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POLÍCIA CIVIL / POLÍCIA MILITAR.

ALTERNATIVAS
 

(Nota prévia: Escrito há 22 anos, este artigo, resumido e adaptado, corresponde a tópico do capítulo XIV de DA
SILVA, Jorge. Controle da criminalidade e segurança pública na nova ordem constitucional. Rio de Janeiro:
Forense,1990, 2ª ed. Ocorre-me publicá-lo agora no site em virtude de considerar que o mesmo continua atual.
Diante das greves e manifestações violentas de PMs e BMs Brasil afora, reaparecem propostas de reorganizar o
sistema de segurança pública dos estados). (Obs. O primeiro parágrafo é ora acrescentado para contextualizar o
artigo)     
    

O tempo era o da Assembléia Nacional Constituinte. A dicotomia “militar / civil” impregnara ideologicamente a discussão sobre a segurança
pública, após anos de regime militar. Antes, a segurança pública não era assunto constitucional. As Polícias Militares apareciam na Constituição
por serem "“forças auxiliares" e "reserva" do Exército, voltadas para a segurança interna (conceito militar de defesa) e a manutenção da ordem
pública em sentido estrito (relativo a forças de choque). Isso desde a Constituição de 1934. Passam a executar o policiamento ostensivo civil em
1967, por decisão do regime militar (Dec-Lei nº 317/67). Fazia algum sentido que os pleitos dos diferentes setores e categorias
convergissem para a Constituição. Todos queriam “"entrar"” na Carta Magna, o que acabou acontecendo. Multiplicavam-se as propostas de
cunho organizativo, algumas delas no sentido da desmilitarização das PPMM e BBMM, ao que se opunha o Exército. Outro ponto: no interesse
das PPMM e dos BBMM, sobretudo dos oficiais, e do próprio Exército, os integrantes daquelas corporações foram considerados “"militares” dos
Estados, do Distrito Federal e dos Territórios" (Cf. Art. 42). Acontece que, promulgada a Constituição em 1988, os lobbies corporativos não
cessaram, o que inviabilizou a regulamentação do Artigo 144, prevista no seu § 7º, tornado letra morta. E continuaram as propostas: uma polícia,
duas polícias, fusão, desmilitarização etc. etc. 

À época, com o intuito de discernir mais claramente entre essas propostas, impus-me a tarefa de fazer um apanhado das principais delas para
deduzir os efeitos de cada qual caso fossem efetivamente implantadas. O capítulo é aqui reproduzido de forma resumida não só para falar desses
efeitos como para mostrar que continuamos e caminhar em círculos. 
 
O objetivo do presente texto é mostrar que a proliferação de propostas a respeito da estruturação da polícia acabou por gerar a crença de que se
conseguirá reduzir a criminalidade alterando-se organogramas, unindo-se ou separando-se órgãos e mudando-se nomes, como se, mudando os
rótulos, o conteúdo mudasse automaticamente. Ficou no ar a ideia de que a única diferença entre as duas polícias é que uma é “militar” e a outra
é “civil”, sendo esta uma das principais causas dos equívocos verificados no emprego dessas corporações.
 
Com referência às sugestões organizativas, é preciso sublinhar que elas deixam de responder a determinados quesitos, relacionados com as
práticas da polícia. Antes, respondem a interesses corporativos e conveniências políticas. Tem-se a impressão de que, para os seus proponentes,
se forem feitas mudanças para cá e para lá, com custos gigantescos, e se, no final, não der certo – ou mesmo se tudo tiver piorado–, não há
problema; é só começar tudo de novo.    
 
Critérios para a avaliação das sugestões(alternativas)
 
Sempre que se imagina que existe um determinado problema, é preciso identificá-lo claramente, a fim de que não se criem falsos problemas ou
se agravem os que realmente existem. Se uma proposta é apresentada, o mínimo que se requer do proponente é que fale das implicações na
hipótese da sua implementação, vale dizer, nas suas vantagens e desvantagens, e que se indague se ela é ou não original, buscando saber, caso
ela não seja original, os motivos pelos quais não foi adotada antes. Como ainda não se tem um diagnóstico suficientemente abrangente dessas
questões, resultado de ampla pesquisa científica, pode ser útil aos estudiosos ter uma visão geral, ainda que superficial e intuitiva, do conjunto
das propostas de alternativas à dicotomia Polícia Civil / Polícia Militar.
 
