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INTRODUÇÃO
Uma vez que o objetivo principal dos serviços de saúde é a melhoria das condições
de saúde e a redução do sofrimento, espera-se que a oferta de serviços de saúde siga o
perfil das necessidades da população. Os serviços de saúde devem estar disponíveis em
quantidade e qualidade suficientes para o atendimento da população que deles necessite.
Porém, é comum observar-se que estes serviços variam entre áreas geográficas, e tais
variações geralmente não estão relacionadas com diferenças nas condições de saúde
17,18
das populações residentes . No Brasil, por exemplo, há maior concentração de
hospitais e serviços de média e alta complexidade nas regiões mais ricas do país,
seguindo, de um modo geral, as leis de mercado e não o perfil das necessidades de
atenção 19.
Os recursos de saúde podem estar organizados de diferentes maneiras. As
políticas e/ou as leis de mercado definem a organização dos serviços de saúde, a forma
de financiamento (público, privado) e a complexidade tecnológica destes serviços.
A oferta pode ser medida a partir das quantidades de recursos físicos (consultórios,
leitos, centros cirúrgicos), recursos humanos (médicos, enfermeiros, psicólogos) e
equipamentos, ou detalhando-se estes totais em termos da disponibilidade de horas
20,21
semanais e do volume de produção que se tem capacidade de oferecer . Indicadores
da oferta de recursos de saúde têm como denominador a população-alvo.
As práticas profissionais, especialmente a prática médica, constituem-se em outro
fator determinante da oferta. Profissionais de saúde podem estar mais bem treinados, ou
até mais motivados em realizar certos procedimentos e não outros, tanto pelo entusiasmo
em lidar com determinadas tecnologias, quanto pelo incentivo financeiro e prestígio que
determinadas práticas promovem. Desse modo, a oferta pode sofrer influência do perfil de
profissionais existentes em cada serviço, incluindo características demográficas, tipo ou
tempo de formação 18,22.
ACESSO
Segurança
50
O relatório To err is human: building a safer health system , publicado em 2001,
pelo Institute of Medicine dos Estados Unidos, expôs o elevado risco, grandemente
prevenível, associado a processos do cuidado de saúde. A partir daí a preocupação com a
segurança ganhou ênfase internacionalmente, com fortalecimento da ideia de que erros
podem ser prevenidos a partir do desenho de processos de cuidado que garantam a
segurança do paciente em relação a danos acidentais.
Segurança do paciente, segundo a OMS, é a redução, ao mínimo aceitável, do
51-53
risco de dano desnecessário associado ao cuidado de saúde .
Em termos gerais, os eventos ou circunstâncias que poderiam ter resultado ou
resultam em dano desnecessário para o paciente são denominados de incidentes. Os
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eventos adversos são especificamente os incidentes com dano ao paciente .
Considerando que o cuidado de saúde é passível de produzir danos inerentes ou não
evitáveis mesmo em condições de provisão adequadas, a distinção destes daqueles que
são evitáveis se faz fundamental, sendo a sua agregação equivocada na estimativa de
incidências de eventos adversos 53.
Os eventos adversos têm sido objeto de diversos estudos no âmbito de diferentes
tipos de serviços de saúde A avaliação da ocorrência de eventos adversos insere-se
amplamente no escopo da Epidemiologia, podendo produzir estimativas gerais, assim
como estimativas mais específicas tais como as taxas de quedas em hospitais ou de
infecções no sítio cirúrgico.
O monitoramento e estabelecimento de barreiras contra a ocorrência de incidentes
de forma mais ampla é o coração do movimento pela melhoria da segurança do paciente,
com vistas à prevenção de danos nos processos do cuidado de saúde.
