E STA D O D E M I N A S ● S E X T A - F E I R A ,
OPINIÃO
O advogado
e a OAB
LUIZ FERNANDO VALLADÃO NOGUEIRA
Presidente da Comissão de Ética da OAB-MG
Começamos 2005 com uma ad-
vocacia tratada pejorativamente,
seja pela sociedade, seja por setores
da mídia. Também, verdade seja di-
ta, notícias vinham à tona sobre es-
cândalos envolvendo advogados,
no campo profissional, no meio
político, ou em outros setores da
sociedade. Some-se a tudo isso
uma inconseqüente avalanche de
cursos de direito, que lança no
"mercado" uma infinidade de advo-
gados, todos os anos. Por conta dis-
so, percebíamos uma desvaloriza-
ção da advocacia, o que, natural-
mente, importava no enfraqueci-
mento da própria cidadania. E esta
perda de valor dos advogados po-
deria, como conseqüência nefasta,
enfraquecer a instituição maior
que os agrega, a Ordem dos Advo-
gados do Brasil (OAB).
Pois bem, a OAB/MG tratou de
ajudar nessa reconstrução do pro-
fissional e da instituição. Assim é
que, no campo disciplinar, as reu-
niões mensais do conselho pleno
redundam na exclusão de alguns
tantos profissionais. Aliás, poucos
sabem, mas é causa de exclusão do
advogado a sua
“inidoneidade
moral” (artigos
O estado já se
comprometeu, tério
34, XXVI, e 38, II,
Lei 8.906/94), cri-
este que
vem sendo utili-
por meio de zado aqui em Mi-
seu orçamento nas. Nos casos
mais graves, o
para 2006, a Tribunal de Ética
pagar os e Disciplina vem
decretando
honorários imediata suspen-
dos advogados são preventiva do
advogado faltoso
dativos (artigo 70, pará-
grafo 3º, Lei
8.906/94). Todas
as representa-
ções recebidas pela Comissão de
Ética e Disciplina, por sua vez, são
imediatamente processadas, com
rápida resposta aos interessados. A
partir desse trabalho das várias ins-
tâncias disciplinares da OAB/MG,
foi possível construir uma advoca-
cia mais respeitada e, por conse-
qüência, uma cidadania mais efi-
caz. Acrescente-se a isso, que o rigo-
roso exame da OAB tem feito séria
triagem, não permitindo o ingres-
so de profissionais despreparados.
Já a Escola Superior de Advocacia
da OAB-MG tem promovido cursos
por todo o estado, permitindo uma
reciclagem dos profissionais. A par-
tir disso, o advogado passa a ser
mais respeitado, tanto que os plei-
tos da OAB-MG, no plano institu-
cional, são bem recebidos. Por
exemplo, o estado já se comprome-
teu, por meio de seu orçamento pa-
ra 2006, a pagar os honorários dos
advogados dativos; o egrégio Tribu-
nal de Justiça acolheu o pleito de
um breve "recesso" forense, única
forma de haver um descanso míni-
mo aos advogados, tão sacrificados
pela hipócrita reforma do Judiciá-
rio; no Fórum de Belo Horizonte,
foram cessadas as constrangedoras
revistas em pastas de advogados.
São várias as vitórias obtidas, todas
elas decorrentes desse valor que o
advogado possui, e, sobretudo, do
peso institucional da OAB. Verdade
seja dita: qualquer silêncio impos-
to ao advogado e à própria OAB só
satisfaz aos que não se sentem bem
com uma sociedade mais justa e
democrática. Que venha 2006!
S/A ESTADO DE MINAS
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O passar dos anos
JOSÉ SARNEY
Senador
difícil fugir a um tema
É
quando ele se impõe
avassalador. Pensei escre-
ver sobre flores ou sobre
a Bolívia e seu labirinto.
Logo 2006 chegou à mi-
nha frente e não tive co-
mo afastá-lo.
Meu pai teve um vaqueiro, Ludgero, que
contava os anos pelos bezerros: 1948, 50 bezer-
ros, e assim por diante, listava todos. Outra ami-
ga nossa, dona Anicota, que tinha uma questão
sobre umas terras do Engenho da Anta, que du-
rara mais de 20 anos, já falava dos anos pelos
eventos do processo: 1953, “ano em que saiu a
sentença que deu ganho de causa a meu irmão,
mas em 1954 teve o acórdão do tribunal que
botou abaixo tudo”.
