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RESUMO
Localizado no campus da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), o Museu da
Farmácia Professor Lucas Marques de Amaral, administrado pela Faculdade de
Farmácia, procura resguardar a memória da farmácia através de seu acervo
histórico. Criado em 1972, por iniciativa do então Diretor da Faculdade, professor
Lucas Marques de Amaral, abriga insumos, medicamentos e objetos oriundos dos
séculos XIX e XX que retratam o ofício do farmacêutico, bem como a trajetória
histórica da própria Faculdade de Farmácia da UFJF. Assim, este texto apresenta
um relato de experiência do projeto de extensão Ações educativas no Museu da
Farmácia da UFJF, desenvolvido entre 2015 e 2017, procurando problematizar como
a equipe de trabalho do projeto, ao intervir no espaço, procurou solucionar
problemas relacionados à democratização do espaço museal. Acredita-se que as
ações não apenas diminuíram a distância simbólica entre o espaço e o público,
fomentando, assim, uma maior quantidade de visitas e uma melhor mediação do
espaço, como também requalificaram arquitetonicamente o museu.
Diante desse exposto, este trabalho tem como objetivo descrever e problematizar as
atividades realizadas pela equipe do projeto de extensão Ações educativas no
Museu da Farmácia da UFJF,1 levado a efeito entre os anos de 2015 e 2017. A
equipe era composta por discentes dos cursos de Turismo, Bacharelado
Interdisciplinar em Ciências Humanas, Arquitetura e Farmácia, sendo coordenado
por um docente do Departamento de Turismo da própria universidade, além de
contar com o apoio de um técnico administrativo da Faculdade de Farmácia, de uma
docente daquela mesma unidade, e de uma pesquisadora com experiência na área
de turismo e museus.
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O projeto de Extensão foi aprovado pela Pró-Reitoria de Extensão da Universidade Federal de Juiz
de Fora no ano de 2015. Contou com a participação de discentes dos cursos de Turismo,
Bacharelado Interdisciplinar em Ciências Humanas, Arquitetura, Farmácia e de técnicos
administrativos da Faculdade de Farmácia. Este projeto surgiu a partir de visitas técnicas da disciplina
de Fundamentos do Lazer ao museu, fatos esses ocorridos em 2013 e 2014. Durante as visitas, o
professor idealizador do espaço apontava um conjunto de fragilidades do espaço, que, naquele
momento, se encontrava fechado, a exceção dos dias em que o professor, então aposentado, poderia
se deslocar até a UFJF para mediar visitas. Após diálogos com o diretor da Faculdade de Farmácia,
no primeiro semestre de 2015, ficou acertado que o projeto daria início para ativar o museu
novamente e suprir as deficiências mais intensas, como as fragilidades do espaço físico, a gestão do
espaço e a mediação das visitas.
seguida, foi feita uma análise DAFO, SWOT ou FOFA, em português, (Forças,
Oportunidades, Fraquezas e Ameaças) com os bolsistas do projeto, com a finalidade
de avaliar o espaço do museu, além de um levantamento do entorno do museu e o
quão ele era salientando na sinalização. Em seguida, realizou-se um diagnóstico
arquitetônico do espaço, para, a posteriori, realizar intervenções físicas que visavam
corrigir problemas estruturais. Concomitantemente a essa ação, propostas relativas
à segurança, à gestão, sobretudo na comunicação, e ações educativas foram
colocadas em prática. A concepção de diagnóstico e o monitoramento de público
também foram realizados, com o intuito de analisar a forma como as visitas ocorriam
no espaço museal, levando em consideração o perfil do visitante, a condição que o
museu se apresentava ao público e a mediação da equipe do projeto.
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Para ilustrar o cenário museal de Juiz de Fora, pode-se destacar a diversidade presente no campo
museal, como, por exemplo: o Museu Mariano Procópio, detentor do segundo maior acervo ligado ao
império do país; o Museu Ferroviário, um dos poucos com essa temática na Zona da Mata Mineira,
cujo propósito é registrar e resguardar elementos do patrimônio ferroviário material e imaterial; o
Museu do Crédito Real, que se dedica à preservação da memória monetária e bancária e, por último,
o Museu de Arte Murilo Mendes (MAMM), que guarda, dentre outros elementos, parte do acervo do
escritor Murilo Mendes, composto por quadros, manuscritos e a biblioteca do artista.