Efetividade
A efetividade refere-se aos resultados produzidos sobre a saúde de uma população
ou de um indivíduo pelo uso de intervenções voltadas para o cuidado de saúde em
condições habituais nos serviços de saúde, que incluem imperfeições de implementação
54,55
pertinentes ao mundo cotidiano . Na prática, é o conceito adequado para traduzir o
quanto as práticas de saúde empregadas no dia-a-dia redundam em melhorias no estado
55
de saúde das pessoas. O conceito afim de eficácia também traduz os efeitos de uma
tecnologia/intervenção sobre a saúde das pessoas, mas em condições ideais, bem
controladas, o que se aplica a contextos muito específicos, tais como os de ensaios
clínicos, e não propriamente à realidade dos serviços de saúde. Se por um lado, é
importante que os serviços e profissionais de saúde incorporem tecnologias
comprovadamente eficazes na sua prática, por outro, termina sendo central considerar o
grau de perda dos resultados idealmente atingíveis na realidade vigente. Um bom
exemplo é o tratamento da tuberculose, ainda um sério problema de saúde pública no
Brasil. Ainda que com eficácia comprovada há anos, ele tem a sua efetividade
substanciamente comprometida por fatores tais como a longa duração, a percepção do
paciente de estar curado em face da cessação de sintomas, efeitos adversos etc.
A efetividade é, portanto, um dos elementos fundamentais na avaliação de
qualidade, na medida em que revela se o cuidado de saúde está produzindo benefícios e
como esses benefícios se comparam aos esperados. Medidas de efetividade positivas
incluem a cura de doenças, o controle de doenças crônicas segundo marcadores, casos
evitados por uma intervenção profilática, o aumento na sobrevida da população com dada
condição de saúde, a melhoria da qualidade de vida etc. A natureza dos estudos de
mensuração e atribuição causal da efetividade de intervenções de saúde é
essencialmente epidemiológica.
Provavelmente, o aumento da efetividade das práticas de saúde nos serviços seja
o objetivo mais perseguido na implementação de iniciativas de melhoria da qualidade do
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cuidado de saúde , valendo destacar a sua forte dependência do contexto,
especialmente quando envolve, de forma relevante, elementos socioadaptativos 57, 58.
Eficiência
O conceito de eficiência implica em uma análise da relação entre recursos
empregados e resultados obtidos, podendo ser medida ou sob condições próximas do
ideal, considerando, por exemplo, dados de eficácia obtidos em estudos clínicos, ou na
prática diária.
É uma dimensão da qualidade do cuidado de saúde fundamental do ponto de vista
populacional, considerando que os sistemas de saúde, seja em países mais pobres ou
ricos, têm sido afetados por gastos crescentes e recursos limitados. Nos seus diferentes
níveis, os sistemas de saúde devem buscar investir em programas ou tecnologias
capazes de produzir os melhores resultados em saúde frente aos recursos disponíveis.
Essa ideia de otimização de resultados foi destacada por Donabedian na sua definição
dos sete pilares da qualidade 55.
A análise da eficiência de tecnologias/intervenções em saúde insere-se no escopo
60
da avaliação econômica de programas ou tecnologias em saúde , incorporando a
consolidação de de custos envolvidos, mas também as medidas de efetividade
observadas. Em termos gerais, objetiva dimensionar se custos adicionais introduzidos por
uma nova intervenção, em comparação com o status-quo da provisão do cuidado para a
mesma condição, é justificado pelos benefícios (normalmente medidos em termos de
mudanças positivas no estado de saúde) que adiciona. Pode gerar resultados diferentes
conforme a perspectiva empregada, que pode ser a da sociedade, do sistema de saúde,
de um prestador, de um plano de saúde, entre outras.
Análises de eficiência podem se restringir à consideração de custos e
consequências substantivas, mas também podem gerar medidas síntese de custo-
efetividade, a partir da quantificação dos dois elementos envolvidos. Um tipo específico de
análise de custo-efetividade é denominada custo-utilidade, privilegiando com
denominador uma medida que acopla a medição da quantidade de vida ganha (ou
perdida) ajustada pela qualidade de vida associada .61.
