Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Quadro clínico
Paciente do sexo masculino, 46 anos de idade, com quadro de tremores,
agitação e sudorese há 2 dias. Há algumas horas com alucinações visuais; fora isso, a
consciência está preservada. Apresenta ainda dor em membro inferior esquerdo há 4
dias com hiperemia local, além de história de trauma leve no local há alguns dias.
Antecedente de etilismo diário pelo menos 4 doses de álcool/dia.
Exame físico
BEG, corado, hidratado, anictérico, acianótico;
pressão arterial: 155 x 90 mmHg;
temperatura: 37,2 °C;
frequência cardíaca: 120 bpm;
sudoreico, agitado com tremores;
ausculta respiratória e cardiovascular normais;
hiperemia em membro inferior esquerdo com edema local, sugestivo de
erisipela.
Comentários
O alcoolismo é uma condição comum que afeta de 8 a 15 milhões de pessoas
nos Estados Unidos, com cerca de 500.000 episódios anuais de abstinência alcoólica.
No Brasil, acredita-se que cerca de 6% da população apresente dependência ao
álcool, sendo esta a segunda causa de internações psiquiátricas. Algumas estimativas
interessantes concluem que o álcool é responsável por:
Fisiopatologia
A fisiopatologia não é completamente entendida, mas é dependente de
neurotransmissores ligados ao uso contínuo de álcool. A ingestão aguda de álcool leva
inicialmente a uma liberação de opioides endógenos causando euforia e reforço para o
uso contínuo. E m seguida, há ativação dos receptores inibitórios GABA tipo A, que
causam efeitos sedativos, ansiolíticos e alteração da coordenação e inibição dos
receptores excitatórios glutamato tipo NMDA (N-metil-D-aspartato), causando mais
sedação, intoxicação e distúrbios cognitivos. Em longo prazo, o uso crônico do álcool
altera o número e a função dos receptores como uma resposta compensatória aos
efeitos depressivos do álcool. Assim, há uma diminuição (down regulation) nos
receptores GABA tipo A e um aumento (up regulation) nos receptores glutamato tipo
NMDA. Tal adaptação crônica na ausência aguda do álcool leva ao estado de
hiperexcitabilidade da síndrome de abstinência alcoólica. A síndrome ainda está
associada à alteração nos níveis de liberação de noradrenalina e dopamina. A
hiperestimulação adrenérgica deve-se a uma redução da atividade de
adrenorreceptores inibitórios pré-sinápticos do subtipo, um fenômeno conhecido como
down-regulation.
A hiperatividade de receptores NMDA (N-mMetil-D-aspartato) também está
relacionada ao aumento da liberação noradrenérgica no locus ceruleus de ratos,
observada após a retirada do álcool. Assim, algumas reações que podem ocorrer
incluem taquicardia, hipertensão, náuseas, vômitos, midríase, tremores pela facilitação
da neurotransmissão muscular e febre. Não é claro, porém, o motivo de alguns
http://www.medicinanet.com.br/conteudos/casos/5136/sindrome_de_abstinencia_alcoolica.htm 2/13
16/07/2017 Síndrome de abstinência alcoólica | MedicinaNET
Achados clínicos
O diagnóstico depende da história de cessação ou redução do uso de álcool em
paciente que costuma usar grandes quantidades dessa substância. A história de
cessação de álcool e mais 2 dos sintomas a seguir são suficientes para o diagnóstico:
Alguns fatores de risco para desenvolver delirium tremens são bem definidos na
literatura:
http://www.medicinanet.com.br/conteudos/casos/5136/sindrome_de_abstinencia_alcoolica.htm 4/13
16/07/2017 Síndrome de abstinência alcoólica | MedicinaNET
Avaliação
A monitoração próxima e repetida destes pacientes é importante, e o uso de
escalas objetivas pode auxiliar o tratamento. Uma das escalas mais utilizadas é a
CIWA-Ar – Revised Clinical Institute Withdrawal Assessment for Alcohol Scale,
desenvolvida para avaliar e monitorar a terapêutica dirigida por sintomas nestes
pacientes (Tabela 2).
Exames complementares
O diagnóstico da síndrome é clínico e exige a exclusão de diagnósticos, como
infecções, exemplo da meningite, crise tireotóxica, entre outras condições. Os exames
são importantes ainda para avaliar condições que podem ter precipitado a interrupção
de álcool e pioram o prognóstico destes pacientes. Tais exames incluem:
http://www.medicinanet.com.br/conteudos/casos/5136/sindrome_de_abstinencia_alcoolica.htm 6/13
16/07/2017 Síndrome de abstinência alcoólica | MedicinaNET
hemograma;
glicemia;
ureia, creatinina, sódio, potássio, magnésio, cálcio;
enzimas hepáticas;
tempo de protrombina;
amilase e lipase;
eletrocardiograma;
radiografia de tórax;
urina tipo 1;
tomografia computadorizada de crânio.