Em linhas gerais, Juiz de Fora não se difere da realidade existente no país, uma vez
que é possível identificar uma significativa assimetria na distribuição dos
equipamentos culturais, especialmente de museus. Segundo o Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada - IPEA, 73,2% dos municípios brasileiros não possuem museu.
Em outra pesquisa, realizada no ano de 2013, o SESC publicou um apanhado sobre
os públicos de cultura, com dados advindos de 25 Estados brasileiros. Foram
aplicadas cerca de 2400 entrevistas e identificou-se que 71% dos brasileiros
entrevistados nunca estiveram em exposições de pintura, escultura e outras artes
em museus ou outros locais afins. Ademais, 70% daqueles ouvidos nunca foram a
uma exposição de fotografia.
O Museu da Farmácia Prof. Lucas Marques de Amaral foi criado por iniciativa do
primeiro Diretor da Faculdade de Farmácia, professor Lucas Marques de Amaral.
Sua fundação data de 1972, período após o desmembramento dos Institutos de
Odontologia e Farmácia, constituintes da então Escola de Farmácia e Odontologia
de Juiz de Fora – EFOJF, e a transferência da Faculdade de Farmácia para o
campus universitário.
Essa separação acabou por criar as condições para que o acervo começasse a ser
formado, tendo em vista que, com a divisão dos órgãos supracitados, novos
equipamentos foram adquiridos pelo curso de Farmácia. Com a intenção de
preservá-los, o professor Lucas guardou todos os objetos, reunindo-os com os
outros que já possuía, provenientes da antiga farmácia de seu pai. Além disso, a
liberação do mercado nacional para a importação de equipamentos modernos na
década de 90, principalmente no setor educacional, contribuiu para que o material
utilizado nas aulas se tornasse obsoleto para o ensino. Logo, o acervo foi
complementado por peças da antiga escola de Farmácia e Odontologia, do
laboratório de física da antiga Faculdade de Engenharia e também por doações de
farmacêuticos, funcionários e até mesmo de alunos.
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Ferreira (2018) realizou um levantamento sobre os museus de Farmácia do Brasil. São 8
instituições, sendo elas o Centro de Memória da Farmácia da Universidade Federal de Minas Gerais
(Belo Horizonte, Minas Gerais), Centro de Memória da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da
Universidade de São Paulo (São Paulo, São Paulo), Espaço História da Farmácia (Curitiba, Paraná),
Farmácia Internacional (Antonina, Paraná), Museu da Farmácia da Santa Casa de Misericórdia (Rio
de Janeiro, Rio de Janeiro), Museu da Farmácia Professor Lucas Marques do Amaral (Juiz de Fora,
registrado junto ao IBRAM como um museu de coleção científica, contendo itens
concernentes a insumos, medicamentos e objetos oriundos dos séculos XIX e XX.
Diante desse acervo, surge a importância do estabelecimento de medidas de
salvaguarda das peças contidas ali, consideradas aqui como bens culturais de
grande valor, além do desenvolvimento de ações que favorecessem a acessibilidade
às informações e ao rico conjunto de objetos preservados neste museu.
A primeira ação mais efetiva do projeto aqui descrito, realizada de setembro de 2015
a maio de 2016, diz respeito às pesquisas de campo que visavam analisar a
acessibilidade em diversas escalas, partindo da universidade para depois se chegar
no próprio museu.
Minas Gerais), Museu de Farmácia Antônio Lago (Rio de Janeiro, Rio de Janeiro) e Museu
Pharmacia (Ouro Preto-Minas Gerais).
Foram realizadas observações in loco e registros fotográficos para observar como o
museu é sinalizado no próprio campus e se essa divulgação, caso existisse, conteria
todas as informações necessárias para orientar um visitante até o espaço
museológico. Além disso, o intuito das visitas era averiguar também as condições da
acessibilidade física.
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A UFJF possui, desde 2012, um campus avançado na cidade de Governador Valadares, na região
do Vale do Rio Doce, em Minas Gerais. Nessa cidade, são oferecidos nove cursos: Medicina,
Odontologia, Farmácia, Fisioterapia, Nutrição, Direito, Economia, Administração e Ciências
Contábeis. Outra frente é relativa ao ensino de educação a distância, que abarcam 30 polos em
diferentes cidades de Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo e são oferecidos oito
cursos de graduação e cinco de pós-graduação.
