainstreaming de género no sistema educativo e nos seus diferentes contextos –
da sala de aula e das aprendizagens disciplinares aos projetos de escola e às aprendizagens
transversais, em especial as globalmente integradas na educação para a cidadania (de que são
exemplo a saúde, as tecnologias e a liderança, entre outras).

Uma última nota sobre a utilidade destes Guiões. Tal como tem sido reiterado pela ONU, através do
Comité CEDAW, pelo Conselho da Europa e pela União Europeia, não basta produzir bons materiais
sobre género e educação. É imprescindível uma aposta efetiva, exigente e continuada na formação
de profissionais de educação para que a aplicação destes materiais se concretize, respeitando-se os
objetivos para que foram criados, e para que a sua aplicação tenha um impacto real junto das
crianças e jovens de ambos os sexos a quem se destinam, não apenas no seu percurso escolar, mas
durante toda a sua vida, enquanto pessoas e enquanto elementos de pleno direito em todas as
comunidades a que pertencerem.

&RPLVVmRSDUDD&LGDGDQLDHD,JXDOGDGHGH*pQHUR

4
Jardins de Infância Rossio do sul do Tejo, de Mora, n.º 1 de Rio Maior, da Póvoa de Santarém, de S. Domingos, das
Fontainhas e da Portela das Padeiras, CSIS – Unidade S. Domingos, EDUCOR, Escolas Secundárias Sebastião da Gama
e de Oliveira do Douro; Escolas EB 2/3 do Cerco e de Rio Tinto n.º 2 e Escola Secundária com 2.º e 3.º ciclos Professor
Reynaldo dos Santos.
5
56 ações de formação cobrindo todo o país.
6
Institutos Politécnicos de Santarém, Setúbal, Portalegre e Lisboa, através das respetivas Escolas Superiores de Educação,
e Universidades Aberta e do Minho, Porto, Coimbra, Beira Interior e Évora.
7
Merecem destaque as Câmaras Municipais do Seixal, de Sintra e da Figueira da Foz.

VIII Lisboa, CIG, 2015


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001
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(VWDSXEOLFDomRSUHWHQGHDSRLDUDV fundamentos do trabalho sobre questões de
género e cidadania na educação, versando a
SUiWLFDVHGXFDWLYDVDGHVHQYROYHUSRU
especificidade deste trabalho na educação de
HGXFDGRUHVHHGXFDGRUDVGHLQIkQFLD infância.
UHODWLYDPHQWHDRWUDEDOKRVREUHJpQHUR Na segunda parte apresentamos sugestões
HFLGDGDQLDFRPDVFULDQoDV$VTXHVW}HV práticas, considerando a organização do
ambiente educativo e o trabalho com as
UHODWLYDVDRJpQHURHjFLGDGDQLDHQWUDP
famílias. Exemplificamos projetos a trabalhar
QDYLGDGDVLQVWLWXLo}HVGHHGXFDomRGH transversalmente ou nas várias áreas de
LQIkQFLDWUD]LGDVSHODVFULDQoDVID]HP conteúdo; projetos originados quer por
SDUWHGRTXRWLGLDQR1RHQWDQWRQmRp situações do quotidiano, quer por propostas
feitas pela educadora ou pelo educador.
IiFLODVXDDERUGDJHPVmRPXLWDVYH]HV
Todas as sugestões apresentadas são apenas
³HVTXHFLGDV´$VXDFRPSOH[LGDGHD exemplos, pontos de partida para novas
IDOWDGHDSRLRHPWHUPRVGHIRUPDomR propostas. Com efeito, se a especificidade de
GDGDDHGXFDGRUHVHHGXFDGRUDV cada contexto deve ser sempre considerada,
quando se abordam temáticas como o género
DIDOWDGHUHFXUVRVHGHELEOLRJUD¿D
e a cidadania a atenção a esta especificidade
UHWLUDPDRWUDEDOKRVREUHHVWHVFRQWH~GRV toma particular importância, dada a
DDWHQomRQHFHVViULD$OpPGLVVR±GH complexidade destas temáticas e a forma como
DFRUGRFRPDV2ULHQWDo}HV&XUULFXODUHV são condicionadas pela diversidade sociocultural
que caracteriza a vida das crianças.
GH¿QLGDVSDUDDHGXFDomRSUpHVFRODU
0( ±HVWHVFRQWH~GRVLQWHJUDPVH De acordo com a legislação em vigor no
QDiUHDIXQGDPHQWDOGDIRUPDomR nosso país, a “educação pré-escolar” refere-se
SHVVRDOHVRFLDO2IDFWRGHHVWDiUHDWHU apenas às crianças a partir dos 3 anos, sendo
as Orientações Curriculares definidas pelo
XPFDUiFWHUWUDQVYHUVDOQmRIDYRUHFH
Ministério da Educação destinadas apenas a
DLQWHQFLRQDOLGDGHHGXFDWLYDTXH este grupo etário.
LPSRUWDQWHHPWRGRVQtYHLVGHHQVLQR Nesta publicação tivemos sobretudo em
GHYHSUHGRPLQDUQDHGXFDomRGDV conta as crianças dos 3 aos 6 anos, idade de
ingresso na escola obrigatória. No entanto,
FULDQoDVSHTXHQDV
optámos por utilizar preferencialmente a mais
abrangente expressão “educação de infância”, já

)
que o trabalho realizado pelo/a educador/a em
oi para ajudar a superar estas dificul- creches (portanto antes da entrada na educação
dades que surgiu o presente guião. pré-escolar) deve integrar atentamente esta
Numa primeira parte refletimos dimensão, presente desde que as crianças
sobre os principais conceitos e nascem.

por: Maria João Cardona (coord.), Cristina Vieira, Marta Uva e Teresa-Cláudia Tavares 003

(QTXDGUDPHQWR
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$GLYHUVLGDGHGHFDUDFWHUtVWLFDVGRV desigualdade qualitativa: elas já são mais


KRPHQVHGDVPXOKHUHVFRQVWLWXL numerosas do que eles na escola, mas
ensino misto e coeducação estão longe
XPPDQDQFLDOGHUHFXUVRVGHWDO
de ser conceitos sinónimos; no mundo
PDQHLUDYDOLRVRTXHDWUDMHWyULDGH profissional existem ainda disparidades
FDGDSHVVRDDRORQJRGRVHXFLFORGH salariais em muitos sectores de atividade,
YLGDHVWiFRQWLQXDPHQWHHPDEHUWR persistem os chamados tetos de vidro na
FRQVWUXLQGRVHHPIXQomRGHXPD ascensão profissional, as jovens mulheres
recém-licenciadas têm mais dificuldade
PXOWLSOLFLGDGHGHIDWRUHVKLVWyULFRV
de acesso ao emprego do que os seus
HFRQWH[WXDLV(VWDVSRVVLELOLGDGHVGH colegas do sexo masculino e o desemprego
GHVHQYROYLPHQWRHGHDSUHQGL]DJHP afeta-as mais. Para além desta situação,
WrPVLGRQRHQWDQWRKLVWRULFDPHQWH o discurso sobre a conciliação entre a vida
UHVWULQJLGDVVHPSUHFRPEDVHQD doméstica e a carreira continua a existir
associado essencialmente às mulheres
GHIHVDGHHVWHUHRWLSLDVDUFDLFDV
que, na realidade (seja em termos das
FRQGXFHQWHVDGHVLJXDOGDGHVH tarefas domésticas, ou do cuidado aos
GLVFULPLQDo}HVSHQDOL]DGRUDVHP filhos e a familiares dependentes), são
PDLRUHVFDODSDUDRVH[RIHPLQLQR de uma forma geral as garantes da vida
quotidiana das famílias, vendo a sua saúde
física e psicológica posta em risco por esta

8
real sobrecarga. Finalmente, as mulheres,
ma leitura desatenta das se bem que agora mais presentes na
estatísticas atuais relativas vida pública, continuam minoritárias em
à situação das mulheres e posições onde o poder importa e o estatuto
dos homens ocidentais faz socioeconómico é fundamental. A atual
crer que a igualdade entre homens e Lei da Paridade (Lei Orgânica n.º 3/2006, de
mulheres está praticamente conseguida. 21 de agosto) poderá alterar esta situação,
Porém, a aparente igualdade quantitativa mas, ainda assim, muito será necessário
em alguns sectores escamoteia a real fazer para que elas se encontrem igualmente

por: Cristina Vieira (coord.), Conceição Nogueira e Teresa-Cláudia Tavares 007


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representadas e todos os seus talentos entre os principais agentes de mudança,


sejam de igual forma valorizados. contribuindo, “juntamente com outros
intérpretes sociais, para a construção
Embora as mulheres sejam, efetivamente, da realidade”, como escreveram Gisela
a face legitimamente mais visível da Tarizzo e Diana Marchi (1999: 6). Por esse
batalha pela igualdade de direitos e motivo, deve desempenhar o seu papel
oportunidades, é indubitável que um na eliminação das desigualdades entre
tratamento produtivo desta problemática homens e mulheres que continuam a
deve incluir também a consciência do prevalecer. Isto pode conseguir-se através
impacto que estas desigualdades de boas práticas de cidadania ativa e
acarretam para o sexo masculino. democrática, que possam ser aprendidas
São disso bastante expressivos factos na escola a par dos conteúdos do currículo
como: a maior taxa de formal. Para o alcance
abandono escolar dos $/HL2UJkQLFDQžGH dos objetivos que
rapazes, sobretudo no GH DJRVWR GHVLJQDGD SRU /HL GD norteiam a efetiva
ensino secundário; realização desta
3DULGDGHHVWDEHOHFHTXHDVOLVWDV
o número e a gravidade cidadania ativa é
dos acidentes de viação SDUDD$VVHPEOHLDGD5HS~EOLFD necessário que a escola
dos rapazes na SDUD R 3DUODPHQWR (XURSHX H assuma também a
adolescência, associados SDUD DV DXWDUTXLDV ORFDLV VmR responsabilidade de se
a uma pressão societal FRPSRVWDV GH PRGR D DVVHJXUDU tornar um local
para uma forma de privilegiado de partilha,
D UHSUHVHQWDomR PtQLPD GH 
masculinidade de cooperação e de
hegemónica que também GRVH[RPHQRVUHSUHVHQWDGR educação para a
os constrange; e a falta participação. Uma
de autonomia a nível da realização escola democrática é
de tarefas domésticas, limitação essa uma organização de liberdade, capaz de
subjacente às razões alegadas pelos oferecer resistência contra o autoritarismo,
homens para o casamento na sequência a opressão e todas as formas de
de um primeiro divórcio ou viuvez, ou ainda discriminação baseadas no sexo, na classe,
à decisão de alguns idosos (do sexo na raça/etnia, na orientação sexual, na
masculino) saudáveis de passarem a viver religião, na cultura. É uma escola que supera
em instituições quando ficam sozinhos. preconceitos e estereótipos. Uma cidadania
Pelo exposto, importa trabalhar no sentido ativa numa sociedade cada vez mais plural
da construção de um mundo onde homens implica a aceitação do valor da igualdade
e mulheres possam viver em igualdade, dos direitos e dos deveres para todos e
sem constrangimentos a todas as suas todas, implica um compromisso genuíno
aspirações e com garantias de com a sociedade na sua diversidade, o
oportunidades de exercício dos seus respeito crítico pelas culturas, crenças,
múltiplos talentos1. religiões etc., e implica também abertura
à solidariedade pela diferença, rejeitando
A escola, para além de ser um local de qualquer tipo de exploração – racismo,
compreensão e de preparação de rapazes sexismo… enfim, recusando a discriminação
e raparigas para a vida, deverá estar sob qualquer forma.

1
Estas problemáticas são aprofundadas, neste Guião, no capítulo “A transversalidade do género na intervenção educativa”.

008 Lisboa, CIG, 2015


(148$'5$0(1727(Ï5,&2_*pQHURH&LGDGDQLD

Apesar das múltiplas discri-


minações existentes, vamos
centrar-nos neste guia nas ³ ©0DV©D©DSOLFDomR©FRUUHWD©GR©SULQFtSLR©GD©LJXDOGDGH©H[LJH©TXH©
VH©WUDWH©GH©PRGR©LJXDO©R©TXH©p©LJXDO©H©GH©PRGR©GLIHUHQWH©R©TXH©p©
questões da igualade
GLIHUHQWH©'HVGH©TXH©VH©YHUL½TXHP©VLWXDo}HV©GH©GHVLJXDOGDGH©j©
entre homens e mulheres e
SDUWLGD©KDYHUi©TXH©FRUULJLU©HVVD©GHVYDQWDJHP©LQLFLDO©DWUDYpV©GH©
por isso na erradicação do Do}HV©SRVLWLYDV©TXH©SURFXUDQGR©DQXOiõOD©FULHP©FRQGLo}HV©SDUD©

´
sexismo, conceito que XPD©UHDO©LJXDOGDGH©GH©RSRUWXQLGDGHV
abrange todos os
(OLDQH©9RJHOõ3ROVN\©©
preconceitos e formas de
discriminação exercidas
contra um indivíduo devido
ao respetivo sexo. Temos
bem presente que há uma Amâncio (1994), perpassa Encontra-se dividido em
multiplicidade de discrimina- toda a sociedade e sete secções articuladas
ções que se podem cruzar e conduz à emergência de entre si. Numa primeira
produzir formas de estereótipos, preconceitos secção é feita uma tentativa
desigualdade particulares. e discriminações que de clarificação dos termos
Não esquecemos, como afetam prioritariamente sexo e género, a que
advertiu Conceição Nogueira as mulheres. Importa por se segue uma reflexão
(2009), essas formas isso clarificar conceitos, sobre a importância do
interseccionais de viver as mapear argumentos e género enquanto categoria
múltiplas discriminações diferentes posicionamentos social desde a primeira
(como acontece, por para que este fenómeno do infância. Logo em seguida,
exemplo, no caso de jovens sexismo possa ser pensado, analisa-se sob o ponto
raparigas provenientes de repensado e, quando de vista psicológico a
classes desfavorecidas ou interrelacionado com outras formação e consolidação
de etnias não dominantes); categorias de pertença da identidade de género
elas estão presentes ao que acarretam também nos primeiros anos de
longo deste trabalho, mesmo discriminações, analisado na vida. O conhecimento dos
mesmo que nem sempre sua inerente complexidade. estereótipos de género,
nomeadas. Apenas por por parte das crianças, e
razões de ordem prática nos Este capítulo constitui a adoção dos mesmos
centraremos essencialmente a parte introdutória de com a idade, são aspetos
na categoria de sexo (homens um Guião destinado à tratados na parte seguinte.
e mulheres) que tende a promoção da igualdade O capítulo termina com uma
fomentar uma visão dos dois de género no âmbito reflexão sobre o que é a
sexos como opostos. de diferentes espaços cidadania, sobre a relação
educativos formais, com entre género e cidadania e
Esta divisão, assimétrica especial ênfase no ensino sobre as formas de praticar
do ponto de vista simbólico, pré-escolar e no terceiro uma verdadeira educação
no entender de Lígia ciclo do ensino básico. para a cidadania.

por: Cristina Vieira (coord.), Conceição Nogueira e Teresa-Cláudia Tavares 009


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2
sexo de uma criança é sem dúvida mulheres em termos pessoais e sociais, a partir
um fator importante para o seu do conhecimento da sua categoria biológica
desenvolvimento. Não é por acaso de pertença, abriu caminho a raciocínios
que uma das primeiras perguntas simplistas de explicação dos comportamentos
que se faz às mães e aos pais quando uma individuais, à crença na estabilidade dos
criança acaba de nascer é se é menina ou atributos individuais e à ideia de que seria
menino. O próprio nome que se escolhe para “normal” que os seres masculinos tivessem
o/a bebé deixa antever o seu sexo e a presença certas características psicológicas e os seres
de um/a bebé ou de uma criança em relação à femininos evidenciassem outras, distintas. Para
qual se desconhece o sexo suscita sentimentos além desta visão dicotómica não ter qualquer
de desconforto naqueles que a rodeiam. Ainda fundamento científico – sendo por isso de toda
que nos primeiros meses de vida as crianças de
ambos os sexos tenham características físicas
semelhantes, a mãe e o pai começam logo
a construir o género do/a bebé: dão-lhe um
nome, vestem-no/a de cores diferentes e criam
³ © $FUHGLWDõVH© TXH© RV© EULQTXHGRV© RIHUHFLGRV© jV©
PHQLQDV© FRQMXQWRV©GH©SDQHODV©H©WDFKRV©ERQHFDV©
um espaço físico de tal forma distintivo que é H© ERQHFRV© HOHWURGRPpVWLFRV© HP© PLQLDWXUD©
fácil para um/a observador/a externo/a adivinhar HVWRMRV©GH©FDEHOHLUHLUD©NLWV©GH©PDTXLOKDJHP©HWF ©
XPD© YH]© TXH© WrP© XPD© ½QDOLGDGH© KDELWXDOPHQWH©
se o/a bebé em questão é do sexo masculino
SUHYLVWD©IRPHQWDP©QHODV©XPD©PHQRU©FULDWLYLGDGH©
ou do sexo feminino. Assim sendo, podemos
GR© TXH© RV© EULQTXHGRV© RIHUHFLGRV© DRV© UDSD]HV©
afirmar que o sexo, para além de ser um fator
SLVWDV© GH© FDUURV© OHJRV© FRQVWUXo}HV© ERODV©
biológico, é também um fator social e cultural,
WUDQVSRUWHV© HP© PLQLDWXUD© HWF © 2V© VHJXQGRV©
uma vez que as pessoas tendem a reagir de SHOR© IDFWR© GH© QmR© WHUHP© XPD© XWLOLGDGH© WmR© SUHõ
maneira diferente perante uma criança do sexo GH½QLGD© WHQGHP© D© VHU© PDLV© IRPHQWDGRUHV© GD©
masculino ou do sexo feminino. Reações FULDWLYLGDGH© H© LQFOXVLYH© GH© XPD© PDLRU© RFXSDomR©
essas diferentes não só ao nível de aspetos GR© HVSDoR© FLUFXQGDQWH© (VWD© GHVLJXDOGDGH©
concretos, como a oferta de brinquedos, mas QD© HVWLPXODomR© FRJQLWLYD© GHVSROHWDGD© SHORV©
também ao nível da formação de expectativas EULQTXHGRV© SRGHUi© UH¾HWLUõVH© PDLV© WDUGH© GH©
de desempenho, da expressão de elogios IRUPD©GLIHUHQWH©HP©DPERV©RV©VH[RV©HP©DVSHWRV©
e encorajamentos, do estabelecimento WmR©GLYHUVRV©FRPR©D©FDSDFLGDGH©GH©UHVROXomR©GH©
de interações verbais e não-verbais e da SUREOHPDV©D©DSHWrQFLD©SDUD©HQIUHQWDU©GHVD½RV©D©
linguagem utilizada. DXWRFRQ½DQoD© SDUD© D© H[SORUDomR© DXWyQRPD© GR©
HVSDoR©HWF
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-HDQQH©%ORFN©
Esta caracterização (que podemos apelidar
de quase “automática”) dos homens e das

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(148$'5$0(1727(Ï5,&2_*pQHURH&LGDGDQLD

a conveniência examinar e não tem sido sinónimo de que norteiam este Guião,
refletir em torno da origem diversidade, mas sim de parece-nos extremamente
das eventuais diferenças desigualdade, de hierarquia pertinente e útil, para uma
entre homens e mulheres – a e de posse dissemelhante de atuação pedagógica que
discussão desta problemática poder e de estatuto social. contrarie preconceitos e
ganha ainda maior relevância Neste enquadramento, e discriminações, a distinção
se pensarmos que a diferença tendo presentes os objetivos entre sexo e género.

³ © 8P© FDWiORJR© LQWLWXODGR© ±)HVWD© GRV© EULQTXHGRV²© GLIXQGLGR© SRU© XP© KLSHUPHUFDGR© QR© SHUtRGR© GH©
1DWDO©  ©DSUHVHQWD©RV©DUWLJRV©RUJDQL]DGRV©HP©YiULRV©FDStWXORV©HQWUH©RV©TXDLV©DQDOLViPRV©GRLV©TXH©
FRUUHVSRQGHP©jV©VHJXLQWHV©GHVLJQDo}HV
§©0HQLQD© ©SiJLQDV ©©©§©5DSD]© ©SiJLQDV 
3DVVDQGR© DR© ODGR© GDV© TXHVW}HV© OLQJXtVWLFDV© PHQLQD© YV© UDSD] © DSUHVHQWDPRV© D© VHJXLU© D© OLVWD© GRV©
EULQTXHGRV©LQFOXtGRV©HP©FDGD©XP©GHVVHV©GRLV©LWHQV©  
8P©EULQTXHGR©QmR©p©XP©REMHWR©QHXWUR©p©XP©YHtFXOR©GH©VLPXODomR©H©GH©DSUHQGL]DJHP©GD©YLGD©DGXOWD©
HQFDPLQKD© RV© FRPSRUWDPHQWRV© H© DV© SUiWLFDV© VRFLDLV© H© FXOWXUDLV© GH½QH© OXJDUHV© QD© FRPXQLGDGH© H© QD©
IDPtOLD©1HVWD©yWLFD©TXH©LQIRUPDomR©QRV©WUDQVPLWH©R©FDWiORJR©GR©KLSHUPHUFDGR"©©

Feminino Masculino
Brinquedo n.º de vezes Brinquedo n.º de vezes
Boneca bebé 24 Motorizada 3
Banheira para bebé 3 Figuras espaciais 2
Alcofa para bebé 5 Nave espacial 1
Cadeira para bebé 1 Robots 5
Carro para bebé 6 Heróis de BD e cinema 21
Casa das bonecas 2 Avião de guerra 2
Baloiço para boneca 1 Viaturas de heróis 2
Boneca adulta – tipo “Barbie” 10 Hidrojet 1
Casa da boneca 5 Submarino 1
Automóveis para boneca adulta 2 Porta-aviões 1
Boneco adulto – tipo “Ken” 1 Pista de carros 4
Parque infantil para boneca 2 Garagem 5
Escola e enfermaria 1 Conjunto de carrinhos 3
Consultório de pediatra 1 Jipe 1
Castelo encantado / palácio 4 Helicóptero 2
Acessórios de toilette 3 Carro teleguiado 24
Cozinha / equipamento de cozinha 5 Gruas 2
Supermercado/produtos 2 Comboio elétrico 2
Bonecos Disney 2
Maleta de teatro 1
Secretária 1
Patins 2

3HUPLWHõQRV©GHWHWDU©GRLV©SHU½V©GLVWLQWRV©XP©HQFDPLQKD©DV©FULDQoDV©SDUD©D©PDWHUQLGDGH©SDUD©DV©WDUHIDV©
GRPpVWLFDV© H© SDUD© D© HVWpWLFD© GR© FRUSR© RXWUR© DSRQWD© FODUDPHQWH© SDUD© D© WHFQRORJLD© LQFOXLQGR© DOJXQV©
HOHPHQWRV©GH©YLROrQFLD©RX©SHOR©PHQRV©GH©FRQ¾LWXRVLGDGH
,VDEHO©0DUJDULGD©$QGUp©©õ
´

por: Cristina Vieira (coord.), Conceição Nogueira e Teresa-Cláudia Tavares 011


0
*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3Up(VFRODU

2© WHUPR© VH[R© p© XVDGR© SDUD© GLVWLQJXLU© RV© de região para região, e são ainda sujeitos a
LQGLYtGXRV©FRP©EDVH©QD©VXD©SHUWHQoD©D©XPD© readaptações de acordo com outras variáveis,
GDV© FDWHJRULDV© ELROyJLFDV© VH[R© IHPLQLQR© H©
como a classe social, a idade, a etnia e a
VH[R©PDVFXOLQR
religião.
2© WHUPR© JpQHUR© p© XVDGR© SDUD© GHVFUHYHU©
LQIHUrQFLDV© H© VLJQL½FDo}HV© DWULEXtGDV© DRV© O estudo da importância do género para a
LQGLYtGXRV© D© SDUWLU© GR© FRQKHFLPHQWR© GD© VXD© compreensão da vida individual de homens
FDWHJRULD©VH[XDO©GH©SHUWHQoD©7UDWDõVH©QHVWH© e de mulheres tem despertado a atenção de
FDVR© GD© FRQVWUXomR© GH© FDWHJRULDV© VRFLDLV© cientistas com origens teóricas diversas que,
GHFRUUHQWHV© GDV© GLIHUHQoDV© DQDWyPLFDV© H©
fazendo uso de abordagens e metodologias
½VLROyJLFDV
distintas, trouxeram para a discussão desta
problemática argumentos de extrema relevância,
No sentido de clarificar a ideia de que as ainda que nem sempre facilmente conciliáveis
diferenças observadas entre os sexos não entre si. Este facto tem tornado ainda mais
se justificam simplesmente pela pertença da profícuo o debate e contribuiu indubitavelmente
pessoa a uma categoria biológica presente para a compreensão da natureza socialmente
à nascença, mas que resultam sobretudo de construída do género, a qual legitimou todo um
construções culturais, Ann Oakley propôs, sistema de relações sociais – de dominação
em 1972, que se efetuasse a distinção entre e de subordinação – pautadas, ao longo da
os termos sexo e género, distinção essa que história, por desigualdades de poder tanto ao
passou a servir de referência para as Ciências nível material como simbólico, como escreveu a
Sociais. Em seu entender, o sexo com que historiadora Joan Scott (1986).
nascemos diz respeito às características
anatómicas e fisiológicas que legitimam a
diferenciação, em termos biológicos, entre
masculino e feminino. Por seu turno, o género
que desenvolvemos envolve os atributos ³ © 4XH© VLJQL½FD© ³VHU© KRPHP´© GR© SRQWR© GH©
YLVWD©VRFLDO"©
psicológicos e as aquisições culturais que o $© SHUJXQWD© p© WmR© FRPSOH[D© TXDQWR©
homem e a mulher vão incorporando, ao longo DSDUHQWHPHQWH© LQJpQXD© 3DUD© D© ODUJXtVVLPD©
do processo de formação da sua identidade, e PDLRULD©GDV©SHVVRDV©SDUD©R©QtYHO©D©TXH©QDV©
que tendem a estar associados aos conceitos &LrQFLDV© 6RFLDLV© FKDPDPRV© VHQVR© FRPXP©
de masculinidade e de feminilidade. Assim, o VHU©KRPHP©p©IXQGDPHQWDOPHQWH©GXDV©FRLVDV©
termo sexo pertence ao domínio da biologia e QmR©VHU©PXOKHU©H©WHU©XP©FRUSR©TXH©DSUHVHQWD©
o conceito de género inscreve-se no domínio yUJmRV©JHQLWDLV©PDVFXOLQRV©$©FRPSOH[LGDGH©
da cultura e remete para a construção de HQFRQWUDõVH©SUHFLVDPHQWH©QD©LQJHQXLGDGH©¯©
significados sociais. Para além das diferenças DJRUD©VLP©¯©GH©UHPHWHU©SDUD©FDUDFWHUHV©ItVLFRV©
genéticas entre os sexos, espera-se, na maior GR©FRUSR©XPD©TXHVWmR©GH©LGHQWLGDGH©SHVVRDO©
H© VRFLDO© ,VWR© SRUTXH© ³VHU© KRPHP´© QR© GLD© D©
parte das sociedades, que os homens e as
GLD© QD© LQWHUDomR© VRFLDO© QDV© FRQVWUXo}HV©
mulheres se comportem de uma maneira
LGHROyJLFDV© QXQFD© VH© UHGX]© DRV© FDUDFWHUHV©
diferente e assumam papéis distintos. Ainda na
VH[XDLV©PDV©VLP©D©XP©FRQMXQWR©GH©DWULEXWRV©
linha do pensamento da autora atrás citada,
PRUDLV© GH© FRPSRUWDPHQWR© VRFLDOPHQWH©
convém ter presente que os conceitos de VDQFLRQDGRV©H©FRQVWDQWHPHQWH©UHDYDOLDGRV©
feminilidade e de masculinidade diferem em QHJRFLDGRV© UHOHPEUDGRV© (P© VXPD© HP©

´
função de especificidades culturais, o que FRQVWDQWH©SURFHVVR©GH©FRQVWUXomR
significa que variam no espaço e no tempo,
0LJXHO©9DOH©GH©$OPHLGD©©õ
apresentando definições distintas de época
para época e, num mesmo período histórico,

012 Lisboa, CIG, 2015


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Já em 1949 Simone de evidenciar principalmente as nos homens e nas mulheres


Beauvoir falava desta semelhanças – a chamada desenvolvem-se em sintonia
legitimação da construção de perspetiva do enviesamento com uma multiplicidade de
diferenças sociais com base beta2. De facto, apesar influências que são inerentes
nas diferenças sexuais, ao de numerosos trabalhos ao processo de socialização
defender que o ser humano concluírem pela inexistência e que começam logo a partir
do sexo feminino não nasce de diferenças sexuais em do momento em que se toma
mulher, mas sim torna-se domínios como, por exemplo, conhecimento do sexo da
mulher pela incorporação o cognitivo3, outros apontam criança, ou seja, mesmo antes
de modos de ser, de papéis, para a existência de diferenças do nascimento.
de posturas e de discursos entre homens e mulheres,
condizentes com o modelo sobretudo ao nível da (VWXGRVHIHFWXDGRVFRP
de feminilidade dominante personalidade na vida adulta,
PXOKHUHVJUiYLGDVH
na cultura a que pertence. quando se pede às pessoas
GHVFULWRVSRU&DUROH
O mesmo poderá dizer-se a que se autodescrevam4 de
propósito da aprendizagem acordo com determinadas %HDO  SHUPLWLUDP
do que é ser homem por características. Certos FRQFOXLUTXHH[LVWHXPD
parte dos seres humanos que traços como independência, WHQGrQFLDSRUSDUWH
nascem do sexo masculino, competitividade, agressividade GDVIXWXUDVPmHVSDUD
os quais tendem a ser e dominância continuam a SHUFHFLRQDUHPGH
socializados de acordo com ser associados a homens,
PDQHLUDGLIHUHQWHRV
as características distintivas da reunidos sob a designação
masculinidade culturalmente de instrumentalidade PRYLPHQWRVIHWDLVHP
preponderante da sua masculina; a sensibilidade, a IXQomRGRFRQKHFLPHQWR
geração. emocionalidade, a gentileza, a GRVH[RGREHEp1RFDVR
empatia e a tendência para o GHHVWDUHPjHVSHUDGH
As investigações, sobretudo estabelecimento de relações XPUDSD]DVPXOKHUHV
de natureza psicológica e continuam a estar associadas
HPDQiOLVHWHQGLDPD
sociológica, dedicadas à às mulheres, sob a designação
descoberta de diferenças/ de expressividade feminina. GHVFUHYHURVPRYLPHQWRV
semelhanças entre homens IHWDLVFRPRYLJRURVRV
e mulheres, nem sempre Quer se dê destaque YHUGDGHLURVWUHPRUHV
têm conduzido a conclusões às eventuais diferenças GHWHUUDHFDOPRVPDV
coincidentes, e há quem tenda encontradas entre os sexos, IRUWHV&DVRDFULDQoD
a destacar sobretudo as quer se valorize a perspetiva
HPGHVHQYROYLPHQWR
diferenças entre os indivíduos que defende serem mais
– a chamada perspetiva do as semelhanças, o que é
IRVVHGRVH[RIHPLQLQR
enviesamento alfa – enquanto importante realçar é que as DVPmHVLQFOLQDYDPVH
outros/as se inclinam a características observadas DGHVFUHYrODV

2
Para a compreensão desta distinção, recomenda-se a consulta do artigo de Rachel T. Hare-Mustin e Jeanne Marecek
(1988).
3
Ver, a este propósito, as revisões de estudos específicos que foram efetuadas por Janet Hyde (1981) e por esta autora e
seus colegas (1990).
4
A revisão de estudos publicada por Alain Feingold (1994) e a investigação de doutoramento de Cristina Vieira (2003; 2006)
retratam claramente estas distinções que é possível observar entre homens e mulheres, no que concerne às suas autodes-
crições individuais.

por: Cristina Vieira (coord.), Conceição Nogueira e Teresa-Cláudia Tavares 013


0
*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3Up(VFRODU

FRPRDSUHVHQWDQGR estática, bipolar e categorial se clarificação é crucial em


PRYLPHQWRV situam dentro dos indivíduos virtude das suas implicações
PXLWRVXDYHVQmR e que os sexos são opostos5. educativas e daí ser
A continuar-se com esta necessário desconstruir
H[FHVVLYDPHQWHDWLYRV
falsa dicotomia, dividindo as toda a lógica determinista
HYLYRVPDVQmRPXLWR
características e as atividades usada para prescrever a
HQpUJLFRV em masculino e feminino, homens e mulheres atributos,
estar-se-á a transpor para competências e interesses
Além disso, as diferenças a compreensão do humano decorrentes da diferenciação
observadas dentro de cada um sistema de oposições biológica.
grupo formado com base na homólogas, como escreveu
categoria sexual (grupo das Miguel Vale de Almeida No campo da psicologia, e
pessoas do sexo masculino e (1995), como alto/baixo, no âmbito de uma tentativa
das pessoas do sexo feminino)
são mais numerosas do que
6HQVLYHOPHQWH D PHLR GR VpF ;; H SDUWLQGR GH XPD
as diferenças entre esses
mesmos dois grupos5, pelo DQiOLVH GRV FRPSRUWDPHQWRV GDV SHVVRDV DGXOWDV GD
que as categorias “mulher” FXOWXUD RFLGHQWDO  ± HVSHFLDOPHQWH GRV SDLV H GDV PmHV
e “homem” não poderão ±QDIDPtOLDHHPSHTXHQRVJUXSRVRVVRFLyORJRV7DOFRWW
continuar a ser vistas como 3DUVRQV H 5REHUW %DOHV   GHIHQGHUDP TXH D PXOKHU
homogéneas nem como
HVWDYDPDLVSUHGLVSRVWDDRHVWDEHOHFLPHQWRGHLQWHUDo}HV
passíveis de traduzir modelos
ideais e exclusivos (de VRFLDLVHjPDQXWHQomRGRVODoRVHGDKDUPRQLDIDPLOLDUHV
um grupo ou de outro) de (UD SRU LVVR VREUHWXGR H[SUHVVLYD GHL[DQGR R KRPHP
conduta. OLYUHSDUDRGHVHPSHQKRGRVSDSpLVLQVWUXPHQWDLV(QWUH
Para espelhar a diversidade RV FRPSRUWDPHQWRV PDLV WtSLFRV GRV LQGLYtGXRV GR VH[R
de formas de ser e de estar,
PDVFXOLQR HQFRQWUDYDPVH SRU H[HPSOR D RULHQWDomR
os termos deverão inclusive
SDUD R DOFDQFH GH PHWDV H R HVWDEHOHFLPHQWR GH UHODo}HV
ser formulados no plural –
mulheres e homens –, não HQWUH D IDPtOLD H R PXQGR H[WHULRU 7DO GLVWLQomR GHX
esquecendo (se o objetivo RULJHPDRDSDUHFLPHQWRGHGXDVFDWHJRULDVGHDWULEXWRVGD
for a compreensão das SHUVRQDOLGDGHTXHYLULDPDVHXXWLOL]DGDVHPRXWUDViUHDV
singularidades individuais) o SDUD FODVVL¿FDU H GLVWLQJXLU RV KRPHQV GDV PXOKHUHV
seu necessário cruzamento
ID]HQGR FRUUHVSRQGHU GLUHWDPHQWH H SHULJRVDPHQWH  D
com outras categorias
pessoais e sociais de GLVWLQomR ELROyJLFD D GLIHUHQoDV SVLFROyJLFDV LQVWUXPHQ
análise, algumas delas atrás WDOLGDGHPDVFXOLQDHH[SUHVVLYLGDGHIHPLQLQD
mencionadas.
sobre/sob, fazendo crer de compreensão do
Por esta razão, e seguindo o que a diferença estaria na comportamento dos homens
pensamento de Conceição natureza dos seres e não num e das mulheres ao longo do
Nogueira (2001), não pode processo de aprendizagem ciclo de vida, uma das visões
continuar a acreditar-se e de apropriação diferencial mais consensuais do conceito
que diferenças de natureza de normas e valores. Esta de género foi influenciada

5
Ver o trabalho de Hugh Lyntton e David Romney (1991).

014 Lisboa, CIG, 2015


(148$'5$0(1727(Ï5,&2_*pQHURH&LGDGDQLD

pelos trabalhos de Janet Spence (1985;


1993), que o considera de natureza
multidimensional e o explica recorrendo ³ ©$©PLQKD©GH½QLomR©GH©JpQHUR©WHP©GXDV©SDUWHV©
H© YiULDV© DOtQHDV© (VWmR© LQWHUOLJDGDV© PDV© VmR©
aos princípios do desenvolvimento DQDOLWLFDPHQWH© GLVWLQWDV© 2© FHUQH© GD© GH½QLomR©
humano. Quer isto dizer que ao falarmos UHVLGH© QXPD© UHODomR© FRPSOHWD© HQWUH© GXDV©
de género nos referimos a um conjunto SURSRVLo}HV©JpQHUR©p©XP©HOHPHQWR©FRQVWLWXWLYR©
de componentes que incluem, para citar GDV© UHODo}HV© VRFLDLV© EDVHDGDV© QDV© GLIHUHQoDV©
apenas algumas, a identidade de género, YLVtYHLV©GH©VH[R©H©JpQHUR©p©XPD©IRUPD©SULPiULD©GH©
a orientação sexual, os papéis de género, QRV©UHIHULUPRV©D©UHODo}HV©GH©SRGHU© ¨ ©(QTXDQWR©
as características da personalidade, as HOHPHQWR© FRQVWLWXWLYR© GDV© UHODo}HV© VRFLDLV©
competências pessoais e os interesses. EDVHDGDV©QDV©GLIHUHQoDV©VH[XDLV©JpQHUR©HQJORED©
TXDWUR©HOHPHQWRV©LQWLPDPHQWH©OLJDGRV©SULPHLUR©
RV© VtPERORV© GLVSRQtYHLV© QXPD© GHWHUPLQDGD©
No entender da autora atrás citada,
FXOWXUD©TXH©HYRFDP©P~OWLSODV© H©IUHTXHQWHPHQWH©
os aspetos que contribuem para a
FRQWUDGLWyULDV © UHSUHVHQWDo}HV© ¯© SRU© H[HPSOR©
diferenciação de cada fator integrante
(YD© H© 0DULD© FRPR© VtPERORV© GH© PXOKHU© QD©
do género possuem histórias de WUDGLomR©FULVWm©RFLGHQWDO© ¨ ©6HJXQGR©FRQFHLWRV©
desenvolvimento idiossincráticas sempre QRUPDWLYRV© TXH© DYDQoDP© LQWHUSUHWDo}HV© GRV©
distintas de pessoa para pessoa e são VHQWLGRV© GRV© VtPERORV© TXH© WHQWDP© OLPLWDU© H©
influenciados por uma multiplicidade de FRQWHU© DV© VXDV© SRVVLELOLGDGHV© PHWDIyULFDV© (VWHV©
variáveis não necessariamente relacionadas FRQFHLWRV©VmR©H[SUHVVRV©SHODV©GRXWULQDV©UHOLJLRVDV©
com o género. Para além disso, durante os HGXFDWLYDV©FLHQWt½FDV©OHJDLV©H©SROtWLFDV©H©PDQWrP©
diferentes períodos da vida de cada sujeito, WLSLFDPHQWH© D© IRUPD© GH© RSRVLo}HV© ELQiULDV©
os fatores que integram o género podem ½[DV© TXH© HVWDEHOHFHP© GH© PDQHLUD© FDWHJyULFD© H©
apresentar graus e tipos de associação LQHTXtYRFD© RV© VLJQL½FDGRV© GH© KRPHP© H© PXOKHU©
PDVFXOLQR© H© IHPLQLQR© ¨ © 2© WHUFHLUR© DVSHWR©
variados entre si.
 © LQFOX>L@© QmR© Vy© RV© ODoRV© GH© SDUHQWHVFR© FRPR©
O comportamento exibido (por homens e
WDPEpP©  ©R©PHUFDGR©GH©WUDEDOKR© ¨ ©R©VLVWHPD©
mulheres) resulta da interação complexa HGXFDWLYR© ¨ ©H©R©VLVWHPD©SROtWLFR© ¨ ©2©TXDUWR©
das suas diversas componentes de género. DVSHWR©GR©JpQHUR©p©D©LGHQWLGDGH©VXEMHWLYD©
Por este motivo, é possível observar uma $© SULPHLUD© SDUWH© GD© PLQKD© GH½QLomR© GH© JpQHUR©
considerável variabilidade – intrassexo FRQWpP© SRUWDQWR© HVWDV© TXDWUR© YHUWHQWHV© H©
e entre o sexo feminino e o masculino – QHQKXPD©GHODV©IXQFLRQD©LQGHSHQGHQWHPHQWH©GH©
quanto à constelação de características TXDOTXHU©GDV©RXWUDV©&RQWXGR©HODV©QmR©IXQFLRQDP©
congruentes com o género que cada HP©VLPXOWkQHR©FRPR©VH©XPD©IRVVH©VLPSOHVPHQWH©
pessoa é suscetível de manifestar nas R© UH¾H[R© GDV© RXWUDV© ¨ © 2© TXH© PH© SURSRQKR© p©
diferentes situações que tiver de enfrentar. WRUQDU© FODUD© H© REMHWLYD© D© IRUPD© FRPR© GHYHPRV©
DQDOLVDU© D© LQ¾XrQFLD© GR© JpQHUR© QDV© UHODo}HV©
É ainda fundamental salientar, como
VRFLDLV© H© LQVWLWXFLRQDLV© XPD© YH]© TXH© HVWD© DQiOLVH©
referiram Susan Egan e David Perry (2001),
QmR© p© QD© PDLRU© SDUWH© GRV© FDVRV© IHLWD© GH© IRUPD©
que a consistência com que os homens e
SUHFLVD© H© VLVWHPiWLFD© 8PD© WHRULD© VREUH© JpQHUR©
as mulheres apresentam comportamentos p© SRUWDQWR© GHVHQYROYLGD© QD© PLQKD© VHJXQGD©
típicos de género, em diferentes dimensões IRUPXODomR© JpQHUR© p© XPD© IRUPD© SULPiULD© GH©
(por exemplo: papéis de género, orientação GHPRQVWUDomR©GDV©UHODo}HV©GH©SRGHU©2X©PHOKRU©
sexual), poderá ser apenas modesta. GL]HQGR© R© JpQHUR© p© R© SULPHLUR© GRPtQLR© FRP© R©
Mas esta visão psicológica do género
constitui simplesmente um dos múltiplos
TXDO©RX©DWUDYpV©GR©TXDO©R©SRGHU©VH©DUWLFXOD
-RDQ©6FRWW©©õ© DGDSWDGR
´
contributos que diferentes áreas do saber
têm trazido para o debate, havendo

por: Cristina Vieira (coord.), Conceição Nogueira e Teresa-Cláudia Tavares 015


*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3Up(VFRODU

outras perspetivas feministas (mais críticas – e $ WHQGrQFLD GR SHQVDPHQWR GH VHQVR
aparentemente opostas àquelas) que defendem FRPXP p SDUD XQLIRUPL]DU D FDUDFWHUL]D
o seu relativismo e a sua natureza situacional.
omRGDVGLIHUHQWHVFRPSRQHQWHVGHJpQHUR
GH XPD SHVVRD D SDUWLU GR FRQKHFLPHQWR
Hoje em dia a perspetiva feminista mais
crítica e mais próxima das perspetivas GH DSHQDV XPD GHODV 1D VHTXrQFLD GH
pós-modernas recusa a possibilidade de HVWXGRVHIHWXDGRVSRU.H\'HDX[H0HOLVVD
discursos universalizantes e generalizáveis .LWH  IRLREVHUYDGRTXHpXPDFUHQoD
acerca do género. Esta perspetiva desafia FRUUHQWHTXHDVPXOKHUHVFRPXPDRULHQWD
o carácter natural da diferença de género,
omRKRPRVVH[XDODSUHVHQWDPFDUDFWHUtVWLFDV
sustentando que todas as características
sociais significativas são ativamente criadas WtSLFDV GRV KRPHQV H TXH RV KRPHQV FRP
e não são nem biologicamente inerentes, XPD RULHQWDomR KRPRVVH[XDO WHQGHP D
nem permanentemente socializadas ou H[LELU FRPSRUWDPHQWRV GLWRV IHPLQLQRV R
estruturalmente predeterminadas. Segundo TXH QmR FRUUHVSRQGH j UHDOLGDGH QHP
este ponto de vista, o género não é apenas
WUDGX] D GLYHUVLGDGH GH FDUDFWHUtVWLFDV GH
algo que a sociedade impõe aos indivíduos.
XPD SHVVRD LQGHSHQGHQWHPHQWH GD VXD
Mulheres e homens escolhem certas opções
comportamentais e ignoram outras e, ao fazê-lo, FDWHJRULDVH[XDO
elas e eles fazem o género. Pode dizer-se
fazer o género, isto é, comportar-se de 1D WHQWDWLYD GH FRQWUDULDU SUiWLFDV
maneira que, seja qual for a situação, sejam HUUyQHDV H GLVFULPLQDWyULDV SDUD
quais forem os atores, o comportamento dos DPERV RV VH[RV R FRPSURPLVVR EiVLFR
homens e das mulheres seja visto, em cada GH WRGDV DV IHPLQLVWDV HP GLIHUHQWHV
contexto, como adequado às expectativas de
GRPtQLRV GR FRQKHFLPHQWR WHP VLGR D
género socialmente delineadas para cada um
dos sexos. Nesta sequência, acredita-se que o OXWD SHOD SHUPDQHQWH HUUDGLFDomR GDV
género é performativo7. GHVLJXDOGDGHVGHJpQHURWHQWDQGRDFDEDU
FRP RV HQYLHVDPHQWRV TXH SUHMXGLFDP DV
Este entendimento8 sobre o que é o género PXOKHUHVPDVWDPEpPRVKRPHQV
ajuda a reconciliar os resultados empíricos,
de que mulheres e homens são mais similares
que diferentes na maioria dos traços e constrangimentos e expectativas podem ser
competências, com a perceção comum de condicionados a tomar decisões distintas
que parecem comportar-se de forma diferente. relativamente ao seu repertório de opções.
Com efeito, mulheres e homens, ainda Desta forma, ao agirem em aparente
que tenham as mesmas competências, conformidade com o que é esperado para as
ao enfrentarem diferentes circunstâncias, pessoas do seu sexo, acabam por reafirmar

7
Para um desenvolvimento suplementar deste assunto, ver os trabalhos de Judith Butler (1990; 2002; 2006).
8
Segundo Chris Beasley (1999), trata-se de uma visão influenciada pelo chamado construcionismo social, o qual apareceu
como resposta alternativa à epistemologia positivista, que defendia a existência de uma verdade fundamental na explicação
de todos os fenómenos, a qual era possível apurar através da razão. Contrariando esta posição, para os construcionistas
sociais são defensáveis, como escreveram Sara Davies e Mary Gergen (1997), os seguintes pressupostos: 1) O
conhecimento é socialmente construído; 2) Não existe uma versão única da verdade; 3) Os significados são constituídos
através do discurso; 4) Os indivíduos são vistos como passíveis de expressões múltiplas.