Equidade
O conceito de equidade é relacionado à justiça social, ou seja, relacionado à justiça
na distribuição de bens sociais e materiais em uma sociedade. Desigualdades estão
intrinsecamente relacionadas à estratificação social, à chance de acesso aos recursos
materiais e produtos sociais. Políticas de redução destas desigualdades devem-se voltar
à minimização das diferenças no bem-estar material entre os grupos sociais, na redução
da variação de suas chances em obter o que o indivíduo almeja em termos de renda,
condições de trabalho e lazer 62,63.
Os mecanismos de produção social da doença enfatizam o conceito de posição
social, que desempenha papel central na determinação social na equidade em saúde. A
estrutura e relações da sociedade criam a estratificação social e a atribuição dos
indivíduos às diferentes posições sociais. Essa estratificação gera, por sua vez,
diferenças na exposição a condições de saúde prejudiciais e diferenças de
vulnerabilidade e de disponibilidade de recursos materiais. Da mesma forma, determina
resultados diferenciados, tanto em saúde como econômicos e sociais.
Os determinantes guardam precedência causal e podem ser classificados como
estruturais e intermediários. Os fatores mais importantes de estratificação social
estruturais são: renda, educação, ocupação, classe social, gênero e raça/cor de pele. As
categorias principais de determinantes intermediários da saúde são: condições materiais
(características da moradia e vizinhança, consumo potencial – meios para comprar
alimentação, roupas adequadas ao clima etc. - e ambiente físico de trabalho); condições
psicossociais (estresse psicológico, modos de vida e relações estressantes, suporte
social, e a habilidade em lidar com os problemas; fatores biológicos (genética) e
comportamentais (nutrição, atividade física, consumo de álcool e fumo); e o sistema de
saúde, ele mesmo como determinante social. O sistema de saúde é um determinante
social, na medida que atua como um mediador, influenciando o impacto que a doença
pode gerar nas pessoas.
A operacionalização do conceito de equidade depende de se considerar equidade
horizontal ou vertical. Chama-se de equidade horizontal à situação em que indivíduos com
mesmo problema de saúde possuam a mesma oportunidade de utilização de serviços de
saúde e recebam cuidados adequados às suas necessidades, independentemente de sua
condição social. Para atingir a equidade vertical, necessidades diferentes devam receber
cuidados diferenciados. Por exemplo, em uma situação de limitação de recursos, pode-se
determinar que quem necessita mais utiliza mais, para que os resultados em saúde sejam
63
aproximados . Este pode ser o enfoque dado quando se adota uma política de garantia
de atenção médica a um grupo populacional desprivilegiado socioeconomicamente,
objetivando-se um aumento da condição de saúde deste grupo, equiparando-a às
populações de melhores condições socioeconômicas.
Uma simples comparação da quantidade média de atenção à saúde recebida por
indivíduos de diferentes classes sociais não revela acerca de se as pessoas em igual
necessidade estão recebendo igual atenção à saúde (se pessoas mais privilegiadas estão
recebendo menos atenção à saúde, provavelmente é por elas adoecerem menos, sem
mencionar o fato da adequação desse tratamento às necessidades das diferentes classes
sociais). Uma das formas de contornar este problema é através da comparação entre a
distribuição da atenção à saúde pelas diferentes classes sociais e a distribuição da
necessidade por estas mesmas classes sociais. Se a atenção à saúde dada às classes
mais privilegiadas exceder as suas necessidades e o contrário ocorrer com as classes
menos privilegiadas, pode-se concluir que há desigualdade em favor das classes mais
privilegiadas. Assumindo que todas as pessoas que reportem morbidade estejam em igual
necessidade e considerando que somente pessoas que estejam doentes recebam
cuidados de saúde, equidade horizontal é alcançada se os indivíduos com mesma
necessidade recebem atenção à saúde iguais 64.
CONSIDERAÇÕES FINAIS