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Outro dado a ser considerado é que a universidade acomoda um Hospital Universitário, sendo
considerado centro de referência ao atendimento de pacientes da rede do Sistema Único de Saúde
(SUS), com uma área de cobertura que engloba mais de 90 municípios da Zona da Mata Mineira e do
estado do Rio.
espaços geridos e inseridos na UFJF. Entretanto, apesar dos esforços institucionais,
notou-se que no que concerne a sinalização indicativa de existência do museu é
inexistente. Não existem placas, letreiros e nem mapas com demarcações que
possam orientar os usuários da instituição federal de ensino acerca dos espaços
culturais presentes no campus, quiçá do museu.
Figuras 04 e 05: À esquerda, placa localizada próximo à Ascomcer, na Avenida Presidente Itamar
Franco. À direita, placa indicativa dentro da universidade, próximo ao pórtico norte.
FONTE: Acervo pessoal, 2016.
Figuras 06 e 07: À esquerda, trecho do anel viário onde não há sequer placas que orientem a localização das
faculdades. À direita, vista da única placa existente no estacionamento da faculdade de Farmácia
FONTE: Acervo pessoal, 2016.
Nesse sentido, apesar de pequenas ações em voga que buscam atender a essa
demanda, como a inserção de informações sobre esses lugares no sítio eletrônico
da universidade e de mapas com indicação dos institutos e das faculdades nos
pontos de ônibus localizados dentro do campus, percebe-se que essas intervenções
ainda são embrionárias e não favorecem a divulgação do museu.
Assim, pensar a apropriação dos espaços públicos, se torna central para a reflexão
em torno do próprio planejamento das cidades. Rechia (2006) pondera que a
apropriação de um espaço ou a delimitação espacial deste, está socialmente
condicionada ao poder simbólico do lugar com os laços de afetividade que as
pessoas estabelecem entre si, em determinado ambiente. A pesquisadora
exemplifica que a representação de uma quadra esportiva em uma planta seria
apenas a representação gráfica de uma estrutura físico espacial, já essa estrutura
construída pode nos dar elementos para interpretar determinadas relações sociais
como localização, abrangência e acessos. São as vivências e práticas ali
concretizadas, da apropriação daquele bem entre grupos sociais, que vão fornecer
sentidos e significados a essa parcela do espaço urbano.
Cabe enfatizar, entretanto, que o lazer não pode, sozinho, transformar a vida
humana e torná-la melhor, uma vez que, como pontua Valle (1998, p.44), “em suas
raízes históricas e, marcadamente, em sua formulação contemporânea, [...] o lazer
foi sempre profundamente caracterizado por uma busca direta de manipulação
ideológica”. Com isso, ao investigar o tema, não se pode desconsiderar que o lazer,
muitas vezes, reflete os contrassensos presentes em determinado contexto,
podendo ser “utilizado” com diferentes finalidades, seja para reforçar o status quo,
estereótipos e valores excludentes, consumistas e alienantes, seja para contribuir
com a constituição de uma nova sociedade, mais justa, humana e comprometida
com os princípios democráticos (GOMES, 2004).
Porém, notou-se que antes de realizar uma divulgação mais ostensiva junto à
comunidade, visando, assim, minimizar esse distanciamento, era necessário tornar o
espaço do museu mais acessível visto que alguns pontos se apresentavam
dificultadores, eram eles: i) a naturalização da tipologia do museu, tendendo a uma
certa cientificialização do espaço; ii) a falta de acessibilidade ao espaço expositivo e
ausência de um programa de segurança; iii) carência de mão de obra qualificada e
especializada; iv) inexistência de projetos de ações educativas.
[...] Não há mais limites do que os próprios limites do homem. Este museu
apresenta tudo em função do homem: seu meio ambiente, suas crenças,
suas atividades, da mais elementar à mais complexa. O ponto focal do
museu não é mais o ‘artefato’ mas o Homem em sua plenitude. Nessa
perspectiva a noção de ‘passado’ e de ‘futuro’ desaparecem, tudo se passa
no ‘presente’, em uma comunicação com o ‘indivíduo’ e o Homem, por
intermédio do ‘Objeto’. (VARINE-BOHAN, 1969 citado por MARTINS, 2006,
p. 9)
Posto isso, um dos pontos privilegiados no museu, que prioriza a participação social
e a aproximação com a sociedade é constituído, principalmente, por exposições
permanentes ou itinerantes, com caráter participativo e/ou interativo. Assim,
reconhecida como peça-chave para a democratização do espaço, a exposição pode
proporcionar uma educação mais instigante e plural. Quando associada às
possibilidades de lazer, ela pode contribuir para vivências lúdicas no espaço museal
que, em muitos casos, são considerados lugares frios e maçantes, isto é,
possibilitando, através de elementos da ludicidade, como, por exemplo, as
brincadeiras, uma possibilidade de reflexão crítica e aprendizagem em torno das
informações propiciadas pelos museus.