Aparentemente, as propostas são muitas; porém, num apanhado que se faça das mesmas, chega-se à conclusão de que podem ser reunidas em
não mais que cinco, correspondendo às alternativas de solução comentadas adiante. Apesar de superficial e livre, a análise a seguir pode servir
de roteiro para outros aprofundamentos. Ainda assim, com o propósito de balizá-la um pouco, parti do critério de listar as possíveis vantagens e
desvantagens de cada uma em função de alguns “indicadores”, aos quais cheguei, por exclusão, depois que muitos outros foram listados
aleatoriamente e abandonados. Uma alternativa que atendesse, em nível ótimo, aos indicadores selecionados seria considerada a melhor. Os seis
indicadores escolhidos foram os seguintes:
- aproveitamento das estruturas físicas existentes;
- racionalização dos meios materiais e humanos;
- economia de recursos financeiros;
- simplicidade na implementação;
- utilidade; e
- eliminação dos conflitos de competência.
 
Alternativas
 
Como já mencionado, as alternativas comentadas abaixo correspondem ao conjunto das principais propostas que costumam circular no debate
público em torno da dicotomia Polícia Civil / Polícia Militar, não se tendo a pretensão de esgotar as possibilidades a esse respeito. Elas são
apresentadas sem que se lhes atribua maior ou menor importância, pois o que interessa mesmo aqui é tentar mostrar a limitação que representa
abordar o tema da segurança apenas pela via organizativa. Independentemente de suas possíveis variações, as alternativas vislumbradas são as
seguintes:   
- Alternativa A: Duas Polícias: Polícia Judiciária e Polícia Ostensiva;
- Alternativa B: Duas Polícias: Polícia Judiciária Especializada e Força Policial;
- Alternativa C: Duas Polícias Completas;
- Alternativa D: Polícia Única: Polícia Estadual;
- Alternativa E: Duas Polícias: Polícia Completa e Polícia de Intervenção.
 
Como se verá, qualquer mudança substancial que se tente empreender encontrará grandes barreiras, difíceis de transpor até mesmo no longo
prazo. Os integrantes das duas corporações atuam com estatutos, regime de trabalho, escalas, remuneração e regime disciplinar diferenciados. As
resistências corporativas e de categorias funcionais dentro das corporações são imensas. Algumas propostas dependem de engenharia legislativa
intrincada, inclusive com mudanças constitucionais, e assim por diante. 
 
Alternativa A: Duas Polícias: Polícia Judiciária e Polícia Ostensiva
 
Em princípio, esta alternativa corresponderia a manter o modelo atual, desenhado pela Constituição de 1988. Porém seria necessário maior
integração orgânica entre as duas polícias (e não só dependente da boa vontade das pessoas), integração essa que começaria com uma
providência aparentemente óbvia e simples: que a polícia judiciária (Polícia Civil) atuasse como tal, e que a polícia ostensiva (Polícia Militar)
também se ativesse às suas funções. Assim:
           
Polícia Civil – Polícia Judiciária
- apuração das infrações penais;
           
Polícia Militar – Polícia Ostensiva
- policiamento ostensivo (e preservação da ordem).
           
Os constituintes chegaram a esse esquema depois de acaloradas discussões e de embates dos lobbies corporativos. Para que a solução que
adotaram fosse bem sucedida seria necessário que se evitassem disputas entre as duas corporações por ampliação de espaço e poder, o que
exigiria empenho dos governantes no sentido de que as mesmas atuassem de forma integrada, não valendo a desculpa de que tal só seria possível
com a regulamentação prevista no mencionado § 7o do Art. 144, como muitos afirmam.
 