016 Lisboa, CIG, 2015


(148$'5$0(1727(Ï5,&2_*pQHURH&LGDGDQLD

os arranjos baseados nas categorias sexuais Passados cerca de quarenta anos desde que o
como sendo naturais, fundamentais e imutáveis, género foi identificado como uma categoria de
legitimando consequentemente a ordem social. análise, sabe-se que muito está por conseguir
no que diz respeito à igualdade entre homens e
Poder-se-ia então imaginar que a simples mulheres e às assimetrias de poder material e
mudança na forma como homens e mulheres simbólico daí recorrentes nas diversas esferas
fazem o género poderia ser o caminho para a da vida. Com base em ideias sem qualquer
transformação. No entanto, é importante ter em suporte científico, a família e todos os restantes
atenção que os constrangimentos institucionais, agentes de socialização continuam a educar
a hierarquia social e as relações sociais de de maneira diferente o rapaz e a rapariga para
poder limitam a capacidade de ação dos o desempenho dos mais variados papéis ao
indivíduos. longo da vida, como se a diferenciação biológica
determinasse as características pessoais,
as oportunidades de desenvolvimento e os
percursos de vida de uns e de outras.
³ © /RQJH© GH© D½UPDU© TXH© DV© HVWUXWXUDV©
GH© GRPLQDomR© VmR© DõKLVWyULFDV© WHQWDUHL©
HVWDEHOHFHU© TXH© VmR© XP© SURGXWR© GH© XP©
WUDEDOKR© LQFHVVDQWH© SRUWDQWR© KLVWyULFR ©
GH© UHSURGXomR© SDUD© TXH© FRQWULEXHP©
DJHQWHV© VLQJXODUHV© ¨ © H© LQVWLWXLo}HV©
³ © 2© IXQGDPHQWDO© QD© GLIHUHQFLDomR©
HQWUH© R© PDVFXOLQR© H© R© IHPLQLQR© QmR©

´
IDPtOLDV©,JUHMD©(VFROD©(VWDGR
3LHUUH©%RXUGLHX©©
VmR© RV© DWULEXWRV© TXH© DSDUHQWHPHQWH©
RV© GLVWLQJXHP© ¨ © PDV© VLP© R© IDFWR© GRV©
FRQWH~GRV©TXH©GH½QHP©D©PDVFXOLQLGDGH©
HVWDUHP© FRQIXQGLGRV© FRP© RXWUDV©
FDWHJRULDV© VXSUDRUGHQDGDV© FRPR©
D© GH© SHVVRD© DGXOWD© HQTXDQWR© RV©
Deste modo, podemos afirmar que é o VLJQL½FDGRV© IHPLQLQRV© GH½QHP© DSHQDV©
reconhecimento de que o género resulta de uma XP© FRUSR© VH[XDGR© e© QHVWH© SURFHVVR©
construção social que nos permite compreender GH© FRQVWUXomR© VRFLDO© TXH© R© VLPEROLVPR©
como a discriminação continua, apesar de todo PDVFXOLQR© VH© FRQVWLWXL© FRPR© UHIHUHQWH©
o trabalho de cientistas feministas – os/as quais, XQLYHUVDO© UHODWLYDPHQWH© DR© IHPLQLQR©
minimizando ou maximizando as diferenças, TXH© SHUPDQHFH© PDUFDGR© SHOD© FDWHJRULD©
esperavam contribuir para a eliminação das VH[XDO
´
/tJLD©$PkQFLR©©
desigualdades de género na sociedade, tanto
nos espaços públicos como no domínio privado.

³ ©$©FDWHJRULD©DQDOtWLFD©GH©JpQHUR©WRUQRXõVH©PDLV©SUHVHQWH©HP©3RUWXJDO©QRV©DQRV©©>GR©VpF©;;@©
WHQGR© FRPR© Qy© IXOFUDO© RV© DVSHWRV© UHODFLRQDLV© GD© FRQVWUXomR© VRFLDO© GR© IHPLQLQR© H© GR© PDVFXOLQR ©
7RUQRXõVH©QXPD©SDODYUD©SDVVH÷SDUWRXW©QRPHDGDPHQWH©QD©VXD©HPLJUDomR©H©WUDGXomR©HP©FRQWH[WRV©
LQVWLWXFLRQDLV© FXMD© XWLOL]DomR© ¯© QHVVD© WUDGXomR© LQVWLWXFLRQDOL]DGD© ¯© p© PXLWDV© YH]HV© LQGHYLGD© SRU©
HVFDPRWHDU©D©FUtWLFD©TXH©HVVD©FDWHJRULD©DQDOtWLFD©LPSOLFD©SRGHQGRõVH©ID]rõOD©³GHVSROLWL]DU´©D©OXWD©GDV©
PXOKHUHV
´
7HUHVD©-RDTXLP©©

por: Cristina Vieira (coord.), Conceição Nogueira e Teresa-Cláudia Tavares 017


*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3Up(VFRODU

Daí que seja imperativo falar de género quando contextos formais de ensino na manutenção
se quer promover uma cidadania ativa. Na de uma ideologia de género adotada pelo
realidade, o género deve ser encarado como um coletivo e assumida como inquestionável,
dos princípios organizadores da construção do ainda que naturalize hierarquias de poder
percurso individual de cada cidadã ou cidadão, e legitime situações de desigualdade entre
na formação das respetivas competências homens e mulheres. Correndo-se o risco de
para o exercício pleno da cidadania. Em deixar de fora deste elenco muitas pesquisas
qualquer sociedade, as crenças associadas importantes de cientistas portuguesas/es
ao género tendem a constituir, para ambos empenhadas/os no estudo das questões de
os sexos, normas – muitas vezes silenciosas género e da sua ligação ao que se passa na
– condicionantes da formação de valores e escola, citem-se, por exemplo, os trabalhos
de atitudes, com influência direta na auto e sobre os estereótipos de género nos Manuais
heteroavaliações das variadas expressões Escolares, adotados oficialmente no ensino
comportamentais e nos desafios que uns e básico, de Eugénio Brandão (1979), Ivone
outras acreditam serem capazes de enfrentar Leal (1979), Maria Isabel Barreno (1985), José
com sucesso. Paulo Fonseca (1994), Fernanda Henriques e
Teresa Joaquim (1995), Maria de Jesus Martelo
(1999) e Anabela Correia e Maria Alda Ramos
(2002); a investigação de Teresa Alvarez Nunes
³ © ,QFRUSRUiPRV© VRE© D© IRUPD© GH©
HVTXHPDV© LQFRQVFLHQWHV© GH© SHUFHomR©
(2007) sobre as representações de cidadania
associadas ao masculino e ao feminino nos
H© GH© DYDOLDomR© DV© HVWUXWXUDV© KLVWyULFDV©
Manuais de História e no software educativo
GD© RUGHP© PDVFXOLQD© DUULVFDPRõQRV©
SRUWDQWR© D© UHFRUUHU© SDUD© SHQVDU© D© utilizados no ensino secundário; o trabalho de
GRPLQDomR© PDVFXOLQD© D© PRGRV© GH© Luísa Saavedra (2005) sobre a aprendizagem
SHQVDPHQWR© TXH© VmR© HOHV© SUySULRV©
SURGXWRV©GD©GRPLQDomR
3LHUUH©%RXUGLHX©©
´
³ © $V© LQYHVWLJDo}HV© WrP© PRVWUDGR© TXH©
R© HQVLQR© PLVWR© QmR© VH© VXEVWDQFLRX©
HP© SUiWLFDV© HGXFDWLYDV© FRQGXFHQWHV©
A investigação em torno das diferentes j© WUDQVIRUPDomR© GDV© UHODo}HV© VRFLDLV©
problemáticas do género, impulsionada, GH© JpQHUR© QR© SURFHVVR© GH© VRFLDOL]DomR©
como se disse atrás, pelo pensamento e H© GH© FRQVWUXomR© GD© LGHQWLGDGH© GH©
movimentos feministas, e produzida com UDSDULJDV© H© GH© UDSD]HV© &RQVWDWDõVH© D©
maior intensidade desde as décadas finais SHUVLVWrQFLD© GH© HVWHUHyWLSRV© GH© JpQHUR©
do século XX, chamou a atenção para a VHMD© QRV© PDWHULDLV© SHGDJyJLFRV© VHMD©
complexidade cultural dos estereótipos de QDV© LQWHUDo}HV© QR© HVSDoR© HVFRODU©
género, para o carácter imbricado das ideias TXH© VXVWHQWDP© XP© LPDJLQiULR© VRFLDO©
TXH© UHSUHVHQWD© DVVLPHWULFDPHQWH© DV©
associadas à masculinidade e à feminilidade e
LGHQWLGDGHV© IHPLQLQD© H© PDVFXOLQD© H©
para as arbitrariedades advindas da promoção
UHSURGX]© H[SHFWDWLYDV© GLIHUHQFLDGDV©
e manutenção de um raciocínio dicotómico,
SDUD©UDSDULJDV©H©UDSD]HV©QR©TXH©UHVSHLWD©
conformista e alicerçado em estereotipias. jV©YiULDV©GLPHQV}HV©GD©VXD©YLGD©SUHVHQWH©

´
Estudos portugueses desenvolvidos, H©IXWXUD
sensivelmente desde essa altura, também
7HUHVD©3LQWR©©
já colocaram em evidência, por exemplo, o
papel dos recursos pedagógicos utilizados em

018 Lisboa, CIG, 2015


(148$'5$0(1727(Ï5,&2_*pQHURH&LGDGDQLD

promovida pelo currículo e pela organização género, quer na organização dos espaços
escolar do que é ser rapaz ou ser rapariga; a didáticos, quer nas interpretações que fazem
pesquisa de Laura Fonseca (2001) sobre as do comportamento dos pais e das mães.
subjetividades na educação das raparigas; No que diz respeito à fraca representação das
e o trabalho de Teresa Pinto (2008) sobre a raparigas em profissões não tradicionalmente
associação (historicamente construída) do femininas, um trabalho realizado por Luísa
ensino industrial ao sexo masculino. Saavedra (1997) deixa antever grandes
dificuldades a médio prazo na alteração
No que concerne ao que se passa no nível dos estereótipos de género associados às
pré-escolar, uma investigação recente de profissões, pois esta mudança parece exigir
Fernanda Rocha (2009) mostrou que os/as uma modificação ideológica das representações
educadores/as de infância são também associadas à posição social do grupo feminino
propensos/as ao uso de estereotipias de face ao grupo masculino.

por: Cristina Vieira (coord.), Conceição Nogueira e Teresa-Cláudia Tavares 019


*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3Up(VFRODU



2JpQHURFRPRFDWHJRULD
VRFLDO

2
género é uma das primeiras de a criança ter capacidade de expressar
categorias que a criança aprende, por palavras o seu pensamento. Todavia, ao
facto que exerce uma influência longo dos anos subsequentes são múltiplas as
marcante na organização do influências que podem ocorrer suscetíveis de
seu mundo social e na forma como se avalia afetar quer o desenvolvimento posterior das
a si própria e como perceciona as pessoas várias componentes do género, quer as suas
que a rodeiam. Para corresponder às normas manifestações situacionais. Por esse motivo,
sociais, e como parte integrante do processo numa situação particular uma rapariga pode
de socialização, a criança aprende a comportar- exibir um comportamento habitualmente mais
-se de acordo com os modelos dominantes de comum nos rapazes e vice-versa.
masculinidade e de feminilidade. Este processo
é movido por uma complexa interação entre os A análise da composição sexual dos grupos
fatores individuais e contextuais, neles incluindo de crianças formados por iniciativa própria em
a relação com o pai e a mãe, os/as amigos/as, situações lúdicas fornece dados que destacam
os/as educadores/as/professores/as e outras a importância do género enquanto categoria
pessoas significativas. social, especialmente durante a primeira década
de vida. Sobrepondo-se a outras características
Algumas investigações no domínio da psicologia individuais como a etnia ou a raça, o sexo surge
têm mostrado que as crianças iniciam o como um dos principais critérios na escolha de
processo de desenvolvimento respeitante ao um/a potencial companheiro/a de brincadeiras,
género (e a categorização de si e dos outros por parte da criança10. Assim, por exemplo,
daí decorrente) muito antes de tomarem um rapaz branco de quatro anos brinca mais
consciência do seu sexo, ou seja, dos seus prontamente com um rapaz negro do que com
órgãos genitais9. Janet Spence (1985) defende uma rapariga branca da mesma idade.
mesmo que o núcleo central da identidade de
género começa a consolidar-se, em crianças É importante referir que durante a infância
de ambos os sexos, ainda numa fase pré- a distinção entre os sexos remete para a
-verbal do desenvolvimento, ou seja, antes prevalência, no pensamento da criança, de duas

9
Ver, a este respeito, os trabalhos de Diana Poulin-Dubois e colegas (1994), de Teresa Alário Trigueiros e outros/as
autores/as (1999) e de Ana da Silva e outros/as autores/as (1999), tendo estes dois últimos livros sido publicados pela
Comissão para a Igualdade e para os Direitos das Mulheres, no âmbito dos Cadernos Coeducação.
10
Ver os estudos citados por Carole Beal (1994) que se debruçaram sobre este comportamento sexista das crianças.

020 Lisboa, CIG, 2015


(148$'5$0(1727(Ï5,&2_*pQHURH&LGDGDQLD

categorias básicas (binárias): a dos homens e G ePDLRUHPVLWXDo}HVQmR


a das mulheres, categorias essas diretamente
HVWUXWXUDGDVSRUDGXOWRVFRPRpR
ligadas a um processo prévio de categorização
FDVRGRVUHIHLWyULRVHVFRODUHVGRTXH
social que teve como fundamento as diferenças
físicas aparentes entre os sexos. HPFRQWH[WRVPDLVIRUPDLVFRPRVHMDP
DVVDODVGHDXOD
Uma segunda distinção – assente na primeira,
H 1mRWHPDYHUFRPMXt]RVGHYDORU
porém, de contornos mais indefinidos – é a que
resulta da aplicação dos conceitos de masculino
VREUHRPDLRURXPHQRUSRGHUVRFLDO
e de feminino. Na realidade, um indivíduo pode GHWLGRSHODFULDQoDHPYLUWXGHGDVXD
ser mais ou menos masculino, mas não pode SHUWHQoDDXPRXDRXWURVH[RRXGH
ser mais ou menos homem, como escreveu SDSpLVHVSHFt¿FRVGHJpQHURSRUHOD
Eleanor Maccoby (1988). Esta segunda GHVHPSHQKDGRV
dicotomia reveste-se de uma importância menor
na compreensão do comportamento social da I eXPDWHQGrQFLDTXHSDUHFH
criança, até porque faz apelo a determinadas FRPHoDUSRUYROWDGRVGRLVDQRV
capacidades cognitivas mais abstratas, que ela GHLGDGHFRQWLQXDUGXUDQWHDIDVH
ainda não possui. SUpHVFRODUHLQWHQVL¿FDUVHQRVDQRV
VHJXLQWHVGDLQIkQFLDHQWUHRV
O interesse científico pela compreensão do
HRVDQRV
fenómeno da preferência explícita das crianças
pelo estabelecimento de interações com outras J eXPIHQyPHQRTXHVHPDQLIHVWD
do mesmo sexo deu origem ao desenvolvimento GHIRUPDHTXLYDOHQWHHPHVWXGRV
de numerosas investigações11. Entre outras
UHDOL]DGRVHPGLIHUHQWHVFXOWXUDV
conclusões dignas de relevância, foi observado
que a predisposição das crianças para a
segregação sexual: Para explicar a segregação dos sexos
observada na infância, Carole Beal (1994)
D eXPSURFHVVRJUXSDOSRLVQmR apresenta duas ordens de razões. Em primeiro
lugar, afirma que as crianças preferem brincar
GHSHQGHGDVFDUDFWHUtVWLFDVSDUWLFXODUHV
com outras do mesmo sexo em virtude
H[LELGDVSRUFDGDFULDQoDRXGRVHX da semelhança mútua, ao nível dos estilos
JUDXGHWLSL¿FDomRGHJpQHUR de interação. Em segundo lugar, fala da
necessidade individual de desenvolvimento da
E 2FRUUHHPDPERVRVVH[RVPDV
identidade de género que conduz as crianças
WHQGHDDSDUHFHUPDLVFHGRQDV
a procurar contactar, preferencialmente, com
UDSDULJDV outras parecidas consigo, isto é, outras que
F 7HQGHDVHUWDQWRPDLVLQWHQVD correspondam aos modelos aprendidos do que
“é ser rapaz” ou “ser rapariga”. Como escreveu
TXDQWRPDLRUIRURQ~PHURGH
Beverly Fagot (1985), para que a criança inicie o
FULDQoDVGRPHVPRVH[RHGDPHVPD desenvolvimento de algumas regras associadas
LGDGHGLVSRQtYHLVSDUDSDUWLFLSDUQDV ao género basta aprender a designar a categoria
EULQFDGHLUDV sexual a que pertence. Também a este respeito,

11
Consultar, por exemplo, Eleanor Maccoby (1998) para uma visão abrangente dos resultados destes estudos.

por: Cristina Vieira (coord.), Conceição Nogueira e Teresa-Cláudia Tavares 021


*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3Up(VFRODU

Eleanor Maccoby (1988) defendeu que as As diversas pesquisas sobre a importância


crianças escolhem brincar com outras do do género no desenvolvimento da criança,
mesmo sexo porque o processo cognitivo de embora nem sempre tenham conduzido a
categorização social, por elas efetuado, é de conclusões plenamente coincidentes, parecem
tal maneira forte que a sua opção, a este nível, no entanto reunir consenso quanto a dois
deve ser encarada como parte integrante da aspetos particulares. A manifestação de
formação da identidade de género. comportamentos típicos de género durante
os primeiros anos de vida tende a preceder
(1) o desenvolvimento de uma compreensão
$ PHGLGD HP TXH GHWHUPLQDGD SHVVRD sofisticada sobre o género, ou seja, sobre os
modelos de masculinidade e de feminilidade
VH PRVWUD HP FRQIRUPLGDGH FRP RV
culturalmente dominantes12 e (2) a consolidação
SDSpLVGHJpQHURTXHOKHVmRVRFLDOPHQWH da identidade de género13. Como veremos
SUHVFULWRV HP YLUWXGH GH WHU QDVFLGR a seguir, este último aspeto é algo que
GR VH[R PDVFXOLQR RX IHPLQLQR p R TXH se estende no tempo, sobretudo ao longo
dos primeiros sete anos de vida. O grau de
VH GHVLJQD SRU WLSL¿FDomR GH JpQHUR
complexidade das explicações apresentadas
'H IRUPD PDLV VLQWpWLFD 6DQGUD %HP pelas crianças para os comportamentos de
  GHIHQGH TXH WDO FRQFHLWR WUDGX] género e para a avaliação dos mesmos em si e
nas outras pessoas depende diretamente do
R SURFHVVR DWUDYpV GR TXDO D VRFLHGDGH
desenvolvimento das capacidades intelectuais,
FRQYHUWHDVQRo}HVGHPDFKRHGHIrPHD as quais se tornam progressivamente mais
HPPDVFXOLQRHIHPLQLQR complexas com a idade em ambos os sexos.

12
Ver Diana Poulin-Dubois, Lisa A. Serbin e Alison Derbyshire (1994).
13
Ver Valerie Edwards e Janet T. Spence (1987).

022 Lisboa, CIG, 2015


(148$'5$0(1727(Ï5,&2_*pQHURH&LGDGDQLD



$IRUPDomRGDLGHQWLGDGHGH
JpQHUR

)
oram várias as posições Sendo este Guião destinado principalmente ao
teóricas desenvolvidas ensino pré-escolar e ao 3.º ciclo do ensino
durante o séc. XX que básico, e abrangendo, portanto, quer crianças
tentaram esclarecer o muito novas (a partir dos três anos de idade),
processo de formação da identidade de quer adolescentes, optámos por apresentar
género. Com o intuito de dar uma certa nesta seção do capítulo uma visão psicológica
organização teórica e conceptual às sobre a formação da identidade de género, que
mesmas, Susan Freedman (1993) reúne-as a perspetiva como intrinsecamente ligada ao
em duas classes distintas. A primeira (onde desenvolvimento humano em outros domínios
inclui, por exemplo, as ideias psicanalíticas (cognitivo, emocional e social). Esta opção não
e evolucionistas) agrega teorias que tentam significa, contudo, que outras abordagens mais
explicar as possíveis causas das diferenças críticas e reflexivas – como aquelas que são
entre os sexos. Trata-se de saber por que é influenciadas pelo construcionismo social ou
que os sexos podem apresentar diferenças.
A segunda categoria agrupa as teorias (como
3DUWLQGR GH HVWXGRV UHDOL]DGRV FRP
as da aprendizagem social, teorias cognitivo-
FULDQoDV H DGROHVFHQWHV 6XVDQ (JDQ H
-desenvolvimentistas e teorias da interação
social) que abordam os processos conducentes 'DYLG 3HUU\   DSUHVHQWDUDP XPD
à observação das diferenças entre homens e SRVVtYHOGH¿QLomRGHLGHQWLGDGHGHJpQHUR
mulheres. Neste caso, a preocupação dos/as FRPUHFXUVRDTXDWURSURSRVLo}HVWHyULFDV
respetivos/as autores/as gira em torno de 1R VHX HQWHQGHU D LGHQWLGDGH GH JpQHUR
como é que os sexos enveredam por formas DEUDQJH
distintas de comportamento.
³ D $WRPDGDGHFRQVFLrQFLDLQGLYLGXDOGD
Como se disse anteriormente, a SHUWHQoD GR VXMHLWR D XPD GDV FDWHJRULDV
coexistência de diferentes perspetivas e o GHJpQHUR
recurso a metodologias de análise
E  $ VHQVDomR GH FRPSDWLELOLGDGH FRP
distintas sobre o género – e as suas
XP GRV JUXSRV IRUPDGRV D SDUWLU GD
implicações para a organização da vida
pessoal e social das mulheres e dos FDWHJRUL]DomRDQWHULRU « 
homens – tornam difícil a tarefa de F  2 VHQWLUVH SUHVVLRQDGRD D HVWDU HP
apresentar princípios explicativos e modelos FRQIRUPLGDGHFRPDLGHRORJLDGHJpQHUR
que reúnam unanimidade entre as e os
especialistas e que espelhem a riqueza e G  2 GHVHQYROYLPHQWR GH DWLWXGHV SDUD
complexidade das abordagens. FRPRVJUXSRVGHJpQHUR´ S 

por: Cristina Vieira (coord.), Conceição Nogueira e Teresa-Cláudia Tavares 023


*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3Up(VFRODU

pelos feminismos radicais, corte de cabelo, de tamanho de compreensão geral do


cuja análise tende a centrar- e forma do corpo) do que mundo em que vive e do seu
-se na compreensão das as diferenças relativas aos papel no mesmo.
múltiplas determinantes dos órgãos genitais. É partindo da
comportamentos dos homens constatação destas distinções Neste enquadramento, por
e das mulheres na vida adulta entre pessoas adultas que volta dos dois/três anos a
– sejam vistas como menos a criança se inclui num dos criança está apta a designar
interessantes ou com menor grupos (isto é, se classifica corretamente o seu género.
valor heurístico. Apenas por como do sexo masculino ou Todavia, a formação da
uma questão prática não serão do sexo feminino) e começa, identidade de género, que
aqui referenciadas. inevitavelmente, a fazer se estende, como se disse,
avaliações da realidade. aproximadamente dos 2 aos 7
Na psicologia, a perspetiva anos de idade, é um processo
cognitivo-desenvolvimentista Para Kolhberg, as ideias da que acompanha a transição
– onde merece especial criança acerca dos papéis para o período das operações
destaque o pioneirismo do dos homens e das mulheres concretas15 e durante o qual a
pensamento de Lawrence são determinantes para a criança é capaz de começar
Kolhberg (1966) – reconhece exibição de comportamentos a compreender determinadas
à criança um papel ativo na consonantes com os categorias sociais – como é o
construção da sua identidade modelos dominantes caso do género.
de género e a impossibilidade de masculinidade e de
de dissociar este processo feminilidade; e a motivação As ideias de Lawrence
do próprio desenvolvimento para a aprendizagem desses Kolhberg (1966) a respeito
das capacidades intelectuais. mesmos papéis resulta da do papel da motivação no
Considerando o ciclo de vida, sua necessidade individual desenvolvimento do género
e salientando a importância de se identificarem com reuniram grande consenso
da interação social entre um dos grupos. Por esse na comunidade científica.
as crianças de ambos os motivo, acredita que durante Na sua opinião, para que a
sexos destacada por Key o processo de formação criança se sinta motivada a
Bussey e Albert Bandura da identidade de género valorizar os outros do mesmo
(1999), pode afirmar-se que a criança é capaz de sexo e inicie o processo
a primeira etapa do processo compreender o género, em de ensaio/imitação dos
de desenvolvimento das vez de, simplesmente, imitar comportamentos, tem de estar
diferentes dimensões do o comportamento daqueles assegurada a estabilidade do
género consiste na formação que são do mesmo sexo que seu género; ou seja, tem de
da identidade de género. o seu. Assim, a progressiva ter consciência de que ainda
Ao observar o mundo das compreensão que a criança que algumas características
pessoas adultas, para as evidencia acerca do que é o externas ou o próprio
crianças são muito mais género está intrinsecamente comportamento, exibido em
aparentes as diferenças ligada ao seu desenvolvimento situações particulares, venham
exteriores (de vestuário, de cognitivo14, isto é, ao seu nível a sofrer modificações, o sexo

14
Ver os trabalhos de Jeanne Brooks-Gunn e Wendy Matthews (1979).
15
Em virtude da saliência do género na organização da vida individual, Diana Ruble e Carol Martin (1998) defendem que a
“conservação da categoria sexual” pode ser considerada uma das primeiras manifestações de pensamento operatório por
parte da criança.

024 Lisboa, CIG, 2015


(148$'5$0(1727(Ï5,&2_*pQHURH&LGDGDQLD

e a identidade de género do indivíduo são família, na escola, na comunicação social, que


invariáveis. funcionam como modelos. Nesta sequência, a
criança imita os modelos do mesmo sexo que o
Pelo facto de não ser capaz de alcançar, seu e exibe, preferencialmente, comportamentos
antes de determinada idade, a permanência típicos de género, já que esses mesmos
do objeto (noção piagetiana segundo a qual desempenhos são considerados os mais
existe constância nas características físicas adequados (e os mais aprovados pelas outras
dos objetos), não é de prever que com três pessoas) e estão em consonância com o seu
anos apenas a criança consiga, por exemplo, autoconceito, enquanto rapaz ou rapariga, e
desenvolver uma identidade de género com a sua identidade de género em formação.
permanente. Ilustremos esta afirmação com Na linha do pensamento kolhbergiano, a
uma referência aos trabalhos de Jean Piaget vontade da criança de agir em conformidade
(1932) sobre a compreensão da conservação: com as normas adequadas ao seu sexo
pode aplicar-se ao modo como as crianças precede o próprio comportamento, em virtude
compreendem o género a explicação para a da sua compreensão da realidade. Ela envereda
incapacidade das crianças, até determinada pela adoção de comportamentos típicos
idade, de acreditarem que o número de objetos de género, movida pela sua necessidade de
numa torre se mantém, ainda que a disposição coerência interna e de desenvolvimento de uma
física dos mesmos se altere. Enquanto não sólida autoestima.
atingem aquilo a que Kolhberg (1966) chamou
estabilidade de género, as crianças tendem Todo o processo de categorização cognitiva
a pensar que, tal como mudam de corte de que parece, então, ser indispensável, numa
cabelo ou de vestuário, as pessoas podem primeira fase, para a progressiva consolidação
mudar de sexo, ou podem pertencer a um ou a da identidade de género nos primeiros anos
outro grupo de género. Segundo este nível de de vida da criança abre, no entanto, caminho
pensamento infantil, como escreveu Margaret à apropriação de normas comportamentais
Matlin (1996), “uma mulher pode tornar-se rígidas, ou de estereotipias, as quais
homem se cortar o cabelo muito curto e um poderão ter uma influência perversa na
homem pode tornar-se mulher se decidir usar autenticidade da trajetória de desenvolvimento
uma mala de mão” (p. 99). individual, subsequente, dos rapazes e das
raparigas. Torna-se, por isso, fundamental o
À medida que vão compreendendo, dos 2 aos 7 desenvolvimento de uma atuação pedagógica
anos aproximadamente, a imutabilidade do facto adequada e concertada – entre as várias
de serem do sexo masculino ou do feminino fontes de influência, como seja a escola, a
– isto é, à medida que vão consolidando a família, os media – que corrija as mensagens
estabilidade do género – as crianças sentem- estereotipadas sobre o género que a criança
-se motivadas a procurar informação sobre os vai aprendendo e solidificando nas suas redes
comportamentos considerados adequados cognitivas de informação.
ao seu sexo, pela observação dos outros na

por: Cristina Vieira (coord.), Conceição Nogueira e Teresa-Cláudia Tavares 025


*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3Up(VFRODU



(VWHUHyWLSRVGHJpQHUR

2
s estereótipos constituem de cada grupo específico. Daí que seja baixo o
conjuntos bem organizados de poder preditivo destas crenças generalizadas,
crenças acerca das características correndo-se o risco de se efetuarem
das pessoas que pertencem a um grupo julgamentos inadequados sobre uma pessoa
particular. Se bem que a tendência seja para particular, a partir dos estereótipos que se sabe
encarar os estereótipos como expedientes servirem para caracterizar o grupo a que ela
negativos de perceção das outras pessoas, pertence. Acresce o facto de se apresentarem,
dada a facilidade com que, a partir deles, se com frequência, de tal maneira consolidados
envereda por juízos discriminatórios, pode ser- nos esquemas mentais das pessoas, que a
-lhes atribuído, no entanto, um papel positivo no sua propensão a alterações é reduzida, mesmo
modo como o indivíduo lida com a multiplicidade na presença de informação contrária, como
de estímulos com que é confrontado no dia- advertiu John Santrock (1998).
-a-dia. Daqui ser possível asseverar que os
estereótipos assumem, para o ser humano, No caso particular do género, os estereótipos
uma função adaptativa, na medida em que lhe a ele associados têm a ver com as crenças
permitem a organização da complexidade do amplamente partilhadas pela sociedade sobre
comportamento em categorias operacionais, o que significa ser homem ou ser mulher. Mais
facilmente manejáveis. Não obstante, também do que qualquer outro tipo de estereótipos, os
é verdade que os estereótipos podem ser de género apresentam, como nos disse Susan
bastante prejudiciais, em virtude do risco Basow (1992), um forte poder normativo, na
de consubstanciarem uma leitura distorcida medida em que assumem não apenas uma
e redutora da realidade, porque facilmente função descritiva das supostas características
legitimam categorizações irrefletidamente dos homens e das mulheres, mas também
generalizáveis, na sua maioria mais negativas do consubstanciam uma visão prescritiva, se bem
que positivas. que não uniforme, dos comportamentos (papéis
de género) que ambos os sexos deverão exibir,
De facto, com base nos estereótipos, todos porque veiculam, ainda que implicitamente,
os membros de um dado grupo social tendem normas de conduta16. Se bem que os
a ser avaliados da mesma maneira, como estereótipos de género possam apresentar
se os indivíduos pertencessem a categorias alguma correspondência com as características
internamente homogéneas. Deste ajuizamento e comportamentos que os homens e as
resulta, como é óbvio, uma clara omissão da mulheres exibem no dia a dia, a excessiva
variabilidade que é possível observar no seio generalização que lhes é inerente e o seu

16
Para uma compreensão alargada sobre o poder dos estereótipos de género no comportamento dos homens e das
mulheres, ver os trabalhos de Madeline Heilman (2001) e de Conceição Nogueira e Luísa Saavedra (2007).

026 Lisboa, CIG, 2015


(148$'5$0(1727(Ï5,&2_*pQHURH&LGDGDQLD

carácter quase inquestionável


mascaram, como afirmou 5HIHULQGRõVH© FRQFUHWDPHQWH© DR© FDUiFWHU© H[FOXGHQWH© GR©
Janet Spence (1999), “a WHUPR©PDVFXOLQLGDGH©KHJHPyQLFD©¯©TXH©SUHWHQGH©WUDGX]LU©
considerável sobreposição da R© PRGHOR© GRPLQDQWH© GR© TXH© p© VHU© KRPHP© QD© QRVVD©
variabilidade comportamental VRFLHGDGH© ¯© FRQVWDQWHPHQWH© OHPEUDGD© QD© P~VLFD© H© QRV©
relativa a cada um dos grupos” GLWDGRV© SRSXODUHV© RX© DLQGD© QDV© VpULHV© WHOHYLVLYDV© DWXDLV©
(p. 281). SDUD©FULDQoDV©H©DGROHVFHQWHV ©0LJXHO©9DOH©GH©$OPHLGD©DOHUWD©

³
SDUD© R© IDFWR© GH© D© PDLRULD© GRV© KRPHQV© ½FDU© GH© IRUD© QR©
FDVR© GRV© KRPHQV© D© GLYLVmR© FUXFLDO© p© HQWUH© PDVFXOLQLGDGH©
$SURSyVLWRGDVFRQVHTXrQ KHJHPyQLFD© H© YiULDV© PDVFXOLQLGDGHV© VXERUGLQDGDV© ¨ ©
'DTXL© VHJXHõVH© TXH© DV© PDVFXOLQLGDGHV© VmR© FRQVWUXtGDV©
FLDV GRV VXSRVWRV GHVYLRV
QmR© Vy© SHODV© UHODo}HV© GH© SRGHU© PDV© WDPEpP© SHOD© VXD©
DRV PRGHORV GRPLQDQWHV LQWHUUHODomR© FRP© D© GLYLVmR© GR© WUDEDOKR© H© FRP© RV© SDGU}HV©
GHIHPLQLOLGDGHHGHPDVFX GH© OLJDomR© HPRFLRQDO© 3RU© LVVR© QD© HPSLULD© VH© YHUL½FD© TXH©
OLQLGDGH YHMDVH R TXH VH D© IRUPD© FXOWXUDOPHQWH© H[DOWDGD© GH© PDVFXOLQLGDGH© Vy©
FRUUHVSRQGH©jV©FDUDFWHUtVWLFDV©GH©XP©SHTXHQR©Q~PHUR©GH©
SDVVD SRU H[HPSOR QRV
SULPHLURVDQRVGDLQIkQFLD
KRPHQV
´
0LJXHO©9DOH©GH©$OPHLGD©©
H DLQGD QD LGDGH FRUUHV
SRQGHQWH DR ž FLFOR GH
HVFRODULGDGH EiVLFD 8PD
esperado de cada um dos normas comportamentais
UDSDULJDTXHpFRQVLGHUDGD sexos, eles encerram em consideradas adequadas
PDULDUDSD] FRVWXPD VHU si, também, uma avaliação para o seu sexo. Em virtude
PHOKRUDFHLWHSHODIDPtOLDH daquilo que o homem e a desta maior coação
SHODV RXWUDV SHVVRDV ± H mulher não deverão exibir, social que é sentida pelas
quer em termos físicos, quer pessoas do sexo masculino,
WHQGH D WHU XP HVWDWXWR
a nível psicológico. De um autoras como Susan Basow
VXSHULRU QR VHX JUXSR GH modo geral, os indivíduos (1992) defendem não ser
SDUHV ± GR TXH XP UDSD] que se afastam das visões de estranhar a persistente
TXH H[LEH FRPSRUWDPHQWRV dominantes de masculinidade preocupação de alguns
GLWRVIHPLQLQRV$OLiVSDUD (o homem “choramingas”, por homens em “dar provas” da
exemplo) e de feminilidade sua masculinidade.
HVWHV VmR ³LQGL]tYHLV´ DV
(a mulher “agressiva”, por
H[SUHVV}HV SRSXODUHV SDUD exemplo) costumam ser alvo Os estudos desenvolvidos
RV FDUDFWHUL]DU« SRUTXH de julgamentos negativos sobre os estereótipos de
GH IDFWR D IHPLQLOLGDGH p por parte dos outros. género têm chamado a
VRFLDOPHQWHGHVYDORUL]DGD Neste âmbito, é de realçar atenção para o seu carácter
que tende a ser o homem não unitário17 e para a
quem sofre mais punições constante adaptação dos
Mas, se os estereótipos sociais, da família, dos pares, mesmos às mudanças
estabelecem aquilo que é etc., caso se desvie das sociais18. No mesmo sentido,

17
Ver, a este propósito, a obra de Susan Golombock e Robyn Fivush (1994).
18
Ver o livro de António Neto e outros/as autores/as (1999), sobre estereótipos de género, que foi publicado no âmbito dos
Cadernos Coeducação.

por: Cristina Vieira (coord.), Conceição Nogueira e Teresa-Cláudia Tavares 027


*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3Up(VFRODU

a investigação histórica nível sociocultural ou mesmo a H[HPSORFDPLRQLVWD


tem evidenciado que os orientação sexual. YHUVXVUHFHFLRQLVWD 
estereótipos têm variado ao
longo do tempo e, em cada Numa tentativa de mostrar ŀ(VWHUHyWLSRVUHODWLYRV
época, de uma região para que os estereótipos de jVFDUDFWHUtVWLFDV
outra19. Esta necessidade género são complexos e que ItVLFDV SRUH[HPSOR
de adaptação conduziu ao tendem a apresentar, por RPEURVODUJRVHFRUSR
aparecimento e refinamento isso, mais subdivisões que
PXVFXORVRYHUVXVIRUPDV
(ou mesmo reformulação) outros estereótipos, Susan
de subtipos particulares de Basow (1986) afirmou que é
FRUSRUDLVDUUHGRQGDGDV
estereótipos de género, tanto possível identificar naqueles HKDUPRQLRVDV 
relativos aos homens como às pelo menos quatro subtipos,
mulheres. No entanto, parece não necessariamente Na linha do pensamento
consensual a ideia de que a correlacionados entre si: de Kay Deaux e Laurie
distinção entre os subtipos de Lewis (1984), destes vários
estereótipos relativos à mulher ŀ(VWHUHyWLSRVUHODWLYRV subtipos de estereótipos de
é mais clara e reúne maior DRVWUDoRVRXDWULEXWRV género, aqueles que parecem
acordo entre os indivíduos do GHSHUVRQDOLGDGH SRU exercer mais poder sobre o
que os subtipos referentes ao H[HPSORLQGHSHQGrQFLD comportamento, na medida
homem. Apesar da relativa YHUVXVGRFLOLGDGH  em que despoletam com maior
estabilidade com que se intensidade a atuação das
apresentam (e utilizam) nas ŀ(VWHUHyWLSRV crenças associadas ao género,
sociedades contemporâneas UHODWLYRVDRVSDSpLV são os estereótipos relativos
as classificações GHVHPSHQKDGRV às características físicas21. E o
diferenciadoras mais gerais, problema das ideias erradas e
SRUH[HPSOR³FKHIH
ligadas às categorias discriminatórias, a este nível,
GHIDPtOLD´YHUVXV
homem e mulher, pesquisas coloca-se ainda com mais
particulares20 dedicadas ao ³FXLGDGRUD´GRV¿OKRV  premência, se atendermos
exame dos possíveis subtipos ao facto de ser a aparência
ŀ(VWHUHyWLSRVUHODWLYRV
destas têm mostrado a física – o corpo – o aspeto
jVDWLYLGDGHV
importância de outros fatores mais difícil de mudar, de todos
no seu aparecimento, como SUR¿VVLRQDLV os que se relacionam com o
a raça, a idade, a religião, o SURVVHJXLGDV SRU género22.

19
Refiram-se, a título de exemplo, os trabalhos de Michelle Perrot (1998), Joan W. Scott (1994), Maria Victoria Lopez-Cordon
Cortezo (2006), Annette F. Timm e Joshua A. Sanborn (2007).
20
Entre estas investigações encontram-se as de Susan Basow (1992), de Kay Deaux e Melissa Kite (1993) e de Kay Deaux
(1995).
21
Numa pesquisa conduzida por Kay Deaux e Laurie Lewis (1984) com crianças e adolescentes verificou-se que as
pessoas descritas como tendo uma voz mais grossa e ombros mais largos eram percecionadas como possuindo mais
características masculinas e como mais capazes de desempenhar papéis típicos dos homens do que as pessoas que se
sabia possuírem uma voz mais aguda ou uma constituição física mais franzina. Diversas investigações subsequentes (ver
a revisão de Kay Deaux e Marianne LaFrance, publicada em 1998, onde é possível tomar conhecimento destas pesquisas)
vieram oferecer suporte empírico a esta convicção de que na avaliação dos indivíduos as características físicas parecem
assumir um predomínio sobre todas as outras informações relativas ao género. Foi observado, por exemplo, que, sobretudo
entre os homens, a altura destes estava positivamente correlacionada com as avaliações de outros sujeitos acerca do seu
estatuto profissional ou mesmo da sua adequação pessoal, enquanto membros do sexo masculino.
22
Ver a este propósito o capítulo “Corpo, género, movimento e educação” deste Guião.

028 Lisboa, CIG, 2015


(148$'5$0(1727(Ï5,&2_*pQHURH&LGDGDQLD

Para além dos estereótipos relacionados


com a aparência corporal, outros relativos às
características de personalidade, aos papéis
³ ©6H©D©~QLFD©LQIRUPDomR©GLVSRQtYHO©DFHUFD©GH©
XP©LQGLYtGXR©GR©VH[R©PDVFXOLQR©p©D©GH©TXH©
desempenhados e às ocupações profissionais HOH©WHP©XPD©FRQVWLWXLomR©ItVLFD©DOJR©GHOLFDGD©
preferidas por cada um dos sexos tendem, H©IUDQ]LQD©D©WHQGrQFLD©GDV©SHVVRDV©VHUi©SDUD©
igualmente, a persistir nas imagens que são SUHGL]HU©TXH©HVVH©VXMHLWR©SRVVXL©FRP©DOJXPD©
traçadas do homem e da mulher. Ainda que SUREDELOLGDGH© WUDoRV© HVWHUHRWLSDGDPHQWH©
IHPLQLQRV© TXH© GHVHPSHQKD© XPD© SUR½VVmR©
tenha vindo a sofrer variações em função dos
PDLV©FRPXP©QDV©PXOKHUHV©H©TXH©WDOYH]©VHMD©
contextos socioculturais, a dicotomia atrás
referida – “expressividade feminina” versus
KRPRVVH[XDO
´
6XVDQ©%DVRZ©©
“instrumentalidade masculina” – parece
continuar a ser usada para manter uma certa
ordem social e para distinguir os seres que
nasceram do sexo feminino daqueles que
nasceram do sexo masculino. ³ ©2V© SDSpLV© VRFLDLV© GH© JpQHUR
DSUHVHQWDP© QR© SODQR© QRUPDWLYR© D© PHVPD©
DVVLPHWULD© YHLFXODGD© SHORV© HVWHUHyWLSRV©
Uma síntese muito geral das principais GH© PDVFXOLQLGDGH© H© GH© IHPLQLOLGDGH© D©
conclusões dos estudos efetuados, sobretudo QtYHO© GRV© FRQWH~GRV© (QTXDQWR© RV© WUDoRV©
ao longo das últimas décadas do séc. XX, quer GH½QLGRV©FRPR©PDVFXOLQRV©VH©WUDGX]HP©HP©
em Portugal23, quer a nível transnacional24, FRPSHWrQFLDV© DVVRFLDQGRõVH© GLUHWDPHQWH©
põe em destaque a grande coincidência de j© HVIHUD© GR© WUDEDOKR© H© GR© GRPtQLR© VREUH© RV©
resultados quanto à forma como costumam ser RXWURV© H© VREUH© DV© VLWXDo}HV© RV© FRQWH~GRV©
TXH© FDUDFWHUL]DP© R© IHPLQLQR© FRUUHVSRQGHP©
descritos o homem e a mulher, por pessoas de
D© VHQWLPHQWRV© H© UHVWULQJHPõVH© j© HVIHUD© GR©
diferentes idades em momentos distintos. De
UHODFLRQDPHQWR©VRFLDO©H©DIHWLYR©,VWR©FRQGX]©
um modo geral, os homens tendem a ser vistos
D© XPD© GLVWLQomR© QD© GH½QLomR© GDV© iUHDV© GH©
como sendo mais fortes, ativos, competitivos LQWHUYHQomR© GRV© GRLV© VH[RV© R© PDVFXOLQR©
e agressivos do que as mulheres, tendo ainda GH½QLQGRõVH© D© SDUWLU© GD© PXOWLSOLFLGDGH©
maiores necessidades de realização, de GH© FRPSHWrQFLDV© H© GH© IXQo}HV© LQWHJUD©
dominação e de autonomia do que elas. As FRPR© SUySULDV© HVIHUDV© GH© LQWHUYHQomR©
mulheres, por seu turno, surgem caracterizadas GLYHUVL½FDGDV©TXH©DEUDQJHP©D©PXOWLSOLFLGDGH©
como necessitando, sobretudo, de estabelecer H© FRPSOH[LGDGH© VRFLDO© GR© HVSDoR© S~EOLFR©
ligações afetivas com as outras pessoas, HQTXDQWR© R© IHPLQLQR© FHQWUDGR© HP© IXQo}HV©
como sendo mais carinhosas e aptas a prestar HVSHFt½FDV©p©FRQ½JXUDGR©QR©kPELWR©UHVWULWR©
cuidados, como possuindo uma autoestima
mais baixa e como sendo mais propensas a
GR©SULYDGR©H©GR©IDPLOLDU
´
7HUHVD©$OYDUH]©1XQHV©©õ
prestar auxílio em situações difíceis.