A única região da sala onde a aproximação era dificultada em razão da posição dos
objetos se encontrava perto da janela. Abaixo do peitoril estão expostos diversos
tipos de medicamentos e remédios antigos, cuja visibilidade é limitada devido à
baixa altura e à proximidade com outras peças do acervo. Os objetos que estão
próximos distam no máximo 80cm dos armários, impedindo o alcance de um
cadeirante e a permanência confortável de uma pessoa em pé, a qual precisa de, no
mínimo, 60cm para conseguir circular de forma desejável.
FIGURAS 11,12 e 13: Medidas de algumas passagens de circulação..
FONTE: Acervo pessoal, 2016.
No que se refere ao alcance visual, a norma 9050 aponta que a linha do horizonte
visual de um cadeirante é em torno de 1,15m, enquanto que de uma pessoa em pé é
de 1,45m. O museu possui mesas e armários de alturas diversas, havendo sobre
todos eles objetos que fazem parte da exposição. Entretanto, alguns não possuíam
altura desejável para que cadeirantes ou indivíduos de menor estatura visualizem as
peças de forma completa. No mais, a forma como os objetos estavam distribuídos
proporciona um entendimento isolado, sem oferecer ao visitante uma leitura conjunta
acerca do acervo.
FIGURA 14: Altura de alguns móveis do museu.
FONTE: Acervo pessoal, 2016
Ora, diante das funções atribuídas aos museus, destaca-se aqui a constituição de
espaços e acessos democráticos, a qual remete ao desenvolvimento de ações em
prol das acessibilidades, dentre elas a física.
Assim sendo, foram feitas modificações que objetivam qualificar o museu. As mesas
e estantes foram dispostas de modo a permitir a circulação confortável de uma
pessoa em pé, oferecendo também espaço para o giro de manobra de um
cadeirante. Além disso, a nova disposição permitiu que mostras temporárias e
atividades lúdicas com visitantes fossem realizadas na própria sala da mostra
permanente.
FIGURA 15: Sala da mostra permanente do Museu da Farmácia após mudança do layout e da
exposição das peças.
FONTE: Acervo pessoal, 2017.
Também neste momento, foi iniciada, sobretudo no mês de julho de 2016, uma
importante ação relativa à acessibilidade: a readequação da reserva técnica. Um
fator que deve ser ressaltado que o projeto de extensão não contou com apoio
financeiro de nenhuma espécie o que dificultava certas ações serem realizadas. No
âmbito da reserva técnica foram aplicadas metodologias apreendidas na fase inicial
do projeto relativas a pesquisas sobre preservação e conservação. Além disso, a
equipe não contou com a presença de museólogos o que dificultava o
empreendimento de ações mais técnicas. Para suprir essas lacunas a equipe de
bolsistas e professores que compunham o projeto fizeram inserções em campo, em
visitas técnicas que contavam com o apoio de profissionais especializados e tinham
acervos parecidos com o que compunha o Museu da Farmácia.
Tal ação objetivou criar condições para a reorganização das peças através da
catalogação e descrição exaustiva de peças e suas utilidades. Para isto foram
criadas fichas catalográficas com numerações que facilitavam o acesso aos objetos,
dando a saber quais peças se encontravam fora da exposição permanente do
museu. Peças essas que foram sendo guardadas nesse espaço a medida que iam
sendo incorporadas à coleção do museu. Entretanto, a falta de manutenção nesse
ambiente desencadeou a saturação da reserva, face ao excesso de peças em um
espaço diminuto, ocasionando a proliferação de fungos e insetos.
Diante desse contexto, foi feita uma proposta de ampliação para esse espaço, o qual
passou a conter 13,75 metros quadrados, concluída em outubro de 2016. Além
disso, foram requalificadas as formas de armazenamento das peças da reserva em
ambientes que favoreciam a conservação, logo depois que a equipe realizou
algumas visitas em reservas técnicas de outros museus da cidade. Um exemplo
dessa ação foi que, além da limpeza realizada no ambiente, foram coletadas caixas
de isopor com vistas à proteção das peças, muitas delas de cerâmica ou vidro. Aliás,
a opção pelas caixas de isopor se deu pela impossibilidade da universidade adquirir
caixas com cartão não ácido e papel não alcalino. Assim, as condições de
armazenamento e proteção dessas peças foram potencializadas aumentando a
capacidade de vida útil desses elementos, mediante adaptação do entendimento
vigente em acervos arqueológicos (BANDEIRA, 2016, 2017), ao fazer uso desse
material.