A marcação dos anos foi uma invenção do
homem. O padre Vieira, com este sentimento,
não via o ano, mas os anos, e pregava desejando
bons anos, não só o vindouro, mas todos. Para
mim, a cada ano saúdo o ano-novo, mas minha
gratidão se volta para o ano velho. Quando a ca-
da ano transpomos a marca do tempo, recordo
que nos 365 dias que vivemos, nosso coração a
cada dia bombeou 343 litros de sangue por ho-
ra, 8 mil litros por dia e 3 milhões no ano, para
oxigenar os 10 trilhões de células do nosso cor-
‘Na verdade, a paz!’
DOM WALMOR OLIVEIRA DE AZEVEDO
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte
a Esta afirmação, “Na verdade, a paz”, é a voz
da Igreja Católica, por meio do magistério do
papa Bento XVI, para o Dia Mundial da Paz, nes-
te domingo, reafirmando o compromisso in-
substituível dos verdadeiros discípulos e discí-
pulas de Jesus Cristo nessa gravíssima hora da
história da humanidade. A gravidade dessa ho-
ra se revela no volume incalculável e sempre
multiplicado de necessidades. Menor não é a
complexidade dos desafios de toda ordem que
se põem. É impressionante também a insatis-
fação vigente no âmago da subjetividade hu-
mana contemporânea, temperando com exa-
cerbações esse contexto de gravidade.
‘Na verdade, a paz’é um convite. Ao mesmo
tempo é um clamor. É, sobretudo, uma séria ad-
vertência aos corações, se quiserem evitar o
acontecimento de colapsos irreversíveis de ins-
tituições e das relações. É também uma tarefa
a ser assumida pessoalmente dando novas con-
figurações à própria vida. O retardamento dos
processos de paz e o desinteresse pelo engaja-
mento nas fileiras dos seus construtores reve-
lam o quanto é importante focalizar essa con-
quista como tarefa pessoal, sustentada pela
qualidade da própria condição existencial, sem
perder a visão de conjunto do social e das suas
exigências políticas próprias. Essa perspectiva
não invalida ou obscurece a necessária posição
contrária que se deve ter diante do “aumento
preocupante dos gastos militares e comércio
sempre próspero das armas”, reveladores da in-
diferença para com os compromissos da comu-
nidade internacional assumidos neste âmbito.
Bem assim, não perde sua importância e neces-
sidade o combate às guerras, fratricidas e san-
guinolentas, estabelecidas entre nações e po-
vos, nascidas todas essas das justificativas cla-
ramente imperialistas ou de considerações cal-
cadas na superioridade dos próprios critérios e
dos juízos de suas competências. Esse é um per-
curso de proporções mundiais ainda tímidas
diante das urgências que afligem incontáveis
grupos e culturas.
Os governantes da terra e os que têm poder
de decisão estão desafiados a compreender que
a grandeza de suas gestões não se deve confinar
apenas na edificação de grandes obras, no ajun-
tamento de bens ou nas simples e indispensá-
veis correções dessas economias que estão per-
petuando as perversidades com os pobres. Con-
tudo, cada pessoa precisa acolher a advertência
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Ano-novo, ano velho,
renovação de esperanças
no mundo com menos
violência e mais amigos.
Mas, infelizmente,
estamos longe de
chegar à utopia de
um tempo solidário
po, no milagre da vida, na harmonia dessa má-
quina que nos distingue dos outros animais
pelo pensar. Ela alimenta o nosso sonho de so-
nhar, os sentimentos do amor, da fraternida-
de, da paixão, da solidariedade humana. Todos
que vivemos e estamos aqui na Terra pode-
mos louvar o ano que passou e renovar espe-
ranças sobre o ano que vem, porque somos vi-
toriosos. Na evolução, somos produto de uma
linhagem em que tudo deu certo. Jay Gould,
pensando sobre isso, observou: “Nossa espécie
nunca se rompeu nenhuma vez, em bilhões
de momentos em que poderia acabar”. E
quantas espécies acabaram.