No estudo realizado em Portugal por Lígia positivos do que estes. Além disso, os traços
Amâncio (1994), foi verificado ainda que os avaliados como positivos nas mulheres
estereótipos masculinos mostraram englobar envolviam, sobretudo, o seu relacionamento
um maior número de características do que com os outros, como o ser afetuosa,
os femininos e evidenciaram mais aspetos meiga ou sensível, características estas que

23
Consultar, por exemplo, o livro de Lígia Amâncio (1994) ou o artigo de Félix Neto (1990).
24
Merecem especial destaque, neste âmbito, o trabalho, pioneiro na Europa, de Anne-Marie Rocheblave-Spenlé (1964) e a
investigação transnacional de John Williams e Deborah Best (1990).

por: Cristina Vieira (coord.), Conceição Nogueira e Teresa-Cláudia Tavares 029


*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3Up(VFRODU

habitualmente integram a visão causa é uma maior hostilidade rapazes e nas raparigas,
estereotipada de feminilidade. para com as pessoas do sexo ainda que as crianças
Nos homens eram mais feminino. entre os 8 e os 11 anos de
valorizados aspetos como o idade mostrem em geral
ser audacioso, independente A variação do conhecimento conhecer um maior número
ou empreendedor, os dos estereótipos com a idade de estereótipos relativos
quais caracterizam a tem posto em evidência uma à mulher do que relativos
visão estereotipada de correlação positiva entre ao homem, como mostrou
masculinidade. Tanto num ambas as variáveis, sobretudo a pesquisa de Félix Neto
caso como no outro, o ao longo das duas primeiras (1997). Mas torna-se aqui
conceito de sexismo volta décadas de vida25, em virtude imperioso fazer a distinção
a ser importante para da complexidade cognitiva entre o conhecimento dos
compreender as respostas crescente das crianças e dos estereótipos e a flexibilidade
dos/as participantes, pois adolescentes. É de referir cognitiva com que são
segundo Peter Glick e Susan que a força desta associação aplicadas tais crenças, quer
Fiske (1996) o que está em tende a ser equivalente nos nas descrições que os rapazes
e as raparigas fazem de si
próprios/as, quer na maneira
(PERUD© FHUWDV© LGHLDV© WUDGLFLRQDLV© D© SURSyVLWR© GRV© DWULEXWRV© H©
como avaliam as outras
GRV©SDSpLV©PDLV©FRQYHQLHQWHV©SDUD©DV©SHVVRDV©GR©VH[R©IHPLQLQR©
pessoas. A este propósito,
WHQKDP©YLQGR©D©VRIUHU©XPD©UHODWLYD©PRGL½FDomR©FRP©R©SDVVDU©
GR©WHPSR©RXWUDV©FUHQoDV©WrP©VXUJLGR©QR©VHX©OXJDU©IDFWR©TXH© as pesquisas têm mostrado
que o simples conhecimento
DXWRUL]D©D©IDODU©HP©YHOKDV©H©HP©QRYDV©IRUPDV©GH©VH[LVPR© ©'H©
DFRUGR©FRP©-DQHW©6ZLP©H©FRODERUDGRUHV©  ©WDLV©IRUPDV©GH©
³ dos estereótipos não motiva
VH[LVPR© SRGHP© GLVWLQJXLUõVH© D© QtYHO© FRQFHSWXDO© GD© VHJXLQWH© necessariamente as crianças
PDQHLUD© a exibirem comportamentos
§© 2© VH[LVPR© DQWLJR© FDUDFWHUL]DõVH© SHOD© GHIHVD© GRV© SDSpLV© GH© consonantes com eles, como
JpQHUR©WUDGLFLRQDLV©SHOR©WUDWDPHQWR©GLIHUHQFLDO©GR©KRPHP©H©GD© concluíram Key Bussey e
PXOKHU©H©SHOD©DGRomR©GRV©HVWHUHyWLSRV©TXH©WUDGX]HP©D©FUHQoD© Albert Bandura (1999).
QD©PHQRU©FRPSHWrQFLD©GD©PXOKHU©HP©UHODomR©DR©KRPHP
§© 2© VH[LVPR© PRGHUQR© HQYROYH© D© UHMHLomR© GRV© HVWHUHyWLSRV© Na sequência dos trabalhos
WUDGLFLRQDLV© TXH© GHVYDORUL]DP© D© PXOKHU© H© D© FUHQoD© GH© TXH© D© de Lawrence Kolhberg (1966)
GLVFULPLQDomR©FRP©EDVH©QR©VH[R©Mi©QmR©FRQVWLWXL©XP©SUREOHPD© citados no ponto anterior,
$OpP©GLVVR©RV©LQGLYtGXRV©TXH©PDQLIHVWDP©DWLWXGHV©GHVWH©WLSR© foi mesmo esboçada uma
WHQGHP©D©FRQVLGHUDU©TXH©RV©PHLRV©GH©FRPXQLFDomR©VRFLDO©H©RV© relação curvilínea entre a
SUySULRV©JRYHUQRV©FRVWXPDP©GHGLFDU©PDLV©DWHQomR©j©PXOKHU© rigidez com que são aplicados
GR©TXH©DTXHOD©TXH©OKH©p©GHYLGD©H©LQFOLQDPõVH©D©VHQWLU©XPD©FHUWD© os estereótipos e a idade
DYHUVmR© SHODV© PXOKHUHV© TXH© H[HUFHP© DOJXP© WLSR© GH© DWLYLVPR
das crianças estudadas. Tal
SROtWLFR©HP©GHIHVD©GRV©VHXV©GLUHLWRV
&ULVWLQD©9LHLUD©©
´ conclusão veio a ser fortalecida
mais tarde com os resultados
de uma meta-análise26 sobre

25
Vejam-se, a este respeito, por exemplo, as investigações levadas a cabo por Félix Neto (1990; 1997) e por Deborah Best
e John Williams (1990) e a revisão teórica de estudos efectuada por Diane Ruble e Carol Martin (1998).
26
Como pode ler-se em Cristina Vieira (2004), uma meta-análise consiste num procedimento quantitativo de revisão de
investigações originais que se dedicaram ao estudo da mesma hipótese, no âmbito do qual se recorre a indicadores
estatísticos, como a magnitude do efeito (neste caso, o tamanho das diferenças entre os sexos), para a apresentação das
conclusões.

030 Lisboa, CIG, 2015


(148$'5$0(1727(Ï5,&2_*pQHURH&LGDGDQLD

o tema que foi levada a efeito aplicados aos homens e às a refinar certos aspetos
por Margaret Signorella e mulheres, como também daqueles que já conhece, o
colaboradores/as (1993). As acreditam na veracidade de ponto máximo do processo
crianças muito pequenas tais ideias27. Todavia, por esta de estereotipia tende a ser
são relativamente flexíveis na altura, já são capazes de atingido, em ambos os
utilização dos estereótipos, perceber que as atividades sexos, por volta dos 7 anos
pois entendem o género e os comportamentos de idade. Parece, pois, que
como uma categoria muito prescritos pelos estereótipos até à entrada para a escola,
abrangente, onde podem ser de género não são cruciais a rigidez da adoção dos
incluídas diversas atividades para que um indivíduo possa estereótipos tende a aumentar,
e papéis correlacionados ser considerado do sexo sendo o período dos 5 aos 8
entre si, como defendeu masculino ou feminino. anos de idade considerado
Aletha Huston (1983). Mas Isto é, uma mulher pode o “mais sexista” do ciclo de
a partir dos 3 até cerca dos desempenhar uma profissão vida. Esta tendência sofre,
7 ou 8 anos de idade, com mais comum nos homens, no entanto, um decréscimo
a progressiva aquisição pode não saber cozinhar ou nos anos subsequentes. De
da estabilidade do género, pode ainda gostar de desporto facto, na fase intermédia
dá-se um incremento das automóvel e não é por isso da infância – sensivelmente
perceções estereotipadas que se sentirá menos mulher. dos 8 aos 11 anos – que
acerca das características corresponde ao estádio das
dos homens e das mulheres. Para Eleanor Maccoby (1998), operações concretas, as
Nesta faixa etária, as crianças embora seja possível que a crianças mostram-se cada
não só conhecem quais são criança continue a aprender vez mais propensas a encarar
os estereótipos culturalmente alguns estereótipos ou tenda de forma flexível a diversidade
de papéis, de atividades
e de características da
personalidade que cada um
6HJXQGR DOJXPDV LQYHVWLJDo}HV GHVFULWDV SRU 'LDQH dos sexos é suscetível de
5XEOH H &DURO 0DUWLQ   HQWUH RV  H RV  DQRV DV exibir em diferentes situações.
FULDQoDV WHQGHP D HIHWXDU GHVFULo}HV PDLV HVWHUHRWLSD
GDVGHVLHGRVRXWURVGRTXHRVDGXOWRV(ODVDFUHGLWDP O problema da flexibilidade
com que é utilizado o
QR HQWDQWR TXH RV HVWHUHyWLSRV VH DSOLFDP PDLV DRV
conhecimento estereotipado
UDSD]HVHUDSDULJDVGDVXDLGDGHGRTXHjVSHVVRDVPDLV relacionado com o género,
FUHVFLGDV(PERUDDVUDSDULJDVHRVUDSD]HVDSUHQGDP durante a adolescência, tem
SULPHLUR RV HVWHUHyWLSRV DVVRFLDGRV DRV LQGLYtGXRV GR levado os/as investigadores/as
PHVPRVH[RTXHRVHXSRUYROWDGRVRXDQRVDPDLRULD a encontrar resultados nem
sempre coincidentes. Por um
GHODVMiFRQVHJXHFRPSUHHQGHUTXDLVDVH[SHFWDWLYDVGD
lado, certas investigações28 já
FXOWXUDHPTXHYLYHPDUHVSHLWRGRVSDSpLVHUHVSRQVDEL evidenciaram que, em virtude
OLGDGHVDWULEXtGDVDRKRPHPHjPXOKHUFRPRFRQFOXLX das pressões sociais para a
(OHDQRU0DFFRE\   assunção progressiva de

27
Veja-se a obra de Susan Golombock e Robyn Fivush (1994) para uma compreensão mais alargada do modo como as
crianças aprendem e utilizam os estereótipos de género.
28
Consultar Diane Ruble e Carol Martin (1998).

por: Cristina Vieira (coord.), Conceição Nogueira e Teresa-Cláudia Tavares 031


*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3Up(VFRODU

responsabilidades enquanto membros de um em função do género do que as raparigas.


ou de outro sexo, os/as adolescentes mais Também Margaret Signorella e colaboradores/as
velhos/as parecem mostrar-se mais sensíveis (1993) verificaram, na meta-análise a que
às crenças estereotipadas sobre os homens já fizemos menção, que as crianças, à
e as mulheres, ocorrendo, por isso, durante a medida que se tornam mais conscientes dos
fase final da adolescência, uma relativa perda estereótipos de género, acreditam cada vez
de flexibilidade cognitiva a esse nível. Outros menos (especialmente as raparigas) que esses
estudos têm, no entanto, concluído pela estereótipos deveriam existir. Na extensa revisão
continuação da menor rigidez na utilização narrativa que efetuaram de estudos publicados
dos estereótipos, mesmo durante os anos nos anos posteriores ao trabalho de Aletha
equivalentes ao ensino secundário. Os autores Huston (1983), as investigadoras Diane Ruble e
de um trabalho que utilizou formas diferentes Carol Martin (1998) corroboraram novamente a
de medir a flexibilidade com que crianças e maior tendência dos rapazes para se revelarem
adolescentes de ambos os sexos, com idades menos flexíveis do que as raparigas na
compreendidas entre os 8 e os 18 anos, se aceitação e utilização dos estereótipos.
descreviam e avaliavam as outras pessoas,
em função dos modelos dominantes de A tendência das pessoas para enveredarem
masculinidade e de feminilidade, chegaram à pelo uso dos estereótipos no seu funcionamento
conclusão de que, em ambos os casos, era pessoal e social parece traduzir o recurso a uma
evidenciada uma relação positiva com a idade29. certa visão ingénua de organização do mundo,
Assim, desde os anos intermédios da infância assente sobretudo num conjunto de teorias
até ao final do ensino secundário parecia ocorrer implícitas do comportamento, relacionado não
uma aceitação crescente da possibilidade de só com a categoria sexual de pertença, mas
os próprios indivíduos, ou as outras pessoas, também com a raça, a classe social e a etnia,
poderem vir a desempenhar atividades não para falar apenas em alguns dos fatores que
típicas do seu sexo. costumam abrir caminho a raciocínios simplistas
desta natureza. O problema reside no facto
A flexibilidade com que são utilizados os de estas lentes (turvas) conduzirem a uma visão
estereótipos parece, no entanto, variar com o limitada do mundo e acarretarem consequências
sexo. Diversos estudos, descritos por Aletha negativas para a pessoa (seja ela do sexo
Huston (1983), que envolveram amostras masculino ou feminino), tanto a nível individual
de crianças, concluem todos que quando como coletivo, na vivência de uma cidadania
foram encontradas diferenças entre os sexos, plena e na edificação de uma sociedade
os rapazes revelaram possuir visões mais verdadeiramente democrática e plural, onde
estereotipadas das características individuais coexistem singularidade e diversidade.

29
Consultar, a este respeito, o trabalho de Phyllis Katz e Keith Ksansnak (1994).

032 Lisboa, CIG, 2015


(148$'5$0(1727(Ï5,&2_*pQHURH&LGDGDQLD



'HTXHIDODPRVTXDQGR
IDODPRVHPFLGDGDQLD"

2
termo “cidadania”, no âmbito da conjunto de três tipos de direitos – direitos
sua aplicação ao ensino e à civis, direitos políticos e direitos sociais. Aqueles
educação, começou a ser e aquelas que possuem o estatuto de cidadãos
expressão corrente nos últimos ou cidadãs são – no que respeita aos direitos e
anos. No entanto, surgiu sem uma clara responsabilidades associados a esse estatuto
apresentação dos seus múltiplos significados. – iguais. É aspiração dos cidadãos e das
Por isso, é importante questionarmo-nos sobre cidadãs implementar a plena igualdade, lutando
o que é realmente a cidadania. Na realidade, pela progressiva concessão de direitos que
este conceito é problemático, ambíguo, e a aumente o número de pessoas a quem é
história tem mostrado que ao longo dos tempos conferido o estatuto de cidadania.
lhe estão associadas diferentes conceções, que
vão sendo retomadas, reformuladas ou mesmo A preocupação de Thomas Marshall (1964)
criticadas enquanto outras novas vão surgindo. relativamente à cidadania implicava procurar
A cidadania é um estado no qual (ou com o formas de (re)conciliar a democracia política
qual) a pessoa (ou “o/a cidadão/ã”) tem os formal com a continuidade da divisão da
direitos e/ou obrigações associados à pertença sociedade capitalista em classes sociais.
a uma comunidade alargada, especialmente a A resposta que avançou para esta reconciliação
um Estado. residia na hipótese de existência e promoção do
chamado Welfare State – Estado de Bem-Estar
Uma referência chave na literatura sobre Social ou Estado-Providência. Marshall
cidadania é Thomas Marshall (1893-1981), um argumentava que o Estado-Providência poderia
professor de sociologia na Universidade de limitar os impactos negativos das diferenças
Londres, considerado um clássico no estudo de classe nas oportunidades de vida de todas
do tema. Numa série de conferências realizadas as pessoas, ao mesmo tempo que permitia
na Universidade de Cambridge nos anos 50 um comprometimento delas próprias com o
do século XX, conceptualizou a cidadania sistema.
como um tipo específico de estatuto legal de
identidade oficial; juntamente, desenvolveu a Apesar de Thomas Marshall conceber a
noção de membro pleno de uma comunidade possibilidade de expansão dos direitos de
soberana que se autogoverna. Nos seus cidadania através do conflito no seio da
termos, a cidadania é um estatuto conferido sociedade civil, o desenvolvimento histórico
àqueles e àquelas que são membros plenos de não deve ser entendido como um processo
uma determinada comunidade. Tal como um linear e evolutivo, segundo o qual se dá uma
estatuto legal, a cidadania confere o direito a ter acumulação de direitos que passam a ser
direitos. A sua teoria de cidadania assenta num aceites como garantidos. Pelo contrário, os

por: Cristina Vieira (coord.), Conceição Nogueira e Teresa-Cláudia Tavares 033


*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3Up(VFRODU

direitos alcançados devem 7KRPDV0DUVKDOOGHVHQYROYHXXPHVTXHPDFODVVL¿FDWyULR


ser defendidos e exercidos H KLVWyULFR ,GHQWL¿FRX QD FLGDGDQLD WUrV HOHPHQWRV
continuamente, o que implica
HVWiGLRV  FRQFHSWXDLV H KLVWRULFDPHQWH GLVWLQWRV FRQV
a importância não só da
obtenção do poder, como WUXtGRV GH IRUPD HQFDGHDGD H TXH ID]HP SDUWH GH XP
também do seu contínuo GHVHQYROYLPHQWRWDPEpPHOHVHTXHQFLDO'HDFRUGRFRPR
exercício. DXWRURSULPHLURHVWiGLRQDFLGDGDQLDpDFLGDGDQLDFLYLO
RVGLUHLWRVLQHUHQWHVVmRRVGLUHLWRVIXQGDPHQWDLVjOLEHU
O trabalho deste autor tem
GDGH LQGLYLGXDO ± OLEHUGDGH GD SHVVRD OLEHUGDGH GH
gerado muito debate30. Para
Ruth Lister (1997), uma H[SUHVVmR SHQVDPHQWR H Ip R GLUHLWR j SURSULHGDGH H R
das principais razões para GLUHLWR j MXVWLoD -i TXH RV LQGLYtGXRV TXH SRVVXHP HVWHV
o carácter controverso GLUHLWRVFLYLVEiVLFRVH[LVWHPSHUDQWHDOHLWUDWDVHGHXPD
desta teoria de cidadania
HVSpFLH GH SHUVRQDOLGDGH OHJDO 8P VHJXQGR HVWiGLR p D
reside na forma como pode
funcionar, simultaneamente,
FLGDGDQLD SROtWLFD RV LQGLYtGXRV WrP GLUHLWR D SDUWLFLSDU
como mecanismo inclusivo e QRH[HUFtFLRGRSRGHUSROtWLFRFRPRPHPEURVGHXPFRUSR
excludente. Esta classificação LQYHVWLGRGHSRGHUSROtWLFR(VWHHVWiGLRUHSUHVHQWDRUHFR
pode ser muito proveitosa QKHFLPHQWREiVLFRHIRUPDOGDGRSHODVLQVWLWXLo}HVOHJDLVH
para se mostrar, por exemplo,
SROtWLFDVGRLQGLYtGXRFRPRXPPHPEURLJXDOHQWUHLJXDLV
como se caracteriza a
história das mulheres como QDVXDFRPXQLGDGHFRPRDOJXpPTXHWHPRGLUHLWR HDV
não-cidadãos. As mulheres REULJDo}HVUHODFLRQDGDV GHWRPDUGHFLV}HV SRUH[HPSOR
casadas inglesas no fim YRWDU  VREUH D FRPXQLGDGH )LQDOPHQWH IDOD GR WHUFHLUR
do século XIX não teriam HVWiGLRQRGHVHQYROYLPHQWRGDFLGDGDQLDOLEHUDOTXHWHUi
atingido ainda o primeiro
RFRUULGRGXUDQWHRVpFXOR;;DFLGDGDQLDVRFLDO$FLGD
estádio preconizado por
Thomas Marshall – podendo GDQLDVRFLDOHQYROYHRDFHVVRLQGLYLGXDOLQGHSHQGHQWHDRV
considerar-se pessoas a EHQV VRFLDLV EiVLFRV SURYLGHQFLDGRV SHOD FRPXQLGDGH
viver num sistema feudal. FRPR XP WRGR D WRGRV RV VHXV PHPEURV $VVLP R DFHVVR
O mesmo se pode dizer das GLVSRQLELOL]DGRDRVEHQHItFLRVGHEHPHVWDUVRFLDO±FXLGD
portuguesas, para quem
GRVPpGLFRVHDWRGDDJDPDGHSURJUDPDVGHEHPHVWDU
só muito mais tarde (muitas
conquistas são posteriores GHVGHDHGXFDomRjKDELWDomR±pRHOHPHQWRTXH7KRPDV
ao 25 de Abril de 1974) o 0DUVKDOO LGHQWL¿FD FRPR FLGDGDQLD VRFLDO (VWDV IRUPDV
estatuto de igualdade foi VRFLDLV GH FLGDGDQLD IRUDP LQVWLWXFLRQDOL]DGDV QD IRUPD
formalmente estabelecido GR (VWDGR3URYLGrQFLD $ EDWDOKD SHORV GLUHLWRV VRFLDLV
na lei, e consubstanciado
IXQGDPHQWDLVpDLQGDKRMHXPDUHDOLGDGHFRQWLQXDQGRD
na Constituição Portuguesa
de 1976. Assim, as críticas VHUDLQGDXPDDVSLUDomRHQmRFRQIRUPHRUHIHULGRDXWRU
fundamentais a este modelo SUHFRQL]DYDR¿PGDKLVWyULDGRFRQFHLWRGHFLGDGDQLD

30
As feministas criticam fortemente esta teoria, já que nesta evolução histórica dos direitos de cidadania não reveem os
direitos das mulheres. O facto de a teoria assumir que desde a sua implementação estes direitos foram universais – i.e.,
abrangeram todas as pessoas – ainda aumenta mais o argumento crítico. Como é possível pensar em todas as pessoas se
metade da população (as mulheres) estava excluída da cidadania política?

034 Lisboa, CIG, 2015


(148$'5$0(1727(Ï5,&2_*pQHURH&LGDGDQLD

proveem da sua lógica dominante sobre a cidadania a promoção dos interesses


evolucionista, que não inclui nas democracias liberais e do potencial individuais;
nem explica a história da ocidentais. Esta teoria assume permite a existência e
maioria de indivíduos – as um estatuto de igualdade e promoção da liberdade, isto
mulheres – ao assumir que de cidadania plena para todos é, da existência de seres
no início do século XIX a os adultos nascidos dentro do autossuficientes e libertos
cidadania, na forma de direitos território de um Estado da interferência de outros
civis, se tornou universal. preexistente. Parte do princípio indivíduos ou da comunidade.
Thomas Marshall atira para que – de um ponto de vista Desta perspetiva de direitos
as margens da universalidade meramente teórico e no que naturais e individuais, nasce
a história da cidadania das diz respeito à vida pública a ideologia do individualismo,
mulheres. Como sublinha – todos os membros das essencialmente abstrato,
Helena Araújo (1998), as sociedades (ocidentais) têm mas fundamentalmente em
mulheres foram excluídas um estatuto igual e possuem oposição à comunidade, que
da esfera pública, relativa iguais direitos. é assumida como potencial
ao Estado e à economia, Nos termos da tradição ameaça para essas mesmas
mas foram incluídas como liberal, a cidadania é definida liberdades individuais.
subordinadas, confinando-se a primeiramente como um
sua ação à esfera doméstica, conjunto de direitos individuais, Este individualismo abstrato
com ênfase para o exercício com funções diferentes, desenvolvido pela lógica
do dever da maternidade. sendo que uma das suas liberal depois do século XVIII,
Veremos adiante como no funções mais frequentemente e continuamente exacerbado
campo dos estudos de género valorizadas diz respeito à até aos dias de hoje, pode
os debates se têm centrado autonomia individual. Ou provavelmente explicar as
essencialmente à volta do seja: de acordo com esta ambivalências da teoria da
mecanismo excludente da teoria, os direitos são cidadania liberal face às
cidadania e da questão entre a encarados sobretudo na sua noções de responsabilidades
igualdade e a diferença. vertente de possibilitadores sociais e de direitos sociais.
e auxiliadores do espaço Assim, a ênfase liberal na
Depois da Segunda Guerra para o desenvolvimento autonomia individual implica
Mundial, o liberalismo individual. O desenvolvimento uma desconfiança básica
social tem sido a teoria pessoal, por sua vez, permite relativamente à noção e ideia
de comunidade. O receio que
a comunidade possa implicar
constrangimentos aos

³ ©  ©D©H[LJrQFLD©PDLV©SUHPHQWH©GRV©SRYRV©HXURSHXV©VmR©
RV©GLUHLWRV©FtYLFRV©H©VRFLDLV©TXH©GmR©IRUPD©D©XPD©YHUGDGHLUD©
interesses e desenvolvimentos
pessoais tem dado origem a
FLGDGDQLD© GHPRFUiWLFD©  © 2© REMHWLYR© GH© LQWURGX]LU© RV© um afastamento progressivo
GLUHLWRV©VRFLDLV©QRV©7UDWDGRV©GD©8QLmR©(XURSHLD©YLVD©HOHYDU© de uma lógica coletivista
R© VRFLDO© ID]HQGR© FRP© TXH© HVWH© GHL[H© GH© VHU© XPD© PHUD© de interesses comuns e
FRUUHomR© RX© VLPSOHV© DMXVWDPHQWR© GDV© FRQWLQJrQFLDV© GD© partilhados.
HFRQRPLD©SDUD©DVFHQGHU©DR©QtYHO©TXH©GHYH©RFXSDU©R©GH©XPD©
FDWHJRULD©GH©SHQVDPHQWR©GH©SROtWLFD©H©GH©DomR©YLQFXODGD©
Na prática, esta teoria não
j©YLGD©H©DR©GLUHLWR©TXH©WRGRV©WrP©D©OHYDU©XPD©YLGD©GLJQD©GH©
evita nem a persistência da
´
VHU©YLYLGD
0DULD©GH©/RXUGHV©3LQWDVLOJR©©
desigualdade, nem o aumento
da exclusão social, nem a
crescente complexificação e

por: Cristina Vieira (coord.), Conceição Nogueira e Teresa-Cláudia Tavares 035


*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3Up(VFRODU

dificuldade de resolução dos problemas que as as suas obrigações e direitos de cidadania em


sociedades enfrentam. No presente, colocam-se espaços múltiplos que incluem quer espaços
seriamente em causa as perspetivas próximos, como a vizinhança, as associações
liberais sobre igualdade, liberdade, direitos ou de sociedade civil, quer espaços locais e
representação política. A sociedade está cada espaços regionais, nacionais e supranacionais.
vez mais complexa e perspetivas limitadas Isto possivelmente pode vir a representar não
(como as de tipo nacionalista) de cidadania apenas fronteiras políticas mais fluidas, como
estão a mostrar-se completamente desajustadas também a emergência de uma “cidadania
e só poderão produzir fenómenos profundos de múltipla”, nas palavras de Derek Heater (1990).
exclusão. Os processos migratórios implicaram
uma complexa heterogeneidade que tem Temos de pensar num conceito de cidadania
implicações para as noções de identidade que implique direitos, mas também deveres,
baseadas na nacionalidade ou na etnicidade. ações, qualidades, méritos e opiniões que são
Por isso, se se pretender viver, compreender e consequência da relação quer entre o Estado e
promover sociedades onde a ordem e a justiça os indivíduos, quer destes entre si. Isso implica
social possam coexistir num mundo plural e uma conceção mais ampla de cidadania.
misto, como o são os Estados modernos, Assim, para o desenvolvimento de um sentido
é essencial que se faça uso de aspirações de cidadania inclusivo, é necessário que cada
igualitárias de cidadania distanciando-a cidadão ou cidadã desenvolva sentimentos
do conceito de nação e aceitando-se a de simpatia, empatia e solidariedade face aos
multiplicidade de “pertenças” das pessoas, outros e a outras culturas em particular. Para
como defendeu Karen O’Shea (2003). isso, é necessário uma política voltada para a
flexibilidade e a heterogeneidade, isto é, para
Concluindo, atualmente é possível conceber o a diversidade cultural, procurando desenvolver
exercício dos direitos e deveres de cidadania de políticas de interculturalidade, onde há respeito e
pessoas que residem num determinado espaço aceitação de todos, havendo igualmente direitos
geográfico (como a Comunidade Europeia) mais e deveres. Por isso se pode dizer que não existe
do que em qualquer Estado ou nação particular. uma única teoria unificadora de cidadania, mas
Cada vez mais os indivíduos podem exercitar pelo contrário várias tipologias e classificações.

036 Lisboa, CIG, 2015


(148$'5$0(1727(Ï5,&2_*pQHURH&LGDGDQLD



4XHUHODo}HVHQWUHJpQHURH
FLGDGDQLD"

6
ob a influência do pensamento imediato à questão fundamental do feminismo
pós-moderno, o estudo do contemporâneo, central nos debates sobre
género e da cidadania tem-se cidadania: o debate entre a igualdade e a
desenvolvido através de uma diferença.
série de fases diferentes, centrando-se grande
parte da dinâmica do debate na controvérsia No cerne deste impasse prevalecem duas
igualdade/diferença. Inicialmente, as críticas questões: (1) será que a diversidade implica
baseavam-se no carácter excludente da uma cidadania diferenciada, já não universal?
evolução de direitos (conforme preconizada (2) a reivindicação de políticas de diferença é
por Thomas Marshall, por exemplo), criticando- emancipatória (i.e., libertadora)?
-se a pretensa universalidade de direitos e
referindo-se a existência de desigualdades Na sua forma liberal, o conceito de
(ainda no presente) entre homens e mulheres cidadania apela à incorporação do ideal do
no que diz respeito a direitos de cidadania. universalismo. Neste âmbito, é suposto que
Esta constatação da exclusão das mulheres todos os indivíduos que podem legitimamente
da cidadania tem sido abordada por duas assumir-se como sendo cidadãos de um
vias distintas: uma que reclama a inclusão Estado partilhem uma igualdade de direitos e
nos mesmos termos em que os homens estão responsabilidades de cidadania. No entanto,
incluídos, e outra que reclama que a cidadania este universalismo gera graves situações de
deve ter em conta os interesses particulares exclusão, pois há pessoas que, pelo facto
das mulheres. No primeiro caso, as teóricas da de partilharem determinadas características,
igualdade reclamam uma cidadania neutra em são continuamente vítimas de exclusão. É o
termos de género, na qual as mulheres estejam caso, por exemplo, da desigualdade associada
incluídas e possam participar com os homens ao sexo, à raça, a emigrantes, a pessoas de
como cidadãs iguais, especialmente na esfera classes sociais economicamente desfavorecidas
pública. No segundo caso, para as teóricas ou de orientações sexuais minoritárias.
da diferença, o objetivo é uma cidadania É importante assegurar que pessoas e grupos
diferenciada, onde as responsabilidades e não sejam excluídos dos benefícios da cidadania
as competências da esfera privada – esfera devido a qualquer aspeto (global, particular
habitualmente associada às mulheres – sejam ou singular) da sua identidade. Por isso, há
reconhecidas, valorizadas e recompensadas. quem reclame para as mulheres uma política
Falam por exemplo da valorização do espaço de identidade e uma cidadania diferenciada,
privado e das competências associadas ao isto é, de reivindicação de direitos especiais e
cuidado. construída sobre direitos grupais.
Falar de pluralismo e diversidade mesmo entre
o grupo de mulheres e ao mesmo tempo Para as perspetivas que advogam a cidadania
assumir a desigualdade persistente leva-nos de diferenciada só será possível alcançar a

por: Cristina Vieira (coord.), Conceição Nogueira e Teresa-Cláudia Tavares 037


*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3Up(VFRODU

igualdade através de mecanismos


que reconheçam as vozes distintas
e as perspetivas dos grupos ³ © ¨ © R© YRWR© GDV© PXOKHUHV© p© REWLGR© GH© PRGR© PDLV©
SUHFRFH© QRV© (VWDGRV© 8QLGRV© QD© *Umõ%UHWDQKD© H©
oprimidos. Assim, a promoção de HP© PXLWRV© RXWURV© SDtVHV© SRU© UD]}HV© OLJDGDV© DRV©
uma cidadania sem carácter de IXQGDPHQWRV© ½ORVy½FRV© H© SROtWLFRV© GR© GLUHLWR© GH©
exclusão implica que se reconheça VXIUiJLR© 1D© DERUGDJHP© XWLOLWDULVWD© GD© GHPRFUDFLD©
a identidade particular dos grupos GRPLQDQWH© QRV© SDtVHV© DQJORõVD[yQLFRV© DV© PXOKHUHV©
sociais e, consequentemente, a FRQTXLVWDP© GLUHLWRV© SROtWLFRV© HP© UD]mR© GD© VXD©
necessidade de construção de uma HVSHFL½FLGDGH© &RQVLGHUDõVH© TXH© LQWURGX]HP© QD©
política da diferença. Uma política da HVIHUD© SROtWLFD© SUHRFXSDo}HV© H© XPD© FRPSHWrQFLD©
diferença caracterizar-se-ia: 1) pela SUySULDV© e© SRUWDQWR© HQTXDQWR© PHPEURV© GH© XP©
incorporação das identidades grupais JUXSR© UHSUHVHQWDQGR© LQWHUHVVHV© SDUWLFXODUHV© TXH© DV©
envolvidas, 2) pela representação PXOKHUHV© WrP© DFHVVR© DR© YRWR© 2© YRWR© GDV© PXOKHUHV©
grupal nas instituições, 3) pela LQVFUHYHõVH© DVVLP© QXPD© SHUVSHWLYD© GD© UHSUHVHQWDomR©
produção de políticas que indicassem GDV© HVSHFL½FLGDGHV© p© HQTXDQWR© PXOKHUHV© H© QmR©
de que forma foram tomadas em HQTXDQWR© LQGLYtGXRV© TXH© VmR© FKDPDGDV© jV© XUQDV©
consideração as perspetivas dos (P© )UDQoD© R© GLUHLWR© GH© VXIUiJLR© WHP© RXWUDV© UDt]HV©
grupos e, finalmente, 4) pelo poder VHQGR© GHULYDGR© GR© SULQFtSLR© GD© LJXDOGDGH© SROtWLFD©
de veto do grupo em relação a HQWUH©LQGLYtGXRV©2©XQLYHUVDOLVPR©j©IUDQFHVD©FRQVWLWXL©
políticas que especialmente lhe QHVWH© FDVR© XP© REVWiFXOR© DR© VXIUiJLR© IHPLQLQR© D©
dissessem respeito – por exemplo, o PXOKHU© p© SULYDGD© GR© GLUHLWR© GH© YRWR© HP© UD]mR© GD© VXD©
veto das mulheres para as políticas SDUWLFXODULGDGH©SRUTXH©QmR©p©XP©YHUGDGHLUR©LQGLYtGXR©
relacionadas com os direitos DEVWUDWR© SRUTXH© FRQWLQXD© D© VHU© GHPDVLDGR© PDUFDGD©
reprodutivos. SHODV© GHWHUPLQDo}HV© GR© VHX© VH[R© $R© PHVPR© WHPSR©
TXH©SRGHP©VHU©PXLWR©SUy[LPDV©DV©UHSUHVHQWDo}HV©GR©
Preenchidas estas condições, a SDSHO© GD© PXOKHU© QD© IDPtOLD© H© QD© VRFLHGDGH© LQGX]HP©
cidadania diferenciada quebraria DVVLP© HIHLWRV© ULJRURVDPHQWH© LQYHUVRV© HP© )UDQoD©
com o carácter universal da H© QD© PDLRU© SDUWH© GRV© RXWURV© SDtVHV© (P© )UDQoD© RV©
cidadania liberal, possibilitando a SUHFRQFHLWRV© IXQFLRQDP© QHJDWLYDPHQWH© LPSHGHP© D©
aspiração a uma política mais justa, PXOKHU© GH© VHU© SHUFHELGD© HQTXDQWR© LQGLYtGXR© VRFLDO©
para as sociedades cada vez mais UHPHWHQGRõD© SHUPDQHQWHPHQWH© SDUD© R© VHX© SDSHO©
pluralistas. Apesar do interesse desta GRPpVWLFR© TXH© D© LVROD© H© D© HQFHUUD© QXPD© UHODomR© FRP©
perspetiva – sendo uma tentativa RV© KRPHQV© TXH© p© GH© WLSR© QDWXUDO© © 1RV© SDtVHV© RQGH©
válida de ultrapassar os problemas UHLQD© XPD© DERUGDJHP© XWLOLWDULVWD© GD© GHPRFUDFLD© RV©
da modernidade e da cidadania SUHFRQFHLWRV© VREUH© D© QDWXUH]D© IHPLQLQD© FRQWULEXHP©
liberal –, ela acarreta também algumas SHOR©FRQWUiULR©SDUD©LQVWDXUDU©DV©PXOKHUHV©FRPR©JUXSR©
questões que interessa discutir. VRFLDO© EHP© GLVWLQWR© SRGHQGR© DVSLUDU© D© LQWHJUDUõVH© QD©
HVIHUD© SROtWLFD© SUHFLVDPHQWH© HP© UD]mR© GD© VXD© IXQomR©
A reivindicação de uma política da VRFLDO©SUySULD©
diferença e de cidadania diferenciada +i©DVVLP©GRLV©PRGHORV©GH©DFHVVR©j©FLGDGDQLD©SROtWLFD©
cria sérios problemas, porque SDUD©DV©PXOKHUHV©3RU©XP©ODGR©R©PRGHOR©IUDQFrV©TXH©
a sua adoção poderia levar a VH© LQVFUHYH© QXPD© HFRQRPLD© JHUDO© GR© SURFHVVR© GH©
situações que colocam em causa o LQGLYLGXDOL]DomR© H© QR© TXDO© D© REWHQomR© GR© VXIUiJLR©
potencial emancipador do próprio VH© OLJD© DR© UHFRQKHFLPHQWR© GR© HVWDWXWR© GH© LQGLYtGXR©
conceito de cidadania. O facto de a DXWyQRPR© 3RU© RXWUR© ODGR© R© PRGHOR© DQJORõVD[yQLFR©
teoria se basear no essencialismo TXH© LQVFUHYH© R© YRWR© GDV© PXOKHUHV© QXPD© SHUVSHWLYD©

´
(perspetiva segundo a qual algumas VRFLROyJLFD©JOREDO©GH©UHSUHVHQWDomR©GRV©LQWHUHVVHV
características são imutáveis e
3LHUUH©5RVDQYDOORQ©©õ
necessárias) atribuído a um ou mais
grupos, implica negar ou pelo menos

038 Lisboa, CIG, 2015


(148$'5$0(1727(Ï5,&2_*pQHURH&LGDGDQLD

subvalorizar fortemente a natureza construída a manutenção pela busca de igualdade de


das suas características diferenciadoras e, por direitos e oportunidades como um objetivo
isso, impedir as possibilidades de emancipação essencial, sendo a metodologia a procura de
desse grupo. Por exemplo: reivindicar uma áreas de compromisso, de criação de interesses
cidadania diferenciada para as mulheres, comuns e de sistemas de governação capazes
entendidas como um grupo que partilha de de acomodar as diferenças de forma pacífica.
forma imutável características próprias – que
devem ser valorizadas – não acabará por Esta aspiração política face à igualdade não
aumentar os problemas da desigualdade? necessita negar a diferença, já que uma
Reificar as diferenças justificando-as através ambição de igualdade pressupõe as diferenças
de mecanismos essencializadores pode ter iniciais. A igualdade de direitos e oportunidades
como efeito perverso manter a lógica grupal inclui precisamente respeitar os direitos de todos
e a assimetria simbólica a ela associada. os seres humanos, independentemente das
Resumindo, o essencialismo e mesmo a suas características, crenças ou identidades.
legitimação da existência dos próprios grupos
surgem como fortes problemas para a adoção
desta visão alternativa de cidadania.

As políticas da diferença, assim como o debate


entre a igualdade e a diferença, são assuntos
altamente desafiadores que estão na ordem
³ © $© SURPRomR© GD© LJXDOGDGH© GH© RSRUWXQLGDGHV©
H© GH© UHVXOWDGRV© ID]õVH© HVVHQFLDOPHQWH© DWUDYpV©
GH© SURJUDPDV© GH© DomR© SRVLWLYD© 5HSRXVD© VREUH©
do dia de todos quantos se preocupam
PHGLGDV© ¾H[tYHLV© H© VHOHWLYDV© VHJXQGR© REMHWLYRV©
com as questões de género, da cidadania e,
H© SULRULGDGHV© SUHYLDPHQWH© GHWHUPLQDGRV© H©
essencialmente, de desigualdade social.
HVFROKLGRV
9HUL½FDõVH© LJXDOPHQWH© XPD© PRGL½FDomR© GDV©
O feminismo contemporâneo demonstra uma
WpFQLFDV© GH© LPSOHPHQWDomR© XWLOL]DGDV© SHODV©
tensão contínua, quer a nível do pensamento e
DXWRULGDGHV© H© SHORV© PHFDQLVPRV© LQVWLWXFLRQDLV©
da teoria, quer a nível da ação, relativamente HQFDUUHJDGRV© GH© SURPRYHU© D© LJXDOGDGH© 3URFXUDõ
à ideia de, por um lado, ter de construir a õVH© PDLV© IUHTXHQWHPHQWH© SHUVXDGLU© LQ¾XHQFLDU© D©
identidade mulher/es dando-lhe um significado RSLQLmR©H©SURSRU©IyUPXODV©YROXQWiULDV©GH©UHDOL]DomR©
político sólido e, por outro, sentir a necessidade GRV©REMHWLYRV©½[DGRV©H©UHFRUUHõVH©PHQRV©D©PHLRV©
de desconstruir a categoria mulher: no que FRHUFLYRV© ¨ © e© LOXVyULR© SHQVDU© TXH© D© OHL© Vy© SRU©
respeita ao exercício pleno da cidadania, as VL© SRVVD© XOWUDSDVVDU© D© GLVFULPLQDomR© 4XDQGR© D©
mulheres querem ser iguais aos homens, ou GLVFULPLQDomR© OHJDO© GHVDSDUHFH© IRUPDOPHQWH© D©
assumir a biologia (ou a socialização) como GLVFULPLQDomR© VRFLDO© SHUPDQHFH© H© LQVWDODõVH© VRE©
estabelecendo uma diferença essencial? QRYDV© IRUPDV© jV© YH]HV© PXLWR© PDLV© VXEWLV© 'Dt© D©
QHFHVVLGDGH© GH© D© OHL© FRQWHU© SULQFtSLRV© GH© DomR©
Mas esta oposição entre igualdade e diferença SRVLWLYD
também pode ser vista como um produto do $© DomR© SRVLWLYD© QHFHVVLWD© GH© XPD© FRQMXJDomR© GH
individualismo abstrato; não parece haver razão DWRUHV© IRUoDV© FRQVWUDQJLPHQWRV© H© LQFHQWLYRV©
para supor que a igualdade e a diferença estão 'HYH© FRQVHJXLU© DWLQJLU© WRGRV© TXDQWRV© SRVVDP©
WRUQDUõVH© FXOSDGRV© GH© GLVFULPLQDomR© DVVRFLD©
inerentemente em oposição. A escolha entre
PpWRGRV© GHFRUUHQWHV© GD© DXWRDVVLVWrQFLD© FROHWLYD©
a igualdade e a diferença pode ser um falso
H© GD© LQWHUYHQomR© GR© (VWDGR© $© DomR© SRVLWLYD©
problema. A igualdade e a diferença constituem
QHFHVVLWD© LJXDOPHQWH© GD© FULDomR© GH© PHFDQLVPRV©
outra falsa dicotomia que devemos procurar LQVWLWXFLRQDLV© GH© XP© QRYR© WLSR© TXH© QmR© VHMDP©
dissolver. A maneira de isso começar a ser DSHQDV© HVWUXWXUDV© GH© SURWHomR© PDV© TXH©
conseguido é através da adoção de uma teoria HVWHMDP© LQFXPELGRV© GH© UHVROYHU© RV© SUREOHPDV© GD©
de cidadania não atomista, mas relacional. GLVFULPLQDomR
´
(OLDQH©9RJHOõ3ROVN\©©
Pretender a emancipação e uma cidadania
inclusiva das diversas identidades deve implicar

por: Cristina Vieira (coord.), Conceição Nogueira e Teresa-Cláudia Tavares 039


*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3Up(VFRODU



'HTXHIDODPRVTXDQGR
IDODPRVHPFLGDGDQLDH
HGXFDomR"

1
a atualidade fala-se cada vez ±'LULJHPVHDWRGDVDVSHVVRDVVHMD
mais de uma cidadania ativa, TXDOIRUDVXDLGDGHHRVHXSDSHOQD
emancipadora e múltipla. Esta VRFLHGDGH
conceção de cidadania implica
um conjunto de práticas a ser implementadas ±3UHVVXS}HPXPSURFHVVRGH
nos diferentes espaços sociais de educação e DSUHQGL]DJHPTXHSRGHGHVHQURODUVH
formação, as quais poderão envolver pessoas DRORQJRGDYLGDRTXDOGHVWDFD
de todas as idades, no sentido de as dotar
YDORUHVFRPRDSDUWLFLSDomRD
de competências de participação nos vários
SDUFHULDDFRHVmRVRFLDODHTXLGDGHH
domínios de vida.
DVROLGDULHGDGH
De acordo com Karen O’Shea (2003), estas
práticas de educação para a cidadania: Para a concretização desta educação para a
cidadania, há ainda que refletir sobre o modelo
±7rPFRPRREMHWLYRIXQGDPHQWDO universalista da escola, já questionado por
DSURPRomRGHXPDFXOWXUDGH Raul Itúrra (1990), dado que este não tem em
GHPRFUDFLDHGLUHLWRVKXPDQRV conta as especificidades culturais – as múltiplas
pertenças – dos seus alunos e alunas, os quais
±3URFXUDPIRUWDOHFHUDFRHVmRVRFLDOD já trazem consigo, à chegada à instituição
FRPSUHHQVmRP~WXDHDVROLGDULHGDGH escolar, uma bagagem de conhecimentos que
modelaram o seu entendimento do mundo e
±3}HPHPUHOHYRDH[SHULrQFLD
prepararam terreno para a incorporação de
LQGLYLGXDOHDEXVFDGHERDV novos saberes. Logo, no âmbito da educação
SUiWLFDVSDUDRGHVHQYROYLPHQWR para a cidadania, espera-se que a escola seja
GHFRPXQLGDGHVHPSHQKDGDVQR um espaço de respeito pela diversidade de
HVWDEHOHFLPHQWRGHUHODo}HVKXPDQDV quem a frequenta, não se correndo o risco
DXWrQWLFDV de culturas dominantes submergirem as
idiossincrasias culturais de grupos minoritários.
±2FXSDPVHGDSHVVRDHGDVVXDV
UHODo}HVFRPRVRXWURVGDFRQVWUXomR Nesta era de globalização económica (e
GHLGHQWLGDGHVSHVVRDLVHFROHWLYDVH infelizmente ainda não de uma globalização
GDVFRQGLo}HVGHYLGDHPFRQMXQWR da solidariedade), as desigualdades sociais

