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Sem

«Faça-se em mim segundo a


tua palavra.»
Advento 2020 – Retiro online com «a Bela Acarie»

1. Fecundidade eclesial ditinos, cartuxos, capuchinhos, cistercienses,


frades bernardos…), teólogos, doutores da
a) A notoriedade do salão Sorbonne, clérigos seculares, magistrados,
dos «Acarie» damas influentes da Corte, mulheres piedosas
Em 1599, a vida retoma o seu curso da burguesia e até mesmo o confessor do Rei.
no palacete dos Acarie. O casal tem de se re- Bérulle, Francisco de Sales e depois Vicente de
construir, depois de anos de separação. Bárba- Paulo são hóspedes assíduos. As partilhas de
ra, com 33 anos, é ainda uma bela mulher, mas ideias versam sobre os caminhos da união com
já não pode ter relações conjugais por causa Deus, mas também sobre a situação da Igreja,
das suas enfermidades. Quanto a Pierre, é um exangue pelas Guerras Religiosas: como susci-
homem humilhado; conheceu a desgraça e a tar uma renovação, tanto do clero como da vida
ruína, enquanto a sua esposa beneficia de uma religiosa? André Duval, seu confessor, declara:
aura excecional. Amargurado e ocioso, torna- «nesse tempo, nada se fazia de importante para
se autoritário mas apoia sem reservas todas os glória de Deus de que não se lhe falasse ou cuja
empreendimentos da mulher. Bárbara escolhe opinião não lhe fosse pedida.»
obedecer às suas mais pequenas exigências. Tinha chegado a um estado em que a comunhão
Desde que se deu o fracasso da «Sainte Ligue», com Deus se vive tão bem na ação como na
ela sabe que as verdadeiras armas são de ordem oração. A sua vida é inteiramente marcada pela
espiritual. Nesse mesmo ano é agraciada por docilidade às inspirações do Espírito, como no-
uma visão da Virgem com o Menino, sentada vamente testemunha o Padre Duval: «Estando
num trono resplandecente colocado num estra- no mundo, empreendeu coisas muito grandes
do de três degraus. O Padre André Duval, seu mas nunca se dispunha a decidi-las ou execu-
confessor, testemunha que Maria nessa altura tá-las, se não tivesse reconhecido claramente
lhe ensinou tudo o que diz respeito aos graus que Deus assim o queria. Se percebesse que o
da vida espiritual. De facto ela dá provas de sentimento divino não correspondia ao seu, ou,
ter uma admirável capacidade de discerni- então, se depois de ter pensado longamente
mento, pelo que eminentes personalidades permanecia com dúvidas, abandonava o seu
a vêm consultar. Declina o convite de Maria sentimento ou suspendia a execução até que
de Médicis a recebê-la como sua confidente. O Deus a tivesse esclarecido plenamente. Isto
seu salão torna-se o quartel general da Refor- verificou-se não apenas na fundação da Ordem
ma Católica. Lá se encontram religiosos (bene- das Carmelitas e na das Ursulinas, mas também