Vantagens:
(1) aprimoramento máximo das estruturas físicas existentes atualmente;
(2) economia máxima de recursos financeiros na solução;
(3) simplicidade máxima na implementação;
(4) diminuição sensível dos conflitos de competência;
(5) solução na esfera administrativa,sem a necessidade de edição de leis e decretos;
(6) medida de utilidade média.
 
Desvantagens:
(1) falta de racionalização demeios materiais e humanos;
(2) resistência dos policiais militares e civis, particularmente dos mais graduados;
(3) resistência dos dirigentes da Polícia Civil, preocupados em dar uma resposta “visível” aos reclamos por segurança;
(4) resistência da população, que quer “ver” a polícia nas ruas;
(5) persistência residual de conflitos de competência.
 
Alternativa B: Duas Polícias: Polícia Judiciária Especializada e Força Policial
 
É mais ou menos o esquema anterior. As duas polícias seriam mantidas, porém com pequena modificação de suas atribuições. A Polícia Civil
continuaria com as atuais incumbências, mas se concentraria na apuração dos crimes de autoria desconhecida e se especializaria no combate à
criminalidade organizada, liberando-se de ter que manter estruturas para lavrar flagrantes de prisões efetuadas pela Polícia Militar, que seria
autorizada afazê-lo:
 
Polícia Civil – Polícia Judiciária Especializada:
- apuração de crimes de autoria desconhecida;
- repressão à criminalidade organizada;
- investigação especializada.
 
Polícia Militar – Força Policial:
- polícia ostensiva;
- autos deflagrante, nos casos de prisão em flagrante que efetuasse.
 
Para a efetivação dessa medida, bastaria que os governos estaduais, ao fixarem quais, dentro do Estado, seriamas autoridades para efeito do que
estabelece o Art. 4º do Código de Processo Penal, aí incluíssem, com o fim exclusivo de lavrar os flagrantes realizados por policiais-militares,
oficiais da PM, preferentemente os formados em direito, com isso desafogando o trabalho da Polícia Civil, que se desobrigaria de manter
estruturas para atender os policiais-militares, evitando com isso o desperdício de tempo hoje verificado nas delegacias de polícia. Os oficiais da
Polícia Militar têm a prática da presidência de inquéritos e flagrantes de crimes considerados militares. Em vários Estados da Federação, oficiais
da Polícia Militar recebem essa delegação do governo do Estado. O dado novo é que não precisariam mudar de polícia – como ocorre nesses
Estados – para exercer excepcionalmente essa “autoridade policial judiciária”.
           
Vantagens:
(1) aproveitamento máximo das estruturas físicas existentes;
(2) economia máxima de recursos financeiros na solução;
(3) implementação relativamente simples;
(4) medida útil;
(5) surgimento de uma polícia judiciária altamente especializada, voltada para a grande criminalidadeorganizada e crimes de autoria
desconhecida;
(6) ausência de duplicidade de procedimento policial, pois hoje, paralelamente ao flagrante que é lavrado pela Polícia Civil, os policiais-militares
fazem um circunstanciado Registro de Ocorrências, o qual, quando muito, só serve para consumo de papel e tempo. Na prática, esse registro é
um auto de flagrante;
(7) solução na esfera do governo estadual;
(8) eliminação dos conflitos de competência.
 
Desvantagens:
(1) falta de racionalização dos meios materiais e humanos;
(2) necessidade de redistribuição do efetivo de oficiais e sargentos para atenderem à lavratura de flagrantescomo autoridades e escrivães,
respectivamente;
(3) resistência de ambas as polícias, particularmente dos delegados, que entenderiam ter o seu poderdiminuído;
(4) resistência dos dirigentes da Polícia Civil, preocupados em dar uma resposta “visível” aos reclamos porsegurança;
(5) resistência da população, que quer “ver” a ação da polícia;
 
Alternativa C: Duas Polícias Completas
 
Por polícia completa entende-se aquela que executa todas as fases da atividade policial: prevenção, repressão, investigação e apuração dos
crimes. As competências seriam divididas por área geográfica:
 
Polícia Civil (ou Polícia Militar) – Polícia Metropolitana:
- policiamento ostensivo;
- investigação criminal;
- polícia judiciária.
 