040 Lisboa, CIG, 2015


(148$'5$0(1727(Ï5,&2_*pQHURH&LGDGDQLD

aumentam de dia para a toda a hora e não parece de desenvolvimento humano,


dia, ameaçando direitos haver receitas consideradas como sejam o jardim de
humanos fundamentais. Só a adequadas a todas as infância ou os diferentes níveis
valorização da justiça social situações a enfrentar. de escolaridade formal. Não
e da solidariedade poderão Assim, esta perspetiva de é possível esperar de alguém
ajudar na construção de uma cidadania ativa e múltipla uma atuação congruente
sociedade solidária. implica uma ética de com os princípios da
participação – complexa e em cidadania tendo a igualdade
Esta solidariedade é, nesta diferentes níveis e contextos, como rota estruturante,
perspetiva, assumida quer na esfera pública, se esse alguém for (por
como uma responsabilidade quer na privada – sempre ausência de informação, por
e um dever de todos e de acordo com a lógica da exemplo) incapaz de tomar
de todas. A ligação que relação recíproca entre direitos decisões informadas e/ou
os comuns e recíprocos e deveres. Com efeito, as de interpretar criticamente
direitos e responsabilidades competências sociais e cívicas a realidade, se não tiver
estabelecem entre a promover deverão englobar, capacidade de autocrítica, ou
cidadãos/ãs pode sustentar indispensavelmente, um nível se a sua liberdade tiver sido
a comunidade política pelo mais individual de atuação e indevidamente sequestrada
menos de duas maneiras: níveis mais relacionais, como com base em motivos
possibilitando a construção sejam o interpessoal e o social de índole diversa, como
de uma solidariedade entre e intercultural. A discussão, estereotipias de género,
os membros da sociedade o respeito pelas ideias dos fundamentalismos religiosos,
e aumentando o número de outros, mas também a tradições culturais, etc.
indivíduos que participam reflexividade pessoal, são
(deste modo, aprendendo) nas competências fundamentais Seguindo as orientações
esfera da politica. a praticar em contextos do documento produzido
privilegiados de interação e recentemente pelo Fórum
Também o pluralismo cultural e
a prática da interculturalidade
é algo que urge assumir
por todas as pessoas com

³
responsabilidades educativas ©2©VHQVR©FRPXP©WHP©GH©VHU©RXWUD©pWLFD©H©HVVD©Ki©GH©VHU©
e formativas das gerações SUy[LPD©GD©TXH©QRV©p©SURSRVWD©SRU©+DQV©-RQDV©QR©VHX©'DV©
mais jovens, já que a 3ULQ]LS« GHU« 9HUDQWZRUWXQJ« pWLFD« GD« UHVSRQVDELOLGDGH « 2©
inevitabilidade de vivência SULQFtSLR©GD©UHVSRQVDELOLGDGH©D©LQVWLWXLU©QmR©SRGH©DVVHQWDU©
com a diversidade é clara. HP©VHTXrQFLDV©OLQHDUHV©SRLV©YLYHPRV©QXPD©pSRFD©HP©TXH©
É necessário promover a p© FDGD© YH]© PDLV© GLItFLO© GHWHUPLQDU© TXHP© VmR© RV© DJHQWHV©
interculturalidade, valorizar TXDLV© DV© Do}HV© H© TXDLV© VmR© DV© FRQVHTXrQFLDV© $VVHQWDUi©
a diferença e aceitar a DQWHV©QD©VRUJH©QR©FXLGDGR©TXH©QRV©S}H©QR©FHQWUR©GH©WXGR©
igualdade sem que isso R© TXH© DFRQWHFH© H© TXH© QRV© ID]© UHVSRQViYHLV© SHOR© RXWUR© 2©
RXWUR© TXH© SRGH© VHU© XP© VHU© KXPDQR© RX© JUXSR© VRFLDO© XP©
represente uniformidade
REMHWR© XP© SDWULPyQLR© D© QDWXUH]D© R© RXWUR© TXH© SRGH©VHU©
ou homogeneização. No
QRVVR© FRQWHPSRUkQHR© PDV© TXH© VHUi© FDGD© YH]© PDLV© XP©
entanto, temos de ter presente
RXWUR© IXWXUR© FXMD© SRVVLELOLGDGH© GH© H[LVWrQFLD© WHPRV© TXH©
que este é um campo que
necessita de grande reflexão
JDUDQWLU©QR©SUHVHQWH
´
%RDYHQWXUD©GH©6RXVD©6DQWRV©©õ
e de genuíno pensamento
crítico. Os dilemas espreitam

por: Cristina Vieira (coord.), Conceição Nogueira e Teresa-Cláudia Tavares 041


*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3Up(VFRODU

Educação para a Cidadania31 (2008: 73-75), GHWRGDVDVSHVVRDVWHQGRHPFRQWDD


poderemos dar como exemplo algumas SOXUDOLGDGHGHSHUWHQoDVLQGLYLGXDLV
competências essenciais a desenvolver nos/as
alunos/as para a vivência de uma cidadania não ±6DEHUFRPXQLFDUGHLJXDOSDUDLJXDO
restringida por estereotipias de género: FRPKRPHQVHPXOKHUHV
±$FHLWDUDVXDSUySULDLGHQWLGDGH ±6DEHUUHVSHLWDUDGLYHUVLGDGH
DVFDUDFWHUtVWLFDVSRVVLELOLGDGHVH KXPDQDH[HUFHUDOLEHUGDGHFXOWXUDO
OLPLWDo}HVGRSUySULRFRUSR QRTXDGURGRVGLUHLWRVKXPDQRVHGH
XPDFRQFHomRJOREDOHVLVWpPLFDGR
±9DORUL]DUDVH[SHULrQFLDVSHVVRDLV
PXQGRHPTXHYLYHPRV
FRPRFRQVWUXomRGDLGHQWLGDGH
±6DEHUUHFRQKHFHUDVLQMXVWLoDV
±'HVHQYROYHUDDXWRHVWLPDD
HGHVLJXDOGDGHVHLQWHUHVVDUVH
UHVSRQVDELOLGDGHRUHVSHLWRSRUVL
DWLYDPHQWHSHODSURFXUDHSUiWLFDGH
HSHODVRXWUDVSHVVRDVDFRUDJHP
IRUPDVGHYLGDPDLVMXVWDV
DSHUVLVWrQFLDDFDSDFLGDGHGH
VXSHUDomRGDDGYHUVLGDGHHD ±$GTXLULUFULWpULRVGHYDORU
D¿UPDomRGDFLGDGDQLDHPTXDOTXHU UHODFLRQDGRVFRPDFRHUrQFLDD
FLUFXQVWkQFLD VROLGDULHGDGHHRFRPSURPLVVRSHVVRDO
HVRFLDOGHQWURHIRUDGDHVFROD
±7HUDXWRQRPLDTXHUSDUDRFXLGDGR
LQGLYLGXDO « TXHUSDUDDVWDUHIDVGH ±6DEHUYLYHUHPSD]LJXDOGDGH
FXLGDGRLQHUHQWHVjYLGDIDPLOLDU «  MXVWLoDHVROLGDULHGDGHHSURPRYHU
HVWHVYDORUHVQDVVRFLHGDGHVSOXUDLVGRV
±7HUDXWRQRPLDSDUDRH[HUFtFLRGH
QRVVRVGLDV
XPDSUR¿VVmRHSDUDRDMXVWDPHQWR
DRVULVFRVGHFRQMXQWXUDVHFRQyPLFDV A cidadania numa sociedade plural implica um
GLYHUVL¿FDGDV conjunto amplo de aspetos – por exemplo, a
experiência da diferença e da reciprocidade,
±6DEHUFRPRSDUWLFLSDUVRFLDOPHQWH
a consciência de direitos e deveres
HFRPRDVVXPLUUHVSRQVDELOLGDGHV contextualizados, a aquisição de qualidades
GHVLJQDGDPHQWHGHOLGHUDQoDSDUD relacionais e de comunicação positiva e a
DFRQVWUXomRGREHPHVWDUFROHWLYR rejeição de desigualdades, de preconceitos
WDQWRDQtYHOORFDOFRPRJOREDO e de racismos. Cada aluno/a deve aprender
a ter responsabilidade pelas tarefas que tem
±6DEHUFRPXQLFDUQRUHVSHLWRSHOD de desempenhar como estudante e na vida
LJXDOOLEHUGDGHHSHODLJXDOGLJQLGDGH quotidiana para além da escola, de forma a

31
Não havendo aqui lugar para a descrição de todas as competências apresentadas nos eixos da postura cívica individual,
do relacionamento interpessoal e do relacionamento social e cultural, recomenda-se vivamente a consulta e utilização do
documento em questão, pois trata-se de um recurso valioso para todos os agentes educativos, no âmbito da educação
e formação para a cidadania. Este documento integra e sintetiza as principais conclusões saídas dos debates realizados
no âmbito do Fórum Educação para a Cidadania (constituído, no outono de 2006, por várias personalidades convidadas
pela Ministra da Educação e pelo Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros) e enquadra e sistematiza,
em medidas de política e de intervenção social, o que se considerou serem os objetivos estratégicos da Educação para a
Cidadania. Disponível em: http://www.dgidc.min-edu.pt/cidadania/Documents/FECidadaniaSP.pdf

042 Lisboa, CIG, 2015 http:


(148$'5$0(1727(Ï5,&2_*pQHURH&LGDGDQLD

desenvolver competências necessárias ao A resposta a esta questão apela a uma ênfase


exercício de uma verdadeira cidadania32. na ação, apela ao ensaio de comportamentos
É fundamental o desenvolvimento de valores, em espaços protegidos, como sejam a turma,
de atitudes, de padrões de comportamento o recreio, a família, o grupo de pares, as
e de compromissos. Uma parte central da associações recreativas, etc., espaços esses
educação para a cidadania deverá consistir cuja organização implícita e explícita espelhe
em explorar e discutir conceitos-chave da também ela exemplos de cidadania.
vivência democrática, valores de cariz universal Referimo-nos, em concreto, à existência de uma
e temas quotidianos do individual e do coletivo, boa gestão/liderança, quer ela diga respeito ao
tentando sempre fazer pontes com a vida real e estabelecimento de regras de funcionamento
levando os/as alunos/as a identificarem-se com desses mesmos grupos, quer ela se relacione
as temáticas em análise. Para James Banks com a participação democrática de todos os
(2008), torna-se imperioso que alunos e seus membros na tomada de decisões e na
alunas se comprometam genuinamente com partilha de deveres e responsabilidades.
uma atitude de mudança do mundo, no sentido
de o tornar mais democrático e justo. É fundamental, todavia, ter em conta que a
conceção de educação para/na cidadania
Refletindo sobre a miríade de competências varia em função da orientação adotada
e de saberes cognitivos e relacionais que relativamente à educação. Pode-se colocar
é suposto os/as alunos/as aprenderem a a ênfase numa educação orientada para
mobilizar, coloca-se a questão central: como os indivíduos, enquanto sujeitos que
ensinar e praticar a cidadania nos diferentes partilham características comuns, ou para
espaços educativos e formativos? o interesse público e coletivo, e estes dois
posicionamentos representam opções distintas
e, mesmo, antagónicas. Frequentemente
confunde-se educação para a cidadania

³
©©©©©6DEHõVH©TXH©D©FLGDGDQLD©QmR©VH©DSUHQõ
GH© SRU© YLD© GH© XP© HQVLQR© H[SRVLWLYR© RX©
com desenvolvimento pessoal dos alunos e
alunas, o que representa enfatizar a primeira
FRP©EDVH©QXPD©SHGDJRJLD©GD©DXWRULGDõ vertente do problema. Ensinar ou formar para
GH©3DUD©TXH©RV©YDORUHV©TXH©D©GLVWLQJXHP© a cidadania, tendo por base valores societais
VHMDP©LQFRUSRUDGRV©HOD©QHFHVVLWD©GH©VHU© comuns e promovendo a participação individual,
REVHUYDGD© HQVDLDGD© UHSUHVHQWDGD© H© seria importante para a formação de cidadãos
GLVFXWLGD© HP© HVSDoRV© ³HPRFLRQDOPHQWH©
e cidadãs independentes, autónomos/as, que
SURWHJLGRV´© H© FRP© UHFXUVR© D© PRGHORV©
participam nas instituições democráticas
SRVLWLYRV© H© DOFDQoiYHLV© 3DLV© PmHV©
e são atores dos seus próprios destinos.
SURIHVVRUHV© H© SURIHVVRUDV© ¯© H© WRGRV© RV©
Salvaguardar os interesses individuais, conhecer
UHVWDQWHV© DJHQWHV© HGXFDWLYRV© ¯© GHYHUmR©

´
FRQVWLWXLU©HVVHV©PRGHORV
e exercer os seus direitos, parece ser um
projeto louvável e frequentemente exequível.
&ULVWLQD©9LHLUD©©
Mas não é suficiente para ensinar/formar
na e para a cidadania.

32
Ao equacionarmos a possibilidade de qualquer projeto de educação para a cidadania na escola, pensamos também
nos contributos da perspetiva da pedagogia crítica, profundamente influenciada pelos trabalhos de Paulo Freire. Para a
promoção da democracia valoriza-se de forma fundamental o objetivo da justiça social, isto é, que a educação possa
“provocar mudanças na sala de aula mas também identificar e ensaiar estratégias que consciencializem os discentes a
envolver-se em mudanças sociais para além da sala de aula”, como escreveram Luísa Saavedra e Conceição Nogueira
(1999: 132).

por: Cristina Vieira (coord.), Conceição Nogueira e Teresa-Cláudia Tavares 043


*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3Up(VFRODU

torna-se fundamental o
conhecimento dos assuntos
³ ©$V©LQLFLDWLYDV©GH©HGXFDomRIRUPDomR©SDUD©D©FLGDGDQLD©QmR©
GHYHP© VHU© FRQIXQGLGDV© FRP© VHVV}HV© GH© GHVHQYROYLPHQWR© que implicam a relação dos
SHVVRDO© XPD© YH]© TXH© D© rQIDVH© GDV© DWLYLGDGHV© QmR© GHYH© VHU© indivíduos com a sociedade.
FRORFDGD© QR© SUySULR© LQGLYtGXR© PDV© VLP© QD© VXD© SHUWHQoD© D© Neste âmbito, todos os/as
XPD©FRPXQLGDGH©VHQGR©UHDOoDGRV©DVSHWRV©FRPR©D©SDUWLOKD© que acreditam num projeto
D©FRRSHUDomR©R©GLiORJR©R©HQWHQGLPHQWR©P~WXR©HWF©
.DUHQ©2´6KHD©
´ emancipatório de educação
para a cidadania reconhecem
o valor do aprofundamento
de problemáticas como o
desenvolvimento sustentável,
Por essa razão, a defesa da paralisadoras de projetos ou da análise – orientada para
educação para a cidadania, verdadeiramente igualitários. a procura de soluções – das
tendo por suporte o garante A liberdade individual e os questões das desigualdades,
da defesa dos interesses direitos que lhe são inerentes da pobreza, dos problemas
individuais, tem sido criticada só podem ser garantidos dos emigrantes e das minorias,
por enfatizar os direitos dos tendo por base as instituições dos riscos ambientais, dos
cidadãos e das cidadãs democráticas de suporte, fundamentalismos religiosos,
em detrimento das suas sem as quais a própria da exclusão social.
responsabilidades no âmbito liberdade fica comprometida.
de uma convivência coletiva. As responsabilidades para
Neste sentido, poderia com todas as instituições que Reconhecer a contribuição
ser perspetivada como mantêm a sociedade e para da diferença e da diversidade
educação para uma cidadania a sociedade de uma forma para a sociedade atual – e
consumista, como lhe chamou geral são, por isso, garantias não procurar submergi-
Paulo Freire (1995), na medida das liberdades individuais. -las – deve ser também
em que se enfatiza a exigência Com esta orientação, uma um aspeto crucial na
dos direitos para garantir educação para o exercício educação para a cidadania.
os interesses individuais. de uma verdadeira cidadania As abordagens experienciais
Consideramos importante pretende esbater a tensão são consideradas as
que a população infantil e entre projetos individuais e mais adequadas a este
juvenil esteja consciente dos coletivos. tipo de formação, já que
seus direitos mas também A educação para a cidadania valorizam a mobilização
das suas responsabilidades, perspetivada como lógica direta dos saberes na
enquanto cidadãos e cidadãs. relacional entre indivíduo prática, a implicação dos/as
Educar para e na cidadania e comunidade, através da aprendizes/as nas situações
implica educar para a complementaridade entre concretas analisadas e a
consciencialização da relação direitos e deveres, pode possibilidade de eles/as
recíproca entre direitos e implicar escolhas no que diz mesmos/as protagonizarem
deveres. Direitos e deveres não respeito aos assuntos a tratar tais situações. O trabalho
são polos de uma dicotomia, ou a conhecer, assim como em grupos, o debate de
mutuamente exclusivos, relativamente à melhor forma assuntos (implicando
mas sim complementares. de os ensinar ou de os ensaiar consciencialização, reflexão
Numa orientação de e praticar efetivamente. Para crítica e mudança de atitudes),
cidadania mais ativa e plural além do conhecimento das o envolvimento estudantil nas
pretende-se a dissolução de estruturas políticas, base estruturas administrativas
dicotomias frequentemente de suporte democrático, da escola, assim como

044 Lisboa, CIG, 2015


(148$'5$0(1727(Ï5,&2_*pQHURH&LGDGDQLD

em projetos externos de participação (por individualismo, no qual a globalização da


exemplo, através de ações de voluntariado em economia, das comunicações e da cultura vão
instituições de solidariedade social próximas) a par com o ressurgimento dos nacionalismos,
são ações positivas de educação para/na do racismo e da violência33, Paulo Freire (1997)
cidadania, numa lógica de envolvimento reivindicou uma educação, uma ética e uma
educativo amplo. Desta forma, a educação para cultura para a diversidade. Para as atingir deve
a cidadania será um processo de verdadeira pensar-se num novo cenário para a educação:
capacitação dos/as discentes de todas as reconstruir o saber da escola e a formação de
idades, que resultará num comprometimento quem educa. Isto implica, no entender de Luísa
genuíno com a transformação social, com o Saavedra e Conceição Nogueira (1999), levar
cuidado com o ambiente, e com a valorização e os e as discentes – mas também todos e todas
partilha do espaço público. com responsabilidades educativas e formativas
– a desenvolver as competências necessárias
Como resposta à preocupação relativa ao tipo para se saberem localizar na história, para
de educação que homens e mulheres deste encontrarem as suas próprias vozes e para
século necessitam para viver num mundo formarem as convicções necessárias ao
complexo, pautado por um certo triunfo do exercício capaz da democracia.

33
Claro que existe também a possibilidade de construção de redes de cidadania a nível global que são de valorizar e
incentivar.

por: Cristina Vieira (coord.), Conceição Nogueira e Teresa-Cláudia Tavares 045


*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3Up(VFRODU



&RQVWUXLQGRSUiWLFDVGH
FLGDGDQLD

$
educação formal deve ser termos de opiniões e práticas; deverá ser
vista apenas como uma capaz de exercer algum tipo de influência
das componentes de um sobre o mundo; e deverá ser ativo/a nos seus
conjunto de políticas sociais grupos de pertença, como defenderam Rolf
e de programas que deverão ser assumidos Gollob e Peter Krapf (2007). Em suma, deverá
oficialmente e postos em prática (com o ser responsável na forma como exerce a sua
devido acompanhamento e monitorização) cidadania, quer no desempenho de papéis
para a promoção de um sentido pleno de privados (por exemplo, filha, esposa, marido,
cidadania global em todas as pessoas. E para pai, filho, mãe), quer no desempenho de papéis
que tal ultrapasse uma mera declaração de sociais e profissionais (por exemplo, professor/a,
intenções, é indispensável não só a elaboração educador/a, formador/a).
de recursos pedagógicos e didáticos, mas
também o reequacionamento da formação inicial 6HQGRLQGLVSHQViYHODDERUGDJHP
e contínua de quem tem responsabilidades GDLJXDOGDGHGHJpQHURQRkPELWR
educativas e formativas. Ensinar, orientar e
GDHGXFDomRSDUDDFLGDGDQLD
promover ações no âmbito da educação
UHYHODVHIXQGDPHQWDODIRUPDomR
para a cidadania implica, antes de tudo, ser-se
genuinamente cidadão ou cidadã. E isso apela HDFRQVFLHQFLDOL]DomRGHWRGRVRV
ao desenvolvimento de uma consciência crítica DJHQWHVHGXFDWLYRVSDUDDLPSRUWkQFLD
em torno do papel individual na manutenção GRJpQHURQDPRGHODomRGRV
das desigualdades, devendo levar cada FRPSRUWDPHQWRVGHVGHRVSULPHLURV
pessoa, nessa sequência, à assunção de DQRVGHYLGDGDVFULDQoDV$DWXDomR
responsabilidades, ao respeito por si e pelos GDVHVWHUHRWLSLDVGHJpQHURWHQGHD
outros, à adoção de valores de cariz universal
VHUVXEUHSWtFLDRVGDQRVFDXVDGRV
e à promoção de uma cultura de justiça, paz e
solidariedade.
jDXWHQWLFLGDGHGRGHVHQYROYLPHQWR
LQGLYLGXDOWHQGHPDVHUHTXLYDOHQWHV
Um cidadão ou uma cidadã informado/a, SDUDFULDQoDVGHDPERVRVVH[RVHD
ativo/a e responsável deverá estar consciente WRPDGDGHFRQVFLrQFLDGHVWHIDFWRSRU
dos seus direitos e responsabilidades enquanto SDUWHGRVKRPHQVHGDVPXOKHUHVSRGH
membro da sociedade; deverá conhecer o QXQFDDFRQWHFHU
mundo social e político; deverá preocupar-se
-com o seu bem-estar e com o das outras A escola, dado o seu protagonismo não só na
pessoas; deverá mostrar-se congruente em transmissão de conteúdos disciplinares, mas

046 Lisboa, CIG, 2015


(148$'5$0(1727(Ï5,&2_*pQHURH&LGDGDQLD

também na formação do ser em termos multinacionais. SULQFLSDOGRWDUWRGRVH


humano enquanto membro de Além do mais, aprender, WRGDVGDVFRPSHWrQFLDV
uma sociedade que partilha ensinar, ensaiar e praticar QHFHVViULDVj
valores e pressupõe o usufruto efetivamente cidadania pode
SDUWLFLSDomRFtYLFDH
de direitos e o exercício de acontecer em muitas esferas
deveres e responsabilidades, da vida de todos os dias, pode
SROtWLFDjFRQYLYrQFLD
é vista aqui como podendo envolver pessoas de diferentes P~WXDHPVRFLHGDGH
ter um papel realmente idades e deve ter um impacto DRUHFRQKHFLPHQWRGD
transformador. Essas práticas de tal forma transformador GLIHUHQoDDRUHVSHLWR
transformadoras podem que as implicações daí SHODDOWHULGDGHHj
ser logo ensaiadas desde decorrentes se estendam para HGL¿FDomRGHXP
o jardim de infância, que lá do contexto pessoal/local e
IXWXURFRPXP¿UPH
deve ser encarado como um tenham um papel positivo na
GRSRQWRGHYLVWDpWLFR
espaço por excelência de construção dos fundamentos
vivência inicial de cidadania de um mundo melhor. HLQGXELWDYHOPHQWH
numa fase crucial da vida das IHOL]3DUDWDOH
crianças para a apropriação 3DUWLQGRGDFHUWH]D SDUDIUDVHDQGR$QD
de estereotipias34 – sendo GHTXHRUHVSHLWR 0DULD&UX]KiTXH
as de género, como vimos,
SHODOLEHUGDGHH SURPRYHUHPWRGDV
fortemente normativas neste DVHQWLGDGHVFRP
SHODLJXDOGDGH
período do desenvolvimento
FRQVWLWXHPYDORUHV UHVSRQVDELOLGDGHV
humano.
IXQGDPHQWDLVTXH HGXFDWLYDVGDV
No mundo globalizado em que VHPSUHDFRPSDQKDUDP JHUDo}HVPDLVQRYDV
vivemos, palco de múltiplas DHYROXomRGRFRQFHLWR HWDPEpPQHVWDV
identidades e espaços de GHFLGDGDQLDFRPR ~OWLPDVDUHFRQVWUXomR
participação, a educação e SRGHOHUVHQRYDOLRVR GH³ROKDUHVTXHQmR
a formação para a cidadania
GRFXPHQWRUHVXOWDQWH VHMDPQLYHODGRUHV
podem ocorrer na escola e em
GR)yUXP(GXFDomR GDVGLIHUHQoDVPDV
todos os locais de vida dos
SDUDD&LGDGDQLD SURIXQGDPHQWH
cidadãos e das cidadãs, no
sentido de os e as capacitar  WRUQDVH UHVSHLWDGRUHVGDVRSo}HV
para a participação individual LPSHULRVRWUDQVIRUPDU GHYLGDGDVSHVVRDV
e coletiva nos espaços de DDEVWUDomRTXH PXOKHUHVHKRPHQV´
intervenção social envolventes. RVFDUDFWHUL]DHP  
O conceito de cidadania deve
HVWUDWpJLDVHGXFDWLYDV
ser equacionado em termos Dado que as instituições
FRQFUHWDV(VWDIRUPD
da prática democrática ao escolares são uma parte
nível dos contextos locais JHUDOGHDWXDomR integrante da sociedade, as
e concretos, apesar de se TXHSRGHUiDVVXPLU desigualdades nas escolas
poderem equacionar hipóteses PRGDOLGDGHVGLYHUVDV podem ser um sintoma, assim
de participação múltipla, WHUiFRPRREMHWLYR como uma consequência, de

34
AAVV (2008), Fórum Educação para a Cidadania. Objectivos Estratégicos e Recomendações para um Plano de Acção de
Educação e de Formação para a Cidadania, Lisboa, p. 8 [em linha] disponível em http://www.min-edu.pt/np3content/?new
sId=297&fileName=edu_cidadania.pdf [consultado em 15/07/09].

por: Cristina Vieira (coord.), Conceição Nogueira e Teresa-Cláudia Tavares 047


*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3Up(VFRODU

desigualdades mais alargadas. No entanto, as construam de forma ativa e empenhada um


desigualdades educacionais necessitam ser mundo que é o seu.
tomadas em consideração, já que o futuro dos
e das estudantes enquanto cidadãos e cidadãs, É verdade que a educação para a cidadania
assim como o de toda a sociedade civil, estará – assim como a educação de uma forma
comprometido se eles e elas não receberem geral – por si só não resolverá os problemas
uma educação que lhes permita desenvolver que as pessoas enfrentam no seu quotidiano.
o seu potencial e participarem ativamente na No entanto, pode chamar a atenção para as
construção de uma sociedade que – sendo a responsabilidades individuais e para o exercício
democracia uma condição do desenvolvimento das mesmas e assegurar que as pessoas estão
e não uma causa – se pretende cada vez mais capazes de viver as suas vidas baseadas nos
democrática. A democracia requer, tanto o princípios da paz, da harmonia, do respeito e da
suporte efetivo das instituições do Estado, tolerância, e que saberão identificar a potencial
como uma sociedade civil forte. Não é suficiente violação desses modos de ser e de estar com
que o Estado legisle de forma a assegurar que os outros cidadãos e cidadãs. Neste âmbito, a
as condições mínimas da democracia sejam educação para a cidadania deve perspetivar-se
conseguidas, nem é suficiente que se iniciem como um local privilegiado para a construção de
apenas discussões de questões controversas uma educação emancipatória numa sociedade
para tentar encontrar consensos. É também verdadeiramente democrática para mulheres
vital que quer crianças e jovens, quer docentes e homens, independentemente das suas
participem nas discussões políticas, que sejam pertenças identitárias.
capazes de aprender através dos erros e que

048 Lisboa, CIG, 2015


(148$'5$0(1727(Ï5,&2_*pQHURH&XUUtFXORQD(GXFDomRGH,QIkQFLD


*pQHURH&XUUtFXORQD
(GXFDomRGH,QIkQFLD

±1DV© VRFLHGDGHV© PRGHUQDV© H© GHPRFUiWLFDV© pedagógicos perpetuam a ideia que a tradicional


R© IXWXUR© GH© FDGD© KRPHP© H© GH© FDGD© PXOKHU© categoria Homem inclui a diversidade da
QmR©REVWDQWH©D©VXD©UDoD©D©VXD©UHOLJLmR©H©D©VXD© existência humana (ou seja, representações do
FODVVH© VRFLDO© GHSHQGHUi© VHJXUDPHQWH© GDV©
mundo baseadas na ideia de que o masculino
VXDV©FDSDFLGDGHV©H©GDV©RSRUWXQLGDGHV©TXH©OKH©
IRUHP©RIHUHFLGDV©SDUD©DSUHQGHU©SDUD©H[SORUDU© [é] neutro). Por essa razão, urge refletir sobre
H©SDUD©H[SHULHQFLDU©GHVD½RV² que tipo de cidadania fomentamos nos nossos
&ULVWLQD©9LHLUD©© alunos e alunas.

Manuel Jacinto Sarmento (2006) chama uma

$
cidadania íntima a um espaço de afirmação da
educação para a cidadania deve identidade e da alteridade, de reconhecimento
trabalhar-se desde a mais tenra de uma diferença não menorizante no que
infância de forma abrangente, tal toca ao género, cultura, religião, origem social
como é abrangente a forma como ou étnica, língua, etc. Esta forma última de
desde cedo as crianças aceitam e integram cidadania coloca os outros no centro, leva-nos a
positivamente a diversidade. ultrapassar interesses corporativos imediatos e a
aceitar o outro como colocando limites à nossa
Uma componente fundamental da cidadania própria individualidade (Teresa Vasconcelos,
prende-se com as questões de género: como 2007). O sistema escolar de hoje está longe de
educamos para as questões de género? De a promover.
que forma (mercê da seleção dos materiais,
jogos e livros que proporcionamos) tornamos A educação pré-escolar é a primeira etapa da
os espaços escolares (nomeadamente as educação básica no processo de educação ao
instituições para as crianças mais pequenas) longo da vida. Complementa a ação educativa
espaços não-promotores de estereótipos de da família, com a qual deve estabelecer
género e de “raça”? estreita cooperação. Favorece a formação e o
desenvolvimento equilibrado da criança e tem
Os estudos mostram que os materiais em vista a sua plena inserção na sociedade
pedagógicos portugueses, em particular os como ser autónomo, livre e solidário.
manuais escolares e produtos multimédia que
os acompanham (ver por exemplo, Maria Teresa As instituições de educação de infância têm-se
Alvarez Nunes, 2007), continuam a veicular constituído como espaços em que o papel
conceções estereotipadas de homem/mulher pedagógico (profundamente diferenciado do
e representações do mundo desfasadas da modelo escolar tradicional) se caracteriza
realidade social. Em suma, estes materiais por uma ação indirecta sobre as crianças.

por: Maria João Cardona (coord.), Cristina Vieira, Marta Uva e Teresa-Cláudia Tavares 049
0
*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3UpHVFRODU

Esta ação é mediada O currículo promove a vez maximiza a possibilidade


por propostas à sua educação para a cidadania, de eventuais conflitos durante
atividade para que levem integrando a aceitação da a infância e a adolescência
a cabo livremente as suas diversidade como meio (Maria João Cardona, 1997).
aprendizagens (Maria João de fomentar uma maior Logo no jardim de infância
Cardona, 2006: 73). A igualdade de oportunidades a qualidade da competência
educação de infância surge e participação. As questões social da criança prognostica
como um espaço onde a referentes à promoção de uma competências académicas e
criança pode ser ela própria, maior igualdade de género sociais em anos posteriores
desenvolvendo livremente o não estão suficientemente (Anthony Pellegrini e Carl
seu ofício de brincar (Jean explícitas. Urge desenvolver Glickman, 1990), diminuindo o
Claude Chamboredon e Jean uma maior reflexão sobre esta risco de insucesso académico,
Prévot, 1982). problemática essencial para abandono escolar ou
todo o trabalho inerente à delinquência na adolescência
Ao contrário da escola, que educação para a cidadania. e na idade adulta.
se constituiu como um local
de ensino das gerações mais O facto de a prática do/a ³ « SRGHKDYHUDOJXPD
novas, as primeiras instituições educador/a concretizar os
FRLVDDGL]HUDIDYRUGD
para as crianças pequenas valores deste/a no quotidiano
foram criadas para responder do jardim de infância permite
GLVFXVVmRHUHVROXomR
a uma necessidade social. Só que a educação pré-escolar GHSUREOHPDVGHSRLV
depois de muitos anos a sua seja um contexto social GHSDVVDURPRPHQWR
função educativa começou e relacional facilitador da TXHQWHORQJHGD
a ser valorizada (Maria João educação para os valores. SHUWXUEDomRGRFRQWH[WR
Cardona, 1997). Atualmente, Embora a criança inicie
« =DKDYLH$VKHU
a educação pré-escolar é desde que nasce o seu
reconhecida como um espaço desenvolvimento pessoal e
 SRUH[HPSOR
de aprendizagem fundamental social no seio da família e no UHIHUHPTXHDVFULDQoDV
na vida das crianças. Está meio sociocultural em que GDSUpHVFRODTXH
comprovado o seu papel vive, a educação pré-escolar GHEDWHUDPEUHYHPHQWH
na promoção do sucesso é um contexto mais alargado FRPRSURIHVVRUDV
educativo, contribuindo para que lhe possibilita a interação
FRQVHTXrQFLDVGR
uma maior igualdade de com outros adultos e crianças
oportunidades entre todas as que poderão ter diferentes
FRPSRUWDPHQWR
crianças no acesso à escola. valores e perspetivas, VRFLDOSRVLWLYRRX
promovendo-se assim a QHJDWLYRWLYHUDP
Sendo a educação pré- tomada de consciência de si e FRQVHTXHQWHPHQWHXP
-escolar um contexto favorável do outro. FRPSRUWDPHQWRPHQRV
para que a criança tome
DJUHVVLYR´ /LOLDQ.DW]
consciência de si e do outro, No entanto, quanto mais
assume-se a centralidade diversificada é a rede de

de uma educação para os interações sociais – a rede de
valores, sendo a formação contactos com outros grupos –, A relação que o/a educador/a
pessoal e social uma área tanto maiores tendem a ser as estabelece com cada criança,
integradora de todo o contradições entre os valores a forma como a valoriza,
processo de educação familiares e os valores do respeita, estimula, encoraja,
pré-escolar (ME, 1997: 20). mundo exterior, o que por sua constitui também um modelo

0
050 Lisboa, CIG, 2015
(148$'5$0(1727(Ï5,&2_*pQHURH&XUUtFXORQD(GXFDomRGH,QIkQFLD

para as relações que as crianças estabelecerão anos, a criança é capaz de identificar certos
com outrem (ME, 1997: 53). Neste sentido, o brinquedos, objetos domésticos e acessórios
papel do/a educador/a, a sua intencionalidade de vestuário como sendo mais típicos dos
educativa, a forma como organiza o ambiente homens ou das mulheres, expandindo-se
educativo, torna-se preponderante para um essa lista ao longo dos anos pré-escolares
desenvolvimento curricular que desemboque e passando a englobar comportamentos
numa ação pedagógica articulando positiva e individuais, atividades específicas e inclusive
democraticamente as questões curriculares e de profissões (Eleanor Maccoby, 1998). Como é
género. óbvio, este pensamento estereotipado influencia
a forma como cada criança se define enquanto
Contrariando o que está definido a nível membro do grupo dos homens ou do grupo
legislativo, o nosso sistema educativo está das mulheres, condiciona o seu comportamento
ainda longe de promover a igualdade de social para com os pares e para com os adultos
oportunidades. Nomeadamente, diferencia o e modela a avaliação que é feita das outras
tratamento e os valores transmitidos aos rapazes pessoas em função da categoria sexual de
e às raparigas. Apesar da evolução que se pertença.
verificou desde abril de 1974, em Portugal
continuam a existir grandes diferenças que As crianças em idade pré-escolar começam
afetam ambos os sexos. por aprender os estereótipos relativos ao seu
sexo, passando depois a conhecer aqueles
É certo que o insucesso escolar tem sido, nas que dizem respeito ao sexo oposto, sendo este
últimas décadas, uma preocupação política processo equivalente em rapazes e raparigas.
que levou à criação de programas e medidas No entanto, na opinião de Carol Martin (1989), é
específicas. Contudo, muitas vezes são somente por volta dos 8-9 anos de idade que a
apresentadas “falsas soluções” que mantêm as maioria das crianças é capaz de evidenciar uma
desigualdades sociais (Luísa Saavedra, 2001). sólida compreensão das expectativas sociais
Paralelamente, cada vez mais as famílias se associadas ao género.
preocupam com a educação dos/as seus/suas
filho/as, desde a educação pré-escolar. Como foi dito no primeiro capítulo, ao mesmo
A valorização do potencial educativo das tempo que a criança (logo a partir dos dois
instituições de educação pré-escolar surge anos) inicia o processo de formação da sua
a par do reconhecimento do seu papel na identidade de género e começa a dar provas
promoção do sucesso educativo, criando uma que conhece os estereótipos de género, surge
maior igualdade de oportunidades entre todas da sua parte a exibição de comportamentos
as crianças no acesso à escola (Maria João estereotipados, sobretudo em situações não
Cardona, 1997). estruturadas por adultos, em que pode interagir
livremente com os pares. Refira-se, a título de
A criança constrói a sua autoestima desde exemplo, a escolha dos brinquedos (Bussey
os seus primeiros anos de vida, à medida que e Bandura, 1992) ou ainda a preferência por
se constrói a si mesma, na sua individualidade crianças do mesmo sexo, quando se trata
– sexo feminino ou masculino, de “raça de estabelecer amizades (Eleanor Maccoby,
branca”, “raça negra” ou etnia cigana, de um 1998). Tanto num caso como no outro, a
determinado país de origem, meio social ou tendência para a exibição de comportamentos
religioso (Teresa Vasconcelos, 2007). No que estereotipados tende a acentuar-se, em ambos
concerne às aprendizagens associadas ao os sexos, durante os anos correspondentes à
género, sabe-se que, logo a partir dos três educação pré-escolar.

por: Maria João Cardona (coord.), Cristina Vieira, Marta Uva e Teresa-Cláudia Tavares 051
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*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3UpHVFRODU

Sendo a aprendizagem OLPLWDGDSDUDSHQVDU através de atividades que,


dos diversos papéis sociais FULWLFDPHQWHDFHUFD embora levando em conta os
realizada desde as idades mais GHWXGRRTXHRPXQGR seus contextos de vida e as
precoces, quando as crianças suas idiossincrasias (isto é,
VRFLDOOKHWUDQVPLWH
aprendem a diferenciar os as diferenças individuais que
papéis sociais atribuídos a $VH[SHULrQFLDV influenciaram tais aquisições),
mulheres e homens, é também YLYLGDVORJRGHVGH façam uso da “plasticidade
precocemente que começa RVSULPHLURVDQRV mental” ( da maleabilidade do
uma excessiva diferenciação VmRGHIXQGDPHQWDO cérebro) das crianças desta
que muitas vezes está na base faixa etária.
LPSRUWkQFLDSDUD
de futuras desigualdades de
participação na vida familiar e
RGHVHQYROYLPHQWR Uma intervenção que promova
profissional (Ana da Silva, et LQGLYLGXDO o desenvolvimento das
al., 2001). $FULDQoDHQFRQWUDVH capacidades atrás descritas
formará indivíduos menos
QXPHVWiGLRHPTXH
Por conseguinte, e tendo estereotipados em relação
pQHFHVViULRHVWDEHOHFHU
igualmente em conta a categorias que baseiam
evidências ao nível da
IURQWHLUDVHLQWHUQDOL]DU discriminações infundadas:
investigação, é necessário DWLYLGDGHVWtSLFDV género, mas também, por
intervir cada vez mais cedo HPRGRVGHFRQGXWD exemplo, “raça”. Este tipo de
e – preferencialmente – de FRQVRQDQWHVFRPRVHX atuação precoce estimula
forma concertada com JpQHUR´ 6DNHOODULRX igualmente o sucesso
outras instâncias educativas   académico, a diminuição dos
fundamentais neste período problemas emocionais e o
da vida, como é o caso da Com efeito, durante os anos estreitamento da relação entre
família. É aqui que se torna pré-escolares (dos três aos cognição e controlo emocional
determinante o papel da cinco) assiste-se a um rápido (Esther Leerkes et al., 2008).
educação pré-escolar, numa desenvolvimento cognitivo
dinâmica de interação adulto- e afetivo da criança, sendo Refletindo sobre o papel e
-criança que veicule o trabalho este um período de excelência funcionamento das instituições
de equipa baseado numa para a promoção de aspetos educativas, lemos que
relação de apoio entre adultos como a identificação e
e que, assim, constitua uma o controlo das emoções ³$VSUiWLFDVHVFRODUHV
base sólida para a educação (Esther Leerkes et al., 2008), HRVFXUUtFXORVQmRVmR
da criança pequena. Para a assunção de perspetivas PHURVWUDQVPLVVRUHVGH
Maria Sakellariou (2008), e o estabelecimento de UHSUHVHQWDo}HVVRFLDLV
esta fase da vida das empatia (Benjamin Hinnant TXHHVWmRDFLUFXODU
crianças, anterior ao início da e Marion O´Brien, 2007), ou
escolaridade formal, assume
QDOJXPOXJDUOiIRUD
mesmo a capacidade para
particular relevância para VmRLQVWkQFLDVTXH
se efetuar a distinção entre
o trabalho em torno das FDUUHJDPHSURGX]HP
a “aparência” e a realidade
questões de género, pelas (Andy Forceno, 2008).
UHSUHVHQWDo}HV
seguintes razões: Todas estas aprendizagens 2VLOrQFLRHPWRUQRGDV
parecem-nos fundamentais ³QRYDV´LGHQWLGDGHV
³$FULDQoDSRVVXL para a desconstrução das VH[XDLVHGHJpQHUR
XPDFDSDFLGDGH estereotipias de género FRQVWLWXLVHQXPDIRUPD

052 Lisboa, CIG, 2015


(148$'5$0(1727(Ï5,&2_*pQHURH&XUUtFXORQD(GXFDomRGH,QIkQFLD

GHUHSUHVHQWiODVQDPHGLGDHPTXH HDOWUXLVWLFDPHQWHGHIHQGLGDVPDV
DVPDUJLQDOL]DHDVGHVOHJLWLPD TXHDFDEDPSRUVHUVXEDOWHUQL]DGDV´
2VLOrQFLRHRVHJUHGRVLJQL¿FDPXPD 0DUJDULGD)HUQDQGHV 
WRPDGDGHSRVLomRDRODGRGHTXHPMi
GHWpPDDXWRULGDGHHDOHJLWLPLGDGH Nesta linha, Michael Apple (1997) reforça a ideia
de que a produção, distribuição e avaliação
« DRPLVVmRVHPSUHIDYRUHFH
do conhecimento traduzem essencialmente
RGRPLQDQWH´ *XDFLUD/RXUR questões de controlo e dominação que têm
 de ser analisadas numa perspetiva mais
ampla. A crítica de Apple dirige-se ao discurso
Considerando a importância do período dos dominante que interessa sobretudo a grupos
zero aos seis anos na construção da identidade sociais influentes cujas idiossincrasias acabam
de género e na formação do conceito de por exercer uma significativa influência sobre
género, a intervenção educativa deve promover as escolhas curriculares, afetando grupos
uma atitude de equidade face ao género, que embora mais numerosos não se fazem
assumindo particular importância os contextos ouvir com o mesmo vigor. Este discurso
de aprendizagem e os modelos apresentados às dominante tem uma perspetiva empresarial
crianças. da escola. Esta perspetiva favorece a
dimensão economicista e desenvolvimentista da
O currículo resulta de uma complexa e educação sobre a humanista e democratizante,
historicamente determinada construção social que valoriza o papel da educação escolar na
(Ivor Goodson, 1997); deve aproveitar-se a construção de uma sociedade mais justa e
sua elaboração para questionar o status quo, solidária (Margarida Fernandes, 2000).
esclarecer o papel dos diferentes saberes e Contudo, é estreita a relação entre democracia
tipos de conhecimento e analisar como estes e escola. Sacristán Gimeno (1998) parte da
se relacionam com os interesses dos diferentes convicção de que a democracia supõe uma
grupos sociais. reflexibilidade coletiva, entendida como a
capacidade de uma sociedade se pensar a
³,GHDOPHQWHDFRQVWUXomRH si mesma e optar pelo seu próprio destino.
UHHODERUDomRGRFXUUtFXORGHYHULD Também a educação deverá constituir-se como
FRQVWLWXLUXPDRSRUWXQLGDGH um meio para melhorar as possibilidades dos
SDUDLQWHUYLUHPFDGDpSRFDQR seres humanos, acreditando no seu progresso
pela cultura e formação da personalidade.
FRQWH[WRVRFLDOHKLVWyULFRGHIRUPD
A educação surge então como um instrumento
DDSURIXQGDUHDHQULTXHFHUDV
que deverá habilitar os sujeitos a pensarem por
VXEMHWLYLGDGHVHSRWHQFLDOLGDGHV si próprios e assim participarem realmente na
LQGLYLGXDLVHFROHWLYDVHDSURPRYHU construção social mediante a construção de si
DSUHQGL]DJHQVGHPHOKRUTXDOLGDGH mesmos.
SDUDWRGRV1RHQWDQWRQDUHDOLGDGH
DVFRLVDVSDVVDPVHGHIRUPDEHP De acordo com Bernard Spodek e Patrícia
Brown (1996: 15), podemos definir modelo
GLIHUHQWHUHYHODQGRDRUJDQL]DomR
curricular como “uma representação ideal de
FXUULFXODUIUHTXHQWHPHQWHDPDUFD
premissas teóricas, políticas, administrativas e
GHLGLRVVLQFUDVLDVSHVVRDLVRXGH componentes pedagógicas de um programa
JUXSRVTXHGHVYLUWXDPDPLVVmR destinado a obter um determinado resultado
SULPHLUDGRFXUUtFXORVREUHSRQGRVHD educativo”. Estas premissas derivam por sua
¿QDOLGDGHVTXHGHYHULDPVHUOHJtWLPD vez de teorias que explicam como as crianças

por: Maria João Cardona (coord.), Cristina Vieira, Marta Uva e Teresa-Cláudia Tavares 053
*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3UpHVFRODU

se desenvolvem e aprendem perspetiva um modelo os papéis assumidos pelos


e de noções sobre a melhor curricular que se apresenta ocupantes (como por exemplo
forma de organizar os no quadro em seguida. o de professor/a ou o de
recursos e oportunidades de Esta autora parte da aluno/a); um tempo
aprendizagem, assim como teoria ecológica de Urie determinado. Partindo desta
juízos de valor sobre o que Bronfenbrenner (1981) conceção e do princípio que o
é mais importante que estas sobre o desenvolvimento projeto de trabalho tem sempre
aprendam. humano, que considera o que ser definido a partir
Artur de la Orden (1986), quadro educativo da especificidade de cada
na sua definição de modelo consequência de um conjunto contexto educativo, quando
curricular para a educação de forças e de sistemas que falamos da organização do
pré-escolar, diferencia as não podem ser estudados trabalho na educação de
bases em que este se isoladamente. Definindo a infância podemos considerar
fundamenta, a saber: as metas sala de atividades como os seguintes elementos:
(que incluem a forma como são um microssistema, o autor espaço; tempo; atividades;
concebidas as funções e o considera que os principais papéis sociais atribuídos às
desenvolvimento das crianças); elementos que o caracterizam crianças e aos adultos.
os objetivos; os conteúdos e a são o espaço (no qual os seus Conciliando estas propostas,
organização do trabalho. ocupantes se envolvem em Maria João Cardona (2008)
determinadas atividades); propõe uma esquematização
A par deste modelo, Maria as características físicas e do modelo curricular para a
João Cardona (2008) materiais desse espaço; educação de infância.