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em muitas outras obras particulares que ela enriqueci a Espanha com esta Ordem tão cé-
nunca empreendia se não visse ou não pres- lebre, também tu, que restauras a piedade em
sentisse em si que tal era a vontade de Deus. França, trata de beneficiar este país da mesma
Até quando falava de qualquer assunto, muitas graça» No entanto, os teólogos consultados
vezes a víamos parar de repente e às vezes arre- aconselham Bárbara a «tirar daí o sentido» por
piar caminho, reconhecendo que o sentimento causa da rutura de relações diplomáticas entre
e a vontade de Deus não era claro na sua alma, a França e a Espanha. Sete ou oito meses mais
mas que a persuadia do contrário ou então que tarde, Teresa reitera o seu pedido, garantindo
a deixava na perplexidade. (…) Uma grande e a Bárbara, numa nova visão, que a fundação se
particular virtude impedia-a de dizer ou fazer fará! Os teólogos desta vez ficam convencidos.
fosse o que fosse contra o parecer ou o senti- Bárbara faz diligências junto de duas princesas
mento d’Aquele que era o Único objeto do seu que solicitam a licença do Rei; este autoriza,
amor e seu Mestre interior.» contra todas as expectativas! Nesse mesmo
ano, de passagem pelo santuário de Saint-Ni-
colas-du-Port, Bárbara entra em êxtase junto
das relíquias do santo. Ouve Teresa chamá-la
b) Fundadora do Carmelo em França
para se tornar Carmelita como Irmã Conver-
Entre os projetos discutidos no seu salão, está sa. Fica desconcertada, de tal forma isso era
o de introduzir em França a Ordem do Car- incongruente com a sua cultura e a sua posi-
melo, reformada em Espanha por Santa Tere- ção social, mas empenhar-se-á em respeitar as
sa d’Ávila. Jean de Brétigny, padre normando disposições deste chamamento, no momento
oriundo de uma família espanhola, empenhava- oportuno.
se sem sucesso nesse projeto desde 1583. Este Bárbara constitui a equipa encarregada
sacerdote traduz então para francês as obras de trazer as Carmelitas para França. Persistindo
de Santa Teresa que surgiram a partir de 1601 e a oposição do Carmelo espanhol, convence
conheceram várias reedições devido ao suces- Pierre de Bérulle a ir pessoalmente a Espanha
so que tiveram. O “Paris devoto” podia ler no para conduzir as negociações. Munido de car-
Caminho de Perfeição (cap. I,2) o que Madre tas de recomendação do Rei e apoiado pelo
Teresa escrevera em 1566, ano do nascimento Núncio, consegue que sejam designadas seis
de Bárbara, a propósito das Guerras da Reli- Carmelitas formadas pela própria Teresa: Ana
gião: «Nesse tempo chegaram-me notícias dos de Jesus, Ana de São Bartolomeu, Isabel de São
danos e estragos causados em França (…) Deu- Paulo, Isabel dos Anjos, Leonor de São Bernar-
me grande pesar, e, como se eu pudesse ou do e Isabel da Conceição. Entretanto, a Senho-
fosse alguma coisa, chorava com o Senhor e ra Acarie supervisiona de perto a construção do
suplicava-Lhe remediasse tanto mal. Parecia- primeiro Carmelo, no bairro de Saint-Jacques.
me que mil vidas daria para remédio de uma Cria também uma comunidade para preparar
alma das muitas que ali se perdiam. (…) Deter- jovens mulheres desejosas de ser Carmelitas.
minei-me pois, fazer este pouquito que está na Depois de uma viagem épica, as Carmelitas
minha mão: seguir os conselhos evangélicos espanholas são acolhidas triunfalmente em
com toda a perfeição que eu pudesse e procu- Paris, a 15 de Outubro de 1604.
rar que estas poucas que aqui estão fizessem Dois meses depois da sua chegada, o
o mesmo. Punha a minha confiança na grande sucesso é tal que é necessário abrir um segun-
bondade de Deus que nunca falta em ajudar a do Carmelo em Pontoise, em 15 de janeiro de
quem por Ele se determina a deixar tudo.» 1605. As fundações sucedem-se rapidamente
Em 1602 Santa Teresa aparece numa visão àque- com o apoio da Senhora Acarie: Dijon (finais de
la cujo nascimento pode ser sido uma resposta 1605), Amiens (1606), Tours (1608), Rouen (1609),
às suas preces! Confia a Bárbara a missão de in- Châlons e Bordeaux (1610)… Ao mesmo tem-
troduzir as Carmelitas em França: «Tal como eu po, pede à Senhora Sainte-Beuve que funde a