Polícia Militar (ou Polícia Civil) – Polícia do Interior:
- policiamento ostensivo;
- investigação criminal;
- polícia judiciária.
 
Cada polícia faria tudo. Uma teria toda a responsabilidade no município da capital e na região metropolitana; a outra ficaria com o interior. É,
grosso modo, a solução européia (nos países unitários) onde, por exemplo, a Gendarmerie  francesa, os Carabinieri italianos e a Guarda Civil
espanhola executam, além das funções ligadas à defesa interna, as funções de polícia nas cidades interioranas.  
 
Vantagens:
(1) medida útil;
(2) eliminação de conflitos decompetência entre a duas polícias;
(3) aumento da cooperação entre ambas.
 
Desvantagens:
(1) aproveitamento deficiente das estruturas físicas existentes;
(2) falta de racionalização dos meios materiais e humanos;
(3) dispêndio elevado de recursos financeiros;
(4) implementação complicada;
(5) resistência à mudança por parte de ambas as polícias;
(6) resistências da população;
(7) necessidade de reformulação profunda nas polícias, sobretudo na Polícia Civil, que precisaria de grandesefetivos uniformizados e em armas;
(8) a Polícia Civil teria de executar todos os serviços de policiamento na capital e região metropolitana (ou no interior): trânsito, escolas,
estádios, bancos, cabines, praias, feiras, radiopatrulha, destacamentos em favelas, guarda externa de presídios, controle de distúrbios (choque),
eventos, festas populares etc., além das funções atuais de polícia judiciária e de apuração dos crimes;
(9) a Polícia Militar teria de executar todos os serviços da Polícia Civil no interior (ou na capital e região metropolitana): investigação,
flagrantes, inquéritos, custódia de presos, buscas, serviços cartorários, polícia técnico-científica;
(10) o Estado careceria de uma polícia judiciária especializada;
(11) necessidade de legislação específica federal.
 
Alternativa D: Polícia Única: Polícia Estadual
 
Fusão da Polícia Militar e da Polícia Civil numa única polícia estadual, completa, executando todas as fases da função policial. Assim: Polícia
Civil Polícia Militar = Força Policial Estadual.
 
Nesta alternativa não haveria absorção de uma polícia pela outra, e sim a fusão de ambas. Desapareceriam as duas polícias atuais e surgiria
apenas uma, com o aproveitamento do pessoal, instalações e meios existentes. Os atuais policiais seriam empregados, respectivamente, nas
funções de polícia ostensiva e de investigação criminal, distribuindo-se por três áreas básicas em que a nova policia seria estruturada:
a) uma estrutura para emprego nas funções de polícia ostensiva, urbana;
b) uma para emprego nas funções de investigação criminal;
c) uma para as funções de intervenção, choque e operações especiais, para as hipóteses de distúrbios, manifestações violentas e outras situações
para as quais se exija o emprego da força.
 
Nesta solução seria aproveitado o que há de melhor em cada polícia, buscando-se o ponto de equilíbrio: Na Polícia Civil: a maior autonomia dos
policias; a informalidade nas relações interpessoais; e a flexibilidade da estrutura hierárquica e disciplinar. E na Polícia Militar: a estrutura física
das instalações e dos meios logísticos; e o modelo militar de controle do pessoal.
 
Grosso modo, os cargos atuais das duas polícias dariam lugar a novos cargos, com nomenclatura unificada, mais ou menos com a
correspondência ensaiada no quadro a abaixo, supondo-se, apenas para efeito de raciocínio, que os cargos da Policia Civil se resumissem aos aí
listados, devendo-se assinalar que adotar esta ou aquela nomenclatura é uma mera questão de preferência, não sendo este o cerne da questão:
 
Quadro 6. Polícia Única. Hierarquia e correspondência de cargos
  ATUALMENTE NOVA POLÍCIA ESTADUAL
Polícia Militar Polícia Civil Polícia Estadual  
Coronel Delegado de 1ª Comandante
Ten-cel Delegado de 2ª 2º Comandante
 
Major Delegado de 3ª Comissário
Capitão  
1º Ten Comissários e demais carreiras Capitão
 
2º Tem de nível superior
Subten    
1º Sgt Detetive-inspetor Inspetor  
2º Sgt    
3º Sgt Detetive/escrivão Sargento  
Cb Escrevente, Papiloscopista, Detetive / Policial
 
Sd outros técnicos etc...
Notas:
1. Em princípio, todos os policiais, dependendo da função, poderiam trabalhar à paisana ou uniformizados.
2. Os acessos na carreira seriam na base do mérito, por meio de seleções e cursos internos.
 