),*85$±0RGHOR&XUULFXODUQD(GXFDomR3Up(VFRODU
(Adaptado de Artur de la Orden, 1986 e de Urie Bronfenbrenner, 1981)

%DVHVGR&XUUtFXOR
» Funções da Educação de Infância Finalidades
» Teorias do Desenvolvimento Infantil

&DUDFWHUL]DomR$QiOLVH,QLFLDO
» Grupo de Crianças
» Meio
» Instituição
» Recursos Disponíveis

2EMHWLYRV&RQWH~GRV

2UJDQL]DomRGR7UDEDOKR
» Espaço Atividades
» Tempo
» Papéis (Educador/a, Crianças, Grupo)

'LQDPL]DomRGDV$WLYLGDGHV

$YDOLDomR

054 Lisboa, CIG, 2015


(148$'5$0(1727(Ï5,&2_*pQHURH&XUUtFXORQD(GXFDomRGH,QIkQFLD

Tendo em conta os contributos das em que processa a informação de modo


neurociências e sabendo que o cérebro da temporal e sequencial.
criança desta idade é caracterizado por uma
grande plasticidade (apesar das diferenças a Técnicas pedagógicas que envolvam a
este nível que é possível observar entre elas), a visualização (imagens, quadros, esquemas,
organização do espaço educativo no jardim diagramas, etc.), a aprendizagem
de infância deverá assentar no pressuposto de multissensorial, a audição, a aprendizagem
que é possível estimular de forma diversificada cinestésica e tátil, o gosto e o odor, a
o desenvolvimento de conexões entre os aprendizagem experiencial, o uso de metáforas
neurónios, de forma a possibilitar a aquisição e as simulações ou o desempenho de papéis
de novas aprendizagens (Noronha, 2009). são estratégias que estimulam sobretudo o
E não é tanto a quantidade de estímulos funcionamento do hemisfério direito (Santos,
que interessa, mas sim a sua qualidade, a 1992). Para a ativação preferencial do
articulação dos mesmos com as especializações hemisfério esquerdo é fundamental o uso da
hemisféricas e o respeito pelo nível (de partida) linguagem verbal, das palavras, das definições,
de desempenho de cada criança. Ainda que a apresentação da informação etapa por etapa,
a idade cronológica seja equivalente, torna-se a utilização de símbolos para substituir coisas,
imperioso que quem educa tenha presente a quantificação, a apresentação de conclusões
que as crianças podem variar enormemente e de argumentos lógicos baseados em factos
quanto aos estilos de aprendizagem, ao grau e em raciocínios, a organização temporal da
de perícia que evidenciam no uso das suas informação, etc. (Santos, 1992).
diferentes capacidades ou ainda ao ritmo com
que efetuam determinadas aquisições. Com Nesta sequência, para que as aprendizagens
efeito, o saber lidar com todas estas eventuais sejam mais eficazes e a criança se sinta mais
diferenças individuais constitui um desafio para motivada, o/a educador/a deverá dinamizar
qualquer agente educativo. atividades que, ao combinarem estímulos de
natureza diversa, façam uso simultâneo das
Embora o cérebro humano trabalhe de modo capacidades específicas dos dois hemisférios.
integrado, apresenta assimetrias funcionais
que têm grande importância para a educação Em seguida, apresentar-se-ão alguns aspetos
(Maxfield, 1990). É sabido que o hemisfério – de extrema relevância para todo o processo
direito do nosso cérebro nomeadamente de planeamento e ação/interação pedagógica
comanda a motricidade e os acontecimentos do/a educador/a – a ter em conta no processo
sensoriais que ocorrem na parte esquerda de desenvolvimento curricular na educação
do corpo; constrói imagens tridimensionais; é de infância. Convém, no entanto, estabelecer
responsável pelas funções afetivas; é o centro algumas premissas transversais a toda a
da perceção espacial, do reconhecimento de intencionalidade educativa.
formas, da compreensão não verbal, do tom
e modulação da voz, da musicalidade, das » A criança aprende interagindo e o
imagens e da cor. Por seu turno, o hemisfério adulto aprende coadjuvando a criança
esquerdo comanda a motricidade e os no desenvolvimento dessa interação.
acontecimentos sensoriais que ocorrem na parte A qualidade desta interação determina a
direita do corpo; é responsável pela linguagem qualidade da construção do conhecimento,
verbal (oral e escrita), pelo cálculo numérico, quer da criança, quer do adulto – sabendo
pelo raciocínio lógico, pela capacidade de que o ser humano constrói o seu próprio
análise e de abstração; é temporal, no sentido conhecimento na interação com os

por: Maria João Cardona (coord.), Cristina Vieira, Marta Uva e Teresa-Cláudia Tavares 055
*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3UpHVFRODU

objetos, as ideias e as negociável através da ideia expressão área designa


pessoas, no contexto da de comunicação. E essa uma forma de pensar e
sua experiência e do seu visão implica aceitar que, tal organizar a intervenção
mundo de significados. como defende Jerome Bruner do/a educador/a e as
(1990), as crianças pequenas experiências proporcionadas
» A situação educativa, também têm acesso a coisas às crianças, sendo que
aqui perspetivada como complexas desde que os esta organização toma por
o encontro do adulto/ meios de comunicação lhes referência as grandes áreas do
educador ou educadora sejam adaptados. desenvolvimento que deverão
com a criança e da criança contribuir para o pleno e global
com os seus pares, é um Quando abordamos as desenvolvimento da criança.
conjunto de “‘espaços questões curriculares na
comunicativos’ onde educação de infância e ³$ViUHDVGHFRQWH~GR
o conhecimento se todas as orientações que VXS}HPDUHDOL]DomR
constrói, os afetos assistem ao processo de GHDWLYLGDGHVGDGR
se desenvolvem, onde desenvolvimento curricular,
TXHDFULDQoDDSUHQGH
a criança cresce e se temos necessariamente que
DSDUWLUGDH[SORUDomR
apropria da cultura mencionar as diferentes
envolvente e o educador áreas de conteúdo, as quais GRPXQGRTXHDURGHLD
se recria profissionalmente” funcionam como referências a 6HDFULDQoDDSUHQGHD
(Júlia Oliveira-Formosinho, ter em conta no planeamento SDUWLUGDDomRDViUHDV
2006: 54). e avaliação de experiências GHFRQWH~GRVmRPDLVGR
e oportunidades educativas. TXHiUHDVGHDWLYLGDGHV
Há que assumir também Estas últimas devem ser vistas SRLVLPSOLFDPTXHD
uma visão menos restritiva de forma articulada, uma vez DomRVHMDRFDVLmR
das crianças enquanto que a construção do saber se
GHGHVFREULUUHODo}HV
aprendizas, reabilitando uma processa igualmente de forma
visão da criança que a torna integrada (ME, 1997).
FRQVLJRSUySULDFRPRV
intérprete des-construtora de RXWURVHFRPRVREMHWRV
mensagens, interlocutora e Segundo as Orientações RTXHVLJQL¿FDSHQVDU
autora no processo educativo Curriculares para a Educação HFRPSUHHQGHU´ 0(
– um processo negociado e Pré-escolar (ME, 1997), a  

),*85$±$ViUHDVGHFRQWH~GRGHDFRUGRFRPDV2ULHQWDo}HV&XUULFXODUHVSDUD
D(GXFDomR3UpHVFRODU 0( 

ÈUHDVGH&RQWH~GR

ÈUHDGDIRUPDomRSHVVRDOHVRFLDO

» Domínio das expressões dramática, musical e plástica


ÈUHDGHH[SUHVVmRHFRPXQLFDomR » Domínio da linguagem oral e abordagem à escrita
» Domínio da matemática

ÈUHDGRFRQKHFLPHQWRGRPXQGR

056 Lisboa, CIG, 2015


(148$'5$0(1727(Ï5,&2_*pQHURH&XUUtFXORQD(GXFDomRGH,QIkQFLD

A Formação Pessoal e Social aparece, então, » a organização do trabalho, considerando:


numa perspetiva globalizante, assente numa » o espaço/materiais
organização do ambiente educativo que deverá » o tempo
promover experiências educativas que deem » o grupo, tendo em conta os papéis, as
sentido aos diferentes conteúdos; é uma área iniciativas do/a educador/a e das crianças (a
transversal e integradora de todo o processo nível individual e do grupo)
educativo (onde se inscreve a educação para a » a conceção das atividades
cidadania) e, por conseguinte, integradora de » a dinamização das atividades
todas as outras áreas de conteúdo, a saber, a » a avaliação do trabalho
área de Expressão e Comunicação e a área do » o envolvimento das famílias e da comunidade.
Conhecimento do Mundo.
Para analisar os diferentes níveis de intervenção,
Partindo destes princípios teóricos e tendo apresentaremos mais adiante (mas ainda
por base as áreas de conteúdo e respetivos nesta secção) algumas sugestões a nível da
objetivos previamente definidos, quando nos organização do trabalho, das atividades
referimos ao desenvolvimento curricular na desenvolvidas, da respetiva avaliação e do
educação de infância podemos diferenciar: envolvimento das famílias e da comunidade.

por: Maria João Cardona (coord.), Cristina Vieira, Marta Uva e Teresa-Cláudia Tavares 057
(148$'5$0(1727(Ï5,&2_(GXFDomRSDUDD&LGDGDQLDH,JXDOGDGHGH*pQHUR


(GXFDomRSDUDD&LGDGDQLDH
,JXDOGDGHGH*pQHURQD(GXFDomR
GH,QIkQFLD DRVDQRV

±$©SHUFHomR©TXH©R©GRFHQWH©WHP©GRV©VHXV© outro como “necessidade de compreensão


DOXQRV©HP©JHUDO©H©GH©FDGD©XP©HP©SDUWLFXODU© de singularidades e diferenças” (Guilherme
H©D©SHUFHomR©TXH©R©DOXQR©WHP©GRV©VHXV© d’Oliveira Martins, 1992), a responsabilidade
FROHJDV©H©GR©GRFHQWH©QD©VLWXDomR©HGXFDWLYD©
pessoal e comunitária, o conhecimento
GHWHUPLQDP©D©PDQHLUD©GH©DJLU©H©GH©UHDJLU²
rigoroso e metódico da vida e das coisas e
0DUFHO©3RVWLF© 
a compreensão de culturas, de nações, do
mundo.

$
A escola, agente de mudança e fator de
educação para a cidadania é desenvolvimento, tem que se assumir não só
um processo que decorre ao como um espaço potenciador de recursos,
longo da vida. Começa em mas também como lugar de abertura e de
casa e/ou no meio próximo solidariedade, de justiça e de responsabilização
das crianças com as questões que vão mútua, de tolerância e respeito, de sabedoria
surgindo na vida quotidiana a propósito das e de conhecimento. O papel da escola pública
relações interpessoais, da identidade, das assume então uma crucial importância na
escolhas, da justiça, do bem e do mal e vai-se educação para a cidadania, sendo aquela
desenvolvendo à medida que se expandem que, por definição, acolhe todos/as e é parte
os horizontes de vida. A promoção de uma integrante da vida da cidade democrática
maior igualdade de género é um elemento (Teresa Vasconcelos, 2007). Como refere esta
fundamental na educação para a cidadania e autora, o jardim de infância – tal como a escola –
na construção de uma verdadeira democracia. é um locus fundamental de cidadania, pois
Lidar com as diferenças sem as transformar em nele se desenrola a formação a nível pessoal
desigualdades é um dos grandes desafios da e social, educando nas crianças o seu sentido
educação na atualidade. ético e estético. Preparando-as para uma
efetiva prática de cidadania, começa no jardim
A escola ocupa um lugar central em todo o de infância a aprendizagem da diversidade e
processo de educação para a cidadania, sendo da igualdade de oportunidades, da paridade
de uma importância cívica fundamental, pois entre os sexos, da diversidade de culturas, da
constitui o primeiro degrau de uma caminhada responsabilidade social de cada pessoa em
que a família e a comunidade enquadram. promover uma sociedade mais democrática e
Por isso, deve proporcionar a cultura do integradora.

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*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3UpHVFRODU

Num ambiente de que não excluam intenções a aprendizagem da própria


aprendizagem ativa em que dos adultos, são espaços democracia.
as crianças – contando com para os temas e interesses
o apoio sempre presente das crianças. Nesses espaços ³1RMDUGLPGHLQIkQFLD
dos pares e dos adultos – as crianças são reconhecidas DFULDQoDGHL[DGHVHUR
são livres para manipular os como cidadãs com direitos, FHQWURSDUDVHWRUQDU
materiais, para fazer escolhas membros participantes dos
XPDHQWUHRXWUDV(OD
e planos, para tomar decisões grupos sociais de que fazem
e para falar e refletir acerca parte, agentes das suas
YDLDSUHQGHUDYLYHU
do que fazem/fizeram, próprias vidas, mas, também, HPJUXSRDWUDEDOKDU
crescem na sua capacidade interdependentes dos outros, FRPRVRXWURVFRPD
de pensar e raciocinar e ainda co-construtoras de saberes, FRQVHTXHQWHGLVWULEXLomR
na sua capacidade de se de identidades e de cultura, GHWDUHIDVHJHVWmRGRV
entenderem a si próprias e de se crianças que coexistem e SUREOHPDVGHIRUPD
relacionarem adequadamente convivem com as outras SDUWLFLSDWLYD$SUHQGH
com os outros (Júlia Oliveira- crianças. DVHUDXWyQRPDQHVWDV
-Formosinho, 2006).
WDUHIDVHDUHFRUUHUDR
Em todo este processo,
Nas salas de educação dinâmico, complexo, nunca
DGXOWRFRPRPHGLDGRU
de infância, a partilha do terminado, a educadora TXDQGRQHFHVViULR´
poder situa-se em muitas ou o educador tem um 7HUHVD9DVFRQFHORV
e diversificadas partilhas: a papel central. É necessária 
do espaço e dos objetos; a sua reflexão, a partilha
de situações e decisões; de de experiências e saberes Enquanto organização
ideias e afetos; de problemas para a constituição de social participada, o jardim
e soluções; de conflitos e uma intencionalidade que de infância pode e deve
de resoluções; de bens e se traduz numa ação proporcionar às crianças, de
de restrições… São estas pedagógica, sistemática, modo sistemático, uma das
experiências de partilha de facilitadora das experiências suas primeiras experiências
poder que geram envolvimento de partilha de poder e que de vida democrática. Assim,
social na ação, no implicam o cuidado ao nível contrariando a história que
pensamento e no sentimento da organização do espaço e tradicionalmente caracterizou
(Júlia Oliveira-Formosinho, dos materiais e a criação de estas instituições, é importante
2006). É este direito de experiências de aprendizagem existirem mais educadores de
participação que vem trazer ativas. Quem educa deve infância do sexo masculino.
o acesso a muitos outros acreditar na competência da Para um trabalho que de facto
direitos, constituindo-se assim criança para pensar, propor, promova uma maior igualdade
o contexto onde se propicia decidir, assim como acreditar de género, é fundamental
a progressiva construção de no seu próprio contributo para que o cuidar das crianças
equilíbrios entre direitos e a inserção sociocultural da pequenas deixe de ser
deveres. criança. A “democratização do considerado como uma tarefa
poder” que a pessoa adulta predominantemente feminina.
Peter Moss e Pat Petrie pode e deve exemplificar
(2002) falam de espaços face à criança (Ramiro Na certeza de que o jardim
da infância, espaços físicos Marques, 1990) é essencial de infância pode ser
em simultâneo sociais, e indispensável para a o primeiro espaço de
culturais e discursivos. Ainda autonomia da criança e para aprendizagem da cidadania,

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060 Lisboa, CIG, 2015
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compete aos profissionais que trabalham GDGRTXHWRGDVDVFRPSRQHQWHV


neste nível educativo “intencionalizar” práticas FXUULFXODUHVGHYHUmRFRQWULEXLU
que conduzam a uma efetiva igualdade de
SDUDSURPRYHUQRVDOXQRVDWLWXGHVH
oportunidades entre rapazinhos e rapariguinhas
a partir dos diversificados processos de YDORUHVTXHOKHVSHUPLWDPWRUQDUHPVH
socialização que vão experimentar (Ana Silva et FLGDGmRVFRQVFLHQWHVHVROLGiULRV
al., 2001). FDSDFLWDQGRRVSDUDDUHVROXomR
GRVSUREOHPDVGDYLGD7DPEpPD
Ser “menino” ou “menina” é um aspeto central
na construção da identidade, e as crianças HGXFDomRSUpHVFRODUGHYHIDYRUHFHUD
em idade pré-escolar vão, como dissemos, IRUPDomRGDFULDQoDWHQGRHPYLVWDD
adquirindo comportamentos conformes com as VXDSOHQDLQVHUomRQDVRFLHGDGHFRPR
expectativas culturais sobre o que é apropriado
VHUDXWyQRPROLYUHHVROLGiULR´ 0(
fazer enquanto membro de um ou outro
grupo, enquanto, ao mesmo tempo, adquirem  
o conhecimento dos estereótipos culturais
referentes aos homens e às mulheres. É através destes eixos transversais que se torna
possível esclarecer e contrariar a sobrecarga
Cumpre então às nossas democracias introduzir de estereótipos discriminatórios presentes no
mudanças estruturais necessárias à efetiva quotidiano das crianças que vão passando subtil
realização de uma cidadania paritária, velando e inconscientemente, por meio dos curricula
pela coesão e solidariedade e concedendo às explícito e oculto, tanto nos materiais e nos
pessoas a faculdade de agir sobre o sentido recursos que são utilizados, como nas atitudes
da mudança (Ana Silva et al., 2001). É preciso dos próprios adultos que delas se ocupam.
aspirar a sistemas de educação e cuidados para Contudo, docentes, educadores/as e outros/as
a infância que apoiem amplas aprendizagens, a profissionais de educação nem sempre são
participação e a democracia. sensibilizados/as para uma educação promotora
de uma maior igualdade de género. Os estudos
A promoção da educação para a cidadania revelam que as interações docentes/discentes
pressupõe a aprendizagem de competências são pautadas por atitudes, comportamentos
que capacitem os/as alunos/as para intervirem e expectativas diferenciadas em função do
em diferentes contextos, sendo que esta sexo (por exemplo: Luísa Saavedra, 2005;
aprendizagem não pode ser remetida para um Cristina Rocha, 2009). Este processo não é
único espaço disciplinar, mas sim ser transversal consciente, por isso não é identificado como
a todo o currículo (Ana Bettencourt; Joana um problema. Todavia, raparigas e rapazes não
Campos; Lourdes Fragateiro, 1999). têm oportunidades iguais no espaço escolar,
como é o caso da educação física e da prática
Nos primeiros anos, a cidadania está do desporto. Pensar na construção de uma
relacionada com o desenvolvimento pessoal, cultura infantil atravessada pelo género significa
social e emocional das crianças. É nesta linha analisar que os papéis assumidos no jogo e na
que aparece, no âmbito das Orientações brincadeira estão carregados de construções
Curriculares para a Educação Pré-escolar, culturais nem sempre aparentes e visíveis, pois,
definidas pelo Ministério da Educação: por vezes, estão situadas no plano simbólico
ou imaginário. Como captá-las se, geralmente,
estamos de costas para as brincadeiras [livres]
³$)RUPDomR3HVVRDOH6RFLDOp dos rapazinhos e das rapariguinhas? (Deborah
FRQVLGHUDGDXPDiUHDWUDQVYHUVDO Sayão, 2003).

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Parece-nos ser de extrema constituem na formação e valores que nascem no


importância, para a pessoal e social, na sua seio familiar e que o jardim
compreensão e apropriação dimensão formadora. de infância deve respeitar
dos capítulos que se seguem, Neste contexto, a avaliação e integrar, de modo
sublinharmos esta última pode ser para a criança co-criador. Não se trata de
afirmação e sobre ela, mais uma oportunidade de uma reprodução passiva,
enquanto educadores/as, aprendizagem, deixando o mas de reconstrução
determo-nos numa reflexão educador ou a educadora desses mesmos valores à
mais cuidada acerca das de assumir sozinho a luz de uma experiência de
nossas práticas educativas e responsabilidade de avaliar vida comunitária onde se
sobre a necessidade da sua os processos de construção equacione a aprendizagem
des-construção. de saberes. Ao implicar as de uma cidadania paritária em
crianças neste processo (e igualdade de género.
À complexidade que subjaz não apenas no seu resultado),
à educação para a cidadania este torna-se mais refletido Importa, contudo, que
e à promoção da igualdade e participado, o que se vai educadores ou educadoras
de género responde, na traduzindo (progressivamente) saibam reconhecer as
mesma medida, um difícil, em situações de situações, estejam atentos/as
complexo e multidimensional verdadeira aprendizagem, e saibam observar as
processo de avaliação. responsabilização e brincadeiras e interações das
Solicitamos às instituições autonomia. crianças, reconhecendo-se a
educativas de hoje formação si próprios/as como sujeitos
para o exercício da cidadania, Tal como já foi referido, há que e veículos de preconceitos
para o desenvolvimento assumir as potencialidades e estereótipos que também
de competências sociais e das crianças enquanto pesam no processo de
para viver com os outros; aprendizas, reabilitando a avaliação: na aplicação dos
solicitamos uma educação visão da criança enquanto instrumentos, nos trabalhos
para os valores, ou seja, uma intérprete, interlocutora e propostos, nos objetivos
orientação para a formação autora do processo educativo e critérios estabelecidos,
global dos indivíduos. (entendido também como nos juízos formulados, na
Consequentemente, urge a processo comunicativo) comunicação dos resultados,
implementação de práticas e aceitar que as crianças nos comportamentos verbais e
avaliativas que se constituam pequenas também aprendem não verbais…
como oportunidades de coisas complexas, podendo
formação e que se aproximem chegar a universos adultos No quotidiano do jardim
cada vez mais da realidade de reflexão e conhecimento, de infância acontecem
dos alunos e das alunas, desde que os meios de frequentemente situações
tomando em linha de conta a comunicação (e motivação!) que levam o educador ou a
sua diversidade sociocultural sejam adequados e educadora a interpretações
(Carlinda Leite e Preciosa devidamente planificados. erradas, estereotipadas,
Fernandes, 2001). reveladoras da subjetividade
Será igualmente relevante um da avaliação, bem como da
Sabemos da importância esforço de reconhecimento importância pedagógica da
do papel da avaliação, e valorização dos contextos diferenciação, do diálogo
nomeadamente no que educativos na sua aceção e análise cuidadosa dos
concerne a áreas transversais mais abrangente, as acontecimentos. Lembramos,
como aquelas que se aprendizagens, os saberes como exemplo, a situação

062 Lisboa, CIG, 2015


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de um rapazinho que chorava disfarçado de esta é uma das áreas do currículo mais difíceis
coelho cor-de-rosa e cuja educadora, ainda que e sensíveis: como trabalhar com as crianças,
convicta de que a razão de tal birra nascia da pondo em causa modelos que correspondem
efeminada cor do disfarce – herança da irmã, aos seus modelos familiares? Como trabalhar
pensava! –, solicitou à criança a justificação de com as crianças sem questionar estes
tamanho sofrimento. Foi então que descobriu modelos?
a vontade dele em se disfarçar de fada (que
voava) e não de coelho, já que em sua opinião o Em primeiro lugar, é fundamental que
coelho não sabia fazer nada de importante! a educadora ou o educador comece por
autoanalisar as suas próprias posições
Tal como tem sido referido, uma componente face à temática da igualdade de direitos e
fundamental da cidadania prende-se com oportunidades no que respeita ao género: qual
as questões de género, pelo que enquanto a sua posição relativamente à necessidade
educadores e educadoras devemos analisar de promover uma maior igualdade de direitos
e avaliar a nossa prática de trabalho à luz de e oportunidades entre o sexo masculino e
algumas questões: feminino.

» como entendemos as questões de género? A desvalorização inconsciente destas questões


» como educamos para as questões de género? poderá conduzir a um efeito contraproducente
» como tornamos os espaços escolares em junto das crianças em virtude de uma eventual
espaços onde não se criem estereótipos de reprodução, ainda que involuntária, dos
género, de “raça”, de cultura, mercê dos estereótipos de género nas atitudes e nas
materiais que proporcionamos e da forma como práticas realizadas.
organizamos o espaço?
» como selecionamos os jogos ou os livros? É essencial caracterizar a especificidade de
cada contexto familiar, que é muito variável,
A constatação de que os materiais pedagógicos levando à necessidade de uma reflexão
continuam a veicular conceções estereotipadas cuidadosa, adaptada às peculiaridades de
de homem e de mulher e representações cada contexto. A melhor estratégia é promover
desiguais sobre os respetivos papéis e uma atitude reflexiva atenta sobre as práticas
responsabilidades na sociedade desperta educativas questionando (sempre de forma
preocupações que nos remetem não só para a não invasiva relativamente ao seu ambiente
educação de infância mas para a continuidade familiar, já que uma abordagem intrusiva poderá
no sistema educativo, nomeadamente, no 1.º mesmo gerar efeitos opostos ao pretendido) as
ciclo do ensino básico, onde o manual escolar intervenções das crianças e apresentando-lhes
assume um carácter mais formal e onde se vão novos modelos familiares, facultando-lhes
reforçando e potenciando comportamentos que perspetivas sociais mais diversificadas.
estão em conformidade com as expectativas
culturais sobre o que é apropriado para os Caracterizar bem o contexto comunitário
rapazinhos e para as rapariguinhas fazerem, e familiar das crianças é difícil, já que os
consolidando estereótipos referentes aos educadores e as educadoras só podem ter um
homens e às mulheres. acesso indireto a este conhecimento. Nessa
tarefa há que procurar saber: qual a constituição
Paralelamente, a importância do trabalho com dos agregados familiares em causa? Existe um
as famílias num assunto tão importante para elevado número de mulheres trabalhadoras?
a organização da vida privada como é o caso Que profissões são mais frequentes? Há muitas
do género dispensa justificações. No entanto, famílias com empregadas domésticas? Quem

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*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3UpHVFRODU

traz habitualmente as crianças ao jardim de várias sugestões apresentadas têm como


infância? Quem participa habitualmente nas principal finalidade promover uma base para
reuniões e nas atividades organizadas? um questionamento mais fundamentado
relativamente às questões de género e cidadania
Outra forma de melhor conhecer as famílias na educação pré-escolar.
é prestar atenção às conversas, brincadeiras
e desenhos das crianças, assim como às A utilização de grelhas de análise, facilitadoras
questões que colocam e às narrativas que da (auto)avaliação do trabalho realizado,
produzem sobre a sua vida familiar. é uma estratégia importante, que pode
ser desenvolvida desde a formação inicial,
Esta avaliação é a base para a realização de continuando ao longo da experiência
práticas educativas inclusivas na educação profissional.
de infância – deve ser uma componente
fundamental, levando ao desenvolvimento Em anexo são também providenciados
de práticas educativas mais refletidas. Mas exemplos de referências que podem ser
é também a parte mais complexa e difícil de consultadas para apoiar as educadoras e
realizar neste trabalho. Nesta publicação, as os educadores neste trabalho.

064 Lisboa, CIG, 2015




*pQHUR
&LGDGDQLDH
,QWHUYHQomR
(GXFDWLYD
VXJHVW}HV
 SUiWLFDV

065
*e1(52&,'$'$1,$(,17(59(1d­2('8&$7,9$_$RUJDQL]DomRGRDPELHQWHHGXFDWLYR


$RUJDQL]DomRGRDPELHQWH
HGXFDWLYR
1DHGXFDomRGHLQIkQFLDPDLVGR dispõem, confrontamo-nos frequentemente
TXHHPTXDOTXHUQtYHOGHHQVLQRD com situações que, fortalecendo ideias e
comportamentos preconcebidos relativamente
RUJDQL]DomRGRDPELHQWHHGXFDWLYR às questões de género, reforçam a distância
WRPDSDUWLFXODULPSRUWkQFLDVHQGR entre rapazinhos e rapariguinhas. Para começar,
DEDVHSDUDRGHVHQYROYLPHQWRGH analise-se até que ponto as áreas de atividades
SUiWLFDVHGXFDWLYDVLQWHJUDGRUDVHP existentes (e a forma como estão organizadas)
influenciam os comportamentos das crianças
TXHUDSD]HVHUDSDULJDVVHLGHQWL¿FDP neste domínio1.
HSRGHPDSUHQGHUSULQFtSLRVEiVLFRVGH
FLGDGDQLDV A área da casa, por exemplo: até que ponto foi
organizada de forma a ser sobretudo apelativa

0
para as rapariguinhas? E a área da garagem?
as por vezes há ideias E qual é a intervenção dos educadores e
estereotipadas que se das educadoras nestas áreas? Como reagem
manifestam na forma como quando observam a realização de atividades
está organizado o espaço que revelam estereótipos relativamente às
das instituições de educação de infância: questões de género?
“Na sala de Jardim de Infância deve haver
espaços diferenciados para os meninos e para Paralelamente, há também que ter em conta
as meninas, com as cores e os brinquedos de a forma como estão decoradas as paredes
que gostam mais.” Ana (2008). Este extrato de das salas, quais as imagens que
um texto de uma estudante de dezoito anos que sobressaem, até que ponto estas últimas
quer ser educadora de infância revela a forma induzem papéis especificamente atribuídos
como predominam excessivas diferenciações às rapariguinhas e rapazinhos, aos homens
nos papéis atribuídos ao sexo masculino e e às mulheres. Induzem ou não a uma
feminino, diferenciações excessivas – igualmente representação inclusiva dos dois sexos?
presentes na comunicação social, nos livros, etc., Lembramos um placard de Páscoa, onde a
a que as crianças estão expostas – que afetam galinha se distinguia do galo não pela crista,
o desenvolvimento e aprendizagem das crianças mas pelo avental!
desde a mais tenra idade.
Estas questões colocam-se igualmente em
De facto, observando a organização das salas relação à escolha dos jogos, dos materiais
de atividades e o tipo de materiais de que pedagógicos, dos livros que existem na sala:

1
Baseámos todos os exemplos apresentados em trabalhos realizados com estudantes, educadoras e crianças de institui-
ções que colaboram connosco. Para todos e todas MUITO OBRIGADA pelas aprendizagens proporcionadas sobre a forma
mais adequada de trabalhar as questões de género e cidadania na educação das crianças pequenas.

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0
*8,«2©'(©('8&$d«2©
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qual a imagem predominantemente atribuída Em primeiro lugar, que áreas de atividades


a rapazinhos e rapariguinhas; a homens e existem nas salas? Porquê? Quais as suas
a mulheres? finalidades? Como são denominadas, como
estão organizadas, que materiais/equipamento
Alguns exemplos apoiarão a reflexão sobre integram?
estas questões. Observe as duas figuras que se seguem.

),*85$±ÈUHDGDFDVDVLWXDomR$

),*85$±ÈUHDGDFDVDVLWXDomR%

0
068 Lisboa, CIG, 2015
*e1(52&,'$'$1,$(,17(59(1d­2('8&$7,9$_$RUJDQL]DomRGRDPELHQWHHGXFDWLYR

Perante os exemplos apresentados, qual acha fica de uns anos para os outros, que as crianças
que induz a uma prática mais integradora que trazem de casa, e que não pode ser escolhido
não reforce ideias estereotipadas relativamente de forma cuidada. Mas mesmo os maus
aos papéis atribuídos ao sexo masculino e ao exemplos podem ser um ponto de partida para
sexo feminino? Até que ponto esta organização um trabalho interessante, levando as crianças a
influencia a escolha das crianças? questionar-se, a procurar soluções alternativas,
etc.
Qual o papel que o/a educador/a pode assumir?
Para começar, tem que estar atento/a ao Os exemplos apresentados induzem práticas
que dizem as crianças, às suas sugestões, de trabalho diferentes relativamente aos papéis
questionar os motivos que condicionam as suas atribuídos a ambos os sexos: qual a intervenção
escolhas e os seus comportamentos. Este é que o/a educador/a pode ter nos dois casos?
o ponto de partida para a organização de um Tendo em conta o exemplo B, que apresenta
ambiente educativo integrador. situações mais igualitárias, podem-se trabalhar
inúmeras situações relacionadas com a vida
A escolha dos materiais é, como já foi referido, quotidiana das crianças. Mas mesmo o exemplo
uma questão básica que a educadora ou A, que apresenta situações mais estereotipadas,
o educador tem que cuidar quando organiza o pode ser um bom ponto de partida para
seu trabalho. Claro que há muito material que trabalhar com as crianças, podendo estas

),*85$±'RLVMRJRVGHORWRVREUHDVSUR¿VV}HV±([HPSOR$H%

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0
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“re”construir o jogo, inventar novas sobre as questões de género, os papéis


regras, ou mesmo partir para a atribuídos a homens e mulheres.
construção de um novo jogo sobre
as profissões, com propostas mais Imaginemos que a educadora ou o educador
igualitárias. decide explorar um texto em que as personagens
do sexo feminino, além de estarem sub-represen-
Os livros e os filmes também necessitam de tadas em número, têm reações estereotipadas
atenção, podendo dar o mote para refletir e negativas, como o texto que se segue.

48$'52±([HPSORGHXPDKLVWyULD

“O Paulino e o Januário eram irmãos.


O Marcelino e a Zira também, eram
gémeos. Os quatro eram primos e
estavam com o cão da Zira, o Tum, a
passar férias em casa do tio Alberto.
Uma noite em que os tios tinham saído
e os quatro já estavam deitados,
ouviram barulho e viram luz no andar
de baixo.

Eram dois ladrões que vinham roubar os


cadernos e o computador do tio Alberto,
e não sabiam que ele tinha os sobrinhos ),*85$±,OXVWUDomRGDKLVWyULD
em casa. Os três rapazes desceram logo
do quarto e ficaram a espreitar a ver se
resolviam a situação. A Zira tinha medo, impedir que eles a deitassem abaixo, e
mas não queria ficar sozinha sem os a Zira, que continuava muito assustada,
rapazes e eles podiam precisar do Tum. telefonou para a mãe a contar.
Então, foi também. Os rapazes pensaram
num plano. Estava a chorar tanto que quase nem
O Paulino e o Januário cortaram a luz e se ouvia, mas a mãe percebeu e ligou
depois, com um gravador de brinquedo, para a polícia. Entretanto o tio Alberto e
fingiram que a polícia se aproximava. a tia Clara também chegaram a casa e,
Quando os ladrões se assustaram e enquanto o tio Alberto ligava para a polícia
quiseram fugir, o Marcelino mandou o de novo, a tia Clara ajudou a Zira a parar
Tum atirar-se às pernas deles, para que de chorar. A polícia veio logo a seguir e
se enganassem na porta e entrassem levou os ladrões. Todos/as ficaram muito
para um quarto sem janela. Como contentes e a tia Clara fez bifes para
continuavam às escuras, enganaram-se todos/as. Guardar ladrões dá fome! E,
mesmo. Então os três rapazes fecharam claro, deram um grande bocado de bife ao
a porta e ficaram do lado de fora a valente Tum.”

070 Lisboa, CIG, 2015


*e1(52&,'$'$1,$(,17(59(1d­2('8&$7,9$_$RUJDQL]DomRGRDPELHQWHHGXFDWLYR

As questões a colocar
às crianças face a esta
48$'52±3RVVtYHLVIRUPDVGH história são múltiplas: por
GHVUHFRQVWUXomRGDVKLVWyULDV exemplo, por que razão
só a Zira chora tanto e
+i©YiULDV©IRUPDV©SRVVtYHLV©GH©SURFHGHU©DR©WUDEDOKR©GH©GHVõUHFRQVWUXomR©
está tão assustada? Face
GDV©KLVWyULDV©GH©IRUPD©D©TXH©DV©FULDQoDV©SRVVDP©GLYHUVL½FDU©RV©PRGHORV© às respostas dadas (se,
FRP©TXH©JHUDOPHQWH©VmR©FRQIURQWDGDV© por exemplo, as crianças
responderem que isso
±(VWH©WUDEDOKR©SRGHUi©LQFLGLU©VREUH©D©WRWDOLGDGH©GD©QDUUDWLYD©RX©DSHQDV© acontece porque “é mais
VREUH©XPD©SDUWH pequena”, lembrar que
D  $© GHVõUHFRQVWUXomR© GD© QDUUDWLYD© IHLWD© SHORD© HGXFDGRUD© SDUD© DV© é gémea do Marcelino)
FULDQoDV©GR©SUpõHVFRODU©SRGHUi©VHU©REMHWR©GH©PRGL½FDo}HV©DR©QtYHO© questionar a relação
¯©GR©WtWXOR entre identidade biológica
¯©GD©OLQJXDJHP e características da
¯©GD©DomR©GD©LQWULJD©SULQFLSDO©H©GD©VHFXQGiULD personalidade (ou seja,
¯©GR©HVSDoR©ItVLFR©HRX©GR©WHPSR©GD©KLVWyULD a relação entre sexo e
¯©GDV©SHUVRQDJHQV©DOWHUDQGR©R©VHX©UHOHYR©QD©HFRQRPLD©GD©QDUUDWLYD© género), pedindo e dando
DOWHUDQGR© DV© IXQo}HV© GHVHPSHQKDGDV© DOWHUDQGR© D© FDUDFWHUL]DomR©
exemplos de mulheres e
ItVLFD©HRX©SVLFROyJLFD©VXEVWLWXLQGR©XP©VH[R©SRU©RXWUR©DFUHVFHQWDQõ©
raparigas valentes.
GR©XPD©QRYD©SHUVRQDJHP©HRX©UHWLUDQGR©XPD©GDV©SHUVRQDJHQV©HP©
É igualmente possível
FHQD©HWF©
¯©GD© IRFDOL]DomR© FRQWDU© D© PHVPD© KLVWyULD© VRE© XP© SRQWR© GH© YLVWD©
explorar, a partir do texto,
GLIHUHQWH a relação de homens e
¯©GRV©PRGRV©GH©H[SUHVVmR©GLiORJR©HRX©PRQyORJR mulheres com o trabalho
científico, lembrando que

E $© GHVõUHFRQVWUXomR© GD© QDUUDWLYD© IHLWD© SHORD© HGXFDGRUD© HP© em Portugal grande parte
FRODERUDomR© FRP© DV© FULDQoDV© SRGHUi© VHU© REMHWR© GDV© VHJXLQWHV©
das pessoas que são
HVWUDWpJLDV
cientistas são mulheres, e
¯©$SUHVHQWDU©R©½P©RX©R©LQtFLR©GH©XPD©QDUUDWLYD©jV©FULDQoDV©H©LQYHQWDU©
que também há grandes
FRP©HODV©XPD©QRYD© DWUDYpV©GH©XP©GLiORJR©VXSRUWDGR©SRU©LPDJHQV©
FRPR©IRWRJUD½DV©GHVHQKRV©HWF 
cozinheiros. Há ladrões e
¯©,PDJLQDU©D©FRQWLQXDomR©GH©XPD©QDUUDWLYD©¯©VHJXLQGR©SRU©H[HPSOR©R ladras, etc.
PpWRGR©GH©/¶2XUV©IDULQp©SURSRVWR©HP©)RUPDU©FULDQoDV©OHLWRUDV© 3DULV
 © 6HJXQGR© HVWH© PpWRGR© D© HGXFDGRUD© RX© R© HGXFDGRU© Or© RX© Finalmente, após a
FRQWD©XP©HSLVyGLR©GD©QDUUDWLYD©DV©FULDQoDV©LQYHQWDP©XPD©VHTXrQFLD© discussão, pode propor-se
SRVVtYHO© FRQIURQWDQGRõVH© GHSRLV© HVWD© VHTXrQFLD© FRP© D© TXH© IRL© às crianças um
HVFULWD©SHOR©DXWRU©RX©SHOD©DXWRUD exercício de reconstrução
¯©&RQVWUXLU©XP©QRYR©WH[WR©D©SDUWLU©GR©FRQIURQWR©HQWUH©XP©WH[WR©VH[LVWD da história. Seguindo
H©XP©WH[WR©QmR©VH[LVWD© FXLGDGRVDPHQWH©SUHSDUDGR©SHOD©HGXFDGRUD© essas orientações e
RX©SHOR©HGXFDGRU ©DWUDYpV©GH©XPD©GLVFXVVmR©FRP©DV©FULDQoDV retomando anteriores
¯©/HU©XP©WH[WR©VH[LVWD©H©FRQYLGDU©XP©PHPEUR©GD©FRPXQLGDGH©SDUD©R©
intervenções das crianças
FRPHQWDU© QXPD© SHUVSHWLYD© QmR© VH[LVWD© SURFHGHQGR© HP© FRQMXQWR©
e educador/a, na nova
HGXFDGRUD©¯©FRQYLGDGRD©¯©FULDQoDV ©D©XP©WUDEDOKR©VLPXOWkQHR©GH©
versão, por exemplo,
GHVõUHFRQVWUXomR©GR©WH[WR©DWUDYpV©GDV©VXJHVW}HV©DSUHVHQWDGDV²
tanto o tio Alberto como
,Q©$QD«GD«6LOYD©HW«DO© ©  a tia Clara podiam ser
cientistas, sendo além

por: Maria João Cardona (coord.), Cristina Vieira, Marta Uva e Teresa-Cláudia Tavares 071
*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3UpHVFRODU

disso o tio Alberto um grande cozinheiro de O/A educador/a pode proceder a esta análise
bifes. com as crianças, trabalho que pode servir de
base para o desenvolvimento de diversos
Há grelhas de análise que podem ser utilizadas projetos de trabalho: por exemplo, a
ou criadas pelo/a educador/a para avaliar as des-re/construção da história; a organização de
imagens e os textos dos livros, de forma a novos livros, etc.
perceber quais os papéis atribuídos ao sexo
masculino e ao sexo feminino.

072 Lisboa, CIG, 2015


*e1(52&,'$'$1,$(,17(59(1d­2('8&$7,9$_$RUJDQL]DomRGRJUXSR


$RUJDQL]DomRGRJUXSR

$IRUPDFRPRpSODQHDGD Se por um lado há mais tolerância aos


comportamentos indisciplinados dos rapazes,
DRUJDQL]DomRGRJUXSR por outro lado esta excessiva tolerância acaba
HVWUHLWDPHQWHOLJDGDjRUJDQL]DomR por prejudicar a sua integração escolar, não os
GRHVSDoRWHPSRGDVDODQHP preparando de forma adequada para serem
mais perseverantes e atentos às aprendizagens
VHPSUHpJHUDGRUDGHSUiWLFDV escolares. Esta atuação mais permissiva para
HGXFDWLYDVTXHSURPRYDPXPD com eles pode ainda torná-los menos sensíveis
LJXDOSDUWLFLSDomRSRUSDUWHGRV – e menos atentos – às advertências e às regras
disciplinares estabelecidas, o que também os
UDSD]LQKRVHGDVUDSDULJXLQKDV prejudica quer a nível da formação pessoal, quer
a nível da aprendizagem do respeito por quem
detém a autoridade.

$
s normas definidas, a forma O mesmo relativamente às exigências
como os trabalhos de pequeno quanto ao cumprimento das regras
grupo são organizados, por definidas: em alguns casos, verifica-se que às
vezes reforçam uma excessiva raparigas é atribuída a tarefa de ajudar a manter
diferenciação entre rapazes e raparigas que é a ordem no grupo, sendo maior a exigência
necessário repensar. quanto ao seu comportamento.

Neste sentido, é importante começar por refletir Considerando os exemplos apresentados, quais
sobre as expectativas relativamente a ambos as suas principais diferenças e semelhanças?
os sexos, por exemplo: perceber quais as Porquê? Qual a sua habitual intervenção?
características que a educadora ou o educador
atribui ao bom aluno e à boa aluna, até que Como é que a sua intervenção pode conduzir
ponto estas são ou não coincidentes e porquê. a uma prática mais integradora que não reforce
ideias estereotipadas relativamente aos papéis
A imagem do bom aluno é frequentemente atribuídos aos dois sexos?
diferente, em termos de disciplina e
desempenho social, da imagem da boa aluna. Frequentemente observa-se que nos grupos
Esta excessiva diferenciação que habitualmente existe como regra o ajudar os/as mais
caracteriza as práticas educativas induz a pequenos/as. Será que esta regra é igualmente
comportamentos excessivamente diferenciados respeitada por rapazinhos e rapariguinhas? Qual
que acabam por ter repercussões nos a intervenção do/a educador/a perante a sua
desempenhos escolares. falta de cumprimento?

por: Maria João Cardona (coord.), Cristina Vieira, Marta Uva e Teresa-Cláudia Tavares 073
*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3UpHVFRODU

48$'52±([HPSORVGHFRPSRUWDPHQWRV
KDELWXDOPHQWHDWULEXtGRVDRVUDSD]HVHjV
UDSDULJDV
Pense em três exemplos de maus comportamentos que habitualmente atribui:
aos rapazes
às raparigas

É importante uma atitude atenta e interveniente A intervenção do/a educador/a é fundamental


do/a educador/a relativamente à forma como para refletir com as crianças sobre os motivos
rapazes e raparigas se auto-organizam tanto das diferenças observadas, até que ponto estas
na sala de atividades como no recreio, como são reforçadas por si, ou até que ponto são
resolvem os seus conflitos, como assumem a indutoras de práticas educativas
liderança, etc. excessivamente diferenciadoras.