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ordem das Ursulinas, destinada à educação de simultaneamente a graça da nossa adoção
raparigas. Também apoia o seu primo Pierre de filial e a graça de nos podermos entregar ao
Bérulle na fundação do Oratório. Acompanha serviço dos outros em obediência a Deus.
a reforma de diversos mosteiros assumindo ao Tanto na oração como na ação, a Senhora Aca-
mesmo tempo os cuidados da casa e tratando rie experimenta agora a unificação da sua vida,
do seu marido, cuja saúde se degrada. recebendo tudo como um dom da graça. Uma
só coisa é necessária: deixar-se conduzir por
Deus: daí a sua extrema vigilância no discerni-
mento da ação do Espírito Santo, antes de em-
preender fosse o que fosse. Não se trata tanto
de fazer belas coisas, com o risco de acabar por
c) Uma obra da Igreja
procurar a própria glória, mas de perder a vida
Esta fecundidade surpreendente foi preparada para que Deus possa cumprir a sua obra, uma
por acontecimentos providenciais, não apenas obra que não se mede quantitativamente pela
os anos em que a Senhora Acarie teve de assu- sua importância visível, mas qualitativamente
mir sozinha os negócios familiares, mas também pelo amor divino que é a sua fonte. Somente
as graças místicas pelas quais foi conduzida a aquilo que é recebido como dom de Deus é
comprometer-se na reforma da Igreja. Nessa vivido em verdade. Certamente que o dom
altura, recebe tudo de Cristo, tanto na oração apela a uma resposta, mas esta aparece então
como na ação. Cristo foi o primeiro a realizar como a necessidade interior de se comprome-
a sua identidade filial através da missão rece- ter no serviço de Deus, mantendo-se livre de
bida do Pai: Como Pessoa, Ele é Filho de Deus toda a preocupação de si mesmo. A condição
e encarna essa identidade divina numa existên- do amor é esta liberdade vivida como exigên-
cia humana, cumprindo filialmente no mundo a cia interior, como obediência àquilo que é não
vontade do Pai. Receber a Cristo, Verbo feito somente dado, mas reconhecido como dom de
carne, na nossa humanidade, é receber dEle Deus.

2. A Anunciação a Maria (Lc 1,26-38)

Naquele tempo, o Anjo Gabriel foi enviado por Deus a uma cidade da Galileia chamada Nazaré,
a uma Virgem desposada com um homem chamado José. O nome da Virgem era Maria. Tendo
entrado onde ela estava, disse o Anjo: «Ave, cheia de graça, o Senhor está contigo».

Ela ficou perturbada com estas palavras e pensava que saudação seria aquela. Disse-lhe
o Anjo: «Não temas, Maria, porque encontraste graça diante de Deus. Conceberás e darás à luz
um Filho, a quem porás o nome de Jesus. Ele será grande e chamar-Se-á Filho do Altíssimo. O
Senhor Deus Lhe dará o trono de seu pai David; e o seu reinado não terá fim». Maria disse ao
Anjo: «Como será isto, se eu não conheço homem?»

O Anjo respondeu-lhe: «O Espírito Santo virá sobre ti e a força do Altíssimo te cobrirá


com a sua sombra. Por isso o Santo que vai nascer será chamado Filho de Deus. E a tua parenta
Isabel concebeu também um filho na sua velhice porque a Deus nada é impossível». Maria disse
então: «Eis a escrava do Senhor; faça-se em mim segundo a tua palavra». E o anjo saiu de junto
dela.»

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Maria exerceu a sua liberdade de maneira úni- a nossa vida seja uma existência que não tenha
ca acolhendo o dom por excelência, o dom do outro sentido senão Deus, Verbo feito carne,
Filho de Deus: «Eis a escrava do Senhor; faça-se Palavra única em Quem toda a vida encontra
em mim segundo a tua palavra». O Anjo apre- sentido e plenitude. Somos chamados a des-
senta o Menino que está para chegar como cobrir em Jesus Cristo o sentido da nossa vida:
sendo o herdeiro das promessas de Deus à des- «Como será isso?» Não temos outra resposta
cendência de David. Mas o cumprimento ultra- além daquela que foi dada a Maria: é obra do
passará a promessa: Ele será chamado Filho do Espírito Santo e da Omnipotência do Altíssimo,
Altíssimo! Maria aceita então confiar, apesar que ultrapassa tudo o que possamos com-
das suas dúvidas quanto à sua capacidade de preender. No entanto isto não se faz sem nós:
compreender a vontade do Senhor. Não pode devemos dar o salto da confiança para acolher
saber precisamente onde é que a levará este esta Palavra na precariedade da nossa condi-
SIM e, no entanto, esse desconhecimento não ção humana. O Natal é um apelo a viver este
faz violência à sua liberdade. Maria não diz SIM ato de confiança radical, este SIM da verda-
ao teor de uma palavra que manifestamente a deira liberdade, para nos tornarmos, tal como
ultrapassa, mas a Deus em Quem ela coloca Maria, responsáveis pela Palavra de Deus. Deus
toda a confiança. Acolhendo positivamente chama-nos a isso, e para isso nos cumula da sua
o anúncio desta Criança, ela diz SIM ao que graça na medida em que aceitemos ser habita-
lhe é dado, aceitando não apenas o descon- dos pela sua Palavra, Lhe abramos o coração:
hecido que constitui toda a criança que está num mundo cheio de incertezas Deus vem ao
para nascer, mas também o desconhecimento nosso encontro. Prepararmo-nos para o Natal é
deste dom que vem do próprio Deus. Todo o aprender a escutar esta Palavra que surge mes-
ser humano é chamado desde o despertar da mo no meio dos imprevistos das nossas vidas.
sua liberdade a dizer SIM ao dom da vida, mas Acolher este Deus que fala ao homem é discer-
a graça da fé em Cristo permite reconhecer nir os dons que Ele nos concede e responder
nesse dom, o dom do próprio Deus. Na escuta aos convites que constituem. A vida é dom, e o
da Palavra de Deus, este SIM à vida torna-se amor é acolhimento desse dom na confiança e
um SIM a Deus. A partir de então o sentido da na aceitação do desconhecido: o Natal chama-
vida humana passa a ser apenas um, Deus: Ele nos a acolher o dom que nos é dado, não ape-
será chamado Filho de Deus. Ao acolher este nas o da vida, mas da Vida Divina no nascimen-
menino, Maria diz SIM a uma existência inteira- to do Emanuel na nossa carne: Deus connosco.
mente referenciada a Deus.
Também nós somos chamados a consentir que Fr. Olivier Rousseau OCD (Convento de Avon)