Tratamento
Os pacientes devem ser alocados em ambiente tranquilo e com pouco barulho.
Orientação constante pela equipe ajuda o paciente a melhorar, sendo restrição
mecânica necessária em boa parte dos pacientes com delirium tremens.
Desidratação e déficits eletrolíticos são importantes nestes pacientes. Assim,
atenção especial deve ser dada à hidratação, realizada de preferência com soluções
fisiológicas. Em pacientes com delirium tremens, a reposição usual é de 2 L/dia,
podendo chegar até 5 L/dia.
Um problema potencial é o risco de desenvolver encefalopatia de Wernicke
durante a reposição com solução glicosada. A encefalopatia de Wernicke é uma
condição associada à deficiência de tiamina e é caracterizada por confusão mental,
ataxia e oftalmoplegia. Uma de suas principais causas é o alcoolismo crônico. A
tiamina é uma enzima envolvida em múltiplas fases do metabolismo energético e suas
necessidades são maiores em momento de maior demanda, como após infusão de
glicose. Por este motivo, pode precipitar-se a encefalopatia de Wernicke em pacientes
com história importante de etilismo. Critérios clínicos para seu diagnóstico foram
propostos, sendo os de Caine os mais aceitos. A presença de 2 desses critérios é
suficiente para o diagnóstico:
déficit nutricional;
alterações cerebelares;
alterações oculomotoras;
alterações de estado mental ou memória.
Outras opções
Betabloqueadores
http://www.medicinanet.com.br/conteudos/casos/5136/sindrome_de_abstinencia_alcoolica.htm 8/13
16/07/2017 Síndrome de abstinência alcoólica | MedicinaNET
Anticonvulsivantes
Não são indicados para profilaxia de crises convulsivas. O hidantal em particular
não deve ser utilizado em crises convulsivas associadas à abstinência de álcool. A
carbamazepina, por sua vez, pode ser utilizada como alternativa aos
benzodiazepínicos para tratar a síndrome de abstinência, sendo superior ao placebo
em pacientes com abstinência leve a moderada.
A administração é via oral; iniciar com 200 a 400 mg a cada 12 horas, podendo
chegar a 1.200 a 1.600 mg/dia. Pode causar náusea e vômitos ao início da
terapêutica. Não há disponível preparação parenteral.
Clonidina
Reduz manifestações autonômicas da abstinência, mas não há nenhuma
evidência de diminuir desfechos importantes, como delirium e convulsões.
Etanol parenteral
Pode melhorar os sintomas, mas seu uso não é considerado seguro nestes
pacientes.
Barbitúricos
Podem ser utilizados e em um único estudo a eficácia foi semelhante aos
benzodiazepínicos, devido ao risco de depressão respiratória devem ser evitados.
Baclofeno
Relaxante muscular de ação central usado para espasticidade, que age como
agonista GABA e, portanto, teria efeitos teóricos benéficos sobre os sintomas de
abstinência alcoólica. Um estudo mostrou melhora de sintomas após dose de 10 mg
de baclofeno, mas ainda não existem dados suficientes para recomendar seu uso.
Prescrição
Paciente com escore CIAWA de 18 caracterizando abstinência moderada,
evoluiu em poucas horas com delirium tremens. De qualquer forma, o tratamento
desde o início foi internado devido à erisipela associada. A Tabela 3 traz a prescrição
sugerida para este paciente.
Medicações
Benzodiazepínicos
Substâncias sedativas, ansiolíticas e amnésticas. Atingem tais efeitos por
interagirem com receptores GABAérgicos do sistema nervoso central, que controlam o
influxo de íons cloreto para as células-alvo.
Midazolam
1. Modo de ação
Agonista dos receptores GABA do sistema nervoso central.
2. Indicações
Medicação para sedação contínua ou utilizada como ansiolítico. Usado, ainda,
no controle de estados epilépticos.
3. Posologia
Pode ser administrada por via oral, intramuscular ou endovenosa. Para sedação
contínua, administrar em doses de 0,05 a 0,1 mg/Kg/h.
Sugestão de diluição: 10 ampolas (150 mg) de midazolam em 120 mL de soro
glicosado (solução com 1 mg/mL de midazolam).
4. Efeitos adversos
Pode-se observar bigeminismo, hipotensão arterial, taqui ou bradicardia,
bradipneia, broncoespasmo e cefaleia.
5. Apresentação comercial
DormonidÒ (ampolas de 3 mL, com 15 mg).
6. Monitoração
A possibilidade de hipotensão e o nível de sedação tornam constante a
monitoração do nível de consciência – idealmente com parâmetros eletrofisiológicos –
e dos dados vitais, como frequência cardíaca e pressão arterial, em pacientes
submetidos a infusão contínua de tal droga.
7. Classificação na gestação
Classe D.