074 Lisboa, CIG, 2015


*e1(52&,'$'$1,$(,17(59(1d­2('8&$7,9$_2SDSHOGRDHGXFDGRUD


2SDSHOGRDHGXFDGRUD
([HPSORVGHDWLYLGDGHV

$VDWLYLGDGHVGHGLiORJRHGLVFXVVmR De acordo com a perspetiva sócio-


SDUHFHPVHUXPPHLRSULYLOHJLDGRSDUD -construtivista, a estratégia de discussão deve
envolver a promoção da interação de grupo de
DDERUGDJHPGDVTXHVW}HVGHJpQHUR
modo a manter as crianças mentalmente ativas
HPFRQWH[WRSUpHVFRODU(QWHQGHVH naquilo que deve ser aprendido. É necessária
DGLVFXVVmRFRPRXPDHVWUDWpJLD habilidade didática para gerir quer uma
DVVHQWHQDLQWHUDomRRUDODWLYD discussão mais organizada e formalizada em
HQWUHRHGXFDGRURXDHGXFDGRUDHD termos estratégicos, quer um pequeno diálogo
FULDQoDHRXHQWUHDVFULDQoDVHQWUHVL espontâneo (oportuno e, por conseguinte,
menos formal) – há que saber como começar
DSURSyVLWRGHXPDVLWXDomRSUREOHPD
a discussão, fazer perguntas, avaliar, vencer
TXHVWmRRXDVVXQWRFRQWURYHUVR resistências (Juan Diaz Bordenave e Adair
(QYROYHUiQHVWDOyJLFDXPDWURFD Pereira, 1991)…
GHLGHLDVFRPDSUHQGL]DJHPDWLYD
HSDUWLFLSDomRGHWRGRVDV 0DUTXHV Com base numa adaptação das propostas
H9LHLUD VXEOLQKDQGRD dos autores e das autoras acima referidos
(e dado que a discussão enquanto estratégia
LPSRUWkQFLDGRVPRPHQWRVGHUHXQLmR
para a formação e mudança de atitudes pode
assumir muitas variantes), destacamos algumas

3
técnicas de participação comunicativa passíveis
or outro lado, ressalta a relevância de estruturarem a abordagem das questões de
da definição de um plano que género com crianças em idade de jardim de
envolva uma sequência de infância:
passos que permitam facilitar
o questionamento e chegar ao(s) objetivo(s) » O grupo de discussão. Trabalha com o
previamente estabelecidos. Contudo, como é grupo uma questão, um problema, uma
sabido, nem sempre os momentos de discussão controvérsia relacionada com o género
poderão ser rigorosamente planificados e, a discutir por todos/as durante um
muitas vezes, emergem de situações vividas no determinado período de tempo, ou até ser
jardim de infância. Deve aproveitar-se qualquer encontrada uma solução ou resposta. Um
oportunidade de dialogar acerca de um princípio básico desta estratégia é promover
comportamento ou situação, de uma afirmação, a participação de todas as crianças, ouvindo
de um juízo, de um livro, de uma imagem… as suas opiniões e sugestões. Não tem
principalmente no que concerne à cidadania e forçosamente que existir consensualidade,
às questões de género. o que implica um esforço para não haver

por: Maria João Cardona (coord.), Cristina Vieira, Marta Uva e Teresa-Cláudia Tavares 075
*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3UpHVFRODU

lideranças que controlem ou imponham passíveis de se tornarem reais) dilemáticas,


um ponto de vista. Mas é importante que associadas ao género. Conjugada com o
as crianças se apercebam de que a igualdade desempenho de papéis, a dramatização
da participação de todos/as deve ser poderá envolver a encenação completa
promovida: por exemplo, nos momentos de uma situação, tendo as crianças como
de planificação do trabalho; na tomada de protagonistas e levando-as a trocar à vez de
decisões; para ultrapassar problemas que se papéis. Uma rapariga poderá ser convidada
colocam ao grupo, etc. a exibir um suposto comportamento
masculino, num aspeto concreto do enredo,
» O turbilhão de ideias ou discussão e vice-versa. Para além dos papéis de
criadora (brainstorming). É um modo de género específicos que forem teatralizados
estimular e gerar novas ideias ancorado pelas crianças, importa compreender
no compromisso de educador/a e também o enredo subjacente e os fatores
alunos/as se considerarem uma equipa. que, no entendimento infantil, condicionam
Estabelece-se a regra de que cada um é as variadas expressões comportamentais
capaz de produzir ideias acerca do tópico (dos homens e das mulheres). Todas as
inicial, sendo igualmente essencial planear crianças devem ser estimuladas a falar
e definir uma forma de registo. Estas ideias sobre o seu próprio pensamento e sobre
deverão ser avaliadas e reconduzidas as razões por que escolheram exibir
(mediante a participação de todos/as certos comportamentos e não outros (na
os/as intervenientes) para as questões representação de papéis masculinos e
da igualdade de género e cidadania femininos).
democrática, podendo daqui surgir, por
exemplo, a base de projetos sobre as » O estudo de caso. O/a educador/a
temáticas em questão. apresenta ao grupo um exemplo a estudar.
Apresenta-o de forma oral ou através de
» A simulação ou jogo de papéis um documento escrito ou outro suporte
(role-playing). Envolve a simulação ou pedagógico, construído para o efeito. Pode
dramatização de papéis. Proporciona ser um caso real, adaptado ou totalmente
uma forma divertida de apresentação de fictício, mas deve proporcionar o máximo
um problema, situação, acontecimento, de detalhes. Esta técnica deverá favorecer
ou objetos, implicando a duplicação o intercâmbio de opiniões e a variedade de
ou inversão de papéis estereotipados, perspetivas, sem a pretensão de encontrar
por exemplo: em relação às profissões, a resposta. Da análise e compreensão de
situações concretas que surgem no uma situação vivida por outras pessoas
quotidiano, etc. Dado o distanciamento que surgem aplicações para outras situações.
esta técnica possibilita, procura-se que cada O/a educador/a poderá partir de um caso
qual viva o seu papel, identificando-se com vivenciado na sua sala com o seu grupo de
a personagem que representa, conseguindo crianças. Poderá selecionar uma situação
uma perceção diferente de atitudes e problemática relativamente às questões de
comportamentos face às (des)igualdades género que se deseja alterar, uma positiva
de género, assim como a sua clarificação e que se deseja reforçar ou uma situação
abordagem pedagógica. dilemática – abrindo-se assim o debate,
ouvindo as crianças e os seus pareceres,
» A dramatização de situações. As crianças reforçando práticas democráticas e
poderão ensaiar no espaço protegido democratizantes no desenvolvimento do
do jardim de infância situações reais (ou diálogo e da discussão.

076 Lisboa, CIG, 2015


*e1(52&,'$'$1,$(,17(59(1d­2('8&$7,9$_2SDSHOGRDHGXFDGRUD

No desenvolvimento de estratégias de Saber dialogar é uma estratégia básica para


clarificação de valores e de mudança de enfrentar as questões morais, a análise e a
atitudes, parte-se do princípio que as compreensão da realidade pessoal e social,
pessoas podem ser induzidas a mudar a bem como a empatia moral. O educador ou a
sua atitude a respeito de uma determinada educadora deve possuir a destreza de saber
realidade, mediante a apresentação de novas conduzir o diálogo pessoal ou o debate, uma
informações sobre determinadas características vez que a maioria das técnicas de educação em
ou qualidades que façam mudar a sua valores, atitudes e normas tem uma fase em que
compreensão. Nesta linha, podemos distinguir o diálogo é essencial. Há que valorizar todos os
estratégias de discussão de estratégias momentos de uma atividade e o saber dialogar,
de comunicação persuasiva, das quais antes e depois da sua realização (José Antonio
destacamos: Blasco e M.ª Remedios Mancheño, 2001: 23).

» A fotopalavra. Consiste em utilizar Como já foi referido, a maioria das salas


fotografias como meios de expressão ou de jardim de infância está organizada em
linguagem. Trata-se de uma estratégia áreas de atividades. A observação do seu
que incorpora nos processos de ensino funcionamento, a forma como o/a educador/a
e aprendizagem a imagem simbólica, interfere são aspetos que carecem de
fotografias que interpelam, falam e fazem uma (auto)avaliação atenta. Observa-se,
falar. As imagens deverão ser de qualidade, por exemplo, que há geralmente áreas de
mas sobretudo simbólicas, expressivas, atividades mais e menos escolhidas por
evocadoras, capazes de suscitar reações rapazes e raparigas; que, para além da forma
positivas e valiosas nos/as alunos/as. Estas como estão organizadas, os/as educadores/as
imagens deverão ser lidas em profundidade condicionam as áreas de atividades devido ao
e deverão, acima de tudo, servir o propósito modo de apoio e dinamização das atividades.
comunicativo e expressivo, o que poderá
de alguma forma distanciar-se de uma Apresentam-se, em seguida, alguns elementos
estratégia de discussão, no seu sentido mais importantes para uma reflexão educativa que
restrito. O/a educador/a poderá recorrer a conduza a uma avaliação do comportamento
registos fotográficos do quotidiano familiar das crianças nas áreas, tal como a seguir será
das crianças ou do quotidiano do jardim de explicitado.
infância, imagens de revistas, de publicidade
ou obras de arte, recorrendo ao computador Considerando os exemplos apresentados, o que
e a suportes multimédia. teria feito se estivesse no lugar do educador ou
educadora deste grupo? Porquê?
» A técnica do testemunho. Convida-se Considerando a situação A, o/a educador/a
para vir falar ao grupo alguém com uma pode, por exemplo, apoiar a entrada do Miguel no
experiência interessante ou emblemática jogo da área da casa, falar com ele para o ajudar
no que concerne às questões de género, a tomar consciência das suas contradições e
no âmbito das atividades profissionais, receios, estimulá-lo a lá organizar atividades
por exemplo. Esta técnica pode envolver individualmente ou em grupo, etc.
também o testemunho/divulgação a Perante a situação B, poderá ser importante
um público previamente selecionado levar a Maria a experimentar outras atividades,
(famílias, outras salas da mesma instituição, ouvir os seus motivos, tentar perceber os seus
outras instituições, etc.) de um projeto, receios e contradições, apoiá-la a interagir mais
atividades, experiências desenvolvidas e com os/as colegas, rapazes e raparigas, por
vivenciadas pelas próprias crianças. exemplo.

por: Maria João Cardona (coord.), Cristina Vieira, Marta Uva e Teresa-Cláudia Tavares 077
*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3UpHVFRODU

48$'52±([HPSORVGHLQWHUYHQo}HVGH
XPDHGXFDGRUDSHUDQWHDVHVFROKDVGDV
FULDQoDV

6LWXDomR$

O Miguel nunca escolhe ir para a área


da casa. No entanto, passa a vida a
perturbar os/as colegas que jogam nesta
área, chamando nomes, deitando abaixo
o que fazem. A educadora pressente que
este comportamento corresponde ao
conflito sentido entre a vontade que ele
tem de jogar nesta área e as expectativas
de género interiorizadas, conflito que
leva a que se sinta pouco à vontade para
fazer esta escolha.

),*85$

6LWXDomR%

A Maria não sai da área da casa. Passa a


vida a cozinhar, a lavar a loiça, a arrumar.
Argumenta que está a aprender a ser
dona de casa.

),*85$

6LWXDomR&

A Vanessa vai alindar-se sempre que possível na área do faz-de-conta. Não faz outra coisa
que não seja tentar maquilhar-se, experimentar colares e outros adornos e ensaiar poses
de sedução num espelho. Quando questionada, explica que o que é preciso é ser como a
Barbie. Depois diz que esta área é só para as raparigas.

078 Lisboa, CIG, 2015


*e1(52&,'$'$1,$(,17(59(1d­2('8&$7,9$_2SDSHOGRDHGXFDGRUD

Relativamente à situação C, uma forma de confrontá-las com diferentes pontos de


intervenção será conversar com a Vanessa e vista, são formas de agir face a situações
levá-la a questionar-se. Ajudá-la a encontrar com que todos/as os/as profissionais
outras motivações será igualmente eficaz. de educação de infância se confrontam.
Relativamente às atividades orientadas, os
Não há respostas “certas”: a sua desempenhos das crianças são também
(des)adequação depende dos contextos, da diferenciados. Estas diferenças verificam-se a
especificidade de cada realidade. Mas uma níveis distintos, desde as conversas a formas
atitude atenta e interveniente do/a educador/a é de participação, exigindo uma reflexão da
fundamental. Ouvir as crianças, questioná-las e educadora ou educador também perante estas
levá-las a questionar-se sobre os seus motivos, situações.

48$'52±([HPSORVGHLQWHUYHQo}HVGRD
HGXFDGRUDGXUDQWHXPDFRQYHUVDGHJUXSR

6LWXDomR$

É 2.ª feira, as crianças contam como foi o seu fim de


semana.
A Rita conta que esteve a ajudar a mãe a tratar do
jardim enquanto o irmão mais velho ajudou o pai a
cozinhar. Há rapazinhos e rapariguinhas que se riem,
e dizem que em suas casas é tudo ao contrário.
A educadora pergunta o porquê daquela reacção, e
pede para deixarem a Rita acabar de falar.

),*85$

6LWXDomR%

O Miguel vai fazer anos. E diz que está triste porque


ninguém lhe vai dar a prenda que ele queria:
uma boneca. Um colega diz que “isso é para as
meninas”. O Miguel diz que também “pode ser para
os meninos”, que os rapazes também sabem cuidar
de bebés e por isso podem brincar com bonecas.
Começam todos a falar ao mesmo tempo, a fazer
troça do Miguel. A educadora pede silêncio e diz ao
Miguel para falar com o pai e com a mãe sobre a
prenda que quer para os anos.
),*85$

por: Maria João Cardona (coord.), Cristina Vieira, Marta Uva e Teresa-Cláudia Tavares 079
*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3UpHVFRODU

Considerando estes exemplos, se estivesse no


lugar desta educadora, como teria agido?
Tal como já foi referido, o confronto de ideias 48$'52±
é uma estratégia fundamental, tendo o
educador ou a educadora um papel nuclear,
([HPSORGD
moderando, estimulando, orientando, apoiando LQWHUYHQomR
a explicitação dos diferentes pontos de vista,
dando espaço para que todas as crianças GRDHGXFDGRUD
possam participar.
SHUDQWHWUDEDOKRV
Estas duas situações espontâneas podem UHDOL]DGRVSHODV
proporcionar uma reflexão das crianças
sobre os papéis sociais que são/podem FULDQoDV
ser desempenhados por ambos os sexos,
confrontando-as com situações diversas das
que conhecem. 6LWXDomR$

Tendo em conta estes exemplos, o que faria A Ana está a desenhar uma menina
se estivesse no lugar desta educadora? Como muito elegante, com um vestido e um
usaria as duas ocorrências para um trabalho penteado muito sofisticado. Diz que
com estas crianças? é tão bonita como a Barbie mas que
se chama Ana como ela e que vai ser
Em todos os grupos, diariamente são várias as assim quando crescer.
situações deste tipo com que as educadoras A Ana é uma menina muito gordinha,
e os educadores se confrontam. Perante as que tem uma vasta coleção de
diversas situações que ocorrem, uma atitude Barbies de que passa a vida a falar.
de escuta interveniente que leve as crianças a
questionar-se é fundamental.

Neste sentido, já foram apresentadas várias


estratégias. Mas há muitas mais, que cada 6LWXDomR%
profissional deverá procurar, adequando-as
ao seu estilo de trabalho. Uma atitude de O Rui desenha-se a ver com o pai
alheamento ou de indiferença é sempre a um jogo de futebol na televisão
resposta mais desadequada para qualquer enquanto a mãe na cozinha faz o
situação, não proporcionando às crianças jantar. A educadora pergunta se ele
aprendizagens construtivas relativamente aos e o pai não podem cozinhar com a
papéis de género. mãe para ela poder ver o jogo.
O Rui diz que não, que a mãe é que
Para apoiar uma atitude mais interveniente cozinha e trata da casa porque o
dos/as profissionais, podemos considerar os pai trabalha para ganhar dinheiro.
contributos da Filosofia para Crianças. A educadora sabe que a mãe do Rui
é empresária e questiona-o: então
As questões que se ligam com a cidadania e e a mãe também não trabalha para
o género facilmente se correlacionam com as ganhar dinheiro? O Rui diz que “não
disciplinas filosóficas, como a filosofia política; é a mesma coisa”.
a filosofia da ação; a axiologia; a ética;
a estética…

080 Lisboa, CIG, 2015


*e1(52&,'$'$1,$(,17(59(1d­2('8&$7,9$_2SDSHOGRDHGXFDGRUD

A reflexão pedagógica em transversais a todo o trabalho SHQVDQXPDHVFROD


torno destas questões tem e possibilitam a abordagem SDUDTXrLUHFRPR
que ser equacionada no das questões de género.
GHYHULDPVHUDV
contexto (mais alargado) de
uma reflexão filosófica que, Lipman propõe que o
HVFRODVFRQVWDWDP
na sua aceção mais pura e espaço educativo se torne RVSUHFRQFHLWRVTXH
original, deve começar desde numa comunidade de busca KDELWDPQRSHQVDU
as idades mais precoces. e investigação, onde se GHPXLWRVDGXOWRVH
Autores de referência, tais aprende solidariamente, HQWmRSHUJXQWDPVH
como Matthew Lipman ou em comunidade, onde a
TXDQWRVSUHFRQFHLWRV
Gareth Mathews, sugerem igualdade dos participantes,
inclusivamente que a infância a sua tolerância, a
H[LVWHPQDVXD
é a fase mais filosófica do comunicação de ideias e a SUySULDHVFROD
ser humano. É na infância renuncia à violência fazem DSUHQGHPRYDORUGR
que conseguimos atingir a dessa mesma comunidade GLiORJRFRPRPRGR
verdadeira profundidade do o espaço adequado GHID]HUIUHQWHDRV
pensamento e do exercício para o descobrimento,
SUREOHPDVTXHVH
filosófico. Contudo, esta aplicação e discussão dos
propensão filosófica das conhecimentos que aspiram
DSUHVHQWDPQDHVFROD
crianças não é devidamente a ser considerados como HIRUDGHOD´ .RKDQ
aproveitada e estimulada em verdadeiros. 
termos educativos. Segundo
Lipman (citado por Kohan, É no quadro deste método O educador e a educadora
1999: 84), “fazer filosofia não com algumas especificidades deverão por sua vez ser
é uma questão de idade, mas e alguns passos fundamentais filosoficamente “retraídos/as”
de refletir escrupulosa e que se poderão inspirar e “reservados”, facilitando
corajosamente sobre o que a algumas atividades no a discussão, cuidando das
gente considera importante.” contexto deste guião regras, mas expondo poucas
pedagógico, uma vez que vezes o seu ponto de vista.
Inspirado nas comunidades apontam para um modo Assim, tendo em conta o
de investigação de Dewey, de fazer a discussão e papel do educador/a (que se
Mathew Lipman (1995) propõe reflexão filosófica sobre as entende como quem organiza,
então um programa muito mais diversas temáticas/ modera, ajuda, motiva,
específico que se conhece problemáticas. coopera, participa…), podem
como Filosofia para Crianças. diferenciar-se algumas etapas:
Em traços gerais, propõe-se ³$VUHJUDVHRV
alcançar os seguintes 1. Selecionar o texto,
SULQFtSLRVGRSHQVDU
objetivos: melhorar a a imagem, a história (ou
capacidade de raciocinar;
DSDUHFHPVHPSUH capítulo dela!) que vai ser
desenvolver a criatividade; OLJDGRVjH[SHULrQFLD lido e/ou mostrado às
promover o crescimento TXHDVFULDQoDVYmR crianças – escolhido em
pessoal e interpessoal; YLYHQGR função dos temas, ideias,
desenvolver a compreensão problemas aí sugeridos;
SHUJXQWDPVHRTXH
ética; desenvolver a
VLJQL¿FDSHQVDUSDUD 2. Analisar o texto de forma
capacidade para encontrar
significado na experiência. HPVHJXLGDLQGDJDU aprofundada, encontrar
Estes objetivos são TXDQWRHFRPRVH as ideias centrais, os

por: Maria João Cardona (coord.), Cristina Vieira, Marta Uva e Teresa-Cláudia Tavares 081
*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3UpHVFRODU

48$'52±(LVXPH[HPSORFRQFUHWR
EDVHDGRQRPpWRGRGH/LSPDQ

Um/a educador/a de infância,


preocupado/a desde há algum tempo
com as questões de género no seu
jardim de infância, vai recolhendo e
compilando algumas imagens – fotografias
do quotidiano do jardim de infância,
recortes de jornais, ilustrações de alguns
livros infantis, desenhos das crianças.
Expressam situações/acontecimentos/
comportamentos (aqui as cartas Viver
em Igualdade poderão ser também um
bom recurso) dissonantes ou socialmente
controversos em termos das questões de
género. Estamos aqui a falar, por exemplo,
de representações de mulheres toureiras,
mulheres bombeiras, mulheres operárias
da construção civil, halterofilistas ou de ),*85$±6LWXDomRGRH[HPSORGH
homens cabeleireiros, homens de avental
WUDEDOKRFRPDPHWRGRORJLDGD¿ORVR¿D
na cozinha, a costurar ou a assegurar a
SDUDFULDQoDV
“muda de fraldas” nos bebés, rapazes na
área da casinha a dar biberão aos bebés,
raparigas a brincar com action figures, sobre aquelas imagens. Vai registando
rapazinhos mascarados de fada, raparigas cada uma das questões num painel,
mascaradas de mecânico, raparigas a acompanhadas do nome do/a autor/a
jogar futebol… (educador/a incluído/a). No final pede
às crianças que votem a questão que
No final desta angariação, estrutura um gostariam de ver discutida por todos.
livro de imagens bastante apelativo para Tendo sido eleita a questão, passa-se à
as crianças. Decide trabalhar com ele sua discussão – o mesmo se repete
recorrendo a alguns passos essenciais da em todas as sessões planificadas.
metodologia da filosofia para crianças.
Em cada sessão, o/a educador/a
Assim, planifica um conjunto de sessões distribui as crianças em círculo (para que
de filosofia para crianças, tendo por base ninguém seja conotado como líder da
o visionamento das imagens do livro em discussão) e tenta garantir que todas
questão. Em cada sessão são trabalhadas as crianças apresentem a sua opinião,
duas ou três imagens do livro respeitantes o seu argumento – que na maioria das
a uma temática/problemática aglutinadora, vezes aparece como um exemplo
por exemplo: o género e as profissões, o e/ou testemunho do seu quotidiano –
género e as tarefas domésticas, o género e estimulando a livre participação, evitando
as brincadeiras… juízos, deixando que as crianças
argumentem e contra-argumentem entre
Parte-se da apresentação das imagens si, encontrando elas próprias (ou não!) a
às crianças e solicita-se a cada uma, sem sua própria resposta e/ou um projeto a
exceção, que formule uma pergunta desenvolver.

082 Lisboa, CIG, 2015


*e1(52&,'$'$1,$(,17(59(1d­2('8&$7,9$_2SDSHOGRDHGXFDGRUD

argumentos, as questões e variações do das sessões. A eficácia do método no


tema que poderão aparecer (de forma desenvolvimento das competências e objetivos
implícita e/ou explícita) e ser colocadas pelas em questão exige não só tempo mas também
crianças. um habitus, uma continuidade que favoreça
a compreensão do processo por parte das
3. Planificar e preparar as atividades que crianças e a sua adesão ao mesmo.
poderão servir para clarificar, orientar e
estimular o debate; Há aqui que considerar a importância da
sensibilidade do educador ou da educadora
4. Estabelecer e planificar a dinâmica de para o nível de envolvimento das crianças,
trabalho: determinar como vai ser a leitura uma vez que a avaliação da disposição e da
– dramatizada, ilustrada, frase a frase, sua motivação para a discussão em curso
parágrafo a parágrafo, audiogravada… poderá dar azo a uma gestão pedagógica do
ou como vai ser mostrada a imagem tempo e da própria participação das crianças,
ou imagens; decidir se a sessão vai ser levando o/a educador/a a optar por continuar a
videogravada; como vai ser o debate – se discussão noutro dia ou simplesmente abreviá-la.
haverá debate prévio em pequenos grupos
ou se será logo em grande grupo; como vão É de ressalvar, tal como já foi referido, a
ser registadas as questões das crianças…; importância de tornar este tipo de sessões
se haverá atividades de produção de habituais, numa lógica de continuidade e
materiais relacionados com o tema eleito… sequencialidade, nomeadamente para que
(adaptado de Navarro, 2009). o envolvimento da criança nas
sessões/discussões vá aumentando em função
Sublinhemos a necessidade da continuidade do (re)conhecimento da dinâmica própria
no que diz respeito ao desenvolvimento das mesmas.

),*85$±(VTXHPDVtQWHVHGDVVHVV}HVGH¿ORVR¿DSDUDFULDQoDV

1. Leitura do texto/
novela ou visionamento
2. Solicitação das questões
de imagens

3. Registo das questões com o


5. Discussão
nome do/a autor/a

4. Votação da
questão a ser
discutida na
sessão

por: Maria João Cardona (coord.), Cristina Vieira, Marta Uva e Teresa-Cláudia Tavares 083
*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3UpHVFRODU


$ DXWR DYDOLDomR

1DVHTXrQFLDGDVTXHVW}HVMi e mais tarde, quando uma situação idêntica se


DQDOLVDGDVDQtYHOGDRUJDQL]DomRGR gerar espontaneamente, verificar semelhanças e
diferenças na sua receção pelas crianças.
JUXSRKiTXHWHUHPFRQWDDIRUPD
A maior parte dos contextos fornece
FRPRTXHPHGXFDSURFHVVDDDYDOLDomR pretextos para avaliar as representações
HDIRUPDFRPRHVWDFRQVWLWXLXP das crianças sobre os papéis de género:
LQFHQWLYRGHUHÀH[mRHGHHYROXomRGDV enredos, caracterização e descrições das
DSUHQGL]DJHQVIHLWDVSHODVFULDQoDV relações entre as personagens de livros /filmes
infantis ou programas televisivos, desenhos e
narrativas das próprias crianças, publicidade,

4
caracterização dos brinquedos, etc.
uando falamos de avaliação,
podemos diferenciar dois níveis Na figura 13 encontramos um grupo de
distintos que se completam: a crianças em interação no recreio.
(auto)avaliação do/a educador/a;
a (auto)avaliação das crianças. Repare na figura 14: não há interação entre
A forma como processa e trabalha a avaliação rapazes e raparigas (situação de recreio).
é uma estratégia fundamental para a evolução
do seu trabalho e pode incentivar a reflexão Como poderia trabalhar estas situações com
também por parte das crianças sobre os as crianças? Até que ponto estas poderiam ser
respetivos comportamentos e atitudes e sobre pretexto para discutir com as crianças a forma
as aprendizagens que vão realizando. como avaliam o que é ser “menino” e “menina”
A avaliação da evolução das aprendizagens e os comportamentos de género?
pode decorrer de situações não planificadas
previamente (mas exploradas de forma a Veja ainda a figura 15, inspirada num livro para
proporcionar essa avaliação) ou resultar crianças sobre cenas da vida doméstica.
de uma situação previamente planeada e
só aparentemente casual. O educador ou Para além das situações que naturalmente
educadora podem também combinar as duas ocorrem, os trabalhos realizados pelas crianças
formas de ação, por exemplo explorando uma podem também ser pretexto para o/a educador/a
situação nascida do acaso e posteriormente trabalhar com as crianças a forma como
expondo deliberadamente as crianças à representam as diferenças, os papéis atribuídos
mesma situação ou a uma situação similar ao sexo masculino e ao feminino. Neste sentido,
e comparando os resultados obtidos; ou, apresentamos alguns exemplos de desenhos
inversamente, criar uma situação de avaliação realizados por crianças (figuras 16 e 17).

084 Lisboa, CIG, 2015


*e1(52&,'$'$1,$(,17(59(1d­2('8&$7,9$_$ DXWR DYDOLDomR

),*85$±6LWXDomRGH5HFUHLR([HPSOR$
IMAGEM PARA REPRODUZIR E DISCUTIR EM CONTEXTO DE “AULA”

por: Maria João Cardona (coord.), Cristina Vieira, Marta Uva e Teresa-Cláudia Tavares 085
*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3UpHVFRODU

),*85$±6LWXDomRGH5HFUHLR([HPSOR%
IMAGEM PARA REPRODUZIR E DISCUTIR EM CONTEXTO DE “AULA”

086 Lisboa, CIG, 2015


*e1(52&,'$'$1,$(,17(59(1d­2('8&$7,9$_$ DXWR DYDOLDomR

),*85$±6LWXDomRUHWUDWDGDQXPOLYURSDUDFULDQoDV
IMAGEM PARA REPRODUZIR E DISCUTIR EM CONTEXTO DE “AULA”

por: Maria João Cardona (coord.), Cristina Vieira, Marta Uva e Teresa-Cláudia Tavares 087
*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3UpHVFRODU

),*85$±'HVHQKRGDFULDQoD$
IMAGEM PARA REPRODUZIR E DISCUTIR EM CONTEXTO DE “AULA”

/HJHQGD³23DLYrWHOHYLVmRHQTXDQWRDPmHOLPSDDFDVD´

088 Lisboa, CIG, 2015


*e1(52&,'$'$1,$(,17(59(1d­2('8&$7,9$_$ DXWR DYDOLDomR

),*85$±'HVHQKRGDFULDQoD%
IMAGEM PARA REPRODUZIR E DISCUTIR EM CONTEXTO DE “AULA”

/HJHQGD³(XJRVWRGDPmHSRUTXHHODMRJDIXWHEROFRPLJR´

por: Maria João Cardona (coord.), Cristina Vieira, Marta Uva e Teresa-Cláudia Tavares 089
*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3UpHVFRODU

São exemplos que podem ser trabalhados Observemos como a realização de um


pela educadora ou pelo educador. Para além projeto despoletado por uma
de possibilitarem um melhor conhecimento necessidade educativa aparentemente
das crianças, estes trabalhos podem ser exterior a esta área foi utilizado para
utilizados para uma melhor compreensão uma avaliação – e, em simultâneo, a
das representações de género das crianças, des-construção – das representações
ou ser trabalhados com elas no sentido de as de género de um grupo de quatro e
obrigar a questionar essas representações. cinco anos.

48$'52±([HPSORGHXPSURMHWRTXH
HQYROYHRJUXSR
Uma das crianças da sala apresenta de que as raparigas aparecem quase
sintomas de difícil diagnóstico. É internada sistematicamente no papel de doentes/
no hospital para realização de exames. As vítimas a serem socorridas pelos rapazes
outras crianças ficam bastante ansiosas. ou, então, no papel de secretárias e
Para as acalmar, a educadora propõe que ajudantes dos rapazes salvadores.
brinquem ao faz-de-conta, transformando
a sala em hospital. As crianças conversam Pede às crianças que registem as suas
sobre os espaços – atendimento de atividades e que indiquem que papéis
urgências, enfermarias, secretaria, desempenharam. As crianças fazem então
consultórios… – e serviços que compõem uma lista das atividades que realizaram.
o hospital. Também discutem sobre o que A educadora explica às crianças que,
lá acontece: tenta-se descobrir o que está apesar de toda a conversa anterior,
de errado com as pessoas, receita-se rapazes e raparigas distribuíram entre si as
medicamentos, e as pessoas ficam perto tarefas de forma estereotipada.
do pessoal de saúde para terem a certeza Pergunta de novo às crianças se acham
de que a ajuda está muito próxima. que as mulheres podem ajudar tanto como
O hospital, concluem as crianças, é um ser ajudadas e se com os rapazes não se
sítio onde se tem cuidado com as pessoas passa o mesmo. A resposta continua a ser
e se toma conta delas. Seguidamente, a afirmativa.
educadora questionou as crianças sobre
se todas as pessoas têm/devem ter A educadora leva então as crianças a
cuidado umas com as outras, ou se só confrontar a lista que fizeram com as suas
algumas o devem ter. Todas as crianças escolhas com a afirmação anterior.
afirmam que todas as pessoas devem As crianças admitem a contradição e, em
ter cuidado umas com as outras, e que conjunto com a educadora, dão exemplos
isso não depende de serem crianças ou de outras situações a respeito dos papéis
pessoas adultas, rapazes ou raparigas, etc. de género em que há contradições, entre
aquilo que dizem e o que de facto fazem.
A atividade prossegue ensaiando as
crianças o exercício de várias situações: A educadora propõe então às crianças
um atendimento de urgência, a realização a regra pensarem o que dizem, dizerem
de análises clínicas, a realização de o que pensam. A regra é aceite por
radiografias, etc. A educadora apercebe-se unanimidade.

090 Lisboa, CIG, 2015


*e1(52&,'$'$1,$(,17(59(1d­2('8&$7,9$_$ DXWR DYDOLDomR


Todos estes exemplos podem servir como ponto Como é que cada profissional de educação
de partida para o trabalho com as crianças, a de infância avalia a promoção de uma prática
nível individual ou em grupo, levando-as a avaliar integradora entre rapazes e raparigas? Porquê?
o que pensam, o que fazem, as diferenças entre Estas são as questões de base que estão
o que pensam e o que fazem. subjacentes a todo o trabalho realizado,
condicionando-o.
O mesmo princípio aplica-se a educadores e
educadoras, que muitas vezes se confrontam Propomos de seguida um guião de análise para
com as suas próprias contradições. Nem que possa (auto)avaliar o seu trabalho e a partir
sempre o que dizem corresponde à sua daí planear uma intervenção promotora de uma
atuação, o que implica a necessidade de maior igualdade de género.
uma atitude atenta e de um trabalho de
(auto)avaliação constante. A partir do preenchimento do Quadro 9 – Ficha
de (auto)avaliação, enuncie: três aspetos que
E, primeiro do que tudo, é fundamental refletir necessita mudar; o porquê destas mudanças;
sobre a forma como concebem estas questões as implicações que estas poderão ter na vida
tão sensíveis que se prendem com as vivências das crianças do grupo.
de cada um desde a infância.

por: Maria João Cardona (coord.), Cristina Vieira, Marta Uva e Teresa-Cláudia Tavares 091
*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3UpHVFRODU

)LFKDGH DXWR DYDOLDomR 4XDGUR


JARDIM DE INFÂNCIA:

Rede pública Rede Privada /IPSS Rede privada/com fins lucrativos

N.º de salas existentes no Jardim de Infância:

N.º de crianças do grupo:


n.º de rapazes
n.º de raparigas

Idades das crianças do grupo:


n.º de crianças com 3 anos
n.º de crianças com 4 anos
n.º de crianças com 5 anos
n.º de crianças com mais de 5 anos

Existem crianças com Necessidades Educativas Especiais?

Quais os critérios que estiveram subjacentes à organização do grupo.

CARACTERIZAÇÃO DA SALA DE ATIVIDADES


Esquematização das áreas de atividades existentes:

Para cada área, quais são as atividades passíveis de serem diariamente escolhidas pelas crianças:
» Como são organizadas com as crianças as escolhas destas atividades
Há um sistema de planeamento definido: Sim Não
Estas escolhas são feitas: Individualmente Em grupo
Existe um quadro de planeamento: Sim Não

» Quantas crianças podem estar em cada área

» Quanto tempo por dia as crianças podem estar nestas áreas de atividades

» Quais são as atividades mais escolhidas pelas crianças

» Há diferenças nas escolhas feitas pelas raparigas e pelos rapazes? Quais?

» Quais são as atividades menos escolhidas pelas crianças

» Estas escolhas serão influenciadas pelas escolhas dos/as colegas: Sim Não
» As escolhas serão influenciadas pelo tempo que o/a educador/a costuma habitualmente estar a apoiar
cada uma destas atividades: Sim Não

092 Lisboa, CIG, 2015


*e1(52&,'$'$1,$(,17(59(1d­2('8&$7,9$_$ DXWR DYDOLDomR

)LFKDGH DXWR DYDOLDomR 4XDGUR


RECREIO / FORA DA SALA:

Quanto tempo passam as crianças em média por dia no recreio


Costumam estar com o/a educador/a: Sim Não
Costumam estar com a auxiliar: Sim Não
Habitualmente predominam : Atividades livres Atividades orientadas
Há diferenças nas brincadeiras feitas pelas raparigas e pelos rapazes: Sim Não
Em caso afirmativo, quais são as principais diferenças

ORGANIZAÇÃO EM PEQUENOS GRUPOS


Há pequenos grupos que habitualmente se organizam de forma espontânea dentro do grande
grupo: Sim Não
» Estes grupos são mistos constituídos
por rapazes e raparigas: Sim Não
por crianças de idades diferentes: Sim Não
» Os pequenos grupos que se organizam na sala mantêm-se no recreio, fora da sala:
Sim Não
» O/A educador/a interfere na organização destes grupos: Sim Não

Em caso afirmativo, como:

DIFERENÇAS ENTRE RAPAZES E RAPARIGAS


Outras diferenças relativas aos comportamentos dos rapazes e das raparigas:

– dentro da sala

– no recreio/fora da sala

DESENHOS – Registar respostas

Peça a 3 meninas e a 3 meninos do grupo que desenhem e descrevam separadamente:


» o que faz o pai (em casa e fora de casa) » o que faz a mãe (em casa e fora de casa)

Na sequência dos desenhos/registos realizados, perguntar o que as crianças pensam em relação


às diferenças que existem entre o que fazem:
» os homens e as mulheres » os rapazinhos e as rapariguinhas

Outras observações importantes:

Data de preenchimento da ficha Observador/a

por: Maria João Cardona (coord.), Cristina Vieira, Marta Uva e Teresa-Cláudia Tavares 093
*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3UpHVFRODU


2HQYROYLPHQWRGDVIDPtOLDV
HGDFRPXQLGDGH

7DOFRPRMiIRLUHIHULGRDSDUWLFLSDomR de infância. Paralelamente, importa clarificar


GRVSDLVHGDVPmHVQRWUDEDOKRGR todas as questões que possam ser alvo de
interpretações ambíguas.
MDUGLPGHLQIkQFLDpIXQGDPHQWDO
HPWRGDVDViUHDVFXUULFXODUHVPDV
Por outras palavras: na educação, sobretudo
WHPHVSHFLDOLPSRUWkQFLDQXPD no trabalho com crianças pequenas, há sempre
iUHDWmRVHQVtYHOFRPRDIRUPDomR uma enorme “carga ideológica”. Clarificá-la
SHVVRDOHVRFLDOHHVSHFL¿FDPHQWHQD e explicitá-la, por parte de educadoras e
DSUHQGL]DJHPGRVYDORUHVUHODFLRQDGRV educadores, não é fácil, mas é fundamental para
FRPRJpQHURHDFLGDGDQLD estabelecer uma relação de confiança, mesmo
quando as ideias não são as mesmas que as
veiculadas pelas famílias.

$
criança interioriza desde
muito cedo algumas ideias Esta explicitação passa, como foi já referido,
estereotipadas, sendo pela explicitação dos princípios que estão na
determinante o papel dos adultos base de todo o desenvolvimento curricular e
significativos, de entre os quais se destacam que desde o início devem ser apresentados
com maior frequência – mas não exclusivamente às famílias. Antecipando ou respondendo à
– o pai e a mãe. Abordadas explicitamente no preocupação destas em acompanhar o trabalho
quadro de uma análise reflexiva que leve em realizado no jardim de infância, é fundamental
conta as capacidades cognitivas das crianças, ouvir e envolver encarregados de educação – de
até as eventuais dissonâncias entre as ideias ambos os sexos – nesse trabalho.
veiculadas na vida familiar e no jardim de
infância estimularão o seu desenvolvimento e Seguem-se alguns exemplos de projetos de
a sua aprendizagem. reflexão sobre as questões do género e da
cidadania realizados com a finalidade de implicar
Mas, provavelmente, este é o principal desafio as famílias.
com que os educadores e as educadoras de
infância se confrontam. Paralelamente, há que considerar a cada vez
maior diversidade dos contextos sociofamiliares
Neste sentido, toma particular importância a em que as crianças vivem. Durante muitos
atenção ao ambiente familiar e a (auto)avaliação anos, o nosso imaginário foi povoado de ideias
da forma como as famílias são levadas a ter sobre as famílias ditas “tradicionais”, que já não
conhecimento e participar no trabalho do jardim existem.

094 Lisboa, CIG, 2015


*e1(52&,'$'$1,$(,17(59(1d­2('8&$7,9$_2HQYROYLPHQWRGDVIDPtOLDVHGDFRPXQLGDGH

48$'52±([HPSORVGHVLWXDo}HVGR
TXRWLGLDQR

6LWXDomR$ pode auxiliar a família a uma posterior


reflexão sobre as regras que existem na
O Miguel, a Ana, a Carla, a Maria, a Teresa esfera doméstica, a respeito de rapazes
e a Susana estão a brincar na área da e raparigas poderem/deverem realizar as
casa. Prepararam um lanche, convidaram mesmas atividades.
colegas, tendo estado toda a tarde muito
empenhados nesta atividade. Chegou a 6LWXDomR%
hora de arrumar. O Miguel sai da casa e diz
que vai para o recreio, pois não é nenhuma Uma mãe vem trazer os dois filhos ao
menina para ter que arrumar a casa. jardim de infância, um menino de 3 anos e
Se fosse educador/a desta sala, qual uma menina de 5 anos. Conta à educadora
seria a sua intervenção? Pode ser um da filha, a rir, que se vê logo que o filho é
bom exemplo para discutir e trabalhar em rapaz: já dá ordens à irmã, é muito mais
grande grupo! esperto apesar de ser mais pequeno. Qual
a intervenção da educadora? Se calhar
Mas o que faria no caso de a família vir ao pode ser importante convidar esta mãe a
jardim de infância criticar o/a educador/a vir mais vezes ao jardim de infância para
por obrigar o filho a fazer tarefas femininas? conhecer melhor os comportamentos
Pode ser um bom ponto de partida para da filha, no meio das outras crianças, e
falar com a família sobre as regras definidas desmistificar esta ideia preconcebida
na sala de jardim de infância, em que de que os rapazes são mais espertos,
todos têm que participar nas tarefas do ao mesmo tempo que pode observar
quotidiano, independentemente de serem que os rapazes também conseguem atingir
rapazes ou raparigas. Esta constatação os seus objetivos sem dar ordens.

Quando os educadores ou educadoras Esta diversidade impõe algumas reflexões: será


caracterizam os universos familiares das que tem sentido celebrar o Dia do Pai ou o Dia
crianças com quem trabalham, confrontam-se da Mãe como tradicionalmente se fazia? Como
cada vez mais com uma rede complexa que é que se explica às crianças esta diversidade de
tende a intensificar-se: há crianças que vivem só situações? Como é que as famílias toleram esta
com o pai; crianças que vivem só com a mãe; diversidade?
crianças que para além do pai ou da mãe
biológico/a, têm um “novo” pai ou uma nova Há livros de histórias que abordam estas
“mãe” derivada de outros casamentos; crianças questões e que são um auxiliar muito útil para
que vivem em tutelas partilhadas com o pai e a educadora ou para o educador. Mas é
com a mãe; crianças que vivem com dois pais sobretudo no dia a dia que, através da conversa,
ou duas mães (homossexuais ou bissexuais); das respostas às questões que vão surgindo,
crianças que vivem com os avós; crianças que se conseguem ultrapassar estas diferenças
vivem em instituições; etc., etc…. de forma positiva, proporcionando às crianças

por: Maria João Cardona (coord.), Cristina Vieira, Marta Uva e Teresa-Cláudia Tavares 095
*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3UpHVFRODU

48$'52±([HPSORGH3URMHWRV

6LWXDomR$

No Dia da Criança, as educadoras


convidam os encarregados de educação
do sexo masculino para prepararem uma
festa para as crianças na qual têm que
desempenhar tarefas diversas, muitas
destas habitualmente associadas ao sexo
feminino (cozinhar, tecer serapilheiras
para fazer almofadas...). O evento
proporciona às crianças observarem
tarefas tradicionalmente femininas a
serem desempenhadas por homens.
Paralelamente, a iniciativa é importante
porque frequentemente são as mães ou
avós quem se disponibiliza a participar nas
atividades do jardim de infância.

6LWXDomR%

Na conversa de grupo, as crianças


discutem sobre a necessidade de pedirem
à presidente da Junta de Freguesia (mãe
de uma rapariguinha do grupo) ajuda para
a compra de um computador. Um dos
rapazes reage: a mãe dela não pode ser
presidente da Junta! Ela não é homem!
Gera-se uma discussão. Esta polémica e
a consequente intervenção da educadora
pode ser a base para um projeto em que
o grupo vai perguntar à presidente quais
as suas funções, porque é que estas tanto
podem ser assumidas por homens como
),*85$±6LWXDomR$ por mulheres, etc.

uma aprendizagem estimulante sobre a riqueza integradas nas vivências do quotidiano do jardim
da diversidade. de infância.

E estas questões também se colocam Mas subjacente à diversidade que caracteriza


relativamente às diferenças étnicas, religiosas, cada vez mais a vida sociofamiliar das crianças,
linguísticas, à integração de crianças com a promoção de uma educação inclusiva entre
necessidades educativas especiais, etc., que rapazes e raparigas é a base que não pode ser
não podem ser negligenciadas, devendo ser esquecida para a construção de uma verdadeira

096 Lisboa, CIG, 2015


*e1(52&,'$'$1,$(,17(59(1d­2('8&$7,9$_2HQYROYLPHQWRGDVIDPtOLDVHGDFRPXQLGDGH

igualdade de oportunidades e

48$'52±([HPSORV de participação de todos/as.