Mas, para mim esse mistério é tão grande e
tão inexplicável quando compreendemos que
em relação aos riscos que advém de compreen-
sões e modos de ser que estão hospedados em
arriscados ismos, permeando juízos e convic-
ções, comprometendo o próprio sentido liber-
tador da verdade. Essa desconsideração da ver-
dade inviabiliza a promessa do Mestre e Senhor
quando diz que “conhecereis a verdade, e a ver-
dade vos libertará” (Jo 8,32). Entre estes ismos,
há de se destacar o nihilismo e o fundamenta-
lismo. Grave é a negação da existência de qual-
quer verdade, como é grave a atitude que facul-
ta uma sua imposição, até mesmo com o uso
da força, alimentando um “desprezo perigoso”
na consideração da vida humana. Gravíssimo é
o subjetivismo que se faz o invólucro da verda-
de comprometendo a paz.
Um comprometimento que nasce da baixa
qualificação humana e espiritual do ser. São
mentalidades cristalizadas e incapazes de ad-
mitir algo que esteja para além do seu estreito
território de compreensão. Essas mentalidades
consideram como verdade o que pensam e o
modo próprio, geralmente tacanho, de julgar
processos, circunstâncias e pessoas. Essa situa-
ção propicia a armação de um verdadeiro tobo-
gã de mentiras, todas apresentadas como ver-
dade, cozinhadas no banho-maria de condições
patológicas. Esses consideram numa estima
exagerada os seus próprios critérios e juízos,
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toda ciência é inevitável, mas ela só se comple-
ta na plenitude da fé. É a presença de Deus na
obra da criação que fecha e acaba o ciclo da dú-
vida. Ao meditar sobre a vida na contagem dos
anos, a expressão que me ocorre é de Hannah
Arendt, que fala da obrigação de nossa “grati-
dão pelo mundo”. Os gregos pensavam que na
amizade residia boa parte da felicidade e era
um dos requisitos “fundamentais para o bem-
estar da cidade” e, assim, ligavam a filantropia
ao “amor dos homens”. Os romanos já cami-
nhavam na noção de “humanidade”, como sen-
timento de solidariedade entre os homens: ser-
mos humanos.
Ano-novo, ano velho, renovação de espe-
ranças no mundo com menos violência e mais
amigos. Mas, infelizmente, estamos longe de
chegar à utopia de um tempo solidário. Bandei-
ra Tribuzzi, um grande poeta ainda a ser desco-
berto como foi Sousândrade, tem um poema
sobre a máquina do mundo, em que diz “que
sonho raro / será mais puro e belo e mais pro-
fundo / do que esta rica máquina do mundo”,
acrescentando o toque corporal quando diz
“nos rins se processam um mistério tão sério /
que é injusto esquecê-lo”.
Num tempo da morte das utopias, reze-
mos pela sua ressurreição, um mundo de paz,
de humanidade, sem desigualdades, sem fome
e sem miséria. Tudo isso para chamar todos os
homens de amigos e desejar um ano-novo de
grandes alegrias, sem esquecer o ano velho
com rins e coração funcionando bem.
com interesses de defesa própria e de ataques
para compensar aquelas perdas que só se
contabilizam nos corações pouco generosos
e seduzidos pela ganância de poderes e de
grandes posses.
Entre outras conseqüências graves dos sub-
jetivismos estão aquelas que servem para ali-
mentar ressentimentos, espalhando a cizânia
do desentendimento e da desavença, bem co-
mo do gosto mórbido de tentar causar desesta-
bilizações por vingança e mesquinhez. A raiz
desses ismos está, incontestavelmente, na men-
tira que vai se tornando marca do caráter e ins-
trumento para se conseguir o que é do próprio
interesse. Irremediável é o conseqüente com-
prometimento da paz. Assim, o propósito de
construir a paz e aquele de se querer a paz, pe-
de de todos, sinceramente, uma revisão de vida
e daquilo que se faz e se fala. Assim, para que a
paz nasça da verdade é bom que se leve em con-
ta o que Jesus diz a interlocutores seus, marca-
dos pelos ismos também: “O vosso pai é o dia-
bo, e quereis cumprir o desejo do vosso pai. Ele
era assassino desde o começo e não se mante-
ve na verdade, porque nele não há verdade.
Quando ele fala mentira,fala o que é próprio de-
le, pois é mentiroso e pai da mentira” (Jo 8,44)
Quem tem ouvidos ouça! Quem quiser a paz
busque-a na verdade!
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