8. Interações medicamentosas
http://www.medicinanet.com.br/conteudos/casos/5136/sindrome_de_abstinencia_alcoolica.htm 10/13
16/07/2017 Síndrome de abstinência alcoólica | MedicinaNET
Diazepam
1. Modo de ação
Agonista dos receptores GABA do sistema nervoso central.
2. Indicações
Medicação utilizada para ansiólise, como sedativo em infusão contínua ou como
medicação para controle agudo de crises convulsivas. Pode ser utilizado no controle
de crise de abstinência ao álcool.
3. Posologia
Na administração oral, pode-se iniciar doses por volta de 10 mg (menores em
indivíduos idosos, nefropatas ou hepatopatas) repetindo-se em intervalos frequentes
para o controle da abstinência alcoólica ou para controle da ansiedade.
Quando usado para abortar crise epiléptica, deve-se administrar (de maneira
endovenosa) dose de 0,3 mg/kg.
Para sedação contínua, podem ser necessárias doses por volta de 10 mg/h,
devendo-se titular conforme o efeito desejado ou surgimento de efeitos adversos.
4. Efeitos adversos
Pode ser observado rebaixamento do nível de consciência, que vai desde leve
sonolência até coma e apneia. Eventualmente, pode ser observado fenômeno
paradoxal de agitação neuropsicomotora, podendo-se deflagrar até quadros
francamente psicóticos.
5. Apresentação comercial
ValiumÒ, comprimidos de 10 mg e ampolas de 10 mg em 2 mL.
6. Monitoração
Assim como para midazolam, deve-se acessar frequentemente o nível de
consciência do indivíduo, bem como os sinais vitais, atentando-se para os possíveis
efeitos adversos advindos de sua administração.
7. Classificação na gestação
Classe D.
8. Interações medicamentosas
Diazepam pode interagir significativamente com cimetidina, ACO, dissulfiram,
glicosídeos cardíacos, omeprazol e xantinas.
Lorazepam
1. Modo de ação
Agonista de receptores GABA do sistema nervoso central.
2. Indicações
http://www.medicinanet.com.br/conteudos/casos/5136/sindrome_de_abstinencia_alcoolica.htm 11/13
16/07/2017 Síndrome de abstinência alcoólica | MedicinaNET
3. Posologia
A dose ansiolítica via oral pode variar entre 1 e 10 mg/dia, usualmente entre 2 e
6 mg. Para controle de crise epilética, doses endovenosas de 4 mg podem ser
administradas em intervalos de até cada 15 minutos, lentamente numa taxa de 2
mg/minuto. Dose de indução de hipnose deve ser de 0,044 mg/kg com titulação
conforme o efeito desejado.
4. Efeitos adversos
O uso do lorazepam pode-se associar a hipotensão, rebaixamento do nível de
consciência, diarreia/constipação intestinal e elevação de enzimas como TGO, TGP,
desidrogenase lática e fosfatase alcalina.
5. Apresentação comercial
LoraxÒ, comprimidos de 0,5, 1 e 2 mg, ampolas de 2 e 4 mg/mL.
6. Monitoração
O nível de consciência e variáveis fisiológicas deve ser acessado
frequentemente, a fim de flagrar eventos adversos precocemente.
7. Classificação na gestação
Classe D.
8. Interações medicamentosas
Álcool, outros depressores do sistema nervoso central, digoxina,
anticoncepcionais, rifampicina, escopolamina e xantinas podem interagir
significativamente com o lorazepam.
Penicilinas semissintéticas
Oxacilina
A oxacilina pertence à família das isoxazolilpenicilinas, derivado semissintético
das penicilinas. A oxacilina pode ser utilizada na forma oral e parenteral, com meia-
vida de 30 a 60 minutos e eliminação renal. Em pacientes com meninges normais, a
concentração liquórica é inadequada, aumentando-se de forma significativa na
vigência de meningite. A principal característica da droga é a resistência à ação das
penicilinases produzidas por Staphylococcus aureus.
A administração deve ser feita em intervalos de 4 horas. A meticilina é uma
droga do mesmo grupo, porém não é utilizada clinicamente.
As indicações clínicas limitam-se ao tratamento de infecções ocasionadas por
Staphylococcus aureus sensíveis à oxacilina, como celulite, furunculose, endocardite,
pneumonias e osteomielite. Apesar do aumento de cepas de Staphylococcus aureus
resistentes à oxacilina, principalmente em ambiente hospitalar, a oxacilina continua
sendo a droga de escolha para cepas sensíveis, independente da gravidade da
doença.
http://www.medicinanet.com.br/conteudos/casos/5136/sindrome_de_abstinencia_alcoolica.htm 12/13
16/07/2017 Síndrome de abstinência alcoólica | MedicinaNET
http://www.medicinanet.com.br/conteudos/casos/5136/sindrome_de_abstinencia_alcoolica.htm 13/13