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Ferreira (2018, p. 46) atestou que “a criação dos perfis nas mídias sociais Facebook e Instagram,
possibilitou uma maior aproximação com o público”. As postagens das peças da exposição eram
realizadas em dois dias da semana, contendo curiosidades e informações das mesmas. Os grupos
desde visitas agendadas também ganhavam destaque nas redes e para isso foi desenvolvido uma
“moldura”, onde as fotos eram editadas e em seguidas postadas, os comentários eram caracterizados
por elogios e marcações de usuários, outros perfis. Dados do Facebook e Instagram apresentavam
mais de 1.500 visualizações nas postagens das redes e recebíamos um número significativo de
visitantes que conheceram o museu pelas redes sociais.
Ao analisar as sociedades americanas Jacobs (2000), concluiu que a
manutenção da segurança não é feita exclusivamente pela polícia, “[…] mas pela
rede intrincada, quase inconsciente, de controles e padrões de comportamento
espontâneos presentes em meio ao próprio povo e por ele aplicados” (JACOBS,
2000, p. 32). Os “olhos vigilantes” dos espaços públicos são as pessoas que,
consciente ou inconscientemente, utilizam o espaço público e/ou costumam
contemplá-lo de suas casas, exercendo uma vigilância natural sobre o que ali
acontece “[...] a calçada deve ter usuários transitando ininterruptamente, tanto para
aumentar na rua o número de olhos atentos quanto para induzir um número
suficiente de pessoas de dentro dos edifícios da rua a observar as calçadas”
(JACOBS, 2000, p. 35-36).
Algumas intervenções que deveriam ter sido desenvolvidas de forma ativa na etapa
posterior, ou seja, de dezembro de 2016 à maio de 2017, foram insuficientes, haja
vista que o projeto abarcou outras demandas até então não esperadas inicialmente7.
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Desde o início do projeto a equipe foi surpreendida com um conjunto de situações não previstas, como
problemas estruturais, ausência de recursos e inexperiência do grupo de trabalho.
Através de diálogos com estudantes da Faculdade e relatos de professores das
turmas de Farmácia (que passaram, a partir de 2016 a levar suas turmas ao espaço)
foi identificado que os discentes do curso de Farmácia desconheciam a existência
do museu. Outro dado importante que durante as observações in loco os
professores e funcionários da Faculdade pouco visitavam o espaço, com exceção
dos docentes e funcionários diretamente ligados ao museu.
Antes de lançar mão dos programas educativos, a equipe do projeto realizou uma
exaustiva pesquisa bibliográfica sobre as relações de patrimônio, educação, museus
e mediação para embasar as ações que seriam desenvolvidas.
Certamente, o contato com os objetos, através das exposições facilita o acesso das
pessoas aos museus, entendendo-os como lugares de cultura. Benjamin (1989), ao
definir os espaços museais, pondera que eles “são casas e espaços que suscitam
sonhos”. Assim, mais do que abrigar coleções ou expor obras de arte famosas, eles
podem ser também:
Um cuidado foi essencial para essa etapa evitar malabarismos para chamar a
atenção do público, sem sequer criar laços que o façam retornar, passa a ser
entendido como um espaço do espetáculo fortemente ligado ao número de
visitantes. Filho (2006) alerta que
Por mais que em sua concepção guarde uma série de valores políticos, econômicos,
sociais e culturais, o museu não deveria ser uma estância sectária. Entretanto, as
ações de democratização desse espaço necessitam de ressignificações, uma vez
que essa instituição pode reforçar a naturalização das diferenças sociais,
econômicas e culturais. Essa ressignificação tende a ser um pilar fundamental das
ações educativas de um museu, sobretudo ao diminuir tensões e apreensões no
público, que, muitas vezes, acha que não é apto a visitar dada exposição ou, ainda,
que deveria deter uma gama de conhecimento para ser capaz de usufruir o espaço.
Desta maneira, entendendo que não seria apenas o papel do mediador despertar o
interesse dos visitantes junto ao espaço do museu, mas também o seu próprio
espaço, tendo em vista que o processo de mediação é envolto por um conjunto de
fatores (a recepção, os painéis, a qualidade das fotos, o trabalho dos curadores,
entre outros), poder-se-ia, então, afirmar que eles detêm igual papel, um
sustentando o outro, de modo que nem a atuação do mediador é mais importante e
nem a qualidade expositiva é a mais efetiva. Em suma, ambas são necessárias para
o processo de mediar as visitas em museus, especialmente aquelas ligadas
direcionadas a escolares.