GHWHPDVTXHSRGHPVHU Neste sentido, são


REMHWRGHDQiOLVHHP apresentadas algumas
questões que poderão ser
JUXSRVGHSDLVHPmHV trabalhadas com os pais
e com as mães pelos/as
³ © §© 'LVWULEXLomR© GHVLJXDO© GR© WHPSR© GHGLFDGR© jV© WDUHIDV©
IDPLOLDUHV©H©GRPpVWLFDV©DV©TXDLV©SRGHUmR©VHU©GHVHPSHQKDõ
profissionais de educação de
infância.
GDV©SRU©DPERV©RV©F{QMXJHV©UHWLUDQGR©j©PXOKHU©D©VREUHFDUJD
GH©WUDEDOKR©D©TXH©FRVWXPD©HVWDU©VXMHLWD
Uma análise atenta das
consequências de uma
§©1HFHVVLGDGH©H©XWLOLGDGH©SDUD©R©EHPõHVWDU©H©SDUD©D©VD~GH©
socialização das gerações
GRV©½OKRV©H©GDV©½OKDV©GH©HVFODUHFHU©WDQWR©RV©UDSD]HV©FRPR©
mais novas condicionada por
DV©UDSDULJDV©D©UHVSHLWR©GH©GLYHUVRV©DVVXQWRV©DEUDQJLGRV©SHOD©
HGXFDomR©VH[XDO© ¨  estereotipias de género poderá
ainda legitimar a discussão
§© 'LVSRQLELOLGDGH© GHVLJXDO© GH© WHPSR© OLYUH© HQWUH© KRPHQV© com grupos de pais e mães
H© PXOKHUHV© SDUD© D© UHDOL]DomR© GH© DWLYLGDGHV© GH© OD]HU© HJ« de outras temáticas atuais,
SUiWLFD© GH© GHVSRUWRV © GH© LPSRUWkQFLD© IXQGDPHQWDO© SDUD© com enorme impacto para
XPD©YLGD©ItVLFD©H©SVLFROyJLFD©GH©TXDOLGDGH a vida familiar e social. Entre
os assuntos a merecerem
§©$FHQWXDGD©DVVLPHWULD©QD©GLVWULEXLomR©GH©PXOKHUHV©H©KRPHQV© especial atenção, poderemos
SHORV©GLYHUVRV©VHFWRUHV©GH©DWLYLGDGH©SUR½VVLRQDO©VHQGR©HP© citar a pesada taxa de
JHUDO©DV©SUR½VV}HV©GLWDV©PDVFXOLQDV©PDLV©YDORUL]DGDV©H©PDLV© acidentes de viação, sobretudo
EHP©SDJDV©GR©TXH©DV©GLWDV©IHPLQLQDV no grupo dos rapazes, e
a maior tendência destes
§© )DOWD© GH© IXQGDPHQWR© FLHQWL½FR© UREXVWR© GDV© FUHQoDV©
para abandonarem a escola,
WUDGLFLRQDLV© GH© TXH© RV© UDSD]HV© VHULDP© SRU© H[HPSOR©
especialmente durante o
PHOKRUHV©QDV©iUHDV©GH©HVWXGR©TXH©HQYROYHP©D©PDQLSXODomR©
ensino secundário.
GH© Q~PHURV© FRPR© D© PDWHPiWLFD© H© GH© TXH© DV© UDSDULJDV©
WHQGHULDP© D© DSUHVHQWDU© FRPSHWrQFLDV© VXSHULRUHV© DR© QtYHO©
GDV© OtQJXDV© H© XPD© PHOKRU© FDSDFLGDGH© GH© UHODFLRQDPHQWR© Mas se as circunstâncias
LQWHUSHVVRDO atrás referidas parecem pôr
em destaque os prejuízos
§© 'HVPLVWL½FDomR© GD© LGHLD© GH© TXH© DV© PXOKHUHV© SRU© VHUHP© das estereotipias para o sexo
FDSD]HV©GH©JHUDU©FULDQoDV©VmR©QDWXUDOPHQWH©PDLV©DSWDV©SDUD© masculino, são inúmeros os
OKHV© SUHVWDU© RV© FXLGDGRV© EiVLFRV© SRU© H[HPSOR© GH© KLJLHQH© exemplos que os pais e as
GH©QXWULomR ©H©SDUD©DV©HGXFDU©GR©TXH©RV©KRPHQV© mães poderão discutir que
salientam os efeitos nefastos
§© 5HDOoDU© D© FRQVWDWDomR© HPStULFD© GH© TXH© DV© GLIHUHQoDV© dos estereótipos para as
LQWUDLQGLYLGXDLV©VmR©PDLRUHV©GR©TXH©DV©GLIHUHQoDV©LQWHULQGLõ© mulheres.
YLGXDLV© SHOR© TXH© p© SRVVtYHO© TXH© GXDV© SHVVRDV© GH© VH[RV©
GLIHUHQWHV© VHMDP© PDLV© SDUHFLGDV© HQWUH© VL© SRU© H[HPSOR© DR©
Ainda que as estatísticas mais
QtYHO©GDV©FDUDFWHUtVWLFDV©GH©SHUVRQDOLGDGH©GRV©LQWHUHVVHV ©GR©
recentes conduzam a opinião
TXH©GXDV©SHVVRDV©GR©PHVPR©VH[R
&ULVWLQD«9LHLUD©©õ
´ pública a acreditar que as
mulheres já conquistaram
a quase maioria das áreas

por: Maria João Cardona (coord.), Cristina Vieira, Marta Uva e Teresa-Cláudia Tavares 097
*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3UpHVFRODU

profissionais que outrora eram do domínio -jovens, ou ainda da violência no namoro,


masculino, urge trazer para a discussão, que, pela sua importância (desigualdade de
entre outros assuntos, a questão da “tripla poder nas relações de intimidade), deu o mote
jornada” das mulheres (mães, profissionais e para uma campanha em 2009 por parte da
responsáveis pela gestão doméstica) e dos Comissão para a Cidadania e a Igualdade de
prejuízos que isso pode trazer para a sua Género (CIG).
saúde mental e física (dormir menos horas, por
exemplo). Por essa razão, não pode concluir-se Para finalizar, salientemos que a pertinência da
que a aparente igualdade quantitativa discussão destas temáticas com grupos de
esteja associada a uma verdadeira igualdade pais e mães deve enfatizar o papel negativo
qualitativa (em termos de condições de vida das estereotipias de género não só para o
e de bem-estar de ambos os sexos) e que a desenvolvimento das crianças, mas também
problemática das desigualdades entre homens para a vida dos próprios adultos, homens e
e mulheres seja um assunto já “fora de moda”. mulheres, que tendem a contestá-las, mas
Dando ainda mais premência à atualidade que talvez nunca tenham sido ajudados a lidar
destes assuntos e falando da face mais visível criticamente com elas, procurando alternativas
das violências de género, podemos falar da de atuação mais condizentes com os valores
violência doméstica, que em Portugal é a da igualdade, da partilha e do respeito mútuo.
primeira causa de morte entre mulheres adultas-

098 Lisboa, CIG, 2015


*e1(52&,'$'$1,$(,17(59(1d­2('8&$7,9$_$ViUHDVGHFRQWH~GR([HPSORVGHSURMHWRV


$ViUHDVGHFRQWH~GR
([HPSORVGHSURMHWRV

'HVHJXLGDQDVHTXrQFLDGDVVXJHVW}HV ³9LVDQGRRGHVHQYROYLPHQWRH
MiDSUHVHQWDGDVYmRVHUGDGRV DSUHQGL]DJHPGRVDOXQRVRVSURMHWRV
H[HPSORVGHSRVVtYHLVSURMHWRVD SHGDJyJLFRVSHUPLWHPLQWHJUDUXP
VHUHPDERUGDGRVQDVYiULDViUHDV FRQMXQWRGLYHUVL¿FDGRGHDWLYLGDGHV
GHFRQWH~GRIRUPDomRSHVVRDOH HDDERUGDJHPGHGLIHUHQWHViUHDVGH
FRQWH~GRQXPD¿QDOLGDGHFRPXPTXH
VRFLDOH[SUHVVmRHFRPXQLFDomR
OLJDRVGLIHUHQWHVPRPHQWRVGHGHFLVmR
FRQKHFLPHQWRGRPXQGR
SODQHDPHQWRUHDOL]DomRDYDOLDomR
FRPXQLFDomR´,VDEHO/RSHVGD6LOYD


1
uma primeira parte são
apresentados exemplos de Nos vários exemplos apresentados há sempre
projetos relacionados com a preocupação de intercalar projetos que têm
cada uma das áreas de origem em situações que naturalmente surgem
forma diferenciada, mas sem contrariar as no quotidiano do jardim de infância e outros que
características integradoras de cada uma partem da iniciativa do/a educador/a, de acordo
destas áreas, que não podem ser concebidas com uma planificação prévia definida a partir de
isoladamente. A reforçar este aspeto, numa determinada intencionalidade educativa.
segunda parte são apresentados exemplos
de projetos mais abrangentes que de forma
globalizante articulam as diferentes áreas de
conteúdo.

Os projetos apresentados, em linhas gerais,


inspiram-se na pedagogia do projeto.
Como refere Isabel Lopes da Silva (2005),
esta metodologia contraria a atomização das
aprendizagens, valorizando, numa perspetiva
articulada, atividades que proporcionam
aprendizagens significativas e motivadoras,
mobilizando as várias áreas de conhecimento
em torno de uma temática central, globalizante.

por: Maria João Cardona (coord.), Cristina Vieira, Marta Uva e Teresa-Cláudia Tavares 099
*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3UpHVFRODU


$iUHDGDIRUPDomRSHVVRDOH
VRFLDO

$iUHDGDIRUPDomRSHVVRDOHVRFLDO UHODWLYDPHQWHjVUHVWDQWHViUHDVGH
pXPDiUHDGHFRQWH~GRWUDQVYHUVDO FRQWH~GRRXDH[FHVVLYDGLOXLomRGDV
HPTXHSRUH[FHOrQFLDVHLQWHJUDPDV WHPiWLFDVTXHQHVWDVHLQWHJUDP
TXHVW}HVUHODFLRQDGDVFRPRJpQHUR
Nesse sentido, apresentamos agora exemplos
HDHGXFDomRSDUDDFLGDGDQLD
de projetos que se incluem nesta área,
1RHQWDQWRDWUDQVYHUVDOLGDGH os quais, apesar das suas características
TXHFDUDFWHUL]DHVWDiUHDQmR integradoras, não deixam de ter finalidades
SRGHLPSOLFDUDVXDPHQRUL]DomR específicas de trabalho.

48$'52±3URMHWRTXHGHULYDGHXPD
VLWXDomRRFRUULGDQRTXRWLGLDQR

Em resposta a um pedido da educadora


à sala para que as crianças trouxessem
materiais que as ajudassem a escolher
prendas a pedir ao Pai Natal numa carta
escrita na sala, uma menina traz um
catálogo de brinquedos e jogos de uma
grande superfície comercial, estruturado
de forma estereotipada em três partes:
uma parte unissexo para as crianças mais
novas/bebés, uma parte para raparigas,
marcada por cercaduras cor-de-rosa vivo,
uma parte para rapazes marcada por
cercaduras azuis. Os brinquedos e jogos
de cada área são também estereotipados.

 A educadora pede à menina para ),*85$±,OXVWUDomRGRSURMHWR


mostrar o catálogo e a cada criança que DSUHVHQWDGR

100 Lisboa, CIG, 2015


*e1(52&,'$'$1,$(,17(59(1d­2('8&$7,9$_$ViUHDVGHFRQWH~GR([HPSORVGHSURMHWRV

escolha um brinquedo de lá. Todas as e simulam situações que questionam os


crianças escolheram um brinquedo da estereótipos de género: caso do rapazinho
área cujo estereótipo corresponde ao seu que deseja um brinquedo atribuído a
sexo. A educadora propõe que escolham rapariguinhas ou o inverso; da fabricante
um segundo brinquedo, mas da outra que quer fabricar bonecas para rapazinhos
área. As crianças escolhem. mas a quem clientes dizem que não vale a
pena; etc.
 A educadora leva as crianças a
questionar a proibição inicialmente sentida  A educadora reflete com as crianças
pelas crianças na escolha de brinquedos sobre uma ou mais das situações criadas.
da área que não era para elas (ou com a
qual não se identificavam).  As crianças vão apresentar a outra sala
o seu novo catálogo e tentar convencer as
 Propõem-se organizar um novo
crianças da outra sala da razão pela qual
catálogo em que não haja divisões entre
esse catálogo é mais interessante que o
as idades e os sexos, mas em que os
original.
brinquedos se dividam, por exemplo, pelo
tamanho, pelo número de utilizadores/as,
Ao contrário do inicialmente previsto,
se são jogos ou representações de
a principal finalidade deste trabalho
objetos ou seres do mundo, etc.
foi contribuir para desmistificar a
 As crianças fingem ser fabricantes, proibição de existirem brinquedos só
compradoras/vendedoras de brinquedos para rapazes ou só para raparigas.

48$'52±6tQWHVHGHXPSURMHWR
SODQHDGRSHORDHGXFDGRUDFRPXP
JUXSRGHFULDQoDV
A educadora está ao corrente de que os
rapazes (de 4 anos de idade) recusam,
na maioria, que os homens possam
ser apenas donos de casa, ou que os
homens adultos devam partilhar as
tarefas domésticas. Quer trabalhar com
as crianças a noção de cidadania não
restringida por estereotipias de género e
ao mesmo tempo contemplar alguns dos
objetivos propostos para esta área de
conteúdo nas Orientações Curriculares
para a Educação Pré-escolar: a partilha de
poder; a vivência de valores democráticos.

),*85$±,OXVWUDomRGDVLWXDomR

por: Maria João Cardona (coord.), Cristina Vieira, Marta Uva e Teresa-Cláudia Tavares 101
*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3UpHVFRODU

 Discute-se com as crianças o caso da   As crianças discutem para decidir se


Ana, que trabalha fora de casa como o o Rui pode ou não trabalhar apenas em
seu marido, e também quer ser bombeira, casa.
tal como o marido é caçador. Discute-se
 Na sequência deste trabalho, a
se as mulheres devem poder ter tempo
educadora fala-lhes sobre a Declaração
para ocupar cargos públicos ou devem
Universal dos Direitos Humanos e leva
ser impedidas disso por se ocuparem
o livro de Peter et al. (2008), Todos Nós
sozinhas do trabalho com a casa e a
Nascemos Livres. Declaração Universal
família em simultâneo. Discute-se a seguir
dos Direitos Humanos ilustrada1. Falam
o caso do Rui, que não quer trabalhar fora
também da declaração dos direitos
de casa, mas trabalhar apenas para a sua
da criança e a educadora leva o livro
família.
da Luísa Ducla Soares, Os Direitos das
 As crianças simulam respetivamente Crianças (2009) 2. Dão particular atenção
os papéis da Ana e do Rui para às questões de género.
perceberem melhor os diferentes pontos
de vista de cada um.

1
Peter et al. (2008), Todos Nós Nascemos Livres. Declaração Universal dos Direitos Humanos ilustrada, Prior Velho:
Paulinas/Amnistia Internacional.
2
Soares, Luísa Ducla (2009), Os Direitos da Criança, Barcelos: Ed. Civilização.

102 Lisboa, CIG, 2015


*e1(52&,'$'$1,$(,17(59(1d­2('8&$7,9$_$ViUHDVGHFRQWH~GR([HPSORVGHSURMHWRV


$iUHDGRFRQKHFLPHQWRGR
PXQGR

$iUHDGRFRQKHFLPHQWRGR
PXQGRWDPEpPWHPXP 48$'52±
SRWHQFLDOULFRGHWUDEDOKRWDQWR ([HPSORGHSURMHWR
SDUWLQGRGDVVLWXDo}HVTXHYmR TXHGHULYDGHXPD
RFRUUHQGRQDWXUDOPHQWHQD
VLWXDomRRFRUULGDQR
YLGDGRJUXSRHTXHVmRSUHWH[WR
SDUDRGHVHQYROYLPHQWRGH TXRWLGLDQR
SHVTXLVDVHSURMHWRVGLYHUVRV
FRPRDSDUWLUGHSURMHWRV A partir de uma conversa escutada na
SODQHDGRVSHODHGXFDGRUDRX área de garagem entre dois rapazes, a
educadora apercebe-se de que a maioria
SHORHGXFDGRUTXHGHVD¿DP das crianças considera que as mulheres
DVFULDQoDVSDUDDDTXLVLomR não podem conduzir camiões. Liga essa
GHQRYDVDSUHQGL]DJHQV1R convicção a uma observação sobre o
FDVRGRJpQHURHHGXFDomR desinteresse que os homens devem
ter por moda. Vai então planear um
SDUDDFLGDGDQLDVmRPXLWDV alargamento dos conhecimentos das
DVSRWHQFLDOLGDGHV3DUDR crianças sobre as profissões cruzando
GHPRQVWUDUVmRGHVHJXLGD esse alargamento de conhecimentos
com a dissolução de estereótipos de
DSUHVHQWDGRVGRLVH[HPSORV
género.
SRVVtYHLVGHWUDEDOKR
 Recorrendo à técnica “testemunho”,
uma condutora de um veículo comercial
(a condutora de uma carrinha de caixa
alta de um viveiro local) vem à sala
falar da sua experiência de condutora
e do prazer de conduzir este particular
tipo de veículo. A pedido prévio do/a
educador/a, refere o nome da Elisabete

por: Maria João Cardona (coord.), Cristina Vieira, Marta Uva e Teresa-Cláudia Tavares 103
*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3UpHVFRODU

Jacinto como o de uma mulher-piloto


que pilota camiões e participa em
competições desportivas por etapas,
como o Paris-Dakar, que é além disso
uma professora que também co-realizou
uma banda desenhada (Os Portugas no
Dakar, obra incluída no Plano Nacional
de Leitura)3.

 As crianças pesquisam sobre


Elisabete Jacinto e sobre o trabalho
desempenhado pelas diferentes equipas
técnicas – equipas de planificação e
supervisão de trajetos, equipas de
apoio ao alojamento e restauração,
equipas de apoio mecânico, equipas de
pilotagem – que são necessárias para a
realização de uma prova como o Paris-
-Dakar. Veem a banda desenhada.

 Recorrendo à técnica da simulação,


todas as crianças desempenham ),*85$±,PDJHPGDVLWXDomR
o papel de membros de diferentes
DSUHVHQWDGD
equipas, promovendo o/a educador/a
a inclusão de raparigas para equipas
ligadas aos estereótipos de género Tenente; pesquisa na Internet nomes de
masculino, como as equipas de mulheres que são grandes líderes políticas
pilotagem e de apoio mecânico, e a na Europa, etc.).
inclusão de rapazes em equipas mais
ligadas aos estereótipos de género  Pesquisam imagens de pilotos/
feminino, como as de apoio ao camionistas de ambos os sexos e
alojamento e à restauração. criadores de moda de ambos os sexos.
Com essas imagens, constroem um livro
 As crianças fazem, na sala ou no em concertina, onde de um lado vemos
exterior, a dramatização de um rali. uma das profissões representada pelos
dois sexos, e do outro a outra profissão
 As crianças discutem se há profissões também representada pelos dois sexos.
fechadas por causa do sexo.
A educadora menciona exemplos No final avaliaram o que aprenderam com
diversos de acordo com as sugestões este projeto: não há profissões só para
que forem surgindo (ex.: figuras do sexo homens ou só para mulheres, ao contrário
masculino que são grandes criadores de do que algumas crianças inicialmente
moda, como Nuno Gama ou José António afirmavam.

3
Jacinto, Elizabete; Pinto-Coelho, Luis (2007) Os Portugas no Dakar, Lisboa: Plátano Ed.

104 Lisboa, CIG, 2015


*e1(52&,'$'$1,$(,17(59(1d­2('8&$7,9$_$ViUHDVGHFRQWH~GR([HPSORVGHSURMHWRV

48$'52±([HPSORGHVtQWHVHGHXP
SURMHWRSODQHDGRSHORDHGXFDGRUDFRP
RJUXSRGHFULDQoDV

O/A educador/a quer que as crianças  Mediante a técnica do estudo de caso,


compreendam a diversidade intrassexual, as crianças vão discutir os diferentes
isto é, que compreendam o facto de que estilos de viver a masculinidade e a
o sexo masculino (acontecendo o mesmo feminilidade dos animais em estudo,
com o sexo feminino…) expressa a estabelecendo comparações, por
masculinidade com estilos diferentes, mais exemplo, entre a forma como as galinhas
e menos estereotipados e mais e menos protegem as ninhadas e as mães da
positivos do ponto de vista relacional; a tal maioria dos insectos abandonam as suas.
ponto que podem ser mais pronunciadas
as diferenças entre dois homens do  As crianças criam uma peça de
que entre um homem e uma mulher; e teatro em que tentam aplicar ao estudo
mais marcadas as diferenças entre duas do comportamento humano o que
mulheres do que entre uma mulher e um perceberam sobre a multiplicidade dos
homem. Assim, uma mulher e um homem comportamentos animais, aparecendo
podem ser mais parecidos entre si do que personagens semi-humanas / semi-animais
duas mulheres entre elas e vice-versa. (com rosto humano, mas corpo de galinha,
Quer também alargar o conhecimento das a figurar de mãe-galinha) a comportar-se
crianças sobre os animais, nomeadamente como os diferentes animais estudados4.
dando-lhes a conhecer a diversidade de
estratégias de reprodução existente entre
 As crianças ensaiam a dramatização.
os seres vivos.

 As crianças representam a
 As crianças pesquisam sobre a vida
dramatização para os/as colegas e famílias
de animais com formas de expressão da
e no final fazem a (auto)avaliação deste
sexualidade diversa da humana, tal como
trabalho.
o caracol; e formas não estereotipadas de
expressar o género, tal como a agressiva
rainha das abelhas ou o cuidadoso pai
castor.

4
Podem surgir ideias para a dramatização a partir do livro: Soares, Luísa Ducla e Leitão, Pedro (2008), Mãe, Querida Mãe!
Como É a Tua? Lisboa: Terramar

por: Maria João Cardona (coord.), Cristina Vieira, Marta Uva e Teresa-Cláudia Tavares 105
*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3UpHVFRODU


$iUHDGDH[SUHVVmRH
FRPXQLFDomR
7DOFRPRDViUHDVGHFRQWH~GR &RPRH[HPSORYDPRVYHUFRPRD
DQWHULRUHVDiUHDGDH[SUHVVmRH SDUWLUGDPDWHPiWLFDHGDP~VLFDVH
FRPXQLFDomRQRVVHXVGLIHUHQWHV SRGHPWUDEDOKDUDVTXHVW}HVGHJpQHUR
GRPtQLRVDSUHVHQWDXPSRWHQFLDO HDHGXFDomRSDUDDFLGDGDQLDQD
ULFRHGLYHUVL¿FDGRGHDSUHQGL]DJHQV HGXFDomRSUpHVFRODU
GLYHUVDV

48$'52±3URMHWRTXHGHULYDGHXPD
VLWXDomRRFRUULGDQRTXRWLGLDQR
As crianças falam do campeonato de 4) Voltam ao campeonato de futebol,
futebol e defendem as cores dos seus falam das regras do jogo, do número de
clubes. jogadores/as de cada equipa.
Gera-se uma discussão; os rapazes 5) A educadora lança o desafio: em
acham que as raparigas não percebem pequenos grupos, desenharem o campo
nada de futebol e não podem jogar. com o número de jogadores/as que
O/A educador/a decide então partir desta participam.
discussão para desmistificar algumas
6) Surgem várias questões: o/a árbitro/a
ideias preconcebidas relativamente à
entra? E os/as suplentes, como se podem
relação das mulheres com o desporto.
representar? É o início de uma situação
1) O/A educador/a intervém dizendo que que o/a educador/a explora do ponto
ela também gosta de futebol e que as de vista matemático: as crianças podem
raparigas também podem jogar visto que fazer o registo da situação, proceder à
também há campeonatos de equipas contagem e registar o número de cada
femininas. grupo de intervenientes no jogo, procurar
as respostas para as várias situações
2) Falam dos desportos que podem pensadas, etc.
ser jogados só por homens ou só por
mulheres. Chegam à conclusão que a Uma das principais finalidades deste
maioria das modalidades pode ser jogada trabalho é levar as crianças a questionar
por ambos os sexos. algumas ideias estereotipadas
relativamente à relação de homens e
3) Fazem uma tabela para registo das mulheres com o desporto.
diferentes modalidades desportivas de que
falaram.

106 Lisboa, CIG, 2015


*e1(52&,'$'$1,$(,17(59(1d­2('8&$7,9$_$ViUHDVGHFRQWH~GR([HPSORVGHSURMHWRV

48$'52±6tQWHVHGHXPSURMHWR
SODQHDGRSHODRHGXFDGRUDFRPRJUXSR
GHFULDQoDV

O/A educador/a, a quem preocupa o Discutem o absurdo da letra; as crianças


facto de as crianças cantarem algumas dizem gostar porque a música é bonita.
canções da moda sem estarem atentas à
agressividade das letras relativamente às O/A educador/a sublinha a necessidade
mulheres, decide promover uma atitude de estarem mais atentos/as às letras das
mais atenta e crítica relativamente às letras canções de que gostam.
das canções, nomeadamente refletindo
em conjunto sobre a agressividade que Decidem inventar uma nova letra para
estas manifestam em relação ao sexo aquela música.
feminino.
É um ponto de partida para a organização
Elabora um registo com a letra da canção de um livro de canções e uma gravação
e lê em voz alta o primeiro verso. das canções que conhecem. Na seleção
Sem a música, as crianças não todas as crianças estão atentos/as às
reconhecem a canção e ficam sem letras. A organização destes registos pode
entender onde o/a educador/a quer constituir uma ótima oportunidade para
chegar, revelando uma certa dissonância trabalhar com as crianças atividades da
por o/a ouvirem falar assim. área da linguagem e da descoberta da
escrita.
O/A educador/a volta a ler e pergunta se
não conhecem. Com ajuda, as crianças
identificam a canção.

por: Maria João Cardona (coord.), Cristina Vieira, Marta Uva e Teresa-Cláudia Tavares 107
*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3UpHVFRODU


3URMHWRVTXHHQYROYHPDV
GLIHUHQWHViUHDVFXUULFXODUHV

1DVHTXrQFLDGRTXHIRLMiDSUHVHQWDGR &RPRUHIHUH,VDEHO/RSHVGD6LOYD
SDUDDVGLIHUHQWHViUHDVGHFRQWH~GR  RSODQHDPHQWRGHXP
GHVHJXLGDIRUQHFHPRVXPH[HPSOR SURMHWRGDGDDFRPSOH[LGDGH
TXHLPSOLFDDDUWLFXODomRHQWUHWRGDV GHVWHQmRSRGHVHUIHLWRGHIRUPD
DViUHDVDWUDYpVGDPHWRGRORJLDGH OLQHDUSRGHQGRWHUYiULDVYHUWHQWHV
SURMHWR1HVWHH[HPSOREDVHDPRQRV GHFRQKHFLPHQWRHGHDomR1HVVH
QDHVWUXWXUDDSUHVHQWDGDSRU7HUHVD VHQWLGRRVHXSODQHDPHQWRSRGHVHU
9DVFRQFHORV  TXHWHPFRPR YDQWDMRVDPHQWHUHSUHVHQWDGRDWUDYpV
PRGHORGHWUDEDOKRXPDSHUVSHWLYD GHXPDWHLDRXUHGHHPTXHDTXHVWmR
VyFLRFRQVWUXWLYLVWDTXHSDUWHGH GHSDUWLGD¿JXUDQRFHQWURHPWRUQR
VLWXDo}HVSUREOHPDWL]DQWHVVXJHULGDV GRTXDOVHVLWXDPYiULDVIRUPDVGH
SHORJUXSRGHFULDQoDVHDSDUWLUGDV GHVHQYROYLPHQWRHQTXDGUDGDVSHODV
TXDLVpSODQHDGRWRGRRWUDEDOKR iUHDVGHFRQWH~GRPRELOL]DGDV

48$'52±(WDSDVGHXPSURMHWR

FASES A TER EM CONTA NO DESENVOLVIMENTO DE UM PROJETO:

» Definição do problema
» Mapas conceptuais – “teia”
» Planificação e lançamento do projeto
» Execução
» Avaliação/divulgação
» Papel do/a educador/a
» Organização do tempo, espaços e recursos

108 Lisboa, CIG, 2015


*e1(52&,'$'$1,$(,17(59(1d­2('8&$7,9$_$ViUHDVGHFRQWH~GR([HPSORVGHSURMHWRV

Apresentamos de seguida
48$'52±3HUVRQDOLGDGHVIHPLQLQDV um exemplo de uma situação
simulada.
TXH SRGHP VHU WUDEDOKDGDV FRP DV
FULDQoDV Em diálogo com as crianças,
o/a educador/a constata que
o grupo manifesta algum
,UHQH/LVERD 
interesse em encontrar um
1DVFHX HP  HP $UUXGD GRV 9LQKRV )RL XPD ¿JXUD nome para o seu jardim de
SLRQHLUDQDKLVWyULDGDHGXFDomRGHLQIkQFLDHP3RUWXJDO infância, pelo que se começa
)RLXPDUHFRQKHFLGDHVFULWRUDTXHHVFUHYHXSDUDFULDQoDV a definir a problemática de
REUDVFRPRRVOLYURVGHFRQWRV8PD0mR&KHLDGH1DGD partida: O nosso jardim de
2XWUDGH&RLVD1HQKXPD  H4XHUHV2XYLU"(X&RQWR infância não tem nome!
± +LVWyULDV SDUD 0DLRUHV H PDLV 3HTXHQLQRV   )RL
Esta questão, que é tão
SURIHVVRUDSULPiULDHHGXFDGRUDGHLQIkQFLDDSUHVHQWRX frequente nas nossas
VHDRVH[DPHVGH¿PGHFXUVRTXDQGRMiHVWDYDDUHJHU instituições, pode ser um bom
FODVVHVLQIDQWLV(VSHFLDOL]RXVHHP&LrQFLDVGD(GXFDomR pretexto para levar as crianças
QD6XtoD RQGHFRQWDFWRXFRP&ODSDUqGHH3LDJHW HYLVL a conhecerem personalidades
WRXMDUGLQVGHLQIkQFLDIUDQFHVHVHEHOJDV2TXHHVFUHYHX femininas, da comunidade,
da região, nacionais,
VREUH HVVDV YLVLWDV H FRQWDFWRV UHYHOD XP SHQVDPHQWR
internacionais.
LQRYDGRU (ODERURX XP SURJUDPD GH DSRLR SHGDJyJLFR
SDUD R WUDEDOKR GDV FODVVHV GH HGXFDomR GH LQIkQFLD Num universo essencialmente
2JRYHUQRVDOD]DULVWDFRQVLGHURX,UHQH/LVERDGHPDVLDGR masculino, a introdução de
VXEYHUVLYD H VXEWLOPHQWH ³DIDVWRXD´ GH TXDOTXHU OXJDU histórias de vida de mulheres
R¿FLDO0RUUHXHP/LVERDHP que tiveram ou têm um papel
importante na sociedade é
9HU)HUQDQGHV5RJpULR³%LRJUD¿DGH,UHQH/LVERD´
LQKWWSZZZLLOSWDUWLJRDVS"LG FRQVXOWDGRHPGHMXOKRGH
uma referência fundamental
que alarga o tipo de modelos
que habitualmente são
$QDGH&DVWUR2VyULR  apresentados às crianças.
1DVFHX HP 0DQJXDOGH HP  )RL XPD UHFRQKHFLGD
HVFULWRUD H DWLYLVWD SROtWLFD VHQGR VREUHWXGR XPD Mas a par desta preocupação,
GHIHQVRUD GRV GLUHLWRV GDV PXOKHUHV )XQGRX D /LJD em resposta à questão sentida
pelas crianças, são muitas as
5HSXEOLFDQD GDV 0XOKHUHV 3RUWXJXHVDV TXH OXWDYD SHOR
atividades que podem ser
GLUHLWRGDVPXOKHUHVDRYRWR7DPEpPFULRXXPDFROHomR realizadas.
 YROXPHV  GH /LYURV  3DUD DV &ULDQoDV SDUD D TXDO
HVFUHYHX PXLWDV REUDV H WUDGX]LX PXLWDV RXWUDV GH Juntamente com as crianças,
$QGHUVHQ H GRV ,UPmRV *ULPP 9LYHX DOJXQV DQRV QR a educadora pode planear
%UDVLO RQGH HQVLQRX $OJXQV GRV VHXV OLYURV IRUDP diferentes atividades que
podem realizar, pelo que um
DGRWDGRV FRPR PDQXDLV HVFRODUHV HP 3RUWXJDO H QR
panorama possível poderia
%UDVLO0RUUHXHP6HW~EDOHP ser aquele que apresentamos
9HUKWWSZZZPXQVHWXEDOSW$FWLYLGDGH0XQLFLSDO&XOWXUD na planificação em teia/mapa
3HVVRDV3HUVRQDOLGDGHV$QDGH&DVWUR2VyULRKWPFRQVXOWDGRHPGH
conceptual que se apresenta
MXOKRGH
na FIGURA 22.

por: Maria João Cardona (coord.), Cristina Vieira, Marta Uva e Teresa-Cláudia Tavares 109
Identificar

110
os traços Pesquisar a Relacionar as características
característicos do história do jardim do jardim de infância com
jardim de infância Fazer Recordar autores/as características da vida
de infância
entrevistas e personalidades e obra das personalidades
envolvidas nos e votar as elegíveis
projetos e atividades
*e1(52©(©&,'$'$1,$
*8,«2©'(©('8&$d«2

Sentimentos Formas Identificar desenvolvidas (livros,


A antigos/as personalidades exposições...)

Lisboa, CIG, 2015


alunos/as ligadas ao jardim
de infância
A funcioná-
Cores rios/as Fazer um levantamento Fazer as urnas
Às dos dados biográficos e os boletins
crianças das personalidades
A/O diretor/a UM NOME PARA O selecionadas
NOSSO JARDIM DE
3UpHVFRODU

INFÂNCIA Constituir a mesa


Dramatizar a vida de voto
da personalidade Elaborar uma lista com
eleita os nomes elegíveis

Eleger o/a As eleições, o


Fazer os direito de voto e
patrono/a do Votar
Apresentar à convites as mulheres – fazer
jardim de infância
comunidade a uma retrospetiva
personalidade histórica Apurar o
eleita resultado da
votação
),*85$±([HPSORGHHVTXHPDWL]DomRGHXPSURMHWR

Fazer uma
Projetar o simbolo festa de
e a placa com o descerramento O que é uma
nome selecionado da placa eleição Ir ao dicionário
para o jardim de Contar Fazer gráficos
infância
*e1(52&,'$'$1,$(,17(59(1d­2('8&$7,9$_$ViUHDVGHFRQWH~GR([HPSORVGHSURMHWRV

48$'52±3HUVRQDOLGDGHVIHPLQLQDVFRQWHPSRUkQHDV

0DULD.HLO 
1DVFHXHPHP6LOYHVeXPDUHFRQKHFLGDSLQWRUDLOXVWUDGRUDHDUWLVWDSOiVWLFDTXH
HQWUH PXLWDV RXWUDV DWLYLGDGHV FRPR D FULDomR GH FHUkPLFDV ¿JXULQRV WDSHoDULDV RX
LPDJHQVSXEOLFLWiULDVWUDEDOKRXFRPD]XOHMRV±DOJXPDVGDVHVWDo}HVGHPHWURSROLWDQR
GH/LVERDWrPFRPSRVLo}HVJHRPpWULFDVGHVXDDXWRULD9HLRYLYHUSDUD/LVERDHDLQGD
MRYHPHVWHYHHP3DULV2VHXWUDoRPXLWRHVWLOL]DGRSHUPLWHXPDDSUHHQVmRIiFLOGRTXHD
LPDJHPUHSUHVHQWD2UJDQL]RXHOHFLRQRXXPFXUVRGHLOXVWUDomRLQIDQWLO,OXVWURXYiULRV
OLYURVSDUDFULDQoDVPDVWUrVGHOHVQmRVyRVLOXVWURXFRPRRVHVFUHYHX23DXGH)LOHLUD
 2V3UHVHQWHV  H$V7UrV0DomV  +RMH0DULD.HLOYLYHQR$OJDUYH
9HU+HLWOLQJHU3DXOR  ³0DULD.HLO´LQKWWSWLSRJUDIRVQHWSRUWXJDOPDULDNHLOKWPOFRQVXOWDGRHPGH
MXOKRGH

3DXOD5HJR 
1DVFHXHPHP/LVERDeXPDSLQWRUDHLOXVWUDGRUDLQWHUQDFLRQDOPHQWHFRQKHFLGD
)RLHVWXGDUSLQWXUDSDUD/RQGUHVFRPGH]DVVHWHDQRV,QVSLUDVHQDVXDLQIkQFLDHQDV
KLVWyULDVTXHQHVVDDOWXUDRXYLX'HODMiVHGLVVHTXHXVRXDVVXDVH[SHULrQFLDVUHFRUGDo}HV
IDQWDVLDV H PHGRV GH FULDQoD H OKHV GHX XP VLJQL¿FDGR XQLYHUVDO (QWUH PXLWDV RXWUDV
REUDV3DXOD5HJRLOXVWURXFRQWRVWUDGLFLRQDLVSRUWXJXHVHV+iDOJXPDVREUDVGHTXHDV
FULDQoDVJRVWDPSDUWLFXODUPHQWHDVSLQWXUDVGDVpULH9LYLDQ*LUOVSRUH[HPSOR$VXD
SLQWXUDUHSUHVHQWDIUHTXHQWHPHQWHFULDQoDVRXDQLPDLVDQWURSRPRU¿]DGRVFRPRVHYr
QDVpULHGR0DFDFR9HUPHOKRHUHWRPRXKLVWyULDVLQIDQWLVFRPRDGR3LQyTXLR%UDQFDGH
1HYHRX&DSXFKLQKR9HUPHOKR7DPEpPLOXVWURXOHQJDOHQJDVLQJOHVDV+RMH3DXOD5HJR
YLYHHP/RQGUHV
9HUKWWSZZZJXDUGLDQFRXNDUWDQGGHVLJQMXODUWDUWFRQVXOWDGRHPGHMXOKRGH

9DQHVVD)HUQDQGHV  

$ DWOHWD ROtPSLFD GH WULDWOR 9DQHVVD GH 6RXVD )HUQDQGHV QDVFHX HP  QXPD DOGHLD
SHUWR GH 9LOD 1RYD GH *DLD (P  DLQGD FRP  DQRV SDUWLFLSRX QD VXD SULPHLUD
SURYDFRPSHWLWLYD(VFROKHXVHUDWOHWDGHWULDWOR2WULDWORpXPDPRGDOLGDGHGHVSRUWLYD
PXLWRH[LJHQWH&RPELQDWUrVGHVSRUWRV1DYHUVmRROtPSLFDpSUHFLVRQDGDUGXUDQWHXP
TXLOyPHWURHPHLRID]HUTXDUHQWDTXLOyPHWURVGHELFLFOHWDHGH]TXLOyPHWURVGHFRUULGD
VXFHVVLYDPHQWH /RJR D VHJXLU DRV  DQRV  9DQHVVD WURFRX D FDVD IDPLOLDU SRU XP
&HQWUR 'HVSRUWLYR SDUD DWOHWDV GH DOWD FRPSHWLomR ± RQGH j GDWD GH SXEOLFDomR GHVWD
REUD   FRQWLQXD D UHVLGLU 9DQHVVD IRL VHPSUH PHOKRUDQGR DV VXDV SUHVWDo}HV
QRV-RJRV2OtPSLFRVGH$WHQDV *UpFLD 9DQHVVDIRLQRWULDWORROtPSLFRHQRV
GH 3HTXLP &KLQD   9DQHVVD WRUQRXVH YLFHFDPSHm JDQKRX D PHGDOKD GH SUDWD
SDUD3RUWXJDO2IXWXURGRVHGDVDWOHWDVpLQFHUWR±SRGHPIDFLOPHQWHOHVLRQDUVHH¿FDU
LQFDSD]HVGHFRPSHWLU1RHQWDQWRVHMDTXDOIRURSHUFXUVRGH9DQHVVD)HUQDQGHVHODMi
SURYRXTXHpSHUVLVWHQWHUHVSRQViYHOHGHWHUPLQDGD
9HUKWWSZZZYDQHVVDIHUQDQGHVQHWHQZLNLSHGLDRUJZLNL 9DQHVVD B )HUQDQGHV
KWWSZZZVOEHQ¿FDSW,QIRUPDFDR0RGDOLGDGHV7ULDWOR$WOHWDVDWOHWDVDVSFRQVXOWDGRHPGHVHWHPEURGH


por: Maria João Cardona (coord.), Cristina Vieira, Marta Uva e Teresa-Cláudia Tavares 111
*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3UpHVFRODU

A planificação apresentada
esquematiza um caminho 48$'52  ± $ KLVWyULD GD HVFULWRUD
que pressupõe a 6RSKLD GH 0HOOR %UH\QHU FRQWDGD jV
interdisciplinaridade e a
consequente articulação FULDQoDV
entre um leque diversificado
de atividades, as quais, por 6RSKLDGH0HOOR%UH\QHU 
sua vez, se conjugam e se
$ HVFULWRUD 6RSKLD GH 0HOOR %UH\QHU QDVFHX HP 
integram em diferentes áreas
de conteúdo. 4XDQGRHUDFULDQoDYLYLDQXPDJUDQGHFDVDFKHLDGHOLYURV
HTXDGURVQR3RUWRSHUWRGRULR'RXUR$FDVDWLQKDXP
No que diz respeito à MDUGLPHQRUPHFKHLRGHiUYRUHVHÀRUHV2MDUGLPHUDWmR
abordagem da cidadania, JUDQGHTXHKRMHpR-DUGLP%RWkQLFRGR3RUWRTXHTXDOTXHU
aparece-nos claramente uma SHVVRDSRGHYLVLWDU1HVVHMDUGLPD6RSKLDEULQFDYDFRP
dimensão fundamental: as
RV LUPmRV H DV LUPmV H RV SULPRV H DV SULPDV $RV WUrV
eleições, o direito de voto,
DQRV FRPHoRX D JRVWDU GH SRHVLD 'HFRURX XP SRHPD
etc., possibilitando a pesquisa
e discussão sobre diferentes FKDPDGR1DX&DWULQHWDHWRGDDIDPtOLDDDSODXGLX
aspetos da história recente
ou passada, assim como a &UHVFHXYHLRHVWXGDUSDUDDXQLYHUVLGDGHGH/LVERDHHP
análise de diferentes histórias FRPHoRXDHVFUHYHUQXPDUHYLVWDFKDPDGD&DGHUQRV
de vida, quer de homens, quer GH 3RHVLD FRP DPLJRV GD PHVPD LGDGH FRPR R -RUJH
de mulheres. GH 6HQD H R 5XL &LQDWWL (P 3RUWXJDO QD DOWXUD HP TXH
D6RSKLDFRPHoRXDHVFUHYHUDPDLRULDGDVSHVVRDVQmR
São inúmeros os cenários VDELDOHUHHUDPXLWRSREUHVyDOJXPDVIDPtOLDV FRPR
possíveis, sendo várias as
DTXHODHPTXHD6RSKLDWLQKDQDVFLGR HUDPULFDVHFRP
sugestões e personalidades
PXLWRV HVWXGRV $OpP GLVVR KDYLD XP ~QLFR JRYHUQDQWH
elegíveis para o nome do
H WRGD D JHQWH HP 3RUWXJDO WLQKD GH YRWDU QHOH 6H XP
jardim de infância.
No entanto, a introdução de SRUWXJXrV RX XPD SRUWXJXHVD TXLVHVVH HVFROKHU RXWUR
personalidades femininas JRYHUQDQWH RX RXWUD IRUPD GH YLYHU D SROtFLD SUHQGLD
é fundamental para que as HVVDSHVVRDSDUDQmRHVSDOKDUDVLGHLDVTXHWLYHVVHRXSRU
crianças tenham referências H[HPSORHVVDSHVVRDHUDSURLELGDGHHQVLQDU
mais diversificadas,
para alargar os seus $ 6RSKLD QmR JRVWDYD GH QDGD GLVVR (OD WLQKD LGHDLV
conhecimentos, abrindo DFUHGLWDYD TXH D ULTXH]D GHYLD VHU GLVWULEXtGD TXH DV
novos horizontes, fora das SHVVRDV GHYLDP WHU HGXFDomR H GHYLDP SRGHU HVFROKHU
referências masculinas
TXHP GLULJLD R SDtV (P  FDVRX FRP R )UDQFLVFR
com que habitualmente
6RXVD7DYDUHVXPDGYRJDGRHMRUQDOLVWDTXHDFUHGLWDYD
são confrontadas, através
dos media, dos livros, etc. QRVPHVPRVLGHDLVHGHIHQGLDQRWULEXQDOSUHVRVSROtWLFRV
Para ajudar neste trabalho, (OD HVFUHYLD SRHVLD H FRQWRV H FRQVHJXLD FRPELQDU DV
de seguida apresentamos SDODYUDV H RV VRQV GH PDQHLUD D FULDU SHQVDPHQWRV
sugestões de personalidades QRYRV H D PRVWUDU SDLVDJHQV (VVDV SDLVDJHQV HUDP
femininas que poderão ser XPD PLVWXUD GH SDLVDJHQV TXH WLQKDP H[LVWLGR FRPR R
estudadas com as crianças.

112 Lisboa, CIG, 2015


*e1(52&,'$'$1,$(,17(59(1d­2('8&$7,9$_$ViUHDVGHFRQWH~GR([HPSORVGHSURMHWRV

regional e que possam ser um


MDUGLPRQGHWLQKDEULQFDGRRXRPDUGDVPDQKmVTXHHP bom exemplo para trabalhar
SHTXHQD SDVVDYD QD SUDLD FRP RXWUDV FRPSOHWDPHQWH com as crianças.
LPDJLQDGDV7RUQDYDVHFDGDYH]PHOKRUDID]HULVVRQR
TXHHVFUHYLD(QWmRXVRXHVVDFDSDFLGDGHTXHWLQKDSDUD Que figuras escolhe? Porquê?
Como pode apresentar às
OHYDUDVSHVVRDVSRUWXJXHVDVDHVFXWDURVVHXVLGHDLVHD
crianças este trabalho? Como
SHQVDU GH IRUPD GLIHUHQWH (VFUHYLD VREUH D OLEHUGDGH H
pode contar a história e obra
VREUHRPXQGRRPXQGRRQGHWLQKDYLYLGRRPXQGRHP destas mulheres? Como é
TXH YLYLD H R PXQGR TXH HOD DFKDYD TXH GHYHULD H[LVWLU que estas histórias podem ser
7HYHFLQFR¿OKRVHHQWmRHVFUHYHXWDPEpPKLVWyULDVSDUD motivo para o desenvolvimento
HOHVHSDUDWRGDVDVFULDQoDV de projetos que envolvam as
várias áreas de conteúdo?
(PGHXVHD5HYROXomRGRGH$EULOTXHGHIHQGLD
RVVHXVLGHDLV$6RSKLD¿FRXPXLWRFRQWHQWH&RPRDFKDYD Há muitos exemplos de
TXH WRGD D JHQWH GHYH SDUWLFLSDU GR JRYHUQR GR SDtV projetos integradores e
muitos possíveis modelos
FDQGLGDWRXVHDXPOXJDUQD$VVHPEOHLD&RQVWLWXLQWH)RL
de planificação. Hernández
HOHLWD (2000) propõe um esquema
(FRQWLQXRXDHVFUHYHUDWpTXHPRUUHXHP de planificação orientado
por alguns critérios que
Tendo em conta a literatura possível forma de abordar a nos parecem, dada a sua
habitualmente trabalhada em história de vida desta autora peculiaridade e pertinência
contexto de jardim de infância, a um grupo de crianças de pedagógica, perfeitamente
entendemos que facilmente jardim de infância. ajustados à apresentação de
poderiam aparecer outras projetos sobre as questões
sugestões por parte das Na sequência dos exemplos de género e cidadania na
crianças, tais como Sophia de apresentados, pedimos que educação pré-escolar. Este
Mello Breyner ou Alice Vieira. pense em figuras femininas autor apresenta a seguinte
Tomando como exemplo a que se tenham destacado na proposta de planificação à
história de Sophia de Mello arte, na ciência, na política, a volta de um tema, questão ou
Breyner, apresentamos uma nível internacional, nacional e ideia-chave.

