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Decisão judicial: Recusa ao bafômetro não é suficiente

para multar
Não é novidade que a Lei 13.281/16 trouxe uma série de modificações
no Código de Trânsito Brasileiro. Com as mudanças surgiram os
questionamentos, as dúvidas e as discussões em torno de
determinados pontos considerados polêmicos. Dentre eles, talvez o que
desperta acirrada controvérsia é o art. 165-A, que estipula punições
severas para a recusa ao bafômetro. cujo teor é o seguinte:
Art. 165-A - Recusar-se a ser submetido a teste, exame clínico, perícia
ou outro procedimento que permita certificar influência de álcool ou
outra substância psicoativa, na forma estabelecida pelo art. 277:
Infração - gravíssima; Penalidade - multa (dez vezes) e suspensão do
direito de dirigir por 12 (doze) meses; Medida administrativa -
recolhimento do documento de habilitação e retenção do veículo,
observado o disposto no § 4º do art. 270. Parágrafo único. Aplica-se em
dobro a multa prevista no caput em caso de reincidência no período de
até 12 (doze) meses

Em outra oportunidade fizemos análise em relação à


constitucionalidade do dispositivo e nos manifestamos, com base na
Doutrina, bem como nos fundamentos das decisões judiciais, a favor
de sua inconstitucionalidade, por ferir direitos fundamentais do
indivíduo. Importante salientar que o objetivo do artigo anterior e deste
não é defender a possibilidade de o condutor dirigir embriagado, mas
possibilitar a correta defesa e análise do caso concreto, com o fito de
evitar injustiças.

Veja o artigo: Recusa bafômetro | Presunção de inocência e teste


bafômetro
À época em que comentamos sobre o tema inexistiam decisões
judiciais no sentido de ratificar ou não os argumentos ali levantados.

Passados quase dois anos, começa a se formar entendimento judicial


em alguns estados-membros no sentido de considerar a simples
recusa ao bafômetro como fator insuficiente para a aplicação da multa
e demais cominações previstas no CTB.

Jurisprudência recente sobre recusa ao bafômetro


Conceito Jurisprudência

Se você não esta acostumado com termos técnico-jurídicos, saiba que


jurisprudência é um conjunto de decisões no mesmo sentido. Assim,
no caso concreto que vamos apresentar, várias decisões foram
tomadas admitindo que a simples recusa ao bafômetro não constitui
motivo suficiente para aplicar as penalidades previstas no art. 165-
A do CTB.
______________

No Rio Grande do Sul, há farta jurisprudência admitindo a nulidade


do auto de infração de trânsito por recusa ao teste do etilômetro. A fim
de ilustrar, colacionamos exemplo abaixo:

RECURSO INOMINADO. DETRAN/RS. AUTO DE INFRAÇÃO DE


TRÂNSITO. RECUSA DO CONDUTOR EM SUBMETER-SE AO TESTE DO
ETILÔMETRO. ARTIGO  165-A  do  CTB. AFASTAMENTO. SENTENÇA
REFORMADA. RECURSO PROVIDO, POR MAIORIA, POR FUNDAMENTOS
DIVERSOS (Processo nº 71007691801 (Nº CNJ: 0027419-
72.2018.8.21.9000).

No caso concreto, o condutor ingressou com ação judicial no sentido


de anular o Auto de Infração por entender que a recusa ao bafômetro,
por si, não é capaz de gerar a presunção de embriaguez, devendo o
agente da autoridade de trânsito utilizar outros elementos para a
constatação da infração, nos termos do art. 277, § 3º do CTB.
Art. 277. O condutor de veículo automotor envolvido em acidente de
trânsito ou que for alvo de fiscalização de trânsito poderá ser submetido
a teste, exame clínico, perícia ou outro procedimento que, por meios
técnicos ou científicos, na forma disciplinada pelo Contran, permita
certificar influência de álcool ou outra substância psicoativa que
determine dependência. § 3º Serão aplicadas as penalidades e medidas
administrativas estabelecidas no art. 165-A deste Código ao condutor
que se recusar a se submeter a qualquer dos procedimentos previstos
no caput deste artigo.

Ademais, arguiu que a inexistência de outros elementos configura


atentado ao princípio constitucional de que ninguém é obrigado a
produzir prova contra si.

A decisão foi no sentido de que "de acordo com a redação do artigo


165-A, e a lógica que dele se depreende, somente é possível submeter o
condutor de veículo aos testes acima descritos caso ele apresente
sinais externos de influência de álcool, os quais deverão ser
devidamente certificados por meio do Termo próprio, com descrição de
todas as características que levam à conclusão e na presença de
testemunha idônea, ou por outro procedimento (art. 277, caput, do
CTB)".
Ainda segundo o julgado, uma vez verificados sinais externos de
embriaguez e recusando-se o condutor a realizar o teste, deveria ser
proposto exame clínico, por médico, no instituto médico legal, não
havendo nos autos provas neste sentido.

Há ainda menção de que autuar sem fosse constatado real ameaça à


segurança no trânsito configura arbitrariedade e viola os princípios
constitucionais da liberdade (direito de ir e vir), da presunção de
inocência e da não auto incriminação, previstos no
art. 5º, XV, LVII e LXIII, da Carta Magna (Constituição Federal).
Argumento interessante levantado pelo julgador-relator se refere à
violação do princípio da individualização da pena, uma vez que há a
mesma cominação para condutas de incomparável reprovabilidade
social (aqui, demonstra que a comprovação de embriaguez -
art. 165 do CTB e simples recusa ao bafômetro sem outros elementos
comprobatórios - art. 165-A do CTB - possuem idênticas punições).
Assim, começa a se formar uma corrente pela inaplicabilidade, por
inconstitucionalidade, do artigo mencionado. Evidente que as
discussões estão longe do fim, mas o importante é debatermos o tema
com foco na solução que atenda ao anseio social.

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