Esta estrutura hierárquica permite empregar o pessoal: (a) em funções policiais típicas; (b) em funções de controle de distúrbios, com estrutura
mais militarizada. Para este segundo fim, os efetivos seriam agrupados em linha vertical, com as unidades sempre constituídas de três, quatro ou
cinco frações menores, até chegar à fração mínima, o policial isolado. Nesta solução, a cadeia de comando e os efetivos poderiam ser articulados
na área geográfica dos Estados da seguinte forma:
 
Quadro 7. Polícia única. Cadeia de comando e articulação das unidades 
ÓRGÃO / UNIDADE OCUPANTE
1. Chefe / Secretário de Polícia 1. Comandante
2. Órgãos de direção geral: Estado-Maior e Diretorias 2. Comandantes
3. Órgãos de apoio: logística, saúde, ensino 3. Comandantes e 2º Comandantes
   4. Órgãos de execução:  
    4.a) Comandos Regionais (atuais batalhõesç grandes 4.a) Comandantes
espaços físicos da atual PC)  
  4.b) Comandos locais (alguns batalhões menores; 4.b) Comandantes e 2º
algumas delegacias espaçosas; algumas companhias Comandantes
 
independentes da PM)  
   4.c) Distritos (os atuais distritos, delegacias, 4.c) Comissários e Capitães
destacamentos, pelotões destacados)
 
Notas:
1. Em todas as unidades subordinadas e frações, de todos os níveis, haveria pessoal especifico para as funções de policiamento
ostensivo e de investigação criminal.
2. Unidades especiais seriam criadas para enfrentar problemas complexos, como as diversas modalidades de crime organizado, e
problemas que extrapolem a capacidade das unidades operacionais nas suas respectivas circunscrições.
 
Vantagens:
(1) aproveitamento máximo das estruturas físicas existentes;
(2) racionalização máxima dos meios materiais e humanos;
(3) medida acentuadamente útil;
(4) comando único em todos os níveis da  cadeia do comando;
(5) estrutura mais ágil para atender aos reclamos da população;
(6) eliminação máxima dos conflitos de competência.
 
Desvantagens:
(1) dispêndio elevado de recursos financeiros;
(2) implementação complicada;
(3) resistências internas do pessoal das duas polícias;
(4) necessidade de legislação específica federal;
(5) necessidade de legislação peculiar dos Estados, como um estatuto único, aplicável ao pessoal de toda a polícia;
(6) dificuldade de adaptação dos atuais delegados aos requisitos e conhecimentos específicos de comando, chefia e liderança para lidar com
grandes efetivos, e vice-versa no que tange aos oficiasda PM em relação aos conhecimentos e requisitos para  as tarefas de policia judiciária e de
investigação criminal.
 
Alternativa E: Duas Polícias: Polícia Completa e Polícia de Intervenção
 
Esta foi, em linhas gerais, a chamada de “solução Afonso Arinos”, ou seja, a absorção pela Polícia Civil dos serviços (e grande parte dos
efetivos) da Polícia Militar.  Esta alternativa foi fortemente defendida pelos delegados de polícia durante os trabalhos da Assembléia Nacional
Constituinte, com a alegação de que com isso se instituiria uma polícia única e civil, e vigorosamente rejeitada pelos oficiais superiores das
Polícias Militares. O esquema seria o seguinte:
 
Polícia Civil: Polícia Completa
- policiamento ostensivo
- investigação criminal
- polícia judiciária
 
Polícia Militar: Polícia de Intervenção
- polícia de choque
 
A Polícia Civil faria o trabalho que faz atualmente e assumiria todos os serviços ostensivos executados pela Polícia Militar, que ficaria reduzida
a algumas unidades distribuídas pelo Estado como polícia aquartelada. Implícita a ideia de opção para a Polícia Civil do pessoal da Polícia
Militar excedente que o desejasse.
 
