PROGREDIR NA ORAÇÃO É FAZER A EXPERIÊNCIA DA RADICAL POBREZA
Quanto mais avançamos na oração mais temos a sensação de não progredir;
assemelhamo-nos ao mergulhador que, à medida que desce mais profundamente no oceano e mais intensamente se encanta com sua beleza, mais descobre, com surpresa, que ele é impenetrável, misterioso, incompreensível... Mes- mo que mergulhemos mais profundamente em Deus, não temos consciência dos espaços percorridos. Só Deus é o Santo, o impenetrável, o que está para além de tudo. Por mais esforço que façamos Ele ficará sempre fora do nosso alcance. Não há vida de oração que não faça um dia a experiência dolorosa do longo túnel e da noite interminável. Antes de se revelar a Elias, Deus fá-lo passar pelo deserto, na solidão, no despojamento, no desalento... Elias experimenta o sentimento de fracasso e da pobreza. Ao término da longa e dolorosa caminhada no deserto ele fará a experiência da INTIMIDADE com o Deus da INTIMIDADE.
O progresso na oração é o de um empobrecimento contínuo. Enquanto em
outros domínios o progresso se verifica pela aquisição de conhecimentos novos, na oração, pelo contrário, a pessoa cresce com o esvaziamento, a auto-doação; tudo acaba por se reduzir pouco a pouco a uma única intuição, poucas palavras... Há um progresso que se verifica na simplificação. Aqui a dinâmica do desenvolvimento humano é a mesma do Evangelho: “Se alguém quer vir após mim, renuncie-se a si mesmo...” (Lc 9,23) Em toda experiência de Deus autêntica entra um elemento “transformador” não por acumulação de conhecimentos, mas por “alteração”, “doação”, despojamento, entrega total. Por esta transformação, que vai da acolhida à entrega, do “grande ânimo e generosidade”(EE 5) à disponibilidade ativa, a pessoa vai sendo “divinizada”, isto é, vai fazendo-se à imagem de um Deus que é Ele mesmo relação. Nos Exercícios Espirituais, através de uma dinâmica interna, a oração vai progredindo, dia após dia, em direção a uma interiorização progressiva, da meditação à contemplação, da reflexão à união. Facilmente se constata que o processo do dia caminha para uma oração cada vez mais simplificada, mais intuitiva, mais espiritual. O puro sentimento da presença de Deus mantém-nos em silêncio orante durante toda a nossa oração... À medida que avançamos na oração, o silêncio vai ganhando mais espaço e importancia que as palavras. Tudo se passa para além das palavras e basta-nos uma breve palavra da Bíblia para alimentar toda a nossa oração. Na oração: - A oração flui da vida e, por isso, a preparação existencial é a mais importante; ela requer tais atitudes: um viver lúcido, desperto, realista, marcado pelo respeito, silêncio, transcendência, liberdade, compromisso, acolhida, escuta atenta, ausência de juízos sobre si mesmo... - Procure uma posição corporal que favoreça a pacificação interior (coluna reta, respiração abdominal, ausência de tensões voluntárias...); isso facilita uma atitude afetiva de atenção bene- volente, acolhida calorosa, liberdade pessoal para orar. - Deixe-se levar como se estivesse num rio, observando-se com um olhar interior, escutando, assimilando. - O Deus que vem ao nosso encontro é mais próximo da experiência dos místicos do que da fala dos dou- tores de qualquer credo religioso. Os místicos rezam. Os doutores pensam. Os místicos falam a Deus. Os doutores falam sobre Deus. Os místicos contam estórias e os doutores ensinam doutrinas. Os mís- ticos vão para o mar alto. Os doutores ficam no porto seguro. Os místicos desafiam as ondas perigo- sas. Os doutores querem livrar-se delas. Os místicos pedem coragem para enfrentá-las. Os doutores pedem a continuidade do mar tranquilo. “O cristão do futuro ou será místico ou não será cristão” (K. Rahner)
Textos bíblicos: Mc l0,46-52; lRe l9,l-l5
Na oração: entregue-se humildemente à experiência de
pobreza radical; seja como o mendigo cego de Jericó, sentado à beira do caminho e estenda as suas mãos abertas ao silêncio de Deus.