48$'52±(VWUXWXUDGHDSRLRjSODQL¿FDomR

GHSURMHWRV DGDSWDGRGH+HUQDQGR+HUQiQGH]
O que as crianças Estratégias Como começar (os Recursos
devem aprender que podem ser conhecimentos e as
desenvolvidas experiências das quais
se parte)
Conexões com outras Tema/ Questão/ Ideia-chave Apresentação final – o
matérias e saberes portefólio
Atividades para todo o Atividades em grupo Atividades individuais Avaliação – o que
grupo compreenderam e são
capazes de transferir

por: Maria João Cardona (coord.), Cristina Vieira, Marta Uva e Teresa-Cláudia Tavares 113
*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3UpHVFRODU

É nesta linha que apresentamos o exemplo de frequentemente trabalhada com as crianças: o


um projeto que parte de uma questão que é que é que eu quero ser quando for grande?

48$'52±([HPSORGHXPSURMHWR
O que as crianças devem Estratégias Como começar: Recursos:
aprender: que podem ser » elencar as » livros/histórias;
desenvolvidas: profissões dos
» que não existem profissões » visita à biblioteca;
de homens e profissões de » usar o diálogo familiares (pai, mãe,
mulheres, como mediador da avô, avó, irmão, » exposição sobre as
aprendizagem; irmã…) e de figuras profissões;
» que todas as opções
» iniciar uma busca de publicas; » questionários
humanas devem ser
respeitadas; informação relevante » elencar as e respetivas
sobre: as profissões profissões que cada respostas;
» que todas as pessoas que existem; o que um/a quer ter; » testemunhos
podem ter sucesso,
sabemos sobre as de diferentes
independentemente do » organizar num
diferentes profissões profissionais;
género. registo escrito tudo
e sobre quem as
o que se sabe sobre » etc….
executa;
os/as profissionais;
» tomar consciência
» elaborar um
do que se diz no
questionário sobre
grupo sobre a
as profissões e o
temática;
género e aplicá-lo no
» elaborar gráficos de contexto educativo
profissões; mais alargado.
» ter acesso a
testemunhos de
alguns profissionais
(homens e mulheres);
» elaborar um livro
sobre as diferentes
profissões que
contemple as
questões de género.

Conexões com outras Tema: Apresentação final:


matérias e saberes: O que é que eu quero ser quando for » organizar um
grande? portefólio da sala,
» Matemática: algarismos;
sequências numéricas; com todas as fases
Ideia-chave: trabalhar a desconstrução do projeto até
gráficos…
do estereótipo de género no que respeita
chegar ao livro;
» Língua Portuguesa: às profissões e culminar na elaboração de
expressão oral; um livro com diferentes profissões (sem » encontrar um
estereotipias). suporte para a
» Expressão Plástica:
apresentação do
diferentes técnicas,
mesmo (CD-ROM e
motricidade fina
dossier…).

114 Lisboa, CIG, 2015


*e1(52&,'$'$1,$(,17(59(1d­2('8&$7,9$_$ViUHDVGHFRQWH~GR([HPSORVGHSURMHWRV

Atividades para todo o Atividades em Atividades Avaliação:


grupo: grupo: individuais:
» elaboração de
» conversa inicial sobre as » elaboração das » comentário pessoal uma grelha que
profissões que conhecemos e questões para o sobre o projeto; contemple a
o que sabemos delas; questionário; » desenhos do livro; questão: o que eu
» debate/discussão sobre » aplicação do sei de novo sobre as
» verbalização das profissões;
o que pensamos sobre as questionário na
questões aos/às
profissões e o género; instituição; » conteúdo das
convidados/as.
» elaboração de registos das » elaboração/ intervenções nas
conversas/diálogos/debates; organização dos conversas, diálogos
capítulos do livro. e debates;
» leitura das histórias e diálogo
sobre elas; » registos;

» planeamento dos » conteúdo do


questionários e entrevistas; comentário pessoal.

» audição dos testemunhos


dos/as profissionais e
questionamento/entrevista aos
mesmos;
» planeamento do livro e
introdução no mesmo das
ideias decorrentes das
respostas às entrevistas e
aos questionários.

Por fim, apresentamos mais um exemplo, O desenvolvimento de projetos integradores


baseado na teoria dos mapas conceptuais, que envolvam as várias áreas de conteúdo
desenvolvida por Novak e Gowin (1988) a é fundamental no trabalho da educação de
partir da teoria da aprendizagem de Ausubel infância, sobretudo quando se trabalham as
(1963). Identificando conceitos-chave, estes são questões relacionadas com género e cidadania,
hierarquizados, unidos de acordo com a relação que colocam questões transversais a todas
que têm uns com os outros. Partindo de uma as áreas de saber. Para o desenvolvimento de
questão que se pretenda esclarecer, ou de um práticas educativas adequadas e significativas
acontecimento que se procura perceber, os para a aprendizagem é no entanto essencial ter
mapas conceptuais são organizados através do sempre em conta as características do contexto
estabelecimento de uma hierarquia, que vai dos em que se trabalhe e as características das
conceitos mais gerais, ou mais amplos, para os crianças.
mais específicos.

Considerando que o conhecimento de si (das


suas capacidades e interesses) é a base para
todas as aprendizagens, nomeadamente a
construção da identidade como pertencendo ao
género masculino ou feminino, experimentemos
o mapa conceptual gerado a partir da seguinte
questão: quem sou eu?

por: Maria João Cardona (coord.), Cristina Vieira, Marta Uva e Teresa-Cláudia Tavares 115
*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3UpHVFRODU

),*85$±(VTXHPDWL]DomRGHSURMHWRVDSDUWLUGDGH¿QLomRGHXPPDSD
FRQFHSWXDO

O que não sou Como posso


capaz de aprender?
fazer?

O que posso
O que sou aprender no
capaz de jardim de
fazer? infância?

QUEM SOU EU? O que


O que gosto (Nome; Idade; aprendo em
mais de fazer? Sexo; Família; casa?
Terra onde
moro...)

DIFERENÇAS ENTRE RAPAZES / RAPARIGAS...

48$'52±2XWUDVTXHVW}HVTXHSRGHP
VHUWUDEDOKDGDVQRMDUGLPGHLQIkQFLD
OUTRAS (POSSÍVEIS) QUESTÕES GERADORAS DA DISCUSSÃO E/OU NOVOS PROJETOS:
» O que se oferece a uma menina quando faz anos ? E a um menino?
» Quais as diferenças entre os rapazes e as raparigas?
» Podem as mulheres fazer tudo o que os homens fazem?
» Podem os homens fazer tudo o que as mulheres fazem?
» Por que devemos respeitar os outros?
» Seremos todos diferentes?
» Seremos todos iguais?
» Como seria um mundo só com mulheres?
» Como seria um mundo só com homens?
» Haverá características que sejam só dos homens?
» Haverá características que sejam só das mulheres?
» Haverá profissões que “fiquem mal” nos homens?
» Haverá profissões que “fiquem mal” nas mulheres?
» Sendo rapaz, como gostarias de ser quando fores crescido?
» Sendo rapariga, como gostarias de ser quando fores crescida?

116 Lisboa, CIG, 2015


*e1(52&,'$'$1,$(,17(59(1d­2('8&$7,9$_3URMHWRVGD,QVWLWXLomR


3URMHWRVGDLQVWLWXLomR

$PDLRULDGDVLGHLDVDSUHVHQWDGDV as práticas educativas não se esgotam na sala


DRORQJRGHVWDSXEOLFDomRUHIHUHVH de atividades, nem na ação desenvolvida
pelo/a educador/a. A formação de quem quer
jFRPSRQHQWHSHGDJyJLFDTXHDV
que trabalhe com as crianças nas questões
LQVWLWXLo}HVGHHGXFDomRGHLQIkQFLD relacionadas com o género e a cidadania é
SURFXUDQGRVHPSUHHQYROYHUDV fundamental para uma melhoria da qualidade
IDPtOLDVDVVXPHPQRWUDEDOKRTXH das práticas educativas.
UHDOL]DPFRPDVFULDQoDV
E este trabalho deve obrigatoriamente começar
por uma reflexão: como é que estas questões,
individualmente, são vividas? Qual a atenção

'
que é atribuída ao trabalho diretamente
e acordo com António Nóvoa
relacionado com a aprendizagem das questões
(1992), podemos diferenciar as
de género e cidadania por parte das crianças?
diferentes áreas de intervenção
Muitas vezes a nível do discurso é valorizada a
das instituições educativas:
necessidade de “incluir”, integrar a diversidade,
» a área pedagógica, que inclui as práticas de mas na prática (e mesmo nos projetos de
trabalho desenvolvidas pelos/as docentes com trabalho definidos) estas questões diluem-se.
as crianças; A área da formação pessoal e social definida
nas orientações curriculares para a educação
» a área escolar, que inclui o trabalho com as
pré-escolar, sendo considerada como estando
famílias e com a comunidade;
presente “em tudo” o que se faz, acaba por
» a área profissional, que inclui o trabalho de ser a área mais esquecida e também a mais
(auto)formação que deve ser um contínuo, tanto difícil de trabalhar. Neste sentido, o género e a
para docentes como para auxiliares de ação educação para a cidadania são frequentemente
educativa e outros/as técnicos/as que os grandes ausentes do trabalho realizado
colaboram na escola. nos jardins de infância, pois a sua suposta
transversalidade acaba por escamotear a sua
É sobre esta última área que incide este verdadeira importância.
capítulo, partindo do princípio que todas as
sugestões de trabalho apresentadas são apenas A agravar esta questão, não podemos deixar de
um ponto de partida, que exige uma contínua considerar a existência de uma certa dificuldade
reflexão e atualização dos/as educadores/as, de abertura das instituições destinadas às
de forma individual e em equipa. crianças pequenas no recrutamento de
pessoal masculino. Esta questão traz algum
O mesmo se poderá afirmar relativamente ao enviesamento a um trabalho mais equilibrado
trabalho a realizar com os/as auxiliares de ação sobre as questões de género e cidadania na
educativa e com os/as outros/as técnicos/as: educação de infância.

por: Maria João Cardona (coord.), Cristina Vieira, Marta Uva e Teresa-Cláudia Tavares 117
*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3UpHVFRODU

Durante muitos anos, ao contrário do que pessoal assume um papel fundamental ao nível
aconteceu nos outros níveis de ensino, o acesso da relação com as crianças, nomeadamente na
à profissão de educador de infância estava responsabilidade (e responsabilização) que esta
vedado aos homens. Só nos últimos anos interação acarreta em termos da transmissão
começaram a aparecer os primeiros homens na e clarificação de valores. Por conseguinte,
profissão. E tal como para muitas mulheres o deve estar em consonância com o trabalho
acesso a profissões tradicionalmente masculinas do/a educador/a, principalmente no âmbito da
não é fácil, o mesmo acontece frequentemente formação pessoal e social e da educação para a
no acesso destes primeiros educadores do sexo cidadania, evitando dissonâncias, disparidades
masculino a esta profissão tradicionalmente e divergências em termos dos conteúdos
feminina. comunicativos, comportamentais e atitudinais.

Mas a existência de mais educadores do sexo Como refere Isabel Alarcão, é importante
masculino nas instituições de educação de compreender a escola como uma “organização
infância é fundamental na promoção de uma que continuamente se pensa a si própria,
maior igualdade de género no trabalho com as na sua missão social e na sua estrutura e se
crianças pequenas. confronta com o desenrolar da sua atividade
num processo simultaneamente avaliativo e
Neste sentido, é importante refletir sobre o formativo” (Alarcão, 2000:13).
contributo de cada qual, enquanto agente
educativo, para ultrapassar algumas limitações Nesta linha, a mudança institucional sustenta-se
verificáveis nas instituições de educação de na assunção pelos/as docentes do poder
infância. e da responsabilidade, como profissionais que
integram um processo coletivo amplo, que
Qual a abertura à existência de profissionais passa pelas relações que estabelecem com
de sexo masculino? Como é que estes são colegas e outros parceiros e parceiras que
integrados? interferem na educação das crianças e na vida
Como é que o espaço institucional é promotor da instituição.
de práticas mais igualitárias?
Como é que a instituição acolhe as famílias? E, como é evidente, este trabalho começa
na creche. E não se esgota no jardim de
Qual a atenção dada à preparação do pessoal infância, continua na educação básica, sendo
auxiliar para o trabalho sobre as questões de fundamental a forma como se processa a
género com as crianças? No contexto das articulação com o 1.º ciclo do ensino básico.
instituições de educação de infância, este

118 Lisboa, CIG, 2015


*e1(52&,'$'$1,$(,17(59(1d­2('8&$7,9$_5HÀH[mR¿QDO


5HÀH[mR¿QDO

4 uando se trabalham as
questões de género e
cidadania na educação
de infância há que ter
em conta duas situações:
48$'52±$LQVWLWXLomR
HGXFDWLYDFRPRHVSDoRGH
SHVTXLVDHUHÀH[mR

» a intervenção do/a educador/a §© ,QWHJUDU© DV© TXHVW}HV© GH© JpQHUR© QXPD© UH¾H[mR©
VREUH© D© HTXLGDGH© HP© HGXFDomR© QXPD© SHUVSHWLYD©
perante situações que naturalmente
GH© FULDomR© GH© QRYDV© FLGDGDQLDV© WRPDQGR© D© FULDQoD©
surgem no quotidiano; FRPR©FLGDGm©H©FDSD]©GH©DJrQFLD©VREUH©R©VHX©SUySULR©
» a intervenção intencional do/a GHVHQYROYLPHQWR
educador/a através da realização de §©&ULDU© XPD© DWLWXGH© SUyõDWLYD© jV© TXHVW}HV© GH© JpQHUR©
atividades previamente planeadas. QD©HGXFDomR©GH©LQIkQFLD©QRPHDGDPHQWH©QD©IRUPDomR©
LQLFLDO©H©FRQWtQXD©GH©HGXFDGRUHV© ¨ 
É necessária uma atitude atenta §© $MXGDU© DV© FULDQoDV© D© GHVõFRQVWUXLU© DV© UHODo}HV©
e refletida perante as situações GH© JpQHUR© QR© VHX© MRJREULQFDGHLUD© HVSRQWkQHR©
que vão surgindo, a integração de LQWURGX]LQGR© GLVVRQkQFLDV© FRJQLWLYDV© H© DMXGDQGRõDV©
atividades previamente planeadas QXPD© DQiOLVH© FUtWLFD© GRV© HVWHUHyWLSRV© TXH© YHLFXODP©
com a intenção de introduzir a QmR© GHL[DQGR© GH© HQYROYHU© DV© IDPtOLDV© QHVWH© SURFHVVR©
abordagem às questões de género GH©±FRQVFLHQWL]DomR²
e cidadania é fundamental para que §© 3DVVDU© GR© GLVFXUVR© GRV© FDQWLQKRV© DR© GLVFXUVR© GD©
esta área de conteúdo não fique R½FLQD© SURPRYHQGR© XPD© DQiOLVH© FULWLFD© H© ULJRURVD©
esquecida no trabalho realizado. GRV© HVSDoRV© GR© HTXLSDPHQWR© H© GRV© PDWHULDLV© TXH©
LQWURGX]LPRV©QRV©MDUGLQV©GH©LQIkQFLD
Foi neste sentido que foram §© $PSOLDU© HVWD© DQiOLVH© FUtWLFD© DRV© PDWHULDLV© TXH© R©
pensadas as várias sugestões e PHUFDGR© HGLWRUDV©FRPHUFLDLV ©RIHUHFH© ¨ 
os exemplos apresentados. §© 'HVHQYROYHU© HVWD© DWLWXGH© SUyõDFWLYD© QR© WUDEDOKR©
SHGDJyJLFR© QDV© URWLQDV© H© QDV© LQWHUDo}HV© HQWUH© DV©
Como refere Teresa Vasconcelos FULDQoDV© HQWUH© HGXFDGRUDHGXFDGRU© H© FULDQoDV© HQWUH©
(2007: 48), para uma reflexão crítica HVWHV©H©DV©IDPtOLDV
do papel desempenhado pelo §© 3DUWLQGR© GR© SULQFtSLR© GH© TXH© D© TXHVWmR© GH© JpQHUR©
jardim de infância relativamente às HVWi©GHSHQGHQWH©GR©FRQWH[WR©SURSRPRV©WUDQVIRUPDU©
questões de género e cidadania é RV©±HVSDoRV©GDV©FULDQoDV² 0RVV©H©3HWULH© ©HP©HVSDõ
essencial ter em conta “os diversos oRV©GH©P~OWLSODV©SRVVLELOLGDGHV©YHUGDGHLUDV©±R½FLQDV²©
universos sociais em que as crianças RQGH© ID]HU© UH¾HWLU© DJLU© SHUFHFLRQDU© ¨ © SRVVDP©
se movimentam”. HQFRQWUDU© H[SUHVVmR© QXPD© HVFROD© TXH© VH© WUDQVIRUPD©
QXP©JUDQGH©ODERUDWyULR©GH©SHVTXLVD©H©UH¾H[mR© ¨ 
7HUHVD«9DVFRQFHORV©©
%RP7UDEDOKR

por: Maria João Cardona (coord.), Cristina Vieira, Marta Uva e Teresa-Cláudia Tavares 119
%LEOLRJUD¿D

121
5()(5Ç1&,$6%,%/,2*5È),&$6(:(%*5È),&$6

,

%LEOLRJUD¿D
5HIHUHQFLDGD
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Decreto-Lei 241/01 de 30/8/2001 – Perfil Específico de Desempenho do Educador de Infância
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139
*ORVViULR

141
*/266È5,2

$VIRQWHVXWLOL]DGDVSDUDFDGDWHUPRHVWmRLQGLFDGDVSHODOHWUDFRPTXHVXUJHPQR
¿QDOGR*ORVViULR

$omRSRVLWLYD – Medidas destinadas a um grupo específico, com as quais se pretende eliminar e


prevenir ou compensar as desvantagens que resultam de atitudes, comportamentos e estruturas
sociais existentes. $

$QiOLVHGHJpQHUR – Estudo das diferenças entre mulheres e homens quanto às condições, às


necessidades, às taxas de participação, de acesso a recursos e de desenvolvimento, à administração
de bens, ao poder de decisão e às imagens que lhes são associadas, em função dos papéis que lhes
são tradicionalmente atribuídos, de acordo com o seu sexo. A análise de género consiste em atender
sempre aos diferentes papéis de mulheres e de homens em qualquer atividade, instituição ou política,
bem como aos diferentes efeitos destas em homens e em mulheres. No essencial, a análise de género
consiste em fazer a pergunta sobre “quem” – faz o quê; tem acesso a quê; controla o quê; beneficia de
quê – para ambos os sexos, nas diferentes classes, grupos, níveis etários, religiões, etnias. É sempre
possível perguntar como pode uma atividade, decisão ou plano/programa vir a afetar, de modo
diferente, tanto homens e mulheres, como algumas mulheres ou alguns homens face a outras mulheres
e outros homens. Implica o recurso a dados e informações desagregadas por sexo e à sua análise
comparativa. $©H©'

%DUUHLUDV LQYLVtYHLV WHWR GH YLGUR – Atitudes fundadas em preconceitos, normas e


valores tradicionais que impedem a responsabilização e a plena participação das mulheres na
sociedade. $

&LGDGDQLD – Conceito que envolve questões relativas a direitos e a deveres, bem como as ideias
de igualdade, diversidade e justiça social. Não se reportando apenas ao ato de votar, o conceito
de cidadania inclui todo um conjunto de ações praticadas por cada pessoa, com impacto na vida
da comunidade (local, nacional, regional e internacional), indissociáveis do espaço público em cujo
contexto as pessoas podem agir em conjunto. (

&LGDGDQLD GHPRFUiWLFD – Assunção e exercício dos direitos e das responsabilidades na


sociedade, através da participação na vida cívica e política, da valorização dos direitos humanos e da
diversidade social e cultural. )

&RQWUDWR VRFLDO GH JpQHUR – Conjunto de normas implícitas e explícitas que regem as
relações entre mulheres e homens, atribuindo-lhes diferentes atividades, valores, responsabilidades e
obrigações. Estas regras funcionam a três níveis: o substrato cultural (normas e valores sociais), as
instituições (proteção da família, sistemas de educação e emprego, etc.) e os processos de
socialização, nomeadamente no seio da família. $ ©

143
*8,«2©'(©('8&$d«2
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3UpHVFRODU

'HPRFUDFLD SDULWiULD – Noção segundo a qual, sendo a sociedade constituída tanto por
mulheres como por homens, o pleno e igual exercício da cidadania, por umas e por outros, está
subordinado a uma representação igual nos processos de tomada de decisão política e à participação
próxima ou equivalente de mulheres e de homens, numa proporção de 40/60, no conjunto do
processo democrático, constitui um princípio democrático.© $

'LIHUHQoD VDODULDO HQWUH PXOKHUHV H KRPHQV JHQGHU SD\ JDS – Diferença


entre as remunerações médias das mulheres e as dos homens. © $

'LJLWDOJHQGHUJDS – Diferenças entre mulheres e homens no acesso às tecnologias digitais e,


em particular, ao uso da internet.© .

'LVFULPLQDomRVH[XDOGLUHWD – Situação em que uma pessoa é tratada menos favoravelmente


em razão do seu sexo. $

'LVFULPLQDomR VH[XDO LQGLUHWD – Situação em que uma lei, um regulamento ou uma


prática social, aparentemente neutra, produz um impacto adverso desproporcional nas pessoas de um
sexo. $©H©&

'LYHUVLGDGH – Diferenças entre os valores, as atitudes, os quadros culturais, as crenças, os


contextos étnicos, as orientações sexuais, as competências, as crenças e as experiências próprias de
cada elemento de um grupo. $

'LYLVmR GR WUDEDOKR HP IXQomR GR VH[R – Divisão do trabalho remunerado e não
remunerado por mulheres e por homens, tanto na vida pública como na vida privada. &

(GXFDomRGHTXDOLGDGH– Uma educação que tenha em conta os três elementos seguintes:


fazer corresponder os resultados às expectativas (adequação da educação aos objetivos); automelhoria
e transformação (educação centrada nos processos); empoderamento, motivação e participação
(educação centrada no/a educando/a). )

(PSRGHUDPHQWRFDSDFLWDomR – Consiste nos processos e resultados de melhoria da


autonomia individual, através de diversos meios, como o acesso ao conhecimento, o desenvolvimento
de capacidades, a educação e formação. Consiste na autoconfiança e vontade individuais para mudar,
positivamente, uma dada situação e que podem, subsequentemente, ser aplicadas na mudança do
estatuto social, político, económico ou cultural individual. É, acima de tudo, um processo interior, de
autocapacitação. Só pode ser empoderada ou empoderado quem se empoderar a si própria/o. '

(VFRODGHPRFUiWLFD– Um estabelecimento de ensino cuja administração se baseie no respeito


dos direitos humanos, bem como no empoderamento e participação dos e das estudantes, do pessoal
e das partes envolvidas em todas as decisões importantes. )

(VWDWtVWLFDV GHVDJUHJDGDV SRU VH[R – Recolha e separação de dados e informações


estatísticas por sexo, de forma a permitir isolar os dados relativos a homens e a mulheres e analisá-los
comparativamente.© ' ©

144 Lisboa, CIG, 2015


*/266È5,2

(VWHUHyWLSRVVRFLDLV– Consiste numa caracterização fixa, inflexível e redutora de um grupo de


pessoas e da qual decorrem falsas expectativas sobre a conformidade dos indivíduos à caracterização
do respetivo grupo. &

(VWHUHyWLSRVGHJpQHUR – Correspondem aos estereótipos sobre o que se entende que devem


ser e fazer homens e mulheres.

(VWXGRVGHJpQHUR – Abordagem científica, geralmente interdisciplinar, da distribuição de papéis


sociais entre mulheres e homens, bem como da dimensão da relação entre homens e mulheres em
todas as disciplinas. $

([SHFWDWLYDVGHDXWRH¿FiFLD– Avaliação do sujeito sobre a sua capacidade pessoal, com


base na qual organiza e executa tarefas de modo a alcançar o comportamento desejado. Quando
temos uma autoeficácia elevada para uma certa atividade (matemática, por exemplo) sentimo-nos
confiantes de que teremos sucesso nessa mesma atividade (por exemplo, de que teremos uma boa
classificação escolar em matemática) e estaremos mais motivados para estudar essa matéria (Luísa
Saavedra).

([SORUDomR YRFDFLRQDO RX GH FDUUHLUD – Atividades de procura de informação


relativamente ao mundo profissional (informação sobre as atividades realizadas no âmbito de uma
profissão, condições de acesso à mesma, características dos cursos que lhes dão acesso, etc.) e a si
próprio/a (conhecer os seus interesses, valores e aptidões profissionais) (Luísa Saavedra).

)HPLQLGDGHIHPLQLOLGDGH – Envolve os valores femininos e as normas que a sociedade


atribui ao comportamento das mulheres.

)HPLQLVPR V – Movimento(s) que visa(m) a igualdade social, política, económica e cultural entre
mulheres e homens, pugnando pelos direitos das mulheres. Pode ser entendido como um fenómeno
global que integra diversos fatores de acordo com a especificidade da situação das mulheres no
mundo, das particularidades de cada cultura e de cada sociedade. Todavia, apesar de os feminismos
se poderem configurar de forma específica, em diferentes sociedades e culturas, todos os seus
movimentos são orientados pelo mesmo fundamento filosófico da conquista da igualdade entre
mulheres e homens em todas as esferas da vida. ,

*HQGHUPDLQVWUHDPLQJ – Ver Integração da perspetiva (dimensão) de género.

*HQGHUSD\JDS – Ver Diferença salarial entre mulheres e homens.

*pQHUR – Ferramenta analítica utilizada para a compreensão dos processos sociais. Trata-se de um
conceito relacional, por isso, não se refere apenas a mulheres ou a homens mas sim às relações que
ocorrem entre ambos e ao modo como essas relações vão sendo socialmente construídas. Como
instrumento de análise, remete para as diferenças sociais (por oposição às biológicas) entre homens e
mulheres, tradicionalmente inculcadas pela socialização, mutáveis ao longo do tempo e que
apresentam grandes variações entre e intraculturas. Inclui as características culturais específicas que
servem para identificar o comportamento de mulheres e de homens.© $©&©H©'

145
*8,«2©'(©('8&$d«2
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3UpHVFRODU

*RYHUQDQoD– Conceito que se refere a todas as regras, procedimentos e práticas que afetam o modo
como se exerce o poder, quer a nível internacional ou nacional, quer no âmbito de organizações. %©H©*

,GHQWLGDGHGHJpQHUR – Conjunto de normas e comportamentos considerados socialmente


adequados a cada um dos sexos (Amâncio, 1998).

,JXDOGDGHGHRSRUWXQLGDGHVHQWUHPXOKHUHVHKRPHQV – Ausência de barreiras


em razão do sexo à participação económica, política e social. $

,JXDOGDGHHQWUHPXOKHUHVHKRPHQV– Princípio dos direitos iguais e do tratamento igual


de mulheres e de homens. Noção que significa, por um lado, que todo o ser humano é livre de
desenvolver as suas aptidões e de proceder às suas escolhas, independentemente das restrições
impostas pelos papéis tradicionalmente atribuídos às mulheres e aos homens e, por outro lado, que os
diversos comportamentos, aspirações e necessidades de mulheres e de homens são consideradas,
valorizadas e promovidas em pé de igualdade. (É neste sentido que é utilizada a expressão Igualdade
de Género). $ ©

,QTXpULWR DRV XVRV GR WHPSR – Inquérito que tem por objetivo medir o modo como as
pessoas utilizam o tempo, no seu quotidiano, em especial com o trabalho remunerado e com o
trabalho não remunerado, com as atividades da vida pessoal e do lazer.© $

,QWHJUDomRGDSHUVSHWLYD GLPHQVmR GHJpQHUR JHQGHUPDLQVWUHDPLQJ


– Integração sistemática, de forma ativa e explícita, das condições, das prioridades e das necessidades
próprias das mulheres e dos homens em todas as ações planeadas. Implica a planificação,
(re)organização, melhoria, desenvolvimento e avaliação dos processos de tomada de decisão,
incluindo legislação, políticas e programas, que assegurem a incorporação transversal, em todas as
áreas e a todos os níveis, da igualdade entre homens e mulheres. Esta incorporação deve estar
presente em todas as fases de implementação e avaliação de qualquer ação planeada. $©&©)©H©+

,QWHUVHFFLRQDOLGDGH – Reporta-se às discriminações múltiplas e ao reconhecimento de que as


experiências de discriminação e de violação dos direitos humanos vividas pelas pessoas resultam não
apenas do seu sexo, mas também de outras relações desiguais de poder, como as que derivam da sua
raça, etnia, classe, idade, situação de deficiência, orientação sexual, religião e de uma multiplicidade
de fatores, incluindo a sua situação de migrantes. '

0DVFXOLQLGDGH – Envolve os valores masculinos e as normas que a sociedade atribui ao


comportamento dos homens.© & ©

1HXWUR HP WHUPRV GH JpQHUR – Que não tem qualquer impacto diferencial, negativo ou
positivo, nas relações de género ou na igualdade entre homens e mulheres. $

3DUWLFLSDomRHTXLOLEUDGDGHPXOKHUHVHKRPHQV – Partilha de responsabilidades e


de prerrogativas entre mulheres e homens em todos os domínios, constituindo uma condição da
igualdade entre mulheres e homens. $ ©

146 Lisboa, CIG, 2015


*/266È5,2

3DSpLV GH HP IXQomR GR  JpQHUR – Conjunto de normas de ação e comportamento


tradicionalmente atribuídas a homens e mulheres e classificadas, respetivamente, por masculinas e
por femininas. Os papéis de género aprendem-se através de processos de socialização e podem
alterar-se não sendo, por isso, fixos.© $©,©H©-

3HUVSHWLYDGHJpQHUR – Noção de que os problemas devem ser examinados tendo em conta


a situação concreta de mulheres e de homens e de que as soluções devem ser concebidas tendo em
conta as suas implicações sobre os homens e sobre as mulheres (Ver análise de género).© +

5HODo}HV GH JpQHUR– Relações assentes na distribuição desigual do poder entre mulheres
e homens. As relações de género estruturam, e são construídas por, diversas instituições como a
família, o sistema legislativo ou o mercado de trabalho. As relações de género traduzem-se em relações
de poder hierárquicas entre mulheres e homens, em desfavor das primeiras. Essas hierarquias de
poder são geralmente aceites como “naturais” ainda que sejam socialmente construídas, culturalmente
determinadas e, como tal, sujeitas a alterações no tempo. ©$©H©'

6HJUHJDomRSUR¿VVLRQDOGRPHUFDGRGHWUDEDOKR – Concentração das mulheres


e dos homens em diferentes tipos de trabalho/profissões e em diferentes níveis de atividades.
Nesta concentração as mulheres veem-se confinadas a um leque restrito de ocupações/profissões
(segregação horizontal) e aos níveis inferiores de responsabilidade e de decisão (segregação vertical).
$

6LVWHPDGHJpQHUR – Sistema social que determina o que é esperado, permitido e valorizado


nas mulheres e nos homens, nas raparigas e nos rapazes, nos diferentes contextos socioculturais.
O sistema de género é institucionalizado através dos sistemas educativo, político e económico, da
legislação, da cultura e das tradições. O sistema de género é baseado na desigualdade entre mulheres
e homens e é, em muitos contextos, negativo para os homens, tal como o é para as mulheres. A sua
mudança exige o envolvimento de mulheres e de homens e o reconhecimento de que a igualdade entre
os sexos só é possível se houver uma mudança nas atitudes e nos comportamentos dos homens. ,

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),*85$ Situação A
),*85$ Situação B
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),*85$ Esquema-síntese das sessões de filosofia para crianças.
),*85$ Situação de Recreio, Exemplo A
),*85$ Situação de Recreio, Exemplo B
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),*85$ Desenho de criança A
),*85$ Desenho de criança B
),*85$ Situação A
),*85$ Ilustração do projeto apresentado
),*85$ Ilustração da situação
),*85$ Ilustração da situação apresentada
),*85$ Exemplo de esquematização de um projeto 
),*85$ Esquematização de projetos a partir de um mapa conceptual 

151
*8,«2©'(©('8&$d«2
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3Up(VFRODU

4XDGURV
48$'52 Exemplo de uma história
48$'52 Possíveis formas de des-re/construção das histórias
48$'52 Exemplos de comportamentos habitualmente atribuídos aos rapazes e às
raparigas
48$'52 Exemplos de intervenções de um/a educador/a perante as escolhas das crianças
48$'52 Exemplos de intervenções do/a educador/a durante uma conversa de grupo
48$'52 Exemplo da intervenção do/a educador/a perante trabalhos realizados pelas
crianças
48$'52 Eis um exemplo concreto, baseado no método de Lipman
48$'52 Exemplo de um projeto que envolve o grupo
48$'52 Ficha de (auto)avaliação
48$'52 Exemplos de situações do quotidiano
48$'52 Exemplo de projetos
48$'52 Exemplos de temas que podem ser objeto de análise em grupos de pais e mães
48$'52 Projeto que deriva de uma situação ocorrida no quotidiano
48$'52 Síntese de um projeto planeado pelo/a educador/a com um grupo de crianças
48$'52 Síntese de um projeto planeado pelo/a educador/a com um grupo de crianças
48$'52 Síntese de um projeto planeado pelo/a educador/a com um grupo de crianças
48$'52 Síntese de um projeto planeado pelo/a educador/a com um grupo de crianças
48$'52 Síntese de um projeto planeado pelo/a educador/a com um grupo de crianças
48$'52 Síntese de um projeto planeado pelo/a educador/a com um grupo de crianças
48$'52 Exemplos de personagens femininas que podem ser trabalhadas com as crianças
48$'52 Exemplos de personagens femininas contemporâneas
48$'52 A história da escritora Sophia de Mello Breyner contada às crianças
48$'52 Estrutura de apoio à planificação de projetos
48$'52 Exemplo de um projeto
48$'52 Outras questões que podem ser trabalhadas no jardim de infância
48$'52 A instituição educativa como espaço de pesquisa e reflexão

152 Lisboa, CIG, 2015


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153
$1(;26

'RFXPHQWRVHVLWHVGHUHIHUrQFLDV

&RQVHMHUtDGH(GXFDFLyQ\&LHQFLDGHO*RELHUQRGHO3ULQFLSDGRGH
$VWXULDV, Espanha.
http://www.educastur.es, visto em 15 de setembro de 2009
Informações e recursos disponibilizados para docentes: procurar Educastur > Profesorado > Apoyo a
la Comunidad Educativa > Coeducacion.
Disponibilizados para famílias: procurar Inicio > Familias > Escuela de Familias > Fomentar la Igualdad
de Género

0LQLVWHULRGH(GXFDFLyQ3ROtWLFD6RFLDO\'HSRUWH, España
http://www.isftic.mepsyd.es/formacion/enred/ofrecemos/coeducacion.php, visto em 15 de
setembro de 2009
“Coeducación: dos sexos en un solo mundo” . Manual de apoio a boas práticas.

)XQGDFLyQ0XMHUHV0DGULG, España
http://www.educarenigualdad.org, visto em 15 de setembro de 2009
Procurar: Directorio de Recursos Educativos para la Igualdad y la Prevención de la Violencia de Género
> Materiales Educativos. Directório de Recursos.

&ROHFFLyQGH0DWHULDOHV&XUULFXODUHVSDUDOD(GXFDFLyQ,QIDQWLO
http://www.oei.es/genero/documentos/niveles/Educacion_Infantil/Coeducacion_en_EInfantil.pdf,
visto em 15 de setembro de 2009
Torres Fernández, Gemma; Arjona Sanchez, M.ª Cármen (2. Coeducación). Manual de reflexão e de
apoio a boas práticas.

3RUWDO(GXFDFLyQHQ9DORUHV(GXFDFLyQSDUDHO'HVDUUROOR
http://www.educacionenvalores.org/-Textos-para-la-reflexion-en,193-.html, visto em 15 de
setembro de 2009 Procurar Educación > Educación para la igualdad > Textos para la reflexión en
educación e igualdad. Directorio de recursos.

*DELQHWHGH'RFXPHQWDomRH'LUHLWR&RPSDUDGR
www.gddc.pt, visto em 15 de setembro de 2009. Reportório de legislação, que inclui a que afeta as
relações de género.

&RQVHOKRGD(XURSD
http://www.coe.int/t/e/human_rights/equality/091_CM_Rec(2007)13.pdf visto em 15 de setembro
de 2009. Legislação – Recomendation CM/Rec (2007)13 of the Committee of Ministers to member
states on gender mainstreaming in education.

155
*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3Up(VFRODU

&RQVHOKRGD(XURSD
www.coe.int, visto em 15 de setembro de 2009. Portal com recursos sobre Educação (sendo a
“igualdade de género” e a “coeducação” temas tratados nesta perspetiva em múltiplos recursos
disponíveis, procurar estes dois conceitos).

1Do}HV8QLGDV*DELQHWHSDUDR$OWR&RPLVViULRSDUDRV'LUHLWRV
+XPDQRV
www.ohchr.org/EN/Pages/WelcomePage.aspx visto em 15 de setembro de 2009.
Portal com recursos sobre Direitos Humanos (sendo a “igualdade de género” e a “coeducação”
temas tratados nesta perspetiva em múltiplos recursos disponíveis, procurar estes dois conceitos no
motor de busca interno).

81(6&2
www.unesco.org visto em 15 de setembro de 2009. Portal com recursos sobre Educação (sendo
a “igualdade de género” e a “coeducação” temas tratados nesta perspectiva em múltiplos recursos
disponíveis, procurar estes dois conceitos no motor de busca interno).

'X&RWrGHV)LOOHV
www.ducotedesfilles.org, visto em 15 de setembro de 2009. Associação Europeia que visa
combater o sexismo nos materiais pedagógicos.

&,*±&RPLVVmRSDUDD&LGDGDQLDHD,JXDOGDGHGH*pQHUR
www.cig.gov.pt visto em 15 de setembro de 2009.

0LQLVWpULRGD(GXFDomR
www.min-edu.pt visto em 15 de setembro de 2009.

$3(,±$VVRFLDomRGH3UR¿VVLRQDLVGH(GXFDomRGH,QIkQFLD
www.apei.pt visto em 15 de setembro de 2009.

156 Lisboa, CIG, 2015


1RWDV
%LRELEOLRJUi¿FDV

157
127$6%,2%,%/,2*5È),&$6

&RQFHLomR1RJXHLUD é doutorada em Psicologia Social, no domínio dos Estudos de Género,


e é docente da Escola de Psicologia da Universidade do Minho. Leciona “Contextos de Intervenção
Comunitária” e “Psicologia e Diversidade” nos cursos de graduação e coordena o Programa de
Doutoramento em Psicologia Social. Género e Sexualidade. É co-editora com Lígia Amâncio de
Gender, Management and Science, co-autora com Isabel Silva de Cidadania. Construção de novas
práticas em contexto educativo e autora de Um Novo Olhar Sobre as Relações Sociais de Género. Tem
vários artigos em revistas (nacionais e internacionais) e capítulos de livros sobre a temática dos Estudos
de Género e Feminismo, para além de experiência de coordenação de projetos de investigação no
domínio.

&ULVWLQD0DULD&RLPEUD9LHLUD nasceu em Coimbra em 1968. É licenciada em Psicologia


e doutorada em Ciências da Educação pela Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da
Universidade de Coimbra, onde exerce funções docentes desde 1992. Os seus principais interesses
de investigação centram-se em torno das questões de género e cidadania, no âmbito da educação e
formação ao longo da vida, em contextos formais e não formais. Fez parte da Comissão de Avaliação
Externa do II Plano Nacional para a Igualdade e integra a Comissão de Avaliação Externa do III Plano
Nacional para a Igualdade, Cidadania e Género (2007-2010). É autora, entre outras publicações, de
Educação Familiar: Estratégias para promoção da igualdade de género e de É Menino ou Menina?
Género e educação em contexto familiar.

0DULD-RmR&DUGRQD é educadora de infância, doutorada em Ciências da Educação, com o


mestrado na mesma área e com licenciatura em Psicologia. É docente da Escola Superior de Educação
de Santarém desde 1986. Foi coordenadora do curso de Educação de Infância; vice-presidente do
Instituto Politécnico e presidente do Conselho Diretivo, sendo atualmente presidente do Conselho
Científico e coordenadora do mestrado em Administração Educacional. Responsável por publicações
e projetos diversos na área da educação e formação, de que se destaca o Projeto Co-Educação: do
princípio ao desenvolvimento de uma prática, coordenado pela atual CIG. Foi presidente da Associação
de Profissionais de Educação de Infância e do Grupo de Estudos de Educação de Infância; é consultora
em Cabo Verde, Moçambique e S. Tomé e Príncipe (pela Fundação Gulbenkian e Banco Mundial) e
Vogal do Conselho Científico-Pedagógico da Formação Contínua do Ministério da Educação.

0DUWD8YD é doutoranda em Ciências da Educação/Formação de Professores, pelo Instituto de


Educação da Universidade de Lisboa, mestre em Ciências da Educação /Orientação da Aprendizagem
e licenciada em Filosofia pela Universidade Católica Portuguesa. É docente na Escola Superior de
Educação de Santarém desde 2007 e exerceu funções docentes na Escola Superior de Educação do
Algarve.

7HUHVD -RDTXLP é Doutorada em Antropologia Social pelo ISCTE, professora auxiliar da


Universidade Aberta, coordenadora do Mestrado de Estudos sobre as Mulheres, membro do Conselho
Nacional de Ética para as Ciências da Vida (1996-2001). Publicou, entre outras, Dar à Luz, Ensaio sobre

159
*8,«2©'(©('8&$d«2©
*e1(52©(©&,'$'$1,$ 3Up(VFRODU

as Práticas e Crenças da Gravidez, Parto e Pós-Parto em Portugal, Publicações D. Quixote, 1983;


Mulheres de uma Aldeia, Editora Ulmeiro, 1985; Menina e Moça, Construção Social da Feminilidade
– XVII-XIX, Fim de Século, 1997; As Causas das Mulheres. A Comunidade Infigurável, Lisboa, Livros
Horizonte, 2006. Membro do CEMRI e do Helsinki Group.

7HUHVD&OD~GLD7DYDUHV é professora adjunta na Escola Superior de Educação de Santarém,


doutoranda em literatura portuguesa oitocentista e ativista da Amnistia Internacional. Investiga e ensina
sobre teoria feminista, Direitos Humanos, literatura de autoria feminina, literatura portuguesa, cultura
oitocentista portuguesa, literatura para crianças e técnicas de animação de crianças e jovens. Procura
sempre que possível cruzar estas áreas de interesse e conhecimento, assim como articular as suas
atividades de docência com as de pesquisa e de intervenção social. A obra que mais prazer lhe deu
escrever foi, em co-autoria, A Narrativa na Promoção da Igualdade de Género: Contributos para a
educação pré-escolar (Lisboa: CIDM, várias edições)

7HUHVD 0DULD 6HQD GH 9DVFRQFHORV Doutorada em Ciências da Educação pela


Universidade de Illinois em Urbana-Champaign, com uma especialização em educação pré-escolar e
elementar, é docente e presidente do Conselho Científico da Escola Superior de Educação do Instituto
Politécnico de Lisboa, onde coordenou o Departamento de Formação em Educação de Infância, a
Área da Pedagogia. É membro do Conselho Nacional de Educação. Foi diretora do Departamento de
Educação Básica do Ministério da Educação e coordenadora do Gabinete Interministerial para a
Expansão e Desenvolvimento da Educação Pré-Escolar. Foi presidente do GEDEI, tendo criado e
dirigido a revista Infância e Educação: Investigação e Práticas. Coordenou, pela parte portuguesa, o
Estudo Comparativo da OCDE sobre Educação e Cuidados para a Infância e foi membro da Comissão
de Acreditação do INAFOP. Tem sido consultora da Fundação Van Leer (Holanda), Fundação Soros
(EU) e Fundação Comenius (Polónia) e realizado investigação no âmbito da educação não-formal,
políticas educativas e currículo, e supervisão pedagógica. É autora de diversas publicações e artigos,
tendo publicado recentemente A Educação de Infância no Cruzamento de Fronteiras (Texto Editores)
e Prática Pedagógica Sustentada: Cruzamento de saberes e competências (Ed. Colibri).

160 Lisboa, CIG, 2015


As questões relativas ao género e à cidadania entram na vida das instituições de
educação de infância trazidas pelas crianças; fazem parte do quotidiano. No entanto,
não é fácil a sua abordagem; são muitas vezes “esquecidas”. A sua complexidade,
a falta de apoio em termos de formação dada aos educadores e às educadoras e a
falta de recursos e de bibliografia retiram ao trabalho sobre estes conteúdos a atenção
necessária. Além disso – de acordo com as Orientações Curriculares definidas para a
educação pré-escolar (ME, 1997) –, estes conteúdos integram-se na área, fundamental,
da formação pessoal e social. O facto de esta área ter um carácter transversal não
favorece a intencionalidade educativa que, importante em todos os níveis de ensino,
deve predominar na educação das crianças pequenas.

Foi para ajudar a superar estas dificuldades que surgiu o presente guião. Todas
as sugestões apresentadas são apenas exemplos, pontos de partida para novas
propostas.

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