Vantagens:
(1) eliminação dos conflitos decompetência;
(2) surgimento de uma polícia de choque altamente preparada e adestrada.
 
Desvantagens:
(1) aproveitamento mínimo das estruturas físicas existentes;
(2) falta de racionalização na distribuição dos meios materiais e humanos;
(3) implementação de complicação máxima;
(4) medida pouco útil;
(5) resistências do pessoal da Polícia Militar, particularmente dos oficiais;
(6) necessidade de disposição constitucional e legislação específica federal;
(7) necessidade de legislação peculiar do Estado e de edição de decretos estaduais;
(8) manutenção de uma força ociosa (o que se procurou corrigir quando se mandou a Polícia Militar para  a rua);
(9) a Polícia Civil teria que adotar uma estrutura em linha, verticalizada, para poder  organizar e controlar os grandes efetivos em armas que
passaria a ter;
(10) teriam que ser construídas novas dependências policiais, mais amplas e arejadas;
(11) dispêndio elevado de recursos financeiros;
(12) teria que ser montada, ou transferida da Polícia Militar para a Polícia Civil, grande parte da estruturade apoio operacional e administrativo:
telecomunicações, transportes, informática, manutenção, saúde, ensino etc.;
(13) os altos funcionários da Polícia Civil teriam que receber formação de Administração, Comando, Chefia e Liderança e de planejamento de
emprego e controle de grandes efetivos;
(14) teria que ser reformulada toda a legislação de direitos, deveres, garantias e obrigações do pessoal da Polícia Civil;
(15) a Polícia Militar ficaria com efetivos insuficientes para auxiliar na defesa interna, em auxílio ao Exército. Em conseqüência, a Polícia Civil
teria de preparar-se para a intervenção em grandes conflitos de rua ou convulsões intestinas, dependendo de acomodações de emergência,
refeitórios e alojamentos para as situações de prontidão (a não ser que alguns quartéis da Polícia Militar tivessem sido transferidos para a Polícia
Civil);
(16) A União teria que criar uma força para a defesa interna ou então atribuir a condição de força auxiliar e reserva também à Polícia Civil, pois
o efetivo da Polícia Militar passaria a ser insignificante;
(17) a Polícia Civil teria que assumir, nos estados, todos os serviços hoje realizados pela Polícia Militar: radiopatrulhamento, trânsito, escolas,
estádios, festas populares, cabines, terminais rodoviários, praias, destacamentos em favelas e locais ermos; guarda externa dos presídios,
policiamento rodoviário, guardas de dignitários, segurança física de instalações: palácios, consulados, policiamento de logradouros públicos,
parques, jardins, policiamento a cavalo, com cães etc.
 
Comparação das alternativas
 
A fim de comparar as alternativas, partimos de dois quadros: o primeiro, contendo o saldo de vantagens e desvantagens; e o segundo, um
exercício livre, assumidamente subjetivo, para atribuir uma pontuação aos seis indicadores utilizados, com a finalidade de verificar quais as
alternativas que apresentariam o maior númerode pontos positivos e aquelas com o maior número de pontos negativos. Como segue.
 
Vantagens e desvantagens das alternativas à dicotomia PM / PC.
 
  ALTERNATIVAS
VANTAGENS E DESVANTAGENS A B C D E
Vantagens 6 8 3 6 2
Desvantagens 5 5 11 6 17
                                           Saldo de VANTAGENS 1 3 -8 0 -15
 
 
Valoração dos indicadores para comparação das alternativas*
  ALTERNATIVAS
INDICADORES A B C D E
1. Aproveitamento das estruturas físicas existentes 2 2 0 2 0
2. Racionalização dos meio materiais e humanos 0 0 0 2 0
3. Economia de recursos financeiros 2 2 0 0 0
4. Simplificação na implementação 2 2 1 1 1
5. Utilidade 1 1 1 2 0
6. Nível de eliminação dos conflitos de competência 1 2 2 2 2
                                                     PONTOS POSITIVOS 8 9 4 9 3
* Valores atribuídos: máximo = 2 pontos; médio = 1 ponto; nulo = 0 ponto.
 