3. As 3 pistas para a semana

• Reconhecer os dons que Deus me dá para servir a sua obra.


• Discernir os chamamentos que ressoam em mim como uma exigência interior.
• Através do meu sim à vida, reconhecida como dom de Deus, dizer SIM ao dom da Vida que
Deus me faz no seu Filho.

4.Uma palavra para orar

«Eis a serva do Senhor: faça-se em mim segundo a tua palavra.» (Lc 1,38)

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Orar cada dia da semana

Segunda-feira, 21 de dezembro - Caridade do coração


Maria pôs-se a caminho
e dirigiu-se apressadamente para a casa de Zacarias e saudou Isabel.» (cf. Lc 1, 39)

Deveríamos ser muito despachados quando se nos apresenta qualquer gesto de cari-
dade, e estar sempre prontos a deixar todas as nossas devoções por essa razão.

Neste tempo do Natal que gesto ou que obra posso fazer para socorrer os necessitados?

Terça-feira, 22 de dezembro - A verdadeira Misericórdia de Deus


O Todo-Poderoso fez em mim maravilhas;
a sua misericórdia se estende de geração em geração. (Lc 1, 49-50)

Ah, meu Deus de Misericórdia!


Que vos digneis olhar para a vossa pobre criatura: que misericórdia!

Como se traduz em mim a misericórdia,


como é que ela transparece nos meus gestos, palavras?

Quarta-feira, 23 de dezembro – Dar Graça


Isabel deu à luz um filho. Os seus vizinhos e a sua família
congratularam-se com ela. (cf. Lc 1, 57-58)

Ó Deus Todo-Poderoso, Criador do Céu e da terra, que sois a minha Vida,


todo o meu Bem e minha Felicidade, desejo dar-Vos infinitos louvores
e bendizer-Vos pelos vossos benefícios desde que nasci, por ter sido do
vosso agrado resgatar-me, ó meu Amado!

Dou graças ao Senhor pelas coisas belas que fez na minha vida
e das quais posso fazer memória com Ele hoje.

Quinta-feira, 24 de dezembro - Ele mora em nós


«O Senhor anuncia que te vai construir uma casa.» (2Sam 7,1)

Diz-me então, minha alma, se não és bem-aventurada se conseguires encontrar repouso


com o teu Deus e dizer com verdade: Aquele que me criou encontrou repouso no meu
tabernáculo.

Deus habita em nós. Como posso levar Deus aos que me rodeiam
e que vou acolher nestas festas?

Sexta-feira, 25 de dezembro - Emmanuel


Os pastores encontraram Maria e José e o Menino
deitado numa manjedoura. (Lc 2,16)

Um Deus, um Deus, rebaixar-Se até Se tornar criança por amor a nós! Quando então nos
tornaremos pequenos aos nossos próprios olhos para imitar a Santa Infância de Nosso
Senhor?

Contemplo o meu Salvador no presépio… humildade amorosa, espírito de infância: deixo


que o meu coração seja invadido pela bondade do Coração de Deus, que Se faz assim
pequeno porque me ama. « La sainte famille », Reynaud Levieux, 1651

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