O mediador, diante desse ponto de vista, pode ser compreendido não apenas como
um intermediário, no sentido de transmissor de informações, mas como aquele que
proporciona diálogo, ao se colocar entre o público e as exposições. Além disso, ele
pode facilitar a interação entre o público e as exposições, pois eles mediam ainda a
aproximação entre o público e a própria instituição, seus discursos e objetivos.
Nesse sentido, os mediadores podem ser considerados o “rosto” ou a “voz” da
instituição, ou seja, aqueles que têm o potencial em revelar ao seu público o que o
museu idealiza (MARANDINO, 2008; MORA, 2007; RIBEIRO E FRUCCHI, 2007).
O roteiro foi concebido de uma forma que fosse adaptável para os diferentes
grupos de visitantes e capaz de orientar os bolsistas-mediadores na explicação da
história e de algumas peças da exposição, estimulando a reflexão crítica e social dos
visitantes.
Após diálogos entre a equipe, ficou definido que o roteiro adotado teria como base
os seguintes núcleos da exposição permanente: análises clínicas, química,
manipulação, alimentos, administração e botica. A visita tinha duração de 30 min e
40 min, com uma mediação em cada núcleo, destacando suas peças principais e
depois os visitantes ficavam livres para poderem observarem com mais calma, fazer
fotografias bem como discutir sobre as peças que mais achava interessante. No final
da visita, pedia-se que eles se agrupassem para tirar alguma dúvida, tecer alguma
avaliação e para os mediadores agradecerem a visita e falar sobre as redes sociais
do museu.
Vale a pena ressaltar que grande parte dos grupos escolares eram
agendados pela equipe do “Programa de Visitas da UFJF”, que apresenta a
Universidade para estudantes da região da Zona da Mata e de algumas cidades do
Estado do Rio de Janeiro. Ao agendar, eles passavam a quantidade de pessoas, a
faixa etária do grupo e o ano escolar. Porém lidava-mos com algumas adversidades,
como atrasos do grupo ou até mesmo o cancelamento de última hora.
Considerações finais
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Uma experiência significativa ocorreu no mês de outubro de 2016, período em que o curso sediou o
Seminário Mineiro de Farmácia. Um público variado de estudantes, professores e farmacêuticos de
várias partes do estado visitaram o museu, apresentando grande interesse pelo acervo exposto.
Entretanto, uma funcionária da limpeza, habituada a higienizar a sala do museu, foi convidada a
conhecê-lo de outra maneira. Após demonstrar grande interesse, ela foi conduzida pelo acervo como
visitante. Motivada, indagou ao final se poderia levar amigos e familiares para conhecer o Museu da
Farmácia. Através da mediação de uma bolsista, o conteúdo contido ali passou a ter outro significado;
consequentemente, o espaço recebeu um novo sentido, não sendo mais somente uma sala onde ela
deveria executar o seu trabalho.
A importância do acesso de pessoas com restrições intelectuais, físicas e motoras
em Museus foi sendo estudado e incorporado em trabalhos, cartilhas e documentos
por Instituições e autores envolvidos com o tema, bem como desenvolvidas ações
para proporcionar tal conquista na prática. A acessibilidade, todavia, não está restrita
a esse público específico, como também não se refere somente ao acesso físico.
Logo, pensar a acessibilidade em espaços museológicos possibilita uma gama de
ações concretas que podem contribuir para a inclusão e o direito à cultura e ao lazer
de todas as pessoas, independente se existam ou não restrições de mobilidade.
Referências
_________. O acesso para todos à cultura e aos museus do Rio de Janeiro. Actas
do I Seminário de Investigação em Museologia dos Países de Língua Portuguesa e
Espanhola, Volume 2, pp. 236-255. Disponível em:
<http://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/8200.pdf>. Acesso em: 22 jan. 2017.
MORA, M. Diversos enfoques sobre as visitas guiadas nos museus de ciências. In:
MASSARANI, L.; MERZAGORA, M.; RODARI, P. (Orgs.) Diálogos e ciência:
mediação em museus e centros de ciências. Rio de Janeiro: Museu da Vida/ Casa
de Oswaldo Cruz/ Fiocruz, 2007, p. 21-26