Daí:
 
- Alternativa que apresenta o maior número (8), e o maior saldo (3) de vantagens: Alternativa B (Polícia Judiciária Especializada e Força
Policial);
 
- Alternativas que apresentam o maior número de pontos positivos: Alternativas B e D (Polícia Única: Polícia Estadual), com nove pontos cada;
 
- Alternativas que apresentam o menor número de pontos positivos (4 e 3, respectivamente), e o maior número de desvantagens (11 e 17,
respectivamente): Alternativas C (Duas Polícias Completas) e E (Polícia Completa e Polícia de Intervenção).
 
Então:
- Melhores alternativas: B (Polícia Judiciária Especializada e Força Policial) e D (Polícia Única: Polícia Estadual);
- Alternativa regular: A (Polícia Judiciária e Polícia Ostensiva);
- Piores alternativas: C (Duas Polícias Completas) e E (Polícia Completa e Polícia de Intervenção).
 
Do exposto, dependendo da disponibilidade de recursos financeiros, das condições políticas, da oportunidade, das prioridades do poder público e
de outros fatores, poder-se-á, caso se opte por modificar o modelo atual, escolher entre as duas alternativas que, aparentemente, seriam as
melhores, apesar das suas desvantagens, cumprindo advertir o leitor, mais uma vez, que se trata de um exercício livre e que, portanto, se deve
relativizar a conclusão, pois a escolha, não obstante o esforço de objetividade, certamente foi afetada pelas preferências pessoais do autor, nada
objetivas.  
 
Resumindo:
- Melhor alternativa: Alternativa B: Duas Polícias (Polícia Judiciária Especializada e Força Policial).  
           
Esta apresenta o maior número de pontos positivos e o maior saldo de vantagens; aproveita ao máximo as estruturas físicas existentes; é medida
relativamente simples, útil e, comparativamente, de fácil implementação; elimina os conflitos de competência e não é solução muito onerosa.
Mas não racionaliza integralmente os meios humanos e materiais.
 
- Segunda melhor alternativa: Alternativa D: Polícia Única (Polícia Estadual).
 
Esta apresenta o maior número de pontos positivos: aproveita ao máximo as estruturas físicas existentes, racionaliza ao máximo os meios
humanos e materiais, é a mais útil de todas e elimina totalmente os conflitos de competência. Mas é solução complicadíssima e onerosa,
sobretudo no que concerne aos direitos e garantias do pessoal ativo e inativo, e de implementação a longo prazo. Afetaria inclusive a relação
hoje existente entre a União e os Estados no que diz respeito às atividades de defesa interna, como explicado no capítulo anterior. 
           
Este estudo foi realizado em 1987. O texto constitucional de 1988 adotou uma solução que não está muito distante do que é proposto na
alternativa B (Duas Polícias: Polícia Judiciária Especializada e Força Policial), considerada neste estudo a melhor delas. Em se tratando da
alternativa D (uma polícia estadual única), considerada a segunda melhor, somente uma emenda constitucional poderia viabilizar a sua adoção, o
que é improvável que venha a acontecer tão cedo, se é que um dia acontecerá. Na verdade, a Constituição Federal, impondo a obrigatoriedade de
os Estados terem uma Polícia Civil e uma Polícia Militar, criou uma camisa-de-força. Trocar uma camisa-de-força por outra seria impor a todos
os Estados que unificassem as duas numa só. Há os que entendem que seria mais razoável que se flexibilizasse o Art. 144, deixando a cargo dos
Estados organizar as suas polícias.
Bem, uma coisa é certa: a questão é muito mais complexa do que muitos imaginam...
 
Advertência. Reitero que os dados quantitativos são arbitrários e serviram tão somente para orientar o raciocínio,e não
para demonstrar consistência da análise. Os dados não são significativos.

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